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Document 61962CC0016

    Conclusões conjuntas do advogado-geral Lagrange apresentadas em 20 de Novembro de 1962.
    Confédération nationale des producteurs de fruits et légumes e outros contra Conselho da Comunidade Económica Europeia.
    Processos apensos 16/62 e 17/62.
    Fédération nationale de la boucherie en gros et du commerce en gros des viandes e outros contra Conselho da Comunidade Económica Europeia.
    Processo 19/62 a 22/62.

    Edição especial inglesa 1962-1964 00175

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1962:40

    CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

    MAURICE LAGRANGE

    apresentadas em 20 de Novembro de 1962

    Senhor Presidente, Senhores Juízes,

    Permitimo-nos examinar conjuntamente as duas categorias de processos apensos, 16/62 e 17/62, por um lado, 19/62 a 22/62, por outro, no decurso da mesma audiência, porque submetem a julgamento a mesma questão de princípio, colocada pela primeira vez perante o nosso Tribunal, isto é, a da interpretação do artigo 173.o, segundo parágrafo, do Tratado CEE, relativo às condições de admissibilidade dos recursos de anulação dos regulamentos comunitários interpostos por uma pessoa singular ou colectiva que não um Estado-membro, o Conselho ou a Comissão.

    Em todos estes processos, os recursos são interpostos por associações, pessoas colectivas de direito privado, a saber:

    1)

    associações de produtores (frutas e produtos hortícolas, uvas de mesa), que contestam o Regulamento n.o 23 do Conselho, que estabelece gradualmente uma organização comum de mercados no sector das frutas e dos produtos hortícolas;

    2)

    associações de comerciantes grossistas (talho, produtos agrícolas), que impugnam o Regulamento n.o 26 do Conselho, relativo à aplicação de determinadas regras de concorrência à produção e ao comércio de produtos agrícolas.

    Em ambos os casos, apenas é pedida uma anulação parcial: anulação do artigo 9.o do Regulamento n.o 23 (os fundamentos dos recursos referem apenas o último número deste artigo, que respeita à renúncia dos Estados-membros à aplicação do artigo 44.o do Tratado, que permite a aplicação de preços mínimos durante o período de transição), e, relativamente ao Regulamento n.o 26, a anulação da última frase do n.o 1 do artigo 2.o deste regulamento, disposição que as recorrentes consideram implicar um regime discriminatório em favor dos exploradores de produtos agrícolas e em detrimento dos comerciantes destes mesmos produtos que não tenham a qualidade de exploradores.

    Por despacho de 24 de Outubro de 1962, o Tribunal admitiu a intervenção da Assembleia permanente dos presidentes de Câmaras de Agricultores em apoio dos recursos 16/62 e 17/62. Não regressaremos a este aspecto, por a interveniente se ter limitado a fazer sua a argumentação das recorrentes.

    Finalmente, em todos os processos, o Conselho opôs aos recursos uma excepção de inadmissibilidade, que deu lugar ao processo previsto no artigo 91o do Regulamento. Por força do n.o 4 deste artigo, o Tribunal será chamado a escolher entre uma das três soluções seguintes: acolher a excepção, rejeitá-la, ou apensar a excepção à questão de mérito. Bem entendido, as recorrentes consideram infundada a excepção, mas insistem para que esta seja apensa à questão de mérito.

    É a primeira questão sobre a qual o Tribunal deverá tomar partido. Muito frequentemente, parece oportuno reservar para um exame de conjunto o julgamento da inadmissibilidade e do mérito, seja porque, prima fade, as excepções de inadmissibilidade invocadas pelo recorrido ou susceptíveis de serem conhecidas oficiosamente parecem duvidosas ou de demasiadamente pouca importância para serem objecto de um acórdão separado, seja porque surgem mais ou menos ligadas ao exame do mérito ou, pelo menos, susceptíveis de serem julgadas numa melhor perspectiva após o esclarecimento mais completo que esse exame trará ao processo.

    Mas, Senhores Juízes, tal não é o caso. Trata-se aqui, com efeito, de uma questão de princípio que põe em jogo a interpretação do Tratado num plano puramente abstracto e absolutamente geral, e que, além disso, é de uma importância tal para o controlo jurisdicional dos executivos, Conselho e Comisssão, que há o maior interesse em que seja decidida claramente e de uma vez por todas, independentemente dos casos concretos.

    Como o Tratado CECA, o Tratado CEE, ao instituir um controlo de legalidade dos actos dos executivos pela instituição de um recurso de anulação destes actos perante o Tribunal de Justiça das Comunidades, entendeu regular ele próprio as condições de admissibilidade destes recursos, designadamente quanto à determinação das pessoas que têm qualidade para agir e dos actos susceptíveis de serem impugnados. Ainda como o Tratado CECA, o Tratado CEE faz uma distinção a este respeito entre certas pessoas privilegiadas, essencialmente os Estados-membros, que não têm que justificar nenhuma condição particular, designadamente quanto ao interesse em agir, e outras pessoas às quais, pelo contrário, são colocadas condições imperativas, que variam segundo a natureza do acto do qual entendem recorrer.

    Mas pára aí a analogia, porque, na ordenação do sistema, os dois Tratados apresentam entre si diferenças profundas, as quais, com toda a evidência, foram pretendidas pelos autores do Tratado de Roma. É pois com a maior circunspecção que convém invocar, para a interpretação do artigo 173.o do Tratado CEE, as disposições correspondentes do Tratado de Paris, designadamente o artigo 33 o, e a jurisprudência a que deram lugar. Pode apenas dizer-se, de forma geral, que o Tratado CEE é mais vasto que o Tratado CECA quanto à determinação das pessoas, que não os privilegiados, a terem acesso ao Tribunal (empresas e suas associações na CECA, «qualquer pessoa singular ou colectiva» na CEE) e quanto à natureza dos fundamentos susceptíveis de serem invocados em apoio do recurso; mas que em contrapartida é mais estrito quanto às condições a preencher para impugnar certos actos. Finalmente, o Tratado de Roma teve o cuidado, como o Tratado de Paris, de definir as várias categorias de actos que emanam do executivo ou dos executivos (artigo 14.o do segundo, artigo 189.o do primeiro), mas estas definições não coincidem e, bem entendido, na aplicação do Tratado de Roma é às definições dadas no artigo 189 o deste Tratado que convém reportarmo-nos quando uma outra disposição, como o artigo 173.o que nos interessa aqui, emprega um dos termos assim definidos, como «regulamento» ou «decisão».

    É sob o benefício destas observações que abordamos o exame da excepção invocada pelo Conselho.

    Uma primeira questão, suscitada pelo Conselho e também pelas recorrentes nos processos apensos 16/62 e 17/62, diz respeito à admissibilidade dos recursos interpostos por associações.

    O Conselho, ainda que reconheça que esta questão não é decisiva para a composição do litígio, declara «exprimir dúvidas quanto à possibilidade das associações recorrentes interporem recurso, seja aliás qual for a natureza do acto impugnado». Com efeito, acrescenta o Conselho, este acto «não afecta a situação das recorrentes enquanto associações», mas apenas a dos seus membros; não é pois «de natureza a dizer directamente respeito a essas associações».

    Esta observação leva-nos «directamente» à interpretação dos termos do segundo parágrafo do artigo 173.o, que é o ponto essencial do litígio; mas esta interpretação não depende da qualidade das pessoas autoras do recurso: «qualquer pessoa singular ou colectiva», diz o texto, pode interpor recurso; uma associação regularmente constituída nos termos da legislação nacional a que está submetida é, evidentemente, uma «pessoa colectiva», desde que esta legislação lhe reconheça essa qualidade, de que normalmente resulta o direito de estar em juízo. Que uma interpretação estrita do segundo parágrafo do artigo 173.o tenha como consequência que as associações estejam praticamente sempre excluídas do direito de interpor um recurso nos termos desta disposição é certo, porque é difícil imaginar que uma associação, nessa qualidade, seja destinatária de uma decisão ou que um regulamento ou uma decisão dirigida a outra pessoa «lhe diga directa e individualmente respeito» enquanto associação. Pode-se, como faz o distinto advogado das recorrentes nos processos 16/62 e 17 /62, retirar daí um argumento em favor de uma interpretação mais lata, mas a interpretação estrita, a ser admitida, não tem por efeito, só por si, excluir de direito as associações do âmbito de aplicação do artigo 173 o, segundo parágrafo: são pessoas colectivas e, nesta qualidade, preenchem a condição requerida pelo texto quanto à capacidade para agir.

    Dito isso, recordemos o. texto: «Qualquer pessoa singular ou colectiva pode interpor, nas mesmas condições (isto é, as condições fixadas no primeiro parágrafo relativamente à fiscalização da legalidade dos actos do Conselho e da Comissão que não sejam recomendações ou pareceres), recurso das decisões de que seja destinatária e das decisões que, embora tomadas sob a forma de regulamento ou de decisão dirigida a outra pessoa, lhe digam directa e individualmente respeito».

    O primeiro caso, o de um recurso de uma decisão de que o recorrente «é destinatário», não se apresenta aqui: as diversas recorrentes reconhecem-no.

    Quanto ao segundo caso, subdivide-se ele próprio em duas hipóteses: decisão «tomada sob a forma de regulamento» e decisão «tomada sob a forma de decisão dirigida a outra pessoa». É a primeira hipótese que está aqui em jogo e convém afastar cuidadosamente do debate tudo o que se relaciona com a segunda, que o Tribunal brevemente terá ocasião de examinar noutros litígios.

    Segundo a letra do texto, quatro condições são necessárias para que um recurso seja admissível a título da primeira hipótese:

    1)

    o acto impugnado deve ser uma decisão;

    2)

    deve ter sido tomada «sob a forma de regulamento»;

    3)

    deve «dizer directamente respeito» ao recorrente;

    4)

    deve também dizer-lhe «individualmente» respeito.

    Comecemos, se permitis, pela segunda condição, cuja existência é a mais simples de verificar: acto com a forma de regulamento. É evidentemente esse o caso nos processos submetidos ao Tribunal, quer se trate do Regulamento n.o 23 ou do Regulamento n.o 26.

    Primeira condição: o acto deve ser uma decisão. É aqui que, em nossa opinião, se encontra o fulcro do problema e a chave da solução.

    O artigo 189.o, recordamo-lo, definiu os diversos actos que o Conselho ou a Comissão podem adoptar, designadamente, o regulamento e a decisão:

    «O regulamento tem carácter geral. É obrigatório em todos os seus elementos e directamente aplicável em todos os Estados-membros.»

    «A decisão é obrigatória em todos os seus elementos para os destinatários que ela designar.»

    A primeira definição, a de regulamento, é conforme com a noção comummente admitida desta categoria particular dos actos administrativos conhecida nos seis países da Comunidade: acto administrativo, com efeito, do ponto de vista formal, porque aprovado por uma autoridade dependente do executivo ou pelo próprio executivo; mas, do ponto de vista material, disposição de carácter normativo, verdadeira legislação secundária, que aprova normas objectivas aplicáveis por si próprias a todas as situações que visa, independentemente da pessoa, do indivíduo.

    A segunda definição, a de decisão, é sem dúvida mais útil, porque o termo «decisão» pode ser entendido em várias acepções. Em particular, é muitas vezes considerado numa acepção ampla, aplicando-se a qualquer acto administrativo que crie ou modifique uma situação jurídica ou que tenha efeito obrigatório: o regulamento não é mais, pois, que uma variedade de decisão, da mesma maneira que a «deliberação» de um órgão colegial, termo utilizado mais especificamente pelo direito administrativo francês e que deu lugar a dificudades no Tratado CECA. É preciso ainda distinguir as decisões «gerais» que não são forçosamente regulamentos (por exemplo, uma decisão que declara o estado de escassez na Comunidade, artigo 59.o do Tratado CECA) e as decisões individuais.

    O Tratado de Roma quis precisar a terminologia, e a definição que deu da decisão («a decisão é obrigatória em todos os seus elementos para os destinatários que ela designar») parece-nos aplicar-se com muita exactidão à noção de decisão individual. Bem entendido, uma mesma decisão pode dizer respeito a diversos destinatários (o plural implica-o): é então uma decisão colectiva que, na realidade, tem o valor de uma série de decisões individuais.

    A «decisão» assim definida não abrange o regulamento, mas, bem pelo contrário, opõe-se-lhe. No Tratado de Roma, um mesmo acto não pode ser simultaneamente regulamento e decisão. Assim, quando o artigo 173.o fala de «decisões tomadas sob a forma de regulamento», visa o caso de disposições que do regulamento só têm a «forma», mas que, na realidade, devido ao facto de terem conteúdo de decisões, não têm carácter regulamentar, razão pela qual o Tratado decide então aplicar-lhes as normas relativas às decisões, designadamente quanto aos recursos de que podem ser objecto.

    Para que fosse de outra forma, seria necessário admitir que o termo «decisão» que figura no segundo parágrafo do artigo 173.o é utilizado numa acepção geral, sinónimo, por exemplo, de «acto», e não no sentido preciso que lhe dá a definição do artigo 189.o É o que parecem sustentar as recorrentes nos processos apensos 16/62 e 17/62, que sublinham que a expressão «decisões individuais» não figura no artigo 173.o Mas, Senhores Juízes, esta tese não é de forma alguma sustentável se nos dermos ao trabalho de ler completamente a disposição em causa.

    O direito de recurso das «pessoas singulares ou colectivas» que não os Estados-membros, o Conselho e a Gomissão, existe, antes de mais, contra «as decisões das quais» o interessado «é o destinatário»: isto corresponde exactamente à definição da decisão dada pelo artigo 189.o Quanto aos outros dois casos de possibilidade de recurso, um e outro exigem que a. decisão «diga directa e individualmente respeito» à pessoa singular ou colectiva em causa. Pode-se verdadeiramente admitir que uma decisão «que diga individualmente respeito» a alguém não seja uma decisão individual? Não é brincar com as palavras? É pelo contrário este carácter individual do acto relativamente a uma pessoa singular ou colectiva que justifica a existência do direito de recurso em benefício desta pessoa, equiparada então ao destinatário.

    Julgamos portanto que a decisão referida no artigo 173.o, segundo parágrafo, só pode ser uma decisão individual tomada sob a forma de regulamento.

    Mas algumas das recorrentes (é a tese essencial dos recursos 19/62 a 21/62, igualmente apresentada a título principal no recurso 22/62) sustentam precisamente que os actos impugnados, ou pelo menos as suas disposições que são objecto dos recursos, são na realidade decisões individuais e não regulamentos. Com efeito, segundo o artigo 189.o, o regulamento deve ter «carácter geral», carácter esse de que o Regulamento n.o 26 não se reveste, porque, dizem-nos, esse carácter não pode existir num acto que apenas visa categorias, grupos de pessoas, bem determinadas.

    Senhores Juízes, esta concepção da noção de regulamento é errada. O que caracteriza o regulamento não é a amplitude maior ou menor do seu âmbito de aplicação, material ou territorial, é o facto de as suas disposições se aplicarem de forma impessoal a situações objectivas, por muito limitadas e específicas que sejam. O regulamento opõe-se assim, vemo-lo, à decisão individual, que visa um ou vários sujeitos de direito, um ou vários indivíduos. Estas noções são tão elementares que nos parece inútil insistir nelas.

    Ora, no presente caso, os dois regulamentos impugnados não têm, nem no seu conjunto, nem nas disposições criticadas pelos recursos, o menor carácter de decisão individual, de «decisão» no sentido dos artigos 173.o e 189.o do Tratado.

    Assim sendo, parece-nos inútil averiguar se as disposições impugnadas dizem «directa e individualmente respeito» às recorrentes.

    Limitemo-nos a fazer observar, mas a título excessivo, que é inútil seguir as associações recorrentes nos seus esforços para pôr em paralelo os interesses ou a esfera de interesses que representam e as disposições dos regulamentos que prejudicam estes interesses. Estes esforços poderiam ser aceites num outro sistema jurídico que não o instituído pelo Tratado e, designadamente, se este se tivesse limitado a exigir, como no direito interno daqueles países membros que admitem o recurso de anulação dos regulamentos, a justificação de um interesse em agir, ou mesmo de um interesse directo, segundo o princípio geral que domina a matéria do recurso de anulação. Como os senhores juízes sabem, o Tribunal invocou a noção de interesse, por diversas vezes, na aplicação do Tratado CECA, se bem que a expressão não figure no texto deste Tratado; fê-lo, em geral, implicitamente, por vezes explicitamente; os advogados-gerais, pela sua parte, consideram-na expressamente para justificar certas soluções, e a doutrina teve frequentemente ocasião de insistir neste aspecto do recurso de anulação. Mas tratava-se então de interpretar certas disposições do Tratado CECA que necessitavam precisamente de ser interpretadas. O Tribunal nunca admitiu que esta noção de interesse possa, por si só, afectar a natureza jurídica do acto impugnado; foi assim que não deu seguimento a uma tentativa da nossa parte de introduzir um elemento de relatividade na noção de decisão individual e se ateve a uma concepção ortodoxa da noção de regulamento, ao qual parece ter equiparado a decisão geral (acórdão de 16 de Julho de 1956, Fédéchar, 8/55, Colect. 1954-1961, p. 43). Um tal esforço é excluído, a fortiori, no âmbito do Tratado CEE.

    Neste Tratado, com efeito, não há lugar para a elaboração de uma jurisprudência sobre o interesse em agir, porque, com toda a evidência, os seus autores entenderam determinar eles mesmos as condições de admissibilidade dos recursos das pessoas que hão são o que chamámos 'privilegiados-, e isso foi feito em termos tão precisos que não deixam nenhum lugar à exegese. Quanto às associações, é exacto que quase não terão ocasião de agir por via de recurso directo, mas o seu papel, em contrapartida, pode ser importante no domínio da intervenção, quando o contencioso estiver vinculado por uma das vias que permaneçam abertas; a jurisprudência do Tribunal é bastante liberal a este respeito, e a intervenção constitui um procedimento particularmente bem adaptado às associações que tenham por missão defender os interesses gerais da profisssão cujos membros agrupam.

    Tal é o sistema que o jurista, pessoalmente, pode lamentar, mas que o juiz tem a obrigação de aplicar. Não temos de justificar aqui este sistema. Podemos somente observar que é coerente e pode invocar em seu favor argumentos sérios.

    É coerente, porque, se recusa, em princípio, aos particulares o direito de recurso directo de anulação dos regulamentos comunitários, prevê expressamente a excepção de ilegalidade (artigo 184.o) e o reenvio ao Tribunal de Justiça das questões prejudiciais que digam respeito, designadamente, à validade dos regulamentos (artigo 177.o), o que remedeia parcialmente os inconvenientes resultantes da ausência de recurso directo. A este respeito, a situação jurídica na Comunidade é sem dúvida menos favorável que aquela à qual chegaram, há mais ou menos tempo, um certo número de Estados-membros, mas é semelhante à que conhecem outros destes Estados.

    Quanto aos argumentos em favor do sistema, prendem-se essencialmente com o carácter quase legislativo que revestem normalmente estes regulamentos, adoptados em aplicação de um Tratado que é, em grande parte, uma «lei-quadro», e com a extrema gravidade que apresenta, em certos casos, a anulação, mesmo parcial, de textos que, como cada um sabe — e é muito especialmente o caso para os regulamentos agrícolas —, só puderam ser elaborados com dificuldades e não sem que compromissos por vezes difíceis tenham tido de verificar-se no seio do Conselho, obrigado ainda à regra da unanimidade. Podemos interrogar-nos — e o Tribunal sabe que alguns se interrogam actualmente — se, nesta matéria que atinge amplamente, uma vez mais, o domínio legislativo, o verdadeiro contrapeso da acção dos Governos representados no Conselho não deveria ser procurado numa participação mais eficaz do órgão parlamentar da Comunidade.

    Desculpamo-nos desta incursão no terreno político. Fizemo-lo unicamente para mostrar que se trata aqui, da parte dos autores do Tratado, de uma escolha deliberada que não pode competir ao juiz corrigir.

    Para terminar, gostaríamos de responder à argumentação que no recurso 22/62 é retirada dos princípios constitucionais do direito alemão relativos à protecção judicial na ordem jurídica da Alemanha. Esta resposta encontra-se num dos acórdãos do Tribunal, de 15 de Julho de 1960, Comptoirs de vente du charbon de la Ruhr et Nold (36/59 a 38/59 e 40/59, Colect. 1954-1961, p. 525): «Não compete ao Tribunal, que decide da legalidade das decisões tomadas pela Alta Autoridade e, portanto, das tomadas neste processo nos termos do artigo 65.o do Tratado, assegurar o respeito das normas de direito interno, ainda que constitucionais, em vigor num ou noutro dos Estados-membros».

    Em definitivo, consideramos que a excepção invocada pelo Conselho em todos estes processos deve ser acolhida e, em consequência,

    concluímos:

    que os recursos devem ser julgados inadmissíveis,

    que as despesas devem ser suportadas pelas associações recorrentes, ficando as despesas da interveniente nos processos 16/62 e 17/62 a cargo desta última.

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