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Document 61992CJ0382

    Acórdão do Tribunal de 8 de Junho de 1994.
    Comissão das Comunidades Europeias contra Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte.
    Manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas.
    Processo C-382/92.

    Colectânea de Jurisprudência 1994 I-02435

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1994:233

    61992J0382

    ACORDAO DO TRIBUNAL DE 8 DE JUNHO DE 1994. - COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS CONTRA REINO UNIDO DA GRA-BRETANHA E DA IRLANDA DO NORTE. - MANUTENCAO DOS DIREITOS DOS TRABALHADORES EM CASO DE TRANSFERENCIA DE EMPRESAS. - PROCESSO C-382/92.

    Colectânea da Jurisprudência 1994 página I-02435
    Edição especial sueca página I-00169
    Edição especial finlandesa página I-00205


    Sumário
    Partes
    Fundamentação jurídica do acórdão
    Decisão sobre as despesas
    Parte decisória

    Palavras-chave


    ++++

    1. Política social ° Aproximação das legislações ° Transferências de empresas ° Manutenção dos direitos dos trabalhadores ° Directiva 77/187 ° Obrigação de o cedente e o cessionário informarem e consultarem os representantes dos trabalhadores ° Regulamentação nacional que não prevê mecanismo de designação dos representantes dos trabalhadores no caso de oposição da entidade patronal ° Inadmissibilidade

    (Directiva 77/187 do Conselho, artigo 6. )

    2. Política social ° Aproximação das legislações ° Transferências de empresas ° Manutenção dos direitos dos trabalhadores ° Directiva 77/187 ° Âmbito de aplicação ° Empresa sem fim lucrativo ° Inclusão

    (Directiva 77/187 do Conselho, artigo 1. , n. 1)

    3. Política social ° Aproximação das legislações ° Transferências de empresas ° Manutenção dos direitos dos trabalhadores ° Directiva 77/187 ° Obrigação de o cedente e o cessionário informarem e consultarem os representantes dos trabalhadores ° Regulamentação nacional que não prevê a obrigação de alcançar um acordo ° Inadmissibilidade

    (Directiva 77/187 do Conselho, artigo 6. )

    4. Política social ° Aproximação das legislações ° Transferências de empresas ° Manutenção dos direitos dos trabalhadores ° Directiva 77/187 ° Obrigação de os Estados-membros punirem as violações da regulamentação comunitária ° Alcance ° Sanção que atinge a entidade patronal que não respeitou a obrigação de informar e consultar os representantes dos trabalhadores ° Indemnização passível de confusão com a indemnização devida em razão da violação da regulamentação sobre despedimentos por motivos económicos ° Sanção não dissuasiva ° Inadmissibilidade

    (Tratado CEE, artigo 5. ; Directiva 77/187 do Conselho, artigo 6. )

    Sumário


    1. Apesar do carácter limitado da harmonização das disposições em matéria de manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferências de empresas que a Directiva 77/187 pretendeu realizar, deve ser considerada contrária às disposições desta uma regulamentação nacional que, ao não prever mecanismo de designação dos representantes dos trabalhadores na empresa quando a entidade patronal recusa reconhecer tais representantes, deixa à entidade patronal a possibilidade de pôr em causa a protecção prevista a favor dos trabalhadores no seu artigo 6. , n.os 1 e 2.

    2. O artigo 1. , n. 1, da Directiva 77/187, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, opõe-se a que um Estado-membro limite a aplicação das regras nacionais de transposição às transferências de empresas com um fim lucrativo.

    Assim, uma entidade pode exercer uma actividade económica e ser considerada uma "empresa" para efeitos de aplicação de normas de direito comunitário, mesmo se não prossegue um fim lucrativo.

    3. Não assegura uma transposição correcta da Directiva 77/187, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, uma regulamentação nacional que obriga simplesmente o cedente ou o cessionário que pretendem tomar medidas relativamente aos trabalhadores afectados por uma transferência a iniciar consultas com os representantes dos sindicatos por eles reconhecidos, a tomar em consideração todas as observações formuladas por esses representantes, e a responder a essas observações e, se as recusam, a indicar as razões, quando o artigo 6. , n. 2, da directiva impõe a consulta dos representantes dos trabalhadores "tendo em vista alcançar um acordo".

    4. Quando uma directiva comunitária não prevê uma sanção específica no caso de violação das suas disposições ou remete, nesse ponto, para as disposições legislativas, regulamentares e administrativas nacionais, o artigo 5. do Tratado impõe aos Estados-membros que tomem todas as medidas adequadas para garantir o alcance e a eficácia do direito comunitário. Para esse efeito, ao mesmo tempo que conservam a possibilidade de escolher as sanções, devem, designadamente, velar para que as violações do direito comunitário sejam punidas em condições, substantivas e de processo, análogas às aplicáveis às violações do direito nacional de natureza e importância semelhantes e que, de qualquer forma, confiram à sanção um carácter efectivo, proporcionado e dissuasivo.

    Não pode ser considerada suficientemente dissuasiva para a entidade patronal que não cumpre a sua obrigação de consulta e informação dos representantes dos trabalhadores, exigida pelo artigo 6. da Directiva 77/187, uma indemnização que, na hipótese em que seja igualmente devida uma indemnização em virtude de uma violação da regulamentação sobre os despedimentos por motivos económicos, se confunde parcialmente com esta.

    Partes


    No processo C-382/92,

    Comissão das Comunidades Europeias, representada por Karen Banks, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Georgios Kremlis, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

    recorrente,

    contra

    Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, representado inicialmente por Sue Cochrane, e depois por John E. Collins, do Treasury Solicitor' s Department, na qualidade de agente, assistido por Derrick Wyatt, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada do Reino Unido, 14, boulevard Roosevelt,

    recorrido,

    que tem por objecto obter a declaração de que, ao não transpor correctamente para direito interno diversas disposições da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos (JO L 61, p. 26; EE 05 F2 p. 122), O Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do Tratado CEE,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

    composto por: O. Due, presidente, G. F. Mancini, J. C. Moitinho de Almeida e Díez de Velasco, presidentes de secção, C. N. Kakouris, R. Joliet, F. A. Schockweiler, G. C. Rodríguez Iglesias, F. Grévisse (relator), P. J. G. Kapteyn e J. L. Murray, juízes,

    advogado-geral: W. Van Gerven

    secretário: J.-G. Giraud

    visto o relatório para audiência,

    ouvidas as alegações das partes na audiência de 12 de Janeiro de 1994,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 2 de Março de 1994,

    profere o presente

    Acórdão

    Fundamentação jurídica do acórdão


    1 Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 21 de Outubro de 1992, a Comissão das Comunidades Europeias intentou uma acção, nos termos do artigo 169. do Tratado CEE, com vista a obter a declaração de que, ao não transpor correctamente para o direito interno diversas disposições da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos (JO L 61, p. 26; EE 05 F2 p. 122, a seguir "directiva"), o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do Tratado.

    2 A directiva, que tem por base, designadamente, o artigo 100. do Tratado, visa "proteger os trabalhadores em caso de mudança de empresário especialmente para assegurar a manutenção dos seus direitos" (segundo considerando). Constata que subsistem diferenças nos Estados-membros no que respeita ao alcance da protecção dos trabalhadores neste domínio e que é conveniente reduzir estas diferenças (terceiro considerando). Sublinha que estas diferenças podem ter uma incidência directa no funcionamento do mercado comum (quarto considerando). Entende necessário "promover a aproximação das legislações nesta matéria, numa via de progresso nos termos do artigo 117. do Tratado" (quinto considerando).

    3 A directiva é aplicável, nos termos do n. 1 do artigo 1. , às "transferências de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos que resultem de uma cessão convencional ou de fusão que impliquem mudança de empresário".

    4 Prevê, no artigo 3. , que os direitos e obrigações emergentes de um contrato de trabalho ou de uma relação laboral são transferidos para o cessionário pela mera transferência da empresa. Nos termos do artigo 4. , a transferência de uma empresa não constitui em si mesma fundamento de despedimento por parte do cedente ou do cessionário. O artigo 5. da directiva tutela, em determinadas condições, o estatuto e a função dos representantes dos trabalhadores implicados na transferência. Por último, o artigo 6. prescreve ao cedente e ao cessionário determinados deveres de informação e de consulta dos representantes dos trabalhadores afectados pela transferência.

    5 Por força do artigo 8. , os Estados-membros estão obrigados a dar cumprimento à directiva no prazo de dois anos a contar da sua notificação. Tendo esta sido notificada ao Reino Unido em 16 de Fevereiro de 1977, o prazo expirou em 16 de Fevereiro de 1979.

    6 No Reino Unido, as disposições da directiva foram transpostas por meio das Transfer of Undertakings (Protection of Employment) Regulations 1981 (regulamento de 1981 sobre a protecção do emprego no caso de transferências de empresas, a seguir "regulamento"). Este foi alterado em determinados pontos pelo Trade Union Reform and Employment Rights Act 1993 posteriormente à propositura da acção.

    7 No entender da Comissão, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da directiva e do artigo 5. do Tratado pelas seguintes razões. Em primeiro lugar, o regulamento não permite assegurar uma informação e uma consulta dos representantes dos trabalhadores em todos os casos considerados na directiva porquanto nem este regulamento nem qualquer outra disposição do direito britânico prevêem a designação de representantes dos trabalhadores quando a entidade patronal se recusa a reconhecê-los. Em segundo lugar, o âmbito de aplicação do regulamento circunscreve-se às situações em que a empresa transferida é propriedade do cedente. Em terceiro lugar, o âmbito de aplicação do regulamento não abrange as empresas sem fim lucrativo. Em quarto lugar, o regulamento não obriga o cedente ou o cessionário que projectam tomar medidas em relação aos respectivos trabalhadores a proceder, atempadamente, a consultas, sobre essas medidas, com os representantes dos trabalhadores, com vista a alcançar um acordo. Em quinto lugar, o regulamento não comporta sanções eficazes contra a entidade patronal que não respeite as obrigações de informação e de consulta dos representantes dos trabalhadores previstas pela directiva.

    Quanto à primeira acusação

    8 A primeira acusação da Comissão incide sobre a transposição, pelo direito britânico, do artigo 6. da directiva.

    9 Este artigo determina que o cedente e o cessionário são obrigados a informar os representantes dos trabalhadores afectados pela transferência dos motivos desta, das suas consequências jurídicas, económicas e sociais, bem como das medidas projectadas em relação aos trabalhadores. O cedente é obrigado a comunicar essas informações aos representantes dos trabalhadores em tempo útil antes da realização da transferência. O cessionário é obrigado a comunicar essas informações aos representantes dos trabalhadores em tempo útil, e, em qualquer caso, antes que estes sejam directamente afectados pela transferência no que respeita às suas condições de emprego e de trabalho (n. 1). Se o cedente e o cessionário projectarem tomar medidas em relação aos respectivos trabalhadores, são obrigados a proceder, em tempo útil, a consultas sobre essas medidas com os representantes dos trabalhadores, tendo em vista alcançar um acordo (n. 2).

    10 Os Estados-membros cuja legislação nacional preveja a possibilidade de os representantes dos trabalhadores poderem recorrer a uma instância de arbitragem para obter uma decisão sobre as medidas a tomar em relação aos trabalhadores podem limitar as obrigações previstas nos n.os 1 e 2, quando a transferência realizada provoque, a nível do estabelecimento, uma modificação susceptível de acarretar para uma parte importante dos trabalhadores desvantagens substanciais (n. 3 do artigo 6. ). Os Estados-membros podem limitar as obrigações previstas nos n.os 1, 2 e 3 às empresas ou aos estabelecimentos que preencham, no que se refere ao número de trabalhadores empregados, as condições para a eleição ou designação de um órgão colegial que represente os trabalhadores (n. 4 do artigo 6. ). Por último, os Estados-membros podem prever que, no caso de não haver representantes dos trabalhadores numa empresa ou num estabelecimento, os trabalhadores afectados sejam previamente informados da iminência da transferência (n. 5 do artigo 6. ).

    11 Segundo o artigo 2. , alínea c), da directiva, entende-se por "representantes dos trabalhadores", na acepção da directiva, "os representantes dos trabalhadores previstos na legislação ou pela prática dos Estados-membros, com excepção dos membros dos órgãos de administração, de direcção ou de fiscalização da sociedade, que façam em certos Estados-membros parte desses órgãos como representantes dos trabalhadores".

    12 A Comissão sustenta que o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 6. da directiva ao não prever o mecanismo de designação dos representantes dos trabalhadores na empresa quando a entidade patronal se recusa a reconhecê-los. Em sua opinião, o efeito útil do artigo 6. da directiva implica que os Estados-membros adoptem todas as disposições para que, sem excepção, os representantes dos trabalhadores sejam designados na empresa, sem o que as obrigações de informação e de consulta previstas no artigo 6. da directiva não podem ser satisfeitas. Alega que o direito britânico, ao impedir a designação de representantes dos trabalhadores na empresa quando a entidade patronal dela discorda, não preenche essa condição.

    13 O Governo do Reino Unido admite que no seu país a representação dos trabalhadores na empresa assenta, tradicionalmente, no reconhecimento voluntário dos sindicatos por parte da entidade patronal e, assim, se esta não reconhece o sindicato não está sujeita às obrigações de informação e de consulta estabelecidas pelo artigo 6. da directiva. Mas sustenta que a directiva não pretendeu alterar as regras ou práticas nacionais de designação dos representantes dos trabalhadores. Sublinha que, no seu artigo 2. , alínea c), a directiva especifica que entende por representantes dos trabalhadores os representantes dos trabalhadores "previstos na legislação ou pela prática dos Estados-membros". Alega também que a directiva se limita a uma harmonização parcial das normas de protecção dos trabalhadores aquando de transferências de empresas, não impõe aos Estados-membros a previsão de uma representação específica dos trabalhadores com vista a dar cumprimento às obrigações que define, que o próprio legislador comunitário encarou a hipótese de o direito nacional poder não impor a representação de trabalhadores na empresa transferida, como se infere do n. 5 do seu artigo 6.

    14 A tese do Governo do Reino Unido não pode ser acolhida.

    15 Ao harmonizar as disposições aplicáveis à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, o legislador comunitário pretendeu, ao mesmo tempo, assegurar uma tutela comparável dos direitos dos trabalhadores nos diferentes Estados-membros e aproximar os encargos que dessas regras de protecção advêm para as empresas da Comunidade.

    16 Com este objectivo, o artigo 6. da directiva prescreve, nos seus n.os 1 e 2, um princípio de informação e, sendo caso disso, de consulta obrigatória dos representantes dos trabalhadores que impende sobre o cedente e sobre o cessionário, com a ressalva do previsto, designadamente, no n. 4.

    17 Por força do artigo 8. , n. 1, da directiva, os Estados-membros dispõem de um prazo de dois anos a contar da notificação da directiva para alterar, se necessário, o direito nacional a fim de lhe darem cumprimento neste ponto.

    18 A interpretação do artigo 6. da directiva não é posta em causa pelo teor do seu artigo 2. , alínea c), ao contrário do sustentado pelo Governo do Reino Unido. Com efeito, o artigo 2. , alínea c), da directiva não opera um reenvio puro e simples para as disposições em vigor nos Estados-membros no concernente à designação dos representantes dos trabalhadores. Deixa unicamente aos Estados-membros o encargo de determinar as modalidades de designação dos representantes dos trabalhadores cuja informação e consulta são obrigatórias por força dos n.os 1 e 2 do artigo 6. da directiva.

    19 A interpretação sugerida pelo Governo do Reino Unido permitiria aos Estados-membros determinar os casos em que os representantes dos trabalhadores podem ser informados e consultados, uma vez que a informação e consulta dos mesmos apenas é possível nas empresas em que é prevista, pelo direito nacional, a designação desses representantes. Esta interpretação permitiria aos Estados-membros retirar ao artigo 6. da directiva o seu pleno efeito.

    20 Ora, o Tribunal de Justiça julgou, em especial no acórdão de 6 de Julho de 1982, Comissão/Reino Unido (61/81, Recueil, p. 2601), contrária ao direito comunitário uma legislação nacional que permite obstar à protecção garantida, incondicionalmente, aos trabalhadores por uma directiva.

    21 O Governo do Reino Unido contesta também que resulte do próprio teor do artigo 6. , n. 5, da directiva que o legislador comunitário admitiu a hipótese de a legislação ou a prática nacionais puderem não prever a representação dos trabalhadores noutros casos para além das hipóteses muito limitadas consideradas pela Comissão, porquanto permitiu, sem qualquer restrição, aos Estados-membros estipular que, no caso de não haver representantes dos trabalhadores numa empresa ou num estabelecimento, os trabalhadores afectados sejam previamente informados da iminência da transferência.

    22 É verdade que o artigo 6. , n. 5, da directiva prevê a hipótese de não haver representantes dos trabalhadores numa empresa ou num estabelecimento. Todavia, esta disposição não pode ser interpretada isoladamente e desenquadrada das restantes disposições do artigo 6. da directiva.

    23 Como já foi anteriormente recordado, o artigo 6. da directiva prevê, nos n.os 1 e 2, a obrigação de informar e consultar os representantes dos trabalhadores no caso de transferência de empresa. Os n.os 3 e 4 enunciam os casos em que os Estados-membros podem limitar, em determinadas condições, esta obrigação. O n. 4 permite, em particular, aos Estados-membros isentar desta obrigação as empresas ou estabelecimentos que não preencham, no que se refere ao número de trabalhadores empregados, as condições para a eleição ou designação de um órgão colegial que represente os trabalhadores. A fim de evitar que os trabalhadores se encontrassem desprovidos de protecção, o n. 5 do artigo 6. da directiva permite aos Estados-membros prever que os trabalhadores serão, pelo menos, obrigatoriamente informados da iminência da transferência.

    24 O legislador comunitário não entendeu assim permitir às diferentes ordens jurídicas nacionais consentir na falta de designação dos representantes dos trabalhadores, quando esta designação é necessária para satisfazer as obrigações prescritas no artigo 6. da directiva.

    25 O Governo do Reino Unido sustenta outrossim que a directiva não impõe aos Estados-membros a previsão de um mecanismo específico de representação dos trabalhadores unicamente com o fim de dar cumprimento às obrigações da directiva quando não há representantes dos trabalhadores na empresa à luz do direito nacional.

    26 Se é certo que a directiva não contém nenhuma disposição destinada a regulamentar expressamente essa hipótese, esta circunstância não prejudica as disposições conjugadas dos artigos 6. e 8. da directiva, que impõem aos Estados-membros a adopção de todas as medidas necessárias para que os rabalhadores sejam informados e consultados por intermédio de representantes em caso de transferência de empresa.

    27 Por último, o Governo do Reino Unido, baseando-se no facto de a directiva realizar uma harmonização parcial da protecção dos trabalhadores, entendeu não alterar as normas nacionais em matéria de representação dos trabalhadores.

    28 É certo que a directiva assegura apenas uma harmonização parcial das normas de protecção dos trabalhadores em caso de mudança de empresário (v., designadamente, acórdãos de 11 de Julho de 1985, dito "Mikkelsen", Danmols Inventar, 105/84, Recueil, p. 2639, n. 26, e de 10 de Fevereiro de 1988, Daddy' s Dance Hall, 324/86, Colect., p. 739, n. 16). A directiva não pretende instaurar uma harmonização do conjunto dos sistemas nacionais de representação dos trabalhadores na empresa. Contudo, o carácter limitado desta harmonização não pode retirar efeito útil às disposições da directiva, nomeadamente, as do seu artigo 6. Em especial, não pode obstar a que os Estados-membros sejam obrigados a adoptar todas as medidas úteis para que os representantes dos trabalhadores sejam designados com vista à informação e consulta previstas no artigo 6. da directiva.

    29 É o próprio Governo do Reino Unido que reconhece que, no estado actual do direito britânico, os trabalhadores afectados por uma transferência de empresa não beneficiam da protecção estatuída no artigo 6. da directiva quando a entidade patronal se opõe à existência de uma representação de trabalhadores na sua empresa.

    30 Nestas condições, o direito britânico, que consente à entidade patronal a faculdade de pôr em causa a protecção prevista a favor dos trabalhadores no artigo 6. , n.os 1 e 2, da directiva, deve ser considerado contrário às disposições do artigo 6. da directiva (v., por analogia, acórdão Comissão/Reino Unido, já referido).

    31 É, por conseguinte, de acolher a primeira acusação da Comissão.

    Quanto à segunda acusação

    32 Com a segunda acusação, a Comissão invoca que o regulamento, na interpretação feita pelos órgãos jurisdicionais britânicos, só se aplica às transferências que se acompanhem de uma mudança da propriedade da empresa, contrariamente ao que prevêem as disposições do artigo 1. , n. 1, da directiva, na interpretação do Tribunal de Justiça. A Comissão refere-se, neste ponto, ao acórdão de 17 de Dezembro de 1987, Ny Moelle Kro (287/86, Colect., p. 5465), e acórdão Daddy' s Dance Hall, já referido.

    33 O Governo do Reino Unido alega que, uma vez que, de acordo com a jurisprudência da House of Lords, o regulamento deve ser interpretado à luz da directiva e da interpretação que lhe dá o Tribunal de Justiça, o seu âmbito de aplicação é idêntico ao da directiva, mesmo que esse regulamento não indique expressamente que uma transferência na acepção deste não implique necessariamente a transferência da propriedade da empresa.

    34 O artigo 3. do regulamento prevê que este se aplica à "transferência de uma pessoa para outra, de uma empresa ou parte de empresa situada imediatamente antes da transferência no Reino Unido".

    35 Em si mesmas, estas disposições não excluem do âmbito de aplicação do regulamento as alterações da entidade patronal que não se acompanhem de uma transferência da propriedade da empresa.

    36 Além disso, o alcance das disposições legislativas, regulamentares ou administrativas nacionais deve ser apreciado tendo em conta a interpretação que delas fazem os órgãos jurisdicionais nacionais (v. acórdão de 16 de Dezembro de 1992, Katsikas e o., C-132/91, C-138/91 e C-139/91, Colect., p. I-6577, n. 39).

    37 Cabe salientar que as decisões dos órgãos jurisdicionais britânicos invocadas pela Comissão para sustentar a sua segunda acusação são anteriores ao acórdão da House of Lords a que faz referência o Governo do Reino Unido, proferido a 16 de Março de 1989, e do qual resulta, como o reconhece a Comissão, que o regulamento deve ser interpretado, na medida do possível, em conformidade com os termos e os objectivos da directiva, bem como à luz da interpretação que dela faz o Tribunal de Justiça. A Comissão não apresenta nenhuma decisão posterior a este acórdão e contrária às disposições do artigo 1. , n. 1, da directiva, na interpretação que dela faz o Tribunal de Justiça.

    38 Nestas condições, a Comissão não demonstrou que na data de expiração do prazo fixado no parecer fundamentado, ou seja, 26 de Maio de 1991, o artigo 3. do regulamento tinha o alcance que lhe atribui.

    39 A segunda acusação da Comissão deve, por conseguinte, ser afastada.

    Quanto à terceira acusação

    40 Na sua terceira acusação, a Comissão invoca que o regulamento, na interpretação que dele fazem os órgãos jurisdicionais britânicos, não se aplica às empresas sem fim lucrativo, contrariamente ao previsto nas disposições do artigo 1. , n. 1, da directiva, na interpretação que delas faz o Tribunal de Justiça. A Comissão remete, neste ponto, para o acórdão de 19 de Maio de 1992, Redmond Stichting (C-29/91, Colect., p . I-3189).

    41 O artigo 2. , n. 1, do regulamento define a noção de "empresa" como compreendendo "todo o empreendimento industrial ou comercial", mas exclui expressamente "toda a empresa ou parte de empresa que não tenha o carácter de empresa assente no risco comercial". Assim, como sustenta a Comissão, cujas afirmações não foram seriamente contestadas pelo Governo do Reino Unido, o regulamento deve ser interpretado no sentido de que não se aplica às transferências de empresas sem fim lucrativo.

    42 O Governo do Reino Unido sustenta que a directiva não se pode aplicar, como pretende a Comissão, às transferências de empresas sem fim lucrativo porque estas, que não exercem uma "actividade económica", na acepção do Tratado, não entram no âmbito de aplicação deste.

    43 Esta argumentação deve ser afastada.

    44 Com efeito, o Tribunal de Justiça já admitiu, pelo menos implicitamente, em contextos como os do direito da concorrência (v. acórdão de 23 de Abril de 1991, Hoefner e Elser, C-41/90, Colect., p. I-1979) ou do direito social (v., precisamente, para a aplicação da directiva, acórdão Redmond Stichting, já referido), que um organismo podia exercer uma actividade económica e ser visto como uma "empresa" para a aplicação das normas de direito comunitário, mesmo se não prossegue um fim lucrativo.

    45 Resulta desta jurisprudência que a falta do carácter lucrativo da actividade exercida por uma empresa não é de molde, por si só, a retirar a esta actividade a natureza económica nem a fazer excluir a empresa do âmbito de aplicação da directiva.

    46 O âmbito de aplicação da directiva não pode ser limitado unicamente às empresas que prosseguem um fim lucrativo, como sustenta o Governo do Reino Unido.

    47 Daí se infere que, ao limitar a aplicação das normas nacionais de transposição da directiva às transferências de empresas com fim lucrativo, o Governo do Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 1. , n. 1 da directiva. Assim, a terceira acusação da Comissão procede.

    Quanto à quarta acusação

    48 A Comissão sustenta que o regulamento transpõe parcialmente as disposições do artigo 6. , n. 2, da directiva, porquanto obriga simplesmente o cedente ou o cessionário que pretendem tomar medidas relativamente a trabalhadores afectados por uma transferência a iniciar consultas com os representantes dos sindicatos por eles reconhecidos, a tomar em consideração todas as observações formuladas por esses representantes, a responder a estas observações e, se as recusam, a indicar as razões, quando o artigo 6. , n. 2, da directiva impõe a consulta dos representantes dos trabalhadores "tendo em vista alcançar um acordo".

    49 O Governo do Reino Unido reconhece que a sua legislação não é conforme à directiva neste ponto.

    50 A este propósito, importa salientar que as disposições do regulamento não impõem ao cedente ou ao cessionário que projectam tomar medidas relativamente a trabalhadores afectados por uma transferência consultar os representantes desses trabalhadores "tendo em vista alcançar um acordo", como o exige o artigo 6. , n. 2, da directiva.

    51 A quarta acusação da Comissão deve, por conseguinte, ser acolhida.

    Quanto à quinta acusação

    52 A Comissão sustenta que as sanções previstas no artigo 11. do regulamento no caso de não cumprimento pelo cedente ou cessionário da obrigação de consulta ou de informação dos representantes dos trabalhadores não são suficientemente dissuasoras para a entidade patronal. Alega que as indemnizações que a entidade patronal pode, sendo caso disso, ser condenada a pagar aos trabalhadores por conta de outrem com base no artigo 11. do regulamento, que, aliás, são limitadas, são dedutíveis das indemnizações ditas "de protecção" que a entidade patronal pode, por outro lado, ser condenada a pagar aos trabalhadores por conta de outrem ao não respeitar o disposto no artigo 99. do Employment Protection Act

    1975 (a seguir "EPA") que impõem à entidade patronal a consulta dos representantes dos trabalhadores no caso de despedimento por motivos económicos.

    53 A acusação visa ainda a hipótese em que a entidade patronal procede concomitantemente a uma transferência de empresa ou estabelecimento e a um despedimento por motivos económicos.

    54 O Governo do Reino Unido sustenta que a sua legislação é conforme à directiva na parte em que esta prevê limitar os montantes que a entidade patronal pode ser condenada a pagar aos trabalhadores por conta de outrem, mas reconhece que não o é na parte em que prevê que as indemnizações pagas aos trabalhadores por conta de outrem se substituem no todo ou em parte aos montantes que, por outro lado, a entidade patronal está obrigada a pagar-lhes. Alegou também que um projecto de lei em vias de adopção deverá alterar a legislação nestes dois pontos.

    55 Quando uma directiva comunitária não prevê uma sanção específica no caso de violação das suas disposições ou remete, nesse ponto, para as disposições legislativas, regulamentares e administrativas nacionais, o artigo 5. do Tratado impõe aos Estados-membros que tomem todas as medidas adequadas para garantir o alcance e a eficácia do direito comunitário. Para esse efeito, ao mesmo tempo que conservam a possibilidade de escolher as sanções, eles devem, designadamente, velar para que as violações do direito comunitário sejam punidas em condições, substantivas e de processo, análogas às aplicáveis às violações do direito nacional de natureza e importância semelhantes e que, de qualquer forma, confiram à sanção um carácter efectivo, proporcionado e dissuasivo (v., para os regulamentos comunitários, os acórdãos de 21 de Setembro de 1989, Comissão/Grécia, 68/88, Colect., p. 2965, n.os 23 e 24, e de 2 de Outubro de 1991, Vandevenne e o., C-7/90, Colect., p. I-4371, n. 11).

    56 Por força do artigo 11. , n. 4, do regulamento, a entidade patronal que não consulta os representantes dos trabalhadores aquando de uma transferência de empresa pode ser condenada a pagar indemnizações adequadas aos trabalhadores afectados com a transferência. Por força do n. 11 deste artigo, o montante da indemnização não pode ultrapassar um limite que foi fixado de duas a quatro semanas de salário do trabalhador abrangido pelo Trade Union Reform and Employment Rights Act 1993. Todavia, de acordo com o n. 7 do artigo 11. , quando a entidade patronal despede, além disso, trabalhadores por motivos económicos e não consulta os representantes dos trabalhadores, contrariamente ao estipulado no artigo 99. do EPA, as indemnizações são deduzíveis das ditas "de protecção" que a entidade patronal pode ser ulteriormente condenada a pagar ao trabalhador com base no EPA e, ao invés, estas indemnizações "de protecção" são dedutíveis das que a entidade patronal pode ser condenada ulteriormente a pagar ao trabalhador.

    57 Assim, quando os trabalhadores por conta de outrem da empresa transferida são objecto de um despedimento por motivos económicos e a entidade patronal é condenada ao pagamento de uma indemnização "de protecção" por não ter respeitado as obrigações de consulta e de informação dos representantes dos trabalhadores em conformidade com o artigo 99. do EPA, a entidade patronal não é penalizada pela sanção pecuniária a que é condenada com base no regulamento, a não ser quando o montante desta sanção ultrapassa o montante da indemnização "de protecção". Esta sanção pecuniária é assim diminuída, ou mesmo, suprimida. De resto, o limite de indemnização que a entidade patronal pode ser condenada a pagar com base no regulamento, sobretudo ao nível a que foi fixado antes da entrada em vigor do Trade Union Reform and Employment Rights Act 1993, limita os casos de ultrapassagem da indemnização "de protecção".

    58 Daí resulta que, na hipótese em que a entidade patronal é também objecto de uma condenação com base na EPA, a sanção não apresenta um carácter verdadeiramente dissuasor. A legislação britânica não é pois conforme, neste ponto, às exigências do artigo 5. do Tratado.

    59 Em consequência, a quinta acusação da Comissão deve ser acolhida.

    60 Do conjunto das considerações que precedem resulta que, ao não prever a designação dos representantes dos trabalhadores quando esta designação não obtém o acordo da entidade patronal, ao excluir as empresas sem fim lucrativo do âmbito de aplicação do regulamento, ao não obrigar o cedente ou o cessionário que prevejam medidas relativamente aos seus trabalhadores a proceder em tempo útil a consultas sobre estas medidas com os representantes dos seus trabalhadores, tendo em vista alcançar um acordo e ao não prever uma sanção eficaz no caso de a entidade patronal não informar e consultar os representantes dos trabalhadores, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da directiva e do artigo 5. do Tratado CEE.

    Decisão sobre as despesas


    Quanto às despesas

    61 Por força do disposto no n. 2 do artigo 69. do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Todavia, segundo o n. 3, primeiro parágrafo, do mesmo artigo, o Tribunal de Justiça pode repartir as despesas ou decidir que cada parte suporte as suas se forem vencidas respectivamente em um ou vários pontos.

    62 Tendo o Reino Unido sido vencido no essencial da sua argumentação, há que condená-lo nas despesas.

    Parte decisória


    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    decide:

    1) Ao não prever a designação de representantes dos trabalhadores quando esta designação não obtém o acordo da entidade patronal, ao excluir as empresas sem fim lucrativo do âmbito de aplicação do regulamento que visa aplicar a Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos, ao não obrigar o cedente ou o cessionário que prevejam medidas em relação aos respectivos trabalhadores a proceder em tempo útil a consultas sobre essas medidas com os representantes dos trabalhadores, tendo em vista alcançar um acordo, ao não prever uma sanção eficaz no caso de a entidade patronal não informar ou consultar os representantes dos trabalhadores, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da directiva e do artigo 5. do Tratado CEE.

    2) A acção é julgada improcedente quanto ao restante.

    3) O Reino Unido é condenado nas despesas.

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