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Document 52020JC0013

RELATÓRIO CONJUNTO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE HONG KONG: RELATÓRIO ANUAL 2019

JOIN/2020/13 final

Bruxelas, 22.7.2020

JOIN(2020) 13 final

RELATÓRIO CONJUNTO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO

REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE HONG KONG:
RELATÓRIO ANUAL 2019


RELATÓRIO CONJUNTO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO

REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE HONG KONG:

RELATÓRIO ANUAL 2019

Resumo

Desde a transferência da soberania de Hong Kong para a República Popular da China (RPC), em 1997, a União Europeia (UE) e os seus Estados-Membros têm acompanhado de perto a evolução política e económica na Região Administrativa Especial (RAE) de Hong Kong. A UE confirma a sua política de «uma só China» e apoia o princípio «um país, dois sistemas» e a respetiva aplicação. A fim de dar cumprimento ao compromisso assumido perante o Parlamento Europeu em 1997, a Comissão apresenta um relatório anual sobre a evolução da situação em Hong Kong. O presente documento é o vigésimo segundo relatório e refere-se a 2019.

O ano de 2019 foi especialmente difícil para Hong Kong, com uma contínua agitação, que foi inicialmente desencadeada pelas propostas de alteração da lei relativa à extradição, cuja primeira leitura no Conselho Legislativo decorreu em 3 de abril de 2019. Na segunda metade do ano, ocorreram grandes manifestações, protestos e violência associada, cercos a universidades, vandalismo e a perturbação das redes de transporte, do aeroporto e de outros aspetos da vida diária. Os manifestantes expressaram cinco exigências ao Governo de Hong Kong. A agitação devia-se tanto a preocupações políticas como socioeconómicas. A resposta do governo incluiu a retirada do projeto de lei sobre extradição, a invocação dos poderes de emergência pela primeira vez desde 1967, a fim de estabelecer uma lei «antimáscara», e um envolvimento limitado com o movimento de contestação através do diálogo comunitário. As alegações de violência policial estavam na base das exigências dos manifestantes no sentido da criação de uma comissão geral de inquérito. No entanto, o Governo de Hong Kong recusou-se a criar essa comissão independente. O conselho independente de instrução de queixas contra as forças policiais (Independent Police Complaints Council – IPCC) está a avaliar vários casos de alegados abusos pela polícia e devia ter publicado um relatório preliminar no início de 2020. Contudo, a adequação dos seus poderes foi questionada.

A forma pacífica como foram conduzidas as eleições para os conselhos distritais, em novembro, alimentou as esperanças de uma inversão da escalada de violência. O nível histórico de 71,2 % de afluência às urnas provou o quão importante é para a população de Hong Kong o exercício dos seus direitos democráticos. Na sequência das eleições, continuaram a ocorrer até ao final do ano, manifestações de protesto maciças maioritariamente pacíficas e alguns incidentes de violência.

A UE continua a incentivar a RAE de Hong Kong e as autoridades governamentais centrais a relançarem a reforma eleitoral, consagrada na Lei Fundamental, e a chegarem a acordo sobre um sistema eleitoral que seja democrático, equitativo, aberto e transparente. O sufrágio universal proporcionaria ao Governo de Hong Kong um maior apoio público e legitimidade, contribuindo para a consecução dos objetivos económicos de Hong Kong e a resolução dos seus problemas socioeconómicos. É necessária uma resposta convincente às reivindicações expressadas através das manifestações e protesto em curso, a fim de assegurar a estabilidade de Hong Kong a longo prazo.

As preocupações intensificaram-se devido à erosão do princípio «um país, dois sistemas» e da autonomia de Hong Kong, Em geral, as liberdades fundamentais continuam a estar garantidas em Hong Kong e o Estado de direito e a independência do poder judicial permanecem salvaguardas essenciais. No entanto, têm-se registado algumas tendências preocupantes no que diz respeito à liberdade de expressão, nomeadamente no contexto das atuais manifestações de protesto. O acórdão do Supremo Tribunal, de 18 de novembro, sobre a inconstitucionalidade da lei «antimáscara» levou Pequim a sugerir que os tribunais de Hong Kong não podem decidir sobre a constitucionalidade da legislação de Hong Kong e a sua conformidade com a Lei Fundamental. Quaisquer medidas para limitar as prerrogativas dos tribunais neste contexto prejudicariam a autonomia conferida a Hong Kong, incluindo a independência do seu poder judicial e o Estado de direito. O sistema de combate à corrupção manteve-se forte e resiliente.

No plano económico, 2019 foi um ano difícil para Hong Kong, que registou uma contração de 1,2 % do PIB e o seu primeiro défice orçamental em 15 anos. Tal deveu-se, em grande parte, a fatores externos já presentes no final de 2018, nomeadamente o abrandamento da economia chinesa e o conflito comercial entre os Estados Unidos e a China, apesar de a agitação na segunda metade de 2019 ter tido um efeito negativo especialmente nos setores relacionados com o turismo. Todavia, Hong Kong dispõe de importantes reservas orçamentais e de divisas estrangeiras, que lhe permitem enfrentar esta conjuntura difícil, assegurar a estabilidade atual e apoiar as empresas. Os seus setores financeiro e bancário permanecem resilientes e altamente competitivos, permitindo-lhe continuar a ser a primeira plataforma de ofertas públicas iniciais (OPI) do mundo e evitar saídas de capitais motivadas pelo pânico.

A comunidade empresarial europeia em Hong Kong foi afetada em diferentes graus pela situação económica e pela agitação. As empresas europeias estão, na sua maioria, à espera para ver como evoluirá a situação, embora estejam profundamente preocupadas com o impasse político, a violência e a pressão que as empresas estão a sofrer a um nível sem precedentes. A comunidade empresarial europeia valoriza o forte sistema jurídico de Hong Kong, a independência do sistema judicial, os direitos e as liberdades fundamentais, bem como um ambiente empresarial livre de interferências políticas, enquanto elementos essenciais da competitividade da região. Qualquer erosão desses ativos afetaria negativamente a atratividade de Hong Kong neste contexto e a sua vantagem sobre outros centros de negócios.

A UE emitiu várias declarações durante o ano. O porta-voz da UE fez três declarações, em 12 de junho, 1 de julho e 13 de agosto, e a Alta Representante fez três declarações em nome da União Europeia, em 17 de agosto, 2 de outubro e 18 de novembro, as quais sublinharam questões como a necessidade de:

·rejeitar a violência,

·encetar um diálogo inclusivo, frisando a vontade da União Europeia de apoiar aqueles que estão dispostos a trabalhar para inverter a escalada de violência e estabelecer um diálogo,

·garantir o respeito pela liberdades fundamentais,

·instituir um inquérito abrangente sobre a violência, a utilização de força e as causas profundas das manifestações de protesto.

O Parlamento Europeu realizou um debate em 18 de julho, sobre Hong Kong, e adotou uma resolução sobre a situação.

Evolução da situação política 

O ano de 2019 foi dominado pelo debate relativo ao projeto de lei sobre criminosos procurados pela justiça e assistência judiciária mútua em matéria penal («projeto de lei sobre extradição») e pelas manifestações de protesto maciças, desencadeadas pela medida proposta. O Gabinete de Segurança de Hong Kong apresentou a proposta em fevereiro de 2019, com vista a facilitar a extradição de criminosos para a China, Taiwan, entre outros locais. A falta de bases para a extradição de um cidadão de Hong Kong acusado de homicídio para Taiwan foi citada como uma justificação para a reforma. 

O projeto de lei sobre extradição foi severamente criticado por profissionais dos setores jurídico e empresarial, bem como pela sociedade civil. As críticas estavam relacionadas principalmente com o facto de o projeto inicial abranger um amplo conjunto de infrações e não prever uma análise suficiente dos casos de extradição propostos, e com o facto de o sistema jurídico da China continental não assegurar uma proteção adequada dos direitos humanos e das garantias processuais. Em resposta, o Governo de Hong Kong reviu a proposta, reduzindo a lista de infrações suscetíveis de implicar a extradição de 46 para 37 e especificando que as infrações suscetíveis de implicar a extradição têm de ser puníveis com penas de prisão superiores a três anos. A oposição social à proposta intensificou-se, com grandes manifestações e debates acesos no Conselho Legislativo.

Com a escalada de confrontos sobre esta questão, o governo limitou a análise da proposta legislativa ao Comité do Conselho Legislativo. A inclusão de salvaguardas adicionais no projeto de lei não atenuou a oposição pública. A Frente Civil pelos Direitos Humanos declarou que uma marcha realizada a 9 de junho contra o projeto de lei tinha contado com a participação de um milhão de pessoas. Em 15 de junho, a Chefe do Executivo, Carrie Lam, anunciou a suspensão, mas não a retirada, do projeto de lei sobre extradição. Outra marcha, realizada em 16 de junho, atraiu alegadamente dois milhões de participantes, a maior concentração de sempre deste género em Hong Kong. Ambas as marchas foram pacíficas. Subsequentemente, o edifício do Conselho Legislativo e outros edifícios governamentais tornaram-se pontos de concentração de manifestantes. Em 1 de julho, alguns manifestantes saquearam o edifício do Conselho Legislativo, causando danos consideráveis e o encerramento do edifício durante três meses. Houve indignação pública na sequência de ataques violentos a passageiros perpetrados por um grupo de pessoas com máscara numa estação de comboios em Yuen Long. O ataque ocorreu depois de uma marcha contra o projeto de lei sobre extradição e de avisos de que os manifestantes sofreriam retaliações se fossem a Yuen Long. A polícia foi fortemente criticada por não ter intervindo para controlar a violência de forma tempestiva. Este incidente está atualmente a ser investigado pelo IPCC.

O projeto de lei só foi retirado total e formalmente em 23 de outubro. A cedência parcial, em junho, não foi suficiente para acalmar as manifestações de protesto, e os manifestantes passaram a apresentar cinco exigências:

1.a retirada formal do projeto de lei;

2.a criação de uma comissão de inquérito independente para examinar questões nomeadamente relacionadas com a alegada violência policial durante a agitação;

3.o fim da utilização da palavra «motim» pelas autoridades para qualificar as manifestações de protesto, sendo essa infração punível com uma pesada pena de prisão de até 10 anos;

4.amnistia para as pessoas que foram detidas; e

5.a introdução do sufrágio universal nas eleições para Chefe Executivo e para o Conselho Legislativo, em conformidade com as disposições da Lei Fundamental.

As táticas do movimento de contestação, sem líderes mas bem organizado, evoluíram no decurso das manifestações. Além das frequentes manifestações e marchas autorizadas e não autorizadas, registaram-se bloqueios recorrentes do sistema de transportes de Hong Kong. Ocupações e manifestações de protesto maciças no aeroporto internacional entre julho e setembro prejudicaram gravemente o funcionamento dos serviços e levaram à imposição de restrições à entrada para os terminais. O sistema de transportes coletivos tem sido particularmente alvo de perturbações e vandalismo à luz das acusações dos manifestantes de que a empresa que opera o sistema compactua com o governo para impedir as manifestações de protesto, nomeadamente através do encerramento de estações nos locais onde ocorrem essas manifestações. As cadeias empresariais cujos proprietários ou a gestão sejam vistos como apoiantes de Pequim também se tornaram alvo de vandalismo.

Episódios frequentes e graves de violência marcaram algumas manifestações de protesto, como, por exemplo, o lançamento de bombas de gasolina e o arremesso de outros objetos. Há a preocupação de que alguns membros do movimento de contestação estejam a radicalizar-se. A polícia recorreu frequentemente à utilização de gás lacrimogéneo e ao disparo de balas de borracha e beanbags, tendo também sido disparadas balas reais. Foram descobertos vários dispositivos explosivos improvisados ao longo do ano. Em novembro, um manifestante alegou que sofreu ferimentos graves depois de ter sido baleado na zona abdominal pela polícia, um manifestante morreu depois de ter caído de um parque de estacionamento e um homem ficou gravemente ferido depois de ter sido incendiado após uma discussão com manifestantes.

Houve muitas alegações de excessos e abusos cometidos pelas autoridades policiais, tendo alguns desses incidentes sido filmados. As alegações estão a ser investigadas pelo IPCC, que devia ter elaborado, até ao início de 2020, um relatório público sobre a forma como a polícia atua durante as manifestações de protesto. Muitas das pessoas que integram o movimento de contestação não confiam no IPCC, cuja credibilidade foi afetada com a retirada de cinco peritos internacionais, nomeados pelo governo, em setembro de 2019, para o ajudar no seu trabalho. Os peritos declararam publicamente que o IPCC não tinha poderes e capacidades de investigação suficientes. A publicação do relatório intercalar do IPCC foi adiada enquanto se aguardava o resultado de uma revisão judicial para apurar se o IPCC tem os poderes necessários para realizar investigações relacionadas com a agitação civil.

Em novembro, os manifestantes ocuparam diversos campus universitários. A Universidade Chinesa e a Universidade Politécnica foram palco de confrontos violentos com a polícia e de cercos que duraram vários dias. Muitas pessoas ficaram feridas e foram feitas várias detenções. Várias figuras importantes da sociedade civil, incluindo algumas tradicionalmente ligadas a Pequim, envidaram esforços para fazer a mediação entre a polícia e os manifestantes, assegurando a passagem segura de alguns manifestantes. A detenção e os maus-tratos de profissionais de saúde que prestavam cuidados médicos de emergência na Universidade Politécnica suscitaram graves preocupações. Foi observado que tal dissuadia os manifestantes feridos de pedir assistência médica e que violava as normas humanitárias. Em resultado dos danos às instalações e do clima de tensão, os semestres universitários foram encurtados, tendo-se recorrido, consequentemente, ao ensino à distância. As eleições para os conselhos distritais em novembro deram lugar a um período mais calmo, em dezembro, com o regresso de manifestações e marchas, na sua maioria sem violência. A polícia mostrou-se mais disposta a autorizar as concentrações e a Frente Civil pelos Direitos Humanos foi autorizada a organizar uma marcha, pela primeira vez desde agosto. Continua a haver um forte apoio ao movimento de contestação: a participação nas marchas autorizadas continuou a ser considerável. Segundo a Frente Civil pelos Direitos Humanos, cerca de 800 000 pessoas participaram numa marcha em 8 de dezembro, para assinalar o Dia Internacional dos Direitos Humanos das Nações Unidas.

A resposta do Governo de Hong Kong à contínua agitação incluiu o recurso aos plenos poderes de emergência, estabelecidos durante a era colonial. Em outubro, a Chefe do Executivo no Conselho invocou o Decreto de Emergência de 1922, a fim de estabelecer um regulamento para proibir o uso de máscaras em concentrações públicas, com entrada em vigor em 5 de outubro («regulamento que proíbe a cobertura do rosto»). Esta foi a primeira vez, desde 1967, que se recorreu a tais poderes. Embora esta medida tenha atraído o apoio de muitos daqueles que integravam a ala política pró-governamental, também suscitou fortes críticas pelo facto de restringir a liberdade pessoal, pela sua inaplicabilidade e pela ausência de análise pelos legisladores.

Em 18 de novembro, o Tribunal Supremo determinou, em resultado de uma ação judicial, que o regulamento era incompatível com a Lei Fundamental e que as restrições aos direitos decorrentes da legislação eram consideradas desproporcionadas para legitimar os objetivos do governo. Aguarda-se um acórdão do Tribunal de Última Instância sobre a questão.

Em 26 de setembro, Carrie Lam enfrentou duras perguntas de 150 membros do público durante o único diálogo comunitário público até à data. Foi criado um Gabinete de Diálogo, no âmbito do Gabinete de Inovação e Coordenação Política, para orientar os esforços de diálogo. Os parceiros internacionais, incluindo a UE, incentivaram os esforços para intensificar o diálogo, a fim de inverter a escalada da situação. A sociedade civil também envidou esforços no sentido de promover o diálogo.

Em 21 de novembro, o Congresso dos Estados Unidos promulgou a lei dos Estados Unidos relativa aos direitos humanos e à democracia em Hong Kong e a lei relativa à proteção de Hong Kong. O Governo da República Popular da China e a administração de Hong Kong criticaram severamente a medida, que, por sua vez, foi bem acolhida por uma grande parte do movimento de contestação. A referida lei prevê uma avaliação regular do grau em que a autonomia de Hong Kong está a ser garantida, a qual está relacionada com o estatuto especial que os Estados Unidos concederam a Hong Kong, e estabelece uma base para possíveis sanções contra pessoas que violem os direitos humanos em Hong Kong. A lei relativa à proteção proíbe a exportação para Hong Kong de determinados bens destinados a fins repressivos.

As eleições para os conselhos distritais realizaram-se em 24 de novembro, apesar de alguns membros do movimento de contestação recearem que as votações viessem a ser suspensas no contexto da agitação. A violência marcou, efetivamente, de forma negativa a época de campanha, tendo ocorrido alguns ataques físicos a candidatos e o vandalismo de instalações de partidos políticos. No entanto, as eleições propriamente ditas decorreram num clima pacífico e a afluência às urnas foi de 71,2 %, o nível mais elevado de sempre. Os representantes pan-democráticos conseguiram 395 dos 452 lugares e o controlo de 17 dos 18 conselhos. Os conselhos distritais apenas detêm limitados poderes consultivos e políticos e fiscalizam orçamentos substanciais. Todavia, os conselheiros distritais determinam 117 dos 1 200 lugares no comité eleitoral que nomeia o Chefe do Executivo e a fação pan-democrática no comité eleitoral ficou agora fortalecida, antes da próxima nomeação do Chefe do Executivo, em 2022.

A agitação contínua e a resposta do governo à mesma afetaram o apoio público à administração. Os resultados de uma sondagem de opinião, publicados em outubro, revelaram que o apoio do público à Chefe do Executivo desceu para um nível histórico de 20,2 %. Outras sondagens realizadas no final do ano colocaram em evidência o impacto negativo das manifestações de protesto sobre a confiança do público nas autoridades.

A UE emitiu várias declarações em reposta à evolução da situação em Hong Kong durante o ano. A Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança (AR/VP) emitiu declarações em nome da UE em 18 de novembro, 2 de outubro e 17 de agosto. Também foi proferida uma declaração conjunta com o ministro dos Negócios Estrangeiros do Canadá, em 17 de agosto. O porta-voz da Alta Representante emitiu declarações em 13 de agosto, 1 de julho de 12 de junho. O Parlamento Europeu realizou um debate de emergência em 18 de julho sobre a situação em Hong Kong, tendo adotado uma resolução nesta matéria. A situação em Hong Kong foi referida em declarações da UE à Terceira Comissão da Assembleia Geral das Nações Unidas e ao Conselho dos Direitos Humanos da Nações Unidas.

Direitos, liberdades e igualdade de oportunidades

A adesão à autodeterminação ou independência continuaram a levar à exclusão dos processos eleitorais. Joshua Wong, o secretário-geral do Partido Demosistō, foi impedido de se candidatar às eleições para os conselhos distritais em 24 de novembro. Foi o único candidato, entre 1 098 potenciais conselheiros, a ser desqualificado. Em três cartas dirigidas às autoridades, e em resposta às perguntas do responsável pelo ato eleitoral, Joshua Wong distanciou-se da sua anterior posição de apoio à independência. O responsável pelo ato eleitoral alegou, na explicação para a desqualificação, que nem Joshua Wong nem o Demosistō tinham mudado verdadeiramente a sua posição relativamente à independência.

Em setembro de 2019, o Supremo Tribunal analisou a exclusão de Agnes Chow da candidatura às eleições intercalares para o Conselho Legislativo, em 2018, com base na sua afiliação ao Demosistō, que defende a autodeterminação. O Supremo Tribunal deliberou a favor do recurso de Agnes Chow por razões processuais, uma vez que não lhe tinha sido dada a justa oportunidade de responder à alegação de que não defenderia a Lei Fundamental. O juiz considerou que tinha havido uma «violação do princípio da justiça natural ou da equidade processual». Porém, acrescentou, no seu acórdão, que a defesa da autodeterminação ou da independência não era compatível com a Lei Fundamental.

Os meios de comunicação social de Hong Kong, inclusivamente em linha, permanecem diversificados e continuam a gozar de um elevado nível de liberdade. Contudo, há preocupações com a influência política em alguns meios de comunicação social e com a censura. Também foram suscitadas preocupações com a alegada perseguição de jornalistas, incluindo o recurso à violência pela polícia durante as manifestações de protesto, e com o impedimento do trabalho dos jornalistas no contexto das manifestações de protesto. A associação Foreign Correspondents’ Club e a Associação de Jornalistas de Hong Kong são algumas das entidades que emitiram declarações sobre esta questão 1 . Hong Kong ficou em 73.º lugar no Índice Mundial da Liberdade de Imprensa, compilado pela organização Reporters Without Borders (RSF).

A liberdade de reunião foi amplamente respeitada durante um ano difícil em termos de ordem pública, tendo as autoridades concedido autorização para muitas manifestações de protesto e marchas públicas. Com a intensificação da violência, tornou-se cada vez mais frequente a recusa de autorização dessas concentrações por razões de segurança. Uma consequência deste facto foi uma maior tendência para a realização de concentrações não autorizadas, com o risco associado de confrontos entre manifestantes e a política.

Direitos das pessoas LGBTI. O novo presidente da Comissão para a Igualdade de Oportunidades, Ricky Chu Man-kin, frisou que serão envidados esforços para aplicar medidas antidiscriminação, a fim de proteger os direitos das pessoas LGBTI. Atualmente, a legislação em matéria de igualdade apenas abrange o sexo, a deficiência, a raça e estado civil. Os processos intentados por ativistas da comunidade LGBTI nos tribunais tiveram algum sucesso na efetivação da reforma jurídica. O Gabinete da UE aliou-se a outras missões para participar no desfile anual de LGBTI.

Hong Kong continuou a investir em esforços para combater o tráfico de seres humanos e elaborou um plano de ação para esse fim. Estão a ser afetados recursos adicionais para a aplicação de medidas em que se inclui o rastreio de possíveis vítimas. O recurso a um «emaranhado» de legislação para combater o tráfico, em vez de um único ato legislativo, tem sido referido como uma fragilidade na resposta de Hong Kong. A UE e Hong Kong continuaram a cooperar de forma estreita nesta questão. O tráfico foi debatido na reunião anual do Diálogo Estruturado entre a UE e Hong Kong, realizada em novembro. O quarto seminário anual UE-Hong Kong sobre a prevenção do tráfico, financiado pelo programa TAIEX da UE, realizou-se em 12 e 13 de dezembro. Abordou questões que são de interesse comum, como a cooperação com a sociedade civil e o setor privado, bem como o tráfico de crianças.

Continuam a existir insuficiências na proteção jurídica efetiva dos trabalhadores domésticos estrangeiros. O salário mínimo obrigatório não se aplica a esses trabalhadores, que são obrigados a viver com os seus empregadores e têm de encontrar trabalho no prazo de duas semanas, depois de ficarem desempregados, ou arriscam-se a ser deportados. O governo tomou algumas medidas para dar resposta a estas preocupações, incluindo a criação de uma linha direta para trabalhadores domésticos estrangeiros que procuram aconselhamento e assistência. Também foi introduzido um rastreio melhorado desses trabalhadores para detetar casos de tráfico e trabalho forçado. O Gabinete da UE organizou a exibição de um filme e um painel de discussão sobre os direitos dos trabalhadores domésticos estrangeiros na Universidade Chinesa, em 15 de setembro.

A pobreza e a desigualdade continuam a ser preocupações reais, já que 20 % da população vive abaixo do limiar de pobreza. São poucos os que conseguem comprar uma casa no mercado imobiliário mais caro do mundo e quase 45 % da população vive em habitações arrendadas. No seu no seu discurso de política geral de 16 de outubro, a Chefe do Executivo anunciou várias medidas para dar resposta às queixas socioeconómicas.

O sistema de combate à corrupção mantém-se forte e resiliente. Hong Kong aplica normas muito elevadas em matéria de transparência e medidas de combate à corrupção. As autoridades e figuras políticas e empresariais reconhecem que a transparência é vital para manter a posição sólida de Hong Kong enquanto centro internacional de negócios.

Evolução económica

A economia de Hong Kong deteriorou-se significativamente em 2019, com uma contração de 1,2 % no PIB. Na primeira metade do ano, prosseguiu o abrandamento da economia que teve início em 2018, resultando num crescimento do PIB de apenas 0,6 %, em relação ao ano anterior. A dependência de Hong Kong do comércio e financiamento internacionais e o papel que desempenha como ponte comercial, empresarial e financeira entre a China e o resto do mundo tornam este território particularmente vulnerável às dificuldades externas e aos desenvolvimentos no continente. Com o início da agitação, em junho, a economia de Hong Kong caiu em recessão e o PIB diminuiu -2,8 % na segunda metade do ano.

No final de 2019, Hong Kong registava o seu primeiro défice em 15 anos, devido a vendas de terrenos e receitas fiscais mais baixas e a um aumento da despesa. Em setembro, a agência Fitch Ratings baixou a notação de crédito de Hong Kong para AA (de AA+), com uma perspetiva negativa, e a Moody's também alterou a perspetiva de Hong Kong para «negativa». Contudo, mesmo após essa descida, a notação do território permaneceu firmemente no nível de investimento e Hong Kong tem importantes reservas orçamentais, que representam 40 % do PIB.

O comércio externo de Hong Kong foi prejudicado pela conjuntura externa conturbada. As exportações e importações de mercadorias diminuíram 4,1 % e 6,5 %, respetivamente, durante o ano, o que teve repercussões nos setores dos serviços relacionados com o comércio, que representam 20 % do emprego e PIB de Hong Kong. Além disso, as vendas a retalho sofreram uma queda drástica na segunda metade do ano, devido à agitação, e foram 11,1 % mais baixas em todo o ano. O comércio externo, as vendas a retalho e o crescimento do PIB já tinham começado a descer em 2018, indicando que a economia estava a perder dinâmica muito antes do início da agitação, em junho.

Uma das consequências mais visíveis da agitação tem sido a diminuição do número de turistas. Após o mês de junho, as chegadas de turistas diminuíram 39 % em relação ao ano anterior. Tradicionalmente, cerca de 80 % dos turistas provêm da China continental, estimando-se que representem 40 % das vendas a retalho totais na cidade, nomeadamente no setor dos artigos de luxo. Além das vendas a retalho, a diminuição da chegada de turistas também foi fortemente sentida nos setores da hotelaria, da restauração, das bebidas e dos transportes.

Apesar do abrandamento, o desemprego aumentou apenas marginalmente – de 2,8 %, no último trimestre de 2018, para 3,3 %, no último trimestre de 2019. No entanto, o mercado de trabalho pode sofrer uma maior pressão se a economia não recuperar. A inflação manteve-se sob controlo, com uma inflação dos preços a nível do consumo de 3 % no ano em causa.

Os preços do imobiliário desceram 4,5 % entre maio e dezembro, mas, graças ao forte início do ano, os preços registaram uma subida de 5,4 % em 2019 no seu conjunto. Hong Kong continua a ser um dos centros urbanos menos acessíveis do mundo para os compradores nacionais. O tempo médio de espera para arrendar uma habitação social aumentou para 5,4 anos.

Apesar de o setor financeiro ser mais resiliente do que o resto da economia, devido à sua grande exposição à China e à região e à importância relativamente baixa das operações locais, não foi totalmente poupado do impacto do abrandamento. O número de ofertas públicas iniciais diminuiu no terceiro trimestre, mas recuperou a partir de setembro, incluindo a amplamente divulgada cotação secundária da Alibaba. Hong Kong manteve mesmo o seu título de primeira plataforma de OPI do mundo para o ano em causa. No entanto, o volume de negócios diário no mercado desceu 18,9 % em relação ao ano anterior e o índice Hang Seng ficou atrás de outros índices importantes. A evolução dos mercados bolsistas foi fortemente influenciada pela evolução da situação na China continental e pelas constantes tensões entre a China e os Estados Unidos. No entanto, o setor bancário permaneceu sólido com níveis de capitalização e liquidez dos bancos acima dos níveis internacionais. Hong Kong também dispõe de importantes reservas de divisas estrangeiras para apoiar o comité monetário do dólar de Hong Kong, tendo evitado, em grande medida, saídas de capital motivadas pelo pânico.

Hong Kong continuou a apresentar-se como uma plataforma para o financiamento verde na região, com base no seu setor de gestão de ativos e na política de apoio ao financiamento verde do governo. Angariou mil milhões de dólares americanos (USD) em maio de 2019, através da primeira emissão de obrigações verdes soberanas, denominadas em dólares americanos. Em 2019, as autoridades de Hong Kong também se concentraram em desenvolver infraestruturas de mercado (ou seja, criação de capacidade de financiamento verde nas instituições financeiras).

Foi realizada uma reforma no domínio das auditorias em 2019, que converteu o Conselho de Informações Financeiras (Financial Reporting Council – FRC) num órgão de supervisão independente, que regula os auditores e promove a transição da autorregulação para a supervisão independente, com conformidade com as normas internacionais. Em novembro de 2019, o FRC adotou uma nova abordagem regulamentar para as plataformas de comercialização de ativos virtuais, regulando-as a título voluntário. Só podem ser concedidas licenças aos operadores que cumprem as mais elevadas normas regulamentares. Prossegui o desenvolvimento do sistema de pagamento acelerado (Faster Payment System – FPS), com a interligação de carteiras eletrónicas de vários bancos, nomeadamente para os pagamentos em renminbi (RMB). Apesar de os serviços de carteira eletrónica também serem fornecidos na China continental, ainda não é possível uma interligação.

No que diz respeito ao apoio à economia pelo Governo de Hong Kong, a Autoridade Monetária de Hong Kong (AMHK) conseguiu acompanhar a Reserva Federal dos Estados Unidos e baixou as taxas de juro várias vezes durante o ano. O amortecedor de capital anticíclico também foi reduzido em outubro, de 2,5 % para 2 %, para apoiar o crédito bancário. No domínio orçamental, o Governo lançou pacotes de medidas de apoio no valor de 30 mil milhões de dólares de Hong Kong (HKD) (3,5 mil milhões de EUR). Estas medidas visavam principalmente reduzir os encargos financeiros nos agregados familiares, apoiar as PME e ajudar os setores do transporte e do turismo. Os observadores criticaram os pacotes pela sua reduzida dimensão, representando apenas 1 % do PIB. Importa notar que, em novembro, o FMI recomendou uma maior despesa pública para apoiar a economia e solucionar os desafios estruturais (escassez de habitação, desigualdade de rendimentos, etc.).

Em outubro, a Chefe do Executivo, no seu discurso de política geral de 2019, centrou-se na habitação e em questões sociais, No que concerne às questões sociais, o discurso retoma, em parte, medidas de apoio anunciadas anteriormente, acrescentando ao mesmo tempo uma série de novas medidas. No que toca à habitação, a proposta mais surpreendente era a de utilizar o Decreto de Recuperação de Terrenos para retirar a promotores imobiliários terrenos destinados à criação de zonas habitacionais de elevada densidade, mas para os quais ainda não existiam planos de desenvolvimento, e de utilizar esses terrenos para a habitação pública.

Durante 2019, as empresas europeias mantiveram, na sua maioria, a abordagem de «esperar para ver». As empresas que utilizam Hong Kong como um centro regional para a região mais vasta Ásia-Pacífico foram essencialmente afetadas pelo conflito comercial entre os Estados Unidos e a China e pela debilidade do comércio mundial. Para as empresas dedicadas às vendas locais, a agitação foi motivo de grande preocupação, especialmente no setor retalhista (nomeadamente, dos artigos de luxo) e nos setores da hotelaria, da restauração e das bebidas, os quais registaram reduções significativas nas vendas, cuja principal razão foi a drástica diminuição do número de visitantes e das despesas de consumo. Algumas empresas decidiram reduzir as operações. Se a situação não melhorar, as empresas poderão ser obrigadas a ponderar outras medidas.

O projeto de lei sobre extradição e o seu processo de adoção, agora colocados de parte, representaram uma grande preocupação para a comunidade empresarial europeia. à medida que a agitação foi aumentando, as empresas europeias condenaram claramente a violência, expressando simultaneamente a sua grande preocupação com o impasse político e a forma como este afetava o clima empresarial em Hong Kong.

Em 2019, a pressão política crescente e a interferência na condução das atividades normais foram novos elementos em Hong Kong, observados com preocupação pela comunidade empresarial em geral. A eficiência operacional de Hong Kong, o seu papel enquanto principal centro financeiro offshore da China continental, o seu elevado nível de autonomia, o seu poder judicial independente e o respeito generalizado pelo Estado de direito são consideradas importantes vantagens competitivas. A erosão de qualquer uma destas vantagens minaria a atratividade de Hong Kong como centro de negócios internacional.

Comércio e outras políticas

Em março, Hong Kong assinou o acordo de comércio livre (ACL) com a Austrália. O ACL com a Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) (assinado em 2017) entrou em vigor para o Laos, Mianmar/Birmânia, Singapura, a Tailândia, o Vietname e a Malásia em 2019. Hong Kong também anunciou publicamente a sua intenção de aderir à Parceria Económica Regional Abrangente (RCEP) e de negociar outros ACL, nomeadamente com a Tailândia e o Reino Unido após a saída deste último da UE. Em 2019, não foram celebrados novos acordos de promoção e proteção do investimento, embora estejam em curso negociações com a Rússia, o Irão e a Turquia.

Incentivar a investigação e a inovação continua a ser uma prioridade para o Governo de Hong Kong: o discurso de política geral da Chefe do Executivo anunciou a reforma de vários regimes de apoio à inovação e tecnologia. Para apoiar a inovação, Hong Kong também introduziu um sistema original de concessão de patentes. A inovação também é incentivada no domínio do financiamento, com o objetivo de tornar Hong Kong líder na tecnologia para a prestação de serviços financeiros («fintech») e no financiamento verde: em 2019, assistiu-se à concessão pela cidade das primeiras oito licenças bancárias virtuais e à emissão do primeiro grupo de obrigações verdes do governo no valor de mil milhões de USD 2 .

A proteção ambiental e a descarbonização continuaram a ser desafios substanciais para Hong Kong em 2019. No domínio dos resíduos, o governo tomou medidas para reduzir a uso de palhinhas de plástico e de recipientes alimentares de polyfoam em instalações utilizadas, maioritariamente, por funcionários do governo. No entanto, um programa de tarifação dos resíduos sólidos, há muito debatido, que foi apresentado ao Conselho Legislativo em novembro de 2018, ainda está pendente. O único plano notório para resolver o problema da quantidade crescente de resíduos gerados na cidade é a construção de um incinerador de grandes dimensões, para a produção de energia a partir de resíduos. As políticas e os instrumentos de redução, recuperação e reciclagem de resíduos permanecem amplamente ausentes. No domínio da poluição atmosférica, a entrada em vigor, em janeiro de 2019, de um regulamento que prevê que as embarcações em águas de Hong Kong devem utilizar combustível com um teor de enxofre limitado (até 0,5 %) representou um avanço significativo. Hong Kong também publicou uma consulta pública sobre descarbonização, tendo em vista desenvolver uma estratégia a longo prazo neste domínio para o território.

Relações entre Hong Kong e a China continental

As contínuas manifestações de protesto tiveram um impacto significativo nas relações entre Hong Kong e a China continental. O Governo da República Popular da China apoiou publicamente a utilização da força pelas autoridades contra os manifestantes. Além disso, afirmou, com provas muito limitadas, que as manifestações de protesto são um veículo para aqueles que defendem a independência para Hong Kong e que potências estrangeiras são responsáveis por fomentar a agitação. A China continental citou as preocupações socioeconómicas como o principal fator para o descontentamento público. O Presidente Xi Jinping afirmou que a violência «punha em causa de forma evidente» o princípio de «um país, dois sistemas».

Continuam a aumentar os receios de que o «elevado grau de autonomia» de Hong Kong sob o princípio «um país, dois sistemas» esteja a ser erodido.

Os meios de comunicação social relataram um aumento do número de soldados do Exército Popular de Libertação estacionados em Hong Kong. Um destacamento de soldados do Exército Popular de Libertação emergiu dos aquartelamentos em Kowloon, em novembro, e começou a limpar barricadas e detritos que tinham sido espalhados pelas vias públicas durante as manifestações de protesto. Nos termos da Lei Fundamental, o Governo de Hong Kong pode solicitar a ajuda do Exército Popular de Libertação em caso de catástrofe ou para manter a ordem pública. Contudo, nunca foi feito um tal pedido neste caso.

Na sequência do acórdão do Tribunal Supremo sobre a inconstitucionalidade da proibição da máscara, um porta-voz da Comissão dos Assuntos Legislativos da República Popular da China declarou que só o Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional pode decidir se as leis de Hong Kong estão em conformidade com a Lei Fundamental. Numa declaração, a Ordem dos Advogados de Hong Kong frisou que esta posição era «legalmente incorreta», que os tribunais em Hong Kong tinham invalidado leis inconstitucionais no passado e que qualquer sugestão de que os tribunais de Hong Kong não podem realizar revisões constitucionais limita o exercício do poder judicial que esses tribunais sempre detiveram e é contrária à Lei Fundamental.

A instabilidade política levou a uma pressão cada vez maior, exercida por ambos os lados do espetro político, sobre a comunidade empresarial de Hong Kong. Os trabalhadores de algumas empresas em Hong Kong foram penalizados, nomeadamente através do despedimento, por terem participado em manifestações e protestos e por terem feito comentários a favor das manifestações nas redes sociais. As próprias empresas foram pressionadas, o que resultou em casos amplamente divulgados de empresários que se demitiram ou emitiram pedidos de desculpa públicos pelas posições e ações políticas dos seus funcionários. As empresas conhecidas por serem apoiantes da China têm sofrido uma grande perseguição por parte de apoiantes do movimento de contestação, o que, em alguns casos, assumiu a forma de boicotes, mas também de atos violentos, em particular vandalismo das respetivas instalações.

Em 2019, Hong Kong continuou a ser um importante centro de comércio para a China continental, enquanto esta continuou a ser, de longe, o maior parceiro comercial de Hong Kong: 55 % das exportações de Hong Kong foram para a China continental, enquanto 47 % das importações de Hong Kong eram provenientes da China continental. Por sua vez, Hong Kong foi o quinto maior parceiro comercial da China em 2018 (depois dos Estados Unidos, da UE, do Japão e da Coreia). A China continental (em particular, a província de Guangdong) continua a ser um importante centro de aperfeiçoamento passivo para Hong Kong.

Hong Kong continuou a ser um centro financeiro e de investimento offshore fundamental da China. É a maior fonte de entrada de investimento direto estrangeiro (IDE) da China continental, representando 54 % do total (no final de 2018), e o primeiro destino para a saída de IDE, representando 65 % do total. Por sua vez, a China continental foi a segunda maior fonte de entrada de IDE de Hong Kong (representando 25,5 % do volume total no final de 2017) 3 . Existem 1 241 empresas do continente cotadas em Hong Kong, que representam 51 % das 2 449 empresas cotadas em Hong Kong, mas 73 % da capitalização do mercado total (final de 2019). Existem 1 146 empresas do continente cotadas em Hong Kong, que representam 50 % das 2 315 empresas cotadas naquele território, mas 68 % da capitalização do mercado total (final de 2018). Os mercados de capitais de Hong Kong e da China continental estão ligados por um dispositivo de conexão bolsistaStock Connect scheme, que liga a bolsa de Hong Kong às suas contrapartes em Xangai e Xenzen, e pelo dispositivo de acesso mútuo ao mercado Bond Connect para mercados obrigacionistas. 

Durante o ano, Hong Kong e a China continental continuaram a desenvolver a sua relação ao abrigo do Acordo de Parceria Abrangente entre a China e Hong Kong (CEPA). Em novembro, ambos assinaram uma alteração ao abrigo do CEPA sobre o comércio de serviços, introduzindo mais medidas de liberalização em setores como o dos serviços financeiros e jurídicos, da construção e engenharia, de ensaios e certificação, do entretenimento e do turismo. A alteração deverá ser adotada em junho de 2020.

O plano relativo à Zona da Grande Baía de Guangdong-Hong Kong-Macau, há muito aguardado, foi divulgado em fevereiro de 2019 e identificou Hong Kong como uma das quatro principais cidades da região (juntamente com Xenzen, Cantão e Macau). A Hong Kong foi atribuído um papel fundamental no desenvolvimento da Zona da Grande Baía de Guangdong-Hong Kong-Macau, em particular para serviços profissionais (incluindo serviços financeiros), e como plataforma offshore global do renminbi. Após a divulgação do plano, foram anunciadas medidas como o reforço da cooperação em matéria de direitos de propriedade intelectual e no domínio aduaneiro, tornando mais fácil para a população de Hong Kong viver, trabalhar e realizar investigação científica na Zona da Grande Baía de Guangdong-Hong Kong-Macau. Todavia, devido à agitação, existe uma crescente preocupação em Hong Kong de que o seu papel na Zona da Grande Baía de Guangdong-Hong Kong-Macau possa ser enfraquecido a favor de outras cidades participantes.

Relações bilaterais e cooperação entre a UE e Hong Kong em 2019

A décima terceira reunião do Diálogo Estruturado entre Hong Kong e a UE realizou-se em Hong Kong, em 28 de novembro de 2019. O diálogo proporcionou uma oportunidade para debater a cooperação num vasto conjunto de domínios, designadamente o comércio bilateral, a reforma da Organização Mundial do Comércio (OMC), serviços financeiros, investimento, contratos públicos, alfândegas, inovação e tecnologia e tráfico de seres humanos.

Segundo o inquérito de 2019 realizado pelo Governo da Região Administrativa Especial de Hong Kong (RAE), mais de 2 300 empresas da UE estão implantadas em Hong Kong e mais de metade tem a sua sede regional ou possui escritórios regionais em Hong Kong. As empresas da UE estão presentes num vasto leque de setores, sobretudo os serviços financeiros e os serviços às empresas, o comércio, a logística, o comércio de retalho, a restauração e as bebidas, bem como a construção.

Em 2019, Hong Kong foi o décimo oitavo maior parceiro comercial da UE para as mercadorias e o nono parceiro comercial da UE na Ásia, com um comércio total de 48 mil milhões de EUR (+3,4 % em relação ao ano anterior). As exportações de mercadorias da UE para Hong Kong ascenderam a 36,7 mil milhões de EUR, ao passo que as importações provenientes de Hong Kong totalizaram 11,3 mil milhões de EUR, o que resultou num excedente considerável de 25,4 mil milhões de EUR para a UE (o seu quarto maior excedente comercial bilateral). A UE também manteve a sua posição de segundo maior parceiro comercial de Hong Kong, após a China continental. A UE foi o segundo maior destino de exportação de Hong Kong e o seu terceiro maior fornecedor de importações durante o ano.

Hong Kong permaneceu uma importante plataforma comercial entre a China continental e a UE. Em 2018, mais de 10 mil milhões de EUR de importações provenientes da UE para a China continental transitaram através de Hong Kong, enquanto as reexportações de produtos da China continental para a UE através de Hong Kong totalizaram 35 mil milhões de EUR.

Hong Kong permaneceu o quinto maior parceiro comercial em matéria de serviços da UE na Ásia, a seguir à China, a Singapura, ao Japão e à Índia. Em 2018 (último ano para o qual existem dados disponíveis), o comércio bilateral de serviços representou 29,3 mil milhões de EUR (+8,7 % em relação ao ano anterior). As importações de serviços da UE provenientes de Hong Kong atingiram 14,8 mil milhões de EUR, enquanto as exportações para Hong Kong atingiram 14,5 mil milhões de EUR, do que resulta um pequeno défice de 325 milhões de EUR para a UE.   

Os fluxos de investimentos bilaterais entre a UE e Hong Kong continuaram a ser extremamente significativos. As estatísticas de Hong Kong mostram que, se excluirmos os centros offshore, a UE é o segundo maior investidor estrangeiro em Hong Kong, com mais de 2 300 empresas e um volume que totaliza 136,2 mil milhões de EUR, tendo contribuído com 8,2 % do total de IDE até ao final de 2018 (últimos dados disponíveis). Por sua vez, até ao final de 2018, o volume total de IDE de Hong Kong para a UE totalizou 168 mil milhões de EUR, tornando Hong Kong uma importante fonte de IDE para a UE.

Hong Kong deve a sua posição de destaque nas relações de investimento com a UE, em parte, ao facto de uma proporção considerável do que é estatisticamente registado como sendo «IDE de Hong Kong» ter origem, de facto, na China continental. Com efeito, de acordo com o Conselho de Hong Kong para o Desenvolvimento do Comércio, mais de 60 % do investimento chinês no estrangeiro é dirigido para Hong Kong ou canalizado através de Hong Kong. Da mesma forma, uma percentagem significativa do IDE da UE na China transita através de Hong Kong. As principais razões para estes resultados são a presença de prestadores de serviços de elevada qualidade, o enquadramento regulamentar previsível de Hong Kong e o seu Estado de direito.

Em 2018, a UE e Hong Kong continuaram a trabalhar em conjunto no domínio aduaneiro, no âmbito de um plano de ação destinado a melhorar a proteção dos direitos de propriedade intelectual, financiado através do programa «IP Key». Em 2019, o plano de ação foi alargado aos portos marítimos UE, para a cooperação conjunta e o controlo conjunto da carga de transbordo. Uma reunião do Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual entre a UE e Hong Kong foi realizada em Hong Kong, em março, e a décima primeira reunião do Comité Misto de Cooperação Aduaneira entre a UE e Hong Kong foi realizada em Bruxelas, em julho. Não obstante a excelente cooperação, Hong Kong permaneceu em segundo lugar em termos de proveniência por valor de mercadorias que infringem os DPI importadas para a UE, mesmo que estas não sejam produzidas no território. Ambas as partes estão a refletir sobre a forma de solucionar este desafio e melhorar a cooperação neste domínio.

As autoridades de Hong Kong publicaram dois novos pedidos de mobilização de fundos para apoiar os participantes no Horizonte 2020 da RAE. Durante o Diálogo Estruturado, a UE e Hong Kong concordaram em explorar a possibilidade de alargar o mecanismo de cofinanciamento de Hong Kong ao Horizonte 2020 e não só, por forma a incluir o setor privado. 

No que diz respeito à cooperação em matéria fiscal, em fevereiro de 2019, Hong Kong alterou os dois regimes restantes aplicáveis aos fundos offshore e aos fundos privados de participações offshore, a fim de responder às preocupações da UE sobre as suas características de delimitação. Neste contexto, o Conselho decidiu, em março de 2019, que Hong Kong tinha honrado os seus compromissos em matéria de boa governação fiscal.

No domínio da luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, o Grupo de Ação Financeira (GAF) emitiu o relatório de avaliação de Hong Kong em setembro de 2019 4 . Hong Kong é uma jurisdição com atividades significativas de constituição de empresas. Recentemente modernizou o seu regime para assegurar que as empresas recolhem e mantêm informações sobre os beneficiários efetivos nas suas instalações, mas a eficácia dessas novas medidas ainda não foi plenamente demonstrada. Hong Kong deve igualmente tomar mais medidas para assegurar que essas informações sobre os beneficiários efetivos em relação às estruturas jurídicas sejam mais facilmente acessíveis e exatas.

A UE e Hong Kong continuaram a trabalhar em conjunto para intensificar os contactos interpessoais, nomeadamente nos domínios da investigação, da cooperação académica, da mobilidade dos estudantes, da cultura e das indústrias criativas.

O Gabinete da UE em Hong Kong implementou uma vasta gama de atividades culturais, económicas e de diplomacia pública, muitas vezes em parceria com os Estados-Membros da UE e as suas instituições culturais. Os destaques do ano incluíram o Festival Europeu de Cinema, o Dia Europeu das Línguas, a Feira do Livro de Hong Kong, a participação no encontro anual «LGBTI Pride» em Hong Kong, um seminário sobre os plásticos de utilização única, a parceria com a Organização Internacional para as Migrações (OIM) sobre o «Global Migration Film Festival», o seminário sobre a prevenção do tráfico entre a UE e Hong Kong, bem como a exibição de um filme e um painel de discussão para explorar os direitos dos trabalhadores domésticos estrangeiros. O Gabinete da UE reuniu-se frequentemente com funcionários do governo, deputados, meio académico e sociedade civil.

 

(1)

Ambas emitiram declarações específicas sobre a violência, que estão disponíveis em: https://www.fcchk.org/fcc-statements/?wpv_aux_current_post_id=1532&wpv_view_count=861-TCPID1532&wpv_paged=2

(2)

Hong Kong criou um programa de obrigações verdes de até 100 mil milhões de HKD (11,5 mil milhões de EUR). Em maio, a Autoridade Monetária de Hong Kong também apresentou um conjunto de medidas para apoiar e promover o desenvolvimento do financiamento verde em Hong Kong.

(3)

  https://www.tid.gov.hk/english/aboutus/publications/factsheet/china.html

(4)

http://www.fatf-gafi.org/media/fatf/documents/reports/mer4/MER-Hong-Kong-China-2019.pdf

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