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Document 52011AE1002

    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Integração da política da água nas demais políticas europeias» (parecer exploratório a pedido da Presidência húngara)

    JO C 248 de 25.8.2011, p. 43–48 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    25.8.2011   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 248/43


    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Integração da política da água nas demais políticas europeias» (parecer exploratório a pedido da Presidência húngara)

    2011/C 248/07

    Relatora: An LE NOUAIL MARLIÈRE

    Em 13 de Novembro de 2010, a futura Presidência húngara solicitou ao CESE a elaboração de um parecer exploratório sobre a

    Integração da política da água nas demais políticas europeias.

    A Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, responsável pela preparação dos correspondentes trabalhos do Comité, adoptou o seu parecer em 20 de Maio de 2011, sendo relatora An Le Nouail-Marlière.

    Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho) o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 106 votos a favor, 26 votos contra e 8 abstenções, o seguinte parecer:

    1.   Conclusões

    1.1   Escorado na sua experiência e nos seus conhecimentos em matéria de ambiente e agricultura e de desafios relacionados com o impacto das alterações climáticas na Europa – inundações que alternam com períodos de seca, com a consequente deterioração dos recursos hídricos, do solo das infra-estruturas e das actividades económicas e sociais – o CESE recomenda que se aborde de forma exaustiva e transversal os problemas, integrando as dimensões ambiental, económica e social.

    1.2   Considera da máxima importância que a UE se tenha dotado de uma política da água graças à directiva-quadro relativa à água, e incita os Estados-Membros e as instituições europeias a consolidarem esta política, dado que a água é um bem de primeira importância para os cidadãos, a indústria e a agricultura, os órgãos de poder local, em primeiro lugar devido ao papel fundamental que desempenha para a vida à face da Terra e, em segundo lugar, devido aos seus aspectos económico, social e ambiental.

    1.3   Recomenda, portanto, que lhe seja dada uma importância central em todas as políticas europeias.

    1.4   Com base nas necessidades e nos compromissos específicos do mundo rural e agrícola no período de discussão sobre o futuro da PAC após 2013, o CESE recomenda que os fundos referentes ao primeiro pilar estejam mais condicionados às políticas da água, de acordo com um dispositivo de «ecocondicionalidade» (1) e se aumente o número de medidas agro-alimentares do segundo pilar e as subvenções destinadas à protecção da água, de forma a atingirem níveis suficientes que atraiam os agricultores.

    1.5   Considerando que numerosos cidadãos europeus sem alojamento ou mal alojados continuam a estar privados de água corrente e ou potável gratuita, o Comité chama a atenção para a problemática da água na luta contra a pobreza e na ambição de a erradicar.

    1.6   Assinala a dimensão internacional e extra-europeia da política ambiental europeia através da estratégia da UE, da sua abordagem comercial e, ao mesmo tempo, ambiental e de desenvolvimento, bem como as suas implicações nas estratégias mundiais em matéria de ambiente, tanto no seu território (bacias transnacionais), como nas suas políticas externas (2).

    1.7   Incita os Estados-Membros da UE a ratificarem a Convenção da ONU de 1997 (3).

    1.8   No domínio do mercado interno, os direitos fundamentais, a integração e a coesão social e a saúde são factores que requerem uma análise aprofundada do impacto e do custo de uma eventual política da água que não integre as dimensões social, ambiental e económica.

    1.9   Esta integração exige que se assegure a coerência das estratégias em curso entre os diferentes interesses territoriais dos Estados-Membros e entre domínios (emprego, saúde, ambiente, agricultura intensiva ou biológica, energia, ordenamento do território, financiamento das políticas públicas, etc.) e actores (utilizadores e consumidores particulares e industriais, agricultores), todos eles em geral afectados por estas políticas.

    1.10   De um modo geral, a gestão dos recursos hídricos na Europa tem-se centrado numa abordagem da oferta e do abastecimento. Neste momento, a UE necessita de se dotar de novos meios que lhe permitam antecipar as respostas a dar face às catástrofes naturais ou associadas à actividade humana que ameaçam e degradam os recursos hídricos a curto prazo.

    1.11   Recordando a função fundamental dos solos e dos vegetais enquanto tampão em relação às águas de precipitação, o Comité convida o Conselho a relançar a adopção da Directiva Solos na medida em que ela é indispensável para uma política da água eficaz (4).

    1.12   Necessita, também, de desenvolver uma abordagem sustentável da gestão da água, centrada especialmente na poupança para preservar e proteger este recurso através de uma utilização mais eficaz – nova organização das captações e utilização de novas tecnologias.

    1.13   Embora seja ainda, em grande parte, natural, o ciclo da água compreende etapas artificiais que são possíveis devido às novas tecnologias, mas que não devem escamotear a necessidade de uma reflexão democrática sobre opções. Com efeito, é preciso abordar as captações numa perspectiva mais equitativa que responda quer às exigências e à concorrência entre sectores económicos, quer à necessidade de preservar os ecossistemas de água doce, e o facto de se tratar de um direito fundamental dos cidadãos.

    1.14   A gestão integrada das bacias hidrográficas é essencial para preservar e gerir os recursos. Favorece a participação das várias partes interessadas na identificação e aplicação de medidas que respondam aos desafios a nível regional, as quais implicam muitas vezes compromissos entre diferentes interesses e sectores – planeamento urbano, zonas de extensão das inundações, uso dos solos, nomeadamente para fins agrícolas, industriais e energéticos.

    1.15   O Comité sublinha que seria interessante definir um quadro de subvenções públicas europeias, com o mesmo volume de dotações e/ou um volume superior, destinadas a preservar o interesse público colectivo territorial, como por exemplo a recuperação de zonas húmidas, ou a preservar a biodiversidade, nomeadamente quando da análise da reforma das regras da UE em matéria de auxílios estatais aplicáveis aos serviços de interesse económico geral (5).

    1.16   Encoraja os Estados-Membros e as colectividades territoriais a serem mais vigilantes e exigentes quanto a condições de transparência e de reversibilidade das delegações de serviços públicos ou de interesse geral, tanto nos domínios jurídico como económico: propriedade pública, arrendamento, tarifação, reinvestimento, manutenção das infra-estruturas.

    1.17   Alerta para a necessidade de antecipar uma gestão dos recursos humanos e sociais de maneira igualmente integrada: formação inicial e contínua, certificação e reconhecimento das qualificações, gestão previsional, global e integrada, para facilitar a mobilidade profissional e geográfica incorporando a dimensão do género, base de dados.

    1.18   O Comité recomenda que o diálogo social seja encarado como algo que contribui para garantir o conjunto das missões, em toda a sua diversidade e a todos os níveis, do serviço de água e saneamento, tanto no que diz respeito ao estatuto dos trabalhadores como à segurança do pessoal e dos cidadãos.

    1.19   Em matéria de informação e de consulta dos utilizadores, os conselhos económicos e sociais constituem um recurso precioso para a consulta, dado que são organismos representativos e independentes e têm experiência e capacidade para organizar audições públicas.

    2.   Instrumentos legislativos relativos às políticas da água

    2.1   São várias as problemáticas ligadas à política da água, por exemplo, a gestão, conservação e exploração dos recursos, a gestão das catástrofes relacionadas com a água, a protecção dos meios naturais e a saúde pública.

    2.2   Segue-se uma lista dos actos legislativos e das políticas mais importantes da UE no domínio da gestão dos recursos hídricos.

    Na década de setenta: primeiras iniciativas

    1976, Directiva relativa às águas balneares

    1980, directiva sobre as águas destinadas ao consumo humano

    Na década de noventa: abordagem das principais fontes de poluição na origem

    1991, tratamento de águas residuais urbanas

    1991, poluição causada por nitratos de origem agrícola

    1996, prevenção e controlo integrados da poluição (directiva IPPC)

    Desde 2000: expansão, coerência, racionalização

    2000, Directiva-Quadro «Água» e directivas derivadas, de 2006 e 2008, relativas às águas subterrâneas e às substâncias prioritárias

    2007, directiva relativa às inundações

    2007, escassez de água e secas (comunicação)

    2.2.1   A Directiva-Quadro Água, Directiva 2000/60/CE, impõe uma gestão integrada das bacias para proteger os recursos no quotidiano, introduzindo o conceito de bacia hidrográfica, e permite igualmente integrar a gestão das águas continentais e costeiras.

    2.2.2   Através de um programa de medidas a executar à escala de distritos de bacias hidrográficas, esta directiva, estabelece como objectivo a consecução de um bom nível de qualidade das águas até 2015 (sob reserva das possibilidades de derrogação justificadas), bem como a não deterioração das águas no futuro, mediante:

    a prevenção e redução da poluição;

    a promoção de uma utilização sustentável da água;

    a protecção do ambiente;

    a melhoria do estado dos ecossistemas aquáticos e limitação dos efeitos das inundações e das secas.

    2.2.3   Incumbe os Estados-Membros de recensearem e classificarem as bacias existentes no seu território, analisar as suas características, identificar as bacias em risco e estudar a influência das actividades humanas nas bacias. Foram elaborados planos de gestão das bacias hidrográficas para evitar a deterioração e a poluição, bem como para melhorar e recuperar as bacias, quer se trate de águas de superfície, de águas subterrâneas ou ainda de zonas protegidas. Pretende-se também reduzir a poluição causada por descargas e emissões de substâncias perigosas. A este propósito a directiva-quadro «água» é completada com a directiva «substâncias prioritárias» 2008.

    2.2.4   A deterioração temporária das bacias é objecto de numerosas excepções. Assim, essa deterioração não constitui uma violação da directiva-quadro se resultar de circunstâncias imprevistas ou excepcionais ligadas a acidentes, de causas naturais ou de força maior. As excepções deverão ser objecto de exposição devidamente justificada e fundamentada dos Estados-Membros à Comissão.

    2.2.5   Nos termos da directiva, os Estados-Membros são obrigados, de 2010 em diante, a instituir uma política de tarifação para os vários utilizadores da água (particulares, agricultura, indústrias, etc.), de acordo com o princípio de proporcionalidade relativamente à quantidade utilizada, poluidor-pagador e cobertura dos custos.

    2.2.6   Cabe aos Estados-Membros fixar as sanções a aplicar em caso de infracção ao disposto na directiva, podendo a Comissão instaurar procedimentos de incumprimento acompanhados de sanções em caso de incumprimento. Todavia, dado que este regime de processos por infracção, que é complexo, não permite uma aplicação estrita de sanções e estas não são suficientemente dissuasivas, seria importante propor uma agravação exponencial de multa por reincidência. (A multa duplica por cada reincidência).

    2.2.7   O trabalho realizado no âmbito do Regulamento REACH – registo, avaliação e autorização de substâncias químicas, lista de poluentes de grande risco – deverá permitir reduzir os poluentes na água, proteger os ecossistemas aquáticos e atenuar os riscos para a saúde pública.

    2.3   A Comissão aborda o problema da água no âmbito do «exame de saúde» da política agrícola comum

    2.3.1   Efectivamente, o «exame de saúde» estabeleceu a obrigação de introduzir «faixas de protecção» ao longo dos cursos de água, nos quais é restringida a utilização de pesticidas, e de afectar parte dos fundos à luta contra a escassez de água. É necessário garantir a aplicação destas medidas. De igual modo, afigura-se importante realizar estudos de impacto sobre a quantidade de água utilizada na produção de biocombustíveis ou biomassa.

    2.4   A directiva relativa à prevenção dos riscos e das inundações prende-se com a preservação dos recursos em caso de catástrofes naturais  (6)

    2.4.1   A Directiva 2007/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa à avaliação e gestão dos riscos de inundações, obriga os Estados-Membros a proceder à cartografia dos perigos e riscos neste domínio, bem como a elaborar planos de gestão dos riscos de inundações, de modo a reduzi-los. A directiva prevê também, ao longo da sua execução, uma cooperação transfronteiriça e um intercâmbio de informações nas regiões hidrográficas transfronteiras comuns.

    2.5   O Fundo de Solidariedade da União Europeia indemniza as vítimas de catástrofes naturais

    2.5.1   Num seu parecer (7), o CESE indicou melhorias possíveis no funcionamento do Fundo de Solidariedade. De facto, os critérios que determinam as operações elegíveis para a disponibilização dos recursos previstos no artigo 4.o são demasiado restritivos e não têm em conta determinados tipos de prejuízos. O parecer sublinha a importância de incluir nas catástrofes elegíveis as que resultem de situações de acumulação ou de consequências de factos ocorridos durante um período mais prolongado. Estas catástrofes, tais como as secas ou as ondas de calor, derivam da evolução do ambiente, cuja responsabilidade é imputável a todos os membros da UE. O parecer considera que o abastecimento de água e o funcionamento das infra-estruturas deviam ser abrangidos pelo FSUE, mesmo que a catástrofe não resulte de uma ocorrência súbita.

    2.6   A Directiva 2008/1/CE relativa à prevenção e controlo integrados da poluição (Directiva PRIP) impõe um quadro para a instalação de unidades de produção industriais e agro-industriais  (8)

    2.6.1   Em teoria, esta directiva obriga as instalações industriais a utilizar a melhor tecnologia disponível. Não é, certamente, um instrumento relevante da política europeia da água. Porém, o recente derrame de lamas vermelhas ocorrido na Hungria, que poluiu os solos e rios da região de Ajka, e chegou inclusive ao Danúbio, chamou a atenção para diversas questões ambientais e de protecção dos cursos de água, bem como para questões relativas ao tratamento e indemnização das vítimas de catástrofes e ao nível de vigilância exigido no âmbito da execução das políticas da água. Existem ainda, por exemplo, cerca de 150 instalações ao longo de 3 019 km de margens do Danúbio (9) que constituem, segundo a WWF autênticas «bombas-relógio». Assim, as lamas vermelhas, resíduos do processo que permite produzir o alumínio, não tinham sido tratadas, se bem que a tecnologia exista, seja utilizada noutros locais e diminua sensivelmente a percentagem de 96 % de soda que permanece nos resíduos. Muitas instalações limitam-se a criar bacias de retenção dos resíduos, não procedendo a uma verdadeira despoluição, mas, não raro, essas bacias não têm uma capacidade de retenção adequada ao volume de produção (10). Esta nova obrigação de tratamento com as técnicas disponíveis mais eficazes deve poder completar melhor, de maneira segura e dimensionada as infra-estruturas de armazenamento.

    2.7   A Directiva relativa aos contratos públicos nos sectores da água, da energia, dos transportes e das telecomunicações (90/531 e 93/38/CEE) estabelece um enquadramento da exploração dos recursos hídricos por parte de operadores públicos ou privados e fixa as condições de adjudicação dos contratos.

    2.7.1   Durante o período de pré-adesão, foi pedido aos países candidatos que adequassem a sua indústria às normas europeias. Vários países haviam alterado a legislação, baixando certos limiares e minimizando determinados problemas ambientais.

    2.7.2   Assim, afigura-se imperativo que a UE e os Estados-Membros reforcem os meios que visam fazer aplicar a legislação europeia, de modo a aumentar a informação e a segurança dos seus cidadãos no atinente ao acesso à água e ao saneamento.

    2.8   Alterações climáticas e inundações

    2.8.1   As recentes inundações ocorridas por toda a Europa suscitaram muitas questões acerca da sua prevenção. A União Europeia dispõe de fundos para conter as catástrofes naturais, mas, paradoxalmente, não possui meios para prevenir e antecipar os riscos de catástrofe decorrentes de comportamentos humanos deliberados ou negligentes. Para serem totalmente eficazes, as políticas ligadas à prevenção spadas inundações deverão fazer parte de políticas mais globais em matéria de ordenamento do território, infra-estruturas, protecção dos ecossistemas e combate às alterações climáticas (11).

    2.9   Colaboração transfronteiras: o exemplo do land do Sarre e da Lorena na bacia do «Blies aval»

    2.9.1   Foi instituída uma cooperação inter-regional entre vários protagonistas para lançar uma parceria transfronteiras «Inundações», no quadro do projecto Interreg IV-A «Gestão de cheias e estiagens na bacia hidrográfica do Mosela e do Sarre - FLOW MS». O acordo reuniu à mesa as comissões internacionais para a protecção do Mosela e do Sarre (CIPMS), o ministério do Ambiente, da Energia e dos Transportes do land do Sarre (MUEV), a prefeitura da região da Lorena, a subprefeitura de Sarreguemines, quatro municípios alemães e cinco franceses. O objectivo é lidar com as inundações mediante uma prevenção comum e um intercâmbio regular de experiências, pretendendo-se, com isto, coordenar melhor os planos de alerta e de intervenção e adaptar o ordenamento municipal aos riscos de inundações.

    2.9.2   Esta cooperação transfronteiras na parte a jusante do Blies visa incentivar a elaboração de cartas de zonas inundáveis e de cartas de riscos de inundações, avaliar os riscos de inundações e emitir recomendações que se concretizem em planos de gestão dos riscos de inundações.

    2.9.3   Os rios não param nas fronteiras. As iniciativas locais na gestão, a montante, dos recursos são essenciais, como o demonstram alguns exemplos. Existe cooperação transnacional nas bacias hidrográficas de alguns rios – Reno, Oder, Mosa, Saar, Mosela e Elba. Os países ribeirinhos criaram instituições para garantir uma gestão coordenada dos riscos de inundações, bem como planos de protecção transfronteiras.

    2.9.4   A bacia do rio Semois, afluente do Mosa que banha e Bélgica e a França, é um exemplo. Não obstante medidas de prevenção e legislações diferentes, existe um plano de acção desde 2002 para lutar contra as inundações a montante (Bélgica) e a jusante (França). O programa financeiro Interreg III França-Valónia-Flandres (2002-2006) de incentivo à cooperação transeuropeia permitiu federar uma actuação comum, através do «contrato de rio» (instrumento vocacionado para a gestão em comum da água) e de acções de prevenção das inundações lançadas em ambos os lados da fronteira.

    2.9.5   Outros projectos, como o EUROTAS e as estratégias transfronteiras para o Danúbio e o Mar Báltico, visam desenvolver métodos comuns a vários países em matéria de gestão do risco de inundações, a longo prazo, e em previsão do tempo real das inundações ou em matéria de preservação de fontes de água doce.

    2.9.6   Deste modo, parece ser possível, necessário e adequado que as autoridades locais definam iniciativas de colaboração à escala local e que, seguidamente, sejam apoiadas, nos planos político e financeiro, pela União Europeia.

    3.   O estatuto e o papel das colectividades territoriais locais e da sociedade civil

    É possível enumerar vários domínios em que os cidadãos europeus são directamente afectados pela integração de uma política europeia da água.

    3.1   Impacto da gestão da água e das catástrofes nas populações

    3.1.1   A escassez de água, os períodos alternados de seca prolongada, as inundações e a poluição da água têm consequências graves, tais como problemas económicos e sociais, podem conduzir à extinção de certas actividades económicas (como a agricultura), à destruição de postos de trabalho e, consequentemente, ao êxodo da população e à fragilização dos territórios.

    3.1.2   A luta contra a poluição química da água é fundamental. Dela depende a saúde das espécies e das pessoas, bem como a transmissão de elementos químicos através da cadeia alimentar. Importa, pois, proceder a uma revisão regular da lista de poluentes cuja utilização esteja proibida ou enquadrada, em conformidade com a directiva relativa a substâncias prioritárias. Tal como salientam os pareceres anteriores do CESE (12), é necessário trabalhar em parceria com os agricultores, a indústria e as associações de defesa do ambiente para enquadrar a utilização de novos produtos e fixar limiares de utilização.

    3.2   Utilizações da água

    3.2.1   Os sectores da indústria, do turismo e da agricultura estão preocupados com a exploração e a poluição dos recursos hídricos. A urbanização galopante das zonas fluviais ou marítimas exerce igualmente pressão sobre este meio frágil. Na União Europeia, a produção de energia corresponde a 44 % das captações totais de água, utilizadas principalmente para arrefecimento. Das captações de água, 24 % destinam-se à agricultura, 21 % ao abastecimento público e 11 % a fins industriais. Estes números não espelham os diferentes níveis de utilização consoante as regiões. No Sul da Europa, por exemplo, a agricultura representa mais de metade das captações, ascendendo a mais de 80 % em certas regiões, ao passo que, no Oeste, mais de metade da água captada é canalizada para a produção de energia e o arrefecimento (13).

    3.2.2   São visíveis as relações de dependência entre a gestão dos recursos hídricos e a produção de energia eléctrica, que devem motivar um trabalho de reflexão por parte da União Europeia. Só uma pequena parcela da água captada é utilizada para produzir energia, acabando a maior parte por ser objecto de descarga a uma temperatura mais elevada. A preservação dos sistemas aquáticos constitui, pois, um enorme desafio. Existem tecnologias capazes de reduzir a quantidade de água utilizada na produção de energia eléctrica ou de recuperar eficazmente a água, mas o custo excessivo obsta à sua utilização. Por conseguinte, é necessário conceder incentivos financeiros à I&D neste domínio, favorecer a utilização destas novas tecnologias e, ao mesmo tempo, integrar a reflexão sobre os investimentos e a sustentabilidade dos seus retornos, associando as vertentes ambiental, social e económica.

    3.2.3   As práticas de utilização dos terrenos agrícolas e o planeamento urbano poderão ter um impacto significativo na escassez de água. A utilização descontrolada agrava a exploração das águas subterrâneas ou de superfície, podendo provocar alterações irreversíveis no meio ambiente e criar um ciclo de evoluções socioeconómicas não sustentável, com os consequentes riscos para a segurança alimentar, a energia e a estabilidade social. Várias zonas húmidas importantes, florestas ou planícies aluviais naturais foram drenadas e contidas, realizaram-se obras de regularização e construíram-se canais para sustentar a urbanização, a agricultura, a procura energética e a protecção contra as inundações (14). É necessário que as futuras políticas de ordenamento do território considerem a problemática da água.

    3.3   O controlo da procura e proposta de uma oferta duradoura e sustentável

    3.3.1   Vários factores influem na procura de água para fins domésticos: a dimensão da população e das famílias, a urbanização, o turismo, os rendimentos, a tecnologia e o comportamento dos consumidores. Além disso, as «fugas» nas redes de distribuição e abastecimento desempenham um papel essencial na determinação da quantidade de água que chega aos utilizadores finais. É preciso reduzir o nível de procura nos casos em que tal é possível. São necessários investimentos para manter e expandir as redes de distribuição, assim como as infra-estruturas de tratamento de águas residuais. Em 2006,10 % da população da UE-25 não estava ainda ligada a um sistema colector de águas residuais, registando-se disparidades significativas entre os diferentes países (15).

    3.3.2   O turismo pode aumentar significativamente o consumo de água, nomeadamente durante os meses das férias de Verão, e em especial no litoral sul da Europa, cujas regiões se encontram já sujeitas a uma forte tensão hídrica. A sensibilização dos consumidores deve vir em complemento de outras medidas de preservação dos recursos.

    3.3.3   Normas e independência: a reutilização das águas residuais na agricultura pode ser um factor significativo de gestão sustentável da água e deve ser objecto de medidas de segurança em termos de saúde pública, como as outras fontes, através de normas sanitárias estabelecidas pelo legislador, de forma transparente, e controladas, do modo totalmente independente, por entidades de controlo certificadas ou públicas.

    3.4   A sociedade civil nas políticas europeias da água

    3.4.1   Precedendo a resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas de 26 de Julho de 2010 (16), o Conselho da União Europeia informou, em 22 de Março de 2010, que os vinte e sete Estados-Membros da UE reconhecem o direito à água e ao saneamento, recordando que «todos os Estados têm obrigações em matéria de direitos humanos no que respeita ao acesso à água potável» e reconhecendo que «as obrigações em matéria de direitos humanos no que respeita ao acesso à água potável e ao saneamento estão estreitamente ligadas a determinados direitos humanos, como o direito à habitação, à alimentação e à saúde.»

    3.4.2   O direito da sociedade civil a ser informada acerca dos dados relativos à água é um direito essencial. Em 1999, o land de Berlim privatizou as empresas de gestão da água em proveito de Veolia e do conglomerado alemão RWE, o que provocou o aumento dos preços no consumidor. Os contratos de delegação e suas cláusulas subscritas entre as partes no contrato mantiveram-se em sigilo total. Uma iniciativa popular permitiu a organização do colectivo Berliner Wassertisch, que conseguiu recolher um número de assinaturas suficiente para desencadear um referendo popular. O voto popular, com uma taxa de participação de 27 %, pronunciou-se por 98 % a favor da publicação e, sem seguida, da anulação dos contratos secretos. A publicação dos contratos, graças a esta iniciativa, revelou que os lucros dos accionistas das duas empresas eram garantidos através de um sistema de compensação. O land de Berlim (graças ao erário público) garantia, pois, às empresas os lucros nos anos em que não se atingiam os montantes fixados nas cláusulas secretas. Cada vez mais frequentemente, as colectividades territoriais servem-se do termo dos contratos de delegação com sociedades privadas para «remunicipalizar» os serviços da água. No entanto, alguns municípios, e não dos menores, viram-se de tal modo reféns de contratos celebrados nestas condições iniciais e juridicamente desiguais que foram obrigados a manter os operadores privados em regime de participação (17). Poderia garantir-se a melhoria das condições de transparência das delegações de serviços públicos ou de interesse geral e sua reversibilidade, examinando, nomeadamente, os seguintes aspectos:

    gestão da água: reinvestimento dos lucros na manutenção e modernização das redes;

    as características e a natureza dos pesados investimentos que afectam a entrada no mercado privado e público não deveriam levar a situações de monopólio e ou a acordos e práticas concertadas;

    o financiamento das mais importantes empresas privadas da água é constituído essencialmente por financiamentos públicos (18);

    condições de trabalho, de emprego e de segurança do pessoal. Tem que haver homens e mulheres em número suficiente, formados e qualificados, que gozem de estatuto único público de trabalhadores assalariados dos serviços da água, saneamento, controlo e repressão das infracções, investigação, etc., de modo a garantir o conjunto das missões em toda a sua diversidade a todos os níveis;

    informação e consulta dos utilizadores: os conselhos económicos e sociais constituem um recurso precioso para a consulta pelo facto de serem organismos representativos e independentes e por terem experiência e capacidade para organizar audições públicas.

    Bruxelas, 15 de Junho de 2011

    O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

    Staffan NILSSON


    (1)  Restituição das subvenções em caso de incumprimento dos instrumentos legislativos (Directiva-Quadro Água) e nacionais (transposição) relativos à poluição provocada por nitratos, à qualidade da água, à directiva-quadro europeia sobre a água, de acordo com o princípio do poluidor-pagador.

    (2)  Relatório de Informação sobre «Trabalho digno e desenvolvimento sustentável na bacia do Mediterrâneo: Os sectores da água doce, da água do mar e do saneamento»

    (3)  Convention on the Law of the Non-navigational Uses of International Watercourses (Convenção sobre o direito da utilização dos cursos de água internacionais para fins que não sejam a navegaçãohttp://untreaty.un.org/ilc/texts/instruments/english/conventions/8_3_1997.pdf

    (4)  COM(2006) 232 final – 2006/0086 COD, COM(2009) 665 final.

    (5)  COM(2011) 146 final; Parecer do CESE «Reforma das regras da UE em matéria de auxílios estatais aplicáveis aos serviços de interesse económico geral», Ver página 149 do presente Jornal Oficial.

    (6)  JO C 195 de 18.8.2006, p. 20.

    (7)  JO C 28 de 3.2.2006, p. 69.

    (8)  JO C 182 de 4.8.2009, p. 46.JO C 97 de 28.4.2007, p. 12.JO C 80 de 30.3.2004, p. 29.

    (9)  WWF/Usine Nouvelle 21.10.2010.

    (10)  (Durante anos, a SANOFI AVENTIS, estabelecida em Ivry (França), lançou poluentes nas redes de saneamento do SIAAP, entre os quais benzeno, um produto altamente cancerígeno, por ter bacias de retenção subdimensionadas.)

    (11)  JO C 195 de 18.8.2006, p. 20.

    (12)  JO C 97 de 28.4.2007, p. 3.

    (13)  Water resources across Europe — confronting water scarcity and drought («Recursos hídricos na Europa – Fazer face à escassez da água e à seca»), relatório da Agência Europeia para o Ambiente, ISSN 1725-9177, Fevereiro de 2009.

    (14)  «O Ambiente na Europa – situação actual e perspectivas para 2010», Agência Europeia do Ambiente, SOER 2010.

    (15)  SOER, pág. 103 + relatório da AEA p. 5 – Comunicado de imprensa do Eurostat de 2006.

    (16)  Resolução da Assembleia-Geral das Nações Unidas «The human right to water and sanitation», 26/7/2010, A/64/L.63/Rev.1, see: http://www.internationalwaterlaw.org/documents/intldocs/UNGA_Resolution_HR_to_Water.pdf

    (17)  Public Citizen, «Campanha de água para todos», 2007.

    «Veolia Environnement: Um perfil de empresa. Relatório especial do Public Citizen no âmbito da Campanha de Água para todos» (http://documents.foodandandwaterwatch.org/Vivendi05.pdf) e

    O contrato secreto da privatização da água em Berlim, publicado no diário de Berlim (Die Tageszeitung) na sua edição de sábado, 30 de Outubro de 2010; http://www.taz.de/1/zukunft/wirtschaft/artikel/1/die-raeuberische-wasser-privatisierung/

    (18)  http://www.psiru.org/reports/2010-W-EWCS.doc


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