ISSN 1725-2482

Jornal Oficial

da União Europeia

C 256

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Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

50.o ano
27 de Outubro de 2007


Número de informação

Índice

Página

 

I   Resoluções, recomendações e pareceres

 

RESOLUÇÕES

 

Comité Económico e Social Europeu
436.a reunião plenária de 30 e 31 de Maio 2007

2007/C 256/01

Resolução do Comité Económico e Social Europeu sobre o Contributo para o Conselho Europeu de 21 e 22 de Junho de 2007 — Roteiro para o processo constitucional

1

 

III   Actos preparatórios

 

COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU

 

437.a reunião plenária de 11 e 12 Julho de 2007

2007/C 256/02

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às medidas penais destinadas a assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectualCOM(2005) 276 final — 2005/0127 (COD)

3

2007/C 256/03

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O potencial das empresas, especialmente das PME (Estratégia de Lisboa)

8

2007/C 256/04

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O investimento no conhecimento e na inovação (Estratégia de Lisboa)

17

2007/C 256/05

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Verde sobre a revisão do acervo relativo à defesa do consumidorCOM(2006) 744 final

27

2007/C 256/06

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos espelhos retrovisores dos tractores agrícolas ou florestais de rodas — (Versão codificada) COM(2007) 236 final — 2007/0081 (COD)

31

2007/C 256/07

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre A definição de uma política energética para a Europa (Estratégia de Lisboa)

31

2007/C 256/08

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a

39

2007/C 256/09

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao transporte terrestre de mercadorias perigosasCOM(2006) 852 final — 2006/0278 (COD)

44

2007/C 256/10

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Verde sobre as aplicações de navegação por satéliteCOM(2006) 769 final

47

2007/C 256/11

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Programa Indicativo Nuclear Apresentado em conformidade com o artigo 40.o do Tratado Euratom para parecer do Comité Económico e Social EuropeuCOM(2006) 844 final

51

2007/C 256/12

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Conferências Marítimas — Convenção das Nações UnidasCOM(2006) 869 final — 2006/0308 (COD)

62

2007/C 256/13

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Identificação por radiofrequências (RFID)

66

2007/C 256/14

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões O GALILEO numa encruzilhada: implementação dos programas europeus de GNSSCOM(2007) 261 final

73

2007/C 256/15

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Relatório intercalar bienal sobre a estratégia da UE para o desenvolvimento sustentável

76

2007/C 256/16

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às estatísticas sobre produtos fitofarmacêuticosCOM(2006) 778 final — 2006/0258 (COD)

86

2007/C 256/17

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Inovação: impacto nas mutações industriais e o papel do BEI

88

2007/C 256/18

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O emprego para as categorias prioritárias (Estratégia de Lisboa)

93

2007/C 256/19

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada

102

2007/C 256/20

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Flexigurança (dimensão da flexibilidade interna — a negociação colectiva e o papel do diálogo social enquanto instrumentos de regulação e de reforma dos mercados do trabalho)

108

2007/C 256/21

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o tema Empregabilidade e empreendedorismo — O papel da sociedade civil, dos parceiros sociais e das instâncias regionais e locais, numa perspectiva de género

114

2007/C 256/22

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Saúde e Migrações

123

2007/C 256/23

Parecer Comité Económico e Social Europeu sobre Euro-regiões

131

2007/C 256/24

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre As relações UE-América Central

138

2007/C 256/25

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Promoção do espírito empresarial das mulheres na região Euromed

144

PT

 


I Resoluções, recomendações e pareceres

RESOLUÇÕES

Comité Económico e Social Europeu 436.a reunião plenária de 30 e 31 de Maio 2007

27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/1


Resolução do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Contributo para o Conselho Europeu de 21 e 22 de Junho de 2007 — Roteiro para o processo constitucional»

(2007/C 256/01)

Na reunião de 29 de Maio de 2007, a Mesa do Comité Económico e Social Europeu, como contributo para o Conselho Europeu de 21 e 22 de Junho de 2007, decidiu apresentar uma resolução relativa ao roteiro para o processo constitucional.

Na reunião plenária de 30 e 31 de Maio de 2007 (sessão de 30 de Maio), o CESE adoptou, por 171 votos a favor, 18 votos contra e 16 abstenções, a seguinte resolução:

1.

O CESE chama a atenção para os pareceres sobre o Tratado Constitucional de 24 de Setembro de 2003 (1), de 28 de Outubro de 2004 (2) e de 17 de Maio de 2006 (3), bem como para a resolução de 14 de Março de 2007 a propósito do 50.o aniversário da assinatura do Tratado de Roma (4). Nos referidos pareceres, o CESE manifestou-se sem reservas a favor do método convencional bem como a favor do resultado obtido.

2.

O CESE mantém o seu apoio ao Tratado Constitucional, que se distingue inequívoca e positivamente de todos os textos institucionais de revisão dos Tratados de Roma que as diversas conferências intergovernamentais produziram até à data: é fruto de um debate livre e público no qual participaram os parlamentares nacionais e europeus; reúne sistematicamente num único texto o conjunto do dispositivo político-institucional tal como evoluiu desde a criação das Comunidades Europeias; e prevê as disposições relativas às necessárias reformas institucionais e processuais do sistema de decisão da União Europeia, descreve os objectivos a que a União se deve propor, define os valores que devem reger a sua política e codifica os direitos fundamentais a respeitar e proteger.

3.

As razões supra justificam intitular o projecto da Convenção de «Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa». Devido a mal-entendidos de vários níveis gerados em alguns Estados-Membros, o termo «Constituição» foi, todavia, rejeitado. O CESE não se opõe a dar um outro nome ao novo Tratado. A substância é mais importante do que o nome.

4.

Enquanto representante institucional da sociedade civil organizada, o CESE fundamenta o seu contínuo apoio ao Tratado Constitucional nas seguintes razões que contribuem para o reforço da legitimidade democrática da União:

Ampliação das competências do Parlamento Europeu mediante extensão da co-decisão a novos domínios;

Associação acrescida dos parlamentos nacionais às actividades da União Europeia: é-lhes atribuído o direito de controlar o respeito do princípio da subsidiariedade;

Aperfeiçoamento da transparência das deliberações do Conselho da União Europeia;

Reforço do diálogo social autónomo na medida em que os parceiros sociais são reconhecidos como agentes da integração europeia;

Reconhecimento da importância da democracia participativa nomeadamente por as instituições europeias deverem proceder a um diálogo transparente e regular com as organizações da sociedade civil e com os cidadãos da União;

No mesmo espírito, introdução de um direito de iniciativa para os cidadãos da União.

5.

O CESE recorda que os chefes de Estado ou de Governo de todos os Estados-Membros reunidos no Conselho Europeu aprovaram o Tratado Constitucional e, em 29 de Outubro de 2004, assinaram-no solenemente em Roma. Desde então, uma maioria dos dois terços dos Estados-Membros, representando uma clara maioria dos cidadãos da União Europeia, ratificou o Tratado Constitucional. O CESE pretende, por conseguinte, que o Tratado Constitucional seja o fundamento das deliberações futuras visando resolver o actual momento de crise.

6.

O CESE apoia a intenção da Presidência alemã de apresentar, na conferência do Conselho Europeu de 21 e 22 de Junho próximos, um roteiro para as acções futuras visando a solução da crise e congratula-se com o facto de a Declaração de Berlim de 25 de Março de 2007 estabelecer a data das eleições europeias de 2009 para a entrada em vigor do novo Tratado.

7.

O que significa que, até ao fim de 2007, uma breve conferência intergovernamental terá de proceder às alterações necessárias ao actual projecto, de forma a obter novo consenso. O mandato da conferência intergovernamental consistirá em precisar as poucas disposições que poderão ser objecto de uma nova deliberação. O resultado teria de ser ratificado por todos os Estados-Membros no decorrer de 2008.

8.

As novas deliberações sobre o Tratado têm de garantir a preservação da substância do que foi decidido no quadro da Convenção Europeia e em seguida aprovado por unanimidade pelos chefes de Estado ou de Governo. Trata-se principalmente de novos elementos institucionais e processuais e do carácter vinculativo da Carta dos Direitos Fundamentais. Ou seja, a Parte I (objectivos, instituições, estrutura da União), a Parte II (Carta dos Direitos Fundamentais da União) e a Parte IV (considerações gerais e finais) mantêm-se inalteradas. As disposições da Parte III, que referem-se essencialmente às considerações sobre as políticas da União Europeia dos Tratados em vigor, não têm obrigatoriamente de fazer parte do novo Tratado; as disposições institucionais e processuais da Parte III deveriam ser incorporadas na Parte I, pois excedem o campo da jurisdição actualmente em vigor.

9.

O CESE acompanhará de forma construtiva o trabalho da conferência intergovernamental. O CESE insiste também no sentido de se dar às organizações da sociedade civil a possibilidade de participar a título consultivo, apesar da previsível brevidade da conferência intergovernamental e do respectivo curto mandato. O CESE disponibiliza-se para organizar em colaboração com a Presidência do Conselho as respectivas reuniões de informação e de consulta; para tal, poder-se-á apoiar nas experiências positivas que teve aquando dos trabalhos da Convenção Europeia, tanto com a Presidência como com o Parlamento Europeu.

10.

Urge pôr um ponto final na actual situação de crise através da adopção de um Tratado que responda às exigências de uma União composta por 27 Estados-Membros. De facto, os novos desafios tornam imperativo que a União Europeia chegue a acordo quanto a novas políticas e tome decisões de grande alcance, sobretudo no que se refere ao desenvolvimento do modelo social europeu, de que os serviços de interesse geral são um elemento constitutivo, e ao reforço da dimensão social da integração europeia; urge controlar os efeitos negativos resultantes da globalização de todas as relações económicas, sociais e culturais; importa promover o crescimento económico e o reforço da competitividade; há que gerir as alterações climáticas, garantir a segurança do aprovisionamento energético, combater os problemas subjacentes à migração e lutar contra a pobreza e a exclusão social.

Bruxelas, 30 de Maio de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Parecer destinado à Conferência Intergovernamental de 2003 (CESE 1171/2003) JO C 10 de 14.1.2004.

(2)  Parecer sobre o Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa JO C 120 de 20.5.2005.

(3)  Parecer de 17 de Maio de 2006«Contributo para o Conselho Europeu de 15 e 16 de Junho de 2006 — Período de reflexão»JO C 195 de 18.8.2006.

(4)  JO C 161 de 13.7.2007.


III Actos preparatórios

COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU

437.a reunião plenária de 11 e 12 Julho de 2007

27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/3


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às medidas penais destinadas a assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual»

COM(2005) 276 final — 2005/0127 (COD)

(2007/C 256/02)

Em 21 de Setembro de 2005, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, que emitiu parecer em 4 de Junho de 2007, sendo relator RETUREAU.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 12 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 76 votos a favor e 3 votos contra, o presente parecer:

1.   Conclusões

1.1

O Comité manter-se-á atento à aplicação da directiva de 2004 conjugada com a presente directiva alterada, bem como com as decisões-quadro complementares pertinentes, para verificar oportunamente a eficácia da luta contra a contrafacção e as suas ramificações internacionais, inclusivamente fora do território comunitário.

1.2

Concordando, em linhas gerais, com as disposições propostas, o Comité convida a Comissão a considerar as observações formuladas no presente parecer, o qual preconiza a concentração de diligências de repressão e de cooperação penal e aduaneira principalmente nas empresas de contrafacção maciça, bem assim nas contrafacções cometidas por organizações criminosas ou quando a infracção implicar um risco para a saúde ou para a segurança das pessoas.

1.3

O Comité apreciaria que a directiva abrangesse os direitos de propriedade industrial na sua íntegra e não excluísse as patentes de invenções, que são os domínios que mais interessam à indústria europeia.

1.4

O CESE salienta a imprecisão de determinados termos jurídicos, como os de «escala comercial» ou «natureza comercial» dos delitos, constantes da proposta de directiva em apreço, o que contradiz os princípios fundamentais do direito penal, segundo os quais o tipo penal deve ser objectivo e definido de forma clara e precisa. O CESE opõe se igualmente à forma de definição das penas previstas no artigo 2.o da proposta, por considerar que seria mais pertinente adoptar um quadro geral de sanções penais (limitado à recomendação de penas de prisão, de coimas ou de outras penas pecuniárias), devendo a determinação das penas concretas ser da competência das legislações nacionais.

2.   Introdução

2.1

No seu MEMO/05/437, de 25 de Novembro de 2005, a Comissão fez uma síntese da sua Comunicação dessa mesma data, regozijando-se com o acórdão do Tribunal de Justiça que reconhecia à Comunidade competências na adopção de medidas penais dissuasivas e proporcionais para garantir a aplicação das normas a que estão sujeitas as políticas comunitárias contidas no TCE.

2.2

Na sua comunicação, a Comissão expõe a sua interpretação do acórdão do Tribunal de Justiça que anulou a decisão-quadro relativa à protecção do ambiente pelo direito penal. O Tribunal considerava que apenas a Comissão tinha competência para adoptar medidas no âmbito do direito penal necessárias para assegurar a eficácia do direito penal. Na opinião da Comissão, o alcance deste acórdão transcende largamente o âmbito do ambiente e visa todas as políticas comunitárias e as liberdades fundamentais reconhecidas pelo Tratado. A inserção de sanções penais no direito comunitário deve ser motivada por uma necessidade devidamente justificada e respeitar a coerência geral da arquitectura do direito penal da União.

2.3

Esta interpretação extensiva de uma sentença que diz respeito ao ambiente não contou com a adesão unânime dos Estados-Membros nem da doutrina. Muitos deles consideram que as incriminações e a escala das sanções penais respectivas relevam essencialmente da subsidiariedade e que a sua harmonização eventual ao nível comunitário releva da cooperação judiciária interestatal prevista no TUE.

2.4

Convém assinalar que esta interpretação é partilhada amplamente pelo Parlamento Europeu, uma vez que os âmbitos que relevam de uma competência penal comunitária já não têm unicamente por base a unanimidade dos Estados-Membros no Conselho, mas a maioria qualificada num processo de co-decisão que também envolve o Parlamento, cujas competências de co-legislador são assim alargadas (1).

2.5

Trata-se, contudo, de uma dilatação considerável das competências comunitárias decorrente de uma decisão do tribunal, podendo o risco de divergências de interpretação entre as instituições retardar, designadamente, a adopção de legislação comportando disposições penais ou restringir a posteriori a sua amplitude, por exemplo, em consequência de novos recursos judiciais ou de compromissos. No caso concreto desta proposta de directiva, continua em aberto a questão de incluir ou não as patentes de invenções no âmbito da protecção penal, visto o Parlamento considerar que o acórdão do Tribunal apenas diz respeito ao direito de origem comunitária, enquanto a Comissão defende a necessidade de visar a legislação em matéria de propriedade intelectual no seu conjunto, seja ela comunitária ou nacional.

3.   Propostas da Comissão

3.1

A proposta de directiva alterada (COM(2006) 168 final) visa a criação de um quadro penal horizontal e harmonizado para assegurar o respeito dos direitos de propriedade industrial, de propriedade literária e artística e outros direitos imateriais equiparados (agrupados sob a designação de «propriedade intelectual»). A proposta diz respeito ao mercado interno e é motivada pela necessidade afirmada de uma intervenção europeia neste domínio, observando os princípios de subsidiariedade e de proporcionalidade. A base jurídica é o artigo 95.o do TCE.

3.2

A proposta estabelece um quadro penal geral que define os «direitos de propriedade intelectual» (DPI) protegidos, as infracções a esses direitos e as sanções penais mínimas a aplicar, no mercado interno, com um intuito de harmonização da repressão penal da contrafacção de bens materiais, serviços e criações intelectuais e artísticas protegidos pelo direito substantivo europeu e pelos direitos nacionais, bem como pelas convenções internacionais pertinentes, designadamente o Acordo TRIPS (2), celebrado em 1994 na OMC, que contém disposições relativas à sanção penal (3) das violações de determinados direitos protegidos.

3.3

Uma directiva de 2004 fixa já um quadro de protecção contra a cópia, a pirataria e a contrafacção (4) para fins comerciais, fornecendo uma declaração da Comissão (5) uma lista detalhada dos direitos protegidos pelo artigo 2.o desta directiva. Trata-se da propriedade industrial (patentes de invenções e certificados complementares, certificados de utilidade, marcas, denominações de origem, desenhos e modelos, bem como variedades vegetais), do direito de autor e direitos conexos, bem como direitos sui generis criados pelo direito comunitário sobre as topografias de circuitos electrónicos e bases de dados. São direitos exclusivos considerados juridicamente como fazendo parte de um direito de propriedade imaterial. Uma parte destes direitos está incluída no acervo comunitário, tendo mesmo protecção material comunitária organizada (desenhos e modelos, marcas e variedades vegetais) (6). Outros, como as patentes, relevam exclusivamente do direito nacional, na expectativa da patente comunitária reivindicada por todos os sectores industriais. A designação consagrada de propriedade intelectual abarca um domínio muito heterogéneo de direitos imateriais, cuja natureza e regime jurídico diferem consideravelmente.

3.4

Os países membros estão sujeitos às obrigações do Acordo TRIPS, que exige a criação de legislação nacional adequada em matéria de acções judiciais e de sanções penais a aplicar à contrafacção para fins comerciais. Todavia, é-lhes dada uma certa latitude de interpretação, além de que alguns Estados ainda não estabeleceram repressão penal proporcional às violações dos DPI cometidas no seu território, inclusivamente entre os membros da UE. A directiva de 2004 permite o ressarcimento dos lesados, impondo aos países membros obrigações em matéria de investigação, procedimento, apreensão (7), muito activa em matéria de contrafacção e indemnização com o objectivo de harmonização do direito aplicável e de luta contra a criminalidade organizada (8). Todavia, esta directiva diz respeito apenas ao procedimento e às sanções em matéria civil, comercial e administrativa, visando principalmente a reparação de danos causados aos titulares de direitos protegidos que tenham instaurado uma acção por contrafacção, havendo países que nem sequer a transpuseram ainda!

3.5

A protecção da «propriedade intelectual» está consignada na Declaração Universal dos Direitos do Homem e na Carta dos Direitos Fundamentais da UE, declaração solene adoptada em Nice em Dezembro de 2000. Está igualmente prevista a protecção internacional através de convenções celebradas no âmbito dos organismos especializados da ONU competentes (OMPI, UNESCO) ou num âmbito regional (Convenção de Munique, de 1973, que cria a OEP e a patente europeia). Por ora, o Acordo TRIPS é o único que contém disposições penais mínimas. A proposta da Comissão preconiza uma certa harmonização comunitária, obrigando os Estados-Membros a introduzirem sanções penais no seu direito interno, com a definição de infracções e sanções-tipo comuns.

3.6

A proposta de directiva alterada visa, portanto, a aproximação do nível das penas por infracção aos DPI, nomeadamente penas de prisão, multas de natureza penal e perda. Pretende fixar regras de competência judiciária para, se possível, centralizar as acções num único Estado-Membro, quando a infracção disser respeito a vários países membros, e facilitar a investigação. Propõe-se que as vítimas ou os seus representantes sejam associados à investigação.

3.7

A principal revisão, relativamente às propostas anteriores, consiste em fixar o nível e natureza das sanções penais aplicáveis às incriminações de violações da propriedade intelectual, definidas igualmente no projecto.

3.8

As pessoas singulares culpadas de infracções previstas no artigo 3.o da directiva devem ser punidas com uma pena máxima de, pelo menos, 4 anos de prisão, quando tiverem agido no âmbito de uma organização criminosa, ou quando a infracção implicar um risco para a saúde ou para a segurança das pessoas (n.o 1 do artigo 2.o).

3.9

As pessoas singulares ou colectivas culpadas de infracções previstas no artigo 3.o da directiva serão passíveis de sanções eficazes, proporcionais e dissuasivas, que incluem multas de natureza penal ou não penal de um máximo de, pelo menos, 100 000 euros (300 000 euros para os casos graves mencionados no n.o 1, sem prejuízo de penas mais graves, nomeadamente em caso de risco de morte ou enfermidade).

3.10

O direito nacional deveria prever a perda dos produtos contrafeitos, dos bens e dos instrumentos relacionados com o crime, pelo menos nos casos graves (criminalidade organizada, risco para a saúde e para a segurança das pessoas) (artigo 3.o).

3.11

A proposta alterada permite aos Estados-Membros ultrapassar os níveis estabelecidos.

3.12

Na sequência da retirada do projecto de decisão-quadro do Conselho que acompanhava o projecto inicial, a Comissão encara a possibilidade de aplicar uma abordagem horizontal no âmbito dos procedimentos penais, adoptada em 23.12.2005, para apoiar o auxílio judicial mútuo e reconduzir a escala das penas a níveis comparáveis entre os vários países, a fim de ser possível solicitar a assistência da Eurojust (9).

3.13

A iniciativa da investigação e da acção penal compete aos Estados-Membros, não devendo depender apenas da apresentação de queixa pelas vítimas.

4.   Observações na generalidade

4.1

O Comité constata a utilização cada vez mais generalizada de um conceito impreciso, o conceito de «propriedade intelectual», que amalgama conceitos jurídicos distintos e vários modos de protecção e utilização, mas o facto é que este termo foi consagrado pelo direito europeu e internacional. A natureza, a duração e o alcance de cada um dos direitos imateriais em questão diferem substancialmente, relevando de um regime jurídico próprio, de uma validade territorial variável e de instâncias específicas de registo ou de protecção, podendo, além disso, a interpretação das infracções a estes direitos divergir consoante o país e evoluir rapidamente em certos casos.

4.2

As análises da composição de medicamentos (sem exploração nem publicação dos resultados) ou a engenharia inversa de programas ou de componentes electrónicas para fins de interoperabilidade ou ainda o exercício de um direito legítimo como o direito à cópia privada, contornando um dispositivo (geralmente bastante débil) de protecção, podem ser qualificados de contrafacção ou de cópia ilegal em vários Estados-Membros, onde aliás as penas podem ser muito elevadas, mesmo na ausência de intenção comercial ou associação criminosa.

4.2.1

O Comité já se pronunciou a favor da luta coordenada a nível comunitário contra as diversas formas de contrafacção comercial que afectam a economia europeia e a favor da repressão dos vários delitos contra a propriedade industrial e os direitos de autor (10), que causam importantes prejuízos à economia europeia; a contrafacção maciça também pode ser obra de organizações criminosas ou de grupos organizados, e pode afectar a saúde, a segurança ou a vida das pessoas: nestes últimos casos, deve ser encarada como circunstância agravante para a determinação das sanções penais. O projecto de directiva deveria considerar o princípio de agravamento das penas para todas as circunstâncias agravantes.

4.2.2

Tal como para a directiva de 2004, o Comité aprova o facto de a harmonização prevista visar apenas as infracções cometidas à escala comercial e, por conseguinte, susceptíveis de afectar o mercado único; seria ainda útil definir melhor esse carácter «comercial» precisando, por exemplo, que os produtos ou serviços de contrafacção se destinam à venda maciça, causando consideráveis prejuízos económicos, ou que são perigosos para as pessoas, independentemente da quantidade vendida ou ainda que em qualquer dos casos os autores dos delitos têm como móbil a obtenção de lucros ilícitos. A aplicação de sanções penais pressupõe a violação manifesta da ordem pública, violação essa que pode variar de intensidade e de gravidade. A escala dos delitos e das penas deve ser em proporção da violação, embora nos possamos interrogar sobre se a distinção entre «violações à escala comercial de um direito de propriedade intelectual» e «violações graves», e se o rigor das penas propostas respondem correctamente ao princípio da proporcionalidade inerente ao direito penal. Por outro lado, as trocas privadas de ficheiros efectuadas pela Internet, a reprodução (ou «remix» musical), a exibição de obras, materiais ou intelectuais, em ambiente familiar ou privado, ou para fins de estudos e experimentais, estão implicitamente excluídas do âmbito de aplicação da legislação proposta; seria conveniente explicitar essa exclusão.

4.2.3

O Comité recorda que os direitos imateriais afectados pela contrafacção não são direitos absolutos; cada direito afectado tem a sua especificidade concedendo, em princípio, exclusividade e um monopólio temporário de exploração cuja duração e extensão geográfica de validade variam, isto é, instaura uma medida proteccionista limitada no tempo (em contrapartida da publicação das invenções em matéria de patentes, devido à criação de uma obra protegida por direitos de autor). Mas os titulares de licenças e os utilizadores legítimos ou de boa-fé de produtos e serviços, ou de obras intelectuais, também têm direitos por vezes muito amplos no âmbito de determinadas licenças (11). Ora, vários direitos nacionais contêm incoerências, privilegiando muitas vezes unilateralmente os direitos dos produtores, dos distribuidores e das indústrias em detrimento dos direitos dos consumidores. A vontade de introduzir em numerosos países sanções penais pesadas no direito nacional também parece ir nesse sentido. Chega-se ao paradoxo de a pena máxima por violação do foro comercial prevista na proposta de directiva revelar-se até tão ou menos pesada que a aplicável a uma violação individual!

4.2.4

Comité apreciaria, por iniciativa da Comissão, por exemplo através de um estudo comparativo aprofundado das legislações nacionais após a transposição, um autêntico nivelamento do direito penal nacional pelo direito penal comunitário com vista a uma efectiva harmonização europeia, em particular no âmbito do direito de autor e dos direitos conexos que são por vezes objecto do excesso de sanções penais desproporcionadas, sem que isso seja realmente necessário, já que os modelos comerciais de difusão das obras estão em plena evolução e, em breve, serão suprimidos os dispositivos de protecção contra a cópia ilegal conhecidos como «GDD». Em certos casos, a tributação dos suportes compensa largamente os titulares de direitos contra cópias não autorizadas.

4.3   Observações na especialidade

4.3.1

O Comité solicita que a natureza do delito «de incitamento» à contrafacção de bens ou serviços da propriedade intelectual seja definida de forma mais clara. Numa infracção penal há a intenção de o seu autor, ou os seus cúmplices, a cometerem: o acordo TRIPS evoca «um acto deliberado de contrafacção» e a directiva fala de acto intencional, deliberado. Na infracção existe também um elemento material, que é a execução do delito, ou pelo menos a tentativa de o executar, equiparável a um começo de execução: os dois elementos são cumulativos, e a mera intenção não é suficiente para constituir a infracção (a não ser que se crie uma polícia do pensamento). Todavia, em geral, não se pode considerar incitamento à comissão de um delito se o «instigador» não fornecer instrumentos (geralmente ilícitos) para esse fim específico. O Comité também considera que o mero fornecimento de materiais ou programas informáticos de uso corrente, ou de acesso à Internet não pode ser equiparado a cumplicidade ou delito de «incitamento» (que, geralmente, só ocorre em situações muito limitadas em direito penal, sendo, aliás, difícil de provar), se esses meios forem utilizados pelos contrafactores. A noção de cumplicidade deveria ser suficiente na legislação comunitária e a questão da co-autoria ser regulada em detalhe pelas legislações nacionais. Doutro modo, incriminações na ausência de elementos intencionais poderiam provocar grande insegurança jurídica em vários fornecedores de material ou de serviços.

4.3.2

A reprodução ilícita de obras, modelos, processos ou invenções protegidas por um monopólio temporário constitui o delito de contrafacção; seria conveniente quedarmo-nos por esta definição, sem a alargar ao conceito de pirataria (que consiste geralmente em intrusão fraudulenta em sistemas informáticos para os controlar e lhes extrair os dados ou utilizar a banda passante, geralmente para fins ilícitos). A pirataria é diferente da contrafacção propriamente dita, e os delitos penais devem continuar a ter uma interpretação estrita. É claro que a intrusão, sem autorização, em sistemas informáticos, o roubo de dados ou de banda passante e a violação da privacidade devem estar sujeitos a incriminação penal adequada, mas não fazem parte directamente da contrafacção. A repressão da pirataria informática deveria ser tratada de um modo específico, mesmo que os conceitos sejam usados ambiguamente em várias declarações políticas que tendem a misturá-los e a causar uma certa confusão. Sendo a pirataria informática utilizada no âmbito de empreendimentos terroristas, deveria ser alvo de uma atenção muito especial e de uma cooperação internacional adequada.

4.3.3

O termo «organização criminosa» ou criminalidade organizada que consta da exposição de motivos deveria ser completado pelo termo «grupo organizado», que já existe como agravante em algumas legislações penais. Cometer contrafacção comercial em grupo organizado, ou no âmbito de uma organização criminosa, deveria constituir uma circunstância agravante, justificando o agravamento das penas e das multas.

4.3.4

A Comissão indica que os Estados-Membros podem fixar penas mais graves ou sancionar outros actos. Isso pode ser interpretado como um incentivo à penalização de actos sem finalidade comercial, e até a tornar o delito de contrafacção extensivo a actos que não constituem reprodução ou cópia propriamente ditas de um produto, de um processo ou de uma obra.

4.3.5

O Comité tem reservas quanto à assimilação pelo direito comunitário e em certos países de programas de cópia susceptíveis de contornar ou anular os GDD (12) (dispositivos anti-cópia, materiais ou programas, amiúde fracos e não codificados) à contrafacção de dispositivos GDD, quando o que é classificado de «contrafacção» não é uma cópia ou uma reprodução do dispositivo original. Além disso, os chamados dispositivos de GDD não são uniformes; dependem de uma plataforma ou de um fornecedor, os formatos dos ficheiros podem ser proprietários, o que dificulta a interoperabilidade ou visa constituir mercados cativos afastando a concorrência. A criação e a utilização de meios de cópia para permitir ao consumidor ou à empresa titular de uma licença de programas exercer os seus direitos (cópia privada, de salvaguarda, para utilizar em diversos materiais standard) não deveriam ser penalizadas enquanto tal, mas só se houver o elemento moral e o elemento material de um delito à escala comercial.

4.3.6

O Comité apoia o princípio da independência da acção penal em relação a qualquer queixa apresentada pela vítima em instâncias civis ou penais. Com efeito, num contexto mafioso, as vítimas poderiam hesitar em instaurar uma acção para proteger os seus direitos. Além disso, a contrafacção comercial, especialmente por bandos ou organizações que são parte da criminalidade organizada ou ainda por terroristas, afecta as economias e o bem-estar social, sendo a sua repressão da responsabilidade do Estado.

4.3.7

Espera que uma cooperação eficaz entre os Estados-Membros permita combater eficazmente as redes internacionais de contrafacção, especialmente as que têm ligações a organizações criminosas e actividades de branqueamento de capitais, recordando que várias destas redes operam a partir de países terceiros e que é indispensável uma acção que se estenda para além das fronteiras da União, com os meios oferecidos pelo direito internacional.

4.3.8

Ao nível comunitário, o Comité considera que as equipas conjuntas de investigação policial também deveriam cooperar com as equipas aduaneiras, bem assim com as vítimas da contrafacção ou com os respectivos peritos mandatados. Regozija-se com a integração das vítimas nos procedimentos de investigação, propondo embora que o seu papel se limite a informar as autoridades públicas. Seria excessivo que, após uma acusação de contrafacção à escala comercial, uma empresa pudesse, por exemplo, participar em controlos e apreensões num concorrente, considerado inocente até prova judiciária e definitiva em contrário por decisão transitada em julgado. O Comité faz questão de evitar derivas de justiça privada, ingerência ou intromissão abusiva de pessoas não dotadas de autoridade pública em processos penais.

4.3.9

Por último, o Comité está preocupado com a tendência para a invasão comercial crescente das redes da Internet e para os pedidos de ampliar a este sector de actividade as sanções penais previstas no TRIPS, conforme ficou bem evidente no relatório de 2006 do Ministério do Comércio dos EUA sobre os capítulos 301 e super 301 (13), em aplicação das convenções da OMPI (Organização Mundial da Propriedade Intelectual) sobre a propriedade intelectual na Internet, instrumento este livre do domínio público e bem comum universal.

Bruxelas, 12 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Os protocolos «opt in» para o Reino Unido e a Irlanda e a excepção no caso da Dinamarca deixariam de opor-se à legislação, como acontece com as iniciativas que relevam do terceiro pilar.

(2)  Acordo sobre os aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio.

(3)  Artigo 61.o do Acordo TRIPS.

(4)  Directiva 2004/48/CE relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual.

(5)  Declaração 2005/295/CE da Comissão no que se refere ao artigo 2.o da supracitada directiva.

(6)  Com a honrosa excepção da patente comunitária, que continua no limbo (a.n.c.).

(7)  Decisão-Quadro 2005/212/JAI do Conselho relativa à perda de produtos, instrumentos e bens relacionados com o crime (contrafacção, pirataria) in JO L 68 de 15.3.2005.

(8)  Projecto de decisão-quadro do Conselho relativa à luta contra a criminalidade organizada. A contrafacção pode estar igualmente envolvida no financiamento de redes terroristas e o branqueamento dos rendimentos da contrafacção são também actos de natureza criminosa a combater com vigor.

(9)  COM(2005) 696 final.

(10)  Ver o parecer Malosse (JO C 221 de 7.8.2001).

(11)  Licença «Creative Commons», «General Public Licence», «BSD», licença audivisual livre da BBC, etc.

(12)  Digital Rights Management (gestão dos direitos digitais, eufemismo para «protecção contra a cópia»).

(13)  2006 SPECIAL 301 REPORT USA.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/8


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O potencial das empresas, especialmente das PME (Estratégia de Lisboa)»

(2007/C 256/03)

Em 14 de Setembro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o artigo 31.o do Regimento, incumbir a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo da elaboração de um relatório de informação sobre O potencial das empresas, especialmente das PME (Estratégia de Lisboa).

Na reunião plenária de 14 e 15 de Março de 2007, foi decidido nos termos do disposto no n.o 2 do artigo 29.o do Regimento transformar o relatório de informação em parecer de iniciativa.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo adoptou parecer em 3 de Maio de 2007, sendo relatora Christine FAES.

Na 437.a reunião plenária, realizada em 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 12 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 123 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

Nas conclusões da Presidência do Conselho Europeu de 23 e 24 de Março 2006 solicita-se ao Comité Económico e Social Europeu a elaboração, no início de 2008, de relatórios sumários de apoio à Parceria para o Crescimento e o Emprego.

1.2

O Conselho Europeu propõe ainda domínios específicos de acção prioritária para 2005-2008:

i.

investimento no conhecimento e na inovação;

ii.

potencial das empresas, designadamente das PME;

iii.

emprego para categorias prioritárias (…);

iv.

definição de uma política energética para a Europa (…);

v.

medidas a tomar a todos os níveis para manter o ritmo em todos os pilares da Parceria para o Crescimento e o Emprego (…).

2.   Síntese e recomendações

2.1

Apesar de a Estratégia de Lisboa ter produzido resultados positivos, não cumpriu a totalidade dos seus objectivos nos domínios do crescimento económico e industrial e da criação de mais e melhor emprego. Em termos de concorrência global, a Europa enfrenta os desafios de concorrentes tradicionais e outros mais recentes, com os quais não consegue lidar de forma adequada.

2.2

As empresas europeias têm de operar num mercado único incompleto, sobretudo no que se refere à harmonização fiscal, à aplicação das directivas pelos Estados-Membros, que é demasiado lenta, aos encargos administrativos, que ainda persistem, e à mobilidade laboral praticamente inexistente. As PME têm dificuldades particulares em superar estes obstáculos.

2.3

Outros desafios a ultrapassar são a falta de espírito empresarial, o envelhecimento da população e o seu efeito no empreendedorismo, a oferta de trabalho e uma maior necessidade de centrar as atenções na transmissão de empresas, acesso a financiamento na fase de criação e na fase de crescimento, acesso a resultados de investigação e, por conseguinte, oportunidades de inovação.

2.4

As pequenas e médias empresas ocupam um papel central na realização dos objectivos de Lisboa. Contudo, o seu contributo, se bem que necessário, foi descurado nos primeiros anos de aplicação da Estratégia. Em particular, deveria ser fomentado o envolvimento das organizações de PME na avaliação do progresso, bem como o seu papel na promoção das PME a todos os níveis de decisão. O CESE apela a que na próxima revisão das orientações integradas para o crescimento e emprego para o período de 2008 a 2010 sejam formuladas orientações integradas sobre as PME mais orientadas e racionais, em particular no domínio das micro reformas económicas. Com vista à sua participação plena no processo, o CESE insta o Conselho a estabelecer uma base jurídica para a Carta das Pequenas Empresas — tal como solicitado pelo Parlamento — de modo a reforçar os fundamentos para acções futuras. As orientações e acções políticas que a seguir se expõem são consideradas cruciais para o desenvolvimento do potencial empresarial das PME.

2.4.1

O CESE insta a Comissão e o Conselho a envidarem todos os esforços no sentido de tornar o princípio de pensar primeiro em pequena escala («Think Small First») um princípio basilar em toda a legislação relevante.

2.4.2

Apela a que se designe 2009 «Ano do Empresário», para sublinhar o papel crucial dos empresários no crescimento e bem-estar e incentivar os jovens e outros a considerarem o empreendedorismo uma carreira.

2.4.3

Solicita que se congreguem esforços para assegurar um Programa de Competitividade e Inovação eficaz, que preste apoio eficiente e acesso facilitado às PME, bem como um 7o Programa-Quadro de Investigação e Desenvolvimento e Fundos Estruturais que facilitem o acesso das PME. A eficácia e o acesso a estes programas, assim como à iniciativa JEREMIE, deveriam ser acompanhados de perto.

2.4.4

A grande mais-valia de uma empresa é o seu capital humano. Estruturas de apoio adequadas, ofertas de formação em função das necessidades e incentivos financeiros bem concebidos deveriam ajudar as PME a valorizar as competências e qualificações dos trabalhadores, assim como dos empresários, através do investimento em formação contínua.

2.4.5

O CESE apela a que a Comissão analise a participação das PME em programas comunitários. Se a participação não for considerada suficiente, deveria ser fixada uma percentagem mínima obrigatória.

2.4.6

Os contratos públicos são um instrumento importante na ajuda ao desenvolvimento das actividades das PME. A participação das PME deveria ser acompanhada de perto e deveriam ser desenvolvidas medidas para facilitar o seu acesso aos contratos públicos. Importa, portanto, encorajar a troca de boas práticas.

2.4.7

Deveria ser criada uma estrutura de coordenação na Comissão que promova a aplicação em todos os programas, acções e medidas legislativas de uma verdadeira política em matéria de PME que seja eficiente e eficaz.

2.4.8

Conviria realizar acções específicas para fomentar e valorizar as melhores práticas no domínio das PME e aumentar a competitividade, em especial nas regiões com um nível de desenvolvimento abaixo da média europeia. Essas acções deveriam ser concretizadas por intermédio das organizações de PME.

3.   Observações na generalidade

3.1

A Estratégia de Lisboa é conhecida antes de mais, de forma redutora, como um compromisso para, até 2010, fazer da União Europeia a economia baseada no conhecimento mais dinâmica e mais competitiva do mundo. Além deste quadro geral, o Conselho adoptou em Junho de 2000, em Santa Maria da Feira, a Carta Europeia das Pequenas Empresas.

3.2

O Comité recorda que, desde o início, o mandato de Lisboa de 24 de Março de 2000

sublinhava a necessidade de envolver activamente os parceiros sociais e a sociedade civil na estratégia, recorrendo a várias formas de parceria;

especificava que o seu êxito depende sobretudo do sector privado e de parcerias público-privadas e da participação tanto dos Estados-Membros como da União;

tinha como objectivo o desenvolvimento equilibrado das suas três vertentes: crescimento económico, coesão social e sustentabilidade ambiental, através do estímulo da competitividade europeia e da criação de emprego, definindo simultaneamente políticas ambientais adequadas.

3.3

No Conselho Europeu de Março de 2005, o Conselho procedeu à revisão intercalar da Estratégia de Lisboa e decidiu relançar o processo, centrando novamente os esforços no crescimento e no emprego enquanto principais prioridades políticas da Europa. Foi alcançado um acordo sobre as orientações integradas para o crescimento e o emprego (1), que deverá promover a coerência de medidas de reforma e apresentar um roteiro para a elaboração de programas nacionais de reforma.

3.4

Na evolução da Estratégia de Lisboa, a busca da competitividade e do crescimento é um elemento fundamental para melhorar o bem-estar económico, criar emprego, manter e melhorar a qualidade dos estilos de vida. Por seu turno, uma melhor qualidade de vida, as melhorias sociais e a sustentabilidade ambiental poderão também gerar crescimento. É especialmente nos domínios do crescimento económico e industrial e da criação de mais e melhor emprego que a Estratégia de Lisboa ainda não apresentou resultados. Face à concorrência mundial, a Europa confronta-se com dificuldades. Desde o lançamento do processo de Lisboa, a UE passou por um grande alargamento de 15 para 25 Estados-Membros e posteriormente para 27.

3.5

O Comité gostaria de assinalar primeiro que a Estratégia de Lisboa já permitiu uma série de elementos positivos, incluindo:

a consciência da necessidade de reforma que ultrapassa as divisões tradicionais;

a expansão acelerada das tecnologias da informação e processos de inovação;

mais apoio à criação de empresas e ao financiamento de PME;

maior preocupação com o desenvolvimento sustentável com vista a reduzir o défice público, restabelecer a estabilidade do orçamento da protecção social e proteger o ambiente;

iniciativas dos parceiros sociais na reforma social;

medidas com vista à simplificação de procedimentos legais e administrativos, apesar do impacto limitado até à data.

3.6

Apesar destes aspectos positivos, a principal observação é que a Europa, encurralada entre os seus grandes concorrentes industrializados e as economias emergentes com custos de produção reduzidos que estão a recorrer mais às novas tecnologias, está perante desafios cada vez maiores a nível de concorrência. Vários indicadores são motivo de preocupação, tais como:

a redução da procura interna, do investimento, da taxa de produtividade e crescimento na União Europeia que a colocam numa posição desfavorável em comparação com os seus principais concorrentes e mercados emergentes;

a globalização, que está a conduzir à integração de novos países no sistema económico internacional;

o incumprimento de objectivos de emprego;

défices públicos persistentes em vários Estados-Membros, embora nem sempre iguais;

a grande disparidade da legislação fiscal e das taxas de tributação aplicáveis às empresas;

a persistência de encargos administrativos para as empresas e lentidão na aplicação das directivas nos Estados-Membros;

o envelhecimento da população europeia, que exercerá enorme pressão nas finanças públicas e na oferta de mão-de-obra;

a ameaça de uma cada vez maior escassez de recursos ou volatilidade dos preços, alterações climáticas e perda de biodiversidade;

a falta de mobilidade laboral, essencial para a realização do mercado interno;

a deslocalização de empresas na Europa para mercados emergentes e em rápido crescimento;

o crescente desinteresse dos cidadãos europeus pela União Europeia.

3.7

Simultaneamente, verificam-se atrasos nas reformas da Estratégia de Lisboa:

3.7.1

A nível europeu, os Estados-Membros envidaram esforços no sentido da realização do mercado único em vários domínios (energia, serviços, contratos públicos, redes transeuropeias, adaptação dos serviços públicos), mas falham na aplicação das medidas necessárias no prazo definido.

3.7.1.1

A nível europeu, a Comissão tem levado a cabo desde 1990 iniciativas com vista a, em primeiro lugar, compreender melhor as necessidades e o funcionamento das PME e, em segundo lugar, apoiar o seu desenvolvimento e ajudar a explorar melhor o seu potencial de criação de emprego. Estas acções foram reforçadas nos últimos anos com a nomeação do representante para as PME, o Plano de Acção para o Espírito Empresarial adoptado em 2004 e os esforços para uma melhor legislação e melhor acesso ao financiamento (FEI e BEI), bem como o Programa de Competitividade e Inovação (PCI).

3.7.2

A nível nacional os resultados variam, notando-se falhas sobretudo no que respeita:

a complexidade estrutural dos regulamentos e procedimentos administrativos;

as elevadas taxas de desemprego, sobretudo em alguns grupos-alvo;

as elevadas taxas de reforma antecipada, apesar dos compromissos;

os sistemas de educação e formação não adaptados, em particular no que se refere a competências empresariais e em matéria de TIC;

a insuficiência da oferta de oportunidades de aprendizagem ao longo da vida;

as despesas em investigação, que, em vez de aumentarem para atingirem o objectivo de Lisboa de 3 % do PIB, continuam, em regra, a diminuir;

a falta de inovação, apesar de o mais recente relatório do painel de avaliação da inovação revelar melhores resultados;

a falta de acesso a financiamento para PME, associada ao desconhecimento das possibilidades existentes a nível da UE;

a persistência de défices públicos embora nem sempre nos mesmos Estados-Membros.

3.7.3

Os novos Estados-Membros têm, não raro, de ultrapassar outras dificuldades decorrentes de um défice de desenvolvimento, por exemplo, em desemprego, tecnologias ou ambiente, se bem que essas dificuldades sejam por vezes compensadas com medidas de renovação mais radicais do que na UE-15.

3.8

É referido o relatório elaborado pelo Comité Económico e Social Europeu (CESE) a pedido do Conselho Europeu de Março de 2005, que apresenta os resultados da consulta do CESE aos seus parceiros em todos os Estados-Membros e a nível europeu sobre a aplicação da Estratégia de Lisboa e o papel dos parceiros sociais e de outros componentes da sociedade civil organizada (2). Nos últimos anos o Comité publicou vários relatórios sobre a Estratégia de Lisboa e aspectos específicos desta estratégia (3).

4.   Melhorar o potencial das empresas, em especial das PME

4.1   A importância das PME na economia europeia

4.1.1

A grande maioria das empresas (99,8 %) na Europa são PME. A empresa típica europeia é uma micro-empresa (91 %), 7 % são pequenas empresas. As empresas de pequena dimensão não só predominam, como também representam uma parte considerável do emprego (dois terços do emprego no sector privado) e da actividade económica (57 % do PIB) na Europa (4).

4.1.2

No intuito de melhorar a monitorização do desempenho económico das PME, o CESE apela à Comissão Europeia para que relance as actividades do Observatório Europeu das PME.

4.1.3

As PME são os principais criadores de emprego, pois representam uma das grandes fontes de receitas dos orçamentos estatais (impostos, IVA, etc.) e oferecem oportunidades profissionais e sociais a boa parte da população, em especial ao segmento mais activo e inovador que é o «motor» da economia. Além disso, constituem a principal componente de um contexto económico propício à economia de mercado caracterizado por flexibilidade, inovação e dinamismo e representam o germe das futuras grandes empresas, nomeadamente nas novas áreas da economia baseadas em tecnologias complexas.

4.2   Competitividade

4.2.1

A ênfase na competitividade reconhece a necessidade de alcançar uma competitividade sustentável numa economia aberta e global, promovendo a utilização de novas tecnologias, privilegiando uma formação profissional mais eficaz, dispondo de trabalhadores qualificados e melhorando a produtividade. O conceito de qualidade (qualidade dos bens, serviços, regulamentação, governação, emprego, relações sociais e ambiente) é fundamental para a estratégia.

4.2.2

Para garantir a estabilidade económica, os Estados-Membros devem manter os seus objectivos orçamentais a médio prazo ao longo do ciclo económico ou adoptar todas as medidas correctoras necessárias. Nesse sentido, os Estados-Membros devem evitar políticas orçamentais procíclicas. Os Estados-Membros que apresentem défices da balança de transacções correntes susceptíveis de se tornarem insustentáveis devem procurar corrigi-los, através da implementação de reformas estruturais destinadas a reforçar a competitividade externa e da adopção de políticas fiscais. Estas medidas são o mínimo indispensável devido ao envelhecimento da população europeia.

4.2.3

O CESE considera que só alterando as linhas gerais básicas das políticas económicas e, em particular das políticas macroeconómicas, será possível eliminar os obstáculos na Europa que estão a travar uma recuperação económica sustentada e de maior alcance. A UE deve actuar do seu interior se pretender reorientar a economia europeia para o crescimento e o pleno emprego. Para tal será necessária uma política macroeconómica equilibrada com o propósito claro de realizar os objectivos da Estratégia de Lisboa, em particular o pleno emprego, reforçar a competitividade, ter devidamente em consideração a obrigação de contribuir para o desenvolvimento sustentável em harmonia com as conclusões da Cimeira de Gotemburgo.

4.2.4

O CESE recorda que o objectivo da política monetária deveria ser o equilíbrio entre a estabilidade dos preços, o crescimento económico e o emprego. Faria sentido instar o BCE a considerar a estabilidade um objectivo numa perspectiva mais ampla, isto é, não apenas a estabilidade dos preços mas também em termos de crescimento, pleno emprego e coesão social (5). Para alcançar resultados importa alinhar os orçamentos nacionais pelas políticas do BCE e respeitar o Pacto de Estabilidade e Crescimento.

4.2.5

O CESE assinala ainda que os serviços ligados às empresas, sendo parte das PME, se revestem de particular importância para o sucesso do processo de Lisboa e para a competitividade da UE. Na sequência da comunicação da Comissão a este respeito (6), o CESE sublinha a necessidade de criar um ambiente regulamentar que permita às PME em questão cumprirem as exigências com que são confrontadas a nível societal.

4.2.6

O CESE apoia igualmente a análise alargada das medidas de apoio necessárias em 27 sectores da indústria transformadora que é feita no documento da Comissão sobre uma política industrial integrada, insistindo, porém, na necessidade de esta política ser posta em prática em coordenação com os Estados-Membros (7).

4.3   Legislar melhor (8)

4.3.1

O CESE congratula-se com a recente proposta da Comissão Europeia de diminuir a carga administrativa das empresas em 25 % até 2012 (9). Tal poderá aumentar o PIB da UE em 1,5 %. O CESE insta a Comissão a apresentar uma estratégia clara para a simplificação total do ambiente regulador, para evitar o incumprimento dos objectivos (10).

4.3.2

Uma menor carga administrativa pode incentivar o dinamismo económico. O controlo do peso das obrigações legais e reguladoras requer uma abordagem global das autoridades locais, regionais e nacionais, bem como da União Europeia. É essencial que os regulamentos sejam bem concebidos e proporcionados.

4.3.3

O CESE apoia a criação de uma Comissão de Avaliação de Impacto (Empresarial), anunciada pela Comissão na sua revisão estratégica da iniciativa «Legislar Melhor» (11), cujo objectivo é reforçar a qualidade e a eficácia das análises de impacto. Contudo, o seu âmbito de acção não deve limitar-se apenas à coordenação, mas também considerar a qualidade do trabalho englobando as PME e a análise das consequências económicas e sociais das propostas de regulamentação. As novas regulamentações nacionais e comunitárias deveriam ser meticulosamente analisadas para avaliar o seu impacto nas PME.

4.3.4

Os impactos económico, social e ambiental de regulamentação nova ou revista devem ser avaliados cuidadosamente a fim de identificar as eventuais soluções de compromisso e as sinergias entre diferentes objectivos políticos. Além do mais, a regulamentação em vigor é analisada para averiguar da possibilidade de simplificação, sendo igualmente avaliado o seu impacto na competitividade. Deveria prestar-se particular atenção ao estudo do impacto de todas as propostas legislativas e regulamentares da Comissão Europeia nas empresas independentes, em particular nas pequenas empresas. Finalmente, está a ser desenvolvida uma abordagem comum para avaliar os custos administrativos da nova legislação e da legislação existente. O princípio «pensar primeiro em pequena escala» («think small first») deveria orientar a revisão da actual legislação e a elaboração da nova legislação. Isto significa que a legislação deveria considerar as particularidades das PME.

4.3.5

O CESE assinala que as melhorias são particularmente importantes no caso das pequenas e médias empresas (PME) que, normalmente, possuem recursos limitados para satisfazer as exigências administrativas impostas, quer pela legislação comunitária, quer pela legislação nacional.

4.3.6

Devem ser tomadas as medidas necessárias para assegurar que todos os Estados-Membros apliquem as directivas atempadamente e com qualidade e convencer os governos e legisladores nacionais e regionais a simplificarem a regulamentação nos casos em que a aplicação da legislação comunitária levou a regulamentação desnecessária («gold-plating»).

4.3.7

A maior parte dos actores políticos a nível regional, nacional e europeu não conhecem suficientemente a realidade nas pequenas empresas e as suas verdadeiras necessidades. Um maior envolvimento de associações representativas de PME (12) a todos os níveis é uma condição imprescindível para melhorar a qualidade da política das PME na Europa. Reforçar as associações de pequenas empresas é também um dos elementos-chave da Carta Europeia das Pequenas Empresas (2000). As associações representativas de PME deveriam ser implicadas enquanto importantes partes interessadas no processo de decisão a todos os níveis.

4.3.8

O CESE manifesta o seu forte apoio à Carta Europeia das Pequenas Empresas, que se revelou um bom instrumento para acompanhar os progressos realizados e identificar os problemas das PME, bem como para impelir os Estados-Membros a agir para melhorar a coordenação das políticas empresariais em toda a Europa. É importante que o processo de integração dos relatórios sobre a execução da Carta nos relatórios anuais da Agenda de Lisboa se faça a um ritmo constante. É imperioso actualizá-la e completá-la permanentemente em função da Estratégia de Lisboa revista e do importante processo de alargamento da União Europeia.

4.4   Cultura empresarial e criação de novas empresas (13)

4.4.1

O empreendedorismo é um fenómeno complexo que inclui espírito de iniciativa, assunção de riscos e inovação. As pequenas e as novas empresas geram inovação, preenchem nichos de mercado, criam emprego e aumentam a concorrência, promovendo, assim, a eficiência económica.

4.4.2

A União Europeia padece, no seu todo, de um fraco nível de actividade das empresas na sua fase inicial. O último relatório GEM (Global Entrepreneurship Monitor) não coloca nenhum Estado-Membro entre os 10 países com melhores resultados (14). Por outro lado, 8 Estados-Membros constam entre os 10 países com níveis de participação mais baixos (15).

4.4.3

O espírito empresarial é importante para toda a sociedade. No intuito de promover e sensibilizar para a cultura empresarial e despertar as consciências para a sua importância para o desenvolvimento global de um país, o Comité propõe que 2009 seja declarado Ano Europeu do Espírito Empresarial. Neste contexto, o Comité assinala que em 2010 terá lugar a revisão intercalar de vários programas comunitários relevantes. Há que criar uma atitude pública positiva em relação ao espírito empresarial. O Ano Europeu do Espírito Empresarial constituiria também uma oportunidade para consolidar e reforçar os actuais intercâmbios de boas práticas.

4.4.4

Há que, na UE, modificar os programas de ensino e de formação — em particular a nível do ensino superior —, dando mais destaque à formação empresarial avançada, ao valor estratégico da gestão da informação e das TIC e à criação de redes. As escolas e as universidades desempenham um papel essencial na promoção do espírito empresarial entre os jovens. Seria desejável, por exemplo, fomentar a participação activa de representantes das empresas nos programas de ensino, bem como o envolvimento de organizações empresariais. Os meios de comunicação social e a imagem por eles veiculada são importantes.

4.4.5

Devem ser desenvolvidas políticas de apoio à criação e desenvolvimento de empresas, nomeadamente estabelecendo processos de criação de empresas mais rápidos e menos onerosos, medidas para melhorar o acesso ao capital de risco, mais programas de formação empresarial, medidas destinadas a facilitar o acesso às redes e aos serviços de utilidade pública e uma rede mais densa de serviços de apoio a pequenas empresas. São ainda necessárias decisões políticas em matéria de reforma dos sistemas fiscais, regulamentação, acesso aos mercados, procedimentos de emergência e de reestruturação e direito de sucessões. É igualmente necessária uma alteração cultural no que se refere à atitude perante a falência.

4.4.6

A disponibilidade de financiamento numa fase inicial é crucial. Na Bélgica, os governos tomaram iniciativas com vista a colmatar a falta de capital próprio. Um exemplo é o fundo ARkimedes, que reuniu 110 milhões de euros sob a forma de acções ou obrigações, garantidas pelo governo regional da Flandres.

4.4.7

Igualmente essencial é prestar informação e serviços de apoio empresarial, nomeadamente para jovens empresários. Os programas de «mentores» na Flandres (Bélgica) revelaram-se úteis.

4.4.8

O receio de falhar tem um forte efeito negativo na eventual criação de empresas. Deve adoptar-se um quadro social adequado para trabalhadores por conta própria, que devem ter acesso facilitado a uma segunda oportunidade.

4.5   Mercado interno (16)

4.5.1

Deve ser libertado o potencial do mercado único. A União Europeia deverá agora gozar das vantagens de um mercado maior do que o dos EUA ou da China. Porém,

demasiadas directivas não foram totalmente transpostas para a legislação nacional;

os progressos realizados em matéria de harmonização e de reconhecimento mútuo no sector da prestação de serviços não foram suficientes;

houve atrasos na liberalização dos mercados, nomeadamente no sector público;

surgiram dificuldades quanto a um acordo sobre um regime europeu viável de direitos de propriedade intelectual;

as distorções são causadas por diferenças a nível fiscal.

4.5.2

O interesse despertado pela União Europeia como espaço de investimento depende da dimensão e da abertura dos seus mercados, do seu quadro regulamentar e da qualidade das suas infra-estruturas. O reforço dos investimentos tornará a Europa também mais produtiva, uma vez que os níveis de produtividade do trabalho dependem dos investimentos em capital físico e humano, no conhecimento e nas infra-estruturas.

4.5.3

A capacidade revelada pelos produtores europeus para competirem e sobreviverem no mercado interno é essencial para consolidar a sua competitividade nos mercados mundiais. Enquanto o mercado interno dos bens está relativamente bem integrado, os mercados dos serviços permanecem, legalmente ou de facto, bastante fragmentados. Para promover o crescimento e o emprego e reforçar a competitividade, o mercado interno dos serviços deve ser plenamente operacional, preservando ao mesmo tempo o modelo social europeu. A eliminação dos obstáculos fiscais às actividades transfronteiras bem como dos entraves remanescentes à mobilidade dos trabalhadores produziriam igualmente importantes ganhos de eficiência. Finalmente, a plena integração dos mercados financeiros aumentaria a produção e o emprego, permitindo uma afectação de capitais mais eficaz e criando melhores condições de financiamento para a actividade empresarial.

4.5.4

Para as PME, sobretudo no sector dos serviços, o mercado interno ainda não está plenamente realizado. A elevada carga administrativa que pesa sobre as operações transfronteiriças e a inadequação das normas europeias impedem as pequenas empresas de tirar partido de um mercado mais vasto.

4.5.5

As normas desempenham um papel fulcral no acesso aos mercados. Os actuais processos de normalização não consideram suficientemente as particularidades do artesanato e das PME. As pequenas empresas devem implicar-se mais na elaboração das normas europeias e internacionais. Apesar do forte apoio da Comissão a estruturas como a NORMAPME (17), são necessários mais esforços, em particular tendo em vista a produção em pequena escala e por encomenda, a redução dos custos, uma representação mais equilibrada nos comités técnicos e a simplificação dos sistemas de certificação.

4.5.6

As práticas no sector dos contratos públicos ainda podem ser significativamente melhoradas. Tais melhorias traduzir-se-iam num aumento da percentagem de anúncios de concursos públicos. As atenções deveriam centrar-se na possibilidade de as PME participarem em processos de adjudicação de contratos públicos. O CESE apoia a elaboração pela Comissão de um compêndio de boas práticas registadas neste domínio pelos Estados-Membros da UE, mas também pelos Estados Unidos e pelo Japão, que tiveram como resultado o acesso alargado das PME a estes contratos.

4.5.7

Na Europa, as PME têm de enfrentar 27 sistemas fiscais diferentes, o que implica custos de conformidade proibitivos e cria barreiras sérias ao mercado interno. Os custos de conformidade para as pequenas empresas são muito superiores aos que as grandes empresas têm de suportar (18). Aguarda-se uma simplificação, em particular, a favor das PME.

4.6   Capital humano, desenvolvimento de competências e diálogo social

4.6.1

Num contexto de uma economia globalizada e baseada no conhecimento, as empresas têm de se adaptar constantemente à mudança. Os empresários de sucesso necessitam, mais do que nunca, de uma base sólida de conhecimentos e qualificações para enfrentar a concorrência crescente e serem capazes de vencer a corrida da inovação. Os desenvolvimentos tecnológicos requerem o desenvolvimento constante de novas competências, sobretudo no domínio das TIC e a aquisição de competências actualizadas tanto por parte dos empresários como dos trabalhadores (19).

4.6.2

Desde 2000, com a Estratégia de Lisboa, os objectivos de formação e as estratégias de aprendizagem ao longo da vida foram claramente reforçados na Europa, mas continuam a necessitar de melhorias, tal como é referido no relatório de avaliação de 2006 do «Quadro de acções para o desenvolvimento de competências e qualificações ao longo da vida», acordado em 2002 pelos parceiros sociais europeus (CES, BusinessEurope, CEEP, UEAPME). Neste contexto, o novo «Programa de Acção Integrado Comunitário de Aprendizagem ao Longo da Vida» também deveria participar plenamente neste esforço, uma vez que o seu objectivo declarado é contribuir para a realização dos objectivos de Lisboa, nomeadamente «o desenvolvimento da União Europeia enquanto sociedade do conhecimento avançada, caracterizada por um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos e uma maior coesão social».

4.6.3

Tal como o CESE referiu com razão (20)«os programas educativos da União Europeia figuram entre as raras actividades comunitárias directamente orientadas para os cidadãos europeus. O novo programa deverá ter por objectivo, por um lado, promover o desenvolvimento democrático baseado no ideal da democracia participativa e de cidadania activa e, por outro, promover o emprego e um mercado de trabalho versátil». Uma vez que também integra os principais programas europeus de mobilidade, nomeadamente Leonardo da Vinci para aprendizes, jovens em formação profissional inicial e jovens trabalhadores, bem como Erasmus para os estudantes, estes deveriam ser mais acessíveis à mobilidade individual. Estudar e trabalhar no estrangeiro durante um determinado período não só enriquece as capacidades e o saber-fazer do indivíduo, mas aumenta também a compreensão da Europa e da cidadania europeia. Ajuda ainda as pessoas a adoptarem uma atitude mais activa e a sentirem-se mais responsáveis pela sua empregabilidade na sua vida profissional.

4.6.4

O CESE sublinhou ainda a «particular importância da possibilidade de as PME acederem ao programa» e «propõe uma abordagem particular para as PME, simplificando os procedimentos relevantes com vista a tornar a sua participação nos programas exequível e eficaz». Numa economia orientada pelos serviços, a grande mais-valia de uma empresa é o seu capital humano. Para que as empresas, sobretudo as PME, possam prosseguir uma estratégia de desenvolvimento de competências, deveriam ser organizadas iniciativas de apoio que lhes permitam investir em formação contínua, como, por exemplo, oportunidades de formação à medida das necessidades, apoio financeiro e incentivos fiscais.

4.6.5

O diálogo social é um instrumento importante para ultrapassar desafios económicos e sociais. Um dos seus grandes êxitos é a melhoria do funcionamento do mercado e a antecipação das mudanças. O diálogo social contribui ainda para a criação de um clima de confiança nas empresas. Pode ainda fornecer soluções adaptadas às pequenas empresas, desde que tenha em conta a especificidade e a qualidade do ambiente de trabalho e das relações laborais, bem como a situação particular em que o artesanato e as pequenas empresas trabalham e se desenvolvem.

4.7   Inovação

4.7.1

A Agenda de Lisboa fixou o objectivo de consagrar 3 % do PIB à investigação e desenvolvimento (I&D), dos quais dois terços devem provir do sector privado, que actualmente contribui apenas com 56 %. Infelizmente, há que referir que a Europa consagra à I&D uma percentagem do seu PIB bastante inferior à dos EUA e do Japão (1,93 %, contra 2,59 % nos EUA e 3,15 % no Japão). Além disso, no atinente à intensidade de investigação a China está em vias de, até 2010, igualar a UE. Investigação e desenvolvimento: em 2002, o sector privado investiu mais 100 mil milhões de euros em investigação e desenvolvimento nos Estados Unidos do que na Europa.

4.7.2

O futuro Instituto Europeu de Tecnologia (IET), cujo objectivo é alcançar a máxima integração possível da educação, da investigação e da inovação de excelência, deveria reconhecer e dar valor ao potencial das PME. Deveria reforçar-se a cooperação entre, por um lado, as universidades e os centros de investigação e, por outro, as empresas, em particular as de pequena dimensão. Os investigadores deveriam ser incentivados a estabelecer contacto com as empresas. Não podemos subestimar a importância de promover a transferência de tecnologias através de centros de tecnologia e de incubadoras. O novo enquadramento dos auxílios estatais à investigação e desenvolvimento e à inovação (I&D&I) deveria igualmente prever medidas de ajuda a prestadores de serviços de apoio à inovação, clusters e redes. Em cada um dos 27 Estados-Membros da UE deveriam ser dadas mais oportunidades aos investigadores europeus. É imperioso promover e divulgar mais os resultados da investigação a fim de melhorar o acesso das empresas a esses resultados e o impacto económico daí decorrente.

4.7.3

A Europa devia prever um ambiente regulador harmonizado favorável à inovação. São necessárias novas iniciativas de patente comunitária europeia, com vista a proteger a inovação e responder às necessidades das empresas europeias. Este sistema deveria prever taxas reduzidas para as PME e uma estrutura adequada de seguros para litígios relacionados com patentes.

4.7.4

A Comissão Europeia reconheceu nas suas últimas comunicações a necessidade de alargar a definição de inovação para centrar as atenções nas PME e considerar a inovação não-técnica em todos os sectores da economia. Esta nova abordagem deve ser executada em todos os domínios de política, para que possa ser útil às pequenas empresas.

4.7.5

Para as PME, é crucial a valorização do seu capital humano e a admissão de universitários para os sectores da produção e da inovação. O 7.o programa-quadro deveria apoiar as PME nos domínios da investigação tecnológica de ponta e das técnicas de produção, bem como noutras formas de inovação importantes na estrutura de uma PME.

4.7.6

Os recursos necessários a nível da UE devem provir do programa de acção em favor da competitividade e da inovação, do programa-quadro para a investigação, dos fundos estruturais e dos programas educativos, para citar apenas os principais. A coordenação das políticas, inclusive dos recursos, será uma tarefa difícil e sensível, uma vez que os recursos financeiros comunitários disponíveis são bastante limitados em relação às necessidades e à procura. Para assegurar que os recursos financeiros provenientes dos fundos estruturais (através do Fundo de Investimento Europeu — JEREMIE) são utilizados para co-financiar programas destinados a PME inovadoras, à criação e à transmissão de empresas, convirá adoptar medidas adequadas em cada Estado-Membro e acompanhar de perto a sua eficácia e acessibilidade.

4.7.7

A introdução de novos métodos e instrumentos de produção avançados, particularmente nas PME, requer créditos em condições favoráveis. O BEI e o FEI deverão estar envolvidos estreitamente na actividade dos grupos de planificação sectorial e intersectorial.

4.7.8

As PME devem beneficiar de maior assistência quanto à utilização das aplicações das TIC, que lhes podem permitir diminuir as despesas, aumentar a produtividade e melhorar a competitividade.

4.8   Transmissão de empresas (21)

4.8.1

Estudos europeus revelam que cerca de um terço dos empresários europeus, sobretudo os proprietários de empresas familiares, as abandonarão dentro de 10 anos. Estima-se que serão assim afectadas cerca de 690 000 empresas, com 2,8 milhões de empregos. As transmissões deveriam ser promovidas como alternativa à criação de uma empresa.

4.8.2

Ao contrário do que se passava anteriormente, cada vez mais as transmissões de empresas ocorrem fora da família, para terceiros. Também tem aumentado o interesse em adquirir uma empresa já existente, em vez de criar uma de raiz. Estudos demonstram que 96 % das empresas objecto de transmissão ainda existem decorridos cinco anos após a transferência, em comparação com 75 % de novas empresas.

4.8.3

O primeiro desafio é, por conseguinte, criar uma plataforma e facilitar a aproximação de potenciais compradores e vendedores de empresas. Este mercado deve ser transparente, com vista a aumentar as possibilidades de estabelecer contactos e garantir a continuidade das empresas viáveis actuais. É essencial dispor de serviços de elevada qualidade, incluindo mediação, consultoria e confidencialidade. Na maior parte dos países europeus há mercados de transmissão de empresas governamentais ou apoiados pelo governo (22). Estas iniciativas deveriam ser desenvolvidas em todos os Estados-Membros da UE.

4.9   Acesso a financiamento

4.9.1

As PME e, especialmente, as novas empresas, as empresas que tenham sido objecto de transmissão e as empresas inovadoras deveriam ter acesso facilitado ao financiamento de modo a poderem explorar totalmente o seu potencial, criar crescimento económico e gerar mais emprego na Europa. Os modelos de partilha de riscos, como sistemas de garantia mútua e de garantia pública, revelaram ser instrumentos muito eficazes e devem ser mais promovidos tanto a nível da UE como dos Estados-Membros.

4.9.2

Para que as novas empresas, as PME e as empresas em rápido crescimento possam dispor de capital a um preço acessível é necessário que as taxas de juro e os prémios de risco se mantenham a níveis razoáveis e que os regimes de ajuda pública sejam racionalizados.

4.9.3

Deveria ser reforçado e apoiado o aconselhamento às PME prestado pelas suas organizações. É igualmente necessário criar instrumentos financeiros que sejam adaptados às necessidades e aos meios das pequenas empresas. O CESE insta a Comissão e o BEI/FEI a financiar a inovação nas pequenas empresas sob a forma de capital de risco e regimes de garantias.

4.9.4

Os investidores de capital de risco e os investidores informais («business angels») são para as PME formas importantes de acesso ao financiamento. Estimular a criação de redes entre investidores de capital de risco e investidores informais, por um lado, e (novos) empresários, por outro, é importante para reduzir um défice de fundos próprios pequeno.

4.9.5

Os sistemas de garantia revelaram ser uma forma eficaz e eficiente de apoiar as pequenas empresas no tocante à utilização dos recursos. Em França, a Caisse Mutuelle de Garantie de la Mécanique (CMGM) tem mais de 45 anos de experiência neste domínio. Oferece garantias bancárias para a quase totalidade dos créditos (créditos de investimento, transmissão de empresas, warrants, créditos em dinheiro) que são concedidos às empresas. As empresas subscrevem o capital e o fundo de garantia. Este sistema permite reduzir as garantias pessoais pedidas aos empresários, conceder-lhes montantes mais avultados e dá-lhes segurança em relação ao seu banco. Deveria ser incentivado o intercâmbio de boas práticas entre os Estados-Membros quanto ao acesso das PME ao financiamento e aos fundos de garantia.

4.10   Internacionalização

4.10.1

A UE deve aproveitar as oportunidades proporcionadas pela abertura de mercados em rápido crescimento no continente asiático, tais como a China e a Índia. Simultaneamente, deve enfrentar a questão da nova repartição internacional do trabalho daí resultante, especialmente porque a China se começa a especializar mais em produtos de elevado valor acrescentado e a Índia se está a desenvolver enquanto centro mundial de deslocalização. O CESE assinala que é essencial adoptar uma abordagem comum em relação aos países terceiros, de forma a melhorar as condições de acesso ao mercado para as empresas europeias.

4.10.2

Apesar de o mercado único já existir há mais de 14 anos, ainda há muitas empresas que exercem a sua actividade apenas no território nacional. Os principais obstáculos são as barreiras linguísticas, as diferenças que persistem no que toca à legislação e à regulamentação e o conhecimento deficiente de outros mercados. O CESE congratula-se com a criação de serviços de apoio de proximidade aos empresários, à semelhança do «Passaporte para a Exportação» do Reino Unido (23). Deveria ser incentivado o acesso das PME a contratos públicos.

4.10.3

Deveriam ser desenvolvidos sistemas de apoio adequados para estimular actividades transfronteiras, bem como dentro da União Europeia e noutros mercados.

4.10.4

O CESE sublinha que os documentos da Comissão sobre política comercial (estratégia de acesso, instrumentos de defesa, Europa Global) deveriam prestar particular atenção às PME.

Bruxelas, 12 de Julho de 2007.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Decisão do Conselho, de 12 de Julho de 2005, relativa às orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros, (2005/600/EC), JO L 205 de 6.8.2005, p. 21.

(2)  Aplicação da Estratégia de Lisboa. Relatório de síntese ao Conselho Europeu.

(3)  JO C 185, 8.8.2006 + CCMI/032.

(4)  Dados referentes a 2003. «Pocket Book», Eurostat 2006.

(5)  O próprio CESE já solicitou em várias ocasiões que a política monetária também tentasse alcançar os objectivos do pleno emprego e crescimento.

(6)  «A competitividade dos serviços ligados às empresas e o seu contributo para o desempenho das empresas europeias» COM(2003) 747 final, 4 de Dezembro de 2003.

(7)  Comunicação da Comissão — «Execução do Programa Comunitário de Lisboa: Um quadro político para reforçar a indústria da UE — Rumo a uma abordagem mais integrada da política industrial» COM(2005) 474 final e «Uma política industrial moderna».

(8)  O CESE publicou recentemente vários pareceres sobre Simplificação, Legislar Melhor.

 

JO C 24, de 31.1.2006, parecer exploratório a pedido da Presidência do Reino Unido sobre «Legislar Melhor», relator Daniel Retureau.

 

JO C 24, de 31.1.2006, parecer de iniciativa sobre «Melhorar a execução e o cumprimento da legislação comunitária», relator Joost van Iersel.

 

JO C 112, 30.4.2004, parecer sobre «Actualizar e simplificar o acervo comunitário», COM(2003) 71 final, relator Daniel Retureau.

(9)  COM(2006) 689, 690 e 691, de 14 de Novembro de 2006.

(10)  Programa de Acção para a Redução da Carga Administrativa na União Europeia COM(2007) 23 final, de 24.1.2007.

(11)  Comunicação da Comissão Europeia de 14 de Novembro de 2006.

(12)  Por organização de PME entende-se as organizações que representam as PME (definição europeia) em vários domínios de acção: artesanato, indústria, serviços, comércio, profissões liberais. Nesta concepção incluem-se tanto as organizações multisectoriais como as organizações relacionadas mais especificamente com um sector em particular.

(13)  JO C 309, de 12.12.2006, Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão intitulada «Aplicar o Programa Comunitário de Lisboa: Promover o espírito empreendedor através do ensino e da aprendizagem» COM(2006) 33 final.

(14)  A Irlanda surge em 11.o lugar.

(15)  Hungria, Bélgica, Suécia, Eslovénia, Países Baixos, Dinamarca, Itália e Finlândia.

(16)  Parecer exploratório sobre a Revisão do Mercado Único. JO C 93, de 27.4.2007.

(17)  NORMAPME: Organização Europeia do Artesanato e das PME para a Normalização

www.normapme.com.

(18)  Trata-se dos custos de conformidade respeitantes à tributação das actividades transfronteiriças.

(19)  Mesmo as profissões tradicionais como canalizador ou carpinteiro devem ter em conta as técnicas de poupança de energia.

(20)  JO C 221, de 8.9.2005.

(21)  Realizar o programa comunitário de Lisboa em prol do crescimento e do emprego. Transmissão de Empresas — Continuidade pela renovação, COM (2006) 117 final, de 14.3.2006.

(22)  França, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Áustria, Finlândia e Bélgica (com uma base de dados individual para cada região). A percentagem de êxito nestes países é de cerca de 25 %, isto é, uma em cada quatro empresas na base de dados encontrou um sucessor.

(23)  Para mais informações sobre o mercado único ver: Eurobarómetro Flash n.o 180 — TNS Sofres/EOS Gallup Group Europe, Pareceres sobre o Mercado Interno e Experiências de Empresas na UE-15, publicado em Junho de 2006.

Para mais informações sobre o «Passaporte para a Exportação», um programa gerido pelo organismo público do Reino Unido UK Trade and Investment para ajudar os exportadores britânicos a ultrapassarem as suas fragilidades em matéria de comércio internacional, ver a Carta Europeia das Pequenas Empresas, Selecção de Boas Práticas 2006, pág. 9.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/17


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O investimento no conhecimento e na inovação (Estratégia de Lisboa)»

(2007/C 256/04)

O Comité Económico e Social Europeu decidiu, em 14 de Setembro de 2006, em conformidade com o artigo 31.o do Regimento, incumbir a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo da redacção de um relatório de informação sobre: «Investimento no conhecimento e na inovação».

Na reunião plenária de 14 e 15 de Março de 2007, decidiu-se transformar o relatório de informação num parecer de iniciativa (n.o 2 do artigo 29.o do Regimento).

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção do Mercado Único, Produção e Consumo que emitiu parecer em 3 de Maio de 2007, sendo relator Gerd WOLF.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 12 de Julho de 2007), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 120 votos a favor e 1 abstenção, o seguinte parecer:

ÍNDICE

1.

Introdução

2.

Conclusões e recomendações

3.

Observações na generalidade

4.

Ensino e formação inicial e contínua

5.

Questões financeiras e procedimentos

6.

Aspectos estruturais e condições gerais

7.

O factor humano — investigadores, engenheiros e empresários

1.   Introdução

1.1

Sob o tema «Estratégia relançada de Lisboa para o emprego e o crescimento», o Conselho Europeu, reunido em 23 e 24 de Março de 2006, saudou, no ponto 12 das Conclusões da Presidência, a iniciativa tomada pelo Comité Económico e Social Europeu para incrementar os níveis de apropriação da Estratégia de Lisboa no plano comunitário. Incentivou o Comité Económico e Social Europeu a prosseguir os seus trabalhos e solicitou-lhe que preparasse, até ao início de 2008, um relatório sumário sobre as actividades de apoio à Parceria para o Crescimento e o Emprego.

1.2

Assim sendo, o CESE adoptou, em 15 de Fevereiro de 2007, uma resolução sobre a aplicação da Estratégia de Lisboa renovada, para apresentação na Cimeira da Primavera de 2007.

1.3

No âmbito da preparação do relatório sumário solicitado pelo Conselho Europeu foram elaborados quatro relatórios de informação sobre os temas seguintes:

«O investimento no conhecimento e na inovação»;

«O potencial das empresas, especialmente das PME»;

«O emprego para as categorias prioritárias» e

«A definição de uma política energética para a Europa».

Os relatórios sumários basear-se-ão nos elementos contidos nestes relatórios de informação.

1.4

O presente parecer de iniciativa, que contou com a participação de representantes de Comités Económicos e Sociais de alguns Estados-Membros, aborda exclusivamente o tema «O investimento no conhecimento e na inovação».

2.   Conclusões e recomendações

2.1

A força da Europa reside nas capacidades dos seus cidadãos.

2.2

A livre interacção do espírito criativo e empresarial do sector artesanal com a metodologia e a sistemática científicas e com as tecnologias e os processos industriais daí resultantes foram duas pedras-chave para o melhoramento dos padrões de vida da sociedade europeia que, de mãos dadas com a evolução histórica e sociopolítica, permitiram a formação do cidadão livre e a constituição do Estado moderno assente na divisão de poderes, na democracia e nos direitos fundamentais.

2.3

Outro factor decisivo nesta evolução foi o desenvolvimento e o uso intensivo de técnicas industriais, máquinas e meios de transporte consumidores de energia: a energia libertou o Homem dos trabalhos pesados e árduos, multiplicou a produtividade do trabalho, criou calor e luz e permitiu uma mobilidade e uma comunicação até então desconhecidas. A energia tornou-se no «alimento» e no motor das economias modernas.

2.3.1

Tendo em conta que os recursos energéticos fósseis são finitos, que as necessidades energéticas mundiais aumentam fortemente e que o consumo de energia terá efeitos sobre o clima do futuro, a segurança do abastecimento de energia, de um modo sustentável e respeitador do clima, é um dos assuntos mais debatidos no meio político. Fundamental para a realização desta difícil tarefa é a existência, na área da energia, de um programa de investigação e desenvolvimento forte, diversificado e eficaz.

2.4

Mas, para além destes, há ainda muitos outros problemas e tarefas que só podem ser resolvidos e desempenhados através da investigação, do desenvolvimento e da inovação. Estes estão relacionados com os esforços para combater doenças físicas e mentais, facilitar a vida dos deficientes e permitir a sua participação na vida social, mas também com os efeitos das evoluções demográficas, incluindo a investigação em gerontologia, com a protecção do ambiente e, em geral, com a preservação e o desenvolvimento do essencial para a sobrevivência da vida, do sistema de valores europeu e do modelo social da nossa sociedade. E por último: a investigação e o desenvolvimento servem o objectivo fundamental de criar mais e novos conhecimentos. Mais conhecimentos ajudam não só a resolver problemas, como também permitem alargar a imagem que temos do mundo, fazer uma apreciação mais objectiva das situações de conflito e enriquecer a nossa cultura.

2.5

Acresce que a União Europeia enfrenta actualmente uma concorrência cada vez mais intensa nos mercados internacionais, em que o que está em jogo é a manutenção dos postos de trabalho, dos níveis de rendimento e dos padrões sociais e ambientais europeus. Pense-se não só no poder económico dos EUA e do Japão, mas sobretudo nos resultados cada vez mais espectaculares alcançados pelos sectores da indústria e da investigação de países como a China, a Índia e o Brasil, com salários baixos e padrões sociais e ambientais muito inferiores aos europeus.

2.6

Para fazer face a este desafio, é necessário manter uma posição de vantagem nos domínios da investigação, do desenvolvimento tecnológico e da inovação permanente, num contexto social e cultural assente na democracia, no Estado de direito, na estabilidade política, na liberdade de gestão empresarial, na segurança de planeamento, na força empreendedora, no reconhecimento dos resultados alcançados e na segurança social.

2.7

A excelência científica e técnica e a correspondente aplicação empresarial como forma de potenciar a competitividade económica constituem requisitos essenciais para assegurar o nosso futuro — sobretudo no que diz respeito à questão energética e climática —, para manter e melhorar a nossa posição actual num mundo globalizado e, também, para aperfeiçoar o modelo social europeu sem o pôr em causa.

2.8

Para atingir este objectivo é fundamental haver na sociedade um clima favorável ao progresso e à inovação, em que esta ideia se possa concretizar plenamente, permitindo a todos os níveis de política a criação de condições e a tomada de decisões para que a indústria possa ter a confiança e o optimismo necessários ao investimento na Europa e para que sejam criados novos postos de trabalho. Importa também, neste contexto, promover mais a sensibilização para a importância elementar da investigação fundamental, pois é ela que lança a semente para futuras inovações. Isto pressupõe sobretudo um espírito empresarial inovador, sem relutância em tomar riscos, bem como capacidade de liderança política, fiabilidade e sentido da realidade.

2.9

Sobretudo a Estratégia de Lisboa e o objectivo de Barcelona devem ser levados muito a sério por todos os actores envolvidos para evitar que a Europa continue a ficar para trás na corrida pela concorrência mundial em matéria de investimentos em I&D. De acordo com o objectivo de Barcelona, o nível global da despesa em I&D na União deverá ser aumentado a fim de se aproximar dos 3 % do PIB até 2010. Dois terços dos investimentos necessários deverão provir do sector privado.

2.10

Em Dezembro de 2006, o Conselho Europeu aprovou o 7.o Programa-Quadro de Investigação e Desenvolvimento (2007-2013), que beneficia de um orçamento de cerca de 50 mil milhões de euros, muito superior ao do programa anterior. Este foi mais um êxito notável da política europeia, para o qual o Comité muito contribuiu. No entanto, com este orçamento, o contributo comunitário para a consecução do objectivo de Barcelona de aumentar os investimentos em projectos de investigação e desenvolvimento é da ordem dos 2 % (equivalente apenas a um quinquagésimo!). Como diversas vezes referido pelo Comité, esta percentagem não é suficiente para que o apoio comunitário possa, tal como se pretende, funcionar plenamente como alavanca e actuar como força integradora da política de apoio dos Estados-Membros e da disponibilidade da indústria para o investimento.

2.11

Face ao exposto, o Comité reitera uma anterior recomendação: quando da revisão do orçamento da UE, em 2008, dever-se-ia, num primeiro passo, aumentar a percentagem do apoio comunitário em 50 %, ou seja, de forma a realizar cerca de 3 % do objectivo de investimento na investigação fixado em Barcelona. Isto é sobretudo válido no que diz respeito ao futuro Instituto Europeu de Tecnologia (IET) e à necessidade urgente de promover actividades de I&D que permitam um abastecimento de energia sustentável e respeitador do clima.

2.12

Mas é igualmente necessário criar condições jurídicas (incluindo em matéria de responsabilidade), administrativas, fiscais e financeiras adequadas para tornar o investimento na investigação e no desenvolvimento mais atractivo e interessante para a indústria, sobretudo também para as pequenas e médias empresas. Neste contexto, assume também papel relevante o direito comunitário em matéria de auxílios estatais. Através dele os Estados-Membros devem ter a possibilidade de promover mais eficazmente e com menos burocracia os projectos de investigação e desenvolvimento das universidades, das organizações de investigação e da indústria, bem como a necessária articulação entre os mesmos. Dever-se-á por isso observar atentamente se o enquadramento comunitário dos auxílios estatais à investigação, ao desenvolvimento e à inovação se orienta para este objectivo.

2.13

O conhecimento assenta em dois pilares equivalentes e interdependentes: o ensino e a investigação. A criação de novos conhecimentos faz-se pela investigação e pelo desenvolvimento, com base no saber disponível. A sua transmissão processa-se pelo ensino e pela formação inicial e contínua. Importa, portanto, examinar se os métodos e os conteúdos obedecem aos objectivos referidos. Ambos os pilares necessitam de investimentos financeiros reforçados e de condições adequadas.

2.14

A força da Europa reside nas capacidades dos seus cidadãos. Por conseguinte, é primordial estimular ainda mais essas capacidades e proporcionar oportunidades de se expressarem. Por tudo isto, o Comité insta os Estados-Membros a reforçarem e a melhorarem as estruturas de ensino e a efectuarem os investimentos necessários. Generalizar um ensino sólido junto de largas camadas da população é tão importante como a formação de elites científicas. Daí haver necessidade de uma vasta rede de estabelecimentos de ensino sérios e qualificados, desde o ensino básico ao ensino superior. Só assim é que poderá surgir uma sociedade europeia favorável à educação e à ciência.

2.15

O Comité relembra a sua recomendação para o desenvolvimento de um espaço comum europeu do conhecimento, como complemento do Espaço Europeu da Investigação, para o que será necessário que os Estados-Membros cooperem mais intensamente nos domínios da aprendizagem, da inovação e da investigação. Os incentivos e as medidas para uma aprendizagem ao longo da vida assumem aqui papel fundamental: sem aprendizagem ao longo da vida não pode haver uma sociedade assente no conhecimento. Há, pois, que abolir o mais rápido possível os obstáculos do mercado interno que obstruem a passagem para uma sociedade europeia assente no conhecimento.

2.16

Para tanto, é necessário, ao nível nacional, facilitar ainda mais a mobilidade pessoal e, ao nível comunitário, reforçar a eficácia dos programas neste domínio (Erasmus, Marie Curie). A mobilidade é importante para a aquisição e a transferência de competências. A liberdade de circulação de trabalhadores, investigadores e estudantes em toda a Europa deve ser assegurada e recompensada através de incentivos. Para isso é preciso haver rendimentos e condições de trabalho aceitáveis e ajudas à família. Refira-se ainda a necessidade de melhorar em todos os Estados-Membros o acesso pan-europeu a informações sobre oportunidades de emprego.

2.17

No respeitante à importância e à promoção da inovação, o Comité remete para as recomendações pormenorizadas que se seguem e, em particular, para o excelente relatório Aho, que apoia. Este foca sobretudo as condições jurídicas e sociais imprescindíveis para que possa haver uma actividade empresarial favorável à inovação e um mercado propício à inovação. O Comité remete ainda para o seu parecer detalhado sobre o tema «Libertar e reforçar o potencial de investigação, desenvolvimento e inovação na Europa».

2.18

O progresso e a inovação assentam na aplicação de novos conhecimentos a novos e melhorados processos e produtos (incluindo a permanente inovação dos já existentes) e na adopção de novos modelos empresariais e métodos de gestão adequados, ou seja, no espírito empreendedor inovador e na iniciativa das empresas. O progresso e a inovação assentam também na concepção de novos serviços, no desenvolvimento dos serviços de saúde e, em geral, na adopção de soluções mais adequadas para questões sociais, em articulação com as necessidades económicas.

2.19

A inovação significa, pois, conceber e pôr em prática novas técnicas, processos, modos de organização, modelos empresariais, modelos de formação, etc., que não tenham sido ou podido ser considerados. Por este motivo, é importante que a legislação pertinente dê margem suficiente para que também novas ideias — até então descuradas — possam ser concretizadas e não acabem por morrer no papel por não se «encaixarem» numa regulamentação demasiado pormenorizada. Demasiadas regulamentações restritivas constituem um obstáculo à inovação, pelo que o Comité apoia todos os esforços que visem a simplificação da regulamentação e a determinação de disposições restritivas supérfluas, demasiado pormenorizadas e/ou desnecessárias.

2.20

Enveredar pela inovação significa também aceitar um certo risco de insucesso ou até de ocorrência de danos. Regra geral, a avaliação da utilidade e do impacto de uma nova abordagem ou de um novo conceito só pode ser feita depois da sua comprovação na prática, em competição com outros processos. Mas o insucesso também é uma forma de aprendizagem. Oportunidade e risco são duas faces da mesma medalha. Em princípio, uma inovação deve trazer mais benefícios do que riscos. Os riscos para a sociedade precisam de ser cuidadosamente avaliados. Há que ponderar se deveria prever-se, pelo menos para as pequenas e médias empresas, a criação — por exemplo pelo BEI — de um fundo que cobrisse eventuais danos ou perdas.

2.21

O Comité já por várias vezes chamou a atenção para o facto de que as capacidades e os potenciais humanos são os recursos mas sensíveis e mais valiosos para o conhecimento e a inovação. Assim, a quantidade, o grau de equipamento e a qualidade dos centros de formação são factores decisivos para se poder suprir as necessidades de investigadores, engenheiros e docentes de qualidade.

2.22

A sociedade — representada pela política — assume a responsabilidade pela utilização o mais eficaz possível dos investimentos pessoais e institucionais numa sólida e complexa formação básica complementada por uma formação especializada avançada. Deve haver, portanto, a preocupação de proporcionar aos investigadores e aos engenheiros qualificados oportunidades profissionais e carreiras adequadas e atractivas, bem como possibilidades de desenvolverem as suas capacidades e constituírem família, com várias opções e saídas profissionais para evitar «becos sem saída»! Avaliados em termos económicos, o desemprego, o trabalho mal pago ou a subutilização do trabalho dos investigadores e engenheiros qualificados (que despendem uma percentagem considerável do seu tempo em tarefas burocráticas e em reuniões) constituem um desperdício de investimentos, com a agravante de terem um efeito dissuasivo na nova geração de elites, que optará por profissões em áreas outras que a técnico-científica ou irá procurar trabalho fora da Europa!

2.23

Por outro lado, mas sem ser uma contradição, exige-se uma participação mais intensa dos peritos com experiência e dos prestadores de serviços técnico-científicos nos processos decisórios e administrativos ligados à política da investigação, à política empresarial e à política da inovação. A criação do Conselho Europeu de Investigação (CEI) é um primeiro passo encorajador neste sentido. Mas também a promoção da investigação e da inovação na Comunidade (incluindo na Comissão!) e nos Estados-Membros exige que se adquiram e mantenham suficientes conhecimentos especializados. A administração, por si só, não é suficiente.

2.24

A aplicação da investigação e da inovação em produtos e processos industriais constitui uma problemática específica. É, pois, compreensível que um dos objectivos fixados em Lisboa tenha sido o de levar o sector industrial a proporcionar dois terços do investimento em I&D. Trata-se especialmente de valorizar a imagem profissional do empresário e cimentar o papel relevante que lhe cabe para a inovação, o progresso económico e o bem-estar geral da sociedade. Por conseguinte, o Comité — enquanto ponte para a sociedade civil organizada — colocou o tema «Dar um rosto humano à actividade empresarial» no centro do seu próximo programa de trabalho. Só através de uma actividade empresarial responsável, enérgica e imaginativa, que demonstre potencial para se desenvolver, se conseguirá concretizar os objectivos de Lisboa.

2.25

No que respeita a outros pontos de vista e pormenores remete-se para a exposição infra e, sobretudo, para os pareceres do Comité intitulados «Rumo à sociedade europeia baseada no conhecimento — o contributo da sociedade civil organizada para a Estratégia de Lisboa» (1) e «Libertar e reforçar o potencial de investigação, desenvolvimento e inovação na Europa» (2).

3.   Observações na generalidade

3.1

Desenvolvimento da ciência e da técnica. A Europa é o berço da ciência e da investigação continuamente actualizadas. Tendo em conta o mundo cultural greco-egípcio e a fusão de influências das culturas indiana e árabe (3), num dado momento da História, não será falso afirmar que, de uma maneira geral, a Europa é o berço da ciência. Na Europa, apesar das oscilações temporárias e rupturas decorrentes de conflitos bélicos, a ciência e a investigação transpuseram fronteiras nacionais e, com os seus métodos e modos de pensar, contribuíram decisivamente para a dinamização da actual sociedade europeia, dos seus valores e do seu modo e nível de vida. Elas foram um marco do mundo cultural europeu (4). Os resultados alcançados foram fruto da livre interacção do espírito criativo e empresarial do sector artesanal com a metodologia e a sistemática científicas e com as novas tecnologias daí resultantes.

3.2

Evolução da sociedade. O progresso científico-técnico andou quase sempre de mãos dadas com as principais evoluções sociopolíticas que levaram à formação do Estado moderno assente na divisão de poderes, na democracia, nos direitos fundamentais e na legislação social.

3.3

Evolução das condições de vida. Este processo conseguiu modificar e melhorar as condições de vida dos povos e das regiões que nele participaram de modo nunca antes visto na história da Humanidade. Nos últimos 135 anos, a esperança de vida média da população (5) mais do que duplicou (6). Ao longo dos últimos 50 anos, a produção agrícola por hectare de superfície quase triplicou. Nos países industrializados mais ricos, os debates deixaram de se centrar na subalimentação, na falta de informação e na mortalidade infantil para se centrarem na obesidade, no bombardeamento de informação e no envelhecimento da população. As capacidades e os resultados que a sociedade industrial moderna, caracterizada pela mobilidade, conseguiu alcançar graças à investigação, ao desenvolvimento e à inovação são importantes para a qualidade de vida e realização dos indivíduos.

3.4

Utilização da energia. Um factor que contribuiu decisivamente para este progresso foi o desenvolvimento e o uso intensivo de técnicas industriais, máquinas e meios de transporte consumidores de energia: a energia libertou o Homem dos trabalhos pesados e árduos, multiplicou a produtividade do trabalho, criou luz e calor e permitiu uma mobilidade, uma comunicação e um florescimento cultural até então desconhecidos. A energia tornou-se no «alimento» e no motor das economias modernas.

3.5

Problemática das alterações climáticas e abastecimento de energia. Esta evolução, de grande significado, também cria novos problemas e desafios. O aquecimento global e os seus eventuais efeitos, bem como a estratégia para o combater, são objecto de vastas decisões políticas (7) e de inúmeros estudos (8), em parte controversos. Segundo os dados do RELATÓRIO STERN (9), «The Economics of Climate Change», publicado em finais de Outubro de 2006, será necessário disponibilizar cerca de 1 % do PIB exclusivamente para combater o aquecimento global associado às emissões de gases com efeito de estufa, daí derivando a necessidade de outras actividades de I&D. Mas mesmo sem o problema das alterações climáticas, a questão do abastecimento de energia seguro e sustentável na Europa (e no resto do mundo!) é um dos desafios políticos centrais, para cuja resolução desempenham papel decisivo as actividades intensivas de investigação e desenvolvimento (10).

3.6

Outros problemas e desafios  (11) . As alterações climáticas e o abastecimento de energia não são os únicos problemas. Também o combate de doenças físicas e psíquicas, as medidas para facilitar a vida dos deficientes ou de outras pessoas desfavorecidas com vista a proporcionar-lhes mais oportunidades profissionais e uma maior participação na sociedade do conhecimento, os efeitos das evoluções demográficas, incluindo a investigação geriátrica, a melhor compreensão da complexidade das relações e dos mecanismos económicos, sociais e culturais, a protecção do ambiente e, em geral, a preservação e o desenvolvimento do essencial para a sobrevivência da vida, do sistema de valores europeu e do modelo social da nossa sociedade, são exemplos de temas de investigação importantes, sobre os quais o Comité já formulou recomendações, por exemplo, nos seus pareceres sobre o 7.o Programa-Quadro de I&D (12) e os respectivos «programas específicos (13)».

3.7

Concorrência à escala global. A União Europeia enfrenta actualmente uma concorrência cada vez mais intensa nos mercados internacionais, em que o que está em jogo é a manutenção dos postos de trabalho, dos níveis de rendimento e dos padrões sociais e ambientais europeus. Pense-se não só no poder económico dos EUA e do Japão, mas também nos resultados cada vez mais espectaculares alcançados pelos sectores da indústria e da investigação de países como a China (cujo objectivo é ultrapassar, até 2050, os EUA enquanto nação líder em tecnologia! (14)), a Índia e o Brasil, com níveis salariais e padrões sociais e ambientais muito inferiores aos europeus. Face a este cenário de concorrência global, caracterizado pela corrida aos investimentos em investigação e desenvolvimento, incluindo a concorrência nos mercados internacionais pelos melhores investigadores e engenheiros, a União Europeia tem de melhorar a sua política nesta área. É certo que se trata acima de tudo da concorrência à escala global e não da concorrência no espaço da UE!

3.8

Posição de vantagem no domínio da investigação, do desenvolvimento e da inovação. Portanto, para permanecer competitiva, a Europa tem de manter a posição de vantagem de que beneficia no domínio da investigação, do desenvolvimento tecnológico e da inovação permanente, num contexto social e cultural assente na democracia, no Estado de direito, na estabilidade política e na fiabilidade, na liberdade de empresa, na segurança de planeamento, na força empreendedora e no reconhecimento dos resultados. É fundamental reforçar e desenvolver o Espaço Europeu da Investigação. Apesar de este objectivo estar patente em todas as declarações políticas de intenção, lamentavelmente persistem lacunas importantes quando se trata de pô-lo em prática, de estabelecer prioridades reais (por exemplo, orçamentos para a investigação) e de adoptar legislação (por exemplo, estrutura tarifária (15), direito fiscal (16)), quer ao nível comunitário quer ao nível nacional. A dimensão dramática deste facto não deve ser subestimada, mesmo que, felizmente, em alguns Estados-Membros se observe uma certa tendência de melhoria (17).

3.9

Excelência científica e técnica. A excelência científica e técnica e a correspondente aplicação empresarial em inovações para aumentar a competitividade económica são requisitos essenciais para assegurar o nosso futuro — por exemplo, no que diz respeito à questão energética e climática —, para manter e melhorar a nossa posição actual num mundo globalizado e, também, para aperfeiçoar o modelo social europeu sem o pôr em causa. E por último: a investigação e o desenvolvimento servem o objectivo fundamental de criar mais e novos conhecimentos. Mais conhecimentos ajudam não só a resolver problemas, como também permitem alargar a imagem que temos do mundo, fazer uma apreciação mais objectiva das situações de conflito e enriquecer a nossa cultura.

3.10

Renovar a tradição. A Europa tem agora de tomar consciência que tem uma longa tradição de liderança na investigação e inovação, procurando reavivá-la. A força da Europa reside nas capacidades dos seus cidadãos. É portanto necessário estimular essas capacidades ainda mais do que até aqui. Mas é também necessário aumentar consideravelmente os investimentos em investigação e desenvolvimento, melhorar a sua eficiência, reforçar a capacidade e a disponibilidade de inovação da indústria, do comércio e da administração, incentivar e reconhecer trabalhos e, ainda, eliminar os obstáculos existentes.

3.11

Aumentar o investimento. Isto significa sobretudo que a União e os Estados-Membros devem investir ainda mais na investigação e no desenvolvimento, bem como na educação dos cidadãos e na formação dos cientistas e engenheiros necessários (de ambos os sexos!). Significa, acima de tudo, que é necessário criar condições jurídicas, administrativas, fiscais (18) e financeiras adequadas para tornar o investimento na investigação e no desenvolvimento mais atractivo e interessante para a indústria, sobretudo também para as pequenas e médias empresas.

3.12

Criar um ambiente social estimulante para o progresso. Para atingir este objectivo é importante que haja na sociedade um clima favorável ao progresso, em que esta ideia se possa concretizar plenamente, permitindo a todos os níveis de política a criação de condições e a tomada de decisões, bem como a criação de emprego, para transmitir à indústria a confiança e o optimismo necessários ao investimento. É preciso dar a conhecer melhor ao cidadão os resultados alcançados pela ciência e pela técnica e a sua importância, bem como o trabalho pioneiro levado a cabo pelas empresas. É também importante, neste contexto, ter noção de que a investigação fundamental (19) lança a semente para futuros conhecimentos e inovações.

3.13

Reconhecer os resultados alcançados. A sociedade tem de tomar consciência do papel decisivo destes avanços para o nosso actual modo de vida, das condições que os tornaram possíveis, bem como das realizações científicas, técnicas, empresariais e culturais alcançadas, e reconhecer e transmitir na escola a importância que têm para a nossa vida.

3.14

Outras condições. Mas o progresso e a inovação permanente assentam não só na ciência, na técnica, na motivação, nas capacidades e no empenho das partes envolvidas, como também em modelos sociais inovadores, em métodos de gestão correctos e num enquadramento jurídico favorável.

3.15

Tomar riscos. Desenvolver novos paradigmas de investigação e tecnologias inovadoras, bem como novas formas de organização e de funcionamento empresarial ou novos modelos empresariais, implica aceitar um certo risco de insucesso ou até de ocorrência de danos. Regra geral, a avaliação da utilidade, do impacto e dos riscos de uma nova abordagem só pode ser feita depois da sua comprovação na prática, em competição com outros processos. Mas o insucesso também é uma forma de aprendizagem. Oportunidade e risco são duas faces da mesma medalha. Em princípio, uma inovação deve trazer mais benefícios do que riscos. Os riscos para a sociedade precisam de ser cuidadosamente avaliados. Há que ponderar se deveria prever-se, pelo menos para as pequenas e médias empresas, a criação — por exemplo pelo BEI — de um fundo destinado a cobrir eventuais danos ou perdas das empresas.

4.   Ensino e formação inicial e contínua

4.1

Bases do conhecimento. O conhecimento assenta em dois pilares equivalentes: a educação e a investigação. A criação de novos conhecimentos faz-se pela investigação e pelo desenvolvimento, com base no saber já disponível. O conhecimento gerado é difundido e consolidado no ensino e na formação inicial e contínua. Neste contexto, os objectivos são dois:

4.1.1

Conhecimentos fundamentais. Por um lado, importa proporcionar aos cidadãos, através dos currículos e programas escolares, uma base sólida de conhecimentos científicos, técnicos e económicos, incluindo o modo como funcionam e as leis por que se regem. Só assim os cidadãos estarão, por exemplo, capacitados para compreender e julgar relações, nem sempre fáceis, e formar uma opinião política qualificada. Consequentemente, os planos curriculares em todos os ciclos devem ser concebidos de forma a preverem tempo de aulas suficiente e fazerem compreender gradualmente às crianças e aos jovens, através de exemplos simples, explicações claras e matérias interessantes, o modo de pensamento científico, técnico e económico, bem como o respectivo acervo de conhecimentos (20), sensibilizando-os para a importância que o trabalho científico, o desenvolvimento tecnológico, a inovação económica e social e a sociedade do conhecimento têm para o futuro e para as oportunidades de vida de cada indivíduo. Este aspecto deveria ter um peso muito maior nos planos curriculares. O Comité saúda e apoia as recomendações do relatório Rocard (21).

4.1.2

Facilitar a escolha de uma profissão. Por outro lado, é preciso entusiasmar e incentivar os alunos com mais aptidões a seguirem uma profissão na área técnico-científica e a enveredarem por um curso que se sabe ser difícil, proporcionando-lhes conhecimentos de base sólidos. Também aqui a concepção dos planos curriculares das escolas, principalmente dos liceus, deveria prever uma oferta educativa abrangente e de qualidade.

4.1.3

Necessidade de ampliar e aprofundar os planos curriculares. Ainda há muito a fazer no que toca à oferta educativa nas áreas da ciência e da técnica. Obviamente que todos os alunos têm de ter oportunidade de fazer valer as suas aptidões, portanto também nas áreas das Ciências Sociais, Económicas e Humanas. Generalizar um ensino sólido junto de largas camadas da população — o que também pressupõe o empenho e a disciplina dos alunos — é tão importante como a formação de elites científicas. Estabelecimentos de ensino de elevada qualidade, desde o ensino básico até ao ensino superior, são condição fundamental para a criação de uma sociedade propícia à educação e à ciência.

4.1.4

Espaço europeu do conhecimento. O Comité relembra a sua recomendação para o desenvolvimento de um espaço comum europeu do conhecimento, como complemento do Espaço Europeu da Investigação, para o que será necessário que os Estados-Membros cooperem mais intensamente nos domínios da aprendizagem, da inovação e da investigação. Há, pois, que abolir o mais rápido possível os obstáculos do mercado interno que obstruem a passagem para uma sociedade europeia assente no conhecimento. O Comité remete igualmente para o seu parecer «Rumo à sociedade europeia baseada no conhecimento — o contributo da sociedade civil organizada para a Estratégia de Lisboa» (22).

4.1.5

Aprendizagem ao longo da vida e mobilidade. Os incentivos e as medidas para uma aprendizagem ao longo da vida assumem aqui papel fundamental: sem aprendizagem ao longo da vida não pode haver uma sociedade assente no conhecimento. Para tanto, é necessário, ao nível nacional, facilitar ainda mais a mobilidade pessoal e, ao nível comunitário, reforçar a eficácia dos programas neste domínio (Erasmus, Marie Curie). A mobilidade intensifica os inter-relacionamentos na Europa e facilita a aquisição e a transferência de competências. A liberdade de circulação de trabalhadores, investigadores e estudantes em toda a Europa deve ser assegurada, devendo prever-se, para esse fim, salários e condições de trabalho aceitáveis e ajudas à família. Refira-se ainda a necessidade de melhorar em todos os Estados-Membros o acesso pan-europeu a informações sobre oportunidades de emprego.

4.2

Formação especializada de alto nível. Isto pressupõe ainda que nas universidades e nas escolas superiores técnicas seja ministrada formação científico-técnica de excelente qualidade, equiparada aos melhores padrões de excelência internacionais: o principal capital para a investigação e a inovação são investigadores e engenheiros motivados e altamente qualificados, de ambos os sexos, que adquirem e actualizam permanentemente as suas competências profissionais através de uma aprendizagem ao longo da vida, pelo que haverá sempre pessoas em número suficiente para assumir posições de chefia e desenvolver trabalho pioneiro nas áreas mais difíceis.

4.3

Oportunidades para todos. Mais do que nunca, o progresso e o sucesso serão no futuro o resultado de um trabalho de equipa e de um sistema de divisão de tarefas, em que idealmente cada elemento da equipa tem oportunidade de desenvolver as suas aptidões e competências, dispondo de espaço para iniciativa e criatividade. Tal pressupõe suficiente permeabilidade entre os sistemas escolares de forma a que todas as aptidões, por exemplo também as dos alunos retardados, possam ser desenvolvidas ao máximo. Absolutamente indispensável é que haja estabelecimentos de ensino de alto nível capazes de formar especialistas e técnicos com um amplo leque de qualificações, capacitando-os para desempenharem hoje e no futuro tarefas nos domínios da técnica, da ciência e da economia.

4.4

Reforçar a interacção. Em particular no que diz respeito à formação inicial e contínua é necessário reforçar as ligações entre os pilares do ensino, da investigação e da aplicação industrial, sabendo-se que há uma relação nítida com o tema da aprendizagem ao longo da vida e a mobilidade (ver ponto 4.1.5 supra). É também necessário que haja uma maior interacção entre as universidades e as escolas superiores técnicas/estabelecimentos de ensino superior dos Estados-Membros. Também sob este ponto de vista, o Comité congratula-se com os planos para a criação de um Instituto Europeu de Tecnologia (IET) (23) que contribuirá para o desenvolvimento da capacidade inovadora da União Europeia e dos Estados-Membros através da articulação das actividades de ensino, de investigação e de inovação ao nível mais elevado. Este aspecto vai além da educação e da formação, dizendo igualmente respeito às actividades de investigação e desenvolvimento «pré-concorrencial» (24) do sector industrial, como por exemplo o aperfeiçoamento conjunto de tecnologias de motores na indústria automóvel.

5.   Questões financeiras e procedimentos

5.1

Investimento é tarefa de todos. A União Europeia, os Estados-Membros e o sector privado têm de investir muito mais do que já investem hoje no ensino, na investigação e no desenvolvimento.

5.2

Objectivo de Barcelona. Todos os actores envolvidos têm de levar a sério e cumprir com determinação a Estratégia de Lisboa e o objectivo de Barcelona para não perderem a corrida internacional aos investimentos em I&D. De acordo com o objectivo de Barcelona, o nível global da despesa em I&D na União deverá ser aumentado a fim de se aproximar dos 3 % do PIB até 2010. Dois terços dos investimentos necessários deverão provir do sector privado.

5.3

Efeito de alavanca do 7.o Programa-Quadro de I&D. Em Dezembro de 2006, o Conselho Europeu aprovou o 7.o Programa-Quadro de Investigação e Desenvolvimento (2007-2013), que beneficia de um orçamento de cerca de 50 mil milhões de euros, muito superior ao do programa anterior. Este foi mais um êxito notável da política europeia, para o qual o Comité muito contribuiu. No entanto, com o orçamento previsto de aproximadamente 50 mil milhões de euros, o contributo comunitário para a consecução do objectivo de Barcelona de aumentar os investimentos em projectos de investigação e desenvolvimento é da ordem dos 2 % (equivalente a apenas um quinquagésimo!). O Comité teve ocasião de salientar por diversas vezes que esta percentagem não é, porém, suficiente para que o apoio comunitário possa funcionar plenamente como alavanca e actuar como força integradora da política de apoio dos Estados-Membros e da necessária disponibilidade de investimento da indústria e, consequentemente, atingir o nível de crescimento exigido para a prossecução do objectivo de Barcelona.

5.4

Reiteração de uma recomendação. Face ao exposto e também tendo em consideração o futuro Instituto Europeu de Tecnologia (IET) e a necessidade urgente de promover actividades de I&D que permitam um abastecimento de energia sustentável e respeitador do clima, o Comité reitera uma anterior recomendação (25): quando da revisão do orçamento da UE, em 2008, dever-se-ia, num primeiro passo, aumentar a percentagem do apoio comunitário em 50 %, ou seja, de forma a realizar cerca de 3 % do objectivo de investimento na investigação fixado em Barcelona. Esta medida comunitária revelar-se-ia particularmente eficaz para acelerar a realização dos tão importantes objectivos de Lisboa e de Barcelona e para solucionar mais rápida e eficientemente os problemas atrás referidos.

5.4.1

Concorrência com a China. Os esforços de investigação da China neste domínio são cada vez maiores e a Europa tem de esforçar-se para impedir que a concorrência internacional assuma a posição de líder no mercado internacional de tecnologias importantes e necessárias. No entanto, não é politicamente aceitável que a União Europeia e os Estados-Membros venham reclamar ao sector privado investimentos, sem que tenham disponibilizado a percentagem do financiamento que, afinal, eles próprios fixaram nos Objectivos de Barcelona.

5.4.2

Financiamento base assegurado pelos Estados-Membros. Os Estados-Membros devem assegurar que os respectivos organismos de investigação e universidades disponham, à partida, de meios de financiamento suficientes para poderem beneficiar ao máximo de um co-financiamento através do 7.o Programa-Quadro de IDT.

5.5

Enquadramento comunitário dos auxílios estatais. O direito comunitário em matéria de auxílios concedidos pelo Estado deveria ser concebido de forma a encorajar os Estados-Membros e dar-lhes liberdade de acção para promoverem mais e mais eficazes projectos de investigação e desenvolvimento — numa articulação entre as universidades, as organizações de investigação e a indústria — e desburocratizarem os procedimentos. Dever-se-á por isso observar atentamente se o enquadramento comunitário dos auxílios estatais à investigação, ao desenvolvimento e à inovação (26) se orienta para este objectivo.

5.6

Direito financeiro dos Estados-Membros. No contexto do apoio a medidas de I&D, o direito financeiro de cada Estado-Membro deveria permitir maior flexibilidade na adequação dos meios afectados às características de cada projecto, por exemplo, através da transição de montantes não realizados para o ano civil ou o exercício subsequente.

5.7

Desenvolver as infra-estruturas científicas. O Comité, já por diversas vezes (27), recomendou que uma parte dos fundos estruturais se destinasse ao desenvolvimento de infra-estruturas científicas. Os fundos provenientes do Banco Europeu de Investimento poderiam igualmente ser utilizados para este fim.

5.8

Potencial das PME. É necessário continuar a reforçar o potencial inovador das PME, e sobretudo das novas empresas (start-ups), e, de modo geral, criar mais incentivos ao investimento por parte da indústria. O Comité remete para as suas recomendações (28) sobre o «Programa plurianual para a empresa e o espírito empresarial, em especial para as pequenas e médias empresas (PME)» e para o apoio no domínio da economia assente no conhecimento, especialmente importante neste contexto. O facto de, na UE, 98 % de todas as empresas serem PME deixa claro quão importante é reforçar a capacidade inovadora desta categoria de empresas (por conseguinte, o Comité acolhe favoravelmente que o 7.o Programa-Quadro preveja 1 300 milhões de euros destinados a actividades de I&D para as PME). As disposições em vigor que colocam entraves às PME deveriam ser examinadas e «desburocratizadas». Por outro lado, as autoridades competentes poderiam ser assistidas por investidores informais (business angels) no acesso a possibilidades de apoio. Também aqui a Europa pode ir buscar sugestões às políticas de apoio de outros Estados.

6.   Aspectos estruturais e condições gerais

6.1

Referência a relatórios anteriores. O Comité remete, em primeiro lugar, para as duas recentes comunicações (29) da Comissão sobre o tema «Inovação», bem como para o excelente relatório Aho (30). Por outro lado, chama a atenção para o seu parecer (31)«Libertar e reforçar o potencial de investigação, desenvolvimento e inovação na Europa» que aborda muitos dos aspectos aqui referidos, embora analisando algumas questões de forma muito mais aprofundada.

6.2

Inovação é mais. Na esteira dos relatórios atrás referidos, o Comité chama novamente a atenção para o seguinte: o progresso e a inovação baseiam-se não só na ciência e na técnica e na correspondente aplicação destes conhecimentos em novos e melhores processos e produtos, mas também em novos modelos sociais e em métodos de gestão adequados, ou seja, no espírito empreendedor inovador e na iniciativa das empresas. O progresso e a inovação assentam também na concepção de novos serviços, no desenvolvimento dos serviços de saúde e, em geral, na adopção de soluções mais adequadas para questões sociais — como é o caso, por exemplo, do conceito de «flexissegurança» que é actualmente objecto de análise do Comité (32).

6.3

InovaçãoUm passo para o desconhecido. A inovação significa também conceber e pôr em prática novas técnicas, processos, modos de organização, modelos empresariais, modelos de formação, etc., até aí desconhecidos. Por conseguinte, a utilidade de uma inovação, na maior parte dos casos, só pode ser comprovada depois de a mesma ter sido posta em prática, em competição com outros processos.

6.4

Criar uma legislação aberta. A regulamentação é criada com base no conhecimento já existente. Por este motivo, é muito importante que a legislação pertinente dê margem suficiente para que também novas ideias — até então descuradas — possam ser concretizadas e não fiquem na gaveta ou acabem por morrer no papel por não se «encaixarem» na regulamentação vigente, o que equivale a dizer que deve haver pluralidade e variabilidade suficientes. Deve sempre ter-se em consideração que a legislação neste domínio deverá abranger e regular todas as questões pertinentes, embora evitando disposições demasiado pormenorizadas. Um excesso de regras e disposições restritivas, por mais bem intencionadas que sejam, constitui uma barreira e um entrave à inovação, pelo que o Comité apoia todos os esforços que visem a simplificação da regulamentação e a determinação de disposições restritivas supérfluas e/ou desnecessárias. Deste modo, evita-se também que os peritos percam tempo com burocracias desnecessárias (ver mais abaixo). Um outro ponto ainda: erros cometidos isoladamente não podem dar azo a um excesso de regulamentação aplicável a todos.

6.5

Liberdade de investigação. Nunca é demais salientar que para haver inovação é necessário que as empresas disponham de suficiente margem de acção. Apesar dos limites impostos pela legislação que regula os problemas de ordem ética, a liberdade de investigação — liberta de prescrições descontextualizadas, limitativas (33) ou, até mesmo, ideológicas — é condição fundamental para poder haver ciência criativa, novas descobertas e invenções, desde que se assegure uma aplicação ajustada dos meios afectados.

6.6

Reafirmação da posição do CESE defendida no parecer 1566/2006. Para outras questões importantes, remete-se para o parecer (34) mencionado no ponto 5.1 supra e reitera-se, expressamente, as afirmações nele contidas. Os pontos 4.7 a 4.11 deste parecer contêm recomendações de interesse neste domínio: Caminho que vai do conhecimento da Natureza ao produto inovador, ao processo inovador e aos serviços inovadores. Mobilidade entre o meio académico e a indústria. Sistemas de informação acessíveis ao público. «Clusters». Novas empresas («Start-ups»). Investigação fundamental. Produtos inovadores. Contratos públicos. Propriedade intelectual e necessidade de criação de uma patente comunitária. Prazo de pesquisa de anterioridade que não prejudique a novidade. Problemas linguísticos. Situação particular dos novos Estados-Membros.

6.6.1

Protecção da propriedade intelectualpatente comunitária. É necessário salientar mais uma vez a importância de uma propriedade intelectual (35) devidamente protegida: os investimentos empresariais na investigação, no desenvolvimento e na inovação têm de ser compensadores; por outro lado, os custos financeiros, jurídicos e administrativos para obter e preservar os direitos de propriedade não podem prejudicar o poder económico da Europa perante os restantes concorrentes mundiais. Tal demonstra, entre outros aspectos, a necessidade urgente de criar uma patente comunitária (e o respectivo sistema de «período de graça»).

7.   O factor humano — investigadores, engenheiros e empresários

7.1

O recurso mais valioso. O Comité faz, em primeiro lugar, referência a um seu parecer sobre esta matéria (36) e reitera com determinação a sua posição, segundo a qual o capital humano é o recurso mais sensível e mais valioso para o conhecimento e a inovação. Por conseguinte, é essencial motivar os jovens dotados a optarem por cursos nas áreas científica ou técnica, proporcionando-lhes a melhor formação possível.

7.2

Qualidade dos estabelecimentos de ensino ( vide Capítulo 4). Assim, a quantidade, o grau de equipamento e a qualidade dos centros de formação são factores decisivos para se poder suprir as necessidades de investigadores, engenheiros e empresários de qualidade. É, portanto, essencial criar e manter em número suficiente universidades, sobretudo universidades técnicas, bem equipadas, atractivas e com um corpo docente excelente, em que haja uma relação estreita entre investigação e ensino (37). Estes estabelecimentos de ensino têm de estar à altura de concorrer com as melhores universidades dos EUA ou de outros países fora da Europa, devendo tornar-se destinos atractivos para os melhores estudantes internacionais.

7.3

Responsabilidade da sociedade. A sociedade — representada pela política — assume a responsabilidade pela utilização o mais eficaz possível dos investimentos pessoais e institucionais numa sólida e complexa formação básica complementada por uma formação especializada avançada. Deve haver, portanto, a preocupação de proporcionar aos investigadores qualificados oportunidades profissionais e carreiras adequadas e atractivas, bem como possibilidades de desenvolverem as suas capacidades, com várias opções e saídas profissionais para evitar «becos sem saída». Avaliados em termos económicos, o desemprego, o trabalho mal pago ou a subutilização do trabalho dos investigadores e engenheiros qualificados constituem um desperdício de investimentos, com a agravante de terem um efeito dissuasivo na nova geração de elites, que optará por profissões em áreas outras que a técnico-científica ou irá procurar trabalho fora da Europa! Ocupar os investigadores com tarefas burocráticas (vide ponto 7.7 infra) é também uma forma de subutilização do seu trabalho.

7.4

Promover talentos. Trata-se de, tendo em conta as aptidões, as capacidades e a criatividade de cada um, proporcionar as melhores oportunidades para as pessoas — incluindo todos os colaboradores de uma empresa, de uma universidade ou de um instituto de investigação — desenvolverem os seus talentos e terem iniciativa própria, e criar um ambiente social estimulante para o desenvolvimento dos seus potenciais criativos e favorável à constituição de família. Mas isto também significa que os jovens que usufruíram de uma formação nestes moldes e obtiveram apoio deverão esforçar-se por aplicar o melhor possível, com empenho e com sentido de dever, as capacidades adquiridas e os talentos de que são dotados. Estas são questões muito importantes da política social, da política da família, da economia empresarial e, em geral, da cultura de gestão. Estas políticas passaram a reconhecer também a importância que um equilíbrio razoável entre vida profissional e vida familiar assume para a criatividade e a produtividade (38).

7.5

Identificação e avaliação dos prestadores  (39). Capacidades notáveis e resultados pioneiros são particularmente difíceis de enquadrar nos esquemas de avaliação formais, que, além disso, se prestam a abusos. É problemática, por exemplo, a atitude dos autores de trabalhos científicos que, acima de tudo, se citam mutuamente, constituindo «cartéis de citações» e obtendo, assim, vantagens numa avaliação esquemática. O número de publicações, citações ou patentes, ou outros dados deste tipo, não constituem, por si só, critério suficiente de avaliação do desempenho. A qualidade, o valor de novidade e a importância são critérios mais importantes. Acresce que, em alguns casos, precisamente os conhecimentos mais inovadores ou as invenções que abriram novos horizontes não foram logo de imediato divulgados, reconhecidos, utilizados ou citados. Para a avaliação da personalidade e do desempenho, em todas as suas formas e manifestações, importa, portanto, recorrer à experiência e à capacidade de análise de representantes conceituados na área em que foram obtidos ou são esperados resultados (e mesmo assim não se está livre de erros de avaliação).

7.6

Participação nos processos decisórios. É necessário que haja uma participação mais intensa dos peritos com experiência e dos prestadores de serviços técnico-científicos nos processos decisórios e administrativos mais importantes ligados à política de investigação, à política empresarial e à política da investigação. A criação do Conselho Europeu de Investigação (CEI) é um primeiro passo encorajador neste sentido, que muito regozija o Comité (40). Mas também a gestão dos apoios à investigação e à inovação na Comunidade (ou seja, sobretudo na Comissão!) e nos Estados-Membros exige que se adquiram e mantenham suficientes conhecimentos especializados. Para tanto, importa envolver nesses processos jovens engenheiros e cientistas de sucesso. O apoio à investigação e à inovação é mais do que uma mera questão administrativa.

7.7

Libertar os investigadores de um excesso de encargos burocráticos não relacionados com a actividade científica. A actividade de investigação e desenvolvimento e os processos inventivos, mas também a aquisição e a transferência de conhecimento, implicam muitas horas de trabalho intelectual e prático (em laboratórios) que exige momentos de concentração absoluta e reflexão. O Comité tem vindo desde 2000 a chamar a atenção (41) para o facto de que cada vez mais as reuniões, os requerimentos, a elaboração de pareceres e de relatórios, em resumo tudo o que é burocracia, consomem a maior parte do tempo de muitos peritos, afastando-os da investigação científica propriamente dita, o que é prejudicial para a sua capacidade criativa e o seu rendimento. Entretanto, esta realidade vai sendo cada vez mais denunciada nos meios de comunicação social (42). O Comité saúda a intenção da Comissão de abordar este tema e procurar, juntamente com os Estados-Membros, meios para melhorar a situação actual. Saliente-se, a este propósito, que a participação dos peritos em processos decisórios importantes na área da política da investigação não contradiz o facto de haver necessidade de libertá-los dos encargos burocráticos. Muito pelo contrário, pode até contribuir para esse fim. Dever-se-ia definir o objectivo concreto de uniformizar e integrar os múltiplos procedimentos de requerimento, de apresentação de relatórios e de acompanhamento exigidos pelas diferentes entidades financiadoras, pelas instituições parceiras, pelas redes, pelas entidades de controlo e pelos grémios que dão pareceres. Deste modo seria possível aumentar a transparência dos procedimentos.

7.8

«Fuga de cérebros» e mobilidade. A profissão de engenheiro ou de cientista exige, a justo título, mobilidade e flexibilidade (vide também o ponto 4.1.5 supra), o que não deve, porém, ser conseguido à custa da vida privada e familiar e da segurança social (43). Por outro lado, tal não deve levar a situações em que os melhores procurem oportunidades de trabalho em países fora da Europa. As condições profissionais na Europa têm de ser suficientemente atractivas para evitar este êxodo e permitir que haja, no mínimo, um balanço equilibrado da mobilidade dos profissionais altamente qualificados. No entanto, alguns Estados-Membros manifestam preocupações de que possa surgir uma «fuga de cérebros» unidireccional dentro da UE. O Comité remete para anteriores pareceres (vide o ponto 5.7 supra) em que recomendou que parte significativa dos meios dos fundos estruturais comunitários deveria destinar-se ao desenvolvimento das infra-estruturas científicas, tendo em vista criar em todos os Estados-Membros locais de investigação atractivos, que poderiam vir a ser pólos de atracção para o regresso dos «cérebros» e, simultaneamente, parceiros em redes de investigação.

7.9

Imagem profissional do empresário. A aplicação da investigação e do desenvolvimento em produtos e processos inovadores constitui uma problemática específica. É, pois, compreensível que um dos objectivos fixados em Lisboa tenha sido o de levar o sector industrial a proporcionar dois terços do investimento em I&D. Trata-se também e especialmente de valorizar a imagem profissional do empresário e cimentar o papel relevante que lhe cabe para a inovação, o progresso económico e o bem-estar geral da sociedade. Por conseguinte, o Comité — enquanto ponte para a sociedade civil organizada — colocou o tema «Dar um rosto humano à actividade empresarial» no centro do seu próximo programa de trabalho. Só através de uma actividade empresarial responsável, enérgica e imaginativa, que demonstre potencial para se desenvolver, se conseguirá concretizar os objectivos de Lisboa.

Bruxelas, 12 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  JO C 65 de 17.3.2006.

(2)  JO C 325 de 30.12.2006.

(3)  Possivelmente também da cultura chinesa.

(4)  No parecer de iniciativa do Comité sobre o tema «Ciência, sociedade e cidadãos na Europa» é feita uma análise detalhada e diferenciada deste processo (JO C 221 de 7.8.2001).

(5)  Na Alemanha.

(6)  Sobretudo devido à redução da taxa de mortalidade infantil.

(7)  Conselho Europeu de 23 e 24 de Março de 2007 — Conclusões da Presidência (Energia sustentável).

(8)  

Por exemplo:

1)

WMO/UNEP Intergovernmental Panel on Climate Change«Climate Change 2007: The Physical Science BasisSummary for Policy Makers» ou

2)

Carta aberta enviada por 61 cientistas ao primeiro-ministro do Canadá

(http://www.lavoisier.com.au/papers/articles/canadianPMletter06.html).

(9)  http://www.hm-treasury.gov.uk/independent_reviews/stern_review_economics_climate_change/sternreview_index.cfm.

(10)  Vide parecer do CESE sobre «Necessidades em matéria de investigação para um fornecimento seguro e fiável de energia», JO C 241 de 7.10.2002. Vide ainda o relatório recentemente publicado «Transition to a sustainable energy system for EuropeThe R&D perspective» (ISBN 92-79-02688-7) e o artigo «Our emperors have no clothes» publicado na revista «Nature», Vol. 444, n.o 7119 (Novembro de 2006), p. 519.

(11)  Vide também a este respeito o parecer do (JO C 185 de 8.8.2006).

(12)  JO C 65 de 17.3.2006.

(13)  JO C 185 de 8.8.2006.

(14)  Informação publicada na revista alemã Bild der Wissenschaft n.o 9/2006, p. 109.

(15)  Sobretudo no que respeita aos salários e aos contratos dos jovens investigadores e dos jovens engenheiros.

(16)  Vide Comunicação da Comissão COM(2006) 728 final: «Para uma utilização mais eficaz dos incentivos fiscais em favor da investigação e do desenvolvimento (I&D)».

(17)  Artigo «Zwischen Fortschritt und Stillstand» publicado no jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung n.o 49, 27.2.2007, página 17.

(18)  Vide Comunicação da Comissão COM(2006) 728 final: «Para uma utilização mais eficaz dos incentivos fiscais em favor da investigação e do desenvolvimento (I&D)». O Comité elaborará um parecer sobre este tema específico.

(19)  Vide a este respeito o parecer do (JO C 110 de 30.4.2004). Historicamente, foi no domínio da investigação fundamental que foram lançadas as primeiras iniciativas de cooperação científica na Europa (Ocidental). Decorreram da necessidade de construir centros que pudessem albergar grandes aparelhos e de formar uma massa crítica, cujos custos excediam a capacidade financeira ou a vontade dos Estados individualmente.

(20)  Não se trata tanto de aprender ou dominar um sem-número de fórmulas, mas sim de compreender os princípios básicos da técnica e das leis mais elementares da Natureza e de ter consciência da importância das relações quantitativas e da utilidade da Matemática.

(21)  «A Renewed Pedagogy for the Future of Europe», Direcção-Geral da Investigação 2007 Science, EUR 22845, High Level Group on Science Education, Michel Rocard (Presidente), Peter Csermely, Doris Jorde, Dieter Lenzen, Harriet Walberg-Henriksson, Valerie Hemmo (relator).

(22)  JO C 65 de 17.3.2006.

(23)  JO C 93 de 27.4.2007.

(24)  Vide também a este respeito o Capítulo 7 do parecer do (JO C 204 de 18.7.2007).

(25)  JO C 325 de 30.12.2006.

(26)  JO C 323/I de 30.12.2006.

(27)  Vide, entre outros, o parecer (JO C 65 de 17.3.2006).

(28)  JO C 234 de 22.9.2005.

(29)  COM(2006) 502 final de 13.9.2006«O conhecimento em acção: uma estratégia alargada para a UE no domínio da inovação»; COM(2006) 589 final de 12.10.2006«Uma Europa moderna favorável à inovação».

(30)  EUR 22005 «Creating an Innovative Europe» ISBN 92-79-00964-8.

(31)  JO C 325 de 30.12.2006.

(32)  Por exemplo, «Flexissegurança: o caso da Dinamarca» (JO C 195 de 18.8.2006).

(33)  Vide também (JO C 65 de 17.3.2006), nomeadamente o ponto 4.13.2 «Carta Europeia do Investigador» e a respectiva nota de rodapé.

(34)  JO C 325 de 30.12.2006.

(35)  Ver o discurso do Comissário Günther Verheugen de 19 de Abril de 2007 (SPEECH/07/236): «Propriedade intelectual — Impulso à inovação na Europa».

(36)  «Investigadores no Espaço Europeu da Investigação: Uma profissão, múltiplas carreiras» (JO C 110 de 30.4.2004).

(37)  Uma maior interacção entre universidades e institutos de investigação não universitários poderia ser vantajosa, sobretudo no que se refere à utilização de equipamentos e infra-estruturas no quadro da articulação entre investigação e ensino, mas também à aquisição de novos conhecimentos nos estabelecimentos de ensino.

(38)  Vide o jornal alemão «Frankfurter Allgemeine Zeitung» n.o 257, de 4 de Novembro de 2005, C1.

(39)  Vide também, a este respeito, o parecer do (JO C 110 de 30.4.2004).

(40)  Vide também, a este respeito, o parecer do (JO C 110 de 30.4.2004).

(41)  Vide sobretudo os pontos 9.8 do parecer do (JO C 204 de 18.7.2000); por exemplo, no ponto 9.8.2 pode ler-se: «Neste sentido, cada cientista bem sucedido dispõe apenas de um número limitado de possibilidades de interacção — e de uma fracção limitada do seu tempo — para iniciar contactos com conteúdos significativos com outras pessoas, grupos, fóruns, comissões, etc., sem prejuízo das suas prestações científicas. A existência de processos de apresentação de candidaturas e de exame pericial demasiado numerosos e muito onerosos — sobretudo quando depois são rejeitados — priva a investigação do trabalho de indivíduos que lhe são indispensáveis. Isto é válido sobretudo quando se observa que para um único projecto existem muitos instrumentos de apoio e muitos procedimentos de avaliação que, frequentemente, chegam mesmo a sobrepor-se».

(42)  Veja-se, por exemplo, o artigo «Ein Forscher geht» publicado no jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung n.o 60 de 12.3.2007 ou a entrevista com Harald Uhlig publicada no mesmo jornal (n.o 67) em 20.3.2007.

(43)  Vide também (JO C 110 de 30.4.2004).


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/27


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde sobre a revisão do acervo relativo à defesa do consumidor»

COM(2006) 744 final

(2007/C 256/05)

Em 8 de Fevereiro de 2007, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Verde sobre a revisão do acervo relativo à defesa do consumidor.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Mercado Interno, Produção e Consumo emitiu parecer em 4 de Junho de 2007, sendo relator ADAMS.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 12 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu aprovou, por 55 votos a favor e 2 abstenções, o presente parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE acolhe a apresentação do Livro Verde, mas duvida de que as propostas nele contidas possam conduzir a um nível elevado e uniforme de protecção dos consumidores na UE. Garantir um tal nível de protecção através de um acervo para a defesa do consumidor mais simples, coerente e efectivamente aplicável tem sido um dos apelos constantes do CESE nos seus pareceres sobre a matéria, mas o processo de revisão em apreço parece indicar que será difícil alcançar esse objectivo. A revisão do acervo constitui, pois, um verdadeiro exercício de aplicação da iniciativa «Legislar Melhor». A base e os objectivos de um tal exercício devem ser claros e definidos previamente com as partes interessadas.

1.2

A revisão do acervo requer uma legitimação verdadeiramente democrática e uma base jurídica e conceptual clara.

1.3

O CESE considera particularmente importante que os princípios do acervo passem a ser aplicados ao sector das tecnologias digitais, em rápida expansão mas deficientemente regulamentado.

1.4

A política dos consumidores é, no entender do CESE, não só parte integrante da estratégia da UE para o mercado interno como também um elemento essencial da cidadania. O Comité preconiza a aplicação dos princípios da iniciativa «legislar melhor» na legislação em matéria de protecção do consumidor. Quaisquer propostas de regras uniformes neste domínio devem basear-se numa avaliação de impacto adequada e visar a simplificação e clarificação das regras vigentes.

1.5

Um melhor controlo do cumprimento das regras e processos mais claros e simples para obter reparação devem ser prioritários.

1.6

O Comité insta a Comissão a examinar o seu parecer de Abril de 2006 sobre o Quadro jurídico para a política dos consumidores  (1), segundo o qual as medidas da política dos consumidores devem poder ser adoptadas em seu direito próprio, e não apenas como consequência do estabelecimento do mercado interno.

1.7

A harmonização da protecção do consumidor em toda a UE deve obedecer ao princípio geral de que o nível de protecção a adoptar deve ser sempre o mais elevado disponível nos Estados-Membros. Qualquer «instrumento horizontal» terá de basear-se nos padrões mais elevados, devendo a necessária «integração vertical» concentrar-se no esclarecimento de questões técnicas. Contudo, um instrumento horizontal pode incluir regras totalmente uniformes em domínios específicos, tais como o direito de rescisão, a definição de consumidor, as cláusulas abusivas, a qualidade das prestações ou o direito dos consumidores de obter compensação, ao passo que noutros domínios a harmonização seria mínima. O Comité espera que seja esta a opção privilegiada, tanto pela Comissão como pelos Estados-Membros.

2.   Introdução

2.1

A Comissão publicou o muito aguardado Livro Verde sobre a revisão do acervo relativo à defesa do consumidor (legislação em matéria de direitos do consumidor) no início de Fevereiro de 2007. Assim terminou a chamada «fase de diagnóstico» da revisão. A Comissão procurou recolher pontos de vista sobre formas possíveis de simplificar, renovar e harmonizar a legislação comunitária em vigor no domínio da protecção do consumidor. Em seu entender, a análise dos pontos fortes e fracos da legislação actual e sua consequente revisão trará benefícios tanto para os consumidores como para as empresas. A Comissão também vê na revisão uma ocasião de fomentar a coerência entre os Estados-Membros e melhorar de forma geral a legislação da UE na matéria (alguma da qual data de há 20 anos), sobretudo pela detecção das discrepâncias entre legislações e dos eventuais entraves ao mercado interno que delas possam resultam para os consumidores e as empresas, sem prejuízo do princípio da subsidiariedade. O presente parecer centra-se, por isso, sobretudo na forma como os temas subjacentes ao acervo relativo à defesa do consumidor são interpretados e apresentados. De momento, apenas foram avançadas opções de revisão.

2.2

As despesas dos consumidores representam 58 % do PIB da UE, mas continuam a estar essencialmente fragmentadas por 27 mercados nacionais. O mercado interno poderia ser o maior do mundo, e a Comissão descreve a sua estratégia como o despertar de um gigante, as vendas a retalho no mercado único (2). Actualmente, a Comissão define a sua política para os consumidores da seguinte forma: «assegurar um nível comum elevado de protecção para todos os consumidores da UE, onde quer que vivam, viajem ou comprem na UE, contra riscos e ameaças à sua segurança e aos seus interesses económicos»  (3).

2.3

O objectivo de estabelecer um quadro uniforme para os direitos dos consumidores na UE goza de amplo apoio. Esse quadro proporcionaria a todos os consumidores uma protecção e direitos claros e equitativos, ao mesmo tempo que criaria condições comparáveis para os fornecedores de bens e serviços. O Livro Verde sobre os direitos dos consumidores reconhece expressamente que o avanço nesse sentido tem sido lento, errático e entravado por uma variedade de prioridades divergentes e de derrogações nacionais A adesão de novos Estados-Membros veio dificultar ainda mais uma compreensão comum da protecção dos consumidores. A revisão em apreço do acervo relativo à defesa do consumidor expõe a visão da Comissão de um processo que poderá conduzir a maior clareza, coerência e respeito das directivas vigentes. Muitas organizações de consumidores consideram, porém, que a revisão também suscita questões quanto à orientação da política dos consumidores no seu todo.

2.4

As directivas abrangidas pela revisão cobrem uma vasta gama de questões relacionadas com o direito dos contratos com os consumidores, incluindo a venda porta a porta, o direito real de habitação periódica, os pacotes de férias, a venda à distância, a venda de bens e as cláusulas abusivas. No entanto, nem todas as directivas relacionadas com a defesa do consumidor foram incluídas na revisão, dado que muitas são julgadas demasiado recentes para serem abrangidas ou tocam domínios que a Comissão trata noutros contextos. A Directiva relativa ao direito real de habitação periódica é descrita no Livro Verde como necessitando de uma revisão urgente, e está para breve uma proposta de directiva revista. Um importante novo domínio especificamente citado como devendo ser abrangido pelos princípios do acervo é o do «meio» digital, que inclui os desafios globais do comércio electrónico.

2.5

A Comissão reviu as directivas através de:

uma análise comparativa da sua transposição para o direito nacional,

um estudo das percepções dos consumidores e das empresas,

seminários com peritos nacionais e interessados no direito contratual.

2.6

A terminologia consagrada entre os intervenientes nas questões ligadas à defesa do consumidor pode prestar-se a confusão, pelo que a Comissão esclarece alguns dos principais termos usados. «Harmonização mínima» refere-se a um conjunto de requisitos mínimos impostos por uma directiva para aplicação pelos Estados-Membros. Isso significa que os Estados-Membros podem impor requisitos mais severos do que os previstos na directiva. «Harmonização máxima» significa que os Estados-Membros têm que aplicar as regras da directiva e não podem excedê-las. Desta forma, muitas organizações de consumidores tendem a equacionar a harmonização máxima com um nível mínimo de defesa do consumidor e a harmonização mínima com a possibilidade de um nível de protecção muito superior.

2.7

A publicação do Livro Verde marca o final da fase exploratória da revisão. A Comissão apelou a comentários sobre o Livro Verde até 15 de Maio de 2007. A Comissão vai agora analisar as reacções obtidas, publicar um resumo dessas reacções e decidir da necessidade ou não de um instrumento legislativo, um processo que tomará vários meses. Qualquer proposta legislativa será acompanhada de uma avaliação de impacto. «O ideal seria que, no final do exercício, fosse possível dizer aos consumidores comunitários “onde quer que esteja na UE ou onde quer que faça compras não faz diferença: os seus direitos fundamentais são os mesmos”»  (4).

3.   Síntese do Livro Verde

3.1

O Livro Verde visa encorajar todos os interessados a apresentarem os seus pontos de vista sobre as opções políticas para a revisão do acervo ligado à defesa do consumidor e outras questões específicas. Define três questões principais:

Evolução do mercado: a maioria das directivas que formam o acervo relativo à defesa do consumidor «já não satisfaz plenamente as exigências dos mercados actuais, caracterizados por uma rápida evolução». Os telecarregamentos de música e os leilões em linha são citados como exemplos, assim como a exclusão do software e dos dados do âmbito de aplicação da Directiva relativa às vendas aos consumidores.

Fragmentação das regras: as directivas vigentes permitem aos Estados-Membros adoptar regras mais rigorosas nas suas legislações nacionais. Há falta de coerência entre as legislações nacionais sobre várias questões, como por exemplo a duração do prazo de reflexão em certos contratos.

Falta de confiança: a maioria dos consumidores considera que é menos provável que empresas de outros Estados-Membros respeitem as leis de defesa do consumidor.

3.2

Com base em estudos anteriores, a Comissão apresenta em seguida duas opções possíveis para a revisão do acervo.

Opção I: a abordagem vertical, que consiste em alterar separadamente as directivas vigentes e eliminar gradualmente, mais tarde, as incongruências que subsistam entre elas.

Opção II: a abordagem mista, que passa pela identificação de aspectos comuns das directivas em vigor e sua regulação sistemática num instrumento horizontal. Algumas directivas poderão ter de ser adaptadas de forma «vertical».

3.3

É referida ainda uma terceira opção, a de «nenhuma medida legislativa», mas a Comissão frisa que dessa forma os actuais problemas continuariam por resolver e as incongruências entre Estados-Membros poderiam mesmo aumentar.

3.4

O Livro Verde analisa em seguida o âmbito de aplicação possível de um instrumento horizontal. São sugeridas três opções:

I.

Um instrumento-quadro aplicável a transacções domésticas e transfronteiras mas que não se sobreporia a regras sectoriais específicas, que continuariam em vigor. Os serviços financeiros e os seguros são exemplos de tais sectores.

II.

Um instrumento horizontal exclusivamente aplicável aos contratos transfronteiras. Esta alternativa pode fomentar a confiança dos consumidores no comércio transfronteiras mas pode também aumentar a fragmentação legal, sujeitando consumidores e profissionais a regimes jurídicos diferentes consoante a transacção seja doméstica ou transfronteiras.

III.

Um instrumento horizontal limitado às aquisições à distância, tanto transfronteiras como domésticas. Esta solução substituiria a directiva relativa às vendas à distância, mas aumentaria a fragmentação legal ao impor condições diferentes às transacções à distância e face a face.

3.5

O tópico que o Livro Verde analisa em seguida é, para muitos, o mais importante para a revisão do acervo relativo à defesa do consumidor — o grau de harmonização. Actualmente, os Estados-Membros podem impor níveis de protecção dos consumidores mais elevados do que o previsto nas directivas. Chama-se a isto a «harmonização mínima». A filosofia e as prioridades da defesa do consumidor variam enormemente de um Estado-Membro para outro, gerando amiúde confusão entre os consumidores e desencorajando as empresas de comercializar os seus produtos para lá das fronteiras nacionais. A Comissão sugere duas soluções possíveis:

1.

Uma legislação revista e plenamente harmonizada. Nos sectores em que a harmonização total seja impossível seria aplicada uma disposição de reconhecimento mútuo, «em relação a certos aspectos abrangidos pela legislação proposta, mas não completamente harmonizados».

2.

Legislação revista com base na harmonização mínima combinada com uma disposição de reconhecimento mútuo ou com o princípio do país de origem (5).

3.6   Anexo I — A consulta

A parte mais extensa do Livro Verde descreve em pormenor o exercício de consulta no âmbito do qual os respondentes são convidados a dar a sua opinião sobre temas tão diversos como questões políticas gerais, definições, direito contratual, questões de princípio e questões de âmbito e pormenor. A consulta começa pelas três questões anteriormente citadas:

A abordagem legislativa geral

O âmbito de aplicação de um instrumento horizontal

O grau de harmonização

Para cada tema, a Comissão coloca uma questão central e propõe três ou quatro respostas possíveis. Seguem-se 27 questões específicas relacionadas com as directivas em apreço. O formato é novamente o de uma breve introdução ao tema, seguido da questão principal — por exemplo: Até que ponto as regras em matéria de cláusulas abusivas devem igualmente aplicar-se aos contratos negociados individualmente? ou A duração dos prazos de reflexão deve ser harmonizada em todo o acervo? — e de três ou quatro opções de resposta possíveis.

4.   Observações na generalidade

4.1

Há muitos anos que o CESE apoia, através dos seus trabalhos e pareceres, o objectivo principal da política da UE para os consumidores — um nível elevado, uniforme e coerente de defesa de todos os consumidores. O Comité também apoia o objectivo secundário de permitir aos consumidores obterem informação adequada e fazerem escolhas judiciosas num mercado sem entraves. Atendendo à estrutura do Livro Verde, é inevitável que as tensões subjacentes à consecução desses dois objectivos se tornem aparentes.

4.2

É evidente que continuar com o acervo relativo à defesa do consumidor na sua forma actual não é uma opção a longo prazo. As diferenças entre a legislação dos Estados-Membros, a falta de coerência nas definições, a enorme discrepância na forma como a actual legislação na matéria é aplicada e a ausência de clareza nas vias de recurso (quando elas existem) têm todas contribuído para gerar entraves no mercado interno.

4.3

É igualmente claro que a Comissão vê a revisão como uma oportunidade de repensar certos aspectos da política dos consumidores, até agora tidos por fundamentais, e de averiguar se são compatíveis com um mercado interno dinâmico e competitivo face à globalização. Neste aspecto, a revisão assemelha-se a outros processos de revisão em curso na sequência da execução da Estratégia de Lisboa. Um nível elevado e uniforme de defesa do consumidor é encarado por muitos como parte integrante do modelo social europeu, e qualquer tentativa de redefinir a política comunitária dos consumidores de modo a torná-la tributária dos dois objectivos prioritários da UE — criar crescimento e emprego e reaproximar a Europa dos cidadãos — corre o risco de ser interpretada como um desafio a essa visão (6).

4.4

Ainda que a missão se afigure espinhosa, o CESE saúda a revisão do acervo relativo à defesa do consumidor e apoia os objectivos da Comissão de suprimir os entraves ao mercado interno e de manter um nível elevado de protecção dos consumidores, mas entende que tal esforço não deve ficar limitado apenas às 8 directivas agora em apreço, antes deve englobar, no mínimo, as 22 directivas constantes da lista elaborada pela Comissão em Maio de 2003.

4.5

O CESE deseja participar activamente neste debate com o fito de consolidar o mercado interno no interesse de todos os seus intervenientes — consumidores, profissionais, empresas e cidadãos.

5.   Observações na especialidade

5.1

O Livro Verde levanta questões complexas em matéria política, jurídica e de princípios. Os Estados-Membros têm eles próprios elaborado um acervo de legislação para defesa dos consumidores que, embora muitas vezes semelhante entre países nos seus princípios gerais, difere em pormenor e na aplicação. O processo de consulta sistemática e alargada descrito no anexo ao documento da Comissão dá testemunho dessa complexidade. Essa consulta apela às reacções das muitas centenas de organizações interessadas que desejem dar a conhecer a sua posição. No presente parecer, o CESE limitar-se-á, porém, a expor as suas observações sobre as principais questões em jogo, considerando que, caso a caso, se deverá pronunciar sobre cada uma das directivas a rever, como já o fez no seu Parecer sobre a directiva das vendas à distância (Parecer INT/334 sobre a Comunicação da Comissão COM(2006) 514 final, de 21.09.2006).

5.2

A principal prioridade deve ser corrigir as deficiências das directivas vigentes e coordená-las melhor umas com as outras.

5.3

A «harmonização mínima» combinada com uma abordagem positiva por parte dos Estados-Membros no sentido de adoptarem níveis cada vez mais elevados de defesa do consumidor deverá constituir a base da maior parte do acervo no futuro próximo. Por vários motivos sociais e económicos, os Estados-Membros preferirão certamente manter o nível de defesa do consumidor de que já dispõem ou avançar progressivamente, ao seu próprio ritmo, para um nível de protecção superior. Esta posição respeita e é muito mais facilmente conciliável com o princípio da subsidiariedade. Não obstante, reconhece igualmente que muitas categorias de consumidores na UE se encontram em desvantagem no seu grau de protecção actual ou na sua capacidade de obter reparação, pelo que é necessário intervir tanto a nível comunitário como nacional.

5.3.1

Tal não significa que, numa apreciação casuística, em domínios bem precisos em que sobreleve o interesse da realização do mercado interno, não seja de considerar a possibilidade de uma harmonização máxima, desde que salvaguardado um mais elevado nível de protecção dos consumidores, eventualmente mesmo com a utilização de regulamentos.

5.4

O objectivo declarado de promover a posição dos consumidores (conhecimento dos seus direitos, capacidade de agir contra fornecedores e obter reparação) não pode ser encarado como uma alternativa à necessidade de reforçar a sua protecção através de uma combinação de legislação comunitária e nacional. Informar é muito diferente de proteger. Com efeito, na maior parte das transacções comerciais a vantagem está do lado do fornecedor, e é à legislação de defesa do consumidor que cabe assegurar os direitos do comprador.

Bruxelas, 12 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  JO C 185 de 8.8.2006.

(2)  http://europa.eu/rapid/pressReleasesAction.do?reference=IP/07/320&format=HTML&aged=0&language=EN&guiLanguage=en.

(3)  http://ec.europa.eu/consumers/overview/cons_policy/index_en.htm.

(4)  http://ec.europa.eu/consumers/cons_int/safe_shop/acquis/green-paper_cons_acquis_en.pdf.

(5)  O reconhecimento mútuo significaria que os Estados-Membros manteriam a possibilidade de introduzir na legislação nacional regras mais estritas de defesa do consumidor, mas não seriam autorizados a impor as suas próprias exigências mais rigorosas a empresas estabelecidas noutros Estados-Membros de uma forma que criasse restrições injustificadas à livre circulação de mercadorias ou à livre prestação de serviços. A aplicação do princípio do país de origem significaria que um Estado-Membro manteria a possibilidade de introduzir na legislação nacional regras mais rigorosas de defesa do consumidor, mas as empresas estabelecidas noutros Estados-Membros teriam de cumprir apenas as regras aplicáveis no seu país de origem.

(6)  Cf. Meglena Kuneva, comissária responsável pela defesa do consumidor, in

http://europa.eu/rapid/pressReleasesAction.do?reference=IP/07/256&format=HTML&aged=0&language=EN&guiLanguage=en.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/31


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos espelhos retrovisores dos tractores agrícolas ou florestais de rodas» — (Versão codificada)

COM(2007) 236 final — 2007/0081 (COD)

(2007/C 256/06)

Em 29 de Maio de 2007, o Conselho da União Europeia decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Considerando que o conteúdo da proposta é inteiramente satisfatório e não suscita quaisquer observações, o Comité, na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho) decidiu, por 145 votos a favor, 2 votos contra e 4 abstenções, emitir parecer favorável ao texto proposto.

 

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/31


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A definição de uma política energética para a Europa (Estratégia de Lisboa)»

(2007/C 256/07)

Em 14 de Setembro de 2006 (com confirmação em 26 de Outubro de 2006), o Comité Económico e Social decidiu, nos termos do artigo 31.o do Regimento, elaborar um relatório de informação sobre A definição de uma política energética para a Europa.

Na reunião plenária de 14 e 15 de Março de 2007, nos termos do disposto no n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, o CESE decidiu transformar o relatório de informação em parecer de iniciativa.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 19 de Junho de 2007, sendo relatora Ulla Sirkeinen.

Na 437.a reunião plenária, realizada em 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 12 de Julho de 2007), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 126 votos a favor e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Recomendações

1.1

A energia tornou-se um assunto político de importância fulcral, estando estreitamente ligado à Estratégia de Lisboa para o crescimento e o emprego.

A energia condiciona uma parte cada vez maior da economia europeia. Para responder aos desafios da política energética relativos às alterações climáticas, segurança do aprovisionamento e competitividade, a UE precisa de passar a ser uma economia com alto rendimento energético e níveis baixos de emissão de CO2.

Deste modo, importa adoptar uma perspectiva global e reflectir ao nível da União sobre o controlo da procura europeia de energia; a garantia de aprovisionamentos através de fontes diversificadas, o acesso a redes e a necessidade de falar em uníssono nas relações externas no domínio da energia, bem como outras medidas possíveis.

A criação e utilização de inovações, que permitirão esta mudança, exigem determinadas condições e algumas medidas específicas no plano comunitário, nacional, regional e local.

1.2

O enfoque da Estratégia de Lisboa incide na criação de mais e melhores postos de trabalho. Quando as condições do mercado mudam, o sector energético perde alguns postos de trabalho. Por outro lado, novas soluções em matéria de energia poderão ser importantes motores da criação de postos de trabalho de alta qualidade. A educação e formação profissional são facilitadoras essenciais.

1.2.1

A Estratégia de Lisboa engloba aspectos da dimensão social da energia além do emprego, incluindo, em particular, um serviço público de alta qualidade e a preços acessíveis. A sociedade civil, incluindo os parceiros sociais, deverá ter uma intervenção activa na definição da política energética.

1.3

No quadro da Estratégia de Lisboa, o CESE apresenta, em conjunto com os Conselhos Económicos e Sociais nacionais, as seguintes recomendações sobre uma «Política energética para uma sociedade do conhecimento»:

Avaliar políticas energéticas e outras condições-quadro pertinentes para cumprir os objectivos da UE respeitantes a uma economia eficiente e com níveis baixos de emissão de CO2.

Criar uma mão-de-obra qualificada e muito motivada com base num sistema de educação de alta qualidade.

Obter I&D suficiente do sector público, comparável à dos principais concorrentes, e promover o financiamento privado de I&D.

Desenvolver a cooperação internacional no domínio das tecnologias energéticas, especialmente com outros actores importantes. Acompanhar de forma sistemática as políticas e medidas relativas à tecnologia energética assumidas pelos principais concorrentes e parceiros.

Assegurar a disponibilidade de financiamento de risco nas fases de criação e de arranque da actividade de PME, bem como para investimentos em novas tecnologias.

Garantir uma concorrência aberta e saudável nos mercados da energia para forçar as empresas a inovar. O acesso à rede, no caso das energias renováveis, pode ser crucial para uma inovação de sucesso.

Eliminar obstáculos aos investimentos necessários para a generalização do uso das novas tecnologias. Os requisitos de planeamento e autorização abrandam e dificultam até os investimentos. Para reduzir os riscos de investimento, o quadro regulamentar precisa de ser claro e estável.

Garantir o acesso das novas tecnologias aos mercados comunitários e globais.

Assegurar a igualdade de condições de concorrência no plano mundial estabelecendo, por exemplo, um preço global para as emissões de CO2 e garantindo que este não se torna uma mercadoria igual a outras, dado que uma redução significativa dos níveis de CO2 influenciará a própria sobrevivência do planeta.

O estabelecimento de metas ambiciosas pode ajudar a UE a assumir uma posição forte nos mercados globais de tecnologias de eficiência energética e de energias renováveis. Contudo, é necessário definir cuidadosamente os objectivos e os prazos, para que as perspectivas sobre o seu cumprimento sejam realistas.

Para obter resultados com eficiência de custos, a escolha das medidas de apoio activo à inovação deverá ser feita cuidadosamente de entre as seguintes:

Financiamento de I&D;

Educação e formação;

Sensibilização do público;

Mecanismos de preços, tributação;

Subsídios;

Objectivos vinculativos e obrigações;

Regulamentos e normas vinculativas;

Normas voluntárias, acordos voluntários;

Contratos públicos.

1.4

Para conseguir a transformação urgente do sector energético que é necessária, precisa de ser acelerado o ritmo de inovação. O Comité insiste em que seja dada especial atenção a

Medidas para estabelecer um preço económico apropriado para as emissões de CO2,

Expandir a I&D pública e privada para apoiar novas formas de energia e a eficiência energética,

Utilizar a regulação (ou outros instrumentos caso sejam mais eficientes do ponto de vista do custo) para impulsionar um progresso mais rápido na melhoria da eficiência energética de produtos de todas os tipos,

Utilizar os concursos públicos muito mais proactivamente para dar um impulso a normas mais severas de eficiência energética, especialmente na construção civil.

2.   Introdução

2.1

No início de 2008, o CESE pretende apresentar, em colaboração com os Conselhos Económicos e Sociais nacionais, um «relatório sumário» sobre as prioridades da Estratégia de Lisboa para o crescimento e o emprego. Este parecer sobre a política energética integra o relatório sumário. Elaborado em colaboração com os Conselhos Económicos e Sociais nacionais, conta com o envolvimento activo dos conselhos francês, italiano e maltês.

2.2

Este parecer diz respeito à «Secção B — Reformas microeconómicas para aumentar o potencial de crescimento da Europa» das Orientações Integradas para o Crescimento e o Emprego (2005-2008). Incide particularmente nas orientações 8 (reforço da competitividade), 12 (I&D), 13 (inovação e TIC) e 14 (utilização sustentável dos recursos) (1).

Conselho Europeu de Março de 2006

2.3

Nas conclusões da reunião de 23 e 24 de Março de 2006, em Bruxelas, o Conselho Europeu saudou «as iniciativas tomadas pelo Parlamento Europeu, o Comité das Regiões e o Comité Económico e Social Europeu para incrementar os níveis de apropriação no plano comunitário [da Estratégia de Lisboa renovada para o emprego e o crescimento]. O Conselho Europeu incentiva o Comité Económico e Social Europeu e o Comité das Regiões a prosseguirem os seus trabalhos e solicita-lhes que apresentem, no início de 2008, relatórios sumários sobre as actividades de apoio à Parceria para o Crescimento e o Emprego» (ponto 12 das conclusões da Presidência).

2.4

O Conselho Europeu indicou que «a situação na Europa se caracteriza por uma concorrência acrescida vinda do estrangeiro, pelo envelhecimento da população, pelo aumento dos preços da energia e pela necessidade de salvaguardar a segurança energética» (ponto 7 das conclusões da Presidência). O Conselho Europeu confirmou «que se mantêm válidas as Orientações Integradas para o Emprego e o Crescimento 2005-2008. Neste quadro, chega a acordo sobre domínios específicos de acção prioritária nos capítulos do investimento no conhecimento e na inovação, do potencial das empresas, designadamente das PME, e do emprego para categorias prioritárias; bem como sobre a definição de uma política energética para a Europa» (ponto 16).

2.5

O Conselho Europeu registou que «a Europa enfrenta uma série de desafios no domínio da energia: a persistência das dificuldades nos mercados do petróleo e do gás, a crescente dependência das importações e a limitada diversificação conseguida até ao momento, os preços elevados e voláteis da energia, a crescente procura de energia a nível global, os riscos de segurança que afectam os países produtores e de trânsito, bem como as rotas de transporte, as ameaças cada vez maiores das alterações climáticas, os lentos progressos na eficiência energética e na utilização das energias renováveis, a necessidade de uma maior transparência dos mercados energéticos e de uma maior integração e interconexão dos mercados energéticos nacionais na iminência da liberalização do mercado da energia (Julho de 2007), bem como a limitada coordenação entre os intervenientes neste sector num momento em que são necessários grandes investimentos nas infra-estruturas energéticas» (ponto 43).

2.6

Em resposta a estes desafios e com base no Livro Verde da Comissão «Estratégia europeia para uma energia sustentável, competitiva e segura», o Conselho Europeu apelou à «definição de uma política energética para a Europa, a fim de garantir que uma política comunitária eficaz, coerência entre os Estados-Membros e congruência das acções nos diversos domínios de intervenção, e o alcance de forma equilibrada dos três objectivos da segurança do abastecimento, da competitividade e da sustentabilidade ambiental» (ponto 44).

2.7

O Conselho Europeu sublinhou que, «a fim de alcançar esta congruência tanto nas políticas internas como nas políticas externas da UE, a política energética deve satisfazer as necessidades de muitos domínios de acção. Enquanto componente de uma estratégia de crescimento e através de mercados abertos e competitivos, este sector estimula o investimento, o desenvolvimento tecnológico e o comércio interno e externo. Está firmemente relacionado com a política ambiental e estreitamente ligado ao emprego, à política regional e, em especial, à política dos transportes. Por outro lado, os aspectos da política externa e de desenvolvimento estão a adquirir uma importância cada vez maior na promoção dos objectivos em matéria de política energética junto dos outros países» (ponto 45).

2.8

A política energética para a Europa deverá basear-se «em perspectivas comuns sobre a oferta e a procura a longo prazo e numa avaliação objectiva e transparente das vantagens e inconvenientes das várias fontes de energia, bem como contribuir de forma equilibrada para os seus três objectivos principais:» (pontos 46 e 47)

Aumentar a segurança do abastecimento.

Assegurar a competitividade das economias europeias e uma oferta energética a preços acessíveis, em benefício tanto das empresas como dos consumidores, num quadro regulamentar estável.

Promover a sustentabilidade ambiental.

2.9

«Na prossecução destes objectivos principais, a política energética para a Europa deverá:

garantir a transparência e a não discriminação nos mercados;

ser coerente com as regras da concorrência;

ser coerente com as obrigações de serviço público;

respeitar plenamente a soberania dos Estados-Membros em relação às fontes de energia primária e à escolha do leque energético».

O «Pacote da Energia» de 2007

2.10

A partir de 2007, a Comissão apresentará regularmente uma Análise Estratégica da Política Energética. Em 10 de Janeiro de 2007, a Comissão publicou a sua primeira análise bem como uma Comunicação ao Conselho e ao Parlamento Europeu «Uma política energética para a Europa», documentos que compõem o «pacote da energia».

2.11

O ponto de partida da Comissão para uma política energética europeia assenta em três vertentes: combater as alterações climáticas, promover o emprego e o crescimento e limitar a vulnerabilidade externa da UE relativamente às importações de hidrocarbonetos.

2.12

A Comissão propõe como objectivo central da política energética para a Europa a redução em 20 % das emissões de gases com efeito de estufa na UE, até 2020. O objectivo da UE deve ser visto à luz da necessidade de as nações industriais tomarem medidas no plano internacional em matéria de alterações climáticas. Assumindo um compromisso desta natureza, a Europa terá de se propor a mais. Assim, o objectivo deveria ser aumentar esta redução para 30 % em 2020 e entre 60 a 80 % em 2050.

2.13

A preocupação não são apenas as alterações climáticas, mas também a segurança da Europa em matéria de aprovisionamento de energia, economia e bem-estar dos cidadãos. A Comissão considera que o cumprimento deste objectivo poderá também limitar a exposição cada vez maior da UE à crescente volatilidade e aos preços mais elevados do petróleo e do gás, tornar o mercado energético da UE mais competitivo e incentivar a tecnologia e a criação de emprego.

2.14

Em termos especificamente energéticos, o cumprimento do objectivo relativo aos gases com efeito de estufa exigirá à UE a redução em 20 % ou mais da quantidade de CO2 resultante do uso de energia, nos próximos 13 anos. Isto significa que a UE assumirá a liderança mundial na catalisação de uma nova revolução industrial.

2.15

Para alcançar este objectivo, a Comissão propõe igualmente concentrar esforços numa série de medidas relacionadas com a energia: aumentar a presença da energia renovável no cabaz energético bem como medidas que garantam que todos beneficiam do mercado interno da energia; reforçar a solidariedade entre Estados-Membros numa perspectiva mais a longo prazo para o desenvolvimento de tecnologias energéticas, com um novo destaque dado à segurança e às salvaguardas nucleares e de esforços determinados para uma UE falando a «uma só voz» com os parceiros internacionais, incluindo produtores de energia, importadores de energia e países em desenvolvimento.

2.16

A análise engloba um Plano de Acção para a energia com dez pontos e um calendário para a aplicação das medidas. O primeiro pacote de medidas concretas é apresentado com o Plano de Acção, compreendendo:

um relatório sobre a implementação pelos Estados-Membros do mercado interno do gás e da electricidade, bem como os resultados de um inquérito sobre o estado da concorrência nestes dois sectores;

um Plano de Interconexões Prioritárias nas redes de electricidade e gás dos Estados-Membros para que a rede europeia se transforme numa realidade;

propostas para promover a produção de energia sustentável a partir de combustíveis fósseis;

um roteiro e outras iniciativas para a promoção das energias renováveis, nomeadamente dos biocombustíveis para os transportes;

uma análise da situação da energia nuclear na Europa;

uma ficha de trabalho para um futuro Plano Estratégico Europeu para as Tecnologias Energéticas.

2.17

O Plano de Acção para a Eficiência Energética, que a Comissão adoptou em 19 de Outubro de 2006, faz igualmente parte do Plano de Acção. A Comunicação da Comissão «Limitação das alterações climáticas a 2 graus Celsius — trajectória até 2020 e para além desta data» e a Análise Estratégica complementam-se e reforçam-se mutuamente.

2.18

O Conselho Europeu apoiou, sem reservas, as propostas da Comissão na Cimeira da Primavera de 8 e 9 de Março de 2007. A Comissão elaborará propostas legislativas detalhadas e outras que sejam relevantes, em conformidade com as conclusões da cimeira. Uma segunda Análise Estratégica da Política Energética, a realizar dentro de dois anos, comunicará os progressos realizados, tendo-se os Chefes de Estado e de Governo comprometido a discutir regularmente as questões energéticas.

Pareceres anteriores do Comité Económico e Social Europeu sobre política energética

2.19

Durante o mandato de 2002 a 2006, o CESE redigiu vários pareceres sobre política energética, especialmente sobre as características e o papel de diferentes fontes de energia e tecnologias. Na reunião plenária de Setembro de 2006, o CESE aprovou finalmente um parecer exploratório sobre «O aprovisionamento energético da UE: estratégia para uma combinação de energias optimizada» (2). Este parecer abrangeu muitos dos temas abordados no Conselho Europeu de Março de 2006. São de assinalar as seguintes conclusões do parecer:

2.20

O CESE considerou que a Europa necessita de estabelecer como objectivo estratégico a obtenção de uma combinação de energias diversificada, que corresponda da melhor forma a objectivos económicos, de segurança do aprovisionamento e de política climática. Face a estes objectivos, todas as fontes de energia e tecnologias apresentam vantagens e desvantagens, que devem ser levadas em conta de forma aberta e equilibrada.

2.21

Um maior recurso às fontes de energia renováveis tem potencialidades que é necessário explorar. Porém, mesmo que se cumpra o objectivo de, em 2020, produzir 20 % de energias renováveis, não é provável que estas substituam inteiramente as fontes de energia tradicionais num futuro próximo.

2.22

Há que manter em aberto todas as opções. Os cenários para a UE a 25 apresentados no parecer sustentam claramente esta conclusão. Nem num cenário pressupondo os maiores progressos em matéria de eficiência energética e um aumento das energias renováveis, se tornaria qualquer das tecnologias energéticas obsoleta sem produzir um impacto negativo seja no ambiente ou na economia.

2.23

O desenvolvimento da actual combinação de energias na Europa deve ter por base estratégias políticas no sentido de reduzir a dependência externa e de dispor de mais fontes de energia que não emitam gases com efeito de estufa, tendo presente que os actores do mercado decidem investimentos em diferentes tecnologias.

2.24

O CESE recomendou o desenvolvimento de uma estratégia visando a obtenção da melhor combinação de energias possível. Neste contexto, é importante clarificar o papel que cabe à UE, aos Estados-Membros, às autoridades independentes e aos intervenientes no mercado.

Propôs-se uma estratégia para obter a melhor combinação de energias possível que seria composta pelos seguintes elementos:

eficiência energética, incluindo a produção combinada de calor e electricidade;

fontes de energia renováveis incluindo a utilização dos biocombustíveis nos transportes;

eficiência energética nos transportes;

reforço da segurança nuclear e uma solução para o problema do combustível irradiado;

tecnologias limpas do carvão e preparação para uma maior utilização das reservas de carvão da UE;

incentivo aos investimentos nos terminais para gás natural liquefeito;

enquadramento jurídico para garantir investimentos suficientes na produção e no transporte de energia;

a UE falando a uma só voz e assumindo-se como um dos mais fortes intervenientes na cena internacional;

avaliação do impacto das medidas políticas climáticas e ambientais, actuais e futuras, nos outros objectivos de política energética;

solução global para as políticas climáticas pós-Quioto, que envolva, pelo menos, os principais produtores de emissões;

aumento dos esforços de I&D e apoio da UE à I&D no sector da energia, a curto e longo prazo.

3.   Observações do CESE sobre a política energética para a Europa à luz da Estratégia de Lisboa

3.1

A energia é uma necessidade na sociedade moderna. Para satisfazer as nossas necessidades de alimentação, aquecimento em climas frios, iluminação, transporte, produtos de base e bens de consumo, bem como as necessidades cada vez mais importantes, nos dias de hoje, de telecomunicações e tratamento de informação, precisamos de um aprovisionamento de energia seguro. Contudo, a forma como satisfazemos estas necessidades pode e terá de mudar. À luz dos desafios da actualidade, nomeadamente os relativos às alterações climáticas, precisamos urgentemente de uma mudança de paradigma visando uma economia com alto rendimento energético e níveis baixos de emissão de CO2.

3.2

A energia está estreitamente ligada à Estratégia de Lisboa para o crescimento e o emprego. Para cumprir os objectivos desta estratégia precisamos de energia suficiente a preços acessíveis e competitivos. Por outro lado, novas soluções energéticas poderão ser importantes motores para a competitividade europeia e a criação de postos de trabalho de alta qualidade, principalmente se tiverem sucesso nos mercados globais.

3.3

Os objectivos gerais da política energética (competitividade, segurança de aprovisionamento e sustentabilidade) permanecem válidos. O sério desafio das alterações climáticas exige a redução da crescente procura de energia através de uma melhor eficiência energética e do forte aumento da quota de tecnologias à base de energia renováveis e com níveis baixos de emissão de CO2 (como, por exemplo, a captação e o armazenamento do CO2, no futuro). A segurança do aprovisionamento de energia beneficia também com uma melhor eficiência energética, com diversificação das fontes de energia bem como com uma UE falando a uma só voz nas relações externas. A competitividade precisa de ser potenciada por um mercado aberto que funcione bem e proporcione uma concorrência justa, bem como o acesso a redes, assegurando um serviço público de alta qualidade.

3.4

Criar mais e melhores postos de trabalho é um elemento fulcral da Estratégia de Lisboa. Dado que a concorrência nos mercados em geral exige uma melhor produtividade, também as empresas no mercado de energia precisam de ser mais eficientes. Quando confrontados com a perda do seu posto de trabalho, os trabalhadores do sector energético têm de ser devidamente apoiados. Por outro lado, deverão prevalecer e aumentar os postos de trabalho nos sectores que usam energia. Em particular, a obtenção de uma melhor eficiência energética e de tecnologias ligadas às fontes de energia renováveis e outras criará numerosos postos de trabalho, principalmente de alta qualidade.

3.4.1

É preciso conceder-se especial atenção à dimensão social da política energética, no quadro da Estratégia de Lisboa. O conceito abrange questões de emprego e postos de trabalho, bem como a disponibilização generalizada de energia a preços acessíveis, ou seja, um serviço público de alta qualidade. A sociedade civil, incluindo os parceiros sociais, deverá ter uma intervenção activa na definição da política energética.

3.5

O CESE apresentou detalhadamente a sua visão sobre as questões-chave da política energética acima referidas nos pareceres recentemente publicados e elaborará, em devido tempo, pareceres sobre as propostas legislativas (e de outra natureza) apresentadas pela Comissão, com base nas conclusões do Conselho Europeu, no quadro do «pacote da energia».

3.6

Visando evitar a duplicação do trabalho e enriquecer o debate sobre energia, o presente parecer do CESE incide na relação entre a política energética e a ideia de base da Estratégia de Lisboa — uma Europa enquanto sociedade do conhecimento. O parecer abordará também questões presentes no «pacote da energia» relativas à inovação.

O papel da tecnologia e inovação no cumprimento dos desafios energéticos deste século

3.7

Objectivos e medidas definidos politicamente estabelecem o enquadramento, mas a tecnologia e a inovação (incluindo a mudança de comportamento) são a chave do progresso real. Esta afirmação é verdadeira para a melhoria da eficiência energética, tanto no respeitante à conversão como ao consumo de energia. A inovação pode desempenhar um papel importante na redução da dependência de fontes de energia externas através da diversificação do cabaz energético. A redução das emissões de gases com efeito de estufa passará definitivamente pela inovação através do desenvolvimento e utilização de fontes de energia renováveis, de tecnologias limpas do carvão e outros combustíveis fósseis, bem como de energia nuclear mais segura.

3.8

Num sentido lato, inovação significa renovação. Trata-se de desenvolver e introduzir novas ideias na utilização generalizada dotando-as de valor económico. O termo engloba a inovação tecnológica assim como novas soluções ao nível da gestão e organização, estando presente tanto na indústria como nos serviços e no sector público. A investigação é frequentemente a origem da inovação, mas nem sempre. Neste contexto, o Comité remete para o parecer sobre «Necessidades em matéria de investigação para um fornecimento seguro e fiável de energia» (3).

3.8.1

As tecnologias energéticas, como a combustão mais eficiente, moinhos de vento, colectores solares, futuras células de combustível, tecnologia do hidrogénio e fusão estão no centro das atenções. As tecnologias relacionadas indirectamente com a energia são igualmente importantes, como o desenvolvimento de materiais e a meteorologia que contribuirá para a utilização optimizada da energia com melhores previsões meteorológicas.

3.8.2

Para uma utilização mais eficiente de energia, o leque de tecnologias relevantes é quase ilimitado: melhor isolamento, aparelhos electrodomésticos com menor consumo energético, materiais mais leves, melhor planeamento industrial de produtos e processos, maquinaria mais eficiente. Neste contexto, o papel das indústrias de elevada intensidade energética é importante: se estas não garantirem a procura através de investimentos e competência especializada, a UE assistirá ao afrouxamento da inovação na grande parte das tecnologias eficientes do ponto de vista energético destinada à indústria.

3.8.3

As tecnologias da informação e comunicação (TIC) oferecem um grande potencial. Aplicadas à produção, conversão e distribuição de energia, as TIC podem fornecer, como acontece com todos os outros processos, maior eficiência e produtividade. O mesmo se verifica na segurança das operações, incluindo particularmente as das redes de transmissão. As TIC assistem os utilizadores e consumidores no controlo do consumo energético. Um exemplo com vários benefícios seria a redução das sobrecargas facilitando a reacção imediata dos consumidores aos preços sinais. Num contexto mais amplo, a utilização das TIC poderá substituir necessidades de transporte através, por exemplo, do teletrabalho e de teleconferências.

3.8.4

Precisamos igualmente de inovar nas formas de operação e gestão de energia e de sistemas relacionados com a energia. O objectivo seria assegurar serviços de alta qualidade a um preço acessível. Exemplos destas inovações são a gestão do funcionamento seguro de sistemas de produção e transmissão bem como a manutenção e gestão do mercado, nomeadamente das trocas, dos picos de consumo e do ajustamento à luz do dia. Finalmente, sem ser o aspecto menos importante, uma logística eficiente poderá contribuir bastante para a gestão da procura de energia e uma melhor gestão do combustível.

3.8.5

É preciso inovar também no comportamento. O consumidor é o actor principal: uma utilização de energia mais inteligente é da responsabilidade de cada um de nós e exige novas ideias e um maior conhecimento. Sensibilizar de forma mais eficaz e divulgar informação mais adequada aos consumidores para o conduzir nas suas escolhas constituem um grande desafio. O ordenamento regional e urbano, bem como as soluções arquitectónicas e os requisitos de construção, poderão assistir os cidadãos nas suas escolhas energéticas. Neste sentido, dever-se-iam promover campanhas oficiais de informação a favor da utilização eficiente e da poupança de energia.

3.9

É necessário encontrar soluções radicalmente novas para os problemas e a mudança é urgente. A mudança radical exige tempo e, por isso, é necessário iniciar imediatamente o processo e atribuir recursos. Entretanto, as melhores tecnologias actuais deveriam ser generalizadas visando, por exemplo, a redução do consumo doméstico de energia.

3.10

Para que a inovação e os investimentos sejam rentáveis, dever-se-ia avaliar quantitativamente a rentabilidade das tecnologias a montante. Um exemplo importante é o custo de diferentes tecnologias para evitar a emissão de 1 tonelada CO2: as turbinas movidas pelo vento são mais dispendiosas do que o isolamento das casas.

Condições e medidas políticas para reforçar a inovação

3.11

A criação e utilização de inovações exigem determinadas condições e medidas políticas a nível local, regional, nacional e comunitário. Uma vez que a UE pretende ser o líder mundial das tecnologias com alto rendimento energético e níveis baixos de emissão de CO2, é muito importante avaliar as políticas energéticas e outras condições-quadro em função dessa finalidade.

3.12

A primeira condição prévia para uma inovação bem-sucedida é uma mão-de-obra qualificada e motivada apoiada por um sistema de educação de alta qualidade. O desenvolvimento de novas tecnologias exige I&D suficiente bem como o financiamento de risco na criação e na fase inicial do negócio de PME. A concorrência saudável e aberta força as empresas a inovar. É necessário que estas possam aceder ao mercado, incluindo ao mercado global. O acesso à rede, no caso das energias renováveis, pode ser crucial para uma inovação de sucesso. O quadro regulamentar deverá ser concebido para aumentar a inovação através, por exemplo, da atribuição de recompensas aos inovadores (o regime de comércio de emissões, por exemplo, não recompensou os que tomaram medidas numa fase precoce para reduzir as emissões). A regulamentação excessiva refreia a inovação.

3.12.1

Para que as novas tecnologias possam ser generalizadas, são necessários investimentos. As empresas precisam de ter lucro para poderem investir. Este é também o caso de investimentos destinados a melhorar a eficiência energética, apesar de o período de retorno poder ser curto. O negócio da energia tem sido muito lucrativo nos últimos anos, mas os investimentos continuam a ser baixos. Sabe-se que os requisitos de planeamento e autorização, bem como a concessão de licenças, abrandam e dificultam os investimentos. Para reduzir os riscos de investimento, o quadro regulamentar precisa de ser claro e estável. Dado que os investimentos em infra-estruturas energéticas têm frequentemente períodos longos de retorno, seria vantajoso celebrar-se contratos a longo prazo.

3.12.2

Para que uma empresa possa investir no desenvolvimento ou na utilização de novas tecnologias, é necessário que haja retorno do investimento por parte de mercados suficientemente grandes. Na maioria dos casos, os mercados nacionais não são suficientemente vastos — cada vez mais o acesso aos mercados globais é uma condição prévia para fazer o investimento. A procura global e um mercado com condições equitativas são igualmente importantes. As medidas unilaterais da UE não criam procura noutros locais, embora tal possa suceder no futuro. O preço sobre o CO2 pode ser, por exemplo, um incentivo importante mas deverá ser global.

3.12.3

A forte posição da UE nos mercados globais de tecnologias energéticas eficientes e de energias renováveis deverá ser mais desenvolvida e reforçada. A capacidade da UE de cumprir este objectivo pode encontrar um incentivo na sua ambição de ser pioneira nas políticas climáticas — mediante o estabelecimento de objectivos ambiciosos — bem como na eficiência energética e energias renováveis. Porém, esta evolução não sucederá de forma automática. Os objectivos e os prazos para a sua aplicação deverão ser estabelecidos com cuidado, para que a perspectiva de os cumprir seja realista, caso contrário o resultado poderá ser despesas suplementares e possível redução de postos de trabalho. As tecnologias relevantes têm de estar, por exemplo, na fase de desenvolvimento para poderem estar prontas a tempo dos prazos previstos. Devem ser igualmente considerados os ciclos de investimento em diferentes sectores.

3.12.4

A UE prefere interferir no mercado para aumentar a inovação, medida que pode não ser suficientemente eficaz. Os EUA e outros países recorrem mais ao financiamento público de I&D. A Europa precisa de incrementar o financiamento público e privado de I&D na área da energia. Dever-se-ia investir na cooperação tecnológica com os outros grandes actores e no acompanhamento sistemático das suas políticas e medidas. É igualmente necessário que haja uma maior cooperação entre Estados-Membros bem como uma melhor coordenação dos esforços nacionais e comunitários, sem que a concorrência seja eliminada. Dever-se-á promover uma cooperação mais próxima entre a investigação pública e as empresas, tanto no planeamento como na execução das agendas de investigação de modo a garantir que os esforços de investigação conduzem à inovação. O projecto do Instituto Europeu de Tecnologia poderia ter um papel a desempenhar nesta matéria.

3.13

Para apoiar a inovação de forma activa, deverão ser combinados instrumentos. Para serem eficazes, as diferentes fases de desenvolvimento e as diferentes circunstâncias do mercado exigem diferentes medidas. Em relação às medidas necessárias para as tornar inovações no mercado com êxito, as tecnologias poderão ser agrupadas, por exemplo, em três categorias:

1)

Ainda longe do mercado, na fase de I&D: é necessário apoiar de forma selectiva a investigação, o desenvolvimento e a demonstração. Os preços sinais, como o preço sobre o CO2, não são suficientes.

2)

Em vias de entrar no mercado, a tecnologia apresenta já um bom funcionamento mas é ainda demasiado cara para o mercado: o preço sobre o CO2 poderá ser o incentivo correcto, bem como um apoio especial que garanta um aumento rápido da procura e, consequentemente, volumes altos de produção.

3)

Um bom produto no mercado mas com pouca procura (exemplos deste caso há-os nas tecnologias energéticas eficientes): o objectivo principal é sensibilizar contando com o apoio de sistemas de auditoria energética ou semelhantes.

3.14

Nos planos comunitário, nacional e regional, encontram-se à disposição numerosas medidas e instrumentos. Dever-se-á escolher cuidadosamente as medidas a aplicar para alcançar determinados objectivos de modo que os resultados sejam rentáveis. A rapidez de acção deve ser avaliada de forma crítica para evitar o gasto de recursos e efeitos não desejados. As medidas que servem claramente os objectivos directos e indirectos — ou seja, medidas que não «comprometem» o futuro — deveriam ser executadas com a maior brevidade possível. As medidas mais complicadas — por norma, os novos tipos de medidas — deveriam ser estudadas cuidadosamente (por exemplo, os modos de estabelecer preço de mercado para CO2). Para evitar situações complicadas, dever-se-ão evitar efeitos laterais inesperados e a multiplicidade de soluções não optimizadas para o mesmo objectivo. Na escolha de medidas a aplicar é também importante ter em consideração o funcionamento eficiente do mercado interno; até à data, nem sempre tem sido o caso.

3.14.1

Financiamento da I&D: O Comité remete em particular para o seu parecer sobre «O investimento no conhecimento e na inovação (Estratégia de Lisboa)» (INT/325). A UE encontra-se, no seu todo, claramente atrás dos EUA e outros concorrentes maiores. O 7.o Programa-Quadro para a I&D atribui cerca de 4 mil milhões de euros à energia para um período de sete anos (exceptuando a construção do projecto ITER — Reactor Termonuclear Experimental Internacional), enquanto o orçamento federal dos EUA prevê 4,4 mil milhões de dólares para a energia, somente para 2007, montante que será posteriormente aumentado. Além do aumento do financiamento público da I&D, o sector privado deveria ser igualmente incentivado a financiar a I&D na área da energia, reforçando a cooperação entre os Estados-Membros.

3.14.2

Educação e a formação: Além dos esforços visando sistemas de educação e formação de maior qualidade na Europa, a energia precisa de atrair os jovens enquanto escolha de carreira com perspectivas positivas. Dado que as tecnologias mudam cada vez mais rapidamente, a aprendizagem ao longo da vida é essencial.

3.14.3

Sensibilização do público: Mudar o comportamento de todos com vista a uma utilização da energia mais inteligente constitui um grande desafio. As escolas e as campanhas têm um papel a desempenhar. A educação dos «cidadãos do futuro» sobre esta matéria poderia ter início na escola primária, tendo em conta a receptividade das crianças em relação a questões que envolvam o futuro do planeta e a sua vontade de agir. Na esfera profissional e nas empresas, as auditorias energéticas com base, por exemplo, em acordos voluntários, já demonstraram bons resultados.

3.14.4

Mecanismos de preços, tributação: Se bem concebidos, os preços sinais podem apoiar a inovação de forma eficiente orientando as escolhas dos utilizadores. Enquanto instrumento para reduzir a utilização geral de energia o aumento de preços não é muito eficaz — sabe-se que a elasticidade dos preços de energia é geralmente fraca.

3.14.5

Subsídios: Se bem concebidos, poderão orientar escolhas de forma eficiente. Na fase inicial da curva de aprendizagem, são frequentemente necessários subsídios para contrariar riscos que seriam, de outra forma, demasiado altos. Para não provocar distorções na concorrência, os subsídios poderão ser unicamente aplicados no quadro das regras actuais da UE para resolver deficiências do mercado. Os subsídios devem ser limitados no tempo e desaparecer gradualmente. Para impulsionar a eficiência energética, é necessário desenvolver incentivos apropriados que ajudem a cobrir as despesas suplementares iniciais em aparelhos electrodomésticos com menor consumo energético, que têm por norma períodos de retorno curtos.

3.14.6

Objectivos e obrigações definidos politicamente: Estes elementos são indicativos quanto à direcção que se deseja dar ao desenvolvimento. Para a tomada de decisões relativas a investimentos, os instrumentos políticos concretos destinados a alcançar os objectivos são importantes. Ao definirem-se os objectivos deverá ter-se em consideração que, geralmente, certas áreas económicas lucrarão enquanto outras sairão prejudicadas e sobretudo que os objectivos demasiado ambiciosos poderão trazer mais danos do que benefícios. Actualmente parece haver uma tendência para se estabelecerem objectivos gerais que são completados por objectivos específicos no âmbito da mesma finalidade. Exemplo disso são os objectivos de redução das emissões de CO2 que, para serem cumpridos, passarão pelo objectivo de aumentar a utilização de energias renováveis. Esta tendência poderá levar a soluções que não são as óptimas para o cumprimento do objectivo geral. Tanto os objectivos como os instrumentos específicos seleccionados, como os acordos com o sector industrial alemão e finlandês, deverão ser objecto de avaliações de impacto exaustivas.

3.14.7

Comércio de emissões, certificados verdes/brancos: São instrumentos eficientes que, se bem concebidos, podem levar ao estabelecimento de objectivos. É, no entanto, difícil calcular a despesa antecipadamente, sendo que os custos podem variar muitíssimo. Quanto maior for o mercado e o número de intervenientes com direitos ou certificados de comercialização, melhor. Quando aplicado às empresas que competem no mercado global, o sistema terá de ter uma dimensão global, para não distorcer a concorrência.

3.14.8

Regulamentação ou normas vinculativas: Uma regulamentação bem concebida poderá contribuir para a inovação, revelando ser particularmente eficiente para o descarte de tecnologias desactualizadas. Pode também prestar apoio à inovação impondo a eficiência energética em produtos mediante a definição de metas ambiciosas para o aumento dos níveis de eficiência, a serem alcançadas a médio prazo. O risco de prejudicar a inovação está, porém, sempre presente. De qualquer modo, dever-se-á assegurar que a regulamentação não cria obstáculos ao mercado.

3.14.9

Normas voluntárias, acordos voluntários, certificação: São instrumentos políticos favoráveis à inovação. A sua utilização nem sempre resulta no cumprimento dos objectivos gerais ou específicos, mas cria espaço para a inovação sem causar, na prática, efeitos laterais negativos.

3.14.10

Contratos públicos: A contratação poderá desempenhar um papel importante no aumento da inovação aplicada à energia. Dever-se-ão desenvolver e partilhar amplamente métodos visando este fim. Normalmente, os contratos públicos mais compatíveis com o ambiente requerem a utilização da análise do ciclo de vida. Este e outros métodos inovadores exigem, por sua vez, um aprofundamento da educação às autoridades competentes. As normas comunitárias relativas aos contratos públicos, que têm de ser respeitadas, prevêem a ecologização dos contratos públicos, exigindo soluções conformes com o estado da técnica.

3.14.11

Para conseguir a transformação urgente do sector energético que é necessária, precisa de ser acelerado o ritmo de inovação. O Comité insiste em que seja dada especial atenção a

Medidas para estabelecer um preço económico apropriado para as emissões de CO2,

Expandir a I&D pública e privada para apoiar novas formas de energia e a eficiência energética,

Utilizar a regulação (ou outros instrumentos caso sejam mais rentáveis) para impulsionar um progresso mais rápido na melhoria da eficiência energética de produtos de todas os tipos,

Utilizar os concursos públicos muito mais proactivamente para dar um impulso a normas mais severas de eficiência energética, especialmente na construção civil.

Bruxelas, 12 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  COM(2005) 141 final, Orientações integradas para o crescimento e o emprego.

(2)  JO C 318 de 23.12.2006, p. 185.

(3)  JO C 241 de 7.10.2002, p. 13.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/39


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a

«Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à interoperabilidade do sistema ferroviário comunitário» (Versão codificada)

«Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 881/2004 que institui a Agência Ferroviária Europeia»

«Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 2004/49/CE relativa à segurança dos caminhos-de-ferro da Comunidade»

COM(2006) 783 final — 2006/0273 (COD)

COM(2006) 785 final — 2006/0274 (COD)

COM(2006) 784 final — 2006/0272 (COD)

(2007/C 256/08)

Em 16 de Janeiro de 2007, o Conselho decidiu, em conformidade com os artigos 71.o e 156.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre as propostas supramencionadas.

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 19 de Junho de 2007, sendo relator CONFALONIERI.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 137 votos a favor e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

A proposta:

que altera o Regulamento (CE) n.o 881/2004 que institui a Agência Ferroviária Europeia

que altera a Directiva 2004/49/CE relativa à segurança dos caminhos-de-ferro da Comunidade

de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à interoperabilidade do sistema ferroviário comunitário;

são coerentes com a intenção de facilitar o acesso dos operadores ao sistema ferroviário europeu.

As referidas propostas

simplificam os procedimentos de certificação do material circulante no sistema interoperável;

uniformizam grande parte das verificações efectuadas a nível nacional para o material circulante, processos de manutenção, operadores da circulação e da manutenção;

criam um sistema de comparação completo de normas de certificação nacionais, também no que se refere aos elementos não incluídos nas ETI (Especificações técnicas de Interoperabilidade).

1.2

O CESE concorda com o objectivo de simplificar o procedimento de entrada em serviço.

1.3

O CESE é da opinião de que as referidas simplificações aumentarão a utilização do sistema ferroviário europeu, conquistando quotas de procura de outros meios de transporte, contribuindo para melhorar o ambiente e utilizando fontes de energia referidas nos planos energéticos da UE.

1.4

O CESE recomenda que o processo de uma nova aplicação das normas europeias de interoperabilidade e a subdivisão dos controlos de certificação entre organismos nacionais e comunitários não comporte riscos para a segurança.

1.5

Em particular, o CESE recomenda que sejam geridos com atenção os limites de competência entre organismos que o novo sistema introduz.

1.6

O CESE considera que no caso dos vagões e das carruagens colocados em serviço posteriormente ao início da vigência da presente directiva, uma única autorização de entrada em serviço emitida por um Estado-Membro da Comunidade deve poder ser suficiente. O novo regulamento da Agência Europeia permitirá aos operadores ferroviários, aos gestores de infra-estruturas, aos detentores de vagões, mas sobretudo aos organismos de certificação nacional:

tornar a certificação mais rápida;

reduzir o número de certificações, eliminando as repetições nacionais de normas comuns;

operar num quadro normativo unívoco e com a possibilidade de utilizar as indicações técnicas da Agência.

1.7

Toma nota de que com as acções futuras, a Agência se configura como órgão director para a criação do sistema ferroviário europeu (constituído pela rede de AV (alta velocidade), pelos corredores transeuropeus de transporte e, futuramente, pelas restante redes nacionais) através da coordenação e extensão do sistema ERTMS (Sistema de Gestão do Tráfego Ferroviário Europeu), com a publicação do sistema de comparação das normas nacionais, com o apoio técnico aos organismos de certificação nacional.

1.8

O reforço progressivo do papel da Agência Europeia, enquanto organismo de orientação e controlo do processo de interoperabilidade ferroviária e das evoluções tecnológicas, implicará a alteração parcial das funções dos organismos de certificação nacional.

1.9

Insta-se a Comissão a avaliar a oportunidade de um registo europeu dos riscos para a segurança da circulação, comum e partilhado entre Estados-Membros, com vista a criar a base de conhecimento para parâmetros comuns.

1.10

O objectivo é a criação de um mercado europeu de material circulante, de actividades de manutenção dos sistemas e do material circulante, de recursos humanos para a gestão de serviços de transporte.

1.11

Esta será uma oportunidade única para os construtores europeus de material circulante, sobretudo se as escolhas técnicas das ETI salvaguardarem a possibilidade de manter um número adequado de construtores para garantir um mercado europeu competitivo de material circulante (e sua manutenção).

1.12

O CESE recomenda que no caso do material circulante colocado em serviço antes da entrada em vigor da presente directiva e que não dispõe da declaração «CE» de verificação, a aplicação da directiva relativa à segurança ferroviária não seja penalizante do ponto de vista administrativo para os operadores ferroviários.

1.13

O CESE considera que deve ser prevista a existência de organismos de certificação nacional nos países do SEE.

1.14

Prevê-se que na análise das derrogações às ETI, na perspectiva do equilíbrio económico do projecto, seja analisado na especificidade o impacto do co-financiamento comunitário para a viabilidade económica do próprio projecto.

1.15

Não se considera que a análise das derrogações possa ser feita para cada ETI, mas sim para a totalidade do sistema das ETI.

1.1.16

Recomenda-se a aplicação do actual regime linguístico na publicação das ETI pela Agência.

As avaliações e os pareceres da Agência devem ser solicitados para todas as intervenções de construção ou renovação, mesmo se não forem financiadas pela Comunidade Europeia, com vista a orientar as intervenções nacionais e comunitárias na direcção do sistema de segurança europeu.

1.17

A possibilidade de solicitar pareceres à Agência Europeia deve ser alargada a todos os interessados, mesmo se a sua posição for contrária às avaliações dos organismos nacionais de certificação. Em particular, deve garantir-se o acesso às Empresas Ferroviárias Comunitárias e às Organizações de Trabalhadores do sector.

2.   Observações

2.1   Principais elementos e contexto geral da proposta

2.1.1

A criação progressiva de um espaço ferroviário europeu sem fronteiras necessita de uma acção de regulamentação técnica para os aspectos relacionados com a segurança, gestão e procedimentos de acesso ao sistema.

2.1.2

A Directiva 91/440/CEE do Conselho de 29 de Julho de 1991, 95/18/CE do Conselho de 19 de Junho de 1995, 2001/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de Fevereiro de 2001 relativa ao desenvolvimento dos caminhos-de-ferro comunitários, prevêem a abertura progressiva dos direitos de acesso à infra-estrutura comunitária a todas as empresas ferroviárias comunitárias titulares de uma licença emitida por um Estado-Membro, que pretendam prestar serviços de transporte de mercadorias num novo quadro de referência.

2.1.3

Perseguir simultaneamente objectivos de segurança e interoperabilidade requer um trabalho técnico que deve ser colocado sob a direcção de um organismo especializado. Nesse sentido, foi criada um Agência Ferroviária Europeia para a segurança e interoperabilidade.

2.1.4

Os principais objectivos da agência são os seguintes:

promover a criação de um espaço ferroviário europeu, contribuir para a recuperação do sector, reforçar a segurança,

desenvolver indicadores, objectivos e métodos comuns de segurança,

facilitar os procedimentos de atribuição de certificados de segurança às empresas ferroviárias,

garantir a máxima transparência possível e uma difusão eficaz da informação,

dar continuidade às actividades e à evolução no tempo das ETI num quadro técnico permanente,

potenciar a interoperabilidade da rede transeuropeia através da adopção dos novos projectos de investimento apoiados pela Comunidade, respeitando o objectivo da interoperabilidade,

apoiar a criação de um sistema de certificação das oficinas de manutenção,

prestar o apoio técnico necessário para que as competências profissionais necessárias para a condução dos comboios sejam devidamente consideradas a nível europeu,

prestar apoio técnico para a criação de um sistema de registo para o reconhecimento da idoneidade do material circulante em condições especificadas,

garantir a máxima transparência e a paridade de acesso de todas as partes às informações pertinentes,

incentivar a promoção da inovação em matéria de segurança ferroviária e interoperabilidade.

2.1.5

Os procedimentos nacionais de homologação das locomotivas são actualmente considerados uma das principais barreiras à criação de novas empresas de transporte ferroviário de mercadorias e um grande obstáculo à interoperabilidade do sistema ferroviário europeu.

2.1.6

Atendendo a que nenhum Estado-Membro tem competência para decidir por si só que a autorização de colocação em serviço por ele emitida será também válida no território de outros Estados-Membros, é necessária uma iniciativa comunitária para harmonizar e simplificar os procedimentos nacionais e para permitir um recurso mais sistemático ao princípio do reconhecimento mútuo.

2.1.7

Em segundo lugar, no contexto do programa de simplificação da legislação, a Comissão propõe a consolidação e fusão das directivas relativas à interoperabilidade ferroviária, com o objectivo de criar um sistema único de regras para o sistema ferroviário europeu.

2.1.8

As presentes iniciativas permitem aumentar a competitividade do transporte ferroviário, diminuindo os custos da cadeia do sistema ferroviário.

2.2   Agência Ferroviária Europeia

2.2.1

A Agência facilita o procedimento de certificação do material circulante existente, criando um instrumento de referência que permita estabelecer a correspondência entre normas nacionais.

2.2.2

A Agência avalia os pedidos de financiamento comunitário no sector dos projectos de infra-estrutura e material circulante com vista a verificar a sua «interoperabilidade».

2.2.3

A Agência avalia as relações entre os detentores de vagões e as empresas ferroviários (antigo Acordo RIV (Acordo entre as empresas ferroviárias para a troca e utilização de vagões)), nomeadamente no que se refere à manutenção e apresenta recomendações à Comissão sobre a sua regulamentação.

2.2.4

A Agência formulará recomendações para a definição de critérios comuns para a determinação das competências profissionais e a avaliação do pessoal envolvido na gestão e na manutenção.

2.2.5

A Agência assume o papel de Autoridade no âmbito do projecto ERTMS (European Railway Traffic Management System).

2.3   Interoperabilidade

2.3.1

A proposta pretende simplificar e modernizar o quadro normativo na Europa. É neste quadro que propõe novamente a codificação e a fusão das directivas relativas à interoperabilidade ferroviária.

2.3.2

Com base numa experiência de dez anos na aplicação das directivas da interoperabilidade, a Comissão propõe também melhoramentos à parte técnica do quadro regulamentar.

2.4   Segurança dos caminhos-de-ferro

2.4.1

A alteração do artigo 14.o da directiva da segurança ferroviária permite especificar que parte de uma autorização carece de reconhecimento mútuo e que parte permanece estritamente vinculada à compatibilidade do veículo em questão com a infra-estrutura em causa.

2.4.2

Na sequência das alterações ao quadro regulamentar:

cada vez que um veículo é colocado em serviço, deverá ser claramente identificado um «responsável» pela manutenção,

a empresa ferroviária deve fazer prova de que a exploração e manutenção dos vagões que utiliza obedecem às normas em vigor,

as empresas ferroviárias ilustram o sistema e os procedimentos estabelecidos para assegurar que a utilização mista de vagões provenientes de diferentes detentores não prejudica a segurança ferroviária,

a Agência avalia os procedimentos instaurados pelas empresas ferroviárias para gerir as suas relações com os detentores de vagões.

3.   Observações na generalidade

3.1   Agência Ferroviária Europeia

3.1.1

As características do sistema ferroviário contribuem para a segurança do sistema.

3.1.2

Se a Agência vai do sistema interoperável ao da segurança, a sua competência no tempo alargar-se-á a todos os elementos do sistema.

3.1.3

É possível que no final do processo exista apenas um sistema comunitário e uma única Agência ferroviária.

3.1.4

A fase de comparação entre os regulamentos é considerada um dos passos necessários neste sentido.

3.1.5

Há que avaliar o impacto que as escolhas das ETI e os novos procedimentos de certificação terão nos vários Estados-Membros, gestores das infra-estruturas, empresas ferroviárias e detentores de vagões e clientes finais.

3.1.6

A salvaguarda do equilíbrio económico das várias redes nacionais e dos vários operadores no mercado é tida em conta, sobretudo nas fases de harmonização das normas técnicas e dos procedimentos de certificação.

3.1.7

A Agência é incumbida de orientar as escolhas tecnológicas sobre a rede aberta à interoperabilidade, actual e futura, também sem utilizar ajuda financeira.

3.1.8

A competência da Agência será alargada a toda a rede ferroviária comunitária, de acordo com o previsto na proposta de directiva sobre a interoperabilidade.

3.2   Interoperabilidade

3.2.1

A proposta de directiva prevê uma simplificação das ETI referentes ao sistema AV e ao sistema tradicional, quando comparáveis.

3.2.2

A proposta de directiva prevê a extensão da validade das ETI além da rede de AV e dos corredores TEN (Rede Transeuropeia), com vista a abranger todas as redes nacionais, salvo excepções.

3.2.3

Esta extensão assinala uma mudança na política de evolução tecnológica do sistema ferroviário europeu, rumo a uma rede única europeia. O impacto económico e estratégico resultante é superior ao indicado nas premissas da proposta.

3.2.4

As decisões referentes à tipologia das ETI a aplicar nas novas acções e adaptações importantes das infra-estruturas existentes enquadram-se, em grande medida, na responsabilidade comunitária.

3.2.5

As decisões comunitárias sobre a definição das ETI e sobre a sua evolução em relação à situação actual de cada Estado-Membro terão um forte impacto económico na programação dos investimentos tecnológicos e infra-estruturais dos vários Estados-Membros.

3.2.6

É necessária uma avaliação económica do impacto das novas ETI para cada um dos Estados-Membros, que deveria ser a base da avaliação de oportunidades da sua adopção.

3.2.7

Essa avaliação será feita de forma distinta para as ETI com impacto nos investimentos públicos dos Estados-Membros e para as ETI com impacto nos investimentos das empresas ferroviárias e de operadores privados.

3.2.8

A extensão do âmbito de aplicação das ETI a toda a rede ferroviária europeia, salvo excepções, sugere igualmente um novo sistema de relações entre a Agência Ferroviária Europeia e os organismos de certificação de cada Estado-Membro.

3.2.9

No atinente a estes últimos, é previsível que concentrem a sua acção nas actividades operativas de certificação a favor das empresas e dos operadores e não tanto na gestão da evolução das normas tecnológicas.

3.2.10

A alteração da directiva sobre a segurança é uma das alterações técnicas que visam facilitar a circulação do material circulante interoperável.

3.2.11

Simultaneamente introduz-se a nova figura do «detentor» dos vagões.

3.2.12

O processo de certificação do material circulante é organizado de forma a que esses materiais sejam avaliados por organismos diferentes segundo os vários aspectos técnicos.

3.2.13

Os aspectos incluídos nas ETI serão certificados por qualquer um dos organismos de certificação nacional.

3.2.14

Os aspectos nacionais complementares serão controlados pelo organismos de certificação nacional da rede interessada. O organismos de certificação nacional toma nota das certificações «comunitárias», verifica as especificas nacionais e emite o documento de segurança. Este tem o poder de rejeitar o pedido de certificação, pelo que permanece o responsável pela coerência de todos os elementos certificados.

3.2.15

Em relação ao êxito do pedido de certificação, a Agência Ferroviária Europeia trabalha como organismo independente de recurso.

3.2.16

Sem prejuízo das observações no capítulo anterior (Interoperabilidade e Agência), não serão formuladas outras observações.

4.   Observações na especialidade

4.1   Agência Ferroviária Europeia

4.1.1

Art. 8.o-A: Por um lado, a Agência redige e mantém um documento de comparação e equivalência das normas nacionais para cada um dos parâmetros (ponto 2) e, por outro, formulará apenas pareceres técnicos sobre:

a equivalência das normas

Informações complementares exigidas

o motivo de uma recusa de autorização.

A acção da Agência seria mais eficaz se esse parecer fosse vinculativo e pudesse ser solicitado também pelos interessados: gestores da infra-estrutura, empresas ferroviárias, detentores de material circulante.

4.1.2

Art. 15.o : As competências da Agência seriam alargadas a todos os projectos de renovação, de adaptação ou de construção referentes a partes de infra-estrutura sujeitas às actuais e futuras ETI.

4.1.3

Art. 16.o-A: É necessário definir parâmetros de avaliação da Agência para a escolha entre sistema voluntário ou obrigatório de certificação, com base em:

níveis de segurança

relações claras entre empresas

transparência do mercado e regulamentação

Há que sublinhar o tipo de impacto que o sistema de certificação terá nas empresas ferroviárias detentoras de vagões.

4.1.4

Art. 18.o : Sublinha-se que, com os formulários de registro, a Agência pretende limitar ao máximo as especificações não incluídas nas secções comuns.

4.1.5

Art. 21.o-B: O mandato parece completo em relação aos objectivos da Agência. O princípio da subsidiariedade não é salvaguardado.

4.2   Interoperabilidade

4.2.1

Art. 1.o: Onde se prevê o alargamento das ETI ao Espaço Económico Europeu, está contextualmente previsto o reconhecimento dos organismos de certificação nacional.

4.2.2

Art. 6.o: A liberdade deixada à Agência no que respeita ao regime linguístico da publicação dos anexos técnicos das ETI não vai no sentido de um acesso fácil e comum à legislação comunitária sobre interoperabilidade.

4.2.3

Art. 7.o : O conceito de derrogação surge particularmente amplo, sobretudo nas motivações de carácter económico, não prevendo a influência dos financiamentos comunitários na análise de viabilidade económica. Seria melhor aplicar o sistema de derrogações a todo o sistema das ETI referentes ao projecto examinado do que como derrogação a uma única ETI.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/44


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao transporte terrestre de mercadorias perigosas»

COM(2006) 852 final — 2006/0278 (COD)

(2007/C 256/09)

Em 19 de Janeiro de 2007, o Conselho da União Europeia decidiu, nos termos dos artigos 71.o e 251.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação que emitiu parecer em 19 de Junho de 2007, sendo relator Krzysztof OSTROWSKI.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 136 votos a favor e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Posição do CESE

1.1

O Comité acolhe favoravelmente a proposta da Comissão sobre o transporte terrestre de mercadorias perigosas, cujo objectivo estratégico é harmonizar a legislação comunitária naquele domínio, o que permitirá melhorar as condições de segurança do transporte terrestre destas mercadorias.

1.2

A directiva proposta consiste na actualização das quatro directivas em vigor e das quatro decisões da Comissão relativas ao transporte de mercadorias perigosas, fundindo-as num único acto legislativo e aproveitando, neste contexto, para alargar ao transporte fluvial o âmbito das disposições comunitárias aplicáveis ao transporte rodoviário e ferroviário.

1.3

O Comité partilha da opinião da Comissão de que sem legislação comunitária uniforme para todos os tipos de transporte terrestre (rodoviário, ferroviário e fluvial) é difícil falar da criação das melhores condições de segurança possíveis para o transporte de mercadorias perigosas.

1.4

O Comité concorda com a afirmação da Comissão de que a harmonização da legislação em vigor no domínio do transporte rodoviário e ferroviário de mercadorias perigosas, sem introdução de alterações de fundo nas actuais disposições, assim como o alargamento da legislação comunitária ao transporte fluvial constituem uma simplificação significativa da legislação e dos procedimentos administrativos a aplicar pelas autoridades públicas e pelos organismos privados.

1.5

O facto de se englobarem os três modos de transporte terrestre num único acto legislativo e de se haver remissão para os acordos internacionais aplicáveis ao transporte de mercadorias perigosas nos anexos da directiva (que não estavam incluídos na mesma, ao contrário do que sucede agora) reduzirá consideravelmente o acervo comunitário.

1.6

O Comité considera particularmente judicioso ter-se optado pela directiva como instrumento jurídico para apresentar as novas disposições. No entanto, tendo em conta o vasto leque de derrogações e isenções previstas para os Estados-Membros, o Comité apela para que estes cooperem o mais estreitamente possível com a Comissão, de modo a que a harmonização legislativa seja uma realidade.

1.7

O Comité sublinha que só pode focar os aspectos mais gerais da proposta, em virtude da especificidade das disposições referentes às condições técnicas do transporte de mercadorias perigosas e dos próprios tipos de mercadorias.

1.8

Apraz ao Comité saber que, segundo informação da Comissão, as observações dos Estados-Membros e das partes interessadas, isto é, das associações industriais que representam as empresas de transporte de mercadorias perigosas, tiveram um enorme impacto no conteúdo da proposta e que durante todo o processo de consulta procurou-se, na medida do possível, chegar a posições comuns.

1.9

O Comité acolhe favoravelmente que a Comissão continue a ser assistida por um Comité especial de regulamentação para o transporte de mercadorias perigosas, que a assistirá nos procedimentos de comitologia.

1.10

Congratula-se, igualmente, com o facto de as associações industriais terem tido oportunidade de apresentar os seus pontos de vista durante a fase de preparação da proposta, graças às possibilidades de participação nas reuniões do Comité de regulamentação. Apraz-lhe saber que os países EFTA foram igualmente consultados e o Parlamento Europeu continuamente informado.

1.11

O Comité aprecia o facto de a Comissão Central para a Navegação do Reno também ter sido consultada, sobretudo porque o transporte de mercadorias perigosas nesse rio corresponde a cerca de 80 % do total europeu.

1.12

O Comité toma, igualmente, nota da informação dada pela Comissão de que foi realizada uma avaliação do domínio político por consultores externos em 2004-2005: «Avaliação da política da UE no domínio do transporte de mercadorias perigosas desde 1994», a qual confirmou a ideia que presidiu à apresentação da proposta. Regista ainda que, na consulta pública, a grande maioria dos inquiridos era favorável à medida proposta pela Comissão.

1.13

O Comité considera bastante oportuno que a Comissão apoie financeiramente as traduções nacionais, no âmbito da transferência, da Comunidade para os Estados-Membros, da necessária tarefa de tradução e publicação dos anexos técnicos da directiva.

1.14

À luz do exposto, o Comité está convencido de que é oportuno apoiar a proposta apresentada, a qual foi elaborada por peritos de alto nível no domínio do transporte terrestre de mercadorias perigosas oriundos de diferentes Estados-Membros.

1.15

O Comité gostaria, no entanto, de chamar a atenção para alguns aspectos que, na sua opinião, deveriam ainda ser precisados ou clarificados, nomeadamente a ausência de uma definição do que se entende por mercadorias perigosas para efeitos da directiva, o direito concedido aos Estados-Membros de proibir, exclusivamente por razões diferentes da segurança, o transporte de mercadorias perigosas no seu território e a ausência total de informação nos anexos III.2 e III.3.

As observações do Comité sobre estas questões são apresentadas no ponto 3 do parecer «Observações na especialidade».

2.   Principais elementos da proposta da Comissão

2.1

O transporte terrestre de mercadorias perigosas (materiais químicos, materiais de limpeza, gasolina, explosivos, cartuchos para armas de pequeno calibre, aerossóis, matérias radioactivas, pesticidas, etc.) apresenta riscos de acidente consideráveis. Tal aplica-se a todos os modos de transporte, seja por estrada, caminho-de-ferro ou via navegável interior. Não são só as pessoas envolvidas no transporte deste tipo de mercadorias que correm perigo de vida e põem em risco a sua saúde. Muitos habitantes das zonas urbanas e rurais também correm esses riscos.

2.2

Já foram adoptadas medidas para assegurar que os transportes de tais mercadorias sejam realizados nas melhores condições de segurança possíveis. Actualmente, o transporte internacional de mercadorias perigosas é regulado por acordos internacionais baseados nas Recomendações das Nações Unidas (ONU). Para garantir a segurança do transporte de mercadorias perigosas e a livre prestação de serviços multimodais de transporte internacional, esta organização elaborou e actualizou as suas «Recomendações para o transporte de mercadorias perigosas — Regulamento-tipo».

2.3

A regulamentação do transporte de mercadorias perigosas é importante devido à especificidade deste tipo de mercadorias e ainda ao seu volume. Na União Europeia, é transportado um total de 110 000 milhões de toneladas-km de mercadorias perigosas por ano, o que perfaz cerca de 8 % de todos os transportes de mercadorias na UE. Destes, 58 % são efectuados por via rodoviária, 25 % por via férrea e 17 % por via navegável interior. Com excepção do transporte ferroviário, a tendência observada é para o crescimento.

2.4

Na Europa, as disposições dos acordos internacionais são aplicadas aos transportes terrestres através de três instrumentos:

a)

«ADR», o Acordo Europeu relativo ao transporte internacional de mercadorias perigosas por estrada (concluído em Genebra, em 30 de Setembro de 1957, conforme alterado);

b)

«RID», o Regulamento relativo ao transporte internacional ferroviário de mercadorias perigosas (constante do Apêndice C da Convenção relativa aos transportes internacionais ferroviários — COTIF, concluída em Vilnius, em 3 de Junho de 1999, conforme alterado);

c)

«ADN», o Acordo Europeu relativo ao transporte internacional de mercadorias perigosas por via navegável interior (concluído em Genebra, em 26 de Maio de 2000, conforme alterado).

2.5

Contudo, a legislação comunitária no domínio do transporte terrestre de mercadorias abrange apenas os modos rodoviário e ferroviário. A legislação já garante para estes modos um nível elevado de segurança do transporte, a livre prestação de serviços de transportes e a livre circulação de meios de transporte no território da União Europeia. O direito comunitário inclui quatro actos legislativos neste domínio, nomeadamente:

a)

Directiva 94/55/CE do Conselho, de 21 de Novembro de 1994, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes ao transporte rodoviário de mercadorias perigosas;

b)

Directiva 96/49/CE do Conselho, de 23 de Julho de 1996, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes ao transporte ferroviário de mercadorias perigosas;

c)

Directiva 96/35/CE do Conselho, de 3 de Junho de 1996, relativa à designação e à qualificação profissional dos conselheiros de segurança para o transporte de mercadorias perigosas por estrada, por caminho-de-ferro ou por via navegável;

d)

Directiva 2000/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Abril de 2000, relativa às exigências mínimas aplicáveis ao exame de conselheiro de segurança para o transporte de mercadorias perigosas por estrada, caminho-de-ferro ou via navegável.

2.6

Não há, todavia, regras comunitárias para o transporte de mercadorias perigosas por via navegável interior. No sector do transporte fluvial de mercadorias perigosas, coexistem, na verdade, dois sistemas de regras que regulam o transporte nas zonas do Reno e do Danúbio (ADN-R e ADN-D). No entanto, estas regras são regionais. Existem ainda disposições nacionais para o transporte nacional. A ausência de legislação neste domínio decorre da não assinatura do ADN. A proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes ao transporte de mercadorias perigosas por via navegável interior, apresentada pela Comissão em 1997, não foi adoptada, acabando por ser retirada em 2004.

2.7

No entanto, o acordo relativo ao transporte fluvial está actualmente em fase de ratificação, esperando-se que entre em vigor até 2009. Atendendo a este facto, o Comité concorda com a afirmação da Comissão de que é lógico que também o transporte fluvial seja incorporado na legislação comunitária, por uma questão de harmonização. É neste contexto que surge a oportunidade de actualizar e harmonizar a legislação em vigor. Além disso, é conveniente evitar a criação de dois regimes diferentes, um para o transporte internacional e outro para o transporte nacional. Outra razão para a revisão é o facto de a legislação da UE aplicável ao transporte de mercadorias perigosas ser bastante complexa. Ora, a coexistência de actos legislativos específicos de cada modo gera determinadas incoerências. Além disso, algumas disposições são hoje obsoletas ou ficá-lo-ão num futuro próximo. Por exemplo, actualmente há mesmo duas directivas que podem ser consideradas supérfluas, já que as suas disposições foram incorporadas nos Acordos ADR, RID e ADN. Há ainda um problema de ordem técnica relacionado com a estrutura actual das directivas em vigor. Assim, de dois em dois anos, a cada nova revisão dos acordos internacionais é necessário, por força das directivas, traduzir completamente os seus volumosos anexos técnicos, tarefa que é extremamente difícil e onerosa.

2.8

Segundo informação da Comissão, se nada se fizer, estes problemas não vão desaparecer mas podem agravar-se. A complexidade das disposições vigentes aumentará provavelmente com a alteração dos acordos internacionais; as disposições obsoletas manter-se-ão, confundindo os utilizadores, e o risco de incumprimento tenderá a aumentar. As disposições comunitárias poderão mesmo tornar-se mais difíceis de aplicar e não o contrário. Com o uso crescente de conceitos multimodais, o facto de haver disposições diferentes para os vários modos de transporte irá exacerbar os problemas práticos diários encontrados nas operações multimodais, aumentando desnecessariamente os custos. O facto de haver disposições diferentes para as operações nacionais e internacionais impede o desenvolvimento de um modo que, caso contrário, e de acordo com as estatísticas, seria o preferido em muitas situações.

2.9

Por esta razão, propõe-se a adopção da nova directiva que actualiza as quatro directivas em vigor e as quatro decisões da Comissão relativas ao transporte rodoviário e ferroviário de mercadorias perigosas, fundindo-as num único acto legislativo (os três modos terrestres de transporte passarão a ser regulados por um único acto legislativo) e alargando ao transporte fluvial o âmbito das disposições da UE.

2.10

A nova directiva revogará as Directivas 94/55/CE e 96/49/CE, conforme alteradas, relativas ao transporte de mercadorias perigosas, as Directivas 96/35/CE e 2000/18/CE relativas aos conselheiros de segurança para o transporte de mercadorias perigosas e as Decisões 2005/263/CE e 2005/180/CE da Comissão, conforme alteradas, relativas às derrogações nacionais às Directivas 94/55/CE e 96/49/CE. Convém, neste contexto, referir que as disposições das Directivas 96/35/CE e 2000/18/CE estão incluídas nos anexos das Directivas 94/55/CE e 96/49/CE, o que significa que aquelas são supérfluas para os modos rodoviário e ferroviário.

2.11

Para além de incorporar no direito comunitário as regras em vigor aplicáveis ao transporte internacional, a proposta alarga o âmbito de aplicação das regras internacionais ao transporte nacional. No entanto, apesar desta circunstância, a proposta é uma importante simplificação da legislação comunitária no domínio do transporte de mercadorias perigosas.

2.12

É também objectivo da proposta transferir, da Comunidade, ou seja, da Comissão, para os Estados-Membros a necessária tarefa de tradução e publicação dos anexos técnicos da directiva. Uma das razões para tal é o facto de a tradução efectuada na Comunidade nem sempre ser clara e evidente para os Estados-Membros, os quais acabam por efectuar as suas próprias traduções, realizando eventuais correcções. Os anexos são actualizados de dois em dois anos. A Comissão deverá, por conseguinte, apoiar financeiramente a tarefa de tradução a nível nacional. Contudo, a Comissão está convicta de que as economias realizadas pela Comunidade em custos de tradução e de publicação excederão os apoios concedidos aos Estados-Membros.

2.13

A proposta prevê criar um sistema graças ao qual os anexos da directiva apenas farão uma referência aos acordos internacionais aplicáveis ao transporte de mercadorias perigosas, em vez de os incluir na directiva como sucede actualmente. É evidente que esta medida reduzirá o acervo comunitário em cerca de 2 000 páginas.

2.14

A simplificação da legislação comunitária facilitará a sua transposição para o direito nacional. Graças à harmonização das disposições que regulam o transporte de mercadorias perigosas, a tarefa das autoridades a quem compete fazê-las cumprir, incluindo a elaboração de relatórios, passará a ser mais simples e eficaz.

2.15

Os procedimentos administrativos aplicáveis aos intervenientes no transporte de mercadorias perigosas, do expedidor ao destinatário, serão mais simples com regras simplificadas e harmonizadas.

2.16

Os documentos de transporte e dos veículos, a formação das pessoas envolvidas e o trabalho dos conselheiros de segurança para o transporte de mercadorias perigosas serão mais simples com disposições harmonizadas.

2.17

A proposta consta do programa da Comissão de actualização e simplificação do acervo comunitário, assim como do seu programa legislativo e de trabalho.

3.   Observações na especialidade

O Comité gostaria de chamar a atenção para algumas questões que lhe suscitam determinadas reservas:

3.1

Em primeiro lugar, na proposta intitulada «Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao transporte terrestre de mercadorias perigosas» no capítulo consagrado às definições informa-se sobre o que se entende pelos diferentes termos (p. ex. ADR, RID, ADN, veículo, vagão, navio) para efeitos da presente directiva. Não há, no entanto, qualquer informação sobre o que se entende pelo próprio conceito de «mercadoria perigosa». É indubitável que tendo em conta a quantidade de mercadorias existentes e o progresso técnico que faz com que a lista esteja em permanente crescimento, não é simples responder a esta questão. O Comité é, no entanto, de opinião de que deve haver informação sobre o que se entende por «mercadorias perigosas» para efeitos da presente directiva.

3.2

Em segundo lugar, o projecto de directiva confere aos Estados-Membros o direito de regulamentar ou de proibir, exclusivamente por razões diferentes da segurança, o transporte de mercadorias perigosas no seu território. Muito embora compreenda as razões que levam a permitir aos Estados-Membros regulamentar ou proibir o transporte de mercadorias perigosas, o Comité não percebe o que está na base do exercício deste direito «exclusivamente por razões diferentes da segurança». O Comité é de opinião que no caso da presente proposta, cujo objectivo é aumentar a segurança no transporte de mercadorias perigosas, a formulação proposta significa que um Estado-Membro não poderá proibir o transporte de mercadorias perigosas precisamente por razões de segurança do transporte, o que se afigura ilógico. Além disso, não é claro para o Comité de que forma se poderá assegurar a coordenação destas proibições no transporte transfronteiriço quando os Estados-Membros apliquem proibições recíprocas.

3.3

Em terceiro lugar, os pontos III.2 e III.3 do anexo III (Transporte fluvial) não têm qualquer informação sobre a previsão de disposições transitórias adicionais nem sobre disposições nacionais complementares. Neste contexto, o Comité solicita que se clarifique se, na realidade, não estão previstas quaisquer disposições nesta matéria ou se estas estão ainda em fase de elaboração.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/47


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde sobre as aplicações de navegação por satélite»

COM(2006) 769 final

(2007/C 256/10)

Em 8 de Dezembro de 2006, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde sobre as aplicações de navegação por satélite».

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 19 de Junho de 2007, sendo relator Stéphane BUFFETAUT.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 134 votos a favor e 5 abstenções, o presente parecer.

1.   Introdução

1.1

O GALILEO é um projecto emblemático da política espacial europeia. A amplitude do projecto e o seu carácter estratégico levaram a Agência Espacial Europeia (ESA) a trabalhar em concertação com a União Europeia. Desta forma, a cultura intergovernamental e a cultura comunitária deverão contribuir para o sucesso do projecto. No mesmo espírito de cooperação, o projecto deverá ser executado sob a forma de parceria público-privado.

1.2

O primeiro satélite experimental, precursor de futuros satélites da constelação que terá trinta, foi colocado em órbita no final de 2005 e o desenvolvimento do projecto segue, pois, o seu curso, mas não sem dificuldades e atrasos.

1.3

O GALILEO constituirá um sistema mundial de navegação por satélite que oferecerá uma série de serviços de localização, navegação e cronometria.

1.4

O GALILEO, com os seus trinta satélites e estações terrestres, permitirá oferecer informações sobre a sua posição geográfica aos utilizadores de diversos sectores da vida económica, tais como transportes (localização de veículos, navios, aeronaves, sistemas de orientação, busca de itinerários, etc.), justiça, polícia e alfândegas (controlo das fronteiras), obras públicas (topografia, geodesia e sistemas de informação geográfica), lazer (orientação no mar e em montanha), serviços sociais (por exemplo, auxílio às pessoas portadoras de deficiência ou idosas), serviços públicos de segurança e, por último, graças ao serviço de localização de ELT de socorro (transmissor localizador de emergência), salvamento de pessoas em alto mar ou em regiões isoladas do nosso planeta.

1.5

Prevê-se que o mercado de produtos e serviços resultantes das aplicações de navegação por satélite atinja 400 000 milhões de euros em 2025.

1.6

Actualmente, as negociações do contrato de concessão estão paradas, tal o desacordo entre os diversos parceiros sobre o modelo económico do GALILEO e sobre a administração do consórcio industrial. A situação é tal que os atrasos acumulados e a ausência de progressos nas negociações constituem um risco para o próprio projecto.

1.7

Face a estes problemas, o Conselho Transportes de Março solicitou à Comissão Europeia que fizesse um ponto da situação sobre a negociação do contrato de concessão e estudasse eventuais soluções alternativas. Aquela, na sua comunicação «GALILEO numa encruzilhada», e dada esta situação de impasse, insta o Conselho e o Parlamento Europeu a actuar perante o fracasso das negociações em curso do contrato de concessão e a pôr-lhe um ponto final. Todavia, ao mesmo tempo, solicita-lhes que reiterem a sua vontade de levar a cabo e prosseguir o programa GALILEO. Propõe a criação de um cenário alternativo em que as fases de desenvolvimento e implantação serão suportadas pelo poder público, abrangendo o contrato de concessão apenas a exploração. A Agência Espacial Europeia seria a responsável e o poder adjudicador em nome da União Europeia.

2.   Conteúdo do Livro Verde

2.1

O texto da Comissão comporta, por um lado, uma rápida descrição do sistema criado e evolução previsível e, por outro lado, a inovação das diversas aplicações possíveis, recordando que serão propostos cinco tipos de serviços (serviço aberto, serviço comercial, serviço «salva-vidas», serviço de busca e salvamento e serviço público de acesso limitado — PRS). O Livro Verde não aborda as aplicações referentes a este último serviço que depende da utilização que os Estados-Membros lhe dêem. Cada Estado-Membro é, portanto, questionado directamente sobre este tema pela Comissão, que compilará e sintetizará as respostas.

2.2

Os tipos de actividades potencialmente interessadas, enumeradas pela Comissão, são os seguintes:

informação sobre a posição geográfica (para o grande público) e chamadas de emergência;

transporte rodoviário;

transporte ferroviário;

transporte marítimo e fluvial e pescas;

aviação;

protecção civil, gestão de situações de emergência e auxílio humanitário;

seguimento de mercadorias perigosas;

transporte de animais;

agricultura, medição de parcelas, geodesia e levantamentos cadastrais;

energia, petróleo e gás;

serviço de busca e salvamento;

logística;

ambiente;

desporto e turismo;

manutenção da ordem pública.

2.3

A extensão desta lista sublinha com efeito a amplitude e a grande diversidade das aplicações possíveis.

2.4

O Livro Verde termina, como de costume, com uma lista de perguntas às partes interessadas. Não cabe ao CESE responder a essas perguntas com precisão, mas sim sublinhar as que lhe parecem especialmente importantes e referir as que deviam ter sido incluídas e não o foram.

2.5

A Comissão efectua a análise das respostas ao Livro Verde que recebeu das partes interessadas. Estas são muito pouco numerosas e por vezes demasiado gerais para as poder aproveitar. Por isso, a Comissão pretende completar o exercício mediante consultas aprofundadas, tendo em vista a publicação de um plano de acção em Outubro de 2007. Até ao momento, nenhum grande sector económico manifestou verdadeiro interesse em serviços pagos. É bem perceptível a dificuldade de competir com um serviço aberto gratuitamente ao público, mesmo se este não for garantido. Coloca-se, pois, a questão do equilíbrio económico e financeiro do sistema europeu, serviço de natureza civil e que não dispõe do mesmo apoio público (militar) que o GPS americano.

3.   Principais perguntas

3.1

A pergunta 2 (1) sobre a protecção da vida privada reveste especial importância, tendo sido alvo da atenção do CESE, que solicitou a protecção rigorosa do princípio do respeito da vida privada. Coloca-se aqui a questão do equilíbrio entre o direito à protecção da vida privada e as possibilidades oferecidas pela tecnologia. É, porém, de sublinhar que os sistemas de posicionamento e navegação por satélite permitem aos utilizadores determinar a sua posição, mas que essa posição só é conhecida por eles próprios e não está disponível a terceiros, excepto se o utilizador decidir comunicá-la, por exemplo, por um meio de telecomunicação móvel de tipo telemóvel. Dado que estes sistemas funcionam em sentido único, o operador de um sistema de navegação, seja ele GPS, GALILEO ou GLONASS russo, não conhece os utilizadores e não tem forma de saber quem utiliza os sinais de navegação e ainda menos a sua posição geográfica. Assim, a questão da protecção da vida privada deve ser examinada ao nível dos serviços individuais de aplicação a propor aos utilizadores. Na verdade, muitos desses serviços exigem o envio da posição geográfica instantânea do utilizador para um servidor que comunicará, em seguida, a informação solicitada pelo mesmo (por exemplo, uma informação sobre o tráfego rodoviário).

3.2

A pergunta 5 (2) sobre a cooperação internacional levanta algumas dúvidas. Foram assinados acordos de cooperação entre a União Europeia e a China, Israel, Coreia do Sul, Marrocos e Ucrânia, e estão previstos acordos com a Índia, o Brasil, a Argentina e a Austrália. Embora seja claro que esses acordos de cooperação são úteis pois reforçarão a base internacional do GALILEO, nomeadamente no que se refere a questões de normalização, abertura de mercados, certificação e frequências e ainda direitos de propriedade intelectual, há, porém, que manter uma boa vigilância, pois certos parceiros têm por principal motivação adquirir os conhecimentos e as competências europeias, a fim de ganhar tempo no desenvolvimento de uma tecnologia própria que, posteriormente, competirá com a do GALILEO. Hoje em dia, é perfeitamente evidente que era essa a motivação da China quando assinou, em 2003, o seu acordo de cooperação sobre o GALILEO com a União Europeia. Além disso, é surpreendente constatar que nem a Noruega nem a Suíça têm acordos com a União Europeia sobre a sua cooperação no âmbito do GALILEO, quando financiam a fase de desenvolvimento e validação do programa através da sua participação na Agência Espacial Europeia. Assim, o seu acesso eventual ao serviço PRS do GALILEO não está regulamentado.

3.3

De qualquer forma, e em geral, a cooperação aprovada não abrange o serviço público de acesso limitado. Acresce que as negociações em matéria de cooperação internacional perderam velocidade, pois a prioridade principal é a execução efectiva do projecto europeu de navegação por satélite, fenómeno revelador dos problemas que surgiram.

3.4

As perguntas 6 e 7 (3) sobre normas e certificação levantam o problema da certificação dos equipamentos e do próprio sistema e dos terminais de navegação inclusos. Esta questão é especialmente sensível para os transportes aéreo e ferroviário, dois sectores em que os equipamentos de segurança e sinalização são submetidos a um processo rigoroso de certificação reconhecido internacionalmente. A certificação do próprio GALILEO só tem sentido se em relação com um sector de aplicação em particular, por exemplo, a aviação civil, que define as normas e os processos de certificação aplicáveis. A certificação dos terminais e equipamentos inclusos a bordo de engenhos móveis que utilizam os serviços do GALILEO implica muito mais do que um único terminal de posicionamento, designadamente todos os outros equipamentos que exploram as informações de posição e entregam em seguida a informação elaborada ao piloto ou ao comandante de bordo. Os processos de certificação habituais, próprios à aplicação, devem, pois, ser aplicados. Assim, a questão deve ser tratada para cada aplicação particular.

3.5

O outro aspecto da pergunta, o da responsabilidade, é referido apenas em geral, sendo certo que tem grande importância e é de uma complexidade especial. São de incluir as questões da responsabilidade contratual, relativamente simples, e as da responsabilidade extracontratual, muito mais difíceis de tratar. Há que considerar igualmente que o nível de responsabilidade pode variar segundo o quadro de serviço seja aberto, comercial ou de serviço público. A Comissão Europeia propõe um esquema parecido com o da aviação civil, ou seja, a cobertura até um certo montante pelas companhias de seguros e depois pelos poderes públicos. A questão essencial neste caso é a da fixação do limite de activação da cobertura pública do risco. O limite definido actualmente é elevado, por volta de um milhar de milhão de euros.

3.6

Até que ponto o fornecedor de sinal garante o desempenho? A questão tem particular acuidade no transporte aéreo, ferroviário e marítimo.

3.7

Se, por exemplo, uma má qualidade do sinal estiver na origem de uma catástrofe aérea ou de um naufrágio, provocando talvez uma maré negra, quem deverá suportar a responsabilidade e em que proporção? Convém distinguir entre a responsabilidade contratual, por um lado, e a responsabilidade extracontratual, por outro.

3.8

O operador do sistema GALILEO deverá suportar a responsabilidade total ou partilhá-la com os Estados? E com que Estados? O Estado de lançamento, a União Europeia, os Estados participantes do projecto GALILEO? Estas perguntas merecem ser respondidas e tratadas para que as aplicações comerciais do GALILEO se possam desenvolver num quadro jurídico satisfatório e seguro.

3.9

Existem precedentes, como, por exemplo, o ARIANE. O risco de danos causados a terceiros num lançamento é suportado até 100 milhões de euros pelo ARIANESPACE e, para além desse montante, pelo Estado francês. Há uma partilha semelhante dos riscos entre os operadores comerciais e os Estados no domínio da aviação civil, que se poderia aplicar ao GALILEO. Todavia, o ponto delicado continua a ser chegar a acordo sobre a proporção: qual a divisão adequada entre o poder público e o operador, sobretudo quando se trata de um serviço novo?

3.10

Um sistema inspirado neste para o programa GALILEO implica evidentemente definir com clareza qual a autoridade pública que partilharia a responsabilidade com o operador do GALILEO.

3.11

A pergunta 9 (4) sobre a propriedade intelectual é importante. Ainda que a investigação inicial seja financiada por instituições públicas, seria importante que a propriedade intelectual dos desenvolvimentos fosse adquirida às empresas, nomeadamente as PME que as aperfeiçoam e aplicam.

3.12

Seria igualmente útil analisar o aspecto da utilização militar do GALILEO. Ao contrário do GPS, sistema militar aberto à discrição ao público civil, o GALILEO é um sistema civil. Tal como acontece com o sinal civil do GPS, nada impede as forças armadas de qualquer país de utilizar o sistema aberto do GALILEO para fins militares, ao passo que a utilização do serviço público de acesso limitado, cujo acesso está precisamente regulamentado pelos Estados-Membros da União Europeia, apresenta vantagens de maior resistência a interferências e maior independência em relação aos outros serviços prestados pelo GALILEO (as bandas de frequência utilizadas não são as mesmas).

3.13

Sem pretender iniciar um debate sobre os diferentes tipos de utilização militar do sinal PRS do GALILEO, que ultrapassaria amplamente o âmbito do presente parecer e não é referido no Livro Verde, é patente que o equilíbrio económico da exploração do GALILEO depende em parte disso mesmo. Na nova configuração do projecto GALILEO proposta pela Comissão, não restam dúvidas de que este ponto será ainda debatido. Na sua comunicação, a Comissão assinala que, sem pôr em causa o carácter civil do sistema, há que admitir que os utilizadores militares podem gerar receitas substanciais.

4.   Conclusão

4.1

O Livro Verde sobre as aplicações da navegação por satélite passa em revista bastante sectores de actividade efectivamente afectados por elas. Necessita ser completado em domínios muito importantes como a propriedade intelectual em procedimentos susceptíveis de abrir novos campos de aplicação, questões da certificação e regime de responsabilidade.

4.2

A questão da utilização governamental ou mesmo militar do GALILEO pelos Estados-Membros da União Europeia, que é tratada através de um diálogo directo entre a Comissão e os Estados-Membros e entre os próprios Estados-Membros no seio do Conselho para a Segurança («GALILEO security board»), é importante na medida em que tem um impacto significativo no modelo económico do GALILEO. É patente que esta questão deve ser novamente examinada, tanto mais que a contribuição pública deve ser bastante reforçada pelo fracasso da primeira estratégia de parceria público-privado.

4.3

É muito útil e interessante analisar as aplicações da navegação por satélite, sendo ainda necessário assegurar a realização completa da constelação. As novas propostas da Comissão constituem uma última oportunidade para o projecto GALILEO. O CESE está bem consciente dos esforços financeiros exigidos aos Estados-Membros mas, num momento em que a União Europeia se depara com um certo cepticismo da parte das populações europeias, uma forma de «desamor» revelado pelos debates sobre o projecto de Tratado Constitucional, o abandono do programa GALILEO teria consequências desastrosas na Europa e mais além. Um fracasso destes comprovaria ao mundo a incapacidade de a União Europeia se mobilizar em torno de um projecto de grande porte científico, tecnológico e económico. É essencial levar o projecto GALILEO até ao fim e provar, dessa forma, a faculdade de recuperação da União Europeia e a sua capacidade de concretização de grandes projectos de futuro.

4.4

A realidade é que, por estas razões, o projecto GALILEO atravessa um período difícil. O CESE pode apenas afirmar que um fracasso eventual deste projecto essencial para a União Europeia constituiria um elemento grave de perda de confiança dos cidadãos em relação à construção europeia e que se deve fazer tudo para o evitar.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  COM(2006) 769, ponto 4.

(2)  COM(2006) 769, ponto 5.3.

(3)  COM(2006) 769, ponto 5.4.

(4)  COM(2006) 769, ponto 5.6.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/51


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Programa Indicativo Nuclear Apresentado em conformidade com o artigo 40.o do Tratado Euratom para parecer do Comité Económico e Social Europeu»

COM(2006) 844 final

(2007/C 256/11)

Em 10 de Janeiro de 2007, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 40.o do Tratado Euratom, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação que emitiu parecer em 19 de Junho de 2007, sendo relatora Ulla SIRKEINEN.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 12 de Julho de 2007), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 81 votos a favor, 28 votos contra e 15 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Síntese

1.1

No seu parecer de 2004 sobre «Os desafios colocados pela energia nuclear na produção de electricidade», o CESE sugere que «se preveja e se leve a cabo um esforço de informação sobre os verdadeiros desafios que se colocam à indústria nuclear — segurança do aprovisionamento, não emissão de CO2, preços competitivos, segurança e gestão dos combustíveis usados —, de modo a permitir à sociedade civil organizada analisar de forma crítica o conteúdo dos debates que lhe são propostos sobres estas questões.» O novo Programa Indicativo Nuclear (PINC) fornece essa informação. O CESE concorda, de um modo geral, com a análise e a descrição apresentadas na comunicação da Comissão. A grande maioria dos aspectos essenciais relativos à energia nuclear é considerada e, segundo o CESE, descrita de modo apropriado. O Comité refere ainda alguns aspectos da energia nuclear que devem ser tidos em conta.

1.2

A energia nuclear, com a sua quota-parte de 31 % da electricidade e 15 % do consumo total de energia primária da UE em 2004, desempenha um papel crucial no mercado da energia. A vertente nuclear também cumpre plenamente os objectivos da política de energia da UE. Actualmente, o custo da energia nuclear é claramente competitivo. A dependência externa é reduzida e as fontes de combustível são diversificadas e seguras, o que responde às exigências em matéria de segurança do aprovisionamento. Presentemente, a energia nuclear é a maior fonte de energia essencialmente isenta de dióxido de carbono (CO2) na Europa.

1.3

Na sequência da decisão do Conselho Europeu sobre os objectivos em matéria de emissões de gases com efeito de estufa para 2020 e anos subsequentes, é evidente que todas as capacidades adicionais de produção eléctrica com emissões reduzidas de carbono, quer se trate de energias renováveis, de energia nuclear ou de carvão potencialmente limpo, deverão substituir as capacidades de emissão de CO2 e aumentar, deste modo, a electricidade total produzida com emissões reduzidas de carbono. Na prática, se a parte actual da energia nuclear não for mantida pelo menos até que estejam disponíveis novas soluções energéticas completamente limpas, não poderão ser atingidos os objectivos relativos ao clima e às outras vertentes da política energética.

1.4

O CESE sublinha que a UE continua a desempenhar um papel essencial no desenvolvimento do quadro mais avançado para a energia nuclear nos Estados-Membros que optam pela energia nuclear, em conformidade com as normas mais rigorosas em matéria de segurança e de não proliferação, conforme exige o Tratado Euratom.

1.5

A tarefa mais importante é encontrar uma solução para a questão dos resíduos radioactivos, em particular a eliminação definitiva dos combustíveis nucleares usados, para a qual existe a tecnologia, mas faltam as decisões políticas. O CESE concorda igualmente com o ponto de vista da Comissão sobre outras questões que ainda carecem de atenção à escala comunitária: a segurança nuclear e a protecção radiológica, que são excelentes na Europa, bem como as garantias de financiamento a longo prazo para o desmantelamento.

1.6

O CESE chama a atenção para alguns aspectos adicionais da energia nuclear que não foram tidos em conta no projecto de PINC, nomeadamente a ameaça do terrorismo e a questão da suficiente disponibilidade de água para arrefecimento em algumas centrais eléctricas.

1.7

Poderá ser preocupante para os Estados-Membros que queiram continuar a apostar na energia atómica o interesse do sector para os empregadores e a investigação. O CESE concorda com o ponto de vista da Comissão de que os conhecimentos especializados em matéria de protecção radiológica e de tecnologia nuclear são fundamentais para a UE e que, por conseguinte, é oportuno analisar as questões da educação, da formação e da investigação nestes sectores.

1.8

Por fim, o CESE realça o direito que assiste a cada Estado-Membro de escolher o seu próprio cabaz energético, incluindo a utilização da energia nuclear, como referido no PINC.

2.   Introdução

2.1

O artigo 40.o do Tratado Euratom mandata a Comissão para «publicar periodicamente programas de natureza indicativa que incidam nomeadamente sobre objectivos de produção de energia nuclear e sobre os investimentos de qualquer natureza que a sua realização implique. A Comissão deverá obter o parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre estes programas antes da sua publicação.» Desde 1958, foram publicados quatro programas indicativos e uma actualização, datando a última publicação de 1997.

2.2

O presente projecto de programa indicativo nuclear (PINC) foi publicado pela Comissão Europeia no contexto do Pacote sobre a Energia e o Clima — Uma política da Energia para a Europa, em 10 de Janeiro de 2007. A versão final será preparada e publicada logo que a Comissão Europeia receba o parecer do CESE.

2.3

As restantes partes do pacote abrangem, em primeiro lugar, uma proposta que inclui objectivos no âmbito das alterações climáticas de redução de 30 % dos gases com efeito de estufa pelos países desenvolvidos até 2020 com base nos níveis de 1990 ou, em todo o caso, uma redução de 20 % só para a UE. O pacote abrange ainda o mercado interno do gás e da electricidade, as interfaces das redes de electricidade e de gás, propostas para promover a produção de energia sustentável a partir dos combustíveis fósseis, um roteiro para a promoção das energias renováveis, que inclui um objectivo vinculativo de 20 % até 2020 para a quota das energias renováveis no cabaz energético total da UE e a poupança de energia com um objectivo de aumento de 20 % da eficiência energética até 2020, bem como um futuro plano estratégico europeu para as tecnologias da energia. Em 9 de Março de 2007, o Conselho Europeu apoiou os objectivos e os principais conteúdos políticos do pacote.

2.4

O CESE preparou pareceres sobre cada um dos PINC, tal como é exigido no Tratado. O Comité também abordou a questão da energia nuclear em vários outros pareceres, em particular no parecer de iniciativa sobre o papel da energia nuclear, em 2004, tendo afirmado nas conclusões que «o CESE considera que a energia nuclear deve constituir um dos elementos de uma política energética diversificada, equilibrada, económica e sustentável na UE. Tendo em conta as questões que suscita, não deve ser considerada a hipótese de apostar tudo no nuclear; pelo contrário, o Comité entende que um abandono parcial ou total da energia nuclear comprometeria as possibilidades de a UE respeitar os seus compromissos em relação à questão climática».

3.   Documento da Comissão

3.1

O documento da Comissão revê os investimentos realizados durante os dez últimos anos na energia nuclear, descreve as condições económicas da produção de electricidade nuclear, as consequências para o cabaz energético e as condições para a sua aceitação social. O conteúdo é descrito com mais pormenor como segue.

3.2

Cabe a cada Estado-Membro decidir se pretende utilizar ou não a energia nuclear para produzir electricidade. A França e a Finlândia decidiram recentemente continuar a desenvolvê-la. Nos Países Baixos, Polónia, Suécia, República Checa, Lituânia, Estónia, Letónia, Eslováquia, Reino Unido, Bulgária e Roménia foi relançado um debate sobre a política da energia nuclear. Apesar do contínuo debate, a Alemanha, a Espanha e a Bélgica prosseguem as suas políticas de supressão progressiva da energia nuclear. 12 dos 27 Estados-Membros abdicam completamente da utilização do nuclear.

3.3

Com 152 reactores repartidos pela UE dos 27, a energia nuclear representa 30 % da electricidade produzida hoje na Europa. Todavia, a continuar a política de abandono progressivo da energia nuclear adoptada por certos Estados-Membros, esta percentagem será sensivelmente reduzida. Com a finalidade de satisfazer a procura prevista de energia e reduzir a dependência da Europa face às importações, poderão ser adoptadas decisões sobre novos investimentos ou sobre o prolongamento do período de vida de algumas centrais.

3.4

Segundo a Comissão, o reforço da produção de energia nuclear poderá representar uma possibilidade de reduzir as emissões de CO2 e desempenhar um papel decisivo no combate às alterações climáticas ao nível mundial. A energia nuclear praticamente não produz emissões de dióxido de carbono e inscreve-se no cenário de redução do carbono estabelecido pela Comissão, do qual um dos objectivos é a redução das emissões de CO2. Este elemento também poderá ter a sua importância no âmbito dos debates sobre os futuros regimes de comércio de licenças de emissão.

3.5

O principal factor que afecta as perspectivas de crescimento da energia nuclear são as considerações de ordem económica subjacentes, pois uma central nuclear implica um investimento inicial da ordem de 2 a 3,5 mil milhões de euros. Em relação aos combustíveis fósseis, a produção de energia nuclear comporta custos de construção mais elevados, mas os custos de funcionamento são sensivelmente reduzidos depois de efectuado o investimento inicial. Diz a Comissão:

3.5.1

Os riscos económicos de uma central nuclear estão ligados ao grande investimento de capital na fase inicial e exigem um funcionamento praticamente sem falha durante os primeiros 15-20 dos 40-60 anos da sua vida útil para recuperar o investimento inicial. Além disso, o desmantelamento e a gestão dos resíduos significam que devem ser disponibilizados activos financeiros durante um período de 50 a 100 anos após o encerramento do reactor.

3.5.2

Na UE-27 (1), há 152 reactores nucleares em funcionamento em 15 Estados-Membros. A idade média das centrais nucleares aproxima-se dos 25 anos (2). Em França, que possui o maior parque nuclear (59 reactores), fornecendo cerca de 80 % da sua electricidade, e na Lituânia, que tem uma única central nuclear que assegura 70 % da produção de electricidade, a idade média é de cerca de 20 anos. O parque nuclear do Reino Unido tem 23 centrais, cuja idade média se aproxima dos 30 anos, enquanto que na Alemanha a idade média das centrais em funcionamento é de 25 anos.

3.5.3

Tradicionalmente, a energia nuclear tem apresentado custos de construção mais elevados e custos de exploração mais baixos que a produção de energia a partir de combustíveis fósseis, que apresenta custos de capital mais baixos, mas custos de combustível — e portanto de exploração — mais elevados e potencialmente flutuantes.

3.6

A energia nuclear é muito pouco afectada pela variação do preço das matérias-primas na medida em que uma pequena quantidade de urânio, que provém em grande parte de regiões estáveis do mundo, basta para manter um reactor em funcionamento durante décadas. As reservas conhecidas de urânio, razoavelmente seguras e passíveis de exploração a preços competitivos, podem satisfazer as necessidades da indústria nuclear pelo menos nos próximos 85 anos aos níveis de consumo actuais. Por conseguinte, na maioria dos países industrializados a construção de novas centrais nucleares é um meio económico para produzir electricidade de base.

3.7

A indústria nuclear realizou consideráveis investimentos desde 1997. A Comissão reconhece a importância de manter o avanço tecnológico neste domínio e apoia o desenvolvimento futuro do quadro mais avançado para a energia nuclear, incluindo em matéria de não proliferação, de tratamento dos resíduos e de desmantelamento. Desde a adopção do Tratado Euratom, a segurança nuclear e a protecção da população contra as radiações têm sido uma das principais preocupações da Comunidade Europeia. A importância destas questões tem aumentado, aliás, com os sucessivos alargamentos.

3.8

Cabe à UE continuar a desenvolver o quadro mais avançado para a energia nuclear nos Estados-Membros que optam pela energia nuclear, em conformidade com as normas mais rigorosas em matéria de segurança e de não proliferação, conforme exige o Tratado Euratom. Esta incumbência deverá incluir a gestão dos resíduos radioactivos e o desmantelamento.

3.9

A Comissão propõe que o debate sobre as acções futuras se concentre nomeadamente no seguinte:

reconhecer níveis de referência comuns em matéria de segurança nuclear para serem aplicados na UE, com base nos amplos conhecimentos especializados das autoridades nacionais de segurança nuclear dos Estados-Membros;

instituir um Grupo de Alto Nível para a Segurança e as Salvaguardas Nucleares com mandato para desenvolver progressivamente um consenso e, eventualmente, adoptar regras comuns ao nível europeu em matéria de segurança e salvaguardas nucleares;

assegurar que os Estados-Membros instaurem planos nacionais para a gestão dos resíduos radioactivos;

durante a primeira fase do 7.o programa-quadro, estabelecer plataformas tecnológicas para assegurar uma melhor coordenação da investigação no âmbito dos programas nacionais, industriais e comunitários nos domínios da cisão nuclear sustentável e da eliminação geológica;

acompanhar a aplicação da recomendação sobre a harmonização das abordagens nacionais para a gestão dos fundos de desmantelamento, a fim de garantir que sejam disponibilizados recursos adequados;

simplificar e harmonizar os processos de atribuição de licenças, com base numa colaboração mais estreita entre as entidades reguladoras nacionais, a fim de manter as normas de segurança mais elevadas;

assegurar uma maior disponibilidade de empréstimos Euratom, desde que sejam actualizados os valores máximos em função das necessidades do mercado, tal como já foi proposto pela Comissão;

desenvolver um regime harmonizado de responsabilidade e mecanismos para assegurar a disponibilidade de fundos em caso de danos causados por acidente nuclear;

dar um novo impulso à cooperação internacional, nomeadamente através de uma colaboração mais estreita com a AIEA e a AEN, de acordos bilaterais com países não pertencentes à UE e de uma assistência renovada aos países vizinhos.

4.   Observações na generalidade

4.1

O CESE congratula-se com o novo projecto de programa indicativo nuclear da Comissão. O ambiente da energia evoluiu muito nos 10 anos desde a última publicação. Nos últimos anos em particular, as novas evoluções espectaculares atraíram muita atenção para três aspectos da política da energia — a segurança do abastecimento, a competitividade e os preços razoáveis, bem como o ambiente, especialmente as alterações climáticas. A UE reagiu aos problemas e aos desafios evidentes através de propostas relativas a uma política europeia da energia. Neste contexto, é necessário efectuar uma análise e elaborar propostas sobre a energia nuclear. O programa coloca a energia nuclear no contexto energético global e fornece as informações necessárias para o debate e a definição de uma política energética para a Europa.

4.2

No seu parecer de 2004 sobre «Os desafios colocados pela energia nuclear na produção de electricidade», o CESE sugere que «se preveja e se leve a cabo um esforço de informação sobre os verdadeiros desafios que se colocam à indústria nuclear — segurança do aprovisionamento, não emissão de CO2, preços competitivos, segurança e gestão dos combustíveis usados —, de modo a permitir à sociedade civil organizada analisar de forma crítica o conteúdo dos debates que lhe são propostos sobres estas questões.» O novo PINC fornece essa informação e o CESE concorda, de um modo geral, com a análise e a descrição apresentadas na comunicação da Comissão. A grande maioria dos aspectos essenciais relativos à energia nuclear é considerada e, segundo o CESE, descrita de modo apropriado. O Comité refere ainda alguns aspectos da energia nuclear que devem ser tidos em conta.

4.3

A energia nuclear, com a sua quota-parte de 31 % da electricidade e 15 % do consumo total de energia primária da UE em 2004, desempenha um papel crucial no mercado da energia. A vertente nuclear também cumpre plenamente os objectivos da política de energia da UE. Actualmente, o custo da energia nuclear é claramente competitivo, em particular quando é utilizado como carga de base. A dependência externa é reduzida e as fontes de combustível são diversificadas e seguras, o que responde às exigências em matéria de segurança do aprovisionamento. Presentemente, a energia nuclear é a maior fonte de energia essencialmente isenta de dióxido de carbono (CO2) na Europa (ver ponto 4.8 infra).

4.4

O objectivo absolutamente prioritário da política energética é aumentar a eficiência energética, incluindo a produção combinada de calor e electricidade, e reduzir assim a procura. No entanto, são necessários grandes investimentos na produção de energia na UE para substituir as velhas centrais e para eventualmente responder a um aumento da procura, tendo em conta que a evolução do mercado e os progressos tecnológicos poderão provocar um aumento da quota-parte da electricidade na procura total de energia.

4.4.1

A médio e a longo prazo, é possível que as novas tecnologias da energia, nomeadamente a tecnologia do hidrogénio, as bombas de calor, os carros eléctricos, etc., aumentem a procura de electricidade, como parte da procura geral de energia, mais rapidamente do que se prevê nos cenários actuais. Uma evolução deste tipo poderá conferir à energia nuclear um papel muito mais importante do que aquele que desempenha actualmente no cabaz energético da UE.

4.5

O Comité está preocupado com os planos actuais para prolongar a actividade das centrais nucleares que ultrapassaram o seu período de exploração comercial que vai dos 30 aos 40 anos. O problema do envelhecimento das centrais nucleares na Europa não foi aprofundado pela Comissão no seu documento, sendo necessário completar essa informação. Dado que a Comissão afirma que «certos riscos financeiros e ambientais continuam ainda a ser assumidos pelos Governos em alguns Estados-Membros, como a responsabilidade pelas instalações de eliminação e gestão de resíduos a longo prazo», ainda estão por definir no futuro regulamentações neste âmbito.

4.6

Idealmente, estes novos investimentos deverão corresponder aos objectivos de segurança do aprovisionamento, de competitividade e de combate às alterações climáticas. Tendo em conta as características e as potencialidades de outras formas de produção eléctrica, podemos esperar um prolongamento do período de vida das centrais nucleares existentes, bem como novos investimentos. Sobre este ponto, o Comité concorda com a Comissão.

4.7

Segundo a Comissão, os recursos de urânio podem durar 85 anos aos níveis de consumo actuais. Nesta matéria, a informação varia consoante as diferentes fontes, indo dos 85 aos 500 anos. Uma vez que a disponibilidade de combustível é importante para garantir o abastecimento de energia, a Comissão deveria fornecer informação mais pormenorizada sobre a disponibilidade do combustível nuclear.

4.8

Quando se comparam os impactos ambientais de várias fontes de energia, importa avaliar os efeitos gerais sobre o ambiente do processo no seu conjunto, ou seja, entre o aprovisionamento em matérias-primas, a produção, o transporte e o fornecimento de energia e as fases de reciclagem e eliminação. O Conselho Mundial da Energia (CME) publicou um relatório intitulado «Comparação entre os sistemas energéticos com base na avaliação do ciclo de vida» (CME, Julho de 2004), que identifica e passa em revista vários estudos existentes sobre a avaliação do ciclo de vida. Este relatório revela que a taxa de emissões de CO2 por kWh de electricidade produzida a partir do nuclear é reduzida, situando-se num nível comparável ao da energia eólica, da biomassa e da energia hidráulica, ou seja entre 1 e 5 % da taxa de emissões produzidas pelas centrais a carvão.

4.9

Assim, é essencial ter em conta o contributo válido da energia nuclear para o combate aos gases com efeito de estufa. Se tivermos em conta o cabaz energético actual, a utilização de energia nuclear na UE evita actualmente a emissão de cerca de 600 milhões de toneladas de CO2 por ano. À escala planetária, este valor eleva-se a cerca de 2 mil milhões de toneladas de CO2. Tal equivale ao número total actual de emissões de CO2 na França, na Alemanha e no Reino Unido juntos. A manter-se o abandono gradual previsto em certos Estados-Membros, grande parte das actuais centrais nucleares europeias tem de ser substituída por outras fontes de energia não poluentes. Se, além disto, as centrais nucleares existentes não forem substituídas findo o seu ciclo de vida por novas instalações, todas as necessidades de energia nuclear deverão ser substituídas, a médio prazo, por outras energias não poluentes.

4.10

Na sequência da decisão do Conselho Europeu sobre os objectivos em matéria de gases com efeito de estufa para 2020 e anos subsequentes, é evidente que todas as capacidades adicionais de produção eléctrica com emissões reduzidas de carbono, quer se trate de energias renováveis, de energia nuclear ou de carvão potencialmente limpo, deverão substituir as capacidades de geração de energia com emissão de CO2 e aumentar, deste modo, a electricidade total produzida com emissões reduzidas de carbono. Na prática, se a parte actual da energia nuclear não for mantida pelo menos até que estejam disponíveis novas soluções energéticas, não poderão ser atingidos os objectivos relativos ao clima e às outras vertentes da política energética de um modo aceitável do ponto de vista económico. Por outro lado, é evidente que associando-se as energias renováveis a uma percentagem crescente de energia nuclear conseguir-se-ia uma melhor relação custo-eficácia na luta contra as alterações climáticas.

4.11

O CESE apoia o objectivo da internalização dos custos externos nos preços de todas as actividades dos mercados da energia e de outros mercados. Um estudo nesta matéria (ExternE) (3) realizado pela Comissão revela que os custos externos da energia nuclear são aproximadamente 0,4 cents por kWh. Segundo estimativas, os custos externos correspondentes à produção de electricidade por centrais a carvão são mais de dez vezes superiores e os custos da biomassa várias vezes superiores. Por seu lado, estes custos são inferiores para a energia eólica e situam-se num nível idêntico para a produção hidráulica.

4.12

A Comissão observa que uma questão essencial é saber se a energia nuclear exige uma intervenção política. Todas as tecnologias limpas de produção de energia devem ser tratadas da mesma forma. Importa criar mecanismos propícios à investigação orientada para os reactores da próxima geração e para o ciclo de combustíveis nucleares que lhes é inerente. No entanto, poder-se-ia prever um subsídio, mas apenas para desenvolvimentos (projectos-piloto) totalmente novos. A energia nuclear convencional não necessita de qualquer subsídio, pelo que não deve ser subsidiada.

4.13

A Comissão reconhece que a opinião e a percepção pública sobre a energia nuclear são fundamentais para o futuro da política neste domínio. O Comité concorda com este parecer, mas recorda que a sua aceitação varia sensivelmente de um Estado-Membro para outro. O acesso do público à informação e a transparência dos processos de decisão devem ser melhorados, pois alguns estudos realizados mostram que o público europeu não está bem informado sobre as questões nucleares. A Comissão poderia desempenhar um papel útil nesta matéria. Todavia, conforme o CESE reafirmou várias vezes no passado, é também preciso adoptar medidas concretas para responder às preocupações do público.

4.14

O Comité sublinha que a UE continua a desempenhar um papel essencial no desenvolvimento do quadro mais avançado para a energia nuclear nos Estados-Membros que optam pela energia nuclear, em conformidade com as normas mais rigorosas em matéria de segurança e de não proliferação, conforme exige o Tratado Euratom.

4.15

A tarefa mais urgente é encontrar uma solução para a questão dos resíduos radioactivos, em particular a eliminação definitiva dos combustíveis nucleares usados, para a qual existe a tecnologia, mas faltam as decisões políticas. Trata-se de uma questão prioritária em termos de impacto sobre o ambiente e a saúde, bem como de aceitação da energia nuclear pelo público. O PINC sublinha que ainda nenhum país procedeu à aplicação da solução final proposta. Todavia, são visíveis progressos na Finlândia, país em que foi escolhido um sítio para a eliminação dos resíduos, assim como na Suécia e na França, onde foram dados grandes passos para a escolha de um sítio.

4.16

O Comité concorda igualmente com o ponto de vista da Comissão sobre outras questões que ainda carecem de atenção à escala comunitária: a segurança nuclear e de radiação, que é excelente na Europa, sendo necessário assegurar o financiamento do desmantelamento.

4.17

A nova ameaça do terrorismo não é mencionada no PINC. Trata-se de uma grave ameaça para as centrais nucleares, bem como para muitas instalações industriais e edifícios públicos em todo o mundo. Todas as centrais nucleares devem ser concebidas para resistir ao choque de um grande avião de passageiros sem produzir emissões radioactivas fora das instalações. Os sistemas técnicos e humanos de segurança também devem ser concebidos e aplicados, por forma a evitar qualquer espécie de ofensivas terroristas dentro de uma central nuclear. A Comissão devia, em colaboração com as autoridades e os operadores competentes, promover medidas para que, em cada instalação nuclear, haja as adequadas disposições de prevenção do terrorismo.

4.18

Durante os verões quentes e secos mais recentes, colocou-se a questão da suficiente disponibilidade de água para arrefecimento, captada dos rios para as centrais eléctricas de condensação. Até à data, o problema tem sido muito localizado e não tem sido frequente nem de longa duração, mas pode, em certos casos, agravar-se com o decorrer do tempo. Ao conceberem-se novas unidades de centrais eléctricas e ao optar-se pela sua localização, há que ter este aspecto em consideração.

4.19

Outra preocupação é o interesse do sector da energia nuclear para os empregadores e a investigação depois de cerca de 20 anos de quase moratória na Europa. A resultante falta de interesse dos estudantes e dos peritos profissionais constitui um ponto de estrangulamento no desenvolvimento geral da energia nuclear e também pode representar um risco em matéria de segurança. O CESE concorda com o ponto de vista da Comissão de que os conhecimentos especializados em matéria de protecção radiológica e de tecnologia nuclear são fundamentais para a UE e que, por conseguinte, é oportuno analisar as questões da educação, da formação e da investigação nestes sectores. O mesmo se poderá dizer da preservação e da transmissão dos conhecimentos da geração dos cientistas e dos engenheiros que construíram o actual parque de centrais na Europa, enquanto que em muitos países há vários anos que nenhum jovem perito integra este sector.

4.20

A Comissão chama a nossa atenção para o facto de que cada Estado-Membro é soberano para decidir se pretende ou não utilizar a energia nuclear. O CESE aprova o direito que assiste a cada Estado-Membro de escolher o seu próprio cabaz energético, incluindo a utilização da energia nuclear. Este direito deve ser respeitado não só pela UE, mas também pelos outros Estados-Membros. Todavia, as decisões adoptadas por um Estado-Membro influenciam a situação dos outros sob vários aspectos, e esta interdependência vai aumentar com uma maior abertura dos mercados internos.

5.   Observações na especialidade

5.1

No ponto 6.5 do PINC intitulado «A via a seguir», a Comissão apresenta propostas de medidas, principalmente ao nível da UE, para debate (ver ponto 2.8). Os pontos de vista do CESE sobre as propostas apresentadas são os seguintes:

5.1.1

O CESE concorda com a posição actual da Comissão, segundo a qual os níveis de referência comuns para a segurança nuclear e a sua adequada aplicação devem basear-se nos amplos conhecimentos especializados das autoridades nacionais de segurança nuclear dos Estados-Membros, em colaboração com a WENRA (4). Qualquer outra abordagem poderá colocar em risco o actual bom desempenho em matéria de segurança em alguns Estados-Membros.

5.1.2

A instituição de um Grupo de Alto Nível para a Segurança e as Salvaguardas Nucleares, composto de representantes das autoridades nacionais competentes, poderá contribuir para o processo de harmonização e ajudar a melhorar os elos com as convenções internacionais sobre segurança nuclear.

5.1.3

O CESE considera urgentemente necessário que os Estados-Membros que utilizam energia nuclear instaurem planos nacionais para a gestão dos combustíveis nucleares e dos resíduos radioactivos. Os planos nacionais poderiam prever uma abordagem puramente nacional, uma abordagem multinacional ou uma combinação das duas. Qualquer outra possibilidade deve ser considerada como uma transmissão irresponsável das obrigações das gerações actuais para as gerações futuras.

5.1.4

As plataformas tecnológicas demonstraram ser instrumentos muito úteis para criar parcerias entre o sector público e o privado com vista a desenvolver agendas europeias de investigação estratégica. O CESE apoia a ideia da Comissão de utilizar este instrumento nos domínios da cisão nuclear sustentável e da eliminação geológica. Este poderá ser um instrumento indispensável para atrair jovens cientistas para esta indústria.

5.1.5

Por forma a garantir uma cobertura total dos custos operacionais ao longo de todo o ciclo de vida, bem como condições de igualdade, é essencial que os operadores disponibilizem recursos apropriados por intermédio de fundos de desmantelamento não só na UE, como também a nível mundial. Todavia, o Comité considera que não é necessária uma harmonização total da gestão destes fundos, desde que sejam respeitados os princípios de cobertura completa e segura, bem como de transparência.

5.1.6

A observância das normas de segurança mais elevadas, associada à simplificação dos procedimentos de autorização, bem como a respectiva harmonização progressiva graças à cooperação entre as entidades reguladoras nacionais são necessárias para tornar os prazos de entrega para os projectos de construção mais previsíveis, permitindo deste modo um planeamento e um cálculo dos custos mais rigorosos. A segurança nunca deve ser comprometida.

5.1.7

O CESE aprova as propostas da Comissão de actualizar os limiares dos empréstimos EURATOM e garantir uma melhoria da sua disponibilidade. Em princípio, os investimentos em todas as formas de energia deveriam beneficiar de um acesso geral em condições de igualdade aos instrumentos financeiros, que de resto são fornecidos pelo BEI.

5.1.8

Na opinião do CESE, para uma maior aceitabilidade da energia nuclear é também essencial elaborar um regime harmonizado de responsabilidade que inclua um mecanismo para assegurar a disponibilidade de fundos em caso de danos causados por acidente nuclear sem envolver o financiamento público. O sistema actual (seguro de responsabilidade no valor de 700 milhões de dólares) não cumprirá este objectivo. O problema dos seguros colocado pelas probabilidades extremamente reduzidas de um acidente associadas aos danos potencialmente muito graves e onerosos deve ser abordado de maneira aberta, construtiva e prática. Um sistema de fundos de seguros poderia ser um modelo a seguir.

5.1.9

O CESE congratula-se com a proposta de dar um novo impulso à cooperação internacional com a AIEA e a AEN, bem como no quadro de acordos bilaterais. Deve ser dado um destaque particular à assistência aos países limítrofes.

5.2

Além das propostas da Comissão, o CESE entende que as questões seguintes devem ser analisadas quando a Comissão preparar as próximas iniciativas:

5.2.1

Chamar a atenção dos Estados-Membros para a probabilidade de um ulterior aumento das necessidades em matéria de educação e de formação no vasto sector da energia e da tecnologia nucleares, incluindo em particular a educação e a formação no domínio da segurança nuclear. A educação não é apenas uma via para fornecer novos especialistas em energia nuclear, mas também para sensibilizar os cidadãos em geral para esta questão, o que é fundamental no processo de formação da opinião pública.

5.2.2

Explorar outros problemas eventuais associados aos investimentos na energia nuclear num mercado de energia aberto, dada a dimensão e os longos prazos de entrega, e apresentar propostas de resolução fundadas no mercado.

5.2.3

A indústria europeia da tecnologia nuclear adquiriu uma posição de vanguarda no plano mundial, o que fornece empregos de alto nível ao mesmo tempo que é benéfica para as salvaguardas nucleares no mundo inteiro, tendo em conta os excelentes níveis de segurança na Europa. Para manter esta posição de liderança, na medida em que se espera uma verdadeira explosão mundial de investimentos na energia nuclear, esta indústria e a indústria que produz as suas componentes a montante devem ser consideradas como objectivos para a nova abordagem sectorial da Comissão em matéria de política industrial.

5.3

Por último, o CESE felicita-se igualmente da intenção da Comissão de aumentar a frequência de publicação dos programas indicativos nucleares, o que fornecerá assim uma imagem mais actualizada da situação na UE.

Bruxelas, 12 de Julho de 2007.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Anexo 2: Informação por país sobre as actuais actividades do ciclo do combustível nuclear.

(2)  Anexo 1: Ver Figuras 6 e 7: Centrais nucleares por idades e distribuição das idades por países.

(3)  External CostsResearch results on socio-environmental damages due to electricity and transport (Custos Externos — Resultados da investigação sobre os danos socioambientais derivados da electricidade e do transporte, em inglês: http://ec.europa.eu/research/energy/pdf/externe_en.pdf), Comissão Europeia 2003.

(4)  WENRA — Western European Nuclear Regulatory Authorities (Associação das Autoridades de Regulamentação Nuclear da Europa Ocidental).


ANEXO

ao parecer do Comité Económico e Social Europeu

As alterações seguintes, que recolheram pelo menos um quarto dos votos, foram rejeitadas:

Ponto 1.1

Alterar como segue:

«No seu parecer de 2004 sobre “Os desafios colocados pela energia nuclear na produção de electricidade”, o CESE sugere que “se preveja e se leve a cabo um esforço de informação sobre os verdadeiros desafios que se colocam à indústria nuclear — segurança do aprovisionamento, não emissão de CO2, preços competitivos, segurança e gestão dos combustíveis usados —, de modo a permitir à sociedade civil organizada analisar de forma crítica o conteúdo dos debates que lhe são propostos sobres estas questões.” O novo Programa Indicativo Nuclear (PINC) fornece essa parte dessa informação. O CESE concorda, de um modo geral em parte, com a análise e a descrição apresentadas na comunicação da Comissão, afirmando, porém, que esta não examinou temas importantes (ver, nomeadamente, o ponto 1.6). A grande maioria dos aspectos essenciais relativos à energia nuclear é considerada e, segundo o CESE, descrita de modo apropriado O CESE assinala que deviam ainda ser considerados alguns aspectos da energia nuclear.».

Justificação

Decorre das outras alterações, bem como do ponto 1.6 do projecto de parecer, no qual o CESE sublinha que não foram considerados alguns aspectos importantes, como o terrorismo e a água para arrefecimento.

Resultado da votação:

Votos a favor: 49

Votos contra: 52

Abstenções: 11

Ponto 1.2

Alterar como segue:

«A energia nuclear, com a sua quota-parte de 31 % da electricidade e 15 % do consumo total de energia primária da UE em 2004, desempenha um papel crucial no mercado da energia. A vertente nuclear também cumpre plenamente os objectivos da política de energia da UE. Actualmente, o custo da energia nuclear é claramente competitivo. A dependência externa é reduzida e as fontes de combustível são diversificadas e seguras, o que responde às exigências em matéria de segurança do aprovisionamento. Presentemente, a energia nuclear é a maior uma das maiores fontes de energia essencialmente isenta de dióxido de carbono (CO2) na Europa. As outras implicações ambientais deste tipo de energia são limitadas e controladas.».

Justificação

No documento da Comissão não se fala da «maior» fonte de energia isenta de CO2, mas antes de «uma das maiores». Devemos citar de forma correcta.

Sobre as outras implicações ambientais: ver as outras alterações.

Resultado da votação (N.B.: a última parte da alteração — a supressão da última frase — foi aceite em Plenária):

Votos a favor: 57

Votos contra: 60

Abstenções: 3

Ponto 1.3

Alterar como segue:

«Na sequência da decisão do Conselho Europeu sobre os objectivos em matéria de emissões de gases com efeito de estufa para 2020 e anos subsequentes, é evidente que todas as capacidades adicionais de produção eléctrica com emissões reduzidas de carbono, quer se trate de energias renováveis, de energia nuclear ou de carvão potencialmente limpo, deverão substituir as capacidades de emissão de CO2 e aumentar, deste modo, a electricidade total produzida com emissões reduzidas de carbono. O Comité regista a afirmação do documento da Comissão, segundo a qual “actualmente, mais de 110 instalações nucleares na União [se] encontram (…) em várias fases de desmantelamento. Prevê-se que, pelo menos, um terço das 152 centrais nucleares que hoje funcionam na União Europeia alargada deverá ser desmantelado até 2025 (sem ter em conta um possível prolongamento da sua vida útil)”. Dado que, por outro lado, a Comissão prevê apenas a construção de um novo reactor, a percentagem de energia nuclear destinada à produção de electricidade assistirá, muito provavelmente, a uma quebra. Contudo, de acordo com um estudo realizado pela Chancelaria Federal alemã, os objectivos climáticos serão cumpridos, o que prevê esforços adicionais em matéria de poupança de electricidade, eficiência e consumo de energias regeneradoras. Na prática, se a parte actual da energia nuclear não for mantida pelo menos até que estejam disponíveis novas soluções energéticas completamente limpas, não poderão ser atingidos os objectivos relativos ao clima e às outras vertentes da política energética.».

Justificação

Decorre do texto da Comissão, assim como do estudo referido.

Resultado da votação:

Votos a favor: 49

Votos contra: 65

Abstenções: 6

Ponto 1.7

«Outra preocupação é Poderá ser preocupante para os Estados-Membros que queiram continuar a apostar na energia atómica o interesse do sector para os empregadores e a investigação depois de cerca de 20 anos de quase moratória na Europa. O CESE concorda com o ponto de vista da Comissão de que os conhecimentos especializados em matéria de protecção radiológica e de tecnologia nuclear são fundamentais para a UE e que, por conseguinte, é oportuno analisar as questões da educação, da formação e da investigação nestes sectores, cuja responsabilidade cabe, em primeiro lugar, às entidades exploradoras das instalações. ».

Justificação

Não se pode falar de «moratória». A responsabilidade pela educação etc. compete em primeiro lugar às empresas, não ao Estado/Comunidade.

Resultado da votação (apenas a segunda parte foi posta a votação; a primeira foi aceite):

Votos a favor: 45

Votos contra: 71

Abstenções: 2

Ponto 3.6.1

Aditar o novo ponto 3.6.1:

«No que diz respeito à disponibilidade dos recursos de urânio, o Comité chama a atenção para o facto de existirem diferenças entre a Comunicação da Comissão e o resumo do último livro vermelho da AIEA (Agência Internacional da Energia Atómica). Neste documento, refere-se que: “Segundo as previsões, a capacidade de produção primária de urânio, que inclui os centros de produção existentes, comprometidos, planeados e potenciais com base em recursos identificados (…) poderia satisfazer as necessidades mundiais de urânio previstas para 2010 se se realizarem todas as expansões e aberturas de minas, tal como estão planeadas e se a produção mantiver a capacidade completa em todas as operações. (…) Contudo, espera-se que a importância das fontes secundárias se reduza, em particular depois de 2015, de maneira que se responderá cada vez mais à necessidade de reactores através da expansão da capacidade de produção actual bem como do desenvolvimento de centros de produção adicionais ou da introdução de ciclos de combustível alternativo. Ambos os casos correspondem a esforços dispendiosos, tanto em termos económicos como a nível de tempo. No futuro próximo, necessitar-se-á de uma forte procura de urânio para estimular o devido desenvolvimento dos recursos identificados necessários. Tendo em conta os longos prazos para a identificação e exploração de novos recursos (em geral, 10 anos ou mais), poder-se-á assistir a uma escassez no aprovisionamento de urânio e, dando-se o esgotamento das fontes secundárias, a uma pressão contínua sobre os preços do urânio.” O Comité espera que a Comissão esclareça esta situação.».

Justificação

Devemos apontar as diferenças evidentes e não ignorá-las.

Resultado da votação:

Votos a favor: 49

Votos contra: 65

Abstenções: 5

Ponto 4.1

Alterar como segue:

«O CESE congratula-se com toma conhecimento do novo projecto de programa indicativo nuclear da Comissão. O ambiente da energia evoluiu muito nos 10 anos desde a última publicação. Nos últimos anos em particular, as novas evoluções espectaculares atraíram muita atenção para três aspectos da política da energia — a segurança do abastecimento, a competitividade e os preços razoáveis, bem como o ambiente, especialmente as alterações climáticas. A UE reagiu aos problemas e aos desafios evidentes através de propostas relativas a uma política europeia da energia. Neste contexto, é necessário efectuar uma análise e elaborar propostas sobre a energia nuclear. O programa coloca a energia nuclear no contexto energético global e fornece parte das informações necessárias para o debate e a definição de uma política energética para a Europa.».

Justificação

A própria relatora indica que nem todos os aspectos foram discutidos (entre outros, o terrorismo).

Resultado da votação:

Votos a favor: 50

Votos contra: 69

Abstenções: 2

Ponto 4.5

Alterar como segue:

«Idealmente, estes novos investimentos deverão corresponder aos objectivos de segurança do aprovisionamento, de competitividade e de combate às alterações climáticas. Tendo em conta as características e as potencialidades de outras formas de produção eléctrica, o CESE chama a atenção para as discussões que decorrem em alguns Estados-Membros com vista ao podemos esperar um prolongamento do período de vida das centrais nucleares existentes, bem como à realização de novos investimentos. Sobre este ponto, o Comité concorda com a Comissão.».

Justificação

O proponente desconhece a passagem em que a Comissão afirma podermos «esperar» um prolongamento. Trata-se aqui de uma pura especulação.

Veja-se igualmente o ponto 1.5, alterado na reunião da secção, onde se manifestou preocupação face a um possível prolongamento do período de vida das centrais nucleares.

Resultado da votação:

Votos a favor: 50

Votos contra: 67

Abstenções: 6

Ponto 4.6

Inserir no final:

«Segundo a Comissão, os recursos de urânio podem durar 85 anos aos níveis de consumo actuais. Nesta matéria, a informação varia consoante as diferentes fontes, indo dos 85 aos 500 anos. Uma vez que a disponibilidade de combustível é importante para garantir o abastecimento de energia, a Comissão deveria fornecer informação mais pormenorizada sobre a disponibilidade do combustível para a energia nuclear. Por outro lado, o Comité sublinha ainda que existem notáveis diferenças no que toca a questão da disponibilidade dos recursos de urânio.».

Justificação

Explica-se por si só.

Resultado da votação:

Votos a favor: 55

Votos contra: 68

Abstenções: 0

Ponto 4.8

Alterar como segue:

«Assim, é essencial ter em conta o contributo válido da energia nuclear para o combate aos gases com efeito de estufa. Se tivermos em conta o cabaz energético actual, a utilização de energia nuclear na UE evita actualmente a emissão de cerca de 600 milhões de toneladas de CO2 por ano. À escala planetária, este valor eleva-se a cerca de 2 mil milhões de toneladas de CO2. Tal equivale ao número total actual de emissões de CO2 na França, na Alemanha e no Reino Unido juntos. A manter-se o abandono gradual previsto em certos Estados-Membros, grande parte das actuais centrais nucleares europeias tem de ser substituída por outras fontes de energia não poluentes, através de medidas de eficiência energética, nomeadamente de medidas de poupança. Se, além disto, as centrais nucleares existentes não forem substituídas findo o seu ciclo de vida por novas instalações, todas as necessidades de energia nuclear deverão ser substituídas, a médio prazo, por outras energias não poluentes, através de medidas de eficiência e poupança.».

Justificação

A nossa reflexão não se pode limitar à substituição de formas de produção de electricidade por outras. O CESE referiu-se várias vezes a este facto.

Observações adicionais do proponente: pedi à relatora que confirmasse os valores relativos à poupança de CO2, após a citação do número 300 milhões de toneladas no documento de trabalho, com base numa fonte. Infelizmente, tal não se verificou.

Resultado da votação:

Votos a favor: 61

Votos contra: 61

Abstenções: 2

Ponto 4.9

Inserir no final:

«Na sequência da decisão do Conselho Europeu sobre os objectivos em matéria de emissões de gases com efeito de estufa para 2020 e anos subsequentes, é evidente que todas as capacidades adicionais de produção eléctrica com emissões reduzidas de carbono, quer se trate de energias renováveis, de energia nuclear ou de carvão potencialmente limpo, deverão substituir as capacidades de emissão de CO2 e aumentar, deste modo, a electricidade total produzida com emissões reduzidas de carbono. Na prática, se a parte actual da energia nuclear não for mantida pelo menos até que estejam disponíveis novas soluções energéticas completamente limpas, não poderão ser atingidos os objectivos relativos ao clima e às outras vertentes da política energética. Por outro lado, é evidente que associando-se as energias renováveis a uma percentagem crescente de energia nuclear conseguir-se-ia uma melhor relação custo-eficácia na luta contra as alterações climáticas. Além disso, estudos demonstram — como o realizado pela Chancelaria Federal alemã — que os objectivos climáticos serão cumpridos, o que pressupõe esforços adicionais em matéria de poupança de electricidade, eficiência e consumo de energias regeneradoras.».

Justificação

Evidente.

Resultado da votação:

Votos a favor: 58

Votos contra: 65

Abstenções: 1

Ponto 4.11.1

Aditar o novo ponto 4.11.1:

«A Comissão descreve que “a responsabilidade pelos acidentes nucleares nos Estados-Membros da UE-15 rege-se pela Convenção de Paris de 1960, que criou um sistema harmonizado internacional de responsabilidade pelos acidentes nucleares, limitando actualmente a responsabilidade dos operadores no caso de acidentes nucleares a cerca de 700 milhões de euros”. O CESE reconhece aqui uma subvenção indirecta da energia atómica e apela para que as empresas sejam obrigadas a responsabilizar-se por todos os potenciais danos através de um seguro adequado.».

Justificação

Nas reuniões do grupo de estudo, a relatora referiu que teria e poderia ser encontrada uma solução. Este aspecto não foi referido no texto de forma clara. A proposta de alteração vai exactamente nesse sentido.

Informação: na Alemanha, os automóveis têm obrigatoriamente um seguro de responsabilidade no valor de 100 milhões de euros. As centrais nucleares têm um seguro de apenas 700 milhões de dólares — uma quantia ridícula, tendo em conta os potenciais danos que podem causar.

Resultado da votação:

Votos a favor: 41

Votos contra: 44

Abstenções: 3

Ponto 4.14

Alterar como segue:

«A tarefa mais urgente é encontrar uma solução para a questão dos resíduos radioactivos, em particular a eliminação definitiva dos combustíveis nucleares usados, para a qual existe a tecnologia, mas faltam as decisões políticas. Trata-se de uma questão prioritária em termos de impacto sobre o ambiente e a saúde, bem como de aceitação da energia nuclear pelo público. O PINC sublinha que ainda nenhum país procedeu à aplicação da solução final proposta. Todavia, são visíveis progressos na Finlândia, país em que foi escolhido um sítio para a eliminação dos resíduos, assim como na Suécia e na França, onde foram dados grandes passos para a escolha de um sítio.».

Justificação

O problema não está, de modo algum, resolvido tecnicamente.

Resultado da votação:

Votos a favor: 55

Votos contra: 69

Abstenções: 4


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/62


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Conferências Marítimas — Convenção das Nações Unidas»

COM(2006) 869 final — 2006/0308 (COD)

(2007/C 256/12)

Em 20 de Março de 2007, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 80.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Em 14 de Fevereiro de 2007, a Mesa do Comité incumbiu a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), designou relatora-geral A. BREDIMA-SAVOPOULOU e adoptou, por 86 votos a favor e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões

1.1

O CESE concorda com a proposta de revogação do Regulamento (CEE) n.o 954/79, uma vez que é a inevitável consequência da revogação do Regulamento (CEE) n.o 4056/86 que previa a isenção por categoria para as conferências marítimas. O CESE faz notar que os dois regulamentos constituem um pacote jurídico.

1.2

O Regulamento (CEE) n.o 954/79 refere-se à ratificação pelos Estados-Membros da Convenção das Nações Unidas relativa a um Código de Conduta das Conferências Marítimas (a partir daqui chamado Código das Conferências Marítimas da CNUCED ou Código) ou à adesão destes Estados à Convenção. Neste contexto, é de notar que o Código das Conferências Marítimas da CNUCED foi ratificado por 81 países, incluindo os novos países na linha da frente do comércio mundial (China, Índia, Rússia e Brasil), assim como a Austrália, o Canadá, o Japão, a Nigéria, o México, a Indonésia, a Arábia Saudita e Singapura. O Código foi também ratificado por dezasseis Estados-Membros da UE. Além disso, as companhias marítimas regulares transportam 60 % do total do comércio internacional, especialmente através de contentores. Assim sendo, a revogação do Regulamento (CEE) n.o 954/79 (e do Regulamento n.o 4056/86) terá sem dúvida implicações que não devem ser subestimadas.

1.3

O CESE convida em particular a Comissão a clarificar a situação jurídica internacional das companhias de transportes marítimos regulares da UE, na sequência da revogação do Regulamento (CEE) n.o 954/79. De facto, tendo em conta a importância de uma política marítima integrada para o papel da UE na economia mundial, bem como a importância do transporte marítimo, incluindo o da UE, no comércio da UE e no comércio mundial, o CESE julga que deve haver uma vigilância particular no que concerne a esta revogação e que as suas repercussões, tanto a nível europeu como internacional, devem ser examinadas cuidadosamente. Quanto à proposta de base da Comissão para revogar o Regulamento (CEE) n.o 954/79, o CESE considera que não tem em conta dois parâmetros: a) a discriminação entre transportadores marítimos da UE que pode resultar dessa revogação e que deve ser evitada; b) a competitividade dos transportadores marítimos da UE (incluindo operadores de pequena distância) que deve ser salvaguardada (em conformidade com a Estratégia de Lisboa revista).

1.4

Em sintonia com anteriores pareceres do CESE e do Parlamento Europeu, o Comité insta a Comissão a sopesar as consequências (políticas, jurídicas e práticas) que adviriam da revogação dos Regulamentos (CEE) n.o 4056/86 e 954/79, de forma a evitar quaisquer implicações negativas para os interesses das companhias de navegação europeias ao nível internacional.

1.5

Depreende-se que as Orientações, que explicam a aplicação das regras de concorrência marítima da CE para os transportes marítimos, que por sua vez serão aplicáveis aos serviços das companhias marítimas após a proibição de conferências marítimas de e para a UE a partir de 18.10.2008, permitiriam essencialmente aos operadores marítimos uma autoavaliação dos seus acordos ao abrigo da legislação de concorrência da CE. Consequentemente, o CESE julga ser pouco provável que essas Orientações tratem das consequências internacionais (políticas, jurídicas e práticas) de uma revogação dos Regulamentos (CEE) n.o 4056/86 e n.o 954/79. No entanto, o CESE e o Parlamento Europeu, nos seus pareceres anteriores, solicitaram repetidamente à Comissão que analisasse estas consequências e as tivesse em consideração quando, no futuro, concebesse um novo regime. Assim, o CESE deseja, a seu tempo, ser consultado sobre o projecto de Orientações referente à aplicação das regras de concorrência da UE aos transportes marítimos e ter a oportunidade de expressar a sua opinião sobre o assunto.

1.6

Embora concorde com a revogação do Regulamento (CEE) n.o 954/79, o CESE não compreende a urgência em proceder à revogação antes de se analisar e avaliar adequadamente as repercussões internacionais das políticas europeias recentes relacionadas com as companhias marítimas.

2.   Introdução

2.1

A indústria das companhias marítimas de contentores é um factor vital para a economia europeia. Os serviços regulares de transporte de contentores representam aproximadamente 40 % do comércio externo marítimo da UE-25 em valor. Os três maiores operadores a nível mundial são europeus e as rotas que ligam a Ásia e a Europa, juntamente com as que ligam a Ásia e os EUA, são, de longe, as rotas comerciais mais importantes (1). Além disso, há cerca de 150 conferências marítimas internacionais a nível mundial, 28 das quais operam em rotas de e para a UE. Entre os Estados-Membros com companhias de transportes marítimos que operam linhas regulares contam-se, entre outros, a Dinamarca, a Alemanha, a França, a Itália, o Reino Unido, os países bálticos e o Chipre. De acordo com os dados disponíveis mais recentes (2), 60 % do valor total do comércio marítimo internacional e 25 % das 5,9 mil milhões de toneladas conduzidas por mar são transportados por serviços regulares, incluindo conferências marítimas.

2.2

A actual proposta tem por objectivo revogar o Regulamento (CEE) n.o 954/79 do Conselho, de 15 de Maio de 1979, respeitante à ratificação pelos Estados-Membros da Convenção das Nações Unidas relativa a um Código de Conduta das Conferências Marítimas ou à adesão destes Estados à Convenção. A presente proposta resulta da revogação do Regulamento (CEE) n.o 4056/86 que estabelecia uma isenção por categoria para as conferências marítimas, em virtude do Regulamento (CE) n.o 1419/2006 do Conselho, de 25 de Setembro de 2006. O Regulamento n.o 1419/2006 também amplia o âmbito do Regulamento (CE) n.o 1/2003 para incluir a cabotagem e os serviços internacionais de tramp (transporte marítimo não regular).

2.3

A Convenção das Nações Unidas relativa a um Código de Conduta das Conferências Marítimas (Genebra, 6 de Abril de 1974) foi elaborada sob os auspícios da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (CNUCED) com o objectivo de estabelecer um quadro internacional harmonizado para o funcionamento das conferências marítimas. O Código das Conferências Marítimas da CNUCED foi adoptado para satisfazer as aspirações legítimas dos países em vias de desenvolvimento a uma maior participação das suas companhias de navegação no transporte de cargas em linhas regulares. Foi o resultado de negociações multilaterais prolongadas entre países desenvolvidos e países em vias de desenvolvimento (3). A sua fórmula de distribuição da carga entre operadores dos dois países envolvidos na troca comercial e os operadores de países terceiros foi concebida para suster tendências proteccionistas. O Regulamento (CEE) n.o 954/79 visava tornar os mecanismos do Código compatíveis com os princípios do Tratado CE.

2.4

Entre os Estados-Membros que aderiram ao Código das Conferências Marítimas da CNUCED, ou o ratificaram, contam-se a Bélgica, a Bulgária, a República Checa, a Dinamarca, a Finlândia, a França, a Alemanha, a Itália, Malta, os Países Baixos, Portugal, a Roménia, a Eslováquia, a Espanha, a Suécia e o Reino Unido. A Noruega, membro do EEE, também aderiu ao Código.

2.5

Na discussão sobre a revogação do sistema das conferências marítimas na UE, o Parlamento Europeu sublinhou em dois pareceres (2005 e 2006) o seguinte: «Dado que a aplicação do presente regulamento (4) [que revoga o Regulamento n.o 4056/86] cria um conflito de direito com a adesão de certos Estados-Membros ao código de conduta das conferências marítimas da CNUCED, recomenda-se que os Estados-Membros se retirem deste código, sem contudo lhes poder impor esta solução. Decorre desta situação a necessidade de dispor de um procedimento preciso que permita gerir os conflitos de direito internacional que possam ocorrer. (…) a Comissão apresentará ao Parlamento Europeu uma visão de conjunto transparente da posição dos países terceiros (China, EUA, Canadá, Japão, Singapura e Índia) relativamente à nova política da UE em matéria de serviços regulares (aceitação, adaptação, oposição, efeitos negativos, etc.) e da sua vontade de adaptar os seus próprios sistemas. (…) a Comissão deve investigar exaustivamente as implicações comerciais e políticas de [uma] denúncia [do código da CNUCED]. (…) a Comissão deve examinar se é necessário alterar ou revogar outra legislação da CE, tal como (…) o Regulamento (CEE) n.o 4055/86 do Conselho»«de 22 de Dezembro de 1986 que aplica o princípio da livre prestação de serviços aos transportes marítimos entre Estados-membros e Estados-membros para países terceiros» (5). Além disso, o Parlamento Europeu «Exorta a Comissão a não dar seguimento à proposta de revogar o artigo 9.o do Regulamento (CEE) n.o 4056/86 que prevê a realização de negociações em caso de conflito entre a legislação comunitária e a legislação de países terceiros, especialmente tendo em conta a intenção da Comissão de rever o direito comunitário da concorrência no que respeita aos transportes marítimos» (6). No entanto, contrariamente às recomendações do Parlamento Europeu, o artigo 9.o foi revogado juntamente com o Regulamento n.o 4056/86; enquanto a avaliação do impacto político e jurídico da revogação do sistema da conferência marítima que tinha sido solicitada parece continuar a faltar.

2.6

O CESE também discutiu a revogação do Regulamento n.o 4056/86 e adoptou duas opiniões a esse respeito, nomeadamente em 2004 e 2006. Além disso, em 2006, o CESE afirmou que não tomaria uma posição até ver se a revogação proposta do Regulamento n.o 4056/86 teria um efeito sustentável. Segundo o Comité, «O sistema de conferências (…) ainda é objecto de acordos multilaterais e bilaterais, de que são signatários Estados-Membros da UE e a Comunidade». O CESE fazia igualmente notar que «a Comissão reconhece que, em consequência destes acordos, a data de revogação do n.o 3, alíneas b) e c), do artigo 1.o, e dos artigos 3.o a 8.o e 26.o do Regulamento 4056/86 deve ser prorrogada por um período de dois anos, a fim de permitir a denúncia ou a revisão destes acordos com países terceiros». O CESE considerava que «a Comissão deve ter igualmente em conta, ao revogar o Regulamento 4056/86, os interesses das pequenas e médias empresas. Estas empresas constituem a coluna dorsal da economia da UE e desempenham um importante papel no contexto da Estratégia de Lisboa revista. Os mercados devem permanecer abertos à concorrência actual e potencial, incluindo por parte de pequenos e médios operadores de transportes marítimos». Por fim, o CESE entendia que, «embora a consolidação possa ter efeitos positivos para a indústria da UE (ganhos de eficiência, economias de escala, redução de custos), é necessária prudência para evitar que a mesma consolidação — que pode seguir-se à revogação do Regulamento 4056/86 — resulte numa diminuição do número de operadores nos mercados relevantes, ou seja, em menos concorrência».

3.   A proposta da Comissão Europeia

3.1

O regulamento proposto contém apenas dois artigos, isto é, o artigo 1.o que revoga o Regulamento n.o 954/79 e o artigo 2.o relativo à entrada em vigor do novo regulamento em 18.10.2008.

4.   Observações na generalidade

4.1

O CESE tem seguido de perto as regras da concorrência para os transportes marítimos e, particularmente, a questão das conferências marítimas há mais de duas décadas, tendo sido expressos pontos de vista divergentes quanto aos méritos da retirada da isenção por categoria para as conferências marítimas. No entanto, na sequência da revogação do Regulamento n.o 4056/86 em virtude do Regulamento n.o 1419/2006, as conferências marítimas de e para a UE serão proibidas a partir de 18 de Outubro de 2008.

4.2

Os Regulamentos 4056/86 e 954/79 constituem um pacote jurídico, tendo o último sido adoptado devido à ratificação do Código das Conferências Marítimas da CNUCED por alguns Estados-Membros da UE. Consequentemente, a revogação do Regulamento n.o 4056/86 implicou a necessidade de revogar o Regulamento n.o 954/79. Desta forma, o CESE (que originalmente se opôs à revogação do Regulamento n.o 4056/86, mas foi, mais tarde, obrigado a aceitá-la, tendo prevenido para as suas repercussões) não pode deixar de concordar com a proposta de revogação do Regulamento n.o 954/79 em nome da simplificação da legislação da UE. Apesar disso, como fez com a revogação do Regulamento 4056/86, o CESE gostaria de salientar, uma vez mais, que é preciso estar particularmente atento a quaisquer possíveis repercussões jurídicas e/ou políticas (bem como a efeitos potencialmente adversos) que possam advir da revogação proposta do Regulamento 954/79. No entanto, o CESE nota que parece faltar, mais uma vez, à proposta de revogação do Regulamento n.o 954/79 uma avaliação dos potenciais problemas políticos, jurídicos e práticos que possam resultar da revogação. Embora não esteja em causa a necessidade de uma revogação, já que essa é inevitável tendo em conta a revogação do Regulamento 4056/86, o CESE continua a entender, e reitera, que todas as possíveis repercussões da revogação (políticas, jurídicas e práticas) deviam ser analisadas adequadamente pela UE.

4.3

O Código das Conferências Marítimas da CNUCED e o conceito de Conferências Marítimas são mencionados no acervo comunitário e noutros instrumentos jurídicos adoptados pela UE. Eles formam, por exemplo, a base dos Regulamentos 4055/86, 4058/86 (7) e 823/2000 relativos aos consórcios de transportes marítimos regulares. Além do mais, o Código é também especificamente mencionado em alguns acordos bilaterais, tais como o Acordo UE/Rússia (art. 39.o (1) (a)) e o Acordo de Associação UE/Algéria de 2005 (art. 34.o, parágrafo 3).

4.4

Ao revogar o Regulamento 4056/86, a Comissão Europeia indicou que publicaria Orientações para explicar a aplicação das regras de concorrência da CE aos transportes marítimos, incluindo aos serviços regulares de transportes marítimos. No que concerne a esses serviços, as Orientações deviam ajudar os operadores de linhas marítimas regulares após 18.10.2008 (data a partir da qual as conferências marítimas serão proibidas em trocas comerciais de e para a UE) a fazer uma autoavaliação dos seus acordos ao abrigo das regras de concorrência da UE (artigos 81.o e 82.o do Tratado CE). No entanto, resta ainda saber se estas Orientações incluirão soluções para os potenciais problemas jurídicos que possam surgir ao nível internacional devido à revogação do Regulamento n.o 954/79. Por enquanto, o CESE entende que o projecto de Orientações é de natureza muito geral e, por isso, lhe falta a segurança jurídica de que a indústria de navegação necessita para levar a cabo uma autoavaliação. Além disso, considera-se que o projecto de Orientações não foca as implicações internacionais da revogação dos Regulamentos 4056/86 e 954/79. Assim, o CESE exprime o desejo de vir a ser consultado, a seu tempo, para acompanhar de perto os futuros desenvolvimentos na matéria e, caso seja necessário, fornecer assistência e/ou peritos para o processo de elaboração das Orientações finais.

4.5

Para o CESE, a questão fundamental a analisar é se a revogação proposta do Regulamento 954/79 também implicará uma obrigação jurídica de denunciar o Código das Conferências Marítimas da CNUCED. O CESE nota que a Comissão Europeia não examinou esta questão na sua exposição de motivos no contexto da proposta de revogação do Regulamento 954/79. No entanto, a este respeito, de acordo com a Comissão, entende-se que os Estados-Membros que pertencem ao Código não terão qualquer obrigação legal de o denunciar. Nesse caso, o panorama jurídico após a revogação do Regulamento 954/79 seria o seguinte: os Estados-Membros da UE não teriam de denunciar o Código, mas não o poderiam continuar a aplicar em trocas comerciais de e para a UE. No entanto, o Código continuará a ser aplicado noutros continentes. Ao mesmo tempo, os Estados-Membros da UE que ainda não ratificaram o Código não o poderão fazer depois de 18.10.2008, tal como é explicado na exposição de motivos e no quinto considerando da proposta para revogar o Regulamento 954/79. Consequentemente, se um Estado-Membro que ainda não é parte contratante do Código das Conferências Marítimas da CNUCED desejar aderir ao mesmo, com vista a salvaguardar os interesses das suas companhias de transportes marítimos que operam fora da UE, tal Estado-Membro será impedido de o fazer.

4.6

Perante este cenário, o seguinte paradoxo jurídico pode surgir após 18.10.2008: companhias de navegação de Estados-Membros que são parte contratante do Código e não o denunciam continuarão a beneficiar das suas disposições no que toca aos direitos aplicáveis às trocas comerciais fora da UE, como previsto no art. 2.o, parágrafo 4 (a) e (b) e na Resolução 2. Por outro lado, companhias de Estados-Membros que não são parte contratante do Código, e que não poderão ratificá-lo ou aceder ao Código após 18.10.2008, não beneficiarão das suas disposições. Deste modo, surge a seguinte questão: é possível adoptar uma proposta que incluiria uma discriminação entre companhias da UE, contrariamente ao artigo 12.o do Tratado CE? Além disso, não iria essa situação afectar a competitividade das empresas da UE na Europa e/ou no mundo, contrariando a Estratégia de Lisboa renovada? Será que uma tal situação não ilustra a necessidade de uma abordagem horizontal das políticas da UE, em particular das políticas de transportes e de concorrência no que se refere aos transportes marítimos, como previsto pelo Livro Verde para uma futura política marítima?

4.7

O CESE recomenda veementemente à UE que não subestime as implicações internacionais que adviriam de uma revogação do sistema das conferências marítimas. O CESE nota que outras jurisdições estão, por enquanto, a manter os seus sistemas de imunidade anti-trust. Alguns países terceiros expressaram preocupação quanto à revogação do sistema das conferências marítimas na UE. A este respeito, pode-se referir a afirmação recente do Fórum dos Armadores Asiáticos (Bussan, Coreia, 29.5.2007):

«Os membros notaram desenvolvimentos recentes na Austrália, na China, em Hong Kong, no Japão e em Singapura, mas assinalaram com preocupação a decisão da UE de abolir a sua isenção por categoria para as conferências marítimas. Os delegados confirmaram a posição de longa data do Fórum segundo a qual o sistema de imunidade anti-trust é indispensável para a saúde da indústria dos transportes marítimos e para a sua capacidade de encorajar os investimentos necessários para apoiar a procura crescente de comércio internacional e o sistema beneficia toda a indústria. Concordou-se que os operadores deviam fazer esforços contínuos para que as partes envolvidas, tais como companhias de navegação e governos, compreendessem o importante papel dos acordos de transportes no apoio ao comércio. O Fórum notou que as associações membros do Fórum dos Armadores Asiáticos, AAC (Associação dos Armadores da Coreia), AAJ (Associação dos Armadores do Japão) e AAS (Associação dos Armadores de Singapura) em particular, expressaram, por escrito, à Comissão Europeia e aos órgãos relevantes a sua oposição à abolição do sistema de imunidade jurídica anti-trust. Acresce que a AAC recebeu uma resposta da Comissão dizendo que iria eliminar o Regulamento 4056/86, mas estava a preparar uma alternativa, ao mesmo tempo que mantinha intacto o Regulamento dos Consórcios, um dos dois eixos do sistema de imunidade anti-trust». O CESE regista a declaração do Fórum dos Armadores Asiáticos como uma ilustração da necessidade de analisar (ou pelo menos de dar a devida atenção a) o impacto internacional da revogação do sistema das conferências marítimas na UE, numa base mundial e para uma economia globalizada, em consonância com inúmeras solicitações semelhantes feitas pelo CESE e pelo Parlamento Europeu.

4.8

À luz das considerações supramencionadas, o CESE acredita firmemente que a presente questão não pode ser examinada apenas da perspectiva do direito da concorrência. As consequências políticas e de política de transportes marítimos da revogação do sistema das conferências marítimas na UE, e logo do Regulamento 954/79, não podem ser subestimadas. Assim, o CESE não compreende a urgência da proposta da Comissão para revogar o Regulamento 954/79, uma vez que as repercussões internacionais da política da UE sobre regras de concorrência para transportes marítimos e, em particular, da revogação do sistema das conferências marítimas ainda não foram analisadas adequadamente, apesar dos muitos pedidos nesse sentido, incluindo do CESE.

5.   Observações na especialidade

5.1

No que diz respeito ao estado actual das ratificações do Código das Conferências Marítimas, o CESE nota que a exposição de motivos da proposta da Comissão para revogar o Regulamento n.o 954/79 se refere a treze Estados-Membros como partes contratantes do Código das Conferências Marítimas da CNUCED, quando, na realidade, dezasseis Estados-Membros são partes contratantes do Código, na sequência da ratificação da Roménia, Bulgária e Malta.

O Regulamento 954/79 previa certas reservas para salvaguardar os interesses, entre outros, das companhias de navegação de países terceiros (companhias terceiras ou «cross traders»). No entanto, a proposta para revogar este Regulamento não prevê tais medidas de salvaguarda. A este respeito, os interesses das companhias de linhas regulares dos transportadores da UE que operam entre outros continentes (onde o Código das Conferências Marítimas é aplicável) não devia ser subestimado. É igualmente de salientar que o Código das Conferências Marítimas da CNUCED foi ratificado por 81 países, incluindo os novos países na linha da frente do comércio mundial: Brasil, Rússia, Índia e China (BRIC), assim como Indonésia, México, Nigéria, Arábia Saudita, Austrália, Canadá, Japão e Singapura.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Relatório final da «Global Insight» sobre a aplicação das regras de concorrência ao transporte marítimo, Outubro de 2005.

(2)  (CNUCED — 2003, Clarksons — 2003).

(3)  JO C 157 de 28.6.2005.

(4)  Relatório do Parlamento Europeu A6-0217/2006 de 22.6.2006.

(5)  JO L 378 de 31.12.1986, p. 1.

(6)  Relatório do Parlamento Europeu A6-0314/2005 de 24.10.2005.

(7)  O Regulamento 4055/86 de 22.12.1989 («que aplica o princípio da livre prestação de serviços aos transportes marítimos entre Estados-membros e Estados-membros para países terceiros») baseia-se no Código das Conferências Marítimas da CNUCED, artigo 4.o, parágrafo 1 (a) (b) que prevê uma eliminação progressiva do regime existente de divisão da carga através de referência directa ao Código das Conferências Marítimas; O Regulamento 4058/86 de 22.12.1986 (relativo a «uma acção coordenada com vista a salvaguardar o livre acesso ao tráfego transoceânico») baseia-se no Código das Conferências Marítimas da CNUCED, artigo 1.o que prevê acções conforme as transacções pertençam ou não ao Código — JO L 378 de 31.12.1986, p. 4.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/66


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Identificação por radiofrequências (RFID)»

(2007/C 256/13)

Em 26 de Fevereiro de 2007, a Comissão Europeia solicitou ao Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, que elaborasse um parecer sobre: Identificação por radiofrequências (RFID).

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação emitiu parecer em 19 de Junho de 2007, sendo relator P. MORGAN.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 138 votos a favor, 1 voto contra e 6 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

A identificação por radiofrequências (RFID) é uma tecnologia significativa que vai ser muito importante no futuro. As suas aplicações presentes e futuras têm potencial para melhorar positivamente uma vasta gama de processos industriais, tanto no sector público como no privado, e para trazer benefícios significativos aos indivíduos e às empresas. Também tem potencial para estimular um desenvolvimento maciço das aplicações Internet, tornando possível o que uma agência das Nações Unidas designou por «Internet das coisas». No entanto, se a RFID não for cuidadosamente controlada, também corre o risco de violar a privacidade das pessoas, de destruir as liberdades cívicas e de ameaçar a segurança dos indivíduos e das empresas.

1.2

O título completo desta Comunicação é «Identificação por radiofrequências na Europa: Rumo a um quadro político» (doc. COM(2007) 96 final). A Comissão já realizou uma consulta alargada que serviu de base para a Comunicação. Convida-se agora o CESE a emitir um parecer exploratório. Com base nas reacções à Comunicação, a Comissão tenciona apresentar uma recomendação aos Estados-Membros no final do ano. E qualquer legislação que leve mais tempo, será adoptada mais tarde. Assim, efectivamente, este parecer deverá concentrar-se no conteúdo dessa recomendação.

1.3

Para ajudar a formular as suas recomendações, a Comissão decidiu instituir um grupo de partes interessadas que actuará como «caixa de ressonância». O CESE gostaria de ter a oportunidade de apresentar este parecer àquele grupo.

1.4

O CESE apoia as acções propostas pela Comissão no domínio do espectro de radiofrequências, das normas, da saúde, da segurança e do ambiente. O CESE sublinha a urgência de estabelecer uma efectiva contribuição industrial para os foros de normalização.

1.5

Visto que a Comissão vai publicar as suas recomendações aos Estados-Membros no final do ano em curso, é razoável supor que aceitará a infra-estrutura de segurança e privacidade dos dados no estado em que se encontra actualmente. Isto sugere em particular que os organismos de protecção dos dados em cada Estado-Membro passarão a ser as autoridades responsáveis pelas questões de privacidade e de protecção de dados da RFID. Estas questões estão no cerne do presente parecer.

1.6

As ameaças à vida privada e às liberdades cívicas provocadas pela RFID são graves:

As etiquetas RFID podem ser incorporadas ou apostas a objectos e documentos, sem o conhecimento da pessoa que obtém estes artigos. Tendo em conta que as radiofrequências passam sem dificuldade e silenciosamente através dos tecidos, do plástico e de outros materiais, é possível ler as etiquetas RFID cosidas nas peças de vestuário ou apostas a objectos transportados em carteiras, sacos de compras, malas ou outro tipo de objectos semelhantes.

O código electrónico do produto podia permitir dotar cada objecto existente à face da terra do seu próprio bilhete de identidade único. A utilização de números de identificação únicos poderá levar à criação de um sistema mundial de registo de objectos, através do qual cada objecto físico seria identificado e associado a um comprador ou ao seu proprietário no ponto de venda ou transferência.

A difusão da RFID requer a criação de bases de dados gigantescas com informações contidas em etiquetas únicas. Estes registos poderão ser associados a dados de identificação pessoais, nomeadamente à medida que aumenta a memória dos computadores e as suas capacidades de processamento.

As etiquetas podem ser lidas à distância, sem que estejam forçosamente à vista, por leitores que podem ser colocados de maneira invisível em praticamente qualquer ambiente onde se reúnem pessoas. Os leitores podem ser colocados por baixo dos azulejos do chão, cosidos em tapetes, escondidos nos patamares das portas e dissimulados em estantes, de tal modo que é praticamente impossível que uma pessoa saiba se, e quando, está a ser controlada à distância.

Se a identidade das pessoas estiver ligada a números de etiquetas RFID únicos, é possível localizar as pessoas ou estabelecer o seu perfil sem o seu conhecimento ou consentimento.

E possível imaginar um mundo em que os leitores RFID formam uma rede mundial omnipresente. Uma rede deste género não teria necessidade de colocar leitores em todo o lado. O sistema londrino de pagamento de taxas de circulação pode localizar todos os veículos que entram no centro da cidade graças a um número relativamente reduzido de máquinas de filmar colocadas em pontos estratégicos. Seria possível construir do mesmo modo uma rede de leitores de etiquetas RFID colocados em pontos estratégicos, mas isto não deve ser autorizado.

1.7

As implicações destas ameaças são as seguintes:

Os utilizadores da RFID devem tornar públicas as suas políticas e práticas e não devem existir bases de dados secretas com informações pessoais.

As pessoas têm o direito de saber quando os artigos existentes no comércio a retalho contêm etiquetas ou leitores RFID. Qualquer leitura de etiquetas realizada num comércio a retalho deve ser transparente para todas as partes.

Os utilizadores de RFID devem informar o público sobre o objectivo da utilização das etiquetas e dos leitores. A recolha das informações deve limitar-se aos elementos necessários para atingir o objectivo que se pretende.

Os utilizadores de RFID são responsáveis pela aplicação da tecnologia e pelo seu funcionamento no respeito pelas leis e pelas orientações em matéria de segurança dos dados. São igualmente responsáveis pela segurança e pela integridade do sistema e da sua base de dados.

1.8

Todavia, é discutível o modo como estes princípios devem ser levados à prática. Idealmente, qualquer empresa envolvida numa transacção comercial «da empresa para o consumidor», por exemplo, o comércio a retalho, a emissão de bilhetes, o controlo dos acessos ou os serviços de transporte deve dar aos clientes uma garantia de que estes princípios serão respeitados, o que constitui uma espécie de carta do cliente. Conceptualmente, essa carta podia incorporar todas as boas práticas de protecção de dados referidos no ponto 4.5. Além disso, o CESE propõe as seguintes orientações:

a)

Os comerciantes devem ser proibidos de pressionar ou de obrigar os clientes a aceitarem produtos com etiquetas activas ou passivas. Uma alternativa poderia consistir na aposição das etiquetas à embalagem ou na utilização de etiquetas electrónicas que podem ser retiradas, à semelhança das etiquetas de preços.

b)

Os consumidores deveriam ter a possibilidade de retirar ou de desactivar qualquer etiqueta colocada nos artigos comprados.

c)

Em princípio, a RFID não deve ser utilizada para localizar pessoas; esta prática é imprópria, seja ela através do vestuário, de mercadorias, bilhetes ou de outros artigos.

d)

A RFID nunca deverá ser utilizada de molde a suprimir ou a reduzir o anonimato.

e)

A autoridade responsável deve dar orientações claras de que as disposições das alíneas c) e d) apenas serão admissíveis em circunstâncias excepcionais e com a notificação formal prévia da autoridade.

1.9

Poderão estar previstas certas excepções às orientações precedentes nos seguintes casos:

Se os particulares optarem por manter as etiquetas activas por uma questão de conveniência pessoal.

Se os particulares derem o seu consentimento para serem localizados em ambientes sensíveis como estabelecimentos e instituições públicas e privadas de elevada segurança.

Se os particulares optarem por utilizar aplicações que os localizem e identifiquem do mesmo modo que já são localizados e identificados através da utilização de telefones portáteis, de cartões ATM, de moradas Internet, etc.

Qualquer excepção deste tipo deve ser notificada à autoridade responsável.

1.10

A RFID não é uma tecnologia que já tenha atingido a fase da maturidade, por isso ainda não compreendemos o seu pleno potencial. Por um lado, esta tecnologia poderá trazer benefícios por ora inconcebíveis à nossa civilização tecnológica, e por outro lado poderá representar a maior ameaça tecnológica que jamais se colocou para a vida privada e a liberdade. O CESE considera que as aplicações RFID devem ser desenvolvidas em conformidade com um rigoroso código de ética no respeito pela vida privada, pela liberdade e pela segurança dos dados, mas que, tendo em conta as necessárias salvaguardas, deveria continuar o desenvolvimento das aplicações.

1.11

Em resumo, nos domínios em que são permitidas aplicações RFID, a aplicação deve ser totalmente transparente para todas as partes envolvidas. As aplicações destinadas a melhorar a manipulação das mercadorias são geralmente aceitáveis. Em geral, as aplicações que implicam a etiquetagem das pessoas só são aceitáveis em situações temporárias. As aplicações que associam pessoas a mercadorias podem ser aceitáveis para efeitos de comercialização. As aplicações que identificam as pessoas graças às mercadorias compradas são geralmente inaceitáveis. Além disso, algumas aplicações são impróprias numa sociedade livre e nunca deveriam ser autorizadas. A necessidade imperiosa de preservar a vida privada e o anonimato deve estar no cerne da recomendação apresentada pela Comissão aos Estados-Membros.

2.   O que é a RFID e porque é importante?

2.1

A RFID é uma tecnologia que permite a identificação automática e a captação de dados através de radiofrequências. A principal característica desta tecnologia é que permite associar um identificador único e outras informações — por meio de uma etiqueta electrónica — a qualquer objecto, animal ou mesmo pessoa, bem como ler essas informações mediante um dispositivo sem fios.

2.2

As etiquetas são constituídas por um circuito electrónico que armazena dados e por uma antena que transmite os dados por ondas de rádio. Um leitor de RFID interroga as etiquetas para obter as informações armazenadas. Quando o leitor emite ondas de rádio, todas as etiquetas ao seu alcance comunicam com ele. É necessário material software para gerir o leitor e recolher e filtrar as informações.

2.3

Estão disponíveis diferentes tipos de sistemas RFID. As etiquetas tanto podem ser activas como passivas. Nas etiquetas activas está incorporada uma pilha que alimenta o circuito interno e que emite ondas de rádio, podendo emitir sinais mesmo na ausência de um leitor RFID. As etiquetas passivas são alimentadas pela energia das ondas de rádio transmitidas pelo leitor e não dispõem da sua própria fonte de energia. As etiquetas podem estar em modo de «leitura simples» ou de «leitura-escrita». As etiquetas que estão em modo de leitura simples são produzidas a preços mais baixos e são utilizadas na maior parte das aplicações actuais.

2.4

O âmbito de um sistema RFID depende da radiofrequência, da potência do leitor e do material existente entre a etiqueta e o leitor, que pode atingir alguns metros nos sistemas passivos e ultrapassar cem metros nos sistemas activos.

2.5

A identificação por radiofrequências (RFID) ocupa o nível inferior na hierarquia das tecnologias sem fios. Se o critério for a distância percorrida pelos sinais, o primeiro lugar é ocupado pelos sistemas de comunicação por satélite, por exemplo o GPS. Seguem-se as tecnologias de telefonia móvel de longo alcance como o GSM e o GPRS, os sinais de menor alcance no interior dos edifícios como o Wifi, e as redes pessoais como o Bluetooth, e, por último, a RFID. Cada uma destas tecnologias funciona em separado e de maneira autónoma, de forma que não há, por exemplo, qualquer perigo de que os sistemas por satélite leiam as etiquetas RFID. Não obstante, os dados podem ser transmitidos de um sistema para outro por aparelhos como os telefones portáteis.

2.6

Seguem-se alguns exemplos dos benefícios potenciais das aplicações RFID:

Para os particulares, poderá ser sinónimo de segurança (por exemplo, segurança alimentar, cuidados de saúde, luta contra a contrafacção), de comodidade (por exemplo, menos filas de espera nas caixas, melhor manutenção das bagagens nos aeroportos, pagamentos automatizados) e de melhores cuidados de saúde para os doentes, em particular nos casos de doenças crónicas como a demência.

Nos transportes, espera-se que a RFID contribua para melhorar a eficácia, a segurança e a qualidade dos serviços para as pessoas e os bens.

Na saúde, a RFID pode aumentar a qualidade dos cuidados e a segurança dos pacientes, bem como melhorar a observância da medicação e a logística; de facto, está actualmente em estudo a etiquetagem RFID dos medicamentos em pastilhas.

No comércio a retalho, a RFID pode contribuir para reduzir as rupturas de abastecimento, o nível das existências e os roubos.

Em muitas indústrias em que prevalece a contrafacção, a utilização da RFID pode detectar o ponto de entrada de produtos ilegais na cadeia de abastecimento.

A etiquetagem RFID também poderá contribuir para melhorar a triagem e a reciclagem de componentes de produtos e materiais, o que poderá ter uma incidência positiva na gestão dos resíduos e no desenvolvimento sustentável.

2.7

Muitos aspectos da RFID são exemplificados através da sua aplicação na gestão do ciclo de vida dos livros. A mera quantidade de livros impressos cria um pesadelo logístico para os editores, os distribuidores, os bibliotecários e os retalhistas. Além da logística da cadeia de abastecimento, é necessário localizar os livros depois de terem sido colocados nas estantes para que possam ser encontrados e recolocados no seu lugar. Por outro lado, as bibliotecas devem controlar o ciclo da requisição, e os compradores podem ter dificuldades em localizar os seus próprios livros. A aposição de etiquetas RFID aos livros constitui uma solução para todos estes problemas. O controlo das requisições nas bibliotecas tem analogias com outras aplicações em que os artigos são reciclados ou alugados.

2.8

Para exemplificar a natureza das ameaças inerentes a esta tecnologia, eis um excerto de um requerimento de patente (20020615758) apresentado pela empresa IBM em Novembro de 2002, relativo à identificação e à localização de pessoas através de artigos etiquetados pela RFID.

«Um método e um sistema de identificação e de localização de pessoas através de artigos com etiquetas RFID usados por estas pessoas. Os registos das compras realizadas por cada pessoa num comércio a retalho são compilados pelos terminais de venda e conservados numa base de dados das transacções. Quando uma pessoa que usa vestuário ou que traz consigo artigos com etiquetas RFID entra num estabelecimento comercial ou noutra zona definida, um leitor óptico de etiquetas RFID situado no interior deste espaço procede à leitura das etiquetas RFID usadas por esta pessoa e lê as informações contidas nas etiquetas RFID. As informações provenientes das etiquetas RFID estão em correlação com os registos das transacções armazenados na base de dados das transacções em função de algoritmos de correlação conhecidos. Com base nos resultados desta correlação, pode ser determinada a identidade exacta desta pessoa ou algumas das suas características. Estas informações são utilizadas para seguir os movimentos da pessoa no estabelecimento comercial ou noutros espaços.».

O requerimento de patente American Express 20050038718 é bastante semelhante.

2.9

A identificação por radiofrequências (RFID) é obviamente muito mais do que um simples código de barras electrónico. O dispositivo descrito no requerimento de patente anterior contém diferenças significativas em relação a um código de barras electrónico, a saber:

a)

A etiqueta contém não só a descrição do artigo, mas também uma identificação de cada artigo analisado individualmente, o que por sua vez permite identificar o seu comprador.

b)

A etiqueta não precisa de ser necessariamente um microchip físico. Os circuitos podem ser impressos directamente na maior parte dos materiais, por exemplo, numa peça de vestuário.

c)

A etiqueta pode continuar a funcionar depois da venda, de forma que pode ser lida permanentemente.

d)

Os leitores de etiquetas não se situam apenas no ponto de venda, mas podem estar em qualquer lugar, e não só no recinto do comércio a retalho.

e)

A correlação através de uma base de dados confere uma nova dimensão à recolha dos dados, ao respeito da vida privada e à segurança dos dados.

2.10

A questão de saber se uma etiqueta deverá continuar activa depois de passar pela caixa registadora do retalhista é assunto para debate. Por um lado, representa uma ameaça para a vida privada e, por outro lado, poderá ter vantagens para o comprador. Por exemplo, a possibilidade de dispor de leitores RFID em casa poderia ajudar a organizar a adega, o frigorífico, o guarda-roupa e a biblioteca. É lógico, por conseguinte, que sejam os particulares a fazer as suas próprias escolhas, mas a tecnologia e a aplicação devem dar-lhe essa possibilidade.

2.11

A RFID tem muitas mais aplicações do que a identificação dos produtos a retalho. Os cartões de identificação electrónicos do CESE funcionam com um dispositivo RFID. O sistema do metro de Londres utiliza amplamente os cartões RFID para pagamentos e acesso. Os cartões de crédito serão brevemente dotados de um dispositivo RFID para efectuar transacções de valor reduzido sem código secreto. As placas RFID são utilizadas para as portagens rodoviárias e noutras aplicações de identificação dos condutores. Em algumas estações de esqui europeias, o acesso aos teleféricos que transportam as pessoas para as pistas de esqui é controlado por placas RFID que o utilizador traz no bolso do seu fato de esqui. O relator do presente parecer utiliza quotidianamente três cartões e uma placa RFID. O seu cão é identificado por um chip RFID subcutâneo. A utilização destes chips está a generalizar-se no mundo inteiro para etiquetar os animais, garantindo assim a rastreabilidade na cadeia alimentar. Daí a etiquetar os criminosos e os doentes problemáticos como se fossem cães não vai senão um passo.

2.12

Os cartões de identificação usados pelo CESE são uma aplicação RFID inócua. A identificação representa um repto bem mais importante quando as etiquetas RFID são incorporadas no vestuário de trabalho ou nos uniformes para poder seguir permanentemente os movimentos da pessoa que os usa, graças a leitores ópticos situados em todos os pontos estratégicos do espaço onde se encontram. Todavia, há que admitir que esta prática pode ser desejável em certos casos, por exemplo, por motivos de segurança. Em todo o caso, seguir o rasto de uma pessoa, na ausência de garantias adequadas, pode constituir uma grave ingerência na sua vida privada, que deve ser cuidadosamente motivada e controlada.

2.13

O semanário «The Economist» apresentou uma estranha advertência para o que poderão ser as futuras aplicações desta tecnologia: no Baja Beach Club de Barcelona, o bilhete de entrada na zona VIP é um microchip implantado no braço do cliente. Um bocadinho maior do que um grão de arroz e envolto em vidro e silicone, o chip é utilizado para identificar os clientes quando entram no estabelecimento e quando pagam os seus consumos. Este chip é implantado, com anestesia local, por uma enfermeira. Trata-se, essencialmente, de uma etiqueta RFID.

3.   Síntese da comunicação

3.1

A RFID reveste-se de interesse político devido à sua capacidade para ser um novo motor de crescimento e de criação de empregos e, por conseguinte, um poderoso contributo para a Estratégia de Lisboa, na condição de ser possível ultrapassar os obstáculos à inovação.

3.2

Em 2006, a Comissão organizou uma consulta pública sobre a RFID, que pôs em destaque as expectativas baseadas nesta tecnologia a partir dos resultados obtidos pelos seus primeiros utilizadores, mas também revelou os receios da população quanto às aplicações de RFID que implicam a identificação e/ou a localização de pessoas.

3.3

O desenvolvimento mais avançado e a difusão generalizada da RFID poderão reforçar ainda mais o papel das tecnologias da informação e da comunicação enquanto motores da inovação e factores de promoção do crescimento económico.

3.4

É necessário definir um quadro jurídico e político claro e previsível para tornar esta nova tecnologia aceitável para os utilizadores. Como a tecnologia RFID é por natureza transfronteiriça, este quadro deverá garantir a coerência no interior do mercado interno.

3.5   Segurança, respeito da vida privada e ética

3.5.1

Há sérios receios de que esta tecnologia omnipresente e «habilitante» possa pôr em perigo a vida privada: efectivamente, a tecnologia RFID pode ser utilizada para recolher informações que estão directamente ou indirectamente ligadas a uma pessoa identificada ou identificável e que são, por conseguinte, consideradas como dados de carácter pessoal; as etiquetas RFID podem conter dados pessoais; a tecnologia RFID poderá servir para localizar indivíduos ou para seguir os seus movimentos, ou ainda para estabelecer os perfis de comportamento. A RFID poderá tornar-se uma tecnologia intrusa. Foram manifestados receios quanto à violação de valores fundamentais e da vida privada, bem como no que diz respeito a um aumento dos controlos, em particular no local de trabalho, susceptíveis de conduzir a formas de discriminação, exclusão e vitimização e, eventualmente, a despedimentos.

3.5.2

É óbvio que a aplicação da RFID deve ser socialmente e politicamente aceitável, eticamente admissível e juridicamente viável. A RFID apenas terá os seus inúmeros efeitos positivos sobre a economia e a sociedade se estiverem previstas garantias efectivas em relação com a protecção dos dados, o respeito da vida privada e os aspectos éticos conexos que estão no cerne do debate sobre a adesão do público à RFID.

3.5.3

O quadro legislativo comunitário sobre a protecção dos dados de carácter pessoal e da vida privada na Europa foi concebido para ser sólido perante a inovação. A protecção dos dados de carácter pessoal está abrangida pela directiva geral sobre a protecção dos dados (1), aplicável a todas as tecnologias, inclusivamente à RFID. A directiva geral relativa à protecção dos dados é completada pela directiva relativa à privacidade nas comunicações electrónicas (2). Em conformidade com estas directivas, as autoridades públicas dos Estados-Membros devem velar por que a introdução das aplicações RFID seja conforme com a legislação sobre a protecção da vida privada e dos dados. Por conseguinte, poderá ser necessário fornecer indicações precisas sobre a realização prática das aplicações RFID e elaborar códigos de conduta nesta matéria.

3.5.4

Quanto à segurança, as empresas, os Estados-Membros e a Comissão devem conjugar os seus esforços para compreender melhor os problemas sistémicos e os riscos de segurança conexos que estão potencialmente associados com a difusão maciça das tecnologias e dos sistemas RFID. Um aspecto importante da resposta aos desafios referidos consistirá em definir e adoptar critérios de concepção que limitem os riscos para a vida privada e a segurança, não só ao nível tecnológico, mas também ao nível organizativo, bem como no plano dos processos comerciais. Por conseguinte, antes da selecção dos sistemas RFID e da difusão das suas aplicações, é necessário analisar cuidadosamente os riscos específicos que estes comportam para a segurança e a vida privada em custos e benefícios.

3.5.5

São motivos de preocupação o carácter aberto e neutro das bases de dados em que serão registados os identificadores únicos que estão no cerne do sistema RFID, o arquivo e a gestão dos dados recolhidos, bem como a sua utilização por terceiros. Trata-se de uma questão importante, pois a RFID vai provocar uma nova vaga de desenvolvimento da Internet que acabará por possibilitar a interconexão de milhares de dispositivos inteligentes e de sofisticadas tecnologias de sensores numa infra-estrutura mundial de comunicações em rede. Esta nova fase do desenvolvimento da Internet chama-se a «Internet das coisas».

3.5.6

O sistema de registo e nomenclatura das identidades nesta futura «Internet das coisas» deve ser concebido de modo a excluir as avarias ou as utilizações involuntárias susceptíveis de criar perturbações graves. Este sistema não deverá ser controlado por interesses particulares que possam utilizar estas bases de dados e estes sistemas para atingir objectivos próprios. As exigências em matéria de segurança, de ética e de respeito da vida privada devem ser salvaguardadas para todas as partes interessadas (quer se trate de indivíduos ou de empresas), de que certas informações comerciais sensíveis seriam integradas nos processos comerciais baseados na RFID.

3.5.7

Na fase de concepção do sistema de informações RFID, devem ser consideradas as exigências das partes activamente envolvidas na criação do sistema (organizações comerciais, administrações públicas, hospitais), bem como dos utilizadores finais que serão submetidos a este sistema (cidadãos, consumidores, pacientes, empregados). Como os utilizadores finais geralmente não participam na fase de concepção, a Comissão vai apoiar o desenvolvimento de um conjunto de orientações específicas para as aplicações (código de conduta, boas práticas) por um grupo restrito de peritos que representam todas as partes. Até finais de 2007, a Comissão tenciona publicar uma recomendação que enunciará os princípios que deverão ser aplicados pelas autoridades públicas e pelas restantes partes interessadas em matéria de utilização da RFID.

3.5.8

A Comissão também tenciona considerar a possibilidade de acrescentar disposições apropriadas à próxima proposta de alteração da directiva relativa à vida privada nas comunicações electrónicas, e terá simultaneamente em conta os elementos de informação fornecidos pelo futuro grupo das partes interessadas na RFID, pelo grupo de trabalho sobre o artigo 29.o relativo à protecção dos dados e por outras iniciativas pertinentes como o grupo europeu de ética das ciências e das novas tecnologias. Nesta base, a Comissão tenciona determinar a necessidade de adoptar novas medidas legislativas para garantir a protecção dos dados e da vida privada.

3.5.9

A Comissão vai acompanhar de perto a evolução para a «Internet das coisas», de que a RFID deverá constituir um elemento importante. Em finais de 2008, a Comissão tenciona publicar uma comunicação que analisa a natureza e as consequências desta evolução, com uma tónica particular nas questões relativas ao respeito da vida privada, à confiança e à governação. Esta comunicação avaliará as diferentes opções políticas, nomeadamente a possibilidade de introduzir novas medidas legislativas para assegurar a protecção dos dados e da vida privada, bem como para abordar outros objectivos de política geral.

3.5.10

As observações relativas às questões de segurança, de respeito da vida privada e de ética encontram-se na secção 4 do presente parecer.

3.6   Outras questões políticas em matéria de RFID

3.6.1

Além do vasto domínio da segurança, do respeito da vida privada e da ética, as outras questões políticas suscitadas pela RFID abrangem o espectro de radiofrequências, as normas, a saúde, a segurança e o ambiente.

3.6.2

É importante harmonizar as condições de utilização do espectro para facilitar a mobilidade e limitar os custos. A Comissão adoptou recentemente uma decisão (2006/808/CE) sobre as frequências RFID na banda UHF. Esta atribuição é considerada apropriada para o horizonte dos próximos três a dez anos; todavia, se houver necessidade de frequências adicionais, a Comissão adoptará as medidas que se impõem por força dos poderes que lhe confere a decisão sobre o espectro de radiofrequências (676/2002/CE). O CESE aceita esta posição.

3.6.3

A adopção racional de novas normas internacionais ISO e a harmonização de normas regionais são essenciais para facilitar a aceitação dos serviços. Os organismos europeus de normalização competentes (CEN e ETSI) estão totalmente envolvidos. A Comissão convida estes organismos, em cooperação com a indústria, a garantirem que as normas desenvolvidas satisfazem os critérios europeus, nomeadamente em matéria de respeito da vida privada, de segurança, de DPI e de autorizações. Tendo em conta que as normas industriais e as patentes de marcas registadas avançam frequentemente em paralelo, o CESE exorta a Comissão a mobilizar as suas forças para incitar a indústria e os organismos de normalização a agir rapidamente, de modo a impedir que as aplicações europeias de RFID se tornem demasiado dependentes da propriedade intelectual onerosa pertencente a agentes extracomunitários.

3.6.4

Em relação ao ambiente, os dispositivos RFID são totalmente abrangidos pela directiva relativa aos resíduos de equipamentos eléctricos e electrónicos (directiva REEE) e pela directiva relativa à restrição do uso de determinadas substâncias perigosas em equipamentos eléctricos e electrónicos (directiva RoHS). No âmbito da saúde, poderá colocar-se a questão dos campos electromagnéticos associados aos dispositivos RFID. Estes campos electromagnéticos são geralmente de fraca potência, pelo que a exposição dos trabalhadores e da população em geral deveria situar-se muito abaixo dos limiares em vigor. No entanto, no contexto do aumento geral das aplicações sem fios, a Comissão manter-se-á atenta ao quadro jurídico. O CESE aceita esta posição.

4.   Observações

4.1

Visto que a Comissão tenciona publicar as suas recomendações aos Estados-Membros no final do ano em curso, é razoável supor que aceitará a infra-estrutura de segurança e privacidade dos dados no estado em que se encontra actualmente. Isto sugere em particular que os organismos de protecção dos dados em cada Estado-Membro passarão a ser as autoridades responsáveis pelas questões de privacidade e protecção de dados da RFID.

4.2

Na sua Comunicação, a Comissão afirmou, nomeadamente, que pretende instaurar e consultar um novo grupo de partes interessadas. O CESE gostaria de apresentar o presente parecer a esse grupo.

4.3

As ameaças colocadas pela RFID à vida privada e às liberdades cívicas são graves:

a)

As etiquetas RFID podem ser incorporadas ou apostas a objectos e documentos, sem o conhecimento da pessoa que obtém estes artigos. Tendo em conta que as radiofrequências passam sem dificuldade e silenciosamente através dos tecidos, do plástico e de outros materiais, é possível ler etiquetas RFID cosidas no interior das peças de vestuário ou apostas a objectos transportados numa carteira de mão, num saco de compras, numa mala ou noutro tipo de objecto semelhante.

b)

O código electrónico do produto podia permitir dotar cada objecto existente à face da terra do seu próprio bilhete de identidade único. A utilização de números de identificação únicos poderá levar à criação de um sistema mundial de registo de objectos, através do qual cada objecto físico seria identificado e associado a um comprador ou ao seu proprietário no ponto de venda ou transferência.

c)

A difusão da RFID requer a criação de bases de dados gigantescas com informações contidas em etiquetas únicas. Estes registos poderão ser associados a dados de identificação pessoais, nomeadamente à medida que aumenta a memória dos computadores e as suas capacidades de processamento.

d)

As etiquetas podem ser lidas à distância, sem que estejam forçosamente à vista, por leitores que podem ser incorporados de maneira invisível em praticamente qualquer ambiente onde se reúnem pessoas. Os leitores podem ser colocados por baixo dos azulejos do chão, cosidos em tapetes, escondidos nos patamares das portas e dissimulados em estantes, de tal modo que é praticamente impossível que uma pessoa saiba se, e quando, está a ser controlada à distância.

e)

Se a identidade das pessoas estiver ligada a números de etiquetas RFID únicos, é possível localizar as pessoas ou estabelecer o seu perfil sem o seu conhecimento ou consentimento.

f)

E possível imaginar um mundo em que os leitores RFID formam uma rede mundial omnipresente. Uma rede deste género não teria necessidade de colocar leitores em todo o lado. O sistema londrino de pagamento de taxas de circulação pode localizar todos os veículos que entram no centro da cidade graças a um número relativamente reduzido de máquinas de filmar colocadas em pontos estratégicos. Seria possível construir do mesmo modo uma rede de leitores de etiquetas RFID colocados em pontos estratégicos, mas isto não deve ser autorizado.

4.4

No sétimo programa-quadro, a Comissão já deu indicações sobre as aplicações éticas da tecnologia que afectam a segurança dos dados e a vida privada (ver «Guia para os candidatos» a projectos de colaboração, p. 54) (3). A RFID é um excelente exemplo da relação evolutiva entre a tecnologia e o direito legal ou as expectativas do público em matéria de respeito da vida privada na recolha e na partilha de dados. Surgem problemas de respeito da vida privada a partir do momento em que são recolhidos e conservados dados, em suporte digital ou outro, que permitem uma identificação única de uma ou de várias pessoas. Os problemas de respeito da vida privada podem ter origem num controlo inadequado ou inexistente em matéria de divulgação destes dados. As fontes de dados mais correntes que são afectadas pelas questões de respeito da vida privada prendem-se com os domínios da saúde, da justiça penal, das finanças, da genética e da localização. A localização é o problema fundamental para a RFID.

4.5

Nas suas orientações (4) sobre a abordagem a adoptar em matéria de protecção dos dados e da vida privada, a Comissão estabeleceu oito princípios de boas práticas aplicáveis. Segundo esses princípios, os dados de carácter pessoal devem ser:

Processados lealmente e licitamente;

Processados para efeitos limitados;

Adequados, pertinentes e não excessivos;

Exactos;

Conservados unicamente enquanto são necessários;

Processados em conformidade com os direitos da pessoa a quem se aplicam;

Seguros;

Não transferidos para outros países sem protecção adequada.

Estas orientações estão perfeitamente adaptadas às questões de respeito da vida privada e de segurança dos dados associadas às aplicações RFID.

4.6

No entender do CESE, os princípios fundamentais das boas práticas são os seguintes:

Os utilizadores da RFID devem tornar públicas as suas políticas e práticas e não devem existir bases de dados secretas com informações pessoais.

As pessoas têm o direito de saber quando os artigos existentes no comércio a retalho contêm etiquetas ou leitores RFID. Qualquer leitura de etiquetas realizada num comércio a retalho deve ser transparente para todas as partes.

Os utilizadores de RFID devem informar o público sobre o objectivo da utilização das etiquetas e dos leitores. A recolha das informações deve limitar-se aos elementos necessários para atingir o objectivo que se pretende.

Os utilizadores de RFID são responsáveis pela aplicação da tecnologia e pelo seu funcionamento no respeito pelas leis e pelas orientações em matéria de segurança dos dados. São igualmente responsáveis pela segurança e pela integridade do sistema e das suas bases de dados.

4.7

Todavia, é discutível o modo como estes princípios devem ser levados à prática. Idealmente, qualquer empresa envolvida numa transacção comercial «da empresa para o consumidor», por exemplo, o comércio a retalho, a emissão de bilhetes, o controlo dos acessos ou os serviços de transporte deve dar aos clientes uma garantia de que estes princípios serão respeitados, o que constitui uma espécie de carta do cliente. Conceptualmente, essa carta podia incorporar todas as boas práticas de protecção de dados referidos no ponto 4.5. Além disso, o CESE propõe as seguintes orientações:

a)

Os comerciantes devem ser proibidos de pressionar ou de obrigar os clientes a aceitarem produtos com etiquetas activas ou passivas. Uma alternativa poderia consistir na aposição das etiquetas à embalagem ou na utilização de etiquetas electrónicas que podem ser retiradas, à semelhança das etiquetas de preços.

b)

Os consumidores deveriam ter a possibilidade de retirar ou de desactivar qualquer etiqueta colocada nos artigos comprados.

c)

Em princípio, a RFID não deve ser utilizada para localizar pessoas; esta prática é imprópria, seja ela através do vestuário, de mercadorias ou de outros artigos.

d)

A RFID nunca deverá ser utilizada de molde a suprimir ou a reduzir o anonimato.

e)

A autoridade responsável deve dar orientações claras de que as disposições das alíneas c) e d) apenas serão admissíveis em circunstâncias excepcionais e com a autorização oficial prévia da autoridade.

4.8

Poderão estar previstas certas excepções às orientações precedentes nos seguintes casos:

Se os particulares optarem por manter as etiquetas activas por uma questão de conveniência pessoal.

Se os particulares derem o seu consentimento para serem localizados em ambientes sensíveis como estabelecimentos e instituições públicas e privadas de elevada segurança.

Se os particulares optarem por utilizar aplicações que os localizem e identifiquem, do mesmo modo que já são localizados e identificados através da utilização de telefones portáteis, de cartões ATM, de moradas Internet, etc.

Qualquer excepção deste tipo deve ser notificada à autoridade responsável.

4.9

Uma classe de aplicações que poderiam beneficiar de uma excepção geral é a localização de pessoas ou de bens em situações transitórias. No sector dos transportes aéreos, as bagagens poderiam ser etiquetadas no momento do registo das bagagens para aumentar a segurança e o grau de certeza associados à sua manipulação; os passageiros também poderiam ser etiquetados para melhorar a pontualidade dos movimentos dos aviões e aumentar a rapidez dos processos de segurança. Outra aplicação poderia servir para localizar os pacientes após a sua admissão ao hospital para serem operados. Para que esta classe de aplicações seja aceitável, é essencial ter a certeza de que as etiquetas serão destruídas finda a experiência temporária da operação.

4.10

A RFID não é uma tecnologia madura, por isso ainda não compreendemos o seu pleno potencial. Por um lado, esta tecnologia poderá trazer benefícios por ora inconcebíveis à nossa civilização tecnológica, e por outro lado poderá representar a maior ameaça tecnológica que jamais existiu para a vida privada e a liberdade. O CESE considera que devem ser desenvolvidas aplicações RFID em conformidade com um rigoroso código de ética em matéria de vida privada, liberdade e segurança dos dados, mas que, tendo em conta as necessárias salvaguardas, deveria continuar o desenvolvimento das aplicações.

4.11

Em resumo, nos domínios em que são permitidas aplicações RFID, a aplicação deve ser totalmente transparente para todas as partes envolvidas. As aplicações destinadas a melhorar a manipulação das mercadorias são geralmente aceitáveis. Em geral, as aplicações que implicam a etiquetagem de pessoas só são aceitáveis em situações transitórias. As aplicações que associam pessoas a mercadorias podem ser aceitáveis para efeitos de comercialização. As aplicações que identificam as pessoas graças às mercadorias compradas são geralmente inaceitáveis. Além disso, algumas aplicações são impróprias numa sociedade livre e nunca deveriam ser autorizadas. A necessidade imperiosa de preservar a vida privada e o anonimato deve estar no cerne da recomendação apresentada pela Comissão aos Estados-Membros.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Directiva 95/46/CE relativa à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados.

(2)  Directiva 2002/58/CE relativa ao tratamento de dados pessoais e à protecção da privacidade no sector das comunicações electrónicas.

(3)  http://cordis.europa.eu/fp7/dc/index.cfm?fuseaction=UserSite.CooperationDetailsCallPage&call_id=11.

(4)  Directiva sobre protecção de dados (CE/95/46), art. 6.o.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/73


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões O GALILEO numa encruzilhada: implementação dos programas europeus de GNSS»

COM(2007) 261 final

(2007/C 256/14)

Em 16 de Maio de 2007, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Em 29 de Maio de 2007, a Mesa do Comité incumbiu a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), designar relator-geral Stéphane BUFFETAUT e adoptou por 95 votos a favor e 1 abstenção, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité Económico e Social Europeu congratula-se com o realismo e a coragem da Comissão que, na sua comunicação «O GALILEO numa encruzilhada: implementação dos programas europeus de GNSS», COM(2007) 261, soube avaliar as consequências do impasse nas negociações do contrato de concessão do sistema GALILEO.

1.2

Aprova plenamente que seja posto um ponto final nestas negociações e que se elabore uma estratégia alternativa.

1.3

Partilha com convicção a vontade do Conselho, do Parlamento Europeu e da Comissão de levar o projecto GALILEO a bom porto, mantendo a dimensão e definição iniciais.

1.4

Considera que o GALILEO constitui um projecto estratégico para a União Europeia, capaz de provar a capacidade da Europa de se mobilizar para uma fantástica aventura humana, científica, tecnológica e económica.

1.5

Tem para si que o abandono do projecto seria desastroso para a União Europeia.

1.6

Sublinha que o cenário proposto pela Comissão representa uma proposta interessante e realista para realizar o projecto e considera que o facto de confiar a responsabilidade e o financiamento da fase de desenvolvimento e aplicação aos poderes públicos corresponde a uma visão realista da situação.

1.7

Este cenário tem consequências financeiras importantes e exige um certo esforço por parte das finanças públicas. Por isso, o CESE insiste na necessidade de reflectir a priori sobre a possibilidade de uma utilização militar, nomeadamente defensiva, do sistema GALILEO, pelos Estados-Membros da União Europeia, bem como sobre a eventualidade de uma pequena contribuição para os custos dos terminais do sistema que ajudaria ao equilíbrio financeiro do projecto.

1.8

O CESE recomenda uma rápida definição das condições e forma de concessão do sistema EGNOS, complemento regional europeu do GPS americano, e uma boa coordenação da aplicação deste programa com a do GALILEO.

1.9

Aprova a decisão de atribuir à Agência Espacial Europeia a responsabilidade de agente de contratação pública e autoridade responsável pela concepção do projecto.

1.10

Alerta para a tentação de submeter o projecto GALILEO às restrições do princípio dito de «compensação justa», ainda que compreenda as preocupações pertinentes dos Estados-Membros em matéria de desenvolvimento científico, tecnológico e económico.

1.11

Recorda que as questões de administração e repartição das responsabilidades económicas e tecnológicas, quando mal geridas, podem revelar-se muito perigosas, como demonstrou a história recente da Airbus.

1.12

Insta os Estados-Membros a empenharem-se na realização bem sucedida do projecto GALILEO.

2.   O contexto da comunicação

2.1

Cinco meses depois da publicação do Livro Verde sobre aplicações de navegação por satélite, a Comissão publicou uma nova comunicação com o título alarmista «O GALILEO numa encruzilhada: implementação dos programas europeus de GNSS».

2.2

Título chocante provocado pelo impasse nas negociações do contrato de concessão. Com efeito, nenhum acordo com o consórcio industrial, candidato a esta concessão, foi considerado aceitável. Havia efectivamente divergências fundamentais quanto ao modelo económico do projecto.

2.3

Assim, a Comissão Europeia não teve alternativa senão assumir o fracasso, após um grande atraso na aplicação do GALILEO, e dar uma nova orientação ao projecto, económica e juridicamente.

2.4

Entretanto, o Conselho de Ministros dos Transportes de 22 de Março deste ano solicitara à Comissão que avaliasse a situação e apresentasse fórmulas alternativas para o contrato de concessão e para a rápida disponibilização do sistema de navegação EGNOS, complemento regional europeu do GPS americano, como precursor do GALILEO.

2.5

O Parlamento Europeu reafirmou o seu apoio ao projecto GALILEO mas manifestou-se alarmado com os repetidos atrasos no desenvolvimento do projecto e solicitou à Comissão que apresentasse propostas para resolver a situação.

2.6

A comunicação da Comissão responde a esta dupla solicitação das instituições comunitárias com poder de decisão.

3.   O conteúdo da comunicação

3.1

O primeiro ponto importante é a Comissão convidar o Conselho e o Parlamento Europeu a tomarem nota do fracasso da actual negociação do contrato de concessão e, em consequência, a terminarem as actuais negociações da PPP. Na verdade, perante o impasse nas negociações, não há outra alternativa.

3.2

Todavia, convida igualmente o Conselho e o Parlamento Europeu a reafirmarem o seu empenho na criação de um sistema autónomo de navegação por satélite e a apoiarem a continuação do programa GALILEO. Assim, o fracasso das negociações em curso do contrato de concessão não deverá significar o abandono do GALILEO, pelo contrário, a Comissão gostaria que o carácter estratégico do projecto fosse reafirmado pela União Europeia, bem como a sua importância ao nível económico.

3.3

O programa GALILEO deve ser prosseguido, pela Comissão, num regime idêntico ao regime actual. As características técnicas devem ser as mesmas, designadamente uma constelação de 30 satélites oferecendo cinco serviços diferentes com uma qualidade de sinal excelente.

3.4

Não se deve, portanto, pôr a questão de aceitar um GALILEO mais modesto.

3.5

A Comissão propõe dois cenários alternativos:

a.

Cenário A): o sector público financia e procede à aquisição por concurso de um sistema operacional com desempenhos limitados. Esta infra-estrutura de base é composta por 18 satélites com o respectivo segmento terrestre. Permite uma precisão do posicionamento e a cobertura geográfica suficientes para introduzir serviços no mercado, mas todavia sem capitalização do valor acrescentado técnico do GALILEO.

Os restantes 12 satélites serão colocados pelo sector privado no âmbito do regime de concessão PPP (parceria público-privado).

b.

Cenário B): o sector público financia e procede à aquisição por concurso de todo o sistema operacional com desempenho total. Esta infra-estrutura é composta por 30 satélites com o respectivo segmento terrestre. Permite a oferta de todos os serviços GALILEO a todos os utilizadores visados e promove a confiança do futuro concessionário na solidez da concepção. A PPP, sob a forma de contrato de concessão de serviço, cobre as operações e as actividades de exploração e da manutenção da constelação dos 30 satélites. A plena aplicação pode ser conseguida até ao final de 2012 e o contrato de concessão PPP abrangerá o período de 2010 a 2030.

3.6

A Comissão preconiza a adopção do segundo cenário em duas etapas:

arrancar com a aplicação imediata do EGNOS, através de uma concessão específica, como um precursor do GALILEO até ao início de 2008. A capacidade operacional, após a aplicação da primeira constelação Galileo completa, deve estar completa até final de 2012;

paralelamente, negociar e criar uma PPP, sob a forma de uma concessão, para a fase subsequente de exploração do EGNOS e do GALILEO de 2010-2030.

3.7

A Comissão gostaria que o Conselho e o Parlamento apoiassem estes dois programas com base nos seguintes princípios:

tornar o sistema EGNOS operacional a partir de 2008;

decidir que os programas europeus de GNSS são definidos, acordados, geridos e acompanhados a nível da União Europeia, no interesse de todos os seus Estados-Membros;

reconhecer o carácter estratégico do GALILEO;

seleccionar a Agência Espacial Europeia como agente de contratação pública e autoridade responsável pela concepção do sistema em nome da União Europeia e actuando sob a autoridade e segundo as regras da União Europeia;

introduzir uma concorrência leal no programa, sempre que possível;

reforçar e reestruturar a administração pública dos programas confiando a responsabilidade política e a liderança à Comissão Europeia;

aumentar a confiança dos investidores.

3.8

Um programa destes exige a mobilização de recursos financeiros importantes, a disponibilização dos montantes previstos nas perspectivas financeiras para o programa actualmente proposto, mas também da garantia de financiamento suplementar.

3.9

No quadro financeiro 2007-2013, tratar-se-ia de disponibilizar 2,4 mil milhões de euros para prosseguir o regime actual, associados a acções de atenuação dos riscos. Se considerarmos a aquisição da primeira constelação completa (30 satélites), seguida da constituição de uma PPP, para a fase de exploração de 2010 a 2013, seria necessário mobilizar 3,4 mil milhões de euros.

4.   Observações na generalidade

4.1

É positivo que a Comissão tenha tomado nota do impasse na actual negociação da concessão e concluído que é necessário terminá-la. Qualquer outra atitude teria por consequência apenas prolongar uma situação de mal-estar e atrasar ainda mais a aplicação do programa.

4.2

Sobre este ponto, o Conselho chegou à mesma conclusão que a Comissão e decidiu terminar as negociações para as reabrir noutra base. Reafirmou igualmente o carácter prioritário do projecto GALILEO, o que mereceu o aplauso do CESE.

4.3

Um recente estudo do Eurobarómetro (Maio/Junho de 2007) sobre o programa GALILEO, encomendado pela DG TREN, assinala que 80 % da população da União Europeia defende a ideia de um sistema de navegação por satélite independente e 63 % dessa população seria favorável a um financiamento complementar para concretizar o projecto. Todavia, a apreciação do impacto de um abandono do GALILEO na imagem da União Europeia é bastante diversificada. 44 % das pessoas inquiridas consideram que o impacto seria nefasto e 41 % que não teria qualquer impacto.

4.4

O CESE congratula-se com o apoio do Conselho e da opinião pública ao projecto GALILEO, mas considera que um abandono do projecto teria efeitos desastrosos para a imagem da União Europeia e para a confiança depositada nos projectos europeus. Representaria a incapacidade da União Europeia de levar a bom porto um projecto científico e tecnológico de futuro, que mobilizaria o melhor das nossas capacidades de investigação, inovação e tecnologia, abrindo oportunidades em mercados importantes.

4.5

Dito isto, a comunicação deixa questões em aberto. A tónica é fortemente colocada no sistema EGNOS e na necessidade de o explorar o mais rapidamente possível, mas a Comissão adia a questão de saber quem o vai explorar. Limita-se a indicar que haverá uma concessão, mas não dá qualquer indicação sobre a forma da mesma e sobre os eventuais parceiros (empresa, consórcio dos organismos ou sociedades encarregadas da gestão do tráfego aéreo, etc.). Será um operador público ou privado? Quais os procedimentos de aplicação e respectivos prazos?

4.6

Os sistemas de aumento que permitem melhorar a qualidade de serviço de GPS são regionais (além de EGNOS, há um na América do Norte, o WAAS, e outro na Índia). Quais as conexões entre estes sistemas regionais e de que acordos internacionais necessitam?

4.7

No que se refere aos problemas com o consórcio candidato à concessão Galileo, há que ter atenção a não voltar a deparar com os mesmos problemas nos novos cenários propostos. Com efeito, por trás dos membros do consórcio encontravam-se muitas vezes as directivas nacionais. Muitas empresas envolvidas dependem na verdade de concurso público ou são empresas públicas e seria ingénuo pensar que se tratava de um consórcio «privado» clássico. Esta situação pode repetir-se nos novos cenários. Nesta perspectiva, dever-se-á organizar uma real e rigorosa concorrência.

4.8

O CESE congratula-se por o regime geral do projecto não ter mudado e, nomeadamente, a gama de serviços propostos. A proposta da Comissão é a mais sensata. Mudar a economia do projecto teria implicado atrasos suplementares, custos financeiros acrescidos e riscos desnecessários.

4.9

O Comité gostaria igualmente de sublinhar que a Comissão assinalou justamente que, «sem pôr em causa o carácter civil do sistema, há que admitir que os utilizadores militares podem gerar receitas substanciais». Consciente do carácter sensível desta questão, tem para si que os debates sobre a matéria devem ser prosseguidos entre os Estados-Membros da União Europeia. Considera que estes devem poder decidir livremente utilizar o sistema governamental de acesso limitado para fins militares defensivos se assim o desejarem, mediante financiamento adequado.

4.10

A questão do financiamento do projecto é essencial e, por isso, o CESE pergunta-se se não seria de prever uma contribuição muito reduzida para a venda dos terminais que contribuiria para o financiamento do GALILEO.

4.11

Embora o CESE aprove a decisão de atribuir à Agência Espacial Europeia a responsabilidade de agente de contratação pública e autoridade responsável pela concepção do projecto, sublinha que tal não deve significar submeter o projecto GALILEO à chamada regra de compensação justa, ainda que tenha perfeita consciência de que os acordos entre os Estados no cenário anterior eram o resultado de subtis equilíbrios económicos entre os Estados-Membros. Salienta a necessidade de não pôr em perigo um projecto tão fundamental como emblemático para a União Europeia, por receio das consequências económicas do projecto para os principais Estados-Membros participantes. Recorda que as dificuldades enfrentadas actualmente pela EADS nasceram deste género de apreensões. A vontade de equilíbrio económico entre parceiros é legítima mas, se implicar uma paralisia efectiva ou atrasos na aplicação dos projectos, é o conjunto deste projecto europeu emblemático, com as suas dimensões industrial e científica, bem como as suas incidências económicas, que é posto em causa.

4.12

Por último, o CESE pressupõe que foi a vontade da Comissão de preservar os princípios de administração comunitária que a levou a reivindicar insistentemente a gestão política do projecto, de uma forma talvez pouco diplomática e subestimando o papel importante desempenhado pela Agência Espacial Europeia.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/76


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Relatório intercalar bienal sobre a estratégia da UE para o desenvolvimento sustentável»

(2007/C 256/15)

A Comissão Europeia solicitou ao Presidente do Comité Económico e Social Europeu, Dimitris DIMITRIADIS, por ofício de 11 de Dezembro de 2006, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, a elaboração de um parecer sobre o tema: «Relatório intercalar bienal sobre a estratégia da UE para o desenvolvimento sustentável».

Foi incumbido da preparação dos correspondentes trabalhos o Observatório do Desenvolvimento Sustentável da Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, que emitiu parecer em 8 de Junho de 2007, sendo relator Lutz RIBBE.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 70 votos a favor, 21 contra e 10 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Resumo das conclusões e das recomendações do Comité

1.1

O Comité saúda o impulso dado à discussão pela «nova» estratégia de desenvolvimento sustentável adoptada no Conselho Europeu de Junho de 2006. A obrigação de apresentar bianualmente relatórios intercalares, sobretudo, contribuirá para informar melhor a sociedade e os responsáveis políticos sobre as mudanças positivas e sobre eventuais problemas de aplicação.

1.2

O CESE apoiou já no essencial, em anteriores pareceres, os documentos apresentados pela Comissão, pelo Conselho e pelo Conselho Europeu, mas colocou igualmente questões críticas e avançou propostas, algumas de largo alcance, que não tinham sido feitas pelas outras instituições. Desta feita, o CESE critica mais uma vez a falta de objectivos concretos nos domínios considerados prioritários, e sobretudo a falta de clareza quanto aos instrumentos a empregar.

1.3

O CESE aplaude em particular os objectivos centrais da nova estratégia e os princípios orientadores desta política e exorta a Comissão, o Conselho e o Parlamento Europeu a empenhar-se realmente na sua consecução.

1.4

O Comité espera que o primeiro relatório intercalar, a publicar em Setembro de 2007, informações mais precisas sobre:

os instrumentos económicos que a Comissão conta utilizar «para promover a transparência do mercado e preços que reflictam os custos económicos, sociais e ambientais reais dos produtos e serviços (acertar os preços)»,

de que forma será concretizada na prática a recomendação do Conselho de «estudar novas medidas fiscais que incidam menos no trabalho e mais no consumo dos recursos e da energia e/ou na poluição, a fim de contribuir para os objectivos da UE de aumentar o emprego e de reduzir os impactos ambientais negativos, de um modo que garanta uma boa relação de custo/eficácia»,

o calendário concreto previsto pela Comissão para realizar o objectivo definido pelo Conselho de suprimir gradualmente as subvenções com efeitos negativos sobre o ambiente; e se será seguida a recomendação do CESE de transferir pelo menos parte dessas subvenções para um fundo comunitário da sustentabilidade,

a forma como a Comissão tenciona evitar as contradições ainda aparentes entre aspirações e realidade na política de sustentabilidade, e sobretudo no sector dos transportes (cf. pontos 4.15 e 4.16),

o que sucederá aos Estados-Membros que não tenham apresentado uma estratégia nacional de sustentabilidade válida.

1.5

É compreensível, à luz das mudanças climáticas, cada vez mais marcadas, que temas como o clima e a energia recebam prioridade. Contudo, o CESE considera que

essa prioridade, embora justificada, não deve levar a que outros elementos essenciais da estratégia sejam relegados para segundo plano, e

apesar da urgência da intervenção política todas as decisões devem ser tomadas de acordo com os princípios directores da nova estratégia, ou seja, com o envolvimento dos cidadãos, das empresas e dos parceiros sociais e com base nos melhores conhecimentos disponíveis. A decisão no quadro do «pacote energético» de passar a produzir 10 %, em vez dos 5,75 % inicialmente acordados, dos combustíveis europeus a partir de biomassa não obedece a este princípio. O CESE receia que desta situação possam resultar graves problemas, que se propõe examinar mais detidamente num parecer específico sobre o relatório intercalar da Comissão (1).

2.   Elementos principais e antecedentes do parecer

2.1

No Conselho Europeu de Gotemburgo de Junho de 2001 foi adoptada uma Estratégia da UE para o Desenvolvimento Sustentável (EDS). Em Dezembro de 2005, a Comissão apresentou uma comunicação ao Parlamento Europeu e ao Conselho intitulada Revisão da estratégia de desenvolvimento sustentávelPlano de acção  (2), que anunciava novas medidas concretas para os próximos anos.

2.2

Nos últimos anos, o Comité Económico e Social Europeu emitiu diversos pareceres sobre a estratégia para o desenvolvimento sustentável, salientando sempre a importância do desenvolvimento sustentável para as sociedades modernas. No essencial, o Comité apoiou as propostas da Comissão e as declarações do Conselho, de acordo com as quais a estratégia para o desenvolvimento sustentável é a principal prioridade da União, a cujos objectivos a própria Estratégia de Lisboa deve conformar-se.

2.3

Contudo, nos seus pareceres sobre desenvolvimento sustentável o CESE formulou igualmente críticas e questões construtivas a que o Conselho e a Comissão ainda só responderam parcialmente.

2.4

No seu mais recente parecer sobre o tema, o CESE examinou nomeadamente a comunicação da Comissão de Dezembro de 2005. O Comité deplorou então que o plano de acção descrito pela Comissão como «ambicioso» não seguisse nem a recomendação do CESE de 2004 nem a promessa que a própria Comissão fizera em Junho de 2005. Uma mais vez, a Comissão não definiu nesse plano de acção quaisquer objectivos claros a alcançar no âmbito da estratégia de desenvolvimento sustentável.

2.4.1

O CESE recordou que uma estratégia deve descrever o percurso a seguir para alcançar determinados objectivos. A ausência de objectivos implica necessariamente uma selecção deficiente de instrumentos: quando não se sabe exactamente onde se quer ir, também não é possível determinar a melhor maneira de lá chegar. A comunicação deixava por isso, no entender do Comité, mais questões em aberto do que aquelas a que permitia responder.

2.4.2

Quando não são propostos nem objectivos nem instrumentos concretos ao público em geral e aos parceiros sociais, quando «há uma grande incerteza quanto ao significado concreto do conceito de desenvolvimento sustentável e ao modo como o desenvolvimento futuro se diferenciará da actual situação», não surpreende que «sectores potencialmente afectados manifestem receios e oposição», como escreveu o CESE no seu parecer de 2004 (3). O CESE deplora que nos últimos três anos pouco tenha sido feito para esclarecer estes aspectos, o que põe em causa a credibilidade das políticas de sustentabilidade.

2.5

A Presidência Austríaca do primeiro semestre de 2006 chegou aparentemente à mesma conclusão. Foi por isso que deixou a comunicação da Comissão de 2005 mais ou menos de lado e elaborou um novo documento que apresentou aos chefes de Estado e de Governo no Conselho de Junho de 2006. Este documento foi aí adoptado como a «nova estratégia» (4).

2.6

Esta nova estratégia confere um papel de destaque ao CESE, porventura devido ao seu anterior empenho na matéria. De acordo com o ponto 39, o Comité «deverá desempenhar um papel activo na criação de apropriação, designadamente actuando como catalizador para estimular o debate a nível da UE» e «preparar o seu contributo para o relatório intercalar bienal da Comissão».

2.7

São estas missões que o presente parecer procura desempenhar. O Comité começará por fazer algumas observações na generalidade sobre a nova estratégia (Capítulo 3), a que se seguirão observações mais específicas sobre os temas da nova estratégia (Capítulo 4) e propostas quanto ao conteúdo do relatório intercalar a publicar até Setembro de 2007 (Capítulo 5).

3.   Observações na generalidade sobre a «nova» estratégia

3.1

Quando a mais importante instituição política da UE analisa e renova uma das suas políticas, como fez o Conselho com a estratégia para o desenvolvimento sustentável, a sociedade civil tem o direito de esperar que essa instituição explique também:

O porquê de proceder a uma análise dessa política,

Quais os problemas detectados pela análise,

O que teria de ser alterado concretamente no futuro, que aspectos seriam alterados e que outros seriam acrescentados, e

De que forma se poderá integrar o objectivo da sustentabilidade nos trabalhos de todas as direcções-gerais.

3.2

Contudo, o documento em apreço nada refere sobre uma tal análise e o respectivo resultado. É apenas apresentada uma «nova» estratégia.

3.3

A Estratégia de Gotemburgo definiu, com base numa comunicação da Comissão, quatro temas prioritários:

as alterações climáticas,

os transportes,

a saúde pública e

os recursos naturais.

3.4

Dois outros domínios propostos pela Comissão (combate à pobreza e envelhecimento da população) não foram incluídos na Estratégia de Gotemburgo, sem que o Conselho tenha apresentado quaisquer razões para a omissão. No seu parecer de Maio de 2000, o CESE criticou a não inclusão dos dois domínios citados (5). Outras críticas foram dirigidas aos factos de a estratégia ter sido publicada em mais do que um documento, de não ter sido mais bem divulgada junto do público e de a dimensão externa ter sido tratada separadamente num outro documento.

3.5

A nova estratégia descreve apenas sete desafios centrais, para os quais define objectivos e tarefas concretos. Esses desafios são:

alterações climáticas e energia limpa,

transportes sustentáveis,

consumo e produção sustentáveis,

conservação e gestão dos recursos naturais,

saúde pública,

inclusão social, demografia e migração, e

pobreza global e desafios do desenvolvimento sustentável.

3.6

O confronto da antiga estratégia com a nova revela que esta última não trouxe, no essencial, grandes novidades, tendo-se limitado a acrescentar aos temas da Estratégia de Gotemburgo os domínios já citados na comunicação da Comissão de 2001 (combate à pobreza e envelhecimento da população) e a questão do «desenvolvimento e produção sustentáveis».

3.7

O CESE compreende esta repetição, dado que quer as questões adoptadas em 2001 quer as que foram rejeitadas pelo Conselho continuam por resolver e a exigir uma intervenção política urgente. Mas é justamente à luz da ausência de intervenção política até à data que se torna particularmente interessante a questão de saber em que medida a nova estratégia difere da anterior e de como avaliar o êxito desta até agora. Esta questão é importante sobretudo para prevenir a acusação de que a apresentação de novos documentos só complica, em vez de acelerar, o processo político. O CESE já chamou várias vezes a atenção para o facto de que a eficácia da política da sustentabilidade não pode medir-se pela quantidade de documentos que produz, mas sim pela qualidade das medidas propostas.

3.8

A nova estratégia baseia-se numa lista de princípios para o desenvolvimento sustentável, os quais deverão ser convertidos em objectivos e medidas para cada um dos sete domínios prioritários. Estão igualmente previstas medidas para temas transversais, assim como processos de transposição e acompanhamento dos progressos realizados. Neste aspecto, a nova estratégia representa uma melhoria indiscutível sobre a precedente.

3.9

Os primeiros indícios revelam que as secções da estratégia relacionadas com as mudanças climáticas e com a energia são as que mais atenção merecem actualmente. Este destaque é justificado, mas não deve levar a que outros elementos essenciais da estratégia sejam negligenciados. A presente revisão da execução da estratégia oferece uma excelente ocasião de analisar esta questão e de conferir a todos os domínios centrais da estratégia uma maior projecção e impulsão. O Comité salienta mais uma vez que o desenvolvimento sustentável requer uma estratégia integrada e abrangente, e não uma lista de opções a escolher livremente. Os objectivos e as medidas propostos relativamente às mudanças climáticas são claros, precisos e suficientemente concretos para encorajar a adopção de medidas efectivas. Mas para a maioria dos restantes temas esses objectivos são demasiado vagos e não prevêem prazos concretos que permitam estimular alterações significativas.

3.10

Âmbito da estratégia. Os sete domínios temáticos da nova estratégia representam uma melhoria relativamente aos quatro temas insuficientes da anterior estratégia. Todavia, continuam a estar ausentes alguns domínios importantes. O CESE apelou já no seu parecer exploratório de Abril de 2004 (6) a que fosse consagrado um capítulo específico à agricultura. O Comité reitera agora esse apelo, por não estar seguro de que uma agricultura sustentável conforme ao «modelo agrícola europeu» seja possível nas condições do mercado mundial. As reservas do CESE quanto ao futuro da PAC foram reforçadas pela redução significativa das dotações financeiras do segundo pilar da PAC, particularmente importante para uma agricultura sustentável, acordada pelos chefes de Estado e de Governo para o período de programação 2007-2013. O CESE criticou repetidamente esta redução e questiona-se agora como será possível conciliar tal decisão com uma política de desenvolvimento sustentável. A inclusão na nova estratégia de um capítulo sobre «Recursos naturais» não permite um tratamento adequado de toda a problemática da agricultura.

3.11

Saber se uma política agrícola europeia orientada para a concorrência num mercado mundial aberto pode ser sustentável implica obrigatoriamente uma definição, a um nível mais geral, das regras de produção e comércio. A OMC é uma organização baseada em acordos destinados a promover o comércio livre mundial. Um comércio liberalizado não tem, porém, de ser necessariamente sustentável, como o CESE demonstrou já várias vezes. Infelizmente, a nova estratégia nada diz sobre como conciliar o comércio livre com os princípios do desenvolvimento sustentável. Trata-se de uma omissão importante! O CESE lastima ter de salientar mais uma vez que os responsáveis políticos da UE ainda não responderam a esta questão, que lhes foi lançada há já mais de três anos (7), embora a UE se tenha empenhado nos últimos anos em impor novas regras no comércio global e nas operações do FMI e do Banco Mundial.

3.11.1

A dimensão global é, obviamente, fundamental para uma estratégia europeia de desenvolvimento sustentável, dado que a economia comunitária também depende da evolução das condições fora da UE. Qualquer estratégia comunitária deve, por isso, ser compatível com o objectivo do desenvolvimento sustentável e contribuir para o mesmo. A nova estratégia reconhece esta necessidade ao referir-se aos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, ao Protocolo de Quioto, ao Programa das Nações Unidas para o Ambiente (UNEP) e a outras iniciativas globais. A estratégia também reconhece a urgência de colocar a globalização ao serviço do desenvolvimento sustentável. Salienta que a Comissão está a preparar um plano de acção para o consumo e a produção sustentáveis em 2007, mas o CESE considera que é necessária uma análise mais aprofundada que reflicta o problema das desigualdades globais. A marcha para o crescimento das nações em vias de industrialização, que procuram, com razão, níveis de vida mais elevados, terá certamente um efeito catastrófico para os recursos e os sistemas globais. A estratégia deve pois ter em conta os limites da «capacidade» do planeta, já extenuada por 200 anos de uma industrialização desigualmente distribuída.

3.11.2

O CESE sugere que a Comissão publique uma comunicação sobre as soluções de gestão e atribuição dos recursos universais, centrando-se numa estratégia a longo prazo destinada a estabilizar as concentrações de gases atmosféricos com efeito de estufa a níveis «seguros» através da partilha internacional de um orçamento para as emissões globais que diminua gradualmente. Após um período determinado durante o qual as emissões per capita seriam harmonizadas, os direitos de emissão tornar-se-iam idênticos. Esta estratégia, já largamente debatida e conhecida como «contracção e convergência», tem em consideração os efeitos tanto do crescimento demográfico como da capacidade industrial, da globalização e dos apelos a uma distribuição mais equitativa e pragmática da atmosfera planetária enquanto recurso universal.

3.12

Clareza dos objectivos. O desenvolvimento sustentável é globalmente aceite como um dos objectivos centrais da UE. Para que a estratégia de desenvolvimento sustentável possa ter um impacto real, ela terá, contudo, de ser executada em função de objectivos e medidas quantificáveis e sujeitos a um controlo severo. A nova estratégia prevê, com efeito, um grande número de medidas e objectivos, mas estes não são confrontados com uma análise quantitativa de dados e tendências ou com uma análise qualitativa das questões e dos problemas centrais. Assim, resulta muitas vezes pouco claro por que foram seleccionados tais ou tais objectivos ou medidas, de que forma serão avaliados os progressos e em que medida os mesmos podem ser encarados como contribuição para a sustentabilidade em geral. A revisão em apreço deveria aproveitar a oportunidade para melhorar e esclarecer todos estes aspectos, para que de futuro seja realmente possível avaliar sistematicamente os resultados.

3.13

Após estas observações críticas, o CESE gostaria de salientar igualmente os aspectos positivos. A «nova estratégia» apresenta, se comparada com o «plano de acção» da Comissão publicado em Dezembro de 2005, muitos mais objectivos concretos, nomeadamente no que respeita à limitação das emissões poluentes ou à eficiência energética. São, porém, sobretudo as conclusões do Conselho Europeu de Março de 2007 em matéria de política climática e energética que permitem discernir melhor alguns dos objectivos.

3.14

Instrumentos de execução da estratégia. Contudo, mesmo na nova estratégia (como também nas conclusões do Conselho de Março de 2007) não é suficientemente claro com que instrumentos se pretende alcançar esses objectivos mais concretos nem que tipo de estratégia se tenciona lançar. É efectivamente possível ler, nas entrelinhas, pelo menos alusões a possíveis instrumentos; mas essas alusões permanecem ainda demasiado vagas no entender do Comité, e o relatório intercalar deveria ser aproveitado para apresentar dados mais concretos e um pouco mais de orientação (ver ponto 5).

4.   Observações na especialidade sobre a «nova» estratégia

4.1

A nova estratégia salienta que a dinâmica da Estratégia de Lisboa deve impreterivelmente ser integrada nos objectivos mais vastos do desenvolvimento sustentável. Mas não apresenta qualquer fundamentação séria sobre a forma como os modelos de crescimento e desenvolvimento devem ser alterados a fim de tornar o mundo mais sustentável. As consequências do desenvolvimento não sustentável são cada vez mais visíveis. Manifestam-se sobretudo nos efeitos por vezes fatais das mudanças climáticas, mas também na diminuição continuada da biodiversidade, no fosso sempre crescente entre ricos e pobres, na exaustão inexorável das matérias-primas, etc.

4.2

Essas consequências podem ter repercussões económicas consideráveis. Em certas regiões, a actual base económica pode ruir inteiramente. Na Suíça, por exemplo, os bancos deixaram de autorizar empréstimos a investidores nas infra-estruturas de desportos de Inverno quando o local se encontre a menos de 1 500 m acima do nível do mar. E é cada vez maior a incerteza sobre as consequências para a agricultura e para o turismo na orla mediterrânica se o clima se tornar ainda mais quente e seco.

4.3

As despesas públicas na UE com a protecção das linhas costeiras contra a erosão e a subida das águas elevam-se a cerca de 3,2 mil milhões de euros, contra 2,5 mil milhões em 1986. De acordo com estudos, a erosão das costas implicará custos anuais de cerca de 5,4 mil milhões de euros entre 1990 e 2020. Mesmo este elevado montante só poderá, contudo, atenuar o impacto negativo.

4.4

Esta situação é inevitável num sistema económico em que os custos com os cuidados de saúde e com os danos ambientais (por exemplo, os milhares de milhões de euros em prejuízos provocados pela tempestade Kyrill no início de 2007) são encarados como globalmente positivos para a economia, dado que contribuem para engrossar o PIB. O CESE considera altamente positivo que o Conselho, na nova estratégia, tenha finalmente começado (ainda que só marginalmente) a deter-se sobre esta contradição. O Conselho tem toda a razão ao afirmar, no ponto 20 da sua nova estratégia, que «o sistema fundamental de contabilidade dos rendimentos nacionais poderá ser alargado para integrar, designadamente, os conceitos de existências e de fluxos e o trabalho não relacionado com o mercado, e ser desenvolvido através de contas satélite incluindo, por exemplo, despesas em matéria ambiental, fluxos de material, e tendo em conta as melhores práticas internacionais».

4.5

A este respeito, o CESE recorda o seu parecer de 2004, em que considerava «oportuno analisar, no âmbito da estratégia em favor do desenvolvimento sustentável, questões que têm vindo a ser consideradas quase como tabu. Uma delas é o crescimento económico permanente como objectivo primário e aspecto central de todas as políticas»  (8). Esse crescimento não pode limitar-se ao crescimento meramente quantitativo, devendo antes obedecer a critérios qualitativos de sustentabilidade. A Comissão e o Conselho deveriam aproveitar o relatório intercalar para

Esclarecerem de uma vez por todas se o indicador «Produto Interno Bruto» enquanto medida do bem-estar social e da prosperidade económica não é uma das causas da oposição entre a sustentabilidade e a Estratégia de Lisboa, e

Proporem de forma concreta um novo «indicador de bem-estar» mais adequado aos princípios da sustentabilidade.

4.6

Muitos exemplos demonstram que os progressos económicos e ambientais não devem levar obrigatoriamente a um aumento do PIB, mas sim à criação de emprego e à preservação do meio ambiente. Quando as lâmpadas ecológicas substituírem as lâmpadas eléctricas tradicionais, menos eficientes, isso permitirá poupar energia sem afectar o PIB, mesmo tendo em conta os investimentos necessários. O CESE apela a ainda maiores esforços neste domínio, como também no isolamento de edifícios, na concepção de motores mais económicos, de aparelhos mais ecológicos, etc.

4.7

O Comité aplaude, por conseguinte, a intenção da Comissão de procurar alternativas ao PIB como medida do bem-estar social e manifesta o seu grande interesse por esse trabalho.

4.8

Como o CESE salientou já diversas vezes, o desenvolvimento sustentável tem um preço. Haverá que proceder a profundas reformas estruturais a nível macroeconómico, reformas essas que acabarão por se impor quer se queira quer não. Os responsáveis políticos devem, pois, procurar introduzir progressivamente as reformas necessárias, a fim de evitar uma transição brusca e de atenuar as suas consequências.

4.9

No que respeita à resolução destes problemas, o Comité recorda que, a nível microeconómico, os responsáveis políticos não são os únicos responsáveis pela criação das condições adequadas. As empresas e todos os cidadãos devem igualmente contribuir. Há já vários anos que a Comissão tem salientado, com toda a razão, a responsabilidade social das empresas, que abrange aspectos económicos, sociais e ambientais através do diálogo social.

4.10

O Conselho declara que a nova estratégia «constitui o quadro geral em que os objectivos económicos, sociais e ambientais podem reforçar-se mutuamente»  (9). O Conselho considera ainda que todas as decisões políticas da UE devem ser precedidas por uma avaliação «equilibrada» dos aspectos sociais, ambientais e económicos do desenvolvimento sustentável que tenha em conta «a sua dimensão externa e os custos da inacção». Contudo, assim que se fala de meios financeiros deixa de se evocar o diálogo social em favor de um diálogo institucionalizado entre a Comissão e os Estados-Membros, por um lado, e entre o mundo empresarial, por outro, a fim de definir objectivos de rendimento para produtos e processos.

4.11

O CESE frisa a importância de debater com todos os sectores sociais a questão das medidas políticas a tomar e de ter sempre presentes os objectivos centrais e os princípios orientadores da nova estratégia. Só assim se poderá evitar uma evolução negativa, obter a aceitação do público e impor a sustentabilidade como princípio de acção.

4.11.1

Um exemplo de como não se deve proceder a nível técnico são as decisões do Conselho relativas à utilização de biocombustíveis a 10 %, em vez dos 5,75 % anteriormente acordados, no âmbito do pacote energético. O CESE apoia sem reservas o objectivo do Conselho de reduzir de 20 % a 30 % (consoante as concessões dos parceiros extra-europeus) as emissões de CO2 até 2020 e o objectivo mais geral de reduzir essas emissões entre 60 % e 80 % até 2050. A promoção dos biocombustíveis deve não só servir esse objectivo mas também coadunar-se com os outros princípios directores.

4.11.2

Assim, há que ter em conta não só o impacto energético como também as repercussões naturais e ambientais e os efeitos de uma eventual concorrência entre superfícies agrícolas (em cada país e a nível global). O debate actualmente em curso sobre a utilização extremamente elevada de combustíveis fósseis para a produção de biocombustíveis alegadamente neutros em matéria de CO2  (10), sobre o verdadeiro impacto climático dos biocombustíveis (11) e sobre os seus efeitos para a produção de géneros alimentares (12) revela que as questões da sustentabilidade estão ainda longe de estar inteiramente esclarecidas. O CESE dedicará um parecer específico a este tema de extrema importância.

4.12

O Comité congratula-se pelo facto de a apresentação do Relatório Stern, entre outros, ter tornado mais objectivo o debate sobre as políticas económicas e sobre o impacto financeiro da sustentabilidade. Como é sabido, o Relatório Stern afirma que basta 1 % do PIB para atenuar grandemente as mudanças climáticas. Um estudo da empresa Vattenfall, apresentado na cimeira mundial de Davos, afirma mesmo que esse custo poderia ser ainda inferior. Ainda que 1 % do PIB, expresso numericamente, represente uma soma colossal, há que compará-lo com outros domínios políticos igualmente custosos. A realização dos chamados projectos TINA (13) no sector dos transportes implica, por exemplo, investimentos anuais de cerca de 1,5 % do PIB até 2015 apenas para os corredores de transportes já definidos, ou seja, mais do que o montante calculado por Stern para conter as mudanças climáticas.

4.13

Contudo, como se disse já, não se trata apenas de dinheiro e sim muito mais de reformas estruturais. A «nova estratégia» requer, nomeadamente, que se «dissocie o crescimento económico da procura de transporte com o objectivo de reduzir os impactos ambientais». O Comité aplaude esta posição. Isso significa igualmente, porém, que a chamada produção «just in time», através da qual as empresas abandonam as práticas de armazenagem e os custos a ela associados e transformam os seus camiões ou comboios de mercadorias em armazéns ambulantes, deve ser submetida a uma análise mais crítica.

4.14

O CESE deplora, porém, a discrepância que logo surge entre as ambições e a realidade. Com efeito, apenas 13 dias após a adopção pelo Conselho deste objectivo operacional, a Comissão Europeia apresentou a Revisão intercalar do Livro Branco da Comissão de 2001 sobre os Transportes  (14). Essa revisão prevê, para o período 2000-2020, um provável aumento de 52 % do PIB, de 55 % do trânsito rodoviário e de 108 % dos transportes aéreos. A desejada dissociação regista-se principalmente no caso do transporte ferroviário de mercadorias (+ 19 %) e de passageiros (+ 13 %).

4.15

O CESE confessa-se surpreso pelo facto de não haver qualquer coordenação aparente entre a elaboração da revisão intercalar do Livro Branco sobre os Transportes e a estratégia para a sustentabilidade, visto que em momento algum se faz referência à contradição manifesta entre os objectivos políticos e a realidade. No sector dos transportes, a Comissão parece ter praticamente abandonado o primeiro objectivo específico, a saber, dissociar o crescimento económico do aumento da mobilidade. De futuro, a Comissão deverá envidar todos os seus esforços para evitar tais incompatibilidades. No sector dos transportes haverá que procurar soluções para reduzir gradualmente os trajectos a percorrer pelos passageiros e pelas mercadorias até ao seu destino. Isso implica rever a política fiscal e a política de ordenamento e coordenar todos os níveis de governação, desde a UE até às autarquias locais.

4.16

A nova estratégia é assaz decepcionante no que toca à resolução do problema cada vez mais premente dos transportes. O CESE não pode senão constatar que a UE tem proposto soluções muito mais concretas para a política energética do que para o sector dos transportes, cujo impacto negativo no clima, no ambiente e na protecção da natureza continuará a aumentar.

4.17

A conclusão do Conselho Europeu de Março de 2007 (15) de que o sistema de trocas de quotas de emissões poderia eventualmente ser alargado ao transporte terrestre e marítimo deve ser integrada no relatório intercalar sobre a estratégia de desenvolvimento sustentável e avaliadas à luz do seu impacto potencial, nomeadamente em comparação com outros instrumentos.

5.   Síntese do relatório

5.1

O CESE apoia a provisão do ponto 33 da nova estratégia segundo a qual a Comissão deverá apresentar cada dois anos (começando em Setembro de 2007) um relatório intercalar sobre a execução da estratégia de desenvolvimento sustentável na UE e nos Estados-Membros, contendo igualmente futuras prioridades, orientações e medidas. O CESE espera que esses relatórios permitam resolver as questões ainda em aberto.

5.2

É o caso sobretudo dos instrumentos económicos e de gestão, descritos de forma ainda demasiado vaga. O ponto 22, por exemplo, recomenda «que sejam utilizados os instrumentos económicos mais adequados para promover a transparência do mercado e preços que reflictam os custos económicos, sociais e ambientais reais dos produtos e serviços (acertar os preços)». O que equivale a reconhecer a recomendação que o CESE reiterou várias vezes de internalizar os custos externos e criar os instrumentos necessários para esse efeito. O CESE recorda que este debate se tem arrastado por vários anos, sem grande êxito. A Comissão apresentou apenas em finais de Março de 2007, com um atraso de três anos, o seu Livro Verde sobre instrumentos de mercado para fins da política ambiental e de políticas conexas, que deu um novo impulso ao debate. O Comité manter-se-á atento à evolução desta questão central para a sustentabilidade nos futuros relatórios intercalares.

5.3

No ponto 23, o Conselho, ou seja, os chefes de Estado e de governo, exortam os Estados-Membros a «estudar novas medidas fiscais que incidam menos no trabalho e mais no consumo dos recursos e da energia e/ou na poluição, a fim de contribuir para os objectivos da UE de aumentar o emprego e de reduzir os impactos ambientais negativos, de um modo que garanta uma boa relação de custo/eficácia». O CESE concorda e anima a Comissão a dar a devida atenção a este aspecto no relatório intercalar e a apresentar propostas concretas para alcançar esse objectivo. Para tal importa ter em conta não só o impacto ambiental como também a repartição dos encargos, para que os mais desfavorecidos socialmente não sejam igualmente os principais afectados pela reforma fiscal.

5.4

O CESE aplaude a intenção de apresentar, até 2008, «um roteiro para a reforma, sector por sector, dos subsídios que têm consideráveis efeitos negativos no ambiente e que são incompatíveis com o desenvolvimento sustentável». Também apoia o objectivo declarado de eliminar gradualmente esses subsídios, para o que conviria definir um calendário concreto e transferir os recursos assim obtidos para um «fundo europeu da sustentabilidade» ao qual os Estados-Membros pudessem recorrer sempre que uma medida de preservação do ambiente envolvesse custos desproporcionalmente elevados para o seu orçamento (Artigo 175.o, n.o 5, e artigo 174.o, n.o 1, do Tratado de Nice).

5.5

Em anteriores pareceres, o CESE defendeu repetidamente a importância de os cidadãos, as empresas e os outros interessados saberem o que está previsto concretamente ao nível político, e por que razões. Só assim os cidadãos estarão dispostos a acompanhar e a apoiar activamente este processo necessário. O Comité apoia, por isso, o apelo do Conselho a que a Comissão elabore «um guia destinado ao grande público sobre esta estratégia, que incluirá as boas práticas e boas políticas levadas a cabo nos Estados-Membros» (ponto 26). Infelizmente, falta também aqui um roteiro, lacuna que o relatório intercalar deverá colmatar.

5.6

A estratégia prevê a obrigação de melhorar o processo de formulação de políticas através do recurso mais frequente a avaliações de impacto e de uma maior envolvimento dos interessados. O Comité aplaude esta obrigação e exorta a Comissão e os Estados-Membros a desenvolverem métodos de avaliação de impacto no domínio do desenvolvimento sustentável e a assegurarem a sua aplicação efectiva em todos os domínios políticos.

5.7

O CESE considera particularmente importante a intenção de definir «uma visão concreta e realista da UE rumo ao desenvolvimento sustentável nos próximos 50 anos» (ponto 27). Todavia, também neste caso cabe perguntar o que deve ser apresentado concretamente, e dentro de que prazo. O Comité apela desde já a que essa visão vá para lá do ano 2060. Isso porque as obrigações e os objectivos principais (16) anunciados no documento sobre a estratégia renovada requerem que as orientações sociais sejam definidas o mais cedo possível, mesmo a muito longo prazo. O Conselho Europeu de Março de 2007 já deu os primeiros passos nesse sentido, ao defender a redução das emissões de 60 a 80 % até 2050 relativamente aos valores de 1990 (17). Algumas matérias-primas fósseis ou não renováveis continuarão certamente a existir daqui a mais de 50 anos, mas acabarão por se extinguir mais cedo ou mais tarde, pelo que convém elaborar desde já uma política que vá mais longe do que apenas 50 anos se se quer ser correcto com as gerações futuras.

5.8

O Comité recomenda que estes aspectos horizontais, que devem influenciar a formulação das políticas a todos os níveis (UE e Estados-Membros), sejam igualmente tidos em conta na estratégia a fim de assegurar a sua eficácia. Mas não é dada qualquer indicação sobre a forma de o fazer, presumivelmente porque a versão actual dos Tratados, confirmada pelo projecto de Tratado Constitucional, a competência da União neste domínio é partilhada, cabendo aos Estados-Membros o financiamento e a execução da política orçamental (artigo 175.o, n.o 4, do Tratado de Nice). Desta forma, não claramente delimitado o papel dos diferentes intervenientes.

5.9

A nova estratégia prevê que cada Estado-Membro designe um representante como pessoa de contacto. O CESE parte do princípio de que a revisão intercalar informará se a nomeação teve ou não lugar e de que forma evoluiu a cooperação.

5.10

O primeiro relatório intercalar também deveria declarar se todos os Estados-Membros completaram a sua (primeira) estratégia nacional, prevista para Junho de 2007. Para o CESE, também não é claro quem deverá avaliar essas estratégias nacionais, segundo que critérios e quais as consequências caso os Estados-Membros não tenham completado as suas estratégias ou estas tenham sido «desqualificadas».

5.11

No ponto 41, o Conselho fala de «revisões voluntárias pelos pares» das estratégias nacionais, a começar em 2006 com um primeiro grupo de Estados-Membros. O relatório intercalar deve conter informações sobre o resultado dessas revisões e suas consequências para a estratégia comunitária.

5.12

O CESE reconhece que os Estados-Membros e as autarquias locais e regionais possuem competências próprias em muitos domínios do desenvolvimento sustentável e podem desenvolver as suas próprias soluções e medidas para muitos problemas. Considera, porém, que os progressos no sentido do desenvolvimento sustentável só poderão seguir a orientação desejada se for reforçada a capacidade da Comissão de acompanhar a evolução geral e de tomar novas medidas sempre que a execução da estratégia pareça abrandar e que seja necessária uma abordagem comunitária. O Comité duvida de que a coordenação e o intercâmbio de boas práticas sejam por si sós suficientes. Mais útil seria dar a conhecer anualmente as metas a atingir pelos Estados-Membros.

5.13

A estratégia preconiza a instituição ou o reforço dos conselhos nacionais para o desenvolvimento sustentável. Os conselhos nacionais são essenciais para a elaboração das estratégias nacionais de desenvolvimento sustentável e podem contribuir para estimular a adopção de medidas nos Estados-Membros, para o envolvimento da sociedade civil em medidas de desenvolvimento sustentável e para o acompanhamento dos progressos. As suas tarefas incluem ainda a aplicação do princípio do desenvolvimento sustentável, velando por um equilíbrio dinâmico entre as suas componentes económica, social e ambiental. O Comité deplora o pouco seguimento dado a esta recomendação e propõe-se revisitar a questão mais tarde no corrente ano. De momento, recomenda que a questão seja debatida com os Estados-Membros no quadro da revisão da execução da estratégia.

5.14

É igualmente importante que os Estados-Membros e a Comissão averigúem de que forma melhorar a coordenação das questões ligadas ao desenvolvimento sustentável nos seus próprios serviços. O desenvolvimento sustentável é um conceito transversal e global que deve ultrapassar e por vezes modificar as prioridades sectoriais ou locais dos diferentes organismos e serviços. A experiência revela que isso só é possível em presença de um nível central forte e capaz de promover o desenvolvimento sustentável num governo que disponha do conhecimento e da autoridade para desafiar e alterar os interesses de determinadores sectores ou níveis governativos. O relatório intercalar deveria identificar os serviços da Comissão em que são possíveis melhorias a este respeito. O CESE está convencido de tais melhorias são necessárias (cf. pontos 4.15 e 4.16).

5.15

A estratégia defende com razão que o desenvolvimento sustentável deve ser inteiramente integrado nos objectivos e nos métodos de trabalho dos governos locais e regionais. Algumas autarquias europeias têm-se revelado vanguardistas na adopção de soluções sustentáveis na sua actividade e no desenvolvimento de respostas adequadas às mudanças climáticas e a outros desafios da sustentabilidade. O relatório intercalar proporcionará uma ocasião privilegiada de avaliar o progresso alcançado nesta matéria a nível local e regional e de examinar formas de divulgar melhor os exemplos de boas práticas.

5.16

O ponto 45 afirma que em 2011 será decidido quando proceder a uma revisão da estratégia de desenvolvimento sustentável. O CESE não pode aceitar esta proposta. Se os relatórios intercalares demonstrarem que a União continua a não ser capaz de assegurar a sustentabilidade, isso significa que a estratégia falhou enquanto roteiro para alcançar esse objectivo. Nesse caso, a revisão deve fazer-se imediatamente, e não apenas em 2011.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  COM(2006) 845 final.

(2)  COM(2005) 658 final de 13.12.2005.

(3)  JO C 117 de 30.4.2004, p. 22, ponto 2.2.1.

(4)  Conselho da União Europeia, documento 10917/06 de 26.6.2006: Revisão da estratégia da UE para o desenvolvimento sustentávelA nova estratégia.

(5)  JO C 204 de 18.7.2000.

(6)  JO C 117 de 30.4.2004.

(7)  JO C 117 de 30.4.2004, em particular os pontos 0.8 e 6.4 ss.

(8)  JO C 117 de 30.4.2004, p. 22, ponto 2.3.9.

(9)  Cf. ponto 8.

(10)  83 % do conteúdo energético do etanol, produzido a partir do milho, provém de energias fósseis.

(11)  Percentagem elevada de protóxido de azoto na produção de colza (antes do Verão, e logo antes da plenária, estará disponível um estudo sobre a matéria).

(12)  Cf. os distúrbios no México provocados pelo aumento do preço das tortilhas, dado que o milho é aproveitado para a produção de combustíveis.

(13)  TINA = Transport Infrastructure Needs Assessment (Avaliação das necessidades em termos de infra-estruturas de transporte).

(14)  COM (2006) 314.

(15)  Cf. ponto 35.

(16)  Nomeadamente permitir às gerações futuras satisfazer as suas necessidades, preservar a justiça social e a coesão e assegurar um nível de vida elevado e o pleno emprego, bem como respeitar os princípios directores de reorientar as políticas da União Europeia para os cidadãos, promovendo os direitos fundamentais, combatendo todas as formas de discriminação e contribuindo para o combate à pobreza e à exclusão social.

(17)  Cf. conclusões, ponto 30.


ANEXO

ao parecer do Comité

As propostas de alteração seguintes, que obtiveram mais de um quarto dos votos, foram rejeitadas:

Ponto 2.4

Alterar como segue:

«2.4.

No seu mais recente parecer sobre o tema, o CESE examinou nomeadamente a comunicação da Comissão de Dezembro de 2005. O Comité deplorou então que o plano de acção descrito pela Comissão como “ambicioso” não seguisse nem a recomendação do CESE de 2004 nem a promessa que a própria Comissão fizera em Junho de 2005. Uma mais vez, a Comissão não definiu nesse plano de acção quaisquer , de definir objectivos claros a alcançar no âmbito da estratégia de desenvolvimento sustentável.».

Resultado da votação:

A favor: 35

Contra: 6

Abstenções: 4

Ponto 2.4.1

Alterar como segue:

«2.4.1.

O CESE recordou que uma estratégia deve descrever o percurso a seguir para alcançar determinados objectivos. A ausência de objectivos , difíceis de definir cumprindo o requisito de considerar os vários aspectos da sustentabilidade, implica necessariamente uma selecção deficiente de instrumentos: quando não se sabe exactamente onde se quer ir, também não é possível determinar a melhor maneira de lá chegar. A comunicação deixava por isso, no entender do Comité, mais questões em aberto do que aquelas a que permitia responder.».

Resultado da votação:

A favor: 34

Contra: 63

Abstenções: 3

Ponto 3.11

Alterar:

«3.11.

Saber se uma política agrícola europeia orientada para a concorrência num mercado mundial aberto pode ser sustentável implica obrigatoriamente uma definição, a um nível mais geral, das regras de produção e comércio. A OMC é uma organização baseada em acordos destinados a promover o comércio livre mundial. Um comércio liberalizado não tem, porém, de ser necessariamente sustentável, como o CESE demonstrou já várias vezes. Infelizmente, a A nova estratégia nada diz sobre como conciliar desenvolver o comércio livre no sentido de o tornar compatível com os princípios do desenvolvimento sustentável. Trata-se de uma omissão importante! O CESE lastima ter de salientar mais uma vez que os responsáveis políticos da UE ainda não responderam a esta questão, que lhes foi lançada há já mais de três anos, embora a UE se tenha empenhado nos últimos anos em impor novas regras no comércio global e nas operações do FMI e do Banco Mundial.».

Resultado da votação:

A favor: 35

Contra: 63

Abstenções: 8

Ponto 3.11.2

Elidir:

«3.11.2.

O CESE sugere que a Comissão publique uma comunicação sobre as soluções de gestão e atribuição dos recursos universais, centrando se numa estratégia a longo prazo destinada a estabilizar as concentrações de gases atmosféricos com efeito de estufa a níveis “seguros” através da partilha internacional de um orçamento para as emissões globais que diminua gradualmente. Após um período determinado durante o qual as emissões per capita seriam harmonizadas, os direitos de emissão tornar se iam idênticos. Esta estratégia, já largamente debatida e conhecida como “contracção e convergência”, tem em consideração os efeitos tanto do crescimento demográfico como da capacidade industrial, da globalização e dos apelos a uma distribuição mais equitativa e pragmática da atmosfera planetária enquanto recurso universal.

Resultado da votação:

A favor: 38

Contra: 63

Abstenções: 3

Ponto 4.2

Alterar:

«4.2.

Essas consequências podem ter repercussões económicas consideráveis. Em certas regiões, a actual base económica está em perigo pode ruir inteiramente. Na Suíça, por exemplo, os bancos deixaram de autorizar empréstimos a investidores nas infra-estruturas de desportos de Inverno quando o local se encontre a menos de 1 500 m acima do nível do mar. E é cada vez maior a incerteza sobre as consequências para a agricultura e para o turismo na orla mediterrânica se o clima se tornar ainda mais quente e seco.».

Resultado da votação:

A favor: 41

Contra: 57

Abstenções: 3

Ponto 4.4

Alterar:

«4.4

É um problema bem conhecido que Esta situação é inevitável num sistema económico em que os custos com os cuidados de saúde e, em alguns casos, com os danos ambientais (por exemplo, os milhares de milhões de euros em prejuízos provocados pela tempestade Kyrill no início de 2007) são encarados como globalmente positivos para a economia, dado que contribuem para engrossar o PIB, ao passo que algumas actividades importantes não são incluídas . O CESE considera altamente positivo que o Conselho, na nova estratégia, tenha finalmente começado (ainda que só marginalmente) a deter-se sobre esta contradição. O Conselho tem toda a razão ao afirmar, no ponto 20 da sua nova estratégia, que “o sistema fundamental de contabilidade dos rendimentos nacionais poderá ser alargado para integrar, designadamente, os conceitos de existências e de fluxos e o trabalho não relacionado com o mercado, e ser desenvolvido através de contas satélite incluindo, por exemplo, despesas em matéria ambiental, fluxos de material, e tendo em conta as melhores práticas internacionais”.».

Resultado da votação:

A favor: 35

Contra: 56

Abstenções: 8

Ponto 4.10

«4.10

O Conselho declara que a nova estratégia “constitui o quadro geral em que os objectivos económicos, sociais e ambientais podem reforçar-se mutuamente”. O Conselho considera ainda que todas as decisões políticas da UE devem ser precedidas por uma avaliação “equilibrada” dos aspectos sociais, ambientais e económicos do desenvolvimento sustentável que tenha em conta “a sua dimensão externa e os custos da inacção”. Contudo, assim que se fala de meios financeiros deixa de se evocar o diálogo social em favor de um diálogo institucionalizado entre a Comissão e os Estados Membros, por um lado, e entre o mundo empresarial, por outro, a fim de definir objectivos de rendimento para produtos e processos.».

Resultado da votação:

A favor: 41

Contra: 55

Abstenções: 3

Ponto 4.14

Alterar:

«4.14

Contudo, como se disse já, não se trata apenas de dinheiro e sim muito mais de reformas estruturais. A “nova estratégia” requer, nomeadamente, que se “dissocie o crescimento económico da procura de transporte com o objectivo de reduzir os impactos ambientais”. O Comité aplaude esta posição. Isso significa igualmente, porém, que a chamada produção “just in time”, através da qual as empresas abandonam as práticas de armazenagem e os custos a ela associados e transformam os seus camiões ou comboios de mercadorias em armazéns ambulantes, deve ser submetida a uma análise mais crítica.

Resultado da votação:

A favor: 39

Contra: 56

Abstenções: 6

Ponto 4.16

Alterar como segue:

«4.16

O CESE confessa-se surpreso pelo facto de não haver qualquer coordenação aparente entre a elaboração da revisão intercalar do Livro Branco sobre os Transportes e a estratégia para a sustentabilidade, visto que em momento algum se faz referência à contradição manifesta entre os objectivos políticos e a realidade. No sector dos transportes, a Comissão parece ter praticamente abandonado o primeiro objectivo específico, a saber, dissociar o crescimento económico do aumento da mobilidade. De futuro, a Comissão deverá envidar todos os seus esforços para evitar tais incompatibilidades. No sector dos transportes haverá que procurar soluções para reduzir gradualmente os trajectos a percorrer pelos passageiros e pelas mercadorias até ao seu destino. Isso implica rever a política fiscal e a política de ordenamento e coordenar todos os níveis de governação, desde a UE até às autarquias locais.».

Resultado da votação:

A favor: 36

Contra: 63

Abstenções: 4


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/86


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às estatísticas sobre produtos fitofarmacêuticos»

COM(2006) 778 final — 2006/0258 (COD)

(2007/C 256/16)

Em 16 de Maio de 2007, o Conselho decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu, nos termos do n.o 1 do artigo 285.o do Tratado CE, sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, responsável pela preparação dos correspondentes trabalhos do Comité, emitiu parecer em 8 de Junho de 2007 (Relator: Frank Van OORSCHOT).

Na sua 437.a reunião plenária, realizada em 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 138 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Síntese das conclusões e recomendações

1.1

O CESE congratula-se com o regulamento em apreço enquanto instrumento de aferição dos resultados nos Estados-Membros sobre a realização dos objectivos da directiva relativa a uma utilização sustentável dos pesticidas (1).

1.2

O CESE lamenta que o regulamento relativo às estatísticas inclua apenas a utilização profissional na agricultura e que se exclua a utilização em solos duros de produtos fitofarmacêuticos potencialmente nocivos para o ambiente.

1.3

O CESE salienta que, quando se trata de juntar os dados referentes à utilização com os dados sobre o nível residual máximo (NRM), não é apenas a quantidade de produtos utilizados e a área de cultura tratada que são relevantes, mas também as informações sobre os rendimentos das plantas. Para garantir a junção de dados referentes à utilização com as estatísticas existentes na UE sobre plantas, em particular sobre o rendimento das plantas, as estatísticas sobre plantas deverão ser explicitamente referidas no regulamento.

2.   Proposta da Comissão

2.1

O objectivo do regulamento proposto é definir um quadro para a produção de estatísticas comunitárias sobre a colocação no mercado e utilização de produtos fitofarmacêuticos, obrigando os Estados-Membros a produzir regularmente estatísticas pormenorizadas. Para garantir a comparabilidade destas estatísticas entre Estados-Membros e a nível comunitário, o regulamento define a cobertura das estatísticas — que será limitada à utilização profissional na agricultura — e define regras harmonizadas para recolha e tratamento de dados.

2.2

Estas estatísticas serão essenciais para fazer uma estimativa do risco para a saúde humana e para o ambiente relacionado com a utilização de produtos fitofarmacêuticos, bem como para medir o progresso no sentido da realização dos objectivos da directiva quadro sobre a Estratégia Temática sobre a Utilização Sustentável de Pesticidas.

2.3

Os benefícios desta medida devem ser considerados à luz da directiva-quadro. O objectivo geral da aplicação das medidas da directiva quadro é alcançar melhorias a nível ambiental e de saúde ou outros benefícios societais, tais como a redução de custos externos devido à utilização de produtos fitossanitários, através da utilização mais sustentável de pesticidas. O progresso só pode ser medido com base em dados fiáveis e indicadores relevantes. Podem esperar-se benefícios directos deste regulamento a nível nacional e comunitário através do conhecimento aprofundado da utilização de pesticidas, tais como sistemas de acompanhamento melhorados e políticas mais orientadas e eficazes. Além disso, a existência de estatísticas oficiais em toda a Europa criará um mercado mais transparente que contribuirá para aumentar a competitividade na indústria dos pesticidas.

3.   Quadro regulamentar actual

3.1

Regulamento (CE) n.o 396/2005 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Fevereiro de 2005, relativo aos limites máximos de resíduos de pesticidas no interior e à superfície dos géneros alimentícios e dos alimentos para animais, de origem vegetal ou animal, e que altera a Directiva 91/414/CEE do Conselho.

3.2

Regulamento (CE) n.o 852/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativo à higiene dos géneros alimentícios, nomeadamente a parte A, ponto 9, do Anexo I, onde se estabelece que os operadores do sector alimentar que produzam ou colham produtos vegetais devem manter registos sobre qualquer utilização de produtos fitossanitários e biocidas.

3.3

Directiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2000, que estabelece um quadro de acção comunitária no domínio da política da água.

3.4

Directiva 91/414/CEE do Conselho, de 15 de Julho de 1991, relativa à colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado, actualmente em revisão.

4.   Síntese da proposta

4.1

O regulamento proposto cria um quadro normativo e estabelece regras harmonizadas para a recolha e a divulgação dos dados relativos à colocação no mercado e à utilização de produtos fitofarmacêuticos. Instrui, nomeadamente, os Estados-Membros:

a recolher dados regularmente (anualmente quanto à colocação no mercado — cada cinco anos no que diz respeito à utilização);

quanto ao modo de processamento da recolha, se através de inquéritos representativos, de estimação estatística com base em juízos periciais ou em modelos, de obrigações de comunicação de informações impostas à cadeia de distribuição dos produtos fitofarmacêuticos, de obrigações de comunicação de informações impostas aos utilizadores profissionais, de fontes administrativas ou através de uma combinação destes meios;

quanto ao modo de transmissão dos dados à Comissão.

4.2

Além disso, também encarrega a Comissão das tarefas de adaptar alguns aspectos técnicos e de definir os critérios de avaliação da qualidade e o formato de transmissão dos dados.

5.   Observações na generalidade

5.1

O CESE congratula-se com o regulamento sub judice enquanto instrumento de aferição dos resultados nos Estados-Membros sobre a realização dos objectivos da directiva-quadro relativa a uma utilização sustentável dos pesticidas.

6.   Observações na especialidade

6.1   Utilização profissional não agrícola

6.1.1

Dados da indústria da água para consumo humano revelam que mais de 50 % dos casos de infracção da norma da água para consumo humano por utilização de produtos fitofarmacêuticos resultam da utilização para fins não agrícolas em solos duros.

6.1.2

O regulamento sobre estatísticas permite fazer uma estimativa por alto da utilização total não agrícola subtraindo da quantidade total anual de um produto colocado no mercado o total da utilização profissional na agricultura do produto em questão.

6.1.3

O CESE é da opinião de que este cálculo por subtracção da utilização não agrícola é demasiado impreciso para uma avaliação correcta da política decorrente da directiva-quadro.

6.1.4

O CESE apela a que, além da recolha de dados sobre a utilização agrícola profissional, se tire partido do regulamento sobre estatísticas para a recolha de dados sobre a utilização profissional de produtos fitofarmacêuticos na silvicultura, utilização profissional em solos duros e utilização não profissional.

6.2   Regulamentos relativos às estatísticas e dados sobre NRM

6.2.1

O CESE salienta que, quando se trata de juntar os dados referentes à utilização com os dados sobre o NRM, não é apenas a quantidade de produtos utilizados e a área de cultura tratada que são relevantes, mas também as informações sobre os rendimentos das plantas. Em caso de menor rendimento, a mesma quantidade de produto na mesma superfície resulta numa eco-eficiência inferior e numa probabilidade maior de ultrapassar os NRM.

6.2.2

No anexo II da proposta refere-se o Regulamento (CEE) n.o 571/88 relativo à organização de uma série de inquéritos comunitários sobre a estrutura das explorações agrícolas. Esta referência visa utilizar a mesma classificação de plantas tanto para os inquéritos sobre as estruturas das explorações como para os dados referentes à utilização de produtos fitofarmacêuticos. As estatísticas sobre a utilização de produtos fitofarmacêuticos podem ser juntadas de forma eficaz às estatísticas sobre os rendimentos das plantas.

6.2.3

O CESE reconhece que a referência ao Regulamento n.o 571/88 oferece a possibilidade de juntar dados sobre a utilização de produtos fitofarmacêuticos com os dados referentes aos rendimentos das plantas em questão. Com vista a garantir o recurso a esta possibilidade, as estatísticas sobre as plantas em questão, em particular sobre o rendimento das plantas, deverão ser explicitamente referidas no regulamento, na análise dos dados sobre a utilização.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  COM(2006) 373 final «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um quadro de acção a nível comunitário para uma utilização sustentável dos pesticidas».


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/88


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Inovação: impacto nas mutações industriais e o papel do BEI»

(2007/C 256/17)

Em 6 de Julho de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer de iniciativa sobre «Inovação: impacto nas mutações industriais e o papel do BEI».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Comissão Consultiva das Mutações Industriais que emitiu parecer em 20 de Junho de 2007, sendo relator J. TÓTH e co-relator CALVET CHAMBON.

Na 437.a reunião plenária, de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 138 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

Tendo examinado as relações entre a inovação e as mutações industriais, bem como as numerosas iniciativas levadas a cabo aos níveis europeu e nacional nestes domínios, o CESE decidiu servir-se do seu parecer de iniciativa para analisar os aspectos do sistema de inovação susceptíveis de favorecer a tradução directa dos resultados da investigação em êxito comercial, no reforço e no crescimento da indústria e da economia europeias, formulando ainda recomendações sobre as questões em apreço.

1.2

O CESE entende que importa atentar na correlação estreita, a que se assiste em muitos países e regiões, entre o êxito da inovação, por um lado, e a abertura da sociedade e do sistema educativo, por outro. Tendo em conta que, no século XXI, a inovação não só é um elemento presente como decisivo para a economia e para todas as actividades, é evidente que a qualidade dos recursos humanos pode ser um importante factor de crescimento. O CESE entende que este factor funcionará cada vez mais enquanto catalisador do desenvolvimento, devendo, por conseguinte, a inovação basear-se em grande medida na educação e na formação, em conformidade com os critérios da aprendizagem ao longo da vida e, para tal, tomar por base o acesso equitativo às bases de dados de fonte aberta e conteúdo livre.

1.3

O CESE considera importante que, nas empresas, a inovação, a política dos recursos humanos e o sector do conhecimento estabeleçam uma sinergia que seja não apenas a base da inovação como também apoie a sua realização. Simultaneamente, é conveniente que a evolução do sistema de emprego siga, com toda a flexibilidade, a transformação do sistema industrial e que se reúnam as condições financeiras necessárias.

1.4

O CESE reputa essencial aumentar, junto da opinião pública, a visibilidade, a presença e o eco positivo das iniciativas de inovação coroadas de êxito. O papel da inovação social reveste-se de uma importância capital em toda a cadeia da inovação. A inovação não-tecnológica, que se manifesta, por exemplo, nos novos modelos de empresa, na melhoria do planeamento, no aumento da qualidade relativamente à organização trabalho e às competências, é tão importante como a inovação tecnológica. De um modo geral, a inovação estrutural, relativa ao desenvolvimento estrutural, é necessária para que o potencial de inovação tecnológica se exprima da melhor forma possível.

1.5

Os parceiros sociais, os agentes e as instituições da sociedade civil organizada já desempenham um papel muito importante para transmitir, consolidar e aceitar o carácter modernizador das mensagens da inovação, mas entendemos que seria conveniente reforçar essa função, englobando igualmente a identificação das prioridades estratégicas e a elaboração das políticas.

1.6

O CESE está convencido de que para resolver o paradoxo europeu — segundo o qual somos muito bons em investigação fundamental, mas não deixamo-nos ultrapassar na exploração prática, comercial, dos resultados obtidos —, convém, mais do que sublinhar o aumento da parte do PIB consagrada aos esforços financeiros em matéria de I&D, insistir na transformação da estrutura destas despesas. É necessário aumentar os esforços em matéria de despesas, mas também convém redobrar a atenção dedicada às novas abordagens.

1.6.1

Nos Estados-Membros da União Europeia, o mercado da oferta continua a ser dominante no campo da I&D: a oferta dos resultados das investigações neste âmbito é maior do que a procura por parte das empresas. É necessário reforçar o mercado da procura limitando os riscos ligados à iniciativa empresarial, criando condições mais favoráveis à investigação nas empresas, mudando o ambiente da actividade empresarial e estimulando a cooperação entre as universidades, os institutos científicos e as empresas.

1.6.2

De forma a aumentar a capacidade de inovação sustentável das empresas, têm de ser envidados esforços coordenados nos domínios do financiamento, da I&D, da indústria, da fiscalidade, da educação, da protecção ambiental, dos meios de comunicação social e da comunicação em geral, tanto ao nível europeu como nacional e regional.

1.6.3

Entendemos que importa aplicar uma solução, já em prática nos Estados-Membros, que consiste em que as empresas que realizam actividades de desenvolvimento e que confiam missões deste tipo a institutos de investigação tenham acesso, por meio de concursos públicos, a fundos suplementares, quer provenham do orçamento quer de fontes privadas.

1.7

O CESE sublinha que o reconhecimento e a protecção do valor da propriedade intelectual na UE estão cada vez menos à altura das exigências crescentes da concorrência ao nível mundial. É preciso continuar a reconhecer a importância da publicação dos resultados científicos e o papel que desempenha a sua avaliação posterior, isto é, a importância do «mercado científico». Todavia, há que encontrar soluções que permitam explorar comercialmente os resultados da investigação e pantenteá-los, fazer respeitar os direitos de propriedade intelectual e valorizar os interesses comunitários, o que exige dedicar mais atenção a esta matéria e tomar medidas globais. O CESE considera importante que, paralelamente ao desenvolvimento do direito comunitário, os Estados-Membros examinem que instrumentos políticos podem utilizar para aumentar a protecção dos direitos da propriedade intelectual e o acompanhamento institucional da exploração de patentes, melhorando assim a cooperação no seio da UE.

1.8

O CESE está convicto de que para promover a inovação e aumentar a competitividade de modo dinâmico na óptica do desenvolvimento sustentável, é indispensável garantir as funções de gestão da inovação estratégica e encontrar soluções para a questão da formação de investigadores e de peritos empresariais neste campo. É particularmente importante incorporar as tecnologias da informação e da comunicação na educação (1), de forma a que a aprendizagem em linha dê especial atenção à formação em gestão da inovação, a um dispositivo de promoção na matéria e à criação das condições necessárias à sua organização.

1.9

O CESE julga que, no interesse da inovação, importa envidar esforços para que os eixos prioritários das mutações industriais e os da formação e da formação contínua sejam coerentes e que seja possível reagir atempadamente às exigências e às mutações do mercado. Importa que, para além da livre circulação dos investigadores, o dispositivo de gestão da inovação se caracterize por uma mobilidade adequada e que se ponha em prática uma vasta cooperação entre os responsáveis executivos dos organismos de inovação e os dos parques científicos e tecnológicos.

1.10

O CESE considera que as estruturas de direcção e de organização aptas a melhorar a eficiência das transferências tecnológicas desempenham um papel importante para estimular a mutação das estruturas industriais. Os parques industriais, científicos ou tecnológicos e os centros tecnológicos são elementos de extrema importância para que as pequenas e médias empresas ousem lançar-se, se estabeleçam, ganhem quotas de mercado e acompanhem os avanços tecnológicos, já que põem à sua disposição a perícia e a assistência indispensáveis, assim como os laboratórios que são absolutamente necessários. Para que as empresas obtenham a um custo relativamente baixo e com um conteúdo de nível satisfatório as condições que lhes permitam inovar, é cada vez mais necessário que os organismos de transferência de tecnologias funcionem em rede, de forma a que as tarefas logísticas sejam efectuadas através das tecnologias da informação e das comunicações. É importante que a Comissão reflicta sobre as diversas pistas para o desenvolvimento deste tipo de estruturas, fomentando, em particular, o desenvolvimento de pólos de tecnologia científica (de competitividade) e dos centros do conhecimento. Importa atribuir aos pólos científicos (de competitividade), incluindo universidades, parques científicos ou tecnológicos e centros de incubação e tecnológicos, um papel-chave na realização das prioridades de desenvolvimento da UE e fomentar a criação dessas estruturas.

1.11

O CESE entende que os objectivos pelos quais a UE se bateu, como a ambição da Estratégia de Lisboa de tornar a Europa no espaço mais competitivo do mundo num razoável espaço de tempo, não aparecem reflectidos nos debates orçamentais, em particular nos números do orçamento aprovado. A Comissão consagra importantes instrumentos a programas I&D, mas o papel e o peso desses instrumentos não aumentam na medida desejável. Estes programas cumpririam eficazmente a sua função se, nos Estados-Membros, o seu impacto se multiplicasse e fossem criados programas em sintonia com as características dos diferentes países. Não é o caso. O CESE considera necessário que a Comissão reavalie o seu sistema de inovação e apoie os Estados-Membros para que coordenem melhor os esforços envidados e apostem no efeito multiplicador dos recursos de I&D, atentando sobretudo nas prioridades de desenvolvimento da União Europeia.

1.12

No que respeita ao financiamento, o CESE acolhe favoravelmente os múltiplos esforços do Banco Europeu de Investimento (grupo BEI) no sentido de reforçar o vigor e a capacidade de inovação da economia europeia, tanto do ponto de vista da oferta como da procura. O CESE sublinha que se trata apenas de um elemento do vasto leque de instrumentos financeiros: importa que o orçamento europeu garanta a inovação dos recursos financeiros indo ao encontro dos objectivos estabelecidos pela Estratégia de Lisboa. Ademais, um contributo dos orçamentos dos Estados-Membros e das regiões é também necessário na mesma proporção.

1.13

O CESE considera que as experiências adquiridas demonstram que o funcionamento do grupo BEI desencadeia um efeito de alavanca. Por esta razão, o CESE convida o grupo BEI a rever periódica e escrupulosamente as possibilidades de promover um tal efeito, em coordenação com a Comissão e o mundo financeiro em geral, com o objectivo de obter o maior efeito de alavanca possível.

1.14

O CESE considera que o grupo BEI tem muitas possibilidades de acção, tanto enquanto banco público como enquanto banco fornecedor de serviços. O CESE convida o grupo BEI a expandir as suas actividades de gestor de fundos, não se limitando às dotações do orçamento comunitário, mas estendendo-as às do mercado privado de capitais.

2.   Uma Europa moderna que favorece a inovação

2.1

A comunicação da Comissão Europeia COM (2006) 589, publicada por ocasião da reunião informal dos Chefes de Estado e de Governo europeus realizada em Lahti, em 20 de Outubro de 2006, sob a égide da presidência finlandesa, trata as questões relativas ao impacto da inovação sobre a mutação do tecido industrial. Aponta que a Europa e os Estados-Membros dispõem de vários trunfos em matéria de inovação, embora sofram de um certo número de contradições: nós, Europeus, inventamos e inovamos, mas frequentemente não convertemos as nossas invenções em novos produtos, empregos e patentes; são criadas muitas pequenas empresas altamente inovadoras, mas elas não se transformam facilmente em grandes empresas com êxito ao nível mundial; ou seja, em alguns sectores, como o das telecomunicações, a adopção de inovações (TIC) gerou importantes ganhos de produtividade, mas noutros sectores tal não sucedeu, como o demonstram vários exemplos. Nos domínios da inovação e das mutações industriais, não podemos abdicar de uma legislação séria e flexível em matéria de registo de patentes e de propriedade intelectual. Para tal, seria conveniente reavaliar a proposta de regulamento do Conselho sobre a patente comunitária de 1 de Agosto de 2000, a fim de melhor adaptá-la às realidades económicas que evoluem rapidamente (veja-se, a este propósito, as licenças obrigatórias e as causas de extinção da patente comunitária). Para isso, há que dispor de procedimentos aptos a facilitar as diversas aplicações industriais e/ou comerciais das patentes registadas e a reconhecer a propriedade intelectual da inovação produzida por cada agente — quer seja investigador, quadro ou engenheiro — ou por grupos de agentes, ainda que integrados numa estrutura administrativa ou empresarial, pois a inovação é independente desta estrutura.

2.2

A inovação pode exercer impacto muito importante sobre a transformação do tecido industrial se existir um dispositivo que articule de modo coordenado os instrumentos ao nível das empresas, dos sectores, das regiões, dos Estados-Membros e da UE e que facilite o acesso e a utilização dos instrumentos pelos agentes interessados, podendo as referidas entidades ser empresas, assalariados, estabelecimentos de ensino e institutos de investigação, ou ainda outras organizações de intervenientes/partes interessadas.

2.3

Ao nível da empresa, os principais motores proactivos da inovação são os seguintes: 1) a gestão estratégica da inovação; 2) a gestão estratégica dos recursos humanos; 3) o desenvolvimento de competências; 4) o recurso a novos métodos de organização do trabalho; 5) os acordos de inovação ao nível da empresa. A transição de uma organização de trabalho rígida para uma mais dinâmica, que enfatiza o respeito e a valorização das competências e das capacidades de cada profissional e que orienta a escolha destes últimos entre os programas de formação contínua e/ou de reconversão profissional, favorecerá necessariamente o conhecimento e a inovação, bem como uma produção mais vasta e generalizada de ideias inovadoras.

2.4

No tocante às empresas, os motores activos da gestão das mutações são sobretudo: 1) as avaliações das competências e os planos personalizados de progressão na carreira; 2) a externalização dos serviços; 3) a formação contínua e a formação de reconversão; 4) as convenções colectivas e os planos sociais relativos à reorganização da empresa.

2.5

Os que a seguir se enumeram podem ser considerados como instrumentos proactivos susceptíveis de serem aplicados tanto ao nível sectorial como regional: 1) o desenvolvimento de sistemas produtivos locais (clusters); 2) as redes e parcerias de inovação; 3) os parques científicos, tecnológicos e industriais e os pólos de inovação; 4) as estratégias de inovação regional e os planos de desenvolvimento regional associados às instituições que garantem a respectiva aplicação; 5) as regiões do conhecimento.

2.6

A Comissão Europeia analisa periodicamente os sectores mais eficazes em matéria de inovação na Europa.

2.7

O Comité Económico e Social Europeu considera que nenhum sector pode dissociar crescimento célere da capacidade de inovação ou do aumento da parte representada pelo valor acrescentado. O Comité recomenda que se apoiem ideias inovadoras relativas a novos métodos de utilização de materiais, o desenvolvimento das tecnologias e de novos produtos e a afirmação de novas qualidades e de um novo valor acrescentado.

2.8

É sobretudo por meio da articulação das políticas nacionais que lhes são próprias em matéria de emprego, indústria, inovação, protecção ambiental, educação e de comércio e pela respectiva coordenação a todos os níveis da administração pública que os governos dos Estados-Membros podem favorecer, de modo proactivo, o impacto da inovação. Neste processo, é inequívoco o valor acrescentado que representa a colaboração com os parceiros sociais e com os agentes da sociedade civil organizada. Ainda ao nível nacional, conviria recorrer aos seguintes elementos: 1) investigação e sistema de previsão para a procura de novas fontes de criação de emprego; 2) programas de formação contínua e de formação para a reconversão; 3) estratégia para a educação e formação ao longo da vida; 4) regulamentação do mercado de trabalho favorável à construção de competências e à mobilidade.

2.9

As formas inovadoras de cooperação transfronteiriça podem ser dotadas de um papel catalisador particularmente importante e específico no domínio da inovação e da transformação do tecido industrial. A este respeito, importa sublinhar a importância das iniciativas tecnológicas comuns (JTI), das nanotecnologias, dos medicamentos inovadores, do hidrogéneo e das células de combustível, dos sistemas informáticos a bordo de veículos, da aeronáutica e do transporte aéreo, bem como da vigilância global do ambiente e da segurança. Importa, por conseguinte, insistir na importância das plataformas tecnológicas europeias e no interesse de prosseguir o seu desenvolvimento. Seria, por exemplo, adequado difundir as experiências da plataforma tecnológica europeia do aço, da plataforma para o carvão limpo e da plataforma tecnológica WATERBORNE, que já contam com um sólido balanço.

2.10

Ao nível das instituições europeias, seria conveniente articular de forma coordenada e proactiva a aplicação e o desenvolvimento dos seguintes elementos: 1) a Estratégia de Lisboa; 2) a estratégia em favor do desenvolvimento sustentável; 3) a parceria para o crescimento e o emprego; 4) o diálogo social europeu (sectorial e intersectorial); 5) os programas comunitários de investigação e desenvolvimento, de inovação, emprego, educação e formação ao longo da vida; 6) a política regional comunitária, 7) o Fundo Social Europeu (FSE), o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER); 8) o Observatório Europeu da Mudança, 9) um sistema europeu de previsão de novas fontes de criação de emprego.

2.11

A iniciativa relativa à criação do Instituto Europeu de Tecnologia (IET) (2) é promissora. No contexto do presente parecer, convém sublinhar que a actual fase de desenvolvimento do quadro de funcionamento deste instituto, isto é a fase inicial, é a mais adequada para garantir que este organismo contribua realmente para que a inovação se traduza em produtos e em emprego.

2.12

Entre as iniciativas da Comissão Europeia, importa destacar a comunicação COM(2006) 728 final, publicada em 22 de Novembro de 2006, intitulada «Para uma utilização mais eficaz dos incentivos fiscais em favor da investigação e do desenvolvimento».

2.13

Igualmente importante para a promoção da investigação-desenvolvimento e a inovação é a iniciativa da Comissão Europeia sobre as normas em matéria de auxílios estatais (3).

2.14

O CESE reputa de extrema importância: 1) edificar alicerces para que a Europa desempenhe um papel motor nas tecnologias estratégicas do futuro; 2) tomar medidas de fundo para reforçar os laços entre as universidades, os centros de investigação e as empresas; 3) aperfeiçoar as condições gerais.

2.15

No tocante à melhoria das condições gerais, importa prestar especial atenção aos seguintes elementos: 1) mercado único; 2) financiamento da inovação; 3) propriedade intelectual no séc. XXI; 4) apoio às relações comerciais e económicas externas das empresas da UE e acesso ao mercado dos países terceiros.

2.16

Além disso, há que proceder a avaliações sectoriais com a maior brevidade, para que as condições específicas de cada sector sejam o mais vantajosas possível. No âmbito deste processo, destaquem-se os seguintes elementos: 1) pontos de vista relativos às PME; 2) contribuição para a concretização da Estratégia de Lisboa; 3) criação de redes entre as regiões.

3.   O papel do Grupo Banco Europeu de Investimento

3.1

O CESE sublinha que, para que o impacto da inovação em relação às mutações industriais seja o mais favorável possível, é necessário dispor de todo o leque de instrumentos de financiamento e que estes funcionem harmoniosamente. Todos os produtos dos mercados financeiro e de capitais devem estar acessíveis, independentemente do facto de terem sido criados por uma empresa financeira clássica, pelos poderes públicos regionais ou de um Estado-Membro, ou pela União Europeia. Deve poder contar-se com instrumentos de financiamento ao longo de todo o processo de inovação, até à sua conclusão, e velar-se por que sejam afectados recursos financeiros para estimular o impulso tecnológico e a procura do mercado (push/market pull). No contexto da complexa questão do financiamento, o presente parecer debruça-se em particular sobre um dos agentes-chave deste domínio, o Grupo Banco Europeu de Investimento, que reúne os instrumentos do Banco Europeu de Investimento (BEI) e os do Fundo Europeu de Investimento (FEI).

3.2

Entre os objectivos primordiais que o BEI e o FEI estabeleceram contam-se o reforço dos desempenhos económicos e da inovação na Europa. Para concretizar este objectivo, que constitui um contributo para a Estratégia de Lisboa e a Acção Europeia para o Crescimento, serão mobilizados e desenvolvidos os instrumentos financeiros adequados. A iniciativa Inovação 2010 (i2i) constitui o principal contributo do BEI para o processo que visa tornar a Europa mais inovadora e mais competitiva, com o objectivo de disponibilizar 50 mil milhões de euros ao longo da presente década para apoiar projectos de inovação em toda a Europa nos domínios da educação e formação, da investigação, do desenvolvimento e da inovação (IDI), das tecnologias da informação e das comunicações (TIC) avançadas (incluindo os serviços dos meios de comunicação audiovisuais e respectivos conteúdos) e dos serviços em linha.

3.2.1

Estima-se que o valor dos compromissos assumidos em apoios aos projectos i2i desde 2000 tenham atingido os 46 mil milhões de euros no final de 2006, o que indica que o objectivo de chegar aos 50 mil milhões de euros em 2010 deverá ser ultrapassado. Além disso, tendo em vista direccionar os recursos financeiros para os produtos, os procedimentos e os sistemas de ponta e inovadores, o BEI aumentou a sua capacidade de financiamento utilizável em investimentos por meio do mecanismo de financiamento estruturado (MFE), cuja utilização não está limitada aos objectivos de I&D. Trata-se de apoiar projectos e promotores de risco acrescido, na medida em que os projectos não têm valor de investimento. A fim de financiar as actividades de investimento desenvolvidas pelas PME, o BEI disponibiliza linhas de crédito com os intermediários financeiros adequados.

3.2.2

Além disso, desenvolveram-se transacções inovadoras, tais como mecanismos de risco partilhado ou a articulação de instrumentos de apoio nacionais e regionais com produtos do BEI, de forma a responder às necessidades concretas das PME. O FEI dedica-se às pequenas e médias empresas (PME) por meio do investimento de capital de risco e de garantias. A acção do FEI é complementar ao apoio às PME prestado pelo BEI.

3.2.3

No que se refere ao acesso ao crédito pelas PME, deve ser notado o efeito negativo do Acordo de Basileia II. Em geral este acordo estabelece obrigações específicas para o sistema bancário, obrigando os Bancos a estabelecer um «rating» a cada PME que se candidatar à concessão crédito. Para o cálculo desse «rating» as PME vão ter de disponibilizar um conjunto muito mais alargado de informação quantitativa mas também qualitativa. As PMEs que não possuam sistemas de informação, tipo ERP (enterprise resourcing planning) não terão capacidade de fornecer toda a informação necessária, os sistemas ERP custam muito dinheiro e a grande maioria das PME não os possuem, sujeitando-se assim a não serem seleccionadas para a concessão do crédito em condições vantajosas afectando de forma negativa o seu desenvolvimento. Solicita-se ao BEI e à Comissão Europeia que se mantenham atentos e monitorizar o nível de acesso das PME ao financiamento de que necessitam e a sua relação com os efeitos produzidos pelo acordo Basileia II.

3.3

O apoio à inovação dado pelo Grupo BEI pressupõe o desenvolvimento de novas modalidades de financiamento adequadas ao perfil de risco das operações, bem como de produtos dotados das mesmas características. Paralelamente, tendo em vista aumentar o valor acrescentado e as sinergias entre os diferentes instrumentos de financiamento da Comunidade, o Grupo BEI e a Comissão lançaram novas iniciativas através de parcerias com programas financiados pelo orçamento europeu, tais como o 7.o programa-quadro (PC7) e o programa para a competitividade e inovação (PCI). Estas iniciativas conjuntas não se limitam ao mecanismo financeiro de partilha de riscos (MFPR), disponível a partir de 2007, nem às novas iniciativas instituídas pelo FEI no quadro do PCI, sendo, no entanto, exemplos particularmente pertinentes.

3.4   Mecanismo financeiro de partilha de riscos (MFPR)

3.4.1

Este mecanismo é uma iniciativa nova e inovadora levada a cabo pela Comissão Europeia e pelo Banco Europeu de Investimento conjuntamente, visando favorecer o investimento, sobretudo privado, na Europa nas áreas da investigação, do desenvolvimento tecnológico e da demonstração, bem como no âmbito da inovação, disponibilizando garantias apropriadas para os empréstimos que cubram os projectos europeus de maior risco. Este novo dispositivo pretende facilitar o acesso ao financiamento, através de empréstimo, às actividades caracterizadas por um perfil de risco acima da média, com base na partilha de riscos entre a Comunidade Europeia, o BEI e os promotores de projectos de IDI. O financiamento que o BEI disponibiliza no âmbito do MFPR será acessível à comunidade dos investigadores europeus como complemento aos fundos do 7.o PQ.

3.4.2

O MFPR, cujo funcionamento é regido por um quadro idêntico às regras do BEI relativas ao MFS, compor-se-á de duas vertentes, financiadas respectivamente pela a Comissão Europeia (7.o PQ) e pelo BEI, cada um de um valor máximo de 1 000 milhões de euros para o período 2007-2013. Os recursos do PQ7 serão utilizados para financiar os projectos de investigação, de desenvolvimento e de demonstração, ao passo que os recursos do BEI poderão igualmente ser utilizados como complemento de financiamento de projectos de inovação. A mobilização, a partir destas duas vertentes, de uma verba que pode atingir os 2 mil milhões de euros para o financiamento de capitais de risco, permite, assim, financiar em maior escala programas de investigação, de desenvolvimento e de inovação dotados de um perfil de risco acima da média. Isto implica que, a cumprirem-se as expectativas, o BEI deverá estar apto a prestar um apoio financeiro, no quadro de um financiamento complementar com efeito de alavanca, que poderá atingir os 10 mil milhões de euros. O MFPR visa apoiar as iniciativas europeias de investigação, tais como o Fórum Europeu de Estratégias para as Infra-estruturas de Investigação (ESFRI), a plataforma tecnológica europeia, a iniciativa tecnológica comum ou ainda os projectos iniciados no quadro da Agência Europeia para a coordenação da investigação (Eureka).

3.4.3

Tomando por base a ideia da partilha dos riscos entre a Comunidade, o BEI e os beneficiários, o MFPR proporciona um instrumento suplementar para financiar a investigação, o desenvolvimento e a inovação, oferecendo assim um vasto leque de possibilidades tanto ao sector privado como à comunidade dos investigadores, e completando desta maneira o leque d instrumentos para o financiamento da IDI. O MFPR dá ao BEI a capacidade de elaborar produtos financeiros que atenuem as fraquezas do mercado e respondam às exigências próprias de cada sector e de cada promotor de projecto, alargando assim o leque dos potenciais beneficiários de financiamento. O MFPR será acessível às entidades jurídicas de qualquer dimensão e estatuto, tais como as grandes empresas, as empresas de dimensão intermédia (mid-caps), as PME, as organizações de investigação, universidades, estruturas de colaboração, empresas comuns ou estruturas eventuais (Special Purpose Vehicles). Através de acordos de partilha de riscos com o sector bancário, o MFPR contribuirá para melhorar a capacidade global dos agentes financeiros no apoio às actividades de IDI, em particular no âmbito das PME.

3.4.4

O Conselho «Competitividade», de Julho de 2006, decidiu conceder ao MFPR um valor inicial de 500 milhões de euros até ao período da revisão intercalar do 7.o programa-quadro, para que possa ser lançado rapidamente e dotada de uma massa crítica suficiente ao nível dos instrumentos financeiros. A atribuição de uma dotação complementar de 500 milhões de euros até 2013 a cargo do orçamento comunitário dependerá dos resultados da avaliação intercalar e da procura potencial do novo instrumento. Enquanto as condições gerais relativas à utilização dos fundos e às normas de gestão do MFRP, incluindo os critérios de elegibilidade, a regulamentação e a repartição do risco entre instituições, são definidos no quadro dos programas Cooperação e Capacidades do PQ7, ao passo que as medidas pormenorizadas se regem por um acordo bilateral entre a Comissão Europeia e o BEI, assinado em 5 de Junho de 2007.

3.5   Apoio à inovação pelo FEI

3.5.1

O FEI executa os mandatos que lhe são confiados pelos seus accionistas (BEI, Comissão Europeia) ou por terceiros (ao nível dos Estados-Membros) tendo em vista apoiar a inovação e o financiamento das PME, em conformidade com os objectivos da Comunidade. Em finais de 2006, as transacções do FEI atingiram 15 mil milhões de euros, dos quais 11,1 mil milhões para garantias e 3,7 mil milhões de euros para operações de investimento de capital de risco.

3.5.2

A Estratégia de Lisboa, que visa reforçar a competitividade europeia, é um dos principais motores das actividades do FEI (único órgão da UE dedicado ao financiamento das PME). Com 3,7 mil milhões de euros investidos em 244 fundos de investimento de capital de risco, o FEI contribuiu para colmatar o fosso em matéria de inovação, exercendo um efeito de alavanca que gerou financiamentos na ordem de 20 mil milhões de euros em favor das PME e de novas empresas de forte crescimento (entre as quais, êxitos mundiais como o Skype, Bluetooth/Cambridge Silicon Radio ou kelkoo). As conclusões da Presidência do Conselho Europeu de Março de 2005 indicam que o Conselho Europeu incentiva o FEI a diversificar as suas actividades de financiamento das transferências de tecnologias. Em 2006, as primeiras operações deste tipo foram para a concessão de licenças e a acções de spin-off.

3.5.3

No âmbito das novas perspectivas financeiras, o FEI encarregar-se-á da gestão do programa para a competitividade e inovação (PCI) e será um dos principais protagonistas da iniciativa JEREMIE. Estes dois programas visam melhorar o financiamento das PME e a engenharia financeira.

3.5.3.1

O PCI, um dos instrumentos de acção essenciais da UE dirigido às PME e à inovação, disponibiliza capital de risco (financiando, designadamente, actividades de transferência de tecnologias, redes de investidores providenciais (business angels) e actividades de eco-inovação) e oferece mecanismos de garantias às PME.

3.5.3.2

No quadro da iniciativa JEREMIE (Joint European Resources for Micro to Medium Enterprises, apoio para PME no domínio da engenharia financeira), os poderes públicos nacionais e regionais podem utilizar os recursos do FEDER sob a forma de instrumentos financeiros adaptados e que respondem a uma lógica de mercado, tais como os fundos próprios, capital de risco, garantias ou empréstimos. A iniciativa JEREMIE foi concebida de maneira a optimizar os financiamentos do FEDER atraindo recursos complementares, ao mesmo tempo que a sua aplicação é facilitada por um quadro regulamentar mais flexível. Em 2007, o aumento do capital do FEI deveria completar os recursos do PCI e do JEREMIE; calcula-se que, até 2013, mais de um milhão de PME terão beneficiado de instrumentos financeiros do FEI.

3.5.3.3

Porque funcionam como uma importante alavanca (por exemplo, 1 euro proveniente do orçamento comunitário pode gerar 50 euros para as PME através da actividade de garantia) e um poderoso catalisador face aos agentes financeiros (nomeadamente dos fundos de capital de risco), importa considerar os instrumentos financeiros da Comunidade como uma das melhores práticas da Agenda de Lisboa. Para que haja maior utilização das aplicações tecnológicas no quadro do PCI, seria conveniente identificar como público-alvo as universidades e as PME, insistir no fomento de medidas que permitam identificar o capital intelectual, medidas relativas a autorizações e respectivas concessões, acordos de cooperação e respectivos benefícios. O êxito desta acção deve ser garantida através da iniciativa JEREMIE, nos mesmos moldes dos regulamentos relativos aos financiamentos e às ajudas de Estado.

3.5.4

Em 2006, o BEI e o FEI realizaram operações conjuntas que consistiram, entre outras, na articulação de linhas de crédito do BEI com as garantias do FEI para as PME inovadoras. É provável que tais operações tenham seguimento no âmbito do programa JEREMIE.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  «Tecnologias da informação para a aprendizagem ao longo da vida e mutações industriais», CCMI/034, 13.9.2006.

(2)  COM(2006) 604 final.

(3)  Regulamento (CE) n.o 364/2004 da Comissão, de 25.2.2004, que altera o Regulamento (CE) n.o 70/2001, JO L 63 de 28.2.2004.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/93


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O emprego para as categorias prioritárias» (Estratégia de Lisboa)

(2007/C 256/18)

Em 14 de Setembro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu (confirmação em 26 de Outubro de 2006), em conformidade com o artigo 31.o do Regimento (no âmbito do trabalho do CESE efectuado a pedido do Conselho Europeu de 23 e 24 de Março de 2006), elaborar um relatório de informação sobre: «O emprego para as categorias prioritárias (Estratégia de Lisboa)».

Em 15 de Março de 2007, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, converter esse relatório de informação em parecer de iniciativa.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania que emitiu parecer em 18 de Junho de 2007, sendo relator W. GREIF.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 12 de Julho), o Comité Económico e Social adoptou, por 122 votos a favor e 2 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O presente parecer demonstrará que os ambiciosos objectivos para o emprego da Estratégia de Lisboa foram apenas parcialmente atingidos em termos quantitativos — embora haja diferenças significativas a ter em conta entre os Estados-Membros. Também em termos de qualidade do emprego, o quadro é negativo: aos exemplos positivos de boas práticas a nível de política de emprego em alguns Estados-Membros, que, do ponto de vista do CESE, deviam ser coleccionados e avaliados de forma sistemática no futuro, continuam a sobrepor-se a nível da UE factos decepcionantes.

Embora a maioria dos postos de trabalho da UE continue a ter vínculos de trabalho normalizados, é de notar que o crescimento do emprego observado nos últimos anos especialmente junto das mulheres se deve, em larga medida, à multiplicação de empregos a tempo parcial, que continua a haver uma manifesta falta de postos de trabalho adequados para os trabalhadores mais velhos e que particularmente junto dos jovens se observa um forte crescimento de formas de emprego atípicas (não normalizadas), algumas das quais sem protecção jurídica e social suficiente.

As oportunidades de integração no mercado de trabalho pouco melhoraram para os grupos desfavorecidos (como se pode verificar pelo nível elevado e persistente do desemprego prolongado, bem como pelas taxas de desemprego comparativamente elevadas entre os jovens e os trabalhadores pouco qualificados ou as reduzidas taxas de emprego sobretudo entre os mais velhos); Também para os grupos socialmente marginalizados, a situação do mercado de trabalho continua extremamente problemática.

1.2

Neste contexto, o CESE considera importante, no âmbito do actual debate sobre o conceito da flexissegurança, notar que cada definição geral, cada medida para melhorar a adaptabilidade das empresas e dos trabalhadores deve estar sempre ligada a uma elevada segurança social, a uma política de mercado activa, à educação e formação contínua, bem como ao acesso aos serviços sociais.

1.3

O CESE exorta a que, no âmbito das políticas nacionais e de emprego, seja atribuída maior importância aos aspectos a seguir descritos, no que diz respeito às categorias prioritárias no mercado de trabalho mencionadas neste parecer:

medidas para a promoção da inserção dos jovens no mercado de trabalho, com o objectivo de lhes proporcionar um primeiro emprego com perspectivas de futuro;

reforço do combate a discriminações de vária ordem e desvantagens em razão da idade, sexo, deficiência ou origem étnica, em especial no acesso à formação e ao mercado de trabalho e na permanência no mesmo;

aumento da segurança no mercado de trabalho e prevenção de «casos de precariedade», por exemplo, garantindo que os desempregados não sejam forçados a aceitar empregos sem protecção social, que o trabalho ilegal seja combatido e que seja reduzida a utilização de trabalhadoras e trabalhadores temporários;

medidas para a melhoria da qualidade dos postos de trabalho e protecção do trabalhador contra a discriminação;

mais investimentos na qualidade e adaptação das condições de trabalho aos mais idosos;

investimentos no âmbito da educação e formação contínua e da formação ao longo da vida, assim como redução das discrepâncias existentes entre as qualificações oferecidas e as procuradas no mercado de trabalho;

modernização e melhoria da segurança social das formas de emprego não normalizadas, em todos os locais onde isso se revele necessário;

redução da segmentação do mercado de trabalho de acordo com o género, sobretudo com medidas eficazes para a compatibilização da vida profissional e familiar (em especial, desenvolver serviços de cuidados a crianças com ampla cobertura, bem como formas de apoio para pessoas dependentes e seus familiares, incluindo instituições sociais abertas 24 horas por dia para essas pessoas);

redução dos obstáculos à (re)entrada e permanência no mercado de trabalho de pessoas com dependentes a seu cargo e incentivos a uma participação mais activa do pai nas tarefas de cuidado das crianças;

desenvolvimento de incentivos e serviços de apoio adequados para as empresas com vista a uma maior contratação de jovens e idosos com dificuldades específicas no mercado de trabalho.

1.4

Para os grupos socialmente marginalizados, são ainda necessárias medidas especiais:

por exemplo, a criação de mercados de trabalho de transição com incentivos adequados às empresas para aumentarem o emprego e, em simultâneo, apoio às pessoas afectadas para ultrapassarem os problemas que estão na origem da sua exclusão social (deve-se evitar a todo o custo os efeitos indesejáveis da exploração destes incentivos, bem como as distorções da concorrência);

iniciativas de emprego no sector das actividades sem fins lucrativos, particularmente no serviço público, adquirem, neste contexto, uma função especial. O orçamento da política do mercado de trabalho deverá prever meios para os incentivos adequados.

1.5

O CESE salienta que, em muitos países da UE, a aplicação das prioridades definidas neste parecer torna necessários esforços acrescidos no âmbito da política de emprego, para o que importa assegurar a correspondente dotação orçamental.

Assim, as medidas da política activa do mercado de trabalho ao nível nacional e europeu não produzirão grande efeito, se não forem devidamente dotadas no planeamento orçamental dos Estados-Membros.

O CESE detectou, a este respeito, uma grande disparidade entre propostas de iniciativas no domínio da política do mercado de trabalho nos diversos países — por exemplo no quadro dos respectivos planos de reforma nacionais — e entre as dotações orçamentais (1).

Melhor incorporação das experiências positivas dos países nos programas de acção nacionais e utilização do FSE 2007-2013 em consonância.

1.6

O CESE já referiu várias vezes, neste contexto, que a dotação orçamental nesta área requer um ambiente macroeconómico favorável, que deve assentar numa política económica orientada para o crescimento, a fim de ultrapassar a situação persistente de debilidade conjuntural (2).

1.7

Em vários Estados-Membros, as contribuições sociais associadas aos custos salariais subiram para um nível que pode ter um efeito negativo na criação de postos de trabalho. Em muitos caso o regresso ao trabalho pode-se revelar pouco atractivo devido à pequena diferença entre o salário líquido (após os impostos) e o nível dos benefícios sociais. Importa reduzir estas «armadilhas do desemprego» sem pôr em causa a cobertura financeira dos sistemas de segurança social. Neste aspecto, o CESE concorda com as recomendações do grupo de peritos de alto nível sobre o futuro da política social numa União alargada, nomeadamente a de se alargar a base de financiamento dos sistemas de segurança social, repartindo assim a carga fiscal equitativamente por todos os factores de produção e aliviando o factor trabalho (3).

1.8

No que diz respeito à revisão próxima das orientações para a política de emprego em 2008, o CESE considera necessária a definição mais clara de prioridades e a proposta de medidas mais concretas para vários dos campos mencionados no presente parecer.

Neste sentido, o CESE defende uma formulação mais vinculativa dos objectivos ao nível europeu, a fim de impor aos Estados-Membros um quadro claro com obrigações inequívocas. Para o CESE, a monitorização da aplicação desses objectivos a nível nacional exige que a Comissão desempenhe um papel mais importante na estratégia de emprego.

Além disso, o CESE preconiza uma melhoria dos objectivos, sobretudo no emprego juvenil e no combate ao desemprego entre os jovens (por exemplo, uma redução do prazo de seis meses para a inserção na vida activa dos jovens que procuram um emprego ou um estágio), na promoção da igualdade de oportunidades, no incentivo às pessoas com deficiência e na integração dos imigrantes.

O CESE espera que, desta forma, os programas de reformas nacionais possam, no futuro, ser mais ambiciosos no que respeita à política de emprego e que se verifique uma melhoria qualitativa em matéria de prazos, responsabilização, carácter vinculativo e base financeira. Neste contexto, o CESE sugere que se reflicta sobre como adoptar objectivos concretos para que se reservem recursos orçamentais adequados para medidas de política de mercado activa em cada um dos Estados-Membros.

O CESE apresentará o seu ponto de vista sobre os ajustamentos necessários nas orientações da política de emprego a partir de 2009 (aqui apenas esboçados) num outro parecer.

2.   Contexto

2.1

Nas suas conclusões de 23 e 24 de Março de 2006, O Conselho Europeu solicitou ao CESE que, na perspectiva da cimeira da Primavera de 2008, elaborasse um «relatório sumário sobre as actividades de apoio à Parceria para o Crescimento e o Emprego» considerando, entre outros aspectos, a prioridade de «aumentar as oportunidades de emprego para as categorias prioritárias». Assim, o CESE elaborou o presente parecer de iniciativa, que envolveu, na sua produção, as competências técnicas dos Conselhos Económicos e Sociais nacionais.

2.2

O CESE sempre frisou que o aumento da competitividade e o crescimento económico sustentado não são um fim em si no âmbito da Estratégia de Lisboa, mas devem sim contribuir também para reduzir a elevada taxa de desemprego na UE, tentar alcançar o pleno emprego, proporcionar uma base mais sólida aos sistemas de segurança social e garantir a protecção contra a exclusão social (4).

2.3

Neste sentido, no domínio da política de emprego, deviam emanar da Estratégia de Lisboa novos impulsos para a estratégia europeia para o emprego, que promoveriam o aumento da taxa de emprego e a melhoria da qualidade do mesmo. O objectivo da Estratégia de Lisboa não é apenas aumentar o emprego, mas sim melhorar a qualidade dos postos de trabalho. Consequentemente, é dada a mesma prioridade aos investimentos em capital humano, investigação, tecnologia e inovação que às medidas ao nível do mercado de trabalho e das políticas estruturais (5).

2.4

No parecer que se segue, o CESE concentrará a sua análise sobre o desenvolvimento do mercado de trabalho europeu e as suas recomendações políticas nos grupos-alvo relativamente aos quais o Conselho tem vindo a instar repetidamente os Estados-Membros a adoptarem medidas especiais com carácter de urgência, com vista a

melhorar a situação dos jovens no mercado de trabalho e reduzir significativamente o desemprego juvenil;

implementar estratégias para o envelhecimento activo, de modo a que as pessoas mais idosas possam prolongar a sua vida profissional;

promover fortemente o emprego das mulheres e, tanto para os homens como para as mulheres, possibilitar uma melhor conciliação da vida profissional e privada;

melhorar a integração das pessoas com deficiência e a respectiva permanência no mercado de trabalho;

aumentar a taxa de emprego e as oportunidades de emprego dos imigrantes e das minorias étnicas.

2.5

O CESE propõe para cada um destes grupos-alvo um pacote de medidas preventivas e activas de (re)integração, as quais deverão ser objecto da máxima atenção no âmbito da política de mercado de trabalho e de emprego dos Estados-Membros. São abordados também os grupos socialmente marginalizados que frequentemente são excluídos do mercado de trabalho. Com base nestes princípios, são formuladas recomendações políticas respeitantes nomeadamente às orientações da política de emprego, que devem ser revistas até à Cimeira da Primavera de 2008.

3.   Taxas de actividade, desemprego e emprego — Ponto da situação (6)

3.1

Pela primeira vez desde 2001, verificou-se na UE, em 2005 e 2006, um crescimento do emprego e um recuo considerável da taxa de desemprego (de 9,0 % em 2004 para 7,9 % em 2006). Com um crescimento de 0,6 %, registou-se uma dinâmica da taxa de emprego mais forte entre as mulheres do que entre os homens em relação à estagnação de anos anteriores. Esta tendência positiva mantém-se em 2007 (7).

3.2

Todavia, há que registar, com desapontamento, o seguinte:

Os progressos na realização dos objectivos intermédios de Lisboa e Estocolmo são lentos e os objectivos não foram atingidos em 2005, nem no que diz respeito à taxa de emprego global de 67 % (2005: 63,8 %), nem na taxa de emprego específica das mulheres de 57 % (2005: 56,3 %). Torna-se cada vez mais evidente que os objectivos para 2010 não serão atingidos em diversos Estados-Membros, nem na Comunidade no seu conjunto.

Embora o trabalho a tempo inteiro continue a ser a forma de emprego predominante na UE, é de notar que o crescimento do emprego observado nos últimos anos — especialmente junto das mulheres — se deve, em larga medida, à multiplicação de empregos a tempo parcial (o que se traduz por um menor crescimento do emprego equivalente de tempo inteiro, ou mesmo uma redução em alguns Estados-Membros).

Nos últimos anos, o crescimento mais significativo da taxa de emprego tem-se registado ao nível dos mais velhos. Apesar disso, a taxa de emprego de trabalhadores mais velhos situa-se também bastante abaixo dos objectivos (taxa média anual de apenas 42,5 % no grupo etário 55-64 em 2005). Apenas 9 países da UE atingiram o objectivo de 50 % (grande diferença entre homens e mulheres: o objectivo foi cumprido para os homens em 17 países, mas para as mulheres apenas em 4 países, os da Escandinávia e a Estónia).

A taxa de desemprego dos jovens continuou, em 2005, com 18,5 % na média dos países da UE-25, a ser cerca de duas vezes mais elevada do que a taxa de desemprego global.

Apesar de melhorias gerais em vários Estados-Membros, particularmente naqueles que tinham uma taxa de desemprego muito elevada, o desemprego permanece a um nível elevado em toda a UE (pouco menos de 8 %) e aumentou mesmo em alguns países.

As diferenças regionais nas taxas de emprego continuam a ser grandes em alguns Estados-Membros (em especial quando se observa o emprego equivalente de tempo inteiro). O número de pessoas a viver actualmente em regiões da UE-27 com uma taxa de desemprego superior a 15 % aumentou significativamente com os alargamentos.

Para os grupos socialmente marginalizados, a situação do mercado de trabalho continua extremamente problemática.

Perante os desenvolvimentos do mercado de trabalho apresentados aqui, e apesar de alguns progressos relativos, ainda há um longo caminho a percorrer para atingir os ambiciosos objectivos de Lisboa.

3.3

Tanto mais que o desenvolvimento do emprego revela as seguintes características e tendências (por vezes muito variáveis de um país e de um sector para outro):

As oportunidades de integração no mercado de trabalho pouco melhoraram para os grupos desfavorecidos (como se pode verificar pelo nível elevado e persistente do desemprego prolongado, bem como pelas taxas de desemprego comparativamente elevadas entre os jovens e os trabalhadores pouco qualificados ou as reduzidas taxas de emprego sobretudo entre os mais velhos);

Embora a maioria dos postos de trabalho na UE continue a ter vínculos de trabalho normalizados, os dados disponíveis apontam para um forte crescimento de formas de emprego atípicas (não normalizadas), algumas das quais sem protecção jurídica e social suficiente. Em termos globais, a percentagem de vínculos laborais a prazo tem subido, em especial entre os jovens, onde essa percentagem está acima da média. Os contratos de prestação de serviços, o trabalho a tempo parcial, os falsos independentes (8) e os vínculos laborais insignificantes e com menos direitos sociais revelam também um forte crescimento, ainda que a situação varie bastante entre os Estados-Membros. De uma forma geral, a precariedade tem aumentado em especial junto dos grupos desvaforecidos. Só quando essas formas de trabalho forem escolhidas livremente e gozarem de protecção social, poderão servir de ponte para o mercado de trabalho normal;

Em diversos Estados-Membros, a insegurança do emprego aumentou sobretudo no segmento com baixas qualificações, em especial entre os jovens que abandonam a escola e as pessoas sem formação profissional. Devido ao desequilíbrio entre a procura e a oferta de qualificações, a entrada no mercado de trabalho e o abandono de uma situação de desemprego afiguram-se particularmente difíceis para este segmento;

As pessoas com dependentes continuam a ter dificuldades em encontrar um posto de trabalho estável e satisfatório;

Os deficientes continuam a pertencer em grande medida ao grupo dos excluídos do mercado de trabalho. De acordo com os dados europeus mais recentes, apenas 40 % das pessoas com deficiência trabalham. Os dados são ainda mais preocupantes no caso das pessoas com deficiência grave;

Além disso, existe um grande número de pessoas cuja marginalização radica em causas como patologias de adição, sobreendividamento, ou situação de sem-abrigo e cuja integração no mercado de trabalho exige medidas especiais de inserção social;

As condições de trabalho e as oportunidades no mercado de trabalho são, na maioria dos Estados-Membros, mais precárias para os imigrantes e as pessoas com um passado ligado à imigração do que para a restante população. Deve-se prestar, aqui, especial atenção à população cigana que, com o alargamento à Roménia e à Bulgária, se tornou a maior minoria da Europa e cuja situação no mercado de trabalho (com taxas de desemprego que chegam a atingir os 70-90 %) é, por várias razões, preocupante. O CESE pronunciar-se-á sobre esta questão num parecer de iniciativa separado.

3.4

O crescimento do sector informal com condições de emprego precárias e, muitas vezes, rendimentos reduzidos acarreta o perigo de os grupos que não conseguem fazer a transição para o mercado de trabalho regulamentado se tornarem desqualificados a longo prazo. Esta evolução (difícil de aferir através dos dados disponíveis) não só traz grandes incertezas às pessoas afectadas, mas também conduz a elevadas quebras de receitas fiscais e, por fim, coloca em causa a sustentabilidade do potencial de produção na UE.

4.   Criação de um quadro para o crescimento e para mais e melhor emprego

4.1

Há anos que predominam as orientações políticas europeias que apontam os dificuldades estruturais do sistema do mercado de trabalho como responsáveis pelos problemas do mercado de trabalho. Em muitos países da UE, a prioridade política de emprego recaiu unilateralmente sobre a redução dos níveis gerais de exigência no direito do trabalho, o agravamento das condições de acesso aos direitos, a redução das prestações sociais e a flexibilização dos vínculos laborais.

4.2

Por outro lado, em muitos países, foram negligenciadas medidas activas ao nível do mercado de trabalho, como por exemplo, a promoção da empregabilidade, o combate ao défice de qualificações e programas centrados na integração de grupos desfavorecidos no mercado de trabalho, embora desde 1995 alguns países promovam essas medidas com despesas muito reduzidas. Na maioria dos países para os quais existem dados, registou-se mesmo, nos últimos anos, um decréscimo da quota da despesa para medidas activas no total das despesas para a política do mercado de trabalho (serviços de apoio activos e passivos). É da maior importância que os recursos disponibilizados para medidas activas no âmbito do mercado de trabalho sejam assegurados em função dos desafios e que, ao mesmo tempo, seja reforçada a eficácia das medidas da política do mercado de emprego, assim como a sua concentração nos grupos-alvo mencionados.

4.3

O CESE já referiu várias vezes, a este respeito, que as medidas activas ao nível do mercado de trabalho e a reformas estruturais só podem, em última análise, ser bem sucedidas num ambiente macroeconómico favorável, que assente na saída da situação persistente de fraqueza conjuntural e na consolidação do crescimento (9) Para isso é necessário um compromisso, a nível nacional e da UE, com uma política económica orientada para o crescimento, com as seguintes condições de política monetária, fiscal e económica:

De acordo com o seu mandato, o Banco Central Europeu devia contribuir, especialmente através da sua política de taxas de juro, para o crescimento económico e a diminuição do desemprego, mantendo ao mesmo tempo a estabilidade dos preços. Só será possível um elevado crescimento da taxa de emprego se houver um crescimento económico constante superior ao crescimento da produtividade a médio prazo.

Assim, o maior espaço de manobra oferecido pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento reformado deve ser usado para permitir aos países da UE contrariarem a conjuntura e criarem uma margem orçamental para reformas estruturais que gerem consenso social e um nível apropriado de investimentos públicos.

Os objectivos da Estratégia de Lisboa indicam para onde devem ser canalizados os investimentos: desenvolvimento das infra-estruturas de comunicações e transportes, protecção do clima, estratégia a favor da investigação e do desenvolvimento, rede de serviços de cuidados a crianças com cobertura nacional, promoção da educação e formação contínua, medidas activas ao nível do mercado de trabalho e qualidade dos postos de trabalho. Os programas nacionais de reforma devem ser concebidos de tal maneira que resultem num programa de estímulo à economia coordenado a nível europeu, para o qual todos os actores a nível nacional e da UE dêem o seu contributo.

5.   Combate eficaz do desemprego juvenil

5.1

O desemprego juvenil continua a ser um dos temas quentes da política de emprego na UE. A taxa de desemprego juvenil situa-se, em todos os países da UE, acima da taxa de desemprego global e, na maioria deles, corresponde pelo menos ao dobro da taxa do conjunto da economia nacional. Em alguns países da UE-15 e em muitos novos países da UE a situação é ainda mais problemática. Em muitos Estados-Membros, a insegurança no emprego aumentou até no segmento das qualificações mais elevadas.

5.2

A inserção no mercado de trabalho ocorre, cada vez mais, através de formas de emprego alternativas, com condições de trabalho e de direitos sociais por vezes muito precárias. A fronteira entre o trabalho formal e o informal é cada vez mais difícil de distinguir. Para determinados grupos de jovens, nomeadamente aqueles com menos qualificações, os imigrantes ou os provenientes de camadas da população discriminadas, a transição para um emprego regulamentado afigura-se cada vez mais difícil. O risco de permanência à margem da sociedade activa aumenta consideravelmente nos casos em que várias destas características se sobrepõem.

5.3

O objectivo aqui é dar perspectivas de futuro para lá do trabalho temporário ao maior número possível de jovens. Esta questão também tem aspectos demográficos: a situação económica dos jovens tem uma influência determinante na disponibilidade para iniciarem família. Neste sentido, é de louvar o facto de a Comissão Europeia promover, no seu relatório da Primavera, não só a melhoria contínua das qualificações, mas também um reforço das medidas activas ao nível do mercado de trabalho e insistir, em especial, na implementação expedita de um sistema de apoio para jovens que procuram emprego e no combate aos problemas estruturais na transição da formação para a vida activa.

5.4

A título de exemplo positivo, podem citar-se os modelos aprovados de combinação de ensino escolar com formação orientada para o trabalho e para as necessidades das empresas em alguns Estados-Membros (Alemanha, Áustria e, em certa media, Países Baixos). Numerosos estudos sublinham a qualidade desta «formação profissional dupla» e atribuem-lhe um papel essencial no que toca a facilitar a transição entre a escola e a vida activa, contribuindo, assim, para reduzir a disparidade entre a taxa de desemprego dos jovens e a taxa de desemprego geral.

5.5

Medidas activas e preventivas no âmbito da educação e formação contínua para a melhoria das oportunidades de emprego dos jovens (10):

Garantia de uma qualificação de qualidade, desde a formação inicial até à formação profissional e em serviço, que possibilite aos jovens aceder sem dificuldades ao mercado de trabalho e nele permanecer de forma continuada, cabendo a responsabilidade, neste caso, não só ao sector público como também ao sector privado;

Assistência activa precoce aos jovens que procuram um estágio ou emprego (se necessário logo ao fim de 4 meses), programas prioritários reforçados e apoio e acompanhamento individuais à integração de grupos problemáticos, tais como os jovens em situação de desemprego prolongado, bem como os que abandonaram a escola ou a aprendizagem, através, nomeadamente, de projectos de emprego de utilidade pública e de promoção da formação;

Desenvolvimento generalizado das possibilidades de acesso fácil dos homens e das mulheres jovens a orientação profissional e a informação em todos os níveis da formação; correspondente melhoria da qualidade dos serviços de emprego e atribuição aos mesmos de recursos humanos apropriados;

Redução das discrepâncias existentes entre as qualificações oferecidas e as procuradas no mercado de trabalho; melhoria da eficiência dos sistemas educativos básicos (particularmente, redução das taxas de abandono escolar prematuro e luta contra o analfabetismo), bem como maior permeabilidade entre o ensino escolar e a formação posterior; redução da segregação com base no género na orientação profissional;

Aplicação de medidas que garantam que o trabalho temporário e os empregos com insuficiente segurança social sejam apenas uma solução temporária para os jovens.

6.   Melhoria das perspectivas de integração para imigrantes

6.1

Na maioria dos países da UE, pouco mudou no que diz respeito à discriminação dos imigrantes e seus familiares no mercado de trabalho. Continuam demasiado presentes nos sectores com piores condições de trabalho e de remuneração, correm um risco muito superior de ficarem desempregados e permanecem, em grande medida, em empregos caracterizados pela pouca protecção, pelos riscos acrescidos para a saúde, pela falta de segurança e (em alguns países) pela protecção limitada dos salários.

6.2

É especialmente preocupante que esta posição precária no mercado de trabalho seja «herdada» pelas segundas gerações de imigrantes, também devido a grandes desvantagens educativas. Os jovens provenientes de famílias de imigrantes contam-se, na maioria dos Estados-Membros, entre os grupos mais afectados pela precariedade do emprego e pelo risco de serem empurrados para a margem do trabalho regulamentado.

6.3

O CESE já afirmou, em várias ocasiões, que julga necessária a imigração de mão-de-obra, nomeadamente em razão do desenvolvimento demográfico na UE, e apontou o exemplo positivo de vários Estados-Membros, como a Espanha e a Irlanda. Tal deve, no entanto, ser sempre conciliado com perspectivas de uma correspondente política de integração nos Estados-Membros, especialmente no que diz respeito ao emprego (11). A situação em matéria de imigração difere fortemente de uns Estados-Membros para outros, assim como as medidas adoptadas no domínio da integração, nomeadamente no que se refere à política de emprego e de educação. Os Estados-Membros devem dar especial atenção à situação dos requerentes de asilo que, muitas vezes, são particularmente alvo de descriminações.

6.4

Aspectos principais da melhoria da integração dos imigrantes:

Importa dedicar uma atenção especial ao apoio individual (pré-)escolar e ao investimento precoce na qualificação linguística e profissionalizante, evitar a discriminação na inserção profissional (sobretudo através da eliminação da barreira linguística o mais cedo possível), bem como agilizar o reconhecimento de qualificações académicas obtidas no estrangeiro pelos imigrantes;

É necessário incorporar transversalmente a integração em toda a política social e do mercado de trabalho (por exemplo, aumentar as competências interculturais das autoridades e dos serviços de emprego, bem como apoiar as empresas, especialmente as PME); dotação apropriada a nível europeu e nacional das medidas de promoção da integração;

Eliminação dos obstáculos institucionais e da discriminação no acesso ao mercado de trabalho nos Estados-Membros (por exemplo, redução dos prazos para obtenção de autorização de trabalho — particularmente para os requerentes de asilo (12)), bem como prevenção do dumping salarial, com o reforço simultâneo das perspectivas da integração na política de imigração europeia (impedir uma politica migratória que dificulte a integração e, consequentemente, promova formas de trabalho precárias e marginalização);

Melhoria dos dados disponíveis quanto à correlação entre antecedentes migratórios, segregação e discriminação no mercado de trabalho (13);

Medidas preventivas, sanções e parcerias entre os parceiros sociais e as autoridades públicas a nível nacional para combater o trabalho ilegal a fim de evitar o dumping social e as distorções da concorrência, nomeadamente em ligação com os movimentos transfronteiriços de trabalhadores.

7.   Aproveitar as oportunidades de emprego para os trabalhadores mais velhos

7.1

A resposta fulcral ao desafio demográfico só pode residir na política de crescimento concertada e no aumento do emprego. O potencial de mão-de-obra necessário existe em números suficientes. Porém, o potencial de emprego dos trabalhadores mais velhos (+ de 55) continua subaproveitado em toda a Europa.

7.2

O risco de desemprego prolongado aumenta rapidamente com a idade. Em média, na UE-25, o desemprego prolongado entre os mais velhos (50-64) é superior a 60 %. Perante este cenário, é preciso tomar as medidas necessárias para que os trabalhadores mais velhos tenham, de facto, a oportunidade de encontrar um emprego e de o manter a longo prazo.

7.3

As principais causas do abandono precoce da vida activa são a degradação do estado de saúde resultante de condições de trabalho duras, a elevada intensidade de trabalho, o despedimento precoce de trabalhadores mais velhos, a insuficiente formação contínua e a falta de oportunidades de (novo) emprego. Os esforços para aumentar as taxas de emprego dos mais velhos que assentam essencialmente em alterações dos regimes de aposentação susceptíveis de agravar as condições de acesso e restringir o direito aos benefícios passam ao lado do problema.

7.4

Só uma política consciente de «envelhecimento activo», incluindo possibilidades amplas de participar em medidas de formação contínua e em aprendizagem ao longo da vida, pode conduzir a um crescimento sustentado da taxa de emprego dos trabalhadores mais velhos. Os modelos de sucesso aplicados nos países nórdicos (principalmente o pacote integrado de medidas adoptadas na Finlândia, no quadro do programa de acção nacional em favor das pessoas mais velhas) demonstram a existência de uma solução socialmente aceitável que permite criar, com a participação dos parceiros sociais, um mercado de trabalho funcional para trabalhadores mais velhos, com grande estabilidade de emprego e um elevado nível de capacidade de trabalho e de actividade das pessoas mais velhas.

7.5

Elementos centrais de uma reestruturação consequente para um mercado de trabalho adaptado ao envelhecimento (14):

Aconselhamento e acompanhamento generalizados das pessoas que procuram emprego, assim como apoio activo à mediação (por exemplo, emprego apoiado, subsídios de integração, projectos sociais de utilidade pública) e, quando necessário, medidas de reabilitação para uma reinserção duradoura; dotação financeira adequada das medidas activas ao nível do mercado de trabalho, a fim de possibilitar um planeamento seguro, a longo prazo, dos serviços de emprego;

Criação de estímulos socialmente aceitáveis para uma aposentação mais tardia e, onde seja necessário ou desejável, de modelos atractivos de transição gradual da vida activa para a aposentação no interior dos sistemas públicos de pensões (entre outros, desenvolvimento de modelos de trabalho a tempo parcial para trabalhadores mais velhos);

medidas que tenham como objectivo prolongar a vida activa ao nível físico e psicológico, nomeadamente a diminuição da pressão do desempenho nas empresas e a adaptação das condições de trabalho à idade dos trabalhadores (por exemplo, incentivos à protecção da saúde no local de trabalho, programas gerais para as empresas de promoção da saúde e de prevenção, assim como de protecção dos trabalhadores);

maior participação dos trabalhadores mais velhos na formação contínua (campanha de qualificação 40+, incentivos à participação na formação contínua dentro da empresa, em especial dos menos qualificados);

medidas de sensibilização favoráveis aos trabalhadores mais velhos (valorização da experiência e transferência das competências adquiridas na vida activa para os trabalhadores mais jovens) e aconselhamento e apoio às empresas, em particular PME, no planeamento dos recursos humanos e no desenvolvimento de uma organização do trabalho adaptada aos mais velhos.

8.   Melhorias no emprego das mulheres

8.1

Embora o nível de qualificação formal das mulheres tenha aumentado significativamente nos últimos 30 anos, continua a não existir igualdade de oportunidades no mercado de trabalho. As mulheres permanecem, em grande medida, nos sectores tradicionais dos serviços e nos sectores da indústria que tradicionalmente utilizam em larga escala mão-de-obra feminina. As mulheres têm muito mais dificuldade em explorar as suas qualificações académicas para obterem um emprego. Continua a ser-lhes incomparavelmente mais difícil conciliar a vida profissional e familiar do que aos homens.

8.2

A percentagem de emprego a tempo parcial é muito mais elevada, em todos os escalões etários, do que nos homens. O aumento do trabalho a tempo parcial que, quando escolhido livremente e realizado em condições que não conduzam a um impasse em termos de progressão salarial e de perspectivas no mercado de trabalho, é em si algo de positivo, continua a ser, na maioria dos Estados-Membros, um dos factores principais da segmentação do mercado de trabalho por sexos.

8.3

A disparidade entre os rendimentos dos homens e das mulheres continua a ser grande em quase todas as categorias profissionais e independentemente do estatuto no mercado de trabalho. As longas interrupções da actividade profissional devido a obrigações de assistência e actividades de cuidado de dependentes têm um efeito particularmente negativo nas oportunidades de progressão profissional, no rendimento e nos direitos sociais. Enquanto os homens continuam a poder contar com aumentos progressivos associados à antiguidade, os rendimentos das mulheres estagnam precisamente nos grupos etários em que elas interrompem a vida profissional para cuidar dos filhos ou passam a exercer a sua profissão a tempo parcial.

8.4

Os exemplos da Dinamarca e da Suécia mostram que a situação se pode alterar e que a incorporação transversal das questões da igualdade de género na política de mercado pode ser mais do que um slogan. Nestes países, as disparidades salariais são menores, as taxas de emprego das mulheres e a cobertura das necessidades em termos de lugares disponíveis em creches (em especial para crianças com menos de 2 anos) são bastante mais elevadas do que nos outros Estados-Membros da UE. Outro exemplo positivo é o dos Países Baixos. Aí a taxa de emprego das mulheres é elevada, com números muito elevados de trabalho a tempo parcial que, na maioria dos casos, é escolhido por vontade própria.

8.5

Ângulos para a resolução dos problemas estruturais do emprego das mulheres (15):

medidas para combater a discriminação existente no mercado de trabalho e as causas estruturais da disparidade de rendimentos entre homens e mulheres, em especial a promoção da segurança social individual das mulheres, sobretudo através de medidas de redução do emprego a tempo parcial com salários baixos e sem protecção e de melhor regulamentação do emprego a tempo parcial (por exemplo, alargamento do direito ao trabalho em tempo parcial para ambos os pais, com direito ao regresso ao trabalho a tempo inteiro, aumento da integração nos programas de formação contínua internos das empresas);

desenvolvimento em larga escala de serviços externos de cuidados para crianças em idade pré-escolar e escolar, com vasta cobertura e elevada qualidade, compatíveis com os horários de trabalho e, de forma geral, acessíveis em termos económicos; contributos para a promoção efectiva da divisão das obrigações familiares entre os dois parceiros (por exemplo, incentivos ao aumento da participação do pai);

eliminação de medidas de política familiar com fortes incentivos ao abandono da vida activa ou a uma interrupção prolongada, com as consequentes dificuldades acrescidas de uma reinserção adequada; o «subsídio de maternidade» não deve ter um efeito negativo na evolução do rendimento, não deve representar, para as mulheres, mais um incentivo ao abandono da vida activa e não deve criar obstáculos suplementares à divisão das tarefas de cuidado das crianças entre os parceiros;

medidas de política de emprego para a promoção da reinserção na vida activa após a licença de maternidade ou paternidade (nomeadamente, apoio a iniciativas para a autonomia) e medidas contra a desqualificação e a perda de rendimentos (por exemplo, modelos flexíveis de formação contínua durante a licença de maternidade ou paternidade, ou permanência no posto de trabalho com horário reduzido);

horários adaptados à vida familiar (por exemplo, possibilidade de os pais de crianças em idade pré-escolar e escolar poderem participar na organização do seu tempo de trabalho, acordos para teletrabalho e direito a uma organização variável do tempo de trabalho para pessoas com dependentes a seu cargo).

9.   Promoção das oportunidades dos deficientes no mercado de trabalho

9.1

As pessoas com deficiência continuam a pertencer em larga medida ao grupo dos excluídos do mercado de trabalho. Os trabalhadores deficientes têm mais probabilidades de ocupar empregos mal pagos e são muitas vezes discriminados no acesso à formação e à progressão na carreira. Tendo em conta que 15 % da população da UE em idade activa é portadora de algum tipo de deficiência e dada a baixa taxa de emprego deste grupo, o aumento da taxa de emprego dos deficientes contribuiria significativamente para atingir os objectivos de Lisboa.

9.2

Neste contexto, o CESE congratula-se com o documento da Comissão intitulado «Integração da Deficiência na Estratégia Europeia de Emprego» (16) que constitui um ponto de partida positivo para se avançar na integração dos deficientes no mercado de trabalho e relembra que essa integração é a melhor arma para combater a exclusão social. O CESE recorda que a maioria das pessoas adquire a deficiência durante a sua vida activa, mas poucos têm a oportunidade de regressar ao mercado de trabalho num emprego adaptado à sua deficiência. Neste domínio, é de realçar, pela positiva, o exemplo da rigorosa legislação ant-discriminação existente no Reino Unido que está ligada a mecanismos de denúncia e o exemplo dinamarquês que associa flexibilidade no mercado de trabalho a segurança social suficiente e a um elevado grau de formação profissional e contínua.

9.3

Medidas prioritárias para promover o emprego das pessoas com deficiência (17):

ajustamento dos sistemas fiscais e de benefícios de modo a tornar atractiva a vida activa e a transição para o trabalho, por exemplo através de regalias no emprego; além disso, devia ser possível voltar a beneficiar da pensão por deficiência após um período experimental;

desenvolvimento, aplicação e apoio de programas activos do mercado de trabalho (em especial medidas de reabilitação) especificamente para pessoas com deficiência, assim como medidas que facilitem a transição do emprego protegido para o mercado de trabalho global (por exemplo, adaptação de acções de informação e comunicação para pessoas com deficiência que procuram emprego);

tornar os locais de trabalho adequados para pessoas com deficiência e apoiar acções positivas dirigidas especificamente a trabalhadores que adquiriram a sua deficiência durante a vida activa; deviam ser consideradas as possibilidades de combinar períodos de licença com formação contínua, adaptar as descrições das funções desempenhadas ou atribuir outras funções;

concessão de apoio adicional aos trabalhadores com deficiência, bem como serviços de assistência a pessoas com deficiência, de modo a permitir que os trabalhadores que tenham na sua família um deficiente possam continuar a trabalhar.

Bruxelas, 12 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Ver o parecer do CESE de 17.5.2006 sobre a «Proposta de decisão do Conselho relativa às orientações para o emprego dos Estados-Membros», relator W. GREIF (JO C 195 de 18.8.2006).

(2)  Ver o relatório do grupo de peritos de alto nível sobre o futuro da política social na União Europeia alargada, de Maio de 2004.

(3)  Idem.

(4)  Ver, entre outros, o parecer exploratório do CESE de 13.9.2006 sobre «Qualidade da vida activa, produtividade e emprego no contexto da globalização e dos desafios demográficos». Relatora: U. ENGELEN-KEFFER (JO C 318 de 23.12.2006).

(5)  Ver, a este propósito, o parecer de iniciativa do CESE de 9.2.2005 sobre «Política de emprego: Papel do CESE após o alargamento e na perspectiva do processo de Lisboa». Relator W. GREIF (JO C 221 de 8.9.2005).

(6)  Ver os diferentes gráficos em anexo.

(7)  «O emprego na Europa 2006».

(8)  Ver Livro Verde «Modernizar o direito do trabalho para enfrentar os desafios do século XXI», COM(2006) 708 final.

(9)  Ver, nomeadamente, o parecer do CESE de 11.12.2003 sobre as «Orientações gerais de política económica para 2003-2005», relator: T. DELAPINA (JO C 80 de 30.3.2004) e o parecer do CESE de 17.5.2006 sobre a «Proposta de decisão do Conselho relativa às Orientações para o Emprego dos Estados-Membros», relator: W. GREIF (JO C 195 de 18.8.2006).

(10)  Ver os seguintes pareceres do CESE: «Comunicação da Comissão ao Conselho sobre as políticas europeias de juventude — Responder às preocupações dos jovens europeus — Aplicação do Pacto Europeu para a Juventude e promoção da cidadania activa», (26.10.2005), relatora: J. van TURNHOUT (JO C 28 de 3.2.2006); «Comunicação da Comissão relativa à Agenda Social» (13.7.2005), relatora U. ENGELEN-KEFER (JO C 294 de 25.11.2005); «Proposta de decisão do Conselho relativa às orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros (em conformidade com o artigo 128.o do Tratado CE)» (31.5.2005), relator: H. MALOSSE (JO C 286, de 17.11.2005).

(11)  Ver o parecer do CESE de 10.12.2003 sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões relativa à imigração, à integração e ao emprego», relator: L. M. PARIZA CASTAÑOS (JO C 80 de 30.3.2004).

(12)  Ver o parecer do CESE de 28.11.2001 sobre a «Proposta de Directiva do Conselho que estabelece normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros», relator: D. MENGOZZI (JO C 48 de 21.2.2002).

(13)  O Eurostat está actualmente a desenvolver um módulo ad hoc sobre a situação laboral dos imigrantes e seus descendentes directos, que será implementado na recolha de dados de 2008. O objectivo é melhorar a cobertura das pessoas nascidas no estrangeiro no âmbito do Inquérito Europeu às Forças de Trabalho.

(14)  Ver o parecer do CESE de 15.12.2004 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Aumentar os níveis de emprego dos trabalhadores mais velhos e retardar a saída do mercado de trabalho», relator: G. DANTIN (JO C 157 de 58.6.2005).

(15)  Ver o parecer do CESE de 13.9.2006 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões: Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010», relatora: G. ATTARD (JO C 318 de 23.12.2006) e o parecer do CESE de 19.9.2005 sobre a «Pobreza entre as mulheres na Europa», relatora B. KING (JO C 24 de 31.1.2006).

(16)  EMCO/II/290605.

(17)  Ver o parecer do CESE de 20.04.2006 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a situação das pessoas com deficiência na União Europeia alargada: o Plano de Acção Europeu 2006-2007», relatora: T. GREIF (JO C 185 de 8.8.2006) e o parecer exploratório do CESE de 17.1.2007 sobre «Igualdade de oportunidades para pessoas com deficiência», relator M. JOOST JO C 93 de 27.4.2007.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/102


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada»

(2007/C 256/19)

Em 13 de Fevereiro de 2007, o Comité Económico e Social Europeu foi solicitado pela próxima Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia a emitir parecer sobre o: «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 18 de Junho de 2007, tendo sido relator Peter CLEVER.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 145 votos a favor e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Antecedentes

1.1

No quadro da Estratégia de Lisboa, os Chefes de Estado e de Governo acordaram em aumentar a taxa de emprego das mulheres para 60 % até 2010. Este objectivo foi confirmado nas orientações integradas (Orientação 17) adoptadas em 2005, que se constituem como elemento central do novo mecanismo orientador da Estratégia de Lisboa.

1.2

A Estratégia de Lisboa atingirá mais rapidamente, e de um modo mais sustentável, os objectivos ambiciosos que se propõe nos domínios do crescimento, do emprego e da competitividade se, apesar do decréscimo da população em idade activa, decorrente do envelhecimento demográfico, lograrmos continuar a aumentar nos próximos anos o número de trabalhadores na UE, melhorando as suas qualificações. Há boas possibilidades de se atingir ambos os objectivos através de uma taxa de emprego das mulheres nitidamente superior, uma vez que a nova geração de mulheres pretende participar mais no mercado de trabalho e usufrui de melhor formação. Mas há ainda obstáculos a ultrapassar.

1.3

Para que estes objectivos possam ser concretizados, os Estados-Membros acordaram, entre o mais, no seguinte:

adoptar medidas resolutas para aumentar a taxa de emprego das mulheres e reduzir as disparidades de género em termos de emprego, desemprego e remuneração; e

alcançar uma melhor conciliação do trabalho com a vida privada e disponibilizar estruturas acessíveis e económicas de acolhimento de crianças e de outras pessoas a cargo (Orientação 18).

1.4

A Presidência portuguesa solicitou ao Comité Económico e Social Europeu que elaborasse um parecer exploratório sobre o tema «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada».

1.5

Na óptica dos parceiros sociais, a conciliação da vida profissional, familiar e privada representa um contributo importante para o crescimento económico, o bem-estar e a competitividade na Europa.

1.6

Por outro lado, a conciliação da vida profissional, familiar e privada é uma das prioridades estabelecidas pela Comissão Europeia no roteiro para a igualdade entre homens e mulheres, adoptado em Março de 2006 (1). Para atingir este fim, a Comissão definiu no roteiro três áreas de intervenção prioritárias:

1.

Flexibilidade na organização do tempo de trabalho para homens e mulheres;

2.

Aumento do número das estruturas de cuidados;

3.

Melhores políticas de conciliação que beneficiem tanto homens como mulheres.

1.7

Na sequência da Comunicação intitulada «O futuro demográfico da Europa: transformar um desafio em oportunidade», que já fora anunciada no roteiro, a Comissão Europeia organizou, em 12 de Outubro de 2006, uma primeira consulta aos parceiros sociais sobre a conciliação da vida profissional, familiar e privada, com base no artigo 138.o do Tratado CE.

1.8

Na primeira parte da consulta, a Comissão realça a importância do tema da conciliação da vida profissional, familiar e privada. Tendo como pano de fundo a evolução demográfica e as pressões que esta exerce nos sistemas de segurança social, é imprescindível melhorar a taxa de emprego das mulheres. Salienta-se, igualmente, o papel da conciliação no contexto da concretização dos objectivos definidos pela Comissão.

1.9

Nas suas respostas, os parceiros sociais europeus realçaram a importância do tema da conciliação da vida familiar e profissional, precisamente no contexto da insuficiente participação das mulheres no mercado de trabalho e de uma população cada vez mais envelhecida. Um outro aspecto prende-se com a concretização dos objectivos fixados pelo Conselho Europeu de Barcelona, em 2002, no sentido de aumentar o número das estruturas de acolhimento de crianças. Os parceiros sociais são consensuais ao referir que as três áreas de intervenção prioritárias mencionadas no roteiro para a igualdade podem convergir para a prossecução desses objectivos. Os parceiros sociais referem ainda que, precisamente no contexto da evolução demográfica, a conciliação da vida profissional, familiar e privada e a questão da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres no meio profissional devem ocupar um papel central no debate político. Especial atenção deve ser dada também à questão de ultrapassar os papéis estereotipados atribuídos à mulher e ao homem, sem o que será muito difícil promover mudanças.

1.10

Por sua vez, os parceiros sociais (BUSINESS EUROPE/UEAPME, o CEEP e a CES) (2) criaram, em 2005, um quadro de acção para a «Igualdade entre homens e mulheres» (3) como contributo para a promoção da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres no meio profissional. A conciliação da vida familiar e profissional também faz expressamente parte das quatro áreas em que a actuação dos parceiros sociais nacionais incidirá até 2010. Por conseguinte, é correcto que o Conselho de Ministros deixe ao critério dos parceiros sociais a organização do tempo de trabalho — um aspecto que se reveste da maior importância para a conciliação da vida familiar e profissional —, a fim de pôr em prática soluções adequadas às necessidades de todos os interessados.

1.11

Ao contribuírem para o melhoramento das condições de trabalho, os parceiros sociais podem facilitar a vida às famílias. Desempenham, pois, um papel determinante neste contexto. O quadro de acção é um dos contributos dos parceiros sociais para a aplicação da Estratégia de Lisboa. Visto que as causas dos desequilíbrios existentes nos mercados de trabalho são complexas e estão interligadas, os parceiros sociais europeus estão convencidos de que a solução dos problemas pressupõe uma estratégia integrada para promover a igualdade entre homens e mulheres. A conciliação da vida familiar e profissional é aqui um dos factores mais influentes.

1.12

Embora nos últimos anos algumas empresas tenham vindo a apostar cada vez mais na conciliação entre família e emprego, de tal modo que a promoção de um ambiente favorável às famílias passou a fazer parte integrante da política de pessoal e da filosofia empresarial, como é confirmado no primeiro balanço conjunto relativo ao acordo dos parceiros sociais, publicado em Fevereiro de 2007, subsistem défices, ao nível das empresas, dos parceiros sociais e dos Estados-Membros, que importa colmatar (4).

1.13

A noção de igualdade de oportunidades no local de trabalho, a introdução de iniciativas de apoio à conciliação da vida familiar e profissional e a criação de um modelo de gestão de «empresa de igualdade de oportunidades» fazem parte do conceito de responsabilidade social das empresas, que as incita a criar boas práticas e a agir de forma responsável para com os seus trabalhadores.

2.   Análise da situação

2.1

As estruturas familiares diferenciaram-se significativamente como reflexo das mudanças ocorridas na sociedade. Uma política que vise a conciliação da vida profissional, familiar e privada precisa de considerar todas as formas de família existentes (por exemplo, famílias uniparentais, famílias patchwork (onde cada parceiro leva para a nova relação os filhos do último casamento), pais solteiros, pais divorciados, pais adoptivos, trabalhadores estudantes, uniões de facto entre pessoas do mesmo sexo, pessoas que vivem sozinhas). O número crescente de pessoas idosas e de idade avançada traduz-se numa necessidade crescente de serviços de assistência prestados por familiares ou terceiros.

2.2

Paralelamente à profissão que exercem, as mulheres, ao contrário dos homens, continuam a cuidar mais do lar e da família e, portanto, estão permanentemente sobrecarregadas, confrontando-se amiúde com situações de stress. As mulheres no meio rural e as trabalhadoras independentes não escapam a esta regra. Devido a esta situação, as mulheres vêem-se muitas vezes obrigadas a aceitar um trabalho a tempo parcial que resulta em efeitos negativos nas respectivas remunerações, pensões e carreiras. Por conseguinte, a conciliação da vida familiar e profissional é também um instrumento importante para alcançar a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, quer com filhos ou sem eles.

2.3

Precisamente porque os problemas subjacentes e as possibilidades de solução variam não só de um Estado-Membro para outro, mas também de região para região e até mesmo de empresa para empresa, não há uma solução única que sirva para todos os casos. O CESE considera, neste contexto, que os parceiros sociais têm também responsabilidade na procura de soluções. Com base nas estruturas existentes em cada país, os parceiros sociais podem influir decisivamente no dia-a-dia das famílias, empenhando-se no sentido da conciliação entre vida familiar e profissional.

2.4

Conquanto a decisão de ter ou não ter filhos seja do foro pessoal, o mesmo acontecendo com a decisão de familiares ou de outras pessoas mais chegadas à família de providenciar, no domicílio, cuidados e assistência a pessoas doentes, deficientes ou idosas, no entanto a sociedade no seu todo é afectada com estas decisões. A falta crescente de crianças significa que, no futuro, haverá inevitavelmente falta de trabalhadores especializados, gestores, clientes, colaboradores, empresas, investigadores e cientistas, com consequências negativas para a sociedade no seu conjunto (5). Assim, incumbe ao Estado assumir particular responsabilidade principalmente em áreas como:

Apoio material e financeiro, atribuição de prestações pecuniárias, reconhecimento das prestações de pensão de velhice;

Infra-estruturas de apoio (guarda de crianças, escolas que funcionam todo o dia, acompanhamento extra-escolar e durante as férias escolares, ocupação dos tempos livres — garantidos por organizações de voluntários — e apoio, por exemplo, a serviços de assistência ambulantes);

Licença parental adequada para ambos os progenitores (incluindo as licenças por adopção);

Mundo do trabalho favorável à família.

2.5

Na opinião da Comissão, a flexibilidade da organização do tempo de trabalho é importante para explorar ao máximo as potencialidades da força de trabalho, devendo servir equitativamente homens e mulheres. Neste domínio, afigura-se desejável que houvesse um quadro legal. Contudo, o facto de serem mais as mulheres do que os homens a recorrerem a essas disposições gera um desequilíbrio entre uns e outras, que se repercute negativamente na situação das mulheres no local de trabalho e na sua independência económica. Há que encorajar os homens a assumirem responsabilidades familiares, em especial através de incentivos ao exercício da licença parental e da licença por paternidade, de modo a partilharem com as mulheres, de forma justa e no respeito pelo outro parceiro, as tarefas domésticas não remuneradas e a guarda dos filhos e de outros familiares.

3.   Papéis sociais masculino e feminino

3.1

As mudanças na sociedade, que permitiram um aumento considerável dos níveis de qualificação das mulheres, estão também associadas a mudanças dos papéis sociais das mulheres e dos seus ideais. Hoje em dia, na Europa, as jovens têm melhores qualificações do que os rapazes e o exercício de uma actividade profissional passou a fazer parte dos seus projectos de vida. A melhoria dos níveis de qualificação das mulheres deveria levar também à redução das desigualdades salariais entre homens e mulheres. As actuais diferenças na remuneração explicam-se essencialmente pelo número elevado de mulheres que trabalham a tempo parcial, por interrupções mais prolongadas da actividade profissional e, portanto, menos anos de experiência profissional, bem como pelo número mais reduzido de mulheres em posições de chefia e pelo baixos níveis de qualificação das mulheres mais idosas. Embora as convenções colectivas estabeleçam que homens e mulheres, com qualificações iguais, recebem o mesmo salário pelo mesmo trabalho, a desigualdade salarial persiste. Além disso, para uma verdadeira liberdade de escolha do projecto de vida pessoal é necessário que haja condições, na sociedade, para que as mulheres e os homens se possam decidir por um projecto de vida de acordo com as suas aspirações, sem terem de se confrontar com juízos críticos da sociedade — positivos ou negativos — sobre a decisão que tenham tomado.

3.2

Há factores que condicionam decisivamente a concepção dos projectos de vida, nomeadamente as infra-estruturas de guarda de crianças do país em que se vive e a percepção que a sociedade tem das mães que trabalham e dos pais que se dedicam à família. A atitude dos parceiros sociais em relação a estas questões influi também na visão que a sociedade tem delas. As experiências dos países escandinavos e da Alemanha mostraram que a atribuição de prestações pecuniárias a uma família, como por exemplo parcelas do subsídio parental, ou o aumento dos subsídios pode ser útil apenas quando também o pai assumir por um determinado período de tempo a responsabilidade pelos cuidados do filho. Os pais dispõem assim de um quadro legal que lhes permite mais facilmente dedicarem-se, por um período de tempo limitado, à educação dos filhos. Quanto às mães, a aplicação desta regra permite-lhes um reingresso mais rápido no mercado de trabalho.

3.3

O CESE salienta que uma mera alteração de factores isolados é insuficiente para que as mulheres sobrecarregadas de trabalho, em casa e no emprego, possam conciliar a sua vida familiar, profissional e privada. O objectivo deverá ser, sobretudo, uma nova divisão entre homens e mulheres das tarefas familiares não remuneradas, como a educação dos filhos, a prestação de cuidados a familiares e a organização das tarefas domésticas. Os homens devem ser levados a partilhar efectivamente com o cônjuge/companheira as tarefas domésticas e os cuidados em relação aos filhos. Tal requer mudanças estruturais profundas e sensibilização para a mudança de atitudes.

4.   Apoio dos parceiros sociais à aplicação nas empresas de medidas de conciliação da vida familiar, profissional e privada

4.1

A evolução da estrutura demográfica e as transformações daí decorrentes têm repercussões significativas, tanto nos trabalhadores como nos empregadores. Os parceiros sociais podem contribuir, a todos os níveis, para a conciliação da vida profissional, familiar e privada.

4.2

O sucesso de uma política de conciliação nas empresas depende de uma política de pessoal que, ajustada às necessidades das empresas e dos trabalhadores, favoreça um equilíbrio justo entre responsabilidades laborais, familiares e pessoais. Cada Estado-Membro deverá velar por que sejam preenchidas as seguintes condições essenciais:

Infra-estruturas adequadas de acolhimento de crianças (incluindo adolescentes) compatíveis com as necessidades existentes;

Oferta suficiente de serviços de qualidade na prestação de cuidados e assistência a idosos e deficientes;

Modalidades de tempo de trabalho justas;

Medidas para evitar que os regimes de licenças e de trabalho a tempo parcial por motivo de prestação de cuidados a menores e a pessoas dependentes afectem as prestações futuras; e

Pessoal qualificado e justamente remunerado.

Não só os trabalhadores e as empresas, mas também o próprio Estado e a sociedade, beneficiam da existência generalizada deste tipo de infra-estruturas.

4.3

O leque de instrumentos de política de pessoal — alguns deles acordados entre os parceiros sociais — que podem ser utilizados pelas empresas é diversificado e passa por:

Introdução de modelos inovadores de organização do tempo de trabalho — sem consequências penalizantes para os trabalhadores (horários flexíveis, acumulação de empregos) —, do teletrabalho, de licenças sabáticas e de contas de tempo de trabalho;

Segurança jurídica nos contratos de trabalho estável;

Empresas contactam os seus trabalhadores em gozo de licença parental com ofertas de trabalho ocasionais;

Apoio à organização do acompanhamento de crianças, desde creches nas empresas a lugares em creches financiados pelas empresas e apoio financeiro;

Apoio à prestação de cuidados a familiares idosos ou dependentes;

Apoio a medidas de desenvolvimento pessoal.

Apoio à reinserção profissional após períodos de licença ou de trabalho a tempo parcial para prestação de cuidados a menores e a pessoas com dependência.

4.4

Pretende-se, assim, também, alcançar o objectivo de permitir a todos conciliarem mais facilmente a vida profissional, familiar e privada, utilizando-se, para o efeito, modelos de trabalho a tempo parcial — flexíveis e adequados às necessidades de cada um —, num compromisso entre os interesses dos empregadores e os dos assalariados e assalariadas. Mas este objectivo só pode alcançar-se se a decisão de trabalhar a tempo parcial for voluntária. Para o CESE, é indispensável que os trabalhadores do sexo masculino optem mais frequentemente pelo trabalho a tempo parcial, desde que as necessidades da família obriguem um dos pais a optar por essa forma de trabalho. Deste modo, podem demonstrar, na prática, que as responsabilidades domésticas e familiares não incumbem exclusivamente às mulheres e que, portanto, deverá haver uma efectiva partilha de tarefas dentro da família.

4.5

Os parceiros sociais podem ajudar a encontrar respostas para a questão de saber como os pais podem concretizar o modelo de vida idealizado. O procedimento das empresas que viabilizam às trabalhadoras em licença parental a possibilidade de substituírem colegas ausentes do local de trabalho (férias, baixas) ou participarem nas festas da empresa, se assim o desejarem, tem-se revelado também bastante benéfico na medida em que facilita às mães o regresso ao emprego após interrupções para cuidar da família. O CESE chama a atenção para o facto de que a legislação de protecção das trabalhadoras grávidas e de protecção da maternidade e paternidade tem de ser obrigatoriamente cumprida e não pode ser contornada através de discriminações indirectas.

4.6

Outra possibilidade é a prestação de apoio aos pais na organização de serviços de guarda de crianças. Várias empresas ajudam os seus empregados na procura de amas e de lugares em creches e na organização de assistência aos filhos em caso de doença. Através de medidas específicas, algumas empresas tentam também encorajar os trabalhadores do sexo masculino a participarem mais na vida familiar e a passarem mais tempo com os filhos, oferecendo-lhes a possibilidade de usufruírem de um dia de férias por ocasião do aniversário dos filhos. As empresas que aplicam este tipo de medidas devem ser apoiadas. No entanto, na maioria dos casos, as empresas não dão apoio aos trabalhadores com filhos. Agindo deste modo, estão a prejudicar-se a elas próprias, pois o seu comportamento, para além de ser contrário à lei, repercute-se negativamente no ambiente de trabalho e na motivação dos trabalhadores.

4.7

O CESE remete para os estudos científicos realizados pela Prognos AG, cujos resultados indicam que a introdução de medidas especificamente orientadas para satisfazer as necessidades familiares e individuais dos trabalhadores é economicamente rentável para as empresas, uma vez que estes instrumentos de política de pessoal reduzem o absentismo e reforçam a ligação dos trabalhadores à empresa, aumentando a motivação e o rendimento dos mesmos. Acresce que uma política de pessoal concebida nestes moldes contribui para aumentar a atractividade do local de trabalho, sobretudo, e também, se possibilitar que as trabalhadoras com responsabilidades familiares usufruam de licenças e regressem às funções de chefia que ocupavam antes do gozo das mesmas. Uma tal cultura empresarial cria, além disso, um clima de trabalho agradável — um factor determinante de localização —, que se repercute positivamente na respectiva região.

4.8

O CESE assinala que a flexigurança não pode ser esquecida quando se fala da introdução de modelos flexíveis de organização do tempo de trabalho. No contexto da Estratégia de Lisboa, a flexigurança proporciona uma abordagem integrada de reforma do mercado de trabalho, conciliando a necessária e desejada flexibilidade com a segurança e o planeamento convenientes a todos os interessados. A flexibilidade acordada entre os parceiros sociais deve trazer vantagens, quer para as empresas, quer para os(as) trabalhadores(as). Há que ter em conta tanto as adaptações das empresas às exigências do mercado como o interesse crescente dos trabalhadores em dispor de flexibilidade, por exemplo no que diz respeito à organização do tempo de trabalho, para conciliar mais facilmente a vida profissional com a vida familiar e privada, garantindo a segurança e evitando a precarização das relações laborais. O essencial aqui é procurar soluções individuais e adaptadas às necessidades, normalmente acordadas pelos parceiros sociais. O CESE frisa que o debate sobre a flexigurança deverá incidir mais no facto de que os homens e as mulheres são afectados de forma diferente (6).

4.9

O sucesso da conciliação da vida profissional, familiar e privada é tanto maior quanto mais os instrumentos se mostrarem adaptados à realidade da empresa. Por isso, deve dar-se a maior importância à aplicação ao nível nacional.

4.10

O CESE considera que os concursos de empresas, que devem contar com o envolvimento dos parceiros sociais, podem ser um instrumento adequado para publicitar junto do público exemplos de práticas favoráveis à família e às mulheres e aconselhar a que sejam seguidos. Assim, novos instrumentos inovadores como sejam a:

criação nas empresas de espaços de recreação para os filhos dos seus trabalhadores;

abertura de creches nas empresas; e

criação de uma rede geracional nas empresas, cuja função consistiria em coordenar a prestação de serviços a trabalhadores mais jovens por trabalhadores reformados, a título voluntário, como ir às compras e tratar de assuntos junto de serviços públicos,

são dados a conhecer a um vasto público.

4.11

Obviamente que muitas das pequenas e médias empresas, que constituem a maioria das empresas implantadas na UE, não dispõem de meios para financiarem este tipo de ofertas atractivas, pelo que deveria ser considerada a possibilidade de criação de incentivos fiscais específicos. Nestas empresas, o facto de os contactos sociais serem mais estreitos é garantia de que as partes envolvidas chegarão a acordo quanto a soluções adequadas às circunstâncias e necessidades de cada um. Por outro lado, há a possibilidade de, dentro de uma região, várias empresas de pequena dimensão se concertarem com os órgãos de poder local, associações de cidadãos e organizações não governamentais para promoverem uma oferta conjunta, procurando assim valorizar-se a si próprias e potencializar a sua localização na região.

5.   Iniciativas práticas aos níveis regional e local

5.1

Para melhorar de forma prática e realista as condições para uma melhor conciliação da vida profissional, familiar e privada, seria da maior utilidade que os diversos actores locais coordenassem as suas actividades. Assim, o CESE encoraja os parceiros sociais a tomarem iniciativas aos níveis regional e local, integrando actores empenhados (empresas, conselhos de empresa, associações de pais, associações religiosas, clubes desportivos, representantes municipais, etc.) nas cidades e nos municípios, com o objectivo de coadunar da melhor forma os interesses empresariais, familiares e individuais. Alterações a nível local resultam em medidas práticas de apoio para todos os envolvidos. A intervenção dos mais diversos actores é extremamente diversificada e está aberta a todo o tipo de ideias criativas. Seguem-se alguns exemplos concretos, embora as possibilidades sejam muitas:

Criação para cada cidade de um sítio na Internet com informação sobre ofertas especialmente destinadas às famílias;

Criação de bases de dados para pesquisa de lugares disponíveis em creches;

Bolsas de contacto «Avós prontos a ajudar!», que fazem a ligação entre famílias jovens que não podem contar com o apoio dos seus avós e pessoas mais idosas sem família;

Acompanhamento das crianças no caminho para a escola;

Apoio prestado por organizações de voluntários e voluntários, que cuidam de crianças nos tempos livres;

Workshops sobre desenvolvimento urbano favorável à família, tendo em vista travar o êxodo das famílias jovens dos centros das cidades;

Programas de mentoria para pais de família que trabalham em regime de tempo parcial;

Reestruturação dos horários das carrinhas da escola, de forma a permitir aos pais coordenarem melhor os horários de trabalho com os ritmos escolares;

Maior flexibilidade nos horários de abertura das creches;

Realização de eventos dedicados ao tema da conjugação da vida familiar com a vida profissional, em que as empresas divulgam as políticas de pessoal que vão nesse sentido;

Análise das decisões dos órgãos municipais para averiguar em que medida são, ou não, favoráveis à família.

6.   Serviços de guarda de crianças e prestação de cuidados a familiares idosos

6.1

O CESE chama a atenção para o problema, apontado no segundo relatório de progresso da Comissão Europeia sobre a realização da Estratégia de Lisboa, apresentado em meados de Dezembro de 2006 (7), da insuficiência de serviços de guarda de crianças a preços acessíveis em vários Estados-Membros. Os Estados-Membros são, portanto, instados a promoverem, consoante os objectivos que perseguem, serviços de guarda de crianças de melhor qualidade e acessíveis para todos.

6.2

Por outro lado, o Conselho Europeu, reunido em Barcelona em 2002 (8), decidiu que os Estados-Membros deverão garantir a disponibilidade de estruturas de acolhimento, até 2010, para pelo menos 90 % das crianças com idades compreendidas entre os 3 anos e a idade da escolaridade obrigatória e pelo menos 33 % das crianças com menos de 3 anos.

6.3

Precisamente no contexto das mudanças dos papéis sociais das mulheres e dos homens é importante que os parceiros sociais tornem claro que o desenvolvimento da criança não é afectado nem pelo facto de a mãe exercer uma actividade profissional, nem por uma participação activa do pai na vida familiar.

6.4

Tendo em conta que a oferta de lugares disponíveis em creches para crianças com idade inferior a 3 anos varia fortemente de Estado-Membro para Estado-Membro, o CESE recomenda vivamente a todos os Estados-Membros que estabeleçam objectivos concretos e mensuráveis para as infra-estruturas de guarda de crianças deste nível etário. A fim de assegurar a conciliação entre vida familiar e vida profissional, é necessário que, até 2010, no mínimo 33 % das crianças com idade inferior a 3 anos sejam admitidas numa creche ou confiadas aos cuidados de uma ama qualificada.

6.5

O CESE considera necessário valorizar mais o desenvolvimento das estruturas de acolhimento de crianças nos Estados-Membros da UE, assegurando-se o seu incentivo e apoio através de medidas políticas.

6.6

No seu parecer intitulado «A família e a evolução demográfica» (9), o CESE analisou em detalhe a evolução da estrutura demográfica na União Europeia, bem como a sua repercussão nas famílias. Para muitos, o aumento da esperança de vida pode significar uma melhoria da qualidade de vida. Mas o aumento crescente da esperança de vida também obriga um número cada vez mais maior de pessoas a cuidar dos seus familiares idosos paralelamente à actividade profissional. O desenvolvimento dos serviços na área da prestação de cuidados deveria estar mais no centro das atenções, a fim de aliviar dessa responsabilidade quem cuida de familiares dependentes.

6.7

Aqui, a tarefa dos parceiros sociais poderia consistir em informar sobre instrumentos que se tenham revelado úteis na prática. Por exemplo: adaptação do horário de trabalho para fazer face a situações imprevisíveis em que se torna necessário cuidar de um familiar dependente; postos de trabalho equipados de modo a facilitar a prestação de cuidados, ou seja, o(a) trabalhador(a) deve estar contactável pelo telefone e ter acesso a computadores e à Internet, o que lhe permitirá encontrar possibilidades de prestação de cuidados; e disponibilização de material informativo sobre a organização, o financiamento e os aspectos jurídicos da situação de dependência.

7.   Perspectivas de futuro

7.1

O CESE considera que a conciliação da vida profissional e familiar está intimamente ligada à criação de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres e que os resultados pretendidos pelos parceiros sociais neste domínio, quando bem sucedidos, reforçam a conciliação. Para que se possa tornar normalidade, os programas de educação das crianças deveriam transmitir a ideia de que a conciliação da vida profissional e familiar é normal e necessária.

7.2

O CESE insta o Conselho, o Parlamento Europeu e a Comissão a tomarem em conta e a apoiarem, nas suas acções futuras, as propostas apresentadas no presente parecer com vista a melhorar a conciliação da vida profissional, familiar e privada.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  COM(2006) 92.

(2)  BUSINESSEUROPE (a antiga UNICE) é a União das Confederações da Indústria e dos Empregadores da Europa; a UEAPME é a União Europeia do Artesanato e das Pequenas e Médias Empresas, o CEEP é o Centro Europeu das Empresas de Participação Pública e das Empresas de Interesse Económico Geral; a CES é a Confederação Europeia dos Sindicatos.

(3)  http://ec.europa.eu/employment_social/news/2005/mar/gender_equality_en.pdf.

(4)  Ver o parecer exploratório do CESE, de 14.3.2007, sobre «O impacto económico e orçamental do envelhecimento», relatora S. FLORIO JO C 161 de 13.7.2007.

(5)  Ver, a este propósito, o parecer exploratório do CESE, de 14.3.2007, sobre «A família e a evolução demográfica», relator Stéphane BUFFETAUT JO C 161 de 13.7.2007.

(6)  Ver, neste contexto, o parecer exploratório do CESE, de 12.7.2007, sobre o tema «Flexigurança (dimensão da flexibilidade interna — a negociação colectiva e o papel do diálogo social enquanto instrumentos de regulação e de reforma dos mercados do trabalho)», relator Thomas Janson JO C 97 de 28.4.2007.

(7)  COM(2006) 816 Comunicação da Comissão ao Conselho Europeu da Primavera — Execução da Estratégia de Lisboa renovada para o crescimento e o emprego «Um ano de realizações».

(8)  Conclusões da Presidência: Conselho Europeu de Barcelona, 15 e 16 de Março de 2002.

(9)  Ver, a este propósito, o parecer exploratório do CESE, de 14.3.2007, sobre «A família e a evolução demográfica», relator Stéphane BUFFETAUT JO C 161 de 13.7.2007.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/108


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Flexigurança (dimensão da flexibilidade interna — a negociação colectiva e o papel do diálogo social enquanto instrumentos de regulação e de reforma dos mercados do trabalho)»

(2007/C 256/20)

A futura Presidência portuguesa enviou ao Comité Económico e Social Europeu uma carta, datada de 13 de Fevereiro de 2007, solicitando a elaboração de um parecer sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 18 de Junho de 2007 sendo relator Thomas JANSON.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu aprovou, por 163 votos a favor, 2 votos contra e 5 abstenções, o presente parecer.

1.   Síntese e conclusões

1.1

O CESE saúda o pedido de elaboração de um parecer sobre flexigurança por parte da Presidência portuguesa, dado que, até ao momento, o debate sobre este tema se tem restringido principalmente ao aumento da flexibilidade externa e a formas de compensação desse aumento mediante o reforço das políticas do mercado de trabalho ou esquemas de segurança social. Em vez disso, dever-se-ia privilegiar outras dimensões permitindo a criação de situações vantajosas para todas as partes.

1.2

O CESE gostaria de sublinhar que o papel dos parceiros sociais deverá ser reforçado. Estes deveriam ser protagonistas em todos os debates sobre flexigurança e desempenhar um papel privilegiado nas consultas da Comissão Europeia. Assim, a Comissão deveria ter atribuído maior destaque à consulta dos parceiros sociais europeus sobre a definição comunitária do conceito de flexigurança.

1.3

Reforçar os sistemas de relações industriais tanto a nível comunitário como nacional é necessário em qualquer debate sobre flexigurança. É essencial criar um diálogo social forte e dinâmico, no qual os parceiros sociais participem activamente e possam negociar, influenciar e assumir responsabilidades na definição, nos componentes e na avaliação dos resultados da flexigurança.

1.4

A Comissão e os Estados-Membros deveriam procurar associar os debates que podem conduzir a reformas, baseadas no conceito de flexigurança, à modernização das relações laborais a todos os níveis. O CESE deseja ver um elo mais forte entre o debate sobre flexigurança, o reforço do diálogo social a todos os níveis e a negociação colectiva na medida adequada, respeitando os sistemas de relações industriais divergentes dos Estados-Membros. O conceito de flexigurança deve aumentar tanto a flexibilidade como a segurança de modo equilibrado. O conceito de flexigurança não significa a redução unilateral e ilegítima dos direitos dos trabalhadores, uma ideia que o CESE rejeita.

1.5

Tendo em conta o papel essencial dos parceiros sociais no desenvolvimento gradual das políticas comunitárias de flexigurança, o CESE considera que este debate não pode ser visto de forma independente do conteúdo nem da evolução do diálogo social europeu.

1.6

O CESE deseja realçar que a Comissão e os Estados-Membros deveriam dar mais atenção à igualdade entre homens e mulheres, bem como à solidariedade intergeracional no âmbito da flexigurança. Do ponto de vista da flexibilidade e da segurança, as mulheres, os trabalhadores mais velhos e os jovens encontram-se frequentemente em desvantagem no mercado de trabalho; dever-se-ia procurar melhorar a situação destes grupos.

1.7

O CESE deseja que os Estados-Membros e a Comissão avaliem o reforço da adaptabilidade através da flexibilidade interna tornando-a numa dimensão viável e aceitável de flexigurança. A flexibilidade interna pode desempenhar um papel-chave no aumento da produtividade, inovação e competitividade podendo contribuir desta forma para o cumprimento dos objectivos da Estratégia de Lisboa. Poderá igualmente desempenhar um papel importante assistindo os trabalhadores na conciliação do trabalho com outras actividades e responsabilidades e melhorando a qualidade do seu emprego. Tudo na condição essencial de ter como base um quadro de regulamentação que assegure a protecção no emprego e nos cuidados de saúde e forneça estabilidade e segurança aos trabalhadores. A protecção do emprego aliada a serviços eficazes de reinserção profissional e a políticas activas no mercado de trabalho é essencial para a capacidade de adaptação e para a segurança das empresas e dos trabalhadores.

1.8

No entender do CESE, deveria ser encontrado um equilíbrio entre a flexibilidade do tempo de trabalho e a protecção do trabalhador, o qual será melhor assegurado através de regulamentos estabelecidos por negociações colectivas e segundo as práticas nacionais. Tal negociação em torno da flexibilidade do tempo de trabalho exige um contexto sólido de direitos e instituições sociais que funcionem correctamente e sistemas de segurança social favoráveis ao emprego que possam suportá-la.

1.9

A flexibilidade de funções é, assim, um assunto-chave para a negociação colectiva entre os parceiros sociais. Através desta negociação, poder-se-á equilibrar e ajustar as necessidades das empresas e dos trabalhadores bem como definir uma compensação adequada para os trabalhadores que melhorem as suas capacidades.

1.10

A flexibilidade de funções exige uma constante actualização do conhecimento e das capacidades dos trabalhadores, bem como um sistema de educação e formação que funcione bem, de forma a suportar esta actualização. Apesar dos compromissos assumidos no passado no âmbito da aprendizagem ao longo da vida, muito se encontra por fazer na prática.

2.   Contexto

2.1

A Presidência portuguesa solicitou ao CESE a elaboração de um parecer exploratório sobre flexigurança integrando questões como:

1)

A dimensão da flexibilidade interna;

2)

A negociação colectiva e o papel do diálogo social enquanto instrumentos de regulação e de reforma dos mercados do trabalho.

2.2

O debate sobre flexigurança poderia ter por base vários aspectos das orientações para as políticas de emprego (2005-2008). O Conselho Europeu da Primavera de 2006 solicitou aos Estados-Membros que prestassem especial atenção ao desafio-chave da «flexigurança» (equilíbrio entre flexibilidade e segurança). Os Estados-Membros foram convidados, de acordo com a situação dos respectivos mercados de trabalho, a prosseguirem reformas do mercado de trabalho e das políticas sociais numa perspectiva integrada de «flexigurança».

2.3

Tal como sucedera nas Cimeiras Europeias de Dezembro de 2006 e Março de 2007, o tema da flexigurança foi debatido em duas cimeiras sociais.

2.4

A Comissão criou um grupo de trabalho de peritos responsável por propor «caminhos para a flexigurança», ou seja, um conjunto de dimensões de flexibilidade e segurança na vida profissional. Com base neste documento, a Comissão publicou uma comunicação sobre flexigurança, em Junho de 2007, que contém um feixe de princípios comuns. Em Dezembro de 2007, deverá ser incluído um conjunto de princípios comuns nas orientações revistas para o emprego de 2008. O Livro Verde Modernizar o direito do trabalho para enfrentar os desafios do século XXI  (1) também abrange a dimensão de flexigurança, sob o ângulo particular do contrato de trabalho, cujas recomendações se dão por reproduzidas.

2.5

O CESE gostaria de realçar o importante trabalho realizado pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho, que apresenta aspectos relevantes para a definição de flexigurança.

3.   Dimensões das estratégias de flexigurança

3.1

a)

As estratégias de flexigurança pretendem combinar, de forma equilibrada, vários tipos de flexibilidade e segurança do mercado de trabalho para promover a adaptabilidade dos trabalhadores e das empresas proporcionando-lhes, ao mesmo tempo, estabilidade e protecção contra riscos. A título de exemplo de tipos de flexibilidade e tipos de segurança poder-se-á citar:

Exemplos de flexibilidade

Flexibilidade externa numérica

Adaptação do volume de emprego mediante uma troca com o mercado de trabalho externo, envolvendo despedimentos, trabalho temporário e contratos a prazo.

Flexibilidade interna numérica

Adaptação temporária do volume de trabalho dentro da empresa, envolvendo medidas como horários de trabalho atípicos e esquemas de contagem de tempos.

Flexibilidade interna de funções

Organização da flexibilidade dentro da empresa através de formação, multi-tarefas e rotação de trabalho com base na capacidade dos trabalhadores de realizarem várias tarefas e actividades.

Flexibilidade salarial

Variação do salário de base e da remuneração adicional consoante o desempenho do trabalhador ou da empresa.

Exemplos de segurança

Segurança do posto de trabalho

Segurança proporcionada pela legislação de protecção do emprego, etc., reduzindo o poder do empregador de despedir à vontade.

Segurança do emprego

Adaptação das oportunidades de emprego mediante níveis altos de empregabilidade assegurados, por exemplo, pela formação e educação.

Segurança salarial

Protecção de níveis salariais adequados e estáveis.

Segurança de conciliação

Segurança do trabalhador quanto à conciliação da vida profissional com outras responsabilidades e compromissos não profissionais.

b)

Importa salientar a segurança jurídica do contrato de trabalho que o faz oponível a todos e perante os tribunais. Implica a subsistência do nexo de subordinação que produz entre outras todas as consequências no plano do direito à protecção social (mantida e aplicada) do assalariado.

3.2

Liderado pela Comissão Europeia e com base em certos aspectos do exemplo dinamarquês, o debate sobre flexigurança na Europa tem-se restringido principalmente ao aumento da flexibilidade externa e a formas de compensação desse aumento mediante o reforço das políticas do mercado de trabalho ou esquemas de segurança social. As opiniões dos sindicatos e das organizações de empregadores sobre as vantagens e desvantagens da flexibilidade externa são frequentemente díspares. Além disso, a OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económicos) (2) declarou recentemente que a legislação de protecção do emprego não tem um impacto significativo na taxa total de emprego. Por outro lado, a OIT (Organização Internacional do Trabalho) demonstrou que há uma relação positiva entre a antiguidade num posto de trabalho e a produtividade (ver Anexo).

3.3

O presente parecer visa expandir o debate sobre flexigurança em três direcções. Primeiramente, pretende demonstrar que é preciso reforçar o papel dos parceiros sociais neste debate e nas reformas do mercado de trabalho em geral. Em segundo lugar, o CESE pretende realçar que o debate sobre flexigurança deveria dar mais atenção às diferenças entre homens e mulheres e, enquanto tal, à categoria dos jovens no mercado de trabalho. A igualdade entre homens e mulheres tem sido ignorada nesta discussão. Apesar da maioria das mulheres desejar formas de trabalho mais flexíveis, bem como garantir um maior equilíbrio entre a vida privada e o trabalho, em alguns casos, do ponto de vista da flexibilidade e da segurança, as mulheres poderão estar estão frequentemente em desvantagem no mercado de trabalho; dever-se-ia procurar igualar a sua situação à dos homens (3). Em terceiro lugar, o CESE considera importante alargar o debate explorando formas alternativas para atingir a adaptabilidade, facilitar a aprendizagem ao longo da vida, melhorar a produtividade e incentivar a inovação, dimensões essenciais do processo de Lisboa. O CESE abordou igualmente outros temas no seu parecer sobre as orientações para as políticas de emprego (4). Face ao exposto, este parecer não se dedica à temática da flexibilidade externa mas sim às possibilidades de aumentar a adaptabilidade através da flexibilidade interna.

3.4

A flexigurança tem especial relevância no universo das pequenas e médias empresas (PME), tendo em conta que estas empresas têm um peso esmagador em termos de emprego. Em consequência disto, as políticas dos Estados-Membros sobre flexigurança, deverão conter disposições que salvaguardem as necessidades das PME e dos seus assalariados

3.5

O CESE salienta que na base de qualquer modelo de flexigurança está a noção de um Estado providência capaz de garantir níveis altos de protecção social mediante assunção dos encargos por serviços públicos com meios suficientes, assentando também num quadro jurídico estável para a negociação colectiva e o diálogo social. Os sistemas de segurança social podem melhorar a mobilidade garantindo aos trabalhadores que não ficarão em desvantagem se confrontados com alterações no seu posto de trabalho. Um quadro estável para o diálogo social e a negociação colectiva cria oportunidades de acordo entre parceiros sociais fortes quanto a assuntos fundamentais do mercado de trabalho.

4.   Flexigurança e parceiros sociais

4.1

A flexigurança implica definir a distribuição equilibrada de direitos e obrigações entre empregadores e trabalhadores. O diálogo social e a negociação colectiva são instrumentos cruciais na concepção e execução de qualquer reforma do mercado de trabalho, incluindo a flexigurança. Assim, o Comité Económico e Social Europeu sublinha que os parceiros sociais são protagonistas no debate a qualquer nível sobre flexigurança. Os parceiros sociais deveriam ser, cada vez mais, os actores principais na definição do equilíbrio entre flexibilidade e segurança contribuindo, desta forma, para a melhoria das regras do mercado de trabalho.

4.2

No plano europeu, o CESE reconhece que a Comissão informou os parceiros sociais sobre o plano relativo a este debate. Porém, no que toca a este tema, o CESE considera que a Comissão deveria ter atribuído maior destaque à consulta, especialmente, dos parceiros sociais europeus sobre a definição comunitária do conceito de flexigurança. Sem um envolvimento forte dos parceiros sociais, será difícil executar qualquer tipo de estratégia de flexigurança.

4.3

O Comité Económico e Social Europeu declarou no seu parecer sobre o sistema dinamarquês de flexigurança (5) que «os parceiros sociais tiveram um papel fundamental no desenvolvimento da versão dinamarquesa de flexigurança, tanto no processo decisório como na aplicação das decisões em domínios como a política de formação e as reformas estruturais do mercado de trabalho. […] O papel dos parceiros sociais resulta […] do devir histórico […] O maior envolvimento e contributo dos parceiros sociais pode, assim, potenciar a capacidade da sociedade para competir e adaptar-se».

4.4

No parecer sobre o modelo social europeu (6), o CESE sublinhou que «no tocante à estrutura de base do modelo social europeu, não é possível avaliar adequadamente o papel fundamental dos parceiros sociais na política económica e social. Assim, o papel regulador das organizações sindicais e patronais é especialmente importante no quadro dos acordos colectivos e dos acordos salariais».

4.5

Assim, a agenda da flexigurança não deveria ser estabelecida do topo para a base, ou seja, definida pela Comissão e discutida pelos governos dos Estados-Membros. Os parceiros sociais têm de poder negociar, influenciar e assumir responsabilidades na definição, nos componentes e na avaliação dos resultados da flexigurança. Dado que a flexigurança se relaciona estritamente com o diálogo social e a negociação colectiva, a emergência do debate sobre flexigurança põe também em evidência deficiências destas dimensões, que deverão ser tratadas ao mesmo tempo em que se executa a agenda da flexigurança. Assim, o CESE pretende ver um elo mais forte entre a discussão sobre flexigurança, o reforço do diálogo social a todos os níveis e a negociação colectiva na medida adequada, respeitando os diversos sistemas de relações laborais dos Estados-Membros.

4.6

O diálogo social no plano europeu é um caso único no mundo, dado que os parceiros sociais desempenham funções de co-legisladores no campo social. Nos últimos anos, esta situação levou a que o diálogo social se tornasse mais autónomo. Os parceiros sociais têm o direito de tratar assuntos de interesse comum em prol de um mercado de trabalho europeu mais funcional. Tendo em conta o papel essencial dos parceiros sociais no desenvolvimento gradual das políticas comunitárias de flexigurança, o CESE considera que este debate não pode ser visto de forma independente do conteúdo nem da evolução do diálogo social europeu. No programa de trabalho plurianual, os parceiros sociais decidiram explorar aspectos da flexigurança e tomar medidas que contribuam para uma melhor percepção comum dos instrumentos europeus de diálogo social (7). O CESE desenvolveu a sua posição nesta matéria no parecer sobre «Empregabilidade e empreendedorismo — O papel da sociedade civil, dos parceiros sociais e das instâncias regionais e locais, numa perspectiva de género» (8) .

4.7

Nos Estados-Membros há múltiplos exemplos do papel importante que os parceiros sociais desempenham, a todos os níveis, no aumento da flexibilidade e segurança dos empregadores e trabalhadores. Os acordos colectivos per se não são apenas um factor de segurança para os empregadores e trabalhadores, mas permitem também uma flexibilidade negociada. Dado que comportam elementos de uma maior flexibilidade interna, a progressão na carreira e os direitos à aprendizagem ao longo da vida tornam-se mais evidentes num ambiente cada vez mais competitivo. Contudo, nos Estados-Membros em que o diálogo social é inadequado devido a sistemas frágeis de relações laborais, estes factores expõem demasiado os trabalhadores a forças do mercado de trabalho proporcionando-lhes frequentemente pouca protecção. Deste modo, o reforço e a modernização dos sistemas de relações laborais nos Estados-Membros deveria acompanhar, a par e passo, as discussões sobre flexigurança nos Estados-Membros.

4.8

Neste contexto, o CESE gostaria de realçar alguns exemplos de acordos entre parceiros sociais:

Os acordos de negociação colectiva na Dinamarca introduzem prazos de aviso prévio obrigatórios, possibilitando que os trabalhadores estejam mais bem preparados para assumir outro lugar de trabalho.

Na Suécia, os acordos colectivos no contexto laboral estabeleceram fundos de «transição de carreira» financiados pelo sector empresarial e co-geridos pelos parceiros sociais. Estes fundos fornecem acções de formação, assistência na procura de trabalho ou estágios remunerados noutras empresas aos trabalhadores que tenham recebido um aviso, mesmo durante o período de funções na empresa que os despediu.

O acordo tripartido de Espanha diz respeito à forma de limitação de contratos de trabalho a prazo. Este acordo segue o princípio segundo o qual uma quota demasiado elevada de trabalho a prazo não serve os interesses comuns do trabalho e das empresas.

Na Alemanha, os acordos colectivos, elaborados e aplicados mediante acordo dos grupos de interesses da empresa, prevêem flexibilidade no horário e na organização do trabalho dentro de um quadro limitado.

O CESE considera igualmente que os acordos celebrados pelos parceiros sociais europeus relativamente a, por exemplo, trabalho a prazo, licença parental, trabalho a tempo parcial e teletrabalho, integram o conceito de flexigurança, contribuindo para a segurança e a flexibilidade dos trabalhadores e empregadores.

4.9

Para que os parceiros sociais participem nas negociações sobre temas fundamentais do mercado de trabalho, visando alcançar um equilíbrio viável do ponto de vista social entre flexibilidade e segurança, terá de haver um quadro jurídico nacional incentivando os parceiros sociais a contribuírem e negociarem de forma eficaz, no âmbito dos assuntos de flexigurança. Com regulamentação da protecção do emprego e um sólido quadro normativo, os parceiros sociais podem negociar acordos que promovam os esforços e a cooperação dos trabalhadores, assim como a sua determinação em empreenderem actividades de formação, o que é positivo para o emprego total e para a eficiência económica. O contributo dos parceiros sociais garante que serão tidos em conta tanto os interesses das empresas como os dos trabalhadores. Além disso, a protecção do emprego aliada a serviços eficazes de reinserção profissional e a políticas activas no mercado de trabalho é essencial para a capacidade de adaptação e para a segurança das empresas e dos trabalhadores.

4.10

O contributo dos parceiros sociais poderia ter por objectivo aumentar a mobilidade protegida e tirar partido das transições. Os parceiros sociais podem ajudar na organização de um controlo colectivo e negociado das oportunidades e dos direitos do mercado de trabalho, o que, no entender do CESE, combateria a tendência para a segmentação e melhoraria a integração.

5.   Igualdade entre homens e mulheres, solidariedade intergeracional e flexigurança

5.1

A flexibilidade e segurança do mercado de trabalho afectam os homens e as mulheres de forma diferenciada. As mulheres têm frequentemente postos de trabalho mais precários e inseguros, caracterizados por uma flexibilidade excessiva. A flexibilidade excessiva, que, em alguns casos, pode levar a um posto de trabalho precário e inseguro, deve ser compensada por uma forma de segurança adequada. Por outro lado, tendo em conta a persistência dos papéis tradicionais desempenhados por homens e mulheres, as mulheres têm maiores responsabilidades relativamente aos cuidados com crianças e idosos enfrentando maiores dificuldades na conciliação das actividades profissionais e não profissionais. Além disso, não obstante a legislação de combate à discriminação, há uma disparidade salarial entre homens e mulheres, tendo estas frequentemente menos direitos em matéria de segurança social, incluindo no respeitante a pensões. Assim, as mulheres são afectadas mais frequentemente pelos aspectos negativos da flexibilidade.

5.2

O CESE sublinha que o debate sobre flexigurança deverá englobar uma dimensão significativa de igualdade entre homens e mulheres, que tem sido, até ao momento, ignorada neste debate. É importante melhorar a situação das mulheres no mercado de trabalho através da análise de questões de flexibilidade e segurança, como o aumento dos postos de trabalho seguros, a sua integração nos sistemas de segurança social e um melhor apoio das instituições à conciliação entre actividades profissionais e não profissionais. Além disso, a divisão de responsabilidades entre homens e mulheres relativas a cuidados e tarefas domésticas deveria integrar o debate. No parecer sobre o «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada», o CESE demonstrou, a pedido da Presidência portuguesa, a sua posição relativamente a estes assuntos (9).

5.3

Além da igualdade entre homens e mulheres, a flexigurança tem igualmente uma dimensão geracional. Em comparação com a mão-de-obra em geral, a taxa de emprego é mais baixa entre os trabalhadores mais velhos. Também os jovens de muitos Estados-Membros enfrentam mercados de trabalho instáveis caracterizados por uma taxa alta de desemprego, contratos de trabalho a prazo, cobertura insuficiente de segurança social e postos de trabalho abaixo das suas habilitações.

5.4

O CESE (10) indicou que o posto de trabalho deveria corresponder à formação e experiência profissional do trabalhador sem qualquer discriminação entre gerações e que todos os Estados-Membros deverão transpor e aplicar a directiva sobre igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional (2000/78/CE). Uma política a favor do emprego de qualidade orienta e forma gerações de cidadãos ao longo da sua carreira. O que implica uma intervenção dos parceiros sociais e de todos os actores económicos e sociais a nível local, nacional e europeu.

5.5

Os parceiros sociais europeus concluíram um quadro de acção sobre igualdade entre homens e mulheres susceptível de ser utilizado igualmente no debate sobre flexigurança. Neste quadro de acção os parceiros sociais identificaram quatro prioridades: análise do papel de homens e mulheres, promoção das mulheres na tomada de decisão, conciliação entre vida profissional e familiar e correcção das disparidades salariais entre homens e mulheres.

5.6

As considerações do parágrafo anterior e o diálogo entre os Parceiros Sociais devem dar igual relevância e importância ao problema dos trabalhadores com deficiência e dos jovens estudantes.

6.   Flexigurança e flexibilidade interna

6.1

A flexibilidade interna tem sido um aspecto insuficientemente desenvolvido no debate sobre flexigurança. A flexibilidade interna diz respeito à flexibilidade do tempo de trabalho e à flexibilidade de funções, servindo para reforçar a adaptabilidade. Tipicamente, os parceiros sociais têm uma ampla experiência na negociação de acordos colectivos nesta matéria, sendo os resultados positivos. A flexibilidade interna pode desempenhar um papel fundamental no aumento da produtividade, inovação e competitividade podendo contribuir, desta forma, para o cumprimento dos objectivos da Estratégia de Lisboa. Poderá igualmente desempenhar um papel importante assistindo os trabalhadores na conciliação do trabalho com outras actividades e responsabilidades e melhorando a qualidade do seu emprego. Tanto num caso como no outro, poderá aumentar a estabilidade e previsibilidade. Contudo, a flexibilidade interna pode também tornar-se excessiva, seja por conduzir a más condições de trabalho ou a situações de trabalho precário, seja por impedir o equilíbrio entre actividades profissionais e não profissionais, seja ainda pelos efeitos prejudiciais que é susceptível de ocasionar na qualidade dos bens e nas garantias de prestação de serviços aos consumidores. Assim, este tipo de flexibilidade é apenas viável quando resultante da negociação colectiva e com base num quadro de regulamentação que assegure a protecção no emprego e nos cuidados de saúde e forneça estabilidade e segurança aos trabalhadores. Neste contexto jurídico, a aposta na flexibilidade interna negociada é uma solução viável tendo por objectivo combinar a melhoria da competitividade com a melhoria da qualidade do emprego e da vida profissional.

6.2   Flexibilidade do tempo de trabalho

6.2.1

A flexibilidade do tempo de trabalho tem a ver com a distribuição do tempo de trabalho normal semanal, fixado em acordos colectivos ou na lei, por um período maior de tempo. As empresas podem beneficiar desta flexibilidade através de possibilidades de adaptação a flutuações da procura ou de pessoal e da utilização plena de investimentos de capital fazendo uso de horas extraordinárias, planificação flexível de horários de trabalho com base em calendários predefinidos, trabalho por turnos, etc. Desta forma, a flexibilidade do tempo de trabalho poderá fortalecer a produtividade e a competitividade.

6.2.2

A flexibilidade do tempo de trabalho pode igualmente consistir na distribuição do tempo de trabalho na vida profissional de cada um, bem como no equilíbrio entre a vida profissional e pessoal (mas não na duração do tempo normal de trabalho durante a semana). Estas formas de flexibilidade do tempo de trabalho poderão servir os interesses dos trabalhadores criando possibilidades para estes combinarem, de forma positiva, actividades e responsabilidades profissionais e não profissionais através do uso de sistemas de tempo flexível, contas de tempo de trabalho, licenças parentais ou para formação, opções para transitar entre trabalho a tempo inteiro e parcial, etc.

6.2.3

O CESE considera que se deverá evitar a expansão da flexibilidade do tempo de trabalho se esta favorecer somente os interesses das empresas não tendo simultaneamente em conta a necessidade de protecção dos trabalhadores (11). Por outro lado, a organização do tempo de trabalho deveria servir «[…] também o interesse dos trabalhadores em controlarem mais o seu tempo, bem como, em particular, numa maior compatibilidade entre trabalho e família, respeitando as necessidades da empresa de uma organização do tempo de trabalho mais flexível» (12).

6.2.4

Para esse efeito, na opinião do CESE, dever-se-ia procurar um equilíbrio entre flexibilidade do tempo de trabalho e protecção do trabalhador, o qual poderá ser mais bem garantido através de regimes estabelecidos por negociações colectivas. De facto, num parecer anterior, o CESE afirmou que «a concepção de regras aplicáveis ao tempo de trabalho nas convenções colectivas apresenta […] um interesse fundamental para os parceiros sociais, que têm grande competência e experiência nessas questões» (13).

6.2.5

A negociação sobre flexibilidade do tempo de trabalho exige um quadro de negociação apropriado e um contexto sólido de direitos e instituições sociais que possam suportá-lo. Este contexto implica a existência de regulamentação que proporcione estabilidade e protecção aos trabalhadores bem como protecção social aos assalariados com contratos a tempo parcial e que facilite esquemas de licença parental e estruturas para acolhimento de crianças e idosos. É essencial que a legislação seja flexível e neutra e que permita aos parceiros sociais encontrarem as soluções mais adequadas.

6.3   Flexibilidade de funções

6.3.1

A flexibilidade de funções consiste em tirar partido, sempre que necessário, da capacidade dos trabalhadores de realizarem diferentes tarefas através da rotação de postos de trabalho, alargamento do âmbito das tarefas e enriquecimento do trabalho. As empresas podem beneficiar desta flexibilidade, dado que lhes permite adaptarem o tipo de tarefas a realizar às flutuações de procura ou de pessoal bem como utilizarem, de forma mais produtiva, os recursos humanos e investimentos de capital. A flexibilidade de funções poderá também servir o interesse dos trabalhadores aumentando as suas oportunidades de desenvolvimento pessoal, aprendizagem, empregabilidade, satisfação profissional e aumentos salariais.

6.3.2

A flexibilidade de funções pode ser um factor-chave no cumprimento dos objectivos de Lisboa relativos ao aumento da produtividade, inovação e competitividade. Conforme demonstra a Fundação de Dublin, por exemplo, a flexibilidade de funções, associada à formação, tem um efeito positivo no desenvolvimento e manutenção de capacidades, influenciando positivamente a produtividade (14).

6.3.3

No entanto, a flexibilidade de funções exige empregos seguros, condições de trabalho dignas, responsabilização e formas de trabalho baseadas na cooperação. Como o CESE defendeu num parecer anterior, «a segurança do emprego, um ambiente de trabalho sadio e uma organização do trabalho que permita maior margem de manobra individual constituem, no seu conjunto, factores decisivos para o aumento do desempenho e, por conseguinte, da capacidade de inovação» (15). No mesmo parecer afirmava se que «as formas cooperativas de trabalho assentes em hierarquias “planas” e numa maior autonomia de decisão, como o trabalho em grupo ou em equipa, tornam possível tirar globalmente partido dos conhecimentos e capacidades das pessoas, tendo em conta as crescentes exigências de flexibilidade da economia. Boas condições de trabalho e formas cooperativas da sua organização constituem simultaneamente condições indispensáveis à melhoria da produtividade e ao reforço da capacidade de inovação das empresas» (16).

6.3.4

Contudo, a Fundação de Dublin chamou a atenção para o facto de a flexibilidade de funções poder conduzir a mais pressão de trabalho e stress. Assim, a Fundação sublinha que é importante «[…] alcançar um equilíbrio entre procura e controlo de emprego para prevenir o esgotamento dos trabalhadores» (17).

6.3.5

A aprendizagem ao longo da vida deveria ser um elemento fundamental das estratégias de flexibilidade de funções e de flexibilidade interna, em geral. O CESE realçou em diversos pareceres recentes (18) a importância da aprendizagem ao longo da vida para o aumento das capacidades dos trabalhadores, das oportunidades de carreira e da produtividade. A flexibilidade de funções exige uma constante actualização do conhecimento e das capacidades dos trabalhadores, bem como um sistema de educação e formação que funcione bem, de forma a suportar esta actualização. Apesar dos compromissos assumidos no passado no âmbito da aprendizagem ao longo da vida, muito se encontra por fazer na prática.

6.3.6

A flexibilidade de funções é, assim, um assunto-chave para a negociação colectiva entre os parceiros sociais. Através desta negociação, poder-se-á equilibrar e ajustar as necessidades das empresas e dos trabalhadores bem como definir uma compensação adequada para os trabalhadores que melhorem as suas capacidades.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Ver COM(2006) 708 final. «Livro Verde — Modernizar o direito do trabalho para enfrentar os desafios do século XXI». Parecer do CESE, de 30.5.2007, sobre «Modernizar o direito do trabalho» SOC/246 (relator D. Retureau) JO C 175 de 27.7.2007.

(2)  Perspectivas da OCDE para o emprego 2006: Impulsionar o emprego e os salários.

(3)  Pareceres em curso sobre o «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada» SOC/271 (sendo relator P. Clever) e SOC 273 «Empregabilidade e empreendedorismo — O papel da sociedade civil, dos parceiros sociais e das instâncias regionais e locais, numa perspectiva de género» (relator: L. M. Pariza Castaños).

(4)  Ver Parecer do CESE de 31.5.2005 sobre as «Orientações para as políticas de emprego 2005-2008» relator: H. MALOSSE, (JO C 286 de 17.11.2005).

(5)  Parecer do CESE, de 17.5.2006, sobre «Flexissegurança: o caso dinamarquês», relatora: A. VIUM, (JO C 195 de 18.8.2006).

(6)  Vide parecer do CESE, de 6.7.2006, sobre «Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu», relator E. Ehnmark, CESE (JO C 309 de 16.12.2006).

(7)  O programa de trabalho plurianual dos parceiros sociais 2006-2008 inclui uma «análise conjunta dos principais desafios dos mercados de trabalho europeus».

(8)  SOC/273 «Empregabilidade e empreendedorismo — O papel da sociedade civil, dos parceiros sociais e das instâncias regionais e locais, numa perspectiva de género» (relator: L. M. Pariza Castaños).

(9)  Parecer em curso sobre o «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada» (relator: P. Clever).

(10)  Ver Parecer do CESE de 14.3.2007 sobre «O impacto económico e orçamental do envelhecimento», ECO/186 (relatora S. FLORIO), JO C 161 de 13.7.2007.

(11)  Cf. Parecer do CESE de 11.5.2005 sobre a Proposta de directiva que altera a Directiva 2003/88/CE relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, ponto 3.4. relatora: Engelen-Kefer, (JO C 267 de 27.10.2005).

(12)  Ibid, ponto 3.6.

(13)  Parecer do CESE de 1.7.2004 sobre a Revisão da Directiva 93/104 relativa à organização do tempo de trabalho, ponto 2.2.6., relator: E. Hahr, (JO C 302 de 7.12.2004).

(14)  http://eurofound.europa.eu/ewco/2004/02/NL0402NU03.htm.

(15)  Parecer do CESE de 13.9.2006 sobre a «Qualidade da vida activa, produtividade e emprego no contexto da globalização e dos desafios demográficos», relatora: Engelen-Kefer, (JO C 318 de 23.12.2006, ponto 1.3).

(16)  Idem, ponto 1.4.

(17)  http://eurofound.europa.eu/ewco/2004/02/NL0402NU03.htm.

(18)  Parecer do CESE sobre a «Proposta de recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho sobre as competências-chave para a aprendizagem ao longo da vida», relatora: Mária Herczog, (JO C 195 18.8.2006); e Parecer exploratório sobre «Formação e produtividade», relator: Koryfidis, (JO C 120 de 20.5.2005).


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/114


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o tema «Empregabilidade e empreendedorismo — O papel da sociedade civil, dos parceiros sociais e das instâncias regionais e locais, numa perspectiva de género»

(2007/C 256/21)

O Comité Económico e Social Europeu recebeu uma consulta, com data de 13 de Fevereiro de 2007, da futura Presidência portuguesa sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 18 de Junho de 2007. Relator: L. M. PARIZA CASTAÑOS.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o presente parecer por 141 votos a favor, sem votos contra e 5 abstenções.

1.   Síntese das propostas do CESE

1.1

A desigualdade entre mulheres e homens no mundo das empresas e no mercado de trabalho é um grave problema de toda a sociedade europeia, tanto dos homens como das mulheres, das empresas, dos trabalhadores e das trabalhadoras, dos governos, dos parceiros sociais e da sociedade civil. O Comité é de opinião que chegou o momento de dar um novo impulso às políticas de igualdade, mediante medidas activas no mercado de trabalho, na iniciativa empresarial e na organização da vida social.

1.2

A igualdade entre mulheres e homens é um desafio fundamental para o futuro da Europa. Assim, o Comité propõe um reforço da dimensão de género na Agenda de Lisboa e que, na revisão intercalar das orientações integradas para o crescimento e o emprego, na agenda social e nos planos nacionais de reforma, se incluam:

1.2.1

O desenvolvimento decidido pelos Estados-Membros do pacto europeu para a igualdade de género e designação de um responsável nacional para a igualdade de género nos planos nacionais de reforma.

1.2.2

Novos objectivos específicos para a igualdade de género nas políticas de emprego, com indicadores qualitativos e quantitativos, uma vez que é prioritário que mais mulheres sejam empresárias e tenham emprego, de melhor qualidade.

1.2.3

Objectivos precisos para eliminar (em particular no ensino) os estereótipos de género que restringem o espírito empresarial das mulheres.

1.2.4

Melhoria da governação: participação adequada dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil, particularmente a nível local e regional. As autoridades locais e regionais devem associar-se de modo activo aos planos nacionais de reforma.

1.2.5

Maior transparência nos serviços públicos de emprego e nas agências privadas, a fim de promover a igualdade e eliminar a discriminação na contratação laboral.

1.2.6

Compromissos assumidos pelas instituições de supervisão do sector dos serviços financeiros no sentido de se assegurarem de que, no exame dos pedidos de crédito apresentados por mulheres empresárias estas não sejam alvo de discriminação em razão do género. São igualmente necessárias ajudas públicas para o acesso ao crédito, em especial para as mulheres que desenvolvem pela primeira vez uma actividade económica.

1.2.7

Objectivos precisos para fomentar, no ensino universitário e profissional, o acesso das mulheres e dos homens a todas as profissões, ultrapassando os estereótipos culturais.

1.2.8

Apoio e ajuda aos parceiros sociais, em particular aos níveis sectorial, local e regional, a fim de eliminar, através da negociação colectiva e do diálogo social, os desequilíbrios de género que colocam as mulheres numa posição secundária nas empresas.

1.2.9

Os planos de igualdade e as medidas de acção positiva que os parceiros sociais acordam e desenvolvem em numerosas empresas e sectores; estes devem ser alargados e apoiados pelos governos nacionais, regionais e locais, e igualmente através dos recursos comunitários do Fundo Social Europeu.

1.2.10

As orientações comunitárias; devem reforçar os objectivos nacionais para a igualdade salarial entre homens e mulheres, mediante indicadores precisos.

1.2.11

Programas específicos para o acesso ao emprego e para a criação de empresas de mulheres imigrantes e de grupos minoritários; devem-se elaborar, a nível local e regional.

1.2.12

Programas e objectivos específicos para as mulheres com deficiência, que são igualmente necessários.

1.2.13

Os planos nacionais de reforma dos sistemas de cálculo das pensões; devem evitar que muitas mulheres percam o direito a pensão ou vejam o valor da sua pensão seriamente reduzido em virtude do trabalho a tempo parcial e das interrupções da carreira profissional decorrentes, nomeadamente, de obrigações familiares. É necessário um estatuto jurídico adequado para as cônjuges co-empresárias.

1.2.14

As autoridades locais e regionais devem colaborar com as empresas e os trabalhadores e as trabalhadoras, a fim de garantir a conciliação da vida familiar com a profissional.

1.2.15

Face ao envelhecimento da geração actual dos empresários, a transmissão de numerosas sociedades, em particular PME, representa uma oportunidade para o acesso das mulheres a lugares de direcção das empresas. É crucial que esta passagem de testemunho seja secundada por disposições nacionais ou locais que favoreçam a assunção destas funções por mulheres. Ao nível europeu, esta realidade mereceria um estudo e o levantamento de práticas de acompanhamento incentivadoras.

2.   Introdução

2.1

A futura Presidência portuguesa da UE solicitou ao CESE a elaboração de um parecer exploratório sobre «Empregabilidade e empreendedorismo — O papel da sociedade civil, dos parceiros sociais e dos organismos regionais e locais, numa perspectiva de género», a fim de preparar os trabalhos da sua presidência.

2.2

O CESE congratula-se com a proposta da Presidência portuguesa de reforçar o processo de consulta sobre as novas «Orientações integradas para o crescimento e o emprego 2008-2010» através da incorporação da perspectiva de género e da sua aplicação pela sociedade civil, pelos parceiros sociais e pelos entes locais e regionais, bem como pelos governos, uma vez que a perspectiva de género, a igualdade entre homens e mulheres, constitui um desafio para a sociedade europeia.

2.3

O Tratado dispõe de modo claro que se incluem entre os objectivos da UE a promoção do progresso económico e social, um elevado nível de emprego e a igualdade entre homens e mulheres.

2.4

A igualdade entre homens e mulheres é um dos princípios fundamentais da União Europeia, garantido no Tratado e na Carta dos Direitos Fundamentais da UE. As instituições e órgãos da UE têm a obrigação de combater a discriminação que afecta as mulheres e de promover a igualdade entre homens e mulheres através da legislação e das políticas públicas.

2.5

A UE dispõe de um importante acervo de políticas de igualdade. Em relação às políticas de emprego e à legislação laboral, são de referir duas directivas: a Directiva 2002/73/CE, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho; a Directiva 2004/113/CE, que aplica o princípio de igualdade de tratamento entre homens e mulheres no acesso a bens e serviços e seu fornecimento.

2.6

Nestes últimos anos, o CESE elaborou uma série de pareceres (1) que contribuíram para o desenvolvimento do acervo comunitário, para a melhoria da legislação e para a qualidade das políticas de igualdade. O Comité apoiou a Estratégia Europeia de Emprego e salientou o esforço positivo para encontrar soluções aos problemas nacionais e locais através de uma abordagem comum e coordenada à escala europeia. O Comité considera necessário apoiar este esforço através de mais acções e com melhor coordenação.

2.7

O CESE pretende efectuar uma avaliação das políticas adoptadas até à data, destacar as boas práticas e propor algumas novas iniciativas, para que as mulheres europeias desenvolvam o espírito empresarial e sejam mais activas no mercado de trabalho. O presente parecer inscreve-se nos debates de avaliação e de reforma da Agenda de Lisboa, e as propostas podem desenvolver-se na revisão da estratégia integrada para o crescimento e o emprego e nos futuros planos nacionais de reforma.

3.   A Agenda de Lisboa

3.1

A Estratégia de Lisboa preconiza o pleno emprego na Europa através do reforço da qualidade e da produtividade no trabalho, da coesão económica, social e territorial, a par de melhor governação, no quadro de uma sociedade do conhecimento adaptada às opções pessoais de homens e mulheres. Estabelece-se, pela primeira vez, uma tabela quantitativa para alcançar a igualdade entre homens e mulheres na vida económica, mediante um índice de emprego feminino de 60 % para 2010.

3.2

A pedido do Conselho Europeu, o CESE está a colaborar com os CES nacionais no desenvolvimento da Estratégia de Lisboa (2).

3.3

Apesar dos bons resultados, a experiência revelou a necessidade de maiores reformas no âmbito da Estratégia de Lisboa, a fim de garantir a participação num pé de igualdade das mulheres e dos homens na criação de empresas e no acesso ao emprego.

3.4

Na Europa, as mulheres não têm ainda as mesmas oportunidades empresariais que os homens, nem as mesmas possibilidades no mercado de trabalho. Como consequência dos estereótipos sociais herdados do passado, a taxa de actividade das mulheres é globalmente mais baixa do que a dos homens e persiste a segregação profissional do mercado de trabalho. De modo geral, as mulheres têm empregos mais precários e de pior qualidade, com salários mais baixos, deparam-se com maiores dificuldades para desenvolverem as suas qualificações profissionais, e as mulheres empresárias enfrentam mais obstáculos no acesso ao financiamento.

3.5

Por isso, o CESE considera necessário reforçar a dimensão de género na Estratégia de Lisboa, com uma revisão dos objectivos comunitários e nacionais, para conseguir que mais mulheres sejam empresárias, tenham emprego e melhore a qualidade deste. Entenda-se por qualidade, aqui, uma maior diversificação profissional, a igualdade salarial, maior estabilidade e o acesso à formação e à promoção profissional.

3.6

Após a revisão intercalar, o Conselho aprovou, em 2005, o «Relançamento da Estratégia de Lisboa», cujo objectivo principal consiste em não centrar a atenção exclusivamente nos objectivos quantitativos, mas, sim, nas políticas e acções práticas necessárias para os atingir. As prioridades são criar mais empregos e de melhor qualidade, e para tal torna-se necessário atrair e manter mais pessoas no mercado de trabalho; modernizar os sistemas de protecção social; melhorar a capacidade de adaptação dos trabalhadores e das empresas; melhorar a flexibilidade e a segurança dos mercados de trabalho; e aumentar os investimentos no capital humano através da melhoria da educação e das qualificações (3).

3.7

Esta Agenda de Lisboa revista coloca igualmente em destaque a importância da boa governação através de um método de trabalho político mais eficaz que vincule todas as partes interessadas, os Estados-Membros, os cidadãos, os parlamentos, os parceiros sociais e a sociedade civil, bem como as instituições comunitárias, numa visão comum de progresso e oportunidades de futuro. O CESE considera que se deve melhorar a governação da Agenda de Lisboa através de um protagonismo mais activo da sociedade civil, dos parceiros sociais e dos entes locais e regionais.

3.8

O CESE salienta a importância da participação dos parceiros sociais na fase mais precoce possível do processo de elaboração das orientações, bem como de que sejam consultados sobre os aspectos relativos à integração dos critérios de género.

3.9

As «Orientações integradas para o crescimento e o emprego 2005-2008», base para a preparação dos programas nacionais de reforma dos Estados-Membros, reforçam o carácter essencial da igualdade entre homens e mulheres para enfrentar as prioridades estabelecidas, conjugando medidas específicas sobre o emprego feminino com a integração da igualdade em todas as acções empreendidas (4).

3.10

Como disse no seu parecer sobre as orientações para o emprego, o CESE considera estranho que, sendo o problema da igualdade entre homens e mulheres no âmbito do emprego um dos principais temas da Estratégia de Lisboa, as orientações não incluam uma linha de conduta integrada específica sobre o tema da igualdade entre homens e mulheres (5).

3.11

O balanço do programa comunitário de Lisboa e dos programas nacionais de reforma (6) acentua a necessidade de reforçar as políticas de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, através de medidas que possibilitem a conciliação da vida profissional, familiar e pessoal.

3.12

O Relatório Conjunto sobre o Emprego 2006-2007 valoriza de modo positivo o rápido crescimento das taxas de emprego das mulheres e considera que representa um avanço para atingir o objectivo de Lisboa (7). Todavia, destaca que «Os relatórios de execução da maioria dos Estados-Membros continuam a não fazer referência a medidas específicas que visem promover o emprego feminino ou reduzir as disparidades entre homens e mulheres, à excepção de medidas para alargar o acesso a estruturas de acolhimento de crianças. Alguns Estados-Membros (AT, BE, DK, DE, ES, IE, IT, LU, PT e UK) definiram objectivos nacionais em termos do número de vagas em estruturas de acolhimento de crianças, mas poucos são os que dão conta de progressos na consecução da meta europeia. Na globalidade, estes progressos continuam a ser lentos. AT, DK, FI, IE, MT e NL dão relevo a acções destinadas a tornar mais acessíveis as estruturas de acolhimento de crianças através da criação de uma taxa máxima ou da redução dos custos. Não é, no entanto, mencionada a necessidade de reforçar o papel dos homens na conciliação da vida profissional e familiar. A SI lançou uma campanha para tornar os homens mais activos na vida familiar, a LT abriu novas possibilidades de licença de paternidade remunerada e CZ, DE e EL alargarão a possibilidade de licença parental para os pais.»

4.   O Pacto Europeu para a Igualdade de Género e o Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres

4.1

O «Pacto Europeu para a Igualdade de Género» (8), aprovado pelo Conselho Europeu de Março de 2006, pressupõe um avanço qualitativo ao envolver todos os Estados-Membros no objectivo comum de aumentar a participação feminina no mercado de trabalho e de promover a igualdade entre homens e mulheres.

4.2

O «Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010» adoptado pela Comissão fixa seis áreas de intervenção prioritárias para a acção da União Europeia: igualdade em matéria de independência económica para homens e mulheres; conciliação do trabalho com a vida privada e familiar; participação equilibrada de homens e mulheres em instâncias de tomada de decisão; erradicação da violência em razão do sexo; eliminação dos estereótipos de género, e promoção da igualdade entre homens e mulheres nas políticas externa e de desenvolvimento (9).

4.3

Para melhorar a governação em matéria de igualdade entre homens e mulheres, o Roteiro estabelece igualmente uma série de acções de grande relevância, e a Comissão compromete-se a acompanhar de perto os avanços nesta área.

4.4

No seu parecer sobre o «Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010», o CESE congratula-se com a vontade política da Comissão de dar prioridade à igualdade entre homens e mulheres no seu programa de trabalho para 2006-2010, e destaca a importância de implicar todas as partes interessadas na aplicação das suas acções (10).

4.5

Por outro lado, o CESE também apoiou a criação do Instituto Europeu da Igualdade de Género (11).

4.6

O Comité é de opinião que chegou o momento de dar novo impulso às políticas de igualdade, mediante novas políticas activas no mercado de trabalho, na criação de empresas e na organização da vida social. Vários Estados-Membros estão a adoptar novas legislações para garantir a igualdade efectiva entre homens e mulheres na vida política, nas organizações sociais e nas empresas, tanto entre trabalhadores assalariados, como nas direcções e conselhos de administração. Na generalidade, o CESE apoia estas reformas que incluem políticas activas na base de um quadro legal racional que garanta uma efectiva protecção no emprego e forneça as indispensáveis estabilidade e segurança.

5.   Propostas do CESE: Reforçar a dimensão de género na Agenda de Lisboa

5.1

Os desequilíbrios e a desigualdade entre homens e mulheres no mundo das empresas e no mercado de trabalho é um grave problema de toda a sociedade europeia, tanto dos homens como das mulheres, das empresas, dos trabalhadores e das trabalhadoras, dos governos, dos parceiros sociais e da sociedade civil. A igualdade entre homens e mulheres é um desafio crucial para o futuro da Europa.

5.2

O CESE apoia a Resolução do Parlamento Europeu de 13 de Março de 2007 (12) sobre o Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010, em particular o ponto 17, que «solicita aos Estados-Membros que integrem ou reforcem, nos seus planos de acção nacionais para o emprego e a integração social, medidas destinadas a favorecer o acesso das mulheres ao mercado laboral em condições de dignidade e de remuneração iguais para um salário igual, a encorajar a iniciativa empresarial feminina» e o ponto 20, que «solicita aos Estados-Membros que nomeiem um responsável nacional pela igualdade dos géneros no âmbito da aplicação da Estratégia de Lisboa encarregado de participar na elaboração e na revisão dos diferentes planos nacionais e de controlar a sua aplicação de forma a favorecer a integração da dimensão do género, nomeadamente no orçamento, no que diz respeito às políticas e aos objectivos definidos por esses planos.»

5.3

O CESE insiste que é necessário que os novos planos nacionais de reforma incluam a obrigação de os Estados-Membros nomearem um responsável nacional pela igualdade dos géneros.

5.4

As orientações para o emprego devem fixar objectivos concretos e melhorar os indicadores qualitativos e quantitativos precisos para efectuar uma avaliação comparativa, entre os Estados-Membros, dos progressos para a igualdade efectiva das mulheres no mercado de trabalho e nas iniciativas empresariais.

5.5

O CESE considera que, a nível europeu, se deve prestar maior atenção às mulheres que trabalham em zonas rurais dependentes da agricultura, com escassa cultura de aprendizagem, e apoiar a sua participação no mercado de trabalho.

5.6

Invocando a subsidiariedade, alguns governos pretendem reduzir o nível das exigências comunitárias sobre os planos nacionais de reforma. O CESE considera, todavia, que, na globalidade, as orientações integradas são suficientemente flexíveis, para que os Estados-Membros possam identificar as soluções mais bem adaptadas às suas necessidades.

5.7

Além disso, o CESE considera que, no respeito da subsidiariedade, é necessário reforçar o carácter comunitário da Agenda de Lisboa e das «Orientações integradas para o crescimento e o emprego». Como consta do parecer sobre o Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010, «O Comité reconhece a necessidade de estabelecer prioridades comuns na coordenação das políticas de emprego a fim de aumentar a taxa de participação feminina. Na avaliação dos programas nacionais de reforma, a Comissão deve providenciar para que seja dada prioridade à eliminação das desigualdades entre os sexos e sejam adoptadas as medidas necessárias»  (13).

5.8

Melhorou a governação na estratégia europeia de emprego, mas o CESE é de opinião que a situação ainda não é plenamente satisfatória. É necessário reforçar a colaboração entre a Comissão, os Estados-Membros e os parceiros sociais, as organizações que trabalham no âmbito da igualdade, e as organizações da sociedade civil, garantindo uma participação adequada em todos os níveis e em todas as etapas das acções.

5.9

O CESE considera necessário melhorar a participação dos cidadãos na Estratégia Europeia de Emprego. Os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil devem ser associados a estas políticas, sendo necessária a sua participação, mediante procedimentos adequados, a todos os níveis — comunitário, nacional, regional e local. Para que a Estratégia de Lisboa seja bem sucedida, deve-se melhorar a governação, o valor acrescentado do protagonismo activo dos parceiros sociais, da sociedade civil, e das entidades locais e regionais.

5.10

No respeitante ao emprego, é ao nível local que melhor se revela o impacto da aplicação das políticas; pelo que o papel das autoridades locais e regionais, juntamente com o dos parceiros sociais, são essenciais para a aplicação das políticas. A inserção profissional em condições de igualdade requer um conhecimento profundo e próximo das características e necessidades das mulheres, e do contexto económico e social do território, pelo que será necessário que as instituições locais e regionais participem no diagnóstico, na concepção, na execução e na avaliação das acções.

5.11

Embora as mulheres tenham ganho muito terreno, nestes últimos anos, no acesso à universidade (59 % dos diplomados do ensino superior são mulheres) (14), o âmbito dos estudos ainda apresenta fortes estereótipos. De cada dez diplomadas, só uma o é em estudos técnicos, quando nos homens são quatro de cada dez. O ensino, as humanidades e as ciências da arte e da saúde atraem quase metade das diplomadas e menos de um quarto dos diplomados. O CESE propõe que as autoridades educativas adoptem medidas gerais de promoção para ultrapassar os estereótipos sexistas para que as mulheres e os homens escolham profissões em que estão pouco representados.

5.12

As políticas de conciliação contribuem para melhorar a qualidade de vida de mulheres e homens. Ajudam todas as pessoas a integrarem o mercado de trabalho e lá permanecerem utilizando todo o potencial da mão-de-obra. Estas políticas devem aplicar-se tanto às mulheres como aos homens.

5.13

O CESE (15) recorda aos Estados-Membros o seu compromisso com o pacto europeu para a igualdade de género e propõe à Comissão que solicite aos Estados-Membros que incluam nos planos nacionais de reforma maiores compromissos para melhorar a conciliação entre a vida familiar e profissional dos homens e mulheres, e recorda que, uma vez que se trata de uma tarefa para a sociedade em geral, é necessário garantir a co-responsabilidade de todas as partes, igualmente das empresas.

5.14

Não se deve confundir a conciliação com certas medidas de política familiar que colocam obstáculos ao emprego, com fortes incentivos para o afastamento da vida profissional e a interrupção prolongada, que se traduz numa redução das oportunidades para uma reintegração adequada.

5.15

É necessário desenvolver medidas mais eficazes para promover a reintegração das mulheres e homens no emprego — sem perda de qualificação e de salários — após o período de maternidade ou de ausência dedicada ao cuidado de pessoas dependentes. Entre as medidas, podem-se desenvolver modelos flexíveis de formação contínua durante o período de ausência e a permanência no emprego com redução do tempo de trabalho. Convém destacar, nesse sentido, o Acordo-Quadro Europeu sobre Teletrabalho, conseguido pelos parceiros sociais (CES, UNICE/UEAPME E CEEP), que estabelece a definição e o campo de aplicação do teletrabalho, o carácter voluntário, as condições de emprego, a protecção de dados, a vida privada, os equipamentos, a saúde e a segurança, a organização do trabalho, a formação, e os direitos colectivos, bem como a aplicação e o acompanhamento do mesmo.

5.16

As ONG desempenham um papel muito importante na promoção da igualdade entre homens e mulheres na Europa, fazem campanhas no mundo das ideias políticas e dos valores culturais, bem como desenvolvem acções de carácter social que promovem a melhoria das oportunidades de muitas mulheres. Há também muitas mulheres que participam em numerosas ONG que representam diferentes grupos de mulheres junto das instituições locais e regionais e que devem ser apoiadas.

5.17

As mulheres de origem imigrante, ou que pertencem a minorias, têm dificuldades particulares em criar empresas e em aceder ao mercado de trabalho num pé de igualdade, pelo que as novas orientações para o emprego deverão incluir objectivos específicos.

5.18

O CESE advogou, em vários pareceres, uma política comum de imigração e a inclusão da luta contra a discriminação e das políticas de integração nos objectivos prioritários dos governos europeus. Estas políticas devem incluir a perspectiva de género, para que as mulheres imigrantes ou pertencentes a minorias étnicas ou culturais possam desenvolver os seus projectos empresariais e integrar-se no mercado de trabalho num pé de igualdade.

5.19

As mulheres com deficiência também têm mais dificuldades em integrarem o mercado de trabalho e em criarem empresas. O CESE propõe que as novas orientações e os planos nacionais de reforma reforcem o objectivo de integração destas mulheres no mercado de trabalho, com indicadores específicos.

5.20

O CESE propõe que as autoridades locais e regionais lancem políticas para promover a igualdade de oportunidades das mulheres com deficiência, e que os parceiros sociais adoptem estratégias em favor da igualdade, no âmbito das convenções colectivas e das práticas laborais.

5.21

Através da iniciativa EQUAL e no âmbito da Estratégia de Lisboa, o FSE desenvolveu valiosas abordagens inovadoras para dar um impulso ao espírito empresarial e à empregabilidade destas mulheres, vítimas de maior discriminação. Os governos locais e regionais, em particular, poderiam aproveitar estas experiências com vista a um subsequente desenvolvimento, no âmbito das acções do FSE previstas para o novo período de programação de 2007-2013, a fim de adoptar novas iniciativas para promover o acesso ao emprego destes grupos de mulheres com dificuldades particulares.

6.   Empregabilidade

6.1

Depois do lançamento da Estratégia de Lisboa, seis dos oito milhões de empregos criados na UE foram ocupados por mulheres. Em 2005, a taxa de emprego das mulheres atingiu 56,3 % (+ 1,1 %), face aos 71 % da taxa de emprego masculina (+ 0,6 %). A taxa de emprego das mulheres com mais de 55 anos também registou um aumento mais rápido do que a dos homens, atingindo 33,7 % (16).

6.2

Verifica-se uma redução do desemprego: 8,8 % em 2005, sendo 9,9 % para as mulheres e 7,9 % para os homens. Não obstante a evolução favorável da taxa global de emprego das mulheres na Europa, ainda não se aproveita plenamente o seu contributo. Prova disso são as menores taxas de actividade e ocupação das mulheres, o maior índice de desemprego, a maior precariedade na contratação, a forte segregação profissional e sectorial, a desigualdade salarial, e as dificuldades, das mulheres e dos homens, em conciliarem a vida profissional com a familiar.

6.3

O CESE recorda que embora se possa atingir a taxa estabelecida para o emprego de mulheres (60 % em 2010), mas não em todos os países, deve-se ter em mente que esta percentagem inclui o trabalho a tempo parcial, o trabalho flexível e o trabalho temporário, ocupado em grande parte por mulheres, nem sempre de forma voluntária, muitas vezes em consequência da repartição desigual das responsabilidades familiares entre homens e mulheres.

6.4

Persistem diferenças muito importantes na participação dos homens e das mulheres no mercado de trabalho, e uma grande segmentação, sobretudo no que respeita às modalidades de trabalho ou aos sectores em que trabalham e às profissões que exercem. Estas disparidades afectam tanto as mulheres empregadas como as que pretendem aceder ao emprego. Por consequência, é necessário lançar novas políticas destinadas a reduzir as causas que estão na origem do desequilíbrio no número de mulheres no mercado de trabalho.

6.5

As mulheres encontram também mais dificuldades do que os homens para encontrar um emprego adequado à sua formação. Além disso, a compatibilidade entre profissão e vida familiar dificulta ainda mais o seu acesso e permanência no mercado de trabalho, o que continua a ser para elas incomparavelmente mais difícil do que para os homens.

6.6

O CESE considera muito positivos os planos de igualdade que os parceiros sociais adoptaram em numerosas empresas, com o objectivo de melhorar a integração das mulheres, a sua permanência nas empresas, melhorar o nível de formação e carreira profissional e lutar contra a discriminação e, para tal, tomaram medidas de acção positiva. As autoridades públicas, em particular locais e regionais, devem apoiar os planos de igualdade.

6.7

O diálogo social europeu, responsabilidade dos parceiros sociais, tem um papel importante no desenvolvimento da perspectiva de género da Estratégia de Lisboa. O CESE destaca e apoia a importância do quadro de acções para a igualdade de género em que os parceiros sociais acordaram em 2005 (17), que se está a desenvolver nos níveis sectoriais e nacionais.

6.8

O recente acordo-quadro europeu sobre assédio e violência no trabalho (18) é um exemplo de boas práticas que merece o apoio do CESE. Alguns dos comités de diálogo sectorial estão a integrar uma abordagem de género. O Comité à Comissão uma colaboração mais activa com os parceiros sociais a fim de atingir estes objectivos.

6.9

A negociação colectiva conforme as leis e práticas nacionais é uma das características do modelo social europeu. Os parceiros sociais nos diferentes contextos desenvolvem negociações e acordos para melhorar a segurança e a flexibilidade do emprego, actualizando os salários e a organização do trabalho e os sistemas de formação e qualificação profissional.

6.10

Mediante a negociação colectiva nas empresas e nos sectores, devem-se eliminar os desequilíbrios de género que colocam as mulheres numa posição secundária. Assim, o CESE considera que a negociação colectiva e o diálogo social são instrumentos cruciais para alargar os planos de igualdade nas empresas europeias. A Europa, os Estados-Membros, as empresas e o conjunto da sociedade têm necessidade de ver desaparecer definitivamente as discriminações no âmbito profissional que afectam muitas mulheres em virtude dos estereótipos culturais e sociais.

6.11

O princípio de igualdade de remuneração entre os trabalhadores masculinos e femininos, que consta do artigo 141.o do Tratado, «princípio de igualdade de remuneração», implica, para um mesmo trabalho ou para um trabalho com o mesmo valor, a eliminação, na globalidade dos elementos e condições de remuneração, de qualquer discriminação em razão do sexo. Sem dúvida, as mulheres ganham, em média, 15 % menos por hora de trabalho que os homens (diferença relativa do salário médio bruto por hora entre homens e mulheres) (19). Esta discriminação salarial verifica-se em todos os sectores de actividade e, em particular, nas categorias profissionais mais altas.

6.12

O CESE apoia que a igualdade salarial entre homens e mulheres, já defendida nas orientações comunitárias integradas, se reforce mediante uma avaliação com indicadores precisos.

6.13

Para eliminar as discriminações salariais é necessária a colaboração activa dos parceiros sociais nos diferentes sectores. O parecer sobre o Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010 recomendava: «que os governos nacionais, os organismos nacionais para a igualdade e os parceiros sociais de todos os Estados-Membros têm a obrigação clara de assegurar que os regimes retributivos por eles instituídos não provoquem discriminação salarial entre homens e mulheres»  (20) .

6.14

Os serviços públicos de emprego são instituições fundamentais para o bom funcionamento dos mercados de trabalho, e devem associar-se à promoção de políticas activas para o acesso ao emprego das mulheres desempregadas, através de programas de formação e de orientação profissional. Para uma aplicação adequada da legislação em vigor, o CESE propõe que os serviços públicos de emprego e as agências privadas elaborem códigos de boas práticas, a fim de que as ofertas de emprego e os procedimentos de selecção não sejam discriminatórios contra as mulheres.

6.15

Há maior igualdade entre homens e mulheres nos mercados de trabalho mais transparentes; por exemplo, no sector público há maior participação profissional das mulheres porque, entre outras causas, nos processos de selecção, se avaliam as competências das pessoas e se eliminam melhor os preconceitos discriminatórios baseados em estereótipos de género.

6.16

Em muitos casos, os sistemas de cálculo das pensões prejudicam as mulheres, visto que estão vinculados às carreiras profissionais. Muitas mulheres que trabalham a tempo parcial e com períodos de trabalho descontínuos ou precários têm muitas dificuldades para obterem uma pensão de reforma ou o valor dessa pensão é muito baixo. O CESE propõe à Comissão e aos Estados-Membros que, através do método aberto de coordenação para as reformas dos sistemas de pensões, se tenham em conta estas situações que prejudicam a igualdade das mulheres no mercado de trabalho e se procurem soluções mais justas.

6.17

A formação contínua é crucial para o desenvolvimento sustentável das actividades profissionais de homens e mulheres. O CESE propõe que as autoridades locais e regionais, em colaboração com os parceiros sociais, concebam programas de formação contínua destinados às empresárias e às trabalhadoras no âmbito das políticas de emprego e de igualdade de oportunidades.

6.18

O CESE salienta o papel activo que desempenham os parceiros sociais para superar as dificuldades que afectam as mulheres na sociedade e no mercado de trabalho. As mulheres vão-se integrando nas organizações sindicais e nas organizações empresariais e estão a promover nestas políticas activas e planos de igualdade, mas o seu número é pequeno ainda e têm que superar muitas dificuldades para ascender aos níveis directivos.

7.   Espírito empresarial

7.1

As mulheres empresárias representam uma pequena percentagem, ou seja, 30 % dos empresários da Europa, e 37 % dos trabalhadores independentes (21).

7.2

As mulheres também enfrentam mais obstáculos do que os homens na criação de empresas, em virtude dos estereótipos e dos obstáculos culturais e sociais, da orientação da educação e da formação, e ainda das dificuldades acrescidas para a obtenção de financiamentos necessários aos projectos empresariais. Todavia, uma vez criadas as empresas, não há dados de que as mulheres tenham menos êxito do que os homens na consolidação das suas empresas.

7.3

O CESE propõe a todos os actores políticos e sociais que intensifiquem os esforços para promover o espírito empresarial entre as mulheres europeias e eliminar da sociedade os antigos preconceitos sociais que ainda persistem: «o mundo empresarial é uma esfera masculina, com horários incompatíveis com a vida familiar, etc.» Estes estereótipos sociais estão na origem de muitas dificuldades culturais e sociais que as mulheres enfrentam quando desenvolvem um trabalho independente ou criam empresas.

7.4

O plano de acção sobre a política em matéria de espírito empresarial (22) propõe um conjunto de medidas para fomentar o espírito empresarial, destinadas à UE e aos responsáveis políticos de todos os Estados-Membros. Entre outras questões, o plano salienta a necessidade de prestar apoio personalizado às mulheres. Mas os relatórios de progresso efectuados sobre o cumprimento dos objectivos e acções-chaves da Carta Europeia da Pequena Empresa (23) não fazem referência a esta questão. O CESE considera que os relatórios anuais deveriam incluir informação concreta dos progressos realizados à escala europeia e nos Estados-Membros sobre o apoio às mulheres empresárias, a fim de facilitar o intercâmbio de boas práticas e conhecimentos.

7.5

É necessário promover o espírito empresarial entre as mulheres e entre os homens na Europa (24). O CESE adoptou em 2006 um parecer (25) sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões «Aplicar o programa comunitário de Lisboa: Promover o espírito empreendedor através do ensino e da aprendizagem», no qual se salienta a importância das mulheres empresárias, a capacidade empresarial das mulheres e o facto de que o espírito empresarial é um factor crucial para o crescimento, o emprego e a realização pessoal. O parecer afirmava que o desenvolvimento de uma mentalidade empresarial é um processo de aprendizagem permanente, pelo que deve ser integrado nos programas de estudo.

7.6

O CESE recomenda que se inclua nos planos de estudo nacionais a educação empresarial (em técnicas de gestão de empresas e ferramentas informáticas, etc.) no segundo e terceiro níveis, em particular entre as alunas, e que se adoptem medidas destinadas a aumentar o número de mulheres empreendedoras.

7.7

O objectivo é proporcionar às mulheres as mesmas oportunidades que os homens no acesso ao mundo das empresas, eliminando todas as discriminações existentes. Os governos locais e regionais devem incentivar as mulheres para a liberdade de iniciativa empresarial como um factor de igualdade e igualmente de desenvolvimento económico e social local.

7.8

É necessário tomar medidas de apoio para que as mulheres possam beneficiar dos serviços financeiros e dos créditos de que necessitem. Os bancos devem oferecer às mulheres empreendedoras programas específicos de micro-créditos. As instituições financeiras devem evitar a discriminação das mulheres empresárias, uma vez que têm hoje mais dificuldades do que os homens em encontrar o financiamento necessário ao desenvolvimento da actividade empresarial, ao crescimento da empresa, ao desenvolvimento de programas de inovação e de actividades de formação e de investigação.

7.9

É necessário aumentar a informação sobre as possibilidades de financiamento dos Fundos Estruturais para explorar modalidades inovadoras como, por exemplo, a criação de instrumentos financeiros flexíveis, combinando as subvenções com micro-créditos e garantias.

7.10

Os fundos comunitários para o fomento do espírito empresarial, reforçados e geridos pelos governos nacionais e regionais, devem ser transparentes e de fácil utilização pelas pequenas e médias empresas promovidas por mulheres. Os governos locais e regionais devem, em colaboração com as organizações empresariais, facilitar instalações, ajudas financeiras e assessoria às mulheres empresárias, sobretudo na fase inicial do seu projecto empresarial.

7.11

Entre os exemplos de boas práticas, o CESE destaca que, em França, o Fundo de garantia para a criação, aquisição ou desenvolvimento de empresas criadas por mulheres (Fonds de Garantie pour la Création, la Reprise ou le Développement d'Entreprise à l'Initiative des Femmes) facilita o acesso ao financiamento às mulheres que desejam criar, adquirir ou desenvolver uma empresa. O fundo foi criado para ajudar as mulheres a ultrapassar as dificuldades que encontram em matéria de acesso a créditos bancários. O fundo é gerido através de uma organização privada, o Instituto de Desenvolvimento da Economia Social (Institut de Développement de l'Economie Sociale), e beneficia de financiamento de diversas entidades, entre as quais o Fundo Social Europeu.

7.12

Os Estados devem prestar maior apoio às pequenas empresas, uma vez que a maioria das mulheres empresárias considera que as políticas fiscais constituem um dos maiores obstáculos ao desenvolvimento das empresas em virtude das inconsistências na legislação aplicável.

7.13

Quando as pessoas criam a sua própria empresa, em princípio, são mais donas do seu tempo e, por isso, cada vez mais mulheres e homens desenvolvem o auto-emprego e o espírito empresarial. Na prática, as mulheres empresárias têm mais dificuldades que os homens em conciliar melhor a vida profissional e a vida familiar.

7.14

Há, em toda a Europa, numerosos exemplos de boas práticas para promover o papel das mulheres nas organizações empresariais nos diferentes níveis, e também se constituíram associações de mulheres empresárias. As câmaras de indústria e comércio (26) também desenvolvem numerosas iniciativas positivas que o CESE apoia.

7.15

O CESE apoia o trabalho desenvolvido pela «Rede europeia para a promoção do espírito empresarial feminino» (WES), cujo principal objectivo é aumentar a visibilidade das empresárias, criando um bom contexto graças a elementos como o intercâmbio de informação sobre financiamento, formação, redes, assessoria, investigação e estatísticas.

7.16

Em muitas ocasiões, as empresas da economia social — cooperativas, mutualidades, associações, fundações — em virtude da sua natureza, são utilizadas pelas mulheres para desenvolverem a sua iniciativa empresarial, e encontram menos dificuldades que em outros tipos de empresas para atingirem os seus objectivos profissionais.

7.17

Com base no seu objectivo social, as empresas da economia social promovem, em larga medida, a integração laboral das mulheres, pelo que merecem o apoio dos governos locais e regionais no impulso a este grande trabalho social.

7.18

A maioria dos cônjuges co-empresários são mulheres que trabalham, muitas vezes, a tempo parcial. As preocupações relacionadas com a licença de maternidade, o problema dos infantários e os problemas ligados ao falecimento ou ao divórcio do cônjuge, são problemas muito específicos diferentes dos que os homens enfrentam. Não há, em muitos Estados-Membros, um estatuto jurídico adequado.

7.19

São igualmente importantes as disparidades resultantes dos regimes de segurança social. É necessário desenvolver acções precisas em matéria de protecção social, de formação e de apoio à criação de novas empresas por mulheres. Alguns países, no que se refere à protecção social das mulheres empresárias e dos cônjuges co-empresários, oferecem um leque de estatutos diferentes que podem beneficiar as mulheres empresárias, por exemplo, «cônjuge colaborador», «cônjuge assalariado» ou «cônjuge associado». O CESE propõe à Comissão o lançamento de um debate com o objectivo de melhorar a protecção social das mulheres empresárias.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Parecer do CESE de 13.9.2006 sobre a «Comunicação Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões — Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010», Relatora: G. ATTARD (JO C 318, de 23.12.2006).

Parecer do CESE, de 14.12.2005, sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao Ano Europeu da Igualdade de Oportunidades para Todos (2007) — Rumo a uma sociedade justa», Relatora: M. HERCZOG (JO C 65, de 17.3.2006).

Parecer do CESE de 29.9.2005 sobre «Pobreza das mulheres na Europa», Relatora: B. KING (JO C 24, de 31.1.2006).

Parecer do CESE, de 28.9.2005, sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria um Instituto Europeu da Igualdade de Género», Relatora: D. ŠTECHOVÁ (JO C 24, de 31.1.2006).

Parecer do CESE de 2.6.2004 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões que estabelece as directrizes para a segunda fase da iniciativa comunitária EQUAL relativa à cooperação transnacional para a promoção de novas práticas de luta contra todas as formas de discriminação e desigualdade no mercado do trabalho Livre circulação de boas ideias», Relator: S. SHARMA (JO C 241, de 28.9.2004).

Parecer do CESE de 15.12.2004 sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e igualdade de tratamento entre homens e mulheres em domínios ligados ao emprego e à actividade profissional», Relatora: M. SHARMA (JO C 157, de 28.6.2005).

Parecer do CESE de 10.12.2003 sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um programa de acção comunitária para a promoção das organizações de mulheres que operam ao nível europeu no domínio da igualdade entre homens e mulheres», Relatora: WAHROLIN (JO C 80, de 30.3.2004).

Parecer do CESE de 14.2.2006 sobre a «Representação das mulheres em órgãos de decisão dos meios económicos e sociais da União Europeia», Relator: Relatora: T. ETTY (JO C 88, de 11.4.2006).

Parecer do CESE de 3.6.2004 sobre a «Proposta de directiva do Conselho que aplica o princípio de igualdade de tratamento entre homens e mulheres no acesso a bens e serviços e seu fornecimento», Relatora: CARROLL (JO C 241, de 28.9.2004).

(2)  Ver as conclusões do Conselho Europeu de 22 e 23 de Março de 2005 e os trabalhos realizados, em particular a declaração dos presidentes e secretários-gerais dos CES da UE e do CESE, feita em Paris em 25 de Novembro de 2005.

http://eesc.europa.eu/lisbon_strategy/eesc_documents/index_fr.asp.

(3)  Trabalhando juntos para o crescimento e o emprego — Um novo começo para a Estratégia de Lisboa — COM(2005) 24 final.

(4)  Orientações integradas para o crescimento e o emprego (2005-2008) — COM(2005) 141 final.

(5)  Parecer do CESE de 31.5.2005 sobre a «Proposta de Decisão do Conselho relativa às orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros (em conformidade no artigo 128.o do Tratado CE)», Relator: H. MALOSSE (JO C 286, de 17.11.2005).

(6)  COM(2006) 30 final.

(7)  Relatório Conjunto sobre o Emprego 2006-2007, adoptado pelo Conselho (EPSCO) em 22 de Fevereiro de 2007, para transmissão ao Conselho Europeu de 8 e 9 de Março de 2007.

(8)  Conclusões da Presidência, 7775/1/06/REV 1.

(9)  COM(2006) 92 final.

(10)  Parecer do CESE de 13.9.2006 sobre a «Comunicação Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões — Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010», Relatora: G. ATTARD (JO C 318, de 23.12.2006).

(11)  Parecer do CESE, de 28.9.2005, sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria um Instituto Europeu da Igualdade de Género», Relatora: D. ŠTECHOVÁ (JO C 24, de 31.1.2006).

(12)  Resolução do Parlamento Europeu de 13 de Março de 2007 sobre o Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010 (2006/2132(INI)).

http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+TA+P6-TA-2007-0063+0+DOC+XML+V0//ES.

(13)  Ver o ponto 2.3.3.1.3 do parecer do CESE de 13.9.2006 sobre a «Comunicação Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010». Relatora: G. ATTARD (JO C 318, de 23.12.2006).

(14)  COM(2007) 49 final.

(15)  Parecer do CESE de 11.7.2007 sobre o tema «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada». Relator: CLEVER.

(16)  Relatório conjunto sobre o emprego 2006/2007

http://register.consilium.europa.eu/pdf/pt/07/st06/st06706.pt07.pdf.

(17)  http://ec.europa.eu/employment_social/news/2005/mar/gender_equality_en.pdf.

(18)  http://ec.europa.eu/employment_social/emplweb/news/news_en.cfm?id=226.

(19)  COM(2007) 49 final.

(20)  Ver o ponto 1.2 do parecer do CESE de 13.9.2006 sobre a «Comunicação Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões — Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010». Relatora: G. ATTARD (JO C 318, de 23.12.2006).

(21)  Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010. COM(2006) 92 final de 1.3.2006.

http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/es/com/2006/com2006_0092es01.pdf.

(22)  Plano de acção: Programa europeu em favor do espírito empresarial.

http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/es/com/2004/com2004_0070es01.pdf.

(23)  http://ec.europa.eu/enterprise/enterprise_policy/charter/index_en.htm.

(24)  O CESE está a elaborar um parecer sobre «O Empreendedorismo e a Estratégia de Lisboa».

(25)  Parecer do CESE de 16.7.2006 sobre a «Comunicação Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões “Aplicar o programa comunitário de Lisboa: Promover o espírito empreendedor através do ensino e da aprendizagem”». Relatora: Ingrid JERNECK (JO C 309, de 16.12.2006).

(26)  Ver http://www.eurochambres.eu/women_onboard/index.htm.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/123


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Saúde e Migrações»

(2007/C 256/22)

A futura Presidência portuguesa enviou ao Comité Económico e Social Europeu uma carta, datada de 14 de Fevereiro de 2007, solicitando a elaboração de parecer sobre: Saúde e Migrações.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, que emitiu parecer em 18 de Junho de 2007, sendo relator S. SHARMA e co-relatora Cser.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu aprovou, por 109 votos a favor, 3 votos contra e 0 abstenções, o presente parecer.

1.   Conclusões

O presente parecer versa sobre a relação entre saúde e migração e, como tal, não é um debate sobre migração per se. A migração é importante para a economia da UE e é um processo contínuo que envolve uma parte significativa e cada vez maior da UE e da população mundial.

Importa que as políticas da UE e os Estados-Membros proporcionem aos migrantes e às suas famílias um nível elevado de protecção da saúde. Isto significa agir num vasto número de políticas, incluindo emprego e saúde e segurança no trabalho, educação, protecção social, promoção da saúde e cuidados de saúde.

O presente parecer identificou várias questões no domínio da saúde que afectam os migrantes, assim como implicações para a saúde pública que requerem a intervenção dos Estados-Membros e da União Europeia.

1.1   Recomendações

Uma globalização humanista (1) e equitativa (2) deve basear se em valores universais e no respeito dos direitos humanos, de um nível elevado de saúde e de segurança alimentar para todas as camadas da população (sobretudo as mais vulneráveis), da diversidade cultural e linguística e do acesso de todos ao conhecimento.

No que respeita aos direitos humanos universais, o CESE faz as seguintes recomendações:

1.1.1

Há que criar pontos de encontro e centros de informação, que facilitem o acesso dos imigrantes a informação sobre cuidados de saúde e prestações sociais, a qual deve ser prestada por indivíduos provenientes das mesmas minorias migrantes que trabalhem nesses centros, bem como proporcionar um ponto de contacto de cooperação entre as autoridades e as ONG dos países de origem e as das comunidades de acolhimento dos migrantes.

1.1.2

Os Estados-Membros e a União Europeia no seu conjunto devem reforçar a cooperação com as organizações internacionais em matéria de saúde dos migrantes e monitorizar e avaliar os problemas e vantagens aos níveis local, regional, nacional e europeu.

1.1.3

Os programas nacionais de saúde pública devem ser incluídos nos programas pedagógicos tendo em conta a especificidade das culturas minoritárias.

1.1.4

Há que criar um fundo de compensação específico e programas para a formação, a reinstalação e a cooperação entre os países de acolhimento e os países de origem.

1.1.5

O acesso a tratamento médico e cuidados preventivos deveria ser permitido como um direito humano a todas as pessoas na UE, independentemente do seu estatuto, em consonância com a Carta dos Direitos Fundamentais, que garante o acesso a cuidados preventivos e médicos.

1.1.6

Devem ser criadas cláusulas de confidencialidade entre pacientes e instituições médicas (quando estas não existem) para garantir que a informação sobre o estatuto de imigração do paciente não é divulgada a terceiros e, por conseguinte, para não dissuadir os migrantes de procurarem ajuda e tratamento médico, sobretudo no caso de migrantes em situação irregular.

1.1.7

Os Estados-Membros e a UE deveriam colaborar na melhoria da recolha de dados e na investigação no domínio da migração e da saúde na UE.

1.1.8

A saúde deveria ser incluída enquanto dimensão essencial da migração.

1.1.9

As avaliações de impacto da saúde deveriam assinalar o potencial impacto das políticas de saúde e outras na saúde dos migrantes.

1.1.10

Os Estados-Membros que têm uma tradição de serviços de saúde especializados em medicina tropical devem alargar as suas competências a todos os residentes da UE e prosseguir uma investigação de qualidade nas terapias das doenças tropicais, em particular o paludismo.

1.1.11

São necessários mecanismos melhorados para avaliar e responder às necessidades de saúde de todas as categorias de migrantes assim que possível após a sua chegada. É necessária uma cooperação reforçada entre a UE e os Estados-Membros para responder às necessidades imediatas dos migrantes que chegam com necessidades médicas urgentes, garantindo em particular um serviço de interpretação.

1.1.12

Deve ser dada prioridade à saúde dos migrantes no trabalho. Para tal, os parceiros sociais e as autoridades competentes deveriam colaborar na manutenção de elevados níveis de saúde e segurança no trabalho nos sectores que empregam mais migrantes. Programas de promoção da saúde a partir do local de trabalho deveriam ainda ser desenvolvidos em cooperação com serviços da comunidade, com vista a responder às necessidades dos trabalhadores migrantes e das suas famílias.

1.1.13

Programas de promoção da saúde deveriam igualmente ser considerados uma forma de responder às necessidades das crianças migrantes no domínio da saúde. A saúde das crianças migrantes, em particular, é uma prioridade. Os serviços de saúde escolar e pré-escolar devem prestar atenção às necessidades de todas as crianças, na globalidade, inclusive os filhos dos migrantes, com uma especial atenção aos que chegaram recentemente.

1.1.14

Os cuidados de saúde e os serviços preventivos a desenvolver deveriam ser adequados e sensíveis do ponto de vista cultural, sem derrogações à proibição da excisão.

1.1.15

Os profissionais de saúde deveriam receber formação contínua e desenvolvimento profissional para prestarem assistência às comunidades migrantes, cujas necessidades a nível de saúde estão em mutação.

1.1.16

Prever o recrutamento de pessoal de saúde formado em países em desenvolvimento, numa perspectiva de co-desenvolvimento, que facilita o seu regresso após uma estadia temporária ou que oferece um reembolso ao país de origem que garantiu a formação. A Comissão tem de observar domínios de boas práticas de recrutamento de pessoal médico de países terceiros com vista a propor um Código de Boas Práticas da UE.

1.1.17

O papel das autoridades que controlam a saúde pública deveria ser reforçado e a partilha de boas práticas deveria ser incentivada, devendo o papel de coordenador caber às autoridades da UE.

1.1.18

Reforçar o diálogo intercultural — centrar as atenções no estado da saúde e dos cuidados de saúde (3).

1.1.19

O CESE sublinhou novamente as suas recomendações anteriores, referindo que os Estados-Membros deveriam executar as convenções da OIT sobre migrantes (4).

2.   Contexto

2.1

O Comité Económico e Social Europeu congratula-se com o interesse continuado da Presidência portuguesa em investigar a questão da saúde pública e da migração. As Presidências alemã, portuguesa e eslovena, concordaram que «a política de saúde desempenha um papel crucial, uma vez que uma prevenção melhor e os cuidados de saúde transfronteiras beneficiam directamente os cidadãos europeus» (5).

As três presidências comprometeram-se a trabalhar activamente no sentido de combater as desigualdades que afectam os migrantes em termos de acesso a serviços de saúde. Acordou-se igualmente apoiar um grande número de actividades comunitárias com vista a contribuir para um nível de saúde elevado para todos os cidadãos, centrando-se na promoção da saúde, prevenção de doenças, inovação e acesso a cuidados de saúde.

2.2

O Comité adoptou um vasto número de pareceres sobre a questão das migrações regulares e irregulares (6), razão pela qual o presente parecer se centrará em questões de saúde. Instamos a Presidência portuguesa e outras partes interessadas envolvidas a consultarem o nosso trabalho anterior no domínio da migração.

3.   Introdução

3.1

Muito tem sido escrito sobre saúde e migração e este relatório é elaborado com base no recente documento preparado para o Programa de Investigação e Análise Política da Comissão Mundial para a Migração Internacional (Carballo & Mboup, Setembro de 2005). Ao longo do parecer serão feitas outras referências.

3.2

A Organização Mundial de Saúde define a saúde como «um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a inexistência de doenças ou enfermidades». O presente parecer defende que a «saúde», tal como definida, é um direito humano.

3.3

A saúde dos migrantes e refugiados é importante por inúmeras razões, nomeadamente:

Os direitos humanos e o respeito pela dignidade humana;

a dimensão da perda da vida, doença e risco para a saúde vivida por algumas pessoas, sobretudo emigrantes ilegais;

os riscos de saúde vividos por um grande número de emigrantes que se deslocam para outro país;

acesso variável a cuidados sociais e de saúde;

riscos para a população em geral; e

riscos para o país de origem com a perda de profissionais de saúde.

4.   Dimensão e âmbito da questão

4.1

A nível internacional, estima-se que mais de 200 milhões de pessoas se deslocam todos os anos para procurar trabalho e uma vida melhor. Pelo menos 30-40 (7) milhões não são oficiais. Reunidos, os migrantes de todo o mundo formariam o quinto país mais populoso do planeta (8). As mulheres representaram 49,6 % dos migrantes globais em 2005. Há entre 7 e 8 milhões de migrantes não registados na Europa (9).

4.2

Para o presente parecer exploratório, o CESE considerou as questões da migração e da saúde sobretudo em relação a nacionais de países terceiros emigrantes na UE. Actualmente, cerca de 18 milhões de cidadãos de países terceiros vivem na UE. Há ainda um número significativo de cidadãos nascidos no estrangeiro e de migrantes irregulares ou ilegais. A grande maioria dos migrantes que entram na UE, fazem-no de forma legal.

4.3

Os requerentes de asilo representam uma percentagem relativamente pequena do total da população migrante e o número de pedidos de asilo diminui nos últimos anos devido à política da UE e não à diminuição do número de requerentes de protecção.

 

2006

2005

2004

2003

2002

Pedidos de asilo na UE

266 270

350 103

421 236

532 300

640 347

Número de pedidos aceites

38 857

46 742

35 872

41 823

59 705

% pedidos aceites

22,71

20,55

13,36

12,4

14,73

Nos últimos anos, a migração legal e ilegal aumentou numa série de países do sul da Europa, nomeadamente, Portugal, Espanha e Itália. Muitos destes migrantes são oriundos da África do Norte ou Subsaariana, da América Latina e Ásia e dos países da CEI.

4.4

Apesar de os migrantes serem geralmente mais saudáveis do que as pessoas no seu país de origem, podem sofrer de mais problemas de saúde do que a média na sua comunidade de acolhimento. Tal deve-se a uma série de factores, designadamente:

stress psicológico e social (resultante de uma cultura desconhecida, da ilegalidade, das alterações de ambiente, desconhecimento de línguas estrangeiras, desconfiança e falta de informação, saúde mental);

riscos corridos no país de origem;

pobreza e trabalho em condições de risco;

difícil acesso a cuidados de saúde e informação sobre serviços de saúde, promoção da saúde e serviços preventivos;

riscos adicionais do país de acolhimento;

condições de alojamento.

4.5

Nos migrantes de algumas zonas, há maior incidência de doenças transmissíveis e prolongadas tais como problemas de saúde mental, doenças coronárias, doenças respiratórias e diabetes são muitas vezes mais comuns.

4.6

Os migrantes em situação irregular, incluindo as suas famílias e as crianças em particular, têm mais problemas de saúde do que os migrantes legais, o que pode estar relacionado com os riscos de saúde que correm ao tentar entrar no país, com condições económicas e sociais mais desfavoráveis e acesso inadequado a serviços.

5.   Diferentes tipos de migração

5.1   Migração voluntária

5.1.1

A principal motivação para a migração para a UE prende-se com factores económicos. A fuga a conflitos ou perseguições constitui outra motivação importante. As pessoas migram e continuam a migrar por várias razões. Há quem migre com intenção de se instalar e começar uma vida nova, outros pretendem ganhar o suficiente para poderem regressar a casa.

5.1.2

Alguns migram legalmente com o estatuto de trabalhador, outros fazem-no de forma ilegal mas encontram trabalho e permanecem por um período indeterminado. Ambos podem apresentar desafios a nível de saúde, muitas vezes relacionados com políticas nacionais e atitudes sociais para com os migrantes e as grandes determinantes da saúde tais como educação, emprego e habitação.

5.1.3

A migração circular é cada vez mais reconhecida como um tipo de migração-chave (10) que, se for bem gerida, pode ajudar a satisfazer a oferta a nível internacional e a procura de emprego, contribuindo assim para o crescimento económico e para uma atribuição dos recursos disponíveis mais eficaz. Pode ser uma resposta à necessidade da UE de oferecer uma alternativa credível à imigração ilegal.

5.2   Migração forçada

5.2.1

As implicações dos cuidados de saúde da migração forçada são graves e de longo alcance. Todos os anos, pessoas são forçadas a deixar os seus países de origem e a tornarem-se refugiadas sob a protecção das Nações Unidas. Milhões de pessoas são forçadas a deixar as suas casas e a permanecerem dentro das suas fronteiras.

5.2.2

Muitas vezes têm de pagar montantes elevados para receberem ajuda para atravessarem as fronteiras, o que representa uma grande carga financeira. Os migrantes vivem no medo e são facilmente explorados pelos empregadores. No caso das mulheres, a violação e a exploração são comuns.

5.2.3

O tráfico de seres humanos é um crime que viola os direitos humanos fundamentais e destrói vidas. É reconhecido como uma forma moderna de escravatura e estima-se que, todos os anos, o número de pessoas em todo o mundo que vive sob algum tipo de escravatura (de acordo com a OIT) é de 12 milhões, sendo 1 milhão vendido como mercadoria com vista à prostituição ou trabalhos forçados. Dados do Departamento de Estado dos Estados Unidos da América sugere que 80 % são mulheres e meninas e 50 % são menores. Os dados sugerem igualmente que a maioria é vítima de tráfico para exploração sexual.

5.2.4

O tráfico gera lucros avultados para os traficantes: algumas estimativas referem cerca de 10 mil milhões de dólares (11) por ano. (iii: UNICEF).

5.3   Viagens Internacionais

5.3.1

Segundo a Organização Internacional de Turismo, na última década do século XX, o turismo internacional representava 30 % das indústrias de serviços globais. Estima ainda que as «chegadas» internacionais serão superiores a 1,55 mil milhões em 2020, dos quais 0,4 mil milhões implicarão viagens de longo curso através de zonas ecológicas.

5.3.2

Calcula-se que, anualmente, 14 milhões de pessoas viagem de países industrializados para os trópicos em África, Ásia, América Latina e Ilhas do Pacífico. Uma percentagem considerável regressa com uma doença que necessita de tratamento. A diarreia é a mais comum, mas a malária tornou-se um problema comum em termos de diagnóstico, tratamento e custos para os países para os quais os turistas regressam.

5.3.3

Desprotegidos, os turistas correm o risco de infecção com hepatite A, bem como de doenças sexualmente transmissíveis, como o VIH.

6.   O impacto da Migração na Saúde e na Saúde Pública

6.1   Política

6.1.1

Muitos países na UE têm políticas referentes ao direito de entrada, duração da estadia e data de saída. Em geral, estas políticas são mais restritivas do que permissivas e complicam a migração. Isto pode criar um ambiente económico e social prejudicial para a saúde dos migrantes.

6.1.2

A abordagem à saúde pública e à despistagem de doenças varia de país para país, assim como a abordagem ao acesso à saúde e à assistência social. Contudo, parece haver falta de informação geral sobre a comparação de práticas nacionais.

6.2   Dados

6.2.1

Poucos países da UE possuem dados sobre a saúde dos migrantes, o que dificulta o facultar de informação fiável sobre a experiência da saúde e as necessidades dos migrantes no domínio da saúde. Em muitos países, os sistemas de registos de saúde não identificam as pessoas pelo seu estatuto de migrantes.

6.2.2

Alguns países fazem a recolha destes dados, outros centram as suas atenções na região de origem ou grupo étnico. Pode não ser claro quem é migrante e quem é descendente de migrante. Em alguns casos as pessoas são referidas apenas com base na sua origem étnica e não é feita distinção, por exemplo, entre crianças migrantes e crianças filhas de migrantes.

6.2.3

Há também um número desconhecido de migrantes em situação irregular e, por conseguinte, não registado, que pode mostrar-se relutante a procurar cuidados de saúde quando necessário.

6.2.4

Os migrantes podem ainda ser relutantes em facultar informação sobre o seu estatuto de migração às autoridades dos serviços de saúde, no caso destas poderem ser utilizadas para seu prejuízo. Isto prova a falta de informação de qualidade disponível.

6.2.5

Esta relutância pode ter origem em motivos culturais e religiosos. Acresce que as autoridades e os prestadores de serviços de saúde não dispõem do conhecimento adequado e não estão preparados para responder às suas necessidades especiais. Por estes motivos, não há informação suficiente sobre migrantes e o seu estado de saúde.

6.3   Migração e bem-estar psico-social

6.3.1

Tanto para os migrantes legais como irregulares, desafios como a língua, a cultura e políticas são exacerbados pelo medo do desconhecido (v: Tizon 1983). Outras questões, tais como:

separação das famílias, dos cônjuges e dos filhos,

exploração pelos empregadores,

exploração sexual,

ansiedade e saudades,

não integração nas comunidades locais,

deficiência física ou mental,

afectam a saúde dos indivíduos e das comunidades.

6.4   Migração e Saúde Mental

6.4.1

Investigações (12) revelaram que alguns grupos de migrantes na Europa apresentam as mais elevadas taxas de esquizofrenia e suicídio, elevada incidência de abuso de drogas e álcool e elevado risco de depressão e ansiedade. A investigação sugere ainda que o acesso ao apoio à saúde e o apoio social a estes grupos não são adequados.

6.4.2

Alguns dos factores identificados como contributo para os problemas de saúde mental dos migrantes são: alterações na alimentação, família e apoio social; cultura, língua e clima; hostilidade, racismo e xenofobia das populações de acolhimento; refugiados de guerra com os horrores da tortura, da perda da família e do abuso sexual latentes.

6.4.3

A investigação sugere que dois terços dos refugiados são vítimas de ansiedade ou depressão e apresentam sintomas de stress pós-traumático, tais como pesadelos e ataques de pânico.

6.4.4

O acesso a tratamento e apoio a estas doenças é particularmente difícil para os requerentes de asilo e migrantes sem documentação, que são quem mais necessita destes serviços.

6.5   Migração e saúde física

6.5.1

Todas têm um «passado» de saúde, marcado pela sua origem e ambiente social em que vivem. Em geral, os migrantes económicos tendem a deslocar-se de países mais pobres para países mais ricos, razão pela qual parte destes migrantes terá um perfil de saúde relacionado com a pobreza.

6.6   Doenças transmissíveis

6.6.1

O apoio aos migrantes infectados com VIH ou tuberculose é variável e implica desafios em relação à cultura, a linguagem e a religião, assim como o estatuto legal e económico dos migrantes. Para as gerações mais jovens, mulheres e raparigas, o risco de contacto com o VIH/SIDA é superior.

6.6.2

Não há políticas consistentes de controlo médico e a forma como o controlo médico que precede a entrada no território é feito varia até a nível local. Inacreditavelmente, as respostas a nível de controlo médico local diferem consideravelmente. Em alguns serviços, a taxa de absentismo nas consultas de acompanhamento é superior a 50 % e os prestadores dos serviços justificam este facto com dificuldades de comunicação, medo da autoridade e falta de compreensão sobre os serviços disponíveis. O CESE tem conhecimento de que o Comissário Kyprianou solicitou ao Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças um plano de acção para a tuberculose. O Plano deverá ser publicado no Outono de 2007 e considerará a situação em vários Estados-Membros.

6.6.3

Entre 1995 e 2005, o número de casos de tuberculose aumentou consideravelmente na UE. O último relatório epidemiológico ECDC refere que «os casos de origem estrangeira» representavam 30 % do total dos casos registados nos 25 países (vi: The First European Communicable Disease Epidemological Report, European Centre for Disease Prevention and Control, 2007 (Primeiro Relatório Epidemiológico Europeu sobre Doenças Transmissíveis, Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças, 2007)). Há que reconhecer também que os migrantes estão muitas vezes em zonas com poucas condições de habitação, com lares e locais de trabalho sobrelotados com o risco latente de disseminação de infecções respiratórias. É igualmente provável que os migrantes estejam sobre representados entre os sem abrigo.

6.6.4

No que toca ao VIH, o Relatório da UE «SIDA e Mobilidade — Cuidados de Saúde e Apoios no âmbito do VIH/SIDA nos Migrantes e Comunidades de Minorias Étnicas na Europa» (vii: UE — Edição de Clark K & Broring G) apresenta relatórios dos países sobre:

políticas nacionais;

acesso a apoio médico e social;

serviços de cuidados e apoio.

6.6.5

O relatório sublinha o facto de a situação dos migrantes (número de pessoas, contexto étnico e epidemiologia) e as respostas da sociedade variarem muito em toda a Europa.

6.6.6

É possível que as pessoas oriundas de países com elevadas taxas de VIH tragam com elas a doença. De facto, entre 1997 e 2005, 47 % das infecções com VIH transmitidas entre heterossexuais na UE foram diagnosticadas em pessoas provenientes de países com uma elevada incidência de VIH.

6.6.7

Em contrapartida, os migrantes de países com baixa prevalência de VIH não parecem estar em grande risco (e podem estar em menor risco) do que os nacionais no país de origem.

6.7   Doenças não transmissíveis

6.7.1

Doenças prolongadas como a Doença das Artérias Coronárias (DAC), a Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC), o enfarte e a diabetes representam um grande desafio para os serviços de saúde em grande parte do mundo e é a elas que se deve cerca de metade do número anual de mortes.

6.7.2

A DAC é a principal causa de morte e tem um grande impacto em termos de tratamento, custos e impacto nos indivíduos, prestadores de cuidados e comunidades. Nas comunidades migrantes, a DAC pode estar relacionada com uma predisposição étnica, alimentação e stress. No Reino Unido, os homens asiáticos parecem ser mais propensos à DAC (viii: Baljaran & Raleigh, 1992; McKeigue & Sevak, 1994, BMJ 2003).

Tanto os homens como as mulheres de origem sul asiática têm taxas de DAC 30-40 % superiores (ex.: Balajaran, 1991).

6.7.3

Dados do Reino Unido sugerem que a incidência de enfarte nos migrantes das Caraíbas é duas vezes superior à da população «branca» (x: Stewart 1999). Na Suécia verificaram-se elevadas taxas de obesidade e DAC entre migrantes finlandeses, relacionadas com dieta e consumo de álcool (xi: Jarhult et.al 1992).

6.8   Doenças hereditárias

6.8.1

A migração de pessoas de várias partes do mundo pode significar igualmente movimento de doenças genéticas. A anemia falciforme e a talassemia tornaram-se mais evidentes na sequência da migração de África, das Caraíbas e do Mediterrâneo. A anemia falciforme é relativamente comum na UE e calcula-se que afecte todos anos 6 000 adultos e entre 75 a 300 bebés no Reino Unido. (xii: Karmi 1995). Também se verificou uma elevada incidência de anemia falciforme em migrantes em Portugal (xiii: Carrerio et al, 1996).

6.8.2

A talassemia é uma doença do sangue hereditária de origem mediterrânea detectada no reino Unido em minorias étnicas do Médio Oriente e de origem cipriota. Há provas de que poderá ser comum em pessoas do Paquistão, China e Bangladesh.

6.8.3

Estas doenças requerem o diagnóstico de um especialista e serviços de aconselhamento que nem sempre existem.

6.9   Doenças de trabalho

6.9.1

Os migrantes tendem a aceitar empregos pouco qualificados que se tornaram pouco atractivos para a população local. Alguns destes empregos, tais como nas minas, o trabalho com amianto, a indústria química ou a indústria transformadora pesada implicam riscos de saúde. No sector agrícola a exposição a pesticidas e outros químicos tem sido associada a uma elevada incidência de depressões, dores de cabeça e abortos espontâneos.

6.9.2

No caso dos migrantes altamente instruídos, qualificados ou incluídos na «fuga de cérebros», assim como dos migrantes circulares, o stress relacionado com o trabalho é frequente, uma vez que as suas condições de trabalho são piores do que as dos trabalhadores do país de acolhimento (direitos diferentes, etc.). Contudo, o seu estatuto de dependência económica não lhes permite escolher (13).

6.10   Acidentes

6.10.1

O número de acidentes de trabalho é aproximadamente duas vezes superior entre os trabalhadores migrantes na Europa. (xiv: Bollini & Siem, 1995). Na Alemanha, o número de acidentes tende a ser elevado entre os migrantes, em particular entre os que trabalham em indústrias com fracas medidas de saúde e segurança (xv: Huismann et al, 1997). Dados referentes a viagens sugerem que as crianças da faixa etária entre os 5 e 9 anos são mais vulneráveis a acidentes rodoviários e outras lesões(xvi: Korporal & Geiger, 1990). Nos Países Baixos, as crianças de origem turca e marroquina parecem correr um risco superior de acidentes domésticos, incluindo envenenamento e queimaduras, bem como acidentes rodoviários (xvii: de Jong & Wesenbeek, 1997).

6.11   Saúde reprodutiva

6.11.1

Em alguns grupos de migrantes, tais como homens separados das suas esposas, a incidência de doenças sexualmente transmissíveis é superior. Em muitos países da UE, a mortalidade relacionada com gravidezes é superior nas mulheres migrantes do que nas mulheres locais. As taxas de aborto tendem a ser superiores entre as mulheres migrantes. Em Barcelona, o número de pedidos de aborto voluntário é duas vezes superior entre as mulheres migrantes do que entre as mulheres espanholas. Um estudo do ICMH em Genebra revela que a taxa de aborto entre mulheres migrantes ilegais é três vezes superior à verificada entre mulheres nacionais da mesma idade. (xviii: Carballo et al, 2004).

6.11.2

No Reino Unido, os bebés de mães asiáticas tendem a ter menos peso à nascença do que outros grupos étnicos e o risco de mortalidade perinatal e pós-natal tende a ser superior. Entre os bebés de mulheres oriundas das Caraíbas, a taxa média de mortalidade pós-neonatal é igualmente superior. Na Bélgica e na Alemanha, verificaram-se elevadas taxas de mortalidade perinatal e infantil nas mulheres migrantes de Marrocos e da Turquia. As mulheres da África subsaariana e da América Central e do Sul sofrem de complicações durante o parto e têm filhos com baixo peso à nascença.

6.11.3

Os filhos de migrantes podem ter taxas inferiores de recurso a serviços preventivos, tais como a imunização.

6.12   Obstáculos ao acesso e utilização efectiva dos sistemas de saúde por parte dos migrantes

6.12.1

Os migrantes têm dificuldades legais, psicossociais e económicas no acesso aos cuidados de saúde. O obstáculo da linguagem é um problema óbvio, assim como os custos dos cuidados de saúde quando, para um migrante, até uma despesa muito reduzida constitui uma barreira significativa perante um salário baixo. Os migrantes irregulares e os requerentes de asilo que aguardam o processamento dos seus pedidos deparam-se com obstáculos legais aos cuidados de saúde em muitos países.

6.12.2

Acresce que os serviços de saúde pública muitas vezes não têm condições para enfrentar os problemas de saúde específicos dos migrantes e não têm a sensibilidade e as qualificações necessárias para prestar cuidados de saúde a pessoas que podem ter diferentes concepções de saúde e diferentes atitudes em relação à doença, à dor e à morte, bem como outras formas de manifestar os sintomas, lidar com a doença e exprimir as suas expectativas ao médico.

6.12.3

A complexidade do sector da saúde dos Estados-Membros, altamente desenvolvido e diferenciado, poderá complicar ainda mais esta situação.

6.12.4

A organização da prevenção de doenças e a promoção da saúde nas populações migrantes é muitas vezes desadequada. Isto verifica-se não apenas nos exames pré-natais mas também nos programas de vacinação e outros tipos de prevenção e diagnóstico precoce, incluindo o rastreio. Até à data, os programas de prevenção raramente recorriam a uma abordagem sensível à cultura para chegar aos vários grupos de migrantes.

6.12.5

Os preços elevados de alguns serviços de saúde e o custo dos medicamentos são um fardo pesado para a maioria dos migrantes. Estes elementos podem fazer com que o tratamento não seja procurado com a antecedência necessária, ou que o tratamento prescrito não seja seguido ou os medicamentos não sejam tomados. O resultado é o aumento incalculável do sofrimento humano de cada um, assim como dos custos a nível económico para a sociedade.

6.13   Profissionais de saúde

6.13.1

A tendência crescente de recrutamento activo de profissionais de saúde de países pobres por parte da UE e de outros países desenvolvidos representa um desafio cada vez maior. Se se mantiver, poderá tornar-se um obstáculo ao progresso no domínio da saúde nos países de origem (que são igualmente os países perdedores) e tornar a educação médica e de enfermagem menos sustentável nestes países. O êxodo de profissionais de saúde de países com poucos recursos representa uma perda significativa a nível de investimento na formação de profissionais de saúde (14). Há que encontrar novas soluções para responder a este problema, tais como o fundo de compensação especial para a formação e a reinstalação. O exemplo do Reino Unido, e da República da Irlanda, ao garantir que o Sistema nacional de Saúde respeita práticas de recrutamento ético, são amplamente reconhecidos como uma boa prática. Os Estados-Membros devem garantir que essas práticas são adoptadas e aplicadas às agências de recrutamento no domínio da saúde e aos serviços de saúde do sector privado, assim como a serviços públicos.

6.13.2

Os profissionais de saúde (sobretudo enfermeiros e médicos) desempenham um papel crucial na manutenção e melhoria dos cuidados de saúde dos migrantes. Os Estados-Membros devem garantir que os profissionais de saúde respondem às necessidades dos migrantes a nível de cuidados de saúde e que compreendem os factores culturais, religiosos e relacionados com o estilo de vida que influenciam os hábitos de saúde desses grupos específicos. Tal é necessário para garantir que os migrantes têm acesso a serviços de saúde adequados e sensíveis do ponto de vista cultural.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Ver parecer do CESE de 31 de Maio de 2007 sobre «Desafios e oportunidades da UE no contexto da globalização» (parecer exploratório), relator Staffan Nilsson, JO C 175, 27.7.2007.

(2)  OIT. A Fair Globalization, 2004.

(3)  Ver o parecer do CESE de 20.04.2006 sobre a «Proposta de Decisão do Parlamento Europeu e do Conselho sobre o “Ano Europeu do Diálogo Intercultural (2008)”» — COM(2005) 467 final — 2005/0203 (COD), relatora Cser (JO C 185, 8.8.2006).

(4)  A Convenção Internacional para a protecção dos direitos dos trabalhadores migrantes e das suas famílias, adoptada em 1990, entrou em vigor em Julho de 2003. Esta convenção complementa a Convenção n.o 97 da OIT sobre Trabalhadores Migrantes e a Convenção n.o 143 da OIT sobre Trabalhadores Migrantes (disposições suplementares), 1975. O conjunto das referidas três convenções constitui um quadro para a questão dos direitos dos trabalhadores migrantes e da migração irregular. Insere-se num contexto político mais vasto, incluindo tratados das NU recentemente adoptados sobre tráfico, a passagem ilícita e a exploração, tais como: a Convenção da NU contra o Crime Transnacional Organizado (2000); o Protocolo das NU para Prevenir, Suprimir e Punir o tráfico de pessoas, especialmente mulheres e crianças (2000) e o Protocolo contra o tráfico de migrantes por terra, ar e mar (2000); o Protocolo opcional à Convenção sobre os direitos das crianças, sobre a venda de crianças, prostituição infantil e pornografia infantil (2000), bem como a anterior convenção de 1951 e o Protocolo de 1967 sobre o estatuto dos refugiados. Apesar de relativamente poucos países e, nos casos relevantes, organizações económicas regionais, terem ratificado estas convenções até à data (com excepção dos tratados sobre refugiados), os instrumentos referidossão elementos importantes para uma agenda mais abrangente.

(5)  Conselho da União Europeia, programa de dezoito meses das Presidências alemã, portuguesa e eslovena, Bruxelas, 21 de Dezembro de 2006.

(6)  Ver os seguintes pareceres do CESE:

13.09.2006 sobre «A imigração na UE e as políticas de integração: Colaboração entre os governos regionais e locais e as organizações da sociedade civil», relator: Pariza Castaños (JO C 318 23.12.2006).

15.12.2005 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu Programa da Haia: dez prioridades para os próximos cinco anos — Parceria para a renovação europeia no domínio da liberdade, segurança e justiça» (COM(2005) 184 final — Relator: L. PARIZA CASTAÑOS) (JO C 65 17.3.2006).

20.04.2006 sobre a «Proposta de Decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às estatísticas comunitárias sobre migração e protecção internacional» — COM(2005) 375 final — 2005/0203 (COD), relatora Cser (JO C 185, 8.8.2006).

(7)  United Nations' Trends in Total Migrant Stock: The 2003 Revision.

(8)  US Census Bureau, IDB — Rank Countries by Population,

http://www.census.gov/ipc/www/idbrank.html.

(9)  Migration Information Source,

http://www.migrationinformation.org/Feature/display.cfm?id=336.

(10)  COM sobre migração circular, 16 de Maio de 2007.

(11)  The New Global Slave Trade, Ethan B. Kapstein, in Foreign Affairs, Novembro/Dezembro de 2006.

(12)  M.G. Carta, M Bernal, MC Harday and JM Abad: Migration and mental health in Europe 2005.

(13)  «Who Cares? Women Health Workers in the Global Labour Market», edited by Kim Van Eyck, PhD, 2005.

(14)  Kim Van Eyck ed., 2005. Who cares? UNISON UK: PSI.


ANEXO

ao parecer do Comité Económico e Social Europeu

As seguintes propostas de alteração obtiveram pelo menos um quarto dos votos expressos, mas foram rejeitadas durante o debate (nos termos do n.o 3 do artigo 54.o do Regimento):

Ponto 1.1.8

Elidir ponto:

«Os programas nacionais de saúde pública devem ser incluídos nos programas pedagógicos tendo em conta a especificidade das culturas minoritárias».

Votação

A favor: 44

Contra: 51

Abstenções: 11


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/131


Parecer Comité Económico e Social Europeu sobre «Euro-regiões»

(2007/C 256/23)

Em 17 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre: «Euro-regiões».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, que emitiu parecer em 21 de Junho de 2007 sendo relator J.M. ZUFIAUR.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 108 votos a favor e 1 abstenção o presente parecer:

1.   Estado actual da questão

1.1   Definição

1.1.1

As Euro-regiões são estruturas permanentes de cooperação transfronteiriça entre órgãos regionais e locais com relações de vizinhança directas situadas ao longo de fronteiras estatais partilhadas.

1.1.1.1

Entre as suas características (1) incluem-se:

As Euro-regiões e estruturas análogas, que não são uma nova forma de administração nem uma nova instância governativa mas sim uma plataforma de intercâmbio e de cooperação transfronteiriça horizontal entre órgãos governativos locais e regionais, promovem, mesmo assim, uma maior cooperação vertical entre os órgãos regionais ou locais, os órgãos governativos estaduais e as instituições europeias;

São associações de órgãos locais e regionais situadas nos dois lados de uma fronteira nacional, por vezes com assembleia parlamentar;

São associações transfronteiriças com secretariado permanente, equipa técnica e administrativa e recursos próprios;

Nuns casos são entidades de direito privado, constituídas com base em associações sem fins lucrativos ou em fundações, de um lado ou do outro de uma fronteira, segundo as competências nacionais respectivas. Noutros, são entidades de direito público, constituídas com base em acordos interestaduais, que se ocupam, entre outro, da participação e da cooperação das entidades territoriais;

Muitas vezes as Euro-regiões não são apenas definidas pelos seus limites geográficos ou politico-administrativos mas também partilham características económicas, sociais ou culturais comuns.

1.1.2

Utilizam-se vários termos para designar as diferentes «Euro-regiões»: Eurorregio, Eurorregión, Europarregión, Gran Región, Regio, etc.

1.2   Objectivos

1.2.1

As Euro-regiões e outras estruturas análogas (2) têm como objectivo principal a cooperação transfronteiriça, cujas prioridades são seleccionadas de forma diferente consoante as especificidades regionais e geográficas. Em fases iniciais ou na modalidade de grupos de trabalho com objectivos muito específicos situam-se, em primeiro plano, a promoção da compreensão mútua, a edificação de relações culturais e o reforço da cooperação económica. As Euro-regiões, dotadas de estruturas mais integradas e de meios financeiros próprios, estabelecem para elas próprias objectivos mais ambiciosos. Estas tratam de todo o tipo de questões relacionadas com a cooperação transfronteiriça, desde a promoção de interesses comuns a todos os níveis até à realização e administração de programas transfronteiriços e de projectos concretos.

1.2.2

As actividades transfronteiriças incluem não apenas o desenvolvimento socioeconómico e a cooperação cultural mas também outras questões que têm interesse geral para as populações limítrofes, em especial: questões sociais, de saúde, de educação e de formação, de investigação e de desenvolvimento, de gestão de resíduos, de protecção da natureza e de gestão paisagística, de turismo e de lazer, questões relativas a catástrofes naturais, transportes e vias de comunicação.

1.2.3

As Euro-regiões são consideradas um quadro idóneo para a execução das políticas europeias de mobilidade do trabalho e de coesão económica, social e territorial, através de procedimentos de cooperação nas zonas fronteiriças que evitem conflitos de competência.

1.2.4

As Euro-regiões contribuem para dar um impulso, de baixo para cima e a partir da vida quotidiana, à construção e integração da União Europeia.

1.2.5

A cooperação entre os dois lados de uma fronteira contribui, por sua vez, para o desenvolvimento de formas de organização e de actuação transfronteiriças perante problemas comuns, como os comités sindicais inter-regionais, a colaboração entre organizações empresariais e câmaras de comércio, a constituição de comités económicos e sociais euro-regionais, etc.

1.2.6

Neste sentido, o grupo de estudo encarregado da elaboração deste parecer teve a oportunidade de comprovar em directo esta afirmação, uma vez que foi convidado pelo Comité Económico e Social da Grande Região (3) para uma audição no Luxemburgo em 13 de Fevereiro de 2007.

1.3   Evolução histórica

1.3.1

O Conselho da Europa, com sede em Estrasburgo, é a organização europeia que trata, já há décadas, o tema das Euro-regiões e, em geral, o tema da cooperação transfronteiriça.

1.3.2

As primeiras experiências de cooperação transfronteiriça ocorreram em finais dos anos quarenta. O Acordo de Benelux, assinado em 1948, foi a primeira iniciativa para superar as linhas divisórias entre fronteiras estaduais. A Euregio foi criada em 1958 em redor do território holandês de Enschede e do alemão de Gronau. Só um pouco depois é que se efectuaram, então fora da Comunidade Europeia, várias experiências na Escandinávia, em que se incluem as de Oresund, Callote do Norte e Kvarken, através das fronteiras da Dinamarca, Finlândia, Noruega e Suécia.

1.3.3

Entre 1975 e 1985 criaram-se grupos de trabalho (GT) entre regiões de diferentes Estados (por exemplo, o GT do Jura e o GT dos Pirinéus), com uma capacidade de acção limitada.

1.3.4

A cooperação regional transfronteiriça e a criação de Euro-regiões expandiram-se a partir de 1990 (4). Entre os factores que contribuíram para essa expansão destacam-se:

Os avanços na integração europeia, especialmente a criação do Mercado Único, o Euro e o alargamento da União Europeia;

A descentralização e a regionalização crescentes dos Estados europeus;

O aumento do trabalho transfronteiriço;

O reconhecimento, embora limitado, do papel das regiões na governação das instituições europeias;

O desenvolvimento de iniciativas comunitárias de cooperação transfronteiriça como o INTERREG.

1.3.5

Os dois últimos alargamentos implicaram, com a passagem de 15 para 27 Estados-Membros, uma aumento importante do número e das características das regiões transfronteiriças. Em concreto, as regiões fronteiriças, a nível do NUTS II, aumentaram para mais 38 e passaram de 7 137 quilómetros para 14 300 quilómetros de fronteiras.

1.3.6

O Parlamento Europeu, na sua Resolução (5) de Dezembro de 2005, considera que a cooperação transfronteiriça tem uma importância fundamental para a integração e a coesão europeias e pede aos Estados-Membros e à Comissão que fomentem e apoiem a utilização das Euro-regiões. A cooperação transfronteiriça foi também incluída no projecto de Tratado Constitucional Europeu (artigo III-220).

1.4   Formas de cooperação

1.4.1

A Comissão, através da iniciativa comunitária Interreg III a favor da cooperação entre regiões, identificou três tipos de cooperação.

A — Cooperação transfronteiriça

O objectivo da cooperação transfronteiriça é a integração económica e social através da aplicação de estratégias comuns de desenvolvimento e de intercâmbios estruturados entre os dois lados de uma fronteira.

B — Cooperação transnacional

O objectivo da cooperação transnacional entre os órgãos nacionais, regionais e locais é fomentar uma melhor integração territorial através da formação de grandes grupos de regiões europeias ou macro-regiões.

C — Cooperação inter-regional

O objectivo da cooperação inter-regional é aumentar o intercâmbio de informações e de experiências sem que se trate necessariamente de regiões fronteiriças.

Às Euro-regiões aplica-se especialmente o ponto A e também, cada vez mais, o ponto B.

2.   Contexto comunitário

2.1

Recentemente, várias propostas comunitárias melhoraram o quadro geral em que actuam as Euro-regiões. No primeiro semestre de 2006 foram adoptadas pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho de Ministros várias decisões importantes com implicações na cooperação transfronteiriça.

2.2   Perspectivas financeiras

2.2.1

A Comissão apresentou em 2004 a sua proposta inicial sobre a revisão das Perspectivas Financeiras (2007-2013) (6). Na referida proposta, a Comissão calculava, para uma União de 27 Estados-Membros, o nível da despesa em 1,14 % do RNB para o período 2007-2013. No seu parecer (7), o CESE, tendo em conta os importantes desafios a que a União Europeia deve dar resposta, pronunciava-se a favor de um aumento dos recursos próprios até um limite máximo de 1,30 % do RNB (ultrapassando o limite anterior de 1,24 %). O Conselho Europeu de Dezembro de 2005 estabeleceu o total de despesas para o período 2007-2013 em 1,045 % do RNB. Finalmente, em Abril de 2006, após negociações entre o Conselho e o Parlamento Europeu, a proposta definitiva foi estabelecida em 864 316 milhões de EUR, ou seja, 1,048 % do RNB.

2.2.2

Este importante corte afectou o esforço consagrado à coesão económica e social, que passou de 0,41 % do RNB na UE-15 para 0,37 % na UE-27. Isto num momento em que a entrada dos novos Estados-Membros e outros reptos que a UE enfrenta, como a globalização, exigiam o aumento dos recursos e não a sua diminuição.

2.2.3

No que se refere à cooperação territorial europeia, o novo Objectivo 3 prevê 8 720 milhões de EUR (2,44 % de 0,37 % do RNB previsto para a coesão) em comparação com os 13 000 milhões de EUR pedidos pela Comissão na sua proposta inicial. Está claro que não se pode fazer mais com menos.

2.2.4

O estímulo financeiro à cooperação transfronteiriça da parte da UE aumentou relativamente ao período 2000-2006 anterior, mas a redução face às propostas iniciais da Comissão Europeia torna necessário uma maior cooperação por parte das entidades regionais e locais e o recurso, em maior medida, às parcerias público-privadas. Os meios previstos destinam-se agora a mais zonas fronteiriças, especialmente na Europa Central e Oriental, dada a entrada dos 12 novos Estados-Membros.

2.3   Novos regulamentos

2.3.1

As propostas da Comissão, apresentadas em Julho de 2004, sobre os Fundos Estruturais para o período 2007-2013, estabelecem um objectivo de «convergência», em vez do anterior Objectivo 1, um objectivo de «competitividade e emprego» em vez do anterior Objectivo 2 e criam um novo Objectivo 3, «cooperação territorial europeia», que dá maior relevância à actuação a nível regional transfronteiriço.

2.3.2

Em especial, este novo Objectivo 3 (8), baseado na experiência da iniciativa comunitária Interreg, está destinado a favorecer a integração equilibrada do território da União através da cooperação transfronteiriça, transnacional e inter-regional.

2.3.3

O Comité proferiu os seguintes pareceres sobre a reforma dos Fundos Estruturais e de Coesão em 2005 (9). O Conselho e o Parlamento Europeu aprovaram as novas propostas de regulamentos em 2006 (10).

2.4   Política de coesão: Orientações estratégicas

2.4.1

A Comunicação da Comissão (11) sobre orientações estratégicas em matéria de coesão, foi aprovada após a adopção dos diferentes regulamentos sobre fundos estruturais. A referida comunicação confirma a importância do novo Objectivo 3, «Cooperação territorial europeia», na sua tripla vertente: cooperação transfronteiriça, transnacional e inter-regional.

2.4.2

A finalidade do novo objectivo de cooperação é promover uma maior integração do território da União e reduzir o efeito barreira através da cooperação transfronteiriça e o intercâmbio de boas práticas.

2.4.3

As orientações estratégicas para a política europeia de coesão pretendem:

a)

melhorar a atractividade do território com vista ao aumento do investimento;

b)

fomentar a inovação e a iniciativa empresarial;

c)

a criação de emprego, e, de uma forma muito específica, ter em conta a dimensão territorial das políticas de coesão.

2.4.4

É sabido que as fronteiras nacionais são, com frequência, um obstáculo para o desenvolvimento do território europeu no seu todo e podem limitar o seu potencial competitivo. Um dos objectivos principais da cooperação transfronteiriça comunitária é, portanto, a eliminação do efeito barreira entre fronteiras nacionais e a criação de sinergias para enfrentar problemas partilhados através de soluções comuns.

2.4.5

As políticas de coesão devem centrar-se em acções que produzam valor acrescentado às actividades transfronteiriças, como por exemplo: aumentar a competitividade transfronteiriça através da inovação e da investigação e desenvolvimento; conectar redes intangíveis (serviços) ou físicas (transportes) para fortalecer a integração transfronteiriça enquanto expressão da cidadania europeia; promover a mobilidade e a transparência transfronteiriça do mercado de trabalho; gerir os recursos hídricos e controlar as inundações; desenvolver o turismo; favorecer a participação dos agentes económicos e sociais; a valorização do património cultural; melhorar o ordenamento do território, etc.

2.5   Nova base jurídica para a cooperação territorial

2.5.1

Historicamente, a ausência de uma base jurídica europeia homogénea para a cooperação transfronteiriça constituiu um obstáculo ao desenvolvimento de acções relevantes nesse domínio.

2.5.2

A Comissão propôs em 2004 a criação de um Agrupamento Europeu de Cooperação Transfronteiriça (AECT) denominação que, na última proposta da Comissão, se alterou substituindo-se o termo «transfronteiriça» pelo termo «territorial».

2.5.3

O Regulamento adoptado (12) em 31 de Julho de 2006 reconhece que:

Cumpre adoptar medidas para paliar as sérias dificuldades que os Estados-Membros e, em particular, as autoridades regionais e locais têm para executar e gerir acções de cooperação territorial no quadro de legislações e procedimentos nacionais diferentes.

A fim de eliminar os obstáculos à cooperação territorial, é necessário criar um instrumento de cooperação a nível comunitário destinado à criação no território da Comunidade de agrupamentos de cooperação dotados de personalidade jurídica, designados «agrupamentos europeus de cooperação territorial» (AECT).

As condições necessárias à cooperação territorial deverão ser criadas em conformidade com o princípio da subsidiariedade consagrado no artigo 5.o do Tratado. Em conformidade com o princípio da proporcionalidade consagrado no mesmo artigo, o presente regulamento não excede o necessário para atingir os seus objectivos, uma vez que o recurso ao AEGT é facultativo, sem prejuízo da ordem constitucional de cada Estado-Membro.

3.   Integração económica e coesão social e territorial

3.1   Integração e especialização

3.1.1

Nos grandes Estados tradicionais, uma grande parte da actividade económica concentrou-se na zona central do país e, em muitos casos, na sua capital e nas cidades mais importantes. Dentro de cada Estado produziu-se uma certa especialização económica regional.

3.1.2

A integração europeia favorece a criação de novos espaços de cooperação como as Euro-regiões. Com a integração europeia, a especialização regional já não se desenvolve dentro de cada Estado, mas sim, cada vez mais, à escala europeia. As fronteiras entre Estados deixaram de ser uma barreira intransponível para os intercâmbios. Isso favorece o estabelecimento de novas relações entre regiões, por vezes com níveis de desenvolvimento diferentes, de distintos Estados-Membros, mas com objectivos comuns no âmbito da crescente especialização a nível europeu.

3.1.3

Tal cooperação torna-se particularmente necessária em actividades de âmbito de actuação reduzido, mais afectadas pelo efeito fronteira, como pode ser o caso das PME.

3.1.4

O CESE é de opinião que as Euro-regiões deveriam contribuir de forma substancial para os objectivos da política de coesão económica, social e territorial da UE. Neste sentido, a nova proposta de política territorial da União Europeia tem como objectivos prioritários a convergência e o aumento da competitividade e do emprego, sobretudo em regiões menos prósperas e em regiões que enfrentam novos desafios de especialização.

3.2   Competitividade

3.2.1

As Euro-regiões favorecem as economias de escala. Basicamente, induzem um aumento da dimensão dos mercados (economias de aglomeração), a complementaridade de factores produtivos e maiores incentivos ao investimento. É possível prever que determinados investimentos em inovação e desenvolvimento podem ter impacto directo numa distância de 250-500 quilómetros. Embora algumas Euro-regiões superem esta distância, a média tem entre 50 e 100 quilómetros de distância máxima.

3.2.2

As Euro-regiões são fundamentais para alcançar uma massa crítica suficiente em determinadas matérias, tornando possível investimentos em serviços essenciais que, se não existisse cooperação transfronteiriça, não se poderiam realizar.

3.2.3

Para aumentar a competitividade, a cooperação transfronteiriça entre órgãos regionais e locais pode ser aplicada a diferentes bens públicos.

Redes de informação, comunicação, energia e transporte e outras infra-estruturas transfronteiriças;

Serviços conjuntos, como escolas, hospitais, serviços de emergência;

Instituições e serviços que favoreçam a actividade económica privada, incluindo o desenvolvimento do comércio, a iniciativa empresarial e a associação de empresas transfronteiriças, a criação de novas oportunidades de emprego e a mobilidade dos trabalhadores.

3.3   Coesão: dificuldades do trabalho transfronteiriço

3.3.1

A maior parte das Euro-regiões incluem regiões com um grau semelhante de desenvolvimento. No entanto, existem também Euro-regiões que incluem regiões com diferentes níveis de desenvolvimento. Um dos objectivos das Euro-regiões é promover as actividades económicas e de outro tipo que diminuam as disparidades inter-regionais. Para isso é fundamental um maior envolvimento dos Estados afectados e da UE.

3.3.2

Os investimentos sociais em matéria de serviços básicos nas zonas fronteiriças são, frequentemente, inferiores relativamente a áreas mais centrais em cada país. Em muitos casos com a consequência de uma menor influência daquelas nos centros decisórios. Esta falta de influência implica, muitas vezes, estarem insuficientemente dotadas de serviços de qualidade, diversificados e rentáveis, em especial para os sectores mais vulneráveis da população (crianças, imigrantes, famílias com menor poder de aquisição, pessoas com deficiências, doentes crónicos, etc.).

3.3.3

As Euro-regiões podem ser de grande valor para desenvolver este tipo de serviços e para que, em consequência, esses sectores sociais possam atingir um maior grau de protecção através de uma abordagem transfronteiriça. Além disso, as Euro-regiões podem contribuir para superar, numa grande parte, as barreiras e assimetrias jurídicas, administrativas e financeiras que limitam o progresso das suas populações. Também contribuem para a superação de preconceitos históricos, para a elaboração de análises conjuntas e para a melhor compreensão mútua das suas respectivas diferenças.

3.3.4

As lacunas jurídicas e a insuficiente harmonização referente à livre circulação de trabalhadores transfronteiriços apenas foram parcialmente supridas pelo acervo comunitário e pelo Tribunal de Justiça. Devido ao crescente número de trabalhadores transfronteiriços, esta realidade converteu-se num facto relevante a nível europeu, especialmente a nível da fiscalidade, segurança social e da assistência social, onde ainda subsistem definições e tratamentos diferentes de conceitos como o da residência, a definição de circunstâncias familiares, o reembolso das despesas de saúde, a dupla tributação e outro tipo de restrições administrativas (13).

4.   A cooperação transfronteiriça: um valor acrescentado para a integração europeia

4.1   A superação das fronteiras

4.1.1

A necessidade de superar os obstáculos para a integração é uma experiência quotidiana para os habitantes das fronteiras. Não se trata de alterar as fronteiras nem de violar a soberania dos Estados mas sim permitir uma cooperação efectiva em todos os aspectos da vida de ambos os lados das fronteiras, melhorando as condições de vida e fazendo com que a Europa dos cidadãos seja uma realidade.

4.1.2

As fronteiras da UE já superaram amplamente o seu antigo papel de barreira, mas ainda há diferenças económicas, socioculturais, administrativas e jurídicas, algo que é particularmente evidente nas fronteiras exteriores da UE. Portanto, o objectivo da cooperação nas zonas transfronteiriças é desenvolver estruturas, procedimentos e instrumentos cooperativos que permitam remover os obstáculos administrativos e jurídicos, conseguir a eliminação dos factores históricos de divisão e converter a vizinhança em factor de mobilidade, de desenvolvimento económico e de progresso social. Trata-se, em suma, de fazer das regiões transfronteiriças «zonas de prosperidade partilhada».

4.2   Valor acrescentado

4.2.1

A cooperação transfronteiriça e a sua realização estável através das Euro-regiões, não só permite prevenir conflitos, dar resposta a catástrofes, ou superar barreiras psicológicas, como também aumenta de forma evidente o desenvolvimento de ambos os lados das fronteiras. Este valor acrescentado pode materializar-se em termos políticos, institucionais, económicos, sociais, culturais e de integração europeia. A cooperação transfronteiriça implica uma valiosa contribuição para a promoção da convivência, segurança e integração europeias. É uma forma muito eficiente de executar os princípios comunitários da subsidiariedade, parceria, coesão económica, social e territorial e de apoiar a plena incorporação de novos Estados-Membros na UE.

4.2.2

Estas estruturas permanentes de cooperação transfronteiriça permitem um envolvimento activo e sustentado dos cidadãos e das administrações, bem como de grupos políticos e sociais de carácter transnacional, asseguram o conhecimento mútuo e permitem uma parceria vertical e horizontal, a partir de estruturas e competências nacionais diferentes. Permitem, mesmo assim, a gestão de programas e projectos transfronteiriços, ou a gestão conjunta de fundos de diferente procedência (comunitários, estatais, próprios ou de terceiros). Na opinião do CESE, o desenvolvimento comum deste tipo de iniciativas pode ser levado a cabo com mais êxito e de uma forma mais eficaz se a sociedade civil organizada desempenhar um papel principal.

4.2.3

De uma perspectiva socioeconómica, as estruturas de cooperação transfronteiriça permitem mobilizar o potencial endógeno de todos os intervenientes (câmaras de comércio, associações, empresas, sindicatos, instituições sociais e culturais, organizações ecologistas ou agências turística, entre muitos outros); abrir os mercados laborais e harmonizar as qualificações profissionais; aumentar o desenvolvimento económico e a criação de emprego através de actuações noutros sectores como o das infra-estruturas, o transporte, o turismo, o meio ambiente, a educação, a investigação e a cooperação entre PME.

4.2.4

A nível sociocultural, o valor acrescentado da cooperação transfronteiriça radica na difusão permanente de conhecimento geral, difusão considerada como um continuum transfronteiriço, que pode ser abordada em diferentes publicações e formatos. Da mesma forma, permite envolver uma rede de entidades que actuam como multiplicadores. Este é o caso dos centros educativos, das instituições para a protecção do meio ambiente, das associações culturais, das bibliotecas, dos museus, etc. Além disso, a cooperação transfronteiriça fomenta a igualdade de oportunidades e o conhecimento extensivo da língua do país vizinho, ou inclusive de dialectos locais, componentes essenciais do desenvolvimento regional transfronteiriço e requisito prévio para a comunicação.

4.2.5

A cooperação transfronteiriça assim entendida, impelida por estruturas permanentes como as Euro-regiões, acrescenta valor às medidas nacionais graças à adicionalidade dos programas e projectos transfronteiriços, às sinergias mobilizadas, à investigação e à inovação em conjunto, à criação de redes dinâmicas e estáveis, ao intercâmbio de conhecimentos e de boas práticas, aos efeitos indirectos da supressão das fronteiras e à gestão transfronteiriça e eficiente dos recursos disponíveis.

4.3   Obstáculos

No entanto, subsistem diferentes circunstâncias que dificultam a cooperação transfronteiriça (14), entre as quais podem ser citadas como as mais evidentes:

As limitações jurídicas à actividade transfronteiriça dos órgãos regionais e locais impostas pelas legislações estatais.

As diferenças de estrutura e de competência dos diferentes níveis administrativos de cada lado da fronteira.

A falta de vontade politica, especialmente a nível estatal, para eliminar restrições, por exemplo, mediante regulamentação estatal ou tratados bilaterais.

A ausência de quadros legislativos comuns de fiscalidade e de segurança social, ou de reconhecimento de títulos académicos e habilitações profissionais.

As diferenças económicas estruturais de ambos os lados da fronteira.

As barreiras linguísticas, culturais e psicológicas, entre as quais se destacam os preconceitos e as resistências históricas entre os povos.

4.4   Princípios gerais para a cooperação transfronteiriça

4.4.1

O elevado número de exemplos por toda a Europa permitem identificar princípios gerais para o êxito da cooperação transfronteiriça.

A proximidade dos cidadãos: os habitantes das zonas fronteiriças desejam a cooperação para superar os problemas que enfrentam ou para melhorar as suas expectativas de vida.

O envolvimento dos representantes políticos (locais, regionais, estatais e europeus) é essencial para uma boa cooperação transfronteiriça.

A subsidiariedade: os níveis local e regional já demonstraram ser os melhores para a realização da cooperação transfronteiriça, embora seja necessária a aliança com os governos nacionais.

A parceria: o envolvimento de todos os intervenientes de ambos os lados da fronteira é essencial para atingir objectivos comuns.

As estruturas conjuntas: dotadas de recursos comuns (meios técnicos, administrativos, financeiros e decisórios) são a garantia de uma actividade duradoira e em constante evolução, bem como a garantia para exercer determinadas competências, gerir programas, incluindo os europeus, atingir consensos além fronteiras e evitar egoísmos nacionais.

5.   Rumo a uma governação cooperativa

5.1   Novos espaços que exigem novas formas de governação

5.1.1

As Euro-regiões são espaços territoriais que põem em prática novos modelos de cooperação e de associação entre os sectores públicos, entre os sectores privados e entre uns e outros, para a definição de novas políticas em rede, com maior participação de todos os intervenientes realmente interessados.

5.1.2

O conceito de governação pode ser entendido como uma forma de governo mais participativa e horizontal do que as formas tradicionais mais hierarquizadas e verticais. Este conceito de governação é especialmente apropriado no caso das Euro-regiões, uma vez que se trata de dar soluções comuns a problemas comuns.

5.1.3

Por sua vez, as Euro-regiões desempenham cada vez mais uma função subsidiária, mas fundamental, na governação europeia da política de coesão económica social e territorial.

5.1.4

O CESE considera que, neste sentido, as Euro-regiões e estruturas semelhantes deveriam dar uma contribuição essencial para o aprofundamento do processo de integração e de construção europeia.

5.1.5

Por sua vez, a criação de Euro-regiões implica a cooperação entre actores institucionais e sociais que muitas vezes têm tradições e lógicas muito diferentes. Nem sempre por estar próximo se coopera mais. Daí o importante papel das instituições e das organizações da sociedade civil na governação horizontal.

5.1.6

A participação dos actores económicos e sociais na governação das Euro-regiões necessita da criação de quadros institucionais que a tornem efectiva. Trata-se de associar as organizações da sociedade civil na formulação e execução de políticas que emanam dos diferentes níveis de cooperação transfronteiriços entre dois ou mais Estados. A participação dos parceiros sociais na Rede EURES em questões transfronteiriças é uma concretização importante desse princípio.

6.   Conclusões e recomendações

6.1

A adopção do regulamento relativo aos agrupamentos europeus de cooperação territorial (AECT) e a inclusão de um novo objectivo sobre cooperação territorial propiciou novas possibilidades de actuação das Euro-regiões. Por um lado, porque estabelece um instrumento jurídico comunitário para a cooperação transfronteiriça, e, por outro, porque abre a possibilidade de os Estados-Membros, nos seus diferentes níveis, se associarem à cooperação territorial transfronteiriça. Em segundo lugar, a passagem da «cooperação transfronteiriça» para a «cooperação territorial» implica que as Euro-regiões possam expandir o seu campo de actividade para além das matérias próprias da cooperação no âmbito local e em colectividades próximas, até ao desenvolvimento integral de territórios mais amplos que partilhem sinergias e potencialidades comuns.

6.2

Em consequência, o CESE entende que a cooperação territorial promovida pelas Euro-regiões constitui um elemento essencial para promover a integração europeia, reduzir a fragmentação económica, social e cultural gerada pelas fronteiras nacionais e desenvolver a coesão económica, social e territorial. Para esse efeito, o CESE advoga que a cooperação territorial transfronteiriça seja objecto de uma atenção especial no próximo debate sobre a aprovação definitiva do novo Tratado Europeu.

6.3

Para que a cooperação territorial europeia possa cumprir as expectativas abertas pelas reformas anteriormente referidas é necessário, na opinião do CESE, um maior envolvimento dos Estados e das suas estruturas intermédias no desenvolvimento das Euro-regiões. Para esse efeito, são necessárias estratégias estaduais para a cooperação territorial no âmbito comunitário. E, em especial, os Estados terão que contribuir para a solução dos problemas mais prementes das suas populações transfronteiriças que, usualmente, têm a ver com o mercado de trabalho, a saúde, a assistência social, a educação e o transporte.

6.4

Na opinião do CESE, para uma maior eficácia das acções de cooperação territorial e em conformidade com o princípio da subsidiariedade, é conveniente um aumento da gestão directa por parte dos AECT dos projectos transfronteiriços e, em determinados casos, transnacionais financiados com fundos comunitários ou estatais.

6.5

Converter as Euro-regiões em «zonas de prosperidade partilhada» exige um maior envolvimento do sector privado empresarial (incluindo a economia social) nas iniciativas de desenvolvimento transfronteiriço tendo em conta, para esse efeito, a importâncias das Pequenas e Médias Empresas na estruturação do tecido produtivo e na criação de emprego.

6.6

O CESE entende que as Euro-regiões, como os AECT, constituídos nos termos do Regulamento n.o 1082/2006, são uma materialização exemplar dos princípios da governança europeia que a Comissão enunciou no seu Livro Branco de 2001. Neste sentido, o CESE considera que a eficácia das acções e das políticas transfronteiriças e de cooperação territorial em geral depende da realização de uma real «parceria» entre todos os intervenientes territoriais e socioeconómicos em causa. Assim sendo, o CESE pede que se estabeleçam fórmulas de participação das organizações representativas da sociedade civil organizada nos projectos de cooperação territorial.

6.7

Em especial, o CESE considera que a rede EURES deveria converter-se num instrumento europeu que exerça efectivamente um papel central na intermediação da procura e da oferta de trabalho. O âmbito transfronteiriço é, neste sentido, um laboratório fundamental. É por isso que o CESE lamenta a tendência, que se observa nos últimos anos, de «renacionalização» da gestão da EURES e advoga uma gestão realmente transfronteiriça da referida rede. Tendo em conta, por acréscimo, que a EURES, para além da sua função de mediadora no mercado de trabalho, desempenha um papel importante como impulsionadora do diálogo social nos níveis transnacionais mais próximos.

6.8

É notório que as organizações socioeconómicas desempenham uma importante função na integração europeia. Neste sentido, o CESE saúda as experiências de transnacionalização que representam os conselhos sindicais inter-regionais, as diferentes formas de cooperação e de associação transnacionais de organizações empresariais, câmaras de comércio, centros de investigação e universidades ou a criação de comités económicos e sociais euroregionais, entre outras experiências, e encoraja, ao mesmo tempo que oferece o seu possível apoio, a sua consolidação e desenvolvimento.

6.9

Na opinião do CESE, as Euro-regiões desempenham e podem desempenhar ainda mais um papel importante nas regiões com fronteiras com países terceiros, tanto do ponto de vista do desenvolvimento económico como da segurança dos cidadãos e da integração social. Por isso, o CESE solicita que este tipo de organismos e as acções que as mesmas possam realizar façam parte das Políticas de Vizinhança e de Pré-adesão da UE.

6.10

Tendo em conta a grande riqueza de experiências da acção transfronteiriça (de que damos alguns exemplos no anexo deste parecer) e o grande desconhecimento que existe sobre as mesmas, inclusive nas próprias Euro-regiões, o CESE considera que seria muito oportuna a elaboração pela Comissão de um «Guia de boas práticas» na matéria, que inclua casos de parcerias público-privadas de êxito.

6.11

Sendo evidente que a análise de uma questão tão multifacetada como a que aqui se aborda não se pode cingir a um só parecer, o CESE considera conveniente aprofundar esta matéria — a cooperação territorial transfronteiriça e as estruturas que lhe servem de suporte — através de outros pareceres sobre temas de interesse comum transfronteiriço: o mercado de trabalho, o turismo, os pólos de desenvolvimento, etc.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Características baseadas no «Guia prático da Cooperação Transfronteiriça», ARFE, 2000.

(2)  Quando falamos de Euro-regiões pressupõe-se que também se incluem outras estruturas análogas.

(3)  Sarre, Lorena, Luxemburgo, Renânia-Palatinado, Região da Valónia, Comunidade francesa da Bélgica, Comunidade alemã da Bélgica.

(4)  Actualmente há mais de 168 Euro-regiões e estruturas análogas. Aproximadamente metade das regiões dos Estados-Membros da União Europeia fazem parte de uma Euro-Região.

(5)  Resolução do Parlamento Europeu de 1.12.2005 sobre o papel das «Euro-regiões» no desenvolvimento da política regional.

(6)  COM(2004) 101 final.

(7)  Parecer sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Construir o nosso futuro em comum — Desafios políticos e recursos orçamentais da União alargada para 2007-2013», JO C 74 de 23.3.2005, p. 32.

(8)  COM(2004) 495 final, artigo 6.o: Cooperação territorial europeia.

(9)  Pareceres do CESE sobre «Disposições gerais» dos Fundos, sobre o «Fundo de Coesão» o «Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional» e sobre o «Agrupamento Europeu de Cooperação Transfronteiriça (AECT)», JO C 255 de 14.10.2005, pp. 76, 79, 88 e 91.

(10)  JO L 210 de 31.7.2006.

(11)  COM(2005) 299 final e COM(2006) 386 final adoptada pelo Conselho de Ministros em 5 de Outubro de 2006.

(12)  JO L 210 de 31.7.2006.

(13)  O futuro Observatório do Emprego do CESE poderia realizar um acompanhamento da problemática do trabalho fronteiriço e transfronteiriço na Europa.

(14)  Parecer do CESE sobre «Gestão das mutações industriais nas regiões transfronteiriças após o alargamento da União Europeia» de 21 de Abril de 2006, JO C 185 de 8.8.2006.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/138


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «As relações UE-América Central»

(2007/C 256/24)

Na reunião plenária de 17 de Janeiro de 2007 o Comité Económico e Social Europeu decidiu, de acordo com o n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar parecer de iniciativa sobre: «As relações UE-América Central».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Relações Externas que emitiu parecer em 14 de Junho de 2007, sendo relator M. SOARES.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 12 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 63 votos a favor, 0 votos contra e 2 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE, desde há vários anos, tem considerado que as relações entre a União Europeia e a América Latina fazem parte de um quadro estratégico mais vasto que, para lá das relações comerciais, reflectem a vontade da Europa em se afirmar como um interlocutor válido na construção de um modelo de sociedade assente no Estado de Direito, na democracia e no respeito pelos direitos humanos, na paz e na solidariedade entre os povos (1).

1.2

Por outro lado, as relações com a América Latina e as Caraíbas são, do ponto de vista da história, muito mais do que a simples procura de um parceiro económico ou geo-estratégico. Os povos latino-americanos mantêm há muito tempo com a Europa laços culturais, políticos, sociais, linguísticos e afectivos e até de visão do mundo que, não só não podem nem devem ser esquecidos, mas, mais do que isso, profundamente valorizados no quadro de negociação que agora começa.

1.3

Iniciadas as negociações entre a União Europeia e a América Central com vista a se alcançar um Acordo de Associação entre estas duas regiões, o CESE insta a que todos os esforços se concentrem na possibilidade de se chegar a um acordo de uma forma rápida e satisfatória para ambas as partes, que possa desta forma constituir um exemplo para actuais ou futuras negociações com a América Latina e Caraíbas sobre as vantagens recíprocas de uma parceria estratégica com a União Europeia. Vantagens que devem ir muito para além do comércio mas assentarem em bases de progresso económico, social e de desenvolvimento sustentável da região, no respeito pelas normas do Estado de Direito e pela dignidade de todos os seres humanos.

1.4

O CESE espera que as negociações sirvam para que os governos centro-americanos intensifiquem o seu diálogo com a sociedade civil organizada dos seus países. Um diálogo democrático, transparente, assente em propostas concretas mutuamente respeitadas. O CESE incita assim o Comité Consultivo do Sistema de Integração da América Central (CC-SICA) a continuar os seus esforços no sentido de celebrar acordos o mais consensuais possível que reflictam a posição de toda a sociedade civil centro americana face às negociações e permitam os compromissos necessários para acompanhar todo o processo.

1.5

Recomenda o CESE que as negociações tenham em conta os seguintes aspectos:

1.5.1

A necessidade de reforçar a sociedade civil organizada centro-americana, em particular através do reforço institucional do CC-SICA enquanto órgão consultivo do Sistema de Integração da América Central. A União Europeia deve contribuir para o aumento do reconhecimento por parte dos seus parceiros de negociação do papel fundamental desempenhado e que deve desempenhar o CC-SICA para uma boa integração regional, ao mesmo tempo que analisa medidas de apoio financeiro àquela estrutura, em consonância com o objectivo adoptado pela Comissão no documento de cooperação regional.

1.5.2

A introdução das cláusulas de natureza social necessárias para que o Acordo de Associação beneficie o conjunto da sociedade e seja um factor decisivo na consolidação das democracias, para o combate à pobreza, à exclusão social e ao desemprego, para o desenvolvimento de um modelo económico que não contribua para aumentar ou aprofundar as desigualdades. O Acordo deve servir ainda para incrementar a coesão social e o respeito pela biodiversidade ambiental (nesse sentido, o Acordo deveria contribuir para incluir milhares de pequenos produtores que visam uma agricultura mais respeitadora do ambiente. Por outro lado, durante a negociação e posterior aplicação do Acordo de Associação, o respeito e pleno cumprimento das Normas Internacionais do Trabalho da OIT por parte dos governos deve merecer, igualmente, uma atenção particular.

1.5.3

A existência de um Sistema de Preferências Generalizadas (SPG), instrumento unilateral da União Europeia para apoio aos países menos desenvolvidos, pelo que o capítulo comercial do Acordo deve ser mais vantajoso para os países da América Central do que o referido Sistema já prevê e que é, importa referir, já bastante positivo.

1.5.4

A necessidade de que a sociedade civil organizada receba informação regular, atempada e relevante, para que possa acompanhar as negociações de forma institucional. Nesse sentido, deve prever-se a possibilidade de haver consultas antes das rondas negociais para que se tenha em conta o ponto de vista da sociedade civil organizada e de organizar fóruns convocados de forma ampla no sentido de que toda a sociedade acompanhe de perto a evolução das referidas negociações. Neste capítulo deve ser considerada como elemento central da participação da sociedade civil a criação de um Comité Conjunto de Acompanhamento das negociações que funcione de uma forma institucionalizada e possa acompanhar todas as negociações e fazer a ponte entre o processo de negociação e a sociedade civil de um modo geral.

1.5.5

Finalmente, para que todos os aspectos do Acordo de Associação UE/América Central tenham verdadeiramente a participação da sociedade civil organizada, o CESE recomenda que o Comité Consultivo Misto, órgão institucional consultivo composto pelo CESE e pelo CC-SICA, previsto no acordo político entre as duas regiões no seu artigo 52.4, entre em funcionamento imediatamente a seguir à assinatura do Acordo, com a função de acompanhar o Acordo.

2.   Introdução

2.1

As relações entre a União Europeu e a América Central no seu conjunto não têm sido até agora muito intensas apesar de a União Europeia ter contribuído de forma decisiva no processo de pacificação e democratização da região e lançado um processo de diálogo interministerial que ainda hoje é um marco para a região — o diálogo ministerial de S. José, em 1984.

2.2

Em 2003, a UE e a América Central assinaram um acordo com vista à consolidação do diálogo político e da cooperação. Mais recentemente, na IV Cimeira de Chefes de Estado e de Governo da União Europeia e da América Latina e das Caraíbas, realizada em Maio de 2006, foi afirmada a vontade de progredir na direcção de um acordo de associação o mais rapidamente possível (2).

2.3

Em Abril de 2006 na «Declaração de Viena», adoptada no 4.o Encontro da Sociedade Civil UE-ALC, se afirma que os acordos de associação entre a UE e a ALC não se deveriam limitar aos aspectos comerciais e económicos antes deveriam ter em conta, em simultâneo as componentes políticas, culturais e sociais com vista a conduzir a uma coesão social acrescida.

2.4

Do mesmo modo, no protocolo de cooperação assinado entre o CESE e o CC-SICA estabelecem-se como linhas orientadoras da acção das duas instituições «trabalhar em prol da inscrição da dimensão social no futuro acordo de associação UE/SICA» e de «apoiar a iniciativa de trabalhar no projecto da constituição de um Comité Consultivo Conjunto» da sociedade civil organizada das duas regiões no quadro institucional do futuro acordo de Associação. A possibilidade de se alcançar com êxito um Acordo de Associação esta intimamente ligada ao facto de a sociedade civil organizada de ambas as regiões poderem acompanhar efectivamente as negociações e terem a capacidade de informarem o conjunto da sociedade sobre os avanços, as dificuldades e os êxitos.

3.   Uma nova etapa nas relações União Europeia/América Central

3.1

Actualmente as relações entre a União Europeia e a América Central concretizam-se no quadro do diálogo político e de cooperação e, no quadro das relações comerciais através do Sistema de Preferências Generalizadas que a UE lançou na década de 70 e a que hoje se acrescenta um regime especial de incentivo ao desenvolvimento sustentável e à boa governação, incluindo a luta contra o narcotráfico (SPG+).

3.2

Representando 12 % do comércio global, a EU é o segundo parceiro comercial externo da América Central a seguir aos Estados Unidos com 46 %. No que respeita à cooperação e à ajuda ao desenvolvimento, a UE é o maior doador da América Central tendo a dotação orçamental de 2002-2006 sido de 563,2 milhões de euros aos quais se devem somar 74,5 milhões de euros ao abrigo do memorando entre a Comissão e o Secretariado-geral do SICA bem como, os mais de 279 milhões de euros para ajuda após os desastres que abalaram a região, em particular na sequência do furacão Mitch e o sismo que em seguida abalou El Salvador. Para o período 2007-2013, a EU prometeu elevar para 840 milhões de euros o montante da ajuda ao desenvolvimento. Por outro lado, o volume de investimentos directos europeus na América Central continua a aumentar.

3.3

Contudo, as relações entre a União Europeia e a América Central são muito mais do que comércio e Cooperação e assentam numa visão estratégica mais ampla que abrange áreas hoje tão sensíveis como são a segurança e o combate ao terrorismo, a defesa do meio ambiente e a construção de um modelo de desenvolvimento sustentável, o fenómeno migratório e a necessidade do seu controlo para benefício quer dos países que recebem quer dos que exportam mão-de-obra, a instauração de uma nova ordem económica mundial assente nas boas práticas governativas respeitadoras dos direitos humanos, económicos e sociais.

3.4

A decisão tomada em Viena, em Maio de 2006, de abertura de negociações com a América Central com vista a alcançar um Acordo de Associação com a América Central constitui, só por si, um desafio e uma oportunidade que não podem ser perdidas.

3.5

Tendo em conta que a estratégia europeia para a assinatura de acordos de associação assenta num diálogo inter-regional importa analisar qual o estado actual da integração da região centro-americana.

3.5.1

A integração centro-americana é um projecto antigo, e com raízes na própria independência dos Estados desta região. Com o protocolo de Tegucigalpa, em 1991, e pelo Tratado Geral de Integração Económica Centro-Americana em 1993 este projecto ganha novo alento.

3.5.2

Apesar de existir um consenso maioritário sobre a integração regional, a verdade é que os avanços têm sido pouco significativos seja por dificuldades em concretizar as decisões tomadas a nível político seja ainda por fortes debilidades de natureza económica ou, mesmo, ausência de solidariedade regional. No entanto, pode-se dizer que, a partir de 2002, a integração parece ter tomado um caminho mais firme (3).

3.5.3

No entanto, a fragilidade das instituições regionais que impedem a tomada de decisões a nível supranacional, a diferença de desenvolvimento das economias dos países que compõem a região e a quase ausência de participação dos sectores sociais na tomada das decisões e na consciencialização dos benefícios da integração regional são factores que dificultam um avanço mais decisivo do processo de integração.

3.5.4

Contudo, apesar das dificuldades, existem alguns factores que imprimem algum optimismo ao processo de integração regional em particular a tradição e a cultura que une os diversos países, a existência de um quadro jurídico e institucional relativamente estável e comprometido bem como a necessidade sentida e manifestada de reformar algumas instituições (caso do PARLACEN (4)) de modo a que seja possível alcançar uma maior eficácia nas estratégias de implantação de políticas regionais. Igualmente uma maior consciencialização e uma maior intervenção da sociedade civil constituem um factor de optimismo e de confiança.

3.5.5

Nos recentes encontros da Comissão Mista UE/América Central, realizados em Abril de 2007, os governos centro-americanos comprometerem-se a apresentar um quadro legislativo que configure a realização da União Aduaneira centro-americana acompanhado de um calendário para a sua aplicação até ao final das negociações do Acordo de Associação, o que consubstancia um passo importante e decisivo na direcção da integração centro-americana e da possibilidade de se chegar a um acordo entre as duas regiões.

3.6

O processo de negociação que agora se abre é uma extraordinária oportunidade para o aproveitamento dos benefícios mútuos, em áreas diversas, que podem e devem ser aproveitados. A título de exemplo podem-se referir os seguintes aspectos:

3.6.1

O desenvolvimento e fortalecimento da União Aduaneira e a eliminação das barreiras económicas e alfandegárias entre os países da região, política apoiada pela União Europeia, pode constituir um forte contributo para que a América Central seja capaz de complementar as suas economias fortalecendo os seus níveis de competitividade face aos seus actuais e potenciais parceiros económicos. Pelo seu lado, facilitará os eventuais investimentos europeus na região e, mesmo, a implementação da cooperação para o desenvolvimento.

3.6.2

Uma maior e mais harmónica coesão social contribuirá para o fortalecimento das jovens democracias centro-americanas, reduzindo as hipóteses de conflito e aumentando a segurança jurídica, possibilitando que o intercâmbio entre as duas regiões assente em regras claras, mutuamente decididas e respeitadas. Como demonstram sucessivas investigações realizadas pela Comissão Económica para a América latina e Caribe das Nações Unidas — CEPAL, o desenvolvimento político, económico e social dos países depende, em boa parte, do nível de coesão social que consigam alcançar. Daí a necessidade de envolver a sociedade civil organizada em todo o processo negocial.

3.6.3

Outra área de interesse para ambas as regiões é a procura das soluções de prevenção face aos desastres naturais, diminuindo desse modo a vulnerabilidade dos países da América Central. Esta é uma região altamente sujeita a este tipo de fenómenos com um consequente custo em vidas humanas e na deterioração das condições de vida e de trabalho de milhões de pessoas. As negociações deveriam ter em conta esta questão de modo a encontrar medidas de prevenção e de acção tendentes a gerir estes fenómenos. Simultaneamente, estas medidas facilitariam a tarefa de ajuda nos casos de emergência e reduziria os custos da intervenção internacional solidária.

3.6.4

Finalmente, e sem pretender esgotar o tema, importa referir a coincidência de interesses entre a UE e a AC na urgência de proteger o meio ambiente e a diversidade através de políticas, programas e acções concretas. Se as negociações incentivarem a exploração racional dos recursos naturais, a recusa da utilização de formas e produtos agressivos para a natureza, o respeito pelos direitos laborais e sindicais das/dos trabalhadoras/es agrícolas, o reconhecimento da existência de reservas naturais a serem protegidas, o Acordo de Associação terá dado um importante contributo válido não só para as duas regiões, mas também para desenhar um modelo de associação de tipo novo que servirá de exemplo para outras negociações.

4.   A situação política, económica e social da América Central

4.1

Os países da América Central encontram-se entre os mais pobres da América Latina com graves lacunas de desenvolvimento económico e uma grande vulnerabilidade social que coloca em grande risco a coesão social de cada um dos países e da região no seu conjunto. Um elevado nível de pobreza e uma muito desigual distribuição da riqueza contribuem para essa vulnerabilidade.

4.2

Tratando-se de uma região que vive processos democráticos recentes, que sofreu ditaduras e conflitos armados prolongados que deixaram sequelas profundas (a única excepção é Costa Rica), é possível determinar de forma concisa alguns dos constrangimentos mais importantes para o seu desenvolvimento:

a)

a ainda frágil situação democrática onde se incluem a insuficiente protecção das liberdades fundamentais, a permanência de impunidade e da corrupção, a falta de transparência nas decisões económicas e políticas e da gestão pública, entre outros;

b)

a debilidade económica devida essencialmente à falta de competitividade dos diferentes países e à sua vulnerabilidade face às alterações dos mercados internacionais;

c)

a débil coesão social devida fundamentalmente aos elevados níveis de pobreza e à deficiente distribuição da riqueza que não permite às camadas mais desfavorecidas serem beneficiárias do crescimento económico, gerando fenómenos de sobrevivência alternativa como a emigração e, noutra dimensão, violência social;

d)

as múltiplas vulnerabilidades ambientais devidas quer a fenómenos próprios da natureza a que a região está sujeita (terramotos, inundações, secas prolongadas) quer à exploração irracional dos seus recursos naturais. Segundo o PNUD, os factores que aumentam a fragilidade ambiental na América Central são, entre outro, o desordenado e pouco planificado processo de urbanização, a sobreexploração dos recursos hídricos, o uso excessivo de pesticidas na agricultura e a desflorestação.

4.3

No plano económico a região centro-americana teve algum crescimento económico que, no entanto, se mostra insuficiente para ultrapassar os desafios sociais que tem pela frente. Nos últimos anos a taxa média anual do crescimento regional situou-se entre os 3,2 % e os 3,5 %. Contudo a falta de competitividade das economias centro-americanas com a relativa excepção de Costa Rica e El Salvador colocam os países desta região em lugares modestos no ranking da competitividade efectuado pelo World Economic Fórum para 2006 — 53.o (Costa Rica), 61.o (El Salvador), 75.o (Guatemala), 93.o (Honduras), e 95.o (Nicarágua) numa amostra de 125 países.

4.4

No plano social importa referir que a sociedade centro-americana é muito complexa e diversa incluindo comunidades indígenas e uma importante comunidade afrodescendente que, em geral, têm sido esquecidas quando não marginalizadas.

4.5

No caso das comunidades indígenas é comum associá-las às zonas rurais pobres esquecendo o importante fenómeno de migração em direcção às cidades devido à cada vez maior deterioração das economias rurais o que tem vindo a engrossar a cintura de pobreza das grandes cidades.

4.6

Os afro descendentes que se encontram disseminados por todos países (a excepção é El Salvador) não tem merecido a devida atenção política e social pelo que são vítimas de fenómenos de discriminação racial, laboral e social.

4.7

A desigualdade entre homens e mulheres expressa por todos os indicadores socio-económicos é um fenómeno que pela sua amplitude não pode ser ignorado. Seja no desemprego ou no emprego precário, seja na qualidade do emprego ou no salário recebido, seja no abandono escolar que atinge essencialmente as meninas, a situação altamente penalizante das mulheres na sociedade centro-americana é quase dramática tanto mais que uma percentagem elevada são, por razões diversas, cabeças de casal.

4.8

A falta de dados estatísticos actualizados, fiáveis e comparáveis sobre a situação das meninas e das mulheres parece sugerir a escassa atenção dada a esta questão apesar dos governos da região terem assinado e ratificado as convenções internacionais tais como as Convenções da OIT sobre este tema ou a Convenção para a Eliminação de todas as formas de discriminação contra a Mulher, das Nações Unidas. A situação de violência sobre as mulheres (nas suas diferentes versões, desde a violência doméstica até à violência no trabalho) continua sendo muito preocupante, apesar dos esforços desenvolvidos pelos movimentos de mulheres.

4.9

Toda esta situação de pobreza que afecta, à excepção de Costa Rica, praticamente metade, ou mais, da população, o peso da informalidade laboral que se situa ao redor de 40 %, os mais que insuficientes orçamentos destinados aos sectores sociais como a saúde e a educação e o desemprego são características de uma região que importa reter para se ter uma ideia da falta de coesão social que ali se vive.

4.10

É igualmente importante sublinhar a ausência generalizada de uma política respeitadora dos direitos humanos. Em particular há que ressaltar a falta de respeito pelos direitos laborais e sindicais apesar de os vários países centro-americanos terem ratificado um número significativo de Convenções da OIT pelo que as responsabilidades dos governos pelo seu cumprimento são, naturalmente, acrescidas. Exercer os direitos cívicos e sindicais na região pode significar, em muitos casos, um enorme custo pessoal que pode ir até à perda da própria vida.

5.   Critérios a ter em conta para um Acordo de Associação UE/América Central

5.1

Na abordagem para a concretização do futuro Acordo de Associação importa tornar evidentes alguns critérios a ter em conta e que devem ser, na opinião do CESE, elementos fundamentais para o sucesso não só do referido Acordo, mas como parte de uma estratégia mais global para toda a América Latina.

5.2

Assimetrias. Um dos primeiros elementos a ter em conta são as enormes assimetrias entre as duas regiões em múltiplos aspectos — extensão territorial, população, PIB, relações comerciais, desenvolvimento sócio-económico.

5.2.1

A existência de assimetrias tão importantes entre as duas regiões torna obrigatória a implementação de medidas compensatórias para o êxito do Acordo de Associação de modo a que este contribua para que as politicas comerciais e de cooperação sejam coerentes e não divergentes nos seus objectivos.

5.3

Favorecimento da coesão social. Este deve ser um dos critérios centrais do futuro acordo não só porque a coesão social é um elemento estratégico da actuação da União Europeia na sua relação com os países terceiros, mas porque ela é a chave do próprio desenvolvimento da região centro americana que se debate com enormes problemas de pobreza e de exclusão social.

5.3.1

Para tal, é necessário que sejam tomadas as medidas necessárias e suficientes no plano do desenvolvimento de políticas sociais como sejam a educação, a saúde e a segurança social, bem como no plano da fiscalidade, entre outras, de modo a que toda a sociedade, no seu conjunto, possa beneficiar do desenvolvimento económico e das oportunidades que venham a ser abertas pelo Acordo de Associação.

5.4

Fortalecimento da democracia e das instituições. Numa sociedade tão diversa e tão dilacerada pela pobreza, longas ditaduras e guerras civis como é a da América Central importa que o Acordo seja uma oportunidade para o reforço da democracia, em especial a democracia participativa, e das instituições que nela intervêm.

5.4.1

Instituições tão diversas como as que pugnam pela defesa dos direitos humanos, os direitos dos povos indígenas ou afrodescendentes, os direitos das mulheres, dos trabalhadores ou do meio ambiente têm vindo a exigir uma maior participação nos processos de decisão política, económica e social apesar das dificuldades que enfrentam para que sejam ouvidas enquanto parceiros de pleno direito. Importa que o Acordo seja um factor de estímulo ao reconhecimento dessa intervenção.

5.4.2

No caso concreto do CC-SICA, Comité Consultivo do Sistema de Integração Centro Americano, órgão consultivo consagrado pelo artigo 12.o do protocolo de Tegucigalpa, deve ser reconhecido e apoiado o seu papel de representante da sociedade civil organizada conferindo-lhe os meios logísticos e orçamentais necessários para o desempenho da sua missão.

5.4.3

O CESE reconhece no CC-SICA o seu parceiro institucional tendo celebrado um acordo em Abril de 2006 assente no compromisso comum de defesa dos princípios da democracia, dos direitos humanos e dos direitos económicos e sociais e na vontade de participação no processo de diálogo e de instauração de vínculos económicos e de cooperação mais estreitos entre a União Europeia e o Sistema de Integração da América Central.

5.5

Reforço da integração regional. A integração regional não deve ser encarada apenas como uma exigência europeia com vista à conclusão de um acordo comercial, mas igualmente como uma oportunidade para os países da América Central para enfrentarem as suas debilidades económicas e aproveitarem as sinergias que a mesma pode proporcionar.

5.5.1

Não se pode, contudo, ter uma visão maximalista desta questão. A integração regional é um processo que leva tempo e exige apoios e um esforço continuado. Nesse sentido, o Acordo deve prever um conjunto de mecanismos (entre outros, o estabelecimento de fundos de compensação e de coesão económica e social) que estimulem, apoiem e facilitem o processo integrador da região centro-americana.

5.6

Conferir uma dimensão social ao Acordo de Associação. O Acordo de Associação contém três pilares profundamente interligados — político, comercial e de cooperação — pelo que todos eles são importantes e não se pode sobrevalorizar nas negociações aquele que se pode afigurar como mais complexo e difícil.

5.6.1

No plano político, o Acordo de Associação deverá consagrar medidas concretas de apoio à boa governação, deve conter uma dimensão social que vise alcançar um maior nível de coesão social, deverá conter cláusulas de tenham em conta o papel das mulheres e a defesa dos direitos humanos, laborais, ambientais, dos indígenas e dos afrodescendentes.

5.6.2

Deverá ter igualmente uma abordagem à situação da emigração da América Central cujas consequências para o desenvolvimento dos países da região podem ser contraditórias (remessas de dinheiro/fuga de cérebros e de trabalhadores no activo). Essa abordagem deve ter em conta o respeito devido à dignidade e aos direitos dos imigrantes que vivem e trabalham na União Europeia.

5.6.3

No plano da Cooperação, o Acordo deve prever a continuação e mesmo o reforço das ajudas comunitárias ao desenvolvimento da região e à superação das suas debilidades políticas, económicas, sociais e ambientais. Pode, e no entender do CESE deve, prever o apoio a instituições especializadas em determinados temas como a OIT, a UNESCO ou a OMS no sentido de analisarem a evolução dos elementos mais delicados.

5.6.4

Aliás, para responder às expectativas dos países da região centro-americana, que têm já a experiência de outros acordos internacionais (em particular o CAFTA, assinado com os Estados Unidos da América) a Europa deve demonstrar que este Acordo persegue objectivos mais amplos e que se conformam com uma visão social global, inspirada nos princípios fundadores da própria EU, incluindo um modelo económico capaz de conduzir ao desenvolvimento sustentável da região.

6.   As recomendações do CESE

Face ao exposto nos pontos anteriores o CESE formula as seguintes recomendações:

6.1

Que o Acordo de Associação entre a UE e os países da América Central constitua uma prioridade política da União pelo que pode representar de estratégico para a actuação birregional da UE com outros parceiros da América Latina.

6.2

Que o referido Acordo contemple, no mesmo pé de igualdade, todas as suas componentes — política, comercial e de cooperação.

6.3

Que tenha em consideração que no parceiro de negociação se encontram os países mais pobres da América Latina e que as enormes assimetrias entre as duas regiões obrigam a reforçar os programas de cooperação de molde a evitar os impactos negativos que porventura possam surgir bem como a consagrar uma abertura comercial condicente com esta apreciação.

6.4

Que contemple medidas que fomentem a competitividade das empresas e assegurem a estabilidade jurídica dos investimentos bem como preveja a existência de instrumentos de compensação face às naturais dificuldades que a realização do mercado único centro-americano acarreta em razão das assimetrias existentes nas economias da própria região.

6.5

Que o Acordo contribua de um modo decisivo para o reforço da coesão social na região pelo que os benefícios sejam visíveis para todos e não apenas para alguns sectores, já de si beneficiados.

6.6

Que contenha uma dimensão sócio-laboral sobretudo no respeito pelas normas da OIT. O Acordo de Associação deve promover a observância, pelas partes contratantes, dos princípios e valores expressos na Constituição da OIT e os seus principais instrumentos em matéria social, como a Declaração relativa aos princípios e direitos fundamentais no trabalho (1998), a Declaração tripartida de princípios sobre as empresas multinacionais e a política social (1977, alterado em 2000), e a resolução da Conferência Internacional do Trabalho sobre os direitos sindicais e a sua relação com as liberdades civis (1970).

6.7

Que tenha uma clara dimensão social não só pelo relevo dado às questões de natureza laboral, mas também pelo respeito do meio ambiente e pela consagração de alcançar o progresso global da região e dos seus povos.

6.8

Que tenha em atenção os sectores mais vulneráveis da população como são o caso das mulheres, dos indígenas e dos afrodescendentes.

6.9

Que preveja os mecanismos necessários para que a participação da sociedade civil seja efectiva desde o início das negociações até à sua implementação.

6.10

Neste sentido devem ser reforçados os apoios aos organismos de consulta da sociedade civil organizada, muito em particular o CC-SICA, órgão institucional do processo de integração da região centro-americana, de molde a poder ter os meios humanos, logísticos e financeiros necessários ao cumprimento da sua missão.

6.11

Deve igualmente constituir-se, desde já, o Comité Conjunto de Acompanhamento das negociações, composto por membros do CESE e do CC-SICA, ao qual se poderão agregar, de comum acordo entre as partes, outras organizações julgadas necessárias e relevantes para a análise do processo negocial.

6.12

Finalmente, devem iniciar-se as discussões entre o CC-SICA e o CESE sobre a composição, funções e forma de actuação do futuro Comité Consultivo Conjunto, órgão institucional consultivo do futuro Acordo de Associação.

Bruxelas, 12 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  «A Coesão Social na América Latina e Caraíbas», JO C 110, 10.4.2004; «As relações UE-México», «Relações entre a União Europeia e a Comunidade Andina de Nações», JO C 309, 16.12.2006.

(2)  A Declaração final da Cimeira de Viena diz, no ponto 31: Recordando o objectivo estratégico comum da Declaração de Guadalajara e tendo em conta o bom resultado do exercício conjunto de avaliação da integração económica regional levada a cabo na América Central, apoiamos a decisão da UE e da América Central de entabularem negociações de um acordo de associação, incluindo a criação de uma zona de comércio livre.

(3)  As exportações intra-centroamercanas aumentaram cerca de 60 % entre 1995 e 2002. «Informe Centroamericano 2004» BID.

(4)  Parlamento Centro Americano.


27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/144


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Promoção do espírito empresarial das mulheres na região Euromed»

(2007/C 256/25)

Em 17 de Janeiro de 2007, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre a Promoção do espírito empresarial das mulheres na região Euromed.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção de Relações Externas emitiu parecer em 14 de Junho de 2007, sendo relatora Grace ATTARD.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho (sessão de 12 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu aprovou, por 130 votos a favor, 1 voto contra e 4 abstenções, o presente parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE congratula-se com o forte empenho da União Europeia e dos Estados do Mediterrâneo na Parceria Euromediterrânica, como previsto no programa de trabalho quinquenal da Comissão Europeia que apoia, em particular, os projectos que visam acções de promoção da emancipação das mulheres. Para o efeito, propõe a atribuição de fundos específicos para financiar os países da região euromediterrânica que tenham acções positivas para melhorar concretamente o estatuto jurídico da mulher (1).

1.2

O CESE defende que os mecanismos de reexame das conclusões da primeira conferência ministerial euromediterrânica sobre «Reforçar o papel das mulheres na sociedade» garantem o acompanhamento e a avaliação do desenvolvimento do espírito empresarial das mulheres e a realização de acções para o fomentar.

1.3

O CESE considera que, no âmbito da política europeia de vizinhança (PEV), se devem incluir nos planos de acção nacionais medidas e objectivos específicos para promover o espírito empresarial das mulheres.

1.4

O CESE recomenda que, no PEV, sejam atribuídos mais recursos ao desenvolvimento do espírito empresarial das mulheres e à assistência técnica a empresas novas (start-ups) de mulheres.

1.5

O CESE congratula-se com as iniciativas da DG Empresa e Indústria e do Gabinete EuropeAid (2) destinadas aos empresários na Europa e nos países parceiros do Mediterrâneo. Insta os parceiros euromediterrânicos a tomarem medidas semelhantes, orientadas para as necessidades desta região, através de planos de acção negociados com os países parceiros do Mediterrâneo.

1.6

O CESE acolhe com agrado a criação de uma comissão eventual dos direitos das mulheres no âmbito da Assembleia Parlamentar Euromediterrânica (APEM). Insta a Comissão a propor políticas que reforcem as actividades empresariais desenvolvidas actualmente por mulheres e a promover iniciativas sustentáveis a longo prazo tendo em mente a concorrência mundial.

1.7

O CESE recomenda que a aplicação da Carta Euromediterrânica para Empresas (3) tenha por alvo as mulheres.

1.8

Devem ser envidados esforços para assegurar que um número equilibrado de raparigas e rapazes beneficiam dos programas euromediterrânicos destinados aos jovens, tanto em termos de participantes como de líderes.

1.9

O CESE congratula-se com a iniciativa da Plataforma Euromediterrânica da Juventude de criar uma rede Euromed de grupos de jovens dedicados às questões da igualdade entre os géneros (4) e uma rede Euromed de jovens empresários (5).

1.10

O CESE acredita que a cooperação interministerial e o envolvimento de outras partes interessadas, como representantes de instituições financeiras, agências para a execução de programas, representantes de comunidades empresariais, peritos e doadores, na troca de pontos de vista sobre os domínios prioritários bem como o facilitar da transmissão de empresas a mulheres obterão melhores resultados na promoção do espírito empresarial das mulheres.

1.11

O CESE insta ao reforço das ONG e organizações socioprofissionais que trabalham na promoção de actividades económicas por mulheres através de parcerias público-privadas.

1.12

O CESE considera que as partes interessadas Euromed devem organizar uma conferência sobre o tema das mulheres empresárias na região euromediterrânica para debater questões conexas e apresentar propostas sobre o contributo das mulheres para os desafios em geral nesta região.

1.13

O CESE está convicto de que a promoção do espírito empresarial das mulheres na região euromediterrânica desempenha um papel importante na criação de uma economia activa e dinâmica com capacidades a nível mundial.

1.14

O CESE crê que o reforço do ambiente empresarial para as mulheres é uma condição prévia para o desenvolvimento do acesso ao mercado na região e com os países comunitários.

1.15

O CESE recomenda que a estratégia para os desafios futuros enfrentados pelas mulheres empresárias envolva mais estudos que identifiquem as necessidades específicas dentro de cada país.

1.16

O CESE está ciente da multiplicidade de observatórios, incluindo o GEM (Global Entrepreneurship Monitor), o PNUD (Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas) e o Banco Mundial, que acompanham já a evolução do espírito empresarial na região Euromed, mas recomendaria a criação de uma plataforma que permitisse uma comunicação mais eficaz das conclusões desse acompanhamento aos políticos e a recolha do material e a sua divulgação pelas microempresas, pequenas e médias empresas da região Euromed. Esta plataforma poderia centrar a sua actividade especialmente:

a.

nos domínios em que as mulheres empresárias se deparam com maiores dificuldades;

b.

no apoio e desenvolvimento de programas para mulheres empresárias;

c.

no desenvolvimento de mecanismos referentes ao estatuto jurídico de cônjuges colaboradores e respectiva protecção social;

d.

em acções que reforcem a segurança social e o estatuto jurídico das mulheres que desenvolvem o seu próprio negócio.

1.17

O Comité recomenda que no domínio das tecnologias da informação e comunicação:

seja dada prioridade ao fomento do investimento em infra-estruturas e estratégias para melhorar o acesso a novas tecnologias da informação e comunicação (TIC);

seja facilitado o acesso às aplicações e às acções de formação TIC às mulheres que iniciam uma actividade empresarial, para facilitar a comercialização e publicidade, distribuindo os bens ao consumidor através dos canais de distribuição apropriados, dado que as TIC podem ser um veículo de melhor comercialização;

seja promovida a participação das mulheres nas tomadas de decisão em matéria de políticas, desenvolvimento e concepção de TIC, estabelecendo um diálogo com as empresas de TIC e outras partes interessadas para abrirem caminho para a cooperação e acção conjunta.

O CESE insta firmemente o Fórum Universitário Permanente Euromediterrânico (6), lançado em Tampere, a dar prioridade à dimensão do género das suas iniciativas, em particular no domínio do espírito empresarial.

1.18

O CESE recomenda que seja dada especial atenção à influência dos meios de comunicação social, em especial a televisão, no espírito empresarial e nas mulheres.

2.   Recomendações para mecanismos específicos ao espírito empresarial das mulheres na região Euromed

2.1

É necessário introduzir políticas e programas específicos que permitam às mulheres contribuir mais para o crescimento e desenvolvimento. Algumas dessas políticas podem ser estabelecidas num plano de acção, com calendários e procedimentos de avaliação precisos, e devem incluir, designadamente:

1.

mecanismos de reforço das capacidades e de apoio que incentivem as mulheres a avaliar o ambiente em que vivem e trabalham e a forma como poderão participar activamente no seu desenvolvimento recorrendo às suas próprias capacidades. Tal poderá incluir formas de promover a constituição de grupos de auto-ajuda.

2.

investimento em infra-estruturas sociais e serviços de apoio às mulheres no trabalho e auto-emprego.

3.

definição de actividade empresarial tradicional, PME e trabalho independente individual.

4.

constituição em pé de igualdade de empresas de qualquer dimensão por homens e mulheres.

5.

criação de um sistema jurídico equitativo que permita às mulheres assinarem documentos e possuírem património.

6.

dar formação às mulheres que gerem ou possuem empresas, adaptada às suas necessidades específicas. Isto pode incluir também programas de orientação, criação de órgãos profissionais e aconselhamento em questões jurídicas e fiscais.

7.

constituição de «empresas de garantia mútua», órgãos económicos cujos membros possuem PME e actuam como fiadores junto das instituições financeiras.

8.

aplicação de programas específicos para facilitar a criação de empresas por mulheres migrantes e grupos minoritários.

9.

mecanismos de informação e apoio à criação de empresas sociais e cooperativas.

10.

cooperação e co-ligação em rede com homólogos comunitários por forma a identificar estruturas e mecanismos, incluindo as melhores práticas, que representaram uma mais-valia noutros locais.

11.

políticas de ensino que promovam o espírito e atitudes empreendedoras desde tenra idade (7). Um espírito empreendedor deve ser encarado como um processo de aprendizagem ao longo da vida que se inicia na escola primária. Isto permite maior flexibilidade em diferentes fases da vida do indivíduo.

12.

maior envolvimento das mulheres nos processos de tomada de decisão em todos os níveis, nacional, local e judicial.

13.

abertura de concursos públicos a PME e particularmente às empresas de mulheres, a fim de estimular o crescimento empresarial.

14.

objectivos específicos para a igualdade entre homens e mulheres nas políticas de emprego, com indicadores qualitativos e quantitativos, sendo essencial ter mais mulheres empresárias, por forma a garantir o emprego e a melhorar a qualidade deste emprego (8).

3.   Situação actual e reptos

3.1

É importante que os direitos das mulheres não sejam tratados como uma questão isolada do papel das mesmas no desenvolvimento económico. É fundamental que todos os parceiros sociais se comprometam a reconhecer a relação entre os direitos humanos, a democracia, o desenvolvimento e os direitos das mulheres. Deve ser dada prioridade à supressão dos obstáculos à emancipação da mulher decorrentes de normas tradicionais, culturais e familiares.

3.2

A supressão do fosso entre os géneros na educação e no emprego na região euromediterrânica exige um esforço concertado para criar um ambiente onde as mulheres possam desenvolver as suas actividades empresariais.

3.3

Embora varie de país para país, o analfabetismo feminino na região do Médio Oriente e Norte de África ainda é extremamente elevado, em média 42 %, ao passo que a média de analfabetismo masculino é de 21 %. Todavia, as últimas duas décadas mostram uma tendência positiva na igualdade de acesso à educação que varia entre os países. Em todos os países há uma diferença significativa entre o nível de alfabetização da população feminina jovem (15-24 anos) e a população feminina adulta (24 anos e mais) (9).

3.4

Na última década, o aumento das oportunidades de emprego para mulheres foi o resultado de educação e formação e crescimento em sectores onde a procura de trabalho feminino é mais elevada, tais como serviços sociais, educação e saúde e profissões no sector de serviços. Apenas 32 % das mulheres em idade activa estão a trabalhar ou à procura de emprego fora de casa. Nas classes sociais tradicionais, em que as raparigas vão à escola, estas são desencorajadas de procurar emprego.

3.5

O sistema de ensino deve incentivar iniciativas empresariais e a assunção de riscos. É fundamental a criação de um plano nacional de ensino para promover a qualidade do ensino básico e erradicar o analfabetismo feminino, em particular entre as mulheres desfavorecidas e portadoras de deficiência.

3.6

Embora a necessidade de educação em questões de cidadania e sensibilização para os direitos sociais, políticos, jurídicos e económicos das mulheres seja grande, é também necessário educar as entidades financeiras e outras partes interessadas no sentido de compreenderem as necessidades das mulheres com actividades empresariais.

3.7

Há que considerar os preconceitos sexistas como questão prioritária no contexto social e político e na evolução geral do crescimento económico na região. O papel e estatuto particulares que a sociedade impõe às mulheres através da lei da família tradicional, também designada Código do Estatuto Pessoal, são discriminatórios para as mulheres. O estatuto legal das mulheres que controla a participação das mesmas nas actividades económicas, políticas, sociais, cívicas e culturais continua a ser um dos maiores obstáculos, embora quase cento e noventa países, incluindo a região árabe, tenham ratificado a Declaração do Milénio (10).

3.8

Há que dar visibilidade e reforçar as pequenas actividades comerciais tradicionais geridas por mulheres. Isso inclui actividades não remuneradas em família e trabalho tradicional. Deve ser fornecida formação e apoio de forma a incentivar o desenvolvimento e a modernização de muitas empresas pequenas e de artesanato que podem ser transformadas em emprego produtivo remunerado através da criação de serviços comercializáveis que as dotarão de poder económico.

3.9

O contributo das mulheres é maior no sector agrícola. Nas zonas rurais, onde uma grande percentagem de mulheres é analfabeta ou não tem mais do que o ensino primário, o acesso a recursos de formação é muito limitado (11). Carecem muitas vezes de conhecimentos e autoconfiança para melhorarem a sua situação e a das suas famílias. Precisam de programas integrados, associando intervenção pessoal, formação profissional e formação em espírito empresarial e competências empresariais básicas, bem como de apoio na concepção de planos comerciais viáveis, acesso a empréstimos e subvenções para empresas em fase de arranque por forma a criarem microempresas nas suas aldeias. Os programas de formação devem oferecer oportunidades às mulheres das zonas rurais de associarem iniciativas agrícolas e não agrícolas e garantir o apoio da população masculina das comunidades às suas actividades não agrícolas.

3.10

É importante criar pequenas cooperativas que prestem apoio às mulheres empresárias.

3.11

É igualmente importante incentivar as mulheres já empresárias a descobrir novos sectores onde as mulheres possam ter iniciativa económica no desenvolvimento de actividades empresariais não tradicionais, incluindo reforçar capacidades em publicidade, comercialização e fixação de preços, e ter por objectivo os mercados estrangeiros.

3.12

A criação de oportunidades para desenvolver as actividades económicas das mulheres exige uma boa compreensão da situação socioeconómica actual e futura nas diferentes regiões.

3.13

É necessário o envolvimento de todas as partes interessadas para eliminar os obstáculos às mulheres e introduzir políticas e programas específicos que lhes permitam contribuir mais para o crescimento e desenvolvimento.

3.14

O acesso a financiamento é fundamental. É preciso subir os limites máximos de crédito para encorajar micro e pequenas empresas a expandirem-se e a investirem nos seus negócios. O Estado e doadores podem oferecer incentivos a instituições de crédito formais para esses projectos. Os decisores políticos devem sempre ter em mente as diferenças entre as PME e as microempresas em termos de organização, finanças, produtividade e potencial de crescimento.

3.15

Os incentivos para novos projectos empresariais e criação de empresas devem incluir maior eficiência do sector de microcrédito e a oferta de condições adequadas e realistas para empréstimos por parte dos bancos comerciais.

3.16

A organização de exposições de comercialização e promoção na região e nos Estados-Membros pode permitir iniciativas orientadas para a exportação, em particular na indústria transformadora.

3.17

O futuro das mulheres da região euromediterrânica deve ser visto no contexto económico, político, social e familiar em que se insere. Sem crescimento económico e melhorias na taxa de emprego, as mulheres continuarão a ser discriminadas numa competição injusta com os homens.

3.18

É necessário introduzir políticas e programas específicos que permitam às mulheres contribuir mais para o crescimento e desenvolvimento.

3.19

As estratégias dirigidas especificamente às mulheres empresárias podem dar-lhes a oportunidade de se libertarem das estruturas económicas tradicionais e investir mais em empresas.

3.20

Todas as iniciativas devem basear-se em estudos que identifiquem as necessidades específicas de cada país de orientar-se para os pontos fortes e fracos das mulheres através da segmentação em diferentes grupos etários e estudos sectoriais especializados.

3.21

A identificação e avaliação das acções nacionais em prol da criação de empresas (start-ups), informação e aconselhamento, financiamento, formação, orientação e constituição de redes são necessários para determinar e trocar boas práticas na região Euromed, nos eixos norte-sul e sul-sul. Há que acompanhar permanentemente os progressos nos países parceiros euromediterrânicos, de forma a garantir o desenvolvimento da plena participação das mulheres na vida económica do seu país.

3.22

Através de programas transnacionais na região euromediterrânica, as associações de mulheres empresárias podem trocar experiências e boas práticas, o que é uma forma eficaz de desenvolver actividades e competências empresariais.

3.23

O sistema de franchising pode ser uma ferramenta útil para a intervenção das mulheres através do emprego por conta própria e das pequenas empresas. Pode reduzir o risco de iniciar um novo projecto, pois permite partir de práticas e competências comprovadas. É também importante melhorar o desempenho dos centros de recursos empresariais. É necessária a formação de capacidades apropriadas para o que requer a actividade empresarial, que podem ser desenvolvidas com base em práticas e programas bem sucedidos noutros países.

3.24

A exploração de novos domínios, como os serviços de TIC, I&D, gestão de centros de informação e comunicação social e produção de programas de comunicação social inovadores, bem como a exploração de novos nichos de mercado no sector do turismo podem abrir novos caminhos para actividades empresariais de mulheres.

3.25

As TIC contribuem para a produtividade, o crescimento, a competitividade e o emprego. É essencial desenvolver este sector para a região euromediterrânica competir a nível mundial. Ao estabelecer as infra-estruturas necessárias, é importante garantir o acesso a todos, de forma a que o fosso digital não aumente, em particular entre as mulheres e nos sectores da população com elevado nível de analfabetismo. O valor criado pelo desenvolvimento das TIC reforçará as competências empresariais tanto dos homens como das mulheres.

3.26

O Portal para as Mulheres Empresárias (12) da DG Empresa e Indústria da Comissão Europeia pode ser uma ferramenta útil para partilhar boas práticas e estabelecer redes de contactos.

3.27

Podem ser criados postos de trabalho na prestação de serviços de cuidados à infância que também podem ajudar as mulheres a conciliar as responsabilidades familiares e laborais.

3.28

Os serviços de apoio e informação sobre trabalho por conta própria destinados às mulheres aliviam as pressões da imigração, podendo levar à criação de emprego tanto nos países de origem como nos países de acolhimento.

4.   O processo de Barcelona e a política europeia de vizinhança

4.1

A política europeia de vizinhança pretende fomentar a integração económica entre a UE e os seus parceiros. A dotação orçamental para os parceiros mediterrânicos na PEV para 2007-2013 aumentou em 32 % para 12 mil milhões de euros. No entanto, não prestou atenção suficiente à promoção das actividades económicas das mulheres.

4.2

Durante a reunião plenária da Assembleia Parlamentar Euromediterrânica de 16 e 17 de Março de 2007, o CESE viu-se atribuído o estatuto de observador permanente, com o direito de intervir em todas as reuniões dessa assembleia. Isso permite ao CESE promover o reforço da actividade económica feminina.

4.3

Na primeira conferência ministerial euromediterrânica sobre «Reforçar o papel das mulheres na sociedade» em Istambul, em Novembro de 2006 (13), assumiu-se o compromisso de promover o espírito empresarial das mulheres melhorando o acesso destas a instalações, financiamento, mercados, informação, formação e redes de contactos e incentivando as instituições financeiras a criar produtos adaptados às necessidades das mulheres, em particular concedendo microcréditos.

5.   A Carta Euromediterrânica para as Empresas

5.1

Na V Conferência Euromediterrânica, em Caserta (Itália), em 4 de Outubro de 2004, os ministros da Indústria aprovaram um programa de trabalho em cooperação industrial para 2005-2006. Uma das propostas referia-se ao intercâmbio de conhecimentos e experiências na educação em prol do espírito empresarial.

5.2

Por consequência, a Direcção-Geral Empresa e Indústria da Comissão Europeia lançou a Carta Euromediterrânica para as Empresas (14) que foi aprovada por nove parceiros mediterrânicos. Um dos princípios fundamentais é criar uma sociedade com espírito empresarial na região euromediterrânica que inclua os jovens e os adultos através de um sistema de ensino a todos os níveis, numa perspectiva de aprendizagem ao longo da vida. Essa Carta não refere, contudo, especificamente medidas para fazer face aos desafios colocados às mulheres empresárias.

5.3

A Carta é um instrumento eficaz na melhoria das condições para desenvolver a actividade empresarial. Todavia, na aplicação da Carta, a promoção do espírito empresarial das mulheres nunca foi um princípio fundamental nem um dos objectivos.

5.4

Embora o Programa de trabalho de cooperação industrial euromediterrânica para 2007-2008 se baseie no que já foi concretizado até ao momento e reforce as medidas para uma aplicação mais eficiente, mais uma vez não está especificamente orientado para a promoção do espírito empresarial das mulheres.

5.5

Algumas iniciativas da Comissão Europeia podem servir de exemplo de boas práticas e transferência de conhecimentos entre os países europeus e mediterrânicos (15).

6.   O papel da sociedade civil

6.1

A sociedade civil organizada desempenha um papel importante na emancipação das mulheres, na participação na esfera pública bem como na promoção das suas actividades empresariais.

6.2

Com uma forte tradição de auxiliar os mais desfavorecidos, incluindo entre outros as mulheres portadoras de deficiência e as mulheres com acesso difícil ou impossível a estabelecimentos de ensino e formação, os recursos existentes podem ser utilizados de melhor forma com a prestação de formação em competências de gestão e fornecimento de financiamento.

6.3

Através de parcerias público-privadas, as ONG e organizações socioprofissionais podem estimular eficazmente o crescimento económico (16). Outras parcerias podem oferecer uma nova gama de serviços para as actividades geradoras de rendimento.

6.4

Outros domínios em que ONG experientes e organizações socioprofissionais podem trabalhar é em formação e acreditação de forma a erradicar o fosso sexista existente na educação.

7.   O papel do CESE

7.1

O CESE tem uma função importante na garantia da participação da sociedade civil na aplicação da política euromediterrânica de integração das mulheres na vida económica e social (17).

7.2

O CESE contribuiu para o exame da questão das mulheres e o emprego através de um relatório apresentado na 21.a reunião do Comité Consultivo Misto UE-Turquia, em 13 e 14 de Julho de 2006 (18), e elaborará um relatório sobre mulheres e o espírito empresarial para a sua próxima reunião a realizar em Novembro de 2007, na Turquia.

7.3

Na declaração final da Cimeira Euromed dos Conselhos Económicos e Sociais e Instituições Similares, realizada em Liubliana, Eslovénia, de 15 a 17 de Novembro (19), os participantes comprometeram-se a avançar com as suas iniciativas para a integração das mulheres na vida económica e social, em especial desenvolvendo o espírito empresarial das mulheres.

7.4

O CESE aprova igualmente o reconhecimento pelos ministros da importância de promover o papel da sociedade civil e reforçar as suas capacidades através de maior interacção com contactos governamentais e parlamentares entre as organizações da sociedade civil, as organizações de mulheres, associações de jovens, comerciais, sindicais, empresariais e profissionais e cooperação entre as administrações nacionais, regionais e locais.

7.5

Como parte do Acordo de Barcelona, a UE lançou diversos programas, alguns dos quais dirigidos directamente à juventude euromediterrânica. O Comité apresentou um relatório de informação sobre o «Apoio aos jovens nos países parceiros mediterrânicos» onde também referia a promoção do espírito empresarial das mulheres (20).

8.   Conclusão

8.1

A Comissão Europeia deve assegurar a realização de uma avaliação de impacto das acções da política europeia de vizinhança, incluindo os programas MEDA, e incluir sistematicamente aspectos de género. O papel das mulheres no espírito empresarial na região Euromed é fundamental para responder aos desafios económicos da globalização. O programa regional da Comissão Europeia para a região do Médio Oriente e Norte de África que promove o papel das mulheres na vida económica é um passo positivo. Há que estabelecer medidas que garantam a consulta dos representantes pertinentes da sociedade civil, incluindo ONG dedicadas às mulheres, em todas as fases dos projectos (programação, aplicação, avaliação e seguimento), para concretização dos objectivos definidos.

Bruxelas, 12 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  http://ec.europa.eu/comm/external_relations/euromed/barcelona_10/docs/10th_comm_en.pdf.

(2)  http://ec.europa.eu/europeaid/index_en.htm.

(3)  http://ec.europa.eu/enterprise/enterprise_policy/ind_coop_programmes/med/doc/f1949_en.pdf.

(4)  http://www.cesie.org/cms/index.php?option=com_content&task=view&id=70&Itemid=85.

(5)  REX/222 — Relatório de informação — Apoio aos jovens nos países parceiros mediterrânicos, CESE 642/2006.

(6)  http://www.medainstitute.fi/?navi=360&lang=2.

(7)  Parecer do CESE «Promover o espírito empreendedor através do ensino e da aprendizagem», relatora: Ingrid JERNECK.

(8)  Parecer do CESE «Empregabilidade e empreendedorismo — O papel da sociedade civil, dos parceiros sociais e das instâncias regionais e locais, numa perspectiva de género», relator Luis Miguel PARIZA CASTAÑOS.

(9)  Base de dados central do Banco Mundial (Abril de 2006).

(10)  Hijab, Nadia, 2001: «Laws, Regulations and Practices impeding Women's Economic Participation in the Mena Region», relatório paralelo apresentado ao Banco Mundial em Abril.

(11)  «Economic Empowerment of Rural Palestinian Women» — programa MEDA, EuropeAid — Janeiro de 2006-Dezembro de 2007 — Um projecto conjunto de desenvolvimento palestiniano, israelita e europeu.

(12)  http://ec.europa.eu/enterprise/entrepreneurship/craft/craft-women/womenentr_portal.htm.

(13)  http://ec.europa.eu/comm/external_relations/euromed/women/docs/conclusions_1106.pdf.

(14)  http://ec.europa.eu/enterprise/enterprise_policy/ind_coop_programmes/med/doc/f1949_en.pdf.

(15)  http://ec.europa.eu/enterprise/entrepreneurship/craft/craft-women/women-dgentr-active.

http://ec.europa.eu/enterprise/entrepreneurship/craft/craft-women/database-women.htm.

(16)  file://E:\PPP for women entrepreneurship.htm 8.3.2007.

(17)  «O papel dos órgãos consultivos e das organizações socioprofissionais na aplicação dos acordos de associação e no âmbito da política europeia de vizinhança».

(18)  Comité consultivo misto UE-Turquia.

(19)  http://www.europarl.europa.eu/intcoop/empa/home/final_declaration_ljubljana_112006_en.pdf.

(20)  Relatório de informação — Apoio aos jovens nos países parceiros mediterrânicos.