COMISSÃO EUROPEIA
Bruxelas, 8.12.2022
COM(2022) 674 final
RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES
Primeiro acompanhamento e prospetiva da poluição zero
"Rumo a ar, água e solo mais limpos na Europa"
1.Introdução
O ar limpo, a água limpa e o solo limpo num ambiente natural resiliente e próspero são fundamentais para uma vida saudável. O isolamento imposto pela pandemia de COVID‑19 paradoxalmente proporcionou novas perspetivas sobre o valor de um ambiente limpo e rico em biodiversidade. Hoje em dia, a guerra russa contra a Ucrânia e a consequente crise energética e económica, os esforços de recuperação pós-COVID e as inundações, vagas de calor e secas induzidas pelo clima estão, sem dúvida, a agravar os desafios enfrentados pela UE, incluindo o desafio de reduzir a poluição.
No entanto, a trajetória a médio e longo prazo estabelecida pelo Pacto Ecológico Europeu e confirmada pelo oitavo programa de ação em matéria de ambiente (8.º PAA) para 2030, que estabelece objetivos prioritários para 2050, continua a ser válida, e inclui, em consonância com o objetivo de neutralidade climática para 2050, a ambição de poluição zero para um ambiente livre de substâncias tóxicas. O plano de ação da UE «Rumo à poluição zero no ar, na água e no solo» e a Estratégia para a Sustentabilidade dos Produtos Químicos estabelecem uma visão para 2050, quantificaram metas e ações concretas para 2030 de modo a colocar a UE numa trajetória para alcançar a poluição zero, bem como os seus objetivos em matéria de clima e restauração da natureza. A Comissão apresentou várias propostas pertinentes, mais recentemente para rever a Diretiva Qualidade do Ar Ambiente, a Diretiva Tratamento de Águas Residuais Urbanas e atualizar a lista de poluentes da água ao abrigo da Diretiva-Quadro da Água, bem como a proposta de homologação das emissões Euro 7 dos veículos a motor. A importância de reduzir a poluição como meio para melhorar a saúde humana é realçada no plano europeu de luta contra o cancro.
O presente relatório integrado de acompanhamento e prospetiva da «poluição zero» é parte integrante do quadro de acompanhamento do 8.º PAA, que estabelece indicadores-chave por objetivo prioritário e outros instrumentos de acompanhamento setoriais, por exemplo, para as alterações climáticas, a biodiversidade e a economia circular, a fim de proporcionar uma imagem pormenorizada e coerente. O objetivo geral do presente relatório é apresentar os progressos e as prospetivas em relação às seis metas adotadas no Plano de Ação para a Poluição Zero, destacando também as lacunas existentes. Nele são respondidas as seguintes perguntas: Quão poluída é a UE? Quais são as tendências dos últimos anos? Podemos alcançar as metas de poluição zero para 2030?
Tal contribuirá para uma melhor governação em matéria de poluição, pois permitirá, em particular:
·oferecer novas e pertinentes perspetivas;
·verificar se a execução das políticas está no bom caminho;
·analisar sinergias e compromissos entre as diferentes políticas da UE;
·ajudar a traduzir os «alertas precoces» em recomendações sobre poluentes que suscitam preocupação crescente, com base nos mais recentes resultados da investigação.
Além disso, o relatório expõe uma série de lacunas que serão abordadas nos próximos anos. Estas incluem dificuldades na avaliação da poluição do solo, dada a falta de um quadro jurídico da UE para a monitorização e a comunicação de informações, que será abordada na futura legislação sobre a saúde dos solos e a monitorização das florestas, bem como o desafio de combinar dados dificilmente comparáveis, provenientes de diferentes fontes ou projetos científicos, num quadro integrado. Outro desafio consiste em melhorar a partilha e a utilização dos dados disponíveis mais recentes, para que estes adiram aos princípios FAIR (dados fáceis de encontrar, acessíveis, interoperáveis e reutilizáveis). Embora estejam disponíveis dados quase em tempo real para a política do ar, e apesar de existirem dados mais atualizados disponíveis a nível nacional, os dados para avaliar a água e o meio marinho estão frequentemente desatualizados e incompletos. Esta questão é parcialmente abordada nas últimas propostas sobre a monitorização e comunicação de informações sobre poluentes das águas superficiais e subterrâneas, mas terá de ser complementada por futuras revisões da legislação pertinente relativa à água e ao meio marinho.
O presente relatório consiste no resumo estratégico do relatório de acompanhamento que foi compilado pela AEA e integra os dados passados e atuais mais relevantes em todas as zonas de poluição monitorizadas a nível da UE e o relatório de prospetiva coordenado pelo Centro Comum de Investigação da Comissão. Os resultados da modelização e antevisão baseiam-se numa avaliação dos benefícios esperados para a redução da poluição das principais iniciativas políticas da UE, incluindo as recentemente apresentadas. As fontes de informação para este primeiro relatório de prospetiva sobre a «poluição zero» incluem o terceiro relatório sobre o Programa Ar Limpo, avaliações de prospetivas sobre o ruído, os nutrientes, o consumo e a produção, bem como as principais conclusões do recente relatório de antevisão sobre a poluição zero. Além disso, os resultados dos programas de investigação da UE foram resumidos num relatório recente que inclui uma série de projetos financiados pela UE que proporcionam um apoio valioso e soluções inovadoras para a base de conhecimentos sobre poluição zero.
2.Monitorização do objetivo de poluição zero
O presente capítulo resume sucintamente as conclusões sobre a monitorização do objetivo de poluição zero, centrando-se igualmente nos progressos realizados até à data e na distância para a consecução das metas para 2030.
2.1.Poluição zero e saúde
Metas de saúde e poluição zero até 2030
Ao abrigo do direito da UE, as ambições do Pacto Ecológico e em sinergia com outras iniciativas, a UE deve, até 2030, reduzir em mais de 55 % os impactos da poluição atmosférica na saúde (mortes prematuras) e em 30 % a percentagem de pessoas que sofrem de perturbações crónicas causadas pelo ruído dos transportes.
Registaram-se progressos tangíveis na redução de 45 % dos impactos nocivos para a saúde relacionados com a poluição atmosférica (como as doenças cardíacas, o cancro e as doenças respiratórias), em comparação com os níveis de 2005. Em contrapartida, os danos para a saúde associados à poluição sonora, como o risco de doenças cardiovasculares, as perturbações do sono e o incómodo, mantiveram-se bastante estáveis desde 2012.
As elevadas taxas globais de conformidade com as normas da UE em matéria de poluição da água potável e das águas balneares (>99 % e >93 %, respetivamente) são encorajadoras. Quanto aos efeitos na saúde da utilização de produtos químicos, embora os níveis de certos produtos químicos estejam a diminuir, a utilização de alguns produtos químicos de substituição que apresentam um risco semelhante está a aumentar de forma constante. Apesar dos progressos realizados, mais de 10 % das mortes prematuras na UE todos os anos ainda estão relacionadas com a poluição ambiental. Tal deve-se principalmente aos elevados níveis de poluição atmosférica, mas também à poluição sonora e à exposição a produtos químicos, que é suscetível de ser subestimada. A poluição não está distribuída equitativamente por toda a UE. Os cidadãos vulneráveis, nomeadamente as crianças, os idosos e as pessoas que sofrem de
asma
ou de outras doenças respiratórias ou
cardiovasculares
, são mais sensíveis à exposição à poluição e as pessoas pertencentes a grupos socioeconómicos mais baixos também tendem a estar expostas a níveis mais elevados de poluição.
O legado da poluição, por exemplo, proveniente de sítios contaminados, é dispendioso de eliminar, dado que, muitas vezes, o poluidor não é responsabilizável, nem conhecido, nem capaz de pagar pela reparação dos danos. Este facto sublinha a importância de evitar, em primeiro lugar, a poluição e de substituir os produtos químicos por outros menos perigosos. Tendo em conta as lições do passado, temos de estar mais vigilantes no combate aos poluentes que suscitam preocupação emergente, nomeadamente os provenientes de produtos farmacêuticos e antimicrobianos, as «substâncias químicas para sempre» (tais como as substâncias perfluoroalquiladas e polifluoroalquiladas — PFAS), os desreguladores endócrinos e os microplásticos. Além disso, é necessário introduzir medidas para fazer face aos impactos na saúde das misturas de produtos químicos e aos seus efeitos combinados, por exemplo, na qualidade do ar interior
A Comissão está a abordar estas questões numa vasta gama de iniciativas, nomeadamente o Plano de Ação para a Economia Circular (por exemplo, microplásticos), a Estratégia para a Sustentabilidade dos Produtos Químicos (por exemplo, PFAS e a revisão das regras relativas à classificação, rotulagem e embalagem dos produtos químicos, bem como a revisão do Regulamento REACH), o Plano de Ação para a Poluição Zero (por exemplo, a qualidade do ar interior e a recente comunicação sobre o amianto) e a Estratégia de Proteção do Solo (por exemplo, o novo ato legislativo sobre a saúde dos solos, uma lista prioritária da UE de contaminantes do solo que suscitam preocupação emergente, melhoria da avaliação dos riscos). Foi igualmente proposto alinhar progressivamente as normas jurídicas da UE em matéria de qualidade do ar com as orientações relevantes da OMS, a fim de proteger melhor a saúde e o bem-estar das pessoas (por exemplo, reduzir ainda mais as mortes prematuras).
2.2.Poluição zero e biodiversidade
Metas de poluição zero e biodiversidade para 2030
Ao abrigo do direito da UE, das ambições do Pacto Ecológico e em sinergia com outras iniciativas, a UE deve, até 2030, reduzir em 25 % os ecossistemas da UE em que a poluição atmosférica ameaça a biodiversidade e em 50 % as perdas de nutrientes, a utilização e o risco de pesticidas químicos, a utilização dos pesticidas mais perigosos e a venda de agentes antimicrobianos para animais de criação e na aquicultura.
A poluição é uma das cinco principais ameaças à biodiversidade. Os limites do planeta para a poluição, ou seja, o espaço operacional seguro da Terra, são ultrapassados por nutrientes (na Europa por um fator de dois para o fósforo e um fator de 3,3 para o azoto) e por «novas entidades» (incluindo produtos químicos e plásticos).
Até à data, em comparação com os anos de referência, a poluição atmosférica, a poluição causada por pesticidas e antimicrobianos foi reduzida em 12 % (para a área dos ecossistemas afetados pela poluição atmosférica), 14 % (para a utilização e risco de pesticidas químicos), 26 % (para a utilização de pesticidas mais perigosos) e 18 % (para a venda de antimicrobianos) em relação às metas acima referidas. Para a meta de 50 % de perdas de nutrientes, ainda estão a ser recolhidos dados. Uma série de indicadores de substituição parecem indicar que as perdas de nutrientes se mantiveram relativamente estáveis, sem qualquer indicação de uma redução significativa ao longo da última década.
Os limites de poluição da UE para proteger a biodiversidade foram consideravelmente ultrapassados. Com base nos dados de 2015, 23 % das quase 10 000 massas de águas subterrâneas da UE e 59 % das quase 100 000 massas de águas de superfície da UE ainda não conseguem alcançar um «bom estado químico». No que respeita aos contaminantes, com base nos dados de 2018, 80 % da zona marítima da UE ainda não satisfaz o «bom estado ambiental». 13 Estados-Membros apresentaram os seus terceiros planos de gestão de região hidrográfica antes do final de outubro de 2022. Uma análise preliminar indica uma situação globalmente estável em comparação com os segundos planos, em especial no que se refere ao estado químico das águas subterrâneas. O estado ecológico das águas superficiais e o estado químico estão mais misturados, com alguns países a apresentarem sinais de melhoria, enquanto outros referem uma deterioração da qualidade. Está em curso uma análise mais exaustiva.
Os dados científicos apontam para desafios adicionais, como a falta de conhecimento e de dados sobre a poluição da água, do meio marinho e do solo. O impacto dos poluentes nos ecossistemas aumenta devido aos seus efeitos combinados. A dimensão do impacto do ruído subaquático, dos microplásticos e da poluição luminosa na biodiversidade está a tornar-se cada vez mais evidente.
A Comissão propôs uma série de medidas para proteger melhor a biodiversidade da poluição, principalmente no âmbito das suas estratégias em matéria de biodiversidade e «do prado ao prato» (por exemplo, sobre pesticidas, nutrientes e antimicrobianos), do seu Plano de Ação para a Poluição Zero (por exemplo, sobre poluentes da água e águas residuais urbanas) e da sua Estratégia de Proteção do Solo (por exemplo, a futura legislação sobre a saúde dos solos)
. Além disso, encontra-se a adaptar as normas jurídicas aos dados científicos mais recentes e a combater a poluição emergente, por exemplo, com a recente proposta sobre a lista de poluentes da água e os limiares para o ruído subaquático no âmbito da Diretiva-Quadro Estratégia Marinha. Os efeitos combinados dos poluentes estão a ser abordados na revisão do Regulamento REACH e de outra legislação relativa aos produtos químicos. A Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) está atualmente a desenvolver métodos para avaliar os efeitos cumulativos dos pesticidas, tal como estabelecido num plano de ação específico. Por último, os impactos da poluição luminosa nos insetos polinizadores estão a ser abordados pela iniciativa relativa aos polinizadores.
2.3.Poluição zero e economia circular
Metas de economia circular e poluição zero para 2030
Ao abrigo do direito da UE, das ambições do Pacto Ecológico e em sinergia com outras iniciativas, a UE deve, até 2030, reduzir em 50 % os resíduos de plástico no mar, em 30 % a libertação de microplásticos para o ambiente, em 50 % os resíduos urbanos finais e reduzir consideravelmente a produção total de resíduos.
Os progressos na consecução destas metas têm sido lentos. No que diz respeito aos resíduos de plástico e aos microplásticos, a recolha e a análise de 2015-2020 ainda estão a ser finalizadas, pelo que não é possível fornecer um cálculo tendencial consolidado e acordado a nível da UE. No entanto, uma análise preliminar dos dados disponíveis indica que as concentrações de resíduos de plástico estão a diminuir na maioria das costas da UE, o que constitui um sinal encorajador. Serão publicados dados harmonizados em 2023. Além disso, a aplicação da Diretiva-Quadro Estratégia Marinha , da Diretiva Plásticos de Uso Único, da Diretiva Meios Portuários de Receção e das iniciativas em matéria de microplásticos ajudará a esclarecer a situação do lixo marinho e a avaliar a meta relativa aos microplásticos para o próximo relatório, em 2024. No que diz respeito aos resíduos, as estatísticas mais recentes indicam que a produção total de resíduos diminuiu 4 % entre 2010 e 2020. Quanto aos resíduos urbanos finais, não foi detetada qualquer alteração significativa desde 2016. Ao mesmo tempo, os resíduos de embalagens aumentaram 19 % nos últimos 10 anos. À semelhança de outros domínios, o défice de aplicação das medidas em vigor e a não resolução de algumas fontes de poluição são as principais razões para os progressos limitados. Além disso, a presença de produtos químicos perigosos nos produtos continua a dificultar a reciclagem de materiais.
Em contrapartida, a poluição do ar e da água proveniente das atividades de produção na UE está a diminuir de forma constante, com as emissões da UE a diminuir entre 3 % e 26 % em 2015, dependendo do poluente em apreço. O impacto ecológico do consumo global da UE, a pegada material e a utilização de produtos químicos pela indústria e pelos consumidores são, até à data, relativamente estáveis, com valores mais baixos em 2020, muito provavelmente devido à pandemia de COVID-19. A pegada material, isto é, a procura mundial de extrações de materiais desencadeadas pelo consumo e investimento por empresas, famílias e administrações públicas nos países europeus, é muito elevada, situando-se em 13,7 toneladas por pessoa em 2020. De um modo geral, os impactos ambientais associados à produção e ao consumo da UE são elevados e insustentáveis, já excedendo significativamente a quota da UE sobre os vários limites do planeta. Por conseguinte, é importante ter mais em conta os impactos ambientais dos bens importados e a «exportação de poluição» para fora da UE. Tal é relevante, por exemplo, para o setor da extração dentro e fora da UE, considerando a importância das matérias-primas essenciais para o objetivo da UE de aumentar a sua autonomia estratégica e acelerar a transição ecológica. Outro fator a considerar é a transferência de resíduos.
A Comissão já está a tomar medidas para tornar os sistemas de consumo e produção mais seguros e sustentáveis, principalmente no âmbito do Plano de Ação para a Economia Circular (por exemplo, medidas relativas à transferência de resíduos, uma proposta sobre a conceção ecológica de produtos sustentáveis, a revisão da diretiva relativa a embalagens e resíduos de embalagens) e do Plano de Ação para a Poluição Zero (por exemplo, medidas relativas às emissões industriais), bem como da Estratégia da UE para a Bioeconomia. Estão previstas mais ações, em particular, a revisão dos regulamentos REACH e o quadro de avaliação da «segurança e sustentabilidade desde a conceção» para produtos químicos e materiais no âmbito da Estratégia para a Sustentabilidade dos Produtos Químicos, bem como a Iniciativa Alegações Ecológicas. O desenvolvimento de métodos e indicadores da pegada material e do impacto ecológico do consumo da UE e a sua comparação com os limites do planeta podem também ajudar a compreender melhor o sistema.
3.Prospetiva e antevisão para a poluição zero
As fontes para este capítulo abrangem uma série de projetos e iniciativas, incluindo estudos de modelização e de antevisão coordenados pela Comissão (ver infra). Na medida do possível, os cenários de modelização tiveram em conta os progressos esperados se a legislação da UE atual e proposta viesse a ser plenamente aplicada. No entanto, cada prospetiva baseia-se em pressupostos e limitações concretos documentados nas publicações específicas referenciadas infra. As conclusões deste exercício são apresentadas como prospetivas para o ar limpo, a água e os ambientes marinhos limpos, bem como para o solo limpo.
3.1.Poluição zero e saúde
As prospetivas para 2030 em relação à poluição atmosférica e sonora foram avaliadas em função da provável consecução das metas relacionadas com a saúde (ver ponto 2.1).
O terceiro Relatório sobre o Programa Ar Limpo concluiu que, caso se aplicasse plenamente a legislação atual e proposta da UE, haveria uma redução do número de mortes prematuras causadas pela poluição atmosférica em mais de 55 % em 2030, em comparação com 2005. Com efeito, em resultado da revisão da Diretiva Qualidade do Ar Ambiente proposta pela Comissão, é provável que possam ser alcançadas, em 2030, reduções de cerca de 70 %, em comparação com os níveis de 2005. Para garantir a concretização das projeções esperadas, é importante aplicar integralmente a legislação em vigor. Do mesmo modo, é importante que as recentes propostas políticas — em especial sobre as normas de emissões dos veículos (Euro 7), as emissões industriais (incluindo o alargamento do âmbito de aplicação da Diretiva Emissões Industriais de modo a abranger as grandes explorações agrícolas, o que deverá ter um impacto significativo na redução das emissões de amoníaco) e as iniciativas no âmbito do Objetivo 55 e do RePowerEU — sejam adotadas rapidamente, mantendo simultaneamente o nível de ambição proposto.
Embora se encontrem em vigor na UE, desde 2002, vários atos legislativos específicos relativos à poluição sonora, afigura-se pouco provável, nesta fase, que seja alcançada a meta de redução do número de pessoas afetadas pelo ruído dos transportes em 30 % até 2030 (em comparação com 2017). As estimativas atuais mostram que o número não diminuirá mais de 19 % até 2030, a menos que se adote um conjunto substancial de medidas adicionais a nível nacional, regional e local e que o reforço da ação da UE em todos os setores relevantes dos transportes conduza a uma redução significativa da poluição sonora. A distância em relação à meta pode ser ainda mais reduzida se os Estados-Membros reforçarem as suas medidas. Tal incluiria, nomeadamente, a execução de uma regulamentação mais rigorosa em matéria de ruído a nível dos transportes, por exemplo, melhorando os veículos e as suas operações e reduzindo significativamente o tráfego rodoviário e os limites de velocidade nas cidades. Este último aspeto já está previsto por muitas cidades no âmbito das suas medidas relativas ao clima e à qualidade do ar.
3.2.Poluição zero e biodiversidade
As prospetivas para 2030 em relação à poluição do ar, da água e do meio marinho por nutrientes foram avaliadas em função da provável consecução das metas relacionadas com a biodiversidade relevantes para os nutrientes (ver ponto 2.2). Nesta fase não foi efetuada qualquer avaliação dos pesticidas, dos antimicrobianos ou da poluição do solo, devido à falta de dados e à indisponibilidade de modelos adequados.
O terceiro Relatório sobre o Programa Ar Limpo considerou a situação mais preocupante. As políticas atuais e propostas da UE não parecem suficientes para permitir à UE reduzir em 25 % a superfície dos seus ecossistemas ameaçados pela poluição atmosférica em 2030, em comparação com 2005. No entanto, com a aplicação da revisão recentemente proposta das diretivas relativas à qualidade do ar ambiente, esta meta poderá ser alcançada.
A principal preocupação continua a ser as emissões de amoníaco provenientes da agricultura, o que exige muitos mais esforços de redução, dependendo, em grande medida, da adoção e implementação da nova Diretiva Emissões Industriais, bem como da adoção efetiva das medidas de combate à poluição propostas pelos Estados-Membros nos seus planos estratégicos da política agrícola comum (PAC).
As prospetivas para a água e o meio marinho limpos revelam que as metas acordadas em matéria de nutrientes e as medidas adicionais propostas até à data a nível da UE podem não ser suficientes para eliminar os impactos da poluição por nutrientes em todas as partes dos mares europeus. À semelhança dos cenários de poluição atmosférica, a redução das emissões de nutrientes dependerá fortemente da aplicação e execução da legislação ambiental pertinente (ou seja, a Diretiva Nitratos, a Diretiva-Quadro da Água e outra legislação pertinente no domínio da poluição da água, incluindo as diretivas revistas relativas às emissões industriais e às águas residuais urbanas). As medidas adotadas no âmbito da nova PAC podem contribuir para esta finalidade. As prospetivas são apoiadas por uma análise integrada dos nutrientes (analisando a poluição pelo azoto e pelo fósforo), que indica que podem ser realizados progressos com as medidas atuais, embora os Estados-Membros tenham de tomar novas medidas para cumprirem a meta relativa às perdas de nutrientes para o ambiente até 2030. A nível da UE, o próximo plano integrado de gestão dos nutrientes explorará novas medidas políticas para melhorar a eficiência na utilização de nutrientes e reduzir as perdas para o ambiente, bem como novas técnicas e as medidas necessárias para promover a recuperação e a reciclagem de nutrientes. Além disso, o Horizonte Europa apoiará abordagens sistémicas destinadas a limitar as emissões de nutrientes de diferentes fontes e a repor os seus fluxos dentro de limites ecológicos seguros, por exemplo, melhorando a gestão dos produtos fertilizantes na agricultura, tendo simultaneamente em conta as condições regionais. Analisará igualmente a redução do desperdício ao longo da cadeia alimentar, juntamente com as mudanças societais (como as alterações alimentares, as mudanças na produção e no consumo).
A prospetiva dos solos encontra-se numa fase inicial de desenvolvimento. Os trabalhos iniciados no âmbito da Estratégia de Proteção do Solo da UE e do Observatório dos Solos da UE (EUSO) incluem o desenvolvimento de ferramentas de modelização que permitam prever futuras tendências em matéria de poluição. Além disso, a missão da UE «Pacto Europeu para os Solos» define uma trajetória para promover e restaurar a saúde dos solos, nomeadamente por meio da monitorização alargada e harmonizada dos solos na Europa.
3.3.Poluição zero e economia circular
As prospetivas para 2030 em relação ao consumo e à produção analisaram a poluição e o consumo de plástico, mas não foi efetuada qualquer avaliação das metas conexas (ver ponto 2.3).
As prospetivas da água e do meio marinho também analisaram a modelização da poluição por plásticos no mar Mediterrâneo. Até 2030, prevê-se que as medidas relativas ao plástico de utilização única permitam reduzir o lixo total no Mediterrâneo em apenas 14 % (lixo flutuante e nas praias). É necessário realçar a dimensão internacional da poluição por plásticos, a fim de alcançar a meta da UE. Outra avaliação analisou os impactos do consumo na toxicidade em água doce como parte de uma prospetiva mais ampla sobre o impacto ecológico do consumo e previu que os impactos ambientais do consumo da UE continuariam a aumentar até 2030, prosseguindo a transgressão dos limites planetários, inclusive a nível da ecotoxicidade em água doce.
3.4.Poluição zero e antevisão
A antevisão e a exploração do horizonte revelaram que as atuais tendências e transformações societais, por exemplo, o aumento da digitalização e da descarbonização, terão impacto na poluição. Estas transformações podem trazer benefícios para a saúde e o ambiente, especialmente se a ambição de poluição zero for tomada como orientação. A título de exemplo, o roteiro tecnológico industrial para as tecnologias e modelos empresariais circulares, em preparação, recorda a necessidade de a investigação abordar as sinergias e os compromissos entre a circularidade e a poluição zero. Estas tendências emergentes e a transição ecológica e digital em curso podem proporcionar uma via para uma Europa mais sustentável, mas tal dependerá da situação socioeconómica.
4.Principais conclusões
O presente relatório integrado de acompanhamento e prospetiva da «poluição zero» sublinha, uma vez mais, que as três crises ambientais concomitantes — poluição, alterações climáticas e perda de biodiversidade — estão profundamente interligadas. A transição para um modelo económico limpo, circular e com impacto neutro no clima é cada vez mais premente, tanto para a UE como para o resto do mundo.
A atual crise económica e energética causada pela guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia e a recuperação da pandemia de COVID-19 estão a afetar a vida das pessoas em toda a UE. Algumas medidas de redução e controlo da poluição estão a falhar devido a perturbações na cadeia de abastecimento, que dificultarão muito mais os progressos na redução da poluição a curto prazo. No entanto, a médio e longo prazo, podemos tentar encontrar formas de transformar os atuais desafios em oportunidades para combater a poluição. Por exemplo, a vontade coletiva de aumentar a autonomia estratégica aberta da UE por meio da aceleração significativa da implantação de energias renováveis limpas, contribuirá também para reduzir a poluição.
É evidente que a cooperação mundial para fazer face à crise do planeta está a intensificar-se. A UE deve fazer parte da solução global, uma vez que a sua pegada de poluição é demasiado elevada. As desigualdades nos níveis de poluição são também elevadas, afetando as partes mais vulneráveis da sociedade. A UE está a liderar o apelo à obtenção de resultados ambiciosos nas negociações da COP15 para uma estratégia mundial para a biodiversidade e na conferência das Nações Unidas sobre a Década da Água, de março de 2023, assim como a preparar o caminho para um acordo mundial sobre os plásticos.
O presente relatório marca o ponto de partida da iniciativa «Rumo a ar, água e solo mais limpos na Europa». Os factos são convincentes, bem como os desafios e as oportunidades. De um modo geral, os níveis de poluição estão a diminuir em várias zonas de poluição, por exemplo, no que diz respeito à poluição atmosférica ou à causada por pesticidas. Ao mesmo tempo, persistem outros problemas de poluição, por exemplo, as tendências em matéria de ruído, poluição por nutrientes ou produção de resíduos urbanos, que se mantêm bastante estáveis nos últimos anos. A consecução das metas de poluição zero para 2030 não está garantida. Por conseguinte, é necessário acelerar a transição ecológica e digital para permitir à UE alcançar estas metas em 2030. Por seu lado, a Comissão realizou ou avançou em relação a todas as 33 ações anunciadas para 2021‑2024.
Para que a poluição zero se torne cada vez mais uma realidade é necessário concretizar:
1.o acordo dos colegisladores sobre as principais propostas legislativas;
2.o reforço da aplicação de atos legislativos fundamentais da UE a nível local, nacional e internacional;
3.a promoção de iniciativas globais, apoiando os países terceiros nos seus esforços.
Além disso, o relatório identificou uma série de deficiências, tais como a necessidade de uma melhor partilha e utilização dos dados disponíveis mais recentes. A Comissão, juntamente com a AEA, abordará as lacunas identificadas em matéria de conhecimentos e de dados (por exemplo, sobre a poluição do solo), a fim de apresentar um relatório ainda mais abrangente até 2024.
5.Próximas etapas
Este primeiro relatório de acompanhamento e prospetiva da «poluição zero» não só constitui um ponto de partida para acompanhar os progressos rumo à ambição de poluição zero da UE, como reúne dados facilmente disponíveis na primeira visão integrada e de alto nível à escala da UE das principais ameaças da poluição e das suas fontes, contribuindo futuramente para o primeiro relatório intercalar sobre o Pacto Ecológico Europeu e o 8.º PAA, previsto para o final de 2023. Além disso, apresenta informações pormenorizadas na maioria das secções por tipo de poluição (atmosférica, aquática, marinha, química e sonora) e salienta igualmente uma série de deficiências que serão especificamente abordadas até 2024.
Em especial, o relatório salienta que ainda existem lacunas significativas em matéria de conhecimentos e de dados em alguns domínios, designadamente, no que diz respeito à poluição do solo e às questões emergentes que necessitam de atenção. Para colmatar o défice de dados, o sistema europeu Copernicus de observação da Terra fornece um conjunto de dados, serviços e aplicações espaciais com um potencial considerável. A investigação e a inovação em curso e planeadas apoiarão igualmente as próximas edições do relatório. Outros domínios a melhorar são a disponibilidade de dados em tempo oportuno e a eficiência e eficácia da gestão dos conhecimentos sobre poluição (por exemplo, otimizando a comunicação de informações, promovendo a ciência cidadã e utilizando melhor as ferramentas digitais). Muitas iniciativas estão já em curso ou previstas, por exemplo, no âmbito da abordagem «uma substância, uma avaliação» ou das recentes propostas relativas à lista de poluentes da água.
A Comissão e a AEA liderarão o caminho para assegurar que o âmbito, a qualidade, a atualidade e a robustez do quadro de acompanhamento e prospetiva da «poluição zero» aumentarão com todas as edições. Além disso, a Agência Europeia dos Produtos Químicos e a AEA estão a trabalhar em conjunto para desenvolver um quadro de indicadores específicos para os produtos químicos, que será tido em conta no próximo relatório.
Serão também envidados esforços especiais para melhorar a apresentação e a visualização dos impactos da poluição, nomeadamente pela combinação e agregação dos vários dados a fim de melhor apoiar os esforços de comunicação. Além disso, as capacidades de prospetiva a nível do ar, da água, do meio marinho e, em especial, dos solos serão reforçadas, a fim de melhor apoiar a elaboração de políticas.
Estes esforços ajudarão também a apoiar as nove vertentes emblemáticas do Plano de Ação para a Poluição Zero, uma vez que um melhor acompanhamento e prospetiva nos ajudam a identificar as desigualdades no domínio da saúde, melhoram a nossa compreensão da dimensão da poluição causada por produtos e edifícios e permitem uma melhor utilização de soluções digitais para monitorizar a poluição. O sólido acompanhamento e prospetiva da «poluição zero» também contribuem para a avaliação da poluição global, uma vez que nos permitem concentrar em cidades e regiões específicas para determinar os seus progressos no sentido da poluição zero.
A Comissão convida as instituições da UE, os Estados-Membros, as empresas, as organizações não governamentais, o meio académico e outras partes interessadas a apresentarem observações sobre este primeiro relatório de acompanhamento e prospetiva da poluição zero. A Comissão utilizará igualmente a Plataforma das Partes Interessadas na Poluição Zero, criada em cooperação com o Comité das Regiões, para ajudar a preparar o segundo relatório de acompanhamento e prospetiva da poluição zero em 2024.
A próxima versão do relatório fará o balanço dos progressos iniciais realizados e definirá uma perspetiva para a consecução das metas de poluição zero para 2030, em consonância com a visão de poluição zero para 2050, contribuindo assim para a revisão intercalar do quadro de acompanhamento do 8.º PAA, prevista para 2024.