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Document 61987CC0382

    Conclusões do advogado-geral Tesauro apresentadas em 15 de Fevereiro de 1989.
    R. Buet e SARL Educational Business Services (EBS) contra Ministère public.
    Pedido de decisão prejudicial: Cour d'appel de Paris - França.
    Proibição da promoção de vendas porta a porta - Livre circulação de mercadorias.
    Processo 382/87.

    Colectânea de Jurisprudência 1989 -01235

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1989:66

    61987C0382

    Conclusões do advogado-geral Tesauro apresentadas em 15 de Fevereiro de 1989. - R. BUET E SARL EDUCATIONAL BUSINESS SERVICES CONTRA MINISTERIO PUBLICO. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICAL DO COUR D'APPEL DE PARIS. - PROIBICAO DE VENDA DIRECTA - LIVRE CIRCULACAO DE MERCADORIAS. - PROCESSO 382/87.

    Colectânea da Jurisprudência 1989 página 01235


    Conclusões do Advogado-Geral


    ++++

    Senhor Presidente,

    Senhores Juízes,

    1. A venda porta a porta é uma das técnicas comerciais mais controversas que foram idealizadas e desenvolvidas neste século. Se o efeito de surpresa típico desta abordagem pode ser aproveitado com grande sucesso por um vendedor hábil e experiente, isso implica, por outro lado, um risco particularmente grave de logro para o consumidor, que é apanhado completamente impreparado e, especialmente tratando-se de pessoas pertencentes a categorias, por várias razões, mais influenciáveis, como podem ser os idosos, as donas de casa, os trabalhadores emigrantes, muitas vezes induzidos a subscrever contratos de que desconhecem o real alcance relativamente a bens ou serviços, às vezes insignificantes, ou, de qualquer modo, bastante menos interessantes do que o que lhes foi acenado. Por outro lado, acontece frequentemente que o consumidor, embora apercebendo-se do carácter pouco vantajoso do negócio que lhe é proposto pelo vendedor que se lhe apresentou em casa de surpresa, celebre, por timidez, contratos que em condições diferentes não aceitaria.

    2. Os repetidos abusos verificados no âmbito da promoção comercial mediante visita ao domicílio chamaram, em numerosos países, a especial atenção do legislador que, muitas vezes, considerou necessário proibir ou, pelo menos, disciplinar rigorosamente a aplicação desta técnica de vendas.

    Em França, a Lei n.° 556, de 12 de Julho de 1971, proibiu, entre outros, os institutos privados de ensino, de praticarem a promoção de vendas porta a porta "para celebrarem contratos de ensino".

    Tendo alguns institutos tentado contornar a proibição, propondo ao domicílio a venda de material didáctico não conexionada com qualquer oferta de um "serviço" de ensino, a Lei n.° 1137, de 22 de Dezembro de 1972, colmatou a lacuna estabelecendo que é proibido "deslocar-se ao domicílio de particulares para propor a venda de qualquer documento ou material que responda às mesmas necessidades que prestações de serviços cuja promoção de vendas porta a porta é proibida em razão do seu objecto".

    3. Roger Buet, gestor de uma sociedade que utiliza o sistema de porta à porta para vender material didáctico de aprendizagem da língua inglesa, elaborado pela Encyclopaedia Britannica e importado da Bélgica, foi penalmente accionado e condenado pelo tribunal de grande instance de Paris por actuações contrárias às disposições da Lei n.° 1137.

    A cour d' appel de Paris, embora confirmando tudo quanto a este respeito se afirmara na decisão de primeira instância, considerou oportuno colocar ao Tribunal de Justiça a questão da "compatibilidade com o artigo 30.° do Tratado CEE das disposições das citadas leis francesas n.os 556 e 1137".

    4. Resulta claramente da decisão de reenvio que a questão (independentemente da sua formulação pouco ortodoxa) tem como objectivo esclarecer se uma proibição do tipo da que é descrita cabe no conceito de medidas de efeito equivalente a uma restrição quantitativa às importações proibidas pelo artigo 30.° e se, para justificá-la, é pertinente invocar uma exigência imperativa do direito comunitário como a protecção dos consumidores.

    5. Proponho-me, portanto, examinar, em primeiro lugar, se a proibição de utilizar uma técnica comercial particularmente eficaz, como a venda porta a porta, pode prejudicar o comércio entre os Estados-membros.

    6. A este propósito, devemos, antes de tudo, sublinhar que a proibição em questão não implica qualquer discriminação dos produtos importados, uma vez que a venda porta a porta é proibida independentemente da origem dos produtos que dela constituam objecto.

    7. Trata-se, por conseguinte, de examinar qual o fundamento da tese de R. Buet, segundo a qual a proibição da promoção de vendas porta a porta constitui um obstáculo ao comércio entre os Estados-membros, uma vez que obriga os operadores comerciais a renunciar a uma forma de distribuição particularmente eficaz e a aplicar técnicas diferentes que garantem um sucesso de vendas inferior, tendo como consequência que o volume de produtos importados para serem vendidos em França é consideravelmente reduzido, ou que impõem à empresa despesas suplementares para adoptar, num Estado-membro, formas de venda diversas das que pratica noutros Estados-membros.

    8. A Comissão e os Estados-membros que apresentaram observações não estão de acordo quanto a este ponto.

    A primeira cita, a propósito, uma passagem do acórdão, de 15 de Dezembro de 1982, no processo 286/81, Oosthoek (1), cujo teor é o seguinte: "Uma norma que limite ou proíba determinadas formas de publicidade e determinados métodos de promoção de vendas é susceptível, mesmo que não condicione directamente as importações, de restringir o volume das mesmas, afectando as possibilidades de distribuição dos produtos importados. Não se pode ignorar que o facto de o operador interessado ser obrigado a adoptar sistemas diferentes de publicidade ou de promoção de vendas em função dos Estados-membros em cujo território desenvolve as suas actividades, ou a abandonar um sistema que considere particularmente eficaz, possa constituir um obstáculo às importações, mesmo que a referida norma se aplique indistintamente aos produtos nacionais e aos produtos importados."

    Com base nisto, a Comissão afirma que a proibição de praticar um método comercial pode afectar o volume de vendas do produto e, por conseguinte, é susceptível de reduzir o volume das importações.

    Os Estados-membros, em contrapartida, chamam a atenção para o acórdão de 31 de Março de 1982, no processo 75/81, Blesgen (2) no qual se afirmava que a proibição, constante de uma lei belga, de vender nos locais abertos ao público bebidas alcoólicas de elevado teor alcoólico para consumo imediato não produzia sobre a livre circulação efeitos restritivos mais acentuados do que os resultantes de uma regulamentação comercial normal, uma vez que não era aplicável a outras formas de venda das mesmas bebidas, fazendo, deste modo, parte das medidas que, com base na Directiva 70/50 da Comissão, de 22 de Dezembro de 1969 (3), não têm, em regra, efeitos equivalentes aos das restrições quantitativas "dado que tais efeitos são normalmente inerentes à disparidade das disposições aplicadas nesta matéria nos diferentes Estados-membros". O mesmo raciocínio seria válido para a venda de material pedagógico e, em especial, de métodos de ensino de línguas, que pode efectuar-se nas livrarias, nos sectores especializados dos grandes armazéns, por correspondência, e ainda de diversos outros modos.

    9. Parece-me, à luz da jurisprudência do Tribunal, que a solução do problema depende, em grande medida, do carácter mais ou menos importante das limitações que a proibição de um determinado método de venda pode provocar no comércio intracomunitário.

    Por outro lado, tenho que admitir que a fundamentação do acórdão Blesgen me deixa ligeiramente perplexo na parte em que afirma que as limitações resultantes da proibição de vender álcool para consumo imediato não excedem os efeitos próprios de uma norma comercial. Uma fundamentação baseada nas exigências de tutela da saúde pública parecer-me-ia, com efeito, assentar em bases mais sólidas, uma vez que a afirmação de que a proibição do consumo imediato de bebidas alcoólicas não prejudica sensivelmente as respectivas vendas me parece discutível, sendo exigível, em meu entender, uma verificação com base em avaliações objectivas do volume das importações.

    Também no que toca à venda porta à porta, considero pouco convincente a construção proposta pelos Estados-membros que apresentaram observações, uma vez que resulta dos documentos do processo, e é confirmado pela experiência comum, que o método comercial em questão, abstraindo das graves e justificadas reservas que suscita e às quais faremos referência em seguida, é um método de êxito garantido e proporciona um volume de vendas que nenhum outro sistema consegue, nem de perto nem de longe, alcançar. R. Buet invocou, de facto, a este propósito, que 90% do seu volume de negócios é alcançado através de vendas porta a porta e que a proibição da promoção ao domicílio tornaria quase nulas as suas possibilidades de venda do produto.

    Concordo, portanto, com a Comissão, em considerar que a proibição deste método de vendas produz uma importante influência no comércio intracomunitário.

    10. A jurisprudência do Tribunal veio, todavia, a declarar, a partir do famoso acórdão Rewe, de 20 de Fevereiro de 1979 (4), que "se aceitam os obstáculos à circulação intracomunitária resultantes de disparidades entre as legislações nacionais relativas ao comércio dos produtos ((...)), desde que tais prescrições sejam necessárias para responder a exigências imperativas relacionadas, em especial, com a eficácia dos controlos fiscais, com a protecção da saúde pública, a lealdade das transacções comerciais e a defesa dos consumidores".

    11. Todavia, é certo que, no presente processo, o obstáculo à circulação intracomunitária não deriva de uma disparidade entre as legislações nacionais, uma vez que existe independentemente do facto de o Estado-membro de que provém o produto proibir, do mesmo modo que a França, a venda ao domicílio, ou autorizá-la, como parecem fazer a maior parte dos Estados-membros.

    12. O problema que aqui se coloca é, assim, relativamente novo e consiste em determinar se uma exigência imperativa pode justificar, à luz do direito comunitário, uma medida restritiva da livre circulação de mercadorias, abstraindo de qualquer disparidade entre a norma do Estado-membro de exportação e a do Estado-membro de importação.

    13. Parece-me não existirem razões para que o Tribunal proponha neste caso uma solução diversa, uma vez que os dados fundamentais do problema são os mesmos e que nos encontramos novamente perante, por um lado, uma disposição interna que impede indirectamente a livre circulação e, por outro, uma exigência imperativa que hipoteticamente justifica tais disposições.

    14. Entre as diversas exigências imperativas reconhecidas pela jurisprudência do Tribunal tem especial relevância a protecção dos consumidores, que veio a constituir, sem dúvida também graças ao impulso dado por esta mesma jurisprudência, um dos objectivos expressamente prosseguidos pela legislação comunitária, em especial pela Directiva 85/577/CEE do Conselho, de 20 de Dezembro de 1985, relativa à protecção dos consumidores no caso de contratos negociados fora dos estabelecimentos comerciais (5).

    15. No preâmbulo da referida directiva, o Conselho, após invocar o programa prévio da Comunidade Económica Europeia para uma política de protecção e de informação dos consumidores e o subsequente segundo programa da Comunidade para a realização do mesmo objectivo e após sublinhar que, nos contratos celebrados fora dos estabelecimentos comerciais, a iniciativa das negociações provém normalmente do comerciante, ao passo que o consumidor é apanhado de surpresa, não tendo, frequentemente, a possibilidade de comparar a qualidade e o preço da oferta com outras ofertas, considera que é necessário conceder ao consumidor um direito de resolução do contrato celebrado em tais condições, sem com isto afectar a liberdade dos Estados-membros manterem ou introduzirem uma proibição, total ou parcial, à celebração de contratos fora dos estabelecimentos comerciais, desde que tal proibição seja imposta, em seu entender, no interesse dos consumidores. O artigo 8.° da directiva prevê, portanto, expressamente, que a mesma "não impede os Estados-membros de adoptarem ou manterem disposições mais favoráveis à protecção do consumidor no domínio por ela abrangido".

    16. O requerido no processo principal não contesta igualmente a faculdade de os Estados-membros disciplinarem, mediante disposições particularmente severas, o exercício de vendas mediante visita ao domicílio com o objectivo de proteger os consumidores contra possíveis fraudes.

    Sustenta, todavia, que no caso vertente não está preenchido o outro requisito amplamente referido pela jurisprudência do Tribunal e que é, justamente, a proporcionalidade do meio adoptado relativamente ao objectivo prosseguido, no sentido de que os Estados-membros devem satisfazer essa exigência imperativa da protecção do consumidor, tal como as outras exigências imperativas do direito comunitário "adoptando meios adequados que entravem o menos possível o fluxo das trocas comerciais entre os Estados-membros" (6).

    17. Segundo R. Buet, a proibição absoluta de promoção de vendas porta a porta de material didáctico é claramente desproporcionada ao fim prosseguido, se se tiver em conta que a própria legislação francesa autoriza a promoção ao domicílio de outros bens e serviços não menos "delicados" que o produto em causa, como, por exemplo, automóveis novos ou seguros de vida, considerando, em tais casos, serem suficientes em termos de protecção do consumidor as garantias particularmente rigorosas impostas pelas normas especificamente aplicáveis, entre as quais a obrigação de celebração de contrato escrito, o direito do cliente de rescindir o contrato dentro de determinado prazo e a proibição de o vendedor exigir pagamento imediato. Os especiais requisitos que a lei n.° 556, de 12 de Julho de 1971, impõe aos organismos que ministram ensino à distância para os autorizar a celebrar contratos e as garantias de que tais contratos são acompanhados asseguram, de resto, em seu entender, uma protecção do consumidor que não é afectada pelos simples facto de um contrato ser celebrado no domicílio deste último.

    Em seu entender, portanto, existe toda uma série de precauções não desprezíveis que poderiam, se fosse caso disso, ser ainda reforçadas tornando, por exemplo, obrigatório efectuar uma chamada telefónica para o potencial cliente a fim de combinar antecipadamente a visita ao domicílio, sem que, no entanto, seja necessário estabelecer processos excessivamente restritivos como a proibição absoluta das vendas porta a porta.

    18. Perante este argumento, há que verificar se é efectivamente possível obter o mesmo resultado com meios menos restritivos do comércio intracomunitário. Embora seja verdade que, na falta de uma harmonização das normas nacionais, cada Estado-membro é livre de fixar, conforme entender, um nível mais ou menos elevado de protecção dos consumidores, os processos mais draconianos eventualmente adoptados podem, todavia, justificar-se, segundo orientação constante do Tribunal, apenas quando sejam necessários para garantir este nível de protecção.

    19. Recentes desenvolvimentos da jurisprudência do Tribunal permitem, por outro lado, uma nova abordagem da questão. Enquanto até agora o critério de determinação da proporcionalidade consistia em avaliar se um determinado nível de protecção fixado por um Estado-membro poderia igualmente ser alcançado por meios menos restritivos do comércio intracomunitário do que os que foram adoptados pelo referido Estado, o acórdão proferido pelo Tribunal em 20 de Setembro de 1988, no processo 302/86 (Comissão/Reino da Dinamarca, Colect. p. 4607) partiu, pelo contrário, do pressuposto de que um Estado-membro não pode impor que uma exigência imperativa de protecção seja integralmente respeitada graças a uma determinada norma, quando o nível de protecção alcançável com outros instrumentos se afigure suficiente. Com base nesta nova abordagem, poder-se-ia, por exemplo, examinar, no caso vertente, se um conjunto de medidas como as sugeridas pelo requerido no processo principal seriam susceptíveis de garantir uma rede de protecção com malhas suficientemente estreitas, que apenas deixasse o consumidor exposto a um risco de fraude em casos esporádicos e que limitasse, de qualquer modo, a respectiva gravidade.

    20. A luz das considerações expostas, parece-me possível proceder a uma análise em dois tempos, determinando, em primeiro lugar, se a proibição da promoção de vendas porta a porta é necessária para garantir a protecção do consumidor ao nível fixado pela legislação nacional e examinando em seguida, em caso de resposta afirmativa, se, nos termos do direito comunitário, não seria eventualmente aceitável um nível de protecção inferior ao garantido pela legislação francesa.

    21. A necessidade de adoptar instrumentos particularmente severos com vista a garantir plenamente o nível de protecção dos consumidores no caso de venda mediante visita ao domicílio, parece-me particularmente justificada em relação à venda de material didáctico em geral, e de cursos de línguas em particular. De facto, ao promover a venda de cursos de línguas, o vendedor contactará sobretudo pessos desejosas de aprenderem uma língua que lhes é completamente desconhecida, só posteriormente estando em condições de avaliar se o método de ensino proposto lhes foi útil para alcançar tal objectivo. Diversamente da oferta de outros bens ou serviços, a oferta de material pedagógico, e, mais especificamente, de materiais de ensino linguístico, destina-se, portanto, a um potencial comprador que, por definição, não está em condições de avaliar a qualidade do bem ou do serviço que lhe é proposto e que, por esta razão, pode ser induzido em erro mais facilmente do que, por exemplo, o potencial comprador de um automóvel novo, o qual deverá, necessariamente, na generalidade dos casos, possuir um mínimo de conhecimentos acerca das características e do funcionamento do produto "automóvel".

    22. Outra ordem de considerações que nos leva a considerar proporcionadas medidas particularmente rigorosas de protecção dos consumidores é a situação psicológica de muitos potenciais adquirentes de material didáctico. Tratam-se, de facto, frequentemente, de estudantes que têm necessidade de adquirir determinados conhecimentos para progredirem nos seus estudos ou trabalhadores que esperam ter, graças aos novos conhecimentos, ocasiões de progressão profissional. A forte motivação psicológica da escolha pode facilmente levar tais consumidores a afastarem conscientemente quaisquer dúvidas acerca da eficácia de um método de estudo ou de um material pedagógico nos quais depositam grandes esperanças de sucesso escolar ou profissional e a não utilizarem correctamente os mecanismos de garantia eventualmente previstos na lei, como a faculdade de rescindir o contrato.

    23. Finalmente, no que respeita às vendas de alguns outros bens e serviços, a venda de material didáctico distingue-se pelo facto de a má qualidade do material fornecido poder ter consequências bastante graves quer em termos financeiros, uma vez que se trata, frequentemente, de uma despesa considerável, quer em termos de investimento de recursos pessoais, dado que o interessado deve aplicar no estudo muito tempo e muita energia intelectual, que se desperdiçariam se os resultados se viessem a revelar negativos.

    24. O que acima se afirmou não exclui, como observou o requerido no processo principal, que possam existir sectores nos quais considerações análogas justificariam disposições igualmente rígidas, sendo certo, porém, que as legislações nacionais se contentam em adoptar normas bastante menos restritivas.

    Todavia, na falta de uma disciplina uniforme, a faculdade de fixar o nível de protecção faz parte do poder discricionário dos Estados-membros e, se se podem eventualmente criticar as motivações que levaram um Estado-membro a ser mais severo num sector do que noutro, isto não permite contestar a validade da regulamentação mais rigorosa à luz do direito comunitário, a menos que se prove que o nível diferente de protecção encontra justificação na intenção dissimulada de afectar as importações de uma mercadoria de outro Estado-membro.

    25. Por conseguinte, das considerações expostas há que concluir que a proibição da promoção de vendas porta a porta se afigura necessária para garantir a protecção do consumidor ao nível desejado pela legislação nacional, e isto abstraindo da seriedade de cada estabelecimento de ensino à distância e da validade do material didáctico que ponha à venda, questões sublinhadas com especial ênfase por R. Buet, que, no entanto, não demonstrou que tenha desaparecido do sector a possibilidade de abusos que tornou necessária, ao tempo, a adopção de uma severa disciplina legislativa.

    26. Há que perguntar ainda se, à luz da recente jurisprudência do Tribunal, não seria possível, no caso vertente, considerar suficiente uma protecção menos ampla.

    27. Parece-me que a esta pergunta se deve responder negativamente. Uma protecção menos rígida e menos absoluta acabaria, de facto, por deixar expostos ao risco de fraude exactamente as pessoas que por razões físicas ou sociais são menos informadas e mais indefesas, como os idosos ou os trabalhadores imigrantes. É exactamente esta categoria de pessoas, particularmente carentes de protecção, que menos possibilidades tem de explorar certas garantias mais flexíveis como, por exemplo, a faculdade de rescindir o contrato dentro de um determinado prazo após a sua celebração.

    28. A luz das considerações expostas, proponho, portanto, que se responda à questão colocada pela cour d' appel de Paris da seguinte forma :

    "O artigo 30.° do Tratado CEE não obsta à aplicação por parte de um Estado-membro de uma norma interna, indistintamente aplicável aos produtos nacionais e aos produtos importados, que proíba a promoção de vendas porta a porta de documentos e material didáctico para aprendizagem de línguas estrangeiras".

    (*) Língua original: italiano.

    (1) Recueil, p. 4575.

    (2) Recueil, p. 1211.

    (3) JO L 13, p. 29.

    (4) Processo 120/78, Recueil, p. 649.

    (5) JO L 372, p. 31; EE 15 F6 p. 131.

    (6) Ver, por exemplo, acórdão de 1 de Julho de 1984, processo 51/83, Comissão/República Italiana, Recueil, p. 2793.

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