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Document 52012DC0635

    RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO sobre a aplicação da Diretiva 2009/22/CE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às ações inibitórias em matéria de proteção dos interesses dos consumidores

    /* COM/2012/0635 final */

    52012DC0635

    RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO sobre a aplicação da Diretiva 2009/22/CE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às ações inibitórias em matéria de proteção dos interesses dos consumidores /* COM/2012/0635 final */


    RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO

    sobre a aplicação da Diretiva 2009/22/CE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às ações inibitórias em matéria de proteção dos interesses dos consumidores

    ÍNDICE

    1........... INTRODUÇÃO............................................................................................................ 3

    2........... APLICAÇÃO DA DIRETIVA A PARTIR DE 2008..................................................... 4

    3........... IMPACTO DA DIRETIVA SOBRE OS CONSUMIDORES....................................... 8

    4........... OBSTÁCULOS À EFICÁCIA DAS AÇÕES INIBITÓRIAS..................................... 12

    5........... PRÓXIMAS ETAPAS................................................................................................ 15

    6........... CONCLUSÃO............................................................................................................ 17

    1.           INTRODUÇÃO

    A Diretiva 98/27/CE de 19 de maio de 1998, relativa às ações inibitórias[1] em matéria de proteção dos interesses dos consumidores, introduziu um processo judicial ou procedimento administrativo que permite às organizações de consumidores e/ou às autoridades públicas intentarem uma ação inibitória para impedir a prática de um comerciante que infrinja algumas regras da UE em matéria de defesa do consumidor (enumeradas no anexo da diretiva) em todos os Estados-Membros. A Diretiva 98/27/CE foi alterada várias vezes (novas diretivas foram acrescentadas ao anexo). Por questões de clareza, a referida diretiva foi codificada pela Diretiva 2009/22/CE, atualmente em vigor.

    1.1.        Transposição da diretiva pelos Estados-Membros e sua aplicação até 2008

    O primeiro relatório concluiu que a principal vantagem da diretiva relativa às ações inibitórias era o facto de introduzir um processo que permitia a uma entidade intentar ações inibitórias destinadas a proteger os interesses coletivos dos consumidores em cada Estado-Membro. Esses procedimentos foram bem sucedidos no que respeita a infrações nacionais, mas tiveram um impacto mais limitado no que se refere a infrações transfronteiriças. Os principais motivos mencionados pelos Estados-Membros e pelas partes interessadas para explicar o reduzido número de ações inibitórias intentadas noutro Estado-Membro foram os custos, a complexidade e a morosidade dos processos noutro Estado-Membro.

    O relatório da Comissão sublinhou também que a entrada em vigor do Regulamento (CE) n.º 2006/2004 relativo à cooperação entre as autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da legislação de defesa do consumidor (Regulamento CPC)[2] explicava parcialmente a limitada utilização pelas autoridades públicas das ações inibitórias em casos de infração transfronteiriça, dado que os mecanismos de assistência mútua ao abrigo do regulamento são menos dispendiosos.

    1.2.        Metodologia e objetivo do presente relatório

    O artigo 6.º, n.º 1, da Diretiva 2009/22/CE relativa às ações inibitórias em matéria de proteção dos interesses dos consumidores («a diretiva») prevê a adoção de um relatório sobre a sua aplicação de três em três anos. Inicialmente previsto para 2003, o primeiro relatório foi adotado em novembro de 2008.

    Em março de 2011, a fim de preparar este segundo relatório, a Comissão enviou questionários sobre a aplicação da diretiva às autoridades públicas e às organizações de consumidores. A Comissão recebeu 58 respostas, 37 das quais provenientes de ministérios ou outras autoridades públicas dos Estados-Membros e 21 de organizações de consumidores a nível nacional ou europeu.

    Além disso, a Comissão encomendou um estudo externo[3] destinado a recolher mais dados sobre a aplicação da diretiva e a apresentar uma panorâmica do impacto da diretiva sobre os consumidores em nove Estados-Membros, a saber, a Áustria, Bulgária, França, Alemanha, Países Baixos, Portugal, Espanha, Suécia e Reino Unido. Esses Estados-Membros foram escolhidos porque, para além da ação inibitória, têm sistemas de ações coletivas de indemnização já em vigor há vários anos.

    2.           APLICAÇÃO DA DIRETIVA A PARTIR DE 2008

    2.1.        Estimativa do número de ações inibitórias

    São limitados os dados disponíveis relativos ao número de ações inibitórias nacionais e transfronteiriças que foram iniciadas em defesa dos interesses coletivos dos consumidores nos vários Estados-Membros. Esta falta de dados estatísticos exaustivos e fiáveis deve-se à ausência de uma obrigação formal de os Estados-Membros manterem uma base de dados central das ações inibitórias intentadas nos seus territórios e de comunicarem essa informação à Comissão. Por este motivo, estimar o número de ações inibitórias é uma tarefa difícil e qualquer estimativa tem de ser tratada com prudência. É possível dar conhecimento de um número de casos documentados, mas tal não significa que esses casos sejam as únicas ações inibitórias que foram efetivamente instauradas.

    No questionário enviado às partes interessadas em causa, os inquiridos foram interrogados sobre o número de ações inibitórias que tinham intentado desde 2008, tanto a nível nacional como transfronteiriço. No total, foram comunicadas 5 632 ações inibitórias, a grande maioria das quais a nível nacional. As respostas indicavam apenas cerca de 70 ações inibitórias com uma dimensão transfronteiriça durante o período especificado. Se estes dados forem repartidos por Estado-Membro, os Estados-Membros com o maior número de ações inibitórias comunicadas, a partir de 2008, são os seguintes: Alemanha: embora exista uma falta de dados estatísticos a nível global e centralizado, a República Federal da Alemanha declarou que só sete entidades competentes alemãs tinham introduzido mais de 3 000 ações. Esta situação pode estar relacionada com o facto de, na Alemanha, o controlo dos mercados de consumo ser tradicionalmente efetuado por privados. Letónia: a Autoridade de Proteção dos Consumidores declarou 956 casos. Reino Unido: o Office of Fair Trading (OFT) comunicou 938 ações. Na Áustria, o estudo externo identificou mais de 500 ações e o Governo de Malta comunicou 267 casos.

    No que respeita a ações inibitórias com uma dimensão transfronteiriça, os Estados-Membros com o maior número de ações anunciadas durante o período específico são os seguintes: Alemanha: A Federação Alemã das Organizações de Consumidores declarou que tinha intentado cerca de 20 ações inibitórias relativas a infrações transfronteiriças. Áustria: a Câmara Federal do Trabalho declarou que tinha instaurado oito ações inibitórias transfronteiriças. As entidades competentes, bem como os advogados especializados no domínio do direito do consumidor, tendem a intentar ações apenas nos casos em que a competência dos tribunais austríacos está assegurada.

    A taxa de êxito das ações iniciadas é geralmente elevada. No entanto, isso deve-se em parte ao facto de, devido aos riscos em matéria de custos associados aos litígios, as entidades competentes apenas intentarem ações inibitórias quando estão seguras de obter ganho de causa.

    2.2.        Setores económicos mais afetados

    Apesar de terem sido instauradas ações inibitórias num vasto leque de setores económicos, a maioria das ações inibitórias estão concentradas num número limitado de setores.

    Os setores económicos que foram mais frequentemente mencionados pelos inquiridos como mais afetados pelas ações inibitórias são os seguintes:

    (1) Telecomunicações

    (2) Bancário e de investimentos

    (3) Turismo e viagens organizadas

    Outros setores mencionados por vários inquiridos são as vendas à distância, os seguros, a energia, os bens de consumo não alimentares e o transporte de passageiros. Alguns inquiridos mencionaram bens imobiliários e reparações, ou a concessão de empréstimos por instituições não bancárias («empréstimos rápidos»), como outros setores afetados.

    2.3.        Infrações mais comuns das regras de proteção do consumidor

    Foram intentadas ações inibitórias relativamente a um vasto leque de infrações da legislação de proteção dos consumidores. Além disso, alguns Estados-Membros alargaram o âmbito de aplicação das ações inibitórias para além da lista limitada constante do anexo da presente diretiva. Esse alargamento é positivo para os consumidores. No entanto, deve ser feita referência à legislação incluída no anexo da diretiva, a fim de garantir a segurança jurídica. A Alemanha, a Áustria, Portugal, a Espanha, a Bulgária e os Países Baixos são alguns Estados-Membros em que o âmbito de aplicação das ações inibitórias é muito mais vasto do que a lista de legislação incluída no anexo da diretiva. No entanto, a maioria das ações inibitórias foram iniciadas para pôr termo apenas a um número limitado de práticas ilegais que prejudicam os interesses coletivos dos consumidores.

    A avaliar pelas respostas ao questionário, as seguintes práticas ilegais que lesam os interesses coletivos dos consumidores deram mais frequentemente origem ao exercício de ações inibitórias, por ordem de importância:

    (1) Cláusulas contratuais abusivas. Este tipo de prática é o que mais frequentemente deu origem a uma ação inibitória;

    (2) Práticas comerciais desleais e publicidade enganosa, em igual medida.

    Em muito menor medida, outras violações dos direitos dos consumidores que deram origem a uma ação inibitória foram as violações das disposições relativas às regras em matéria de garantia, as regulamentações em matéria de indicação dos preços ou o envio de correio eletrónico não solicitado. Alguns Estados-Membros (especialmente a Espanha) também têm um grupo de ações inibitórias relativas à aplicação da Diretiva relativa ao crédito ao consumo. Em alguns Estados-Membros em que as ações inibitórias têm um âmbito de aplicação mais vasto, foram intentadas ações contra a interrupção de serviços essenciais (como o abastecimento de eletricidade). Neste caso, a decisão do tribunal pode perfeitamente exigir o cumprimento dos direitos dos consumidores, obrigando uma parte a efetuar uma determinada ação. Casos como a interrupção de serviços ou de serviços de utilidade pública em Espanha são um bom exemplo deste tipo de ação inibitória que impõem medidas a tomar.

    2.4.        Entidades competentes: enquadramento jurídico nos diversos Estados-Membros

    A lista mais recente de entidades competentes[4] inclui um total de 313 entidades competentes. O número e as características dessas entidades variam amplamente de um Estado-Membro para outro. Ao passo que vários Estados-Membros apenas designaram uma entidade competente (Irlanda, Letónia, Lituânia, Países Baixos, Roménia e Suécia), outros designaram mais de 70 (Alemanha e Grécia). A Espanha, a Itália e a França encontram-se numa posição intermédia, com mais de 15 e menos de 30 entidades competentes designadas. Em termos gerais, sempre que os Estados-Membros designaram uma única entidade competente, geralmente é uma autoridade pública responsável pela proteção do consumidor, embora haja exceções, como os Países Baixos.

    Os Estados-Membros que designaram várias entidades competentes normalmente incluem uma combinação de autoridades públicas responsáveis pelas questões dos consumidores a nível local, regional e nacional, bem como as organizações de consumidores mais representativas. A lista de entidades competentes enumera as entidades habilitadas a intentar uma ação inibitória noutro Estado-Membro, mas em muitos Estados-Membros determinadas entidades jurídicas que não estão incluídas na lista têm igualmente legitimidade para intentar ações inibitórias a nível nacional. Algumas organizações de consumidores criticam a excessiva margem discricionária no que respeita a decidir quais as entidades jurídicas incluídas na lista, o que pode conduzir a decisões arbitrárias e desleais. Outras afirmam igualmente que as organizações de consumidores devem ter legitimidade para intentar ações inibitórias em todos os Estados-Membros, tanto no que se refere a casos nacionais como a casos transfronteiriços.

    O estudo revela também que a utilização efetiva das ações inibitórias depende dos conhecimentos e competências dos juristas habilitados a instaurá-las. A experiência demonstra também que, mesmo nos Estados-Membros em que um grande número de entidades tem legitimidade para intentar uma ação inibitória, só uma pequena parte faz uso dessa possibilidade.

    2.5.        Ações inibitórias com uma dimensão transfronteiriça: a conceção da diretiva e a situação no terreno

    A fim de avaliar exatamente qual a utilização efetiva das ações inibitórias na UE, o conceito de litígio transfronteiriço necessita de ser clarificado. As ações inibitórias transfronteiriças, ou seja, os processos de injunção que incluam um elemento transfronteiriço, podem assumir diferentes formas.

    A diretiva foi concebida para permitir que entidades competentes do Estado-Membro A possam processar operadores comerciais no Estado-Membro B, se este último, no desenvolvimento de atividades comerciais com consumidores no Estado-Membro A, infringir a legislação em matéria de direitos dos consumidores. Para que isso seja possível, foi conferida legitimidade jurídica às entidades competentes para intervir nos tribunais estrangeiros. O tribunal no Estado-Membro B, ao ser instado para proferir uma decisão no âmbito de uma ação inibitória intentada contra um comerciante estabelecido na sua jurisdição, deve analisar e decidir o processo sem pôr em causa a legitimidade jurídica da entidade competente do Estado-Membro A.

    No entanto, uma das principais conclusões do estudo é que o «processo transfronteiriço» referido é apenas uma de duas possíveis formas de ação inibitória com uma dimensão transfronteiriça, e raramente é utilizado.

    A segunda forma, mais comum, de «processo transfronteiriço» verifica-se na mesma situação de transação do Estado-Membro B para o Estado-Membro A. Neste caso, contrariamente ao que os responsáveis pela diretiva tinham em mente, uma ação judicial é intentada por uma entidade competente no Estado-Membro A perante um tribunal no Estado-Membro A. O comerciante, embora estabelecido no estrangeiro, é processado no país onde desenvolve a sua atividade comercial. Este tipo de funcionamento tem a vantagem de uma entidade competente poder intentar uma ação na sua própria jurisdição, que aplica o direito processual que aquela entidade provavelmente melhor conhece. Se, além disso, a lei aplicável for a lei do Estado-Membro A (princípio lex loci damni do artigo 6.º de «Roma II»[5]), e o problema da notificação de documentos jurídicos no estrangeiro puder ser resolvido, esta segunda possibilidade de ação inibitória é a opção mais fácil de escolher. Isto torna igualmente possível instaurar uma ação inibitória contra comerciantes de países terceiros.

    Uma ação «transfronteiriça» de um certo tipo foi intentada em maio de 2009 pela DECO[6], em cooperação com a UFC-Que Choisir de França e a Test-Achats da Bélgica. A «ação coordenada» referia-se a condições gerais de transporte das companhias aéreas (Diretiva 93/13/CEE). Foi proferida uma decisão relativa à Bélgica, obrigando três companhias aéreas a deixar de utilizar um certo número de condições contratuais consideradas abusivas. Cada medida das organizações de consumidores foi coordenada, incluindo as medidas publicitárias de acompanhamento, tais como comunicados de imprensa. Esta forma de ação coordenada representou um determinado tipo de cooperação transfronteiriça, embora formalmente não possa ser qualificada como litígio transfronteiriço.

    2.6.        Interação com o Regulamento CPC no que respeita a infrações transfronteiriças

    O Regulamento CPC estabelece um quadro de assistência mútua para as autoridades de execução nacionais que permite às autoridades cooperarem em matéria de investigação e/ou de assistência relativamente à aplicação da legislação, a fim de pôr termo a práticas que não sejam conformes com a legislação indicada no anexo do regulamento. O Regulamento CPC visa proteger os interesses económicos coletivos dos consumidores e não tratar queixas individuais.

    O relatório de 2008 sobre a diretiva relativa às ações inibitórias indicava que o Regulamento CPC teve impacto na utilização das ações inibitórias, demonstrando a experiência especialmente que, desde a entrada em vigor do Regulamento CPC, a maior parte das autoridades públicas tinha optado por utilizar os seus mecanismos de assistência mútua na luta contra práticas ilegais por parte de um comerciante noutro Estado-Membro, em vez de ter intentado diretamente uma ação inibitória perante os tribunais desse Estado-Membro, dado que a primeira possibilidade poderia ser menos onerosa para elas. As respostas ao questionário em 2011 confirmaram esta tendência, apesar de uma autoridade pública de um Estado-Membro ter realçado o facto de as ações inibitórias continuarem a constituir uma ferramenta valiosa para as autoridades públicas, que pode ser utilizada caso os mecanismos CPC não atinjam os resultados esperados.

    Por último, muitos dos inquiridos sublinharam que a lista da legislação constante do anexo da diretiva relativa às ações inibitórias devia ser alinhada com a do anexo do Regulamento CPC.

    3.           IMPACTO DA DIRETIVA SOBRE OS CONSUMIDORES

    As respostas ao questionário e as conclusões do estudo revelam que as ações inibitórias são um bom instrumento para controlar os mercados, nomeadamente para assegurar condições contratuais justas. A este respeito, acarretaram benefícios substanciais para os consumidores no seu conjunto. Todavia, o seu impacto é projetado sobretudo para o futuro, em vez de serem úteis para corrigir danos anteriores, sendo muito difícil de quantificar em termos monetários.

    Apesar de as ações inibitórias, enquanto tais, não constituírem uma solução para solicitar reparações por danos relativas ao passado, a possibilidade de recorrer a ações inibitórias pode ser, em si mesma, valiosa. Como instrumento de governação, as ações inibitórias podem ser utilizadas como um mecanismo de dissuasão sem serem aplicadas em tribunal.

    Outra conclusão importante é que as ações inibitórias funcionam particularmente bem com os intervenientes no mercado que respeitam, em certa medida, a lei. No que se refere a comerciantes pouco escrupulosos, as ações inibitórias nem sempre são um mecanismo adequado para pôr termo a práticas ilícitas. Vários inquiridos afirmam que, em tais situações, podem ser necessárias sanções penais e administrativas, como sanções que imponham restrições específicas sobre o exercício de atividades comerciais, para garantir o cumprimento da legislação de proteção do consumidor.

    3.1.        Redução do número de infrações às normas de defesa do consumidor

    Embora a maior parte dos inquiridos e dos peritos entrevistados tenha declarado que o efeito das ações inibitórias não pode ser medido apenas em termos do número de casos apresentados aos tribunais, é igualmente uma importante opção que pode ser utilizada para convencer as empresas a cessar voluntariamente a prática de infrações . Para várias partes interessadas, a mera possibilidade de poder intentar ações inibitórias tem um efeito dissuasivo inerente em negociações com os autores de infrações. Em certos casos, por outro lado, quando uma ação inibitória produz resultados satisfatórios e declara ilegal a prática de um comerciante, os restantes operadores tendem a abster-se de recorrer a práticas semelhantes, mesmo que não estejam juridicamente vinculados pela decisão.

    Tendo em conta os resultados do estudo e as respostas ao questionário, a nossa conclusão é que a diretiva reforça, em certa medida, a conformidade com as leis de proteção do consumidor entre os operadores económicos em determinados setores da economia, embora não existam suficientes dados disponíveis para estimar essa redução de infrações em termos percentuais.

    3.2.        Redução dos prejuízos para o consumidor

    Uma conclusão importante do estudo é que a diretiva acarretou benefícios qualitativos diretos para os consumidores, apesar de não ser necessariamente possível exprimir esses benefícios em termos monetários. Tal deve-se ao facto de, em muitos casos, não ser possível determinar o número exato de consumidores que potencialmente sofrem danos em resultado de uma prática ilegal. Além disso, muitas condições contratuais que são declaradas ilegais na sequência de uma ação inibitória não estão relacionadas com o preço a pagar pelos consumidores.

    A fim de avaliar o possível efeito das ações inibitórias na redução dos prejuízos para o consumidor, deve ser prestada uma atenção especial às condições contratuais abusivas que possam afetar, de forma direta e imediata, as obrigações dos consumidores ao abrigo dos contratos.

    Quando um tribunal declara uma determinada condição contratual nula e sem efeito, o operador deixa de poder aplicar essa condição em todos os contratos. Isto é benéfico para o consumidor, em particular se a condição regular aumentos de preços ou outros efeitos financeiros e, neste caso, o benefício pode ser avaliado em termos monetários, uma vez que muitos consumidores reduzirão os seus pagamentos futuros como consequência direta das ações inibitórias. Por exemplo, os casos de «arredondamento» em Espanha levaram à proibição de novos encargos ilegais em diversos setores (bancário, telecomunicações, estacionamento).

    Por exemplo, na Áustria, foi intentada uma ação inibitória contra condições abusivas nos contratos bancários de um banco austríaco. Em agosto de 2009, o banco informou os seus clientes, por meio dos extratos bancários, que os preços das contas correntes seriam aumentados, a partir de 1 de outubro, em conformidade com o aumento do índice de preços ao consumidor de 2008, o que representava um aumento de 3,2 %. O banco referia-se às condições contratuais gerais, que permitiam que o banco aumentasse automaticamente os preços para obrigações permanentes, uma vez por ano, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor. Esta ação inibitória teve um impacto significativo sobre os consumidores, uma vez que, na primavera de 2011, a maior parte dos outros bancos, que tinham utilizado condições análogas, abstiveram-se de aumentar automaticamente o preço, o que beneficiou vários milhões de clientes de bancos austríacos. Este é um exemplo claro do êxito que uma ação inibitória pode ter, com um impacto tangível no que respeita à conformidade com a legislação, não só no que respeita ao requerido, mas para todo o setor económico. Além disso, os benefícios para os consumidores foram fáceis de avaliar em termos monetários.

    Outro caso em que os benefícios para os consumidores decorrentes de processos bem sucedidos foram calculados em termos monetários foi o processo «Foxtons» no Reino Unido[7] (relativo a condições abusivas em contratos de arrendamento com proprietários). A apreciação do caráter equitativo no que respeita ao processo «Foxtons» abrangeu a) as condições de renovação da comissão, b) a comissão sobre a venda de imóveis, e c) a renovação das comissões por terceiros. O High Court declarou formalmente que determinadas condições dos contratos «Foxtons» eram abusivas, e proferiu uma decisão impedindo a «Foxtons» de utilizar essas condições ou condições semelhantes, bem como de inserir essas condições em contratos futuros. Segundo o OFT, o benefício dos consumidores eleva-se a 4,4 milhões de libras, embora um entrevistado tenha considerado que os efeitos positivos poderão facilmente vir a ser dez a vinte vezes mais elevados.

    3.3.        Efeitos das ações inibitórias sobre os consumidores individuais afetados pelas infrações: possibilidades de obter reparação em diferentes Estados-Membros

    Em regra geral, o processo de ação inibitória introduzido pela diretiva não prevê a atribuição de qualquer indemnização aos consumidores que tenham sofrido danos devido a uma prática ilícita. Contudo, as possibilidades de reparação dos consumidores afetados pela prática de um comerciante que tenha sido declarada ilegal na sequência de uma ação inibitória varia de Estado-Membro para Estado-Membro. Alguns Estados-Membros repercutem o impacto de uma ação inibitória, até certo ponto, nos consumidores afetados. Vários interessados que responderam ao questionário ou foram entrevistados sublinharam a importância de alargar os efeitos das ações inibitórias de modo a incluir os consumidores individuais, permitindo-lhes obter uma indemnização adequada pelos prejuízos causados. Algumas possibilidades de reparação, tanto de caráter coletivo como individual, que estão disponíveis para os consumidores nos vários Estados-Membros, são descritas a seguir.

    a) Reparação individual

    Na maior parte dos Estados-Membros, não existe uma ligação entre uma ação inibitória e a concessão de indemnizações aos consumidores pelo dano sofrido em resultado de uma prática ilegal. Deste modo, os consumidores lesados têm de fazer valer os seus direitos, intentando uma ação perante um tribunal ordinário, individual ou coletivamente, nos Estados-Membros em que existem mecanismos de reparação coletiva. Além disso, em muitos Estados-Membros, os tribunais que tratam de processos deste tipo, intentados por consumidores para obter uma indemnização, não estão vinculados pela decisão anterior no âmbito da ação inibitória. Os consumidores que pretendem uma indemnização têm de provar a infração, o dano e o nexo de causalidade adequada entre os dois.

    No entanto, em alguns Estados-Membros, a situação é diferente. Por exemplo, segundo a Comissão para a proteção do consumidor da Bulgária, os consumidores podem invocar uma decisão judicial com força executória relativa a um crédito quando intentam uma ação inibitória por danos causados, tendo apenas de provar o montante dos danos sofridos. No Luxemburgo, o consumidor pode utilizar uma decisão do tribunal relativa a uma ação inibitória para solicitar a concessão de uma indemnização ao juiz de paz. Na Irlanda, o tribunal pode exigir que o comerciante pague os danos causados a um consumidor que tenha sofrido prejuízos em resultado das ações do comerciante. Em Malta, a restituição de qualquer quantia ou de qualquer bem imobiliário cedido pelo consumidor pode ser decidida em ligação com os procedimentos administrativos.

    Noutros Estados-Membros, os consumidores afetados por uma prática ilegal podem obter uma indemnização através da execução de uma decisão judicial e, em seguida, o tribunal pode determinar de que modo os consumidores afetados pela prática ilegal devem ser indemnizados, por exemplo, fazendo com que o comerciante reembolse os montantes indevidamente pagos.

    Nos Países Baixos, um tribunal decidiu que a gravidade do comportamento de uma empresa também tinha ficado estabelecida em relação ao requerente individual, na medida em que este pertencia ao grupo mencionado na declaração. Tal significa que a decisão relativa à gravidade do comportamento num processo coletivo pode constituir um ponto de partida para uma ação posterior. Por conseguinte, o processo de ação inibitória ajudou um requerente individual a determinar a gravidade do comportamento do requerido.

    b) Reparação coletiva

    Em alguns dos Estados-Membros em que existem sistemas de reparação coletiva, o êxito de uma ação inibitória pode ter algumas consequências sobre uma ação coletiva intentada pelos consumidores afetados, com vista a pedir uma indemnização por danos resultantes da prática ilegal, além dos efeitos normais de uma ação inibitória bem sucedida mencionados no ponto anterior.

    Em Espanha, é possível apensar à ação inibitória um pedido de reembolso dos montantes recebidos dos consumidores indevidamente; a decisão que declara a ilegalidade de uma prática pode também, neste caso, fixar a indemnização a pagar pelo comerciante. Se os consumidores afetados tiverem sido identificados, o tribunal determinará o montante a receber por cada um deles. Contudo, existem alguns obstáculos processuais, que tornam difícil, na prática, combinar a ação inibitória e o pedido de indemnização.

    Nos Países Baixos, as partes que agem em nome de consumidores que tenham sofrido danos podem tentar obter uma decisão declarativa que reconheça a infração cometida pela parte que causou o prejuízo. Esta sentença declarativa é considerada um incentivo para as partes chegarem a acordo e para tornar o acordo vinculativo através da utilização da lei neerlandesa relativa às ações coletivas (Wcam[8]). Nos termos da lei relativa aos acordos coletivos em matéria de prejuízos maciços de 2005, o tribunal de recurso de Amesterdão pode impor um acordo no que respeita a prejuízos de massa entre uma entidade que represente interesses coletivos e a(s) pessoa(s) responsável(is) pelos danos que afetam todos os membros do coletivo. O ponto de partida é um acordo que visa compensar os danos coletivos. As partes que tenham chegado a acordo apresentam um pedido conjunto ao tribunal de Recurso de Amesterdão, com vista a declarar o acordo vinculativo. Crucial para o Wcam é o facto de a totalidade do grupo de vítimas estar vinculada ao acordo após o tribunal ter declarado o acordo vinculativo. Existe, contudo, a possibilidade de renunciar. Uma das limitações deste sistema é que só funciona se as partes chegarem a acordo, e mesmo uma decisão que determine a gravidade do comportamento nem sempre é suficiente para garantir que se chegue a um acordo na matéria.

    Na Bulgária, um pedido de indemnização das partes lesadas pode ser apresentado ao mesmo tempo que uma ação inibitória. O tribunal fixa um prazo para que as partes lesadas declarem a sua intenção de participar no processo. Após proferir a sua decisão, o tribunal pode estabelecer a indemnização a pagar às partes lesadas. A decisão do tribunal vincula o infrator, os requerentes e todas as pessoas que tenham sofrido danos devido à mesma infração e não tenham declarado a sua intenção de apresentarem um pedido individual. As ações inibitórias precedem a ação de indemnização. Se a ação inibitória for bem sucedida, um grupo de consumidores pode intentar uma ação de indemnização. Nesta (nova) ação judicial não terão de provar a infração da legislação (prática ilegal ou condição abusiva); terão de provar apenas o montante dos danos sofridos. Embora a ação representativa possa ser avaliada no mesmo processo da ação inibitória, ou em processos distintos, os tribunais muitas vezes dividem as duas ações em processos separados.

    Na Suécia, o Provedor de Justiça do consumidor também desempenha um papel central na aplicação dos direitos coletivos dos consumidores; o Provedor pode intentar uma ação coletiva de indemnização em nome de uma pluralidade de consumidores no processo de ação inibitória. No entanto, esta possibilidade só foi utilizada num número limitado de casos.

    4.           OBSTÁCULOS À EFICÁCIA DAS AÇÕES INIBITÓRIAS

    Os obstáculos que impedem a eficácia das ações inibitórias podem ser classificados nos seguintes grupos: riscos financeiros, duração do processo, complexidade do processo, efeito jurídico limitado das sentenças e execução das sentenças.

    4.1.        Risco financeiro ligado ao processo

    As custas do processo são referidas como um dos principais obstáculos a uma utilização mais vasta das ações inibitórias. Embora as taxas judiciais sejam geralmente baixas e os advogados não sejam extremamente dispendiosos em todos os países, as custas continuam a representar um importante efeito dissuasor, principalmente devido ao princípio «perdedor pagador». A fim de limitar o risco de pagar as taxas e as custas da parte contrária, só são levados a tribunal os casos em que haja certeza de obter ganho de causa. No entanto, as entidades competentes que dispõem de maiores recursos financeiros estão preparadas para levar um caso a tribunal, aceitando o risco de perder quando está em causa uma questão de princípio. Mas, mesmo o facto de ganhar um processo não impede as entidades competentes de enfrentarem riscos financeiros: as partes interessadas mencionam também o risco de as custas processuais não serem reembolsadas mesmo se o requerente obtiver ganho de causa, uma vez que o demandado é incapaz de assumir as custas. Além disso, nalguns Estados-Membros, como a Áustria, a parte que intenta a ação inibitória tem obrigação de pagar uma indemnização se a decisão tomada nas medidas cautelares for posteriormente anulada no âmbito da ação principal.

    O risco financeiro das ações inibitórias é atenuado em alguns Estados-Membros em que as organizações que defendem interesses coletivos estão isentas de custas judiciais, podendo até beneficiar de apoio no âmbito do sistema geral de assistência judiciária. É este o caso, por exemplo, em Espanha, que está a ser analisado nos Países Baixos. Em Espanha, este direito de assistência judiciária inclui os honorários dos advogados e solicitadores, a publicação de avisos ou editais, cópias, certificados, etc. No entanto, mesmo nos Estados-Membros em que as organizações de consumidores beneficiam de sistemas de assistência judiciária, o pagamento dos avisos publicados nos meios de comunicação social, exigidos quando as organizações de consumidores intentam ações coletivas de indemnização, para além da ação inibitória, é um dos principais problemas que as associações de consumidores enfrentam, dado que estes custos não são reembolsados.

    Na Bulgária, as organizações de consumidores não recebem qualquer ajuda para ações judiciais, mas é concedido financiamento às organizações de consumidores, de acordo com o as ações assumidas em favor dos consumidores no ano anterior. Um dos critérios utilizados para a atribuição de uma ajuda estatal às organizações de consumidores é o número de ações inibitórias instauradas durante o ano anterior. Além disso, na Bulgária, existem critérios suplementares estabelecidos no Código de Processo Civil relativamente à admissibilidade dos pedidos; segundo os referidos critérios, as «entidades competentes» têm de provar a sua capacidade para assumir os encargos relacionados com a tramitação do processo, incluindo as custas.

    4.2.        Duração do processo

    O segundo obstáculo é a duração do processo. A ideia relativa a qual a duração aceitável varia de um Estado-Membro para outro. Convém salientar que a duração do processo não está ligada ao mecanismo da ação inibitória em si mesmo, mas sim à inerente lentidão dos processos que correm nas jurisdições nacionais.

    Na Suécia, a existência de um tribunal especial, o Tribunal do Comércio, com competência predominantemente para dirimir ações inibitórias para a proteção dos interesses coletivos dos consumidores, garante uma apreciação relativamente rápida a este tipo de casos. No entanto, a duração média de um processo no Tribunal do Comércio ainda é de cerca de 11-12 meses. Noutros Estados-Membros, a duração de todo o processo, com três audiências em tribunal, pode inclusivamente ultrapassar cinco anos nalguns casos complexos.

    Outro obstáculo relacionado com a duração do processo é quando a execução pode ser pedida. Por exemplo, em Espanha, embora a lei estabeleça como regra geral a execução provisória de qualquer sentença e não existam regras especiais para as ações coletivas que contradigam esta regra geral, normalmente os tribunais decidiram não permitir a execução devido à natureza provisória destas decisões, ficando as entidades competentes, por conseguinte, obrigadas a esperar até à decisão final.

    Na Bulgária, a entrada em vigor das disposições do novo Código de Processo Civil, em 2008, levou a que as decisões dos tribunais em relação a ações inibitórias, em caso de recurso, apenas possam ser executadas após o tribunal de terceira instância ter tomado uma decisão.

    4.3.        Complexidade do processo

    A maioria das partes interessadas e dos peritos considera que um outro fator dissuasor importante no que diz respeito ao uso mais alargado de ações inibitórias é a complexidade, real ou pressentida, do processo. Esta situação é agravada em casos transfronteiriços, devido ao desconhecimento das regras substantivas e processuais nos outros Estados-Membros.

    Relacionado com este aspeto, uma das dificuldades nos casos transfronteiriços, que foi mencionada por partes interessadas e por peritos, é a dificuldade em aplicar as normas de direito internacional privado, nomeadamente as relativas à competência (Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, «Bruxelas I»[9]) e à lei aplicável (Regulamento (CE) n.º 864/2007 relativo à lei aplicável às obrigações extracontratuais, «Roma II»[10]). É difícil compreender, a partir dos contributos recebidos das partes interessadas, se tal se deve a uma falta de conhecimento, a inexperiência ou a lacunas da lei. A harmonização das normas de direito internacional privado a nível da União Europeia tem, sem dúvida, conferido uma maior segurança jurídica em comparação com a situação de há alguns anos, em que cada Estado-Membro aplicava as suas próprias regras. Não obstante, apesar da harmonização destas normas, continuam a existir dúvidas sobre a interpretação dessas normas, enquanto o TJUE não fornecer mais orientações sobre a sua aplicação, em especial no que se refere ao regulamento relativo à lei aplicável às obrigações extracontratuais - «Roma II», cuja aplicação na União é recente.

    A complexidade das ações inibitórias em casos transfronteiriços é agravada por outros problemas de caráter mais prático, como as barreiras linguísticas e também a dificuldade de acesso aos dados de empresas no estrangeiro. Um dos problemas é identificar um operador estrangeiro e encontrar o seu endereço. Isso torna mais difícil o envio de notificações ou a instauração de ações judiciais. Mesmo que o comerciante esteja identificado, a notificação de empresas estrangeiras pode demorar muito tempo e ser infrutífera, nomeadamente quando os operadores apenas comunicam caixas postais ou endereços falsos[11].

    4.4.        Efeito limitado das decisões

    Em muitos Estados-Membros, uma decisão é vinculativa apenas no que diz respeito ao caso e às partes envolvidas.

    Em alguns Estados-Membros, este princípio é aplicado de forma menos estrita, em especial no que diz respeito à nulidade das cláusulas contratuais abusivas. A França é um exemplo perfeito da aplicação estrita deste princípio, dado que a anulação de cláusulas abusivas apenas afeta os contratos futuros do comerciante, tornando assim inúteis ações judiciais contra cláusulas abusivas quando a cláusula contratual contraditada deixar de ser proposta pelo comerciante ao consumidor.

    Em Espanha, quando uma cláusula é declarada abusiva, a consequência é a cláusula ser declarada nula e sem efeito com efeitos ex tunc, o que implica o regresso ao status quo anterior e a obrigação de devolver o dinheiro indevidamente pago aos consumidores afetados em aplicação da cláusula abusiva. Além disso, em alguns casos, os tribunais decidiram que os efeitos da nulidade deviam ser alargados a outras empresas que utilizavam a mesma cláusula contratual.

    Outro problema consiste no facto de o âmbito de aplicação de uma ação inibitória não ser pan-europeu, o que significa que um comerciante sem escrúpulos pode deslocar-se de um Estado-Membro para outro, prosseguindo as suas atividades. Uma parte interessada mencionou também o facto de, em muitas jurisdições, os particulares não poderem ser notificados. No Reino Unido, o OFT pode tomar medidas contra a publicidade enganosa no que se refere a «qualquer pessoa» implicada na difusão de publicidade (como os diretores e os diretores executivos de empresas).

    4.5.        Aplicação das decisões judiciais

    As dificuldades assinaladas nas secções anteriores referiam-se principalmente à fase declarativa da ação inibitória. Nessa base, pode presumir-se que, quando os obstáculos tiverem sido superados e a entidade competente tiver obtido uma decisão final positiva em tribunal, o caso está resolvido. No entanto, tal não é necessariamente verdade, dado que, muitas vezes, uma decisão favorável não implica a sua aplicação efetiva e a suspensão da infração. Muitas partes interessadas sublinharam a dificuldade de assegurar a concretização de decisões adotadas, especialmente nos casos em que o vendedor ou o prestador de serviços ignora a decisão, independentemente das sanções aplicadas. A experiência tem mostrado que as infrações só podem ser devidamente contestadas quando os operadores temem uma sanção que seja suficientemente dissuasiva e efetivamente aplicada. Se a sanção não for suficientemente dissuasiva, muitos comerciantes aceitam conscientemente as custas dos processos judiciais, que são baixas em comparação com os lucros realizados.

    As sanções impostas por incumprimento da decisões proferidas em ações inibitórias variam de um Estado-Membro para outro, mas são, em geral, consideradas como não sendo suficientemente dissuasivas. Nos Países Baixos, é possível impor o pagamento de um montante fixo quando a decisão do tribunal não for cumprida. Quando tal ocorre, e o pagamento de um montante fixo é exigido, este montante é canalizado para a outra parte. Na Suécia, as decisões são proferidas sob pena de multa no caso de incumprimento. Na Bulgária, é imposta uma sanção pecuniária, que varia entre 5 000 e 23 000 BGN[12], a qualquer pessoa que não cumprir uma decisão proferida numa ação inibitória. Em Espanha, aplica-se uma sanção pecuniária diária por incumprimento, que varia entre 600 e 60 000 euros, por dia de atraso na execução da decisão judicial. Teoricamente, qualquer pessoa que se recuse continuadamente a cumprir uma decisão judicial pode sofrer sanções penais em Espanha, ainda que, de acordo com o nosso conhecimento, isso nunca tenha acontecido no âmbito de uma ação inibitória.

    5.           PRÓXIMAS ETAPAS

    5.1.        Introdução

    Apesar das suas limitações, as ações inibitórias são consideradas pela esmagadora maioria das partes interessadas e dos peritos como um instrumento útil com potencial considerável se as deficiências identificadas forem resolvidas.

    Na Resolução do Parlamento Europeu, de 2 de fevereiro de 2012, intitulada «Rumo a uma abordagem europeia coerente sobre a ação coletiva», o Parlamento Europeu considera que «a ação inibitória desempenha igualmente um importante papel na salvaguarda dos direitos conferidos pela legislação da UE aos cidadãos e às sociedades e sustenta que os mecanismos estabelecidos nos termos do Regulamento (CE) n.º 2006/2004, relativo à cooperação no domínio da defesa do consumidor e da Diretiva 2009/22/CE, relativa às ações inibitórias em matéria de proteção dos interesses dos consumidores, podem ser consideravelmente aperfeiçoados de molde a fomentar a cooperação e o recurso à ação inibitória em situações transfronteiriças».

    As partes interessadas sugeriram eventuais medidas para melhorar a eficácia das ações inibitórias:

    a) Medidas não legislativas

    Existem medidas que podem aumentar a utilização das ações inibitórias e a sua eficácia, sem alterar o quadro jurídico, tanto a nível europeu como nacional. Uma medida possível desse tipo é a organização de campanhas de sensibilização e formação para entidades competentes no que respeita à utilização de ações inibitórias, uma vez que muitas dessas entidades não dispõem de conhecimentos suficientes para utilizar as referidas ações. Do mesmo modo, algumas partes interessadas sugerem a introdução de mecanismos (por exemplo, um sítio web) para divulgar as ações inibitórias em toda a Europa. Esse sítio web poderia igualmente conter informações sobre o âmbito de aplicação das ações inibitórias e das regras processuais aplicáveis nos diferentes Estados-Membros, traduzidas em todas as línguas oficiais da UE.

    b) Alterações possíveis do quadro jurídico

    A maior parte das partes interessadas considera que a diretiva é um ato legislativo simples e bem elaborado. No entanto, aparentemente, o nível de utilização e de eficácia das ações inibitórias varia de um Estado-Membro para outro, mais do que seria desejável. A diretiva contém algumas normas básicas, mas deixa uma grande margem de manobra para os Estados-Membros conceberem as características das ações inibitórias, incluindo as regras processuais, bem como o seu âmbito de aplicação e os seus efeitos. A eficácia desigual das ações inibitórias em diferentes Estados-Membros depende, em grande parte, das diferenças na forma como os Estados-Membros transpuseram a diretiva para o direito interno e das diferenças na sua legislação processual e substantiva. Vários inquiridos, incluindo algumas autoridades públicas dos Estados-Membros, preconizam um maior grau de harmonização (no que respeita aos prazos para intentar a ação, ao prazo para proferir uma decisão judicial e às custas) nos processos de ações inibitórias dos diferentes Estados-Membros, pelo menos no contexto transfronteiriço. Em qualquer caso, seria conveniente que as disposições que são particularmente úteis para melhorar a eficácia das ações inibitórias em alguns Estados-Membros fossem introduzidas nos outros Estados-Membros.

    As partes interessadas sugeriram uma série de medidas possíveis tendentes a assegurar que as ações inibitórias sejam utilizadas com mais frequência e de forma mais eficaz. Foi proposto introduzir algumas das medidas que já existem nalguns Estados-Membros a nível europeu. As mais importantes dessas medidas são as seguintes:

    1.           Extensão do âmbito de aplicação da diretiva a todas as normas de proteção dos consumidores. Várias partes interessadas são a favor de um alargamento do âmbito de aplicação das ações inibitórias para além da lista incluída no anexo, como já está a acontecer em alguns Estados-Membros. Por exemplo, as leis sobre a proteção da privacidade e dos dados pessoais são cada vez mais consideradas como «leis de proteção do consumidor».

    2.           Extensão dos efeitos das decisões. Na sua maioria, as partes interessadas consideram que os consumidores devem beneficiar diretamente de uma decisão judicial na sequência de um caso bem sucedido, em vez de serem obrigados a instaurar uma nova ação para fazer valer os seus direitos. Devem ser introduzidas na diretiva disposições claras sobre a possibilidade de indemnizar os consumidores e as modalidades para o fazer Além disso, o prazo de prescrição dos pedidos de indemnização apresentados pelos consumidores lesados pela infração legal deve ser suspenso durante o processo de ação inibitória. Quando uma cláusula contratual é declarada ilegal, o efeito dessa decisão deve ser alargado a todos os contratos presentes e futuros semelhantes (o que já está a acontecer nalguns Estados-Membros).

    3.           Procedimentos acelerados em relação a medidas cautelares. Várias partes interessadas pronunciaram-se a favor de uma disposição que preveja a utilização obrigatória de um procedimento acelerado para todas as ações inibitórias, e não apenas «se for caso disso», como previsto no artigo 2.º da diretiva. Contudo, na medida em que as diferentes legislações nacionais não têm a mesma interpretação do «procedimento acelerado», a diretiva deveria incluir alguns requisitos relativos ao procedimento acelerado, por exemplo no que respeita aos prazos para proferir a decisão do tribunal sobre a ação inibitória.

    4.           Direito à informação. Várias partes interessadas indicaram que as entidades competentes devem ter o direito de aceder ao nome e ao endereço legal das empresas envolvidas em práticas ilegais. As empresas devem ser obrigadas a disponibilizar os contratos-tipo que utilizam, como é o caso em Espanha, em que as condições contratuais gerais devem ser incluídas no «Registro de Condiciones Generales de la Contratación». A maioria das partes interessadas também é de opinião que as decisões devem ser publicadas, a fim de informar os consumidores e dissuadir os comerciantes. Isso já acontece em alguns Estados-Membros.

    5.           Financiamento. A maioria das partes interessadas considera que o princípio «perdedor, pagador» deve continuar a aplicar-se às ações inibitórias. No entanto, algumas partes reconheceram que esse princípio deve ser aplicado de forma flexível, que seja favorável às entidades competentes, como é o caso em alguns Estados-Membros.

    6.           A execução das decisões judiciais deve ser melhorada. Para esse efeito, várias partes interessadas consideram que os Estados-Membros deveriam ser obrigados a impor sanções dissuasivas em caso de incumprimento de decisões proferidas no âmbito de ações inibitórias, a fim de garantir que as práticas comerciais desleais não sejam rentáveis para os comerciantes.

    Por último, várias partes interessadas, incluindo as autoridades públicas de alguns Estados-Membros, declararam que deve ser introduzido, a nível europeu, um mecanismo de ação coletiva dos consumidores, sem prejuízo de eventuais melhorias em matéria de ações inibitórias.

    6.           CONCLUSÃO

    Tendo em conta os resultados descritos supra, a Comissão formula as seguintes conclusões a propósito da aplicação da diretiva:

    Apesar das suas limitações, as ações inibitórias constituem um instrumento útil para a proteção dos interesses coletivos dos consumidores. As entidades competentes estão cada vez mais cientes das possibilidades que lhes são oferecidas pela diretiva e têm vindo a adquirir experiência com a sua utilização.

    Contudo, existem disparidades importantes entre os Estados-Membros no que respeita ao seu nível de utilização e eficácia. Em todo o caso, mesmo nos Estados-Membros em que as ações inibitórias são consideradas bastante eficazes e são amplamente utilizadas, o seu potencial não é plenamente explorado devido a um certo número de insuficiências identificadas no presente relatório. As mais significativas são: os elevados custos associados ao processo, a morosidade do processo, a complexidade dos procedimentos, os efeitos relativamente limitados das decisões proferidas no âmbito de ações inibitórias e a dificuldade de as aplicar. Essas dificuldades fazem-se sentir ainda mais nas ações inibitórias com uma dimensão transfronteiriça.

    A Comissão toma nota das questões suscitadas pelas partes interessadas, bem como das suas sugestões para as solucionar. A Comissão continuará a acompanhar a aplicação da diretiva nos Estados-Membros. Continuará igualmente a avaliar a melhor forma de abordar com os Estados-Membros as questões identificadas no presente relatório, bem como a melhor forma de introduzir melhorias no âmbito do quadro jurídico atualmente em vigor. A Comissão considera que não se afigura existirem razões suficientemente fortes para propor alterações da diretiva na presente fase, e reexaminará a situação aquando da elaboração do próximo relatório relativo à sua aplicação.

    [1]               O texto da diretiva (JO L 110 de 1.5.2009, p. 30 – 36) pode ser consultado no seguinte endereço: http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:32009L0022:EN:NOT.

    [2]               (JO L 364 de 9 12 2004, pp. 1-11).

    [3]               Estudo sobre a aplicação da Diretiva 2009/22/CE relativa às ações inibitórias em matéria de proteção dos interesses dos consumidores, realizado por IBF Internacional Consulting.

    [4]               JO C 97 de 31.3.2012.

    [5]               Regulamento (CE) n.º 864/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de julho de 2007, relativo à lei aplicável às obrigações extracontratuais (Roma II) (JO L 199 de 31.7.2007, p. 40).

    [6]               Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor.

    [7]               http://www.oft.gov.uk/OFTwork/consumer-enforcement/consumer-enforcement-completed/foxtons

    [8]               Wet collectieve afwikkeling massaschade

    [9]               JO L 12 de 16.1.2001, p. 1-23.

    [10]             JO L 199 de 31.7.2007, p. 40-49.

    [11]             Os Regulamentos (CE) n.º 1393/2007 e (CE) n.º 1206/2001 permitiram aumentar a celeridade e a segurança jurídica da notificação transfronteiriça de documentos e de obtenção de provas.

    [12]             De 2 556 a 11 759 euros, de acordo com a taxa de câmbio de 21 de junho de 2012.

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