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Document 61989CC0190

    Conclusões do advogado-geral Darmon apresentadas em 19 de Fevereiro de 1991.
    Marc Rich & Co. AG contra Società Italiana Impianti PA.
    Pedido de decisão prejudicial: Court of Appeal - Reino Unido.
    Convenção de Bruxelas - Artigo 1.º, segundo parágrafo, ponto 4.º - Arbitragem.
    Processo C-190/89.

    Colectânea de Jurisprudência 1991 I-03855

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1991:58

    CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

    MARCO DARMON

    apresentadas em 19 de Fevereiro de 1991 ( *1 )

    Senbor Presidente,

    Senbores Juízes,

    1. 

    A interpretação da Convenção de Bruxelas (a seguir «Convenção») levanta imensas dificuldades, pois a complexidade inerente a tal matéria conjuga-se com a utilização de conceitos definidos com precisão nos direitos nacionais mas de modo muitas vezes divergente entre si, o que conduz o Tribunal a, frequentemente, atribuir-lhes um significado autónomo. Para o desempenho desta missão, os objectivos da Convenção, assegurar a «livre circulação das decisões judiciais», constituem indicadores sólidos que permitem afastar soluções que provocariam a multiplicação dos processos perante órgãos jurisdicionais diferentes e o risco correlativo de inconciliabilidade das decisões ( 1 ).

    2. 

    Estas preocupações constantes e justificadas da jurisprudência do Tribunal deparam, no entanto, com um limite óbvio: o que define o próprio âmbito de aplicação da Convenção. O presente processo prejudicial, relativo ao alcance do artigo 1.°, segundo parágrafo, ponto 4, da Convenção, que exclui a arbitragem do seu âmbito de aplicação, deve servir para recordar a este respeito que, por mais construtiva e determinada que seja, a interpretação que o Tribunal dá deste tratado não pode conduzir a que nos afastemos da sua letra, da sua economia e da coerência das suas disposições.

    3. 

    Estas observações preliminares são-nos ditadas por algumas das análises que são tecidas no caso em apreço, invocando de forma ortodoxa os objectivos da Convenção, negligenciando qualquer outra consideração, ditada talvez pela lógica do diploma e pelas especificidades do problema em causa: a arbitragem internacional. A este propósito, a presente dificuldade não pode ser abordada sem, antes de mais, se evocar a importância fundamental que a arbitragem tem hoje em dia na «comunidade internacional dos comerciantes», parafraseando aqui a expressão consagrada pela doutrina ( 2 ). Em favor da expansão do comércio mundial, a arbitragem internacional tornou-se à escala universal o «método mais frequente de resolução dos litígios do comércio internacional» ( 3 ). Esta forte tendência ( 4 ) pode ser ilustrada por esta disposição da Acta Final da Conferência de Helsínquia (CSCE) de 1 de Agosto de 1975:

    «Os Estados participantes, considerando que a solução rápida e equitativa dos conflitos que possam resultar de transacções comerciais relativas a bens e serviços e de contratos de cooperação industrial contribuiria para a expansão e promoção do comércio e da cooperação; considerando que a arbitragem é um meio apropriado para a solução de tais conflitos, recomendam às organizações, empresas e sociedades dos seus respectivos países que, quando tal for procedente, incluam cláusulas de arbitragem nos contratos comerciais ou de cooperação industrial ou nos acordos especiais; recomendam que as disposições relativas à arbitragem prevejam uma arbitragem conforme a um conjunto de regras mutuamente aceitáveis e permitam a arbitragem num terceiro país, tendo em conta os acordos intergovernamentais e de outro carácter já existentes nesta matéria.»

    4. 

    O autor de uma importante obra consagrada à Convenção de Nova Iorque de 1958 ( 5 ) — principal instrumento multilateral em matéria de arbitragem — descreve perfeitamente as necessidades profundas a que corresponde o recurso à arbitragem internacional e que sublinham a sua clara especificidade relativamente à arbitragem interna:

    «The foreign court can be an alien environment for a businessman because of his unfamiliarity with the procedure which may be followed, the laws to be applied, and even the mentality of the foreign judges. In contrast, with international commercial arbitration parties coming from different legal systems can provide for a procedure which is mutually acceptable. They can anticipate which law shall be applied: a particular law or even a lex mercatoria of a trade. They can also appoint a person of their choice having expert knowledge in the field.»

    E o autor continua:

    «These and other advantages are only potential until the necessary legal framework can be internationally secured. This legal framework should at least provide that the commitment to arbitrate is enforceable and that the arbitral decision can be executed in many countries, precluding the possibility that a national court review the merits of the decision.»

    5. 

    Ora, a decisão que o Tribunal é chamado a tomar no caso em apreço não deixa de ter consequências sobre a estabilidade jurídica proporcionada à arbitragem internacional no território da Comunidade. Com efeito, algumas das teses propostas poderiam implicar, se o Tribunal as consagrasse, que fossem postos em causa princípios assentes perturbando por um período indeterminado as expectativas na matéria. De resto, o Tribunal não pode ignorar que existem no território da Comunidade Europeia centros importantes para a arbitragem internacional cujo desenvolvimento foi favorecido, nos últimos tempos, por uma intensa actividade doutrinal, legislativa e jurisprudencial. Quer isto dizer que o exame da dificuldade que levanta a questão prejudicial apresentada pela Court of Appeal deve ser feito de forma minuciosa.

    6. 

    O Tratado de Roma, e quando é certo que o direito comunitário tem vários pontos de contacto com a arbitragem ( 6 ), tinha previsto no seu artigo 220.° :

    «Os Estados-membros entabularão entre si, sempre que necessário, negociações destinadas a garantir, em benefício dos seus nacionais:

    ...

    a simplificação das formalidades a que se encontram subordinados o reconhecimento e a execução recíprocos tanto das decisões judiciais como das decisões arbitrais.»

    7. 

    Apesar da redacção desta disposição, a Convenção de Bruxelas previu, no seu artigo 1.°, cujo texto não foi alterado quanto a este aspecto pelas convenções de adesão:

    «A presente Convenção aplica-se em matéria civil e comercial e independentemente da natureza da jurisdição...

    São excluídos da sua aplicação:

    1)

    o estado e a capacidade das pessoas singulares, os regimes matrimoniais, os testamentos e as sucessões;

    2)

    as falências, as concordatas e outros processos análogos;

    3)

    a segurança social;

    4)

    a arbitragem» ( 7 ).

    8. 

    Sem abordar nesta fase a questão de saber qual o alcance a atribuir a esta disposição, recordemos aqui os fundamentos como apresentados no relatório do comité de peritos que elaborou o projecto da Convenção:

    «Existem numerosos acordos internacionais que regulam já a arbitragem, igualmente mencionada no artigo 220.° do Tratado de Roma. Além disso, o Conselho da Europa elaborou uma Convenção Europeia sobre a lei uniforme em matéria de arbitragem, que será certamente acompanhada de um protocolo destinado a facilitar, mais do que o faz a Convenção de Nova Iorque, o reconhecimento e a execução de sentenças arbitrais» ( 8 ).

    9. 

    Uma breve referência histórica à elaboração das convenções internacionais no domínio da arbitragem internacional é aqui necessária ( 9 ). Até ao período posterior à primeira guerra, o direito na matéria encontrava-se quase exclusivamente sujeito ( 10 ) aos direitos nacionais que, à semelhança dos tribunais, desfavoreciam frequentemente a arbitragem. O desenvolvimento da arbitragem internacional consecutivo ao fim do primeiro conflito mundial ia conduzir a uma importante actividade normativa internacional sob a égide da Sociedade das Nações ( 11 ). A adopção do protocolo de Genebra de 1923 ( 12 ), que afirma a validade das cláusulas compromissórias até então proibidas por inúmeros direitos nacionais e instituindo, para os órgãos jurisdicionais estaduais, uma obrigação de recurso à arbitragem na presença de um litígio para que tivesse sido celebrada uma convenção de arbitragem, e depois, em 1927 ( 13 ), da Convenção de Genebra sobre a execução das sentenças estrangeiras, conduziu a uma melhoria na situação jurídica da arbitragem internacional.

    10. 

    No entanto, determinados aspectos restritivos dessas convenções limitavam ainda o impacte da sua contribuição para um funcionamento plenamente satisfatório da arbitragem internacional ( 14 ). Designadamente, a interpretação dada ao artigo 1.° da Convenção de Genebra de 1927, que exige que a sentença a reconhecer ou a executar se tenha tornado definitiva no país onde foi proferida, conduzia frequentemente a impor um «duplo exequatur», o primeiro dos órgãos jurisdicionais do local de arbitragem, o segundo dos órgãos jurisdicionais do Estado demandado. Igualmente, no fim do segundo conflito mundial assistiu-se à continuação da procura de soluções internacionais. Foi no quadro dos trabalhos do Comité Económico e Social das Nações Unidas que devia, deste modo, ser elaborado o projecto da Convenção de Nova Iorque de 10 de Junho de 1958. Este texto, que comporta inúmeras e significativas modificações relativamente às convenções de Genebra ( 15 ), tem a ver com duas facetas essenciais da arbitragem comercial internacional: a eficácia das convenções de arbitragem ( 16 ) e a execução das sentenças arbitrais. Convém, designadamente, sublinhar que exigência do «duplo exequatur» foi suprimida. Mais de 80 Estados, entre os quais onze da CEE ( 17 ), aderiram a esta Convenção, motor da arbitragem internacional contemporânea.

    «The modem tendency is for a coming together of the different systems of law which govern the procedural aspects of international commercial arbitration and the recognition and enforcement of international awards. This is partly because of the unifying effect of conventions on arbitration, most importantly the New York Convention» ( 18 ).

    «The New York Convention... is easily the most important international treaty relating to international commercial arbitration. The general level of success of the Convention may be seen as one of the factors responsible for the rapid development over recent decades of arbitration as a mean of resolving international trade disputes» ( 19 ).

    11. 

    Embora a Convenção de Nova Iorque constitua um instrumento maior da arbitragem internacional, convém, no entanto, mencionar as virtualidades da recente lei modelo Cnudci (Uncitral) de 1985 sobre a arbitragem comercial internacional ( 20 ) cujas disposições fornecem um quadro de referências às legislações nacionais ( 21 ) relativas à convenção de arbitragem, à composição do tribunal arbitrai, ao processo arbitral, à pronúncia das sentenças, aos recursos destas bem como ao seu reconhecimento e execução. Reflectindo a evolução dos direitos nacionais, a lei modelo retém o princípio da «competencia-competencia» ( 22 ) do árbitro, segundo o qual este último pode ele próprio, sob controlo judicial posterior, apreciar a sua própria competência.

    «In adopting the concept of “competence//competence”, the Model Law has recognised the general trend of modern national legal systems, and of international conventions, which allow an arbitral tribunal to determine its own jurisdiction. However, the Model Law does not give an arbitral tribunal the final word; there is position for concurrent control by the court specified by article 6» ( 23 ).

    12. 

    A par destes instrumentos ( 24 ), existem múltiplas convenções regionais em matéria de arbitragem comercial internacional. Atendo-nos à Europa, devem ser mencionados dois tratados: a Convenção Europeia sobre a Arbitragem Comercial Internacional de 21 de Abril de 1961 ( 25 ) e a Convenção europeia que estabelece a lei uniforme em matéria de arbitragem de 20 de Janeiro de 1966 (Convenção de Estrasburgo) ( 26 ). O primeiro destes diplomas, complemento da Convenção de Nova Iorque, limita as causas de recusa de reconhecimento e de execução das sentenças arbitrais. Mais precisamente, a anulação da sentença pelos órgãos jurisdicionais do Estado em que foi pronunciada só pode justificar uma recusa de exequatur desde que tenha sido proferida em virtude de determinadas razões especificadas ( 27 ). Por outro lado, a Convenção Europeia de 1961 estabelece, designadamente, o princípio da «competencia-competencia» dos árbitros e regula a hipótese da litispendência entre processo de arbitragem e recurso ulterior aos órgãos jurisdicionais estaduais. Esta Convenção vincula vinte Estados-membros dos quais sete da Comunidade ( 28 ). Em contrapartida, a Convenção de Estrasburgo não teve o sucesso esperado visto apenas um Estado, a Bélgica, a ter ratificado até hoje.

    13. 

    Paralelamente, os direitos nacionais reconheceram de forma crescente as necessidades da arbitragem comercial internacional consagrando as incidências da autonomia da vontade na ordem internacional. Esta tendência é particularmente nítida na Europa e manifesta-se tanto no domínio legislativo ( 29 ) como através das atitudes dos órgãos jurisdicionais estaduais isentas de qualquer preconceito relativamente à arbitragem internacional.

    14. 

    «It used occasionally to be suggested that the English courts were hostile to the process of arbitration. Whether this was ever true, in the distant past, it is a matter of opinion. What must be clear, to anyone reading the judgments delivered during the past 60 years, is that this is now a complete misconception» ( 30 ).

    Formulada a propósito de órgãos jurisdicionais britânicos, uma tal opinião podia sem qualquer dúvida ser transposta para a grande maioria dos outros órgãos jurisdicionais nacionais.

    15. 

    Tal é, em grandes traços que deveriam ser completados por uma descrição do papel essencial das instituições permanentes de arbitragem ou de aparecimento de uma nova «lex mercatoria» ( 31 ), a fisionomia geral da arbitragem internacional que, progressivamente libertada de todos os quadros estaduais, tenderia, de acordo com alguns comentadores, para a «desnacionalização» ou, ainda, para a «deslocalização» ( 32 ).

    16. 

    Primeira questão de um órgão jurisdicional britânico relativa à Convenção de Bruxelas mas igualmente a primeira ocasião de o Tribunal se pronunciar sobre o alcance da exclusão da arbitragem do âmbito de aplicação desse diploma, o presente processo prejudicial reveste, a este título, uma importância considerável ( 33 ). Encontra a sua origem numa situação que é indispensável recordar para a boa compreensão do que se encontra em causa.

    17. 

    Por telex de 23 de Janeiro de 1987, a sociedade Marc Rich and Co. AG (a seguir «Marc Rich») propôs-se adquirir petróleo bruto iraniano à Società Italiana Impianti PA (a seguir «SII»). Em 25 do mesmo mês, esta última aceitava a proposta de compra sob reserva de condições suplementares que parecem ter sido aceites por Marc Rich em 26 de Janeiro, data em que a sociedade SII considera que foi, deste modo, celebrado um contrato completo. Em 28 de Janeiro, Marc Rich enviou um novo telex contendo detalhes quanto aos termos do contrato bem como a seguinte cláusula:

    «Lei aplicável e arbitragem

    As questões relativas à interpretação, à validade e à execução do presente contrato serão resolvidas segundo o direito inglês. Em caso de litígio entre o comprador e o vendedor, será o mesmo resolvido por três árbitros em Londres. Cada uma das partes designará um árbitro e o terceiro será escolhido por estes dois, sendo a decisão deles, ou de dois deles, definitiva e obrigando ambas as partes.»

    Este telex não obteve qualquer resposta.

    18. 

    Alguns dias mais tarde, o carregamento de petróleo no navio «Atlantic Emperor» começou para terminar em 6 de Fevereiro. Parece que, no mesmo dia, Marc Rich invocou uma grave contaminação da carga, que implicava um prejuízo superior a 7 milhões de USD.

    19. 

    A sociedade italiana intentou, em 18 de Fevereiro de 1988, uma acção judicial em Itália para obter uma declaração liberando-a de toda a responsabilidade em relação a Marc Rich. Tal facto foi notificado a esta sociedade em 29 de Fevereiro de 1988, que, nesse mesmo dia, iniciou em Londres um processo de arbitragem designando o seu árbitro e, em 4 de Outubro de 1988, alegou a incompetência do órgão jurisdicional italiano invocando a existência da cláusula compromissória. Por outro lado, Marc Rich posteriormente recorreu directamente à Corte di Cassazione italiana com vista a obter a declaração da incompetência dos órgãos jurisdicionais italianos em virtude da existência da convenção de arbitragem. Como a sociedade SII não designou um árbitro, Marc Rich intentou em 20 de Maio de 1988 uma acção para obter a nomeação de um árbitro pela High Court ao abrigo do Arbitration Act de 1950. O órgão jurisdicional britânico autorizou a notificação do requerimento inicial à sociedade SII em Itália. Em 8 de Julho de 1988, a sociedade italiana solicitou a anulação dessa autorização alegando que o litígio real entre as partes está relacionado com a questão de saber se o contrato em questão contém ou não uma cláusula de arbitragem. Este litígio relevaria do âmbito de aplicação da Convenção de Bruxelas e deveria, por conseguinte, ser julgado em Itália. De acordo com Marc Rich, este litígio escapa ao âmbito de aplicação da Convenção por força do artigo 1.° que exclui a arbitragem.

    20. 

    O juiz Hirst considerou que a Convenção não é aplicável ao litígio, afirmando, por outro lado, que o contrato se encontra sujeito ao direito inglês e tendo autorizado a notificação no estrangeiro. Desta decisão foi interposto recurso. Apesar das reticências que as partes no processo principal pareceram manifestar a respeito de um pedido prejudicial, convidando a Court of Appeal a decidir, ela própria, da interpretação da Convenção em apreço, este órgão jurisdicional colocou ao Tribunal estas três questões:

    «1)

    A excepção prevista no ponto 4 do artigo 1.° da Convenção abrange:

    a)

    todo e qualquer litígio ou decisão e, em caso afirmativo,

    b)

    os litígios ou decisões em que é contestada a existência de um compromisso arbitral?

    2)

    No caso de o presente litígio ser abrangido pela Convenção, e não pela excepção à Convenção, os compradores podem não obstante ser sujeitos à jurisdição inglesa nos termos:

    a)

    do ponto 1 do artigo 5.° da Convenção, e/ou

    b)

    do artigo 17.° da Convenção?

    3)

    No caso de os compradores poderem estar sujeitos à jurisdição inglesa por qualquer outra razão que não a do ponto 2 supra,

    a)

    este Tribunal deve declarar-se incompetente ou deve sobrestar na decisão nos termos do artigo 21.° da Convenção, ou, em alternativa,

    b)

    deve sobrestar na decisão, nos termos do artigo 22.° da Convenção, com fundamento em que o órgão jurisdicional italiano foi demandado em primeiro lugar?»

    21. 

    Impõem-se duas observações preliminares.

    22. 

    Os pareceres de Jenard e Schlosser, apresentados ao Tribunal pela sociedade SII, inspiram-nos a primeira. É do conhecimento geral que estas individualidades redigiram, respectivamente, os relatórios dos comités de peritos que elaboraram a convenção inicial e a convenção de adesão da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido. A esse título, o Tribunal foi conduzido a tomar esses relatórios em consideração ( 34 ). Recordemos, além disso, que o Civil Jurisdiction and Judgments Act de 1982 ( 35 ) a eles se refere expressamente para efeitos da interpretação da Convenção pelos órgãos jurisdicionais britânicos. Em contrapartida, está fora de dúvida que os pareceres aqui submetidos ao Tribunal têm o «estatuto» de simples consultas a que, evidentemente, convém atribuir apenas o peso que lhes conferem os seus méritos intrínsecos. Este esclarecimento é tanto mais indispensável quanto Schlosser defende, por seu lado, uma tese que contradiz em todos os pontos a posição do relatório oficial de que foi signatário quanto à aplicação da Convenção aos litígios relativos à arbitragem perante os órgãos jurisdicionais estaduais.

    23. 

    A segunda observação tem a ver com o alcance da resposta que o Tribunal dará à primeira questão apresentada em termos muito gerais pela Court of Appeal. A forma como foi redigida pode levar o Tribunal a examinar uma vasta série de hipóteses relativas ao alcance da exclusão da arbitragem do âmbito de aplicação da Convenção de Bruxelas. Pensamos, designadamente, numa delicada questão surgida aquando da negociação que precedeu a adesão do Reino Unido ( 36 ). A delegação desse Estado tinha, ao que parece, sustentado a tese de que a Convenção não se aplicava ao reconhecimento e à execução de uma decisão sobre o mérito da causa proferida por um órgão jurisdicional estadual com desprezo por uma convenção de arbitragem ou negando-lhe qualquer validade. Embora esta tese não parecesse ser aceite pelos Estados-membros originários, esta divergência não implicou qualquer alteração na redacção da Convenção. De acordo com o relatório Schlosser, os «Estados-membros poderão ter em conta esta incerteza de interpretação» ( 37 ). Seja qual for a análise que estejamos mais inclinados para aceitar a esse respeito, deve observar-se que esta dificuldade é alheia ao litígio pendente perante o órgão jurisdicional britânico, que foi submetido a este Tribunal. Em consequência, contrariamente ao convite do Governo francês a este respeito, sugerimos que o Tribunal não aborde esta questão na resposta a dar à Court of Appeal. Compartilhamos a opinião do Governo alemão segundo a qual a resposta deve limitar-se a fornecer apenas esclarecimentos úteis para a resolução do processo principal.

    24. 

    Nesta perspectiva, o pedido de Marc Rich tem por objecto a designação de um árbitro, quer dizer, a constituição do tribunal arbitral. A defesa da sociedade SII suscita previamente a questão da própria existência da convenção de arbitragem. É esta, incontestavelmente, a fisionomia do litígio perante o juiz a quo e aquela a partir da qual propomos que o Tribunal proceda à interpretação do artigo 1.°, segundo parágrafo, ponto 4, da Convenção.

    25. 

    Parece, de resto, que surgiu uma certa confusão a este respeito em virtude de a sociedade SII contestar que o litígio pendente perante o juiz a quo tenha por objecto a designação de um árbitro. O «principal ou verdadeiro diferendo entre as partes» relacio-nar-se-ia com a existência da convenção de arbitragem. Sem dúvida que esta questão é, no estado actual do litígio, a mais importante. No entanto, de um ponto de vista processual, apenas se trata de uma questão incidental ou, mais exactamente, prévia. A própria sociedade SII referiu na audiência que a questão da existência da arbitragem devia ser decidida antes de se poder proceder à designação de um árbitro. E as suas alegações escritas indicam claramente:

    «L'action introduite par l'acheteur devant la juridiction anglaise a pour objectif la désignation d'un arbitre. Mais — le juge M. Hirst l'a dit et l'acheteur ne l'a pas contredit sur ce point — l'acheteur ne pourra obtenir le prononcé de cette mesure tant qu'il n'aura pas établi l'existence d'un accord d'arbitrage valide» ( 38 ).

    Não se poderia fornecer melhor descrição de uma questão prévia.

    26. 

    Assinalemos, aliás, que esta distinção entre questão prévia e questão principal, familiar aos juristas continentais, já foi utilizada, precisamente nesta matéria, pelos juristas de «common law». Com efeito, numa decisão da High Court — relativa às prerrogativas dos árbitros cuja competência seria contestada — a questão da competência que precede a apreciação quanto ao mérito da causa foi precisamente qualificada de «preliminary matter» nos termos seguintes:

    «They are entitled to inquire into the merits of the issue whether they have jurisdiction or not, not for the purpose of reaching any conclusion which will be binding upon the parties — because that they cannot do — but for the purpose of satisfying themselves as a preliminary matter whether they ought to go on with the arbitration or not ( 39 )».

    27. 

    Se bem que formulada a propósito da questão da competência do árbitro suscitada perante este último, a análise, aliás lógica e evidente, segundo a qual se trata de uma questão prévia não pode variar a este respeito quando se encontra pendente perante um órgão jurisdicional nacional chamado a nomear um árbitro.

    28. 

    De acordo com a tese sustentada pela sociedade SII, que assenta amplamente nos pareceres de Jenard e Schlosser, a Convenção seria aplicável ao litígio submetido ao juiz a quo. A primeira vista, esta conclusão contraria a solução que decorre dos princípios até então aceites quanto à implementação das exclusões da Convenção e que vamos de imediato apresentar. Esta solução foi claramente exposta nas alegações do Governo alemão. E clara e precisa. O ponto de partida da análise é aqui fornecido pelo princípio incontestável segundo o qual «as matérias excluídas deixarão de sê-lo se forem o objecto principal do litígio» ( 40 ).

    29. 

    Já vimos que, no caso em apreço, o mesmo se prende com a designação de um árbitro. Ora, o relatório oficial do professor Schlosser é desprovido de qualquer ambiguidade a este respeito:

    «A Convenção não é aplicável aos processos judiciais que se destinam a dar início a um processo de arbitragem, tais como os processos de designação ou de recusa de um árbitro...» ( 41 ).

    De igual modo, todos os autores que abordaram esta questão estão de acordo em excluir este tipo preciso de processo do àmbito de aplicação da Convenção ( 42 ).

    30. 

    A não ser que se adopte a tese radical do parecer reactualizado de Schlosser segundo o qual a Convenção se aplica a todos os litígios em matéria de arbitragem submetidos aos tribunais, tese que posteriormente examinaremos, não é permitida qualquer hesitação: a Convenção não se aplica ao objecto principal do litígio pendente perante o juiz a quo. Mas, previamente, é submetida a este último a questão da existência da convenção de arbitragem.

    31. 

    Torna-se necessário sublinhar aqui, com ênfase, que no sistema da Convenção a competência do juiz a que foi submetida uma questão principal que não releva do âmbito desta para conhecer de uma questão prévia não se regula, de forma alguma, pela Convenção mas pela lex fori, e isto mesmo que a questão prévia releve do âmbito de aplicação da Convenção.

    32. 

    Gothot e Holleaux referem de uma forma muito clara que nessa perspectiva:

    «La Convention ne joue pas au sujet des questions principales exclues de son domaine même si elles soulèvent incidemment une question appartenant à ce domaine. La compétence du juge en ce qui concerne la question principale (de sécurité sociale, par exemple...), exclue du domaine du traité, et L question incidente (relative à un contrat de travail, par exemple), comprise dans le champ de la convention, dépend de la lex fori étatique et non de la convention (le jugement prononcé ne saurait évidemment bénéficier du régime conventionnel de reconnaissance et d'exécution)» ( 43 ).

    33. 

    Daqui devem retirar-se duas consequências. A primeira é que é apenas à lex fori, quer dizer, ao direito inglês no caso em apreço, que incumbe determinar se o juiz é competente para decidir da questão prévia. A segunda é que, evidentemente, o litígio, cujo objecto principal é alheio ao âmbito de aplicação da Convenção, não pode relevar desse âmbito de aplicação em consequência de uma questão prévia, ainda que esta última releve, ratione materiae, da Convenção. A este propósito, não é necessário, em nosso entender, que o Tribunal se pronuncie, no caso em apreço, sobre o ponto de saber se a questão da existência de uma convenção de arbitragem submetida, a título principal, a um órgão jurisdicional releva ou não do âmbito de aplicação da Convenção. Em nosso entender, basta observar que, quando uma tal questão reveste a natureza de uma questão prévia num litígio cujo objecto principal escapa à Convenção, esta última não é aplicável e que, por consequência, é à lex fori que compete decidir se o juiz demandado pode_ conhecer da questão incidental em causa. E esta a conclusão que nos parece decorrer naturalmente dos princípios que recordámos.

    34. 

    Mas se o Tribunal recusar esta interpretação por entender, independentemente de qualquer análise processual, que a questão principal no caso em apreço se refere à questão de saber se existe uma convenção de arbitragem entre as partes, também não pode decidir que o litígio submetido ao juiz a quo releva do âmbito de aplicação da Convenção. Em nosso entender, com efeito, um litígio relativo à existência da convenção de arbitragem é alheio a este.

    35. 

    Convém recordar aqui os termos do relatório Schlosser:

    «A Convenção não é aplicável às decisões judiciais que verificam a validade ou nulidade de um compromisso de arbitragem ou que ordenam que as partes não dêem continuidade a um processo de arbitragem devido à sua invalidade» ( 44 ).

    E esta uma opinião que se encontra na doutrina :

    «Furthermore, it is considered, perhaps controversially, that legal proceedings concerning purely the contractual validity of the arbitration agreement, should also be regarded as being excluded from the Convention as involving arbitration under Article 1, para. 2(4), through being more closely related to the arbitration process itself than, for example, are contractual questions in respect of matrimonial property rights — likewise excluded under Article 1, para. 2(1) — related thereto» ( 45 ).

    O Governo do Reino Unido sublinhou perfeitamente a este respeito que não existe nenhuma razão substancial para distinguir entre uma convenção de arbitragem inexistente e uma Convenção inválida. A este propósito, não se pode deixar de sublinhar que a Convenção Europeia de 1961 não estabelece, precisamente, nenhuma distinção entre uma contestação relativa à existência de uma convenção de arbitragem e a relativa à sua validade ( 46 ). Nas duas hipóteses, trata-se sempre da competência do árbitro. Por outro lado, não descortinamos as razões que autorizariam a distinguir, como o faz Jenard no parecer que apresentou ao Tribunal, entre uma contestação sobre a existência ou a validade da convenção de arbitragem antes de a arbitragem começar, o que relevaria do âmbito de aplicação da Convenção, e uma impugnação da competência do árbitro perante o juiz na pendência do processo de arbitragem, que estaria, esta sim, excluída do âmbito de aplicação da Convenção.

    36. 

    Em determinados sistemas jurídicos, o controlo judicial sobre a competência do árbitro é, essencialmente, exercido a posteriori. É essa, por exemplo, a solução do direito francês que, salvo na hipótese de uma convenção de arbitragem manifestamente nula, impõe aos órgãos jurisdicionais o reenvio à arbitragem, sendo as apreciações do árbitro sobre a sua competência susceptíveis de serem objecto de um controlo judicial posterior em caso de recurso de anulação da sentença. Ora, os relatórios Jenard ( 47 ) Schlosser ( 48 ) afastam a hipótese de a Convenção ser aplicável às decisões de anulação de uma sentença arbitral, embora o fundamento da anulação possa precisamente residir na falta de competência do árbitro. Parece, portanto, que, segundo Jenard, a Convenção não se aplica a esse tipo de controlo, enquanto, em contrapartida, regularia impugnações iniciais da competência do árbitro em sistemas de direito que permitem um controlo ab initio dessa competência.

    37. 

    Semelhante solução introduziria uma linha divisória arbitrária relativamente a instâncias judiciais que, todas, conduzem o órgão jurisdicional a pronunciar-se sobre a impugnação da competência do árbitro e encontrar-se-iam, no entanto, umas sujeitas à Convenção, e as outras afastadas do seu âmbito de aplicação.

    38. 

    Por último, torna-se necessário examinar o argumento da sociedade SII, que exprime o seguinte ponto de vista: a «arbitragem» depende do consentimento. Sem consentimento não existe «arbitragem». No entanto, se nos ativermos à sua acepção vulgar, o conceito de «arbitragem» não se aplica a um diferendo relativo à existência inicial de um acordo «de arbitragem». Noutros termos, a matéria de um litígio não incidiria sobre a arbitragem se a própria existência da cláusula de arbitragem fosse contestada.

    39. 

    Face à jurisprudência do Tribunal, esta análise não se revela de forma alguma convincente. No acórdão Effer ( 49 ), tratava-se de um litígio em que a um pedido de pagamento de honorários se opunha uma defesa que contestava a existência de relações contratuais entre as partes. A questão que era colocada ao Tribunal consistia em determinar se a contestação da própria existência do contrato impedia a aplicação do artigo 5.°, ponto 1, da Convenção que servia incontestavelmente de base ao pedido de pagamento. E o Tribunal considerou que o demandante beneficiava do foro do local de execução do contrato, «embora a celebração do contrato que está na origem do recurso seja litigiosa entre as partes». Noutros termos, o Tribunal considerou que não bastava alegar a inexistência do contrato cuja execução se pretende para que não nos encontremos perante matéria contratual. Aplicado ao caso em apreço, este raciocínio deve conduzir a que se considere que a invocação da inexistência de uma convenção de arbitragem não pode conduzir à conclusão de que o litígio submetido ao juiz a quo — que é relativo à nomeação de um árbitro, quer dizer, à implementação da referida convenção de arbitragem — não releva da matéria da arbitragem.

    40. 

    Por conseguinte, seja qual for a análise relativa à questão de saber se a existência da convenção de arbitragem constitui uma questão prévia ou principal, resulta que o essencial do litígio submetido ao juiz a quo é relativo à arbitragem. Sublinhamos, aliás, que no seu parecer Jenard admitiu que a arbitragem é a «main issue» do litígio submetido ao órgão jurisdicional britânico, para daí retirar no entanto a conclusão, que posteriormente examinaremos, de que a Convenção se aplica a esse litígio.

    41. 

    Este não é o resultado que corresponde à aplicação dos princípios clássicos na matéria, resultado que é combatido pela SII e pela Comissão.

    42. 

    Antes de abordar a tese da sociedade italiana, que invoca a título principal uma interpretação radical segundo a qual a Convenção seria aplicável a todos os litígios relativos à arbitragem submetidos aos tribunais, devemos desde já invocar a posição da Comissão que defende a aplicação da Convenção no caso em apreço, no termo de uma análise que parece ignorar completamente os princípios já evocados.

    43. 

    Para a Comissão, a solução da dificuldade é fornecida pela seguinte passagem do relatório Evrigenis e Kerameus:

    «Todavia, dever-se-á considerar incluído no âmbito de aplicação da Convenção o controlo incidental da validade do acordo de arbitragem solicitado por uma parte a fim de contestar a competência internacional da jurisdição perante a qual foi demandada em aplicação da Convenção» ( 50 ).

    44. 

    Antes de mais afirmamos que teríamos sérias dúvidas sobre a razoabilidade deste excerto se o mesmo significasse que é a Convenção que atribui competência ao órgão jurisdicional perante quem foi intentada uma acção que releva do seu âmbito de aplicação para conhecer de uma questão incidental alheia a este. Tal possibilidade é, com efeito, determinada pela «lex fori» do órgão jurisdicional demandado e não pela Convenção. Como referem Gothot e Holleaux:

    «En réalité, la convention n'intervient pas à cet égard: il appartient au droit commun de compétence et de procédure du for de décider si une telle question incidente doit être traitée comme simplement préalable ou comme préjudicielle» ( 51 ).

    45. 

    Parece-nos, portanto, preferível considerar que os autores do relatório pretendiam, na verdade, fazer alusão à aplicação da Convenção ao reconhecimento e à execução de uma decisão relativa a um litígio que releve do domínio da Convenção, após se ter pronunciado sobre a questão da validade de uma questão de arbitragem. Como já referimos, esta questão foi evocada aquando das negociações que precederam a adesão do Reino Unido. Permanece, em nosso entender, aberta e, de qualquer modo, é estranha ao litígio submetido ao juiz a quo.

    46. 

    Mas, mesmo supondo que os autores do relatório tenham considerado que a Convenção determinava a competência de um órgão jurisdicional a quem foi submetida uma questão ao abrigo desta para conhecer, a título preliminar, da validade de uma convenção de arbitragem, a passagem evocada não conduz de forma alguma à conclusão da Comissão.

    47. 

    Com efeito, evoca-se expressamente a situação de um órgão jurisdicional ao qual, ao abrigo da Convenção, foi submetido um controlo incidental da convenção de arbitragem. Noutros termos, é fundamental determinar se a questão principal que foi submetida ao órgão jurisdicional a quo releva do âmbito de aplicação da Convenção. E esta a primeira etapa obrigatória do raciocínio que a Comissão parece saltar.

    48. 

    Encontramo-nos, com efeito, reduzidos a conjecturas sobre os fundamentos do seu raciocínio que afirma que a arbitragem apenas é uma «questão incidental» no caso em apreço. Entenderá a Comissão que, perante o órgão jurisdicional britânico, a designação do árbitro é uma questão incidental e a existência de uma convenção de arbitragem a questão principal? Se é essa a sua análise, são espectacularmente postas em causa noções processuais essenciais. Mas mesmo esta tese só pode conduzir à aplicação da Convenção ao litígio submetido ao juiz britânico se se demonstrar que a questão da existência de uma convenção de arbitragem releva da Convenção. Não encontrámos qualquer resposta para estas questões nas alegações apresentadas ao Tribunal.

    49. 

    Os argumentos particularmente elaborados da sociedade SII reterão de modo mais longo a atenção do Tribunal.

    50. 

    A tese favorável à aplicação da Convenção ao caso em apreço assenta, essencialmente, numa alternativa:

    a título principal, e é esta a análise radical que a sociedade italiana sustenta ao invocar, designadamente, as observações de Schlosser, a Convenção aplica-se a todos os processos que correm os seus trâmites perante os órgãos jurisdicionais em matéria de arbitragem; por conseguinte, propõe-se assim ao Tribunal uma tomada de posição considerável quanto ao alcance do seu artigo 1.°, segundo parágrafo, ponto 4;

    a título subsidiário, e é esta a posição da sociedade SII que assenta, designadamente, no parecer de Jenard, a aplicação da Convenção ao caso em apreço justifica-se em virtude dos verdadeiros objectivos da Convenção.

    51. 

    Examinemos sucessivamente estas duas linhas de argumentação.

    52. 

    A tese segundo a qual a Convenção de Bruxelas se aplica a todos os litígios relativos à arbitragem pendentes nos órgãos jurisdicionais tem o mérito aparente da simplicidade. É, no entanto, contrariada pela economia da Convenção e comporta sérios inconvenientes, não apresentando, em definitivo, nenhuma vantagem significativa.

    53. 

    De acordo com o parecer de Schlosser, o artigo 1.°, segundo parágrafo, ponto 4, da Convenção é meramente declaratório. Noutros termos, esta disposição só tinha um sentido: recordar que a Convenção não se aplica ao reconhecimento e à execução das sentenças arbitrais. Em contrapartida, tanto a competência dos órgãos jurisdicionais estaduais no que se refere a litígios relativos à arbitragem, bem como o reconhecimento da execução de decisões proferidas no termo desses processos, relevam do âmbito de aplicação da Convenção.

    54. 

    Ao contrário dos diferentes relatórios dos comités de peritos, esta análise peca, antes de mais, por falta de lógica se se proceder ao exame da disposição. Citemos aqui um comentador autorizado:

    «La Convention de Bruxelles exclut expressément cette matière à la différence de la Convention de La Haye sur l'exécution des jugements. Il est vrai que les conventions qui ont pour objet la reconnaissance et l'exécution des décisions rendues par les juridictions étatiques ne s'appliquent pas, par hypothèse, à l'exécution des sentences arbitrales. Toutefois un doute qui n'a pas effleuré les négociateurs de La Haye a subsisté dans l'esprit de ceux de Bruxelles et ils ont voulu, par une disposition formelle, éliminer toute tentative de reconnaissance ou d'exécution de décisions judiciaires statuant sur les contestations relatives à l'arbitrage, comme par exemple une action en nullité. En outre la Convention de Bruxelles étant relative à la compétence internationale, il est ainsi précisé que le Traité ne prétend pas déterminer la compétence des tribunaux pour les contestations relatives à un arbitrage» ( 52 ).

    55. 

    Observe-se, aliás, que a própria redacção do texto serve de apoio a esta análise. Com efeito, se o artigo l.°, segundo parágrafo, da Convenção enumera nos seus pontos 1 (estado das pessoas...), 2 (falência...), 3 (segurança social...) matérias que, embora sujeitas aos órgãos jurisdicionais, se encontram no entanto excluídas da Convenção, é lógico que o ponto 4 vise da mesma forma os litígios submetidos aos órgãos jurisdicionais estaduais. Se a exclusão da arbitragem tivesse apenas o carácter declaratório que lhe atribuem a SII e Schlosser — quer dizer, recordar o que é evidente, ou seja, que uma Convenção relativa à competência dos tribunais e ao reconhecimento e à execução das decisões judiciais não se aplica aos processos de arbitragem e ao reconhecimento e à execução de sentenças arbitrais — a norma seria então muito pouco coerente.

    56. 

    A tese da SII é nitidamente contrariada pelos diferentes relatórios dos comités de peritos. Antes de mais o relatório Jenard ( 53 )

    «A Convenção não se aplica nem no que se refere ao reconhecimento e à execução de sentenças arbitrais..., nem para determinar a competência dos tribunais em matéria de diferendos relativos a arbitragens, por exemplo as acções de anulação de uma sentença arbitral, nem tampouco no que se refere ao reconhecimento de decisões proferidas nessas acções.»

    57. 

    Em seguida o relatório Schlosser ( 54 ), e mais nitidamente ainda:

    «... A Convenção não é aplicável aos processos judiciais que se destinam a dar início a um processo de arbitragem, tais como os processos de designação ou de recusa de um árbitro, de determinação do lugar de arbitragem e de prorrogação do prazo fixado para a pronúncia da sentença ou as decisões prejudicais sobre as questões de fundo, tais como existem no direito inglês, sob a forma de “statement of special case” (artigo 21.° do Arbitration Act de 1950. Do mesmo modo, a Convenção não é aplicável às decisões judiciais que verificam a validade ou nulidade de um compromisso de arbitragem ou que ordenam que as partes não dêem continuidade a um processo de arbitragem devido à sua invalidade.

    ... A Convenção também não é aplicável aos processos e decisões relativos aos pedidos de anulação, de alteração, de reconhecimento e de execução de sentenças arbitrais.»

    58. 

    Sublinhemos por outro lado que, de acordo com este último relatório, para todos os Estados que são parte na Convenção, era claro que a exclusão abrange pelo menos «os processos que transitam perante os tribunais dos Estados no caso de esses processos se referirem a processos de arbitragem, quer tais processos se encontrem já encerrados, em curso ou se trate de processos futuros» ( 55 ). Encontrava-se aí vertida, com efeito, desprovida de qualquer ambiguidade, a posição dos Estados originários, no entanto considerada mais restritiva que a do Reino Unido a propósito da dificuldade que anteriormente evocámos.

    59. 

    Por último, o relatório Evrigenis e Kerameus ( 56 )

    «Os processos que dizem directamente respeito, e a título principal, à arbitragem não se encontram abrangidos pela Convenção. Trata-se, por exemplo, dos seguintes casos: intervenção de um tribunal para a constituição do órgão de arbitragem, anulação judicial, verificação da validade de uma sentença arbitrai ou da existência de vícios que a afectam.»

    60. 

    A doutrina está de acordo quanto à exclusão da aplicação da Convenção aos litígios relativos à arbitragem ( 57 ). O único ponto controverso diz respeito à dificuldade que já abordámos, relativa à questão do reconhecimento e da execução ao abrigo da Convenção de Bruxelas de uma decisão que resolva em sede de mérito um litígio apesar da existência de uma convenção de arbitragem ( 58 ). Mas mesmo para os autores favoráveis à aplicação da Convenção em casos semelhantes, todos os litígios em matéria de arbitragem estão excluídos da Convenção ( 59 ).

    61. 

    Se a redacção da Convenção se encontra apoiada por uma convergência completa dos relatórios dos comités de peritos — que provocou, convém sublinhar, legítimas expectativas dos meios interessados — seriam necessárias, parece-nos, razões de fundo sólidas para que se possa seriamente encarar a hipótese de consagrar a solução radical agora defendida por Schlosser. Ora, após análise, os fundamentos aduzidos para justificar esta posição são muito discutíveis.

    62. 

    A tese apresentada invoca, designadamente, a descontinuidade que existiria entre a Convenção de Bruxelas e convenções internacionais se a primeira não fosse aplicada aos litígios relativos a uma arbitragem submetidos aos tribunais.

    63. 

    Permitimo-nos, antes de mais, observar que, no entender do próprio professor Schlosser,

    «muitas vezes na prática as sentenças arbitrais foram reconhecidas extraterritorialmente apesar do facto de outros órgãos jurisdicionais (ou seja, os órgãos jurisdicionais do local onde foi celebrada a arbitragem) terem previamente intervindo na arbitragem, por exemplo, através da nomeação de um árbitro. Os tribunais do país de execução acham, muitas vezes, normal e evidente que os tribunais do local de arbitragem tenham competência nos processos de arbitragem se as medidas judiciais em causa forem familiares a outros sistemas jurídicos. Aparentemente, nunca surgiram problemas de validade destes processos judiciais, como o respeito do princípio do contraditório relativamente às duas parte na arbitragem. Também muitas vezes nunca foi concedida qualquer atenção à questão de saber se decisões relativas à arbitragem devem verdadeiramente ser reconhecidas noutro país por aplicação do tratado bilateral em vigor» ( 60 ).

    64. 

    Todavia, o professor Schlosser não parece satisfeito com o pragmatismo aparentemente eficaz dos diferentes órgãos jurisdicionais nacionais. Com efeito, prossegue:

    «Um exame mais aprofundado destes tratados revela, no entanto, que esta abordagem é superficial. Uma decisão relativa à arbitragem é uma decisão como as outras. Apenas pode ser reconhecida num outro país se existir um fundamento jurídico para se proceder nesses termos. Essa base jurídica pode resultar do tratado bilateral aplicável» ( 61 ).

    E o autor sublinha as carências existentes nos referidos tratados bilaterais a este respeito.

    65. 

    Esta análise está longe de nos convencer.

    66. 

    Enquanto os tribunais nacionais, no momento de reconhecerem as sentenças arbitrais, não vêem aparentemente qualquer inconveniente na intervenção dos órgãos jurisdicionais estaduais do local da arbitragem, é proposta a este Tribunal uma leitura «revista» da Convenção de Bruxelas porque um exame jurídico atento deveria conduzir os órgãos jurisdicionais a levantar dificuldades. Não nos parece satisfatório pôr em evidência um problema puramente teórico, visto aceitar-se que na prática o sistema funciona normalmente, para o invocar em seguida como militando em favor de uma nova interpretação da Convenção. A perspectiva de Schlosser e da SII seria importante se fosse a resposta a indiscutíveis preocupações de ordem prática. Ora, precisamente, as necessidades aqui mencionadas não são convincentes.

    67. 

    Por um lado, Schlosser invoca o reconhecimento e a execução de sentenças arbitrais «fundidas» numa decisão (awards merged into judgments) — situação frequente no Reino Unido de acordo com o autor — que exigiria que a Convenção se aplique aos processos relativos à arbitragem em virtude da importância do Reino Unido como local de arbitragem. A situação a que Schlosser faz referência verifica-se quando o órgão jurisdicional do local da arbitragem concede o exequatur sob uma forma específica: a decisão é proferida «in terms of the award» ( 62 ).

    68. 

    Para refutar sumariamente este argumento, poderíamos limitar-nos a declarar que, precisamente, o reconhecimento e a execução das decisões em que a sentença foi «fundida» não levantou qualquer dificuldade nas hipóteses referidas por Schlosser. É, em todo o caso, o que resulta da leitura das decisões que refere como dando lugar a uma decisão sobre o exequatur em semelhantes circunstâncias ( 63 ).

    69. 

    Mas é necessário completar esta constatação pragamática com uma observação jurídica de maior relevância. No quadro da Convenção de Nova Iorque, não existem dúvidas de que, em presença de uma sentença «fundida» numa decisão, a primeira possa, enquanto tal, ser objecto de um reconhecimento. Com efeito,

    «The fact that the leave for enforcement has the effect of absorbing the award in the country of origin is a technical aspect for the purposes of enforcement within that country. The award can therefore be deemed to remain a cause of action for enforcement in other countries» ( 64 ).

    Nesta perspectiva, a «fusão» da sentença deve ser considerada como limitada ao territorio do órgão jurisdicional que proferiu a decisão ao passo que apenas a sentença deve ser tomada em consideração para o reconhecimento e execução noutros Estados ( 65 ). De qualquer modo, é claro que deve ser afastada a solução que consistiria em limitar o reconhecimento apenas à decisão em que a sentença foi «fundida».

    70. 

    No entanto, a doutrina e a jurisprudência dominantes ( 66 ) inclinam-se para conceder ao beneficiário de uma sentença arbitral «fundida» uma opção entre a possibilidade de execução da própria sentença ao abrigo da Convenção de Nova Iorque ou da decisão com base em convenções bilaterais ou no direito interno. Nestas condições, o beneficiário de uma sentença arbitral tem sempre a possibilidade de obter o reconhecimento e a execução da sentença, ao abrigo da Convenção de Nova Iorque, mesmo que esta tenha sido fundida. A dificuldade a que se refere Schlosser ( 67 ) só surgiria, na verdade, se apenas a decisão pudesse ser objecto de um reconhecimento. Não é esta a solução acolhida pelos órgãos jurisdicionais. As vantagens invocadas a este respeito por Schlosser não podem, portanto, convencer.

    71. 

    Por outro lado, o autor do parecer faz alusão ao interesse em aplicar a Convenção ao reconhecimento das decisões que anulam uma sentença arbitrai. E ainda, a necessidade que Schlosser invoca, aliás, de uma forma bastante lacónica, parece estar longe de ser imperiosa. Com efeito, a Convenção de Nova Iorque no seu artigo V, alínea e), primeiro parágrafo, prevê expressamente a possibilidade de recusa do reconhecimento e da execução da sentença quando esta «foi anulada... por uma autoridade competente do país em que, ou de acordo com a lei do qual, a sentença foi proferida». O artigo IX da Convenção Europeia de 1961 indica, por seu lado, que o exequatur de uma sentença arbitrai pode ser recusado com base num número limitado de fundamentos de anulação determinados. O reconhecimento de uma decisão que anula uma sentença arbitrai parece, portanto, regular-se por estas disposições.

    72. 

    Confessamos não perceber qual a razão por que seria «desejável» aplicar a Convenção de Bruxelas a decisões que anulam sentenças arbitrais. Talvez Schlosser pretenda desse modo abranger os casos em que uma sentença tenha sido anulada pelos órgãos jurisdicionais de um outro Estado que não o daquele em que a sentença foi proferida? Ficaria por demonstrar que é desejável que estas decisões sejam objecto de um reconhecimento «transnacional». Com efeito, não podemos deixar de recordar a análise segundo a qual os órgãos jurisdicionais do «país de origem» são exclusivamente competentes para decidir da anulação da sentença ( 68 ). Nesta perspectiva, não se pode portanto evocar a necessidade de reconhecer decisões de anulação de sentenças proferidas noutros Estados.

    73. 

    Mas, sobretudo, torna-se necessário evocar a clara tendência contemporânea, que inspira determinadas legislações nacionais, de pôr em causa a própria necessidade de reconhecer sistematicamente decisões que anulam sentenças arbitrais. Com efeito, esta tendência traduz-se em reconhecer apenas o controlo dos órgãos jurisdicionais em cujo território a execução deve ser prosseguida, a fim de assegurar um máximo de eficácia às sentenças arbitrais. É óbvio que o reconhecimento transnacional automático das decisões que anulam as sentenças arbitrais a que se refere Schlosser se situa precisamente nos antípodas deste objectivo.

    «... ceux pour qui l'arbitre international statue au nom d'un ordre juridique spécifique, la lex mercatoria, ne peuvent songer à faire dépendre la reconnaissance et l'exécution de la sentence sur le territoire d'un État du point de vue exprimé par un autre ordre juridique étatique: une telle solution ne pourrait s'expliquer que par une infériorité intrinsèque de la lex mercatoria par rapport aux droits étatiques» ( 69 ).

    Os direitos positivos de determinados Estados europeus têm origem nessas concepções, por exemplo, excluindo o recurso de anulação de uma sentença arbitral internacional proferida no território nacional (artigo 1717.° do code judiciaire belga ( 70 )) ou, ainda, não prevendo que a anulação da sentença arbitral no seu Estado «de origem» constitui um fundamento de recusa de exequatur (artigo 1502.° do novo code de procedure civile francês). Esta última solução é demonstrativa de como a tese defendida por Schlosser contraria essas orientações. Basta pensar que a Convenção de Bruxelas imporia aos órgãos jurisdicionais de qualquer Es-tado-membro o reconhecimento de decisões que anulam uma sentença arbitral internacional ( 71 ).

    74. 

    Por último, de acordo com a SII, o artigo II, n.° 3, da Convenção de Nova Iorque «nada diz a propósito do reconhecimento e da execução de uma decisão que nega a existência de uma decisão de arbitragem». Recordemos, antes de mais, que a disposição em causa estabelece:

    «Os tribunais de um Estado contratante, aos quais foi submetido um diferendo sobre uma questão a propósito da qual as partes celebraram uma Convenção na acepção do presente artigo, remeterão as partes à arbitragem, a pedido de uma delas, a menos que verifiquem que a referida Convenção caducou, é inoperante ou não é susceptível de ser aplicada» (tradução não oficial).

    A este respeito, a SII admite que obviamente não existe qualquer dificuldade se o juiz considerar que existe uma convenção de arbitragem. Neste caso, com efeito, as partes serão remetidas à arbitragem.

    75. 

    Em contrapartida, se o juiz conclui pela inexistência da convenção de arbitragem, existirá uma necessidade tão imperiosa de reconhecer uma tal decisão que justifique a aplicação da Convenção de Bruxelas aos litígios em matéria de arbitragem? Antes de mais, no caso de o juiz estadual se pronunciar a título incidental em favor da inexistência ou da invalidade da convenção de arbitragem para concluir pela sua competência e decidir, em seguida, um litígio que releva do âmbito de aplicação da Convenção de Bruxelas, a aplicação desta ao reconhecimento e à execução de uma tal decisão suscita, uma vez mais, a questão que tinha sido abordada aquando da adesão do Reino Unido. Ora, supondo que se chega à conclusão que a uma tal decisão se deve aplicar o regime da Convenção de Bruxelas, esta solução não implica, de forma alguma, que a Convenção se aplique a todos os litígios pendentes nos tribunais em matéria de arbitragem. Como já referimos, os Estados originários, favoráveis a uma tal solução, entendiam, aliás claramente, que a exclusão abrangia os processos pendentes perante os tribunais estaduais que se relacionavam com o processos de arbitragem encerrados, pendentes ou futuros.

    76. 

    Poder-se-ia assim encarar, embora a SII não tenha evocado qualquer caso concreto onde este problema tenha sido suscitado, a questão do reconhecimento eventual de uma decisão que se pronuncie a título principal sobre a existência e a validade de uma convenção de arbitragem. A dificuldade podia ser a seguinte. Antes de qualquer litígio, uma das partes solicita a um juiz num Estado A que se pronuncie sobre a validade de uma cláusula de arbitragem e obtém uma decisão em que se declara a invalidade desta. Surgindo o diferendo entre as partes, esta decisão é invocada no Estado B onde se instaura o processo de arbitragem. Será desejável aplicar a tal decisão o regime de reconhecimento da Convenção? Com efeito, esta decisão pode ter sido proferida noutro local que não o da sede da arbitragem. Ora, a possibilidade de diversos órgãos jurisdicionais estaduais se pronunciarem sobre a competência de um árbitro foi abordada pela doutrina cujas conclusões a essa respeito são — ao que nos parece — nitidamente a favor das apreciações efectuadas pelos órgãos jurisdicionais do local da arbitragem em virtude da sua neutralidade.

    «A — ...

    Reconnaissance internationale du premier jugement étatique rendu

    Les jugements rendus sur une exception d'incompétence opposée à une demande au fond n'ont guère non plus de vocation à la reconnaissance internationale, car leur objet direct est de statuer sur la compétence du tribunal étatique qui les prononce. En revanche, il paraît légitime qu'un jugement rendu au siège du tribunal arbitral, et se prononçant à titre principal sur la compétence arbitrale (soit à titre déclaratoire, soit dans le cadre d'un recours en annulation) soit reconnu, à certaines conditions, dans les autres pays. Certes, le lieu de l'arbitrage est souvent accidentel, et sans relation avec la substance du litige. Mais cela même lui assure une neutralité précieuse. Et il n'y a de toutes façons aucune alternative si l'on cherche à centraliser le contrôle afin d'atteindre l'harmonie internationale des solutions» ( 72 ).

    Deve verificar-se que a solução assim preconizada não será de modo algum favorecida pela aplicação da Convenção de Bruxelas que tornaria aplicável o regime de reconhecimento a qualquer decisão proferida por qualquer órgão jurisdicional de um Estado contratante sem dar uma particular importância ao foro do local da arbitragem. A harmonização das soluções proferidas pelos órgãos jurisdicionais nacionais não constitui um objecto em si, ignorando especificidades do domínio em causa.

    77. 

    Ao aplicar a Convenção de Bruxelas aos litígios em matéria de arbitragem, existe um grande risco de se chegar a soluções sem dúvida harmonizadas mas totalmente inadequadas às necessidades específicas da arbitragem internacional. A inadaptação da Convenção de Bruxelas a este respeito conduz a pôr em dúvida as vantagens que lhe atribui a sociedade SII. De resto, um inconveniente maior ilustra esta inadaptação. Está bem assente a prática de os órgãos jurisdicionais do local da arbitragem concederem o seu apoio e a sua assistência ao processo de arbitragem: nomeação de um árbitro, medidas cautelares provisórias ou para obtenção da prova.

    «For example, the assistance of a national court may be needed for the appointment, replacement or challenge of an arbitrator. It is a generally accepted principle of the international division of judicial competence that the court of the country under the arbitration law of which the arbitration is to take, is taking, or took place, is the competent judicial authority in relation to arbitration» ( 73 ).

    Ora, esta colaboração dos órgãos jurisdicionais estaduais do local onde decorre a arbitragem podia ser profundamente posta em causa se a Convenção de Bruxelas fosse aplicada à matéria da arbitragem. Com efeito, conviria então determinar que disposição da Convenção constituiria uma habilitação para o juiz do local da arbitragem. Esta dificuldade foi perfeitamente exposta na doutrina:

    «it is right and proper that judicial proceedings connected with the prosecution of an arbitration agreement, such as are mentioned above, should be held to be excluded from the Convention's scope under Article 1, para. 2(4) and according by subject to national jurisdiction rules: for, just as the law of the place of arbitration will normally govern the latter proceedings in the absence of a different choice, so too is believed should courts of the same country be regarded as being particularly appropriate and well-placed to control arbitration activities within its territory at national law; thus, if Convention grounds were to apply to any such court proceedings, the English courts might find themselves unable to adjudicate in respect of English arbitration proceedings where the defendant was domicilied in a foreign contracting state (unless, perhaps, Article 5(1) were able to be construing as affording local jurisdiction)» ( 74 ).

    78. 

    Se bem que conteste que a exclusão do artigo 1.°, n.° 2, ponto 4, tenha tido como objectivo reconhecer a competência dos órgãos jurisdicionais do local da arbitragem, a própria sociedade SII admite a «preocupação legítima» de encontrar na Convenção um fundamento de competência. E o parecer de Schlosser vai no sentido de «construir» um foro em proveito dos órgãos jurisdicionais do local de arbitragem com base nos artigos 5.°, ponto 1, ou 17.° da Convenção.

    79. 

    Relativamente ao artigo 5.°, ponto 1, antes de mais Schlosser recorda que as partes numa convenção de arbitragem são obrigadas a colaborar para garantir um desenrolar correcto da arbitragem. A sanção para a violação dessas obrigações, que alguns autores preconizam ( 75 ), pressuporia que existe um local para a execução destas últimas. De acordo com o parecer, este local deve ser considerado como sendo o local da arbitragem por efeito do acordo das partes sobre o local da arbitragem. Por conseguinte, o artigo 5.°, ponto 1, constituiria o fundamento de competência para os órgãos jurisdicionais do local da arbitragem.

    80. 

    Importantes objecções devem ser feitas a este respeito. Antes de mais, a convenção de arbitragem constitui uma convenção de natureza processual cujo objecto é fundamentalmente diferente dos contratos materiais que geram obrigações em relação às partes.

    «It is, however, of a different nature from the other provisions of the contract: not merely because the rights which it creates are procedural rather than substantive» ( 76 ).

    Por outro lado, inúmeras acções intentadas perante os tribunais do local da arbitragem podem dificilmente ser vistas como tendentes à execução de uma obrigação resultante da convenção de arbitragem: assim, o pedido de medidas cautelares, o pedido de concessão de um prazo complementar para dar por terminada a missão de árbitro.

    81. 

    Por ùltimo e sobretudo, Schlosser chega a afirmar que a competência do órgão jurisdicional do local da arbitragem, nos termos do artigo 5.°, ponto 1, não pode ser exclusiva. Chega mesmo, portanto, a admitir que os órgãos jurisdicionais de um outro Estado contratante que não o do local da arbitragem poderiam «give support to arbitration conducted or to be conducted pursuant to the rules of a foreign legal order». Tal hipótese não é realista. Pode-se, por exemplo, imaginar que o juiz inglês aceite intervir em apoio da uma arbitragem que tem lugar em Paris? Schlosser admite, aliás, a este respeito que os órgãos jurisdicionais nacionais se têm quase sempre recusado a intervir em processos arbitrais não regidos pelo seu próprio direito.

    82. 

    Quanto à procura de um foro nos termos do artigo 17.°, esta parece igualmente criticável. Seria, com efeito, perigoso sugerir que a convenção de arbitragem deve ser analisada como contendo, tacitamente, uma prorrogação de jurisdição em favor dos órgãos jurisdicionais do local da arbitragem. Esta solução preconizada por Schlosser conduziria a que se exija que as cláusulas compromissórias preencham as condições do artigo 17.° para que exista um fundamento para a competência dos órgãos jurisdicionais do local da arbitragem. Com a tese de Schlosser, entrevêem-se claramente os inextricáveis diferendos que poderiam nascer, a este respeito, no momento de solicitar a intervenção dos órgãos jurisdicionais do local da arbitragem. De uma forma muito especial, pode-se ser extremamente reservado a propósito da sugestão do autor que propõe encontrar no artigo II.2 da Convenção de Nova Iorque, relativo à forma da convenção de arbitragem, a forma admitida pelos usos no comércio internacional, a que se refere o artigo 17.° da Convenção de Bruxelas para os pactos atributivos de jurisdição.

    83. 

    Os factores de complexidade que comportaria a «descoberta» da convenção de arbitragem de uma cláusula tácita atributiva de jurisdição em favor dos tribunais da sede da arbitragem condenam esta solução elaborada para tentar sanar os inconvenientes da leitura «revista» da Convenção que é sugerida ao Tribunal.

    84. 

    Se os artigos 5.°, ponto 1, e 17.° da Convenção devem ser interpretados de uma forma tão ousada como sugere Schlosser, é precisamente porque a Convenção não previu qualquer foro para os órgãos jurisdicionais do local da arbitragem, e tal ausência explica-se precisamente para exclusão da arbitragem do âmbito de aplicação da Convenção.

    «Had it been decided expressly to include such legal proceedings within the Convention's scope, it may have required an additional exclusive jurisdiction ground of courts of place of arbitration in Section 5 of Title II» ( 77 ).

    85. 

    As negociações aquando da adesão do Reino Unido à Convenção de Bruxelas tinham revelado claramente que para todos os Estados contratantes os litígios submetidos aos tribunais em matéria de arbitragem não relevavam do âmbito de aplicação da Convenção. O relatório sobre a convenção de adesão de 1978 é desprovido de qualquer ambiguidade a esse respeito. A inexistência de razões convincentes em apoio da tese de SII e os inconvenientes que implica conduzem a rejeitá-la sem qualquer hesitação.

    86. 

    No seu parecer, Jenard propõe uma solução aparentemente menos radical do que a de Schlosser pois não põe expressamente em causa o princípio segundo o qual os litígios em matéria de arbitragem não relevam do âmbito de aplicação da Convenção. Não obstante, chega à conclusão de que esta deve regular o litígio submetido ao juiz a quo. Segundo Jenard, a Convenção aplica-se a uma instância que pressuponha que seja decidida a questão incidental da existência da validade de uma convenção de arbitragem pelo órgão jurisdicional competente nos termos da Convenção. Por outro lado, invoca o acórdão Effer ( 78 ). Através deste último, já observámos, o Tribunal aceitou que o artigo 5.°, ponto 1, da Convenção não deixava de se aplicar ao litígio em que o pedido principal relevava da Convenção — pagamento de honorários — quando era invocada a própria inexistência do contrato cuja execução se pretendia. Estes esclarecimentos levantam alguma perplexidade quanto à questão de saber como podem levar Jenard a considerar que o litígio submetido ao juiz a quo é no entanto regulado pela Convenção. Com efeito, admite que a arbitragem é «a main issue» perante os órgãos jurisdicionais britânicos. No entanto, a existência do processo pendente perante o órgão jurisdicional italiano conduziria a aplicar, no caso em apreço, a Convenção ao litígio submetido ao juiz britânico. Seria este o resultado a que conduziriam os objectivos e o espírito do diploma.

    87. 

    Esta posição suscita fortes objecções.

    88. 

    Um processo releva ou não do âmbito de aplicação da Convenção em virtude da matéria sobre que incide. Trata-se de um critério objectivo. Para decidir da aplicação da Convenção, é preciso determinar se, radone materiae, as normas desta se aplicam a um litígio em virtude das suas características próprias. Mas não pode, de forma alguma, ser a existência de outro litígio perante um outro órgão jurisdicional que pode conduzir a alargar ao litígio em questão a aplicação da Convenção se esta não se aplicava em razão da matéria deste último. É, todavia, esta a tese de Jenard. Esta poderia levar, em definitivo, a considerar que o mesmo litígio releva do âmbito de aplicação da Convenção se existir um outro litígio perante um órgão jurisdicional de um outro Estado contratante mas, em contrapartida, não será regulado pela Convenção se não existir outro processo. O âmbito de aplicação da Convenção a um dado litígio podia portanto estar sujeito a geometria variável.

    89. 

    De acordo com o parecer de Jenard, a pura oportunidade define ao sabor das situações os contornos do âmbito de aplicação da Convenção. Basta, a este respeito, invocar os seus objectivos para que ela seja aplicada a qualquer litígio, independentemente da questão de saber se releva ou não do seu âmbito de aplicação.

    90. 

    Os objectivos da Convenção de Bruxelas são, sem dúvida, determinantes para interpretar as suas disposições. Mas a sua simples invocação não pode servir para justificar o desprezo pelas exigências da coerência jurídica e o afastamento das consequências necessárias da própria lógica do texto que se considerem inoportunas.

    91. 

    Ao afirmar pura e simplesmente que se existem dois processos, tendo um por objecto principal a arbitragem e o outro por objecto apenas incidental esta matéria, pendentes perante os órgãos jurisdicionais de dois Estados contratantes, a Convenção se aplica ao primeiro, o parecer de Jenard tenta evitar a confusão a que conduz inevitavelmente a exclusão da arbitragem que, aliás, não põe em causa no seu princípio.

    92. 

    Para concluir pela aplicação da Convenção, deve repetir-se, é preciso estabelecer que um litígio releva do seu âmbito de aplicação. Fazer apelo apenas aos objectivos da Convenção para obviar à impossibilidade de uma tal demonstração revela a fraqueza jurídica de uma posição que não pode aceitar a evidência: o litígio submetido ao juiz a quo escapa ao âmbito de aplicação da Convenção.

    93. 

    Face à resposta que pensamos dever ser dada à primeira questão, não nos pronunciaremos sobre as segunda e terceira questões da Court of Appeal, limitando-nos a curtas observações a esse respeito.

    94. 

    A análise do parecer de Schlosser permitiu-nos demonstrar quanto a criação de uma competência com base nos artigos 5.°, ponto 1, ou 17.°, em proveito dos órgãos jurisdicionais do local da arbitragem nos parece artificial e inadaptada. O Tribunal seria, portanto, em nosso entender, inelutavelmente obrigado a forjar de forma pretoriana um tal foro se consagrasse a tese segundo a qual todos os litígios em matéria de arbitragem relevam do âmbito de aplicação da Convenção.

    95. 

    Por último, o Tribunal apenas terá de responder à questão relativa aos artigos 21.° e 22.° da Convenção caso entenda que a Convenção regula o litígio submetido ao juiz a quo e que este tem competência com base nos artigos 5.°, ponto 1, ou 17.°

    96. 

    Sublinhamos, antes de mais, que é impossível detectar uma hipótese de litispendência entre uma acção que tem por objecto a designação de um árbitro e a que tem por objecto a decisão de mérito do mesmo litígio. A própria Comissão, favorável no entanto à tese da sociedade italiana, admite que, no caso em apreço, não se trata de litispendência.

    97. 

    Em seguida, relativamente ao artigo 22.°, não verificaremos se as diferentes condições que o mesmo exige se encontram preenchidas no caso em apreço para nos limitarmos a constatar que, mesmo supondo que seja esse o caso, esse texto «n'impose aucune obligation au juge saisi le second d'une des affaires connexes» ( 79 ). Trata-se apenas para ele de uma faculdade de suspender a instância ou, se as exigências do artigo 22.°, segundo parágrafo, se encontrarem preenchidas, de se declarar incompetente. Quer isto dizer que em nenhum caso a interpretação da Convenção que a SII sugere poderia conduzir o Tribunal a obrigar o juiz a quo a suspender a instância. Quer isto dizer que o exercício dessa faculdade por este último pode ser influenciada pela convicção que este terá da razoabilidade da solução que torna aplicável a Convenção ao litígio que lhe foi submetido.

    98. 

    Noutros termos, uma solução claramente contrária à lógica e à segurança jurídica, adoptada em nome dos objectivos da Convenção, não levaria necessariamente ao resultado imposto por estes últimos: uma decisão do juiz italiano sobre a questão da existência da convenção de arbitragem. É portanto o mesmo que dizer que seria necessário encontrar fundamentos incontestáveis em favor da aplicação da Convenção ao litígio submetido ao juiz a quo. Pelo nosso lado, essa investigação foi totalmente infrutuosa.

    99. 

    Seja-nos permitido, por fim, fazer estas últimas observações finais e gerais. Antes de mais, o processo pendente perante o juiz britânico näo tem nada de excepcional. Com efeito, são muito frequentes os litígios sobre a existência de uma convenção de arbitragem, circunstância que se explica tanto melhor quanto a execução das sentenças arbitrais está hoje em dia perfeitamente rodada na comunidade internacional.

    100. 

    Em seguida, todos estão de acordo em reconhecer que as estratégias dilatórias da parte recalcitrante na arbitragem constituem um atentado maior à eficácia da arbitragem internacional ( 80 ). Obviamente, esta observação tem um alcance geral e não pretendemos, de algum modo, através disto dizer que a atitude de uma das partes no litígio principal se inspirou nestes motivos. Mas, devemos verificar que a aplicação da Convenção a estes litígios constituiria, em certos casos, o fundamento suplementar para favorecer o «forum shopping» contrariando a sujeição acordada do litígio ao árbitro.

    101. 

    A este propósito, é necessário um esclarecimento. Ao decidir que a Convenção de Bruxelas não se aplica em matéria de litígios relativos à arbitragem, o Tribunal não deixará aos árbitros o cuidado de decidirem sobre a sua competência. Ao que parece, serão aliás, no caso em apreço, os órgãos jurisdicionais britânicos que decidirão a questão. Mas não se pode ignorar que os direitos nacionais ( 81 ) e as convenções internacionais tendem, de um modo geral, a reconhecer aos árbitros o direito de decidirem sobre a sua competência ( 82 ), entendendo-se que esta apreciação é sempre susceptível de um controlo jurisdicional. E este o sentido da evolução que a Convenção de Bruxelas não pode obviamente contrariar. Ora, a sua aplicação aos processos em matéria de arbitragem poderia favorecer determinadas manobras dilatórias da parte recalcitrante que submete a questão a um órgão jurisdicional de um Estado contratante a fim de evitar a aplicação dos direitos de outros Estados contratantes mais favoráveis ao processo arbitral. O local da arbitragem é fortuito. Seria paradoxal que a escolha de um local de arbitragem no interior da Comunidade, quando uma das partes resida no território desta, possa provocar uma desaceleração do processo de arbitragem através da Convenção de Bruxelas, a qual, em contrapartida, não seria de qualquer modo aplicável se a arbitragem devesse ocorrer no exterior da Comunidade.

    102. 

    Por último, a sociedade SII frisou os riscos de inconciliabilidade que comportava a não aplicação da Convenção ao litígio submetido ao juiz britânico. Estamos, por nosso lado, plenamente convencidos que convém encontrar as soluções possíveis para evitar esses riscos, mas convém ainda enquadrar correcta e exactamente os dados do problema. Antes de mais, devemos repeti-lo, os mecanismos dos artigos 21.° e 22.° apenas podem ser implementados no quadro do àmbito de aplicação da Convenção. Ora, na medida em que esta não se aplica a determinadas matérias, comporta inevitavelmente o risco da ocorrência de algumas contradições. E esta a consequência inelutável do facto de os autores da Convenção terem excluído determinadas matérias do seu âmbito de aplicação. Que dois juízes, um a quem foi apresentado um litígio que releva da Convenção e outro a quem foi apresentado um litígio alheio à mesma, possam apreciar de forma diferente a mesma questão prévia pode parecer «in abstracto» lastimável. Este tipo de situação resulta das exclusões que comporta a Convenção. O Tribunal já teve aliás a ocasião de examinar hipóteses de contradição entre uma decisão abrangida pela Convenção e uma decisão que se situa fora do seu âmbito de aplicação ( 83 ). Obviamente, no caso em apreço, se o juiz italiano e o juiz britânico tomarem um partido diferente sobre a existência da convenção de arbitragem, não se pode afastar a hipótese de este poder posteriormente conduzir, por exemplo, à pronúncia de uma sentença arbitral inconciliável com a decisão de mérito proferida em Itália ( 84 ). Esta perspectiva deve ser aceite pelo Tribunal.

    103. 

    De resto, a inconciliabilidade de uma sentença arbitral com uma decisão estadual, embora não seja evidentemente desejável, tem formas de ser solucionada. Estas foram expostas designadamente num estudo consagrado aos conflitos entre decisão judicial e sentença arbitral ( 85 ). E o seu autor encarou de uma forma particular o conflito entre uma decisão protegida pela Convenção de Bruxelas e uma sentença arbitral bem como as soluções aplicáveis em semelhante caso. De qualquer modo, resulta claramente deste estudo que os princípios na matéria permitem determinar, conforme as situações de conflito, se é a decisão ou a sentença arbitral que deve primar.

    104. 

    Por último, diremos que não fomos de forma alguma afectados pela crítica da Comissão, que evocou aquando da audiência o carácter «comunitário» da solução que preconiza por oposição à tese dos três Estados-membros intervenientes, segundo a qual a Convenção não se aplica ao litígio submetido ao juiz britânico. Por nosso lado, não vemos qualquer vantagem para a Comunidade em ignorar as necessidades jurídicas específicas da arbitragem internacional, o modo universal de resolução dos litígios do comércio internacional. Estas necessidades, esperamos tê-lo demonstrado, não se identificam necessariamente com as que exprime a Convenção de Bruxelas, instrumento destinado a garantir uma boa administração da justiça estadual no seio da Comunidade.

    105. 

    Convidamos o Tribunal, por conseguinte, a recordar claramente o âmbito de aplicação da Convenção declarando:

    «A questão da existência de uma convenção de arbitragem colocada a um juiz a quem foi solicitado proceder à designação de um árbitro é abrangida pela exclusão do artigo 1.°, segundo parágrafo, ponto 4, da Convenção de 27 de Setembro de 1968 relativa à Competência Judiciária e à Execução das Decisões em Matéria Civil e Comercial.»


    ( *1 ) Língua original: francês.

    ( 1 ) Ver, por exemplo, o acórdão de 8 de Dezembro de 1987, Gubisch/Palumbo (144/86, Colect., p. 4861), onde o Tribunal elaborou uma definição autónoma e extensiva da litispendência; sobre este acórdão, ver designadamente Gaudemet-Tallon, H.: RCDIP, 1988, p. 371; Huet, A.: Clunet, 1988, p. 537; Linke, RIW, 1988, p. 818, 822.

    ( 2 ) Fouchard, P.: L'arbitrage commercial international, Dalloz, Paris, 1965, p. 25.

    ( 3 ) Mayer, P.: « L'autonomie de l'arbitre international dans l'appréciation de sa propre compétence», Recueil des cours de l'académie de droit international de La Haye, 1989, V, tomo 217, p. 321, Martinus Nijhof, 1990.

    ( 4 ) Sobre o carácter mundial do recurso à arbitragem internacional, ver designadamente Gaudet, M.: L'arbitrage, travaux offerts au professeur Albert Fettweis, Story-Scientia, 1989, p. 339 e seguintes.

    ( 5 ) Van den Berg, A. J.: The New York Arbitration Convention of I9S8, T. M. C. Asser Institute, La Have, 1981, p. 1.

    ( 6 ) Para uma análise de conįunto das relações entre direito comunitário e arbitragem, ver, designadamente, Kovar, R. : «Droit communautaire de la concurrence et arbitrage» in Le droit des relations économiques internationales. Etudes offertes à Berthold Goldman, 1982, p. 109; Goffin, L.: «Arbitrage et droit communautaire», in L'arbitrage, travaux offerts au professeur Albert Fettweis, Story-Scientia, 1989, p. 159; de Mello, X.: «Arbitrage et droit commmunau-taire», Revue de l'arbitrage, 1982, p. 349; recordamos que o Tribunal, no acórdão de 23 de Março de 1982, Nordsee (102/81, Recueil, p. 1095), excluiu que um árbitro possa colocar questões prejudiciais nos termos do artigo 177.°

    ( 7 ) O sublinhado e nosso.

    ( 8 ) Relatório de P. Jenard sobre a Convenção de 27 de Setembro de 1968 relativa à Competencia Judiciária e à Execução de Decisões em Matéria Civil e Comercial, JO 1979, C 59, p. 1, 13; ver versão portuguesa no JO 1990, C 189, p. 122, 134. Ver igualmente o relatório dos professores D. Evrigenis e K. D. Kerameus relativo à adesão da Grecia á Convenção (JO 1986, C 298, p. 1, 10; ver versio portuguesa no JO 1990, C 189, p. 257,266):

    «A exclusão da arbitragem, instituição que se enquadra no ámbito do direito civil e, em especial, do direito comercial, prevista no segundo parágrafo, ponto 4, do artigo 1.°, justifica-se pela existência de um grande número de convenções internacionais multilaterais que regulam estas relações.»

    ( 9 ) Vcr. n n especial, A. J. van den Berg, op. cit., p. 6 e seguintes.

    ( 10 ) Convenções bilaterais tinham, no entanto, sido celebradas, designadamente entre Estados europeus, a partir da segunda metade do século XIX.

    ( 11 ) E à iniciativa da Câmara de Comércio Internacional, cujo papel foi particularmente activo no processo contemporâneo de elaboração das convenções internacionais em matéria de arbitragem.

    ( 12 ) Sociedade das Nações, Recueil des traités 158 (1924).

    ( 13 ) Sociedade das Nações, Recueil des traités 302 (1929-1930).

    ( 14 ) Ver a este proposito A. J. van den Berg, op. cit., p. 7.

    ( 15 ) Para uma descrição sintética a este respeito, ver A. J. van den Berg, op. cit, p. 9.

    ( 16 ) Garantida pelo artigo II, n.° 3 da Convenção: «O tribunal do Estado contratante, a quem tenha sido submetido um litígio relativo a uma questão a propósito da qual as partes celebraram uma convenção na acepção do presente artigo, remeterá as partes à arbitragem, a pedido de uma delas, a menos que verifique que a referida convenção caducou, é ineficaz ou não č susceptível de ser aplicada».

    ( 17 ) Portugal, signatário das convenções de Genebra, ainda não aderiu à Convenção de Nova Iorque.

    ( 18 ) Redfern, A. e Hunter, M.: Law and practice ofinternational commercial arbitration, Sweet and Maxwell, Londres, 1986, p. 43.

    ( 19 ) Ibidem, p. 362.

    ( 20 ) Sobre este diploma ver Jarvin: «La loi-rype de la Cnudci», Revue de l'arbitrage, 1986, p. 509; Fouchard: «La loi-type de la Cnudci sur l'arbitrage commercial international», Clunet, 1987, p. 861; Redfern et Hunter, op. cit., p. 402 e seguintes.

    ( 21 ) Para um exemplo de legislação que adoptou a lei-modelo, ver Alvarez, A.: «La nouvelle législation canadienne sur l'arbitrage commercial international», Revue de l'arbitrage, 1986, p. 529.

    ( 22 ) Sobre esta designação, ver designadamente Fouchard, op. cit., p. 135 e seguintes; Mayer, op. cit.,; Redfern et Hunter, op. cit., p. 213-215; Mustill e Boyd: Commercial arbitration, London, Butterworths, 1982, p. 516 e seguintes.

    ( 23 ) Redfern e Hunter, op. cit., p. 395.

    ( 24 ) Convém igualmente referir a este respeito a Convenção para a resolução dos diferendos relativos aos investimentos entre Estados e nacionais de outros Estados, de 1965, denominada Convenção de Washington (Organização das Nações Unidas, Recueil des traités, 1966, vol. 575, p. 160, n.° 8359); esta Convenção aplica-se aos litígios, relativos a um investimento, entre Estado contratante e nacional de um outro Estado.

    ( 25 ) Sobre este diploma, ver, designadamente, Hascher, D.: «Commentary on the European Convention on Commercial Arbitration», Yearbook Commercial Arbitration, vol. XV, 1990, p. 619.

    ( 26 ) Série des traités européens 1966.

    ( 27 ) Artigo IX da Convenção.

    ( 28 ) Bélgica, Dinamarca, Alemanha, Espanha, França, Itália e Luxemburgo; a acessão à Convenção está aberta aos Estados näo europeus.

    ( 29 ) O último decênio viu surgir uma vaga de reformas nacionais favoráveis á arbitragem internacional; assim, o Arbitration Act de 1979 limitou consideravelmente, no Reino Unido, os recursos de anulação interpostos contra sentenças arbitrais internacionais; a reforma francesa de 1981 foi marcada por um grande liberalismo em matéria de arbitragem internacional, do mesmo modo que a lei belga de 1985 e a lei portuguesa de 1986; ver, igualmente, a lei italiana de 1983, as leis alemã e neerlandesa de 1986, que modernizam a arbitragem, bem como a lei espanhola de '988; ver, fora da Comunidade, a lei federal suíça sobre o direito internacional privado de 1987.

    ( 30 ) Mustill e Boyd, op. cit., p. 7; esu citação evoca irresistivelmente os termos da importantíssima decisão Mitsubishi//Soler (105 VS, 1985, p. 3346) do Supremo Tribunal dos Estados Unidos que admitiu a possibilidade de arbitragem de pedidos baseados no Sherman Act no quadro de um litígio relativo a uma transacção comercial internacional : «... vai longe o tempo em que a reticência dos tribunais relativamente às vantagens da arbitragem entravava o desenvolvimento desta como meio alternativo de resolução dos litígios»; sobre este acórdão ver designadamente Robert, J.: «Une date dans l'extension de l'arbitrage international: l'arrêt Mitsubishi/Soler., Revue de l'arbitrage, 1986, p. 173, e as referências que figuram in Carbonneau, T. E.» Le droit américain de l'arbitrage (travaux offerts au professeur Albert Fettweis, ji citados), p. 210, nota 20.

    ( 31 ) Sobre a lex mercatoria, ver, designadamente, Goldman, B.: «Frontières du droit et lex mercatoria», Archives de philosophie du droit, 1964, p. 177; «La lex mercatoria dans les contrats et l'arbitrage internationaux: réalités et perspectives», Cluneļ 1979, p. 475; Mustill, M.: The New Lex Mercatoria, Liber amicorum for Lord Wilberforce, 1987, Bos and Brownlie editors; Paulsson, J.: «La lex mercatoria dans l'arbitrage CCI», Revue de l'arbitrage, 1990, n.° 1, p. 55; para teses criticas, ver, designadamente, Lagarde, P.: «Approche critique de la lex mercatoria», Le droit des relations économiques internationales, Études offertes á Berthold Goldman, 1982, p. 125, e os autores citados in Paulsson, op. cit., p. 57, nota 11.

    ( 32 ) Sobre a deslocalização da arbitragem internacional, ver, designadamente, Fouchard, op. cit., p. 22 e seguintes; Paulsson: «Arbitration Unbound: Award Detached from the Law of its Country of Origin» (1981) 30 ICQL 358; «Délocalisation of International Commercial Arbitration-When and Why it Matters» (1983) 32 ICLQ 53; Sanders: «Trends in the Field of International Commercial Arbitration», Recueil des cours de l'académie de la Haye, 1975, vol. II, p. 207; para uma análise critica desta teoria ver, designadamente, Redfern e Hunter, op. cit., p. 55 e seguintes; Park, «The lex fori arbitri and International Commercial Arbitration» (1983) 32 ICLQ; A. J. van den Berg, op. cit., p. 29 e seguintes.

    ( 33 ) Ver a este respeito dois artigos posteriores à entrada da presente questão prejudicial: Thomas, D. R.: «The Arbitration Exclusion in the Brussels Convention 1968: An English Perspective», Journal of International Arbitration, 1990, p. 44; o autor é favorável a uma solução que exclua o litígio submetido ao juiz a quo do ámbito de aplicação da Convenção; é uma tese inversa que sustenta Bonell, M. J.: «Le Corte Inglesi e i contratti commerciali internazionali: English law and jurisdiction über alles?», Diritto del commercio intemazionale, Pratica intemazionale e diritto intemo, luglio-dicembre 1989, p. 329.

    ( 34 ) Ver, por exemplo, acórdãos de 26 de Maio de 1982, Ivenel e Schwab (133/81, Recueil, p. 1891); de 15 de Novembro de 1983, Duijnstee (288/82, Recueil, p. 3663); de 27 de Setembro de 1988, Kalfelis (189/87, Colea., p. 5565).

    ( 35 ) Part I, Section 3 (3) que está redigida da seguinte forma:

    «3.

    Interpretations or the Conventions:

    1)

    Any question as to the meaning or effect of any provision of the Conventions shall, if not referred to the European Court in accordance with the 1971 Protocol, be determined in accordance with the principles laid down by and any relevant decision of the European Court.

    2)

    Judicial notice shall be taken of any decision of, or expression of opinion by, the European Court on any such question.

    3)

    Without prejudice to the generality of subsection (1), the following reports (which are reproduced in the Official Journal of the Communities), namely —

    a)

    the reports by Mr P Jenard on the 1968 Convention and the 1971 Protocol; and

    b)

    the report by Professor Peter Schlosser on the Accession Convention,

    may be considered in ascertaining the meaning or effect of any provision of the Convenuons and shall be given such weight as is appropriate in the circumstances.»

    ( 36 ) Ver relatório Schlosser nos n.°' 61 e 62 GO 1979, C 59, p. 92 e 93; ver versão portuguesa no JO 1990, C 189, p. 203 e 204).

    ( 37 ) Relatório Schlosser, op. cit., n.° 61.

    ( 38 ) P. 44 da versão francesa das suas observações.

    ( 39 ) Christopher Brown LD/Genossenschaft österreichischer Waldbcsitzer Holzwirtschaftsbetriebe und Registrierte Genossenschaft mit beschränkter Haftung (1952 C. 3851) 1 Q. B. 1954, p. 8, 12 e 13, o sublinhado 6 nosso.

    ( 40 ) Relatório Jenard, op. cit., p. 10, ver versão portuguesa no JO 1990, C 189 p. 131, ; Bellet, P.: «L'élaboration d'une convention sur la reconnaissance des jugements dans le cadre du marche commun», Clunet, 1965, p. 833, 851 e 852.

    ( 41 ) Op. cit., p. 95; ver versão portuguesa no JO 1990, C 189, p. 203.

    ( 42 ) Ver, designadamente, Kaye: «Civil Jurisdiction and Enforcement of Foreign Judgments», Profissional Books Limited, 1987, p. 148; Collins, L.: The Civil Jurisdiction and Judgments Act 1982, Londres, Butterworths 1983, p. 29; Lasok, D. e Stone, P. A.: «Confita of Laws in the European Community», Profissional Books Limited, 1987, p. 185; Hartley, T. C.: Civil Jurisdiction and Judgments, Sweet and Maxwell, p. 22; Beraudo: «Convention de Bruxelles du 27 septembre 1968», Jurisclasseur Europe, fase. 3000, p. 10, n.o34.

    ( 43 ) La Convention de Bruxelles du 27 septembre 1968, Jupiter, 1985, p. 15, n.° 29; ver igualmente Kaye (op. cit., p. 151-152: «In spite of the absence of any express provision in Article 1 of the Convention to such effect, it is widely accepted that it is only the principal subject-matter of proceedings which is to be taken into account in determining whether the latter are within the Convention's scope and that, accordingly, excluded areas which merely arise as incidental issues in the course of main proceedings to which the Convention applies, are themselves subject to Convention jurisdiction and recognition and enforcement rules along with the main claim, while, equally, matters to which the Convention would be applicable if they had formed the principal subject-matter of proceedings, but which are raised incidentally in excluded main proceedings, also fall outside Convention jurisdiction and recognition and enforcement provisions») e Beraudo (op. cit., p. 12, n° 40, «... une question incidente, rattachée a la Convention, ne peut avoir pour résultat de faire entrer dans le champ de la Convention une matière exclue qui serait l'objet principal du proces»).

    ( 44 ) JO 1979, C 59, p. 93, n.° 64; ver versão portuguesa no JO 1990, C 189, p. 203, n.° 64.

    ( 45 ) Kaye, op. cit., p. 150; o juiz Hirst fez, aliás, referência a esta opinião na sua decisão.

    ( 46 ) Ver artigo V, n.° 3 : «Sem prejuízo dos controlos judiciais posteriores previstos pela lei do foro, o árbitro, cuja competencia é contestada, näo deve declarar-se incompetente; tem o poder de decidir sobre a sua própria competência e sobre a existência ou validade da convenção de arbitragem ou do contrato de que essa convenção faz parte», e o artigo VI, n.° 3; Quando, antes de se recorrer a um tribunal judicial, for instaurado um processo de arbitragem, os tribunais judiciais do Estado contratante, posteriormente chamados a decidir sobre uma questão relativa ao mesmo diferendo entre as mesmas panes ou de um pedido de declaração de inexistência, de nulidade ou da caducidade da convenção de arbitragem, não se pronunciarão, salvo por motivos graves, sobre a competência do árbitro até i pronúncia da sentença arbitral (tradução não oficial).

    ( 47 ) JO 1979, C 59, p. 13; ver versão portuguesa no JO 1990, C 189,p. 134.

    ( 48 ) Ibidem, p. 93; ver verslo portuguesa no JO 1990, C 189, p. 203.

    ( 49 ) Acórdão de 4 de Março de 1982 (38/81, Recueil, p. 825).

    ( 50 ) JO 1986, C 298, p. 10; ver versio portuguesa no JO 1990, C 189, p. 266.

    ( 51 ) Op. cit., p. 15.

    ( 52 ) Droz, G. A. L : «Compétence judiciaire et effets des jugements dans le marché commun» Étude de la Convention de Bruxelles du 27 septembre 1968, Dalloz, 1972, p. 27-28, o sublinhado é nosso.

    ( 53 ) JO 1979, C 59, p. 13; ver versão portuguesa no JO 1990, C 189, p. 134.

    ( 54 ) Ibidem, p. 93; ver versão portuguesa no JO 1990, C 189, p. 203.

    ( 55 ) Ibidem, p. 92; ver versão portuguesa no JO 1990, C 189, p. 202.

    ( 56 ) JO 1986, C 298, p. 10; ver versão portuguesa no JO 1990, C 189, p. 266.

    ( 57 ) Ver, designadamente, Kaye, op. cit., p. 146 e seguintes; Lasok e Stone para os quais «The effects of Article 1 (2) (iv) seem largely clear and uncontroversial», op. cit., p. 185; T. C. Hartley, op. cit., p. 22; L. Collins, op. cit., p. 29; Droz, op. cit., p. 37; Beraudo, op. cit., p. 10, n.° 34; por outro lado, este último lamenta que a Convenção näo contenha uma regra uniforme quando as questões são submetidas aos órgãos jurisdicionais apesar da existencia de uma convenção de arbitragem e näo preveja que uma sentença arbitrai possa impedir o reconhecimento e a execução de uma decisão judicial proferida num outro Es-tado-membro.

    ( 58 ) Em favor do reconhecimento e da execução da decisão neste caso preciso, ver designadamente Lasok e Stone, op. cit., p. 186; Kaye, op. cit., p. 147; Cheshire et North's, Private International Law, 11. a edição, Buuerworths, 1987, p. 426-427; em favor da recusa de reconhecimento, Hartley, op. cit., p. 97.

    ( 59 ) Lasok c Stone, op. cit., p. 175-186; Kaye, op. cit., p. 146 e seguintes.

    ( 60 ) P. 3 do parecer, tradução livre.

    ( 61 ) Ibidem.

    ( 62 ) A este propósito ver A. J. van den Berg, op. cit., p. 346 e seguintes; no Reino Unido esta possibilidade resulta da section 26 da Arbitration Act de 1950: «An award on an arbitration agreement may, by leave of die High Court or a judge thereof, be enforced in the same manner as a judgment or order to the same effect, and where leave is so given judgment may be entered in terms of the award.»

    ( 63 ) Paris, 20 de Outubro de 1959, Revue de l'arbitrate, 1960, p. 48; Cone di Cassazione, 27 de Fevereiro de 1979, n.° 1273, Yearbook Commercial Arbitration, 1982, p. 333; Bundesgerichtshof, 10 de Maio de 1984, WM 1984, 1014 (sobre este acórdão ver, designdamente, Lüer, H. J.: «German Court Decisions Interpreting and Implementing the New-York Convention», Journal of International Arbitration, Março de 1990, p. 127, 129 e a nota 14).

    ( 64 ) A. J. van den Berg, op. cit., p. 347.

    ( 65 ) Ver, a este propósito, o acórdão do Oberlandesgericht Hamburg apresentado por A. J. van den Berg, op. cit., p. 347.

    ( 66 ) Ver, por exemplo, o acórdão do Bundesgerichtshof, já citado, e o acórdão da Corte di Cassazione, já citado (ver Yearbook Commercial Arbitration, 1982, vol. 7, p. 334; «The Corte di Cassazione found that, therefore, tne English awards, being final and binding on the parties, could be enforced under the New York Convention, regardless whether a High Court judgment had been entered on the awards.»); ver A. J. van den Berg, op. cit., p. 346-349; o acórdão da cour d'appel de Pans de 20 de Outubro de 1959 referido por P. Schlosser em apoio da sua afirmação segundo a qual a sentença arbitral «merged into judgment» já näo era passível de ser executada como sentença näo serve de forma alguma de base a ul princípio; esu decisão, que, aliás, näo foi proferida ao abrigo da Convenção de Nova Iorque, limitou-se a infirmar uma decisão de primeira instância que excluía o exequatur áz decisão; e, aliás, considerada como tendo escolhido a solução da opção; ver Fouchard, op. cit., p. 540, nota 26.

    ( 67 ) Que de resto está longe de ser frequente; ver a este propósito o comentário do professor G. Recchia relativo ao acórdão da Corte di Cassazione, já citado: «... The recognition and enforcement of a foreign judgment entered upon an award rather than a foreign award without a judgment (according to the law of the place where it was handed down) is very unusual in Italy, particularly after Italy's adherence to the New York Convention of 1958. ... In fact, this is a unique case.»

    ( 68 ) Ver A. J. van den Berg, op. cit., p. 20, pan a Convenção de Nova Iorque.

    ( 69 ) Mayer, op. cit., p. 361-361.

    ( 70 ) Sobre esta norma, ver designadamente Van Houtte: «La loi belge du 27 mars 1985 sur l'arbitrage international», Revue de l'arbitrate, 1986, p. 29-41; Vanderelst: «Increasing the Appeal of Belgium as an International Arbitration Forum, The Belgian Law of March 27, 1985 concerning the Annulment of Arbitral Award», Journal of International Arbitration, 1986, p. 77.

    ( 71 ) Solução que a Convenção de Nova Iorque näo adoptou pois não existe obrigação de recusar o reconhecimento e a execução de uma sentença anulada no Esudo onde foi proferida; trata-se de uma faculdade que não exclui, de acordo com o artigo 7.° da Convenção de Nova Iorque, a aplicação de direitos nacionais que permitem invocar a sentença apesar da anulação; assim, de acordo com a Cour de cassation francesa, «o juiz não pode recusar o exequatur quando a sua ordem jurídica o autoriza» (Pa-balk-Norsolor, 9 de Outubro de 1984; Revue de l'arbitrage, 1985, p. 431, note Goldenau; Dalloz 1985, p. 101, note Robert).

    ( 72 ) Mayer, op. cit,, p. 358-359.

    ( 73 ) A. J. van den Berg, op. cit., p. 30.

    ( 74 ) Kaye, op. cit., p. 149-150.

    ( 75 ) Mustili e Boyd, op. cit., p. 409.

    ( 76 ) Ibidem.

    ( 77 ) Kaye, op. cie, p. 189, nou 412.

    ( 78 ) Citado.

    ( 79 ) Gothot e Holleaux, op. cit., p. 127, n.° 225.

    ( 80 ) Ver, a este propósito, designadamente Gaillard, E.: «Les manoeuvres dilatoires des parties et des arbitres dans l'arbitrage commercial international», Revue de l'arbitrage, 1990, p. 759, n° 4.

    ( 81 ) Pelo menos os sistemas jurídicos de «direito civil»; o direito británico põe inúmeras reticencias no que se refere à «competence-competence» tal como consagrada nos sistemas continentais; sobre este ponto, ver designadamente E. Gaillard, op. cit., p. 776.

    ( 82 ) Sobre o grau de controlo da existencia da convenção de arbitragem peto jurista estadual chamado a designar um árbitro, ver a descrição das funções nacionais em Gaillard, op. cit., p. 778-779; este autor parece considerar que a solução do direito neerlandês (artigo 1027.°, quarto parágrafo, do código de processo civil), segundo o qual «o presidente ou o terceiro designa o árbitro ou os árbitros sem se ater à validade da convenção de arbitragem», é de uma forma demasiado rigorosa favorável à competėncia--compeiència; estabelece a sua preferência por soluções de compromisso acolhidas pelo novo direito suíço (o juiz «dá seguimento ao pedido de nomeação que lhe ć apresentado a näo ser que o exame sumário demonstre que näo existe entre as partes qualquer convenção de arbitragem»; ver o artigo 12.°, n.° 5, da lei portuguesa de 1986 e o artigo 1444.°, terceiro parágrafo, do novo código de processo civil francês que estabelecem que o juiz chamado a designar o ou os árbitros pode declarar que a cláusula compromissória é manifestamente nula e declarar que a designação näo pode ter lugar.

    ( 83 ) Acórdão de 4 de Fevereiro de 1988, Hoffmann/Krieg (145/86, Colect., p. 645; conflito entre uma decisão concedendo uma pensão alimentar entre cônjuges, que releva da Convenção, e uma decisão em que é pronunciado o divórcio, não abrangida pela Convenção).

    ( 84 ) Cujo reconhecimento e execução podiam, aliás, eventualmente conduzir a decidir a questão, abordada por diversas vezes nas nossas conclusões, de saber se a Convenção é aplicável a uma decisão sobre o mérito proferida apesar da existência de uma convenção de arbitragem que o juiz do Estado requerido considerava, por seu lado, válida.

    ( 85 ) P. Schlosser: «Conflits entre jugement judiciaire et arbitrage», Revue de l'arbitrage, 1981, n.° 3, p. 371.

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