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Document 61988CJ0120

    Acórdão do Tribunal de 26 de Fevereiro de 1991.
    Comissão das Comunidades Europeias contra República Italiana.
    IVA - Importação - Pessoas que não são sujeitos passivos - Dedução da parte residual do IVA pago no Estado-membro de exportação.
    Processo C-120/88.

    Colectânea de Jurisprudência 1991 I-00621

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1991:74

    RELATÓRIO PARA AUDIÊNCIA

    apresentado no processo 0-120/88 ( *1 )

    I — Factos e tramitação processual

    1. Enquadramento jurídico

    a) Direito comunitário aplicável.

    O artigo 95.° do Tratado CEE dispõe, no seu primeiro parágrafo, que:

    «Nenhum Estado-membro fará incidir, directa ou indirectamente, sobre os produtos dos outros Estados-membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, directa ou indirectamente, sobre produtos nacionais similares.»

    Esta disposição impõe uma proibição absoluta, de efeito directo, que tem por objecto garantir a completa neutralidade das imposições internas no que respeita à concorrência entre produtos nacionais e produtos importados ( 1 ).

    Além disso, a Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Esatados-membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme QO L 145, p. 1; EE 09 Fl p. 54), dispõe, no seu artigo 2.°, que as importações de bens estão sujeitas a IVA, quer sejam efectuadas por um sujeito passivo quer não.

    Interrogado sobre a questão de.saber se a tributação em IVA aquando da importação de um bem proveniente de um Estado-membro, entregue por um particular, era conforme ao artigo 95.° do Tratado CEE, quando o IVA não é cobrado no momento da entrega de bens entre particulares no interior do Estado-membro de importação, o Tribunal de Justiça esclareceu, no seu acórdão de 5 de Maio de 1982, Gaston Schul I (15/81, Recueil, p. 1409), que

    «para apreciar a compatibilidade com as exigências do artigo 95.° da aplicação do IVA aos produtos provenientes de outro Estado-membro entregues por particulares, na medida em que a entrega de produtos similares efectuada por particulares no interior do Estado-membro de importação não é tributada, deve ter-se ainda em consideração o IVA cobrado no Estado-membro de exportação. Portanto, na medida em que tal produto importado entregue por um particular, e que não pode legalmente ser desagravado no momento da exportação, se mantém efectivamente onerado, no momento da sua importação, por uma parte do IVA pago no Estado-membro de exportação, o montante do IVA exigível aquando da importação deve ser diminuído da parte residual do IVA do Estado-membro de exportação que está ainda incorporada no valor do produto no momento da exportação. O montante que assim deve ser diminuído não pode, no entanto, ser superior ao montante do IVA efectivamente pago no Estado-membro de exportação»? ( *2 )

    Tratando-se, nestas condições, de determinar o montante do IVA devido aquando da importação, o Tribunal de Justiça declarou, no seu acórdão de 21 de Maio de 1985, Gaston Schul II (47/84, Recueil, p. 1491), que:

    «O IVA cobrado por um Estado-membro aquando da importação, proveniente de outro Estado-membro, de um produto entregue por quem não é sujeito passivo, quando este imposto não é cobrado aquando da entrega, por um particular, de produtos similares no interior do Estado-membro de importação, deve ser calculado tendo em conta o montante do IVA pago no Estado-membro de exportação que ainda esteja incorporado no valor do produto no momento da sua importação, de maneira que esse montante não faça parte da matéria colectável e seja, além disso, deduzido do IVA devido na importação.»

    Posteriormente, no seu acórdão de 23 de Janeiro de 1986, Bergeres-Becque (39/85, Colect., p. 259), o Tribunal de Justiça esclareceu que os princípios consagrados nos acórdãos de 5 de Maio de 1982, Gaston Schul I, e de 21 de Maio de 1985, Gaston Schul II, já referidos, se aplicam também quando a operação que dá lugar à importação é efectuada a título gratuito.

    Além disso, no seu acórdão de 25 de Fevereiro de 1988, Drexl (299/86, Colect., p. 1213), o Tribunal de Justiça precisou que estes princípios se aplicam também no caso de um particular importar um bem proveniente de outro Estado-membro e de não estarem preenchidas as condições previstas para a concessão do benefício de franquia fiscal no Estado-membro de importação.

    b) Propostas de directiva

    Em 23 de Julho de 1984, a Comissão apresentou ao Conselho uma proposta de décima sexta directiva em matéria de harmonização das legislações dos Esta-dos-membros relativas aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: regime comum aplicável a certos bens definitivamente tributados em imposto sobre o valor acrescentado, importados por um consumidor final de um Estado-membro, em proveniência de outro Estado-membro (JO C 226, p. 2; a seguir «proposta inicial de Décima Sexta Directiva IVA»). O sistema que esta proposta visava instituir, a fim de evitar as duplas tributações, consistia, em princípio, no desagravamento dos bens na exportação e na tributação no momento da importação, desde que estivessem preenchidas certas condições relativas ao valor dos bens e ao prazo decorrido entre a exportação e a última entrega.

    A proposta inicial de Décima Sexta Directiva IVA foi posteriormente modificada a fim de ter em conta o parecer do Parlamento Europeu. Em 25 de Março de 1986, a Comissão apresentou ao Conselho a proposta alterada de décima sexta directiva do Conselho relativa à harmonização das legislações dos Esta-dos-membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: regime comum aplicável a certos bens definitivamente tributados em imposto sobre o valor acrescentado, importados por um consumidor final de um Estado-membro em proveniência de outro Estado-membro (JO C 96, p. 5; a seguir «proposta alterada de Décima Sexta Directiva IVA»). A proposta alterada visa instituir um sistema baseado na isenção de IVA no Estado-membro de importação, sob certas condições relativas ao valor do bem ou à sua natureza e/ou ao tempo decorrido entre a exportação e a última entrega. Aos bens excluídos do regime de isenção na importação aplicar-se-ia um mecanismo de reembolso de imposto na exportação e de tributação na importação. Esta proposta de directiva ainda não foi aprovada.

    2. Fase pré-contenciosa

    Considerando que a legislação italiana nãc incluía as disposições necessárias para dai cumprimento ao artigo 95.°, tal como fo interpretado pelo Tribunal de Justiça, a Comissão, por carta de 8 de Outubro de 1985, convidou a República Italiana a apresentar no prazo de dois meses, as suas observações, de acordo com o processo previsto nc artigo 169.°, primeiro parágrafo, do Tratado.

    Na sua carta de notificação, a Comissão lembrou que o princípio de base dos acórdãos já referidos é o de que um bem proveniente de um Estado-membro e importado por quem não é sujeito passivo sofre uma dupla tributação, contrária ao artigo 95.° do Tratado CEE, quando o Estado-membro de importação tributa esse bem, a que já foi aplicado IVA no Estado-membro de exportação, sem ter em conta o IVA que nele continua incorporado no momento da importação. Mais precisamente, há dupla tributação, contrária ao artigo 95.° do Tratado, na medida em que a mesma operação, no interior do país de importação, não é objecto de tributação e quando não tenha sido possível obter o reembolso do IVA pago no país de exportação.

    Tendo essa carta ficado sem resposta por parte do Governo italiano, a Comissão procedeu, em 3 de Fevereiro de 1987, ao envio do parecer fundamentado.

    Por carta datada de 15 de Maio de 1987, o Governo da República Italiana respondeu que tencionava introduzir os princípios jurisprudenciais acima referidos numa codificação em preparação, formulando simultaneamente o voto de que a proposta da Comissão de Décima Sexta Directiva IVA ( 2 ) fosse aprovada no mais breve prazo.

    A Comissão considerou que a referência à proposta de directiva não era pertinente e intentou, pois, a presente acção, ao abrigo do segundo parágrafo do artigo 169.° do Tratado.

    3. Tramitação processual

    A petição da Comissão foi entregue na Secretaria do Tribunal de Justiça em 19 de Abril de 1988.

    Com base no relatório preliminar do juiz-relator e ouvido o advogado-geral, o Tribunal de Justiça decidiu iniciar a fase oral do processo sem instrução.

    II — Pedidos das partes

    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

    declarar que, ao não adoptar as medidas necessárias para permitir a quem não é sujeito passivo e importa um bem já tributado em IVA noutro Estado-membro, não tendo podido obter o seu reembolso, deduzir do IVA devido na importação a parte de IVA paga no Estado-membro de exportação ainda incorporada no valor do bem aquando da importação, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 95.° do Tratado;

    condenar a República Italiana nas despesas.

    A República Italiana conclui pedindo que o Tribunal se digne:

    negar provimento ao recurso;

    condenar a Comissão nas despesas.

    III — Fundamentos e argumentos das partes

    A Comissão sustenta que o regime efectivamente aplicado pelas autoridades italianas para a fixação do IVA, devido na importação por um particular, de um bem comprado noutro Estado-membro não é conforme ao princípio da igualdade fiscal estabelecido pelo artigo 95.° Com efeito, a demandada não adoptou as disposições que permitam a quem não é sujeito passivo deduzir do IVA devido na importação a parte do IVA paga no Estado-membro de exportação ainda incorporada no valor do bem aquando da importação.

    A existência de uma proposta de décima sexta directiva de modo algum dispensa os Estados-membros da obrigação de respeitarem o artigo 95.° ( 3 ).

    A Comissão lembra, por fim, que resulta da jurisprudência uniforme do Tribunal de Justiça que os Estados-membros têm a obrigação de produzir uma legislação transparente e de não deixar os seus administrados na incerteza quanto ao alcance dos seus direitos ( 4 ).

    A República Italiana argumenta que a Comissão não cita qualquer facto concreto que seja contrário ao artigo 95.° A acusação — por assim dizer formal — incide unicamente no facto de não ter tomado as «disposições necessárias».

    Segundo a República Italiana, a Comissão nega implicitamente qualquer alcance jurídico à existência da proposta de Décima Sexta Directiva IVA. Esta deve ser rapidamente aprovada, de modo a permitir a adopção de procedimentos e de modalidades de aplicação uniformes. Neste domínio, não é suficiente a aceitação de um princípio geral de proibição das duplas tributações; são necessárias regras que permitam assegurar a instituição de «procedimentos e modalidades de aplicação» precisos.

    Por fim, não pode ser censurado a um Es-tado-membro o facto de a regulamentação comunitária, apesar de muito desenvolvida em matéria de IVA, deixar os cidadãos europeus «na incerteza quanto ao alcance dos seus direitos».

    A Comissão responde, nomeadamente, que a não aplicação da jurisprudência «Schul» pelas autoridades italianas foi confirmada por factos recentes.

    Na sequência de tal jurisprudência, a Comissão entendeu oportuno apresentar ao Conselho uma proposta da directiva que tem por objecto a eliminação das duplas tributações. A Comissão propôs, na sua proposta alterada de décima sexta directiva, que a isenção, do consumidor final, do IVA no Estado-membro de importação constitua a regra, desde que sejam respeitados determinados critérios de valor do bem ou de data da primeira entrega e que, quanto às outras situações, seja estabelecido um mecanismo de desagravamento na exportação e de tributação na importação que se aproxime do que é aplicado aos sujeitos passivos no âmbito da Sexta Directiva IVA.

    Até ao presente, foi impossível alcançar no seio do Conselho um acordo sobre três problemas de fundo: o princípio de uma directiva na matéria, as modalidades propostas pela Comissão e a inclusão das isenções no âmbito de aplicação da directiva.

    No entanto, a implementação do programa de harmonização previsto no artigo 99.° do Tratado não pode constituir um elemento prévio à aplicação do artigo 95.° Quaisquer que sejam as disparidades entre os sistemas fiscais nacionais, o artigo 95.° tende a eliminar, antes de qualquer harmonização, as práticas fiscais nacionais susceptíveis de criar discriminações contra produtos importados ou de proteger certas produções nacionais.

    IV — Tramitação posterior

    A audiência teve lugar em 22 de Fevereiro de 1990. Após a audiência, o Tribunal de justiça convidou as partes a responder por escrito a varias perguntas. Cada parte foi seguidamente convidada a apresentar por escrito as suas observações sobre as respostas dadas pela outra parte às perguntas do Tribunal. Em 10 de Maio de 1990, o Tribunal decidiu reabrir a discussão, a fim de permitir a cada parte a apresentação oral das suas observações sobre as respostas às perguntas formuladas e responder a eventuais perguntas adicionais do Tribunal.

    Além disto, em 19 de Junho de 1990, a Comissão foi autorizada a entregar documentos relativos a uma dupla tributação de IVA aquando da importação para Itália, por quem não era sujeito passivo, de bens definitivamente tributados em IVA no Estado-membro de exportação. A República Italiana foi convidada a apresentar por escrito as suas observações sobre os documentos entregues pela Comissão.

    V — Respostas às perguntas formuladas pelo Tribunal de Justiça

    1.

    O Tribunal de Justiça convidou a Comissão a indicar quais as disposições da legislação italiana que regem a importação, por quem não é sujeito passivo, de bens definitivamente tributados em IVA no Estado-membro de exportação. O Tribunal de Justiça convidou ainda a República Italiana a apresentar o texto legal que se previa introduzir na ordem jurídica italiana.

    A Comissão esclarece que nenhuma disposição legal específica rege actualmente a importação para Itália, por quem não é sujeito passivo, de bens definitivamente tributados em IVA no Estado-membro de exportação. Esta operação está abrangida pela disposição legal que determina que a importação é uma operação tributável (artigo 1.° do DPR n.° 633, de 26 de Outubro de 1972, com as alterações em vigor), não estando prevista a tomada em consideração do IVA residual tributado no Estado-membro de exportação.

    A República Italiana apresentou o projecto de Lei n.° 2148, que contém as disposições de aplicação das obrigações que decorrem, para a República Italiana, da sua pertença às Comunidades Europeias («lei comunitária para 1990»). O artigo 32.°, n.° 1, desse projecto dispõe que:

    «Quanto às importações de outro Estado-membro da Comunidade Económica Europeia, quando os bens importados não tenham beneficiado do desagravamento no Estado-membro de proveniência e quando não estejam preenchidas as condições para o reconhecimento da franquia na importação, o imposto é aplicado tendo em conta o imposto análogo pago no Estado-membro e ainda incorporado no valor dos bens em questão no momento da importação.»

    Esta mesma disposição define ainda as modalidades de cálculo do montante do imposto pago no Estado-membro de exportação que ainda onera o bem no momento da importação, bem como as modalidades de cálculo do imposto devido na importação. Determina que cabe ao importador fazer a prova do pagamento do imposto no Estado-membro de exportação referente à última transacção sujeita a imposto.

    2.

    O Tribunal convidou a Comissão a esclarecer se via o incumprimento na não aplicação da jurisprudência Schul pelas autoridades italianas ou na falta de textos legais que integram essa jurisprudência na ordem jurídica italiana.

    A Comissão esclareceu que o incumprimento consiste essencialmente na não aplicação da jurisprudência Schul. Acrescenta que, para obviar a esse incumprimento, é necessário que sejam dadas instruções, por exemplo sob a forma de circular ministerial, às administrações em causa. A Comissão argumenta também que essa circular deve ser objecto de publicação, a fim de que os particulares possam conhecer os seus direitos.

    A Comissão esclarece ainda que, enquanto se espera uma regulamentação específica, a administração italiana pode dar cumprimento à jurisprudência Schul calculando o IVA segundo o método indicado pelo Tribunal de Justiça.

    3.

    O Tribunal solicitou ainda à Comissão que indicasse os fundamentos jurídicos pelos quais os Estados-membros cuja legislação transpõe o artigo 2.° da Sexta Directiva em matéria de IVA devem adoptar medidas normativas expressas a fim de assegurar o respeito pelo artigo 95.° do Tratado, já que o acórdão Schul I afirmou a validade do artigo 2.° da Sexta Directiva em matéria de IVA, face ao artigo 95.° do Tratado, através de interpretação conforme.

    A Comissão esclarece que não é necessária uma modificação das legislações nacionais para assegurar a aplicação da jurisprudência Schul, uma vez que o artigo 95.° é directamente aplicável e que os particulares não têm interesse em propor uma interpretação das normas nacionais contrária a essa jurisprudência. A Comissão considera, no entanto, que uma circular administrativa deve dar as instruções necessárias para permitir a aplicação daquela jurisprudência e que essa circular deve ser objecto de publicação adequada.

    A República Italiana alega que o artigo da Sexta Directiva em matéria de IVA não é contrário ao artigo 95.° do Tratado, uma vez que o artigo 15.° da referida directiva prevê um regime de isenção das operações de exportação, tendente a evitar as duplas tributações. Uma vez que o acórdão de 5 de Maio de 1982, Gaston Schul I, já referido, introduz uma excepção à regra fixada pelo artigo 15.°, compete ao legislador comunitário modificar a regulamentação comunitária a fim de dar cumprimento ao acórdão do Tribunal de Justiça. Segundo a República Italiana, é singular que a Comissão mantenha a sua acção judicial, já que o incumprimento é imputável à omissão do legislador comunitário.

    VI — Documentos entregues pela Comissão

    A Comissão fez entrega no Tribunal de Justiça de documentos relativos a um diferendo que opõe um nacional italiano à administração das alfândegas italiana, a propósito da tributação em IVA aquando da importação para Itália de um veículo adquirido por esse particular em França.

    Resulta desses documentos que o nacional italiano em causa importou para Itália um veículo para o ceder aos seus filhos, alguns dias após tê-lo comprado em França. Aquando da compra do veículo, pagou IVA à taxa de 25 %. Aquando da importação para Itália, pagou novamente IVA, agora à taxa de 19 %. A conselho das autoridades francesas, dirigiu-se à administração das alfândegas italiana a fim de obter o reembolso do IVA pago aquando da importação.

    Em resposta a este pedido, o chefe da circunscrição aduaneira italiana competente realça que a Comissão recomendou que qualquer imposto aplicado no momento da importação de um bem proveniente de outro Estado-membro tome em consideração o IVA já pago sobre esse bem. Esclarece, no entanto, que a administração central parece não ter seguido esta recomendação adoptando disposições formais aplicáveis para esse efeito, e que os acórdãos do Tribunal de Justiça de 5 de Maio de 1982, Gaston Schul I, e de 21 de Maio de 1985, Gaston Schul II, já referidos, em que se se baseou a recomendação da Comissão, não parecem directamente aplicáveis por analogia ao caso vertente. Considera, por consequência, que não estão reunidas as condições para a concessão de isenção do IVA aquando da importação, embora indique, no entanto, que o requerente pode queixar-se à Comissão da não aplicação da sua recomendação.

    A República Italiana não apresentou observações sobre os documentos apresentados pela Comissão.

    T. F. O'Higgins

    Juiz-relator


    ( *1 ) Lingua do processo: italiano.

    ( 1 ) Ver os acórdãos do Tribunal de Justiça de 27 de Fevereiro de 1980, Comissão/França, Comissão/Itália e Comissão/-Dinamarca (168/78, 169/78 e 171/78, Recueil, p. 347, 385 e 447).

    ( *2 ) Tradução provisória.

    ( 2 ) Proposta de décima sexta directiva do Conselho relativa à harmonização das legislações dos Estados-membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: regime comum aplicável a certos bens definitivamente tributados em imposto sobre o valor acrescentado, importados por um consumidor final de um Estado-membro em proveniência de outro Estado-membro [TO 1984, C 226, p. 2 (proposta original), e JO 1986, C 96, p. 5 (proposta alterada].

    ( 3 ) Ver, nomeadamente, o acórdão de 27 de Fevereiro de 1980 proferido no processo 171/78, já refendo.

    ( 4 ) Ver, nomeadamente, o acórdão de 15 de Outubro de 1986, Comissão/República Italiana (168/85, Colect., p. 2945).

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    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    26 de Fevereiro de 1991 ( *1 )

    No processo C-120/88,

    Comissão das Comunidades Europeias, representada por Johannes Føns Buhl e Giuliano Marenco, consultores jurídicos, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Guido Berardis, membro do Serviço Jurídico da Comissão, Centre Wagner, Kirchberg,

    demandante,

    contra

    República Italiana, representada pelo professor Luigi Ferrari Bravo, chefe do Serviço do Contencioso Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, assistido por Franco Favara, avvocato dello Stato, com domicílio escolhido no Luxemburgo na sua Embaixada, 5, rue Marie-Adélaïde,

    demandada,

    que tem por objecto obter a declaração de que a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 95.° do Tratado CEE,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

    composto por: O. Due, presidente, G. F. Mancini, T. F. O'Higgins e G. C. Rodríguez Iglesias, presidentes de secção, C. N. Kakouris, R. Joliét e F. A. Schockweiler, juízes,

    advogado-geral : M. Darmon

    secretário: D. Louterman, administradora principal

    visto o relatório para audiência, completado após a audiência de 22 de Fevereiro de 1990,

    ouvidas as alegações das partes nas audiências de 22 de Fevereiro e de 18 de Setembro de 1990,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 6 de Novembro de 1990,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 19 de Abril de 1988, a Comissão das Comunidades Europeias intentou, ao abrigo do artigo 169.° do Tratado CEE, uma acção destinada a obter a declaração de que a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 95.° do Tratado, ao não adoptar as medidas necessárias para permitir a quem não é sujeito passivo do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») e importa para esse Estado-membro bens já onerados com esse imposto noutro Estado-membro, sem dele ter podido obter o reembolso, deduzir do IVA devido na importação o montante do IVA pago no Estado-membro de exportação ainda incorporado no valor dos bens no momento da importação.

    2

    A Comissão sustenta que a não adopção pela República Italiana de disposições que dêem o direito à dedução a quem não é sujeito passivo, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, cria uma situação de facto ambígua, contrária ao princípio da segurança jurídica, e permite uma dupla tributação incompatível com a proibição de discriminações fiscais, princípio directamente aplicável consagrado pelo artigo 95.° já referido, tal como interpretado pelo Tribunal de Justiça, na medida em que as entregas de produtos similares efectuadas por quem não é sujeito passivo, no interior do território italiano, não estão sujeitas a IVA.

    3

    A República Italiana alega que o princípio da proibição das duplas tributações não é em si suficiente para resolver todos os problemas de técnica fiscal inerentes à matéria e que a proposta de décima sexta directiva do Conselho, visando estabelecer um regime comum aplicável a certos bens definitivamente tributados em imposto sobre o valor acrescentado, importados por um consumidor final de um Estado-membro em proveniência de outro Estado-membro (JO 1986, C 96, p. 5), deveria ser rapidamente aprovada, de modo a permitir a instituição de procedimentos e de modalidades de aplicação uniformes. Além disso, a incerteza sobre o alcance dos seus direitos, em que são mantidos os cidadãos europeus, é imputável à regulamentação comunitária e não pode ser censurada à República Italiana.

    4

    Para mais ampla exposição dos factos, da tramitação processual e dos fundamentos e argumentos das partes, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal.

    5

    Deve começar por lembrar-se que, segundo jurisprudência uniforme do Tribunal de Justiça, o artigo 95.° estabelece uma proibição de discriminação fiscal dos bens importados que produz efeitos directos e cria para os particulares direitos que os órgãos juridicionais nacionais devem proteger (ver, nomeadamente, o acórdão de 5 de Maio de 1982, Gaston Schul I, n.° 46, 15/81, Recueil, p. 1409).

    6

    Também segundo jurisprudência uniforme (ver os acórdãos de 21 de Maio de 1985, Gaston Schul II, 47/84, Recueil, p. 1491, e de 25 de Fevereiro de 1988, Drexl, 299/86, Colect., p. 1213), o referido artigo 95.° deve ser interpretado no sentido de que o IVA cobrado por um Estado-membro aquando da importação, com origem noutro Estado-membro, de um produto entregue por quem não é sujeito passivo, quando esse imposto não é cobrado aquando da entrega por um particular de produtos similares no interior do Estado-membro de importação, deve ser calculado tendo em conta o montante do IVA pago no Estado-membro de exportação que está ainda incorporado no valor do produto no momento da sua importação, de modo a que tal montante não faça parte da matéria colectável e, além disso, seja deduzido do IVA devido na importação.

    7

    Daqui resulta que as disposições comunitárias relevantes não deixam, contrariamente ao que sustenta a República Italiana, os cidadãos europeus na incerteza quanto ao alcance dos seus direitos face ao princípio da não discriminação fiscal dos produtos importados.

    8

    Aliás, é pacífico que as disposições nacionais em causa impõem a cobrança do IVA na importação, por quem não é sujeito passivo, de bens já tributados em IVA no Estado-membro de exportação, sem permitir aos interessados deduzir o IVA residual do montante do IVA cobrado na importação, enquanto as entregas de produtos similares efectuadas por quem não é sujeito passivo, no interior do território italiano, não estão sujeitas a IVA.

    9

    Tais disposições são incompatíveis com a proibição de discriminação fiscal dos produtos importados, na medida em que, apesar do efeito directo do artigo 95.°, mantêm os importadores que não são sujeitos passivos num estado de incerteza quanto ao seu direito de invocar este artigo e são susceptíveis de incitar os agentes da administração nacional encarregados da cobrança do IVA a não aplicar o princípio da dedução do IVA residual.

    10

    Com efeito, a faculdade concedida aos administrados de invocar perantes os órgãos jurisdicionais nacionais as disposições directamente aplicáveis do Tratado apenas constitui uma garantia mínima e não basta, só por si, para assegurar a plena e integral aplicação do Tratado (ver o acórdão de 15 de Outubro de 1986, Comissão/Itália, n.° 11, 168/85, Colect., p. 2945).

    11

    Por outro lado, os princípios da segurança jurídica e da protecção dos particulares exigem que, nos domínios abrangidos pelo direito comunitário, as regras de direito dos Estados-membros sejam formuladas de um modo inequívoco, que permita às pessoas em causa conhecer os seus direitos e obrigações de um modo claro e preciso e aos órgãos jurisdicionais nacionais assegurar o seu respeito (ver o acórdão de 21 de Junho de 1988, Comissão/Itália, 257/86, Colect., p. 3249).

    12

    O fundamento de defesa utilizado pela República Italiana, baseado na actual inexistência de um regime comum de IVA aplicável às operações de importação em causa, deve ser rejeitado.

    13

    A este respeito, basta lembrar que, embora a instituição de um regime comum de IVA aplicável a essas operações caiba ao legislador comunitário, o artigo 95.° opõe-se, enquanto tal regime não for instituído, a que um Estado-membro possa aplicar o seu regime de IVA aos produtos importados de um modo contrário ao princípio da não discriminação fiscal (ver o acórdão Gaston Schul I, já referido).

    14

    Com efeito, a concretização da harmonização das legislações fiscais de acordo com o artigo 99.° do Tratado não pode ser erigida em condição prévia da aplicação do artigo 95.°, que impõe aos Estados-membros, com efeito imediato, a obrigação de aplicar de maneira não discriminatória a sua legislação fiscal, ainda antes de qualquer harmonização (ver o acórdão de 27 de Fevereiro de 1980, Comissão/-Dinamarca, 171/78, Recueil, p. 447).

    15

    Daqui resulta que os argumentos da República Italiana não podem ser acolhidos.

    16

    Tendo em conta todas as considerações que precedem, deve declarar-se que a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 95.° do Tratado CEE, ao não adoptar as medidas necessárias para permitir a quem não é sujeito passivo do IVA e importa para o território italiano bens já tributados por este imposto noutro Estado-membro, sem ter podido obter o seu reembolso, deduzir do IVA devido na importação o montante do IVA pago no Estado-membro de exportação, ainda incorporado no valor dos bens no momento da importação, enquanto as entregas de produtos similares efectuadas por quem não é sujeito passivo, no interior do território italiano, não estão sujeitas a IVA.

    Quanto às despesas

    17

    Por força do disposto no n.° 2 do artigo 69.° do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo a República Italiana sido vencida, há que condená-la nas despesas.

     

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    decide:

     

    1)

    A República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 95.° do Tratado CEE, ao não adoptar as medidas necessárias para permitir a quem não é sujeito passivo do IVA e importa para o território italiano bens já tributados por este imposto noutro Estado-membro, sem ter podido obter o seu reembolso, deduzir do IVA devido na importação o montante do IVA pago no Estado-membro de exportação, ainda incorporado no valor dos bens no momento da importação, enquanto as entregas de produtos similares efectuadas por quem não é sujeito passivo, no interior do território italiano, não estão sujeitas a IVA.

     

    2)

    A República Italiana é condenada nas despesas.

     

    Due

    Mancini

    O'Higgins

    Rodríguez Iglesias

    Kakouris

    Joliét

    Schockweiler

    Proferido em audiencia pública no Luxemburgo, em 26 de Fevereiro de 1991.

    O secretário

    J.-G. Giraud

    O presidente

    O. Due


    ( *1 ) Língua do processo: italiano.

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