COMISSÃO EUROPEIA
Bruxelas, 23.4.2024
COM(2024) 176 final
RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES
Aplicação da proibição de práticas comerciais desleais para fortalecer a posição dos agricultores e dos operadores na cadeia de abastecimento agrícola e alimentar – Ponto da situação
{SWD(2024) 106 final}
Índice
1.
Introdução
1.1.
Contexto
1.2.
Objetivo e âmbito de aplicação do relatório
2.
Panorâmica geral da transposição
3.
Pontos de análise específicos
3.1.
Âmbito de aplicação e dimensão das empresas (artigo 1.º)
3.1.1.
Relações entre operadores da cadeia de abastecimento
3.2.
PCD proibidas (artigo 3.º)
3.3.
Mecanismos de execução (artigos 4.º a 8.º)
3.3.1.
Designação das autoridades competentes (artigo 4.º)
3.3.2.
Queixas e confidencialidade (artigo 5.º)
3.3.3.
Poderes das autoridades competentes designadas (artigo 6.º)
3.3.4.
Medidas de execução e sanções (artigo 6.º)
3.3.5.
Execução administrativa e judicial e resolução alternativa de litígios
3.3.6.
Cooperação entre autoridades competentes (artigo 8.º)
3.3.7.
Publicação do relatório anual de atividades das autoridades competentes (artigo 10.º)
3.4.
Regras nacionais mais estritas (artigo 9.º)
3.5.
Ênfase na execução transfronteiras
4.
Avaliação da diretiva (artigo 12.º)
5.
Conclusões
1.Introdução
1.1.Contexto
A 17 de abril de 2019, o Parlamento Europeu e o Conselho adotaram a Diretiva (UE) 2019/633 relativa a práticas comerciais desleais nas relações entre empresas na cadeia de abastecimento agrícola e alimentar («Diretiva»).
A diretiva é vinculativa para os 27 Estados-Membros («EM»). A diretiva prevê um nível mínimo de harmonização, mediante o estabelecimento de uma lista de práticas comerciais desleais («PCD») proibidas entre compradores e fornecedores da cadeia de abastecimento agrícola e alimentar. Estabelece também regras mínimas sobre a aplicação dessas proibições e sobre a cooperação entre as autoridades competentes. Os EM podem adotar ou manter regras nacionais que vão para além das PCD enumeradas na diretiva, desde que essas regras sejam compatíveis com as regras aplicáveis ao funcionamento do mercado interno.
A Comissão («COM») reconhece o valor da Diretiva PCD como instrumento político fundamental para reforçar a posição dos produtores primários na cadeia de abastecimento alimentar. O presente relatório constitui uma das medidas imediatas, enumeradas no documento de reflexão dirigido ao colegislador em 15 de março de 2024, para responder aos desafios que atualmente se colocam ao setor agrícola e às preocupações manifestadas pelos agricultores. A Comissão apresenta também outras medidas a médio e longo prazo, sob a forma de um pacote, incluindo a criação de um observatório de custos, margens e práticas comerciais na cadeia de abastecimento agrícola e alimentar, a fim de aumentar a transparência, introduzir alterações específicas ao Regulamento relativo à organização comum dos mercados (OCM), e adotar novas regras sobre a aplicação transfronteiras das PCD, bem como uma avaliação da diretiva até 2025.
1.2.Objetivo e âmbito de aplicação do relatório
Em 27 de outubro de 2021, a Comissão apresentou um relatório com o ponto da situação da transposição e aplicação da diretiva, em conformidade com o seu artigo 12.º. O relatório abrange os 15 EM que tinham notificado a transposição completa até 31 de julho de 2021 e a França, que tinha notificado a transposição parcial.
O presente relatório inclui informações sobre o estado da aplicação da diretiva nos 27 EM e apresenta uma panorâmica das opções de transposição tomadas pelos EM. Incide exclusivamente nas disposições vertidas nas legislações nacionais de transposição da Diretiva PCD.
Atendendo ao controlo da conformidade em curso – que consiste em avaliar a compatibilidade das medidas nacionais de execução com as disposições da diretiva –, o presente relatório não apresenta uma avaliação definitiva das medidas de transposição. Além disso, dado haver várias leis nacionais que acabam de ser alteradas, este relatório abrange apenas as alterações à legislação de transposição oficialmente notificada até 1 de março de 2024.
De notar também que as disposições nacionais que mantêm ou introduzem regras mais estritas do que as previstas na Diretiva PCD não são avaliadas pela Comissão no contexto do controlo de conformidade. Estas disposições podem ser objeto de um pedido de informações ou de um processo de investigação complementar.
O presente relatório é acompanhado de um documento de trabalho dos serviços da Comissão («SWD») com informação mais pormenorizada, em especial sobre as escolhas dos EM em matéria de transposição.
2.Panorâmica geral da transposição
Nos termos do artigo 13.º da diretiva, os EM deviam transpor a diretiva para o direito nacional até 1 de maio de 2021. Em dezembro de 2022, os EM tinham todos notificado a transposição completa à Comissão.
3.Pontos de análise específicos
3.1.Âmbito de aplicação e dimensão das empresas (artigo 1.º)
Seis EM optaram pela aplicação das medidas de transposição, independentemente da dimensão das empresas fornecedoras ou compradoras. Todos os outros EM referem, em certa medida, a dimensão das empresas medida em volume de negócios anual como indicador do poder de negociação dos operadores a proteger, limitando o âmbito de aplicação da legislação adotada ou de partes da mesma, tal como previsto na diretiva.
3.1.1.Relações entre operadores da cadeia de abastecimento
No que respeita à relação entre fornecedores e compradores de produtos agrícolas e alimentares, a maioria dos EM determinou o âmbito de aplicação setorial e pessoal, tal como definido na diretiva.
A Letónia alargou o âmbito de aplicação por forma a incluir as relações entre fornecedores e retalhistas (apenas) de produtos não alimentares. A Eslováquia incluiu, na definição de comprador e de fornecedor, as pessoas coletivas que não são operadores económicos. A Espanha optou pela proteção de todos os operadores ao longo da cadeia (incluindo os compradores).
3.2.PCD proibidas (artigo 3.º)
Nos termos da diretiva, os EM devem proibir todas as PCD constantes da lista, que foram repartidas por dois grupos: i) as proibições per se ou incondicionais («lista negra») e ii) as proibições condicionais («lista cinzenta»), ou seja, as práticas comerciais que estão proibidas, salvo disposição em contrário em termos claros e inequívocos do acordo de fornecimento ou de um acordo subsequente entre o fornecedor e o comprador (artigo 3.º, n.º 2). Todas as práticas são especificamente definidas na diretiva. Os EM podem adotar ou manter regras nacionais que vão para além das PCD enumeradas na diretiva, desde que essas regras sejam compatíveis com as regras aplicáveis ao funcionamento do mercado interno. Embora estejam em conformidade com os requisitos prescritos, os EM podem:
·recorrer a cláusulas gerais para alargar o âmbito de aplicação das proibições a práticas que não estejam especificamente enumeradas,
·acrescentar outras práticas às listas,
·alargar o âmbito de aplicação das proibições enumeradas ou torná-las mais estritas,
·transferir práticas constantes da «lista cinzenta» para a «lista negra».
O documento de trabalho dos serviços da Comissão contém informações pormenorizadas sobre as opções de transposição pelos EM, incluindo práticas individuais. Há duas práticas que constam da «lista negra» e que merecem especial atenção, uma vez que os EM podem prever variações dentro de certos limites:
·Atrasos nos pagamentos: 16 dos 27 EM aplicam as disposições da diretiva estabelecendo uma distinção entre as vendas de produtos perecíveis (prazo de pagamento de 30 dias) e as vendas de produtos não perecíveis (prazo de pagamento de 60 dias), enquanto 11 EM aplicam prazos de pagamento mais apertados.
Todos os EM, exceto a Bélgica, Eslováquia, Estónia, Hungria e Suécia, incorporaram a definição de produtos perecíveis que consta da diretiva nos seus diplomas de transposição. A França tem definições diferentes para produtos «perecíveis» e «muito perecíveis». A Hungria e a Eslovénia aditaram à sua legislação de transposição uma lista de produtos perecíveis, enquanto a Lituânia conferiu a uma instituição autorizada pelo Governo poderes para aprovar essa lista.
·Cancelamento de encomendas com pouca antecedência: Todos os EM, exceto a Estónia, Hungria e Eslováquia, incluem o período de 30 dias como norma mínima para o cancelamento. Seis EM preveem a possibilidade de fixar períodos inferiores a 30 dias para setores específicos em casos devidamente justificados (por exemplo, produtos muito perecíveis).
3.3.Mecanismos de execução (artigos 4.º a 8.º)
3.3.1.Designação das autoridades competentes (artigo 4.º)
Os 27 EM designaram todos uma ou mais autoridades (autoridades competentes) responsáveis pela aplicação das proibições estabelecidas no artigo 3.º a nível nacional. Os dados de contacto e os sítios Internet destas autoridades estão disponíveis num sítio Web específico da Comissão
.
Todos os EM escolheram autoridades administrativas e a maioria optou por lhe atribuir os principais poderes de execução: no caso de onze EM, a uma autoridade da concorrência; no caso de quatro EM, a uma autoridade do mercado alimentar; no caso de dois EM, ao respetivo Ministério da Agricultura; no caso de dois EM, à autoridade responsável pelo combate às práticas comerciais desleais no setor agroalimentar; no caso de dois EM, a um organismo governamental no âmbito do Ministério da Economia e Finanças; e no caso de um EM, à autoridade para os consumidores e os mercados. Alguns conferiram os poderes de execução previstos na diretivaa um Tribunal.
Três EM (Grécia, Lituânia e Roménia) designaram duas autoridades, sendo a segunda a autoridade da concorrência.
3.3.2.Queixas e confidencialidade (artigo 5.º)
De acordo com os instrumentos de transposição notificados à Comissão, não só os fornecedores individuais, mas também as organizações de produtores ou as outras organizações de fornecedores e associações destas organizações têm o direito de apresentar queixa à autoridade competente designada.
A grande maioria dos instrumentos de transposição dos EM prevê meios para salvaguardar a confidencialidade da identidade do queixoso cuja divulgação possa prejudicar os seus interesses ou os dos seus membros ou fornecedores. Estas salvaguardas deverão, normalmente, ser adotadas a pedido do fornecedor. No entanto, algumas medidas nacionais de transposição também preveem, a esse respeito, a iniciativa de uma autoridade. Na maioria dos casos, os queixosos são convidados a indicar as informações relativamente às quais solicitam confidencialidade. Em contrapartida, nos termos do direito polaco, a identidade e as informações sobre o queixoso, caso a divulgação possa ser prejudicial para o mesmo, são sempre mantidas confidenciais, salvo se este autorizar por escrito a divulgação. Em Espanha, a lei prevê a proteção da identidade do queixoso também durante os processos judiciais. Nalguns EM, os instrumentos de transposição preveem a possibilidade de suspensão dos processos sempre que a sua prossecução implique a divulgação de informações confidenciais. Na Lituânia, a autoridade competente pode rejeitar um pedido de confidencialidade, caso as informações específicas tenham um valor probatório para determinar a infração. Os casos de queixas anónimas são, contudo, explicitamente tratados na legislação lituana.
3.3.3.Poderes das autoridades competentes designadas (artigo 6.º)
A maioria dos EM confere às autoridades competentes designadas os poderes previstos no artigo 6.º, a saber:
·Poderes de investigação e de monitorização,
·O poder de adotar decisões em caso de incumprimento das proibições estabelecidas no artigo 3.º,
·O poder de exigir que o comprador ponha termo à prática comercial proibida,
·O poder de aplicar ou de dar início a processos para a imposição de coimas e outras sanções igualmente eficazes, bem como de medidas cautelares, aos infratores, em conformidade com as regras e os procedimentos nacionais, e
·O poder de publicar as decisões tomadas.
Em nove EM, a autoridade competente tem igualmente poderes para validar os compromissos assumidos pelo infrator ou para emitir alertas ou formular recomendações em caso de infração.
3.3.4.Medidas de execução e sanções (artigo 6.º)
As medidas de execução incluem uma vasta gama de instrumentos, incluindo sanções, vias de recurso e compromissos. As medidas mais comuns à disposição das autoridades competentes nacionais são as sanções financeiras (multas ou outras sanções igualmente eficazes), que estão previstas em todos os 27 EM.
3.3.5.Execução administrativa e judicial e resolução alternativa de litígios
A maioria das medidas e dos mecanismos de execução podem ser considerados de caráter administrativo.
Alguns atos de transposição dos EM referem explicitamente a execução administrativa e judicial. As legislações austríaca e finlandesa estabelecem que determinados poderes (por exemplo, a aplicação de sanções) estão reservados aos tribunais, ao passo que (na Finlândia) há outras medidas (como as injunções) que podem ser adotadas tanto pela autoridade administrativa como pela autoridade judicial. Em França, a autoridade administrativa pode emitir injunções e aplicar coimas, ao passo que o tribunal pode adotar injunções, medidas corretivas e sanções civis (multas civis). A legislação búlgara estabelece que a instituição responsável por processos específicos abrangidos por legislação de transposição não deve impedir qualquer parte num acordo de abastecimento de procurar obter reparação através de outro procedimento estabelecido, reconhecendo implicitamente o papel das outras entidades de execução, incluindo os tribunais. Nos termos da legislação letã, paralelamente ao Conselho da Concorrência, nos termos dos procedimentos previstos no direito processual civil, um tribunal pode igualmente determinar se houve ou não infração à legislação de transposição.
Estes EM utilizam um sistema de vias de recurso paralelas sem, no entanto, prever regras específicas de coordenação entre autoridades administrativas e judiciais.
3.3.6.Cooperação entre autoridades competentes (artigo 8.º)
Nos termos do artigo 8.º, n.º 3, a Comissão criou um sítio Web de acesso público com os dados de contacto das autoridades competentes nacionais e as hiperligações para os respetivos sítios Web. Além disso, a Comissão criou um fórum digital para facilitar o intercâmbio de informações.
Após ter acompanhado de perto os EM no respetivo processo de transposição, através de reuniões regulares, ter respondido às questões de aplicação e ter dado mais de 50 respostas escritas individuais neste domínio, a Comissão facilitou a criação da rede de autoridades competentes em matéria de PCD («rede»). Composta pelos representantes das autoridades competentes nacionais, a rede organiza debates sobre a aplicação da diretiva com base nos relatórios anuais dos EM (artigo 10.º, n.º 2,). O objetivo é assegurar uma abordagem comum no que respeita à aplicação das regras definidas na diretiva e à partilha de boas práticas, de novos desenvolvimentos e de novos instrumentos de execução. Além disso, a rede pode formular recomendações no âmbito dos seus esforços de colaboração para reforçar o quadro de execução.
Desde a sua criação, em junho de 2022, os membros da rede reuniram-se duas vezes ao nível dos dirigentes das autoridades competentes e duas vezes ao nível técnico. Além disso, foram organizadas reuniões específicas para debater em pormenor temas concretos de natureza técnica. Desde 2022, foram realizadas cinco reuniões desse tipo. Os temas debatidos foram, por exemplo, o cálculo dos limiares para os volumes de negócios, a execução transfronteiras e as alianças de compras. O debate sobre a execução transfronteiras permitiu identificar possíveis domínios de melhoria, que são descritos na secção 3.5.
3.3.7.Publicação do relatório anual de atividades das autoridades competentes (artigo 10.º)
Para melhorar o acesso aos relatórios anuais publicados pelas autoridades competentes nacionais nos respetivos sítios Web (artigo 10.º, n.º 1), a Comissão tenciona publicar uma panorâmica geral consolidada dessas hiperligações na página Web dedicada às PCD em 2024.
Considerando que as legislações nacionais de transposição começaram a ser aplicadas em 1 de novembro de 2021 no caso dos novos acordos e no máximo 12 meses a contar da sua publicação no caso dos contratos já em vigor, observou-se que existiam diferentes calendários de transposição entre EM. Esta divergência conduziu a variações no número de processos de execução comunicados até à data. Alguns EM concentram-se na formulação de orientações para que fornecedores e compradores cumpram as regras, enquanto outros lançaram inquéritos ao setor agroalimentar ou um conjunto de processos de investigação por iniciativa própria (ou seja, processos de investigação não baseados em queixas ou sugestões). Em 2023, por força da experiência passada em matéria de execução e dos recursos disponíveis, cerca de 75 % dos processos e das investigações por iniciativa própria dizem respeito à Espanha. Foram detetadas 269 infrações (cerca de 27 % dos processos de investigação encerrados), o que conduziu a uma sanção financeira global superior a 22 milhões de EUR. O nível das sanções financeiras varia na UE.
As PCD mais frequentes são os pagamentos em atraso de produtos agrícolas e alimentares perecíveis (mais de 30 dias) ou não perecíveis (mais de 60 dias) (50 % e 13 %), os pagamentos não relacionados com uma transação específica (7 %) e os pagamentos exigidos pelo fornecedor para ações de marketing (7 %) assim para o armazenamento, a exposição e a inclusão de produtos no inventário (7 %). Cerca de 41 % das PCD ocorreram ao nível das vendas a retalho (47 % em 2022), 36 % ao nível da transformação (27 % em 2022) e 22 % ao nível do comércio grossista (25 % em 2022).
O documento de trabalho dos serviços da Comissão inclui uma panorâmica dos dados agregados sobre as medidas de execução adotadas pelos EM em 2022 e, em parte, em 2023.
Neste contexto, importa sublinhar que o número de medidas de execução realizadas depende da disponibilidade de recursos humanos das respetivas autoridades, cuja afetação primária para executar a lei em matéria de PCD difere entre EM.
3.4.Regras nacionais mais estritas (artigo 9.º)
Nos termos do artigo 9.º da diretiva, os EM podem introduzir regras mais estritas para garantir um nível de proteção mais elevado, desde que essas regras sejam compatíveis com as regras de funcionamento do mercado interno. Estas regras podem significar o estabelecimento de um âmbito mais restrito, conforme acima referido, ou a inclusão de práticas não enumeradas na diretiva, como por exemplo a proibição de venda ou de compra abaixo dos custos de produção, de revenda com prejuízo ou abaixo do preço de compra ou qualquer outra obrigação de respeitar um determinado nível de preços.
As «vendas ou compras abaixo do custo» e a «revenda com prejuízo» não se regem especificamente pela diretiva ou pelo regulamento relativo à organização comum dos mercados. Enquanto quatro EM introduziram uma disposição relativa à «venda ou compra abaixo do custo de produção», três deles fizeram o mesmo para uma disposição relativa à «revenda com prejuízo» e dois para a obrigação de respeitar um determinado nível de preços.
3.5.Ênfase na execução transfronteiras
Em 2019, 17 % dos produtos agrícolas da UE consumidos num EM eram originários de outro EM. Ao nível da rede, os intercâmbios de informações sobre as orientações gerais em matéria de execução consideram-se benéficos e um êxito da diretiva. Os debates levados a cabo entre autoridades competentes ao nível da rede sugerem que a obrigação geral, prevista no artigo 8.º, de prestar assistência mútua no caso das investigações transfronteiras pode nem sempre proporcionar uma base jurídica suficiente para assegurar uma cooperação e aplicação eficazes e efetivas. É o caso, em especial, dos processos transfronteiras em que os compradores envolvidos em práticas comerciais estão localizados num EM diferente do EM de estabelecimento do fornecedor. Estas situações exigem o intercâmbio de informações confidenciais, a eventual adoção de medidas coercivas contra um comprador estabelecido noutro EM que não o da autoridade competente no que respeita ao fornecedor ou a redistribuição dos processos através da rede de autoridades competentes, assim como a aplicação de coimas. Podem também suscitar questões relacionadas com as línguas utilizadas nos intercâmbios. As diferentes escolhas no que respeita aos tipos de autoridades competentes designadas pelos EM (por exemplo, autoridades da concorrência que têm à sua disposição instrumentos jurídicos que lhes permitem colaborar mais facilmente do que outras) podem significar dificuldades acrescidas. Além disso, os compradores de produtos agrícolas e alimentares podem adquirir esses produtos em vários EM, o que aponta para a necessidade de uma ação coordenada das autoridades competentes. Neste contexto, a Comissão considera que poderão vir a ser necessárias novas regras de aplicação transfronteiras para lutar contra as práticas comerciais desleais. Estas novas regras teriam por objetivo melhorar o intercâmbio de informações entre autoridades competentes ou permitir a tomada de medidas coordenadas contra os compradores num contexto transfronteiras.
Uma parte dos debates realizados ao nível da rede centrou-se também na natureza transfronteiras do tratamento das queixas relativas a PCD no domínio das alianças de compras. Embora deva salientar-se que as alianças de compras estão sujeitas à Diretiva PCD como qualquer outro comprador e que, por conseguinte, não existe qualquer razão específica para as tratar de forma diferente, nos debates mantidos ao nível da rede sublinharam-se os desafios colocados pela localização dessas alianças, por vezes fora da UE, e a pressão exercida sobre os recursos da autoridade competente.
Num relatório do JRC de maio de 2020 afirma-se que as alianças de compras, tanto nacionais como europeias, podem desempenhar um importante papel na promoção da concorrência na cadeia de abastecimento alimentar e ter um impacto positivo nos preços no consumidor. Simultaneamente e de acordo com o mesmo estudo, o papel desempenhado pelas alianças de compras na atividade dos intervenientes a montante, como os agricultores, não é claro e justifica uma investigação mais exaustiva. A Comissão tenciona atualizar estes resultados no decurso de 2024.
4. Avaliação da diretiva (artigo 12.º)
Nos termos da diretiva, a Comissão deve proceder a uma primeira avaliação da mesma até 1 de novembro de 2025. A avaliação basear-se-á nos resultados de um estudo de apoio, no âmbito do qual serão organizadas as consultas adequadas orientadas para todas as partes interessadas envolvidas, fornecedores e compradores.
Para contribuir para esta avaliação, a Comissão tem vindo a realizar, nomeadamente, inquéritos anuais em todos os países da UE, tendo começado por um inquérito de base, em 2020.
Além disso, alguns EM já realizaram as suas primeiras avaliações, caso da Alemanha e da Suécia.
5.Conclusões
A Diretiva PCD procura resolver, através de uma harmonização mínima à escala da UE, a situação antes verificada, marcada por legislações nacionais fragmentadas. Em dezembro de 2022, todos os EM tinham transposto esta diretiva para o seu direito nacional.
A maioria destes EM optou por um nível de proteção para lá do mínimo estabelecido pela diretiva. É possível estabelecer normas nacionais mais estritas do que as previstas na diretiva, desde que respeitem as regras do mercado interno da UE. De um modo geral, os EM seguem a abordagem setorial e só aplicam as disposições da diretiva à cadeia agroalimentar. Em termos de âmbito, mais de metade dos EM afastou-se das categorias de volume de negócios definidas na diretiva, aplicando mesmo, nalguns casos, as regras independentemente do volume de negócios dos operadores em causa. A maioria dos EM alargou a lista de PCD. Tornou as proibições da diretiva mais estritas, por exemplo, transformando práticas «cinzentas» em práticas «negras» ou acrescentando mais proibições à lista de práticas comerciais prevista na diretiva. Por outro lado, os EM que não dispunham de legislação em vigor neste domínio antes da transposição da diretiva alinharam-se, de um modo geral, pelo âmbito de aplicação da mesma. O controlo da conformidade, para avaliar a compatibilidade das medidas nacionais de execução com a diretiva, não está ainda concluído.
A rede de autoridades competentes nacionais, no quadro de várias reuniões, colaborou, partilhou boas práticas no que respeita à aplicação desta nova diretiva e trabalhou em formas de reforçar a cooperação em certos domínios como a aplicação transfronteiras. O lançamento do novo observatório de custos de produção, margens e práticas comerciais na cadeia de abastecimento agroalimentar contribuirá para aumentar mais a transparência e a confiança.
Melhorar a posição dos agricultores na cadeia de abastecimento alimentar, apoiar os seus rendimentos e garantir uma remuneração justa são objetivos políticos importantes para apoiar a competitividade, a sustentabilidade e a resiliência do setor agrícola. A perceção das desigualdades e as preocupações quanto à viabilidade da atividade agrícola ligadas, entre outras coisas, aos possíveis desequilíbrios no poder de negociação, em detrimento dos agricultores, alimentaram os recentes protestos dos agentes do setor da agricultura. As medidas abrangidas pelo documento de reflexão acima referido mostram a importância atribuída pela Comissão ao reforço da posição dos agricultores na cadeia de abastecimento alimentar.
Embora se trate de um instrumento recente, a Diretiva PCD dá resposta a algumas destas preocupações, permitindo que os agricultores e os fornecedores que se encontram numa posição relativamente mais frágil na cadeia de abastecimento alimentar possam operar de forma mais segura e eficiente, graças a práticas comerciais mais justas, bem como exprimir-se e apresentar mais facilmente queixa. A aplicação tem vindo a ganhar força e contribuirá para um cada vez maior grau de proteção dos agricultores e dos fornecedores numa posição mais frágil. Quando da avaliação prevista para 2025, será o momento de refletir sobre a eventual necessidade de adaptar a própria diretiva e os seus parâmetros em termos de âmbito de aplicação ou de práticas em causa.