Choose the experimental features you want to try

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 61985CJ0009

    Acórdão do Tribunal (Primeira Secção) de 8 de Outubro de 1986.
    Nordbutter GmbH & Co. KG contra República Federal da Alemanha.
    Pedido de decisão prejudicial: Verwaltungsgericht Frankfurt am Main - Alemanha.
    Leite desnatado destinado à alimentação de animais - Reembolso integral das ajudas especiais.
    Processo 9/85.

    Colectânea de Jurisprudência 1986 -02831

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1986:372

    RELATÓRIO PARA AUDIÊNCIA

    apresentado no processo 9/85 ( *1 )

    I — Factos e tramitação processual

    1. Enquadramento regulamentar do litígio

    Com vista a garantir a absorção dos excedentes de leite na Comunidade, o Regulamento n.° 804/68 do Conselho, de 27 de Junho de 1968, que estabelece a organização comum de mercado no sector do leite e dos produtos lácteos (JO L 148, p. 13; EE 03 F2 p. 146), prevê no seu artigo 10.° a concessão de uma ajuda ao leite desnatado fabricado na Comunidade e utilizado na alimentação de animais.

    Após ter sido verificado que o leite desnatado era tradicionalmente utilizado para a alimentação dos vitelos, o legislador comunitário decidiu, em 1977, criar um incentivo especial à utilização desse leite para a alimentação de outros animais, nomeadamente de porcos. O regime de ajudas, em vigor desde 1968, foi assim desdobrado, uma vez que a utilização do leite desnatado para alimentação dos vitelos continuou a dar direito ao pagamento da ajuda, ao mesmo tempo que foi criada uma ajuda mais elevada, designada por «ajuda especial», para a utilização deste leite na criação de outros animais.

    A dualidade do regime de ajudas, tal como existe desde 1977, expunha-o ao perigo de ser desvirtuado, designadamente nas chamadas explorações mistas, isto é, aquelas onde são criados, simultaneamente, vitelos e outros animais. Os criadores de gado interessados poderiam, com efeito, tentar fornecer-se de leite desnatado nas condições particularmente vantajosas da ajuda especial e utilizar esse leite para criar vitelos. Foi para evitar esse perigo que a Comissão adoptou um sistema de controlo cujas regras de aplicação fixou no Regulamento n.° 2793/77, de 15 de Dezembro de 1977, relativo às regras de aplicação de uma ajuda especial para o leite desnatado destinado à alimentação dos animais com exclusão dos vitelos jovens (JO L 321, p. 30; EE 03 F13 p. 156).

    De acordo com o artigo 3.° do Regulamento n.° 2793/77, a ajuda especial apenas é concedida a uma central leiteira ou fábrica de lacticínios em relação a quantidades de leite desnatado cobertas por um compromisso assumido pelo criador. Para tanto, a fábrica de lacticínios em causa deve apresentar um documento em que o criador de gado se compromete a respeitar as condições fixadas no artigo 4.° do regulamento. No que respeita às explorações mistas, o artigo 4.° comporta, para o criador de gado, na alínea c) do seu n.° 1, a obrigação de:

    «—

    dirigir à indústria em causa... uma relação da existência em gado no momento do pedido de entrega,

    declarar à indústria, antes do início de cada trimestre civil, o número máximo de vitelos com menos de quatro meses que ficarão retidos na exploração durante o trimestre considerado; o produtor pode substituir este compromisso pelo compromisso de efectuar a declaração citada antes do início de cada mês para o mês considerado,

    entregar para cada um dos vitelos, cujo número é determinado de acordo com as disposições do travessão precedente, uma quantidade mínima de leite desnatado que não beneficie da ajuda especial, igual a 6 quilogramas de leite por dia ou 180 quilogramas por mês».

    Este mesmo artigo 4.° foi completado pelo Regulamento n.° 188/83 da Comissão, de 26 de Janeiro de 1983 (JO L 25, p. 14; EE 03 F27 p. 3), que acrescentou um n.° 3 que prevê que o montante da ajuda especial será reduzido em 10 % para o período em causa «no caso de as declarações à fábrica de lacticínios ou centro de tratamento de leite, relativas ao inventário do efectivo ou ao número máximo de vitelos jovens, forem feitos tardiamente e se o atraso não exceder 10 dias» [alínea b) do n.° 1 do artigo 1.° do Regulamento n.° 188/83].

    Finalmente, resulta do artigo 5.° do Regulamento n.° 2793/77 que o pedido de pagamento da ajuda especial é dirigido pela fábrica de lacticínios à autoridade nacional competente. Como beneficiária directa desta ajuda, a fábrica de lacticínios deve, além disso, apresentar por ocasião do pedido uma declaração certificando que «renuncia à ajuda especial ou a reembolsará, conforme o caso, integral ou parcialmente, à autoridade competente no caso de se ter constatado que o produtor não tinha respeitado um dos compromissos mencionados no artigo 4.°» [alínea b) do n.° 3].

    2. Antecedentes do litígio

    O litígio no processo principal opõe a fábrica de lacticínios Nordbutter GmbH & Co., que vendeu leite desnatado a preços reduzidos a proprietários de explorações mistas alemãs e que beneficiam de ajudas especiais para esse efeito, ao Bundesamt für Ernährung und Forstwirtschaft (Departamento Federal da Alimentação e Florestas, a seguir designado por «Departamento Federal»). No decurso de fiscalizações efectuadas junto de certas explorações mistas, os serviços competentes do Departamento Federal tinham constatado que, nos anos de 1980/1981, alguns criadores de gado não tinham respeitado inteiramente os compromissos assumidos na base do artigo 4.° do Regulamento n.° 2793/77. A este respeito, resulta do processo que vários produtores tinham feito as declarações necessárias relativas ao inventário do efectivo com um atraso de doze, e mesmo treze dias; além disso, outros criadores teriam declarado menos vitelos jovens do que aqueles que de facto tinham durante o período em causa, na mira de fazer reduzir na mesma proporção o seu compromisso de comprar quantidades suplementares de leite desnatado a preços não reduzidos.

    Na sequência destas verificações, o Departamento Federal ordenou a restituição da totalidade das ajudas especiais que a fábrica de lacticínios Nordbutter tinha obtido, no período em causa, pelo fornecimento de leite desnatado aos produtores em causa. A fábrica de lacticínios impugnou esta decisão perante o Verwaltungsgericht Frankfurt am Main, sustentando que o Departamento Federal se tinha baseado, nas fiscalizações efectuadas, num processo de cálculo errado: este teria simplesmente verificado o número total de vitelos jovens existentes durante o período em causa, sem tomar em consideração a saída de alguns vitelos ocorrida entretanto, por terem atingido o limite de idade de quatro meses, limite que consta do segundo travessão da alínea c) do n.° 1 do artigo 4.° do Regulamento n.° 2793/77. Em contrapartida, para determinar de maneira correcta o número máximo de vitelos, para efeitos desta disposição, o Departamento Federal deveria ter verificado em primeiro lugar o número máximo de vitelos jovens por cada dia do período em causa. Em seguida, deveria ter considerado como «número máximo» o número de vitelos jovens existentes na exploração em causa no dia em que o seu número era mais elevado.

    Contra a decisão impugnada, a fábrica de lacticínios Nordbutter alegava, além disso, que era desproporcional exigir o reembolso integral das ajudas especiais mesmo nos casos em que os criadores não tivessem respeitado o prazo de dez dias previsto pelo n.° 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 2793/77; com efeito, este prazo seria apenas um prazo de natureza processual. Por fim, no que diz respeito aos casos em que alguns produtores declararam um número de vitelos jovens inferior à realidade, a fábrica de lacticínios sustentou que o Departamento Federal deveria igualmente ter exigido uma restituição parcial de ajudas, especialmente na medida em que estas tinham sido pagas com base em dados errados.

    3. Questões prejudiciais

    Entendendo que o litígio suscitava um problema de interpretação do direito comunitário, o Verwaltungsgericht Frankfurt am Main, por decisão de 13 de Dezembro de 1984, solicitou ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, que se pronunciasse a título prejudicial sobre as seguintes questões:

    «1)

    Como deverá interpretar-se a noção de “número máximo” constante do segundo travessão da alínea c) do n.° 1 do artigo 4.° do Regulamento (CEE) n.° 2793/77 da Comissão, de 15 de Dezembro de 1977 (JO L 321 de 16.12.1977)?

    2)

    A regulamentação estabelecida no n.° 3 do artigo 4.° do Regulamento (CEE) n.° 2793/77, na versão da alínea b) do n. c 1 do artigo 1.° do Regulamento (CEE) n.° 188/83 da Comissão, de 26 de Janeiro de 1983 (TO L 25 de 27.1.1983), é compatível com o princípio da proporcionalidade na medida em que, por força dela, a ajuda é recusada pela única razão de que o inventário do efectivo ou o número máximo de vitelos jqvens foram declarados à fábrica de lacticínios com um atraso superior a dez dias?

    3)

    É compatível com o princípio da proporcionalidade recusar ou pedir a restituição total da ajuda quando um produtor tenha prestado falsas declarações, de forma que a liquidação da ajuda especial nos termos do terceiro travessão da alínea c) do n.° 1 do artigo 4.° se baseia num número de vitelos inferior à realidade, ou o direito à ajuda especial apenas desaparece relativamente à diferença entre o montante que deveria ter sido pago na base do inventário efectivo e o montante efectivamente pago?

    4)

    Cabe no poder discricionário da autoridade competente recusar ou pedir o reembolso integral ou parcial da ajuda especial, de acordo com a alínea b) do n.° 3 do artigo 5.° do Regulamento (CEE)n.° 2793/77?

    5)

    Em caso de resposta negativa à questão 4, em que circunstâncias e em que proporções as ajudas especiais devem ser recusadas ou ser objecto de uma restituição apenas parcial?»

    Na sua decisão de reenvio, o tribunal nacional explica, em primeiro lugar, que encontrou algumas dificuldades em extrair da noção de «número máximo» o significado mais conforme com o sentido e a finalidade da regulamentação comunitária em causa. A aplicação que lhe deu o Departamento Federal («número máximo» = «número total») significa necessariamente, em seu entender, que os criadores de gado são obrigados a comprar mais leite desnatado a preços não reduzidos do que aquele de que efectivamente necessitam para a alimentação dos seus animais; com efeito, seriam assim obrigados a alimentar igualmente vitelos que não nasceram ainda ou que já foram vendidos. A este respeito, o tribunal nacional interroga-se sobre se uma tal consequência corresponde ao objectivo do Regulamento n.° 2793/77.

    Todavia, a interpretação proposta pela fábrica de lacticínios Nordbutter(»número máximo» = «o maior número de vitelos no dia de um período em que esse número é mais elevado») provocaria uma desigualdade de tratamento entre, por um lado, os criadores que detêm durante o período em causa, de forma constante, o mesmo número de vitelos jovens, e, por outro, os criadores que detêm vitelos cujo «número máximo» existe apenas durante poucos dias no decurso do mesmo período; com efeito, neste último caso, os criadores deveriam igualmente comprar mais leite desnatado a preços não reduzidos do que aquele de que efectivamente necessitam para a alimentação do seu gado.

    À luz destas considerações, o tribunal nacional pergunta se a noção em questão pode ser interpretada de maneira a designar antes o «número médio» de vitelos jovens, isto é, o número resultante do número total de vitelos existentes no período em causa, dividido pelo número de dias desse período.

    Em relação à segunda questão, o tribunal nacional manifesta dúvidas quanto ao ponto de saber se a transmissão tardia das declarações para efeitos do n.° 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 2793/77 pode justificar que ajudas pagas tenham de ser reembolsadas na totalidade. Refere, para este efeito, o acórdão do Tribunal de 21 de Junho de 1979 (Atalanta, 240/78, Recueil p. 2137), de acordo com o qual, no âmbito dos processos da concessão de ajudas, o desrespeito de um compromisso acessório não pode ser punido com o mesmo rigor que a violação de uma obrigação principal. De acordo com o mesmo tribunal nacional, trata-se, neste caso, de um compromisso acessório, sendo o prazo de dez dias em causa um prazo de natureza meramente processual.

    Em relação à quarta e quinta questões, o tribunal nacional sublinha que, de acordo com dados fornecidos pelo recorrido no processo principal, não existe na República Federal da Alemanha um único caso em que tenha sido pedido um reembolso parcial. O tribunal nacional entende que, desta forma, o Departamento Federal não esgota as possibilidades que lhe são oferecidas pela alínea b) do n.° 3 do artigo 5.° do Regulamento n.° 2793/77, disposição segundo a qual as ajudas pagas poderiam ser reembolsadas integral ou parcialmente. Todavia, se cabe no poder discricionário do Departamento Federal pedir o reembolso total ou parcial da ajuda especial, conviria saber segundo que critérios deve ser escolhida uma ou outra hipótese.

    4. Tramitação do processo

    A decisão de reenvio foi registada na Secretaria do Tribunal em 17 de Janeiro de 1985.

    De acordo com o artigo 20.° do estatuto (CEE) do Tribunal, foram apresentadas observações escritas pelo Departamento Federal da Alimentação e Florestas, em nome da República Federal da Alemanha, recorrida no processo principal, representada para este efeito por G. Siebert, e pela Comissão das Comunidades Europeias, representada pelos seus consultores jurídicos D. Boos e P. Karpenstein, na qualidade de agentes.

    Por decisão de 24 de Outubro de 1985, tomada nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo 95.° do Regulamento Processual, o Tribunal atribuiu o processo à Primeira Secção.

    Com base no relatório do juiz relator e ouvido o advogado-geral, o Tribunal decidiu iniciar a fase oral do processo sem instrução. No entanto, convidou o recorrido no processo principal a responder a algumas perguntas; este deu sequência ao pedido no prazo fixado.

    II — Resumo das observações escritas apresentadas ao Tribunal

    Quanto à primeira questão

    A título preliminar, o Departamento Federal, recorrido no processo principal expõe que, contrariamente ao que afirmou a recorrente no processo principal, não se limitou a verificar o «número total» de vitelos jovens existentes durante o período em causa, sem ter em conta as eventuais saídas de vitelos. Teria, pelo contrário, tentado determinar em que momento de um período existia simultaneamente o maior número de vitelos jovens. Na opinião do Departamento Federal, qualquer outra interpretação do conceito de «número máximo» é contrária ao próprio texto do Regulamento n.° 2793/77.

    Na mesma ordem de ideias, a Comissão das Comunidades Europeias afirma que o conceito em causa designa o número máximo de vitelos existentes em qualquer momento de um período de declaração. Se, pelo contrário, o legislador comunitário tivesse querido adoptar como critério o «número total» ou o «número médio», poderia ter utilizado precisamente essses conceitos, que seriam aliás perfeitamente claros. Além disso, a interpretação proposta pela Comissão corresponderia ao objectivo do terceiro travessão da alínea c) do n.° 1 do artigo 4.° do Regulamento n.° 2793/77. Com efeito, para poder verificar se os criadores de gado respeitam o seu compromisso a esse respeito, seria necessário conhecer o número exacto de vitelos jovens existente numa exploração mista em qualquer momento.

    Quanto às segunda e terceira questões

    O Departamento Federal, recorrido no processo principal, lembra que o prazo de dez dias foi fixado, em 1983, precisamente com o objectivo de evitar uma aplicação rígida do regime de ajudas em causa. Por outras palavras: seria nomeadamente pela introdução de um prazo suplementar que o princípio da proporcionalidade já teve aplicação. Nestas circunstâncias, não se poderia qualificar de excessiva a perda integral da ajuda findo um tal prazo suplementar. Quanto à prestação de falsas declarações, o Departamento Federal acentua que esta pode dar lugar, na República Federal da Alemanha, a um pedido de restituição parcial de ajudas na medida em que estas ajudas tinham sido concedidas com base em dados inexactos; neste último caso, deveria ser certo que as declarações foram feitas em tempo útil.

    De acordo com a Comissão, o princípio da proporcionalidade não se opõe a que as autoridades nacionais competentes façam o pedido de reembolso integral de ajudas, quando tenha havido quer uma transmissão tardia de declarações quer tenham sido prestadas declarações falsas. Em apoio deste ponto de vista, afirma primeiramente que o prazo em questão é uma componente essencial do regime de ajudas em causa; haveria, com efeito, um nexo de finalidade entre o respeito deste prazo e a possibilidade de verificar se as quantidades mínimas que os criadores são obrigados a comprar a preços não reduzidos foram correctamente calculadas. Assim, sendo o respeito do prazo de importância fundamental para o bom funcionamento do regime de ajudas, não seria desproporcionado, em caso de desrespeito, recusar a totalidade da ajuda. Em seguida, quanto à prestação de falsas declarações, a Comissão alega que a perda da totalidade das vantagens resultantes do regime de ajudas é também susceptível de garantir o seu bom funcionamento: com efeito, só uma tal sanção será susceptível de levar os produtores a fornecer apenas indicações correctas, designadamente sobre o número de vitelos jovens.

    Quanto às quarta e quinta questões

    Sobre este aspecto, o Departamento Federal e a Comissão concordam em que a expressão «integral ou parcialmente», tal como consta da alínea b) do n.° 3 do artigo 5.° do Regulamento n.° 2793/77, não deixa liberdade de apreciação às autoridades nacionais competentes para darem, eventualmente, um tratamento diferente a infracções verificadas. Em contrapartida, a expressão indicaria somente que, apesar da existência de um pedido único de ajuda da parte da fábrica de lacticínios, apenas há obrigação de reembolso em relação à infracção verificada. Se, por exemplo, um criador de gado não tivesse respeitado um dos seus compromissos, a fábrica de laticínios apenas deveria reembolsar parcialmente a ajuda, isto é, unicamente no que toca ao criador de gado que não cumpriu as suas obrigações no período em causa.

    T. Koopmans

    Juiz relator


    ( *1 ) Língua do processo: alemão.

    Top

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL (Primeira Secção)

    8 de Outubro de 1986 ( *1 )

    No processo 9/85,

    que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, pelo Verwaltungsgericht Frankfurt am Main e destinado a obter, no litígio pendente naquele órgão jurisdicional entre

    Nordbutter GmbH & Co. KG, de Rendsburg,

    e

    República Federal da Alemanha, representada pelo Bundesamt für Ernährung und Forstwirtschaft,

    uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação e validade de algumas disposições do Regulamento n.° 2793/77 da Comissão, de 15 de Dezembro de 1977, relativo às regras de aplicação de uma ajuda especial para o leite desnatado destinado à alimentação dos animais com exclusão dos vitelos jovens (JO L 321, p. 30; EE 03 F 13 p. 156),

    O TRIBUNAL (Primeira Secção),

    constituído pelos Srs. R. Joliét, presidente de secção, G. Bosco e T. Koopmans, juízes,

    advogado-geral : G. F. Mancini

    secretário: Η. A. Rühi, administrador principal

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da recorrida no processo principal, pelo Bundesamt für Ernährung und Forstwirtschaft, representado para este efeito por G. Siebert, na fase escrita do processo, e por Bergemann, na fase oral,

    em representação da Comissão das Comunidades Europeias, pelos seus consultores jurídicos D. Boos e P. Karpenstein, na qualidade de agentes, na fase esenta do processo, e na fase orai por D. Boos,

    visto o relatório para audiência e após a realização desta em 6 de Fevereiro de 1986,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 27 de Maio de 1986,

    profere o presente

    ACÓRDÃO

    1

    Por decisão de 13 de Dezembro de 1984, entrada no Tribunal em 17 de Janeiro de 1985, o Verwaltungsgericht Frankfurt am Main apresentou, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, várias questões prejudiciais relativas à interpretação e validade dos artigos 4.° e 5.° do Regulamento n.° 2793/77 da Comissão, de 15 de Dezembro de 1977, relativo às regras de aplicação de uma ajuda especial para o leite desnatado destinado à alimentação dos animais com exclusão dos vitelos jovens (JO L 321, p. 30), na redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CEE) n.° 188/83 da Comissão, de 26 de Janeiro de 1983, que estabelece a décima segunda alteração do Regulamento n.° 2793/77 (JO L 25, p. 14; EE 03 F27 p. 3).

    2

    A causa principal tem como objecto um pedido de reembolso de determinadas ajudas que tinham sido concedidas a uma fábrica de lacticínios, a empresa Nordbutter, a título de ajudas especiais para o leite desnatado destinado à alimentação de animais, com exclusão dos vitelos jovens. Esta restituição era exigida pelo organismo de intervenção alemão, o Bundesamt für Ernährung und Forstwirtschaft (Departamento Federal da Alimentação e Florestas). O Departamento Federal tinha verificado, por ocasião de fiscalizações efectuadas junto de criadores de vacas leiteiras com os quais a fábrica de lacticínios tinha celebrado contratos de fornecimento de leite desnatado, que davam lugar ao pagamento da ajuda especial, que alguns desses produtores não tinham respeitado as condições fixadas pela regulamentação comunitária.

    3

    A ajuda especial é concedida a uma fábrica de lacticínios quando ela vende, a um preço máximo fixado, leite desnatado a criadores de gado que o utilizam para a alimentação de animais com excepção de vitelos jovens. Para evitar que os criadores obtenham leite desnatado nas condições particularmente vantajosas da ajuda especial e o utilizem para criar vitelos, foi adoptado um sistema de controlo que diz respeito, em particular, às explorações mistas, isto é, aquelas em que são criados simultaneamente vitelos e outros animais. É assim que o artigo 3.° do Regulamento n.° 2793/77 da Comissão, que fixa as modalidades do sistema de controlo, prevê que a ajuda especial apenas seja concedida a uma fábrica de lacticínios para quantidades de leite desnatado abrangidas por um compromisso, assumido pelo produtor (criador de gado), de respeitar as condições constantes do artigo 4.° do regulamento.

    4

    No que diz respeito às explorações mistas, o mesmo artigo 4.°, na alínea c) do n.° 1, comporta para o criador a obrigação de enviar à fábrica de lacticínios uma relação da existência em gado no momento do pedido de fornecimento; de declarar à fábrica de lacticínios, antes do início de cada trimestre civil «o número máximo de vitelos de menos de 4 meses que ficará retido na exploração durante o trimestre considerado»; e adquirir, por cada um dos vitelos cujo número é assim determinado, uma quantidade mínima de leite desnatado que não beneficie de ajuda especial igual a 6 quilogramas de leite por dia ou 180 quilogramas por mês; o n.° 3 do artigo 4.°, introduzido pelo Regulamento n.° 188/83, acrescenta que o montante da ajuda especial é reduzido em 10 % para o período em causa, «no caso de as declarações à fábrica de lacticínios ou centro de tratamento de leite, relativas ao inventário do efectivo ou ao número máximo de vitelos jovens, forem feitos tardiamente e se o atraso não exceder dez dias».

    5

    Resulta dos elementos do processo que, no caso presente, de acordo com verificações feitas pelos serviços competentes do Departamento Federal, diversos criadores tinham feito as declarações relativas ao inventário do seu efectivo com um atraso de doze ou mesmo treze dias, enquanto outros produtores tinham declarado menos vitelos jovens do que realmente detinham durante o período em causa.

    6

    A empresa Nordbutter opôs-se ao pedido de restituição integral das ajudas especiais obtidas para o período em causa e referentes aos fornecimentos de leite desnatado aos criadores interessados. Por um lado, alegou que seria desproporcionado exigir o reembolso integral das ajudas especiais mesmo no caso de os criadores não terem respeitado o prazo de dez dias previsto pelo n.° 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 2793/77. Por outro lado, sustenta que a forma de cálculo do «número máximo dos vitelos com menos de quatro meses», na acepção da alínea c) do n.° 1 do artigo 4.° deste regulamento, tal como é utilizado pelo organismo de intervenção, é incorrecta: não se trataria simplesmente do número total de vitelos jovens detido durante o período em causa, mas do número de vitelos jovens que pudesse ter sido encontrado no dia desse período em que o seu número fosse mais elevado.

    7

    Foi com vista à resolução destes problemas que o Verwaltungsgericht Frankfurt am Main, tendo-lhe sido presente o litígio, submeteu ao Tribunal as seguintes questões a título prejudicial :

    «1)

    Como deverá interpretar-se a noção de “número máximo” constante do segundo travessão da alínea c) do n.° 1 do artigo 4.° do Regulamento (CEE) n.° 2793/77 da Comissão, de 15 de Dezembro de 1977 (JO L 321 de 16.12.1977)?

    2)

    A regulamentação estabelecida no n.° 3 do artigo 4.° do Regulamento (CEE) n.° 2793/77, na versão da alínea b) do n.° 1 do artigo 1.° do Regulamento (CEE) n.° 188/83 da Comissão, de 25 de Janeiro de 1983 (JO L 25 de 27.1.1983), é compatível com o princípio da proporcionalidade na medida em que, por força dela, a ajuda é recusada pela única razão de que o inventário do efectivo ou o número máximo de vitelos jovens foram declarados à fábrica de lacticínios com um atraso superior a dez dias?

    3)

    È compatível com o princípio da proporcionalidade recusar ou pedir a restituição total da ajuda quando um produtor tenha prestado falsas declarações, de forma que a liquidação da ajuda especial nos termos do terceiro travessão da alínea c) do n.° 1 do artigo 4.°, se baseia num número de vitelos inferior à realidade, ou o direito à ajuda especial apenas desaparece relativamente à diferença entre o montante que deveria ter sido pago na base do inventário efectivo e o montante efectivamente pago?

    4)

    Cabe no poder discricionário da autoridade competente recusar ou pedir o reembolso integral ou parcial da ajuda especial, de acordo com a alínea b) do n.° 3 do artigo 5.° do Regulamento (CEE) n.° 2793/77?

    5)

    Em caso de resposta negativa à questão 4, em que circunstâncias e em que proporções as ajudas especiais devem ser recusadas ou ser objecto de uma restituição apenas parcial?»

    Quanto à primeira questão

    8

    Ao expor as razões que o levaram a apresentar esta questão, o tribunal nacional manifesta o receio de que uma interpretação literal do termo «número máximo», constante da alínea c) do n.° 1 do artigo 4.°, prejudique as explorações em que o número máximo existe apenas durante poucos dias no decurso do período em causa. Com efeito, estas explorações deveriam comprar muito mais leite desnatado, sem beneficiarem do pagamento da ajuda especial, do que as quantidades de que efectivamente necessitam para a alimentação dos vitelos.

    9

    Há que observar, a este propósito, que a declaração do número máximo de vitelos durante um período trimestral faz parte das obrigações impostas aos criadores com vista a impedir que o leite desnatado obtido em condições vantajosas não seja desviado do seu destino para servir, designadamente, para a alimentação de vitelos jovens. Face à impossibilidade de determinar, numa exploração mista, se o leite desnatado fornecido por uma fábrica de lacticínios foi efectivamente utilizado para a alimentação de outros animais que não vitelos jovens, o Regulamento n.° 2793/77 criou um sistema de dedução fixa. Este sistema assenta na presunção de que a quantidade de leite desnatado não consumido por outros animais que não vitelos jovens equivale ao produto de uma multiplicação, que é função de dados controláveis (número de dias do trimestre, número fixo de quilogramas por dia, número de vitelos igual ao «número máximo de vitelos... retidos na exploração» durante esse trimestre).

    10

    Neste contexto, a referência ao «número máximo» em vez de ao número total ou ao número médio de vitelos jovens, não permite outra interpretação senão a que designa o número mais elevado de vitelos existentes na exploração em causa em qualquer momento do período trimestral. Só essa interpretação permite, com efeito, aos órgãos competentes verificar de maneira relativamente simples se os compromissos assumidos pelos criadores foram respeitados.

    11

    Por conseguinte, cabe responder à primeira questão que a alínea c) do n.° 1 do artigo 4.° do Regulamento n.° 2793/77, deve ser interpretada no sentido de que a expressão «número máximo de vitelos com menos de quatro meses que ficarão retidos na exploração durante o trimestre considerado» se refere ao número mais elevado de vitelos existente na exploração em causa num determinado dia do período trimestral.

    Quanto às segunda e terceira questões

    12

    De acordo com a decisão de reenvio, a segunda e a terceira questões devem-se à preocupação de obter uma interpretação do direito comunitário no domínio agrícola que seja conforme ao princípio da proporcionalidade. O tribunal nacional reconhece que, após a alteração introduzida pelo Regulamento n.° 188/83, a ajuda não é integralmente recusada, mas apenas reduzida em 10 %, se o atraso na apresentação da declaração não ultrapassar dez dias. Todavia, seria difícil descortinar as razões pelas quais o direito à ajuda especial deve desaparecer na sua totalidade depois de decorridos mais de dez dias.

    13

    O tribunal nacional interroga-se, além disso, dentro do mesmo espírito, sobre a razão por que uma falsa declaração relativa ao número de vitelos jovens deve acarretar a perda de qualquer direito à ajuda especial. Quando a declaração comporta um número de vitelos jovens inferior ao que efectivamente existe, o princípio da proporcionalidade levaria antes a subtrair ao montante da ajuda a diferença entre o montante efectivamente pago, por um lado, e' o que deveria ter sido pago com base na existência em gado realmente disponível, por outro.

    14

    A Comissão explica, a este propósito, que o respeito dos prazos e a exactidão dos dados declarados constituem elementos essenciais do regime de ajudas em causa, uma vez que garantem, em conjunto, a possibilidade de verificar se as deduções feitas com base no inventário do efectivo dos vitelos jovens foram correctamente calculadas. Quanto à prestação de falsas declarações, a Comissão sustenta que a perda total das vantagens concedidas em virtude do regime de ajudas é a única susceptível de garantir o bom funcionamento deste regime, dado que nenhuma outra sanção seria susceptível de incentivar os produtores a apresentar indicações correctas, em particular no que diz respeito ao número máximo de vitelos jovens.

    15

    E necessário, antes de mais, recordar a este propósito que os regulamentos comunitários já prevêem, desde 1968, a concessão de ajudas ao leite desnatado utilizado para a alimentação de animais, com vista, nomeadamente, a assegurar a absorção dos excedentes de leite na Comunidade. Sendo o leite desnatado, segundo a experiência, tradicionalmente utilizado para a alimentação de vitelos, os regulamentos comunitários adoptaram, em 1977, um incentivo particular à utilização do leite desnatado para a alimentação de outros animais, designadamente porcos. A dualidade deste regime de ajudas tem-no exposto, assim, ao risco de ser desviado do seu objectivo, risco cujas condições de realização se verificam sobretudo nas explorações mistas.

    16

    Decorre daqui que, não existindo um mecanismo de controlo seguro e simples, o regime de ajudas não poderia continuar a funcionar. Com efeito, o funcionamento deste regime estaria comprometido se os criadores não fossem incentivados a respeitar plenamente os seus compromissos, em particular no que respeita à veracidade das declarações feitas e aos prazos em que essas declarações são apresentadas.

    17

    No que toca aos prazos, há que lembrar que o próprio regulamento prevê que a ultrapassagem dos prazos em dez dias ou menos não tem como efeito a perda total da ajuda especial. Desta forma, a regulamentação comunitária tem em consideração a desvantagem importante que resultaria da perda total do benefício da ajuda, no caso de serem excedidos em pouco os prazos fixados. Com efeito, nos considerandos do Regulamento n.° 188/83, após se declarar que a aplicação rígida dos prazos no caso de serem ligeiramente excedidos poderia conduzir à perda total da ajuda, afirma-se que convém prever uma redução da ajuda em função da gravidade do desrespeito das obrigações em causa. Nestas condições, não cabe ao juiz determinar se os órgãos legislativos da Comunidade deveriam ter fixado, como «ligeira ultrapassagem» um desrespeito dos prazos em doze ou treze dias em vez de dez dias.

    18

    Haverá, por isso, que responder às segunda e terceira questões que a perda total da ajuda especial em caso de declarações incorrectas sobre o número de vitelos existente numa exploração mista, ou no caso de ser excedido em mais de dez dias o prazo previsto pelo artigo 4.° do Regulamento n.° 2793/77, não é contrária às exigências impostas pelo respeito do princípio da proporcionalidade.

    Quanto às quarta e quinta questões

    19

    As quarta e quinta questões dizem respeito à interpretação da alínea b) do n.° 3 do artigo 5.° do Regulamento n.° 2793/77. De acordo com esta disposição, qualquer pedido de pagamento da ajuda especial, dirigido pela fábrica de lacticínios à autoridade competente, deve ser acompanhado de uma declaração que certifique, entre outros aspectos, que a fábrica de lacticínios renuncia à ajuda especial ou a reembolsará, conforme o caso, «integral ou parcialmente» à autoridade competente no caso de se verificar que o criador de gado não respeitou um dos compromissos referidos no artigo 4.° do regulamento.

    20

    O tribunal nacional interroga-se designadamente sobre a questão de saber se caberá no poder discricionário da autoridade competente exigir o reembolso integral ou parcial da ajuda. Se não for esse o caso, o tribunal nacional gostaria de saber em que circunstâncias pode ser considerada uma restituição parcial.

    21

    A este propósito, há que lembrar que, no âmbito do regime de ajuda especial para o leite desnatado destinado à alimentação de animais, com excepção dos vitelos jovens, não é o criador individual que tem direito à ajuda, mas a fábrica de lacticínios. A obrigação de reembolso está, no entanto, ligada ao desrespeito de um compromisso assumido por um criador de gado. Nestas condições, a existência de um único pedido por parte da fábrica de lacticínios não pode ter como consequência que o não cumprimento, por um criador individual, dos compromissos que assumiu, leve à perda total da ajuda, mesmo no que se refere a outros criadores. Por conseguinte, a fábrica de lacticínios é apenas obrigada a reembolsar as importâncias que correspondam ao compromisso não respeitado, continuando o pedido válido no que toca aos còmpromissso respeitados.

    22

    Convém, por isso, responder às quarta e quinta questões que o reembolso «parcial» da ajuda especial referido na alínea b) do n.° 3 do artigo 5.° do Regulamento n.° 2793/77 tem em vista o. caso em que o pedido de ajuda apresentado pela fábrica de lacticínios diz respeito a compromissos assumidos por vários criadores, dos quais apenas alguns respeitaram os respectivos compromissos.

    Quanto às despesas

    23

    As despesas efectuadas pela Comissão, que apresentou observações ao Tribunal, não podem ser reembolsadas. Revestindo o processo, em relação às partes no processo principal, o carácter de incidente suscitado perante o tribunal nacional, cabe a este decidir quanto às despesas.

     

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL (Primeira Secção),

    pronunciando-se sobre as questões que lhe foram apresentadas pelo Verwaltungsgericht Frankfurt am Main, por decisão de 13 de Dezembro de 1984, declara:

     

    1)

    A expressão «nùmero máximo de vitelos com menos de quatro meses que ficarão retidos na exploração durante o trimestre considerado», tal como consta da alínea c) do n.° 1 do artigo 4.° do Regulamento n.° 2793/77 da Comissão, de 15 de Dezembro de 1977 (JO L 321, p. 30), refere-se ao número mais elevado de vitelos existente na exploração em causa, num determinado dia do período trimestral.

     

    2)

    A perda total da ajuda especial em caso de declarações incorrectas sobre o número de vitelos existente numa exploração mista ou no caso de ser excedido em mais de dez dias o prazo previsto pelo artigo 4.° do Regulamento n.° 2793/77 não é contrária às exigências impostas pelo respeito do princípio da proporcionalidade.

     

    3)

    O reembolso parcial da ajuda especial a que se refere a alínea b) do n.° 3 do artigo 5.° do Regulamento n.° 2793/77 tem em vista o caso em que o pedido de ajuda apresentado pela fábrica de lacticínios diz respeito a compromissos assumidos por vários criadores dos quais apenas alguns respeitaram os respectivos compromissos.

     

    Joliét

    Bosco

    Koopmans

    Proferido em audiência pública no Luxemburgo, a 8 de Outubro de 1986.

    O secretário

    P. Heim

    O Presidente da Primeira Secção

    R. Joliét


    ( *1 ) Lingua do processo: alemão.

    Top