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Document 32006D0748

    2006/748/CE: Decisão da Comissão, de 4 de Julho de 2006 , relativa ao auxílio estatal n. o C 30/2004 (ex NN 34/2004) aplicado por Portugal que isenta de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas as mais-valias de certas operações/transacções realizadas por empresas públicas [notificada com o número C(2006) 2950] (Texto relevante para efeitos do EEE)

    JO L 307 de 7.11.2006, p. 219–225 (ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, NL, PL, PT, SK, SL, FI, SV)

    Legal status of the document In force

    ELI: http://data.europa.eu/eli/dec/2006/748/oj

    7.11.2006   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    L 307/219


    DECISÃO DA COMISSÃO

    de 04 de Julho de 2006

    relativa ao auxílio estatal n.o C 30/2004 (ex NN 34/2004) aplicado por Portugal que isenta de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas as mais-valias de certas operações/transacções realizadas por empresas públicas

    [notificada com o número C(2006) 2950]

    (O texto em língua portuguesa é o único que faz fé)

    (Texto relevante para efeitos do EEE)

    (2006/748/CE)

    A COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS,

    Tendo em conta o Tratado que institui a Comunidade Europeia, nomeadamente o no 2, primeiro parágrafo do artigo 88o,

    Tendo em conta o Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, nomeadamente o n.o 1, alínea a), do artigo 62.o,

    Após ter convidado as partes interessadas a apresentarem as suas observações nos termos do referido artigo (1),

    Considerando o seguinte:

    I.   PROCEDIMENTO

    (1)

    No seguimento de informações relativas à alegada concessão, pelas autoridades portuguesas a certas empresas públicas, de isenções fiscais sobre as mais-valias nos termos do artigo 25.o do Estatuto do Benefícios Fiscais (doravante designado EBF) (2) português, a Comissão solicitou àquelas autoridades informações pormenorizadas por carta de 14 de Março de 2001.

    (2)

    As autoridades portuguesas responderam por ofício com a data de 25 de Abril de 2001. Em 28 de Outubro de 2003 foi enviado um novo pedido de informações, cuja resposta foi recebida em 30 de Janeiro de 2004. As autoridades portuguesas apresentaram informações complementares por ofício com a data de 8 de Setembro de 2004.

    (3)

    Por carta de 6 Outubro 2004 (3), a Comissão informou Portugal da sua decisão de dar início ao procedimento previsto no n.o 2 do artigo 88.o do Tratado CE relativamente deão referido auxílio. Nessa decisão, publicada no Jornal Oficial da União Europeia  (4), a Comissão convidou as partes interessadas a apresentarem os seus comentários sobre a medida.

    (4)

    Por carta recebida pela Comissão em 21 de Dezembro de 2005, as autoridades portuguesas apresentaram as suas observações.

    (5)

    Nenhuma parte interessada apresentou observações.

    II.   DESCRIÇÃO PORMENORIZADA DO REGIME DE AUXÍLIOS

    (6)

    As isenções fiscais estão previstas no artigo 25.o do EBF, intitulado «Mais-valias no âmbito do processo de privatização», que corresponde ao artigo 32.o-C na versão original de 2000, antes de o EBF ter sido revisto pelo Decreto-Lei 198/2001, de 3 de Julho.

    (7)

    O artigo 25.o do EBF prevê, para efeitos de apuramento do lucro tributável em IRC das empresas de capitais exclusivamente públicos, bem como das sociedades que com elas se encontram em relação de domínio, a exclusão da base tributável das mais-valias provenientes de operações de privatização ou de processos de reestruturação efectuados de acordo com orientações estratégicas no quadro do exercício da função accionista do Estado e reconhecidas como tal por despacho do Ministro das Finanças.

    (8)

    O artigo 25.o do EBF português entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2000, em conformidade com o artigo 103.o da Lei 3-B/2000, de 4 de Abril.

    III.   FUNDAMENTOS PARA DAR INÍCIO AO PROCEDIMENTO

    (9)

    A decisão de dar início ao procedimento de investigação formal indicava que o artigo 25.o do EBF aparentava constituir um regime de auxílios estatais na acepção do n.o 1 do artigo 87.o do Tratado CE. Este regime aparentava ser um auxílio ao funcionamento e, com base nas informações disponíveis, era incompatível, uma vez que não parecia destinar-se a quaisquer investimentos ou despesas elegíveis. Acresce que nenhuma das isenções previstas nos n.os 2 e 3 do artigo 87.o do Tratado CE parecia aplicável. Em contrapartida, a medida constituía um apoio injustificado que privilegiava as empresas públicas em detrimento das suas concorrentes do sector privado.

    IV.   OBSERVAÇÕES DE PORTUGAL

    (10)

    Por carta recebida pela Comissão a 21 de Dezembro de 2005, Portugal confirmou os elementos que já tinham sido apresentados durante a avaliação preliminar da Comissão.

    (11)

    As autoridades portuguesas resumem a evolução da tributação das mais-valias em IRC em Portugal do seguinte modo:

    Desde 1993, as mais-valias reinvestidas beneficiam de um tratamento fiscal privilegiado, desde que resultem de imobilizações corpóreas ou de acções detidas por sociedades gestoras de participações sociais (SGPS) (5). Nesses casos, o reinvestimento dos rendimentos leva à sua exclusão do lucro tributável.

    Esta situação viria a ser alterada a partir de 2001 (6). O saldo positivo entre mais-valias e menos-valias de capital era tributável da seguinte forma: quando os lucros eram reinvestidos no ano de obtenção, um quinto desses lucros era tributável nesse ano e mais um quinto em cada um dos quatro anos seguintes.

    A partir de 2002, metade das mais-valias passaram a ser tributáveis, mesmo que fossem reinvestidas (7).

    Em 2003 a situação foi de novo alterada: as SGPS (bem como as sociedades de capital de risco — SCR) beneficiaram da isenção total de imposto sobre as mais-valias realizadas com acções de que fossem titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano (8).

    (12)

    As autoridades portuguesas alegam que a legislação relativa às isenções fiscais se limitou a aplicar às empresas do sector público as mesmas regras de tributação de mais-valias e neutralidade fiscal aplicáveis às empresas privadas em reestruturação desde a reforma fiscal de 1988 e da criação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC).

    (13)

    A este respeito, as autoridades portuguesas argumentam que, ao abrigo legislação portuguesa relativa às isenções fiscais, as mais-valias reinvestidas beneficiam de um tratamento fiscal privilegiado, desde que resultem de imobilizações corpóreas ou de acções detidas por SGPS. Nesses casos, o reinvestimento dos lucros leva à sua exclusão do lucro tributável, o que constitui um elemento estruturante do regime fiscal português.

    (14)

    O artigo 25.o do EBF exclui igualmente da base tributável do IRC as mais-valias realizadas por empresas integralmente detidas pelo Estado e por empresas controladas por estas. Limita-se a alargar a estes organismos o tratamento fiscal aplicável às mais-valias reinvestidas por SGPS e às reestruturações efectuadas por outras empresas privadas. Assim, as empresas elegíveis não têm vantagens financeiras quando estão envolvidas em privatizações, reorganizações ou processos de reestruturação.

    (15)

    Segundo as autoridades portuguesas, o que o artigo 25.o do EBF procurou evitar foi, precisamente, condicionar as privatizações e processos de reestruturação empresarial do sector público à intervenção de SGPS públicas, facilitando assim o exercício da função accionista do Estado.

    (16)

    As autoridades portuguesas indicam que o artigo 25.o do EBF não contém disposições que criem um sistema de tributação excepcional das mais-valias, comparado com o sistema geral. A sua aplicação não confere qualquer vantagem adicional às empresas beneficiárias envolvidas em processos de reorganização ou reestruturação.

    (17)

    As autoridades portuguesas comunicam igualmente a sua intenção de revogar o artigo 25.o do EBF. Consequentemente, a partir da sua revogação, cada processo de reestruturação ou privatização em que esteja envolvida uma empresa pública seria tratado segundo o sistema de benefícios fiscais geral português aplicável às empresas privadas.

    (18)

    No que diz respeito à recuperação, as autoridades portuguesas argumentaram que; a) só quatro transacções beneficiaram do referido regime e que, em qualquer caso, uma empresa privada obteria as mesmas vantagens fiscais criando uma SGPS e reinvestindo os fundos em activos financeiros e que b) três dessas quatro transacções foram decididas pelo Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos (CGD) numa perspectiva privada (criação de SGPS), dado que, nessa altura, o artigo 25.o do EBF ainda não tinha sido aprovado. Por conseguinte, dado que não foi concedida às empresas qualquer vantagem financeira pública, as autoridades portuguesas defendem que nada há a recuperar.

    (19)

    As quatro transacções que beneficiaram do regime são as seguintes:

    A primeira refere-se à venda pela Mundial Confiança (MC), companhia de seguros subsidiária da instituição financeira portuguesa CGD, da sua participação (5,46%) no Crédito Predial Português (CPP) ao Banco Santander Central Hispano (BSCH), em 5 de Abril de 2000. As mais-valias obtidas pela MC ascenderam a 9,3 milhões de euros.

    A segunda transacção refere-se à venda pelo Banco Pinto & Sotto Mayor (BPSM), controlado pela CGD no momento em que a transacção teve lugar, da sua participação (94,38%) no Banco Totta & Açores (BTA), bem como da sua participação (7,09%) no CPP ao BSCH, a 7 de Abril de 2000. As mais-valias obtidas pelo BPSM foram estimadas em 310 milhões de euros.

    A terceira transacção refere-se a uma permuta de acções entre a MC e o BCP. A MC vendeu a sua participação (53,05%) no BPSM ao BCP, recebendo em troca cerca de 10% do capital do BCP, em 19 de Junho de 2000. As mais-valias obtidas pela MC foram de 1 566,4 milhões de euros.

    A quarta e última transacção refere-se às mais-valias da venda da participação da CGD no banco brasileiro ITAÚ, SA., que teve lugar entre 2000 e 2003. As mais-valias totais obtidas pela CGD foram de 357,4 milhões de euros.

    (20)

    As primeiras três transacções foram decididas na sequência dos acordos entre o «Grupo Champalimaud» e o BSCH. Com esta finalidade, a CGD e o BSCH assinaram em 11 de Novembro de 1999 um contrato pelo qual:

    O BSCH comprava as participações de António Champalimaud no «Grupo Champalimaud», vendendo-as em seguida à CGD.

    As participações no BTA e no CPP eram vendidas ao BSCH.

    (21)

    O objectivo da reestruturação do «Grupo Champalimaud» era separar as actividades bancárias e seguradoras, a fim de melhorar a eficiência das autoridades de supervisão portuguesas (Banco de Portugal e Instituto de Seguros de Portugal).

    (22)

    No quarto caso, a alienação foi decidida devido a um novo acordo entre a CGD e o Unibanco — União de Bancos Brasileiros, SA.

    (23)

    O objectivo da medida em questão é assegurar a neutralidade fiscal das operações de privatização e dos processos de reestruturação que envolvem empresas de capitais exclusivamente públicos e empresas por estas controladas.

    (24)

    As autoridades portuguesas, na sua qualidade de accionistas da CGD, enviaram, em 18 de Outubro e 31 de Março de 2000, cartas do Ministro das Finanças que autorizavam as operações acima mencionadas, de acordo com orientações estratégicas.

    V.   APRECIAÇÃO DO AUXÍLIO

    V.1.   Qualificação como auxílio estatal

    (25)

    A Comissão confirma a posição assumida na decisão de dar início ao procedimento formal sobre a qualificação da medida como auxílio estatal. O artigo 25.o do EBF, que isenta de IRC as mais-valias das empresas públicas decorrentes de operações de privatização e de processos de reestruturação, constitui um regime de auxílios estatais.

    (26)

    O Tribunal de Justiça tem defendido sistematicamente que uma medida através da qual as autoridades públicas atribuem a certas empresas isenções fiscais que, embora não implicando transferência de recursos de Estado, colocam os beneficiários numa situação financeira mais favorável que a dos outros contribuintes, constitui um auxílio estatal na acepção do n.o 1 do artigo 87.o do Tratado (9).

    (27)

    A medida prevista no artigo 25.o do EBF utiliza recursos estatais porque se baseia na não cobrança de impostos sobre sociedades que seriam normalmente cobrados pelo Estado. A decisão de abdicar desta receita preenche o critério de recursos estatais.

    (28)

    Em comparação com o regime fiscal normalmente aplicável às mais-valias em Portugal, as disposições do artigo 25.o do EBF concedem uma vantagem aos beneficiários.

    (29)

    O regime fiscal normal a ter em consideração é o regime aplicável às empresas independentemente da sua propriedade (pública ou não) e da sua natureza (SGPS ou não).

    (30)

    O regime fiscal normal não é o regime aplicável exclusivamente às SGPS, porque as transacções abrangidas pelo artigo 25.o do EBF (processos de reestruturação) tanto podem envolver tanto SGPS como outras sociedades.

    (31)

    Quanto ao regime fiscal aplicável às mais-valias obtidas por SGPS em Portugal, o regime fiscal privilegiado começou a ser aplicado em 1993. Contudo, no momento em que as referidas transacções tiveram lugar, este tratamento privilegiado só era possível quando os rendimentos obtidos eram reinvestidos. Isso significa que, mesmo em comparação com o regime aplicável às SGPS, que não era o regime fiscal normal em Portugal, verifica-se que foi atribuída uma vantagem selectiva às empresas de capitais exclusivamente públicos e às empresas por estas controladas.

    (32)

    Uma isenção do imposto relativo às mais-valias coloca as empresas públicas que dela beneficiam numa situação de vantagem, comparativamente a outras empresas que operam nos mesmos sectores económicos, na medida em que essas empresas públicas beneficiariam de um maior cash flow no exercício das suas actividades. Independentemente do objectivo da medida, o carácter de auxílio estatal é apreciado em função dos seus efeitos e não dos seus objectivos.

    (33)

    A vantagem é concedida apenas a certas empresas, as de capitais exclusivamente públicos e as empresas por estas controladas envolvidas em processos de privatização ou reorganização que obedecem a objectivos políticos estatais. Exclui todas as outras empresas, incluindo as empresas privadas que concorrem com as empresas de capitais públicos beneficiárias. A Comunicação da Comissão sobre a aplicação das regras relativas aos auxílios estatais às medidas que respeitam à fiscalidade directa das empresas (10) lembra que, por exemplo, quando algumas empresas públicas são isentas de impostos sobre o rendimento das pessoas colectivas, as regras que concedem esse tratamento preferencial a empresas que têm o estatuto jurídico de empresa pública e desenvolvem uma actividade económica podem ser qualificadas como auxílios estatais na acepção do artigo 92.o do Tratado.

    (34)

    As disposições fiscais do artigo 25.o do EBF são selectivas de jure, uma vez que apenas se referem a certas empresas (ou seja, empresas públicas ou empresas controladas por estas). Além disso, de facto, a medida aplicou-se exclusivamente a empresas públicas do sector bancário ou segurador ou a empresas controladas por estas, o que transparece dos dados fornecidos pelas autoridades portuguesas.

    (35)

    As autoridades portuguesas negam a natureza selectiva da medida, alegando que a mesma se destina a entidades de sector público enquanto categoria de empresas, sendo por conseguinte uma medida geral. Contudo, este argumento não pode ser aceite pela Comissão, pelas seguintes razões:

    (36)

    Em primeiro lugar, não existe um tal conceito de empresas do sector público relevante para efeitos fiscais, dado que as empresas que potencialmente podem beneficiar da vantagem concedida pelo artigo 25.o do EBF podem em princípio intervir numa grande variedade de mercados.

    (37)

    Em segundo lugar, a presente medida não permite identificar aspectos específicos das empresas públicas em comparação com as empresas privadas. Empresas privadas e empresas públicas estrangeiras com sucursais em Portugal podem igualmente promover programas de reorganização. Além disso, os seus accionistas podem decidir vender as empresas, mas não beneficiariam do regime.

    (38)

    Em terceiro lugar, apenas um subsector das empresas públicas é visado por esta medida: as que se encontram em processo de privatização ou reorganização, quando essas operações são reconhecidas como tal pelo Ministro das Finanças. Há selectividade nesta medida, mesmo entre empresas do sector público, também devido ao poder discricionário de que goza a autoridade competente.

    (39)

    Por conseguinte, a Comissão conclui que o artigo 25.o do EBF atribui uma vantagem selectiva. A selectividade da medida em questão não é justificada pela natureza e pela economia do sistema fiscal português.

    (40)

    Ao permitir que as empresas públicas em processo de privatização ou de reestruturação beneficiem de reduções da tributação das suas mais-valias, o artigo 25.o do EBF concede-lhes uma vantagem ao nível da exploração e reforça a sua posição relativamente a outras empresas. Na sua avaliação, a Comissão não tem de apurar se o auxílio produz um efeito real nas trocas comerciais entre os Estados-Membros ou se a concorrência está efectivamente a ser distorcida, mas apenas de examinar a susceptibilidade de esse auxílio afectar as trocas comerciais e distorcer a concorrência (11). Quando o auxílio concedido por um Estado-Membro reforça a posição de uma empresa relativamente a outras empresas concorrentes no comércio intracomunitário, deve considerar-se que estas últimas são afectadas por esse auxílio (12).

    (41)

    Além disso, todos os beneficiários identificados do regime operam nos sectores bancário e segurador, sectores que estão abertos à concorrência há muitos anos. A progressiva liberalização aumentou a concorrência que poderia ter já resultado da livre circulação de capitais prevista no Tratado CE.

    (42)

    As repercussões nas trocas comerciais entre os Estados-Membros e o impacto dos auxílios em termos de distorção da concorrência fazem-se sentir especialmente naqueles sectores de actividade (13).

    (43)

    Por conseguinte, o regime de auxílios é susceptível de afectar essas trocas comerciais e de distorcer a concorrência.

    (44)

    Do exposto decorre que o regime excepcional previsto no artigo 25.o do EBF, que isenta do IRC as mais-valias das empresas públicas resultantes de operações de privatização e de reestruturação, constitui um regime de auxílios estatais na acepção do n.o 1 do artigo 87.o do Tratado CE.

    V.2.   Qualificação do regime como auxílio ilegal

    (45)

    Portugal aplicou este regime de auxílios sem o notificar. Por conseguinte, ao aplicar o artigo 25.o do EBF Portugal infringiu o disposto no n.o 3 do artigo 88.o do Tratado.

    V.3.   Compatibilidade do regime de auxílios ilegal

    (46)

    Este auxílio não é compatível com o n.o 2 do artigo 87.o. Não se trata de um auxílio com carácter social, concedido a consumidores individuais, nem visa compensar os prejuízos causados por catástrofes naturais ou eventos excepcionais; também não é um auxílio atribuído à economia de certas regiões da República Federal da Alemanha afectadas pela divisão da Alemanha.

    (47)

    O auxílio aplica-se da mesma forma em todo o território nacional, não podendo, por conseguinte, ser considerado compatível nos termos das alíneas a) ou c) do n.o 3 do artigo 87.o, que visa o desenvolvimento de certas regiões.

    (48)

    A Comissão considera que o auxílio ao funcionamento em questão não pode ser visto como favorecendo o desenvolvimento de certas actividades económicas, nos termos da alínea c) do n.o 3 do artigo 87.o, nomeadamente porque esta disposição exige que as ajudas «não alterem as condições das trocas comerciais de maneira que contrariem o interesse comum», uma condição que, no presente caso, a Comissão considera não se verificar. Este auxílio não preenche algumas das condições previstas nas orientações comunitárias relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação em vigor no momento da sua concessão (14). Não é visado qualquer outro objectivo horizontal de interesse comum. Finalmente, a sua aplicação restritiva ao sector financeiro não altera a conclusão da avaliação, nomeadamente porque o efeito nas trocas comerciais entre os Estados-Membros e o impacto deste auxílio ao funcionamento, em termos de distorção de concorrência, é particularmente sensível neste sector.

    (49)

    O auxílio também não é compatível ao abrigo da alínea d) do n.o 3 do artigo 87.o (auxílios destinados a promover a cultura e a conservação do património) nem da alínea e) (outras categorias de auxílios determinadas por decisão do Conselho). Portugal nunca invocou qualquer destas derrogações.

    (50)

    Além disso, o auxílio também não é compatível ao abrigo da alínea b) do n.o 3 do artigo 87.o. O auxílio não pode ser considerado «um projecto de interesse europeu comum», uma vez que beneficiará as empresas públicas de um Estado-Membro e não da Comunidade no seu conjunto e não promove um projecto concreto, preciso e bem definido; nem sequer visa «sanar uma perturbação grave da economia de um Estado-Membro», uma vez que não parece que, sem o auxílio, a economia portuguesa sofreria uma perturbação grave.

    (51)

    Em qualquer caso, com excepção de declarações muito gerais, Portugal não invocou especificamente qualquer das derrogações do Tratado.

    VI.   RECUPERAÇÃO

    (52)

    Nos termos do no 1 do artigo 14o do Regulamento (CE)04 de Abril de 2006 n.o 659/99, nas decisões negativas relativas a auxílios ilegais, a Comissão decide que o Estado-Membro em causa deve tomar todas as medidas necessárias para recuperar o auxílio do beneficiário. Contudo, a Comissão não deve exigir a recuperação do auxílio se isso for contrário a um princípio geral de direito comunitário.

    (53)

    A Comissão considera que, no caso em apreço, não há princípio geral do direito comunitário que impeça a recuperação.

    (54)

    As autoridades portuguesas argumentam que, de qualquer forma, as quatro transacções que beneficiaram do regime estariam isentas do imposto nos termos do regime português aplicável às SGPS. Além disso, três das quatro transacções já tinham sido aprovadas ao abrigo do regime anterior, dado que, nessa altura, o artigo 25.o do EBF ainda não tinha sido aprovado. Por conseguinte, as autoridades portuguesas defendem que não se deve proceder à recuperação.

    (55)

    Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça (15) e a Comunicação da Comissão sobre a fiscalidade directa das empresas (16), é na fase da recuperação que tem de ser avaliado o restabelecimento da situação anterior, para determinar se existe um tratamento fiscal alternativo que, na ausência do auxílio ilegal e nos termos de regras nacionais compatíveis com o direito comunitário, concederia uma vantagem semelhante às empresas em questão.

    (56)

    O montante a recuperar para repor a situação anterior é a diferença entre: i) o beneficio líquido total concedido às empresas públicas ou às empresas por estas controladas em resultado da aplicação do artigo 25.o do EBF e ii) o tratamento fiscal «normal» que se aplicaria se as operações em questão tivessem sido efectuadas sem a medida de auxílio. Com efeito, no processo «Unicredito»  (17), o Tribunal de Justiça indica que não seria correcto determinar os montantes a reembolsar à luz de várias operações que poderiam ter sido aplicadas pelas empresas caso não tivessem optado pelo tipo de operação que beneficiou do auxílio. Neste contexto, a Comissão não tem de ter em conta as opções que hipoteticamente os operadores interessados poderiam ter tomado, tais como a possibilidade de terem estruturado as operações de outra forma.

    (57)

    Assim, para avaliar a situação que existiria se as operações em questão tivessem sido efectuadas sem a redução fiscal, tem de se proceder a uma análise de cada uma das transacções que beneficiaram do artigo 25.o do EBF. No caso em apreço, essa análise pode ser feita com base nas informações apresentadas pelas autoridades portuguesas, sem prejuízo uma nova avaliação de cada transacção com base em novas informações que venham a estar disponíveis.

    (58)

    A primeira transacção está relacionada com a venda pela MC ao BSCH da sua participação no CPP, em 5 de Abril de 2000. A segunda transacção refere-se à venda pelo BPSM, controlado pela CDG, da sua participação no BTA, bem como da sua participação no CPP ao BSCH, em 7 de Abril de 2000.

    (59)

    Uma vez que o artigo 25.o do EBF não tinha sido publicado no momento em que as transacções foram estudadas, ambas as transacções foram planeadas e aprovadas pela administração da CGD de acordo com a legislação fiscal aplicável às SGPS. A este respeito, a criação das SGPS, bem como as sucessivas vendas ou permutas de acções, teriam sido isentas de imposto ao abrigo do regime fiscal normal português. As autoridades portuguesas transmitiram todos os documentos relevantes à Comissão.

    (60)

    De facto, nas transacções em apreço a escolha dos operadores não foi de todo casual, mas as decisões já tinham sido planeadas e aprovadas pelos conselhos de administração dos grupos em causa. Além disso, já estavam reunidas as condições para executar as transacções ao abrigo da legislação fiscal geral aplicável às SGPS. As autoridades portuguesas confirmaram que não era necessário obter o acordo prévio da administração fiscal para tais transacções.

    (61)

    Em conclusão, a Comissão considera que não é necessário proceder a qualquer recuperação nestes dois casos. Nestas transacções não resultou qualquer benefício da aplicação do artigo 25.o do EBF, uma vez que na ausência deste artigo e pelas características da operação executada, a MC e o BPSM estariam isentos sob o regime de isenção das SGPS, que é o regime fiscal normal segundo as normas internas.

    (62)

    A terceira transacção refere-se a uma permuta de acções entre a MC e o BCP, tal como explicado anteriormente.

    (63)

    Desta forma as mais-valias realizadas pela MC com a permuta da maioria do capital do BPSM por acções que representam cerca de 10% do capital social do BCP estariam sujeitas ao «regime especial aplicável às fusões, cisões, entradas de activos e permutas de partes sociais» previsto nos artigos 67.o a 72.o do CIRC. Estes artigos aplicam a Directiva 90/434/CEE (18), que não deixa outra possibilidade aos Estados-Membros senão isentar de impostos a operação.

    (64)

    É certo que, por Despacho de 14 de Novembro de 2000, o Ministro das Finanças decidiu aplicar a esta transacção o artigo 25.o do EBF. Contudo, neste caso não resultou qualquer benefício da aplicação do artigo 25.o do EBF, uma vez que a isenção, sendo imposta pela directiva comunitária transposta pelo n.o 1 do artigo 71.o do CIRC, é o tratamento fiscal normal que, na ausência do auxílio ilegal e nos termos das normas nacionais compatíveis com o direito comunitário, seria aplicado à operação efectivamente realizada. Por conseguinte, também neste caso não há lugar a qualquer recuperação.

    (65)

    A quarta e última transacção refere-se às mais-valias da venda da participação da CGD no banco brasileiro ITAÚ, SA, que teve lugar entre 2000 e 2003. Contrariamente às outras três operações, esta não tem relação com os acordos entre o «Grupo Champalimaud» e o BSCH.

    (66)

    A venda efectiva teve lugar em diversas transacções sucessivas, entre 2000 e 2003. Embora as autoridades portuguesas argumentem que esta transacção teria podido processar-se através de uma SGPS, o facto é que essa forma de a realizar para obter um tratamento fiscal mais favorável do que o regime geral não foi efectivamente planeada. Por conseguinte, tendo em conta o processo Unicredito, a Comissão entende que, no caso em apreço, a aplicação da isenção fiscal a favor das SGPS implicaria reconstituir eventos passados com base em elementos hipotéticos. As autoridades portuguesas não forneceram elementos pormenorizados suficientes sobre as diferentes etapas da operação que teria permitido a neutralidade fiscal mesmo que o artigo 25.o do EBF não tivesse sido aplicado.

    (67)

    Por conseguinte, as autoridades portuguesas não demonstraram, nesta fase, que o montante a calcular mediante a aplicação da taxa efectiva do imposto às mais-valias realmente obtidas (357,4 milhões de euros), acrescido de juros, não deva ser recuperado.

    VII.   CONCLUSÃO

    (68)

    A Comissão considera que Portugal, ao aplicar o artigo 25.o do EBF, infringiu o disposto no n.o 3 do artigo 88.o do Tratado CE. Este regime de auxílios é incompatível com o mercado comum e deve ser revogado, conforme o compromisso assumido pelas autoridades portuguesas.

    (69)

    A presente decisão diz respeito ao regime enquanto tal e deve ser executada imediatamente, inclusivamente no que se refere à recuperação dos auxílios concedidos no âmbito do regime. Contudo, não prejudica a possibilidade de a totalidade ou parte dos auxílios concedidos em casos específicos poderem ser considerados compatíveis com o mercado comum.

    (70)

    As autoridades portuguesas demonstraram que, quanto às três primeiras transacções, não é necessário proceder a qualquer recuperação. Por conseguinte, com base nas informações apresentadas pelas autoridades portuguesas, e sem prejuízo de uma nova avaliação de cada transacção com base em novas informações que venham a estar disponíveis, só o auxílio relativo às mais-valias resultantes da transacção da participação da CGD no banco brasileiro ITAÚ, SA tem de ser recuperado.

    ADOPTOU A PRESENTE DECISÃO:

    Artigo 1.o

    O regime de auxílios estatais criado por Portugal nos termos do artigo 25.o do EBF é incompatível com o mercado comum.

    Artigo 2.o

    Portugal deve revogar o regime de auxílios referido no artigo 1.o.

    Artigo 3.o

    1.   Portugal deve tomar as medidas necessárias para recuperar junto dos beneficiários os auxílios referidos no artigo 1.o e que lhes foram concedidos ilegalmente.

    2.   A recuperação deve ter lugar de imediato e em conformidade com os procedimentos do direito nacional, desde que estes permitam uma execução imediata e efectiva da presente decisão.

    3.   O auxílio a recuperar incluirá os juros devidos entre a data em que os auxílios foram postos à disposição do beneficiário e a data da sua recuperação efectiva.

    4.   Os juros serão calculados com base na taxa de referência utilizada para o cálculo do equivalente-subvenção no âmbito dos auxílios regionais.

    Artigo 4.o

    Portugal informará a Comissão, no prazo de dois meses a contar da notificação da presente decisão, das medidas tomadas para lhe dar cumprimento. Para o efeito, será utilizado o questionário constante do Anexo I da presente decisão.

    Artigo 5.o

    Portugal é o destinatário da presente decisão.

    Feito em Bruxelas, em 04 de Julho de 2006.

    Pela Comissão

    Neelie KROES

    Membro da Comissão


    (1)  JO C 256 de 15.10.2005, p. 26.

    (2)  Decreto-Lei 215/89, de 1 de Julho.

    (3)  C (2004) 2637 de 6.10.2004.

    (4)  Ver nota 1.

    (5)  O n.o 2 do artigo 7.o do Decreto-Lei 495/88, de 30 de Dezembro, e n.o 2 do artigo 31.o do EBF aplicaram o disposto no artigo 44.o (novo artigo 45.o) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC).

    (6)  Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro.

    (7)  Lei 109-B/2001, de 27 de Dezembro.

    (8)  Nos termos do n.o 2 do artigo 31.o do EBF, na redacção que lhe foi dada pela Lei 32-B/2002, de 30 de Dezembro, que aprovou o orçamento de Estado para 2003, «as mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS e pelas SCR mediante a transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição, não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades».

    (9)  Processo C-6/97, República Italiana/Comissão Col. 1999, p. I-2981, ponto 16.

    (10)  JO C 384 de 10.12.1998, p. 3.

    (11)  Ver, por exemplo, o acórdão do Tribunal no processo C-372/97 Itália/Comissão (Col. 2004 p. I -3679, ponto 44).

    (12)  Processo 730/79, Philip Morris Holland/Comissão (Col. 1980, p. 2671, ponto 11).

    (13)  No que respeita ao efeito nas trocas comerciais e à distorção da concorrência no sector bancário, ver em especial o acórdão de 15.12.2005 do Tribunal de Justiça no processo C-222/04 «Fondazioni bancarie», ponto 139 e segs., e a jurisprudência citada.

    (14)  Orientações comunitárias dos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas em dificuldade (JO C 288 de 9.10.1999, p. 2).

    (15)  Processo C-148/04 «Unicredito Italiano SpA».

    (16)  Comunicação da Comissão sobre a aplicação das regras relativas aos auxílios estatais às medidas que respeitam à fiscalidade directa das empresas (JO C 384 de 10.12.1998, p 3).

    (17)  Ver nota 19, pontos 113 a 119.

    (18)  Directiva 90/434/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às fusões, cisões, entradas de activos e permutas de acções entre sociedades de Estados-Membros diferentes (JO L 225 de 20.8.1990). O n.o 1 do artigo 8.o determina que «em caso de fusão, cisão ou permuta de acções, a atribuição de títulos representativos do capital social da sociedade beneficiária ou adquirente a um sócio da sociedade contribuidora ou adquirida, em troca de títulos representativos do capital social desta última, não deve, por si mesma, implicar qualquer tributação sobre o rendimento, os lucros ou as mais-valias do referido sócio».


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