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Document 61992CJ0392

Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 14 de Abril de 1994.
Christel Schmidt contra Spar- und Leihkasse der früheren Ämter Bordesholm, Kiel und Cronshagen.
Pedido de decisão prejudicial: Landesarbeitsgericht Schleswig-Holstein - Alemanha.
Manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresa.
Processo C-392/92.

Colectânea de Jurisprudência 1994 I-01311

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1994:134

61992J0392

ACORDAO DO TRIBUNAL (QUINTA SECCAO) DE 14 DE ABRIL DE 1994. - CHRISTEL SCHMIDT CONTRA SPAR- UND LEIHKASSE DER FRUEHEREN AEMTER BORDESHOLM, KIEL UND CRONSHAGEN. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: LANDESARBEITSGERICHT SCHLESWIG-HOLSTEIN - ALEMANHA. - MANUTENCAO DOS DIREITOS DOS TRABALHADORES EM CASO DE TRANSFERENCIA DE EMPRESA. - PROCESSO C-392/92.

Colectânea da Jurisprudência 1994 página I-01311
Edição especial sueca página I-00081
Edição especial finlandesa página I-00111


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

Política social - Aproximação das legislações - Transferências de empresas - Manutenção dos direitos dos trabalhadores - Directiva 77/187 - Âmbito de aplicação - Recurso a um empresário independente para os trabalhos de limpeza executados anteriormente pelo pessoal da empresa - Inclusão - Actividade ocupando apenas um único assalariado - Irrelevância

(Directiva 77/187 do Conselho, artigo 1. , n. 1)

Sumário


O artigo 1. , n. 1, da Directiva 77/187, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos, deve ser interpretado no sentido de que é abrangido pelo seu âmbito de aplicação uma situação em que o empresário confia, por contrato, a um outro empresário a responsabilidade de executar os trabalhos de limpeza anteriormente assegurados de modo directo, mesmo que, antes da transferência, esses trabalhos fossem executados por uma única empregada.

Com efeito, nem o facto dessa transferência só dizer respeito a uma actividade acessória da empresa cedente, sem relação necessária com o seu objecto social, nem o facto de não ser acompanhada de qualquer transferência de activos, nem o número de trabalhadores em causa, podem ter por efeito excluir essa operação do âmbito de aplicação da directiva, porque o critério decisivo para estabelecer a existência de uma transferência na acepção da directiva é o da manutenção da identidade da entidade económica, o que resulta nomeadamente da prossecução efectiva ou da continuação pelo novo empresário das mesmas actividades económicas ou actividades análogas.

Partes


No processo C-392/92,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pelo Landesarbeitsgericht Schleswig-Holstein (Alemanha), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Christel Schmidt

e

Spar- und Leihkasse der frueheren AEmter Bordesholm, Kiel und Cronshagen,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos (JO L 61, p. 26; EE 05 F2 p. 122).

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: J. C. Moitinho de Almeida, presidente de secção, R. Joliet, G. C. Rodríguez Iglesias, F. Grévisse (relator) e M. Zuleeg, juízes,

advogado-geral: W. Van Gerven

secretário: D. Louterman-Hubeau, administradora principal

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação da Spar- und Leihkasse der frueheren AEmter Bordesholm, Kiel und Cronshagen, demandada no processo principal, por Wolfgang Jordan, advogado em Bordesholm,

- em representação do Governo da República Federal da Alemanha, por Ernst Roeder, Ministerialrat no Ministério federal da Economia, na qualidade de agente,

- em representação do Governo do Reino Unido, por Sue Cochrane, do Treasury Solicitor' s Department, e Derrick Wyatt, barrister, na qualidade de agentes,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Karen Banks e Juergen Grunwald, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações do Governo alemão, do Governo do Reino Unido, representado por John E. Collins, Assistant Treasury Solicitor, e Derrick Wyatt, na qualidade de agentes, e da Comissão das Comunidades Europeias, na audiência de 20 de Janeiro de 1994,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 23 de Fevereiro de 1994,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 27 de Outubro de 1992, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 9 de Novembro de 1992, o Landesarbeitsgericht Schleswig-Holstein, submeteu, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, duas questões prejudiciais sobre a interpretação da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à manutenção das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos (JO L 61, p. 26; EE 05 F2 p. 122, a seguir "directiva").

2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe Christel Schmidt à Spar- und Leihkasse der frueheren AEmter Bordesholm, Kiel und Cronshagen (caixa económica e de empréstimos das antigas associações profissionais de comunas de Bordesholm, Kiel e Cronshagen, a seguir "caixa económica").

3 Resulta dos fundamentos do despacho de reenvio que a demandante no processo principal, que era uma trabalhadora, empregada pela caixa económica para limpar as instalações da sua sucursal de Wacken, foi despedida em Fevereiro de 1992 devido à reorganização dessa sucursal, cuja limpeza a caixa económica desejava confiar à empresa Spiegelblank, que já fazia a da maior parte dos outros estabelecimentos da caixa económica.

4 A sociedade Spiegelblank propôs à interessada que continuasse ao seu serviço por uma remuneração mensal superior à que recebia até então. Mas C. Schmidt não estava disposta a trabalhar nessas condições porque considerava que o aumento das superfícies a limpar conduzia, na realidade, a uma redução do seu salário horário.

5 C. Schmidt intentou uma acção contra o seu despedimento, que foi julgada improcedente em primeira instância. Em seguida, recorreu para o Landesarbeitsgericht Schleswig-Holstein.

6 Este órgão jurisdicional, considerando que a solução do litígio dependia da interpretação da Directiva 71/187, submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

"1) Os trabalhos de limpeza de um estabelecimento podem ser equiparados a uma parte de estabelecimento, na acepção da Directiva 77/187/CEE, no caso de serem contratualmente transferidos para outra empresa?

2) No caso de a resposta à primeira questão ser afirmativa, isso também é válido no caso de os trabalhos de limpeza serem assegurados, até à transferência, por uma única trabalhadora?"

7 Estas duas questões podem ter uma resposta comum.

8 Nos termos do artigo 1. , n. 1, da directiva, "A presente directiva é aplicável às transferências de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos que resultem de uma cessão convencional ou de fusão que impliquem mudança de empresário".

9 Através destas duas questões, o órgão jurisdicional nacional pretende saber se os trabalhos de limpeza de um estabelecimento de uma empresa podem ser equiparadas a uma parte de estabelecimento na acepção da directiva e se essa equiparação é possível quando esses trabalhos eram executados por uma única empregada antes de serem transferidos contratualmente para uma empresa externa.

10 A caixa económica, a República Federal da Alemanha e o Reino Unido propõem que se responda negativamente. Essencialmente, a caixa económica alega que a execução dos trabalhos de limpeza não é nem a actividade principal nem uma actividade acessória da empresa e os Governos da República Federal da Alemanha e do Reino Unido sustentam que a decisão da empresa de confiar esses trabalhos a uma outra empresa não envolveu transferência de entidade económica nem de locais ou de elementos do activo.

11 A Comissão considera, nomeadamente, que embora a limpeza seja assegurada pelo pessoal da empresa, trata-se de um serviço gerido de modo directo e o facto deste trabalho apenas constituir uma actividade acessória sem relação necessária com o objecto social da empresa não pode ter por efeito excluir a transferência do âmbito de aplicação da directiva.

12 Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça (v. acórdão de 12 de Novembro de 1992, Watson Rask e Christensen, C-209/91, Colect., p. I-5755, n. 15), a directiva é aplicável desde que se dê uma mudança, no âmbito de relações contratuais, da pessoa singular ou colectiva responsável pela exploração da empresa e que, por isso, contrai obrigações de entidade patronal perante os assalariados que trabalham na empresa, sem que interesse saber se a propriedade da empresa se transmite.

13 A protecção prevista pela directiva aplica-se, em especial, por força das referidas disposições do artigo 1. , n. 1, quando a transferência só diz respeito a um estabelecimento ou uma parte de estabelecimento, quer dizer, a uma parte da empresa. Diz então respeito aos trabalhadores dessa parte da empresa uma vez que, como decidiu o Tribunal de Justiça no acórdão de 7 de Fevereiro de 1985, Botzen (186/83, Recueil, p. 519, n. 15), a relação de trabalho é essencialmente caracterizada pelo vínculo que existe entre o trabalhador e a parte da empresa a que está afectado para o exercício das suas funções.

14 Assim, quando um empresário confia, mediante acordo, a responsabilidade de explorar um serviço da sua empresa, tal como o que consiste na execução das tarefas de limpeza, a um outro empresário que assume, por esse facto, as obrigações de entidade patronal relativamente aos assalariados aí afectados, a operação pode ser abrangida pelo âmbito de aplicação da directiva. Como o Tribunal de Justiça já salientou no acórdão Watson Rask e Christensen, já referido, n. 17, o facto de, nesse caso, a actividade transferida só constituir, para a empresa cedente, uma actividade acessória sem relação necessária com o seu objecto social não pode ter por efeito excluir essa operação do âmbito de aplicação da directiva.

15 A circunstância de a actividade em causa ser assegurada antes da transferência por uma única empregada também não é suficiente para afastar a aplicação das disposições da directiva, a qual não depende do número de assalariados da parte da empresa objecto da transferência. Com efeito, deve recordar-se que a directiva tem, nomeadamente, por objectivo, como resulta do seu segundo considerando, proteger os trabalhadores em caso de mudança de empresário, especialmente para assegurar a manutenção dos seus direitos. Esta protecção visa todos os assalariados e deve, assim, ser assegurada mesmo quando um único trabalhador é abrangido pela transferência.

16 O argumento dos Governos da República Federal da Alemanha e do Reino Unido retirado da não transferência de elementos activos também não pode ser acolhido. A circunstância de a jurisprudência do Tribunal de Justiça citar a transferência desses elementos entre os diferentes critérios a tomar em conta pelo juiz nacional para, no âmbito da avaliação global de uma operação complexa, apreciar a realidade de uma transferência de empresa não permite concluir que a sua falta exclui a existência de uma transferência. Com efeito, a manutenção dos direitos dos trabalhadores que, segundo o seu próprio título, é o objecto da directiva, não pode depender apenas da tomada em consideração de um factor que o Tribunal, aliás, já referiu não ser, só por si, determinante (v. acórdão de 18 de Março de 1986, Spijkers, 24/85, Colect., p. 1119, n. 12).

17 Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça (v. acórdão Spijkers, já referido, n. 11, e acórdão de 19 de Maio de 1992, Redmond Stichting, C-29/91, Colect., p. I-3189, n. 23), o critério decisivo para caracterizar a existência de uma transferência de empresa ou parte de empresa na acepção da directiva é o da manutenção da identidade da entidade económica. Segundo a mesma jurisprudência, a manutenção dessa identidade resulta, nomeadamente, da prossecução efectiva ou da continuação pelo novo empresário das mesmas actividades económicas ou de actividades análogas. Assim, no caso em apreço no processo principal, cuja decisão de reenvio fornece todos os elementos úteis, a similaridade das actividades de limpeza exercidas antes e depois da transferência, a qual, aliás, se traduziu pela oferta de reemprego feita à trabalhadora em causa, constitui um elemento característico de uma operação que é abrangida pelo âmbito de aplicação da directiva e que dá ao assalariado cuja actividade foi transferida a protecção que lhe garante essa directiva.

18 Pode observar-se, no entanto, que, embora, nos termos do artigo 4. , n. 1, da directiva, a transferência de uma empresa ou de uma parte de empresa não possa constituir, em si mesma, fundamento de despedimento por parte do cedente ou do cessionário, esta disposição não constitui obstáculo aos despedimentos por razões económicas, técnicas ou de organização que impliquem mudanças no plano do emprego.

19 Por último, deve também recordar-se que a directiva não se opõe a uma alteração da relação de trabalho com o novo empresário, na medida em que o direito nacional aplicável admita tal alteração fora da hipótese de uma transferência de empresa (v., em último lugar, acórdão Watson Rask e Christensen, já referido, n. 31).

20 Assim, há que responder às questões prejudiciais que o artigo 1. , n. 1, da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos, deve ser interpretado no sentido de que é abrangida pelo seu âmbito de aplicação uma situação, tal como a caracterizada no despacho de reenvio, em que o empresário confia, por contrato, a um outro empresário a responsabilidade de executar os trabalhos de limpeza anteriormente assegurados de modo directo, mesmo que, antes da transferência, esses trabalhos fossem executados por uma única empregada.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

21 As despesas efectuadas pelo Governo alemão, pelo Governo do Reino Unido e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Landesarbeitsgericht Schleswig-Holstein, por despacho de 27 de Outubro de 1992, declara:

O artigo 1. , n. 1, da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos, deve ser interpretado no sentido de que é abrangido pelo seu âmbito de aplicação uma situação, como a caracterizada no despacho de reenvio, em que o empresário confia, por contrato, a um outro empresário a responsabilidade de executar os trabalhos de limpeza anteriormente assegurados de modo directo, mesmo que, antes da transferência, esses trabalhos fossem executados por uma única empregada.

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