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Document 52004DC0334

    Livro Verde sobre a aproximação, o reconhecimento mútuo e a execução das sanções penais na União Europeia

    /* COM/2004/0334 final */

    52004DC0334

    Livro Verde sobre a aproximação, o reconhecimento mútuo e a execução das sanções penais na União Europeia /* COM/2004/0334 final */


    LIVRO VERDE sobre a aproximação, o reconhecimento mútuo e a execução das sanções penais na União Europeia

    (apresentado pela Comissão)

    Objectivos do Livro verde

    A União Europeia estabeleceu por objectivo facultar aos cidadãos um elevado nível de protecção num espaço de liberdade, segurança e justiça (artigo 29º do Tratado da União Europeia). Nesta perspectiva, a Comissão entende ser pertinente analisar se as diferenças nacionais em matéria de sanções penais constituem obstáculo à realização deste objectivo. Além disso, convém examinar se estas diferenças levantam problemas à cooperação judiciária entre os Estados-Membros, o que implica a identificação prévia dos obstáculos à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo, o qual, segundo as conclusões do Conselho Europeu de Tampere, deverá tornar-se "a pedra angular" do funcionamento da União em matéria de justiça e permitir, em geral, a execução num Estado-Membro das sanções pronunciadas noutro Estado-Membro.

    O presente documento constitui um esforço de reflexão prévia que deverá permitir, numa segunda fase, adoptar uma posição mais fundamentada, à luz das reacções e comentários ao Livro Verde, sobre a utilidade e exequibilidade de uma proposta legislativa eventualmente e em certa medida conducente, por um lado, à aproximação das normas aplicáveis às sanções penais em geral e, por outro, ao reconhecimento mútuo das sanções privativas de liberdade e das penas alternativas na União Europeia.

    Consulta de todas as partes interessadas

    Fazem-se diversas perguntas sobre os problemas que a Comissão entende serem os mais importantes no âmbito da realização de um verdadeiro espaço de justiça.

    A Comissão gostaria de receber respostas fundamentadas a estas perguntas por parte de todos os interessados. Estes podem, caso assim o entendam, formular comentários sobre outros aspectos úteis, evocados ou não no documento. As respostas às questões e os eventuais comentários deverão ser enviados até 31 de Julho de 2004, para

    Comissão Europeia

    Direcção-Geral da Justiça e Assuntos Internos, Unidade D.3

    B-1049 Bruxelas

    Fax: +32 2 296.76.34

    Endereço electrónico: JAI-justicepenale@cec.eu.int

    Para facilitar a gestão do dossier, solicita-se às partes interessadas que comuniquem as respostas e comentários por diversos meios (correiro electrónico e carta, por exemplo) que indiquem, sendo caso disso, se o mesmo documento foi já enviado à Comissão. As partes interessadas que pretendam comentar o presente Livro Verde deverão fornecer informações sobre os intersses que representam e qual o grau dessa representação.

    A presente consulta, bem como as respostas e comentários recebidos, serão publicados no sítio Internet da Comissão:

    http://europa.eu.int/comm/justice_home/ news_consulting_public_en.htm, excepto quando o autor a tal se oponha expressamente.

    ÍNDICE

    Objectivos do Livro verde

    Consulta de todas as partes interessadas

    1. Introdução

    1.1. Objectivos da aproximação

    1.2. Objectivos do reconhecimento mútuo

    1.3. Método e estrutura do Livro Verde

    2. Medidas tomadas a nível da União Europeia: ponto da situação

    2.1. Aproximação das sanções

    2.1.1. Tratado da União Europeia

    2.1.2. Plano de Acção de Viena

    2.1.3. Conclusões do Conselho Europeu de Tampere

    2.1.4. Instrumentos adoptados ou em fase de negociação

    2.1.5. Sanções privativas de liberdade

    2.1.6. Sanções pecuniárias

    2.1.7. Interdição de direitos

    2.1.8. Apreensão e perda

    2.1.9. Sanções aplicáveis às pessoas colectivas

    2.1.10. Sanções alternativas

    2.1.11. Execução das sanções penais

    2.2. Reconhecimento mútuo e execução das sanções penais noutro Estado Membro

    2.2.1. Mandado de detenção europeu

    2.2.2. Reconhecimento de sanções pecuniárias

    2.2.3. Reconhecimento das decisões de apreensão e perda

    2.2.4. Reconhecimento das decisões de interdição de direitos

    2.2.5. Acordos celebrados entre os Estados Membros da Comunidade Europeia

    no âmbito da cooperação política europeia (CPE)

    2.2.6. Conclusões

    3. Situação actual: Legislações nacionais e acordos internacionais

    3.1. Enorme diversidade entre os Estados Membros

    3.1.1. Regras de direito penal geral

    3.1.1.1. Princípios em matéria de instauração da acção penal: legalidade ou oportunidade

    3.1.1.2. Margem de apreciação do tribunal penal

    3.1.1.3. Grau de participação. Cumplicidade

    3.1.1.4. Grau de realização. Tentativa

    3.1.1.5. Circunstâncias agravantes e atenuantes

    3.1.1.6. Caso especial: reincidência

    3.1.1.7. Concurso de infracções

    3.1.2. Sanções privativas de liberdade

    3.1.3. Sanções pecuniárias

    3.1.4. Interdição de direitos

    3.1.5. Apreensão e perda

    3.1.6. Sanções aplicáveis às pessoas colectivas

    3.1.7. Sanções alternativas

    3.1.8. Execução das sanções penais

    3.2. Um arsenal de instrumentos de reconhecimento mútuo incompleto

    3.2.1. Reconhecimento mútuo das sanções privativas de liberdade

    3.2.1.1. Convenção Europeia sobre o Valor Internacional das Sentenças Penais,

    do Conselho da Europa, de 28 de Maio de 1970

    3.2.1.2. Convenção entre os Estados Membros das Comunidades Europeias relativa à Execução de Condenações Penais Estrangeiras, de 13 de Novembro de 1991

    3.2.1.3. Tratado de 26 de Setembro de 1968 entre a Bélgica, os Países Baixos e o Luxemburgo sobre a execução de decisões judiciais em matéria penal

    3.2.1.4. Modelo de cooperação entre os Estados nórdicos

    3.2.1.5. Convenção relativa à transferência das pessoas condenadas, do Conselho

    da Europa, de 21 de Março de 1983

    3.2.1.6. Protocolo Adicional à Convenção relativa à Transferência das Pessoas

    Condenadas, do Conselho da Europa, de 18 de Dezembro de 1997

    3.2.1.7. Acordo relativo à aplicação, entre os Estados Membros das Comunidades

    Europeias, da Convenção relativa à transferência das pessoas condenadas,

    do Conselho da Europa, de 25 de Maio de 1987

    3.2.2. Reconhecimento de decisões que concedem a suspensão ou a liberdade

    condicional ou que impõem sanções alternativas

    3.2.2.1. Descrição e identificação do problema

    3.2.2.2. Instrumentos existentes

    3.2.3. Reconhecimento das decisões de interdição de direitos

    3.2.4. Conclusões

    4. Problemas subsistentes e necessidade de acção a nível da União Europeia

    4.1. Aproximação das sanções privativas de liberdade e das penas alternativas

    4.1.1. Regras de direito penal geral

    4.1.1.1. Legalidade/Oportunidade

    4.1.1.2. Margem de apreciação do tribunal penal

    4.1.1.3. Grau de participação. Cumplicidade

    4.1.1.4. Circunstâncias agravantes e atenuantes

    4.1.1.5. Reincidência

    4.1.1.6. Concurso de infracções

    4.1.2. Sanções privativas de liberdade

    4.1.3. Sanções pecuniárias

    4.1.4. Interdição de direitos

    4.1.5. Apreensão e perda

    4.1.6. Pessoas colectivas

    4.1.7. Sanções alternativas

    4.1.8. Execução das sanções

    4.2. Reconhecimento e execução de sanções privativas de liberdade e de sanções alternativas noutro Estado Membro

    4.2.1. Âmbito de aplicação de uma regulamentação exequível ao nível da

    União Europeia

    4.2.1.1. Âmbito de aplicação pessoal

    4.2.1.2. Âmbito de aplicação material

    4.2.2. Condições para o reconhecimento

    4.2.2.1. Direito de iniciativa para lançar o processo de reconhecimento

    4.2.2.2. Motivos de recusa

    4.2.2.3. Poder do Estado de execução para adaptar a sanção (privativa de

    liberdade ou alternativa) pronunciada pelo Estado de julgamento

    4.2.2.4. Participação do condenado

    4.2.2.5. Participação da vítima

    4.2.3. Questões processuais e modalidades práticas para a aplicação do

    reconhecimento de sentenças penais e da transferência de reclusos

    4.2.3.1. Prazos

    4.2.3.2. Reembolso de despesas efectuadas pelo Estado de execução das sanções

    4.2.4. Repartição de competências entre o Estado de julgamento e o Estado

    de execução

    ANEXO I Inventário e análise comparada da legislação dos Estados Membros em

    matéria de modalidades de execução das sanções privativas de liberdade

    impostas no âmbito da sentença

    1. Suspensão da execução da pena

    2. Suspensão e adiamento da pronúncia da pena

    3. Regime de semidetenção

    4. Fraccionamento da execução da pena ("prisão por dias livres")

    5. Vigilância electrónica

    6. Prisão domiciliária

    ANEXO II Inventário e análise comparada da legislação dos Estados Membros

    em matéria de sanções alternativas

    1. Prestação de trabalho a favor da comunidade

    2. Mediação em processo penal

    3. Transacção em processo penal

    ANEXO III Inventário e análise comparada da legislação dos Estados Membros

    em matéria de execução das sanções penais

    1. Suspensão da pena

    2. Regime de semidetenção

    3. Libertação antecipada

    4. Atenuação da pena

    5. Amnistia e indulto

    ANEXO IV Quadro recapitulativo das perguntas

    1. Introdução

    O Tratado da União Europeia (TUE) prevê, na alínea e) do artigo 31º, "adoptar gradualmente medidas que prevejam regras mínimas quanto aos elementos constitutivos das infracções penais e às sanções aplicáveis" em determinados domínios. Esta abordagem é confirmada no Plano de Acção do Conselho e da Comissão sobre a melhor forma de aplicar as disposições do Tratado de Amesterdão relativas à criação de um espaço de liberdade, de segurança e de justiça [1] (Plano de Acção de Viena), bem como nas conclusões do Conselho Europeu de Tampere [2] (ponto 48).

    [1] JO C 19 de 23.01.1999, p. 1. Ver também ponto 2.1.2.

    [2] Disponíveis em: http://ue.eu.int/pt/Info/eurocouncil/ index_pt.htm

    A aproximação das sanções penais contribui igualmente, por um lado, para assegurar a compatibilidade das normas aplicáveis nos Estados-Membros, de acordo com o previsto na alínea c) do artigo 31º, na medida do necessário para melhorar a cooperação judiciária em matéria penal e, por outro lado, para facilitar e acelerar a cooperação entre os ministérios e as autoridades judiciárias ou outras equivalentes dos Estados-Membros, no que respeita à execução das decisões, tal como referido na alínea a) do artigo 31º.

    Para concretizar este mandato, foram já adoptados pelo Conselho alguns instrumentos legislativos (decisões-quadro), no que respeita à fraude dos meios de pagamento que não efectuados em numerário, a contrafacção do euro, o branqueamento de capitais, o terrorismo, a criminalidade ambiental, o tráfico de seres humanos, a corrupção no sector privado e a ajuda à entrada e permanência irregulares de cidadãos estrangeiros. Estão em discussão outros instrumentos no Conselho e no Parlamento Europeu, entre os quais propostas de decisões-quadro relativas à poluição originada por navios ou ao racismo e à xenofobia [3]. As decisões-quadro têm por objectivo aproximar as disposições legislativas e regulamentares dos Estados-Membros. Vinculam-nos quanto ao resultado a alcançar, deixando, no entanto, às instâncias nacionais a competência quanto à forma e aos meios [4].

    [3] Ver ponto 2.1.5.

    [4] Nº 2, alínea b), do artigo 34º do Tratado da União Europeia.

    No que respeita às sanções, foram fixadas as penas aplicáveis. A fórmula utilizada para a harmonização das sanções consistiu em estabelecer penas eficazes, proporcionais e dissuasivas, procurando cada vez mais fixar o mínimo da pena máxima [5]. Esta abordagem, que se limita à pena privativa de liberdade, conduz, do ponto de vista da Comissão, a uma aproximação mínima que poderá revelar-se insuficiente para a realização dos objectivos mencionados. A Comissão pretende responder à eventual necessidade de identificar os domínios em que se justifique uma acção ao nível da União.

    [5] No entanto, a Acção Comum adoptada pelo Conselho, em 21 de Dezembro de 1998, relativa à incriminação da participação numa organização criminosa nos Estados-Membros da União Europeia, não prevê um nível mínimo de pena.

    Acresce ainda que as acções lançadas pela Comunidade com base no Tratado da União Europeia não prejudicam as competências que esta detém em matéria de realização dos objectivos enunciados no artigo 2º do TCE, para impor aos Estados-Membros que adoptem sanções eventualmente de carácter penal, a nível nacional, quando tal se revele necessário para atingir o objectivo comunitário. Entre estes domínios podem citar-se, por exemplo, a protecção do ambiente, incluindo a proibição de descargas ilegais por navios ou a política comum de pescas.

    Para além da pena de prisão, os sistemas penais dos Estados-Membros prevêem uma vasta gama de sanções. Por outro lado, mesmo que se fixe a mesma pena em relação a uma infracção, divergências importantes nas normas gerais de direito penal dos Estados-Membros provocam diferenças entre a pena pronunciada e a pena executada.

    O presente Livro Verde contém uma análise comparativa da legislação dos Estados-Membros. A situação nos países em vias de adesão não pôde ser tida em consideração nesta fase, visto que os estudos utilizados na sua elaboração não abrangiam a legislação de todos estes países. No âmbito da consulta lançada pelo Livro Verde, os países em vias de adesão terão, como é óbvio, a possibilidade de exprimirem os seus pontos de vista. A Comissão instá-los-á a enviar-lhe contribuições, por forma a completar as informações factuais relativas à respectiva legislação nas matérias abrangidas pelo Livro Verde.

    Neste contexto, podemos interrogar-nos, em termos de eficácia, se a sanção é efectivamente aplicada e se esta aplicação tem efeito dissuasivo, por forma a reutilizar conceitos bem conhecidos que vingam desde o processo do "milho grego ou jugoslavo" [6] e que estão na base do sistema de aproximação das sanções patente nos textos adoptados no âmbito do terceiro pilar. Em conclusão, a sanção sofrida é o resultado final de uma equação complexa com um número extremamente elevado de variáveis. Teoricamente, seria necessário intervir sobre todos os factores para garantir sanções iguais entre as diversas ordens jurídicas.

    [6] TJCE, Acórdão de 21 de Setembro de 1989, Comissão/República Helénica, Processo 68/88,

    Col. 1989, p. 2965.

    Todavia, há que admitir que não se trata de harmonizar de forma simultânea e a curto prazo todos os factores pertinentes na matéria e a Comissão não tem, como é óbvio, a intenção de propor a uniformização de todas as sanções penais na União Europeia. Tal não seria nem desejável nem juridicamente exequível.

    As diferenças entre as legislações dos Estados-Membros em matéria de sanções são consideráveis. Tal explica-se por motivos históricos, culturais e jurídicos fortemente enraizados nos sistemas jurídicos que evoluíram ao longo do tempo e que são a expressão da forma como os Estados foram confrontados e responderam a questões fundamentais no domínio do direito penal. Estes sistemas apresentam uma coerência interna, pelo que modificar as regras sem ter em conta o conjunto é susceptível de acarretar distorções.

    É necessário, pelo contrário, de acordo com o princípio da subsidiariedade, centrar-se em domínios onde se identifiquem necessidades, em função dos objectivos estabelecidos e das bases jurídicas disponíveis. Trata-se, sobretudo, de identificar as diferenças prejudiciais em matéria de sanções e os eventuais limites que é necessário impor para garantir a realização de um espaço europeu de justiça.

    No que respeita ao projecto de Constituição [7], o artigo I-41º, que diz respeito à realização do espaço de liberdade, segurança e justiça, prevê, no nº 1, que a União realize este espaço:

    [7] Disponível em http://european-convention.eu.int/

    - através da adopção de leis e leis-quadro europeias destinadas, se necessário, a aproximar as legislações nacionais nos domínios enumerados na Parte III;

    - pela promoção da confiança mútua entre as autoridades competentes dos Estados-Membros, em especial com base no reconhecimento mútuo das decisões judiciais e extrajudiciais;

    - através da cooperação operacional entre as autoridades competentes dos Estados-Membros.

    Além disso, na Parte III do projecto de Constituição, na secção relativa à cooperação judiciária em matéria penal (artigo III-171º) especifica-se que esta assenta no princípio do reconhecimento mútuo das sentenças e decisões judiciais e inclui a aproximação das disposições legislativas e regulamentares dos Estados-Membros em diversos domínios. A este respeito, o artigo III-172º prevê que a lei-quadro europeia "pode estabelecer regras mínimas relativas à definição das infracções penais e das sanções em domínios de criminalidade particularmente grave e com uma dimensão transfronteiras que resulte da natureza ou das incidências dessas infracções, ou ainda da especial necessidade de as combater, assente em bases comuns".

    Nos termos do nº 1, alínea d), do artigo III-171º do projecto de Constituição, a lei ou lei-quadro estabelece as medidas destinadas a «facilitar a cooperação entre as autoridades judiciárias ou outras equivalentes dos Estados-Membros, no âmbito da investigação e do exercício da acção penal, bem como da execução de decisões». Acresce ainda que o Conselho pode, deliberando por unanimidade, após aprovação do Parlamento Europeu, adoptar uma decisão europeia que identifique outros domínios de criminalidade (nº 1, terceiro parágrafo, do artigo III-172º).

    Quando a aproximação de normas de direito penal se afigure indispensável para assegurar a aplicação eficaz de uma política da União num domínio que tenha sido objecto de medidas de hamonização, a lei-quadro europeia pode estabelecer regras mínimas relativas à definição das infracções penais e das sanções no domínio em causa (cf. nº 2 do artigo III-172º).

    Nos termos do artigo III-173º do projecto de Constituição, a lei ou lei-quadro europeia estabelece medidas para incentivar e apoiar a acção dos Estados-Membros no domínio da prevenção da criminalidade que desempenha um papel importante no âmbito das modalidades de execução das sanções privativas de liberdade e das sanções alternativas (ver Anexos I e II). No entanto, esta base jurídica não permite proceder à aproximação das disposições legislativas e regulamentares dos Estados-Membros.

    1.1. Objectivos da aproximação

    A aproximação das sanções penais poderá congregar vários objectivos:

    - Antes de mais, ao estabelecer incriminações e sanções comuns relativamente a certas formas de criminalidade, a União enviaria uma mensagem simbólica. A aproximação das sanções contribuiria para dar aos cidadãos um sentimento comum de justiça, que é uma das condições da realização do espaço de liberdade de segurança e de justiça [8]. Além disso, manifestaria claramente que determinados comportamentos são inaceitáveis e sancionados de forma equivalente. Poder-se-á pensar, por exemplo, na repressão da exploração sexual de crianças. A aproximação relativa à incriminação de um comportamento, bem como ao nível da sanção que lhe é atribuído, conduz a uma protecção eficaz e equivalente dos cidadãos em todo o território da União contra um fenómeno que se opõe a princípios e valores comuns dos Estados-Membros.

    [8] Ver ponto 15 do Plano de Acção de Viena.

    - Além disso, o corolário de um espaço europeu de justiça consistiria em submeter comportamentos criminosos idênticos a riscos de sanções semelhantes para o autor, independentemente do local onde a infracção fosse cometida na União. A aproximaçãos das legislações constitui, assim, um objectivo autónomo, nos domínios considerados prioritários e identificados enquanto tal. É necessário, um determinado grau de aproximação das disposições de direito penal material, tendo em conta, designadamente, o facto de certas formas de criminalidade revestirem uma dimensão transnacional e de os Estados-Membros não poderem atacá-las eficazmente se agirem sozinhos.

    - Normas mínimas da União contribuiriam igualmente para impedir que os autores de infracções (ou, pelo menos, determinadas categorias de autores como, por exemplo, os envolvidos na criminalidade organizada beneficiem do facto de as penas serem muito divergentes consoante os Estados, evitando que se desloquem de um Estado para outro para iludir acções penais ou a execução de penas. As conclusões de Tampere (ponto 5) salientam que os autores de infracções não devem ter a possibilidade de tirar partido das diferenças entre os sistemas judiciários dos Estados-Membros. Tal é especialmente válido no contexto da criminalidade financeira.

    - As discussões no Conselho sobre o projecto de decisão-quadro relativa à aplicação do princípio « ne bis in idem » demonstraram igualmente que a aplicação do princípio consagrado no artigo 50º da Carta dos Direitos Fundamentais da União será mais facilmente aceite se as penas aplicáveis forem comparáveis e efectivamente aplicadas.

    - Se o nível de penas aplicáveis condicionava a aplicação de determinados mecanismos de cooperação judiciária em matéria penal, tal deixou de se verificar após a adopção de instrumentos baseados no princípio do reconhecimento mútuo.

    - Existe igualmente um nexo, tal como indicado no nº 2 do artigo III-172º do projeto de Constituição, entre a aproximação das normas de direito penal e a aplicação eficaz de uma política da União num domínio que tenha sido objecto de medidas de harmonização. Poder-se-iam citar a protecção do ambiente, a segurança no trabalho ou ainda as transacções económicas e financeiras como exemplos de matérias onde o direito penal poderá contribuir para garantir o respeito de uma política da União.

    - Finalmente, a aproximação das normas de direito penal relativas a sanções e sua execução contribui para facilitar a aceitação do reconhecimento mútuo das sentenças, visto reforçar a confiança mútua. A aproximação não constitui, no entanto, uma condição sine qua non do reconhecimento mútuo. Trata-se, isso sim, de dois mecanismos complementares que permitem concretizar o espaço judiciário europeu. A compatibilidade das normas aplicáveis nos Estados-Membros seria, pois, facilitada, em conformidade com a alínea c) do artigo 31º do TUE e, por outro lado, melhorada a cooperação entre as autoridades competentes dos Estados-Membros no que respeita à execução das decisões - alínea a) do artigo 31º do TUE. Condições de execução das penas compatíveis entre os Estados-Membros contribuiriam para reintegrar as pessoas, permitindo-lhes purgar as penas num Estado-Membro diferente daquele em que a sentença foi proferida.

    Todavia, qualquer intervenção que tenha por objectivo aproximar as sanções penais deverá, como é evidente, respeitar os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade. O Protocolo relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, anexado ao Tratado CE pelo Tratado de Amesterdão, contém os critérios de aplicação destes princípios. Justifica uma acção da Comunidade quando se trate de aspectos transnacionais, quando uma acção apenas ao nível nacional ou a ausência de acção por parte da Comunidade sejam contrárias às exigências do Tratado ou ainda quando uma acção empreendida ao nível comunitário apresente vantagens evidentes devido à sua dimensão ou aos seus efeitos.

    Por força do artigo 2º do TUE, estes critérios são aplicáveis no contexto das competências da União. Para realizar o objectivo de criação de um espaço de liberdade, de segurança e de justiça na União Europeia, fixado pelo Tratado, justificam-se todos os esforços de aproximação no domínio da aplicação e da execução das penas, na medida em que os objectivos da acção proposta não possam ser realizados de forma suficiente pelos Estados-Membros, sendo mais facilmente exequíveis, devido à dimensão ou efeitos da acção pretendida, ao nível da União. Para atingir estes objectivos, as medidas de aproximação pretendidas poderiam incidir sobre diferentes aspectos relacionados com as sanções que correspondem, globalmente, a quatro temas:

    (1) Quais as sanções que o direito penal permite impor?

    (2) Como se processa a investigação e a acção penal?

    (3) Como são pronunciadas as sanções?

    (4) Como são executadas as sanções pronunciadas?

    A Comissão entende que seria necessário abordar toda esta problemática e não apenas a aproximação das penas aplicáveis. Na realidade, não basta, por exemplo, que sejam fixadas nos Estados-Membros níveis de penas semelhantes se, uma vez pronunciadas, as sanções são aplicadas de forma mais flexível ou mais severa consoante o país. A escolha de uma sanção aplicável implica necessariamente uma escolha quanto às modalidades de execução dessa sanção.

    Uma política coerente em matéria de sanções penais na União deverá, no mínimo [9], questionar os quatro aspectos que se seguem, sem preconceitos, nesta fase, sobre a oportunidade ou a exequibilidade de uma acção relativamente a cada um destes pontos:

    [9] Recapitulando: em substância, as sanções penais são influenciadas pelos factores seguintes:

    (1) O nível das penas e a panóplia das sanções disponíveis (por exemplo, penas privativas de liberdade, penas alternativas à prisão, sanções pecuniárias, etc.);

    (2) As regras em vigor em matéria de investigação e acção penal (por exemplo, princípio da legalidade/oportunidade da acção penal, prioridades em matéria de política criminal, etc.);

    (3) As normas de direito penal geral (por exemplo, participação, tentativa, cumplicidade, instigação, circunstâncias agravantes e atenuantes, reincidência, etc.);

    (4) As normas e práticas em matéria de execução das penas (por exemplo, diferentes formas de liberdade condicional, comutação e redução de penas, amnistia, indulto, reabilitação, intervenção das autoridades judiciais ou outras na execução da pena, medidas de individualização da pena na perspectiva da reintegração, etc.).

    Para levar a bom termo a sua reflexão sobre estas questões, a Comissão terá igualmente em consideração os resultados de um estudo recente sobre a harmonização das sanções penais na Europa [10], efectuado pela Unité Mixte de Recherche de Droit Comparé de Paris. O estudo, que beneficiou de um financiamento no âmbito do programa Grotius, centra-se, por um lado, na viabilidade da aproximação das normas gerais de direito penal relativas à aplicação das sanções e, por outro, nas normas de enquadramento da execução das penas. Os resultados deste estudo poderão contribuir para precisar numa etapa ulterior, as questões susceptíveis de virem a ser consideradas para acção ao nível da União.

    [10] «L'harmonisation des sanctions pénales en Europe ». Dir: M. Delmas-Marty, G. Giudicelli-Delage, E. Lambert-Abdelgawad. Société de législation comparée. Collection de l'UMR de Droit comparé de Paris (Paris I- CNRS, vol.V), Paris, 2003.

    1.2. Objectivos do reconhecimento mútuo

    Nos termos da alínea a) do artigo 31° do Tratado da União Europeia, a acção em comum no domínio da cooperação judiciária em matéria penal terá por objectivo, nomeadamente, "facilitar e acelerar a cooperação entre os ministérios e as autoridades judiciárias ou outras equivalentes dos Estados-Membros no que respeita à tramitação dos processos e à execução das decisões". Esta disposição, introduzida pelo Tratado de Amesterdão [11], não menciona o princípio do reconhecimento mútuo segundo o qual sentenças ou outras decisões das autoridades judiciais de um Estado-Membro (Estado de julgamento) são reconhecidas e, sendo necessário, executadas noutro Estado-Membro (Estado de execução).

    [11] Assinado em 2 de Outubro de 1997, entrou em vigor em 1 de Maio de 1999.

    A primeira menção a este conceito, anteriormente utilizado no contexto do mercado único, data do Conselho Europeu de Cardiff, de 15 e 16 de Junho de 1998, onde se solicitou ao Conselho que determinasse em que medida se justificaria a sua aplicação às decisões dos tribunais dos Estados-Membros [12].

    [12] Conclusão n° 39 da Presidência.

    Evocada na alínea f) do ponto 45 do Plano de acção do Conselho e da Comissão, adoptado em 3 de Dezembro de 1998, sobre a melhor forma de aplicar as disposições do Tratado de Amesterdão relativas à criação de um espaço de liberdade, de segurança e de justiça, a ideia do reconhecimento mútuo foi retomada pelo Conselho Europeu de Tampere, de Outubro de 1999, que considerou que este princípio se deveria tornar "a pedra angular da cooperação judiciária na União, tanto em matéria civil como penal" (pontos 33 a 37). De acordo com a declaração do Conselho Europeu de Tampere, "um maior reconhecimento mútuo das sentenças e decisões judiciais e a necessária aproximação da legislação facilitariam a cooperação entre as autoridades e a protecção judicial dos direitos individuais". O reconhecimento mútuo deverá, pois, garantir não apenas que as sentenças sejam aplicadas, mas também que o sejam de forma a proteger os direitos individuais. A título de exemplo, o reconhecimento e a execução de uma decisão noutro Estado-Membro deverão também intervir quando permitam uma melhor reinserção social do delinquente.

    O Conselho Europeu de Tampere solicitou ao Conselho e à Comissão que adoptassem um programa de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo [13].

    [13] Conclusão n° 37 da Presidência.

    Na Comunicação apresentada em 26 de Julho de 2000 ao Conselho e ao Parlamento sobre o reconhecimento mútuo de decisões finais em matéria penal [14], a Comissão propunha orientações de base nesta matéria.

    [14] COM(2000) 495 final.

    Estas orientações foram seguidamente circunstanciadas no "Programa de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo das decisões penais" [15]. Este programa salienta que o reconhecimento mútuo das decisões é um factor de segurança jurídica na União Europeia, na medida em que garante que uma sentença pronunciada num Estado-Membro não seja questionada noutro Estado-Membro. Salienta ainda que a aplicação do princípio do reconhecimento mútuo das decisões penais pressupõe a confiança recíproca dos Estados-Membros nos respectivos sistemas de justiça penal. Esta confiança assenta, em especial, no elemento comum que constitui o seu empenhamento nos princípios da liberdade, da democracia e do respeito pelos direitos do homem e liberdades fundamentais, bem como do Estado de direito. A confiança mútua é por seu turno facilitada pela aproximação das legislações nacionais, como o demonstra a experiência de cooperação entre os países nórdicos (ver ponto 3.2.1.4.).

    [15] JO C 12 de 15.1.2001, p. 10.

    O projecto de Constituição confirma este método e esta abordagem. O seu artigo III-171º prevê que a cooperação em matéria penal na União "assenta no princípio do reconhecimento mútuo das sentenças e decisões judiciais e inclui a aproximação das disposições legislativas e regulamentares dos Estados-Membros [...]".

    1.3. Método e estrutura do Livro Verde

    Partindo do ponto da situação das medidas tomadas a nível da União Europeia no domínio da aproximação, do reconhecimento mútuo e da execução das sanções penais noutro Estado-Membro (Capítulo II), o Livro Verde faz seguidamente um balanço da situação da legislação dos Estados-Membros com base nos princípios gerais do direito penal, nas sanções e respectiva execução, bem como nos acordos internacionais celebrados pelos Estados-Membros nesta matéria (Capítulo III, completado pelos Anexos I, II e III).

    Na última parte (Capítulo IV), identificam-se os problemas que subsistem apesar da adopção de diversas medidas a nível da União Europeia em matéria de harmonização e reconhecimento mútuo e da celebração de acordos internacionais pelos Estados-Membros. Nesta parte demonstrar-se-ão, através de exemplos, os obstáculos reais ou potenciais que se colocam a nível jurídico e prático à realização do espaço de justiça. Com base nesta análise, o capítulo aborda seguidamente as necessidades em matéria de actuação da União Europeia, tal como a Comissão o entende nesta fase, relativamente às possibilidades jurídicas de realização dos objectivos. O capítulo contempla unicamente o reconhecimento mútuo das sanções privativas de liberdade (incluindo as modalidades de execução) e das penas alternativas. Estão em discussão no Conselho iniciativas sobre o reconhecimento das sanções pecuniárias e das decisões de apreensão e perda. No que respeita às decisões de interdição de direitos, a Comissão abordará o assunto numa comunicação independente. As reacções ao Livro Verde e, em especial, as respostas às perguntas formuladas neste capítulo (ver Anexo IV, que recapitula todas as perguntas), permitirão acrescentar, suprimir ou alterar as necessidades sentidas.

    2. Medidas tomadas a nível da União Europeia: ponto da situação

    2.1. Aproximação das sanções

    2.1.1. Tratado da União Europeia

    O Tratado da União Europeia (TUE), com a redacção que lhe foi dada pelo Tratado de Nice, entrado em vigor em Fevereiro de 2003, atribui à União a realização do objectivo de facultar aos cidadãos um elevado nível de protecção num espaço de liberdade, segurança e justiça (artigo 29º). De acordo com o Tratado, este objectivo é atingido, nomeadamente, graças a uma aproximação, quando necessário, das disposições de direito penal dos Estados-Membros. Em especial, a alínea e) do artigo 31º prevê a adopção gradual de «medidas que prevejam regras mínimas quanto aos elementos constitutivos das infracções penais e às sanções aplicáveis nos domínos da criminalidade organizada, do terrorismo e do tráfico ilícito de droga».

    Com o Tratado de Maastricht, fora já encetada a via da aproximação. Definiram-se, em acções comuns, incriminações comuns em matérias como o racismo e a xenofobia [16] ou a participação numa organizaçao criminosa [17], mas nada é definido nestes instrumentos quanto ao nível das sanções.

    [16] JO L 185 de 24.7.1996, p. 5.

    [17] JO C 351 de 29.12.1998, p. 1.

    2.1.2. Plano de Acção de Viena

    O Plano de Acção do Conselho e da Comissão sobre a melhor forma de aplicar as disposições do Tratado de Amesterdão relativas à criação de um espaço de liberdade, de segurança e de justiça [18] faz referência, no ponto 46, à aproximação das regras de direito penal dos Estados-Membros, no prazo de dois a cinco anos após a entrada em vigor do Tratado, relativamente a diversas infracções.

    [18] JO C 19 de 23.1.1999, p. 1.

    São mencionados, em especial, os comportamentos nos domínios da criminalidade organizada, do terrorismo e do tráfico de droga, relativamente aos quais é urgente e necessário instaurar regras mínimas quanto aos elementos constitutivos das infracções penais e às sanções aplicáveis e ainda, se necessário, adoptar outras medidas. Os primeiros domínios considerados para esta análise podiam ser, de acordo com o Plano de Acção e desde que estejam ligados à criminalidade organizada, ao terrorismo e ao tráfico de droga, infracções como o tráfico de seres humanos e a exploração sexual de crianças, infracções à legislação contra o tráfico de droga, a corrupção, a fraude informática, infracções cometidas por terroristas, infracções cometidas contra o ambiente, infracções cometidas através da Internet e o branqueamento de capitais relacionado com estas diferentes formas de criminalidade.

    2.1.3. Conclusões do Conselho Europeu de Tampere

    O Conselho Europeu de Tampere de Outubro de 1999 salientou, no ponto 48 das respectivas conclusões, que "no que diz respeito à legislação nacional em matéria penal, os esforços para que sejam aprovadas definições, incriminações e sanções comuns deverão incidir em primeiro lugar num número limitado de sectores de particular importância, tais como a criminalidade financeira (branqueamento de capitais, corrupção, contrafacção do euro), o tráfico de droga, o tráfico de seres humanos, nomeadamente a exploração de mulheres, a exploração sexual de crianças, os crimes de alta tecnologia e os crimes contra o ambiente ".

    Consequemente, existe a obrigação de proceder à aproximação das sanções, decorrente quer do Tratado, quer do Plano de Acção de Viena, quer ainda da vontade política dos Chefes de Estado e de Governo expressa nas conclusões do Conselho Europeu de Tampere.

    2.1.4. Instrumentos adoptados ou em fase de negociação

    Todos os domínios citados no Tratado da União Europeia, no Plano de Acção de Viena e nas conclusões do Conselho Europeu de Tampere foram já objecto de iniciativas por parte dos Estados-Membros ou de propostas da Comissão, adoptadas ou em fase de negociação. Estas iniciativas são seguidamente apresentadas em função do tipo de penas previstas:

    2.1.5. Sanções privativas de liberdade

    A fórmula utilizada para a harmonização das sanções aplicáveis consistiu em definir, pelo menos, penas efectivas, proporcionadas e dissuasivas, fixando cada vez mais o mínimo da pena máxima. São os seguintes os instrumentos adoptados:

    - Decisão-quadro do Conselho, de 29 de Maio de 2000, sobre o reforço da protecção contra a contrafacção de moeda na perspectiva da introdução do euro, através de sanções penais e outras [19]: prevê sanções penais eficazes, adequadas e dissuasivas, incluindo penas privativas da liberdade que possam dar lugar a extradição. Diversos comportamentos abrangidos por este instrumento são puníveis com pena de prisão, cujo máximo não pode ser inferior a oito anos.

    [19] JO L 140 de 14.6.2000, p. 1.

    - Decisão-quadro do Conselho, de 28 de Maio de 2001, relativa ao combate à fraude e à contrafacção de meios de pagamento que não em numerário [20]: prevê sanções penais efectivas, proporcionadas e dissuasivas, incluindo, pelo menos nos casos graves, penas privativas da liberdade que possam dar lugar a extradição.

    [20] JO L 149 de 2.6.2001, p. 1.

    - Decisão-quadro do Conselho, de 26 de Junho de 2001, relativa ao branqueamento de capitais, à identificação, detecção, congelamento, apreensão e perda dos instrumentos e produtos do crime [21]: prevê que a infracção de branqueamento seja passível de penas privativas da liberdade de uma duração máxima igual ou superior a quatro anos.

    [21] JO L 182 de 5.7.2001, p. 1.

    - Decisão-quadro do Conselho, de 13 de Junho de 2002, relativa à luta contra o terrorismo [22]: prevê sanções penais eficazes, proporcionadas e dissuasivas, susceptíveis de implicar a extradição. Estas infracções, na medida em que se relacionem com actividades terroristas, devem ser passíveis de penas privativas de liberdade mais severas do que as previstas no direito nacional para essas mesmas infracções quando cometidas na ausência desta intenção. No que respeita às infracções relativas a grupos terroristas, devem ser passíveis de penas máximas privativas de liberdade que não podem ser inferiores a oito anos para a participação em actividades destes grupos e a quinze anos para a direcção de um grupo terrorista.

    [22] JO L 164 de 22.6.2002, p. 3.

    - Decisão-quadro do Conselho, de 19 de Julho de 2002, relativa à luta contra o tráfico de seres humanos [23]: prevê que os Estados-Membros tomem as medidas necessárias para garantir que as infracções visadas sejam passíveis de sanções penais efectivas, proporcionadas e dissuasivas, que podem dar lugar a extradição.

    [23] JO L 203 de 1.8.2002, p. 1.

    - Directiva 2002/90/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2002, e Decisão-quadro do Conselho, de 28 de Novembro de 2002, relativa ao reforço do quadro penal para a prevenção do auxílio à entrada, ao trânsito e à residência irregulares [24]: prevê que os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para garantir que as infracções visadas sejam passíveis de sanções penais efectivas, proporcionadas e dissuasivas, susceptíveis de conduzir à extradição.

    [24] JO L 328 de 5.12.2002, pp. 1 e 17.

    - Decisão-quadro do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, relativa à protecção do ambiente através do direito penal [25]: prevê sanções penais efectivas, proporcionadas e dissuasivas, que incluam, pelo menos nos casos graves, penas que possam dar lugar a extradição. No que respeita às pessoas singulares, prevê igualmente a inibição do exercício de uma actividade que exija autorização ou aprovação oficial.

    [25] JO L 29 de 5.2.2003, p. 55. A Comissão introduziu um recurso contra o Conselho no Tribunal de Justiça. O recurso visa fazer reconhecer que a Decisão-quadro afecta a competência comunitária para impor que os Estados-Membros adoptem sanções, eventualmente penais, quando tal seja necessário para atingir um objectivo comunitário.

    - Decisão-quadro do Conselho, de 22 de Julho de 2003, relativa ao combate à corrupção no sector privado [26]: prevê sanções penais efectivas, proporcionadas e dissuasivas. Relativamente a determinados comportamentos, o nível máximo da pena privativa de liberdade deverá situar-se pelo menos entre um e três anos.

    [26] JO L 192 de 31.7.2003, p. 54.

    - Decisão-quadro do Conselho, de 22 de Dezembro de 2003, relativa à luta contra a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil [27]: prevê sanções penais de pena privativa de liberdade com duração máxima não inferior de um a três anos.

    [27] JO L 13 de 20.1.2004, p. 44.

    Em contrapartida, a acção comum adoptada pelo Conselho em 21 de Dezembro de 1998 [28], relativa à incriminação da participação numa organização criminosa nos Estados-Membros da União Europeia, não prevê qualquer nível mínimo de pena.

    [28] JO L 351 de 29.12.1998, p. 1.

    Estão em fase de discussão os instrumentos seguintes:

    - Proposta de decisão-quadro do Conselho sobre o estabelecimento de disposições mínimas relativas aos elementos constitutivos das infracções penais e das sanções aplicáveis no domínio do tráfico ilícito de droga [29]. No Conselho JAI de 27 e 28 de Novembro de 2003, registou-se um acordo político.

    [29] Proposta de decisão-quadro do Conselho sobre o estabelecimento de disposições mínimas relativas aos elementos constitutivos das infracções penais e das sanções aplicáveis no domínio do tráfico ilícito de droga, apresentada pela Comissão em 23 de Maio de 2001, COM(2001)259, JO C 270 E de 25.9.2001, p. 144.

    - Proposta de decisão-quadro do Conselho relativa à luta contra o racismo e a xenofobia [30]: prevê sanções penais efectivas, proporcionadas e dissuasivas. Relativamente a determinados comportamentos, o nível máximo da pena privativa de liberdade deve situar-se pelo menos entre um e três anos.

    [30] Proposta de decisão-quadro do Conselho relativa à luta contra o racismo e a xenofobia, apresentada pela Comissão em 29 de Novembro de 2001; COM(2001) 664, JO C 75 E de 26.3.2002, p. 269.

    - Proposta de decisão-quadro do Conselho relativa a ataques contra os sistemas de informação [31]: prevê penas efectivas, proporcionadas e dissuasivas. Relativamente a determinados comportamentos, o nível máximo da pena privativa da liberdade deve situar-se pelo menos entre um e três anos. No Conselho JAI de 27 e 28 de Fevereiro de 2003 registou-se um acordo político.

    [31] Proposta de decisão-quadro do Conselho relativa a ataques contra os sistemas de informação, apresentada pela Comissão em 19 de Abril de 2002; JO C 203 E de 27.8.2002, p. 109.

    - Projeto de decisão-quadro do Conselho relativa à prevenção e repressão do tráfico de órgãos e tecidos humanos [32].

    [32] Iniciativa da República Helénica tendo em vista a adopção de uma decisão-quadro relativa à prevenção e repressão do tráfico de órgãos e tecidos humanos, JO C 100 de 26.4.2003, p. 27.

    - Proposta de decisão-quadro do Conselho destinada a reforçar o quadro penal para a repressão da poluição por navios [33]: prevê penas de prisão que não podem ser inferiores a uma duração compreendida entre cinco e dez anos nos casos mais graves, bem como multas de carácter penal ou não penal. Tiveram início no Conselho as negociações sobre esta proposta.

    [33] COM(2003) 227 de 2.5.2003.

    A declaração do Conselho anexa à Decisão-quadro relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados-Membros [34], adoptada em 13 de Junho de 2002, insta à prossecução desta harmonização relativamente às infracções referidas no nº 2 do artigo 2º da Decisão-quadro [35], que não foram objecto de aproximação ao nível da União. Esta declaração não dispensa, no entanto, uma análise caso a caso da necessidade de continuar o exercício à luz dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade. No que respeita ao nível das penas, na sequência das reflexões efectuadas durante as Presidências belga e espanhola, o Conselho JAI de 25 e 26 de Abril de 2002 adoptou conclusões que determinam a abordagem a aplicar em matéria de harmonização de penas, incluindo, designadamente, a aplicação de intervalos de variação com o objectivo de fixar o mínimo da pena máxima aplicável, ou seja:

    [34] JO L 190 de 18.7.2002, p. 1.

    [35] O nº 2 do artigo 2º da decisão refere-se a uma lista de 32 infracções.

    - nível 1: pena privativa de liberdade com duração máxima de, pelo menos, 1 a 3 anos;

    - nível 2: pena privativa de liberdade com duração máxima de, pelo menos, 2 a 5 anos;

    - nível 3: pena privativa de liberdade com duração máxima de, pelo menos, 5 a 10 anos;

    - nível 4: pena privativa de liberdade com duração máxima superior a 10 anos.

    O texto das conclusões prevê expressamente a possibilidade de ultrapassar o nível 4 em circunstâncias especiais. Por exemplo, a Decisão-quadro do Conselho, de 13 de Junho de 2002, relativa à luta contra o terrorismo [36] prevê penas privativas de liberdade cuja duração máxima não pode ser inferior a quinze anos quando se trata da direcção de um grupo terrorista.

    [36] JO L 164 de 22.6.2002, p. 3.

    Há que salientar que a apresentação sob forma de intervalos de variação é puramente visual: na realidade, apenas o limiar de cada um dos níveis é pertinente, visto tratar-se do máximo aplicável, cuja duração não deve ser inferior a 1, 2, 5 e 10 anos respectivamente.

    Em contrapartida, não há nenhum instrumento da União que permita fixar a pena mínima. Convém lembrar que a Declaração n° 8 do Tratado de Amesterdão assinala que um Estado-Membro que não preveja penas mínimas não pode ser obrigado a adoptá-las.

    No que respeita às modalidades de execução das sanções privativas de liberdade (como, por exemplo, suspensão da execução da pena, suspensão e adiamento da pronúncia da sentença, semidetenção, fraccionamento da execução da pena, vigilância electrónica e prisão domiciliária), salienta-se que a União Europeia não adoptou legislação.

    2.1.6. Sanções pecuniárias

    Tal como anteriormente constatado, por enquanto, as diligências em matéria de aproximação de sanções ao nível da União limitam-se à pena privativa de liberdade.

    Todavia, a Comissão, na proposta de decisão-quadro do Conselho destinada a reforçar o quadro penal para a repressão da poluição por navios [37], propõe uma escala que fixa o nível mínimo das penas máximas de multas susceptíveis de serem aplicadas, por força da proposta de directiva que completa [38], às pessoas singulares ou colectivas responsáveis por infracções abrangidas pela referida directiva. A Comissão entendeu que, para este tipo de infracções, a pena de multa era mais adequada do que uma pena privativa de liberdade.

    [37] Ver acima, ponto 2.1.5.

    [38] Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à poluição por navios e à introdução de sanções, incluindo sanções penais, pelo crime de poluição

    (COM(2003) 92 final de 5.3.2003).

    Estão previstos dois níveis de sanções. O primeiro, de 1 a 10% do volume de negócios, diz respeito às hipóteses que não devem necessariamente dar origem a penas de prisão em aplicação da directiva. O segundo, de 10 a 20% do volume de negócios, diz respeito aos casos mais graves, susceptíveis de originarem penas de prisão em aplicação da directiva.

    No entanto, são concebíveis outros critérios de harmonização, que estão actualmente em discussão no Conselho. Por exemplo, o relativo à amplitude dos danos causados (grau de poluição em questão) parece pouco susceptível de ser aprovado, na medida em que poderia ser entendido como uma forma de encorajamento a danos menores, ou ainda o da fixação de um montante mínimo da pena de multa, acompanhado da possibilidade de aumentar este montante até ao equivalente de dois terços do valor da carga transportada ou do frete do navio que está na origem da infracção. As discussões sobre este instrumento prosseguem no Conselho.

    2.1.7. Interdição de direitos

    Para efeitos do presente Livro Verde, entende-se por inibição de direitos, a pena privativa ou restritiva de direitos ou a medida preventiva, de acordo com a qual uma pessoal singular ou colectiva, por um período limitado ou ilimitado, fica proibida de exercer determinados direitos, ocupar determinados cargos, exercer uma actividade, deslocar-se a determinados locais ou realizar determinados actos.

    Ao nível da União, algumas das decisões-quadro adoptadas ou em vias de adopção prevêem a possiblidade de se impor a interdição do exercício de determinadas actividades profissionais. É assim que a decisão-quadro do Conselho relativa ao reforço do quadro penal para a prevenção do auxílio à entrada, ao trânsito e à residência irregulares [39] prevê a possibilidade de proibição do exercício, directo ou por interposta pessoa, da actividade profissional exercida no momento da prática da infracção.

    [39] Nº 2 do artigo 1º, JO L 328 de 5.12.2002, p. 1.

    A Decisão-quadro do Conselho relativa à luta contra a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil prevê, por seu turno, que os Estados-Membros possam proibir, temporária ou definitivamente, a pessoas condenadas por uma das infracções abrangidas pelo instrumento o exercício de actividades profissionais que impliquem ter crianças sob a sua responsabilidade. A Decisão-quadro relativa ao combate à corrupção no sector privado contém uma disposição que obriga os Estados-Membros a tomar as medidas necessárias para garantir que uma pessoa condenada por corrupção activa ou passiva no sector privado possa ficar temporariamente proibida do exercício de uma actividade profissional comparável mediante o preenchimento de determinadas condições.

    2.1.8. Apreensão e perda

    A apreensão e perda foi objecto de uma certa aproximação ao nível da União Europeia. A Decisão-quadro do Conselho, de 26 de Junho de 2001, relativa ao branqueamento de capitais, à identificação, detecção, congelamento, apreensão e perda dos instrumentos e produtos do crime [40], prevê que, quando a infracção seja punida por uma pena privativa de liberdade ou uma medida de segurança com duração máxima superior a um ano, os Estados-Membros não possam formular ou manter reservas ao artigo 2º da Convenção do Conselho da Europa de 1990 relativa ao branqueamento, detecção, apreensão e perda dos produtos do crime [41]. Esta última disposição prevê que cada um dos signatários da Convenção adopte as medidas necessárias que lhe permitam apreender instrumentos e produtos ou bens cujo valor corresponda a esses produtos. Os Estados-Membros devem adoptar as medidas necessárias para aplicar as disposições da decisão-quadro até 31 de Dezembro de 2002. A Comissão apresentará em breve um relatório sobre a aplicação da decisão-quadro pelos Estados-Membros.

    [40] JO L 182 de 5.7.2001, p. 1. Artigos 1º e 3º.

    [41] Tratados do Conselho da Europa, n° 141. Abertura para assinatura em 8 de Novembro de 1990, entrada em vigor em 1 de Setembro de 1993, disponível em http:// conventions.coe.int

    Esta decisão-quadro aplica-se, consequentemente, de forma horizontal, quando a medida ou a infracção seja punida com pena privativa de liberdade ou com medida de segurança cuja duração máxima seja superior a um ano. No entanto, há outros instrumentos sectoriais que prevêem igualmente disposições específicas em matéria de apreensão e perda, a saber: Decisão-quadro do Conselho relativa ao reforço do quadro penal para a prevenção do auxílio à entrada, ao trânsito e à residência irregulares [42] e a proposta de decisão-quadro do Conselho sobre o estabelecimento de disposições mínimas relativas aos elementos constitutivos das infracções penais e das sanções aplicáveis no domínio do tráfico ilícito de droga [43].

    [42] Nº 2 do artigo 1º, JO L 328 de 5.12.2002, p. 17.

    [43] Artigo 4º, JO C 304 E de 30.10.2001, p. 144.

    Em Agosto de 2002, a Dinamarca apresentou uma iniciativa tendo em vista a aprovação de uma decisão-quadro do Conselho sobre o confisco de produtos, instrumentos e bens relacionados com o crime [44] por considerar que os instrumentos existentes neste domínio não contribuíram suficientemente para garantir uma cooperação transfronteiriça eficaz em matéria de apreensão e perda, visto determinados Estados-Membros nem sempre poderem confiscar os produtos de todas as infracções passíveis de penas privativas de liberdade com duração superior a um ano.

    [44] Iniciativa do Reino da Dinamarca tendo em vista a aprovação de uma decisão-quadro do Conselho sobre o confisco de produtos, instrumentos e bens relacionados com o crime,

    JO C 184 de 2.8.2002, p. 3.

    No Conselho JAI de Dezembro de 2002 chegou-se a um acordo político sobre este instrumento, destinado a aproximar as legislações sobre a pena ou a medida de apreensão e perda. Este instrumento visa permitir a apreensão e perda de instrumentos e produtos provenientes de infracções penais passíveis de pena privativa de liberdade com duração superior a um ano ou de bens cujo valor corresponda aos referidos produtos. Este instrumento constitui um avanço relativamente à decisão-quadro de 2001, visto contemplar igualmente poderes de apreensão e perda alargados relativamente a uma lista de infracções.

    2.1.9. Sanções aplicáveis às pessoas colectivas

    Desde a adopção, em 1997, do Segundo Protocolo da Convenção relativa à Protecção dos Interesses Financeiros das Comunidades Europeias [45], que previa que cada Estado-Membro tomasse as medidas necessárias para garantir que as pessoas colectivas possam ser consideradas responsáveis por um acto de fraude, de corrupção activa e de branqueamento de capitais, inúmeros instrumentos legislativos, baseados no Título VI do TUE, adoptados ou em vias de adopção, contêm este tipo de disposições que obrigam os Estados-Membros a tomarem as medidas necessárias para que as pessoas colectivas possam ser consideradas responsáveis pelas infracções referidas no instrumento e a preverem sanções.

    [45] JO C 221 de 19.7.1997, p. 11.

    Estes instrumentos não obrigam os Estados-Membros a estabelecerem a responsabilidade penal das pessoas colectivas - a responsabilidade pode ser administrativa - uma vez que a responsabilidade penal das pessoas colectivas não é reconhecida em todos os Estados-Membros. A responsabilidade das pessoas colectivas não é geral, limitando-se às infracções concretas, e as sanções previstas devem ser efectivas, proporcionadas e dissuasivas, incluindo multas de carácter penal ou não penal. Podem igualmente ser impostas outras sanções, nomeadamente medidas de exclusão do benefício de vantagens ou auxílios públicos, medidas de proibição temporária ou permanente do exercício de actividades comerciais, colocação sob vigilância judicial e uma medida de extinção judicial [46].

    [46] Ver Decisão-quadro do Conselho relativa ao combate à fraude e à contrafacção de meios de pagamento que não em numerário (artigos 7° e 8°); Decisão-quadro do Conselho sobre o reforço da protecção contra a contrafacção de moeda na perspectiva da introdução do euro, através de sanções penais e outras (artigos 8° e 9°); Decisão-quadro do Conselho relativa à luta contra o tráfico de seres humanos (artigos 4° e 5°); Decisão-quadro do Conselho relativa à entrada, trânsito e permanência irregulares (artigos 2° e 3°); Decisão-quadro do Conselho relativa à luta contra o terrorismo (artigos 7° e 8°); Decisão-quadro relativa à luta contra a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil (artigos 6° e 7°); proposta de decisão-quadro relativa ao tráfico ilícito de droga (artigos 7° e 8°); proposta de decisão-quadro relativa à luta contra o racismo e a xenofobia (artigos 9° e 10°); proposta de decisão-quadro relativa ao combate à corrupção no sector privado (artigos 6° e 7°) e proposta de decisão-quadro do Conselho relativa a ataques contra os sistemas de informação (artigos 9° e 10°).

    A Decisão-quadro do Conselho relativa à luta contra o tráfico de seres humanos e a Decisão-quadro relativa à luta contra a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil, bem como a proposta de decisão-quadro relativa ao tráfico ilícito de droga, prevêem igualmente o encerramento temporário ou permanente dos estabelecimentos utilizados para a prática da infracção.

    Verifica-se que, sempre que se procedeu a uma aproximação na União dos elementos constitutivos das infracções num determinado sector, esta foi acompanhada de uma aproximação das sanções impostas às pessoas singulares e colectivas.

    Por outro lado, os instrumentos horizontais relativos à apreensão e perda e ao reconhecimento das multas são igualmente aplicáveis às pessoas colectivas, mesmo para infracções não harmonizadas.

    2.1.10. Sanções alternativas

    Tendo em conta as diferenças consideráveis existentes entre o direito penal dos Estados-Membros, nomeadamente no que diz respeito à classificação das penas em penas principais [47], complementares [48] ou acessórias [49], não causa admiração verificar que a expressão "sanção ou pena alternativa" não seja interpretada da mesma forma em todos os Estados-Membros. Na França, por exemplo, a pena alternativa ou pena de substituição é a que a lei nacional permite que o tribunal pronuncie em substituição de uma ou várias penas principais. Neste país, as penas alternativas consistem em penas privativas ou restritivas de direitos, enumeradas no n° 6 do artigo 131° do Código Penal francês [50], em prestação de trabalho a favor da comunidade ou em dias-multa. Em contrapartida, na Alemanha, a sanção dias-multa é uma pena principal, visto ser o único modo de calcular as multas [51], e na Bélgica a prestação de trabalho a favor da comunidade foi recentemente introduzida enquanto pena principal (ver adiante).

    [47] Na maior parte dos Estados-Membros, existem duas penas principais, a privação de liberdade e a multa, previstas alternativa ou cumulativamente pelos legisladores dos Estados-Membros.

    [48] Em direito francês, a pena complementar é aquela que o juiz pode acrescentar à pena principal, sempre que o texto que reprime a infracção a preveja expressamente.

    [49] Trata-se de penas que resultam de pleno direito da condenação e que se aplicam, por conseguinte, conjuntamente com a pena principal, em certos Estados-Membros (por exemplo, na França) sem que o tribunal as pronuncie.

    [50] 1) Suspensão da carta de condução; 2) proibição de conduzir determinados veículos; 3) anulação da carta de condução, 4) apreensão e perda de um ou vários veículos pertencentes ao delinquente; 5) imobilização de um ou vários veículos pertencentes ao delinquente; 6) proibição de deter ou possuir, durante um período de cinco anos ou mais, uma arma sujeita a autorização; 7) apreensão e perda de uma ou várias armas de que o delinquente seja proprietário e que tenha à sua disposição; 8) apreensão da licença de caça; 9)proibição de emitir cheques; 10) apreensão e perda do objecto que serviu ou estava destinado a cometer a infracção ou do objecto produto da mesma; 11) proibição de exercer uma actividade profissional ou social, quando as facilidades que essa actividade proporciona tenham sido utilizadas, com conhecimento de causa, para preparar ou cometer a infracção.

    [51] "Tagessatzsystem" do artigo 40° do Código Penal alemão (StGB).

    Para evitar divagações com comparações complexas das classificações dos quinze sistemas de direito penal dos Estados-Membros, sugere-se a definição seguinte: para efeitos do presente Livro Verde, por «sanções alternativas» entende-se aquelas que são impostas às pessoas singulares ou por elas aceites no âmbito de mecanismos de mediação penal ou de mecanismos de transacção, que não consistam em sanções privativas de liberdade (ou modalidades de execução deste tipo de sanções), multas, apreensão e perda ou interdição de direitos [52].

    [52] Embora alguns Estados-Membros incluam a interdição de direitos nas sanções alternativas.

    Esta definição corresponde sensivelmente à expressão inglesa "community sanctions" (sanções e medidas aplicadas na comunidade) para a qual a Recomendação n° R (92) 16, do Comité dos Ministros do Conselho da Europa, relativa às regras europeias sobre as sanções e medidas aplicadas na comunidade - que consagra um conjunto de medidas alternativas à pena de prisão - dá, no anexo, a seguinte definição: A noção de "sanções e medidas aplicadas na comunidade" refere-se a sanções e medidas que mantêm a pessoa condenada na comunidade e implicam uma certa restrição da sua liberdade através da imposição de condições e/ou obrigações e que são executadas por organismos previstos nas disposições legislativas em vigor. Esta noção designa as sanções decididas por um tribunal ou um juiz e as medidas tomadas antes da decisão que impõe a sanção ou que substituem esta decisão, bem como as que consistem numa modalidade de execução de uma pena de prisão fora de um estabelecimento prisional [53].

    [53] Cf. igualmente a lista das sanções e medidas alternativas enumeradas no ponto 1 da Recomendação

    n° R(2000)22 do Comité dos Ministros do Conselho da Europa relativa à melhoria da aplicação das regras europeias relativas às sanções e medidas aplicadas na comunidade, adoptada em 29.11.2000, bem como na Resolução n° (76) 10 do Comité dos Ministros do Conselho da Europa sobre certas medidas de substituição das penas privativas de liberdade, adoptada em 9 de Março de 1976.

    No que respeita à União Europeia, deve constatar-se a ausência de legislação relativa a sanções alternativas.

    2.1.11. Execução das sanções penais

    Em conformidade com o disposto na alínea c) do artigo 31º do TUE, a acção em comum no domínio da cooperação judiciária em matéria penal tem por objectivo, nomeadamente, «assegurar a compatibilidade das normas aplicáveis nos Estados-Membros, na medidda do necessário para melhorar a referida cooperação», o que abrange também as normas de execução das sanções penais.

    Embora a União Europeia disponha, consequentemenete, de competência no âmbito da execução das sanções penais, as suas acções neste domínio não registam ainda grande alcance. No entanto, procedeu-se a alguma investigação e reflexão, apoiadas por iniciativas da União ou por ela financiadas [54].

    [54] Exemplos de projetos e medidas: 1. Projecto «European citizens in prison abroad» (financiado no âmbito do Porgrama GROTIUS - II (Penal). 2001/GRP/020). Visa, designadamente, a criação e o apoio a uma rede composta por organizações não governamentais que representem as necessidades dos cidadãos europeus que cumprem penas de prisão. 2. Projecto « Des innovations pour une réinsertion durable des délinquants - modèles de réforme dans les Etats de l'UE » (financiado no âmbito do Porgrama GROTIUS - II (Penal) ; 2002/GRP/019). Aborda questões de enquadramento da reinserção dos reclusos, com base numa comparação sistemática de experiências nos diferentes Estados-Membros.

    3. Projecto HERO (Health and Educational Support for the Rehabilitation of Offenders). Trata-se de um projecto «e-learning» da DG Educação e Cultura que visa o desenvolvimento de investigação e tecnologia, financiado pela Comissão Europeia no âmbito do Programa de tecnologia da sociedade da informação (IST). O Programa HERO aborda dois problemas que a maior parte das sociedades têm de enfrentar: como melhorar as condições nas prisões e como reduzir o nível de reincidência, reduzindo assim o número crescente de pessoas enviadas para a prisão. O HERO aborda estes problemas sob dois ângulos. Em primeiro lugar, ajudando os reclusos e o pessoal das prisões a tomar decisões sobre questões como a saúde e a educação de uma forma mais eficaz e com mais informação. Em segundo lugar, ajudando os autores de infracções a prepararem-se melhor para a libertação e para a vida fora da prisão.

    4. Projeto de resolução dos representantes dos governos dos Estados-Membros, reunidos no seio do Conselho, sobre o tratamento dos toxicodependentes na prisão, Documento nº 10497/4/02, REV 4, CORDROGUE 54). Este projecto de resolução lança um apelo aos Estados-Membros no sentido de explorarem a possibilidade de introduzir ou alargar programas que contribuam para melhorar a saúde dos toxicodependentes na prisão, velando por que o tratamento dos toxicodependentes na prisão tenha por objectivo a respectiva reabilitação e a prevenção de infracções futuras.

    5. Estudo efectuado em 2003, pela Unité Mixte de Recherche de Droit Comparé, de Paris, sob a direcção de Delmas-Marty, Guidicelli-Delage e Lambert-Abdelgawad sobre «L'harmonisation des sanctions pénales en Europe».

    2.1.12. Conclusões

    Há que constatar que a aproximação do direito penal material efectuada ao nível da União continua a ser muito limitada. Efectivamente, nem todos os domínios da criminalidade são abrangidos e as incriminações são por vezes explicitamente mínimas ou contêm derrogações [55]. Além disso, há comportamentos susceptíveis de incriminação que não são definidos nos instrumentos e são entendidos de forma diferente nos diversos Estados-Membros (por exemplo: tentativa, participação, instigação).

    [55] Por exemplo, a Decisão-quadro, de 28 de Maio de 2001, relativa ao combate à fraude e à contrafacção de meios de pagamento que não em numerário, não abrange todos os meios de pagamento; a proposta de decisão-quadro relativa a ataques contra os sistemas de informação, que foi objecto de acordo político no Conselho JAI de Fevereiro de 2003, permite excluir a incriminação de ataques ilícitos na ausência de infracção a uma medida de segurança.

    Deve ainda salientar-se que, no que respeita à aproximação das sanções, o exercício se limitou a estabelecer, quanto às sanções aplicáveis, quer penas efectivas, proporcionadas e dissuasivas, quer o mínimo da pena máxima. Ora, para além da pena de prisão, os sistemas penais dos Estados-Membros prevêem uma vasta gama de outras sanções.

    Acresce ainda que, mesmo se for fixada uma pena idêntica aplicável a uma infracção, existem divergências importantes nas normas gerais do direito penal dos Estados-Membros, o que conduz a uma diferença entre a pena pronunciada e a pena executada (por exemplo, no que respeita à política de detecção de delitos, à aplicação do princípio da legalidade ou da oportunidade das acções penais, ao nível da pena pronunciada e à pena efectivamente executada).

    2.2. Reconhecimento mútuo e execução das sanções penais noutro Estado-Membro

    No que respeita ao reconhecimento mútuo e à execução das sanções penais noutro Estado-Membro, foram ou estão em vias de ser adoptadas no Conselho ou estão a ser preparadas na Comissão, as medidas seguintes:

    2.2.1. Mandado de detenção europeu

    Em 13 de Junho de 2002, o Conselho adoptou uma Decisão-quadro "relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados-Membros" [56], que entrou em vigor em 7 de Agosto de 2002. Devia ser transposta pelos Estados-Membros até 31 de Dezembro de 2003. Este mandado de detenção europeu constitui a primeira concretização, no domínio do direito penal, do princípio do reconhecimento mútuo das decisões judiciais. O seu objectivo consiste em entregar a pessoa em questão ao Estado-Membro que a condenou (n° 1 do artigo 1°). Todavia, permite à autoridade judicial de execução recusar a execução do mandado de detenção europeu quando a pessoa se encontre no Estado-Membro de execução, dele seja cidadão ou nele resida, e este Estado se comprometa a executar a pena ou a medida de segurança nos termos do seu direito nacional (n° 6 do artigo 4° da decisão-quadro).

    [56] JO L 190 de 18.7.2002, p. 1.

    2.2.2. Reconhecimento de sanções pecuniárias

    Neste domínio, recebeu acordo político do Conselho, em 8 de Maio de 2003, a Iniciativa do Reino Unido, da República Francesa e do Reino da Suécia tendo em vista a aprovação de uma decisão-quadro do Conselho relativa à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às sanções pecuniárias [57]. Esta iniciativa corresponde à conclusão n° 37 do Conselho de Tampere e à medida n° 18 do Programa de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo das decisões penais que refere a "elaboração de um instrumento que permita assegurar a execução das penas de multa pelo Estado de residência impostas por decisão transitada em julgado a uma pessoa singular ou colectiva por outro Estado-Membro". A decisão-quadro será aplicável a todas as decisões que, a título definitivo, inflijam sanções pecuniárias a pessoas singulares ou colectivas. A decisão que pronuncia a sanção pecuniária poderá ser adoptada por um órgão jurisdicional, bem como por uma autoridade administrativa, desde que o interessado tenha tido a possibilidade de levar o caso a uma jurisdição com competência, nomeadamente, em matéria penal.

    [57] JO C 278 de 2.10.2001, p. 4.

    A medida n° 18 supramencionada prevê que o instrumento a adoptar inclua igualmente disposições sobre o procedimento a seguir em caso de falta de pagamento. Uma vez que o projecto actual não prevê nada a este respeito, levanta-se a questão de saber se o projecto supramencionado deverá ser completado por um outro instrumento.

    2.2.3. Reconhecimento das decisões de apreensão e perda

    O Governo dinamarquês apresentou, em 2001, uma Iniciativa tendo em vista a aprovação da decisão-quadro do Conselho relativa à execução das decisões de confisco na União Europeia [58]. Esta iniciativa prevê o reconhecimento mútuo das decisões de confisco entre os Estados-Membros e completa o projecto de decisão-quadro relativa à execução na União Europeia das decisões de congelamento de bens ou de provas [59]. Não foi ainda adoptada pelo Conselho. Dá execução ao primeiro travessão da medida n° 19 do Programa de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo das decisões penais ("Analisar: ... em especial, se todas as causas da recusa de execução de uma medida de confisco que constam no artigo 18° da Convenção de 1990 são compatíveis com o princípio do reconhecimento mútuo") [60], sem abranger, no entanto, o objectivo previsto no segundo travessão da medida n° 19 ("Analisar ... como melhorar o reconhecimento e a execução imediata num Estado-Membro de uma decisão proferida noutro Estado-Membro para proteger os interesses da vítima, sempre que essa decisão esteja incluída numa decisão de condenação penal"), que continua por concretizar.

    [58] JO C 184 de 2.8.2002, p. 8.

    [59] A França, a Suécia e o Reino da Bélgica apresentaram, em 2001, uma Iniciativa relativa à execução na União Europeia das decisões de congelamento de haveres ou de provas (JO C 75 de 7.3.2001, p. 3), que visa a execução directa de uma decisão de congelamento de um Estado-Membro por um outro Estado-Membro, sem que o Estado-Membro de execução deva tomar nova decisão.

    [60] « Objectivo: Melhorar a execução num Estado-Membro de uma decisão de confisco proferida noutro Estado-Membro, nomeadamente para efeitos de restituição à vítima de infracção penal, tendo em conta a existência da Convenção Europeia, de 8 de Novembro de 1990, relativa ao branqueamento, detecção, apreensão e perda dos produtos do crime».

    2.2.4. Reconhecimento das decisões de interdição de direitos

    No que diz respeito ao reconhecimento das decisões de interdição ou perda de direitos, o programa de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo prevê "alargar progressivamente a eficácia das sanções de perda de direitos a todo o território da União Europeia: efectivamente, para que sejam eficazes no contexto do espaço europeu, certas sanções deverão ser reconhecidas e executadas em toda a União". No que respeita à realização deste objectivo, o programa prevê as medidas seguintes:

    Medida n° 20: "Elaborar um inventário das perdas de direitos, proibições e incapacidades comuns a todos os Estados-Membros pronunciadas relativamente a uma pessoa singular ou colectiva num Estado-Membro, por ocasião ou no seguimento de uma sentença condenatória".

    Medida n° 21: "Realizar um estudo de viabilidade que permita determinar qual a melhor forma de, atendendo plenamente às exigências relativas às liberdades individuais e à protecção de dados, chegar à informação das autoridades competentes da União Europeia quanto às medidas de perdas de direitos, de proibição e de incapacidade pronunciadas num Estado-Membro. Este estudo deverá visar escolher o melhor método de entre os seguintes: a) a facilitação dos intercâmbios bilaterais de informação; b) a colocação em rede dos ficheiros nacionais; c) a constituição de um verdadeiro ficheiro central europeu".

    Medida n° 22: "Criar um ou vários instrumentos que permitam não só tornar efectivas as perdas de direitos assim inventariadas no Estado de residência do condenado, mas também tornar certas perdas de direitos extensivas a todo o território da União, pelo menos para certas categorias de infracções e perdas de direitos. Deverá ser também abordada neste contexto a questão da extensibilidade a toda a União da sanção de interdição territorial pronunciada num dos Estados-Membros".

    A Dinamarca apresentou, em 2002, uma Iniciativa «tendo em vista a aprovação da decisão do Conselho relativa ao reforço da cooperação entre os Estados-Membros da União Europeia em matéria de inibição de direitos» [61]. Esta iniciativa, actualmente no Conselho, aplica-se às «inibições de direitos impostas a pessoas singulares no âmbito ou na sequência de uma condenação penal, que restrinjam o acesso da pessoa condenada ao exercício de uma actividade profissional, excepto a inibição do direito de conduzir.» O projecto de decisão prevê apenas, entre os Estados-Membros, o intercâmbio de informações sobre decisões de interdição de direitos. Não implica qualquer reconhecimento mútuo das decisões nesta matéria. No entanto, deverá facilitar a evolução futura desta questão, de acordo com a medida n° 22 do programa.

    [61] JO C 223 de 19.9.2002, p. 17.

    A inibição do direito de conduzir está abrangida por uma Convenção da União Europeia relativa às decisões de inibição de conduzir, de 17 de Junho de 1998 (ver ponto 3.2.3.).

    2.2.5. Acordos celebrados entre os Estados-Membros da Comunidade Europeia no âmbito da cooperação política europeia (CPE)

    Em articulação com o reconhecimento das decisões definitivas em matéria penal, convém ter presente diversos acordos elaborados entre os Estados-Membros da Comunidade Europeia no âmbito da cooperação política europeia (CPE), que aplicam e completam convenções do Conselho da Europa. O esforço que representam os acordos celebrados pelos Estados-Membros da Comunidade Europeia não foi, no entanto, frutuoso, visto que estes não foram ratificados por todos os Estados-Membros e foram emitidas muitas reservas. Por razões sistemáticas e para facilitar a sua compreensão, estes acordos entre os Estados-Membros da Comunidade Europeia serão apresentados e analisados no contexto das convenções do Conselho da Europa a que se referem (ver Capítulo 3.2., em especial 3.2.1.2. e 3.2.1.7.).

    2.2.6. Conclusões

    Apesar da adopção da Decisão-quadro «relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados-Membros», que constitui um enorme avanço no domínio do reconhecimento mútuo, e embora se possa esperar que os projectos em discussão ou em preparação sobre o reconhecimento de sanções pecuniárias, decisões de apreensão e perda e decisões de interdição de direitos sejam adoptados num futuro próximo, é impossível deixar de constatar que o arsenal de instrumentos de reconhecimento mútuo ao nível da União Europeia permanece bastante incompleto. Em especial, não existe praticamente nenhuma regulamentação a este nível no âmbito do reconhecimento mútuo de sanções privativas de liberdade e respectiva execução noutro Estado-Membro.

    3. Situação actual: Legislações nacionais e acordos internacionais

    3.1. Enorme diversidade entre os Estados-Membros

    As diferenças entre as legislações dos Estados-Membros em matéria de sanções são consideráveis. A Comissão não tem intenção, de proceder, no presente Livro Verde, a uma análise exaustiva, mas considera útil apresentar uma panorâmica global destas diferenças.

    3.1.1. Regras de direito penal geral [62]

    [62] Para a elaboração do presente capítulo, utilizaram-se as informações contidas no documento 12432/01 DROIPEN 83 e no estudo sobre « L'harmonisation des sanctions pénales en Europe » (ver nota 10).

    3.1.1.1. Princípios em matéria de instauração da acção penal: legalidade ou oportunidade

    Os sistemas penais dos Estados-Membros estão divididos no que diz respeito aos princípios da oportunidade e da legalidade relativamente à instauração da acção penal. O princípio da oportunidade é aplicado na Bélgica, França, Dinamarca, Irlanda, Reino Unido, Luxemburgo e Países Baixos. Na Alemanha, Áustria, Espanha, Finlândia, Suécia, Grécia, Itália e Portugal é o princípio da legalidade que se aplica.

    Em conformidade com o princípio da legalidade, as autoridades competentes para propor acções penais devem intervir oficiosamente - e, portanto, mesmo na ausência de uma queixa - sempre que suspeitem da existência de uma infracção. Em contrapartida, segundo o princípio da oportunidade, a decisão de agir contra a infracção é deixada à apreciação do Ministério Público.

    Todavia, na prática, todos os sistemas jurídicos contêm elementos decorrentes dos dois princípios. Certas questões são, aliás, comuns aos dois sistemas, como por exemplo a questão da prova exigida para lançar uma acção penal. Os que seguem o princípio da legalidade aplicam em certos casos critérios de oportunidade, por exemplo, a possibilidade de arquivamento em determinadas condições, e os que se baseiam em critérios de oportunidade admitem, por exemplo, instruções dos procuradores gerais ou orientações de política criminal emanadas do Ministério da Justiça e são enquadrados, nomeadamente, pela exigência de fundamento das decisões de arquivamento e/ou pela disponibilização de vias de recurso efectivas.

    No Reino Unido, por exemplo, a oportunidade baseia-se em duas regras: a perspectiva razoável de obter uma condenação - que é cada vez mais utilizada nos países em que o princípio da legalidade é aplicado - e o interesse público. Paralelamente, nos sistemas em que o princípio da legalidade se aplica, existem critérios para dar prioridade a certos processos e não agir em relação a casos de menor importância.

    3.1.1.2. Margem de apreciação do tribunal penal

    Embora se ambicione realizar um espaço de liberdade, de segurança e de justiça, onde a infracção equivalente corresponda sanção equivalente, a verdade é que só é possível utilizar quadros legislativos que fornecem, de algum modo, equações, sabendo que o resultado concreto será sempre função de uma incógnita: a decisão do juiz que dispõe sempre de um poder de apreciação quanto à pronúncia da sentença.

    No entanto, o primeiro limite à liberdade do tribunal na pronúncia da sentença decorre do princípio fundamental da legalidade das sanções, o qual impõe, quando o tribunal entenda que foi cometida uma infracção, a pronúncia de uma sentença prevista na lei para a referida infracção. Tal facto decorre do princípio da segurança jurídica, que exige que a pena correspondente a uma infracção esteja especificada na lei.

    A presença de circunstâncias agravantes e atenuantes, abordadas mais adiante, poderá também, de algum modo, limitar a liberdade do tribunal, bem como a possibilidade, por exemplo, de redução ou isenção da pena.

    3.1.1.3. Grau de participação. Cumplicidade

    A cumplicidade é a forma de participação criminal mais frequente. Por cúmplice, entende-se aquele que participa, em determinadas condições, na prática da infracção. Em geral, para que haja cumplicidade, são necessários dois elementos: uma infracção principal, punível, e um acto de cumplicidade que inclua um elemento material (por exemplo, auxílio ou assistência) e um elemento moral (intenção de participação na infracção por parte do cúmplice).

    Em geral, é possível distinguir dois modelos de penas em função da participação na infracção. Em alguns Estados-Membros (por exemplo, França, Itália, Portugal, Áustria, Dinamarca e Irlanda), qualquer pessoa que participe na prática de uma infracção deve ser punida com pena idêntica à prevista para o autor, sem ter em consideração o grau de implicação da pessoa. No entanto, o tribunal pode ter em consideração o grau de participação no momento da pronúncia da sentença. Em contrapartida, noutros Estados-Membros (por exemplo, Alemanha, Espanha, Bélgica, Luxemburgo, Países Baixos, Finlândia e Grécia), a lei estabelece uma distinção no que respeita à pena aplicável ao autor e ao cúmplice. Os co-autores e os instigadores são punidos, em geral, com pena idêntica à do autor.

    3.1.1.4. Grau de realização. Tentativa

    Pode acontecer que o resultado de uma infracção não seja consumado mesmo se foram realizados os actos destinados a concretizá-la. Esta ausência de resultado pode dever-se a duas causas: os actos da pessoa foram suspensos no decurso da execução e/ou a pessoa concretizou a acção mas o resultado não se produziu.

    Em relação à tentativa, de uma forma geral, quer porque o tribunal dispõe de uma margem de apreciação (Áustria, Almanha, Dinamarca, França e Irlanda), quer porque tal é expressamente previsto na lei (Bélgica, Espanha, Finlândia, Grécia, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Portugal e Reino Unido), há possibilidade de prever penas mais baixas do que nos casos de infracção consumada.

    Nestes casos, a redução da pena é, frequentemente, calculada com base nas penas previstas para a infracção consumada. Uma vez que em relação a estas últimas existem diferenças importantes, a pena aplicável à tentativa difere em proporção semelhante.

    3.1.1.5. Circunstâncias agravantes e atenuantes

    As circunstâncias agravantes da responsabilidade penal podem ser de carácter geral - aplicáveis a todas as infracções - ou de carácter específico - aplicáveis a infracções concretas. No que diz respeito ao nível da pena, certos Estados-Membros prevêem a possibilidade de o tribunal pronunciar uma pena superior ao máximo previsto na lei, devido a circunstâncias agravantes [63], enquanto outros não admitem que sejam ultrapassadas as penas máximas previstas na lei [64].

    [63] Por exemplo, Grécia, Itália e Portugal.

    [64] Por exemplo, Espanha, Irlanda e Suécia.

    No que respeita às circunstâncias atenuantes, os sistemas penais de todos os Estados-Membros prevêem a possibilidade de o tribunal diminuir a pena prevista na lei para a infracção específica, por exemplo, devido a circunstâncias atenuantes ou por outras razões para atenuação especial da pena previstas por lei. Todavia, nos sistemas penais que não prevêem limiares mínimos de pena, como por exemplo a França, o mecanismo das circunstâncias atenuantes tornou-se inútil. Tal como no que respeita às circunstâncias agravantes, os sistemas penais de alguns Estados-Membros prevêem uma lista geral de circunstâncias atenuantes - por exemplo, a Espanha - enquanto outros não prevêem qualquer lista deste tipo, deixando à apreciação do tribunal os elementos que podem ser considerados a título de circunstâncias atenuantes - por exemplo, a Bélgica.

    3.1.1.6. Caso especial: reincidência

    No que respeita ao passado do delinquente, a reincidência pode ser considerada quer ao nível da pena prevista na lei (por exemplo, Itália, Bélgica e Áustria), quer enquanto circunstância agravante (por exemplo, Finlândia, Dinamarca e Espanha). No que respeita ao nível da pena, tal como para as circunstâncias agravantes, há Estados-Membros que prevêem uma pena superior ao máximo previsto - por exemplo, Áustria, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo, Suécia ou Portugal, enquanto outros não admitem que sejam ultrapassadas as penas máximas previstas na lei, que podem já ter em consideração tal circunstância - por exemplo, Finlândia, Irlanda e Espanha.

    Neste âmbito, há que assinalar que a Decisão-quadro do Conselho, de 6 de Dezembro de 2001, que altera a Decisão-quadro 2000/383/JAI sobre o reforço da protecção contra a contrafacção de moeda na perspectiva da introdução do euro, através de sanções penais e outras [65], prevê que cada Estado-Membro deve reconhecer o princípio da reincidência, nas condições vigentes no seu direito nacional, e reconheça, nas mesmas condições, como geradoras de reincidência, as condenações definitivas pronunciadas noutro Estado-Membro em relação a uma das infracções previstas na decisão-quadro.

    [65] JO L 329 de 14.12.2001, p. 3.

    3.1.1.7. Concurso de infracções

    Pode definir-se o concurso de infracções como a prática de várias infracções simultânea ou sucessivamente antes da condenação definitiva por uma delas. É a ausência de condenação anterior que distingue esta figura da reincidência. Diversos sistemas - por exemplo, o da Bélgica - estabelecem uma distinção entre concurso material (o mesmo indivíduo é culpado de diversas actividades distintas tipificadas no direito penal) e concurso ideal (quando um indivíduo, num único acto, infringe diversas disposições da lei).

    Quando uma pessoa é objecto de uma acção penal por infracções conexas ou não em diversos Estados-Membros, poderia considerar-se a hipótese de transferir o processo penal para outro Estado-Membro a fim de facilitar a acção penal. Neste âmbito, a Convenção Europeia de 1972 sobre a transmissão de processos penais [66] prevê, na alínea d) do artigo 8º, a possibilidade de um Estado contratante solicitar a outro Estado contratante que instaure procedimento, por exemplo, se, no Estado requerido, tiver sido instaurado procedimento contra o arguido em virtude da mesma infracção ou de outras infracções. O artigo 32º da referida Convenção prevê que os Estados em causa apreciem a oportunidade de instauração de um procedimento único por um deles.

    [66] Tratados do Conselho da Europa, n° 73. Abertura para assinatura em 15 de Maio de 1972, entrada em vigor em 30 de Março de 1978.

    Esta Convenção de 1972 prevê que qualquer Estado contratante que, antes da instauração ou durante a fase de tramitação do procedimento, tiver conhecimento da existência noutro Estado contratante de um procedimento pendente contra a mesma pessoa, em virtude dos mesmos factos, examinará se pode renunciar ao seu próprio procedimento, suspendê-lo ou transmiti-lo ao outro Estado contratante. Caso considere oportuno não renunciar ao seu próprio procedimento ou suspendê-lo, deve avisar o outro Estado em tempo oportuno e, em qualquer caso, antes de proferida a decisão sobre o mérito da causa. Neste caso, os Estados em causa esforçar-se-ão, na medida do possível, por determinar a qual de entre eles incumbirá prosseguir o procedimento único. Todavia, apenas cinco Estados-Membros [67] ratificaram a Convenção de 1972, que nem sequer foi assinada por outros cinco de entre eles.

    [67] Áustria, Dinamarca, Países Baixos, Espanha e Suécia.

    Saliente-se que a situação em que uma pessoa, no âmbito de uma única actividade, infrinja diversas disposições da lei está relacionada com a questão do ne bis in idem, princípio fundamental do direito penal, segundo o qual uma pessoa não pode ser perseguida ou condenada duas vezes pelos mesmos factos [68], bem como à litispendência, ou seja, a suspensão de uma acção relativa a uma infracção, visto ter sido proposta uma acção num primeiro processo.

    [68] Ou seja, por factos idênticos aos visados na primeira decisão, entre os quais a data, o local e os efeitos específicos do comportamento em causa.

    3.1.2. Sanções privativas de liberdade

    Embora a fixação de um mínimo da pena máxima a nível da União se tenha tornado clássica nos instrumentos sectoriais de aproximação do direito penal material, não existe, em contrapartida, uma pena máxima comum, registando-se, neste domínio, diferenças significativas. Os sistemas penais de alguns Estados-Membros, como a Bélgica, a Grécia, o Reino Unido, a França ou a Itália, prevêem a pena de prisão perpétua. Outros, como a Espanha e Portugal, não prevêem este tipo de pena.

    Em geral, nos Estados-Membros cujos sistemas penais prevêem a pena de prisão perpétua, há possibilidade de libertação condicional decorrido um determinado período de cumprimento, que, no entanto, difere amplamente (por exemplo, 10 anos, no mínimo, na Bélgica, 15 anos na Alemanha ou 20 anos na Irlanda). Em França, é possível impor um período de segurança que pode atingir trinta anos.

    A prisão perpétua é uma pena reservada a crimes muito graves. A pena máxima de prisão abaixo da prisão perpétua difere também entre os Estados-Membros. Pode variar entre 15 anos na Alemanha, 20 anos na Áustria ou 30 anos na Bélgica. Do mesmo modo, a libertação antecipada pode ocorrer após ter sido cumprido um terço (Bélgica), dois terços (Dinamarca e Alemanha) ou três quartos (Espanha) da pena. Quanto há reincidência, estes períodos são normalmente aumentados.

    Quanto às modalidades de execução das sanções privativas de liberdade e antes de se abordarem as questões de oportunidade de uma intervenção a nível da União Europeia neste domínio, entendeu-se útil apresentar mais pormenorizadamente este tema no Anexo I para o qual se remete. Este anexo diz respeito à suspensão da execução da pena, à suspensão e adiamento da pronúncia da sentença, à semidetenção, ao fraccionamento da execução da pena, à vigilância electrónica e à prisão domiciliária.

    Com base neste inventário e na análise comparada da legislação dos Estados-Membros em matéria de modalidades de execução das sanções privativas de liberdade, é possível constatar que a maioria dos Estados-Membros introduziu uma variedade relativamente grande de modalidades de execução das sanções privativas de liberdade que permite a passagem progressiva do encarceramento à libertação. Em substância, esta abordagem é motivada pelo desejo de se dispor de penas mais apropriadas do que as penas de prisão para permitir uma melhor reintegração do delinquente na sociedade, bem como pelos problemas de sobrepopulação prisional [69]. O instrumento mais frequente neste contexto é a suspensão da execução da pena, existente em quase todos os Estados-Membros. A vigilância electrónica é aplicada em seis Estados-Membros, estando em fase de ensaio ou a ser considerada noutros cinco. Todos os instrumentos restantes (suspensão/adiamento da pronúncia da sentença, semidetenção, fraccionamento da execução da pena e prisão domiciliária) só são reconhecidos e aplicados numa minoria de Estados-Membros.

    [69] Em muitos Estados-Membros o problema da sobrepopulação prisional é actualmente objecto de aceso debate público. É o caso da Bélgica (ver artigo no Le Vif/L'Express de 9.5.2003, p. 26), da França

    (ver artigos no Le Monde de 12.4.2003 e de 30.4.2003) e de Portugal (ver artigo da Grande Reportagem de Abril de 2003, p. 78).

    3.1.3. Sanções pecuniárias

    Alguns Estados-Membros aplicam o regime de sanções pecuniárias «dias-multa» (por exemplo, Dinamarca, Espanha, Portugal e Alemanha), outros (Bélgica, Luxemburgo, Países Baixos, Reino Unido e Itália) seguem o sistema clássico do montante fixo. Os dois sistemas coexistem em alguns Estados-Membros (por exemplo, França, Grécia, Suécia e Finlândia).

    No regime «dias-multa», as multas são geralmente aplicadas pelos tribunais nacionais da forma seguinte: o tribunal fixa o período de prisão que corresponde à infracção, caso pretenda punir com pena de prisão, fixando seguidamente o montante a pagar relativamente a cada dia do período em causa. O período mínimo mencionado na legislação dos Estados-Membros é, em geral, de 5 dias, ou mesmo menos (França, Finlândia, Grécia, Espanha e Alemanha) com excepção da Suécia, em que é de 30 dias. O número máximo de dias que os tribunais podem impor varia entre 150 (Suécia) e 730 dias (Espanha). Os montantes mínimos que o tribunal determina para cada dia variam, em geral, entre 1 e 10 euros, constatando-se uma enorme variedade quanto aos montantes máximos por dia, por exemplo, 60 euros na Grécia, 300 na Espanha e 360 na França, até ao montante de 5 000 euros na Alemanha.

    No que respeita ao regime clássico do montante fixo, a lei prevê, normalmente, montantes mínimos e máximos, em função das diferentes categorias de infracções. Entre os extremos, o tribunal dispõe frequentemente de uma margem de manobra considerável para determinar a multa.

    Nos ordenamentos onde o regime clássico do montante fixo coexiste com o regime "dias-multa", o sistema de aplicação das sanções pecuniárias é mais complicado e varia consoante o país. Na Finlândia, por exemplo, aplica-se o sistema dos «dias-multa», mas, relativamente a determinadas infracções específicas, utiliza-se também o sistema do montante fixo, enquanto na França, o sistema aplicável difere consoante a natureza da pena (criminal, correccional ou de contra-ordenação).

    Independentemente do regime de cálculo da multa, a legislação ou a jurisprudência da maior parte dos Estados-Membros prevê que o tribunal, ao decidir o montante da multa, deve ter em consideração as circunstâncias da infracção e/ou a situação financeira do seu autor.

    As legislações nacionais, independentemente do regime de cálculo utilizado, prevêem, em geral expressamente, que o tribunal que impõe a multa imponha igualmente uma pena de prisão alternativa, a título subsidiário, aplicável na ausência de pagamento da multa (por exemplo, Alemanha, Bélgica, França, Países Baixos, Luxemburgo e Portugal).

    3.1.4. Interdição de direitos

    Existe um leque de penas ou medidas de interdição de direitos nos sistemas jurídicos dos Estados-Membros, que vão desde a interdição de conduzir determinados veículos durante um determinado período até à pena de interdição do território nacional ou interdição do exercício de uma actividade profissional.

    A interdição do direito de conduzir existe em todos os Estados-Membros. Em contrapartida, alguns tipos de interdição de exercer profissões específicas (por exemplo, a gerência de empresas, serviço militar) ou de entrada em determinados locais (por exemplo, estádios de futebol, locais de venda de álcool) não são reconhecidas em todos os Estados-Membros.

    Existem igualmente diversas interdições em matéria de direitos cívicos e civis que podem revestir um carácter «acessório», ou seja, devem ser impostas quando outra pena - normalmente uma pena de prisão com determinada duração - seja pronunciada. É o caso, por exemplo, das medidas em matéria de direito de voto, elegibilidade, interdição ou incapacidade de exercício de funções públicas.

    3.1.5. Apreensão e perda

    A apreensão e perda tem habitualmente um carácter específico (por exemplo, Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Luxemburgo, Países Baixos, Itália ou Reino Unido), aplicando-se aos objectos utilizados para cometer a infracção e às vantagens patrimoniais retiradas directamente da infracção ou aos bens e valores a elas correspondentes e, inclusivamente, aos rendimentos investidos. Quando as coisas não possam ser encontradas no património da pessoa condenada, o tribunal procede à respectiva avaliação monetária e a apreensão e perda incidirá sobre o montante equivalente em dinheiro (por exemplo Bélgica, Dinamarca, Luxemburgo e França).

    Todos os Estados-Membros ratificaram a Convenção de 8 de Novembro de 1990 do Conselho da Europa relativa ao branqueamento, detecção, apreensão e perda dos produtos do crime [70]. No entanto, alguns Estados-Membros efectuaram, relativamente ao artigo 2º [71] sobre as medidas de perda, declarações segundo as quais são obrigados a apreender apenas os produtos e instrumentos derivados de infracções devidamente especificadas. As informações recolhidas pela Comissão no âmbito da elaboração do relatório, a adoptar em breve, sobre a aplicação da Decisão-quadro do Conselho, de 26 de Junho de 2001, relativa ao branqueamento de capitais, à identificação, detecção, congelamento, apreensão e perda dos instrumentos e produtos do crime [72] permitem concluir que a grande maioria dos Estados-Membros respeita a alínea a) do artigo 1º da decisão-quadro, que proíbe que sejam feitas reservas relativamente ao artigo 2º da Convenção mencionada. Todavia, alguns deles deverão rever as reservas ao artigo 2º para respeitarem a decisão-quadro.

    [70] Disponível em http://conventions.coe.int/

    [71] Artigo 2º - Medidas de perda: (1) Cada uma das Partes adopta as medidas legislativas e outras que se revelem necessárias para lhe permitirem decretar a perda de instrumentos e produtos, ou bens cujo valor corresponda a esses produtos. (2) Cada uma das Partes pode, no momento da assinatura ou no momento do depósito do seu instrumento de ratificação, de aceitação, de aprovação ou de adesão, mediante declaração dirigida ao Secretário Geral do Conselho da Europa, declarar que o nº 1 do presente artigo apenas se aplica às infracções ou categorias de infracções especificadas na declaração.

    [72] JO L 182 de 5.7.2001, p. 1.

    Isto revela a que ponto existem ainda divergências no que respeita às possibilidades de apreensão e perda nos Estados-Membros, bem como a persistência, em alguns Estados-Membros, da impossibilidade de se apreenderem os produtos de todas as infracções passíveis de penas privativas de liberdade com duração superior a um ano.

    3.1.6. Sanções aplicáveis às pessoas colectivas

    No que se refere às sanções aplicáveis às pessoas colectivas, as diferenças entre os Estados-Membros são consideráveis. Alguns deles prevêem a responsabilidade - e, por vezes, de forma específica a responsabilidade penal - das pessoas colectivas: é o caso da França, Irlanda, Reino Unido, Bélgica e Países Baixos. Tal não é o caso, por exemplo, da Grécia, Alemanha, Luxemburgo ou Itália. A responsabilidade das pessoas colectivas é objecto de inúmeros debates. Os adversários desta ideia argumentam sobretudo que, uma vez que as pessoas colectivas não possuem espírito próprio, não podem agir com culpa em matéria criminal (societas delinquere non potest). Os partidários da responsabilidade penal das pessoas colectivas adoptam uma perspectiva completamente diferente. Consideram que as pessoas colectivas não são simples ficção. As instituições existem, ocupam uma posição predominante na organização da nossa sociedade e devem, consequentemente, ser responsáveis pelas infracções que cometem.

    No Reino Unido, por exemplo, a jurisprudência baseia a responsabilidade das pessoas colectivas na chamada teoria da identificação. Com base nesta teoria, a pessoa colectiva é identificada com as pessoas que constituem o núcleo dirigente, ou seja, os indivíduos, os quadros ou os dirigentes, cujas funções no seio da empresa são de natureza tal que não recebem, na execução das suas funções, ordens ou orientações por parte de um superior hierárquico. A prática de uma infracção por um indivíduo ou grupo de indivíduos identificados com uma organização constitui, assim, uma infracção por parte da pessoa colectiva. No entanto, apesar das diferenças com os sistemas de common law, certos Estados-Membros, como por exemplo a França, prevêem a responsabilidade penal das pessoas colectivas.

    3.1.7. Sanções alternativas

    As sanções e medidas não detentivas permitem uma abordagem mais criativa e, ao mesmo tempo, mais humana da forma de tratar o problema da delinquência e das sanções. Servem, em especial, para limitar o recurso às penas de prisão de curta duração, sobre as quais a maior parte dos especialistas tem uma opinião muito negativa. A implicação da comunidade (local) constitui um elemento necessário e original da execução das penas alternativas.

    Este tipo de pena desempenha, por conseguinte, um papel muito importante no âmbito da prevenção da criminalidade, já que, muito mais do que as penas detentivas, contribui para uma reinserção mais adequada dos delinquentes na sociedade. Nos termos do segundo parágrafo do artigo 29° do TUE, o objectivo da União de facultar aos cidadãos um elevado nível de protecção num espaço de liberdade, de segurança e de justiça será atingido, nomeadamente, através da prevenção da criminalidade. A reintegração contribui de forma directa para a prevenção da reincidência.

    Com base no inventário e na análise comparada da legislação dos Estados-Membros em matéria de penas alternativas (ver Anexo II), é possível constatar que a maior parte dos Estados-Membros introduziu nos últimos anos, ou está em vias de introduzir, sanções alternativas. Essencialmente, a sua abordagem é motivada pelo desejo de disporem de penas mais apropriadas do que as penas de prisão para conseguirem uma melhor reintegração dos delinquentes na sociedade, bem como pelos problemas de sobrepopulação prisional. É possível observar que a aceitação de penas alternativas encontra algumas dificuldades nos órgãos jurisdicionais de diversos Estados-Membros. Observa-se ainda uma tendência dos legisladores nacionais para se concentrarem em certas penas alterantivas, como sejam a prestação de trabalho a favor da comunidade e a mediação em processos penais.

    3.1.8. Execução das sanções penais

    Para conhecer a situação nos Estados-Membros, é necessário proceder previamente a um inventário e a uma análise comparada da sua legislação no domínio da execução das sanções penais. Para tal, remete-se para o Anexo III que, sem pretender ser exaustivo, apresenta a legislação dos Estados-Membros em matéria de suspensão de pena, semidetenção, liberdade antecipada e comutação de pena, bem como de amnistia e indulto.

    O Anexo III revela que, no domínio da execução das sanções penais, são igualmente consideráveis as diferenças entre as legislações dos Estados-Membros.

    A suspensão da execução da pena só é reconhecida numa minoria de Estados-Membros, como por exemplo a França e a Itália. Apenas um número reduzido de Estados-Membros reconhece o instrumento da semidetenção (por exemplo, Alemanha, Bélgica, Espanha, França, Itália e Portugal) na fase da execução da pena. As condições de acesso, as modalidades de aplicação e as consequências para os beneficiários em caso de violação das condições impostas, variam consideravelmente. O instrumento da liberdade antecipada existe, em contrapartida, em todos os Estados-Membros, embora as condições de elegibilidade e de aplicação desta medida difiram sensivelmente de um Estado para outro. A possibilidade de comutação mais ou menos automática da pena só é reconhecida num número reduzido de Estados-Membros (França e Grécia). As legislações dos Estados-Membros em matéria de aministia e indulto diferem substancialmente, sendo a sua aplicação, em geral, objecto de um poder de apreciação muito vasto por parte das autoridades competentes.

    Estas diferenças são, aliás, ilustradas de forma marcante pelos números ou percentagens de reclusos (por 100 000 habitantes) nos Estados-Membros, embora estas diferenças percentuais não reflictam apenas as diferenças existentes entre Estados-Membros no âmbito da execução de sanções, mas também do conjunto de factores do direito penal que determinam uma sanção. A Comissão enviou, em 1 de Agosto de 2003, um questionário sobre a população prisional aos (actuais e futuros) Estados-Membros. Embora não disponha ainda de todas as respostas, é já possível constatar o seguinte: tradicionalmente, regista-se uma tendência moderada nos Estados-Membros escandinavos (entre 50 e 70 reclusos por 100 000 habitantes), um grupo de Estados-Membros apresenta uma taxa média abaixo de 100 reclusos (Alemanha, Áustria, Bélgica, França, Itália, Grécia, Luxemburgo e Países Baixos) e outro grupo de Estados-Membros uma taxa entre 100 e 150 reclusos por 100 000 habitantes (Espanha, Reino Unido, Portugal e alguns novos Estados-Membros). Considerando que alguns dos novos Estados-Membros têm taxas superiores a 350 reclusos por 100 000 habitantes, é possível constatar que a taxa de reclusos por 100 000 habitantes em determinados Estados-Membros futuros é cerca de seis vezes superior à dos Estados-Membros escandinavos.

    3.2. Um arsenal de instrumentos de reconhecimento mútuo incompleto

    3.2.1. Reconhecimento mútuo das sanções privativas de liberdade

    Diversas convenções adoptadas no âmbito do Conselho da Europa e completadas por instrumentos adoptados no âmbito da cooperação política europeia (CPE) revestem pertinência no presente contexto. As convenções CPE têm por objectivo principal facilitar a aplicação das convenções do Conselho da Europa e reforçar a cooperação judiciária em matéria penal entre os Estados-Membros. Há que ter ainda em consideração acordos a nível regional, tais como os existentes entre os países nórdicos.

    3.2.1.1. Convenção Europeia sobre o Valor Internacional das Sentenças Penais, do Conselho da Europa, de 28 de Maio de 1970

    A Convenção Europeia sobre o Valor Internacional das Sentenças Penais [73], de 28 de Maio de 1970, foi ratificada por quinze dos quarenta e cinco membros do Conselho da Europa. Entrou em vigor em 26 de Julho de 1974. Assinaram-na onze Estados-Membros [74] e cinco ratificaram-na [75]. Muitas foram as reservas formuladas pela maioria das partes contratantes quanto à aplicação desta Convenção que incide sobre as sanções privativas de liberdade.

    [73] Disponível em http://conventions.coe.int/

    [74] Áustria, Bélgica, Dinamarca, Alemanha, Espanha, Grécia, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Portugal, Suécia.

    [75] Áustria, Dinamarca, Espanha, Países Baixos, Suécia.

    De acordo com a Convenção, o Estado que profere a sentença penal só pode solicitar a execução de uma sanção a um outro Estado contratante se forem preenchidas uma ou várias das condições enumeradas no artigo 5°: a) quando o condenado possua residência habitual no outro Estado-Membro, b) quando a execução da sanção no outro Estado-Membro seja susceptível de melhorar as possibilidades de reinserção social do condenado, c) quando se trate de sanção privativa de liberdade susceptível de ser executada no outro Estado na sequência de uma outra sanção privativa de liberdade a que o condenado está sujeito ou deverá cumprir neste Estado, d) quando o outro Estado seja o Estado de origem do condenado e se tenha declarado disposto a encarregar-se da execução desta sanção ou e) no caso de considerar não estar em condições de executar a sanção, mesmo com recurso à extradição, possuindo o outro Estado as condições requeridas. Além disso, a decisão pronunciada no Estado requerente deve ter carácter definitivo e executório, devendo a infracção que conduziu a infracção em causa constituir igualmente uma infracção perante a legislação do Estado requerido (exigência de "dupla incriminação" [76]).

    [76] A exigência de «dupla incriminação» não foi incluída nas convenções seguintes: Acordo de Cooperação de 23 de Março de 1962 entre a Dinamarca, a Finlândia, a Islândia, a Noruéga e a Suécia (denominado Acordo de Helsínquia), a Convenção sobre a cooperação judiciária celebrada em Riyadh, em 1983, entre alguns Estados árabes e o Regime relativo à transferência das pessoas condenadas no seio do Commonwealth de 1986.

    A execução só pode ser recusada inteira ou parcialmente quando se verifique um dos casos enumerados no artigo 6° [77].

    [77] Motivos de recusa: a) quando a execução seja contrária aos princípios fundamentais da ordem jurídica do Estado requerido; b) quando o Estado requerido considere que a infracção reprimida pela sentença se reveste de um carácter político ou que se trata de uma infracção puramente militar; c) quando o Estado requerido considere haver motivos sérios para entender que a sentença foi provocada ou agravada por considerações atinentes à raça, religião, nacionalidade ou opinião política; d) quando a execução seja contrária aos acordos internacionais do Estado requerido; e) quando o facto seja objecto de acção judicial no Estado requerido ou quando este decida encetar uma acção; f) quando as autoridades competentes do Estado requerido tenham decidido não encetar uma acção ou pôr termo a acção em curso relativamente ao mesmo facto; g) quando o facto tenha sido cometido fora do território do Estado requerente; h) quando o Estado requerido não tenha capacidade para executar a sanção; i) quando o pedido se baseie na alínea e) do artigo 5° (caso entenda não ter condições para executar a sanção, mesmo com recurso à extradição, possuindo o outro Estado essas condições), e que não se verifica nenhuma das outras condições previstas por este artigo; j) quando o Estado requerido entenda que o Estado requerente tem capacidade para executar a sanção; k) quando, devido à idade no momento em que foi cometido o facto, não tenha sido possível abrir processo ao réu no Estado requerido; l) quando a sanção tenha prescrito de acordo com a lei do Estado requerido; m) na medida em que a sentença pronuncie interdição.

    A execução de uma sanção pronunciada no Estado-Membro requerente só pode ocorrer no Estado requerido mediante decisão do tribunal deste Estado (artigo 37°). Antes de tomar uma decisão sobre o pedido de execução, o tribunal dá ao condenado a possibilidade de fazer valer o seu ponto de vista (artigo 39°). Deve prever-se uma via de recurso contra as decisões judiciais tomadas no Estado requerido, tendo em vista a execução solicitada (artigo 41°). O Estado requerido está vinculado pela constatação dos factos, desde que estes sejam expostos na decisão ou desde que esta se baseie implicitamente neles (artigo 42°).

    Após a recepção do pedido de execução, o tribunal substitui a sanção privativa de liberdade pronunciada no Estado requerente por uma sanção prevista pela sua própria legislação para o mesmo facto (artigo 44°). Esta sanção pode, nos limites seguidamente indicados, ser de natureza ou duração diferente da pronunciada no Estado requerente. Caso esta sanção seja inferior ao mínimo que a legislação do Estado requerido permita pronunciar, o tribunal não é obrigado a este mínimo, aplicando uma sanção correspondente à sanção pronunciada no Estado requerente. Ao estabelecer a sanção, o tribunal não pode agravar a situação penal do condenado resultante da decisão pronunciada no Estado requerente.

    De acordo com a Convenção, a execução rege-se pela legislação do Estado requerido e apenas este Estado é competente para tomar todas as decisões adequadas, nomeadamente no que respeita à liberdade condicional. Só o Estado requerente pode decidir dos recursos de revisão introduzidos contra a sentença condenatória. Os dois Estados podem exercer o direito de amnistia ou de indulto.

    3.2.1.2. Convenção entre os Estados-Membros das Comunidades Europeias relativa à Execução de Condenações Penais Estrangeiras, de 13 de Novembro de 1991

    Oito Estados-Membros [78] das Comunidades Europeias assinaram, em 13 de Novembro de 1991, uma convenção relativa à execução de condenações penais estrangeiras [79]. Não tendo sido ratificada por nenhum dos Estados-Membros, nunca entrou em vigor. Nas relações entre os Estados-Membros que são parte na Convenção Europeia do Conselho da Europa sobre o Valor Internacional das Sentenças Penais, de 28 de Maio de 1970, a Convenção de 1991 destinava-se a ser aplicada na medida em que completasse as disposições da referida convenção ou facilitasse a aplicação dos princípios nela contidos (artigo 20°).

    [78] Bélgica, Dinamarca, Alemanha, Grécia, Espanha, França, Itália e Luxemburgo.

    [79] Disponível em http://ue.eu.int/ejn/

    De acordo com o artigo 2° desta Convenção, os Estados-Membros das Comunidades Europeias comprometem-se a conceder mutuamente a mais ampla cooperação possível em matéria de transmissão da execução das sentenças (penas privativas de liberdade ou penas pecuniárias). A transmissão da execução pode ser solicitada quer pelo Estado que pronuncia a sentença, quer pelo Estado de execução. Cada um dos Estados-Membros pode precisar, numa declaração, as infracções que pretende excluir do âmbito de aplicação da Convenção. Os restantes Estados-Membros podem aplicar a regra da reciprocidade (artigo 1°).

    A transmissão da execução de uma sentença de pena privativa de liberdade pode ser solicitada quando: a) a pessoa condenada se encontre no território do Estado de execução e seja nacional deste último ou nele resida habitualmente ou b) a pessoa condenada se encontre no território do Estado de execução e a sua extradição tenha sido recusada, ou seria recusada se tivesse sido solicitada ou não seja possível ou c) a pessoa condenada se encontre no território do Estado de execução onde cumpra ou deva cumprir uma pena privativa de liberdade

    (artigo 3°).

    A transmissão da execução de uma sentença condenatória depende do acordo entre o Estado de condenação e o Estado de execução, só podendo ocorrer se estiverem reunidas de forma cumulativa as condições enumeradas no artigo 5° da Convenção: a) a sentença é definitiva e executória; b) os actos ou omissões que deram lugar à sentença correspondem a uma das infracções mencionadas no n° 1, alínea a), do artigo 1°, nos termos do direito do Estado de execução, ou constituiriam uma infracção se tivessem ocorrido no seu território - "dupla incriminação"; c) a sanção não é proferida nem de acordo com a lei do Estado de condenação nem com a do Estado de execução; d) não exista, no Estado de execução, sentença definitiva relativamente à pessoa condenada pelos mesmos factos; e) quando exista sentença definitiva pelos mesmos factos relativamente à pessoa condenada noutro Estado, a transmissão da execução não seja contrária ao princípio "ne bis in idem".

    Há que referir que, contrariamente ao disposto no artigo 39° da Convenção do Conselho da Europa de 1970, a Convenção de 1991 entre os Estados-Membros das Comunidades Europeias não prevê que a pessoa seja ouvida quanto ao local de cumprimento da pena.

    Quando a transmissão da execução de uma sentença de pena privativa de liberdade tenha sido aceite, as autoridades competentes do Estado de execução devem executar a pena pronunciada no Estado de condenação - directamente ou com base numa decisão - ou convertê-la, mediante processo judicial ou administrativo, numa decisão deste Estado, substituindo assim a pena pronunciada no Estado de condenação por uma pena prevista pela legislação do Estado de execução para a mesma infracção (artigo 8°).

    O Estado de execução deve, caso tal lhe seja solicitado, indicar ao Estado de condenação qual dos dois processos adoptará. Qualquer Estado pode indicar, por meio de declaração, que pretende excluir a aplicação de um dos processos.

    No caso de o Estado de execução adoptar o primeiro processo (execução da pena pronunciada no Estado de condenação), fica vinculado pela natureza jurídica e pela duração da pena pronunciada pelo Estado de condenação. No entanto, se a natureza ou a duração desta pena for incompatível com a legislação do Estado de execução, ou caso a legislação deste Estado assim o exija, o Estado de execução pode, por decisão judicial ou administrativa, adaptar esta pena à pena prevista pela sua própria legislação para infracções da mesma natureza. Esta pena corresponderá, o mais possível, quanto à sua natureza, à pronunciada pela sentença a executar. Não pode agravar, em termos de natureza ou duração, a pena pronunciada pelo Estado de condenação, nem exceder o máximo previsto pela legislação do Estado de execução para o mesmo facto (n° 4 do artigo 8°).

    No caso de o Estado de execução optar pelo processo da conversão da sentença, este Estado: a) fica vinculado pela constatação dos factos na medida em que estes figurem expressa ou implicitamente na sentença pronunciada no Estado de condenação, b) pode, salvo declaração em contrário, converter uma pena privativa de liberdade numa pena pecuniária quando a pena privativa de liberdade seja de duração inferior ou igual a seis meses e c) não agravará a situação penal do condenado e não fica vinculado à pena mínima eventualmente prevista pela sua própria legislação para a ou as infracções cometidas (n° 5 do artigo 8°).

    O Estado de condenação deixa de poder executar a sentença quando a transmissão da execução tenha sido acordada com o Estado de execução. No entanto, em caso de evasão do condenado, o Estado de condenação readquire o direito de execução, excepto quando acordado de outro modo entre este Estado e o Estado de execução (artigo 17°).

    3.2.1.3. Tratado de 26 de Setembro de 1968 entre a Bélgica, os Países Baixos e o Luxemburgo sobre a execução de decisões judiciais em matéria penal

    Este Tratado [80] incide sobre a execução de decisões repressivas entre os Estados do Benelux. É aplicável às sentenças de pena privativa de liberdade ou a medidas privativas de liberdade, a sentenças de multa ou de apreensão e perda, a sentenças que determinam interdição de direitos e a decisões judiciais limitadas à declaração de culpa [81].

    [80] O Tratado Benelux de 1968 nunca entrou em vigor. Ver C. Van den Wyngaert, Strafrecht en strafprocesrecht in hoofdlijnen, Maklu, Antuérpia, 1998, página 1010.

    [81] Artigo 2º.

    O Tratado prevê que uma condenação pronunciada num Estado contratante só possa ser executada noutro Estado contratante quando o facto reprimido constitua infracção neste último ou quando faça parte de uma lista estabelecida em conformidade com o Tratado [82].

    [82] Artigos 3º e 57º.

    No entanto, o Tratado prevê a possibilidade de recusa da execução solicitada quando o facto se revista de carácter político ou militar ou seja objecto de acção penal no Estado requerido ou quando este decida propor uma acção. O Estado requerido pode ainda recusar a execução quando esta seja contrária aos seus compromissos internacionais ou aos princípios fundamentais da sua ordem jurídica, quando o facto tenha sido cometido fora do território do Estado requerente ou quando se trate da execução de uma condenação de interdição de direitos [83]. A autoridade competente do Estado requerente tem de certificar o carácter executório da decisão [84]. A execução das condenações proferidas à revelia está, em princípio, submetida às mesmas regras que as condenações contraditórias [85].

    [83] Artigo 5º.

    [84] Idem.

    [85] Artigo 17º.

    Prevê-se igualmente que, quando exista mandado de captura ou qualquer outro título de detenção no Estado requerente, o qual solicita a execução da condenação, o Estado requerido pode proceder à detenção imediata do condenado. Em caso de urgência, prevê-se que o Estado requerido possa proceder à detenção antes de lhe serem transmitidos os documentos que normalmente acompanham o pedido de execução [86].

    [86] Artigo 30º.

    A possibilidade de deslocação temporária do detido é prevista [87], bem como a apreensão de determinados objectos tendo em vista a sua posterior perda se, em aplicação do Tratado, tal for passível de execução no Estado requerido [88]. No âmbito do Tratado, prevê-se igualmente em que casos e em que circunstâncias o condenado pode purgar a pena no Estado requerente.

    [87] Artigos 32º e 33º.

    [88] Artigo 33º.

    No que respeita à execução das sentenças de multa e de apreensão, o Estado requerido não pode proceder à execução de tais medidas, excepto em virtude de decisão do Ministério Público do Estado requerido, a quem compete verificar a autenticidade do pedido e o seu carácter executório [89]. Compete-lhe igualmente controlar se as condições do Tratado foram observadas, sendo responsável pela execução das modalidades técnicas. A decisão do Ministério Público é passível de recurso junto do tribunal competente do Estado requerido.

    [89] Artigo 42º.

    Quanto à execução das sentenças condenatórias que determinam interdição de direitos, prevê-se que o Estado contratante só possa proceder à execução desta medida pronunciada noutro Estado contratante em virtude de decisão do tribunal do primeiro Estado contratante. Prevê-se expressamente que a interdição de direitos só possa produzir efeitos num Estado diferente do da condenação quando a legislação deste último preveja a interdição de direitos para esta infracção ou para uma equivalente, de acordo com a lista prevista pelo Tratado [90].

    [90] Artigos 50º e 57º.

    3.2.1.4. Modelo de cooperação entre os Estados nórdicos

    Os Estados nórdicos (Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia) possuem uma longa tradição de cooperação em matéria penal, baseada na sua proximidade geográfica, nos elos históricos, culturais e linguísticos [91] e em interesses comuns de ordem política e económica. Os diferentes instrumentos desta cooperação foram precedidos de períodos de discussão pública intensa para elaborar soluções comuns e harmonizar as suas legislações nacionais.

    [91] Excepto a língua finlandesa.

    O primeiro instrumento é a Convenção de 8 de Março de 1948 relativa ao reconhecimento e à execução de sentenças em matéria penal, celebrada entre a Noruega, a Dinamarca e a Suécia. A Convenção prevê que as sentenças definitivas pronunciadas num Estado sejam executórias num outro Estado signatário. O âmbito de aplicação da Convenção limita-se, no entanto, a multas, apreensão e perda e despesas de justiça. Seguiu-se-lhe, em 23 de Março de 1962, um acordo de cooperação entre a Dinamarca, a Finlândia, a Islândia, a Noruega e a Suécia, designado por "Acordo de Helsínquia". Segundo este Acordo, os Estados signatários deverão adoptar - e adoptaram efectivamente - regulamentações idênticas ou pelo menos semelhantes, que permitam às autoridades de um Estado signatário reconhecer e executar as sentenças pronunciadas pelas autoridades dos outros Estados signatários e transferir reclusos para este fim. É nesta base de regulamentações idênticas ou semelhantes que assenta a confiança mútua que caracteriza a cooperação penal entre os Estados nórdicos.

    A transferência de reclusos entre os Estados nórdicos baseia-se em considerações humanitárias e de política penal. O objectivo desta cooperação consiste, designadamente, em promover a reabilitação e a reinserção do delinquente. Argumenta-se - a justo título - ser mais fácil preparar o recluso para a sua vida futura em liberdade se a execução ocorrer no Estado onde este tem intenção de viver. Esta abordagem facilitaria também os contactos com os possíveis empregadores e outras organizações, o que contribui para reduzir o risco de reincidência.

    No que respeita à execução de sanções privativas de liberdade, o Estado de execução está vinculado pelo número de dias de prisão fixado na decisão do Estado de julgamento. Após deliberações intensas, a possibilidade de redução ou adaptação da pena em função do nível das penas do Estado de execução foi considerada inadequada. O princípio da "dupla incriminação" não foi aceite. A transferência de reclusos não depende do acordo do recluso. No entanto, este deve ser ouvido antes de ser adoptada qualquer decisão, sendo a sua posição, em geral, respeitada. O recluso é protegido pelo princípio da especialidade, segundo o qual o Estado de execução só pode executar a pena relativamente à qual a transferência diz respeito. Para facilitar a execução prática do processo, as decisões de transferência de reclusos entre Estados nórdicos são tomadas ao nível das administrações penitenciárias centrais do Estado de execução. Na Suécia, por exemplo, a administração penitenciária central dispõe do poder de apresentar pedidos de transferência de reclusos para outro Estado e decidir quanto aos pedidos provenientes de outros Estados. Apesar de a execução ser regida pelo direito do Estado de execução, os Estados nórdicos acordaram no sentido de o Estado de execução não poder conceder indultos sem ter previamente ouvido as autoridades do Estado de julgamento.

    3.2.1.5. Convenção relativa à transferência das pessoas condenadas, do Conselho da Europa, de 21 de Março de 1983

    A Convenção do Conselho da Europa relativa à transferência das pessoas condenadas foi celebrada em 21 de Março de 1983 [92] e ratificada por cinquenta e dois Estados [93]. Entrou em vigor em 1 de Julho de 1985. Todos os Estados-Membros da União Europeia a assinaram e ratificaram. Foram formuladas numerosas reservas pela maioria dos Estados-Membros quanto à aplicação de determinadas partes da Convenção.

    [92] Disponível em http://conventions.coe.int/ .

    [93] Parte dos quais não faz parte do Conselho da Europa.

    A Convenção tem por objecto principal facilitar a reinserção social das pessoas condenadas a penas ou medidas privativas de liberdade, permitindo a um estrangeiro privado de liberdade na sequência de uma infracção penal, cumprir a pena ou o restante da pena no seu meio social de origem. É motivada por considerações humanitárias, uma vez que parte da constatação de que as dificuldades de comunicação devido aos obstáculos linguísticos, sociais e culturais e à ausência de contacto com a família podem exercer efeitos nefastos sobre o comportamento dos reclusos estrangeiros e impedir, ou mesmo impossibilitar, a reinserção social dos delinquentes.

    De acordo com o procedimento previsto no n° 3 do artigo 2° da Convenção, a transferência pode ser pedida quer pelo Estado onde a condenação foi pronunciada (Estado de condenação), quer pelo Estado de nacionalidade do condenado (Estado de execução). A Convenção não implica nem a obrigação de os Estados em questão transferirem as pessoas condenadas nem o direito de estas serem transferidas. Os Estados dispõem de poder discricionário significativo.

    A transferência só pode ocorrer nos termos da Convenção se estiverem reunidas as condições seguintes (artigo 3°): a) o condenado tem de ser nacional do Estado de execução; b) a sentença tem de ser definitiva; c) na data da recepção do pedido de transferência a duração da condenação ainda por cumprir deve ser, pelo menos, de seis meses ou indeterminada; d) o condenado ou, quando em virtude da sua idade ou do seu estado físico ou mental um dos Estados o considere necessário, o seu representante deve consentir na transferência; e) os actos ou omissões que originaram a condenação devem constituir uma infracção penal segundo a lei do Estado de execução ou constituiriam uma infracção se tivessem sido praticados no seu território; f) o Estado de condenação e o Estado de execução devem estar de acordo quanto à transferência.

    À semelhança do que ocorre na Convenção entre os Estados-Membros das Comunidades Europeias relativa à execução de condenações penais estrangeiras, de 13 de Novembro de 1991, o Estado de execução dispõe de duas opções quanto ao modo de execução: as autoridades competentes do Estado de execução devem prosseguir a execução da condenação directamente ou convertê-la, mediante processo judicial ou administrativo, numa decisão desse Estado, substituindo assim a sanção proferida no Estado de condenação por uma sanção prevista pela legislação do Estado de execução para a mesma infracção (artigo 9°). A execução da condenação rege-se pela legislação do Estado de execução que é o único competente para tomar todas as decisões adequadas.

    As modalidades processuais em caso de prossecução da execução - regidas pelo artigo 10° da Convenção de 1983 - são idênticas às da Convenção de 1991 (ver acima). Caso a natureza ou a duração desta sanção seja incompatível com a legislação do Estado de execução, este poderá, pois, adaptar a sanção à pena ou medida prevista na sua própria legislação para infracções da mesma natureza.

    Em caso de conversão da condenação (artigo 11°), aplica-se o processo previsto pela legislação do Estado de execução. Ao efectuar a conversão, a autoridade competente: a) estará vinculada pela constatação dos factos na medida em que estes figurem explicita ou implicitamente na sentença pronunciada no Estado de condenação; b) não pode converter uma sanção privativa de liberdade numa sanção pecuniária; c) descontará integralmente o período de privação de liberdade cumprido pelo réu; d) não agravará a situação penal do réu nem ficará vinculada à sanção mínima eventualmente prevista pela lei do Estado de execução para a infracção ou infracções cometidas. As condições previstas nas alíneas b) e c) diferem das estabelecidas no n° 5 do artigo 8° da Convenção de 1991, que permite a conversão de uma pena privativa de liberdade numa pena pecuniária, excepto declaração em contrário; a condição prevista na alínea c) não tem equivalente na Convenção de 1991.

    Quanto ao Estado de condenação, a execução da sentença condenatória fica nele suspensa logo que as autoridades do Estado da execução tomem o condenando a seu cargo. O Estado de condenação não pode executar a condenação a partir do momento em que o Estado de execução a considere cumprida (artigo 8°).

    A aplicação da Convenção tornou-se difícil devido às divergências de interpretação do critério da nacionalidade, à situação dos reclusos que padecem de perturbações mentais e ao tratamento das multas não pagas, ao desrespeito dos prazos de tratamento dos pedidos de transferência e às diferenças entre os sistemas penais dos Estados em questão.

    a. Critério da nacionalidade: a Convenção prevê que as pessoas condenadas que pretendam obter a transferência sejam nacionais do Estado de execução (artigo 3°). Esta disposição deve ser lida, no entanto, em articulação com o n° 4 do artigo 3°, que prevê que qualquer Estado pode, mediante declaração, definir, no que lhe diz respeito e para os fins da Convenção, o termo "nacional". Consequentemente, pode alargar a aplicação da Convenção a pessoas que não sejam "nacionais", por exemplo abrangendo igualmente cidadãos de outros Estados que sejam residentes permanentes. Infelizmente, a interpretação dos Estados signatários não é uniforme. O Conselho da Europa, na sua Recomendação (88) 13, sugeriu, consequentemente, aos Estados que definam o termo "nacional" em sentido lato. Para o Conselho da Europa, a residência habitual deverá ser o critério principal.

    b. Situação dos reclusos que padecem de perturbações mentais: estas pessoas não são necessariamente condenadas - na acepção habitual do termo - a uma pena na sequência de uma declaração de culpa. De acordo com as legislações dos Estados-Membros, estas pessoas são, devido à sua responsabilidade atenuada ou irresponsabilidade total, quer condenadas directamente a um período indeterminado de internamento em estabelecimentos especializados, quer isentas de comparecer perante o tribunal, embora submetidas a um internamento em estabelecimentos especializados por constituírem um perigo público. Ora, há Estados signatários que consideram que a Convenção não se aplica a esta última categoria de reclusos. Para colmatar esta dificuldade de interpretação, o Conselho da Europa tenciona adoptar uma nova recomendação para que a Convenção se aplique a todos os reclusos que padeçam de perturbações mentais.

    c. Em alguns Estados-Membros (por exemplo, Reino Unido e França), podem ser aplicadas simultaneamente sanções pecuniárias e penas de prisão. Nestes casos, é frequente que o Estado de condenação bloqueie todos os pedidos de transferência do condenado até que este tenha pago a multa. O Conselho da Europa tentou lutar contra esta prática: através da Recomendação n° R (92) 18, alínea f) do ponto 1, instou os Estados signatários a tomarem medidas que lhes permitam não terem de recusar a transferência apenas por não terem sido satisfeitas as multas impostas pela sentença à pessoa condenada. Uma vez que esta recomendação não permitiu eliminar esta prática, o Conselho da Europa tenciona agora analisar o problema com maior profundidade no sentido de sugerir uma solução sob a forma de um novo protocolo à Convenção.

    d. Constatou-se, por parte de alguns Estados de condenação, a tendência para recusar a transferência no caso de esta proporcionar ao recluso a possibilidade de cumprir no seu país de origem uma pena menos severa do que a imposta no Estado de condenação. Esta situação pode ocorrer não apenas no caso de o Estado de execução optar pela solução da conversão (artigo 11°), mas também caso decida prosseguir a execução da pena (artigo 10°). No caso da conversão, o risco é evidente, uma vez que a legislação do Estado de execução (que pode sempre prever uma pena menos pesada) se sobrepõe inteiramente à do Estado de condenação (n° 1, alínea b), do artigo 9°, que remete para o artigo 11°). Em caso de prossecução da execução da pena, o Estado de execução pode ver-se obrigado a adaptar a pena pronunciada (pelo Estado de condenação), por exemplo, caso a pena pronunciada exceda a duração máxima autorizada pela legislação do Estado de execução. Finalmente, na prática, uma pena menos severa e mesmo a liberdade imediata poderá ocorrer em resultado das diferenças consideráveis existentes entre as legislações dos Estados-Membros no que respeita à execução da pena [94], em especial quanto à liberdade antecipada (ver acima). Para resolver o problema da liberdade imediata, o Conselho da Europa adoptou, em 27 de Junho de 2001, uma recomendação [95] que sugere um período mínimo de execução da pena (por exemplo, 50% da duração total da pena pronunciada) para além do qual se recomenda aos Estados-Membros que facilitem a transferência [96].

    [94] A execução da condenação rege-se pela lei do Estado de execução, o qual detém competência exclusiva para tomar todas as decisões apropriadas (n° 3 do artigo 9° da Convenção).

    [95] Recomendação nº 1527 (2001) sobre o funcionamento da Convenção do Conselho da Europa relativa à transferência das pessoas condenadas.

    [96] O Comité de técnicos em matéria de funcionamento das convenções europeias no domínio penal levantou objecções, no entanto, no seu parecer de 22 de Janeiro de 2003, argumentando que o facto de se fixar um índice mínimo seria lesivo da flexibilidade, que é um valor reconhecido pela Convenção. Acresce ainda que o índice fixo impediria qualquer solução caso a caso. O Comité pronunciou-se, pois, a favor de uma abordagem que assente na ideia de um período de determinada duração compatível com os fins da justiça.

    3.2.1.6. Protocolo Adicional à Convenção relativa à Transferência das Pessoas Condenadas, do Conselho da Europa, de 18 de Dezembro de 1997

    Em 18 de Dezembro de 1997 foi celebrado o Protocolo Adicional à Convenção relativa à Transferência das Pessoas Condenadas [97], do Conselho da Europa. Este Protocolo entrou em vigor em 1 de Junho de 2000. Foi ratificado por dezasseis dos Estados membros do Conselho da Europa. Entre os Estados-Membros da Comunidade Europeia, onze assinaram-no e cinco ratificaram-no.

    [97] Disponível em http:// conventions.coe.int

    O Protocolo completa a Convenção relativa à Transferência das Pessoas Condenadas de 1983 e define as regras aplicáveis à transferência da execução das penas, relativamente às pessoas condenadas e evadidas do Estado da condenação para regressar ao Estado de nacionalidade, por um lado, e, por outro, às pessoas condenadas que são objecto de medida de expulsão ou de recondução à fronteira devido à condenação.

    3.2.1.7. Acordo relativo à aplicação, entre os Estados-Membros das Comunidades Europeias, da Convenção relativa à transferência das pessoas condenadas, do Conselho da Europa, de 25 de Maio de 1987 [98]

    [98] Disponível em http://ue.eu.int/ejn/

    Este acordo completa, a nível das relações entre os Estados-Membros que ratificaram a Convenção do Conselho da Europa relativa à transferência das pessoas condenadas de 1983 (seguidamente designada "Convenção relativa à transferência"), as disposições da referida Convenção do Conselho da Europa (artigo 1°). O acordo foi assinado por onze Estados-Membros e ratificado por quatro.

    Tendo em vista a aplicação da Convenção relativa à transferência, cada um dos Estados-Membros assimila aos seus próprios nacionais os nacionais de qualquer outro Estado-Membro cuja transferência pareça adequada e no interesse da pessoa em causa, tendo em consideração a sua residência habitual e regular no território do referido Estado

    (artigo 2°). As declarações efectuadas em aplicação da Convenção relativa à transferência não produzem efeitos relativamente aos Estados-Membros signatários do Acordo. Cada Estado-Membro pode, nas suas relações com os Estados-Membros parte no presente Acordo, proceder à renovação ou alteração das declarações previstas pela Convenção relativa à transferência (artigo 3°).

    3.2.2. Reconhecimento de decisões que concedem a suspensão ou a liberdade condicional ou que impõem sanções alternativas

    3.2.2.1. Descrição e identificação do problema

    No que respeita às medidas de vigilância e de assistência a título, nomeadamente, do regime de prova ou da liberdade condicional, o Programa de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo das decisões penais anteriormente evocado estabelece, no Capítulo 4, "Decisões tomadas no contexto da execução das penas", o objectivo e a medida seguintes:

    "Objectivo: Assegurar a cooperação no caso de uma pessoa sujeita a obrigações ou medidas de vigilância e de assistência a título, nomeadamente, de um regime de prova ou de liberdade condicional.

    Medida n° 23: Procurar optimizar a aplicação da Convenção Europeia para a vigilância de pessoas condenadas ou libertadas condicionalmente, de 30 de Novembro de 1964. Convirá, nomeadamente, determinar em que medida certas reservas e motivos de recusa da execução poderiam tornar-se inoponíveis entre os Estados-Membros da União Europeia, se necessário, através de um instrumento específico".

    As obrigações ou medidas de vigilância e de assistência supramencionadas que acompanham penas de prisão suspensas ou decisões de liberdade condicional levantam problemas idênticos aos do reconhecimento das penas alternativas.

    O reconhecimento mútuo das sanções alternativas coloca dificuldades pelos motivos seguidamente enunciados. Em primeiro lugar, verificam-se, tal como demonstrado na parte relativa à aproximação das penas alternativas, diferenças consideráveis no que respeita à sua função e estatuto jurídico: em alguns Estados-Membros, algumas penas alternativas constituem penas principais ou penas de substituição, enquanto noutros as mesmas penas são medidas complementares das penas de prisão suspensas. Por outro lado, existe uma grande variedade quanto ao conteúdo das sanções alternativas. Além disso, certas penas alternativas - incluindo o enquadramento social e as instâncias de controlo adequadas para este tipo de penas - não existem em todos os Estados-Membros. Finalmente, uma parte das sanções alternativas, ou seja, as que podem depender de mediação penal, são objecto, em alguns Estados-Membros, de um processo simplificado que se desenrola em parte fora do processo penal clássico e que implica, regularmente, o arquivamento do processo quando o referido processo simplificado é encerrado com êxito.

    Embora a legislação dos Estados-Membros tente evitar discriminações abertas, constata-se que os tribunais nacionais, na prática, não pronunciam sentenças suspensas combinadas com medidas de reeducação relativamente a pessoas com residência habitual num Estado-Membro diferente daquele onde é pronunciada a sentença. Considerando que o Estado-Membro de julgamento não pode assegurar medidas de vigilância no Estado de residência habitual do autor do delito [99], este arrisca-se a uma pena de prisão, mesmo quando se trata apenas de delitos de menor gravidade, o que implica que o autor do delito seja punido mais severamente do que se tivesse cometido o mesmo delito no Estado-Membro de residência. A nacionalidade estrangeira não é a principal causa de dificuldades neste contexto, mas sim o facto de a residência habital do condenado se situar noutro Estado-Membro.

    [99] Sem um acordo internacional ou regulamentação da União Europeia, o Estado de julgamento cometeria um atentado à soberania do Estado de residência habitual do autor da infracção, caso procedesse a medidas de vigilância no território deste último.

    Actualmente, a nível da União Europeia, não há qualquer legislação que contemple a execução de sanções alternativas fora das fronteiras nacionais. É um facto que o Governo belga apresentou, em 2002, uma iniciativa tendo em vista a criação de uma rede europeia de pontos de contacto nacionais para a justiça reparadora [100]. Esta iniciativa visa desenvolver e promover diversos aspectos da justiça reparadora ao nível da União, através da criação de uma rede europeia de pontos de contacto nacionais. No entanto, não aborda a questão do reconhecimento mútuo das sanções alternativas.

    [100] JO C 242 de 8.10.2002, p. 20.

    3.2.2.2. Instrumentos existentes

    A Convenção Europeia para a Vigilância de Pessoas Condenadas ou Libertadas Condicionalmente [101], elaborada sob a égide do Conselho da Europa, tenta encontrar uma solução para os problemas supramencionados. Foi assinada em 30 de Novembro de 1964 e entrou em vigor em 22 de Agosto de 1975. Foi ratificada por dezasseis Estados. Actualmente, assinaram-na [102] onze Estados-Membros e oito ratificaram-na [103].

    [101] Disponível em http://conventions.coe.int/

    [102] Áustria, Bélgica, Dinamarca, Alemanha, França, Grécia, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Portugal e Suécia.

    [103] Áustria, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Portugal e Suécia.

    A Convenção visa permitir às pessoas condenadas abandonarem o território de uma parte contratante (Estado requerente) onde foram julgadas ou libertadas condicionalmente e colocá-las sob a vigilância adequada das autoridades de uma outra parte contratante (Estado requerido). Diz respeito a pessoas que foram objecto de uma decisão judicial de culpabilidade, acompanhada de suspensão condicional da pena, ou de condenação com privação de liberdade, pronunciada condicionalmente ou cuja execução tenha sido condicionalmente suspensa, no todo ou em parte, quer no momento da condenação ("suspensão"), quer posteriormente ("libertação antecipada") [104].

    [104] Na maior parte dos Estados-Membros, a liberdade antecipada é uma liberdade condicional, ver acima.

    De acordo com esta Convenção, as partes contratantes comprometem-se a conceder a assistência mútua necessária à reinserção social das pessoas condenadas no estrangeiro. A convenção trata de três tipos de entreajuda:

    (1) A primeira forma de entreajuda é a vigilância (Título II da Convenção). O Estado requerente (que pronunciou a sentença) pode solicitar ao Estado no território do qual o delinquente estabeleceu residência habitual, que assegure a sua vigilância. A vigilância pelo Estado requerido pode exigir ou não uma adaptação das suas medidas de vigilância.

    No primeiro caso, a vigilância pode ser aceite sem qualquer formalidade, por exemplo, quando exista igualmente no Estado requerido e não seja necessário adaptá-la. Se a vigilância das condições em caso de suspensão for efectuada pelo Estado da execução, coloca-se a questão de saber se o Estado de julgamento deverá ter possibilidade de garantir que o condenado respeite as condições da suspensão. Qual o mecanismo a prever neste âmbito?

    No caso de a legislação do Estado requerido não prever as medidas de vigilância prescritas, este deve adaptá-las segundo a sua própria legislação (n° 1 do artigo 11° da Convenção). Tal implica a transformação de uma parte da condenação ou da decisão da autoridade que ordenou a libertação condicional do delinquente. Em caso algum as medidas de vigilância aplicadas pelo Estado requerido podem agravar, pela sua natureza ou duração, as medidas prescritas pelo Estado requerente (n° 2 do artigo 11° da Convenção).

    Nos termos da Convenção e no caso de o interessado estar sujeito a uma revogação da decisão de suspensão condicional, quer em virtude de procedimento judicial ou de sentença condenatória por nova infracção, quer pelo não cumprimento das obrigações que lhe haviam sido impostas, apenas o Estado requerente tem competência para apreciar, tendo em conta as informações e pareceres fornecidos pelo Estado requerido, se o delinquente satisfez ou não as condições que lhe haviam sido impostas e para tirar dessas constatações as consequências previstas na sua legislação (artigos 13° e 15° da Convenção). Compete-lhe informar o Estado requerido da sua decisão.

    (2) A segunda forma de entreajuda possível consiste em proceder à execução das sentenças (Título III da Convenção), caso o Estado requerente assim o solicite e caso tenha revogado a decisão de suspensão condicional. A execução tem lugar nos termos da lei do Estado requerido (artigo 17°). O Estado requerido substitui, se for o caso, a sanção imposta no Estado requerente em caso de revogação, pela pena ou medida prevista na sua própria legislação para uma infracção análoga. Tanto quanto possível, esta pena ou medida corresponde, no que diz respeito à sua natureza, à imposta pela decisão a executar, não podendo exceder o máximo previsto pela lei do Estado requerido nem agravar, pela sua natureza ou duração, a sanção pronunciada no Estado requerente (artigo 19°). O Estado requerente não pode, a partir desse momento, proceder a qualquer das medidas de execução pedidas, a menos que uma recusa ou impossibilidade de execução lhe tenham sido notificadas pelo Estado requerido (artigo 20°).

    (3) A terceira forma de entreajuda possível diz respeito à renúncia a favor do Estado requerido (Título IV da Convenção). Neste caso, Estado requerido adapta a pena ou a medida pronunciada à sua legislação penal como se a sentença tivesse sido pronunciada pela mesma infracção cometida no seu território. A sanção imposta pelo Estado requerido não pode agravar a sanção pronunciada no Estado requerente (artigo 23°). O Estado requerido assegura a aplicação integral da sentença assim adaptada como se se tratasse de uma sentença pronunciada pela sua jurisdição (artigo 24°). A aceitação pelo Estado requerido de um pedido formulado nos termos do presente título faz cessar o direito de execução da sentença no Estado requerente (artigo 25°).

    Na maioria dos casos, a revogação da suspensão condicional implica que o condenado deva cumprir a pena de prisão no Estado de execução. Consequentemente, colocam-se as mesmas questões já levantadas no ponto 3.2.1.

    A Convenção de 1964 apresenta dois grandes inconvenientes: o número elevado de reservas [105] formuladas pela maioria dos Estados-Membros e os motivos de recusa [106] que tornam ineficaz a sua aplicação.

    [105] Estas reservas excluem, em especial, a aplicação dos títulos III e IV.

    [106] De acordo com o artigo 7°, a vigilância, a execução ou a aplicação integral não têm lugar: a) se são consideradas pelo Estado requerido como sendo de natureza a constituir um atentado à sua soberania, à sua segurança, aos princípios fundamentais da sua ordem jurídica ou a outros dos seus interesses essenciais; b) se a sentença que motiva o pedido for fundamentada em factos que tenham sido definitivamente julgados no Estado requerido; c) se o Estado requerido considerar os factos que motivam a sentença quer como uma infracção política, quer como uma infracção conexa com uma tal infracção, quer ainda como uma infracção puramente militar; d) se a sanção se encontra prescrita de acordo com a lei do Estado requerente ou do Estado requerido; e) se o autor da infracção beneficia de uma amnistia ou de um perdão no Estado requerente ou no Estado requerido. Acresce ainda que a vigilância, a execução ou a aplicação integral podem ser recusadas: a) se as autoridades competentes do Estado requerido decidiram não instaurar procedimento ou encerrar o procedimento que tinham iniciado pelos mesmos factos; b) Se os factos que motivam a sentença são objecto de procedimento no Estado requerido; c) se a sentença que motiva o pedido foi pronunciada à revelia; d) na medida em que o Estado requerido considere que a sentença é incompatível com os princípios que presidem à aplicação do seu direito penal, especialmente se, em virtude da idade, o autor da infracção não tivesse podido ser condenado no Estado requerido.

    3.2.3. Reconhecimento das decisões de interdição de direitos

    A inibição do direito de conduzir está abrangida por uma Convenção da União Europeia relativa às decisões de inibição de conduzir, de 17 de Junho de 1998 [107]. Esta Convenção, actualmente ratificada apenas pela Espanha, limita-se, no entanto, a prever um mecanismo de reconhecimento relativamente débil. Não prevê a possibilidade de a inibição do direito de conduzir ser reconhecida directamente em todos os Estados-Membros da União, pressupondo a passagem pelo Estado-Membro de residência. Este dispõe de três possibilidades para executar as decisões relativas à inibição do direito de conduzir: pode executar directamente a decisão de inibição, pode executá-la indirectamente por intermédio de uma decisão judicial ou administrativa ou pode ainda convertê-la numa decisão judicial ou administrativa interna, o que implica substituir a decisão do Estado da infracção por uma nova decisão do Estado de residência (ver nº 1 do artigo 4º da Convenção). Nos dois últimos casos, o Estado-Membro de residência pode reduzir a duração da inibição. Esta possibilidade não parece estar em conformidade com o princípio do reconhecimento mútuo. A Convenção prevê aliás motivos de recusa obrigatórios e opcionais para efectivar a inibição. Mais um vez, alguns destes motivos não parecem estar em conformidade com o princípio do reconhecimento mútuo.

    [107] Relatório explicativo sobre a Convenção relativa às decisões de inibição de conduzir, JO C 211 de 23.7.1999, p. 1.

    3.2.4. Conclusões

    Com excepção da Convenção do Conselho da Europa relativa à transferência das pessoas condenadas, de 21 de Março de 1983, que todos os Estados-Membros da União Europeia assinaram e ratificaram, nenhuma outra das convenções supramencionadas foi assinada ou ratificada por todos os Estados-Membros da União Europeia. Entre o número reduzido de Estados-Membros (da União Europeia) que ratificaram estas convenções, muitas foram as declarações e reservas efectuadas, reduzindo assim consideravelmente a sua eficácia. Sem pretender reproduzir e repetir aqui as diferentes críticas quanto ao fundamento da regulamentação prevista, identificadas nos pontos 3.2.1. e 3.2.2., e que serão tratadas com mais pormenor no ponto 4.2., há que constatar que o arsenal de instrumentos aplicáveis entre os Estados-Membros da União Europeia, e que permitem responder à preocupação de reconhecimento e execução da pena noutro Estado-Membro, é igualmente bastante incompleto e, quando existe (ou seja, em especial, a Convenção do Conselho da Europa relativa à transferência das pessoas condenadas, de 21 de Março de 1983), é susceptível de ser melhorado.

    4. Problemas subsistentes e necessidade de acção a nível da União Europeia

    4.1. Aproximação das sanções privativas de liberdade e das penas alternativas

    No domínio que nos ocupa, tal como noutros, a acção da União Europeia é norteada pelos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade. O Protocolo relativo à aplicação do princípio da subsidiariedade justifica uma acção da Comunidade quando estão em causa questões transnacionais, quando a acção apenas a nível nacional ou a ausência de acção da Comunidade seja contrária às exigências do Tratado ou ainda quando uma acção empreendida ao nível comunitário apresente vantagens evidentes devido à sua dimensão ou aos seus efeitos.

    Esta abordagem foi patenteada nas conclusões do Conselho JAI de 25 e 26 de Abril de 2002 [108], que insistiram na coerência interna dos sistemas penais dos Estados-Membros e na aceitação das diferenças em matéria de sanções. Como já referido, esta situação tem fundamentos históricos, culturais e jurídicos fortemente enraizados nos sistemas legais, que evoluíram ao longo do tempo e que são a expressão da forma como os Estados foram confrontados e responderam a questões fundamentais no domínio do direito penal. Trata-se, em absoluto, de um domínio fulcral da soberania dos Estados.

    [108] Ver 2.1.5 supra.

    O princípio que sustenta a acção da União no domínio da cooperação judiciária em matéria penal é o do reconhecimento mútuo, tal como reiterado nas conclusões de Tampere. No entanto, surgem interrogações sobre as consequências da diversidade em matéria de sanções penais. Em especial, convém analisar em que medida algumas de entre elas criam um obstáculo à realização do espaço de liberdade, de segurança e de justiça que a União estabeleceu como objectivo.

    A Comissão entende que uma acção da União poderia ser considerada quando seja necessária para garantir a eficácia de uma política em sectores harmonizados. Pode levantar-se a questão se será realmente eficaz, por exemplo, a resposta «harmonizada» desenvolvida ao nível da União, nos limites acima descritos, a um fenómeno criminal. Por outras palavras, pode obter-se o nível pretendido de segurança quando determinados comportamentos podem não ser objecto de incriminação ou não ser reprimidos ?

    De igual modo, coloca-se a questão de determinar a eventual existência do risco de que alguns criminosos «transfiram» a sua actividade repreensível para um Estado-Membro onde essa actividade não seja incriminada ou seja menos severamente sancionada. Seria interessante reflectir sobre a eventualidade de estarmos perante uma hipótese académica ou de uma realidade, por exemplo, no caso da criminalidade financeira, da criminalidade no mundo dos negócios ou da criminalidade que recorre às novas tecnologias.

    Outra pista de reflexão é a de verificar se a ausência de harmonização constitui obstáculo à livre circulação, e em que medida, ou se os cidadãos deverão esperar, pelo contrário, que um comportamento, lícito no seu Estado-Membro de residência, não seja autorizado noutro (por exemplo, em matéria de racismo, de pedofilia ou de consumo de droga).

    Pergunta 1: Em que medida as diferenças entre os sistemas de sanções penais constituem obstáculo à realização do espaço de liberdade, de segurança e de justiça, nos casos de, por exemplo,

    (1) deslocação dos criminosos, com base em disparidades nas incriminações e sanções ou

    (2) obstáculos à livre circulação de pessoas?

    No que respeita às possiblidades de acção do ponto de vista da Comissão relativamente aos diferentes tipos de sanções, aplicando a divisão já utilizada, é possível distinguir:

    4.1.1. Regras de direito penal geral

    4.1.1.1. Legalidade/Oportunidade

    A escolha entre estes dois sistemas levanta a questão da oportunidade ou não de desenvolver uma política criminal europeia de prioridade da investigação e acção penal relativamente a certos tipos de infracções.

    A título incidental, no Livro Verde relativo à criação de um Procurador Europeu [109], relativamente à fraude ao orçamento comunitário, a Comissão afirma a sua preferência por um sistema de legalidade da acção penal, moderado por excepções. Isto implica, em princípio, uma acção penal uniforme em todo o espaço judicial europeu, sem margem de apreciação por parte do Procurador Europeu. Aquando de uma audição pública sobre o Livro Verde, realizada em Setembro de 2002, a maioria dos intervenientes considerou ser preferível adoptar o princípio da legalidade nesta matéria, modulado contudo por excepções específicas.

    [109] COM(2001)715 final, de 11.12.2001, ponto 6.2.2.1.

    O objectivo principal consiste em encontrar um equilíbrio e em assegurar a eficácia da justiça. Regra geral, a procura deste equilíbrio compete a cada Estado-Membro, embora se pudesse procurar, pelo menos no que diz respeito às infracções harmonizadas a nível da União, que não existissem divergências sensíveis entre os Estados-Membros no que diz respeito à instauração de acções penais.

    4.1.1.2. Margem de apreciação do tribunal penal

    A independência é uma prerrogativa dos tribunais que decorre do princípio da separação de poderes reconhecido em todos os Estados-Membros. Em geral, o tribunal penal tem uma margem de liberdade considerável para pronunciar a pena. Consequentemente, não seria adequado estabelecer regras vinculativas neste aspecto. Acresce ainda que, no actual estado do Tratado, segundo a Declaração nº 8 ao Tratado de Amesterdão, um Estado-Membro que não preveja penas mínimas não pode ser obrigado a adoptá-las.

    No âmbito do estudo sobre «L'harmonisation des sanctions pénales en Europe», prevêem-se, em contrapartida, abordagens legislativas não vinculativas que recomendem a adopção de penas compreendidas entre um período mínimo e um período máximo (directrizes em matéria de pronúncia de sentenças) ou de zonas de aplicação corrente em casos normais. Uma outra opção consistiria em realizar regularmente exercícios de comparação, sob a forma de encontros ou estudos de casos por exemplo, para saber quais as práticas dos órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros em matéria de pronúncia da pena. Poder-se-á ainda considerar a eventualidade de adoptar como modelo a nível europeu sistemas do tipo «High Court Sentencing Information System», aplicado na Escócia, ao qual todos os tribunais escoceses têm acesso e que contém todas as decisões dos «High Courts», que constituem na prática uma linha orientadora para os tribunais.

    4.1.1.3. Grau de participação. Cumplicidade

    As decisões-quadro adoptadas e as que estão em vias de adopção [110] prevêem, de uma forma geral, disposições que visam incriminar e impor sanções penais - com um carácter efectivo, proporcionado e dissuasivo [111] - à instigação e cumplicidade nas infracções visadas pelos instrumentos respectivos.

    [110] Ver ponto 2.1.5.

    [111] Por exemplo, artigos 2 e 3 da Decisão-quadro do Conselho relativa à luta contra o tráfico de seres humanos (JO L 203 de 1.8.2002, p. 1); artigos 5 e 6 da Decisão-quadro do Conselho sobre o reforço da protecção contra a contrafacção de moeda na perspectiva da introdução do euro, através de sanções penais e outras (JO L 149 de 2.6.2001, p. 1).

    Encetar a aproximação das penas aplicáveis em função do grau de participação sem ter procedido previamente à aproximação da própria definição dos diferentes graus de participação, nem da pena para o autor da infracção, não parece possível, considerando que, com frequência, a pena aplicada à cumplicidade, nos Estados-Membros que prevêem pena diferenciada para estes casos, é determinada em função da pena prevista para o autor.

    4.1.1.4. Circunstâncias agravantes e atenuantes

    Tendo em consideração o facto de o agravamento da pena em curcunstâncias determinadas previstas na lei ser, em geral, fixado relativamente à pena imposta à infracção de base, que não está harmonizada de uma forma geral, torna-se igualmente difícil prever uma aproximação neste domínio.

    No que respeita às circunstâncias atenuantes, será sempre necessário assegurar que um sistema de redução proporcional não entre em conflito com a Declaração nº 8 do Tratado de Amesterdão, que não permite obrigar os Estados-Membros que não as reconhecem a preverem penas mínimas.

    Qualquer acção a nível da União poderá apenas, aparentemente, ter um alcance muito limitado, sendo a sua justificação, aliás, duvidosa.

    4.1.1.5. Reincidência

    O «Programa de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo das decisões penais» [112] contém diversas medidas destinadas a assegurar que os tribunais de um Estado-Membro tenham em consideração uma condenação pronunciada noutro Estado-Membro para avaliar o passado criminal do delinquente e decidir quais as consequências relativamente à condenação do interessado.

    [112] JO C 12 de 15.1.2001, p. 10.

    A medida nº 2, designadamente, prevê a adopção de um ou vários instrumentos que consagrem o princípio segundo o qual o tribunal de um Estado-Membro deve ter capacidade para ter em consideração as decisões penais definitivas pronunciadas noutros Estados-Membros para apreciar o passado criminal do delinquente, para apurar a reincidência e para determinar a natureza das penas e as modalidades de execução susceptíveis de aplicação.

    No que diz respeito à tomada em consideração das decisões penais definitivas pronunciadas noutros Estados-Membros, de acordo com o previsto na medida nº 2, a posição dos Estados-Membros difere. O artigo 56º da Convenção europeia sobre o valor internacional das sentenças penais [113], de 1970, prevê que compete aos Estados contratantes adoptarem as medidas legislativas que entendam adequadas e que permitam aos seus tribunais, ao pronunciarem uma senteça, terem em consideração todas as sentenças penais europeias contraditórias anteriormente pronunciadas por motivo de outra infracção, para que constituem referência para a totalidade ou parte dos efeitos previstos na lei em matéria de sentenças pronunciadas no seu território. Determina quais as condições para que este tipo de sentença seja tido em consideração. Todavia, apenas quatro Estados-Membros ratificaram a Convenção de 1970, sem reservas quanto ao artigo 56º [114].

    [113] Tratados do Conselho da Europa, nº 70. Abertura para assinatura em 28 de Maio de 1970, entrada em vigor em 26 de Julho de 1974, disponível em http:// conventions.coe.int

    [114] Áustria, Dinamarca, Espanha e Suécia.

    Parece óbvio que, para a tomada em consideração de uma decisão estrangeira, constitui pré-condição o conhecimento dessa mesma decisão por parte da autoridade judicial que deve pronunciar a pena. Por forma a facilitar a informação mútua, convirá, segundo a medida nº 3 do programa de reconhecimento mútuo, criar um modelo de pedido de antecedentes judiciários traduzido nas diferentes línguas da União Europeia, com base no modelo elaborado no âmbito das instâncias Schengen. A Comissão, na proposta de decisão-quadro do Conselho relativa a um mandado europeu de obtenção de provas [115], introduziu um modelo de pedido de antecedentes judiciários, que servirá para concretizar a medida nº 3 do programa de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo das decisões penais.

    [115] COM(2003) 688 final de 14.11.2003.

    Finalmente, a medida n° 4 do programa de reconhecimento mútuo prevê a realização de um estudo de viabilidade que permita determinar qual a melhor forma, tendo plenamente em conta as exigências relativas às liberdades individuais e à protecção de dados, de informar as autoridades competentes da União Europeia sobre as decisões penais condenatórias pronunciadas contra uma pessoa. A Comissão financiou dois estudos neste domínio, que contribuem para o estudo de viabilidade solicitado pelo programa de reconhecimento mútuo.

    A questão da informação sobre as penas pronunciadas noutros Estados-Membros e da tomada em consideração de tais informações em novos processos penais ou novas condenações será objecto de um estudo e de propostas da Comissão num quadro distinto do presente Livro Verde.

    No entanto, a questão da reincidência penal pode dar origem a diversos debates que merecem ser contemplados aqui.

    A aplicação do princípio do reconhecimento mútuo deve conduzir à consideração da decisão tomada pelo órgão jurisdicional de outro Estado-Membro em pé de igualdade com uma decisão nacional pronunciada para uma infracção equivalente. Quando uma decisão nacional equivalente constitua o primeiro termo da reincidência penal, a decisão do outro Estado-Membro deverá ser tratada igualmente como tal.

    A aplicação deste princípio simples poderá, todavia, na prática, ser entravada por certos dificuldades. A primeira dificuldade prende-se com a qualificação adoptada pelo tribunal que pronunciou a primeira decisão. Trata-se de uma questão clássica de dupla incriminação que foi já objecto de inúmeras diligências na União. Reveste, todavia, características especiais quando se trata da reincidência, visto que alguns Estados-Membros aplicam, relativamente a determinadas infracções, o princípio da reincidência especial. Neste caso, existe reincidência apenas quando a segunda infracção é objecto de uma qualificação idêntica à infracção que deu lugar à primeira condenação (por exemplo: duas infracções sucessivas em matéria de tráfico de droga). Poder-se-ia portanto considerar a possibilidade de estabelecer, a minima, um mecanismo de reincidência especial à escala da União que conduza à tomada em consideração, em todos os Estados-Membros, das condenações penais pronunciadas nos outros Estados-Membros a título de reincidência, quando digam respeito a determinadas infracções.

    A segunda dificuldade prende-se com a natureza da decisão, o tipo de autoridade que a pronunciou (o tribunal, mas também, em alguns casos, o Ministério Público cuja decisão poderá pôr termo ao processo ou autoridades administrativas, em determinados casos), a natureza da pena ou da decisão pronunciada (pena de prisão com ou sem execução suspensa, pena alternativa, dispensa de pena, mas também transacção em processo penal, mediação, etc.) ou a medida da pena pronunciada. Estes diferentes parâmetros poderão, consoante as legislações nacionais, ser tomados em consideração para determindar se a primeira decisão constitui ou não o primeiro termo da reincidência. Poderá ser necessário, quanto a estes aspectos, dispor de uma abordagem comum nas diferentes legislações nacionais.

    Finalmente, as legislações nacionais divergem quanto aos prazos durante os quais as decisões penais são tidas em consideração para constituir o primeiro termo da reincidência penal e quanto às circunstâncias susceptíveis de anular os efeitos de uma primeira decisão relativamente à reincidência. Mais uma vez, poderá ser necessário considerar a aproximação.

    4.1.1.6. Concurso de infracções

    A Presidência grega apresentou uma iniciativa [116] tendo em vista a adopção de uma decisão-quadro do Conselho que tem por objectivo harmonizar as diferentes disposições relativas ao princípio "ne bis in idem" incluindo a litispendência. As discussões sobre esta iniciativa prosseguem a nível do Conselho.

    [116] JO C 100 de 26.4.2003, p. 24.

    Não parece ser adequado, por enquanto, propor medidas de aproximação de carácter geral neste domínio, antes de se conhecerem os resultados das negociações sobre o referido instrumento.

    4.1.2. Sanções privativas de liberdade

    Seria desejável, em especial, prever sanções comuns em matéria de incriminação por participação numa organização criminosa, visto que a Acção Comum adoptada pelo Conselho, em 21 de Dezembro de 1998, relativa à incriminação da participação numa organização criminosa nos Estados-Membros da União Europeia não prevê um nível mínimo de pena.

    Acresce ainda que, embora a fixação de um mínimo para a pena máxima, ao nível da União, se tenha tornado clássica nos instrumentos sectoriais de aproximação do direito penal material, não é definido um nível máximo comum para as penas, verificando-se, neste domínio, tal como já constatado, diferenças substanciais. Determinados Estados-Membros prevêem a pena de prisão perpétua e outros não. Levanta-se a questão de saber se esta pena não deveria ser suprimida ou adaptada a nível da União.

    A supressão da pena de prisão perpétua justificar-se-ia do ponto de vista do objectivo de reeducação e reinserção dos indivíduos a ela condenados. Como é sabido, uma pessoa pode alterar o seu comportamento ao longo do tempo de prisão e a ausência de esperança de um dia sair em liberdade não estimula o esforço de reinserção. No entanto, há que salientar que, devido ao concurso de determinadas circunstâncias previstas na lei (boa conduta, estudos, formação profissional durante o período de reclusão, por exemplo), a pena de prisão perpétua pode ser substancialmente reduzida num Estado-Membro que preveja este tipo de pena, enquanto noutro Estado-Membro que não a prevê, uma longa pena de prisão pode, na prática, constituir uma pena de prisão perpétua.

    A prisão perpétua poderia ser substituída por uma pena de prisão por tempo indeterminado. Para as infracções mais graves, associadas a determinadas características pessoais, que representam manifestamente uma ameaça, é possível considerar a redução da pena para um período determinado que poderá situar-se entre vinte e trinta anos, com a reapreciação regular da situação do condenado, ou garantir que o caso dos condenados objecto deste tipo de sanção com duração indeterminada seja alvo de reapreciação periódica. A combinação destas duas opções poderá também ser uma possibilidade. Acresce ainda que uma determinada aproximação evitaria dificuldades quanto à execução das penas privativas de liberdade impostas nos Estados-Membros de emissão num Estado que as não reconheça.

    Não há nenhum instrumento da União que permita, em contrapartida, fixar a pena mínima. Convém recordar que a Declaração nº 8 ao Tratado de Amesterdão prevê que um Estado-Membro que não preveja penas mínimas não pode ser obrigado a adoptá-las.

    No que respeita às modalidades de execução das sanções privativas de liberdade, seria interessante conhecer a eventual necessidade de harmonizar, neste âmbito, a legislação dos Estados-Membros a nível da União Europeia (cf. Anexo I). À primeira vista, poder-se-á pensar que estas modalidades de execução das sanções privativas de liberdade não levantam problemas que ultrapassem os problemas típicos relacionados com o reconhecimento de sanções que não existem em todos os Estados-Membros ou cujas condições de aplicação e de execução variam de Estado-Membro para Estado-Membro (cf. Capítulo 4.2.). Todavia, a existência de grandes divergências poderá conduzir a situações em que apenas os residentes beneficiem de modalidades de execução mais flexíveis.

    4.1.3. Sanções pecuniárias

    Quando a aproximação das normas de direito penal se revele indispensável para garantir a aplicação eficaz de uma política da União num domínio que foi objecto de medidas de harmonização, é possível estabelecer regras mínimas relativas à definição das infracções penais e das sanções no domínio em questão. Poderia ser oportuno proceder desta forma quanto às sanções pecuniárias, em caso de incumprimento das disposições comunitárias no âmbito de uma política da União. Este exercício poderia não se limitar ao princípio, abrangendo igualmente as regras de cálculo, que diferem entre os Estados-Membros.

    Esta necessidade poderia impor-se para garantir que as sanções pecuniárias ou outros tipos de sanções, impostas pelos Estados-Membros em caso de violação de uma política da União, sejam efectivamente proporcionadas, efectivas e dissuasivas.

    4.1.4. Interdição de direitos

    No que respeita à interdição de direitos, a abordagem preconizada pela União no programa de reconhecimento mútuo [117] é a do reconhecimento e da execução das interdições de direitos em toda a União. Não parece adequado, por enquanto, propor medidas de aproximação gerais neste domínio. Tal não impede, se for caso disso, que se prevejam medidas específicas de interdição de direitos, relacionadas com determinadas infracções, tal como já se verificou no caso da exploração sexual de crianças ou da corrupção no sector privado [118].

    [117] Ver ponto 2.2.4.

    [118] Ver ponto 2.1.7.

    4.1.5. Apreensão e perda

    Tal com já mencionado, a medida de apreensão e perda foi objecto de aproximação parcial a nível da União, com a adopção de decisões-quadro neste domínio. Consequentemente, parece adequado esperar-se pela aplicação dos instrumentos já adoptados antes de se preverem novas medidas no que respeita à apreensão e perda dos produtos do crime. A Comissão está a elaborar um relatório sobre a aplicação, pelos Estados-Membros, da Decisão-quadro do Conselho, de 26 de Junho de 2001, relativa ao branqueamento de capitais, à identificação, detecção, congelamento, apreensão e perda dos instrumentos e produtos do crime [119].

    [119] Ver ponto 2.1.8.

    4.1.6. Pessoas colectivas

    Não existe um instrumento geral que preveja sanções comuns aplicáveis às pessoas colectivas. É necessário ter em conta o facto de a maior parte das pessoas colectivas exercerem actividades e possuírem bens em vários Estados-Membros. Se estas medidas não forem aplicáveis em todos os Estados-Membros, há o risco de as pessoas colectivas localizarem as suas actividades e/ou os seus bens no Estado-Membro onde o risco de sanção é mais ténue, ou mesmo inexistente.

    À imagem do que se verifica relativamente às sanções pecuniárias, poder-se-á pensar na aproximação das sanções aplicáveis às pessoas colectivas sempre que tal se revele indispensável para assegurar a aplicação eficaz de uma política da União num domínio que é objecto de medidas de harmonização.

    Pergunta 2: Como evitar, pelo menos no que respeita às infracções harmonizadas a nível da União, divergências significativas entre os Estados-Membros em matéria de instauração de acções penais ?

    Pergunta 3: Em que medida poderão ser definidas «directrizes em matéria de pronúncia de sentenças» a nível europeu, ou seja, princípios de base para a pronúncia de penas, respeitando sempre a margem de apreciação dos tribunais ?

    Pergunta 4: Seria adequado proceder previamente ao estudo de casos sobre a prática dos órgãos de jurisdicionais dos Estados-Membros no que respeita à pronúncia da pena ?

    Pergunta 5: Em que medida seria útil prever a criação de um sistema de informação sobre a pronúncia da pena susceptível de servir de orientação para os tribunais ?

    Pergunta 6: Bastará reconhecer (e/ou assimilar a uma decisão nacional) as decisões penais definitivas proferidas noutro Estado-Membro, para que o tribunal nacional possa tê-las em consideração a título de reincidência ?

    Pergunta 7: Será conveniente proceder previamente a determinadas aproximações das legislações, como por exemplo:

    - determinação de infracções a ter em consideração de forma sistemática, passíveis de constituirem o primeiro termo da reincidência (criação da noção de reincidência especial europeia);

    - determinação do tipo de decisões penais definitivas susceptíveis de serem tomadas em consideração a título da reincidência (natureza da decisão, tipo de autoridade que a pronunciou, natureza e medida da pena pronunciada);

    - período durante o qual as decisões penais definitivas deveriam ser tidas em consideração para poderem constituir o primeiro termo da reincidência em determinado Estado-Membro e circunstâncias susceptíveis de neutralizarem o efeito de uma condenação a título da reincidência ?

    Pergunta 8: Em que medida será conveniente reduzir as divergências entre os regimes nacionais em matéria de modalidades de execução de sanções privativas de liberdade, em especial tendo em vista evitar riscos de discriminação de delinquentes não residentes na aplicação deste tipo de sanções ?

    Pergunta 9: Existem categorias de infracções mencionadas na lista do nº 2 do artigo 2º da Decisão-quadro relativa ao mandado de detenção europeu e/ou da proposta de decisão-quadro relativa à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às sanções pecuniárias, relativamente às quais se deverá proceder prioritariamente à harmonização do nível das sanções (bem como da definição das incriminações) ?

    Pergunta 10: Em que medida se deverão aproximar os sistemas penais de multas (por exemplo, no domínio da criminalidade económica, incluindo as infracções cometidas por pessoas colectivas) ?

    Pergunta 11: Em que medida seria conveniente reduzir as divergências entre os regimes nacionais de responsabilidade penal ou administrativa das pessoas colectivas, em especial tendo em vista evitar riscos de deslocalização no domínio da criminalidade económica e financeira ?

    Pergunta 12: Seria conveniente generalizar a gama de sanções relativamente às pessoas colectivas, previstas em várias decisões-quadro em vigor ?

    4.1.7. Sanções alternativas

    Face às vantagens que as penas alternativas apresentam relativamente às penas detentivas, seria interessante saber se convém prever, ao nível da União Europeia, medidas destinadas a promover - ou mesmo introduzir obrigatoriamente - certas penas alternativas e em relação a que delitos. A título de exemplo, pode referir-se o n° 4 do artigo 6° da proposta de decisão-quadro do Conselho relativa à luta contra o racismo e a xenofobia [120].

    [120] JO C 75 E de 26.3.2002, p. 269.

    Quais as penas alternativas que merecem ser fomentadas? Quais as medidas incentivadoras a prever? A aceitação das penas alternativas pelos tribunais poderá ser melhorada, por exemplo prevendo, ao nível da União Europeia, mecanismos de informação e de intercâmbio de experiências, bem como a instituição de boas práticas a este respeito.

    No que respeita à prestação de trabalho a favor da comunidade, coloca-se a questão da conveniência da aproximação, a nível da União Europeia, de determinadas condições de concessão e modalidades de aplicação desta pena alternativa, de modo a facilitar o seu reconhecimento e a execução noutro Estado-Membro. Tal como referido na introdução, existe um nexo estreito de complementaridade entre a aproximação e o reconhecimento mútuo. Neste sentido, a apresentação terá de ser estudada no espírito da secção 4.2.

    Um enquadramento mínimo deste tipo poderia resolver alguns dos aspectos seguintes: condições de acesso a este tipo de pena; respectiva duração, eventualmente fixando um período mínimo e/ou máximo; condições a impor para a sua execução; natureza do trabalho a executar que, tal como as modalidades de execução do trabalho a favor da comunidade, poderá variar consoante o delito cometido (por exemplo, trabalho num hospital para um delinquente que tenha causado lesões corporais graves ou trabalho numa casa de repouso para um jovem delinquente que tenha agredido uma pessoa idosa); condições de controlo destas penas alternativas, bem como das sanções em caso de incumprimento das condições impostas para a sua execução. Quanto à mediação penal, é importante examinar se convém prever no âmbito dos processos penais, ao nível da União Europeia e para além das exigências previstas no artigo 10° da Decisão-Quadro do Conselho, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal [121], a aproximação de certas condições e modalidades de aplicação da mediação penal, por forma a facilitar o reconhecimento das medidas e acordos resultantes de procedimentos de mediação penal e respectiva execução noutro Estado-Membro. Este enquadramento mínimo poderia abranger, por exemplo, as categorias de infracções em causa, o procedimento de mediação penal e o estatuto dos mediadores, incluindo o seu grau de independência relativamente aos órgãos judiciais. Por último, será útil saber se convém prever, ao nível da União Europeia, medidas - desde que a mediação penal esteja em causa, para além das disposições previstas na Decisão-Quadro, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal - que tenham em conta, aquando da imposição de sanções alternativas, os interesses das vítimas, incluindo as que não residam no Estado-Membro em que a infracção foi cometida.

    [121] JO C 82 de 22.3.2001, p. 1.

    Pergunta 13: Em que medida seria conveniente reduzir as divergências entre os regimes nacionais de sanções alternativas, em especial tendo em vista evitar que se apliquem na prática exclusivamente aos residentes ?

    Pergunta 14: Quais os mecanismos a prever para reduzir as dificuldades jurídicas e práticas susceptíveis de constituirem obstáculo ao reconhecimento mútuo e à execução de sanções alternativas noutro Estado-Membro ?

    Pergunta 15: Em que medida será conveniente prever, ao nível da União Europeia e para além do estabelecido no artigo 10° da Decisão-Quadro do Conselho, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal, uma aproximação de certas condições e modalidades de aplicação da mediação penal, por forma a facilitar o reconhecimento das medidas e acordos resultantes de processos de mediação penal e respectiva execução noutro Estado-Membro? O que deverá prever um enquadramento mínimo deste tipo?

    - as categorias de infracções em causa?

    - o procedimento de mediação penal?

    - o estatuto dos mediadores, incluindo o seu grau de independência relativamente aos órgãos judiciais?

    Pergunta 16: Será conveniente prever, ao nível da União Europeia, medidas que tenham em conta, no âmbito dos processos e sanções alternativas, os interesses das vítimas, incluindo as que não residam no Estado-Membro onde é tomada a decisão? Em caso afirmativo, quais?

    4.1.8. Execução das sanções

    Como está patente no Anexo III, os instrumentos da suspensão da pena, da semidetenção e da comutação da pena não são conhecidos só são conhecidos em poucos Estados-Membros. Considerando que estes instrumentos não levantam especiais problemas que ultrapassem os relacionados com o reconhecimento de sanções não existentes em todos os Estados-Membros ou cujas condições de acesso e de aplicação variem entre eles (ver Capítulo 4.2.), a Comissão entende não ser adequado lançar, neste momento, um debate sobre a eventual harmonização destes instrumentos. O mesmo se aplica aos instrumentos de amnistia e indulto, uma vez que ambos são, em geral, objecto de um poder de apreciação lato por parte das autoridades competentes. O único instrumento relativamente ao qual não parece excluir-se o debate a priori é o da libertação antecipada, existente em todos os Estados-Membro, mesmo se, evidentemente, as condições de elegibilidade quanto à sua aplicação diferem consideravelmente entre eles. Na prática de aplicação da Convenção do Conselho da Europa relativa à transferência das pessoas condenadas, de 21 de Março de 1983 [122], as diferenças entre as legislações dos Estados-Membros no que respeita ao período mínimo de detenção (recorda-se que a Bélgica, por exemplo, permite a libertação antecipada após cumprido um terço da pena enquanto em Espanha este período é de três quartos [123]) criaram dificuldades de aplicação e mesmo a recusa de transferência por poderem implicar uma pena menos severa ou até a liberdade imediata. A aproximação da legislação dos Estados-Membros quanto ao período mínimo parece, pois, útil para facilitar a transferência dos reclusos [124].

    [122] Disponível em http://conventions.coe.int/

    [123] Artigo 90° do Código Penal.

    [124] Ver igualmente 3.2.1.3. e 4.2.2.2.

    A questão fundamental que se coloca neste contexto é saber se será conveniente prever, ao nível da União Europeia, um enquadramento das condições mínimas comuns, que abranjam, em especial, os aspectos seguintes: a) período mínimo de detenção a observar para a concessão da libertação antecipada, b) critérios para a concessão ou recusa da libertação antecipada, c) processo de libertação, d) condições de controlo e duração do regime de prova, e) sanções em caso de desrespeito das condições impostas por ocasião da libertação antecipada, f) garantias processuais dos condenados e g) interesses das vítimas.

    No que respeita aos interesses das vítimas, coloca-se a questão de determinar como tê-los em consideração na fase de execução das penas e se será conveniente, por exemplo, prever, ao nível da União Europeia, que a libertação antecipada não possa ser concedida excepto no caso de a(s) vítima(s) ter(em) sido indemnizada(s) ou de o condenado ter envidado esforços sérios para o fazer, podendo ser revogada caso não seja preenchida esta condição.

    Pergunta 17: Em que medida será conveniente prever, ao nível da União Europeia, uma aproximação de determinadas condições de elegibilidade e modalidades de aplicação da libertação antecipada, por forma a facilitar o reconhecimento das penas de prisão e a respectiva execução noutro Estado-Membro? O que deverá prever um enquadramento mínimo deste tipo?

    - no que respeita às penas de prisão perpétua, a possibilidade de serem objecto de reapreciação periódica tendo em vista a libertação antecipada ?

    - no que respeita às penas de prisão temporária, o período mínimo de encarceramento a observar para concessão de libertação antecipada? Em caso afirmativo, qual a duração deste período? Haverá perspectivas de aproximação no sentido de, quando se trate de penas temporárias e excepto em caso de reincidência, que a libertação antecipada seja possível após o cumprimento de metade da pena e, em caso de reincidência, de dois terços da pena?

    - critérios para a concessão ou recusa da libertação antecipada?

    - processo de libertação? Será conveniente prever processos normalizados?

    - condições de controlo e duração do regime de prova?

    - sanções em caso de desrespeito das condições impostas à libertação antecipada?

    - garantias processuais dos condenados?

    - interesses das vítimas? Será conveniente prever, por exemplo, ao nível da União Europeia, que só possa ser concedida libertação antecipada no caso de a(s) vítima(s) ter(em) sido indemnizada(s) ou no caso de o condenado ter enviado esforços sérios no sentido de o fazer, podendo esta ser revogada se não for preenchida esta condição?

    4.2. Reconhecimento e execução de sanções privativas de liberdade e de sanções alternativas noutro Estado-Membro

    Este capítulo limita-se a abordar o reconhecimento mútuo das sanções privativas de liberdade (incluindo as respectivas modalidades de execução) e das penas alternativas. Efectivamente, estão em discussão no Conselho iniciativas sobre o reconhecimento de sanções pecuniárias e de decisões de apreensão e perda. No que respeita às decisões de interdição de direitos, a Comissão tenciona apresentar uma comunicação separada. Quanto às sanções privativas de liberdade, o programa de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo das decisões penais, já evocado, fixa, no ponto 3.1.1., o objectivo e a medida seguintes:

    "Objectivo: É necessário avaliar os instrumentos jurídicos internacionais em matéria de decisões condenatórias transitadas em julgado que impõem uma pena privativa de liberdade, e analisar se esses instrumentos permitem assegurar um regime completo de reconhecimento mútuo.

    Medida n° 14: Avaliar em que medida será possível, através de mecanismos mais modernos, prever um regime completo de reconhecimento mútuo das decisões condenatórias transitadas em julgado que impõem uma pena privativa de liberdade".

    A medida nº 13 [125] do programa de medidas supramencionado foi parcialmente aplicada na Decisão-quadro «relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados-Membros». No entanto, prevê igualmente a adopção de um instrumento que institua um novo princípio de «extraditar ou executar a decisão condenatória». Este princípio foi executado no ponto 6 do artigo 4º e no ponto 3 do artigo 5º da Decisão-quadro relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados-Membros.

    [125] "Objectivo: Se se verificar que não é possível, para um Estado-Membro, renunciar ao princípio de não extradição dos seus cidadãos, providenciar a execução no seu território da decisão condenatória a título da qual é solicitada a extradição. Medida n° 13: Aprovação de um instrumento jurídico adicional à Convenção relativa à extradição entre os Estados-Membros da União Europeia, de 27 de Setembro de 1996, e à Convenção Europeia de Extradição, de 13 de Dezembro de 1957. A alínea b) do artigo 3° da Convenção entre os Estados-Membros das Comunidades Europeias relativa à execução de condenações penais estrangeiras, assinada em Bruxelas em 13 de Novembro de 1991, prevê apenas a transmissão "facultativa". O instrumento jurídico a elaborar poderá consignar na opção adoptada um novo princípio, o de "extraditar ou executar a decisão condenatória".

    A medida 13 determina, nomeadamente, que «as modalidades concretas de execução da decisão condenatória, tais como a prossecução da execução da decisão ou a conversão desta, deverão ser previstas» no novo instrumento. No que respeita à transferência das pessoas condenadas, que constitui uma forma especial de reconhecimento de sanções privativas de liberdade, visto a execução de sentenças (pronunciadas em determinado Estado) implicar o seu reconhecimento, o Programa acima referido fixa, no capítulo "3.1.3. Transferência de condenados a fim de favorecer a reinserção social", o objectivo e a medida seguintes:

    "Objectivo: Permitir aos residentes de um Estado-Membro o cumprimento da respectiva pena no Estado de residência. A este respeito, convém ter em mente o artigo 2° [126] do Acordo relativo à aplicação entre os Estados-Membros das Comunidades Europeias da Convenção do Conselho da Europa relativa à transferência de pessoas condenadas, de 25 de Maio de 1987 [127].

    [126] "Em virtude da aplicação do n° 1, alínea a), do artigo 3° da Convenção relativa à transferência das pessoas condenadas, cada Estado-Membro assimilará aos seus próprios nacionais os cidadãos de qualquer outro Estado-Membro cuja transferência pareça adequada para o interesse da pessoa em causa, tendo em consideração a sua residência habitual e regular no território do referido Estado".

    [127] Este acordo foi assinado por onze Estados-Membros e ratificado apenas por quatro.

    Medida n° 16: Aprovação de um instrumento adicional à Convenção relativa à transferência de pessoas condenadas, de 21 de Março de 1983, aplicável aos nacionais dos Estados em causa, que a torne extensível aos residentes".

    Tendo em conta a crescente mobilidade dos cidadãos da União, é cada vez mais frequente constatar-se que o autor de uma infracção é condenado num Estado-Membro que não é o da sua residência habitual. Tal como já foi salientado no ponto 9.1. da Comunicação de 26 de Julho de 2000 supramencionada, há que conciliar dois tipos de interesses no domínio do reconhecimento mútuo de penas de prisão: o interesse do Estado-Membro onde a pena foi pronunciada quanto à sua execução e o interesse da pessoa condenada em dispor da possibilidade real de reinserção na sociedade. Na comunicação conclui-se "que as penas de prisão devem, em geral, ser executadas o mais próximo possível do ambiente social em que o delinquente será reintegrado" e que, "na maior parte dos casos, tratar-se-á do Estado-Membro onde reside".

    Para o condenado, o peso da pena será mais elevado quando esta tenha de ser cumprida num Estado-Membro que não seja o da sua nacionalidade ou residência habitual. Devido às diferenças entre culturas, línguas, costumes, religiões e condições sociais, a situação dos reclusos estrangeiros é muito mais difícil do que a dos nacionais. As dificuldades linguísticas são susceptíveis, por si só, de afectar consideravelmente a forma como podem exercer os seus direitos ou mesmo tomar conhecimento deles, complicar consideravelmente a vida quotidiana dos reclusos (por exemplo, no que diz respeito a tratamento médico), conduzindo assim, devido ao afastamento da família ou dos amigos, a um maior isolamento social dos reclusos estrangeiros e também, com frequência, à sua exclusão dos programas de reabilitação e de reinserção comunitária dentro e fora do estabelecimento prisional.

    Em geral, o reconhecimento de uma pena e a sua execução no Estado de residência habitual não é apenas do interesse do condenado, mas também do Estado de julgamento e do Estado de execução. Relativamente ao Estado de julgamento, a execução das penas impostas a estrangeiros implica custos suplementares consideráveis (para ultrapassar os problemas mencionados) que pode evitar com a transferência da execução. Finalmente, a reintegração do condenado na sociedade do Estado de execução - que é o Estado-Membro de residência habitual do condenado - vai ao encontro dos interesses deste último Estado.

    A eventual regulamentação ao nível da União Europeia, com o objectivo do reconhecimento mútuo, pelos Estados-Membros, das sanções privativas de liberdade, incluindo as que determinem a suspensão ou a libertação condicional, bem como as penas alternativas, deveria abordar os aspectos seguintes:

    4.2.1. Âmbito de aplicação de uma regulamentação exequível ao nível da União Europeia

    4.2.1.1. Âmbito de aplicação pessoal

    Antes de mais, cabe definir o âmbito de aplicação pessoal de uma regulamentação possível, em especial no que respeita ao reconhecimento de uma sentença penal cuja execução tenha já começado (transferência de execução): a que tipo de condenado deverá aplicar-se a regulamentação? A experiência adquirida no âmbito da Convenção do Conselho da Europa relativa à transferência das pessoas condenadas, de 21 de Março de 1983, permite constatar que a limitação da possibilidade de transferência apenas aos nacionais do Estado da execução implicaria uma discriminação das pessoas que residem habitualmente no território deste Estado. Por este motivo, será necessário confirmar a solução encontrada no Acordo relativo à aplicação, entre os Estados-Membros das Comunidades Europeias, da Convenção do Conselho da Europa relativa à transferência das pessoas condenadas, de 25 de Maio de 1987, ou seja, que os Estados-Membros equiparem aos seus próprios nacionais os nacionais de outros Estados-Membros, tendo em consideração a sua residência habitual e regular no território do referido Estado.

    Tal como indicado na Comunicação da Comissão, de 26 de Julho de 2000, apresentada ao Conselho e ao Parlamento sobre o reconhecimento mútuo de decisões finais em matéria penal [128], as regras de direito penal relativas ao tratamento dispensado aos menores e às pessoas com deficiência mental variam consideravelmente entre os Estados-Membros. Tendo em consideração esta situação, e na ausência de uma análise aprofundada da situação existente em todos dos Estados-Membros, talvez seja preferível, pelo menos por enquanto, excluir as decisões relativas a estas pessoas do âmbito de aplicação de uma eventual regulamentação sobre o reconhecimento mútuo.

    [128] COM(2000)495 final.

    Pergunta 18: Qual deveria ser o círculo de pessoas condenadas susceptíveis de beneficiarem da possibilidade de a execução se processar noutro Estado-Membro? Os nacionais do Estado de execução, as pessoas que nele habitualmente residem, os condenados que se encontrem no território do Estado de execução, onde cumprem ou deverão cumprir uma pena privativa de liberdade? Existem condições específicas a ter em consideração para que os menores e as pessoas com deficiência mental possam igualmente beneficiar de tais disposições?

    4.2.1.2. Âmbito de aplicação material

    Seria ainda interessante saber quais as decisões que deverão ser objecto de reconhecimento mútuo entre os Estados-Membros. A Comissão entende que a criação de um verdadeiro espaço de liberdade, de segurança e de justiça exige o reconhecimento de todas as sanções penais, incluindo as penas alternativas e as medidas e acordos decorrentes de processos de mediação penal e de transacções em processo penal. No que respeita às penas alternativas, parece inaceitável que apenas os residentes possam delas beneficiar na prática, mas não os residentes noutro Estado-Membro.

    No que respeita às penas de prisão suspensa (combinadas com medidas de vigilância e de reeducação), existe claramente - ver pontos 3.2.2.1 e 3.2.2.2 - a necessidade de incluir também estas penas num regime de reconhecimento, por forma a evitar que as pessoas que cometam delitos num Estado-Membro que não seja o da sua residência habitual sejam discriminadas com sanções mais severas do que se os tivessem cometido no Estado-Membro da sua residência habitual, uma vez que não lhes será concedida suspensão da pena de prisão.

    Quando as medidas e acordos decorrentes de processos de mediação penal e de transacções em processo penal obriguem o autor da infracção a reparar o dano ou a pagar à vítima uma indemnização, tornam-se fonte de créditos civis, o que implica que, no que respeita ao respectivo reconhecimento nos outros Estados-Membros, se apliquem as reflexões suscitadas no Livro Verde de 19 de Abril de 2002 sobre os modos alternativos de resolução dos litígios em matéria civil e comercial [129]. A questão principal, neste contexto, consiste em determinar se os acordos resultantes de processos de mediação penal e de transacções em processo penal possuem um carácter executório e se se justifica prever regulamentação da União Europeia neste âmbito.

    [129] COM(2002)196 final, ponto 3.2.2.3.

    No que respeita ao reconhecimento mútuo de decisões de interdição de direitos e por forma a preparar a aplicação das medidas n.os 20 e 22 do Programa de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo das decisões penais (ver ponto 2.2.4.), a Comissão vai apresentar, no segundo trimestre de 2004, uma comunicação não legislativa prevista no Programa legislativo e de trabalho da Comissão [130] que identificará uma eventual necessidade de actuação nesta matéria e apresentará sugestões, se for caso disso, de soluções ao nível da União Europeia. Esta reflexão deverá contemplar o que a Comissão constatara já na sua Comunicação de 26 de Julho de 2000 sobre o reconhecimento mútuo de decisões finais em matéria penal [131], ou seja, que os efeitos de uma tal decisão de interdição de direitos seriam em grande parte neutralizados, caso a pessoa que dela seja objecto - que não pode, consequentemente, exercer funções ou uma profissão no Estado onde é proferida a sentença - possa subtrair-se a tal sanção atravessando simplesmente a fronteira para exercer as funções ou a profissão interdita nos Estados-Membros vizinhos. No que respeita ao reconhecimento de sanções pecuniárias e de decisões de apreensão e perda, estão actualmente em discussão no Conselho projectos de decisão-quadro (ver pontos 2.2.2. e 2.2.3.).

    [130] COM(2002) 645 final, referência 2003/ JAI/142.

    [131] COM(2000)495 final.

    Pergunta 19: Será necessário reforçar a eficácia dos acordos resultantes de processos de mediação penal e de transacções em processo penal nos Estados-Membros? Qual será a melhor solução para o problema do reconhecimento e da execução deste tipo de acordo noutro Estado-Membro da União Europeia? Deverão ser adoptadas, por exemplo, regras específicas que confiram carácter executório a estes acordos? Em caso afirmativo, sob reserva de que tipo de garantias?

    4.2.2. Condições para o reconhecimento

    4.2.2.1. Direito de iniciativa para lançar o processo de reconhecimento

    Contrariamente ao previsto nas Convenções do Conselho da Europa de 30 de Novembro de 1964 [132], de 28 de Maio de 1970 [133] e de 21 de Março de 1983 [134], a Convenção entre os Estados-Membros das Comunidades Europeias, de 13 de Novembro de 1991 [135], estipula que ambos os Estados envolvidos, ou seja, quer o Estado do julgamento quer o da execução, podem solicitar a execução da sentença no outro Estado-Membro. Esta última solução parece ser preferível, não apenas por motivos de flexibilidade prática, mas também porque o Estado da execução tem ou deveria ter um certo interesse em que se concretize no seu território a execução de uma sentença que diga respeito a um dos seus nacionais ou a uma pessoa que habitualmente nele resida.

    [132] Convenção do Conselho da Europa para a Vigilância de Pessoas Condenadas ou Libertadas Condicionalmente, de 30 de Novembro de 1964.

    [133] Convenção Europeia sobre o Valor Internacional das Sentenças Penais, de 28 de Maio de 1970.

    [134] Convenção relativa à Transferência das Pessoas Condenadas, de 21 de Março de 1983.

    [135] Convenção entre os Estados-Membros das Comunidades Europeias relativa à Execução de Condenações Penais Estrangeiras, de 13 de Novembro de 1991.

    Pergunta 20: A transmissão da execução deverá poder ser solicitada apenas pelo Estado da decisão condenatória ou também pelo Estado da execução?

    4.2.2.2. Motivos de recusa

    No que respeita a uma eventual recusa de reconhecimento pelo Estado da execução de uma decisão relativa a uma sanção penal, convém saber quais os motivos que poderão legitimamente ser evocados. De qualquer forma, tendo em consideração o objectivo de livre circulação das decisões em matéria penal, os motivos de recusa deveriam ser muito limitados. A título de exemplo, a Decisão-quadro do Conselho, de 13 de Junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados-Membros [136] enuncia motivos ditos «de não execução», obrigatórios e facultativos. Seria conveniente suscitar a questão quanto à aplicabilidade mutatis mutandis de todos estes motivos no contexto do reconhecimento de sanções penais e, em especial, de sanções alternativas, tendo em consideração que o reconhecimento e a execução funcionam prioritariamente em benefício da pessoa em questão, ou se o estatuto de alguns deles não deveria ser adaptado ou ainda se será pertinente acrescentar outros e, em caso afirmativo, quais e por que motivos.

    [136] JO L 190 de 18.7.2003, p. 1

    O primeiro motivo para a não execução obrigatória diz respeito ao caso em que a infracção que está na origem do mandado de detenção é abrangida por uma amnistia no Estado-Membro de execução, quando este era competente para a respectiva acção penal nos termos da sua própria legislação penal (n° 1 do artigo 3° da Decisão-quadro de 13 de Junho de 2002).

    O segundo motivo para a não execução obrigatória diz respeito à situação em que o Estado-Membro de execução constate que a pessoa procurada foi definitivamente julgada pelos mesmos factos por outro Estado-Membro, na condição de, em caso de condenação, a pena ter sido cumprida ou estar actualmente a ser cumprida ou já não possa ser cumprida segundo as leis do Estado-Membro de condenação (n° 2 do artigo 3° da Decisão-quadro, princípio "ne bis in idem").

    No acórdão de 11 de Fevereiro de 2003 [137] (processos apensos "Gözütok" e "Brügge"), o Tribunal de Justiça confirmou que o princípio "ne bis in idem", consagrado no artigo 54° da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen, assinado em 19 de Junho de 1990, se aplica também a processos de extinção da acção pública, tais como o caso vertente, segundo os quais o Ministério Público de um Estado-Membro arquiva definitivamente processos penais, sem a intervenção de um órgão jurisdicional, depois de o arguido ter satisfeito determinadas condições, nomeadamente, ter liquidado um determinado montante fixado pelo Ministério Público ("transacções em processo penal").

    [137] CJTJ, Acórdão de 11 de Fevereiro de 2003, Gözütok e Brûgge, processos apensos 187/01 e 385/01,

    Col. 2003, p. I-1345.

    Esta situação é igualmente abordada no n° 3 do artigo 4° da decisão-quadro supramencionada: a autoridade judiciária de execução pode recusar a execução do mandado de detenção europeu se as autoridades judiciárias do Estado-Membro de execução tiverem decidido não instaurar procedimento criminal ou pôr termo ao procedimento instaurado pela infracção que determina o mandado de detenção europeu. Esta situação constitui um motivo de não execução facultativo, que deverá, no entanto, tornar-se obrigatório na sequência do acórdão acima evocado.

    Embora o Tribunal de Justiça tenha clarificado que o princípio "ne bis in idem" se aplica também às transacções em processo penal, continua por determinar se os processos de mediação penal, que se distinguem dos primeiros por permitirem uma participação activa da vítima na solução negociada, não deveriam beneficiar igualmente do efeito "ne bis in idem", e se seria conveniente prever legislação neste âmbito a nível europeu.

    Recorda-se que o princípio "ne bis in idem" é actualmente objecto de uma iniciativa da República Helénica tendo em vista a adopção de uma decisão-quadro do Conselho relativa à aplicação do princípio "ne bis in idem" [138], em discussão no Conselho. Esta iniciativa prevê, nomeadamente, disposições relativas à litispendência de acções penais (alínea d) do artigo 1° e artigo 3°) e aos critérios de selecção do Estado-Membro competente.De acordo com o terceiro motivo de não execução obrigatória previsto na Decisão-quadro do Conselho de 13 de Junho de 2002 (n° 3 do artigo 3°), a autoridade judiciária do Estado-Membro de execução recusa a execução se, nos termos do direito do Estado-Membro de execução, a pessoa sobre a qual recai o mandado de detenção europeu não puder, devido à sua idade, ser responsabilizada pelos factos que fundamentam o referido mandado.

    [138] JO C 100 de 26.4.2003, p. 24.

    Estes motivos de não execução obrigatória deverão aplicar-se, no contexto do reconhecimento das sanções penais, independentemente de se saber se a infracção integra ou não o âmbito de aplicação do mandado de detenção europeu.

    Todos os outros motivos de não execução enunciados no artigo 4° da Decisão-quadro de 13 de Junho de 2002 são facultativos, designadamente:

    - a ausência de dupla incriminação nos casos não mencionados na lista do artigo 2°;

    - quando o suspeito seja objecto de procedimento penal no Estado-Membro de execução pelo mesmo facto;

    - em caso de prescrição da acção penal ou da pena, de acordo com a legislação do Estado-Membro de execução;

    - quando a pessoa procurada tenha sido julgada pelos mesmos factos num país terceiro;

    - se o mandado de detenção europeu tiver sido emitido para efeitos de cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas de liberdade, quando a pessoa procurada se encontrar no Estado-Membro de execução, for sua nacional ou sua residente e este Estado se comprometa a executar essa pena ou medida de segurança nos termos do seu direito nacional;

    - no caso de o Estado-Membro de julgamento fazer uso da sua competência extraterritorial (em determinadas condições).

    O motivo constante do segundo travessão da lista supramencionada ("procedimento penal no Estado-Membro de execução pelo mesmo facto") será objecto de um futuro instrumento em matéria de litispendência. O motivo constante do quinto travessão não é pertinente no presente contexto. Considerando o objectivo principal que consiste em facilitar a reinserção e o seu corolário, que consiste em reter unicamente os motivos que contribuem para tal objectivo, talvez apenas os motivos mencionados nos terceiro e quarto travessões (prescrição, ne bis in idem) devam ser considerados.

    Entre outros eventuais motivos poderão considerar-se as circunstâncias seguintes:

    Tal como mencionado na alínea c) do ponto 3.2.1.3, determinados Estados-Membros (por exemplo, o Reino Unido e a França) permitem a aplicação simultânea de sanções pecuniárias e de penas de prisão. Nestes casos, não é raro verificar-se que o Estado de condenação bloqueie qualquer pedido de transferência apresentado pelo condenado até que este tenha pago a multa. Na perspectiva da aprovação de uma decisão-quadro do Conselho relativa à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às sanções pecuniárias [139], impõe-se determinar se o Estado de condenação deverá ter o direito de recusar a transferência da execução até o condenado pagar a multa.

    [139] JO C 278 de 2.10.2001, p. 1.

    Em virtude das diferenças existentes entre os Estados-Membros no que respeita à legislação sobre libertação antecipada (ver Anexo III, ponto 3), pode acontecer que um condenado seja objecto de libertação imediata na sequência da sua transferência para o Estado requerido: uma pessoa condenada a 9 anos de prisão no Estado-Membro A, que, após ter cumprido 4 anos, peça transferência da execução para o Estado-Membro B, poderá ser libertada imediatamente por a libertação antecipada ser possível, de acordo com o direito do Estado-Membro B, após o cumprimento de, por exemplo, um terço (neste caso 3 anos) da pena. Neste contexto, é necessário determinar se o risco de libertação antecipada poderá constituir para o Estado de julgamento A um motivo legítimo de recusa da transferência.

    Para resolver este problema, poderá considerar-se a introdução, ao nível da União Europeia, de um período mínimo durante o qual o condenado continuaria a cumprir a pena no Estado de condenação, por forma a evitar a sua libertação imediata na sequência da transferência para o Estado de execução ou o cumprimento de uma pena muito menos severa do que a imposta pelo Estado de condenação. Qual deverá ser a duração deste período?

    Pergunta 21: Quais os motivos que o Estado de execução poderá legitimamente invocar para recusar o reconhecimento e a execução no seu território de uma sanção penal pronunciada noutro Estado-Membro?

    Pergunta 22: Quando a legislação nacional permita inflingir sanções pecuniárias paralelamente a penas de prisão e tendo em consideração a aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às sanções pecuniárias [140], continua a ser aceitável que o Estado que profere a sentença condenatória possa recusar a transferência da execução até a pessoa condenada ter pago a multa ?

    [140] JO C 278 de 2.10.2001, p. 1.

    Pergunta 23: Em virtude das diferenças existentes entre os Estados-Membros no que respeita à legislação sobre libertação antecipada, pode acontecer que um condenado deva ser imediatamente libertado na sequência da transferência para o Estado requerido. Esta consequência poderá constituir, para os Estados envolvidos, um motivo legítimo de recusa da transferência?

    Pergunta 24: Justificar-se-á a introdução de um período mínimo da pena a cumprir no Estado de condenação, por forma a evitar a libertação imediata na sequência da transferência para o Estado de execução ou uma redução significativa por parte do Estado de execução da pena finalmente executada? Qual deverá ser esse período? Ou será que a introdução de um período mínimo é susceptível de atentar contra a flexibilidade e impedir qualquer solução caso a caso? Seria preferível a fixação de um determinado período compatível com os fins da justiça, tal como proposto pelo Comité de técnicos sobre o funcionamento das convenções europeias no domínio penal do Conselho da Europa (ver alína d) do ponto 3.2.1.5.)?

    4.2.2.3. Poder do Estado de execução para adaptar a sanção (privativa de liberdade ou alternativa) pronunciada pelo Estado de julgamento

    O reconhecimento e a execução de uma pena pronunciada noutro Estado-Membro podem levantar problemas se a natureza ou a duração desta sanção for incompatível com a legislação do Estado de execução. O problema da incompatibilidade da natureza da pena com a legislação do Estado de execução coloca-se, em especial, no contexto das penas alternativas. Nesta situação, as Convenções do Conselho da Europa de 30 de Novembro de 1964 e de 21 de Março de 1983, bem como a Convenção entre os Estados-Membros das Comunidades Europeias de 13 de Novembro de 1991, oferecem ao Estado de execução a escolha [141] entre a adaptação da pena a reconhecer à pena prevista pela sua própria legislação para infracções da mesma natureza (Convenções de 1964, 1983 e 1991) e a possibilidade de substituição da sanção pronunciada no Estado de julgamento por uma sanção prevista pela sua própria legislação para o mesmo facto (Convenções de 1964 e 1970) ou ainda a conversão da sanção pronunciada no Estado de julgamento numa sanção prevista pela sua própria legislação para o mesmo facto (Convenções de 1983 e 1991). Na prática, estas três possibilidades têm resultado idêntico, ou seja, o Estado de execução pode alterar a pena que é chamado a reconhecer, adaptando-a a uma pena prevista na sua legislação para infracções da mesma natureza. No entanto, esta possibilidade não parece ser compatível com o princípio do reconhecimento mútuo. Todas as convenções prevêem que a sanção imposta no Estado de execução não possa agravar a sanção pronunciada no Estado de julgamento; que a sanção imposta no Estado de execução deva corresponder, tanto quanto possível, quer quanto à sua natureza quer à sua duração, à sanção pronunciada no Estado de julgamento e que o Estado de execução não fique vinculado pela pena mínima eventualmente prevista pela sua própria legislação para a ou as infracções cometidas. Neste contexto, coloca-se a questão de saber se será necessário adoptar regras neste âmbito, a nível da União Europeia - e, em caso afirmativo, quais - para orientar os Estados-Membros (Estados de execução) nas suas diligências para encontrar uma sanção equivalente.

    [141] A Convenção de 28 de Maio de 1970 prevê apenas a possibilidade de substituição.

    No que se refere às penas alternativas ou às modalidades de controlo ligadas à suspensão, caso o Estado da execução ignore totalmente as medidas de vigilância prescritas pelo Estado de julgamento, é necessário saber de que forma o Estado de execução pode encontrar uma medida adequada que melhor corresponda, tendo em conta as respectivas funções e objectivos, à prescrita pelo Estado de julgamento. Para evitar que o condenado seja prejudicado por esta transformação, o Instituto Max Planck de Direito Penal Estrangeiro e Internacional, de Friburgo, sugere, no seu estudo sobre o "Reconhecimento de sanções alternativas na União Europeia", de Dezembro de 2001 - estudo encomendado pela Comissão - que o juiz do Estado de execução proceda a uma comparação funcional entre as penas ou medidas (alternativas) do Estado de julgamento e do Estado de execução.

    Esta comparação funcional deverá realizar-se de acordo com um quadro de "categorias funcionais" e um determinado método de análise e de avaliação que progrida sucessivamente de acordo com os três níveis seguintes:

    No primeiro nível ("nível processual"), o mais elevado, é conveniente distinguir entre as sanções alternativas adoptadas "dentro do processo penal" e as adoptadas "fora do processo penal", consideradas como não punitivas, que visam evitar um processo penal. Na última categoria inserem-se as sanções alternativas descritas no ponto "mediação penal". No segundo nível da comparação funcional ("nível funcional"), o Instituto Max Planck sugere a distinção a nível das sanções alternativas adoptadas "dentro do processo penal", entre as categorias "penas formais" e "penas de substituição". No terceiro nível ("nível material"), a comparação incide sobre o conteúdo da pena alternativa: entre as "penas de substituição", há que distinguir entre as penas alternativas adoptadas antes, durante ou após a pronúncia da sentença. A categoria das "penas formais" deve ser subdividida em duas subcategorias: as penas que visam a restrição da liberdade de deslocação (por exemplo, detenção domiciliária, com ou sem vigilância electrónica) e as penas alternativas que, sem implicarem nenhuma restrição da liberdade de deslocação, afectam apenas o estilo de vida do condenado. Esta última categoria inclui todas as formas de condenação suspensa complementada por medidas de vigilância (incluindo, por exemplo, a prestação de trabalho a favor da comunidade), bem como formação e tratamentos e todas as penas acessórias (tais como interdição de exercer determinadas actividades profissionais ou condução de veículos).

    Partindo do quadro de classificação funcional acima descrito e do método sugerido de "comparação funcional", a tarefa das autoridades do Estado de execução consistiria em "transpor" a sanção alternativa pronunciada pelas autoridades do Estado de julgamento para uma sanção alternativa tão equivalente quanto possível, sem alteração das respectivas funções, sentido ou objectivo. Por outras palavras, as autoridades do Estado de execução podem apenas recorrer, quando transpõem sanções alternativas do Estado de julgamento, às sanções alternativas da sua própria legislação que se inserem na mesma "categoria funcional". Só no caso de o Estado de execução não dispor de nenhuma sanção alternativa da mesma "categoria funcional", é que poderá recorrer a uma outra "categoria funcional" pertencente ao mesmo nível. Caso não se disponha de nenhuma sanção alternativa a este nível, poderá recorrer-se a uma sanção alternativa de um nível superior. Quando se procede à escolha da sanção correspondente, será necessário, tanto quanto possível, ter em consideração o objectivo da reinserção do condenado e escolher a pena mais adequada a este fim.

    A abordagem acima sugerida omite, no entanto, os critérios quantitativos que permitem classificar as penas alternativas em função do seu rigor ou severidade. O estabelecimento de uma tal classificação quantitativa - à semelhança das "Sentencing Guidelines" dos Estados Unidos - pressupõe, tal como salientado pelo Instituto Max Planck, a existência de uma certa homogeneidade das sanções alternativas a nível europeu, que não existe actualmente. Na sua ausência, seria conveniente deixar qualquer comparação quantitativa à discricionaridade dos tribunais do Estado de execução.

    Pergunta 25: Quando a natureza ou a duração da pena pronunciada pelo Estado de julgamento seja incompatível com a legislação do Estado de execução, este deverá dispor da possibilidade de adaptar a pena pronunciada pelo Estado de julgamento a uma pena prevista pela lei do Estado de execução relativamente a infracções da mesma natureza ?

    Pergunta 26: Será necessário prever regras de adaptação (ou de conversão ou substituição) ao nível da União Europeia, ou poderá deixar-se toda a latitude à autoridade competente do Estado-Membro de execução?

    Pergunta 27: Poderá considerar-se uma solução a abordagem proposta pelo Instituto Max Planck de Direito Penal Estrangeiro e Internacional, de Friburgo, que consiste em proceder, de acordo com determinado método de análise e avaliação, a uma "comparação funcional" entre as penas ou medidas (alternativas) do Estado de julgamento e do Estado de execução? Quais as lacunas desta abordagem? Como colmatá-las?

    4.2.2.4. Participação do condenado

    O artigo 39° da Convenção do Conselho da Europa de 1970 prevê que o tribunal dê ao condenado a possibilidade de fazer valer o seu ponto de vista antes de tomar uma decisão quanto ao pedido de execução. Neste contexto, interessa saber se não será necessário condicionar a transferência da execução ao pedido ou ao acordo do condenado.

    Pergunta 28: A transferência da execução de uma sentença penal deverá ser subordinada ao pedido, ao acordo ou apenas à consulta do condenado? A resposta a esta pergunta diferirá se o condenado tiver já iniciado o cumprimento da pena numa prisão do Estado de julgamento?

    4.2.2.5. Participação da vítima

    No que respeita à participação da vítima no âmbito de um processo de reconhecimento de sanções penais, incluindo a transferência de reclusos, interessa saber se será adequado prever, ao nível da União Europeia, o fornecimento de informações à vítima (sobre a existência de um pedido de reconhecimento e de transferência, bem como sobre o resultado do processo), a sua consulta ou mesmo o seu acordo, eventualmente como condição para o reconhecimento e a transferência da execução (ver n° 2, alínea d), do artigo 13° da Decisão-quadro do Conselho, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal [142]).

    [142] JO C 82 de 22.3.2001, p. 1.

    Pergunta 29: Como poderão ter-se em consideração os interesses das vítimas no âmbito da transferência da execução da pena? Deverá prever-se o fornecimento de informações à vítima (sobre a existência de um pedido de reconhecimento e de transferência, bem como sobre o resultado do processo), a sua consulta ou mesmo o seu acordo, eventualmente como condição para a transferência da execução?

    4.2.3. Questões processuais e modalidades práticas para a aplicação do reconhecimento de sentenças penais e da transferência de reclusos

    4.2.3.1. Prazos

    A aplicação da Convenção do Conselho da Europa de 21 de Março de 1983 revela-se relativamente burocrática, lenta e rígida [143]. Na maior parte dos casos, a duração do tratamento dos pedidos de transferência (que se situa, em média, entre um ano e um ano e meio) é sensivelmente superior ao prazo implícito de seis meses previsto no nº 1, alínea c), do artigo 3º da referida Convenção. Tal deve-se a vários motivos: simultaneamente ao número elevado de documentos administrativos que os dois Estados implicados têm de trocar; ao facto de determinados Estados ultrapassarem as exigências da Convenção e solicitarem ainda outros documentos; bem como ao facto de os pedidos de transferência, sobretudo quando emanam directamente do detido, não serem tratados com a diligência que se impõe.

    [143] J.C. Froment, Les avatars de la Convenção sur le transfèrement des détenus en Europe, em : «Panorama européen de la prison», Paris, 2002, p. 133.

    A primeira questão que se coloca neste contexto é, pois, saber se é necessário prever, ao nível da União Europeia, um prazo para o tratamento dos pedidos de reconhecimento de sanções penais e, em especial, para o tratamento dos pedidos de transferência de reclusos. No que respeita à transferência de reclusos, esta questão está estreitamente ligada à questão de se saber se seria adequado exigir, ao nível da União Europeia, uma duração mínima de x meses para o restante da pena, abaixo da qual o condenado não poderia solicitar a transferência (sobretudo devido ao prazo de tratamento do dossier). Acresce ainda que os serviços competentes para tratar os pedidos de transferência se deparam com estruturas e processos internos que diferem de um Estado para outro. Por estes motivos, a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa recomendou, a este propósito, ao Comité dos Ministros que fixasse um prazo para a resposta a todos os pedidos de informação. Saliente-se ainda que a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa recomenda a racionalização e harmonização das informações solicitadas pelos Estados, bem como a organização de seminários de formação (sobre os processos de transferência respectivos) para o intercâmbio de informações e o estudo das possibilidades de melhorar as práticas e de as tornar mais transparentes.

    4.2.3.2. Reembolso de despesas efectuadas pelo Estado de execução das sanções

    Uma outra questão que não é abordada nas convenções existentes, mas que é susceptível de se colocar quando ocorra a transferência da execução, é a do reembolso das despesas relacionadas com a detenção. Na Comunicação de 26 de Julho de 2000, ponto 9.1, a Comissão partia do princípio que "o interessado na adopção de uma determinada medida deve também suportar os custos financeiros da mesma. Um Estado-Membro, ao pronunciar uma pena privativa de liberdade, está a aplicar a sua política de direito penal. Por conseguinte, é razoável assumir que essa medida é do seu interesse. Deste modo, a regra geral poderá consistir em que o Estado-Membro que pronuncia a sentença deve suportar os custos inerentes à pena de prisão». Por outro lado, a reintegração do delinquente na sociedade do Estado de execução - que é o seu Estado-Membro de residência habitual - serve igualmente o interesse deste último Estado. Acresce que, a longo prazo, cada Estado de execução se tornará o Estado de julgamento e vice-versa. Por estes motivos e também por razões de simplificação administrativa, não deveria prever-se o reembolso das despesas efectuadas. Esta é igualmente a solução adoptada no artigo 17° da Iniciativa do Reino de Dinamarca tendo em vista a aprovação da decisão-quadro do Conselho relativa à execução das decisões de confisco na União Europeia [144].

    [144] JO C 184 de 2.8.2002, p. 8. Artigo 17°: "Sem prejuízo do disposto no artigo 14°, os Estados-Membros renunciam mutuamente ao reembolso das despesas resultantes da aplicação da presente decisão-quadro".

    Pergunta 30: Será necessário prever, ao nível da União Europeia, um prazo para a decisão sobre o reconhecimento de sanções penais e, em especial, para o tratamento dos pedidos de transferência de reclusos e, em caso afirmativo, qual?

    Pergunta 31: Tendo em consideração a carga administrativa que representa o tratamento de um pedido de transferência de reclusos, será conveniente prever, ao nível da União Europeia, que sejam considerados para transferência apenas os reclusos condenados a penas de prisão de determinada duração mínima ou que devam ainda cumprir uma pena de determinada duração mínima? Em caso afirmativo, qual a duração adequada?

    Pergunta 32: Será necessário prever, ao nível da União Europeia, um prazo de resposta a todos os pedidos de informação necessária no âmbito do reconhecimento de sanções penais e, em especial, da transferência de reclusos?

    Pergunta 33: Tendo em conta a complexidade das estruturas judiciárias e administrativas dos Estados-Membros e as diferenças existente entre elas, que tipo de estruturas, simples e efectivas, será necessário prever para a aplicação do reconhecimento mútuo de sanções penais e da transferência de reclusos?

    Pergunta 34: Será necessário prever um formulário uniforme ao nível da União Europeia para facilitar a concretização do reconhecimento de sanções penais e da transferência de reclusos?

    Pergunta 35: O Estado de execução deverá poder solicitar o reembolso das despesas efectuadas por motivo de execução de penas por ele reconhecidas?

    Pergunta 36: Será necessário criar uma rede de pontos de contacto por forma a facilitar - ou mesmo contribuir para a avaliação - a aplicação prática de um eventual instrumento legislativo da União Europeia sobre o reconhecimento mútuo de sanções penais e a transferência de reclusos?

    4.2.4. Repartição de competências entre o Estado de julgamento e o Estado de execução

    As convenções supramencionadas do Conselho da Europa, bem como diversos actos da União Europeia em matéria de reconhecimento [145], prevêem em geral que a execução se reja pela lei do Estado requerido (Estado de execução). Neste contexto, o ponto 9.1. da Comunicação de 26 de Julho de 2000 sobre o reconhecimento mútuo das decisões finais em matéria penal, acima mencionada, refere que "a confiança mútua devia intervir nos dois sentidos: enquanto o Estado-Membro que executa a sentença confia em que o outro Estado-Membro pronunciou uma decisão correcta, este último deverá também confiar no Estado-Membro de execução no que se refere à forma como a sentença é executada. Deste modo, afigura-se que as decisões relevantes para a execução, baseadas no comportamento do recluso, serão da competência do Estado-Membro de execução. Questões de ordem prática favorecem também esta solução: são as autoridades do Estado-Membro de execução que contactam directamente com o recluso, estando por conseguinte na melhor situação para formar uma opinião sobre o seu comportamento". Tal justificar-se-á duplamente quando estiverem criados os mecanismos que permitam que a pessoa condenada cumpra a pena no seu Estado de residência.

    [145] Por exemplo, o n° 2 do artigo 6° da Decisão-Quadro do Conselho, de 13 de Junho de 2002

    (mandado de detenção europeu).

    Tendo em consideração a probabilidade de o condenado querer viver, após a sua libertação, no Estado da sua residência habitual, que é o Estado de execução, deve estar preparado para ser integrado na sociedade deste Estado. Esta é mais uma razão para deixar este aspecto à competência do Estado de execução. No entanto, não é de excluir a possibilidade de consulta das autoridades do Estado-Membro de julgamento, ou pelo menos a sua informação, antes da tomada de uma medida importante, como seja a libertação antecipada. Uma outra possibilidade consistirá em que caiba ao Estado-Membro que toma a decisão impor os limites ou as condições no momento da transferência (por exemplo, para proteger ou informar a vítima).

    Finalmente, no que respeita às sanções privativas de liberdade, pronunciadas mediante condição ou cuja execução foi suspensa condicionalmente, bem como às sanções alternativas, importa saber qual o Estado (o Estado de julgamento ou o Estado de execução) que será competente para pronunciar a sua revogação caso o condenado não satisfaça as condições que lhe foram impostas.

    De acordo com a Convenção de 1970, apenas o Estado requerente tem o direito de decidir sobre os recursos de revisão introduzidos contra uma sentença condenatória, embora cada um dos Estados possa exercer o direito de amnistia ou de indulto.

    Pergunta 37: Em caso de reconhecimento de uma sanção privativa de liberdade ou de uma sanção alternativa, haverá motivos para um afastamento da regra que determina que a execução deva ser regida inteiramente pela legislação do Estado de execução?

    Pergunta 38: No caso de a vigilância das condições de suspensão depender do Estado de execução, será necessário prever, relativamente ao Estado de julgamento, a possibilidade de garantir que o condenado respeite as condições da suspensão? Qual o mecanismo a prever neste âmbito?

    Pergunta 39: Qual dos dois Estados (Estado de julgamento ou Estado de execução) deverá poder exercer o direito de amnistia ou de indulto?

    ANEXO I

    Inventário e análise comparada da legislação dos Estados-Membros em matéria de modalidades de execução das sanções privativas de liberdade impostas no âmbito da sentença

    1. Suspensão da execução da pena

    Tradicionalmente, a suspensão da execução da pena é considerada como um meio preventivo da reincidência. A experiência revela, sobretudo no que diz respeito às penas privativas de liberdade de curta duração, que a reclusão pode ter um efeito mais pernicioso do que benéfico. Com a suspensão da execução da pena, o delinquente é encorajado a ter uma boa conduta sob o risco de revogação da suspensão, que conduz à execução da pena.

    Consciente das importantes diferenças entre os sistemas penais dos Estados-Membros relativamente às regras e condições de suspensão da pena, propõe-se a sua definição como uma dispensa provisória da execução da pena. Assim, graças à suspensão da execução, os efeitos da pena podem ser suspensos.

    No que se refere às condições de aplicação, de um modo geral, os autores de infracções graves não podem beneficiar destas medidas. Todavia, os limiares das sentenças condenatórias para a concessão de uma suspensão da execução da pena diferem de um sistema para outro, podendo ir, de um modo geral, de uma pena privativa de liberdade inferior ou igual a 1 ano na Alemanha [146] ou nos Países Baixos, dois anos na Grécia, no Reino Unido ou na Espanha e cinco anos na Bélgica ou na França. De um modo geral, existe uma margem de apreciação do tribunal que decide da oportunidade da medida. Em alguns Estados-Membros (Itália e Bélgica, por exemplo) a administração encarrega-se do controlo da medida.

    [146] Em casos excepcionais, mesmo uma pena de prisão até dois anos pode ser suspensa, n° 2 do artigo 56° do Código Penal alemão.

    Por outro lado, pode ser pronunciado um regime de prova, durante o qual a sanção é adiada. Durante este período, o condenado deve, de uma forma geral, submeter-se às diversas medidas de vigilância e/ou de assistência. Estas obrigações podem ser diversas: reparar o dano causado à vítima, não frequentar a companhia de certas pessoas ou certos lugares, submeter-se a medidas de controlo, de tratamento ou de cuidados, seguir uma formação ou prestar trabalho a favor da comunidade.

    O período de regime de prova pode ir, em geral, de 1 a 5 anos para as infracções mais graves e de 6 meses a 3 anos para as menos graves. Pode igualmente ser pronunciada a suspensão da execução da pena relativamente a penas de multa, dias-multa ou penas alternativas, por exemplo na França ou nos Países Baixos.

    No que se refere aos efeitos durante o período de regime de prova, se a conduta do condenado for boa, no termo do prazo do regime de prova, a condenação é considerada extinta. Em contrapartida, se o condenado não respeitou as condições impostas ou se cometeu uma infracção, verifica-se normalmente uma revogação do regime de prova [147].

    [147] Segundo o direito britânico [n° 1 do artigo 119° do Powers of Criminal Courts (Sentencing) Act], apenas as sentenças condenatórias a penas de prisão ocorridas durante o período do regime de prova podem dar origem a revogação.

    As diferenças entre as legislações dos Estados-Membros têm como consequência, na prática, que certos tribunais coloquem reservas à pronúncia da suspensão de execução da pena relativamente a pessoas que tenham a sua residência habitual num Estado-Membro diferente daquele onde é pronunciada a condenação. Um certo grau de aproximação das condições de concessão e das regras de acompanhamento da suspensão de execução da pena facilitariam indubitavelmente as condições de reconhecimento e de execução destas medidas entre os Estados-Membros [148].

    [148] Ver ponto 3.2.2.

    2. Suspensão e adiamento da pronúncia da pena

    Numa minoria de Estados-Membros, por exemplo na Bélgica e na França, existe a possibilidade de adiar a pronúncia da pena para uma audiência posterior e de colocar o arguido, durante esse período, sob o regime de prova.

    Na Bélgica, a Lei de 29 de Junho de 1964 relativa à suspensão, à suspensão da execução da pena e ao regime de prova permite ordenar, com o consentimento do interessado, a suspensão da pronúncia da pena a favor do arguido que não tenha sido anteriormente objecto de condenação a uma pena criminal ou a prisão correccional principal com duração superior a seis meses, sempre que o facto não pareça susceptível de originar, como pena principal, prisão correccional superior a cinco anos ou uma pena mais grave, e que a prevenção seja declarada estabelecida (artigo 3° da lei supramencionada). A suspensão pode ser sempre ordenada oficiosamente, requerida pelo Ministério Público ou solicitada pelo réu. As decisões que ordenam a suspensão determinam a respectiva duração, que não pode ser inferior a um ano nem superior a cinco anos a contar da data da decisão, bem como, se for caso disso, as condições de prova impostas [149]. Estas decisões põem termo à acção penal, se não forem revogadas. A suspensão pode ser revogada se for cometida nova infracção durante o regime de prova com condenação a pena criminal ou a prisão principal de pelo menos um mês (artigo 13° da lei supramencionada).

    [149] Neste caso, fala-se de "suspensão com regime de prova".

    Na França, nos termos do artigo 132º-60 do Código Penal, o tribunal pode adiar a pronúncia da pena sempre que se verifique estar iminente a revisão da situação do culpado, que o dano causado esteja em vias de ser reparado e que a anomalia resultante da infracção esteja a cessar. Nesse caso, o tribunal fixa na decisão a data em que se procederá à deliberação sobre a pena. O adiamento só pode ser ordenado se o arguido ou o representante da pessoa colectiva arguida estiver presente na audiência.

    O tribunal pode ordenar a colocação do arguido em regime de prova ("ajournement avec mise à l'épreuve", artigo 132º-63 do Código Penal). O regime de prova é idêntico ao organizado para a suspensão da execução da pena com regime de prova. A legislação francesa oferece mesmo a possibilidade de ordenar expressamente à pessoa declarada culpada que respeite uma ou várias das prescrições previstas pelas leis ou regulamentos (artigo 132º-66 do Código Penal).

    A decisão sobre a pena é tomada, o mais tardar, um ano após a primeira decisão de adiamento (artigo 132º-62 do Código Penal). Na audiência de adiamento, o tribunal pode dispensar o arguido de qualquer pena (embora registando a sua culpabilidade) [150], pronunciar a pena prevista pela lei ou ainda adiar de novo a pronúncia da pena (artigo 132º-61 do Código Penal).

    [150] Artigos 132º-58 e 132º-59 do Código Penal. A decisão constará, salvo dispensa, do registo criminal.

    3. Regime de semidetenção

    A semidetenção permite ao condenado sair do estabelecimento prisional em que cumpre a pena para exercer uma actividade profissional, realizar estudos ou seguir uma formação profissional, um estágio, ou ocupar um emprego temporário com vista à sua inserção social, ou ainda assegurar a participação essencial na sua vida familiar ou seguir um tratamento médico, sem estar normalmente sob vigilância constante da administração prisional.

    O regime de semidetenção visa atenuar um dos principais inconvenientes reconhecidos da prisão, isto é, a dessocialização do delinquente. Relativamente à suspensão da execução da pena com regime de prova, a semidetenção parece conciliar melhor a exigência da ressocialização com a da protecção da colectividade.

    Entre os poucos Estados-Membros que reconhecem esta medida, a semidetenção é sobretudo utilizada na fase da execução da pena [151] como uma etapa intermediária entre a vida prisional e o regresso à vida em liberdade [152]. Esta medida só pode ser decidida ab initio pelo órgão jurisdicional que pronuncia a sentença condenatória numa minoria de Estados-Membros [153].

    [151] É o caso, por exemplo, da Alemanha ( 11 StVollzG), da Bélgica (em que é chamada "semi-détention"), da Espanha, da Finlândia (Lei sobre a execução das sanções penais de 19.12.1889/39ª, capítulo 3 , artigo 8º, e capítulo 4, artigos 4º e 5º) da França (artigo 132º-25 do Código Penal) e da Itália

    (artigo 50° da Lei n° 354 de 26/7/1975).

    [152] Na França, é mesmo condição prévia para a liberdade condicional, artigo 723º-1 do CPP.

    [153] Na França (artigo 132º-25 do CPP), na Itália (artigo 50° da Lei n° 354 de 26/7/1975) e em Portugal (artigo 46° do CP).

    Podem beneficiar desta medida ab initio as pessoas condenadas a penas de prisão curtas (três meses em Portugal [154] e um ano na França). Em Portugal, o regime de semidetenção só pode ser concedido se a pena de prisão não puder ser substituída por multa, por outra pena não privativa da liberdade, nem cumprida em dias livres. O regime de semidetenção requer, por vezes, o consentimento do condenado (na Alemanha, em Portugal). Enquanto modo de execução das penas, a Itália concede esta medida se o delinquente tiver sido condenado a uma pena que não exceda seis meses ou, tratando-se de penas de prisão mais graves, se o condenado tiver cumprido metade da pena. Na França, só pode ser concedida no final da pena se o tempo de detenção restante for inferior ou igual a um ano.

    [154] Artigo 46° do Código Penal português.

    Para beneficiar do regime de semidetenção, este deve ser acompanhado de diversas obrigações a respeitar. O condenado é obrigado a regressar ao estabelecimento prisional segundo as modalidades determinadas pela autoridade competente, em função do tempo necessário para prosseguir a sua actividade profissional, estudos, formação profissional, estágio, participação na vida familiar ou tratamento por força do qual foi admitido ao regime de semidetenção. Normalmente, é obrigado a permanecer no estabelecimento prisional nos dias em que, independentemente do motivo, não tenha obrigações no exterior.

    Os condenados em regime de semidetenção estão submetidos ao conjunto das regras disciplinares. Este regime pode ser revogado se o delinquente não respeitar as suas obrigações, se der provas de má conduta ou sempre que as condições que estiveram na origem da concessão da medida deixem de estar preenchidas. Nesse caso, o condenado deverá cumprir o resto da pena na prisão. Em certos Estados-Membros, o facto de se eximir ao controlo a que está sujeito no âmbito desta medida ou de regressar demasiado tarde ao estabelecimento prisional dá origem a condenação por evasão (França).

    4. Fraccionamento da execução da pena ("prisão por dias livres")

    O fraccionamento da execução da pena pode ser definido como a possibilidade de ordenar uma ou várias interrupções da execução da pena. A duração da pena mantém-se inalterada, mas é cumprida de forma variável. Trata-se de uma modalidade de execução aplicada principalmente às penas privativas de liberdade de curta duração, que existe apenas numa minoria de Estados-Membros, nomeadamente na Bélgica [155], Espanha [156], França [157], Grécia [158] e Portugal [159]. Distingue-se da possibilidade que a administração prisional detém de conceder uma interrupção da execução da pena por doença grave [160].

    [155] Na Bélgica, esta medida - chamada "arrêt de fin de semaine" - desempenha apenas um papel muito marginal.

    [156] "Arresto de fin de semana", artigo 37° do CP.

    [157] Artigo 132º-27 CP.

    [158] Artigo 63° do Código de Processo Penal.

    [159] Prisão por dias livres, artigo 45° do CP.

    [160] Cf., por exemplo, 46 do Regulamento alemão sobre a execução das penas (StVollstrO).

    Na França, a medida de fraccionamento pode ser pronunciada aquando da decisão ou durante a fase de execução da pena. Caracteriza-se por um prolongamento do prazo de execução da pena (três anos no máximo). O fraccionamento pode ser decidido por motivo grave de ordem médica, familiar, profissional ou social, em caso de pena de prisão com duração igual ou superior a um ano. As fracções não podem ser inferiores a dois dias.

    O condenado é libertado na data prevista sem qualquer medida de acompanhamento ou de vigilância, como se estivesse no final da pena. Durante o fraccionamento, as pessoas condenadas que são objecto de acompanhamento sociojudiciário continuam a respeitar as suas obrigações [161], cujo cumprimento é verificado em primeiro lugar pela administração prisional.

    [161] Artigo 763º-7 CPP.

    O reencarceramento efectua-se no estabelecimento prisional onde se efectua a saída, nos dias e horas acordados. O desrespeito da obrigação de regressar ao estabelecimento prisional é sancionado a título de evasão [162] pela autoridade judiciária, mas também pela administração prisional.

    [162] Artigo 434º-29, 3° CP.

    O tribunal de aplicação das penas é competente para conceder, adiar, recusar, retirar ou revogar a suspensão ou o fraccionamento da pena de prisão. O tribunal pode agir oficiosamente, a pedido do condenado ou a requerimento do Procurador da República. A decisão (susceptível de recurso) é tomada após parecer do representante da administração prisional, na sequência de debate contraditório na Câmara do Conselho onde são ouvidas as alegações do Procurador e as observações do condenado ou do seu advogado.

    Na Espanha, a prisão por dias livres, pronunciada aquando da decisão, tem uma duração de 36 horas e equivale a dois dias de privação de liberdade. Em princípio, podem ser impostos, no máximo, 24 períodos de prisão por dias livres, excepto nos casos em que esta medida seja uma medida de substituição de outra pena privativa de liberdade. A execução da prisão por dias livres tem lugar, em princípio, às sextas-feiras, sábados e domingos, no estabelecimento prisional mais próximo do domicílio do condenado.

    No entanto, o juiz ou o tribunal que pronunciou a sentença pode ordenar que se proceda à execução durante os outros dias da semana ou noutros locais. Se o condenado cometer duas ausências injustificadas, o tribunal de vigilância pode ordenar a prisão de forma ininterrupta.

    Todavia, a Espanha está a debater um projecto de lei cujo objectivo consiste em suprimir a prisão por dias livres devido à sua ineficácia, após sete anos de experiências (negativas) com esta pena. Nos termos deste projecto de lei, a prisão por dias livres será substituída, em função da natureza e da gravidade do delito, por pena de prisão, multa, trabalho a favor da comunidade ou um sistema electrónico de controlo.

    Em Portugal, as penas de prisão até três meses que não devam ser substituídas por multa ou por outra pena não privativa de liberdade são cumpridas em dias livres, se tal se afigurar adequado e suficiente para efeitos da punição. Cada período tem a duração mínima de trinta e seis horas e máxima de quarenta e oito horas, o que equivale a 5 dias de privação de liberdade contínua. Podem ser impostos, no máximo, 18 períodos de prisão por dias livres. No caso de um fim de semana ser imediatamente precedido ou seguido de dias feriados, estes dias podem igualmente ser utilizados para a execução desta pena.

    5. Vigilância electrónica

    A colocação sob vigilância electrónica consiste em submeter um condenado ou um arguido ao porte de um emissor (na maior parte dos casos, uma "pulseira electrónica") que permita detectar à distância a sua presença ou a sua ausência num determinado local (frequentemente o seu domicílio) designado pela autoridade competente durante um período determinado. Este sistema implica, para o condenado, a proibição de se ausentar do local designado pela autoridade competente, fora dos períodos fixados por esta.

    A vigilância electrónica é uma medida relativamente recente praticada por seis Estados-Membros (Bélgica, Espanha, França, Itália, Suécia e Reino Unido). No Land alemão de Hesse, nos Países Baixos, na Finlândia e em Portugal, é aplicada a título experimental. A sua introdução a nível nacional está actualmente a ser discutida na Alemanha e na Dinamarca.

    Para o legislador, o motivo principal para a introdução desta medida consiste em diversificar os modos de execução das penas, de modo a reduzir a população prisional e a limitar os prejuízos ligados ao cumprimento de uma pena de prisão (estigmatização social, perda de emprego e dificuldades financeiras correlativas para a família, défice de presença e de autoridade parental, etc.), favorecer a (re)inserção dos delinquente mediante um enquadramento estrito e reduzir, deste modo, o risco de reincidência, diminuir as tensões geradas pela sobrepopulação prisional e efectuar economias nos custos prisionais [163].

    [163] Na França, por exemplo, um dia de prisão custa cerca de 60 euros, contra 20 a 30 euros por um lugar em semidetenção ou 22 euros pela colocação sob vigilância electrónica (Le Monde de 29.4.2003).

    Esta medida pode desempenhar várias funções consoante o estado processual em que ocorra: pode ser pronunciada a título de pena principal (Itália, Suécia [164]). A vigilância electrónica pode igualmente substituir a detenção provisória no que diz respeito a pessoas sob investigação (França, Itália, Portugal) [165]. Está igualmente prevista a título de regime de prova para a liberdade condicional (Bélgica, França [166], Países Baixos, Suécia), durante o regime aberto (Espanha) ou para a prisão por dias livres (Espanha). Na Suécia, está em curso desde 1 de Outubro de 2001 um projecto-piloto de três anos que prevê esta medida na fase final (últimos 3 meses) da execução de penas de prisão com o mínimo de dois anos.

    [164] Para substituir penas de prisão de curta duração (até três meses).

    [165] Expressamente excluído na legislação sueca.

    [166] Na França, por um período não superior a um ano.

    Podem beneficiar desta medida as pessoas condenadas a uma pena inferior ou igual a um certo limiar (França: um ano ou mais para os condenados a quem só falte cumprir menos de um ano; Itália: 4 anos; Suécia: 3 meses). Na Bélgica, os beneficiários destas medidas são os condenados a penas que não excedam três anos, contados a partir do início da sua detenção, e os condenados a penas mais graves, a partir do momento em que sejam elegíveis ou propostos para liberdade condicional.

    Certas categorias de condenados estão excluídas desta medida: por exemplo, na Bélgica, as pessoas condenadas por infracções de carácter sexual, tráfico de seres humanos ou tráfico de estupefacientes.

    A medida pressupõe, em todos os Estados-Membros, o consentimento expresso do condenado, por vezes dado na presença do advogado (França). Em alguns Estados-Membros, as pessoas que vivem com o condenado devem igualmente dar o seu consentimento (Bélgica).

    Em vários Estados-Membros, estão previstos prazos mínimos (Bélgica: um mês) e máximos para a aplicação desta medida (Bélgica: 3 meses; Reino Unido: 6 meses [167]; Escócia: 12 meses [168]).

    [167] "Curfew order", cuja execução é parcialmente confiada a empresas privadas.

    [168] "Restriction of liberty orders".

    A consulta de um médico - a pedido do condenado - está prevista em vários Estados-Membros (França), por forma a verificar que o procedimento não é nocivo para a saúde do condenado.

    Consoante o caso, o condenado não pode ausentar-se do local previsto fora dos períodos fixados, por exemplo, para exercer uma profissão, seguir uma formação, um tratamento ou participar na vida familiar.

    A autoridade competente pode simultaneamente submeter o condenado a uma ou várias medidas de suspensão da execução da pena com regime de prova (Bélgica, França). Pode modificar as condições da colocação sob vigilância electrónica quer oficiosamente quer a pedido do condenado.

    A pedido do condenado ou em caso de recusa de uma modificação, ou de nova condenação (em caso de suspensão de execução da pena), ou de inobservância das obrigações impostas, ou ainda de subtracção voluntária à vigilância electrónica (o que constitui delito de evasão nalgumas legislações - por exemplo, na França), a medida pode ser revogada de acordo com o procedimento em vigor. Nesse caso, o condenado cumprirá o restante da pena que lhe faltava cumprir aquando da colocação sob vigilância. Todavia, este tempo conta para a execução da pena (França).

    A inobservância das condições e, nomeadamente, do horário, é sancionada com uma advertência ou um agravamento das condições. Em caso de infracção grave (ausências repetidas, destruição voluntária da pulseira ou dos instrumentos de controlo, novos factos puníveis, etc.), a medida pode ser revogada, prosseguindo o condenado a sua detenção na prisão.

    6. Prisão domiciliária

    A prisão domiciliária constitui uma figura criada para reservar um tratamento privilegiado a certas categorias de pessoas, em consideração pelo seu estatuto especial, para que estas possam cumprir a pena no domicílio ou noutro local de cura ou de assistência. Excepto no Reino Unido e na Itália, a prisão domiciliária só existe associada a uma medida de vigilância electrónica (ver supra). Na Espanha, a prisão domiciliária foi abolida com a entrada em vigor do novo Código Penal de 1995. [169]

    [169] Artigos 27° e 30° do Código Penal de 1973.

    No Reino Unido, o artigo 37° do Powers of Criminal Courts (Sentencing) Act 2000 permite impor uma forma de prisão domiciliária (ou noutro local) por tempo determinado. Pode ser utilizada para todas as infracções, excepto o homicídio e outros crimes enunciados nos artigos 109° a 111° da lei supramencionada.

    A decisão que ordena a detenção ("curfew order"), especifica o ou os locais em que esta tem lugar, bem como os períodos durante os quais o condenado não se pode ausentar do local. A duração máxima é de 6 meses para as pessoas com 16 anos ou mais e de 3 meses no caso de delinquentes com menos de 16 anos. A duração diária não pode ultrapassar 12 horas nem ser inferior a 2 horas. A prisão domiciliária (ou noutro local) pode ser controlada por vigilância electrónica. A decisão do tribunal que impõe a prisão domiciliária deve especificar o nome da pessoa responsável pela vigilância do condenados durante o período em questão. A imposição desta sanção não requer o consentimento do delinquente.

    Um condenado que não respeite as condições do "curfew order" corre o risco de lhe ser imposta uma multa de 1000 libras. Alternativamente, a "curfew order" pode ser revogada e o delinquente corre o risco de ser condenado a uma pena mais severa. Solução idêntica (revogação e nova condenação) está reservada ao condenado que cometa nova infracção durante o período da "curfew order".

    Segundo o direito italiano, a prisão domiciliária destina-se a conciliar, por um lado, as exigências contraditórias da execução da pena e da segurança social e, por outro, de protecção de certos direitos fundamentais do indivíduo (como o direito à saúde, o direito-dever ao sustento e à educação dos filhos e o direito à protecção da maternidade) [170]. Em direito italiano, a prisão domiciliária está prevista quer como modo de execução de uma detenção provisória na fase de instrução (chamada então "detenção domiciliária") [171], quer como modo de execução de uma pena inferior ou igual a quatro anos de prisão ou de uma pena de prisão mais grave da qual só faltam cumprir quatro anos. Neste caso, não é pronunciada aquando da sentença, mas sim durante a fase de execução da pena. Podem beneficiar desta medida as seguintes pessoas: a) mulheres grávidas ou mães cujos filhos tenham idade inferior a 10 anos e com elas coabitem; b) pais que exerçam autoridade parental sobre filhos com idade inferior a 10 anos, que com eles coabitem, quando a mãe tenha falecido ou esteja absolutamente impossibilitada de prestar assistência aos filhos; d) pessoas de idade superior a 60 anos, se estiverem incapacitadas, mesmo apenas parcialmente; e) menores de 21 anos, por motivos de saúde devidamente atestados, estudos, trabalho e situação familiar [172]. Além disso, existem disposições específicas a favor de condenados que sofram de SIDA. Recentemente, foi introduzida para todos os condenados - e não apenas os mencionados nas alíneas a) a e) - a possibilidade de acesso à prisão domiciliária nos casos de execução de penas, ainda que residuais, com duração máxima de dois anos, sempre que as condições exigidas para o regime de prova não existam e que se possa excluir o perigo de serem cometidos outros delitos [173].

    [170] Artigo 47ter da Lei n° 354/1975.

    [171] Artigo 284° CPP.

    [172] Artigo 47ter da Lei n° 354/1975.

    [173] Artigo 47ter (1bis) da Lei n° 354/1975.

    Cabe ao tribunal de vigilância italiano definir as modalidades de execução da prisão domiciliária e estabelecer as condições relativas à intervenção do serviço social. O juiz de vigilância ordena ao condenado que não se afaste do seu domicílio ou de qualquer outro local de residência privada ou de um estabelecimento de cuidados de saúde ou de assistência pública. Se necessário, o tribunal pode impor limites ou proibições à possibilidade que o condenado tem de comunicar com pessoas que não sejam as que com ele habitam ou que o assistem. Se o condenado não puder satisfazer de outra forma as suas exigências vitais indispensáveis ou se se encontrar numa situação de indigência absoluta, o tribunal pode autorizá-lo a ausentar-se durante o dia do seu local de detenção, durante o período estritamente necessário à satisfação dessas exigências ou para exercer uma actividade profissional. O Ministério Público ou a polícia judiciária podem controlar em qualquer momento o respeito das prescrições impostas ao condenado [174].

    [174] Artigo 284° CPP.

    A medida é revogada quando a pessoa se afaste do local prescrito para a execução da pena (e que se esteja em presença de delito de evasão, artigo 385° do Código Penal) ou que o comportamento da pessoa seja contrário à lei ou às prescrições formuladas e que esteja na origem de incompatibilidade com a prossecução da medida. Além disso, há revogação sempre que as condições necessárias para a sua concessão deixem de estar reunidas ou que a pena se extinga.

    ANEXO II

    Inventário e análise comparada da legislação dos Estados-Membros em matéria de sanções alternativas

    1. Prestação de trabalho a favor da comunidade

    Esta pena consiste na prestação não remunerada de serviços realizada a favor de uma autarquia, de um estabelecimento público ou de uma associação sem fins lucrativos.

    Devido à necessidade de reduzir a sobrepopulação prisional e de encontrar alternativas à prisão, o Conselho da Europa, na sua Resolução (76) 10 sobre certas medidas penais de substituição de penas privativas de liberdade, recomendou a prestação de trabalho a favor da comunidade por forma a contribuir activamente para a reabilitação do delinquente através da aceitação da sua cooperação em trabalho voluntário.

    Desde então, a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade foi introduzida por todos os Estados-Membros, sendo praticada com certo êxito na maior parte deles [175].

    [175] Certos Estados-Membros (como por exemplo, a França) têm, todavia, dificuldades na sua execução (atrasos na execução, falta de postos de trabalho, etc.).

    A pena de prestação de trabalho a favor da comunidade pode preencher várias funções consoante o estádio do processo em que surge: pode situar-se ao nível do início ou não da acção penal, muitas vezes no âmbito de mediação, composição ou transacção penal (ver infra), a fim de evitar uma condenação (Bélgica [176], Alemanha [177], França [178]), podendo ser pronunciada a título de pena principal (Bélgica [179], França, Itália [180], Países Baixos) ou complementar (França) ou relativamente a certas infracções graves (Bélgica, França [181]). Pode igualmente servir como pena de substituição de pena privativa de liberdade [182], para a cobrança de multas (Alemanha [183], Itália), de multa (Espanha, Itália, Portugal) ou de prisão por dias livres (Espanha). A pena de prestação de trabalho a favor da comunidade pode igualmente ser associada à suspensão da execução da pena (Bélgica, Alemanha, Dinamarca, França e Suécia). Na Grécia, a pedido do condenado, a pena de prisão ou a multa podem ser parcialmente convertidas em pena de prestação de trabalho a favor da comunidade.

    [176] Artigo 216ter do Código de Instrução Criminal.

    [177] 153, 153a StPO.

    [178] No âmbito de uma composição penal.

    [179] Introduzida pela Lei de 17 de Abril de 2002 a título de pena principal.

    [180] Para delitos menores da competência do juiz de paz.

    [181] Infracções ao Código da Estrada.

    [182] A "contrainte par corps" consiste na prisão de uma pessoa com vista a obrigá-la a pagar um montante que deve ao Tesouro público, em execução de uma condenação penal.

    [183] O alargamento do âmbito de aplicação da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade está actualmente a ser ponderado na Alemanha, no âmbito de uma reforma do sistema das sanções: doravante, a pena de trabalho comunitário tornar-se-á a principal pena de substituição de uma multa (em vez de privação de liberdade para a cobrança das multas).

    Em certos Estados-Membros, a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade só pode ser imposta relativamente a certos delitos determinados pela sua natureza (Dinamarca, Itália) ou pela gravidade da pena que substitui [por exemplo, uma sanção de polícia ou uma sanção correccional (Bélgica), uma pena de prisão máxima de seis meses (Países Baixos) ou de um ano (Portugal)].

    As legislações de todos os Estados-Membros exigem o consentimento da pessoa em causa, independentemente da forma. Com efeito, vários textos internacionais exigem o consentimento da pessoa, nomeadamente o artigo 4° da Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, que determina que "ninguém pode ser constrangido a realizar um trabalho forçado ou obrigatório". Além disso, segundo o artigo 5° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia "ninguém pode ser constrangido a realizar trabalho forçado ou obrigatório".

    O número de horas a prestar por força de uma condenação a uma pena de prestação de trabalho a favor da comunidade varia entre 20 e 300 horas (Bélgica [184]), 20 e 200 horas (Finlândia), 30 e 240 horas (Dinamarca), 40 e 240 (França, Suécia, Reino Unido [185]) e 36 e 380 (Portugal). No caso de "composição penal" (que visa evitar a condenação), o número máximo de horas é inferior (60 horas em França).

    [184] O limiar entre a sanção de polícia e a sanção correccional está fixado em 45 horas.

    [185] Tratando-se de uma "community punishment order" a pena máxima é de 240 horas. Em caso de "community punishment and rehabilitation order", a pena máxima é de 100 horas.

    O trabalho deve ser normalmente efectuado num dado prazo (por exemplo, 12 meses no Reino Unido, 18 meses em França, excepto em caso de "composição penal", em que é de

    6 meses).

    Tradicionalmente, o trabalho a efectuar diz principalmente respeito a tarefas de manutenção, limpeza ou renovação, propostas por autarquias ou administrações.

    Quando se trate de prestação de trabalho a favor da comunidade enquanto pena principal, se o condenado se subtrair à mesma voluntariamente, pode ser incriminado por não execução do trabalho, delito especificamente previsto, por exemplo, em França [186]. Tratando-se de suspensão de execução da pena em regime de prova, incorre na revogação da suspensão. Se, neste caso, o condenado já tiver prestado uma parte do trabalho, pode beneficiar, consoante a legislação de certos Estados-Membros (por exemplo, Portugal), de uma redução correspondente da pena de prisão.

    [186] Em França, pode ser condenado a pena de prisão ou a multa ou ainda a nova pena de prestação de trabalho a favor da comunidade.

    2. Mediação em processo penal

    A mediação penal consiste num processo estruturado em que participam a vítima e o delinquente, que visa encontrar, com a intervenção de um mediador qualificado, uma solução negociada para o conflito originado pela infracção [187]. Tem por objecto garantir a reparação dos danos causados, pôr termo às perturbações resultantes da infracção e contribuir para a reabilitação do autor da infracção. Além disso, visa a modificação prolongada do comportamento das partes, de forma a prevenir a repetição dos factos por motivos idênticos.

    [187] A alínea e) do artigo 1° da Decisão-quadro do Conselho, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal define mediação em processos penais como "a tentativa de encontrar, antes ou durante o processo penal, uma solução negociada entre a vítima e o autor da infracção, mediada por uma pessoa competente". Na sua Recomendação n° R (99) 19 do Comité dos Ministros do Conselho da Europa, de 15 de Setembro de 1999, sobre a mediação em matéria penal, o Conselho da Europa dá a seguinte definição do termo "mediação penal": "qualquer tipo de processo que permita à vítima e ao delinquente participarem activamente, desde que expressem livremente o seu consentimento para tal, na solução das dificuldades decorrentes do delito, com a ajuda de uma terceira pessoa independente (mediador)."

    Permite à vítima encontrar voluntariamente o autor do delito, encoraja o autor do delito a compreender as consequências dos seus actos e a assumir a responsabilidade pelos danos causados, proporcionando à vítima e ao delinquente a ocasião de desenvolverem um projecto de compensação pelos danos causados.

    A mediação penal em sentido estrito difere de outras formas de contratos ou acordos ("transacções em processo penal") entre o Ministério Público e o autor da infracção, susceptíveis de suprimir a acção pública, como por exemplo, em direito francês, a "composição penal" e a transacção em processo penal, já que estas últimas não prevêem a possibilidade de a vítima participar activamente na procura de uma solução negociada.

    A mediação penal inscreve-se no conceito mais lato de "justiça reparadora" no âmbito do qual a reparação, material e imaterial, da relação alterada entre a vítima, a comunidade e o delinquente constitui um princípio orientador. Este conceito é apoiado na União Europeia por uma série de organizações não governamentais, algumas das quais receberam subvenções no âmbito dos programas GROTIUS ou AGIS.

    Em Junho de 2002, a Bélgica apresentou uma iniciativa formal "tendo em vista a aprovação da decisão do Conselho que cria uma rede europeia de pontos de contacto nacionais para a justiça reparadora" [188]. Esta rede europeia deverá contribuir para desenvolver, apoiar e promover os diferentes aspectos da justiça reparadora nos Estados-Membros, bem como ao nível da União. Esta iniciativa não foi objecto de debate no Conselho.

    [188] JO C 242 de 8.10.2002, p. 20.

    No que diz respeito à legislação existente na União Europeia, o artigo 10° da Decisão-quadro do Conselho, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal [189], prevê que cada Estado-Membro se esforce por promover a mediação nos processos penais relativos a infracções que considere adequadas para este tipo de medida. Além disso, assegura que possam ser tidos em conta quaisquer acordos entre a vítima e o autor da infracção, obtidos através da mediação em processos penais. Todavia, esta disposição só entrará em vigor em 22 de Março de 2006 (ver artigo 17° da Decisão-quadro supramencionada).

    [189] JO L 82 de 22 de Março de 2001, p. 1.

    A Alemanha, Áustria, Bélgica, Finlândia, França, Luxemburgo, Suécia e Reino Unido adoptaram legislação relativamente pormenorizada em matéria de mediação penal. Na Dinamarca, Espanha, Irlanda, Países Baixos e Portugal, está a ser objecto de projectos-piloto.

    Em vários Estados-Membros existem disposições especiais sobre a mediação penal em matéria de delinquência juvenil. Muitas vezes, estas disposições foram adoptadas antes das relativas à mediação para adultos.

    A mediação penal pode ser exercida em várias fases do processo: pode situar-se ao nível da instauração ou não de um processo penal a fim de evitar uma condenação (Áustria [190], Bélgica [191], Alemanha [192] e França [193]), pode fazer parte da sentença (como por exemplo, na Alemanha [194] e no Reino Unido [195]) ou surgir unicamente na fase de execução da pena (como por exemplo na Bélgica [196]).

    [190] Artigo 90a do Código de Processo Penal ("Diversion")."

    [191] Artigo 216ter do Código de Instrução Criminal e Decreto Real de 24 de Outubro de 1994.

    [192] Artigos 153 e 153a do Código de Processo Penal (StPO).

    [193] No âmbito da "composição penal", artigo 41-2 CPP.

    [194] Artigo 46a do Código Penal, artigo 155a do Código de Processo Penal.

    [195] "Compensation order" segundo os artigos 130º a 134º do Powers of Criminal Courts (Sentencing)Act.

    [196] Com a ajuda de um "consultant en justice réparatrice" (consultor em matéria de justiça reparadora) em cada prisão.

    Na Alemanha, a mediação penal foi introduzida em 1994 pelo artigo 46a do Código Penal alemão, enquanto "terceira via" de reacção do direito penal, paralelamente às penas principais (pena privativa de liberdade e multa) e às medidas de educação e de segurança. Esta disposição prevê que o tribunal possa atenuar uma pena - em função dos índices fixados no artigo 49° do Código Penal - ou inclusivamente renunciar a qualquer pena desde que a pena aplicável não ultrapasse um ano ou uma pena de dias-multa equivalente a 360 índices diários, se o autor da infracção a) se submeteu a um processo de mediação ("Täter-Opfer-Ausgleich") e reparou - completamente ou em grande parte - o dano causado ou tenha tentado seriamente fazê-lo, ou b) reparou - completamente ou em grande parte - o dano causado, desde que tal implique esforços pessoais consideráveis por parte do autor da infracção. Nas duas variantes, a reparação ultrapassa a simples indemnização e exige uma participação activa do autor da infracção.

    Na Áustria, a legislação relativa à mediação penal estabelece uma distinção, em função da gravidade das infracções em causa, entre dois regimes:

    a. Para as infracções que são, em princípio, passíveis de multa ou de pena privativa de liberdade de três anos no máximo, o legislador prevê que esta infracção não é punível [197] se a) a culpa do autor da infracção for muito ligeira, b) o acto não teve efeitos negativos ou só teve efeitos negativos negligenciáveis, ou se o autor da infracção reparou ou compensou os efeitos do seu acto ou tentou seriamente fazê-lo e c) não for necessária qualquer pena para evitar que o autor volte a cometer outras infracções [198].

    [197] "... so ist die Tat nicht strafbar, wenn...".

    [198] Artigo 42° do Código Penal austríaco.

    b. Quanto às infracções passíveis de pena privativa de liberdade de cinco anos no máximo e na condição de a culpa não ser grave nem ter causado a morte de ninguém, o procurador deve renunciar à acção penal quando, tendo em vista a mediação penal («aussergerichtlicher Tatausgleich»), o pagamento de uma multa, a prestação a favor da Comunidade ou a imposição de um período de regime de prova acompanhado de obrigações, não for necessária outra pena para impedir que o autor cometa novas infracções [199]. De acordo com a alínea g) do artigo 90º do Código do Processo Penal austríaco, a mediação penal implica que o autor confesse ter cometido a infracção, aceite procurar as causas da infracção, repare ou compense de outro modo os efeitos negativos da infracção e assuma, se for caso disso, compromissos que revelem estar disposto a abandonar os comportamentos que estiveram na origem da infracção. A mediação penal pressupõe o acordo da vítima, excepto quando os seus motivos de recusa sejam inadequados. O elemento essencial do procedimento consiste na organização de um encontro de mediação entre a vítima e o autor da infracção. Este encontro é organizado por um mediador independente. Os resultados do encontro são fixados num acordo escrito que o mediador comunica ao procurador e cuja execução controla. Se o autor da infracção respeitar as condições do acordo, o processo penal é arquivado; caso contrário, segue os trâmites normais até à sentença condenatória.

    [199] Artigo 90a do Código de Processo Penal austríaco ("Diversion")."

    Na Bélgica, segundo o artigo 216ter do Código Penal, o Procurador do Rei pode convocar o autor de uma infracção e, desde que o facto não pareça susceptível de ser punido com pena de prisão correccional principal superior a dois anos ou com uma pena mais pesada, instá-lo a indemnizar ou reparar o dano causado pela infracção e a fornecer-lhe a respectiva prova. O autor da infracção e a vítima podem solicitar a assistência de um advogado. O Procurador do Rei é assistido nas diferentes fases da mediação penal e, nomeadamente, na sua execução concreta, pelo serviço das "maisons de justice" do Ministério da Justiça. Os agentes deste serviço ("conseillers et assistants en médiation") cumprem a sua missão em estreita colaboração com o Procurador do Rei, que controla as suas actividades. Os pormenores relativos à mediação em processo penal são regulados por decreto real [200]. As modalidades de execução da mediação penal são consignadas em acta. Sempre que o autor da infracção satisfizer todas as condições, por si aceites, a acção pública extingue-se.

    [200] Decreto Real de 24 de Outubro de 1994 "portant les mesures d'exécution concernant la procédure de médiation pénale".

    Na França, o artigo 41-1, ponto 5, do Código de Processo Penal permite ao Procurador da República recorrer, no que diz respeito à "pequena delinquência" (delitos ou contra-ordenações), a mediação penal com o acordo da vítima e do autor da infracção penal, antes de decisão sobre a acção pública, se entender que tal medida é susceptível de assegurar a reparação do dano causado à vítima, pôr termo à dificuldade resultante da infracção ou contribuir para a reabilitação do autor da infracção.

    A mediação penal só pode realizar-se sob mandato do Procurador da República. As partes em conflito não podem recorrer directamente ao mediador. A mediação penal suspende os prazos de prescrição. Para executar a mediação, o Procurador recorre a um serviço associativo de mediação ou a um mediador independente [201]. O processo de designação e de habilitação dos mediadores é regido pelo artigo R. 15-33-30 do Código do Processo Penal. A mediação é facultativa para as partes em causa. Respeita os direitos dos queixosos e dos autores presumidos, que podem ser aconselhados ou assistidos a expensas suas pelo advogado que escolherem. O tipo de infracções em causa é da competência exclusiva do Ministério Público. Pode tratar-se de violência ligeira, furto, burla menor, não pagamento de pensão alimentar, não apresentação dos filhos, degradação voluntária, ameaça, injúria, delito de fuga, uso simples de estupefacientes, etc. A mediação em processo penal é gratuita para as partes. Existem diferentes modalidades de reparação de prejuízos: financeira, material ou simbólica.

    [201] Desde a criação, em 1990, das "Maisons de Justice et du Droit", os processos de mediação desenrolam-se cada vez mais nestas instâncias. Estes centros estão colocados sob a autoridade do presidente do tribunal de grande instância e do Procurador da República.

    A mediação em processo penal desenrola-se, de uma forma geral, do seguinte modo: o serviço de mediação de uma associação ou o mediador, requisitados pelo Procurador:

    * convoca por escrito as partes em litígio;

    * recebe as partes em causa, separada ou conjuntamente, explica-lhes os objectivos da mediação, obtém, sempre que o Ministério Público não o tiver feito, o respectivo acordo sobre o princípio de participação na mediação;

    * organiza o encontro de mediação que consiste em reunir todas as partes a fim de estabelecer ou de restabelecer laços, um diálogo e encontrar soluções para o litígio;

    * formaliza por escrito os termos de um eventual acordo;

    * informa por escrito o Procurador dos resultados da mediação, após ter seguido, em função do necessário, a evolução do processo durante o período fixado pelo Procurador.

    O magistrado do Ministério Público verifica a execução das condições (reparação, reembolso) do arquivamento. Toma a decisão judicial de arquivamento ou de instauração de uma acção penal junto do tribunal competente. No caso de, após a mediação, o procurador arquivar o processo, o queixoso será informado do facto.

    3. Transacção em processo penal [202]

    [202] Com excepção das informações relativas à Bélgica e à França, o texto deste capítulo sobre a transacção em processo penal retoma, no essencial, os pontos 61 e seguintes das conclusões do Advogado Geral Ruiz-Jarabo Colomer apresentadas em 19 de Setembro de 2002 nos processos apensos C-187/01 e C-385/01.

    A transacção é um processo através do qual os litígios em matéria penal podem ser resolvidos de comum acordo pelo representante da acção pública e o arguido, sem que seja necessário um processo judicial em sentido estrito. Neste tipo de "composição", não há, porém, qualquer negociação entre o delinquente e o Procurador para fixar a pena. O Estado, enquanto poder público, apresenta, através do titular da acção pública encarregado de aplicar a sanção, uma oferta que não admite discussão. Não se trata de um acordo negociado entre o arguido e o Ministério Público. Seria errado atribuir a transacção em processo penal um carácter contratual, já que impõe uma condenação, ligeira e aceite, que não deixa de ser uma sanção e preenche as funções de qualquer pena.

    Como se pode verificar, sob a designação de transacção ou designações afins, muitos Estados-Membros reconhecem procedimentos em que o Ministério Público renuncia, por habilitação legal e, em certos sistemas, sem qualquer decisão jurisdicional, ao exercício da acção pública contra um indivíduo, após este ter pago ao Estado um certo montante ou ter preenchido outras condições.

    Este tipo de administração da justiça penal não se aplica, todavia, a todas as infracções. Trata-se de um procedimento que é expressão de uma justiça destinada a sancionar uma categoria específica de comportamentos, pouco repreensíveis socialmente e cuja repressão não exige a intervenção do aparelho repressivo do Estado em toda a sua plenitude, nem, por conseguinte, a plena aplicação das garantias do processo penal através da intervenção de um juiz.

    Assim, a transacção permite ao arguido, sem que este deva ser objecto de um processo judicial, reconhecer expressa ou implicitamente a sua culpa e expiá-la através da execução das obrigações que o Procurador e ele próprio acordaram, nos limites estabelecidos pelo legislador, e que serão, de qualquer modo, menos austeras do que as que as que resultariam de um processo penal ordinário de que seria objecto na ausência de acordo. Em contrapartida, o poder público abandona a acção pública, que se extingue.

    Em direito alemão [203], o Ministério Público pode decidir abandonar a acção penal, desde que o autor da infracção aceite as obrigações que lhe são impostas e as execute. Embora, regra geral, a aprovação da jurisdição competente seja necessária, não é obrigatória se se tratar de delitos susceptíveis de serem reprimidos com uma pena que não exceda a pena mínima prevista no Código Penal e se o prejuízo causado for pouco importante. Em caso de acordo, o Procurador fixa um prazo para a execução das obrigações acordadas e, quando estas tiverem sido executadas, a responsabilidade do autor da infracção é definitivamente afastada e "a infracção não pode ser objecto de acção judicial na qualidade de delito" [204].

    [203] Artigo 153a do Código de Processo Penal. Ver igualmente acórdão "Brügge" de 11 de Fevereiro de 2003, no processo C -385/01.

    [204] N° 1 do artigo 153a supramencionado. O Código Penal alemão estabelece a distinção entre delito ("Vergehen") e crime ("Verbrechen"). Qualquer infracção susceptível de ser punida com pena privativa de liberdade igual ou superior a um ano é considerada "crime". As restantes infracções, objecto de punição menos severa, constituem "delitos".

    A Áustria [205] dispõe de um procedimento denominado "Diversion", que permite ao Procurador (ou ao juiz de instrução) renunciar ao exercício da acção pública em troca do pagamento de um certo montante, da prestação de trabalho a favor da comunidade, da fixação de um período de regime de prova ou da submissão do processo a mediação penal ("aussergerichlicher Tatausgleich"). Quando o acusado tiver cumprido as obrigações impostas, a acção pública extingue-se definitivamente [206].

    [205] Artigos 90a a 90m do Código de Processo Penal.

    [206] Artigo 90c, nº 5, 90d, nº 5, 90f, nº 4, e 90g, nº 1, Código de Processo Penal.

    Na Bélgica existem dois tipos de processo da competência do Ministério Público: a transacção e a mediação em processo penal (ver capítulo precedente), previstas nos artigos 216bis e 216ter do Código de Instrução Criminal, que permitem ao Procurador abandonar definitivamente as acções penais se o acusado preencher determinadas condições. Nos termos do artigo 216bis, o Procurador do Rei pode, relativamente a uma infracção punível quer com multa quer com pena de prisão cujo máximo não ultrapasse cinco anos, requerer apenas uma multa ou uma multa acompanhada de apreensão e perda. O dano eventualmente causado a outrem deve ser inteiramente reparado antes de se poder propor a transacção. Todavia, esta poderá também ser proposta se o autor tiver reconhecido por escrito a sua responsabilidade civil no que diz respeito ao facto gerador do dano e apresentar a prova da indemnização da fracção não contestada do dano e das modalidades de pagamento do mesmo. Seja como for, a vítima pode fazer valer os seus direitos junto do tribunal competente. Nesse caso, a aceitação da transacção pelo autor da infracção constitui presunção inelidível de culpa (n° 4 do artigo 216bis).

    Em direito francês, nos termos do artigo 41-2 do Código de Processo Penal, enquanto não tiver sido dado início à acção pública, o Procurador da República pode propor "composição penal" a uma pessoa de maior idade que reconheça ter cometido um ou vários delitos punidos com três anos de prisão máxima, a qual consiste numa ou várias das medidas seguintes: 1) pagamento de uma "amende de composition" ao Tesouro Público, que não pode exceder 3750 euros nem metade do máximo da multa em que incorre; 2) renúncia, a favor do Estado, à coisa que serviu ou se destinava a cometer a infracção ou que constitui o seu produto; 3) entrega ao Secretariado do tribunal de grande instância da carta de condução, por um período máximo de seis meses, ou da licença de caça, por um período máximo de quatro meses; 4) realização, em benefício da comunidade, de trabalho não remunerado durante um período máximo de 60 horas, num prazo que não pode ser superior a seis meses; 5) realização de um estágio ou de formação num serviço ou organismo de saúde, social ou profissional, por um período que não pode ultrapassar três meses num prazo que não pode ser superior a dezoito meses.

    Sempre que a vítima esteja identificada, e excepto quando o autor dos factos repare o prejuízo causado, o Procurador da República deve igualmente propor-lhe a reparação dos danos causados pela infracção num prazo que não pode ultrapassar seis meses. Compete-lhe informar a vítima desta proposta. A "composição penal" pode ser pronunciada numa "maison de justice et du droit". A pessoa a quem é proposta a "composição penal" é informada de que poderá ser assistida por um advogado antes de aceitar a proposta do Procurador da República. O referido acordo é incluído na acta, da qual lhe é transmitida cópia.

    Sempre que o autor dos factos dê o seu acordo relativamente às medidas propostas, o Procurador da República apresenta um pedido ao presidente do tribunal para efeitos de validação da "composição". O Procurador da República informa o autor dos factos desta diligência e, se for caso disso, a vítima. O presidente do tribunal pode proceder à audição do autor dos factos e da vítima, assistidos, se for caso disso, pelo respectivo advogado. Se este magistrado proferir um despacho que valide a "composição", as medidas decididas são executadas. Se a pessoa em causa não aceitar a "composição" ou se, após ter dado o seu acordo, não executar integralmente as medidas decididas, o processo continua até à eventual sentença condenatória. A prescrição da acção pública é suspensa entre a data em que o Procurador da República propõe a "composição penal" e a data de caducidade dos prazos previstos para execução da "composição penal". A execução da "composição penal" extingue a acção pública.

    A Dinamarca [207] prevê que, em caso de infracção passível de multa, o Ministério Público pode propor à pessoa em causa abandonar a acção penal se esta reconhecer a sua culpa e se comprometer a pagar uma multa num determinado prazo. Terminado o prazo de dois meses previsto para a anulação desta proposta pela via hierárquica, a decisão de renúncia à acção penal torna-se definitiva.

    [207] Artigo 924° do Código de Processo Penal.

    A ordem jurídica espanhola [208] permite ao arguido aceitar a pena solicitada pelo Procurador, adoptando o juiz ou o tribunal, nesse caso, uma decisão baseada na qualificação mutuamente acordada.

    [208] Artigo 655°, n° 3 do artigo 791°, e n° 3 do artigo 793, da Ley de Enjuiciamiento Criminal.

    O direito finlandês [209] não reconhece a transacção propriamente dita, mas prevê medidas de natureza transaccional susceptíveis de levar à extinção da acção pública. Trata-se do processo simplificado aplicável às contra-ordenações, através do qual o procurador pode impor uma multa sem que seja necessária a intervenção de um órgão jurisdicional. A sua decisão é definitiva e tem força de caso julgado.

    [209] Laki rangaistusmääräysmenettelystä lagen om strafforderförfaran, de 26.7.1993/692.

    A Irlanda [210] dispõe de meios que permitem que uma infracção não seja objecto de acção penal, por diferentes razões. A título de exemplo, pode referir-se o pagamento de uma multa, que põe termo à acção penal.

    [210] Road Traffic Acts, 1961-1995, Litter Pollution Act, 1997, p. 28.

    Embora o direito italiano não reconheça, em geral, nem a transacção nem a mediação penal (excepto quanto a infracções cometidas por menores), existe um processo singular designado por «patteggiamento» [211]. Trata-se de um processo especial que implica a existência de acordo transaccional quer quanto ao processo quer quanto à pena, cuja duração não pode exceder dois anos. O Procurador e o réu são ambos titulares da acção de "patteggiamento". O acordo tem de ser obrigatoriamente aprovado pelo tribunal.

    [211] Artigos 444° a 448° do Código de Processo Penal.

    No Luxemburgo, a Lei de 6 de Maio de 1999 acrescentou um nº 5 ao artigo 24° do Código de Instrução Criminal, segundo o qual o Procurador pode, antes de iniciar a acção penal, proceder a mediação, susceptível de dar lugar à decisão de continuar a acção penal ou de deixar prescrever a acção pública.

    Os Países Baixos reconhecem igualmente a transacção ("transactie") [212], regida pelos artigos 74° e seguintes do Código Penal neerlandês. A acção pública cessa sempre que o réu cumpra as condições impostas pelo Procurador. O efeito de extinção está expressamente previsto no n° 1 do artigo 74°.

    [212] Ver igualmente acórdão « Brügge » de 11 de Fevereiro de 2003, no processo C-385/01

    Em Portugal [213] o processo pode ser suspenso a título provisório. Este mecanismo permite ao Ministério Público paralisar o exercício da acção pública impondo certas obrigações durante um período determinado. A sua decisão está sujeita à aceitação do arguido e, se for caso disso, do assistente, bem como à aprovação do juiz de instrução. Quando o arguido cumprir as injunções e regras de conduta, o processo penal é arquivado, não podendo ser reaberto(34).

    [213] Artigos 281° e 282° do Código de Processo Penal e caso específico do processo sumaríssimo, previsto nos artigos 392° a 398° do mesmo código. N° 3 do artigo 282° do Código de Processo Penal.

    No Reino Unido, o direito inglês reconhece o processo de natureza transaccional em matéria de circulação rodoviária. Uma "fixed penalty notice" permite evitar a acção penal a troco do pagamento de uma multa ou da aplicação de "pontos de penalidade" na carta de condução. Quando estão preenchidas estas condições, a acção penal cessa [214]. Convém ter em consideração o facto do Lord Justice Auld ter preconizado [215] o alargamento do âmbito de aplicação das transacções em processo penal e de a sua proposta ter sido objecto de um Livro Branco do Governo em meados de Julho de 2002. Em direito escocês [216], o Procurador pode fazer uma "oferta condicional" ("conditional offer") ao arguido, que lhe permite não ser objecto de acção penal relativamente às infracções susceptíveis de serem reprimidas pelos District Courts. Se este aceitar a proposta, o arguido deve pagar uma multa, após o que a acção penal é arquivada [217].

    [214] N° 1 do artigo 52° do Road Traffic Offendors Act, de 1988.

    [215] «A Review of the Criminal Courts of England and Wales».

    [216] Artigo 302° da Lei sobre o processo penal (Criminal Procedure (Scotland) Act) de 1995.

    [217] Nº 6 do artigo 302º supramencionado.

    Por último, existe na Suécia [218] um processo penal sem intervenção de um órgão jurisdicional ("strafföreläggande"), que é utilizado para os delitos menos graves, tais como a condução sob a influência do álcool e os pequenos furtos. Se a sanção proposta pelo Ministério Público for aceite pelo réu (após acordo com as eventuais vítimas), adquire força de caso julgado.

    [218] Capítulo 48, artigo 4º, do Rättegangsbalk (Código Penal), de 1942

    ANEXO III

    Inventário e análise comparada da legislação dos Estados-Membros em matéria de execução das sanções penais

    No que respeita às penas privativas de liberdade, os mecanismos de aplicação e de execução das penas devem ser norteados pela preocupação constante de atingir o equilíbrio entre o pedido das autoridades repressivas de que as penas pronunciadas sejam efectivamente executadas e o interesse dos condenados, mas também da sociedade em geral, de que o sejam em condições que garantam o mais possível a reintegração social.

    No que respeita à semi detenção, vigilância electrónica e fraccionamento de execução da pena («prisão por dias livres»), salienta-se que estas medidas podem ser decididas (impostas ?) em alguns Estados-Membros não apenas ab initio pelo tribunal da condenação mas também posteriormente pela autoridade competente em matéria de execução da pena. Relativamente a estas medidas, remete-se portanto para o Anexo I.

    1. Suspensão da pena

    A suspensão da execução da pena - não confundir com a suspensão pronunciada no momento da sentença - só pode ocorrer após o início da execução. Apenas uma minoria de Estados-Membros reconhece a sua existência, como é o caso da França e da Itália.

    De acordo com o n° 1 do artigo 720° do Código de Processo Penal francês, quando esteja por cumprir uma pena de prisão inferior ou igual a um ano, esta pena pode, por motivos graves de ordem médica, familiar, profissional ou social e durante um período que não exceda três anos, ser suspensa pelo tribunal de aplicação de penas ou pelo tribunal correccional, consoante a suspensão não ultrapasse ou ultrapasse três meses.

    No direito italiano, a suspensão da execução da pena está prevista no Código Penal para duas hipóteses diferentes, sendo uma obrigatória (cf. artigo 146° do Código Penal), e a outra facultativa (cf. artigo 147° do Código Penal). A competência desta decisão cabe ao Tribunal de Surveillance. As duas hipóteses de alteração da execução da pena, previstas por lei, dizem respeito às exigências de protecção da maternidade, salvaguarda da saúde e da dignidade de doentes com SIDA e a salvaguarda da saúde da população prisional. Devido à extrema semelhança entre as condições de admissão da prisão domiciliária e as de concessão de alteração da execução da pena, o domínio de aplicação destas medidas tende a ser coincidente.

    2. Regime de semidetenção

    Esta medida, descrita pormenorizadamente no ponto 3 do Anexo I, pode não só ser decidida ab initio pelo tribunal de condenação mas, por vezes, também ulteriormente [219] pela autoridade competente em matéria de execução da pena.

    [219] Por exemplo, na França.

    3. Libertação antecipada

    A libertação antecipada consiste na libertação de um condenado antes de expirada a pena de prisão. Só pode ocorrer na fase de execução da pena [220]. As legislações de todos os Estados-Membros prevêem este instrumento embora as características e mesmo as designações [221] difiram consoante os Estados-Membros. Em muitos Estados-Membros, recebe a designação de "liberdade condicional", salientando-se a sua principal característica (ou seja, que a libertação antecipada ocorre apenas em caso de boa conduta do libertado durante o regime de prova), embora exista também sob a forma não condicional (Países Baixos e Reino Unido).

    [220] Por este aspecto, distingue-se da suspensão da execução de pena que apenas pode ser pronunciada apenas numa sentença.

    [221] Em direito alemão, chama-se "Aussetzung des Strafrestes" (suspensão de execução), 57 StGB. Em direito belga, distingue-se entre "libération conditionnelle" (liberdade condicional) e "libération provisoire" (liberdade provisória). Esta última não está prevista por nenhum texto legal mas é organizada através de circulares ministeriais. Relativamente à liberdade condicional, as condições que regem a liberdade provisória são atenuadas, visto que, por exemplo, todos os condenados a penas cujo total não exceda três anos podem ser libertados após cumprimento de um terço da pena, mesmo quando sejam reincidentes.

    Todos os sistemas penais dos Estados-Membros exigem, para que seja concedida a liberdade antecipada, a execução de uma parte "mínima" da pena. Esta "parte mínima" traduz-se, em determinados Estados-Membros, numa percentagem relativamente à pena pronunciada e/ou em termos absolutos, ou seja, em meses ou anos. Aplicam-se regras específicas às sentenças de prisão perpétua.

    Quanto às penas temporárias, a duração mínima da permanência do condenado na prisão para poder beneficiar de libertação antecipada varia entre um terço (Bélgica) e três quartos (Espanha) da pena imposta pela sentença e a duração máxima (em especial em caso de reincidência) entre dois terços e cinco sextos (Portugal) [222]. No entanto, é possível constatar que, na maioria dos Estados-Membros, prevê-se como duração mínima o cumprimento de metade da pena e, como duração máxima - sobretudo em caso de reincidência - o cumprimento de dois terços.

    [222] Trata-se de um caso especial que pressupõe apenas o decorrer do tempo, n° 5 do artigo 61° do Código Penal Português.

    Em termos absolutos, o mínimo varia entre 1 mês (Suécia), 2 meses (Alemanha), 3 meses (Bélgica) e 6 meses (Bélgica, Alemanha, Países Baixos e Portugal).

    Quanto às sentenças de prisão perpétua, a duração mínima da permanência do condenado na prisão para poder beneficiar de libertação antecipada varia entre 10 anos (Bélgica) e 26 anos (Itália). A maioria dos Estados-Membros prevê, no entanto, como duração mínima, a pena de 15 anos.

    Em alguns Estados-Membros, a libertação antecipada não pode ser concedida se a pena a executar apresentar determinadas características em termos de duração - inferior ou igual a 2 anos (Alemanha) [223], 4 anos (França). Quanto aos restantes países (por exemplo, Portugal), o período mínimo mencionado acima varia em função da pena aplicada. Será de metade, caso a pena aplicada seja inferior a 5 anos e de dois terços quando a pena aplicada seja superior a 5 anos.

    [223] Aplicável apenas quando o réu pretenda fazer valer a libertação antecipada após cumprimento de metade da pena.

    As legislações dos Estados-Membros apresentam uma vasta gama de condições a preencher para que o condenado possa ter acesso à libertação antecipada. Seguem-se alguns exemplos:

    - o condenado tem de exprimir o seu acordo (Bélgica, Alemanha, França, Grécia, Luxemburgo, Portugal);

    - o condenado deverá ter efectuado "um sério esforço de readaptação social" (França);

    - o condenado deverá encontrar-se, antes de ser libertado, numa "fase menos rigorosa da execução" (Espanha, França), e ter cumprido, por exemplo, uma prova de semidetenção, de colocação no exterior, etc.;

    - o condenado deverá entregar a totalidade ou parte da sua conta ao serviço prisional (França);

    - o condenado tem de ingressar no exército ou numa formação das forças armadas (França);

    - tratando-se de estrangeiros, terão de ser expulsos do território nacional (França);

    - a liberdade condicional está excluída durante o período de segurança;

    - é exigida a indemnização das vítimas [224];

    [224] Segundo a legislação belga, a vítima pode ser ouvida, caso se manifeste nesse sentido, quanto às condições que poderão ser impostas ao condenado.

    - há disposições mais favoráveis para os condenados de idade superior a 70 anos ou a pessoas doentes (Espanha, Grécia) ou que exerçam autoridade parental sobre filhos menores de 10 anos que residam habitualmente com este progenitor (França);

    - o condenado não deverá constituir um perigo para o público (Alemanha) ou deverá apresentar "ausência de contra-indicações que impliquem um risco grave para a sociedade" (Bélgica); esta condição é avaliada tendo em consideração os critérios seguintes: possibilidade de reabilitação do condenado (Bélgica), personalidade do condenado (Bélgica, Alemanha), comportamento do condenado durante o período de prisão (Bélgica, Espanha, Finlândia, Grécia, Itália), risco de reincidência por parte do condenado (Bélgica, Alemanha), atitude do condenado face às vítimas (Bélgica) e gravidade do delito (Alemanha).

    Na maioria dos Estados-Membros, a libertação antecipada é condicional, ou seja, combinada com um regime de prova durante o qual o condenado deverá abster-se de qualquer tipo de infracção, caso não queira sujeitar-se a ver revogada a decisão de libertação antecipada. No entanto, há dois Estados-Membros (Países Baixos e Reino Unido) que prevêem a liberdade antecipada sem qualquer regime de prova.

    Na maioria dos Estados-Membros, o regime de prova a que o condenado está sujeito é fixado em função da duração da pena por cumprir no momento da libertação (por exemplo, Bélgica, Alemanha, Espanha, Finlândia, Grécia [225], Suécia), não podendo ser inferior a um ano (Suécia) ou, na Bélgica, dois anos ou cinco anos, tratando-se de penas mais graves (superiores a cinco anos de prisão correccional), com o máximo de três anos (Finlândia) ou dez anos (Bélgica). Quanto à prisão perpétua, o regime de prova é de cinco anos na Alemanha, na Itália e em Portugal.

    [225] Aplica-se apenas se a pena por cumprir for inferior a três anos. Nos outros casos, o prazo do regime de prova é de 3 anos.

    A libertação antecipada é normalmente acompanhada por diversas interdições ou obrigações, tais como a proibição do exercício de determinadas profissões (França, Portugal), a frequência de determinados locais (Alemanha, França, Grécia, Portugal, Suécia), a residência em determinados locais (França, Grécia, Portugal), o convívio com determinadas pessoas (Alemanha, França, Grécia, Portugal), a participação em associações e reuniões (Portugal), bem como a posse de determinados objectos (Alemanha, Portugal), a condução de determinados veículos (França), a detenção ou porte de arma (França) ou a obrigação de residência em determinados locais (França, Grécia, Suécia), a comparência periódica perante as autoridades (Alemanha, Portugal), a realização de formação (França, Suécia), tratamento médico (Grécia, Suécia), com o acordo do condenado (Portugal), a prestação de trabalho a favor da comunidade (Grécia), o pagamento de despesas (França, Portugal) ou a indemnização por danos (França, Portugal, Suécia), a reparação de danos (Alemanha), satisfação moral à vítima (Portugal), pagamento de um montante líquido a favor de uma instituição sem fins lucrativos (Alemanha, Portugal) ou do tesouro público (Alemanha), apresentação de programa de reabilitação (Bélgica) ou de readaptação social (Portugal), pagamento de alimentos (Alemanha, França, Grécia) ou sujeição à tutela social (Bélgica).

    Em caso de violação das condições de libertação antecipada, esta pode ser suspensa (Bélgica), revogada (Bélgica, Alemanha, França) ou serem alteradas as suas modalidades (Bélgica, Alemanha). A legislação de vários Estados-Membros permite um escalonamento de reacções, que pode variar entre a advertência (Suécia) e a pena de prisão firme de quinze dias por violação cometida (Suécia).

    Existem diferenças significativas entre as legislações dos Estados-Membros no que diz respeito aos aspectos seguintes: competências dos intervenientes implicados (tribunais, Ministério da Justiça ou administração penitenciária regional ou local), margem de apreciação das autoridades competentes (em especial no que diz respeito a determinar se a libertação é facultativa ou obrigatória), procedimento aplicável à libertação antecipada, possibilidades de recurso contra decisões de recusa de libertação antecipada, regime de controlo, etc.

    4. Atenuação da pena

    Em determinados Estados-Membros (por exemplo, França e Grécia) é possível a atenuação ou a redução da pena na fase de execução.

    Na França, esta possibilidade reveste diversas formas: redução ordinária da pena (concedida de forma praticamente automática por bom comportamento: 7 dias por mês ou 3 meses por ano) e redução especial da pena (4 dias por mês ou 2 meses por ano de prisão caso o condenado manifeste "esforços sérios de readaptação social, nomeadamente passando num exame escolar, universitário ou profissional"). A redução especial da pena é mesmo concedida em caso de reincidência (2 dias por mês ou 1 mês por ano). Na Grécia, a lei prevê um sistema segundo o qual cada dia de trabalho equivale, de acordo com um quadro de correspondência criado em função da natureza do trabalho, a dois dias e meio, dois dias, um dia e três quartos ou um dia e meio de prisão.

    Há dois Estados-Membros (França e Grécia), onde a redução da pena pode ser acumulada com liberdade condicional, podendo reduzir assim o prazo a partir do qual o condenado pode solicitar a liberdade condicional.

    5. Amnistia e indulto

    A amnistia é uma medida que se traduz na eliminação retroactiva do carácter delituoso de determinados factos. Consequentemente, torna a execução da pena juridicamente impossível, ou provoca a sua extinção imediata, caso a respectiva execução esteja em curso. O indulto é uma graça que permite a um indivíduo reconhecido culpado e definitivamente condenado subtrair-se, na totalidade ou em parte, à aplicação da sanção. As legislações dos Estados-Membros em matéria de amnistia e indulto diferem consideravelmente, sendo a sua concessão, em geral, objecto de um vasto poder de apreciação por parte das autoridades competentes.

    ANEXO IV

    Quadro recapitulativo das perguntas

    Pergunta 1 : (ver ponto 4.1.): Em que medida as diferenças entre os sistemas de sanções penais constituem obstáculo à realização do espaço de liberdade, de segurança e de justiça, nos casos de, por exemplo,

    (1) deslocação dos criminosos, com base em disparidades nas incriminações e sanções ou

    (2) obstáculos à livre circulação de pessoas?

    Pergunta 2 (ver ponto 4.1.1.1.): Como evitar, pelo menos no que respeita às infracções harmonizadas a nível da União, divergências significativas entre os Estados-Membros em matéria de instauração de acções penais ?

    Pergunta 3 (ver ponto 4.1.1.2.): Em que medida poderão ser definidas «directrizes em matéria de pronúncia sentenças» a nível europeu, ou seja, princípios de base para a pronuncia de penas, respeitando sempre a margem de apreciação dos tribunais ?

    Pergunta 4 (ver ponto 4.1.1.2.): Seria adequado proceder previamente ao estudo de casos sobre a prática dos órgãos de jurisdicionais dos Estados-Membros no que respeita à pronúncia da pena

    Pergunta 5 (ver ponto 4.1.1.2.) Em que medida seria útil prever a criação de um sistema de informação sobre a pronúncia da pena susceptível de servir de orientação para os tribunais?

    Pergunta 6 (ver ponto 4.1.1.5) : Bastará reconhecer (e/ou assimilar a uma decisão nacional) as decisões penais definitivas proferidas noutro Estado-Membro, para que o tribunal nacional possa tê-las em consideração a título de reincidência ?

    Pergunta 7 (ver ponto 4.1.1.5): Será conveniente proceder previamente a determinadas aproximações das legislações, como por exemplo:

    - determinação de infracções a ter em consideração de forma sistemática, passíveis de constituirem o primeiro termo da reincidência (criação da noção de reincidência especial europeia);

    - determinação do tipo de decisões penais definitivas susceptíveis de serem tomadas em consideração a título da reincidência (natureza da decisão, tipo de autoridade que a pronunciou, natureza e medida da pena pronunciada);

    - período durante o qual as decisões penais definitivas deveriam ser tidas em consideração para poderem constituir o primeiro termo da reincidência em determinado Estado-Membro e circunstâncias susceptíveis de neutralizarem o efeito de uma condenação a título da reincidência ?

    Pergunta 8 (ver ponto 4.1.2.): Em que medida será conveniente reduzir as divergências entre os regimes nacionais em matéria de modalidades de execução de sanções privativas de liberdade, em especial tendo em vista evitar riscos de discriminação de delinquentes não residentes na aplicação deste tipo de sanções ?

    Pergunta 9 (ver ponto 4.1.2.): Existem categorias de infracções mencionadas na lista do nº 2 do artigo 2º da Decisão-quadro relativa ao mandado de detenção europeu e/ou da proposta de decisão-quadro relativa à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às sanções pecuniárias, relativamente às quais se deverá proceder prioritariamente à harmonização do nível das sanções (bem como da definição das incriminações)?

    Pergunta 10 (ver ponto 4.1.3): Em que medida se deverão aproximar os sistemas penais de multas (por exemplo, no domínio da criminalidade económica, incluindo as infracções cometidas por pessoas colectivas) ?

    Pergunta 11 (ver ponto 4.1.6.): : Em que medida seria conveniente reduzir as divergências entre os regimes nacionais de responsabilidade penal ou administrativa das pessoas colectivas, em especial tendo em vista evitar riscos de deslocalização no domínio da criminalidade económica e financeira ?

    Pergunta 12 (ver pontos 2.1.9 e 4.1.6.): Seria conveniente generalizar a gama de sanções relativamente às pessoas colectivas, previstas em várias decisões-quadro em vigor ?

    Pergunta 13 (ver ponto 4.1.7.): Em que medida seria conveniente reduzir as divergências entre os regimes nacionais de sanções alternativas, em especial tendo em vista evitar que se apliquem na prática exclusivamente aos residentes ?

    Pergunta 14 (ver ponto 4.1.7.): Quais os mecanismos a prever para reduzir as dificuldades jurídicas e práticas susceptíveis de constituirem obstáculo ao reconhecimento mútuo e à execução de sanções alternativas noutro Estado-Membro ?

    Pergunta 15 (ver ponto 4.1.7.): Convém prever, a nível da União Europeia e para além das exigências do artigo 10° da decisão-quadro do Conselho de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal, uma aproximação de certas condições e modalidades de aplicação da mediação penal, a fim de facilitar o reconhecimento das medidas e acordos resultantes de processos de mediação penal e a sua execução noutro Estado-Membro? O que deverá prever um enquadramento mínimo deste tipo?

    - as categorias de infracções em causa?

    - o procedimento de mediação penal?

    - o estatuto dos mediadores, incluindo o seu grau de independência relativamente aos órgãos judiciais?

    - a formação e as condições de admissão dos mediadores?

    Pergunta 16 (ver ponto 4.1.7): Convém prever, a nível da União Europeia, medidas que tenham em conta, no âmbito dos procedimentos e sanções alternativas, os interesses das vítimas incluindo as que não residem no Estado-Membro em que a infracção foi cometida? Em caso afirmativo, quais?

    Pergunta 17 (ver ponto 4.1.8): Em que medida seria conveniente prever, ao nível da União Europeia, uma aproximação de certas condições de elegibilidade e modalidades de aplicação da liberdade antecipada por forma a facilitar o reconhecimento das penas de prisão e o respectivo cumprimento noutro Estado-Membro? O que deverá prever um enquadramento mínimo deste tipo?

    - no que respeita às penas de prisão perpétua, a possibilidade de serem objecto de reapreciação periódica tendo em vista a libertação antecipada ?

    - no que respeita às penas de prisão temporária, o período mínimo de encarceramento a observar para concessão de libertação antecipada? Em caso afirmativo, qual a duração deste período? Haverá perspectivas de aproximação no sentido de, quando se trate de penas temporárias e excepto em caso de reincidência, que a libertação antecipada seja possível após o cumprimento de metade da pena e, em caso de reincidência, de dois terços da pena?

    - o procedimento de colocação em liberdade? Será conveniente prever normas de procedimento?

    - as condições de controlo e duração do período de experiência?

    - Sanções em caso de desrespeito das condições impostas pela liberdade antecipada?

    - garantias processuais dos réus?

    - interesses das vítimas? Será conveniente prever, ao nível da União Europeia, que liberdade antecipada só pode ser concedida no caso de a(s) vítima(s) ter(em) sido indemnizada(s) ou no caso do réu ter revelado esforços sérios no sentido de o fazer, ou poderá ser revogada mesmo não sendo satisfeita esta condição?

    Pergunta 18 (ver ponto 4.2.1.1.): Qual deveria ser o círculo de pessoas condenadas susceptíveis de beneficiarem da possibilidade de a execução se processar noutro Estado-Membro? os nacionais do Estado de execução, as pessoas que nele habitualmente residem, os condenados que se encontrem no território do Estado de execução, onde cumprem ou deverão cumprir uma pena privativa de liberdade? Existem condições específicas a ter em consideração para que os menores e as pessoas com deficiência mental possam igualmente beneficiar de tais disposições?

    Pergunta 19 (ver pontp 4.2.1.2.): Será necessário reforçar a eficácia dos acordos resultantes de processo de mediação penal e de transações em processo penal nos Estados-Membros? Qual é a melhor solução para o problema do reconhecimento e da execução deste tipo de acordo num outro Estado-Membro da União Europeia? Deverão ser adoptadas regras específicas que conferiram um carácter executório a estes acordos? Em caso afirmativo, sob reserva de que tipo de garantias?

    Pergunta 20 (ver ponto 4.2.2.1.): A transmissão da execução deveria poder ser solicitada apenas pelo Estado da condenação ou também pelo Estado da execução?

    Pergunta 21 (ver ponto 4.2.2.2.): Quais os motivos que o Estado de execução poderá legitimamente fazer valer para recusar o reconhecimento e a execução no seu território de uma sanção penal declarada noutro Estado-Membro?

    Pergunta 22 (ver ponto 4.2.2.2.): Quando a legislação nacional permita inflingir sanções pecuniárias paralelamente a penas de prisão e tendo em consideração a aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às sanções pecuniárias, continua a ser aceitável que o Estado que profere a sentença condenatória possa recusar a transferência da execução até a pessoa condenada ter pago a multa ?

    Pergunta 23 (ver ponto 4.2.2.2.): Em virtude das diferenças existentes entre os Estados-Membros no que respeita à legislação sobre liberdade antecipada, pode acontecer que um réu tenha de ser imediatamente libertado na sequência de transferência para o Estado requisitado. Esta consequência poderá constituir para os Estados envolvidos um motivo legítimo de recusa da transferência?

    Pergunta 24 (ver ponto 4.2.2.2.): : Justificar-se-á a introdução de um período mínimo da pena a cumprir no Estado de condenação, por forma a evitar a libertação imediata na sequência da transferência para o Estado de execução ou uma redução significativa por parte do Estado de execução da pena finalmente executada? Qual deverá ser esse período? Ou será que a introdução de um período mínimo é susceptível de atentar contra a flexibilidade e impedir qualquer solução caso a caso? Seria preferível a fixação de um determinado período compatível com os fins da justiça, tal como proposto pelo Comité de técnicos sobre o funcionamento das convenções europeias no domínio penal do Conselho da Europa (ver alína d) do ponto 3.2.1.5.)?

    Pergunta 25 (ver ponto 4.2.2.3.): Quando a natureza ou a duração da pena pronunciada pelo Estado de julgamento seja incompatível com a legislação do Estado de execução, este deverá dispor da possibilidade de adaptar a pena pronunciada pelo Estado de julgamento a uma pena prevista pela lei do Estado de execução relativamente a infracções da mesma natureza ?

    Pergunta 26 (ver ponto 4.2.2.3.): Será necessário prever regras de adaptação, conversão ou substituição ao nível da União Europeia, ou será possível deixá-lo ao critério da autoridade competente do Estado-Membro de execução?

    Pergunta 27 (ver ponto 4.2.2.3.): Poderá considerar-se uma solução a abordagem proposta pelo Instituto Max Planck de direito penal estrangeiro e internacional, de Friburgo, que consiste em operar, de acordo com determinado método de análise e de avaliação, uma "comparação funcional" entre as penas ou medidas (alternativas) do Estado de emissão e do Estado de execução? Quais as lacunas desta abordagem? Como colmatá-las?

    Pergunta 28 (ver ponto 4.2.2.4.): A transferência da execução de uma sentença penal deverá ficar subordinada ao pedido, ao acordo ou apenas à consulta do réu? A resposta a esta pergunta difere se o réu tiver já iniciado o cumprimento da pena numa prisão do Estado de condenação?

    Pergunta 29 (ver ponto 4.2.2.3.): Como poderão ter-se em consideração os interesses das vítimas no âmbito da transferência da execução da pena? Deverá prever-se o fornecimento de informações à vítima (sobre a existência de um pedido de reconhecimento e de transferência, bem como sobre o resultado do processo), a sua consulta ou mesmo o seu acordo, eventualmente como condição para a transferência da execução?

    Pergunta 30 (ver ponto 4.2.3.): Será necessário prever, ao nível da União Europeia, um prazo para a decisão sobre o reconhecimento de sanções penais e, em especial, para o tratamento dos pedidos de transferência de presos e, em caso afirmativo, qual?

    Pergunta 31 (ver ponto 4.2.3.): Considerando a carga administrativa que representa o tratamento de um pedido de transferência de prisioneiro, será necessário prever, ao nível da União Europeia, que apenas os presos réus a penas de prisão de uma certa duração mínima ou que possam ainda cumprir uma pena de uma certa duração mínima sejam elegíveis para transferência? Em caso afirmativo, qual a duração adequada?

    Pergunta 32 (ver ponto 4.2.3.): Será necessário prever, ao nível da União Europeia, um prazo para a resposta a todos os pedidos de informação necessário no âmbito do reconhecimento de sanções penais e, em especial, da transferência de presos?

    Pergunta 33 (ver ponto 4.2.3.): Considerando a complexidade das estruturas judiciárias e administrativas dos Estados-Membros e as diferenças existente entre elas, quais as estruturas simples e efectivas que será necessário prever para a aplicação do reconhecimento mútuo de sanções penais e da transferência de presos?

    Pergunta 34 (ver ponto 4.2.3.): Será necessário prever um formulário uniforme ao nível da União Europeia para facilitar a concretização do reconhecimento de sanções penais e da transferência de presos?

    Pergunta 35 (ver ponto 4.2.3.): O Estado de execução deverá poder solicitar o reembolso das despesas efectuadas por motivo de execução de penas por ele reconhecidas?

    Pergunta 36 (ver ponto 4.2.3.): Será necessário criar uma rede de pontos de contacto por forma a facilitar - ou mesmo contribuir para a avaliação de - a aplicação prática de um eventual instrumento legislativo da União Europeia sobre o reconhecimento mútuo de sanções penais e a transferência de presos?

    Pergunta 37 (ver ponto 4.2.4.): Em caso de reconhecimento de uma sanção privativa de liberdade ou de uma sanção alternativa, haverá motivos para um afastamento da regra que determina que a execução deva ser regida inteiramente pela legislação do Estado de execução?

    Pergunta 38 (ver ponto 4.2.4.): No caso de a vigilância das condições de suspensão depender do Estado de execução, será necessário prever, relativamente ao Estado de julgamento, a possibilidade de garantir que o condenado respeite as condições da suspensão? Qual o mecanismo a prever neste âmbito?

    Pergunta 39 (ver ponto 4.2.4.): Qual dos dois Estados (Estado de emissão ou Estado de execução) deverá poder exercer o direito de amnistia ou de indulto?

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