ISSN 1725-2482

Jornal Oficial

da União Europeia

C 318

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Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

49.o ano
23 de Dezembro de 2006


Número de informação

Índice

Página

 

II   Actos preparatórios

 

Comité Económico e Social Europeu

 

429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006

2006/C 318/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Desenvolvimento sustentável, motor das mutações industriais

1

2006/C 318/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre A governação territorial das mutações industriais: o papel dos parceiros sociais e o contributo do Programa para a Competitividade e a Inovação (PCI)

12

2006/C 318/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Contributo da aprendizagem ao longo da vida baseada nas tecnologias da informação para a competitividade europeia, as mutações industriais e o desenvolvimento do capital social

20

2006/C 318/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Os serviços e a indústria transformadora da UE: Interacções e impactos no emprego, na competitividade e na produtividade

26

2006/C 318/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece o Fundo Europeu de Ajustamento à GlobalizaçãoCOM(2006) 91 final — 2006/0033 (COD)

38

2006/C 318/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao exercício do direito de voto pelos accionistas de sociedades com sede social num Estado-Membro e cujos valores mobiliários estejam admitidos à negociação num mercado regulamentado e que altera a Directiva 2004/109/CECOM(2005) 685 final — 2005/0265 (COD)

42

2006/C 318/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece regras comuns para o fornecimento de informação de base sobre Paridades de Poder de Compra e para o respectivo cálculo e divulgação (apresentada pela Comissão)COM(2006) 135 final — 2006/0042 (COD)

45

2006/C 318/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a um quadro sem papel para as alfândegas e o comércio(COM(2005) 609 final — 2005/0247 (COD))

47

2006/C 318/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Aplicar o Programa Comunitário de Lisboa: Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos serviços de pagamento no mercado interno e que altera as Directivas 97/7/CE, 2000/12/CE e 2002/65/CECOM(2005) 603 final — 2005/0245 (COD)

51

2006/C 318/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (Roma I)COM(2005) 650 final — 2005/0261 (COD)

56

2006/C 318/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à homologação dos veículos a motor no que respeita às emissões e ao acesso a informação sobre a reparação de veículos, que altera a Directiva 72/306/CEE e a Directiva …/…/CECOM(2005) 683 final — 2005/0282 (COD)

62

2006/C 318/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Turismo Social na Europa

67

2006/C 318/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às estatísticas estruturais das empresas COM(2006) 66 final — 2006/0020 (COD)

78

2006/C 318/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 91/477/CEE do Conselho relativa ao controlo da aquisição e da detenção de armasCOM(2006) 93 final — 2006/0031 (COD)

83

2006/C 318/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu relativa a uma estratégia temática sobre ambiente urbanoCOM(2005) 718 final — SEC(2006) 16

86

2006/C 318/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Perspectivas de futuro da agricultura nas zonas com desvantagens particulares de carácter natural (regiões de montanha, insulares e ultraperiféricas)

93

2006/C 318/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Responder ao desafio das alterações climáticas — O papel da sociedade civil

102

2006/C 318/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Destruição de cadáveres de animais e utilização de subprodutos animais

109

2006/C 318/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Conselho que prevê medidas especiais tendo em vista favorecer a criação do bicho-da-seda (versão codificada) COM(2006) 4 final — 2004/0003 CNS

114

2006/C 318/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 76/769/CEE do Conselho relativa à limitação da colocação no mercado de certos instrumentos de medição contendo mercúrioCOM(2006) 69 final — 2006/0018 (COD)

115

2006/C 318/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Melhoria da situação económica no sector das pescasCOM(2006) 103 final

117

2006/C 318/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Conselho relativo à glicose e à lactose (Versão Codificada)COM(2006) 116 final — 2006/0038 CNS

122

2006/C 318/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre A sociedade civil na Bielorússia

123

2006/C 318/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre A imigração na UE e as políticas de integração: Colaboração entre os governos regionais e locais e as organizações da sociedade civil

128

2006/C 318/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o tema Os conselhos de empresa europeus: um novo papel na promoção da integração europeia

137

2006/C 318/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Participação da sociedade civil na luta contra a criminalidade organizada e o terrorismo

147

2006/C 318/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Qualidade da vida activa, produtividade e emprego no contexto da globalização e dos desafios demográficos

157

2006/C 318/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre A cidadania europeia e os meios de lhe conferir visibilidade e efectividade

163

2006/C 318/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010COM(2006) 92 final

173

2006/C 318/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Os corredores pan-europeus de transporte 2004-2006

180

2006/C 318/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O aprovisionamento energético da UE: estratégia para uma combinação de energias optimizada

185

2006/C 318/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao cumprimento dos deveres do Estado de bandeira — COM(2005) 586 final — 2005/0236 (COD), a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às regras comuns para as organizações de vistoria e inspecção dos navios e para as actividades relevantes das administrações marítimas — COM(2005) 587 final — 2005/237 (COD), a Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à inspecção de navios pelo Estado do porto — COM(2005) 588 final — 2005/0238 (COD), a Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 2002/59/CE relativa à instituição de um sistema comunitário de acompanhamento e de informação do tráfego de navios — COM(2005) 589 final — 2005/0239 (COD), a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece os princípios fundamentais que regem a investigação de acidentes no sector do transporte marítimo e altera as Directivas 1999/35/CE e 2002/59/CE — COM(2005) 590 final — 2005/240 (COD), a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à responsabilidade das transportadoras de passageiros por mar e por vias navegáveis interiores em caso de acidente — COM(2005) 592 final – 2005/0241 (COD) a Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à responsabilidade civil e às garantias financeiras dos proprietários de navios — COM(2005) 593 final — 2005/0242 (COD)

195

2006/C 318/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 89/552/CEE do Conselho relativa à coordenação de certas disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros relativas ao exercício de actividades de radiodifusão televisivaCOM(2005) 646 final — 2005/0260 (COD).

202

2006/C 318/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Programa GALILEO: concretizar a criação da Autoridade Europeia Supervisora

210

2006/C 318/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão sobre a promoção do transporte por vias navegáveis interiores NAIADES Programa de acção europeu integrado para o transporte por vias navegáveis interiores COM(2006) 6 final

218

2006/C 318/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Pôr fim aos desníveis em matéria de banda larga COM(2006) 129 final

222

2006/C 318/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 417/2002 relativo à introdução acelerada dos requisitos de construção em casco duplo ou equivalente para os navios petroleiros de casco simples e que revoga o Regulamento (CE) n.o 2978/94 do ConselhoCOM(2006) 111 final — 2006/0046 (COD)

229

PT

 


II Actos preparatórios

Comité Económico e Social Europeu

429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006

23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Desenvolvimento sustentável, motor das mutações industriais»

(2006/C 318/01)

Em 14 de Julho de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre o tema «Desenvolvimento sustentável, motor das mutações industriais».

A Comissão Consultiva das Mutações Industriais, responsável pela preparação dos correspondentes trabalhos do Comité, adoptou o seu parecer em 31 de Agosto de 2006, do qual foi relator J. Siecker e co-relator Činčera.

Na 429.a reunião plenária, realizada em 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 98 votos a favor, 11 votos contra e 11 abstenções, o seguinte parecer:

Primeira parte: Síntese das conclusões e das recomendações do CESE

A.

Em Janeiro de 2003, o CESE adoptou um parecer de iniciativa sobre «As mutações industriais na Europa: balanço e perspectivasUma abordagem global». A finalidade deste parecer era dar uma panorâmica dos aspectos e tendências mais prementes das mutações industriais e pôr em evidência o papel da CCMI e os seus trabalhos futuros. Entre os domínios de competência confiados à CCMI, neste contexto, estão os seguintes:

«analisar a mutação industrial e as suas causas do ponto de vista económico, social, territorial e ambiental, bem como avaliar o impacto da mutação industrial numa perspectiva sectorial, empresarial, laboral, territorial e ambiental;

procurar abordagens comuns com vista a fomentar o desenvolvimento sustentável […]».

O parecer supramencionado salientava, também, a necessidade de combinar «a competitividade com o desenvolvimento sustentável e a coesão social e territorial» para acompanhar a Estratégia de Lisboa. Além disso, propunha o parecer um conceito operacional de «mutação industrial» que englobava a evolução permanente da empresa e a interacção desta com o seu meio envolvente.

Até agora, a CCMI tem-se dedicado, principalmente, a avaliar o impacte da mutação industrial nos diversos sectores, empresas, trabalhadores, territórios e no ambiente. A finalidade do presente parecer de iniciativa é examinar o modo como o desenvolvimento sustentável pode ser um elemento catalisador das mutações industriais.

B.

A crer nas ilações desse mesmo parecer, as mutações no sector industrial europeu têm sido frequentemente abordadas sob o ponto de vista da reestruturação, quando se trata de um conceito bastante mais dinâmico. Por outro lado, o mundo empresarial está intimamente ligado ao meio político e social europeu em que vai evoluindo e que, por seu turno, também influencia os processos de mutação industrial. As mutações industriais realizam-se principalmente de dois modos: adaptação progressiva e transformações radicais. Ora, o propósito deste parecer de iniciativa é analisar até que ponto o desenvolvimento sustentável definido no Relatório Brundtland (um desenvolvimento que responde às necessidades de hoje sem pôr em risco a satisfação das necessidades das gerações futuras) poderá agir como catalisador de mutações industriais graduais e pró-activas.

C.

O parecer dá, no essencial, exemplos do sector da energia e sectores conexos, mas os processos aqui descritos podem ser aplicados a outros sectores. As razões para esta selecção de sectores são várias:

a definição do Relatório Brundtland de desenvolvimento sustentável torna necessário passar a utilizar fontes de energia renováveis;

a energia é um sector transversal aos demais;

o que se aprender com a introdução de novas tecnologias neste domínio pode ser extrapolado para outros sectores;

os 25 Estados-Membros importam, actualmente, cerca de 50 % do petróleo e do gás de que necessitam; estes valores podem aumentar para 70 % em 2030, momento em que, segundo prognósticos da Comissão, a maior parte dos fornecedores serão originários de «zonas geopoliticamente instáveis».

D.

O momento em que uma certa tecnologia passa a estar disponível é determinado pela I&D. É, contudo, o mercado que determina o momento da sua aplicação efectiva. Ora, o intervalo entre estes dois momentos pode ser também influenciado pela política. Mercê de uma combinação equilibrada de medidas políticas — subsídios, promoção, medidas fiscais –, as empresas da Suécia e do Japão deram início, numa fase ainda precoce, ao desenvolvimento tecnológico de bombas de calor geotérmicas e de colectores solares. Este foi justamente um dos factores que permitiram a estes países conquistar uma posição de liderança no mercado mundial.

E.

O CESE reafirma que os três pilares da estratégia de Lisboa têm igual importância. No entanto, é frequente afirmar que apenas haverá espaço para os interesses ecológicos e sociais quando se puder falar de uma economia saudável e em crescimento. É uma explicação demasiado simplista da estratégia como o contrário também o é. Não há dúvida de que uma economia saudável e em crescimento jamais singrará num ambiente degradado ou numa sociedade fendida por dissensões sociais. O Comité saúda as acções empreendidas neste âmbito descritas no Anexo 2 da comunicação da Comissão sobre o «Reexame da Estratégia em favor do Desenvolvimento Sustentável — Uma plataforma de acção» (1).

F.

A sustentabilidade não é uma opção entre várias, mas antes a única via possível para assegurar um futuro viável. A «sustentabilidade» é um conceito global e, por isso, não se restringe ao ambiente, mas inclui também questões de sustentabilidade económica e social. A continuidade de uma dada empresa é uma forma de sustentabilidade económica, cuja melhor garantia é manter uma margem de lucro suficiente. A Europa poderá contribuir para isso reforçando a competitividade através da inovação e adoptando uma política incisiva que estimule a investigação e o desenvolvimento, graças a uma combinação de medidas com objectivos precisos (ver os exemplos da Suécia e do Japão).

G.

Sustentabilidade social é oferecer às pessoas uma vida saudável e activa capaz de gerar um certo rendimento e garantindo, simultaneamente, um nível razoável de segurança social àqueles que não conseguem um tal objectivo. O CESE está convicto de que a Europa poderá dar o seu contributo ao empenhar-se por uma sociedade que permita às pessoas manterem o nível das suas aptidões profissionais e lhes ofereça um emprego digno num ambiente de trabalho seguro e saudável e uma situação em que há espaço para os direitos dos trabalhadores e para um diálogo social construtivo.

H.

A eco-indústria e os sectores conexos, em que a Europa ocupa uma posição bastante sólida, oferece muitas oportunidades para o crescimento económico. Para conservar e desenvolver as suas potencialidades e alcançar uma posição semelhante noutros sectores, a Europa terá de ser, na opinião do CESE, mais ambiciosa.

I.

Uma política industrial norteada pelo desenvolvimento sustentável pode estimular a competitividade de toda a economia europeia, não só nos novos sectores emergentes, como também nos sectores industriais tradicionais. O CESE espera que a Comissão Europeia apoie esta política. Os exemplos enunciados neste parecer mostram que um sistema de apoio bem pensado e bem aplicado (tributação fiscal combinada, tarifas de abastecimento, promoção e regulação), a par da introdução de novas tecnologias ambientais, poderá contribuir para criar um mercado para estas tecnologias apto a desenvolver-se ulteriormente sem qualquer apoio. Todo e qualquer mecanismo de apoio tem de ser claramente degressivo, pois o custo dos auxílios estatais não deverá restringir a competitividade internacional de outros sectores.

J.

O CESE adverte que subsídios e incentivos nem sempre são eficazes e poderão implicar custos financeiros substanciais com um efeito económico reduzido quando usados indevidamente. Subsídios e regulamentação deveriam servir apenas para ajudar a lançar e a desenvolver inicialmente o mercado até a tecnologia estar suficientemente avançada para permitir a sua sobrevivência sem qualquer apoio. Os factores fundamentais para um apoio bem sucedido são:

duração adequada;

especificação correcta;

degressivo no tempo;

anunciado com bastante antecedência;

cooperação entre as autoridades públicas e o sector privado.

K.

O desenvolvimento sustentável tem uma dimensão mundial e não deverá, por isso, cingir-se ao contexto europeu. A política europeia de sustentabilidade deveria munir-se de instrumentos capazes de prevenir a deslocalização de postos de trabalho para outras regiões. Para garantir condições de concorrência equitativas, é necessário actuar internamente e externamente à UE. Internamente à UE, devem ser instituídos instrumentos apropriados para assegurar que os custos sociais e ambientais resultantes de métodos de produção não sustentáveis sejam repercutidos no preço dos bens, com o fito de promover a linha geral do relatório da Comissão Mundial sobre a Dimensão Social da Globalização (CMDSG) que defende a coerência entre as políticas da OIT, da OMC, do FMI e do Banco Mundial (ver CESE 252/2005). Externamente, a União Europeia deverá empenhar-se em fóruns internacionais pertinentes (em particular, na OMC) pela inclusão de preocupações não comerciais, como normas sociais e ambientais, nos acordos comerciais internacionais, para permitir aos concorrentes da Europa a elevação do nível da sua política de sustentabilidade. Países como os Estados Unidos, a Índia e a China terão uma vantagem económica desleal em relação à Europa, enquanto não se vincularem aos objectivos de redução das emissões de CO2 do Protocolo de Quioto. Esses acordos deveriam ser aplicados mundialmente, já que o comércio apenas poderá ser realmente livre se obedecer a princípios de equidade.

Segunda parte: Argumentos a favor do parecer

1.   Panorâmica

1.1

A nossa economia baseia-se, actualmente, na disponibilidade de energia e de matérias-primas baratas. Mas as reservas são finitas e é esse um dos motivos por que ficarão cada vez mais caras. É indispensável uma mudança estrutural e tecnológica, onde tal for possível, e cabe à Europa promover essa mudança para ajudar a indústria europeia a enfrentar com êxito esse desafio. Os sectores em que é elevado o consumo de energia e matérias-primas terão de optar, futuramente, por uma produção mais sustentável para refrear o esgotamento dos recursos naturais. E são sectores de que é impossível prescindir no futuro, já que a produção de materiais de base e de semi-manufacturados está na base do valor industrial.

1.2

Os sectores europeus energia-intensivos que produzem de modo sustentável e concorrem a nível internacional não deverão ser expelidos do mercado por concorrentes exteriores à UE que utilizam métodos de produção menos sustentáveis. Para impedir que isto ocorra, é preciso criar condições equitativas de concorrência para estes sectores, através da cooperação entre a sociedade civil e os governos.

1.3

O maior desafio que temos diante de nós é o desenvolvimento de uma sociedade sustentável que consiga manter o actual nível de bem-estar e, ao mesmo tempo, esteja à altura de neutralizar os efeitos colaterais negativos dos actuais padrões de consumo. Uma da principais premissas para tal é procurar satisfazer de outro modo as nossas necessidades de energia e adoptar uma forma de produção e de consumo diversa da actual.

1.4

É inelutável o imperativo de transitar gradualmente para um modelo de sociedade mais sustentável. São múltiplas as razões que estão na base desta exigência. Os especialistas divergem quanto ao período de tempo em que os combustíveis continuarão disponíveis a um preço razoável, mas todos concordam que estes serão cada vez mais raros e caros. Além disso, e devido aos nossos hábitos de consumo, enfrentamos uma das maiores ameaças do nosso tempo: as alterações climáticas.

1.5

Teoricamente, a melhor maneira de suster este processo seria deixar de queimar combustíveis fósseis como fazemos agora. Mas uma solução a curto prazo é tanto política como economicamente impraticável. Isso significa que teremos de buscar novas soluções para pôr termo a esta situação insustentável. Algo terá de mudar, se não for tão depressa como desejaríamos, pelo menos que o seja o mais brevemente possível.

1.6

Com a aplicação do modelo «Trias Energetica» (2), em que é estimulada ao longo de três fases a utilização eficaz da energia, poderia ser, a curto prazo, o primeiro passo para um consumo e uma produção sustentáveis. Estas fases são:

reduzir a procura de energia através de um consumo mais racional,

utilizar dentro do possível fontes de energia sustentáveis e renováveis e

aplicar tecnologias eficazes que permitam a utilização mais limpa dos combustíveis fósseis remanescentes.

1.7

É necessário adoptar uma série de medidas para concretizar estas três fases e assegurar a transição para uma produção industrial sustentável. Estas medidas deverão ser fruto de uma ponderação económica e estratégica. Nesta ponderação surgirão inevitavelmente momentos em que será preciso fazer escolhas entre interesses antagónicos. Mas não se deve fugir a este tipo de conflitos. Há, sem dúvida, situações em que todas as partes ficam a lucrar. A política deveria procurar sempre criá-las, mas pode ser uma empresa muito difícil, na prática. Assim sendo, é forçoso optar em vários pontos entre oportunidades de mudança sustentáveis e a defesa dos interesses reinantes, tendo em conta a ascensão e o declínio de um sector em relação a outro. Há que abordar e tornar transparentes os interesses antagónicos em jogo.

1.8

O conceito de sustentabilidade determina que os aspectos económicos, ambientais e sociais do desenvolvimento da sociedade europeia sejam considerados igualmente importantes. O presente parecer:

concentrar-se-á primordialmente nas fontes de energia renováveis e nas vias para conseguir uma utilização racional da energia e das matérias primas (capítulos 2 e 3);

deter-se-á nas oportunidades de desenvolvimento sustentável num conjunto de sectores (capítulo 4);

ocupar-se-á de alguns aspectos sociais (capítulo 5).

2.   Energias renováveis

2.1   Introdução

2.1.1

A Terra capta do Sol três milhões de exajoules de energia ao ano. As reservas totais de combustíveis fósseis ascendem a 300.000 exajoules, ou seja, 10 % desta irradiação anual. O consumo total anual de energia é de 400 exajoule. Os três milhões de exajoules captados estão disponíveis em forma de energia hidroeléctrica (90 exajoules), de energia eólica (630 exajoules) e de biomassa (1.250 exajoules). O resto está disponível em forma de energia solar (3). Como se vê, há fontes de energia renováveis suficientes para satisfazer as nossas necessidades. O problema é a sua exploração.

2.1.2

Uma vez que as fontes de energia renováveis não conseguem satisfazer, a curto prazo, a procura crescente de energia, devido aos elevados custos que implicam e à falta de tecnologia adequada, é preciso recorrer a outras fontes de energia. Há potencial para os combustíveis fósseis serem utilizados igualmente de uma forma compatível com o ambiente, por exemplo, se se extrair e armazenar em seguida o dióxido de carbono, impedindo que se liberte para a atmosfera. A tecnologia necessária para reter e armazenar o dióxido de carbono está em pleno desenvolvimento: cerca de uma dúzia de instalaçõespiloto estão já em fase de concepção ou de construção na Europa, América do Norte e China. Espera-se que o uso desta tecnologia comece a dar os seus frutos já entre 2015 e 2020.

2.1.3

É crucial a duração das modalidades de apoio a fontes de energia renováveis, uma vez que a sua suspensão prematura poderá prejudicar a indústria emergente. Mas o seu prolongamento também não é eficaz. Regra geral, o apoio pode ser retirado progressivamente, à medida que os preços da tecnologia forem diminuindo graças à I&D e às economias de escala. É igualmente essencial especificar bem as modalidades de apoio. Importa, por último, comunicá-las com antecedência para as empresas terem tempo de preparar-se para as novas condições de mercado.

2.1.4

O debate sobre a energia nuclear é cada vez mais pertinente, conforme demonstram o Livro Verde «Estratégia europeia para uma energia sustentável, competitiva e segura» (4) e as Conclusões do Conselho Europeu de Março de 2006 neste capítulo. Em certos países há uma maioria a favor da energia nuclear, enquanto noutros a maioria da população é contra, sobretudo devido ao problema dos resíduos (5). Não obstante, a energia nuclear poderá ser indispensável ainda por muito tempo, para fazer face à procura crescente de energia. Isto porque se trata de uma fonte de energia que não liberta emissões e produz uma quantidade de resíduos relativamente reduzida em comparação com a quantidade de energia gerada. A longo prazo, talvez a fusão nuclear seja uma solução para os inconvenientes associados habitualmente à cisão nuclear.

2.1.5

Refira-se que as fontes de energia hidroeléctricas não são objecto de um ponto específico, uma vez que esta tecnologia (à excepção da energia das marés) é considerada plenamente desenvolvida e operacional. Mas não se pretende com isso retirar-lhe, de modo algum, a sua importância para a sustentabilidade.

2.2   Biomassa

2.2.1

A biomassa é todo o material orgânico proveniente de plantas e árvores criadas propositadamente para fins energéticos. Para o efeito, são utilizadas plantas de crescimento rápido com um elevado rendimento por hectare. Também são utilizados subprodutos da agricultura, com especial ênfase nos alimentos. É, além disso, possível gerar fluxos de biomassa a partir de produtos residuais, como os derivados do cultivo de plantas e da sua manutenção e dos resíduos domésticos e provenientes da indústria e das empresas em geral. Estão neste caso os restos de legumes, de fruta, de jardinagem, resíduos de madeira, estrume, lamas, serrim e cascas de cacau.

2.2.2

A biomassa pode ser utilizada para substituir (parcialmente) os combustíveis fósseis. Actualmente, o consumo deste tipo de energia é de 400 exajoules. A disponibilidade anual da energia proveniente da biomassa é de 1.250 exajoules. Mas é extemporâneo pensar numa transição imediata. A partir da tecnologia disponível, é possível neste momento gerar 120 extrajoules de energia a partir da biomassa. Hoje o consumo mundial de energia da biomassa é de 50 exajoules (6). É, portanto, possível a curto prazo um crescimento limitado da utilização de biomassa para combustíveis, mas são necessários novos avanços tecnológicos para explorar as potencialidades existentes.

2.2.3

Há uma série de iniciativas que deram já resultados muito promissores. Nos últimos dez anos, o emprego da biomassa no aquecimento urbano aumentou seis vezes na Áustria e oito vezes na Suécia. Nos Estados Unidos, mais de 8.000 MW da capacidade de geração instalada tem por base a biomassa. Na França, 5 % do calor utilizado para aquecimento é produzido a partir da biomassa. Na Finlândia, a bioenergia já contribui com uma percentagem de 18 % para a produção total de energia, havendo o propósito de aumentá-la até 28 % em 2005. No Brasil é produzido etanol em larga escala para ser utilizado como combustível em automóveis, sendo actualmente responsável por cerca de 40 % do combustível não diesel (7).

2.2.4

O desenvolvimento da biomassa é fundamental sob diversos aspectos:

a.

Política ambiental: O ciclo de vida da biomassa enquanto matéria renovável tem um efeito neutro nas emissões de CO2 e SO2. Também graças à utilização em larga escala de biomassa, é possível encerrar o ciclo de minerais e de azoto.

b.

Política agrícola: Na Europa há terras que foram retiradas da exploração. Estima-se que será possível destinar 200 milhões de hectares de terras agrícolas e 10 a 20 milhões de hectares de terras pouco produtivas à produção de biomassa como fonte de matérias-primas e energia. A necessidade de produção agrícola mais extensiva deverá ter, como pano de fundo, a necessidade de preservar a riqueza da paisagem europeia, atingir o objectivo da UE de suster o declínio da biodiversidade e reservar uma área suficiente para a protecção da natureza. Será preciso ter apropriadamente em conta o equilíbrio em todos estes domínios.

c.

Política social: Em termos gerais, serão criados 11 novos postos de trabalho por cada megawatt de capacidade de produção instalada. Se na Europa a utilização de biomassa como fonte de energia correspondia em 2003 a uns 4 % das necessidades de energia, um aumento de cerca de 10 % em 2010 (8) poderá criar 160.000 empregos.

d.

Política regional: A biomassa pode ser utilizada como fonte de energia descentralizada, cuja conversão se situa na proximidade da produção através de centrais eléctricas de pequenas dimensões, o que permitirá a estabilidade social no plano regional, especialmente nas regiões que se ressentem de um certo atraso económico.

e.

Necessidade de produzir energia ecológica: há uma directiva europeia que exige aos produtores de electricidade europeus que uma percentagem da electricidade por eles produzida provenha de fontes de energia renováveis. Esta percentagem varia de país para país, mas está a subir a um ritmo regular. Estão previstas sanções (ou a retirada de subsídios) caso as percentagens necessárias não sejam atingidas. É evidente que a produção de energia a partir de biomassa, por si só ou em combustão conjunta com o carvão, dará um importante contributo para que se atinjam as metas estipuladas para a energia ecológica.

2.3   Energia eólica

2.3.1

No mundo inteiro, o potencial teórico de energia eólica é mais do dobro das necessidades de electricidade previstas até 2020. Este potencial e a posição concorrencial cada vez mais favorável, em resultado dos avanços tecnológicos constantes, transforma a energia eólica num substituto fundamental dos combustíveis fósseis. Em virtude do carácter flutuante da oferta, a energia eólica nunca conseguirá prover inteiramente às necessidades existentes.

2.3.2

Nas últimas dezenas de anos, a capacidade eólica instalada aumentou de uma forma espectacular. A capacidade das turbinas comerciais cresceu dos 10 kilowatts (rotor com um diâmetro de 5 metros) para mais de 4.500 kilowatts (rotor com um diâmetro de mais de 120 metros) (9). Nos últimos oito anos, a capacidade eólica instalada tem sofrido um aumento anual superior a 30 % (10). A crer nas projecções da Associação Europeia da Energia Eólica (EWEA), o total da capacidade eólica em 2020 será suficiente para cobrir 12 % das necessidades de electricidade. Tal implica um aumento da capacidade eólica de 31 gigawatts, em 2002, para 1.260 gigawatts em 2020, ou seja, um crescimento anual de 23 %. O mercado de energia eólica é liderado pelo Reino Unido, a Dinamarca e a Alemanha, que são os seus maiores exportadores, sendo a China, a Índia e o Brasil os principais mercados de exportação. A situação na China, onde a indústria mecânica associada à energia eólica está a crescer rapidamente, evoluirá certamente nos próximos anos. Comparando com 2004, verifica-se que o número de produtores chineses cresceu uns 60 % em 2005. Isso significa que a indústria de maquinaria eólica na Europa terá, porventura, diante de si o mesmo cenário da indústria de painéis solares e perderá uma importante fatia de mercado a favor dos concorrentes chineses.

2.3.3

O sector da energia eólica depende ainda, em parte, economicamente de várias medidas de apoio. A mais importante é a tarifa que os produtores podem obter se venderem energia à rede desde que garantam um nível de preços estável nos próximos dez a vinte anos. Graças a estas medidas, o sector da energia eólica é um segmento que tem crescido velozmente em alguns Estados-Membros. O inconveniente é o surgimento de parques de energia eólica de grandes dimensões e centralizados com lucros gigantescos em vez de uma rede de malha fina de centrais de energia eólica de pequenas dimensões e descentralizadas. A opinião pública é cada vez mais contrária a este desenvolvimento em grande escala. É evidente que, mais tarde ou mais cedo, a energia eólica terá de sobreviver autonomamente sem subsídios e tarifas de abastecimento.

2.3.4

Para reforçar a posição da energia eólica, será necessário intensificar a investigação e o desenvolvimento, com o fito de melhorar a posição concorrencial da energia eólica. É igualmente fundamental seguir atentamente as orientações jurídicas e não perder de vista os objectivos políticos. Os desafios mais importantes são, designadamente, a exploração de novos locais para parques eólicos no mar e a supressão de incertezas a respeito da viabilidade da energia eólica.

2.3.5

O desenvolvimento da energia eólica é fundamental sob diversos aspectos:

a.

A energia eólica é uma forma de produção de energia compatível com o ambiente, já que não implica emissões de CO2 nem de quaisquer outros poluentes. A oferta de energia eólica é flutuante mas muito considerável.

b.

Em 2002, a energia eólica contribuiu para o emprego com 20 postos de trabalho por megawatt de capacidade instalada. No entanto, o que se tem aprendido com a concepção, o fabrico e a instalação das turbinas não conduziu a um aumento proporcional do emprego que, segundo se prevê, sofrerá uma quebra em 2020 para 9,8 empregos por megawatt de capacidade instalada. Tal significa que as possibilidades de emprego na indústria eólica aumentarão de cerca de 114.000 postos de trabalho em 2001 para uns 1,47 milhões em 2020 (11).

c.

Política regional: dada a existência de modalidades de apoio, a energia eólica está a evoluir para parques energéticos de grandes dimensões e centralizados, muito atraentes para os investidores graças aos lucros que retiram desta actividade. Em contrapartida, a opinião pública tem-se oposto a esta evolução e manifestado a sua preferência por redes de malha fina de centrais de energia eólica de pequenas dimensões e descentralizadas.

2.4   Energia solar

2.4.1

Pode-se utilizar a energia solar para duas finalidades: para o aquecimento de espaços específicos e da água e para a produção de electricidade (12). Os sistemas de energia solar são relativamente simples e baratos e já funcionam plenamente em muitos países.

2.4.2

O motivo principal para aspirar à utilização em grande escala da energia solar é que se trata de uma fonte inesgotável. Ao nível mundial, tem enormes potencialidades e é perfeitamente compatível com o ambiente, desde que bem concebida e construída.

2.4.3

Pode-se utilizar energia solar praticamente em todos os lugares da Terra e de maneiras múltiplas: desde sistemas de dimensões muito reduzidas em lugares isolados com painéis colocados nos telhados das casas até centrais solares de grandes dimensões.

2.4.4

Os sistemas solares térmicos encontram-se já muito divulgados. O mercado mais importante para estes sistemas é a China, sobretudo porque escasseia nas zonas rurais a infra-estrutura de abastecimento de gás e electricidade. Em tais casos os sistemas solares térmicos são a solução mais eficaz para a produção de energia. Outro mercado fundamental é a Turquia. À escala mundial, a venda de colectores solares sofreu entre 2001 e 2004 um aumento de 10 % a 15 %. A China absorveu 78 % da produção mundial total e a Turquia 5,5 %.

2.4.5

Na Europa, são a Alemanha, a Áustria, a Espanha e a Grécia os principais mercados de sistemas de energia solar. Os governos da Alemanha e da Áustria apoiam financeiramente a instalação desses sistemas. Na Espanha é mesmo obrigatória em várias regiões a sua instalação nos edifícios construídos de raiz. Graças a estas medidas de apoio, a Alemanha e a Áustria são de longe os maiores produtores de sistemas solares térmicos da Europa e respondem por 75 % da produção europeia. Mas esta percentagem não é nada em comparação com a produção deste tipo de sistemas na China. Enquanto a Europa produziu 0,8 milhões de m2, a China chegou aos 12 milhões de m2. Essa diferença deve-se, sobretudo, ao facto de o governo chinês ter reconhecido desde muito cedo a importância da energia solar e ter estimulado a construção de sistemas solares e incluído uma série de medidas de incentivo nos seus planos económicos quinquenais.

2.4.6

Não obstante o seu carácter inesgotável, a energia solar ainda cobre apenas uma parcela ínfima das nossas necessidades. Tal deve-se ao facto de os custos de geração continuarem a ser muito mais elevados do que os custos da electricidade produzida por centrais alimentadas a gás ou a carvão. Para romper o círculo vicioso de receitas baixas e preços altos, é necessário utilizar o mais possível a energia solar para gerar importantes economias de escala na produção e na instalação dos sistemas. Só nessa altura será realmente possível renovar e melhorar a tecnologia indispensável.

2.4.7

Além disso, a produção de energia com unidades relativamente pequenas de rendimento variável (dependente do sol) requer uma mudança de atitude. A transição para a energia solar apenas será possível a médio prazo, mas isso não retira a urgência de incentivos para o sector.

2.4.8

Embora o mercado de energia solar fotovoltaica cresça a um ritmo acelerado, só há de facto três grandes mercados: o Japão, a Alemanha e a Califórnia. Estes três mercados são responsáveis por 80 % da produção de sistemas de energia solar, graças a subsídios avultados e ao preço reduzido que os particulares têm de pagar pela electricidade gerada desta forma. Em 2004, foi produzida no mundo inteiro uma capacidade total de 1.150 megawatts através de células solares fotovoltaicas. Somando este montante aos mais de 3.000 megawatts já instalados no final de 2003, a capacidade total em 2005 reflecte um crescimento de cerca de 4.500 megawatts.

2.4.9

O mercado japonês surgiu em 1994 mercê de um programa de incentivos em que os subsídios atribuídos atingiam os 50 %. Todos os anos era descontada uma percentagem de 5 % e 2004 foi o último ano do programa com direito a um subsídio de 5 %. Uma vez que este programa fez aumentar significativamente a procura, a economia japonesa tirou partido das economias de escala: a redução dos preços de 5 % ao ano manteve estável o preço ao consumidor. Não obstante o subsídio ter cessado, o mercado continua a crescer uns 20 % ao ano. A procura estável permitiu às empresas japonesas investir em I&D e em novas técnicas de produção. Com tudo isto, o Japão tem actualmente nas suas mãos uns 53 % do mercado mundial.

2.4.10

A Alemanha deu início a um processo semelhante, mas só em 1999, ou seja, com cinco anos de atraso. Uma combinação de empréstimos a juros baixos, de subsídios e de preços estáveis para a venda de electricidade fez crescer rapidamente o mercado de energia fotovoltaica na Alemanha. Já em 2001 a Alemanha ultrapassava os Estados Unidos em capacidade instalada. Os produtores locais desenvolveram-se entretanto e a Alemanha é hoje responsável por metade da produção europeia (13 % da produção mundial). O início de um novo programa de apoio em 2004, com a garantia de preços de compra estáveis nos vinte anos seguintes, imprimiu um novo ímpeto ao mercado alemão, que registou em 2004 e 2005 um crescimento aproximado de 40 %. Esta procura interna dá às empresas alemãs a hipótese de se desenvolverem e de passarem a produzir para os mercados de exportação quando o mercado nacional estiver saturado.

2.4.11

O desenvolvimento da energia solar é fundamental sob diversos aspectos:

a.

Política ambiental: A energia solar é uma forma de produção de energia limpa sem emissões de CO2 nem de quaisquer outros poluentes. O seu potencial é gigantesco, já que a Terra capta anualmente três milhões de exajoules de energia proveniente do sol. A título de comparação, as reservas totais de combustíveis fósseis são estimadas em 300.000 exajoules.

b.

Política social: o desenvolvimento da energia solar criará empregos nos sectores do design, da promoção, da produção e da instalação de sistemas destinados à sua geração. Em contrapartida, haverá uma perda de empregos se forem necessárias menos centrais de grandes dimensões e centralizadas.

c.

Política regional: a energia solar-térmica pode ser utilizada em zonas periféricas e pobres onde não há infra-estruturas para a distribuição de energia. É um solução barata para o aquecimento e para o fornecimento de água quente.

2.5   Energia geotérmica

2.5.1

A energia geotérmica pode ser usada para o aquecimento e o arrefecimento de edifícios por meio de bombas térmicas. Estas bombas apenas utilizam uma fracção da quantidade de gás e de electricidade exigida por sistemas convencionais de ar condicionado. A energia para aquecer (ou arrefecer) é retirada do espaço envolvente (ar, água ou terra) (13).

2.5.2

Os principais mercados de bombas térmicas são os Estados Unidos, o Japão e a Suécia que, no seu conjunto, têm por sua conta 76 % da capacidade total instalada. Seguem-se a China, a França, a Alemanha, a Suíça e a Áustria. O mercado europeu registou um crescimento de 40.000 unidades em 1997 para 123.000 unidades em 2004. Em 2004, o crescimento total do mercado foi de 18 %. A produção e a instalação de bombas térmicas estão mais concentradas em países onde os governos concederam subsídios e outros incentivos.

2.5.3

A Suécia é um bom exemplo deste fenómeno. Nos anos noventa, o governo sueco encorajou a utilização de bombas térmicas com uma série de medidas, tais como subsídios de financiamento directo, incentivos fiscais e actividades de promoção. Mas também a nova legislação no sector da construção civil, ao estabelecer minuciosamente a temperatura máxima autorizada nos sistemas de aquecimento, contribuiu consideravelmente para a utilização de bombas térmicas.

2.5.4

Surgiu deste modo na Suécia um mercado para a produção de bombas térmicas. Este país possui actualmente uma sólida indústria de bombas térmicas com três grandes intervenientes no mercado internacional, a qual satisfaz mais de 50 % da procura europeia. O mercado sueco de bombas térmicas, cujo número tem aumentado sem cessar, é actualmente auto suficiente, mesmo sem medidas de apoio do governo. Na Suécia, mais de 90 % dos edifícios estão munidos de uma bomba térmica.

2.5.5

Houve uma evolução semelhante na Áustria, onde as autoridades regionais atribuíram subsídios até 30 % dos custos de aquisição e instalação de bombas térmicas. Este país conta agora com sete produtores de bombas térmicas. Em ambos os países, mercê da combinação de apoios financeiros directos com normas de construção específicas e campanhas de promoção, foi possível à indústria do sector evoluir ao ponto de funcionar perfeitamente sem qualquer apoio.

2.5.6

O desenvolvimento da energia geotérmica é fundamental sob diversos aspectos:

a.

Política ambiental: a energia geotérmica é inesgotável, limpa e permite poupanças de energia. O seu potencial é enorme, já que a camada externa da crosta terrestre, com uma espessura de 6 quilómetros, armazena uma quantidade de energia que é 50.000 superior à de todas as reservas conhecidas de petróleo e gás no mundo inteiro (14).

b.

Política social: o desenvolvimento da energia geotérmica criará empregos nos sectores do design, da promoção, da produção e da instalação de sistemas destinados à sua geração. Em contrapartida, haverá uma perda de empregos se forem necessárias menos centrais de grandes dimensões e centralizadas.

c.

Política regional: a energia geotérmica oferece às pessoas que habitam em zonas periféricas sem infra-estruturas de distribuição de energia uma solução barata para as suas necessidades de aquecimento e de água quente. Para explorar a energia geotérmica, é indispensável a electricidade, mas numa quantidade muito inferior à requerida pelo aquecimento directo e pelo abastecimento convencional de água quente.

3.   A utilização racional das matérias-primas

3.1

Se a energia de combustíveis fósseis é finita, também são finitas as reservas de matérias-primas metálicas, minerais e biológicas para a produção industrial (15). A sua utilização no mundo industrializado é considerável: 20 % da população mundial consome mais de 80 % do total de matérias-primas.

3.2

Ora, este padrão de consumo é incompatível com a utilização sustentável dos recursos naturais de que dispomos. Presumindo que as reservas de matérias-primas são nossa herança comum e que o acesso actual e futuro às mesmas é um direito universal e inalienável, a Europa terá de reduzir a sua utilização de um quarto até 2050 e de um décimo até 2080 (16). O CESE saúda as iniciativas neste domínio, como a desmaterialização da economia e o Programa de Acção sobre Tecnologias Ambientais (ETAP).

3.3

Em última análise, não há nenhum produto que não cause danos ao ambiente: seja durante a sua produção, a sua utilização seja aquando da sua eliminação no fim do ciclo de vida. Este ciclo envolve diversas fases: a extracção da matéria-prima, a concepção do produto, a produção, a montagem, o marketing, a distribuição, a venda, o consumo e a eliminação. Em cada uma destas fases há vários intervenientes: fabricantes, distribuidores, consumidores, etc. O objectivo de uma política de produção integrada é promover a coordenação destas fases (por exemplo, tendo em conta a reciclagem óptima na fase da concepção), para melhorar o desempenho ambiental do produto ao longo de todo o seu ciclo de vida.

3.4

Com tantos e diversos produtos e intervenientes, não é possível adoptar uma medida uniforme para resolver todos os problemas. É necessária toda uma gama de instrumentos políticos, quer facultativos quer obrigatórios, a aplicar em cooperação estreita com os sectores público e privado e com a sociedade civil.

3.5

As organizações dos consumidores devem desempenhar um papel mais incentivador e de apoio do que até à data. Até agora, muitas destas organizações têm-se preocupado sobretudo em obter o melhor produto possível ao mais baixo preço. Na prática, isto significa que a produção não é realizada da forma mais sustentável.

3.6   Co-geração (CHP)

3.6.1

A utilização do calor libertado na produção de electricidade significa uma melhoria considerável da eficiência energética, não obstante as limitações técnicas dada a grande distância entre o local onde o calor é produzido (zona industrial) e o local onde é consumido (zona residencial), o que causa grandes perdas de energia. As unidades de micro co-geração têm como primeiro objectivo satisfazer as necessidades térmicas de um edifício com a electricidade como subproduto. Poder-se-á prever produtos alternativos para prover às necessidades de energia primeiramente como subproduto. Até à data, a maioria das vendas tem-se concentrado em sistemas de micro co-geração térmica, o que quer dizer que as células de combustível são configuradas especialmente para satisfazer as necessidades de energia.

3.6.2

A tecnologia de CHP é capaz de contornar estas limitações, o que coloca a indústria europeia perante um desafio económico. A co-geração, que gera electricidade como subproduto, é sobretudo utilizada para aquecer blocos residenciais e estabelecimentos comerciais. Até 2004 foram instaladas cerca de 24.000 unidades. A tecnologia de CHP é possível com base em diversas fontes de energia. A modalidade com mais perspectivas parece ser a que tem por base a tecnologia do hidrogénio (pilha de combustível), embora ainda não esteja suficientemente desenvolvida.

3.6.3

Graças a subsídios aos utilizadores finais de instalações de co-geração, o Japão ocupa a posição dianteira no desenvolvimento desta tecnologia, também pelo facto de, neste país, a pilha de combustível ser fortemente promovida pela indústria automóvel. O governo japonês deseja que a indústria nacional venha a ocupar uma posição de liderança no desenvolvimento da tecnologia da pilha de combustível, tal como sucede já com a energia solar. O seu empenho traduz-se quer em incentivos e financiamento quer em subsídios de aquisição a utilizadores finais, numa fase precoce do desenvolvimento do mercado.

3.6.4

O desenvolvimento da co-geração é fundamental sob diversos aspectos:

a.

Política ambiental: é uma fonte de energia barata e permite poupanças de energia. É acima de tudo extremamente limpa e a utilização desta tecnologia para água quente e electricidade reduz as emissões de CO2 em 20 %.

b.

Política social: o desenvolvimento da co-geração criará empregos nos sectores da concepção, da promoção, da produção e da instalação de sistemas CHP. Em contrapartida, haverá uma perda de empregos, se forem necessárias menos centrais de grandes dimensões e centralizadas.

4.   Implicações da sustentabilidade para vários sectores

O crescimento dos sectores que se dedicam à investigação para aperfeiçoar as tecnologias das energias renováveis demonstra que o desenvolvimento sustentável oferece, de facto, oportunidades económicas consideráveis. Estas oportunidades situam-se não só nos sectores que desenvolvem directamente tecnologias sustentáveis, mas também nos sectores em que as novas tecnologias terão de ser aplicadas.

4.1   Transportes

4.1.1

O sector dos transportes é um dos maiores consumidores de combustíveis fósseis. São, porém, boas as hipóteses de utilização sustentável de energia, a crer nas muitas recomendações úteis constantes do relatório final da iniciativa CARS 21 (17). A melhor planificação do desenvolvimento e das infra-estruturas urbanas e a utilização mais intensiva das tecnologias TCI abre perspectivas para aumentar a eficiência dos transportes. Se combinarmos isto com uma tecnologia melhorada dos motores de combustão, teremos uma poupança muito substancial de energia. A curto prazo, são também boas as hipóteses de transitar parcialmente para outros combustíveis, como o gás natural ou o combustível a partir da biomassa (BTL — biomass to liquid). A longo prazo, tudo indica que a economia do hidrogénio oferece oportunidades bastante atraentes. As tecnologias híbridas, a ser desenvolvidas neste momento, são uma solução transitória muito positiva.

4.1.2

Estima-se que a fatia de mercado potencial máxima do combustível de biomassa é de 15 %. A UE estabeleceu como meta 6 % até 2010. Está já em curso um primeiro projecto-piloto para produzir combustível a partir da biomassa.

4.1.3

O gás natural produz menores emissões de CO2 do que a gasolina (-16 %) e do que o gasóleo (-13 %) e poderá conquistar uma maior fatia de mercado num clima fiscal favorável. Deste modo, será possível um mercado estável tanto para os produtores como para os consumidores. A tecnologia encontra-se, aliás, já disponível. São sobretudo consideráveis as possibilidades dos transportes públicos em zonas urbanas, porque é aqui que os pontos de abastecimento de gás poderão ser explorados ao máximo. Em princípio, é possível alcançar em 2020 uma fatia de mercado de 10 % (18).

4.1.4

Exemplos noutros países (em especial no Brasil) mostram claramente que não se consegue obter uma tal fatia de mercado apenas através da disponibilização do biocombustível. É também imprescindível uma política de apoio — incentivos fiscais, legislação e regulamentação específicas e ainda campanhas de promoção — que procure persuadir o consumidor a fazer esta transição.

4.1.5

O reverso da medalha é que um aumento na utilização de biocombustíveis com origem em zonas ecologicamente sensíveis (tal como o óleo de palma proveniente do Sueste Asiático) poderá causar a destruição em larga escala das florestas húmidas, se estas tiverem de dar lugar a plantações de óleo de palma. De acordo com um estudo recente das Nações Unidas, há no mundo 23 grandes ecossistemas, 15 dos quais estão esgotados ou fortemente poluídos.

4.2   Construção civil

4.2.1

A construção civil — sobretudo em casas de habitação — oferece enormes possibilidades em termos de sustentabilidade. Já é possível construir, com reduzidos custos suplementares, edifícios com um consumo de energia igual a zero, sobretudo se considerarmos que eles são rapidamente recuperáveis graças à poupança de energia. Construir deste modo custa em média mais 8 % do que segundo métodos convencionais. Mas as economias de escala poderão reduzir estes custos suplementares a 4 % em dez anos. Norman Foster, um dos arquitectos mais famosos do mundo, afirmou uma vez que considerando os custos totais de uma construção por um período de vinte e cinco anos, se conclui que os custos actuais de construção são apenas de 5,5 %, dos quais mais de 86 % correspondem aos custos de ocupação do edifício (energia, manutenção a grande e a pequena escala, taxa de juro de amortização/lease, etc.), durante o mesmo período de tempo. Portanto, embora construir de uma forma sustentável possa ser mais dispendioso a curto prazo, acaba por sair consideravelmente mais barato a médio e a longo prazo.

4.2.2

Na Alemanha e na Áustria, a construção com base em conceitos de eficiência energética está a crescer mais velozmente do que no resto da União Europeia. Na Alemanha, o «Passiv Haus Institut» encomendou projectos de construção de casas que consomem muito pouca energia, graças à utilização de energia solar conjugada com um isolamento eficaz e hermético. Neste momento, o número de edifícios deste tipo é já superior a 4.000 na Alemanha e a 1.000 na Áustria. Este princípio está a ser adoptado com mais frequência também na construção de edifícios para fins comerciais.

4.2.3

O município de Friburgo estabeleceu novas normas para edifícios com um consumo racional de energia, as quais são parte integrante de todos os contratos de arrendamento e de compra e venda que celebra com empresas de construção e promotores imobiliários. Deste modo, o município tira o máximo partido das suas competências legais para contribuir em grande escala para a gestão da energia. Os contratos estipulam que, nos terrenos adquiridos ou arrendados pelo município, é obrigatório construir edifícios segundo directrizes de eficiência energética e projectá-los por forma a aproveitar ao máximo a energia solar e preparar os telhados para a instalação de painéis solares. Nos bairros construídos desta forma as economias chegam aos 40 % no consumo de água quente.

4.3   Indústria

4.3.1

O Comité congratula-se com a posição da Comissão sobre a política industrial, a qual tem em conta as preocupações de sustentabilidade, corroboradas pela sua comunicação intitulada «Aplicar o Programa Comunitário de Lisboa: Um enquadramento político para reforçar a indústria transformadora da UE — rumo a uma abordagem mais integrada da política industrial» (19). A consecução dos objectivos de Lisboa requer uma indústria europeia competitiva. O CESE saúda, portanto, a criação de um Grupo de Alto Nível sobre Competitividade, Energia e Ambiente, uma das principais iniciativas políticas intersectoriais para reforçar as sinergias entre diferentes domínios políticos, à luz de considerações de competitividade. O Comité saúda igualmente os esforços envidados pela indústria europeia neste sentido.

4.3.2

Actualmente, a indústria ainda está muito dependente dos combustíveis fósseis. No entanto, em muitos casos, a escolha de processos eléctricos permite a utilização de todos os tipos de fontes de energia primárias contribuindo, na maioria dos casos, para poupar energia (20). Há também formas de intercâmbio de energia residual entre os complexos industriais e outros sectores ou complexos residenciais. Por exemplo, o calor residual do complexo industrial Europoort é utilizado para aquecer o maior complexo de estufas do Noroeste da Europa situado a vinte quilómetros de distância, em Westland, nos Países Baixos.

4.3.3

O petróleo continua a ser a pedra angular da indústria química, quando se sabe que será futuramente a matéria-prima mais escassa. A alternativa a esta fonte de energia é a biosíntese — a produção de produtos químicos de base a partir da biomassa com a utilização de bactérias — que é um terreno bastante complexo mas cheio de perspectivas. Nos últimos anos, o conhecimento da genética de microorganismos, como as bactérias, tem registado progressos extraordinários. As novas técnicas tornam possível modificar geneticamente estes organismos, por forma a transformar material de base em substâncias específicas. As bactérias convertem-se, deste modo, numa espécie de mini-reactores programáveis.

4.3.4

Actualmente, esta tecnologia de microrganismos é utilizada especialmente pela indústria alimentar e farmacêutica, designadamente, na produção de queijo, cerveja e penicilina. Nestes sectores são consideráveis as possibilidades de bioconversão, mas a indústria química começa também a revelar interesse por esta tecnologia. São necessárias diversas fases de reacção para extrair as substâncias do petróleo e depurá-las. A tecnologia precisa de ser desenvolvida, mas é teoricamente possível passar à conversão directa de biomassa em produtos químicos de base e outros produtos. Poupar-se-ia, assim, no consumo de petróleo com todos os benefícios económicos e ecológicos relevantes — redução das emissões, encerramento do ciclo e gestão da cadeia.

4.3.5

É possível que os sectores com grande consumo de energia se venham a defrontar com problemas específicos na transição para as fontes de energia renováveis. Há uma relação directa entre o grau de sustentabilidade da produção e o nível da tecnologia utilizada, não se esperando aqui grandes progressos num futuro próximo. Na Europa, os sectores do aço e do alumínio, por exemplo, estão já a obter bons resultados neste domínio. Enquanto a indústria siderúrgica está a investir em massa em novas tecnologias para uma produção mais sustentável, especialmente através do projecto ULCOS (Ultra Low CO2 Steelmaking — fabrico de aço com emissões de CO2 drasticamente reduzidas), o maior projecto europeu para a produção de aço de sempre, na expectativa de uma redução para metade das emissões de CO2 por volta de 2040, a produção de alumínio primário na Europa caracteriza-se pela utilização notoriamente elevada de energia renovável (44,7 %). Dado que a energia utilizada na produção de alumínio secundário, a partir de resíduos de alumínio, é apenas 10 % da energia necessária para a produção de alumínio primário, há um grande potencial de poupança de energia neste sector. Todavia, os resíduos de alumínio, no mercado europeu, estão a ser comprados massivamente pela China através de incentivos governamentais para fomentar a poupança de energia.

4.3.6

A indústria siderúrgica europeia também apresenta resultados positivos no atinente à eficácia das matérias-primas e à reciclagem. Metade do aço mundial é produzido com a utilização de resíduos de metal. Também são utilizados optimamente resíduos reciclados. Na fábrica Corus, em Ijmuiden (Países Baixos), 99 % dos resíduos são reutilizados ou no próprio local ou externamente.

4.3.7

Embora a utilização de fontes de energia fóssil como matéria-prima na produção industrial seja, em grande medida, inevitável num futuro previsível, a utilização de materiais recentemente desenvolvidos ajudará a poupar energia na área das aplicações, por exemplo reduzindo o peso na produção de veículos. Para promover tal inovação, a indústria europeia tem de preservar a sua competitividade internacional, começando pelas indústrias extractivas, onde tem início a cadeia de criação de valor.

5.   Aspectos sociais

5.1

É inevitável e inelutável o imperativo de transitar gradualmente para uma produção sustentável. A desindustrialização, a deslocalização da produção para outras regiões e a concorrência cada vez mais acirrada das economias emergentes criaram uma sensação de insegurança e de receio. Neste clima, propagou-se a ideia de que a transição para uma produção mais sustentável seria nefasta para a competitividade da Europa, entravaria o crescimento, eliminaria postos de trabalho e seria contraproducente para a economia e o emprego.

5.2

Na Europa têm sido, de facto, patentes os efeitos negativos sobre o emprego. Na Alemanha, vários estudos prenunciam a perda de 27.6000 postos de trabalho até 2010 devido ao comércio de licenças de emissão (ETS), número este que ascenderá a 34.300 em 2020 (21). Na Alemanha, desaparecerão até 2010 mais 6.100 postos de trabalho, em consequência da aplicação da legislação sobre fontes de energia renováveis (22). Por último, o cumprimento dos acordos de Quioto terá eliminado em 2010 mais 318.000 postos de trabalho na Alemanha (23). Colocando estes números em relação com os empregos criados, conclui-se que uma política orientada para os objectivos de protecção do clima produz, com efeito, uma «mutação industrial». Refira-se, a propósito, que, na Alemanha, os 16,4 mil milhões de euros despendidos em 2005 em energias renováveis levaram, entretanto, à criação neste sector de 170 000 postos de trabalho (24). Com um volume de produção de 55 mil milhões de euros (2004), a protecção do ambiente e do clima são, neste momento, responsáveis, neste país, por cerca de 1,5 milhões de empregos e a sua quota-parte nas exportações federais (31 mil milhões de euros em 2003), contribui para assegurar muitos outros (25).

5.3

Mas este impacto não é apenas negativo. Um estudo realizado sobre o declínio do emprego na Europa mostra que menos de 5 % dos postos de trabalho perdidos desapareceram em consequência da deslocalização da produção para outras regiões (26). Apesar das limitações metodológicas inerentes às técnicas de recolha de dados, este estudo continua a ser uma útil fonte de informação, especialmente quando associado a outros indicadores pertinentes. Poder-se-ia ir mais longe dizendo que apenas uma pequena percentagem dessa perda de postos de trabalho se deve à legislação ambiental.

5.4

Houve também um aumento do coeficiente de emprego. A eco-indústria, que tem a seu cargo a investigação para o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis, é um sector dinâmico com uma taxa de crescimento de emprego de 5 % ao ano. Actualmente, este sector é, na Europa, com os seus mais de dois milhões de empregos directos e a tempo inteiro, um empregador com a mesma envergadura das indústrias farmacêutica e aeronáutica (27).

5.5

Segundo um estudo da OCDE (28), uma produção mais sustentável não gera, por definição, custos mais elevados e, a longo prazo, contribui até para reduzi-los. Além disso, os rendimentos gerados pela produção sustentável compensam largamente os custos incorridos. Nítidas vantagens comerciais, a legislação ambiental e a regulamentação acessória estimulam os investimentos em inovação sustentável e encorajam à utilização mais eficiente das matérias-primas, consolidam as marcas, melhoram a imagem da empresa e resultam, em última instância, numa rentabilidade mais elevada e no aumento de postos de trabalho. Para ter êxito, este processo carece de uma abordagem comum assente numa responsabilidade partilhada pelas empresas, o mundo laboral e os governos.

5.6

É, porém, de evitar por todos os meios que a indústria europeia sofra com uma significativa desvantagem competitiva em relação a regiões exteriores à UE, em virtude de custos mais elevados provocados por legislação e regulamentação ambientais e sociais. Se a Europa impuser à sua indústria normas para a produção sustentável, será inaceitável e pouco razoável permitir, simultaneamente, a produtores de fora da região comercializar produtos produzidos sem preocupação de obedecer a estas normas. Para estimular a produção sustentável, é imprescindível actuar tanto internamente como externamente à UE.

5.6.1

Internamente à UE, devem ser instituídos instrumentos apropriados para assegurar que os custos sociais e ambientais resultantes de métodos de produção não-sustentáveis sejam repercutidos no preço dos bens, em consonância com a linha geral do relatório da Comissão Mundial sobre a Dimensão Social da Globalização (CMDSG) que defende a coerência entre as políticas da OIT, da OMC, do FMI e do Banco Mundial, conforme salienta o parecer do CESE sobre «A dimensão social da globalização».

5.6.2

Externamente, a União Europeia deve empenhar-se em fóruns internacionais pertinentes (em particular, na OMC) pela inclusão nos acordos comerciais internacionais de preocupações não comerciais, como normas sociais e ambientais fundamentais, para permitir aos concorrentes da Europa a elevação do nível da sua política de sustentabilidade. Países como os Estados Unidos, a Índia e a China terão uma vantagem económica desleal em relação à Europa, enquanto não estiverem vinculados aos objectivos de redução das emissões de CO2 estabelecidos no Protocolo de Quioto. Esses acordos deveriam ser aplicados mundialmente, já que o comércio apenas poderá ser realmente livre se obedecer a princípios de equidade.

5.7

A eco-indústria europeia representa quase um terço do mercado mundial e regista um excedente comercial de mais de 600 milhões de euros. As exportações apresentaram em 2004 um aumento de 8 %. Trata-se, além disso, de um mercado em expansão, já que, futuramente, países como a China e a Índia terão de optar cada vez mais por produtos e processos de produção sustentáveis.

5.8

A sociedade sustentável e inovadora para que tendemos necessita de uma ampla campanha de informação sensibilizando os cidadãos para esta questão e de uma base social mais ampla. Também são indispensáveis trabalhadores bem qualificados. Nos últimos anos, a Europa tem dado pouca importância a este aspecto. Com efeito, numa busca dos termos «training», «learning», «skilling» e «education» nas versões inglesas de dez directivas comunitárias publicadas sobre esta matéria (sustentabilidade e inovação), apenas foi detectada uma única ocorrência numa única directiva.

5.9

Nas comunicações que precederam estas directivas, a Comissão deu amplo realce à necessidade de formação. Mas esta preocupação está completamente ausente nestas últimas. Ora, como se sabe, enquanto as comunicações são meras palavras, as directivas são actos palpáveis. E uma política não é aquilo que se diz mas aquilo que se faz. O CESE saúda, portanto, o facto de a UE ter dedicado na sua nova política industrial ter dedicado tanta atenção à educação e exorta a Comissão Europeia a persistir nesta via.

5.10

É aspiração da estratégia de Lisboa fazer da União Europeia, no horizonte de 2010, a economia assente no conhecimento mais competitiva do mundo, caracterizada por uma grande coesão social e emprego duradouro. Mas para construir e manter uma sociedade com estas características, é imprescindível dispor de mão-de-obra com um nível de qualificações elevado. Se não investir o suficiente na formação dos seus trabalhadores, a Europa não só não conseguirá alcançar os objectivos de Lisboa até 2010 como não os alcançará nunca.

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2005) 658 final, de 13/12/2005.

(2)  Um modelo desenvolvido pela Universidade Técnica de Delft para uma utilização sustentável da energia.

(3)  Fonte: Energie Centrum Nederland, www.ecn.nl.

(4)  COM(2006) 105 final, de 08/03/2006.

(5)  Eurobarómetro n.os 227 (sobre energia nuclear e resíduos, Junho de 2005) e 247 (Atitudes em relação à energia, Janeiro de 2006).

(6)  Fonte: Energie Centrum Nederland, www.ecn.nl.

(7)  www.worldwatch.org.

(8)  Plano de acção para a biomassa, Comunicação da Comissão (SEC(2005) 1573).

(9)  Fonte: Energie Centrum Nederland, www.ecn.nl.

(10)  Fonte: www.ewea.org, www.wind-energie.de.

(11)  Fonte: Energie Centrum Nederland, www.ecn.nl.

(12)  Ver anexo I.

(13)  Ver anexo II.

(14)  Fonte: Informatiecentrum Duurzame Energie (Centro de informação sobre energia sustentável).

(15)  Parecer do CESE intitulado «Riscos e problemas do aprovisionamento da indústria europeia em matérias-primas».

(16)  Revisão da Estratégia Europeia de Desenvolvimento Sustentável.

(17)  Grupo de Alto Nível CARS 21: iniciativa Cars21centrada num sistema regulamentar concorrencial no sector automóvel para o século XXI.

(18)  COM(2001) 547, Directiva 2003/30/CE relativa à promoção da utilização de biocombustíveis nos transportes, Relatório do grupo de contacto «Combustíveis alternativos», de Dezembro de 2003.

(19)  COM(2005) 474 final, ponto 4.1.

(20)  Ver Electricity for more efficiency — Electric technologies and their energy savings potential (July 2004):

http://www.uie.org/library/REPORT_FINAL_July_2004.pdf.

(21)  «Zertifikatehandel für CO2-Emissionen auf dem Prüfstand» (Comércio de licenças de emissões de CO2 no banco de ensaio), 2002, Arbeitsgemeinschaft für Energie– und Systemplanung (AGEP)/Rheinisch-Westfälisches Institut für Wirtschaftsforschung (RWI).

(22)  «Gesamtwirtschaftliche, sektorale und ökologische Auswirkungen des Erneuerbare-Energien-Gesetzes (EEG)» (Impacto da legislação sobre as energias renováveis em termos macroeconómicos, sectoriais e ecológicos) 2004, Energiewirtschaftliches Institut an der Universität zu Köln (EWI, Köln), Institut für Energetik und Umwelt (IE, Leipzig), Rheinisch-Westfälisches Institut für Wirtschaftsforschung (RWI, Essen).

(23)  «Das Kyoto-Protokoll und die Folgen für Deutschland 2005» (O Protocolo de Quioto e as suas consequências para a Alemanha 2005), Institut für politische Analysen und Strategie (ipas) em cooperação com o International Council for Capital Formation (ICCF).

(24)  Comunicado de Imprensa 179/06 do Ministério Federal do Ambiente de 10.7.2006.

(25)  Comunicado de Imprensa 81/06 do Ministério Federal do Ambiente de 20.4.2006.

(26)  www.emcc.eurofound.eu.int/erm/.

(27)  Documento de referência do Ministério federal do Ambiente «Umweltschutz und Beschäftigung» (Ecologia e emprego), Umweltbundesamt, Abril de 2004.

(28)  www.oecd.org/dataoecd/34/39/35042829.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/12


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A governação territorial das mutações industriais: o papel dos parceiros sociais e o contributo do Programa para a Competitividade e a Inovação (PCI)»

(2006/C 318/02)

Em 19 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu elaborar, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, um parecer sobre: A governação territorial das mutações industriais: o papel dos parceiros sociais e o contributo do Programa para a Competitividade e a Inovação (PCI).

A Comissão Consultiva das Mutações Industriais, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 31 de Agosto de 2006, sendo relator A. PEZZINI e co-relator GIBELLIERI.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 181 votos a favor, 2 votos contra e 8 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Conselho Europeu de Março de 2006 procurou centrar o relançamento da estratégia de Lisboa, por um lado, no crescimento e o emprego e, por outro, na necessidade de uma abordagem integrada da governação face aos desafios colocados pela globalização.

1.2

A UE deverá, com efeito, fazer tudo para assegurar aos seus cidadãos um desenvolvimento inovador, competitivo e sustentável, bem como para conseguir uma maior coesão económica e social no seu território graças à criação e ao desenvolvimento de novas empresas, de novos perfis profissionais e de mais e melhores empregos, preservando o modelo social europeu e tendo por horizonte uma economia assente no conhecimento.

1.2.1

O Comité está firmemente convicto de que, sem «um novo ciclo de governação baseado na parceria e na apropriação» (1), serão vãos todos os esforços de relançamento da competitividade e do emprego na Europa. É, pois, imprescindível adoptar novos paradigmas de governação e generalizar rapidamente a sua aplicação.

1.2.2

Na opinião do Comité, tanto o sétimo programa-quadro de IDT como o novo CIP continuam a obedecer demasiado a uma orientação «do topo para a base», não permitindo ainda a concretização das oportunas integrações nem das necessidades de participação responsável dos actores públicos e privados do desenvolvimento local e regional. No entanto, só deste modo será possível optimizar o papel essencial dos parceiros sociais e criar perspectivas de crescimento sustentável e duradouro.

1.3

A União Europeia deveria incentivar, também mediante os dois instrumentos supramencionados, este novo tipo de parceria local com as autoridades e os actores económicos, especialmente com os parceiros sociais, favorecendo a conclusão de novos «pactos territoriais para o desenvolvimento na globalização» (2).

1.4

É firme convicção do Comité que não há formas de governação válidas para todos. Cabe e cada nível regional ou local encontrar as fórmulas que melhor respondam às exigências de governabilidade territorial e sejam compatíveis com o contexto nacional, europeu e internacional de referência.

1.5

No entanto, é possível, na opinião do Comité, indicar alguns critérios comuns a essas fórmulas:

a existência de um diálogo civil e social estruturado;

a avaliação, regular e pública, da qualidade e do impacto das acções empreendidas;

a formação de agentes e de integradores de desenvolvimento;

pontes estruturadas entre a universidade, a indústria e o governo;

estruturas de educação e de formação de qualidade;

a integração em rede dos centros de excelência científicos e tecnológicos;

a criação ou o reforço de estruturas de agregação avançadas (distritos industriais, parques de tecnologia avançada, conglomerados produtivos e financeiros, etc.);

um território bem equipado, sustentável, atraente e informatizado;

estruturas de consenso e de decisão eficazes e geralmente aceites, baseadas no envolvimento dos cidadãos.

1.5.1

É, por último, absolutamente necessário que a política integrada do território inclua o diálogo social estruturado, graças também à valorização dos conselhos económicos e sociais locais e regionais existentes, com os parceiros sociais e os representantes da sociedade civil organizada, bem como a criação de formas eficazes de parceria económica e social (3).

1.5.2

Para tal, será oportuno seguir a via indicada pelo Comité, com a participação dos conselhos económicos e sociais, ou órgãos afins, dos vários países europeus, num diálogo estruturado com o CESE.

1.6

O êxito da nova fórmula de governação dependerá cada vez mais da capacidade de encontrar o nível de proximidade mais eficaz para a gestão dos problemas e das soluções encontradas, de acordo com o princípio da subsidiariedade, mas procurando salvaguardar um todo coerente e uma visão comum com os demais níveis de intervenção (4).

1.7

O Comité não tem dúvidas de que a prática de explorar as possibilidades de percursos, acções e intervenções numa perspectiva a médio ou a longo prazo, partilhada através de exercícios de prospectiva participativos, poderá dar um contributo muito valioso, da base para o topo, para o crescimento cultural da sociedade e o enriquecimento das escolhas dos decisores políticos e administrativos. Graças a ela, poderão surgir e ser consolidadas no território interacções entre sectores tecnológicos, económicos, sociais e culturais fundamentais para a governação de um desenvolvimento sustentável e competitivo.

1.8

Tal requer, acima de tudo, o envolvimento dos parceiros sociais e dos representantes da sociedade civil organizada, para ter uma percepção clara dos pontos fortes e fracos e identificar novas posições tanto no mercado nacional como internacional.

1.9

Se, por um lado, a globalização exerce uma pressão competitiva no sentido de modernizar, inovar e alçar a cadeia de valores a um nível mais elevado, e permite produzir e distribuir bens e serviços de um modo mais eficiente e económico, por outro lado, há o risco de ela causar, se não se intervier a tempo, novas segmentações e fragmentações do tecido económico e social, sobretudo ao nível territorial.

1.9.1

Daí a necessidade, na opinião do Comité, de procurar criar quanto antes novas competências capazes de preparar os cidadãos para as mudanças. É, por isso, imperioso organizar acções de formação conjunta para gestores de distrito, dirigentes de empresa e gestores de sistemas financeiros e de crédito, em colaboração com os decisores políticos e os funcionários do sector público e ainda com os quadros das administrações públicas locais e regionais.

1.10

Na opinião do Comité, é indispensável uma abordagem territorial integrada e participada para que os conhecimentos acumulados graças aos investimentos na investigação e no desenvolvimento, na inovação e na educação sejam capazes de gerar capacidades inovadoras e vantagens competitivas para a base industrial europeia e atrair capital humano e financeiro.

1.10.1

Neste contexto, é de primordial importância estudar novas formas para atrair capital humano para um território, conseguindo, designadamente, um melhor equilíbrio entre os anos de vida e de trabalho e incentivos especiais, sobretudo no caso das profissões intelectuais e das que exigem qualificações elevadas, como quadros superiores, investigadores, profissionais da indústria, os quais permitam aos interessados usufruir de benefícios suficientemente interessantes durante a sua vida profissional.

1.11

O Comité crê que o novo CIP 2007-2013 não pode ser visto dissociadamente das outras políticas e programas de intervenção comunitários no território, já que pretende resolver estes problemas por meio de três linhas de acção: o programa para o espírito empresarial e a inovação, o programa de apoio às tecnologias das comunicação e da informação e o programa para a energia inteligente.

1.12

Nesta óptica, o Comité vê toda a conveniência em coordenar melhor o CIP com as acções de política regional e de coesão e cooperação transfronteiras, transnacionais e interregionais, bem como com o sétimo programa-quadro de IDT, que dedica uma parte substancial do seu programa específico «Capacidades» ao desenvolvimento da investigação nas PME e nas «regiões do conhecimento», ao apoio à inovação e aos serviços inovadores para as empresas, bem como às relações incontornáveis entre o mundo da formação e o mundo empresarial.

1.13

O Comité considera indispensável que essas iniciativas, para além de um elevado grau de coordenação para assegurar sinergias e evitar sobreposições ou incongruências, sejam prioritariamente reformuladas e acolhidas adequadamente por um território num quadro prioritário de parcerias tendo como objectivo comum o desenvolvimento local.

1.14

O Comité reafirma, por último, aquilo que já defendeu em alguns dos seus pareceres mais recentes sobre a política industrial moderna: «O que falta é uma ligação clara entre os esforços a nível da UE e o indispensável envolvimento dos governos, da indústria e das partes interessadas a nível nacional e regional.»

2.   Definições

No presente parecer é feita referência a vários conceitos cujo significado procuramos elucidar a seguir:

2.1

Governação : a literatura antropológica distingue três tipos de governação  (5): A governação «a partir da base», que prevê a coordenação de todos os actores, ao nível local, e é caracterizada por uma vincada predisposição para todas as actividades tecnológicas. A governação «em rede» assente num elevado grau de coordenação em rede de todos os actores, e particularmente das empresas, dos centros de investigação e dos organismos financeiros A governação «dirigista» que se baseia num elevado grau de coordenação e numa gestão centralizada de muitos dos aspectos particularmente importantes, como os financiamentos e as competências em matéria de investigação.

2.2   Território socialmente responsável (6)

Um território é definido como socialmente responsável quando orienta o seu desenvolvimento pelos princípios do desenvolvimento sustentável, tendo em conta nessa dinâmica as dimensões económica, social e ambiental. Um território é socialmente responsável quando consegue:

integrar considerações sociais e ambientais nas decisões económicas,

partilhar um modelo de valores e um método participativo nos processos de decisão,

favorecer as boas práticas e a interacção contínua entre as partes interessadas, para aumentar a inovação e a competitividade.

Para fazer a projecção de um território socialmente responsável, é necessário:

identificar a comunidade que nele habita,

procurar descobrir que valores a norteiam.

2.3   Capital social de um território

O capital social pode adoptar formas diversas: cultura de cooperação ou de concorrência, consenso associativo ou grupos de interesses polarizados e modalidades de aprendizagem. As tradições culturais e o tipo de organização podem influir notavelmente nos obstáculos que podem opor-se à realização de um território socialmente responsável. Uma análise mais profunda dos recursos sociais disponíveis num território (capital social) obriga-nos a distinguir entre: capital institucional, capital cultural, capital simbólico, capital psicossocial e capital cognitivo.

Capital institucional: a capacidade das instituições formais de um território em concentrar-se na solução dos problemas, a sua capacidade de acção, a rapidez do processo de decisão, o nível de informação das organizações e a sua flexibilidade e, por último, o tipo de relações entre as várias organizações;

Capital cultural: o património de tradições de um território, os seus valores e convicções, a riqueza da sua língua e, por último, as suas relações sociais e modelos de comportamento (7);

Capital simbólico: a capacidade de um território mobilizar as energias necessárias para garantir a sua evolução, bem como o seu potencial de servir de imagem de referência às empresas nele implantadas;

Capital psicossocial: tipo de capital que se baseia principalmente no conceito de confiança, na convicção de que existe uma comunidade e de que esta possui um potencial de desenvolvimento e, por último, na consciência de que é real a possibilidade de uma cooperação organizada com os grupos e as associações;

Capital cognitivo: saber-fazer colectivo, a não confundir com o capital humano de cada indivíduo. O capital cognitivo sedimenta-se nas organizações que constituem a infra-estrutura do saber, ou seja, nas universidades, nos centros de investigação, bem como nas organizações culturais e profissionais, nas empresas e nos organismos incumbidos de desenvolver o diálogo social (8).

2.4   Actividades de prospectiva  (9): o futuro como construção social

O futuro é algo por construir. São os próprios indivíduos que o constróem através das suas acções voluntárias e das suas consequências, por vezes inesperadas. O futuro não é, pois, algo que existe para ser prenunciado mas para ser construído pela sociedade. Ora, uma reflexão sistemática sobre os acontecimentos prováveis ou possíveis poderá ser útil para esta construção. Enquanto campo da investigação, o estudo sistemático do futuro constitui um instrumento que poderá ajudar-nos a criar um amanhã mais consentâneo com os nossos desejos. O objectivo das actividades de prospectiva não é, por conseguinte, prenunciar o futuro mas imaginar um futuro diverso do presente, tornado possível por factores tais como as mutações tecnológicas, estilos de vida e de trabalho, a regulamentação, a geopolítica mundial, etc.

2.4.1

Com o propósito de apoiar as orientações estabelecidas pelo Conselho Económico de Lisboa, a Comissão criou condições para organizar o Espaço Europeu da Investigação (EEI) (10) cujo financiamento está previsto no sexto programa-quadro, onde é conferida uma atenção muito especial à prospectiva territorial (11). Posteriormente, em 2001, a Comissão criou a unidade Prospectiva científica e tecnológica, relações com o IPTS (12), com o objectivo de difundir a prospectiva como modelo de inovação.

2.5   Democracia de proximidade

2.5.1

Entre as tendências dos últimos anos, para além da afirmação da subsidiariedade, adquiriu importância especial a questão da proximidade, ou seja, uma atitude cultural pela qual o cidadão exprime o desejo de se sentir protagonista das decisões que envolvem a esfera social. Com as novas tecnologias, o conhecimento está a difundir-se a uma velocidade e com uma amplitude antes impensáveis.

3.   Antecedentes

3.1

No dealbar do terceiro milénio, a UE está perante mutações estruturais profundas que revolucionaram em poucos anos o ambiente mundial em que opera e compete a economia europeia. Entre estas mutações, são de citar especialmente:

a mão-de-obra no mercado livre duplicou com o ingresso de mais de dois mil milhões de pessoas na área económica de mercado, regulada pela OMC,

a revolução económica, causada pela globalização, alterou os modelos económicos implantados, perturbando o equilíbrio entre a oferta e a procura,

surgiram novos concorrentes económicos, alguns deles agrupados, que se juntaram aos actores tradicionalmente presentes no mercado,

concebe-se cada vez mais a empresa como um sujeito integrado num sistema capaz de garantir redes de conhecimento integradas,

o sucesso de uma empresa é cada vez mais o corolário da nova governação pública do território, cuja actuação se insere numa visão estratégica partilhada,

os novos tipos de governação, pública e privada, coexistem dentro de um quadro mundial que apresenta fortes desníveis demográficos e económicos,

imiscuíram-se no novo mercado global liberalizado novas estratégias agressivas de penetração económica e comercial, cujo objectivo principal é identificar as fragilidades dos mercados estrangeiros para retirar delas vantagens competitivas.

3.2

O relatório Aho (13) corroborou a necessidade de novos paradigmas de governação para se conseguir uma Europa competitiva e consciente dos desafios colocados ao sistema pelas mutações estruturais.

3.2.1

A adopção deste novo paradigma de governação passa por:

uma mudança perceptível para concretizar a unicidade do mercado europeu, favorecer a inovação e comercializar produtos e serviços novos, contrariando a tendência para a fragmentação que é o principal obstáculo aos investimentos, às empresas e ao emprego;

uma revisão dos esquemas de mobilidade dos recursos humanos na UE, a qual deverá prever canais de intercâmbio e de mobilidade quer entre ciência, indústria e governo, quer entre os vários países, bem assim novos instrumentos de diálogo para valorizar o modelo social europeu do conhecimento e para favorecer o surgimento de novas gerações de distritos do saber, de novos parques tecnológicos e industriais e pólos de excelência, de plataformas tecnológicas e agrupamentos;

uma nova visão estratégica comum, valendo-se de instrumentos de prospectiva participativa, para fazer face aos desafios sociais internos e aos desafios económicos externos e para colmatar o hiato entre as sugestões políticas e as necessidades concretas de participação de todas as regiões que desejam ser parte integrante da economia do conhecimento;

o desenvolvimento no território de «integradores de desenvolvimento» (14) com elevadas aptidões profissionais;

o apoio à criação do Instituto Tecnológico Europeu (15), para evitar a fuga de cérebros e atraí-los de outras partes do mundo, para desenvolver e dinamizar a investigação e a inovação no território da UE;

uma resoluta acção europeia de apoio à requalificação profissional e à formação de perfis multidisciplinares pertinentes.

3.3

A investigação e o desenvolvimento, os processos de fabrico, os sistemas logísticos (16), o marketing e os serviços à clientela são funções cada vez mais integradas que agem conjuntamente como uma única entidade a qual liga os clientes aos inovadores de novos produtos.

3.4

A nova arquitectura de empresa relaciona-se cada vez menos com a disponibilidade de infra-estrutura física e cada vez mais com as propriedades dos activos incorpóreos. Ela carece de um «território bem equipado», dotado de estruturas de governação territorial capazes de apoiar as capacidades produtivas e distributivas e de prestação de serviços e garantir, o melhor possível, os serviços pós-venda.

3.5

O desenvolvimento de uma clara identidade territorial, traduzida em capital social, afigura-se fundamental não só para evitar riscos de deslocalização como por se exigir às novas implantações características específicas e o respeito de normas de qualidade muito severas impostas aos serviços prestados localmente. Ora, apenas será possível cumprir estas normas com pessoal sensibilizado e preparado para uma tal problemática.

3.6

A consciência de uma identidade territorial por parte dos cidadãos, decisores políticos e parceiros sociais é uma premissa fundamental para uma abordagem integrada da sustentabilidade ambiental e social, a qual representa um factor suplementar na captação de novos investimentos.

3.7

A valorização desta identidade assenta numa combinação de afinidade, reconhecimento e empatia para com um conjunto de valores comuns, no contexto de uma visão prospectiva partilhada. Para promovê-la, é necessário prever:

modelos de governação participativos e transparentes, com uma repartição de poderes equilibrada pelos vários actores e vários centros públicos e privados de decisão; acções para o reforço das capacidades, a fim de optimizar a organização, a gestão e a operacionalidade, bem como garantir a utilização sustentável dos recursos locais, inclusivamente dos transportes, serviços de saúde, recursos físicos, infra-estruturas e serviços TIC;

a construção de uma imagem «cativante» do território;

análises SWOT (17);

exercícios de prospectiva participativos, para promover a consciência de visões/percursos comuns;

a articulação em rede e intercâmbio de boas práticas entre regiões;

exercícios de aferição de desempenho para comparar as vantagens de cada território.

4.   Abordagem territorial integrada (ATI) e sistemas de prospectiva para a inovação e a investigação no território

4.1   A ATI e os recursos humanos locais

4.1.1

São diversas as áreas de intervenção prioritária para valorizar o património de recursos humanos locais:

visão estratégica comum e partilhada das actividades de prospectiva, a médio e a longo prazo, do desenvolvimento do território em termos de tecnologia e de inovação;

diálogo social estruturado ao nível territorial; é essencial respeitar plenamente, neste contexto, os instrumentos legais existentes de informação e consulta (18);

formação com estruturas de qualidade que permitam melhorar constantemente as qualificações dos trabalhadores em função dos perfis profissionais exigidos pelas novas perspectivas de desenvolvimento regional, no âmbito da concorrência global;

utilização dos numerosos instrumentos sociais previstos para os recursos humanos ora afectados por mudanças repentinas no mercado, que os excluem das possibilidades de desenvolvimento, ora pelo declínio territorial de zonas em crise;

uma política de inclusão social e de respeito das minorias étnicas;

uma gestão inteligente e responsável da flexibilidade para criar mais possibilidades de realização profissional (flexissegurança) (19);

o pleno envolvimento dos cidadãos.

4.2   A ATI e o desenvolvimento de um novo espírito empresarial mais forte

4.2.1

Uma abordagem territorial integrada poderá encorajar e promover a criação e o desenvolvimento das empresas, especialmente das PME, criando um ambiente favorável em termos de:

simplificação dos trâmites administrativos e eliminação dos obstáculos burocráticos à criação e ao desenvolvimento das empresas (do seu tamanho, por exemplo);

estruturas de educação, formação profissional, formação contínua, aprendizagem ao longo de toda a vida activa, geridas pelos parceiros sociais mediante instâncias bilaterais e segundo projectos voltados para o futuro;

redes integradas entre universidades, empresas e centros de investigação, com planos de trabalho e metodologias de acção, bem como estruturas homogéneas, tendo em vista a transferência de tecnologias;

criação e relançamento de distritos industriais e tecnológicos do saber e de plataformas industriais integradas, nos quais os actores saídos da fileira tecnológica se expandem para absorver novos centros de elaboração cognitiva e de investigação aplicada e, superando o conceito de pertença territorial, concebem sistemas de produção e de distribuição que assentam em valores e estratégias comuns de «comunidades de aprendizagem».

criação de redes de parques industriais e tecnológicos, também através de agências de desenvolvimento regional, para desenvolverem zonas bem equipadas, capazes de oferecer serviços de apoio ao desenvolvimento de novas empresas;

melhoria do acesso às fontes de financiamento e de crédito, também através da introdução em todo o território da UE de mecanismos como a iniciativa Jeremie (Joint European Resources. for Micro-to-Medium Enterprises), para as pequenas e as microempresas.

desenvolvimento e difusão de mecanismos de responsabilização social da empresa;

promoção e reforço dos sistemas de cooperação entre parceiros sociais e actores económicos e sociais locais, potenciando as suas capacidades institucionais e de diálogo social;

modernização do sistema digital local de comunicação entre todos os actores políticos, económicos e sociais do território e as autoridades e instituições públicas e privadas relevantes; convém concentrar-se especialmente em instrumentos tais como a administração pública em linha, negócios electrónicos e comércio electrónico, teletrabalho, bem como redes de comunicação de banda larga e de grande capacidade, como a rede GEANT (20) de transmissão de dados e os sistemas GRID (21).

reforço dos valores apoiados pelo programa JESSICA para promover a integração das áreas metropolitanas periféricas;

contextos de segurança física, económica e social do cidadão, do mundo empresarial e laboral;

sustentabilidade da abordagem territorial integrada na política industrial regional e local, com a optimização da protecção do ambiente face às mutações económicas e industriais.

4.3   A AIT, o CIP e o sétimo programa-quadro e a coerência com as outras políticas comunitárias

Em 2005, os Chefes de Estado e de Governo imprimiram um novo ímpeto político à estratégia de Lisboa relançada, sublinhando especialmente o modo como os valores europeus podem inspirar a modernização da economia e da sociedade num mundo globalizado.

4.3.1

O Conselho Europeu de Março de 2006 apontou as prioridades a adoptar no contexto da Parceria Renovada para o Crescimento e o Emprego:

aumentar o investimento no conhecimento e na inovação,

libertar o potencial das empresas, em especial das PME,

aumentar as oportunidades de emprego, novas e duradouras, para categorias prioritárias, em especial dos jovens (22), das mulheres, dos trabalhadores mais idosos, das pessoas com deficiência e ainda dos migrantes legais e das minorias.

4.4

O programa para o empreendedorismo e a inovação (PEI) que reúne num quadro coerente muitas das actividades vocacionadas para abordar problemas fulcrais para a competitividade e a inovação do tecido económico e social da UE e para orientar o desenvolvimento para acções inovadoras e produtivas, respeitadoras do ambiente e utilizando os recursos de uma forma eficaz e aceite socialmente.

4.5

Por seu turno, o programa específico já antes citado «Capacidades» do sétimo programa-quadro tem por objectivo reforçar as capacidades de investigação e de inovação, nomeadamente:

indo ao encontro das exigências das PME que precisam de externalizar as actividades de investigação;

favorecendo as redes transnacionais das «regiões do conhecimento» para facilitar a constituição de agregados, metadistritos e parques tecnológicos, reunindo universidades, centros de investigação, empresas e autarquias,

libertando o potencial de investigação e de inovação das regiões da convergência e ultraperiféricas, em sinergia com as intervenções dos fundos estruturais e de coesão.

4.5.1

Importa, contudo, optimizar a participação das PME nas actividades de investigação e inovação também nos demais programas específicos do sétimo programa-quadro: «Cooperação», «Ideias» e «Pessoas».

4.5.2

Outra característica essencial, comum a todos os programas, é a obrigação de promover a valorização dos resultados da investigação, o que ocorre predominantemente ao nível territorial. Nesta óptica, o CESE considera indispensável conseguir níveis elevados de coordenação, de coerência e de sinergia com as acções comunitárias de política regional e de coesão e dos demais instrumentos de apoio à cooperação territorial e à educação e formação.

4.5.3

Há, além disso, a necessidade de coordenar as acções antes enunciadas com as políticas regionais que têm como ponto de referência os fundos estruturais europeus revistos.

4.6

Estas iniciativas, para além de requererem muita coordenação para gerar sinergias e evitar sobreposições ou incongruências, para serem bem recebidas no território deverão poder contar com:

um ambiente receptivo e bem equipado capaz de gerar efeitos sinergéticos com programas locais e regionais relevantes e de desenvolver redes internacionais de parceiros no âmbito da investigação, com o objectivo de satisfazer os critérios de cooperação transnacional dos projectos europeus e traduzir os resultados da investigação num crescimento real em termos de competitividade e de emprego, que possa ser explorado directamente pelos processos de mutação industrial em curso, através de redes territoriais que garantam a interacção contínua entre universidade, indústria e centros de investigação.

estruturas de educação e formação avançadas, concebidas para dar uma resposta funcional às exigências de desenvolvimento económico e industrial assente no conhecimento; estas estruturas deverão estribar-se em programas de formação orientados para os novos paradigmas tecnológicos e produtivos, de distribuição e de consumo, bem como em sistemas de formação contínua à altura de antecipar as respostas às mutações industriais e de mercado;

acções centradas no reforço das capacidades institucionais e associativas e iniciativas de diálogo social para um planeamento eficaz e o máximo aproveitamento da investigação e da transferência de tecnologias, tudo isto a partir de uma visão partilhada por todos os actores económicos e sociais que têm contacto directo com a realidade local, perseguindo o objectivo de criar novas oportunidades empresarias e de formação, qualificações avançadas e novos perfis profissionais para os recursos humanos;

uma política integrada do território que saiba explorar as potencialidades de desenvolvimento local, aumentando a capacidade de adaptação e de antecipação inovadora, para tirar partido dos benefícios dos novos fluxos de bens e serviços, dos recursos humanos e dos capitais gerados pela globalização;

um diálogo social consolidado ao nível local e regional, que constitui um instrumento fundamental para maximizar os benefícios de uma visão prospectiva das mutações industriais e de mercado, bem como dos fluxos de educação e formação dos recursos humanos; um diálogo realmente capaz de garantir uma nova segurança de percursos profissionais e uma nova flexibilidade à organização da produção, da distribuição e dos serviços.

4.6.1

Na opinião do Comité, tanto o sétimo programa-quadro de IDT como o novo CIP, sobre os quais o já teve a oportunidade de pronunciar-se, continuam orientar-se demasiado «do topo para a base» e não permitem ter em conta, como seria desejável, as oportunas integrações nem as necessidades de participação responsável dos actores públicos e privados do desenvolvimento local e regional. Esta abordagem não confere, em substância, aos actores locais o papel que lhes competiria enquanto co-responsáveis pela governação europeia.

4.6.2

A União Europeia deveria incentivar, também mediante os dois instrumentos supramencionados, este novo tipo de parceria ao nível local com as autoridades e os actores económicos, especialmente com os parceiros sociais, favorecendo a conclusão de novos «pactos territoriais para o desenvolvimento na globalização» (23). Estes pactos deveriam reunir todas as partes interessadas no desenvolvimento económico e do emprego, para responder adequadamente aos desafios dos mercados e da competitividade, procurando ultrapassar uma atitude «localista» que tende cada vez mais a formar um limite perigoso face a realidades mundiais indelevelmente interligadas.

4.7   A ATI, a governação participativa, os parceiros sociais e a sociedade civil

4.7.1

Uma parte relevante das acções para promover a competitividade sustentável è da competência dos níveis local e regional. Por este motivo, são prioritários sistemas de governação e de cooperação entre as várias entidades locais e regionais, as diversas autoridades e instituições, os parceiros sociais, as empresas e os actores económicos e sociais da sociedade civil que interagem num dado território.

4.7.2

No atinente ao conceito de «governação», remetemos para as considerações tecidas anteriormente pelo Comité: «As partes interessadas privadas deveriam agir e assumir responsabilidades mediante contributos e acções tangíveis. Os diálogo social e cívico são ferramentas importantes …» (24).

4.7.3

No que se refere à intensificação do diálogo social sectorial, «o Comité partilha o ponto de vista da Comissão de que os parceiros sociais podem desempenhar um papel específico de alerta, dado o conhecimento que têm dos sectores».

4.7.4

Na opinião do Comité, trata-se de pôr em prática sistemas de engenharia social e decisória baseadas na participação, ágeis, proactivos e reactivos, capazes de manter um nível qualitativo elevado de democracia política, económica e social, sem dificultar nem refrear o desenvolvimento de acções e de iniciativas.

4.7.5

Adoptar uma visão comum a médio e a longo prazo é tão essencial como apontar e repartir responsabilidades em torno de objectivos intermédios partilhados, bem como recorrer a instrumentos avançados e comprovados ao nível regional, como os de prospectiva.

4.8

A ATI e uma estratégia de governação para o desenvolvimento de regiões socialmente responsáveis

4.8.1

Num contexto como o nosso, aberto à concorrência global, uma estratégia de governação propiciadora de um desenvolvimento territorial socialmente responsável deverá possuir uma dinâmica duradoura de desenvolvimento económico e de padrões sociais elevados. Uma estratégia deste tipo deverá ser concretizada especialmente através de:

melhorias constantes das qualidades e capacidades cognitivas e inovadoras do sistema produtivo territorial graças a análises sistemáticas e previsões do desenvolvimento social, económico e tecnológico com a participação de todas as partes interessadas;

a criação de redes globais de referência para o sector público e privado que assegurem fluxos bidireccionais em constante interacção com o mercado global;

desenvolvimento com níveis elevados de sustentabilidade ambiental e social, quer em termos de produção como de consumo;

circuitos eficazes e consolidados par a criação, difusão e circulação do conhecimento, informação e formação contínua de operadores tecnológicos, utentes e consumidores finais;

elaboração de «balanços sociais territoriais» para medir, seguir de perto e avaliar as dinâmicas úteis para a realização dos objectivos qualitativos e quantitativos, com base em normas e metodologias comuns, ao nível europeu.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Ver Conclusões da presidência do Conselho Europeu de 23-24 de Março de 2006, ponto 4.

(2)  Ver Pactos industriais da região metropolitana de Barcelona ( http://www.pacteind.org/eng/activities/), em que se afirma que «a competitividade do território depende da qualidade das empresas e dos seus trabalhadores, …».

(3)  Ver Orientações da Comissão Europeia sobre a política de coesão: Parcerias horizontais activas (parceiros sociais, sociedade civil organizada, administradores); Uma parceria vertical eficaz (Comissão Europeia, governos nacionais, administrações regionais e locais) — Regulamento (CE) n.o 1260/1999 de 21.06.1999 e COM(2002) 598 de 7.11.2002.

(4)  Ver «A democracia da proximidade.»

(5)  P. Cooke e outros, 1998, Regional Innovation System-The role of governance in a globalised world.

(6)  Este conceito está na base do novo programa Jessica, lançado pela DG REGIO, financiado pelo BEI e destinado, especialmente, à recuperação das áreas metropolitanas mais degradadas.

(7)  No sentido antropológico, a cultura é constituída por «formas de comportamento adquiridas e transmitidas mediante símbolos, sinais, actos e obras do intelecto» (Alberoni, Consumi e società).

(8)  F. Albuquerque e outros, Learning to innovate, seminário da OCDE em 30.9-1.10.1999, Málaga, Espanha.

(9)  Actividades de prospectiva: processo sistemático e participativo que comporta o levantamento de informações e a criação de visões sobre o futuro, a médio e alongo prazo, com o fito de orientar as decisões e mobilizar os meios necessários para as acções conjuntas.

(10)  COM(2002) 565 final, de 16/10/2002.

(11)  http://www.cordis.lu/rtd2002/foresight/main.htm.

http://www.cordis.lu/rtd2002/foresight/seminar.htm.

http://www.regional-foresight.de/.

http://prospectiva2002.jrc.es/.

(12)  Instituto de Prospectiva Tecnológica. É um dos sete institutos que dependem do CCI (Centro Comum de Investigação).

(13)  «Criar uma Europa inovadora», relatório do grupo de peritos independentes europeus sobre I&D, presidido por Esko Aho, Janeiro de 2006.

(14)  Pessoas preparadas socialmente e tecnologicamente para assistir, com a ajuda dos pólos tecnológicos, às pequenas e microempresas em processos de inovação.

(15)  Ver Conclusões do Conselho Europeu de 15 e 16 de Junho de 2006.

(16)  Ver «Política europeia em matéria de logística».

(17)  O acrónimo inglês SWOT significa Strengths, Weaknesses, Opportunities and Threats, ou seja, pontos fortes, pontos fracos, oportunidades e ameaças.

(18)  Ver documento da Confederação Europeia dos Sindicatos (CES) «Reestruturações — Antecipar e acompanhar a reestruturação para o desenvolvimento do emprego: o papel da UE» (Comité executivo da CES, Bruxelas, 14 e 15 de Junho de 2005).

(19)  Flexissegurança: o caso da Dinamarca, ECO/167, relatora: Anita VIUM.

(20)  O projecto GEANT é fruto da colaboração entre 26 redes nacionais de investigação e educação de 30 países europeus, a Comissão Europeia e DANT (Delivery of Advanced Network Technology to Europe). O seu objectivo principal era desenvolver a rede GEANT, uma rede paneuropeia multi-gigabite de comunicação de dados especificamente para fins de investigação e educação.

(21)  O GRID é um sistema que integra e coordena recursos e utentes de áreas diversas, por exemplo, a ligação entre o computador pessoal e o servidor central, várias unidades administrativas da mesma empresa ou empresas diferentes; trata, além disso, dos problemas relacionados com a segurança, a regulamentação, o pagamento, as condições de adesão, etc. surgidos neste contexto.

(22)  Cf. p.ex. O pacto para os jovens definido pelo governo francês.

(23)  Ver Pactos industriais da região metropolitana de Barcelona ( http://www.pacteind.org/eng/activities/), em que se afirma que «a competitividade do território depende da qualidade das empresas e dos seus trabalhadores, …».

(24)  Ver «Rumo à sociedade europeia baseada no conhecimento — o contributo da sociedade civil organizada para a Estratégia de Lisboa», Relatores: OLSSON, BELABED, VAN IERSEL


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/20


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Contributo da aprendizagem ao longo da vida baseada nas tecnologias da informação para a competitividade europeia, as mutações industriais e o desenvolvimento do capital social»

(2006/C 318/03)

Em 19 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre o Contributo da aprendizagem ao longo da vida baseada nas tecnologias da informação para a competitividade europeia, as mutações industriais e o desenvolvimento do capital social.

A Comissão Consultiva das Mutações Industriais, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 31 de Agosto de 2006, tendo sido relator Marian KRZAKLEWSKI e co-relator András SZÜCS.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 181 votos a favor, 6 votos contra e 11 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Propostas e recomendações

1.1

O Comité Económico e Social Europeu expressa a sua convicção de que a utilização de recursos electrónicos no ensino e na formação (e-learning) (1) ajudará a União Europeia a aumentar a eficácia e a qualidade da educação, incluindo a educação e a formação no local de trabalho. Isto, juntamente com outras medidas, levará à redução dos custos de formação profissional, o que melhorará substancialmente a competitividade das empresas, em particular das pequenas e médias empresas.

1.2

O Comité considera que a educação e a formação baseadas nas tecnologias da informação e da comunicação (TIC) são ainda incoerentes a nível da UE, em razão da diversidade linguística e cultural, bem como da insuficiente maturidade dos respectivos mercados.

1.2.1

Para alterar esta situação convém que todos os estabelecimentos de ensino, em particular os que actuam no domínio da aprendizagem ao longo da vida (lifelong learning) (2), estejam mais abertos a novas formas de aprendizagem e à sua utilização em larga escala, mediante o apoio à integração de conhecimento e prática para obtenção de sinergias no desenvolvimento tecnológico e económico previsto.

1.2.2

Na opinião do Comité, a Comissão Europeia é o órgão mais adequado para definir uma nova orientação neste contexto. A questão da comunicação e coordenação é, pois, particularmente importante para os serviços da Comissão, especialmente nos domínios da educação e da sociedade da informação.

1.2.3

Chegou o momento de reconhecer que a generalização da aprendizagem electrónica e a consolidação do conhecimento profissional neste domínio assegurarão a aplicação de abordagens coerentes e ajudarão a criar mais-valias.

1.3

O CESE crê ser necessária uma maior sensibilização para as TIC na UE, em particular no que se refere ao modo como estas tecnologias podem apoiar a formação no sector industrial e a aprendizagem ao longo da vida, incluindo:

a formação prestada principalmente no local de trabalho e destinada a solucionar problemas num determinado contexto profissional;

métodos e abordagens que reconhecem os resultados alcançados com aprendizagens prévias, incluindo os obtidos graças ao trabalho e à experiência, e que fomentam uma participação activa na aprendizagem tanto individual como colectiva.

1.4

O CESE apela às instituições da União Europeia e aos Estados-Membros para que, ao executarem programas de desenvolvimento relacionados com a criação da sociedade da informação, tenham em atenção o facto de que estes processos não podem levar a nenhuma forma de exclusão, não se podendo, portanto, criar quaisquer obstáculos sociais, económicos ou regionais ao acesso à infra-estrutura electrónica enquanto instrumento de aprendizagem.

1.4.1

O Comité salienta que uma condição fundamental para a aplicação das TIC na aprendizagem ao longo da vida, em particular nas zonas rurais e nas pequenas cidades da Comunidade, é o apoio da UE e dos governos dos Estados-Membros às conexões Internet por banda larga (3), que facilitam o acesso aos sistemas de aprendizagem por via electrónica. A situação é particularmente difícil nestas zonas nos novos Estados-Membros, o que reforça substancialmente a tese de que não pode haver nenhum tipo de obstáculos no acesso às conexões por banda larga.

1.4.2

Neste contexto, o CESE apela à Comissão Europeia para que reconheça o acesso à banda larga como elemento de uma estratégia mais alargada que conduza à atribuição do estatuto de serviço de interesse geral à info-acessibilidade (e-accessability).

1.5

O Comité considera que no âmbito do ensino e da formação à distância por via electrónica há que dar particular atenção ao risco de aparecimento de um fosso geracional, sobretudo porque um número cada vez maior de actividades no domínio da educação para adultos ao longo da vida irá ocorrer mediante recurso às TIC.

1.6

O CESE chama também a atenção para o facto de que a ciberaprendizagem deve ser igualmente proposta enquanto solução «adequada aos invisuais». São conhecidas várias aplicações técnicas neste domínio, pelo que os autores de manuais sobre a ciberaprendizagem devem basear-se nas medidas já elaboradas por organizações que representam a comunidade dos invisuais.

1.7

O CESE é de opinião que o ensino com recurso às TIC (ciberaprendizagem) é um instrumento eficaz para melhorar a competitividade das empresas e aumentar o seu potencial comercial, especialmente o das pequenas e médias empresas, as quais desempenham um papel fundamental para o crescimento económico e a criação de emprego.

1.8

O Comité considera que o alargamento do apoio à aprendizagem ao longo da vida com recurso às TIC na UE terá uma influência fundamental não só no aumento da competitividade das empresas, como também no crescimento do capital social dos trabalhadores das mesmas, o que deverá resultar no aumento do valor do capital das empresas europeias.

1.9

O CESE defende que é urgente definir um novo papel para a sociedade civil e para o diálogo com os parceiros sociais no âmbito da promoção e da aplicação da aprendizagem ao longo da vida baseada em recursos electrónicos nos mercados de trabalho da UE. A preparação de todas as sociedades europeias para a aprendizagem ao longo da vida baseada nas TIC contribuirá para a construção do Espaço Europeu do Conhecimento e da sociedade baseada no conhecimento (4).

1.10

O Comité observa que a integração das TIC na aprendizagem e a consolidação profissional da aprendizagem electrónica foram executadas em menor grau do que o previsto. Insta-se, portanto, com as entidades competentes a nível comunitário e nacional para que tomem medidas que aumentem consideravelmente a penetração efectiva deste tipo de aprendizagem. Uma evolução neste sentido pode contribuir de forma significativa para a competitividade e produtividade do sector industrial.

1.11

O CESE apela às instituições da UE para que dêem especial atenção às necessidades das PME, das suas redes e organizações de representantes, a fim de assegurar que estas utilizam realmente todo o potencial das TIC na formação.

1.12

O Comité considera que há que apoiar de forma permanente e sistemática os professores que darão formação no domínio das novas tecnologias e metodologias (pedagogia informática) através de programas abrangentes e incentivos.

1.13

O CESE realça que a Comissão Europeia deve, igualmente, dar especial atenção à questão dos direitos de propriedade intelectual no domínio da educação informática.

1.14

Como conclusão final das suas propostas e recomendações, o Comité propõe a introdução de uma expressão para designar a aprendizagem ao longo da vida baseada nas TIC — e-lifelong learning — ciberaprendizagem ao longo da vida/aprendizagem electrónica ao longo da vida, à semelhança da nomenclatura comunitária já utilizada como eEuropa, ciberaprendizagem (e-learning), cibercompetências (e-skills), etc., salientando ao mesmo tempo o papel e a necessidade de sensibilizar e divulgar estas formas de aprendizagem no programa eEurope action plan e a subsequente iniciativa«i2010».

2.   Introdução e justificação do parecer

2.1

O presente parecer examinará o contributo da aprendizagem ao longo da vida baseada nas tecnologias da informação e da comunicação (TIC) para a competitividade, as mutações industriais e o desenvolvimento do capital social da União Europeia.

2.2

Juntamente com a Estratégia de Lisboa, a aprendizagem ao longo da vida é um dos conceitos mais importantes da política educativa e dos novos programas de educação da UE para o período de 2007-2013 (5). A utilização de métodos de educação e formação abertos e flexíveis em conjunção com as TIC desempenha, indubitavelmente, um papel fundamental para o desenvolvimento de uma economia baseada no conhecimento.

2.3

Na sequência do inovador programa eEuropa e das medidas que introduziram a ciberaprendizagem e que já levaram a algumas evoluções prometedoras, há que reflectir sobre a forma como se pode beneficiar desses resultados no domínio das mutações industriais, como se podem desenvolver oportunidades ligadas a esses mesmos resultados e quais são as perspectivas futuras.

3.   Observações na generalidade

3.1

O Parlamento Europeu e o Conselho de Ministros da UE reconheceram a importância das tecnologias informáticas no processo de desenvolvimento dos recursos humanos com a adopção de um programa plurianual (2004-2006) para a integração efectiva das tecnologias da informação e comunicação (TIC) nos sistemas europeus de educação e formação (6). O objectivo central do programa é recorrer às TIC para se chegar a uma educação e formação de melhor qualidade no âmbito da aprendizagem ao longo da vida.

3.2

O ensino à distância aberto e flexível dominou, juntamente com a aprendizagem electrónica, a última década; actualmente volta a ser objecto de atenção, mas agora num contexto mais abrangente. A ciberaprendizagem torna a vida, educação e trabalho mais flexíveis e é considerada como uma das principais formas de atingir os objectivos de Lisboa. A educação não formal (7) e informal (8), bem como a educação no local de trabalho têm vindo a ganhar uma importância cada vez maior.

3.3

O parecer do CESE de 2004 sobre «Melhorar a aplicação da Estratégia de Lisboa» (9) realça a necessidade de se examinarem as novas oportunidades da economia do conhecimento e a importância de uma crescente expansão das tecnologias da informação e dos processos de inovação.

3.3.1

Este parecer chamou, igualmente, a atenção para as insuficiências verificadas nos sistemas de educação, bem como para a necessidade de uma melhor integração da dimensão social.

3.4

Algumas das iniciativas tomadas na última década pela União Europeia no domínio da educação baseada nas TIC produziram resultados excepcionais, mas outras revelaram-se incoerentes e não levaram aos resultados qualitativos e quantitativos esperados.

3.4.1

Os primeiros modelos de aprendizagem com recurso a meios electrónicos (ciberaprendizagem) centravam-se nos indivíduos e transferiam exclusivamente um conhecimento pré-determinado, não havendo praticamente qualquer informação didáctica e ajuda à avaliação, o que decepcionou em parte todos aqueles que fizeram as primeiras tentativas para se adaptarem a esta forma de aprendizagem.

3.4.2

O rápido progresso tecnológico, o aumento das pressões económicas e o diferente ritmo das medidas de política governamental nos últimos anos, que deveriam incorporar as TIC na educação e formação, não foram suficientes para consolidar o desenvolvimento profissional.

3.5

Pretende-se que, em 2010, 12,5 % dos adultos na UE, com idades compreendidas entre os 25 e 64 anos, participem em diferentes formas de aprendizagem ao longo da vida, contra a actual média de 10 % (10). Estes objectivos só serão conseguidos mediante uma intensificação das medidas com vista à generalização da educação e formação ministrada com a ajuda das TIC.

3.5.1

Os desafios enfrentados pelos programas de educação e formação da Comissão e dos Estados-Membros são ainda maiores, se considerarmos que nos próximos cinco anos apenas 15 % dos novos empregos criados serão adequados a indivíduos pouco qualificados e 50 % exigirão trabalhadores altamente qualificados (11).

3.6

A iniciativa para a info-inclusão (e-inclusion), que significa, por um lado, a inclusão das TIC e, por outro lado, o recurso a estas com vista à inclusão (12), é uma nova iniciativa comunitária decidida no âmbito da comunicação da Comissão «i2010» (13). A política de info-inclusão tem por objectivo eliminar as barreiras existentes na aplicação das TIC e promover a utilização destas tecnologias com o objectivo de prevenir a exclusão e melhorar a produtividade económica e as oportunidades de emprego.

3.6.1

O ensino à distância mediante recurso às TIC é de extrema importância na iniciativa info-inclusão que tem por objectivo diminuir ou prevenir a marginalização social de grupos profissionais com dificuldades em aceder às formas de educação tradicionais devido à sua localização geográfica, situação social ou necessidades especiais de ensino.

3.6.2

As vantagens do ensino à distância são as seguintes: independência em relação ao local onde é ministrada a formação, possibilidade de adaptação do ritmo da aprendizagem às necessidades individuais do discente, oportunidade de utilizar tecnologias da informação modernas, possibilidade de os indivíduos de grupos desfavorecidos melhorarem a sua formação, etc.

3.6.3

O CESE já apelou, em parecer recente (14), aos representantes governamentais e sectoriais para que elaborassem ou promovessem medidas sobre a educação e formação no domínio das TIC destinadas aos diferentes grupos sociais ameaçados pela info-exclusão (15).

3.6.4

A aplicação do programa para a info-inclusão está, igualmente, relacionada com a promoção da literacia digital (16), a qual passou a ser sinónimo de sociedade moderna baseada no conhecimento. O reconhecimento num futuro próximo da literacia digital como uma das competências-chave para a aprendizagem ao longo da vida, nomeadamente no contexto do recente parecer do CESE (17), afigura-se não só necessário como evidente.

3.7

A promoção das cibercompetências (e-skills  (18)) está a ter uma influência importante nos diferentes aspectos das mutações industriais. O termo cibercompetências refere-se a todas as competências relacionadas com as TIC por parte dos profissionais, dos utilizadores e ao cibernegócios. No âmbito da promoção de uma agenda global nesta matéria, a Comissão propôs recentemente um conjunto de medidas, muitas das quais se referiam à indústria e à promoção destas competências no mercado de trabalho, bem como ao desenvolvimento e divulgação de novas cibercompetências (19).

3.7.1

A parceria entre os representantes das partes interessadas desempenha um papel fundamental nas medidas referentes tanto às cibercompetências como a todas as questões relacionadas com a introdução da aprendizagem ao longo da vida assente nas TIC. Estes representantes incluem:

sindicatos,

representantes de empresas (enquanto utilizadores das TIC) dependentes de mão-de-obra qualificada,

representantes de diferentes sectores industriais, responsáveis pela aplicação das novas tecnologias e que conhecem melhor qual o tipo de qualificações necessárias,

representantes do sector das TIC,

investigadores no domínio das TIC e programadores nesta área,

investigadores dos aspectos quantitativos e qualitativos das cibercompetências,

criadores de políticas no domínio da educação, investigação, empresas, inovação e sociedade da informação,

especialistas de prognósticos com uma visão abrangente das alterações na sociedade e das interacções entre sociedade e tecnologia.

3.8

A expansão do acesso à Internet por banda larga é fundamental para a concretização dos objectivos da estratégia i2010, bem como os dos projectos de info-inclusão. Este acesso não pode limitar-se exclusivamente às grandes cidades, devendo, pelo contrário, abranger eficazmente os habitantes das regiões menos desenvolvidas (20).

3.8.1

Convém chamar a atenção para o facto de que na UE-15 cerca de 90 % de empresas e famílias nas zonas urbanas têm acesso à banda larga, ao passo que nas zonas rurais e remotas este número é de apenas 60 %. Estas diferenças são ainda mais evidentes nos novos Estados-Membros.

3.8.2

As conexões informáticas por banda larga são fundamentais não só para o aumento da competitividade das empresas e para o crescimento económico das regiões, mas também para o sector da educação e formação, especialmente nos casos em que se recorre à ciberaprendizagem para dar formação.

3.9

Seria extremamente aconselhável elaborar agora um discurso político para melhorar a prática da aprendizagem ao longo da vida com recurso às TIC e levar a um crescimento da eficácia deste tipo de aprendizagem. A UE está melhor posicionada para dar uma nova orientação política neste contexto preciso.

3.9.1

As actuais orientações políticas dão efectivamente prioridade à introdução das TIC nos estabelecimentos de ensino tradicionais, especialmente escolas e universidades. No caso da aprendizagem ao longo da vida, bem como da educação de adultos não formal e informal dá-se consideravelmente menor atenção às TIC e atribuem-se substancialmente menos recursos para incentivar a sua utilização.

4.   Observações na especialidade

Contributo da aprendizagem ao longo da vida baseada nas TI para a competitividade europeia e produtividade

4.1

Em conformidade com a comunicação da Comissão de 2002 (21) e o parecer do CESE sobre «Formação e produtividade», pode-se afirmar que a produtividade é fundamental para o crescimento da competitividade das empresas e das economias europeias, bem como para o crescimento económico. A melhoria da produtividade depende, em grande medida, do progresso na utilização das TIC pelas empresas e da capacidade de adaptação da mão-de-obra às exigências da modernização industrial.

4.1.1

Apesar de as tecnologias electrónicas, como foi fortemente publicitado, não terem cumprido nas primeiras fases de desenvolvimento as expectativas criadas, os sectores da sociedade e da economia que nelas se centraram registaram, na verdade, um desenvolvimento sem precedentes e continuam a ter um potencial considerável.

4.1.2

Neste contexto, a Comissão Europeia considera e avalia correctamente a importância de TIC modernas para estimular a competitividade e a inovação, bem como para a economia baseada no conhecimento, sobretudo no caso das PME.

4.2

A via para melhorar a competitividade das economias europeias passa forçosamente por uma educação profissional ministrada através de programas e formações que utilizem as TIC. A criação de sistemas de educação e formação coerentes, móveis e flexíveis para indivíduos à procura de emprego, a prepararem-se para trabalhar, mas também para trabalhadores do sector industrial, aumentará a taxa de crescimento do conhecimento e permitirá obter alterações tecnológicas e inovações nas empresas transformadoras, o que aumentará a sua competitividade.

4.2.1

Neste contexto, a introdução da aprendizagem ao longo da vida baseada nas TIC nas empresas e sectores vizinhos deverá aumentar a sua competitividade e contribuir para o crescimento do capital social dos seus trabalhadores, ajudando paralelamente a aumentar o valor do capital empresarial europeu.

4.3

Por volta de 1994 houve um claro progresso na aplicação e utilização efectiva da ciberaprendizagem quando as empresas — predominantemente as grandes sociedades — começaram a recorrer a este método de forma sistemática na formação que ministravam aos seus trabalhadores e no desenvolvimento dos recursos humanos. Foi um sinal de maturidade, com a ciberaprendizagem a demonstrar a sua capacidade de fornecer soluções consolidadas e sustentadas, ultrapassando o primeiro período de mensagens de marketing e de promoção simplistas. Por seu turno, as PME representam, pelas mais variadas razões, um grupo de utilizadores da ciberaprendizagem praticamente desfavorecido, onde a taxa de utilização deste método de formação, e frequentemente também das TIC, é baixa, com a maior parte dos trabalhadores neste sector a correr o risco de ficar excluída do acesso às oportunidades da formação contínua. O crescente aumento da utilização da ciberaprendizagem é um factor que pode contribuir para melhorar a competitividade e a eficácia das PME. As entidades competentes, a nível comunitário e nacional, devem sensibilizar para esta questão e tomar medidas que promovam a utilização das TIC para efeitos de formação nas PME.

Contributo da aprendizagem ao longo da vida baseada nas TI para o desenvolvimento do capital social

4.4

O capital social abrange competências, informação, cultura, conhecimento e criatividade individual, bem como as relações entre pessoas e organizações. Há, portanto, que analisar, neste contexto, a importância destes recursos para o crescimento económico e para as mutações industriais que o acompanham, à luz da relação entre o seu desenvolvimento, divulgação e utilização e o valor acrescentado que criam.

4.4.1

A aptidão para criar uma sociedade baseada no conhecimento — criativa, inovadora, aberta à mudança e capaz de criar laços sociais e económicos duradouros — é influenciada directamente por um elevado nível de capital social. O investimento na investigação, educação e formação é um dos elementos fundamentais para a criação deste tipo de sociedade.

4.4.2

O capital social pode ser aumentado mediante a capacidade de colaboração das partes interessadas (ver ponto 3.7.1) em todos os programas e actividades de educação e formação baseadas nas TIC, especialmente a aprendizagem ao longo da vida.

Contributo da aprendizagem ao longo da vida baseada nas TI para as mutações industriais, com particular referência ao investimento nas competências dos trabalhadores, no desenvolvimento dos recursos humanos e no combate ao desemprego

4.5

O ensino e a formação à distância ministrados mediante recurso às TIC podem possibilitar uma transferência de conhecimentos sistemática, rápida e pouco onerosa. Estes conhecimentos são particularmente importantes para o sector industrial, onde o capital humano é um elemento importante, e facilitam a transferência de conhecimentos dos centros de investigação para a indústria.

4.5.1

A existência de quadros bem formados, em constante aperfeiçoamento das suas qualificações, é um importante indicador do valor de determinada empresa ou sociedade, uma vez que estes possibilitam mudanças na tecnologia de produção, respectivo perfil e adaptação às exigências do mercado de trabalho.

4.6

A Comissão Europeia (22) referiu que um rápido desenvolvimento tecnológico e uma alteração das condições económicas requer investimento a longo prazo no desenvolvimento dos recursos humanos da parte de privados, empresas, parceiros sociais e entidades públicas. Infelizmente, não há nos Estados-Membros da UE uma tendência clara de aumento da despesa pública com a educação, a qual ascende, em média, a cerca de 5 % do PIB, com grandes diferenças entre os Estados-Membros, algumas sendo mesmo drásticas.

4.7

O investimento no desenvolvimento de recursos humanos tem uma influência directa no crescimento da produtividade, sendo igualmente uma forma atraente de investimento ao nível microeconómico e social. Alguns estudos (23) revelam que, por cada ano de formação, o crescimento económico aumenta directamente em cerca de 5 % e 2,5 % numa perspectiva respectivamente a curto e longo prazo. Este factos são, igualmente, confirmados pelas conclusões do Conselho Europeu (24) que realçam que os investimentos em educação e formação geram rendimentos elevados, que ultrapassam grandemente os custos.

4.8

O rápido desenvolvimento tecnológico leva a que surjam equipamentos modernos de produção que utilizam frequentemente sistemas informáticos, que só podem ser operados por trabalhadores com conhecimentos em TIC. O recrutamento de pessoal com estes conhecimentos nem sempre é possível, mas graças à utilização em grande escala das TIC na educação e formação, em particular na aprendizagem ao longo da vida, será certamente mais fácil encontrar trabalhadores com estas competências no mercado de trabalho.

4.9

Pelas razões referidas supra e tendo em conta as actuais mutações industriais, conviria tomar medidas com vista a uma mais rápida introdução das TIC na aprendizagem ao longo da vida. Estas medidas devem acelerar o processo de aquisição de novos conhecimentos e competências pelos trabalhadores das empresas transformadoras europeias e pelos formandos desempregados. É precisamente aos desempregados, em particular, que se deve assegurar o acesso aos programas de formação em TIC subvencionados pelos poderes públicos (25).

4.9.1

Os desempregados não têm grande motivação para aprenderem sozinhos, pois têm poucas oportunidades de utilizar os conhecimentos adquiridos. A melhor motivação é haver uma possibilidade concreta de encontrar um novo emprego em virtude de determinada qualificação ou formação, idealmente, ministrada por uma empresa que ofereça um emprego.

4.9.2

Esta situação pode criar condições favoráveis para a introdução da aprendizagem ao longo da vida baseada nas TIC nos sectores onde é especialmente indicada (sectores agrícolas com indústrias transformadoras em situação de falência, uma situação que se está a tornar comum nos novos Estados-Membros), mas que não têm infra-estruturas suficientes.

4.9.3

A infra-estrutura nestas zonas carece de ajuda nacional e comunitária, pois as empresas de TI não estão muito interessadas em suportar os custos do acesso à Internet em zonas pobres (pequenas cidades e zonas rurais).

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  e-learning (aprendizagem electrónica/ciberaprendizagem/aprendizagem em linha): uso das novas tecnologias multimédia e da Internet para melhorar a qualidade da aprendizagem mediante o acesso a recursos e serviços, e a colaborações e intercâmbios a grande distância (fonte: www.elearningeuropa.info).

(2)  Lifelong learning (aprendizagem ao longo da vida/educação permanente/educação contínua/aprendizagem permanente): expressão que se utiliza para significar que a aprendizagem de novos conhecimentos se considera actualmente um processo contínuo, que não se acaba ao terminar a escola ou a universidade, mas que se desenvolve de maneira ininterrupta ao longo da vida profissional e se mantém depois da reforma, estendendo-se hoje a todas as etapas da vida e colectivos sociais, graças, em boa parte, às possibilidades do e-learning (fonte: www.elearningeuropa.info).

(3)  Acesso à Internet por banda larga: canal de comunicações que opera com ampla capacidade e que facilita um acesso ágil e rápido aos sistemas de informação e de e-learning (fonte: www.elearningeuropa.info).

(4)  Sociedade baseada no conhecimento ou sociedade do conhecimento: sociedade cujos processos e práticas assentam na produção, divulgação e utilização dos conhecimentos com o objectivo de melhorar continuamente as competências/aptidões e participar plenamente na vida familiar, social e profissional (COM(2001) 678 final).

(5)  «Programa de acção integrado no domínio da aprendizagem ao longo da vida», COM(2004) 474 final de 14.7.2004.

(6)  Decisão n.o 2318/2003/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Dezembro de 2003, que adopta um programa plurianual (2004-2006) para a integração efectiva das tecnologias da informação e comunicação (TIC) nos sistemas europeus de educação e formação (Programa eLearning) http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:32003D2318:PT:HTML.

(7)  Educação não formal: aprendizagem que ocorre em paralelo com a dispensada por um estabelecimento de ensino ou de formação, que não conduz tradicionalmente a uma certificação formal. Pode ser ministrada no local de trabalho e mediante actividades de grupos e organizações da sociedade civil (como organizações juvenis, sindicatos e partidos políticos). Pode, igualmente, ser ministrada mediante actividades ou serviços criados com vista a complementar os sistemas tradicionais. Comissão Europeia, SEC(2000) 1832 [Não há versão portuguesa].

(8)  Educação informal: aprendizagem decorrente das actividades da vida quotidiana, relacionadas com o trabalho, a família ou o lazer. Não é estruturada nem institucionalizada (em termos de objectivos, duração e recursos). Para os participantes pode ser intencional mas, na maioria dos casos, não o é, tendo um carácter fortuito (aleatório). Tradicionalmente não conduz à certificação.

Comissão Europeia, SEC(2000) 1832 [Não há versão portuguesa].

(9)  «Melhorar a aplicação da Estratégia de Lisboa».

(10)  «Modernizar a educação e a formação: um contributo essencial para a prosperidade e a coesão social na Europa», COM(2005) 549 final, de 30.11.2005.

(11)  Conclusões do Conselho Educação, Juventude e Cultura de 21.2.2005.

(12)  Conferência de Ministros sobre ICT for an inclusive society (Contributo das TIC para uma sociedade inclusiva), Riga, 11.6.2006.

(13)  COM(2005) 229 final.

(14)  «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Info-acessibilidade».

(15)  e-exclusion (info-exclusão): exclusão de participação nas comunicações electrónicas.

(16)  Literacia digital (por vezes também alfabetização digital ou cultura informática): é uma das principais competências para participar activamente na sociedade do conhecimento e na cultura dos novos meios de comunicação. Centra-se na aquisição de capacidades e aptidões (competências) relacionadas com as novas tecnologias, cada vez mais indispensáveis na vida quotidiana, Decisão n.o 2318/2003/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Dezembro de 2003, que adopta um programa plurianual (2004-2006) para a integração efectiva das tecnologias da informação e comunicação (TIC) nos sistemas europeus de educação e formação (Programa eLearning), http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:32003D2318:PT:HTML.

(17)  Parecer sobre a «Proposta de recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho sobre as competências-chave para a aprendizagem ao longo da vida», Maio de 2006.

(18)  Relatório da RAND Europe sobre The Supply and Demand of E-skills in Europe (A procura e a oferta de cibercompetências na Europa — não há versão portuguesa), Setembro de 2005 (http://ec.europa.eu/enterprise/ict/policy/doc/eskills-2005.10.11.rand.pdf).

(19)  Cibercompetências: aptidões pessoais no domínio do conhecimento sobre as TIC, bem como as competências e conhecimentos relacionados com a sua aplicação, possibilitando a realização de tarefas profissionais no nível adequado.

(20)  Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Pôr fim aos desníveis em matéria de banda larga, de 21.3.2006 (COM(2006) 129 final).

(21)  COM(2002) 262 final.

(22)  Comunicação da Comissão «Investir eficazmente na educação e na formação: um imperativo para a Europa», COM(2002) 779 final de 10.1.2003 (doc. 5269/2003).

(23)  De la Fuente e Ciccone, «Human capital in a global and knowledge based economy» (O capital humano numa economia global e baseada no conhecimento), relatório final para a DG Emprego e Assuntos Sociais, Comissão Europeia, 2002.

(24)  Conclusões da Presidência, Conselho Europeu de Bruxelas, 23 e 24 de Março de 2006 (doc. 7775/06, ponto 24) http://www.consilium.europa.eu/ueDocs/cms_Data/docs/pressData/pt/ec/89015.pdf.

(25)  Parecer sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre «i2010: Uma sociedade da informação europeia para o crescimento e o emprego».


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/26


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Os serviços e a indústria transformadora da UE: Interacções e impactos no emprego, na competitividade e na produtividade»

(2006/C 318/04)

Em 19 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre Os serviços e a indústria transformadora da UE: Interacções e impactos no emprego, na competitividade e na produtividade.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Comissão Consultiva das Mutações Industriais, que emitiu parecer em 31 de Agosto de 2006, sendo relator Calleja e co-relator Rohde.

Na 429.o reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 183 votos a favor, 3 votos contra e 4 abstenções, o seguinte parecer:

Conclusões e recomendações

O presente parecer advoga:

Declaração geral

É necessário reconhecer a importância dos serviços às empresas para os níveis de crescimento, competitividade e emprego da indústria transformadora e dos serviços da UE. O recurso a serviços às empresas competitivos deve ser promovido, através de um conjunto de medidas políticas coerentes a nível europeu. O projecto de plano de acção de 2005 do Fórum dos Serviços Ligados às Empresas na UE constitui uma boa plataforma para aprofundar a discussão.

Objectivos políticos e acompanhamento

O papel positivo dos serviços às empresas para o desenvolvimento dos sectores público e privado da indústria transformadora e dos serviços deve ser apoiado através de medidas específicas. A nível da UE, o CESE recomenda vivamente as seguintes:

acções directas e complementares para completar o mercado interno dos serviços às empresas e, especialmente, a eliminação dos obstáculos ao regular funcionamento do sector (barreiras que impedem a integração do mercado, mobilidade da força de trabalho e crescimento económico);

reconhecimento urgente dos serviços às empresas como parte integrante de toda e qualquer política industrial; a Comissão Europeia deveria ter isto em atenção e actuar no sentido de alargar o âmbito da política industrial europeia integrando nela os serviços às empresas;

criação de um Observatório Europeu dos Serviços às Empresas para recolher informação, incentivar a investigação, estimular o debate e sugerir e acompanhar a execução de recomendações de política;

reforço do Diálogo Social para seguir e avaliar as mudanças nas condições de trabalho e nas oportunidades de emprego resultantes de mudanças estruturais que suportam a nova economia de serviços às empresas.

De uma maneira mais geral, há outras medidas a tomar a nível do mercado, que deverão, aliás, ser apoiadas pelas administrações públicas, a saber:

promoção dos serviços às empresas, como meio de melhorar o desempenho industrial e empresarial e de conseguir vantagens competitivas em relação a países, com custos baixos ou outros, concorrentes no mercado global;

incentivo ao recurso mais extenso e eficaz aos serviços às empresas por parte das PME;

estímulo do emprego e melhoria das condições de trabalho nos serviços às empresas como meio de aumentar a produtividade e de melhorar a qualidade dos serviços e do nível de vida;

programas de formação dirigida a alvos bem precisos e de reciclagem para reforçar a adaptabilidade e melhorar a empregabilidade dos trabalhadores atingidos por mudança estrutural.

I & D, inovação e prestação digital

Os programas de I & D com financiamento público nacionais ou comunitários deverão dar especial atenção a acções e projectos que visem aumentar a produção e a utilização de serviços às empresas inovadores.

Deverá ser dada especial atenção a projectos específicos de serviços de conhecimento intensivo na indústria transformadora, conducentes à inovação e com potencial de elevada produtividade e crescimento (por exemplo, serviços de TIC e de I & D).

Os serviços às empresas são uma fonte de inovação na economia do conhecimento. Deve incentivar-se a investigação para desenvolver mais a «ciência dos serviços», em especial o saber-fazer metodológico a aplicar nos processos empresariais.

Os direitos de propriedade intelectual, bem como outros mecanismos de protecção, deverão ser reforçados, mediante a adopção da legislação pendente em matéria de patentes, para incentivar as empresas a investirem mais em I & D e em inovação.

Há que reconhecer e promover o papel das TIC na inovação dos serviços com objectivos como assegurar a prestação dos serviços, especialmente nas PME, através do acesso à Internet em banda larga de alta velocidade por toda a Europa, procurando ao mesmo tempo resolver os problemas de segurança e privacidade relacionados com as redes digitais de cibernegócio. A iniciativa da Comissão Europeia «i2010» tem um importante papel neste contexto.

Engenharia de serviços e normas

A engenharia de serviços é uma disciplina nova com utilidade como base para a melhoria da qualidade da produção dos serviços às empresas através do aperfeiçoamento do planeamento sistemático. Esta abordagem inovadora merece ser desenvolvida como uma especialidade de investigação e de ensino nas universidades, nas escolas de Ciências da Empresa e noutras organizações de formação.

As normas podem desempenhar um papel útil no aumento da qualidade dos serviços e na maior integração dos mercados da UE. Para tanto, deve incentivar-se a promoção da normalização voluntária dos serviços em geral e dos serviços às empresas em particular.

Melhorar o conhecimento e o emprego nos serviços às empresas europeus

Encontrar soluções para reforçar o capital humano na UE e inverter a tendência de fuga crescente de cérebros das actividades de investigação da UE.

Introduzir novos incentivos ao sector privado, para aumentar a participação deste nas actividades de I & D na linha da Estratégia de Lisboa.

Melhorar os dados e as informações sobre serviços às empresas e sobre os serviços prestados por empresas industriais.

Aumentar a transparência dos mercados fornecedores de serviços às empresas.

Prever mais recursos para uma melhor educação, formação, ciberaprendizagem e conhecimento de línguas para possibilitar o desenvolvimento dos serviços às empresas transfronteiriços.

Justificação

1.   Introdução

1.1

O presente parecer examina o impacto dos serviços às empresas no emprego, na competitividade e na produtividade da indústria transformadora europeia e a forma como este sector pode conhecer um maior desenvolvimento, em conformidade com o programa de Lisboa. Foca também os progressos da nova disciplina conhecida como «engenharia de serviços» e o impacto da externalização/subcontratação dos serviços às empresas.

1.2

As perspectivas da economia europeia e a forma como esta enfrentará a emergência de uma forte concorrência de economias de baixo custo suscitam apreensão. Na Europa, a indústria transformadora e os serviços perderam muitos postos de trabalho para outros países com vantagens comparativas em termos de custos e qualificações (por exemplo, a China, na indústria transformadora, e a Índia, nos serviços às empresas). Apesar desta evolução, a indústria transformadora continua a desempenhar um papel fundamental na economia europeia. De acordo com as mais recentes estatísticas disponíveis relativas a 2004, a UE é o maior exportador de mercadorias, com um valor superior a 1,2 biliões de dólares E.U.A. (1).

1.3

A indústria transformadora ainda é considerada a principal fonte de mudança tecnológica e inovação na UE, mas constata-se, por outro lado, que, na última década, não soube incrementar as suas actividades nas áreas de alta tecnologia e de maior valor acrescentado. O crescimento relacionado com os serviços às empresas, em especial através da utilização de serviços de conhecimento intensivo, constitui um canal complementar para o desenvolvimento de novas tecnologias, para novas oportunidades de emprego e para a aquisição de vantagens concorrenciais. Os serviços às empresas proporcionam também fontes de inovação não-tecnológica (por exemplo, organizativa) que melhoram os activos incorpóreos das empresas e o saber-fazer dos trabalhadores.

1.4

A notável reorientação do consumo para os serviços nas economias muito desenvolvidas não denota uma tendência para a desindustrialização, como, por vezes, se presume. Esta evolução pode ser considerada como o reflexo estatístico de uma divisão cada vez mais marcada do trabalho nas economias desenvolvidas e uma desagregação de cadeias de valor verticais anteriormente integradas. Os prestadores de serviços especializados oferecem agora serviços que, anteriormente, eram assegurados internamente pelas empresas transformadoras. Desenvolveram-se novas empresas de serviços, que apoiam os esforços da indústria europeia para aumentar a eficiência e absorver novas tecnologias susceptíveis de dar origem a produtos novos e de maior valor acrescentado.

1.5

Trabalhos de investigação recentes revelam que, no tipo de economia que se está a desenvolver, os serviços e a indústria transformadora são, por natureza, integrados e complementares. A procura de serviços existe onde quer que haja uma forte economia industrial, desenvolvendo-se em resultado desta. Não representam uma alternativa única (2).

1.6

O presente parecer não defende uma promoção especial dos serviços em detrimento da indústria transformadora, mas sublinha a interdependência entre a indústria transformadora e o sector dos serviços (3) e destaca o potencial positivo de melhoria e expansão dos serviços às empresas. O CESE sublinha o contributo positivo destes serviços para o aumento da produtividade e da competitividade do sector transformador europeu. Simultaneamente, o sector dos serviços às empresas aumenta a sua própria produtividade através da inovação, com a rápida incorporação das novas tecnologias, atraindo trabalhadores com melhores qualificações e melhorando as condições de trabalho (4).

1.7

A externalização/subcontratação dos serviços mediante o recurso a prestadores de serviços especializados, capazes de tirar partido de economias de escala e de uma inovação contínua nos processos, tem um impacto positivo nos custos e na produtividade. Contudo, a incorporação de conhecimentos e serviços às empresas inovadores pelas PME parece não ser suficiente. Ao mesmo tempo, a capacidade dos trabalhadores de se deslocarem da indústria transformadora para os serviços às empresas precisa de ser facilitada através de programas apropriados de reconversão profissional.

1.8

Actualmente, os prestadores nacionais de serviços asseguram a maior parte dos serviços às empresas. Contudo, não existem garantias de que esta situação se mantenha no futuro. Há toda uma série de serviços que as empresas podem comprar fora do país, a um nível europeu mais vasto que inclui os novos Estados-Membros e os países candidatos, ou mesmo a nível mundial, em função dos custos e da oportunidade (externalização «próxima»(nearshoring) e «remota» (offshoring)). Os dados mais recentes revelam que, em 2004, a UE-25 teve um balanço positivo de 42 800 milhões de euros no comércio de serviços (um aumento de 5 800 milhões de euros em relação a 2003) (5).

1.9

É necessária uma análise permanente e exaustiva das estruturas e processos empresariais, a fim de identificar as funções que podem ser adquiridas a prestadores de serviços especializados às empresas ou a redes de empresas (serviços partilhados) capazes de lidar com tais funções mais eficientemente, na medida em que operam numa escala mais vasta e que põem em conjunto a sua experiência especializada. Embora possa ter impacto no emprego na indústria transformadora, isto pode, por vezes, ajudar a contrabalançar os potenciais efeitos negativos da externalização remota (offshore outsourcing), a manter as indústrias transformadoras na Europa e a aumentar a procura de emprego nos serviços às empresas. O aumento do número de postos de trabalho qualificados na área dos serviços nas empresas confere novas vantagens competitivas.

2.   Desafios para a indústria europeia: um desafio para os serviços às empresas

2.1

Todos os sectores da economia europeia sentem os efeitos da globalização e a necessidade de mudar para se adaptarem às novas circunstâncias. A política industrial pode desempenhar um papel positivo neste contexto. Na Comunicação Acompanhar as mutações estruturais: Uma política industrial para a Europa alargada  (6), a Comissão Europeia afirmava a sua intenção de desenvolver uma política industrial adequada para acompanhar as mutações industriais:

a indústria europeia tem de suportar um processo de mutações estruturais globalmente benéfico e que deve ser incentivado por políticas tendentes a facilitar o desenvolvimento e a utilização de conhecimentos;

a internacionalização económica oferece oportunidades à indústria europeia, desde que a política industrial apoie as evoluções necessárias e políticas activas do mercado de trabalho e social impeçam o impacte negativo nos trabalhadores;

o alargamento da UE proporcionou não só a ampliação do mercado interno, mas também a possibilidade de reorganizar as cadeias de valor em todo o continente para tirar o melhor partido das vantagens competitivas dos novos Estados-Membros;

a transição para uma economia do conhecimento será fundamental, e será necessária uma certa prudência regulatória, para evitar pôr sob pressão a competitividade industrial dos novos Estados-Membros.

O CESE defende progressos mais rápidos em realizações concretas da política industrial da UE e a inclusão dos serviços às empresas no seu quadro.

2.2

Mais recentemente, a Comissão Europeia publicou uma Comunicação sobre Aplicar o Programa Comunitário de LisboaUm enquadramento político para reforçar a indústria transformadora da UErumo a uma abordagem mais integrada da política industrial  (7). No âmbito deste enquadramento para a política industrial, a Comissão identificou sete grandes iniciativas políticas transsectoriais:

iniciativa em matéria de direitos de propriedade intelectual e da contrafacção;

grupo de alto nível sobre competitividade, energia e ambiente;

aspectos externos da competitividade e do acesso aos mercados;

novo programa de simplificação legislativa;

melhorar as competências sectoriais mediante a identificação das correspondentes necessidades e défices de competências;

gerir a mudança estrutural na indústria transformadora;

uma abordagem europeia integrada da investigação e da inovação industriais.

O facto de não se debruçar sobre os serviços em geral e sobre os serviços às empresas em particular é uma séria insuficiência desta comunicação. O CESE reclama que os serviços às empresas façam parte integrante de toda e qualquer política industrial e insta com a Comissão Europeia para alargar o âmbito das futuras abordagens da política industrial integrando os serviços às empresas. Isto significa o reforço da aprendizagem ao longo da vida e apoio para facilitar a mobilidade dos trabalhadores.

2.3

A Europa necessita de abraçar mais ampla e profundamente as tecnologias da informação e da comunicação (TIC). A intensificação das TIC e a sua integração na indústria é tão importante quanto o é nos serviços às empresas. Em termos de adopção das TI, a Europa está muito aquém dos seus principais concorrentes. Em 2004, a despesa per capita com TI era de 732 euros na Europa Ocidental, de 1 161 euros nos Estados Unidos e de 1 012 euros no Japão. Em termos de percentagem do PIB, a despesa com TI representava 3,08 % na Europa Ocidental, 4,55 % nos Estados Unidos e 3,59 % no Japão (8).

2.4

O diferencial de produtividade da indústria europeia é, frequentemente, atribuído à escassa adopção de tecnologia e à insuficiente exploração do potencial das TIC, sobretudo pelas PME. Aparentemente, o problema não é originado pelo custo do hardware. O problema reside na falta de conhecimento e de proficiência das PME em TIC, o que lhes torna difícil acompanhar as rápidas mudanças nas TIC e a crescente complexidade delas. Existe uma «fractura digital» que separa as pequenas das médias empresas, em consequência da qual ainda não foi realizado o pleno potencial dos modelos de TIC e de negócios electrónicos (9). O papel dos serviços às empresas é importante para tornar o sector das TIC eficiente e, assim, proporcionar ganhos de produtividade sustentáveis.

2.5

O mercado interno dos serviços em geral e dos serviços às empresas em particular não está completo, existindo muitos obstáculos que dificultam as oportunidades de eficiência, competitividade e criação de emprego. No relatório sobre a «Situação do mercado interno dos serviços» (10) são reconhecidas muitas barreiras, mas alguns progressos foram feitos com a aplicação da Estratégia de Lisboa. Além dos aspectos de regulação dos mercados de serviços às empresas, são necessárias políticas complementares como as indicadas neste documento para garantir a necessária competitividade da UE no mercado global bem como progressos sociais e económicos.

3.   A importância dos serviços às empresas e a sua interacção com a indústria

3.1   Definição de serviços às empresas

Tradicionalmente, estes serviços são definidos como um subgrupo (NACE 70-74) dos serviços relacionados com as empresas (isto é, serviços às empresas mais os serviços de transporte, comunicações, distribuição e serviços financeiros) (11). O critério subjacente à definição de ambos os conceitos é a clientela a que os serviços são dirigidos. Não se trata de serviços principalmente dirigidos a consumidores finais, mas antes a empresas. Trata-se de actividades reais, que influenciam, em primeiro lugar, a competitividade das empresas (não são incompatíveis com a prestação de serviços a consumidores), através da sua utilização como inputs intermédios na cadeia de valor e, também, através dos ganhos de qualidade e de inovação resultantes da interacção entre fornecedor, cliente e serviço. Os serviços às empresas têm a característica particular de muitos deles poderem quer ser realizados na e pela própria empresa quer contratados externamente a uma empresa especializada.

3.2

Os serviços às empresas são um grupo muito heterogéneo de actividades que vão dos serviços profissionais (por exemplo, engenharia, contabilidade, serviços jurídicos) aos serviços de elevado valor acrescentado (por exemplo, serviços de TIC, consultoria de gestão), aos serviços de pessoal (por exemplo, selecção de pessoal, recolocação externa (outplacement), trabalho temporário) e aos serviços às empresas, que incluem os de baixo valor acrescentado (por exemplo, limpeza, segurança, alimentação) e os de valor acrescentado crescente (por exemplo, gestão de energia, abastecimento e tratamento de água e outros líquidos e tratamento do ar e resíduos). Nestes grupos de actividades, merecem especial atenção as condições laborais e sociais.

Quadro 1.   Principais serviços necessários para o desempenho das empresas (abordagem funcional) (12)

Funções nas empresas

Principais serviços ligados às empresas

 

Funções nas empresas

Principais serviços ligados às empresas

Administração

Consultoria de gestão

Serviços jurídicos

Auditoria e contabilidade

 

Gestão da informação

Serviços informáticos e de TI

Telecomunicações

Recursos humanos

Trabalho temporário

Recrutamento de pessoal

Formação profissional

 

Marketing e vendas

Publicidade

Distribuição

Relações públicas

Feiras e exposições

Serviços pós-venda

Actividades financeiras

Actividade bancária

Seguros

Aluguer e leasing

 

Transportes e logística

Logística

Serviços de transporte

Serviços de expedição

Produção e apoio técnico

Serviços técnicos e de engenharia

Testes e controlo de qualidade

serviços I & D

Design industrial

Manutenção e reparação de equipamentos

 

Gestão de instalações

Serviços de segurança

Serviços de limpeza

Fornecimento de refeições

Serviços ambientais/

gestão de resíduos

Serviços fornecimento de energia e de água

Imobiliário (entrepostos)

3.3   O lugar dos serviços às empresas na economia

Os serviços às empresas constituem uma componente importante da economia de mercado europeia. Contudo, a mais importante característica destes serviços consiste no facto de estarem presentes, e integrados, em todos os estádios da cadeia de valor. O crescimento dos serviços às empresas é normalmente explicado pela migração do emprego da indústria transformadora para o sector dos serviços, por força da externalização das funções dos serviços. No entanto, são múltiplas as razões desse crescimento. Mudanças nos sistemas de produção, maior flexibilidade, maior concorrência nos mercados internacionais, crescente papel e conhecimento das TIC e emergência de novos tipos de serviços são outros tantos factores importantes. «De acordo com as Estatísticas Estruturais das Empresas (SBS), o sector dos serviços ligados às empresas (excluídos os serviços financeiros) absorvia 53 % do emprego total na economia da UE em 2001, enquanto que a indústria representava 29 % (cerca de 29 milhões de pessoas empregadas). […] Em média, o valor acrescentado dos serviços ligados às empresas foi de 54 % em 2001, contra 34 % para a indústria» (13).

3.4

Hoje cada vez mais empresas transformadoras se aventuram elas próprias nos serviços. Não só oferecem serviços pós-venda, mas descobrem em cada vez maior medida o valor acrescentado através da venda do seu conhecimento especializado na engenharia, no design ou na inovação de processos a outras empresas como parte da sua actividade económica. Está a emergir um novo modelo de empresa híbrida que inclui empresas com actividades de transformação/serviço. Os clientes procuram cada vez mais «soluções» em vez de produtos simplesmente, pelo que é, muitas vezes, a capacidade de prestar serviços adicionais que confere a uma empresa transformadora a sua vantagem competitiva.

3.5

Ausência de dados estatísticos específicos sobre serviços às empresas  (14). Não existem dados estatísticos suficientes sobre a procura de serviços. A inter-relação entre os diferentes sectores não está suficientemente documentada. Espera-se que a informação sobre as actividades do sector dos serviços e a sua contribuição para as economias dos Estados-Membros seja melhorada através de uma revisão do sistema de classificação NACE, prevista para 2007. A classificação revista dará uma melhor visão da estrutura e da evolução do sector de serviços (15). Falta também informação sobre até que ponto as empresas industriais prestam serviços.

3.6

Fragmentação e escassez de informação e análise relacionadas com os serviços às empresas. Para o CESE é necessário um Observatório Europeu dos Serviços às Empresas para recolher informação, incentivar a investigação, estimular o debate e sugerir e acompanhar a execução das recomendações de política. Um observatório ou acção similar levaria a uma melhor compreensão da nova evolução a grande velocidade do sector e serviria de ponto de encontro entre os decisores políticos e as partes interessadas.

3.7

Normalização dos serviços. O novo impulso imprimido à normalização voluntária dos serviços, com base nas necessidades do mercado e em elementos comprovativos consistentes, inclui o aumento dos níveis básicos de segurança, qualidade e desempenho e a promoção da concorrência e da inovação na prestação de serviços. Este desafio tem de ser enfrentado pelo Comité Europeu de Normalização (CEN), pela Organização Internacional de Normalização (ISO) e pelas entidades nacionais de normalização. O desenvolvimento de normas voluntárias no sector dos serviços estimularia, seguramente, o comércio de serviços transfronteiras e contribuiria para promover o mercado interno de serviços.

4.   De que forma os serviços às empresas reforçam a competitividade da indústria (16)

4.1

Os serviços às empresas têm um papel fundamental na ajuda ao sector das PME para realizar o seu contributo potencial para a inovação e o crescimento. Há dados comprovativos de que as PME mais dinâmicas utilizam amplamente os serviços às empresas. Face às pressões da internacionalização, importa promover um maior recurso a estes serviços por uma gama mais vasta de PME.

4.2

Capacidade de inovação nacional.

A capacidade de uma nação para produzir novas ideias e para comercializar um fluxo de tecnologias inovadoras durante um longo período de tempo é influenciada por uma série de factores (17):

infra-estrutura geral de inovação;

condições-quadro/políticas de acompanhamento essenciais;

interconexão do sistema de inovação geral;

sistemas gerais de educação.

4.3

85 % da investigação da UE concentra-se na indústria transformadora (contra 66 % nos Estados Unidos), e não há dados fiáveis acerca da repartição das actividades de I & D no sector dos serviços. Do total das actividades de I & D na indústria transformadora, 87,5 % são desenvolvidas em oito áreas específicas (produtos químicos, engenharia mecânica, equipamento de escritório, equipamento eléctrico, material semicondutor para comunicações, instrumentos, veículos motorizados e aeronaves e naves espaciais).

4.4

Em termos de despesa absoluta, a UE não conseguiu colmatar o fosso na I & D em relação aos Estados Unidos; na verdade, este fosso aumentou na última década.

4.5

Para a competitividade da indústria europeia, é fundamental que seja prestada maior atenção ao financiamento da I & D na área dos serviços de alta tecnologia e de conhecimento intensivo (margem elevada). O objectivo de 3 % (18) será mais fácil de atingir se os governos aumentarem as suas autorizações financeiras e o sector privado for incentivado e ajudado a investir mais neste particular, incluindo os serviços às empresas.

4.6

A criação de um instituto de tecnologia europeu, proposta pela Comissão Europeia numa comunicação recente (19), é útil, mas a tecnologia tem de ser acompanhada por estratégias empresariais e organizativas eficazes.

4.7

O impacto das funções inovadoras dos serviços às empresas é apresentado no quadro seguinte.

Quadro 2:   Funções inovadoras dos serviços às empresas (20)

Funções inovadoras

Principais elementos de inovação

Serviços às empresas (alguns sectores representativos)

Inovação tecnológica

Maior integração de tecnologia

Utilização da tecnologia existente

Adaptação da tecnologia às necessidades das empresas

Eficiência dos processos avançados de informação e comunicação

Automatização de processos rotineiros

Flexibilização de estruturas produtivas

Melhoria da qualidade

Serviços de TI

Serviços de engenharia

Serviços de design

Serviços de telecomunicações

Serviços em linha de comunicação electrónica

Serviços de controlo de qualidade

Inovação organizacional

Eficácia da organização interna

Articulação dos processos de controlo e de coordenação

Melhoria da selecção, formação e utilização do factor humano

Melhoria das diferentes especializações operacionais

Consultoria de gestão e gestão

Auditoria e serviços jurídicos

Serviços de pessoal (selecção, formação e emprego temporário)

Inovação estratégica

Flexibilidade para contextos dinâmicos

Posicionamento em mercados complexos

Informação estratégica sobre alianças

Informação sobre adaptação de produtos

Informação sobre localização e mercados

Defesa em enquadramentos jurídicos de conflito

Serviços de gestão

Serviços em linha

Serviços de auditoria

Serviços jurídicos

Serviços de feiras e exposições

Serviços de marketing

Inovação comercial

Concepção concorrencial de produtos

Comercialização inovadora

Aproveitamento de oportunidades

Prospecção e relações com o cliente

Marketing inovador

Imagem

Serviços de design

Feiras e exposições

Publicidade

Marketing directo

Relações públicas

Serviços pós-venda

Inovação operacional

Divisão funcional do trabalho

Concentração em tarefas essenciais

Capacidade operacional

Imagem

Serviços linguísticos

Serviços de expedição

Serviços de segurança

Serviços operacionais

Fonte: Rubalcaba (1999) Business services in European Industry; Comissão Europeia, Bruxelas.

4.8

Algumas das mais inovadoras empresas europeias pertencem ao sector dos serviços, mas o nível global de I & D no sector dos serviços é demasiado baixo e pouco estruturado. Muitas vezes, os novos serviços e modelos empresariais são resultado de tentativas e inêxitos onerosos e demorados de empresas individuais. É necessário que a UE apoie a investigação em áreas seleccionadas, a fim de actualizar a proficiência das empresas em tecnologias de ponta globais liderantes.

4.9

É importante encontrar maneiras de melhorar o acesso das PME aos resultados da investigação e apoiá-las no desenvolvimento de produtos a curto prazo.

4.10

Para que as empresas invistam mais em inovação e em I & D, é necessário que a Comissão Europeia garanta a adequada protecção dos direitos de propriedade intelectual e que se actue no sentido de pôr em aplicação a proposta pendente relativa ao registo de patentes das invenções implementadas por computador.

4.11

É necessário também melhorar a legislação e a regulamentação.

5.   O sistema de criação de conhecimento da UE

5.1

É necessária uma reestruturação radical do sistema de criação de conhecimento da UE, incluindo:

a reorientação das actividades de I & D para empresas de alta tecnologia produtoras de TIC;

a cessação da fuga de cérebros da UE para os EUA (os investigadores da UE que vão trabalhar para os EUA são o dobro dos investigadores dos EUA que vêm trabalhar para a UE; 40 % da I & D dos EUA é realizada por cientistas formados na UE);

o aumento da despesa total com investigação, para atingir a meta de Lisboa de 3 % do PIB;

a necessidade de considerar as competências de utilizador de TIC, a literacia digital e as competências de comércio electrónico como essenciais; os curricula devem integrar competências em TIC desde uma idade precoce;

a banda larga avançada, fixa ou móvel, será a infra-estrutura da economia baseada no conhecimento neste século. Neste contexto, a iniciativa i2010, lançada pela DG da Sociedade da Informação em 2005, desempenha um papel crucial.

6.   O papel da «engenharia de serviços»

6.1

A inovação na área dos serviços tem sido objecto de intensas discussões e investigação, principalmente na Alemanha, desde meados da década de 90. A engenharia de serviços esteve na base de grande parte do impulso aos trabalhos académicos e práticos neste domínio, tendo-se transformado numa disciplina técnica que se ocupa do desenvolvimento sistemático e da concepção de produtos de serviços com utilização de modelos, métodos e instrumentos adequados. Embora a engenharia de serviços cubra igualmente aspectos da gestão do funcionamento dos serviços, o desenvolvimento de novos produtos de serviços constitui o seu principal objecto. Simultaneamente, a engenharia de serviços concentra-se também na concepção de sistemas de desenvolvimento, ou seja, nas questões relacionadas com os serviços no domínio da gestão da I & D e da inovação em geral.

6.2

A investigação fundamental de novos modelos, métodos e instrumentos empresariais dará à engenharia de serviços um valioso impulso. As abordagens integradas de bens físicos, de software e de serviços de co-engenharia assumirão um carácter cada vez mais estabelecido. Por último, a crescente harmonização das normas de serviços incentivará a especificação e o eficaz desenvolvimento de novos serviços (21).

6.3

A engenharia de serviços é um dos poucos domínios do sector de serviços que foi substancialmente modelado pela investigação europeia. Uma mais estreita integração em redes internacionais e o desenvolvimento sistemático de uma comunidade independente de engenharia de serviços são essenciais para sustentar futuramente um papel de liderança neste domínio (22).

7.   A importância da prestação digital de serviços

7.1

Intensificação da prestação em linha. É dada crescente atenção ao aumento e ao impacto da contratação internacional de serviços de tecnologia de informação e de serviços de processos de empresa, que as TIC tornaram possível. A aplicação das TIC está a reorientar os serviços às empresas, sendo cada vez mais intensa a prestação em linha. Em áreas como os serviços de software, serviços de I & D e ensaios técnicos, serviços de consultoria e serviços de desenvolvimento de recursos humanos e de fornecimento de mão-de-obra, a tónica está agora na prestação digital. Esta mudança é induzida, essencialmente, pelo mercado e resulta:

de novas exigências e expectativas dos clientes;

do impulso para aumentar o alcance do mercado e expandir mercados;

da melhoria da qualidade e da profundidade das relações com os clientes;

do acréscimo da eficiência operacional e das economias de escala;

da redução dos custos através da melhoria e da expansão de opções de produção e de prestação de baixo custo.

7.2

Exploração dos benefícios potenciais da externalização para lugares remotos (offshoring) para a economia da UE. Estão a surgir novos desafios na prestação a decorrer de serviços externalizados a partir de qualquer ponto do globo. A Europa deve, por isso, estar pronta a prestar e exportar serviços de alta qualidade para o resto do mundo. A prestação digital de serviços e o correspondente apoio de comércio electrónico (e-business) vai aumentar de certeza. A externalização para locais remotos (offshoring) no plano internacional de serviços ligados às empresas está a concentrar-se em funções de apoio logístico e administrativo (back-office) (por exemplo, serviços de TI, serviços financeiros e contabilísticos, funções de centro de chamadas). Nos serviços de maior valor acrescentado, como a engenharia, investigação e análise de TI, a UE está ainda a manter os seus próprios serviços. Todavia, o desenvolvimento tecnológico, a disponibilidade de competências e os custos relacionados no mercado global vão com certeza afectar mais as decisões das empresas europeias no futuro. Este é um desafio para o mercado de trabalho europeu proporcionar mais oportunidades de emprego que requeira elevadas competências e evitar o desemprego (23).

7.3

Obstáculos à generalização da prestação digital de serviços. Há obstáculos ao desenvolvimento da prestação de serviços digital que devem ser objecto de profunda investigação e para os quais devem ser encontradas soluções, de modo que as empresas europeias de serviços às empresas possam ser mais agressivas e expandir-se mais fora das fronteiras da UE. Entre estes obstáculos contam-se a falta de normas e interoperabilidade, confiança e segurança no comércio electrónico, a falta de investimento em infra-estruturas de banda larga fixa ou móvel e a adopção ainda demasiado escassa das TIC pelas PME.

8.   O potencial de emprego nos serviços às empresas

8.1

O emprego no sector dos serviços às empresas aumentou exponencialmente nas últimas décadas. Entre 1979 e 2002, as taxas de crescimento anual foram de cerca de 4,5 %, muito superiores às de qualquer outro sector da economia. Em 2003, a parte do emprego nos serviços às empresas no emprego total era de 9 % na UE-15 e de 8,6 % na UE-25. Os sectores dos serviços em geral e os serviços às empresas em particular serão chamados a desempenhar um papel fundamental na criação de novos postos de trabalho e irão compensar a diminuição de postos de trabalho na indústria transformadora.

8.2

O Quadro 3 mostra o aumento do emprego na área dos serviços às empresas até 2002, comparativamente com a economia em geral.

Quadro 3:   Taxas de crescimento anual do emprego na área dos serviços às empresas, 1979-2002 (24)

País

Economia total

Serviços às empresas

Imobiliário

Aluguer

Serviços profissionais

Contratos I & D

Serviços de IC

Serviços operacionais

LU

2,6

7,6

5,2

4,4

7,5

6,5

12,4

7,4

PT

0,4

6,9

6,5

5,5

6,7

7,7

8,1

7,0

IE

2,0

6,4

5,3

4,6

6,0

0,8

10,5

6,5

IT

0,5

6,4

4,4

8,0

6,1

4,1

6,5

6,7

DE

0,6

5,3

4,2

3,4

4,5

2,9

6,5

5,8

FI

0,1

5,4

1,0

1,6

4,3

3,3

8,5

6,0

ES

1,1

5,4

3,7

6,0

4,9

3,2

7,4

5,8

NL

1,6

4,7

3,7

5,3

4,1

3,4

8,1

4,7

AT

0,3

4,8

1,4

2,6

4,3

4,0

9,6

4,8

SE

0,2

4,7

1,2

2,7

4,3

4,2

6,1

4,7

EL

0,8

4,6

5,9

3,4

4,2

4,0

8,1

4,8

UK

0,4

3,3

4,8

2,2

2,8

-0,4

6,9

3,5

FR

0,5

3,2

1,3

4,1

2,5

1,7

4,7

3,8

DK

0,3

3,1

1,5

2,8

1,8

-0,8

5,8

4,3

BE

0,3

3,6

3,9

0,9

3,2

-1,7

5,0

4,0

UE15

0,6

4,4

3,3

3,3

3,9

1,7

6,4

4,7

EUA

1,4

4,7

1,6

3,5

3,5

2,9

8,8

5,3

8.3

O crescimento dinâmico do emprego no sector dos serviços, em especial nos serviços às empresas de conhecimento intensivo, é um atributo característico das economias modernas. Embora, na Europa, os níveis de emprego nos serviços às empresas, bem como as taxas de crescimento, variem de país para país, pode afirmar-se que «não há países pobres com muitos serviços às empresas, nem países ricos com poucos empregos na área dos serviços às empresas» (25).

8.4

É de esperar que o aumento do emprego no sector dos serviços, em especial dos serviços às empresas de conhecimento intensivo, prossiga a uma taxa um pouco mais moderada. Não obstante, segundo o quadro 4, esta será mais elevada dos que as projectadas para as outras actividades económicas. As taxas de crescimento deverão ser essencialmente superiores nos novos Estados-Membros, onde o desenvolvimento dos serviços parte de níveis absolutos substancialmente inferiores.

Quadro 4.   Tendências de emprego nos diversos sectores na Europa Ocidental Agriculture etc.

Image

Nota: Entende-se por Europa Ocidental a UE-15 + Noruega + Suíça.

Fonte: Cambridge Econometrics Press Release, What has happened to the Lisbon agenda? (Que aconteceu à Agenda de Lisboa?), Novembro de 2005.

8.5

Uma característica especial do emprego no sector dos serviços às empresas é o nível elevado de habilitações. Como revela o inquérito à força de trabalho da UE, em 2003, a proporção de empregos «muito qualificados» atingia 41 %, contra 38 % em 1998. O nível de pouco qualificados situava-se em 17 %, contra 25 % em 1998. O facto de a maior parte dos postos de trabalho no sector dos serviços às empresas exigir qualificações de nível médio ou elevado representa ainda um desafio para os sistemas de ensino europeus (em especial para as políticas de aprendizagem ao longo da vida), uma vez que as mutações estruturais da indústria europeia obrigarão um número crescente de pessoas provenientes de outras áreas de emprego a procurar emprego no sector dos serviços às empresas. A aplicação rigorosa da agenda da educação 2010 da agenda de Lisboa será especialmente importante nesta situação. O Quadro 5 mostra os níveis de habilitações dos trabalhadores de diversos sectores.

Quadro 5.   Níveis de habilitações nas principais actividades económicas e serviços às empresas — UE-15, 2003 (26)

Image

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Estatísticas do comércio da OMC, 2004.

(2)  Business Services in European Industry (Os Serviços às Empresas na Indústria Europeia), Luis Rubalcaba-Bermejo — Comissão Europeia, 1999.

(3)  Resumo do relatório final: The significance of competitive manufacturing industries for the development of the services sectors (A importância de indústrias transformadoras competitivas para o desenvolvimento do secto dos serviços), Kalmbach et al.,Universidade de Bremen, Dezembro de 2003.

(4)  Ver o parecer do CESE sobre «O desafio competitivo das empresas europeias» que salienta a importância de garantir as condições sociais apropriadas ao procurar aumentar a produtividade e a competitividade. Ver, em especial, os pontos 2.5 a 2.5.3; em 2.5.2, por exemplo, o CESE afirma que «urge também reforçar a competitividade do espaço europeu face à concorrência em condições que garantam o seu desenvolvimento económico e social, a coesão, o emprego e a protecção do ambiente».

(5)  Comunicado de imprensa 17/2006 do Eurostat, de 13.2.2006.

(6)  COM(2004) 274 final. Ver parecer do CESE adoptado em 15.12.2004 (relator: J. Van Iersel, co-relator: B. Legelius), JO C 157, 28.6.2005, p. 75 e segs.

(7)  COM(2005) 474 final. Ver parecer do CESE adoptado em 20.4.2006 (relator E. Ehnmark), JO C 185, 8.8.2006, p. 80 e segs. Ver também o parecer complementar da CCMI (relator A. Pezzini).

(8)  EITO 2005, p. 263.

(9)  E-Business Report (Relatório sobre os Negócios Electrónicos), 2005.

(10)  COM(2002) 441 final, de 30 de Julho de 2002.

(11)  Ver comunicação da Comissão Europeia intitulada «A competitividade dos serviços ligados às empresas e o seu contributo para o desempenho das empresas europeias» (COM(2003) 747 final, de 4 de Dezembro de 2003), que pode ser consultada em

http://europa.eu.int/eur-lex/pt/com/cnc/2003/com2003_0747pt01.pdf (ver, em especial, 1.2 e Caixa 1).

(12)  Fonte: A competitividade dos serviços ligados às empresas e o seu contributo para o desempenho das empresas europeias (COM(2003) 747 final), Anexo I (Classificação dos serviços e dados complementares), disponível em

http://europa.eu.int/eur-lex/pt/com/cnc/2003/com2003_0747pt01.pdf.

(13)  COM(2003) 747 final, II.2, p. 12.

(14)  Ver o «Estudo sectorial das deslocalizações» (sobretudo as págs. 107 e 177-179), encomendado pela CCMI e utilizado como base para o seu relatório de informação intitulado «Estudo sectorial das deslocalizações» (relator: J. Van Iersel, co-relator: E. Calvet Chambon).

(15)  Relatório do EU Business-Related Service Forum [Fórum dos Serviços Ligados às Empresas na UE], Junho de 2005.

(16)  Ver COM(1998) 534 final e COM(2003) 747 final.

(17)  Stern, Furman, Porter, 2002.

(18)  Ver o parecer do CESE sobre o sétimo programa-quadro: Atendo-se à Estratégia de Lisboa, o «Conselho Europeu de Barcelona (Primavera de 2002) definiu quantitativamente os objectivos do reforço da investigação: o nível global da despesa em inovação e I&D na União deverá ser aumentado a fim de se aproximar o mais possível dos 3 % do PIB até 2010, devendo dois terços deste novo investimento provir do sector privado (Objectivo de 3 %). O Comité chama, todavia, a atenção para o facto de a corrida planetária em curso o ter transformado em objectivo móvel (moving target): quem não o alcançar a tempo ficará sempre cada vez mais para trás» (ponto 2.5).

(19)  COM(2006) 77 final.

(20)  Extraído da publicação intitulada The Contribution of Business Services to European Employment, Innovation and Productivity, de Luis Rubalcaba e Henk Kox, a publicar pela Palgrave-Macmillan.

(21)  Service engineeringmethodical development of new service products (Engenharia de serviços — desenvolvimento metódico de novos produtos de serviços), de Hans-Jorg Bullinger, Klaus-Peter Fahnrich, Thomas Meiren.

(22)  Thomas Meiren, Instituto Fraunhofer de Engenharia Industrial, Estugarda, Alemanha.

(23)  Fórum Europeu dos Serviços ligados às Empresas, Relatório de 2005.

(24)  The Contribution of Business Services to European Employment, Innovation and Productivity (A Contribuição dos Serviços às Empresas para o Emprego, a Inovação e a Produtividade na Europa), de Luis Rubalcaba e Henk Kox (a publicar em 2006 pela Palgrave-Macmillan).

(25)  Rubalcaba, Kox, 2006, p. 42.

(26)  Fonte: Rubalcaba e Kox (2006), com base em dados do Eurostat, Labour force Survey (Inquérito às forças de trabalho), 2004.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/38


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece o Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização»

COM(2006) 91 final — 2006/0033 (COD)

(2006/C 318/05)

Em 27 de Março de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 159.o, n.o 3, do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Comissão Consultiva das Mutações Industriais emitiu parecer em 31 de Agosto de 2006, tendo sido relator J. van Iersel e co-relator E. Gibellieri.

Na 429.a reunião plenária, realizada em 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 170 votos a favor, 10 votos contra e 15 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Síntese

1.1

O CESE acolhe favoravelmente a proposta da Comissão Europeia relativa à instituição de um Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização (FEG). O CESE concorda com o objectivo de intervir através do FEG nas situações que suscitam problemas sociais imediatos e graves para os trabalhadores como consequência de perturbações económicas graves e imprevisíveis.

1.2

O CESE concorda que a principal responsabilidade compete aos próprios Estados-Membros e que o FEG apenas deve intervir a pedido de um Estado-Membro e depois de a autoridade orçamental ter adoptado uma decisão correspondente. As regras devem ser claras.

1.3

Quando houver perturbações graves, é fundamental uma política de previsão, espírito empresarial dinâmico e responsabilidade regional, bem como medidas e acções de cooperação oportunas por parte das partes interessadas (nomeadamente as empresas, os parceiros sociais, os governos e as autoridades regionais). O FEG tem uma função complementar enquanto instrumento de solidariedade da UE. E para serem credíveis, as expectativas não podem ser demasiado ambiciosas.

1.4

As acções específicas financiadas pelo FEG devem adaptar-se à programação geral de todas as partes interessadas. O FEG não deve intervir nos âmbitos de competência exclusiva dos Estados-Membros. É conveniente esclarecer que este Fundo se destina a financiar oportunidades de emprego específicas para pessoas em situações económicas urgentes.

1.5

O CESE solicita à Comissão que garanta uma participação activa dos parceiros sociais em procedimentos que se destinam a criar empregos para os trabalhadores despedidos. A consecução do objectivo da «reintegração rápida» dos trabalhadores despedidos no mercado do trabalho é geralmente uma tarefa difícil. Está provado que estes procedimentos levam muito tempo.

1.6

Deve ser garantida uma coordenação rigorosa entre os vários instrumentos existentes, em particular entre o FEG e os Fundos Estruturais, para aumentar a eficácia e a coerência.

2.   A proposta da Comissão

2.1

Em Março de 2006, a Comissão apresentou uma proposta a favor de um Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização (1). Este Fundo pretende dar apoio específico e pontual para facilitar a reintegração profissional dos trabalhadores em áreas ou sectores afectados por graves perturbações económicas.

2.2

Estas perturbações podem implicar relocalizações de empresas em países terceiros, importações maciças ou um declínio progressivo da parte do mercado da UE num determinado sector. O principal critério para o FEG é mais de 1 000 despedimentos numa empresa ou num grupo de empresas em regiões com uma taxa de desemprego acima da média.

2.3

As acções elegíveis ao abrigo do FEG são as que criam condições favoráveis a uma reintegração rápida no mercado do trabalho das pessoas que perderam o emprego. A assistência é uma medida complementar das disposições nacionais e dos programas regionais específicos. As medidas incluem a reconversão profissional, os auxílios à relocalização, o apoio à criação de empresas e os rendimentos complementares.

2.4

O FEG só intervirá a pedido de um Estado-Membro. O montante da contribuição financeira da UE não pode ultrapassar 50 % da estimativa total do custo do pacote completo das medidas previstas pelo Estado-Membro.

2.5

Não há qualquer disposição financeira específica para o Fundo nas Perspectivas Financeiras. O Fundo será financiado através de «subutilizações» e de autorizações orçamentais anuladas. A afectação de recursos a cada acção será decidida pela autoridade orçamental, o que significa que será da competência exclusiva do Conselho e do PE.

2.6

Está previsto um processo orçamental detalhado. Os Estados-Membros assumirão a responsabilidade da gestão das acções apoiadas pelo FEG. A Comissão terá um papel de supervisão. No caso de subutilização das dotações, os montantes não utilizados serão reembolsados.

2.7

A Comissão realizará uma avaliação contínua dos resultados, critérios e eficácia do regulamento, bem como uma avaliação ex-post. A partir de 2008, a Comissão apresentará um relatório anual sobre a execução do Fundo, que incluirá avaliações.

3.   Antecedentes do FEG

3.1

Esta proposta, que pretendeu demonstrar a solidariedade da UE para com os trabalhadores despedidos em razão de alterações súbitas nas estruturas do comércio mundial, baseia-se nas conclusões do Conselho Europeu de Dezembro de 2005. Enquanto compromisso, a proposta faz parte do acordo sobre as Perspectivas Financeiras. Foi realizada uma avaliação de impacto que inclui (2) informações importantes sobre o conteúdo e o âmbito de aplicação do FEG.

3.2

O FEG é independente dos Fundos Estruturais e será um dos instrumentos da UE que se destina a melhorar a adaptação e a competitividade da economia europeia (3).

3.3

Enquanto que os Fundos Estruturais apoiam acções de prospecção a longo prazo que se inscrevem numa óptica plurianual, o FEG não está previsto para efeitos de reestruturação. Este Fundo pretende especificamente apoiar os cidadãos nas regiões afectadas por graves choques nas estruturas do comércio mundial. Estas situações pouco frequentes mas dramáticas podem exigir um apoio individualizado e pontual durante um período de tempo limitado. Alguns objectivos do FEG não estão abrangidos pelos Fundos Estruturais.

3.4

De certo modo, o programa americano de apoio ao ajustamento das trocas comerciais (US Trade Adjustement Assistance ou TAA) de 1962 serviu de exemplo. O TAA pretende corrigir a assimetria entre, por um lado, os efeitos negativos da abertura das trocas comerciais e da liberalização internacional para certos casos isolados ou regiões e, por outro lado, os seus benefícios em geral. Todavia, não é fácil estabelecer uma comparação entre o TAA e o FEG devido à diferença de cultura entre os Estados Unidos e a União Europeia, bem como à diversidade de critérios que esta situação comporta.

3.5

O FEG deve funcionar em conformidade com as melhores práticas identificadas pela OCDE, que especificam a identificação clara de grupos de trabalhadores vítimas das mutações das estruturas comerciais e uma assistência por períodos de tempo limitados, de acordo com os princípios da eficácia em termos de custos, da transparência e da responsabilidade.

3.6

O FEG pretende contribuir para o desenvolvimento da «flexissegurança» na UE, ou seja, de um equilíbrio entre flexibilidade e segurança do emprego, e completará as prioridades e as políticas estratégicas plurianuais dos Fundos Estruturais.

4.   Observações na generalidade

4.1

O Regulamento em apreço começa por referir o efeito positivo geral da globalização sobre o crescimento e o emprego na UE, mas o CESE nota que, ao mesmo tempo, são perfeitamente possíveis incidências visíveis e negativas à escala sectorial e regional. O FEG será um instrumento destinado a incrementar as oportunidades de reemprego de trabalhadores afectados por perturbações económicas graves. É de lastimar que não tenham sido feitas análises de casos concretos nem a avaliação de impacto (4).

4.2

Na medida em que o quarto considerando do Regulamento exige que as actividades do FEG sejam «coerentes e compatíveis com as outras políticas da Comunidade e conformes com o seu acervo», as propostas devem ser analisadas pelos serviços da Comissão responsáveis pelas decisões políticas, em particular a DG Concorrência, para evitar a eventual concessão injustificada de auxílios estatais.

4.3

O FEG é uma iniciativa concreta da União Europeia na via da resolução das consequências de choques graves nas estruturas do comércio externo e no mercado mundial. Para o futuro, pode ser considerado um instrumento similar para mitigar as consequências negativas do comércio interno e do mercado único da UE (por ex. deslocalizações na UE, política fiscal).

4.4   Critérios de intervenção

4.4.1

Impõem-se critérios de intervenção rigorosos. Contudo, é relativamente vago o critério referido no artigo 1.o, a saber, «apoiar os trabalhadores que perderam os respectivos empregos em resultado de importantes mudanças na estrutura do comércio mundial, sempre que se verifique um impacto negativo considerável na economia regional ou local». Os Estados-Membros são os principais responsáveis pela apresentação de candidaturas às contribuições do Fundo. A Comissão deve garantir critérios uniformes de aplicação em todas as situações e em todos os Estados-Membros.

4.4.2

Compete aos Estados-Membros justificar as candidaturas. As candidaturas serão analisadas e supervisadas atentamente pela Comissão através de documentos de orientação, e o apoio financeiro será concedido pela autoridade orçamental numa base individual. Isto implicará um processo de familiarização através da prática e da experiência, tanto por parte da Comissão, como por parte dos Estados-Membros e da autoridade orçamental. Devem ser evitadas ambiguidades: devem ser adoptadas e aplicadas as mesmas regras e uma abordagem idêntica em toda a União.

4.4.3

Em relação ao nível mínimo de despedimentos em determinadas regiões, no artigo 2.o estão claramente definidos os critérios de intervenção. O critério correspondente a «1 000 assalariados» não se limita a uma única empresa, mas abrange todos os produtores a montante e a jusante.

4.4.4

Geralmente, os motivos que levam as empresas a despedir pessoal têm a ver com vários factores, por exemplo a modernização, a racionalização, a mudança dos métodos de produção e, naturalmente, das estruturas do comércio internacional. É raro que um só factor prevaleça sobre os restantes.

4.4.5

O TAA americano serviu de exemplo. Mas, mais uma vez, na descrição que a Comissão faz do funcionamento do TAA, não está bem esclarecida a relação entre as mutações estruturais das trocas comerciais e as acções dos poderes públicos concebidas para atenuar as consequências dos despedimentos. Além disso, os critérios e a história da aplicação do TAA são bastante diferentes na UE.

4.4.6

Prevê-se o recurso ao financiamento do FEG no caso de choques económicos e de circunstâncias imprevisíveis. Todavia, as tendências evolutivas geralmente já são visíveis antes que se sinta o impacto real das mutações. Uma boa gestão empresarial deve prever medidas anticipatórias com a devida oportunidade.

4.4.7

Isto significa que qualquer planificação das medidas de apoio nacionais e comunitárias deve ter em conta a maneira como as empresas e os próprios parceiros sociais se anteciparam às mutações. Por exemplo, que importância têm as medidas de apoio se as empresas e os parceiros sociais não tiverem identificado a tempo as mutações potencialmente perigosas para os seus mercados e/ou empregos?

4.5   Definição das acções elegíveis

4.5.1

A diferença entre os Fundos Estruturais e o FEG é tripla: a) diferença de escala: 44 mil milhões de euros para os Fundos Estruturais e 500 milhões de euros anuais para o período de programação 2007-2013; b) diferença de abordagem: prospectiva e a longo prazo, centrada em questões gerais de modernização por um lado, a curto prazo e orientada para a reinserção rápida dos trabalhadores no mercado do trabalho por outro lado; e c) devido ao seu volume e âmbito de aplicação, os Fundos Estruturais tendem a ser burocráticos, enquanto que para o FEG é preciso uma abordagem não burocrática.

4.5.2

Importa estabelecer uma distinção clara entre os Fundos Estruturais e o FEG. A acção do FEG é por definição a curto prazo e limitada no tempo, e aplica-se a casos específicos. A longo prazo, podem estar previstas dotações suplementares a título dos Fundos Estruturais num quadro regional mais alargado. No caso de complementaridade das acções, devem ser respeitadas as diferentes filosofias e estruturas de cada fundo.

4.5.3

Não será fácil criar condições para uma reinserção «rápida» dos trabalhadores despedidos no mercado do trabalho se o contexto e as circunstâncias não forem favoráveis, nomeadamente nas regiões em que predomina uma só actividade industrial, nas regiões com atrasos de desenvolvimento, no caso de falta de estabelecimentos locais de formação e reconversão profissional etc. Há que prestar especial atenção aos gestores intermédios e sénior para evitar a fuga de cérebros. Nestes casos, será provavelmente necessário combinar o FEG com os Fundos Estruturais, bem como o melhor uso da rede EURES para promover a mobilidade na Europa. Uma coordenação insuficiente poderá colocar problemas. A este respeito, o disposto no artigo 5.o, n.o 3, requer especial atenção.

4.5.4

As acções elegíveis previstas no artigo 3.o devem estar em relação estreita com as disposições previstas nos artigos 5.o e 6.o, nomeadamente no que diz respeito às inter-relações e interacções entre as medidas regionais, nacionais e comunitárias. Na medida em que as acções da UE são complementares das medidas adoptadas no plano regional e nacional, poderá ser útil a grande experiência adquirida no passado, na UE — como RESIDER, RECHAR e RELEX — e noutras situações, sabendo-se que o FEG não tem qualquer função de reestruturação.

4.5.5

Em casos específicos, a abordagem sectorial utilizada na política industrial moderna poderá ser útil para examinar as análises e determinar a utilização dos instrumentos.

4.5.6

Alguns Estados-Membros dão uma importância particular a que as políticas sobre o mercado do trabalho e as medidas sobre o rendimento continuem a ser da competência dos Estados-Membros e a que a Comissão não possa interferir nas competências nacionais. Consequentemente, no quadro do pacote de medidas previstas por um Estado-Membro em vista a resolver uma crise específica, o contributo da União Europeia deve concentrar-se explicitamente nos indivíduos e na promoção da reinserção profissional dos trabalhadores despedidos. Neste ponto, o CESE refere-se aos critérios de aplicação do antigo capítulo social do Tratado que institui a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, que podem contribuir para evitar duplicações e conflitos institucionais.

4.6

O papel da autoridade orçamental é primordial. O CESE congratula-se com o facto de que o regulamento em apreço preveja os procedimentos financeiros adequados e pormenorizados que devem ser seguidos.

4.7

O regulamento foi concebido para situações de emergência específicas que, regra geral, exigem uma acção rápida e eficaz. Isto significa que, na aplicação das regras, a burocracia tem que ser minimizada em todo o caso, mas ao mesmo tempo impõe-se a devida precaução. O objectivo deverá continuar a ser a concessão de auxílios eficazes no mais curto prazo possível.

4.8

No passado (recente), foram realizadas reestruturações felizes num certo número de casos, mesmo complexos. Embora os casos concretos sejam sempre únicos, a multiplicidade das reestruturações faz ressaltar a importância, para o seu êxito, da concentração ao nível regional dos esforços de todas as partes interessadas, frequentemente apoiados pelos respectivos governos, sendo a prioridade a criação de condições propícias à redistribuição e à constituição de novas empresas ou de empresas consolidadas no sector industrial ou dos serviços.

4.9

Na maioria dos casos, foram elaborados planos económicos e sociais em estreita cooperação entre os governos nacionais, as autoridades regionais e os parceiros sociais que, regra geral, organizaram mesas redondas e associaram todas as partes interessadas da região.

4.10

Tratando-se do novo FEG, há que prever e aplicar procedimentos semelhantes para o seu êxito. Para tal, os representantes da Comissão devem participar directamente nestes encontros e reuniões organizados ao nível regional e local.

5.   Observações na especialidade

5.1

Embora a Comissão haja atribuído 500 milhões de euros ao FEG mediante simulações estatísticas assentes em casos concretos, o valor daquela atribuição deve ser apreciado e possivelmente ajustado anualmente, com base na evolução da situação e na informação sobre a aplicação dos fundos.

5.2

O artigo 2. o indica que as perturbações económicas graves são a justificação para a intervenção do FEG. O CESE solicita ao Conselho que analise as definições dos fenómenos referidos no parágrafo introdutório deste artigo, antes da entrada em vigor do regulamento. As definições demasiado latas podem complicar, mais tarde, a tarefa da autoridade orçamental no momento da tomada de decisões. As definições demasiado restritas poderão ter o mesmo efeito. A realização de um debate no Conselho poderá ajudar a clarificar o dilema e estabelecer um equilíbrio. Este debate também poderá fornecer indicações úteis para as orientações da Comissão.

5.3

Importa justificar de maneira explícita esta intervenção. Devem ser consideradas as medidas prospectivas adoptadas pelas empresas, pelos parceiros sociais e pelas outras partes interessadas, Este aspecto também poderia ser incluído nas orientações da Comissão.

5.4

Fazendo parte da avaliação anual e em vista da eventual alteração em conformidade com o artigo 20.o, deve ser considerada uma avaliação dos critérios de intervenção previstos no artigo 2.o (número de trabalhadores envolvidos, dimensão territorial e indicadores de emprego) para garantir que os critérios de intervenção também são suficientemente flexíveis para se adaptarem à diversidade de certas regiões, em particular no que respeita a pequenos países com uma predominância de pequenas e médias empresas.

5.5

O artigo 3. o prevê nas suas alíneas a) e b) as acções elegíveis para a intervenção financeira do FEG. O CESE observa que os domínios relacionados com o rendimento, como os direitos à pensão e as prestações sociais, são da competência exclusiva dos Estados-Membros. O FEG deverá limitar-se ao financiamento de vários tipos de instalações de educação e formação e de condições-quadro. Em circunstâncias específicas, isto poderá comportar rendimentos complementares para as pessoas que têm emprego ou que o procuram.

5.6

O artigo 10. o, n.o 1, fixa a contribuição máxima do FEG num limiar de 50 % do custo total das medidas previstas pelo Estado-Membro. O CESE não pretende questionar o nível desta percentagem, mas aponta, todavia, para o facto de que existe uma relação entre o nível de participação financeira do FEG e o número e importância dos casos que serão tratados.

5.7

Em relação ao artigo 12. o, o CESE propõe que a alínea b) do n.o 1 seja reformulada como segue: «provas do cumprimento dos critérios enunciados no artigo 2. o e das exigências previstas no artigo 6. o».

5.8

O CESE considera que os parceiros sociais e as outras partes interessadas nas regiões devem participar em todas as fases do processo do FEG. O CESE e o Comité das Regiões também deveriam ser informados pela Comissão.

5.9

A partir de 2008, a Comissão apresentará relatórios anuais sobre o FEG. Esta avaliação ex post poderá ser objecto de debate no Conselho. O artigo 20. o prevê uma revisão formal do regulamento em apreço até 31 de Dezembro de 2013. O CESE recomenda que a Comissão também inclua uma avaliação do FEG no seu Livro Branco antes da revisão intercalar do orçamento da UE prevista em 2009.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que institui o Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização, Março de 2006 (COM(2006) 91 final — 2006/0033 (COD)).

(2)  Avaliação do impacto relativa ao referido regulamento (SEC(2006) 274/2).

(3)  EU Competitiveness and Industrial Location, Bureau of European Policy Advisors to the Commission, BEPA (2005), 26 de Outubro de 2005.

(4)  SEC(2006) 274.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/42


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao exercício do direito de voto pelos accionistas de sociedades com sede social num Estado-Membro e cujos valores mobiliários estejam admitidos à negociação num mercado regulamentado e que altera a Directiva 2004/109/CE»

COM(2005) 685 final — 2005/0265 (COD)

(2006/C 318/06)

Em 31 de Janeiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social que emitiu parecer em 20 de Julho de 2006, sendo relator Bryan CASSIDY.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 83 votos a favor, 9 votos contra e 18 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE congratula-se com a proposta, uma vez que os obstáculos à votação transfronteiras provocam distorções do mercado único.

1.2

A cativação de acções, ou seja, a obrigação de depositar ou manter cativas as acções durante alguns dias antes de uma assembleia geral para poder exercer o direito de voto, ainda se mantém em vigor em diversos Estados-Membros da UE, sendo inclusivamente obrigatória em alguns. Trata-se de uma prática dispendiosa que impede os accionistas de negociarem as suas acções antes da assembleia geral, sendo considerada pela maioria dos investidores institucionais um dos principais obstáculos à votação. O artigo 7.o da Directiva proposta proíbe qualquer condição que exija a «cativação» das acções mediante depósito antes da assembleia geral. O CESE acolhe de forma particularmente favorável esta proibição, embora ciente de que é reduzido o número de Estados-Membros onde a referida prática ainda se mantém em vigor.

1.3

O CESE considera que a Directiva deveria reflectir a procura de melhor regulamentação e chama a atenção, em particular, para o número 34 do Acordo Interinstitucional «Legislar melhor», de Dezembro de 2003, que encoraja os Estados-Membros a «elaborarem, para si próprios e no interesse da Comunidade, os seus próprios quadros, que ilustrem, na medida do possível, a concordância entre as directivas e as medidas de transposição, e a publicá-los».

1.4

O CESE veria com agrado uma utilização mais ampla da votação electrónica, de modo a aumentar a transparência e encorajar a participação dos accionistas. No entanto, considera que este aspecto deverá ser deixado à discrição das sociedades em causa e deseja que os Estados-Membros evitem a criação de obstáculos a uma utilização mais ampla da participação electrónica nas assembleias gerais.

1.5

Na sequência do número anterior, o CESE espera um aumento da utilização de votação segura através da Internet, incluindo possivelmente o recurso a SMS. Esse aumento deve ser encorajado, mas não imposto através de directiva comunitária.

1.6

O CESE congratula-se especialmente com a proposta relativa à votação por procuração estabelecida no artigo 10.o. O Comité acolhe de forma particularmente favorável a eliminação das limitações à votação por procuração, uma vez que, em alguns Estados-Membros, apenas podem ser nomeados representantes familiares dos accionistas.

1.7

O CESE apoia a possibilidade de os Estados-Membros definirem uma data única, considerando um número específico de dias antes da assembleia geral e determinando que a sociedade não deva ser obrigada a responder a interpelações apresentadas após essa data.

1.8

O CESE gostaria de ver reforçado o artigo 5.o, relativamente a informações aos accionistas antes da assembleia geral.

2.   A proposta da Comissão

Está relacionada com os obstáculos à votação transfronteiras pelos accionistas.

2.1

Dada a recente onda de escândalos relacionados com o mau governo das sociedades na UE e nos EUA, é necessário encorajar os accionistas a desempenharem um papel mais activo através da votação nas assembleias gerais. A proposta em apreço tem por objectivo proteger não só os direitos dos accionistas da UE, mas também os direitos dos accionistas de todos os restantes países.

2.2

A proposta em apreço tem por objectivo melhorar o governo das sociedades cotadas da UE através da melhoria dos direitos dos accionistas no âmbito das assembleias gerais. Pretende-se atingir esse objectivo assegurando que os accionistas que possuem acções de sociedades com sede e cotadas noutro Estado-Membro possam votar sem dificuldades nas assembleias gerais dessas sociedades.

2.3

A proposta de Directiva aborda quatro questões dignas de nota:

(a)

abolir a «cativação das acções»

(b)

assegurar que as assembleias gerais são convocadas com antecedência suficiente (incluindo o requisito de que todas as assembleias gerais de accionistas sejam convocadas com pelo menos 30 dias de antecedência)

(c)

remover todos os obstáculos jurídicos à participação electrónica

(d)

oferecer aos accionistas formas simples de votar sem comparecer nas assembleias.

2.4

A presente proposta é uma das medidas de curto prazo apresentadas na Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu, de 21 de Maio de 2003 (1) intitulada «Modernizar o direito das sociedades e reforçar o governo das sociedades na União Europeia — Uma estratégia para o futuro».

2.5

A Comissão assinala que o processo de votação em assembleias gerais de sociedades varia consideravelmente entre os Estados-Membros, sendo frequentemente um procedimento complexo. O procedimento torna-se ainda mais complexo quando as acções são detidas por accionistas estrangeiros.

2.6

A Comissão considera que a actual legislação comunitária é insuficiente para resolver o problema da votação transfronteiras. O artigo 17.o da «Directiva Transparência» (Directiva 2004/109/CE) exige que os emitentes disponibilizem certas informações e documentos que são pertinentes para as assembleias gerais. No entanto, a Directiva Transparência não resolve o problema do processo de votação pelos accionistas.

2.7

A votação pode ser um processo complexo. Muitas vezes, os investidores detêm as suas acções através de intermediários de valores mobiliários. Quando tal acontece, a votação pode implicar uma sequência de acontecimentos em que participam sociedades, conservatórias, bancos depositários, gestores de investimentos, depositários centrais de valores mobiliários e agências de votação por procuração.

3.   Opções

3.1

Não é de modo algum garantido que o mercado reaja de forma suficientemente rápida para melhorar os direitos dos accionistas, nem que em todos os Estados-Membros sejam efectuadas as alterações legislativas necessárias para resolver o problema da complexidade do processo de votação.

3.2

Uma recomendação da Comissão não tem força jurídica, mas proporcionaria flexibilidade suficiente para que os Estados-Membros a introduzam na respectiva legislação nacional com base nas directrizes da Comissão.

Uma recomendação não poderia garantir a introdução de normas mínimas em áreas fundamentais que estão na base dos problemas da votação transfronteiras e do agravamento de custos, como a cativação de acções, um requisito que, quando está presente a nível nacional, desincentiva os accionistas de exercerem o direito de voto.

3.3

Um regulamento introduziria um tratamento uniforme, independentemente da legislação nacional de cada Estado-Membro. Poderia igualmente garantir a introdução de um quadro comum rigoroso para as questões transfronteiras. Teria ainda a vantagem de impedir a «sobre-regulamentação» (gold-plating, a introdução de procedimentos que não são automaticamente exigidos por uma directiva).

A Comissão considera que os custos de um regulamento poderiam ser significativos, uma vez que não teria flexibilidade suficiente para que fossem respeitadas as diferenças de tradições jurídicas dos Estados-Membros.

3.4

Uma directiva permitiria a existência de diferenças da prática em vigor nos Estados-Membros, mas preveniria o desequilíbrio entre diferentes classes de acções e accionistas e favoreceria a existência de normas mínimas básicas.

4.   Custos e benefícios

4.1   Benefícios

4.1.1

A curto prazo, os principais beneficiários da proposta serão os investidores institucionais actualmente titulares de acções de sociedades de outros Estados-Membros. A existência de custos e de obstáculos à votação transfronteiras impede que os accionistas se envolvam tão activamente quanto gostariam no governo das sociedades.

4.1.2

A longo prazo, a proposta poderá encorajar os pequenos investidores — actualmente dissuadidos de deter acções desse tipo pelos elevados custos associados ao exercício do direito de voto — a aumentar o número de acções de sociedades de outros Estados-Membros nas suas carteiras de títulos. Poderão, assim, aumentar a diversificação das carteiras de títulos, reduzindo o risco. De uma forma geral, a longo prazo, a proposta deverá contribuir para maior liquidez nos mercados de capitais europeus.

4.1.3

Actualmente, há obstáculos à votação transfronteiras. A cativação de acções continua a ser um problema em diversos países, sendo considerada por muitos investidores como um importante obstáculo à votação. Neste aspecto, representa um obstáculo ao funcionamento eficaz dos mercados de capitais transnacionais. Além disso, existe alguma confusão entre os investidores no que diz respeito à verdadeira natureza das disposições de cativação de acções em vigor nos diferentes Estados-Membros. Este facto também representa um custo significativo para os investidores, que a directiva proposta permitiria reduzir.

4.1.4

Verifica-se uma discriminação injusta entre os accionistas nacionais e os de outros Estados-Membros no que diz respeito à informação relativa às assembleias gerais que lhes é prestada. A proposta da Comissão, que assegura o acesso oportuno a informação adequada em todos os mercados, contribuiria para a redução da dimensão deste problema.

4.1.5

A jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE) chama a atenção para a necessidade de os Estados-Membros evitarem atitudes abusivas de algumas classes de accionistas relativamente a outras classes.

4.1.6

A votação por procuração e os requisitos de novo registo têm frequentemente custos elevados e há indicações, baseadas na avaliação de impacto da Comissão, que sugerem que esses custos desencorajam efectivamente o exercício do direito de voto dos pequenos fundos de investimento. A proposta da Comissão deverá simplificar o processo de nomeação de representantes e clarificar quem poderá ser nomeado representante. Deverá igualmente melhorar os direitos dos representantes em alguns Estados-Membros.

4.1.7

Quando o presidente da mesa da assembleia geral for representante de accionistas, deverá ser obrigado a votar rigorosamente de acordo com as intenções expressas por esses accionistas.

4.2   Custos

4.2.1

A uniformização proposta do prazo de convocatória introduziria um elemento de inflexibilidade nos Estados-Membros onde se exige um prazo de apenas 14 dias para a convocação de uma assembleia geral extraordinária.

4.2.2

O requisito de apresentação de respostas sob forma escrita às interpelações dos accionistas apresentadas sob a mesma forma é essencial.

4.2.3

Os artigos 5.o e 7.o da proposta de Directiva estabelecem um período não inferior a 30 dias de calendário entre a data de registo e a data da assembleia geral, de modo a facilitar o exercício do direito de voto pelos accionistas.

5.   Observações na especialidade

5.1

O CESE congratula-se com a proposta da Comissão, na medida em que os obstáculos à votação transfronteiras provocam distorções do mercado único.

5.2

Dado que o sector financeiro exerce influência importante na economia e no crescimento do emprego, qualquer factor que iniba a participação dos accionistas deverá ser desencorajado. A proposta da Comissão aponta nesse sentido.

5.3

Actualmente, a votação transfronteiras é, a priori, mais dispendiosa para os accionistas não residentes do que para os residentes no Estado-Membro onde a sociedade em causa está cotada, o que é um exemplo de distorção do mercado.

5.4

A Comissão considera haver actualmente demasiados condicionalismos que tornam a votação por procuração em alguns Estados-Membros desnecessariamente complicada.

5.5

A cativação de acções, ou seja, a obrigação de depositar ou manter cativas as acções durante alguns dias antes de uma assembleia geral para exercer o direito de voto ainda persiste em diversos Estados-Membros da UE, sendo mesmo obrigatória em alguns. Trata-se de uma prática dispendiosa, que impede os accionistas de negociarem as suas acções por um período de até duas semanas antes da assembleia geral, o que é considerado pela maioria dos investidores institucionais um dos principais obstáculos ao exercício do direito de voto.

5.6

O CESE partilha o ponto de vista da Comissão em como a disponibilização tardia de informações pertinentes para as assembleias gerais ou o facto de essas informações estarem incompletas, bem como as deliberações em formato resumido e os prazos reduzidos de convocatória constituem alguns dos principais obstáculos que os cidadãos residentes noutro Estado-Membro enfrentam quando pretendem exercer os seus direitos como accionistas. Todos os documentos pertinentes, incluindo relatórios de auditoria, respostas às interpelações apresentadas pelos accionistas e notificações de realização de assembleias gerais, bem como as moções a apresentar nas assembleias gerais devem ser disponibilizados em suporte electrónico e físico.

5.7

O artigo 8.o diz respeito à participação em assembleias gerais por meios electrónicos. Segundo a proposta da Comissão, que invoca a rápida evolução da tecnologia, os «Estados-Membros não proibirão a participação de accionistas em assembleias gerais por meios electrónicos».

5.8

A proposta da Comissão não aborda especificamente o problema das acções ao portador. A comunicação com esses accionistas é efectuada principalmente através de anúncios em jornais. O CESE considera que a comunicação electrónica é mais moderna, mais rápida e seguramente mais barata.

5.9

O artigo 10.o clarifica as disposições referentes ao voto por procuração, abolindo as restrições impostas por algumas empresas relativamente às pessoas que podem ser representantes.

5.10

A opção de não tomar qualquer iniciativa, ou seja, manter a situação actual, não é considerada recomendável pelo CESE. Os obstáculos tornam a votação transfronteiras muitíssimo dispendiosa para os pequenos accionistas e resultam em custos elevados para os investidores institucionais.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2003) 284 final, Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Modernizar o direito das sociedades e reforçar o governo das sociedades na União Europeia — Uma estratégia para o futuro.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/45


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece regras comuns para o fornecimento de informação de base sobre Paridades de Poder de Compra e para o respectivo cálculo e divulgação (apresentada pela Comissão)»

COM(2006) 135 final — 2006/0042 (COD)

(2006/C 318/07)

Em 20 de Julho de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Em 20 de Julho de 2006, a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, incumbida de preparar os trabalhos sobre esta matéria, emitiu o seu parecer, sendo relator SANTILLÁN.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 182 votos a favor, 3 votos contra e 12 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE acolhe favoravelmente a proposta de regulamento que estabelece a base jurídica para as paridades de poder de compra (PPC), que deverá melhorar a transparência, a oportunidade e a qualidade de todo o processo de elaboração de PPC, tanto no plano comunitário como nacional.

1.2

Considerando a importância do objecto da proposta de regulamento em questão e a necessidade de regras vinculativas que definam as competências da Comissão e dos Estados-Membros, ao mesmo tempo que estabelecem bases homogéneas de cálculo e transmissão de dados em matéria de PPC, o Comité recomenda a rápida aprovação do projecto de regulamento.

1.3

Todavia, o CESE assinala que actualmente, por motivo de custos, a Comissão (Eurostat) calcula as PPC por país e não por região (1). Contudo, estes cálculos são usados, entre outros fins, para avaliar o desempenho económico das regiões. Os dados existentes revelam que — dentro dos Estados-Membros — há diferenças regionais, por vezes consideráveis, no preço de bens e serviços. Apesar de os institutos de estatística que recolhem informações básicas aplicarem factores de ajustamento espacial, é imprescindível que esses factores sejam adequados para evitar distorções no cálculo das PPC. Por conseguinte, há que recomendar que os Estados-Membros façam o que esteja económica e tecnicamente ao seu alcance, para que os factores correctores reflictam com a maior precisão possível as diferenças geográficas de preços.

1.4

Pelas razões referidas no ponto anterior, o prazo mínimo de seis anos para a revisão dos factores de ajustamento espacial parece excessivo, pelo que se recomenda a sua redução. Do mesmo modo, dado que o projecto de regulamento em apreço define uma frequência mínima (2) para o fornecimento de informação de base, seria conveniente que o fornecimento de informação sobre preços se efectuasse, na medida do possível, de dois em dois anos (3) (o projecto de regulamento fixa uma frequência mínima de três anos).

1.5

Genericamente, é de realçar a necessidade de desenvolver esforços para aumentar a eficácia do sistema estatístico da UE, tanto no que se refere aos recursos técnicos e humanos de que dispõe, como também no que diz respeito à coordenação entre o Eurostat e os institutos de estatística dos Estados-Membros, que assumem importantes responsabilidades no cálculo das PPC.

2.   As paridades de poder de compra (PPC)

2.1

O programa PPC Eurostat-OCDE foi criado no início dos anos 80 com vista a comparar, numa base regular e atempada, o PIB dos Estados-Membros da União Europeia e da OCDE (4). Por conseguinte, as PPC são taxas de conversão de moedas que convertem os indicadores económicos expressos em moedas nacionais nominais em uma moeda comum fictícia, denominada Poder de Compra Padrão (PCP), que coloca ao mesmo nível o poder de compra das várias moedas nacionais.

2.2

Os agregados de volume económico em PCP obtêm-se dividindo o seu valor original em moedas nacionais pelo seu equivalente em PPC. Ao utilizar o PPC como factor de conversão, é possível comparar o volume puro do PIB dos países expresso em PCP, se se eliminar a componente «nível de preço».

2.3

As PPC são simultaneamente deflacionadores de preços e conversores de moedas. Com a implantação do euro nos Estados-Membros da zona euro, podem comparar-se directamente, pela primeira vez, os preços entre esses países com poder de compra distinto, em função dos níveis de preços nacionais. Por conseguinte, para os países que não pertencem à zona euro, as PPC são conversores de moeda e anulam os efeitos dos vários níveis de preços, para os países da zona euro cumprem apenas a função de deflacionadores de preços.

2.4

As PPC calculam-se com base num cabaz de bens e serviços comparáveis, seleccionados com base em sistemas como a Classification of Individual Consumption by Purpose (COICOP (5) e Classification of Products by Activity (CPA), entre outros. O trabalho de campo realiza-se em uma ou várias cidades no território económico (geralmente só nas capitais dos Estados-Membros). A maioria dos Estados-Membros aplica factores de ajustamento espacial para considerar as diferenças regionais. Todavia, há um Estado que analisa apenas os dados da capital por considerar que a extensão geográfica reduzida não apresenta diferenças significativas.

3.   PPC e Produto Interno Bruto (PIB)

3.1

O PIB reflecte o resultado do conjunto de actividades dos operadores económicos de um território económico num determinado período, geralmente um ano. O PIB calcula-se de acordo com um sistema de contas nacionais que, no caso da UE é o Sistema Europeu de Contas Económicas Integradas 1995 (SEC-95). O PIB pode ser medido do ponto de vista da produção, da despesa ou do rendimento. Para efeitos das PPC, o cálculo das despesas tem importância particular, uma vez que revela em que medida os bens e serviços produzidos (ou importados) pela economia de um país são utilizados para consumo privado ou público, formação de capital ou exportação.

3.2

Para se poder fazer uma comparação real há que utilizar factores de conversão (deflacionadores espaciais) que reflictam as diferenças de nível de preços entre países. Não podem utilizar-se taxas de câmbio porque estas reflectem outros elementos além das diferenças de preços.

3.3

Nesse sentido, elaboram-se PPC específicas entre as moedas de vários países para que possam ser utilizadas de forma adequada enquanto factores espaciais de conversão.

4.   Qual a utilidade das PPC?

4.1

No início, os maiores utilizadores eram organizações internacionais como o Eurostat, o FMI, a OCDE, o Banco Mundial e as Nações Unidas. No entanto, com o passar do tempo, o uso de estatísticas expressas em PPC foi-se generalizando e, actualmente, são múltiplos os utilizadores: organismos governamentais, universidades, institutos de investigação, bem como empresas públicas e privadas. Os bancos utilizam as PPC para efectuar análises económicas e acompanhar a evolução das taxas de câmbio, e os particulares, incluindo os empregadores, utilizam-nas para estabelecer pagamentos quando mudam de um país para outro.

Além destas utilidades, as PPC podem também ser utilizadas na negociação colectiva dos salários a nível transnacional.

4.2

As PPC são indicadores vitais para a UE do ponto de vista económico e político. Por um lado, a legislação comunitária estabelece a sua aplicação aos Fundos Estruturais (6). Por outro lado, elas são uma referência obrigatória para o Fundo de Coesão (7). Assinale-se, contudo, que no primeiro caso (Fundos Estruturais) o cálculo baseia-se no produto interno bruto (PIB) per capita, ao passo que no caso do Fundo de Coesão o cálculo é baseado no produto nacional bruto (PNB) per capita. O projecto de requerimento em análise considera somente o PIB (8).

4.3

As PPC utilizam-se ainda para elaborar os coeficientes de correcção aplicados às remunerações e pensões dos funcionários e outros agentes das Comunidades Europeias (9).

5.   A proposta de regulamento

5.1

A proposta de regulamento tem o objectivo de colmatar um vazio legal, estabelecendo um quadro jurídico para o cálculo das PPC. Pretende-se melhorar a transparência e a qualidade dos dados apresentados pelos Estados-Membros através de regras comuns para o fornecimento de informação (artigo 1.o). Por conseguinte, o objectivo almejado afecta positivamente não apenas o Eurostat, enquanto coordenador dos resultados, mas também os institutos de estatística de cada país.

5.2

Delimitação de responsabilidades e competências. Através do Eurostat, a Comissão será incumbida de coordenar a informação de base, calcular e publicar as PPC e desenvolver metodologia, em consulta com os Estados-Membros (artigo 4.o, n.o 1) enquanto estes devem prestar a informação de base, aprovar os resultados do inquérito e verificar a plausibilidade dos dados (artigo 4.o, n.o 2).

5.3

Os institutos de estatística dos Estados-Membros transmitirão ao Eurostat a informação básica elaborada de acordo com os parâmetros comuns conformes a um formato técnico único (artigo 5.o e Anexo I).

5.4

As unidades estatísticas estão definidas no regulamento (CEE) n.o 696/1993 e outras estão ainda por criar (artigo 6.o). Será estabelecido um sistema de controlo de qualidade entre a Comissão e os Estados-Membros (artigo 7.o).

5.5

O Eurostat calculará as PPC uma vez por ano (artigo 8.o) e será incumbido da sua difusão a um nível agregado para cada Estado-Membro (artigo 9.o).

5.6

O projecto de regulamento não exige dos Estados-Membros a realização de inquéritos com o simples objectivo de determinar os coeficientes de correcção aplicáveis a remunerações de funcionários e outros agentes das Comunidades Europeias (artigo 10.o).

5.7

Factores de ajustamento temporal e espacial. O cálculo das PPA obtém-se a partir de preços médios nacionais anuais (artigo 2.o, n.o 2). Uma vez que «a recolha de dados pode ser limitada a uma ou mais zonas geográficas no território económico» e «a um período de tempo específico», os Estados-Membros devem aplicar um factor de ajustamento temporal (que não deverá ter mais de um ano) e um factor de ajustamento espacial (que não deverá ter mais de seis anos) (Anexo I: Metodologia, números 2 a 4).

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Há 254 regiões NUTS 2. Cf. o Regulamento (CE) n.o 1059/2003, Anexo 1.

(2)  Anexo I: Metodologia, ponto 2.1.

(3)  No que diz respeito a «Preços de bens e serviços de consumo e indicadores de representatividade conexos», «Preços dos bens de equipamento» e «Preços dos projectos de construção».

(4)  Contudo, as origens do preço internacional e comparações de volume de PIB remontam às comparações experimentais levadas a cabo pela Organização para a Cooperação Económica Europeia (OCEE) nos anos 50.

(5)  Sistema utilizado por organismos internacionais (Nações Unidas, FMI, etc.).

(6)  De acordo com o Regulamento n.o 1260/99 do Conselho, os Fundos Estruturais aplicam-se às regiões cujo PIB per capita, medido com base nas PPC, seja inferior a 75 % da média comunitária. O mesmo se aplica aos países que adiram posteriormente à União Europeia (Anexo II do Acto de Adesão de 2003).

(7)  No que se refere ao Fundo de Coesão, esta exigência consta do n.o 1 do artigo 2.o do Regulamento (CE) n.o 1164/94 do Conselho, de 25 de Maio de 1994, segundo o qual se aplica aos «(…) Estados-Membros com um PNB per capita inferior a 90 % da média comunitária».

(8)  Do artigo 3.o consta a seguinte definição: «“Paridades de Poder de Compra” ou “PPC”: os deflacionadores espaciais e conversores monetários que eliminam os efeitos das diferenças nos níveis dos preços entre países, permitindo assim comparações em volume das componentes do PIB e comparações de níveis dos preços».

(9)  Estatuto dos Funcionários, Anexo XI, artigo 1.o («As paridades económicas serão calculadas de forma a que cada posição elementar possa ser actualizada duas vezes por ano e verificada por inquérito directo, pelo menos de cinco em cinco anos») e regime aplicável a outros agentes das Comunidades Europeias.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/47


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a um quadro sem papel para as alfândegas e o comércio»

(COM(2005) 609 final — 2005/0247 (COD))

(2006/C 318/08)

Em 17 de Janeiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, que emitiu parecer em 12 de Julho de 2006, com base no projecto apresentado pelo relator Umberto BURANI.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 190 votos a favor e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

A proposta da Comissão diz respeito a um novo projecto de informatização das alfândegas que deverá, a prazo, tornar o sistema aduaneiro europeu completamente automatizado, interoperável, seguro, acessível e funcionando numa base totalmente electrónica sem suporte papel. É o elemento que faltava para a introdução do novo Código Aduaneiro Comunitário proposto pela Comissão (1), sobre o qual o CESE elaborou um parecer separado.

1.2

A adopção do sistema de informatização proposto implica o esforço conjunto e coordenado de todos os Estados-Membros, no que diz respeito não só às alfândegas, mas também a outras entidades responsáveis pelas fronteiras, as quais devem assumir o compromisso de pôr em prática os conceitos de ponto de acesso único e balcão único: estes dois objectivos permitirão aos operadores um funcionamento simplificado, mais rápido e mais económico das operações aduaneiras e às alfândegas controlos de gestão dos riscos mais eficazes.

1.3

Os Estados-Membros já efectuaram investimentos consideráveis na aplicação de sistemas aduaneiros informatizados. Existem, no entanto, diferenças notáveis entre eles, quer quanto aos níveis de satisfação, quer no atinente à regulamentação e utilização dos dados. A harmonização conseguida até à data é, pois, insuficiente, a que acresce um problema mais importante e ainda por resolver, o da falta de interoperabilidade dos sistemas.

1.4

A interoperabilidade permitirá o intercâmbio de informações entre as administrações dos diversos países. Em atenção aos cidadãos, o projecto prevê também a possibilidade de fornecer interfaces com os operadores comerciais, não só para permitir a aplicação do princípio de balcão único, mas também para garantir o intercâmbio de informações. Quando estiver plenamente operacional, o novo sistema informatizado constituirá um progresso decisivo — pelo menos, na perspectiva puramente aduaneira — para a realização de um mercado interno unificado, cujas únicas fronteiras são as externas. Há que, no entanto, não esquecer que a dimensão global dos mercados exige que se tenham em conta as relações com os países terceiros, aspecto este que não é evocado no documento da Comissão.

2.   Observações na generalidade

2.1

A Comissão realça que um sistema aduaneiro centralizado também corresponderia aos objectivos da informatização baseada em sistemas interoperáveis. Observa, porém, que tal solução não é possível por diversos motivos, nomeadamente, a dificuldade de transferir a responsabilidade operacional dos Estados-Membros para a própria Comissão, contrariando os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade. É provável que o verdadeiro motivo de tal impossibilidade resida, no entanto, na resistência dos Estados-Membros em cederem as suas próprias prerrogativas, muito embora saibam que uma parte das receitas aduaneiras está sob controlo directo do orçamento comunitário. O CESE considera que a gestão comunitária das alfândegas deveria fazer parte dos objectivos a longo prazo da União: uma gestão desse tipo traria vantagens não só do ponto de vista da simplicidade, fiabilidade e custos, bem como da possibilidade de interconexão com outros sistemas da UE e dos países terceiros. Os possíveis atrasos na implantação dos sistemas básicos desenvolvidos por cada dos 25 Estados-Membros tornam necessário avaliar se não seria preferível implantar sistemas completamente automatizados, como o «Sistema Automatizado de Importação» («Automated Import System» = AIS) e o «Sistema Automatizado de Exportação» («Automated Export System» = AES), ligados por um «Ponto de Acesso Único Europeu».

2.2

A iniciativa da Comissão impunha-se, em primeiro lugar, porque a aplicação do novo código aduaneiro exige que os procedimentos sejam coerentes com as novas normas. Para além disso, inscreve-se num conjunto de outras iniciativas adoptadas em diversos outros sectores no âmbito da «eEurope» e do «eGoverno» (2) e, mais especificamente, dá continuidade aos compromissos assumidos em 2003 com a comunicação da Comissão ao Conselho relativa a um quadro sem papel para as alfândegas e o comércio (3). Por outro lado, esses compromissos já tinham sido delineados, pelo menos no que respeita à eliminação do suporte papel, no programa «Alfândega 2007» (4) e reiterados quando da alteração de 2004 ao regulamento do Código Aduaneiro Comunitário (5).

2.3

O CESE não pode deixar de aplaudir as principais inovações introduzidas pelo sistema proposto pela Comissão: a interconexão dos sistemas nacionais, a criação de uma interface para os operadores graças ao balcão único, a possibilidade de transmitir por via electrónica os pedidos de desalfandegamento e a gestão integrada dos riscos constituem bases inegáveis de progresso desde que os custos para a colectividade e para os operadores sejam acessíveis. Para o efeito, deveriam ser consideradas as consequências de todas estas mudanças para os funcionários alfandegários (meios, formações, carreiras, adaptação).

2.4

O CESE não pode, todavia, abster-se de tecer algumas observações a propósito da integração dos sistemas informáticos e sua complementaridade. A Comissão tenciona conseguir a plena interoperabilidade dos sistemas aduaneiros: as administrações aduaneiras deverão, pois, poder proceder ao intercâmbio de informações entre si e também com «outras autoridades envolvidas na circulação de mercadorias». Nesta definição não estão certamente incluídas as autoridades encarregadas da cobrança do IVA. No entanto, uma ligação orgânica entre as alfândegas e as administrações do IVA poderia ser útil para controlar, pelo menos em certos casos e para algumas mercadorias, a falsificação das marcas de origem. Não se trata, é evidente, de um facto novo, mas antes de um fenómeno em contínua expansão: frequentemente mercadorias importadas de países terceiros são postas em circulação (mediante pagamento do IVA) na Comunidade com marcas de origem europeia ou com marcas «europeias» falsificadas.

2.5

O CESE tenciona, além disso, chamar a atenção para o segundo considerando da proposta de decisão: «A prestação interoperável de serviços pan-europeus de administração em linha (eGoverno) (…) requer a adopção de medidas destinadas a melhorar a eficácia da [luta] contra a fraude, o crime organizado e o terrorismo». A declaração de intenções é clara; menos claro porém é o modo como as disposições contidas na proposta poderão permitir alcançar o objectivo. A recolha de dados para efeitos aduaneiros não pode, de facto, servir outros fins se um sistema não estiver apto a comunicar com outros sistemas.

2.5.1

Em Dezembro de 2004, o Conselho adoptou, com base numa avaliação da Comissão (6) e numa recomendação do PE de 14 de Outubro de 2004, o «Programa da Haia». Tal programa definia medidas e acções destinadas a reforçar a segurança na UE e, em particular, estabelecer uma «cooperação policial, aduaneira e judiciária». Um documento posterior, de 10 de Junho de 2005, estabelecia um plano de acção a fim de executar o Programa da Haia, que fazia referência a uma resolução do Conselho JAI (Justiça e Assuntos Internos) de 30 de Março de 2004 em matéria de cooperação aduaneira, bem como uma comunicação relativa à luta contra o tráfico ilícito transfronteiras de mercadorias proibidas ou regulamentadas. Num documento mais recente (7), a cooperação aduaneira era novamente referida entre as prioridades. Todos os projectos previstos nos documentos supra citados baseiam-se na disponibilidade de informações em matéria de repressão, elemento que consta também do Programa da Haia. Atendendo ao conjunto da matéria e à natureza dos projectos em curso, é evidente para o CESE que um sistema aduaneiro informatizado destinado a perdurar deverá ser forçosamente projectado de tal modo que, no momento da sua entrada em vigor ou logo a seguir, o banco de dados aduaneiro possa interagir com outros sistemas e, em particular, com os sistemas de segurança interna, tanto europeus como dos países terceiros. Desnecessário será dizer que deverá ser sempre assegurado o respeito pela vida privada, o sigilo profissional e a protecção dos dados.

2.5.2

Exceptuando a citação no ponto 2.5.1, o documento da Comissão não faz nenhuma outra referência a esta preocupação. Além disso, em parte alguma da exposição de motivos a Comissão alude ao Programa da Haia. Com efeito, no título «Coerência com outras políticas e objectivos da União» apenas são citadas a Estratégia de Lisboa e as iniciativas no domínio da eEurope e do eGoverno. Embora tendo em conta a alínea d) do artigo 3.o — que se tratará infra — uma omissão de tal importância não pode ser casual e a Comissão deveria explicar claramente as razões. Seja como for, não será aceitável que se adie uma iniciativa que já deveria, pelo contrário, ter sido adoptada.

2.5.3

Na fase preparatória do documento, a Comissão organizou nada menos do que seis seminários no espaço de dois anos, interrogou os utilizadores e promoveu debates no âmbito do Comité do Código Aduaneiro, do Grupo de Política Aduaneira, do Grupo das Alfândegas Electrónicas 2007 e do Grupo de Contactos Comerciais; em contrapartida, não é feita qualquer referência a contactos com a Europol, o OLAF ou outras direcções-gerais da Comissão. Um sistema não pode ser projectado apenas em função das exigências dos seus utilizadores directos. A ter de ser estruturado de modo a ligar-se a outros sistemas, não pode deixar de conhecer as características e as necessidades destes. O CESE tem a impressão de ver agora confirmadas as reservas que manifestou no seu parecer sobre o código aduaneiro comunitário a propósito da falta de uma verdadeira tomada de consciência da interdependência das várias administrações públicas na luta contra a criminalidade.

2.5.4

Os prazos curtos impostos pelo programa para a sua execução dificultam provavelmente a mudança radical de abordagem no sentido indicado no ponto anterior; não se afigura, no entanto, impossível prever, desde já, medidas de segurança aplicáveis às «mercadorias sensíveis» (armas, explosivos, materiais nucleares, equipamento para a indústria química, nuclear ou de defesa, estupefacientes, álcool, tabaco). Tais medidas poderiam traduzir-se na recolha de informações a transmitir, automaticamente ou a pedido, às autoridades competentes na matéria.

2.6

Os custos financiados pelo orçamento comunitário são, com base no princípio de subsidiariedade, os necessários para assegurar a interoperabilidade dos sistemas, a interface única e os portais aduaneiros. Esses custos são estimados em cerca de 180 milhões de euros, repartidos em dotações anuais crescentes, que vão desde 4 milhões em 2006 a 111 milhões no ano 2011 e seguintes. O CESE manifesta a sua concordância, mas considera com perplexidade a decisão de afectar ao orçamento comunitário as despesas relativas aos portais nacionais: ainda que seja um facto que eles estão, em princípio, à disposição de todos os operadores, nacionais ou de outros países da União, é muito provável que sejam usados principalmente por operadores nacionais. Seria, pois, mais indicado que o custo dos portais fosse suportado por cada um dos Estados-Membros e não pela Comunidade. Naturalmente seriam outras as condições se a Comissão se referisse aos portais europeus, aos quais não há menção explícita.

2.7

Quanto aos prazos de execução, a Comissão elaborou um calendário com prazos a cumprir obrigatoriamente por todos os Estados-Membros calculados a partir da data de publicação da decisão no Jornal Oficial: três anos para adoptar sistemas de desalfandegamento automatizados e interoperáveis, sistemas de registo dos operadores económicos e portais de informação; cinco anos para constituir uma rede de pontos de acesso únicos e um quadro tarifário conforme às normas comunitárias; seis anos para assegurar serviços de «balcão único». O CESE estima que estes prazos, especialmente o primeiro, foram fixados com um certo optimismo. Três anos não é muito tempo se se tiver em conta que neste período devem incluir-se alguns meses de ensaio dos programas e de intercâmbio com os outros participantes. Para além disso, nem todos os Estados-Membros atingiram o mesmo grau de informatização e de disponibilidade de recursos financeiros e humanos. Seria prejudicial para o funcionamento do sistema e ainda mais para a sua credibilidade se o desrespeito dos prazos por um ou mais Estados-Membros impelisse a Comissão a conceder prorrogações. O Plano Estratégico Plurianual precisa, por conseguinte, de ser revisto, tendo em conta:

a necessidade de todos os Estados-Membros de terem concluído a implantação do sistema antes de passar à sua operação, e

a necessidade de as empresas disporem de um período um mínimo de 12 meses para prepararem os sistemas, após terem recebido todas as prescrições das alfândegas do seu Estado-Membro. A indústria e o comércio não deviam ser obrigados a apresentar declarações sumárias de importações e exportações antes de concluída a implantação de sistemas homogéneos.

3.   Observações na especialidade

3.1

Artigo 2. o : Objectivos. Dos objectivos da proposta consta a procura de uma estratégia comum de controlo de mercadorias perigosas e ilícitas. Este objectivo deveria ser reformulado tendo em conta a sugestão apresentada pelo CESE no ponto 2.5.4.

3.2

Artigo 3. o : Intercâmbio de dados. Na alínea d), o artigo prevê que os sistemas aduaneiros devem permitir o intercâmbio de dados entre as administrações aduaneiras dos Estados-Membros e «outras administrações ou serviços com actividades no âmbito da circulação internacional de mercadorias». O CESE já exprimiu amplamente o que pensa sobre o carácter limitado desta definição (ver ponto 2.4 e seguintes). Se a sugestão de incluir o Programa da Haia no capítulo «Coerência com outras políticas comunitárias» for tomada em consideração, a formulação deste parágrafo deverá ser modificado nesse sentido. Seja como for, deve ser clarificada a redacção do texto, que pode dar lugar a interpretações divergentes: ou se faz referência às «administrações (…) com actividades no âmbito da circulação internacional de mercadorias» como alternativa aos «serviços», ou se fala de «administrações» em geral, devendo neste caso ser bem especificado que com esta formulação a Comissão pretende frisar uma nova abordagem em consonância com o Programa da Haia. A formulação, algo vaga, e a sua consequente interpretação deixam uma grande margem de incerteza.

3.3

Artigo 4. o : Sistemas, serviços e calendário. Como é dito no ponto 2.7, os prazos para implantação do sistema são aparentemente demasiado optimistas. A Comissão deveria discuti-los ainda, no plano técnico, com os Estados-Membros e respectivos serviços directamente interessados, de modo a obter de todos eles a garantia explícita de que estão em condições de respeitar os compromissos nos prazos fixados.

3.4

Artigo 9. o : Recursos. O artigo reparte entre a Comissão e os Estados-Membros os recursos a disponibilizar em termos de pessoal, orçamento e meios técnicos, sendo a Comissão responsável pelas componentes comunitárias e os Estados-Membros pelas componentes nacionais. A formulação deste artigo está correcta, mas está associada ao disposto no artigo 10.o no que se refere ao significado e ao conteúdo das noções de «componentes comunitárias» e «componentes nacionais».

3.5

Artigo 10. o : Disposições financeiras. Mais um artigo que não dá azo a críticas quanto à sua formulação, mas comporta riscos de interpretação. O n.o 3 prevê que os Estados-Membros assumam os custos das componentes nacionais do sistema, «incluindo as interfaces com outros serviços governamentais e com os operadores económicos». Dever-se-ia partir do princípio de que os portais — que, em norma, funcionam na língua nacional do Estado-Membro e são realizados segundo as necessidades do operador do país — serão considerados como componentes nacionais. A exposição de motivos afirma, pelo contrário (ver ponto 2.6), que eles foram incluídos nas componentes comunitárias, o que passaria despercebido a quem lesse apenas o texto do artigo. O CESE entende que este ponto deve ser revisto, em substância, se as suas observações forem aceites, e, pelo menos, na forma, se o não forem, a fim de respeitar o princípio da transparência.

3.6

Artigo 12. o : Relatórios. Os Estados-Membros devem apresentar, até 31 de Dezembro de cada ano, um relatório anual sobre os progressos realizados e os resultados conseguidos. Por seu lado, a Comissão envia aos Estados-Membros, até 31 de Março de cada ano, um relatório de síntese, que deverá incluir os resultados de eventuais visitas de controlo e de outros controlos. Em princípio nada há a criticar, mas pode-se perguntar quais são as implicações das «visitas de controlo» e se os seus resultados devem ser divulgados.

3.7

Artigo 13. o : Consulta dos operadores económicos. Está previsto que a Comissão e os Estados-Membros consultem «regularmente» os operadores económicos em todas as fases da elaboração, do desenvolvimento e da implantação dos sistemas e serviços. A consulta deveria fazer-se através de um mecanismo de consultas, no âmbito do qual um grupo representativo de operadores económicos se reúne regularmente. O CESE considera que este tipo de mecanismo é coerente com a prática comunitária normal e que respeita os princípios da consulta e da transparência. A experiência demonstra, no entanto, que a consulta não deve dar lugar a demasiadas exigências diversas ou tendências contraditórias susceptíveis de criar obstáculos que, para serem vencidos, necessitariam de muito tempo e de compromissos não razoáveis. A fase consultiva deve, pois, ser aprofundada tanto quanto o permita a necessidade de tomar uma decisão rapidamente.

3.8

Artigo 14. o : Países aderentes e países candidatos. Este artigo prevê que a Comissão informe os referidos países das iniciativas tomadas e dos progressos realizados nas diversas fases, autorizando-os a nelas participarem. A formulação é vaga. Não é esclarecido se tais países podem participar como membros activos ou apenas como observadores, se estão autorizados a porem em prática sistemas aduaneiros paralelos na perspectiva da sua adesão e se, neste caso, podem beneficiar de contribuições do orçamento comunitário. O CESE solicita que a formulação desta disposição seja mais transparente.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2005) 608 final.

(2)  Comunicação da Comissão ao Conselho, Parlamento Europeu, Comité Económico e Social Europeu e Comité das Regiões — Papel da administração em linha (eGoverno) no futuro da Europa (COM(2003) 567 final), de 26 de Setembro de 2003.

(3)  COM(2003) 452 final, de 24 de Julho de 2003, citado no projecto de parecer sobre o código aduaneiro.

(4)  COM(2002) 26 final, de 21 de Março de 2002, objecto do parecer do CESE publicado no JO C 241 de 7 de Outubro de 2002, pág. 6.

(5)  COM(2003) 452 final, de 24 de Julho de 2003, objecto do parecer do CESE publicado no JO C 110 de 30 de Abril de 2004, pág. 6.

(6)  COM(2004) 401 final.

(7)  COM(2005) 184 final.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/51


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Aplicar o Programa Comunitário de Lisboa: Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos serviços de pagamento no mercado interno e que altera as Directivas 97/7/CE, 2000/12/CE e 2002/65/CE»

COM(2005) 603 final — 2005/0245 (COD)

(2006/C 318/09)

Em 18 de Janeiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 47.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo que emitiu parecer em 12 de Julho de 2006, tendo sido relator FRANK von FÜRSTENWERTH.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 191 votos a favor, 1 voto contra, com 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Síntese do parecer

1.1

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) partilha a opinião da Comissão Europeia de que a realização do mercado interno só será possível mediante o desmantelamento de todas as fronteiras internas da Comunidade, de molde a permitir a livre circulação de bens, pessoas, serviços e capitais. O perfeito funcionamento do mercado único de serviços de pagamento é fundamental neste contexto, mas não é ainda realidade. O CESE concorda com a iniciativa de, na sequência da feliz introdução do euro, se apostar agora na criação de um espaço único para os pagamentos em euros (SEPA — Single Euro Payment Area), doravante designado «espaço único de pagamentos».

1.2

O CESE reconhece os esforços da Comissão Europeia para criar as condições jurídicas necessárias à instauração do referido espaço único, considerando a respectiva proposta de directiva uma medida exemplar.

1.3

O CESE saúda aliás também todas as medidas já tomadas pela Comissão Europeia e pelo sector europeu de crédito para criar este espaço único, cuja — ambiciosa — meta é assegurar que os pagamentos transfronteiras no mercado interno se processem de forma fácil, confortável, segura e pouco onerosa.

1.4

O CESE faz todavia notar que, com esta proposta de directiva, a Comissão Europeia optou por uma abordagem regulamentar demasiado abrangente, extravasando claramente o quadro legal necessário aos serviços de pagamento transfronteiras. Daí o seu receio que — atendendo aos necessários prazos para a sua transposição pelos prestadores e utilizadores de serviços de pagamento nos Estados-Membros — a meta de 2008 para a concretização deste espaço único de pagamentos não seja alcançada, devido à sobrecarga e à desproporção do quadro jurídico em causa. O Comité sugere que se tenham em maior consideração os instrumentos de auto-regulação e co-regulação.

1.5

Para atingir o objectivo da Comissão Europeia de iniciar a operação do espaço único de pagamentos em 2008, bastaria apenas criar bases jurídicas para os serviços de autorização de débito transfronteiras e rever as necessárias disposições legais da proposta de directiva, nomeadamente as constantes nos seus títulos II (prestadores de serviços de pagamento) e IV (direitos e obrigações associados à prestação e à utilização destes serviços), com vista, entre outros, à autorização, à revogabilidade e ao reembolso das ordens de débito (título IV). Mais não seria preciso para manter 2008 como ano de arranque para o espaço único de pagamentos.

1.6

O CESE considera assim que, perante os actos jurídicos até agora adoptados, cingir a regulamentação ao estritamente necessário bastará para honrar o compromisso de melhorar a regulamentação (better regulation). Nessa medida, o fio condutor da proposta de directiva devia consistir em promover e facilitar os pagamentos no interesse dos prestadores e utilizadores de serviços de pagamento e não em dificultá-los com medidas burocráticas, que resultam num agravamento dos custos dos sistemas e na concomitante retracção dos utilizadores.

1.7

O CESE observa, porém, que, no contexto da criação do mercado interno, se colocam outras questões que não puderam ainda ser resolvidas, como a segurança do pagamento electrónico e aspectos com ela relacionados. Por outro lado, seria ainda de salientar o facto de o acesso a uma conta-corrente estar praticamente vedado a quem não participa efectivamente na vida económica, questão que é cada vez mais sentida como importante nos Estados-Membros.

1.8

Eis, em particular, as adaptações que o CESE propõe efectuar à proposta de directiva:

2.   Conteúdo da proposta de directiva

2.1

A proposta de directiva visa criar um quadro jurídico unificado para o espaço único de pagamentos, particularmente destinado a facilitar os pagamentos transfronteiras. O objectivo é harmonizar a multiplicidade de regimes existentes nos diferentes Estados-Membros e, com isso:

aumentar a concorrência entre os mercados nacionais, na medida em que são criadas condições iniciais de concorrência idênticas;

aumentar a transparência do mercado em benefício dos prestadores e dos utilizadores;

uniformizar direitos e obrigações dos utilizadores e prestadores de serviços de pagamento.

A proposta de directiva contém no essencial as seguintes disposições:

2.2   Direito de prestar serviços de pagamento ao público (título II)

2.2.1

A harmonização das condições de acesso ao mercado aplicáveis aos prestadores de serviços de pagamento que não instituições de crédito destina-se a assegurar a igualdade das condições de concorrência iniciais entre os mercados nacionais e a estimular a sua entrada em concorrência. Simultaneamente, pretende-se avaliar a evolução do mercado nos últimos anos e favorecer a entrada no mercado a toda uma nova geração de operadores, as chamadas «instituições de pagamento».

2.3   Obrigações em matéria de transparência e informação (título III)

2.3.1

A clareza, a coerência das regras em matéria de transparência por que se devem regem os serviços de pagamento são condições passíveis de reforçar a concorrência, na medida em que oferecem aos consumidores um leque de escolha mais vasto e os protegem. A Comissão Europeia vem propor a imposição generalizada aos serviços de pagamento de obrigações de informação que deverão substituir os diferentes regimes nacionais.

2.4   Direitos e obrigações dos utilizadores e dos prestadores de serviços de pagamento (título IV)

2.4.1

A proposta de directiva define os principais direitos e obrigações dos utilizadores e dos prestadores de serviços de pagamento. As disposições em causa visam reforçar a confiança dos utilizadores nos sistemas de pagamento electrónico, a fim de garantir a eficiência e a aceitação destes sistemas.

3.   Observações na generalidade

3.1

O Comité Económico e Social Europeu aprova o objectivo da proposta de directiva de criar um espaço único de pagamentos, sobretudo para os serviços de pagamento transfronteiras. Muito embora a criação de um mercado interno para os serviços de pagamento seja devida há bastante tempo, espera-se agora que aconteça em 2008.

3.2

A abordagem regulamentar adoptada pela Comissão é demasiado abrangente. As disposições propostas excedem em parte o quadro legal necessário para o dito espaço único de pagamentos, tanto mais que já existe suficiente direito harmonizado neste domínio, com a directiva relativa às transferências transfronteiras (97/5/CE), a directiva relativa à comercialização à distância de serviços financeiros prestados a consumidores (2002/65/CE) e a directiva relativa à moeda electrónica (2000/46/CE).

3.3

A manutenção de um mecanismo eficiente e pouco oneroso não é obstáculo ao espaço único de pagamentos. Ela permite, ao invés, concretizar medidas de normalização que, por um lado, garantem o nível de segurança e eficiência já alcançado e, por outro, graças a uma gestão inteligente das interfaces, tornam o espaço único de pagamentos uma realidade de elevado nível qualitativo. Baseando-se no princípio geral já referido de melhorar a regulamentação, o CESE é a favor de limitar as regras para a melhoria dos pagamentos no mercado interno ao mínimo indispensável e sugere que se tenham em maior consideração os instrumentos de auto-regulação e co-regulação.

3.4

O CESE vê o espaço único de pagamentos como um pressuposto importante para o desenvolvimento de produtos à escala europeia, em condições de transparência e de livre concorrência entre os prestadores destes serviços e em benefício dos seus clientes. O CESE considera ainda essencial que a liberdade de escolha de instrumentos de pagamento de que usufruem os consumidores continue de futuro a ser preservada, tendo assim em devida conta a preferência do cliente.

3.5

O que se afigura problemático é o acesso a sistemas de pagamento por instituições de pagamento sem licença bancária, situação que requer um nível uniforme de requisitos prudenciais como condição essencial para uma concorrência leal. Caso contrário, são de recear distorções da concorrência e a colocação em risco da funcionalidade e da segurança das operações de pagamento e dos prestadores destes serviços (risco de insolvência, por exemplo).

3.6

O Comité Económico e Social recomenda à Comissão que circunscreva a sua proposta às regras necessárias a um futuro serviço europeu de autorização de débito, tais como constam nos títulos II (prestadores de serviços de pagamento) e IV (direitos e obrigações associados à prestação e à utilização destes serviços) da directiva (e que visam, entre outros, a autorização, a revogabilidade e o reembolso das ordens de débito). Tanto a adopção da directiva como a sua transposição para o direito nacional deverão ter lugar dentro do prazo indicado, por forma a poder respeitar a data de arranque (2008) de um espaço único de pagamentos dotado de condições de enquadramento uniformes para os prestadores de serviços de pagamento e de um serviço europeu de autorização de débito (permitindo o débito directo no espaço único).

3.7

O Comité Económico e Social Europeu aprecia bastante que nesta proposta de directiva (artigo 79.o) a Comissão Europeia preveja para o mais tardar dois anos após a data de adopção da directiva apresentar ao Parlamento Europeu, ao Conselho e ao Comité Económico e Social Europeu um relatório sobre a sua aplicação.

4.   Observações na especialidade

4.1

Eis, em pormenor, as observações do CESE sobre a proposta de directiva em exame:

4.2   Artigo 2.o, 1o parágrafo — Excluir do âmbito da directiva o direito privado internacional

4.2.1

A inclusão, no âmbito territorial de aplicação da directiva, de pagamentos de/para países externos à União Europeia e ao Espaço Económico Europeu (países terceiros), tal como prevista no 1o parágrafo do artigo 2.o, vai claramente além do objectivo de criar condições de enquadramento uniformes no mercado interno europeu. Por outro lado, tal regulamentação não só não deveria ser da competência do legislador europeu como também é problemática, tanto mais não seja porque o legislador europeu não tem maneira de assegurar que os países terceiros adoptem disposições equivalentes às suas. Será assim, por exemplo, totalmente inadequado prever (artigo 67.o) que seja exclusivamente o prestador do serviço de pagamento a assumir perante o autor do mesmo a responsabilidade pelo êxito de um pagamento efectuado para um país terceiro, sem que exista aí regulamentação correspondente.

4.2.2

O CESE recomenda por conseguinte restringir o âmbito de aplicação da directiva aos serviços de pagamento prestados no mercado interno europeu.

4.3   Artigo 5o e segs. — Estabelecer um nível uniforme de requisitos prudenciais como condição essencial para uma concorrência leal

4.3.1

Os requisitos prudenciais para o acesso ao mercado por parte de instituições de pagamento sem licença bancária (artigo 5o e segs.) só deviam divergir dos requisitos de supervisão da actividade bancária nos aspectos em que as instituições de pagamento não são equiparáveis a instituições de crédito titulares de licenças bancárias globais. Caso contrário, são de recear distorções da concorrência em prejuízo das instituições de crédito e consideráveis riscos para a funcionalidade das operações de pagamento. Além disso, forçar o acesso das instituições de pagamento sem licença bancária a sistemas de pagamento poderia comprometer a integridade e funcionalidade do serviço europeu de autorização de débito (actualmente em preparação), caso elas não satisfizessem as condições impostas às instituições de crédito, nomeadamente: capital próprio de risco, adequação profissional e idoneidade dos gerentes, planificação da exploração e organização da actividade comercial, supervisão contínua da operação e ainda a possibilidade — necessária — de aplicação de sanções. Mas se não houver um nível adequado de requisitos prudenciais é sobretudo a confiança dos consumidores no espaço único de pagamentos que se ressentirá por bastante tempo. O mesmo se aplica à protecção no caso de insolvência e às necessárias precauções para garantir a separação dos fundos dos clientes.

4.3.2

O CESE considera por isso indispensável que, no que toca aos riscos e perigos das operações de pagamento, todas as instituições de pagamento sejam submetidas aos mesmos requisitos de supervisão da actividade bancária e que as autoridades encarregadas dessa supervisão sejam dotadas das competências necessárias.

4.4   Artigo30o e segs. — Evitar uma formalização excessiva das obrigações de informação

4.4.1

O CESE partilha a opinião da Comissão de que regras claras e coerentes em matéria de transparência dos serviços de pagamento são essenciais para o consumidor — e para a aceitação do espaço único de pagamentos. As informações devem ser claras, compreensíveis e legíveis. Demasiada variedade e acumulação de informações pode, porém, convertê-las no seu oposto e resultar em mais opacidade do que transparência. Por outro lado, o utilizador privado deste espaço único precisa de informações diferentes das do comerciante que o utiliza. O CESE também considera confuso — e dispendioso — que a Comissão preveja diferentes requisitos de transparência para situações análogas, pelo que, neste contexto, remete em especial para os requisitos de transparência que figuram na directiva relativa à comercialização à distância de serviços financeiros.

4.4.2

Do ponto de vista do consumidor, convém chamar a atenção para o facto de a abordagem escolhida de harmonização global e de reconhecimento mútuo se poder revelar bastante problemática, não sendo de excluir que fique aquém do nível de protecção dos consumidores já alcançado em certos Estados-Membros.

4.4.3

As disposições sobre o modo de transmissão da informação (artigo 30.o) deviam ser simplificadas. Sobretudo no que respeita à notificação ao utilizador de alterações contratuais (artigo 33.o), bem como da expedição (artigo 36.o) ou da recepção de pagamentos (artigo 37.o), seria preciso manter a pouco onerosa prática actual de — sempre que acordado e usual — lhe facultar informações, enviando-lhe um extracto da conta ou possibilitando-lhe a consulta dos movimentos da conta em linha (online banking). Devia também existir a possibilidade de cumprir a obrigação de informação através da afixação do preço ou da sua publicação na Internet. Havia que formular mais claramente (artigos 31o e 37.o) que, numa comissão global, os preços das diferentes componentes do serviço só podem ser discriminados ao cliente se as diferentes componentes do serviço implicarem constelações de produtos separadas ou alheias.

4.4.4

Do ponto de vista do utilizador, é importante que para cada pagamento recebido/expedido se indiquem, para além de dados claros sobre os respectivos autor e beneficiário, também referências completas quanto à finalidade prevista. Só assim o lançamento em «rubricas em aberto» ou «créditos» poderá ser completamente automático.

4.5   Artigo 41.o, 2o parágrafo — Permitir todos os tipos de autorização

4.5.1

O CESE concorda com a condição estabelecida pela Comissão, segundo a qual uma operação de pagamento só pode ser considerada autorizada se o autor da ordem pagamento tiver dado ao prestador do serviço o seu consentimento para a executar. No artigo 41.o, 2o parágrafo, o consentimento do autor do pagamento é feito depender de uma autorização «expressa» de «uma ou de um conjunto de operações de pagamento». Esta formulação não é clara. Exigir, no âmbito de uma relação contratual, uma autorização expressa para cada procedimento de autorização de débito prejudicaria a eficiência e o custo deste processo.

4.5.2

Para, também no interesse dos consumidores, se poder continuar a usufruir de mecanismos comprovados e baratos, como, por exemplo, a domiciliação bancária, a directiva devia visar exclusivamente uma coordenação mínima em vez de uma harmonização completa.

4.6   Artigo 48.o, 1o e 2o parágrafos — Não parece sensato repartir o ónus da prova em caso de operações de pagamento controversas

4.6.1

O espaço único de pagamentos não será aceite pelos consumidores se, no caso de uma autorização controversa, estes se virem confrontados com insuperáveis dificuldades de produção de provas. O CESE subscreve por isso a intenção da Comissão de prever medidas destinadas a facilitar aos utilizadores a dita produção de provas.

4.6.2

Não obstante, essa abordagem não pode levar a privar o prestador de serviços de pagamento da possibilidade de apresentar uma contraprova em caso de abuso grave. Ora, no artigo 48.o, 2o parágrafo, prevê-se precisamente impedir o prestador do serviço de produzir provas de negligência grave, ou até de dolo, por parte do utilizador. Mas se deixa de ser possível provar ao utilizador do serviço que cometeu uma negligência grave ou mostrou uma intenção delituosa, pode-se estar a convidá-lo a ignorar de futuro toda a diligência normal ou até a adoptar uma prática abusiva. Esta regulamentação tem ainda por resultado limitar grandemente a oferta de certos mecanismos de pagamento electrónico.

4.6.3

O CESE é a favor de uma repartição justa do ónus da prova. Cabe depois ao prestador do serviço provar que foi realmente o titular do instrumento de verificação de pagamentos que deu a ordem de pagamento. Se o pagamento for efectuado com dispositivos de segurança especiais e de reconhecida protecção contra abusos, devia valer a prova «à primeira vista» (prima facie) de que foi o próprio utilizador do serviço que autorizou o pagamento ou de que foi pelo menos ele que cometeu a negligência grave. De resto, a apreciação da prova pelos tribunais nacionais não devia ser indevidamente limitada, tanto mais que os processos civis dos Estados-Membros não estão harmonizados.

4.7   Artigo 49o — Criar segurança jurídica para os pagamentos não autorizados com a fixação de um prazo uniforme para prescrição do reembolso

4.7.1

Na exposição de motivos da proposta de directiva, a Comissão Europeia chama a atenção para o facto de se realizarem anualmente na Comunidade cerca de 231 mil milhões de transacções no quadro dos serviços de pagamento. Só isto mostra claramente que terá de haver em dado momento segurança jurídica quanto a saber se uma transacção foi ou não autorizada. Para a obtenção da devida segurança jurídica, o direito a reembolso de que goza o utilizador do serviço no caso de pagamentos não autorizados devia ser limitado no tempo. Este prazo tem de ser justo, e o CESE considera o prazo de um ano adequado.

4.7.2

Segundo o artigo 45.o, é ao utilizador do serviço que cabe — devidamente — a obrigação de verificar regularmente os movimentos na sua conta e de reclamar imediatamente no caso de operações não autorizadas. É por isso coerente e equilibrado limitar a um ano o direito do utilizador a ser reembolsado de pagamentos não autorizados. Tanto os prestadores como os utilizadores do serviço de pagamento têm assim a necessária segurança jurídica de que, uma vez expirado este prazo, a operação de pagamento é definitiva. Além disso, o prazo anual corresponde à obrigação de conservação mencionada no artigo 44.o.

4.8   Artigos 49o e 50o — Repensar a repartição da responsabilidade

4.8.1

O CESE considera que será preciso prever uma repartição justa da responsabilidade entre o prestador e o utilizador do serviço de pagamento. Só então os consumidores recorrerão ao serviço e os prestadores poderão oferecê-lo ao preço justo.

4.8.2

A estrita responsabilidade do prestador do serviço por pagamentos não autorizados, tal como proposta no artigo 49.o, afigura-se ao CESE como pertinente, desde que o utilizador do serviço utilize o instrumento de verificação dos pagamentos de forma correcta e respeitadora do contrato.

4.8.3

O CESE considera adequada a limitação da responsabilidade do utilizador a 150 euros, como prevista no artigo 50.o, caso este, apesar de uma conduta cuidadosa, não se aperceba da perda do instrumento de verificação de pagamentos, mas a notifique sem demora logo que a registe. Se o utilizador não proceder a essa notificação, apesar de a ela estar obrigado nos termos do artigo 46.o, e se o prestador do serviço se vir assim impedido de evitar ou limitar a perda, o utilizador devia perder o privilégio relacionado com a sua responsabilidade em detrimento dos utilizadores de conduta cautelosa.

4.9   Artigo 53o — Fixar claramente o prazo de reembolso

4.9.1

O exercício do direito ao reembolso no processo europeu de autorização de débito é uma particularidade essencial deste processo de pagamento. Para funcionar correctamente, é essencial que o termo do prazo para exercer o direito ao reembolso no caso de pagamentos autorizados possa ser claramente fixado por todos os intervenientes no processo de pagamento. Esta condição não é assegurada pela correlação entre o início do prazo e a sua tomada de conhecimento pelo autor do pagamento, tal como prevista no artigo 53.o, 1o parágrafo, 1o período, porque nem o beneficiário do pagamento nem o respectivo prestador do serviço têm conhecimento do momento em que o prestador de serviço que assiste o autor do pagamento o terá realmente notificado da execução do mesmo, pelo lançamento na sua conta.

4.9.2

A razão reside no facto de a regularidade com que os extractos de conta são disponibilizados para consulta ser bastante diversificada na prática. Com efeito, os extractos de conta são disponibilizados ora trimestralmente, ora uma semana após a operação, ora diariamente. É uma questão de preferência do utilizador e de custos. Assim, dependendo da frequência com que a informação é disponibilizada, o prazo para o reembolso com base nos exemplos dados acima pode consistir em «3 meses + 4 semanas», «1 semana + 4 semanas» ou «1 dia + 4 semanas». O momento em que o processo de pagamento é considerado definitivo é, por conseguinte, praticamente indeterminável, o que coloca um problema quase irresolúvel e compromete seriamente a execução deste processo.

4.9.3

O CESE propõe por isso, de acordo com o artigo 53.o, 1o parágrafo, que, no momento em que o cliente é notificado, comece a contar um prazo de 4 semanas, o qual deverá, em qualquer dos casos, expirar 8 semanas após a data em que esse débito é registado na conta do autor do pagamento.

4.10   Artigos 60.o, 61o e 67o — Separar claramente as esferas de obrigações dos prestadores de serviços de pagamento envolvidos na sua execução

4.10.1

Nos artigos 60.o, 61o e 67o é estabelecida uma relação entre a realização efectiva do pagamento e o momento em que a conta do seu beneficiário é creditada. Isso representa, sem razão aparente, uma ruptura face ao direito europeu em vigor para as transferências. As obrigações contratuais dos prestadores do serviço que assistem, respectivamente, o autor e o beneficiário do pagamento, encontram-se misturadas. Nesta situação, o prestador do serviço que assiste o autor do pagamento pode ser obrigado a algo que só pertence à esfera de obrigações do prestador do serviço que assiste o beneficiário e que o primeiro não pode controlar.

4.10.2

O CESE propõe, por conseguinte, submeter esta questão ao princípio da aplicação do direito das operações de pagamento, que, graças à directiva relativa às transferências transfronteiras, é uniformemente aplicado em todos os Estados-Membros. Uma vez isso assegurado, é o prestador do serviço que assiste o autor do pagamento que assume a responsabilidade pela parte da transacção que vai até ao prestador de serviço que assiste o beneficiário. Pela parte da transacção que vai deste até ao momento em que a conta do beneficiário é creditada responsabiliza-se o prestador de serviço que assiste este último.

4.11   Artigos 60.o, 61o e 67o — Fixar prazos de execução negociáveis

4.11.1

O CESE considera fundamental que os prazos de execução sejam fixados de modo a permitirem, por um lado, optimizar a situação actual, mas a impedirem, por outro, que a execução técnica implique custos desproporcionalmente elevados, que levariam a um aumento dos preços das operações de pagamento.

4.11.2

Os prazos do processamento bancário previstos nos artigos 60o e 61o (dia de recepção + 1 dia de processamento) poderão ser demasiado ambiciosos face à situação actual. Segundo a directiva para as transferências transfronteiras, existe um período regulamentar de 6 dias para o processamento bancário (dia de recepção + 5 dias de processamento bancário + 1 dia de prazo para o crédito em conta = prazo de 5 dias para o prestador do serviço que assiste o autor do pagamento transferir o montante para o prestador do serviço que assiste o beneficiário, + 1 dia para este último creditar esse montante a conta do beneficiário), mas são admitidos desvios. Uma série de pequenos prestadores deste serviço a nível regional ou sub-regional têm alegado não conseguir cumprir com esta regra. O prazo (máximo) de execução agora previsto (1 dia para o prestador de serviço que assiste o autor do pagamento creditar o montante na conta do beneficiário) corresponderia a 1/6 do prazo até agora permitido. Segundo os prestadores de serviços de pagamento, a execução técnica também estaria associada a custos desproporcionalmente elevados e levaria infalivelmente ao aumento dos preços das operações de pagamento. O próprio sector europeu de crédito estabeleceu para si, no quadro da «Convenção Credeuro», a obrigação de respeitar um prazo máximo de execução de 3 dias de processamento bancário para os pagamentos efectuados em euros e um prazo normal de execução de 3 dias de processamento bancário para os pagamentos efectuados noutras moedas europeias.

4.11.3

No caso de se estarem assim a criar condições de concorrência desvantajosas para pequenos prestadores de serviços de pagamento a nível regional ou sub-regional, o CESE recomenda a adopção, durante um período de transição adequado, do prazo regulamentar de execução de 3 dias, independentemente da possibilidade de autorização de prazos de execução mais curtos para operações de pagamento puramente nacionais (artigo 64.o).

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/56


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (Roma I)»

COM(2005) 650 final — 2005/0261 (COD)

(2006/C 318/10)

Em 24 de Fevereiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 26 de Julho de 2006, tendo sido relator FRANK von FÜRSTENWERTH.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 191 votos a favor, 1 voto contra e 5 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Síntese das conclusões e recomendação

1.1

O Comité Económico e Social Europeu acolhe com agrado a intenção da Comissão de regular os conflitos de leis em matéria de obrigações contratuais sob a forma de regulamento europeu. Trata-se de um passo coerente no sentido de aperfeiçoar as regras de conflitos de leis e colmatar uma lacuna do actual sistema do direito comunitário. O regulamento é útil e indispensável ao desenvolvimento de um espaço de justiça europeu uniforme, dada a necessidade de modernizar a legislação específica que regulamenta a matéria, nomeadamente a Convenção de Roma de 1980 sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (1), o que, pelo facto de a Convenção revestir a forma de um acordo multilateral, implicaria negociações morosas que só muito dificilmente, ou mesmo nunca, chegariam a bom termo.

1.2

O Comité apoia a Comissão neste projecto, incentivando-a simultaneamente a conclui-lo o mais rapidamente possível (tendo em conta as propostas apresentadas infra), para que o regulamento possa entrar em vigor.

1.3

O Comité felicita a Comissão pelo seu esforço em pôr termo ao actual défice na regulamentação das normas que regem os conflitos de leis no domínio das obrigações contratuais, resultante da inexistência de um acto jurídico europeu vinculativo para todos os Estados-Membros, mediante a harmonização geral das normas vigentes nesta matéria. Daí resultam simplificações de inestimável importância para o utilizador da lei, o qual pode, doravante, contar com um conjunto normativo unitário, que, graças à aplicação directa do regulamento, é idêntico em todos os Estados-Membros. O regulamento em apreço é um complemento necessário da proposta de regulamento Roma II (2), cujos trabalhos legislativos se encontram em fase adiantada. Através dos dois regulamentos, a União Europeia passará a dispor, pela primeira vez, de um corpus unitário de normas aplicáveis a conflitos de leis em matéria de obrigações contratuais.

1.4

O Comité exorta os órgãos legislativos da UE a terem em conta as propostas de alteração apresentadas infra:

O teor do n.o 1, terceiro parágrafo, do artigo 3.o deveria ser transformado em regra de interpretação;

No n.o 3 do artigo 3.o dever-se-ia incluir uma disposição segundo a qual as partes nos contratos celebrados por consumidores só podem escolher a lei aplicável posteriormente à emergência do litígio;

Apurar se, para casos muito excepcionais, seria útil prever uma regra menos rígida que a constante do n.o 1 do artigo 4.o;

Dever-se-ia analisar se e em que condições pode também haver, no âmbito do artigo 5.o, liberdade de escolha da lei aplicável nos casos em que a empresa exerceu a sua actividade no ou para o país do consumidor;

A alínea c) do artigo 22.o deveria ser suprimida.

Os trabalhos do regulamento devem ser concluídos o mais rapidamente possível, para que ele possa entrar em vigor.

1.5

O Comité regozija-se com o facto de a Irlanda aderir voluntariamente ao regulamento. Lamenta, porém, que o Reino Unido e a Dinamarca não adoptem o regulamento, pois o nível de harmonização não será tão elevado quanto possível. O Comité insta a Comissão a utilizar todos os meios ao seu dispor para fazer com que estes Estados-Membros o venham a adoptar.

2.   Observações na generalidade

2.1   Exposição dos motivos da iniciativa

2.1.1

Com o regulamento em apreço, a Comissão cria na União Europeia um corpus único de regras para os conflitos de leis no domínio das obrigações contratuais. Esse corpus unitário existe já desde 1980, quando a maioria dos Estados da Europa Ocidental de então decidiu concluir a «Convenção sobre a lei aplicável às obrigações contratuais» (Convenção de Roma). Vários outros Estados aderiram posteriormente a essa convenção. Na altura, foi escolhida a forma de convenção multilateral, porque o Tratado CEE não previa base jurídica para adoptar tal acto. Decorridos mais de 25 anos desde a sua entrada em vigor, reconhece-se hoje que a Convenção de Roma representou um verdadeiro progresso e que, basicamente, as soluções nela contidas continuam a ser viáveis. No entanto, impõe-se a sua reestruturação e modernização no sentido de rectificar os pontos fracos detectados. Isso só seria possível através de uma renegociação que, pelo facto de a Convenção revestir a forma de um acordo multilateral, seria morosa e poderia conduzir a resultados imprevisíveis. Actualmente, uma vez que o Tratado CE proporciona uma base jurídica para a adopção de um tal acto comunitário (artigo 61.o, alínea c), e artigo 65.o, alínea b), do Tratado CE), essa necessidade já não existe. De futuro, a regulamentação deverá ser idêntica em todos os Estados-Membros, a fim de facilitar a sua aplicação. O regulamento constitui, portanto, o instrumento jurídico adequado.

2.1.2

Em 2004, a Comissão, com base num Livro Verde publicado em 2003 (3), realizou uma audição pública. Nessa ocasião, uma grande maioria pronunciou-se a favor da adopção do regulamento. Também o CESE (4) e o Parlamento Europeu (5) defenderam a transformação da Convenção de Roma num regulamento europeu e sua modernização.

2.2   Contexto jurídico

2.2.1

O regulamento insere-se no quadro das actividades da Comissão nos domínios do Direito Civil e do Direito Processual Civil, tendo em vista a criação de um espaço europeu de justiça uniforme e o melhor acesso dos cidadãos ao direito. O Comité já por várias vezes se pronunciou sobre várias propostas da Comissão (6).

2.2.2

O regulamento em análise é o prolongamento do trabalho da Comissão no domínio do direito material aplicável a conflitos de leis, nomeadamente a proposta de regulamento Roma II. Os dois regulamentos são instrumentos complementares.

2.3   Base jurídica/Proporcionalidade/Subsidiariedade/Forma jurídica

2.3.1

O regulamento sub judice visa unificar as regras aplicáveis aos conflitos de leis em matéria de obrigações contratuais. A harmonização das regras aplicáveis ao conflito de leis tem por base jurídica o artigo 61.o, alínea c), em relação com o artigo 65.o, alínea b), do Tratado CE. A Comissão tem, pois, competência para tomar esta iniciativa, se necessária para o bom funcionamento do mercado interno. No entender do Comité, é precisamente esse o caso, já que a harmonização das normas aplicáveis ao conflito de leis contribui para assegurar a igualdade de tratamento dos agentes económicos comunitários no caso de litígios transfronteiriços, reforçar a segurança jurídica, simplificar a aplicação do direito e, nessa medida, fomentar a apetência para as transacções transfronteiriças. O reconhecimento mútuo dos actos jurídicos é condição prévia para que os seus conteúdos exactos possam ser imediatamente determinados pelos nacionais de outros Estados-Membros.

2.3.2

A realização destes objectivos não é possível através de acções isoladas dos Estados-Membros, pelo que se torna necessária uma intervenção da União, sem prejuízo, no entanto, dos princípios da proporcionalidade e subsidiariedade (artigo 5.o do Tratado CE).

2.4

O Comité entende correcta a decisão da Comissão de que o acto revestirá a forma de regulamento e não de directiva, visto que esta última deixaria aos Estados-Membros margem de manobra quanto à sua execução. Evita-se, assim, uma situação de insegurança jurídica.

3.   Observações na especialidade

3.1   Âmbito de aplicação material, aplicação da lei de um país terceiro (artigos 1o e 2.o)

3.1.1

O regulamento ora em exame visa regular as obrigações contratuais em matéria civil e comercial que impliquem um conflito de leis (no 1 do artigo 1.o). Significa isto que o legislador pode socorrer-se da terminologia utilizada no Regulamento Bruxelas I (artigo 1.o) e que também foi adoptada na proposta de regulamento Roma II, cujo conteúdo está claramente definido. A exclusão de matérias fiscais, aduaneiras e administrativas é óbvia, mas, mesmo sendo desnecessário, não se perde nada em mencioná-la.

3.1.2

O regulamento em apreço não pretende regular na íntegra os conflitos de leis em matéria civil, ainda que isso pudesse ser útil para dirimir determinados conflitos no domínio das obrigações contratuais. O legislador faz bem em não ser demasiado ambicioso, para não comprometer a viabilidade do projecto. Daí saudar-se a exclusão do seu âmbito do direito das pessoas singulares (o estado e a capacidade jurídica — artigo 1.o, n.o 2, alínea a), uma vez que esta matéria, devido às suas implicações sociopolíticas, é tradicionalmente regulada por instrumentos próprios do Direito de Conflitos (até à data, quase exclusivamente, através de convenções multilaterais) (7). A exclusão das obrigações emergentes de relações de família, incluindo as obrigações alimentares, de regimes de bens no matrimónio, bem como das obrigações decorrentes de testamentos e sucessões (artigo 1.o, n.o 2, alíneas b) e c)), por razões semelhantes, afigura-se justificável e deve ser regulamentada por meio de instrumentos jurídicos próprios.

3.1.3

A exclusão das obrigações decorrentes de letras, cheques e livranças (artigo 1.o, n.o 2, alínea d)) explica-se pelo facto de esta matéria já estar suficientemente regulamentada em convenções específicas de âmbito internacional (8), que não devem ser postas em causa.

3.1.4

A exclusão das convenções de arbitragem e de eleição do foro (artigo 1.o, n.o 2, alínea e)) justifica-se pelo facto de esta matéria ser mais bem regulada pelo direito processual civil internacional e, em parte, também por convenções internacionais que se sobrepõem à legislação comunitária. O mesmo é válido para a prova e o processo (artigo 1.o, n.o 2, alínea h)).

3.1.5

A exclusão de conflitos no domínio do direito das sociedades, associações e pessoas colectivas no (artigo 1.o, no 2, alínea f)) é inevitável, pois as questões aí referidas estão tão intimamente ligadas ao estatuto de sociedade, que seria precisa regulamentação neste contexto. Matéria especial do direito anglo-americano é a constituída pelo «trust». Esta matéria já foi retirada da Convenção de Roma (artigo 1.o, no 2, alínea g)), medida que o regulamento correctamente segue (artigo 1.o, n.o 2, alínea g)).

3.1.6

A exclusão das obrigações que decorrem de relações pré-contratuais (artigo 1.o, n.o 2, alínea i)) está relacionada com obrigações resultantes de um acto ilícito. Esta matéria está regulada, de forma sistemática, na proposta de regulamento Roma II, razão por que não é aqui tratada.

3.1.7

Apraz ao Comité que a Irlanda queira adoptar voluntariamente o regulamento, mas lamenta que o Reino Unido não esteja disposto a dar o mesmo passo. A Dinamarca não aderirá ao regulamento (artigo 1.o, n.o 3) enquanto não for assinado um acordo entre este país e a União Europeia que defina as condições para a sua adopção ou enquanto a Dinamarca não decidir transpor o seu conteúdo para a ordem jurídica interna. O Comité insta a Comissão a utilizar todos os meios ao seu dispor para fazer com que estes Estados-Membros venham a adoptar o regulamento. A não-adesão de alguns Estados-Membros significaria que o objectivo visado pelo regulamento de harmonizar em toda a Europa o direito de conflitos de leis acabaria por resultar, de certo modo, frustrado. Seria lamentável se continuasse a ser necessário recorrer à Convenção de Roma para a resolução de litígios que envolvam um dos Estados-Membros em causa, pois este diploma e o Regulamento Roma I não serão idênticos no seu conteúdo. Logo, dependendo do tribunal ao qual o litígio venha a ser submetido — o que apesar do Regulamento Bruxelas I, da Convenção relativa à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (Convenção de Bruxelas) e da Convenção de Lugano é de certo modo arbitrário — pode haver lugar a decisões diferentes sobre uma mesma questão. Esta situação dificilmente seria aceitável na Comunidade.

3.1.8

O regulamento designa a lei aplicável sem considerar se se trata da lei de um Estado-Membro ou de um país terceiro (artigo 2.o). Segue assim uma norma reconhecida em matéria de conflito de leis, que rejeita discriminações de outros regimes jurídicos. O Comité aplaude esta posição. Se é verdade que os elementos de conexão requerem que se aplique um regime jurídico, não fará diferença tratar-se de um regime «comunitário» ou não.

3.2   Regras de conexão gerais (artigos 3.o e 4.o)

3.2.1

O n.o 1 do artigo 3.o preceitua que, regra geral, a lei aplicável é a lei escolhida pelas partes. O Comité saúda esta regra que visa acautelar o princípio estruturante do direito das obrigações contratuais, a liberdade contratual, e respeita as normas de direito internacional privado. A disposição corresponde, no essencial, à regra contida no n.o 1 do artigo 3.o da Convenção de Roma, a qual é considerada adequada. O Comité, embora não se opondo a esta regra, alerta para o perigo de a sua aplicação judicial poder significar a indagação da vontade hipotética das partes sem que haja pontos de referência suficientes. Esta situação deverá ser evitada. Seria conveniente clarificar este aspecto no sétimo Considerando. O estabelecido no n.o 3 do artigo 3.o é de tal modo permissivo que permite às partes, em qualquer momento, escolher de novo a lei aplicável. Em princípio, o Comité não se opõe, mas adverte para o perigo que daí pode resultar para a protecção do consumidor que, possivelmente, não pode perceber o alcance de tal disposição. Assim, o Comité propõe que a escolha pelas partes da lei aplicável nos contratos celebrados por consumidores seja autorizada apenas posteriormente à emergência do litígio — em paralelo com a regra em matéria de convenções sobre a escolha do tribunal competente (n.o 1 do artigo 17.o do Regulamento Bruxelas I) –, pois desse modo o consumidor ficará avisado e agirá com maior prudência.

3.2.2

O terceiro parágrafo do n.o 1 do artigo 3.o estabelece a presunção de que (na falta de escolha expressa) as partes ao convencionarem qual a jurisdição competente para dirimir um litígio consentem na escolha da lei do Estado do foro. A ideia subjacente a esta regra é a de que foro e lei aplicável devem coincidir, o que habitualmente simplifica os processos judiciais. Porém, o Comité receia que uma formulação tão estrita signifique uma restrição à autonomia da vontade das partes. Considera, portanto, que o enunciado no terceiro parágrafo deve ser introduzido, como regra de interpretação, no segundo parágrafo, passando a ter a seguinte redacção:

«Dever-se-á ter especialmente em conta a escolha do foro pelas partes».

3.2.3

Há ainda que analisar um aspecto de extrema importância para o futuro do espaço europeu de justiça, nomeadamente a criação eventual do chamado «instrumento de opção ou regime 26» por parte da Comunidade Europeia. Entende-se por isto uma ordem jurídica civil comunitária escolhida pelas partes. A sua criação é actualmente objecto de debate e os trabalhos em curso do Quadro Comum de Referência vão nesse sentido. O n.o 2 do artigo 3.o contém uma cláusula aberta, que permite às partes escolher um regime jurídico supranacional. No direito internacional privado este ponto não é evidente e o Comité defende expressamente essa possibilidade. As partes poderiam, pela primeira vez, utilizar extensivamente um contrato-tipo uniforme para toda a Europa, o que representaria um enorme progresso na realização do mercado interno (9).

3.2.4

O n.o 1 do artigo 4.o contém conexões para um conjunto de obrigações contratuais, complementando a regra do n.o 2 do artigo 4.o do regulamento, retirada da Convenção de Roma. Na Convenção de Roma era necessário interpretar o disposto no n.o 2 do artigo 4.o para determinar a conexão. A regra proposta pela Comissão pode ser encarada como garante de uma maior segurança jurídica, embora tenha o inconveniente de ser demasiado rígida e não permitir usar de flexibilidade, nem mesmo em situações concretas em que tal seria útil. O Comité receia que haja aqui um retrocesso em relação à Convenção de Roma e que pode ter efeitos negativos, dado ser concebível haver casos em que a conexão rígida prevista na proposta possa excepcionalmente conduzir a solução inadequada. Assim, parece-nos que dar ao juiz a possibilidade de aplicar a lei mais próxima do facto concreto poderia conduzir a soluções mais adequadas. Obviamente que uma tal excepção à regra não pode, de forma alguma, significar que uma qualquer lei possa ser aplicada, devendo portanto esta possibilidade ser cautelosamente ponderada e devidamente fundamentada na decisão, a fim de corresponder ao objectivo de um elevado nível de segurança jurídica e previsibilidade da lei aplicável. Face ao exposto, o Comité gostaria de ver examinada a possibilidade de alteração da regra.

3.2.5

O Comité compreende a ideia da Comissão subjacente à alínea f) do n.o 1 do artigo 4.o. Gostaria, porém, de salientar que muitos dos direitos de protecção industrial, devido à natureza da sua justificação, podem ser transferidos em aplicação de outras leis que não sejam a do país onde o titular do direito tem a sua residência habitual. Uma vez que o n.o 1 do artigo 4.o não estipula a aplicação da lei do país de residência na fundamentação da relação jurídica, uma mudança de estatuto mediante alteração posterior da residência habitual do titular do direito pode suscitar problemas relativamente à base jurídica dos direitos de protecção. O Comité insta a Comissão a analisar este problema e a propor uma solução adequada.

3.3   Regras de conexão especiais (artigos 5.o a 17.o)

3.3.1

No artigo 5.o são retomadas e desenvolvidas as regras constantes da Convenção de Roma em matéria de contratos celebrados por consumidores, que são dificilmente compreensíveis e carecem de revisão. O Comité é de opinião que as propostas apresentadas pela Comissão vão no bom sentido, pois permitem evitar a aplicação complexa de duas leis diferentes a uma mesma situação, conforme o exigido pelo disposto no artigo 5.o da Convenção de Roma. É óbvio que o consumidor, que celebra contratos com uma empresa, deve beneficiar de disposições protectoras em matéria de conflitos de leis. Este direito é, em princípio, assegurado pela aplicação da lei do Estado em que o consumidor tem a sua residência habitual (n.o 1 do artigo 5.o), quer pelo facto de ser esta a lei que o consumidor (na melhor das hipóteses) conhece, quer pelo facto de dominar a língua e poder beneficiar mais facilmente de serviços de assessoria profissional. O texto proposto exige, ainda, que a actividade exercida pela empresa se dirija para o país em que o consumidor tem a sua residência habitual ou seja prestada nesse país. Assim, vai-se, na linha da Convenção de Roma, de encontro aos interesses dos empregadores para quem é mais cómodo submeter-se à lei do seu país, o qual é permitido nos restantes casos. No entanto, o Comité pergunta-se se, na área dos contratos celebrados por consumidores, é realmente necessário vedar completamente às partes a possibilidade de escolha da lei aplicável, no sentido do disposto no n.o 2. Em sua opinião, os consumidores provavelmente beneficiariam com a possibilidade de escolha da lei aplicável, pelo menos desde que previstas determinadas disposições protectoras, de que sem dúvida necessitam por serem a parte mais fraca e menos experiente da relação contratual. Por conseguinte, o Comité recomenda à Comissão que reveja a disposição no sentido do atrás exposto.

3.3.2

A regra atinente aos contratos individuais de trabalho (artigo 6.o) deriva da necessidade de estabelecer disposições protectoras especificamente destinadas aos trabalhadores. Esta regra corresponde ao artigo 6.o da Convenção de Roma, agora completado por regras que visam acompanhar a evolução das relações de trabalho independente. O aditamento da expressão «ou a partir do qual» resulta da jurisprudência do TJCE sobre o artigo 18.o da Convenção de Bruxelas. Contudo, dada à ausência, no próprio regulamento, de uma definição precisa ou de explicações, na «Exposição de motivos», o Comité fica sem saber o que se deve entender por «trabalho temporário noutro país» (alínea a) do n.o 2 do artigo 6.o). É absolutamente necessário colmatar este vazio, pois o trabalho prestado «temporariamente» reveste especial importância enquanto critério de conexão. Este problema não pode ser resolvido invocando-se o disposto no artigo 2.o da Directiva sobre o destacamento de trabalhadores (10), uma vez que dela também não consta uma definição precisa. Por outro lado, o Comité não entende porque motivo é introduzida uma regra específica para espaços «não sujeitos a uma soberania nacional» (alínea b) do n.o 2 do artigo 6.o). Possivelmente, a Comissão está-se a referir a plataformas petrolíferas em águas internacionais. Este ponto deveria ser clarificado, quanto mais não fosse, na exposição de motivos.

3.3.3

O artigo 7.o refere-se aos contratos celebrados por um intermediário, matéria que só é parcialmente regulada pela Convenção de Roma, cujas disposições pertinentes não se aplicam à relação entre o representado e o terceiro. Importa colmatar esta lacuna (n.o 2 do artigo 7.o). Aqui é difícil responder à questão de saber qual a lei aplicável, pois estão em jogo tanto os interesses do representado como do terceiro. Na eventualidade de o intermediário exorbitar das suas competências ou agir sem competências, o terceiro deve beneficiar de protecção especial. O texto proposto tenta encontrar um ponto de equilíbrio entre os interesses de ambas as partes, razão por que tem o apoio do Comité.

3.3.4

As disposições imperativas constituem matéria difícil, pois deve-se interferir o menos possível na escolha das partes da lei aplicável ao contrato e evitar complicar a aplicação da lei através de normas estranhas ao estatuto contratual. O artigo 8.o condiz no essencial com o n.o 2 do artigo 7.o da Convenção de Roma. A proposta de regulamento, que se inspira na jurisprudência do Tribunal de Justiça (11), dá uma definição jurídica do conceito «disposições imperativas», dando prevalência a estas normas. O problema para o utilizador da lei é que nestes casos deixa de haver uniformidade da decisão, pretendendo-se aplicar normas divergentes ou, até, contraditórias, com sacrifício da coerência. Para além de ser moroso e juridicamente complicado, este procedimento contribui para agravar a insegurança jurídica. No entanto, o Comité, no quadro da aproximação das legislações nacionais, reconhece que essas normas são necessárias, tanto mais que a sua aplicação em situações de conflito de leis é maioritariamente defendida nos círculos científicos.

3.3.5

Na opinião do Comité, os artigos 10.o a 17.o não suscitam problemas e dispensam comentários, sobretudo no que se refere às disposições retiradas da Convenção de Roma.

3.3.6

O artigo 10.o (validade formal do contrato) reflecte, face à multiplicação dos contratos celebrados à distância, a necessidade de facilitar a validade formal dos contratos ou dos actos unilaterais mediante introdução de conexões alternativas complementares.

3.3.7

A cessão de créditos e a possibilidade, prevista em alguns regimes jurídicos, de o credor e o devedor convencionarem que este último toma a posição do credor, desempenham uma função económica idêntica (12), pelo que é correcto tratá-los no mesmo artigo 13.o. O n.o 3 introduz uma nova regra de conflito que regula a questão de saber qual a lei aplicável à oponibilidade da cessão a terceiros. Esta regra tem por base a Convenção da CNUDCI, de 12 de Dezembro de 2001, sobre a cessão de créditos no comércio internacional.

3.3.8

O artigo 14.o contém uma regra de conflitos de leis em matéria de sub-rogação legal. Esta regra existe na maior parte dos sistemas jurídicos. Ora, assim sendo, há necessidade de uma regra de conflitos de leis. O artigo 15.o completa o artigo 14.o, prevendo uma regra de conflitos de leis em matéria de pluralidade de devedores na cessão de créditos. Recomenda-se, não sendo contudo obrigatório, condensar o artigo 14.o numa única disposição.

3.4   Outras disposições/disposições finais (artigos 18.o a 24.o)

3.4.1

Os temas tratados nos capítulos III e IV do regulamento em apreço estabelecem predominantemente regras técnicas, conformes com as normas reconhecidas em matéria de conflito de leis, pelo que dispensam comentários em pormenor. É esse o caso dos artigos 19o (exclusão do reenvio), 21o (ordenamentos jurídicos plurilegislativos), 20o (ordem pública) e 23o (relações com convenções internacionais existentes), correspondentes, respectivamente, aos artigos 15.o, 19.o, 16o e 21o da Convenção de Roma.

3.4.2

A residência habitual (artigo 18.o) de uma pessoa desempenha um papel determinante para a conexão no actual direito internacional privado. Enquanto a determinação da residência habitual de pessoas singulares não suscita problemas, pode haver dúvidas no caso de pessoas colectivas. O regulamento resolve-as adequadamente, ao declarar como determinante o critério do lugar da sua administração principal. Não teria sido adequado retomar aqui o artigo 60o da Convenção de Bruxelas, pelo facto de a convenção se basear em geral no critério do domicílio e não da residência habitual e de a solução tripartida por ela avançada proporcionar menos segurança jurídica.

3.4.3

O teor da alínea c) do artigo 22.o não é de compreensão fácil. Da sua leitura, poder-se-ia depreender que os actos comunitários que venham a ser promulgados poderiam estabelecer regras de conflito próprias, com prevalência sobre o regulamento em apreço. No entanto, o já alcançado grau de harmonização do direito privado internacional deverá ser mantido no futuro. Há que evitar uma multiplicidade de fontes de Direito e de regras com conteúdos divergentes. Quaisquer regras especiais, se necessárias, devem ser incorporadas no regulamento.

O Comité sugere que se suprima a alínea c).

3.5   Anexo I

3.5.1

No Anexo (terceiro e quarto travessões) são referidas a «Segunda Directiva sobre o seguro não vida» e a «Segunda Directiva sobre o seguro de vida». Independentemente de a última das duas directivas ter sido revogada (presume-se que o regulamento se refere à Directiva sobre os seguros de vida (13), que a substitui), os dois travessões são problemáticos. O Comité não chega ao ponto de exigir que ambos sejam suprimidos, mas gostaria de chamar expressamente a atenção da Comissão para os enormes problemas que a proposta acarreta. Desta forma, perde-se uma grande oportunidade de simplificar e harmonizar as regras de conflitos de leis e solucionar os problemas que afectam este sector. Juntamente com a alínea a) do artigo 22.o, o terceiro e o quarto travessões do Anexo I fariam com que o regulamento não fosse aplicável aos conflitos de leis no que diz respeito a contratos de seguro (directo) (14) que cobrem riscos situados no território dos Estados-Membros, uma vez que esta matéria é regulada pelas duas directivas.

3.5.2

Por seu turno, os conflitos de leis respeitantes a contratos de seguro em que o risco se situa fora do território da União Europeia e a contratos que cobrem riscos situados no território da União Europeia (mas apenas se o contrato tiver sido celebrado com uma seguradora não pertencente à UE) são indubitavelmente abrangidos pelo âmbito de aplicação do regulamento em apreço. De facto, estar-se-ia a perpetuar uma situação que tem vindo a suscitar confusão entre os utilizadores da lei (15). Desde a adopção das directivas sobre seguros, os conflitos de leis respeitantes a contratos de seguro e os conflitos de leis em matéria de obrigações contratuais são regulados diferentemente (n.o 3 do artigo 1.o da Convenção de Roma), apesar de os contratos de seguro constituírem obrigações contratuais. Não houve motivos substanciais para justificar esta opção que se fundamentou no facto de os trabalhos preparatórios das directivas sobre seguros de segunda geração terem sido iniciados em data posterior à celebração da Convenção de Roma, e no facto de se pretender aguardar a evolução do quadro prudencial antes de estabelecer uma regra de conflitos de leis (16). Actualmente, esta posição é obsoleta.

3.5.3

Nas directivas, que visam essencialmente reforçar a supervisão prudencial, as regras de direito internacional privado aparecem como um corpo estranho. O simples utilizador da lei nunca as imaginaria aí. Um outro aspecto que vem complicar a situação é a multiplicidade de instrumentos horizontais e sectoriais de direito internacional privado em matéria de seguros. Por motivos de sistematização legislativa, dever-se-ia condensar a legislação e abolir as regras especiais.

3.5.4

A inclusão, sem alteração substancial, das regras de direito internacional privado no Regulamento «Roma I» não se afigura razoável. A situação de coexistência, sem razão objectiva, de diferentes regimes normativos de contratos de seguros que cobrem riscos situados dentro e fora do território dos Estados-Membros da UE em nada se alteraria. O argumento do direito de supervisão não pode ser invocado como justificação: a supervisão das seguradoras está sujeita ao princípio do «país da sede», o que, em caso de contratos transfronteiras, conduz, regra geral, a que a supervisão e determinação do local do risco não coincidam. Em caso de contratos de seguros que cobrem riscos situados no território e fora do território da UE ambas são idênticas. Afigura-se útil a inserção dos contratos de seguros que cobrem riscos situados no território dos Estados-Membros da UE no regime de conexão geral do regulamento. A conexão do regulamento com a escolha da lei aplicável alargaria as possibilidades de escolha da lei aplicável das seguradoras e dos seus clientes no segmento dos não consumidores, o que é desejável. Através de uma escolha adequada da lei aplicável, seria possível, no que diz respeito ao direito contratual, oferecer produtos idênticos em toda a Europa, o que permitira diminuir a necessidade de desenvolvimento de produtos. O que tem vindo a acontecer é que as empresas seguradoras que não cobrem grandes riscos praticamente não podem usufruir da liberdade de prestação de serviços. Também no sector dos seguros, no que diz respeito à escolha da lei aplicável, apenas os consumidores devem beneficiar de uma protecção mais ampla. O grupo dos profissionais que exercem actividades comerciais e dos independentes, que não têm liberdade total de escolha da lei aplicável e que até aqui têm beneficiado de menor protecção em relação aos consumidores, não necessitam de uma protecção especial. Dada a experiência de que dispõem, têm noção do que significa não optar pelo ordenamento jurídico nacional e sabem quando necessitam de assessoria jurídica.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Convenção de Roma sobre a lei aplicável às obrigações contratuais, de 19 de Junho de 1980. Versão actualizada: JO C 27 de 26.01.1998, pág. 36.

(2)  COM(2006) 83 final — 2003/0168 (COD).

(3)  COM(2002) 654 final.

(4)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Verde relativo à transformação da Convenção de Roma de 1980 sobre a lei aplicável às obrigações contratuais num instrumento comunitário e sua modernização. INT/176 de 29.1.2004.

(5)  Resolução do Parlamento Europeu sobre as perspectivas de aproximação do Direito Processual Civil na União Europeia — (COM(2002) 654 — COM(2002) 746 — C5-0201/2003 — 2003/2087(INI)), A5-0041/2004).

(6)  Refiram-se, a título de exemplo, apenas algumas:

 

Transformação da Convenção de Bruxelas de 1968 em regulamento, Regulamento (CE) n.o 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO L 12 de 16.01.2001, pág. 1). Ver parecer do CESE (relator: H. Malosse), JO C 117 de 26.4.2000, pág. 6.

 

Regulamento que cria o título executivo europeu para créditos não contestados, Regulamento (CE) n.o 805/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Abril de 2004, que cria o título executivo europeu para créditos não contestados (JO L 143 de 30.4.2004, pág. 15). Ver parecer do CESE (relator: G. Ravoet), JO C 85 de 8.4.2003, pág. 1.

 

Regulamento relativo à citação e à notificação dos actos judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial nos Estados-Membros, Regulamento (CE) n.o 1348/2000 do Conselho, de 29 de Maio de 2000, relativo à citação e à notificação dos actos judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial nos Estados-Membros (JO L 160 de 30/06/2000, pág. 37). Ver parecer do CESE (relator: B. Hernández Bataller), JO C 368 de 20.12.1999, pág. 47.

 

Regulamento relativo à cooperação entre os tribunais dos Estados-Membros no domínio da obtenção de provas em matéria civil ou comercial, Regulamento (CE) n.o 1206/2001 do Conselho, de 28 de Maio de 2001, relativo à cooperação entre os tribunais dos Estados-Membros no domínio da obtenção de provas em matéria civil ou comercial (JO L 174 de 27.06.2001, pág. 1). Ver parecer do CESE (relator: B. Hernández Bataller), JO C 139 de 11.5.2001, pág. 10.

 

Regulamento relativo aos processos de insolvência, Regulamento (CE) n.o 1346/2000 do Conselho, de 29 de Maio de 2000, relativo aos processos de insolvência (JO L 160 de 30/06/2000, pág. 1). Ver parecer do CESE (relator: G. Ravoet), JO C 75 de 15.3.2000, pág. 1.

 

Directiva relativa ao crédito ao consumo (COM(2002) 443 final de 11.9.2002). Ver parecer do CESE (relator: Pegado Liz), JO C 234 de 30.9.2003, pág. 1.

 

Directiva relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores (JO L 95 de 21.4.1993, pág. 29). Ver parecer do CESE (relator: Hilkens), JO C 159 de 17.6.1991, pág. 35.

 

Livro Verde relativo a um procedimento europeu de injunção de pagamento e a medidas para simplificar e acelerar as acções de pequeno montante (COM(2002) 746 final). Ver parecer do CESE (relator: Fürstenwerth), JO C 220 de 16.9.2003, pág. 5.

 

Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria um procedimento de injunção de pagamento. Ver parecer do CESE (relator: Pegado Liz), JO C 221 de 8.9.2005, pág. 77.

(7)  Ver as diversas convenções de Haia, por exemplo a de 12 de Junho de 1902, sobre o âmbito de aplicação da legislação em matéria de casamentos, a de 24 de Outubro de 1956, sobre a legislação aplicável às obrigações alimentares para com os filhos, a de 2 de Outubro de 1973, sobre o reconhecimento e a execução das decisões relativas às obrigações alimentares, etc..

(8)  Convenção de Genebra sobre regras no domínio do direito internacional privado em matéria de letras, de 7 de Junho de 1930, a «Convenção de Genebra sobre regras no domínio do direito internacional privado em matéria de cheques,» de 19 de Março de 1931.

(9)  Se o «instrumento de opção ou regime 26» vier a ser criado, ele será o melhor de todos os direitos civis concebíveis. Desta forma, evitar-se-iam — ao contrário do que aconteceria se a escolha da lei aplicável recaísse no direito nacional — clarificações e ajustamentos devido às disposições imperativas (ou também à ordem pública — artigo 20. o) da legislação nacional de cada Estado. Pelo contrário, a escolha do instrumento de opção levaria a uma aplicação totalmente ilimitada deste complexo de normas, pelo facto de reflectir os padrões geralmente reconhecidos na União Europeia. Uma vez que o disposto no n.o 2 do artigo 3.o já prevê, em princípio, a possibilidade de escolher a lei aplicável, deveriam, por conseguinte, ser aqui também criadas condições para se poder beneficiar das vantagens do instrumento de opção. Dever-se-ia indicar explicitamente que a decisão de aplicar um regime jurídico supranacional torna supérfluo o artigo 8. o (aplicando-se o mesmo ao artigo 20. o (ordem pública)).

(10)  Directiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Dezembro de 1996, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços, JO L 18 de 21.1.1977, pág.1.

(11)  Processos C-369/96 e C-374/96 de 23.11.1999.

(12)  Esta ideia está patente apenas na versão francesa da proposta, não constando da versão alemã porque o direito alemão não prevê esta figura. No entanto, por uma questão de rigor, dever-se-ia, pelo menos, mencioná-la ainda que por outras palavras.

(13)  Directiva 2002/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Novembro de 2002, relativa aos seguros de vida (JO L 345 de 19.12.2002, pág. 1).

(14)  Ao contrário do resseguro.

(15)  A situação actual é a seguinte: de acordo com o n.o 3 do artigo 1.o da Convenção de Roma, são excluídos do seu âmbito de aplicação os contratos de seguro directo, mas somente nos casos em que o risco se situa no território da UE. Contudo, os casos em que se está perante uma situação deste tipo não são mencionados na Convenção de Roma, mas sim nas directivas sobre seguros. Todavia, tratando-se de contratos de resseguro ou de casos em que o risco se situa fora do território da UE, aplica-se a Convenção de Roma.

(16)  Giuliano/Lagarde, Relatório sobre a convenção sobre o direito aplicável às obrigações contratuais (JO C 282 de 31.10.1980, pág. 13).


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/62


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à homologação dos veículos a motor no que respeita às emissões e ao acesso a informação sobre a reparação de veículos, que altera a Directiva 72/306/CEE e a Directiva …/…/CE»

COM(2005) 683 final — 2005/0282 (COD)

(2006/C 318/11)

Em 31 de Janeiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 12 de Julho de 2006, com base no projecto do relator Virgilio RANOCCHIARI.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 180 votos a favor, 3 votos contra e 11 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE concorda que é necessário promover o melhoramento contínuo dos níveis de emissões dos veículos de passageiros mediante actos legislativos que introduzam objectivos gradualmente mais ambiciosos. Acolhe, portanto, favoravelmente a proposta da Comissão que representa uma nova etapa nesta direcção.

1.2

O CESE concorda ainda com a decisão da Comissão de optar pelo regulamento em vez da directiva, mediante o processo legislativo da co-decisão, completado por um regulamento elaborado, para os aspectos mais técnicos, com a assistência de um comité de regulamentação (processo de comitologia).

1.3

O CESE nota, no entanto, que a proposta de regulamento, na sua actual redacção, cria inúmeros problemas, não só para a indústria como para a administração dos Estados-Membros incumbidos da homologação e da matrícula dos automóveis.

1.3.1

O CESE recomenda, em particular, a revisão das datas de entrada em vigor das disposições previstas na proposta em apreço, fixando-as respectivamente no dia 1 de Janeiro de 2010 (para a homologação de novos modelos de veículos automóveis) e no dia 1 de Janeiro de 2011 (para as novas matrículas) ou, em alternativa, respectivamente em 36 e 48 meses depois da publicação dos novos regulamentos no Jornal Oficial da União Europeia. O CESE recomenda ainda que se mantenha o período de mais um ano para os veículos N1 (1) classes II e III.

1.3.2

O CESE concorda com os limites propostos para os veículos equipados com motores diesel. Tem, no entanto, dúvidas quanto à real necessidade de reduzir mais os limites dos veículos com motores alimentados a gasolina ou a combustíveis gasosos.

1.3.3

O CESE considera judicioso manter a isenção que permite a determinados veículos de transporte de passageiros, veículos M1 (2) que exercem funções específicas ou são instrumentos de trabalho (p. ex. miniautocarros), serem homologados segundo os limites previstos para os veículos comerciais ligeiros (N1). Convida, portanto, a Comissão a introduzir uma definição de tais veículos mais precisa e restrita do que a constante na actual directiva.

1.3.4

O CESE recomenda que se evite que o regulamento proposto contenha disposições que são mais correctamente abrangidas por outros regulamentos ou directivas já em vigor.

1.3.5

O CESE convida, por fim, a Comissão a rever os pontos do texto da proposta que possam levantar incertezas administrativas, recorrendo para o efeito ao apoio dos peritos nacionais, os quais se confrontam quotidianamente com problemas associados à homologação por modelo e à matrícula de veículos de passageiros.

2.   Fundamentação e contexto legislativo

2.1

Actualmente, as emissões dos automóveis de passageiros (veículos M1) e dos veículos comerciais ligeiros (veículos N1) estão regulamentadas na Directiva 70/220/CEE e nas suas sucessivas alterações. As actualizações mais recentes, usualmente designadas como Euro 4 (3), entraram em vigor a partir respectivamente de 1 de Janeiro de 2005 (novos modelos de veículos automóveis) e 1 de Janeiro de 2006 (novas matrículas).

2.2

A proposta em exame prevê tornar mais restritivas as disposições legislativas sobre as emissões dos veículos a motor, mediante a adopção de um regulamento em vez da actual directiva. A escolha deste instrumento jurídico justifica-se pela aplicação directa pelos Estados-Membros do regulamento e, portanto, dos objectivos nele especificados, e não tanto pela necessidade, inerente à directiva, de se efectuar uma transposição para a legislação nacional. O novo regulamento revoga simultaneamente as directivas existentes.

2.3

A Comissão propõe um processo legislativo que segue duas vias paralelas:

a)

um regulamento que define os princípios gerais — proposto como regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho — a aprovar segundo o procedimento de co-decisão (proposta de co-decisão);

b)

um regulamento que define os pormenores técnicos de aplicação que será adoptado pela Comissão com a assistência de um Comité para Adaptação ao Progresso Técnico (proposta de comitologia).

2.4

Em complemento à proposta, foi ainda publicada uma avaliação do impacto económico do regulamento proposto e, portanto, a estimativa dos custos das medidas a aplicar nos veículos para torná-los conformes à redução das emissões prevista.

3.   Conteúdo da proposta

3.1

A proposta de regulamento, conhecida no jargão comunitário como «Euro 5», aplica-se aos veículos particulares de passageiros e aos veículos comerciais ligeiros com motores alimentados a gasolina, gás natural, gás de petróleo liquefeito (GPL) e diesel e fixa os valores-limite para as emissões de poluentes considerados anteriormente pela Comissão como prioritários, designadamente as partículas (PM), os óxidos de azoto (NOx), o monóxido de carbono (CO) e os hidrocarbonetos (HC).

3.2

A proposta fixa, em particular, limites para as emissões dos tubos de escape dos veículos com motor de ignição comandada (gasolina e combustíveis gasosos) e a diesel, segundo o esquema seguinte:

alimentação a gasolina e gás: é proposta uma redução de 25 % de NOx e HC,

alimentação a diesel: é proposta uma redução de 80 % das emissões de partículas, o que implica a instalação de filtros de partículas (DPF) nos veículos. Está também prevista uma redução de 20 % das emissões de NOx,

a Comissão completa ainda as propostas sobre os limites para as emissões dos tubos de escape com regras sobre a durabilidade dos sistemas de controlo de emissões, as verificações de conformidade dos veículos em circulação, os sistemas de diagnóstico a bordo (OBD), as emissões por evaporação, as emissões em regime de marcha lenta sem carga (ao ralenti), as emissões do cárter, a opacidade dos fumos e a medição do consumo de combustível.

3.3

A Comissão prevê, por fim, medidas sobre o acesso à informação sobre a reparação de veículos incluindo para os indivíduos fora do circuito dos reparadores automóveis autorizados. Segundo o proposto, esta informação deverá ser disponibilizada nos sítios Web no formato normalizado desenvolvido por um comité técnico internacional (norma OASIS (4)).

3.4

A Comissão propõe que o regulamento se aplique a:

veículos de passageiros e veículos comerciais ligeiros classe I: respectivamente 18 meses após publicação do regulamento no Jornal Oficial da União Europeia para os novos modelos e 36 meses após essa data para todas as novas matrículas,

veículos comerciais ligeiros classes II e III: 30 meses para os novos modelos e 48 meses para todas as novas matrículas,

para os veículos de passageiros tal pode traduzir-se por uma eventual introdução das normas propostas a partir da primeira metade de 2008.

4.   Observações na generalidade

4.1

O CESE acolhe favoravelmente a opção da Comissão pelo regulamento em vez da directiva, dado que, não sendo necessário um processo de transposição para a legislação nacional, o regulamento poderá ter aplicação imediata e simultânea em todos os Estados-Membros.

4.2

O CESE concorda com o novo processo legislativo em duas vias paralelas, mas chama ao mesmo tempo a atenção para a necessidade de os dois regulamentos, um mediante o processo de co-decisão, o outro pela via da comitologia, serem publicados simultaneamente no Jornal Oficial. O sector industrial precisa dos dois regulamentos para concluir a concepção das soluções técnicas a adoptar para observância das novas disposições.

4.3

O CESE dá o seu aval quanto à intenção de introduzir limites mais restritivos para as emissões dos veículos a diesel.

4.4

O CESE reconhece que actualmente já estão disponíveis tecnologias para reduzir as emissões de partículas (PM) dos veículos equipados com motores a diesel e que os valores-limite propostos implicam a sua utilização generalizada.

4.5

Quanto à avaliação do impacto económico do regulamento proposto, o CESE exprime, pelo contrário, inúmeras reservas:

em primeiro lugar, em forte contraste com as modalidades de trabalho do Programa CAFE (5) (Ar Limpo para a Europa), não foi disponibilizado nenhum dos resultados obtidos com os modelos utilizados para avaliação das relações entre os custos e benefícios das intervenções viáveis nos vários sectores responsáveis pela poluição atmosférica, como sugerido pelo CARS 21 (6);

a avaliação do impacto económico refere unicamente os custos adicionais decorrentes da entrada em vigor dos novos limites de emissão dos veículos de passageiros e a correspondente redução dos poluentes emitidos em toneladas/ano. Não permite, deste modo, um juízo comparativo sobre os custos e benefícios das medidas viáveis noutros sectores, segundo os modelos do CAFE,

no cenário Euro 5 proposto pelo regulamento, há uma redução de 33 % dos valores estimados pelo grupo de peritos independentes (7), escolhido pela Direcção-Geral das Empresas e Indústria, da Comissão Europeia, para ter em conta as economias de escala decorrentes do aumento dos volumes de produção, sem que haja uma qualquer fundamentação que explique a escolha desta percentagem (8),

em particular a estimativa feita pelo grupo de peritos independentes sobre os custos das intervenções a efectuar nos veículos para torná-los conformes aos diversos cenários de redução das emissões, inclui já uma diminuição do preço dos metais preciosos igual a 30 %. Os metais preciosos são um dos elementos fundamentais dos sistemas de pós-tratamento do gás do tubo de escape e a sua cotação no mercado influencia consideravelmente os custos dos próprios sistemas. O facto de se ter verificado nos últimos anos um aumento contínuo das cotações da platina não corrobora a hipótese acima referida.

4.6

O CESE exprime, igualmente, reservas quanto às datas de aplicação do regulamento:

o período de 18 meses a contar desde a entrada em vigor do novo regulamento não é suficiente, pois a introdução na linha de produção de uma tecnologia conhecida mas ainda não aplicada em modelos específicos requer, no mínimo, três anos;

o regulamento proposto deveria confirmar o dia 1 de Janeiro de 2010 como data de entrada em vigor dos novos critérios para homologação dos novos modelos de veículos automóveis ou fixar um período de 36 meses a partir da data de publicação do regulamento, mediante esclarecimento prévio dos valores-limite e dos protocolos de ensaio;

a indústria já planificou, com o acordo dos seus fornecedores, a introdução das normas Euro 5 para 2010/2011, segundo o que foi explicitamente indicado na comunicação da Comissão sobre os incentivos fiscais de Janeiro de 2005 (9). Uma vez que já foram programadas as alterações aos diversos modelos e aos processos associados de produção, não é possível acelerar o ritmo, já que o prazo que decorre para a introdução do Euro 5 é já muito curto.

4.7

Por fim, a Comissão fixa no n.o 4 do artigo 5.o as exigências específicas para homologação, sem contudo prever orientações ou instruções posteriores. O CESE manifesta a sua preocupação nesta matéria, uma vez que sem tais instruções não é possível avaliar o impacto real da proposta na concepção do veículo e no ambiente.

5.   Observações na especialidade

5.1

O quadro 1 do Anexo 1 da proposta de regulamento apresenta os valores-limite das emissões Euro 5 de HC e NOx previstos para os veículos a gasolina de ignição comandada: trata-se de uma redução de 25 % que fixa os HC em 75 mg/km e os NOx em 60 mg/km. Ora, esta diminuição dos valores-limite em relação aos fixados na norma Euro 4 não se justifica do ponto de vista dos resultados obtidos pelo programa Auto Oil II sobre a qualidade do ar e, por outro lado, não se prevê nenhum cenário de redução dos níveis de NOx e HC desses veículos na análise do Programa CAFE nem no documento Estratégia temática sobre a poluição atmosférica  (10).

5.2

Perante os resultados do Programa CAFE, o CESE vê-se forçado a concluir não haver prova evidente de benefícios para a qualidade do ar que justifique as medidas indicadas na proposta em apreço, e isto pelas seguintes razões:

valores-limite de NOx : a redução proposta constituiria mais um obstáculo à diminuição do consumo de combustível, e portanto das emissões de CO2 dos veículos equipados com motor a gasolina, ou seja o desafio mais importante com que a indústria se deve confrontar actualmente. Paralelamente, os benefícios para o ambiente seriam de todo irrelevantes, uma vez que, segundo o CAFE, os veículos a gasolina constituirão apenas 4 % das emissões totais de NOx provenientes do tráfego automóvel (11);

valores-limite de HC: o novo limite proposto seria um obstáculo inultrapassável para os veículos movidos a gás natural que oferecem, no entanto, vantagens consideráveis de um ponto de vista ambiental. Na verdade, as emissões de HC são formadas por 90 % de gás metano, ou seja um gás notoriamente estável e não poluente, no qual se baseiam, aliás, os hidrocarbonetos aromáticos. As emissões de CO2 desses veículos são, pois, 20 a 25 % inferiores às dos veículos a gasolina. Se a redução dos 25 % dos hidrocarbonetos não queimados introduzida pelo regulamento fosse para a frente, deixaria de ser possível produzir e lançar no mercado veículos a gás natural com impacto negativo nas emissões de CO2. Poder-se-ia, além disso, entrar em contradição com os objectivos de substituição fixados pela Comissão na comunicação sobre combustíveis alternativos (12).

5.3

A proposta da Comissão suprime a isenção que permite aos veículos de transporte de passageiros, veículos M1, com uma massa superior a 2,5 toneladas (mas inferior a 3,5 t), serem homologados segundo os limites previstos para os veículos comerciais ligeiros (N1).

5.3.1

O CESE observa que é necessário distinguir entre os veículos pesados projectados para responderem a exigências precisas de trabalho e os veículos frequentemente adquiridos apenas por uma questão de moda ou para subir passeios nas grandes cidades! Alguns exemplos do primeiro tipo são:

os veículos projectados para acolherem sete ou mais lugares. Trata-se de veículos adaptados a funções de transporte local (p.ex. miniautocarros, autocarros pendulares, autocaravanas e veículos destinados a fins específicos como as ambulâncias). A capacidade de acolher um elevado número de passageiros e a capacidade de carga requerem a concepção de um veículo mais pesado, mais alto e mais largo com caixas de velocidade específicas e, portanto, com emissões ligeiramente superiores,

os veículos todo-o-terreno com uma massa máxima superior às 2,5 toneladas. Estes veículos são um instrumento de trabalho essencial para as comunidades rurais, para os serviços de socorro, para as organizações de utilidade pública e para muitas outras aplicações importantes, incluindo militares. Por este motivo, as suas necessidades específicas são tidas em consideração em diversos sistemas legislativos e deveriam continuar a beneficiar de tal tratamento,

os volumes de produção nestes dois segmentos são assaz reduzidos e as emissões deles decorrentes são irrelevantes no cômputo total das emissões dos veículos automóveis. O seu impacto na qualidade do ar é, portanto, irrelevante, a menos que lhes sejam aplicadas as mesmas regras aplicáveis aos veículos comerciais ligeiros.

5.3.2

Não se partilha da posição da Comissão segundo a qual já não existem as condições que justificavam a possibilidade de homologar nos limites previstos para os veículos comerciais ligeiros os veículos M1 com massa máxima superior a 2,5 t. Paralelamente, o CESE reconhece a necessidade de definir melhor quais os veículos que podem desfrutar de tal derrogação.

5.3.3

Por fim, a revogação integral desta derrogação para todos os veículos M1 pesados comportaria a passagem para a motorização a gasolina, com o correspondente aumento do consumo de combustível e, por conseguinte, das emissões de CO2.

5.4

O CESE concorda com a Comissão quando esta defende a necessidade de facultar o acesso a informação sobre a reparação de veículos e de concorrência efectiva no mercado dos serviços de reparação de veículos e de informação, para facilitar a livre circulação de veículos no mercado interno. Esta tese é corroborada, designadamente, pelo regulamento (CE) n.o 1400/2002 relativo à aplicação do n.o 3 do artigo 81.o do Tratado a certas categorias de acordos verticais e práticas concertadas no sector automóvel, assim como pelas Directivas 98/69/CE e 2002/80/CE.

5.4.1

Contudo, o CESE assinala a necessidade de permitir o acesso ilimitado e normalizado a informação sobre a reparação de veículos, uma vez que, na prática, os fabricantes tendem a difundir esta informação por diferentes meios de comunicação e centros de documentação. Criam-se desta forma barreiras consideráveis aos operadores de serviços pós-venda, em particular, às pequenas empresas que predominam no mercado independente de reparação da UE. Por conseguinte, o CESE apoia a proposta da Comissão de incluir no regulamento a exigência de disponibilizar informação sobre reparação de veículos também através da Internet em formato normalizado.

6.   Avaliação e recomendações específicas

6.1

No texto da proposta de regulamento refere-se, por diversas vezes, a futura directiva xxxx/xx/CE. Uma vez que esta directiva modificará a directiva-quadro sobre a homologação dever-se-ia, desde já, indicar claramente que se pretende fazer referência à Directiva-quadro sobre a homologação por modelo 70/756/CEE, com a última redacção que lhe foi dada pela Directiva xxxx/xx/CE.

6.2

O considerando 13 introduz requisitos quanto a um método normalizado de medição do consumo de combustível, bem como quanto à necessidade de assegurar que os clientes e utilizadores recebem informação rigorosa e objectiva. Estes requisitos já são, no entanto, obrigatórios (Directiva 1999/94/CE), pelo que o facto de voltar a referi-los é absolutamente supérfluo.

6.3

O CESE observa que o texto do n.o 1 do artigo 2.o, do n.o 1 do artigo 4.o e do artigo 5.o da proposta de regulamento em apreço não é claro, em particular:

6.3.1

O n.o 1 do artigo 2.o especifica os veículos a motor aos quais se aplica o regulamento. O n.o 1 do artigo 4.o e o artigo 5.o parecem depois impor a obrigação a todos os modelos dos veículos abrangidos pelo regulamento (ou seja, os enumerados no artigo 2.o) de serem conformes à seguinte longa lista de requisitos: emissões pelo tubo de escape, emissões a baixa temperatura ambiente, emissões por evaporação, funcionamento do sistema de diagnóstico a bordo (OBD), durabilidade e dispositivos antipoluição, emissões em regime de marcha lenta sem carga, emissões do cárter, emissões de CO2 e consumo de combustível, opacidade dos fumos.

6.3.2

Do exposto resultaria um aumento injustificado dos ensaios a efectuar no momento da homologação dos modelos. A título de exemplo, medir as emissões em regime de marcha lenta sem carga ou as emissões por evaporação de um veículo diesel é totalmente inútil. Seria mais apropriado e menos ambíguo utilizar a tabela proposta no quadro I.5.2 do Anexo I da Directiva 70/220/CEE (13).

6.4

O CESE observa, por fim, que há uma falta de clareza na definição do âmbito de aplicação no que toca aos veículos M (veículos concebidos para o transporte de passageiros) com motores de ignição comandada, excluindo os motores a gás natural e GPL. O texto do regulamento (artigos 4.o e 5.o) parece, na verdade, alargar todo o conjunto de requisitos também aos veículos de categoria M2 e M3 quando no passado os veículos M com massa superior a 3,5 toneladas (a propósito, raríssimos na Europa) deviam ser conformes unicamente aos requisitos das emissões em marcha lenta e sem carga e do cárter.

6.5

O n.o 3 do artigo 4.o refere a obrigação dos fabricantes fornecerem ao comprador informação técnica sobre as emissões e o consumo do veículo. Uma vez que esta obrigação já está prevista na Directiva 1999/94/CE com a última redacção que lhe foi dada pela Directiva 2003/77/CE, este número é inútil.

6.6

O artigo 10.o foca a homologação de componentes de substituição que não são de origem e veta, em particular, a venda ou instalação de catalisadores de substituição, a menos que sejam de um tipo homologado nos termos da proposta de regulamento. Não é claro se a Comissão pretende limitar a utilização de tais catalisadores aos veículos matriculados antes de 1992 (e portanto para os veículos pré-OBD) excluindo-os dos veículos mais recentes. Ademais, a necessidade de homologação deve ser alargada a outros eventuais componentes não originais do sistema de controlo das emissões como os filtros de partículas.

6.7

O n.o 2 do artigo 11.o autoriza os Estados-Membros a preverem incentivos financeiros para a instalação de sistemas de retroapetrechamento (retrofit) (14) que adaptarão as emissões pelos tubos de escape dos veículos em circulação aos limites fixados no regulamento. A Comissão não esclarece, porém, quais serão os procedimentos segundo os quais se poderá demonstrar a conformidade de tais sistemas, nem especifica se os mesmo já estão disponíveis.

6.8

O artigo 17.o lista uma série de directivas (15) que serão revogadas com efeitos a partir de 18 meses a contar da data de entrada em vigor do regulamento. A este propósito observa-se, porém, o seguinte:

se a intenção da Comissão era incluir todas as directivas que modificam a Directiva 70/220/CEE sobre as emissões dos veículos e a Directiva 80/1268/CEE sobre o consumo de combustível, então esta lista está incompleta (por exemplo, a Directiva 70/220/CEE sofreu 18 modificações, mas apenas seis destas são referidas). Assim, a abordagem mais simples afigura-se ser o recurso a uma formulação como: «A Directiva 70/220/CEE, com a última redacção que lhe foi dada pela Directiva 2003/76/CE e a Directiva 80/1268/CEE, com a última redacção que lhe foi dada pela Directiva 2004/3/CE são revogadas com efeitos a partir de …».

6.8.1

A própria revogação das directivas citadas sobre as emissões dos veículos e sobre o consumo de combustível prevista pelo regulamento com efeitos 18 meses após a data de entrada em vigor do mesmo coloca sérios problemas.

6.8.2

Essa data coincidiria com a data de entrada em vigor das disposições de homologação, mesmo limitando-se apenas aos novos modelos M1 introduzidos por um fabricante. Os modelos M1 já homologados antes dessa data podem, na verdade, ser matriculados durante um período suplementar de 18 meses, sem que seja necessária uma nova homologação. Aos veículos N1 classe II e classe III aplicam-se condições semelhantes. Os novos modelos beneficiam de um período suplementar de 12 meses para serem homologados, ao passo que os homologados previamente e que necessitam de ser matriculados beneficiam de um período suplementar de 30 meses.

6.8.3

O problema consiste em compreender como será possível emitir o certificado de conformidade solicitado no momento da matrícula, uma vez que esse certificado poderá apenas fazer referência a uma directiva que já foi revogada.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Os veículos de categoria N são os veículos com pelo menos quatro rodas concebidos para transporte de mercadorias. Dividem-se em três classes: N1, N2 e N3, com base na massa máxima: N1 < 3 500 kg; N2 < 12 000 kg; N3 > 12 000 kg. A classe N1 subdivide-se em 3 subclasses, a NI, NII e NIII, determinadas sempre com base na massa.

(2)  Os veículos de categoria M são os veículos com pelo menos quatro rodas concebidos para transporte de passageiros. Estes dividem-se em três classes (M1, M2, M3) com base no número de lugares e na sua massa máxima: M1 < 9 lugares; M2 > 9 lugares e < 5 000 kg; M3 > 9 lugares e > 5 000 kg.

(3)  JO L 350 de 28.12.1998, Directiva 1998/69/CE.

(4)  OASIS, Organization for the Advancement of Structured Information Standards (Organização para o Avanço de Normas de Informação Estruturadas).

(5)  CAFE, Clean Air for Europe (Ar Limpo para a Europa) — é um programa lançado com a comunicação COM(2001) 245 final, destinado a desenvolver uma estratégia de análise para examinar a directiva sobre a qualidade do ar, a eficácia dos programas nos Estados-Membros, uma monitorização permanente da qualidade do ar e divulgação ao público da informação, a revisão e a actualização dos limites de emissões e o desenvolvimento de novos sistemas e modelização.

(6)  CARS 21, Competitive Automotive Regulatory System for the 21st Century — é um grupo de peritos constituído por representantes da Comissão, do Parlamento Europeu, dos Estados-Membros, da indústria, dos sindicatos, das ONG e dos consumidores. Tem por missão apresentar recomendações para melhorar a competitividade da indústria automóvel europeia, tendo em atenção os aspectos sociais e ambientais conexos.

(7)  Por ocasião da reunião do Grupo sobre as Emissões dos Veículos a Motor (Motor Vehicle Emissions Group), em Dezembro de 2005, a DG Empresas e Indústria distribuiu um documento elaborado pelo grupo de peritos independentes que expunha os resultados da análise efectuada sobre a relação tecnologias/custos para os veículos que respondiam à norma Euro 5.

(8)  SEC(2005) 1745, Avaliação de Impacto da proposta de regulamento em apreço, ponto 6.2: Scenarios of the Regulatory Approach, Table 1Scenario G, p. 17 (não há versão portuguesa).

(9)  SEC(2005) 43, documento de trabalho da Comissão, Fiscal incentives for motor vehicles in advance of Euro 5 (Incentivos fiscais para veículos a motor na previsão do Euro 5 — não há versão portuguesa).

(10)  COM(2005) 446 final.

(11)  Informações disponíveis no sítio web do IISA — International Institute for Applied Systems Analysis (Instituto Internacional de Análise de Sistemas Aplicados) http://www.iiasa.ac.at/ (em inglês).

(12)  COM(2001) 547 final, na qual o objectivo de substituição dos combustíveis tradicionais pelo gás natural é fixado em 5 % até 2015 e 10 % em 2020.

(13)  Este quadro identifica os ensaios a efectuar por modelo de veículo.

(14)  Retroapetrechamento (retrofit), neste contexto, refere-se a um dispositivo a instalar num veículo já em utilização para controlar posteriormente as emissões.

(15)  Directiva 70/220/CEE, Directiva 80/1268/CEE, Directiva 89/458/CEE, Directiva 91/441/CEE, Directiva 93/59/CEE, Directiva 94/12/CE, Directiva 96/69/CE e Directiva 2004/3/CE.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/67


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Turismo Social na Europa»

(2006/C 318/12)

Em 19 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar parecer sobre: «Turismo Social na Europa».

A Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 26 de Julho de 2006 (relator: MENDOZA CASTRO).

Na 429a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu aprovou o presente parecer, por 138 votos a favor, 2 votos contra e 4 abstenções.

A.   PRIMEIRA PARTE: ANÁLISE DA SITUAÇÃO ACTUAL

1.   Introdução

1.1

Na sequência dos vários pareceres que tem vindo a elaborar como contributo para a configuração de uma política turística europeia, o Comité Económico e Social Europeu viu por bem elaborar um parecer sobre o chamado «Turismo Social», analisando as suas origens, a sua presença e situação actual na Europa, as várias experiências dos Estados-Membros e os valores que lhe subjazem. O seu propósito é essencialmente fazer recomendações às várias instituições públicas ou privadas para uma maior eficácia, universalização e melhoria do Turismo Social Europeu. O propósito do presente parecer é, além disso, contribuir para o debate em curso sobre a Política de Turismo Europeia através da análise do Turismo Social enquanto parte integrante do Modelo Turístico Europeu.

1.2

O turismo na Europa: situação actual e desafios futuros. A situação actual do turismo tem vindo a ser analisada em vários estudos, relatórios e pareceres, com base em pontos de vista muito diversos: económicos, sociais e ambientais; a sua grande importância para a actividade económica na Europa, em geral, e para os diversos países, em particular; o seu valioso contributo para a riqueza e o emprego na Europa. Todas estes factores conjugados oferecem uma imagem marcada por grandes potencialidades, estabilidade e crescimento. Por outro lado, tem havido sempre a preocupação de considerar as diversas realidades e as ameaças internas e externas a curto, médio e longo prazo que podem derivar do turismo. Estas devem-se, por exemplo, ao seu carácter sazonal, à utilização por vezes abusiva dos recursos naturais, à escassa valorização do património cultural e do ambiente local e à apreensão causada pelo terrorismo que condiciona a segurança das populações e dos turistas. Os factos apontados obrigam-nos a estar preparados para enfrentar desafios muito consideráveis, se desejamos realmente que a actividade turística siga a senda do desenvolvimento sustentável. Estes desafios significam que é preciso garantir efectivamente o acesso de todos os cidadãos ao turismo, contribuir de forma palpável para o desenvolvimento dos muitos países do mundo não desenvolvido, garantir a sustentabilidade ambiental, respeitar o Código Ético do Turismo, salvaguardar a estabilidade e a qualidade do emprego e contribuir para a paz mundial. Ao fazer face a todos estes desafios e a outros mais, a indústria turística, que tem uma importância tão estratégica para a Europa, poderá dar o seu contributo específico para melhorar a qualidade de vida de todos os cidadãos.

1.3

A política turística na União Europeia. O Comité Económico e Social Europeu aprovou em 6 de Abril de 2005 um parecer sobre « A política de turismo na União Europeia alargada » que analisava com minúcia a actual política turística, à luz do Tratado Constitucional, e ainda as consequências do alargamento presente e futuro. Nesse parecer o papel do turismo era considerado positivo para as acções de apoio, coordenação e complemento das restantes políticas comunitárias. Assim, por exemplo, concluía-se que o turismo tem influência nas políticas de emprego e social, na melhoria da qualidade de vida, na investigação e no desenvolvimento tecnológico, na protecção dos consumidores, na política do ambiente e em muitas outras políticas. Convém salientar que o presente parecer procurava concretizar e analisar o contributo do Turismo Social para as políticas de emprego e social. O CESE tem tentado promover com os seus vários pareceres sobre o turismo a definição de políticas europeias que confluam num Modelo Turístico Europeu, assente não necessariamente em normas mas sim em valores. O Turismo Social e os valores que lhe são intrínsecos poderão ser uma componente essencial desse modelo e contribuir para a sua implantação e difusão.

1.4

O desafio da Agenda de Lisboa e o Turismo Social. Importa destacar o desafio colocado pela Agenda de Lisboa no âmbito do Turismo, mais concretamente do Turismo Social. Se o objectivo estratégico da Agenda é tornar a Europa « na economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos, e com maior coesão social », teremos de analisar se o Turismo Social poderá contribuir eficaz e positivamente para alcançar esse objectivo, como o fará e como poderá reforçar esse seu contributo. Diga-se desde já que já existe na realidade um tal contributo, como veremos mais adiante neste parecer, só que poderá ser reforçado graças às medidas a seguir enunciadas que deverão ser adoptadas pelos agentes do Turismo Social.

1.5

Antecedentes do presente parecer. Os antecedentes deste parecer são muito variados: teóricos, em forma de estudos, relatórios, jornadas, e práticos, com base nas diversas iniciativas e realidades do Turismo Social na Europa. São numerosos os contributos de várias instituições públicas e privadas, mas, no caso específico do CESE, merecem ênfase o parecer aprovado em 29 de Outubro de 2003 intitulado « Para um turismo acessível a todas as pessoas e socialmente sustentável », que já incluía o Turismo Social como uma das cem iniciativas (ponto 5.5.2), e o parecer aprovado em 6 de Abril de 2005 intitulado « A política de turismo na União Europeia alargada », que referia o Projecto de Turismo Social Europeu como possível projecto-piloto de cooperação institucional europeia.

2.   O conceito de Turismo Social

2.1

O direito ao turismo como fundamento do Turismo Social. Todos os cidadãos têm direito ao descanso diário, semanal ou anual, a um período de ócio que lhes permita desenvolver plenamente as várias facetas da sua personalidade e a sua integração social. E, no fim de contas, todos os cidadãos têm o direito de fazer jus na prática ao seu direito de desenvolver-se como pessoas. O direito ao turismo é, sem sombra de dúvida, a expressão concreta desse direito geral e a razão de ser do Turismo reside justamente no desejo de torná-lo universal e acessível a todos. O Turismo Social não é, por conseguinte, uma actividade marginal nem estranha ao conjunto das actividades gerais do turismo — uma indústria mundial muito poderosa — na Europa, em geral, e nos vários Estados-Membros, em particular. É, antes, uma forma de concretizar esse direito universal de fazer turismo, de viajar, de conhecer outras regiões e países que está na base da actividade turística. Merece aqui destaque especial o facto de este direito estar consagrado no artigo 7.o do Código Ético Mundial do Turismo, aprovado na Organização Mundial de Turismo (OMT), em Santiago do Chile, em 1 de Outubro de 1999, e perfilhado pelas Nações Unidas em 21 de Dezembro de 2001.

2.2

Definição de Turismo Social. Dada a variedade de concepções sobre a essência do Turismo Social, não é fácil definir este conceito, já que as instituições que têm abordado o tema usam fórmulas bem distintas como: identificação do conteúdo, dos resultados esperados, do conjunto de intenções, ideias e convicções. Mas todas elas tomam por base a mesma realidade: todos os cidadãos, incluindo os menos favorecidos, precisam e têm direito ao descanso, ao lazer e a um período reparador da sua actividade profissional, com uma frequência diária, semanal e anual. Assim, para o Instituto Internacional de Turismo Social (BITS) é «o conjunto de relações e de fenómenos resultantes da participação no turismo das camadas sociais com rendimentos modestos, participação que se torna possível ou é facilitada por medidas de carácter social bem definidas». Actualmente, o BITS está a rever esta definição ampliando-a a actividades de turismo que contribuem para o desenvolvimento e a solidariedade.

2.2.1

Para a Comissão Europeia (1) «O Turismo Social é organizado nalguns países por associações, cooperativas e sindicatos e tem por finalidade tornar as viagens realmente acessíveis ao maior número possível de pessoas e, especialmente, às camadas mais desfavorecidas da população». Esta definição, que remonta já há alguns anos, está a ser revista após as reuniões técnicas realizadas nos últimos anos. Parece-nos que nenhuma das definições é suficientemente exacta, mas como sucede frequentemente no âmbito das ciências sociais, ela não é tão importante como a identificação das suas manifestações concretas.

2.2.2

Por isso e não tendo a intenção de definir exactamente Turismo Social, mas partindo da premissa de que o turismo é um direito geral que é preciso tornar acessível a todos, pode-se falar de uma actividade de Turismo Social sempre que se cumprirem as três condições seguintes:

que se detecte uma situação real de incapacidade total ou parcial para exercer plenamente o direito ao turismo; tal pode resultar tanto da falta de condições económicas, de uma deficiência física ou mental, de condições de isolamento pessoal ou familiar, de mobilidade reduzida, de dificuldades geográficas e de causas muito várias que representem, em última instância, um obstáculo real;

que alguém, seja uma instância pública ou privada, uma empresa, um sindicato ou simplesmente um grupo organizado de pessoas, entre em acção para vencer ou reduzir o obstáculo que impede um indivíduo de exercer o seu direito ao turismo;

que essa acção seja realmente eficaz e permita a um grupo de pessoas fazer turismo de uma forma que respeite valores tais como a sustentabilidade, a acessibilidade e a solidariedade.

2.2.3

Por último, assim como o turismo, na sua acepção comum, é uma actividade que envolve vários sectores, ramos de actividade e áreas de desenvolvimento, também o Turismo Social congrega um conjunto de iniciativas que permitem às pessoas com dificuldades especiais fazer turismo, produzindo, simultaneamente, benefícios sociais e económicos para vários sectores, actividades, grupos e áreas.

2.3

História do Turismo Social

Não se sabe muito bem quando surgiram as primeiras actividades de Turismo Social tal como são entendidas nos nossos dias. Talvez tenham a sua origem em organizações especializadas na realização de férias baseadas no exercício físico na montanha, que tiveram a sua aparição no início do século XX, bem como nas colónias de férias destinadas às crianças de famílias desfavorecidas surgidas na Suíça e na França.

Os poderes públicos começaram a intervir nas primeiras formas do Turismo Social depois da Segunda Guerra Mundial. Esta intervenção estava ligada aos movimentos operários, havendo alguns países europeus (França, Itália, Portugal e Espanha) que organizavam actividades de Turismo Social, ao passo que outros (Reino Unido e Países Baixos) optaram por uma posição não intervencionista.

Só a partir dos anos cinquenta e sessenta do século XX é que são visíveis esforços para promover realmente a implantação do Turismo Social e se depara com um surto de organizações com vocação associativa, coordenadora e organizadora, nomeadamente o BITS, com sede em Bruxelas, que ainda hoje é símbolo de uma ampla actividade promotora e representativa.

2.4

Bases do Turismo Social. O Turismo Social assenta, segundo o BITS, em cinco critérios de valor:

2.4.1

O direito da maioria dos cidadãos a desfrutar do turismo. É, porventura, a vontade de transformar em realidade este direito que melhor justifica e fundamenta as várias iniciativas do Turismo Social. O número de pessoas que desfruta de um período de férias cresceu consideravelmente nos últimos tempos em resultado da socialização do turismo, mas há ainda muitos grupos que, por motivos vários, ainda não têm acesso a férias. A falta de recursos económicos é, provavelmente, o factor principal a impedir a universalização deste direito. Mas não é realista esperar nem exigir dos poderes públicos que disponibilizem fundos para garantir o direito a fazer turismo e a gozar férias. A resposta dos vários países é muito diferente: enquanto uns se guiam por critérios sociais, outros são muito menos assertivos perante uma realidade que impede que todos possam gozar férias. Importa salientar que, de modo algum, se pode ou deve identificar o Turismo Social com turismo de qualidade inferior ou de segunda categoria. Antes pelo contrário, é imperioso que as suas actividades se caracterizem por grande esmero na qualidade global, tanto das instalações como dos serviços prestados.

2.4.2

O contributo do Turismo Social para a socialização. O turismo é um poderoso instrumento de socialização, já que promove o contacto com outras realidades culturais e geográficas e outros usos e costumes. Sem viagens e sem férias as pessoas jamais se encontrariam, dialogariam e se reconheceriam como iguais no essencial, não obstante as diferenças culturais. Esse intercâmbio cultural, esse desfrutar dos tempos livres contribui para o desenvolvimento pessoal, tanto dos turistas como das comunidades que os acolhem. O seu valor é ainda mais fundamental para os jovens, já que lhes proporciona uma formação intelectual e uma visão mais rica do mundo. No caso da União Europeia, o Turismo Social pode ser um contributo muito valioso para a criação de uma Europa dos Cidadãos. Convém frisar que está generalizada a opinião de que os circuitos do Turismo Social não devem, por um lado, diferir dos circuitos gerais do turismo, mas devem, por outro, estar ao serviço da integração social. Cabe aos vários grupos de Turismo Social procurar encontrar nos circuitos turísticos gerais as condições adequadas para desfrutar das suas férias e não inversamente. É evidente que isso pressupõe um esforço não só ao nível das condições materiais mas também do tipo de serviço e, por conseguinte, da formação especializada a ministrar aos profissionais do sector.

2.4.3

A criação no território de estruturas de turismo sustentável. Na realidade, as infra-estruturas das zonas e destinos turísticos nem sempre podem ser qualificadas como sustentáveis, sobretudo pelo facto de o turismo se ter desenvolvido muitas vezes segundo critérios de rentabilidade a curto prazo, com utilização abusiva dos recursos naturais e ocupação das zonas mais atraentes, geralmente na costa e na montanha. O Turismo Social, com uma visão mais centrada nas condições sociais que nos aspectos económicos, poderá contribuir para a construção ou recuperação dos destinos turísticos segundo critérios de sustentabilidade económica, social e ambiental. A forma como serão geridas as várias manifestações do Turismo Social é essencial para garantir a eficácia deste seu contributo. Se a sustentabilidade é, fundamentalmente, o equilíbrio entre as várias facetas da actividade humana, o Turismo Social é um instrumento de desenvolvimento sustentável para muitos dos países actualmente menos desenvolvidos que vêem no turismo uma fonte de actividade económica capaz de libertá-los da pobreza.

2.4.4

O contributo para o emprego e o desenvolvimento económico. O turismo é, e será decerto também futuramente, a indústria mais poderosa à escala mundial, uma das actividades que mais contribuirá para o emprego, o desenvolvimento, a prosperidade e a qualidade de vida da população dos destinos turísticos. Embora o Turismo Social seja parte deste potencial económico, ainda não está plenamente ciente do seu poder, da sua importância económica nem, com efeito, da sua capacidade de impor a sustentabilidade na escolha dos seus destinos. As empresas e os organismos que gerem o Turismo Social deverão, por conseguinte, favorecer critérios não exclusivamente económicos no exercício das suas actividades. Um critério a adoptar seria a criação de emprego, de emprego estável e de qualidade, absolutamente essencial para o desenvolvimento sustentável de um destino turístico. Em especial, o contributo do Turismo Social (seja ele grande ou pequeno) no combate à sazonalidade é um critério básico de actuação para garantir a qualidade e a estabilidade do emprego, pelo que deve fazer parte integrante do Modelo de Turismo Europeu. As parcerias público-privadas na gestão do Turismo Social poderão ser um instrumento muito útil e um indicador do cumprimento desse critério.

2.4.5

O contributo do Turismo Social para o desenvolvimento mundial. Já se referiu anteriormente que o turismo e, em particular, o Turismo Social pode significar para muitos povos uma saída para o subdesenvolvimento ou para uma situação de crise industrial e de abandono da actividade mineira, industrial ou agrícola. Há uma total coincidência de critérios entre as premissas a que deve obedecer o Turismo Social e as condições necessárias para uma determinada zona e os seus habitantes encontrarem na actividade turística o motor do seu desenvolvimento. A partir do momento em que as populações possam retirar desta actividade o seu sustento, haverá um reforço da economia local e um maior enraizamento social. Tal como sugeriram numerosos organismos internacionais, a actividade turística é um bom antídoto contra as guerras e desastres de todos os tipos. Turismo significa acolhimento, intercâmbio, valorização das condições locais, amizade e comunicação entre as pessoas, em total oposição à guerra que significa agressão, invasão e destruição da Natureza. Se é verdade que apenas se ama o que se conhece, o turismo é o instrumento ideal de aproximação, de conhecimento dos povos e, por conseguinte, um instrumento de paz, de concórdia e de desenvolvimento. O Turismo Social, mais concretamente, pode e deve reafirmar a sua posição e contribuir para a criação em todo o mundo de condições de igualdade, de justiça, de democracia e de bem-estar para o desenvolvimento solidário de todos os povos do mundo.

2.5

Princípios e condições do Turismo Social e sua gestão. É essencial analisar os elementos e os critérios que caracterizam as actividades do Turismo Social e a sua forma de gestão para demarcar os seus traços distintivos dos aspectos que não podem ser rotulados de «sociais». De acordo com o BITS, eis alguns dos critérios que qualificam o conceito geral de turismo:

ter como princípio orientador fundamental o maior acesso à actividade turística de todos os grupos que lutam com certas dificuldades para fazer turismo ou de alguns deles;

estar aberto a muitos e diversos grupos e tipos de utentes; estar também aberto a diversas fórmulas de gestão e a diversos agentes activos no Turismo Social;

definir correctamente os grupos a que se dirigem as suas actividades: classes sociais, diversas faixas etárias, pessoas com deficiência, sempre no respeito do critério de não discriminação em razão de raça, cultura ou situação social;

integrar acções e objectivos de carácter humanista, pedagógico, cultural e de desenvolvimento pessoal, em geral;

ser transparente no regime económico da actividade em que os seus lucros se limitem ao necessário para o cumprimento dos objectivos sociais;

conferir ao produto turístico um valor acrescentado não monetário;

manifestar uma vontade inequívoca de integrar a actividade turística na zona de destino de uma forma sustentável;

garantir uma gestão dos recursos humanos que os valorize e os integre e dê ênfase à qualidade do emprego do pessoal das organizações que se dedicam ao Turismo Social.

Estes e outros critérios análogos poderão servir de fio condutor à actuação dos gestores do Turismo Social e à definição desta actividade.

2.6

A rentabilidade das empresas e o Turismo Social. O Turismo Social tem de ser e é uma actividade económica (embora não exclusivamente) e deve reger-se, como tal, pelos princípios básicos de rentabilidade dos investimentos e dos lucros necessários para perseguir e alcançar os objectivos fundamentais. Apenas empresas competitivas e rentáveis, no sentido lato, poderão desenvolver actividades de qualidade, seguras e com garantias para os consumidores. A actual diversidade do Turismo Social é prova de que as empresas e as organizações que se dedicam a essa actividade o fazem com rentabilidade, já que têm uma estrutura consolidada, um mercado adequado e preços adaptados a esse mercado. Convém referir especialmente os empregos criados pelas organizações do Turismo Social o ano inteiro e nos períodos de quebra de actividade, o que resolve o problema de desemprego dos trabalhadores afectados.

2.7

Rentabilidade social do turismo. Mas se o Turismo Social é uma actividade económica, também é uma actividade social com benefícios neste âmbito. O utente pode desfrutar das suas férias, os trabalhadores de turismo lucram com os empregos criados e a sociedade, no seu todo, usufrui benefícios sociais. No caso da UE, o Turismo Social tem tido e continuará a ter um impacto crescente na construção da Europa dos Cidadãos. Viagens na Europa do maior número possível de cidadãos traduzir-se-ão, sem dúvida, em mais conhecimento, mais compreensão e mais tolerância.

2.8

Diversas concepções e visões do Turismo Social na Europa. O Turismo Social tem hoje significados diferentes nos vários Estados-Membros com programas específicos neste âmbito, mas há três elementos em comum:

a capacidade real de dispor de tempo livre para fazer férias,

a capacidade monetária para poder deslocar-se e viajar,

a existência de um canal, de uma estrutura ou de um instrumento que permita exercer estes direitos.

2.8.1

Assim, entende-se por Turismo Social o conjunto de viagens e actividades organizadas por sindicatos, o turismo familiar, o turismo de inspiração religiosa, o organizado pelas empresas para os seus trabalhadores ou por instituições públicas, o programado especificamente para pessoas com deficiência, jovens ou cidadãos idosos com baixos rendimentos, e muitas outras realidades.

2.9

Os organismos do Turismo Social. Em toda a Europa, são vários os organismos que intervêm no Turismo Social e na sua gestão, destacando-se:

as federações ou consórcios nacionais,

os estabelecimentos públicos vocacionados para o Turismo Social ou com actividades exclusivas neste contexto,

as associações de Turismo Social, desportivas, culturais,

os organismos de cooperação,

os sindicatos e

os organismos de gestão mista ou paritária.

3.   Os agentes que intervêm no Turismo Social e seu papel

3.1

As instituições europeias. É crescente o interesse demonstrado pelas várias instituições europeias pelas actividades do Turismo Social, manifesto nos diversos estudos, pareceres, relatórios e conferências realizados, promovidos e coordenados quer pelo Parlamento quer pela Comissão e o CESE. A sua actividade incide essencialmente na obtenção, catalogação e difusão do amplo leque de experiências dos vários países europeus. A Comissão, em particular, dedica-se a promover novas experiências dentro de cada país e a estabelecer contactos com os responsáveis dos países que manifestarem o desejo de participar em experiências transnacionais. Actualmente, o papel da Comissão não parece incluir a coordenação geral das experiências do Turismo Social ao nível comunitário. É digno de nota, neste contexto, o inquérito realizado pela Unidade de Turismo da Direcção-Geral «Empresas» sobre a participação dos cidadãos em actividades de lazer, que procurava apurar os motivos pelos quais cerca de 40 % deles não fazem turismo. Mas não se vê por que razão a Comissão não venha a assumir futuramente o papel de coordenador e de integrador de uma plataforma de Turismo Social à escala europeia, até porque isso não implicará forçosamente a afectação pelas instituições europeias de recursos financeiros para o desenvolvimento dessa plataforma comum e do seu carácter transnacional.

3.2

Os governos dos Estados-Membros. Tal como se referiu anteriormente, o envolvimento dos governos dos Estados-Membros nas actividades de Turismo Social é muito variável, em função do seu grau de intervenção e de razões históricas, ideológicas e sociais. Há países onde são o governo ou o Estado, as regiões ou as administrações locais que respondem por um volume substancial de ajudas financeiras. Estas ajudas têm frequentemente por alvo determinados grupos: jovens, idosos, pessoas com deficiência, pessoas carenciadas, etc. Actualmente, os governos procuram ultrapassar, mediante vários tipos de intercâmbio transnacional, os limites nacionais dos seus programas de Turismo Social.

3.3

Os empresários. Por um lado, é importante considerar a existência de iniciativas tais como os «cheques de férias», em que os empresários contribuem financeiramente para as férias do seu pessoal. Por outro lado, convém recordar que, como já se disse, o Turismo Social é uma actividade económica de grande relevância e potencial e atrai, como tal, os empresários do sector turístico que vêem nela uma oportunidade para incrementarem as suas actividades de prestação de serviços ou de mediação. Vale a pena citar o caso da empresa espanhola Mundo Senior, que reúne várias empresas turísticas unidas originalmente para gerir o programa de Turismo Social do Ministério do Trabalho e da Segurança Social e que expandiram o seu âmbito social e a sua actividade com a oferta de produtos de turismo especializados para idosos. É evidente que a condição da competitividade não está em oposição ao carácter social da actividade. No futuro, serão necessárias parcerias público-privadas para desenvolver programas de Turismo Social rentáveis, tanto dentro de cada um dos Estados-Membros como entre países diferentes.

3.4

Os trabalhadores. Desde o momento em que surgiu o Turismo Social que os sindicatos, enquanto organizações de defesa dos direitos dos trabalhadores, têm uma forte presença na actividade turística como forma de obter benefícios para os seus sócios. Esta presença é visível tanto no suporte proporcionado pelas infra-estruturas materiais, cidades de férias, residências, etc. como em simples serviços especializados. As experiências diferem de país para país, mas quase em todos eles há formas de actividade de Turismo Social de raiz sindical. Merecem referência especial as organizações sindicais dos países que aderiram recentemente à União Europeia e que buscam um modelo válido para o Turismo Social e estabelecer relações com organismos mais experientes. Refira-se igualmente, neste contexto, o interessante estudo realizado pelo BITS, em Maio de 2005, sobre as actividades de vários sindicatos dirigidas aos trabalhadores, enumerando uma a uma as actividades actualmente existentes nos 25 países da UE. Trata-se, com efeito, de um instrumento muito útil para conhecer e analisar a situação actual.

3.5

As associações especializadas. Entre estas associações encontram-se as cooperativas de consumo que em alguns países (Itália e Reino Unido) dispõem de amplas redes de agências para canalizar as actividades de Turismo Social. São dignas de nota as organizações juvenis e as ambientais com actividades nesse âmbito. Neste capítulo são igualmente de referir os organismos de carácter associativo das próprias organizações de turismo social, como é o caso do BITS que tem uma missão de apoio, de coordenação e de incentivo de importância vital.

3.6

Os grupos implicados directa e indirectamente enquanto sujeitos do Turismo Social. É evidente que os utentes são os verdadeiros protagonistas dos vários programas e actividades de Turismo Social. São eles os primeiros a beneficiar de diversas vantagens económicas que lhes permitem desfrutar dos seus tempos livres e das suas férias, tendo a oportunidade de praticar as actividades desportivas e culturais favoritas. São, além disso, beneficiários de um turismo respeitador dos recursos territoriais, patrimoniais e ambientais, bem como dos contactos com os habitantes dos destinos turísticos. Estas actividades contribuem, no seu conjunto, para o conhecimento mútuo, para o relaxamento e o equilíbrio pessoal. As comunidades locais que acolhem os utentes do Turismo Social também retiram benefícios desta situação que se traduzem em empregos, actividade económica e desenvolvimento.

4.   Situação actual do Turismo Social na Europa.

4.1

Aspectos teóricos, regulamentares e programáticos. Na Europa de hoje, o Turismo Social não dispõe de um quadro teórico, regulamentar e programático muito extenso, não obstante os estudos e as investigações relativamente abundantes que têm procurado inventariar e analisar comparativamente as suas várias manifestações na Europa. Algumas delas inserem-se no capítulo D do presente parecer a título de referências documentais e técnicas.

4.2

Diversas experiências concretas na Europa. Tal como referimos antes, no estudo realizado pelo grupo de trabalho durante a audição que teve lugar em Barcelona, nos dias 4 e 5 de Maio de 2006, as experiências divulgadas na conferência sob a égide do BITS e da Comissão intitulada «Turismo para Todos» permitiram detectar e conhecer numerosas práticas na Europa que se pode classificar de bem sucedidas. Não é intenção do presente parecer estudar minuciosamente estas experiências, mas talvez fosse oportuno citar as mais importantes por contribuírem para avaliar o Turismo Social de uma forma muito positiva e servirem para nortear os esforços de outros agentes ou dos Estados ou âmbitos territoriais que não disponham, por vários motivos, de programas desta natureza.

4.2.1

A Agência Nacional dos Cheques de Férias (ANCV) que desenvolve em França uma actividade económica muito importante com um volume de negócios calculado em 1.000 milhões de euros, no ano de 2005. Trata-se de um estabelecimento público de carácter industrial e comercial, criado em 1982, que conta já com mais de 23 anos de actividade e continua a ser um instrumento útil para as políticas sociais no âmbito do turismo.

4.2.1.1

Os seus objectivos articulam-se em torno dos três eixos seguintes:

favorecer a saída real de férias ao maior número possível de pessoas e, especialmente, às que têm rendimentos mais modestos;

oferecer liberdade de utilização graças a uma ampla rede de profissionais do turismo capaz de responder com qualidade a todos as solicitações;

colaborar no desenvolvimento turístico, participando na melhor distribuição territorial da actividade turística.

4.2.1.2

Convém referir que os cheques de férias são distribuídos anualmente por cerca de 2,5 milhões de pessoas e contemplam um total de 7 milhões de viajantes. São mais de 21.000 os organismos filiados que participam no seu financiamento e é de 135.000 o número de profissionais do sector de turismo e lazer implicados na prestação dos serviços que lhe são inerentes.

4.2.1.3

O programa permite, além disso, facilitar a saída de férias de grupos especialmente desfavorecidos, grupos de pessoas com deficiência, jovens, etc., graças a bolsas de viagem num valor total que ronda os 4,5 milhões de euros. Também são fundamentais os investimentos da Agência na modernização das instalações de Turismo Social.

4.2.1.4

Tudo indica que, no seu conjunto, o programa tem a sua continuidade e a sua rentabilidade asseguradas. Sem dúvida que os estudos económicos realizados confirmam que é real a recuperação financeira através da actividade económica.

4.2.1.5

Os objectivos da Agência para os próximos anos são continuar a expandir e a difundir os seus serviços pelos utentes e profissionais de turismo. Talvez estes objectivos pudessem incluir a dimensão transnacional do programa mediante concertação com outros países da Europa. Não há dúvida que os benefícios retirados desta internacionalização seriam recíprocos, modelares e de grande importância económica e social.

4.2.2

O Programa de Turismo Social do IMSERSO (Instituto de Migrações e Serviços Sociais) da Espanha tem objectivos idênticos mas é diferente na sua abordagem e nos instrumentos utilizados. Concretamente, há mais de um milhão de pessoas, especialmente idosos, que beneficiam anualmente de viagens organizadas, em grupo, durante a época baixa. O Estado espanhol investe anualmente neste programa 75 milhões de euros, mas mediante diversos mecanismos fiscais (IVA, IAE (Imposto de Actividades Económicas), lucros das empresas e rendimentos de pessoas físicas). Por outro lado, graças às maiores receitas arrecadadas em consequência das quotizações para a segurança social e das poupanças nos subsídios de desemprego, esse programa gera receitas que rondam os 125 milhões de euros e é, por isso, muito rentável economicamente.

4.2.2.1

É evidente a rentabilidade do programa, já que, por um lado, permitiu a amplas camadas da população idosa viajar pela primeira vez, conhecer outras cidades e outras realidades, expandir as suas relações sociais em pé de igualdade, melhorar o seu estado físico, tudo segundo parâmetros razoáveis de qualidade e de aceitação por parte dos utentes e possibilitou, por outro lado, a recuperação dos custos numa relação de 1,7 euros por cada euro investido.

4.2.2.2

É digno de nota o impacto deste programa sobre o emprego, avaliado em 100.000 trabalhadores directos que não são atirados para o desemprego quando chega a época baixa, uma vez que tanto hotéis como outros estabelecimentos se mantêm abertos todo o ano.

4.2.2.3

O programa cresce e evolui continuamente em busca de novas fórmulas de Turismo Social com maior valor em termos sociais, de cultura e de saúde, como é o caso das estadias em termas, que têm tido grande êxito, ou de circuitos e acontecimentos culturais.

4.2.2.4

Tal como sucede na França, as possibilidades de crescimento do programa são múltiplas, não só dentro do país como internacionalmente. Actualmente, o IMSERSO espanhol está a negociar com o seu homólogo português o intercâmbio de turistas e tenciona fazer o mesmo com a França, o que pode transformá-lo num modelo exportável precioso para o resto da Europa.

4.2.3

Outras experiências: Para além destes dois importantes programas de Turismo Social na Europa, convém referir outros exemplos positivos, talvez mais limitados, mais segmentados e dirigidos a utentes mais específicos, mas nem por isso menos valiosos. É o caso, analisado na audição de Barcelona, da Plataforma Representativa Estatal de Deficientes Físicos (PREDIF), que se dirige a um grupo muito concreto mas que gere com bastante eficácia um programa de férias específico.

4.2.3.1

De outra óptica muito interessante, convém citar a experiência partilhada por três organizações, uma do Reino Unido, Family Holiday Association, outra da Bélgica, Toerisme Vlaanderen e outra ainda da França, Vacances Ouvertes, que se coordenam entre si para concretizar o «Turismo para Todos» nos três países.

4.2.3.2

Há em diversos países europeus também actividades de Turismo Social, como, por exemplo, em Portugal, Polónia e Hungria, com um papel essencial dos sindicatos, e em Itália o programa promovido pelas cooperativas de consumo. Pode-se afirmar, por último, que a variedade de experiências, o número de utentes e a sua diversidade se estão a consolidar e a ampliar em todos os países da Europa.

4.2.3.3

Constata-se, analogamente, que algumas regiões e alguns municípios estão a desenvolver, de uma forma ou de outra, experiências de Turismo Social, como é o caso da Comunidad Autónoma de las Islas Baleares com o seu Plano OCI 60.

4.2.3.4

Ao nível regional, o governo da Andaluzia (Espanha) lançou o programa de Residencias de Tiempo Libre, sendo de referir, também como iniciativa andaluza, o programa «Conoce tu Costa» — um exemplo de cooperação entre a administração regional e as câmaras municipais para favorecer o turismo de pessoas idosas na Comunidade Autónoma.

4.2.3.5

O Turismo Social está igualmente presente no portal da União Europeia www.visiteurope.com, como local de consulta sobre todos os tipos de actividade turística europeia, e obviamente do Turismo Social.

4.3

Avaliação global do Turismo Social. São numerosos os trunfos do Turismo Social para a sociedade europeia. Eis alguns deles:

Satisfação dos utentes, não só pela actividade directa de férias, em si, como pelo carácter «especial» desta actividade de lazer;

A dimensão e os valores humanos da actividade;

O melhor equilíbrio e o desenvolvimento pessoal dos utentes e da comunidade de acolhimento;

A rentabilidade e os benefícios económicos da indústria turística, em especial graças ao prolongamento da época alta;

Os benefícios derivados da criação de empregos estáveis e de qualidade durante todo o ano;

A manutenção de condições de sustentabilidade nos zonas de destino;

A valorização do ambiente local e dos seus recursos naturais, sociais, culturais e patrimoniais;

A promoção do conhecimento e do intercâmbio entre os diversos Estados-Membros.

4.3.1

Estes trunfos, em conjugação com os casos actuais de sucesso do Turismo Social, com as perspectivas de crescimento da actividade e com a investigação e a implantação de novos produtos, dá uma nota global muito positiva ao Turismo Social na Europa em todos os seus aspectos.

4.3.2

Com uma avaliação tão positiva é grande a tentação de classificar de «milagre» o Turismo Social, já que todos os agentes e todos os utentes envolvidos retiram benefícios vários: sociais, de saúde, de emprego, de cidadania europeia… Também não há ninguém que saia prejudicado por esta actividade… Em suma, dificilmente se encontrará uma actividade humana e económica com um reconhecimento e um apoio tão unânimes.

4.3.3

Com tal perspectiva, é inteiramente lógico o presente parecer recomendar vivamente propostas e fórmulas susceptíveis, por um lado, de consolidar e melhorar os programas existentes e, por outro, de estender os seus efeitos benéficos a camadas mais amplas da população.

B.   SEGUNDA PARTE: PROPOSTAS

5.   Para um projecto europeu de Turismo Social

5.1

Premissas. Nos pontos anteriores ficou claro que, independentemente da definição de Turismo Social e da forma como este é financiado ou gerido, se trata de uma realidade social e económica poderosa, lucrativa e estável que cumpre os seus objectivos com um elevado grau de satisfação por parte dos utentes, contribui para a criação de empregos e para pôr termo ao carácter sazonal da actividade turística. É, com efeito, uma actividade de grande relevância no mundo inteiro e, em especial, na Europa. O objectivo é, por conseguinte, analisar até que ponto os efeitos benéficos do Turismo Social poderão estender-se e propagar-se a todos os indivíduos, às empresas e à sociedade no seu conjunto.

5.1.1

Não é fácil abrigar num só conceito uma actividade de Turismo Social com âmbito europeu. Pode-se falar de plataforma, de projecto, de programa, de iniciativa, que embora não tenham necessariamente o mesmo significado fazem todos eles alusão a uma actividade organizada, com objectivos claros e de cariz supranacional e europeu. Neste parecer, que pretende apenas apresentar uma proposta geral, estas designações são usadas indiferentemente, enquanto se aguarda que a realidade desta futura plataforma sugira o termo mais adequado.

5.1.2

Por outro lado, constata-se que o turismo europeu padece de várias deficiências e vê-se perante certas ameaças a médio prazo:

A situação grave e cada vez mais premente causada pelo carácter sazonal da indústria turística, tanto no Norte da Europa, como no centro e no litoral mediterrânico, onde na época baixa há zonas desertas e faltam infra-estruturas adequadas durante todo o ano;

A subutilização de recursos humanos durante as épocas média e baixa;

O grande aumento da população activa devido à emigração, que obriga a ampliar a actividade económica para manter o nível de vida actual;

As dificuldades da indústria turística em manter preços adequados e uma ocupação média durante todo o ano capazes de assegurar a sua rentabilidade a médio prazo;

A existência de limites objectivos no número de zonas turísticas que podem ser exploradas para o efeito;

O desenvolvimento sustentável da indústria turística exige infalivelmente o aumento do valor acrescentado de cada lugar disponível ao longo do ano, ou incrementando a qualidade e, por conseguinte, o preço, ou aumentando a ocupação média anual através do prolongamento da temporada de abertura dos estabelecimentos turísticos;

A emergência de numerosos destinos turísticos em todo o mundo oferecendo produtos e serviços inovadores e competitivos. Esta nova concorrência deveria representar, antes de mais, um novo estímulo para melhorar a qualidade e a competitividade.

5.1.3

Mas também há elementos que representam reais oportunidades para a viabilidade de uma eventual Plataforma ou Projecto de Turismo Social Europeu:

aumento gradual na Europa, em termos absolutos e relativos, do número de cidadãos não activos mas com pensões de reforma e um nível de vida elevado;

aumento gradual da esperança de vida dos europeus;

aumento da média de tempos livres de que dispõe um indivíduo durante toda a sua vida e, sobretudo, em idade avançada;

custos de transporte mais baratos graças ao grande surto de companhias de baixo custo com repercussões favoráveis à mobilidade e ao turismo;

nível cultural crescente que propicia uma actividade turística responsável e sustentável;

experiências positivas e bem sucedidas em toda a Europa de programas de Turismo Social;

adesão de novos países à União Europeia a qual contribui para dilatar o mercado e as possibilidades e oportunidades de viajar.

5.2

São vários os objectivos a definir na perspectiva de uma eventual Plataforma de Turismo Social Europeu:

generalizar e ampliar os actuais programas e o número de utentes de Turismo Social dos vários países da Europa até conseguir que todos eles disponham de um programa próprio;

consolidar o carácter transnacional dos programas existentes através de acordos de cooperação bilaterais ou multilaterais;

criar condições para a elaboração e o arranque de uma Plataforma de Turismo Social de carácter europeu, em que os beneficiários potenciais são cidadãos europeus que terão a possibilidade de visitar outros países de uma forma acessível e sustentável; neste sentido, seria profícuo conhecer o número de cidadãos europeus que nunca viajaram para outro país da Europa, um grupo certamente bastante numeroso que poderia servir de base ao referido programa;

promover a implantação progressiva de uma actividade de Turismo Social de cariz europeu em que participe o maior número possível de países.

5.3

Agentes e grupos implicados na Plataforma de Turismo Social Europeu. São dignos de nota:

as actuais organizações que gerem programas de Turismo Social em diversos países;

as organizações sindicais e cooperativas interessadas no desenvolvimento do programa;

os empresários do sector turístico no seu sentido mais lato interessados em melhorar a rentabilidade duradoura dos seus estabelecimentos;

os governos nacionais, regionais e locais interessados em intervir no sector e melhorá-lo e preocupados em garantir o desenvolvimento pessoal e social dos seus cidadãos;

a União Europeia e as suas instituições interessadas em ampliar e promover o emprego, a actividade económica e a cidadania europeia; face à dimensão supranacional da Plataforma, as instituições da União Europeia deveriam assumir, além disso, um papel de coordenação e de acompanhamento das condições em que o programa se desenvolve, e liderarem também a sua implantação;

as organizações de turismo Social, especialmente o BITS.

5.4

Elementos essenciais do Turismo Social Europeu. Para que uma plataforma deste tipo seja social e economicamente viável terá de obedecer aos seguintes parâmetros:

dirigir-se aos grupos mais desfavorecidos económica, territorial ou socialmente e, de forma especial, às pessoas com deficiência física ou psíquica ou com dificuldades para viajar decorrentes da realidade geográfica em que vivem, por exemplo, nas zonas insulares da Europa. Isso implica assumir o financiamento parcial, justo e equitativo, independentemente da duração da viagem e da estadia, como forma de compensar essa situação desvantajosa, entendida num sentido muito amplo;

ser, no seu todo, rentável económica e socialmente, a curto, médio e longo prazo, tanto ao nível privado como público;

criar empregos estáveis e de qualidade durante todo o ano; assegurar uma gestão centralizada e o máximo aproveitamento das estadias e estabelecimentos turísticos para conseguir o objectivo do emprego;

desenvolver-se durante em períodos da época baixa;

ser sustentável e garantir o enriquecimento pessoal e social tanto dos beneficiários como das comunidades que os acolhem;

manter um elevado nível de qualidade das prestações adequado aos objectivos almejados;

desenvolver-se em forma de cooperação público-privada.

Uma vez satisfeitas estas condições, o Turismo Social será indubitavelmente um elemento fundamental para integrar o Modelo de Turismo Europeu.

5.5

A cooperação público-privada na Plataforma. A viabilidade do programa será provavelmente muito condicionada — mas também favorecida — por uma efectiva cooperação público-privada na sua concepção, configuração e gestão. Parece ser possível, mesmo não sendo fácil, encontrar na Europa organizações e empresas dispostas a desenvolver esta Plataforma de Turismo Social Europeu.

6.   Efeitos e resultados de uma Plataforma Europeia de Turismo Social

6.1

Crescimento e emprego. Se esta Plataforma for concretizada, nas suas diversas fases, são de esperar fortes repercussões no crescimento e no emprego que contribuirão incontestavelmente para alcançar os objectivos de Lisboa. Por exemplo, a experiência do programa do IMSERSO lançado em Espanha demonstra claramente o impacto positivo do Turismo Social e de como é possível manter e criar empregos durante a época baixa.

6.2

Direito real de acesso ao turismo. Não obstante as estatísticas disponíveis revelarem que, actualmente, cerca de 40 % da população não faz férias, a Plataforma de Turismo Social Europeu poderia almejar e ajudar a reduzir esta percentagem substancialmente, transformar o turismo em realidade universal e ampliar o conhecimento recíproco dos povos da Europa.

6.3

Modelo Turístico Europeu. Nos seus vários pareceres sobre o turismo, o CESE tem-se mostrado confiante em relação à construção de um modelo de turismo europeu não baseado em legislação, mas em valores de aceitação e aplicação gerais. A universalização do turismo — turismo para todos — seria um dos valores a incluir nesse modelo. A Plataforma de Turismo Social Europeu poderia ser muito valiosa para coadjuvar o Modelo Turístico Europeu.

7.   O contributo do turismo e, em especial, do turismo social para a construção de uma identidade e dimensão europeias

7.1

Nos últimos tempos, tem ficado cada vez mais evidente que a construção europeia não é um caminho fácil nem curto, já que são ainda muitas as incertezas e as dificuldades a vencer. O Turismo Social poderia ser um poderoso instrumento de informação, de conhecimento recíproco dos cidadãos, de solidariedade entre os povos e contribuir, assim, para a construção da Europa dos Cidadãos, não com sacrifícios e penosamente, mas mediante o desfrute dos tempos livres, das viagens e das férias. Especialmente os jovens formam um grupo que parece inclinado a aumentar as suas viagens na época alta, justamente um período em que as várias instalações de carácter residencial ligadas ao ensino não estão ocupadas e poderiam acolher temporariamente acções de turismo análogas ao programa ERASMUS.

7.2

Tudo indica que a actividade turística é uma boa forma de construir essa Europa dos Cidadãos, já que os vários grupos implicados e o próprio sector económico de turismo e as comunidades locais poderão fazer coincidir os seus interesses e permitir uma experiência agradável e acessível a todos.

C.   TERCEIRA PARTE: CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

8.   Conclusões

8.1

Uma primeira conclusão geral da análise feita neste parecer sobre a situação actual do Turismo Social na Europa, é que se trata de uma actividade sustentável numa óptica ambiental, económica e social e, além disso, fundamental em cada um destes domínios.

8.2

Os benefícios económicos, sociais, para a saúde e a integração usufruídos por todos os utentes e agentes que intervêm nos programas contam com uma aceitação geral incondicional e representam um notável valor acrescentado.

8.3

Os vários grupos de utentes do Turismo Social e, em especial, as pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida têm nos programas uma extraordinária componente e um valioso contributo para a sua plena integração como pessoas.

8.4

O Turismo Social na Europa conta com uma grande variedade de agentes, de formas de desenvolvimento, de um público concreto, de instrumentos financeiros, etc. que o enriquecem, o diversificam e o ajudam a evoluir.

8.5

Podemos concluir especialmente que a rentabilidade social do Turismo Social é compatível com a rentabilidade económica e tem nela um efeito positivo.

8.6

É economicamente viável e socialmente oportuno que cada país europeu desenvolva um programa nacional de Turismo Social com diversas abordagens e formas de gestão.

8.7

É economicamente viável e socialmente desejável a criação de uma Plataforma de Turismo Social Europeu.

8.8

Todas as actividades de Turismo Social, ao desenvolver-se, deverão subentender um conjunto de valores de sustentabilidade e de criação de emprego, no espírito da estratégia de Lisboa.

8.9

O Turismo Social poderá ser um instrumento muito valioso para a criação da Europa dos Cidadãos, de todos os cidadãos, sendo aqui de especial importância o papel que os jovens poderão desempenhar nesse processo.

8.10

O Turismo Social é uma actividade que contribui para concretizar alguns dos valores que se inserem perfeitamente no Modelo Turístico Europeu.

8.11

As comunidades locais da Europa inteira poderão beneficiar das actividades de Turismo Social graças ao seu contributo para a preservação do património cultural e local.

8.12

À guisa de conclusão geral, cabe afirmar que a actividade de turismo social é hoje uma actividade generalizada em numerosos países da Europa e que atingiu a sua maturidade, com bons gestores e estruturas organizativas adequadas, estando preparada para dar o salto para a sua universalização e para assumir o carácter transnacional da sua oferta de serviços, o qual implicará objectivos mais exigentes em termos de quantidade e qualidade.

9.   Recomendações

9.1

A recomendação principal aos potenciais utentes dos programas de Turismo Social é, obviamente, incentivá-los a participar numa actividade como é o turismo, a que têm direito como pessoas e à qual não tiveram a possibilidade de aceder devido a uma série de circunstâncias. O Turismo Social promove clara e profundamente a integração, o conhecimento e o desenvolvimento pessoal, pelo que só se pode lucrar com a participação nas actividades organizadas no seu âmbito.

9.2

Importa reconhecer, em primeiro lugar, os benefícios do trabalho dos agentes que participam na gestão dos vários programas de Turismo Social, a sua entrega à missão de que os incumbem as suas organizações e o seu cuidado em prestar aos utentes um serviço acessível mas de grande qualidade. Convém, contudo, instigá-los também a melhorar continuamente a qualidade dos seus produtos e dos seus serviços, a investir na melhoria das infra-estruturas e na inovação de novos produtos, sobretudo os que têm uma dimensão transnacional. A coordenação de programas e a parceria de organismos responsáveis representam um instrumento muito útil para melhorar o intercâmbio de experiências.

9.3

Recomendamos às empresas do sector turístico que participem com entusiasmo nas actividades de Turismo Social. O Turismo Social tem valores compatíveis com uma correcta gestão empresarial, com a competitividade e a rentabilidade, a curto prazo e, em especial, a médio e a longo prazo, assegurando emprego a numerosos trabalhadores o ano inteiro.

9.4

Aconselhamos as instâncias e os governos nacionais, regionais e locais a implantarem programas de Turismo Social, não só pelos seus benefícios sociais mas também económicos. A obtenção de receitas suplementares provenientes de impostos e quotizações, as economias nos gastos associados ao desemprego são indiscutíveis incentivos para prever subvenções justas a grupos menos favorecidos económica, social ou fisicamente, com a certeza da sua recuperação e rentabilidade.

9.5

Convidamos as instituições europeias a terem em conta o Turismo Social e a considerá-lo como uma actividade fundamental capaz de combinar objectivos do âmbito do turismo com a acção social, como uma actividade que merece ser reconhecida e desenvolvida e deverá contar com assistência técnica especializada, apoio e incentivos não necessariamente económicos. Animação, coordenação técnica, disseminação de experiências e ponto de encontro para acordos transnacionais são algumas das funções a assumir sobretudo pela Comissão, através da sua Unidade de Turismo, e a realizar com os seus próprios meios, na perspectiva da criação de uma poderosa Plataforma Europeia de Turismo Social. A liderança da Comissão nestas vertentes da promoção do Turismo Social Europeu seria, sem sombra de dúvida, um instrumento valioso para a consecução dos objectivos estabelecidos e para o seguimento das acções empreendidas.

9.6

Todas as instituições deveriam empenhar-se em intensificar as suas políticas de remoção de todo o tipo de obstáculos, tanto nas infra-estruturas de comunicações como nas de alojamento e de prestação de serviços turísticos. As zonas insulares da Europa são um caso exemplar de como a situação geográfica condiciona fortemente a mobilidade e o acesso ao turismo dos cidadãos.

9.7

Por sua vez, o Parlamento Europeu deveria, dada a sua dimensão política, social e económica, adoptar iniciativas para promover o debate e resoluções que dêem alento a este sector específico.

9.8

O CESE é favorável a que o presente parecer seja conhecido, editado e divulgado como «Declaração de Barcelona sobre o Turismo Social na Europa» represente o seu contributo para o Fórum Europeu de Turismo de 2006 e para o Dia Mundial do Turismo do ano em curso.

D.   QUARTA PARTE: REFERÊNCIAS DOCUMENTAIS E TÉCNICAS

As várias noções de Turismo Social: a evolução da oferta e da procura — Comissão Europeia — Direcção-Geral XXIII — Unidade de Turismo, 1993.

Declaração de Montreal: Para uma visão humanista e social do turismo — BITS, Setembro de 1996.

Código Ético Mundial para o Turismo. OMT, Santiago do Chile, 1 de Outubro de 1999.

Actas do seminário: Ajudas para férias na União Europeia, Parlamento Europeu, Estrasburgo, Março de 2000.

Os conceitos de Turismo para Todos e de Turismo Social na União Europeia — BITS, Seminário de Bruges, Junho de 2001. Junho de 2001.

Relatório sobre os resultados do inquérito: Turismo para todos, Junho de 2001.

Parecer «Para um turismo acessível a todas as pessoas e socialmente sustentável» — CESE, Outubro de 2003.

Estudo sobre o Programa de Férias para Idosos do IMSERSO — Espanha, Maio de 2004.

Fórum Europeu de Turismo Social — BITS, Budapeste, Abril de 2005.

Relatório sobre turismo e desenvolvimento — — Parlamento Europeu A6-0173/2005, Maio de 2005.

Relatório sobre as novas perspectivas e os novos desafios de um turismo europeu sustentável — Parlamento Europeu A6-0235/2005, Julho de 2005.

Turismo acessível para todos — Plano de acção do Comité de Representantes de Pessoas com Deficiência (CERMI), Dezembro de 2005.

Consulta sobre as actividades no âmbito do turismo e férias para os trabalhadores — BITS, Bruxelas, Maio de 2005.

Conferência europeia sobre Turismo Social, crescimento económico e emprego — Govern Balear, Palma de Maiorca, Novembro de 2005.

Conferência Turismo para todos: situação actual e práticas correntes na UE — Comissão Europeia — Direcção-Geral empresas, Unidade de Turismo, Janeiro de 2006.

Congresso Mundial do Turismo Social — «Para um turismo de desenvolvimento e solidariedade», Aubagne (França), Maio de 2006.

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  As várias noções de Turismo Social: a evolução da oferta e da procura — Direcção-Geral XXIII — Unidade de turismo, 1993.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/78


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às estatísticas estruturais das empresas

COM(2006) 66 final — 2006/0020 (COD)

(2006/C 318/13)

Em 27 de Março de 2006, o Conselho, nos termos do n.o 1 do artigo 285.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a a proposta supramencionada.

Em 26 de Julho de 2006, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer com base no projecto da relatora, S. FLORIO.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 130 votos a favor e 7 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Contexto

1.1

Em 20 de Dezembro de 2000, o Conselho Europeu decidiu a elaboração de um «Programa plurianual para a empresa e o espírito empresarial, em especial para as pequenas e médias empresas» (1). Com este novo quadro de referência, a União pretendia reforçar a competitividade das empresas numa economia assente no conhecimento, simplificar e melhorar o seu enquadramento jurídico, administrativo e financeiro, sobretudo para favorecer a investigação e a inovação, facilitar o seu acesso aos serviços e aos programas comunitários, bem como promover o espírito empresarial.

1.2

No início de 2003, a Comissão Europeia apresentou o «Livro Verde — Espírito Empresarial na Europa» (2), em que sublinhava a necessidade de um apoio específico e solicitava políticas estratégicas em prol do sector industrial e transformador que, na Europa vem sofrendo — já há anos — um abrandamento perigoso, sobretudo se comparado com outras partes do mundo.

1.2.1

Eis as principais acções sugeridas para apoiar e reforçar o espírito empresarial na Europa:

remover os obstáculos administrativos ao desenvolvimento da empresa,

sopesar os riscos e as vantagens do espírito empresarial,

solicitar uma abordagem mais positiva a toda a sociedade em relação à criação de novas empresas.

1.3

Dando seguimento a uma consulta das partes interessadas baseada no Livro Verde, a Comissão apresentou em 2004 um plano de acção intitulada «A agenda europeia para o espírito empresarial» (3) que tem em conta as novas reacções recebidas e integra o plano plurianual a favor da empresa e do espírito empresarial.

1.4

Temas tão relevantes como a política industrial, o apoio aos serviços e o emprego como motor do crescimento económico estão intimamente ligados, tanto ao nível nacional como europeu, com as prioridades sociais e de emprego que são um objectivo importante das escolhas políticas da União Europeia. Também neste domínio, as instituições europeias têm adoptado nos últimos anos diversas iniciativas, das quais se realça a apresentação de um plano anual pelos Estados-Membros.

1.5

A Cimeira do Luxemburgo de 1997 lançou a Estratégia Europeia de Emprego (EEE) que passou desde logo a ser considerada como elemento-chave da estratégia de Lisboa. Com efeito, a estratégia de Lisboa coloca como objectivo a modernização da economia europeia graças à redução da taxa de desemprego e à criação de postos de trabalho altamente qualificados. Para realizar estes desideratos, é imprescindível prestar mais atenção às políticas sociais e de igualdade de oportunidades entre as diversas camadas da população. Este último objectivo é uma espécie de pressuposto a montante de uma reestruturação substancial do sistema económico, à luz do outro objectivo de conseguir o aumento da taxa de crescimento e um ambiente económico «são».

1.6

Outros elementos deste ambicioso projecto deveriam ser o «Espaço Europeu da Investigação», a integração completa dos mercados e a criação de um ambiente favorável às pequenas e médias empresas. Na proposta de um «Programa-quadro para a Competitividade e a Inovação (2007-2013)» (4), a própria Comissão afirma que a promoção das tecnologias e da investigação tem uma relação directa com o aproveitamento das oportunidades oferecidas pelo mercado aos produtos, serviços e processos empresariais novos. Além disso, importa alimentar a vontade de assumir riscos e experimentar novas ideias sobre o mercado. A inovação insuficiente é uma das causas principais dos resultados decepcionantes do crescimento europeu.

1.7

No tocante à coesão social, considerava-se necessário intervir urgentemente no âmbito da formação e da protecção social. Para assegurar a coordenação entre os Estados-Membros na formulação das suas políticas, previa-se a possibilidade de um método aberto de coordenação (MAC) garantindo o intercâmbio e a disseminação das melhores práticas e dos melhores desempenhos nos vários domínios.

1.8

Foi justamente graças à avaliação intercalar da estratégia de Lisboa que a Comissão Europeia pôde apresentar em 2005 uma comunicação intitulada «Acções Comuns para o Crescimento e o Emprego (5): o Programa Comunitário de Lisboa», com ênfase em dois pontos importantes: garantir um crescimento mais consistente e duradouro e criar mais e melhores empregos. Estes objectivos eram considerado exequíveis apenas no caso de se conseguir o máximo de sinergias entre os níveis comunitário e nacional.

2.   Observações na generalidade

2.1

O processo de transformação do mundo económico e produtivo é contínuo e avança a um ritmo acelerado, obrigando os vários sectores industriais e seus operadores a mudanças e a inovações para acompanharem a evolução do mercado, na tentativa de se manterem competitivos e de criarem oportunidades de crescimento e de lucro cada vez maiores.

2.1.1

Num mercado como o europeu, onde as empresas evoluem a um ritmo vertiginoso e os sectores tradicionais se interpenetram (produção, comércio, distribuição, etc.), é muito difícil traçar uma linha de demarcação entre os vários tipos de actividade. Além disso, na avaliação e na classificação dos vários tipos de empresas é cada vez mais difícil estabelecer o campo de actividade preponderante (comercial, agrícola, transformadora, artesanal, serviços, etc.).

2.1.2

Dada a evolução na economia social, que abarca percentagens substanciais do mercado europeu sujeitas a um crescimento constante, não é nada fácil fazer levantamentos estatísticos a partir de uma realidade que se altera e renova incessantemente. Os representantes do Eurostat dizem ter tido dificuldade em definir este campo pelo simples facto de as actividades de economia social nem sempre serem registadas como actividades empresariais. No entanto, na opinião do Comité, é imperioso multiplicar esforços para aferir a importância crescente do sector ligado à economia social, essencial para a realização dos objectivos da Estratégia de Lisboa. A falta desses dados constitui um obstáculo a uma melhor compreensão da evolução do mundo empresarial e do mercado.

2.1.3

Ficou, portanto, demonstrado que é fundamental dispor de estatísticas estruturais das empresas europeias, actualizadas e centradas essencialmente na actividade, na competitividade, no rendimento e na estrutura. Ao sublinhar a importância de um suporte estatístico, não se deve esquecer que a recolha de dados e tratamento subsequentes comportam investimentos em recursos humanos e financeiros que podem ser relevantes, sobretudo para as pequenas empresas.

2.1.4

O crescimento económico é, para todos os países da União Europeia, uma prioridade absoluta, conforme têm reiterado em inúmeras ocasiões o Conselho Europeu e as demais instituições europeias. Este crescimento económico terá de ser necessariamente acompanhado da criação de mais e melhores empregos e fazer-se sentir em todos os sectores, mas particularmente na indústria transformadora e no sector de serviços. Só assim será possível estimular o crescimento e dar a possibilidade aos cidadãos europeus de usufruir dos seus benefícios.

2.2

O modelo de desenvolvimento europeu é um modelo que se distingue dos demais pelo papel relevante atribuído à componente social e à noção de sustentabilidade do crescimento económico. É preciso, portanto, que as instituições tenham isso em mente de cada vez que se propõem legislar no âmbito das suas competências.

2.3

Por conseguinte, para conceber uma regulamentação realmente eficaz, útil e coerente, convém ter uma ideia bem precisa da situação real da indústria europeia. As opções políticas têm por base uma análise da realidade e dos problemas que lhe são inerentes e as soluções propostas levam em consideração o maior número possível de elementos e procuram prever com antecedência o eventual efeito e o impacto das decisões tomadas nessa realidade, em termos políticos, económicos, jurídicos, sociais, nacionais e territoriais.

2.4

Ora, o instrumento estatístico é, sem sombra de dúvida, um factor fundamental para uma análise exaustiva e eficaz de uma dada realidade. O trabalho realizado pelo Eurostat tem sido, desde o início até à data, um apoio precioso e indispensável para o processo decisório e político da União Europeia.

2.4.1

Um instrumento desta natureza é essencial porque permite medir, estudar e descrever os numerosos e diversos aspectos dos fenómenos associados a uma realidade concreta. É crucial dispor de informações estatísticas para formular e avaliar as políticas adoptadas, para a gestão dos serviços e das funções públicas, para uma regulamentação jurídica mais eficaz e ainda para o controlo permanente e periódico dos êxitos e progressos conseguidos por essas mesmas políticas.

2.5

Esta asserção é válida para todos os âmbitos de competência da União Europeia, cabendo consequentemente ao Eurostat, apoiada e coadjuvada pelos institutos de estatística dos Estados-Membros, a missão de elaborar e fornecer dados actualizados e fiáveis. Nos últimos anos, têm sido fundamentais os dados recolhidos no âmbito da economia e finanças, da agricultura, da política demográfica, da segurança social, do comércio, da investigação científica, do ambiente, dos transportes e, o que não é menos importante, do mundo industrial e dos indicadores de mercado que lhe são próprios.

2.5.1

Para ter uma noção da importância atribuída ao mundo empresarial europeu e ao seu desenvolvimento, basta pensar nas recentes iniciativas adoptadas nos últimos anos pela Comissão e pelo Conselho neste contexto.

3.   A proposta de regulamento relativo às estatísticas estruturais das empresas

3.1

O Regulamento (CE, Euratom) n.o 58/97 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1996, foi alterado umas quatro vezes nos últimos dez anos, representando esta a última proposta de reformulação que permitirá maior coerência de análise e de aplicabilidade das políticas e das estratégias destinadas a apoiar o mundo industrial e produtivo europeu.

3.1.1

Com o propósito de corresponder à necessidade crescente de estatísticas, a Comissão propõe algumas melhorias, entre as quais merecem atenção particular os serviços, os quais estiveram no fulcro de um amplo debate realizado nos últimos meses face à sua importância económica e às suas potencialidades ainda não exploradas inteiramente ao nível europeu. Insere, além disso, um anexo sobre a demografia das empresas e os serviços que lhes são prestados.

3.2

Numa série de actividades associadas sobretudo aos serviços prestados às empresas, a Comissão verificou que não há estatísticas pormenorizadas e recentes. A nova proposta oferece, por conseguinte, a oportunidade de adaptar os regulamentos em vigor para permitir comparar as actividades económica e produtiva das empresas com as dos serviços.

3.2.1

Por outro lado, e em apoio das recomendações estratégicas sobre o espírito empresarial, a Comissão considerou necessários dados harmonizados sobre a demografia das empresas, isto é, número de empresas criadas, as sobreviventes e as que cessaram actividade, e respectivo impacto no emprego. Os dados «demográficos» das empresas constituem um elemento dos indicadores estruturais que monitorizam as metas definidas pela estratégia de Lisboa. É justamente nesta linha de pensamento que deve ser analisada a proposta de revisão da Comissão.

3.3

A proposta estabelece como instrumento de referência para a recolha de dados estatísticos a nomenclatura NACE (6), a qual é normalmente usada pelos serviços da Comissão para todas as estatísticas das diversas actividades económicas. Este mesma nomenclatura passou por algumas revisões e actualizações consideradas indispensáveis para melhor compreender as evoluções económica e produtiva da UE.

3.4

A NACE rev. 1.1, índice de referência, não é mais que uma actualização da NACE rev. 1 e não comporta uma reorganização muito significativa. A actualização tinha por objectivo reflectir:

as novas actividades ainda não existentes no momento da elaboração da NACE rev.1,

as actividades cuja importância cresceu após a elaboração da NACE rev. 1, em virtude de mudanças tecnológicas ou de transformações da realidade económica,

as correcções dos erros presentes na NACE rev. 1 original já então evidentes e não decorrentes de mudanças na filosofia operacional.

3.4.1

A última versão da NACE, com novas alterações e revisões, encontra-se actualmente no Parlamento Europeu para segunda leitura e será publicada nos próximos meses.

3.5

O levantamento estatístico, definido no âmbito de aplicação (artigo 2.o), é organizado em módulos enunciados no artigo 3.o do regulamento proposto:

um módulo comum para estatísticas estruturais anuais,

um módulo pormenorizado para as estatísticas estruturais da indústria,

um módulo pormenorizado para as estatísticas estruturais do comércio,

um módulo pormenorizado para as estatísticas estruturais da construção,

um módulo pormenorizado para as estatísticas estruturais dos seguros,

um módulo pormenorizado para as estatísticas estruturais das instituições de crédito,

um módulo pormenorizado para as estatísticas estruturais dos fundos de pensões,

um módulo pormenorizado para as estatísticas estruturais dos serviços prestados às empresas,

um módulo pormenorizado para as estatísticas estruturais da demografia das empresas,

um módulo flexível para a realização de uma pequena recolha de dados ad hoc sobre as características das empresas.

3.5.1

Os últimos três módulos foram inseridos nesta proposta de regulamento reformulado, estando previsto para todos eles um anexo que esclarece o seu conteúdo e a sua utilização.

3.6

Estão, além disso, previstos estudos-piloto para alguns dos módulos. Estudos deste tipo têm, aliás, vindo sempre a acompanhar a recolha de dados estatísticos para os módulos. Neste caso concreto, é de salientar a inclusão de estudos-piloto ad hoc para os sectores da saúde e da educação. Trata-se aqui de estudos facultativos que, segundo o Eurostat, serviriam para avaliar com mais precisão a incidência das actividades de mercado nos referidos sectores.

4.   Observações na especialidade

4.1

O CESE reconhece o contributo fundamental do instrumento estatístico para a definição das prioridades em matéria de política industrial, no âmbito da estratégia de Lisboa. Ainda no «Programa-quadro para a competitividade e a inovação (2007-2013)» (7), a Comissão defende a utilidade de análises comparativas como instrumento de elaboração de políticas, a par dos estudos e intercâmbios de boas práticas entre autoridades nacionais e regionais.

4.2

Por este motivo, o CESE reputa essencial uma actualização do Regulamento (CE, Euratom) n.o 58/97, sugerindo algumas modificações.

4.3

No módulo comum (anexo I), a rubrica «encargos sociais», já incluída nas versões anteriores, parece vaga e de difícil interpretação face aos novos desenvolvimentos do mercado interno. A segurança social está organizada diversamente nos vários Estados-Membros com sistemas e práticas diferentes, pelo que é difícil adoptar a mesma definição de «sistema de segurança social» nos 25 países da UE. Este conceito terá, provavelmente, de ser desenvolvido e articulado.

4.4

Ainda no anexo I, mas também nos anexos seguintes, os dados relativos ao emprego são muito limitados e não reflectem a grande complexidade da situação do mercado de trabalho nos vários Estados-Membros. De facto, são fornecidos apenas dados sobre o número de empregados a tempo parcial e a tempo completo, quando a realidade das relações laborais é muito mais diversificada. Além disso, estes dados não estão repartidos por género, o que apenas sucede no módulo do sector bancário (anexo VI).

4.4.1

Seria pertinente, dado que já nas versões anteriores do Regulamento CE, Euratom) n.o 58/97 se mencionava (artigo 1.o) entre os objectivos da elaboração de estatísticas a análise da «política das empresas», aproveitar esta reformulação para testar e analisar mais atenta e profundamente a política de emprego das empresas, dada a sua importância para as políticas da União Europeia.

4.5

No atinente aos estudos-piloto, parece-nos inadequada a modalidade escolhida pela Comissão que reputa necessário analisar sectores tais como a saúde e a educação com o objectivo de «testar a viabilidade de abranger nestas secções as actividades mercantis e não mercantis». Em particular, e remetendo para o texto provisório proposta pela Comissão sobre a directiva «Serviços» que os exclui do âmbito de aplicação, não cremos ser oportuno que sectores tão delicados sejam incorporados nas estatísticas estruturais das empresas. Com base nas novas propostas de regulamentação em matéria de serviços no mercado interno, a Comissão poderia prever, na opinião do CESE, a realização de um levantamento estatístico ad hoc com incidência nestes sectores.

4.6

No anexo II (módulo da indústria), a Comissão optou por excluir do levantamento os dados sobre as despesas totais e sobre o pessoal envolvidos na investigação e desenvolvimento. Mas, à luz da estratégia de Lisboa, esta falta de dados é um óbice a uma melhor compreensão da evolução do mundo empresarial e da natureza e do destino dos investimentos.

4.7

A Comissão excluiu os dados sobre as compras de produtos energéticos, quando estes são fundamentais por fornecerem um quadro geral sobre o consumo de energia e a sua utilização pelas empresas. Tanto mais que o artigo 1.o do regulamento proposto reza que a elaboração das estatísticas tem por objectivo também «os factores de produção utilizados» e não há dúvida de que a energia é um deles. Para além do mais, estes indicadores são considerados prioritários nas últimas declarações do Conselho e do Parlamento Europeu, designadamente no Livro Verde recentemente adoptado com o título «Estratégia europeia para uma energia sustentável, competitiva e segura» (8).

4.8

O anexo VIII é novo e diz respeito à estrutura, à actividade e ao rendimento dos serviços prestados às empresas, ao passo que o anexo IX trata da demografia das empresas. O levantamento estatístico nestes dois domínios carece de um acompanhamento muito mais assíduo. Também o módulo sobre a demografia das empresas não contém dados repartidos por tipo de relação laboral e por género, quando seria extremamente útil ter a percepção das tendências do emprego e do enquadramento profissional dos assalariados no momento da criação e da extinção das empresas.

5.   Conclusões e recomendações

5.1

A União Europeia carece de dados estatísticos mais elucidativos capazes de apoiar as actuais políticas industriais sectoriais.

5.2

Perante tão inegável facto, o CESE salienta o papel fundamental do Eurostat, o principal instrumento de acompanhamento das políticas comunitárias e reputa indispensável a intensificação da sua actividade, valorizando e promovendo, nos Estados-Membros, as redes de recolha de dados estatísticos.

5.3

O CESE dá, em termos gerais, o seu aval à proposta de reformulação do Regulamento n.o 58/97 (CE, Euratom) relativo às estatísticas estruturais das empresas.

5.4

Sendo os levantamentos estatísticos um instrumento fundamental tanto no plano comunitário como nacional, urge pensar em instrumentos de apoio para melhorar continuamente a sua eficácia, oportunidade e fiabilidade.

5.4.1

Os levantamentos estatísticos deveriam ter por base, dentro do possível, dados actualizados que estão na posse das autoridades administrativas ou entidades competentes. O seu peso administrativo deverá ser calibrado em função das dimensões da empresa. Em alguns países, a recolha de dados sobre as PME está a cargo das associações industriais com representação local ou regional. Ora, um intercâmbio destas boas práticas entre os Estados-Membros poderia ter grande utilidade.

5.5

Seria, com efeito, de toda a conveniência dispor de estatísticas cada vez mais específicas e actualizadas sobre a estrutura das empresas e sobre a sua actividade produtiva, tendo em conta as dimensões e a multiplicidade de actividades dentro de uma mesma empresa (produção, comércio e distribuição).

5.6

Na opinião do Comité, é importante haver um bom sistema de consulta e de aferição entre o Eurostat, os parceiros sociais, o mundo académico e as associações. Este mecanismo poderia ser aperfeiçoado e ampliado no Comité Consultivo da Informação Estatística nos Domínios Económico e Social (CEIES) junto do Eurostat (um representante dos utilizadores por cada Estado-Membro).

5.7

Por exemplo, no caso dos encargos sociais, um contacto mais estreito do Eurostat com os parceiros sociais permitiria definir melhor (e não a uma só voz) o empenhamento das empresas neste sector, que não parece ser igual nos 25 países da UE.

5.8

Os dados sobre o emprego, embora sejam objecto de outras estatísticas específicas, se fossem mais detalhados dariam uma ideia sobre a situação das actividades das empresas. O Comité observa que as estatísticas estruturais das empresas, designadamente as que dizem respeito à sua demografia, não podem prescindir de uma análise atenta da qualidade do emprego. Sendo o emprego um factor fundamental para o sucesso das actividades empresariais, as estatísticas sobre os tipos de trabalho, que apenas fazem a distinção entre tempo completo e tempo parcial, são absolutamente insuficientes, sobretudo se considerarmos a evolução constante do mercado de trabalho. Além disso, o Comité não vê qualquer utilidade em dissociar completamente as estatísticas estruturais das empresas dos dados sobre o emprego, já que estamos perante domínios nitidamente interligados.

5.9

A quota-parte da economia social na economia europeia tem vindo a aumentar todos os anos. O CESE entende, por conseguinte, que a Comissão poderia, por intermédio do Eurostat, lançar mão de estudos-piloto para avaliar este sector e a sua incidência no mundo empresarial.

5.10

O Comité reafirma as suas reservas quanto à oportunidade de utilizar o método dos estudos-piloto para examinar os sectores da saúde e da educação. Face ao carácter delicado destes sectores e à importância fundamental que têm para todos os cidadãos europeus, o CESE considera descabida a possibilidade de incluí-los nas estatísticas estruturais das empresas. Com base nas novas propostas de regulamentação em matéria de serviços no mercado interno, a Comissão poderia prever, na opinião do CESE, a realização de um levantamento estatístico ad hoc com incidência nestes sectores.

5.11

No concernente às compras de produtos energéticos e aos investimentos em recursos humanos dirigidos para a investigação e o desenvolvimento, o CESE considera que, não obstante estarem previstos instrumentos estatísticos ad hoc, seria essencial avaliar, em termos qualitativos e quantitativos, qual a importância dessas rubricas para a vida das empresas. Isto seria útil tanto à luz dos objectivos da estratégia de Lisboa como das preocupações da União Europeia nos últimos tempos e das acções por ela empreendidas no âmbito da política energética.

5.12

No atinente às estatísticas sobre as variáveis ambientais, o CESE sublinha a importância da recolha de dados no atinente à eliminação dos resíduos industriais. Também seria conveniente apurar se a eliminação dos resíduos produzidos pela indústria é realizada com recurso a sistemas internos à empresa ou se é adjudicada a operadores externos, tendo em conta os custos destas operações.

5.13

No anexo VI, que diz respeito ao sector da construção, seria útil diferenciar as várias actividades: construção para habitação, para uso público, redes de transporte, infra-estruturas.

5.14

Convinha dar mais ênfase às estatísticas com base regional que indicariam em que áreas são desenvolvidas actividades industriais e empresariais, quais as actividades predominantes e em que regiões se concentram os investimentos na investigação e, por último, em que áreas é maior a taxa de natalidade ou de mortalidade das empresas.

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Decisão 2000/819/CE.

(2)  COM(2003) 27 final de 21/01/2003.

(3)  COM(2004) 70 final de 11/02/2004.

(4)  COM(2005) 121 final de 6/04/2005.

(5)  COM(2005) 330 final de 20.07.2005.

(6)  NACE: Nomenclatura geral das actividades económicas na Comunidade Europeia.

(7)  Cf. nota 4.

(8)  COM(2006) 105 final de 8/03/2006.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/83


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 91/477/CEE do Conselho relativa ao controlo da aquisição e da detenção de armas»

COM(2006) 93 final — 2006/0031 (COD)

(2006/C 318/14)

Em 7 de Julho de 2006 o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 26 de Julho de 2006 (Relator: J. PEGADO LIZ).

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu aprovou o presente parecer por 186 votos a favor e 7 votos contra, com 12 abstenções.

1.   Síntese da proposta da Comissão

1.1

A presente proposta entende promover a actualização da Directiva 91/477/CEE de 18 de Junho de 1991 (1), onde, na sequência do Conselho Europeu de Fontainebleu de 1984, se considerou, pela primeira vez, a necessidade de «uma regulamentação eficaz que permita o controlo, no interior dos Estados-Membros, da aquisição e da detenção de armas de fogo e da sua transferência para outro Estado-Membro», à luz dos critérios estabelecidos pelo Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, que a Comissão foi autorizada a assinar, em nome da Comunidade Europeia (2).

1.2

A proposta pretende, assim, conferir execução jurídica ao referido Protocolo Adicional a uma Convenção Internacional, que a Comissão, em nome da União, outorgou. Ou seja, através deste modus operandi a União chama a si o tratamento da matéria em questão, ganhando foros de vinculatividade directa, i.e, ultrapassa o ónus da livre adesão pelos Estados ao supracitado Protocolo ou a quaisquer recomendações da Comunidade, porquanto integrada no âmbito do Título V do Tratado (3).

1.3

Como objectivos macro, identificam-se as seguintes necessidades:

harmonização da legislação europeia alusiva à matéria,

combate ao mercado clandestino de armas de uso civil;

luta contra a alimentação do mercado clandestino de armas via furto de armas legais.

1.4

Assim, a proposta sub judice avança e induz mecanismos compromissórios entre Estados que pretendem tornar a directiva de 1991 mais coerente, eficaz e rápida, quanto aos mecanismos e finalidades por ela veiculados.

1.5

Designadamente, a proposta de directiva:

a)

reenquadra o conceito de fabrico ilícito, daí partindo para a tipificação dos crimes de fabrico ilícito, falsificação e tráfico, a que correspondam penas adequadamente proporcionadas ao dano social provocado;

b)

preconiza medidas instrumentais ao controlo e rastreamento de armas, de que são melhores exemplos a sua marcação e regras de inutilização/desactivação;

c)

estabelece regras e medidas que visam o controlo acrescido a certas actividades relacionadas com o comércio de armas.

2.   Enquadramento político e social da medida no contexto internacional actual

2.1

O crime transnacional e altamente organizado é uma realidade que decorre das modernas sociedades de risco, fundadas na globalização do conhecimento, da comunicação e da informação.

2.1.1

É, também, das mais graves ameaças à integridade dos Estados e, de uma forma geral, à própria matriz democrática que os caracteriza, podendo mesmo configurar, no extremo, formas alternativas e ilegítimas de controlo da Comunidade.

2.2

Neste género de criminalidade e em resultado do cariz pluridimensional e multivariável do risco, entrecruzam-se e alimentam-se reciprocamente diversas manifestações criminógenas. São intimamente próximas as relações entre o terrorismo e o crime altamente organizado e destes relativamente ao tráfico de armas e suas munições (4).

2.3

Estimativas apontam para que circulem pelo Mundo centenas de milhões de armas ligeiras, responsáveis por algumas centenas de milhares de mortes por ano, sendo que deste número de baixas, mais de metade ocorrerão em conflitos internos de diversos países, da Ásia e de África. É, evidentemente, um negócio materialmente lucrativo, mas humanitariamente devastador.

2.4

A uma realidade transnacional deve o concerto dos Estados da União responder de forma adequada e coerente. Para esse efeito mostra-se essencial a harmonização de soluções normativas, tanto preventivas como repressivas, indutoras de políticas integradas e comuns.

2.5

A temática da presente proposta cruza regras de mercado com relevantes questões de segurança intracomunitária, valor prevalecente em qualquer sociedade democrática e de que a União não é nem pode ser excepção. A segurança é, de facto, condição primeira para o exercício de todas as Liberdades.

2.6

O que está presentemente em causa não é mais do que a criação de pressupostos de afirmação de um desejado espaço europeu de Liberdade, Segurança e Justiça para todos os cidadãos, matéria que entronca o terceiro pilar da construção europeia. Além de constituir ameaça à integridade dos diferentes Estados-Membros, o tráfico de armas é, também, factor de risco relevante no domínio dos assuntos internos da União.

2.7

A Comunidade havia já sentido a necessidade de, intra-muros, corresponder a esta ameaça, através da adopção da Directiva 91/477/CEE, do Conselho, de 18 de Junho de 1991. Posteriormente, por via da Acção Comum da União Europeia, de 17 de Dezembro de 1998 (5), estimulou-se a produção pelos diferentes Estados de medidas destinadas a corrigir e prevenir um maior controlo sobre armas e munições, de que fazem eco diversos Relatórios anuais entretanto publicados (6).

2.8

Também as Nações Unidas têm, mais recentemente, dedicado grande interesse à matéria, tendo mesmo impulsionado alguma acção neste domínio. É neste seguimento que é criado no seu âmbito um Comité Especial (7), tendo por missão elaborar uma Convenção internacional contra a criminalidade organizada transnacional, que viria a ser adoptada 2 anos mais tarde, em Palermo (8). Daqui, rapidamente se chegou à percepção da importância, neste contexto, do tráfico de armas de fogo.

2.9

Nesta sequência, culminando o Processo de Viena, nasceria o Protocolo Adicional à supracitada Convenção, relativo ao fabrico e tráfico ilícitos de armas de fogo, suas partes, componentes e munições, aberto à adesão de todos os países interessados desde 1 de Setembro de 2001, mas cuja assinatura e ratificação se acham relativamente atrasadas ao nível dos Estados-Membros da União Europeia.

3.   Observações na generalidade

3.1   A base jurídica

3.1.1

Para efeito da sua integração na Ordem Jurídica Comunitária, o art.o 95.o do Tratado CE é hoje habilitação bastante, dado tratar-se de medida compreendida no âmbito do funcionamento do mercado interno, aplicando-se-lhe o procedimento previsto no seu art.o 251.o.

3.1.2

A forma de directiva é a correcta, até por força do princípio da hierarquia das normas, designadamente, quanto ao diploma a alterar.

3.1.3

O Comité apoia, assim, a iniciativa da Comissão e sustenta a sua base jurídica, que considera conforme aos fins em vista (9).

3.2   O teor da Proposta

3.2.1

Ao fazer seu o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra a criminalidade transnacional organizada, a Comissão inspira-se correctamente nos princípios fundamentais que o mesmo consagra quanto à necessidade de prevenir, de combater e de erradicar o fabrico e o tráfico ilícitos de armas de fogo, das suas peças, elementos e munições, pela ameaça que os mesmos constituem ao bem estar dos povos e ao seu direito de viver em paz.

3.2.2

O Comité saúda esta preocupação e apoia inteiramente a iniciativa da Comissão.

3.2.3

O Comité recorda que esta questão tem sido recorrentemente alvo de escrutínio por parte do Parlamento Europeu e objecto de várias perguntas escritas apresentadas à Comissão (10).

3.2.4

Por outro lado, nas suas relações externas, o Conselho tem estado particularmente atento à necessidade de prestar assistência a países terceiros, na elaboração de legislação e regulamentação adequadas sobre posse, detenção, utilização, venda e transferência de armas e munições, como forma de garantir a paz e a segurança e de contribuir para o desenvolvimento sustentável (11).

3.2.5

Mas é também evidente a relação próxima desta questão com as preocupações relativas à luta contra o terrorismo (12), ao branqueamento de capitais, à identificação, detecção, congelamento, apreensão e perda de instrumentos e produtos do crime (13), ao controlo de explosivos para utilização civil (14) e, em geral, a todas as medidas contra o banditismo e o crime organizado.

3.2.6

Nesta medida, o Comité não só acolhe com particular agrado como saúda a iniciativa da Comissão, que espera venha a ter o mais franco acolhimento pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho.

4.   Observações na especialidade

4.1

O artigo 1.o da presente proposta altera os artigos seguintes da Directiva 91/477/CEE:

1.o, com o aditamento de dois novos números;

4.o, com nova redacção;

16.o, com nova redacção;

Anexo I com nova redacção da alínea a) e um novo parágrafo.

4.1.1

Qualquer das alterações propostas colhe a concordância deste Comité, na medida em que incorporam adequadamente as disposições do Protocolo em que se inspiram.

4.2

O art.o 2.o prevê o regime de vinculação dos Estados-Membros decorrente da aprovação da directiva sob proposta, estando em aberto o período para transposição, não obstante a sua imediata entrada em vigor (cfr. o seu art.o 3.o).

4.2.1

Sobre este aspecto, não se crê que haja necessidade de grande dilação no prazo de transposição da directiva, uma vez aprovada. Na verdade, o impacto da mesma nos seus destinatários situa-se fundamentalmente aos níveis quer do processo legislativo, nomeadamente do penal, quer da adaptação dos agentes económicos às novas regras tanto de acesso à actividade de armeiro, como de organização dos registos dos fluxos comerciais. Para tal, julga-se suficiente o prazo de 12 a 18 meses.

4.3

No respeitante às tipificações dos ilícitos em presença, o Direito Comparado existente nos Estados-Membros (15) pode constituir precioso auxiliar para o totus comunitatae, podendo a respectiva moldura sancionatória ser concretamente discutida quanto antes em sede de Conselho Europeu.

4.4

Consideração eventual poderá merecer ainda a necessidade de precisar que o conceito de «tráfico ilícito» constante da proposta deverá ser olhado no contexto da luta contra o crime organizado transnacional por forma a limitar a aplicação de sanções penais às situações que relevem exclusivamente do objecto específico do referido Protocolo das Nações Unidas.

4.5

Quanto à disposição constante do n.o 3, alínea c), do Anexo I da Directiva relativa à definição do que sejam armas antigas ou réplicas de armas antigas, o CESE urge a Comissão para que proceda à sua coordenação a nível comunitário.

4.6

Como nota final, conviria talvez prever algo acerca da utilização de armas em actividades cinegéticas, desportivas e coleccionísticas, pois o primado dos interesses de segurança deve igualmente prevalecer em tais domínios, em razão da matéria, ou melhor, da letalidade dos objectos em presença. Na realidade, a aferição relativa à finalidade de posse das armas, reduz-se, afinal, a uma questão meramente volitiva, passível de conhecer desvios e utilizações abusivas que importa ao máximo prevenir. Neste contexto, aconselhar-se-ia, no sentido genericamente pretendido pela presente proposta, vincular os diferentes Estados à obrigatoriedade de manifesto, licença ou outro procedimento administrativo de autorização de uso e porte de arma onde tenham participação as autoridades de segurança interna com competências de fiscalização e controlo.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Directiva 91/477/CEE do Conselho de 18 de Julho de 1991 relativa ao controlo da aquisição e da detenção de armas (J. O. L 256 de 13/09/1991, p. 51). O CESE, pela sua então Secção dos Assuntos Familiares, Educação e Cultura, e sendo relator o conselheiro VAN DAM, emitiu parecer em 17/12/1987 (J.O. C 35 de 08/02/1988, p. 5) em que se mostrou muito crítico quanto ao âmbito das medidas demasiado restritas adoptadas para o controlo da transferência de armas de um Estado-Membro para outro.

(2)  Decisão do Conselho de 16 de Outubro de 2001 (JO L 280 de 24.10.2001).

(3)  Ou seja, da política externa e de segurança comum.

(4)  A questão da traçabilidade das munições, não fazendo parte do âmbito específico da proposta da Comissão, já encontrou tratamento parcial, simultaneamente com o comércio e a supervisão dos explosivos para uso civil, na Directiva 93/15/CEE de 5 de Abril de 1993 (JO L 121 de 15/05/1993, p. 20, Parecer do CESE — JO C 313 de 30/11/1992, p. 13), alterada pelo Regulamento (CE) no 1882/2003 de 29 de Setembro de 2003 (JO L 284 de 31/10/2003, p. 1, Parecer do CESE — JO C 241 de 07/10/2002, p. 128) e na Directiva 2004/57/CE de 23 de Abril de 2004 (JO L 127 de 29/04/2004, p. 73), bem como na Decisão da Comissão 2004/388/CE de 15 de Abril de 2004 (JO L 120 de 24/04/2004, p. 43) e no programa constante da Comunicação da Comissão, de 15 de Julho de 2005, relativa às medidas com vista a assegurar uma maior segurança em matéria de explosivos, detonadores e armas de fogo.

(5)  Compreendida, por sua vez, no âmbito do programa da EU sobre o tráfico ilegal de armas convencionais de Junho de 1997.

(6)  Vide para os anos de 2001 a 2003 os JO, respectivamente, C 216, de 1 de Agosto de 2001, p. 1, C 330, de 31 de Dezembro de 2002, p. 1 e C 312, de 22 de Dezembro de 2003, p. 1.

(7)  Por força da Resolução n.o 53/111, de 9 de Dezembro de 1998, da Assembleia Geral da ONU.

(8)  Pela Resolução n.o 55/25, de 15 de Novembro de 2000.

(9)  Merecem, contudo, reflexão aprofundada os termos em que a Comissão se acha habilitada a regular matéria de natureza penal na emenda proposta ao artigo 16.o da directiva 91/477/CEE.

(10)  De que se destacam as perguntas escritas P-4193/97, da deputada Maria Berger (J.O. C/223/70 de 17.7.98), E- 1135/01, do deputado Christopher Huhne (J.O. C 350 E/78 de 11.12.2001) e E-1359/02 do deputado Gerhard Schmid (J.O. C 229 E/209 de 26.09.2002).

(11)  Cf. Decisão do Conselho de 15 de Novembro de 1999, relativa ao Camboja, in JO L 294 de 16.11.1999, p. 5.

(12)  Decisão-Quadro relativa à luta contra o terrorismo (Doc. COM(2001) 521 final de 19.09.2001) e Parecer do CESE 1171/2006.

(13)  Decisão-Quadro de 6 de Julho de 2001 in J.O. L 182 de 05.07.2001.

(14)  Directiva 93/15/CEE de 5 de Abril de 1993, in J.O. L 121 de 15.05.93, alterada pelo Regulamento CE 1882/2003 de 29.09.2003, in J.O. L 284 de 31.10.2003.

(15)  Por exemplo, em Portugal, a recente Lei n.o 5/2006, de 23 de Fevereiro, já incorpora todas as medidas ora propostas.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/86


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu relativa a uma estratégia temática sobre ambiente urbano»

COM(2005) 718 final — SEC(2006) 16

(2006/C 318/15)

Em 11 de Janeiro de 2006, a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, emitiu parecer em 11 de Julho de 2006 com base no projecto apresentado pelo relator Antonello PEZZINI.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 194 votos a favor, 2 votos contra e 6 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE está consciente de que para o crescimento sustentável e o relançamento da competitividade e da inovação tornou-se indispensável enfrentar os problemas complexos que caracterizam actualmente as cidades, como a degradação ambiental, o congestionamento do tráfego, os problemas de alojamento, a insegurança e a criminalidade, a crise em matéria de emprego e a reconversão da produção, as alterações demográficas, a exclusão social — em especial de jovens e idosos — e a segregação espacial e étnica.

1.2

A poluição atmosférica urbana é, desde há muito, uma emergência sanitária, caracterizada por custos sociais e de saúde altíssimos. A Organização Mundial da Saúde identificou a má qualidade do ar nas cidades como a causa primeira do aumento de várias doenças crónicas que oneram em muito quer os sistemas de saúde em termos de tratamentos e de hospitalizações, quer os resultados económicos em termos de dias de trabalho perdidos.

1.3

A prevenção da poluição tornou-se indispensável não só a nível da responsabilidade individual, sob a forma de uma limitação do uso dos veículos privados, mas também a nível colectivo, mediante novas políticas de mobilidade.

1.4

O CESE observa que as autoridades dos Estados-Membros devem deixar de reflectir, e recomenda-lhes, pelo contrário, que adoptem, seguindo as inúmeras indicações que provêm da Comissão, planos de intervenção concretos e imediatos no âmbito de uma abordagem integrada, participada e responsável por uma melhoria significativa, contínua e verificável da qualidade de vida e do ambiente.

1.5

O Comité está, igualmente, convicto de que a via escolhida pela Comissão de desenvolver uma estratégia integrada de desenvolvimento do ambiente urbano, fortemente alicerçada nos princípios da subsidiariedade e da proximidade, é uma abordagem que funciona, sobretudo se for concebida com uma metodologia participada e participativa, no quadro da Agenda renovada de Lisboa e de Gotemburgo.

1.5.1

Segundo o Comité, a União Europeia deve adoptar mecanismos de compensação que valorizem as melhores práticas adoptadas pelas autoridades nacionais, regionais e locais para desenvolver em concreto a referida estratégia segundo cada realidade de referência.

1.5.2

O Comité sublinha que, para serem competitivas, as cidades devem desenvolver serviços modernos eficazes e acessíveis em linha, sobretudo no domínio da saúde, dos serviços sociais e da administração pública, a fim de garantir uma maior coesão social e a inclusão dos jovens e dos idosos no âmbito da revalorização das relações entre os centros históricos e a periferia, entre as zonas ricas e pobres do espaço urbano e entre este último e as suas zonas interiores (hinterland).

1.6

Segundo o CESE, nesta matéria procura-se atingir — sobretudo no ambiente urbano — o modelo do «território socialmente responsável», ou seja, um território que orienta o seu desenvolvimento segundo os princípios do desenvolvimento sustentável, englobando na sua dinâmica a dimensão económica, social e ambiental, bem como as consequências socioeconómicas do envelhecimento da população.

1.7

Um território pode ser definido como «socialmente responsável» quando consegue conjugar níveis suficientes de bem-estar com os deveres que fazem parte da responsabilidade social.

1.7.1

A educação para os deveres, juntamente com os direitos, nasce de uma tomada de consciência informada no seio da família e vai crescendo durante os processos formativos, a partir da escola da primeira infância.

1.8

O actual programa-quadro de investigação e desenvolvimento (o «sexto») oferece, mediante o exercício da previsão, a possibilidade de associar os actores da sociedade civil a uma definição conjunta das melhores orientações a seguir para as escolhas, inspirando-se num modelo de futuro mais consciente da responsabilidade social territorial.

1.8.1

Nas propostas do sétimo programa-quadro de investigação e desenvolvimento, para além das actividades de previsão, prevê-se no âmbito da prioridade temática dedicada à saúde (1), uma actividade específica sobre o desenvolvimento humano e o envelhecimento, incluindo as interacções entre factores como o ambiente, os comportamentos individuais e as questões de género.

1.8.2

O Comité realça o papel fundamental que as escolas, os centros de educação e a universidade em geral desempenham para orientar os jovens e os cidadãos para o desenvolvimento sustentável.

1.8.3

Há inúmeras iniciativas a nível internacional que procuraram identificar um núcleo de princípios e de valores fundamentais a ter como referência quando se fala da responsabilidade social das empresas. As mais significativas de entre estas são as seguintes:

a Carta Europeia dos Direitos Fundamentais, artigo 37.o sobre a protecção do ambiente (2),

o Pacto Mundial (Global Compact) das Nações Unidas (3),

as directrizes da OCDE (4),

a Carta dos Valores da Empresa do Instituto Europeu para o Balanço Social — IEBS (5).

1.9

O Comité afirma expressamente que as acções destinadas a apoiar a aplicação concreta destes princípios e valores fundamentais devem ser consideradas como investimentos rentáveis para a valorização dos aspectos económicos, sociais e laborais do tecido urbano e das suas potencialidades de atracção e expressão.

1.10

O Comité apoia com vigor a criação de um «prémio europeu para a cidade verde», por forma a incentivar a melhoria dos esforços e dos comportamentos das autarquias e das entidades públicas e privadas que as compõem.

1.10.1

O Comité observa que é importante que o CESE seja a primeira entidade, em concertação com o Comité das Regiões, a dar o exemplo, examinando a possibilidade de lançar ele próprio um prémio anual da sociedade civil «Eurogreen City» e de acompanhar as melhores práticas de desenvolvimento sustentável urbano no âmbito do Observatório do Mercado Único (OMU).

2.   Justificação

2.1

A grande maioria da população europeia vive em zonas urbanas (6) onde a qualidade de vida enfrenta, com frequência, uma degradação dramática dos sistemas de mobilidade, bem como das condições ambientais, sociais e de acesso aos serviços de base, os quais carecem de grandes intervenções inovadoras, de uma utilização mais inteligente dos recursos e de comportamentos mais respeitadores do ambiente da parte das pessoas singulares e colectivas.

2.1.1

O CESE já teve, por diversas vezes, a oportunidade de focar este problema, salientando em particular que «As cidades, por várias razões, (…) são um concentrado de problemas ambientais de que os cidadãos estão plenamente conscientes, em particular no atinente à qualidade do ar, à poluição sonora e, especialmente nos países meridionais da União, aos recursos hídricos».

2.1.2

A problemática sobre a integração das questões ambientais no processo de desenvolvimento urbano inscreve-se no âmbito das prioridades delineadas no Sexto Programa de Acção em matéria de Ambiente (2002-2012) da União Europeia a favor do desenvolvimento sustentável em vários domínios prioritários, documento sobre o qual o Comité já se pronunciou em parecer.

2.1.3

Com efeito, o dito programa previa a elaboração e o lançamento de sete estratégias temáticas (7):

* poluição atmosférica,

* meio marinho,

* utilização sustentável dos recursos naturais,

* prevenção e reciclagem de resíduos,

protecção do solo,

utilização de pesticidas,

* ambiente urbano.

2.1.4

Destas sete estratégias temáticas, cinco foram formalizadas pela Comissão nos seguintes documentos: comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre uma Estratégia temática sobre a poluição atmosférica, adoptada pela Comissão em 21 de Setembro de 2005 (8); proposta de directiva sobre a estratégia para o meio marinho, lançada em 24 de Outubro de 2005 (9); proposta de directiva relativa aos resíduos (nova Estratégia Temática sobre a Prevenção e Reciclagem de Resíduos), adoptada em 21 de Dezembro de 2005 (10); proposta para uma Estratégia Temática sobre a Utilização Sustentável dos Recursos Naturais, apresentada em 21 de Dezembro de 2005 (11); a última proposta em matéria de ambiente urbano, objecto do presente parecer, foi apresentada em 11 de Janeiro de 2006.

2.1.5

Há uma clara interacção entre o proposto nas quatro estratégias temáticas apresentadas previamente e a estratégia objecto do presente parecer. No âmbito do ambiente urbano, concentram-se e interagem intimamente:

as medidas de combate à poluição atmosférica;

as medidas de prevenção e reciclagem de resíduos;

as iniciativas para limitar as emissões de gases com efeito de estufa produzidas pelos combustíveis fósseis utilizados nos transportes urbanos e nos sistemas de aquecimento e de refrigeração urbanos;

a protecção dos aquíferos e dos recursos naturais da fauna e da flora dos parques urbanos;

a protecção do meio marinho (no caso dos portos e das cidades costeiras).

2.1.6

São ainda relevantes para uma estratégia temática sobre ambiente urbano, as medidas de combate à poluição sonora, no âmbito das quais já foi lançado, em 2002 (12), um plano de acção para as grandes aglomerações, bem como a recente proposta de directiva relativa à promoção de veículos de transporte rodoviário não poluentes (em particular as propostas sobre os contratos públicos) (13).

2.1.6.1

Em estreita ligação com a proposta de estratégia em apreço estão igualmente:

as intervenções comunitárias de política ambiental para gestão urbana previstas no Programa LIFE-PLUS;

as intervenções comunitárias de política regional e de coesão referentes ao FSE, ao FEDER e ao Fundo de Coesão, bem como as iniciativas comunitárias URBAN II, EQUAL, Interreg;

as intervenções comunitárias no domínio da utilização racional de energia, da poupança de energia e da eficiência energética, no âmbito do Programa Energia Inteligente e, no futuro, do Programa-quadro sobre a Competitividade e a Inovação;

as intervenções no domínio da investigação e do desenvolvimento comunitários previstas por programas específicos do Programa-quadro plurianual de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico da Comissão atinentes, em particular, ao ambiente e à saúde pública, aos transportes e energia, à sociedade da informação ao serviço de uma melhor qualidade de vida, ao desenvolvimento da ciência a ao crescimento da cultura na sociedade, aos novos materiais e à nanotecnologia, à radionavegação e ao desenvolvimento de satélites com o Galileu, o GEO (Group on Earth Observations — Grupo sobre Observação da Terra) e o GMES (Global Monitoring for Environment and Security  (14));

as intervenções para conservação do património arquitectónico, monumental e cultural urbano previstas nos programas comunitários Minerva, LIFE/Ricama (regulamentação e gestão integradas do litoral), Cultura 2000, MEDIA PLUS e Contentplus;

as intervenções comunitárias previstas para os países da bacia do Mediterrâneo e dos Balcãs (MEDA), bem como para os países da Comunidade dos Estados Independentes — CEI (Tacis), que serão objecto, no futuro, de um novo instrumento de proximidade;

as intervenções comunitárias previstas para a política comunitária de cooperação para o desenvolvimento em várias regiões: ACP, América Latina (Mercocidades) e Ásia, bem como para a política comercial da UE (EU Trade Sustainability Impact Assessment — SIA — Avaliação de Impacto no Desenvolvimento Sustentável do Comércio da UE).

2.1.7

Os resultados da consulta realizada pela Comissão sobre a sua comunicação intercalar de 2004 (15) trouxeram um grande contributo para a concepção da estratégia temática sobre ambiente urbano, assim como uma primeira análise de possíveis estratégias na matéria, as iniciativas voluntárias da Agenda 21, a Carta de Aalborg (16), as conclusões do Conselho de 14 de Outubro de 2004 sobre a pertinência deste tema e a importância de actuar a todos os níveis e, por fim, as conclusões de Bristol elaboradas durante a Presidência britânica (17).

2.1.8

A Comissão elaborou igualmente um documento de trabalho, apenso à comunicação objecto do presente parecer, que consiste numa avaliação de impacto de diversos cenários possíveis de aplicação da estratégia e dos seus custos.

2.1.9

Em 2005, o Parlamento Europeu reconheceu, num relatório sobre a dimensão urbana no contexto do alargamento (18), que as cidades e as aglomerações ou zonas urbanas que congregam 78 % da população da União Europeia representam um lugar onde se concentram os problemas simultaneamente mais complexos e mais correntes, mas também um lugar onde se constrói o futuro e se aprofundam e consolidam todas as formas de conhecimento. Assim, as cidades «têm um papel central a desempenhar na realização dos objectivos revistos de Lisboa e de Gotemburgo». O Parlamento convidou a Comissão a criar e propor «modelos e instrumentos de desenvolvimento urbano sustentável, acessíveis a todas as cidades e aglomerações ou zonas urbanas».

2.1.10

O CESE observa que os decisores políticos, juntamente com os parceiros sociais e, em geral, com toda a sociedade civil, devem alcançar o objectivo de um ambiente urbano que atinja um alto rendimento social através de políticas orientadas para a formação.

2.2   Proposta da Comissão

2.2.1

A proposta da Comissão toma nota de que «A diversidade das condições históricas, geográficas, climáticas, administrativas e legais exige soluções elaboradas a nível local, adequadas ao ambiente urbano» e que «A aplicação do princípio da subsidiariedade, em cujo âmbito as acções são adoptadas à escala mais eficaz, implica também a adopção de iniciativas a nível local». «Atendendo à diversidade das zonas urbanas e das obrigações nacionais, regionais e locais em aplicação, bem como às dificuldades associadas ao estabelecimento de normas comuns, foi decidido que a legislação não constitui a melhor via para atingir os objectivos da presente estratégia»; esta ideia foi confirmada pela maioria dos Estados-Membros e das próprias autoridades locais.

2.2.2

A estratégia temática proposta articula-se da seguinte forma:

orientação em matéria de gestão ambiental integrada;

orientação em matéria de planos de transporte urbano sustentável elaborados pelas autoridades locais com o apoio de orientações técnicas sobre os principais aspectos dos planos de transporte, com exemplos das melhores práticas, que serão publicados pela Comissão em 2006;

acções comunitárias de apoio ao intercâmbio das melhores práticas na UE;

portal Internet da Comissão destinado às autoridades locais para permitir um acesso mais fácil a todos os documentos publicados em numerosos sítios para as autoridades locais, em conformidade com o plano de acção para o melhoramento da comunicação sobre a Europa;

formação para permitir a aquisição de competências específicas necessárias a uma abordagem integrada da gestão, incluindo mediante programas de intercâmbio para os funcionários das autoridades locais e iniciativas do FSE para reforçar a eficiência das administrações públicas a nível regional e local (19);

recurso a outras políticas comunitárias, nomeadamente a política de coesão (20) e a política de investigação (21).

2.2.3

Dado o seu carácter transversal, a proposta da Comissão deve ser lida em conjunção com as outras estratégias temáticas propostas, em particular com a estratégia sobre a poluição atmosférica, as estratégias relativas aos resíduos sólidos urbanos, a estratégia para proteger as cidades costeiras da poluição marinha e a estratégia para protecção do solo.

2.2.4

Seria ainda oportuno se a Comissão apresentasse um texto consolidado das disposições normativas relevantes para o desenvolvimento sustentável das cidades e das aglomerações urbanas, bem como dos vários programas comunitários susceptíveis de serem utilizados no domínio do ambiente urbano e, por fim, directrizes de orientação estratégica que, em vários domínios, presidem ao desenvolvimento urbano.

2.3   Observações

2.3.1

O Comité acolhe favoravelmente a comunicação da Comissão na medida em que esta foca um problema de grande pertinência para os cidadãos europeus, para a qualidade de vida nas suas cidades e zonas urbanas, bem como para o papel fundamental que estas últimas têm enquanto criadoras de riqueza e de desenvolvimento económico, social e cultural.

2.3.2

Há que focar as condições prévias da acção estratégica, como estabelecidas no Acordo de Bristol de Dezembro de 2005 (22), que determina como pré-requisitos da criação de comunidades sustentáveis na Europa:

o crescimento económico sem o qual não há capacidade para investir na criação e na manutenção das comunidades sustentáveis;

a capacidade de uma abordagem integrada que garanta um equilíbrio entre o desenvolvimento sustentável e os desafios económicos, sociais e ambientais e de inclusão e justiça social;

uma forte identidade cultural para fazer das cidades centros de excelência internacional na óptica da Agenda de Lisboa;

a capacidade de responder aos desafios da segregação social;

o reconhecimento de que as comunidades sustentáveis podem existir em diversos níveis: local, urbano, regional.

2.3.3

O Comité refere que, em conformidade com o princípio comunitário «legislar menos, legislar melhor», seria oportuno basear-se em:

métodos de coordenação voluntária, combinando a nova abordagem de gestão urbana integrada com os conteúdos das directivas ambientais (água, ar, ruído, resíduos, emissões gasosas, alterações climáticas, natureza e biodiversidade) e com as outras estratégias temáticas referidas no sexto programa de acção 2002-2012;

sistemas de previsão do desenvolvimento do ambiente urbano com a participação de todas as entidades económicas e sociais interessadas, das partes interessadas e dos grupos de utentes finais, incluindo os mais precários e marginalizados, os quais seriam objecto das livres escolhas dos decisores locais e seriam representativos de resultados que possibilitariam elaborar indicadores comuns, a nível europeu, para o acompanhamento e a avaliação de desempenhos;

uma intensificação da cooperação entre os vários níveis de governo (local, regional e nacional) e entre os diversos serviços das administrações locais, incluindo no domínio da protecção da segurança dos cidadãos e das actividades económicas face ao fenómeno da criminalidade e da microcriminalidade urbana;

intervenções concretas que dão resposta aos problemas suscitados pelo envelhecimento da população urbana, nomeadamente através da comparação das experiências de várias cidades europeias;

apoio comunitário às acções de desenvolvimento das capacidades das administrações locais e das organizações dos actores económicos e sociais da sociedade civil presentes no território;

apoio comunitário à formação técnica, ao intercâmbio de boas práticas e ao intercâmbio de funcionários e de peritos entre as administrações locais dos diversos Estados-Membros;

recurso à constituição de parcerias público/privadas, em especial para gestão dos programas integrados de desenvolvimento económico e promoção de actividades económicas ecológicas na concepção urbana sustentável e na recuperação de zonas degradadas ou abandonadas, bem como na revitalização socioeconómica sustentável das pequenas e médias cidades ou de bairros em crise nas grandes cidades (23);

coordenação e coerência das instruções entre os serviços da Comissão responsáveis pelas políticas e programas focalizados em diversos aspectos económicos, sociais e ambientais referentes ao desenvolvimento urbano, mediante a criação de um ponto central interserviços bem identificado e identificável pelos vários interlocutores externos;

apoio comunitário aos estudos de viabilidade para garantir uma visão clara e objectiva dos custos de preparação, adopção, aplicação, certificação, controlo e monitorização, avaliação de qualidade e revisão dos planos integrados de gestão ambiental, dos planos de transporte urbano sustentável, bem como dos sistemas de gestão ambiental (24) para as diversas tipologias e características das cidades e aglomerações urbanas;

reforço do apoio comunitário a projectos concretos de desenvolvimento, para além das redes de cidades europeias e extra-europeias como o European Urban Knowledge Network, Eurocities, Mercocidades, Civitas-Mobilis, Urbact;

desenvolvimento do potencial tecnológico da sociedade da informação, da administração em linha (e-Government), da aprendizagem em linha (e-learning) e do teletrabalho para servir o desenvolvimento do ambiente urbano;

desenvolvimento de currículos formativos a utilizar pelas escolas e pelos centros de formação em vários níveis, por forma a aumentar a responsabilidade dos cidadãos em matéria ambiental e criar «trabalhadores do conhecimento»;

sistemas de avaliação de impacto susceptíveis de fornecer análises harmonizadas dos progressos, tanto no âmbito das dinâmicas ambientais, como das económicas, sociais, culturais e tecnológicas, das cidades europeias. Neste contexto, afigura-se útil prever a criação de guias comuns de avaliação de impacto do género do EU Draft Handbook for Sustainability Impact Assessment (projecto de guia comunitário para a avaliação de impacto no desenvolvimento sustentável).

2.3.4

O Comité dá muita importância ao processo que pode levar um território, e uma cidade em particular, a ser designado como «território socialmente responsável  (25)», o que pode acontecer se o território ou cidade em questão conseguir integrar:

considerações sociais e ambientais nas decisões económicas;

modelos de valores integrados numa metodologia participativa nos processos de decisão para o relançamento da competitividade, incluindo através da iniciativa comunitária Jessica (26);

boas práticas e o confronto contínuo entre as partes interessadas para aumentar a inovação e a competitividade;

o bem-estar «justo» em relação à responsabilidade em matéria de ambiente e saúde;

uma visão sensível e participada da classe política sobre o desenvolvimento urbano sustentável.

2.3.4.1

O Comité está convencido de que o desenvolvimento social e cultural do ambiente urbano tem uma importância primordial, atenta igualmente a evolução demográfica da população e dos fluxos migratórios.

2.3.4.2

O Comité está, igualmente, convicto de que na base de uma estratégia eficaz de desenvolvimento sustentável das cidades está o combate à pobreza económica, social e cultural, à degradação física e ao stress mental dos indivíduos, à exclusão social, bem como à marginalização das camadas mais frágeis da população urbana, na perspectiva de uma inclusão social mais eficaz dos diversos grupos étnicos e culturais.

2.3.5

O processo deverá decorrer em fases bem definidas, incluindo:

a identificação dos valores comuns da comunidade local ou regional;

a identificação dos recursos e das necessidades;

a definição dos objectivos de melhoramento e dos critérios de avaliação comuns;

a elaboração de um plano operacional e de identificação dos instrumentos;

a gestão e o controlo, da base para o topo, dos projectos de «território socialmente responsável»;

Uma acção intensiva de sensibilização e formação permanente para o desenvolvimento de uma cultura do território.

2.3.5.1

Alguns instrumentos foram já identificados pelas autarquias locais. A título de exemplo podem citar-se os seguintes:

a utilização de mini-autocarros eléctricos como alternativa aos automóveis privados nos centros urbanos (Salzburg),

a utilização de autocarros a biocombustíveis (Bolonha),

o recurso a bicicletas de «pedalada assistida» (27), muito importantes para os idosos e em geral para os habitantes de cidades com relevo pouco acidentado (Ferrara, Milão),

o desenvolvimento de metropolitanos ligeiros que liguem os aeroportos e os centros intermodais ao centro das cidades,

a elaboração de planos locais de ordenamento urbano com vista a promover a renovação da cidade e preservar a sua qualidade arquitectónica e ambiental, seguindo o modelo exemplar de Versalhes (28).

2.3.5.2

O CESE apoia a proposta da Comissão de fomentar a difusão de veículos limpos no transporte rodoviário e de tributar os veículos com base não na cilindrada, mas sim na difusão de CO2.

2.3.6

O CESE considera que há que reforçar as acções de sensibilização para estas questões a todos os níveis, mas sobretudo a nível local, para que os cidadãos e as empresas correspondam com empenho e responsabilidade, e mesmo pró-activamente, ao trabalho efectuado nos últimos anos em matéria de desenvolvimento sustentável e de responsabilidade social das empresas por organismos internacionais como a Comissão Europeia, a ONU, a OCDE ou o Instituto Europeu para o Equilíbrio Social.

2.3.6.1

As acções a adoptar concentrar-se-ão na investigação e na inovação, no apoio à renovação das implantações, na formação, na difusão dos sistemas de gestão ambiental e nos controlos.

2.3.6.2

Os instrumentos mais adequados, para além da informação e da difusão de uma cultura da responsabilidade, são as normas ISO 14001, EMAS (29), GHG (30), os incentivos fiscais e financeiros à consecução dos objectivos, a simplificação dos procedimentos e a isenção de obrigações ambientais para os detentores de certificados.

2.3.6.3

O Comité considera útil a criação de um «prémio europeu para a cidade verde», por forma a incentivar a melhoria dos esforços e dos comportamentos das autarquias e das entidades públicas e privadas que as compõem e a desenvolver uma abordagem integrada e comportamentos consentâneos.

2.3.6.4

O Comité observa que é importante que o CESE seja a primeira entidade, em concertação com o Comité das Regiões, a dar o exemplo, examinando a possibilidade de lançar ele próprio um prémio anual da sociedade civil «Eurogreen City», de contribuir para o controlo dos progressos registados pelo ORATE/ESPON (31), de identificar os entraves e de acompanhar as melhores práticas de desenvolvimento sustentável urbano no âmbito do Observatório do Mercado Único (OMU).

2.3.7

No entender do CESE, uma estratégia eficaz de desenvolvimento urbano depende antes de mais da criação de sistemas de governação eficazes que permitam uma gestão integrada de situações complexas, tendo em consideração:

a diversidade dos níveis territoriais de intervenção e de decisão,

a multiplicidade de centros de decisão, com especifidades e prioridades próprias,

um calendário bem definido com objectivos a breve, médio e longo prazo.

2.3.8

O CESE entende que a melhoria da governação integrada do território socialmente responsável deve passar pelos seguintes elementos:

melhoria do processo de consulta na Comissão,

envolvimento na formulação das propostas de acção de todas as partes interessadas na sustentabilidade socioeconómica e ambiental da cidade,

um diálogo constante e estruturado com a sociedade civil que permita a difusão em toda a transparência das informações sobre riscos ambientais, sobre as opções tecnológicas limpas e sobre a necessidade de tornar a cidade mais atraente,

uma visão comum das perspectivas a médio prazo através de análises prospectivas que envolvam os centros de decisão públicos e privados,

o recurso a mecanismos de avaliação de impacto baseados em critérios e indicadores previamente definidos a nível comunitário e adequados a uma abordagem territorial integrada,

a análise das melhores práticas, sobretudo em matéria de inclusão social, segurança e coexistência cívica,

reforço da educação escolar sobre a protecção ambiental e da formação não escolar para a população adulta e idosa,

um esforço conjunto para desenvolver, nomeadamente com o apoio das iniciativas comunitárias JEREMIE e JESSICA, o enquadramento financeiro no sentido de promover o crescimento, o emprego e a integração social nas cidades, através dos fundos estruturais e de coesão, do BEI, do FEI e das PPP (parcerias público-privadas),

medidas de incentivo e sistemas de certificação que recompensem os esforços voluntários das entidades públicas e privadas para o desenvolvimento de um ambiente urbano sustentável e competitivo.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 65/02/2006, ponto 5.2.2 (relatora: HEINISCH) e JO C 65 de 2006 (relatores: WOLF e PEZZINI).

(2)  Artigo 37.o Protecção do Ambiente : «Todas as políticas da União devem integrar um elevado nível de protecção do ambiente e a melhoria da sua qualidade, e assegurá-los de acordo com o princípio do desenvolvimento sustentável.».

(3)  «Optamos por unir o poder dos mercados com a autoridade dos ideais universais. Escolhemos reconciliar a força criativa da iniciativa privada com as necessidades dos mais desfavorecidos e com as exigências das gerações futuras», anunciou o Secretário-Geral das Nações Unidas, Kofi Annan, no Fórum Económico Mundial de Davos, Suíça, em Janeiro de 1999, oficialmente apresentado às Nações Unidas em Julho de 2000. O Pacto Mundial convida as empresas a aderirem a novos princípios universais nas áreas dos direitos humanos, das condições de trabalho e do ambiente. http://www.unglobalcompact.org/index.html.

(4)  As directrizes da OCDE foram publicadas em Junho de 2000 e destinam-se às empresas multinacionais http://www.icep.pt/empresas/TextoIntegralv1.pdf (em português).

(5)  O IEBS elaborou a «Carta dos valores da empresa» (cf. anexo II).

(6)  Com mais de 50 000 habitantes.

(7)  Indicadas com um asterisco estão as estratégias que já foram objecto de directivas.

(8)  COM(2005) 446 final.

(9)  COM(2005) 505 final.

(10)  COM(2005) 667 final.

(11)  COM(2005) 670 final.

(12)  Directiva 2002/49/CE.

(13)  COM(2005) 634 final.

(14)  Monitorização Global do Ambiente e da Segurança — GMES.

(15)  COM(2004) 60 — «Para uma Estratégia Temática sobre Ambiente Urbano».

(16)  www.aalborgplus10.dk

(17)  Acordo de Bristol de Dezembro de 2005, www.odpm.gov.uk cod. prod. 05 EUPMI 03584. O Acordo de Bristol distingue oito características de base da comunidade sustentável: 1) activa, inclusiva e segura; 2) bem governada; 3) com boas ligações; 4) bem servida; 5) atenta ao ambiente; 6) atraente; 7) bem estruturada e edificada; 8) atraente para todos.

(18)  PE– A6-0272/2005 de 21 de Setembro de 2005 http://www.europarl.europa.eu/omk/sipade3?PUBREF=-//EP//NONSGML+REPORT+A6-2005-0272+0+DOC+PDF+V0//PT&L=PT&LEVEL=1&NAV=S&LSTDOC=Y.

(19)  O Fundo Social Europeu (COM(2004) 493) pode apoiar a formação das administrações públicas a vários níveis. É igualmente importante, neste domínio, o papel do novo Programa Life+.

(20)  COM(2004) 494 e 495.

(21)  COM (2005) 1.

(22)  Cfr. nota 18.

(23)  É de salientar, neste domínio, a contribuição do Banco Europeu de Investimento (BEI).

(24)  Ver o anexo F do documento de trabalho da Comissão SEC(2006) 16 (não há versão portuguesa).

(25)  Neste domínio, ver o documento do Conselho Reapreciação da Estratégia da UE para o Desenvolvimento Sustentável (EDS) — Nova estratégia; doc. n.o 10117/06 de 9.6.2006, pontos 29 e 30. http://register.consilium.europa.eu/pdf/pt/06/st10/st10117.pt06.pdf.

(26)  O programa Jessica (Joint European Support for Sustainable Investment in City Areas — Apoio comunitário conjunto para um investimento sustentável nas zonas urbanas) procura dar solução a problemas de financiamento de projectos de redistribuição e desenvolvimento urbano, bem como a projectos de alojamento social, graças a uma combinação de subvenções e empréstimos.

(27)  Com motor eléctrico.

(28)  O grupo de estudo, presidido por MENDOZA CASTRO, teve a ocasião de verificar no local, a convite do conselheiro BUFFETAUT, vice-presidente da câmara municipal, a concepção, a articulação e o desenvolvimento do plano local de desenvolvimento urbano (PLU) de Versalhes, no âmbito da realização da Agenda 21, aprovada pela assembleia municipal em 2003 (cf. Anexo 3).

(29)  EMAS, Regulamento n.o 1836/93, alterado pelo Regulamento n.o 761/2001.

(30)  As novas normas ISSO 14064: uma nova norma sobre o gás com efeito de estufa (GHG) e Directiva 2003/87/CE.

(31)  ORATE (Observatoire en réseau de l'aménagement du territoire éuropéen) / ESPON (European Spatial Planning Observation Network).


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/93


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Perspectivas de futuro da agricultura nas zonas com desvantagens particulares de carácter natural (regiões de montanha, insulares e ultraperiféricas)»

(2006/C 318/16)

Em 19 de Janeiro de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um sobre: «Perspectivas de futuro da agricultura nas zonas com desvantagens particulares de carácter natural (regiões de montanha, insulares e ultraperiféricas)».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, que emitiu parecer em 11 de Julho de 2006, sendo co-relatores BROS e CABALL i SUBIRANA.

Na 429a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 173 votos a favor, 6 votos contra e 16 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE considera que é necessário o reconhecimento público e político da existência de zonas com desvantagens particulares de carácter natural (regiões de montanha, ultraperiféricas e, em especial, insulares), para que se possam definir políticas específicas e coerentes com as necessidades reais dessas regiões.

1.2

Estando em negociação entre as regiões ou os Estados-Membros e a Comissão Europeia os programas de desenvolvimento rural e os programas regionais para a competitividade, o Comité Económico e Social Europeu entendeu dever sublinhar a importância e as necessidades da agricultura nas zonas com desvantagens particulares de carácter natural (regiões de montanha, insulares e ultraperiféricas).

1.3

Constatando estas desvantagens, o Comité insta a Comissão Europeia a propor políticas verdadeiramente específicas em favor destas zonas, de forma a coordenar as diferentes políticas que se lhes aplicam e a desenvolver sinergias entre as acções existentes.

1.4

Embora o segundo pilar da PAC, o desenvolvimento rural, seja indispensável e constitua, portanto, uma prioridade política fundamental, é forçoso constatar que foi uma das principais variáveis de ajustamento que permitiram chegar a um acordo sobre as Perspectivas Financeiras. Face a estas reduções de meios orçamentais, o Comité insta a Comissão e o Conselho a concentrarem as dotações do desenvolvimento rural prioritariamente nas zonas mais frágeis e mais necessitadas, isto é, nas zonas com desvantagens permanentes de carácter natural.

1.5

Na elaboração dos programas de desenvolvimento rural e dos programas regionais dos fundos estruturais, o Comité solicita à Comissão e aos Estados-Membros que assegurem a complementaridade e a coerência destes programas nas zonas com desvantagens de carácter natural.

1.6

O CESE propõe que, a exemplo das plataformas já existentes nas regiões de montanha, como a Plataforma EUROMONTANA, destinadas a promover e melhorar a existência destas regiões, deveria incentivar-se o mesmo tipo de cooperação nas regiões insulares e ultraperiféricas, sobretudo em torno de temas de política agrícola, com a participação activa da sociedade civil.

1.7

Dada a fragilidade e a importância da agricultura nestas regiões, o CESE considera da maior importância a criação de um observatório europeu para estas regiões (de montanha, insulares e ultraperiféricas). Trata-se de desenvolver uma visão europeia da agricultura nestas regiões, que funcione como ponto de referência para o acompanhamento, análise e divulgação da situação da agricultura nestas zonas e como ponto de encontro, reflexão e diálogo entre as administrações, a sociedade civil e os diversos organismos europeus e que apresente iniciativas europeias para a preservação e desenvolvimento da agricultura nestas regiões.

1.8

O CESE gostaria, porém, de salientar que para além das regiões montanhosas, insulares e ultraperiféricas referidas no presente parecer, há muitas outras zonas rurais com problemas comparáveis para o exercício de uma actividade agrícola, designadamente a localização das explorações, os custos de produção e as condições climatéricas. É esse o caso, por exemplo, das «regiões especialmente desfavorecidas» e das «zonas com desvantagens específicas». O CESE examinará essas regiões num futuro parecer.

1.9

A delimitação das demais regiões desfavorecidas deve também ser efectuada essencialmente em função de desvantagens objectivas na utilização agrícola. Mas há também de ter devidamente em conta as características específicas regionais.

2.   Justificação

2.1

Antecedentes do parecer:

Parecer do CESE sobre «Futuro das regiões de montanha na União Europeia» (1).

Parecer do CESE sobre o desenvolvimento rural (2).

Resolução do Parlamento Europeu de 6 de Setembro de 2001 sobre «25 anos de aplicação da legislação comunitária a favor da agricultura nas regiões de montanha» (3).

Parecer do CESE sobre as regiões ultraperiféricas (4).

Parecer do CESE sobre a estratégia para as regiões ultraperiféricas (5).

Parecer do CESE sobre «Os problemas da agricultura nas regiões e ilhas ultraperiféricas da União Europeia» (6).

3.   Parte comum: as zonas com desvantagens permanentes de carácter natural

3.1

Os regulamentos relativos ao desenvolvimento rural e às políticas regionais já foram adoptados. As repartições financeiras foram difíceis, por causa dos montantes reduzidos afectados a estas políticas. O acordo sobre as Perspectivas Financeiras 2007-2013 conduz a uma redução dos montantes atribuídos ao desenvolvimento rural nos Estados-Membros mais antigos e a uma maior dispersão dos fundos da política regional.

3.2

Desde há muitos anos que há zonas de montanha e ultraperiféricas, com desvantagens permanentes de carácter natural, reconhecidas ao nível da Política Agrícola Comum e da política regional, enquanto as regiões insulares não beneficiam desse reconhecimento.

3.2.1

As zonas de montanha são importantes no contexto europeu: cobrem um terço do território e nelas vivem cerca de 18 % da população da União Europeia de 25 Estados-Membros. A adesão da Roménia e da Bulgária trará para a União Europeia vastas zonas de montanha. As zonas de montanha europeias são extremamente variadas, quer pelas características físicas, como a topografia e o clima, quer pelas características socioeconómicas, como a demografia, a acessibilidade e as ligações com as zonas vizinhas. Diferem em termos de utilização das terras, do papel da agricultura, de coesão social e, o que é mais importante, do seu grau de desenvolvimento económico.

3.2.2

O EUROSTAT utiliza os seguintes cinco critérios para definir uma região insular: a sua superfície deve ser, no mínimo, de 1 km2; a distância entre a ilha e o continente deve ser de, pelo menos, 1 km; a sua população residente, com carácter permanente, deve ser de, pelo menos, 50 habitantes; não deve existir ligação física permanente entre o continente e a ilha e não pode situar-se na ilha a capital de um Estado-Membro.

3.2.3

Uma ilha em que se situe a capital de um Estado-Membro está excluída da definição do EUROSTAT. Com efeito, antes do alargamento, ficavam excluídas a Grã-Bretanha e a Irlanda; no entanto, duas ilhas relativamente pequenas, Chipre e Malta são, desde Maio de 2004, Estados-Membros da UE. O CESE sugere que se reconsidere a definição, a fim de que nela se possam incluir estes dois Estados-Membros. Este facto já foi reconhecido pela UE na sua proposta relativa aos novos fundos estruturais e Fundo de Coesão, assim como no Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa, o qual inclui uma consideração a este respeito.

3.2.4

As regiões ultraperiféricas, a saber, os departamentos ultramarinos franceses, os Açores, a Madeira e as Ilhas Canárias, fazem parte de pleno direito da UE, embora sejam caracterizadas por uma realidade singular. Trata-se de regiões que partilham uma realidade similar, caracterizada por um conjunto de factores geográficos, físicos e históricos que determinam, em grande parte, o seu desenvolvimento económico e social.

3.2.5

Outras zonas específicas menos vastas, como as zonas periurbanas (7), as zonas húmidas, os polders, etc., podem enfrentar desvantagens particulares, que deverão ser objecto de atenção especial num quadro mais desconcentrado de aplicação das políticas europeias. O Comité poderá abordar estas questões num futuro parecer.

3.3

Estas zonas são afectadas por desvantagens permanentes de carácter natural, como o isolamento, que gera custos adicionais de comercialização, de aprovisionamento e de serviços, assim como dificuldades de acesso aos mercados. Além disso, os custos das infra-estruturas, dos transportes e da energia são mais elevados.

3.4

Por esse motivo se torna especialmente importante assegurar a presença da actividade agrícola nestas zonas com desvantagens para o desenvolvimento económico, a vida social, o património cultural (percentagem elevada de população agrícola), o equilíbrio territorial e o ambiente.

3.5

As alterações recentes da PAC são numerosas e profundas e afectarão necessariamente o desenvolvimento sustentável dos territórios europeus e, em especial, as zonas com desvantagens particulares de carácter natural, nomeadamente devido ao enfraquecimento do segundo pilar no que respeita aos Estados-Membros mais antigos. Pode ver-se nestas alterações uma dupla tendência: por um lado, uma resposta europeia às negociações da OMC (Organização Mundial do Comércio) e uma busca de competitividade nos mercados internacionais e, por outro lado, uma tendência para o reforço, desejável mas não real, das ajudas para a protecção do ambiente, para o bem-estar animal e para o meio rural.

3.6

A reforma da PAC de 2003 tem por objectivo teórico melhorar a competitividade e orientar a produção agrícola em função dos mercados. Ora, só por si, as forças do mercado conduziriam ao desaparecimento da agricultura nas zonas em desvantagem. É necessário, portanto, conduzir uma política voluntarista para manter a actividade agrícola nestas zonas difíceis.

3.7

O impacto da reforma do «primeiro pilar», adoptada em 29 de Setembro de 2003, com a dissociação, a condicionalidade e a modulação, é difícil de avaliar, porquanto os Estados e as regiões intervieram nas opções estratégicas de forma diferente. Porém, afigura-se que a reforma implica riscos de abandono e/ou de deslocalização das produções (uma vez que a produção não é obrigatória para receber ajudas directas), por exemplo, em matéria de produção animal e de transformação dos produtos animais.

3.8

Num momento em que a Comissão negoceia com as regiões europeias e os Estados-Membros os programas de desenvolvimento rural e de política regional, é indispensável que os territórios com desvantagens permanentes de carácter natural sejam objecto de uma atenção muito especial, com vista a assegurar a coesão territorial, necessária ao sucesso da Estratégia de Lisboa. Nesta perspectiva, orientar as políticas públicas unicamente por estratégias de competitividade seria contraditório com os objectivos pretendidos. No entanto, é neste sentido que alguns países da União parecem querer avançar.

3.9

A agricultura deve continuar a ser uma actividade económica baseada na vontade empreendedora dos agricultores. Não se trata de transformar as zonas com desvantagens em reservas de práticas agrícolas ultrapassadas, nem em zonas com fins dominante ou exclusivamente ambientais. O sector agrícola soube desenvolver-se e modernizar-se de forma a corresponder às expectativas dos consumidores e dos cidadãos. Esta dinâmica deve ser mantida de maneira a valorizar as capacidades de inovação e de empreendimento dos agricultores. A agricultura das zonas com desvantagens deve continuar nesta via e permitir o desenvolvimento de um sector agro-alimentar com base na sua produção, a fim de assegurar a vitalidade económica destas zonas. Os auxílios estatais com finalidade regional devem dar um contributo especial para este fim.

4.   Regiões de montanha

4.1

Introdução: as características específicas da agricultura de montanha e os desafios do desenvolvimento rural.

4.1.1

A agricultura de montanha na Europa apresenta características particulares. Embora as zonas de montanha não sejam uniformes na Europa, nem de um ponto de vista ambiental, das características do solo e do clima nem do ponto de vista económico e social, elas têm em comum restrições (ou desvantagens) no exercício agrícola, devido aos declives, aos relevos acidentados e aos climas quase sempre desfavoráveis. Estas restrições limitam as opções de produção às pastagens e às produções animais. Tornam a agricultura menos facilmente adaptável às condições de concorrência e geram custos suplementares que não lhe permitem obter produtos muito competitivos a baixo preço. Em contrapartida, esta agricultura tem numerosas vantagens para o desenvolvimento sustentável das regiões de montanha.

4.1.2

Os desafios do desenvolvimento rural na montanha estão ligados, essencialmente, à escassez de terras aráveis, à concorrência de outras actividades como a exploração florestal ou a urbanização, ao declínio da agricultura, à sensibilidade das paisagens, ao desenvolvimento do turismo, à acessibilidade (ou ao isolamento), aos serviços de interesse geral, à gestão da água e dos recursos naturais e, em especial, à preservação da biodiversidade. Estão igualmente ligados, por último, à segurança das pessoas e bens, graças aos papéis positivos desempenhados pela agricultura e pela floresta em matéria de luta contra os riscos naturais, como os desprendimentos de terras, as cheias torrenciais, as avalanches e os incêndios.

4.2   A necessidade de uma definição harmonizada na União Europeia

Recordando a posição do parecer do CESE sobre «Futuro das regiões de montanha na União Europeia»  (8):

Constatam-se assim importantes disparidades [na zonagem das montanhas] entre os Estados-Membros. Se bem que se mantenha uma certa subsidiariedade na designação final dos territórios envolvidos, seria conveniente uma harmonização da realidade da montanha europeia, através da consequente adaptação da actual definição comunitária mediante um intervalo de variação para cada um dos [três] critérios [declive, altitude, clima].

4.2.1

No seguimento do relatório do Tribunal de Contas Europeu, o estudo encomendado pela Comissão Europeia intitulado «Zones de montagne en Europe: analyse des régions de montagne dans les États membres actuels, les nouveaux États membres et d'autres pays européens» («Zonas de montanha na Europa: análise das regiões de montanha nos actuais Estados Membros, nos novos Estados Membros e noutros países europeus»), que foi publicado em Janeiro de 2004 na Internet, no endereço http://europa.eu.int/comm/regional_policy/sources/docgener/studies/study_fr.htm, dá à Comissão os meios para chegar a uma definição harmonizada da região de montanha.

4.3   A União Europeia deve ter uma política específica em favor das zonas de montanha

4.3.1

A agricultura de montanha tem efeitos insubstituíveis sobre o ambiente e o território. Do ponto de vista da economia local, do ambiente e do conjunto da sociedade, os agricultores desempenham um papel positivo.

Isto deve-se aos «factores externos positivos» ou ao carácter «multifuncional» desta agricultura. Com efeito, ela constitui um instrumento eficaz de ordenamento do espaço e de gestão dos recursos naturais e é o elemento-chave da construção da paisagem. Ora, estes elementos são especialmente preciosos na montanha, devido aos importantes recursos aquíferos, à biodiversidade específica e ao interesse turístico de quase todas as regiões de montanha. Por outro lado, esta agricultura contribui para a manutenção de determinadas espécies animais e vegetais, quer pela sua exploração directa (raças bovinas e ovinas exportadas para o mundo inteiro devido, nomeadamente, à sua rusticidade, ou espécies vegetais específicas, como as plantas para produção de perfumes ou certos cereais redescobertos hoje pelos consumidores), quer pelo efeito da actividade agrícola (manutenção das pastagens). Contribui também para uma diversidade de produções agrícolas e alimentares nos mercados, nomeadamente porque, muitas vezes, oferece produtos originais — e dotados de uma grande notoriedade — para os quais há menos concorrência, o que permite igualmente preservar o saber-fazer tradicional. Por último, esta agricultura contribui para o emprego rural e está estreitamente ligada às actividades rurais não agrícolas, havendo, em muitas regiões, uma proporção considerável de pessoas com múltiplas actividades.

4.3.2

A menos que se imagine que estes «factores externos positivos» possam ser objecto de facturação por serviços prestados — o que, em regra, presentemente não acontece — uma diminuição global do apoio aos agricultores de montanha terá impactos imediatos sobre eles, acelerando o desaparecimento das explorações e, em consequência, da sua função de manutenção do espaço. Trata-se de uma questão de interesse geral, que diz respeito a todos os decisores públicos e à sociedade. E não pode ser ignorada, se realmente quisermos privilegiar as vias e os meios para um desenvolvimento sustentável.

4.3.3

A necessidade de conservar uma actividade agrícola produtiva em zona de montanha é especialmente relevante para a economia rural, a fim de permitir a transformação e, portanto, a criação de um valor acrescentado nestes zonas, o que é sinónimo de emprego, de crescimento, etc. Além disso, os produtos de montanha estão frequentemente na base de um património cultural particularmente rico, cuja sobrevivência depende dos produtos locais como, por exemplo, o queijo artesanal de Margeride (9), que está na origem da festa dos queijos artesanais, do queijo de Mahon ou do anis em Rute, etc.

4.3.4

A agricultura de montanha está sujeita a dificuldades específicas e permanentes. Devido à criação do primeiro pilar da PAC, historicamente baseada nos níveis de produção dos sistemas agrícolas, as zonas de montanha têm um nível de apoio do primeiro pilar inferior ao das planícies. As ajudas do segundo pilar têm, de facto, uma importância equivalente à do primeiro pilar nestas zonas. Uma política específica em favor das zonas de montanha deve permitir uma tomada em consideração global e coerente dos problemas específicos com que se defrontam as explorações de montanha, tanto agrícolas como pastoris. Esta política é a expressão do facto de a sociedade se atribuir os meios de promover uma agricultura dinâmica na montanha, capaz de assegurar as funções de produção agrícola e de manutenção da paisagem consideradas indispensáveis para o ordenamento e o desenvolvimento futuros destes territórios.

4.3.5

No quadro da rede europeia de desenvolvimento rural, o Comité solicita à Comissão que crie um grupo de trabalho temático sobre as questões relativas às zonas de montanha.

4.3.6

As montanhas mediterrânicas acumulam ao mesmo tempo as desvantagens da montanha e as do clima mediterrânico (secas, incêndios, tempestades, etc.). Esta especificidade deverá ser tida em conta ao nível europeu, para permitir uma adaptação das políticas ao nível regional.

4.4   Privilegiar as zonas de montanha na afectação das dotações do segundo pilar

4.4.1

Num momento em que os orçamentos do desenvolvimento rural estão a diminuir ou a estagnar nos Estados-Membros mais antigos e os novos Estados-Membros são tentados a concentrar as dotações nas zonas mais produtivas a curto prazo, a Comissão Europeia deve procurar que os fundos europeus sejam afectados prioritariamente às zonas com desvantagens naturais permanentes, que deles necessitam de forma recorrente.

4.5   A consolidação dos subsídios aos agricultores de montanha é essencial

4.5.1

A compensação das desvantagens naturais e, consequentemente, dos custos suplementares de produção, constitui a medida mais importante para o apoio à agricultura de montanha. Ninguém põe hoje em causa esta medida, ainda que não disponha de meios suficientes para satisfazer os seus objectivos.

4.5.2

As condições da produção agrícola em montanha caracterizam-se essencialmente por fortes condicionalismos ligados à altitude, ao declive, à neve e às dificuldades de comunicação. Estes condicionalismos têm duas ordens de consequências. Implicam custos suplementares de equipamento (edifícios e material) e de transporte e reduzem a produtividade dos factores (terra, capital, trabalho) em proporções mais ou menos elevadas, segundo os sistemas de produção praticados e o grau das desvantagens.

4.5.3

A mais baixa produtividade dos factores de produção na montanha está ligada à redução da duração da vegetação activa, que passa de oito meses na planície para menos de seis meses a mil metros de altitude. Isto significa que é necessário colher pelo menos um terço de forragem suplementar para alimentar um animal, o que tem de ser feito em solos menos produtivos em unidades forrageiras.

4.5.4

O subsídio compensatório de desvantagens naturais é o primeiro instrumento de apoio que integra estes objectivos. É desejável que lhe seja imposto um limite máximo, restringindo a ampliação de explorações que já são de dimensão média ou grande, para preservar um número suficiente de explorações e evitar desse modo a desertificação.

4.6   As outras medidas de apoio à actividade agrícola nas zonas de montanha devem ser mantidas e reforçadas

4.6.1   A política de criação de gado extensiva em pastagem

4.6.1.1

Através de medidas agro-ambientais, foi possível, durante os períodos de programação anteriores, aplicar uma política com vista a apoiar a produção pastoril nas zonas de produção extensiva. É preciso prosseguir nesta via, recorrendo a medidas simples e acessíveis ao maior número de criadores, completadas por outras medidas mais orientadas para os territórios com condições ambientais específicas.

4.6.1.2

Limitar o apoio agro-ambiental a este último tipo de zona iria, com efeito, contrariar o objectivo pretendido, na medida em que conduziria, quase inevitavelmente, ao desaparecimento de actividades pecuárias e ao regresso da natureza ao estado selvagem, o que seria prejudicial à prevenção dos riscos naturais, à multifuncionalidade dos espaços em causa e à preservação da biodiversidade. Importa, aliás, referir que, de qualquer forma, as medidas agro-ambientais que entrarão em vigor em 2007 são, de facto, mais selectivas do que as anteriores, uma vez que incluem agora uma base obrigatória não remunerada associada à aplicação da condicionalidade.

4.6.2   O apoio aos investimentos

4.6.2.1

Os custos suplementares da construção de edifícios na montanha estão ligados a muitos factores: resistência às cargas de neve e aos ventos violentos, isolamento, maior volume de terraplanagem, aumento da duração da estabulação e, portanto, do volume de armazenagem de forragens e de efluentes. Os custos suplementares de mecanização devem-se à especificidade do material necessário para trabalhar em terrenos inclinados e ao seu desgaste rápido devido às condições climáticas. Estão também ligados à pequena dimensão das séries produzidas. Tal como a compensação das desvantagens naturais, o apoio aos investimentos constitui, com efeito, uma condição da perenidade das explorações agrícolas, pelo que deve ser reforçado nas zonas de montanha.

4.6.3   Instalação dos jovens e crédito bonificado

4.6.3.1

Na montanha, tal como noutras zonas, a tendência é no sentido de uma diminuição do número de instalações, devido à ausência de perspectivas de futuro, à penosidade do trabalho e ao peso financeiro do capital de exploração a transmitir: quando três agricultores cessam a sua actividade, só um é substituído, nas zonas de montanha como noutras.

4.6.3.2

No entanto, devido à fragilidade dos sistemas agrícolas na montanha e aos níveis de investimento mais elevados do que na planície, é ali que é mais importante favorecer a renovação de gerações e a instalação na agricultura. Trata-se de um objectivo que interessa directamente à agricultura, mas que também se insere plenamente num interesse geral bem compreendido, como já foi anteriormente salientado.

4.6.4   Compensação dos custos suplementares dos serviços

4.6.4.1

Os custos suplementares da inseminação artificial e da recolha das colheitas devem-se, essencialmente, à menor densidade das explorações de montanha, o que alonga os transportes, assim como às condições do próprio transporte, que são mais difíceis e implicam um desgaste precoce dos veículos. Para responder ao objectivo de manter explorações em zonas de montanha, é necessário prever um apoio a estes serviços, em especial à recolha do leite, cujo encargo é actualmente suportado pelos agricultores. No contexto da montanha, o argumento segundo o qual estes apoios teriam efeitos anti-concorrenciais não deve ser considerado aceitável, porque as regras do mercado não se aplicam de forma igual e indiferenciada em todos os territórios.

4.6.5   Apoio às indústrias agro-alimentares

4.6.5.1

Para valorizar os produtos da agricultura de montanha, é indispensável que existam localmente meios de transformação industrial e de comercialização. Porém, estas indústrias agro-alimentares também estão sujeitas aos condicionalismos inerentes à montanha: distância dos mercados, custo acrescido dos transportes e custos de construção e de manutenção mais elevados. A presença daqueles meios permitiria a criação de emprego, o que é especialmente importante em zonas rurais.

4.6.5.2

Por esse motivo, os apoios permanentes a estas actividades são legítimos e necessários. As indústrias agro-alimentares devem poder beneficiar de amplo acesso aos auxílios com finalidade regional.

4.6.6   Apoio aos investimentos agro-turísticos

4.6.6.1

O agro-turismo está muito desenvolvido em certas regiões de montanha europeias, como na Áustria, e assegura um complemento de receita indispensável à sobrevivência destas explorações. Inversamente, o desenvolvimento do turismo nestas zonas, inclusivamente fora das explorações, deve-se à atracção das paisagens e das culturas, resultante, essencialmente, da actividade agrícola.

4.6.7   Apoio à Carta europeia dos produtos agro-alimentares de qualidade

4.6.7.1

A maior parte das explorações de montanha não podem ser competitivas através da produção em massa, com produtos normalizados, pagos ao mesmo preço (ou, frequentemente, a preço inferior, devido ao isolamento) dos da planície. A procura da qualidade, da autenticidade e da originalidade dos produtos, a criação de circuitos capazes de valorizar a produção e a estruturação de fileiras agro-alimentares que permitam optimizar o valor acrescentado são, na montanha mais do que em qualquer outro lado, uma necessidade imperiosa para aumentar os rendimentos agrícolas. Muitas denominações de origem correspondem a zonas de montanha.

4.6.7.2

Uma protecção adequada dos produtos agro-alimentares de qualidade originários da montanha, sinónimo de confiança para o consumidor e de valorização para o produtor, constitui um factor de grande importância para o futuro da agricultura de montanha. Por isso, o Comité é signatário da Carta dos produtos agro-alimentares de montanha de qualidade (10) e pretende que as instituições comunitárias apoiem esta iniciativa.

4.7   Integração das políticas agrícola e regional para um melhor efeito sobre as regiões de montanha

4.7.1

A política regional europeia, por exemplo, integra um objectivo de coesão que surge muito pouco na PAC. Aquela política tem uma dimensão rural que poderia ser reforçada. As duas políticas em conjunto, de forma coordenada, têm potencial para actuar forte e positivamente sobre o desenvolvimento sustentável na montanha.

4.8   Outros aspectos a considerar

4.8.1   A gestão dos grandes predadores deve ser concertada.

4.8.1.1

A emergência e o desenvolvimento de uma criação ovina extensiva nas montanhas europeias tornaram-se possíveis pela erradicação dos grandes predadores. O seu recrudescimento (o lobo nos Alpes e o urso nos Pirenéus) volta a pôr em questão este modo de criação de gado extensiva, pouco guardada.

4.8.1.2

Existem iniciativas para propor soluções equilibradas susceptíveis de conciliar o exercício da pastorícia nas zonas de montanha com a protecção dos grandes predadores, nomeadamente em Itália e em Espanha (meios de protecção eficazes, indemnização das perdas, compensação pelos esforços suplementares impostos pela coabitação com o predador, etc.), que devem ter continuidade. Estas experiências devem ser valorizadas nas outras regiões de montanha europeias.

4.8.2   A actividade florestal é um complemento indispensável

4.8.2.1

A superfície total das florestas de montanha está calculada em cerca de 28 milhões de hectares na UE-15 e em 31 milhões de hectares na UE-25. Esta superfície progride a uma taxa superior à do conjunto da floresta europeia. A actividade florestal está frequentemente na origem de um complemento de receita dos agricultores de montanha. No contexto actual de uma melhor valorização da biomassa, nomeadamente para fins energéticos, esta poderá constituir uma oportunidade suplementar para o desenvolvimento sustentável das regiões de montanha, desde que a implantação de novos espaços florestais seja gerida racionalmente. A selecção de espécies e de variedades adaptadas, nomeadamente pelas suas qualidades mecânicas, constituiria igualmente uma oportunidade para as regiões de montanha e para os mercados da construção em madeira, permitindo, ao mesmo tempo, limitar as importações provenientes de países terceiros, que podem estar na origem de desastres ecológicos.

4.8.2.2

Do ponto de vista funcional, os ecossistemas florestais têm também características particulares. Têm, aliás, uma função central e fundamental de regulação das águas superficiais e subterrâneas e são especialmente sensíveis aos impactos externos (poluição, excesso de caça, tempestades, insectos) e aos incêndios, mais difíceis de prevenir e de controlar nas zonas onde o acesso é limitado e onde a propagação do fogo pode ser muito rápida.

4.8.2.3

A estabilidade ecológica dos ecossistemas de montanha é importante não apenas para estes, mas também para a protecção das regiões a jusante.

4.8.3

O Comité congratula-se com a aprovação do protocolo agrícola da Convenção Alpina pela Comunidade Europeia. No âmbito destes trabalhos, a Comissão Europeia deve favorecer as cooperações internacionais deste tipo para todos os maciços montanhosos europeus.

5.   Regiões insulares

5.1   Definição

5.1.1

Mais de 10 milhões de europeus, cerca de 3 % do total da população, vivem nas 286 regiões insulares, que têm uma superfície de mais de 100 000 km2, cerca de 3,2 % da superfície total da União Europeia. Estas 286 ilhas estão agrupadas em arquipélagos, pelo que se fala de 30 regiões insulares. Por exemplo, as Ilhas Baleares, que incluem 4 ilhas segundo a definição da UE, estão agrupadas numa só região insular. De uma maneira geral, a agricultura destas 286 ilhas apresenta um grau de desenvolvimento económico inferior ao do continente europeu. As regiões insulares geram 2,2 % de todo o PIB da UE, representando apenas 72 % da média da União Europeia.

5.1.1.1

Estamos a falar, basicamente, de ilhas mediterrânicas: 95 % dos habitantes das ilhas europeias vivem em ilhas mediterrânicas e só 5 % em ilhas atlânticas ou setentrionais. Em apenas 5 regiões insulares mediterrânicas (Sicília, Córsega, Sardenha, Ilhas Baleares e Creta) vivem 85 % da população insular europeia.

5.1.1.2

Fala-se frequentemente do custo da insularidade, entendendo por este o custo suplementar que implica viver numa ilha, mas há razões para questionar se existe, realmente, o custo da insularidade. É mais caro consumir e produzir numa ilha do que fazê-lo no continente? Para poder responder afirmativamente, temos de aceitar uma premissa: se se considera que o ambiente natural afecta a actividade humana e, portanto, agrícola, poderá então falar-se de custo da insularidade.

5.2   Observações gerais

5.2.1

Embora mantendo aspectos diferenciadores de uma região para outra, a agricultura das ilhas apresenta, efectivamente, uma dupla característica comum: o seu carácter dual e o seu carácter dependente, a coexistência de uma agricultura moderna «de exportação» com uma agricultura tradicional mais ou menos próxima da agricultura de subsistência e com elevada dependência do exterior, tanto para os meios de produção como para o destino final das suas produções, tanto para o mercado local como para o mercado externo. A balança comercial mostra claramente a exportação de um ou dois produtos «especializados», juntamente com importações de um vasto leque de produções agrícolas e pecuárias para consumo interno.

5.2.2

Em todo o caso, o desenvolvimento rural enfrenta uma série de problemas comuns de carácter permanente, resultantes do isolamento geográfico e económico destas regiões, agravado pelas outras desvantagens naturais já citadas.

5.3   Observações na especialidade

Estas regiões caracterizam-se pela existência de desvantagens permanentes que as distinguem claramente das regiões continentais, a saber:

5.3.1

Desvantagens gerais e agrícolas:

isolamento em relação ao continente;

dimensão reduzida dos terrenos;

fraca disponibilidade de água;

fontes de energia limitadas;

diminuição da população autóctone, nomeadamente dos jovens;

falta de mão-de-obra qualificada;

ausência de envolvente económica para as empresas;

dificuldade de acesso aos serviços de educação e de saúde;

custo elevado das comunicações e das infra-estruturas (marítimas e aéreas);

dificuldade de gestão dos resíduos.

5.3.2

Desvantagens agrícolas:

monocultura e sazonalidade da actividade agrícola;

fragmentação territorial que complica a gestão, a administração e o desenvolvimento económico destas regiões;

mercados de dimensão reduzida;

isolamento em relação aos grandes mercados;

oligopólios para o aprovisionamento em matérias-primas;

défice de infra-estruturas de transformação e de comercialização;

forte competição pelo solo e pela água por parte de um turismo crescente;

falta de matadouros e de indústrias de primeira transformação dos produtos locais.

6.   Regiões ultraperiféricas

6.1   Definição

6.1.1

A Comissão Europeia decidiu adoptar uma política conjunta para estas regiões, através de programas de opções específicas relativas ao afastamento e à insularidade das regiões ultraperiféricas (POSEI): POSEIDOM para os departamentos franceses ultramarinos (Martinica, Guadalupe, Guiana e Reunião), POSEICAN para as Ilhas Canárias e POSEIMA para a Madeira e os Açores.

6.2   Observações gerais

6.2.1

A agricultura das regiões ultraperiféricas, para além da sua importância relativa no PIB regional, superior à média comunitária, constitui um sector fundamental da economia regional, com importantes efeitos directos nos transportes e noutras actividades conexas, no equilíbrio social e laboral, no ordenamento do território, na conservação do seu património natural e cultural e ainda, por razões estratégicas, na segurança do seu aprovisionamento.

6.3   Observações na especialidade

6.3.1

As limitações naturais e as dificuldades de aprovisionamento em métodos de produção e tecnologia adequada ocasionam custos de produção mais elevados.

6.3.2

As suas produções, mais caras do que as continentais, enfrentam ainda sérias dificuldades em concorrer nos mercados locais com as importações, devido à sua dispersão e fragmentação e à falta de estruturas adequadas de transformação e de comercialização. A crescente implantação de hipermercados e de grandes redes de distribuição não contribui, por seu lado, para melhorar esta situação.

6.3.3

Acrescente-se a ausência de economias de escala, com mercados locais de dimensão reduzida e frequentemente fragmentados, a falta de estruturas associativas (cooperativas, etc.), poucos ou nenhum matadouro e pequenas indústrias de transformação.

6.3.4

A indústria transformadora local, que enfrenta obstáculos semelhantes ao seu desenvolvimento, também não representa um cliente adequado, pelo que a possibilidade de obter valores acrescentados é muito limitada.

6.3.5

Nas exportações, as dificuldades são semelhantes: dispersão e atomização da oferta, diferentes sistemas e estruturas de comercialização, dificuldades de acesso aos centros de distribuição no destino e de reacção atempada às alterações de mercado, etc.

6.3.6

Registe-se também a diminuição da população autóctone, sobretudo dos jovens, tanto pela transferência para outros sectores económicos, principalmente o turístico, como pela emigração para fora das regiões insulares.

6.3.7

As explorações, nas quais o papel das mulheres é determinante, são geralmente de dimensão reduzida e de carácter familiar, com uma incidência muito elevada do emprego a tempo parcial e com claras dificuldades para praticar uma agricultura mais extensiva devido à atomização da propriedade e às dificuldades de mecanização.

6.3.8

Na ausência de um sector industrial significativo, o desenvolvimento económico orienta-se para o sector turístico, o que agrava a fragilidade do meio natural e confronta a agricultura com uma competição pelas melhores terras, pela água e pela mão-de-obra, no que esta está sempre em desvantagem. Além disso, a deslocação da população para zonas menos planas cria problemas de erosão e de desertificação.

6.4   Desvantagens agrícolas

6.4.1

As produções agrícolas como o tomate, os frutos tropicais, as plantas ornamentais e as flores devem poder concorrer nos seus mercados com produtos semelhantes provenientes de outros países que têm acordos de associação com a UE, como é o caso dos países ACP e de Marrocos, que beneficiam de regimes preferenciais.

6.4.2

Os programas POSEI agrícolas ainda não chegaram ao seu nível óptimo de utilização, essencialmente devido ao carácter recente de certas medidas. Importa respeitar, portanto, os limites máximos fixados, dotando estes programas de meios económicos suficientes para atingir os objectivos definidos.

6.4.3

A mudança de regime que se perfila no âmbito da futura reforma da OCM da banana visa preservar os rendimentos dos produtores comunitários e o emprego, para garantir o futuro da banana comunitária.

6.4.4

O resultado das negociações da OMC (proposta de alteração dos direitos aduaneiros) poderá tornar necessário tomar medidas adequadas para garantir o emprego e os rendimentos dos agricultores dos sectores em causa.

6.4.5

Tendo em conta o ambiente próprio a estas regiões, devia-se estabelecer e reforçar os controlos no domínio da saúde vegetal e animal, disponibilizando para tal todos os meios humanos e tecnológicos necessários.

7.   Propostas para as regiões insulares e ultraperiféricas

7.1

O Comité constata a importância do papel estratégico da actividade agrícola nestas regiões, como factor de equilíbrio social, ambiental, cultural, territorial, natural e paisagístico.

7.2

Depois de estudar os vários documentos supracitados, o Comité constata a existência de desvantagens estruturais para o desenvolvimento das actividades agrícolas nas regiões insulares e ultraperiféricas.

7.3

O Comité considera, pois, necessário dirigir uma série de recomendações à Comissão Europeia, exortando-a a tomar medidas específicas para compensar as desvantagens ligadas à insularidade e à situação ultraperiférica que afectam 16 milhões de cidadãos europeus e, em particular, o desenvolvimento das actividades agrícolas nestes territórios.

7.4

Relativamente às regiões insulares e ultraperiféricas, o Comité solicita insistentemente à Comissão que:

7.4.1

Conceda o estatuto de zona agrícola desfavorecida ao conjunto destes territórios. As desvantagens particulares para o desenvolvimento da agricultura nas ilhas de Malta e de Gozo (11) constituem um precedente importante para o estabelecimento desta medida nos territórios insulares e ultraperiféricos;

7.4.2

Estabeleça um regime de auxílio ao transporte de produtos agrícolas entre estes territórios e o continente e ao transporte interinsular. A subvenção dos custos de transporte deverá permitir aos produtos agrícolas das ilhas e regiões ultraperiféricas concorrerem com os restantes produtos agrícolas da União no mercado europeu;

7.4.3

Estabeleça um plano que garanta a igualdade de preços dos factores de produção agrícolas de base nestes territórios (combustíveis, fertilizantes, equipamentos agrícolas, etc.), a fim de corrigir o custo suplementar de produção das actividades agrícolas nas ilhas e regiões ultraperiféricas. Deverão ser adoptadas medidas destinadas ao apoio a importações de produtos básicos para a alimentação animal;

7.4.4

Inclua e aumente as percentagens de co-financiamento europeu nos planos de desenvolvimento rural, incluindo na construção e no investimento em infra-estruturas específicas destinadas a compensar as desvantagens ligadas à insularidade e à situação ultraperiférica. Entre estas contam-se os planos de irrigação com águas tratadas, os sistemas de drenagem, as infra-estruturas portuárias e o armazenamento, os auxílios à comercialização, etc.;

7.4.5

Estabeleça medidas especiais para garantir a vigilância e o controlo de actividades oligopolistas, especialmente presentes nas ilhas, onde a dimensão reduzida do mercado local favorece o aparecimento de um pequeno número de empresas de distribuição que, por vezes, têm margens de lucro substanciais. O combate a estas práticas favorecerá o desenvolvimento do comércio livre nestes territórios.

7.5

Por outro lado, no que se refere às medidas especificamente dirigidas às regiões insulares da União (não ultraperiféricas), o Comité exorta a Comissão Europeia a:

7.5.1

Adoptar programas de acção específicos para as regiões insulares não ultraperiféricas da União. Inserindo-se na linha dos programas aprovados para as regiões ultraperiféricas (12), estes programas especiais devem permitir às regiões insulares obter um resultado comparável aos obtidos pelas sete regiões ultraperiféricas: durante os períodos 1994-1999 e 2000-2006, estes territórios receberam, por habitante, mais 33 % de financiamento dos fundos estruturais do que os restantes habitantes das regiões do Objectivo n.o 1. Esta ajuda facilitou um crescimento económico e uma diminuição das taxas de desemprego bem superiores às de muitas outras regiões da UE;

7.5.2

Aumentar, para o novo período de programação política regional (2007-2013), a participação dos fundos europeus nos custos totais subvencionáveis, de forma a que essa percentagem seja fixada num máximo de 85 %, como já acontece em relação às regiões ultraperiféricas e às ilhas gregas mais afastadas (13). A nova proposta da Comissão (14) (período 2007-2013) para o caso das ilhas parece ser insuficiente (máximo de 60 %).

7.5.2.1

Permitir às colectividades territoriais aplicar o programa «JEREMIE» (15) sob a forma de um fundo de investimento para disponibilizar meios financeiros aos jovens agricultores que pretendam dedicar-se à cultura de produtos alimentares.

7.5.3

O Comité propõe que as ilhas recebam um tratamento específico no quadro dos novos fundos estruturais.

7.6

O CESE, tendo em conta as consequências da inexistência de uma política específica que compense os custos da insularidade, insta à criação, por parte dos agentes activos, governo, sociedade civil, etc., de uma plataforma que canalize e coordene todos os esforços para superar os problemas, a fim de que continuem a existir agricultores e agricultoras em todas as regiões insulares.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 61 de 14.3.2003, relator: Jean-Paul BASTIAN.

(2)  JO C 302 de 7.12.2004 e CESE 251/2005, JO C 234 de 22.9.2005, relator: Gilbert BROS.

(3)  INI 2000/2222, JO C 72 de 21.3.2001.

(4)  JO C 221 de 17.9.2002, relator: Philippe LEVAUX.

(5)  JO C 24 de 31.1.2006, relatora: Margarita LÓPEZ ALMENDÁRIZ.

(6)  JO C 30 de 30.1.1997, relator: Leopoldo QUEVEDO ROJO.

(7)  JO C 74 de 23.3.2005.

(8)  Ver nota 1.

(9)  Para mais informações sobre o queijo: http://www.artisoudemargeride.com.

(10)  Ver o sítio Internet http://www.mountainproducts-europe.org/sites/euromontana.

(11)  Tratado de adesão à União Europeia da República Checa, da Estónia, de Chipre, da Letónia, da Lituânia, da Hungria, de Malta, da Polónia, da Eslovénia e da Eslováquia.

(12)  Programa POSEIDOM para as regiões ultraperiféricas francesas, POSEICAN para as Ilhas Canárias e POSEIMA para a Madeira e os Açores.

(13)  Regulamento n.o 1260/1999.

(14)  COM(2004) 492 final.

(15)  JO C 110 de 9.5.2006, relator: Antonello PEZZINI.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/102


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Responder ao desafio das alterações climáticas — O papel da sociedade civil»

(2006/C 318/17)

Em 19 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar sobre: Responder ao desafio das alterações climáticas — O papel da sociedade civil.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, que emitiu parecer em 11 de Julho de 2006, sendo relator E. EHNMARK.

Na 429.a reunião Plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 59 votos a favor, 1 voto contra e 2 abstenções, o seguinte parecer:

A.   Conclusões

A.1

O processo das alterações climáticas não pode ser parado, pelo menos nos próximos 15 a 20 anos. Nesse sentido, temos de aprender a viver com as alterações climáticas e procurar formas de mitigar os seus efeitos e de nos adaptarmos.

A.2

O debate sobre as alterações climáticas centra-se demasiado no plano geral e em acontecimentos num futuro distante. Há uma necessidade clara de debater a forma como as alterações climáticas afectam — e afectarão — os cidadãos no seu quotidiano. As questões relacionadas com alterações climáticas devem ser reestruturadas por forma a torná-las mais compreensíveis e concretas.

A.3

Os parceiros sociais e a sociedade civil organizada têm um papel essencial na sensibilização dos cidadãos para as alterações climáticas e na promoção do debate a nível local sobre a forma como as comunidades locais podem preparar medidas concretas com vista à adaptação às alterações climáticas.

A.4

As alterações climáticas terão impacto em inúmeros sectores da sociedade. O CESE mencionou alguns exemplos. A conclusão geral é que, juntamente com os parceiros sociais e a sociedade civil organizada, as comunidades locais na UE devem assumir mais responsabilidades na preparação e planeamento das consequências das alterações climáticas.

A.5

O CESE propõe que a sociedade civil organizada e os parceiros sociais lancem em conjunto o Diálogo Público a nível da UE sobre as alterações climáticas, centrado nos efeitos das alterações climáticas no quotidiano. O principal objectivo do Diálogo seria sensibilizar e fazer preparativos ao longo dos próximos 15-20 anos — período durante o qual as alterações climáticas actuais se agravarão, independentemente do que a humanidade fizer agora.

A.6

O CESE propõe que cada Estado-Membro identifique e/ou crie um gabinete de informação e coordenação para as alterações climáticas para promover as relações entre o plano local, regional e nacional.

A.7

O CESE lamenta que as alterações climáticas sejam mais frequentemente debatidas como cenários distantes. Mas, já não se trata sobretudo, ou apenas, de uma questão do futuro distante:

as alterações climáticas afectam-nos aqui e agora.

1.   Introdução

1.1

A existência de alterações climáticas é amplamente reconhecida, a natureza e a dimensão das suas consequências não tanto. Uma razão para tal é a necessidade de mais conhecimento oriundo da investigação e de estudos de cenários. Outra é a natureza das próprias alterações climáticas: trata-se de uma longa alteração, interrompida por acontecimentos trágicos cada vez mais frequentes. Uma terceira razão é o facto de, no debate público, as alterações climáticas serem frequentemente tratadas como uma questão que diz respeito aos outros e não a nós próprios. Uma quarta razão é o facto de se centrar a atenção em cenários distantes que parecem esbater as questões mais concretas do quotidiano.

1.2

A fusão das calotas polares pode ser referido como exemplo. Nos últimos meses, a comunicação social ficou fascinada com os cálculos que indicavam que a fusão das calotas polares poderia provocar a subida do nível dos oceanos em 13 metros (estimativas da Agência Europeia do Ambiente (AEA)). Outro exemplo é a corrente do Golfo: se os mecanismos que controlam a corrente do Golfo forem alterados, as temperaturas no Norte da Europa poderão descer drasticamente. Apesar de serem questões interessantes e importantes, não levam as pessoas a encarar as alterações climáticas de uma forma mais imediata e concreta.

1.3

Importa sublinhar que as alterações climáticas que observamos actualmente e que tentamos controlar são apenas o início de um longo processo. Nos próximos 15 a 20 anos, as alterações climáticas existentes agravar-se-ão, pela simples razão de a humanidade ter produzido — e continuar a produzir — suficiente material prejudicial sob a forma de gases com efeito de estufa. A nossa tarefa é a preparação e adaptação às alterações climáticas. Todavia, o que acontecerá depois dos próximos 15 a 20 anos é também da responsabilidade das gerações actuais, uma vez que as medidas tomadas agora podem ajudar a mitigar as alterações climáticas no futuro distante. O debate no âmbito da CQNUAC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas) e do Protocolo de Quioto representam uma oportunidade a não perder para acções após 2012. Se esta oportunidade for desperdiçada o clima continuará a deteriorar-se e será necessária mais acção no sentido de inverter as tendências. Não surpreende que cada vez mais governos considerem as alterações climáticas uma prioridade máxima. Contudo, tal não significa que os governos traduzam as suas prioridades em acções.

1.4

O debate sobre as alterações climáticas é em grande parte dominado pelos governos e pela comunidade científica. As ONG ambientais estão a fazer um óptimo trabalho, mas com recursos reduzidos. Em geral, as grandes organizações, tais como sindicatos e organizações de empregadores, não são, em geral, particularmente activas no debate sobre como responder às alterações climáticas e mitigá-las. A sociedade civil organizada deveria desempenhar um papel de destaque, mas parece relutante em assumi-lo.

1.5

O CESE é da opinião de que a preparação para as alterações climáticas e para o debate sobre a apropriação das alterações climáticas deve ser alargado, por forma a implicar activamente os parceiros sociais e a sociedade civil organizada. As alterações climáticas estão a entrar numa fase na qual a mitigação e a adaptação se tornam questões do quotidiano. Já não é, sobretudo ou apenas, uma questão do futuro distante: afecta-nos aqui e agora. Por conseguinte, é fulcral que os parceiros sociais e a sociedade civil organizada avaliem e reclamem a preparação e debate das alterações climáticas.

1.6

É essencial que o debate actual sobre as alterações climáticas integre melhor as micro-perspectivas com base na situação de cada cidadão e das comunidades locais. Há que analisar a forma como os cidadãos podem mitigar os efeitos das actuais alterações climáticas em termos de custos (custos energéticos), de seguros, ou de preferências dos consumidores, apenas para referir alguns exemplos.

1.7

O objectivo do presente parecer é, essencialmente, examinar o papel dos parceiros sociais e da sociedade civil organizada na análise, planeamento e execução dos passos no sentido de responder aos desafios das alterações climáticas. Centra-se no ponto de vista económico, social e democrático, numa abordagem concreta da base para o topo.

1.8

Centramo-nos nos próximos 15 a 20 anos por se tratar do período durante o qual as alterações climáticas prosseguirão com base no que já foi feito. É indiscutível a necessidade de adaptação imediata aos efeitos iniciais deste processo, mas importa não descurar os efeitos futuros.

1.9

Afirma-se frequentemente que o volume de relatórios e de informação sobre as alterações climáticas é tão grande como a dificuldade de absorção dos cidadãos que procuram respostas para as implicações das alterações climáticas no seu quotidiano. Há muita informação sobre as alterações climáticas, o que representa um desafio de comunicação. Trata-se de uma situação que necessitará de liderança política, uma vez que algumas das medidas inevitáveis implicarão certamente algum desconforto no quotidiano.

1.10

Importa sublinhar que estão em curso estudos frutíferos. O Programa Europeu para as Alterações Climáticas, agora na sua segunda fase, é particularmente importante. O programa formou grupos de trabalho para o comércio de emissões, aprovisionamento energético e procura de energia, transportes, indústria, agricultura e florestas, apenas para mencionar alguns temas. O Segundo Programa para as Alterações Climáticas, lançado pela Comissão Europeia em Outubro de 2005, inclui novos grupos de trabalho sobre adaptação, captura de dióxido de carbono e armazenamento geológico, aviação e uma abordagem integrada das emissões de CO2 de viaturas ligeiras, bem como uma série de grupos incumbidos da revisão da execução de acções anteriores. No conjunto, os Programas para as Alterações Climáticas proporcionam uma análise e informação ricas, assim como a base para várias decisões do Conselho.

1.11

É necessário desenvolver mais o Programa para as Alterações Climáticas? A resposta é afirmativa, uma vez que há necessidade generalizada de mais informação concreta e, em particular, mais exemplos de iniciativas bem sucedidas. Além disso, responder às alterações climáticas requer o envolvimento activo das partes interessadas e, em última análise, dos próprios cidadãos. A Comissão Europeia constatou esta necessidade e lançou uma grande campanha de informação e comunicação. A iniciativa é muito bem-vinda. Todavia, é necessário desenvolver mais esforços que envolvam todos os Estados-Membros, que coordenem as acções a nível comunitário, nacional e local e que, sobretudo, levem as questões às pessoas.

2.   A dimensão dos desafios das alterações climáticas

2.1

As alterações climáticas terão efeitos profundos numa série de sectores nas sociedades modernas. Os efeitos não se limitam às condições metereológicas extremas. Uma lista não exaustiva de zonas de impacto inclui inundações, incêndios florestais, danificação de infra-estruturas, reestruturação da agricultura, problemas de qualidade do ar (em particular nas zonas metropolitanas), problemas de aprovisionamento energético, limitações na utilização de água e impacto na indústria (em particular na indústria transformadora). A esta lista podemos acrescentar o planeamento urbano e a introdução de novas soluções arquitectónicas para poupança de energia.

2.2

O facto de as alterações climáticas afectarem um leque tão vasto de sectores transversais está a ser gradualmente compreendido. O apoio público que terá de haver para as acções necessárias lá vai surgindo lentamente.

2.3

Combater as alterações climáticas através de acções específicas terá muitas vezes efeitos claros e por vezes desagradáveis no quotidiano dos cidadãos.

2.4

O paralelismo com o debate em curso sobre a estratégia da UE para o desenvolvimento sustentável é óbvio. Desde a primeira fase deste debate, ficou claro que o público não estava sensibilizado para o que seria necessário para melhorar as perspectivas do desenvolvimento sustentável tanto na União Europeia como mundialmente. Os desafios que se avizinham no domínio do desenvolvimento sustentável foram referidos como desafios que levariam a alterações radicais no funcionamento das nossas sociedades (1).

2.5

A luta contra as alterações climáticas é, obviamente, parte integrante dos esforços para alcançar um desenvolvimento sustentável. A luta contra as alterações climáticas deve ser, tal como todos os esforços no sentido do desenvolvimento sustentável, concreta e realista.

2.6

A Estratégia de Lisboa é muitas vezes referida como a concretização da visão do desenvolvimento sustentável, numa fase inicial de 10 anos. A Estratégia de Lisboa centra a sua atenção nos pilares económico, social e ambiental. Esquece-se muitas vezes que, desde o início, a Estratégia de Lisboa também definia grandes ambições no que toca ao ambiente, alterações climáticas e desenvolvimento sustentável em geral. Por conseguinte, as medidas contra as alterações climáticas não podem ser debatidas como um assunto isolado. As alterações climáticas desempenham um papel-chave na visão mais ampla e estão fortemente relacionadas com a necessidade geral de acção.

2.7

Uma observação recorrente em relação à Estratégia de Lisboa é o facto de os Estados-Membros e respectivos governos não darem prioridade suficiente a acções e investimentos acordados. Pode argumentar-se que os efeitos da Estratégia de Lisboa nos cidadãos não são muito directos nem tangíveis. Contudo, os efeitos das alterações climáticas (as catástrofes naturais, por exemplo) são muitas vezes bastante tangíveis. Os cidadãos terão de fazer os preparativos adequados para mitigar estes efeitos.

2.8

As alterações climáticas são frequentemente identificadas apenas em termos de prejuízos financeiros, o que não representa a totalidade da questão. A dimensão social das alterações climáticas deve ser plenamente reconhecida. Não se trata apenas de os cidadãos perderem as suas casas ou locais de trabalho, é também uma questão de aumento dos custos de energia, lazer e férias. Está igualmente relacionada com a motivação dos cidadãos para alterar os seus hábitos de consumo. Entre muitos outros aspectos, há o risco de a adaptação às alterações climáticas provocar novos desequilíbrios socioeconómicos, com efeitos negativos para os cidadãos em regiões longínquas ou de baixo rendimento disponível.

2.9

O CESE sublinha a importância da coesão social na luta contra as alterações climáticas. O recurso recorrente a factores económicos com vista a persuadir os cidadãos deve ser equilibrado com os possíveis efeitos sociais negativos. Outros instrumentos de resposta às alterações climáticas devem ser equilibrados com os efeitos na coesão social. Sublinha-se assim a importância da implicação da sociedade civil organizada em todo o processo de luta contra as alterações climáticas.

2.10

Há que prosseguir a análise das consequências das alterações climáticas na vida profissional. Estas consequências incluem não apenas a transição para métodos de produção que poupam energia e que economizam os recursos naturais, mas também a deslocalização de unidades de produção de acordo com a disponibilidade de recursos de energia renovável baratos. Para os trabalhadores, a transição para novos métodos de produção e novas áreas de serviço porá em evidência novas necessidades de mais conhecimento especializado e formação ao longo da vida. O diálogo social, em particular na UE, deveria assinalar o impacto social das alterações climáticas, sobretudo os seus efeitos na vida profissional. Os parceiros sociais a nível da UE deveriam dar prioridade à questão das alterações climáticas. Neste contexto, é importante sublinhar que atenuar as alterações climáticas não acarreta em si riscos de desemprego. Pelo contrário, os efeitos das alterações climáticas podem proporcionar novas oportunidades de emprego (ver 2.13).

2.11

Os consumidores sentirão em breve os efeitos das alterações climáticas, uma vez que estas levarão a mutações nos padrões de consumo, tanto na alimentação como nos transportes, habitação ou férias. Contudo, os consumidores são também potenciais responsáveis pela mitigação dos efeitos das alterações climáticas, bem como por uma base de acção a longo prazo com vista a travar as alterações climáticas. A melhor forma de conseguir padrões de produção sustentáveis é, sem dúvida, através de um movimento de consumidores vigoroso e reconhecido, com capacidade para chegar aos cidadãos. Os consumidores deveriam ser reconhecidos como actores-chaves que são — ou poderiam ser — na mitigação do impacto das alterações climáticas em cada cidadão.

2.12

A dimensão global das alterações climáticas é reconhecida em catástrofes relacionadas com o clima em outros países, provocando prejuízos avultados em vidas humanas e bens materiais. Como resultado das alterações climáticas, as doenças tropicais podem alastrar a novas zonas, contribuindo para os desafios que se aproximam. As alterações climáticas serão um teste à solidariedade entre povos e nações. Os países industrializados terão de reforçar a sua capacidade de prestar apoio e ajuda. Deve recordar-se que, sobretudo nos países em desenvolvimento, são muitas vezes os mais pobres que têm de suportar o peso das alterações climáticas. A dimensão social global das alterações climáticas é fulcral; trata-se de um domínio onde muito pode ser feito com vista à resolução de problemas que, de outra forma, poderiam facilmente multiplicar-se.

2.13

As alterações climáticas são frequentemente debatidas em termos de ameaças e fraquezas. Contudo, as acções com vista a mitigar as alterações climáticas devem ser vistas como uma oportunidade positiva. Com o aumento rápido da necessidade de produção e transporte que poupe energia, surgiu um novo domínio para investigação, desenvolvimento de novas tecnologias e marketing de novos produtos. Esta deveria ser uma parte importante da resposta da UE aos desafios das alterações climáticas. No quadro da iniciativa da Comissão para uma política industrial integrada, o apoio e a preparação do desenvolvimento de tecnologias respeitadoras do ambiente deveria ser uma prioridade absoluta. As PME podem desempenhar um papel muito importante nesta questão.

2.14

Responder às alterações climáticas e mitigá-las pode levantar questões inesperadas. Por exemplo, a produção de etanol a partir de produtos agrícolas está a tornar-se um sucesso em alguns países. Por conseguinte, o uso do produto de algumas colheitas, tais como o milho, está cada vez mais associado à produção de etanol. Contudo, o produto das mesmas colheitas é fulcral no apoio alimentar a regiões que sofrem de fome nos países em desenvolvimento. Este exemplo ilustra a importância de evitar soluções com uma só finalidade.

2.15

A dimensão do desafio que se aproxima pode ser ilustrada pela seguinte citação: «A ciência afirma-nos que, para restringir os danos, temos de procurar limitar o aumento da temperatura média global futura a 2.oC acima dos níveis pré-industriais. O objectivo dos 2.oC implica que são necessárias políticas para adaptar e mitigar as alterações climáticas. Não obstante a aplicação de políticas já aprovadas, é provável que as emissões globais aumentem nas duas próximas décadas, afigurando-se necessárias reduções globais das emissões, até 2050, de 15 % no mínimo relativamente aos níveis de 1990, o que exigirá esforços significativos.» (Comunicação da Comissão «Ganhar a batalha contra as alterações climáticas globais») (2). A última parte da citação pode ser considerada aquém da realidade. Todavia, ilustra a importância de relacionar os cidadãos com o processo a nível regional e local.

3.   Dez sectores para a participação da sociedade civil

3.1

O planeamento urbano e comunitário local é um sector onde as vantagens podem ser consideráveis no que toca à mitigação das alterações climáticas e poupança de energia. Um bom planeamento urbano deve incluir soluções respeitadoras do clima, tanto para a habitação como para os transportes. Estudos elaborados confirmaram já efeitos muito positivos no plano energético em função do posicionamento dos edifícios na paisagem ou na comunidade (3). As soluções arquitectónicas são importantes não apenas para que se tire o máximo partido da energia solar mas também para o isolamento dos edifícios. Outro aspecto a considerar é, obviamente, a importância das referidas soluções na formação de subúrbios, zonas metropolitanas e localidades que funcionem correctamente do ponto de vista social. É essencial que os parceiros sociais e a sociedade civil organizada estejam envolvidos desde o início no planeamento urbano e comunitário local.

3.1.1

A Comissão Europeia deveria lançar consultas com o poder regional e local, bem como com outras partes interessadas sobre orientações para o planeamento urbano tendo em conta as alterações climáticas em agravamento. O CESE propõe que a Comissão produza material informativo básico para o planeamento urbano, a par de orientações sobre soluções bem sucedidas.

3.2

A luta contra as alterações climáticas chamará a atenção para a necessidade de modernização e isolamento dos edifícios novos e dos já existentes, a par da aplicação de todas as técnicas e materiais relevantes para a poupança de energia. Os materiais de construção, sobretudo os específicos para o isolamento do calor, são um domínio que requer mais iniciativas. Não se trata apenas de tornar os sistemas de aquecimento mais eficientes, é também uma questão de isolar melhor as casas das temperaturas exteriores elevadas mas também das baixas. A experiência do Verão quente na Europa há alguns anos não deve ser esquecida. Poderia haver medidas fiscais para incentivar utilizadores privados a isolar novamente casas e apartamentos. O CESE recomenda a criação de um sistema de certificados de desempenho energético como forma de prestar aos consumidores informação sobre os custos energéticos de habitar uma determinada casa ou apartamento.

3.3

O transporte rodoviário está a aumentar rapidamente na UE. Os sistemas ferroviários têm dificuldades em competir com as vantagens do transporte rodoviário no que toca à rapidez da entrega porta-a-porta. Esta tendência é insustentável, tanto no que toca às emissões de CO2 como aos preços do combustível a aumentar. Para que a luta contra as alterações climáticas seja bem sucedida, há que dissociar o crescimento do PIB do crescimento do transporte rodoviário. Os passos práticos para alcançar esta meta ainda terão de ser definidos. Um sistema rápido de transporte ferroviário de mercadorias seria a resposta lógica, em particular na União alargada. O aumento do transporte ferroviário de mercadorias implicaria investimentos muito avultados. Em certa medida, os preços podem incentivar o transporte ferroviário de mercadorias. Para os consumidores, a rapidez da distribuição de produtos alimentares é essencial. Para a indústria é essencial que as entregas tenham lugar sem problemas e que sejam eficazes e pontuais. Por um lado, o congestionamento das auto-estradas é um poluente substancial e as frotas de camiões antigas aumentam ainda mais a poluição. Não há uma solução simples para a questão dos transportes no quadro mais vasto das alterações climáticas. É necessária uma estratégia com base em acções múltiplas, que inclua medidas de apoio a opções ferroviárias, mais investigação e trabalho de desenvolvimento, nomeadamente no sentido de desenvolver motores de camiões respeitadores do ambiente e que funcionem com combustíveis alternativos. Será importante para os consumidores conhecer o custo real do transporte de um determinado produto.

3.4

O sector das viagens e do lazer terá de fazer face a preços da energia cada vez mais altos — o que terá impacto tanto no transporte rodoviário como no aéreo. O preço do petróleo aumentou rapidamente nos últimos anos e representa presentemente um argumento muito convincente para os consumidores optarem por novas soluções. O aumento rápido do interesse em comprar viaturas pequenas e mais eficientes do ponto de vista energético é um sinal altamente promissor. Na realidade, este é um dos casos mais claros de situação vantajosa na luta contra as alterações climáticas: viaturas mais pequenas e menos poluentes e um grande mercado mundial potencial para esse tipo de viaturas e soluções. Os incentivos fiscais para a utilização de combustíveis alternativos também está a dar resultados promissores, como se pode constatar em alguns países.

3.5

Neste contexto, o volume de trânsito das pessoas que se deslocam diariamente de e para as zonas metropolitanas para trabalhar carece de uma atenção especial. O rápido crescimento das zonas metropolitanas, na UE e em outras partes do mundo, torna urgente a necessidade de tentar novas abordagens às deslocações diárias para trabalhar, bem como ao transporte de mercadorias. Em geral, as experiências com tarifas especiais para entrar no centro das cidades de viatura revelaram-se positivas, quando combinadas com grandes investimentos em transportes públicos rápidos e convenientes. A tomada de medidas contra a utilização das viaturas sem oferecer em troca algo semelhante geraria protestos públicos. Os cidadãos lutarão pelo direito de utilizarem viaturas ligeiras para transporte se as alternativas não forem adequadas. A sociedade civil organizada tem um papel crucial neste domínio.

3.6

Os referidos desafios são também parte da questão mais vasta da redução da importação e do uso de combustíveis fósseis na União Europeia. As incertezas no assegurar do aprovisionamento de combustíveis fósseis no Inverno de 2005-2006 aumentaram a urgência de novas soluções. Alguns Estados-Membros estão a lançar programas ambiciosos de redução drástica do uso de combustíveis fósseis e procuram mais alternativas renováveis, a par de novas políticas de promoção do uso de soluções eficientes do ponto de vista energético. Em alguns países, como a Suécia, os governos lançaram estudos sobre como reduzir drasticamente a importação e uso de combustíveis fósseis. A Comissão Europeia deveria lançar consultas com as partes interessadas e os governos dos Estados-Membros sobre os esforços no sentido de reduzir drasticamente as importações de combustíveis fósseis da UE. No final da década, todos os Estados-Membros deverão ter lançado iniciativas para identificar formas de conseguir reduzir consideravelmente a importação de combustíveis fósseis. Este passo poderia ser um grande contributo para o próximo programa de Quioto e para impedir as alterações climáticas a longo prazo. Constituiria, também, uma grande oportunidade tecnológica e industrial para a UE e traria grandes vantagens para a sociedade civil organizada.

3.7

A agricultura — e, por conseguinte, o preço dos alimentos — será directamente afectado pelas alterações climáticas e pelos efeitos decorrentes no preço da energia. A desertificação no sul da UE carecerá de medidas especiais de apoio, em conformidade com a solidariedade prevista pela PAC. A Comissão deveria iniciar estudos sobre os efeitos das alterações climáticas na agricultura da UE, com base em relatórios e análises nacionais. É essencial sublinhar a importância da investigação na prossecução da redução do uso de factores de produção em práticas agrícolas e do desenvolvimento de substitutos para derivados do petróleo à base de matéria-prima agrícola. O papel da agricultura na diversificação do aprovisionamento energético pode tornar-se cada vez mais importante. Por último, seria apropriado incentivar os agricultores a produzir a sua própria energia.

3.8

Os desafios para a indústria constituem outro domínio onde é essencial planeamento e adaptação. Não se trata apenas de uma questão para a indústria nas zonas de planície, onde as inundações podem ser, ou serão, um grande problema. Para a indústria, são essenciais soluções suaves e eficazes para as necessidades de transporte de mercadorias. As alterações climáticas poderão limitar a disponibilidade de matérias-primas. O aprovisionamento energético — a preços razoáveis — é essencial. As alterações climáticas também oferecem novas oportunidades à indústria. O mercado mundial de tecnologias de poupança de energia será muito vasto. As empresas com capacidade de investimento suficiente no desenvolvimento destas tecnologias podem ter pela frente futuro auspicioso.

3.9

As questões relacionadas com o local de trabalho são outro sector onde o planeamento para a adaptação é importante. Com o surgir de novas tecnologias de poupança de energia e de produção de bens com recurso a essas tecnologias, haverá uma procura de reforço adicional de competências. Algumas novas tecnologias para continuação da expansão limitarão consideravelmente os trabalhadores, por exemplo, na aplicação de nanotecnologias. As questões relacionadas com os desafios do local de trabalho são agravadas pelo aumento dos preços da energia. Haverá cada vez mais interesse nas oportunidades do trabalho a partir de casa — o que requer melhores técnicas TIC, incluindo a possibilidade de banda larga.

3.10

A gestão de catástrofes é outro domínio importante no contexto das alterações climáticas. As catástrofes relacionadas com o clima são cada vez mais frequentes e têm consequências mais amplas. Deveria ser criado na UE um órgão de resposta às catástrofes apto a prestar assistência atempada e imediata. Estas unidades já existem em alguns Estados-Membros. Há que criar órgãos semelhantes em todos os Estados-Membros, bem como uma certa coordenação e cooperação. Desta forma a UE teria capacidade de assistir as vítimas de catástrofes relacionadas com o clima não apenas na UE mas também em outras partes do mundo.

3.11

As catástrofes provocadas por condições climáticas extremas exigem grandes esforços financeiros, sobretudo das companhias de seguros. A frequência das catástrofes causará dificuldades ao sector dos seguros, com impacto nos custos dos seguros para os cidadãos. A Comissão Europeia deveria elaborar um estudo sobre estas questões com vista a salvaguardar o funcionamento sustentável do sistema de seguros.

4.   Adaptação e mitigação — mas como e por quem?

4.1

Informar o público das alterações climáticas e suas consequências será uma tarefa imensa. É importante que se adopte uma abordagem equilibrada e pragmática no sentido da sensibilização. Não se trata de assustar os cidadãos, mas sim de concentrar os esforços no trabalho prático que se perspectiva com vista a proporcionar a todos os cidadãos uma qualidade de vida sustentável.

4.2

O CESE propõe que os Estados-Membros criem gabinetes de contacto, informação e coordenação com capacidade para serviços de aconselhamento e elaboração de estudos sobre a adaptação e a mitigação das alterações climáticas. O intercâmbio de experiências com outros Estados-Membros e a transmissão dessa informação à sociedade civil e aos municípios deve ser uma parte importante do trabalho. O contacto com as comunidades locais, os parceiros sociais e a sociedade civil organizada será particularmente importante, bem como o contacto com a indústria e empresas.

4.3

O CESE propõe o lançamento de um Diálogo sobre as Alterações Climáticas e formas de combater a contínua deterioração do clima, bem como medidas no sentido da adaptação às alterações que já estão a ocorrer. Este Diálogo deveria ser apoiado pelas instituições da União Europeia mas a responsabilidade pelo trabalho prático deveria ser dos municípios, institutos de educação, sindicatos e organizações de empregadores, agricultores e consumidores e outros. O CESE está disposto a tomar parte activa no Diálogo e funcionar como centro de coordenação do intercâmbio e da avaliação.

4.4

O CESE manifesta satisfação pelo lançamento pela Comissão Europeia de um programa comunitário de informação e comunicação de grande alcance sobre as alterações climáticas. Será um grande contributo para a sensibilização para aquele problema. Os destinatários da proposta do CESE referente ao Diálogo sobre as Alterações Climáticas são as comunidades locais, regiões e países, com ênfase especial nos parceiros sociais e na sociedade civil organizada. Os dois programas complementar-se-iam de forma construtiva.

4.5

Uma parte essencial do Diálogo sobre as Alterações Climáticas seria a circulação de informação sobre exemplos de boas práticas, por exemplo, de países que elaborem planos de redução da dependência de combustíveis fósseis. Outro tipo de exemplo poderiam ser soluções metropolitanas para redução do uso de viaturas em deslocações pendulares para o centro das cidades (Londres e Estocolmo são apenas dois exemplos).

4.6

O Diálogo deveria ter início no Inverno de 2006-2007. Não necessita de um prazo para o seu termo. Deveria estar intimamente relacionado com os esforços para comunicar uma visão do desenvolvimento sustentável. As questões relacionadas com as alterações climáticas proporcionarão uma oportunidade para tornar o desenvolvimento sustentável um tema mais visível.

4.7

O diálogo com os cidadãos sobre as alterações climáticas não será possível sem a participação clara e contínua das partes interessadas a nível local e regional. Deveria ser disponibilizado apoio financeiro para planeamento e troca de experiências. Obviamente será necessário tempo para desenvolver capacidades nas comunidades, na sociedade civil organizada e entre os parceiros sociais.

4.8

Em 2012 terá lugar o seguimento da conferência das Nações Unidas sobre o desenvolvimento sustentável que teve lugar em 1992, no Rio de Janeiro, e em 2002, em Joanesburgo. O CESE recomenda vivamente que a próxima conferência, em 2012, centre as atenções em particular nas alterações climáticas e respectivo impacto mundial. A cooperação desenvolvida entre o CESE e a OIT e entre o CESE e o Conselho Económico e Social das Nações Unidas proporcionará oportunidades de estudos conjuntos sobre os efeitos das alterações climáticas a nível mundial. A cooperação ajudará igualmente a chamar a atenção para a forma como os parceiros sociais e a sociedade civil organizada podem ser partes activas na luta contra as alterações climáticas.

5.   Instrumentos de sensibilização e apoio

5.1

Promover a sensibilização para as alterações climáticas e suas consequências deveria começar por ser da responsabilidade do poder local, regional e nacional, com um apoio e iniciativas ao nível da UE. O objectivo deveria ser o recurso a uma abordagem ascendente que convide os cidadãos a proporem as soluções que preferem e não respostas já preparadas.

5.2

Entre as organizações da sociedade civil, as organizações dos consumidores serão particularmente importantes na mobilização dos consumidores e na promoção de um envolvimento dedicado. Os consumidores exercem — ou podem exercer — uma pressão considerável sobre o mercado através dos serviços e bens que consomem. Para os movimentos de consumidores europeus será um verdadeiro desafio.

5.3

Os parceiros sociais serão particularmente responsáveis pela análise do impacto das alterações climáticas na vida laboral e por propor uma mitigação relevante ou estratégias de adaptação. A dimensão social da luta contra as alterações climáticas é parte fundamental de todos os esforços.

5.4

Vencer a luta contra as alterações climáticas não será possível sem o apoio activo e a cooperação da indústria e das empresas. A indústria pode desempenhar um papel-chave na integração das alterações climáticas no planeamento, produção, comercialização e avaliação. As indústrias podem beneficiar da integração nos seus relatórios anuais de mais informação sobre o seu trabalho no domínio das alterações climáticas. O envolvimento activo nas questões relacionadas com as alterações climáticas pode revelar-se um conceito vencedor de comercialização.

5.5

Nos debates sobre os efeitos das alterações climáticas, muitos observadores manifestam o seu apoio a várias formas de incentivos fiscais ou financeiros. Não há dúvida de que estes podem produzir resultados claros. Contudo, deveriam ser aplicados com alguma precaução. Por exemplo, os impostos sobre o combustível para automóveis terão um impacto social negativo nas zonas com fraca densidade populacional. A cobrança de «taxas» nos veículos que entram no centro das cidades está a ter um impacto positivo na situação do tráfego em geral, mas esse sistema tem de ser acompanhado de novos investimentos em transportes públicos. De outro modo, esta cobrança provocará novos desequilíbrios socioeconómicos: quem puder suportar o custo continuará a utilizar os seus veículos, quem não puder terá de recorrer a um sistema de transportes públicos que pode ser ou não realmente eficiente.

5.6

Outro instrumento importante para a sensibilização seria a introdução de processos de gestão ambiental, tais como o Sistema de Ecogestão e Auditoria (EMAS), um sistema voluntário criado no âmbito do Regulamento do Conselho Europeu 761/01. O objectivo do EMAS é reconhecer e recompensar as organizações que vão além do cumprimento dos requisitos legais mínimos e que aperfeiçoam continuamente o seu desempenho ambiental.

5.7

Ao utilizar o EMAS, as organizações e instituições individuais exploram formas concretas de medir e reduzir o impacto ambiental de várias actividades, como, por exemplo, a utilização de energia e materiais e as deslocações em viatura, comboio ou avião. O Comité Económico e Social Europeu podia considerar a introdução do sistema EMAS e em particular explorar a possibilidade de calcular as emissões causadas pelas deslocações para as reuniões, introduzindo em seguida medidas compensatórias (ver anexo com cálculos preliminares).

5.8

Outra proposta em debate é o cálculo dos custos de transporte como parte do preço total de um produto. Os consumidores obteriam desta forma mais informação básica ao optar entre produtos alternativos.

6.   Um desafio para a sociedade civil

6.1

A sociedade civil organizada a nível europeu tem trabalhado as questões do desenvolvimento sustentável desde as conferências mundiais do Rio de Janeiro e de Joanesburgo.

6.2

A sociedade civil organizada tem uma oportunidade única para desempenhar um papel importante no Diálogo Europeu sobre as Alterações Climáticas. O contributo da sociedade civil poderia centrar-se essencialmente em 5 domínios:

Participar activamente na sensibilização para as alterações climáticas e os seus efeitos.

Mobilizar os consumidores e outros grupos vitais para a adopção de preferências de consumo claras que tenham em conta o impacto nas alterações climáticas.

Iniciar, influenciar e apoiar novos programas de planeamento urbano, incluindo habitação, transportes e deslocações pendulares.

Servir de intermediário entre os cidadãos e os governos em questões de mitigação das alterações climáticas e, numa perspectiva mais a longo prazo, travar o processo em curso.

Cooperar com a sociedade civil em outros países e regiões com vista a agir construtivamente no sentido de mitigar os efeitos das alterações climáticas.

6.3

Em conformidade com as declarações do Conselho Europeu, o CESE estabeleceu uma rede interactiva com todos os Conselhos Económicos e Sociais nos Estados-Membros da UE. A rede centra-se sobretudo na Estratégia de Lisboa.

6.4

O CESE está disposto a considerar a expansão da rede com vista a incluir questões relacionadas com as alterações climáticas e as respostas da Europa aos efeitos dessas alterações.

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Ver declaração de Rocard no Fórum CESE das Partes Interessadas em Abril de 2001.

(2)  COM(2005) 35 final, p. 9.

(3)  p. ex., o projecto de construção de habitações em Freiburg.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/109


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Destruição de cadáveres de animais e utilização de subprodutos animais»

(2006/C 318/18)

Em 19 de Janeiro de 2006, nos termos do disposto no n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, o Comité Económico e Social Europeu decidiu elaborar sobre a «Destruição de cadáveres de animais e utilização de subprodutos animais».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente que emitiu parecer em 11 de Julho de 2006, sendo relatora Maria Luísa SANTIAGO.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 115 votos a favor, 32 votos contra e 16 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões

1.1

A informação tem um papel fundamental na Sociedade, e o consumidor tem o direito de ser correcta e atempadamente informado e esclarecido sobre a qualidade dos alimentos que consome. Por isso, o CESE considera que são necessárias campanhas convenientes de informação e esclarecimento ao consumidor. Reafirma o CESE que a defesa da saúde pública e a garantia de segurança alimentar na produção europeia fazem parte dos princípios que ele, CESE, defende.

1.2

O CESE sugere que a Comissão Europeia prossiga e complete o mais rapidamente possível os estudos em curso que mostram, sem margem para dúvidas, que as farinhas de animais não ruminantes podem ser utilizadas na alimentação de suínos e de aves, sem risco para a saúde pública.

1.2.1

A identificação das proteínas, e os métodos usados na traçabilidade das respectivas farinhas, terão que dar ao consumidor a garantia absoluta de que os suínos são alimentados com farinhas provenientes exclusivamente de subprodutos de aves e as aves alimentadas com farinhas provenientes exclusivamente de subprodutos de suínos.

1.2.1.1

Terminadas estas operações, os subprodutos destes animais, saudáveis e abatidos em matadouros diferentes, poderão ser utilizados na produção de farinhas, cujas proteínas seriam claramente identificadas e rastreadas desde a sua origem.

1.3

O desenvolvimento de programas de investigação que permitam encontrar métodos para a destruição de cadáveres na exploração é fundamental na prevenção de possíveis alastramentos de doenças devido ao transporte.

1.4

O CESE recomenda que se promova a investigação de sistemas, se possível com produção de energia, que integrem o tratamento de todos os subprodutos e resíduos produzidos na exploração, com o fim de harmonizar a produção, garantindo a defesa do meio ambiente a curto e médio prazo, velando pelo equilíbrio económico das explorações e garantindo a segurança sanitária dos efectivos da exploração e a saúde do próprio produtor.

2.   Introdução

2.1

Passados seis anos sobre a crise da BSE, o Comité entendeu ser oportuno reequacionar o problema da eliminação de cadáveres e a utilização de subprodutos animais, tendo em conta a segurança alimentar, a defesa da saúde do consumidor e os problemas económicos da produção.

2.1.1

Os padrões de segurança alimentar da produção europeia são muito mais elevados que os dos países terceiros, mas eles são a garantia da segurança alimentar dos consumidores, da preservação do ambiente e da saúde e bem-estar animal. A sua manutenção, com os custos acrescidos para a produção que lhes são inerentes, só será possível com a manutenção da produção na Europa.

2.2

Antes da crise da BSE, a destruição dos cadáveres de animais mortos nas explorações suinícolas não constituía um problema para os produtores, pois os animais mortos podiam ser utilizados na produção de farinhas de carne, e estas utilizadas depois na alimentação animal. Assim, em vários países, as empresas que procediam à produção dessas farinhas faziam a recolha dos cadáveres de forma gratuita.

2.3

Com a crise da BSE e no seguimento do Regulamento n.o 1774/2002 de 3 de Outubro do Parlamento Europeu e Conselho, além da proibição da utilização das farinhas de carne na alimentação animal, passou a considerar-se os cadáveres como material de risco de categoria 2, o que implica transporte e destruição por incineração, tudo isto feito exclusivamente por empresas devidamente licenciadas.

2.4

Esta situação, como é lógico de ver, acarretou mais custos para os produtores e portanto aumentou a distorção da concorrência face a países terceiros. Este facto levou os produtores a tentar encontrar alternativas menos gravosas para a economia do sector, mas que fossem eficientes do ponto de vista da biossegurança e do meio ambiente.

2.5

A tendência actual do Comércio consiste num mercado mundial aberto, onde funcione somente a lei da oferta e da procura. No entanto, nós, os Europeus, sofremos uma terrível distorção na concorrência, pois decisões Técnico-científicas várias, têm levado a posições políticas que aumentam significativamente os nossos custos de produção face aos países terceiros.

2.6

Caso disso é a decisão 2000/766/CE do Conselho de 4 de Dezembro de 2000, que no artigo 2.o, alínea 1, proíbe o uso de proteínas animais na alimentação animal em todos os Estados-Membros. Esta decisão afectou todas as espécies animais. O Regulamento n.o 1774/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho de 3 de Outubro de 2002, no seu artigo 22.o, ponto 1, alínea a), consolida essa proibição, ampliando o prazo da mesma.

2.7

Como é fácil de entender, a crise desencadeada com o aparecimento da BSE nos bovinos e a sua relação com as Encefalopatias Espongiformes transmissíveis, afectou sectores de produção intensiva (Suinicultura e Avicultura) que não têm qualquer tipo de ajuda ou prémio à produção e trabalham com margens muito reduzidas e com grandes entraves ao seu desenvolvimento, devido a legislações de meio ambiente, bem-estar animal e dificuldades sanitárias.

2.8

A proibição da utilização das farinhas de carne trouxe um prejuízo enorme ao sector, que deixou de poder contar com uma fonte de proteína na ração, e viu subir o preço da proteína vegetal, em virtude do aumento de procura desta e consequentemente uma subida acentuada no preço do alimento. Por outro lado, os subprodutos de matador deixaram de ser uma mais-valia para ser um custo e este facto aliado à subida do preço das farinhas traduziu-se num inevitável aumento dos preços ao consumidor.

3.   Observações gerais

3.1   Aspectos legais e contradições técnico científicas relativo à eliminação de cadáveres de suínos

3.1.1

O Regulamento n.o 1774/2002 que definiu a obrigatoriedade de recolha e destruição dos cadáveres por empresas credenciadas e a proibição do uso de proteínas animais, além de ter trazido problemas económicos aos produtores dos países que já tinham esse sistema implementado, trouxe problemas muito mais graves aos países que não o tinham, pois tiveram que o implementar com custos ainda mais acrescidos. Esta situação levou os produtores desses países a questionar-se se esta norma visa compensar financeiramente os processadores de subprodutos pela proibição de venda de farinhas de carne.

3.1.2

Esta questão toma ainda mais força quando vemos que este regulamento abre uma excepção para as zonas remotas com fraca densidade de animais, onde é permitido manter métodos tradicionais para a destruição dos cadáveres. Não podemos ignorar que os custos de recolha nestas regiões seriam caríssimos. A esta excepção juntam-se mais duas:

os animais de companhia mortos podem ser eliminados directamente como resíduos, mediante enterramento;

os subprodutos animais podem ser eliminados como resíduos, mediante incineração e enterramento no local da exploração, no caso de aparecimento de uma doença que faça parte da lista A da OIE (Organização Internacional de Epizotias), desde que a autoridade sanitária competente considere que há risco de propagação da doença pelo transporte dos cadáveres dos animais, ou porque a unidade de processamento mais próxima se encontre com a sua capacidade preenchida.

3.1.3

Hoje em dia, tem havido uma necessidade crescente de colocar, sempre que possível, as explorações o mais afastado possível de povoações e também umas das outras. Assim, cada vez mais se procuram zonas remotas, para que não se incomodem vizinhos e se defendam sanitariamente os efectivos.

3.1.4

Como atrás se disse o processo de recolha é caríssimo, pelo que se pretende encontrar soluções que vão para além do proposto no regulamento e que sejam compatíveis com a realidade actual. Ao estudar essas opções, temos de ter sempre em consideração a saúde e segurança humana, a saúde e o bem-estar animal e a protecção do meio ambiente.

3.2   Aspectos legais e contradições técnico-científicas relativos ao uso de farinhas de carne

3.2.1

Não há qualquer evidência científica que mostre algum risco de contaminação de porcos e aves com a BSE. No Reino Unido não há a menor dúvida que porcos e aves estiveram expostos ao agente infeccioso (Prião) da Encefalopatia Espongiforme Bovina. Mesmo tendo sido alimentados com as mesmas proteínas animais que provocaram a BSE no gado bovino, não há um único caso de animais daquelas espécies contaminados. Os estudos realizados em frangos mostram também que são resistentes ao contágio tanto por via parentérica como oral (1).

3.2.2

Em questões relacionadas com a protecção da saúde e da segurança do consumidor, a Comissão toma as medidas para o controle de riscos baseada nos ensaios mais recentes de que dispõe e numa assessoria científica sólida tal como a emanada das directivas do Comité Director Científico (CDC). O próprio CDC é assessorado por um grupo Ad Hoc de Encefalopatia Espongiforme Transmissível/Encefalopatia Espongiforme Bovina composta por cientistas europeus.

3.2.3

A limitação do conhecimento em matéria de EET's está exposta nos seguintes trabalhos:

Parecer científico sobre a exposição oral dos seres humanos ao agente patogénico da BSE (Dose infecciosa e barreira de espécies) adoptado pelo CDC na reunião de 13 e 14 de Abril de 2000.

Informação científica sobre a inocuidade da farinha de carne e ossos procedente de mamíferos e utilizada como alimento de animais não ruminantes, do CDC de 24 e 25 de Setembro de 1998.

3.2.4

O assunto das EET's no gado suíno foi abordado e teve parecer do CDC:

Parecer científico adaptado pelo CDC na reunião de 24 e 25 de Junho de 1999, sobre o tema «Animais encontrados mortos»;

Parecer científico sobre o risco da reciclagem de subprodutos de origem animal em alimentos na propagação da doença a não ruminantes. CDC de 17 de Setembro de1999;

Parecer científico sobre a utilização de proteínas animais em todos os animais, adoptado pelo CDC em reunião de 27 e 28 de Novembro de 2000.

3.2.5

A conclusão resumida que podemos tirar de todos estes pareceres científicos é que não existe qualquer prova epidemiológica que os porcos, aves e peixes sejam susceptíveis de contrair a BSE e de que a BSE tenha afectado essas espécies. Até ao momento não existem nenhuns ensaios científicos que mostrem desenvolvimento de EET em porcos, aves ou peixes.

3.3   Análise da realidade dos problemas e possibilidade de tratar os subprodutos na exploração

3.3.1

O tratamento dos resíduos de uma exploração pecuária deve ser considerado numa perspectiva global que integre segurança alimentar, sanidade, bem-estar animal e respeito pelo meio ambiente.

3.3.2

Na UE produzem-se anualmente mais de 170 milhões de toneladas de resíduos de explorações pecuárias (2). A moderna exploração pecuária tem hoje uma gestão muito complexa e nela está incluído o destino a dar aos resíduos. Em relação à gestão dos cadáveres, devemos procurar métodos mais eficientes e rentáveis para a sua manipulação.

3.3.3

A problemática dos cadáveres de animais é muito complexa, pois se por um lado temos de ter em consideração o meio que nos rodeia, por outro lado temos também de analisar a possibilidade de transmissão de doenças em caso de transporte e também de higiene, segurança e saúde pública (3).

3.3.4

Com este trabalho queremos alargar o leque de opções para o produtor tendo sempre como princípio a defesa da saúde pública e o meio ambiente. Assim sugerimos a hidrólise, bem como todos os métodos que cumpram o atrás exposto, que devem também ser considerados (4).

3.3.5

A hidrólise, como tratamento primário de cadáveres animais, não difere biologicamente da hidrólise do resto das matérias orgânicas susceptíveis de auto degradar-se em condições controladas. A rota bioquímica da hidrólise está determinada pela capacidade de autólise. Basicamente as proteínas decompõem-se, produzindo aminoácidos, os glúcidos produzindo açúcares e os lípidos, produzindo ácidos gordos e álcool. No caso do porco, uma esterificação da matéria gorda faz com que o aspecto final da hidrólise seja denso e viscoso, comportando-se hidraulicamente como um líquido viscoso o que adiciona uma vantagem para o seu tratamento em condições controladas e que permite a sua veiculização hidrodinâmica. Para que a hidrólise seja mais eficaz, devem ser controlados alguns factores tais como o tamanho das partículas (trituração prévia dos cadáveres), controle de temperatura e tempo, controle de O2 atmosférico, para evitar a emanação de maus cheiros. O líquido proveniente da hidrólise, pode depois ser tratado em conjunto com o chorume da exploração, com vantagens acrescidas tais como:

a biossegurança (os cadáveres são geridos na própria exploração em condições controladas, diminuindo a possibilidade de transmissão de doenças a outras explorações);

o aumento da eficácia do processo tradicional de gestão de chorumes;

a eliminação de elementos patogénicos;

e a melhoria da gestão da exploração, pois os cadáveres e o tratamento dos chorumes são feitos no local, em tempo real (5).

3.3.6

A produção de energia através de biogás é importante e para tal podemos utilizar depósitos comunicantes, sem possibilidade de refluxo ou contacto com a atmosfera. No entanto, estamos também muito interessados no estudo de processos mais simples, adequados a explorações de menor dimensão e que também garantam a defesa da saúde pública e sanitária das explorações e do meio ambiente.

4.   Observações particulares

4.1

Hoje em dia a informação tem um papel fundamental na nossa sociedade. O consumidor tem o direito de estar devida e correctamente informado, o que raramente acontece, pois na imprensa é dado sempre realce a catástrofes e acidentes, e pouco se fala do que positivo se faz. Temos por isso de fazer um enorme esforço no sentido de dar a conhecer todo o trabalho que é feito no campo da saúde pública para que o consumidor possa optar conscientemente pelo que ache melhor.

4.2   Consequências económicas relativas à eliminação de cadáveres e resíduos animais

4.2.1

A gestão dos cadáveres está originando uma série de problemas logísticos (em países que não tinham o sistema de recolha implementado) e, nalguns casos, a recolha é incompatível com as boas práticas de defesa sanitária das explorações.

4.2.2

O impacto económico da directiva comunitária deve ser analisado em dois casos concretos:

4.2.2.1

Nos países onde não havia recolha de cadáveres em que serão necessários investimentos ao nível da exploração (tal como construção de estruturas de armazenamentos frigoríficos e estabelecimento de planos de recolha seguros dos cadáveres), ao nível de empresas de transporte, aquisição de camiões apetrechados para o serviço; ao nível das fábricas de subprodutos, modificações para processar animais inteiros (6).

4.2.2.2

Nos países com sistemas já implantados de recolha de cadáveres não são necessários investimentos adicionais. No entanto, uma vez que não se podem utilizar farinhas de carne, há que pagar a recolha e destruição dos mesmos (7).

4.3   Consequências económicas relativas à utilização de subprodutos animais

A proibição de utilização de proteínas animais nas rações dos suínos, aves e peixes, causou um aumento de custo significativo de produção na Europa e, assim, aumentaram os problemas de distorção de concorrência face a outros países como por exemplo Brasil, Argentina, E.U.A., onde é autorizada a sua utilização. Estas consequências de aumento de custo deram-se a vários níveis, pois os subprodutos de matadouro deixaram de ser um proveito, para ter um custo de destruição e o aumento de procura de proteína vegetal levou a um aumento de preço e consequentemente a uma subida no preço das rações (8).

4.3.1

Em termos concretos temos um acréscimo de custo de produção face aos países terceiros de:

Destruição de subprodutos:

:

6 euros/100 Kg de carcaça de porco (9)

Não utilização de farinhas animais:

:

0,75 euros/100Kg (10)

Aumento do preço da soja:

:

1,5 euros/100Kg (11)

Estes valores multiplicados pela produção anual de porcos indicam um prejuízo total na Comunidade de 173 milhões de Euros. A este aumento de custos junta-se um conjunto de factores de produção tais como alimentação, energia, mão-de-obra, normas de bem-estar animal e ambientais, que levam a que um kg de carcaça de porco tenha um custo de 0,648 euros/kg… no Brasil (12) contra 1,25 euros/kg na UE (13).

4.3.2

Em termos de negociações no âmbito da OMC esta distorção de concorrência nunca pode ser posta em cima da mesa pois se o fosse era imediatamente refutada uma vez que não é suportada por qualquer prova científica. A continuar esta situação ou compensamos a produção europeia ou ameaçamos a sua continuidade.

4.4   Elementos a considerar para um hipotético levantamento da proibição do uso de farinhas de carne de origem não ruminante na alimentação de suínos e de aves

4.4.1

Os elementos principais seriam a garantia de ausência de contaminações cruzadas de farinhas de carne, pelo que se pediu a um grupo de investigadores de diferentes organismos belgas a apreciação e posta em prática de técnicas que permitissem determinar a presença de proteínas animais de origem ruminante nas rações. Este grupo concluiu satisfatoriamente os seus trabalhos na primeira metade do ano 2004, emitindo a SANCO uma informação final datada de 24/09/2004«Determination of Processed Animal Proteins Including Meat and bone Meal in Feed» onde se apresentam métodos que garantem a possibilidade de detectar essas proteínas na ração. Esta situação já nos permitiria estabelecer canais de produção de farinhas de carne não ruminante perfeitamente rastreabilizadas (ou seja, cuja origem seria fácil de determinar) e monitorizadas, que nos pudessem levar a estabelecer uma primeira linha de canais de produção e reincorporação destes ingredientes, com todas as garantias de ausência de farinhas de origem ruminante (14).

4.5   Último obstáculo para voltar a incorporar farinhas de carne de origem não ruminante nas rações destinadas a porcos e aves

4.5.1

Actualmente, só falta desenvolver técnicas capazes de distinguir as proteínas de origem porcina das de origem avícola, para satisfazer outro pedido do Parlamento Europeu, ou seja, de garantir a ausência de canibalismos. A nível de farinhas de carne falar de canibalismo não é correcto. O canibalismo referencia um consumo directo e só pode ocorrer em algumas explorações de uma maneira acidental; no entanto, falar de canibalismo a nível de aminoácidos e ácidos gordos não é aceitável.

4.5.2

De todas as formas, independentemente das considerações anteriores, existe hoje em dia a possibilidade real de se estabelecer um mecanismo de monitorização de canais exclusivos de fornecimento de proteínas de origem suína para rações de aves e vice-versa. Isto porque:

Nunca se podem produzir farinhas de carne suína e avícola num mesmo matadouro, porque estas espécies exigem instalações de abate distintas;

Havendo fábricas que produzem só rações de aves e outras só rações de porcos, não é possível haver qualquer confusão nas mesmas;

O mesmo se aplica a fábricas que tenham linhas distintas de produção conforme as espécies.

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  (D. Mattews e B. C. Cooke, Rev. Sci. Tecl. Int. Eprit. 2003, 22(1), 283 — 296). Outro estudo relevante: Poultry, pig and the risk of BSE following the feed ban in Francea spatial analysis. Abrial D, Calavas D, Jarrige N, Ducrot C; Vet. Res. 36 (2005)615-628.

(2)  Tabela n.o 1 — Inventário de resíduos zootécnicos (EU15) — Fonte EUROSTAT/MAPYA 2003.

(3)  Tabela n.o 2 — Contabilização de resíduos e subprodutos, provenientes de explorações pecuárias (Fonte EUROSTAT/MAPYA).

(4)  

Risk assessment: use of composting and biogas treatment to dispose of catering waste containing meat (Final report to the department for Environment, Food and Rural Affairs). Gale P. (2002). In http://www.defra.gov.uk/animalh/by-prods/publicat/

Informe final relativo a los resultados obtenidos en los proyectos de estudio de alternativas a sistemas de cadáveres. Antonio Muñoz LunA, Guillermo Ramis Vidal, Francisco José Pallarés Martínez, Antonio Rouco Yáñez, Francisco Tristán Lozano, Jesús Martínez Almela, Jorge Barrera, Miriam Lorenzo Navarro, Juan José Quereda Torres. (2006)

(5)  Estudos nesta área:

Informe final de resultados sobre la hidrolización de cadáveres animales no ruminantes: experiencia en ganado porcino. Lobera JB, González M, Sáez J, Montes A, Clemente P, Quiles A, Crespo F, Alonso F, Carrizosa JA, Andujar M, Martínez D, Gutiérrez C.

Parámetros Físico-químicos y bacteriológicos de la hidrolización de cadáveres de animales no ruminantes con bioactivadores. Gutiérres C, Fernández F, Andujar M, Martín J, Clemente P, Lobera JB CARM-IMIDA. http://wsiam.carm.es/imida/publicaciones%20pdf/Ganader%EDa/Gesti%F3n%20de%20Residuos%20Ganaderos/Hidrolizaci%F3n%20de%20Cad%E1veres/Resultados%20del%20Estudio%20Preliminar.pdf

(6)  Foram feitos cálculos que apontam para um aumento do custo de produção de 0,36 a 0,96 € por animal produzido, dependendo da localização e da dimensão da exploração, sendo certo que serão sempre mais penalizadas as mais pequenas.

(7)  Temos assim um custo adicional para o produto, que varia entre os 0,3 e 0,5 € por animal produzido.

(8)  Estudos efectuados pelo grupo de trabalho da Universidade de Múrcia chefiados pelo Prof. Dr. António Muñoz Luna, DMV, PhD, MBA.

(9)  Fonte INRA( Institue National de Recherche Agricole).

(10)  Cálculo na base do preço médio das matérias-primas antes e depois da interdição aplicando uma dieta tipo para o porco de engorda.

(11)  Idem 10

(12)  Custo de produção de uma exploração de 1200 porcas em ciclo fechado com uma produtividade de 20,3 leitões desmamados por porca/ano, situada no Estado do Paraná.

(13)  Exploração de 500 porcas em ciclo fechado com uma produtividade de 23 leitões/porca/ano, situada em Portugal.

(14)  Outros estudos tratando deste tema:

Effective PCR detection of animal species in highly processed animal byproducts and compound feeds. Fumière O, Dubois M, Baeten V, von Holst C, Berben G. Anal Bioanal Chem (2006) 385: 1045-1054.

Identification of Species-specific DNA in feedstuffs. Krcmar P, Rencova E.; J. Agric. Food Chem. 2003, 51, 7655-7658.

Species-specific PCR for the identification of ovine, porcine and chicken species in meat and boné meal (MBM). Lahiff S, Glennon M, O'Brien L, Lyng J, Smith T, Maher M, Shilton N. Molecular and Cellular Probes (2001) 15, 27-35.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/114


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Regulamento do Conselho que prevê medidas especiais tendo em vista favorecer a criação do bicho-da-seda»

(versão codificada)

COM(2006) 4 final — 2004/0003 CNS

(2006/C 318/19)

Em 8 de Fevereiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 37.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente emitiu parecer em 11 de Julho de 2006 (relatora: A. LE NOUAIL).

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 168 votos a favor, 7 votos contra e 17 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

A proposta da Comissão consiste na codificação do Regulamento (CEE) n.o 845/72 que prevê medidas especiais tendo em vista favorecer a criação do bicho-da-seda ou bombyx da amoreira (Bombyx mori (Linnaeus, 1758)), segundo o processo acelerado previsto no acordo interinstitucional de 20.12.1994.

1.2

A codificação diz respeito a actos jurídicos muitas vezes modificados no decorrer dos tempos, e que, por isso, se tornam de difícil leitura.

2.   Observações na generalidade

2.1

O regulamento acima entrou em vigor há mais de trinta anos. Foi por várias vezes substancialmente remodelado e tornou-se difícil, para os destinatários desta legislação, compreender o conteúdo e o alcance sem um trabalho de análise jurídica e de recomposição do texto efectivamente aplicável.

2.2

O Comité aprova a proposta de codificação que facilita o acesso ao direito dos cidadãos europeus e contribui, como ele deseja e o exprimiu em pareceres anteriores (1), para uma melhor legislação.

3.   Observações na especialidade

3.1

É também conveniente colocar a questão da utilização de outros processos de simplificação, por exemplo, a revogação ou a actualização da legislação em questão.

3.2

A sericultura, que se desenvolveu consideravelmente no sul da Europa desde o século XIII, conheceu o apogeu no século XIX e depois desmantelou-se na sequência de uma epidemia que atacou o Bombyx mori, insecto cujo casulo, que serve para a sua metamorfose, é feito de um só fio de seda, utilizado na indústria têxtil. A reintrodução de «grãos» (2) sãos não conseguiu relançar a criação do bicho-da-seda, que exige muita assistência, nem a produção de amoreiras, cujas folhas constituem o alimento exclusivo da larva, que é consumida em grandes quantidades, e tem que ser quotidianamente colhida. Hoje em dia, a indústria depende quase exclusivamente das importações, sobretudo provenientes da China e do Vietname.

3.3

O Comité, tendo em conta as diversas utilizações da seda, que requerem diferentes qualidades, bem como as novas aplicações que a investigação permite antever no futuro, considera que conviria manter as bases de uma sericultura na Europa; esta actividade permite, além do mais, conservar empregos nas regiões menos favorecidas ou periféricas (3). Uma ajuda por caixa de ovos de bicho-da-seda, como previsto no regulamento, é indispensável para a perenidade de uma actividade com muita concorrência de importações maciças de países terceiros com custo de mão-de-obra muito baixo. A seda europeia convém, além do mais, para aplicações actuais e poderá permitir eventuais aplicações futuras, que justificam a manutenção de uma produção comunitária.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Entre outros, ver o parecer exploratório do CESE «Legislar melhor», 2005 (relator: Daniel RETUREAU) INT/265 — JO C 24 de 31.1.2006, pág. 39.

(2)  Ovos da borboleta Bombyx mori.

(3)  Metade da produção europeia é proveniente das Ilhas Canárias.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/115


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 76/769/CEE do Conselho relativa à limitação da colocação no mercado de certos instrumentos de medição contendo mercúrio»

COM(2006) 69 final — 2006/0018 (COD)

(2006/C 318/20)

Em 8 de Março de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, emitiu parecer em 11 de Julho de 2006, com base no projecto da relatora G. CASSINA.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 181 votos a favor, 5 votos contra e 8 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões

1.1

Com base na argumentação dos pontos 2 e 3, o CESE:

a)

apoia a proposta da Comissão e a escolha da base jurídica (artigo 95.o do Tratado) e concorda com o objectivo da estratégia de conseguir a eliminação total do mercúrio dos instrumentos de medição referidos no ponto 2.2,

b)

considera que a proposta em apreço é coerente com outras regras e políticas comunitárias em matéria de ambiente e de saúde pública,

c)

pretende que seja acelerada a substituição com produtos alternativos isentos de mercúrio (através de eventuais incentivos e de campanhas de informação e sensibilização para impedir a permanência em circulação de instrumentos com mercúrio potencialmente perigosos), e que os custos de substituição se reflictam igualmente nos preços para os consumidores,

d)

solicita que sejam indicados percursos de recolha diferenciada e que sejam os vendedores a responsabilizar-se pela recolha dos instrumentos deitados ao lixo (como acontece, num âmbito diferente, para os aparelhos eléctricos e electrónicos),

e)

solicita à Comissão que especifique quais as garantias que existem para que os sectores excluídos (ambientes profissionais e industriais) sejam obrigados a funcionar em conformidade com o objectivo da não disseminação do mercúrio no ambiente,

f)

convida as autoridades comunitárias e dos Estados-Membros a verificarem com atenção que os produtos importados estão em conformidade com a legislação da UE.

2.   Introdução e conteúdo da proposta

2.1

A proposta de directiva em análise segue as orientações indicadas na Comunicação relativa a uma estratégia comunitária sobre o mercúrio  (1), de 28 de Janeiro de 2005. Partindo da consideração, que passou a ser reconhecida ao nível mundial, de que o mercúrio é nocivo e constitui um grave perigo para os seres humanos, os ecossistemas e a fauna selvagem, esta estratégia propõe uma série de intervenções que têm em vista a protecção da saúde humana e do ambiente. A estratégia pretende eliminar o mercúrio de todas as actividades em que já é possível actualmente a sua substituição por substâncias ou produtos alternativos capazes de evitar os efeitos nocivos que têm incidência no desenvolvimento neurológico, no sistema imunitário e no aparelho reprodutivo.

2.2

Neste quadro, a Comissão propõe a alteração (2) da Directiva 76/769/CEE como passo na aplicação da estratégia geral. Está prevista a proibição da colocação no mercado dos seguintes instrumentos contendo mercúrio:

(a)

termómetros para medir a temperatura do corpo;

(b)

outros aparelhos de medição destinados à venda ao grande público (como manómetros, barómetros, esfigmomanómetros, etc.).

2.3

Com base nas proibições e/ou restrições já em vigor em alguns Estados-Membros e, consequentemente, com base na experiência adquirida, exclui-se porém a aplicação da proibição a instrumentos e a aparelhos utilizados no âmbito científico e industrial, já que o número de tais aparelhos é relativamente limitado e são manipulados em ambientes altamente especializados já sujeitos a regras e a procedimentos de controlo para a segurança do trabalho e a gestão dos resíduos perigosos, ou então estão abrangidos pelo âmbito de aplicação do programa REACH.

3.   Observações na generalidade

3.1

Embora em alguns Estados-Membros tivesse sido iniciada a progressiva eliminação do mercúrio, substituído por produtos alternativos, calcula-se que ainda hoje na Europa (3) se utilize cerca de 33 toneladas por ano de mercúrio em aparelhos de medição e controlo, das quais cerca de 25 a 30 toneladas são colocadas no mercado através dos termómetros.

3.2

Por conseguinte, o mercúrio e os seus derivados mais tóxicos estão presentes nos fluxos dos resíduos domésticos na medida em que os termómetros e os outros instrumentos de medição são deitados no lixo, na maior parte dos casos, depois de serem utilizados ou no caso de se partirem. A colocação de resíduos em aterros ou as formas de deposição não adequadas permitem que os resíduos de mercúrio se infiltrem nas águas residuais e contaminem o ambiente. Assim, verifica-se a presença de mercúrio nos géneros alimentares, com particular perigo para a cadeia alimentar aquática, o que torna particularmente vulneráveis os consumidores de peixe e de moluscos (especialmente nas zonas mediterrânicas).

3.3

O CESE nota que existem e que já estão no mercado instrumentos que desempenham a mesma função do que os instrumentos referidos na proposta de directiva e que contêm substâncias alternativas ao mercúrio. Por conseguinte, a substituição já é possível agora e, aparentemente, sem custos adicionais (cfr. todavia também o ponto 4.1, alíneas b, c, e)). Porém, o estudo de impacto não refere minimamente os custos de substituição que vão pesar sobre os consumidores, enquanto que o CESE solicita que se quantifiquem e integrem medidas de apoio no mecanismo de aplicação da directiva.

3.4

O CESE apoia com convicção o objectivo da Comissão de proibir a comercialização dos instrumentos contendo mercúrio referidos na proposta: o perigo e a persistência do mercúrio não precisam de ser demonstrados, e a proibição dos instrumentos contendo mercúrio contribui para atingir um elevado nível de protecção do ambiente e da saúde humana, como indica a base jurídica da disposição (artigo 95.o do Tratado) que o CESE considera absolutamente correcta e adequada.

4.   Observações na especialidade

4.1

O CESE observa todavia que:

a)

a exclusão dos instrumentos contendo mercúrio que são utilizados em ambientes profissionais ou industriais, deve ser garantida pela certeza de que, quando forem deitados ao lixo, a reciclagem ou a recuperação desses instrumentos implique um tratamento do mercúrio que evite a sua disseminação e os respectivos riscos para o ambiente e a saúde humana; é importante que sejam efectuados controlos adequados, e que sejam facilitados apoios à formação e consulência, em particular nas empresas de tipo artesanal ou de pequenas dimensões do sector da ourivesaria em que o mercúrio ainda é largamente utilizado em tarefas específicas,

b)

tanto no estudo de impacto como na proposta, parece ter sido subestimado o problema da colocação nos resíduos urbanos de instrumentos contendo mercúrio e que ainda estão actualmente em uso: seria útil alertar os Estados-Membros para a necessidade/utilidade de aplicar um sistema de incentivos (tipo «desmantelamento») para acelerar o mais possível a substituição dos instrumentos que são objecto desta directiva.

c)

a retirada dos instrumentos contendo mercúrio que ainda se encontram em circulação pode ser incentivada através de medidas de apoio financeiro, mas sobretudo através de campanhas de informação adequadas destinadas aos utilizadores; estas campanhas pretendem torná-los conscientes dos riscos existentes e responsabilizá-los, bem como recomendar que não coloquem mercúrio nos resíduos urbanos e ainda menos que permitam a sua manipulação pelas crianças; todavia, os consumidores que procedam rapidamente à substituição devem receber incentivos adequados,

d)

a retirada dos instrumentos em questão deve ser feita através de uma recolha diferenciada gerida pelos vendedores dos instrumentos que são objecto da presente proposta de directiva, com base no modelo previsto na directiva relativa aos aparelhos eléctricos e electrónicos,

e)

também deve ser dada especial atenção à conformidade dos produtos de importação, para que os benefícios induzidos pela legislação restritiva da UE não sejam anulados por produtos de países terços que não têm em conta os riscos que implica uma utilização imprópria do mercúrio.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2005) 20 final.

(2)  Através da adenda de um ponto específico 19 bis, ao Anexo I da Directiva 76/769 CEE.

(3)  Com base em informações fornecidas pela Comissão Europeia.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/117


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Melhoria da situação económica no sector das pescas»

COM(2006) 103 final

(2006/C 318/21)

Em 9 de Março de 2006 a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente emitiu parecer em 11 de Julho de 2006. Relator: SARRÓ IPARRAGUIRRE.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro), Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 120 votos a favor, 16 votos contra e 9 abstenções, o presente parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE, dada a importância económica e social do sector pesqueiro na União Europeia, que vai além da contribuição directa para o PIB (1) e estando de acordo com o diagnóstico sobre a crítica situação económica deste mesmo sector que a Comissão apresenta na sua Comunicação (2), considera, sem perder de vista a necessidade de actuar para melhorar tal situação, que as acções propostas para salvar o sector da crise não são nem realistas nem suficientes. O CESE tem para si que as acções não são realistas porque a grande maioria das empresas são empresas familiares e proprietárias de uma única embarcação, trabalhando em zonas de pesca com recursos limitados, com tripulações mínimas, com normas de gestão de pescas rigorosas e com muito pouca margem de manobra para poder realizar acções que permitam reestruturar e assegurar a viabilidade das empresas a curto prazo.

1.2

Por outro lado, ao não existir um novo orçamento comunitário, distinto do IFOP/FEP (3), as possibilidades de pôr em prática estas novas medidas são muito limitadas. Por isso, o CESE considera que esta comunicação terá poucos efeitos práticos para a maioria das empresas.

1.3

No entanto, para as empresas que, pela sua dimensão, tentarão ter acesso aos auxílios de emergência e reestruturação, o CESE considera que a comunicação deveria oferecer:

um orçamento comunitário distinto do contemplado pelo IFOP/FEP;

auxílios de emergência a fundo perdido, cujo prazo de aplicação seja superior a 6 meses;

flexibilização e agilidade nos programas nacionais que os Estados-Membros devem apresentar de forma a permitir às empresas que o solicitem aceder rapidamente aos auxílios previstos.

1.4

Além dos auxílios de emergência e reestruturação de empresas em crise, o Comité considera que para poder atenuar as graves consequências que o elevado preço dos combustíveis está a provocar nas empresas de pesca e nos seus tripulantes, dever-se-ia dar início a outra série de medidas. Em particular, o CESE propõe à Comissão e ao Conselho a adopção das seguintes medidas:

a)

Aumento do limite das ajudas de minimis até 100.000 euros por empresa.

b)

Paralisação temporária da frota em caso de «acontecimento imprevisível», assimilando este à crise provocada pelo elevado preço do gasóleo.

c)

Autorização de auxílios para financiar os prémios de contratos de cobertura, tal como acontece com os seguros agrícolas.

d)

Criação de um fundo especial comunitário de abates, dotado de um orçamento extraordinário, que dê aos segmentos da frota com mais problemas e prioridade que permita que os armadores que voluntariamente queiram abandonar a actividade o possam fazer de forma digna.

e)

Máximo apoio das administrações públicas, tanto nacionais como comunitárias, através de ajudas de I+D+I (4), aos projectos apresentados pelo sector das pescas, para melhorar a eficiência energética da pesca, para a procura de energias alternativas ou complementares ao gasóleo e para o desenvolvimento das plataformas tecnológicas pesqueiras.

f)

Dirigir esforços para alterar a mentalidade dos pescadores para fazer com que estes participem na comercialização dos produtos de pesca, tentando assim conseguir aumentar o valor acrescentado desses produtos.

g)

Revisão da fiscalidade da frota costeira, nomeadamente pela introdução na legislação da isenção do Imposto sobre Sociedades dos montantes obtidos pelas entidades concessionárias das lotas pela sua intervenção na primeira venda do produto da pesca e a redução do Imposto sobre o Valor Acrescentado das operações de intermediação por elas efectuadas.

h)

Incorporação da frota de pesca longínqua que opera fora das águas comunitárias nos segundos registos existentes para a frota mercante em vários Estados-Membros da UE, alterando as directrizes comunitárias sobre auxílios estatais para o sector da pesca.

2.   Justificação do parecer de iniciativa

2.1

O sector não fornece apenas uma parte substancial das proteínas necessárias ao consumo humano, como dá também uma importante contribuição para o tecido económico e social de muitas comunidades costeiras na UE. Segundo os dados da Comissão (5), a União Europeia alargada (UE 25) representa, com 7 293 101 toneladas de peixe (capturas e aquicultura), 5 % da produção total mundial de produtos da pesca, sendo o segundo maior produto mundial a seguir à China. Conta, igualmente, com uma frota de um pouco menos de 90 000 embarcações de pesca que geram 229 702 postos de trabalho.

2.2

O sector enfrenta ajustamentos difíceis, devido à diminuição e mesmo ao depauperamento da das unidades populacionais na maioria dos seus pesqueiros, alguns quase esgotados, e às condições de mercado desfavoráveis. De acordo com a comunicação, desde meados da década de noventa têm diminuído as quotas atribuídas às embarcações que pescam na Europa ocidental as principais espécies demersais (bacalhau, arinca, badejo, escamudo e pescada) e bentónicas (solha, linguado, tamboril e lagostim).

2.3

A reforma da política comum da pesca (PCP) de 2002, embora tenha começado a modernizar a gestão dos pesqueiros na União Europeia, colocando-a no caminho da sustentabilidade, implicou diversas medidas, nomeadamente os planos de recuperação, que restringem as capturas dos pescadores, provocando a drástica redução dos lucros, situação que se prolongará no futuro.

2.4

Esta situação, juntamente com o normal e continuado aumento dos custos operacionais e a espectacular subida dos preços dos combustíveis, fez com que muitos navios estejam a operar com grandes perdas.

2.5

Na presente comunicação, a Comissão, na comunicação, identifica a origem das dificuldades económicas de grande parte da frota comunitária e sugere vias para superar esta situação.

3.   Historial

3.1

Na origem das dificuldades, a Comissão, na comunicação, identifica duas circunstâncias facilmente compreensíveis:

Redução dos rendimentos.

Aumento dos custos.

3.1.1

A redução dos rendimentos tem por base:

Estagnação dos preços de mercado

Proporção crescente das importações de peixe.

Desenvolvimento da aquicultura.

Concentração das vendas nas grandes cadeias de distribuição.

Quebra dos rendimentos da pesca

Intenso esforço de pesca incidindo em determinadas unidades populacionais.

Redução insuficiente da capacidade da frota.

3.1.2

Os custos de exploração das embarcações, que habitualmente aumentam ano após ano, sofreram um aumento enorme desde 2003 com o aumento dos custos de combustível, afectando todas as frotas de pesca, especialmente os arrastões de fundo, que constituem, de longe, o maior segmento da frota de pesca comunitária, cujo resultado operacional líquido é negativo.

4.   Observações na generalidade

4.1

Como uma das soluções para fazer face às actuais dificuldades económicas do sector das pescas, a Comissão sugere que se adoptem acções:

A curto prazo, para recuperar e reestruturar as empresas de pesca que podem tornar a ser rentáveis através de alterações estruturais.

A longo prazo, para que o sector das pescas se possa adaptar à nova conjuntura caracterizada pelo preço elevado dos combustíveis.

4.1.1   Recuperação e reestruturação a curto prazo

4.1.1.1

Para salvar e reestruturar as empresas de pesca em risco de falir ou em declínio financeiro, a Comissão prevê a possível utilização dos instrumentos existentes e o actual quadro de auxílios estatais, baseado nas Orientações comunitárias relativas aos auxílios estatais de emergência e de reestruturação de empresas em dificuldade (6), bem como nas Directrizes para o exame dos auxílios estatais no sector das pescas e da aquicultura (7). Prevê, além disso, algumas excepções que vão além das Orientações e Directrizes (ver pontos 4.1.1.5 e 4.1.1.6).

4.1.1.2

O auxílio em causa, que não poderá ser concedido por mais de seis meses, reveste a forma de um empréstimo reembolsável ou uma garantia. O objectivo é que as empresas de pesca se possam adaptar à nova conjuntura de preços de combustível, em especial no caso dos navios que usam artes rebocadas e exercem a pesca dirigida a unidades populacionais demersais. Quando o auxílio de emergência for seguido de um plano de reestruturação aprovado, poderá ser reembolsado com o apoio recebido pela empresa sob a forma de auxílio à reestruturação.

4.1.1.3

O CESE tem para si que, para que o auxílio em causa possa realmente ser eficaz, deverá ser concedido a título de fundo perdido e não de um empréstimo ou garantia reembolsável, já que, desta forma, o auxílio de emergência teria um valor acrescentado que o poderia tornar mais atractivo para as empresas. Senão, poder-se-ia obter um simples empréstimo reembolsável junto de qualquer organismo financeiro, sem necessidade de autorização por parte da Comissão Europeia.

4.1.1.4

O auxílio à reestruturação das empresas de pesca com vista a restabelecer a viabilidade económica implicará com frequência a realização de investimentos para adaptar os navios de pesca. As Orientações sobre ajudas estatais ao sector das pescas estabelecem, entre outras, as normas que permitem os auxílios à modernização e ao equipamento dos navios de pesca, em conformidade com as normas estabelecidas no Regulamento relativo ao Instrumento Financeiro de Orientação da Pesca (IFOP) (8). As condições de concessão de auxílios nacionais para esses fins são idênticas às aplicáveis aos auxílios da Comunidade ao abrigo do Regulamento IFOP (9).

4.1.1.5

A Comissão prevê, excepcionalmente, a autorização para a concessão de auxílios nacionais para determinados tipos de modernização não contemplados pelo Regulamento IFOP, caso se destinem à reestruturação de empresas de pesca no âmbito de regimes de auxílios nacionais de emergência e reestruturação. Com vista a essa autorização, a Comissão avaliará os regimes em causa com base nas Orientações comunitárias, desde que a reestruturação das empresas se baseie em premissas económicas realistas no contexto actual, tendo também em conta o estado e a possível evolução das unidades populacionais-alvo e assegure a rentabilidade das empresas mediante a redução dos custos operacionais sem aumentar nem o esforço, nem a capacidade de pesca actual.

4.1.1.6

A autorização, com carácter excepcional, da Comissão às ajudas estatais no âmbito dos programas nacionais de auxílios de emergência e reestruturação, será para os seguintes investimentos:

a)

Uma primeira alteração de uma arte de pesca que resulte num método de pesca com menor consumo de combustível.

b)

A aquisição de equipamentos para aumentar a eficiência dos combustíveis, tais como económetros.

c)

Uma substituição do motor, desde que:

1.

No caso dos navios de comprimento de fora a fora inferior a 12m que não utilizem artes rebocadas, o novo motor tenha uma potência igual ou inferior à do motor anterior.

2.

No caso de todos os outros navios de comprimento de fora a fora não superior a 24m, o novo motor tenha uma potência inferior em, pelo menos, 20 % à do motor anterior.

3.

No caso dos arrastões de comprimento de fora a fora superior a 24m, o novo motor tenha uma potência inferior em, pelo menos, 20 % à do motor anterior e o navio seja reconvertido num método de pesca que implique um menor consumo de combustível.

4.1.1.7

A Comissão poderá aceitar, nos regimes nacionais que autorizem um plano de reestruturação de empresas individuais que exploram vários navios de comprimento de fora a fora superior a 12m, que a redução da potência do motor referida nos n.os 2 e 3 do ponto 4.1.1.6. c) supra se aplique «globalmente» ao nível da empresa, bem como que o abate de um navio sem recurso a um auxílio público seja também imputado à taxa de redução solicitada.

4.1.1.8

Do mesmo modo, podem ser aceites os regimes nacionais que autorizem a apresentação de planos de reestruturação por grupos de pequenas e médias empresas (PME). Neste caso, a rendibilidade de alguns membros do grupo poderá ser reforçada por acções, tais como o abate, executadas por outros.

4.1.1.9

Durante a cessação temporária das actividades pelo tempo necessário à realização dos supracitados investimentos autorizados, as empresas poderão solicitar os auxílios estatais correspondentes, desde que sejam concedidos no âmbito dos referidos regimes de emergência e reestruturação.

4.1.1.10

Quaisquer outros auxílios públicos, incluindo apoio comunitário, concedidos a uma empresa em dificuldade, deverão ser tidos em conta na avaliação global dos planos de reestruturação e da viabilidade a longo prazo.

4.1.1.11

Os Estados-Membros deverão notificar à Comissão, no prazo de dois anos a contar da publicação da presente comunicação, esses regimes e, se pertinente, os planos individuais, no caso das empresas de maiores dimensões. Os Estados-Membros adoptarão as decisões administrativas sobre os planos de reestruturação no prazo de dois anos após a notificação da aprovação do plano pela Comissão.

4.1.1.12

Dado que as actuais dificuldades económicas afectam particularmente os navios que utilizam artes rebocadas, a Comissão considera que os arrastões devem constituir os principais destinatários dos auxílios à reestruturação.

4.1.1.13

Sobre as ajudas directas ao funcionamento, na actual conjuntura de elevados preços de combustível, a Comissão rejeita na Comunicação qualquer intervenção pública para compensar este aumento dos custos, já que constituiria uma ajuda ao funcionamento incompatível com o Tratado.

4.1.1.14

Como alternativa, a Comissão poderia aceitar um sistema de garantia, solicitado pela indústria de pescas, mediante o qual os montantes pagos pelo sector quando a conjuntura se mostra favorável poderiam ser reembolsados, sob a forma de compensação, em caso de aumento súbito do preço dos combustíveis. A Comissão poderia apenas aprovar tal sistema se o mesmo fornecesse garantias de reembolso de todos os auxílios públicos nas condições comerciais.

4.1.1.15

O CESE, embora estando de acordo com o diagnóstico sobre a crítica situação económica do sector de pescas comunitário que a Comissão apresenta na sua Comunicação, considera que as acções propostas para salvar o sector da crise não são nem realistas nem suficientes. O CESE tem para si que as acções não são realistas porque a grande maioria das empresas são familiares e proprietárias de uma única embarcação, trabalhando em zonas de pesca com recursos limitados, com tripulações mínimas, com normas de gestão de pescas rigorosas e com muito pouca margem de manobra para poder realizar acções que permitam reestruturar e assegurar a viabilidade das empresas a curto prazo. Por outro lado, ao não existir um novo orçamento, distinto do IFOP/FEP, as possibilidades de pôr em prática estas novas medidas são muito limitadas. Por isso, o CESE considera que esta Comunicação terá poucos efeitos práticos para a maioria das empresas.

4.1.1.16

No entanto, para as empresas que, pela sua dimensão, tentarão aceder aos auxílios de emergência e reestruturação, o CESE considera que a Comunicação deveria oferecer:

Um orçamento distinto do contemplado pelo IFOP/FEP.

Que os auxílios de emergência sejam a fundo perdido e o seu prazo de aplicação superior a 6 meses.

Flexibilização e adaptabilidade nos programas nacionais que os Estados-Membros devem apresentar de forma a permitir às empresas que o solicitem aceder rapidamente aos auxílios previstos.

4.1.1.17

O CESE lembra à Comissão que, a curto prazo, uma acção eficaz pode ser a aplicação dos auxílios de minimis. No entanto, o Comité estima que o limite previsto na legislação actual (3.000 euros por empresa num período de três anos) é muito reduzido e não corresponde à realidade, sobretudo tendo em conta que os demais sectores da UE, salvo a agricultura, têm um limite de 100.000 euros. Por isso, o Comité considera necessária a urgente revisão da legislação que regula os auxílios de minimis para a pesca, aumentando o limite para 100.000 euros, como os demais sectores. O CESE já tinha aduzido esta observação no seu parecer sobre o «Auxílios estatais: Plano de acção. Menos auxílios estatais mais orientados: um roteiro para a reforma dos auxílios estatais 2005-2009» (10).

4.1.1.18

Igualmente, outra medida possível e que poderia ser muito benéfica para empresas e tripulantes é a consideração da gravidade da situação económica do sector das pescas como um «acontecimento imprevisível» dos previstos no artigo 16.o do Regulamento do IFOP, que permite a concessão de indemnizações aos pescadores e proprietários de navios como consequência de uma paralisação temporária da frota por este motivo.

4.1.1.19

Por outro lado, para adequar mais rapidamente a capacidade dos navios de pesca ao estado dos recursos de pesca, o Comité sugere à Comissão a criação a curto prazo de um fundo comunitário de abates, dotado de um orçamento extraordinário e de aplicação obrigatória e exclusiva por parte dos Estados-Membros às empresas que solicitem o abate dos seus barcos. Este fundo poderia dar prioridade aos segmentos da frota com mais problemas.

4.1.1.20

Para além disto, o Comité considera que, a curto prazo, a Comissão deveria rever as Orientações de auxílios estatais para a pesca com o objectivo de permitir a criação nos Estados-Membros de Registos Especiais de navios de pesca que permitam melhorar a competitividade da frota de pesca longínqua que opera fora das águas comunitárias, tal como aconteceu nos anos 90 com a frota mercante.

4.1.1.21

Relativamente ao sistema de garantia dos aumentos súbitos do preço do combustível, o Comité considera que é outro tipo de auxílio que pode favorecer a sustentabilidade da faina dos barcos de pesca na actual situação difícil, pelo que manifesta o seu apoio ao sistema, embora considere que a sua aplicação com as condições exigidas pela Comissão é muito pouco provável nas circunstâncias económicas actuais. Por isso, o Comité tem para si que a Comissão deveria permitir que os Estados-Membros pudessem cobrir, parcial ou totalmente, os prémios dos contratos de cobertura que as organizações do sector celebrassem, para assegurar um preço máximo do gasóleo durante um período de tempo determinado, tal como acontece com os seguros agrários.

4.1.1.22

Por outro lado, o Comité considera que seria adequada a revisão da fiscalidade da frota costeira. Em concreto, considera que se poderia autorizar a isenção do Imposto sobre Sociedades dos montantes obtidos pelas entidades concessionárias das lotas pela sua intervenção na primeira venda do pescado e a redução do Imposto sobre o Valor Acrescentado das operações de intermediação por elas efectuadas.

4.1.2   Medidas e iniciativas a mais longo prazo

4.1.2.1

Apenas será possível definir perspectivas positivas a longo prazo para o sector das pescas num contexto de recuperação das unidades populacionais de peixes e de recurso a práticas de pesca sustentáveis. Neste quadro, a Comissão propõe-se levar a efeito as acções seguintes:

a)

Melhoramento da gestão das pescas.

b)

Melhor cumprimento das normas de gestão das pescas.

c)

Organização e funcionamento dos mercados.

d)

Promoção da investigação sobre métodos de pesca mais eficientes em termos de combustível e mais ecológicos.

4.1.2.2

O Comité considera que todas estas medidas de longo prazo já estão contempladas na nova PCP. Todavia, deseja sublinhar à Comissão que, para conseguir um sistema de gestão das pescarias que produza o rendimento máximo sustentável, uma vez superados os planos de recuperação e de gestão das unidades populacionais mais ameaçadas, impõem-se novas ideias práticas.

4.1.2.3

O CESE manifesta o seu total apoio à Comissão nos seus esforços por velar, em toda a União, pela correcta aplicação do regulamento da política comum de pesca. Reitera uma vez mais à Comissão que a sua colaboração com a Agência Comunitária de Controlo das Pescas deve ser total, tal como o afirma a Comissão na sua Comunicação, e que a deve dotar de pessoal e meios económicos suficientes para a importantíssima missão de que é incumbida.

4.1.2.4

O CESE insta a Comissão a intensificar o seu combate à pesca ilegal, não declarada e não regulamentada, e afirma-lhe que uma acção decisiva contra essa pesca é o encerramento do mercado comunitário a este tipo de capturas, porque é onde maioritariamente vai parar o produto da pesca ilegal. O Comité considera igualmente que outra medida efectiva contra este tipo de pesca é a proibição de transbordos em alto mar.

4.1.2.5

O Comité considera necessária a avaliação que a Comissão propõe sobre a organização do mercado da pesca. Efectivamente, pode ser oportuna, para melhorar o rendimento financeiro das empresas, a utilização de novas ferramentas, para melhorar a comercialização do pescado e dos produtos da pesca, que permitam que os produtores dêem um valor acrescentado a tais produtos na primeira venda e se envolvam no processo de comercialização. Assim, o Comité considera que as organizações de produtores podem desempenhar um importante papel e, por isso, tem para si que deveriam ser favorecidas. Para alcançar este objectivo, o CESE considera que os esforços da Comissão e dos Estados-Membros deveriam dirigir-se para a mudança da mentalidade dos pescadores relativamente a estas questões.

4.1.2.6

O CESE apoia a ideia da Comissão de adoptar um código de conduta sobre o comércio dos produtos de pesca na União Europeia e o fomento da rotulagem ecológica uma vez concluído o debate sobre este tema, sobre o qual o Comité recentemente emitiu opinião.

4.1.2.7

No âmbito desta Comunicação, o Comité considera que é fundamental a última medida a longo prazo que a Comissão propõe, isto é, a promoção da investigação sobre métodos de pesca mais eficientes em termos de combustível e mais ecológicos, para o que espera que se cumpram as garantias de financiamento que a Comissão apresenta na Comunicação e o máximo apoio aos projectos que as organizações representantes do sector da pesca apresentem, assim como ao desenvolvimento das Plataformas Tecnológicas pesqueiras.

4.1.2.8

O CESE considera que, face à actual conjuntura dos preços do combustível que não parece reversível, é de suma importância investigar em todos os campos que a Comunicação propõe. Em particular, o Comité considera necessária a investigação sobre a produção de energias renováveis, em especial o desenvolvimento e a aplicação prática de novos tipos de bio-combustíveis e a melhoria do rendimento energético, solicitando o apoio económico da Comissão Europeia e dos Estados-Membros aos projectos que as organizações do sector das pescas apresentem.

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Produto interno bruto.

(2)  COM(2006) 103 final de 09.03.2006.

(3)  Instrumento Financeiro de Orientação das Pescas/Fundo Europeu das Pescas.

(4)  Investigação, desenvolvimento e inovação.

(5)  «Toda a informação sobre a PCP» — Informação básica sobre a Política Comum de Pesca, Edição de 2006, Comissão Europeia.

(6)  JO C 244, de 1.10.2004.

(7)  JO C 229, de 14.09.2004.

(8)  Regulamento (CE) n.o 1263/1999 de 12.06.1999

(9)  Regulamento (CE) n.o 2792/1999, de 17.12.1999.

(10)  JO C 65 de 17.3.2006.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/122


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Regulamento do Conselho relativo à glicose e à lactose (Versão Codificada)»

COM(2006) 116 final — 2006/0038 CNS

(2006/C 318/22)

Em 2 de Maio de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 308.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente emitiu parecer em 11 de Julho de 2006 (Relator: J. DONNELLY).

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o seguinte parecer por 187 votos a favor, 1 voto contra e 7 abstenções.

1.   Introdução

1.1.

O objectivo da presente proposta consiste em proceder a uma codificação do Regulamento (CEE) n.o 2730/75 do Conselho, de 29 de Outubro de 1975, relativo à glicose e à lactose. O novo regulamento substituirá os diversos actos nele integrados. A presente proposta preserva integralmente o conteúdo dos actos codificados, limitando-se a reuni-los e apenas com as alterações formais exigidas pelo próprio processo de codificação.

2.   Observações gerais

2.1

No contexto da Europa dos cidadãos, o Comité Económico e Social Europeu apoia a Comissão na simplificação e clarificação da legislação comunitária, a fim de torná-la mais acessível e fácil de compreender pelo cidadão comum, o que lhe permitirá novas oportunidades e a possibilidade de beneficiar dos direitos específicos que lhe são atribuídos.

2.2

Segundo o Comité, a codificação deve ser efectuada respeitando integralmente o processo legislativo comunitário normal.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/123


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A sociedade civil na Bielorússia»

(2006/C 318/23)

Em 14 de Julho de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre: A sociedade civil na Bielorússia.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Relações Externas, que emitiu parecer em 19 de Julho de 2006), sendo relator David Stulík.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 146 votos a favor, 2 votos contra e 5 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Síntese do parecer

1.1

Através do presente parecer, o Comité Económico e Social Europeu (CESE) deseja expressar o seu apoio, solidariedade e simpatia para com todas as organizações da sociedade civil na Bielorússia que aí se esforçam para instaurar a democracia, os direitos humanos, o Estado de direito, a liberdade de associação e de expressão, isto é os valores fundamentais da União Europeia.

1.2

O Comité Económico e Social expressa, em particular, o seu apoio moral às organizações da sociedade civil tais como as organizações não governamentais de defesa dos direitos do Homem, que acompanham a situação da democracia e do Estado de direito, as organizações independentes de jovens, as fundações independentes, as associações independentes de empregadores e empresários e de sindicatos livres, que se esforçam por instaurar na Bielorússia a democracia, os direitos humanos, o Estado de direito e os valores europeus.

1.3

Os contactos interpessoais directos que podem revestir a forma de intercâmbio de jovens, em especial, são primordiais para os contactos com a sociedade civil da Bielorússia. Ora, para apoiar e intensificar estes contactos é indispensável maior abertura na política de vistos da União Europeia e dos seus Estados-Membros em relação aos cidadãos deste país.

1.4

É conveniente que a União Europeia, no seu conjunto, se empenhe em pôr de pé uma política de informação adequada, compreensível e bem direccionada, bem como uma estratégia que explique aos bielorussos os valores fundamentais da União Europeia e o seu modo de funcionamento.

1.5

Se a UE deseja apoiar financeiramente a sociedade civil na Bielorússia, é indispensável que esse apoio seja dado de forma apropriada e flexível, para que a ajuda chegue a quem dela realmente precisa.

1.6

O Comité Económico e Social Europeu convida as instituições da UE a recorrer, no quadro da elaboração da estratégia de apoio às organizações da sociedade civil na Bielorússia, à experiência e saber-fazer das organizações da sociedade civil dos novos Estados-Membros em matéria de transição.

2.   Introdução

2.1

Através do presente parecer, o Comité Económico e Social Europeu deseja expressar o seu apoio, solidariedade e simpatia para com todas as organizações da sociedade civil na Bielorússia que aí se esforçam pela promoção da democracia, dos direitos humanos, do Estado de direito e da liberdade de associação e de expressão (valores basilares da União Europeia).

2.2

O CESE considera da máxima importância a criação de uma verdadeira sociedade civil legítima e livre na Bielorússia como condição para a estabilidade e para o desenvolvimento da democracia no país.

2.3

O CESE reprova totalmente as acções tomadas pelas autoridades da Bielorússia e pela administração pública que levaram às eleições presidenciais pouco transparentes e altamente irregulares de 19 de Março de 2006. Do mesmo modo, não pode concordar com os processos encenados e movidos pelos responsáveis políticos contra militantes democráticos e membros de organizações não governamentais que apenas queriam exercer os direitos cívicos e seguir o desenrolar das eleições presidenciais e que, ultimamente, têm sido objecto de condenações exemplares e injustas (caso dos membros da ONG «Parceria»).

2.4

O CESE observa que a Bielorússia, vizinha imediata da UE, persegue politicamente os seus próprios cidadãos, viola direitos humanos básicos e desrespeita as convenções e os acordos internacionais juridicamente vinculativos em matéria de direitos humanos. As sociedades civis organizadas dos 25 Estados-Membros consideram esta situação inaceitável.

2.5

O CESE condena e rejeita a perseguição e a subsequente criminalização das organizações da sociedade civil que se têm insurgido contra a actuação arbitrária do Estado.

2.6

O objectivo do presente parecer de iniciativa é propor uma linha de acção futura para as instituições da UE no que respeita à Bielorússia e apoiar a sociedade civil do país. A estratégia comunitária de apoio à sociedade civil bielorussa deve conter propostas concretas, viáveis e sustentáveis a médio prazo, sobretudo agora que o interesse da comunidade internacional pela Bielorússia começa a esmorecer passadas as eleições presidenciais.

2.7

O parecer procura igualmente fornecer às organizações da sociedade civil europeias uma visão mais completa da situação na Bielorússia e estimular o seu interesse na situação dos seus parceiros bielorussos e nos problemas que enfrentam, com vista a promover e a preparar a colaboração futura.

3.   Situação da sociedade civil na Bielorússia

3.1

À primeira vista, o quadro jurídico necessário para a existência formal das organizações da sociedade civil pode parecer suficiente e conforme às normas de uma sociedade moderna. Contudo, o problema do enquadramento jurídico bielorusso consiste na sua interpretação em pormenor e nos entraves artificialmente levantados ao funcionamento e registo das organizações da sociedade civil. Na prática, a situação é tal que o quadro jurídico proporciona pretextos para a recusa do registo das organizações que o regime vigente considere incómodas.

3.2

A sociedade civil da Bielorússia caracteriza-se, como a de todos os países de regime autoritário ou totalitário, pela divisão entre as organizações oficiais e as que operam, no melhor dos casos, legalmente mas com dificuldades, semi-legalmente ou mesmo clandestinamente. A administração bielorussa politiza essas organizações e amalgama-as à oposição política. Cabe aqui notar que o direito dos cidadãos a associarem-se livremente para defenderem os seus interesses específicos e públicos constitui um direito fundamental e um valor europeu. Assim, as situações de «conflito» entre a sociedade civil e o poder político oficial são igualmente correntes e normais nos países da União Europeia, mas nas democracias tradicionais esses «conflitos» não afectam a legitimidade das organizações, antes permitindo à opinião pública exercer um controlo dos assuntos públicos e participar na sua gestão.

3.3

A Bielorússia conta várias organizações oficiais leais ao regime ou directamente controladas ou dirigidas pelo Estado. Os poderes públicos descrevem essas organizações como «a sociedade civil bielorussa» (1). No outro extremo encontram-se as organizações da sociedade civil que criticam o regime e são criminalizadas e muitas vezes proibidas devido a essas críticas.

3.4

No país estão igualmente activas organizações informais ou associações de cidadãos que merecem ser também incluídas na sociedade civil. Para estes grupos de cidadãos activos e conscientes é impossível converter-se em organizações oficiais dadas as actividades a que se dedicam. As pessoas assim auto-organizadas são alvo de perseguições, processos judiciais, despedimentos ou perda do estatuto de estudantes. É fundamental auxiliar estes grupos informais, que constituem frequentemente o núcleo da sociedade civil bielorussa independente.

3.5

Muitas organizações da sociedade civil exercem as suas actividades desta forma por lhes ter sido recusado o registo oficial com base nos pretextos fúteis e absurdos a que a administração bielorussa recorre para liquidar formalmente as organizações importunas. Trata-se antes de mais de organizações não governamentais de defesa dos direitos do Homem que acompanham a evolução da democracia e do Estado de direito, de organizações independentes de jovens, de fundações independentes, de associações independentes de empregadores e empresários, e de sindicatos livres. Estas organizações não podem exercer a sua actividade enquanto sujeitos legais formalmente instituídos.

3.6

Embora haja ainda mais de 2 500 organizações não governamentais na Bielorússia (2), o número de organizações independentes, as quais se dedicam por vezes apenas marginalmente aos problemas sociais, é cada vez menor, devido às perseguições, à intervenção da administração e à obrigação de cumprir novos requisitos para o registo. No domínio dos direitos humanos, por exemplo, uma das derradeiras organizações legais é o Comité Helsínquia, que tem sofrido nos últimos tempos uma pressão crescente por parte das instituições estatais.

3.7

No sector das associações e dos agrupamentos independentes de empresários, industriais e empregadores, só há algumas pequenas organizações (como por exemplo «Perspektyva»), cujos membros são, porém, vítimas de detenções e de processos espúrios.

3.8

Entre as organizações sindicais contam-se tanto organizações sindicais oficiais (filiadas na Federação dos Sindicatos da Bielorússia, FSB) como um movimento sindical independente designado Congresso dos Sindicatos Democráticos da Bielorússia. A liberdade de associação e os direitos dos membros dos sindicatos independentes são, no entanto, constantemente violados. O recente apelo (3) lançado à Comissão Europeia pela Confederação Europeia dos Sindicatos (CES), pela Confederação Internacional dos Sindicatos Livres (CISL) e pela Confederação Mundial do Trabalho (CMT) veio justamente denunciar as violações dos direitos sindicais na Bielorússia.

3.8.1

Há muitos anos que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) critica e condena as violações graves e sistemáticas dos direitos fundamentais de liberdade de associação e de negociação colectiva (convenções 87 e 98) dos trabalhadores e dos sindicatos. Uma comissão de inquérito da OIT, criada em 2003, publicou em 2004 um relatório que condenou a ingerência do governo nos assuntos internos dos sindicatos, os seus regulamentos e leis anti-sindicais. Desde a adopção do relatório, a OIT tem criticado veementemente o governo pela não aplicação, ou pela aplicação incompleta, das recomendações da referida comissão. Recentemente, na 95.a sessão da Conferência Internacional do Trabalho da OIT(Junho de 2006), foi exigido ao governo que tomasse medidas concretas para pôr em prática aquelas recomendações a fim de realizar progressos tangíveis até à reunião do conselho de administração da OIT de Novembro de 2006. Se esses progressos não fossem registados,a Conferência estava convicta de que o conselho de administração da OIT começaria a contemplar outras medidas ao abrigo da Constituição da OIT, as quais poderiam incluir a recomendação aos membros da OIT, às organizações de empresários e aos sindicatos de reverem as suas relações com a Bielorússia.

3.9

O CESE manifesta todo o seu apoio às organizações bielorussas da sociedade civil que aderem aos valores europeus e que, pelo seu trabalho e actividade, não legitimam nem escoram o regime autoritário nem estão com ele associadas de alguma forma. O CESE insta as instituições da UE a conferir-lhes um apoio semelhante (nomeadamente financeiro).

3.10

O CESE está também consciente de que importa promover o diálogo e os intercâmbios com as organizações cujas actividades ou cujo modo de funcionamento conferem legitimidade ao regime autoritário em vigor, desconceituando assim os valores fundamentais europeus.

3.11

De uma forma geral, as organizações bielorussas da sociedade civil devem procurar, em colaboração, designadamente, com as suas congéneres estrangeiras, sair do seu próprio isolamento e adquirir confiança através da demonstração dos seus resultados e do seu valor para a sociedade.

3.12

A situação e o papel da sociedade civil na Bielorússia são complicados pelo facto de parte significativa dos cidadãos reconhecerem a legitimidade do poder político e apoiarem-no. Ao invés, as organizações da sociedade civil não gozam de amplo apoio do público, e o regime político, através da sua política de informação, dá delas uma imagem negativa junto dos cidadãos comuns.

4.   Observações gerais sobre a estratégia da UE para a Bielorússia

4.1

O CESE dá o seu acordo de princípio e expressa o seu apoio à Comissão Europeia, que adoptou em 28 de Maio de 2004 o Documento de estratégia nacional, programa indicativo nacional para a Bielorússia, 2005-2006. O interesse e o aplauso do CESE dirigem-se antes de mais aos pontos do programa indicativo consagrados ao apoio da UE à sociedade civil bielorussa. O CESE deseja ser associado o mais activamente possível à consulta sobre a forma mais adequada a dar a esse apoio.

4.2

Por outro lado, o CESE espera que a Comissão Europeia apresente um programa semelhante também para o período posterior, visto que muitas organizações bielorussas aguardam da UE um empenho crescente no domínio dos direitos do Homem e da democracia no seu país. Os projectos e programas deste tipo têm um efeito motivador e estimulante para a sociedade civil da Bielorússia.

4.3

O CESE faz notar que para conseguir mudar o regime autoritário, que procura dar a impressão de controlar a situação no país, será preciso apoiar as actividades quotidianas, mormente através de pequenos «passos» políticos. Isto aplica-se sobretudo às organizações bielorussas da sociedade civil. Num país em que mesmo as organizações civis apolíticas são elas também alvo de restrições, as suas actividades tornam-se igualmente políticas.

4.4

As instituições da UE e os Estados-Membros devem afirmar-se perante a Bielorússia e coordenar e harmonizar entre si e com outros organismos internacionais (fundações, governos de países terceiros) as suas estratégias de apoio à sociedade civil.

4.5

A imposição de sanções económicas ou outras deve ser precedida de um exame muito atento das eventuais vantagens e desvantagens. Uma vez que o regime do presidente Lukachenko controla praticamente todos os meios de comunicação, não será difícil representar a UE aos cidadãos bielorussos (em particular fora da capital, Minsk) como uma instituição hostil, reduzindo assim a atractividade da «orientação europeia» para o futuro desenvolvimento político e económico e da Bielorússia.

4.6

Importa distinguir entre sanções com um impacto directo na população e sanções que afectam apenas os representantes do poder vigente. Caso se opte por sanções, esta distinção deve ser tida em conta. As sanções não devem lesar directamente a população da Bielorússia e não deveriam, em caso algum, levar à exclusão deste país do sistema de preferências generalizadas, pois trata-se de um acesso preferencial condicional ao mercado da UE assente no cumprimento de regras basilares. O Governo bielorusso dispõe, além disso, de muito tempo e de bastantes ocasiões para obviar às principais críticas sobre violação dos direitos sindicais.

4.7

Se bem que a Bielorússia esteja oficialmente incluída na política europeia de vizinhança (PEV), não é possível, no presente e nas condições actuais, permitir que este país beneficie plenamente das vantagens que o PEV oferece. O CESE concorda com a Comissão e com o Conselho em que deveria ser possível incluir a Bielorússia neste programa assim que as autoridades demonstrem claramente estar dispostas a respeitar os valores democráticos e os princípios de funcionamento do Estado de direito. Conviria, contudo, que a Comissão elaborasse igualmente um cenário unilateral (ou em colaboração com os representantes da sociedade civil) para a integração rápida da Bielorússia na PEV caso a situação política e económica do país conheça alterações radicais. Poder-se-ia, a este respeito, traçar um paralelo com a Eslováquia dos anos 90 sob o governo de Vladimír Mečiar e o seu estatuto de país candidato (4). Se a UE adoptar uma atitude similar e se mostrar flexível em relação à Bielorússia, isso seria um estímulo para a sociedade civil bielorussa e criaria uma alternativa europeia atraente.

4.8

Um dos principais factores do desenvolvimento da Bielorússia é e será sempre a Rússia. Dado que a Rússia é um parceiro estratégico declarado da União Europeia, é imprescindível fomentar com a Rússia, com os políticos russos e com os representantes da sociedade civil russa um diálogo sobre a situação na Bielorússia.

5.   Sectores concretos sensíveis relacionados com a sociedade civil da Bielorússia e medidas práticas propostas

5.1

Liberdade dos meios de comunicação e acesso a informações objectivas e imparciais. Actualmente, o regime detém praticamente o monopólio da informação. A sociedade civil não tem acesso aos meios de comunicação e aos canais oficiais de informação. A maior parte dos jornais independentes foram encerrados por razões diversas e os restantes periódicos viram o acesso à rede de distribuição estatal praticamente vedado. O acesso à Internet é, também ele, limitado, com excepção da capital, Minsk, e dos centros regionais, se bem que os custos de conexão continuem a ser elevados. A prioridade da UE deveria ser assegurar, apoiar e consolidar as fontes permanentes e independentes de informação à disposição dos bielorussos e garantir a existência de servidores da Internet não censurados. As iniciativas independentes no terreno devem ser apoiadas.

5.2

Apoio da UE à sociedade civil da Bielorússia. Apesar da prioridade da UE de apoiar as organizações da sociedade civil da Bielorússia continua a haver entraves práticos e formais à recepção das ajudas pelos beneficiários. Os procedimentos de financiamento comunitários são extremamente complexos, lentos e onerosos. O actual Regulamento Financeiro deveria ser revisto no sentido de permitir um financiamento mais flexível e mais virado para os utilizadores, não apenas para as ONG oficialmente registadas, mas também para as iniciativas cidadãs não registadas, em particular nos países com condições menos favoráveis. O CESE exorta a Comissão, o Parlamento Europeu e o Conselho a ponderarem a simplificação do financiamento da sociedade civil e alterarem o Regulamento Financeiro e suas disposições de aplicação. Para encaminhar adequadamente as ajudas necessárias poderia recorrer-se às redes europeias já existentes de organizações da sociedade civil e representar as organizações bielorussas (mesmo as que não estão registadas) através dessas redes.

5.3

O CESE aplaude a recente proposta da Comissão que visa criar um instrumento financeiro específico destinado a promover a democracia e os direitos humanos nos países em que as liberdades fundamentais estão expostas a maiores riscos. O CESE espera poder exprimir o seu parecer sobre essa proposta legislativa e que esta reflicta sobretudo os princípios da acessibilidade a todos os necessitados e da flexibilidade de utilização para as organizações da sociedade civil.

5.4

O CESE apoia igualmente as iniciativas recentemente debatidas no Parlamento Europeu e pelas organizações europeias sem fins lucrativos tendentes ao lançamento de um novo instrumento financeiro de apoio (Fundação/agência europeia para a democracia) às forças democráticas em países como a Bielorússia. Esta agência poderia prestar um auxílio financeiro indispensável também às organizações desprovidas de estatuto formal e às quais os governos recusem registo.

5.5

Para o futuro de uma Bielorússia democrática é indispensável consolidar as forças democráticas e a sociedade civil independente e definir orientações estratégicas para o seu desenvolvimento futuro durante o período pós-eleitoral que se inicia. A UE deveria empenhar-se particularmente em apoiar essas forças, em colaboração com outros dadores e com os países que compartilhem os seus objectivos e os seus interesses para a Bielorússia.

5.6

Importa assegurar a igualdade de acesso às ajudas (não exclusivamente financeiras) da UE e ao contacto com as instituições europeias, tanto para as organizações democráticas da sociedade civil bielorussa mais antigas e experimentadas como para as novas organizações e iniciativas em fase de criação.

5.7

Intercâmbio de informações. Na Bielorússia, a delegação da Comissão Europeia não funciona como noutros países, não obstante os pedidos oficiais dirigidos à UE para que abra esta delegação em Minsk e que não foram acolhidos. O país também não conta com uma rede de centros europeus de documentação. O acesso a informações de base e objectivas sobre a UE, o seu funcionamento, os seus valores e as suas políticas é praticamente impossível. Há que promover a reflexão sobre como melhorar o nível de informação dos cidadãos bielorussos sobre a UE, o que tornaria mais atraente a «alternativa europeia» para o futuro do país (5).

5.8

A UE deve investir na elaboração de uma estratégia de informação global capaz de explicar os valores europeus fundamentais aos cidadãos bielorussos. Uma vez que a responsabilidade de ainda não haver uma delegação da Comissão Europeia na Bielorússia deve ser assacada à UE, seria útil que os órgãos representativos dos Estados-Membros trabalhassem em conjunto pela difusão dos valores europeus, nomeadamente através da criação em comum de uma Casa da Europa em Minsk.

5.9

O CESE preconiza a criação de um posto de representante extraordinário da UE para a Bielorússia, como é já o caso para outras regiões (6). Esse representante, nomeado pelos Estados-Membros da União Europeia, informaria as instituições da UE sobre a situação na Bielorússia e a evolução das relações entre este país e a UE. Seria também incumbido de coordenar as políticas estrangeiras dos Estados-Membros da UE em relação à Bielorrússia e de propor medidas e uma posição comuns da UE. Deveria ainda velar pela manutenção dos contactos com os representantes da sociedade civil e da oposição democrática bielorussa, bem assim com os órgãos e instituições oficiais.

5.10

Ao mesmo tempo, constata-se que o conhecimento e a sensibilização para a situação difícil na Bielorússia acusam lacunas nos países da UE e variações importantes de um Estado-Membro para outro.

5.11

Manutenção dos contactos entre organizações da sociedade civil da UE e da Bielorússia. Na prática, as reuniões entre membros das organizações da sociedade civil e os seus homólogos da UE e as viagens dos primeiros ao estrangeiro são impossibilitadas ou extremamente dificultadas pelas autoridades bielorussas. Os entraves aos encontros de jovens são particularmente problemáticos. O regime proíbe frequentemente que os estudantes bielorussos estudem no estrangeiro ou trabalhem em organizações não governamentais. Face a isto, os contactos pessoais entre membros da sociedade civil da Bielorússia e da UE deveriam tornar-se numa das prioridades da política comunitária para a Bielorússia. Os laços interpessoais são insubstituíveis, sobretudo para a difusão de informações e de experiências e para o apoio moral. A UE deveria, pois, financiar os intercâmbios de jovens e estudantes, criar bolsas e estágios para apoiar as acções conjuntas de grupos da sociedade civil e fornecer ajuda específica aos líderes de opinião.

5.12

O CESE está extremamente preocupado com a actual política de vistos de muitos Estados-Membros para com cidadãos bielorussos. Por muito que a UE afirme procurar simplificar a concessão dos vistos a grupos selectos da população (incluindo os representantes das organizações da sociedade civil), assiste-se na prática a atentados flagrantes contra a dignidade humana e a humilhações dos bielorussos que requerem visto de entrada na UE. Dado que a concessão de vistos pode ser morosa, e mesmo humilhante e degradante para o requerente (7), os valores que a UE sustenta e sobre os quais se baseia são desacreditados aos olhos dos bielorussos. Este estado de coisas, bem como o recente aumento dos emolumentos administrativos para a emissão de vistos, limita consideravelmente os contactos interpessoais, nomeadamente entre representantes das organizações da sociedade civil.

5.13

O CESE exorta, pois, as instituições europeias e os Estados-Membros a suprimirem tanto quanto possível os entraves burocráticos, formais e informais, à obtenção de vistos de entrada na UE pelos cidadãos bielorussos que respeitam as leis em vigor e a diminuírem igualmente os custos devidos pela emissão desses vistos. Os Estados-Membros deveriam estudar a possibilidade de simplificar os procedimentos de emissão de vistos por razões humanitárias, científicas e de estudo. Esses custos deveriam ser proporcionais ao poder de compra no país em que é feito o requerimento. Além disso, é preciso garantir que os requerentes são tratados com dignidade. Só assim a UE dará um sinal credível à sociedade bielorussa quanto à seriedade da sua intenção de intensificar os contactos entre os cidadãos da UE e da Bielorússia.

5.14

O saber e a experiência dos parceiros originários dos novos Estados-Membros constituem um contributo valioso para as organizações da sociedade civil bielorussas. Particularmente preciosos são o conhecimento e as experiências (igualmente negativas) inerentes à passagem de um regime totalitário para uma democracia no tocante à adopção de leis transitórias, à criação de instituições democráticas fundamentais e à instauração dos princípios de funcionamento do Estado de direito, ao funcionamento de uma sociedade livre e aberta, aos meios de comunicação social independentes, à instauração de relações equilibradas entre o sector público, o sector privado e a sociedade civil, à aplicação de reformas socioeconómicas, às reformas do aparelho de Estado (incluindo o exército, a polícia e a justiça). A UE deveria promover a difusão na íntegra desse saber em matéria de transição às organizações bielorussas.

5.15

Não é suficiente, para divulgar a experiência e os conhecimentos, convidar representantes para actividades que se realizem fora da Bielorússia; antes pelo contrário, o que importa é organizar na Bielorússia visitas e actividades, seminários, conferências e mesas-redondas com os parceiros da UE. É necessário dar espaço e apoio financeiro suficientes aos trabalhos e actividades das fundações privadas que realizam e financiam projectos deste tipo. Os exemplos de boas práticas e as iniciativas bem sucedidas de actividades semelhantes desenvolvidas pelas organizações ucranianas da sociedade civil podem servir de modelo e de exemplo a seguir.

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie Sigmund


(1)  O presidente Lukachenko, em discurso de 26 de Maio de 2006, apelou à «criação de uma sociedade civil limpa».

(2)  Comissão Europeia: Documento de estratégia nacional, programa indicativo nacional, p. 22. Destas organizações, cerca de 10 % consagram-se exclusivamente a actividades políticas.

(3)  Agência Belapan, 30 de Maio de 2006.

(4)  A estratégia de pré-adesão da UE permitiu à Eslováquia vencer muito rapidamente o atraso de vários anos que a separava dos países vizinhos.

(5)  De acordo com uma recente sondagem sociológica, apenas 1,1 % dos bielorussos associam uma melhoria futura da sua situação à União Europeia, ao passo que 77,7 % a associam ao presidente Lukachenko!

(6)  Por exemplo, o representante especial da UE para a Moldávia, para o Sudão e para o Cáucaso Meridional. Para mais informações sobre o papel e a importância dos representantes da UE, consultar:

http://www.consilium.europa.eu/cms3_fo/showPage.asp?lang=fr&id=263&mode=g&name=

(7)  O relatório da fundação polaca Batory Visa Policies of European Union Members States, Monitoring Report (Políticas dos Estados-Membros da União Europeia em matéria de vistos, relatório de acompanhamento), Varsóvia, Junho de 2006, disponível em inglês no sítio Web http://www.batory.org.pl/english/intl/pub.htm, contém uma descrição detalhada destas práticas e métodos indignos utilizados pelos órgãos de representação dos Estados-Membros da UE em relação aos cidadãos bielorussos que requerem visto (citações literais dos requerentes e descrição da experiência pessoal).

A título indicativo, eis uma citação extraída do relatório: «Praticamente nenhum dos consulados garante condições adequadas às pessoas que fazem fila à porta do consulado. Não há abrigos para proteger do vento, da neve ou das temperaturas extremas, nem bancos para as pessoas se sentarem. Este problema, aparentemente secundário, é muito importante dado que a espera à frente do consulado pode durar uma noite inteira.» (p. 22)


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/128


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A imigração na UE e as políticas de integração: Colaboração entre os governos regionais e locais e as organizações da sociedade civil»

(2006/C 318/24)

Em 14 de Julho de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre «A imigração na UE e as políticas de integração: Colaboração entre os governos regionais e locais e as organizações da sociedade civil».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 13 de Julho de 2006 (Relator: L. PARIZA CASTAÑOS).

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o presente parecer, por 181 votos a favor, 7 votos contra e 8 abstenções.

1.   Introdução

1.1

Em 2002, o CESE elaborou um parecer de iniciativa intitulado «A imigração, a integração e o papel da sociedade civil organizada» (1), com o objectivo de promover um debate político e social ao nível comunitário para que as políticas de integração sejam uma parte fundamental das políticas comuns de imigração e asilo.

1.2

O parecer incluía a proposta de que a União Europeia elaborasse um programa comunitário destinado a promover a integração social dos imigrantes. O CESE considera que é necessário criar programas para promover a integração dos novos imigrantes e das pessoas que pretendem o reagrupamento familiar, bem como dos refugiados e dos candidatos a asilo que, além de beneficiarem de um estatuto europeu, estão protegidos pela legislação internacional.

1.3

Em 9 e 10 de Setembro de 2002, o CESE realizou, em colaboração com a Comissão, uma conferência com o mesmo objectivo. Nela participaram mais de 200 representantes dos parceiros sociais e das ONGs mais representativas dos 25 Estados-Membros e das redes europeias. O objectivo da conferência era associar a sociedade civil à promoção das políticas europeias de integração.

1.4

Nas conclusões da conferência, afirmava-se que os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil tinham um protagonismo essencial na integração. E também se referia que a União Europeia e os seus Estados-Membros, especialmente no âmbito regional e local, devem promover a integração dos imigrantes, dos refugiados e das minorias, e que é necessário um programa europeu para a promoção da integração (2).

1.5

Em 2003, o Conselho Europeu instituiu os pontos de contacto nacionais para a integração e incumbiu a Comissão de apresentar um relatório anual sobre a imigração e a integração (3). Por seu lado, a Comissão elaborou a Comunicação sobre a imigração, a integração e o emprego  (4), em que é feita uma análise global da questão da integração que foi apoiada pelo CESE no seu parecer (5). Em Novembro de 2004, a Comissão publicou um «Manual para a Integração» (Handbook on Integration for policy-makers and practitioners) (6).

1.6

O Programa da Haia, adoptado pelo Conselho em 4 e 5 de Novembro de 2004, sublinha que é necessária uma maior coordenação entre as políticas nacionais e as iniciativas da UE nas políticas de integração; e afirma que as políticas comunitárias basear-se-ão em princípios comuns e em instrumentos de avaliação claros.

1.7

Estamos num quadro político e legislativo mais desenvolvido para as políticas de imigração. O presente parecer é um novo contributo do CESE que dá especial atenção aos actores sociais e políticos no âmbito regional e local, pois é neste âmbito que se podem enfrentar os desafios de maneira mais eficaz e que as políticas podem lograr os melhores resultados.

1.8

De forma complementar à elaboração deste parecer, o CESE organizou em Barcelona uma audição com o objectivo de realizar um intercâmbio de boas práticas nas políticas das autoridades locais e regionais (no Anexo II figura um relatório sobre esta audição) e uma audição em Dublim com o objectivo de analisar as boas práticas em matéria de integração e de luta contra a discriminação no local de trabalho, em colaboração com a OIT e com a Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (no Anexo III figura um relatório sobre esta audição).

2.   Agenda Comum para a Integração

2.1

Em 1 de Setembro de 2005, a Comissão publicou uma Comunicação intitulada «Agenda Comum para a Integração. Quadro para a integração dos nacionais de países terceiros na União Europeia»  (7), com a qual o CESE se congratula e à qual manifesta o seu apoio, na medida em que pretende desenvolver a proposta que o Comité apresentou no seu parecer e na conferência de 2002.

2.2

A Comunicação convida os Estados-Membros a reforçarem os esforços ao nível nacional no que se refere às respectivas estratégias de integração de imigrantes e insta a uma maior coerência entre as suas estratégias e as acções desenvolvidas ao nível da UE.

2.3

O presente parecer é uma iniciativa do CESE, pelo que não é um parecer específico sobre a Comunicação da Comissão. No entanto, o parecer inclui igualmente a opinião do CESE sobre o documento COM(2005) 389 final.

2.4

O Conselho JAI de 19 de Novembro de 2004 adoptou Princípios Básicos Comuns que pressupõem um quadro europeu coerente para as políticas de integração. A Comissão desenvolve estes princípios sob a forma de acções que devem ser encaradas «como os principais elementos de todas as políticas de integração nacionais e da UE» (8). As acções estão agrupadas em 11 princípios. (9) O CESE considera que estes princípios, desenvolvidos no Programa Comum, constituem uma base adequada para políticas de integração equilibradas e coerentes ao nível europeu e nacional.

2.5

Nas Perspectivas Financeiras para 2007-2013, propõe-se a criação de um Fundo Europeu para a Integração  (10) dos nacionais de países terceiros, que se baseia nestes princípios comuns. O CESE apoia esta proposta (11) e espera que a mesma seja incluída no futuro orçamento da UE.

2.6

O programa sugere algumas acções a desenvolver ao nível nacional e outras ao nível comunitário. A Comissão pretende levar a cabo um procedimento de avaliação contínua dos programas.

2.7

A Comissão afirma que «é essencial promover uma abordagem mais coerente da UE em relação à integração que atenda devidamente às competências dos Estados-Membros e das respectivas autoridades locais e regionais » (12).

2.8

A Comissão propôs um método aberto de coordenação (13) para as políticas de imigração que não foi aceite pelo Conselho. O CESE (14), que apoiou esta proposta da Comissão, considera que a rede dos pontos de contacto nacionais, os princípios comuns e o procedimento de avaliação das políticas de integração são um passo em frente na coordenação das políticas nacionais, no quadro de uma abordagem comum. O CESE propõe à Comissão e ao Conselho que se adopte o método aberto de coordenação com base nestas experiências positivas.

2.9

É necessário continuar a desenvolver um quadro jurídico (política comum) sobre as condições de entrada e estadia dos nacionais de países terceiros. Os Estados-Membros devem transpor de maneira adequada as directivas relativas aos residentes de longa duração e ao reagrupamento familiar (15) que foram adoptadas em 2003.

2.10

A Comissão sublinha o nexo existente entre uma política comum de «imigração» e uma estratégia comum de integração. Todavia, não foi adoptada a directiva relativa à admissão de imigrantes por motivos económicos. O CESE (16) concorda com a Comissão Europeia quando esta afirma que «todos os futuros instrumentos de migração devem atender à igualdade de tratamento e aos direitos dos imigrantes» (17). A Comissão anuncia a publicação da segunda edição do Manual de Integração, a criação de um sítio Internet para a integração, de um Foro Europeu sobre a Integração e o reforço dos relatórios anuais sobre migração e integração. O CESE apoia estes objectivos e manifesta a sua vontade de colaboração com a Comissão.

2.11

O CESE manifesta o seu apoio determinado ao lançamento deste programa e recorda o que já tinha afirmado noutro parecer: «O CESE propõe que a Comissão possa gerir um programa europeu para a integração, dotado de recursos económicos suficientes, no quadro da coordenação das políticas nacionais, e sublinha a importância de o Conselho dotar a Comissão dos meios políticos, legislativos e orçamentais necessários para promover a integração dos imigrantes. O CESE frisa a importância de estabelecer programas positivos e eficazes de acolhimento de imigrantes, em colaboração com as organizações da sociedade civil» (18).

2.12

Por outro lado, o CESE também propõe que a UE reserve fundos suficientes ao acolhimento humanitário dos muitos imigrantes sem documentos que estão a chegar aos países do Sul da Europa. Os Estados-Membros da UE devem mostrar a sua solidariedade e responsabilidade para que a Europa actue com uma política comum.

3.   As políticas de integração

3.1

A integração é um processo bidireccional baseado nos direitos e obrigações dos nacionais de países terceiros e da sociedade de acolhimento, que permite a plena participação dos imigrantes. Num outro parecer, o CESE definiu «a integração como a progressiva equiparação dos imigrantes ao resto da população, quanto a direitos e deveres, bem como o seu acesso a bens, serviços e canais de participação cívica em condições de plena igualdade de oportunidades e de tratamento» (19).

3.2

Esta abordagem bidireccional significa que a integração afecta não só os imigrantes, mas também a sociedade de acolhimento. Não se trata de uma integração dos imigrantes na sociedade de acolhimento, mas de uma integração dos imigrantes com a sociedade de acolhimento: ambas as partes têm de se integrar. As políticas de integração devem orientar-se para os imigrantes e para a sociedade que os acolhe, com o objectivo de que todos os cidadãos tenham os mesmos direitos e deveres e partilhem os valores da sociedade democrática, aberta e plural.

3.3

Os imigrantes têm o dever de compreender e de respeitar os valores culturais da sociedade de acolhimento, e esta, de compreender e de respeitar os valores culturais dos imigrantes. Os assuntos culturais são muitas vezes utilizados com fins discriminatórios. A integração não consiste na adaptação cultural dos imigrantes à sociedade de acolhimento. Algumas situações mal sucedidas relacionam-se com esta visão errónea. As sociedades europeias são sociedades plurais do ponto de vista cultural e, no futuro, esta tendência acentuar-se-á como consequência do alargamento e do aumento da imigração.

3.4

Importa ter em conta que em vários Estados-Membros residem inúmeras pessoas que pertencem a minorias de várias origens nacionais ou culturais, cujos direitos também devem ser protegidos e garantidos.

3.5

O CESE considera que a diversidade cultural é uma característica da Europa plural e democrática, assim como o princípio da neutralidade religiosa do Estado. A imigração proveniente de países terceiros contribui com novos elementos para a nossa diversidade, enriquecendo as nossas sociedades do ponto de vista social e cultural. A cultura das comunidades humanas não pode ser entendida como algo de estático, mas como um processo em permanente evolução, que se enriquece com os mais variados contributos. Os princípios de independência e neutralidade das instituições perante as religiões contribuem para uma boa relação entre os imigrantes e a sociedade de acolhimento. É preciso que as sociedades europeias promovam programas de formação intercultural. A Convenção da UNESCO (20) sobre a diversidade cultural é um instrumento fundamental para as políticas europeias.

3.6

A integração social dos imigrantes é igualmente um processo de equiparação de direitos e obrigações, e tem uma relação muito estreita com a luta contra a discriminação. A discriminação é uma forma ilegal de fragilizar os direitos das pessoas. O direito à vida em família não está devidamente garantido em vários Estados-Membros que têm legislações muito restritivas em matéria de reagrupamento familiar. Tão-pouco é adequada a directiva aprovada pelo Conselho (21).

3.7

O princípio da subsidiariedade indica-nos que, num quadro europeu coerente, as políticas de integração não são uma responsabilidade exclusiva dos governos dos Estados-Membros. Estas políticas terão mais êxito se as autoridades locais e regionais participarem nelas e se as organizações da sociedade civil colaborarem activamente. O CESE propõe que as autoridades locais e regionais envidem mais esforços e promovam novas políticas de integração.

3.8

As autoridades locais e regionais, no quadro das suas competências nos vários Estados-Membros, dispõem de instrumentos políticos, normativos e orçamentais que devem utilizar de forma adequada no âmbito das políticas de integração.

3.9

Os imigrantes e a sociedade de acolhimento devem manifestar uma atitude integradora. Os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil devem empenhar-se nas políticas de integração e na luta contra a discriminação.

3.10

As organizações da sociedade civil têm pela frente um repto fundamental: promover atitudes integradoras nas sociedades europeias de acolhimento. Os parceiros sociais, as organizações de direitos humanos, as associações culturais e desportivas, as comunidades religiosas, as associações de vizinhos, as comunidades educativas, os meios de comunicação social, etc, devem ser a vanguarda da integração, pelo que devem abrir as suas portas e promover a participação dos imigrantes.

3.11

Em alguns sectores minoritários das sociedades europeias cresce a discriminação, o racismo e a xenofobia. Alguns políticos irresponsáveis e certos meios de comunicação social, que aumentam socialmente o efeito destes comportamentos, também alimentam estas atitudes. No entanto, muitas organizações da sociedade civil europeia estão empenhadas na luta social e política contra estes comportamentos.

3.12

As autoridades locais e regionais, em colaboração com as organizações da sociedade civil, têm a responsabilidade de informar os imigrantes e a sociedade de acolhimento sobre os seus direitos e obrigações.

3.13

As organizações e as comunidades de imigrantes desempenham um papel muito importante no acolhimento e na integração. Estas organizações também devem promover dinâmicas de integração junto dos seus membros, e reforçar a associação com as organizações da sociedade de acolhimento.

3.14

As autoridades locais e regionais têm de apoiar o trabalho destas organizações e consultá-las antes da adopção de decisões políticas.

3.15

As directivas contra a discriminação (22) foram aprovadas e transpostas para as legislações nacionais. O Comité espera conhecer os relatórios de avaliação sobre os efeitos e seus resultados.

3.16

No entanto, muitos imigrantes, descendentes de imigrantes ou pessoas pertencentes a minorias étnicas e culturais são vítimas de discriminação no local de trabalho (embora tenham as mesmas qualificações profissionais); estas pessoas têm mais dificuldade em encontrar emprego, têm empregos precários e são despedidos com maior frequência.

3.17

É preciso que os parceiros sociais nos âmbitos local e regional lutem contra estas práticas discriminatórias que são contrárias à legislação europeia e constituem novos obstáculos à integração. A discriminação no local de trabalho também constitui um obstáculo para o êxito das empresas. A integração no local de trabalho, em condições de igualdade de tratamento, sem discriminação profissional em relação aos trabalhadores nacionais, é uma condição imprescindível para o êxito das empresas e da integração social (23). No Anexo III, é incluído um relatório da audição realizada em Dublim para analisar as boas práticas de integração no local de trabalho.

4.   Programas regionais e locais para a integração

4.1

Em alguns Estados-Membros, pensava-se antigamente que não era necessário definir políticas de integração, pois considerava-se que os imigrantes eram simples «convidados» cujo destino era o regresso aos países de origem uma vez terminada a actividade laboral. Esta atitude errada causou inúmeros problemas de segregação e de marginalização social, que as políticas actuais estão a procurar resolver.

4.2

Noutros Estados-Membros pensou-se, durante anos, que a integração dos imigrantes seria um processo automático e fácil, sem que fosse necessário adoptar políticas activas. No entanto, com o tempo foram-se consolidando situações de segregação e de marginalidade que levaram a graves conflitos sociais. As novas políticas pretendem corrigir hoje os problemas herdados do passado.

4.3

Há que ter em conta que a imigração clandestina dificulta as políticas de integração, dada a situação precária e muito vulnerável em que se encontra o imigrante «sem papéis». Em alguns Estados-Membros, foram criados processos para regularizar a estadia destas pessoas, promovendo-se assim a sua integração.

4.4

Embora no Conselho Europeu ainda persistam algumas dúvidas em relação à subsidiariedade, a maioria dos líderes considera necessário promover políticas coerentes de integração a todos os níveis: comunitário, nacional, regional e local.

4.5

O CESE considera que, para que estas políticas sejam eficazes, devem ser proactivas e desenvolver-se num quadro coerente e numa perspectiva global. Muitas vezes as autoridades actuam a posteriori, quando os problemas já se manifestaram e são de difícil resolução.

4.6

A integração é um processo multidimensional que deve envolver as diferentes administrações públicas e os parceiros sociais. As autoridades europeias, nacionais, regionais e municipais devem elaborar programas no âmbito das suas competências. Para serem eficazes e terem uma coerência global, os programas e as acções devem ser complementares e coordenados de forma adequada.

4.7

Os cidadãos e as autoridades locais sofrem as consequências das políticas erradas dos governos. Os primeiros a serem prejudicados com o fracasso dessas políticas são os municípios urbanos, o que justifica que vários governos locais e regionais tenham vindo a desenvolver políticas de acolhimento e de integração desde há bastante tempo. As experiências são muito diferentes: nuns casos são exemplos de boas práticas, noutros porém de fracassos.

4.8

A importância da dimensão actual e futura dos processos migratórios evidencia a envergadura dos desafios que temos pela frente. No entanto, são insuficientes os recursos económicos e as acções políticas das autoridades locais e regionais.

4.9

O CESE considera que os governos municipais e regionais têm de elaborar, em colaboração com as organizações da sociedade civil, planos e programas de integração que estabeleçam os objectivos e prevejam os recursos necessários: são ineficazes as «políticas de papel» e os programas sem recursos económicos.

4.10

O CESE considera razoável prever que uma parte dos benefícios económicos derivados da imigração seja destinada às políticas de acolhimento e integração.

4.11

Na elaboração dos programas e planos de integração, é muito importante que também sejam consultadas as associações mais representativas dos imigrantes.

4.12

Em vários municípios e regiões europeias existem sistemas e órgãos de participação e consulta para que as organizações da sociedade civil se associem às autoridades na elaboração e gestão das políticas de integração.

5.   Instrumentos, orçamentos e avaliações

5.1

Os planos e programas locais e regionais para a integração devem dispor de orçamentos suficientes e contar com instrumentos próprios de gestão e avaliação.

5.2

Há bastantes exemplos de cidades e de regiões europeias que têm organismos e serviços específicos com muita experiência política e técnica.

5.3

Muitas cidades e regiões dispõem igualmente de órgãos de consulta e participação para as organizações da sociedade civil. Foram criados vários foros e conselhos consultivos em que participam as organizações da sociedade civil e as associações de imigrantes.

5.4

O CESE considera que estes são exemplos de boas práticas que devem ser divulgados na UE.

5.5

Em várias cidades, também há exemplos de gabinetes especializados no apoio aos imigrantes e no desenvolvimento de capítulos concretos dos planos de integração.

5.6

São analisados os riscos de segregação que se criam quando se atendem os imigrantes em serviços especializados criados para eles. O CESE considera que deve ser evitada a segregação na utilização dos serviços públicos, não obstante a necessidade, por vezes, de serviços específicos, em particular para o acolhimento dos imigrantes quando da sua chegada.

5.7

O CESE considera que é necessária a participação dos parceiros sociais e das restantes organizações da sociedade civil na elaboração e gestão dos planos e programas regionais e municipais de integração.

5.8

Também é positivo fomentar a cooperação entre as autoridades locais e regionais das sociedades europeias de acolhimento e dos países de origem. Há exemplos de boas práticas que devem ser divulgados.

5.9

Algumas autoridades têm fundos exclusivamente dedicados à redução de eventuais conflitos. Para que as políticas de integração sejam eficazes, devem ser proactivas.

5.10

A integração constitui um repto para as sociedades europeias. Acontecimentos recentes em vários países mostraram que os objectivos não estão a ser atingidos. Embora a situação seja diferente nos vários Estados-Membros e alguns problemas sejam específicos, é preciso melhorar as políticas de igualdade de tratamento, de integração e de luta contra a discriminação em todo o território europeu.

5.11

O CESE propõe que as diferentes administrações públicas (europeias, nacionais, regionais e municipais) elaborem, de acordo com as práticas específicas de cada país, programas para a integração com dotações orçamentais adequadas e uma abordagem proactiva.

5.12

Os programas devem dispor de sistemas de avaliação com indicadores precisos e procedimentos transparentes, e a sociedade civil deve participar nos procedimentos de avaliação.

6.   Objectivos

6.1

Os programas regionais e municipais para a integração incluem um grande leque de assuntos e de abordagens, os mais importantes são os seguintes:

6.2

Observação da realidade — As instituições devem analisar convenientemente a realidade da imigração e da situação das minorias num dado território, de forma a desenvolver as acções adequadas.

6.3

Primeiro acolhimento — Criação de centros de acolhimento; apoio sanitário e assistência jurídica; alojamento temporário para casos específicos; início de cursos de língua; informação sobre as leis e costumes da sociedade de acolhimento; apoio no acesso ao primeiro emprego; etc. Estas acções devem dar especial atenção aos menores e a outras pessoas em situação vulnerável.

6.4

Ensino do idioma — As autoridades locais e regionais devem realizar políticas activas para o ensino do idioma, porque para a integração é necessário um conhecimento suficiente da língua da sociedade de acolhimento. Os programas de ensino devem ser organizados nas proximidades do local de residência e em horários muito flexíveis. É obrigação das autoridades facilitar a todos os imigrantes a participação nos cursos.

6.5

Acesso ao emprego — O trabalho é, sem dúvida, um aspecto prioritário da integração. Os serviços públicos de emprego devem ter programas adequados de cursos de formação profissional, de orientação profissional, etc.

6.6

A discriminação no local de trabalho é um obstáculo muito importante para a integração. Os parceiros locais e regionais devem assumir um papel activo na luta contra a discriminação.

6.7

Acesso à habitação — O acesso a habitação de qualidade, sem discriminação, é um dos grandes reptos das políticas locais e regionais. As autoridades devem evitar a existência de guetos urbanos degradados onde se concentra um grande número de imigrantes; para tal urge modificar, com suficiente antecedência, as políticas de urbanismo. A melhoria da qualidade de vida nestes bairros deve ser uma prioridade.

6.8

Ensino — Os sistemas de ensino devem garantir aos filhos de imigrantes o acesso a escolas de qualidade. Há que evitar a concentração excessiva destes alunos em escolas-gueto de muito fraca qualidade, como ocorre frequentemente. A educação infantil, em todas as suas fases, é a base para a integração das novas gerações.

6.9

O ensino deve ter em conta a diversidade interna das sociedades europeias. É necessária a presença de mediadores interculturais, bem como o reforço dos recursos docentes, para superar as dificuldades linguísticas e culturais.

6.10

Os programas de ensino de adultos devem abranger a população imigrante, especialmente as mulheres. A formação para o emprego é fundamental para favorecer o acesso dos imigrantes ao emprego.

6.11

Acesso a cuidados de saúde — Deve ser promovido o acesso aos cuidados de saúde e o atendimento sanitário dos imigrantes. Em determinadas circunstâncias, será necessária a colaboração dos serviços de mediação intercultural.

6.12

Adaptação dos serviços sociais — A imigração impõe amiúde exigências para as quais os serviços sociais não estão preparados. Estes devem adaptar-se a uma nova situação: a gestão da diversidade.

6.13

Formação dos profissionais — Os funcionários dos serviços sociais, do ensino, das forças policiais, dos serviços de saúde e de qualquer outro serviço público devem beneficiar de novos elementos formativos para servir de forma adequada os imigrantes e as minorias.

6.14

Diversidade como factor positivo — Os programas culturais devem reconhecer a diversidade cultural, que é um aspecto característico das cidades europeias actuais. Também são diferentes as crenças religiosas.

6.15

É igualmente necessário que as autoridades locais fomentem a pedagogia da convivência e promovam a adaptação de todas as pessoas, independentemente da sua origem, aos estilos de vida das cidades onde residem. Nesta pedagogia para a convivência devem participar tanto as populações de origem imigrante como as sociedades de acolhimento, no intuito de melhorar a compreensão entre as culturas e promover a integração social.

6.16

Todas as pessoas devem ter o direito de viver em família, que é um dos direitos fundamentais reconhecidos internacionalmente pelas convenções sobre direitos humanos. No entanto, muitas legislações nacionais e também a directiva europeia relativa ao reagrupamento familiar (24) não garantem de modo adequado que muitos imigrantes possam desfrutar do direito à vida em família, que é, por outro lado, um factor muito positivo para as políticas de integração.

6.17

Perspectiva do género — Deve ser incluída a perspectiva do género em todas as políticas de integração. São especialmente importantes as políticas de formação profissional com o objectivo de facilitar a integração no local de trabalho.

6.18

Participação cívica — O acesso aos canais de participação cívica é um dos elementos mais importantes da integração. Devem ser garantidos os direitos de cidadania e de voto nas eleições municipais aos nacionais de países terceiros com residência permanente ou de longa duração, tal como o CESE propôs em vários pareceres (25).

7.   Novas estratégias para as autoridades locais e regionais (algumas conclusões da Audição de Barcelona)

7.1   Necessidade de trabalho em rede e coordenação entre as diferentes instituições

7.1.1

O trabalho em rede e a coordenação interinstitucional são fundamentais e manifestam-se de duas formas: a horizontal, ou seja, entre os governos locais, e a vertical, ou seja, entre as administrações locais, regionais e estatais. Os desafios que comporta a imigração e a integração não podem ser assumidos por cada administração individualmente. O CESE propõe que as administrações públicas melhorem os sistemas de coordenação e que o trabalho em rede disponha de procedimentos de avaliação. Também o CESE deseja estabelecer uma melhor colaboração com o Comité das Regiões na promoção das políticas de integração.

7.1.2

Algumas regiões, como a Catalunha e o Land de Schleswig-Holstein, referiram que um dos elementos centrais do seu trabalho tinha sido envolver os municípios na planificação das suas acções. Também a região da Campania sublinhou a sua aposta no trabalho em rede com os sindicatos, os dignitários da Igreja, etc. Por seu lado, os governos locais salientaram que, em tarefas como o acolhimento, era muito importante trabalhar em rede com as entidades especializadas nessas funções.

7.1.3

Estão a aumentar as experiências de trabalho em rede entre os governos locais no âmbito europeu. A Eurocities é uma organização criada em 1986 que já integra 123 cidades europeias. Organiza-se em grupos de trabalho e um deles trata da imigração e da integração; neste grupo, participam activamente algumas das cidades presentes nesta audição, como Roterdão e Leeds. Além do intercâmbio de experiências e de boas práticas, promovem projectos europeus em que participam várias cidades.

7.1.4

Outra rede que foi criada mais recentemente e cujo objectivo é especificamente a política de imigração e integração é a rede ERLAI, a que já pertencem 26 governos locais e regionais. Os seus objectivos também são o intercâmbio de informações e de experiências, bem como o desenvolvimento de acções e de projectos comuns.

7.1.5

Existem ainda outras experiências promovidas por entidades diversas. A Fundação Europeia para a Melhoria da Qualidade de Vida e de Trabalho («European Foundation for the Improvement of Living and Working Conditions») também se apoia numa rede de cidades para cordenar as políticas de integração.

7.1.6

Ao nível europeu, a rede dos pontos de contacto nacionais para a integração, coordenada pela Comissão Europeia, também tem como objectivo o intercâmbio de experiências. Esta rede contribuiu para a elaboração do 'Manual para a Integração' (26) e para o relatório anual sobre migração e integração. (27)

7.2   Planos para a integração e participação da sociedade civil

7.2.1

Os governos locais e regionais que elaboraram planos integrais e que dispõem de serviços de gestão para a integração obtêm melhores resultados do que os que privilegiam acções dispersas. A planificação, a atribuição de recursos e a criação de instrumentos de gestão são elementos necessários para abordar a problemática da imigração e da integração.

7.2.2

O CESE considera que é muito importante que as organizações da sociedade civil participem na elaboração das políticas e no desenvolvimento das acções. Para que um plano de integração tenha êxito é importante a participação da sociedade civil. Assim o entendeu o Land de Schleswig-Holstein, que envolveu agentes sociais e entidades diversas num amplo debate sobre a integração antes da aprovação do seu projecto, conseguindo que a sociedade tomasse consciência da necessidade das políticas de integração. Outras cidades e regiões também apresentaram exemplos de processos participativos (nomeadamente Copenhaga, Barcelona e Helsínquia).

7.3   Fundo Europeu para a Integração

7.3.1

Os governos locais e regionais melhoram a sua eficácia quando contam com o apoio económico por parte dos governos dos Estados-Membros, dado que as políticas de integração exigem recursos económicos e os Estados devem assumir mais compromissos. O Land de Schleswig-Holstein referiu-se a este aspecto ao afirmar que uma das suas principais acções foi a de confrontar o Governo Alemão com a necessidade de responder a essa solicitação, tendo conseguido obter resultados positivos a este respeito.

7.3.2

Outros governos locais, como o de Lubljana e de Brescia, fizeram notar que o escasso apoio que recebiam dos respectivos governos obstava ao desenvolvimento de políticas mais gerais neste domínio. Este problema agrava-se quando os governos regionais dispõem de poucos recursos próprios, conforme referiu a região francesa de Midi-Pyrénées.

7.3.3

O Fundo Europeu para a Integração aprovado pelo Conselho e pelo Parlamento para o período 2007—2013 é fundamental, pois mobilizará para as políticas de integração importantes recursos económicos e promoverá a realização das políticas num quadro coerente e global na UE, respeitando o princípio da subsidiariedade. Os novos Estados-Membros manifestaram um interesse especial por este fundo. O CESE reitera o seu apoio à criação deste fundo e convida a Comissão a consultá-lo para a elaboração do regulamento.

7.4   Serviços especializados que não devem criar segregação

7.4.1

É preciso evitar que, através da criação de serviços especializados para os imigrantes, se favoreça a segregação. A representante de Budapeste, por exemplo, assinalou que na Hungria os municípios têm serviços de assistência às famílias e às crianças, serviços de emprego, etc., e que é a estes serviços que se devem dirigir os imigrantes da mesma forma que os outros cidadãos. Todavia, em geral, todas as cidades e regiões que adoptaram políticas de integração fizeram-no através do desenvolvimento de planos específicos e da criação de recursos e de serviços especializados. O representante de Helsínquia declarou que não deviam ser necessários serviços específicos para os imigrantes, mas que na realidade eram necessários, o que indica que a atenção exclusiva dos serviços comuns não resolve as carências, as desvantagens, as dificuldades e as necessidades específicas dos imigrantes.

7.4.2

Para a imigração e a integração são precisos planos, projectos e recursos específicos. Há um problema, contudo, que continua a ser preocupante, que é saber como devemos avançar para uma situação normalizada, ou seja, como evitar que a especificidade acabe por produzir segregação. O representante de Brescia referiu que os serviços criados para a imigração não eram serviços paralelos, mas antes complementares; e que não substituíam os serviços normais, aos quais os imigrantes deviam dirigir-se para todos os assuntos que da competência desses serviços.

7.4.3

Copenhaga sublinha igualmente que uma das preocupações do Conselho de Integração é que as suas acções não legitimem qualquer tipo de segregação das populações de imigrantes e das minorias. Convém realizar acções inclusivas, que favorecem a aproximação entre todos os sectores da população e a sua integração.

7.4.4

Neste contexto, é importante que a população autóctone não veja as acções que se realizam no âmbito da imigração como privilégios que são concedidos aos imigrantes, o que poderá agravar os prejuízos e favorecer a segregação. A região da Catalunha assim o entende ao referir que, quando se realizam acções diferenciadas para a população imigrada, há que ter muito em conta os sentimentos de exclusão que elas podem criar entre a população autóctone. Isto obriga a explicar com uma pedagogia adequada as acções que os governos locais e regionais desenvolvem em matéria de imigração.

7.5   Objectivos da integração

7.5.1

Várias cidades e regiões contribuíram com ideias sobre o próprio conceito de integração, mostrando que este é um debate que ainda não está concluído na Europa, pois existem diferentes culturas políticas e jurídicas e também vários modelos de integração na UE.

7.5.2

Num importante debate participativo, o Land de Schleswig-Holstein referiu três aspectos principais a ter em conta: a participação em condições de igualdade, a equiparação entre direitos e obrigações e o desenvolvimento de medidas inclusivas e antidiscriminatórias a aplicar tanto os imigrantes como à sociedade de acolhimento.

7.5.3

Esta linha inclusiva é a que desenvolve a Santa Casa da Misericórdia em Portugal e é a que orienta as políticas de integração em Portugal. Estas concentram-se sobretudo nas políticas de igualdade e em facilitar o acesso à nacionalidade portuguesa.

7.5.4

Barcelona referiu três aspectos: a promoção da igualdade (reconhecimento de direitos, promoção da igualdade de oportunidades e de tratamento), o reconhecimento da diversidade cultural e a promoção da convivência (favorecendo as acção para a coesão social e evitando o desenvolvimento de mundos paralelos entre a população autóctone e os grupos de população imigrada).

7.5.5

Em 2004, Roterdão iniciou um importante debate que põe em causa o modelo de integração desenvolvido até hoje. A sua necessidade surgiu ao verificar que, apesar de ter realizado políticas activas de integração durante anos, a sociedade estava a fragmentar-se e acentuavam-se os processos de segregação (especialmente em relação à população muçulmana). O aspecto mais controverso do debate foi a questão do «nós perante eles», que se tinha infiltrado na sociedade.

7.5.6

O Comité Europeu de Coordenação do Habitat Social (European Liaison Committee for Social Housing) articula o debate sobre a integração em termos de eliminação das desigualdades e de igualdade de oportunidades. O seu trabalho concentra-se na habitação, e assinala que a discriminação neste domínio é uma das principais causas de segregação das populações imigradas.

7.5.7

O CESE considera que os 11 princípios básicos comuns (que figuram no Anexo I) em que se enquadra o programa europeu para a integração têm uma perspectiva adequada e equilibrada, e este ponto de vista também foi partilhado pela maioria dos participantes na audição de Barcelona.

8.   Novos reptos para a integração no mercado de trabalho (algumas conclusões da audição de Dublim)

8.1

Através do trabalho, os imigrantes contribuem de modo positivo para o desenvolvimento económico e o bem-estar social da Europa. O CESE considera que a imigração na Europa pode representar novas oportunidades para a competitividade das empresas e para as condições de trabalho e de bem-estar social.

8.2

O emprego constitui uma parte fundamental do processo de integração, porque o emprego em condições decentes é a chave para a auto-suficiência económica dos imigrantes, favorece as relações sociais e o conhecimento mútuo com a sociedade de acolhimento. O CESE propõe que a integração no mercado do trabalho seja realizada em condições de igualdade de tratamento, sem discriminação entre trabalhadores autóctones e imigrantes, tendo em conta as qualificações profissionais necessárias.

8.3

Deve ser dado um tratamento justo aos trabalhadores imigrantes na Europa, pois estão protegidos pelas convenções internacionais de direitos humanos e abrangidos pelos princípios e direitos dos acordos da OIT. O CESE reitera a sua proposta para que os Estados-Membros da UE subscrevam a Convenção da ONU de 1990 sobre a protecção internacional dos direitos de todos os trabalhadores imigrantes e das suas famílias.

8.4

As directivas da UE sobre a igualdade de tratamento no trabalho e a igualdade de tratamento independente da origem racial ou étnica são instrumentos jurídicos essenciais para elaborar a legislação e definir as práticas nos Estados-Membros sobre a luta contra a discriminação e o fomento da integração no mercado do trabalho.

8.5

No âmbito laboral, a legislação e as políticas públicas devem ser complementadas com a colaboração dos parceiros sociais, porque a integração no mercado do trabalho também é uma questão de atitude social e de compromissos sindicais e empresariais.

8.6

Os serviços públicos de emprego devem incentivar programas para melhorar o acesso ao emprego dos imigrantes: facilitar o reconhecimento das qualificações profissionais, melhorar a formação linguística e a formação profissional, e prestar informações adequadas sobre os sistemas de trabalho do país de acolhimento.

8.7

Ao nível local, os sindicatos, as organizações empresariais, as associações de imigrantes e outras organizações da sociedade civil desempenham um papel muito importante para a transmissão da informação e para facilitar o acesso dos imigrantes ao emprego. Na Europa, são muito activas as organizações sociais que promovem a integração dos imigrantes e dos seus filhos no mercado do trabalho, nomeadamente através de programas de formação, de assessoria profissional e de apoio à criação de pequenas empresas.

8.8

Há cada vez mais empresas que aproveitam as oportunidades de êxito derivadas da integração laboral dos imigrantes, assim como da crescente diversidade. O CESE considera que as empresas podem contribuir para uma maior sensibilização da sociedade de acolhimento contra a discriminação, recusando qualquer atitude de xenofobia e de exclusão nos contratos de trabalho.

8.9

É essencial estabelecer procedimentos baseados na organização dos fluxos migratórios que deve ser realizada a partir dos países de origem e tendo em conta as possibilidades reais de inserção laboral e, por via de consequência, de integração social.

8.10

A fraca qualidade do emprego também é um factor de discriminação quando se utilizam os imigrantes como mão-de-obra «mais vulnerável».

8.11

Nos sindicatos, por vezes manifestam-se tendências corporativas que defendem unicamente alguns interesses particulares com exclusão dos interesses dos imigrantes. O CESE considera que os sindicatos devem integrar entre os seus membros os trabalhadores imigrantes e facilitar o seu acesso aos cargos de representação e de direcção. Muitos sindicatos dispõem de boas práticas que garantem que qualquer que seja a sua origem ou nacionalidade, todos os trabalhadores são iguais em direitos.

8.12

As associações de empresários estão perante um repto muito importante que é a transparência dos mercados de trabalho. O CESE considera que estas associações, juntamente com os sindicatos de trabalhadores, devem colaborar com as autoridades públicas regionais e locais para evitar situações de discriminação e promover atitudes integradoras.

8.13

Os parceiros sociais, que são actores fundamentais no funcionamento dos mercados de trabalho e constituem pilares essenciais da vida económica e social europeia, têm um importante papel a desempenhar na integração. No âmbito das negociações colectivas, estes devem assumir a responsabilidade que lhes compete na integração dos imigrantes, eliminando dos acordos colectivos e das normas e práticas laborais qualquer tentativa directa ou indirecta de discriminação.

8.14

A Europa tem numerosos exemplos de boas práticas dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil, que o CESE pretende divulgar. Na audição realizada em Dublim, foram estudadas as experiências positivas de empresas, sindicatos, organizações de empresários e organizações sociais, e o Comité pretende frisar designadamente os compromissos dos parceiros sociais na Irlanda na gestão da diversidade nas empresas e na luta contra a discriminação; e o acordo dos parceiros sociais em Espanha para legalizar o trabalho e a imigração clandestina, bem como gerir a mão-de-obra imigrante com base na colaboração e no diálogo social.

8.15

O CESE considera que são necessárias políticas activas e novos compromissos dos parceiros sociais para promover atitudes sociais integradoras, a igualdade de tratamento e a luta contra a discriminação no local de trabalho. O diálogo social europeu pode constituir um quadro adequado para que os parceiros sociais assumam novos compromissos ao nível que considerem oportuno.

8.16

O diálogo social europeu é da responsabilidade exclusiva dos parceiros sociais; a CES e a UNICE elaboraram a agenda do diálogo social europeu e o CESE deseja que alcancem os objectivos previstos.

8.17

O CESE pode constituir-se num foro permanente de diálogo sobre boas práticas em matéria de integração e imigração. O CESE vai continuar a trabalhar em colaboração com a Fundação de Dublim e a OIT para incentivar na Europa o desenvolvimento de políticas e de práticas integradoras; organizará novos encontros e foros em que participem os parceiros sociais e outras organizações da sociedade civil, com o objectivo de estudar e de realizar intercâmbios das boas práticas de integração que se desenvolvem na Europa.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie Sigmund


(1)  JO C 125 de 27.05.2002 (Relator: L. PARIZA CASTAÑOS; Co-Relator: V. MELÍCIAS).

(2)  Cfr. as conclusões gerais da conferência.

(3)  COM(2004) 508 final.

(4)  COM(2003) 336 final.

(5)  JO C 80 de 30.03.2004 (Relator: L. PARIZA CASTAÑOS).

(6)  http://europa.eu.int/comm/justice_home/doc_centre/immigration/integration/doc/handbook_en.pdf

(7)  COM(2005) 389 final.

(8)  Cfr. COM(2005) 389 final, ponto 2.

(9)  Anexo I.

(10)  Cfr. COM(2005) 123 final.

(11)  Parecer sobre «A gestão dos fluxos migratórios», JO C 88 de 11.04.2006 (Relatora: A. LE NOUAIL MARLIÈRE).

(12)  Cfr. COM(2005) 389 final, ponto 3.

(13)  COM(2001) 387 final.

(14)  JO C 221 de 17.09.2002 (Relatora: S. ZU EULENBURG).

(15)  Directivas 2003/109/CE e 2003/86/CE.

(16)  Parecer sobre o Livro Verde «Uma abordagem da União Europeia em matéria de gestão da imigração económica» (Relator: L. PARIZA CASTAÑOS). JO C 286, de 17.11.2005.

(17)  Cfr. COM(2005) 389 final, ponto 3.2.

(18)  JO C 80 de 30.03.2004, ponto 1.10 (Relator: L. PARIZA CASTAÑOS).

(19)  JO C 125 de 27.05.2002, ponto 1.4 (Relator: L. PARIZA CASTAÑOS).

(20)  Convenção sobre a Protecção e a Promoção da Diversidade de Expressões Culturais. (Cfr.

http://portal.unesco.org/culture/en/ev.php-URL_ID=11281&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html).

(21)  Cfr. Directiva 2003/86/CE e pareceres do CESE no JO C 204 de 18.07.2000 (Relatora: G. CASSINA) e no JO C 241 de 07.10.2002 (Relator: D. MENGOZZI).

(22)  Directivas 2000/43/CE e 2000/78/CE.

(23)  Cfr. a actuação positiva dos parceiros sociais na Irlanda, referida no Anexo III.

(24)  Cfr. a Directiva 2003/86/CE e os pareceres do CESE — JO C 204 de 18/07/2000 (Relatora: G.CASSINA) e JO C 241 de 07/10/2002 (Relator: D. MENGOZZI).

(25)  Cfr. o parecer sobre o «Acesso à cidadania da União Europeia», JO C 208 de 03.09.2003 (Relator: L. PARIZA CASTAÑOS).

(26)  http://europa.eu.int/comm/justice_home/doc_centre/immigration/integration/doc/handbook_en.pdf

(27)  COM(2004) 508 final.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/137


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o tema Os conselhos de empresa europeus: um novo papel na promoção da integração europeia

(2006/C 318/25)

Em 12 de Julho de 2005, o Comité Económico e social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 artigo 29.o do Regimento elaborar um parecer sobre: Os conselhos de empresa europeus: um novo papel na promoção da integração europeia.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania que emitiu parecer em 6 de Setembro de 2006, sendo relator E. IOZIA.

Na 429o reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 144 votos a favor, 76 votos contra e 15 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité Económico e Social Europeu reconhece o papel fundamental dos conselhos de empresa europeus (CEE) que favorecem e apoiam a coesão social e constituem um instrumento de integração dos trabalhadores europeus, facilitando a percepção da cidadania europeia através do conhecimento recíproco. Os mais de 10.000 delegados dos CEE activos na Europa são actores directos e motivados na construção de uma nova sociedade.

1.2

O modelo social europeu, assente na busca de consenso e de diálogo social, no respeito da identidade e da dignidade do indivíduo, na contemporização de vários interesses, na capacidade de conjugar o desenvolvimento com a preocupação pelo indivíduo e pelo ambiente, defende a constituição de uma plataforma de encontro e de ligação no âmbito das empresas transnacionais. O CESE considera que a Directiva 94/45 teve um papel muito importante na consecução destes objectivos.

1.3

A Comissão devia reexaminar, até 22 de Setembro de 1999, «em consulta com os Estados-Membros e os parceiros sociais a nível europeu» as regras de execução da directiva para propor ao Conselho «eventuais alterações necessárias».

1.4

A Comissão iniciou a consulta dos parceiros sociais. A UNICE e a CEEP declararam-se contrárias a uma revisão da directiva, enquanto a Confederação Europeia dos Sindicatos (CES) solicitou, em contrapartida, por várias vezes a sua revisão urgente.

1.5

O CESE procedeu a uma análise acurada da situação actual, designadamente, através de uma ampla audição dos representantes do mundo laboral, das empresas e da sociedade civil.

1.6

As experiências até hoje apresentam numerosos aspectos positivos. Como referem vários estudos sobre o assunto, como realçaram as partes sociais em seminários conjuntos e como recorda o CESE especialmente, foram celebrados acordos voluntários sobre a organização do trabalho, o emprego, as condições laborais e a formação profissional, no contexto de uma parceria para a mudança. De igual modo, a sua correcta realização depende exclusivamente da vontade das partes.

1.7

Mas, por outro lado, a experiência dos CEE revela também algumas pechas. A mais evidente é a percentagem bastante reduzida de CEE constituídos em relação ao número de empresas que têm obrigação de o fazer nos termos da directiva que prevê a possibilidade de constituir um CEE por iniciativa das empresas ou dos trabalhadores de, pelo menos, dois Estados-Membros. Entre as causas da aplicação incompleta da directiva figura igualmente a falta de iniciativa dos trabalhadores que, provavelmente, se deve em certos países à inexistência de legislação de protecção dos direitos sindicais nas empresas.

1.8

Nos anos que se seguiram à Directiva 94/45 houve um reforço do quadro normativo comunitário sobre os direitos de informação e consulta, em particular nas directivas 2001/86, 2002/14 e 2003/72, que contêm conceitos de informação e consulta mais avançados dos previstos na directiva supra e procedimentos de participação dos trabalhadores orientados para antecipar a consulta em relação às decisões. Estes procedimentos contribuem para aumentar a competitividade das empresas no plano global.

1.9

O CESE destaca três pontos principais que deverão ser tidos em conta para a rápida actualização da Directiva 94/45:

coordenar as disposições em matéria de informação e consulta contidas na Directiva 94/45 com as de teor idêntico das directivas supramencionadas;

alterar o número de representantes dos trabalhadores no Grupo Especial de Negociação (GEN) e nos CEE, tendo em conta o alargamento da UE e o direito dos representantes de cada país interessado a integrá-los, num número máximo de 17, conforme estabelecido na directiva, correspondente agora ao número dos países a que se destina;

reconhecer o direito dos sindicatos nacionais e europeus de fazerem parte do GEN e dos CEE, com a possibilidade de se fazerem assistir por peritos da sua escolha, também fora das reuniões previstas.

1.10

O CESE propõe que, após um período razoável para a integração dos novos Estados-Membros e a partir do momento em que as partes sociais evidenciarem conhecimentos sobre os CEE durante debates em seminários organizados para o efeito, se proceda ao reexame da directiva integrando estas experiências e indicações, actualmente já disponíveis.

1.11

O CESE apoia a dimensão social da empresa na União Europeia e o papel desempenhado pelos CEE. No debate europeu sobre o desenvolvimento sustentável e o modelo social europeu tem-se dado ênfase às peculiaridades da União Europeia. A responsabilidade social da empresa na economia global é uma das respostas europeias aos problemas colocados pela globalização, cujos efeitos negativos poderão ser atenuados pelo respeito das regras fundamentais da OIT por parte de todos os países membros da Organização Mundial do Comércio. A empresa é considerada como um sujeito fundamental no contexto social, capaz de dar um contributo essencial para a melhoria da qualidade de vida de todas as partes directamente interessadas e das regiões. Note-se que, tal como foi o caso para o comité de empresa europeu, em particular ao nível transnacional, a evolução do diálogo social é muito importante, sobretudo porque passa pelos aspectos normativos.

1.12

O CESE toma nota das afirmações da Comissão Europeia na sua comunicação relativa à Responsabilidade Social das Empresas (CSR) sobre a importância do papel dos trabalhadores e dos seus sindicatos na aplicação de práticas de responsabilidade social (1). Esta refere concretamente que: «O diálogo social, especialmente a nível sectorial, tem sido um meio eficaz de promover as iniciativas de RSE e os conselhos de empresa europeus também têm desempenhado um papel construtivo no desenvolvimento das melhores práticas relacionadas com a RSE. Todavia, a aceitação, implementação e integração estratégica da RSE pelas empresas europeias carece de melhoria. O papel dos trabalhadores, dos seus representantes e dos sindicatos no desenvolvimento e na implementação de práticas de RSE pode ser aperfeiçoado. As partes interessadas externas, incluindo ONG, consumidores e accionistas, podem desempenhar um papel mais forte incentivando e premiando uma conduta responsável por parte das empresas».

1.13

Além da protecção que oferece aos mais desfavorecidos e do bem-estar social, o modelo social europeu caracteriza-se pelo respeito dos direitos que fundamentam a dignidade das pessoas em todos os lugares e em todas as circunstâncias. Na Europa moderna, os direitos de cidadania devem, com efeito, poder ser exercidos em toda a parte, inclusivamente no local de trabalho e, em particular, no âmbito transnacional da empresa. O CESE exorta a Comissão a reconhecer os novos elementos positivos que lhes foram aduzidos graças à adopção da Directiva 94/45/CE e a detectar as medidas mais adequadas para reforçar o sentimento de pertença à União.

2.   O contexto socioeconómico e regulamentar em que funcionam os conselhos de empresa europeus (CEE).

2.1

O CESE pretende, em primeiro lugar, valorizar os vários aspectos positivos resultantes da experiência já decenal de aplicação da Directiva 94/45/CE, embora sem ignorar as dificuldades e as pechas que caracterizaram a experiência dos conselhos de empresa europeus. Solicita, para tal, a colaboração de todos os interessados — instituições, órgãos comunitários e parceiros sociais aos vários níveis organizacionais — para melhorar este instrumento democrático de representação, que surge como indispensável para a consolidação do modelo social europeu, a cujo desenvolvimento estável e reforço o CESE reitera o seu apoio.

2.2

Com o presente parecer de iniciativa, pretende o CESE contribuir para uma maior eficácia do papel dos CEE, através da actualização da Directiva 94/45/CE, com o fito de favorecer a integração e a coesão social, objectivo que se reveste de crescente importância política, sobretudo na actual fase em que é menor a tensão perante a construção de uma União Europeia socialmente mais forte e unida.

2.3

Doze anos volvidos sobre a aprovação da directiva, muita coisa mudou na União. O processo de alargamento, apoiado pelo CESE, determinou a adesão de dez países em Maio de 2004, havendo mais dois (a Bulgária e a Roménia) em vias de adesão. Apesar dos notáveis esforços para harmonizar as legislações nacionais com o acervo comunitário e dos importantes progressos na protecção das condições laborais, nalguns destes países as organizações de trabalhadores e de empresas têm ainda dificuldade em consolidar o seu nível de representação.

2.4

O CESE gostaria que o diálogo social fosse reforçado e que os CEE fossem considerados como um instrumento indispensável para o efeito, porquanto introduzem sistemas de relações e de audição recíprocas susceptíveis de promover a cultura do diálogo social nos Estados-Membros.

2.5

A adopção pelo Conselho de Ministros, em 22 de Setembro de 1994, da Directiva 94/45/CE relativa à instituição de um conselho de empresa europeu ou de um procedimento de informação e consulta dos trabalhadores nas empresas ou grupos de empresas de dimensão comunitária, que a Directiva 97/74/CE do Conselho, de 17 de Novembro de 1997, tornou extensiva ao Reino Unido, constituiu um avanço decisivo no desenvolvimento de um diálogo social europeu nas empresas, em sintonia com a estrutura transnacional das empresas e dos grupos de empresas. Este novo instrumento, de carácter transnacional, contribuiu resolutamente para desenvolver a dimensão europeia das relações industriais (2).

2.6

Nos termos do artigo 15.o da Directiva 94/45/CE, a Comissão devia reexaminar, até 22 de Setembro de 1999, «em consulta com os Estados-Membros e os parceiros sociais a nível europeu» as suas regras de execução para propor ao Conselho «as eventuais alterações necessárias». Este reexame deveria incidir nas regras de execução da directiva e, por conseguinte, em todos os aspectos referentes à constituição e ao funcionamento dos conselhos de empresa europeus, sobretudo a adequação dos limiares de efectivos.

2.7

Embora fosse um processo indubitavelmente inovador, a Comissão considerava que, em 22 de Setembro de 1999, as negociações conduzidas e as actividades desenvolvidas nos conselhos de empresa europeus forneceriam elementos suficientes e experiências concretas para permitir ao reexame da directiva.

2.8

Em 4 de Abril de 2000, a Comissão apresentou o seu relatório sobre a aplicação da directiva ao Parlamento e ao Conselho. Embora incidisse essencialmente na avaliação das medidas de transposição adoptadas pelos Estados-Membros, o relatório avaliava também a aplicação da própria directiva. Independentemente da qualidade dos actos de transposição, a Comissão salientava que alguns dos seus pontos careciam ainda de interpretação e referia que, habitualmente, eram as partes interessadas ou as autoridades judiciais a dirimir esses problemas, razão pela qual não via necessidade de propor uma alteração da directiva naquela fase.

2.9

O Parlamento Europeu também se interessou pelo reexame da directiva, tendo destacado na sua resolução sobre a aplicação da directiva e a necessidade da sua revisão, aprovada em 4 de Setembro de 2001, o papel das organizações transnacionais de representação dos trabalhadores, avaliando os limites e as oportunidades decorrentes do exercício dos direitos de informação e consulta (3). O PE convidou a Comissão a apresentar, sem delongas, uma proposta de alteração da directiva com uma série de melhorias: além da possibilidade de os trabalhadores influenciarem o processo decisório da direcção da empresa e da previsão de sanções adequadas, o PE reputava necessária a revisão do próprio conceito de «empresa de dimensão comunitária» no tocante aos limites numéricos. No entender do PE, o âmbito de aplicação da directiva deveria passar de 1 000 para 500 e de 150 para 100 empregados para as empresas presentes em, pelo menos, dois Estados-Membros (como é sabido, também durante o processo de aprovação da directiva, as propostas do Parlamento e da Comissão apontavam para números inferiores aos que viriam depois a figurar na directiva 94/45) (4).

2.10

Em 2004, após um longo período de aplicação da referida directiva, a Comissão considerou oportuno reexaminá-la, tanto mais que a questão figurava na Agenda Social adoptada em Nice em Dezembro de 2000.

3.   O processo de revisão da Directiva 94/45

3.1

Em 20 de Abril de 2004, a Comissão deu início à primeira fase de consulta dos parceiros sociais sobre a revisão da Directiva 94/45, pedindo-lhes que se pronunciassem sobre:

o melhor modo de garantir, no futuro, a plena concretização das capacidades e potencialidades dos CEE na promoção de um diálogo social transnacional construtivo e profícuo para as empresas,

a possível orientação da acção comunitária neste sentido, incluindo a revisão da directiva sobre os CEE,

o papel que os parceiros sociais se propõem desempenhar no tratamento das questões ligadas à gestão de um contexto em rápida e profunda mudança e às respectivas consequências sociais.

3.2

No início das consultas, a Comissão afirmou que o quadro de referência institucional sofrera profundas alterações em relação ao analisado no seu relatório de 4 de Abril de 2000, que não tinha em conta elementos novos como a Agenda de Lisboa e o alargamento da União. No que se refere especificamente ao alargamento, a Comissão salientou que «a extensão das actividades nos novos Estados-Membros fará aumentar o número de empresas que ficarão abrangidas pelo âmbito de aplicação da directiva» e «se as empresas ou os grupos com filiais nos novos Estados-Membros já tiverem CEE, estes deverão ser alargados para garantir a representação das novas filiais». A partir de 1 de Maio de 2004, a aplicação da directiva relativa à instituição de um CEE contará com mais e novos representantes, alguns dos quais dos novos Estados-Membros, com diferentes condições económicas, tradições sociais, línguas e culturas, o que aumentará a complexidade da situação e o peso dos custos envolvidos.

3.3

Em 24 de Setembro de 2003, o Comité Económico e Social adoptou um parecer no qual chamava a atenção da Comissão para alguns aspectos a ter em consideração para uma eventual revisão da directiva (5).

3.4

A UNICE respondeu à Comissão que era absolutamente contrária a uma revisão de uma directiva sobre os Conselhos de Empresa Europeus (CEE) (6). A melhor maneira de desenvolver a informação e a consulta dos trabalhadores nas empresas comunitárias passa pelo diálogo nas sociedades destinatárias da directiva. Uma intervenção do legislador comunitário seria contraproducente porque poderia reduzir a dinâmica da progressão gradual do funcionamento dos CEE. Por sua vez, a CEEP declarou-se contrária a uma revisão da directiva nesta fase. Embora não esteja de acordo com esta revisão, pede que se utilize melhor os instrumentos existentes, designadamente, o procedimento de informação e de consulta. Os parceiros sociais europeus poderão desempenhar um papel fundamental nesse processo, especialmente nos novos Estados-Membros. Além disso, os estudos pontuais, que criaram as bases para orientar a gestão da mudança e das suas consequências sociais, trazem à luz a importância de uma informação e de uma consulta eficazes e inspiram as actividades ulteriores dos parceiros sociais, sobretudo nos novos Estados-Membros (7).

3.4.1

Em contrapartida, a Confederação Europeia dos Sindicatos (CES) respondeu afirmativamente, corroborando algumas observações já aduzidas numa sua anterior resolução de 1999 (8). Com base nos acordos e nas práticas seguidas até à data, considera a CES que os limites e as lacunas imputáveis à legislação não podem ser corrigidos apenas com negociações, e muito menos facultativas, mesmo que se continue a acompanhar as experiências positivas das boas práticas, mas considera absolutamente «urgente e necessária» (9) a revisão da própria directiva.

3.5

A Comissão procedeu à segunda fase de consulta dos parceiros sociais europeus sobre a revisão da directiva relativa aos conselhos de empresa europeus, mas simultaneamente com a consulta sobre as reestruturações. O CESE congratulou-se com o lançamento da segunda fase de consulta sobre a revisão da Directiva 94/45/CE, mas manifestou igualmente algumas reservas por o procedimento respectivo ter obedecido a um contexto e sido associado a um tema diferente: «Embora os conselhos de empresa europeus tenham um papel preponderante nas reestruturações, os dois temas devem ser tratados separadamente. Porém, e independentemente disso, a directiva relativa aos conselhos de empresa europeus já devia ter sido revista há muito tempo» (10).

4.   A experiência dos CEE. Uma questão de método: valorizar os aspectos positivos e reflectir sobre os resultados negativos

4.1

As experiências até à data denotam numerosos aspectos positivos. Os estudos revelam como um número crescente de CEE funciona bem, apesar das novas condições. Conforme sublinha a declaração conjunta dos parceiros sociais de Abril de 2005 «Ensinamentos sobre os Conselhos de Empresa Europeus», estes contribuíram, designadamente, para que os representantes dos trabalhadores e os próprios trabalhadores compreendessem melhor o mercado interno e a cultura de empresa transnacional numa economia de mercado. Como atrás ficou dito, há cada vez mais CEE a funcionar bem e a participar na melhoria do diálogo sectorial. De acordo com vários estudos sobre o assunto, conforme realçaram os parceiros sociais em seminários conjuntos e relembra o CESE especialmente, foram celebrados acordos voluntários sobre a organização do trabalho, o emprego, as condições laborais e a formação profissional, no contexto de uma parceria para a mudança (11).

4.1.1

Todas as propostas de revisão analisam os principais problemas surgidos durante os controlos frequentes das actividades dos CEE na Europa. Uma investigação muito recente (12) revelou que, actualmente, quase 75 % dos CEE não respeitam o preceituado na directiva sobre o fornecimento de informações em tempo útil no caso de reestruturações. Outro elemento muito importante que ressalta da análise das respostas de 409 delegados pertencentes a 196 CEE é a informação dada por 104 deles, segundo a qual foram negociados e concluídos textos conjuntos no âmbito dos respectivos conselhos de empresa europeus. Se considerarmos que, em 2001, segundo um importante estudo da Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho  (13), houve 22 acordos subscritos directa ou indirectamente pelos CEE, ficamos com uma ideia clara, ainda que parcial, da constante evolução do papel destes conselhos que têm desenvolvido uma verdadeira capacidade negocial.

4.2

A experiência dos CEE também revela algumas pechas que requerem aturada reflexão para se melhorar este instrumento democrático de representação e participação dos trabalhadores, elemento já imprescindível do modelo social europeu. Entre os pontos críticos, o mais evidente é a percentagem bastante reduzida de CEE em relação ao número de empresas que têm obrigação de os constituir, a pedido dos trabalhadores, nos termos da directiva. Em Dezembro de 2004, em 2.000 empresas destinatárias da directiva tinham sido constituídos 800 CEE aproximadamente (14), representando cerca de 70 % dos seus trabalhadores. Entre as causas da aplicação incompleta da directiva figura igualmente a falta de iniciativa dos trabalhadores que se deve, contudo, em certos países, ao carácter incipiente da representação dos trabalhadores nos locais de trabalho, o qual pode ser também consequência da legislação nacional que não oferece a protecção necessária. Este aspecto merecia ser aprofundado para encontrar possíveis soluções.

4.3

O novo âmbito territorial de aplicação da Directiva 94/45/CE, mais vasto, torna necessário um processo de reflexão e estudo para que todos os interessados, sejam eles os Estados-Membros mais antigos ou os mais recentes, possam assimilar elementos e dados pertencentes a culturas, práticas e realidades diversas e superar os obstáculos ligados às diferenças sociais, económicas e culturais, reforçando assim o sistema das relações laborais europeias no seu todo.

4.3.1

Todavia, as questões ligadas ao alargamento da União são apenas um aspecto da mudança mais vasta e geral do mercado de trabalho e do sistema empresarial da UE. A aceleração das reestruturações transnacionais, hoje uma constante na vida das empresas, e a sua nova natureza, constituem um desafio para os conselhos de empresa europeus decerto mais decisivo do que o legislador comunitário havia inicialmente pensado na Directiva 94/45/CE. Para demonstrá-lo, basta observar a legislação adoptada posteriormente sobre a participação dos trabalhadores.

4.4

Com efeito, o contexto legislativo alterou-se significativamente. Surgiram novas normas comunitárias no domínio da informação e da consulta dos trabalhadores, quer em termos transnacionais, como a Directiva 2001/86/CE do Conselho, de 8 de Outubro de 2001, que completa o estatuto da sociedade europeia no atinente ao envolvimento dos trabalhadores, a Directiva sobre a SCE e a Directiva sobre as fusões, bem assim as que incidem nos aspectos nacionais, como a Directiva 2002/14/CE, de 11 de Março de 2002, que estabelece um quadro geral relativo à informação e à consulta dos trabalhadores na Comunidade Europeia.

4.5

O novo papel, mais exigente, a desempenhar pelos CEE é igualmente descrito na comunicação da Comissão relativa às reestruturações das empresas transfronteiriças (15).

4.6

Em numerosos pareceres, manifestou o CESE o seu apreço e apoio ao desenvolvimento e reforço dos CEE (16), discorrendo sobre o seu papel fundamental nas reestruturações transfronteiriças. Com efeito, estes têm sido cruciais no sector metalomecânico, em muitos aspectos, graças ao seu contributo para a celebração de acordos destinados a manter os locais de produção e a salvaguardar os postos de trabalho.

5.   O papel da Directiva 94/45/CE na evolução das relações industriais europeias

5.1

Esta directiva é uma das mais importantes adoptadas no âmbito das relações laborais europeias. Embora com alguns limites e lacunas assinalados por vários quadrantes, contribuiu inegavelmente para lançar o processo de construção de «novas práticas transnacionais de relações laborais», conciliando novos modelos de solidariedade entre trabalhadores de diferentes países e de comparação construtiva entre representações de trabalhadores e empresas transnacionais e prevendo, pela primeira vez, formas comuns de representação e protecção «sem fronteiras» de alguns direitos fundamentais dos trabalhadores.

5.2

Todavia, como demonstram os dados sobre a aplicação da directiva, o seu contributo dinâmico para a construção de um modelo integrado de relações laborais e para a consolidação do modelo social europeu tem vindo a perder eficácia nos últimos anos. Vários são os elementos estruturais atinentes às transformações do mercado de trabalho e do sistema das empresas com influência neste processo. O CESE já abordou essas questões nos pareceres sobre a Agenda Social da Comissão e sobre as reestruturações. O facto de os direitos de informação e consulta de que usufruem os CEE não lhes «permitirem concretamente»«intervir de modo adequado» na definição e na aplicação das políticas industriais das empresas também reduz a incidência da sua acção. Há, porém, casos em que os CEE conseguiram ver reconhecido o seu papel.

5.3

Como frisou o CESE num recente parecer, «a política industrial europeia deve ser definida em termos empresariais, sectoriais e profissionais e aplicada com o contributo dos parceiros sociais, cujos conhecimentos técnicos especializados são fundamentais porquanto são as principais partes interessadas. Tal pressupõe que as empresas clarifiquem as suas intenções numa fase suficientemente precoce para que os outros interessados possam intervir a tempo» (17).

5.4

Um factor de estiolamento da acção dos CEE parece ser o facto de as modalidades de informação e consulta — temas objecto da revisão da Directiva 94/45/CE — não parecerem coerentes nem com o novo quadro económico e estrutural nem com o novo quadro normativo comunitário constituído pelas Directivas 2001/86, 2003/72 e 2002/14 já citadas. Nestas directivas, os procedimentos de informação e consulta não são meras formalidades nem obrigações de rotina que a empresa pode cumprir, observando apenas formalmente as normas jurídicas, e «a jusante» do processo decisório, mas sim procedimentos a seguir «a montante» deste.

5.5

Nas directivas que completam os regulamentos comunitários sobre os estatutos da SE e da SCE, os procedimentos de informação e consulta não almejam apenas dar a conhecer aos representantes dos trabalhadores as decisões irrevogáveis da empresa sobre processos relevantes, como as transformações e as reorganizações transnacionais, mas sobretudo dar-lhes o direito de «influir nelas».

6.   A informação e a consulta dos trabalhadores, componente essencial do modelo social europeu

6.1

Os procedimentos de informação e consulta dos trabalhadores (bem assim os de participação, em sentido estrito, nos termos das Directivas 2001/86 e 2003/72) são elementos essenciais dos sistemas de relações industriais da União Europeia e do próprio modelo social europeu, como se infere da enunciação desses direitos no direito primário da UE (18) e da sua constante evolução no direito derivado comunitário. Com efeito, os direitos em questão são reconhecidos e protegidos numa vasta série de directivas (19), culminando com a assinatura da Carta dos Direitos Fundamentais, em Dezembro de 2000, e com a sua posterior incorporação no Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa (20)

6.1.1

Na Carta dos Direitos Fundamentais reveste-se de especial importância a especificação de que os direitos em questão sejam exercidos «em tempo útil», favorecendo assim uma interpretação orientada para a natureza sobretudo preventiva desses direitos, que vai no sentido da recente legislação (cf. directivas já mencionadas) e jurisprudência (21).

6.1.2

A evolução progressiva e constante da legislação sobre os direitos de informação e consulta, a partir de meados dos anos setenta, tanto no quadro jurídico nacional como transnacional, explica-se pelo interesse do legislador comunitário em não reduzir a meras formalidades de rotina os procedimentos em questão. Como se sabe, o encerramento da fábrica da Renault de Vilvoorde (Fevereiro de 1997), com grandes repercussões também no plano judiciário, foi determinante para o reforço desses direitos.

6.2

Um relatório elaborado por um grupo de peritos, designado por Grupo Gyllenhammar, mandatados pelo Conselho Europeu do Luxemburgo (Novembro de 1997) salientou a necessidade de um novo quadro normativo comunitário que definisse normas mínimas, as quais, além de estabelecerem princípios, regras e modalidades comuns aos Estados-Membros para a informação e a consulta, deveriam ser coerentes com a Estratégia Europeia para o Emprego. Esta estratégia, baseada nos conceitos de «antecipação», «prevenção» e «empregabilidade», que se transformaram logo em seguida em seus elementos constituintes, deve ser integrada nas políticas públicas dos Estados-Membros, para ter repercussões positivas no emprego através da intensificação do diálogo social, também nas empresas, e facilitar uma mudança coerente com a manutenção do objectivo prioritário do emprego.

6.3

É neste quadro que se insere — e é valorizado — o enunciado «promover o envolvimento dos trabalhadores no funcionamento e no futuro da empresa»«e melhorar a competitividade desta» (22). Esse envolvimento, dilucida o legislador, constitui «uma condição prévia para o êxito dos processos de reestruturação e adaptação das empresas às novas condições resultantes da globalização da economia» (23).

6.4

Esta última disposição é particularmente importante para a eficácia dos procedimentos de informação e consulta e, consequentemente, para a participação dos trabalhadores, sobretudo na parte onde se afirma (24), nas disposições supletivas, aplicáveis por via subsidiária, que, caso a sociedade «decida não actuar segundo o parecer expresso pelo órgão de representação, este terá direito a voltar a reunir-se com o órgão competente da SE (ou da SCE) para tentar chegar a um acordo».

6.5

As empresas europeias, sobretudo as organizadas em grandes grupos, estão empenhadas em processos de reestruturação cada vez mais eficazes e rápidos. O CESE realçou num seu recente parecer que «as reestruturações, que não passem de intervenções reactivas, são geralmente dolorosas e repercutem-se negativamente no emprego e nas condições de trabalho», concluindo que «o envolvimento e a co-gestão dos trabalhadores (assim como dos representantes dos trabalhadores nas empresas e dos sindicatos que os representam) contribuem decisivamente para uma actuação socialmente responsável e para a gestão das mutações a nível empresarial», afirmando que «os conselhos europeus de empresa desempenham aqui um papel especial e que tudo indica que o diálogo social transnacional ao nível empresarial continuará a ganhar dinamismo, como o demonstram os acordos sobre medidas de reestruturação celebrados entre empresas e conselhos de empresa europeus ou associações de sindicatos europeias.» (25).

6.6

A qualidade e a intensidade destes processos de reestruturação deixaram bem patentes a insuficiência dos instrumentos legislativos e negociais actualmente ao dispor dos representantes dos trabalhadores e dos parceiros sociais e, por conseguinte, a necessidade de uma maior e mais eficaz participação das organizações sindicais aos vários níveis. Não se trata apenas de completar a fase de aplicação formal da directiva sobre os CEE, mas garantir, primeiro, a plena eficácia dos acordos e das normas nacionais de transposição e, depois, adaptar os procedimentos de informação e consulta e os direitos dos conselhos de empresa europeus às novas condições do mercado e a políticas de gestão mais eficazes.

6.7

Para tal, não basta uma actividade negocial atenta e cheia de boa vontade que é preciso, mesmo assim, encorajar. São necessárias alterações oportunas de partes da directiva, porque senão corre-se o risco de aniquilar o papel dos CEE em geral, não obstante as boas práticas registadas até hoje. Ou melhor, corre-se o risco de a difusão de procedimentos essencialmente de rotina no plano supranacional — que é, aliás, o fundamental para as decisões de muitas empresas que, de outro modo, não passariam pela lupa sindical –, ou o predomínio das «más práticas» em detrimento das «boas» em matéria de informação e consulta registadas até à data, poder afectar esses mesmos direitos no plano nacional. Isto sem contar com o efeito contraproducente que poderia ter na relação com os trabalhadores e com as direcções das empresas locais, no que respeita à legitimação e à autoridade, influenciando negativamente a cultura dos direitos de informação e consulta vinculativos, recentemente consignados na Carta de Nice e nas Directivas 2001/86, 2003/72 e 2004/14 (parafraseando a lei de Gresham, «a má moeda expulsa a boa moeda de circulação», bastando substituir aqui o termo moeda por informação).

6.8

Trata-se fundamentalmente do reconhecimento formal das organizações sindicais. Nas directivas sobre a participação dos trabalhadores na SE ou na SCE, fala-se pela primeira vez de organizações dos trabalhadores como sujeitos que podem integrar o grupo especial de negociação. Nas directivas anteriores (sobre direitos de informação e consulta), às organizações sindicais enquanto tais nunca foi reconhecido um papel directo (ou de apoio) nas negociações. Estes elementos, bem como as especificidades nacionais, devem ser tidos em conta para a eventual revisão da directiva, juntamente com os que expomos a seguir.

7.   Por que motivo é oportuno um reexame da directiva antes de renegociar a sua revisão

7.1

Muitos são os que consideram haver três razões fundamentais para um novo exame da directiva:

7.1.1

O primeiro diz respeito à evolução havida nas directivas relacionadas com este tema que impõe a adaptação da directiva de 1994. É necessário simplificar e coordenar para eliminar definições diferentes sobre o mesmo objecto em várias directivas.

7.1.2

O segundo motivo para esta evolução deriva do alargamento da União que obriga logicamente a aumentar o número dos representantes nos CEE, elevando, proporcionalmente o seu número.

7.1.3

O terceiro motivo reside no reconhecimento do direito dos sindicatos nacionais e europeus de participarem nas negociações e de fazerem parte dos comités de empresa europeus (por analogia com as previsões das directivas sobre a participação dos trabalhadores na SE e na SCE), com a possibilidade de recorrerem a peritos por si designados, também para além das reuniões previstas.

7.1.4

Além disso, avaliando as práticas vigentes nos CEE, afigura-se oportuno a revisão da Directiva 94/45/CE, mesmo à luz das perspectivas que se podem abrir no que respeita à responsabilidade social das empresas e ao novo papel a desempenhar pelas organizações da sociedade civil nas empresas de dimensão europeia e global, além da acção a realizar por estas empresas para impor o respeito dos direitos sociais e sindicais fundamentais no seu próprio âmbito.

7.2

Os ensinamentos extraídos pelos parceiros sociais (26) nos CEE mereciam ser aprofundados para melhorar as práticas destes conselhos e para desenvolver e aperfeiçoar os acordos, mas isto não deve, contudo, obstar ao início dos trabalhos com vista a relançar o funcionamento dos CEE e definir as bases de revisão após um período razoável de integração dos novos Estados-Membros no processo dos CEE. No âmbito das futuras negociações, ter-se-á em conta os seguintes elementos:

a)

clarificar o texto actual no tocante às modalidades e à qualidade da informação e da consulta: seria necessária uma afirmação explícita sobre o carácter preventivo (ou de antecipação) dos procedimentos de informação e consulta, mormente sobre os temas «na ordem do dia» ou solicitados pelos representantes dos trabalhadores. Não admitir o carácter preventivo dos próprios procedimentos na legislação comunitária sobre os CEE daria azo a uma grave assimetria entre os procedimentos da Directiva 94/45/CE, por um lado, e as directivas referentes ao envolvimento dos trabalhadores (directivas sobre a sociedade europeia e a sociedade cooperativa europeia), com o risco, aliás, de estiolar estas últimas. Além de que a difusão de procedimentos de informação e de consulta pouco eficazes nas empresas de dimensão comunitária (obrigatória de acordo com a Directiva n.o 94/45) pode produzir «efeitos miméticos» negativos nos procedimentos de informação e consulta a cumprir pelas empresas nacionais por força de várias directivas (27).

b)

prever, quer no caso de conselhos de empresa muito numerosos, quer atendendo às funções que devem desempenhar, uma estrutura de secretariado permanente e um órgão restrito para garantir a preparação dos encontros, a organização da documentação referente à ordem do dia, a divulgação prévia da ordem do dia e dos documentos nas várias línguas e, posteriormente, dos actos e dos documentos referentes às decisões tomadas (28). igualmente importante é a necessidade de coordenar diversas experiências, por exemplo, sector industrial/sector dos serviços;

c)

garantir a comunicação regular e fácil entre os membros do grupo especial de negociação antes da constituição do CEE e, posteriormente, entre os membros deste conselho nos intervalos das reuniões;

d)

assegurar a organização de encontros com a duração adequada entre os membros do CEE, antes da reunião com os representantes da direcção. e)

e)

reconhecer o direito de os sindicatos nacionais e europeus participarem nas negociações e serem membros do CEE (à semelhança do que prevêem as directivas sobre o envolvimento dos trabalhadores na SE e na SCE), podendo recorrer a peritos de confiança, e não só para as reuniões;

f)

adaptar os acordos existentes às mudanças no «perímetro» do grupo de empresas. é, sobretudo, necessário prever explicitamente uma fase específica de negociação suplementar, no caso de concentrações ou fusões transfronteiras, correlacionando-a com as directivas existentes sobre o assunto;

g)

apoiar a formação inicial — e depois periódica — dos membros do CEE;

h)

incluir também nos temas objecto de informação e consulta o da RSE (conforme previsto na directiva sobre a SCE), envolvendo as organizações europeias que tenham a ver com a actividade da empresa;

i)

prestar atenção à importância das repercussões e da divulgação de informações relacionadas com a vida, os actos e as tomadas de posição do CEE junto das representações e dos trabalhadores de cada uma das empresas de um grupo em todos os países onde a empresa tenha filiais;

j)

velar por uma adequada representação dos deficientes e pelo equilíbrio efectivo entre homens e mulheres nos CEE (cf. Directiva 2003/72);

k)

prever medidas de incentivo para as empresas que garantam a plena aplicação da directiva e medidas dissuasivas para as empresas que procuram entravar a sua realização;

l)

promover, com as oportunas adaptações dos procedimentos aplicáveis, a participação nos CEE de todas as categorias de trabalhadores, incluindo os quadros.

8.   A acção dos CEE numa União mais ampla: o seu contributo para o reforço da coesão social europeia

8.1

Uma das questões que merecem uma reflexão específica é a mudança sofrida pelo mercado do trabalho e pela realidade social em consequência do alargamento.

8.2

Se pensarmos que, só na Polónia, são 425 as empresas destinatárias de um CEE, havendo mais de 100 delegados nestes conselhos, com base em acordos voluntários (29), apercebemo-nos de como este instrumento pode ser um formidável veículo de integração e desenvolvimento de um modelo social europeu que defina normas mínimas de referência. Na UE a 15, mas ainda mais na Europa alargada, os CEE contribuem concretamente para construir uma consciência europeia, graças ao conhecimento e ao reconhecimento resultantes da diversidade dos sistemas nacionais.

8.3

Há muitos obstáculos à constituição de CEE quer nos 15 Estados-Membros mais antigos, quer nos 10 mais recentes. Nalguns destes países, o diálogo social é escasso. A legislação de transposição da directiva nos novos países é formalmente boa mas, no fundo, ineficaz. A Comissão deveria apurar que obstáculos impediram a aplicação eficaz da directiva.

8.4

Hoje em dia, os CEE são um instrumento fundamental para os trabalhadores, visto proporcionarem uma visão transnacional da evolução da empresa a que estão adstritos. O processo de integração europeia no sistema produtivo passa pelo reconhecimento de um novo papel dos CEE, especialmente numa fase da economia em que as fusões transfronteiriças e a constituição de sociedades europeias não cessam de aumentar.

8.5.

A presença dos CEE nos novos Estados-Membros

País

MT

CY

LV

LT

BG

SI

EE

TR

RO

SK

CZ

HU

PL

Número potencial de CEE (empresas destinatárias da Directiva 94/45/CE)

56

65

155

162

163

185

181

256

263

340

636

662

819

Número de CEE constituídos

29

33

84

87

89

108

101

136

140

199

333

334

425

Observadores

 

 

 

 

 

3

 

3

2

2

8

2

5

Delegados

5

2

8

9

5

13

10

5

5

24

73

58

80

Na primeira linha figura o número possível de CEE, determinado com base no actual número de empregados, na segunda os CEE constituídos, na terceira os observadores convidados para participar nos CEE e na quarta os delegados nomeados nos CEE constituídos.

Se fossem constituídos todos os CEE, os delegados possíveis seriam 3.943 e se fosse neles garantida a presença dos delegados dos novos Estados-Membros, seriam 2.098. Mas só foram eleitos 322, o que equivale a 8,17 % do total possível, e a 15,35 % nos CEE já constituídos. (fonte: ETUI (Instituto Sindical Europeu), op.cit).

9.   A dimensão social da empresa na União Europeia e o novo papel dos CEE — A responsabilidade social da empresa na economia global

9.1

O CESE abordou também recentemente, num importante parecer, o papel dos CEE no âmbito das estratégias com respeito à responsabilidade social das empresas (RSE) (30), onde se destaca a importância do diálogo com as principais partes interessadas para os objectivos das empresas: trabalhadores, clientes, fornecedores, representantes territoriais, organizações de consumidores e ambientalistas. Citando: «O diálogo é particularmente importante para as partes interessadas que participam na cadeia de valor».

9.2

E é neste contexto que o CESE afirma que «à escala europeia, a abordagem voluntária e/ou negociada aos desafios da RSE, em todas as multinacionais com conselhos de empresa europeus, constitui uma etapa decisiva, além de permitir associar os novos Estados-Membros a esta dinâmica. Os conselhos de empresa europeus têm um papel a desempenhar na integração da RSE na política social da empresa. Eles são o local privilegiado das partes interessadas internas, sem esquecer que uma política de RSE coerente também deve ter em conta as partes interessadas externas, nomeadamente a totalidade dos recursos humanos envolvidos (trabalhadores temporários, trabalhadores dos subcontratantes presentes no local, artesãos ou outros trabalhadores independentes que trabalham para a empresa) e o maior número possível de elementos da cadeia de valor (subcontratantes, fornecedores).».

9.3

Na sua comunicação sobre o desenvolvimento sustentável (31), a Comissão insta as empresas a publicarem nos seus relatórios anuais aos accionistas os «resultados tripartidos», que avaliam o seu desempenho segundo critérios económicos, ambientais e sociais. A divulgação destas informações deveria contemplar também os CEE.

9.3.1

A parte II, alínea b) das disposições supletivas da recente directiva sobre a Sociedade Cooperativa Europeia incluía a responsabilidade social nas matérias objecto de consulta entre a empresa e os trabalhadores.

9.4

O CESE acolhe favoravelmente o facto de, segundo esta formulação, a empresa ter deixado de ser unicamente um mero sujeito económico para ser considerada igualmente um actor socialmente relevante, capaz de dar um contributo essencial para melhorar a qualidade de vida de todas as partes directamente interessadas e das regiões.

9.5

O CESE toma nota das afirmações da Comissão Europeia na sua comunicação relativa à Responsabilidade Social das Empresas (CSR) que relevam a importância do papel dos trabalhadores e dos seus sindicatos na aplicação de práticas de responsabilidade social (32).

«A consciencialização, a compreensão e a aceitação da RSE têm vindo a melhorar durante os últimos anos, em parte como consequência do Fórum RSE e de outras acções apoiadas pela Comissão. Ao mesmo tempo, as iniciativas das empresas e das outras partes interessadas fizeram avançar o desenvolvimento da RSE na Europa e a nível mundial. O diálogo social, especialmente a nível sectorial, tem sido um meio eficaz de promover as iniciativas de RSE e os conselhos de empresa europeus também têm desempenhado um papel construtivo no desenvolvimento das melhores práticas relacionadas com a RSE. Todavia, a aceitação, implementação e integração estratégica da RSE pelas empresas europeias carece de melhoria. O papel dos trabalhadores, dos seus representantes e dos sindicatos no desenvolvimento e na implementação de práticas de RSE pode ser aperfeiçoado. As partes interessadas externas, incluindo ONG, consumidores e accionistas, podem desempenhar um papel mais forte incentivando e premiando uma conduta responsável por parte das empresas. As entidades públicas a todos os níveis devem melhorar a coerência das suas políticas de apoio ao desenvolvimento sustentável, ao crescimento económico e à criação de emprego. A visão europeia de prosperidade, solidariedade e segurança a longo prazo alarga se também à esfera internacional. A Comissão reconhece as ligações entre a aceitação da RSE na Europa e no resto do mundo e considera que as empresas europeias devem comportar se de forma responsável onde quer que operem, de acordo com os valores europeus e as normas internacionais.».

9.6

Na Directiva 2003/51, que altera as directivas relativas às contas anuais e às contas consolidadas, a União Europeia solicita explicitamente que, se for necessário para a compreensão da evolução dos negócios de uma empresa, a análise deverá abranger igualmente indicadores-chave de desempenho não financeiros, incluindo informações sobre questões ambientais e questões relativas aos trabalhadores. Nestas situações, os conselhos de empresa deveriam receber informação financeira, mas também não financeira, também no âmbito da responsabilidade social da empresa. A directiva reconhece a pertinência das questões ambientais e sociais no contexto da gestão das empresas.

9.7

No seu parecer sobre «A responsabilidade social das empresas» (33), o CESE preconizava o recurso ao sistema de co-regulação ao nível europeu: «O contexto específico da responsabilidade social a nível da UE poderia ser definido no âmbito de iniciativas comuns e acordos voluntários».

9.8

A sociedade civil organizada poderá dar aqui um contributo notável, no âmbito de um processo dialéctico e de cooperação, participando na definição dos objectivos (direitos humanos, normas sociais, prioridades da política de saúde e do ambiente, etc.) e empenhando-se por mais transparência e abertura nas actividades da empresa. Não se propõe certamente uma amálgama de papéis entre sindicatos, empreendedores e ONG, mas sim o enriquecimento de todos os interessados que poderão assim comparar e reflectir sobre alguns temas de interesse comum. Esta iniciativa pode sem dúvida reforçar os seus papéis tradicionais e acrescentar vantagens às regras existentes, sem impedir a sua progressão.

9.9

Além da protecção oferecida aos mais desfavorecidos e do bem-estar social, o modelo social europeu caracteriza-se pelo respeito da dignidade das pessoas em todos os lugares e em todas as circunstâncias. Na Europa moderna, os direitos de cidadania devem poder ser exercidos seja onde for, inclusivamente no local de trabalho. As directivas sobre direitos evocadas e a directiva sobre os CEE têm o grande mérito de harmonizarem esses direitos, reconhecendo, pelo menos formalmente, a mesma dignidade aos trabalhadores de todos os países da União. O processo ainda não está concluído, precisa de ser reforçado e estimulado. À Comissão pede-se que reconheça os novos elementos que surgiram nestes doze anos e faça as escolhas mais adequadas para cimentar nos Estados-Membros o sentimento de pertença à União.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2006) 136 final.

(2)  Parecer do CESE sobre «A aplicação concreta da directiva relativa aos conselhos de empresa europeus (94/45/CE) e aos aspectos que eventualmente necessitem de revisão», JO C 10 de 14.1.2004, p. 11.

(3)  Doc. PE (A 5 028/2001).

(4)  Relatório final do Parlamento Europeu A5-0282/2001, de 4 de Setembro de 2001, sobre a «Comunicação da Comissão sobre a aplicação da Directiva 94/45/CE do Conselho».

(5)  Cf. nota 2.

(6)  Ver documento de 1.6.2004.

(7)  Ver documento de 18.6.2004 da CEEP: «Answer to the first– stage consultation of the European Social Partners on the review of the European Work Councils Directive».

(8)  Ver documento de 1.6.2004.

(9)  Memorando da CES para a Presidência Luxemburguesa da União Europeia — CES Março de 2005 («Trade Union Memorandum to the Luxembourg Presidency of the European Union — ETUC March 2005»).

(10)  Parecer do CESE sobre a «Comunicação da Comissão relativa à Agenda Social» (relatora: ENGELEN-KEFER) in JO C 294 de 25.11.2005, p. 14. 14.

(11)  Idem.

(12)  Jeremy Waddington University of Manchester. The views of ewc representatives for ETUI Nov. 2005.

(13)  Mark Carley, Bargaining at European level, Joint texts negotiated by EWC, Dublin 2001.

(14)  Kerckhofs and Pas EWC Database ETUI (dec 2004).

(15)  COM(2005) 120 final.

(16)  Parecer do CESE sobre o «Diálogo social e participação dos trabalhadores — A chave para a antecipação e gestão das mutações industriais», de 29.9.2005, relator: Zöhrer, JO C 24 de 31.1.2006, p. 90.

(17)  Parecer do CESE sobre o «Alcance e consequências da deslocalização de empresas», (Relator: Rodriguez Garcia Caro), JO C 294 de 25.11.2005, p. 9, ponto 4.5.10.

(18)  Ver artigo 137.o do TCE que passou a artigo III-210.o do novo Tratado de Roma.

(19)  Como as directivas sobre a protecção dos trabalhadores em caso de despedimentos colectivos e a transferência de empresas (Directivas 98/59 e 2001/23), sobre a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no trabalho (Directiva 89/391 e directivas específicas), sobre a participação dos trabalhadores em geral (Directiva 2002/14) e em determinadas sociedades (Directiva 2001/86 que completa o estatuto da sociedade europeia no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores e Directiva 2003/72 que completa o estatuto da sociedade cooperativa europeia no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores).

(20)  Art. II-87.o«Direito à informação e à consulta dos trabalhadores na empresa», que integra o artigo 21.o da Carta Social Europeia, do Conselho da Europa, revista em 1996, bem assim os pontos 17 e 18 da Carta Comunitária de 1989.

(21)  Tribunal de Justiça, acórdão de 29.3.2001, sobre o processo C-62/99, Bofrost; acórdão de 11.7.2002 sobre o processo 440/2000, Kuehne.

(22)  Cf. considerando 7 da Directiva 2002/14.

(23)  Cf. considerando 9 da Directiva 2002/14.

(24)  Vide Directiva 2001/86 e Directiva 2003/72, segunda parte das disposições supletivas.

(25)  Parecer do CESE sobre o «Diálogo social e participação dos trabalhadores — A chave para a antecipação e gestão das mutações industriais», de 29.9.2005, relator: Zöhrer, JO C 24 de 31.1.2006, p. 90.

(26)  Ensinamentos sobre os CEE, de 7 de Abril de 2005, da CES, da UNICE, da UEAPME e da CEEP.

(27)  Protecção dos trabalhadores em caso de despedimentos colectivos e de transferência de empresa, e com base na Directiva 2002/14.

(28)  Da análise dos acordos efectuada em Abril de 2004 pelo Infopoint, só em 51 % dos conselhos de empresa europeus se previra um órgão restrito de coordenação, o que pode ser problemático, porquanto a maior parte deles (70 % aproximadamente) prevê apenas um encontro anual. A inexistência de um órgão restrito que possa assegurar a continuidade das relações com os representantes dos trabalhadores de cada uma das empresas e países, bem assim com a direcção da empresa e as federações europeias, pode ser um grande óbice ao funcionamento e à eficácia do próprio CEE.

(29)  Pesquisa do NSZZ Solidarnosc A. Matla 2004.

(30)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Instrumentos de informação e de avaliação da responsabilidade social das empresas numa economia mundializada» in JO C 286 de 17.11.2005, p. 12.

(31)  COM(2001) 264 final.

(32)  COM(2006) 136 final.

(33)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A responsabilidade social das empresas» (relatora: HORNUNG-DRAUS), in JO C 125 de 27.5.2002.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/147


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Participação da sociedade civil na luta contra a criminalidade organizada e o terrorismo»

(2006/C 318/26)

Em 28 de Outubro de 2005, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, a Comissão solicitou ao Comité Económico e Social Europeu a elaboração de um parecer exploratório sobre: «Participação da sociedade civil na luta contra a criminalidade organizada e o terrorismo»

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 13 de Julho de 2006, tendo sido relatores RODRÍGUEZ GARCÍA-CARO, PARIZA CASTAÑOS e CABRA DE LUNA.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro de 2006), o Comité Económico e Social Europeu aprovou, por 182 votos a favor, 6 votos contra e 11 abstenções, o presente parecer.

1.   Introdução

1.1

A Vice-Presidente da Comissão Europeia, Margot Wallström, solicitou ao CESE a elaboração de um parecer exploratório sobre «As condições e prioridades da participação da sociedade civil e o papel das parcerias público-privado na luta contra a criminalidade organizada e o terrorismo» — um assunto que se reveste da maior importância política e social para a Europa –, na medida em que considera que o Comité é um actor fundamental. Embora o terrorismo e a criminalidade organizada sejam problemas de natureza diversa, o presente parecer refere-se a ambos, tal como solicitado pela Comissão.

1.2

O Programa da Haia é o quadro político geral que define as políticas da UE em matéria de liberdade, segurança e justiça. O CESE adoptou um parecer (1) no qual se afirma que «O CESE deseja que a política de segurança seja eficaz e defenda os cidadãos numa sociedade livre e aberta, regida pela lei e pela justiça, no quadro do Estado de Direito.» Pode ainda ler-se no mesmo parecer que as políticas europeias devem ser equilibradas no que diz respeito à liberdade e à protecção dos direitos fundamentais.

1.3

Nas Perspectivas Financeiras estão previstos apoios a programas importantes na área do combate ao terrorismo e à criminalidade. O CESE adoptou um parecer (2) no qual afirma que «a protecção dos direitos fundamentais, das liberdades e da segurança compete a todos os cidadãos».

1.4

A Comissão publicou recentemente uma Comunicação, intitulada «Recrutamento de terroristas: análise dos factores que contribuem para a radicalização violenta» (3), na qual são definidos objectivos adequados para a prevenção do recrutamento para actividades terroristas.

1.5

O presente parecer, tal como solicitado pela Vice-Presidente da Comissão Europeia, Margot Wallström, aborda a segurança numa perspectiva de participação da sociedade civil e colaboração entre os sectores público e privado, apesar de «sociedade civil» ser um termo impreciso que designa organizações sociais de natureza diferente das empresas privadas. A colaboração entre empresas e operadores privados e as autoridades públicas é fundamental do ponto de vista operacional e da segurança. A sociedade civil não só desempenha um papel fundamental na promoção dos valores do Estado de Direito, como também contribui activamente para a vida democrática.

2.   Conclusões

2.1

A sociedade civil não só desempenha um papel fundamental na promoção dos valores do Estado de Direito, como também contribui activamente para a vida democrática. As organizações da sociedade civil na Europa efectuam um trabalho social muito positivo e promovem uma cidadania europeia activa e uma democracia participativa. No entanto, estas organizações não podem nem devem substituir as autoridades nacionais e europeias nas políticas operacionais.

2.2

O CESE não pode aceitar que terroristas e criminosos se possam furtar à acção da justiça porque as fronteiras internas da União Europeia impedem a actuação policial e judiciária. O CESE insta as instituições da União e os Estados-Membros a elaborarem e aplicarem uma estratégia comum de combate ao terrorismo, que ponha fim à actual situação de tomada de decisões «a quente».

2.3

O CESE considera que a actual situação de mera cooperação intergovernamental é amplamente insuficiente e amiúde ineficaz, motivo por que apoia a Resolução do Parlamento Europeu, segundo a qual se deve aplicar às políticas de segurança a regra da maioria qualificada em vez da regra da unanimidade, e adoptar o método comunitário na tomada de decisões. No que diz respeito à segurança, é imprescindível mais Europa.

2.4

O CESE propõe que a Europol se transforme num organismo europeu, sob os auspícios de uma autoridade política ou judicial europeia, que não se limite a ter um papel coordenador e seja dotada o mais rapidamente possível de capacidade operacional para proceder a investigações em todo o território da União Europeia, em colaboração com as autoridades policiais dos Estados-Membros.

2.5

O CESE apoia a iniciativa do Parlamento Europeu, na qual se recomenda aos Estados-Membros a revisão das normas penais vigentes nos seus países, no sentido de tornar imprescritíveis os actos terroristas definidos na Decisão-Quadro. O CESE apoia a ideia de que o Tribunal Penal Internacional deverá ter jurisdição para conhecer destes actos delituosos.

2.6

O CESE propõe que se promovam programas escolares a nível europeu e actividades de formação entre os jovens, proporcionando-lhes uma formação cívica orientada para os valores democráticos, a igualdade, a tolerância e a compreensão da diversidade cultural, a fim de adquirirem uma bagagem de conhecimentos que evitará que caiam nas malhas de ideologias radicais e violentas.

2.7

Na luta contra a radicalização violenta é necessário organizar consultas entre as autoridades da União e dos Estados-Membros e as organizações da sociedade civil que trabalham activamente no fomento do diálogo entre religiões e culturas e lutam contra o racismo, a xenofobia, a intolerância e o extremismo violento, com o objectivo de reduzir as tensões que propiciam o radicalismo e a violência. A criação de plataformas de colaboração público-privado a nível local pode ser um instrumento positivo para abordar, entre outras, estas questões. A União Europeia e os Estados-Membros devem apoiar e fomentar a criação destas plataformas.

2.8

O CESE insta as instituições da União a criarem um quadro legislativo e normas mínimas que permitam garantir a protecção e o reconhecimento das vítimas do terrorismo. O CESE propõe ainda o desenvolvimento de normas, recomendações, boas práticas e directrizes para a protecção das vítimas do terrorismo, com vista a orientar e facilitar a actuação dos Estados neste domínio.

2.9

O CESE reitera a necessidade de a União Europeia dispor de uma legislação comum que permita a indemnização das vítimas de atentados terroristas.

2.10

O CESE reclama a aplicação imediata das recomendações do GAFI (Grupo da Acção Financeira Internacional sobre branqueamento de capitais e financiamento de actividades terroristas). Insta, portanto, os Estados-Membros a tomarem as medidas legais adequadas ao cumprimento das referidas recomendações.

2.11

O CESE exorta os meios de comunicação social, em particular os públicos, a estabelecerem códigos de conduta adequados e a colaborarem com as autoridades, por forma a proteger, no respeito pela liberdade de imprensa, a dignidade e a privacidade das vítimas e evitar a difusão maciça de notícias que sirvam os interesses propagandísticos dos grupos terroristas.

2.12

O CESE apoia a proposta da Comissão de criação da Plataforma Europeia para a colaboração público-privado e considera indispensável que se dote de meios para aproveitar ao máximo as colaborações público-privado entre os Estados-Membros e entre a União e os Estados-Membros. Nesse sentido, considera que devem ser criadas condições para uma ampla colaboração com o objectivo de reforçar sinergicamente o combate à criminalidade organizada e ao terrorismo, sem ingerência nas competências de órgão consultivo próprias do CESE. No ponto 13.4.2 do presente parecer são mencionados os objectivos prioritários que, na opinião do CESE, devem presidir à colaboração público-privado.

3.   Os valores e os princípios da União Europeia

3.1

O projecto de Tratado Constitucional define os valores, os princípios e os objectivos da União Europeia. A Carta dos Direitos Fundamentais assegura o equilíbrio entre segurança e liberdade e os direitos de todos as pessoas, entre eles o direito à protecção dos dados de carácter pessoal.

3.2

O maior risco para os sistemas democráticos, para a sua estabilidade e para o seu desenvolvimento, não vem do exterior, mas do interior das próprias instituições, nomeadamente da perda de vitalidade e de dinamismo e da erosão dos fundamentos sociais.

3.3

A grande conquista da Europa foi a criação do Estado de Direito como a melhor forma de organizar o poder de forma democrática.

3.4

O Estado Social de Direito significa, por um lado, o exercício do poder sujeito ao Direito, ao império da lei e a uma crescente exigência de legitimação democrática, e, por outro lado, o acesso de todos os cidadãos a bens e serviços em condições de igualdade de oportunidades e de tratamento.

4.   O terrorismo e a criminalidade organizada são atentados ao Estado de Direito

4.1

O terrorismo é um dos principais problemas a nível mundial, constituindo hoje um problema crucial para a Europa. Os Europeus estão a sofrer o flagelo do terrorismo, ou melhor, de terrorismos inspirados em várias ideologias. Nos últimos anos, temos vindo também a assistir a uma forma especialmente perigosa de terrorismo internacional alimentado por uma ideologia islamista radical. Como é muito difícil chegar a uma definição internacional de terrorismo, optou-se aqui pela definição adoptada pelo Conselho, de 13 de Junho de 2002 (4).

4.2

Na Europa, actuam igualmente redes criminosas (5) muito poderosas. Algumas operam à escala nacional, mas as mais perigosas têm dimensão europeia e internacional. A ONU adoptou, em 2002, uma Convenção Internacional contra a Criminalidade Organizada Transnacional (Convenção de Palermo) (6).

4.3

O terrorismo e a criminalidade organizada põem em risco e afectam a própria natureza do Estado: o legítimo monopólio do emprego da força. Nós, os europeus, temos noção de que o terrorismo é uma ameaça real que é preciso combater. Contudo, os cidadãos têm uma percepção menos clara dos riscos associados à criminalidade organizada que se infiltra nas instituições e na sociedade, com uma grande capacidade de influência e corrupção, e que tem consequências devastadoras tanto do ponto de vista económico como do ponto de vista social.

4.4

Tanto as organizações terroristas como a criminalidade organizada recorrem a processos semelhantes de branqueamento de capitais através, entre outros, dos sectores financeiro e imobiliário. A criminalidade organizada tem, e pretende exercer, uma imensa capacidade de corrupção sobre as autoridades políticas e administrativas e também, em alguns casos, sobre as organizações da sociedade civil.

4.5

Há domínios que são partilhados entre o terrorismo e a criminalidade organizada ao nível internacional: o tráfico ilícito de armas e estupefacientes. Um exemplo da convergência entre terrorismo e criminalidade organizada é o fenómeno da extorsão. Não raro, os grupos terroristas actuam como organizações mafiosas que financiam os actos de barbárie que cometem através de actividades ilícitas: tráfico de estupefacientes, armas e seres humanos, uso fraudulento de cartões de crédito, assaltos, roubos e extorsão a profissionais e empresas, jogo ilegal e demais actos delituosos.

4.6

O terrorismo e a criminalidade organizada são dois problemas de natureza diferente, ou seja, o terrorismo é um problema que tem objectivos políticos e se manifesta nas sociedades europeias em determinados momentos da sua história, ao passo que a criminalidade organizada é um problema de ordem pública que afecta permanentemente a sociedade.

4.7

Mas, embora com origens e objectivos distintos, o terrorismo e a criminalidade organizada têm um interesse comum: destruir ou debilitar o Estado de Direito para alcançar os seus objectivos.

4.7.1

As organizações terroristas que operam em alguns países europeus estão dispostas a usar o terror, o crime, a ameaça e a extorsão para atingir os seus objectivos políticos. No entanto, sabem que para assegurar a viabilidade do seu projecto totalitário têm que destruir ou debilitar o Estado de Direito e o império da lei.

4.7.2

A criminalidade organizada pretende reduzir e limitar o espaço do Estado de Direito e alargar o território da impunidade e da ausência de lei. O objectivo visado é a criação de uma sociedade paralela, à margem da lei e da justiça, sob a autoridade de mafiosos e redes de criminosos.

4.7.3

Por vezes acontece que os contornos entre o Estado de Direito e a impunidade se esbatem. Na Europa, há casos em que tanto os terroristas e as suas redes sociais como a criminalidade organizada conseguiram debilitar o Estado através do terror e da corrupção que mina parte do sistema político.

4.7.4

O Estado de Direito é a resposta aos problemas resultantes do terrorismo e da criminalidade organizada: o equilíbrio entre liberdade e segurança; a actuação conjunta das forças policiais e dos juizes; a cooperação europeia e internacional; o compromisso activo dos cidadãos e da sociedade civil.

4.7.5

É preciso que a sociedade e as autoridades não cedam e não desistam de lutar contra o terrorismo e a criminalidade organizada. As possibilidades de alcançar os objectivos favorece a continuidade das organizações terroristas, motivo por que a sociedade e as autoridades devem trabalhar com determinação para o fracasso do terrorismo.

5.   A sociedade civil face ao terrorismo e à criminalidade organizada

5.1

O terrorismo constitui uma gravíssima violação dos direitos humanos, pois atenta directamente contra a vida e a liberdade.

5.2

A luta operacional contra o terrorismo e a criminalidade organizada compete ao Estado enquanto garante da liberdade e da segurança dos cidadãos. Esta responsabilidade é imputada, especialmente, aos agentes policiais e aos juizes. A actuação do Estado tem de estabelecer um equilíbrio apropriado entre liberdade e segurança, respeitar os valores fundamentais (direitos humanos e liberdades públicas) e os valores democráticos (Estado de Direito), pois, como já indicado pelo CESE num outro parecer (7), «a história provou que as sociedades abertas e livres são mais eficazes na defesa da segurança».

5.3

A sociedade civil reforça permanentemente a democracia e os valores do Estado de Direito, combatendo, desta forma, o terrorismo e a criminalidade organizada na sociedade, para evitar e prevenir o alastramento destes fenómenos e minimizar os seus efeitos. Mas, as organizações da sociedade civil não podem nem devem substituir as autoridades nacionais e europeias nas políticas operacionais.

5.4

Não há nenhuma ideologia ou causa que justifique o crime, o terror e a extorsão. Não é legítimo usar o terror para atingir objectivos políticos. O terrorismo não tem causas, nada o pode justificar. Temos que prosseguir ininterruptamente a luta contra a legitimação política e social do terrorismo e contra as correntes políticas radicais que vêem no terrorismo mais um instrumento de acção política.

5.5

Muitos cidadãos europeus não se apercebem da gravidade da ameaça terrorista, havendo inclusivamente sectores que mantêm uma atitude de dúvida. Os cidadãos têm não só o direito de receber informação adequada sobre os riscos para a segurança, como ainda de exercer pressão sobre os poderes públicos para que combatam mais eficazmente o terrorismo e a criminalidade organizada.

5.6

As organizações da sociedade civil na Europa desenvolvem um trabalho social muito positivo e promovem uma cidadania europeia activa e uma democracia participativa.

5.7

Os sistemas políticos dependem da sua própria vitalidade interna. A vitalidade da Europa é a cultura democrática da sociedade. As instituições e os sistemas políticos necessitam de um permanente impulso de vitalidade proveniente da sociedade. Os cidadãos e a sociedade civil apoiam e suportam o Estado Social de Direito, que deve garantir e proteger a sua liberdade e bem estar social.

5.8

A história europeia do século XX revela, porém, que os valores políticos da democracia são muito vulneráveis. Os cidadãos e as organizações da sociedade civil devem defender os valores e os princípios em que assenta a Europa democrática.

5.9

A democracia participativa e o Estado de Direito não se podem manter e transformar sem o impulso dos cidadãos e das organizações que os representam. A sociedade civil, através das suas actividades e das suas organizações, revitaliza permanentemente o Estado Social e Democrático de Direito face ao relativismo e ao radicalismo.

5.10

Porém, continua a haver cidadãos que manifestam um compromisso insuficiente: há uma certa falta de consciência social no que diz respeito à prostituição, ao tráfico de droga, ao branqueamento de capitais, à contrafacção de produtos de consumo, etc.

5.11

Os cidadãos e as organizações da sociedade civil podem intervir mais activamente na luta contra a criminalidade organizada, uma vez que esta tem uma grande capacidade de corrupção sobre os sistemas políticos.

6.   Europa, um espaço de liberdade, segurança e justiça

6.1

O Programa da Haia define que o objectivo da União Europeia consiste em criar um espaço comum de liberdade, segurança e justiça, embora ainda se esteja longe de o conseguir.

6.2

Entretanto, os criminosos e os terroristas aproveitam este ponto fraco da Europa para escaparem à acção da justiça. A liberdade de circulação de pessoas, capitais e bens permite aos criminosos tirarem partido da porosidade das fronteiras que, no entanto, subsistem para a actuação policial e judiciária.

6.3

O CESE não pode aceitar que terroristas e criminosos se possam furtar à acção da justiça devido ao facto de as antigas fronteiras internas da União Europeia terem sido conservadas no que diz respeito à actuação das autoridades policiais e judiciárias.

6.4

Há necessidade de uma estratégia comum de luta contra o terrorismo na União Europeia. A Comissão e o Conselho devem dar permanentemente um impulso político e ultrapassar a actual situação de tomada de decisões «a quente». A cooperação policial e judiciária na Europa é ainda muito débil, uma vez que se dispõe de instrumentos jurídicos e operacionais que se revelam insuficientes para combater o terrorismo e a criminalidade organizada. A maior parte dos instrumentos estão na posse dos Estados e, no Tratado, permanecem no âmbito do «terceiro pilar» da UE, ou seja, pertencem à esfera intergovernamental.

6.5

A estratégia europeia de segurança deve realizar-se ao nível comunitário e ultrapassar a actual situação de mera cooperação intergovernamental. O facto de estes aspectos continuarem a fazer parte do «terceiro pilar» da UE diminui a sua eficácia, e, logo, o seu alcance global. O CESE insta o Conselho a estabelecer um enquadramento jurídico comum, global e coerente para as políticas de segurança. Para o efeito, poder-se-ia recorrer ao artigo 42.o do Tratado UE, tal como havia sido proposto pelo Parlamento Europeu (8), e substituir a regra da unanimidade pela regra da maioria qualificada.

6.6

As organizações criminosas utilizam constantemente as fronteiras externas para as suas actividades ilícitas. O Código Aduaneiro Comunitário deve ser utilizado com maior eficácia pelos serviços de controlo e, em primeiro lugar, pelos próprios serviços aduaneiros e pelos serviços de assistência administrativa mútua internacional. Este código deve proceder à harmonização das infracções e sanções no território aduaneiro comunitário, bem como à generalização do direito de perseguição (continuidade penal extraterritorial da perseguição no interior da UE) e ao reconhecimento mútuo das sentenças proferidas. Já noutros pareceres, o CESE havia salientado a necessidade de criação de uma Guarda de Fronteiras Europeia (9).

6.7

Os Estados-Membros devem reforçar o intercâmbio, entre os serviços de informações e os serviços de segurança, de informações sobre ameaças à segurança interna e externa da UE. Devem ainda compartilhar as análises estratégicas da ameaça terrorista e elaborar planos conjuntos para a protecção das infra-estruturas básicas.

6.8

O princípio da disponibilidade de informações é muito importante para aumentar a eficácia da acção policial. Com ele pretende-se melhorar o intercâmbio transfronteiriço de informações entre as autoridades policiais na UE, ou seja, um agente policial de um Estado-Membro pode obter de outro Estado-Membro toda a informação necessária para levar a cabo as suas investigações (10). A sua interoperabilidade pressuporá um elevado grau de confiança entre as autoridades policiais dos respectivos Estados. A falta de confiança, cujas causa conviria analisar e delas dar conta à sociedade civil, tem sido um dos factores que mais tem limitado a cooperação ao nível europeu.

6.9

Importa reforçar o papel da UE e desenvolver a estratégia europeia de segurança ao nível comunitário, com o objectivo de aumentar a eficácia e a transparência. No que diz respeito à segurança, é imprescindível mais Europa. O CESE propôs (11) que em matéria de segurança se adoptasse o método comunitário que confere à Comissão o direito de iniciativa e ao Parlamento Europeu o poder de co-decisão. É também necessário que o Conselho abandone a regra da unanimidade e passe a adoptar as decisões por maioria, e que o Tribunal de Justiça tenha competência nesta matéria.

6.10

A Europol tem que ser mais do que um mero serviço de coordenação, devendo ser dotada de capacidade operacional. O CESE propõe que a Europol se transforme num organismo com capacidade operacional, que possa levar a cabo investigações em todo o território da UE. O Programa da Haia preconiza uma cooperação e coordenação prática intensificada entre, por um lado, as autoridades policiais, judiciárias e aduaneiras a nível nacional e, por outro, entre estas e a Europol. Os Estados-Membros devem promover o carácter da Europol enquanto organismo europeu e capacitá-la para desempenhar, juntamente com a Eurojust, um papel decisivo na luta contra a criminalidade organizada e o terrorismo. É inaceitável que os protocolos à Convenção Europol ainda não tenham sido ratificados e aplicados por todos os Estados-Membros (12). É da maior urgência dotar a Europol do apoio e dos meios necessários para que possa efectivamente funcionar como pedra angular da cooperação policial europeia. A partir de 1 de Janeiro de 2006, a Europol elaborará uma avaliação da ameaça da criminalidade organizada em vez do seu relatório anual sobre a situação da criminalidade organizada.

6.11

A Eurojust tem por objectivo facilitar a coordenação entre as autoridades judiciárias nacionais na luta contra a criminalidade organizada e o terrorismo, mas, apesar dos progressos alcançados desde a sua criação, ainda se está longe de alcançar tal objectivo. A Eurojust dispõe de meios jurídicos e recursos económicos escassos. Além disso, há diferenças nos compromissos dos Estados-Membros, pois em alguns países a legislação não é suficientemente favorável à cooperação judiciária.

6.12

O CESE sugere que, através da Eurojust, se promova eficazmente as actividades de investigação conjunta de juízes e Ministério Público na UE na luta contra a criminalidade organizada e o terrorismo. As informações sobre as investigações nacionais devem ser transmitidas à Eurojust que criará uma base de dados europeia operacional.

6.13

A cooperação judiciária em matéria penal é imprescindível, pois, actualmente, a relação entre as autoridades judiciárias baseia-se na desconfiança. Em matéria penal não há uma «cultura judiciária europeia» nem normas mínimas comuns. Cumpre aos cidadãos serem muito exigentes para com as instituições da União e os Estados-Membros e reclamarem o máximo de cooperação judiciária entre todos os Estados. Devem ainda exigir que nenhum terrorista ou criminoso se possa furtar à acção da justiça devido a problemas de compreensão ou à ausência de procedimentos de cooperação.

6.14

O CESE apoia a iniciativa do Parlamento Europeu que recomenda aos Estados-Membros que considerem rever as normas penais vigentes nos seus países, no sentido de tornar imprescritíveis os actos terroristas definidos na Decisão-Quadro. Nesse sentido, o CESE (13) apoia a ideia de que o Tribunal Penal Internacional deverá ter jurisdição para conhecer destes actos delituosos terroristas.

6.15

A situação actual é incompreensível e inaceitável para os cidadãos. Não se pode compreender que as iniciativas sejam bloqueadas pelo facto de os Estados-Membros sobreporem as prerrogativas estatais às prioridades da luta conjunta contra o terrorismo e a criminalidade organizada. Os cidadãos europeus não compreendem a multiplicidade de instrumentos e ferramentas destinados a combater o terrorismo e a criminalidade organizada na União Europeia. O Coordenador da Luta Antiterrorista do Conselho, o comissário europeu responsável pela Justiça, Liberdade e Segurança, a Europol, a Eurojust, etc. são alguns dos variados e descoordenados elementos que concorrem para o mesmo objectivo.

6.16

A dispersão de recursos não é, de facto, a melhor forma de alcançar eficiência. A Eurojust e a Europol têm de ultrapassar os problemas de colaboração com que se defrontam e reforçar as equipas de investigação conjuntas. Por sua vez, os serviços de informações devem melhorar os procedimentos de transmissão de informações dentro da Europol. O OLAF deve colaborar com a Europol e a Eurojust na investigação criminal. Os vários organismos e serviços devem trocar dados e informações sobre as investigações para que as suas actividades sejam mais eficazes na luta contra a criminalidade.

6.17

Sendo o terrorismo uma ameaça global, a luta contra ele também diz respeito à política externa e de segurança da UE. A cooperação internacional e o multilateralismo eficaz são questões essenciais. O CESE considera que é imperioso conjugar os esforços empreendidos pela UE na luta contra o terrorismo e a criminalidade organizada com os das organizações regionais que partilham dos valores e interesses da UE. Por isso, é importante recordar a necessidade de encontrar sinergias e meios para reforçar a cooperação com organizações como a ONU, a OSCE, o Conselho da Europa e a NATO nas áreas em que cada uma delas possa trazer valor acrescentado aos objectivos definidos nas políticas da UE contra o terrorismo e a criminalidade organizada.

6.18

Para minimizar alguns dos riscos da radicalização, a Europa deve avançar com uma política externa que promova os valores da democracia, da paz, do diálogo entre as diferentes culturas, da luta contra a pobreza e a corrupção, da defesa dos direitos humanos em todo o mundo e da cooperação internacional no âmbito do sistema das Nações Unidas.

7.   Papel da sociedade civil na prevenção da radicalização violenta

7.1

As organizações da sociedade civil exprimem os direitos democráticos dos cidadãos a associarem-se e a empenharem-se, por exemplo, nos âmbitos sociais, políticos ou culturais. As organizações da sociedade civil desenvolvem um trabalho muito importante na prevenção do terrorismo, promovendo a coesão social e combatendo os factores que contribuem para a radicalização violenta. Deverão obter os meios necessários que lhes permitam difundir o ensino dos valores europeus.

7.2

Como os terroristas não têm idade, nem classe social predeterminada, alguns sectores sociais são mais vulneráveis ao terrorismo. A pobreza, o insucesso escolar, a falta de oportunidades de trabalho, a discriminação, a ausência de valores cívicos, os conflitos de identidade, a exclusão social, etc. são um «caldo de cultura» para frustrações. E é precisamente nestas águas que as seitas, os fundamentalistas religiosos, os grupos terroristas e as organizações criminosas lançam as suas redes para recrutar adeptos.

7.3

O CESE concorda, na generalidade, com a Comunicação da Comissão (14) sobre «Recrutamento de terroristas: análise dos factores que contribuem para a radicalização violenta». É neste domínio que actuam e trabalham as organizações da sociedade civil.

7.4   Destacam-se em seguida os aspectos mais relevantes.

7.4.1

Os programas orientados para os jovens em idade escolar são os mais necessários, para evitar que caiam nas redes de ideias radicais e violentas. Há necessidade de promover programas escolares ao nível europeu e acções de formação entre os jovens, proporcionando-lhes uma formação cívica que incentive valores como a democracia, a igualdade, a tolerância e a compreensão da diversidade cultural.

7.4.2

A Estratégia Europeia de Emprego e os Objectivos de Lisboa devem reforçar as políticas que visam promover a integração laboral dos grupos e das minorias mais vulneráveis.

7.4.3

A sociedade civil e as autoridades públicas devem actuar, privilegiando a vertente pedagógica, para que todas as pessoas, independentemente da origem, disponham de informações e formação adequada sobre os valores do pluralismo, a liberdade de consciência e de religião, a igualdade de tratamento entre homens e mulheres, a tolerância e a natureza laica do Estado, em que assentam a democracia e o Estado de Direito na Europa.

7.4.4

O CESE já apresentou várias propostas no sentido de fazer da integração um dos objectivos prioritários da política de imigração da UE (15).

7.4.5

Os líderes de opinião e os meios de comunicação social podem contribuir positivamente para a integração, nomeadamente através de um relato equilibrado dos acontecimentos.

7.4.6

As sociedades europeias actuais são interculturais e plurais. Contudo, as minorias nacionais, étnicas ou religiosas deparam-se com numerosos problemas de racismo, xenofobia e discriminação.

7.4.7

Na Europa, há organizações sociais muito activas que através do seu trabalho fomentam o diálogo entre religiões e culturas, lutando contra a intolerância, o racismo, a xenofobia e o extremismo violento.

7.4.8

As autoridades devem encetar consultas com estas organizações e estabelecer sistemas de cooperação, tendo em vista reduzir as tensões que propiciam a radicalização e a violência. As empresas, os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil assumem um papel fundamental na formação, na integração e no combate à discriminação.

7.5

O CESE encara positivamente o desenvolvimento de programas de investigação e análise sobre os processos sociais de radicalização violenta, o terrorismo e a criminalidade organizada, e propõe à Comissão que disponibilize fundos para auxiliar os «think tanks» da especialidade, as universidades e os centros de investigação.

8.   Consideração pelas vítimas

8.1

As vítimas do terrorismo sofrem na pele uma violência que é dirigida contra a sociedade no seu todo, e contra os valores que esta representa. As vítimas representam a verdadeira cara do terrorismo, e são a primeira voz e a primeira linha da sociedade face ao terrorismo. As vítimas são agentes fundamentais para o necessário compromisso da sociedade face ao terrorismo e para a articulação de uma resposta cívica. Personificam a mais sólida via de descrédito e isolamento político e moral do terrorismo.

8.2

O maior reconhecimento que uma vítima pode obter é a defesa da democracia e do Estado de Direito e que a Europa seja uma sociedade livre e aberta.

8.3

As vítimas representam, de uma ou outra forma, o que os terroristas e a criminalidade organizada não podem admitir: o poder legítimo e democrático submetido ao império da lei. A sociedade civil deve transmitir esta pedagogia social e política para que as vítimas obtenham dos cidadãos o reconhecimento social e político necessário: revitalizar permanentemente a democracia e o Estado de Direito.

8.4

A protecção das vítimas é uma medida de prevenção eficaz. As vítimas do terrorismo merecem não só todo o respeito, mas também o apoio e a ajuda dos cidadãos e das instituições. A injustiça da situação vivida e do ataque sofrido, que deixam marcas profundas, devem ser atenuadas por uma acção resoluta da sociedade civil e das autoridades nacionais e comunitárias, que vá ao encontro das necessidades das vítimas e reduza ao mínimo o seu sofrimento.

8.5

O CESE insta a UE a tomar as medidas infra para a protecção e o reconhecimento das vítimas do terrorismo e das suas famílias.

8.5.1

A elaboração de um quadro legislativo de normas mínimas que garantam o direito à dignidade, o respeito pela vida privada e familiar, o direito a compensações, o direito a assistência médica, psicológica e social, o direito ao acesso efectivo à justiça e o apoio judiciário, o direito à reinserção laboral e social e, por fim, o direito à formação profissional e académica que permita a igualdade de capacidades perante um oportunidade de emprego.

8.5.2

O desenvolvimento de normas, recomendações, boas práticas e directrizes para a protecção das vítimas do terrorismo, destinadas a orientar e facilitar a actuação dos Estados neste domínio. A Comissão deveria disponibilizar fundos para ajudar as associações de vítimas do terrorismo a estabelecerem redes europeias.

8.6

Não nos podemos esquecer, também, das outras vítimas que são menos conhecidas devido à menor repercussão mediática que a situação tem. Estamo-nos a referir às vítimas das organizações criminosas que atentam contra os direitos humanos, na mesma medida das organizações terroristas. As vítimas da extorsão, do roubo, da droga; as vítimas do tráfico de seres humanos, da prostituição e da exploração de mulheres; e as vítimas da exploração do trabalho ilegal.

8.7

Todas estas vítimas devem ser objecto de especial atenção por parte das autoridades e da sociedade civil. O CESE reforça a recomendação efectuada em dois anteriores pareceres (16), para que a UE disponha de uma legislação comum em matéria de indemnização das vítimas da criminalidade. As empresas de seguros e as mútuas de seguros devem assumir novos compromissos e incluir nas apólices fórmulas adequadas para uma melhor cobertura das vítimas.

9.   Financiamento do terrorismo e da criminalidade organizada

9.1

O Comité recorda que, já noutros pareceres (17), apresentou propostas para melhorar a colaboração entre os sectores público e privado na luta contra o financiamento do terrorismo e das organizações criminosas. Neste campo são as instituições financeiras que têm de assumir os compromissos mais exigentes.

9.2

O CESE emitiu recentemente dois pareceres (18) sobre as obrigações das instituições financeiras para assegurar uma maior transparência nas transacções financeiras, com o objectivo de dificultar as actividades ilegais. Volta assim a exortar os Estados-Membros a tomarem medidas legais adequadas para que as entidades privadas e as organizações sem fins lucrativos susceptíveis de pertencerem aos circuitos que transportam os capitais destinados a financiar actividades terroristas respeitem as recomendações do GAFI (Grupo da Acção Financeira Internacional sobre branqueamento de capitais e financiamento de actividades terroristas) (19). No entanto, não se pode, assim, lançar uma suspeita geral sobre todos os cidadãos nas organizações da sociedade civil.

9.3

O sector imobiliário está cada vez mais a ser utilizado para a aplicação de elevados lucros provenientes do terrorismo e das redes de criminalidade organizada. Por vezes também as autoridades locais são corrompidas por estes grupos. As empresas do sector imobiliário, as grandes construtoras e os operadores do sector devem colaborar com as autoridades nacionais para impedir quer a utilização do sector como refúgio do dinheiro ilícito quer o branqueamento de capitais resultantes das actividades terroristas e criminosas.

9.4

O mercado internacional de obras de arte, filatelia e antiguidades serve cada vez mais para refúgio de ganhos da actividade criminosa. As empresas que negoceiam estes bens devem colaborar mais activamente com as autoridades, por forma a tornar este mercado mais transparente.

9.5

A União Europeia deve dispor de instrumentos jurídicos e administrativos comuns para colaborar na articulação da acção dos Estados contra estas actividades ilícitas. O Conselho da União deve velar por que cada Estado-Membro disponha de legislação penal adequada, no quadro de normas mínimas comunitárias, para combater o financiamento do terrorismo e da criminalidade organizada.

9.6

O Plano de Acção da UE de combate ao terrorismo (20) contém medidas de coordenação das unidades de informação fiscal e financeira, que devem ser incrementadas. Todos os Estados-Membros têm o dever de actuar com eficácia e alcançar uma coordenação adequada no seio do Conselho.

10.   Internet e comunicações telefónicas móveis

10.1

Os operadores de Internet e telefonia móvel devem colaborar com as autoridades no cumprimento da legislação que obriga ao armazenamento de dados sobre o tráfego de comunicações pela Internet (não do conteúdo das mensagens).

10.2

Devem igualmente colaborar na obtenção de dados pessoais no acto de venda de cartões GSM, pois os grupos terroristas e as redes criminosas tiram partido do anonimato de alguns serviços de correio electrónico ou de cartões GSM de pré-pagamento para comunicar, sem serem detectados, ou inclusivamente para detonar artefactos explosivos à distância. O CESE já por várias vezes se pronunciou (21) a este respeito. Também o Parlamento Europeu publicou um relatório (22) com o qual o CESE está de acordo.

10.3

A sociedade europeia é muito vulnerável ao fenómeno da cibercriminalidade. As organizações criminosas utilizam cada vez mais a rede Internet para as suas actividades ilícitas.

10.4

A Internet a cada dia que passa torna-se mais imprescindível para o bom funcionamento das sociedades europeias, para as empresas e os indivíduos, para os prestadores de serviços básicos e para as administrações públicas, bem como para a polícia e os juízes. A Europa enfrenta um novo risco: o ciberterrorismo que pode afectar drasticamente o funcionamento da sociedade.

10.5

Os operadores de Internet devem melhorar os sistemas de segurança e colaborar com as autoridades policiais e judiciárias na luta contra estas novas formas de criminalidade.

11.   Meios de comunicação social

11.1

Os meios de comunicação social têm o direito e a obrigação de informar com veracidade, devendo evitar focar a atenção naquilo que possa servir os interesses das organizações terroristas. Devem igualmente evitar a difusão de imagens e informações que não respeitem a privacidade e a dignidade das vítimas. Sobretudo há que proteger os jovens deste riscos. Nesse sentido, os meios de comunicação social públicos devem dar o exemplo.

11.2

Os meios de comunicação social podem estabelecer códigos de conduta adequados e colaborar com as autoridades para assegurarem a dignidade e a privacidade das vítimas e evitar a difusão maciça de notícias que possam servir os interesses propagandísticos dos grupos terroristas.

11.3

A Comissão está a organizar uma conferência europeia com a participação dos principais meios de comunicação social. O CESE considera que esse evento será uma boa oportunidade para se promover o intercâmbio de boas práticas, estabelecer sistemas de auto-regulação, contribuir para uma opinião pública europeia e proporcionar uma visão construtiva da União Europeia.

12.   Infra-estruturas críticas

12.1

Os terroristas também pretendem alcançar os seus objectivos criminosos atacando as infra-estruturas estratégicas e os serviços públicos básicos. Os seus alvos são os meios de comunicação e as redes de transporte, as redes de distribuição e os operadores de energia, o abastecimento de água potável, os sistemas e os operadores de telefonia e comunicações, os locais de concentração de massas, etc.

12.2

Sobre as sociedades europeias pairam novas ameaças terroristas: os riscos radiológicos e nucleares, químicos, biológicos e bacteriológicos, que segundo a opinião da maioria dos peritos são ameaças actuais. Os sectores que operam com estes produtos devem melhorar os seus sistemas de segurança e cooperar eficazmente com as autoridades policiais.

12.3

O CESE felicita a Comissão pela excelente iniciativa do programa de investigação sobre segurança (SRC'06) e incentiva-a a prosseguir o financiamento de projectos de investigação no âmbito do sector privado e do sector público, no sentido de aumentar a segurança no espaço comum da União.

12.4

Contudo, importa alargar este programa também aos nossos parceiros, no quadro da Política de Vizinhança da União com as fronteiras a leste e a sul (região mediterrânica).

12.5

O sector privado deveria estar preparado para colocar os seus activos à disposição das autoridades em situações de crise, a fim de facilitar a gestão das consequências eventualmente catastróficas de atentados terroristas. Para o efeito, há que identificar as áreas em que as organizações da sociedade civil poderiam ser uma mais-valia em situações de crise, e estabelecer acordos e convenções que permitam activar um mecanismo eficiente de gestão conjunta de crises.

12.6

A capacidade de prevenção e reacção depende da informação e da gestão eficaz dos conhecimentos, bem como da capacidade para antecipar situações futuras. O envolvimento de todos os cidadãos é essencial para enfrentar os desafios que o terrorismo e a criminalidade colocam, sendo para tanto necessária a divulgação adequada de informação entre os intervenientes.

12.7

Os responsáveis das empresas e das organizações da sociedade civil (especialmente em áreas estratégicas) devem ser permanentemente informados acerca do terrorismo e da criminalidade organizada nos assuntos respeitantes à sua área de competências ou responsabilidades, para poderem preparar-se e prevenir ameaças.

13.   Plataforma europeia para a colaboração entre os sectores público e privado

13.1

A Comissão está a elaborar uma comunicação sobre a colaboração entre os sectores público e privado na luta contra a criminalidade organizada e o terrorismo, que inclui um Plano de Acção relativo às parcerias privado-público. O elemento-chave da colaboração, introduzido pela Comissão, é a chamada Plataforma de Colaboração público-privado na luta contra a criminalidade organizada e o terrorismo. Esta Plataforma, cuja criação está prevista para finais do ano, merece ser definida na sua composição, forma de intervenção e regras de funcionamento. Reunir-se-ia periodicamente para debater assuntos de interesse comum, identificar linhas de acção política e legislativa, orientar estratégias de prevenção, trocar boas práticas e informação, etc.

13.2

Composta por representantes dos Estados-Membros e, voluntariamente, de organizações representativas, sejam elas patronais europeias, sindicais ou de organizações não governamentais envolvidas no combate à criminalidade organizada e ao terrorismo, etc., a Plataforma pretende potencializar as sinergias e as vantagens oferecidas por este tipo de colaboração. O objectivo final da iniciativa é minimizar os efeitos da criminalidade organizada e do terrorismo na Europa, tornando a num espaço mais seguro para a acção pública, para os cidadãos e para a actividade económica.

13.3   Condições para a participação da sociedade civil

13.3.1

A sociedade civil deseja que as instituições comunitárias e os Estados-Membros tomem devida nota das preocupações que os cidadãos lhes transmitem. Os cidadãos exigem maior eficácia na luta contra o terrorismo e a criminalidade organizada. Os cidadãos não querem desculpas de carácter nacional, político ou jurídico para justificar a não-resolução dos problemas que surgem na luta contra a criminalidade e o terrorismo. O que eles reclamam são soluções e respostas às questões que os preocupam.

13.3.2

O CESE considera que a proposta da Comissão de criação de uma plataforma público-privado é positiva, mas não é suficiente.

13.3.3

O CESE deverá participar no lançamento e na avaliação da plataforma.

13.3.4

A representação das organizações da sociedade civil na União Europeia, tal como estipulado no Tratado, compete ao Comité Económico e Social Europeu. Obviamente que não se põe em causa a participação de outros actores que representam interesses específicos, mas o CESE enquanto representante dos interesses gerais tem de estar representado na Plataforma por três conselheiros (cada um deles pertencente a cada um dos grupos).

13.3.5

O CESE insta os Estados-Membros a incentivarem a criação de plataformas público-privado aos níveis local e municipal, para os mesmos fins que a plataforma comunitária, ou seja, a participação e a colaboração.

13.4   Parcerias público-privado na luta contra o terrorismo e a criminalidade organizada

13.4.1

O CESE considera que devem ser criadas condições para uma ampla colaboração entre o sector público e o sector privado com o objectivo de reforçar sinergicamente o combate à criminalidade organizada e ao terrorismo.

13.4.2

Principais objectivos da colaboração:

a)

O primeiro objectivo da sociedade civil é o de prevenir a actividade delituosa associada ao terrorismo e à criminalidade organizada, e também evitar que pessoas e sectores vulneráveis caiam nas redes de organizações terroristas e criminosas.

b)

Identificar os sectores mais vulneráveis à acção de bandos criminosos e promover, nesse meio particular, medidas de autoprotecção e vínculos de conexão com as forças de segurança que intervêm no combate à criminalidade organizada e ao terrorismo.

c)

Facilitar a divulgação de informação e agilizar a troca de experiências com vista a limitar a prática de actos delituosos.

d)

Transmitir às instituições comunitárias e nacionais as preocupações dos diferentes sectores da sociedade civil, de modo a que possam orientar a sua acção para as vertentes de prevenção e combate ao terrorismo e à criminalidade organizada mais relevantes para os cidadãos.

e)

Dar a conhecer às instituições comunitárias e nacionais as principais necessidades das empresas e das organizações da União Europeia em matéria de protecção contra a criminalidade organizada. Debater com essas mesmas instituições as melhores formas de defesa contra actos criminosos e de persecução penal.

f)

Favorecer a troca de experiências em sectores específicos e sobre temas particularmente sensíveis à penetração da criminalidade organizada, com especial incidência nos sectores financeiro, dos transportes, das comunicações e da energia.

g)

Impulsionar a criação de plataformas europeias de prevenção.

h)

Servir de fórum de debate para analisar os níveis de resposta às necessidades e reivindicações das vítimas do terrorismo e da criminalidade organizada.

i)

Orientar as estratégias e as políticas comunitárias em matéria de terrorismo e criminalidade organizada a partir da perspectiva das organizações da sociedade civil.

j)

Fomentar os contactos entre os peritos mais qualificados de ambos os sectores, no intuito de tirar o maior partido dos conhecimentos e das experiências na área da prevenção e luta contra a criminalidade organizada e o terrorismo.

k)

Participar no lançamento e na avaliação da plataforma.

13.5   Sistemas de colaboração

13.5.1

Um sistema de colaboração entre os sectores público e privado, baseado num instrumento semelhante ao proposto pela Comissão, poderá ser um meio eficaz de estabelecer um vínculo entre estes dois sectores. Quanto maior for o nível de representação da Plataforma, maior será a repercussão das parcerias entre os sectores público e privado e, consequentemente, mais eficazes serão as medidas empreendidas contra o terrorismo e a criminalidade organizada.

13.5.2

No âmbito deste sistema de colaboração devem ser constituídos grupos de trabalho sectoriais ou temáticos especificamente vinculados à estrutura criada para a colaboração entre o sector público e o sector privado.

13.5.3

Poderiam ser convidados a participar nas sessões desta Plataforma de Colaboração organizações, empresas, peritos, autoridades comunitárias e nacionais, assim como todos aqueles que possam transmitir informação e experiências ou acrescentar uma mais-valia à luta contra o terrorismo e a criminalidade organizada.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Parecer do CESE, de 15 de Dezembro de 2005, sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Programa da Haia: dez prioridades para os próximos cinco anos — Parceria para a renovação europeia no domínio da liberdade, segurança e justiça», relator: L. Pariza Castaños (JO C 65 de 17.03.2006, pp. 120-130).

(2)  Parecer do CESE, de 14 de Dezembro de 2005, sobre a proposta de decisão do Conselho que estabelece o programa específico «Prevenção, preparação e gestão das consequências em matéria de terrorismo» para o período de 2007 a 2013 — «Programa geral Segurança e protecção das liberdades», relator: Cabra de Luna (JO C 65 de 17.03.2006, pp. 63-69).

(3)  COM(2005) 313 final de 21.9.2005.

(4)  Ver nota de rodapé (1) do documento COM(2005) 313 final, que contém a seguinte citação: «Cada Estado-Membro tomará as medidas necessárias para que sejam consideradas infracções terroristas os actos intencionais expressamente enumerados, tal como se encontram definidos enquanto infracções pelo direito nacional, que, pela sua natureza ou pelo contexto em que foram cometidos, sejam susceptíveis de afectar gravemente um país ou uma organização internacional, quando o seu autor os pratique com o objectivo de intimidar gravemente uma população, ou constranger indevidamente os poderes públicos, ou uma organização internacional, a praticar ou a abster-se de praticar qualquer acto, ou desestabilizar gravemente ou destruir as estruturas fundamentais políticas, constitucionais, económicas ou sociais de um país, ou de uma organização internacional».

(5)  As suas actividades centram-se nos seguintes domínios: comércio e tráfico ilícitos de estupefacientes e armas, tráfico e exploração de seres humanos, roubo, prostituição, jogo ilegal, pirataria comercial, etc.

(6)  Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional. Ver o sítio

http://www.uncjin.org/Documents/Conventions/dcatoc/final_documents_2/convention_spa.pdf

(7)  Parecer do CESE, de 15 de Dezembro de 2005, sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Programa da Haia: dez prioridades para os próximos cinco anos — Parceria para a renovação europeia no domínio da liberdade, segurança e justiça», relator: L. Pariza Castaños (JO C 65 de 17.03.2006, pp. 120-130).

(8)  Resolução do Parlamento Europeu sobre os progressos registados em 2004, na criação de um espaço de liberdade, de segurança e de justiça, P6_TA(2005)0227, de 8 de Junho de 2005.

(9)  Ver sobretudo o parecer do CESE, de 27 de Outubro de 2004, sobre a «Proposta de decisão do Conselho que altera a Decisão 2002/463/CE que adopta um programa de acção de cooperação administrativa em matéria de fronteiras externas, vistos, asilo e imigração (programa ARGO)», relator: L. Pariza Castaños (JO C 120 de 20.05.2005, pp. 76-77).

(10)  A Comissão Europeia apresentou, em 12 de Outubro de 2005, uma proposta de decisão-quadro relativa ao intercâmbio de informações com base no princípio da disponibilidade, COM(2005) 490 final, 12.10.2005.

(11)  Parecer do CESE, de 14 de Dezembro de 2005, sobre a proposta de decisão do Conselho que estabelece o programa específico «Prevenção, preparação e gestão das consequências em matéria de terrorismo» para o período de 2007 a 2013 — «Programa geral Segurança e protecção das liberdades», relator: Cabra de Luna (JO C 65 de 17.03.2006, pp. 63-69).

(12)  A Irlanda e os Países Baixos são os únicos países que ainda não ratificaram os protocolos.

(13)  Parecer do CESE, de 15 de Dezembro de 2005, sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Programa da Haia: dez prioridades para os próximos cinco anos — Parceria para a renovação europeia no domínio da liberdade, segurança e justiça», relator: L. Pariza Castaños (JO C 65 de 17.03.2006, pp. 120-130).

(14)  COM(2005) 313 final.

(15)  Ver parecer do CESE, de 21 de Março de 2002, sobre «A imigração, a integração social e o papel da sociedade civil organizada», relator: L. Pariza Castaños (JO C 125 de 27.5.2002, pp. 112-122); parecer do CESE, de 10 de Dezembro de 2003, sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre imigração, integração e emprego», relator: L. Pariza Castaños (JO C 80 de 30.3.2004, pp. 92-102); e parecer do CESE, de 13 de Setembro de 2006, sobre «A imigração na UE e as políticas de integração: Colaboração entre os governos regionais e locais e as organizações da sociedade civil», relator: L. Pariza Castaños.

(16)  Parecer do CESE, de 20 de Março de 2002, sobre o «Livro Verde — Indemnização das vítimas da criminalidade», relator: Melícias (JO C 125 de 27.5.2002, pp. 31-39).

Parecer do CESE, de 26 de Fevereiro de 2003, sobre a «Proposta de directiva do Conselho relativa à indemnização das vítimas da criminalidade», relator: Koryfídis (JO C 95 de 23.4.2003, pp. 40-44).

(17)  Ver, em particular, o parecer do CESE, de 11 de Maio de 2005, sobre a «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais, incluindo o financiamento do terrorismo», relator: Simpson (JO C 267 de 27.10.2005, pp. 30-35).

(18)  Parecer do CESE, de 21 de Abril de 2006, sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às informações sobre o ordenante que acompanham as transferências de fundos», relator: Umberto Burani (JO C 185 de 8.8.2006, pp. 92-96).

Parecer do CESE, de 11 de Maio de 2005, sobre a «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais, incluindo o financiamento do terrorismo», relator: Simpson (JO C 267 de 27.10.2005, pp. 30-35).

(19)  Grupo criado pelos países membros do G-8.

(20)  Ver Plano adoptado pelo Conselho em 13 de Fevereiro de 2006.

(21)  Ver, em particular, o parecer do CESE, de 19 de Janeiro de 2006, sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à conservação de dados tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações electrónicas publicamente disponíveis e que altera a Directiva 2002/58/CE», relator: Hernández Bataller (JO C 69 de 21.3.2006, pp. 16-21).

(22)  Relatório do Parlamento Europeu A6(2005) 365, de 28 de Novembro de 2005.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/157


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Qualidade da vida activa, produtividade e emprego no contexto da globalização e dos desafios demográficos»

(2006/C 318/27)

Em 17 de Novembro de 2005, a Presidência finlandesa do Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre «Qualidade da vida activa, produtividade e emprego no contexto da globalização e dos desafios demográficos».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, que emitiu parecer em 13 de Julho de 2006, tendo sido relatora Ursula ENGELEN-KEFER.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro de 2006), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 116 votos a favor, 3 votos contra e 8 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

A Estratégia de Lisboa é a resposta europeia aos desafios da globalização. Segundo ela, só uma articulação eficaz das políticas económica, laboral, social e ambiental permitirá melhorar a posição concorrencial da Europa no plano internacional. A economia europeia tem toda a vantagem em aproveitar as oportunidades da globalização para criar emprego em prometedores sectores económicos e gerar mais crescimento através da inovação. A Europa devia por isso consciencializar-se dos seus trunfos — que consistem na elevada qualidade do seus produtos e serviços, na sólida formação da sua força de trabalho e no seu modelo social — e estabelecer com os seus concorrentes mundiais uma concorrência qualitativa, em vez de se envolver numa competição pelos mais baixos níveis salariais e sociais, na qual só poderá perder. Uma concorrência assente em critérios qualitativos requer uma abordagem inovadora holística, que englobe o nível microeconómico (isto é, a estrutura das empresas) e a qualidade da vida activa.

1.2

Se bem que um objectivo programático da Agenda de Lisboa consista em criar, não só mais, como também melhores empregos, este aspecto qualitativo tem sido negligenciado nos debates sobre a concretização dos objectivos de Lisboa. Para além de mais investimentos em I&D e de investimentos em geral, bem como, em particular, de investimentos na formação de base e contínua, a fim de dar resposta às exigências da sociedade do conhecimento e da informação, a solução para incrementar a produtividade e a capacidade de inovação das empresas passa também pela melhoria qualitativa da vida activa. É precisamente o que provam estudos científicos sobre a relação entre a qualidade da vida activa e a produtividade e sobre o significado que, do ponto de vista dos trabalhadores em causa, o termo «emprego decente» adquire para a sua motivação e dedicação.

1.3

A qualidade do trabalho engloba vários aspectos, como a prevenção e a redução dos riscos para a saúde, a organização no local de trabalho, a segurança social e a adequação dos rendimentos, a possibilidade de desenvolver competências e de adquirir mais qualificações, bem como uma melhor conciliação entre profissão e família. Segundo os resultados dos estudos sobre a melhoria das condições de vida e de trabalho, apresentados ao CESE pela Fundação de Dublim, quaisquer melhorias efectuadas nestas várias dimensões reflectem-se positivamente na produtividade. A promoção voluntária da saúde por parte das empresas reveste grande importância neste contexto. A segurança do emprego, um ambiente de trabalho sadio e uma organização do trabalho que permita maior margem de manobra individual constituem, no seu conjunto, factores decisivos para o aumento do desempenho e, por conseguinte, da capacidade de inovação, que também é influenciada pelas condições sociais. No entender do CESE, estes factores deviam ser levados em conta pelas direcções das empresas e pela cultura empresarial em geral. A própria Estratégia de Lisboa carece da sua materialização a nível das empresas, na medida em que os objectivos económicos são aliados aos sociais. O diálogo social tem um importante papel a desempenhar neste contexto.

1.4

A melhoria qualitativa da vida activa requer um modelo holístico, consciente das mutações que se operam no mundo do trabalho e mais bem adaptado às necessidades especiais da população activa menos jovem. De acordo com o conceito de «bem-estar no trabalho» seguido pela Comissão na sua «Estratégia comunitária em matéria de saúde e segurança no trabalho», importa sobretudo velar pela prevenção dos riscos para a saúde e pela redução contínua dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais. A precariedade do trabalho com reduzida protecção social é outro aspecto a ter em atenção. Simultaneamente importará também, mediante a criação de novas formas de organização do trabalho, promover a realização profissional e a apetência para trabalhar. As formas cooperativas de trabalho assentes em hierarquias «planas» e numa maior autonomia de decisão, como o trabalho em grupo ou em equipa, tornam possível tirar globalmente partido dos conhecimentos e capacidades das pessoas, tendo em conta as crescentes exigências de flexibilidade da economia. Boas condições de trabalho e formas cooperativas da sua organização constituem simultaneamente condições indispensáveis à melhoria da produtividade e ao reforço da capacidade de inovação das empresas. O CESE defende o princípio da «flexissegurança», segundo o qual a flexibilidade e a segurança social devem estar presentes numa proporção equilibrada, como aprovado pelo Conselho Emprego e Política Social em 1 e 2 de Junho de 2006.

1.5

O CESE aconselha a elaboração de mais estudos sobre a relação entre a qualidade da vida activa e a produtividade. A Fundação de Dublim seria a instituição ideal a quem os encomendar. O CESE propõe igualmente a criação de um índice europeu da qualidade da vida activa, que seria composto por diferentes parâmetros, definidos com base em estudos relevantes sobre o que se entende por «emprego decente», e actualizado e publicado regularmente. Esse índice contribuiria para tornar visíveis desvios e progressos e constituiria a base para novas iniciativas de melhoria da qualidade da vida activa. Os parceiros sociais deviam ser implicados na avaliação dos resultados e poder pronunciar-se regularmente sobre eles.

2.   Argumentos e observações

2.1   Antecedentes do parecer

2.1.1

Antecipando-se à Presidência finlandesa do Conselho, que decorrerá no segundo semestre de 2006, o governo finlandês solicitou ao CESE que elaborasse um parecer exploratório sobre a relação entre a qualidade da vida activa, a produtividade e o emprego, um dos temas que dominará o debate político durante essa presidência.

2.1.2

O presente parecer exploratório procura examinar em que medida a qualidade da vida activa é um factor de aumento da produtividade e de crescimento económico e que contributo pode ela prestar à sociedade da informação e do conhecimento — e, nessa medida, à concretização dos objectivos de Lisboa. Na análise que se segue, a globalização e as mutações demográficas serão abordadas enquanto condições de enquadramento.

2.2   Introdução

2.2.1

Se a globalização envolve riscos, também proporciona oportunidades. Os riscos consistem no facto de, com o aumento da concorrência e da nova repartição do trabalho a nível internacional — resultante das operações de restruturação e deslocalização das empresas –, a economia europeia estar sujeita a perder postos de trabalho se não conseguir conquistar novas áreas de actividade. Simultaneamente aumenta também a pressão sobre os padrões sociais vigentes na Europa e sobre o Modelo Social Europeu, já que os custos salariais e sociais constituem factores de concorrência decisivos no contexto da União Monetária. Um estudo do Eurostat (de Março de 2006) mostra, porém, que os custos salariais têm aumentado mais lentamente na Europa a 25 do que nos EUA. A Estratégia de Lisboa é a resposta europeia aos desafios da globalização. Segundo ela, só uma articulação eficaz das políticas económica, laboral, social e ambiental permitirá melhorar a posição concorrencial da Europa no plano internacional.

2.2.2

Mas uma estratégia de adaptação que aposte unilateralmente na flexibilização do mercado de trabalho, na redução dos padrões sociais e no corte das prestações sociais não permitirá atingir essa meta. O que importa é, ao invés, saber tirar partido das oportunidades da globalização em proveito da economia europeia, tanto mais que a Europa é um local de implantação atraente para as empresas, distinguindo-se pelos seguintes factores:

poder de atracção da zona euro

democracias estáveis e paz social

fiabilidade

eficiência dos serviços públicos

infra-estruturas desenvolvidas

Na opinião do CESE, importa que a flexibilidade e a segurança social estejam presentes numa proporção equilibrada, de acordo com o princípio da «flexissegurança». São identificados quatro elementos para se alcançar um bom equilíbrio entre a flexibilidade e a segurança no mercado de trabalho: «existência de alternativas contratuais adequadas, políticas activas para o mercado de trabalho, sistemas credíveis de aprendizagem ao longo da vida e sistemas modernos de segurança social» (1). Na resolução aprovada no Conselho de ministros do Emprego e Política Social de 1 e 2 de Junho de 2006, o princípio da «flexissegurança» é descrito em mais pormenor. A existência de alternativas contratuais diversas pode contribuir para «uma combinação equilibrada com ofertas de segurança e activação». Sublinha-se a importância de garantir direitos adequados para os trabalhadores em todos os tipos de contratos. A modernização dos sistemas de segurança social devem «ter devidamente em conta as novas formas de trabalho» e «garantir às mulheres a aquisição de direitos de reforma». Os sistemas de prestações de desemprego devem «dar a todos rendimentos suficientes para viver (…), [sendo] igualmente importante garantir incentivos e assistência na procura de trabalho.» E «as políticas activas para o mercado de trabalho e a formação profissional nas empresas são importantes para favorecer a passagem da segurança do posto de trabalho à segurança do emprego» (2).Neste contexto, o CESE congratula-se por os parceiros sociais e outros interessados deverem ser implicados no desenvolvimento de políticas no domínio da «flexissegurança».

2.2.3

As oportunidades da globalização consistem em apostar em áreas de actividade promissoras, na inovação, na concorrência qualitativa (evitando a corrida ao «dumping social» com os concorrentes globais) e na criação de empregos de alta qualidade. Quanto aos elevados padrões sociais, embora constituindo um factor de custo na concorrência internacional, são vantajosos para o local de implantação, na medida em que reforçam a coesão da sociedade em questão e fomentam a capacidade de inovação e a produtividade dos trabalhadores. Este papel produtivo da política social é característico do Modelo Social Europeu, que assenta em valores comuns «tais como a solidariedade e a coesão, a igualdade de oportunidades e a luta contra todas as formas de discriminação, regras adequadas de saúde e de segurança no local de trabalho, o acesso universal à educação e aos cuidados médicos, a qualidade de vida e do emprego, o desenvolvimento sustentável e a participação da sociedade civil.» (E haveria ainda que acrescentar a esta lista o papel dos serviços públicos para a coesão e diálogo sociais). «Estes valores representam a escolha da Europa em favor de uma economia social de mercado» (3). A Europa terá pois de jogar o trunfo do seu modelo social se quiser vingar na concorrência internacional (4).

2.2.4

Os objectivos que a União se propôs atingir no quadro da Estratégia de Lisboa não poderão ser alcançados se ela não reforçar a coesão social através de políticas sociais activas, não aumentar a produtividade, não recorrer mais às tecnologias de informação e comunicação (TIC), e não melhorar assim a qualidade da vida activa, a motivação para o trabalho e a satisfação com ele, enquanto condições indispensáveis para fomentar a inovação. A inovação não é um mero fenómeno técnico que se traduz em novos produtos e processos produtivos, mas é muito mais um processo social, que depende das pessoas, dos seus conhecimentos, das suas qualificações e capacidades. A realização destes objectivos requer novas formas de organização do trabalho, que essas mesmas pessoas deveriam poder ajudar a definir e nelas investir o seu saber e competência, designadamente através da criação de trabalhos de grupo e de equipa e de uma melhor articulação das estruturas de direcção e dos trabalhadores. Um desafio muito especial neste contexto é o das mutações demográficas, visto modificarem a estrutura etária dos recursos humanos das empresas. Assim, trata-se, por um lado, de propor aos trabalhadores menos jovens acções de requalificação profissional, proporcionando-lhes as condições necessárias para se adaptarem às exigências das mutações técnicas/organizacionais, e, por outro, de ter em conta o perfil das prestações desses trabalhadores através de uma maior adequação do seu posto de trabalho à sua idade. Ambas as medidas implicam ter de repensar a política de pessoal das empresas, de modo a oferecer mais hipóteses de trabalho aos trabalhadores menos jovens (5).

2.2.5

A promoção da inovação — elemento indispensável da Estratégia de Lisboa — requer, além de um maior investimento em investigação e desenvolvimento (I&D), outras medidas, tanto do Estado como do sector privado. Essas medidas incluem: melhorar a capacidade de adaptação às novas tecnologias, mas também modificar as estruturas laborais das empresas, adoptando uma organização do trabalho capaz de garantir maior autonomia a cada trabalhador e a melhoria da colaboração com as estruturas de direcção. O aumento da quota de mulheres também em cargos de chefia e a melhoria das possibilidades de conciliação da vida profissional com a familiar contribuem igualmente para isso. Por último, trata-se de melhorar as condições de trabalho em geral para prevenir o stress e as doenças profissionais, de manter a empregabilidade, sobretudo a dos trabalhadores com mais idade, e de garantir condições de trabalho adequadas ao envelhecimento. Neste contexto, o Comité chama a atenção para a importância das iniciativas de promoção da saúde propostas — numa base voluntária — pelas empresas aos seus trabalhadores, e nota a propósito que o apoio dos poderes públicos a tais iniciativas contribuiria para aumentar o recurso a elas por parte das empresas e, em particular, das PME. Mas também a integração dos jovens reveste grande importância, pois as equipas com mistura de idades permitem aliar as competências dos trabalhadores mais jovens à experiência dos mais velhos e fazer surgir dessa aliança as melhores e mais inovadoras ideias.

2.2.6

A regulação das condições de trabalho mediante convenções colectivas é missão específica dos parceiros sociais. O diálogo social reveste, pois, grande importância para a melhoria da qualidade da vida activa a todos os níveis. A criação de condições de trabalho sadias e de um ambiente favorável à inovação mediante formas de organização do trabalho que proporcionem ao indivíduo mais capacidade de acção e decisão requer um esforço de interacção e de parceria com os trabalhadores em causa e com a representação dos seus interesses no interior da empresa. Só a participação activa dos indivíduos visados e dos seus representantes permitirá alcançar o objectivo de criar melhores empregos, proclamado em Lisboa. Assim entendida, a parceria em prol da mudança e da qualidade do trabalho terá de se constituir nas próprias empresas e ser depois prosseguida, através do diálogo social, a nível sectorial e inter-sectorial. O CESE congratula-se com a realização de uma primeira troca de pontos de vista entre os parceiros sociais na véspera da reunião informal do Conselho Emprego e Política Social, em 6 de Julho, na qual também pôde participar um representante da sociedade civil. O CESE tem esperança de que os parceiros sociais consigam chegar a acordo sobre um contributo conjunto para o debate sobre a qualidade do trabalho, a produtividade e o emprego, em ligação com o princípio da «flexissegurança».

2.3   Crescimento, produtividade e emprego

2.3.1

Não é segredo para ninguém que as ambiciosas metas de crescimento e emprego fixadas pelo Conselho Europeu de Lisboa, em Março de 2000, numa conjuntura económica relativamente mais favorável, não foram nem de longe atingidas. «Em vários aspectos», admite-se nas «Orientações gerais das políticas económicas», de 12 de Julho de 2005, «a economia da União Europeia está mais longe do seu objectivo de se tornar a economia mais competitiva do mundo do que em Março de 2000» (6). Além do persistentemente elevado nível do desemprego, que em 2003 se ficou pelo pouco significativo aumento da taxa de emprego para 63 % — consideravelmente abaixo do objectivo de 70 %, que devia ser atingido até 2010 –, a culpa é imputada ao fraco aumento da produtividade. Este fenómeno já fora identificado no relatório sobre a Estratégia de Lisboa publicado em Novembro de 2004 pelo Grupo de Alto Nível presidido por Wim Kok. A queda das taxas de crescimento da produtividade do trabalho (por hora trabalhada) na UE desde meados dos anos 90 foi assim atribuída «(…) mais ou menos por igual, a um menor investimento por empregado e a um abrandamento da taxa de progresso tecnológico» (7). Ainda segundo o mesmo relatório, este abrandamento dever-se-ia às «razões já invocadas para explicar por que a Europa não atinge as metas de Lisboa: investimento insuficiente em I&D e educação, uma capacidade insensível à transformação da investigação em produtos e projectos comercializáveis e o menor desempenho da produtividade nos sectores europeus produtores de TIC (…) e dos serviços europeus que utilizam as TIC (…), devido a uma taxa mais lenta de divulgação das TIC» (8). Ao que parece, a economia europeia carece pois de investimentos em produtos e tecnologias voltados para o futuro e de capacidade de inovar, o que pressupõe ser capaz de investir no potencial de qualificação das pessoas. As reduzidas despesas com I&D, a julgar pelo objectivo de 3 % do PIB até 2010, são apenas um dos indicadores desta situação. Além disso, só 55 % das despesas com investigação na União são financiadas pelo sector privado, o que é considerado uma das principais causas da discrepância entre o grau de inovação dos EUA e da UE (9).

2.3.2

No seu relatório à atenção do Conselho Europeu da Primavera de Março de 2006, a Comissão conclui que a União Europeia, apesar de todos os esforços, «provavelmente não conseguirá atingir o objectivo fixado de aumentar as despesas de investigação para 3 % do PIB até 2010» (10), e salienta neste contexto a necessidade de reforçar o investimento privado, para o que o mercado único terá simultaneamente de criar melhores condições de enquadramento. Paralelamente a uma política macroeconómica voltada para o crescimento e para o emprego, só uma estratégia de promoção da inovação poderá proporcionar «mais e melhores empregos». Eis o que confirmam as conclusões do Conselho Europeu da Primavera, que preconiza uma «abordagem global da política de inovação», implicando em particular investimentos na educação e na formação profissional (11). A necessidade de investimentos no conhecimento e na inovação e das respectivas medidas nacionais e europeias foi também sublinhada pelo Conselho Europeu, na sua reunião de 15 e 16 de Junho de 2006 (12).

2.4   Investir nas pessoas como condição para uma sociedade inovadora baseada no conhecimento

2.4.1

Numa sociedade e economia baseadas no conhecimento, as estruturas da produção e da prestação de serviços são incessantemente renovadas graças às TIC e a produtos e processos produtivos inovadores. Isso vai a par de uma transformação da organização do trabalho, tanto na produção como na administração. Essa restruturação técnico-organizativa gera alterações nas exigências profissionais que importará ter em conta tanto na educação e na formação profissional de base, como na formação contínua. Conhecimentos de informática e competências no domínio das TIC (literacia mediática), mas também competências sociais e relacionais, como a aptidão para o trabalho em equipa e o conhecimento de línguas, serão factores decisivos para estar à altura dos novos requisitos do mercado de trabalho. A transmissão de tais competências-chave terá de constituir uma preocupação comum a todas as áreas do sistema de ensino para, também graças a ela, se reforçar a capacidade de inovação das empresas através da qualificação dos seus recursos humanos.

2.4.2

Já o relatório do Grupo de Trabalho para o Emprego, de Novembro de 2003, lembrava a importância decisiva para o aumento da taxa de emprego que revestem melhores níveis de formação e uma constante adaptação das qualificações às exigências da sociedade do conhecimento. E para tal importará não só melhorar o nível geral da formação de base como também facilitar o acesso à formação contínua em todos os perfis profissionais e tanto no sector público como no privado. A prioridade deve ser dada aos trabalhadores mais necessitados, isto é, com menos qualificações, com mais idade, ou ao serviço de pequenas e médias empresas (PME). O Grupo de Trabalho para o Emprego salientava neste contexto a responsabilidade especial do sector privado e exortava os empregadores a assumirem a responsabilidade pela incessante formação contínua dos seus empregados (13). Neste sentido, uma combinação de disposições legais e de regimes voluntários deveria assegurar suficiente investimento por parte do patronato na formação contínua dos recursos humanos, bem como uma repartição mais justa dos custos inerentes (por exemplo, através da constituição de fundos a nível sectorial ou regional, de regimes de bonificação fiscal ou de esquemas de contribuição financeira para a dita formação, como acontece em França) (14). No entender do CESE, todos os trabalhadores devem ter acesso à formação contínua.

2.4.3

Também o Grupo de Alto Nível «Futuro da política social» recomenda que, no âmbito da estratégia europeia para o emprego, a União concentre em geral nos sistemas de ensino a criação das condições exigidas pela sociedade do conhecimento, e os melhore (15). O mesmo grupo avança com uma série de sugestões incidindo em todos os níveis da educação e da formação, mas em especial na formação profissional contínua, e propõe que o direito geral de acesso a esta seja contemplado nos contratos de trabalho, sejam eles colectivos ou individuais. As empresas deverão ainda conceber planos de desenvolvimento pessoal individualizados e criar um serviço interno para gestão das competências e da formação contínua do seu pessoal. Não faltam, pois, boas propostas, só falta pô-las em prática.

2.5   Melhorar a qualidade da vida activa para reforçar a capacidade de inovação e a integração dos trabalhadores de idade mais avançada

2.5.1   Qualidade da vida activa e produtividade

2.5.1.1

A transição para uma sociedade do conhecimento capaz de inovar requer novas iniciativas de melhoria qualitativa da vida activa. Condições de trabalho sadias e uma organização do trabalho que permita uma maior colaboração entre quadros, dirigentes e outro pessoal qualificado, a cooperação assente na igualdade de direitos e na co-decisão contribuem para a realização profissional e o bem-estar no trabalho e concorrem assim para o êxito económico de uma empresa. Inversamente, condições de trabalho desgastantes e nocivas para a saúde afectam a qualidade de vida e acarretam custos e perdas de produtividade que se repercutem negativamente na capacidade de inovação. É o que demonstram os (aliás, ainda demasiado escassos) estudos especializados nesta matéria.

2.5.1.2

Um estudo publicado em 2004 pela Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho, que aprofunda a relação entre a qualidade da vida activa e a produtividade (16), chega à conclusão crucial de que, no actual contexto de concorrência exacerbada, o êxito de uma empresa já não pode ser apenas medido com indicadores económicos tradicionais. Factores como a satisfação da clientela, a optimização das relações laborais a nível interno, a capacidade de inovação e a existência de estruturas organizativas flexíveis adquirem cada vez maior importância. Também os resultados de uma avaliação documental efectuada neste âmbito confirmam existir uma estreita relação entre boas condições de trabalho e o êxito económico de uma empresa. A qualidade da vida activa reflecte-se fortemente na produtividade e na rendibilidade. O estudo identifica em pormenor os seguintes factores de sucesso empresarial:

uma inter-relação entre as metas da empresa e os planos de desenvolvimento pessoal, de modo a convergirem para a obtenção dos objectivos;

uma abordagem integral da protecção da saúde, não se limitando às condições de trabalho imediatas, mas incluindo a motivação dos trabalhadores e a conduta cooperativa das chefias;

planos de promoção da saúde centrados na prevenção;

melhoria dos processos produtivos e da organização do trabalho, associada à inovação técnica.

2.5.1.3

Com base em estudos de caso efectuados em diversos Estados-Membros e em diferentes ramos, o mesmo estudo identificou os seguintes factores para a melhoria da produtividade:

A elevada qualidade da vida activa, incluindo a capacidade de conciliar família com profissão, é considerada primordial.

O comportamento cooperativo das chefias contribui para maior produtividade.

As formas de organização do trabalho que cedem maior autonomia e responsabilidade aos trabalhadores repercutem-se positivamente no seu desempenho.

A melhoria dos métodos de trabalho e do equipamento dos postos de trabalho no caso de actividades fisicamente desgastantes permite reduzir o esforço físico e, por conseguinte, obter maior produtividade. Tais investimentos valem, pois, a pena.

Condições de trabalho especialmente desgastantes requerem soluções criativas, a fim de evitar acidentes. A diminuição do absentismo por motivo de doença reflecte-se positivamente na produtividade.

2.5.1.4

O espectro de formas de desgaste nas empresas transformou-se em grande medida com a utilização das TIC. Se bem que em certos sectores, nomeadamente na produção industrial, o desgaste físico continue a predominar, assinala-se em geral um agravamento do desgaste psicossocial, em consequência do aumento da intensidade do trabalho, da pressão do tempo e do uso do computador. O stress causado pelo trabalho é o factor de desgaste que predomina em todos os sectores e áreas de actividade e constitui, por conseguinte, o principal desafio que se coloca à prevenção. O estudo da agência europeia já referida conclui que a prevenção do stress não só reduz custos, mas melhora também a produtividade, graças a uma maior motivação e a um melhor ambiente de trabalho.

2.5.1.5

A percentagem da actividade qualificada, dotada de mais autonomia e menos sujeita à hierarquia aumentou particularmente na «nova economia» (new economy), mas a pressão laboral acentuou-se. Os limites do dia de trabalho são cada vez mais fluídos, sendo acompanhados de novas formas de desgaste da saúde, como o esgotamento por exaustão (burn out), e de uma perda geral de qualidade de vida. Simultaneamente observa-se, porém, em certos sectores, outra tendência corrente: perante o aumento dos custos e da concorrência, regressa-se a uma organização do trabalho assente no trabalho em grupo (na indústria automóvel, por exemplo) e reintroduzem-se estruturas rígidas de divisão do trabalho que exigem esforços localizados e comportam concomitantes riscos para a saúde dos trabalhadores visados.

2.5.1.6

A taxa de emprego precário (que reveste formas como trabalho a tempo parcial involuntário, contratos de trabalho a termo certo e trabalho temporário) aumenta, sendo estes grupos da população activa que mais estão expostos a condições de trabalho particularmente penalizantes, como tarefas demasiado fáceis e monótonas, excessivo esforço físico ou ambiente nocivo para a saúde. A precariedade das condições de trabalho anda muitas vezes a par da sua falta de qualidade, o que torna ainda mais necessárias medidas de protecção do trabalho e da saúde, bem como de reorganização do próprio trabalho.

2.5.1.7

Um inquérito representativo da visão dos trabalhadores, realizado pelo Instituto Internacional para a Economia Social Empírica (International Institut für empirische SozialökonomieINIFES), com sede na Alemanha, mostra que expectativas depositam os trabalhadores num «emprego digno» (17). A avaliação das respostas de trabalhadores independentes revelou que em primeiro lugar figuravam aspectos relacionados com a segurança do rendimento e do emprego, sendo seguidos de aspectos qualitativos, como a sua utilidade e diversidade. Em terceiro lugar constavam aspectos ligados a uma conduta cooperativa por parte das chefias e ao apoio mútuo. A lista que se segue enumera em pormenor, e por ordem de importância, os aspectos do trabalho que, na perspectiva dos inquiridos, eram motivo da sua satisfação e dedicação:

1.

rendimento certo e fiável;

2.

segurança do emprego;

3.

prazer no trabalho;

4.

tratamento digno pelos superiores;

5.

contratos de trabalho sem termo certo;

6.

promoção da colegialidade;

7.

ambiente sadio no local de trabalho;

8.

utilidade das funções;

9.

diversidade das funções, polivalência;

10.

influência sobre os processos laborais.

Todos estes aspectos obtiveram uma taxa de adesão de 70 % a 90 %. Outros critérios bastante escolhidos (mais de 60 % das respostas) para a definição de «emprego digno» tinham a ver com a possibilidade de aperfeiçoar as capacidades individuais e de solicitar aos superiores hierárquicos um fomento do desenvolvimento e da especialização profissionais. O estudo mostrava ainda que a elevada qualidade da vida activa — que corresponde em grande medida aos critérios subjectivos que definem «emprego digno» — proporciona maior realização profissional e alegria no trabalho, assim como maior apetência para um bom desempenho. É, pois, possível concluir que estes factores se repercutem na produtividade, mesmo que essa relação não tenha sido expressamente estudada.

2.5.2   Organização do trabalho em função da idade

2.5.2.1

A taxa de trabalhadores com mais idade (isto é, compreendidas entre os 55 e os 65 anos) mantém-se insuficiente na União, pelo que o objectivo de elevar até 2010 a população activa a 50 % da população total não será atingido. Uma razão decisiva para o abandono da vida activa por parte desses trabalhadores mais experientes reside na deterioração da sua saúde, resultante de condições desgastantes ou da elevada intensidade do trabalho. Nos últimos anos, a política de pessoal das empresas tem vindo a convencer estes trabalhadores a optarem pela aposentação precoce, o que desencadeou um processo de eliminação de postos de trabalho que veio sobrecarregar mais ainda os sistemas de segurança social.

2.5.2.2

Na opinião do CESE, não basta formular objectivos ambiciosos sem criar simultaneamente as condições para os alcançar. Perante a considerável falta de emprego, haverá que aliviar a pressão da produtividade exercida sobre empresas e administrações e conceber condições de trabalho e expectativas de desempenho que se mantenham válidas durante toda uma (longa) vida activa. Tal obrigará muitas empresas a reforçarem o número de efectivos, a fim de reduzirem a pressão para o aumento do desempenho e a evitarem assim o fenómeno do desgaste físico precoce. A redefinição e reorganização adequadas das funções e a correcta avaliação da necessidades de pessoal são instrumentos decisivos para alcançar o objectivo de melhorar a qualidade da vida activa. Daí a preocupação não dever centrar-se no aumento da idade legal de aposentação, mas sim na aproximação entre as idades legal e real. E isso requer essencialmente medidas no âmbito da definição das funções e uma nova política de pessoal para os trabalhadores com mais idade.

2.5.2.3

O Grupo de Alto Nível «Futuro da política social da UE» recomenda neste contexto medidas em três níveis. Paralelamente a uma reforma dos sistemas de segurança social, com vista a reduzir os incentivos à aposentação precoce, é a nível das empresas que pensa deverem ser tomadas as medidas necessárias. Seria assim preciso incentivar uma maior participação dos trabalhadores menos jovens nas acções de formação contínua, melhorar as condições de trabalho e modernizar a sua organização. As novas formas de organização do trabalho deviam ter em conta as capacidades e competências desses trabalhadores, adequando os postos de trabalho e facilitando a mudança de funções no interior da empresa (18). Para além disso, seria preciso estimular uma mudança de mentalidade em toda a sociedade, a fim de reavaliar e valorizar o valor da experiência e das competências adquiridas na vida activa.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Conclusões do Conselho Europeu de 1 e 2 de Junho de 2006, pág. 17 (versão portuguesa). URL: http://www.consilium.europa.eu/cms3_applications/Applications/newsRoom/LoadDocument.asp?directory=pt/lsa/&filename=90048.pdf.

(2)  «Flexigurança — Contributo conjunto do Comité do Emprego e do Comité da Protecção Social», aprovado na sessão do Conselho (EPSCO) de 1 e 2 de Junho de 2006. URL: http://register.consilium.europa.eu/pdf/pt/06/st09/st09633.pt06.pdf.

(3)  Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões «Os valores europeus no contexto da globalização — Contribuição da Comissão para a reunião de Outubro dos Chefes de Estado e de Governo» (COM(2005) 525 final/2 de 3.11.2005), p. 4.

(4)  Ver parecer do CESE aprovado em 6 de Julho de 2006 sobre «Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu», relator: E. EHNMARK. URL: http://eescopinions.eesc.europa.eu/viewdoc.aspx?doc=\\esppub1\esp_public\ces\soc\soc237\pt\ces973-2006_ac_pt.doc.

(5)  Ver os pareceres do CESE sobre:

«Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Aumentar os níveis de emprego dos trabalhadores mais velhos e retardar a saída do mercado de trabalho» (JO C 157 de 28.6.2005, pp. 120-129; relator: G. DANTIN).

URL: http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/pt/oj/2005/c_157/c_15720050628pt01200129.pdf.

Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu «Produtividade: a chave para a competitividade das economias e das empresas europeias», relator: MORGAN/SIRKEINEN; co-relator: E. EHNMARK (JO C 85, de 8.4.2003, pp. 95-100);

URL: http://europa.eu/eur-lex/pri/pt/oj/dat/2003/c_085/c_08520030408pt00950100.pdf.

(6)  «Recomendação do Conselho, de 12 de Julho de 2005, relativa às orientações gerais das políticas económicas dos Estados-Membros e da Comunidade (2005-2008)» (JO L 205, 6.8.2005 — pp. 28-37).

URL: http://europa.eu/eur-lex/lex/LexUriServ/site/pt/oj/2005/l_205/l_20520050806pt00280037.pdf.

(7)  «Enfrentar o desafio — A Estratégia de Lisboa para o Crescimento e Emprego». Relatório do Grupo de Alto Nível presidido por Wim Kok, Novembro de 2004 (Relatório Kok), p. 17.

URL: http://ec.europa.eu/growthandjobs/pdf/kok_report_pt.pdf.

(8)  Idem.

(9)  Ver parecer do CESE de 15.9.2004 sobre «Rumo ao 7.o programa–quadro em matéria de investigação: As necessidades de investigação no domínio das mutações demográficas — Qualidade de vida dos idosos e necessidades tecnológicas», relatora: HEINISCH (JO C 74 de 2.3.2005, pp. 44-54).

URL: http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/pt/oj/2005/c_074/c_07420050323pt00440054.pdf.

(10)  Comunicação da Comissão ao Conselho Europeu da Primavera «Passar a uma velocidade superior: a nova parceria para o crescimento e o emprego» (COM(2006) 30 final — PARTE 1, de 25.1.2006), p. 18.

(11)  Conselho Europeu de 23 e 24 de Março de 2006 (Bruxelas) — Conclusões da Presidência do Conselho, pp. 18 e segs.

URL: http://www.consilium.europa.eu/ueDocs/cms_Data/docs/pressData/pt/ec/89015.pdf.

(12)  Conclusões da Presidência, pontos 20 e 21.

URL: http://www.consilium.europa.eu/ueDocs/cms_Data/docs/pressData/pt/ec/90127.pdf.

(13)  Relatório «Jobs, Jobs, Jobs — Creating more Employment in Europe» do Grupo de Alto Nível para o Emprego, presidido por Wim Kok, Novembro de 2003. (N.T.: Documento disponível apenas em DE, EN, FR.)

URL: http://ec.europa.eu/employment_social/employment_strategy/pdf/etf_en.pdf.

(14)  Idem, pág. 51 (versão inglesa).

(15)  Relatório do Grupo de Alto Nível sobre «The future of the social policy in an enlarged European Union» (O Futuro da Política Social na União Europeia Alargada), de Maio de 2004. (N.T.: Documento disponível apenas em DE, EN, FR.)

URL: http://ec.europa.eu/employment_social/publications/2005/ke6104202_en.pdf.

(16)  Documento da Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho: «Quality of the Working Environment and Productivity — Working Paper (2004)» (Qualidade do ambiente de trabalho e produtividade — Documento de trabalho (2004)).

URL: http://osha.eu.int/publications/reports/211/quality_productivity_en.pdf (N.T.: disponível apenas em inglês).

(17)  «Was ist gute Arbeit? Anforderungen aus Sicht von Erwerbstätigen» — Kurzfassung (O que é trabalho digno? Requisitos na perspectiva da população activaSíntese) INIFES, Novembro de 2005 (só existe a versão alemã).

URL: http://www.inqa.de/Inqa/Redaktion/Projekte/Was-ist-gute-Arbeit/gute-arbeit-endfassung,property=pdf,bereich=inqa,sprache=de,rwb=true.pdf.

(18)  Relatório do Grupo de Alto Nível «The future of the social policy in an enlarged European Union» (O Futuro da Política Social na União Europeia Alargada), de Maio de 2004, pág. 35 (versão inglesa). (N.T.: Documento disponível apenas em DE, EN, FR.)

URL: http://ec.europa.eu/employment_social/publications/2005/ke6104202_en.pdf.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/163


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A cidadania europeia e os meios de lhe conferir visibilidade e efectividade»

(2006/C 318/28)

Em 19 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre «A cidadania europeia e os meios de lhe conferir visibilidade e efectividade».

A Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 13 de Julho de 2006, tendo sido relator B. VEVER.

Na 429a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 111 votos a favor, 22 votos contra e 13 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Resumo

1.1

A inscrição formal dos direitos de cidadania europeia nos recentes tratados não foi suficiente para travar a escalada de eurocepticismo na opinião pública europeia. No julgar dos próprios europeus, a Europa sofre de uma acumulação de défices: à cabeça dessa longa lista figuram défices de visibilidade, de apropriação, de informação, de diálogo e de eficácia, mas, no total, foi um défice de confiança que se instalou. O processo de ratificação do Tratado Constitucional foi prejudicado por este facto e o seu bloqueio ameaça alimentar mais ainda o eurocepticismo.

1.2

É, pois, urgente reagir: assim, neste momento, a prioridade deve consistir menos em redigir novas declarações de direitos do que em iniciar acções concretas que permitam a esta cidadania europeia exercer-se plenamente. Mas isso requererá um empenho militante e revigorado da Comissão, um código de conduta para uma melhor governança das instituições, um termo ao crescente desfasamento entre as expectativas depositadas na Europa e os limitados recursos afectados à sua concretização, um reforço da cooperação entre os Estados dispostos a avançar em conjunto e mais pressão e iniciativas por parte dos representantes da sociedade civil.

1.3

O CESE propõe em primeiro lugar colmatar as lacunas europeias particularmente injustificadas, o que passa por:

relançar a elaboração do estatuto europeu das associações e aprová-lo rapidamente,

proceder da mesma forma para o estatuto europeu das sociedades mútuas,

criar um estatuto europeu simplificado aberto às PME,

fazer vigorar a patente comunitária entre os Estados-Membros que a ratificaram,

acabar com toda e qualquer dupla tributação, pelo menos na zona euro, e

assegurar uma transferibilidade não discriminatória das prestações sociais.

1.4

Em segundo lugar, o CESE propõe desenvolver uma governança «mais cidadã» da União, o que implica:

corrigir o défice de sensibilização para a questão europeia na comunicação social e encorajar melhores práticas, contando com o apoio de uma agência europeia do audiovisual,

revalorizar a fase consultiva da preparação de projectos, assegurando melhor o valor acrescentado que estes deverão representar para os cidadãos,

identificar e justificar publicamente as razões dos bloqueios de projectos em matéria de direitos «europeus» dos cidadãos a nível do Conselho, ou do seu abandono pela Comissão,

promover abordagens socioprofissionais de auto-regulação e de co-regulação em todos os domínios que dizem directamente respeito à sociedade civil,

criar juntamente com as diferentes organizações de apoio ao mercado único um modelo de serviço público europeu que inclua, a longo prazo, a constituição de alfândegas externas comuns à Comunidade e da competência dela,

desenvolver modos mais interactivos de informar os cidadãos sobre a Europa,

implicar os meios socioprofissionais nas intervenções dos fundos estruturais no terreno.

1.5

Por último, o CESE propõe promover iniciativas comuns com uma forte vertente de valorização da identidade europeia, nomeadamente:

dar mais prioridade ao financiamento, pelo orçamento comunitário, de grandes projectos europeus particularmente significativos (redes transeuropeias, investigação, alta tecnologia),

investir em ambiciosos programas europeus de educação e formação — inclusivamente linguística –, compreendendo um serviço cívico voluntário europeu atractivo para os jovens,

convidar pessoas de relevo a produzirem testemunhos sobre a sua reivindicada identidade de europeus,

investir em igualmente ambiciosos programas europeus nos planos cultural e mediático, prevendo um mesmo estatuto para as fundações e o mecenato,

envidar esforços particulares de integração económica e social à escala da zona euro,

adoptar decisões de grande significado político, como, por exemplo, a de consagrar um mesmo dia às eleições para o Parlamento Europeu, a de tornar o 9 de Maio feriado europeu, ou a de prever o «direito europeu de iniciativa popular».

1.6

O CESE está convencido de que, na sua globalidade, estas iniciativas permitirão aos europeus sentir mais profundamente a sua cidadania europeia, exercer mais eficazmente as liberdades que ela garante, e insuflar assim na Europa um novo fôlego de identidade, de dinamismo, de competitividade e de coesão que os Estados não estão a ser são capazes de lhe proporcionar.

1.7

Para contribuir para a consecução deste objectivo, o CESE deverá criar um grupo permanente especializado em «cidadania europeia activa» e organizar proximamente um simpósio sobre o tema.

2.   Introdução

2.1

Apesar da pesada atmosfera de eurocepticismo que paira sobre a Europa, os europeus estão profundamente ligados às conquistas fundamentais da construção europeia, que lhes parecem tão naturais quanto irreversíveis, a saber:

a paz e a cooperação entre os Estados-Membros,

o pleno exercício dos seus direitos democráticos,

as liberdades de circulação e de comércio,

a vontade de se unirem face aos desafios mundiais.

2.2

Por outro lado, os europeus permanecem exigentes em relação à construção europeia, dela esperando verdadeiras mais-valias, consistindo em especial:

numa valorização dos seus direitos políticos, cívicos, participativos, económicos e sociais,

num apoio reforçado à sua identidade e à sua qualidade de vida, mediante mudanças profundas,

em mais crescimento, emprego e desenvolvimento económico e social,

numa promoção mais eficaz dos seus interesses comuns no mundo.

2.3

Para muitos europeus, estas expectativas estão actualmente longe de se realizarem, tanto no que toca às suas preocupações quotidianas como relativamente ao futuro. O duplo «não» dos eleitores franceses e neerlandeses ao projecto de Tratado Constitucional foi particularmente sintomático deste mal-estar e das interrogações da opinião pública, muito embora motivos alheios à questão europeia também tenham, sem dúvida, influenciado este resultado.

2.4

E, no entanto, verdadeiros progressos em matéria dos direitos de cidadania europeia, iniciados com o Tratado de Maastricht, já se encontravam consagrados nos tratados mais recentes (Amsterdão e Nice), bem como na Carta dos Direitos Fundamentais e no Tratado Constitucional (que, ao integrar esta Carta, lhe dava força jurídica) submetidos aos seus sufrágios. A Convenção preparatória do Tratado Constitucional, que constituiu uma verdadeira inovação por incluir parlamentares e por se abrir à sociedade civil, tinha-se empenhado em consolidar esses direitos nos planos político, cívico, económico e social. O próprio Comité Económico e Social Europeu não só participou na Convenção, como se empenhou ao longo dos últimos anos em defender o pleno reconhecimento dos direitos dos cidadãos europeus e a tomada em conta das suas preocupações. Importa, porém, admitir que a inscrição formal desses direitos nos tratados não foi de modo algum suficiente para travar o aumento do eurocepticismo na opinião pública. Nem mesmo a citação de Jean Monnet «não coligamos Estados, unimos pessoas» é sentida actualmente como a realidade dominante no funcionamento da União.

2.5

Existe assim actualmente o risco de uma recrudescência dessas preocupações da opinião pública, e isso por uma série de razões, a saber:

2.5.1

a não ratificação do Tratado Constitucional irá submeter o funcionamento da União alargada a uma dura prova: os entraves e as complexidades do Tratado de Nice, que se esperava que o novo tratado corrigisse, irão rapidamente manifestar os seus efeitos negativos;

2.5.2

o aumento do desfasamento entre as ambições proclamadas para a Europa e a debilidade dos seus meios de gestão, quer políticos (dificuldade em decidir a 27) quer orçamentais (modéstia dos recursos financeiros programados para 2007-2013);

2.5.3

os novos direitos dos cidadãos europeus inscritos no Tratado Constitucional, que integra a Carta dos Direitos Fundamentais, não poderão ser oficializados;

2.5.4

este contexto pouco favorável ameaça impedir uma melhoria da situação e remeter a Europa para o péssimo papel de «bode expiatório», que, de resto, muitos dos seus cidadãos já lhe atribuem.

2.6

Como o CESE sublinhou claramente no seu contributo para a cimeira do Conselho europeu de 15 e 16 de Junho de 2006 (1), a pausa de reflexão acordada na sequência do bloqueio do Tratado Constitucional não devia constituir pretexto para esperar passivamente que os cidadãos resolvam dedicar-se mais à causa europeia. Afigura-se, pelo contrário, urgente reforçar a imagem da Europa junto da opinião pública, sob pena de entrar numa espiral de desconfianças, renúncias e bloqueios, cujas repercussões seriam incalculáveis. Seria, aliás, totalmente ilusório pretender remediar de qualquer forma o actual malogro da ratificação do Tratado Constitucional sem procurar primeiro suscitar nos europeus um sentimento mais forte de apropriação da Europa. Isto implica, antes de mais, analisar em que aspectos e por que razões a Europa carece actualmente de visibilidade e de atractivos para tantos europeus.

3.   Uma cidadania europeia muito pouco sentida

3.1

A «cidadania» é sentida, de forma intuitiva e até emocional, antes mesmo de se desdobrar em direitos e deveres. A cidadania «europeia» devia ser sentida como uma mais-valia, isto é, enriquecendo a cidadania nacional sem a abafar, e como uma «nova fronteira», isto é, dando acesso a mais direitos, liberdades e responsabilidades. Ora, em todas estas áreas, e apesar dos progressos reais alcançados no intercâmbio entre as nações, a cidadania europeia não está nem de longe comprovada. Chega mesmo a ter-se a impressão que se fez quase tudo para a desencorajar, o que se pode comprovar através algumas simples constatações. Para todos os europeus e, antes de mais, para «o europeu comum», a Europa apresenta quatro défices evidentes, a saber:

3.1.1

um défice de visibilidade e de percepção: os objectivos e os contornos da construção europeia, também no sentido geopolítico («que fronteiras traçar?»), são actualmente confusos, o que se deve tanto a divergências políticas sobre o próprio objectivo da integração como a uma falta de critérios claros na prossecução do processo de alargamento, que parece permanente;

3.1.2

um défice de apropriação e de proximidade: apesar das liberdades e dos direitos adquiridos, a Europa afigura-se aos olhos dos cidadãos como um projecto que é principalmente da competência dos meios políticos, diplomáticos e especializados e que só conta com um envolvimento secundário e muito limitado dos cidadãos. As próprias administrações nacionais e locais não estão isentas deste sentimento de «externalidade» da Europa, ainda frequentemente sentida como uma realidade alheia, estrangeira à sua;

3.1.3

um défice de informação e de diálogo: os europeus conhecem mal os seus direitos, as suas liberdades e as condições de funcionamento do seu mercado comum. As próprias questões que se colocam sobre a Europa são amiúde mal compreendidas, mal recepcionadas e mal respondidas. Quanto aos governos, tendem a apresentar-lhes da realidade europeia o que lhes convém e a denunciar ou dissimular o que os incomoda, chegando mesmo a brincar perigosamente com a credibilidade da Europa. As grandes cadeias de comunicação social (rádio, televisão), essencialmente nacionais, dão claramente a impressão de estarem pouco familiarizadas com estas questões, que, por falta de formação específica, os próprios jornalistas consideram complicadas. Não difundem informação nesta área, salvo pontualmente, e mesmo essa é frequentemente sumária e inexacta, mas também é verdade que a ausência de uma opinião pública «europeia», que vá além da árdua soma das opiniões públicas nacionais, não favorece o desenvolvimento de órgãos de comunicação intrinsecamente «europeus» e vice-versa;

3.1.4

um défice de eficácia económica e social: perante a globalização, a Europa não é sentida por muitos nem como motor eficiente (devido aos fracos resultados em crescimento e emprego), nem como escudo eficaz contra a intensificação das concorrências externas (consideradas excessivas e até mesmo desleais) e das deslocalizações (que geram também elas um recrudescer das tensões perante o inédito agravamento das diferenças dos custos de produção na União alargada).

3.2

Os europeus que, graças a contactos, à profissão ou a deslocações, estão mais familiarizados com o funcionamento da Europa não só sentem da mesma forma os quatro défices acima mencionados, como apontam ainda outros, igualmente perceptíveis:

3.2.1

um défice de coesão, que se agravou inevitavelmente com os alargamentos: as disparidades administrativas, culturais e sociais acentuaram-se bastante e os desfasamentos entre níveis de desenvolvimento chegaram a triplicar. A isso acrescem as disparidades de integração económica e monetária, com uma zona euro que ainda se limita a 12 membros;

3.2.2

um défice de concretização no funcionamento do mercado único, onde persistem fortes compartimentações nos domínios dos serviços (2/3 do PIB), dos contratos públicos (16 % do PIB) e da fiscalidade, bem como na livre circulação dos nacionais dos novos Estados-Membros, ainda sujeita a restrições transitórias, o que permite afirmar que, no melhor dos casos, o mercado único não está a funcionar nem «a meio vapor»;

3.2.3

um défice de simplificação, que é evidente para todos os cidadãos europeus, enquanto utentes das regulamentações: as directivas e outras disposições comunitárias que deviam simplificar-lhes a vida sobrepõem-se demasiadas vezes às regras nacionais, que já de si proliferam;

3.2.4

um défice de meios, acompanhado de um défice de interesse geral na Europa e de robustez do domínio público europeu, é igualmente nítido para todos os observadores: no plano financeiro, o orçamento comunitário, reduzido a cerca de 1 % do PIB (contra 20 % nos Estados Unidos, num contexto efectivamente muito diferente), e tendo sido objecto, na sua programação para 2007-2013, de negociações tão laboriosas quanto conflituosas, não se revela à altura do vasto leque de competências afectadas à Europa. No plano institucional, as decisões são geralmente difíceis devido à multiplicidade dos parceiros implicados, bem como, em muitos dos casos, à persistência de exigências ou de práticas que requerem a unanimidade dos Estados-Membros;

3.2.5

um défice de infra-estruturas transnacionais (transportes, energia, telecomunicações), associado a um défice de meios orçamentais: o acordo de Dezembro de 2005 no Conselho Europeu reduziu a metade (já só 2 % do orçamento, em vez dos quase 4 % precedentes) o montante total proposto pela Comissão para o período 2007-2013, ainda que negociações posteriores com o Parlamento Europeu tenham permitido temperar um pouco estas restrições;

3.2.6

um défice de disciplina comunitária por parte de muitos Estados-Membros, também claramente patente nos relatórios da Comissão (transposição das directivas, processos de infracção ao direito comunitário);

3.2.7

e finalmente, um défice de comunicação e de aplicação da Estratégia de Lisboa completa a lista: assim, em vez gerar um aumento dos investimentos europeus na investigação, na inovação, nas redes comuns de infra-estruturas e na formação, esta estratégia permaneceu na realidade bem aquém da mobilização necessária e dos objectivos visados (particularmente sintomática disso foi a programação orçamental para 2007-2013, que se revelou fortemente restritiva em todos estes domínios).

3.3

Nesta gama, globalmente impressionante, de défices apontados ao funcionamento da Europa, destaca-se enfim, muito logicamente, para muitos cidadãos europeus, um outro sentimento: um défice de confiança. Para corrigir esta situação, será necessário atacar com determinação o conjunto dos disfuncionamentos constatados. E para isso já não tem cabimento insistir em emendar sucessivamente a lista de direitos europeus, que é tão notável quanto é mal conhecida e mal aplicada. O que importa neste momento é clarificar e simplificar a abordagem da Europa pelos europeus, dando-lhes acesso a uma cidadania comum mais visível e efectiva.

3.4

Mas não será sequer possível alcançar os primeiros progressos significativos se esta abordagem não obtiver mais apoio por parte dos principais actores da Europa. E isso requererá:

3.4.1

um empenho militante e revigorado (isto é, mais audacioso e até mais intransigente) da Comissão Europeia nestas exigências, nomeadamente através do seu poder de iniciativa e dos seus métodos de consulta;

3.4.2

um melhor funcionamento das instituições europeias, através do seu verdadeiro empenho em prestar um serviço aos cidadãos (que poderia revestir a forma de um código de conduta para uma melhor governança) e da sua predisposição para confiar aos europeus mais responsabilidades nas matérias que lhes dizem directamente respeito;

3.4.3

uma linguagem mais valorizante para a Europa por parte dos dirigentes políticos, deixando de fornecer uma visão inutilmente sacrificial ou abusivamente tecnocrática da Europa e de reservar para si o bom papel — o que exigiria também uma atitude mais pedagógica por parte da comunicação social;

3.4.4

uma atitude simultaneamente responsável por parte dos dirigentes, que passa por aceitar investir na Europa que em conjunto constróem, meios mínimos (em matéria de decisões, orçamentos e disciplina) que estejam finalmente à altura das expectativas nela oficialmente depositadas;

3.4.5

o reforço da cooperação entre os Estados dispostos a avançar em conjunto — em condições que não questionem o primado do método comunitário — para encontrarem saídas quando a exigência de unanimidade coloca obstáculos intransponíveis aos progressos considerados essenciais pelos europeus;

3.4.6

mais pressão e iniciativas por parte dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil: com efeito, sem o seu contributo activo e constante, seria ilusório conceber o desenvolvimento de uma cidadania europeia visível e efectiva.

3.5

Como o CESE salientou no seu parecer sobre o «Programa de acçãoCidadania activa» (2), o programa «Cidadãos pela Europa» (2007-2013), apresentado pela Comissão, foi penalizado à partida pela excessiva modéstia do seu campo de intervenção e do seu orçamento (inicialmente no valor de 235 milhões de euros, mas reduzido depois para 190, passando assim a corresponder a menos de 1/2 euro por habitante para este período). Apesar das louváveis intenções, este programa não terá hipótese de alcançar o seu objectivo de garantir aos cidadãos «um lugar central» no processo de construção europeia, devendo estes contentar-se, no melhor dos casos, com um papel de acompanhamento do dito processo.

3.6

Por tudo isto, a prioridade actual deve consistir menos em redigir novas declarações de direitos ou em conceder pontualmente um ou outro subsídio do que em iniciar acções concretas que permitam a esta cidadania europeia concretizar-se plenamente. Para progredir nessa via, o Comité Económico e Social Europeu propõe desenvolver novas iniciativas em três domínios:

colmatar as lacunas europeias particularmente injustificadas,

desenvolver uma governança «mais cidadã» da União

e promover iniciativas comuns com uma forte vertente de valorização da identidade.

4.   Colmatar as lacunas europeias particularmente injustificadas

4.1

Os cidadãos europeus têm toda a razão de estranhar a ausência de instrumentos e liberdades comuns em domínios importantes, as quais deviam, pelo contrário, ilustrar a sua pertença à União. Trata-se nomeadamente de todas as lacunas particularmente injustificadas em matéria de um estatuto europeu para as associações, para as sociedades mútuas e para as pequenas empresas, de uma patente comunitária única ou de uma protecção fiscal comum contra a dupla tributação, bem como ainda de prestações sociais e de regimes de pensões. Estas diversas lacunas são desenvolvidas nos pontos que se seguem.

4.2

É realmente paradoxal que, meio século após a criação do mercado comum, os milhares de associações constituídas para defender os interesses europeus dos seus membros não disponham de um estatuto jurídico de direito europeu e sejam obrigadas a optar pelo direito nacional do local de implantação, que, na maioria dos casos, é o belga.

4.2.1

O projecto que propunha um estatuto europeu foi retirado pela Comissão em Outubro de 2005, juntamente com outros sessenta, igualmente abandonados por razões de simplificação da regulamentação ou de ausência de perspectivas de adopção, conforme invocado. Ao retirar este projecto de estatuto sem consultar dos meios em questão, a Comissão «deitou fora a criança com a água do banho».

4.2.2

Um primeiro gesto para reforçar a cidadania europeia seria a Comissão pedir formalmente desculpas e apresentar novamente esse projecto. Como é evidente, o Parlamento e o Conselho deveriam comprometer-se a aprová-lo rapidamente, após se terem explicado, ou mesmo justificado, quanto às razões do bloqueio ocorrido.

4.3

A mesma abordagem deve ser seguida relativamente ao estatuto europeu das sociedades mútuas, cujo projecto também foi abusivamente retirado pela Comissão Europeia, apesar de esse estatuto ser susceptível de contribuir para promover novas iniciativas europeias e confirmar o reconhecimento do pluralismo da actividade empresarial na Europa.

4.4

Outro paradoxo é a ausência de um estatuto jurídico europeu unificado e simplificado para facilitar a vida às pequenas e médias empresas, enquanto se vão acumulando programas plurianuais e declarações (inclusivamente uma Carta das PME) que não significam mudanças grandemente perceptíveis para os empresários.

4.4.1

Em 2002, o Comité apresentou por unanimidade recomendações precisas sobre esse estatuto (3), às quais, não se seguiu, porém, até à data, qualquer proposta da Comissão. Enquanto se sucedem os comunicados oficiais, apelando a uma Europa mais empreendedora e mais competitiva, esta situação torna-se, a cada dia que passa, mais injustificável.

4.4.2

O Comité reitera, por conseguinte, o seu pedido à Comissão para ela apresentar o mais brevemente possível um projecto de regulamento para o referido estatuto.

4.5

Um malogro particularmente emblemático é o da patente comunitária, por falta de ratificação por todos os Estados-Membros desde a sua assinatura, em 1975.

4.5.1

Os repetidos apelos do Conselho Europeu aos Estados-Membros — ou seja, a si mesmo — para encontrarem finalmente uma solução foram em vão. Assim, os inventores europeus continuam sujeitos a um sistema complexo e dispendioso para conseguirem proteger os seus direitos a uma escala satisfatória. Para uma União Europeia que se fixou como objectivo tornar-se, até 2010, a economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, este impasse demonstra uma impotência deplorável.

4.5.2

Se um acordo unânime continuar a revelar-se inacessível, o Comité sugere que esta patente comunitária passe a vigorar desde já, segundo modalidades eficazes, simples e competitivas, entre os Estados-Membros que a ratificaram.

4.6

A eliminação da dupla tributação entre Estados-Membros continua a ser gerida por um emaranhamento, tão complexo quanto incompleto, de centenas de convenções bilaterais entre Estados, deixando os cidadãos sujeitos à discrição das administrações fiscais, elas próprias muitas vezes bastante mal informadas sobres as disposições aplicáveis.

4.6.1

O projecto de um regulamento único e simplificado apresentado pela Comissão para resolução do problema não se concretizou por falta do acordo unânime dos Estados.

4.6.2

Um progresso útil seria essas disposições serem aprovadas e aplicadas quanto antes pelos Estados-Membros em condições de o fazer, mas o mais lógico seria os Estados pertencentes à zona euro acordarem simplesmente adoptar o dito regulamento.

4.6.3

O CESE sublinha igualmente a necessidade de assegurar uma verdadeira transferibilidade das prestações sociais, sem discriminação fiscal, no quadro da mobilidade intracomunitária. O CESE recorda em especial o seu recente parecer sobre a «Transferibilidade dos direitos à pensão complementar» (4), no qual apela a uma harmonização fiscal dos regimes complementares, que não figura, aliás, no projecto de directiva: a disparidade entre os tratamentos fiscais aplicados nos Estados-Membros representa, com efeito, um sério obstáculo à mobilidade, na medida em que os trabalhadores se podem ver sujeitos à dupla tributação das suas contribuições e prestações.

5.   Desenvolver uma governança «mais cidadã» da União

5.1

A construção europeia continua demasiadas vezes a ser vista como uma questão da responsabilidade dos Estados, em relação à qual os cidadãos se contentam comodamente com um papel secundário. Para corrigir esta situação, seria preciso que a União funcionasse mais claramente ao serviço dos cidadãos, o que passaria por promover uma abordagem «mais europeia» da comunicação social, por avaliar melhor o impacto dos projectos legislativos nos cidadãos, por utilizar melhor os procedimentos de diálogo e consulta, por justificar bloqueios e retiradas de propostas legislativas, por defender melhor as abordagens de auto-regulação e co-regulação, por incentivar o desenvolvimento de negociações colectivas transfronteiriças entre os parceiros sociais, por aplicar um modelo de serviço público que apoie o mercado único com fronteiras externas comunitárias, por desenvolver uma informação mais interactiva sobre a causa europeia e por associar os parceiros sociais e outras componentes representativas da sociedade civil à execução no terreno dos programas que beneficiam de ajudas comunitárias. Estes requisitos são desenvolvidos nos pontos que se seguem.

5.2

Uma vez que os meios de comunicação social são actualmente assimilados a um «quarto poder», que se vem juntar ao legislativo, ao executivo e ao judiciário, é impressionante constatar que, ao invés dos três outros, este poder não apresente qualquer marca da dimensão europeia, embora se trate do mais visível e familiar para os cidadãos. Não existem grandes cadeias de rádio e de televisão de dimensão e perfil europeus, e o próprio objectivo do multilinguismo permanece o «parente pobre» da comunicação social. A comunicação social dedica-se comparativamente muito pouco a debates e programas políticos de cariz europeu. À excepção de acontecimentos episódicos, como as cimeiras, as crises e novas adesões, a vida das instituições europeias não é comentada e permanece confidencial. A título de exemplo, um inquérito recente do Eurobarómetro indica que apenas 30 % das pessoas que declararam interessar-se pelos assuntos europeus (o que equivale, portanto, a uma percentagem bem mais baixa da globalidade dos cidadãos) seriam capazes de responder correctamente a três perguntas básicas sobre a Europa (número de Estados-Membros, eleição ou designação dos deputados europeus, representação ou não de todas as nacionalidades na Comissão). Conviria assim tomar medidas para contrariar esta desinformação crónica, como sejam:

5.2.1

criar entre os órgãos nacionais da comunicação social uma certa «rivalidade» em matéria de questões europeias, incitando-os a consagrar mais espaço noticioso à informação sobre a vida política da União,

5.2.2

promover e coordenar essas iniciativas junto dos órgãos da comunicação social, contando eventualmente com o apoio de uma futura agência europeia do audiovisual, que cooperaria com possíveis órgãos similares existentes nos Estados-Membros.

5.3

Quanto ao funcionamento das instituições europeias, os últimos tratados interessaram-se mais pelos processos de co-decisão (tendo atribuído — a justo título — poderes acrescidos ao Parlamento Europeu) do que pelas modalidades de consulta, que teriam, todavia, merecido grandes melhorias.

5.3.1

Na prática, e em especial na sequência do Livro Branco da Comissão, apresentado em 2002, sobre uma melhor governança europeia, já se registaram alguns progressos reais: mais amplo recurso aos Livros Verdes, consultas públicas na Internet (ainda que de envergaduras operacionais desiguais), pedidos de pareceres exploratórios ao CESE a montante da preparação de legislação.

5.3.2

Entre os progressos ainda a realizar, cite-se um recurso mais sistemático às análises prévias do impacto dos projectos da Comissão, as quais deveriam interrogar-se em especial sobre o valor acrescentado e a verdadeira simplificação que o projecto representa para cidadãos e utentes, ou ainda sobre a viabilidade de abordagens alternativas à regulamentação clássica, e que deveriam acompanhar sempre o projecto. De notar em especial que não será possível assegurar uma verdadeira simplificação da regulamentação sem implicar a montante uma associação de representantes dos utentes e sem programas paralelos de simplificação a nível nacional.

5.3.3

Conviria também velar por melhorar a qualidade das consultas: a Comissão deveria nomeadamente expor o seguimento dado aos debates e explicar as razões da prevalência de certas opções e argumentações sobre as demais. A fase de consulta deveria, em qualquer dos casos, manter-se bem distinta da fase de decisão ou de co-decisão, o que muitas vezes não se verifica. Excepto no caso, acima mencionado, dos pareceres exploratórios, o Comité Económico e Social Europeu é muitas vezes prejudicado na eficácia dos seus pareceres pela consulta paralela e concomitante dos órgãos decisórios.

5.3.4

O Conselho Europeu de Março de 2006 solicitou, com toda a pertinência, que os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil directamente afectados pela Estratégia de Lisboa, obtenham um maior controlo do processo. O Comité Económico e Social Europeu congratula-se, por outro lado, por o Conselho Europeu lhe ter renovado o mandato de contribuir, com o Comité das Regiões, para a avaliação e promoção da aplicação desta estratégia. As redes de intercâmbio que o CESE desenvolveu para este fim com os Conselhos económicos e sociais ou com órgãos representativos similares dos Estados-Membros contribuem de forma útil para a almejada governança «mais cidadã» da União.

5.3.5

No plano nacional, importaria que os governos e os parlamentos consultassem sistematicamente os parceiros sociais antes dos Conselhos europeus do Outono e da Primavera, a fim de os implicarem na actualização das grandes orientações da política económica e nas orientações para o emprego, bem como na aplicação da Estratégia de Lisboa. Os relatórios nacionais dos Estados-Membros deveriam apoiar-se explicitamente nestas consultas.

5.4

Não basta que as instituições europeias se sintam responsáveis pela consulta adequada dos cidadãos e das organizações que os representam antes da adopção de projectos ou orientações que a estes dizem respeito, devendo também prevê-la em caso de bloqueio persistente ou de retracção de um projecto legislativo, de forma a permitirem:

conhecer as razões, os argumentações e as responsabilidades precisas de qualquer bloqueio a nível do Conselho ou do abandono de um projecto legislativo pela Comissão;

recolher as opiniões dos representantes da sociedade civil sobre as perspectivas de uma abordagem alternativa, a fim de evitar as consequências mais negativas desse bloqueio ou dessa retractação.

5.5

Um grande passo no sentido de uma cidadania europeia visível e efectiva consistiria ainda em promover mais as abordagens de co-regulação e auto-regulação, através das quais os meios socioprofissionais são, não apenas consultados, mas realmente implicados na definição das regras económicas ou sociais que a eles se aplicam directamente.

5.5.1

Foi preciso esperar pela assinatura do Tratado de Maastricht, em 1992, para que a capacidade contratual dos parceiros sociais europeus fosse reconhecida oficialmente no quadro de um diálogo autónomo, tanto no plano interprofissional como sectorial. E foi precisa uma década depois disso para que um acordo interinstitucional europeu, celebrado em Dezembro de 2003 entre o Parlamento, o Conselho e a Comissão, reconhecesse pleno direito de cidade às práticas de auto-regulação e co-regulação dos actores da sociedade civil noutros domínios e fixasse as respectivas definições e modalidades.

5.5.2

Estas práticas já se desenvolveram de forma significativa, e, para além do diálogo social, interessam e convêm também a outros domínios, como sejam normas técnicas, regras profissionais, serviços, consumidores, economia de energia e ambiente (5). Contudo, estão ainda longe de adquirir o grau de desenvolvimento que merecem, embora já incidam, de uma maneira ou de outra, sobre todos os cidadãos europeus.

5.5.3

Para apoiar ao máximo o exercício da cidadania europeia nas regiões limítrofes, seria especialmente útil promover o desenvolvimento de negociações colectivas transfronteiriças, como previsto pela Comissão na sua comunicação de 2005 sobre a agenda social.

5.5.4

O desenvolvimento da auto-regulação e da co-regulação deveria permitir, em complemento da acção do legislador e, caso necessário, sob o seu controlo, fazer avançar a Europa e os direitos de cidadania dos europeus numa série de domínios, como, por exemplo:

em múltiplos aspectos das relações laborais, designadamente: emprego, condições de trabalho, formação profissional de base e contínua, participação e protecção social,

na realização de um verdadeiro mercado europeu de serviços,

no reforço dos direitos dos consumidores no mercado único

e na melhoria do ambiente.

5.5.5

Pela sua parte, o CESE adoptou uma abordagem sistemática de recenseamento e de incentivo das práticas alternativas de regulação e de resolução de litígios, nomeadamente através de audições e da sua base de dados PRISM2, actualmente modernizada, que constitui a principal referência sobre o estado da auto-regulação na Europa.

5.6

Tanto a regulamentação europeia clássica (directivas, regulamentos) como a co-regulação e a auto-regulação deviam contribuir para desenvolver o mercado único e melhorar o seu funcionamento. Os cidadãos europeus deviam poder apropriar-se desse mercado único enquanto dimensão natural das suas iniciativas e actividades.

5.6.1

Constituindo um quadro natural de rivalidade e concorrência para os agentes económicos, o mercado único não devia ser colocado em oposição frontal e sistemática com os modelos de serviço público e de interesse geral, que também merecem ser valorizados a nível europeu. Assim, as várias agências europeias criadas em diversos Estados-Membros para contribuírem para diferentes aspectos do funcionamento do mercado único deviam assumir verdadeiras «missões europeias de serviço público» no exercício das respectivas funções. Orientações como esta poderão revelar-se úteis no debate sobre a abertura europeia dos serviços públicos, pois contribuirão para superar a redutora oposição entre aqueles que só concebem o serviço público como estatal e aqueles que assimilam forçosamente a abertura europeia a uma proliferação de privatizações.

5.6.2

No mesmo espírito, as fronteiras externas da União ganhariam em ser geridas a mais longo prazo por uma administração comunitária das alfândegas, com idêntico símbolo visual, em vez de confiadas às administrações nacionais. Um primeiro passo seria criar, em conjunto com uma agência europeia de protecção das fronteiras externas, um corpo de inspectores e de guardas de fronteira europeus, assegurando a todos os alfandegários um tronco de formação comum e desenvolvendo os intercâmbios entre eles, os quais são ainda demasiado ocasionais. Seria igualmente necessário velar por uma harmonização das incriminações e das sanções, bem como pelo reconhecimento recíproco, entre Estados-Membros, e inerente execução, das decisões das suas jurisdições judiciais e administrativas.

5.6.3

A Europa deveria ainda dotar-se de um dispositivo comum, móvel e eficiente, de protecção civil, apto a assistir rápida e eficazmente os Estados-Membros e as suas populações em caso de catástrofes naturais ou de actos de terrorismo.

5.6.4

No que respeita à informação dos cidadãos sobre os seus direitos e oportunidades no mercado único, conviria desenvolver a divulgação, ainda praticamente inexistente, dos Centros Solvit e de outros pontos de informação sobre a Europa, os quais foram criados em todos os Estados-Membros para ajudar os cidadãos a resolver problemas que ainda poderão encontrar nas suas trocas comerciais. As próprias agências europeias atrás referidas não se deram praticamente a conhecer ao público desde a sua criação, o que seria solucionável com a organização de campanhas de divulgação.

5.6.5

A informação sobre o funcionamento da Europa e do mercado único, bem como sobre os direitos e liberdades dos cidadãos a esta escala, deveria também adaptar-se às expectativas e à linguagem dos interlocutores. Ora, para comunicar, é muitas vezes necessário partir das questões e aspirações desses interlocutores, sobretudo se estes forem jovens, em vez de lhes fornecer respostas feitas «ex cátedra». O desenvolvimento desses pontos de contacto e de informação sobre a Europa devia ir a par da aquisição de uma verdadeira capacidade de integrar plenamente a linguagem, a abordagem e os pontos de vista dos interlocutores, através de um diálogo interactivo que permitisse uma apropriação da informação sobre a Europa em função das características de cada um. A utilização da Internet integra-se bem neste «caderno de encargos» e devia ser plenamente explorada tanto pelas instituições europeias como pelas associações da sociedade civil, em proveito da concretização efectiva da cidadania europeia.

5.7

Muito falta, porém, fazer para inteirar os cidadãos europeus das intervenções dos fundos estruturais. Enquanto as disposições que regem a ajuda comunitária aos países ACP da África, Caraíbas e Pacífico prescrevem expressamente uma forte implicação da sociedade civil (cf. Acordo de Cotonu), nada de semelhante existe, por mais paradoxal que pareça, sobre a participação da sociedade civil europeia na política de coesão da União.

5.7.1

As orientações estratégicas propostas pela Comissão para 2007-2013 fazem apenas uma referência informal a essa implicação, sem preverem qualquer disposição explícita sobre ela nos textos propostos, quer se trate das orientações ou dos regulamentos dos fundos estruturais.

5.7.2

Conviria corrigir isso e conseguir que estes textos estipulem claramente a dita consulta/implicação, prevendo simultaneamente disposições a aplicar directamente pelas instituições comunitárias e pelos Estados-Membros.

6.   Promover iniciativas comuns com uma forte vertente de valorização da identidade

6.1

Os cidadãos europeus, que esperam da Europa um valor acrescentado à sua identidade nacional, regional e local, constatam frequentemente que esta valorização se revela modesta, se não mesmo superficial. São inegáveis os progressos significativos e de crescente importância que, pouco a pouco, têm sido decididos pelos governantes da Europa: hino e bandeira europeus, passaporte europeu, assistência mútua das embaixadas, e obviamente, a moeda única, que reúne já doze Estados-Membros.

6.1.1

Mas estes progressos só se registaram lentamente e coexistem ainda com grandes atrasos em matéria de identidade comum em domínios muitas vezes vizinhos. Para resolver este problema, seria necessário desdobrar o leque de possibilidades do princípio da subsidiariedade, não o empregando necessariamente sempre no sentido descendente, mas sim no sentido que mais se adapte a cada caso concreto e que, em muitos dos casos, pode perfeitamente significar a necessidade da intervenção do nível europeu.

6.1.2

Neste espírito, importaria promover iniciativas com uma forte vertente de valorização da identidade, como, por exemplo: dar prioridade ao financiamento de grandes projectos europeus, investir em programas europeus ambiciosos de educação e formação, incluindo um serviço civil voluntário europeu para os jovens, convidar pessoas de relevo a produzirem testemunhos sobre a sua reivindicada identidade de europeus, apostar em programas europeus igualmente ambiciosos nos planos cultural e mediático, prevendo igual estatuto para as fundações e o mecenato, e ainda envidar esforços particulares de integração económica e social à escala da zona euro. Também seria preciso adoptar decisões de grande significado político, como concentrar num só dia as eleições para o Parlamento Europeu, oficializar com pompa e circunstância o «dia da Europa» ou colocar desde já em vigor o «direito europeu de iniciativa popular». Estas recomendações são desenvolvidas nos pontos que se seguem.

6.2

A modéstia de recursos do orçamento europeu devia ser razão suplementar para consagrar uma quota-parte mais significativa ao financiamento de projectos autenticamente europeus.

6.2.1

Tais financiamentos deveriam beneficiar em especial as regiões fronteiriças, que constituem os «pontos de soldadura» da Europa e que, mais do que as outras, são afectadas na sua coesão pela insuficiente harmonização entre os Estados-Membros. Aos actores socioprofissionais destas regiões transfronteiriças deveria ser reconhecido um papel central na concepção e na animação dos programas transfronteiriços, para o que havia de programar em seu favor uma percentagem significativa do orçamento comunitário, a qual deveria ser aumentada entre os períodos plurianuais. Conviria em especial aumentar a dotação orçamental do programa EURES e divulgar as suas actividades quer na imprensa quer nas cadeias de rádio e televisão a nível regional.

6.2.2

Esses financiamentos comunitários, apoiados por parcerias eficazes entre os sectores público e privado, deveriam também promover o desenvolvimento das redes transeuropeias (transportes, energia, telecomunicações) ao serviço de uma Europa mais eficiente e «comunicante». Não obstante, a tendência actual é a inversa, como ilustra a decisão do Conselho Europeu, de Dezembro de 2005, de reduzir a metade o pacote orçamental inicialmente proposto pela Comissão para financiamento destas redes durante o período 2007-2013, um corte que um acordo posterior com o Parlamento Europeu veio ainda assim a temperar modestamente.

6.2.3

Conviria igualmente desenvolver maior número de projectos industriais e tecnológicos europeus através do orçamento comunitário ou de contributos especiais dos Estados-Membros que neles desejassem participar. Os êxitos já registados nos domínios da aeronáutica e do espaço mostram o caminho a seguir. Sucessos como estes fortalecem bastante a imagem da Europa junto da opinião pública e, além de reforçarem a competitividade, insuflam nela um sentimento comum de pertença. No sector da defesa e da segurança é porém ainda vasto o campo de cooperação e de integração industrial e tecnológica por explorar.

6.3

Haveria também que lançar ambiciosas iniciativas com vista a reforçar a cidadania europeia através da educação e da formação, inclusivamente sobre a Europa.

6.3.1

Seria necessário garantir uma formação comum sobre a Europa em todos os níveis do ensino: primário, secundário e universitário. A aprendizagem de línguas devia ser fortemente incentivada com base numa referência comum para os níveis de aquisição (generalizando-se assim a iniciativa do Conselho da Europa de criar uma «carteira» europeia de línguas). A abertura à Europa não devia passar tanto por um ensinamento magistral do que por intercâmbios, estágios, estadias, experiências. As geminações e os percursos escolares e universitários europeus deveriam ser prioritariamente favorecidos. As escolas de jornalismo deveriam passar a integrar uma componente substancial de matérias europeias.

6.3.2

Os jovens deveriam poder prestar um serviço civil europeu voluntário, atractivo e formador, a uma escala bem mais vasta do que nas primeiras experiências efectuadas, que, até agora, envolveram apenas uns escassos milhares. Semelhante oportunidade completaria utilmente os programas de intercâmbio de estudantes «Erasmus» et «Leonardo», que já obtiveram grande sucesso, contando vários milhões de beneficiários.

6.3.3

Para promover o sentimento de identificação com a Europa, as celebridades do mundo cultural ou desportivo poderiam, no quadro de campanhas específicas, apresentar-se como autênticos «europeus», valorizando pela sua personalidade esta sensibilidade e esta expressão da identidade.

6.4

No mesmo espírito, dever-se-ia igualmente promover iniciativas ambiciosas para valorizar a cultura europeia e promover a sua difusão nos meios comunicação social.

6.4.1

Conviria, por outro lado, tirar mais partido da riqueza cultural da Europa, para valorizar tanto o seu tronco comum como a diversidade das suas expressões. Seria assim de promover a utilização das versões originais legendadas de filmes e programas de outros Estados-Membros, o que facilitaria também aos europeus o domínio de línguas diferentes da materna.

6.4.2

A União Europeia deveria incentivar a criação de uma escola europeia de cinema e promover, a exemplo dos Óscares, «Estrelas» ou «Luzes» para recompensar os seus melhores criadores e artistas.

6.4.3

O êxito de um programa cultural europeu ambicioso, com múltiplas repercussões económicas e sociais, seria ele próprio grandemente favorecido por uma promoção conjunta por parte de fundações e mecenato. A elaboração de um estatuto europeu atractivo para a actividade da promoção de eventos contribuiria de imediato para intensificar essa cooperação.

6.5

Por último, valeria ainda a pena levar a cabo uma reflexão específica sobre o euro. Tudo se passa actualmente como se os Estados que adoptaram o euro o considerassem mais como um ponto de chegada do que como um ponto de partida. Os cidadãos da zona euro poderiam, oportunamente, reflectir sobre esta atitude.

6.5.1

No plano económico, que esperam, afinal, estes Estados para aprofundarem a sua integração, intensificarem os intercâmbios financeiros e iniciarem uma melhor harmonização fiscal? Por que razão o Eurogrupo, que reúne os doze ministros das Finanças, está ainda tão longe de constituir o embrião de um governo económico da zona euro, quando o Banco Central Europeu já é federal? Por que razão não se encara desde já uma única actuação económica e financeira dos Estados-Membros que adoptaram o euro (FMI, G7, etc.) para o fortalecer, nomeadamente em relação ao dólar? Por que razão os Estados da zona euro não iniciaram já uma estreita cooperação mútua na elaboração dos respectivos orçamentos?

6.5.2

Num momento em que aumentam as exigências de uma aplicação mais efectiva e convergente da Estratégia de Lisboa, por que razão continua o Eurogrupo limitado aos ministros da Economia e das Finanças e não criou ele um equivalente seu com os ministros dos Assuntos Sociais? Na sua formação dupla, que inclui as vertentes económica/financeira e social, e que poderia ainda aliar os ministros da indústria, não poderia o Eurogrupo desenvolver abordagens mais eficazes em matéria de reformas económicas e sociais, dar o exemplo com a promoção da investigação e a aplicação da patente comunitária e, para além dos relatórios nacionais, elaborar um relatório comum sobre a aplicação da Estratégia de Lisboa?

6.5.3

Os cidadãos dos Estados da zona euro deveriam ser consultados e estreitamente implicados nessas escolhas, nomeadamente através das suas associações representativas, bem como incitados a desenvolver iniciativas próprias à escala da zona euro. Desta forma, a zona euro, laboratório de uma integração económica e social intensificada, tornar-se-ia também o laboratório de uma cidadania europeia mais convicta.

6.5.4

É evidente que importaria ter paralelamente o cuidado de não prejudicar a coesão da União na sua globalidade: para tanto, os Estados não pertencentes à zona euro deveriam ser devidamente informados e consultados, bem como incluídos ao máximo nessa cooperação acrescida, que serão em qualquer dos casos chamados a praticar em pleno a partir do momento em que adoptem o euro.

6.6

No plano puramente político, certas medidas contribuiriam finalmente para fazer evoluir a cidadania europeia no sentido da visibilidade e da efectividade, como sejam:

6.6.1

a escolha de um mesmo dia para a eleição, por sufrágio universal, do Parlamento Europeu: a noite eleitoral autenticamente europeia que se lhe seguiria daria uma dimensão completamente diferente às intervenções e aos debates e integraria os desafios políticos na sua verdadeira dimensão europeia, em vez de os limitar, de forma absolutamente abusiva e incorrecta, à mera dimensão nacional, como é grandemente a prática actual;

6.6.2

a oficialização solene do 9 de Maio como «dia da Europa» — que mereceria, de resto, a categoria de feriado à escala europeia, eventualmente em substituição de um feriado existente à escolha dos Estados-Membros –, com manifestações e programas (especialmente culturais) sob o signo da Europa;

6.6.3

a aplicação do «direito europeu de iniciativa popular», em antecipação das disposições previstas no Tratado Constitucional (um milhão de assinaturas recolhidas em vários Estados-Membros). A Comissão Europeia poderia assim empenhar-se doravante em examinar e, eventualmente, apoiar as propostas de iniciativa popular que tivessem atingido esse limiar, comprometendo-se igualmente a expor publicamente as razões precisas de ter decidido não dar seguimento a determinada iniciativa.

7.   Conclusões

7.1

Tudo bem ponderado, e para além das declarações e das cartas, a cidadania europeia não é decretada, mas merecida e exercida. Evolui e é motora. Só afirmando-se poderá consolidar-se. E só desenvolvendo a dimensão participativa «horizontal» da construção europeia poderá assegurar a plena aceitação e a perenidade da dimensão «vertical» dessa construção.

7.2

Esta cidadania europeia activa precisa urgentemente dos instrumentos que tanto lhe têm faltado e que são mais operacionais do que declarativos. Chegou o momento de dotar os europeus desses instrumentos que aguardam e que saberão utilizar da melhor forma. Que ninguém duvide de que conseguirão insuflar na Europa esse novo fôlego de identidade, de dinamismo, de competitividade e de coesão que os Estados não estão actualmente em condições de lhe assegurar.

7.3

No intuito de se certificar do seguimento dado às presentes recomendações e contribuir para promover verdadeiros progressos para os cidadãos europeus, o Comité Económico e Social Europeu decide criar o grupo permanente «cidadania europeia activa», ao qual confia a missão de:

seguir a evolução dos progressos e atrasos neste domínio,

promover o diálogo público com os actores da sociedade civil,

e encorajar e divulgar iniciativas e melhores práticas.

7.4

Para marcar o lançamento deste seguimento e o orientar, o Comité Económico e Social organizará um simpósio sobre a cidadania europeia activa, como previsto no seu parecer, já referido, sobre o «Programa de acção “Cidadania activa”»  (6).

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Parecer do CESE «Contributo para o Conselho Europeu de 15 e 16 de Junho de 2006Período de reflexão» (relator: H. MALOSSE).

(2)  Parecer do CESE, de 26.10.2005, sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que institui para o período 2007-2013 o programa “Cidadãos pela Europa”, destinado a promover a cidadania europeia activa», relator: D. LE SCORNET (JO C 28, de 03.02.2006).

(3)  Parecer do CESE, de 26.4.2002, sobre «O acesso das PME a um estatuto de direito europeu», relator: H. MALOSSE (JO C 125, de 27.05.2002, p. 100).

(4)  Parecer do CESE, de 20.04.2006, sobre a «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao aumento da transferibilidade dos direitos à pensão complementar», relatora: U. ENGELEN-KEFER.

(5)  Cf. relatório de informação adoptado pela Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo em 11.1.2005, sobre «O estado actual da co-regulação e da auto-regulação no mercado único», relator: B. VEVER.

(6)  Parecer do CESE, de 26.10.2005, sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que institui para o período 2007-2013 o programa “Cidadãos pela Europa”, destinado a promover a cidadania europeia activa», relator: D. LE SCORNET (JO C 28, de 03.02.2006).


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/173


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões Roteiro para a igualdade entre homens e mulheres 2006-2010»

COM(2006) 92 final

(2006/C 318/29)

Em 1 de Março de 2006, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, incumbida de preparar os correspondentes trabalhos, adoptou o parecer em 13 de Julho de 2006, sendo relatora Grace ATTARD.

Na 429.a reunião plenária, de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 175 votos a favor, 11 votos contra e 9 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE saúda a vontade política da Comissão de manter no seu programa para o período de 2006 a 2010 a questão da igualdade de género como uma das principais prioridades. Congratula-se com o empenhamento pessoal do Presidente Durão Barroso na adopção deste programa e concorda que é importante envolver todas as partes interessadas na aplicação dessas prioridades.

1.2   O CESE

reconhece a necessidade de estabelecer prioridades comuns na coordenação das políticas de emprego a fim de aumentar a taxa de participação feminina;

considera que os governos nacionais, os organismos nacionais para a igualdade e os parceiros sociais de todos os Estados-Membros têm a obrigação clara de assegurar que os regimes retributivos por eles instituídos não provoquem discriminação salarial entre homens e mulheres;

recomenda que as estratégias respeitantes às mulheres empresárias tenham por objectivo a melhoria do acesso das mulheres aos créditos e aos serviços bancários;

recomenda que os programas nacionais incluam a educação empresarial no ensino secundário e superior, sobretudo entre as alunas, e que sejam tomadas medidas para que mais mulheres se licenciem em matérias científicas e técnicas, de modo a reduzir as disparidades entre homens e mulheres no emprego em áreas técnicas, como a engenharia e os serviços relacionados com as TIC;

propõe que se intensifiquem as estratégias relacionadas com a igualdade de género em matéria de protecção social e de luta contra a pobreza de modo a garantir que a fiscalidade e os sistemas de segurança social respondam às necessidades das mulheres em risco de pobreza, em particular as mães solteiras; considera que deveriam também ser elaboradas propostas políticas concretas destinadas a encorajar o progenitor de família monoparental a desenvolver as qualificações requeridas pelo mercado de trabalho, tornando, assim, mais fácil o seu acesso ao emprego;

entende que as estratégias nacionais no domínio da saúde e dos cuidados de saúde prolongados deveriam incluir políticas integradas que tratem da questão das normas sanitárias para as mulheres no local de trabalho;

apela a que se tenha em conta, investigue e analise mais aprofundadamente o impacto dos pedidos de assistência a familiares e o esgotamento físico e mental que esta situação provoca nas mulheres;

propõe que o método aberto de coordenação seja aplicado ao domínio dos cuidados de saúde e incorpore os objectivos em matéria de igualdade de género;

reconhece o fenómeno da feminização da migração e recomenda que a dimensão de género se integre plenamente na política e nas acções da UE em todas as fases do processo migratório;

reconhece a importância de elaborar medidas, incluindo a definição de objectivos e indicadores precisos, que garantam a prestação de cuidados às crianças, aos idosos dependentes e aos deficientes;

recomenda a introdução de objectivos e prazos para aumentar a participação feminina em todas as modalidades do processo decisório;

recomenda a elaboração de um plano de acção europeu de combate à violência contra as mulheres;

apela aos Estados-Membros para que assegurem a aplicação de medidas que garantam mais direitos e maior apoio às mulheres vítimas de tráfico para fins de exploração sexual;

recomenda que se levem a cabo em toda a Europa acções de sensibilização sobre a tolerância zero em relação a insultos sexistas e imagens degradantes das mulheres nos meios de comunicação social;

considera que os Estados-Membros deveriam garantir que as comunicações audiovisuais comerciais não contenham qualquer discriminação com base na raça, sexo ou nacionalidade, em conformidade com a proposta de directiva da Comissão sobre a coordenação de certas disposições legislativas relativas ao exercício de actividades de radiodifusão televisiva (1);

recomenda a introdução de módulos de formação em matéria de igualdade de género nas instituições de formação na área da comunicação social e a criação de mecanismos destinados a estabelecer o equilíbrio entre ambos os sexos em todos os níveis de decisão nas empresas do sector;

recomenda que, no contexto da política de desenvolvimento da UE, as mulheres tenham acesso adequado à assistência financeira comunitária, nomeadamente através de projectos nacionais a cargo de organizações de mulheres;

insta a que a política da Comissão Europeia em matéria de ajuda humanitária (ECHO) dê prioridade à ajuda e à assistência financeira às mulheres vítimas de violência com base no sexo perpetrada em situações de conflito;

considera que a melhoria da governação no domínio da igualdade de género é crucial para o êxito do roteiro; recomenda o reforço dos mecanismos de diálogo e consulta com a sociedade civil organizada e, em particular, com organizações de mulheres a nível nacional;

preconiza a criação na DG do Orçamento da Comissão de um grupo de trabalho para a integração da perspectiva de igualdade entre homens e mulheres no processo orçamental e a elaboração todos os anos de uma avaliação específica do impacto do orçamento da UE por género.

2.   Justificação

2.1   Síntese da Comunicação da Comissão

2.1.1

A UE regista progressos significativos na realização da igualdade entre homens e mulheres graças à adopção de legislação sobre igualdade de tratamento, da integração da perspectiva de género em todas as políticas e acções, de medidas específicas para a promoção das mulheres, de programas de acção, do diálogo social e do diálogo com a sociedade civil. Não obstante, as desigualdades persistem e podem mesmo vir a agravar-se, pois a concorrência económica global acrescida exige uma força de trabalho mais flexível e móvel. Estas mudanças podem ter repercussões nas mulheres, que se vêem muitas vezes obrigadas a escolher entre a maternidade e uma carreira profissional devido à falta de estruturas flexíveis de organização do trabalho e de serviços de cuidados, à persistência de estereótipos de género e a uma partilha desigual das responsabilidades familiares com os homens.

2.1.2

O roteiro da Comissão define seis áreas de intervenção prioritárias da UE em matéria de igualdade entre homens e mulheres para o período 2006-2010:

independência económica igual para homens e mulheres;

conciliação da vida profissional e familiar;

representação equitativa na tomada de decisões;

erradicação de todas as formas de violência em razão do sexo;

eliminação dos estereótipos de género;

promoção da igualdade entre homens e mulheres nas políticas externa e de desenvolvimento.

Para cada uma das áreas, são identificados objectivos e acções prioritárias. A Comissão, por si só, não pode concretizar estes objectivos, dado que muitas áreas são da competência dos Estados-Membros. Por conseguinte, o roteiro representa o compromisso da Comissão no sentido de avançar com a agenda da igualdade entre homens e mulheres, reforçando a parceria com os Estados-Membros e outros intervenientes.

2.1.3

Para melhorar a governação em matéria de igualdade de género, a Comissão define também um certo número de acções principais e compromete-se a acompanhar de perto a evolução do processo.

2.2   Observações na generalidade

2.2.1

O CESE saúda a vontade política da Comissão de manter no seu programa para o período de 2006 a 2010 a questão da igualdade de género como uma das principais prioridades. Congratula-se com o empenhamento pessoal do Presidente Durão Barroso na adopção deste programa e concorda que é importante envolver todas as partes interessadas na aplicação dessas prioridades.

2.2.2

A igualdade entre homens e mulheres constitui um direito fundamental, um valor comum da UE e dos seus Estados-Membros e uma condição necessária para a concretização dos objectivos comunitários em matéria de crescimento, emprego e coesão social, que são também os principais pilares da Agenda de Lisboa. O CESE apoia a estratégia do roteiro, baseada na abordagem dupla da integração da igualdade de género em todas as políticas e da adopção de acções específicas.

2.2.3

Os progressos realizados pela mulheres, designadamente em áreas cruciais como é o caso da educação e da investigação, não se reflectem plenamente na situação que ocupam no mercado de trabalho. A UE não pode, simplesmente, permitir-se desperdiçar o seu capital humano. Ao mesmo tempo, as alterações demográficas que induzem baixas taxas de natalidade e diminuição da população activa representam desafios que comprometem o papel político e económico da UE.

2.2.4

O CESE saúda o objectivo da Comissão de atacar e pôr fim à violência e ao tráfico de seres humanos em razão do sexo, que constituem obstáculos à realização da igualdade de género e uma violação dos direitos fundamentais das mulheres.

2.2.5

Além disso, o CESE apoia o compromisso da Comissão de dar resposta a estes desafios globais, proteger os direitos fundamentais das mulheres e integrá-los em todas as políticas, acções e programas relevantes da UE em matéria externa.

2.3   Observações na especialidade à Parte I: Áreas de intervenção prioritária em prol da igualdade entre homens e mulheres

2.3.1

Para que a intervenção nas áreas prioritárias estabelecidas no roteiro seja bem sucedida, é necessário desenvolver estratégias integradas e garantir que a igualdade de género seja tratada e incluída de maneira explícita em todas as políticas, ao nível nacional ou comunitário adequado. Importa reforçar os mecanismos e os recursos da UE para assegurar uma verdadeira integração da igualdade de género à escala nacional de harmonia com o Pacto Europeu para a Igualdade entre Homens e Mulheres adoptado no Conselho da Primavera de 2006.

2.3.2

O acompanhamento efectivo do roteiro deve ser feito em cooperação com os Estados-Membros. Embora haja já indicadores que permitem acompanhar a evolução da situação, é importante recolher dados comparáveis a nível comunitário.

2.3.3   Concretizar a igualdade em matéria de independência económica para homens e mulheres

2.3.3.1   Consecução das metas de emprego de Lisboa

2.3.3.1.1

Segundo as metas de emprego definidas em Lisboa, a taxa de emprego das mulheres deve atingir 60 % até 2010. Apesar dos compromissos assumidos pelos Estados-Membros quanto à Estratégia de Lisboa, a Agenda para o Crescimento e o Emprego e a existência de um conjunto de normas comunitárias de carácter vinculativo sobre a igualdade de género no emprego, persistem ainda importantes assimetrias entre homens e mulheres. A taxa de emprego das mulheres é mais baixa (55,7 % contra 70 % para os homens) e é muito inferior (31,7 %) no caso das mulheres mais velhas entre 55 e 64 anos de idade. As mulheres têm também níveis de desemprego mais elevados do que os homens (9,7 % contra 7,8 %). A dimensão de género da estratégia de Lisboa em prol do emprego e do crescimento deve ser reforçada.

2.3.3.1.2

A Comissão insiste no cumprimento da legislação sobre igualdade de tratamento, na utilização eficaz dos novos fundos estruturais e no modo de tornar o trabalho compensador, em particular mediante a individualização dos direitos associados aos sistemas fiscais e de prestações. O CESE acolhe com satisfação a criação de um Instituto Europeu para a Igualdade entre Homens e Mulheres, mas recorda a necessidade de dispor de recursos humanos e financeiros adequados para garantir o seu eficaz funcionamento (2).

2.3.3.1.3

O Comité reconhece a necessidade de estabelecer prioridades comuns na coordenação das políticas de emprego a fim de aumentar a taxa de participação feminina. Na avaliação dos programas nacionais de reforma, a Comissão deve providenciar para que seja dada prioridade à eliminação das desigualdades entre os sexos e sejam adoptadas as medidas necessárias.

2.3.3.1.4

O CESE considera que os governos nacionais, os organismos nacionais para a igualdade e os parceiros sociais de todos os Estados-Membros têm a obrigação clara de assegurar que os regimes retributivos por eles instituídos não provoquem discriminação salarial entre homens e mulheres;

2.3.3.1.5

O Comité está preocupado com o facto de determinadas novas modalidades de organização laboral puderem conduzir à exploração dos trabalhadores e a empregos precários, frequentemente ocupados por mulheres, e está convicto de que a flexibilidade e a segurança do emprego devem estar numa relação equilibrada.

Considera que é fundamental para a integração das mulheres com deficiência no mercado de trabalho dispor de dados repartidos por sexo, fiáveis e comparáveis, sobre os obstáculos ao emprego com que elas se confrontam.

2.3.3.2   Eliminar as disparidades salariais entre homens e mulheres

2.3.3.2.1

Pese embora a legislação comunitária sobre igualdade de remuneração, as mulheres ganham menos 15 % do que os homens (3), diferença que diminui a um ritmo muito menor do que as assimetrias de emprego. A persistência destas diferenças fica a dever-se à discriminação directa e indirecta das mulheres e a desigualdades estruturais, como a segregação em sectores, profissões e padrões laborais, interrupções de carreira para assistência a crianças e outros familiares, acesso à educação e à formação, sistemas sexistas de avaliação e remuneração e estereótipos. Nesta matéria nem todos os Estados-Membros dispõem necessariamente de recursos técnicos, humanos e financeiros.

2.3.3.2.2

Na sua futura comunicação sobre as desigualdades de género e o envolvimento dos parceiros sociais, a Comissão deveria assegurar maior coerência nas disposições nacionais legais sobre direitos em matéria de igualdade, bem como um acesso mais fácil a vias de recurso.

2.3.3.3   Mulheres empresárias

2.3.3.3.1

As mulheres representam, em média, 30 % dos empresários da UE. Têm, por vezes, maiores dificuldades do que os homens na criação de uma empresa e no acesso a financiamento e formação. O plano de acção para o espírito empresarial na UE deve ser aplicado com maior determinação e contemplar a dimensão de género. É necessário fomentar o espírito empresarial, a informação e o apoio inicial para facilitar a criação e o desenvolvimento de novas empresas mediante uma série de técnicas, incluindo um acesso mais fácil ao financiamento para empresas em fase de arranque. As estratégias deveriam melhorar o acesso das mulheres aos créditos e aos serviços bancários. Além disso, as empresárias deveriam ter a possibilidade de se ligarem em rede às instituições financeiras, para criar pacotes de ajuda adaptados às suas necessidades, especialmente em matéria de microfinanciamento.

2.3.3.3.2

Os programas nacionais deveriam incluir a educação empresarial no ensino secundário e superior, sobretudo entre as alunas de modo a promover uma cultura de participação feminina no desenvolvimento de ideias inovadoras nesta matéria. Todavia, nem todas as mulheres querem trabalhar por conta própria. Por isso, os programas nacionais deveriam também prestar informações aos estudantes sobre os seus direitos em matéria de emprego e incentivá-los a procurarem trabalho em sectores «não tradicionais».

2.3.3.3.3

A adopção de uma política específica mas integrada para o empresariado feminino contribuiria, em particular, para reduzir as diferenças nas taxas de emprego entre homens e mulheres em áreas técnicas como a engenharia e os serviços relacionados com as TIC, e nos empregos qualificados.

2.3.3.4   Igualdade entre homens e mulheres na protecção social e combate à pobreza

2.3.3.4.1

Os sistemas de protecção social devem eliminar os desincentivos à entrada e permanência de homens e mulheres no mercado de trabalho, permitindo-lhes acumular direitos de pensão individuais. As mulheres devem poder beneficiar de direitos a pensão, mas para lhes garantir tais direitos há que encontrar modelos alternativos. As mulheres são sempre mais susceptíveis de ter carreiras profissionais mais curtas ou com interrupções, adquirindo, por conseguinte, menos direitos do que os homens, o que aumenta o risco de pobreza, sobretudo para as famílias monoparentais, as mulheres mais velhas ou as que trabalham em empresas familiares, por exemplo, na agricultura e nas pescas, bem como nos sectores da distribuição ou da indústria transformadora. Os Estados-Membros também deveriam proteger as mulheres migrantes da exploração nestes sectores.

2.3.3.4.2

Há que intensificar as estratégias que permitam às mulheres em risco de pobreza, integradas ou não mercado de trabalho, adquirir as qualificações requeridas por esse mercado que lhes assegurem a futura independência financeira (4).

2.3.3.4.3

O CESE propõe que se intensifiquem as estratégias relacionadas com a igualdade de género em matéria de protecção social e de luta contra a pobreza, de modo a garantir que a fiscalidade e os sistemas de segurança social respondam às necessidades das mulheres em risco de pobreza, em particular as mães solteiras. Considera que deveriam também ser elaboradas propostas políticas concretas destinadas a encorajar o progenitor de família monoparental a desenvolver as qualificações requeridas pelo mercado de trabalho, tornando, assim, mais fácil o seu acesso ao emprego. Em particular, há necessidade de rever a diferença actualmente bastante pequena entre o valor do subsídio de desemprego acrescido do abono por pessoa a cargo e o salário mínimo nacional, que se faz sentir mais acentuadamente em alguns Estados-Membros.

2.3.3.4.4

Na prática, para tornar o trabalho mais atractivo não basta a remuneração, há que propor também outros incentivos não fiscais, como a flexibilidade laboral e oportunidades de formação para os trabalhadores pouco qualificados. Deveriam ser oferecidas estruturas de acolhimento de crianças, adequadamente subsidiadas, às famílias mono ou biparentais em risco de pobreza com dois ou mais filhos.

2.3.3.4.5

O risco de pobreza é mais elevado nas famílias monoparentais (35 % da média da UE); em 85 % destas o progenitor único é mulher. As mulheres de mais de 65 anos também correm risco elevado de pobreza. As mulheres pouco qualificadas correm o risco de perder o emprego antes da idade da reforma.

2.3.3.5   Reconhecer a dimensão de género na saúde

2.3.3.5.1

Homens e mulheres são confrontados com doenças, questões, práticas e riscos sanitários específicos que se repercutem no seu estado de saúde. Entre estes contam-se factores ambientais, como a utilização de produtos químicos, questão já abordada na proposta REACH, e de pesticidas, que muitas vezes se transmitem através da amamentação. A investigação médica actual e muitas normas de saúde e segurança dizem mais respeito a sectores profissionais de dominação masculina. Há que melhorar o conhecimento e a investigação neste domínio, desenvolvendo mais estatísticas e indicadores, inclusive do ponto de vista da mulher.

2.3.3.5.2

No contexto da acção para melhorar a saúde e segurança da mulher no trabalho em áreas em que predominam as mulheres, as estratégias nacionais no domínio da saúde e dos cuidados de saúde prolongados deveriam incluir políticas integradas que tratem a questão das normas sanitárias no local de trabalho para as agricultoras e a saúde das mulheres em famílias de agricultores em geral, bem como o trabalho repetitivo na indústria. Também deveria ser incluída informação e formação que sensibilize as mulheres para assumirem responsabilidades («empoderamento das mulheres»).

2.3.3.5.3

Além disso, o CESE solicita que se tenha em conta, investigue e analise o impacto dos pedidos de assistência a familiares e o esgotamento físico e mental que esta situação provoca nas mulheres.

2.3.3.5.4

O CESE concorda com os objectivos da UE para a igualdade de género e propõe que o método aberto de coordenação seja aplicado ao domínio dos cuidados de saúde e incorpore os objectivos em matéria de igualdade de género, incluindo o reforço de programas de prevenção. Além disso, é necessário intensificar as iniciativas que tenham em conta as diferenças entre homens e mulheres e tratem as doenças sexualmente transmissíveis (incluindo o VIH/SIDA) e as questões de saúde sexual e reprodutiva.

2.3.3.6   Combater as discriminações múltiplas, em especial contra as mulheres imigrantes e oriundas de minorias étnicas

2.3.3.6.1

As mulheres pertencentes a grupos desfavorecidos vivem muitas vezes em piores condições do que os homens. São frequentemente vítimas de discriminação múltipla. A solução para este problema passa pela promoção da igualdade entre homens e mulheres nas políticas de migração e integração, de forma a garantir os direitos das mulheres e a participação cívica, aproveitar plenamente o seu potencial e melhorar o seu acesso à educação e formação.

2.3.3.6.2

O CESE lamenta que os objectivos da Haia, adoptados pelo Conselho Europeu para serem aplicados no espaço de liberdade, segurança e justiça durante o período de 2005 a 2010, não abordem a situação específica das mulheres migrantes. Reconhece o fenómeno da feminização da migração e recomenda que a dimensão de género seja completamente integrada na política e nas acções da UE em todas as fases do processo migratório, em particular na fase de admissão e inserção nas sociedades de acolhimento.

2.3.3.6.3

A transposição e aplicação dos instrumentos em vigor em matéria de asilo e, em particular, a protecção temporária e as normas mínimas para as condições de acolhimento são conformes às obrigações que emanam das convenções internacionais sobre direitos humanos e da Convenção de Genebra de 1951. Além disso, as políticas de asilo deveriam reflectir a natureza sexista das perseguições de que são vítimas as mulheres que fogem dos respectivos países por esse motivo.

2.3.3.7   Principais acções estabelecidas pela Comissão nesta área

2.3.3.7.1

O Comité apoia as acções principais estabelecidas pela Comissão, em particular as que dão prioridade ao controlo e reforço da inclusão da dimensão de género. Concorda com as iniciativas de racionalização do método aberto de coordenação, que abrange, nomeadamente, as pensões, a inclusão social, a saúde e a assistência de longa duração, centrando a atenção na promoção da igualdade entre homens e mulheres (5).

2.3.4   Reforçar a conciliação do trabalho com a vida privada e familiar

2.3.4.1

O CESE reconhece a importância de elaborar medidas, incluindo a definição de objectivos e indicadores precisos, para garantir a prestação de cuidados às crianças, desde o nascimento até à idade da escolaridade obrigatória, e serviços de assistência acessíveis e a preços módicos a outras pessoas dependentes, dado que estes factores têm uma incidência directa na participação feminina no trabalho remunerado. Também deveriam ser criados serviços pós-escolares para as crianças ao longo de toda a sua vida escolar, que correspondam aos horários de trabalho dos pais.

2.3.4.2

O CESE concorda com a importância de encontrar um equilíbrio entre vida pessoal e profissional e reconhece que os benefícios de regimes de trabalho flexíveis ainda não estão tão amplamente utilizados como deveriam. O Comité está preocupado com o facto de determinadas novas modalidades de organização laboral puderem conduzir à exploração dos trabalhadores e a empregos precários, frequentemente ocupados por mulheres, e está convicto de que a flexibilidade e a segurança do emprego devem estar numa relação equilibrada.

2.3.4.3

A UE reconheceu a importância de homens e mulheres (6) encontrarem o equilíbrio entre vida privada e vida profissional. A divisão das tarefas domésticas, incluindo os cuidados a prestar, deve ser modificada de modo a conseguir-se uma partilha equitativa entre homens e mulheres. O papel dos homens no lar deve ser reforçado. Além disso, no contexto dos actuais debates sobre a revisão da directiva sobre o tempo de trabalho, há que estabelecer horários de trabalho socialmente compatíveis com as responsabilidade familiares.

O CESE reconhece a importância de elaborar medidas, incluindo a definição de objectivos e indicadores precisos, para garantir a prestação de cuidados às crianças, aos idosos dependentes e aos deficientes.

2.3.5   Promover a participação equilibrada de homens e mulheres em instâncias de tomada de decisão

2.3.5.1

A subrepresentação das mulheres na política, na tomada de decisões económicas e na ciência e tecnologia não está ainda a ser tratada eficazmente. As medidas fundamentais propostas pela Comissão pretendem lutar contra esta situação não democrática. No entanto, o empenhamento dos Estados-Membros em adoptar as medidas necessárias é ainda muito reduzido. A segregação é visível tanto no sector público como no privado. Tanto num como noutro, as mulheres estão subrepresentadas nos níveis superiores da hierarquia e nos lugares de decisão.

2.3.5.2

Por conseguinte, o Comité recomenda a introdução de objectivos e prazos para alcançar a igualdade de modo a reforçar a participação feminina em todas as modalidades do processo decisório, já que considera que deste modo se poderia dar um impulso eficaz à representação feminina na liderança política, no processo de tomada de decisões no domínio económico e na ciência e tecnologia.

2.3.5.3

Além disso, em conformidade com o disposto no artigo 1.o -A (77) do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias, de 1 de Maio de 2004 (7), todas as instituições europeias deverão aplicar medidas de acção positiva em todos os níveis em que as mulheres estejam subrepresentadas nos processos de decisão. Os resultados destas medidas de acção positiva deverão ser regularmente controlados e publicados.

2.3.6   Erradicar a violência em razão do sexo e o tráfico de seres humanos

2.3.6.1

A Comissão está empenhada no combate a todas as formas de violência. As mulheres são as principais vítimas da violência em razão do sexo. Recentemente, o CESE abordou este assunto num parecer de iniciativa sobre a violência doméstica contra as mulheres (8). A violência doméstica contra as mulheres impede a sua inserção social e, em particular, a sua inclusão no mercado de trabalho, tendo como resultado a marginalização, a pobreza e a dependência financeira e material. Impõe-se a elaboração de um plano de acção europeu de combate à violência contra as mulheres.

2.3.6.2

O tráfico de seres humanos não pode ser abordado de forma isolada. É um componente essencial do crime organizado e a cooperação de todos os Estados-Membros é necessária para aplicar uma política de segurança mais consistente e um quadro legislativo comum que permitam actuar de forma eficaz neste domínio. O Programa da Haia (9) e a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (10) estabelecem os objectivos da UE nesta matéria. O CESE adoptou um parecer em que sublinha a importância de uma política de segurança eficaz, que defenda os cidadãos numa sociedade livre e aberta, regida pela lei e pela justiça, no quadro do Estado de Direito (11).

2.3.6.3

As mulheres vítimas de tráfico não deveriam ser repatriadas contra a sua vontade, visto que podem ser alvo de ameaças dos traficantes nos países de origem, se forem forçadas a regressar. Pelo contrário, deveria ser-lhes concedido o direito de residência no país para onde tenham sido levadas, com todas as precauções necessárias para evitar possíveis abusos decorrentes da introdução de tal direito.

2.3.6.4

O Comité solicita aos Estados-Membros para que tomem medidas que assegurem mais direitos e maior apoio às mulheres vítimas do tráfico para fins de exploração sexual. É necessário combater o aumento da procura de serviços sexuais mediante mais campanhas de sensibilização especialmente dirigidas aos clientes. Tal deveria fazer parte de uma iniciativa educativa mais vasta para facilitar o acesso das pessoas a empregos e financiamentos alternativos.

2.3.6.5

Os Estados-Membros deveriam considerar a possibilidade de criminalizar a compra de serviços sexuais ou, pelo menos, de dar maior protecção às vítimas de tráfico ou outras pessoas que participam contra a sua vontade no comércio sexual.

2.3.7   Eliminar os estereótipos de género na sociedade

2.3.7.1

O CESE subscreve a opinião da Comissão de que os meios de comunicação desempenham um importante papel na formação de atitudes e de comportamentos. As medidas propostas para a eliminação dos estereótipos de género na educação, no mercado de trabalho e nos meios de comunicação abordam estes temas e oferecem orientações aos Estados-Membros.

2.3.7.2

O CESE, embora reconhecendo que o acesso das mulheres aos meios de comunicação social e particularmente a lugares de decisão no sector é ainda deficitário, admite que é necessário formular políticas em matéria de igualdade de género e de comunicação social. Por isso, o CESE recomenda que:

a)

se levem a cabo em toda a Europa acções de sensibilização sobre a tolerância zero para insultos sexistas e imagens degradantes das mulheres nos meios de comunicação social;

b)

na linha das recomendações formuladas pela Comissão na proposta de directiva sobre a coordenação de certas disposições dos Estados-Membros relativas ao exercício da radiodifusão televisiva, os Estados-Membros deverão garantir que as comunicações audiovisuais comerciais não incluam qualquer discriminação com base na raça, sexo ou nacionalidade (12);

c)

seja encorajada a introdução de módulos de formação em matéria de igualdade de género nas instituições de formação na área da comunicação social e a criação de mecanismos fortes destinados a estabelecer o equilíbrio entre ambos os sexos em todos os níveis de decisão nas empresas do sector;

d)

se promova o desenvolvimento da radiodifusão pública como meio de comunicação social independente com a missão de serviço público de salvaguardar os direitos humanos e a igualdade entre homens e mulheres.

2.3.7.3

O CESE apoia a proposta de realização de acções de sensibilização no âmbito do Plano D da Comissão para a Democracia, o Diálogo e o Debate (13), bem como das actividades organizadas na matéria pelos seus escritórios de representação nos Estados-Membros.

2.3.8   Promover a igualdade de género fora da UE

2.3.8.1

O CESE apoia o papel da Comissão na promoção dos direitos da mulher no contexto internacional.

2.3.8.2

As políticas externa e de desenvolvimento da UE devem reflectir o facto de as mulheres desempenharem um papel fundamental na erradicação da pobreza e de o assumir de responsabilidades no plano económico, educativo, político e sexual implicar mudanças não só para elas, mas também para as respectivas famílias e comunidades.

2.3.8.3

A UE deve ainda garantir a integração e o acompanhamento das necessidades e das perspectivas das mulheres tanto a nível nacional como comunitário, bem como assegurar o adequado acesso das mulheres à assistência financeira da UE no contexto da sua política de ajuda ao desenvolvimento.

2.3.8.4

Em caso de intervenções em situações de crise, é indispensável integrar a perspectiva de igualdade na Política Europeia de Segurança e Defesa (PESD), em conformidade com a Resolução 1325 das Nações Unidas (14) e a Resolução Europeia, de Novembro de 2000, sobre a participação das mulheres na resolução pacífica de conflitos.

2.3.8.5

A política da Comissão em matéria de ajuda humanitária (ECHO) deverá dar prioridade à ajuda e à assistência financeira às mulheres vítimas da violência com base no sexo perpetrada em situações de conflito e tentar obter reparação recorrendo aos mecanismos de direito internacional no período a seguir ao conflito armado.

2.4   Parte II: Melhorar a governação em prol da igualdade entre homens e mulheres

2.4.1

A igualdade entre homens e mulheres só se poderá tornar realidade com um compromisso claro ao mais alto nível político. A Comissão promove a igualdade entre homens e mulheres na sua própria administração (15) e apoia um conjunto de estruturas que trabalham nesta área, o que conduziu a progressos significativos. Não obstante, importantes avanços estão ainda por conseguir nas áreas cruciais identificadas neste roteiro, o que exige uma melhoria da governação a todos os níveis: instituições da UE, Estados-Membros, parlamentos, parceiros sociais e sociedade civil. À escala nacional, o apoio dos ministros que operam na área da igualdade entre homens e mulheres é essencial.

2.4.2

O CESE recomenda que se reforcem tanto as estruturas existentes na Comissão para fomentar a igualdade de género, melhorando a coerência e os sistemas de trabalho em rede, como os mecanismos de diálogo e consulta com a sociedade civil organizada. Deverá haver mais apoio e reconhecimento das organizações de mulheres a nível nacional, bem como sinergias reforçadas assentes no princípio da democracia participativa.

2.4.3

Além disso, o CESE advoga a obrigatoriedade de formação em integração da dimensão de género e sensibilização para as questões da igualdade de género no quadro institucional da UE.

2.4.4

Recomenda também a criação na DG do Orçamento da Comissão de um grupo de trabalho para a integração da perspectiva de igualdade entre homens e mulheres no processo orçamental e a elaboração todos os anos de uma avaliação específica do impacto do orçamento da UE por género.

2.4.5

O CESE entende que é essencial acompanhar os progressos realizados na aplicação do roteiro para ter a certeza de que os objectivos nele fixados são atingidos. A revisão intercalar, em 2008, deveria servir também para desenvolver outras medidas adequadas, se necessário em outros domínios políticos que não os até aqui identificados, na perspectiva de 2010 e do seguimento a dar ao roteiro.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 89/552/CEE do Conselho relativa à coordenação de certas disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros relativas ao exercício de actividades de radiodifusão televisiva (COM(2005) 646 final).

URL: http://ec.europa.eu/comm/avpolicy/docs/reg/modernisation/proposal_2005/com2005-646-final-pt.pdf.

(2)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu, de 28.09.2005, sobre a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria um Instituto Europeu da Igualdade entre Homens e Mulheres, relatora: Štechová (JO C 24, 31.1.2006, p. 29 33).

http://eur-lex.europa.eu/JOHtml.do?textfield2=24&year=2006&Submit=Search&serie=C.

(3)  Diferença não corrigida.

(4)  Parecer do Comité Económico e Scoail Europeu sobre a «Pobreza entre as mulheres na Europa», relatora Brenda King (JO C 24 31.1.2006, p. 95-101).

URL: http://eur-lex.europa.eu/JOHtml.do?textfield2=24&year=2006&Submit=Search&serie=C.

(5)  Ver ponto 5.2.2 do parecer do CESE de 20 de Abril de 2006 sobre a «Estratégia para o método aberto de coordenação aplicado à protecção social»; relator: J. OLSSON, (JO C 185 de 8/8/2006, pág. 87).

URL: http://eur-lex.europa.eu/JOIndex.do?year=2006&serie=C&textfield2=185&Submit=Search.

(6)  Resolução do Conselho e dos Ministros do Emprego e da Política Social, Reunidos no seio do Conselho de 29 de Junho de 2000 relativa à participação equilibrada das mulheres e dos homens na actividade profissional e na vida familiar (2000/C 218/02).

URL: http://europa.eu.int/eur-lex/pri/pt/oj/dat/2000/c_218/c_21820000731pt00050007.pdf.

(7)  Ver: http://www.europa.eu.int/comm/dgs/personnel_administration/statut/tocen100.pdf.

(8)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Violência doméstica contra as mulheres» relatora Heinisch, (JO C 110 de 9/5/2006, pág. 89).

URL: http://eur-lex.europa.eu/JOIndex.do?year=2006&serie=C&textfield2=110&Submit=Search.

(9)  Ver: http://ec.europa.eu/justice_home/news/information_dossiers/the_hague_priorities/index_en..htm (só em inglês).

(10)  Ver: http://www.unodc.org/unodc/crime_cicp_convention.html (só em inglês).

(11)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Programa da Haia: dez prioridades para os próximos cinco anos — Parceria para a renovação europeia no domínio da liberdade, segurança e justiça COM(2005) 184 final, relator Pariza-Castaños (JO C 65 de 17.3.2006, p. 120-130).

URL:. http://eur-lex.europa.eu/JOIndex.do?year=2006&serie=C&textfield2=65&Submit=Search.

(12)  COM(2005) 646 final. Ver nota de rodapé 2.

(13)  Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Contributo da Comissão para o período de reflexão e para a fase posterior. Plano D para a Democracia, o Diálogo e o Debate (COM(2005) 494 final).

URL: http://europa.eu.int/eur-lex/lex/LexUriServ/site/pt/com/2005/com2005_0494pt01.pdf.

(14)  Ver http://www.peacewomen.org/un/sc/1325.html (adoptada em 31 de Outubro de 2000).

(15)  Anexo III Comunicação.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/180


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Os corredores pan-europeus de transporte 2004-2006»

(2006/C 318/30)

Em 16 de Dezembro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre: «Os corredores pan-europeus de transporte 2004-2006».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação emitiu parecer em 4 de Setembro de 2006, tendo sido relatora K. ALLEWELDT.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 192 votos a favor, 4 votos contra e 10 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Objectivo do grupo de estudo permanente

1.1

Desde o início da política pan-europeia de transportes em 1991, que serviu de base à planificação dos grandes corredores, o CESE tem vindo a contribuir, activa e convictamente, para esta política de coesão cujo impacto vai além das fronteiras comunitárias. Em 2003, os resultados dos trabalhos realizados ao longo de 10 anos foram publicados num volume único (1). Desde então, um grupo de estudo permanente tem-se dedicado a este tema. O último parecer (2) refere-se ao período 2002-2004. O presente parecer abrange a evolução até meados de 2006.

1.2

O grupo de estudo permanente visa criar, desde o início, uma infra-estrutura pan-europeia de transportes para além das fronteiras da UE, indo ao encontro dos objectivos de política de transportes de desenvolver um sistema de transportes sustentável e eficiente e dos objectivos de coesão. Neste contexto, há que considerar questões sociais, económicas, operacionais, ambientais, de segurança e regionais e assegurar a participação dos respectivos grupos de interesse. Partindo do trabalho no terreno, o grupo de estudo permanente gostaria de dar o seu próprio contributo. O presente parecer resume as actividades e experiências no período entre 2004-2006 e faz uma avaliação das alterações políticas verificadas neste domínio.

2.   Conclusões

2.1

A ligação entre o desenvolvimento das infra-estruturas de transporte, por um lado, e a realização dos principais objectivos de política de transportes e as questões operacionais, por outro, está no centro das iniciativas do CESE e nunca perdeu significado nem urgência. Embora se reconheça a importância política de tal ligação, pouco ou nada foi feito para avançar nessa área, o que se fica a dever à falta de um processo próprio de aplicação. A esperança de que, na prática, os objectivos da política de transportes se alinhassem naturalmente com o desenvolvimento das infra-estruturas desfez-se nos últimos anos. As regiões, para onde convergem todas as questões e em que a compreensão das interdependências pan-europeias é extremamente importante, poderiam desempenhar um papel preponderante neste processo. Na conferência regional realizada no nordeste da Polónia, o grupo de estudo permanente mostrou exemplarmente que é muito importante considerar o impacto regional dos grandes eixos transeuropeus que estão a ser planeados. A política europeia tem de assumir maior responsabilidade. A sua acção não pode limitar-se à realização dos eixos de transporte centrais.

2.2

Nos últimos dois anos, muito foi feito para adaptar o planeamento das infra-estruturas no espaço europeu à nova realidade política. Na UE, assistiu-se à definição de novos projectos prioritários e à identificação de novos eixos de transporte centrais com os Estados vizinhos, bem como ao desenvolvimento da iniciativa para os Balcãs Ocidentais. Essencialmente, o CESE reconhece que este trabalho foi bem-sucedido e regozija-se, acima de tudo, com a importância conferida à ligação com os Estados vizinhos. No entanto, esta nova abordagem desenrola-se com base nos conceitos anteriores, ou seja, trata-se quase exclusivamente do planeamento de vias de transporte e de questões relacionadas com a intermodalidade e o impacto ambiental. Os interesses económicos e sociais locais não são, ou são apenas limitadamente, tomados em conta. O CESE considera que esta situação é absolutamente lamentável.

2.3

Um dos motivos que levaram à revisão do planeamento das infra-estruturas no espaço europeu foi a lentidão na realização de progressos, o que se deve, não raro, à insuficiência dos meios financeiros. Portanto, o principal objectivo era a concentração em alguns poucos projectos. Na opinião do CESE, é também necessário multiplicar os recursos financeiros europeus. O CESE já contribuiu com algumas propostas neste domínio. Pelo menos, dever-se-ia fazer maior uso da possibilidade de co-financiamento em 20 % dos projectos na UE através de fontes comunitárias de financiamento. Paralelamente, com o aumento dos subsídios, os requisitos dos projectos de infra-estruturas, por exemplo no que se refere à protecção ambiental, à intermodalidade ou à segurança, também devem e podem ser mais vinculativos.

2.4

O CESE defende a necessidade de destacar os pontos em comum entre os organismos transfronteiriços instituídos pelos ministérios dos transportes dos Estados-Membros (por exemplo, os comités directores para os corredores) e os criados pela Comissão nesta área. A coordenação, por si só, não é suficiente e pode inclusivamente deitar por terra grandes oportunidades de avançar na política prática. Cada vez mais se torna mais difícil saber quem assume qual responsabilidade pelos objectivos globais de política de transportes. As três primeiras conferências pan-europeias de transportes, realizadas em 1991, 1994 e 1997, dão orientações importantes. A Declaração de Helsínquia de 1997, pela sua natureza abrangente, continua a ser uma óptima base para a cooperação. Foi na altura decidido analisar regularmente os progressos alcançados, mas, actualmente, este exercício limita-se praticamente à análise dos projectos de construção.

2.5

A conferência de Bialystok, organizada pelo CESE, foi um enorme sucesso (3). Esta conferência não só levou a Europa à região, como também veiculou as ideias que as pessoas têm sobre o sucesso de uma política pan-europeia dos transportes. O CESE reforçará a sua capacidade para dar impulsos neste campo. Simultaneamente, é oportuno colaborar estreitamente com os comités directores dos corredores, o Observatório dos Transportes da Europa do Sudeste (SEETO) e, evidentemente, com a Comissão no âmbito das actividades de coordenação. Futuramente, importa examinar e avaliar, para além das abordagens regionais, as questões relacionadas com os modos de transporte ao longo dos eixos principais e, também, os projectos prioritários no quadro da RTE-T.

3.   Novas condições da política pan-europeia de transportes

3.1

Ao longo dos últimos dois anos, a Europa sofreu evoluções consideráveis neste domínio. Em Maio de 2004, dez novos países aderiram à União Europeia. A Europa renovou e reforçou o seu empenho para com os Balcãs Ocidentais, tendo desenvolvido uma nova política de vizinhança. A iniciativa da Comissão Europeia a favor da nova orientação das redes transeuropeias e do desenvolvimento dos corredores incidiu em duas vertentes: uma delas virada para o interior da UE para fazer face ao alargamento em 2004, em que a política da Rede Transeuropeia de Transportes (RTE-T) se baseava na experiência adquirida com os corredores (4), e outra voltada para o exterior, cujo objectivo era alargar as ligações de transporte centrais a fim de ter em conta a nova política europeia de vizinhança e até países mais afastados.

3.2

Em 2002, a Comissão Europeia procedeu à análise do estado de execução da RTE-T e dos corredores pan-europeus. De modo geral, as conclusões apontaram que havia atrasos consideráveis nos grandes eixos. Foi assim adoptada uma abordagem centrada em prioridades claramente definidas e mais empenhada relativamente aos países em questão. Foram definidas três áreas geográficas diferentes: a União Europeia alargada a 27 Estados-Membros, os Balcãs Ocidentais (5) e os restantes países e regiões limítrofes de uma UE a 27. Em cada um destes três casos, a Comissão Europeia incumbiu grupos de alto nível de apresentarem recomendações relativamente a projectos prioritários, bem como medidas para a sua aplicação e mecanismos de acompanhamento.

3.3

O primeiro exercício deste tipo foi realizado, para a UE a 27, pelo Grupo de Alto Nível dirigido por Karel van Miert (2002-2003). Foram analisados três quartos dos corredores pan-europeus, após o que o Grupo apresentou 30 projectos de infra-estrututras de transportes, abrangendo tanto os «antigos» como os «novos» Estados Membros, que representam as prioridades para as redes transeuropeias de transportes na UE a 27. Por outro lado, o Grupo recomendou a adopção de novas disposições financeiras e legislativas favoráveis à aplicação dos novos mecanismos de coordenação em torno de projectos da rede transeuropeia de transportes (RTE-T). As recomendações do Grupo de Alto Nível levaram à revisão das orientações RTE-T em Abril de 2004.

3.4

O facto de os Balcãs Ocidentais serem menos homogéneos do que a UE a 27 dificulta a concepção de políticas regionais: a diversidade dos estatutos destes países comparando com a UE, as relações intra-regionais e a dinâmica das relações com a UE obrigam a um constante ajustamento das políticas. Devido aos conflitos passados, os Balcãs têm uma enorme necessidade de estabilidade — económica, social e política — o que torna a ajuda externa ainda mais urgente. Nesta medida, a abordagem regional cria nos Balcãs uma mais-valia específica. De resto, convém não esquecer que a UE tem sido uma defensora acérrima desta abordagem no sector dos transportes tendo também envidado esforços para criar uma zona de comércio livre e um mercado energético comum.

3.4.1

Em 2000, a Comissão Europeia lançou uma estratégia de sistema regional de transportes na Europa de Sueste que assenta numa rede de infra-estruturas de transporte multimodal. No âmbito da estratégia, foram realizados dois estudos, nomeadamente um estudo sobre as infra-estruturas de transporte ao nível regional (TIRS) e um estudo sobre as infra-estruturas de transporte na região dos Balcãs (REBIS) (6), nos quais é definida a Rede de Base e são apresentadas recomendações em matéria de investimento e financiamento. Este processo preparou o terreno para a criação de um secretariado próprio, baseado em Belgrado, o chamado «Observatório dos Transportes da Europa do Sudeste (SEETO)». Compete-lhe não só apoiar e coordenar o desenvolvimento da infra-estrutura, mas também actuar como ponto de contacto para prestar informações aos actores sociais e económicos, possibilidade essa que é cada vez mais utilizada. Neste contexto, deve também ser feita referência expressa ao grupo de estudo permanente do CESE.

3.4.2

O primeiro plano quinquenal (período de 2006-2010), assinado em Novembro de 2005, identifica cerca de 150 projectos. O plano menciona ainda uns vinte projectos regionais, os chamados projectos «soft», que prevêem medidas para acompanhar o processo de aplicação das redes regionais. Nos últimos tempos, devido às limitações orçamentais, o número de projectos de infra-estruturas prioritários foi drasticamente reduzido, tendo passado para 22. O processo coordenado pelo SEETO pode ser comparado ao antigo processo TINA (Transport Infrastructure Needs Assessment) na UE, através do qual, para além dos grandes eixos/corredores, deverá ser finalizada a rede regional.

3.5

Os trabalhos do Grupo de Alto Nível, presidido por Loyola de Palacio, centraram-se no desenvolvimento dos grandes eixos transeuropeus entre a UE e os seus países vizinhos e em direcção a países mais afastados. Foram definidos um eixo marítimo (7) e 4 ligações terrestres. Pretende-se deste modo estabelecer as ligações internacionais mais importantes e reforçar a coesão regional. O Grupo de Alto Nível apresentou igualmente uma série de propostas para medidas horizontais, nomeadamente no que diz respeito à simplificação das formalidades nas fronteiras, ao aumento da segurança nos transportes e à melhoria da interoperabilidade nos transportes ferroviários. Outra das suas recomendações defende uma coordenação mais eficiente e maior capacidade de execução, sendo para isso necessário substituir o Memorando de Entendimento por acordos vinculativos. Com base nestas recomendações, a Comissão pretende apresentar em Julho ou Setembro uma comunicação sobre os seus planos. Na opinião do grupo de estudo permanente, é importante que a Comissão examine adequadamente as questões horizontais.

3.6

Os trabalhos nos corredores de transportes e nas zonas por estes servidas (ver informações detalhadas no Anexo II) progrediram a ritmos diferentes. À excepção da região euro-árctica do mar de Barents, as zonas de transporte não se têm evidenciado, situação que, mais ou menos, se mantém desde a sua criação em 1997 (conferência de Helsínquia). No entanto, há uma tendência para uma cooperação mais acentuada nos corredores, e também nas redes regionais, um aspecto que, na opinião do CESE, é bastante positivo. No que diz respeito ao apoio financeiro e técnico-organizacional, não se verificou qualquer melhoria nos últimos dois anos. Um apoio reforçado da Comissão nunca houve, embora tenha sido solicitado. Mas o aspecto decisivo é que os trabalhos dos dois grupos de alto nível e as conclusões da Comissão praticamente tornaram obsoleto o «modelo dos corredores». Na UE, os 30 projectos de RTE passaram a ser prioritários. Fora da UE, os corredores foram «substituídos» por 5 novos eixos ou passaram a ter outro nome. No entanto, parece haver razões suficientes para continuar este trabalho. Os comités directores assumiram-se como fóruns de contacto e de cooperação importantes para os ministérios dos transportes envolvidos, tendo criado uma própria identidade (marca). Prosseguem o trabalho em domínios importantes que não são abrangidos por uma iniciativa transfronteiriça, como, por exemplo, os projectos prioritários de RTE para os quais não é designado um coordenador especial.

3.7

A Comissão reforçou a sua oferta de coordenação. Por outro lado, as reuniões coordenadoras regularmente realizadas (uma a duas vezes por ano) com todos os dirigentes dos corredores e outros actores de relevo são um importante fórum de intercâmbio. O CESE, a quem é sempre dada a possibilidade de participar e colaborar nestas reuniões, constata que a sua presença tem sido muito apreciada. Não se trata apenas de trocar ideias sobre as mais recentes evoluções nos projectos de construção, mas também de discutir questões fundamentais e conceptuais ligadas à política pan-europeia de infra-estruturas de transportes. Algumas novidades estruturais são importantes: para encorajar a realização de segmentos importantes de RTE, a Comissão designou coordenadores especiais para 6 projectos (8). Simultaneamente, prevê-se a criação de uma agência para se melhorar o financiamento e a gestão de projectos importantes, dado o elevado volume de financiamento em causa. Por último, prossegue o debate para se encontrar uma forma de cooperação transfronteiriça mais juridicamente vinculativa do que os actuais memorandos de entendimento.

4.   Orientação dos trabalhos do grupo de estudo permanente — actividades

4.1

Na sequência da nova orientação da política pan-europeia de transportes, o grupo de estudo permanente foca, para além dos trabalhos nos corredores, os projectos prioritários da rede transeuropeia de transportes (9), incluindo os novos planos do grupo de peritos coordenado por Loyola de Palacio, como seja a ideia de uma ligação específica entre Espanha e África. Numa série de encontros com responsáveis da DG Transportes e Energia ficou claro que a contribuição do CESE para a avaliação socioeconómica dos projectos de RTE já realizados ou planeados seria bem-vinda.

4.2

Em finais de 2004/princípios de 2005, a Comissão iniciou os preparativos para o segundo relatório do grupo de peritos presidido por Loyola de Palacio. O grupo de estudo permanente teve oportunidade de se pronunciar, nesta fase, sobre questões fundamentais (10). Os aspectos apontados foram os seguintes: necessidade de atribuir à protecção do ambiente um papel de maior destaque; intensificar a prática da intermodalidade, a qual poderia ser utilizada como critério de avaliação; a ligação às redes regionais de transportes deveria assumir um papel mais central. Por fim, o grupo de estudo permanente salientou a importância dos aspectos horizontais, tais como harmonização das legislações, questões de segurança, etc., tendo apontado para a necessidade de dedicar mais atenção e rigor a estas questões, condição essencial para se progredir em direcção aos objectivos da política comunitária de transportes. Na sua resposta (11), a Comissão salientou que daria especial atenção à questão da ligação às redes regionais de transportes.

4.3

Paralelamente ao segundo relatório do grupo de peritos, a Comissão fez um balanço dos trabalhos levados a cabo nos corredores. O grupo de estudo permanente limitou-se aqui a apontar que deve ser dedicada especial atenção à questão da coesão económica e social e às consultas. Adiantou ainda que seria igualmente útil reforçar os comités directores e incentivar a sua interligação, devendo haver mais compromisso e uma avaliação do êxito dos seus trabalhos, embora se saiba que esta tarefa compete principalmente aos comités directores. Da avaliação do questionário, a Comissão extrai quatro conclusões principais (12): os corredores de transporte deram provas de serem eficazes e este modelo será mantido; no que diz respeito às questões operacionais e à necessidade de considerar os factores socioeconómicos há ainda muito para fazer; seria conveniente assegurar um maior controlo dos progressos alcançados, sem, contudo, descurar as características de cada corredor; o efeito positivo dos corredores só pode ser avaliado a longo prazo, mas o seu sucesso será tanto maior quanto maior for o grau de organização da cooperação.

4.4

Nos últimos dois anos, a cooperação com os comités directores dos 10 corredores de transporte continuou a ser importante. Por razões práticas e de ordem pessoal, deixou de haver uma participação activa nas reuniões dos comités directores, como era habitual. Mas os contactos mantêm-se, sobretudo porque as reuniões coordenadoras, realizadas normalmente duas vezes por ano em Bruxelas, são uma oportunidade para encontros e troca de experiências. O grupo de estudo permanente introduziu um sistema de partilha de responsabilidades pelos diversos corredores, com o objectivo de assegurar maior empenho na prática e mais continuidade nas próprias fileiras.

4.5

A elaboração do parecer «O papel das estações ferroviárias na UE alargada» (13) teve um peso relativamente importante. Adoptado em Fevereiro de 2006, este parecer foi integrado nos trabalhos do grupo de estudo permanente. A política europeia de transportes tem de concentrar-se mais nos aspectos da conservação, utilização e concepção das estações ferroviárias — sobretudo do ponto de vista da segurança — que servem como montra do transporte ferroviário de passageiros e centros de serviços na rede de transportes.

4.6

Durante o período abrangido pelo relatório, o grupo de estudo permanente organizou dois eventos externos: em Novembro de 2004, o CESE participou numa muito publicitada viagem de comboio pelo corredor X organizada pela sociedade «ARGE Korridor X», de Villach, na Áustria, a Serajevo, na Bósnia-Herzegovina, passando por Zagreb, na Croácia. Pretendia-se com esta acção salientar a importância de ligações ferroviárias mais eficientes e da cooperação transfronteiriça dos caminhos-de-ferro da região. Em cada ponto de paragem do comboio houve manifestações mediáticas. O segundo evento, organizado pelo CESE fora da sua sede, teve lugar em Bialystok (Polónia) e colocou a tónica nas consequências regionais do corredor I para a protecção da natureza, a segurança e a qualidade de vida no nordeste da Polónia. A conferência de Bialystok foi um enorme sucesso, sob vários pontos de vista, e pode ser considerada como um dos expoentes do trabalho realizado pelo grupo de estudo permanente. Por estes motivos, considerou-se relevante fazer uma avaliação da mesma no capítulo que se segue.

5.   Principais resultados dos trabalhos entre 2004-2006

5.1

Entre 15 e 17 de Novembro de 2005, o grupo de estudo permanente organizou, a convite do voivode de Podláquia, uma conferência e uma audição pública em Bialystok, bem como vários encontros e visitas a regiões ao longo do corredor transeuropeu de transporte 1, a «Via/Rail Baltica». O objectivo era debater com representantes da administração autónoma, diversos grupos de interesses socioeconómicos e responsáveis pela política de transportes aos níveis regional e nacional a melhor via de conciliar o desenvolvimento do corredor I com os interesses regionais e os aspectos da protecção do ambiente. A delegação do CESE integrou um representante da Comissão Europeia, cuja principal função é a de promover a Rail Baltica. Em todos os encontros o ambiente foi de grande hospitalidade. A visita da delegação, para além da importância que teve para a política dos transportes, foi também um sucesso para todos no que diz respeito ao tema «Comunicar a Europa».

5.1.1

Esta conferência reuniu pessoas dos mais diversos quadrantes (ecologistas, políticos municipais, empresas do sector do transporte ferroviário, habitantes dos povoados ribeirinhos, conselhos de empresas) e permitiu que se estabelecesse uma ligação directa entre a região e a UE/Bruxelas. As diferentes dimensões do impacto de um corredor de transporte tornaram-se visíveis: as condicionantes da vida da população que reside ao longo dos eixos de trânsito, a esperança de que a região dê um salto económico devido à melhor acessibilidade, as limitações dos serviços de transporte público de passageiros e de transporte ferroviário regional, a preservação das riquezas naturais específicas da região, o medo de ficar sem trabalho, os problemas financeiros e os entraves burocráticos, problemas estes que só podem ser reconhecidos como tal e eliminados se forem vistos no seu conjunto. Os resultados deste encontro foram muito variados e extremamente instrutivos para todos os participantes, tendo-se também conseguido apontar soluções inovadoras para os problemas.

5.1.2

A Via Baltica no nordeste da Polónia pode tornar-se num modelo exemplar para uma política pan-europeia de transportes integrada. Um dos problemas principais é, por um lado, o aumento do tráfego em trânsito pela região e, por outro, a necessidade urgente de desenvolvimento económico, embora este dependa da acessibilidade da região e não do tráfego de trânsito. Um outro problema advém da necessidade de proteger a incomparável riqueza natural da região, um dos seus maiores «trunfos». Para este problema foram encontradas numerosas soluções praticáveis e economicamente viáveis. Por fim, ficou claro que a Rail Baltica não está devidamente considerada nos planos regionais e o coordenador da UE aproveitou a oportunidade para referir as vantagens precisamente deste corredor de ligação. Foi ainda salientado que apenas um conceito global integrado de transportes para a região permitirá resolver os problemas e ultrapassar os obstáculos no planeamento e na execução da Via Baltica e da Rail Baltica. O CESE continuará a apoiar esta evolução positiva.

5.2

A possibilidade de cooperação transfronteiriça entre os respectivos ministérios dos transportes dos Estados-Membros situados ao longo dos «corredores» será suprimida ou substituída pela iniciativa da Comissão (Vide Capítulo 3). Pretende-se, assim, promover uma colaboração estreita, como se de uma única componente se tratasse, em vez de se continuar, como até aqui, a coordenar dois processos paralelos. Deste modo, contribuir-se-ia também para melhorar a concretização dos objectivos centrais de política de transportes. O problema de como reforçar eficazmente a cooperação transfronteiriça entre os Estados-Membros e países terceiros continua por resolver. O CESE considera que uma solução possível seria a melhoria das relações contratuais e, sobretudo, uma concentração dos meios financeiros disponibilizados pela UE. Portanto, também no que diz respeito aos eixos prioritários, deveria haver uma concentração nos projectos prioritários e conviria explorar efectivamente a possibilidade de co-financiamento a 20 % para projectos na UE. Actualmente, as subvenções praticamente não ultrapassam os 2-5 %.

5.3

Por fim, resta uma questão importante para o CESE que é a da combinação das questões relativas às infra-estruturas e das questões operacionais, aliás um aspecto que tem sido menosprezado. Embora se reconheça a importância política de tal ligação, pouco ou nada foi feito para avançar nessa área, o que se fica a dever à falta de um processo próprio de aplicação. A esperança de que, na prática, os objectivos da política de transportes se alinhassem naturalmente com o desenvolvimento das infra-estruturas desfez-se nos últimos anos. Infelizmente, as grandes conferências sobre transportes pertencem ao passado. O futuro está, portanto, nas regiões, para onde convergem todas as questões e em que a compreensão das interdependências pan-europeias é extremamente importante. A esta conclusão chegaram também os participantes na conferência de Bialystok.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  CESE: 10 anos de política pan-europeia de transportes, 2003.

(2)  Parecer do Comité sobre «Os corredores pan-europeus de transporte», JO C 120 de 20.05.05, p. 17.

(3)  O relatório sobre a conferência consta do Anexo I.

(4)  Serviu de base o relatório do grupo de peritos presidido por Karel van Miert, apresentado em Junho de 2003.

(5)  Por motivos de coerência política, os Balcãs Ocidentais são, por vezes, tratados como uma parte da Europa de Sueste, que compreende, para além da ex-Jugoslávia, a Roménia, a Bulgária e até, ainda que raramente, a Turquia e a República da Moldávia.

(6)  Regional Balkans Infrastructure Study.

(7)  As ligações são as seguintes:

Eixo de sudoeste: liga a região sudoeste ao centro da UE incluindo a Suíça e o eixo «Transmagrebe» entre Marrocos e o Egipto.

Eixo de sudeste: liga o centro da UE ao Cáucaso e ao mar Cáspio através dos Balcãs e da Turquia, bem como o Próximo Oriente ao Egipto.

Eixo central: liga o centro da UE à Ucrânia e ao mar Negro, bem como à Rússia e à Sibéria.

Eixo de nordeste: liga a UE à Noruega e à Rússia e à Transibéria.

Auto-estrada do mar: liga o mar Báltico, o Atlântico, o mar Mediterrâneo e o mar Negro, bem como os países ribeirinhos. Está igualmente prevista uma extensão através do canal de Suez.

(8)  

I.

Eixo ferroviário Berlim-Palermo (van Miert).

II.

Eixo ferroviário de alta velocidade Lisboa-Madrid-Tours/Montpellier (Davignon).

III.

Eixo ferroviário Lião-Turim-Budapeste-fronteira ucraniana (De Palacio).

IV.

Eixo ferroviário Paris-Bratislava (Balzazs).

V.

Eixo ferroviário «Rail Baltica» Varsóvia-Helsínquia (Telicka).

VI.

Corredores ferroviários e ETRMS (Vinck).

(9)  Decisão 884/2004/EC de 29 de Abril de 2004, JO L 167 de 30.04.04 e de 07.07.04.

(10)  Carta enviada pela DG TREN a E. Thielmann, datada de 15.12.2004.

(11)  Carta de E.Thielmann datada de 21.01.05.

(12)  A avaliação foi apresentada na reunião coordenadora, realizada em 21 de Abril de 2005, em Bruxelas.

(13)  Parecer do Comité sobre «O papel das estações ferroviárias na UE alargada», JO C 88 de 11.04.06, p. 9.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/185


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O aprovisionamento energético da UE: estratégia para uma combinação de energias optimizada»

(2006/C 318/31)

Em carta datada de 29 de Agosto de 2005, a Comissão Europeia solicitou ao Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, que elaborasse um parecer sobre: «O aprovisionamento energético da UE: estratégia para uma combinação de energias optimizada».

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação do CESE, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 30 de Maio de 2006, sendo relatora Ulla Birgitta SIRKEINEN.

Na 429a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro de 2006) o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 162 votos a favor, 27 votos contra e 15 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE considera que a Europa necessita de estabelecer como objectivo estratégico a obtenção de uma combinação de energias diversificada, que corresponda da melhor forma a critérios económicos, de segurança do aprovisionamento e de política climática. Face a estes objectivos, todas as fontes de energia e tecnologias apresentam vantagens e desvantagens, que devem ser levadas em conta de forma aberta e equilibrada.

1.2

A combinação diversificada é necessária:

para obter custos de energia razoáveis, através da concorrência entre combustíveis e da eficiência global dos sistemas energéticos, sobretudo no sector da electricidade. Além disso, as fontes de abastecimento têm de ser diversificadas para garantir a concorrência entre os fornecedores;

para aumentar a segurança do aprovisionamento, mediante a substituição das fontes de energia ao surgirem problemas de fornecimento, e para aumentar o poder de mercado dos consumidores;

para fomentar a solidariedade global no que respeita à utilização dos recursos e aos efeitos ambientais.

1.3

A dependência energética externa da UE não pode ser evitada por enquanto, mas há que contar com problemas políticos, económicos e técnicos, resultantes da dependência elevada e crescente de uma única fonte de abastecimento, sobretudo se esta envolver zonas que não respeitem as mesmas regras do jogo ou que sejam politicamente instáveis, como acontece com o petróleo e o gás natural.

1.4

O carvão e o urânio estão disponíveis no mercado mundial a partir de várias fontes, inclusivamente no interior da UE, e não constituem por isso motivo de preocupação.

1.5

Um maior recurso às fontes de energia renováveis para a produção de electricidade tem potencialidades que é necessário explorar. Porém, mesmo que se cumpra o objectivo proposto pelo Parlamento Europeu de, em 2020, produzir 20 % da electricidade a partir de energias renováveis, não é provável que estas possam substituir inteiramente as fontes de energia tradicionais num futuro próximo.

1.6

A utilização de gás natural aumentou, e continua a aumentar, não só por razões de mercado, mas também por opção política, embora já seja evidente que a manutenção desta tendência é problemática. O gás natural dificilmente poderá continuar a substituir o carvão, por razões de segurança de abastecimento e de custos, nem tão pouco poderá substituir a energia nuclear, devido às emissões. Também já houve quem se manifestasse contra a utilização para fins de produção de energia das limitadas reservas de gás natural, que, à semelhança do petróleo, é uma matéria-prima valiosa para usos industriais com elevado valor acrescentado.

1.7

É necessário dar resposta às preocupações com a segurança nuclear, o desmantelamento de centrais nucleares e o tratamento, ainda por esclarecer na maioria dos Estados-Membros, do combustível irradiado, para se poder prosseguir, ou mesmo aumentar, a utilização desta tecnologia, não obstante o tom crítico do debate público a decorrer em muitos Estados-Membros, tendo em conta as suas vantagens no que respeita às alterações climáticas, à reduzida dependência económica externa e à estabilidade dos custos. De acordo com os cenários, num futuro próximo, presume-se que será praticamente impossível concretizar a eventual substituição da energia nuclear sem aumentar o consumo de combustíveis fósseis.

1.8

O CESE preconiza uma atitude cautelosa face às escolhas futuras. Não é sensato partir do princípio de que o futuro é completamente previsível e de que tudo corre perfeitamente de acordo com os objectivos políticos ou com as expectativas mais positivas. É necessário que as escolhas políticas garantam suficiente aprovisionamento de energia a preços razoáveis, mesmo que a evolução seja menos promissora. Qualquer outra atitude seria de uma grande irresponsabilidade.

1.9

Num futuro próximo, há que manter em aberto todas as opções. Os cenários para a UE a 25 apresentados no capítulo 4 sustentam claramente esta conclusão. Nem num cenário pressupondo os maiores progressos em matéria de eficiência energética e um aumento das energias renováveis a exclusão de uma tecnologia energética deixará de produzir um impacto negativo, seja no ambiente ou na economia.

1.10

A actual combinação de energias na Europa deve ser desenvolvida por estratégias políticas no sentido de contrariar a dependência externa e de dispor de mais fontes de energia que não emitam gases com efeito de estufa. Para tal, convém ter presente o possível investimento em diferentes tecnologias por parte dos decisores do mercado.

1.11

O CESE recomenda o desenvolvimento de uma estratégia que vise obter a melhor combinação de energias possível. Neste contexto, é importante clarificar o papel que cabe à UE, aos Estados-Membros, às autoridades independentes e aos intervenientes no mercado. Dado o elevado grau de interdependência dos Estados-Membros em questões energéticas, uma melhor coordenação da política energética na UE melhoraria a capacidade de reacção aos problemas internos e externos.

A estratégia para obter a melhor combinação de energias possível devia ser composta pelos seguintes elementos:

1.12

A eficiência energética, incluindo a produção combinada de calor e electricidade, é a primeira resposta fundamental aos desafios da política energética. Uma maior eficiência não assegura por si só a combinação equilibrada de energias, mas promove todos os objectivos da política energética: competitividade, segurança do aprovisionamento e luta contra as alterações climáticas.

1.13

As fontes de energia renováveis ainda têm grande potencial de desenvolvimento na UE e carecem de apoio. Algumas tecnologias apenas precisam de melhorar a eficiência para se lançarem no mercado, enquanto outras necessitarão de mais investigação e desenvolvimento a longo prazo. As políticas devem ser formuladas com cuidado, de modo a não contribuírem para a já forte tendência de encarecimento da energia.

1.14

Aumentar prudentemente, após exaustivas avaliações de impacto, a utilização dos biocombustíveis nos transportes, na condição, porém, de começar por velar pela transposição efectiva da directiva vigente sobre a promoção da utilização dos biocombustíveis (1).

1.15

Reforçar a eficiência energética nos transportes através da adopção de uma série de medidas (ver ponto 6.3.1.5).

1.16

É premente reforçar a segurança nuclear e procurar uma solução para o problema do combustível irradiado, que está ainda por resolver na maioria dos países. De notar, porém, que se trata de uma responsabilidade dos operadores, cabendo às autoridades de segurança e aos organismos internacionais competentes tomar providências nesse sentido. No que toca ao transporte do combustível irradiado, é preciso respeitar tanto a regulamentação comunitária como os compromissos internacionais.

1.17

Empreender esforços sérios no domínio das tecnologias limpas do carvão, como, por exemplo, investir na eficiência das centrais eléctricas e em aplicações comerciais para a captação e o armazenamento do CO2, uma medida particularmente importante para os progressos globais.

1.18

Preparar-se para um novo aumento da utilização das reservas de carvão da União Europeia, também em estado líquido ou gasoso. Neste e em outros contextos, haverá que ter em mente que as decisões políticas em matéria de energia têm em geral grande impacto económico, social e ambiental e que quaisquer alterações — e o calendário para as efectuar — assumem dimensões consideráveis.

1.19

Incentivar os investimentos nos terminais para gás natural liquefeito, no intuito de diversificar as fontes de aprovisionamento e de desenvolver instalações de armazenamento e medidas de acondicionamento, o que permitirá reduzir os problemas existentes com a manutenção e o aumento da quota do gás natural na combinação de energias.

1.20

Há que garantir investimentos suficientes na produção e no transporte de energia, quer corrigindo o enquadramento jurídico, quer adoptando medidas financeiras adequadas. Por exemplo, os contratos a longo prazo podem constituir um instrumento útil dentro dos limites fixados para assegurar suficiente concorrência.

1.21

A UE deverá falar a uma só voz e assumir a sua posição como um dos mais fortes intervenientes na cena internacional quando negoceia com os fornecedores de energia, em especial com a Rússia. As reacções e negociações em matéria de abastecimento de energia devem ter em conta as várias facetas das dependências mútuas. A União não pode intervir directamente nos mercados da energia, mas, visto que em muitos dos países fornecedores a energia está nas mãos dos governos, deve apoiar fortemente os interesses dos intervenientes comunitários.

1.22

Ao se analisarem as circunstâncias envolventes das escolhas energéticas, há que analisar também os custos externos e o impacto de eventuais subsídios. Também se deverá avaliar cuidadosamente o impacto das medidas políticas climáticas e ambientais, actuais e futuras, nos outros objectivos de política energética — competitividade e segurança do aprovisionamento —, bem como na diversificação do aprovisionamento.

1.23

É necessário encontrar uma solução global para as políticas climáticas «pós-Quioto», que envolva, pelo menos, os principais produtores de emissões. Caso contrário, embora não se obtenham progressos significativos na atenuação das alterações climáticas, poderá existir o risco de prejudicar a evolução económica e social da UE.

1.24

Aumentar os esforços de I&D e o apoio da UE à I&D no sector da energia, em conformidade com a importância e os consideráveis desafios que a energia representa para a sociedade, e, a curto prazo, orientar os esforços para uma melhor eficiência energética, para o desenvolvimento das tecnologias de energias renováveis ainda distantes do mercado, das tecnologias limpas do carvão e da segurança nuclear. Muitas tecnologias de energias renováveis e de eficiência energética precisarão de recorrer a engenharia inteligente para reduzirem os custos. Para tornar possível a visão de um cenário de aprovisionamento energético que inclua as energias renováveis, a fusão nuclear e o hidrogénio será necessário um grande trabalho de investigação e desenvolvimento a longo prazo. Entretanto, há que incentivar e apoiar também elementos de outras visões promissoras do futuro.

2.   Introdução

2.1

O CESE elaborou desde 2002 vários pareceres exploratórios e de iniciativa sobre diversas fontes e tecnologias energéticas: energia nuclear, energias renováveis, combustíveis fósseis e eficiência energética. O presente parecer baseia-se nos anteriores, sem referir especificamente informações e análises mais pormenorizadas neles contidas.

2.2

É impossível prever com exactidão a evolução do sector da energia. Todas as previsões e simulações têm limitações. Acontecimentos surpreendentes ou acções políticas mais radicais podem alterar tendências. Mas as considerações políticas — e mais ainda as decisões — têm de se basear numa informação completa da situação presente, em previsões e cenários tão exactos quanto possível e na compreensão dos factores que aceleram ou travam a mudança. Esta opção baseia-se essencialmente nos cenários da Agência Internacional da Energia (AIE) e da Comissão Europeia e cobre um período que vai até 2030. A partir daí o quadro é muito menos preciso.

2.3

As escolhas das fontes de energia e das tecnologias energéticas é feita pelos investidores e pode ser influenciada por decisões políticas. A UE não tem poder directo sobre as escolhas das fontes de energia pelos Estados-Membros, mas influencia-as indirectamente através do seu mandato no domínio do ambiente. Os Estados-Membros deviam recorrer tanto quanto possível aos seus próprios recursos. As escolhas dos Estados-Membros influenciam-se mutuamente e mesmo os consumidores de Estados-Membros que não possuam, por exemplo, centrais nucleares ou a carvão partilham um mercado de electricidade que utiliza a energia nuclear e o carvão.

2.4

A nossa pergunta fundamental é: poderemos excluir desde já algum dos sistemas existentes ou futuros, ou alguma das opções possíveis? Por outras palavras, saberemos o suficiente e estaremos suficientemente confiantes para restringirmos as opções de que dispomos para cumprir os objectivos da política energética (isto é: um aprovisionamento de energia suficiente e seguro, preços razoáveis e competitivos, a redução dos efeitos negativos sobre o ambiente e o clima)? Procuraremos responder a esta pergunta e apresentaremos as respectivas conclusões e recomendações.

3.   O mercado mundial de energia e a evolução das emissões de dióxido de carbono

3.1

O futuro da energia mundial terá repercussões para o futuro energético da Europa. Actualmente, o consumo de energia e o crescimento externos são superiores aos internos. Mas a crescente procura de combustíveis fósseis repercute-se obrigatoriamente nos preços e na disponibilidade destes na Europa. As alterações dos preços levam a alterações nas escolhas energéticas, no comportamento dos consumidores (particulares e empresas) e na orientação dada aos esforços de investigação e desenvolvimento. Ora tudo isto afecta a Europa. É por isso que, ao se considerarem as opções europeias, é essencial dispor, como referência, de uma imagem do futuro energético a nível global. Nas suas Perspectivas Energéticas Mundiais de 2004 (World Energy Outlook 2004) a Agência Internacional de Energia (AIE) apresenta a sua visão do futuro energético mundial com dois cenários, mostrando a evolução de 2004 a 2030.

O Cenário de Referência de 2004 tem em conta as políticas e medidas governamentais aprovadas ou adoptadas em meados de 2004. O Cenário Mundial de Políticas Alternativas de 2004 (World Alternative Policy Scenario 04), doravante designado Cenário Alternativo de 2004, prevê como evoluiria o mercado energético global se os países de todo o mundo adoptassem um conjunto de medidas que, ou já estão actualmente a ponderar, ou que é razoável esperar que apliquem no período abrangido pela projecção. Algumas partes do Cenário de Referência de 2004 e do Cenário Alternativo de 2004 foram actualizadas nas Perspectivas Energéticas Mundiais de 2005 da AIE, passando a constituir o Cenário de Referência de 2005 e o Cenário Alternativo de 2005.

3.2

Segundo as projecções do Cenário de Referência de 2005, a procura mundial de energia primária deverá aumentar 52 % no período de 2002 a 2030, devendo-se mais de dois terços deste aumento aos países em desenvolvimento. A taxa anual de crescimento da procura de energia, que foi de 2,1 % nas últimas três décadas, abrandará para 1,6 %. Os sectores dos transportes e da produção de electricidade absorverão uma quota crescente da energia global, e o consumo mundial de electricidade duplicará ao longo desse período.

3.3

No Cenário Alternativo de 2005, a procura mundial de energia seria, neste caso, 10 % inferior à do Cenário de Referência de 2005.

3.4

O consumo de energia nos sectores finais crescerá 1,6 % ao ano até 2030 (Cenário de Referência de 2004). A procura por parte do sector dos transportes será a que crescerá mais rapidamente, com 2,1 % ao ano. O consumo de energia nos sectores da habitação e dos serviços crescerá à taxa média anual de 1,5 %, o mesmo acontecendo com a procura industrial.

3.5

Segundo o Cenário de Referência de 2004, a procura mundial de electricidade duplicará entre 2002 e 2030. O maior aumento sectorial registar-se-á no consumo de electricidade na habitação (119 %), seguido pelo sector dos serviços (97 %) e pela indústria (86 %). São necessárias quase 10.000 novas instalações, equivalentes a cerca de 4.800 gigawatts de nova capacidade, para satisfazer o aumento previsto da procura de electricidade e substituir as infra-estruturas envelhecidas.

3.6

De acordo com o Cenário de Referência de 2005, os combustíveis fósseis continuarão a dominar o consumo mundial de energia, sendo responsáveis por cerca de 83 % do aumento do consumo mundial de energia primária. A percentagem de utilização da energia nuclear baixará de 6,5 % para 4,7 %, esperando-se ao invés que a percentagem das fontes de energia renováveis aumente de 13 % para 14 %.

Comparada com o Cenário de Referência de 2004, a procura de combustíveis fósseis no Cenário Alternativo de 2004 diminui 14 % em 2030, ao passo que o consumo de energia nuclear aumenta 14 % e o das fontes de energia renováveis não hidroeléctricas (excluindo a biomassa) cresce 27 %.

3.7

O petróleo continuará a ser o principal combustível. A procura mundial de petróleo irá crescer 1,4 % ao ano até 2030 (Cenário de Referência de 2005), e a quota do mercado mundial da OPEP aumentará de 39 % em 2004 para 50 % em 2030. O comércio petrolífero inter-regional líquido crescerá para mais do dobro durante esse período, e as exportações do Médio Oriente são as que registarão maior crescimento.

Comparada com o Cenário de Referência de 2004, a procura de energia primária é 11 % menor no Cenário Alternativo de 2004.

3.8

A procura de gás natural crescerá à taxa constante de 2,1 % ao ano e o seu consumo aumentará 75 % entre 2003 e 2030. As fábricas de liquefacção tornar-se-ão um novo mercado importante para o gás natural, permitindo utilizar reservas situadas em locais distantes dos mercados tradicionais. A produção aumentará sobretudo na Rússia e no Médio Oriente.

No Cenário Alternativo de 2004 a procura de gás será 10 % menor.

3.9

O carvão continuará a desempenhar um papel fundamental na combinação de energias à escala mundial, aumentando à taxa média anual de 1,4 % (Cenário de Referência de 2005), sobretudo nos países em desenvolvimento asiáticos. O sector da electricidade será responsável por mais de 95 % desse crescimento. Mais de 40 % das reservas mundiais de carvão, equivalentes a quase 200 anos de produção ao ritmo actual, estão situadas nos países da OCDE.

No Cenário Alternativo, a procura de carvão em 2030 será quase Formula inferior à indicada no Cenário de Referência.

3.10

Segundo o Cenário de Referência de 2005, as emissões mundiais de dióxido de carbono aumentarão 1,6 % ao ano entre 2003 e 2030, devendo-se quase 70 % desse aumento aos países em desenvolvimento. Prevê-se que a produção de electricidade contribua para cerca de metade do aumento das emissões mundiais e que os transportes continuem a constituir a segunda maior fonte de emissões de dióxido de carbono em todo o mundo.

Segundo o Cenário Alternativo de 2005, em 2030 as emissões de dióxido de carbono serão 16 % inferiores às do Cenário de Referência e a taxa de crescimento anual no período da projecção diminuirá para 1,1 %.

4.   Mercado de energia e evolução das emissões de dióxido de carbono na UE

4.1

A Comissão Europeia previu vários cenários sobre o futuro energético da UE, com diferentes suposições. Neste capítulo são apresentados dois deles. O Cenário de Base de 2005 (Baseline 2005) mostra o futuro de acordo com as tendências actuais e as políticas a UE e dos Estados-Membros adoptadas antes do final de 2004. Quanto ao Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004 (The high levels of energy efficiency and renewables 04), visa simular os efeitos sobre os recursos energéticos e o ambiente que poderão produzir rigorosas — e rigorosamente aplicadas — políticas de promoção da eficiência energética e da utilização das energias renováveis, tanto quanto tais medidas poderão ser formuladas. Visto que este último cenário não foi actualizado, só o Cenário de Base de 2005 serve de termo de comparação e os dois cenários não são comparáveis. A Comissão não apresentou cálculos das diferenças de custo entre ambos os cenários.

4.2

No ano 2005 o consumo de energia primária na UE a 25 era composto por 18 % de combustíveis sólidos (principalmente carvão), 37 % de combustíveis líquidos (petróleo), 24 % de gás natural, 14 % de energia nuclear e 7 % de energias renováveis. Na produção de electricidade utilizaram-se 29 % de carvão e lignite, 20 % de gás natural, 31 % de energia nuclear, 15 % de energias renováveis (incluindo grandes centrais hidroeléctricas), e 5 % de produtos petrolíferos.

4.3

Segundo as projecções do Cenário de Base de 2005, a procura de energia primária na UE será 15 % mais elevada em 2030 do que em 2000 (+ 0,5 % ao ano), com um crescimento do PIB de 79 %. O Cenário de Base de 2005 mostra que a dissociação entre a procura de energia e o PIB irá continuar e que a intensidade energética (rácio entre o consumo de energia e o PIB) apresenta uma melhoria de 1,5 % ao ano.

No Cenário «Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis» de 2004, prevê-se que, em 2030, as necessidades de energia sejam 14,1 % inferiores aos níveis do Cenário de Base de 2004, mas ainda ligeiramente superiores ao nível existente em 2000.

4.4

Segundo as projecções do Cenário de Base de 2005, o consumo de energia nos sectores finais deverá crescer 25 % até 2030. Prevê-se que a procura de energia no sector terciário em 2030 seja 49 % superior à de 2000, o que se deve ao aumento da procura de electricidade. Espera-se que a procura de energia na habitação aumente 29 % entre 2000 e 2030. Em 2030, o aumento da procura de energia face 2000 será de 21 % no sector dos transportes e de 19 % na indústria.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, a procura de energia é 10,9 % inferior aos níveis para 2030 que figuram no Cenário de Base de 2004.

4.5

Segundo o Cenário de Base de 2005, a procura de electricidade na UE aumentará 43 % entre 2005 e 2030. O crescimento da procura será especialmente rápido no sector da habitação (62 %), seguido pelo sector terciário (53 %) e pela indústria (26 %).

4.6

Prevê-se que a capacidade de produção de electricidade da UE aumente 51 % entre 2000 e 2030 (Cenário de Base de 2005). Uma percentagem crescente de electricidade será produzida sob a forma combinada de calor e electricidade (até quase 10 pontos percentuais, devendo atingir uma quota de produção combinada de 24 % em 2030). A estrutura da produção de energia alterar-se-á significativamente em favor das energias renováveis e do gás natural, enquanto a energia nuclear e os combustíveis sólidos perderão quotas de mercado.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, prevê-se que a produção global de energia em 2030 seja 16 % inferior aos níveis do Cenário de Base de 2004. Os combustíveis sólidos e a energia nuclear descem em termos absolutos (respectivamente, em 2030, -9,3 % do nível do Cenário de Base de 2004) para valores similares de produção de energia.

4.7

O petróleo permanecerá o combustível mais importante, se bem que o seu consumo não deva exceder o nível actual (Cenário de Base de 2005). Espera-se que a procura de gás natural aumente consideravelmente (38 % até 2030) após o substancial aumento que registou nos anos noventa. A quota de mercado dos combustíveis sólidos deverá diminuir ligeiramente até 2020, mas regressar praticamente ao nível actual em 2030, devido aos elevados preços do petróleo e do gás, bem como ao progressivo abandono da energia nuclear em certos Estados-Membros.

De acordo com o Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, uma menor necessidade de energia, combinada com políticas de promoção das energias renováveis, permitirá reduzir significativamente a procura de combustíveis fósseis. Os combustíveis sólidos são os que apresentarão maior declínio (-37,4 % dos níveis do Cenário de Base de 2004).

4.8

No Cenário de Base de 2005, as energias renováveis apresentam um crescimento, em termos relativos, superior ao dos outros combustíveis (mais do que duplicando em 2030 a sua actual parte de mercado), contribuindo quase tanto quanto o gás natural para o aumento da procura de energia.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, as políticas de promoção das energias renováveis permitirão um forte desenvolvimento destas fontes de energia no sistema energético da UE a 25. O aumento é de 43,3 % acima dos níveis do Cenário de Base de 2004 para 2030.

4.9

No Cenário de Base de 2005, a produção de energia nuclear é em 2030 ligeiramente inferior a 2000 (-11 %), o que se deve, por um lado, às decisões políticas de alguns antigos Estados-Membros de reduzir progressivamente a utilização desta energia e, por outro, às preocupações com a segurança das centrais em alguns dos novos Estados-Membros.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, a quota de mercado da energia nuclear seria 19,9 % inferior à do Cenário de Base de 2004.

4.10

A dependência das importações continuará a crescer, atingindo 65 % em 2030, um aumento superior a 15 pontos percentuais em relação ao nível actual (Cenário de Base de 2005). A mais elevada dependência externa continua a ser a do petróleo, atingindo 94 % em 2030. A dependência das importações de gás natural aumenta dos actuais pouco mais de 50 % para 84 % em 2030. Similarmente, também o abastecimento de combustíveis sólidos se apoiará de forma crescente nas importações, atingindo 59 % em 2030.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, a dependência das importações seria 4 a 6 % inferior à do Cenário de Base de 2004.

4.11

As emissões de dióxido de carbono baixaram entre 1990 e 2000. Hoje em dia voltaram ao nível de 1990 e prevê-se que ao longo dos próximos anos excedam o nível de 1990 em 3 % em 2010 e em 5 % em 2030. A longo prazo, o aumento moderado das emissões de dióxido de carbono reflecte uma evolução lenta no consumo de energia, bem como o papel importante que terão adquirido as fontes de energia isentas de emissões de CO2 e a energia nuclear.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, as emissões de dióxido de carbono são consideravelmente inferiores às da evolução prevista no Cenário de Base de 2004 (isto é, em relação aos níveis deste cenário, -11,9 % em 2010 e -22,5 % em 2030). A diminuição em relação ao ano 2000 seria de quase 10 %.

5.   Desafios políticos

5.1   Evolução dos preços

5.1.1

Os aumentos de preços, que são causados pela procura e globais, não têm — muito embora afectem os consumidores — um impacto forte nas economias nacionais quando geram procura nos países produtores. Mas os aumentos de preços abrangendo toda uma área económica, como acontece actualmente em parte com a electricidade, prejudicam tanto os consumidores como a competitividade. A longo prazo, o aumento dos preços altera a competitividade das diferentes fontes de energia e das respectivas tecnologias, a rendibilidade das medidas de eficiência e os comportamentos em geral.

5.1.2

Os preços do petróleo e dos produtos petrolíferos aumentaram drasticamente nos últimos anos e poderão continuar elevados nos próximos anos devido a várias razões, principalmente:

fortes pressões do lado da procura, devido ao rápido crescimento económico nos países asiáticos,

subinvestimento nas infra-estruturas de abastecimento, e ainda

factores geopolíticos e instabilidade política.

5.1.3

Os preços do gás natural sofreram fortes aumentos em todas as regiões, acompanhando os preços do petróleo. Na Europa os preços do gás estão normalmente indexados aos preços do petróleo. Dado que as reservas europeias estão concentradas na Rússia e na Noruega e não é provável que o gás natural liquefeito se torne competitivo a curto prazo, a relação entre os preços irá permanecer. A concorrência entre tipos de gás poderia exercer alguma pressão para uma descida dos preços, mas esse efeito seria em grande medida anulado pelo aumento dos custos de aprovisionamento.

5.1.4

É provável que os preços do carvão continuem moderados a longo prazo, porque muitos aspectos fundamentais do mercado permanecerão inalterados. São muitos os fornecedores actuais e potenciais, o mercado ainda é bastante competitivo e os preços do carvão manter-se-ão em princípio abaixo dos preços de outras matérias-primas da energia primária.

5.1.5

Presume-se que os custos de capital das energias renováveis continuem a diminuir no futuro. A taxa de diminuição mais rápida verificar-se-á nos custos da energia fotovoltaica, que é presentemente o sistema de produção de energia com maior intensidade de capital. Também se prevêem reduções consideráveis nos custos de capital dos parques eólicos offshore, bem como das tecnologias de utilização da energia térmica solar e da energia das ondas e das marés.

5.1.6

Na UE, os preços da electricidade aumentaram por diversas razões. O aumento dos preços do gás contribui para aumentar o preço da electricidade na maioria das regiões da União, onde o gás é um combustível marginal na produção de electricidade. Em contrapartida, os preços mais elevados da electricidade gerada em centrais a carvão dificilmente podem ser justificados pelo aumento constante das matérias-primas. O equilíbrio cada vez mais comprometido entre a oferta e a procura também começou a reflectir-se nos preços. As empresas de aprovisionamento de energia apontam como um dos motivos do aumento dos preços o comércio de emissões, que as obriga a repercutir os pretensos «custos» dos direitos de emissão nos preços ao consumidor, quando estes lhe são concedidos gratuitamente. As medidas de apoio às fontes de energias renováveis fizeram, em alguns casos, aumentar os preços da electricidade, como o fizeram também impostos e outras taxas. Além disso, a Comissão está presentemente a investigar se a insuficiente concorrência existente no mercado da electricidade afectou negativamente os preços.

5.2   Segurança do aprovisionamento

5.2.1

No seu Livro Verde sobre a segurança do aprovisionamento, a Comissão manifestou grande preocupação com esta questão, pois previa-se que a dependência energética externa da UE aumentaria de 50 % para 70 % em três décadas. No seu parecer sobre o Livro Verde (2), o CESE partilhou vivamente esta preocupação. Actualmente, a questão da segurança do aprovisionamento tornou-se mais premente ainda.

5.2.2

A dependência das importações de petróleo a partir de fontes externas está a aumentar e a concentrar-se cada vez mais no Médio Oriente. A crescente procura de gás natural também aumenta a dependência das fontes externas, concentrando-se na Rússia. O transporte por meio de longos oleodutos e gasodutos, que muitas vezes atravessam regiões politicamente instáveis, constitui uma preocupação adicional.

5.2.3

As falhas nas redes têm chamado a atenção (adicionalmente aos problemas de gestão e regulamentação) para a insuficiência dos investimentos face ao aumento da procura de ligações em rede e às distâncias em causa. A interligação das redes de electricidade e de gás natural em toda a Europa progrediu, mas ainda existem importantes zonas de estrangulamento estrutural entre os Estados-Membros. A regulamentação das redes tem de velar simultaneamente pela segurança, pela qualidade e por suficiente investimento.

5.2.4

Os investimentos em centrais eléctricas e refinarias de petróleo têm sido baixos nas últimas duas décadas. Quanto à electricidade, o período de excesso de capacidade está a terminar e até 2030 são necessários investimentos de 600-750 gigawatts para fazer face ao aumento crescente da procura e substituir as centrais envelhecidas. A necessidade de investir numa maior capacidade de produção, em particular para fazer face aos picos de consumo, poderia ser parcialmente compensada pela interconexão total das redes.

5.2.5

O facto de as políticas comunitárias visarem aumentar a utilização de fontes de energia renováveis constitui uma medida importante para contrariar a crescente dependência externa. Simultaneamente, as emissões de gases com efeito de estufa serão atenuadas e, em alguns casos, a dependência da rede diminuirá. No caso da biomassa e dos biocombustíveis, interessa assegurar a observância de uma utilização optimizada dos solos a longo prazo.

5.2.6

A percentagem de urânio importada de várias fontes pela UE perfaz 95 %. Segundo a Agência Internacional da Energia Atómica (AIEA) e a Agência de Energia Nuclear da OCDE, as fontes de urânio conhecidas à data deverão satisfazer a procura mundial, ao seu nível actual, durante os próximos 50 anos. Além disso, a existência, assinalada por medições geológicas, de outros potenciais depósitos remete para daqui a 280 anos a altura prevista para o esgotamento deste recurso. Até lá, espera-se que novas tecnologias forneçam mais soluções para o aprovisionamento de combustível.

5.3   Alterações climáticas

5.3.1

A UE assumiu a liderança mundial no combate às alterações climáticas. As suas políticas são únicas, bastante avançadas e ambiciosas, em especial o regime de comércio de direitos de emissão e a promoção das energias renováveis. Muitas outras regiões do mundo, incluindo as que produzem maior volume de emissões, não lhe seguiu o exemplo.

5.3.2

Os objectivos de Quioto são modestos face às tendências de aquecimento global, mas, mesmo assim, a maior parte dos Estados-Membros da UE parece ter dificuldade em atingi-los.

5.3.3

Até à data, as reduções das emissões foram, na sua maioria, conseguidas graças à substituição do carvão pelo gás natural na produção de calor e electricidade (no Reino Unido) e ao encerramento ou renovação de antigas unidades de produção na zona oriental da Alemanha. Muitas das actuais e futuras reduções das emissões afiguram-se, porém, mais complexas e dispendiosas.

5.3.4

É necessário encontrar uma solução global para as políticas climáticas «pós-Quioto», que envolva, pelo menos, os principais produtores de emissões. Caso contrário, embora não se obtenham progressos significativos na atenuação das alterações climáticas, poderá existir o risco de prejudicar a evolução económica e social da UE.

6.   Opções futuras

6.1   Visão a longo prazo

6.1.1

Afigura-se, actualmente, que um futuro cenário energético ideal, susceptível de minimizar os impactos ambientais e climáticos e de assegurar suficiente aprovisionamento global, consistiria em utilizar as fontes de energia renováveis para a produção de calor e de diversas cargas de electricidade, em recorrer à fusão nuclear para o abastecimento da energia de base e em encarar o hidrogénio como fonte de energia. Não se prevê, contudo, que esta combinação de energia esteja operacional em 2050, mas, provavelmente, só muito mais tarde. Um cenário alternativo mostraria um elevado grau de eficiência energética, a utilização das energias renováveis com base numa solução técnica para o armazenamento da electricidade — o hidrogénio, por exemplo — e a continuação do uso do carvão, em associação com a captura e o armazenamento do CO2.

6.1.2

A tecnologia de fusão ainda implica grandes desafios e incertezas, sendo necessárias algumas inovações técnicas básicas e, sobretudo, um grande esforço de desenvolvimento, para se poder tornar economicamente viável. Quanto a uma economia do hidrogénio generalizada iria requer dispor de electricidade em abundância. Ora, um hidrogénio dependente de fontes de energia renováveis ou do gás natural não poderá assegurar, pelo menos não por si só, uma economia do hidrogénio suficientemente sólida.

6.1.3

É difícil determinar o potencial global das fontes de energia renováveis, quando se tomam em consideração algumas limitações naturais e económicas. Alguns estudos apontaram para a possibilidade de a Europa atingir uma quota de energias renováveis próxima dos 100 % em 2050, mas nem esta opinião é amplamente partilhada, nem os cenários da Comissão a sustentam: mesmo o cenário alternativo mais optimista de uma utilização intensa das energias renováveis não vai além de uma quota de 15 % em 2030. Até à data, a evolução da utilização de fontes de energia renováveis na UE a 25 tem ficado aquém dos objectivos fixados.

6.2   Eficiência energética

6.2.1

A eficiência energética e a economia de energia são elementos centrais da política energética. Recentemente, num parecer sobre o Livro Verde em matéria de eficiência energética, o CESE apoiou vivamente acções neste domínio e tomou posição sobre grande número de possíveis instrumentos e medidas.

6.2.2

A eficiência energética exerce influência na futura combinação de energias. A diminuição relativa da procura levaria, por acção das forças do mercado, a uma menor utilização da fonte de abastecimento menos económica, ou, mediante eventuais medidas políticas, da fonte de energia menos desejada.

6.2.3

No seu recente Livro Verde sobre a eficiência energética, a Comissão estima em 20 % (1,5 % ao ano) a taxa de redução da procura de energia conseguida com a eficiência energética, o que permitiria regressar ao nível da procura existente em 1990 na UE a 25. Os cenários divulgados pela Comissão não indicam, todavia, tal diminuição em 2030, nem mesmo aquele que pressupõe a adopção de medidas políticas mais enérgicas.

6.2.4

No seu parecer, o CESE apoia firmemente a ideia de que uma maior eficiência energética é uma condição essencial para o desenvolvimento sustentável, a competitividade e a independência económica. A seu ver, ela faz simplesmente sentido do ponto de vista económico, se não for levada longe demais. Procurar aumentar a eficiência energética é uma prática quotidiana das empresas, sendo os acordos voluntários um bom instrumento para o conseguir. Em certos sectores, são necessárias muitas medidas, como a sensibilização e a difusão de conhecimentos, para além de medidas económicas adequadas. O CESE considera, contudo, que os objectivos propostos no Livro Verde são optimistas.

6.2.5

Apesar das medidas de eficiência energética, os cenários sugerem que é pouco provável a procura de energia diminuir antes de 2030 na UE a 25, podendo até estabilizar. Um reforço do investimento na eficiência energética seria, pois, altamente benéfico.

6.3   Opções nos diferentes domínios de utilização

Para analisar as diferentes opções de combinação de energias à luz dos desafios políticos acima referidos, convém examinar separadamente os diversos domínios de utilização da energia primária — transportes, calor e electricidade —, pois a sua interdependência é apenas marginal.

6.3.1   Transportes

6.3.1.1

Os transportes estão quase totalmente dependentes dos combustíveis líquidos, isto é, na prática, dos produtos petrolíferos, e o único substituto actualmente existente é, de certa forma, o transporte ferroviário eléctrico. Uma percentagem pequena, mas crescente, de gás natural é utilizada nos transportes públicos, o que permite alguma diversificação, mas não deixa de colocar questões ligadas ao aumento do consumo de gás.

6.3.1.2

A UE fixou como objectivo substituir até 5,75 % dos combustíveis à base de petróleo por biocombustíveis em 2010, mas devido aos actuais preços elevados do petróleo, já são largamente consideradas taxas de substituição bem mais elevadas. A Comissão apresentou uma comunicação sobre o aumento da utilização dos biocombustíveis em Fevereiro de 2006 (o chamado «Plano de acção “biomassa”»). Ora, quando se planeiam políticas nesse sentido, há muitos factores a ter em conta, como os balanços energéticos líquidos, as políticas comercial, financeira, ambiental e agrícola, e os custos para os consumidores. Outras questões importantes são a manutenção da segurança do aprovisionamento e o impacto nas utilizações alternativas da biomassa.

6.3.1.3

Os automóveis a pilhas de combustível estão em fase de ensaio. Uma questão fundamental é saber qual será o combustível utilizado. De futuro, o hidrogénio poderá ser produzido a partir de fontes de energia renováveis ou do gás natural, bem como a partir da água, por acção da electricidade. Até agora, as pilhas de combustível são muito mais caras do que os motores de combustão.

6.3.1.4

A electricidade pode constituir uma alternativa viável como fonte de energia para os transportes, como, por exemplo, para os veículos híbridos, munidos de uma unidade de alimentação de corrente.

6.3.1.5

Não se vislumbra uma forma rápida de obter um sistema de transportes sem petróleo e, por isso, há que redobrar os esforços para aumentar a eficiência energética nos transportes, através dos seguintes elementos:

melhores tecnologias para motores e combustíveis,

automóveis mais leves, veículos de transporte de mercadorias mais eficientes,

melhores transportes públicos, secundados pela instalação de portagens nos centros das cidades,

transferência máxima do transporte para as vias ferroviárias e fluviais, dado funcionarem de forma eficiente,

combate ao congestionamento do tráfego, por exemplo, através da flexibilização dos horários de trabalho.

As necessidades de transporte podem ser reduzidas através do ordenamento do território e do teletrabalho.

Para uma análise aprofundada das infra-estruturas europeias de transportes e dos desafios que enfrentarão no futuro, aconselha-se a consulta do parecer do CESE intitulado «As infra-estruturas de transportes do futuro: planificação e países limítrofes, mobilidade sustentável, financiamento».

6.3.2   Aquecimento e refrigeração

6.3.2.1

Na Europa utilizam-se predominantemente os combustíveis fósseis no aquecimento — petróleo, gás e carvão —, mas a quota do gás natural está a crescer rapidamente. A electricidade também é bastante utilizada enquanto se popularizam a biomassa no Norte e a energia solar no Sul. Na refrigeração, a electricidade continua a ser a fonte dominante, mas outras opções, como os serviços de distribuição urbana de frio a partir das centrais de produção combinada de calor e electricidade, estão, por exemplo, a ganhar terreno.

6.3.2.2

Na Europa, 40 % da energia é consumida nos edifícios, para aquecer e refrigerar. Segundo os peritos, há grandes possibilidades de melhorar a eficiência energética e poupar energia, tendo a UE tomado já medidas a este respeito.

6.3.2.3

As energias renováveis têm grandes potencialidades neste domínio. A biomassa poderia ser muito mais largamente usada nos sistemas modernos de aquecimento ou refrigeração de áreas ou bairros inteiros, combinada com a produção de electricidade, quando tal fosse aplicável. A energia geotérmica oferece potencialidades quase inexploradas, e o aquecimento solar está surpreendentemente pouco desenvolvido em certos países do Sul.

6.3.2.4

O aquecimento e a refrigeração representam uma utilização muito local da energia, pelo que as medidas para melhorar a eficiência da utilização de energia nos edifícios devem ser tomadas a nível local. A nível da UE, há que adoptar medidas para apoiar o desenvolvimento tecnológico, partilhar conhecimentos e melhores práticas e assegurar um mercado interno funcional para os produtos e serviços conexos.

6.3.3   Electricidade

6.3.3.1

As fontes de produção de electricidade são variadas: carvão, gás, petróleo, energia hidroeléctrica, nuclear e eólica, bem como os combustíveis não fósseis, como a biomassa. As tecnologias fotovoltaica e das marés estão em desenvolvimento.

6.3.3.2

A maioria das centrais eléctricas europeias terá de ser substituída num futuro próximo, tanto as centrais eléctricas mais comuns, baseadas em combustíveis fósseis, como as centrais nucleares. Esta situação oferece uma possibilidade única para se avançar para fontes de energia isentas de emissões de carbono e, ao mesmo tempo, para diminuir a dependência externa.

6.3.3.3

É possível tomar medidas de eficiência energética ao longo de toda a cadeia da electricidade — das tecnologias em matéria de combustíveis e de centrais eléctricas até à concepção eco-eficiente dos produtos que utilizam a electricidade.

6.3.3.4

A opinião geral é, porém, que a procura de electricidade continuará a crescer durante mais algumas décadas, tendo de ser construídas entre 400 e 800 novas centrais eléctricas, equivalentes a 400 gigawatts na UE dos 25.

6.3.3.5

A melhor combinação possível de aprovisionamento energético inclui diversos tipos de capacidade de produção, correspondentes a diferentes procuras. Para fazer face a cargas de base, isto é, a uma procura estável e contínua, a capacidade de produção é melhor assegurada por centrais hidroeléctricas, nucleares ou de combustão, que utilizam combustíveis menos caros, como o carvão. As cargas variáveis — equivalentes à maior parte do consumo — exigem um abastecimento facilmente regulável, como a energia hidroeléctrica ou termoeléctrica. As cargas de pico são preferencialmente fornecidas por centrais com baixos custos de capital, mas normalmente associadas a custos de funcionamento elevados, como as turbinas a gás. A capacidade de produção para fazer face a cargas de base pode igualmente ser empregue para aumentar a energia hidroeléctrica no caso de cargas de pico. A utilização de fontes de energia intermitentes exige um abastecimento auxiliar de fácil regulação.

6.3.3.6

Seriam necessárias redes eléctricas — incluindo interligações —, em número suficiente e suficientemente fiáveis para tornar a utilização das centrais eléctricas mais eficiente e diminuir a necessidade de construir novas centrais. Por outro lado, seria preciso optimizar o sistema de abastecimento, a fim de se evitar recorrer ao transporte de electricidade por longas distâncias, quando se poderiam construir centrais eléctricas onde a procura é maior. Quanto à distribuição da energia produzida, as centrais de produção combinada de calor e electricidade são uma opção a explorar. Por fim, num mercado que funcionasse correctamente, uma boa gestão da procura poderia fazer diminuir a procura de pico.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie Sigmund


(1)  Dir. 2003/30/CE, JO L 123, de 17.05.3003.

(2)  «Para uma estratégia europeia de segurança do aprovisionamento energético», JO C 221, de 07.08.2001.


ANEXO

ao parecer do Comité Económico e Social Europeu

As propostas de alteração que se seguem, rejeitadas durante o debate na plenária, obtiveram votos favoráveis de, pelo menos, um quarto dos votos expressos:

Novo ponto 2.2.1

Aditar como segue:

«O CESE nota que os prognósticos citados se podem revelar errados ou ultrapassados pela evolução actual nos mercados de energia e especialmente do preço do petróleo. Isto porque qualquer prognóstico assenta em dados conjunturais e estes alteraram-se decisivamente nos últimos meses. Assim, por exemplo, um estudo encomendado pelo Ministério da Economia alemão  (1) conclui que se se estimar o futuro preço do petróleo em 60 dólares americanos por barril, o consumo de energia diminuirá 17 % até 2030 e passar-se-á a utilizar mais carvão e energias renováveis. Até agoracom um preço do petróleo convencionado de 37 dólares por barriltem-se acreditado num aumento do consumo.»

Justificação

É evidente que as nossas afirmações têm de assentar em prognósticos exactos e a relatora fez bem em citar a Agência Internacional da Energia (AIE) e a Comissão Europeia. Não obstante, o CESE devia pelo menos incluir na reflexão os dados mais recentes, sem que isso signifique alterar as conclusões do seu parecer.

Resultado da votação

Votos a favor: 69

Votos contra: 85

Abstenções: 19

Ponto 2.3

Alterar como segue:

«As escolhas das fontes de energia e das tecnologias energéticas é feita pelos investidores e pode ser influenciada por decisões políticas. A UE não tem poder directo sobre as escolhas das fontes de energia pelos Estados-Membros, mas influencia-as indirectamente através do seu mandato no domínio do ambiente. Os Estados-Membros deviam recorrer tanto quanto possível aos seus próprios recursos. As escolhas dos Estados-Membros influenciam-se mutuamente. e os consumidores de Estados-Membros que não possuam, por exemplo, centrais nucleares ou a carvão dependem de um mercado em que se utiliza a energia nuclear e o carvão para a produção de electricidade »

Justificação

A asserção elidida não é correcta nesta forma. Por um lado, os países que prescindem ou tencionam renunciar às centrais nucleares ou a carvão têm muitas vezes capacidades alternativas suficientes de geração de electricidade. Por exemplo, o facto de a Alemanha se ver obrigada a importar energia nuclear da França ou da República Checa é determinado pelo mercado interno europeu e pelo excedente de capacidade criado deliberadamente em certos países, e não pela necessidade de colmatar uma eventual falta de energia, designadamente, apenas através de centrais nucleares estrangeiras.

Resultado da votação

Votos a favor: 60

Votos contra: 115

Abstenções: 13

Ponto 5.2.6

Aditar texto como segue:

«A percentagem de urânio importada de várias fontes pela UE perfaz 95 %. Segundo a Agência Internacional da Energia Atómica (AIEA) e a Agência de Energia Nuclear da OCDE, as fontes de urânio conhecidas à data deverão satisfazer a procura mundial, ao seu nível actual, durante os próximos 50 anos. Além disso, a existência, assinalada por medições geológicas, de outros potenciais depósitos remete para daqui a 280 anos a altura prevista para o esgotamento deste recurso . No entanto, este período poderá ser reduzido radicalmente se forem concretizados os planos de ampliação das centrais nucleares de certos Estados. Por exemplo, a Índia prevê ampliar o actual parque de centrais nucleares de 3.000 MW para 300.000 MW, o que terá obviamente graves repercussões na disponibilidade mundial de urânio. Espera-se que, mais tarde, novas tecnologias forneçam eventualmente mais soluções para o aprovisionamento de combustível, só que, até à data, estas não foram ainda ensaiadas nem se encontram realmente disponíveis.»

Justificação

Clarificação.

Resultado da votação

Votos a favor: 62

Votos contra: 124

Abstenções: 6

Ponto 6.3.3.2

Alterar como segue:

«A maioria das centrais eléctricas europeias terá de ser substituída num futuro próximo, tanto as centrais eléctricas mais comuns, baseadas em combustíveis fósseis, como as centrais nucleares. Esta situação oferece uma possibilidade única para se avançar para sistemas de produção de electricidade menos nocivos para o ambiente (produção combinada de calor e electricidade, tecnologias limpas de utilização do carvão) fontes de energia isentas de emissões de carbono e, ao mesmo tempo, para diminuir a dependência externa, bem como para melhorar a eficiência da produção de energia.».

Justificação

Evidente. Ver também pontos 1.17 e 1.18, onde também fazemos referência às tecnologias limpas do carvão.

Resultado da votação

Votos a favor: 62

Votos contra: 121

Abstenções: 12


(1)  Elaborado pelo Instituto “Prognos” de Basileia e pelo Instituto “Sewctor da Energia” da Universidade de Colónia.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/195


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre

a «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao cumprimento dos deveres do Estado de bandeira»

COM(2005) 586 final — 2005/0236 (COD),

a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às regras comuns para as organizações de vistoria e inspecção dos navios e para as actividades relevantes das administrações marítimas»

COM(2005) 587 final — 2005/237 (COD),

a «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à inspecção de navios pelo Estado do porto»

COM(2005) 588 final — 2005/0238 (COD),

a «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 2002/59/CE relativa à instituição de um sistema comunitário de acompanhamento e de informação do tráfego de navios»

COM(2005) 589 final — 2005/0239 (COD),

a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece os princípios fundamentais que regem a investigação de acidentes no sector do transporte marítimo e altera as Directivas 1999/35/CE e 2002/59/CE»

COM(2005) 590 final — 2005/240 (COD),

a «Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à responsabilidade das transportadoras de passageiros por mar e por vias navegáveis interiores em caso de acidente»

COM(2005) 592 final – 2005/0241 (COD)

a «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à responsabilidade civil e às garantias financeiras dos proprietários de navios»

COM(2005) 593 final — 2005/0242 (COD)

(2006/C 318/32)

Em 25 de Janeiro (TEN/236), 8 de Fevereiro (TEN/235), 14 de Fevereiro (TEN/234 e 239), 28 de Fevereiro (TEN/237) e 15 de Março de 2006 (TEN/233 e 238), o Conselho decidiu, em conformidade com o n.o 1 do artigo 71.o e com o n.o 2 do artigo 80.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre as propostas supramencionadas.

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 18 de Julho de 2006, tendo sido relator D. RETUREAU e co-relatora A. BREDIMA-SAVOPOULOU.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 198 votos a favor, 2 votos contra e 5 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité acolhe favoravelmente, no seu conjunto, o terceiro pacote de medidas de segurança marítima, que constitui um novo avanço, construtivo e pró-activo, na melhoria da segurança marítima, porque permite limitar os acidentes e a poluição marítima e controlar melhor as suas consequências. O CESE é amplamente a favor das propostas respeitantes à acção do Estado de bandeira, à inspecção de navios pelo Estado do porto, ao acompanhamento efectuado pelas sociedades de classificação encarregadas de proceder às auditorias e investigações de acidentes, bem como à proposta de monitorização do tráfego dos navios (através do sistema VTM = «Vessel Traffic Management») e de informação sobre navios em perigo e locais de refúgio. Estas propostas reflectem as principais posições expostas pelo Comité nos pareceres sobre os pacotes de medidas «ERIKA I» e «ERIKA II». As propostas em exame melhoram diversos aspectos da cadeia do transporte e testemunham o empenhamento da União Europeia na qualidade dos transportes marítimos.

1.2

O Comité exprime uma certa preocupação quanto às propostas respeitantes à responsabilidade dos navios de passageiros, tal como estipulada na «Convenção de Atenas» da Organização Marítima Internacional (OMI), e à responsabilidade civil. A proposta sobre a responsabilidade civil, em especial, mereceria uma análise mais aprofundada.

1.3

O Comité Económico e Social Europeu considera que o reconhecimento textual das funções desempenhadas pela OMI constitui um elemento positivo, que está plenamente de acordo com o espírito dos pareceres publicados pelo Comité desde 1993 sobre a segurança marítima e a prevenção da poluição, nos quais tem reconhecido a necessidade de criar um quadro internacional para estas duas questões.

1.4

O CESE recomenda à Comissão que tome todas as medidas necessárias para que os Estados-Membros ratifiquem rapidamente as convenções existentes da OMI, nomeadamente a «Convenção sobre a Limitação da Responsabilidade em Sinistros Marítimos» («Convenção LLMC», de 1996). A ratificação destes instrumentos terá um impacto directo na segurança marítima, no ambiente global, na responsabilidade e na indemnização por danos devidos à poluição a nível mundial.

1.5

O CESE sugere à Comissão que exclua a navegação interior da sua proposta sobre a responsabilidade pelos passageiros nas vias de navegação interiores e publique uma proposta específica no quadro do programa «Naïades».

1.6

O CESE reitera o seu apelo, já formulado em resposta aos pacotes «ERIKA I» e «ERIKA II», de que um terceiro pacote de medidas intitulado «Segurança Marítima» evoque mais especificamente a dimensão humana, e lamenta que nem neste terceiro pacote o factor humano tenha merecido suficiente atenção a nível comunitário. O CESE propõe assim tomar como base para a elaboração de disposições adequadas a convenção sobre o «Código do Trabalho Marítimo» adoptado em 2005 na «Conferência Marítima» da OIT, que os Estados-Membros deviam ratificar com vista à harmonização das regras de base europeias e internacionais. A parte desse código reservada às «recomendações» («soft law») devia ser igualmente tida em consideração para melhorar a elaboração das normas europeias.

1.7

O CESE observa que a melhoria do processo legislativo passa por uma melhor aplicação das normas legislativas, pelo que chama a atenção para essa necessidade. Convida igualmente todas as partes implicadas a velarem pela aplicação das disposições do novo pacote de medidas para a segurança marítima.

1.8

O CESE chama a atenção para a necessidade de aumentar os recursos destinados ao controlo do Estado do porto pelos Estados-Membros, apelando, por outro lado, a um aumento do número de inspectores nos portos, a fim de assegurar a aplicação efectiva dos diversos aspectos dos pacotes em prol da segurança marítima. O CESE convida a Comissão a recorrer a todos os meios necessários para, em colaboração com os Estados-Membros, atrair e recrutar novos candidatos, devidamente qualificados, para o cargo de inspectores.

2.   Introdução

2.1

Na sequência dos prejuízos causados pelos acidentes do «Erika» (1999) e do «Prestige» (2002) nas costas francesa e espanhola, que são reveladores da vulnerabilidade das costas europeias, a União Europeia apressou-se a tomar medidas para instaurar um mecanismo defensivo, destinado a proteger as costas europeias contra os riscos de acidentes e de poluição marítimos e a melhorar as medidas de segurança dos navios que fazem escala nos seus portos. Foram aprovados dois pacotes legislativos: o «ERIKA I» (1), em 2001, e o «ERIKA II» (2), em 2002, que comportam em conjunto seis instrumentos jurídicos (três directivas e três regulamentos). Em 23 de Novembro de 2005, a Comissão publicou o seu terceiro pacote de medidas dedicadas à segurança marítima, no intuito de reforçar as regras comunitárias nesta matéria e de melhorar a eficácia das medidas existentes.

3.   Propostas da Comissão

3.1

Desde o alargamento da UE, a frota comunitária representa 25 % da frota mundial. O objectivo da Comissão Europeia é criar uma frota exemplar, capaz de assegurar um serviço marítimo seguro, competitivo e respeitador do ambiente.

3.2

O terceiro pacote «Segurança Marítima» permitirá velar melhor pela segurança do transporte marítimo comunitário, na medida em que propõe uma abordagem mais pró-activa, capaz de recriar uma concorrência sã e sustentável para os operadores que respeitam as normas internacionais. O pacote contém sete propostas, que têm em conta a experiência adquirida na aplicação da legislação comunitária sobre segurança marítima e prevenção da poluição e se articulam em torno de dois domínios de acção prioritários:

melhoria da prevenção dos acidentes e da poluição, e

gestão das consequências dos acidentes.

3.3   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao cumprimento dos deveres do Estado de bandeira

3.3.1

Esta proposta visa assegurar que os Estados-Membros garantam um acompanhamento eficaz da conformidade dos navios que arvoram as suas bandeiras com as normas internacionais preconizadas pela Organização Marítima Internacional (OMI), para o que devem contar com uma administração marítima que funcione segundo elevados critérios de qualidade. O que se pretende é, em suma, garantir que os Estados-Membros cumpram as suas obrigações internacionais de forma eficaz e coordenada.

3.4   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às regras comuns para as organizações de vistoria e inspecção dos navios e para as actividades relevantes das administrações marítimas

3.4.1

Esta proposta visa melhorar a qualidade do trabalho das sociedades de classificação autorizadas a procederem à inspecção e certificação dos navios (e por elas responsáveis), reformar o sistema de sanções previstas para as empresas que faltem às suas obrigações (aplicando-lhes penalidades financeiras mais graduais e proporcionais), e reforçar os poderes da Comissão, a fim permitir aos inspectores o acesso a todos os navios, independentemente da bandeira que arvorem. A qualidade do trabalho efectuado pelas sociedades de classificação deverá ser melhorada com a introdução de um sistema de controlo da qualidade.

3.5   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à inspecção de navios pelo Estado do porto

3.5.1

Esta proposta introduz o princípio de revisão em profundidade do sistema actual de controlo pelo Estado do porto (apelidado «MOU» = « M emorandum o f U nderstanding on Port State Control», e assinado em Paris), segundo o qual cada Estado-Membro deve inspeccionar pelo menos 25 % dos navios que fazem escala nos seus portos, substituindo-o por um objectivo comunitário que consiste em inspeccionar sistematicamente todos os navios, tendo porém presente a necessidade de aliviar a pressão que as inspecções tenderiam a exercer nos navios de qualidade.

3.5.2

Além disso, serão adoptadas medidas para melhorar a eficácia e a qualidade dos controlos efectuados nos navios presentes nos portos comunitários (que incidirão inclusivamente nas condições de trabalho das tripulações). O novo regime de inspecções concentrar-se-á nos navios de risco. Para os navios que não cumpram as normas, serão tomadas medidas mais severas, mediante um reforço das disposições que inclui a sua eventual interdição nas águas comunitárias.

3.6   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 2002/59/CE relativa à instituição de um sistema comunitário de acompanhamento e de informação do tráfego de navios

3.6.1

Entre os objectivos visados figura melhorar o quadro jurídico aplicável ao acolhimento de navios em perigo em locais de refúgio. Deverá acelerar-se a identificação de todos locais que possam servir de refúgio, o que, na ocorrência de um acidente marítimo, permitirá melhorar a eficácia da tomada de decisões. A Comissão propõe igualmente equipar todos os navios de pesca com sistemas de identificação automática (AIS), o que contribuirá para reduzir os riscos de colisão com navios de grande porte.

3.6.2

A extensão do sistema comunitário de intercâmbio de informações — o «SafeSeaNet» — a todo o território da União Europeia facilitará a monitorização dos movimentos dos navios e das respectivas cargas. Os navios serão nomeadamente informados dos riscos de formação de gelo em certas zonas marítimas.

3.7   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece os princípios fundamentais que regem a investigação de acidentes no sector do transporte marítimo e altera as Directivas 1999/35/CE e 2002/59/CE

3.7.1

A qualidade das normas em matéria de segurança marítima depende da capacidade de analisar as causas dos acidentes e de retirar daí todos os ensinamentos. A finalidade desta proposta é criar um quadro comunitário harmonizado para a investigação de acidentes. A investigação ficará a cargo de órgãos especializados independentes, devidamente autorizados. A proposta define claramente as directrizes ao nível da Comunidade e preconiza a cooperação entre as investigações técnicas de acidentes marítimos.

3.8   Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à responsabilidade das transportadoras de passageiros por mar e por vias navegáveis interiores em caso de acidente

3.8.1

O objectivo desta proposta é integrar no corpus legislativo comunitário as disposições da «Convenção de Atenas» de 2002 (unicamente aplicáveis aos trajectos internacionais e ainda não em vigor) e alargar a protecção garantida por esta convenção a todos os passageiros de embarcações no espaço da UE, tanto no tráfego marítimo nacional como no internacional ou em qualquer outra via navegável.

3.9   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à responsabilidade civil e às garantias financeiras dos proprietários de navios

3.9.1

Nesta proposta trata-se de incitar os proprietários de navios a agirem de forma mais responsável e de os obrigar a obter uma apólice de seguro ou qualquer outra garantia financeira que cubra os prejuízos causados a terceiros, bem como as despesas de repatriamento de profissionais marítimos «abandonados» pelo armador do navio no exercício da profissão.

3.9.2

O primeiro passo neste sentido consiste na ratificação pelos Estados-Membros de todas as convenções pertinentes da OMI, incluindo a «Convenção sobre a Limitação da Responsabilidade em Sinistros Marítimos» («LLMC»), de 1996. O texto da convenção de 1996 será incorporado no direito comunitário, a fim de garantir a aplicação integral e uniforme das suas disposições em toda a União Europeia. Em segundo lugar, a Comissão solicita ser mandatada para negociar na OMI uma revisão do protocolo de 1996, a fim de rever o nível a partir do qual o proprietário perde o direito de limitar a sua responsabilidade. Os navios que arvorem a bandeira de um Estado que não tenha ratificado a convenção de 1996 serão objecto de um regime de responsabilidade comparativamente mais severo, caso se prove negligência grave.

3.9.3

Os Estados-Membros devem assegurar-se de que os proprietários de navios que frequentam as águas comunitárias, seja qual for a sua bandeira, dispõem de uma garantia financeira em matéria de responsabilidade civil correspondente ao dobro dos limites máximos fixados pela referida convenção de 1996. Os proprietários devem igualmente dispor de uma garantia financeira para o caso de abandono dos profissionais marítimos pelo armador do navio, a qual deve ser comprovada por certificados a conservar a bordo do navio.

4.   Observações na generalidade

4.1   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao cumprimento dos deveres do Estado de bandeira

4.1.1

O CESE é bastante favorável a esta proposta, porquanto implica o cumprimento adequado das responsabilidades dos Estados-Membros e a sua sujeição aos instrumentos da OMI, em particular as disposições do código sobre a aplicação dos instrumentos obrigatórios da OMI respeitantes aos Estados de bandeira e ao seu sistema de auditoria dos Estados de bandeira.

4.1.2

O CESE interroga-se sobre a pertinência do artigo 9.o («Investigação do Estado de bandeira»), visto dizer respeito às investigações de acidentes, um tema já amplamente coberto pelo quinto instrumento proposto no terceiro pacote de segurança marítima. Contudo, preservar esse artigo reforça a necessidade de proceder a investigações e de os Estados-Membros fornecerem recursos adequados para o efeito.

4.1.3

O Comité reconhece que o artigo 10.o («Lotação de segurança») visa assegurar que os navios que arvorem bandeira dos Estados-Membros disponham de pessoal adequado a bordo, em conformidade com a Resolução A.890 (21) da Assembleia da OMI sobre os princípios da lotação de segurança («Principles on Safe Manning»). No entanto, o CESE está convencido de que a igualdade de condições entre os Estados de bandeira é essencial e de que a proposta da Comissão de produzir um relatório sobre a matéria, tal como sublinhada no artigo 15.o («Acordos de cooperação»), deverá ser concretizada quanto antes.

4.2   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às regras comuns para as organizações de vistoria e inspecção dos navios e para as actividades relevantes das administrações marítimas

4.2.1

A responsabilidade das sociedades de classificação não cessa de aumentar, devendo elas assumir perante as administrações dos Estados de bandeira grandes responsabilidades em matéria de segurança do transporte marítimo e de protecção do ambiente. O CESE aprova, pois, as medidas propostas, que procuram melhorar a qualidade do trabalho destes organismos habilitados a agir em nome dos Estados-Membros e reforçar os controlos e as penalidades, mediante a criação de um sistema de sanções graduais mais eficaz do que o actual.

4.2.2

Não obstante, dada a actual imbricação destas funções, o CESE considera oportuno distinguir mais claramente as funções estatutárias das de classificação, o que poderá passar por as confiar a diferentes inspectores de um mesmo organismo autorizado, ou a dois organismos distintos. Isso exigirá, porém, prever um período intercalar para, mediante negociações dos Estados-Membros com as sociedades em questão e entre as próprias sociedades de classificação, insistir continuamente na promoção de «melhores práticas» e recolhê-las finalmente num documento indicativo, destinado a evitar os conflitos de interesses.

4.2.3

Nos termos do n.o 3 do artigo 19.o, os Estados-Membros devem cooperar com as sociedades de classificação por eles habilitadas a desenvolver as regras e/ou regulamentações destas organizações reconhecidas. Apesar do disposto nos artigos 16.o e 17.o, o CESE considera que uma medida similar de obrigação recíproca devia ser aplicada às sociedades de classificação.

4.2.4

O CESE acolhe favoravelmente as disposições do artigo 20.o no que respeita à exigência de as organizações reconhecidas se consultarem e cooperarem entre si, a fim de assegurar a equivalência e a coerência na aplicação das convenções internacionais.

4.3   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à inspecção de navios pelo Estado do porto

4.3.1

O CESE aprova a reformulação da directiva por uma preocupação de clareza, visto ela reforçar e melhorar a eficácia da inspecção efectuada pelo Estado do porto, e nota a propósito que, nos últimos seis anos, o número de navios que foram objecto de uma inspecção obrigatória reforçada passou de 700 para 4.000.

4.3.2

O CESE aprecia a determinação de reconhecer os navios que respeitam as normas de qualidade, submetendo-os a menos inspecções, de concentrar os esforços na inspecção dos navios de alto risco e de desencorajar a utilização de navios que não satisfaçam as normas, interditando-lhes o acesso aos portos europeus. Dado que as disposições do novo sistema assentarão nos princípios incorporados no anexo II, a reformulação da directiva constitui uma ocasião única para impor e aplicar quanto antes o novo sistema.

4.3.3

O CESE regista com satisfação a previsão de intensificar o papel dos pilotos na detecção precoce de eventuais deficiências, mas preocupa-o o facto de a confusão entre funções comerciais e de inspecção não facilitar o trabalho dos pilotos, como acontece com os pilotos de mar alto, cujas companhias de quem dependem prestam serviços de pilotagem não obrigatórios.

4.3.4

O CESE congratula-se igualmente com a introdução, por esta directiva, da inspecção das condições de trabalho a bordo, atendendo ao importante papel que tantas vezes o factor humano desempenha nos acidentes marítimos. A inspecção das condições de vida e de trabalho dos profissionais marítimos a bordo e das suas qualificações exige maior número de inspectores com competências específicas. Com efeito, um único inspector teria dificuldade em realizar, em intervenções que são por regra muito breves, uma inspecção aprofundada sob uma perspectiva «dupla», isto é, técnica e social.

4.3.5

O Comité acolhe ainda favoravelmente a medida prevista no artigo 20.o, de elaboração anual, pela Comissão, de uma «lista negra» mostrando o desempenho dos armadores de navios e das companhias de navegação.

4.4   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 2002/59/CE relativa à instituição de um sistema comunitário de acompanhamento e de informação do tráfego de navios

4.4.1

É gratificante verificar que os repetidos apelos do CESE para instauração de um sistema de apoio aos navios em perigo foram ouvidos (artigo 20.o). O CESE aplaude, portanto, a proposta de reforçar a directiva existente através do aumento e da harmonização dos requisitos em matéria de «locais de refúgio» (3). Para a admissão num local de refúgio, um certificado de adesão a um «Clube P&I» (seguradoras especializadas em «Protecção e Indemnização») deverá constituir garantia financeira suficiente. No entanto, a ausência de tal documento não deverá servir de pretexto para recusar o acesso de um navio em perigo a um local de refúgio.

4.4.2

O CESE considera que a autoridade independente competente para lidar com os casos de acidente e orientar os navios em perigo para locais de refúgio deve, independentemente da obrigação de consulta das partes interessadas, reunir os poderes necessários para tomar decisões e assumir todas as responsabilidades indispensáveis, inclusivamente quaisquer possíveis consequências financeiras de decisões tomadas em situações de urgência.

4.4.3

O CESE constata que a pesca continua a figurar entre os sectores de actividade mais vulneráveis e congratula-se, a este respeito, com a obrigação de os navios de pesca disporem de um sistema de identificação automática (AIS). O CESE considera, aliás, que também as pequenas e médias empresas, nomeadamente as que se dedicam à pesca costeira, devem beneficiar de auxílios ou de regimes para poderem equipar-se com este sistema (4).

4.4.4

O CESE apoia igualmente as disposições que permitem aos Estados costeiros tomar medidas apropriadas para limitar os riscos que a formação de gelo em certas zonas marítimas no norte da União Europeia pode representar para a navegação. Esta questão é ainda mais importante se se considerarem os riscos particularmente elevados presentes no mar Báltico, onde transita um grande volume de produtos petrolíferos. No entanto, para evitar eventuais problemas ligados às normas estabelecidas por algumas sociedades de classificação para a navegação nas zonas sujeitas à formação de gelo, seria aconselhável os Estados uniformizarem as suas regras nesta matéria.

4.4.5

O CESE partilha a opinião de que a criação do sistema de intercâmbio de dados marítimos «SafeSeaNet» contribuirá substancialmente para melhorar a segurança marítima nas águas comunitárias.

4.5   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece os princípios fundamentais que regem a investigação de acidentes no sector do transporte marítimo e altera as Directivas 1999/35/CE e 2002/59/CE

4.5.1

O CESE apoia esta proposta, pois só graças a investigações técnicas independentes dos acidentes se podem tomar as medidas necessárias para evitar que se repitam. O Comité aprova igualmente a constituição de órgãos especializados independentes para efectuarem essas investigações e defende uma clara distinção entre elas e outras com fins repressivos.

4.5.2

O CESE acolhe favoravelmente a disposição do artigo 7.o, que prevê a realização de investigações conjuntas de segurança.

4.5.3

O CESE considera essencial a disposição constante no artigo 9.o, que prevê a não divulgação de informações para além das que servem a investigação de segurança. Inversamente, a disposição que permite a qualquer autoridade judiciária autorizar essa divulgação é preocupante. Assim, o CESE considera pertinente que todos quantos apresentem provas credíveis no âmbito destas investigações técnicas de acidentes possam beneficiar de imunidade ou mesmo de anonimato. A exemplo do que se passa na indústria do transporte aéreo, faria sentido permitir aos representantes do sector do transporte marítimo e aos representantes da sociedade civil organizada participarem no processo de investigação dos acidentes ocorridos, o que constitui não só uma valiosa fonte de ensinamentos para melhorar a prevenção futura, como também uma garantia de transparência. Aliás, a Comissão prevê, muito acertadamente, organizar um sistema de retorno da informação (feedback), de forma a capitalizar as experiências.

4.6   Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à responsabilidade das transportadoras de passageiros por mar e por vias navegáveis interiores em caso de acidente

4.6.1

O CESE apoia o objectivo fundamental desta proposta, que tenciona permitir a todos os passageiros à escala da UE beneficiarem do mesmo nível de protecção em caso de acidente, que se caracteriza por disposições modernizadas para regular a responsabilidade das transportadoras, por um sistema de seguro obrigatório e por um limite de indemnização apropriado. Estas normas de protecção aplicam-se igualmente a todos os passageiros que tenham comprado os seus bilhetes na Europa, mesmo que viajam fora das águas comunitárias ou a bordo de navios arvorando a bandeira de um país terceiro.

4.6.2

O CESE recorda que, no quadro de um projecto de decisão de 2003, os Estados-Membros foram convidados a ratificar o «Protocolo de Atenas» antes do final de 2005. Infelizmente, o processo de ratificação foi bloqueado. A proposta actual permitirá a aplicação uniforme das disposições do «Protocolo de Atenas» na União Europeia, cuja inserção no direito comunitário não dispensa os Estados-Membros da obrigação de o ratificarem para garantirem a sua aplicação a nível internacional.

4.6.3

O CESE salienta duas questões importantes, que continuam por resolver, relacionadas com a proposta de ratificação pelos Estados-Membros e com a entrada em vigor do «Protocolo de Atenas» de 2002. Trata-se, em primeiro lugar, da cláusula que contempla situações de guerra/terrorismo: o CESE chama a atenção para a resolução da OMI que dá aos Estados-Membros a possibilidade de, ao ratificarem o dito protocolo, formularem uma reserva que lhes permite emitir todos os certificados de seguro que lhes forem solicitados, salvo no caso de guerra/terrorismo. Em segundo lugar, trata-se dos limites máximos: a confederação internacional dos clubes P&I declarou estar em condições de cobrir os limites máximos previstos pelo protocolo, na condição de se encontrar uma solução para o problema do terrorismo. Propostas alternativas foram submetidas a exame e espera-se encontrar soluções viáveis a nível internacional e/ou europeu. O Fundo Comunitário de Solidariedade (Regulamento 2012/2002), actualmente em revisão, mas que vigorará a partir de 2007, pode prestar ajuda de urgência em caso de catástrofe (inclusivamente resultante de actos terroristas), mas isso não poderá substituir uma solução negociada — que o Comité considera urgente — de cobertura pelo seguro dos danos causados por um eventual ataque terrorista.

4.6.4

O CESE reconhece o interesse de conceder as mesmas indemnizações aos passageiros de navios que efectuam ligações intracomunitárias e internacionais, mas essa medida poderá vir a constituir uma fonte de dificuldades significativas para certas companhias pequenas ou para certos serviços.

4.6.5

No que respeita aos serviços de transporte marítimo de passageiros à escala nacional, o CESE propõe um período (transitório) de adaptação para colocar em prática esta proposta, a fim de minimizar qualquer repercussão negativa neste domínio e de evitar reduzir drasticamente a viabilidade económica dos serviços locais de ferry-boat, o que poderia afectar a regularidade das ligações com ilhas.

4.6.6

Quanto ao pagamento de adiantamentos às vítimas de acidentes ou a outros beneficiários por conta delas, o Comité apoia a proposta de pagamento antecipado no caso de incidentes de navegação para os quais o «Protocolo de Atenas» prevê um regime de responsabilidade rigoroso.

4.6.7

As disposições respeitantes às pessoas com deficiência e às informações prévias à viagem devem ser consideradas complementares e não um desvio em relação ao «Protocolo de Atenas». Disposições similares foram incorporadas no regulamento relativo aos direitos dos passageiros do transporte aéreo, decorrente da «Convenção de Montreal».

4.6.8

No que respeita à navegação interior, o CESE considera que o terceiro pacote de medidas de segurança marítima não tem devidamente em conta as diferenças entre o transporte por vias interiores navegáveis (cursos de água, rios, estuários, canais e lagos) e o transporte marítimo (ligações continente-ilha/s, serviço público assegurando a contiguidade territorial, e ligações internacionais). Se tanto a natureza como o tipo de exploração destes trajectos são diferentes, justifica-se um regime jurídico diferente (ao nível das regras de navegação, de segurança, de fiabilidade, de responsabilidade e de obrigatoriedade de seguro).

4.7   Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à responsabilidade civil e às garantias financeiras dos proprietários de navios

4.7.1

O CESE pronuncia-se a favor da ratificação, pelos Estados-Membros, do «Protocolo LLMC», de 1996, que, em relação às disposições do protocolo de 1976, duplicará os limites previstos para a responsabilidade civil dos proprietários de navios. O texto de 1976 é uma convenção horizontal, que cobre o conjunto dos sinistros marítimos. No entanto, o CESE toma nota da proposta de impor a todos os navios (independentemente da bandeira) que entrem em águas comunitárias a obrigação de se munirem de um certificado de responsabilidade financeira correspondendo ao dobro do montante previsto no «Protocolo LLMC» de 1996.

4.7.2

Por força da «Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar» (CNUDM), os Estados costeiros só podem aplicar normas diferentes das previstas nesta convenção aos navios com bandeira de um país terceiro que façam escala nos seus portos. Os clubes P&I declararam que só tencionavam emitir certificados conformes com os limites superiores definidos no protocolo de 1996.

4.7.3

O seguro é preferível à insolvência. O seguro depende de uma definição clara dos critérios de responsabilidade. A ilimitação da responsabilidade em caso de negligência grave pode conduzir a uma contracção do mercado de seguros e ao aumento do número de companhias de transporte marítimo possuindo um único navio que recorrem ao regime jurídico das sociedades de responsabilidade limitada.

4.7.4

O CESE constata, porém, que a apuração e o cálculo do alcance dos danos e da responsabilidade evoluíram bastante nos últimos anos: as indemnizações pagas em caso de danos são cada vez mais consideradas bastante inferiores aos montantes dos prejuízos directos — e sobretudo indirectos — constatados. Uma melhoria neste domínio seria sem dúvida bem-vinda. Para já, o Comité propõe que a Comissão proceda a uma análise económica da sua proposta. Essa análise deverá determinar o impacto económico de um abandono total da limitação da responsabilidade e verificar se convém aumentar os níveis dessa limitação.

4.7.4.1

O CESE recorda os seus anteriores pareceres sobre os pacotes «Erika I» e «Erika II» e reitera que a meta visada deve ser a compensação rápida e garantida das vítimas pelos danos sofridos, e não um encorajamento a insistir nos litígios e a deixar arrastar os processos por tempo indefinido. A ratificação de todas as convenções existentes da OMI devia permitir dispor de uma responsabilidade civil mais adequada, de um seguro obrigatório e de uma acção directa para reivindicações claramente definidas, como a própria proposta de directiva prevê.

4.7.4.2

Entende o CESE que a responsabilidade civil deve reger-se por regras claras e transparentes. Em direito marítimo, a negligência grave (gros negligence) é um conceito jurídico correntemente utilizado em litígios sobre danos na carga. No plano internacional, o conceito utilizado para afastar a responsabilidade sem culpa é o de «imprudência com consciência de que podem daí resultar danos»(recklesness with knowledge), solução que o Comité sustentara no parecer Erika II, mas aqui no domínio da poluição petrolífera. Para este efeito, o CESE propõe a introdução, no projecto de directiva, da menção de alguns elementos objectivos, para ajudar os Estados-Membros e os tribunais a determinar satisfatoriamente a «negligência grave». Caso contrário, há risco de divergência entre Estados-Membros na aplicação da directiva.

4.7.4.3

O CESE mantém a sua posição de que os certificados de garantia financeira devem ser validados por um certificado de entrada num clube P&I, em vez de um certificado emitido por um Estado-Membro. O certificado de entrada num clube P&I corresponde aos objectivos do instrumento proposto e pode ser obtido junto de um destes clubes.

4.7.5

O CESE considera que a proposta, tal como se encontra formulada, entra em contradição com as disposições da Directiva 2004/35/CE, de 21 de Abril de 2004, sobre a responsabilidade ambiental em matéria de prevenção e reparação dos danos ambientais, a qual reconheceu a aplicação prevalecente das convenções da OMI, incluindo a «LLMC». Dessa contradição poderiam resultar problemas no âmbito do direito internacional dos tratados para os Estados-Membros signatários das convenções «LLMC» de 1976 e de 1996.

4.7.5.1

O CESE apoia a proposta de velar para que os navios disponham de certificados de garantias financeiras em caso de abandono dos profissionais marítimos pelos armadores e nota que o grupo de trabalho OMI-OIT se está a dedicar a este assunto, que é da sua competência a nível internacional.

4.7.6

A responsabilidade e a indemnização no caso de derrame de substâncias químicas e de combustíveis de qualquer espécie regem-se pelas convenções sobre substâncias nocivas e perigosas e sobre o derrame de hidrocarbonetos dos depósitos dos navios. Estas convenções reflectem o compromisso a que chegou a comunidade internacional. O CESE recomenda vivamente à Comissão que empenhe todos os esforços necessários para que os Estados-Membros da UE ratifiquem rapidamente a convenção sobre as substâncias tóxicas e perigosas, bem como a convenção sobre os hidrocarbonetos nos depósitos dos navios, para que entrem em vigor sem mais demora.

5.   Observações na especialidade

5.1

O Comité toma nota, com interesse, da recente 94.a«Conferência Internacional do Trabalho» (Marítimo) da OIT, que adoptou uma «Convenção Marítima» unificada, contendo uma parte de imposições e uma outra de recomendações. O conjunto das convenções marítimas que têm vindo a se adoptadas desde a década de 20 do século passado, e por várias ocasiões alteradas, está hoje reunido e modernizado num «Código do Trabalho Marítimo» claro e universal. O CESE toma igualmente nota da intenção da Comissão de incorporar a convenção da OIT (isto é, o «Código Marítimo») no direito comunitário, e apoia os esforços em curso do grupo de trabalho sobre o diálogo social para que a convenção entre em vigor e para identificar a melhor maneira de abordar a questão da sua transposição para o direito comunitário.

5.2

Tendo em conta a sua constante preocupação com o factor humano no transporte marítimo, o CESE convida a Comissão a fixar-se como objectivo incitar todos os Estados-Membros a ratificarem o mais rapidamente possível esta convenção, com vista a dispor quanto antes de uma base legislativa harmonizada. Para a convenção poder entrar em vigor são necessárias 30 ratificações, representando um terço da tonelagem bruta mundial. A UE poderia apoiar grandemente esse processo, promovendo a almejada ratificação pelos países do Espaço Económico Europeu e pelos países terceiros com os quais tem acordos de cooperação económica.

5.3

O impacto nas administrações dos Estados do porto e de bandeira da acumulação de medidas propostas (emissão de certificados, inspecção social, inspecção reforçada, objectivo de inspecção de 100 % dos navios, etc.) deverá ser rapidamente avaliado pelas autoridades competentes, para que estas possam tomar em tempo útil as necessárias medidas de organização, de financiamento e de recrutamento.

5.4

Perante as importantes obrigações que incumbem à Agência Europeia de Segurança Marítima, importa igualmente que esta disponha de meios suficientes para as cumprir da melhor maneira.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  «Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 95/21/CE do Conselho relativa à aplicação, aos navios que escalem os portos da Comunidade ou naveguem em águas sob jurisdição dos Estados-Membros, das normas internacionais respeitantes à segurança da navegação, à prevenção da poluição e às condições de vida e de trabalho a bordo dos navios (inspecção pelo Estado do porto)»;

«Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 94/57/CE do Conselho relativa às regras comuns para as organizações de vistoria e inspecção dos navios e para as actividades relevantes das administrações marítimas»;

«Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à introdução acelerada dos requisitos de construção em casco duplo ou equivalente para os navios petroleiros de casco simples» (Parecer do CESE: JO C 14, de 16.01.2001).

(2)  «Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à instituição de um sistema comunitário de acompanhamento, controlo e informação para o tráfego marítimo»;

«Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à constituição de um fundo de compensação de danos causados pela poluição por hidrocarbonetos em águas europeias e medidas complementares»;

«Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que institui a Agência Europeia da Segurança Marítima» (parecer do CESE: JO C 221 de 07.08.2001).

(3)  As excelentes práticas do sistema britânico «SOSREP» constituem uma importante fonte de inspiração neste domínio.

(4)  O Fundo Europeu das Pescas (FEP), adoptado pelo Conselho em 16 de Junho último, permite um financiamento que vai até 40 % do custo dos equipamentos de segurança, sendo, porém, de esperar medidas complementares a nível dos Estados-Membros.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/202


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 89/552/CEE do Conselho relativa à coordenação de certas disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros relativas ao exercício de actividades de radiodifusão televisiva»

COM(2005) 646 final — 2005/0260 (COD).

(2006/C 318/33)

Em 7 de Fevereiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 47.o e do artigo 55.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 18 de Julho de 2006. Relator: HERNÁNDEZ BATALLER.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 53 votos a favor, 7 votos contra e 10 abstenções, o presente parecer.

1.   Introdução

1.1

Em 13 de Dezembro de 2005, a Comissão Europeia apresentou uma proposta destinada a actualizar a Directiva comunitária conhecida como «Televisão sem fronteiras», cuja primeira versão data de 1989 (1) e que já foi alterada em 1997 (2). Em caso de conflito, as disposições desta Directiva prevalecerão sobre a regulação geral da prestação de serviços nos aspectos relacionados com o acesso à actividade e ao seu exercício (3).

1.2

O objectivo declarado desta alteração, prevista no quadro dos procedimentos de acompanhamento e de balanço da aplicação da legislação, é adaptar a directiva ao novo contexto de convergência tecnológica, em que os conteúdos e serviços audiovisuais excedem já em muito a visão tradicional da radiodifusão televisiva, e geram novas necessidades de regulamentação para garantir, tanto o funcionamento do mercado único e a existência de uma indústria europeia de conteúdos forte e criativa, como os direitos dos cidadãos. A modernização do quadro regulamentar comunitário sobre conteúdos dos meios audiovisuais faz também parte da estratégia i2010, cuja finalidade é uma sociedade da informação europeia em prol do crescimento e do emprego (4).

1.2.1

A proposta de alteração da directiva, que inicialmente estabelecia como âmbito de regulação o conjunto dos serviços audiovisuais, concretiza, após a reunião de Liverpool (5), esse âmbito nos denominados serviços de comunicação audiovisual, estabelecendo níveis normativos diferentes conforme a natureza linear ou não desses serviços. A Directiva passaria a referir-se à coordenação de certas disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros respeitantes à oferta de serviços de comunicação audiovisuais, passando a ser conhecida como Directiva dos Serviços de Meios de Comunicação Audiovisuais e já não como Directiva da Televisão sem Fronteiras.

1.2.2

Continuariam a não ser abrangidas pela Directiva, em todo o caso, as mensagens transmitidas num contexto privado, as versões electrónicas dos jornais ou revistas, os sítios Internet não destinados fundamentalmente a difundir conteúdos audiovisuais, ou as transmissões de radiodifusão sonora.

1.3

A proposta de alteração inscreve-se no âmbito do acordo interinstitucional «Legislar melhor», adoptado em 2003 com dois objectivos: por um lado, simplificar, flexibilizar e diminuir o número de obrigações regulamentares dos fornecedores de serviços de comunicação audiovisuais da UE. Por outro lado, promover a auto-regulação e a co-regulação no sector. Procura-se também consolidar um quadro de regulamentação simples e fundamental, consolidando ao mesmo tempo o princípio da legislação do país de origem, uma vez que a directiva tenha sido transposta para o ordenamento jurídico dos diversos Estados-Membros.

2.   Proposta da Comissão

2.1

Como já se disse, a Comissão propõe alargar o âmbito de aplicação da Directiva a todos os serviços (6) de meios de comunicação audiovisual, entendendo como tal o fornecimento de imagens em movimento, com ou sem som, destinadas a informar, formar e entreter o público através das chamadas redes electrónicas (7).

2.2

Estes serviços de meios de comunicação audiovisual podem por sua vez ser:

Lineares, quando o utilizador se deve adaptar às condições temporais de difusão dos serviços ou conteúdos estabelecidos pelo fornecedor, seja qual for o canal de difusão (televisão terrestre, por satélite ou cabo); Internet; telefonia móvel; etc.);

Não lineares, quando o utilizador decide em que momento deseja aceder ao serviço ou conteúdo especifico disponível na oferta do fornecedor.

2.2.1

De acordo com esta distinção, a «radiodifusão televisiva» é definida como um serviço de comunicação audiovisual linear, em que um fornecedor de serviços de comunicação decide o momento em que é transmitido um programa específico e estabelece o horário dos programas. E o organismo ou operador de radiodifusão televisiva é definido como o fornecedor de serviços de comunicação de forma linear.

2.3

De acordo com esta extensão do âmbito de aplicação, a proposta de alteração da directiva introduz o conceito global de comunicação comercial audiovisual, referido a todo o tipo de imagens em movimento, com ou sem som, que acompanham os serviços de meios de comunicação audiovisuais com a intenção de promover, directa ou indirectamente, a aquisição de bens e serviços. A publicidade televisiva entende-se assim como uma parte da comunicação comercial audiovisual, quando se trata de mensagens emitidas por televisão, tanto para a promoção da aquisição de bens e serviços a troco de remuneração ou contrapartida semelhante, como para efeitos de auto-promoção do organismo de radiodifusão. O mesmo se passa com as televendas.

2.3.1

A proibição de publicidade televisiva e de televendas relativa a cigarros e outros produtos de tabaco alarga-se a todas as formas de comunicação comercial audiovisual. Também se mantém a proibição de publicidade e televendas de medicamentos que requerem receita médica bem como se mantêm os limites nos anúncios publicitários no caso das bebidas alcoólicas, para não se estimular o seu consumo imoderado e para proteger os menores:

não poderá estar dirigida especificamente aos menores nem, em particular, apresentar menores consumindo essas bebidas;.

não deve associar o consumo de álcool a uma melhoria do rendimento físico ou à condução de veículos;

não deve dar a impressão de que o consumo de álcool contribui para o êxito social ou sexual;

não deve sugerir que as bebidas alcoólicas têm propriedades terapêuticas ou um efeito estimulante ou sedativo ou que constituem um meio para resolver conflitos;

não deve estimular o consumo imoderado de bebidas alcoólicas ou oferecer uma imagem negativa da abstinência ou da sobriedade;

não deve sublinhar como qualidade positiva das bebidas o seu elevado teor alcoólico.

2.3.2

A proposta de alteração mantém a proibição de «publicidade oculta», entendida como a apresentação oral ou visual de produtos, de serviços, da marca ou das actividades de um fabricante de produtos ou de um fornecedor de serviços em programas, quando essa apresentação seja feita de forma intencional pela empresa de radiodifusão televisiva, com fins publicitários, e possa induzir o público em erro quanto à natureza publicitária dessa apresentação. Volta-se a recordar que a publicidade televisiva deverá ser facilmente reconhecível e claramente separada da restante programação por meios visuais e ou acústicos.

2.3.3

Não obstante, introduz-se uma nova definição referente à colocação de produto, que fica assim diferenciada da comunicação comercial audiovisual oculta, apesar de se definir de um modo muito similar: a inclusão ou a referência a um produto, um serviço ou uma marca registada que faça parte dos serviços de comunicação audiovisuais, normalmente a troco de uma remuneração ou contrapartida similar. A colocação do produto, para ser lícita, deve cumprir uma série de requisitos, entre os quais:

não encorajar directamente a compra ou o aluguer de produtos ou serviços, nomeadamente fazendo referências promocionais específicas a esses produtos ou serviços;

informação adequada aos utilizadores sobre a existência de um acordo de colocação de produto, com uma clara identificação da colocação;

não-inclusão nos serviços de comunicação audiovisuais de produtos do tabaco ou de cigarros, e a não-colocação de produtos de empresas cuja principal actividade seja o fabrico ou a venda desses produtos;

proibição de colocação de produtos nas emissões informativas e de actualidade, nos documentários e nos serviços de comunicação audiovisuais destinados às crianças.

2.3.4

Mantêm-se na proposta de alteração em apreço as referências ao patrocínio e às condições para a sua legalidade, com modificações básicas que adequam esta actividade ao novo âmbito de aplicação. Mantém-se também a proibição de utilizar técnicas subliminares nas comunicações comerciais audiovisuais.

2.4

Do mesmo modo que a directiva em vigor, a proposta de alteração sublinha, no que diz respeito aos direitos e deveres dos Estados-Membros:

A obrigação de assegurar a liberdade de recepção de serviços de comunicação audiovisuais provenientes de outros Estados-Membros.

A obrigação de assegurar, através de meios apropriados e no âmbito das respectivas legislações, a efectiva observância das disposições da directiva em apreço pelos fornecedores de serviços de comunicação sob a sua jurisdição.

A capacidade para exigir aos fornecedores de serviços de comunicação audiovisuais sob a sua jurisdição que cumpram regras mais detalhadas ou mais rigorosas nos domínios abrangidos pela directiva em apreço.

A capacidade para assegurar o livre acesso do público a eventos de grande interesse para a sociedade, impedindo a retransmissão em exclusivo pelas empresas de radiodifusão televisiva sob a sua jurisdição.

A obrigação de garantir que os fornecedores de serviços de comunicação sob a sua jurisdição não transmitam obras cinematográficas fora dos períodos acordados com os detentores de direitos.

A obrigação de procurar (sempre que seja possível e, em certos casos, de forma escalonada) que os organismos de radiodifusão televisiva reservem uma parte maioritária do seu tempo de difusão para obras europeias ou assimiladas, bem como 10 % desse tempo (ou, alternativamente, 10 % do seu orçamento de programação) a obras europeias de produtores independentes dos organismos de radiodifusão televisiva, neste último caso reservando uma parte adequada a obras recentes. O cálculo de tempo deixa de fora determinados conteúdos, tais como a informação, manifestações desportivas, jogos, publicidade, serviços de teletexto e televendas.

2.4.1

Continua a prever-se também a possibilidade de um Estado-Membro poder, para prevenir condutas abusivas ou fraudulentas e infracções de determinadas disposições da directiva, adoptar medidas adequadas contra um fornecedor de serviços de comunicação estabelecido noutro Estado-Membro que dirija toda ou quase toda a sua actividade para o seu território sempre que o Estado-Membro em que está estabelecido o fornecedor de serviços não adopte medidas apesar de tal lhe ter sido requerido, e que se conte com a aprovação da Comissão.

2.4.2

Mantêm-se, igualmente, as quotas previstas nas directivas vigentes sobre produções audiovisuais europeias e nacionais e sobre produções audiovisuais independentes, quotas que foram cumpridas de maneira muito satisfatória nestes anos, de acordo com os relatórios de avaliação de impacto.

2.4.3

Como novidade, a proposta de alteração inclui em relação aos Estados-Membros:

A obrigação de garantir aos organismos de radiodifusão televisiva radicados em outros Estados-Membros o acesso aos eventos de grande importância para o público, que sejam transmitidos por um organismo de radiodifusão televisiva sob a sua jurisdição, para a realização de reportagens breves de actualidade em que indiquem a fonte das mesmas.

A obrigação de garantir o acesso fácil, directo e permanente à informação sobre o número, endereço postal e electrónico dos fornecedores de serviços de meios de comunicação audiovisuais sob a sua jurisdição, bem como à autoridade reguladora competente.

A obrigação de garantir que os fornecedores de serviços de comunicação sob a sua jurisdição promovam, quando viável e pelos de meios adequados, a produção e acesso a obras europeias.

A obrigação de garantir que os fornecedores de serviços de comunicação sob a sua jurisdição não transmitam obras cinematográficas fora dos períodos acordados com os detentores de direitos.

A referência expressa a que seja encorajada a instituição de regimes de co-regulação nos domínios coordenados pela directiva, prevendo a sua aplicação efectiva e a sua aceitação pelas principais partes interessadas.

2.5

No atinente à regulamentação dos valores difundidos pelos serviços de meios de comunicação audiovisuais, reformulam-se as disposições da actual directiva.

2.5.1

Nelas se indica que os referidos serviços não devem:

Afectar seriamente o desenvolvimento físico, mental ou moral dos menores.

Conter qualquer incitamento ao ódio com base no sexo, na raça ou origem étnica, na religião ou credo, na incapacidade, idade ou orientação sexual.

Mantém-se na proposta de alteração a actual referência expressa à não emissão de programas que incluam cenas de pornografia ou violência gratuita. Também, no caso de emissões que possam prejudicar o desenvolvimento físico, mental e moral dos menores, recorda a necessidade de adoptar medidas técnicas de codificação, ou relativas a faixas horárias ou à classificação dos conteúdos, para garantir que os menores que se encontram na sua zona de difusão não verão nem escutarão essas emissões.

2.5.2

Por seu lado, as comunicações comerciais audiovisuais não devem:

Conter qualquer discriminação em virtude da raça, sexo ou nacionalidade.

Atentar contra convicções religiosas ou políticas.

Encorajar comportamentos prejudiciais à saúde ou à segurança.

Encorajar comportamentos prejudiciais à protecção do ambiente.

Prejudicar moral ou fisicamente os menores. Tal implica não exortar directamente os menores a comprarem um produto ou serviço aproveitando-se da sua inexperiência ou credulidade; não os encorajar directamente a persuadirem os pais ou outras pessoas a adquirirem os produtos ou serviços que estejam a ser publicitados; não se aproveitar da confiança especial que os menores depositam nos pais, professores ou outras pessoas; nem mostrar sem justificação menores em situações perigosas.

2.6

No atinente às pausas para publicidade, a proposta de alteração da directiva reduz consideravelmente as regras para simplificar e flexibilizar, em grande parte, os critérios de aplicação.

2.6.1

Mantém-se praticamente nos mesmos termos o carácter excepcional dos anúncios publicitários e de televendas isolados, excluindo-se agora os programas desportivos. É dada preferência a «spots» publicitários entre os programas, desde que a sua inserção não prejudique a integridade desses programas, nem os direitos dos detentores de direitos.

2.6.2

Os diferentes parâmetros de «spots» publicitários autorizados, o espaço entre os «spots» e as excepções conforme o tipo de programas são substituídos por uma regra geral segundo a qual a transmissão de filmes realizados para a televisão, obras cinematográficas, programas infantis e noticiários pode ser interrompida por publicidade e ou televendas uma vez por cada período de 35 minutos. Mantém-se também a proibição de inserir publicidade durante a difusão de serviços religiosos.

2.6.3

Relativamente ao tempo de transmissão dedicado às diferentes formas publicitárias, mantém-se apenas o critério geral de 20 % por hora para anúncios publicitários, televendas e outros formatos curtos promocionais, bem como a excepção relativa ao cálculo de duração para os anúncios da empresa de radiodifusão televisiva aos seus próprios programas e produtos conexos directamente relacionados com esses programas e aos anúncios de patrocínios, que agora se estende também à colocação de produtos.

3.   Observações na generalidade

3.1

O Comité aprova a iniciativa de alterar a actual Directiva da Televisão sem Fronteiras para a adaptar à nova situação de convergência tecnológica e às novas práticas publicitárias e promocionais. Ao mesmo tempo, o Comité reconhece a necessidade de uma legislação mais aplicável e eficaz que contribua para um maior intercâmbio destes serviços no mercado único europeu, fortalecendo e dinamizando o desenvolvimento deste. Todavia, considera que a alteração deve responder tanto a tais necessidades de desenvolvimento tecnológico e económico como à protecção da dignidade humana e a integridade pessoal.

3.2

Igualmente, lamenta que a Comissão não tenha aproveitado a oportunidade que representa a alteração proposta para eliminar certas carências e ambiguidades da directiva vigente, que se revelaram de difícil interpretação e aplicação e, como tal, fonte de incerteza jurídica, tanto na aplicação da directiva, como nas leis que a transpõem para o ordenamento jurídico dos diferentes Estados-Membros.

3.2.1

Assim acontece, por exemplo, com a falta de uma definição das formas publicitárias reguladas pela directiva, inclusivamente alguns dos pressupostos de ilicitude contemplados. Embora nas nossas observações na especialidade entremos mais a fundo neste assunto, pode assinalar-se aqui, a título de exemplo, que o considerando 44 exclui do cômputo publicitário as telepromoções, sem que em nenhum momento se definam no texto as características e limites desta forma publicitária.

O CESE considera que não há nenhuma razão para tal isenção e que, em qualquer caso, as telepromoções deveriam entrar no cálculo da publicidade. De outro modo, só se conseguiria penalizar os anúncios e transferir as comunicações comerciais para outros formatos, mantendo e, inclusivamente, aumentando o nível de saturação publicitária.

3.2.2

Não se deve esquecer também que a combinação entre um normativo cada vez mais básico e a consolidação do princípio do país de origem, longe de promover a harmonização normativa entre os diferentes Estados-Membros, pode originar importantes diferenças legislativas neste âmbito, especialmente em matéria de publicidade e protecção dos menores, dificultando o desenvolvimento do mercado único ou baixando sensivelmente os níveis de protecção dos cidadãos.

3.3

No tocante ao âmbito de aplicação, embora se tente deixar clara a diferença entre os serviços de comunicação audiovisual, que seriam regulados pela directiva alterada, e o resto dos serviços audiovisuais, que cabem no quadro geral da regulação das comunicações electrónicas, é previsível que o desenvolvimento de formatos mistos com a presença cada vez mais indiferenciada de conteúdos textuais, sonoros e de imagem torne cada vez mais difícil estabelecer os limites do seu âmbito de aplicação.

3.4

O Comité considera que a proposta de alteração da directiva deve pelo menos manter, e se possível alargar, as garantias de protecção dos utilizadores desses serviços de meios de comunicação audiovisuais, especialmente no caso dos menores. Não se pode esquecer, como se sublinhou, que, além dos objectivos respeitantes ao mercado único audiovisual, a directiva deve promover uma série de valores de índole social e cultural relacionados com a diversidade, a identidade, o desenvolvimento pessoal dos cidadãos, a dignidade humana, mencionada nos próprios considerandos da proposta de alteração, o direito à informação e à liberdade de expressão, direitos estes contemplados na Carta do Direitos Fundamentais da União Europeia (8). Além disso, a jurisprudência do TJCE (9) considera como um serviço de interesse económico geral o funcionamento da televisão.

3.5

A proposta de alteração da directiva deveria, também, para este Comité, dar um passo mais e propor medidas concretas em relação a aspectos como o pluralismo e a concentração dos meios de comunicação. No que diz respeito ao fomento da produção europeia, esperaríamos uma declaração mais decidida perante os Estados-Membros que não estabelecesse como condição desse fomento «quando seja exequível», assim como a aplicação progressiva aos serviços não-lineares de critérios de produção europeia e independente, na medida do possível.

3.6

Em relação ao direito de resposta contemplado na proposta de alteração, a Comissão não teve em conta a posição do CESE (10) quanto à necessidade de prever, também, com o mesmo alcance geral e nas mesmas condições definidas, um direito de rectificação como reacção contra conteúdos falsos, incorrectos ou inexactos que afectem os direitos das pessoas.

3.7

O Comité considera que a proposta de alteração deveria prever a obrigatoriedade de criação, em todos os Estados-Membros, de autoridades reguladoras, bem como a independência, imparcialidade e transparência destas, tanto na sua composição, como no exercício das suas funções. Julgamos que há que ponderar no futuro, se se deveria constituir uma agência europeia, instituto ou instância similar de carácter supranacional.

4.   Observações na especialidade

4.1

O Comité considera que a definição de comunicação audiovisual comercial proposta pela Comissão é excessivamente restritiva e reproduz mecanicamente a definição de «serviços de comunicação audiovisual». Parece lógico que os serviços de meios de comunicação audiovisuais se definam como «imagens em movimento, com ou sem som», fazendo da imagem em movimento condição «sine qua non» para a existência destes serviços e deixando, assim, fora do âmbito de aplicação da directiva a imprensa na Internet ou a radiodifusão sonora. No entanto, uma vez estabelecido o âmbito de aplicação, as comunicações audiovisuais comerciais podem utilizar imagens estáticas (por exemplo, um logotipo ou um cartaz publicitário) ou sons isolados e sem imagem (por exemplo, uma menção verbal de marca ou um indicativo sonoro comercial). Seria preferível, neste sentido, definir a «comunicação audiovisual comercial» como imagens em movimento, com ou sem som, que acompanham os serviços de comunicação audiovisuais e que se destinam a promover, directa ou indirectamente, os produtos, os serviços ou a imagem de uma pessoa singular ou colectiva que exerce uma actividade económica.

4.2

A proposta de alteração da directiva mantém o critério vigente de considerar publicidade televisiva a que é emitida contra remuneração. Consideramos que se deveria estabelecer como critério definidor da sua natureza a intenção de promover produtos e serviços e não a remuneração, em conformidade com outras definições comunitárias como a que é retomada, por exemplo, na directiva sobre publicidade enganadora. Tal evitaria a possibilidade de emissão de mensagens publicitárias de produtos cuja publicidade em televisão está proibida ou de mensagens publicitárias ilícitas, que actualmente podem aparecer no ecrã, quando não se consegue demonstrar de modo fidedigno a existência de remuneração e, portanto, o seu carácter de publicidade televisiva. E o mesmo se deve dizer da referência ao requisito de remuneração na definição de televendas.

4.2.1

Em todo o caso, a manter-se o critério da proposta, a directiva deveria prever a possibilidade de os Estados-Membros atribuírem aos tribunais, quando existir um procedimento civil ou administrativo, as competências que lhes permitam exigir aos organismos de radiodifusão a apresentação de provas relativas à não-retribuição da comunicação audiovisual, tal como se refere na Directiva 84/850/CEE. Em caso contrário, presumir-se-á o carácter comercial dessa comunicação.

4.3

A proposta de alteração da directiva mantém praticamente nos mesmos termos a definição vigente de publicidade oculta. Todavia, consideramos que essa definição de «oculta» deveria aplicar-se à comunicação comercial audiovisual no seu conjunto e não só à publicidade televisiva, de cada vez que no articulado se proíbe expressamente a comunicação comercial audiovisual oculta.

4.3.1

Consideramos também que o conceito de comunicação comercial audiovisual oculta deveria ser mais extenso do que o que é formulado na proposta de alteração e incluir:

a apresentação ou referência dos bens e serviços, não só através de palavras ou imagens, mas também de sons (por exemplo, um indicativo sonoro comercial associado a determinada marca ou produto);

quanto ao conteúdo dessa apresentação ou referência, não só o nome, marca ou actividades do fabricante de produtos, mas também outros sinais distintivos da oferta, quando estes se lhe associam de forma inequívoca (por exemplo, um determinado tipo de embalagem, ou um «slogan», mesmo que não mencione a marca).

4.3.2

Da mesma forma, deveria estabelecer-se claramente no texto da directiva que a colocação dos produtos não será considerada como uma comunicação comercial audiovisual oculta, sempre que respeite os requisitos de legalidade definidos na regulamentação.

4.4

O Comité considera positiva a referência expressa à colocação de produtos na proposta de alteração da directiva. Ainda que, em teoria, actualmente, qualquer colocação de produto possa ser entendida como publicidade oculta e, portanto, como uma actividade proibida, na prática a tendência tem sido a de nem sequer ser considerada como publicidade televisiva, ficando por isso fora de qualquer regulamentação. Todavia, consideramos que na definição de colocação de produto deveriam distinguir-se, como elementos distintivos desta prática, a intenção promocional por parte do organismo de radiodifusão e a falta de advertência óptica ou acústica ao público sobre o seu carácter promocional durante (isto é, simultaneamente a) tal colocação, face ao que acontece com outros formatos publicitários como as telepromoções.

4.4.1

Também deveria estabelecer-se que a colocação de produto não pode influir de tal modo na programação que afecte a sua independência e integridade, de acordo com o assinalado para outros formatos promocionais, e extremar-se as restrições a ela atinentes proibindo não só a colocação no caso de publicidade proibida, de conteúdos dirigidos a menores ou de noticiários, mas também nos casos da publicidade de medicamentos e, como mais adiante se salientará, da publicidade de bebidas alcoólicas.

4.5

A proposta de alteração da directiva contempla, na linha do texto em vigor, a proibição de utilizar técnicas subliminares na comunicação comercial audiovisual. Todavia, não se inclui no texto qualquer definição das referidas técnicas. Consideramos que se deveria desenvolver expressamente este conceito, fazendo referência ao emprego de estímulos visuais ou sonoros que são difundidos em intensidades que se situam no limiar de percepção dos sentidos e percebidos a um nível subconsciente.

4.6

A proposta de alteração da directiva prevê que a promoção da oferta na comunicação comercial audiovisual tanto pode ser directa como indirecta. Da mesma forma, em alguns casos, como no dos cigarros e de outros produtos do tabaco, também é proibida essa comunicação comercial, mesmo quando é indirecta. No entanto, o texto não inclui uma definição desta modalidade de comunicação comercial audiovisual. Consideramos que se deveria desenvolver expressamente este conceito, fazendo referência ao facto de que, mesmo que não haja uma apresentação directa dos produtos ou uma referência directa a estes, se utilizem marcas, símbolos ou outras características dos produtos ou empresas cujas actividades principais ou conhecidas incluam a sua produção ou comercialização.

4.7

A proposta de alteração da directiva apresenta, na alínea c) do artigo 3.o-G, a lista de valores a respeitar pela comunicação comercial audiovisual. Essa lista retoma os critérios relativos à publicidade e às televendas do texto em vigor, mas é suprimida a referência à dignidade humana. Consideramos que essa referência se deveria manter, tendo em conta a sua importância e à luz da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

4.8

A proposta de alteração da directiva mantém a obrigação de os Estados-Membros garantirem que os serviços de comunicação audiovisuais sob a sua jurisdição não sejam utilizados de um modo susceptível de afectar seriamente o desenvolvimento físico, mental ou moral dos menores. Apresenta também as medidas que devem ser tomadas sobre os conteúdos que possam afectar (já não «seriamente») esse desenvolvimento, e reitera a proibição total da pornografia e da violência gratuita. Seria oportuno interrogarmo-nos sobre o carácter efectivo dessa proibição, à luz da avaliação do cumprimento da directiva desde 1989, e se não seria mais adequado suprimi-la e assegurar a protecção dos menores contra os conteúdos pornográficos e violentos por meio de medidas de codificação, de faixas horárias reservadas e avisos, já previstas na regulamentação.

4.8.1

O Comité lamenta que a Comissão não tenha tido em conta na proposta de alteração da directiva regimes de protecção mais eficazes que funcionam de forma satisfatória em alguns Estados-Membros, como os que ampliam a protecção dos menores face aos conteúdos publicitários ou limitam o abuso da publicidade e da televenda enganosas.

4.9

A proposta de alteração apresenta algumas diferenças pouco justificadas quando se trata de estabelecer restrições para os serviços de comunicação audiovisual e para as comunicações audiovisuais comerciais a elas associadas. Assim, fala-se, em relação aos serviços de comunicação, de «incitamento ao ódio com base no sexo, na raça ou origem étnica, na religião ou credo, na incapacidade, idade ou orientação sexual», e em relação às comunicações audiovisuais comerciais de «discriminação em virtude da raça, sexo ou nacionalidade». Desaparece a referência à dignidade humana. Menciona-se, falando de serviços de comunicação audiovisuais, «afectar seriamente o desenvolvimento físico, mental ou moral», quando, no caso das comunicações audiovisuais comerciais a menção se limita a que «não devem prejudicar moral ou fisicamente os menores». Também não se inclui, em relação a estas comunicações, a proibição de incitar a ou fomentar condutas violentas e anti-sociais, bem como os maus tratos a animais. O Comité tem para si que estas restrições deveriam estender-se, na sua máxima expressão, tanto aos serviços de comunicação audiovisual como às comunicações audiovisuais comerciais.

4.10

No atinente às informações básicas que as instâncias de difusão devem proporcionar, consideramos que se deve estabelecer expressamente a obrigação, quando existir uma autoridade reguladora, de dar pelo menos o seu endereço postal e electrónico.

4.11

A comunicação comercial audiovisual relativa a bebidas alcoólicas fica limitada quanto ao seu alvo (não se deve dirigir aos jovens) e quanto ao seu anúncio, não encorajando o consumo imoderado dessas bebidas. Consideramos, no entanto, que os graves problemas associados ao consumo de álcool, especialmente entre os jovens, aconselhariam uma regulamentação mais estrita por parte da Comissão, regulamentação que se poderia estabelecer em função:

dos programas/conteúdos (por exemplo, não só no caso dos que são dirigidos especificamente aos jovens, mas também nos desportivos);

dos horários de difusão no caso de serviços lineares (por exemplo, não-emissão de comunicações comerciais audiovisuais relacionadas com estes produtos antes das 10 horas da noite);

da graduação alcoólica dos produtos (por exemplo, proibição de comunicações comerciais audiovisuais de bebidas alcoólicas de 18 graus ou mais);

da concentração de anúncios em banda no caso da publicidade televisiva (por exemplo, não mais de um por «spot» publicitário/anunciante/programa);

da forma publicitária e promocional adoptada (por exemplo, proibição de colocação de produto e de patrocínio por parte dos fabricantes de bebidas alcoólicas ou pelo menos a sua limitação horária como indicado supra).

4.12

Os utilizadores dos meios de comunicação, tal como os consumidores, deveriam ver reflectidas na directiva as vias de reclamação já existentes no direito comunitário, tal como a possibilidade de interpor acções de cessação por infracção a esta regulamentação, de acordo com a Directiva 98/27/CE, a qual não aparece mencionada nem sequer nos considerandos da proposta de alteração, ao passo que outra legislação complementar, como a Directiva 2005/29/CE sobre práticas comerciais desleais, dela constam.

4.13

A proposta de alteração da directiva deveria contemplar um aumento das funções do Comité de Contacto em aspectos como os seguintes:

O estabelecimento de regras comuns para a identificação da instância reguladora responsável pelo serviço de meios audiovisuais;

o estabelecimento de regras comuns para informar os utilizadores da existência de patrocínio e colocação de produto;

o estabelecimento de regras comuns para o desenvolvimento dos regimes de auto-regulação e de co-regulação;

o estabelecimento de regras comuns para a emissão por outros organismos de radiodifusão de eventos de interesse geral ou de resumos destes;

o estabelecimento de regras comuns para que os cidadãos possam exercer o seu direito de resposta e rectificação.

Igualmente, haveria que reconhecer o papel das organizações de consumidores e de utilizadores, como partes interessadas tanto na auto-regulação, como na co-regulação (11).

4.14

A proposta de alteração deveria prever a obrigatoriedade de criação, em todos os Estados-Membros, de autoridades reguladoras competentes nas matérias abrangidas pela directiva em apreço, bem como a independência, imparcialidade e transparência dessas autoridades, tanto na sua composição, como no exercício das suas funções, assumindo os critérios da Recomendação 23(2000) do Conselho da Europa.

4.15

Finalmente, seria desejável que a proposta de alteração da directiva actual contemplasse medidas para promover o acesso das pessoas deficientes à televisão digital e aos seus conteúdos interactivos, aproveitando as possibilidades que a convergência tecnológica faculta.

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Directiva 94/552/CE — JO L 298 de 17.10.1989.

(2)  Directiva 94/36/CE — JO L 202 de 30.07.1997.

(3)  COM(2006) 160 final.

(4)  Ver IP/05/643.

(5)  Conferência Audiovisual de Liverpool sobre a Directiva de Televisão sem Fronteiras, organizada pela Comissão.

(6)  Ver a definição destes serviços nos artigos 49.o e 50.o do Tratado.

(7)  Ver a definição dessas redes na alínea a) do número 2 da Directiva-Quadro 2002/21/CE, de 7 de Março de 2002, do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa a um quadro normativo comum das redes e serviços de comunicações electrónicas. JO L 108, de 24.04.2002, p. 33.

(8)  JO C 364, de 2000.

(9)  Sentença de 30 de Abril de 1974, processo C-15/73, Rec. pp. 203. Sentença do Tribunal de Primeira Instância, de 10 de Julho de 1991, processo T-69/89, Rec. pp. II 525. Sentença do TPI, de 18 de Setembro de 2001, processo T-12/99, Rec. pp. II-2549 e seg.

(10)  (JO C 221, de 8.9.2005, p. 17). Relator: Pegado Liz.

(11)  Relatório de informação sobre o «Estado actual da co-regulação e auto-regulação no Mercado Único»; relator: Vever.


ANEXO

ao Parecer do Comité Económico e Social Europeu

As seguintes propostas de alteração obtiveram pelo menos um quarto dos sufrágios expressos mas foram rejeitadas durante o debate:

Ponto 4.1

Redigir do seguinte modo:

«O Comité considera que a definição de comunicação audiovisual comercial proposta pela Comissão é excessivamente restritiva imprecisa e reproduz mecanicamente a definição de “serviços de comunicação audiovisual”. Parece lógico que os serviços de meios de comunicação audiovisuais se definam como serviços de natureza idêntica à da radiodifusão televisiva programada.“imagens em movimento, com ou sem som”, fazendo da imagem em movimento condição “sine qua non” para a existência destes serviços e deixando, assim, fora do âmbito de aplicação da directiva a imprensa na Internet ou a radiodifusão sonora. No entanto, Uma vez estabelecido o âmbito de aplicação, as comunicações audiovisuais comerciais podem utilizar imagens estáticas (por exemplo, um logotipo ou um cartaz publicitário) ou sons isolados e sem imagem (por exemplo, uma menção verbal de marca ou um indicativo sonoro comercial). Seria preferível, neste sentido, definir a “comunicação audiovisual comercial” como imagens em movimento, com ou sem som, que acompanham os serviços de comunicação audiovisuais e que se destinam a promover, directa ou indirectamente, os produtos, os serviços ou a imagem de uma pessoa singular ou colectiva que exerce uma actividade económica.»

Justificação

Neste domínio é difícil traçar linhas precisas. As definições propostas em 4.1 são ainda mais genéricas do que as da proposta de directiva, tornando, pois, mais difícil uma aplicação clara. Para não entravar o desenvolvimento dos serviços em causa, as definições deveriam ser tanto quanto possível claras, respeitando os objectivos de protecção dos menores e da dignidade humana, identificando claramente as comunicações comerciais, prevendo direito de resposta e fornecendo os requisitos fundamentais de identificação.

Resultados da votação:

Votos a favor: 32

Votos contra: 40

Abstenções: 3

Ponto 4.2.1

Suprimir

«Em todo o caso, a manter-se o critério da proposta, a directiva deveria prever a possibilidade de os Estados-Membros atribuírem aos tribunais, quando existir um procedimento civil ou administrativo, as competências que lhes permitam exigir aos organismos de radiodifusão a apresentação de provas relativas à não-retribuição da comunicação audiovisual, tal como se refere na Directiva 84/850/CEE. Em caso contrário, presumir-se-á o carácter comercial dessa comunicação.»

Justificação

A proposta de dar aos tribunais a possibilidade de exigirem aos organismos de radiodifusão que apresentem provas relativas à não-retribuição da comunicação audiovisual daria uso a possíveis abusos. Além disso, é praticamente impossível que os organismos de radiodifusão apresentem provas em como não receberam retribuição por esse serviço.

Resultados da votação:

Votos a favor: 35

Votos contra: 40

Abstenções: 1


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/210


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Programa GALILEO: concretizar a criação da Autoridade Europeia Supervisora»

(2006/C 318/34)

Em 19 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre o «Programa GALILEO: concretizar a criação da Autoridade Europeia Supervisora».

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 18 de Julho de 2006, sendo relator S. BUFFETAUT.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 200 votos a favor, 4 votos contra e 2 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações:

O Comité Económico e Social Europeu atribui a máxima importância ao êxito do Programa Galileo, sublinhando, a esse respeito, a necessidade de levar a bom termo o período de transição entre a Empresa Comum GALILEO (GALILEO Joint Undertaking — GJU) e a Autoridade Supervisora GALILEO (GALILEO Supervisory Authority — GSA). Para o efeito, preconiza o seguinte:

estabelecer um plano de transferência das actividades da Empresa Comum para a Autoridade Supervisora, a fim de garantir a segurança jurídica desta transferência;

resolver, quer no plano jurídico, quer no plano prático, a questão da transferência das actividades realizadas pelas entidades de países terceiros (China e Israel) associadas à Empresa Comum para a Autoridade Supervisora;

assegurar a transmissão efectiva dos saldos credores da Empresa Comum para a Autoridade Supervisora;

procurar evitar duplicações de competências entre a Empresa Comum e a Autoridade Supervisora até à data de encerramento da primeira;

evitar rupturas durante a negociação do contrato de concessão;

garantir o regime de responsabilidade internacional dos Estados de lançamento em relação aos satélites da constelação Galileo.

2.   Introdução

2.1

A transferência de actividades entre a Empresa Comum GALILEO (GJU) e a Autoridade Supervisora GALILEO (GSA) deve estar concluída em finais de 2006. Para o futuro êxito do programa GALILEO, é indispensável que essa transferência decorra nas melhores condições possíveis, tanto a nível jurídico como a nível humano, financeiro e orçamental.

2.2

No mesmo espírito, convém dar continuidade à negociação do contrato de concessão iniciada pela Empresa Comum e que será prosseguida pela Autoridade Supervisora.

2.3

Por último, a questão específica da responsabilidade internacional dos Estados, no âmbito do Programa GALILEO, merece ser abordada, pois deverá ficar resolvida num prazo compatível com a conclusão das negociações do contrato de concessão e os próximos lançamentos dos satélites da constelação GALILEO.

3.   Observações Gerais

3.1   Características do Programa GALILEO

3.1.1

O GALILEO é o grande projecto científico e técnico emblemático da União Europeia. Os sistemas de radionavegação por satélite representam uma aposta estratégica que a Europa não podia desprezar, pelo que decidiu financiar e implantar a sua própria infra-estrutura global de satélites de navegação (GNSS) à semelhança dos Estados Unidos e da Rússia.

3.1.2

O programa GALILEO fornecerá um serviço de determinação da posição a nível planetário, que será muito preciso, robusto, protegido e com uma mensagem de integridade. Prestará serviços autónomos de navegação e determinação da posição, sob controlo civil, mas será, simultaneamente, compatível e interoperável com os dois sistemas militares existentes: o sistema americano GPS (Global Positioning System) e o sistema russo GLONASS. O GALILEO disporá, além disso, de um serviço governamental seguro e acessível, em qualquer circunstância, aos utilizadores autorizados.

3.1.3

O sistema europeu será constituído por uma constelação de trinta satélites e por estações terrestres, que são necessárias ao funcionamento óptimo do sistema e que deverão estar operacionais no final de 2010.

3.1.4

Este programa é suportado e apoiado por dois protagonistas principais: a União Europeia, representada pela Comissão Europeia, e a Agência Espacial Europeia (ESA). A Comissão Europeia e a ESA criaram a Empresa Comum GALILEO (GJU), incumbida de supervisionar o programa e de gerir os financiamentos da UE consagrados ao GALILEO.

3.1.5

Após a fase de validação em órbita (fase IOV — In Orbit Validation), o sistema completo será transferido da Empresa Comum GALILEO para a Autoridade Supervisora GALILEO, entidade reguladora comunitária, à qual competirá assinar um contrato de concessão com um grupo de empresas privadas.

3.1.6

O custo total do Programa GALILEO para a fase de concepção, desenvolvimento e validação em órbita foi estimado em 1 500 milhões de euros.

3.1.7

O contrato de concessão está a ser negociado entre a GJU e um consórcio de empresas europeias (AENA, ALCATEL, EADS, FINMECCANICA, HISPASAT, IMMARSAT, TELEOP, THALES).

3.1.8

As modalidades da transferência de actividades entre a GJU e a GSA estão a ser definidas, sendo conveniente assegurar que este processo não acarrete atrasos, complicações ou duplicação de custos.

3.2   A Empresa Comum GALILEO (GALILEO Joint Undertaking — GJU)

3.2.1

Esta empresa comum foi constituída por decisão do Conselho da União Europeia, através do Regulamento n.o 876/2002, de 21 de Maio de 2002, com base no artigo 171.o do Tratado da União Europeia, o qual determina: «A Comunidade pode criar empresas comuns ou quaisquer outras estruturas necessárias à boa execução dos programas de investigação, de desenvolvimento tecnológico e de demonstração comunitários». O regulamento inclui, em anexo, os estatutos da Empresa Comum Galileo (GJU).

3.2.2

Os membros da GJU são:

a Comunidade Europeia, representada pela Comissão, e

a Agência Espacial Europeia (ESA).

3.2.3

O artigo 2.o dos estatutos da GJU prevê que qualquer empresa, incluindo empresas de países terceiros, pode ser membro da empresa comum. Com efeito, esta conta, actualmente, com um organismo chinês (National Remote Sensing Center of China — NRSCC) e uma sociedade comercial israelita (MATIMOP). Estas duas entidades fazem parte do conselho de administração, com direito de voto proporcional às suas contribuições.

3.2.4

A GJU possui uma natureza jurídica complexa, precisamente devido à composição do seu conselho de administração. O regulamento indica que a empresa comum deve ser considerada como organismo internacional face à legislação fiscal europeia em matéria de impostos sobre o volume de negócios e de impostos especiais de consumo, especificando também que é desprovida de objectivo económico. Segundo a Comissão, a natureza jurídica da GJU aproxima-se mais de uma associação do que de uma empresa comercial, uma vez que apenas recebe contribuições dos seus membros e não produz lucros. Além disso, as autoridades fiscais belgas (a GJU está sujeita ao direito belga no que respeita às questões que não se encontram regulamentadas no regulamento que a institui) consideraram que não se trata de uma sociedade comercial, mas sim de uma pessoa colectiva (equiparada a uma associação segundo o direito belga).

3.2.5

O seu capital reparte-se da seguinte forma:

Comissão Europeia

520 milhões de euros

ESA

50 milhões de euros

NRSCC

5 milhões de euros

MATIMOP

5 milhões de euros.

3.2.6

Devido à natureza jurídica específica da GJU e ao facto de esta apenas receber contribuições, a Comissão propôs que o termo «capital» seja substituído por «contribuições», o que exige uma alteração dos estatutos, cuja aprovação pelo conselho de administração da GJU está em curso. O Tribunal de Contas das Comunidades Europeias salientou, aliás, que a utilização do termo «capital» não era adequada, uma vez que a rubrica orçamental de que a GJU depende não permite contributos em capital.

3.2.7

A GJU tem por tarefa principal concluir com sucesso a fase de desenvolvimento do programa GALILEO, mediante a associação de fundos públicos e privados, e assegurar projectos de demonstração em grande escala. Compete-lhe ainda lançar as acções de investigação e desenvolvimento necessárias para levar a bom termo a fase de desenvolvimento e a coordenação das acções nacionais neste domínio e gerir em conformidade os contratos de investigação celebrados a título do sexto Programa-Quadro de Investigação e Desenvolvimento da Comissão Europeia.

3.2.8

A GJU é dirigida por:

um conselho de administração;

um comité executivo;

um director.

3.2.9

Além disso, o Conselho da União Europeia criou um conselho de supervisão e um conselho de segurança para controlar as suas actividades.

3.2.10

A GJU foi constituída por um período de quatro anos, a contar de 28 de Maio de 2002 (publicação no Jornal Oficial), o que correspondia ao prazo inicial da fase de desenvolvimento do programa GALILEO. O regulamento prevê a possibilidade de o prazo de vigência da GJU ser prorrogado até ao final da fase de desenvolvimento, sem determinar, todavia, as modalidades para o fazer. Tendo em conta a criação da GSA, a Comissão propôs que o prazo de vigência da GJU expirasse em 31 de Dezembro de 2006, o que exige uma alteração dos estatutos anexos ao Regulamento do Conselho n.o 876/2002, de 21.5.2002, e o parecer do Parlamento Europeu e do CESE. Findo o processo de consulta do Conselho de Supervisão da GJU e do Comité Director navegação da ESA, iniciado em 10 de Março de 2006, o Conselho de Administração da GJU aprovou a alteração dos estatutos em 2 de Junho de 2006, o que permitiu à Comissão adoptar a proposta de regulamento sobre aquela alteração em 29 de Junho de 2006. Este regulamento está actualmente pendente de aprovação no Conselho da UE.

3.2.11

A fim de promover uma ampla utilização dos sistemas de navegação por satélite e permitir que entidades de países terceiros participem na GJU, foram assinados vários acordos internacionais entre a União Europeia e países terceiros (China, Israel, Índia, Ucrânia e outros), estando em negociação outros acordos (Marrocos, Coreia, Rússia, Argentina). Estes acordos excluem expressamente qualquer cooperação no que respeita ao serviço reservado às aplicações governamentais. A GJU celebrou dois acordos técnicos de cooperação com as entidades representantes de dois países (National Remote Sensing Center da China e Matimop de Israel), facto que, de acordo com os estatutos da GJU, permite que os representantes destas entidades participem no conselho de administração da Empresa Comum.

3.2.12

Por último, a dissolução da GJU está prevista no artigo 21.o dos seus estatutos.

3.3   A Autoridade Supervisora GALILEO (GSA)

3.3.1

Instituída por decisão do Conselho da União Europeia, através do Regulamento n.o 1321/2004, de 12 de Julho de 2004, a Autoridade Supervisora GALILEO é um organismo regulador comunitário, dotado de personalidade jurídica.

3.3.2

Compete-lhe assegurar a gestão dos interesses públicos relativos aos programas europeus GNSS e ser a autoridade reguladora.

3.3.3

As suas funções, definidas pelo artigo 2.o do regulamento, compreendem:

gestão e o controlo da utilização dos fundos europeus destinados aos programas GNSS (infra-estrutura global de navegação por satélite);

celebração do contrato de concessão com o consórcio seleccionado para a implantação e a exploração do programa GALILEO;

gestão do acordo com o operador económico encarregado da operação do EGNOS (Sistema europeu complementar geoestacionário de radionavegação);

gestão das frequências (coordenação, direito de utilização, relações com o concessionário);

modernização do sistema e sua evolução;

certificação dos componentes do sistema;

gestão dos aspectos relacionados com a segurança do sistema.

3.3.4

Importa salientar que a GSA será proprietária do sistema e, em particular, dos activos desenvolvidos pelo concessionário e encarregada de proteger e valorizar os investimentos realizados pela Comunidade.

3.3.5

A GSA é dirigida por um conselho de administração (um representante de cada Estado-Membro e um representante da Comissão), um comité de protecção e segurança do sistema e um comité científico e técnico. A Autoridade tem um director executivo, que a representa e está encarregado da sua gestão.

3.4   Questões jurídicas, técnicas e financeiras e riscos relativos à transferência GJU/GSA

3.4.1   Execução da transição GJU-GSA

As modalidades de transição e de transferência das actividades da GJU para a GSA não foram claramente definidas pela Comissão. Todavia, um documento informal da Direcção-Geral da Energia e Transportes (1) da Comissão indicava que, através de uma troca de cartas ou da celebração de um memorando de entendimento, as duas entidades poderiam fixar as modalidades de cooperação, garantindo a complementaridade das actividades e evitando duplicações.

3.4.2

Embora na fase de arranque do programa GALILEO as tarefas atribuídas às duas entidades diferissem quanto à natureza e ao calendário de execução, actualmente, devido ao atraso da fase de desenvolvimento (cerca de dois anos) e à instituição efectiva da GSA (nomeação do director em Maio de 2005), afigura-se necessário, por razões económicas, jurídicas e técnicas, autorizar a GSA a intervir desde já e dissolver a GJU o mais rapidamente possível (2), muito antes da fase de desenvolvimento e de validação. Para esse fim, é importante garantir uma transição progressiva das actividades da GJU para a GSA, incluindo as relativas à gestão dos contratos de investigação celebrados pela GJU e, sobretudo, envolver desde já, muito fortemente, as equipas da GSA no processo de negociação do contrato de concessão que deve ser assinado e gerido pela autoridade reguladora.

3.4.3

A data da cessação das actividades da GJU está agora prevista para 31 de Dezembro de 2006, sob reserva de que a alteração dos estatutos da GJU seja aceite pelos seus membros. Um primeiro plano de transição e de transferência das actividades e do saber-fazer da GJU foi adoptado pelos directores da GJU e da GSA, tendo sido submetido ao Conselho de Supervisão e ao de Administração da GJU em Fevereiro de 2006, a fim de assegurar essa transição o mais rapidamente possível e nas melhores condições.

3.4.4

No período de transição, as duas entidades devem trabalhar em estreita colaboração, de modo a permitir uma transferência eficiente e harmoniosa das actividades e do saber-fazer. Este período deverá também permitir à GSA ficar plenamente operacional, a fim de evitar o risco de um défice de efectivos no período em que serão realizadas as actividades mais importantes e das quais depende o êxito do programa.

3.4.5

As acções devem ser planeadas tendo em vista a suspensão das actividades no final de Dezembro de 2006, permitindo abrir a fase de liquidação no início de 2007. Há que realizar esta transição o mais cedo possível, para que a autoridade reguladora defina e ponha em prática as regras de segurança aplicáveis ao programa GALILEO, defina as regras relativas aos direitos de propriedade intelectual e coordene as acções e as posições dos Estados-Membros em matéria de frequências necessárias para utilizar o sistema GALILEO.

3.4.6

O plano de transição deverá prever medidas que permitam assegurar a coerência das acções levadas a cabo por cada uma das duas entidades e as condições de resolução de um eventual desacordo entre elas. No momento presente, está acordado que o Director da DG Energia e Transportes assegura as funções de mediador entre a GJU e a GSA em caso de dificuldade de realização da transição.

3.5   Garantir a segurança jurídica da transferência de activos da GJU para a GSA mediante a criação de um plano concreto de transferência das actividades.

3.5.1

Na sua redacção actual, o regulamento que institui a Autoridade Supervisora não prevê que esta intervenha durante a fase de desenvolvimento, de que a ESA se encarregará. Convirá, portanto, alterá-lo, a fim de atribuir essa competência à Autoridade Supervisora, o que exigirá um parecer do Parlamento (e não necessariamente do CESE). O acordo entre a GJU e a GSA deverá permitir assegurar a segurança jurídica das operações de transferência dos activos da GJU para a GSA determinando um plano concreto de transferência das actividades que incluem a identificação do papel dos diversos órgãos e entidades envolvidos, a identificação precisa dos activos e do passivo, as modalidades concretas da transferência, o planeamento da fase de transição, os actos que é indispensável realizar, as consequências financeiras e fiscais da transferência, etc. As decisões a tomar no que respeita às modalidades de transferência dos activos da GJU para a GSA deverão exigir a intervenção de várias entidades, como o conselho de supervisão da GJU, o conselho de administração da GJU, o conselho da ESA, o conselho de administração da Autoridade Supervisora GALILEO, a Comissão Europeia, o Conselho e o Parlamento Europeu.

3.5.2

É conveniente assinalar que, apesar de o artigo 6.o dos estatutos da GJU dispor que a empresa comum é proprietária de todos os bens corpóreos e incorpóreos criados ou que lhe tenham sido cedidos no âmbito da execução da fase de desenvolvimento do programa GALILEO, afigura-se que grande parte dos elementos desenvolvidos no âmbito do programa GALILEO, incluindo os satélites, não seria propriedade da GJU mas sim da ESA, a título do programa GalileoSat. Com efeito, decorre do artigo IV do anexo III da Convenção da ESA que esta última, agindo em nome dos Estados participantes, é proprietária dos satélites, sistemas espaciais e outros bens produzidos no âmbito do programa da ESA, bem como das instalações e dos equipamentos adquiridos para a sua execução. Toda e qualquer cessão de propriedade deve ser, pois, decidida pelo conselho da ESA. Deste modo, afigura-se que, enquanto o conselho da ESA não tiver decidido a transferência de propriedade ou a concessão de uma licença de utilização em proveito da GJU, esta última não disporá de qualquer direito sobre estes elementos. A Comissão considera, por sua vez, que o direito comunitário é aplicável e que, após a alteração dos estatutos da GSA e da GJU e da dissolução desta última, a totalidade dos bens será automaticamente transferida para a Autoridade Supervisora. Poderá existir, assim, uma divergência de interpretação entre a ESA e a Comissão.

3.5.3

Parece, consequentemente, que esta situação poderá suscitar controvérsia a respeito da interpretação do artigo 7.o do acordo GJU/ESA, o qual dispõe que a propriedade dos satélites e dos outros bens materiais e imateriais produzidos no âmbito do programa será adquirida pela ESA por conta da GJU.

3.5.4

Com efeito, o conceito «por conta de» é interpretado pela ESA com base no texto do artigo IV do anexo III da Convenção da ESA. Neste contexto, essa expressão significa que a ESA adquire os resultados dos desenvolvimentos realizados por conta dos Estados que participam no programa da ESA em causa e que estes últimos podem solicitar à Agência uma licença de utilização dos resultados mais ou menos restritiva em função das necessidades que exprimam (utilização para fins comerciais, científicos, etc.).

3.5.5

Esta posição parece ser confirmada no texto da Declaração de Programa GalileoSat (artigo 12.o), o qual estipula que a ESA é proprietária de todos os elementos materiais e imateriais do programa GalileoSat.

3.5.6

Em compensação, relativamente ao EGNOS, a ESA apenas é proprietária dos elementos materiais em nome dos Estados participantes no programa, continuando os direitos de propriedade intelectual a pertencer às partes contratantes da ESA em conformidade com as regras da Agência.

3.5.7

Deste modo, a expressão «adquiridos pela ESA por conta da GJU» é interpretada pela ESA como «adquiridos pela ESA no interesse da GJU».

3.5.8

Todavia, não se conclui das conversações com a ESA que esta não deseja efectuar uma transferência de activos para a GJU ou para a GSA. Porém, a ESA fez saber que essa transferência exige a autorização do Conselho da ESA (por maioria simples) e que as respectivas modalidades ainda estão por definir. A ESA privilegiaria a opção de uma transferência directa da ESA para a GSA por razões fiscais e de oportunidade, considerando que, neste caso, as entidades dos países terceiros que participam no capital da GJU não teriam direitos sobre os elementos cuja propriedade é transferida pela ESA. Estes elementos não entrariam no património da GJU nem estariam, por isso, sujeitos às modalidades de dissolução desta última.

3.5.9

No que respeita ao caso específico dos elementos e direitos de propriedade intelectual desenvolvidos pelas entidades dos países terceiros, a questão está regulamentada nos acordos internacionais celebrados, por um lado, entre a União e os países terceiros não membros da UE e, por outro lado, entre as entidades dos países terceiros e a GJU (3).

3.5.10

Afigura-se, todavia, que no regulamento da GSA não subsistem dúvidas de que a Autoridade Supervisora é proprietária de todos os bens corpóreos e incorpóreos que lhe sejam cedidos pela GJU após a fase de desenvolvimento, ou que sejam criados ou desenvolvidos pelo concessionário durante as fases de implantação e de exploração. O regulamento da GSA prevê que as modalidades de transferência de propriedade serão estabelecidas, no que respeita à GJU, aquando do processo de dissolução previsto no artigo 21.o dos estatutos da Empresa Comum. Quanto ao EGNOS, a Autoridade é proprietária de todos os bens corpóreos e incorpóreos pertencentes a este programa, sob reserva de um acordo com os investidores do EGNOS relativo às condições e modalidades de transferência de propriedade, pela ESA, da totalidade ou de parte das instalações e dos equipamentos do EGNOS. Essa menção leva a supor que, do ponto de vista da Comissão, não será necessário qualquer processo de transferência entre a GSA e a ESA porque todos os bens corpóreos e incorpóreos pertencem à GJU (contrariamente à interpretação actual da ESA, baseada na sua Convenção e na Declaração de Programa).

3.5.11

Entre os actos jurídicos a realizar, convém assinalar, principalmente:

a alteração dos estatutos da GJU, a fim de fixar 31 de Dezembro de 2006 como data de encerramento da GJU e conclusão das operações de transferência das suas actividades para a GSA e prever um período de liquidação cuja duração terá de ser definida;

a alteração do regulamento da GSA para introduzir as funções transferidas da GJU para a GSA, como a orientação da fase de desenvolvimento e de validação em voo, a gestão das actividades resultantes dos programas-quadro europeus de investigação e desenvolvimento, ou ainda o acompanhamento e a gestão das evoluções técnicas do sistema operacional (4).

3.6   Plano de transferência das actividades dos países terceiros da GJU para a GSA

Deve ser rapidamente iniciada a negociação da transferência das actividades desenvolvidas pelas entidades dos países terceiros mediante a conclusão de aditamentos sobre a transferência entre a GSA, a GJU e as entidades interessadas. Devem estabelecer-se contactos com estas entidades, a fim de se conhecer antecipadamente as suas posições em relação ao encerramento da GJU e do seu lugar e papel futuros no âmbito da GSA. O regulamento que institui a Autoridade Supervisora dispõe que os países terceiros, designadamente aqueles que tiverem participado nas fases precedentes do programa, devem poder participar na GSA desde que concluam um acordo com a Comunidade, que determine, nomeadamente, a natureza, o âmbito e o modo de participação desses países nos trabalhos da Autoridade, incluindo disposições relativas à participação nas iniciativas desenvolvidas pela Autoridade, às contribuições financeiras e ao pessoal. Afigura-se que a reacção das entidades dos países terceiros face à decisão que põe termo à GJU antes do final da fase de validação em órbita (fase IOV — In Orbit Validation) poderá depender do lugar que lhe será atribuído na GSA. De facto, a NRSCC e a MATIMOP poderão reclamar o reembolso de uma parte das suas contribuições devido à suspensão da GJU. A questão da participação dos países terceiros no conselho de administração não deixará de se colocar no contexto das negociações. Os primeiros debates sobre esta questão junto das instâncias comunitárias revelaram uma divergência de pontos de vista entre os Estados-Membros, alguns dos quais não desejam atribuir direitos de voto aos países terceiros, enquanto outros receiam que a segurança do sistema fique comprometida caso haja uma abertura excessiva a esses países terceiros. Não obstante, todos parecem estar de acordo em que a intervenção de países terceiros no conselho de administração da GSA não deve pôr de modo algum em causa o controlo da UE sobre o sistema. Além disso, os países europeus não membros da UE (Noruega e Suíça) poderiam, em determinadas condições, ficar numa posição privilegiada. Uma solução possível consistiria em agrupar os países terceiros numa estrutura específica que lhes permita defender as suas posições face às decisões tomadas pela Autoridade.

3.7   Limitar a duplicação de competências

3.7.1

É conveniente instituir um plano de redução do pessoal da GJU, com uma calendarização precisa que tenha em consideração o planeamento da transferência de actividades, de forma a que no final de Dezembro de 2006 não haja um número importante de efectivos e também para se fazer o ponto da situação sobre os contratos de trabalho e evitar riscos de litígio no fim do contrato, que possam bloquear a transferência dos activos. Prevê-se que cerca de 24 pessoas permaneçam em actividade até ao fim da negociação do contrato de concessão, o mais tardar até 31 de Dezembro de 2006. A fase de liquidação da GJU, após 31 de Dezembro de 2006, deve ser realizada por aproximadamente seis pessoas.

3.7.2

Além disso, é necessário ter uma visão precisa da importância crescente da GSA e, nomeadamente, do plano de recrutamento do pessoal da agência, que permita verificar a compatibilidade com o plano de transferência das actividades da GJU. É conveniente referir que a GSA deve respeitar os procedimentos comunitários e contar com restrições em matéria de recrutamento do pessoal (nível dos salários, duração dos contratos limitada a 3 anos, sede definitiva da agência ainda não designada), que entravam o processo de organização da GSA.

3.8   Aspectos financeiros e orçamentais

3.8.1

Quando a GJU for encerrada, é importante que o saldo credor (estimado em cerca de 46 milhões de euros) seja transferido para a GSA. A Comissão deseja que essa transferência de fundos se opere assim que a Autoridade Supervisora estiver em condições de gerir o final da fase de desenvolvimento. Deste modo, quando a actividade da Empresa Comum cessar, apenas ficarão à sua disposição os fundos necessários para a liquidação.

3.8.2

O orçamento revisto da GJU para o ano de 2006, que inclui um aumento de 7 milhões de euros relativamente ao orçamento aprovado em 2005 que previa o encerramento em Maio de 2006 (em lugar dos 14 milhões de euros que a GJU reclamara inicialmente, sem ter em conta a transferência de actividades para a GSA), permite cobrir com a máxima flexibilidade a transferência das actividades para a GSA até ao final de 2006, o mais tardar: este orçamento revisto foi adoptado pelo conselho de administração e pelo conselho de supervisão da GJU, no final de Fevereiro.

3.8.3

Por sua vez, o orçamento da GSA para 2006 deve ter em conta a necessidade de novos recrutamentos de pessoal durante o ano de 2006 e ser aumentado em conformidade. Após a adopção pelo conselho de administração da GSA, em 23 de Janeiro de 2006, do novo projecto de orçamento para 2006, num montante de cerca de 8 milhões de euros (em lugar do orçamento de 5 milhões de euros inicialmente aprovado em 2005), o projecto de orçamento revisto deve ser examinado pelo Conselho Ecofin e, depois, pelo Parlamento Europeu durante o segundo semestre de 2006. O aumento do orçamento da GSA no valor proposto constitui um requisito para que a GSA possa recrutar o pessoal necessário e levar a cabo as actividades transferidas. As economias obtidas in fine no quadro do orçamento da GJU graças à transferência progressiva das suas actividades para a GSA deverão cobrir, em termos absolutos, o aumento do orçamento da GSA, facto que deverá tranquilizar os deputados quanto à correcta utilização dos fundos europeus no âmbito dessa operação de transferência, mesmo que, na prática, os fundos e os orçamentos em causa tenham origens diferentes.

3.8.4

A avaliação dos custos de liquidação da GJU (nomeadamente o custo de manutenção do pessoal para as operações de liquidação) e das incidências financeiras em matéria fiscal e de IVA (direitos de transmissão, por exemplo) da transferência dos activos deve ser realizada o mais rapidamente possível. Sendo a GJU considerada pelas autoridades belgas — que lhe dirigiram uma «carta de conforto» — como uma pessoa colectiva na acepção do direito belga (equiparada a uma associação) e não como uma sociedade comercial, não deveria ser submetida a qualquer taxa sobre o saldo de liquidação. A imposição fiscal deverá, pois, ser bastante fraca, tanto mais que a maior parte dos seus fundos foi transferida antes da liquidação. É claro que este tipo de questões deve ser antecipado, a fim de evitar surpresas desagradáveis.

3.9   Negociação do contrato de concessão e conclusão das actividades técnicas

3.9.1

O orçamento revisto da GJU para 2006 permitir-lhe-á assegurar a continuação das negociações do contrato de concessão, que deverão estar concluídas até 31 de Dezembro de 2006, o mais tardar, favorecendo simultaneamente a transferência do saber-fazer para a GSA e o envolvimento desta última nas negociações, à medida que se vá reforçando.

3.9.2

É de salientar que ficou registado nas actas das diversas instâncias de controlo da GJU e da GSA que a direcção das negociações, na eventualidade de não estarem concluídas até 31 de Dezembro de 2006, passará a ser da responsabilidade da GSA, a partir de 1 de Janeiro de 2007.

3.9.3

A GJU deverá adoptar, ainda, um procedimento ou um plano de acção que permita encerrar os processos técnicos e finalizar a documentação técnica antes da data de encerramento da GJU.

3.9.4

O papel e as responsabilidades da ESA durante a fase de recepção e de validação do sistema e, em seguida, no que respeita à sua evolução técnica e à sua manutenção em condições operacionais após a validação, deverão ser especificados num contrato-quadro a celebrar entre a GSA e a ESA. Na verdade, a participação da ESA no conselho de administração da GSA na qualidade de observadora e não de membro, como acontece no seio da GJU, já não lhe permite continuar a desempenhar um papel tão activo na tomada de decisões. O regulamento da GSA prevê que a cooperação com a ESA explorará ao máximo as possibilidades do acordo-quadro celebrado entre a Comunidade Europeia e a Agência Espacial Europeia, em 25 de Novembro de 2003, sempre que isso tiver interesse (5), e que a ESA será solicitada a prestar à Autoridade todo o apoio científico e técnico (6). Seja como for, até finais de 2006 deverá celebrar-se um acordo entre a Autoridade Supervisora e a ESA, para cobrir as actividades relativas ao fim da fase de desenvolvimento, e um outro acordo, até 2008, para organizar as relações entre a Autoridade Supervisora e a ESA, depois de esta fase estar concluída, já na fase de recepção e de validação do sistema e, se for caso disso, durante a fase de exploração.

4.   Elementos de reflexão complementares: Responsabilidade internacional dos Estados de lançamento em relação aos satélites da constelação Galileo

4.1

Os satélites lançados durante a fase IOV são actualmente propriedade da ESA (desenvolvimento dos satélites no âmbito do programa ESA GalileoSat) e deverão ser objecto de uma transferência de propriedade para a GSA, após a fase de validação em órbita.

4.2

Em conformidade com o Acordo GJU/ESA, esta última tem a responsabilidade de lançar os primeiros satélites da fase IOV e de os matricular junto do gabinete das Nações Unidas (Office of Outer Space Affairs em Viena). O lançamento do primeiro satélite da constelação (GIOVE A) foi realizado em Dezembro de 2005 pelo operador Starsem, a partir de Baïkonour, por um lançador Soyouz-ST.

4.3

Na prática, a ESA deverá proceder de forma semelhante à utilizada na transferência da propriedade dos satélites que desenvolve por conta de terceiros, como no caso da Météosat ou da Metop, por exemplo (transferência ESA-Eumetsat). Seguidamente, as autoridades competentes deverão ser notificadas da transferência de propriedade dos satélites em órbita.

4.4

Tendo em conta as disposições do Tratado sobre o Espaço, de 1967, e da Convenção sobre a Responsabilidade Internacional, de 1972, é conveniente reflectirmos sobre o regime de responsabilidade decorrente do lançamento e da utilização dos satélites GALILEO em órbita.

4.5

De acordo com os diferentes critérios adoptados para qualificar um Estado como «Estado de lançamento», com responsabilidade internacional caso sejam causados danos, em Terra ou em órbita, por objectos espaciais, a ESA poderá ser considerada um «Estado de lançamento», uma vez que é considerada como o Estado que «manda efectuar o lançamento» dos satélites da fase IOV e que celebra o contrato de lançamento com o respectivo operador.

4.6

Do mesmo modo, pode colocar-se a questão de saber se a Bélgica pode ser considerada como Estado de lançamento, tendo em conta que a GJU, fortemente envolvida no desenvolvimento e no lançamento dos satélites para a fase IOV, se encontra sob a sua jurisdição (a sede da GJU situa-se em Bruxelas). Face ao direito nacional belga, afigura-se que o Estado federal belga apenas é responsável pelas actividades espaciais realizadas a partir do seu território ou de instalações que lhe pertencem ou se encontram situadas sob a sua jurisdição ou o seu controlo (7), o que não é o caso. Todavia, face ao direito internacional, a questão permanece.

4.7

Por outro lado, após a dissolução da GJU e a transferência das suas actividades para a GSA, será por conta desta última que os satélites serão lançados e, consequentemente, a pessoa jurídica internacional à qual está ligada também pode ser considerada como Estado de lançamento. A classificação como Estado de lançamento da UE deve ser, portanto, analisada, tendo em conta não só o lançamento dos satélites da fase IOV mas também o lançamento dos restantes satélites da constelação Galileo, durante a fase de implantação e de exploração.

4.8

Nesta fase, a responsabilidade incumbiria ao Estado onde está sedeado o operador encarregado da constelação (sociedade concessionária), que mandará efectuar os lançamentos. Uma vez que a sede do concessionário foi estabelecida em França (Toulouse), nos termos do acordo de 5 de Dezembro de 2005 entre as principais Partes na concessão, a França poderia ser responsabilizada a esse título.

4.9

Por último, o Estado sob cuja jurisdição se encontra o operador de lançamento será igualmente considerado como Estado de lançamento, o mesmo acontecendo, eventualmente, com o Estado cujo território ou instalações são utilizados. Se o operador em causa for a sociedade francesa Arianespace, a França poderá ser considerada como Estado de lançamento.

4.10

Devido ao facto de vários Estados de lançamento intervirem, é conveniente clarificar as relações entre as diferentes entidades, no que respeita à responsabilidade e à partilha dos riscos entre os diversos Estados de lançamento, caso ocorram danos durante o lançamento e a vida útil dos satélites.

4.11

Note-se que já existe um acordo entre a ESA e a França (acordos sobre o Centro Espacial da Guiana), o qual inclui cláusulas relativas à responsabilidade internacional, nomeadamente no caso dos lançamentos realizados pela Arianespace, e parece ser aplicável ao programa Galileo. Mantém-se em aberto a questão da responsabilidade internacional dos Estados de lançamento em relação à fase de vida útil dos satélites em órbita, e poderá questionar-se a oportunidade do estabelecimento de um acordo ad hoc entre a França e os outros Estados de

Referências documentais

1)

Resolução do Conselho, de 19 de Julho de 1999, relativa à participação da Europa numa nova geração de serviços de navegação por satélite — Galileo — fase de definição — (199/C 221/01)

2)

Decisão n.o 98/434/CE do Conselho, de 18 de Junho de 1998, JO L 194 10.07.1998, p. 15

3)

Regulamento (CE) n.o 876/2002 do Conselho, de 21 de Maio de 2002, que institui a empresa comum Galileu (com os estatutos da GJU em anexo)

4)

Regras de segurança do Conselho — Decisão 2001/264/CE, de 19 de Março de 2001 — JO L 101 de 11.4.2001

5)

Acordo entre a Empresa Comum Galileo (GJU) e a ESA — ESA/C(2002)51, rev. 1, de 23 de Abril de 2002

6)

Galileo Joint Undertaking Organisation and Decision Process — ESA/PB-NAV(2003), de 20 de 5 de Setembro de 2003 (Organização e Processo de Tomada de Decisões da Empresa Comum Galileu)

7)

Regulamento (CE) no 1321/2004 do Conselho, de 12 de Julho de 2004, relativo às estruturas de gestão dos programas europeus de radionavegação por satélite

8)

Comunicação da Comissão «O enquadramento das agências europeias de regulamentação», COM(2002) 718 final de 11 de Dezembro de 2002

9)

Acordo entre a UE e a China, de 30 de Outubro de 2003

10)

Acordo entre a UE e Israel, de 13 de Julho de 2004

11)

Acordo entre a GJU e a NRSCC, de 9 de Outubro de 2004

12)

Acordo entre a GJU e a MATIMOP, de 6 de Setembro de 2005

13)

Acordo entre a GJU e a ESA em relação à NRSCC, de 9 de Outubro de 2004

14)

Acordo entre a GJU e a ESA em relação à MATIMOP, de 18 de Outubro de 2005

15)

Direitos e obrigações dos novos membros da Empresa Comum Galileo — ESA/PB-NAV(2004) 18 rev. 2, de 23 de Junho de 2004

16)

Galileo IPR: Ownership and protection — ESA/PB-NAV (2004)26, de 23.09.2004 (Direitos de propriedade intelectual Galileo: Propriedade e protecção)

17)

Intellectual Property Rights for the Galileo Programme — GJU-EXC-2004-50 de 2.09.2004 (Direitos de Propriedade Intelectual para o Programa Galileo)

18)

Agreement between the Partners of the prospective Galileo Concession, 5 de Dezembro de 2005 (Acordo entre os Parceiros da futura Concessão Galileo)

19)

Transition Plan of GJU Activities and know-how to the GSA (GJU-ADB-2005-13 rev., 11 de Fevereiro de 2006) (Plano de Transferência das Actividades e do saber-fazer da GJU para a GSA)

20)

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho: «Integração do programa EGNOS no programa GALILEO», COM(2003) 123 final de 19.03.2003

21)

Acordo-quadro entre a ESA e a Comunidade Europeia, de 25 de Novembro de 2003, ESA/C-M(2004)4.

22)

Parecer do CESE sobre o «Programa Europeu de Navegação por satélite (GALILEO)» — TEN/077 (12.09.2001)

23)

Parecer do CESE sobre a «Proposta de regulamento do Conselho relativo à constituição da empresa comum GALILEO» — (COM(2001) 336 final — 2001/0136 CNS) — TEN/089 (28.11.2001)

24)

Parecer do CESE sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho — Ponto da situação do Programa de investigação GALILEO no início de 2004» — (COM(2004) 112 final) — TEN/179 (30.06.2004)

25)

Parecer do CESE sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à realização das fases de implantação e de exploração do programa europeu de radionavegação por satélite» — (COM(2004) 477 final — 2004/0156 COD) — TEN/203 (09.02.2005).

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Constituição da Autoridade Supervisora Galileo, Documento para debate no Comité Executivo de 24 de Junho de 2004, TREN E/4/OO/bp D 11090 (2004) de 24 de Julho de 2004, p. 1.

(2)  Inicialmente, a data da cessação das actividades da GJU estava prevista para 28 de Maio de 2006 (ver supra — prazo da GJU).

(3)  A participação dos países terceiros não membros da UE no programa Galileo é objecto de acordos internacionais negociados e celebrados pela UE em nome dos Estados-Membros, após negociação das disposições do acordo pela Comissão Europeia, mandatada pelo Conselho. O primeiro acordo foi assinado com a China, em Outubro de 2003, e a sua ratificação pelos Estados-Membros está em curso. Estes acordos convidam os países terceiros a designar uma entidade participante no capital da GJU (ver supra — Cooperação internacional).

(4)  A Comissão editou duas notas informativas sobre este tema dirigidas aos membros do conselho de administração da GJU: «Changes to the GJU Statutes and GJU/GSA transfer» TREN B5 D(2006) de 18 de Janeiro de 2006, e «Envisaged changes to the GSA Regulation and GJU/GSA transfer», TREN B5 D(2006) de 19 de Janeiro de 2006.

(5)  Considerando n.o 12 do Regulamento da GSA.

(6)  N.o 2 do artigo 2.o do regulamento da GSA.

(7)  Lei belga relativa às actividades de lançamento, operações de voo ou orientação de objectos espaciais, de 17 de Setembro de 2005, publicada no Moniteur n.o 348, de 16 de Novembro de 2005. O n.o 1 do artigo 2.o dessa lei dispõe que «A presente lei tem por objecto as actividades de lançamento, operação de voo ou orientação de objectos espaciais exercidas por pessoas singulares ou colectivas nas zonas colocadas sob a jurisdição ou o controlo do Estado belga, ou por meio de instalações, móveis ou imóveis, que sejam propriedade do Estado belga, ou se encontram sob a sua jurisdição ou o seu controlo» .


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/218


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão sobre a promoção do transporte por vias navegáveis interiores NAIADES Programa de acção europeu integrado para o transporte por vias navegáveis interiores

COM(2006) 6 final

(2006/C 318/35)

Em 3 de Fevereiro de 2006, o Conselho decidiu, em conformidade com o artigo 262o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação emitiu parecer em 4 de Setembro de 2006, do qual foi relator J. SIMONS.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro de 2006), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 64 votos a favor, 2 contra e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

A navegação interior deve ser promovida através de uma política europeia sobre a matéria a elaborar no âmbito do Livro Branco revisto. O desenvolvimento futuro do transporte por vias navegáveis interiores passa pela criação de condições equitativas no sector, pela supressão dos actuais pontos de estrangulamento a nível das infra-estruturas e das instituições e pelo apoio político.

1.2

A proposta de um programa de acção europeu integrado para o transporte por vias navegáveis interiores proporciona uma base estável para o desenvolvimento da navegação interior. As medidas propostas nesse programa devem ser aplicadas sem demora, atentas as observações do CESE, se se pretende aproveitar todo o potencial da navegação interior.

1.3

O CESE deplora que a Comissão não tenha atendido às recomendações do CESE no seu parecer sobre a política social (1). Na aplicação destas recomendações, é indispensável uma boa coadunação das DG implicadas para dar a ponderação adequada a todos os aspectos relevantes.

1.4

O enquadramento jurídico para o transporte por vias navegáveis interiores na Europa é definido, nas suas linhas gerais, pela Comissão Central para a Navegação no Reno (CCNR). Para melhorar o quadro administrativo e jurídico, as Comissões do Reno e do Danúbio, e sobretudo a CCNR, têm-se empenhado na harmonização da legislação em matéria de tripulações, embarcações, qualificações dos capitães e responsabilidades. É por isso que estas comissões devem figurar igualmente nas tabelas de instrumentos da comunicação enquanto actores responsáveis.

1.5

O CESE exorta a Comissão a não sujeitar a responsabilidade das transportadoras de passageiros na navegação interior a um novo regime, conforme sugerido na proposta de Regulamento da Comissão Europeia ao Parlamento Europeu e ao Conselho (COM(2005) 592) relativa à responsabilidade das transportadoras de passageiros por mar e por vias navegáveis interiores em caso de acidente. À semelhança do seu parecer Rumo a um sistema pan-europeu de navegação fluvial, o Comité recomenda antes que se enverede pela solução preconizada pelas Comissões do Reno e do Danúbio de renegociar o tratado internacional já concluído neste domínio (2).

1.6

A mudança modal para a navegação interior permite não só uma melhor protecção do ambiente pelas cadeias de transporte mas também transportes mais sustentáveis em geral. Por esse motivo, há que disponibilizar os meios financeiros e fiscais necessários para investir neste modo de transporte e explorar todo o seu potencial.

1.7

Haverá, através de um diálogo social construtivo a nível europeu, que desenvolver uma estratégia para atrair trabalhadores para a navegação interior e para criar condições sociais e laborais equitativas em todos os Estados-Membros. Da mesma forma, é necessário investir em cursos e estágios de navegação interior a fim de abrir perspectivas de carreira para o pessoal formando.

1.8

O transporte por vias navegáveis interiores é um modo de transporte fiável, seguro, ecológico e barato. Para alterar os padrões tradicionais será necessário promover a sensibilização para o verdadeiro potencial do sector em termos de qualidade e de fiabilidade.

1.9

Importa assegurar que os Estados-Membros mantenham as vias navegáveis interiores em bom estado, que os meios financeiros necessários estejam efectivamente disponíveis, que os projectos de vias navegáveis na lista de RTE-T prioritárias sejam imediatamente realizados e que para tal se possibilite um máximo de cofinanciamento, tal como previsto nas orientações revistas para as RTE-T. A supressão dos pontos de estrangulamento deve ser acelerada através da nomeação de um coordenador europeu para os projectos de navegação interior (eixos de transporte prioritários n.o 18 Reno/Mosa-Meno-Danúbio e n.o 30 Sena-Escalda).

1.10

O CESE entende que um quadro institucional adequado contribuirá para a execução do programa de acção europeu integrado para o transporte por vias navegáveis interiores e para a consolidação da posição da navegação interior. Num parecer de iniciativa recente, o CESE apoia o objectivo final de pôr a funcionar uma organização independente, instituída por via de convenção, que poderá abranger, pelo menos, tanto as organizações internacionais, como a própria UE, os Estados-Membros que praticam a navegação interior, mas também países terceiros, como a Suíça e os países do Danúbio que não fazem parte da UE.

2.   Introdução

2.1

O CESE preconiza uma política de transportes integrada que vise garantir um transporte rápido, eficiente, sustentável e acessível de pessoas e bens. Esta é uma prioridade absoluta à luz dos objectivos da Estratégia de Lisboa para a promoção de uma economia europeia dinâmica e competitiva e da estratégia de desenvolvimento sustentável adoptada em Gotemburgo em 2000, segundo a qual os aspectos económicos, sociais e ambientais devem merecer igual destaque.

2.2

A navegação interior, quando disponível, oferece inúmeras possibilidades de inovação, crescimento, protecção ambiental e segurança. Além disso, possui o potencial necessário para escoar o crescente tráfego de mercadorias na Europa e para ajudar a descongestionar os transportes rodoviários.

2.3

O CESE analisou a situação da navegação interior na Europa nos pareceres de 16 de Janeiro de 2002, o « Futuro da rede transeuropeia de vias navegáveis », e de 24 de Setembro de 2003, « Rumo a um sistema pan-europeu de navegação fluvial » (3). O último desses pareceres chamou a atenção para os pontos de estrangulamento da navegação interior e para a necessidade de harmonizar a legislação, no que respeita tanto aos aspectos de direito público como privado. O parecer trata também outras questões, tais como o ambiente e a segurança, a situação do mercado de trabalho e aspectos sociais. Estes últimos foram ainda abordados no parecer de iniciativa de Setembro de 2005 sobre a « Política social num sistema pan-europeu de navegação interior » (4).

Recentemente foi adoptado um parecer de iniciativa sobre O quadro institucional para a navegação interior na Europa  (5), o qual analisa justamente o ponto deixado em aberto na comunicação em apreço sobre a estrutura organizacional pública.

2.4

Com a presente comunicação, a Comissão apresenta um programa de acção ambicioso de promoção da navegação interior. Com base numa consulta alargada são propostas cinco acções que em conjunto deverão levar a uma melhoria da posição da navegação interior em si e como parte da cadeia logística.

2.5

As acções propostas compreendem cinco domínios:

mercados

frota

empregos e qualificações

imagem e

infra-estruturas

Num capítulo separado, a proposta da Comissão examina quatro possibilidades para a modernização da estrutura organizacional, sem optar por alguma delas em particular.

Os capítulos que se seguem examinarão mais detidamente cada um dos cinco domínios de acção propostas e a estrutura organizacional.

2.6

O programa de acção abrange uma série de medidas cuja aplicação exigirá os esforços, combinados, se necessário, da União Europeia, dos Estados-Membros e do sector (6). Esta estratégia integrada e aberta destina-se a promover o desenvolvimento da navegação interior e contribuir assim para a sustentabilidade da política europeia de transporte.

3.   Observações na generalidade

3.1

A criação e manutenção de condições equitativas para os diferentes modos de transporte e entre os Estados-Membros é uma condição prévia para o bom funcionamento de um mercado interno em que a navegação interior está liberalizada e em que reina concorrência aberta.

3.2

A promoção do transporte por vias navegáveis interiores é uma forma de criar um mercado de transportes mais equilibrado. Para aproveitar todo o potencial deste modo de transporte há que suprimir uma série de entraves que impedem actualmente o pleno desenvolvimento do sector. Os principais entraves situam-se a nível das infra-estruturas e do desenvolvimento das redes transeuropeias. Um outro problema consiste na harmonização deficiente do quadro jurídico e institucional do sector da navegação interior.

3.3

Na proposta em apreço, a Comissão reconhece que a navegação interior deve ser incentivada e propõe um programa de acção integrado centrado em medidas concretas indispensáveis para aproveitar todo o potencial deste modo de transporte e torná-lo mais atraente. O CESE acolhe favoravelmente a proposta enquanto contributo positivo para a resolução dos problemas de transporte e para a consolidação da posição da navegação interior.

3.4

O CESE lamenta que não sejam previstas quaisquer acções no domínio da política social. No seu parecer de iniciativa de 2005, o Comité formulou uma série de recomendações concretas a este respeito, e apela a que esta lacuna seja colmatada em conformidade com essas recomendações.

4.   Observações na especialidade

4.1   Mercados

4.1.1

Para fomentar o espírito empresarial no sector da navegação interior há que criar condições favoráveis para o seu bom funcionamento e assegurar que há condições económicas, ambientais e sociais equiparáveis às dos outros modos de transporte. Em seguida, importa aligeirar as formalidades necessárias através de uma melhor coordenação entre as autoridades competentes e de medidas adequadas.

4.1.2

Para tornar o mercado mais atraente para novos interessados e ao mesmo tempo dar às empresas existentes a oportunidade de crescer, importa estimular, através de vantagens fiscais, o investimento nas acções e nos instrumentos propostos, principalmente no domínio das orientações para as ajudas estatais e dos programas de IDT dedicados especificamente à navegação interior. São justamente os elevados custos dos investimentos que podem entravar a expansão e a renovação do sector.

4.1.3

O enquadramento jurídico para o transporte por vias navegáveis interiores na Europa é definido, nas suas linhas gerais, pela Comissão Central para a Navegação no Reno (CCNR). Para melhorar o quadro administrativo e jurídico, as Comissões do Reno e do Danúbio, e sobretudo a CCNR, têm-se empenhado na harmonização da legislação em matéria de tripulações, embarcações, qualificações dos capitães e responsabilidades. É por isso que estas comissões devem figurar igualmente nas tabelas de instrumentos da comunicação enquanto actores responsáveis (7).

4.1.4

A este respeito refira-se igualmente a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho (COM(2005) 592) relativa à responsabilidade das transportadoras de passageiros por mar e por vias navegáveis interiores em caso de acidente. Com esta proposta, a Comissão tenciona introduzir um mesmo nível de responsabilidade para a navegação marítima e para a navegação interior.

4.1.5

Há, porém, importantes diferenças entre os dois modos de transporte, que requerem uma regulamentação distinta e adequada aos seus condicionalismos específicos. Para sujeitar responsabilidade na navegação interior, actualmente regida por um tratado internacional (8), a limites mais severos estão a ser promovidas negociações para alteração do tratado sob a direcção das Comissões do Reno e do Danúbio. Estas alterações procuram também tornar o tratado vinculativo não só nos países banhados pelo Reno como em todos os países europeus que praticam a navegação interior.

4.1.6

É por isso que o CESE, à semelhança do seu parecer Rumo a um sistema pan-europeu de navegação fluvial, recomenda que se prossiga com estas negociações.

4.2   Frota

4.2.1

As embarcações da navegação interior distinguem-se pela sua longevidade. Assim, cabe incentivar a renovação e a modernização das embarcações através de programas destinados a facilitar a adaptação às novas normas técnicas e baseados nas orientações para a concessão de ajudas estatais. Devem ser lançados programas de IDT e de apoio especificamente orientados para a navegação interior, a fim de suprir as carências de renovação mais urgentes do sector e de adaptar a frota actual aos novos requisitos ambientais e de segurança.

4.2.2

O transporte por vias navegáveis interiores é um modo de transporte que pode contribuir para mitigar o congestionamento das estradas num mercado de transportes sempre crescente e para uma solução sustentável da problemática do transporte, graças à sua segurança e compatibilidade com a protecção ambiental. As normas em matéria de emissões, a qualidade dos combustíveis, a protecção contra a poluição sonora e a gestão dos resíduos das embarcações sempre foram questões essenciais para o sector. Armadores, fabricantes de motores e autoridades competentes examinam constantemente novos métodos de limitar ainda mais as emissões das embarcações até à próxima década. No que respeita à protecção do ambiente, a navegação interior está muito à frente dos outros modos de transporte, e pretende-se que esta situação se mantenha. O sector está empenhado no desenvolvimento de métodos de trabalho com emissões reduzidas para preservar a sua imagem ecológica, empenho que deve ser encorajado.

4.2.3

O interesse do transporte por vias navegáveis interiores reside tanto na concepção geral deste modo de transporte como nas diversas vantagens em matéria de descongestionamento, manutenção e utilização da infra-estrutura, acidentes e outros factores relevantes. A mudança modal para a navegação interior permite assim não só uma melhor protecção do ambiente pelas cadeias de transporte mas também transportes mais sustentáveis em geral.

4.2.4

A navegação interior é extremamente importante nas redes de transporte intermodais. A ideia dos transportes intermodais como alternativa ao transporte rodoviário e seu desenvolvimento futuro devem ser activamente encorajados. Embora este tipo de soluções tenha sido já bastante promovido no que respeita ao transporte de contentores, continuam a faltar medidas para aproveitar melhor o potencial do transporte intermodal (incluindo, nomeadamente, a navegação interior).

4.2.5

Em termos concretos, isso implica a criação de centros de transferência intermodal ao longo das vias navegáveis interiores. Os portos existentes devem ser convertidos em portos intermodais e devem ser construídos de raiz novos portos intermodais. A eficiência do transporte intermodal depende em grande medida da eficiência da infra-estrutura portuária e das rotas de navegação (pontes suficientemente altas sobre rios e canais, etc.).

4.3   Empregos e qualificações

4.3.1

A navegação interior é um sector que requer um nível elevado de qualificações. Trabalhar no sector exige cada vez mais conhecimentos náuticos e técnicos e competências no domínio da segurança, das tecnologias da informação e da comunicação (TIC) e da logística. As formações devem ser adaptadas às exigências modernas a fim de promoverem um sector orientado para o futuro. A estandardização dos programas de ensino e formação pode, como no caso do transporte marítimo, contribuir ainda mais para o profissionalismo do sector, sobretudo no que respeita ao transporte de substâncias perigosas. Há que desenvolver projectos de recrutamento e formação para atrair os jovens e assegurar o nível elevado das competências de todos os trabalhadores do sector.

4.3.2

Haverá, através de um diálogo social construtivo a nível europeu, que desenvolver uma estratégia para tornar atraente o trabalho na navegação interior, atrair profissionais qualificados para o sector e criar condições sociais e laborais equitativas em todos os Estados-Membros.

4.3.3

Como já foi referido, a Comissão Central para a Navegação no Reno (CCNR) foi a principal animadora do actual quadro jurídico para o transporte por navegação interior na Europa. A CCNR e a Comissão do Danúbio estão igualmente empenhadas na harmonização dos requisitos aplicáveis às tripulações e às qualificações dos capitães. As duas comissões deveriam trabalhar em conjunto com a Comissão Europeia por uma maior uniformização neste domínio.

4.3.4

A aplicação da legislação social nacional deve ser objecto de controlos mais severos. A Comissão deveria promover a coordenação entre as autoridades de controlo dos Estados-Membros. Deve-se prestar particular atenção, nesta matéria, aos navios-hotel.

4.3.5

Como já afirmado pelo CESE no seu parecer de iniciativa sobre a Política social num sistema pan-europeu de navegação interior, a Comissão Europeia é a instância mais adequada para promover a política social em sentido lato, baseando-se na longa tradição e na experiência da CCNR e da Comissão do Danúbio, às quais os aspectos sociais têm merecido particular atenção.

4.4   Imagem

4.4.1

O transporte por vias navegáveis interiores é um modo de transporte fiável, seguro, ecológico e barato. Para alterar os padrões tradicionais que seguem em sentido contrário, será necessário promover a sensibilização para o verdadeiro potencial do sector em termos de qualidade e de fiabilidade.

4.4.2

O sistema europeu de observação do mercado recentemente instituído poderá desempenhar um papel fulcral no acompanhamento das tendências da navegação interior e sua difusão junto dos principais interessados. A Comissão Europeia, com o apoio das Comissões do Reno e do Danúbio e do sector, deverá disponibilizar as informações necessárias.

4.4.3

Por outro lado, a criação e manutenção de centros de promoção poderá constituir uma forma de transmitir as informações relevantes em matéria de navegação interior às empresas que, para serem concorrenciais, terão de explorar o potencial do sector, sob a tutela e a orientação das organizações profissionais.

4.5   Infra-estruturas

4.5.1

As recentes inundações nos países banhados pelo Danúbio recordam a actualidade do debate sobre a necessidade de infra-estruturas compatíveis com o ambiente. Um relatório encomendado pelo governo alemão sobre as inundações provocadas pelas cheias do Elba em 2003 revelou que a navegação interior não contribuíra em nada para os desastres ocorridos e não podia ser responsabilizada pelas consequências dos mesmos.

4.5.2

O transporte de pessoas e mercadorias depende de uma infra-estrutura de qualidade, da boa manutenção das vias navegáveis existentes, da supressão dos pontos de estrangulamento e da criação das ligações necessárias. Cumpre não esquecer também a renovação das antigas infra-estruturas.

4.5.3

A rede transeuropeia de transportes é um dos principais elementos da Estratégia de Lisboa revista para a competitividade e o emprego na Europa. Apenas dois dos trinta eixos de transporte prioritários dizem respeito à navegação interior: o n.o 18, Reno/Mosa-Meno-Danúbio, e o n.o 30, Sena-Escalda.

4.5.4

As perspectivas financeiras 2007-2013 reduziram substancialmente o orçamento proposto pela Comissão para as RTE-T. A fim de assegurar o cofinanciamento esperado dos projectos para a navegação interior, o CESE apela a que os Estados-Membros implicados iniciem o mais rapidamente possível as obras previstas nas RTE-Transporte.

4.5.5

Ao mesmo tempo, exorta a Comissão a nomear, como para os projectos ferroviários, um coordenador para dirigir e estimular os dois projectos de navegação interior.

4.5.6

O Comité aguarda com expectativa o processo de consultas que a Comissão conta lançar sobre a questão da tarifação das infra-estruturas.

4.6   Modernização da estrutura organizacional

4.6.1

Uma das mais importantes conclusões do relatório EFIN (European Framework for Inland Navigation — Enquadramento europeu para a navegação interior), publicado sob o título «Um novo quadro institucional para a navegação interior na Europa», e do relatório PINE (Prospects of Inland Navigation in an Enlarged Europe — Perspectivas da navegação interior numa Europa alargada), encomendados pela Comissão, é que este modo de transporte tem recebido uma atenção insuficiente e beneficia de poucas políticas estratégicas. Por esse motivo, o CESE emitiu recentemente um parecer de iniciativa sobre «O quadro institucional para a navegação interior na Europa». No interesse da brevidade, o CESE remete aqui para esse parecer.

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 24 de 31.1.2006.

(2)  Tratado de Estrasburgo sobre a responsabilidade limitada na navegação interior (CLNI).

(3)  JO C 80 de 3.4.2002 e JO C 10 de 14.1.2004.

(4)  JO C 24 de 31.1.2006.

(5)  JO C 185 DE 8.8.2006.

(6)  No presente parecer, o termo «sector» compreende tanto os empregadores como os independentes e os trabalhadores do sector.

(7)  Recorde-se aqui o apelo lançado pelo CESE no seu parecer de iniciativa sobre a política social à realização de consultas adequadas, nomeadamente por intermédio das Comissões do Reno e do Danúbio.

(8)  Tratado de Estrasburgo sobre a responsabilidade limitada na navegação interior (CLNI).


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/222


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Pôr fim aos desníveis em matéria de banda larga

COM(2006) 129 final

(2006/C 318/36)

Em 5 de Abril de 2006, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação emitiu parecer em 4 de Setembro de 2006, tendo sido relator T. McDonogh.

Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 193 votos a favor, 1 voto contra e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

O Comité vê com agrado que o problema crítico do alargamento da clivagem digital entre as zonas desenvolvidas e menos desenvolvidas da Europa está a ser tratado de uma forma coordenada pelas Comissárias responsáveis pelos pelouros da Sociedade da Informação e Meios de Comunicação, da Concorrência, da Política Regional e da Agricultura e Desenvolvimento Rural.

1.2

No entanto, a Comunicação da Comissão — COM(2006) 129, «Pôr fim aos desníveis em matéria de banda larga» — não tem ambição suficiente e não contém recomendações concretas bastantes para demonstrar um verdadeiro empenho na eliminação desses desníveis.

1.3

O relatório (1) do Fórum «Digital Divide» apresenta uma análise da clivagem digital geográfica no que respeita à banda larga na Europa e identifica eventuais iniciativas da UE destinadas a eliminar os desníveis. Dada a gravidade do problema identificado pelo Fórum «Digital Divide» e tendo em conta que os desníveis em matéria de banda larga são responsáveis por atrasos no desenvolvimento socioeconómico, a Comissão deve ter uma intervenção muito mais enérgica e decisiva para fazer face à crescente clivagem digital.

1.4

O Comité acolhe favoravelmente a Declaração Ministerial de Riga sobre info-inclusão (e-inclusion)  (2), na qual os Estados-Membros se comprometem a reduzir significativamente as disparidades regionais no acesso à Internet em toda a UE, alargando o acesso à banda larga em zonas insuficientemente servidas, e a melhorar a acessibilidade à Internet de grupos em risco de exclusão, até 2010. Compete agora à Comissão dar força a esta declaração através de iniciativas políticas e recomendações que permitam superar rapidamente a clivagem digital.

No presente parecer, o Comité pretende chamar a atenção para áreas que justificam uma preocupação especial e recomendar novas acções.

2.   Recomendações

2.1

O Comité entende que devido à crescente importância do serviço de banda larga para o desenvolvimento socioeconómico, a conectividade em banda larga deve ser incluída no âmbito da definição de serviço universal (3) como serviço de interesse público relevante.

2.2

A Comissão deve tomar toda e qualquer medida para assegurar a aplicação rigorosa pelos Estados-Membros do quadro regulamentar das comunicações electrónicas (4).

2.3

A Comissão deve considerar a possibilidade de adoptar medidas e sanções especiais para acelerar o processo de efectiva desagregação do lacete local nos Estados-Membros. Atrasos e obstruções técnicas à realização de uma efectiva desagregação do lacete local constituem um grande obstáculo à introdução da tão necessária concorrência na prestação de serviços, em especial de ligação em banda larga.

2.4

A Comissão deve incentivar os Estados-Membros a defenderem os seus interesses nacionais, mantendo ou recuperando influência sobre a infra-estrutura fundamental de telecomunicações — redes interurbanas de transmissão e comutação. A influência do Estado é necessária para assegurar o desenvolvimento e a utilização deste activo estratégico para a prossecução de objectivos de política nacional, como o de pôr fim aos desníveis em matéria de banda larga.

2.5

Há que proceder a uma análise das estratégias nacionais para a banda larga de modo a promover acções concretas a levar a cabo pelos Estados-Membros até 2010, para pôr fim aos desníveis em matéria de banda larga. As estratégias deverão ser avaliadas em função da disseminação de boas práticas.

2.6

A Comissão deve estabelecer em toda a UE um processo de planeamento e gestão de banda larga eficaz que garanta a existência futura desta infra-estrutura essencial ao nível local. Deste modo, todas as estratégias nacionais para a banda larga e os planos locais seriam integrados num plano operacional pan-europeu que garantiria a cobertura de banda larga em todo o território da União. Este processo centrar-se-ia na implantação da banda larga nas zonas rurais e regiões desfavorecidas para eliminar a clivagem digital.

2.7

A Comissão deve considerar possibilidades de os Estados-Membros concederem incentivos fiscais às empresas de telecomunicações (5), para investimentos nas infra-estruturas em regiões menos desenvolvidas, oferecendo incentivos fiscais significativos às parcerias público-privado (PPP).

2.8

A Comissão deve explorar os mecanismos através dos quais as autoridades governamentais municipais e locais podem desempenhar um papel mais activo na prestação de serviços de banda larga e no desenvolvimento da procura de banda larga nas suas regiões. Estas autoridades devem ser plenamente envolvidas no desenvolvimento e na execução das estratégias nacionais para a banda larga, como referido no ponto 2.6. Por outro lado, poderiam ser explorados outros mecanismos como, por exemplo, a eventual participação destas autoridades nas iniciativas de PPP ou a imposição pelos Estados-Membros de regulamentos sobre a instalação do cabo de banda larga ou prestação de serviços de banda larga em todos os edifícios de construção nova.

2.9

Para facilitar o intercâmbio de conhecimentos técnicos e comerciais entre as PME na UE, a Comissão deve criar um sítio Internet dedicado aos desenvolvimentos nas áreas da tecnologia e dos serviços de banda larga em todo o mundo. Uma rede de conhecimento deste tipo estimularia a actividade empreendedora ligada à conectividade de banda larga e à prestação de serviços de banda larga.

2.10

Por forma a tornar mais clara a realidade da disponibilidade da banda larga na Europa, a Comissão deve estipular os níveis mínimos de débito de descarregamento para que uma ligação à Internet possa classificar-se como banda larga. Tal facilitaria uma avaliação adequada da clivagem geográfica no acesso à banda larga em toda a União.

2.11

Os Fundos Estruturais e os Fundos de Desenvolvimento Rural devem ser utilizados para promover campanhas de informação pública com vista a estimular a procura de banda larga no mercado, especialmente em zonas rurais e entre grupos de consumidores específicos em que a adopção desta tecnologia se revela problemática. Estas campanhas terão o duplo efeito de educar os potenciais consumidores na tecnologia e aumentar a pressão do mercado sobre os fornecedores para que prestem os necessários serviços de banda larga.

2.12

A Comissão deve intensificar o apoio aos esforços de IDT para se encontrarem tecnologias de banda larga que dêem soluções efectivas ao problema de fornecer ligações em banda larga de elevado débito em zonas não servidas por infra-estruturas de telecomunicações adequadas.

2.13

Os decisores políticos devem publicar directrizes relativas à protecção do consumidor que simplifiquem a terminologia e expliquem em linguagem clara as ofertas e benefícios dos serviços de banda larga. Isto tornará mais fácil para os consumidores tomarem boas decisões de compra.

2.14

Todos os alunos do 2.o ciclo devem ter banda larga na escola, a fim de serem integrados na era da informação.

2.15

A Comissão deve apoiar iniciativas em toda a UE para iniciar as crianças em idade escolar, os idosos e os cidadãos socialmente desfavorecidos na utilização da tecnologia de banda larga (por exemplo, através da aprendizagem com base na Internet, de videoconferências, de serviços públicos em linha, etc.).

2.16

A Comissão deve assegurar a recolha e o tratamento, de acordo com o Regulamento da Comissão relativo às estatísticas comunitárias sobre a sociedade da informação (6), de todas as estatísticas futuras relacionadas com a prestação de serviços de banda larga, a dimensão da clivagem digital e os desníveis em matéria de banda larga.

3.   Contexto

3.1

Em 20 de Março de 2006, a Comissão adoptou a Comunicação intitulada «Pôr fim aos desníveis em matéria de banda larga». Esta comunicação centra-se na clivagem territorial em matéria de acesso à banda larga. A Comunicação pretende sensibilizar os governos e as instituições a todos os níveis para a importância dessa clivagem e para o problema da falta de serviços adequados de banda larga nas zonas menos desenvolvidas da União. A Comunicação responde a uma das prioridades da iniciativa i2010 — Uma sociedade da informação europeia para o crescimento e o emprego (7).

3.2

A banda larga permite novas aplicações TIC e melhora a capacidade das existentes. Estimula o crescimento económico através da criação de novos serviços e da abertura de novas oportunidades de investimento e de emprego. Mas a banda larga melhora igualmente a produtividade de muitos procedimentos existentes, conduzindo a melhores salários e a um melhor retorno dos investimentos. Os governos, a todos os níveis, reconheceram o impacto que a banda larga pode ter na vida quotidiana e estão empenhados em assegurar que os seus benefícios sejam acessíveis a todos (8).

3.3

Assegurar a sustentabilidade a longo prazo de zonas remotas e rurais exige uma abordagem estratégica ao desenvolvimento da sociedade da informação. A disponibilidade de serviços de banda larga constitui um elemento crítico no esforço das comunidades locais para atrair empresas, na facilitação do teletrabalho, na prestação de cuidados de saúde e na melhoria da educação e dos serviços públicos, e proporciona uma ligação essencial à informação.

3.4

A procura de serviços de banda larga a nível residencial na UE tem vindo a crescer rapidamente. O número de linhas de acesso em banda larga quase duplicou nos últimos dois anos. Em Outubro de 2005, havia cerca de 53 milhões de ligações na EU-25, o que corresponde a uma taxa de penetração de 11,5 % em termos de população e a cerca de 20 % das residências. Esta evolução foi ditada principalmente pelo mercado e fomentada pelo aumento da concorrência.

3.5

Apesar do aumento geral das ligações em banda larga, o acesso é ainda limitado nas regiões mais remotas e rurais, devido aos elevados custos decorrentes da fraca densidade populacional e da distância.

3.6

A Comunicação sublinha que a União Europeia tem de intensificar os seus esforços para incentivar a utilização de serviços de banda larga e estimular o alargamento da sua oferta, em especial nas zonas menos desenvolvidas da União. O âmbito da intervenção pública em zonas insuficientemente servidas foi sublinhado na Comunicação eEurope 2005 (9), que destacava o papel que os Fundos Estruturais podem desempenhar para levar a banda larga às regiões menos desenvolvidas.

3.7

A Comunicação sublinha o papel crucial das autoridades regionais e locais no desenvolvimento da banda larga nos seus territórios. Estão melhor colocadas para planear um projecto de banda larga que tenha em conta as necessidades e as especificidades técnicas locais. As estratégias nacionais de banda larga têm de ser reforçadas para envolver e reflectir as necessidades locais.

3.8

A Comunicação identifica uma série de instrumentos políticos ao dispor dos governos a nível da UE para pôr fim aos desníveis em matéria de banda larga:

(i)

Aplicação do quadro regulamentar das comunicações electrónicas;

(ii)

Financiamento público;

(iii)

Financiamento comunitário: Fundos Estruturais e Fundo de Desenvolvimento Rural;

(iv)

Agregação da procura e contratos públicos;

(v)

Impulsionar a criação de serviços públicos modernos.

3.9

Em suma, esta Comunicação convida todos os níveis de governo na União Europeia a serem mais activos na utilização dos instrumentos e tecnologias disponíveis para colmatar a crescente clivagem digital. Os Estados-Membros são convidados a actualizar as suas estratégias nacionais de banda larga existentes, para dar orientações suplementares a todos os interessados. Os seus documentos podem definir objectivos em termos de cobertura e de utilização, com base numa parceria activa com autoridades regionais e aproveitando as sinergias entre fontes alternativas de financiamento (nacionais, Fundos Estruturais, Fundo de Desenvolvimento Rural). As estratégias nacionais de banda larga devem estabelecer igualmente objectivos claros para as taxas de ligação de escolas, serviços da administração pública e centros de saúde.

4.   Observações

4.1   Observações na especialidade

4.1.1

A disponibilidade universal de conectividade em banda larga de elevado débito é essencial ao desenvolvimento económico e social de todas as regiões da UE — urbanas e rurais. Isto é especialmente aplicável à economia global, baseada no conhecimento, que está hoje, em grande medida, na origem do desenvolvimento. As empresas baseadas no conhecimento crescerão onde existirem competências e infra-estruturas que lhes sirvam de suporte. A infra-estrutura de banda larga de categoria mundial e a baixo custo é uma componente fundamental de uma economia dinâmica do século XXI. Uma quantidade crescente de serviços avançados na saúde, na educação e no apoio social dependerá da disponibilidade de banda larga. Sem esta disponibilidade, os cidadãos das comunidades menos favorecidas serão ainda mais discriminados.

4.1.2

Em contraste com os Estados Unidos e alguns países asiáticos, a maior parte dos países europeus foram demasiado lentos a oferecer a banda larga aos seus cidadãos. Até mesmo a modesta taxa citada na Comunicação, de 20 % de penetração nas residências da UE-25 em Outubro de 2005, obscurece o facto de a qualidade das ligações (velocidade de acesso) ser fraca em muitos casos — com velocidades de descarregamento abaixo dos 512kbps tanto em zonas urbanas como rurais — e de a maior densidade de implantação da banda se situar nas zonas urbanas, com apenas 8 % das habitações ligadas nas zonas rurais.

4.1.3

As comunidades rurais são especialmente vulneráveis às rápidas mudanças macroeconómicas que estão a ocorrer. Se estas comunidades não tiverem paridade no acesso à conectividade em banda larga, estarão condenadas a um inevitável declínio. Na economia do conhecimento, os países, regiões e cidades concorrem para atrair e desenvolver empresas de conhecimento intensivo que aumentem a sua prosperidade, e a infra-estrutura de banda larga constitui para isso um factor essencial.

4.1.4

Um acesso mínimo, em casa e no trabalho, à Internet em banda larga de elevado débito deve ser um «direito» de todos os cidadãos da UE. O CESE discorda da afirmação da Comissão de que «a banda larga não se tornou ainda necessária para a participação normal na sociedade, ou seja, a falta de acesso não implica exclusão social». A Comissão deve reconsiderar a inclusão da banda larga no âmbito do serviço universal o mais rapidamente possível.

4.1.5

A Comissão deve ainda estipular os níveis mínimos de débito de descarregamento para que uma ligação à Internet possa classificar-se como ligação à Internet de banda larga. Isto é necessário para assegurar normas de infra-estrutura e de serviço suficientemente fortes para suportar serviços emergentes de Internet. Uma directriz deste tipo por parte da Comissão iria clarificar a verdadeira situação na Europa em termos de ligação em banda larga — actualmente, as estatísticas relativas às ligações estão inflacionadas, pois a qualidade do serviço de banda larga prestado ao consumidor final é demasiado baixa para poder ser considerada verdadeiramente banda larga — e exerceria também a pressão adequada sobre as empresas operadoras para que forneçam autêntica banda larga aos seus clientes.

4.2   Barreiras tecnológicas à conectividade em banda larga

4.2.1

Embora o acesso em banda larga seja possível através de uma variedade de plataformas, as limitações das tecnologias existentes impedem o fornecimento de conectividade a muitas zonas rurais.

4.2.2

Os sistemas de televisão por cabo, com capacidade de transmissão de elevado débito, podem ser uma excelente base para os serviços de banda larga. Infelizmente, nas zonas rurais é raro haver sistemas de televisão por cabo e, quando os há, é muitas vezes necessário fazer investimentos de monta para modernizá-los e proporcionar serviços de banda larga.

4.2.3

A linha digital de assinante (DSL) é a tecnologia de acesso à banda larga predominante na maior parte da Europa, e algumas variantes de DSL podem oferecer uma grande largura de banda a baixo custo. No entanto, existem algumas limitações:

A instalação de DSL exige a modernização das estações locais de comutação às quais os clientes estão ligados. Os operadores têm frequentemente relutância em fazer o investimento necessário, porque há muito maiores possibilidades de recuperação do investimento noutras áreas do seu negócio. Os clientes ficam, portanto, sem acesso a banda larga.

A maior parte das ligações de DSL só podem servir clientes situados a 3-5 km de distância da estação de comutação equipada com DSL. Os clientes mais distantes não podem ter banda larga através de DSL.

A DSL utiliza a infra-estrutura de cobre existente na rede local para fornecer o serviço de banda larga. Porém, muitos desses cabos de cobre estão muitas vezes velhos e têm de ser substituídos para que a DSL funcione devidamente. Os operadores podem mostrar-se muitas vezes relutantes em fazer o investimento necessário. Assim, mesmo quando a estação local de comutação está equipada com banda larga e o cliente se situa a menos de 5 km de distância, o lacete local em cabo de cobre até à sua casa ou empresa pode não servir para o fornecimento de banda larga.

4.2.4

O legado de infra-estruturas de base pode ser um obstáculo ao fornecimento de banda larga de elevado débito, especialmente nas zonas de fraca densidade populacional. Por exemplo, nas décadas de 1980 e 1990, muitos países usavam tecnologia digital de hiperfrequência nas suas redes de base de telecomunicações. Esta tecnologia rádio era eficaz para o fornecimento de tecnologia telefónica de elevada qualidade e de serviços de dados de baixo débito em muitas zonas rurais. No entanto, numerosas instalações de tecnologia digital de hiperfrequência deixaram um legado de infra-estruturas de base impróprias para o fornecimento dos serviços de Internet de elevado débito que hoje definem a conectividade em banda larga — serviços de vídeo na Internet. No caso da Irlanda, calcula-se que cerca de 50 % das estações de comutação do país (as situadas em zonas rurais), que servem 15 % dos clientes de telecomunicações, estão equipadas com esta rede de base digital de hiperfrequência e nunca poderão fornecer banda larga de elevado débito utilizando a infra-estrutura de telecomunicações existente. Solucionar o problema do legado, dotando as zonas rurais de uma rede de base de fibra óptica, implica custos extremamente elevados e pode não se justificar em termos meramente comerciais. O Estado teria de subsidiar a modernização da rede.

4.2.5

A Comissão deve sobretudo considerar a possibilidade de os elevados investimentos na modernização da infra-estrutura existente (circuitos interurbanos de base, comutação e lacete local), indispensáveis ao fornecimento de serviços de banda larga de elevado débito, serem suportados aos níveis nacional e comunitário, eventualmente através de incentivos fiscais e/ou de parcerias público-privado.

4.2.6

Têm sido utilizadas tecnologias de satélite e tecnologias sem fios de uso privado para fornecer serviço de banda larga em zonas onde a infra-estrutura pública de telecomunicações não suporta a conectividade em banda larga. Contudo, factores de custo e tecnológicos limitam a utilidade destas tecnologias para pôr fim aos desníveis em matéria de banda larga. A IDT está a progredir numa série de domínios para encontrar tecnologias sem fios de elevada largura de banda a baixo custo que assegurem uma boa conectividade. Os decisores políticos devem dar um apoio pró-activo a este desenvolvimento e resolver os problemas de disponibilidade do espectro radioeléctrico para que estas soluções sejam viáveis.

4.2.7

A inovação no fornecimento de serviços de banda larga a todos os grupos poderia ser estimulada através do desenvolvimento, entre as PME na Europa, de uma rede de conhecimento sobre a mais moderna tecnologia de banda larga. A criação de uma rede de conhecimento deste tipo seria facilitada pela constituição de um sítio Internet, que servisse de repositório e meio de divulgação de informação.

4.3   Problemas com o fornecimento de banda larga

4.3.1

Com a emergência de redes de elevada largura de banda e de tecnologia de rede IP (Protocolo Internet), os custos de rede baixaram e a flexibilidade da oferta de serviços personalizados é quase ilimitada. Em países como a Itália, a França, a Espanha e o Reino Unido, as empresas de telecomunicações criaram redes inteiramente baseadas no IP, conseguindo enormes economias nos custos de operação das redes. Os custos mais baixos da instalação de novas redes IP e a desregulamentação enfraqueceram o poder dos fornecedores de serviço dominantes, e houve um enorme aumento do número de empresas de telecomunicações a oferecer serviços a retalho.

4.3.2

Esta mudança tecnológica alterou o modelo de negócios das empresas de telecomunicações; o novo modelo separa a propriedade das redes da prestação de serviço ao consumidor final. Em mercados eficientes e desenvolvidos, o modelo emergente divide as empresas de telecomunicações em grossistas e retalhistas, com múltiplos fornecedores de serviços por grosso a competir para vender largura de banda a uma miríade de fornecedores de serviços a retalho. Isto reflecte as novas tecnologias, as dinâmicas de custos e os quadros regulamentares que estão a mudar o negócio das telecomunicações, o qual deixa de estar centrado na rede para passar a estar centrado no serviço. Contudo, nos mercados menos desenvolvidos e menos eficientes, o fornecimento de serviços de telecomunicações ainda é controlado pelos fornecedores de serviço dominantes, que não têm incentivos para separar as duas actividades e deixar que a concorrência se instale. Esta separação só se verificará se os decisores políticos a incentivarem através de medidas adequadas de política de concorrência.

4.3.3

Há 25 anos, a maior parte das infra-estruturas de telecomunicações na Europa era propriedade dos governos nacionais e estes activos eram desenvolvidos ao serviço do bem comum. Posteriormente verificou-se uma privatização progressiva da indústria de telecomunicações na UE, o que, de uma maneira geral, constituiu uma experiência positiva para a indústria, os consumidores e a sociedade. Contudo, as empresas de telecomunicações com fins comerciais não têm objectivos nos domínios social, da saúde, da educação ou mesmo do desenvolvimento económico — o seu interesse reside em maximizar os lucros, gerir eficazmente os activos e fazer florescer os seus negócios. Ora, nos sítios onde faltam as condições de rede necessárias para o fornecimento de serviços de banda larga, nas regiões menos desenvolvidas, os fornecedores de telecomunicações com fins comerciais não têm qualquer incentivo para investir nesta infra-estrutura socialmente essencial. Sempre que possível, os governos devem manter uma forte influência na operação e manutenção da infra-estrutura nacional de telecomunicações, equilibrando o elevado retorno do investimento em infra-estruturas em zonas de grande densidade populacional com os investimentos, financeiramente muito menos atractivos, necessários nas regiões menos desenvolvidas.

4.3.4

A disponibilização de banda larga em toda a Europa, especialmente nas zonas menos desenvolvidas, foi dificultada por deficiências de mercado generalizadas. Em muitos mercados persistem condições não concorrenciais, com os fornecedores da infra-estrutura dominantes a atrasarem o mais possível a desagregação do lacete local e com práticas restritivas que impedem o acesso às redes de base nacionais. Nas zonas onde a banda larga tem sido inexistente ou pouco desenvolvida, há muitas vezes insuficientes incentivos ao investimento por parte dos fornecedores da infra-estrutura.

4.4   Problemas com a procura de banda larga

4.4.1

O problema da procura latente de serviços de banda larga e, em especial, o diferencial entre as taxas de utilização dos serviços disponíveis nas zonas desenvolvidas e as taxas muito mais baixas nas zonas menos desenvolvidas, é produto de muitas causas: socioeconómicas, fraca qualidade da conectividade disponível, pouca concorrência, custos elevados e falta de conhecimento dos benefícios ou do modo de utilização da tecnologia.

4.4.2

Os decisores políticos e os governos podem ter um impacto importante no lado da procura de banda larga, e o Comité congratula-se com as recomendações da Comissão no sentido de serem concedidos incentivos fiscais aos assinantes pelos Estados-Membros, com o objectivo de reduzir os custos reais da adopção da banda larga, e de que os governos dêem prioridade ao desenvolvimento de serviços públicos em linha, assim como ao fornecimento de conectividade aos serviços da administração pública, às escolas e aos centros de saúde, a fim de educar os utilizadores sobre os benefícios da banda larga e de promover a procura.

4.4.3

A procura de banda larga pelos consumidores é prejudicada pela falta de clareza da terminologia relativa à banda larga e pela confusão sobre os pacotes de serviços oferecidos pelos fornecedores. Devem ser feitos esforços para simplificar a terminologia e explicar os serviços e benefícios em linguagem fácil de entender.

4.4.4

Sempre que a adopção desta tecnologia se revele problemática, podem ser utilizadas campanhas de informação pública para estimular a procura de banda larga no mercado. Estas campanhas terão o duplo efeito de educar os potenciais consumidores na tecnologia e aumentar a pressão do mercado sobre os fornecedores para que prestem os necessários serviços de banda larga.

4.5   Visão da banda larga para uma Europa interligada

4.5.1

A conectividade da banda larga é um utensílio essencial na era da informação em que vivemos. A necessidade de serviços de banda larga mais rápidos, mais baratos e ubíquos está a crescer exponencialmente à medida que se desenvolve a economia do conhecimento e aumenta a riqueza da experiência da Internet.

4.5.2

Até 2010 há que dispor de um serviço universal de banda larga na Europa com largura de banda suficiente para suportar uma verdadeira experiência multimédia para todos os utilizadores. As empresas e a sociedade poderão então dar passos de gigante rumo à sociedade da informação.

4.5.3

Para dar vida a esta visão, a Comissão pode defini-la recorrendo a critérios técnicos e comerciais válidos e promovendo políticas susceptíveis de ultrapassar os obstáculos nos moldes aqui propostos.

4.6   Necessidade de planeamento e acção ao nível governamental

4.6.1

Os fornecedores competitivos de banda larga aspiram a uma procura organizada no mercado: um mercado em que os consumidores saibam que serviços querem e quanto estão dispostos a pagar por eles e um mercado em que a procura esteja agregada numa proposta de serviço atractiva para um novo fornecedor. A procura organizada contribuirá para o crescimento de uma verdadeira concorrência e ajudará os fornecedores de serviços a verem os benefícios de prestar serviço às regiões menos desenvolvidas da União. O Comité felicita a Comissão pela sua iniciativa de lançar um sítio Internet que facilite a agregação da procura e a oferta.

4.6.2

A UE necessita de um plano coerente e integrado em cada região para o desenvolvimento da infra-estrutura e dos serviços de banda larga. As estratégias nacionais de banda larga têm de ser complementadas por planos de pormenor para o fornecimento local de serviços de banda larga em todas as zonas. O Comité concorda com a posição da Comissão de que os governos locais devem ser os detentores e promotores desses planos de pormenor. Os planos devem incluir um mapa detalhado de toda a infra-estrutura de banda larga da região e uma visão de pormenor (até ao nível da rua) da evolução pretendida da infra-estrutura — o quê, quando e como. Os planos devem especificar igualmente a variedade mínima de serviços de banda larga a fornecer a diferentes grupos de utilizadores e em diferentes locais.

4.6.3

O ritmo sempre crescente da inovação na tecnologia das telecomunicações e a natureza crescentemente dinâmica da indústria das telecomunicações implicam que a Comissão e os Governos dos Estados-Membros terão de gerir um processo contínuo que assegure que todo o território da UE seja servido pela infra-estrutura melhor e mais rentável de banda larga disponível.

4.6.4

Os governos locais e as autoridades municipais podem desempenhar um papel importante no alargamento do fornecimento de ligações em banda larga nas respectivas regiões, nomeadamente através do incentivo de iniciativas de parcerias público-privado e da criação de regulamentação que exija dos promotores imobiliários a inclusão das infra-estruturas de telecomunicações em banda larga nos seus projectos.

4.6.5

Facto significativo é que alguns Estados-Membros conseguiram abordar, melhor do que outros, o problema da clivagem digital, tendo incluído nas estratégias nacionais de banda larga acções específicas para pôr fim aos desníveis em matéria de banda larga (10).

4.6.6

Através de uma política que incida sobre as estratégias nacionais de banda larga, a Comissão pode coordenar e incentivar medidas coerentes que visem o desenvolvimento da banda larga pelos governos dos Estados-Membros da União. Importa reforçar essa política para assegurar que os governos incluam as boas práticas no desenvolvimento dos seus planos, de modo a estabelecer um plano abrangente para a UE que permita pôr fim aos desníveis em matéria de banda larga, até 2010.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Relatório do Fórum «Digital Divide»: Broadband Acess and Public Support in Under-served Areas (Acesso à banda larga e apoio público nas zonas insuficientemente servidas), Bruxelas, 15 de Julho de 2005.

(2)  Declaração Ministerial de Riga, de 11 de Junho de 2006, IP/06/769.

(3)  COM(2005) 203 e Directiva 2002/22/CE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao serviço universal e aos direitos dos utilizadores em matéria de redes e serviços de comunicações electrónicas.

(4)  Directiva 2002/21/CE relativa ao quadro regulamentar comum; Directiva 2002/19/CE relativa ao acesso e à interligação; e Directiva2002/77/CE relativa à concorrência nos mercados de redes e serviços de comunicações electrónicas.

(5)  O conceito de «Empresa de telecomunicações» abrange qualquer empresa que preste serviços de telecomunicações nos dois sentidos, incluindo empresas que oferecem serviços de telefone fixo e móvel e empresas de distribuição de televisão por cabo que prestem este tipo de serviços.

(6)  Regulamento (CE) n.o 1031/2006 da Comissão, de 4 de Julho de 2006, que aplica o Regulamento (CE) n.o 808/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às estatísticas comunitárias sobre a sociedade da informação.

(7)  COM(2005) 229 «i2010 — Uma sociedade da informação europeia para o crescimento e o emprego».

(8)  COM(2004) 369 «Ligar a Europa em alta velocidade: Estratégias nacionais para a banda larga».

(9)  COM(2002) 263 «eEurope 2005: Uma sociedade da informação para todos».

(10)  O novo plano de banda larga (Setembro de 2004) do Comité Interministériel pour l'Aménagement Du Territoire (CIADT), França, é um bom exemplo de uma estratégia abrangente.


23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/229


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 417/2002 relativo à introdução acelerada dos requisitos de construção em casco duplo ou equivalente para os navios petroleiros de casco simples e que revoga o Regulamento (CE) n.o 2978/94 do Conselho»

COM(2006) 111 final — 2006/0046 (COD)

(2006/C 318/37)

Em 25 de Abril de 2006, o Conselho da União Europeia decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 80.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 4 de Setembro de 2006, sendo relator Jan Simons.

Na 429.a reunião plenária, de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 187 votos a favor, 4 votos contra e 8 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE concorda que os Estados-Membros da UE devem respeitar os seus acordos políticos. O apoio a dar através da proposta da Comissão em apreço aos Estados-Membros que o façam, bem como a imagem que transparece mundialmente de que a União Europeia está determinada também a pôr em prática os compromissos assumidos em relação à OMI são medidas muito mais relevantes do que quaisquer consequências negativas, meramente especulativas e muito limitadas, que podem ou não ocorrer.

2.   Introdução

2.1

O Regulamento (CE) n.o 417/2002, com a redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) n.o 1726/2003, introduziu disposições que proíbem o transporte de petróleos e fracções petrolíferas pesados em petroleiros de casco simples que demandem ou zarpem de portos da União Europeia, a fim de reduzir os riscos de poluição acidental por hidrocarbonetos em águas europeias.

2.2

Uma proibição semelhante, baseada nas medidas adoptadas pela UE, foi imposta a nível mundial pela Organização Marítima Internacional (IMO) mediante as novas regras 13G e 13H do Anexo I da Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios 73/78 (MARPOL). No entanto, nos termos do n.o 7 da regra 13G e dos n.o s 5, 6 e 7 da regra 13H da referida regulamentação da MARPOL, as administrações podem isentar os petroleiros da proibição, em certas condições. Este foi o compromisso necessário para que se pudesse dispor de uma regulamentação mundialmente aceite. Logo a seguir, a Presidência italiana da UE, em nome de todos os Estados-Membros e da Comissão Europeia, declarou, na linha do então habitual e mutuamente vinculativo acordo de coordenação prévio, que nem todos eles fariam uso dessas derrogações. No entanto, após a entrada em vigor destas disposições em 5 de Abril de 2005, um Estado-Membro notificou a OMI, logo em 18 de Abril de 2005, da sua intenção de recorrer à derrogação que é objecto da proposta da Comissão em apreço. Nos meses seguintes, muitos Estados-Membros informaram a OMI, nos termos do acordo de coordenação, de que não fariam uso dessa possibilidade. Cinco Estados-Membros ainda têm que fazer a comunicação oficial, mas já anunciaram no âmbito do Coreper e, consequentemente, também à Comissão e aos outros Estados-Membros de que em breve seguirão o exemplo dos restantes 19 Estados-Membros.

2.3

A Comissão Europeia evoca acordos políticos alcançados antes e logo após a entrada em vigor da proibição da OMI em Dezembro de 2003, bem como a declaração feita pela Presidência italiana da União Europeia exprimindo o compromisso político dos então 15, hoje 25, Estados-Membros de não recorrerem às excepções previstas na Convenção MARPOL.

2.4

A Comissão Europeia propõe uma alteração ao Regulamento (CE) n.o 417/2002 de modo a verter em letra de lei o compromisso político de alargar o âmbito do regulamento proibindo o transporte de petróleos pesados em qualquer petroleiro de casco simples que arvore pavilhão de um Estado-Membro da UE, independentemente da jurisdição sob que se encontrem os portos, terminais ao largo ou zonas marítimas em que opere.

3.   Observações na generalidade

3.1

O CESE relembra que no seu parecer sobre Erika II (1) apoiava a proibição da utilização de petroleiros de casco simples para o transporte de petróleos pesados mais poluentes.

3.2

Por uma questão de princípio, os Estados-Membros deverão respeitar os seus compromissos políticos a nível internacional e assegurar a coerência da política comunitária. No entanto, a proposta é precedida de uma breve exposição de motivos centrada apenas nos compromissos políticos e, em particular, na declaração da UE quando da adopção da nova regra 13H da Convenção MARPOL.

3.3

No parecer sobre Erika II, o CESE recomendava que a UE propusesse à OMI a designação, ao abrigo da Convenção MARPOL, de zonas ambientais especialmente sensíveis como «zonas a evitar» pelos petroleiros transportando fuelóleo pesado e o estabelecimento de sistemas vinculativos de organização do tráfego ao abrigo da Convenção SOLAS (2). Em resposta às propostas apresentadas por países interessados, a OMI criou uma série de Áreas Marítimas Particularmente Sensíveis (Águas Europeias Ocidentais, Mar Báltico, Ilhas Canárias, Arquipélago dos Galápagos) e aumentou a Área da Grande Barreira de Coral de modo a incluir o Estreito de Torres (Austrália–Papua Nova Guiné). Estas, tais como as áreas do Arquipélago de Sabana-Camagüey (Cuba), da Ilha de Malpelo (Colômbia), o mar à volta das Florida Keys (EUA) e a Reserva Nacional de Paracas (Peru), estabelecidas entre 1997 e 2003, são protegidas por medidas conexas, que as incluem em áreas a serem evitadas por navios-tanque e outros navios, medidas de organização do tráfego, sistemas de notificação e pilotagem. O estabelecimento destas e de áreas semelhantes deveria ser visto como o reflexo de políticas de países costeiros para reduzir ao mínimo o risco de poluição provocada por petroleiros de casco simples.

3.4

De acordo com as estatísticas apresentadas à OMI em Abril de 2003 pelos Estados-Membros e pela Comissão Europeia (3), em Novembro de 2002 operavam cerca de 660 petroleiros de casco simples da categoria 2 (20 dwt ou mais), dos quais 160 superpetroleiros (VLCC e ULCC, navios-tanque de 200 000 dwt ou mais) utilizados sobretudo no transporte de petróleo bruto do Golfo Pérsico para os EUA e Japão. Os petroleiros podem ser retirados da navegação por variadas razões ou desarmados numa data precisa. No final de 2006, o número máximo destes superpetroleiros em actividade será inferior a 50 e diminuirá anualmente de acordo com o calendário de retirada, que termina em 2010. Destes números nada se pode ainda concluir sobre os aspectos económicos e sociais que podem ser relevantes para o Estado-Membro que optou por recorrer à derrogação. Ainda não é possível consultando o registo de navios do respectivo país ter uma indicação precisa sobre quais os navios eventualmente envolvidos, pelo que qualquer informação nesse sentido não passa de uma mera conjectura, o que não é digno do CESE. Ainda que globalmente pudessem estar envolvidos 23 navios e 300 a 400 marinheiros nacionais, o perigo de transferência de registo não é a primeira opção; qualquer armador ou proprietário de navios avisado procurará justamente utilizá-los no transporte de outros produtos petrolíferos, cujo mercado seja igualmente dinâmico.

3.5

O âmbito de aplicação da proposta em apreço baseia-se na actual legislação aplicável a petroleiros de mais de 5 000 toneladas. Deveria, porém, ser ponderada a possibilidade de prever regulamentação específica para petroleiros com menos de 5 000 toneladas.

4.   Observações na especialidade

4.1

Por último, o CESE entende ser necessário clarificar ou definir o que se entende por «petróleos e fracções petrolíferas pesados» no novo n.o 3-A do artigo 1.o (versão portuguesa).

4.2

Os n.os 4 e 5 do artigo 4.o do Regulamento (revisto) n.o 417/2002 remetem para o n.o 3. A proposta em apreço pretende acrescentar ao artigo 4.o um n.o 3-A, deixando esta remissão de se aplicar, o que, de modo algum, corresponde aos objectivos da proposta de regulamento.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 221 de 7 de Agosto de 2001, p. 54.

(2)  SOLAS: Salvaguarda da Vida Humana no Mar («Safety Of Life At Sea»).

(3)  Documento da OMI MEPC 49/16/1.