COMISSÃO EUROPEIA
Bruxelas, 18.6.2024
COM(2024) 258 final
RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO
sobre a execução da Diretiva (UE) 2019/2161 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de novembro de 2019, que altera a Diretiva 93/13/CEE do Conselho e as Diretivas 98/6/CE, 2005/29/CE e 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho a fim de assegurar uma melhor aplicação e a modernização das regras da União em matéria de defesa dos consumidores
1.Introdução
A Diretiva (UE) 2019/2161 do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 93/13/CEE do Conselho e as Diretivas 98/6/CE, 2005/29/CE e 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho a fim de assegurar uma melhor aplicação e a modernização das regras da União em matéria de defesa dos consumidores («Diretiva Modernização») foi adotada em 27 de novembro de 2019. Alterou quatro diretivas em vigor em matéria de direito dos consumidores: a Diretiva 93/13/CEE relativa às cláusulas abusivas nos contratos (Diretiva Cláusulas Abusivas, DCA), a Diretiva 98/6/CE relativa à indicação dos preços (Diretiva Indicação dos Preços, DIP), a Diretiva 2005/29/CE relativa às práticas comerciais desleais (Diretiva Práticas Comerciais Desleais, DPCD) e a Diretiva 2011/83/UE relativa aos direitos dos consumidores (Diretiva Direitos dos Consumidores, DDC).
A Diretiva Modernização deu resposta às lacunas identificadas no balanço de qualidade de 2017 e na avaliação paralela da DDC. Visava reforçar a aplicação das regras da UE em matéria de defesa dos consumidores e atualizá-las em consonância com o desenvolvimento da digitalização. Paralelamente à proposta de Diretiva Modernização, a Comissão Europeia apresentou uma proposta sobre as ações coletivas para proteção dos interesses coletivos dos consumidores, que se tornou lei em 2020.
A Diretiva Modernização tinha de ser transposta para o direito nacional até 28 de novembro de 2021 e tornar-se aplicável nos Estados-Membros a partir de 28 de maio de 2022. Inclui uma cláusula de revisão, que prevê a apresentação, até maio de 2024, de um relatório ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre a sua aplicação. A revisão deveria incluir uma avaliação do disposto em matéria de eventos organizados em locais diferentes do estabelecimento comercial do comerciante e de bens comercializados como idênticos, mas com características ou composições significativamente diferentes (marketing de «dualidade de qualidade»).
O presente relatório abrange um período de dois anos após a data para a aplicação das legislações nacionais de transposição da Diretiva Modernização (28 de maio de 2022). Na prática, para muitos Estados-Membros, os dados disponíveis abrangem um período mais curto, devido a atrasos na transposição. Por conseguinte, a diretiva encontra-se ainda numa fase relativamente incipiente da sua aplicação, o que tem implicações na interpretação dos dados sobre a execução apresentados no presente relatório. O número de processos ou decisões formais de aplicação relacionados com a Diretiva Modernização é limitado. Até à data, não há qualquer jurisprudência do Tribunal de Justiça da UE sobre a sua aplicação, com exceção de um pedido de decisão prejudicial pendente sobre a nova disposição da DIP relativa às reduções de preços.
O presente relatório foi elaborado em paralelo com o balanço de qualidade da legislação da UE em matéria de proteção dos consumidores no que diz respeito à equidade digital («balanço de qualidade»), lançado em maio de 2022 e ainda em curso, para determinar se os principais instrumentos jurídicos horizontais em vigor continuam a ser adequados para assegurar um elevado nível de proteção dos consumidores no ambiente digital (equidade digital). Os resultados do balanço de qualidade serão apresentados num relatório separado, a publicar no segundo semestre de 2024.
2.Principais elementos da Diretiva Modernização
A Diretiva Modernização introduziu alterações específicas na DPCD, na DCA, na DDC e na DIP, nomeadamente as seguintes alterações principais:
·reforço das regras relativas às sanções aplicáveis em caso de violação do disposto nas quatro diretivas,
·novo direito da UE a meios de ressarcimento individuais para os consumidores lesados por práticas comerciais desleais proibidas pela DPCD,
·proibição de práticas desleais em linha específicas [aditamentos ao anexo I («lista negra») da DPCD] no que respeita a:
oavaliações dos consumidores,
opublicidade e colocações pagas nos resultados das pesquisas,
orevenda de bilhetes para eventos,
·novos requisitos em matéria de transparência (alterações da DPCD e da DDC):
osobre os principais parâmetros que determinam a classificação dos resultados das pesquisas em linha,
osobre se o contrato é celebrado com um profissional ou um particular num mercado em linha,
osobre as medidas tomadas para garantir que as avaliações publicadas são efetuadas por consumidores que efetivamente utilizaram ou adquiriram o produto,
·alargamento da aplicação da DDC a serviços digitais «gratuitos» pelos quais os consumidores não pagam um preço, mas facultam dados pessoais, como o armazenamento em nuvem, as redes sociais e os serviços de correio eletrónico,
·transparência da fixação personalizada dos preços: obrigação prevista na DDC para alertar os consumidores quando lhes é apresentado um preço personalizado com base no tratamento automatizado,
·marketing de «dualidade de qualidade»: alteração da DPCD que proíbe a apresentação enganosa de bens como sendo idênticos a bens comercializados noutros Estados-Membros quando esses bens apresentam diferenças significativas na sua composição ou características,
·transparência das reduções de preços: alteração da DIP que exige que os vendedores que anunciam uma redução de preço também indiquem o preço mais baixo que praticaram nos últimos 30 dias.
Na sequência da adoção da Diretiva Modernização, em dezembro de 2021, a Comissão publicou comunicações de orientação atualizadas sobre a DPCD e a DDC, que abordam as alterações introduzidas, bem como uma nova comunicação de orientação separada sobre a nova disposição da DIP em matéria de reduções de preços.
3.Transposição e avaliação da conformidade
O artigo 7.º da Diretiva Modernização exigia que os Estados-Membros adotassem e publicassem, até 28 de novembro de 2021, as disposições necessárias para lhe dar cumprimento e que aplicassem essas disposições a partir de 28 de maio de 2022.
Durante o ano de 2020, a Comissão organizou três seminários sobre a transposição para ajudar os Estados-Membros a adotar a legislação necessária. Cinco Estados-Membros adotaram e comunicaram à Comissão medidas nacionais de transposição completas antes do prazo de transposição de 28 de novembro de 2021. Em janeiro de 2022, a Comissão deu início a procedimentos formais de infração contra 22 Estados-Membros que não tinham notificado quaisquer medidas de transposição ou que apenas tinham notificado medidas de transposição parciais. Seguiram-se vários pareceres fundamentados no decurso de 2022. Mais de metade dos Estados-Membros notificou a transposição completa da diretiva após a sua data de aplicação, em maio de 2022. No primeiro semestre de 2023, todos os Estados-Membros, exceto um, tinham notificado a Comissão da transposição completa da diretiva. O último Estado-Membro fê-lo em 29 de maio de 2024.
A Comissão avaliou a conformidade da transposição da Diretiva Modernização. Desde o final de 2023, encetou nove diálogos específicos com autoridades nacionais competentes para clarificar os problemas identificados em matéria de transposição e, em breve, dará início a diálogos com outros Estados-Membros.
Entre os problemas identificados, os mais recorrentes dizem respeito à transposição das disposições relativas aos meios de ressarcimento individuais dos consumidores na DPCD e das regras reforçadas relativas às sanções na DCA, na DPCD e na DDC. Ao contrário da maior parte das outras disposições da Diretiva Modernização, que são geralmente transpostas literalmente para as regras nacionais correspondentes, a transposição das disposições em matéria de meios de ressarcimento e sanções implicou, em muitos casos, alterações de várias regras nacionais. Além disso, a verificação da transposição revelou alguns problemas com a transposição do novo artigo 6.º-A da DIP relativo aos anúncios de redução de preços. Alguns Estados-Membros parecem ter alargado o âmbito de aplicação das suas disposições de transposição para abranger não só bens, mas também serviços que não integram o âmbito de aplicação do novo artigo 6.º-A da DIP enquanto tal. Estes e outros problemas relacionados com a transposição são analisados de forma mais pormenorizada nas secções temáticas a seguir apresentadas.
4.Aplicação e cumprimento
As atividades de recolha de informações sobre a execução da diretiva para efeitos do presente relatório tiveram lugar principalmente em 2023, ou seja, numa fase relativamente incipiente da sua aplicação. Por conseguinte, não proporcionam um panorama completo e definitivo. Além disso, a experiência sobre a aplicação da diretiva por parte das autoridades e dos tribunais nacionais é também limitada.
A análise da execução baseia-se em várias fontes de informação. No que respeita ao cumprimento por parte dos profissionais, o relatório refere as ações de fiscalização conjuntas em linha pertinentes realizadas pelas autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei e coordenadas pela Comissão no âmbito da rede de cooperação de defesa do consumidor (CDC) criada pelo Regulamento (UE) 2017/2394 («rede de CDC»). Utiliza também as informações públicas disponíveis sobre as atividades de acompanhamento pertinentes e as ações de aplicação formais adotadas pelas autoridades nacionais, bem como os relatórios e estudos facultados pelas partes interessadas.
No âmbito de um estudo externo de apoio («estudo de apoio») ao balanço de qualidade e ao presente relatório, realizou-se um inquérito aos consumidores a uma amostra de 10 000 inquiridos, que abrangeu 10 Estados-Membros (Alemanha, Espanha, Estónia, França, Hungria, Itália, Polónia, Portugal, Roménia e Suécia), bem como um inquérito específico que reuniu os pontos de vista de várias partes interessadas (empresas, associações de consumidores, ministérios e autoridades responsáveis pela aplicação da lei, etc.) em todos os Estados-Membros («inquérito às partes interessadas») sobre questões específicas. Foram ainda realizadas entrevistas adicionais com associações de consumidores e profissionais, autoridades responsáveis pela aplicação da lei e ministérios selecionados. A elaboração do relatório foi debatida com os Estados-Membros nas reuniões do grupo de peritos da Comissão em direito dos consumidores. Em várias reuniões bilaterais e multilaterais com as partes interessadas e as autoridades nacionais, foram debatidos temas específicos da Diretiva Modernização, em especial as disposições relativas às reduções de preços e à dualidade de qualidade.
Por último, no âmbito do estudo de apoio, foram realizados testes de conformidade de profissionais em linha selecionados sobre temas pertinentes para a diretiva, incluindo a transparência dos mercados em linha, a transparência da classificação dos resultados das pesquisas, a fixação personalizada dos preços, as avaliações dos consumidores em linha, os anúncios de redução de preços e as chamadas telefónicas à tarifa de base nos serviços de transporte de passageiros. Estes testes abrangeram um número limitado de sítios Web e, por conseguinte, diferem das ações de fiscalização conjuntas em grande escala realizadas pelas autoridades nacionais na rede de CDC.
Além disso, os Painéis de Avaliação das Condições dos Consumidores de 2021 e 2023 («PACC de 2021» e «PACC de 2023»), que se basearam, respetivamente, nos inquéritos sobre as condições de consumo de 2020 e 2022, dão informações sobre as perceções dos consumidores no que respeita a vários temas pertinentes para esta análise, antes e pouco depois do início da aplicação da Diretiva Modernização (embora não em todos os Estados-Membros), por exemplo, sobre as experiências dos consumidores com a classificação dos resultados das pesquisas, as avaliações dos consumidores e as reduções de preços.
As secções temáticas seguintes do presente relatório (secções 5 a 15) apresentam uma panorâmica da execução dos principais elementos da Diretiva Modernização. De salientar que as atividades de recolha de dados no âmbito do estudo de apoio ao presente relatório tiveram lugar antes de as regras do Regulamento dos Serviços Digitais (RSD) começarem a ser aplicáveis. O RSD deu origem a importantes desenvolvimentos, que são referidos nas secções temáticas pertinentes.
5.Sanções
A fim de reforçar a aplicação pública da legislação da UE em matéria de defesa dos consumidores em toda a UE e o seu efeito dissuasivo, a Diretiva Modernização alterou as regras em vigor relativas às sanções estabelecidas na DIP, na DPCD e na DDC, que já exigiam que os Estados-Membros estabelecessem sanções efetivas, proporcionadas e dissuasivas. Além disso, introduziu uma nova obrigação para que os Estados-Membros estabelecessem sanções dessa natureza na DCA, diploma em que a obrigação não estava anteriormente prevista.
A principal novidade foi a inclusão na DPCD, na DDC e na DCA da obrigação de imposição de coimas e da fixação do seu montante máximo para as infrações generalizadas e para as infrações generalizadas ao nível da União quando as medidas de aplicação são tomadas de forma coordenada nos termos do artigo 21.º do Regulamento CDC. Nestes casos, os Estados-Membros têm de prever, como elemento obrigatório das suas regras relativas às sanções, coimas máximas num montante correspondente a, pelo menos, 4 % do volume de negócios anual do profissional ou de 2 milhões de EUR para as situações em que o volume de negócios anual não possa ser determinado. Trata-se de requisitos mínimos e os Estados-Membros continuam a ter a possibilidade de manter ou introduzir coimas máximas mais elevadas. Quanto à aplicação das sanções em geral, os Estados-Membros conservam uma margem de apreciação no que respeita ao procedimento de imposição dessas coimas, que pode ser administrativo ou judicial.
Além disso, a Diretiva Modernização incorporou na DPCD, na DCA, na DDC e na DIP critérios não exaustivos e indicativos que devem ser tidos em conta na imposição de sanções, tanto em situações nacionais como transfronteiriças.
A avaliação da conformidade das medidas de transposição notificadas relativamente a estas disposições revelou-se relativamente complexa. Por exemplo, vários Estados-Membros tinham múltiplas regras nacionais preexistentes em matéria de sanções, em função da disposição violada da diretiva em questão, pelo que foram necessárias várias disposições de transposição para as alterar.
No que respeita às coimas que podem ser impostas em situações transfronteiriças nas ações coordenadas ao abrigo do artigo 21.º do Regulamento CDC, quase todos os Estados-Membros transpuseram o requisito de estabelecer uma coima máxima num montante correspondente a, pelo menos, 4 % do volume de negócios anual do profissional ou, em alternativa, 2 milhões de EUR para infrações sujeitas a ações coordenadas de CDC. A situação de alguns Estados-Membros, que suscitou questões ou incerteza, está a ser ou será analisada no contexto dos diálogos específicos com os Estados-Membros.
Alguns países também aplicam a coima máxima de 4 % ou 2 milhões de EUR a outros tipos de infrações (nacionais e transfronteiriças): por exemplo, para violações da DDC, a Áustria aplica a coima máxima de 4 % do volume de negócios anual a todas as infrações. No caso de violações da DPCD, a Polónia aplica a coima máxima de 2 milhões de EUR a todas as infrações, caso não esteja disponível informação sobre o volume de negócios, e a Letónia aplica a coima máxima de 4 % do volume de negócios anual a todas as infrações, com um limite máximo de 300 000 EUR.
Alguns países dispõem de regras mais rigorosas que vão além da regra dos 2 milhões de EUR para as infrações sujeitas à ação coordenada de CDC. Caso não esteja disponível informação sobre o volume de negócios anual, as coimas máximas para infrações transfronteiriças da DPCD sujeitas às referidas ações coordenadas podem ascender a 5 milhões de EUR na Grécia ou a 4 milhões de EUR na Dinamarca.
Além disso, outros países já tinham ou introduziram coimas máximas para todas as infrações que são superiores às exigidas pela Diretiva Modernização para as infrações transfronteiriças sujeitas às ações coordenadas de CDC (4 %/2 milhões de EUR). Por exemplo, as violações da DPCD são geralmente puníveis com uma coima máxima de 10 % do volume de negócios anual do profissional nos Países Baixos e na Polónia, de 6 % na Bélgica e de 5 % em Chipre. No caso de violações da DCA, por exemplo, a Polónia prevê uma coima máxima de 10 % do volume de negócios anual do profissional e Chipre de 5 %.
As novas regras em matéria de coimas máximas por infrações em situações transfronteiriças sujeitas à aplicação coordenada da CDC ainda não foram aplicadas na prática. Com base nas reações recebidas no contexto das ações coordenadas de CDC, algumas autoridades consideram difícil aplicar estas coimas nos casos em que as empresas não proponham compromissos adequados para fazer face às alegadas infrações. Em particular, nem o Regulamento CDC nem as disposições em matéria de sanções previstas nas diretivas em causa preveem procedimentos claros para coordenar a imposição de sanções e evitar o risco de situações de ne-bis-in idem em que tais medidas são tomadas em paralelo em diferentes Estados-Membros. A Comissão está a ponderar rever o Regulamento CDC, nomeadamente para aumentar o seu efeito dissuasivo.
Os Estados-Membros adotaram abordagens diferentes para a transposição dos critérios não exaustivos e indicativos para a imposição de sanções, que foram aditados pela Diretiva Modernização às quatro diretivas alteradas. Alguns Estados-Membros transpuseram (quase) literalmente todos os critérios da lista, enquanto outros, tendo em conta o caráter meramente indicativo da lista, os transpuseram apenas parcialmente ou invocaram as disposições pertinentes já existentes no direito nacional, que exigem frequentemente, por exemplo, que se tenham em conta «fatores agravantes ou atenuantes» na imposição de sanções.
A Diretiva Modernização prevê opções normativas para os Estados-Membros na aplicação das novas regras relativas às sanções constantes da DPCD e da DCA. Nos termos da DCA (artigo 8.º-B, n.º 2), os Estados-Membros podem optar por aplicar as regras relativas às sanções (incluindo a disposição específica em matéria de coimas por infrações sujeitas à aplicação coordenada da Regulamento CDC) apenas a uma ou a ambas as situações seguintes: a) se o profissional utilizar cláusulas contratuais expressamente definidas como abusivas segundo o direito nacional; ou b) se o profissional continuar a recorrer a cláusulas contratuais que tenham sido consideradas abusivas numa decisão definitiva. Em relação à DPCD (artigo 13.º, n.º 3), os Estados-Membros podem, por razões de natureza constitucional a nível nacional, decidir não aplicar as regras em matéria de coimas às infrações sujeitas à aplicação coordenada da CDC se o profissional tiver infringido, pela primeira vez, exclusivamente o artigo 5.º da DPCD em matéria de diligência profissional.
A opção normativa permitida pela DCA é utilizada em muitos Estados-Membros. Por exemplo, a Alemanha, a Croácia, a Finlândia, a França e Portugal aplicam as sanções em ambas as situações previstas na DCA. Só são aplicadas sanções nos casos em que o profissional utiliza cláusulas contratuais expressamente definidas como abusivas segundo o direito nacional, por exemplo, na Áustria, na Chéquia e na Estónia. Por último, as sanções só são aplicáveis se o profissional continuar a recorrer a cláusulas contratuais que tenham sido consideradas abusivas numa decisão definitiva, por exemplo, na Bulgária, na Lituânia, no Luxemburgo e na Suécia.
A opção normativa permitida pela DPCD é utilizada por menos Estados-Membros, por exemplo, a Alemanha, a Áustria, a Croácia, a Finlândia, a França e a Suécia.
Em conclusão, vários Estados-Membros fizeram uso das opções normativas no que respeita às novas regras relativas às sanções. Com algumas exceções, as legislações nacionais transpuseram corretamente o novo requisito relativo às coimas por infrações sujeitas às ações coordenadas de CDC, em alguns casos indo além dos requisitos mínimos, por exemplo, alargando a sua aplicação a todas as violações das diretivas em causa, incluindo as nacionais. As regras em matéria de coimas máximas por infrações verificadas em situações transfronteiriças sujeitas à aplicação coordenada da CDC ainda não foram aplicadas na prática.
6.Meios de ressarcimento para os consumidores ao abrigo da DPCD
A Diretiva Modernização incorporou na DPCD o direito dos consumidores a meios de ressarcimento individuais proporcionados e eficazes quando são lesados por práticas comerciais desleais. O artigo 11.º-A exige agora que os Estados-Membros assegurem que os consumidores que tenham sido vítimas de práticas desleais tenham acesso a meios de ressarcimento contratuais e extracontratuais, ou seja, a uma indemnização por danos sofridos, à redução do preço e à rescisão do contrato. Os Estados-Membros têm a liberdade de estabelecer as condições para a aplicação e os efeitos dos meios de ressarcimento. Os consumidores podem fazer valer estes meios de ressarcimento através de ações individuais ou de ações coletivas de reparação ao abrigo da nova Diretiva Ações Coletivas [Diretiva (UE) 2020/1828], que prevê um meio processual para fazer respeitar os direitos coletivos dos consumidores.
Tal como no caso das regras relativas às sanções, o controlo da conformidade das disposições nacionais de transposição do artigo 11.º-A revelou-se bastante complexo e suscitou uma série de questões que estão a ser ou serão abordadas nos diálogos específicos com vários Estados-Membros. Esta complexidade deve-se ao facto de os meios de ressarcimento dos consumidores terem sido aplicados em muitos Estados-Membros, por um lado, através da introdução de novas regras e, por outro, com base em disposições preexistentes em matéria civil. Além disso, o âmbito e o conjunto dos meios de ressarcimento disponíveis em vários Estados-Membros não eram claros. A DPCD tem um âmbito de aplicação alargado, abrangendo práticas comerciais desleais que ocorram fora de qualquer relação contratual entre um profissional e um consumidor e também na sequência da celebração de um contrato e durante a sua execução. Por conseguinte, os meios de ressarcimento dos consumidores também têm de estar disponíveis para as infrações relativas a todas estas fases e tipos de relações entre empresas e consumidores.
Os Estados-Membros adotaram abordagens diferentes para transpor o artigo 11.º-A da DPCD. Alguns, como a Eslovénia, a Letónia e a Roménia, introduziram (ou já tinham anteriormente) disposições específicas na sua legislação de transposição da DPCD que preveem expressamente o direito dos consumidores a meios de ressarcimento em caso de violação dessas disposições. Outros, como a Alemanha, a Áustria, a Chéquia, a Croácia e a Estónia, têm disposições específicas em matéria de meios de ressarcimento na sua legislação de transposição da DPCD, que também remetem expressamente para regras adicionais do direito civil geral, como os códigos civis. Por último, alguns Estados-Membros, como a França, notificaram que o seu direito civil geral ou outras disposições em matéria de meios de ressarcimento são aplicáveis a violações das regras nacionais de transposição da DPCD.
Alguns Estados-Membros notificaram disposições que, além de preverem os direitos substantivos a meios de ressarcimento, também facilitam a sua execução. Por exemplo, na Bulgária, quando os consumidores solicitam o ressarcimento ao abrigo do direito comum num tribunal cível, não têm de provar que a prática é desleal se a autoridade nacional competente (Comissão da Defesa do Consumidor) já tiver concluído, numa decisão definitiva, que uma determinada prática é desleal. A Espanha adotou disposições que conferem força probatória a uma constatação anterior, por parte da autoridade ou de um tribunal, de uma violação da DPCD.
Em conclusão, a legislação da maioria dos Estados-Membros inclui agora regras que conferem aos consumidores o direito à indemnização por danos, à redução do preço ou à rescisão do contrato quando são vítimas de práticas desleais.
7.Anúncios de redução de preços
A Diretiva Modernização alterou a DIP, introduzindo um novo artigo 6.º-A relativo às reduções de preços, a fim de assegurar que os consumidores estejam mais bem informados e possam avaliar melhor o mérito e as vantagens reais da redução anunciada. O novo artigo exige que os vendedores de bens que anunciam uma redução do preço indiquem o «preço anteriormente praticado», ou seja, o preço mais baixo praticado pelo mesmo comerciante durante um período que não seja inferior a 30 dias anterior à aplicação da redução do preço. Sendo uma regra mais específica, o novo artigo 6.º-A prevalece sobre as disposições gerais da DPCD no que diz respeito, em particular, às características do preço de referência nas reduções de preços. No entanto, a DPCD, com a sua abordagem casuística, continua a ser aplicável para avaliar outros aspetos das reduções de preços que não sejam expressamente regidos pelo artigo 6.º-A da DIP, como a duração da redução do preço. Além disso, a DPCD continua a ser a base jurídica aplicável para avaliar os vários outros tipos de promoções de preços que estão fora do âmbito de aplicação do artigo 6.º-A, como as comparações de preços.
O artigo 6.º-A, n.os 3 a 5, prevê opções normativas que permitem aos Estados-Membros estabelecer exceções à regra geral em caso de: a) bens suscetíveis de se deteriorarem ou de ficarem rapidamente fora de prazo de validade («bens não duradouros»); b) bens que estejam no mercado há menos de 30 dias (bens «recém-chegados»); e c) bens para os quais há um aumento gradual da redução do preço («descontos progressivos»).
Todos os Estados-Membros transpuseram a regra geral relativa ao «preço anteriormente praticado», mantendo os 30 dias como período de referência para a sua determinação. No entanto, embora a DIP e o artigo 6.º-A se apliquem apenas à venda de bens, alguns Estados-Membros alargaram o âmbito de aplicação das disposições nacionais em matéria de reduções de preços para abranger também os serviços. O alargamento do artigo 6.º-A aos serviços suscitou preocupações por parte das partes interessadas da indústria (ver infra), e a Comissão está a abordar esta questão através dos diálogos específicos com os Estados-Membros.
As opções normativas previstas no artigo 6.º-A dão aos Estados-Membros alguma flexibilidade na adaptação das regras nacionais às condições de mercado de categorias específicas de bens. Muitos Estados-Membros, mas não todos, decidiram aplicá-las, o que resultou em algumas diferenças nacionais.
A opção normativa relativa aos bens suscetíveis de se deteriorarem ou de ficarem rapidamente fora de prazo de validade («bens não duradouros»), prevista no artigo 6.º-A, n.º 3, permite aos Estados-Membros prever regras diferentes para esses bens ou isentá-los do âmbito de aplicação do artigo 6.º-A.
Todos os Estados-Membros fizeram uso desta opção regulamentar, exceto a Croácia, a Irlanda e o Luxemburgo. As disposições nacionais que transpuseram o artigo 6.º-A da DIP não se aplicam aos bens «não duradouros» na Alemanha, na Áustria, na Bélgica, na Chéquia, na Espanha, na Finlândia, na França, na Grécia, na Hungria, na Itália, na Letónia, na Lituânia e na Suécia. Em Chipre, na Eslovénia, na Estónia, em Malta, nos Países Baixos e na Polónia, os vendedores têm de indicar, como preço de referência nas reduções, o preço aplicado antes da redução. Por último, alguns Estados-Membros aplicam o artigo 6.º-A aos bens não duradouros, mas previram períodos de referência reduzidos para a fixação do preço «anteriormente praticado», a saber, Bulgária (7 dias), Roménia (10 dias), Dinamarca (14 dias) e Portugal (15 dias).
Além disso, as regras nacionais diferem no que respeita à definição de bens considerados «suscetíveis de se deteriorarem ou de ficarem rapidamente fora de prazo de validade». Por exemplo:
-na Áustria, a opção normativa aplica-se «quando a redução de preços é aplicada em resultado do termo da data de durabilidade mínima na aceção do artigo 2.º, n.º 2, alínea r), do Regulamento (UE) n.º 1169/2011»,
-na Finlândia, aplica-se aos «géneros alimentícios muito perecíveis»,
-na Alemanha, aplica-se a «bens não duradouros ou com um período de conservação restante curto, se o preço solicitado for reduzido devido a um risco iminente de deterioração ou a uma caducidade iminente do período de conservação, e tal for comunicado ao consumidor de forma adequada»,
-em Itália, aplica-se «aos produtos agrícolas e alimentares não duradouros», tal como definidos na legislação nacional específica,
-na Lituânia, aplica-se a «produtos não duradouros ou a artigos que percam rapidamente o seu valor comercial»,
-em Espanha, aplica-se a «produtos idênticos que se aproximam do seu prazo de validade ou da data de durabilidade mínima»,
-na Bulgária, aplica-se a «bens sujeitos a uma rápida deterioração ou com um período de conservação curto»,
-na Estónia, aplica-se aos «bens que, devido à sua natureza ou ao seu nível de transformação, envelhecem ou se deterioram rapidamente e são suscetíveis de se tornarem impróprios para venda antes de decorridos 30 dias a contar do ponto em que são colocados à venda»,
-nos Países Baixos, aplica-se a bens que «se estragam rapidamente ou têm um período de conservação limitado», tal como designado por portaria ministerial,
-na Eslovénia, aplica-se quando os bens estão perto da sua data de validade e aos bens não duradouros,
-em Portugal, entende-se por «produtos agrícolas e alimentares perecíveis» os «produtos agrícolas e alimentares que, pela sua natureza ou devido à sua fase de transformação, são suscetíveis de se tornar impróprios para venda no prazo de 30 dias após a data de colheita, produção ou transformação».
A opção normativa relativa aos bens que estejam no mercado há menos de 30 dias (bens «recém-chegados»), prevista no artigo 6.º-A, n.º 4, permite que os Estados-Membros autorizem os anúncios de redução de preços também em relação aos bens que o comerciante vendeu há menos de 30 dias antes do anúncio da redução do preço. A este respeito, os Estados-Membros podem prever um prazo mais curto do que 30 dias para estabelecer o preço «anteriormente praticado». Muitos Estados-Membros optaram por fazer uso desta possibilidade, com exceção da Alemanha, da Croácia, da Dinamarca, da Finlândia, da França, da Irlanda, de Portugal e da Suécia.
Entre os Estados-Membros que utilizam a opção normativa, muitos definem o «preço anteriormente praticado» como o preço mais baixo praticado pelo comerciante desde que os bens se encontram no mercado, sem determinar um período mínimo, a saber, Áustria, Chéquia, Chipre, Eslovénia, Grécia, Itália, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Polónia e Roménia. A Bélgica, a Bulgária, a Estónia e a Letónia definiram um período mínimo de sete dias e a Hungria de 15 dias.
Por último, ao abrigo da opção normativa para os casos em que há um aumento gradual da redução do preço («descontos progressivos»), prevista no artigo 6.º-A, n.º 5, os Estados-Membros podem estabelecer que, quando o preço é gradualmente reduzido, sem interrupções, durante a mesma campanha de vendas, o preço mais baixo nos 30 dias anteriores à aplicação do primeiro anúncio de redução de preço continua a ser o preço anteriormente praticado para todos os anúncios subsequentes de redução de preços durante a campanha de vendas. Esta opção é utilizada por quase todos os Estados-Membros, com exceção da Espanha e da Polónia.
A execução do artigo 6.º-A da DIP revelou-se o aspeto mais debatido da Diretiva Modernização, tendo merecido uma atenção considerável das autoridades e das partes interessadas dos Estados-Membros. No final de 2021, a Comissão emitiu orientações específicas sobre o artigo 6.º-A. Além disso, vários Estados-Membros adotaram orientações nacionais ou P&R, nomeadamente, a Bélgica, a Dinamarca, a Estónia, a Finlândia, a França, a Irlanda, a Itália, a Lituânia, a Polónia e a Suécia.
As orientações da Comissão clarificaram, em particular, a não aplicabilidade do novo requisito aos benefícios contínuos proporcionados no contexto de programas de fidelização de clientes (enquanto as reduções de preços temporárias ad hoc adicionais para os membros desses programas estariam sujeitas ao artigo 6.º-A) e a reduções de preços efetivamente personalizadas que, pela sua natureza, não são «anunciadas» aos consumidores em geral.
A Comissão também deixou clara a sua posição de que, embora os vendedores possam continuar a indicar (sob reserva do respeito da DPCD) preços de referência adicionais (como o preço de venda normal fora dos períodos promocionais) para reforçar a mensagem promocional, devem abster-se de utilizar técnicas que dissimulem o preço anteriormente praticado, impedindo ou dificultando deste modo que os consumidores tenham em devida conta esse preço. Assim, quaisquer reduções em termos de percentagem (por exemplo, «30 % de desconto») ou montante específico (por exemplo, «50 EUR de desconto») que o vendedor possa optar por indicar como elemento principal do anúncio de redução de preço devem basear-se no preço «anteriormente praticado» obrigatório. No entanto, esta interpretação é contestada por muitas partes interessadas da indústria e é atualmente objeto de um pedido de decisão prejudicial apresentado ao TJUE por um tribunal alemão (processo C-330/23, Aldi Süd).
Desde a adoção das orientações da Comissão, os debates entre as partes interessadas sobre a execução do artigo 6.º-A da DIP, em especial no âmbito da CDC, abordaram, por exemplo, as promoções de preços com base num montante mínimo de compra. A Comissão explicou no documento de orientação que o artigo 6.º-A não se aplica às ofertas condicionais combinadas ou vinculadas, como «compre uma, leve duas» ou «30 % de desconto na compra de três». Essas ofertas condicionais continuam a estar sujeitas à DPCD. À luz do que precede, afigura-se justificado tratar de forma semelhante as promoções baseadas num montante mínimo de compra, desde que tenham o mesmo efeito que as promoções baseadas no volume, ou seja, aplicam-se na prática a compras de mais do que um único artigo oferecido pela loja. Tal como as outras técnicas promocionais alternativas, a promoção do montante mínimo não pode ser utilizada apenas para contornar a aplicação do artigo 6.º-A.
Outro aspeto pertinente é a não aplicabilidade do artigo 6.º-A a artigos individuais de bens que estão prestes a ficar fora de prazo de validade e que, por conseguinte, devem ser vendidos rapidamente numa situação em que o bem em questão não seja perecível pela sua natureza (por exemplo, massas alimentícias, conservas ou cosméticos que, em geral, têm prazos de validade longos). Esta questão é pertinente para o Estado-Membro que utiliza a opção normativa para isentar ou prever regras diferentes em matéria de reduções de preços para «bens suscetíveis de se deteriorarem ou de ficarem rapidamente fora de prazo de validade». Uma vez que o artigo 6.º-A da DIP não define este conceito, afigura-se justificado aplicar essa isenção também a artigos individuais de bens que, objetivamente, tenham de ser vendidos rapidamente, mesmo que o bem em questão não seja geralmente «perecível» por natureza. Na prática, tal significa que os vendedores devem poder fazer descontos em artigos específicos, por exemplo, cosméticos que estão prestes a ficar fora da validade, sem que essa redução afete futuras reduções gerais de preços dos bens em causa.
Outra questão importante para os Estados-Membros e as partes interessadas no contexto do artigo 6.º-A diz respeito à evolução do mercado no que respeita a outras formas de promoções sobre os preços, em especial as comparações de preços. Estas últimas estão fora do âmbito de aplicação do novo artigo 6.º-A e continuam sujeitas aos requisitos gerais de equidade da DPCD. De acordo com várias autoridades e associações de consumidores nacionais, a utilização de comparações de preços por parte dos vendedores, especialmente as comparações com o preço de venda a retalho recomendado pelo fabricante, aumentou após a execução das novas regras relativas às reduções de preços ao abrigo da DIP.
No âmbito da CDC, no que respeita ao cumprimento do artigo 6.º-A, foi levada a cabo uma ação de fiscalização conjunta sobre as reduções de preços em novembro de 2022. Durante a ação de fiscalização, 13 autoridades nacionais analisaram 16 000 produtos de 176 sítios Web, monitorizando-os durante um período de um mês para determinar se o preço «anteriormente praticado» indicado cumpria o novo requisito legal da DIP. A ação de fiscalização conjunta revelou que mais de metade dos produtos monitorizados apresentavam uma redução de preços. Desse número, 23 % dos anúncios de redução de preços violavam o artigo 6.º-A da DIP. Estas violações foram detetadas em, pelo menos, 43 % dos sítios Web analisados. De salientar que nem todos os Estados-Membros em causa tinham transposto e aplicado o novo artigo 6.º-A da DIP no momento da operação de fiscalização, apesar de terem de começar a aplicá-lo a partir de 28 de maio de 2022.
Para ajudar as autoridades nacionais nas suas investigações, a Comissão proporcionou-lhes uma ferramenta específica baseada na IA no contexto do projeto e-Lab da UE, que se destina a desenvolver e aplicar tecnologias digitais avançadas às investigações dos consumidores em linha em apoio da
rede de CDC
. A ferramenta permite às autoridades monitorizar o historial de preços dos produtos selecionados e determinar se o preço anteriormente praticado indicado no anúncio de desconto é efetivamente o preço mais baixo aplicado ao produto nos 30 dias anteriores ao anúncio de redução de preço.
Várias autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei lançaram ações de aplicação de medidas coercivas formais relativamente a violações relacionadas com as reduções de preços. Por exemplo, no outono de 2023, a Agência de Defesa do Consumidor da Suécia (Konsumentverket) monitorizou os preços de mais de 1 700 produtos em vários setores diferentes. A análise abrangeu cerca de 100 empresas, das quais a maioria comercializou produtos a preços reduzidos durante o período em questão. Revelou que 70 % das empresas examinadas que anunciavam reduções de preços violavam a legislação aplicável. Mais especificamente: 1) não indicavam o preço mais baixo nos últimos 30 dias; 2) indicavam um preço mais baixo incorreto; e 3) utilizavam um preço de referência diferente do preço mais baixo anteriormente praticado para calcular a dimensão da redução do preço. Outros exemplos incluem a Autoridade da Concorrência e de Defesa do Consumidor da Polónia (UOKiK), a Autoridade dos Consumidores e dos Mercados neerlandesa (ACM) e a Autoridade de Defesa do Consumidor e de Regulação Técnica da Estónia (TTJA), que comunicaram infrações significativas cometidas por comerciantes e anunciaram investigações formais. No que respeita a medidas coercivas de natureza privada, em maio de 2023, a associação francesa de consumidores UFC Que Choisir publicou um relatório sobre as práticas de comparação de preços de oito grandes vendedores no mercado francês e apresentou queixas sobre práticas comerciais desleais junto do Procureur de la République de Paris.
No que respeita às perceções dos consumidores sobre a fiabilidade das reduções de preços, os inquéritos sobre as condições de consumo de 2020 e 2022 incluíam uma pergunta sobre se os consumidores se tinham deparado com descontos de preços que pareciam demasiado grandes para serem reais ao procurar ou comprar em linha. A percentagem de consumidores que declararam ter encontrado o que lhes pareceram descontos de preços excessivamente grandes sempre, na maior parte das vezes ou, pelo menos, às vezes foi semelhante em ambos os inquéritos: 60 % em 2022 e 61 % em 2020.
Entre janeiro e outubro de 2023, no contexto do estudo de apoio, realizou-se um teste de conformidade de escala limitada a 95 sítios Web em 10 Estados-Membros, que analisou a forma como as reduções de preços e outras técnicas de promoção são apresentadas aos consumidores. Este exercício centrou-se na apresentação das vantagens em termos de preços e não envolveu o acompanhamento do preço de referência durante o período de 30 dias para determinar a validade do preço «anteriormente praticado».
Dos 475 produtos analisados, surgiram reduções de preços ou outras promoções relativas a 360 produtos (em 75 dos 95 sítios Web). A verificação revelou também que 27 sítios Web apresentavam ofertas conjuntas para 88 produtos. Por último, as reduções percentuais gerais ou as reduções percentuais associadas a um montante mínimo de compra eram relativamente comuns (49,5 % dos sítios Web analisados).
No que respeita à apresentação das reduções/promoções de preços para produtos específicos (251 produtos em 42 sítios Web), em cerca de 90 % dos casos, o preço de referência estava riscado para realçar o desconto. Em 75,6 % dos casos, a vantagem em termos de preço era apresentada através de uma percentagem. Muitas vezes, o preço de referência riscado e o desconto percentual ou absoluto eram utilizados em conjunto para destacar a promoção.
No que respeita à natureza da vantagem relativamente ao preço, na maioria dos casos (69,7 %), os investigadores não encontraram qualquer qualificação ou explicação do preço de referência (riscado) fornecido. Tal sugere que o vendedor oferecia uma redução do preço, o que significa que o preço de referência fornecido tinha de cumprir os requisitos do «preço anteriormente praticado» nos termos do artigo 6.º-A da DIP. As restantes promoções pareciam ser comparações de preços. A maior parte utilizava como referência o preço de venda a retalho recomendado (25,8 %) e as restantes referiam o conceito de «preço médio» (3,1 %) e preços noutros sítios Web (1,4 %).
Estes resultados sugerem que as reduções de preços foram o tipo predominante de promoção de preços; no entanto, há que ter em conta que a qualificação específica do preço de referência pode não ter sido apresentada de uma forma facilmente visível e percetível em todos os casos. Por exemplo, o relatório supramencionado da associação francesa de consumidores UFC Que Choisir, de maio de 2023, que analisou uma amostra de 6 586 ofertas com preços de referência riscados, concluiu que apenas 3,4 % dessas ofertas eram «reduções de preços» na aceção do artigo 6.º-A da DIP. Mais de 9 em cada 10 propostas eram comparações de preços, que utilizavam muitas formas diferentes de apresentar a referência, como: «preço de venda a retalho recomendado», «preço original», «preço antigo», «preço médio no mercado», «preço médio nos sítios Web concorrentes», «preço indicado pelo vendedor», etc.
O inquérito aos consumidores no contexto do estudo de apoio recolheu perceções dos consumidores quanto aos tipos de promoções de preços e a sua prevalência. Entre 52 % e 66 % dos inquiridos indicaram que tinham encontrado uma promoção de preços pelo menos «às vezes» nos últimos 12 meses: redução do preço na compra de mais do que um artigo (66 %); redução em caso de compra superior a um determinado montante (60 %); redução do preço (56 %); preço reduzido para membros do «programa de fidelização» (53 %); comparações com o preço recomendado (52 %).
No contexto da consulta das partes interessadas, as associações de profissionais e as empresas da UE, embora apoiem a ideia de melhorar a informação dos consumidores e a transparência das promoções de preços, criticaram a execução divergente da nova regra nos Estados-Membros, como o seu alargamento para além da venda de bens em alguns Estados-Membros e a diferente aplicação da opção regulamentar relativa aos bens não duradouros, que também está a causar dificuldades no comércio transfronteiriço. Solicitam, além disso, uma aplicação mais rigorosa das regras para garantir condições de concorrência equitativas, nomeadamente no que respeita aos comerciantes de países terceiros que visam o mercado da UE. A este respeito, a indústria apela a uma forte cooperação entre as autoridades de defesa do consumidor em toda a UE no âmbito da rede de CDC.
Para muitas partes interessadas do setor empresarial, é importante manter a atual flexibilidade em matéria de comparações de preços. As comparações de preços são especialmente importantes para as redes de franquia, nas quais o franqueador anuncia promoções de preços com base no seu preço de venda recomendado, e no setor outlet da moda. As partes interessadas do setor empresarial consideram que a atual abordagem de avaliação casuística das comparações de preços ao abrigo da DPCD deve ser mantida, nomeadamente no que respeita à utilização do preço de venda a retalho recomendado como referência e das técnicas de marketing de reduções percentuais, reduções de valor absoluto e preços de referência riscados. Na sua opinião, os comerciantes que utilizam comparações de preços podem assegurar a transparência necessária, informando adequadamente os consumidores; os eventuais problemas podem ser resolvidos, alargando as orientações sobre a DPCD em matéria de comparações de preços, a fim de especificar os critérios para comparações justas (assegurando que o preço de referência é real, eficaz e representativo). Muitas partes interessadas do setor empresarial opor-se-iam a quaisquer outras regras formais em matéria de comparações de preços, apelando simultaneamente para que as autoridades nacionais dos vários Estados-Membros evitem abordagens diferentes em matéria de comparações de preços quando aplicam as regras gerais da DPCD a casos individuais no âmbito da abordagem casuística.
Em conclusão, a execução da nova regra da DIP suscitou questões importantes sobre a sua interpretação, especialmente tendo em conta a grande variedade de técnicas de promoção dos preços utilizadas pelos vendedores. Algumas foram clarificadas no presente relatório (para além das orientações já fornecidas na comunicação da Comissão de 2021), ao passo que a importante questão relativa à interação entre o preço «anteriormente praticado» regulamentado e outros preços de referência nas reduções de preços será objeto de um futuro acórdão do TJUE no processo C-330/23, Aldi Süd.
A execução do artigo 6.º-A da DIP reflete algumas divergências entre os Estados-Membros no que respeita ao seu âmbito de aplicação e às categorias de bens sujeitos a opções normativas. Em especial, a execução diferente da opção normativa relativa aos «bens não duradouros» suscita preocupações quanto à possível falta de condições de concorrência equitativas e de segurança jurídica para os consumidores e os comerciantes. É necessário explorar uma solução regulamentar alternativa para abordar estas categorias de bens de forma mais harmonizada em todos os Estados-Membros.
Vários Estados-Membros não só emitiram orientações formais para os seus comerciantes, complementando a comunicação da Comissão, como também procederam à monitorização do mercado e deram início à aplicação formal, nomeadamente através da cooperação no âmbito da CDC e da utilização das ferramentas digitais que esta proporciona. A aplicação continuada e rigorosa da legislação continuará a desempenhar um papel essencial na execução do artigo 6.º-A da DIP. Muitos representantes dos comerciantes apelam também para uma execução mais uniforme e uma aplicação mais rigorosa das regras, a fim de garantir condições de concorrência equitativas.
Muitos representantes dos consumidores e Estados-Membros salientam a necessidade de fazer face ao risco de gerar confusão nos consumidores entre as reduções de preços «reguladas» e outras formas de vantagens em matéria de preços que só estão sujeitas a uma avaliação casuística ao abrigo da DPCD. Estas formas alternativas parecem ser mais amplamente utilizadas desde a entrada em vigor das regras da DIP em matéria de reduções de preços, em especial as comparações de preços que utilizam como referência o preço de venda a retalho recomendado. Em contrapartida, os representantes dos comerciantes gostariam que as comparações de preços fossem objeto de orientações adicionais sobre os seus princípios no contexto da DPCD. Na sua opinião, a escolha flexível das técnicas de comparação de preços deve ser mantida com uma aplicação casuística da DPCD. É necessária mais investigação para avaliar se as atuais práticas comerciais no que respeita ao marketing das comparações de preços causam confusão e induzem os consumidores em erro quanto à natureza real da promoção de preços e à vantagem daí decorrente.
8.Marketing de «dualidade de qualidade»
A expressão «dualidade de qualidade» é correntemente utilizada para referir práticas de comercialização de bens em diferentes Estados-Membros como sendo idênticos, apesar de terem uma composição ou características significativamente diferentes. Estas diferenças não estão relacionadas com a «qualidade» dos bens enquanto tal, mas com as diferenças na sua composição ou características. Por conseguinte, embora de uso corrente, a expressão «dualidade de qualidade» não significa necessariamente uma qualidade inferior dos bens. Reconhecendo a importância da questão da «dualidade de qualidade», levantada no Conselho Europeu, no Parlamento Europeu e por alguns Estados-Membros e partes interessadas, a Comissão propôs reforçar a defesa dos consumidores nestes casos através de uma alteração específica da DPCD.
O novo artigo 6.º, n.º 2, alínea c), da DPCD habilita especificamente as autoridades competentes a fazer cessar e proibir práticas de «dualidade de qualidade», sob reserva de uma avaliação casuística. Com base na avaliação das medidas de transposição efetuada pela Comissão, de um modo geral, os Estados-Membros transpuseram corretamente a disposição relativa à «dualidade de qualidade» para o seu direito nacional. Está a ser debatido um possível problema de transposição apenas com um Estado-Membro.
O artigo 6.º da DPCD visa assegurar a transparência, para que os consumidores não sejam induzidos em erro por produtos apresentados como sendo idênticos na UE quando não o são. Aplica-se quando essa prática de marketing é suscetível de induzir os consumidores a tomar decisões comerciais que não tomariam se tivessem conhecimento da diferença na composição e nas características do bem. A legislação da UE em matéria de defesa dos consumidores não trata da composição e das receitas dos produtos. Por conseguinte, esta alteração da DPCD não visa nem exige especificamente a harmonização das receitas dos produtos na UE.
A Comissão clarificou a aplicação do artigo 6.º, n.º 2, alínea c), da DPCD numa secção específica das orientações sobre a DPCD do final de 2021, que explicam que, em consonância com o âmbito geral alargado da DPCD, a noção de «marketing» inclui a apresentação dos bens na sua embalagem, a publicidade conexa e a venda dos bens aos consumidores. A disposição aplica-se a todos os profissionais envolvidos no fornecimento dos bens aos consumidores, embora o principal grupo-alvo sejam claramente os fabricantes que decidem sobre a composição, a conceção e a apresentação dos bens comercializados em diferentes Estados-Membros.
As orientações sobre a DPCD também explicam conceitos importantes, como «ser idêntico» e a «importância» da diferença na composição ou nas características. Em especial, explicam que a «importância» está relacionada com a perceção de um consumidor médio e constitui, portanto, um elemento inerente à avaliação casuística geral do impacto do marketing na decisão comercial do consumidor médio ao escolher entre bens. Explicam também que a exceção para as diferenças justificadas por «fatores legítimos e objetivos», como a disponibilidade geográfica ou o caráter sazonal das matérias-primas ou as políticas voluntárias de reformulação nutricional dos profissionais que, por motivos técnicos ou económicos, não podem ser aplicadas simultaneamente em todos os mercados, tem de ser interpretada de forma restrita. Além disso, se os profissionais alegarem que as diferenças nos bens comercializados como sendo idênticos se justificam por fatores legítimos e objetivos, devem informar os consumidores desse facto através de formas alternativas, por exemplo, na publicidade conexa, mediante informações nas lojas de retalho ou através de meios em linha de acesso fácil.
A Comissão tem vindo a acompanhar ativamente a questão da «dualidade de qualidade» nos Estados-Membros e continuará a fazê-lo. Realizou também vários estudos sobre esta matéria através do seu Centro Comum de Investigação.
Em julho de 2023, a Comissão publicou os resultados de um segundo estudo sobre a comparação a nível da UE das características e da apresentação de produtos alimentares de marca. Este estudo abrangeu 26 Estados-Membros (em comparação com os 19 abrangidos por um primeiro estudo publicado em 2019). Concluiu que 6 % dos produtos alimentares abrangidos pelo estudo tinham uma composição diferente, mas a apresentação da frente da embalagem idêntica, enquanto 23 % dos produtos diferiam em termos de composição e indicavam, em certa medida, as diferenças através de variações na conceção gráfica da frente da embalagem.
Em comparação com o primeiro estudo de 2019, tal representou uma diminuição de 7 pontos percentuais de bens que têm a apresentação da frente da embalagem semelhante, mas uma composição ou características diferentes. O resultado é animador, especialmente porque a recolha de amostras para a análise teve lugar antes da entrada em aplicação da nova disposição da DPCD. Tal como no primeiro estudo de 2019, em 2023 a Comissão não encontrou provas de qualquer padrão geográfico consistente na composição e nas características dos bens. No entanto, este último estudo também mostrou que ainda existem casos de produtos com composição diferente que são comercializados como sendo idênticos. A Comissão continuará a acompanhar a questão e o impacto da aplicação da nova disposição da DPCD nos Estados-Membros.
Também em 2023, a Comissão publicou vários outros documentos analíticos importantes.
Em primeiro lugar, o estudo sobre os produtos alimentares integrou um inquérito aos fabricantes dos produtos em questão. A maioria (60 %) das empresas que se verificou comercializarem bens com «dualidade de qualidade» indicou ter tomado medidas ou planear fazê-lo, nomeadamente alterando a apresentação do produto (ou seja, a a apresentação da frente da embalagem), harmonizando as receitas, aplicando outras medidas (por exemplo, informando os consumidores) ou combinando estas medidas. A legislação da UE em matéria de defesa dos consumidores foi a razão mais frequentemente referida pelas empresas para tomar medidas (47 % dos inquiridos que responderam). Razões como uma mudança de estratégia empresarial (20 %), a intervenção das autoridades públicas nacionais (7 %) e a publicidade negativa (7 %) também foram apresentadas como motivos para resolver a questão. As empresas que não tencionavam tomar quaisquer medidas (40 % dos inquiridos) referiram que a ausência de medidas se devia a diferenças nas regulamentações nacionais (80 %). Algumas invocaram fatores relacionados com a produção (40 %), como os ligados à disponibilidade de matérias-primas na UE, ou com o equipamento técnico utilizado nas fábricas. Foram também referidas as preferências dos consumidores, como perfis gustativos específicos (30 %), ou diferenças nas normas voluntárias entre os Estados-Membros (20 %). Por último, as «outras razões» incluíam regras de arredondamento diferentes para indicar a percentagem de ingredientes ou produtos comparados não provenientes do mesmo período de produção.
Em segundo lugar, concluiu-se um ensaio empírico das perceções dos consumidores relativamente às diferenças nas embalagens e nas versões de produtos alimentares de marca aparentemente idênticos. O estudo concluiu que os elementos de conceção da frente da embalagem têm um impacto na perceção das diferenças entre embalagens e produtos e nas escolhas dos consumidores e que, dada a complexidade dos elementos de conceção, seria necessária uma avaliação casuística do seu impacto real na perceção e nas escolhas dos consumidores.
Por último, a Comissão publicou também um estudo sobre o setor dos cuidados pessoais e domésticos, após adaptar a metodologia existente utilizada anteriormente para os produtos alimentares. Esse estudo constatou que 8 % dos produtos diferiam em termos de composição, não havendo, contudo, diferenças na frente da embalagem em, pelo menos, um dos 20 Estados-Membros analisados. Havia 25 % dos produtos que diferiam em termos de composição e indicavam, em certa medida, essas diferenças através de variações na conceção gráfica da frente da embalagem. Os proprietários das marcas alegaram que essas diferenças se deviam ao facto de os lançamentos dos produtos terem ocorrido em momentos diferentes nos ciclos de reformulação dos produtos. Mais uma vez, não houve qualquer indicação de uma diferenciação consistente dos produtos relacionada com determinadas regiões geográficas dos Estados-Membros participantes.
Os resultados preliminares destes diferentes estudos foram apresentados durante um evento das partes interessadas, em outubro de 2022, e os resultados finais perante a Comissão IMCO do Parlamento Europeu, em setembro de 2023.
Um estudo anterior da Comissão, realizado em 2020, concluiu que informar os consumidores sobre a diferenciação dos produtos alimentares em vários Estados-Membros através da inclusão da menção «fabricado para» teve impactos diferentes nas decisões de compra dos consumidores, ou seja, em alguns casos levou à escolha das versões «nacionais» e noutros das versões «estrangeiras». O comportamento do consumidor, quando confrontado com a diferenciação dos bens, também dependeria da dimensão da diferença. Havia uma maior probabilidade de a decisão comercial dos consumidores médios ser afetada se soubessem da existência de uma diferença significativa num ou vários ingredientes essenciais ou no seu conteúdo. Além disso, maiores diferenças na composição são mais suscetíveis de conduzir a diferentes características sensoriais, tornando a diferença mais óbvia.
Em abril de 2023, para apoiar as autoridades nacionais nas suas atividades relativas à «dualidade de qualidade», a Comissão organizou, em conjunto com a autoridade romena de defesa do consumidor, um seminário específico no âmbito da CDC. O seminário permitiu intercâmbios úteis entre os representantes dos Estados-Membros e a indústria. Embora, de um modo geral, as autoridades nacionais tenham considerado a questão importante, também salientaram que lhe atribuem diferentes níveis de prioridade, uma vez que o marketing de «dualidade de qualidade» não afeta os consumidores da mesma forma em todos os Estados-Membros. A maioria das autoridades dos Estados-Membros sublinhou a importância da avaliação casuística e salientou que, atualmente, o problema da «dualidade de qualidade» é menos preocupante do que antes da adoção da Diretiva Modernização, o que também acontece devido aos diálogos informais construtivos com os fabricantes no contexto da execução da nova regra da DPCD.
O presente relatório baseou-se ainda numa série de contactos com as partes interessadas centrados na «dualidade de qualidade». As entrevistas com ministérios nacionais centradas na aplicação da Diretiva Modernização abrangeram todos os Estados-Membros. Além disso, através do programa de entrevistas mais vasto realizado para o balanço de qualidade, foram obtidas reações sobre a «dualidade de qualidade» das partes interessadas em causa, incluindo associações de profissionais da UE. Alguns ministérios nacionais comunicaram que consideravam que a questão da «dualidade de qualidade» já tinha sido abordada através da Diretiva Modernização. Outros consideraram que se tinha tornado uma questão de importância comparativamente baixa face a outras práticas problemáticas. No entanto, houve também Estados-Membros que manifestaram preocupações persistentes quanto à «dualidade de qualidade».
De acordo com as entrevistas e as observações por escrito recebidas dos ministérios nacionais, apenas dois Estados-Membros realizaram investigações formais sobre casos de dualidade de qualidade. As autoridades checas deram seguimento a um processo de «dualidade de qualidade» relativo ao fabricante de um produto alimentar que apresentava diferenças de composição em comparação com produtos equivalentes comercializados noutros Estados-Membros. As autoridades romenas investigaram um caso relativo a uma empresa de refrigerantes com o fundamento de que os seus bens da mesma marca tinham uma composição distinta em diferentes Estados-Membros. As conclusões dessas investigações não foram anunciadas publicamente pelas autoridades em causa.
Além disso, em 2024, a Eslováquia realizou estudos de mercado, tendo detetado casos de bens com diferenças de composição, especialmente em refrigerantes, produtos de origem animal e condimentos. A Eslováquia apresentou estas conclusões no Conselho (Agricultura e Pescas) de 27 de maio de 2024, instando a Comissão a continuar a prestar a devida atenção a este problema e todos os Estados-Membros a aplicarem a legislação pertinente da UE.
O inquérito às partes interessadas também incluiu perguntas específicas sobre a perceção dos prejuízos causados aos consumidores devido a práticas de «dualidade de qualidade», as medidas necessárias para resolver a questão e os tipos de potenciais medidas legislativas.
No que respeita aos prejuízos causados aos consumidores, 26 inquiridos consideraram que os consumidores sofrem prejuízos «significativos» ou «moderados» devido a práticas de «dualidade de qualidade». Entre 26 inquiridos, nove ministérios e autoridades responsáveis pela aplicação da lei de seis Estados-Membros e sete associações de consumidores (associações nacionais de seis Estados-Membros e uma associação a nível da UE) responderam que havia prejuízos para os consumidores. Nenhuma associação empresarial manifestou essa opinião.
Relativamente às medidas necessárias para combater as práticas de «dualidade de qualidade» por parte dos profissionais, entre as autoridades dos Estados-Membros (ministérios e autoridades responsáveis pela aplicação da lei), representantes de três Estados-Membros responderam que as atuais regras da DPCD, com base numa avaliação casuística e tendo em conta o impacto nos consumidores, são adequadas e devem ser aplicadas, enquanto os representantes dos outros três Estados-Membros responderam que são necessárias regras mais rigorosas. Entre as associações de consumidores, uma considerou que as regras são adequadas, mas que devem ser mais bem aplicadas, ao passo que as associações que representam cinco Estados-Membros consideraram que eram necessárias regras mais rigorosas. A única associação a nível da UE que respondeu não deu resposta a esta pergunta.
Por último, os inquiridos que salientaram a necessidade de «regras mais rigorosas» foram convidados a indicar as opções para reforçar o quadro jurídico, podendo selecionar mais do que uma das opções pré-formuladas e propor alternativas.
Entre os quatro inquiridos que representavam ministérios e autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei (representando, no total, três Estados-Membros), três (representando dois Estados-Membros) manifestaram-se a favor da proibição de tais práticas de marketing em todas as circunstâncias e em todos os Estados-Membros afetados, independentemente do seu impacto nos consumidores individuais de cada país. Os quatro inquiridos dos três Estados-Membros (também) apoiaram as outras duas opções: restringir/especificar o âmbito dos fatores «legítimos e objetivos» que podem justificar tais práticas de marketing, e adotar regras adicionais sobre a informação dos consumidores quando as versões nacionais dos produtos são diferenciadas devido a fatores «legítimos e objetivos».
Das cinco associações de consumidores (representando cinco Estados-Membros), uma manifestou-se a favor da proibição de práticas de marketing de «dualidade de qualidade» em todas as circunstâncias. Três privilegiaram as outras opções: restringir/especificar o âmbito dos fatores «legítimos e objetivos» e introduzir regras adicionais para informar os consumidores. Outra mostrou abertura a todas as opções.
Em conclusão, a experiência em matéria de aplicação da legislação e os inquéritos realizados para efeitos do presente relatório mostram diferentes perceções da importância dos problemas relacionados com a «dualidade de qualidade». Para alguns Estados-Membros, a questão continua a ser preocupante. No que respeita à alteração pertinente introduzida pela Diretiva Modernização, de um modo geral, os Estados-Membros parecem satisfeitos com as possibilidades atualmente disponíveis ao abrigo da DPCD de agir relativamente a práticas de marketing de «dualidade de qualidade» sempre que tal se justifique para proteger os seus consumidores, ou seja, numa base casuística. Várias autoridades nacionais valorizaram a sua cooperação informal com a indústria na resolução dos problemas identificados.
O último inquérito da Comissão à escala da UE sobre os produtos alimentares demonstra que a indústria tem vindo a tomar medidas no sentido de alterar a apresentação das diferentes versões nacionais, para evitar induzir os consumidores em erro, ou de harmonizar as suas receitas e composição entre os Estados-Membros.
À luz do que precede, e com a nova legislação em vigor há apenas dois anos, afigura-se necessário centrar a atenção na execução e aplicação das novas regras.
Tendo em conta as conclusões do Conselho Europeu de 17 e 18 de abril de 2024, a Comissão continuará a apoiar os esforços dos Estados-Membros para resolver os casos de «dualidade de qualidade» que suscitam preocupação, apoiando a cooperação através da rede de CDC, promovendo a execução e a aplicação efetivas da nova legislação e continuando a acompanhar a situação nos mercados.
9.Vendas ao domicílio não solicitadas, excursões comerciais e eventos de vendas
A Diretiva Modernização aditou à DPCD (artigo 3.º, n.º 5) uma opção normativa que permite aos Estados-Membros adotar regras proporcionadas e não discriminatórias para proteger os legítimos interesses dos consumidores quanto a práticas comerciais ou de marketing agressivas ou enganosas, levadas a cabo no quadro de visitas não solicitadas a casa de um consumidor («vendas ao domicílio não solicitadas») ou de excursões organizadas por um profissional tendo por objetivo ou efeito promover ou vender produtos aos consumidores («excursões comerciais»), sempre que essas regras se justifiquem por motivos de defesa do consumidor.
O considerando 55 da Diretiva Modernização explica que essas disposições nacionais não deverão proibir esse tipo de canais de vendas. Dá também exemplos de possíveis disposições nacionais, por exemplo, proibir as visitas não solicitadas se o consumidor tiver expressamente indicado que as mesmas não são aceitáveis ou definir o período do dia em que essas visitas não são autorizadas. De salientar que estas novas opções normativas não afetam as medidas dos Estados-Membros baseadas noutros motivos que não a defesa do consumidor que não são abrangidas pelo âmbito de aplicação harmonizado da DPCD (ver, por exemplo, o considerando 7 da DPCD no que respeita a medidas relacionadas com o bom gosto e a decência).
Além disso, a DDC foi alterada, permitindo aos Estados-Membros adotar disposições nacionais que prevejam regras mais favoráveis relativas ao direito de retratação do consumidor. Assim, os Estados-Membros podem aumentar o prazo para o exercício do direito de retratação, no caso de visitas não solicitadas ou excursões comerciais, de 14 para 30 dias (artigo 9.º, n.º 1-A, da DDC) e prever derrogações a quatro das exceções específicas ao direito de retratação (artigo 16.º, primeiro parágrafo, alíneas a), b), c) e e), da DDC).
Estas opções normativas não se aplicam a outra categoria de vendas fora do estabelecimento comercial: eventos de vendas (demonstrações de produtos) organizados em locais que não os estabelecimentos comerciais do profissional, como residências privadas, cafés ou restaurantes. Estas técnicas de venda continuam sujeitas às regras gerais da DPCD e da DDC. A cláusula de revisão da Diretiva Modernização exige especificamente que a Comissão avalie se as regras em vigor asseguram um nível adequado de defesa dos consumidores no contexto de tais eventos de vendas.
Vários Estados-Membros fizeram uso das opções normativas para regular aspetos específicos das visitas não solicitadas e/ou excursões comerciais ao abrigo da DPCD (Alemanha, Áustria, Bélgica, Chéquia, Croácia, Eslováquia, Espanha e França). Por exemplo, a legislação croata permite a realização de visitas não solicitadas a casa do consumidor nos dias úteis, entre as 8h00 e as 20h00. Na Alemanha, quando um contrato é celebrado no contexto de uma visita não solicitada a casa de um consumidor, é proibido exigir que este pague o bem ou serviço antes do final do dia em que o contrato foi celebrado (o que não se aplica se o pagamento for inferior a 50 EUR). A França proíbe visitas não solicitadas de um profissional a casa de um consumidor para efeitos de venda de bens ou prestação de serviços, sempre que o consumidor tenha indicado clara e inequivocamente que não deseja receber tais visitas.
Vários Estados-Membros utilizam as opções normativas da DDC no que respeita ao direito de retratação. Por exemplo, Chipre, Eslováquia, Grécia, Itália, Malta, Polónia e Roménia utilizam ambas as opções, ou seja, aumentaram o prazo do direito de retratação para 30 dias e renunciaram à aplicação de todas ou algumas das exceções ao direito de retratação. Além disso, a Chéquia, a Espanha, a Irlanda e Portugal utilizaram apenas a opção de aumentar o prazo do direito de retratação para 30 dias, enquanto a Áustria, a Croácia e a Finlândia renunciaram à aplicação de todas ou de algumas das quatro exceções ao direito de retratação.
As partes interessadas que representam o setor da venda direta (que abrange as vendas ao domicílio e as vendas em eventos) não comunicaram à Comissão preocupações específicas relacionadas com a utilização destas opções normativas pelos Estados-Membros. Também não há indícios de um impacto significativo no comércio transfronteiriço. Segundo os representantes da indústria, as vendas ao domicílio não se caracterizam por uma forte dimensão transfronteiriça. Além disso, muitos vendedores diretos estão a mudar para métodos de venda em linha, mantendo simultaneamente a característica da interação pessoal com os seus clientes.
De acordo com o inquérito Ipsos de 2023 sobre os vendedores diretos, os métodos mais comuns de venda aos clientes existentes são as redes pessoais (54 %), as vendas diretas em reuniões/demonstrações do produto (39 %) e as redes sociais (39 %), enquanto os métodos mais comuns de venda a potenciais novos clientes são as referências/o passa-palavra (64 %), as redes pessoais (51 %) e as vendas diretas em reuniões/demonstrações do produto (43 %).
Os eventos de vendas organizados (ou seja, a demonstração do produto numa residência privada, hotel ou restaurante que envolva a venda do produto) estão sujeitos às disposições gerais da DPCD. As práticas agressivas e enganosas no quadro de tais eventos de vendas podem ser sancionadas pelas autoridades nacionais com base numa avaliação casuística nos termos dos artigos 5.º a 9.º da DPCD. Além disso, o anexo I da DPCD proíbe práticas em que o profissional cria a impressão de que não está a agir para fins relacionados com a sua atividade profissional, bem como práticas que criam a impressão de que o consumidor não poderá deixar o estabelecimento sem que antes tenha sido celebrado um contrato. Ainda, a DPCD não prejudica regimes de autorização nem medidas nacionais adotadas para outros fins que não a defesa do consumidor (como razões culturais, decência, etc.) e que, por conseguinte, estão fora do seu âmbito de aplicação.
O estudo de apoio ao presente relatório não identificou qualquer processo ou ação de aplicação a nível nacional especificamente sobre eventos de vendas.
No inquérito aos consumidores realizado no contexto do estudo de apoio, apenas uma minoria dos consumidores declarou ter participado, nos últimos 12 meses, numa demonstração de um produto numa residência privada, num hotel ou num restaurante que envolvia a venda do produto (16 %, variando entre 28 % na Roménia e 11 % em Portugal). A mesma percentagem de inquiridos (16 %) declarou ter recebido uma visita de vendas ao domicílio não solicitada (variando entre 23 % na Suécia e em França e 6 % na Hungria). Um número ainda mais reduzido participou em excursões comerciais: 11 % (variando entre 14 % em França e 8 % em Portugal e na Hungria).
No entanto, entre os que se tinham deparado com estas técnicas de venda, a maioria (67 % nos casos de vendas ao domicílio e eventos de vendas e 70 % nos casos de excursões comerciais) indicou que se sentiram pressionados a comprar. A percentagem mais elevada de consumidores que se sentiram pressionados durante visitas não solicitadas registou-se na Estónia (81 %) e a mais baixa em França (50 %). No que respeita às excursões comerciais, a percentagem mais elevada de consumidores que se sentiram pressionados registou-se na Polónia (78 %) e a mais baixa em Itália (63 %). No caso das demonstrações de produtos em residências privadas, hotéis ou restaurantes, a percentagem mais elevada de consumidores que se sentiram pressionados registou-se em Portugal (79 %) e a mais baixa em França (59 %).
O inquérito às partes interessadas incluiu perguntas sobre a perceção dos prejuízos causados aos consumidores devido a potenciais práticas desleais, como a venda sob pressão e as informações enganosas utilizadas no contexto dessas técnicas de venda, e as medidas necessárias.
Relativamente às vendas ao domicílio, houve 128 respostas individuais, das quais 87 expressaram uma opinião e 41 responderam «não sei». De um total de 23 inquiridos dos ministérios e autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei (representando 17 Estados-Membros), 17 inquiridos (representando 12 Estados-Membros) consideraram que as vendas ao domicílio causam prejuízos «significativos» ou «moderados» aos consumidores. De um total de 13 inquiridos de associações de consumidores (associações nacionais de oito Estados-Membros e duas associações a nível da UE), 12 inquiridos consideraram que as vendas ao domicílio causam níveis de prejuízos «significativos» ou «moderados» aos consumidores. Entre os inquiridos de associações empresariais (28), nenhum considerou que as vendas ao domicílio causam níveis de prejuízos «significativos» ou «moderados» aos consumidores.
Quanto às excursões comerciais, 76 inquiridos expressaram uma opinião, enquanto 52 responderam «não sei»). De um total de 25 inquiridos dos ministérios e autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei (representando 16 Estados-Membros), 12 inquiridos (representando 10 Estados-Membros) consideraram que as excursões comerciais causam prejuízos «significativos» ou «moderados» aos consumidores. De um total de 13 inquiridos de associações de consumidores (associações nacionais de oito Estados-Membros e duas associações a nível da UE), 11 inquiridos consideraram que as vendas ao domicílio causam níveis de prejuízos «significativos» ou «moderados» aos consumidores. Entre os inquiridos de 27 associações empresariais, nenhum considerou que as vendas ao domicílio causam níveis de prejuízos «significativos» ou «moderados» aos consumidores.
Por último, no que respeita aos eventos de vendas organizados, de um total de 127 inquiridos, 78 expressaram uma opinião e 49 responderam «não sei». De um total de 19 inquiridos dos ministérios e autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei (representando 13 Estados-Membros), 14 inquiridos (representando 11 Estados-Membros) consideraram que os eventos de vendas causam prejuízos «significativos» ou «moderados» aos consumidores. De um total de 14 inquiridos de associações de consumidores (associações nacionais de oito Estados-Membros e três associações a nível da UE), 11 consideraram que os eventos de vendas causam prejuízos «significativos» ou «moderados». Entre os 27 inquiridos de associações empresariais, nenhum respondeu que estes eventos causam prejuízos significativos ou moderados.
Os inquiridos que consideraram que estas técnicas de venda causam prejuízos significativos ou moderados foram convidados a pronunciar-se sobre as medidas que poderiam ser tomadas para proteger melhor os consumidores. Houve 40 respostas relativas às vendas ao domicílio, 31 às excursões comerciais e 34 aos eventos de vendas organizados.
No que respeita às vendas ao domicílio, entre os 16 inquiridos dos ministérios e autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei (representando 10 Estados-Membros), oito inquiridos (representando seis Estados-Membros) apoiaram uma melhor aplicação das regras em vigor, dois inquiridos (representando um único Estado-Membro) apoiaram regras nacionais mais rigorosas e adaptadas e quatro inquiridos (representando três Estados-Membros) apoiaram regras mais rigorosas a nível da UE.
Relativamente às excursões comerciais, entre os 16 inquiridos dos ministérios e autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei (representando 10 Estados-Membros), sete inquiridos (representando três Estados-Membros) apoiaram uma melhor aplicação das regras em vigor, um inquirido apoiou regras nacionais mais rigorosas e adaptadas e dois inquiridos (representando dois Estados-Membros) apoiaram regras mais rigorosas a nível da UE.
Quanto aos eventos de vendas organizados, entre os 16 inquiridos dos ministérios e autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei (representando 10 Estados-Membros), quatro inquiridos (representando quatro Estados-Membros) apoiaram uma melhor aplicação das regras em vigor, dois inquiridos (representando dois Estados-Membros) apoiaram regras nacionais mais rigorosas e adaptadas e quatro inquiridos (representando quatro Estados-Membros) apoiaram regras mais rigorosas a nível da UE.
A nível nacional, a Autoridade dos Consumidores e dos Mercados neerlandesa (ACM) realizou um estudo sobre as experiências dos consumidores em 2022, que concluiu que através das vendas ao domicílio, se vendem principalmente contratos de energia, mas também bilhetes de lotaria, planos de telefone e de banda larga, bem como donativos a instituições de beneficência. O estudo observou que muitos consumidores enfrentam pressões no sentido de celebrarem contratos no contexto da venda ao domicílio.
Em conclusão, com base nos dados recolhidos relativamente a 10 Estados-Membros, apenas uma minoria relativa de consumidores está exposta às três técnicas de venda em questão. No entanto, entre os consumidores que se depararam com essas técnicas na prática, uma grande percentagem afirma ter sido alvo de vendas sob pressão, o que suscita preocupações quanto ao caráter leal das práticas comerciais utilizadas pelos respetivos vendedores. Vários Estados-Membros implementaram as novas opções normativas ao abrigo da DPCD e da DDC para impor regras e restrições adicionais específicas e/ou para reforçar o direito de retratação do consumidor nas vendas ao domicílio e nas excursões comerciais. Contudo, ainda é demasiado cedo para tirar conclusões sobre o impacto destas medidas.
No que respeita aos eventos de vendas (demonstrações de produtos), a investigação para o presente relatório não revelou um forte apelo por parte dos Estados-Membros ou das partes interessadas no sentido de uma ação de natureza legislativa. A situação dos eventos de vendas também não figurava como uma questão importante nas posições escritas recebidas (nas consultas públicas ou específicas). A DPCD permite aos Estados-Membros limitar as práticas desleais no contexto de eventos de vendas, aplicando as disposições gerais contra as práticas enganosas e agressivas, bem como as proibições específicas pertinentes constantes da lista negra.
10. Transparência nas pesquisas em linha
A Diretiva Modernização aditou à DPCD (artigo 7.º, n.º 4-A) o requisito de informar os consumidores sobre os principais parâmetros que determinam a classificação dos resultados das pesquisas em linha no ambiente entre empresas e consumidores. Deste modo, complementou-se a obrigação paralela introduzida pelo Regulamento Plataformas-Empresas no ambiente entre empresas. Nos termos da DPCD, esses requisitos aplicam-se aos mercados em linha e às ferramentas de comparação que permitem aos consumidores pesquisar produtos oferecidos por terceiros (ou seja, por outros profissionais, mas também por consumidores que oferecem bens e serviços em plataformas que servem de intermediárias nas vendas entre consumidores. Um requisito semelhante é também incluído na DDC (artigo 6.º-A), que se aplica apenas aos mercados em linha. Além disso, foi aditada ao anexo I da DPCD (ponto 11-A) uma proibição específica de publicidade e promoção não divulgada de produtos nos resultados das pesquisas.
Além disso, no caso dos sistemas de recomendação, o RSD exige uma maior transparência nos termos e condições sobre os principais parâmetros utilizados, bem como informações e funcionalidades relativas às opções que permitem aos consumidores alterar ou influenciar esses parâmetros. O RSD introduz também a obrigação de as plataformas em linha apresentarem uma exposição de motivos clara e específica a todos os destinatários do serviço afetados relativamente a quaisquer restrições à visibilidade de elementos específicos de informação fornecidos pelo destinatário do serviço, nomeadamente a supressão de conteúdos, a desativação do acesso a conteúdos ou a despromoção de conteúdos. No caso das plataformas em linha de muito grande dimensão e dos motores de pesquisa em linha de muito grande dimensão, o RSD determina que esteja disponível, pelo menos, uma opção de sistema de recomendação não personalizada.
No que respeita às perceções dos consumidores sobre a transparência da classificação em linha, a percentagem de consumidores que indicaram que não compreenderam o método de classificação dos resultados das pesquisas pelo menos «às vezes» foi de 52 % no PACC de 2023 (em comparação com 54 % no PACC de 2021). No inquérito aos consumidores realizado para o estudo de apoio, para 21 % dos consumidores, ao analisarem os resultados das pesquisas, («com frequência» ou «na maior parte das vezes») não foi fácil encontrar informações sobre os parâmetros utilizados para classificar esses resultados, enquanto mais 27 % dos consumidores declararam que «às vezes» consideraram difícil aceder a essas informações. Relativamente à publicidade paga ou à colocação nos resultados de pesquisa, o PACC de 2023 constatou que 75 % dos consumidores se aperceberam de publicidade oculta colocada nos resultados de pesquisa pelo menos «às vezes» (em comparação com 78 % no PACC de 2021).
No contexto do estudo de apoio, realizou-se um teste de conformidade para avaliar a informação prestada aos consumidores sobre os parâmetros de classificação dos resultados das pesquisas e a transparência das colocações/anúncios pagos em 85 sítios Web e aplicações móveis em 10 Estados-Membros.
Os resultados mostram que os consumidores foram informados sobre os parâmetros que influenciam as classificações dos resultados das pesquisas por defeito apenas em 35 % dos sítios Web (30 em 85 sítios Web). Nos casos em que foram apresentadas informações sobre a classificação dos resultados, estas eram geralmente claras, mas limitavam-se a explicar os princípios gerais (ou seja, que a classificação se baseia nas pesquisas dos produtos, na popularidade dos produtos ou nas remunerações recebidas dos parceiros). De um modo geral, estes resultados estão em consonância com os resultados do estudo anterior sobre o cumprimento, por parte das plataformas em linha, dos requisitos de transparência da classificação nas suas relações com os utilizadores profissionais, elaborado para o relatório de 2023 da Comissão sobre o Regulamento Plataformas-Empresas. O estudo concluiu que apenas um terço de todas as cláusulas contratuais gerais das plataformas em linha objeto de análise continha informações sobre os principais parâmetros de classificação e, mesmo nesses casos, as descrições eram fornecidas em termos bastante gerais.
Os resultados das pesquisas incluíam os primeiros resultados indicados como colocações pagas (anúncios) em um quinto dos casos (19,7 % das pesquisas, em 15 dos 85 sítios Web). Na maioria destes resultados, a publicidade ou colocação paga era assinalada com o rótulo «patrocinado» (37,7 %) ou «publicidade» (33,3 %). Outros métodos de identificação incluíam um ícone ou uma ligação para clicar, que levava o utilizador para uma página diferente com informações, ou para um texto que indicava que o resultado era patrocinado, e que aparecia quando se passava com o rato por cima do ícone (26,1 % dos casos).
No que respeita à aplicação a nível da UE relativa à rotulagem dos anúncios pagos, na sequência da ação coordenada da CDC em 2022, o TikTok comprometeu-se a identificar os anúncios pagos nos vídeos com um novo rótulo a testar em termos de eficácia.
Em conclusão, os dados recolhidos através do inquérito aos consumidores e do teste de conformidade numa seleção de sítios Web, bem como nos Painéis de Avaliação das Condições de Consumo, mostram que a transparência dos parâmetros de classificação dos resultados das pesquisas necessita de melhorias. Além disso, os fornecedores de funcionalidades de pesquisa em linha que incluem anúncios ou colocações pagas nos resultados das pesquisas têm de garantir que estes são claramente visíveis para os consumidores e que se distinguem claramente dos outros resultados.
11. Avaliações dos consumidores
A Diretiva Modernização incluiu um requisito de transparência específico na DPCD (artigo 7.º, n.º 6): os profissionais que disponibilizam o acesso a avaliações têm de informar os consumidores sobre se e de que forma garantem que as avaliações publicadas são efetuadas por consumidores que efetivamente utilizaram ou adquiriram o produto. Além disso, aditou ao anexo I proibições específicas relativas a práticas enganosas (pontos 23-B e 23-C). Nestas disposições, o conceito de «avaliações» deve ser interpretado em sentido lato, como abrangendo não só as mensagens textuais, mas também, por exemplo, as «classificações por estrelas» e ferramentas semelhantes através das quais os consumidores exprimem os seus pontos de vista sobre um produto ou sobre o desempenho de um profissional.
Um dos principais desafios no domínio das avaliações diz respeito às medidas que os profissionais que facultam o acesso às avaliações dos consumidores, em especial os intermediários em linha (por exemplo, mercados em linha e plataformas de avaliações específicas), têm de tomar para cumprir o disposto no novo ponto 23-B do anexo I, que proíbe declarar que as avaliações de um produto são apresentadas por consumidores que o utilizaram ou adquiriram efetivamente, sem adotar medidas razoáveis e proporcionadas para verificar que essas avaliações são publicadas por esses consumidores. Nos termos desta disposição, os profissionais que optem por apresentar avaliações que disponibilizam como avaliações dos consumidores têm de tomar medidas que, sem constituírem uma obrigação geral de vigilância ou de apuramento dos factos (ver o artigo 8.º do RSD), aumentem a probabilidade de essas avaliações refletirem as experiências reais dos utilizadores. Por um lado, este requisito implica obrigações mínimas que todos os profissionais que dão acesso a avaliações dos consumidores têm de cumprir, por exemplo, permitindo apenas avaliações de utilizadores que compraram o produto em questão ou exigindo que os utilizadores apresentem provas de que utilizaram o produto noutros casos em que o profissional que dá acesso às avaliações não controla as transações subjacentes. Por outro lado, o elemento «razoáveis e proporcionadas» deste requisito implica a obrigação de estes profissionais tomarem medidas adicionais para evitar e eliminar avaliações falsas que sejam proporcionais ao seu modelo de negócio e aos riscos identificados (por exemplo, quando são alvo da atividade de «corretores» de avaliações falsas – ver infra). Tais medidas podem incluir, por exemplo, a implantação de ferramentas digitais e de inteligência artificial para analisar as avaliações e bloquear aquelas que são falsas.
No que respeita aos intermediários em linha, as avaliações falsas constituem conteúdos ilegais e estão sujeitas aos requisitos do RSD relativamente à supressão de conteúdos ilegais. Além disso, os intermediários em linha estão isentos de responsabilidade, em determinadas condições, no que diz respeito à ilegalidade ou a potenciais ações de indemnização relativas a essas avaliações.
Foram comunicados problemas com a autenticidade das avaliações dos consumidores, por exemplo, na ação de fiscalização conjunta às avaliações dos consumidores realizada pelas autoridades de CDC em 2021 (ou seja, antes da entrada em vigor da Diretiva Modernização): quase dois terços das lojas, mercados, sítios Web de reserva, motores de pesquisa e sítios de serviços de comparação em linha analisados suscitaram dúvidas quanto à fiabilidade das avaliações.
De acordo com o PACC de 2023, 69 % dos consumidores tinham visto avaliações dos consumidores que não pareciam verdadeiras, pelo menos, «às vezes» (em comparação com 67 % no PACC de 2021). No que diz respeito à obrigação de transparência para os profissionais que dão aos consumidores acesso a avaliações, no inquérito aos consumidores realizado para o estudo de apoio, 56 % dos consumidores referiram que, pelo menos, «às vezes» não conseguiram encontrar informações sobre a forma como as avaliações são recolhidas e se a empresa garante que as avaliações publicadas provêm de clientes reais.
O estudo de apoio também incluiu uma análise do cumprimento por parte dos profissionais do novo requisito de informação estabelecido pela DPCD. Dos 85 sítios Web de comércio eletrónico e viagens nos 10 Estados-Membros analisados, 52 continham avaliações de consumidores. Apenas metade desses 52 sítios Web fornecia informações sobre a utilização e o tratamento das avaliações. Quando disponibilizadas, essas informações eram apresentadas nos termos e condições do sítio Web.
Várias organizações investigaram avaliações dos consumidores a nível nacional. Em 2023, a Agência de Defesa do Consumidor da Suécia realizou uma ação de fiscalização conjunta relativa a avaliações dos consumidores no domínio dos seguros, que abrangeu 20 empresas que publicavam avaliações de consumidores. Concluiu que quase todas as empresas incluídas na ação de fiscalização conjunta não indicavam, juntamente com as avaliações, se estas provinham de consumidores que tinham efetivamente utilizado ou comprado os produtos. De acordo com um estudo efetuado em 2023 pela Federação das Organizações de Consumidores Alemãs (Verbraucherzentrale Bundesverband – VzBv), a maioria dos 30 prestadores analisados não cumpria, ou cumpria de forma inadequada, os requisitos de informação para as avaliações em linha. Este último estudo também chamou a atenção para preocupações relacionadas com as práticas dos operadores de sítios Web que incorporam nas suas páginas avaliações provenientes de portais de avaliação externos, por vezes, sem fornecer informações aos consumidores sobre a verificação da origem dessas avaliações externas.
No que respeita à aplicação, a nível da UE, as autoridades nacionais concluíram, em 2023, uma ação coordenada de CDC relativa a vários serviços Google (Google Store, Google Play Store, Google Ads e Google Search, Google Flights e Google Hotels), que abrangeu, entre outras questões, as práticas relacionadas com as avaliações dos consumidores no Google Hotels. A Google aceitou fazer alterações, clarificando que não verifica as avaliações do Google Hotels.
Nos últimos anos, várias autoridades responsáveis pela aplicação da legislação em matéria de defesa do consumidor tomaram medidas no que respeita às avaliações dos consumidores. Por exemplo, em 2022, a Autoridade dos Consumidores e dos Mercados neerlandesa (ACM) aplicou uma coima a uma loja em linha por induzir os consumidores em erro na venda de vários produtos de consumo. A loja em linha publicava avaliações positivas falsas e ocultava as avaliações negativas. Em 2021, a ACM tomou medidas contra influenciadores que utilizavam gostos e seguidores falsos. Em 2023, a Autoridade da Concorrência e de Defesa do Consumidor da Polónia (UOKiK) agiu contra empresas que vendiam avaliações falsas de consumidores. Num acórdão de 2022, um tribunal alemão decidiu que o número total de avaliações incluídas numa pontuação média e o período em que as avaliações foram apresentadas constituem «informação substancial» na aceção do artigo 7.º, n.º 1, da DPCD.
Muitos problemas relacionados com fraudes nas classificações decorrem das ações de «corretores» de avaliações falsas, ou seja, negócios ilícitos especializados que organizam (especialmente nas redes sociais) a publicação de avaliações falsas por parte dos utilizadores (que podem ser utilizadores ou compradores efetivos dos produtos em questão) em benefício das empresas que contratam esses corretores para promover as suas atividades em mercados em linha ou ferramentas de avaliação especializadas. Além disso, há relatos de corretores de avaliações que oferecem às empresas a possibilidade de organizarem o fornecimento de avaliações positivas falsas em sítios de avaliações, e depois retaliam contra aquelas que recusam, organizando a publicação de avaliações negativas falsas. Algumas das empresas em causa na UE referem que apresentam queixas‑crime e tomam medidas de aplicação privadas contra os corretores de avaliações falsas. Outro problema detetado neste domínio são as avaliações geradas pela IA, que podem ser mais difíceis de detetar.
Para além das atividades de aplicação, alguns Estados-Membros emitiram orientações que contribuem para a sensibilização para as regras aplicáveis neste domínio.
A Comissão também promove medidas voluntárias por parte dos operadores de mercado. Em novembro de 2023, 11 plataformas em linha que operam na UE (Allegro, AliExpress, Amazon, bol.com, CDiscount, eBay, eMAG, Etsy, Joom, Rakuten France e Wish) assinaram o Consumer Protection Pledge (compromisso de defesa dos consumidores). Os compromissos voluntários são aplicáveis a partir de julho de 2024 e incluem medidas para tornar as avaliações dos consumidores mais transparentes e fiáveis, por exemplo, apresentando claramente aos utilizadores as avaliações incentivadas. Os signatários apresentarão, a cada seis meses, um relatório sobre a aplicação dos compromissos. Especificamente para o alojamento turístico, a Comissão está também a preparar um código de conduta para classificações e avaliações em linha, que se espera que aumente a coerência na prestação de serviços de alojamento de qualidade e melhore a comparabilidade e transparência para os consumidores em toda a UE.
Em conclusão, os desafios relacionados com as avaliações falsas, sejam elas «positivas» ou «negativas», estão a aumentar. Os profissionais que dão acesso a avaliações que optem por apresentar como avaliações de consumidores, em especial os que estão fortemente expostos às atividades ilícitas de corretores de avaliações falsas, têm de investir mais para bloquear as avaliações falsas. As plataformas em linha também têm de cumprir as regras do RSD para travar os conteúdos ilegais. Os profissionais que dão acesso a avaliações também têm de ser transparentes para com os consumidores, para que estes possam compreender de forma equilibrada e realista as condições em que as avaliações são recolhidas e as limitações relativas à sua fiabilidade. As autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei devem prestar especial atenção a este domínio e, se for caso disso, utilizar o sistema de cooperação de CDC, especialmente no que respeita à atividade ilícita de corretores de avaliações falsas que atuam em clara violação da DPCD. A este respeito, é importante cooperar com a indústria.
12. Transparência dos mercados sobre as partes contratantes
A Diretiva Modernização aditou à DPCD [artigo 7.º, n.º 4, alínea f)] e à DDC [artigo 6.º-A, n.º 1, alínea b)] novas disposições em matéria de transparência no que diz respeito às partes contratantes nos mercados em linha. Os prestadores de mercados em linha são obrigados a facultar aos consumidores informações sobre a qualidade do terceiro que oferece os bens, serviços ou conteúdos digitais, sobre se a legislação em matéria de defesa dos consumidores é aplicável e sobre qual é o profissional (terceiro fornecedor ou mercado em linha) responsável por garantir os direitos dos consumidores relacionados com o contrato (como a entrega dos bens ou o direito de retratação).
Além disso, o RSD obriga os mercados em linha a obter informações sobre a identidade do comerciante, a envidar todos os esforços para avaliar se as informações são fiáveis e completas, a apresentar essas informações aos consumidores e, quando solicitado, a fornecer essas informações às autoridades, bem como a suspender as relações contratuais com comerciantes que forneçam informações inexatas ou incompletas (as chamadas regras «conhecer o cliente empresarial»).
O teste de conformidade e o inquérito aos consumidores realizado no contexto do estudo de apoio, bem como o PACC de 2023, exploraram a conformidade dos profissionais com este requisito de transparência e as perceções dos consumidores quanto à transparência nos mercados.
No que respeita às perceções dos consumidores, no PACC de 2023, 7 % dos consumidores inquiridos indicaram ter tido problemas após comprar um produto num mercado em linha e ter descoberto que tinha sido comprado a um particular e não a um vendedor profissional. No inquérito aos consumidores realizado para o estudo de apoio, 47 % dos consumidores consideraram que, pelo menos às vezes, era pouco claro, quando faziam compras em linha, quem era o vendedor e quem seria responsável pela entrega dos seus produtos, enquanto 35 % indicaram que raramente ou nunca se tinham deparado com essa ambiguidade.
O teste de conformidade de 50 mercados em linha em 10 Estados-Membros, realizado no âmbito do estudo de apoio, também analisou questões de transparência para os consumidores sobre as partes contratantes (total de 212 produtos avaliados). Em 65,6 % dos casos, estavam disponíveis, na página dos resultados da pesquisa informações sobre se o vendedor era o próprio mercado ou outra parte. Na página dos produtos, a percentagem de produtos com uma indicação sobre quem era o profissional aumentava para 85 % dos produtos em 46 sítios Web, o que indica um nível razoavelmente elevado de transparência. Além disso, nestas situações de teste, as informações sobre a qualidade do vendedor (profissional ou particular) eram claras e fáceis de discernir para os investigadores em 65 % dos casos.
Em conclusão, a investigação sobre os mercados em linha mostra que estes aplicaram, em grande medida, o novo requisito de informação sobre a qualidade dos terceiros fornecedores. A percentagem de consumidores que declararam ter tido problemas devido ao facto de não se aperceberem da qualidade de não profissional do vendedor é relativamente pequena. Ao mesmo tempo, muitos compradores em linha indicam ter tido alguma incerteza quanto à identidade do vendedor e às modalidades da sua transação.
13. Fixação personalizada dos preços
Os profissionais podem personalizar o preço das suas ofertas para consumidores ou grupos de consumidores específicos com base em decisões automatizadas e na definição de perfis dos consumidores. A Diretiva Modernização aditou à DDC um novo requisito de informação, que impõe aos profissionais a obrigação de informar os consumidores que compram em linha de que o preço foi personalizado com base numa decisão automatizada [artigo 6.º, n.º 1, alínea e-A)]. Este requisito de transparência no ponto de venda complementa o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados, que estabelece as regras subjacentes à recolha e ao tratamento de dados pessoais.
Os dados sobre a prática de fixação personalizada dos preços ainda estão a surgir. Os estudos da Comissão de 2018 e 2022 não encontraram elementos de prova consistentes e sistemáticos de fixação de preços ou ofertas personalizadas. O estudo do Parlamento Europeu sobre a fixação personalizada dos preços de 2022 concluiu que os dados empíricos sobre a escala da fixação personalizada dos preços não são conclusivos. As investigações realizadas por organizações de consumidores encontraram provas de personalização dos preços nos setores dos encontros, do alojamento e das companhias aéreas em linha.
Os inquéritos recentes aos consumidores facultam informações adicionais sobre as perceções dos consumidores quanto à fixação personalizada dos preços. No inquérito aos consumidores realizado para o estudo de apoio, os inquiridos foram questionados sobre as suas experiências nos últimos 12 meses no tocante à receção de um desconto ou preço que lhes foi apresentado como «personalizado», através de um sítio Web ou por correio eletrónico. Cerca de metade (55 %) dos inquiridos consideraram ter beneficiado deste tipo de personalização pelo menos «às vezes». No âmbito do PACC de 2023, os consumidores foram questionados sobre as suas experiências de compra em linha nos últimos 12 meses, especificamente em termos da frequência com que detetaram preços diferentes para bens ou serviços em comparação com os seus pares. Os resultados revelaram que 39 % dos consumidores inquiridos pensavam ter-se deparado com essa situação pelo menos «às vezes» (em comparação com 38 % no PACC de 2021).
No que respeita ao cumprimento, por parte dos profissionais, da nova obrigação de informação imposta pela DDC, o teste de conformidade realizado para o estudo de apoio analisou um total de 207 produtos em 85 sítios Web/aplicações móveis. Os investigadores não viram, em caso algum, uma indicação expressa de que o preço tinha sido personalizado com base num tratamento automatizado. Além disso, tentaram identificar as possíveis diferenças de preços, acedendo ao sítio com o seu navegador habitual e com um navegador «limpo» de rastreadores. Dessa forma, identificaram diferenças de preços em 10 dos 85 sítios Web/aplicações móveis, ou seja, em 6 % de um total de 207 produtos. Curiosamente, na maioria dos casos em que identificaram uma diferença de preços, a pesquisa através de um navegador com informações pessoais devolveu um preço inferior ao praticado utilizando um navegador «limpo» de rastreadores.
Relativamente à aplicação da legislação a nível da UE, as autoridades nacionais da rede de CDC, na ação coordenada de 2022 liderada pela autoridade neerlandesa relativa ao mercado em linha Wish.com, consideraram que não tinha ficado claro se e de que forma o profissional aplicava a personalização dos preços. A Wish decidiu pôr termo às suas técnicas de fixação personalizada dos preços na UE. Em 2024, na sequência de um diálogo com a Comissão e as autoridades nacionais de defesa do consumidor no âmbito da rede de CDC, o Tinder comprometeu-se a informar os consumidores de que os descontos que propõem para serviços premium são personalizados por meios automatizados. Para além destas ações coordenadas, até à data, os Estados-Membros não indicaram outras ações de aplicação no que respeita aos requisitos de informação da DDC em matéria de fixação personalizada dos preços.
Em conclusão, os vendedores na UE não parecem identificar as suas ofertas de preços como sendo baseadas no tratamento automatizado do perfil do cliente visado. Como é evidente, tal não exclui a possibilidade de essa personalização dos preços ocorrer; além disso, os consumidores distinguem as diferenças de preços que podem basear-se no tratamento automatizado e, por conseguinte, estar sujeitas ao novo requisito de informação da DDC. O teste em pequena escala realizado para o presente relatório sugere que a personalização dos preços pode ocorrer no caso de alguns profissionais, mas estes resultados não permitem tirar conclusões gerais, nomeadamente, quanto à vantagem ou desvantagem da prática para os consumidores em causa.
14. Revenda de bilhetes de eventos adquiridos por meios automatizados
Os «robôs digitais especuladores» podem ser utilizados para comprar automaticamente produtos com elevada procura, com vista a revendê-los a um preço mais elevado. A Diretiva Modernização aditou ao anexo I da DPCD um novo ponto 23-A, que proíbe os profissionais de revenderem aos consumidores bilhetes para eventos culturais e desportivos que tenham adquirido utilizando software especializado («robôs digitais») para contornar os limites técnicos impostos pelos vendedores principais de bilhetes. Outras disposições da Diretiva Modernização são igualmente pertinentes para os mercados secundários de venda de bilhetes, por exemplo, o novo requisito (da DPCD e da DDC) que impõe que os mercados em linha informem os consumidores sobre se a pessoa que vende os bilhetes é um profissional ou um consumidor.
Os organizadores de eventos queixam-se das práticas dos revendedores e das plataformas de revenda, que inflacionam os preços dos bilhetes, enquanto as plataformas de revenda estão preocupadas com o facto de os vendedores principais se expandirem para o mercado de revenda secundário e impedirem a revenda de bilhetes através de plataformas secundárias concorrentes. A nova proibição da DPCD aplica-se quando os vendedores principais de bilhetes tenham implementado medidas técnicas para limitar a aquisição em larga escala dos seus bilhetes para efeitos de revenda. Só pode ser aplicada se esses vendedores principais detetarem e comunicarem a aquisição ilícita de bilhetes. O estudo de apoio não identificou exemplos de jurisprudência e de ações de aplicação tomadas até à data pelas autoridades nacionais ou por organizações privadas contra os revendedores de bilhetes adquiridos através de robôs digitais especuladores.
No que respeita às práticas de revenda de bilhetes de um modo mais geral, numa ação coordenada de CDC, na sequência de um diálogo com a Comissão e as autoridades nacionais de defesa do consumidor, em 2024, a Viagogo, um mercado secundário em linha de bilhetes para eventos ao vivo, comprometeu-se a informar melhor os consumidores sobre as condições em que os bilhetes são revendidos. Houve também alguns relatos de processos nacionais relacionados com práticas (desleais) de revenda de bilhetes.
De acordo com o inquérito aos consumidores realizado para o estudo de apoio, 33 % dos consumidores indicaram que, pelo menos, «às vezes» estiveram numa situação em que pretendiam comprar um bilhete para um evento, mas apenas encontraram bilhetes de vendedores secundários disponíveis a um preço mais elevado. Metade dos inquiridos não esteve ou não se recorda de ter estado na situação descrita. No PACC de 2023, ao responder a uma questão mais geral relativa a práticas de revenda não limitada a bilhetes para eventos, 21 % dos consumidores declararam ter comprado, pelo menos «às vezes», um novo produto a um revendedor a um preço mais elevado, por estar esgotado no sítio Web oficial da marca.
Na consulta específica no contexto do estudo de apoio, várias partes interessadas destacaram problemas relacionados com a revenda de bilhetes em geral e sugeriram medidas legislativas adicionais, como a obrigação de os revendedores de bilhetes divulgarem mais informações (por exemplo, o valor facial original do bilhete, quaisquer taxas ou encargos adicionais e a localização do lugar), a fixação de limites aos preços de revenda (por exemplo, não superior ao preço do bilhete do vendedor original ou a imposição de um limite máximo).
Em conclusão, a alteração da DPCD introduzida pela Diretiva Modernização aborda um aspeto específico da revenda de bilhetes que ainda não foi objeto de uma aplicação concreta. A sua execução prática exige uma cooperação estreita e o interesse dos vendedores principais em travar a aquisição em massa de bilhetes para revenda. A aplicação da DPCD e, se for caso disso, da DDC continua a ser extremamente pertinente para as questões mais vastas relacionadas com a revenda de bilhetes, como o combate às informações enganosas ou a omissão de informações sobre a natureza da oferta de revenda.
15. Chamadas telefónicas à tarifa de base nos serviços de transporte de passageiros
O artigo 21.º da DDC protege os consumidores de encargos adicionais se tiverem de ligar a um profissional relativamente a um contrato celebrado. Essas chamadas não devem obrigar o consumidor a pagar mais do que a «tarifa de base». A Diretiva Modernização alargou o âmbito de aplicação do artigo 21.º, que agora se aplica também aos serviços de transporte de passageiros.
O teste de conformidade realizado para o estudo de apoio dá algumas indicações sobre o cumprimento deste requisito por parte dos profissionais visados. Analisou os tipos de números de telefone utilizados pelas empresas de transporte de passageiros (companhias aéreas, empresas de autocarros e de transporte ferroviário, bem como intermediários de bilhetes, num total de 50 sítios Web) para ver se se trata de números normais fixos/móveis, números de tarifa majorada ou curtos/gratuitos. De um modo geral, o teste mostrou que a maioria das linhas diretas dos sítios Web analisados (69 %) aplicava uma tarifa nacional normal (ou seja, a tarifa fixa/móvel normal), um quarto oferecia um serviço telefónico de tarifa majorada (na maior parte dos casos, o custo era comunicado de forma transparente ao consumidor) e cerca de 6 % oferecia um número de telefone gratuito. Além disso, nestas situações de teste, os números de tarifa majorada, regra geral, diziam respeito a serviços que não os serviços pós-contratuais prestados aos consumidores pela empresa de transporte (como vendas).
Em conclusão, os elementos de prova disponíveis até à data sugerem que as empresas de transporte de passageiros cumpriram, em grande medida, o novo requisito.
16.Conclusões
O presente relatório reflete os resultados das consultas e da recolha de dados sobre a transposição da Diretiva Modernização e a experiência adquirida com a sua aplicação e cumprimento no período relativamente curto desde a sua entrada em vigor.
No que respeita à transposição, os resultados são bastante encorajadores. A maior parte das disposições foi transposta para as legislações nacionais de forma relativamente direta, em muitos casos literalmente. Os problemas identificados dizem principalmente respeito a disposições que exigem uma integração mais complexa no quadro jurídico nacional, em especial as regras relativas às sanções aplicáveis às infrações e aos meios de ressarcimento dos consumidores em caso de práticas comerciais desleais.
O presente relatório centrou-se nos principais domínios específicos abordados pela Diretiva Modernização, apresentando os dados disponíveis e tirando conclusões sobre esses domínios específicos na medida do possível nesta fase. O curto período de referência não permite tirar conclusões definitivas quanto à eficácia das alterações introduzidas pela Diretiva Modernização. No entanto, há sinais positivos de que essas alterações, que reforçaram o quadro jurídico, estão a contribuir para fortalecer a defesa dos consumidores.
A experiência em matéria de aplicação, embora atualmente limitada, está a desenvolver-se, pelo menos nos domínios mais complexos, com um forte impacto prático direto nos consumidores e profissionais, por exemplo, no que diz respeito às promoções de preços e às avaliações dos consumidores, nomeadamente através de ações coordenadas no âmbito da rede de CDC. Em contrapartida, de acordo com os dados disponíveis, as novas regras em matéria de coimas por infrações em casos transfronteiriços sujeitos às ações coordenadas de CDC ou as regras em matéria de meios de ressarcimento previstas na DPCD ainda não foram aplicadas na prática.
A execução de várias regras da Diretiva Modernização exige uma maior atenção. No que respeita às promoções de preços, para além das questões de transposição em alguns Estados-Membros e da execução divergente pelos Estados-Membros da exceção aplicável aos bens não duradouros, os mercados parecem ter reagido ao novo regulamento, passando para comparações de preços e criando assim novos tipos de problemas de transparência. Os problemas com avaliações falsas estão claramente a aumentar. Os profissionais que dão acesso a avaliações, que apresentam como sendo de consumidores, em especial os que estão fortemente expostos às atividades ilícitas de corretores de avaliações falsas, têm de investir mais para bloquear as avaliações falsas. As avaliações devem também tornar-se uma maior prioridade para as autoridades responsáveis pela aplicação da lei, nomeadamente no âmbito do RSD.
Relativamente ao marketing de «dualidade de qualidade», a solução legislativa adotada com base numa avaliação casuística permite resolver este problema, tendo em conta as diferentes situações dos consumidores e dos Estados-Membros. Afigura-se necessário centrar a atenção na execução e na aplicação das novas regras. A Comissão continuará a acompanhar a situação e a facilitar a aplicação transfronteiriça na rede de CDC sempre que surjam problemas de interesse comum.
Quanto aos eventos de vendas (demonstrações de produtos), embora as perceções dos consumidores suscitem alguma preocupação no que respeita à equidade das práticas comerciais no contexto desta técnica de venda relativamente pouco utilizada, das consultas realizadas para o presente relatório não emergem apelos significativos a uma ação legislativa da UE. Deveria, antes, proceder-se à plena aplicação das regras da DPCD em vigor que abrangem integralmente os eventos de vendas.
De um modo geral, é evidente que a evolução dos mercados de consumo em linha e das novas tecnologias coloca desafios e exige um acompanhamento rigoroso. A este respeito, o presente relatório complementa o «balanço de qualidade da legislação da UE em matéria de proteção dos consumidores» no que respeita à equidade digital, que avalia de forma mais ampla a adequação das regras em vigor para a defesa dos consumidores no domínio digital. Além disso, a aplicação efetiva é fundamental para alcançar todo o potencial das alterações introduzidas pela Diretiva Modernização.