Choose the experimental features you want to try

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 61984CJ0160

    Acórdão do Tribunal (Terceira Secção) de 15 de Maio de 1986.
    Oryzomyli Kavallas OEE e outros contra Comissão das Comunidades Europeias.
    Dispensa de pagamento dos direitos de importação - Cláusula geral de equidade prevista pelo artigo 13.º do Regulamento n.º 1430/79 do Conselho, de 2 de Julho de 1979.
    Processo 160/84.

    Colectânea de Jurisprudência 1986 -01633

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1986:205

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL (TERCEIRA SECÇÃO)

    15 de Maio de 1986 ( *1 )

    No processo 160/84,

    Oryzomyli Kavallas OEE, sociedade em nome colectivo de direito helénico, com sede em Kavala, 4, Odos Panagouda,

    e

    Oryzomyli Aghiou Konstantinou G. Raptis — L. Triantafyllidis kai Sia OE, sociedade em nome colectivo de direito helénico, com sede em Pernis, nomo de Kavala,

    representadas por Panagiotis Marinos Bernitsas, advogado inscrito em Atenas, tendo escolhido domicílio no Luxemburgo no escritório do advogado Aloyse May, 27, place de Paris, L-2341 Luxemburgo,

    recorrentes,

    contra

    Comissão das Comunidades Europeias, rue de la Loi 200, B-1049 Bruxelas, representada por Xenophon Yataganas, membro do seu serviço jurídico, tendo escolhido domicílio no escritório de G. Kremlis, bâtiment Jean Monnet, Kirchberg, no Luxemburgo,

    recorrida,

    tendo por objecto a anulação da decisão E(84) 557 da Comissão, de 25 de Abril de 1984, que declara que o reembolso dos direitos à importação não está justificado no seu caso particular,

    O TRIBUNAL (Terceira Secção),

    constituído pelos Srs. U. Everling, presidente de secção Y. Galmot e J. C. Moitinho de Almeida, juízes,

    advogado-geral : J. Mischo

    secretário: K. Riechenberg, administrador f. f.

    ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 13 de Março de 1986,

    profere o presente

    ACÓRDÃO

    (A parte relativa aos factos não é reproduzida)

    Fundamentos da decisão

    1

    Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal, em 25 de Junho de 1984, a sociedade Oryzomyli Kavallas OEE, com sede em Kavala, e a sociedade Oryzomyli Aghiou Konstantinou, com sede em Pernis, nomo de Kavala, interpuseram, ao abrigo do segundo parágrafo do artigo 173.°, do Tratado CEE, um recurso visando a anulação da decisão da Comissão, de 25 de Abril de 1984, na sequência dos pedidos apresentados pelas recorrentes às suas autoridades nacionais, destinados a obterem o reembolso dos direitos de importação, e de um pedido apresentado nesse sentido à Comissão pelo Ministério das Finanças da República Helénica.

    2

    Com o objectivo de importarem de países terceiros lotes de arroz num total de cerca de 1000 toneladas, as sociedades perguntaram, em 26 de Agosto de 1981, ao serviço competente do Ministério da Agricultura da República Helénica a taxa do direito nivelador à importação. Aquele serviço respondeu-lhes que essa taxa era, nesse dia, de 381 DR por tonelada e que a importação estava sujeita à apresentação de um pedido e à prestação de uma garantia bancária, para a emissão do certificado necessário ao desembaraço aduaneiro do produto em questão.

    3

    Em 27 de Agosto de 1981, as sociedades recorrentes apresentaram à autoridade helénica competente dois pedidos destinados à emissão de dois certificados de importação e entregaram as garantias bancárias previstas. Esses certificados foram-lhes entregues em 28 de Agosto de 1981.

    4

    Aquando da importação efectiva do arroz, em fins de Setembro de 1981, o serviço aduaneiro competente informou as recorrentes de que a taxa do direito nivelador à importação já não era de 381 DR por tonelada mas de 3811 DR por tonelada, tendo as recorrentes apresentado certificados de importação simples, não acompanhados de um pedido de fixação antecipada. Nessas condições, as recorrentes preferiram colocar o arroz em depósito em regime aduaneiro.

    5

    As recorrentes encetaram imediatamente diligências junto do Ministério da Agricultura para obterem a emissão retroactiva de um certificado de fixação antecipada da taxa de 381 DR por tonelada e a rectificação dos certificados de importação inicialmente emitidos. Argumentaram que, no momento em que o formulário de pedido dos certificados de importação lhes foi fornecido, em 27 de Agosto de 1981, ignoravam o significado dos termos «fixação antecipada do pedido» e não puderam obter, neste aspecto, qualquer esclarecimento por parte do funcionário competente. Por fim, teria sido este último quem teria preenchido, em vez delas, a casa em questão e determinado, deste modo, a concessão de certificados de importação sem fixação antecipada. Seguiu-se uma abundante troca de correspondência entre a administração e as sociedades recorrentes que não viram satisfeitas, no entanto, as suas pretensões.

    6

    No termo do prazo legal de depósito em regime aduaneiro, ou seja, dois anos depois da armazenagem nesse regime, isto é, em 27 de Setembro de 1983, as recorrentes procederam ao desembaraço aduaneiro do arroz em questão. A taxa do direito nivelador à importação era nessa data de 11487,54 DR por tonelada, ou seja, cerca de trinta vezes mais que em Agosto de 1981. As recorrentes pediram então a dispensa do pagamento da parte do direito nivelador que excedesse o que teria resultado da aplicação de uma taxa de 381 DR por tonelada, em vigor em 26 de Agosto de 1981 (ou seja 11452296 DR — 379832 DR = 11072464 DR), invocando o desconhecimento das disposições comunitárias aplicáveis na Grécia desde 1 de Janeiro de 1981 e a actuação dos serviços administrativos competentes.

    7

    Em 30 de Novembro de 1983, o Ministério das Finanças da República Helénica, em pedido dirigido à Comissão ao abrigo do artigo 13.° do Regulamento n.° 1430/79, do Conselho, de 2 de Julho de 1979, relativo ao reembolso ou à dispensa do pagamento dos direitos de importação ou de exportação (JO L 175, p. 1; EE 02, fase. 06, p. 36), com as alterações introduzidas pelo Regulamento n.° 1672/82 do Conselho, de 24 de Junho de 1982 (JO L 186, p. 1; EE 02, fase. 09, p. 93), solicitou a dispensa do pagamento da importância de 11072464 dracmas e decisão da Comissão nesse sentido. No seu pedido, o Ministério das Finanças indicava que o comportamento das empresas em causa não tinha revelado qualquer negligência ou artifício e que, manifestamente, o serviço competente do Ministério da Agricultura não tinha detectado a diferença entre um certificado simples e um certificado com fixação antecipada do direito nivelador.

    8

    A Comissão indeferiu esse pedido por decisão de 25 de Abril de 1984, contra a qual as sociedades recorrentes interpuseram o presente recurso, bem como um pedido de suspensão da sua execução. Por despacho de 16 de Julho de 1984, o presidente do Tribunal deu provimento ao pedido de suspensão da execução, prorrogada por despacho de 24 de Outubro de 1984 até que o Tribunal profira o acórdão.

    9

    O artigo 13.° do Regulamento n.° 1430/79, do Conselho, de 2 de Julho de 1979, supracitado, com as alterações introduzidas pelo Regulamento n.° 1672/82, do Conselho, de 24 de Junho de 1982, supracitado, dispõe que «pode proceder-se ao reembolso ou à dispensa do pagamento dos direitos de importação em situações diferentes das referidas nas secções A a D decorrentes de circunstâncias especiais que não impliquem qualquer negligência ou artifício por parte do interessado...».

    10

    De um modo geral, as sociedades recorrentes lembram que, como o julgou o Tribunal no acórdão de 15 de Dezembro de 1983 (Papierfabrik Schoellershammer H. A. Schoeller/Comissão, 283/82, Recueil, p. 4219), o supracitado artigo 13.° constitui uma «cláusula geral de equidade» e que esta cláusula deveria ser aplicada no presente processo. Efectivamente, sustentam que as condições relativas à existência de circunstâncias especiais, por um lado, e à ausência de negligência ou artifício, por outro, estavam claramente reunidas. A Comissão, sem apontar qualquer artifício da parte das recorrentes, considera que não existia qualquer circunstância especial no caso em questão e que as recorrentes actuaram com negligência que exclui qualquer dispensa do pagamento de direitos.

    Quanto à existência de circunstâncias particulares

    11

    As sociedades recorrentes invocam, designadamente, a este respeito, as circunstâncias de que o pedido de certificados de importação foi apresentado logo nos primeiros meses de adesão da República Helénica à Comunidade Económica Europeia, nessa altura, os regulamentos relativos às importações agrícolas não estavam ainda disponíveis em língua grega, para aplicar esses regulamentos os funcionários eram obrigados a trabalhar com base em traduções provisórias e não fidedignas, de uso puramente interno, os termos do formulário subscrito pelas recorrentes não permitiam conhecer o alcance exacto da fixação antecipada, e de que o serviço competente do Ministério da Agricultura foi incapaz de as informar satisfatoriamente sobre esse aspecto.

    12

    Pelo contrário, a Comissão contesta a existência de circunstâncias especiais e sustenta que todos os regulamentos comunitários úteis tinham sido traduzidos para grego e estavam à disposição, desde os primeiros dias da adesão, tanto nos serviços oficiais como em poder de particulares que eventualmente os desejassem consultar. Acrescenta que o sentido dos regulamentos que instituem um direito nivelador sobre as importações agrícolas é perfeitamente claro e não pôde criar a menor confusão. O mesmo aconteceria com a redacção do texto do formulário de pedido dos certificados de importação. Quanto ao argumento de que o caso se situa nos primeiros meses da adesão, a Comissão considera que é inaceitável, especialmente quando se trata de pôr em prática mecanismos da política agrícola comum.

    13

    Importa observar que, a partir da entrada de um novo Estado-membro na Comunidade Económica Europeia, os seus operadores económicos ficam imediatamente sujeitos à regulamentação comunitária nas condições previstas pelo tratado de adesão. A circunstância de a importação em litígio ter acontecido nos primeiro meses que se seguiram à adesão da República Helénica e ter sido a primeira operação desse tipo efectuada pelas sociedades recorrentes sob o regime comunitário não pode, por si mesma, ser utilmente invocada em apoio de um pedido de dispensa de pagamento dos direitos de importação ao abrigo do artigo 13.° do Regulamento n.° 1430/79 supracitado.

    14

    Para verificar a exactidão dos factos invocados pelas recorrentes, o Tribunal (Terceira Secção), por despacho de 14 de Fevereiro de 1985, remeteu uma carta rogatória a fim de a autoridade judicial helénica competente proceder à audição de quatro testemunhas, funcionários dos diferentes serviços administrativos helénicos que tiveram de se ocupar do assunto. Os documentos relativos ao cumprimento desse despacho foram registados na Secretaria do Tribunal em 19 de Novembro de 1985.

    15

    Resulta dos depoimentos recolhidos no âmbito dessa carta rogatória, que, na data na qual as sociedades recorrentes apresentaram o seu pedido de certificados de importação, tiveram graves dificuldades imputáveis às seguintes circunstâncias:

    não podiam dispor do texto em língua grega dos regulamentos aplicáveis na matéria;

    os próprios serviços do Ministério da Agricultura não tinham recebido a edição grega do Jornal Oficial das Comunidades Europeias e utilizavam textos noutras versões linguísticas, ou traduções destinadas ao uso interno dos serviços, efectuadas por funcionários gregos;

    não tinha havido qualquer instrução ou circular que explicasse aos funcionários dos referidos serviços os princípios básicos das regulamentações comunitárias;

    as sociedades recorrentes, devido à ausência do chefe do serviço dos certificados da direcção do mercado externo, que conhecia a diferença entre um certificado de importação simples e um certificado de importação com fixação antecipada, foram atendidas por um funcionário recentemente nomeado e sem experiência que lhe permitisse explicar tal diferença.

    16

    Importa considerar que o conjunto destes elementos de facto, efectivamente excepcionais, é constitutivo de «circunstâncias especiais», na acepção do artigo 13.° do Regulamento n.° 1430/79 supracitado.

    Quanto à ausência de negligência

    17

    As sociedades recorrentes alegam que foram induzidas em erro pelo funcionário do Ministério da Agricultura que preencheu, ele mesmo, a casa em questão do formulário, quando ignorava a diferença entre um certificado simples e um certificado com fixação antecipada do direito nivelador. Se as recorrentes cometeram, efectivamente, um erro de direito ao confundirem um certificado de importação simples e um certificado com fixação antecipada, esse erro seria completamemnte desculpável, tendo em conta as circunstâncias especiais examinadas mais acima. Além disso, a partir do momento em que se aperceberam de que o direito nivelador à importação tinha decuplicado, as recorrentes teriam mantido o arroz em depósito em regime aduaneiro para chegarem a um acordo com o Ministério da Agricultura. A despesa do pagamento dos direitos que pedem destinar-se-ia apenas a compensar o prejuízo causado pela ignorância dos serviços ministeriais.

    18

    Pelo contràrio, na opinião da Comissão, a ignorância das disposições comunitárias pelas interessadas constituiria efectivamente uma negligência porque seria impensável que sociedades comerciais, que efectuam trocas comerciais internacionais, ignorem o quadro legislativo no qual exercem as suas actividades. A Comissão considera que, neste caso, as autoridades gregas não cometeram qualquer erro. Além disso, alega que são as recorrentes, que, ao absterem-se de reexportar imediatamente o arroz ou de o colocarem em livre prática, agravaram o seu próprio prejuízo. Se as recorrentes não desejavam assumir o risco comercial ligado às flutuações do montante dos direitos niveladores, deveriam proceder ao desembaraço aduaneiro do arroz o mais tardar aquando da chegada do navio (Setembro de 1981), em vez de colocar o produto em depósito em regime aduaneiro por um período tão longo.

    19

    Deve salientar-se que não se poderia razoavelmente exigir, a sociedades de importância modesta, cuja sede se situa a várias centenas de quilómetros de Atenas, onde as formalidades necessárias para a importação em causa deviam ser efectuadas, na impossibilidade de obter a versão grega dos regulamentos comunitários aplicáveis e confrontadas, além disso, com o conjunto das circunstâncias especiais acima recordadas, que desenvolvessem outras diligências além das que efectuaram, para se informarem sobre o alcance exacto da noção de fixação antecipada.

    20

    Por outro lado, não se podem censurar as sociedades recorrentes de ainda não terem colocado o arroz em livre prática, desde a sua chegada, para limitarem a extensão do prejuízo sofrido. Efectivamente, resulta dos documentos dos autos que o seu comportamento tem explicação na esperança, alimentada de boa-fé, de chegarem a um acordo com a administração grega para pagarem apenas o direito nivelador em vigor no dia da apresentação do pedido de certificado e sem qualquer intenção especulativa, que, aliás, o mercado mundial não encorajava.

    21

    Há que considerar que, no caso vertente, o comportamento das sociedades recorrentes, confrontadas com as circunstâncias especiais acima salientadas, não envolveu qualquer negligência. Portanto, encontravam-se reunidas as condições necessárias para a aplicação do artigo 13.° do Regulamento n.° 1430/79, atrás citado e, consequentemente, a decisão impugnada deve ser anulada.

    Quanto às despesas

    22

    Nos termos do n.° 2 do artigo 69.° do Regulamento Processual, a parte vencida é condenada nas despesas. Tendo a Comissão sido vencida, há que a condenar nas despesas.

     

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL (Terceira Secção)

    decide:

     

    1)

    É anulada a decisão da Comissão, de 25 de Abril de 1984, dirigida à República Helénica e que declara que a dispensa de pagamento dos direitos de importação no caso das recorrentes não é justificada.

     

    2)

    A Comissão é condenada nas despesas.

     

    Everling

    Galmot

    Moitinho de Almeida

    Proferido em audiência pública no Luxemburgo, a 15 de Maio de 1986.

    O secretário

    P. Heim

    O presidente da Terceira Secção

    U. Everling


    ( *1 ) Língua do processo: grego.

    Top