ISSN 1725-2482

Jornal Oficial

da União Europeia

C 28

European flag  

Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

49.o ano
3 de Fevreiro de 2006


Número de informação

Índice

Página

 

II   Actos preparatórios

 

Comité Económico e Social Europeu

 

421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005

2006/C 028/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Verde sobre as sucessões e os testamentosCOM(2005) 65 final

1

2006/C 028/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Situação e perspectivas sobre as fontes de energia convencionais — carvão, petróleo e gás natural — no quadro da futura utilização de fontes de energia

5

2006/C 028/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao financiamento plurianual da actividade da Agência Europeia da Segurança Marítima no domínio do combate à poluição causada por navios e que altera o Regulamento (CE) n.o 1406/2002COM(2005) 210 final — 2005/0098 (COD)

16

2006/C 028/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho sobre a gestão dos riscos e das crises na agriculturaCOM(2005) 74 final

18

2006/C 028/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Conselho relativa ao estabelecimento de regras mínimas para a protecção dos frangos de carneCOM(2005) 221 final — 2005/0099 (CNS)

25

2006/C 028/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que institui para o período de 2007-2013 o programa Cidadãos pela Europa, destinado a promover a cidadania europeia activaCOM(2005) 116 final — 2005/0041 (COD)

29

2006/C 028/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho sobre as políticas europeias de juventude Responder às preocupações dos jovens europeus — Aplicação do Pacto Europeu para a Juventude e promoção da cidadania activaCOM(2005) 206 final

35

2006/C 028/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Período de reflexão: estrutura, temas e quadro para uma avaliação do debate sobre a União Europeia

42

2006/C 028/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Mobilidade das pessoas na Europa alargada e consequências para os meios de transporte

47

2006/C 028/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as

52

2006/C 028/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Relatório sobre a execução da estratégia florestal da União EuropeiaCOM(2005) 84 final

57

2006/C 028/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho que estabelece a organização comum de mercado no sector das sementesCOM(2005) 384 final — 2005/0164 (CNS)

66

2006/C 028/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1493/1999 que estabelece a organização comum do mercado vitivinícolaCOM(2005) 395 final — 2005/0160 (CNS)

68

2006/C 028/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao Fundo de Solidariedade da União EuropeiaCOM(2005) 108 final — 2005/0033 (COD)

69

2006/C 028/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Comércio ético e programas de garantias aos consumidores

72

2006/C 028/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho que estabelece a organização comum de mercado no sector do lúpuloCOM(2005) 386 final — 2005/0162 (CNS)

82

2006/C 028/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades EuropeiasCOM(2005) 181 final — 2005/0090 (CNS)

83

2006/C 028/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Conselho que define as disposições de aplicação relativas ao reembolso do imposto sobre o valor acrescentado, previsto na Directiva 77/388/CEE, a sujeitos passivos não estabelecidos no interior do país mas estabelecidos num outro Estado-MembroCOM(2004) 728 final — 2005/0807 (CNS)

86

2006/C 028/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que revoga a Directiva 90/544/CEE do Conselho relativa às bandas de frequências designadas para a introdução coordenada na Comunidade de um sistema público pan-europeu terrestre de chamada de pessoasCOM(2005) 361 final — 2005/0147 (COD)

88

2006/C 028/0

Parecer do Comité Económico e a Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Decisão n.o 2256/2003/CE com vista ao prolongamento até ao final de 2006 do programa para a difusão das boas práticas e o acompanhamento da adopção das TICCOM(2005) 347 final — 2005/0144 (COD)

89

2006/C 028/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Preparação da sexta conferência ministerial da OMC — Posição do CESE

90

2006/C 028/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Diálogo entre as sociedades civis da UE e dos países candidatosCOM(2005) 290 final

97

2006/C 028/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 2000/14/CE relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros em matéria de emissões sonoras para o ambiente dos equipamentos para utilização no exteriorCOM(2005) 370 final — 2005/0149 (COD)

104

PT

 


II Actos preparatórios

Comité Económico e Social Europeu

421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005

3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde sobre as sucessões e os testamentos»

COM(2005) 65 final

(2006/C 28/01)

Em 1 de Março de 2005, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o: «Livro Verde sobre as sucessões e os testamentos».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, emitiu parecer em 21 de Setembro de 2005, sendo relator D. RETUREAU.

Na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro (sessão de 26 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 118 votos a favor, sem votos contra e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Propostas da Comissão

1.1

Em conformidade com o Programa de Haia (2001), a Comissão apresenta um Livro Verde de consulta sobre os testamentos e as sucessões com aspectos internacionais, que aborda toda a problemática neste domínio:

lei aplicável,

competência jurisdicional e reconhecimento mútuo dos actos e das decisões judiciárias,

disposições administrativas, actos notariais ou administrativos e respectivo reconhecimento mútuo,

possibilidades de simplificação ao nível europeu: certidões de direitos sucessórios e registo dos testamentos.

1.2

Para os herdeiros, uma sucessão transnacional apresenta dificuldades e obstáculos específicos, na medida em que se depara com a diversidade do direito substantivo, das normas processuais e das regras em matéria de conflitos de leis vigentes em cada Estado-Membro.

1.3

O Livro Verde propõe, portanto, que se considere a possibilidade de adoptar, na União, regras substantivas e regras referentes à competência, ao direito aplicável e ao reconhecimento não só das decisões judiciárias, como também das decisões e dos actos administrativos relativos a testamentos e sucessões, incluindo quando a componente internacional da sucessão se refere a um país terceiro.

2.   Observações na generalidade

2.1

A nível internacional, esta matéria já foi objecto de três convenções de Haia sobre as sucessões e os testamentos e de uma convenção relativa aos trusts:

Convenção sobre os conflitos de leis em matéria de forma das disposições testamentárias (assinatura em 5 de Outubro de 1961, entrada em vigor em 5 de Janeiro de 1964). Partes: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Estónia, Finlândia, França, Grécia, Luxemburgo. Esta convenção entrou igualmente em vigor noutros Estados-Membros, nomeadamente nos Países Baixos, no Reino Unido e na Suécia (ratificação); na Irlanda e na Polónia (adesão); e na Eslovénia (sucedendo à ex-Jugoslávia).

Convenção sobre a administração internacional das sucessões (assinatura em 2 de Outubro de 1973, entrada em vigor em 1 de Julho de 1993) entrou em vigor em alguns Estados-Membros, nomeadamente Portugal (ratificação), Eslováquia e República Checa (sucedendo à ex-Checoslováquia).

Convenção sobre a lei aplicável às sucessões por morte (assinatura em 1 de Outubro de 1989) ainda não entrou em vigor, mas já foi ratificada por um Estado-Membro (Países Baixos).

Convenção sobre a lei aplicável ao trust e ao seu reconhecimento (assinatura em 1 de Julho de 1985, entrada em vigor em 1 de Janeiro de 1992). Partes: Itália e Luxemburgo. Esta convenção entrou igualmente em vigor noutros Estados-Membros, nomeadamente nos Países Baixos e no Reino Unido (ratificação) e em Malta (adesão).

2.2

Em 26 de Outubro de 1973, foi assinada uma Convenção (UNIDROIT — Instituto Internacional para a Unificação do Direito Privado Internacional) relativa à lei uniforme sobre a forma de um testamento internacional, que entrou em vigor em 9 de Fevereiro de 1978. São partes desta convenção os seguintes Estados-Membros: Bélgica, Chipre, (Checoslováquia), França, (Santa Sé), Itália, Reino Unido, Eslovénia, bem como outros países terceiros, incluindo os Estados Unidos e a Federação da Rússia. Esta convenção prevê um sistema internacional de registo e um formulário uniforme para o efeito.

2.2.1

Os Estados-Membros partes na Convenção de Basileia de 1972, concluída sob os auspícios do Conselho da Europa, mas aberta à adesão de países terceiros, sobre o estabelecimento de um sistema de registo de testamentos são os seguintes: Bélgica, Chipre, Espanha, Estónia, França, Itália, Lituânia, Luxemburgo, Países Baixos e Portugal.

2.3

As convenções de Haia dizem respeito à competência e à lei aplicável, ao passo que as convenções do UNIDROIT visam o direito substantivo em matérias com uma componente internacional. Apenas as disposições internacionais sobre a forma dos testamentos e a sua inscrição num registo internacional apresentam actualmente um número significativo de ratificações e adesões.

2.4

Esta matéria foca uma forma particular de transmissão do direito de propriedade (direito humano fundamental) que é a transmissão por morte. Uma legislação comunitária em matéria de competência, de lei aplicável e de reconhecimento mútuo das sucessões com componente internacional deveria ser apresentada sob a forma de regulamento.

2.5

Em virtude da complexidade do tema, os objectivos e as propostas da Comissão são ambiciosos, mas apresentam uma pertinência e uma necessidade essenciais no mercado interno no que toca a muitas pessoas singulares. A fim de reforçar a eficácia do regulamento e evitar quaisquer antinomias entre os mecanismos de regulamentação ou decisões discordantes entre Estados, conviria incluir o maior número possível de questões referentes às normas de conflitos de leis, subordinando-as sempre, funcional e essencialmente, à questão da sucessão (evitar inserir, por exemplo, questões que recaem essencialmente no âmbito do regime jurídico dos direitos reais).

2.6

A importância económica de uma regulamentação comunitária é inegável, nomeadamente no que diz respeito à transmissão das PME na Europa, a fim de assegurar a sua continuidade após o falecimento do empresário, questão que é igualmente pertinente para o emprego e a competitividade neste continente.

2.7

Com o objectivo de assegurar uma melhor harmonização do direito material e de garantir a continuação das empresas ou das explorações agrícolas que, caso contrário, correm o risco de ser liquidadas no momento da partilha por entre diversos herdeiros, dever-se-ia considerar alterar as disposições que proíbem, em determinados países, os pactos sobre sucessões futuras ou a afectação de uma parte do património a uma finalidade específica e promovê-las a nível comunitário.

2.8

Devido a diferenças profundas entre as legislações nacionais actuais, não obstante determinadas evoluções recentes, e atento o número limitado de ratificações das convenções internacionais pertinentes, o Comité partilha da opinião da Comissão quanto à impossibilidade de elaborar actualmente um direito substantivo uniforme sobre testamentos e sucessões internacionais válido em todos os países da União. Os temas de trabalho e as prioridades propostas são oportunos, pois um avanço nestes domínios solucionaria já inúmeras das dificuldades práticas com que os herdeiros, os notários, as administrações, os juízes e os profissionais do direito se deparam.

2.8.1

À luz do direito internacional, podem-se ainda explorar outras vias que os Estados-Membros poderiam ter em consideração, como a ratificação ou a adesão a determinadas convenções (forma dos testamentos, lei aplicável, testamento internacional, registo nacional e internacional).

2.8.2

Nos países de tradição romano-germânica, o direito sucessório e testamentário foi durante muito tempo marcado por uma concepção da herança em muitos aspectos ultrapassada. O património do de cujus  (1) devia representar uma espécie de continuação da sua pessoa nos seus herdeiros. O direito das sucessões evolui progressivamente para a contratualização. Depois da Alemanha e da Suíça, está agora em curso, em França, uma reforma do direito sucessório, que permitirá que a vontade do de cujus e dos herdeiros desempenhe um papel mais importante no resultado da sucessão, incluindo para assegurar melhor a continuidade das empresas.

2.8.3

Os regimes de grande liberdade que permitem ao testador deserdar alguns dos seus descendentes sem justificação são, por seu turno, cada vez mais contestados, como o revela o grande aumento do contencioso.

2.8.4

Sem suprimir determinadas particularidades históricas e sociológicas dos diferentes sistemas jurídicos, é possível considerar que, a longo prazo, uma maior harmonização ou, pelo menos, determinadas convergências, que poderiam ser aceleradas mediante a criação de um testamento europeu e de um instrumento sobre a lei aplicável suficientemente aberto e permissivo, acabariam por surgir na Europa para facilitar a execução dos testamentos e a resolução das sucessões com componente internacional. Poder-se-ia igualmente examinar a hipótese de adoptar disposições substanciais comunitárias, no contexto de uma aceitação da professio juris  (2), como alternativa a um ou vários dos direitos nacionais aplicáveis.

2.9

O Comité é de opinião que o Regulamento (CE) n.o 2201/2003, de 27 de Novembro de 2003, do Conselho relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e de regulação do poder paternal e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1347/2000 é uma fonte de inspiração, nomeadamente o n.o 1 do artigo 21.o e o artigo 46.o que constituem fontes pertinentes, e no mínimo precedentes em direito da família, para determinar o conteúdo de algumas das disposições legislativas previstas (3).

2.10

O Comité acolhe, portanto, favoravelmente o Livro Verde, bem como as perguntas formuladas que considera fundamentais e urgentes e esforçar-se-á por lhes dar resposta, tendo em conta os interesses e as necessidades dos cidadãos europeus, bem como a sua mobilidade acrescida e as grandes migrações já ocorridas no passado.

2.11

Conviria começar pelas questões sobre a forma dos testamentos, a competência jurisdicional internacional e a solução dos conflitos de leis no que diz respeito ao direito aplicável, ao registo dos testamentos, bem como ao reconhecimento mútuo das decisões de autoridades judiciárias e de outras autoridades competentes, e à apostila, uma vez que são temas sobre os quais já existem precedentes no direito europeu e internacional.

2.12

O Comité considera que um sistema unitário (lei em matéria de sucessões única e disciplina unitária do património sucessório) é preferível à dispersão do regulamento da sucessão. Contudo, por razões práticas, este princípio deveria ser objecto de excepções em determinados casos, nomeadamente para os imóveis ou determinados bens móveis particulares (navios, aeronaves, fundos de comércio, etc.) situados no estrangeiro.

2.13

Determinadas questões como os pactos sucessórios ou os trusts continuam a ser de competência nacional (4). Contudo, as referentes ao reconhecimento sem exequatur das decisões judiciárias litigiosas ou não em matéria de sucessões, a competência residual, o reconhecimento de decisões e de actos de autoridades não judiciárias públicas ou privadas ou a inscrição nos registos prediais nacionais assente na certidão europeia de direitos sucessórios devem fazer parte da legislação europeia prevista.

3.   Observações na especialidade

3.1

Um regulamento como o anteriormente citado (Regulamento n.o 2201/2003) aplicável aos direitos sucessórios não chegaria para resolver todos os problemas colocados por uma sucessão internacional. Com efeito, a maior parte das sucessões não são litigiosas, sendo, por isso, necessário solucionar também os problemas que surgem quando não há qualquer litígio. Ademais, nalguns países ou para determinadas questões, a intervenção de um juiz é, por vezes, necessária, mesmo quando não há litígio.

3.2

Apesar de o instrumento comunitário dever, obviamente, solucionar os problemas colocados anteriormente de determinação do(s) foro(s) competente(s) e do reconhecimento das decisões judiciárias, deverá também prever possibilidades para solucionar:

sucessões testamentárias: condições de validade do testamento (forma e conteúdo, capacidade testamentária, limites da autonomia da vontade), reservas sucessórias, sucessões anómalas, pactos sucessórios (autorizados ou interditos), reservas sucessórias, trusts sucessórios, qualidade de herdeiro;

sucessões ab intestato e testamentárias: qualidade de herdeiro e partes da herança, regras sobre a indivisão, a liquidação e a partilha da herança, etc.);

para além do reconhecimento das decisões (e das eventuais excepções de ordem pública), o reconhecimento dos actos não judiciários ligados à resolução não litigiosa da sucessão: testamento, actos notariais e outros actos administrativos ou a competência internacional dos agentes públicos e profissionais do direito envolvidos;

quanto aos critérios de conexão em matéria de competência judiciária, afigura-se indispensável uma certa flexibilidade tanto para os critérios que correspondem ao direito que o testador tinha intenção de aplicar ou eventualmente ao direito que os herdeiros poderiam legitimamente esperar ser aplicado (nacionalidade do testador, local de residência habitual, de falecimento, de redacção e de depósito do testamento, local onde a maioria dos bens se encontra, etc.).

3.3

O Comité apoia o programa comunitário de Haia já que prevê a criação de uma «certidão europeia de direitos sucessórios» e a criação de um sistema de registo dos testamentos. Os Estados-Membros deverão designar a autoridade competente para emitir esta certidão e, se não existir, criar um registo central nacional. Haveria que criar um registo central comunitário (ou europeu, no âmbito do Conselho da Europa, se os Estados-Membros que ainda não o fizeram fossem convidados a ratificar a Convenção de Basileia), cuja informação seria acessível aos juizes, notários e outros agentes competentes ao abrigo da lei nacional aplicável (pelo menos, a partir do nome do de cujus e da sua data de nascimento, saber em que país-membro e eventualmente em que país terceiro, quando e junto de que entidade foi depositado testamento para se poder solicitar cópia à autoridade nacional em causa).

3.3.1

O sistema europeu de registo deveria, em todo o caso, ser compatível com o sistema da Convenção de Basileia e com o da Convenção de Washington, uma vez que vários Estados-Membros são já partes destas convenções e que o projecto de legislação comunitária aplicar-se-á igualmente às sucessões que envolvam um país terceiro.

3.4

Após reconhecimento da qualidade de herdeiro e da realização da liquidação e da partilha da sucessão, os procedimentos administrativos devem ser simplificados na medida do possível. O Comité pronuncia-se a favor do reconhecimento mútuo dos actos e dos documentos dos agentes legalmente reconhecidos pelo direito local e da inscrição directa no registo predial (ou junto das autoridades competentes para registar os direitos imóveis) do direito de propriedade, bem como das servidões, hipotecas ou desmembramentos eventuais que possam dizer respeito aos bens considerados em função do direito nacional aplicável.

3.5

O Comité chama a atenção da Comissão para os problemas fiscais que podem surgir para os herdeiros de um património localizado em dois ou mais países. Conviria evitar a dupla tributação sobre a globalidade ou cada parte da herança o que poderá ser um acto de confiscação em algumas sucessões ou criar desigualdades entre os herdeiros em função da natureza dos bens atribuídos a cada um. Conviria recensear as disposições fiscais aplicáveis às sucessões internacionais nos Estados-Membros para identificar os países que pretendem ter acesso através da sua fiscalidade aos bens e valores situados fora do seu território, comparar as taxas e propor soluções justas aos países afectados. Eventualmente, a Comissão poderia prever apresentar uma proposta de convenção-tipo contra a dupla tributação em matéria de sucessões internacionais entre os Estados-Membros.

3.6

Será de prever um «testamento europeu» baseado no modelo do «testamento internacional» da Convenção de Washington e prever, para além do seu registo europeu sob a forma prevista pela Convenção de Basileia, um registo internacional? Tal poderia incentivar uma maior ratificação das convenções de Washington e de Basileia e proteger melhor os herdeiros de uma sucessão testamentária internacional envolvendo não só os Estados-Membros, como também países terceiros. O Comité propõe esta linha de trabalho aos serviços da Comissão, pois as convenções já são conhecidas pelos Estados-Membros, quer porque já as ratificaram, quer porque os funcionários públicos e juizes já tiveram de trabalhar com testamentos e registos sujeitos a estes regimes jurídicos.

3.7

Caso esta hipótese se torne realidade, a forma de testamento europeu será reconhecida por todos os direitos nacionais. Com efeito, o direito europeu deve impedir que simples questões de forma contrariem o princípio universalmente reconhecido do respeito da vontade do testador («favor testamenti») nos limites permitidos pelo direito aplicável.

3.8

É indispensável uma regulamentação específica comunitária para que esta legislação se aplique a todos os casos de sucessões ligadas a dois ou mais Estados-Membros, ou mesmo países terceiros, incluindo nos países que são partes das convenções internacionais para garantir em todas as circunstâncias a aplicação do direito comunitário (a «lei especial» comunitária tendo assim precedência sobre a lei internacional).

4.   Outras questões suscitadas

4.1

O Livro Verde faz 39 perguntas principais, acompanhadas de subquestões. O Comité não está em condições de responder nesta fase preliminar a todas estas questões, mas propõe à Comissão que consulte individualmente as organizações representantes das profissões jurídicas afectadas pelos diferentes temas focados pelo Livro Verde.

4.2

O Comité limitar-se-á a propor algumas respostas possíveis a determinadas perguntas que, na sua opinião, têm uma importância mais relevante. Opta-se, em princípio, pela orientação geral de compatibilidade com as convenções de Haia e com as de Basileia e de Washington, a fim de harmonizar o máximo possível as regras europeias em vista de um futuro consenso jurídico largamente aceitável pelo maior número possível de Estados-Membros e também de países terceiros.

4.3

Dever-se-ia manter, pelo menos, os critérios de conexão previstos pela Convenção de Haia de 1961 sobre os conflitos de leis em matéria de forma das disposições testamentárias, por serem suficientemente abrangentes e permitirem justificar na maior parte dos casos a aplicação da lei subjacente à redacção do testamento.

4.4

Seguindo a lógica de determinadas reformas efectuadas recentemente ou em fase de realização na Europa continental, há que proteger de forma particular os interesses dos herdeiros incapacitados (menores ou maiores) ou com deficiências profundas, caso as possibilidades de extensão da celebração dos contratos de sucessões ou de escolha pelos herdeiros da lei aplicável leve a uma modificação do regime de reserva sucessória ou introduza desigualdades entre os herdeiros. Esta maior flexibilidade para o testador ou para os seus herdeiros não deverá pôr em causa as disposições mais proteccionistas constantes das leis aplicáveis aos herdeiros (ver perguntas 5 e 10 do Livro Verde).

4.5

Os actos de administração da sucessão por um herdeiro ou seu mandatário nos países onde não se designa obrigatoriamente um administrador não devem ser considerados como uma aceitação implícita da sucessão sem benefício de inventário.

4.6

Dever-se-ia prever a opção de uma aceitação da sucessão pelos herdeiros no limite das dívidas que oneram o património, bem como uma opção de um pacto de herdeiros ou de um contrato de herança prevendo uma partilha desigual com fins legítimos (continuação da exploração da empresa, benefícios a favor de um herdeiro incapacitado ou deficiente), bem como aqueles que prevêem uma partilha igual entre filhos de diferentes casamentos ou naturais se o direito aplicável fizer tal distinção, ou transmissão directa por um herdeiro do seu direito aos seus próprios descendentes, tendo em conta o aumento da esperança de vida.

4.7

Conviria ainda permitir, no âmbito de um quadro exaustivo, a escolha pelo testador do direito aplicável à sua sucessão, por exemplo se este direito é o da nacionalidade (ou de uma das suas nacionalidades) ou se é o da sua residência habitual.

4.8

O Comité entende, por fim, que se deveria continuar o excelente trabalho de comparação já iniciado pelos serviços da Comissão e actualizá-lo regularmente no sítio Internet comunitário, bem como traduzi-lo num número suficiente de línguas para que possa ser, de um modo geral, útil aos profissionais do direito, agentes da administração pública, administradores e juizes que devam apreciar sucessões internacionais. Deve ser concebido de forma a que as sínteses dos capítulos permitam a compreensão dos princípios gerais pelos cidadãos europeus que tencionem redigir um testamento com componente internacional ou pelos seus herdeiros.

4.9

O Comité aguarda com interesse os resultados das consultas já efectuadas pela Comissão, bem como das suas consultas futuras, esperando que lhe possam ser, em seguida, submetidas para parecer propostas legislativas mais concretas e uma orientação geral, propondo-se, portanto, a examiná-las em pormenor, pois considera que os testamentos e as sucessões são uma questão de grande interesse para os cidadãos europeus. Não se devem defraudar as expectativas em relação a uma iniciativa comunitária da qual se espera a simplificação das formalidades, bem como uma maior segurança jurídica e fiscal e uma maior rapidez da execução das sucessões, quer se trate de particulares ou de empresas, explorações agrícolas e outras actividades económicas, cujos empresários ou proprietários pretendam assegurar a sua continuação após o seu decesso.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Pessoa que está na origem da sucessão (a pessoa falecida).

(2)  Escolha pelo testador do direito aplicável à sua sucessão.

(3)  JO L 338 de 23.12.2003.

(4)  Os trusts sucessórios não são reconhecidos em inúmeros países continentais. Além disso, determinados países consideram a reserva sucessória ou a relação de doação como sendo de ordem pública, o que fomenta estratégias de contorno do direito em matéria de sucessões, nomeadamente em relação aos imóveis situados no território destes países.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/5


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Situação e perspectivas sobre as fontes de energia convencionais — carvão, petróleo e gás natural — no quadro da futura utilização de fontes de energia»

(2006/C 28/02)

Em 10 de Fevereiro de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre a «Situação e perspectivas sobre as fontes de energia convencionaiscarvão, petróleo e gás natural no quadro da futura utilização de fontes de energia».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 1 de Setembro de 2005, tendo sido relator G. WOLF.

Na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005, (sessão de 26 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 119 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

Recentemente, o Comité adoptou uma série de pareceres (1) sobre a questão energética. Uma vez que grande parte do aprovisionamento energético continua a basear-se nas fontes de energia fósseis carvão, petróleo e gás natural, com cuja utilização se relaciona a questão dos recursos e a emissão de gases com efeito de estufa, o presente parecer avalia as fontes de energia «tradicionais».

O objectivo estratégico desta série de pareceres, que termina com um parecer sobre as energias renováveis e com o presente, é disponibilizar as bases para a elaboração de opções realistas para um futuro cabaz energético.

Partindo dessa base seguir-se-á uma síntese que resumirá os resultados de toda a série e tomará a forma de um parecer de síntese posterior sobre «O aprovisionamento energético da UE — Estratégia para uma combinação energética ideal».

Índice

1.

Síntese e recomendações

2.

A questão energética

3.

Recursos, reservas e alcance

4.

Reservas energéticas na UE — Dependência das importações

5.

Evolução da utilização de energia na UE

6.

Carvão, petróleo e gás natural num cabaz energético sustentável

7.

Protecção do ambiente e do clima

8.

Progressos tecnológicos

9.

Separação e armazenamento final de CO2

1.   Síntese e recomendações

1.1

A energia aproveitável está na base dos nossos modo de vida e cultura actuais. Só um aprovisionamento energético suficiente tornou possível o nível de vida das sociedades contemporâneas. Um aprovisionamento seguro, económico, ecológico e sustentável de energia aproveitável é indispensável para o êxito da Estratégia de Lisboa e das decisões dos Conselhos de Gotemburgo e Barcelona.

1.2

Os combustíveis fósseis carvão (2), petróleo e gás natural compõem actualmente a espinha dorsal do aprovisionamento energético a nível europeu e mundial. Nas próximas décadas manterão esta importância, permanecendo indispensáveis.

1.3

A sua produção e utilização implicam, porém, danos ambientais, nomeadamente provocados pela emissão de gases com efeito de estufa — em particular CO2 e metano –, com as inevitáveis consequências para o Homem e o seu meio. Trata-se da exploração de recursos não renováveis.

1.4

A necessidade de combustíveis fósseis resultou na grande dependência da Europa de importações desta matéria-prima vital — dependência que deverá aumentar ainda mais no futuro, sobretudo no atinente ao petróleo e, cada vez mais, ao gás natural.

1.5

A nível mundial, a sustentabilidade das reservas e recursos estimados de carvão, petróleo e gás natural (3) depende de vários factores, como o crescimento económico, a exploração e o progresso tecnológico. Essas reservas ainda estarão disponíveis durante muitas décadas (talvez séculos, no que respeita ao carvão), embora, em particular no que toca ao petróleo, possa manifestar-se já antes de meados deste século uma diminuição das reservas e uma redução da oferta. A tendência actual dos mercados petrolíferos revela que mesmo a curto prazo podem dar-se aumentos imprevisíveis dos preços, com consequências devastadoras para as economias mundiais (4).

1.6

A política energética da UE deve, por um lado, tomar todas as medidas possíveis para atenuar esta dependência a longo prazo, sobretudo através de medidas de poupança de energia e da utilização eficaz de todas as fontes de energia fósseis e do recurso generalizado a formas de energia alternativas, tais como a energia renovável ou a energia nuclear. O desenvolvimento destas formas de energia torna-se assim muito mais urgente.

1.7

A política energética da UE deve, por outro lado, envidar todos os esforços para assegurar o aprovisionamento e as vias de aprovisionamento de combustíveis fósseis. Uma questão particularmente problemática é a da estabilidade política de alguns dos principais países produtores. Nesse sentido, a cooperação com a Federação Russa, com os países da CEI e do Próximo e Médio Oriente e com os Estados vizinhos da UE (p. ex., Argélia, Líbia) reveste-se de uma importância particular.

1.8

Também um aproveitamento mais intensivo dos consideráveis recursos carboníferos europeus pode contribuir para reduzir a dependência energética da UE.

1.9

Num mercado interno europeu eficiente, e se houvesse medidas mais adequadas à protecção do ambiente, os combustíveis fósseis encontrariam uma aplicação adaptada às suas especificidades e respectivos níveis de preços e custos. Daí também, automaticamente, uma utilização particularmente eficiente destes combustíveis a nível económico e energético.

1.10

Esta situação levou à prevalência do carvão na indústria do aço e nas centrais eléctricas, enquanto o petróleo e o gás são utilizados sobretudo para a produção de calor e domínios não energéticos. Na área dos transportes dominam os produtos derivados do petróleo.

1.11

O consumo das matérias-primas mais escassas e flexíveis, como o gás natural e o petróleo, deve pois concentrar-se em aplicações (sobretudo como combustíveis para os transportes ou como matérias-primas para a indústria química) nas quais o recurso ao carvão envolveria custos superiores, um maior dispêndio de energia e maiores emissões de CO2.

1.12

As emissões de CO2 por unidade de produto (p. ex.: kg CO2/kWh, t CO2/t aço, g CO2/automóvel-Km) têm de continuar a diminuir progressivamente através do recurso ao progresso técnico. Isto exige a melhoria da eficiência energética em todos os domínios da conversão e utilização energética.

1.13

Por conseguinte, a política energética e económica terá de oferecer um quadro fidedigno para o investimento que conduza a uma tecnologia melhorada na indústria, comércio e aquisições privadas.

1.14

Nas próximas décadas, as centrais eléctricas europeias deverão aumentar a sua capacidade para cerca de 400 GWe1 (5). Para limitar/reduzir as emissões de CO2 e a utilização de combustíveis, estas novas instalações deverão estar equipadas com as melhores tecnologias disponíveis.

1.15

No domínio dos transportes, devem ser envidados todos os esforços para reduzir o consumo específico de combustíveis (consumo por veículo por quilómetro) e impedir o aumento do consumo global. Para tal, é tão necessário o progresso técnico em inúmeras áreas do desenvolvimento de automóveis e combustíveis como medidas para evitar engarrafamentos (construção de estradas e túneis/sistemas de orientação) e estimular a diminuição da circulação (6). O recurso a veículos movidos a electricidade (como os carros eléctricos) também reduz a dependência do petróleo dado que permite uma maior diversificação da utilização das fontes de energia primárias (carvão, gás natural, energias renováveis, energia atómica).

1.16

Para que se registem progressos a nível da eficiência no sector energético, é condição fundamental um reforço da investigação e do desenvolvimento (mormente no sector das centrais eléctricas que consomem combustíveis fósseis), tanto da parte da indústria como das medidas de financiamento público.

1.17

O Comité acolhe pois com agrado o acento especial atribuído à questão energética no 7.o Programa-quadro I&D. Este deve ser dotado de meios suficientes e abranger todas as técnicas possíveis de aproveitamento energético. Deve incluir igualmente, e sobretudo, medidas para aumentar o rendimento da utilização de combustíveis fósseis, permitindo maiores benefícios globais.

1.18

A produção de electricidade através de combustíveis fósseis pode também permitir uma redução significativa, a longo prazo, das emissões de CO2 por energia produzida se forem adoptados procedimentos como a separação e armazenamento final de CO2 (Clean Coal Technology). Daí o desenvolvimento e teste de procedimentos deste tipo no 7.o Programa-quadro I&D.

2.   A questão energética

2.1

A energia aproveitável (7) está na base do nosso modo de vida e cultura actuais. Só um aprovisionamento energético suficiente tornou possível o nível de vida das sociedades contemporâneas. A necessidade de um aprovisionamento seguro, económico, ecológico e sustentável de energia aproveitável está no cerne das decisões dos Conselhos de Lisboa, Gotemburgo e Barcelona.

2.2

O Comité afirmou várias vezes que o aprovisionamento e o aproveitamento energético estavam relacionados com efeitos negativos no ambiente, riscos e dependências a nível de política externa e imponderáveis. Nenhuma das opções e técnicas a contemplar para o futuro aprovisionamento energético é tecnicamente irrepreensível, nenhuma permite uma protecção total do ambiente, nenhuma satisfaz todas as necessidades e nenhuma oferece uma evolução de preços e um aprovisionamento suficientemente previsíveis a longo prazo. Acresce a escassez das reservas e recursos, com todas as suas consequências. A problemática continuará a agravar-se com o crescimento demográfico global e com o aumento constante das necessidades energéticas dos países desenvolvidos e sobretudo dos novos grandes países industrializados, como a China, a Índia ou o Brasil.

2.3

Por conseguinte, um aprovisionamento energético disponível a longo prazo, respeitador do ambiente e competitivo deverá permanecer um objectivo importante de uma política energética europeia prospectiva. Devido às razões supra, esta não se pode limitar ao aproveitamento de algumas fontes de energia. A escassez de energia e outros riscos apenas só podem ser resolvidos por meio de um cabaz energético mais diversificado do ponto de vista do tipo e origem que aplicaria e desenvolveria (ainda mais) todas as fontes de energia e técnicas disponíveis para, finalmente, num quadro de parâmetros ecológicos aceitáveis e em condições em mutação, as colocar em concorrência.

3.   Recursos, reservas e alcance

3.1

Actualmente, cerca de 4/5 do aprovisionamento energético mundial — tal como o aprovisionamento na UE-25 — assentam no recurso às fontes de energia fóssil (petróleo, gás natural e carvão).

3.2

De uma forma geral, todos os prognósticos sobre a evolução futura (que variam enormemente em função do ângulo de análise e dos interesses em jogo) dependem das estimativas relativas ao crescimento demográfico e económico, à evolução das novas tecnologias de exploração e aproveitamento energético e às condições-quadro vigentes em cada país. Isto vale sobretudo para a energia nuclear e para as medidas de apoio às fontes de energia renováveis.

3.2.1

Segundo os prognósticos de referência de 2004 (8) da Agência Internacional da Energia (AIE), Paris, e da Administração da Informação de Energia (AIE) dos Departamentos de Energia dos EU (AIEEU), as referidas fontes de energia fósseis cobrirão, dentro de 25 anos, mais de 80 % da utilização mundial de energia.

3.2.2

A percentagem das energias renováveis aumentará de facto — mas, de acordo com as previsões da AIE e da AIEEU, não mais do que o total da utilização de energia. A proporção das energias renováveis no consumo total irá pois manter-se. No atinente à energia nuclear, a tendência actual permite prever que, em valores absolutos, o aumento seja igualmente lento, até mesmo inferior ao desenvolvimento global da utilização, pelo menos enquanto as condições políticas na Europa não mudarem. Por conseguinte, a AIE e a AIEEU prevêem mesmo uma diminuição da percentagem de energia nuclear na cobertura do consumo mundial de energia.

3.2.3

O cenário de referência para a UE-25, publicado pela Comissão Europeia em Setembro de 2004 (9) — divergente da tendência mundial prevista pela AIE e pela AIEEU — consiste no aumento da percentagem de energias renováveis no total do consumo de energia na UE-25 dos 6 % actuais para 9 % em 2030. Por outro lado, porém, uma vez que segundo esta previsão a percentagem de energia nuclear na UE-25 diminuirá, o cenário de referência da Comissão Europeia conclui igualmente que, as energias fósseis na UE-25 ainda cobrirão em 2030 mais de 80 % do total do consumo de energia.

3.3

As fontes de energia fósseis são matéria prima esgotável. Com vista a calcular durante quanto tempo o carvão, o petróleo e o gás natural manterão o seu papel predominante, há que analisar o potencial das fontes de energia fósseis.

3.4

Para tal, são necessárias definições e unidades de medida. Os conceitos utilizados são: reservas, recursos e potencial. As unidades de medida usuais para as fontes de energia são várias (10), tais como a tonelada ou o barril no caso do petróleo, toneladas métricas ou tonelada equivalente-carvão no caso do carvão, metro cúbico ou pé cúbico no caso do gás natural. Para a comparação utiliza-se o teor energético expresso em joules ou watt/s (Ws).

3.5

O potencial total (Estimated Ultimate Recovery — EUR abreviado) inclui o total de matéria prima energética recuperável na crosta terrestre, tal como existia antes de começar a ser explorada pelo Homem. Trata-se de uma previsão: os vários peritos podem chegar a conclusões divergentes. Quanto melhor conhecida for a crosta terrestre e quanto mais longe forem as técnicas de investigação, maior será a convergência das previsões.

3.6

Apenas a parte recuperável é contabilizada para o potencial total. Depende portanto das técnicas e condições financeiras existentes, podendo aumentar em função da sua evolução. O potencial restante é obtido ao deduzir do potencial total a quantidade já obtida.

3.7

O potencial restante é composto pelas reservas e recursos. As reservas incluem as quantidades de matéria-prima energética comprovadas e que, com as possibilidades técnicas actuais, são recuperáveis do ponto de vista económico. Recursos são as quantidades de matéria prima energética que, ou são comprovadas mas ainda não recuperáveis do ponto de vista económico/técnico; ou as quantidades que ainda não são comprovadas, mas que são esperadas com base em indicações geológicas.

3.8

No debate público as reservas são alvo de uma atenção especial, visto ser delas que resulta o alcance das fontes de energia. Ao relacionar as reservas com a actual produção anual, obtém-se o chamado alcance estático. Ao recorrer a este processo obtém-se o alcance estático das reservas mundiais que é de 40 anos no caso do petróleo, 60 anos no caso do gás natural e cerca de 200 anos no caso do carvão.

3.9

As reservas e o seu alcance estático não têm de forma alguma dimensões fixas. A redução do alcance estático das reservas leva na realidade ao reforço da exploração e por conseguinte, à conversão de recursos em reservas (também devido ao progresso técnico). Foi o que aconteceu por exemplo nos anos 70 do século passado, quando o alcance estático do petróleo se estimou em 30 anos).

3.10

No caso do petróleo, os recursos estimados em estatísticas são cerca do dobro das reservas e, no caso do gás natural e do carvão representam até dez vezes as reservas.

3.11

Outro indicador da disponibilidade futura de matéria prima energética fóssil é a quantidade já extraída do potencial total. Quando ultrapassa os 50 % e alcança o «ponto médio de esgotamento» torna-se difícil voltar a aumentar a exploração ou até mesmo apenas regressar ao mesmo nível.

3.12

Petróleo: Entretanto, já foi extraído mais de 1/3 do potencial total do petróleo «tradicional», cerca de 380 mil milhões de toneladas de equivalente-petróleo. Se se mantiverem os níveis de exploração actuais, dentro de dez anos metade do potencial tradicional estará esgotado. Para continuar a aumentar a exploração, devem ser exploradas cada vez mais jazidas não tradicionais (fuelóleo, areia asfáltica, xisto betuminoso). Dessa forma, o «ponto médio de esgotamento» pode ser temporariamente retardado. Caso contrário, poderá assistir-se antes de meados deste século a uma diminuição das reservas e a uma redução drástica da oferta (11).

3.13

Gás natural e carvão: o caso do gás natural é semelhante, visto que o potencial restante aumenta se forem consideradas as jazidas não tradicionais, tais como hidratos gasosos. No caso do carvão, dos 3 400 mil milhões de toneladas de unidades de petróleo de potencial total estimado, 3 % foram extraídos até à data.

3.14

De resto, a exploração dos hidratos gasosos (hidratos de metano) e as tecnologias para o seu aproveitamento encontram-se ainda na fase de investigação, pelo que não é ainda possível prever com segurança que proporção poderão assumir no futuro aprovisionamento energético. Por um lado, há estimativas segundo as quais as reservas possíveis terão um potencial energético superior ao das reservas conhecidas de combustíveis fósseis; por outro lado, subsistem ainda muitas incertezas quanto à possibilidade de aproveitar essas reservas (tecnologia, custos, etc.). Além disso, a libertação dessas reservas (por factores climáticos ou por acção humana) comporta riscos consideráveis dado que pode provocar uma grande concentração na atmosfera de metano, um gás causador de efeito de estufa, com potenciais repercussões no ambiente.

3.15

Os custos da extracção de energias fósseis são muito díspares. No atinente ao petróleo, situam-se actualmente entre 2 e 20 USD/barril, dependendo da jazida. Jazidas cada vez mais pequenas têm de ser exploradas em condições geológicas e geográficas adversas. Este efeito da subida dos custos pode, todavia, tornar-se equilibrado ou até sobrecompensar, através de ganhos de produtividade resultantes de inovações técnicas. O gás natural também regista custos de extracção distintos. No caso do carvão, os custos dependem, em grande parte, da profundidade da jazida, da espessura das camadas e também da possibilidade de extracção a céu aberto ou apenas em profundidade. A disparidade de custos é considerável: varia entre escassos dólares americanos por tonelada (por exemplo, em Powder River Basin, nos Estados Unidos) e até 200 dólares americanos por tonelada na escavação de carvão em algumas jazidas europeias.

3.16

A distribuição regional das reservas fósseis também é muito desigual, em particular no que se refere ao petróleo. 65 % das reservas de petróleo situam-se no Próximo Oriente. Comparativamente, a distribuição de gás natural é um pouco mais equilibrada, centrada sobretudo no Próximo Oriente (34 %) e na ex-URSS (39 %). As reservas de carvão estão repartidas de forma mais equilibrada. As maiores reservas de carvão situam-se na América do Norte. Há ainda grandes recursos de carvão na China, Índia, Austrália, África do Sul e Europa.

3.17

Esta concentração de fontes de energia fóssil estrategicamente mais importantes — em particular de petróleo, mas também de gás natural — em zonas geopolíticas de risco do Próximo e Médio Oriente, levanta problemas específicos de segurança do aprovisionamento energético.

4.   Reservas energéticas na UE  (12)Dependência das importações

4.1

Em 2004, a utilização de energia primária na UE-25 rondava as 2,5 mil milhões de toneladas equivalente de carvão (TEC), cerca de 75 exajoules (75×1018 Joule). Isto representa 16 % do consumo mundial de energia: 15,3 mil milhares de TEC. O consumo de energia per capita na UE-25 situa-se, com 5,5 TEC, em mais do dobro da média mundial, mas apenas metade da média norte-americana. Em relação ao desempenho económico, o consumo de energia na Europa é de apenas metade da média de todas as regiões não-europeias, visto que a energia é utilizada de forma consideravelmente mais eficiente do que noutras partes do mundo.

4.2

Em 2004, as fontes de energia mais importantes na UE-25, em relação ao total de energia primária, eram o petróleo (39 %), gás natural (24 %) e carvão (17 %). Outras fontes importantes de aprovisionamento energético na UE são a energia nuclear (14 %) e as energias renováveis e especiais (6 %). As percentagens de fontes de energia fóssil diferem consideravelmente dentro da UE-25. No caso do gás natural, variam entre 1 % na Suécia e quase 50 % nos Países Baixos; o petróleo varia entre pouco mais de 30 % na Hungria e 2/3 em Portugal: o carvão varia entre 5 % em França e 60 % na Polónia. A principal razão para estas disparidades é a existência ou não, em cada Estado-Membro, de reservas de fontes de energia fóssil.

4.3

Comparativamente, o total das reservas de energia da UE-25 é escasso. Eleva-se a cerca de 38 mil milhões de toneladas de TEC, o que equivale a 3 % dos recursos a nível mundial, incluindo também hidrocarbonetos não tradicionais. Os recursos carboníferos (lignite e hulha) representam a maior parte, com 31 mil milhões de toneladas de TEC, repartidos em quantidades semelhantes de lignite e hulha. As reservas de gás natural elevam-se a 4 mil milhões de TEC e as reservas de petróleo a 2 mil milhões de TEC. No futuro próximo, a UE-25 continuará ser o maior importador líquido mundial de energia. Segundo as estimativas da Comissão, essa dependência aumentará para mais de dois terços até 2030.

4.4

A repartição das reservas de energias fósseis por cada Estado-Membro da UE-25 é muito desigual. As jazidas de petróleo estão concentradas sobretudo no Mar do Norte e na costa dinamarquesa do Mar do Norte. Uma vez que já foram, em grande parte, esgotadas, a exploração começa a diminuir. Os Países Baixos e a Grã-Bretanha são dois locais de destaque. As reservas de carvão estão distribuídas sobretudo pela Alemanha, Polónia, República Checa, Hungria, Grécia e Grã-Bretanha. Destaquem-se ainda as importantes reservas de petróleo e gás natural da Noruega, a qual, embora não seja membro da UE, é membro do Espaço Económico Europeu (EEE).

4.5

Tendo em conta as reduzidas reservas de energias fósseis, a UE-25 já tem, presentemente, de recorrer a importações para cobrir metade da totalidade da procura de energia. De acordo com o Livro Verde da Comissão, esta percentagem aumentará para 70 % até 2030. Esta dependência é particularmente elevada no caso do crude. No caso destas fontes de energia, mais de 3/4 das necessidades têm de ser cobertas por importações de países terceiros. No atinente ao gás natural, a quota de importações é de 55 % e de 1/3 para o carvão.

4.6

Estas condições têm conduzido a uma enorme dependência energética da UE, a qual deverá aumentar ainda mais no futuro, sobretudo no que respeita ao petróleo e, cada vez mais, ao gás natural. A UE é o principal importador mundial de fontes de energia.

4.7

A política energética da UE deve pois, por um lado, empenhar-se o mais possível em assegurar o aprovisionamento e as vias de aprovisionamento em combustíveis fósseis, devendo lidar com o problema da estabilidade política de alguns dos principais países produtores. A este respeito, torna-se prioritária uma boa cooperação com a Federação Russa, com os países da CEI e do Próximo e Médio Oriente e com as regiões vizinhas da UE (como a Argélia e a Líbia).

4.8

Por outro lado, a UE deverá tomar todas as medidas necessárias para reduzir essa dependência a longo prazo, nomeadamente através de uma utilização mais eficiente de todas as fontes de energia e do recurso mais frequente a formas de energia alternativas ou renováveis (incluindo seu desenvolvimento e introdução no mercado) e à energia nuclear. Importa pois continuar a desenvolver formas de energia alternativas.

4.9

Um aproveitamento mais intensivo das consideráveis reservas carboníferas da UE também pode contribuir para diminuir esta dependência, sobretudo atendendo a que a indústria europeia do carvão já aplica normas ambientais muito mais rigorosas do que a de outras regiões do globo.

5.   Evolução da utilização de energia na UE

5.1

A evolução da utilização de energia na UE-25 deveria seguir o cenário de base da publicação da Comissão «European Energy and Transport Scenarios on Key Drivers» (13), que assenta no prosseguimento das tendências e políticas actuais. Esta publicação apresenta os seguintes prognósticos:

5.2

Em 2040, a utilização de energias primárias elevar-se-á a 2,9 mil milhões de toneladas de TEC, cerca de 0,6 % ao ano. Todavia, calcula-se que até 2030 o produto interno bruto cresça em média 2,4 % ao ano. A redução da intensidade energética necessária para tal (relação utilização energética/PIB), superior a 1,7 % ao ano (!), deverá ocorrer com base em alterações estruturais, melhoria da eficiência energética e introdução de tecnologias avançadas.

5.3

A percentagem de energias fósseis na cobertura da utilização de energias primárias aumentará 2 % até 2030, isto é, para 82 %.

5.4

Carvão: após uma diminuição inicial, após 2015 prevê-se um novo aumento do consumo de carvão — como consequência do aumento da competitividade desta fonte de energia na produção de electricidade. Os principais motivos para esta evolução são o aumento dos preços do gás natural e a introdução prevista de tecnologias avançadas de produção de electricidade a partir do carvão. De acordo com esta previsão, em 2030 o consumo de carvão situar-se-á novamente ao mesmo nível de 2000. A percentagem do carvão no consumo de energias primárias na UE-25 rondará, tal como em 2005, os 15 %. Uma vez que se prevê que de 2005 a 2030 ocorra uma redução na extracção do carvão de cerca de 40 % no interior da UE e, simultaneamente, um aumento de 125 % na importação de carvão, as importações para cobertura das necessidades de carvão na UE-25 aumentarão de 1/3 em 2005 para quase 2/3 em 2030.

5.5

Petróleo: uma vez que se prevê que a taxa de crescimento venha a desenvolver-se de forma subproporcional, prevê-se que, em 2030, a percentagem de petróleo na utilização de energias primárias diminua para 34 %, isto é, menos 5 % do que actualmente.

5.6

Gás natural: até 2015, a utilização de gás natural aumentará, de forma subproporcional, 2,7 %/ano, diminuindo em seguida. Esta situação deve-se, nomeadamente, à redução da competitividade em relação ao carvão na produção de electricidade. Até 2030, prevê-se que o maior aumento entre todas as fontes de energia fósseis se verificará no consumo de gás. A percentagem de gás natural no consumo de energias primárias na UE-25 aumentará de 26 % em 2005 para 32 % em 2030. O gás natural liquefeito (GNL) permite uma diversificação do aprovisionamento em gás natural, dado que o seu fornecimento é possível por via marítima. Actualmente, o GNL representa cerca de 25 % do comércio total de gás natural. O maior país exportador é a Indonésia, seguida da Argélia, da Malásia e do Qatar.

5.7

A exploração de fontes de energia fósseis na UE-25 diminuirá cerca de 2 % ao ano até 2030. Por conseguinte, até 2030, a dependência das exportações de todas as fontes de energia fósseis aumentará mais de 2/3. Tal como referido, em 2030 as importações de carvão aumentarão quase 2/3, mais de 80 % no caso do gás natural e quase 90 % relativamente ao petróleo. Particularmente crítica é a dependência de um número limitado de fornecedores para as importações de gás natural.

5.8

Até 2030, o consumo de electricidade aumentará em média 1,4 % ao ano. Por conseguinte, a capacidade das centrais deverá aumentar 400GW, dos actuais 700GW (capacidade máxima) para cerca de 1 100GW em 2030. Há ainda a necessidade de substituir as velhas centrais por novas instalações. De acordo com as previsões da Comissão Europeia no cenário de base, o aumento previsto da capacidade será possível graças a um aumento da produtividade de cerca de 300GW no sector dos combustíveis fósseis e de cerca de 130GW no sector da energia eólica, hídrica e solar, ao passo que as centrais nucleares deverão registar, entre 2005 e 2030, uma redução de capacidade da ordem dos 30GW caso não se dê uma alteração das condições políticas.

5.9

O aprovisionamento energético da UE deparar-se-á com grandes desafios e obrigações nos próximos 25 anos, mas conhecerá igualmente grandes oportunidades económicas. Entre os desafios contam-se a segurança do aprovisionamento, a resposta a restrições ambientais cada vez mais severas, a necessidade de assegurar preços competitivos para a energia, e a realização dos investimentos necessários.

6.   Carvão, petróleo e gás natural num cabaz energético sustentável

6.1

O carvão, o gás natural e o petróleo são hidrocarbonetos naturais resultantes do processo de combustão de substâncias biológicas de biomassa acumulada — processo que se desenrola ao longo de milhões de anos; trata-se, pois, de energia solar acumulada. Em função das condições geológicas (por exemplo: pressão, temperatura, idade) formam-se diferentes produtos. Um importante factor diferenciador é a percentagem de hidrogénio do combustível. A relação hidrogénio-carbono mais importante verifica-se no gás natural (4: 1), no petróleo é de 1,8: 1 e no carvão é de 0,7: 1; esta relação é decisiva na escolha da aplicação destas matérias-primas fósseis nos diversos campos de aplicação.

6.2

Até hoje, o recurso ao carvão, ao petróleo e ao gás natural é insubstituível enquanto fonte de energia, matéria-prima para produção de muitos produtos (desde medicamentos a materiais plásticos) e enquanto agente redutor do carbono na produção de ferro e aço. Além disso, as suas propriedades físico-químicas específicas (por exemplo, estado de agregação, percentagem de hidrogénio, carbono e cinza) tornam-no ideal para algumas finalidades e menos bom para outras. A escolha do hidrocarboneto obedece a critérios de relevância económica, técnica e ambiental.

6.3

Cerca de 7 % das fontes de energia fósseis utilizadas na UE são direccionadas para o chamado consumo não energético, isto é, essencialmente o fabrico de produtos químicos. No início do século passado, a produção, que começava a desenvolver-se, recorria inicialmente a recursos obtidos a partir do carvão. Entretanto, os recursos carboníferos foram substituídos praticamente na totalidade pelo gás natural e produtos petrolíferos. Enquanto esta situação for possível do ponto de vista do aprovisionamento, o petróleo e o gás natural também dominarão neste segmento de mercado no futuro. A capacidade necessária para tal das reservas de petróleo e gás natural seria consideravelmente maior se se conseguisse que estas fontes de energia fossem menos utilizadas para fins de produção de energia e de calor.

6.4

O processo adoptado para a produção de aço de oxigénio é o alto forno conversor com base em carbono, que recorre ao coque como agente redutor na produção de ferro, servindo simultaneamente de estrutura de suporte e de sistema de circulação de gases. A utilização média de um agente redutor nas instalações europeias modernas é de 475kg por tonelada de ferro fundido, próximo do mínimo tecnicamente exigido.

6.5

No sector dos transportes constatam-se ainda taxas de crescimento elevadas. Este sector é responsável por cerca de 25 % da utilização de energia e na rede rodoviária a dependência da produção de petróleo é praticamente total. Os combustíveis líquidos possuem um grande teor energético por unidade de volume ou massa, que lhes permite uma utilização económica e eficaz no sector dos transportes. Foi graças a isso que os combustíveis líquidos se impuseram, juntamente com as suas infra-estruturas, no transporte rodoviário. O recurso a veículos movidos a electricidade e ao transporte ferroviário permite uma maior diversificação da utilização das fontes de energia primárias (carvão, gás natural, energias renováveis, energia atómica) e pode levar, assim, a redução da dependência do petróleo.

6.6

Os concorrentes directos dos combustíveis líquidos à base de petróleo são o gás natural e o gás natural liquefeito (GNL). Resta saber se esta linha de produtos pode conquistar grandes quotas de mercado (14).

6.7

Privados e pequenos consumidores utilizam cerca de 30 % da energia. A escolha da fonte de energia obedece a critérios económicos e é cada vez mais determinada por considerações de conforto e ambientais. Neste sector são concorrentes o fuelóleo, o gás natural, a electricidade e as instalações de cogeração de calor à distância, no caso de zonas de grande densidade populacional.

6.8

40 % do consumo de energia na UE é convertido em electricidade e calor em centrais eléctricas. O carvão, o petróleo e o gás natural, mas também a energia nuclear, são igualmente adequadas para a conversão em electricidade. Em centrais nucleares altamente eficientes a nível técnico, o rendimento do gás natural (de energia primária para energia eléctrica) pode ir até 60 %. No caso da hulha, o rendimento das instalações modernas é de 45 % a 50 %, 43 % no caso da lignite.

6.9

A nível mundial, cerca de 40 % das necessidades de electricidade são produzidas a partir de carvão, contra apenas 30 % na UE. Da produção mundial de carvão, cerca de 63 % são utilizados para produção de electricidade: para esta finalidade o carvão é mais económico do que o petróleo ou o gás natural, além de estar certamente disponível em zonas de produção mais diversificadas a nível mundial.

6.10

Através da concentração da utilização do carvão na produção de aço e de electricidade, é possível almejar um cabaz de energias fósseis que concilie vantagens económicas, protecção do ambiente, segurança do aprovisionamento e preservação dos recursos. As reservas mundiais de carvão são consideravelmente superiores às de petróleo e de gás natural.

6.11

Deveriam existir condições políticas para encorajar a concentração do consumo das matérias-primas mais escassas e flexíveis, como o gás natural e o petróleo, em aplicações (sobretudo como combustíveis para os transportes ou como matérias-primas para a indústria química) nas quais o recurso ao carvão (ou à energia nuclear ou às energias renováveis) envolveria custos superiores, um maior dispêndio de energia e maiores emissões de CO2. Desta forma, o esgotamento das reservas de petróleo e de gás natural far-se-ia mais lentamente, em proveito das gerações futuras.

6.12

Isso implica, ao mesmo tempo, promover a utilização do carvão (e das energias renováveis e da energia nuclear) nas centrais eléctricas para que o petróleo e o gás natural não tenham de ser nelas utilizados (ver também ponto 8.12). Na Europa Central e Oriental há recursos consideráveis de hulha e lignite. A exploração destas reservas pode evitar o aumento da dependência da UE da importação de energia.

7.   Protecção do ambiente e do clima

7.1

Análises e comparações ambientais de fontes de energia fósseis devem incluir toda a cadeia de produção e consumo: na extracção/exploração de recursos, transporte, combustão e utilização final de energia. Todos os passos estão relacionados com maior ou menor impacto ambiental e perdas de energia. As fontes de energia importadas comportam igualmente um impacto ambiental, que ocorre fora das fronteiras da UE.

7.2

Na exploração/produção de carvão, petróleo e gás natural, há que considerar várias implicações ambientais. No caso da extracção do carvão, há que limitar a utilização dos espaços naturais e a libertação de poeiras. Aquando da extracção e exploração de petróleo, deve evitar-se a libertação de petróleo e gás natural, bem como de produtos derivados; o mesmo vale para a exploração do gás natural, bem como ao subsequente transporte marítimo ou por gasoduto de petróleo e gás natural. São necessários procedimentos especiais na produção offshore. Na exploração de petróleo, o metano libertado não deveria ser eliminado por combustão, mas sim direccionado para fins industriais. O mesmo se aplica ao grisu libertado pelas minas de carvão, que pode conter um elevado teor de metano.

7.3

A directiva comunitária relativa às grandes instalações de combustão fixa medidas severas para a construção e exploração de centrais eléctricas com uma potência igual a 50MWth. A concentração de poluentes no gás residual das centrais a gás, petróleo e carvão deve ser limitada, de acordo com o estado da técnica estabelecido nesta directiva. As instalações antigas devem ser melhoradas, visando garantir a redução, para níveis toleráveis pela natureza e pelas pessoas, das emissões de poeiras (incluindo partículas finas, ver 7.6), dióxido de enxofre, óxido de azoto e metais pesados particularmente prejudiciais, bem como de substâncias orgânicas tóxicas ou até mesmo cancerígenas. A título preventivo, as emissões de ruído devem ser reduzidas, para evitar ao máximo qualquer incómodo.

7.4

O carvão contém substâncias não combustíveis que, após a combustão são separadas sob a forma de cinza (por filtros eléctricos ou têxteis). Geralmente, o teor de cinza da hulha pode elevar-se a 10 % (ou mesmo a 15 %, em alguns casos). Em função da sua composição, a cinza é utilizada como agregado na indústria do cimento e utilizada na construção de estradas ou para enchimento de minas ou escavações.

7.5

O petróleo também contém uma percentagem reduzida de cinzas. No tratamento do petróleo nas refinarias, as cinzas (que contêm, nomeadamente, vanádio e níquel) permanecem no estado sólido, o chamado coque de petróleo. Para utilizar a energia restante, este é direccionado para centrais e instalações de combustão que dispõem de sistemas de depuração de substâncias poluentes.

7.6

Há já alguns anos que se debate a questão das emissões de partículas finas (15). Tratam-se de partículas respiráveis em suspensão, de dimensões inferiores a 10 μm e que podem provocar doenças das vias respiratórias. Estas partículas também são emitidas na combustão do petróleo e do carvão, uma vez que não é possível filtrar as partículas mais pequenas de cinzas. Todavia, as mais importantes fontes de emissão de partículas finas são os veículos a gasóleo que não estejam equipados com filtros de partículas. Nas centrais a carvão e petróleo, as emissões de poeiras estão limitadas a 20mg/m pela directiva relativa às grandes instalações de combustão. Nas grandes centrais, as emissões de partículas finas são reduzidas através da dessulfuração húmida de gases de combustão. Para reduzir ainda mais na Europa, de forma generalizada, os valores-limite das emissões de partículas finas, a UE estabeleceu para estes veículos a gasóleo disposições reforçadas, exigindo filtros de partículas nos veículos a partir de 2008.

7.7

A dessulfuração dos gases residuais de grandes centrais a carvão e instalações de combustão já é exigida em alguns Estados-Membros desde os anos 80 do século XX. A acidificação dos solos e dos lagos verificada pode assim ser travada. A nova versão do regulamento sobre as grandes instalações de combustão fixa um limite máximo de 200mg/m3 para as emissões de SO2 pelas instalações >300MW. Tecnicamente, a separação de mais de 90 % dos componentes de enxofre é actualmente possível. Para os produtos resultantes da separação do enxofre, nomeadamente o gesso, foram abertos novos mercados e reduziu-se a utilização dos recursos naturais.

7.8

Na combustão de combustíveis fósseis a elevadas temperaturas forma-se óxido de azoto a partir do azoto existente no próprio combustível, bem como no oxigénio de combustão. Em caso de aumento da concentração, este óxido de azoto pode causar doenças das vias respiratórias e é prejudicial para a camada de ozono. O regulamento sobre as grandes instalações de combustão estabelece que as emissões de óxido de azoto nas centrais > 300MW não podem ultrapassar os 200mg/m3 de gás residual.

7.9

A comunidade científica fala de uma relação causal entre as emissões de CO2 antropogénicas e outros chamados «gases com efeito de estufa», bem como o aumento da temperatura na superfície terrestre (efeito de estufa). Persistem incertezas quanto à dimensão dos efeitos. Anualmente, as emissões de CO2 resultantes da combustão de carvão, petróleo e gás natural rondam os 20 mil milhões de toneladas; trata-se da principal fonte de emissão antropogénica condicionada de CO2. Juntamente com o aumento da eficiência e medidas de poupança de energia, devem ser desenvolvidas técnicas de separação de CO2 (ver infra) para melhorias decisivas a longo prazo.

7.10

O aumento da eficiência na combustão de energia e na utilização de energia é condição essencial para o êxito de uma protecção global do ambiente. As medidas necessárias para tal deveriam ser adoptadas com determinação. As estratégias de substituição de combustível são pouco eficazes, uma vez que são unidireccionadas para a utilização de determinadas fontes de energia, como por exemplo o gás, pondo em causa a economia e a segurança do aprovisionamento energético. Além disso, o gás é uma matéria-prima demasiado importante para a química e o sector dos transportes para ser utilizado na produção de electricidade.

7.11

Por unidade de energia, a combustão do gás natural produz menos 50-60 % de CO2 nocivos para o clima do que a combustão do carvão, uma vez que o gás natural contém também, para além do carbono, hidrogénio que pode ser aproveitado para a produção de energia. O próprio metano — enquanto principal componente do gás natural — é um gás com efeito de estufa consideravelmente mais nocivo para o clima (aproximadamente factor 30) do que o CO2. Na produção e utilização de fontes de energia fósseis devem ser envidados todos os esforços para evitar as emissões de metano. O metano libertado na extracção do petróleo e do carvão deve ser absorvido e aproveitado. Também no transporte de gás natural devem ser evitadas a todo o custo fugas de metano. Já nas pequenas fugas durante o transporte nos gasodutos, o gás natural perde a sua vantagem para o carvão.

7.12

Tal como demonstraram experiências passadas, na utilização de carvão, petróleo e gás natural, podem alcançar-se resultados rápidos na protecção do clima e do ambiente através da substituição instalações de centrais obsoletas por outras tecnicamente mais modernas e eficientes. Condições políticas que favoreçam os investimentos em novas técnicas são particularmente adequadas para alcançar objectivos de protecção ambiental ambiciosos.

7.13

Nos últimos 20 anos, a legislação ambiental comunitária levou a cabo a harmonização das normas ambientais nos Estados da Comunidade Europeia. A Directiva relativa às grandes instalações de combustão e a Directiva relativa à qualidade do ar, bem como políticas e medidas para aumentar a eficiência energética e evitar a emissão de gases com efeito de estufa constituíram importantes etapas dessa harmonização.

8.   Progressos tecnológicos  (16)

8.1

Na UE-25, as centrais de carvão, petróleo e gás natural representam 60 % do total da capacidade das centrais e compõem a espinha dorsal da produção de electricidade. Face à necessidade de substituir as centrais eléctricas obsoletas e de continuar a satisfazer a procura crescente de energia (cf. ponto 5.8), os próximos 25 anos deverão assistir à construção de um grande número de novas centrais. Mesmo tendo em conta a utilização reforçada de energia regenerativa e a continuação da construção, as centrais nucleares e as centrais de carvão e gás natural colmatam uma parte importante desta lacuna. Quanto maior for a eficiência e a retenção de substâncias nocivas destas centrais, mais fáceis se tornam a protecção do clima e o respeito do ambiente.

8.2

Por essa razão, são necessários esforços adicionais de I&D no domínio do desenvolvimento de centrais. Nos anos 90, estes esforços foram negligenciados e os meios públicos para a investigação foram drasticamente reduzidos em quase todos os Estados-Membros.

8.3

O Comité saúda o facto de a sua recomendação reiterada de incluir um capítulo sobre «Energia» n.o 7.o Programa-Quadro de I&D ter sido adoptada. Além disso, os respectivos programas de investigação dos Estados-Membros devem ser adaptados. Dessa forma poderia iniciar-se uma tendência importante. O mesmo se aplica à prossecução do desenvolvimento da tecnologia das centrais para aproveitamento das fontes de energia fósseis, contribuindo para a competitividade da construção de centrais a nível europeu no mercado mundial em expansão de centrais.

8.4

As centrais a carvão modernas alcançam presentemente um nível de eficiência superior a 45 % no caso da hulha e superior a 43 % na lignite. Os desenvolvimentos necessários são conhecidos: alcançar, até 2020, um nível de eficiência de 50 % nas centrais a carvão. Elevar a pressão e a temperatura no ciclo de vapor das centrais para 700° C/350 bar é um objectivo a longo prazo, para o qual devem ser desenvolvidos os materiais necessários. Na nova geração de centrais a lignite, devem ser previamente testadas instalações de secagem da lignite. Estes objectivos tão exigentes a nível do desenvolvimento requerem uma cooperação internacional semelhante, por exemplo, à que existe nos projectos comunitários AD 700 e Comtes 700, para o desenvolvimento de uma central a 700° C. A introdução de novos modelos de centrais requer investimentos de até mil milhões de euros. Visto que poucas empresas têm a possibilidade de suportar os custos e os riscos sozinhas, é desejável uma cooperação entre empresas europeias.

8.5

Nas últimas décadas, o desenvolvimento de turbinas de gás de alta capacidade possibilitou melhorias consideráveis a nível da eficiência nas centrais a gás natural. O rendimento das novas centrais a gás natural aumentou para cerca de 60 %. Devido ao aumento drástico dos preços no mercado do gás, há incertezas quanto à competitividade a longo prazo das centrais a gás à construção de novas centrais a gás natural.

8.6

Para que os progressos da técnica das turbinas de gás seja igualmente útil para a produção de electricidade a partir de carvão, é necessário converter previamente o carvão em gás. Nos anos 80 e 90, a UE contribuiu significativamente através de fundos de investigação para o desenvolvimento da técnica de gaseificação e apoiou a construção de duas centrais-modelo de gaseificação de carvão integrada (IGCC). Esta estratégia deveria levar não só ao aumento da eficiência das centrais a carvão, mas também à constituição de uma base técnica para a prossecução do desenvolvimento da chamada central a carvão isenta de CO2.

8.7

O aumento da eficiência e a redução de CO2 não devem limitar-se ao sector industrial e à produção de electricidade. Actualmente, o potencial de poupança é ainda elevado na utilização final doméstica e comercial, visto que, até à data, o incentivo dos custos (poupança no consumo/custo de novas aquisições ou reconstruções) não existe.

8.8

O sector dos transportes da UE continua a registar uma procura crescente de energia, em parte devido ao aumento da mobilidade após o alargamento. O aumento das emissões de substâncias prejudiciais para a saúde e de gases com efeito de estufa deve antes de mais ser limitado através do desenvolvimento de motores e veículos mais eficientes e menos poluentes para posteriormente ser reduzido em termos absolutos. As tecnologias de depuração dos gases de combustão devem ser continuamente melhoradas. Este objectivo só pode ser alcançado por meio do desenvolvimento bem-sucedido e da introdução em todo o território de um pacote de tecnologias progressistas, nomeadamente: o aperfeiçoamento dos motores de combustão, da tecnologia a gasóleo, dos híbridos, dos combustíveis, do rendimento dos motores dos veículos, do desenvolvimento de células de combustão e, eventualmente, de tecnologias à base de hidrogénio.

8.9

As células de combustão são adequadas para aumentar a eficiência da produção combinada de electricidade e calor possivelmente até 20 % — tanto em veículos, como em unidades fixas domésticas, comerciais e industriais. Para tal, é necessário um combustível gasoso (gás natural, gás de síntese ou simplesmente hidrogénio), o qual pode ser obtido do metanol p. ex. através de um reformador ligado à célula. Além disso, a célula de combustão — apesar de já ser conhecida há 150 anos — não se impôs do ponto de vista tecnológico e económico (mais competitivo) para os motores de veículos ou produção de calor ou electricidade descentralizada. Deveria prosseguir-se com a investigação e o desenvolvimento mediante ajudas públicas, para averiguar o potencial e, se possível, explorá-lo.

8.10

Nos últimos anos, nenhuma opção energética chamou tanta atenção como o hidrogénio. Fala-se muitas vezes da futura sociedade do hidrogénio. É frequente a opinião pública confundir o hidrogénio com as fontes de energia primárias como o petróleo ou o carvão. Não é o caso: o hidrogénio tem de ser extraído de hidrocarbonetos fósseis ou da água — através da energia eléctrica (contudo, ver 9.4). Tal como o CO2 é carbono incinerado, a água (H2O) é hidrogénio incinerado.

8.11

Além disso, o transporte do hidrogénio é desvantajoso do ponto de vista técnico, energético e económico, em relação ao transporte de electricidade ou de hidrocarbonetos líquidos. Isto significa que o hidrogénio só poderia ser utilizado onde a utilização de electricidade não é significativa ou possível. É necessária uma análise imparcial deste modelo para concentrar a investigação em objectivos realistas.

8.12

Devido à importância decisiva de hidrocarbonetos facilmente transportáveis (combustíveis) para o sector dos transportes, as reservas/recursos devem ser conservados ao máximo, isto é, o petróleo não devia ser utilizado para esta finalidade sempre que possa ser substituído por carvão, combustíveis nucleares ou fontes de energia renováveis.

9.   Separação e armazenamento final de CO2

9.1

Uma redução significativa das emissões de gases com efeitos de estufa a nível mundial até meados deste século, que exceda consideravelmente «Quioto», de acordo com os objectivos estabelecidos pela UE, só poderá ser alcançada se, dentro de algumas décadas, as centrais e outras grandes instalações industriais forem construídas e geridas com base no conceito de produção isenta ou pobre em CO2. A energia nuclear e as fontes de energia renováveis não estarão em condições de, por si sós, substituírem os combustíveis fósseis dentro de poucas décadas, nem mesmo sendo alvo de grandes desenvolvimentos.

9.2

Foram propostos vários procedimentos para gerir centrais a carvão «isentas de CO2». Estes procedimentos — com alterações — são igualmente aplicáveis a fornalhas a petróleo e a gás. Em princípio serão seguidas três vias: (i) a separação do CO2 do fumo das centrais, (ii) o desenvolvimento da combustão de oxigénio e (iii) a central combinada de gaseificação com separação de CO2 do combustível; sendo o último o que apresenta mais progressos.

9.3

Da separação do CO2 do gás de combustão da gaseificação de carvão obtém-se hidrogénio limpo, que pode ser utilizado para produção de electricidade nas turbinas de hidrogénio. O gás residual restante é vapor inócuo. Se esta tecnologia se revelar um sucesso, adivinha-se uma sinergia com a tecnologia do hidrogénio noutros domínios.

9.4

Há mais de 20 anos que o projecto de central com gaseificação de carvão integrada (Integrated Gasification Combined CycleIGCC) é investigado e desenvolvido intensivamente. Os passos na preparação do gás são, em princípio, conhecidos, mas devem ser adaptados à tecnologia do carvão. Além disso, os custos da produção de electricidade por este tipo de central sem separação de CO2 pode quase duplicar em relação às centrais tradicionais e a utilização dos recursos pode aumentar cerca de um terço. Todavia, na maioria dos locais, esta tecnologia é mais económica do que outras tecnologias de produção de electricidade isentas de CO2, como por exemplo a energia eólica, a energia solar ou a produção de electricidade a partir de biomassa.

9.5

Nos anos 80 desenvolveram-se na Europa várias soluções de IGCC — obviamente sem separação de CO2 — em parte apoiadas pela UE. Em Espanha e nos Países Baixos foram construídas e geridas instalações de demonstração de 300MW para hulha. Para a lignite foi desenvolvida, construída e explorada uma instalação de demonstração — também com apoios da UE — para a produção de gás de síntese para posterior síntese de metanol. A Europa possui condições tecnológicas excelentes para desenvolver centrais a carvão isentas de CO2 e testá-las em instalações de demonstração.

9.6

Não só as centrais mas também outros processos industriais responsáveis por grandes quantidades de emissões de CO2 (por exemplo a produção de H2, diversos processos químicos e de refinação de petróleo, bem como a produção de cimento e aço) deveriam investigar as possibilidades de separação de CO2. Calcula-se que em muitos destes processos a separação seja mais económica e tecnicamente mais simples do que nas centrais.

9.7

Há uma grande necessidade de investigação sobre um armazenamento final de CO2 mais seguro, respeitador do ambiente e económico. Está a ser investigado o armazenamento em depósitos explorados de petróleo e gás em camadas aquíferas geológicas, em depósitos de carvão e também nos oceanos. O armazenamento em depósitos de petróleo e gás explorados, quando disponível, deveria ser a alternativa mais económica, mas as camadas aquíferas geológicas são preferidas para o armazenamento de grandes quantidades, também porque tais condições geológicas estão disponíveis a nível mundial. Trata-se de comprovar que estes depósitos podem armazenar o CO2 a longo prazo sem efeitos negativos para o ambiente. A UE apoia uma série de projectos de investigação nesse sentido. Os resultados obtidos até à data são encorajadores, mas permanece a incerteza, em caso de armazenamento no oceano, quanto à eventualidade de um aumento da temperatura das águas vir a provocar a libertação do CO2 (ver ponto 3.14).

9.8

A grande escala, a tecnologia de separação e armazenamento de CO2 poderá estar disponível a partir de 2020, sob a condição de os trabalhos da I&D terminarem atempadamente e com êxito. Estudos avaliam os custos de cada tonelada de CO2 evitada em 30-60€/tonelada para a separação, transporte e armazenamento final de CO2, o que é mais económico do que a maioria dos processos regenerativos de produção de electricidade.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Ver «Promover as energias renováveis: meios de acção e instrumentos de financiamento» (JO C 108 de 30.4.2004); «Os desafios colocados pela energia nuclear na produção de electricidade» (JO C 112 de 30.4.2004); «Fusão nuclear» (JO C de 302 de 7.12.2004), «Utilização da energia geotérmica — O calor da terra» (JO C 110 de 30.4.2004).

(2)  Hulha e lignite.

(3)  Vd. Capítulo 3.

(4)  Segundo um estudo publicado pelo banco de investimentos Goldman Sachs, o preço do petróleo poderia encontrar-se no limiar de uma fase de supervalorização, que o banco estima poder atingir os 105$ por barril. Para 2005, a maior parte das estimativas apontava para um preço de 50$, e de 55$ para 2006; mas em 29 de Agosto de 2005 o preço era já da ordem dos 70$.

(5)  As centrais modernas podem produzir em geral 1GW por bloco (GWe1). 1GW (Gigawatt) corresponde a 1000Megawatt (MW), ou a 1 milhão de quilowatt (KW), ou ainda a mil milhões de Watt (W). Um «segundo/Watt» (WS) equivale a 1Joule (J), a uma hora/Quilowatt (kWh) ou a 3,6 milhões de Joule (ou seja, 3,6 de Megajoule [MJ]). Assim, 1Megajoule (MJ) equivale a cerca de 0,28 kWh.

(6)  Sobre a importância de diminuir ou evitar o tráfego automóvel, ver CESE 93/2004.

(7)  A energia não é consumida, apenas transformada e aproveitada. Isto é possível graças a processos de transformação específicos como a combustão do carvão, a conversão da energia eólica em electricidade ou a fusão nuclear (obtenção de energia; E=mc2). Fala-se assim de «aprovisionamento energético», de «obtenção de energia» e de «aproveitamento da energia».

(8)  (AIE) World Energy Outlook 2004, p. 57: «Fossil fuels will continue to dominate global energy use. Their share in total demand will increase slightly, from 80 % in 2002 to 82 % in 2030» («Os combustíveis fósseis continuarão a dominar o consumo global de energia. A sua percentagem da procura total aumentará ligeiramente, de 80 % em 2002 para 82 % em 2030»).

(AIEEU) International Energy Outlook, Abril de 2004 [http://www.eia.doe.gov/oiaf/ieo/]: «The IEO 2004 reference case projects increased consumption of all primary energy sources over the 24-year forecast horizon» («O quadro de referência IEO 2004 prevê um aumento do consumo de todas as fontes de energia primárias nos próximos 24 anos») (figura 14 e Anexo A, quadro A2).

(9)  Comissão Europeia [http://europa.eu.int/comm/dgs/energy_transport/figures/scenarios/doc/chapter_1.pdf], quadro de referência para a energia e os transportes na UE-25 até 2030: p. 9, quadros 1-8.

(10)  1kg de petróleo = 42,7MJ; 1kg de carvão ou equivalente = 29,3MJ; 1m2 de gás natural Hu = 31,7MJ (sobre joules e megajoules cf. nota de rodapé 3).

(11)  A actual crise do petróleo e o consequente aumento dos preços fazem recear que esses efeitos se manifestem ainda mais cedo.

(12)  World Energy Council, Energie für Deutschland, Fakten, Perspektiven und Positionen im globalen Kontext 2004. Schwerpunktthema «Zur Dynamik der Öl- und Erdgasmärkte» («Energia para a Alemanha – Factos, perspectivas e posições no contexto global 2004. Tema sobre a dinâmica dos mercados do petróleo e do gás natural›»).

(13)  Comissão Europeia, Direcção-Geral Energia e Transportes, Setembro de 2004.

(14)  O mesmo se aplica aos combustíveis líquidos à base de biomassa, que até à data só têm singrado no mercado com a ajuda de subvenções elevadas.

(15)  Directiva 96/92/CE do Conselho de 27 de Setembro de 1996 relativa à avaliação e gestão da qualidade do ar ambiente.

(16)  Ver parecer do CESE «Necessidades em matéria de investigação para um fornecimento seguro e fiável de energia».


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/16


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao financiamento plurianual da actividade da Agência Europeia da Segurança Marítima no domínio do combate à poluição causada por navios e que altera o Regulamento (CE) n.o 1406/2002»

COM(2005) 210 final — 2005/0098 (COD)

(2006/C 28/03)

Em 7 de Junho de 2005, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 71.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 4 de Outubro de 2005, sendo relator E. CHAGAS.

Na 421.a reunião plenária, de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 124 votos e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

Com a adopção do Regulamento 724/2004 de 31 de Março, que altera o Regulamento 1406/2002 que estabeleceu a criação da Agência Europeia de Segurança Marítima (AESM), a Agência passou a contar com novas competências no domínio do combate à poluição marítima por hidrocarbonetos.

1.2

A presente proposta visa estabelecer os procedimentos para o financiamento comunitário para as novas funções da Agência, com base numa autorização plurianual para um período de sete anos, ou seja de 2007 a 2013. A Comissão propõe um orçamento de 154 milhões de euros para o referido período.

1.3

Na sequência da atribuição daquelas novas funções, o Conselho de Administração da AESM adoptou em Outubro de 2004 um «Plano de acção para a preparação e a intervenção contra a poluição por hidrocarbonetos»,.o qual identifica as actividades que a Agência conta desenvolver no contexto do regulamento, quer em termos de combate a derrames de hidrocarbonetos com a intervenção de navios especializados, quer em termos de preparação para montar operações de combate eficazes.

1.4

No processo de identificação das prioridades para a sua intervenção, a AESM identificou quatro áreas que requerem uma atenção especial. São elas o Mar Báltico, as aproximações ocidentais ao Canal da Mancha, a Costa Atlântica e o Mar Mediterrâneo, em especial na rota de passagem dos petroleiros procedentes do Mar Negro; nestas áreas a Agência pretende contratar navios de combate à poluição prontos a actuar caso tal seja solicitado por um ou mais Estados-Membros. Recorda-se que o papel da AESM neste domínio será de reforçar (e não substituir) os meios nacionais de combate à poluição. O plano de acção prevê igualmente uma capacidade de reacção suplementar em caso de incidentes que envolvam substâncias nocivas e potencialmente perigosas (HNS).

1.5

O Regulamento alterado em 2004 dá à AESM a responsabilidade de fornecer à Comissão e aos Estados-Membros assistência técnica e científica no campo do combate à poluição que pode ser dividida em três categorias: informação, cooperação e coordenação, e assistência operacional.

1.6

É no campo da assistência operacional que se realizará um maior esforço financeiro, uma vez que o Plano de Acção prevê o estabelecimento de uma rede de navios em regime de disponibilidade para a recuperação de hidrocarbonetos e de um centro de serviços de imagiologia por satélite. Os contratos a celebrar com a AESM para assistência na recuperação de hidrocarbonetos abrangem todas as acções e suas consequências financeiras até ao lançamento da intervenção consecutiva a derrames de extrema gravidade. O custo ocasionado da intervenção de um navio para recuperar hidrocarbonetos será suportado pelo Estado-Membro que solicita este serviço.

1.7

Tendo estas novas responsabilidades um carácter permanente, a Comissão apresenta uma proposta de orçamento plurianual que, por um lado, possa garantir os investimentos de longo prazo necessários e, por outro, assegure a segurança financeira suficiente, reduzindo assim as despesas associadas à negociação de contratos de longo prazo.

2.   Observações gerais

2.1

No seu parecer sobre a proposta que atribuía novas competências à AESM no campo do combate à poluição (1), o CESE congratulou-se com a proposta da Comissão e salientou o papel fundamental da Agência na melhoria e reforço da segurança marítima nos Estados-Membros. Lamentava porém o facto de vários Estados-Membros não estarem ainda equipados para fazer face a novos grandes acidentes marítimos como os dos navios Erika e Prestige.

2.2

Apesar dos progressos registados, a situação actual é ainda, em alguns casos, deficitária. Simultaneamente com a apresentação do Plano de Acção, a Agência apresentou um «Inventário da capacidade de resposta dos Estados-Membros à poluição por hidrocarbonetos», de onde se depreende que a capacidade de intervenção deverá ser reforçada em certas regiões, por meio da disponibilização de navios e equipamento de recuperação suplementares.

2.3

Com efeito, não se deverá esperar que cada Estado costeiro esteja apetrechado em permanência com todos os meios necessários para fazer face por si só a grandes acidentes marítimos e em particular à poluição por hidorcarbonetos em grande escala. No entanto as limitações actuais de meios têm resultado em danos ambientais com consequências que perdurarão por largos anos.

2.4

Assim, o CESE apoia a presente proposta na medida em que pretende dotar a AESM dos meios necessários para complementar os esforços de prevenção e combate à poluição desenvolvidos pelos Estados-Membros. O CESE salienta, porém, que estes meios devem ser considerados unicamente complementares, não podendo em caso algum ser utilizados para substituir medidas de prevenção da poluição que os Estados-Membros têm a obrigação de tomar.

2.5

Em particular, o CESE realça a necessidade de tais meios serem garantidos através de um plano de financiamento plurianual, pois só assim se poderá assegurar a estabilidade da programação das actividades da AESM nesta área, bem como uma melhor rentabilização dos recursos através da celebração de contratos de um mínimo de três anos com navios que assegurarão assistência imediata (2) em caso de necessidade.

2.6

O CESE relembra a observação formulada no seu parecer referido em 2.1 no que respeita à necessidade de assegurar que o(s) armador(es) das embarcações a contratualizar neste contexto respeitam a legislação comunitária e internacional relevante e em particular no que respeita às condições de segurança das embarcações e às condições de vida e de trabalho das tripulações.

2.7

Sendo o Plano de Acção aprovado pela Agência um exercício de identificação de prioridades em função dos recursos limitados que prevê vir a dispor, o CESE manifesta a sua preocupação pela eventualidade de, dadas as presentes dificuldades de acordo sobre o orçamento comunitário, as verbas finalmente disponibilizadas poderem vir a ser reduzidas em relação ao orçamento proposto. Tal implicaria a necessidade de optar por determinadas medidas em detrimento de outras, ou de avançar numas áreas em prejuízo de outras. O CESE não pode apoiar esta perspectiva visto que a decisão dos Estados-Membros de aumentar as competências da Agência requer que se garanta financiamento consentâneo com os objectivos fixados para a prevenção da poluição marítima. É absolutamente necessário que também ao nível comunitário se encare a prevenção e o combate à poluição marítima com a importância que efectivamente merecem e que não pode passar por uma lógica meramente economicista.

2.8

O CESE não pode deixar de manifestar a sua preocupação pelo atraso de alguns Estados-Membros na implementação de algumas das medidas já adoptadas no domínio da prevenção e combate à poluição marítima. Pensamos em especial na designação pelos Estados-Membros de áreas de refúgio ou na melhoria da performance das inspecções do controlo do estado do porto (port state control). Os atrasos verificados levam-nos a duvidar do real empenhamento desses países na prevenção e combate à poluição marítima, apesar das boas intenções regularmente manifestadas e em particular após cada novo grande acidente marítimo.

2.9

Também no campo da vigilância aérea, enquanto meio auxiliar na detecção e combate à poluição e na prevenção de infracções às normas anti-poluição, é necessário investir em meios e equipamentos.

2.10

Por outro lado, a imagiologia por satélite também poderá ser utilizada em complemento das actividades de vigilância e monitorização. O CESE apoia a intenção da Comissão de criar um centro de serviços de imagiologia por satélite orientado para a detecção, monitorização e gestão das descargas ilegais e dos derrames acidentais de hidrocarbonetos, a disponibilizar aos Estados-Membros.

2.11

Dados os custos elevados (3) dos serviços de imagiologia, o CESE considera ser necessário um esforço de rentabilização dos recursos e, em particular, a coordenação entre os Estados-Membros da utilização dessas imagens, o que poderá conduzir a consideráveis economias. Por outro lado, justificar-se-ia um investimento na melhoria da cobertura na recolha de imagens de todas as zonas marítimas europeias, porquanto actualmente essa cobertura não é totalmente eficaz, designadamente na área mediterrânica.

2.12

O CESE atribui igualmente grande importância às acções previstas de informação, cooperação e coordenação. Este é um papel fundamental a desempenhar pela Agência e que permitirá também uma utilização mais racional dos recursos existentes.

3.   Conclusões

3.1

O CESE apoia a presente proposta que pretende dotar a AESM dos meios necessários para complementar os mecanismos nacionais de prevenção e combate à poluição, a pedido dos Estados-Membros.

3.2

Lamenta, no entanto, que alguns Estados-Membros ainda não tenham disponibilizado as verbas necessárias ou não se equipado e exorta a Comissão a incitá-los a agilizar todo este processo.

3.3

O CESE não pode deixar de manifestar a sua preocupação perante a dificuldade em chegar a um acordo sobre o orçamento comunitário, na medida em que os fundos que serão disponibilizados poderão ser inferiores aos estabelecidos na proposta de orçamento. A decisão dos Estados-Membros de aumentar as competências da Agência requer que se garanta o financiamento consentâneo com os objectivos fixados para a prevenção da poluição marítima. É absolutamente necessário que também ao nível comunitário se encare a prevenção e o combate à poluição marítima com a importância que efectivamente merecem e que não pode passar por uma lógica meramente economicista.

3.4

O papel da Agência na promoção da cooperação e da coordenação dos recursos e das actividades dos Estados-Membros é essencial para pôr de pé uma estratégia racional e economicamente rentável.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 108 de 30.4.2004, relator E. CHAGAS.

(2)  Neste contexto, rápido significa que a intervenção do navio ocorre nas 24 horas que se seguem ao acidente. A transformação donavio, incluindo a instalação a bordo do equipamento necessário, demora 4 a 8 horas e mais 4 a 8 horas suplementares para que onavio chegue ao local do acidente.

(3)  O custo por imagem que cobre uma zona de 500 km2 varia entre 800 e 1 000 euros em função de vários factores, mormente doprazo de transmissão do pedido e da data de assinatura do contrato. De acordo com uma estimativa razoável da AESM, sãonecessárias 1 000 imagens por ano.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/18


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho sobre a gestão dos riscos e das crises na agricultura»

COM(2005) 74 final

(2006/C 28/04)

Em 20 de Abril de 2005, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a: «Comunicação da Comissão ao Conselho sobre a gestão dos riscos e das crises na agricultura».

Incumbida da preparação dos respectivos trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente adoptou o seu parecer de 7 de Outubro de 2005 (relator: G. BROS).

Na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 122 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

Esta Comunicação da Comissão Europeia dá seguimento a vários trabalhos realizados a nível europeu, a saber: Relatório da Comissão sobre a gestão de riscos (Janeiro de 2001), debate do Conselho sob Presidência sueca (primeiro semestre de 2001), Memorando espanhol e Conferência Internacional em Madrid (início de 2002) sobre «Seguros agrícolas e garantia de rendimentos», Memorando grego e Seminário sobre as catástrofes naturais (Salónica, 2003) e Conferência organizada pela Presidência neerlandesa (Dezembro de 2004) sobre «Custos materiais e imateriais da erradicação de doenças animais».

1.2

Mais concretamente, a Comunicação vai ao encontro do compromisso da Comissão assumido no quadro da reforma da PAC em Junho de 2003, no Luxemburgo, na forma de declaração:

«A Comissão estudará medidas específicas para responder aos riscos, crises e catástrofes naturais ao nível nacional no domínio da agricultura. Até ao final de 2004, será apresentado ao Conselho um relatório com propostas adequadas. A Comissão analisará, em particular, a possibilidade de financiar estas medidas através do ponto percentual de modulação a redistribuir directamente pelos Estados-Membros. Considerará igualmente a previsão, no quadro de cada organização comum de mercado, de um artigo que lhe permita actuar, na eventualidade de crise ao nível comunitário, baseando-se nos princípios estabelecidos para estes casos na organização comum de mercado no sector da carne bovina.».

1.3

A Comunicação responde igualmente às Conclusões do Conselho de Dezembro de 2003 que apelam a prosseguir o debate e a fazer um inventário dos instrumentos de gestão de riscos disponíveis, a examinar as opções em matéria de gestão de riscos e os eventuais novos instrumentos (Organização Comum de Mercado, compromissos financeiros, regras de concorrência) e a avaliar e adaptar as linhas directrizes referentes às ajudas estatais ao sector agrícola.

1.4

A PAC oferecia no passado uma protecção através de políticas de mercados e preços, mas desde a sua última reforma, os agricultores veêm-se mais directamente confrontados com toda uma série de riscos. Daí que a Comissão pretenda ensaiar novos instrumentos no quadro da PAC por forma a ajudar os agricultores a melhorarem a sua capacidade de gestão de riscos e crises.

1.5

Nos seus documentos de trabalho, a Comissão fez um inventário dos riscos existentes na agricultura; risco humano ou pessoal; risco relativo ao capital (edifício, etc.); risco financeiro; risco em termos de responsabilidade (biotecnologia, etc.); risco relativo à produção (climático, etc.); e risco referente ao preço. A Comissão elaborou igualmente um inventário dos instrumentos de gestão dos riscos existentes: endividamento e investimento (poupança isenta de fisco); adaptação das técnicas de produção; diversificação; técnica de comercialização (contrato, integração); mercado de futuros; fundos mutualistas e seguro.

1.6

Importa aprofundar estas reflexões para corresponder o melhor possível às expectativas e limitar os impactos negativos das crises na agricultura.

2.   A proposta da Comissão

2.1

Nas três primeiras páginas da Comunicação, a Comissão reintegra a problemática da gestão de riscos e crises no seu contexto. Os documentos de trabalho anexos à Comunicação abordam vários aspectos. Nas suas propostas, a Comissão responde aos pedidos expressos nas Conclusões do Conselho: o desenvolvimento de uma rede de segurança e o financiamento de medidas de gestão de riscos e crises pela modulação, através de três opções: seguros contra catástrofes naturais, apoio aos fundos mutualistas e garantia de uma cobertura de base contra as crises de rendimento.

2.2

A utilização de fundos oriundos da modulação exige instrumentos baseados em medidas de desenvolvimento rural. Assim, estas novas medidas deveriam melhorar a competitividade das explorações (eixo 1), respeitar a anuidade do orçamento e as regras sobre as ajudas estatais e ser compatíveis com a caixa verde da OMC.

2.3

A primeira opção diz respeito aos seguros contra as catástrofes naturais. A Comissão considera que estes podem ajudar a reduzir os pagamentos eventuais efectuados pelos Estados-Membros. O prémio pago pelo agricultor pode ser subsidiado a 50 %. Efectua-se um pagamento quando os prejuízos sejam superiores a 30 % da produção média dos 3 últimos anos ou à produção média dos 5 últimos anos (exclui-se do cálculo o melhor e o pior ano dos últimos 5 anos). A compensação não pode exceder 100 % dos prejuízos nem pode especificar o tipo ou volume de produção futura. Uma alternativa ao subsídio do prémio é o resseguro de companhias de seguro privadas.

2.4

A segunda opção são os fundos mutualistas. Trata-se de incentivar os agricultores a partilhar os riscos entre si, sendo possível um apoio temporário e degressivo (assegurando-se os custos administrativos). O subsídio é calculado tendo em conta o número de agricultores participantes e o fundo deve ser reconhecido pelo Estado-Membro. A compatibilidade com a caixa verde da OMC deve ser analisada caso a caso.

2.5

A terceira opção é uma cobertura de base do rendimento. Esta opção baseia-se no modelo canadiano e nas especificações da caixa verde. Trata-se de aumentar a tesouraria em caso de crise (apoio ao rendimento). O sistema deve ser acessível a todos os agricultores. Procede-se à compensação se o prejuízo for superior a 30 % do período de referência (o mesmo se aplica à opção 1). Importa determinar um indicador de rendimento. A compensação deve ser inferior a 70 % dos prejuízos e não deve especificar o tipo ou volume da produção futura.

3.   Observações na generalidade

3.1

O Comité congratula-se com a proposta da Comissão, que abre o debate sobre um assunto fundamental para o futuro da agricultura. A Comissão publicou a Comunicação em apreço na sequência de pedidos específicos num quadro vinculativo. O Comité considera a Comunicação uma primeira reflexão que importará aprofundar para responder aos riscos e crises descritos na Introdução.

3.2

A Comissão expõe sucintamente, nos capítulo 1 (Introdução) e 2 (Antecedentes) da Comunicação, as novas condições em vigor após a reforma da PAC em 2003 (introdução do regime de pagamento único) e nota as diferentes medidas tomadas e as tarefas atribuídas pelo Conselho no que respeita à gestão de riscos e crises na agricultura. Nem a Comunicação da Comissão, nem o documento da DG Agricultura referem explicitamente as alterações atinentes aos riscos a que está exposta a agricultura europeia.

3.3

O Comité nota que a reforma de Junho de 2003 conduz a um aumento acentuado da volatilidade dos preços agrícolas, que se vem juntar à volatilidade dos preços dos factores de produção, e, logo, a uma maior probabilidade de crises económicas prejudiciais às explorações agrícolas. Por outro lado, no entender de vários cientistas, a imprevisibilidade do clima é igualmente cada vez maior. Em caso de crise, os agricultores são sempre o elo mais fraco da cadeia, pelo que necessitam de meios eficazes para responderem aos riscos e crises. Neste contexto, o Comité deseja pronunciar-se sobre vários pontos abordados pela Comissão.

3.4

A Comissão Europeia tem o mérito de propor três opções, que seriam facultativas ao nível dos Estados-Membros e complementares. As três opções são interessantes e nenhuma deve ser rejeitada de antemão. Pelo contrário, importa estudar mais aprofundadamente cada uma delas.

3.5

No que diz respeito ao financiamento destas opções, a Comissão estudou a utilização de um ponto de modulação. Anteriormente, a Comissão teria de realizar uma avaliação das necessidades financeiras das medidas propostas. O Comité sublinha que a proposta da Comissão é neutra do ponto de vista orçamental, mas questiona-se sobre a suficiência dos fundos previstos relativamente às necessidades.

3.6

Os fundos do 1.o pilar têm um papel de estabilização dos mercados e dos rendimentos, garantido aos agricultores até 2013. Dado que são indispensáveis à sobrevivência de várias explorações, importa garantir que não se aumentará a modulação das ajudas directas.

3.7

Os montantes oriundos da modulação variam consideravelmente consoante os Estados-Membros, sendo nulos no caso dos novos Estados-Membros. O Comité propõe, por isso, uma alternativa a este ponto percentual de modulação: cada Estado-Membro poderia atribuir à gestão de riscos e crises uma parte da sua dotação nacional do FEADER até um limite de 0,1 % do Produto Agrícola Nacional.

3.8

Dada a utilização de fundos da modulação, a Comissão realizou os seus trabalhos no quadro do desenvolvimento rural. O Comité considera que importa ter uma abordagem mais ampla e ter em conta outras modalidades de acção, nomeadamente ao nível das organizações comuns de mercado (OCM), da política de concorrência, das trocas comerciais, etc..

3.9

Se bem que se deva estudar um certo número de riscos e crises, nem sempre a sua gestão se insere no âmbito da Política Agrícola Comum. Os riscos ligados a catástrofes naturais imprevisíveis (logo, não cobertas pelos seguros) e a epidemias (como a da febre aftosa) não podem ser abordados no quadro da PAC, havendo outros instrumentos, como o Fundo Veterinário ou o Fundo de Solidariedade, para responder a estas situações específicas. Por outro lado, está em fase de estudo (1) um sistema de resposta a catástrofes naturais ao nível europeu, o qual deverá cobrir os riscos supramencionados na agricultura.

3.10

O Comité insiste no facto de todos estes dispositivos só poderem funcionar enquanto complemento de mecanismos de gestão de mercados actuais nas OCM que incluem os meios mais eficazes adaptados aos diferentes sectores. Por outro lado, ao nível comercial, é imperativo, no quadro do ciclo de Doha, que a UE salvaguarde a preferência comunitária.

3.11   Observações sobre a proposta da Comissão no quadro do desenvolvimento rural

3.11.1   Seguros agrícolas

3.11.1.1

O Comité lembra o seu parecer (2) sobre «O regime comunitário de seguro agrícola». Várias das propostas expressas nesse documento permanecem actuais. Os seguros agrícolas são úteis para cobrir determinados riscos, não podendo, contudo, substituir os poderes públicos na gestão de riscos excepcionais.

3.11.1.2

Actualmente, em conformidade com as linhas directrizes respeitantes às ajudas estatais na agricultura, são autorizadas ajudas até 80 % do custo dos prémios de seguro que cobrem os prejuízos devidos a calamidades naturais (por exemplo, terramotos e outros desastres extraordinários). Os prejuízos devidos a más condições climáticas ou a doenças animais e vegetais são associados a prejuízos devido a calamidades naturais apenas quando ultrapassem um determinado limite, fixado em 20 % da produção normal nas regiões desfavorecidas e em 30 % nas outras regiões.

3.11.1.3

Os seguros que, além das calamidades naturais, cubram igualmente os prejuízos resultantes de más condições climáticas ou de doenças animais ou vegetais inferiores a esses limites poderão beneficiar de ajudas estatais até 50 % do custo dos prémios de seguro.

3.11.1.4

As propostas da Comissão sobre este capítulo são, por isso, insuficientes em relação aos dispositivos já autorizados no quadro das ajudas estatais. Para encorajar a aplicação destes meios a um máximo de agricultores, importa prever um dispositivo mais interessante para o beneficiário.

3.11.1.5

Alguns Estados-Membros dispõem de mecanismos que provaram ser eficazes em determinados sectores da prevenção de riscos (por exemplo, seguros multirriscos). O CESE apoia a abordagem da Comissão que prevê a criação de um novo instrumento complementar de seguro agrícola. A introdução de novas disposições ao nível europeu não deve pôr em causa os regimes existentes que já demonstraram ser eficazes ao nível nacional.

3.11.1.6

Não obstante o seu carácter horizontal no desenvolvimento rural, o dispositivo de seguros agrícolas deve permitir uma aplicação sectorial para se adaptar às necessidades das várias regiões da União Europeia.

3.11.1.7

As possibilidades de resseguros foram objecto de numerosos estudos, não publicados. As mutualidades e os seguros privados dever-se-iam associar na criação de um Fundo de resseguro. A criação de um resseguro ao nível europeu poderia ser uma mais-valia comunitária considerável.

3.11.2   Fundos mutualistas

3.11.2.1

O apoio previsto pela Comissão não é suficientemente encorajador. Importa prever pelo menos uma dotação em capital aquando do lançamento destes fundos para garantir o seu funcionamento inicial. Para ser viável, esta opção dever-se-ia basear em organizações de produtores.

3.11.2.2

A ausência de acordo no Conselho quando dos trabalhos sobre a criação de um fundo no sector suíno evidencia as dificuldades de tal exercício. Na eventualidade de uma crise importante num sector, as quotizações dos profissionais não são suficientes para responder às necessidades. No entanto, em muitos casos, os fundos mutualistas permitem, na ocorrência de uma crise, a sobrevivência de explorações economicamente viáveis.

3.11.2.3

A gestão directa de fundos mutualistas para as acções relativas aos mercados (promoção, transformação, armazenagem ou venda a países terceiros) seria um forte incentivo a um reagrupamento dos produtores e de todos os actores da cadeia produtiva. Esta gestão responsabilizaria os actores da cadeia produtiva cujo papel para os mercados é mais importante, respondendo, desta forma, à orientação da reforma de 2003. Por outro lado, a aplicação a um nível próximo dos operadores económicos permite frequentemente um melhor funcionamento dos instrumentos do que a aplicação pelos poderes públicos.

3.11.2.4

Os fundos mutualistas que foram criados não devem sofrer a concorrência deste novo dispositivo, devendo antes beneficiar dele.

3.11.3   Cobertura de base do rendimento

3.11.3.1

Importa tentar esta opção e prosseguir os trabalhos sobre a mesma. Na União Europeia, esta política de apoio ao rendimento em vários sectores é garantida por ajudas directas. Assim, actualmente, o dispositivo proposto não pode, de modo algum, substituir os pagamentos directos aos agricultores. No entanto, o exposto não deverá impedir a Comissão de analisar outras estratégias a aplicar a longo prazo.

A análise da aplicação de um sistema deste tipo no Canadá (3) demonstra que poderia ser um instrumento interessante a aplicar a médio e longo prazo na União Europeia. De facto, trata-se de um instrumento importante para determinados parceiros comerciais da UE, como os EUA ou o Canadá. No entanto, tal como aplicado pelo Canadá, este mecanismo é um dos principais instrumentos da sua política de apoio ao rendimento agrícola e exige um financiamento público importante de que a UE, actualmente, não dispõe.

3.11.4   Informação sobre medidas de gestão de riscos e crises existentes

3.11.4.1

O Comité concorda com a Comissão quanto à necessidade de promover o desenvolvimento de instrumentos de gestão dos riscos baseados no mercado (seguro, mercado de futuros, agricultura sob contrato).

3.11.4.2

O Comité lembra o seu parecer sobre o desenvolvimento rural (4) e apela à realização de acções de formação e de informação pelo Fundo Social Europeu — e não no âmbito do desenvolvimento rural, que tem outros objectivos.

3.11.5   Harmonização dos dispositivos

3.11.5.1

Os Estados-Membros executam políticas de desenvolvimento rural segundo o princípio da subsidiariedade. Assim, só as medidas agro-ambientais são obrigatórias. O Comité reconhece o interesse desta estratégia para adaptar esta política às necessidades reais das regiões da UE. No entanto, a probabilidade de riscos e de crises aumentou em toda a União Europeia, pelo que importa promover uma certa harmonização de forma a que os agricultores de toda a União Europeia sejam tratados equitativamente e tenham acesso a dispositivos de gestão de riscos e crises.

3.12   Propostas no quadro das Organizações Comuns de Mercado

Para além das três opções indicadas pela Comissão, o CESE tem outras propostas. Tendo em vista uma maior eficácia e um financiamento menos oneroso, a Comissão deveria prever meios de intervenção precoces, a um nível apropriado, como a promoção, a armazenagem privada, a redução da produção, etc., de forma a intervir rapidamente em caso de crise.

Em muitos sectores, os instrumentos de conhecimento dos mercados permitem, actualmente, antever a ocorrência de uma crise conjuntural. Estas crises devem-se frequentemente a um desequilíbrio momentâneo entre a oferta e a procura a um nível regional. Uma acção rápida, eventualmente ao nível regional, permitiria evitar a prolongação destas crises e o seu desenvolvimento a um nível geográfico mais amplo.

3.12.1   Promover os produtos agrícolas

3.12.1.1

Ao nível europeu, as acções de promoção podem ser financiadas por vários instrumentos: desenvolvimento rural, mercado interno ou mercado de países terceiros. Como referido supra, uma acção de promoção precoce é extremamente eficaz para evitar o agravamento de uma crise. A Comissão deveria simplificar, nos vários regulamentos, a aplicação destas acções de forma permitir uma intervenção rápida.

3.12.2   Apoiar a armazenagem de produtos

3.12.2.1

Em caso de crise sectorial, as medidas de ajuda à armazenagem mostraram-se eficazes em certos casos de OCM. De facto, estas medidas permitem evitar crises conjunturais de sobreprodução, procedendo-se à venda dos produtos durante um período de tempo mais longo. A União Europeia deveria autorizar as organizações de produtores a aplicar esta medida no quadro dos fundos mutualistas. Por outro lado, trata-se de um incentivo interessante à organização de produtores.

3.12.3   Alargar a «rede de segurança» em caso de crise do mercado

3.12.3.1

No caso de importantes crises comunitárias na OCM Carne Bovina, a Comissão pode actuar, nos termos do artigo 38.o do Regulamento (5) que estabelece a organização comum de mercado no sector da carne de bovino, que prevê que «quando se verificar uma subida ou uma descida sensível de preços no mercado da Comunidade, se esta situação for susceptível de persistir e, por esse motivo, esse mercado for perturbado ou ameaçado de perturbação, podem ser adoptadas as medidas necessárias».

3.12.3.2

O CESE lamenta que a Comissão não seja a favor da generalização desta disposição, dado que nenhuma outra OCM dela beneficia. O Conselho de Ministros subscreveu a opinião da Comissão nesta matéria.

3.12.3.3

O Comité lembra que, desde a reforma de 2003, a situação evoluiu e que certas OCM não têm uma rede de segurança. Uma crise de confiança dos consumidores no sector suíno ou avícola que levasse a uma redução drástica do consumo conduziria à falência de muitas explorações.

3.12.3.4

Tendo em vista um tratamento equitativo de todos os sectores e consciente de que se trata meramente de dar uma base jurídica à Comissão para actuar, se o julgar oportuno, o Comité solicita a generalização de uma cláusula «rede de segurança» a todas as OCM, pelo que insta a Comissão e o Conselho a reverem a sua posição.

3.12.4   Ajudar à transformação

3.12.4.1

Nos sectores em que os produtos podem ser consumidos frescos ou transformados, medidas de ajuda à transformação permitem evitar uma crise dos produtos frescos autorizando, temporariamente, um excesso de produção ao nível da transformação, cujo mercado é menos volátil e, por isso, menos sensível às variações de volume de produção. Estas acções poderiam ser aplicadas pelos Estados-Membros ou pelas organizações de produtores.

3.12.5   Apoiar a redução voluntária de produção

3.12.5.1

As medidas de redução da produção fazem parte das medidas mais eficazes existentes. Se as perspectivas de mercado permitem prever um excesso de oferta em relação à procura, iniciativas voluntárias ou obrigatórias de redução de produção antes da recolta permitem evitar uma crise. Estas iniciativas poderiam ser aplicadas pelos Estados-Membros ou pelas organizações de produtores.

4.   Observações na especialidade

4.1   Definir crises agrícolas

4.1.1

A Comissão Europeia define as crises como «uma situação imprevista que põe em perigo a viabilidade de explorações agrícolas, quer a um nível localizado, quer em todo um sector de produção ou a uma escala geográfica mais vasta» (6). O Comité considera que importa diferenciar claramente crises económicas de outras crises e definir as crises económicas com critérios objectivos e transparentes.

4.1.2

No que diz respeito às crises económicas, a Comissão deve definir de forma clara «crises regionais», «crises nacionais»e «crises comunitárias». As definições devem basear-se num bom conhecimento dos mercados para determinar o preço médio dos 3 últimos anos ou o preço médio dos 5 últimos anos (excluindo o melhor e o pior ano). No caso de os preços de uma produção baixarem em X % durante Y dias, considerar-se-ia haver uma crise no respectivo mercado. X e Y devem ser definidos consoante os sectores, os Estados-Membros e até mesmo as zonas de produção. Os poderes públicos seriam competentes pela determinação das datas de início e fim de crise.

4.1.3

No que se refere às outras crises, cada Estado-Membro tem suficientes definições para gerir as situações existentes no seu contexto específico.

4.2   Adaptar as regras da concorrência em caso de crise

4.2.1

Durante uma crise, a redução do preço pago ao produtor nem sempre é repercutida no consumidor (7), o que obsta ao bom funcionamento do mercado. O Conselho deve rever o Regulamento de 1962 sobre a aplicação de determinadas regras de concorrência à produção e ao comércio dos produtos agrícolas (8), de forma a alargar as competências da DG Concorrência, que seria obrigada a garantir um bom funcionamento do mercado em caso de crise, graças a uma derrogação aos princípios normalmente aplicáveis.

4.2.2

Neste contexto, poderiam ser criados instrumentos específicos, nomeadamente para os frutos e legumes. Esta intervenção dos poderes públicos no funcionamento do mercado deve ser aceite pela Comissão no quadro dos regulamentos de excepção existentes para determinados sectores, por exemplo, para os seguros. A derrogação às regras da concorrência seria temporária e controlada pelos poderes públicos durante a crise.

4.2.3

Poder-se-iam realizar acordos interprofissionais sobre os preços, como podem fazer as empresas que tenham integrado toda a rede ou os distribuidores, através das centrais de compra.

4.2.4

No caso dos produtos não transformados, também se poderia limitar a diferença entre o preço de compra ao produtor e o preço de venda ao consumidor.

4.3   Gerir melhor os fluxos comerciais

4.3.1

No âmbito do acordo-quadro, de Agosto de 2004, sobre a liberalização das trocas agrícolas, celebrado na OMC, decidiu-se a supressão total (cuja data e ritmo não foram ainda decididos) das restituições à exportação, com a condição de o mesmo se aplicar aos outros instrumentos existentes.

4.3.2

No entanto, quanto mais o mercado da União Europeia se abre, mais os produtores se expõem aos riscos das crises, pelo que importa, nas negociações em curso, preservar a preferência comunitária. Os padrões sociais, ecológicos e de preços na UE não podem ser postos em causa através de dumping social e ecológico resultante da importação de produtos a preços baixos. Os critérios da soberania alimentar têm de ser respeitados. Por tudo isto, torna-se necessário criar e desenvolver um sistema de protecção e concessão condicional de acesso ao mercado.

4.3.3

Em tempo de crise, a União Europeia deveria limitar as importações e tirar o maior proveito possível durante o período de aplicação dos futuros acordos da OMC para favorecer as exportações.

4.3.4

A Comissão poderia considerar manter uma parte dos direitos notificados em Genebra para criar um novo instrumento de gestão dos fluxos comerciais.

4.3.5

A manutenção deste direito na OMC não seria utilizada para restituições sectoriais mas, por exemplo, como mecanismo concertado com os países terceiros (à semelhança do que existe com o Egipto) aplicado em caso de crises comunitárias para facilitar o abastecimento dos mercados externos sem, contudo, exportar a crise.

4.3.6

De facto, a concertação com as autoridades competentes dos países terceiros permitiria fixar um preço para o país beneficiário que não perturbaria o seu próprio mercado. A ajuda europeia poderia abarcar os custos de transportes, os custos administrativos ou o custo da mercadoria (caso da ajuda alimentar).

4.4   Acabar com a anuidade do orçamento

4.4.1

No quadro do orçamento actual, baseado nos recursos próprios da União Europeia e em despesas anuais, é impossível, actualmente, recusar este princípio, que tem, contudo, importantes consequências e deveria ser revisto, a prazo, tendo em vista melhorar o funcionamento da UE.

4.4.2

A curto prazo, é possível evitar esta limitação. Uma solução possível seria considerar como despesa os montantes investidos em fundos de estabilização. Estes seriam utilizados apenas em casos de crise no ano em que tal se afigure necessário.

4.5   Basear-se nas organizações de produtores

4.5.1

O facto de os produtores se organizarem para poderem ter um peso efectivo nas negociações comerciais é uma estratégia eficaz de gestão do risco comercial. A Comissão Europeia deve continuar a trabalhar nesse sentido e a promover, através de meios de incentivo, a organização económica dos produtores.

4.5.2

No que se refere à gestão de crises, o Comité é a favor de um reagrupamento das organizações de produtores e dos actores da rede a um nível pertinente, tendo em consideração as tarefas que lhes possam ser confiadas.

5.   Conclusões

5.1

As propostas da Comissão são um primeiro passo positivo para responder aos problemas da gestão de riscos e de crises. No entanto, trata-se de um primeiro passo.

5.2

Estas propostas não são mais do que um complemento da gestão de mercados agrícolas realizada ao nível europeu pelas OCM e a regulamentação das trocas comerciais. Estes dispositivos, cuja eficácia está demonstrada, não devem, em caso algum, ser postos em causa.

5.3

É necessário garantir a coordenação dos instrumentos existentes que sejam úteis para responder a determinados riscos ou crises. Assim, o Fundo Veterinário e o Fundo de Solidariedade da União Europeia devem ser mantidos e aperfeiçoados para responder aos riscos e às crises do sector agrícola de forma complementar às propostas descritas.

5.4

A reforma da PAC de 2003 e a maior imprevisibilidade do clima terão consequências importantes para a gestão de explorações agrícolas, cuja sensibilidade aos riscos e às crises vai aumentar. Assim, é fundamental que a liberalização das trocas em curso no quadro do ciclo de Doha mantenha a preferência comunitária.

5.5

As três opções propostas pela Comissão devem ser aprofundadas e aplicadas a curto ou médio prazo. No entanto, estas propostas são insuficientes para responder à situação prevista para os próximos anos, pelo que importa prosseguir os trabalhos sobre esta matéria ao nível sectorial durante as próximas reformas das OCM, mas também em termos de regulamento horizontal.

5.6

No que diz respeito ao financiamento, é sem dúvida positivo dedicar 1 % à modulação, mas importa garantir um tratamento equitativo de todos os agricultores da UE, por exemplo, com 0,1 % do Produto Agrícola Nacional. No futuro terão de se definir outras formas de financiamento.

5.7

O CESE solicita com veemência que se proceda a avaliações ex-ante e ex-post para, por um lado, pesar os novos níveis de riscos na agricultura e os meios orçamentais necessários, nomeadamente na sequência da reforma da PAC, da maior imprevisibilidade climática e das negociações da OMC, e, por outro lado, analisar a pertinência das soluções propostas para responder a estas situações.

5.8

A organização de produtores e de redes oferece uma perspectiva de futuro à agricultura europeia. A Comissão deve reforçar as suas iniciativas para promover esta organização.

5.9

A Comissão Europeia tem o mérito de ter proposto três opções. O objectivo não é optar definitivamente por uma delas, mas de as aprofundar e deixar em aberto a sua aplicação futura.

5.10

A gestão de riscos e crises é um tema fundamental para o CESE. Com base em trabalhos realizados sobre a gestão de riscos e crises, seria desejável a Comissão tornar operacionais as várias disposições num futuro próximo, por meio de uma proposta legislativa, sobre a qual o CESE deseja ser consultado.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Cf. parecer do CESE sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Aperfeiçoar o mecanismo comunitário de protecção civil, relatora: SÁNCHEZ MIGUEL (em elaboração).

(2)  JO C 313 de 30/11/92, p. 25.

(3)  Para mais informações consulte http://www.agr.gc.ca/pcsra/main.html.

(4)  JO C 221 de 08.09.2005, p. 40.

(5)  Regulamento n.o 1254/1999, JO L 160 de 26/6/1999, p. 21.

(6)  COM(2005) 74 final.

(7)  JO C 255 de 14.10.2005, p. 44.

(8)  Regulamento n.o 26/1962, JO B030 de 20/4/1962, p. 993.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/25


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Conselho relativa ao estabelecimento de regras mínimas para a protecção dos frangos de carne»

COM(2005) 221 final — 2005/0099 (CNS)

(2006/C 28/05)

Em 13 de Junho de 2005, o Conselho decidiu, de acordo com o disposto no artigo 37.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos trabalhos correspondentes, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente emitiu parecer em 7 de Outubro de 2005. Foi relator Leif E. NIELSEN.

Na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro (sessão de 26 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 123 votos a favor, 3 votos contra e 2 abstenções o presente parecer.

1.   Introdução

1.1

A produção intensiva de frangos de carne implica problemas de bem-estar e de saúde para os animais. Segundo o Comité Científico da Saúde e do Bem-Estar dos Animais, a maior parte dos problemas ligados ao bem-estar deve-se à selecção de espécies apenas com base no seu nível de crescimento e nos índices de consumo, sem procurar melhorar a saúde e o bem-estar dos animais. A selecção genética provocou alterações das características metabólicas e comportamentais, levando a problemas nas pernas, ascite, síndroma da morte súbita e outras questões sanitárias. O Comité Científico constatou igualmente que os efeitos negativos de uma produção muito intensiva eram menores nos edifícios no interior dos quais era possível manter boas condições climáticas (1).

1.2

A UE dispõe apenas de normas gerais em matéria de protecção dos animais em explorações pecuárias (2). Alguns Estados-Membros têm, porém, disposições para a protecção dos frangos de carne, e há igualmente regimes voluntários de garantia da qualidade, os quais abrangem aspectos ligados ao bem-estar. De acordo com a Comissão, a adopção de normas mínimas comuns contribuiria para solucionar os problemas de bem-estar, criar condições de concorrência mais equitativas e melhorar o funcionamento do mercado interno. Por outro lado, a iniciativa da Comissão responde ao reconhecimento crescente por parte da sociedade civil da necessidade de normas adequadas de protecção dos animais e inscreve-se no Plano de Acção Europeu do Bem-Estar dos Animais que a Comissão está a preparar.

1.3

A Comissão propõe que a densidade de frangos por metro quadrado de zona utilizável («densidade animal») não exceda 30 quilogramas de peso vivo. Todavia, os Estados-Membros podem autorizar uma densidade animal não superior a 38 quilogramas de peso vivo em estabelecimentos ou unidades individuais de estabelecimentos, desde que o proprietário ou detentor respeite as exigências em matéria de inspecção, controlo e acompanhamento pelas autoridades competentes. Além disso, a proposta recomenda uma série de normas mínimas detalhadas aplicáveis a todos os estabelecimentos e respeitantes à inspecção, ao controlo, aos bebedouros, à alimentação, ao material de cama, ao ruído, à luz, à limpeza, à desinfecção, aos registos, às intervenções cirúrgicas, à formação e à orientação. Os estabelecimentos cuja densidade máxima seja superior a 30kg/m2 devem sujeitar-se a requisitos adicionais em matéria de notificação e documentação, concentração de NH3 e de CO2, temperatura e humidade, ventilação e aquecimento, assim como à avaliação de indicadores de bem-estar animal nas inspecções após abate e a procedimentos específicos em caso de incumprimento. A Comissão propõe ainda um procedimento de regulamentação destinado a garantir a aplicação uniforme e a adaptação permanente das disposições constantes dos Anexos com a colaboração do Comité Permanente da Cadeia Alimentar e da Saúde Animal.

1.4

Esta «abordagem integrada» para os estabelecimentos e as unidades individuais de estabelecimentos com elevada densidade animal assenta num maior fluxo de informação entre os produtores, as autoridades e os matadouros, com base em inspecções após o abate. A recolha de informações sobre os parâmetros de produção para fins comerciais e para controlar até que ponto a legislação em matéria de substâncias e alimentos e as normas de higiene são respeitadas (3) deve, no entender da Comissão, poder ser utilizada para melhorar as normas relativas ao bem-estar dos animais. A abordagem integrada está também na base das novas disposições em matéria de segurança alimentar e inspecções veterinárias (4).

1.5

A Comissão tenciona apresentar o mais tardar dois anos após a adopção da directiva, e com base na experiência adquirida com a aplicação de regimes voluntários de rotulagem, um relatório sobre a eventual introdução, a nível comunitário, de um regime específico, vinculativo e harmonizado de rotulagem da carne de frango e dos produtos à base de carne de frango, assente no respeito de normas de bem-estar animal, e analisar a compatibilidade desse regime com as regras da OMC. A Comissão pretende ainda apresentar um relatório e avançar, se necessário, propostas legislativas adequadas, com base em pareceres científicos, sobre a influência dos parâmetros genéticos nas deficiências detectadas que lesem o bem-estar dos frangos.

2.   Observações na generalidade

2.1

O bem-estar dos animais nos sistemas de produção intensiva tem sido, como sublinha a Comissão, alvo de atenção crescente por parte da opinião pública na UE. Um bom exemplo ressalta do inquérito de 2005 realizado pelo Eurobarómetro (5). O bem-estar dos animais deve pois ser considerado, juntamente com outros factores, um elemento do modelo social europeu, procurando mitigar o impacto negativo da liberalização do comércio e da intensificação da concorrência, quer no interior da UE quer no resto do mundo.

2.2

Não é legítimo assacar toda a responsabilidade pelos problemas de bem-estar dos animais a um só elo da cadeia de produção e comercialização dos frangos de carne na UE, que inclui a selecção genética em centros de criação concentrados internacionais, a criação de animais para reprodução, as incubadoras, os produtores, os matadouros, a comercialização e os consumidores. Além disso, em cada categoria há concepções divergentes sobre os problemas ligados ao bem-estar dos animais e sobre os aspectos económicos e da concorrência. Enquanto representante da sociedade civil, e graças à diversidade da sua composição, o CESE tem obviamente por missão colaborar na elevação das normas mínimas de bem-estar animal na UE a um nível razoável e aceitável.

2.3

O CESE louva a qualidade dos trabalhos preparatórios realizados pela Comissão e subscreve a sua abordagem. As disposições gerais, aplicáveis a todos os bandos, consistem em exigências baseadas num maior autocontrolo nos estabelecimentos e não apresentam, em geral, problemas de maior. O CESE também endossa os requisitos mais severos da abordagem integrada para os estabelecimentos de elevada densidade animal, que tomam o sistema de pontuação das lesões nas patas, o índice de mortalidade e outros indicadores de más condições de bem-estar animal como base para intervenções e melhorias das condições nos estabelecimentos.

2.4

A questão central é a densidade animal, cujas normas devem tomar como ponto de partida a melhor base científica disponível e assentar num equilíbrio entre os diferentes indicadores de condições fisiológicas, comportamento e saúde. À luz do relatório do Comité Científico, o CESE considera adequado e aceitável introduzir limites máximos de 30kg/m2 para os frangos em geral e de 38kg/m2 para os bandos de frangos em que os efeitos adversos da concentração são contrabalançados pelo cumprimento de normas específicas em matéria de condições climáticas no interior.

2.5

Ao mesmo tempo, importa reconhecer que a densidade animal é crucial para os custos de produção e para a competiti-vidade. Um estudo neerlandês de Março de 2005 revela que a densidade máxima proposta afectará praticamente todos os estabelecimentos do país. Após a dedução dos custos fixos e variáveis, um estabelecimento neerlandês típico de criação de frangos de carne ganha, em média, apenas 1,89 cêntimos por frango (6). Isto demonstra a reduzida margem de lucro destas explorações. Para manter os mesmos lucros com densidades máximas de 30 e 38kg/m2, o preço dos frangos de carne deverá, pois, aumentar de 8 e 2,5 cêntimos, respectivamente, o que do ponto de vista dos consumidores poderá parecer irrisório. Contudo, os representantes do sector a nível europeu sustentam que uma densidade máxima inferior a 42kg/m2 conduzirá inevitavelmente a uma redução gradual das vendas da UE quer no mercado europeu quer no países terceiros devido à concorrência dos principais exportadores não europeus.

2.6

Por isso, a exigência de níveis de densidade mais baixos na UE deve ser acompanhada da adaptação das regras internacionais de comércio, que imponham requisitos idênticos ou equivalentes às exportações de países fora da UE. O CESE reconhece a dificuldade de debater esta questão na actual ronda de negociações da OMC. Mas se a UE decidir adoptar um nível adequado e legítimo de protecção do bem-estar animal neste e noutros sectores, deve poder, como uma das principais forças comerciais do mundo, exigir a introdução de uma espécie de cláusula que assegure o respeito desse nível no plano internacional (7).

2.7

Como é óbvio, os países terceiros com vantagens comparativas e normas aceitáveis em matéria de bem-estar poderão potencialmente aumentar a sua parcela de mercado na UE, e devem, por isso, apoiar a adopção de normas internacionais. Seria porém inaceitável e incompreensível que um país terceiro com padrões menos elevados suplantasse a produção e os volumes de vendas da UE (quer no próprio mercado europeu quer no de outros países) devido às normas mais rigorosas da União ou que esta fosse desencorajada de elevar os seus padrões de protecção do bem-estar dos animais apenas porque essa protecção é insuficiente nos seus parceiros comerciais e por haver o risco de uma deslocalização da produção para esses países.

2.8

É pois necessário que a UE, com ou sem acordo prévio a nível internacional, exija que as importações de países não comunitários respeitem padrões equivalentes. Caso não haja acordo internacional, um certo grau de provocação pode revelar-se necessário para chamar a atenção e sensibilizar para a necessidade de alterar a legislação neste domínio. Em qualquer dos casos, a Comissão deve efectuar uma análise económica circunstanciada da situação concorrencial dois anos após a entrada em vigor da directiva nos Estados-Membros, a fim de avaliar a evolução da situação.

2.9

O Gabinete Internacional de Epizootias (GIE), instituição internacional votada à saúde animal, adoptou recentemente recomendações sobre alguns outros aspectos relacionados com o bem-estar dos animais, revelando uma crescente consciencialização a nível mundial para a necessidade de normas mínimas internacionais. As recomendações do GIE baseiam-se nas conclusões de uma conferência realizada em 2004 que proporcionou um diálogo construtivo entre instituições, cientistas, grupos de interessados e ONG de todo o mundo, incluindo de vários países em desenvolvimento. A conferência frisou a urgência de definir padrões internacionais de bem-estar animal baseados em dados científicos. No entender do CESE, a OMC deve assumir esta tarefa para que as normas mínimas definidas sob a égide do GIE passem a ser aplicáveis no âmbito da OMC.

2.10

Tendo em conta as experiências negativas até à data, como a não aplicação das regras ou a imposição de regras mais severas levando a distorções da concorrência, os representantes do sector a nível da UE consideram que as regras em apreço deveriam ser adoptadas sob a forma de um regulamento. O CESE, posto que reconheça as vantagens de um regulamento, observa que os Estados-Membros preferem as directivas, que permitem a adaptação das regras a transpor ao contexto nacional. Uma directiva também parece adequar-se mais à execução da proposta abordagem integrada, e uma regulamentação demasiado uniforme dos aspectos técnicos dos métodos de produção careceria da necessária flexibilidade quanto aos sistemas a utilizar e poderia mesmo obstar ao progresso técnico destinado a desenvolver métodos de produção mais eficazes e compatíveis com o bem-estar animal. Importa, no entanto, que a Comissão tenha bem presente que o incumprimento das normas ou sua aplicação insatisfatória não podem ser tolerados.

2.11

Não deixa de ser contraditório que a Comissão justifique a sua proposta e a necessidade de normas comuns com as distorções de concorrência que derivam das disparidades entre as legislações nacionais, mas que a proposta abra ao mesmo tempo a possibilidade aos Estados-Membros de adoptarem regras nacionais mais severas. A existências de normas comuns europeias é imprescindível para que a UE possa pugnar pela adopção de normas comuns internacionais. No que toca ao incumprimento das directivas pelos Estados-Membros, a Comissão deverá de futuro assumir efectivamente a tarefa que lhe é imposta pelo Tratado e velar pela aplicação correcta das regras dentro dos prazos que os próprios Estados-Membros contribuíram para determinar.

2.12

O CESE apoia plenamente de regimes voluntários de mais longo alcance sob a forma de códigos de conduta e recomenda a sua substituição por uma regulamentação comum europeia na mesma linha da existente para os produtos ecológicos. Isso daria aos consumidores a oportunidade de escolher por si próprios e seria o mercado a mostrar até que ponto há interesse em elevar os padrões de bem-estar dos animais acima dos requisitos mínimos em vigor. O CESE preconiza igualmente um sistema obrigatório de rotulagem, na medida em que isso seja compatível com as regras da OMC. Escusado será dizer que toda a actual legislação comunitária deve ser respeitada, independentemente da necessidade de rotulagem. Seria igualmente de considerar uma referência à forma de produção para os frangos embalados, à semelhança do que sucede com as embalagens de ovos.

2.13

Como anunciado, a Comissão deverá apresentar um relatório baseado em novos dados científicos, tendo em conta a investigação recente e a experiência na prática, com vista a melhorar ainda mais o bem-estar dos frangos de carne e estudar a influência dos parâmetros genéticos nas deficiências detectadas. Mas a proposta deveria ter em conta as consequências da selecção genética já desde este momento, e reconhecer a necessidade de definir regras sobre as condições para os animais reprodutores. O trabalho sobre esses aspectos deve começar sem demora, para ser revisto posteriormente à luz dos dados obtidos com o abate. De outro modo, a Comissão só poderá começar a analisar estes aspectos cinco anos após a entrada em vigor da directiva, quando esses dados estiverem disponíveis.

2.14

O CESE reconhece que a investigação é um processo longo, e que as regras em vigor devem ser adaptadas aos novos conhecimentos e ao progresso técnico. Ao mesmo tempo, os esforços neste e noutros domínio devem ser redobrados por forma a obter melhores conhecimentos e a colmatar as lacunas existentes. É o caso, por exemplo, da relação entre a densidade animal e as condições climáticas e ambientais (8). A segurança biológica também deveria receber maior atenção, atendendo aos elos estreitos entre a saúde dos animais, o bem-estar e o ambiente, nomeadamente no caso da gripe aviária (9).

3.   Observações na especialidade

3.1

Independentemente dos sistemas de produção, dos níveis de densidade animal e das soluções técnicas, etc., o maneio, a gestão e as boas práticas agrícolas são cruciais para o bem-estar e a saúde dos animais. Estas condições e a respectiva importância no contacto diário e no tratamento dos animais não podem, pela sua natureza, ser impostas por legislação e pelo controlo. Por esse motivo, as disposições da proposta no que toca a instruções, orientação, cursos, formação e inspecções duas vezes por dia são de uma importância evidente. Não obstante, o CESE julga preocupante a ausência de requisitos em matéria de competências e o facto de a formação poder ser substituída por experiência em qualquer outro domínio.

3.2

Importa assegurar que as avaliações do bem-estar dos animais sejam independentes e levadas a cabo por inspectores com formação e experiência suficientes no domínio, e que os relatórios escritos sejam redigidos de maneira uniforme em toda a UE.

3.3

No interesse da transparência, deveria ser explicitado que os estabelecimentos de baixa densidade animal só serão inspeccionados no âmbito do «pacote higiene». Para todos os estabelecimentos a partir de determinadas dimensões deveriam igualmente ser requeridos projectos de formação reconhecidos e períodos de formação documentados.

3.4

Os limites máximos para as concentrações de NH3 e CO2 devem ser definidos de forma a que não possam ser excedidos em condições normais. Não seria possível ultrapassar esses limites, em sistemas de produção ideais, mesmo em caso de condições climáticas atípicas.

3.5

De acordo com a proposta, «todos os edifícios devem dispor de iluminação com uma intensidade mínima de 20 lux durante os períodos de iluminação»e «a iluminação deve seguir um ritmo de 24 horas e incluir períodos de escuridão de, pelo menos, oito horas no total com, pelo menos, um período ininterrupto de escuridão de, no mínimo, quatro horas». Esta disposição é conforme à recomendação do Conselho da Europa (10). Os representantes do sector entendem, porém, com base em relatórios científicos e na prática, que é suficiente um mínimo de 15 lux durante os primeiros catorze dias, seguido de um mínimo de 5 lux e de um período ininterrupto de quatro horas de escuridão. Os produtores afirmam que as experiências com uma luminosidade mais intensa e períodos de escuridão mais prolongados levam a ocorrências mais numerosas de pododermatites e à rejeição dos animais por lesões cutâneas. O CESE entende que é necessário um equilíbrio entre diferentes considerações e que as soluções devem basear-se nos dados científicos mais pertinentes e na experiência prática. Em caso de incerteza ou de ausência de dados relevantes, devem ser realizados novos estudos, a fim de que as disposições em vigor se conformem sempre aos melhores dados disponíveis.

3.6

Nos estabelecimentos de maior densidade populacional, a proposta prevê a possibilidade de intervir caso a taxa de mortalidade exceda 1 % mais 0,06 % multiplicados pela idade de abate do bando em dias, ou seja, cerca de 3,5 %. Os produtores julgam mais adequado um limite máximo de 0,12 % de mortalidade por dia e defendem que, por não haver relação entre o bem-estar e a mortalidade nos primeiros sete dias, os limites poderiam, se necessário, ser elevados a 1,5 %. No entender do CESE, os limites neste caso e noutros devem ser definidos a um nível que reflicta as possibilidades práticas num estabelecimento em bom funcionamento. Deveria contemplar-se, nos estabelecimentos em que se registam problemas graves, a substituição dos registos da taxa de mortalidade e das pododermatites por registos, p. ex., das lesões nas patas e de peritonites.

3.7

A Comissão deveria apresentar descrições pormenorizadas por escrito, acompanhadas de fotografias de pododermatites nos diferentes grupos, para uniformizar as classificações.

4.   Conclusão

4.1

O CESE apoia, sem prejuízo das observações precedentes, a abordagem desta matéria pela Comissão e as disposições específicas da proposta. Os limites para a intensidade da luz, as concentrações máximas de NH3 e de CO2, de mortalidade e de lesões nas patas devem ser definidos de forma a reflectir as possibilidades reais de um estabelecimento em bom funcionamento.

4.2

Qualquer redução dos níveis actuais de densidade animal deve ser acompanhada da introdução de uma cláusula de bem-estar nas regras comerciais internacionais que permita à UE impor requisitos equivalentes às importações de países não comunitários, de forma a que as condições insatisfatórias nos principais países exportadores não entravem a adopção de padrões adequados na UE. Caso não haja acordo internacional, a UE deverá intervir unilateralmente para chamar a atenção e sensibilizar para a necessidade de alterar a legislação neste domínio. Caso contrário, uma grande parte da produção será transferida para países com condições de produção menos severas. Ao mesmo tempo, a Comissão deveria efectuar uma análise económica pormenorizada da evolução registada dois anos após a entrada em vigor da directiva.

4.3

A investigação deve ser um processo longo, e as regras em vigor devem ser adaptadas aos novos conhecimentos e ao progresso técnico. Ao mesmo tempo, há que redobrar os esforços de investigação por forma a obter melhores conhecimentos e a colmatar as lacunas existentes.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  The Welfare of Chickens Kept for Meat Production (Broilers) – Relatório de 21 de Março de 2000.

(2)  Directiva 98/58/CE, JO L 221 de 8 de Agosto de 1998, p. 23 (a directiva foi elaborada com base na Convenção Europeia relativa à protecção dos animais nos locais de criação, que inclui uma referência às aves, a qual por sua vez contém disposições complementares sobre a carne de aves de criação).

(3)  Regulamento (CE) n.o 882/2004, JO L 165, de 30 de Abril de 2004, p. 1. versão rectificada (JO L 191 de 28/5/2004, p. 1).

(4)  Regulamento (CE) n.o 882/2004, JO L 165, de 30 de Abril de 2004, p. 1.

(5)  Eurobarómetro, Junho de 2005: Atitudes dos consumidores quanto ao bem-estar dos animais em explorações.

(6)  Consequências económicas da redução da densidade dos frangos de carne, Ir. P. van Horne, LEI (Instituto de Economia Agrícola), Universidade e Centro de Investigação de Wageningen, Março de 2005.

(7)  Este tema é tratado na comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento sobre a legislação em matéria de bem-estar dos animais de exploração nos países terceiros e implicações para a UE (COM(2002) 626 final, de 18 de Novembro de 2002).

(8)  Entre as publicações científicas mais recentes podem citar-se: «Chicken welfare is influenced more by housing conditions than by stocking density», in NATURE, vol. 427 de 22 de Janeiro de 2004 (www.nature.com).

(9)  Cf. proposta da Comissão COM(2005) 171 de 28 de Abril de 2005 e o parecer do CESE de 28 de Setembro de 2005 sobre a luta contra a gripe aviária.

(10)  Artigo 14.o da Recomendação do Conselho da Europa de 1995, a qual, em conformidade com a Convenção, foi adoptada unanimemente pelos cerca de 40 países membros.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/29


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que institui para o período de 2007-2013 o programa “Cidadãos pela Europa”, destinado a promover a cidadania europeia activa»

COM(2005) 116 final — 2005/0041 (COD)

(2006/C 28/06)

Em 11 de Maio de 2005, o Conselho decidiu, nos termos dos artigos 151.o, 305.o e 251.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, incumbida de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 5 de Outubro de 2005, sendo relator D. LE SCORNET.

Na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 125 votos a favor e 6 abstenções, o presente parecer:

1.   Introdução

1.1

O presente programa pretende fomentar a cooperação entre cidadãos e organizações cívicas de diversos países, de modo a encontrarem-se, agirem em conjunto e desenvolverem as suas próprias ideias num contexto europeu que transcenda uma perspectiva nacional e respeite a sua diversidade. A compreensão mútua, a solidariedade e o sentimento de pertença à Europa são pedras basilares para o envolvimento dos cidadãos.

1.2

Garante a continuidade do programa de participação cívica vigente e, simultaneamente, abre caminho a novas actividades, introduzindo para isso uma margem de flexibilidade que lhe permite adaptar-se a evoluções futuras.

1.3

O objectivo geral do programa proposto é, retomando os termos da proposta, contribuir para:

dar aos cidadãos a oportunidade de interagir e participar na construção de uma Europa cada vez mais próxima, unida e enriquecida pela sua diversidade cultural;

criar uma identidade europeia, baseada em valores, na história e na cultura comuns reconhecidos;

fomentar a compreensão mútua entre cidadãos europeus, respeitando e celebrando a diversidade cultural, contribuindo do mesmo passo para o diálogo intercultural.

1.4

Atendendo à situação actual e às necessidades identificadas, os objectivos específicos mais adequados, que devem ser cumpridos numa base transnacional, são:

congregar os membros de comunidades locais de toda a Europa para partilhar e trocar experiências, opiniões e valores, aprender com os ensinamentos da história e preparar o futuro;

fomentar acções, debates e reflexões relacionados com a cidadania europeia através da cooperação a nível europeu entre organizações da sociedade civil;

tornar a ideia da Europa mais concreta para os seus cidadãos mediante a promoção e a celebração dos valores e realizações europeus, a par da preservação da memória do seu passado;

incentivar uma integração equilibrada dos cidadãos e das organizações da sociedade civil de todos os Estados-Membros, concorrendo para o diálogo intercultural e fazendo sobressair a diversidade e unidade da Europa, com especial atenção às actividades nas quais se envolvam Estados-Membros que aderiram recentemente à União Europeia.

1.5

Prevê-se três tipos de acção para a concretização dos objectivos supra: Acção 1: «Cidadãos activos para a Europa» (geminação de cidades, projectos cívicos e medidas de apoio); Acção 2: «Sociedade civil activa na Europa» (apoio estrutural a organizações de investigação sobre a política pública europeia (grupos de reflexão), apoio estrutural a organizações da sociedade civil a nível europeu, apoio a projectos lançados por organizações da sociedade civil); Acção 3: «Todos juntos pela Europa» (eventos de grande destaque, estudos, instrumentos de informação e difusão).

2.   Contexto

2.1

A Comissão propõe o fomento da cidadania europeia como uma prioridade de topo para a acção da UE (1). Esta «priorização essencial» surge aos olhos do CESE não apenas como justa, mas também como urgente — até mesmo decisiva — para a prossecução da construção europeia. A fraca taxa de participação nas últimas eleições do Parlamento Europeu, sublinhada pela exposição de motivos do programa, não é o único indicador desta urgência. As transformações da ratificação do Tratado constitucional europeu provam que o fraco envolvimento e participação dos cidadãos europeus no processo de construção da União resulta na desconfiança quanto às suas instituições e pode levar mesmo a atitudes de rejeição.

2.2

Esta situação é comum (em graus obviamente diferentes) a todos os Estados-Membros e afecta ou afectará os países candidatos. Deste ponto de vista, é positivo que o programa se dirija a todos em pé de igualdade.

2.3

Isto porque apesar de não se manifestar de forma idêntica em todos os países aderentes (nomeadamente devido à diversidade das formas de ratificação escolhidas em cada país), apesar de não poder, por conseguinte, ser observada com a mesma intensidade em todo os países, esta situação de difícil adaptação cultural a uma realidade europeia já existente parece contudo estar presente, em graus distintos, em todos os Estados-Membros.

2.4

Mesmo quando há debate europeu — por vezes bastante intenso, o que é inédito nomeadamente nos países que quiseram ou puderam recorrer ao referendo para a ratificação do tratado constitucional europeu — esse debate foca mais a identidade e a cidadania nacionais (e a sua preservação, de uma forma muitas vezes defensiva, ou mesmo «nacionalista») do que a realidade do acervo, dos desenvolvimentos propostos pelo tratado constitucional, nomeadamente em termos de políticas sociais (tema visto, justamente, como indicador central de cidadania) e políticas democráticas («minado» pelo preconceito quase geral, e todavia infundado, de uma Europa ademocrática, tecnocrática, que afasta o cidadão da participação na decisão de forma quase voluntária).

2.5

Apesar de dizer respeito ao período 2007-2013, situando-se após a data em que todos os Estados-Membros já terão, de uma forma ou outra, procedido ou não à ratificação do TCE, o programa proposto, o seu debate e aprovação no contexto actual não poderão deixar de ter repercussões imediatas na questão central da cidadania europeia, tal como se apresenta «aqui e agora». O programa referente ao período 2007-2013 permanece demasiado mimético em relação à decisão do Conselho de 2004 (2). Foi dotado de poucos meios e os métodos que valoriza, apesar de já serem comprovados, não são suficientemente inovadores para os desafios que se apresentam actualmente, de forma ainda mais clara. Sobretudo porque é presentemente que o problema existe e porque as crianças que nascerem agora terão 8 anos em 2013 e os seus esquemas mentais de futuros cidadãos já estarão parcialmente formados.

2.6

O CESE crê que o contexto actual e o debate nesse contexto sobre um novo programa «cidadãos para a Europa» para 2007-2013 são, paradoxalmente, extremamente favoráveis a, finalmente, colocar em destaque a questão da cidadania europeia. Para sair um pouco do discurso já instituído sobre a unidade na diversidade, visto que, se não forem tomadas precauções, corre-se o risco de só destacar a diversidade ou a heterogeneidade. Por conseguinte, aprova a proposta de prolongar o programa 2004-2006, sem aguardar o relatório de avaliação externa previsto para até ao final de 2006 (avaliação que deve manter-se). Enquanto CESE, pretende ser um interveniente de destaque, sintetizador da importância atribuída a este programa. Considera que um programa como este deve garantir a continuidade do programa de participação cívica em curso. Todavia, concorda com as críticas severas do Parlamento e certas organizações da sociedade civil no que toca à falta de ambição do programa de participação cívica vigente. As suas propostas visam portanto, garantir que o programa 2007-2013 não seja apenas uma adaptação do programa vigente.

2.7

É óbvio que, tendo em conta o seu modesto orçamento, o presente programa não abrange toda a problemática da cidadania europeia, contrariamente ao que poderia fazer pensar a multiplicidade dos seus objectivos e medidas abrangidas. A «cidadania europeia activa» é, porém, uma peça essencial, que se define como a capacidade dos cidadãos se organizarem de forma autónoma para exercerem poderes e responsabilidades nas políticas públicas, com vista a garantir a defesa e o desenvolvimento dos bens comuns (3). Por conseguinte, o CESE insiste para que o orçamento outorgado (235 milhões de euros para 7 anos!) seja religiosamente mantido, independentemente das conclusões finais do debate sobre as perspectivas financeiras da União Europeia.

2.8

Se o contexto exige um salto qualitativo, o programa permiti-lo-á. Deste ponto de vista, o CESE gostaria que fosse realizado um estudo sobre o actual sentimento de pertença do cidadão em relação à União Europeia — ou, pelo menos, que se acelere a mutualização dos estudos já disponíveis, permitindo um diagnóstico suficientemente apurado.

2.9

O CESE considera que «a atitude distanciada das instituições europeias e as dificuldades em se situar no processo de integração europeia (4)» resulta paradoxalmente — além dos desconhecimentos e incompreensões reais da «mecânica» comunitária e da sua lógica própria, além das inegáveis atitudes nacionalistas e proteccionistas relacionadas com os diferentes riscos e receios objectivos e subjectivos gerados pelo processo de globalização — da falta de reconhecimento da cidadania europeia tal como existe actualmente, em particular das suas formas mais activas e organizadas.

2.10

Deste ponto de vista, poder-se-á argumentar que as aproximações consideráveis, mobilidades de todo o tipo (apesar de muito aquém das possibilidades abertas pela integração europeia), eliminação física e material das fronteiras, moeda comum, mercado único, não são mencionados o suficiente: «a identidade comum dos europeus não é compreendida porque não é verbalizada» (5). Esta ideia parece mais manifesta se virmos a Europa do exterior, quando viajamos ou quando vivemos fora da Europa: em todo o lado se identifica e se sente atracção por um verdadeiro «european way of life».

2.11

Os actuais conflitos de identidade nacionais não devem fazer esquecer o já elevado nível de coerência e qualidade do modo de vida europeu, das suas formas democráticas e participativas. Um programa de «cidadania europeia activa» mais ambicioso pode reduzir, acalmar, transformar esses conflitos.

2.12

Em todo o caso, sejam quais forem as dificuldades ou impasses momentâneos que possam nascer dos debates actuais sobre a ratificação do tratado constitucional, o CESE crê que o período que se seguirá, forçosamente agitado para a construção europeia, será um contexto bastante favorável à problemática da cidadania europeia activa. Considera ainda que o programa 2007-2013 respectivo deve ser visto — e se possível aprofundado — como algo em prol de um contexto onde os cidadãos voltam a interessar-se pela Europa — independentemente da sua posição — pela sua capacidade de intervir directamente e através das suas organizações voluntárias, bem como pelas decisões europeias.

2.13

Por conseguinte, o CESE propõe a realização de um simpósio que permita abordar a globalidade da problemática da cidadania europeia neste novo contexto, pensar de facto sobre a profundidade do conceito e não apenas lançar respostas numa variedade de programas distintos, insuficientemente claros e operacionais. O CESE poderia organizar o simpósio supra. O CESE congratula-se com a reacção positiva da Comissão a esta iniciativa (6).

3.   Observações na generalidade

3.1

O CESE, instituição europeia da sociedade civil organizada, inscrita nos tratados nos mesmos termos que as outras instituições europeias, congratula-se com o facto de ser consultado sobre o programa supra — o que, formalmente, não é obrigatório. Todavia, considera que a proposta apresentada ao Conselho da União Europeia e ao Parlamento Europeu teria ganho ainda mais a montante. O programa foi objecto de uma importante consulta em linha, realizada entre Dezembro de 2004 e Fevereiro de 2005 (com mil respostas) e de um fórum consultivo (que reuniu 350 participantes) em 3 e 4 de Fevereiro de 2005. Contudo, apostar à partida num papel consultivo mais forte do Comité Económico e Social, e não apenas «para pareceres ex poste», seria uma forma de lutar contra as múltiplas causas de afastamento sentidas pelos cidadãos europeus face às suas capacidades concretas, individuais e organizadas, influenciando de facto as decisões da União.

3.2

O CESE lamenta que o programa, que refere a identificação pela Comissão de três tipos de resposta ao problema da atitude distante dos cidadãos em relação às instituições europeias, não permita situar novamente o referido programa na globalidade da problemática. O CESE gostaria que as respostas fossem especificadas segundo os temas e sugere que estes três tipos de respostas sejam igualmente reunidos num programa chapéu. Este permitiria englobar todos os elementos da problemática, trabalhar sobre os seus objectivos comuns, coerências e complementaridades.

3.3

A informação dos cidadãos sobre as instituições europeias, a comunicação sobre as questões europeias, a consciência dos direitos conferidos pela cidadania europeia e o sentimento de pertença, a identidade europeia, formam um todo. O programa apresentado pela Comissão menciona a complementaridade com outros programas e instrumentos da Comunidade; permanece, todavia, vago quanto a esta questão essencial e não refere as modalidades que permitiriam garantir a coerência dos objectivos e das acções. Uma abordagem que não foque de forma equilibrada as três vertentes, dificilmente inverterá a péssima situação actual em termos de sentimento de pertença e identidade europeia.

3.4

O CESE gostaria de estar certo de que, mesmo durante o presente programa, será organizado paralelamente um impulso vigoroso em termos de informação e comunicação sobre as instituições e os direitos dos cidadãos europeus. Este impulso deve incluir informação sobre a existência e o papel do próprio CESE, muito pouco valorizado na comunicação europeia pelas outras instituições europeias. O CESE também deveria repensar radicalmente a sua comunicação, muito aquém do papel que pretende desempenhar na emergência de uma cidadania europeia activa, enquanto instituição privilegiada da mesma.

3.5

Aparentemente, determinando o distanciamento do cidadão em relação às instituições europeias e a sua dificuldade em situar-se no processo de integração europeia, o programa apresentado não parece analisar todas as suas consequências. Tal acontece, nomeadamente, devido aos termos e fórmulas a que recorre, sabendo a priori que até a forma como se menciona esta crise de identificação, de participação, pode desempenhar um papel importante na capacidade de a ultrapassar. Da mesma forma, parece pouco credível apresentar um programa (dotado de um orçamento tão modesto, tendo em conta a dimensão do desafio) enquanto vector que permitirá «reservar um lugar central para os cidadãos» na construção europeia. Quem acreditará no programa? Igualmente, mais uma vez tendo em conta o nível do desafio (bem diagnosticado na exposição de motivos do programa), é difícil perceber, além das novidades consideráveis (plurianualização dos projectos, partilha de experiências, aumento do número de parceiros, alívio dos encargos dos beneficiários, apoio a manifestações de grande dimensão, nomeadamente no contexto do diálogo intercultural), quais as principais inovações que podem contribuir para alterar realmente a situação actual.

3.6

A impressão geral é a de uma continuidade excessiva em relação ao programa 2004-2006. O apoio estrutural novamente concedido a um certo número de organizações, nomeadamente as identificadas pelo programa como visando um objectivo a priori de interesse geral europeu, deveria ser eliminado e substituído por um processo aberto de acesso aos fundos, com base em critérios claros e transparentes. A própria noção de «interesse geral europeu» deveria ser precisada para poder tornar-se operacional.

3.7

O CESE está perfeitamente consciente de que o programa é particularmente dirigido às associações e ONG que não beneficiem como outras organizações da sociedade civil, nomeadamente parceiros sociais, do acesso a outros programas e modalidades que lhes permitam contribuir para a expansão de uma cidadania europeia activa.

Todavia, com o objectivo de identificar correctamente a vontade expressa dos parceiros sociais, organizações da sociedade civil, mutuais e cooperativas, de participar especificamente e de forma visível nesta expansão, o programa deve ser aberto de forma formal e prática a todos os supracitados. Isto sem prejuízo de que, em troca, noutras rubricas orçamentais, os parceiros sociais zelem por uma cooperação mais estreita com as associações e as ONG.

3.8

O CESE reitera, como já fez várias vezes, a urgência de definir uma cidadania europeia aberta, dotada de direitos próprios, acessível a todas as pessoas que residam de forma estável, ou já há algum tempo na União Europeia (7). A inclusão no Tratado Constitucional Europeu da Carta dos Direitos Fundamentais e a adesão da União Europeia à Convenção Europeia de salvaguarda dos direitos humanos e liberdades fundamentais supõem o reconhecimento de uma cidadania «cívica» relativamente independente da cidadania europeia, actualmente conferida apenas pela cidadania nacional dos Estados-Membros. Este primeiro passo rumo a uma cidadania participativa para todos os que residam de uma forma estável no território da União Europeia deveria ser «legalizado», se pretendemos de facto construir uma identidade, uma cidadania europeia própria, se pretendemos de facto que esta cidadania não se limite à sobreposição de uma cidadania europeia abstracta à cidadania nacional dos Estados-Membros.

3.9

Do ponto de vista do CESE, permanece e permanecerá difícil avançar realmente neste domínio essencial se não ocorrer a maturação progressiva de suportes materiais concretos da cidadania europeia, não limitados aos cidadãos nacionais, sem que um certo número de deveres seja associado aos direitos conferidos pela cidadania europeia única, unificadora. Por conseguinte, a não utilização de um instrumento legislativo para promover a participação dos cidadãos é compreensível na ausência de apoios materiais específicos à cidadania europeia, porém, é discutível se houver uma orientação, apesar de progressiva, para a aplicação de direitos e deveres especificamente associados a esta cidadania. O CESE considera necessário avançar nestes domínios, independentemente dos apoios materiais e simbólicos escolhidos, por exemplo: além da criação de um serviço civil europeu para a juventude já proposto pela Comissão, o contributo pessoal para uma parte, mesmo se mínima, dos recursos europeus — apesar de se tratar de um assunto difícil — e/ ou eleição, no mesmo dia, em todos os países, de representantes do povo, escrutínios que envolvam todos os países da União.

4.   Observações na especialidade sobre as acções do programa

4.1   Acção 1: Cidadãos activos pela Europa

O CESE está obviamente atento e favorável ao incentivo à geminação de cidades, na medida em que contribui para o conhecimento mútuo e a mobilidade dos cidadãos na Europa (que, há que reconhecer, é bastante reduzida). O fomento de experiências originais de participação a nível local e o seu intercâmbio no quadro da geminação, deveria ser uma das prioridades deste tipo de acção. No atinente aos projectos cívicos, o carácter extremamente vago do texto a este respeito dificulta a compreensão das suas potencialidades. Por último, podemos interrogarmo-nos sobre o facto de 40 % de um orçamento já muito limitado ser consagrado a acções do tipo 1 (nomeadamente à geminação de cidades), enquanto este instrumento parece ser o mais adaptado para alcançar os objectivos do programa. Sobretudo visto que este programa favorece pouco as inovações em curso neste domínio, nomeadamente a geminação «a três pilares», que junta duas colectividades territoriais europeias num acordo para construir desenvolvimentos sustentáveis com outras colectividades do planeta. Contudo, estas inovações marcam uma abertura ao mundo que pode ser considerada uma das características da cidadania europeia, nomeadamente para e pela juventude. Em todo o caso, seja qual for o tipo de geminação, é importante dar a conhecer aos cidadãos o apoio directo da União Europeia a este tipo de promoção da cidadania activa, apoio que os interessados desconhecem.

4.2   Acção 2: Sociedade civil activa na Europa

4.2.1

O CESE considera que esta parte do programa poderia ser claramente valorizada. Encontros e acções conjuntas a nível transnacional são a própria base da cidadania europeia. O CESE considera que a possibilidade de resolver definitivamente a questão dos estatutos da Associação Europeia, da Mutualidade Europeia enquanto fundações europeias, apesar de não depender deste programa específico, deveria acompanhá-la com vista a valorizar a solidariedade e a acção mútua, nomeadamente num quadro voluntário.

4.2.2

Do ponto de vista do CESE e de acordo com o programa, o reforço das redes europeias constitui um elemento decisivo. Todavia, o CESE insiste de novo sobre o facto de todas as redes europeias deverem dispor das mesmas possibilidades de acesso a estes apoios estruturais, sem que algumas organizações sejam financiadas a priori, mesmo se a Comissão controlar que não se trata de um «bilhete automático», mas sim de projectos avaliáveis. O financiamento de projectos, mesmo os pequenos, é fundamental, uma vez que permite às organizações nacionais ou locais em contacto directo com os cidadãos adquirir uma dimensão europeia e contribuir para eliminar a distância entre cidadãos e instituições europeias. O CESE congratula-se com o facto de o programa permitir, subsidiando pequenos projectos, a emergência de iniciativas transnacionais a partir de redes nacionais, apesar de estas não incluírem a totalidade dos Estados-Membros.

4.2.3

São motivos de extrema preocupação para o CESE as proposta da Comissão que, tal como a da DG Justiça, Liberdade e Segurança (8), contribuem, em nome da segurança e da luta contra o terrorismo, para lançar suspeitas gerais sobre as ONG e as associações, na medida em que, por natureza, poderão estar sujeitas à infiltração de tais fenómenos, a fazer com que, através de procedimentos burocráticos pesados, o ónus da prova na matéria seja das associações. A concretizar-se um procedimento semelhante, estaria a seguir-se precisamente na direcção oposta à do presente programa, do ponto de vista material e conceptual.

4.2.4

O CESE considera que, em acordo com o Parlamento Europeu, deveria ser confiada ao Comité das Regiões e ao próprio CESE a responsabilidade de coordenar a consulta das organizações sociais e das colectividades locais, a responsabilidade de sintetizar a sua opinião e assegurar a transmissão às outras instituições comunitárias e de garantir a difusão correcta da informação a montante das mesmas. O Parlamento Europeu deveria igualmente consultar regular e formalmente o CESE e o CR a este respeito.

4.2.5

O objectivo de uma parceria formal (9) e não esporádica, com base na igualdade na diversidade de funções entre o Parlamento e a sociedade civil organizada, estruturada pelas instituições europeias torna-se decisivo, apesar de, até ao momento, estar longe de realizado e mesmo pensado. O programa para a cidadania europeia activa deveria empenhar-se em eliminar qualquer vestígio de uma visão hierarquizada das instâncias europeias, da cultura europeia enquanto cultura da partilha dos poderes e das funções.

4.3   Acção 3: Juntos pela Europa

4.3.1

Na opinião do CESE o objectivo principal deste programa deveria ser a focalização no diálogo intercultural intra-europeu. O debate em curso sobre o TCE demonstra que foram subestimados o desconhecimento das diferenças culturais intra-europeias, a grande inércia dos estereótipos, o carácter por vezes antitético das principais fontes, nomeadamente de direito e constituição, que determinam o imaginário de cada Estado-Membro. Tal como foram subestimadas as convergências de modos de vida, de valores, de representação do mundo, a garantia de que um «homo europeus» distingue claramente, em termos de cidadania, o europeu de qualquer outro cidadão do planeta. Este «homo europeus» é fruto da execução concreta do património espiritual e moral da União, que se baseia nos valores indivisíveis e universais da dignidade do ser humano, da liberdade, da igualdade e da solidariedade; assenta no princípios da democracia e do Estado de direito. Ao instituir a cidadania da União e ao criar um espaço de liberdade, segurança e justiça, coloca o ser humano no cerne da sua acção. Por conseguinte, devem ser intensamente promovidos eventos de grande visibilidade, instrumentos de informação e difusão e estudos que formalizem não apenas as diversidades reais (e não as diferenças estereotipadas), mas também, e sobretudo, o «european way of life». A cultura europeia não assenta apenas nos valores herdados, mas também nos valores resultantes da construção da própria União Europeia, do seu mercado único, da sua moeda comum, da reunificação da Europa com ela própria (alargamento aos países do leste da Europa). Todavia, para que estes eventos de grande visibilidade contribuam para o sentimento de pertença e reforcem efectivamente a identidade europeia, é fundamental que os cidadãos e as suas organizações se associem estreitamente à sua idealização e realização ou, de preferência, que estejam na sua origem, visto serem quem melhor identifica os elementos essenciais e os símbolos de um identidade que já vivem no quotidiano.

4.3.2

Tendo em conta as suas próprias competências, o CESE considera que o seu contributo para a promoção da dimensão social da cultura com vista à organização de uma parceria perene, com meios, com o Parlamento Europeu neste domínio, constitui uma condição essencial para a identificação e formação contínua de uma identidade cultural comum do cidadão europeu. Esta identidade cultural não pode ser obtida apenas através da preservação de uma herança cultural muitas vezes menos comum do que gostamos de reconhecer. A cidadania europeia comum tem uma forte dimensão contemporânea. Constrói-se pela decisão de unir cada vez mais Estados europeus, de toda a Europa, através da difícil mas essencial tarefa da partilha das soberanias. Como disse Claude LÉVI-STRAUSS, «vivi uma época em que a identidade nacional era o único princípio concebível nas relações entre Estados. São conhecidos os desastres que daí resultam.». Uma cultura de soberanias partilhadas — e não de abandono da soberania– esta é a cultura e a identidade do cidadão europeu de hoje, e ainda mais de amanhã.

5.   Conclusões e propostas

5.1

A cidadania europeia está no centro da crise que acaba de surgir na sequência da rejeição do Tratado constitucional europeu por certos países. Por conseguinte, a aproximação dos cidadãos e das instituições da União deve, mais do que nunca, estar no centro das preocupações e da política da Comissão, nomeadamente devido à promoção da cidadania europeia activa. Nesse sentido, há que organizar uma reflexão profunda sobre este tema, envolvendo todos os intervenientes do sector antes da aprovação do novo programa para 2007-2013.

Esta reflexão poderia ser organizada no quadro do simpósio definido no ponto 2.11 do presente parecer, de cujos trabalhos o CESE poderia ser incumbido.

5.2

Este simpósio deveria deliberar abertamente sobre a cidadania europeia activa, definindo direitos e responsabilidades dos cidadãos europeus distintos dos conferidos pela cidadania de cada Estado-Membro.

A definição e a experimentação de direitos económicos, sociais, políticos, e ambientais próprios à cidadania europeia activa, nomeadamente em matéria de solidariedade e de segurança (pode pensar-se de imediato em segurança civil) deveriam poder ser analisados e submetidos a um escrutínio europeu único por sufrágio universal.

5.3

O CESE considera que a concretização do estatuto europeu da Associação constitui, neste momento e apesar das reais dificuldades para lá chegar, uma obrigação imperiosa se pretendemos dotar a cidadania europeia activa de um quadro apropriado que vá além de um simples e discutível código de boa conduta «de segurança».

5.4

Em todo o caso, seja qual for o resultado das negociações sobre o orçamento europeu, o CESE apela para que o orçamento do programa seja religiosamente mantido, uma vez que representa a dotação mínima a favor de um elemento chave do desenvolvimento da cidadania europeia que a Comissão considerou, justamente, «prioridade essencial» da acção da União. O CESE propõe ainda que não se mantenha o orçamento anunciado de 0,55€ por habitante por 6 anos, mas que se cultivem sinergias entre as diferentes DG da Comissão para reunir objectivos e meios sobre este dossier que diz respeito a todas as instituições europeias pela sua centralidade e importância para o futuro. Nesse sentido, a política da União Europeia sobre a cidadania activa deveria ser elaborada no seio de uma célula interinstitucional permanente, que reagruparia todas as DG da Comissão interessadas nesta questão e representantes de todas as outras instituições da União.

5.5

O CESE sugere que os ciclos de educação primária, e não apenas os programas relacionados com aprendizagem ao longo da vida, sejam momento e local de construção de uma cidadania europeia que possa ser ensinada sem se limitar a ser objecto de acções cosméticas (cores, autocolantes, bonés, festas...). A cidadania não diz respeito apenas aos grupos etários activos.

Nesse sentido, a Comissão poderia propor aos Estados-Membros incluírem nos seus programas escolares um método e conteúdos de conhecimentos da União e questões próprias à cidadania europeia. Deveria considerar-se um «Erasmus» no ciclo primário adaptado a este grupo etário, além dos processos de intercâmbios linguísticos tradicionais.

Todas estas potencialidades das NTIC devem ser solicitadas, nomeadamente na seu vertente lúdica, interactiva, participativa (porque não com a criação para cada novo suporto cívico de uma célula psicológica de avaliação), ultrapassando o carácter estático e pouco atractivo dos sítios europeus actuais. As sugestões e propostas supra são coerentes com o programa Comenius, cujos objectivos são:

1)

sensibilizar os jovens e o pessoal docente para a diversidade e o valor das culturas europeias;

2)

ajudar os jovens a adquirir as aptidões e competências de vida básicas necessárias para o seu desenvolvimento pessoal, para a sua futura vida profissional e para uma cidadania europeia activa;

5.6

No que toca a acções específicas, todos os níveis devem ser promovidos simultaneamente, sem que os micro-projectos que têm os cidadãos como actores — e que participam na promoção da identidade europeia a nível local ou nacional — sejam eliminados em benefício do apoio atribuído às redes europeias. Os fundos consagrados aos diferentes tipos de acção devem ser repartidos tendo por base o único critério do seu impacto na cidadania europeia activa e a participação dos cidadãos no processo de construção da União Europeia e a definição e aplicação das suas políticas.

5.7

O CESE apoia plenamente as propostas da Comissão que visam claramente, no plano técnico, simplificar os procedimentos num domínio (a participação directa e activa do próprio cidadão) que é ainda afectado por obstáculos burocráticos.

5.8

O CESE crê que a «invenção» de atributos próprios à cidadania europeia, não redutíveis à simples soma das cidadanias nacionais (sejam os atributos de ordem simbólica, económica, sociopolítica, cultural, jurídica), constitui agora uma prioridade absoluta da União Europeia e que a promoção da cidadania activa pode contribuir nesse sentido de forma significativa. Disponibiliza-se para participar nesta «invenção», coordenando a consulta das organizações da sociedade civil organizada e promovendo o conhecimento, garantindo que o seu ponto de vista é considerado pelas outras instituições comunitárias.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Comunicação intitulada «Construir o nosso futuro em comum – Desafios políticos e recursos orçamentais da União alargada 2007-2013» COM(2004) 101 final de 10/2/2004).

(2)  JO L 30 de 02/02/2004, p. 6.

(3)  Manuale di Cittadinanza Attiva, Giovanni MORO, Carocci Editore, 1998.

(4)  Introdução do COM(2005) 116 final.

(5)  Sondagem 2005 TNS-Sofres dos 10 países representantes de 85 % da população dos 25, sobre os valores comuns dos europeus.

(6)  Declaração do comissário Jan FIGEL perante a Secção SOC do CESE, em 21 de Junho de 2005.

(7)  Parecer do CESE sobre «Acesso à Cidadania da União Europeia», (JO C 208 de 3/9/2003, relator: Luis Miguel PARIZA CASTAÑOS) e sobre a «Imigração, Integração e Emprego» (JO C 80 de 30/09/2004, relator: Luis Miguel PARIZA CASTAÑOS)

(8)  Projectos de recomendação aos Estados-Membros sobre o código de conduta de organizações sem fins lucrativos na promoção de melhores práticas de transparência e responsabilização, de 22 de Julho de 2005.

(9)  O Parlamento Europeu propôs este tipo de parceria formal num relatório sobre a participação dos cidadãos e dos actores sociais no sistema institucional da União Europeia – 1996, relator: Philippe HERZOG.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/35


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho sobre as políticas europeias de juventude Responder às preocupações dos jovens europeus — Aplicação do Pacto Europeu para a Juventude e promoção da cidadania activa»

COM(2005) 206 final

(2006/C 28/07)

Em 30 de Maio de 2005, a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 5 de Outubro de 2005, tendo sido relatora Jillian van TURNHOUT.

Na 421.a reunião plenária, de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 126 votos a favor, nenhum voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

O Comité Económico e Social Europeu toma conhecimento do Pacto Europeu para a Juventude e respectiva explicação constante da comunicação da Comissão em apreço sobre políticas europeias de juventude. A comunicação apresenta um quadro que pode servir de base para o desenvolvimento futuro de políticas em domínios que digam respeito aos jovens na União Europeia.

1.2

O destino da Europa depende cada vez mais da sua capacidade de promover sociedades acolhedoras para as crianças e os jovens. A adopção do Pacto Europeu para a Juventude pelo Conselho Europeu da Primavera de 2005, como parte da Estratégia de Lisboa revista e centrada no crescimento e no emprego, é o reconhecimento de que a integração dos jovens na sociedade e na vida activa e um melhor aproveitamento do seu potencial são essenciais para assegurar o regresso ao crescimento sustentado e sustentável na Europa.

1.3

Reconhecendo a variedade de desafios enfrentados pelos jovens da sociedade contemporânea, o CESE contribuiu regularmente para o desenvolvimento da política de juventude comunitária ao longo de mais de uma década (1). Encetou importantes debates sobre domínios fundamentais como o emprego dos jovens, a integração social, a educação, a mobilidade, a participação e o papel das ONG. Ao mesmo tempo, o CESE está consciente dos reptos que a União Europeia enfrenta actualmente, bem como da necessidade de restabelecer a confiança.

1.4

O CESE recomenda que os jovens sejam o centro deste quadro, sendo incentivados a participar activamente no desenvolvimento de políticas e proporcionando-lhes os meios de o fazer. Contribuir para a mudança é um factor de grande incentivo para envolver os jovens. Os Estados-Membros e as instituições devem disponibilizar os recursos, os apoios e os mecanismos necessários que permitam aos jovens, em todos os níveis, participar em decisões e acções que tenham impacto nas suas vidas. Só uma verdadeira influência poderá conduzir a uma responsabilidade real.

1.5

Mais do que nunca, a Europa necessita do empenho contínuo dos jovens para ajudar a construir uma Europa inclusiva, integrada, competitiva e segura. Para que a Europa seja significativa para os jovens, deve ter importância na sua vida e interessar-se explicitamente, e dar resposta de modo visível e criativo às suas necessidades. Do mesmo modo, o êxito desta iniciativa depende do envolvimento de todas as partes interessadas e, em particular, das organizações juvenis, bem como das autarquias locais e regionais e dos parceiros sociais. O CESE faz sua «a ideia que emerge» do relatório do grupo de alto nível sobre o futuro da política social na União Europeia alargada (2): «de um novo pacto entre as gerações» para passar «de um pacto centrado nos idosos e baseado no receio … a um novo pacto centrado nos jovens e baseado na confiança ... de transformar todos estes receios num processo em que todos ganham, assente numa percepção positiva do futuro e num novo equilíbrio entre gerações».

1.6

Consequentemente, o CESE espera que esta comunicação lance as bases, tanto a nível europeu como nacional, para uma maior parceria entre os decisores políticos e os jovens. Um envolvimento real e contínuo dos jovens e das organi-zações juvenis no desenvolvimento e na aplicação das políticas garantirá um enfoque nas reais necessidades dos jovens, contribuindo para que estes se identifiquem com o processo de Lisboa.

2.   Antecedentes

2.1

No Conselho Europeu da Primavera em 22 e 23 de Março, os chefes de Estado e de governo adoptaram um «Pacto Europeu para a Juventude» (3). Ao propor este Pacto, os chefes de Estado e de governo da França, da Alemanha, da Espanha e da Suécia identificaram quatro questões principais: a vulnerabilidade dos jovens; a necessidade de desenvolver a solidariedade entre as gerações, numa sociedade em envelhecimento; a necessidade de assegurar aos jovens uma preparação por meio da educação e da formação; a necessidade de uma maior coerência entre todas as áreas de intervenção que afectam os jovens.

2.2

A comunicação foca uma série de temas e domínios políticos que preocupam grandemente os jovens europeus, tendo sido identificados como tal no Livro Branco da Comissão Europeia Um novo impulso à juventude europeia e na subsequente resolução do Conselho de 27 de Junho de 2002 que fixava o quadro para a política de juventude na Europa.

2.3

Em resposta às conclusões do Conselho da Primavera, a Comissão Europeia adoptou as orientações integradas em 12 de Abril (4). Este conjunto de orientações, englobando, por um lado, uma recomendação de Orientações Gerais de Política Económica e, por outro, uma proposta, já aprovada, para uma decisão do Conselho sobre orientações para o emprego, deve servir de base aos programas de reforma nacionais dos próximos três anos que deverão ser elaborados pelos Estados-Membros.

2.4

Na introdução às orientações sublinha-se a importância de envolver as partes interessadas na Estratégia de Lisboa e afirma-se que os Estados-Membros e a UE devem aproveitar todas as oportunidades ao seu alcance para envolver as autarquias locais e regionais, os parceiros sociais e a sociedade civil na execução das orientações integradas.

2.5

Enquanto que as Orientações Gerais de Política Económica se centram no contributo que as políticas económicas podem dar para atingir os objectivos de Lisboa, as orientações para o emprego prendem-se, em particular, com a Estratégia Europeia para o Emprego e visam coordenar as políticas de emprego dos Estados-Membros. Relativamente em particular ao Pacto Europeu para a Juventude, é nas orientações para o emprego que algumas das suas linhas de acção são incorporadas nas orientações integradas. Há, em particular, duas orientações que reflectem o conteúdo do Pacto Europeu para a Juventude: a orientação n.o 18 que inclui a criação de percursos profissionais para os jovens e a redução do desemprego juvenil, uma melhor conciliação do trabalho e da vida privada e estruturas de acolhimento de crianças; e a orientação n.o 23 que inclui a redução do número de abandonos escolares e o aumento do acesso à formação profissional e ao ensino secundário e superior, incluindo a aprendizagem e a formação em espírito empresarial. Além disso, a orientação n.o 24 inclui a disseminação do fornecimento de instrumentos de educação e formação, a criação de estruturas em prol da transparência das qualificações, bem como do reconhecimento efectivo das mesmas e a validação da aprendizagem não oficial e informal. No final das orientações para o emprego, reitera-se que os Estados-Membros devem criar uma ampla parceria para a mudança através da participação dos órgãos parlamentares e das partes interessadas, nomeadamente a nível local e regional.

2.6

Esta iniciativa realça o papel da juventude em áreas fundamentais da parceria de Lisboa para o crescimento e o emprego, nomeadamente através das Estratégias Europeias de Emprego e Inclusão Social e do Programa de Trabalho de Educação e Formação 2010, e propugna uma maior coerência entre as iniciativas lançadas no contexto dos mesmos.

2.7

A adopção do Pacto coincide com a conclusão do primeiro ciclo de aplicação do Livro Branco sobre um novo impulso à juventude europeia de 2001, enunciado na Resolução do Conselho de Junho de 2002. Este Livro Branco instituiu um quadro de cooperação europeia no domínio da juventude para reforçar a cidadania activa dos jovens através do método aberto de coordenação (MAC) e da introdução de uma dimensão «juventude» nas demais políticas.

2.8

O Pacto Europeu para a Juventude, tal como foi finalmente adoptado na cimeira da Primavera do Conselho Europeu, realça a necessidade de os jovens europeus beneficiarem de um conjunto de políticas e medidas que estejam plenamente integradas na Estratégia de Lisboa, e visa melhorar a educação, a formação, a mobilidade, a integração profissional e a inclusão social dos jovens, assim como facilitar a conciliação entre a vida profissional e a vida familiar. O Pacto Europeu para a Juventude tem igualmente a ambição de garantir a coerência global das iniciativas a tomar nestes domínios e de constituir o ponto de partida para uma firme e contínua mobilização em prol dos jovens. Refere-se igualmente que o êxito do Pacto Europeu para a Juventude pressupõe a participação de todos os actores envolvidos e, antes de mais, das organizações juvenis a nível local, regional e nacional, bem como das autoridades locais, regionais e europeias e dos parceiros sociais. As linhas de acção propostas aos Estados-Membros baseiam-se em três domínios: 1) emprego, integração e promoção social; 2) educação, formação e mobilidade; e 3) conciliação da vida profissional com a vida pessoal e familiar.

3.   Participação dos jovens

3.1

No âmbito da redacção do presente parecer, o CESE organizou, em 6 de Setembro de 2005, uma consulta aos representantes das organizações de jovens. Os resultados desta consulta constam do presente parecer.

3.2

A participação dos jovens deve ser o ponto de partida de todas as vertentes. Toda a política de juventude deve reger-se pelo princípio fundamental da participação dos jovens: um princípio reiterado a nível europeu e internacional (5). Apesar de se congratular com as medidas que visam consultar os jovens a nível europeu, em particular através da organização dos Estados Gerais em 2005, o CESE lamenta ter de notar que a comunicação não indica através de recomendações concretas como se envolverão os jovens e as organizações juvenis ao nível do Estado-Membro e de que modo participarão neste nível. O CESE insta com a Comissão e com os Estados-Membros para que recorram a métodos mais criativos para chegarem e interagirem com os jovens.

3.3

O CESE realça a importância da participação activa e da autonomia dos jovens, não só no mercado de trabalho, como na sociedade em geral, as quais deveriam ser tanto um objectivo como uma forma de contribuir para o desenvolvimento pessoal dos jovens, para a sua capacidade de iniciativa e integração social e para a coesão social em geral.

3.4

O CESE lamenta que a comunicação em apreço não apresente mecanismos concretos para envolver verdadeiramente os jovens e as suas organizações. Durante a consulta de 6 de Setembro de 2005 referida no ponto 3.1, as organizações estudantis salientaram, por exemplo, como o facto de gerir por delegação instituições de interesse geral — como é o caso do regime obrigatório de protecção social dos estudantes — permite à juventude na globalidade, e não apenas à juventude organizada — responsabilizar-se e representar-se enquanto tal. O CESE insta com a Comissão e com os Estados-Membros para que elaborem e apliquem as suas políticas em parceria com os jovens e as organizações juvenis e que continuem a envolvê-los em todas as fases. Os jovens, as organizações juvenis e os parceiros sociais têm de ser consultados sobre a elaboração das medidas relativas à presente iniciativa no âmbito dos programas nacionais de reforma da Estratégia de Lisboa, assim como sobre as acções de acompanhamento.

3.5

O CESE aguarda com interesse o relatório de síntese (6) da Comissão que documenta o trabalho realizado até à data pelos Estados-Membros no domínio da participação dos jovens no âmbito do processo MAC (7). Espera-se que este relatório de síntese forneça exemplos de boas práticas que possam ser reproduzidos noutros Estados-Membros.

3.6

O CESE gostaria que o papel das organizações da sociedade civil, particularmente o das organizações de juventude, no ciclo do método aberto de coordenação fosse clarificado. Cumpre recordar que o ponto 38 das conclusões do Conselho Europeu de Lisboa define o papel das ONG no Método Aberto de Coordenação (8). O Comité, graças ao seu conhecimento específico e à sua experiência, pode desempenhar um papel activo nesse domínio e contribuir para construir e criar no seu âmbito um mecanismo de participação dos jovens e das organizações juvenis.

4.   A juventude na parceria de Lisboa para o crescimento e o emprego

4.1

O CESE acolhe favoravelmente a atenção particular dada pelo pacto à questão do emprego dos jovens. No entanto, o Pacto para a Juventude deveria ser elaborado e aplicado de uma perspectiva que o considere como um objectivo importante em si e não como mero elemento da Estratégia de Lisboa. Ademais, apesar de o êxito da Estratégia de Lisboa ser importante para os jovens, os jovens são também importantes para o êxito desta. O investimento nos jovens é fundamental para se conseguirem taxas de emprego e de crescimento maiores, inovação permanente e um maior espírito empresarial. A sua participação na estratégia e a sua identificação e empenho para com os seus objectivos são necessários para que a Estratégia de Lisboa tenha resultados.

4.2

A questão do emprego é igualmente uma preocupação central dos cidadãos europeus, devendo-se envidar todos os esforços para combater o desemprego, cujo nível inaceitável constitui uma ameaça real à coesão das nossas sociedades (9). Na Europa, a taxa de desemprego juvenil é ainda superior ao dobro da taxa de desemprego média. Muitos jovens enfrentam uma possibilidade muito real de ficarem desempregados ou de terem de sobreviver com um rendimento baixo. Os jovens oriundos dos meios mais desfavorecidos, as minorias étnicas, os imigrantes, os deficientes e as mulheres correm um risco ainda maior de exclusão social. De modo geral, a juventude é afectada pelos fenómenos de precariedade, empobrecimento e de dependências, o que representa um drama histórico inédito, bem como uma nova possibilidade de solidariedade entre os jovens e a sociedade a fim de sair desta situação inédita na Europa.

4.3

Os jovens estão mais sujeitos a ficar desempregados e, caso trabalhem, a receber um salário baixo (10). A Estratégia de Lisboa visa criar não só mais emprego, mas também melhores postos de trabalho. Para que o acesso ao mercado de trabalho seja uma realidade para todos os jovens, importa investir numa formação profissional adequada e em oportunidades e ofertas de educação ou aprendizagem mais orientadas para os jovens para se realizarem no plano pessoal e profissional e para adquirirem as competências necessárias para viver. Importa, ademais, que a formação recebida durante o período escolar lhes permita gerir a vida laboral e utilizar com êxito os mecanismos de aprendizagem ao longo da vida activa.

4.4

O CESE recorda o reconhecimento da existência de mutações demográficas na Europa e as ligações com o Livro Verde da Comissão sobre como enfrentá-las (11). O número de crianças entre os 0 e os 14 anos de idade, por exemplo, irá diminuir em 11 % entre 2000 e 2015 e continuará a cair mais 6 % até 2030. O CESE realça que a par desta alteração, haverá igualmente uma alteração política, cultural e social na Europa. As mutações demográficas não são unicamente uma questão de estatística e números; é imperativo ter uma visão abrangente ao ponderarem-se as políticas e acções adequadas. Como assinala o grupo de alto nível sobre o futuro da política social numa União Europeia alargada, esta situação demográfica, que conduzirá a uma diminuição considerável do peso relativo dos jovens no horizonte de 2025, é, se aproveitada, uma oportunidade, uma vez que implica «uma redução da procura de recursos da sociedade» e a possibilidade, a custos constantes, de melhorias consideráveis nestes domínios.

4.5

O CESE é, portanto, de opinião que um Pacto Europeu para e com a Juventude teria o potencial para melhorar significativamente as condições de vida e as perspectivas dos jovens europeus, podendo reforçar simultaneamente uma aplicação eficaz da Estratégia de Lisboa.

5.   O Pacto Europeu para a Juventude

5.1

O CESE congratula-se com as conclusões do Conselho Europeu de que os jovens irão beneficiar de um conjunto de políticas e medidas inteiramente integradas na Estratégia de Lisboa revista.

5.2

Na comunicação identificam-se os seguintes aspectos das orientações integradas como pertinentes para maximizar o impacto do Pacto para a Juventude:

i)

Medidas para o emprego, a integração e a promoção social dos jovens. As orientações integradas incidem principalmente no contributo das políticas de emprego para a criação de mais e melhores empregos.

ii)

Medidas para a educação, a formação e a mobilidade. As orientações integradas sublinham a necessidade de a Europa expandir e melhorar o investimento em capital humano, e adaptar os sistemas de educação e formação. Ademais, convidam os Estados-Membros a melhorar as possibilidades de mobilidade, incluindo maiores oportunidades de trabalho ou estudos no estrangeiro para os jovens.

iv)

Medidas para a conciliação da vida familiar e da vida profissional. As orientações integradas focam a necessidade de se conseguir um melhor equilíbrio entre a vida profissional e familiar, referindo questões como estruturas de acolhimento de crianças, formas de trabalho mais favoráveis à família e igualdade.

5.3

É decepcionante para o CESE constatar que apesar de identificar acções para cada uma das medidas referidas supra, a comunicação peca ao não definir objectivos explícitos e mensuráveis para os Estados-Membros nem para a Comissão. Num momento em que os cidadãos questionam o valor da União Europeia, é fundamental que a Europa seja vista a aplicar acções eficazes. Para tal, é fundamental que os objectivos sejam inequívocos e orientados para os resultados.

5.4

Os governos nacionais devem ser incentivados a quantificar objectivos e a fixar metas claras nos programas de reforma nacionais. Estes objectivos e metas devem incidir não só nos desafios enfrentados pelos jovens em determinadas áreas, mas também em questões que influem de modo significativo, ainda que indirecto, na realização desses objectivos, nomeadamente o problema do alojamento e da habitação, bem como a necessidade de uma política familiar relativa aos jovens progenitores. Importa também criar, tanto a nível nacional como comunitário, mecanismos de coordenação eficazes, por forma a atingir-se uma abordagem coerente em todas as áreas.

5.5

O CESE solicita que se pondere a inclusão das seguintes metas nos programas nacionais de reforma no âmbito da Estratégia de Lisboa:

fixar metas para cada Estado-Membro reduzir o número de jovens desempregados no mínimo em 50 % entre 2006-2010 (actualmente 17,9 % na União Europeia para os jovens de menos de 25 anos) (12);

criar sistemas de protecção social que permitam aos jovens fazer escolhas para determinar o seu próprio futuro;

pôr em prática medidas para promover a inclusão social dos jovens e, em particular, para combater o problema dos jovens que estão fora do sistema educativo, formativo ou laboral ou que não estão registados como desempregados;

fixar objectivos de redução das diferenças no acesso às formações profissionais e tecnológicas entre rapazes e raparigas, e reduzir as disparidades salariais no emprego;

reduzir o abandono escolar em 50 % durante o período de 2006-2010 e promover os estágios de descoberta nas empresas;

promover a importância das competências em línguas estrangeiras para melhorar a educação e as oportunidades de emprego, assim como a mobilidade dos jovens;

promover o espírito empresarial dos jovens fornecendo-lhes assistência financeira e técnica e diminuindo a burocracia que o trespasse, a transmissão e a criação de uma empresa acarreta;

apoiar a educação e os cuidados universais na pequena infância, inspeccionados e regulados por normas reconhecidas;

fornecer apoio suplementar às famílias desfavorecidas.

5.6

O CESE incita a Comissão a continuar os esforços no âmbito do reconhecimento do trabalho juvenil e aguarda com ansiedade a introdução de iniciativas, incluindo o «passe jovem». Contudo, considera que só por si o «passe jovem» não basta para aumentar o reconhecimento do trabalho juvenil, pelo que recomenda à Comissão que inicie conversações com as organizações de empregadores e de trabalhadores, com representantes dos sistemas de educação oficiais e com as ONG pertinentes para desenvolver uma metodologia versátil capaz de sensibilizar para o contributo do trabalho juvenil para o desenvolvimento dos jovens, bem como para as competências, valores e posturas que os jovens adquirem através de um envolvimento activo nas organizações juvenis e em actividades de trabalho juvenil. O CESE poderia ajudar neste processo.

5.7

Os países europeus que estão no topo das posições do ranking de competitividade elaborado pelo Fórum Económico Mundial gozam todos de elevado nível de investimento em política social e protecção social e apresentam taxas de emprego elevadas e um nível de pobreza baixo, após transfe-rências sociais (13). As bases para o sucesso são a existência de sistemas de segurança social sustentáveis, baseados no princípio da solidariedade e concebidos de forma a proteger os indivíduos dos principais riscos que podem surgir na vida.

5.8

O CESE insta a que se dê maior atenção à situação dos jovens nas zonas rurais e nas zonas urbanas desfavorecidas. Os jovens são frequentemente desfavorecidos devido à zona em que residem. Em muitas zonas rurais e zonas urbanas pobres, não têm acesso a educação, formação, mobilidade, serviços de saúde, serviços de lazer, oportunidades de emprego de qualidade, nem têm possibilidades de participar na sociedade civil. Há que introduzir medidas específicas que garantam que os jovens de determinadas zonas geográficas poderão beneficiar plenamente das oportunidades e decidir sobre o rumo da sua própria vida. O afastamento de muitas zonas rurais faz com que os jovens não tenham um bom acesso à informação, especialmente no que toca às oportunidades.

5.9

O CESE acolhe favoravelmente a proposta de lançar em 2005 um estudo sobre a integração dos jovens altamente desfavorecidos. Contudo, os Estados-Membros têm de começar a enfrentar o repto da erradicação da pobreza entre as crianças e estabelecer metas imediatas. Enfrentar este desafio pressupõe um programa de acção abrangente, sustentado e bem equipado que foque o carácter multi-dimensional da pobreza infantil, a qual tem consequências graves para as crianças num vasto leque de domínios como a saúde, a educação e mesmo as «oportunidades de vida» futuras para a criança sair do ciclo vicioso da pobreza. Os Estados-Membros devem aplicar de imediato políticas que foquem toda esta gama de problemas.

5.10

A Comissão está empenhada em integrar as questões da deficiência nas políticas, o que está expressamente confirmado no Plano de Acção Europeu sobre a igualdade de oportunidades para as pessoas com deficiência de 2003 (14). Assim, a Comissão tem a obrigação de lutar contra a discriminação em todas as acções que promova. Integrar as questões da deficiência é necessário para assegurar uma participação e uma inclusão plena e equitativa dos deficientes na sociedade. Por forma a abranger completamente os jovens deficientes na política de juventude, o CESE realça que se têm de incluir os seguintes pontos na comunicação: participação igual nas actividades do Programa Juventude, acesso igual à informação sobre a política de juventude e os projectos juvenis e medidas de sensibilização.

5.11

Os jovens não constituem uma categoria homogénea. É por isso que o CESE recomenda que as políticas nacionais sejam suficientemente variadas e respeitem tanto as necessidades do mercado de trabalho como as dos indivíduos. Ao mesmo tempo, o CESE exorta a Comissão Europeia a fazer uma análise da situação e das expectativas dos jovens na Europa.

6.   Cidadania activa dos jovens

6.1

O CESE saúda a Comissão por incluir a cidadania activa dos jovens nesta iniciativa, não obstante o facto de ter sido excluída do Pacto Europeu para a Juventude e concorda com a proposta da Comissão de manter e consolidar os quatro actuais objectivos de: participação, informação, actividades de voluntariado e conhecimento das questões da juventude. Todavia, recorda a importância de se assegurar que a ênfase do método aberto de coordenação deve ser, agora, a obtenção de resultados tangíveis. Assim, sempre que se identifiquem deficiências no sistema e no processo MAC há que delas tomar nota e solucioná-las.

6.2

O CESE regista que os Estados-Membros irão apresentar os objectivos comuns de participação e informação em finais de 2005, seguindo-se em 2006 os relatórios sobre as actividades de voluntariado e o conhecimento das questões da juventude. Contudo, insta a uma maior parceria e destaca a importância de se incluírem todas as partes interessadas, especialmente os jovens e as organizações juvenis, na elaboração dos relatórios de progresso nacionais. No interesse da transparência importa também que estes relatórios sejam desenvolvidos publicamente e/ou, pelo menos, que estejam disponíveis ao público quando forem apresentados. Do mesmo modo, as ONG devem ser incentivadas e apoiadas financeiramente para realizarem a sua própria avaliação do processo MAC.

6.3

As organizações da sociedade civil e os parceiros sociais fazem parte de todas as democracias pluralistas. Neste contexto, as organizações juvenis desempenham um papel precioso para promoverem a cidadania activa e a participação, fazendo-o mediante trabalho directo com e para os jovens, reforçando as suas aptidões pessoais e confiança, por forma a que possam realizar o seu potencial e atingir um nível e uma qualidade de vida ideais. Estas organizações operam ao nível mais próximo, resolvendo questões locais com o apoio de indivíduos e grupos da própria zona. Envidam igualmente esforços para promover e aumentar a capacidade de os jovens defenderem os seus próprios interesses. As ONG juvenis deveriam ser apoiadas financeiramente de forma adequada, reconhecendo-se o papel que desempenham e conferindo-lhes os meios para poderem participar como actores reais no processo de decisão e na sociedade em todos os níveis.

6.4

Nos seus debates sobre a representatividade das organizações da sociedade civil europeia no diálogo civil, o CESE já realçou em várias ocasiões (15) que apenas uma representatividade claramente estabelecida pode conferir aos actores da sociedade civil o direito de participarem efectivamente no processo de elaboração e preparação das decisões comunitárias, tal como acontece para os parceiros sociais no âmbito do diálogo social europeu.

6.5

O CESE regista com desapontamento que, segundo a Comissão, o principal contributo que os voluntários dão à sociedade tem a ver com o seu papel nos desastres naturais. Não obstante a dignidade desse papel, o CESE considera que a Comissão e os Estados-Membros devem reconhecer e destacar o papel permanente e contínuo que os voluntários desempenham numa ampla variedade de ONG a nível local, regional, nacional e europeu. Em especial, o Comité solicita aos Estados-Membros que favoreçam as actividades de voluntariado, inclusivamente com oportunas políticas fiscais, já que tais actividades voluntárias não só satisfazem exigências psicológicas e éticas dos jovens, mas também permitem desenvolver inúmeros serviços sociais e assistenciais ou reduzir o seu custo.

6.6

O CESE lamenta que as acções propostas sejam marginais e não tenham metas a atingir nem objectivos claros. Esta é uma oportunidade perdida de fazer avançar este elemento-chave.

6.7

Os programas europeus têm um importante papel a desempenhar para contribuírem para os objectivos do método aberto de coordenação e do Pacto Europeu para a Juventude, bem como para reforçarem a participação dos jovens noutras políticas que lhes digam respeito. O CESE concorda com a visão da Comissão de que os projectos que incentivam os jovens a tornarem-se cidadãos activos e participativos e que visam ajudá-los a desenvolver as suas capacidades deveriam ser elaborados ao nível local, regional, nacional e europeu no âmbito dos diferentes programas comunitários. Contudo, apesar de muitos programas poderem, com efeito, ser utilizados com este fito, há ainda a necessidade de promover a utilização destes programas por e para os jovens e as organizações juvenis e torná-los apelativos. A utilização de diferentes programas, em particular o Fundo Social Europeu e os fundos estruturais, é uma grande oportunidade de fazer avançar a política de juventude da retórica para a acção. Os diferentes projectos realizados para promover as condições de vida e o emprego dos jovens são, regra geral, demasiado pequenos para poderem ser contemplados por estes fundos. A Comissão e os Estados-Membros deveriam, portanto, entrar em contacto com as organizações juvenis para facilitar o recurso ao financiamento comunitário em prol dos jovens na Europa.

6.8

O CESE é de opinião que o Programa Juventude comunitário é o programa com o maior potencial para aumentar o desenvolvimento social e pessoal dos jovens e para promover a cidadania activa. O Comité acolhe favoravelmente a iniciativa para um novo Programa Juventude em Acção para os anos 2007-2013 e irá continuar a participar activamente no processo de preparação. Tendo em conta a extensão do programa e a crescente vontade dos jovens para dele beneficiarem, o Comité insta com veemência com o Conselho para que apoie a proposta de aumentar ligeiramente o seu financiamento para 1 200 milhões de euros. Ademais, o Comité considera que os jovens, as organizações juvenis europeias e o Fórum Europeu para a Juventude deveriam ser consultados regularmente sobre a aplicação do programa. O CESE convida os conselhos económicos e sociais nacionais a empenharem-se em experiências inovadoras para facilitar a participação dos jovens nos processos de consultas nacionais, e a intercambiarem as boas práticas sobre o tema do lugar dos jovens nas suas instâncias.

7.   Integração da dimensão «uventude» noutras políticas

7.1

O CESE apoia a proposta da Comissão de conjugar os esforços essencialmente nas áreas de intervenção abrangidas pelo Pacto Europeu para a Juventude. Não obstante, o CESE salienta a importância do desenvolvimento de uma política de juventude intersectorial e integrada, quando do desenvolvimento de políticas no domínio da juventude.

7.2

Uma abordagem horizontal para o desenvolvimento da política garantirá uma estratégia mais eficaz e coordenada. Os Estados-Membros consultam regularmente os sindicatos e as organizações patronais ao elaborarem as políticas, como por exemplo, as orientações para o emprego. Do mesmo modo, os Estados-Membros têm de consultar os jovens e as suas organizações sobre políticas que lhes digam respeito.

7.3

O CESE refere no seu parecer de iniciativa sobre «Obesidade na Europa — Papel e responsabilidades dos diversos parceiros da sociedade civil» (16) que mais de 14 milhões de crianças têm excesso de peso na Europa, das quais três milhões são obesas. Mais preocupante é o facto de a este número acrescentarem mais 400 mil cada ano. O CESE apela a uma participação colectiva de todas as partes interessadas incluindo os jovens.

7.4

O Comité compartilha o interesse prioritário da Comissão em acções incidentes na saúde infantil e juvenil e, em especial, em estilos de vida que promovem a saúde. Considera que tais acções são particularmente urgentes para os cidadãos, motivo por que solicita que a iniciativa de apoio a este tipo de acções, prevista para 2006, seja antecipada para 2005, tendo em conta as consultas e as iniciativas já lançadas.

7.5

O CESE preconiza que o sétimo programa-quadro de investigação realize actividades de investigação que incidam no impacto da participação dos jovens na democracia representativa e nas actividades de voluntariado. Este relatório poderia fornecer potencialmente uma nova perspectiva sobre o impacto da participação.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Livro Branco sobre Política de Juventude (JO C 116 de 20.4.2001 — Relatora: Jillian HASSETT-van TURNHOUT).

Livro Branco da Comissão Europeia — Um novo impulso à juventude Europeia (JO C 149 de 21.6.2002 — Relatora: Jillian HASSETT-van TURNHOUT).

Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que institui o Ano Europeu da Educação pelo Desporto 2004 (JO C 149 de 21.6.2002 — Relator Christoforos KORYFIDIS).

Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que institui um programa de acção comunitária para a promoção de organismos activos no plano europeu no domínio da juventude (JO C 10 de 14.1.2004 — Relatora Jillian HASSETT-van TURNHOUT).

SOC/174 Relações entre gerações (JO C 157 de 28.6.2005 — Relator: Jean-Michel BLOCH-LAINÉ).

SOC/177 Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que cria o programa «Juventude em acção» para o período 2007-2013 (JO C 234 de 22.9.2005 — Relator: José Isaías RODRÍGUEZ GARCÍA-CARO).

(2)  Disponível em alemão, inglês e francês em http://europa.eu.int/comm/employment_social/publications/2005/ke6104202_pt.html.

(3)  http://ue.eu.int/ueDocs/cms_Data/docs/pressData/pt/ec/84339.pdf.

(4)  SOC/206 Orientações para o Emprego 2005-2008 (JO C 286 de 17.11.2005 — Relator: Henri MALOSSE).

(5)  Parecer do CESE sobre o «Livro Branco sobre política de juventude», JO C de 116 de 20.4.2001; Declaração das Nações Unidas no Ano Internacional da Juventude 1985, «Paz, Participação, Desenvolvimento»; Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, 1989; Carta europeia sobre a participação dos jovens na vida municipal e regional do Congresso das autarquias locais e regionais da Europa, 1992; Resolução do Conselho e dos Ministros da Juventude reunidos no Conselho de 8 de Fevereiro de 1999 (JO C 42 de 17.2.1999, p. 1).

(6)  Cuja publicação está prevista para finais de 2005.

(7)  Método aberto de coordenação.

(8)  No ponto 38 das conclusões de Lisboa, afirma-se que «a Comissão Europeia, através de um trabalho em rede com os diversos fornecedores e utilizadores, designadamente os parceiros sociais, as empresas e as ONG, elaborará um método de benchmarking das melhores práticas de gestão da mudança» — http://ue.eu.int/ueDocs/cms_Data/docs/pressData/pt/ec/00100-r1.p0.htm.

(9)  Conclusões da Presidência do Conselho Europeu, Luxemburgo 1997.

(10)  Relatório do grupo de alto nível sobre o futuro da política social na União Europeia alargada, Maio de 2004.

(11)  COM(2005) 94 – Livro Verde «Uma nova solidariedade entre gerações face às mutações demográficas».

(12)  Página 3 da comunicação da Comissão.

(13)  Relatório do grupo de alto nível sobre o futuro da política social na União Europeia alargada, Maio de 2004.

(14)  COM(2003) 650 final de 30.10.2003.

(15)  Ver, por exemplo, a documentação referente à «Primeira Convenção sobre a sociedade civil organizada a nível europeu» de 15 e 16 de Outubro de 1999 e à conferência sobre «O papel da sociedade civil organizada na governação europeia» de 8 e 9 de Novembro de 2001, bem como os pareceres respectivos: «O papel e o contributo da sociedade civil organizada na construção europeia», 23 de Setembro de 1999 (JO C 329 de 17 de Novembro de 1999), «A Comissão e as organizações não governamentais: reforço da parceria», 13 de Julho de 2000 (JO C 268 de 19 de Setembro de 2000), «A sociedade civil organizada e a governação europeia – Contributo do Comité para a elaboração do Livro Branco», 26 de Abril de 2001 (JO C 193 de 10 de Julho de 2001), «Governança Europeia – Um Livro Branco», 21 de Março de 2002 (JO C 125 de 27 de Maio de 2002).

(16)  SOC/201 (2005) — Obesidade na Europa – Papel e responsabilidades dos diversos parceiros da sociedade civil.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/42


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Período de reflexão: estrutura, temas e quadro para uma avaliação do debate sobre a União Europeia»

(2006/C 28/08)

Em 6 de Setembro de 2005, o Parlamento Europeu decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre «Período de reflexão: estrutura, temas e quadro para uma avaliação do debate sobre a União Europeia».

O Subcomité criado para a reflexão em torno do debate sobre a União Europeia, incumbido da preparação dos trabalhos do Comité na matéria, adoptou o seu parecer em 13 de Outubro de 2005, sendo relatora Jillian van Turnhout.

O Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 1 do artigo 19.o do Regimento, criar um subcomité para preparar os trabalhos correspondentes.

Na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o seguinte parecer por 130 votos a favor, 3 votos contra, e 3 abstenções.

1.   Mesma lógica, mesma análise

1.1

A lógica e as análises que levaram o CESE a adoptar, em 28 de Outubro de 2004, o parecer favorável ao Tratado Constitucional por ampla maioria mantêm-se e, por isso, os argumentos e recomendações são os mesmos. Na verdade, o Comité entende que as peripécias do processo de ratificação do Tratado Constitucional confirmam a justeza das posições então assumidas.

1.2

Por exemplo, os resultados dos referendos em França e nos Países Baixos, além de demonstrarem a incapacidade dos Estados-Membros e das instituições europeias de comunicar a Europa tal como ela é e como constrói compromissos, revelam que existe um fosso entre os cidadãos e o projecto europeu. É certo que este fosso não é unicamente uma característica específica destes países e não tem apenas a ver com os aspectos de comunicação ou de conjuntura, mas põe em causa a natureza do próprio compromisso e, por conseguinte, o seu método de construção.

1.3

Vale a pena relembrar as mensagens claras que, no parecer de Outubro de 2004, o Comité entendeu dever passar à sociedade civil:

usar o instrumento da Convenção como um «passo em frente na democratização da construção europeia»;

elaborar uma Constituição como uma «revolução» na história da construção europeia;

estabelecer uma União mais democrática que reconhece os cidadãos enquanto soberanos da construção europeia;

estabelecer uma União que protege melhor os direitos fundamentais dos cidadãos europeus;

estabelecer uma União capaz de corresponder às aspirações dos cidadãos mercê das políticas e do método comunitários.

1.4

A despeito de algumas insuficiências no Tratado Constitucional, que também focou, o Comité exortou a uma forte mobilização da sociedade civil europeia a favor dos aspectos positivos do Tratado por forma a superar as lacunas.

1.5

O Comité havia chamado a atenção para as seguintes insuficiências:

inexistência de disposições para a aplicação do princípio de democracia participativa;

ausência de disposições que reconheçam o papel da sociedade civil organizada na aplicação do princípio de subsidiariedade;

debilidade da governação europeia em matéria de política económica e de emprego e falta de disposições normativas sobre a consulta do Parlamento Europeu e do CESE nestas áreas que tocam muito de perto os actores da sociedade civil;

1.6

Todas estas observações continuam a ser pertinentes e legítimas. No parecer de Outubro de 2004, o Comité advogou a ratificação do Tratado Constitucional, mas também a necessidade de se sensibilizar os cidadãos da União Europeia para os progressos democráticos e as vantagens que o projecto de Constituição representava.

1.7

Os debates sobre o processo de ratificação demonstraram, uma vez mais, que um dos principais desafios com que a União Europeia está confrontada é saber como preservar a garantir o crescimento, o emprego e a prosperidade para as actuais e as futuras gerações. No último inquérito para o Eurobarómetro (Eurobarómetro 63, Setembro de 2005) esta questão é uma preocupação central dos cidadãos europeus.

1.8

Um elemento essencial da resposta a este repto tem de ser encontrada nos objectivos fixados na Estratégia de Lisboa, apresentada pelos Chefes de Estado e de Governo em 2002, a qual propõe uma visão concreta do futuro da sociedade europeia.

1.9

Há que reconhecer, contudo, que após cinco anos de debates e actividades intensos à escala europeia, os resultados são decepcionantes e a aplicação da estratégia insuficiente.

1.10

«A par de incontestáveis progressos, há lacunas e atrasos evidentes», fez notar o Conselho Europeu de Março do corrente ano. As razões destas lacunas e atrasos são porventura múltiplas, mas as duas explicações que se seguem são praticamente consensuais:

a Estratégia é demasiado abstracta. As consequências para os particulares e as empresas não são tangíveis. Em relação às condições de vida e de trabalho, a opinião pública não faz a distinção entre efeitos da globalização, política comunitária e política nacional;

a Estratégia utiliza uma abordagem do topo para a base. O envolvimento da sociedade civil organizada neste processo tem sido muito diminuto. Em alguns Estados-Membros, muitos dos protagonistas desconhecem, em grande medida, a Estratégia. Não parece ter havido verdadeira consulta, em particular através do método aberto de coordenação, sobre investigação e educação.

1.11

Por isso, o Conselho Europeu de Março de 2005 vincou a necessidade de a sociedade civil se apropriar dos objectivos da Estratégia de Lisboa e participar activamente na realização dos mesmos.

1.12

Neste contexto, é muito claro que o futuro do modelo europeu de sociedade, incluindo o seu modelo social — que é uma parte fundamental da identidade colectiva dos cidadãos europeus e com o qual estes se identificam fortemente — dependerá da realização dos objectivos da Estratégia de Lisboa. Por conseguinte, o desafio não é tanto o do futuro do Tratado Constitucional, por muito importante que este seja, mas o de criar condições que permitam que os cidadãos europeus se reapropriem do projecto europeu, com base numa visão global partilhada quanto ao tipo de sociedade que ambicionam.

1.13

É por isso que, no seu parecer de Outubro de 2004, o Comité estabeleceu um nexo entre o Tratado Constitucional e a Estratégia de Lisboa, argumentando que:

«Esta estratégia deveria ser introduzida nos debates, pois oferece a visão de um futuro para cada cidadão europeu: a competitividade, o pleno emprego, o intercâmbio de conhecimentos, o investimento no capital humano, o crescimento, mas também a preservação do quadro e da qualidade de vida através de um desenvolvimento sustentável …».

2.   Retomar o rumo certo — uma visão partilhada através da democracia participativa

2.1

Para vencer os desafios com que a União Europeia está confrontada é preciso dar nova legitimidade ao processo de integração europeia com base numa nova concepção de acção democrática que atribua papel determinante à sociedade civil e às suas instituições representativas.

2.2

Para tal, a participação da sociedade civil no processo de decisão da coisa pública é um instrumento essencial para reforçar a legitimidade democrática das instituições europeias e a acção europeia. O seu papel é ainda mais essencial, visto que incentiva a emergência de uma concepção partilhada da finalidade e da direcção da Europa e, portanto, de um novo consenso, a partir do qual será possível prosseguir com a integração europeia, bem como definir e aplicar um projecto para a Europa do futuro que responda mais plenamente às expectativas dos seus cidadãos.

2.3

As instituições da União Europeia e os governos dos Estados-Membros devem encorajar uma verdadeira cultura da subsidiariedade que englobe não só os vários níveis de poder, mas também as diversas componentes da sociedade, de modo a demonstrar ao cidadão europeu que a UE agirá unicamente se a sua acção representar um inegável valor acrescentado e se o fizer com o objectivo de legislar melhor.

2.4

De acordo com os últimos resultados do Eurobarómetro, 53 % dos inquiridos consideram que a sua voz não conta na União Europeia, contra apenas 38 % que pensam o contrário.

2.5

Estes resultados mostram que é necessário construir e utilizar instrumentos que permitam aos cidadãos europeus sentir que são verdadeiramente parte activa no processo de definição do projecto para a Europa alargada, projecto que deve ter um conteúdo real e que os motivará a apoiar o processo de integração europeia e a com ele se identificarem.

2.6

Neste contexto, convém sublinhar que a legitimidade democrática da União Europeia não assenta unicamente numa definição precisa dos poderes e competências das suas instituições. Também implica:

que as instituições têm a confiança do público e podem escorar-se num forte empenho dos cidadãos a favor do projecto europeu,

que a participação activa dos cidadãos na vida democrática da União Europeia está integralmente garantida, e

que sejam estabelecidos atributos próprios da cidadania europeia, que não seja simples justaposição das cidadanias nacionais (1).

2.7

No entender do Comité, o facto de o processo de ratificação do Tratado Constitucional se encontrar em suspenso ou atrasado contém uma ironia fundamental: a ausência de Constituição, e designadamente a falta das disposições do título VI sobre a vida democrática da União Europeia, acentua ainda mais a necessidade da Constituição. O desafio fundamental a vencer pela União é o de fazer passar esta mensagem elementar.

2.8

Para o Comité, mantém-se intacta a lógica das disposições da Constituição em matéria de democracia participativa e de diálogo civil. As instituições europeias têm que se investir a fundo na lógica da Constituição Europeia e estabelecer uma autêntica democracia participativa.

2.9

A necessidade de melhorar a participação é premente porque, a despeito dos recentes acontecimentos, os cidadãos alimentam grandes esperanças em relação à União Europeia. O já referido inquérito do Eurobarómetro indica que cerca de 60 % dos cidadãos europeus são favoráveis a uma maior integração na União Europeia (outras sondagens obtêm os mesmos resultados). Os resultados mostram, também, que os cidadãos da Europa gostariam de ver reforçado o papel da União para fazer face a desafios urgentes, como o combate ao desemprego, a pobreza e a exclusão social.

2.10

Já em Outubro de 2004, o Comité apontava que a superação das insuficiências do Tratado e a sua ratificação através da mobilização da sociedade civil passavam por medidas para desenvolver o quadro institucional proposto e para melhorá-lo através de medidas operacionais. O Comité apontava, em particular, que:

as disposições sobre democracia participativa deveriam ter sido objecto de comunicações, para definir os métodos de consulta e o papel do CESE;

a sociedade civil deveria ser consultada sobre o conteúdo da legislação europeia que define os procedimentos para aplicação do direito de iniciativa popular. O CESE poderia ser solicitado para emitir parecer exploratório nesta matéria;

o princípio da democracia participativa deveria aplicar-se às grandes estratégias da União para o crescimento, o emprego e o desenvolvimento sustentável.

2.11

O Comité procurou persuadir os governos dos Estados-Membros e as instituições da UE da necessidade vital de mobilizar as organizações da sociedade civil em torno do espírito e da letra da Constituição.

2.12

O Comité verifica que o «amplo debate» a que os Chefes de Estado e de Governo fazem referência na sua Declaração de Junho continua por realizar. O Comité entende que urge relançá-lo. No entanto, o Comité considera que esse debate será contraproducente se entretanto não se tranquilizar a opinião pública acerca da natureza do processo de integração europeia e, em particular, quanto aos aspectos democráticos desse processo.

2.13

Como é natural, seria conveniente utilizar o período de reflexão, decidido em Junho pelos Chefes de Estado e de Governo dos Estados-Membros, para examinar como resolver a situação política e institucional resultante dos referendos em França e nos Países Baixos.

2.14

Mas, para o Comité, haveria sobretudo que utilizar o período de reflexão para construir os alicerces de um desígnio para a Europa, partilhado pela população, e de um novo contrato social entre esta e os seus cidadãos. Neste contexto, os governos dos Estados-Membros deveriam «levar para casa» a União Europeia.

2.15

É essencial demonstrar que a democracia participativa e o diálogo social não são slogans vazios mas, pelo contrário, princípios essenciais de que depende o êxito das políticas da União Europeia e, por conseguinte, o seu próprio futuro.

2.16

Por isso, é indispensável que a sociedade civil participe, o mais amplamente possível, em todos os futuros debates e discussões a todos os níveis — nacional, regional e local –, que os cidadãos da União Europeia exprimam as suas preocupações e expectativas e, para tal, se lance uma verdadeira estratégia de escuta e de diálogo sobre as políticas da União e a maneira como vêem o futuro.

2.17

Neste contexto, o Comité examinará atentamente o «plano D» da Comissão, tanto mais que está convicto de que, por agora, nada está realmente em marcha em termos de debate e que o método, o calendário e os meios que irão ser consagrados para incentivar o debate em cada um dos países aderentes, mas também a nível intracomunitário, serão decisivos. O CESE apoia os argumentos, por diversas vezes reiterados pela vice-presidente da Comissão Margot Wallström, de que a comunicação é um processo que se desenvolve nos dois sentidos e de que a Europa precisa de escutar mais. Para o Comité, «escutar» não significa necessariamente «seguir»; significa seguramente «associar» e deveria significar «compreender».

3.   Comunicar a Europa

3.1

O Comité aplaudiu a ideia de que a União Europeia deveria ter uma verdadeira estratégia de comunicação, modernizar e melhorar os seus instrumentos de comunicação. O Comité acolheu favoravelmente o relatório do Parlamento Europeu, de 26 de Abril de 2005, sobre a execução da estratégia de informação e de comunicação da União Europeia, bem como a adopção do plano de acção da Comissão Europeia, de 20 de Julho de 2005, para melhorar a maneira como a Comissão «comunica a Europa».

3.2

O Comité adoptou um plano de comunicação estratégico que já sofreu algumas revisões. Além disso, em Dezembro de 2004, a Mesa do Comité aprovou uma abordagem estratégica global em resposta ao desafio de «comunicar a Europa». Em ambos os casos, o Comité quis melhorar a função de «vector de comunicação» que é a dos seus membros e das organizações que eles representam. Em 2004, o Comité empenhou-se activamente na chamada «iniciativa Wicklow», tendo apresentado na reunião informal dos ministros dos Assuntos Europeus, em Amesterdão, um documento estratégico «Colmatar o hiato», que versa sobre como associar mais plenamente ao processo de comunicação a sociedade civil organizada, em geral, e o Comité, em particular.

3.3

O Comité acolheu favoravelmente o convite que o Conselho Europeu de Novembro de 2004 dirigiu à Comissão Europeia para elaborar uma estratégia coerente para a União. O Comité, em estreita cooperação com a Comissão, está a organizar um fórum sobre o Desafio da Comunicação, para que as organizações da sociedade civil possam contribuir com as suas ideias para a reflexão actualmente em curso, ideias que a Comissão poderá ter em conta na redacção do Livro Branco que será consagrado ao desafio da comunicação.

3.4

O Comité, que organizou em Abril de 2005 um fórum deste tipo para examinar a questão política do desenvolvimento sustentável, está disposto a organizar esta consulta e auscultação sobre os problemas políticos importantes, de modo a reforçar a voz da sociedade civil e ajudar Bruxelas a «escutar melhor».

3.5

Neste contexto, o Comité põe a tónica no papel central que espera que o Parlamento Europeu continuará a desempenhar enquanto primeiro elemento, e elemento essencial, do exercício democrático. O Comité está pronto a trabalhar ao lado do Parlamento Europeu, como sucedeu durante a Convenção, organizando por sua própria iniciativa audições e fóruns sobre os temas acerca do quais o Parlamento deseja consultar a sociedade civil organizada.

3.6

O Comité deseja acentuar dois aspectos fundamentais. Em primeiro lugar, se, por um lado, o Comité saúda a importância crescente concedida às estratégias e aos instrumentos de comunicação, por outro, lembra que a comunicação só vale pelo conteúdo da mensagem que pretende veicular. Por isso, a comunicação é um aspecto complementar e não um fim em si mesma. Em segundo lugar, se o Comité está plenamente empenhado nos processos paralelos de aplicação da estratégia de comunicação ao nível comunitário e de melhoria dos instrumentos de comunicação, por outro lado, a actividade desenvolvida ao nível da União deve ser considerada complementar das actividades de comunicação levadas a cabo nos Estados-Membros. A estratégia à escala europeia é absolutamente necessária, mas não é suficiente.

3.7

A este propósito, importa salientar o papel das instituições representativas e consultivas dos Estados-Membros (designadamente parlamentos nacionais e conselhos económicos nacionais), bem como ao nível local e regional.

4.   Recomendações

É hora de concretizar a democracia participativa!

4.1

As razões e a lógica que levaram o Comité a pronunciar-se, por ampla maioria, a favor do Tratado Constitucional e, em especial, das disposições referentes à vida democrática da União, mantêm-se. O Comité continua firmemente convicto de que a melhor maneira de garantir a vida democrática da União é dar a essas disposições uma moldura constitucional. Contudo, o actual período de incerteza não deveria obstar a que os protagonistas da União Europeia tomem medidas imediatas para que a democracia participativa se torne uma realidade. Todas as instituições da União deveriam, por seguinte, reflectir sobre como podem:

dar aos cidadãos e às associações representativas a possibilidade de expressarem e partilharem publicamente os seus pontos de vista sobre todos os domínios de acção da União;

estabelecer um diálogo aberto, transparente e regular com as associações representativas e com a sociedade civil;

consultar as partes interessadas, por forma a garantir transparência e coerência às acções da União.

Além disso, conviria que a Comissão Europeia se antecipasse às disposições do artigo n.o 4 do artigo I-47.o do Tratado Constitucional, consultando a sociedade civil sobre o conteúdo do direito europeu que define os procedimentos respeitantes ao direito de iniciativa dos cidadãos (o CESE poderia ser solicitado a emitir parecer exploratório sobre este assunto).

4.2

Por seu lado, o Comité Económico e Social Europeu reitera a sua determinação em desempenhar um papel importante, mesmo que seja complementar, para reforçar o diálogo civil, não só pela via de mecanismos tradicionais de consulta, mas também funcionando como ponte entre a Europa e a sociedade civil organizada. A este propósito, o Comité chama a atenção para a necessidade de uma nova reflexão sobre como interagir com a sociedade civil organizada. O Comité está pronto, disponível e apto a desempenhar o papel de parceiro em todas as actividades que têm em vista reforçar o diálogo civil.

Cativar a imaginação da opinião pública e realizar a Estratégia de Lisboa!

4.3

As condições económicas da Europa são um factor essencial para determinar as reacções das populações ao processo de integração europeia. O Comité Económico e Social Europeu reafirma o seu apoio à Estratégia de Lisboa, mas exorta a União e seus Estados-Membros a respeitarem os seus compromissos O Comité está convicto de que a Estratégia de Lisboa é a melhor garantia possível de prosperidade económica e de bem-estar social, ambiental e cultural, se bem que a União Europeia não tenha conseguido cativar a opinião pública como o logrou em 1992 com a campanha para a criação do mercado único. Devem, neste contexto, os Estados-Membros aceitar e honrar os seus compromissos. Há que tornar a estratégia menos abstracta e integrar os seus objectivos (senão a sua designação) na linguagem política nacional. Há que associar a sociedade civil e as suas organizações a este processo.

4.4

Por seu lado, o Comité Económico e Social Europeu continuará a trabalhar com base no mandato que lhe foi conferido pelo Conselho Europeu de Março para «estabelecer com os Comités Económicos e Sociais dos Estados-Membros e com outros organismos parceiros uma rede interactiva de iniciativas da sociedade civil, destinada a promover a implementação da Estratégia». (Doc. 7619/1/05/rev. 1 Conselho, ponto 9).

Colmatar o hiato — reforçar a comunicação

4.5

O Comité não se tem cansado de insistir na necessidade de reforçar a comunicação entre a União Europeia e os cidadãos em nome dos quais pretende trabalhar. O Comité reconhece que muito foi feito recentemente ao nível das instituições da União Europeia, quer individualmente quer colectivamente; para citar apenas dois exemplos recentes, a reestruturação completa do sítio Internet do Parlamento Europeu e do serviço da Comissão Europeia «Europe Direct». O Comité advoga que se estreite a cooperação interinstitucional no domínio da comunicação. Regista o «Plano D» da Comissão e igualmente a intenção da Comissão de publicar brevemente um Livro Branco. O Comité manifesta o seu total empenho em prestar o seu apoio para aproximar a Europa dos seus cidadãos, como o prova o fórum que organiza sobre este tema em 7 e 8 de Novembro.

4.6

Contudo, o Comité crê que a qualidade da comunicação depende do conteúdo da mensagem que se quer fazer passar. Reportando-se às análises que fez da Estratégia de Lisboa, o Comité considera que as instituições, mas acima de tudo os Estados-Membros, têm que reflectir sobre como fazer passar a mensagem sobre a Europa. Já muito foi dito sobre a necessidade de pôr termo ao jogo do «bode expiatório», mas é claro que a Europa é muitas vezes vista numa perspectiva negativa ou defensiva, e que muito pouco tem sido feito para «vender» os aspectos positivos do processo de integração.

4.7

Quanto ao reforço da coordenação, o Comité preconiza que se relance a iniciativa «Wicklow»(reuniões informais dos ministros dos Assuntos Europeus), e lhe seja conferido um mandato específico permanente para examinar métodos que permitam comunicar melhor e para proporcionar aos Estados-Membros um quadro informal que servirá para tomar o pulso à opinião pública e onde poderão trocar boas práticas. Ao nível interinstitucional, o Comité apela a que se confira ao grupo interinstitucional mandato análogo para se reunir mais assiduamente para debater questões de comunicação. Estes mecanismos são importantes, tendo em conta a rapidez das mutações tecnológicas (por exemplo telefones móveis, banda larga, etc.) e o desenvolvimento de novas técnicas de comunicação para as explorar.

4.8

O Comité reitera a sua convicção de que a comunicação deve ser uma preocupação constante e não apenas objecto de campanhas pontuais sobre determinados problemas.

Reconhecer a quem cabe a principal responsabilidade

4.9

As instituições da União Europeia devem evitar a falsa crença, porventura com as melhores intenções, de que «Bruxelas» pode solucionar a actual «ruptura de corrente». Em matéria de comunicação, as instituições europeias só podem actuar em complementaridade. A principal responsabilidade situa-se a outro nível. Os resultados das eleições para o Parlamento Europeu e dos referendos francês e neerlandês sobre o Tratado Constitucional denotam claramente que os cidadãos europeus estão cépticos em relação à Europa, sobretudo no que diz respeito às repercussões da legislação europeia sobre as condições de vida e de trabalho. Compete aos Estados-Membros explicar aos cidadãos o significado da União Europeia e a necessidade de legislação europeia específica, bem como comunicar os seus efeitos sobre cada esfera nacional pertinente.

4.10

A opinião pública, incluindo a sociedade civil, só ficará convicta da legitimidade e do futuro comum da União Europeia se esta suscitar credibilidade e confiança, denotar transparência do processo legislativo, e mostrar que funciona segundo as regras do direito. É principalmente aos governos dos Estados-Membros que cabe preservar este tipo de relação. Os governos têm de actuar como se a UE também lhes pertença e evitar o jogo do «nós» e «eles» (entenda-se Bruxelas), ou seja evitar o esquema, por demais utilizado, do duplo discurso.

4.11

Como ficou demonstrado com o fórum nacional irlandês sobre a Europa, a sociedade civil organizada pode, por vezes, dar contributos decisivos. É essencial reforçar a comunicação ao nível adequado (local, profissional, etc.) e explicar em termos apropriados e acessíveis em que é que as políticas ou o processo legislativo são um êxito. A sociedade civil organizada está bem colocada para fazer este trabalho. Assim, o CESE está determinado a apoiar e encorajar a sociedade civil organizada nos Estados-Membros e, em particular, através da função de ponte que os seus membros desempenham. Além disso, a haver um amplo debate sobre o projecto europeu e sobre as políticas europeias, ele deverá começar nos níveis inferiores da sociedade civil dos Estados-Membros. Um fórum europeu só faz sentido se essas opiniões se puderem exprimir e repercutir para o topo e para a base. Neste caso concreto, não é tanto uma abordagem de cima para baixo ou de baixo para cima, mas sim de baixo para baixo.

4.12

É de forma deliberada que o presente parecer evita longas considerações sobre o futuro do Tratado Constitucional e as opções que se apresentam à União Europeia. Uma coisa é certa, o status quo do Tratado de Nice não pode ser uma opção. Talvez que o debate a que se referem os Chefes de Estado e de Governo possa contribuir para iluminar o melhor caminho a seguir. Contudo, o Comité verifica, com alguma apreensão, que esse debate não existe na maior parte dos Estados-Membros. Sem ele é difícil conceber progressos concretos.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Parecer do CESE SOC/203 «Programa de acção cidadania activa»


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/47


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Mobilidade das pessoas na Europa alargada e consequências para os meios de transporte»

(2006/C 28/09)

Em 10 de Fevereiro de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do artigo 29.o, n.o 2, do seu Regimento, emitir um parecer sobre a «Mobilidade das pessoas na Europa alargada e consequências para os meios de transporte».

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 4 de Outubro de 2005, sendo relator P. LEVAUX.

Na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 74 votos a favor e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Objecto do parecer de iniciativa

1.1

No horizonte de 2020-2030 a União Europeia, hoje com 25 Estados-Membros, estará certamente mais alargada com a adesão de novos Estados-Membros a começar pela Roménia, a Turquia, a Bulgária, a Croácia, etc.. Sem prejuízo de outras possíveis adesões, é provável que, em termos de cooperação e de trocas comerciais, os limites de influência de proximidade da UE se estendam aos Estados periféricos como a Ucrânia, a Geórgia e a Rússia.

1.2

Neste vasto espaço territorial do tamanho de um continente com a forma de um rectângulo com 6 000 km de Este a Oeste e 4 000 km de Norte a Sul, novas necessidades de transporte de pessoas irão forçosamente surgir para assegurar a livre circulação, em aplicação dos princípios de liberdade, desenvolver uma forma de democracia europeia assente nos intercâmbios culturais e promover o desenvolvimento económico.

1.3

O desenvolvimento dos meios de transporte em função das (prováveis) necessidades de mobilidade nas próximas duas ou três décadas deve ter em vista a realização dos objectivos fixados na Cimeira de Lisboa de 2000, a saber:

«A Europa deve tornar-se no espaço económico mais dinâmico e competitivo do mundo baseado no conhecimento e capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos, e com maior coesão social.».

1.4

Por isso, as propostas para desenvolver os meios de transporte de pessoas (colectivos e individuais), deveriam ter em conta:

os estudos prospectivos mais recentes sobre necessidades, em termos quantitativos e qualitativos, de transporte de pessoas, no horizonte de 2020-2030;

a maior sensibilização dos cidadãos europeus, estimulados pelos objectivos de competitividade preconizados pela UE no início deste novo século;

a mudança de comportamento dos cidadãos europeus, mais respeitadores do ambiente;

a necessidade de interacção nas áreas da cultura, do património (artístico, arquitectónico, etc.), da educação e do conhecimento científico;

uma população europeia mais cosmopolita, num território cuja superfície vai praticamente duplicar;

a emergência e extensão de novas tecnologias que permitem encarar o desenvolvimento de novos meios de transporte (desde que não tardem a ser tomadas decisões sobre regulamentação, dotações para a investigação e modos de financiamento dos investimentos necessários para o seu desenvolvimento);

o incremento das trocas comerciais e do turismo procedente do exterior da Europa, particularmente do sudeste asiático, da China e da Índia.

1.5

Numa perspectiva de inclusão e de igualdade de oportunidades, todos os debates e medidas respeitantes ao desenvolvimento dos meios de transporte de passageiros deverão ter em conta as pessoas com mobilidade reduzida (PMR), como por exemplo pessoas deficientes motoras, idosos e crianças de tenra idade. Para que estas pessoas tenham autonomia e mobilidade sem entraves, haverá que elaborar legislação que lhes garanta o acesso aos futuros meios de transporte e infra-estruturas conexas, à semelhança dos transportes aéreos, para os quais a Comissão propõe um regulamento sobre os direitos dos PMR (1).

1.6

O Comité nota que, nas últimas décadas, a União Europeia tem mostrado especial empenho no transporte de mercadorias e multiplicado as iniciativas para aumentar as capacidades deste sector, tendo em vista incrementar o comércio europeu e, por conseguinte, o desenvolvimento económico. Assistiu-se, pois, à proliferação de projectos de infra-estruturas de transporte, principalmente rodoviário, raramente de infra-estruturas ferroviárias e excepcionalmente fluviais.

1.7

No final de 2005, a Comissão vai apresentar uma comunicação sobre os resultados intercalares das propostas que fez no Livro Branco sobre «A política europeia de transportes no horizonte 2010: a hora das opções». Nessa altura, será possível analisar o lugar que os utilizadores dos transportes têm vindo a ocupar nas políticas conduzidas nesta área e verificar se a maior sensibilização para a problemática do desenvolvimento sustentável se tem traduzido em medidas concretas no sentido de transferir o acréscimo do transporte de mercadorias para modos de transporte alternativos à rodovia, isto é para a ferrovia, as vias fluviais e as vias marítimas. O Comité apresentará, oportunamente, um parecer baseado nesse balanço, sendo pois descabido fazê-lo no presente documento.

1.8

Entretanto, e para já, o Comité observa que, embora haja projecções feitas pela União Internacional dos Caminhos de Ferro sobre o número total de passageiros/km na Europa Ocidental para 2010-2020 (2), falta reflexão global sobre o transporte de pessoas. Nas últimas décadas, a ideia prevalecente parece ser a de que, satisfazendo as exigências e necessidades do transporte de mercadorias, se resolverá o problema do transporte de passageiros. Esta abordagem explica o desenvolvimento das infra-estruturas rodoviárias, utilizadas sem distinção para transporte de mercadorias e o transporte individual ou colectivo de pessoas (automóvel, autocarro). As estradas sempre tiveram esta dupla função. Hoje, o crescimento do tráfego torna a coexistência entre o transporte de mercadorias e o de pessoas mais difícil, e mesmo perigosa, em inúmeras estradas. Esta prioridade absoluta concedida ao transporte de mercadorias levou a que se privilegiassem as infra-estruturas rodoviárias em detrimento dos outros modo de transporte, precisamente pelo facto de poderem ser utilizadas para o transporte de mercadorias e o de passageiros.

1.9

O Comité considera que esta situação:

se afasta da prioridade fixada pelo Livro Branco de colocar o utilizador no centro da política de transportes;

é dificilmente compatível com a vontade expressa de atender aos princípios do desenvolvimento sustentável;

se revela pouco propícia à coesão europeia, que passa necessariamente por se facilitar as trocas e intercâmbios de todo o género e, por conseguinte, a mobilidade das pessoas;

não tem em conta o benefício que a União Europeia pode retirar do desenvolvimento do turismo internacional procedente da China e da Índia que, no horizonte de 2030, terão atingido um nível de vida que vai dar a possibilidade a centenas de milhões de seus cidadãos de viajarem todos os anos por todo o mundo.

1.10

Nestas condições, o Comité que não tem por vocação realizar estudos, solicita à Comissão uma reflexão global para:

avaliar a mobilidade das pessoas na UE e sua zona de influência no horizonte de 2020-2030;

avaliar, para o mesmo horizonte, a importância das deslocações dos europeus para fora do espaço europeu e a dos estrangeiros que vão entrar e circular na Europa por razões profissionais, turísticas ou outros motivos;

assegurar, a partir das avaliações prospectivas, que as capacidades existentes ou planeadas nos diferentes programas respondem às necessidades em matéria de transporte de pessoas no horizonte de 2020-2030;

propor, num Livro Branco 2010 consagrado à política dos transportes, um plano de acção que corresponda às ambições e interesses da UE e seus cidadãos e, por isso, dê maior ênfase à « mobilidade das pessoas na Europa alargada e consequências para os meios de transporte no horizonte de 2020-2030 ».

2.   Orientações e âmbito de investigação da reflexão global sobre mobilidade das pessoas

2.1   As novas dimensões do espaço europeu: distância e tempo

2.1.1

O Comité deseja que a Comissão intervenha para que decisores e cidadãos europeus tomem consciência das dimensões geográficas que o espaço europeu tem actualmente e das que terá num futuro próximo. No horizonte de 2020-2030, ou seja no espaço de uma geração, a União Europeia, que conta actualmente 25 Estados-Membros, terá acolhido novos países, alargado a sua zona de influência mercê da proximidade e da cooperação com Estados vizinhos, passando a abranger todo o continente europeu, o que implica que os problemas de transporte de pessoas e de mercadorias terão que ser estudados a uma escala diferente.

2.1.2

Ainda hoje são poucos os europeus que têm consciência de que a UE e sua zona de influência englobará um território que se estende de Este a Oeste, do oceano Atlântico até ao coração da Rússia passando pelo Mar Negro e o Volga ou pelo Mar Báltico, e do Norte a Sul até ao Mediterrâneo e, por conseguinte, ao Continente Africano.

2.1.3

Nesse novo espaço, as distâncias e o tempo necessário para as percorrer não podem ser vistas como o prolongamento ou uma simples continuidade da situação anterior, tendo em conta os limites tecnológicos e as velocidades previsíveis a médio prazo.

2.1.4

Do mesmo modo, a globalização e a elevação desejada e provável dos níveis de vida de certos países com taxas demográficas muito elevadas farão aumentar a procura de transporte de passageiros, sendo que centenas de milhões de pessoas residentes fora da Europa vão precisar ou querer entrar no espaço europeu para frequentes e curtas estadias. O Comité estima, por isso, que as novas dimensões da Europa devem ser encaradas tanto na perspectiva das distâncias (dentro do espaço europeu propriamente dito, da sua zona de influência de proximidade e das suas relações internacionais), como na do tempo (duração das viagens, velocidade dos meios de transporte, optimização do tempo necessário às deslocações, consoante os desejos dos utilizadores e os constrangimentos a que estão sujeitos).

2.2   Campos possíveis da reflexão global sobre mobilidade das pessoas

2.2.1

Principais razões que explicam a necessidade de as pessoas viajarem

 

A livre circulação das pessoas e bens é um princípio fundamental da construção europeia. O Comité entende que é necessária atenção constante para assegurar que este princípio é correctamente aplicado, especialmente hoje em dia sob o duplo efeito do alargamento e da globalização. Salvaguardar este princípio representa um desafio capital para a democracia e a coesão europeias.

 

A livre circulação das pessoas implica que se fixem regras (jurídicas, judiciais, de protecção contra o terrorismo, transporte de pessoas de mobilidade reduzida, etc.). Não é este o objecto do presente parecer de iniciativa, consagrado aos meios e equipamentos necessários para satisfazer este princípio de livre circulação das pessoas e, por conseguinte, da sua mobilidade.

 

É indispensável identificar as razões que levam as pessoas a ter que viajar ou a desejar fazê-lo, pois os meios postos à disposição dependem dessas razões e da sua importância em termos quantitativos e qualitativos.

2.2.2

O Comité sugere que se examinem as seguintes razões (lista não exaustiva):

negócios (trocas comerciais, profissionais, etc.)

formação e intercâmbio de conhecimentos (estudos, colóquios, cooperação na área da investigação, etc.)

profissionais (emprego com destacamento, exercício de uma profissão, etc.)

intercâmbio e descoberta (turismo, cultura, património, etc.)

etc..

2.2.3

O Comité sugere que a reflexão se cinja às deslocações repetitivas ou contínuas de uma certa importância.

2.2.4   Duas formas de viajar

É importante que se tenha em conta como é que as pessoas desejam viajar, pois isto determina, em parte, os meios que serão utilizados.

Duas grandes categorias a distinguir:

viagem individual ou em grupos muito pequenos (algumas pessoas, casal, família).

Nota: Por grupo pequeno, é de considerar, por exemplo, o número de passageiros autorizados pelo código da estrada a viajar num veículo conduzido por um particular;

viagem em grupo de importância variável (profissionais, turistas, reformados, etc.).

2.2.5   Distâncias percorridas

O Comité deseja limitar o campo de reflexão, mas esta limitação também carece de reflexão. É óbvio que os meios utilizados serão múltiplos, diferentes, complementares e coordenados, dependendo isto das distâncias a percorrer. De igual modo, o tempo que os utilizadores consagram às viagens depende das distâncias a percorrer, dos meios utilizados e das razões por que viajam. Além disso, importa ter em conta as entidades responsáveis nesta área (Estado, entidades locais, municípios, etc.) para definir os meios a pôr em prática.

2.2.6

Por isso mesmo, o Comité propõe fazer uma distinção entre as distâncias seguintes:

0 a 100km: excluído do campo de reflexão global por tratar-se de trajectos urbanos ou periurbanos que remetem para a organização das cidades ou dos agrupamentos de cidades, sendo por isso assunto a analisar em separado. As dificuldades que se colocam na Europa para oferecer serviços de transportes urbanos adaptados e coerentes (segurança, conforto, respeito do ambiente, poluição, qualidade e continuidade do serviço) exigem que se partilhem experiências e conhecimentos, para que os utentes possam tirar o máximo benefício;

100 a 250km: com viagens diárias de ida e volta, cada vez mais frequentes, inclusivamente para os fronteiriços. Por exemplo, para trajectos casa/local de trabalho graças a meios de transporte rápidos e pouco onerosos, permitindo a quem reside longe dos grandes centros urbanos deslocar-se diariamente para o local de trabalho;

250 a 750km: distâncias para as quais se deve examinar as condições em que a concorrência entre a estrada (veículos privados ou autocarros) e o caminho de ferro (clássico ou grande velocidade) se pode exercer;

750 a 1 500km: distâncias para as quais se deve examinar as condições em que a concorrência entre o comboio (grande velocidade) e o avião se pode exercer;

superiores a 1 500km: distâncias à escala do continente europeu em que o factor tempo é mais relevante do que nas distâncias mais curtas, tornando indispensável o recurso ao transporte aéreo.

2.2.7

Por último, no capítulo consagrado às distâncias, convém integrar as viagens internacionais ou transcontinentais para ter em conta o movimento das pessoas que entram e saem do espaço europeu.

2.2.8

O Comité deseja que a reflexão verse sobre os meios de transporte de pessoas e as infra-estruturas necessárias para o efeito. Neste domínio, importa identificar, avaliar e optimizar os meios existentes e que já são sobejamente conhecidos; convém também explorar, sem ideias pré-concebidas, novas vias susceptíveis de integrar rapidamente técnicas e tecnologias que nos próximos anos irão surgir neste domínio. Isto pressupõe que a Comissão apresente propostas para incrementar, organizar e coordenar programas de investigação de novas formas de transporte e antecipar as necessidades do futuro, sem esquecer o tempo necessário para pôr em prática novas soluções.

2.2.9

Neste quadro de reflexão, os actuais meios de transporte podem ser discriminados como segue:

o transporte rodoviário: em veículos privados e autocarros. Nada permite afirmar que se venha a questionar estes modos de transporte (bem pelo contrário), os quais deverão beneficiar de progressos tecnológicos em termos de motores e combustíveis menos poluentes. Duas atitudes são possíveis:

não interferir, esperar e constatar os desenvolvimentos, esperando poder corrigir os efeitos mais perniciosos,

definir eixos de uma política voluntarista, preparando as redes de manutenção e de alimentação dos futuros veículos que utilizam novos combustíveis, construindo infra-estruturas destinadas exclusivamente a determinados veículos e utentes da estrada, retomando a investigação sobre auto-estradas inteligentes e dispositivos de assistência e controlo da condução em longas distâncias.

O transporte ferroviário: que hoje parece privilegiar as ligações a grande velocidade ignorando a insuficiência da rede tradicional.

O transporte aéreo: dada a direcção que a UE está a tomar, é um meio incontornável para as grandes distâncias e as ligações internacionais. Estes desenvolvimentos e o programa de comercialização do Airbus A380 implicam que se tenha que adaptar as infra-estruturas aeroportuárias europeias (incluindo as ligações para os centros urbanos) para que possam acolher estes aviões de grande porte e dar resposta ao aumento de tráfego previsto.

O transporte por via marítima: localmente, nos mares do Norte, Báltico ou Mediterrâneo asseguram localmente e com regularidade o transporte de passageiros em distâncias que podem variar. Este modo de transporte pode ser desenvolvido e completar outros modos de transporte, designadamente nas linhas das auto-estradas do mar.

O transporte por via navegável: considerado actualmente marginal excepto em cidades banhadas por um rio onde as pessoas o utilizam para ir trabalhar ou fazer turismo (cruzeiros fluviais ou barcos/autocarros. Deve poder ser encarado como do domínio do possível e não sistematicamente rejeitado (servir o aeroporto de Veneza, etc.).

2.3   Avaliação das necessidades de transporte de passageiros no horizonte de 2020-2030

2.3.1

Ao procurar dados quantificados sobre as previsões respeitantes à mobilidade das pessoas nas próximas décadas, o Comité verificou que eles são muito escassos. Há muitos dados sobre o passado, mas a partir deles não é possível fazer projecções credíveis sobre o futuro. Por exemplo, não levam em conta certos desenvolvimentos recentes como o alargamento da União a 25 Estados-Membros, as perspectivas a meio prazo das futuras adesões, como também não têm em consideração a evolução nos países situados na zona de influência de proximidade da União Europeia .

2.3.2

O CESE não teve conhecimento de estudos sobre as consequências e o potencial impacto para a UE da melhoria dos níveis de vida nos países emergentes que, de acordo com previsões convergentes de várias fontes, permitirão que centenas de milhões de pessoas viajem todos os anos fora das suas fronteiras, a partir de 2020 no que se refere à China, provavelmente a partir de 2030, no caso da Índia. O número, frequentemente citado, de 100 milhões de chineses susceptíveis de viajar como turistas fora das suas fronteiras em 2020 parece hoje irrealista. Contudo, representa apenas 8 % da população chinesa. Esta percentagem é inferior à dos turistas japoneses que anualmente viajam para o estrangeiro (cerca de 12 milhões de pessoas). Um estudo recente afirma que 4 % da população chinesa já tem o mesmo nível de vida que a média dos europeus. 4 % não é muito, mas à escala da China representa mais de 50 milhões de pessoas!

2.3.3

Na hipótese de apenas 50 milhões de chineses optarem por fazer turismo na Europa visitando de avião vários países da UE com estadias relativamente curtas (em média dez dias), o Comité deseja que a UE se interrogue sobre o desenvolvimento necessário das capacidades depois de analisar as previsões teóricas. Incita os Estados-Membros a dotarem-se de meios apropriados, para que a UE possa tirar proveito do benefício económico deste incremento turístico. Se assim não for, quando a necessidade de mobilidade se fizer sentir, chineses e indianos viajarão nos países que tenham capacidade para os acolher.

2.3.4

O Comité tomou conhecimento, com interesse, do dossiê que a Comissão publicou em Setembro de 2004 sobre «European energy and transport: Scenario on key drivers». Este documento, que servirá de referência, apresenta os resultados de um inquérito em várias áreas tendo em vista três horizontes — 2010-2020-2030. O objectivo do documento é estudar as necessidades energéticas e as possibilidades de utilização de energias menos poluentes e ou renováveis. O capítulo VI é consagrado ao transporte e permite fazer algumas projecções, se bem que seja necessário identificar e separar os dados referentes ao transporte de passageiros, apresentados em paralelo com o transporte de mercadorias, que conserva nestas estatísticas a fatia de leão.

2.3.5

O anexo do relatório (3) fornece indicações sobre os desenvolvimentos previsíveis.

As projecções dizem respeito a trinta países (os 25 Estados-Membros, a que a Comissão juntou a Roménia, a Bulgária, a Suíça, a Noruega e a Turquia). A actividade do transporte de passageiros aumenta nestes trinta países num período de 40 anos (Gpkm = Gigapassenger-km).

4196 Gpkm em 1990 para 5021 em 2000 (+ 20 % em 10 anos)

5817 Gpkm em 2010 (+ 16 % em 10 anos)

6700 Gpkm em 2020 (+15 % em 10 anos)

7540 Gpkm em 2030 (somente 12,5 % em 10 anos).

2.3.6

O Comité nota que as previsões de crescimento para as próximas décadas são inferiores ao crescimento verificado na década de 1990-2000, o que indica que a mobilidade das pessoas já não é critério de vitalidade económica.

2.3.7

O transporte de passageiros em veículo automóvel privado crescerá 45 % no período de 2000-2030 e o transporte ferroviário somente 30 %. O transporte aéreo aumentará em igual período 300 %. O Comité não está em condições de verificar a consistência destas previsões, mas pensa que as mesmas devem ser examinadas em profundidade para se ter uma visão global da situação a médio e longo prazos.

2.3.8

O Comité solicita à Comissão que faça um inquérito para que se possa conhecer o mais exactamente possível as necessidades de mobilidade das pessoas, em termos de quantidade e de qualidade, no horizonte de 2020 e 2030.

2.3.9

Este inquérito deveria versar sobre os 30 países referidos pela própria Comissão no documento atrás citado, mas também sobre os países situados na zona de influência e de proximidade da UE (Croácia, Albânia, Ucrânia, Rússia, Norte de África) que nos próximos vinte e cinco anos verão reforçadas as suas relações com a UE, independentemente da forma que for adoptada.

2.3.10

Deveria também permitir avaliar o impacto das deslocações internacionais, mormente de turistas procedentes dos países emergentes (China e Índia) nos movimentos de entrada e saída do espaço europeu e nas deslocações no interior deste espaço.

3.   Propostas e conclusões

O CESE

3.1

Considera que a mobilidade das pessoas na Europa alargada deve ser imperativamente assegurada para reforçar a democracia e contribuir para a coesão da UE.

3.2

Verifica que há poucos estudos prospectivos sobre a mobilidade das pessoas no horizonte de 2030 que permitam avaliar as necessidades de transporte e correspondentes infra-estruturas.

3.3

Sublinha que a construção de infra-estruturas de grande envergadura à escala do continente europeu exige prazos muito dilatados (da ordem de duas décadas).

3.4

De acordo com dados disponíveis que apontam para o forte aumento das necessidades de mobilidade das pessoas, entende que a Comissão deve encetar estudos e, em seguida, uma reflexão global e específica sobre o assunto, paralelamente aos estudos e reflexões consagrados ao desenvolvimento do transporte de mercadorias.

3.5

Propõe que estas reflexões sejam objecto, em 2010, de um novo «Livro Branco — Política de transportes», dando mais importância do que em 2001 à satisfação das necessidades de transporte de pessoas no horizonte de 2020/2030. Critérios a figurar::

principais razões por que as pessoas viajam,

como se deslocam (grupo ou individual),

classificação por distâncias percorridas,

modos de transporte utilizados, qualidades de acessibilidade e de segurança, etc..

3.6

Sugere à Comissão que accione, com os Estados-Membros em causa, os meios necessários para garantir a mobilidade das pessoas dentro e fora do espaço europeu, nas melhores condições e no respeito do princípios de desenvolvimento sustentável, tendo em conta:

as dificuldades e os constrangimentos das pessoas com deficiência, dos idosos e das crianças de tenra idade, em cooperação com as organizações que representam as pessoas com mobilidade reduzida;

as verbas necessárias para investigação e desenvolvimento de técnicas e de novas tecnologias adaptadas aos meios de transporte de pessoas;

as disposições legislativas, regulamentares e financeiras que permitam que os Estados-Membros realizem os projectos de equipamento para responder às necessidades.

3.7

Sublinha, a terminar, que a União Europeia deve velar por que os Estados-Membros ofereçam um serviço equilibrado de transporte de mercadorias e de passageiros e deseja ser informado sobre o início desta reflexão, participar nela e ser consultado sobre as conclusões.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Parecer do CESE sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo aos direitos das pessoas com mobilidade reduzida nos transportes aéreos».

(2)  Ver Anexo 1.

(3)  Ver Anexo 2.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/52


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as

«Proposta de regulamento do Conselho que estabelece a organização comum do mercado no sector do açúcar

Proposta de regulamento do Conselho que altera o regulamento (CE) n.o 1782/2003 que estabelece regras comuns para os regimes de apoio directo no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores

Proposta de regulamento do Conselho que estabelece um regime temporário de reestruturação da indústria açucareira na Comunidade Europeia e altera o Regulamento (CE) n.o 258/1999 relativo ao financiamento da política agrícola comum»

COM(2005) 263 final — 2005/0118-0119-0120 (CNS)

(2006/C 28/10)

Em 25 de Julho de 2005, o Conselho decidiu, nos termos dos artigos 36.o e 37.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre as propostas supramencionada.

A Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, incumbida da preparação dos trabalhos correspondentes, emitiu parecer em 7 de Outubro de 2005 (relator: J.-P. BASTIAN).

Na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 103 votos a favor, 22 votos contra e 18 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

Há na União Europeia vinte e um países produtores de açúcar de beterraba. Os departamentos franceses ultramarinos e, em menor proporção, a Espanha, produzem açúcar de cana (280 mil toneladas). No total, a produção europeia de açúcar oscila, de ano para ano, entre os 17 e os 20 milhões de toneladas para um consumo europeu de açúcar estimado em 16 milhões de toneladas.

1.2

A beterraba, que intervém na rotação de culturas, é cultivada em 2,2 milhões de hectares de terreno por 320 mil agricultores (o que dá, em média, pouco mais de 7 hectares de cultura de beterraba por produtor). A beterraba é transformada em cerca de 236 fábricas que empregam directamente quase 75 000 trabalhadores, permanentes e sazonais. O sector da beterraba sacarina é responsável por um total de 500 000 empregos directos e indirectos.

1.3

Na União Europeia, produz-se ainda 500 mil toneladas de isoglicose e 250 mil toneladas de xarope de inulina, havendo ainda uma indústria de refinação de açúcar bruto de cana (cuja grande maioria — 1,6 milhões de toneladas — é importada de países ACP (1)).

1.4

No sector do açúcar, da isoglicose e do xarope de inulina, a última recondução do regime de quotas data já de 2001.

1.5

A Comissão apresentou em 14 de Julho de 2004 uma comunicação sobre a reforma do sector do açúcar (2) sobre a qual o Comité emitiu parecer em 15/12/2004 (3).

1.6

A Comissão apresentou em 22 de Junho de 2005 três propostas legislativas (4) que são tratadas no presente parecer.

Simultaneamente, a Comissão apresentou uma proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece medidas de acompanhamento a favor dos países signatários do Protocolo sobre o Açúcar afectados pela reforma do regime da União Europeia aplicado ao sector do açúcar (5).

1.7

A proposta legislativa da Comissão distingue-se da sua comunicação de 14 de Julho de 2004 pelo seguinte:

um período que se prolonga até à campanha de 2014/2015, inclusive;

um preço mínimo da beterraba por tonelada que baixou 42,6 % em duas campanhas (razão de 25,05 euros por tonelada) com uma eventual descida suplementar de 10 % por via de um acordo interprofissional;

um preço de referência que baixou 39 % em quatro campanhas (à razão de 385,5 euros por tonelada), cujo preço de referência líquido diz respeito a duas campanhas (a diferença é a quotização a pagar para o fundo de reestruturação).

uma quotização para a produção de 12 euros por tonelada do açúcar de quota, a distribuir equitativamente por produtores e fabricantes;

quotas A e B fundidas numa só quota, uma quota suplementar de 1 milhão de toneladas repartido pelos Estados-Membros actualmente produtores de açúcar «C», contra o pagamento de um montante de 730 euros por tonelada de quota suplementar;

um regime de reestruturação com a duração de quatro anos seguido de uma eventual redução linear da quota;

aumento das quotas de isoglucose de 100 000 toneladas durante três anos;

regras de gestão do mercado traduzidas no reporte do açúcar extra-quota, na retirada do mercado de açúcar excedentário e numa eventual ajuda à armazenagem privada se o preço de mercado cair abaixo do preço de referência;

a possibilidade de abastecer as indústrias química e farmacêutica também com açúcar extra-quota, à semelhança do que acontece com o sector de leveduras e de álcool e, no caso de haver dificuldades de abastecimento, de abrir para elas um contingente pautal específico;

até 2009/2010 uma garantia de abastecimento das refinarias para prover às suas necessidades tradicionais;

a proposta não restringe as importações de açúcares dos PMD (países menos desenvolvidos) a partir de 2009/2010;

no atinente às exportações, a proposta proíbe a exportação de açúcar extra-quota e não encara a hipótese de exportação de açúcar de quota sem restituição;

a Comissão abandonou a ideia de transferência de quotas entre Estados-Membros e da redução linear das quotas de 2 800 000 toneladas em quatro anos; foi instaurado um plano de reestruturação; este plano é alimentado por uma quotização sobre as quotas de açúcar, isoglucose e inulina; mais de 50 % das quotizações sobre as quotas de açúcar são financiadas pelos agricultores através da descida do preço da beterraba;

o fundo de reestruturação concede aos fabricantes de açúcar, de isoglucose e de inulina que abdicam das suas quotas, em virtude do encerramento da fábrica e do desmantelamento das instalações de produção uma ajuda variável degressiva consoante o ano em que cessaram as suas actividades;

a Comissão prevê uma cobertura do fundo de reestruturação que poderia ir até 6,160 milhões de toneladas de quota num orçamento total de 4,2 mil milhões de euros;

a ajuda compensatória equivalente a 60 % da perda de receitas resultante da baixa do preço da beterraba é atribuída aos produtores de beterraba sacarina e de chicória de uma forma dissociada e respeitando os montantes por hectare destinados à produção A e B, havendo um limite máximo para cada um dos Estados-Membros;

cabe a cada Estado-Membro escolher o período de referência para a repartição;

o total das verbas destinadas ao apoio directo ao rendimento dos agricultores ascende em 2006/2007 a 907 milhões de euros e a partir de 2007/2008 a 1 542 milhões de euros.

2.   Observações na generalidade

2.1

O CESE considera absolutamente necessária a reforma da OCM do Açúcar. Lembra a propósito o seu parecer de 15/12/2004 (6) e, mais concretamente, os pontos 2.1, 2.4, 2.6, 2.7, 2.8, 2.9 e 2.10.

2.2

O CESE constata, no entanto, que a proposta de reforma vai muito para além do que foi anunciado na comunicação de 14 de Julho de 2004. As reduções nos preços e na produção são bastante mais elevadas e as exportações foram rapidamente suprimidas. A proposta envia, por conseguinte, um sinal errado aos nossos concorrentes nas negociações na OMC. Não concorre, além disso, para o objectivo de uma produção açucareira europeia capaz de garantir o abastecimento do mercado, sobretudo nas regiões onde a reconversão é difícil.

2.3

O CESE receia o efeito que as propostas de redução dos preços e da produção poderão ter sobre os rendimentos agrícolas e o emprego. Não pode deixar de sublinhar a este respeito o papel fundamental do sector açucareiro para a economia de muitas regiões. O CESE considera que a proposta não respeita o modelo agrícola europeu, a vontade expressa reiteradamente pelo Conselho de apoiar a produção agrícola tradicional também nas regiões ou Estados-Membros menos favorecidos, nem é tão pouco propícia à multifuncionalidade, à sustentabilidade e à realização da Estratégia de Lisboa. As propostas de reforma levam, de facto, ao desaparecimento de 150 000 empregos directos ou indirectos.

2.4

O CESE pensa que a opção de reforma escolhida pela Comissão, que consiste em procurar equilibrar o mercado através de uma descida dos preços, não é susceptível de atingir o seu objectivo, tornando impossível manter a longo prazo uma cultura de beterraba e uma indústria do açúcar europeias sólidas e respeitar os compromissos europeus para com os países em desenvolvimento fornecedores de açúcares preferenciais. Na opinião do CESE, é preciso evitar por todos os meios, que operações de triangulação (SWAP) com o açúcar, que não trazem aliás qualquer benefício aos PMD, abram as portas a novos segmentos do mercado mundial, nomeadamente ao Brasil. Neste contexto, o Comité sublinha que a produção de açúcar no Brasil, largamente apoiada pela política do bioetanol e pela política monetária, efectua-se em condições sociais, ambientais e de propriedade da terra inaceitáveis, mas que explicam os custos de produção brasileiros extremamente baixos, o aumento da produção nestes últimos anos com o aumento do stock no mercado mundial, e, consequentemente, a volatilidade dos preços neste mercado. O CESE considera que o acesso ao mercado comunitário deveria ficar dependente do cumprimento de determinadas normas sociais, como as contempladas na Declaração da Conferência da Organização Internacional do Trabalho de 1998.

2.5

O CESE (7) considera que as reduções de preços propostas são um passo decisivo rumo à liberalização completa do mercado do açúcar, o que não proporciona perspectivas duradouras aos produtores de beterraba, aos trabalhadores do sector do açúcar e aos consumidores dos países europeus.

2.6

O CESE (8) não compreende, portanto, por que razão a Comissão não considerou a possibilidade de negociar as quotas de importação preferencial com os PMD, tal como, aliás, estes o solicitaram, o que permitiria satisfazer de forma mais orientada os interesses dos países em desenvolvimento mais pobres e conseguir um abastecimento equilibrado do mercado e um nível de preços sustentável na Europa. O CESE chama a atenção para a contradição fundamental em que a Comissão se encontra, a qual, por um lado, justifica a reforma radical da OCM do açúcar com a iniciativa «tudo menos armas», mas recusa, por outro lado, dar seguimento ao desejo explicitamente formulado pelos PMD de obterem um sistema de quotas preferenciais.

2.7

O CESE (9) não partilha da opinião da Comissão de que a baixa significativa dos preços do açúcar irá beneficiar essencialmente os consumidores. Cerca de 70 % do açúcar é consumido através de produtos elaborados, que muito dificilmente podem ser alvo de baixas de preço que se repercutiriam nos preços ao consumidor. A isto há que aditar o facto de em determinados países em que o mercado do açúcar foi liberalizado os preços ao consumidor não terem sofrido qualquer redução.

2.8

O CESE não vê qual o motivo que induziu a Comissão a propor o abandono imediato das exportações de açúcar em estado inalterado. A União Europeia, embora tendo perdido perante o Painel OMC, continua a ter o direito de exportar 1 273 000 toneladas de açúcar em estado inalterado com subvenção, trate-se de açúcar de quota com restituição ou de açúcar extra-quota sem restituição. A cultura de beterraba caracteriza-se por uma certa variação nos rendimentos, estando o mercado além disso sujeito ao carácter variável das importações. Seria, portanto, oportuno dispor, graças às exportações, de uma certa flexibilidade para gerir a variação das disponibilidades de açúcar de quota ou extra-quota. Esta flexibilidade é necessária para assegurar a sustentabilidade da produção e um emprego racional dos trabalhadores e dos equipamentos.

2.9

O CESE dá o seu aval à proposta da Comissão de um plano de reestruturação voluntário capaz de melhorar sensivelmente as premissas para realizar essa mesma reestruturação. Apreciaria, contudo, que este plano fosse completado tendo em conta os interesses dos produtores de beterraba e dos trabalhadores da indústria açucareira.

2.10

Em termos globais, o CESE (10) pensa que a Comissão não avaliou devidamente o impacto da sua proposta, a qual conduzirá a uma transferência em massa de recursos do sector rural (agrícola e de primeira transformação) da Europa e dos países em desenvolvimento para as grandes empresas internacionais da alimentação e da distribuição e desmantelará, simultaneamente, uma parte considerável da indústria do açúcar europeia e dos países ACP em proveito quase exclusivo dos latifúndios que dominam a produção de açúcar brasileira (11).

3.   Observações particulares

3.1

O CESE congratula-se com o facto de a Comissão, conforme era seu desejo, propor um regulamento para o período de 1/7/2006 a 30/9/2015.

3.2

O CESE considera que as reduções de preços propostas são exageradas e não terão qualquer efeito nas importações de açúcar realizadas através de operações de comércio triangular (mercado mundial, PMD, EUA), cujo montante variará em função das flutuações do preço mundial e das taxas de câmbio. O CESE solicita, por conseguinte, que estas reduções de preço se limitem ao estritamente necessário, tendo em conta as negociações na OMC, e sejam escalonadas temporalmente, à semelhança das reduções pautais, sobretudo para dar aos novos Estados-Membros o tempo de que precisam para adaptar-se.

O CESE exorta, além disso, o Conselho a prestar especial atenção às dificuldades dos agricultores das zonas problemáticas ou daquelas que oferecem poucas alternativas rentáveis para a cultura da beterraba.

3.3

O CESE estranha que a proposta preveja um encargo de produção suportado pelos produtores e fabricantes, quando o nível das quotas será manifestamente inferior ao consumo e que a lógica da Comissão seja uma lógica de concorrência da produção europeia com o açúcar importado. Um tal encargo é nesta óptica discriminatório quer para os produtores quer para os fabricantes de açúcar comunitários. O CESE reivindica, portanto, a sua supressão ou, na sua falta, a sua extensão a todo o açúcar importado.

3.4

O CESE considera que é impossível ter uma OCM do açúcar eficaz se não houver a possibilidade de controlar de uma forma ou de outra as importações. Recomenda, pois, o estabelecimento de disposições que proíbam o SWAP do açúcar com os PMD e, caso a Comissão decida retirar do mercado um certo número de toneladas de açúcar de quota (mecanismo de retirada) ou adoptar uma medida de ajuda à armazenagem privada (preço de mercado inferior ao preço de referência), a aplicação automática de uma cláusula de salvaguarda quantitativa para as importações dos PMD.

3.5

Na opinião do CESE, a proposta de regulamento é incompreensivelmente restritiva em matéria de exportações. Todas as possibilidades de exportação autorizadas na OMC deveriam, a seu ver, ser permitidas pelo regulamento, nomeadamente, a exportação de um volume complementar de açúcar extra-quota desde que não tenham sido atingidos pelas exportações com restituição do açúcar de quota os limites quantitativos e orçamentais autorizados na OMC para as exportações subvencionadas.

Além disso, o regulamento deveria liberar a exportação sem restituição de açúcar de quota.

3.6

O CESE aponta para a fragilidade dos instrumentos de gestão do mercado propostos pela Comissão em substituição da intervenção. Presume-se, com efeito, que, face à irregularidade e à imprevisibilidade das importações causadoras de uma pressão permanente sobre o mercado, a armazenagem privada e o reporte obrigatório não permitirão garantir o preço de mercado em relação ao preço de referência. O CESE solicita, portanto, a manutenção do regime de intervenção.

3.7

O CESE regista a proposta da Comissão de compensar em 60 % as perdas de receitas resultantes da redução do preço da beterraba. As compensações deverão ser, no seu entender, equitativas e a percentagem de um nível análogo ao das compensações previstas para outras culturas. Constata que a redução efectiva do preço da beterraba, considerando a quotização para a produção e o risco de uma descida suplementar de 10 %, poderia chegar aos 50 %. Nestas condições, a compensação não passaria dos 51 %. O CESE recomenda, pois, uma redução de preços menos sensível e uma taxa de compensação mais elevada, dentro dos limites orçamentais propostos. O CESE insiste que a concessão de uma ajuda compensatória para contrabalançar uma baixa de preço não exclui a necessidade contínua de instrumentos de gestão eficazes, isto para evitar um colapso do mercado e garantir os rendimentos dos agricultores.

3.8

O CESE verifica que a proposta de compensação prevê ajudas dissociadas, repartidas por hectare de beterraba ou de chicória que tenha sido objecto de um contrato para a produção de açúcar A e B ou de xarope de inulina. O CESE considera que os Estados-Membros deverão, graças a regras adaptadas, ter toda a liberdade para atribuir aos produtores de beterraba e de chicória a totalidade das ajudas até aos limites máximos previstos na proposta. O CESE sugere que a Comissão avalie as consequências a longo prazo desta dissociação.

3.9

O CESE não considera normal que a proposta preconize um aumento gratuito das quotas de isoglucose de 300 000 toneladas quando se estabelece um programa de reestruturação oneroso para reduzir sensivelmente a quota de açúcar, defendendo que a eventual atribuição de um milhão de toneladas de quotas de açúcar suplementar seja contra pagamento.

3.10

O CESE apraz-se registar que a Comissão tenha tido em conta a sua sugestão de aplicar um regime de reestruturação voluntária indemnizada no início do regulamento, em substituição do mecanismo de redução obrigatória das quotas e da transferência de quotas ao nível europeu.

O CESE reivindica uma co-decisão entre os produtores e os fabricantes ao nível da reestruturação, bem como a atribuição de um subsídio adequado de reestruturação aos produtores por ela afectados.

O CESE constata a este respeito que o pagamento suplementar de 4,86 euros por tonelada de beterraba A e B a que têm direito os produtores afectados pela reestruturação no período de 2006-2007 não é mais do que a aplicação antecipada a estes produtores das ajudas para compensar a descida de preços em vigor a partir de 2007-2008. Não se trata, portanto, de um subsídio de reestruturação.

3.11

O CESE pensa que o Conselho deveria dar a máxima importância ao impacto da proposta da Comissão no emprego nas várias regiões afectadas pela reestruturação açucareira. Convida os Estados-Membros e a Comissão a facilitarem o acesso aos Fundos Estruturais comunitários e ao Fundo Social Europeu, sobretudo no caso das regiões que mais se ressentem com a reestruturação e os novos Estados-Membros, contribuindo deste modo para atenuar os efeitos negativos da reforma no emprego através de planos sociais que vão muito além do quadro legal obrigatório. É, com efeito, necessário favorecer a criação de novos empregos, a diversificação e a reconversão.

3.12

O CESE considera conveniente que tanto a Comissão como os Estados-Membros apoiem urgentemente pelas vias regulamentares e financeiras adaptadas uma política voluntarista de utilização de biocombustíveis na qual a beterraba deveria ter um papel essencial. O CESE considera absolutamente indispensável continuar a desenvolver processos que tenham por alvo a valorização do açúcar produzido extra-quota no sector não alimentar.

3.13

O CESE chama a atenção da Comissão e do Conselho para o efeito fortemente desestabilizador das importações de açúcar dos Balcãs nos mercados dos países confinantes. Recomenda a definição e a aplicação das medidas de salvaguarda indispensáveis (sobretudo o respeito do preço de intervenção ou do preço de referência) e insiste ainda que seja rapidamente fixada a quota da Croácia.

4.   Conclusões

4.1

O CESE reconhece a necessidade de adaptar a OCM do açúcar, mas considera que as propostas de reforma vão longe de mais na redução da produção e dos preços.

A sua aplicação terá repercussões consideráveis no sector europeu do açúcar, nomeadamente, devido à perda de um mínimo de 150.000 empregos em regiões muitas vezes já de si fragilizadas e sem alternativas rentáveis para esta cultura.

4.2

O CESE exorta o Conselho a ser mais ambicioso do que a Comissão na produção europeia de beterraba e de açúcar graças ao controlo quantitativo das importações e à autorização de utilizar todas as possibilidades de exportação permitidas pela OMC. É perfeitamente possível um objectivo de produção superior 2 a 3 milhões de toneladas ao proposto pela Comissão, sobretudo através do controlo das importações. Tal permitiria salvar 50 000 a 75 000 empregos e cerca de 50 000 explorações agrícolas de beterraba situadas em diversas regiões da Comunidade.

4.3

O CESE receia que não sejam alcançados os objectivos da iniciativa «Tudo menos armas» e da reforma da OCM do açúcar ao nível da política de desenvolvimento. É este o motivo por que secunda o pedido dos PMD de negociar com a UE as quotas de importação de açúcar. Convém, de qualquer modo, proibir a prática de operações de triangulação e estabelecer cláusulas de salvaguarda automáticas e um código de conduta com critérios de sustentabilidade social e ambiental, bem como de soberania alimentar. O acesso ao mercado comunitário dependerá da sua observância.

4.4

O CESE recomenda a manutenção de uma corrente de exportações de açúcar de quota ou extra-quota correspondente ao número de toneladas autorizado pela OMC para podermos continuar a servir os nossos clientes tradicionais mais próximos.

4.5

O CESE insiste que as descidas de preços sejam escalonadas no tempo e limitadas estritamente aos compromissos internacionais e que, se for necessário, o açúcar seja tratado como um produto sensível no âmbito das negociações da agenda de Doha para o desenvolvimento.

4.6

Sugere a manutenção do regime de intervenção e a aplicação duradoura de instrumentos eficazes de gestão do mercado.

4.7

O CESE solicita que as compensações parciais pagas aos produtores pelas perdas de receitas resultantes da descida do preço da beterraba sejam aumentadas na medida do possível e atribuídas na sua totalidade. Insiste na necessidade de assegurar a sustentabilidade das ajudas e de preservar o orçamento do açúcar.

4.8

Concorda com a proposta da Comissão no atinente ao plano de reestruturação, mas reivindica um direito de co-decisão para os produtores e a concessão de uma ajuda aos que forem afectados pelo encerramento de fábricas que lhes permita reorganizar as suas explorações.

4.9

O CESE insiste na mobilização de verbas dos Fundos Estruturais e dos Fundos Sociais Europeus para dar aos trabalhadores afectados pela reestruturação da indústria açucareira europeia, além das respectivas indemnizações, melhores oportunidades de reconversão profissional.

4.10

O CESE considera necessário e urgente envolver o sector açucareiro no debate energético (uma política de biocombustíveis) como uma maneira de contribuir para compensar os efeitos negativos da reforma.

4.11

O CESE insiste na correcção rápida dos efeitos desestabilizadores das importações de açúcar dos Balcãs.

4.12

O CESE solicita ao Conselho que esteja atento à situação das zonas problemáticas ou que oferecem poucas alternativas agrícolas rentáveis.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  ACP: países em desenvolvimento da África, das Caraíbas e do Pacífico, signatários do Protocolo do Açúcar do Acordo de Cotonou.

(2)  COM(2004) 499 final.

(3)  JO C 157, p. 102.

(4)  COM(2005) 263 final.

(5)  COM(2005) 266 final.

(6)  Ver nota de rodapé 3.

(7)  JO C 157 de 28.6.2005.

(8)  JO C 157 de 28.6.2005.

(9)  JO C 157 de 28.6.2005.

(10)  JO C 157 de 28.6.2005.

(11)  JO C 157 de 28.6.2005.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/57


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Relatório sobre a execução da estratégia florestal da União Europeia»

COM(2005) 84 final

(2006/C 28/11)

Em 17 de Março de 2005, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente emitiu parecer em 7 de Outubro de 2005, sendo relator S. KALLIO. O co-relator foi H.-J. WILMS.

Na 421.a reunião plenária, de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro de 2005), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 97 votos a favor e 1 abstenção, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

Nem o Tratado CE nem a proposta de Tratado Constitucional prevêem uma política florestal comum.

1.2

A Comissão Europeia publicou, em 18 de Novembro de 1998, uma comunicação sobre uma estratégia florestal para a UE. Em 15 de Dezembro de 1998, o Conselho da UE adoptou uma resolução sobre a estratégia florestal da União com base na comunicação da Comissão.

1.3

O Conselho destacou a gestão e utilização sustentáveis das florestas — como definidas na conferência ministerial sobre a floresta realizada em Helsínquia em 1993 — e o papel multifuncional das florestas como elementos-chave da estratégia florestal comum, base geral para a acção.

1.4

Outros princípios-chaves da estratégia florestal são a subsidiariedade, de acordo com a qual cabe aos Estados-Membros definir uma política florestal, e a possibilidade de a Comunidade contribuir para a execução da gestão e utilização sustentáveis da floresta e o respectivo papel multifuncional, sempre que a acção comunitária possa trazer valor acrescentado.

1.5

O Comité Económico e Social Europeu emitiu um aditamento a parecer de iniciativa sobre a política florestal da UE, em 9 de Dezembro de 1999.

1.6

Na sua resolução, o Conselho solicitou à Comissão um relatório, num prazo de cinco anos, sobre a execução da estratégia florestal da União Europeia.

1.7

Em 10 de Março de 2005, a Comissão publicou uma comunicação sobre a execução da estratégia florestal da UE. O documento de trabalho dos serviços da Comissão, anexo à comunicação, descreve pormenorizadamente as acções e iniciativas levadas a cabo durante o período 1999-2004 no âmbito da estratégia florestal da UE.

1.8

O Comité apoia a orientação geral da comunicação da Comissão, em particular no que respeita ao reforço da execução e à melhoria da coordenação. O Comité considera importante a execução imediata do plano de acção proposto para a gestão sustentável das florestas.

2.   Execução da estratégia florestal

2.1   Mutações no ambiente de funcionamento

2.1.1

Desde 1998, a silvicultura e a política florestal da UE foram afectadas pelos desafios que enfrentam e por muitas mutações no contexto político; a comunicação da Comissão destaca o alargamento da UE, a adopção de objectivos de política estratégica e os desenvolvimentos verificados no âmbito da política florestal e ambiental à escala internacional.

2.1.2

Com o alargamento, a área florestal da UE teve um aumento de cerca de 20 %, os recursos florestais aumentaram cerca de 30 % e o número de proprietários florestais passou de 12 milhões para 16 milhões. É necessário aumentar a capacidade institucional para promover uma silvicultura sustentável nos novos Estados-Membros; um desafio particular prende-se com o desenvolvimento de estruturas de propriedade privada e institucionais.

2.1.3

Na Cimeira sobre o Desenvolvimento Sustentável de Joanesburgo, em 2002, salientou-se a importância de uma silvicultura sustentável como recurso de desenvolvimento sustentável e como via para atingir os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, de modo geral. A cimeira aprovou um plano de acção que vincula os governos e que inclui decisões relativas às florestas.

2.1.4

O sector florestal da UE tem-se deparado com um mercado de produtos florestais cada vez mais globalizado e com uma indústria florestal grandemente concentrada que requer uma maior eficiência da produção de madeira.

2.1.5

As florestas desempenham um papel significativo e são fonte de muitos benefícios para a sociedade. Simultaneamente, a utilização sustentável das florestas e os serviços ambientais por elas prestados tornaram-se cada vez mais importantes. Os acordos ambientais internacionais firmados pela UE e Estados-Membros representam novos desafios para a silvicultura.

2.1.6

O Conselho Europeu de Lisboa (Março de 2000) adoptou um novo objectivo estratégico para a UE, o de tornar-se na economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva, capaz de um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos e com maior coesão social. O Conselho Europeu de Gotemburgo (Junho de 2001) aprovou a estratégia de desenvolvimento sustentável da UE, complementar da Estratégia de Lisboa, que exige abordar as políticas económicas, sociais e ambientais por forma que estas se reforcem mutuamente.

2.1.7

Muitas políticas, legislação e medidas comunitárias têm uma incidência directa ou indirecta na silvicultura. Não foram avaliadas a compatibilidade e a complementaridade com a estratégia florestal comunitária e a respectiva execução.

2.2   A União Europeia e a política florestal internacional

2.2.1

Na sua resolução, o Conselho constatou, em relação à estratégia florestal, que a UE deveria implicar-se de modo activo na execução das resoluções da conferência ministerial sobre silvicultura, e ter uma participação proactiva no debate e negociações internacionais sobre questões relacionadas com silvicultura, em particular no Fórum Intergovernamental das Nações Unidas para as Florestas.

2.2.2

No seu parecer de 1999, o Comité Económico e Social Europeu considerava que a UE deveria apoiar vigorosamente o estabelecimento de um instrumento jurídico global vinculativo para a gestão, conservação e desenvolvimento sustentável de todo o tipo de floresta, o que vai ao encontro dos princípios florestais acordados no Rio. Este objectivo ainda é pertinente do ponto de vista da internacionalização do comércio de produtos florestais, da globalização da indústria florestal, da constante destruição de florestas e da necessidade de proteger os direitos das populações locais dependentes das florestas.

2.2.3

Para prevenir o abate e comércio clandestinos de madeira, a Comissão adoptou o plano de acção de aplicação da regulamentação florestal, governação e comércio (FLEGT) e uma proposta legislativa para a criação de um sistema de autorização FLEGT. O Comité considera de primordial importância a prevenção do abate e comércio clandestinos de madeira. O abate clandestino provoca graves prejuízos ambientais, económicos e sociais, e a madeira proveniente de abate clandestino distorce o comércio de produtos da madeira. Todavia, e no respeitante à prevenção do abate clandestino, a tónica deve ser posta nas medidas que se podem tomar em colaboração com os países produtores de madeira, a fim de tornar mais estritos os processos administrativos e melhorar a aplicação da lei. É a melhor maneira de se ter em conta os factores e impactos sociais nacionais nas condições de vida e no bem-estar das comunidades dependentes das florestas, por exemplo. Deve-se prestar particular atenção à protecção de florestas naturais primitivas e da sua diversidade. A clarificação dos direitos de utilização dos solos é um factor essencial para reduzir os abates clandestinos. O sistema de autorização proposto não obvia à necessidade de reforçar estas medidas.

2.2.4

Verificou-se um aumento do impacto da política económica, social e ambiental internacional e dos acordos ambientais da ONU nas florestas e no quadro das actividades florestais da UE. No contexto da Convenção das Nações Unidas sobre a Biodiversidade, adoptou-se, em 2002, um programa de trabalho alargado para a biodiversidade florestal. No âmbito da Convenção das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, houve acordo sobre o papel das florestas como sorvedouros de carbono na prevenção das alterações climáticas. O Protocolo de Quioto, em particular, coloca o sector florestal perante novos desafios e oportunidades. A silvicultura sustentável pode afectar de modo considerável o cumprimento das obrigações impostas por acordos ambientais internacionais. Tal requer a adopção, pela UE, de uma abordagem coordenada e convergente na política ambiental, económica e social internacional, e nas suas próprias políticas, para estabelecer um equilíbrio entre as várias dimensões da silvicultura sustentável e respeitar as diferentes modalidades de utilização das florestas.

2.2.5

A nível pan-europeu, a Conferência Ministerial sobre a Protecção das Florestas na Europa (CMPFE) é o mais importante fórum de debate da política florestal e criou um quadro eficaz para a promoção da gestão e utilização das florestas sustentáveis em termos económicos, ecológicos, sociais e culturais.

2.3   Estratégia florestal comunitária e políticas florestais nacionais

2.3.1

A 4.a Conferência Ministerial sobre a Protecção das Florestas na Europa (realizada em Viena em 28-30 de Abril de 2003) salientou a importância dos programas florestais nacionais para o desenvolvimento da cooperação entre o sector florestal e outros sectores. Na conferência ministerial ficou acordado que um programa florestal nacional é um processo participativo, holístico, intersectorial e interactivo de planificação, execução, monitorização e avaliação de políticas ao nível nacional e/ou subnacional, para avançar para a melhoria da gestão sustentável das florestas, como definida em Helsínquia, e para contribuir para o desenvolvimento sustentável.

2.3.2

Em conformidade com o princípio da subsidiariedade, os programas florestais nacionais são um meio essencial para executar os objectivos da estratégia florestal da UE. Os programas florestais nacionais são programas-quadro holísticos e multi-sectoriais que têm em conta o impacto do sector florestal em outros sectores e vice-versa. Os programas florestais nacionais podem ter em conta e equilibrar as múltiplas modalidades de utilização das florestas e as expectativas da sociedade em relação a elas, tendo em conta as especificidades nacionais. Os programas florestais nacionais estabelecem coerência e consistência entre políticas nacionais e com os compromissos internacionais. Deve-se efectuar uma avaliação destes programas a fim de verificar se atingem os objectivos pretendidos.

2.3.3

Os compromissos internacionais assumidos pela UE e Estados-Membros em matéria de política ambiental e florestal podem ser melhor cumpridos integrando-os nos programas florestais nacionais.

2.3.4

A UE deveria promover a elaboração de programas florestais nacionais, como recomenda a CMPFE, a fim de promover uma silvicultura sustentável e lograr uma abordagem holística do desenvolvimento da silvicultura e da política florestal nos Estados-Membros e na UE.

2.4   Política de desenvolvimento rural e silvicultura

2.4.1

O principal instrumento para executar a estratégia florestal ao nível comunitário tem sido a política de desenvolvimento rural. Durante o período 2000-2006, foram atribuídos 4,8 mil milhões de euros a medidas florestais no âmbito da política de desenvolvimento rural, metade para florestação de terrenos agrícolas e a outra metade para outras medidas florestais.

2.4.2

O Relatório Especial n.o 9/2004 do Tribunal de Contas sobre medidas florestais no âmbito da política de desenvolvimento rural constata que nem a Comissão nem os Estados-Membros assumiram a responsabilidade de avaliar o impacto dos projectos na realização da estratégia florestal da UE.

2.4.3

O regulamento geral relativo ao apoio ao desenvolvimento rural (n.o 1257/1999, artigo 29.o) dispõe que o apoio dos Estados-Membros no âmbito da política de desenvolvimento rural se baseará em programas florestais nacionais ou subnacionais ou instrumentos equivalentes. Em alguns Estados-Membros, os programas nacionais encontram-se ainda na fase de elaboração, e estão operacionais em apenas alguns países.

2.4.4

A avaliação das medidas florestais efectuada no âmbito da política de desenvolvimento rural foi desservida pela ausência de dados da Comissão sobre medidas florestais nos Estados-Membros. Não há um sistema efectivo para monitorar medidas florestais nos Estados-Membros beneficiários de financiamento comunitário.

2.4.5

Embora uma parte considerável do financiamento seja atribuída a medidas de florestação, não foram definidos objectivos operacionais claros em matéria de aplicação das medidas no âmbito da estratégia florestal, tendo em conta, em particular, os objectivos ambientais.

2.4.6

Muitas direcções-gerais e unidades da Comissão estão envolvidas no processo de aprovação de planos e programas operacionais de desenvolvimento rural, bem como de medidas florestais. A complexidade da decisão tem limitado o alcance da política de desenvolvimento rural na execução da estratégia florestal da UE.

2.4.7

Deve-se igualmente esclarecer se seria mais eficiente concentrar os recursos comunitários, em mecanismos de compensação por serviços ambientais, não em subsidiar medidas de florestação, mas, sim, na promoção do mercado da madeira, na investigação, formação e informação, e nas medidas de desenvolvimento rural, a fim de garantir, a longo prazo uma melhoria das condições e do emprego no sector florestal, bem como nos serviços ambientais prestados pelas florestas.

2.4.8

Há que recordar igualmente que a silvicultura e a madeira é um sector baseado no mercado e faz parte do sector aberto da economia. O mercado interno da UE só funcionará com eficiência se o mercado da madeira não for distorcido pela política de apoio.

2.5   Protecção das florestas e salvaguarda dos serviços ambientais prestados pelas florestas

2.5.1

A actividade da silvicultura deve ser sustentável em termos económicos, ecológicos, sociais e culturais. Protecção das florestas, acompanhamento do seu estado, reparação dos danos e salvaguarda dos serviços ambientais prestados pelas florestas são aspectos importantes da silvicultura sustentável. Deve-se salvaguardar a utilização sustentável das florestas mediante uma regeneração adequada.

2.5.2

Os grandes objectivos para as florestas da UE são a salvaguarda da sua saúde e vitalidade através da protecção contra poluentes do ar, incêndios florestais e outros factores nocivos, sejam eles orgânicos (doenças, insectos) ou inorgânicos (erosão).

2.5.3

Cerca de 0,4 milhões de hectares de florestas são anualmente atingidos por fogos na UE. Os incêndios florestais são um grave problema, em particular nos Estados-Membros do Sul. Além da prevenção de incêndios florestais, a UE tem recolhido dados sobre os incêndios e tem acompanhado as suas dimensão e causas. A UE criou um quadro para recolha sistemática de dados sobre a extensão e causas dos incêndios florestais. Tem-se recorrido a este sistema para avaliar e acompanhar as medidas tomadas pelos Estados-Membros e pela Comissão para a prevenção de incêndios florestais. A protecção florestal e ambiental da UE não pode ser bem sucedida se não se desenvolver uma abordagem eficaz do acompanhamento e prevenção dos incêndios florestais.

2.5.4

A principal legislação relativa à salvaguarda da saúde e vitalidade das florestas é a directiva relativa à protecção das plantas, a directiva relativa à comercialização de material reprodutivo e o quadro regulamentar relativo ao acompanhamento das florestas e das interacções ambientais (Forest Focus).

2.5.5

O regulamento Forest Focus estabelece um quadro comunitário para prosseguir o acompanhamento da saúde das florestas e programas de prevenção de incêndios florestais, bem como para desenvolver e diversificar os sistemas de acompanhamento. O objectivo é recolher dados fiáveis e comparáveis sobre o estado das florestas e sobre os factores nocivos que afectam os ecossistemas florestais da União.

2.5.6

Já se recolhem dados no âmbito de acordos internacionais, da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), do Comité da Madeira da Comissão Económica para a Europa, do EUROSTAT e da CMPFE sobre a biodiversidade florestal, os recursos florestais, o sequestro de carbono, o ciclo do carbono e os produtos florestais e medidas de protecção. No desenvolvimento de sistemas comunitários de acompanhamento, é importante estudar sistemas existentes, ou em preparação, de acompanhamento nacionais, pan-europeus e globais, e garantir o respeito da privacidade dos proprietários no respeitante ao tratamento e publicação de dados.

2.5.7

A directiva comunitária relativa à protecção das plantas tem disposições sobre a protecção de plantas ou de produtos de origem vegetal contra substâncias nocivas, e sobre o controlo de pragas. A directiva relativa à protecção das plantas também estabelece normas para o comércio internacional de produtos de madeira e de material reprodutivo. As alterações climáticas aumentam o risco de propagação e reprodução de pragas que afectam as plantas. Para proteger a saúde das florestas e prevenir a propagação das principais pragas florestais no território da UE é necessário dispor de regras de protecção de plantas suficientemente rigorosas e de vigilância eficaz. Todavia, essas regras não deveriam conduzir a medidas distorçoras do comércio, em virtude do recurso a tais directivas como barreira não-pautal ao comércio.

2.5.8

As florestas e a biodiversidade florestal são parte importante do ambiente natural da Europa. A protecção da biodiversidade florestal é um aspecto primordial da política ambiental da UE. A estratégia florestal afirma que se pode conservar a biodiversidade florestal na União, principalmente através de medidas adequadas de gestão florestal. Também se pode proteger a biodiversidade através da silvicultura sustentável mediante a criação de áreas de conservação de florestas. Em conformidade com o princípio da subsidiariedade, cabe aos Estados-Membros integrar as questões de biodiversidade, consoante o caso, nos programas florestais nacionais ou em instrumentos afins.

2.5.9

A legislação mais importante relativa à protecção da biodiversidade florestal é a Directiva «Habitats» (92/43/CEE) e a Directiva «Aves» (79/409/CEE). A conservação de espécies e habitats protegidos foi conseguida ao nível comunitário através da criação de uma rede de áreas especiais de conservação, a rede Natura 2000. Na gestão e controlo das áreas Natura 2000, há que ter em conta os requisitos sociais, económicos e informativos, os impactos financeiros, bem como os aspectos específicos locais e regionais.

2.5.10

A integração da protecção da biodiversidade florestal na exploração sustentável da floresta em todo o espaço florestal e na rede Natura 2000 é indispensável para a consecução dos objectivos de conservação da biodiversidade, bem como para cumprir os compromissos internacionais vinculativos.

2.5.11

Ao nível comunitário, a conservação da biodiversidade florestal é também orientada pela directiva relativa à estratégia da biodiversidade (COM(1998) 42). A comunicação sobre a estratégia da biodiversidade salienta a importância de ter em conta, de modo equilibrado, a necessidade de garantir a conservação e o desenvolvimento adequado da biodiversidade nas florestas, a necessidade de salvaguardar a saúde das florestas e o equilíbrio ecológico, e a produção sustentável de matérias-primas para bens e serviços necessários à indústria florestal e à sociedade. Constata-se igualmente que as acções de desenvolvimento e conservação da biodiversidade florestal deveriam ser um elemento da estratégia florestal comunitária.

2.5.12

Aumentaram a procura dos serviços ambientais prestados pelas florestas e as expectativas da sociedade. Conservar e desenvolver a dimensão social e recreativa das florestas é um aspecto importante da silvicultura sustentável. Deve-se aumentar a cooperação com as ONG e as organizações de consumidores, por forma que a silvicultura possa fornecer os produtos, serviços e aplicações que vão ao encontro das necessidades dos cidadãos. Deve-se informar o público em geral e os proprietários das florestas sobre o impacto ambiental das suas actividades e sobre abordagens sustentáveis disponíveis. Para poder mostrar a importância dos serviços prestados pelas florestas para a economia e a sociedade no seu todo, devem elaborar-se, em todos os Estados-Membros, balanços gerais de tais serviços.

2.5.13

A gestão e utilização das florestas na UE estão reguladas de longa data por vários métodos de política florestal. É fundamental respeitar o direito que cabe aos proprietários florestais de determinarem a utilização das suas florestas e utilizarem os seus recursos florestais dentro do respeito da lei e dos princípios da utilização sustentável da floresta. Devem ser instituídos mecanismos de compensação ou de remuneração apropriados para os casos em que a produção de benefícios sociais e ambientais vá para além dos requisitos legais de gestão florestal e prejudique a viabilidade económica do sector florestal e o direito dos proprietários florestais a tomarem decisões sobre a sua propriedade florestal.

2.5.14

Os serviços ambientais, e outros, prestados pelas florestas são produtos dos proprietários florestais, e como tal devem ser reconhecidos. Deverá ser possível determinar o valor dos serviços ambientais prestados pelas florestas, e devem-se desenvolver modelos operacionais para encorajar a prestação de tais serviços numa base voluntária e orientada para o mercado.

2.6   Florestas e alterações climáticas

2.6.1

As florestas (inclusivamente os respectivos solos) são importantes sumidouros de dióxido de carbono e depósitos de carbono. O armazenamento do carbono pelas florestas contribui para reduzir o efeito de estufa e o aquecimento global. Manter as florestas produtivas e assegurar a sua regeneração pode salvaguardar o seu importante papel de sumidouros de carbono.

2.6.2

Os produtos da madeira podem substituir produtos mais nocivos em termos de alterações climáticas. A promoção da utilização da madeira pode contribuir para aumentar o volume de carbono nos produtos. O incremento da utilização da madeira como combustível pode contribuir para reduzir o recurso a combustíveis fósseis e os danos que causam à atmosfera.

2.6.3

As alterações climáticas também afectam os ecossistemas e as condições necessárias à actividade florestal. Uma floresta bem gerida constitui a base para a adaptação às alterações climáticas. Em virtude do longo prazo necessário às florestas, deve-se iniciar em tempo útil a adaptação às alterações climáticas. A silvicultura também pode tirar partido das alterações climáticas e ter repercussões positivas para a sociedade e para a prevenção das alterações climáticas. Em virtude da grande variedade dos ecossistemas e das actividades florestais na UE, será mais sensato gerir a adaptação ao nível nacional. Ao nível comunitário, pode-se apoiar a investigação sobre a adaptação às alterações climáticas e o desenvolvimento de sistemas de informação.

2.7   Competitividade do sector florestal da UE e promoção do emprego na silvicultura

2.7.1

O sector florestal é um dos mais importantes sectores económicos da UE. O sector florestal, e em particular a silvicultura, é um sector de mão-de-obra intensiva e, assim, é uma fonte importante de emprego. As PME do sector florestal são particularmente importantes para a vitalidade das zonas rurais e para o respectivo nível de emprego. A silvicultura e as indústrias florestais empregam cerca de 3,4 milhões de pessoas, com uma produção anual cujo valor atinge cerca de 356 mil milhões de euros.

2.7.2

O impacto da silvicultura no emprego não se limita ao sector de transformação da madeira, mas abrange igualmente produtos florestais não derivados da madeira e outros produtos biológicos das florestas. Os produtos florestais não derivados da madeira, como a cortiça, os cogumelos e as bagas, bem como o turismo ecológico e actividades conexas com a caça são fontes consideráveis de rendimentos. Podem-se igualmente criar novos empregos e fontes de rendimento através do desenvolvimento de serviços ambientais e recreativos prestados pelas florestas.

2.7.3

A execução da estratégia florestal permitiu promover de modo efectivo as questões ambientais. A vigorosa política ambiental da UE escorou o desenvolvimento de medidas ambientais. De acordo com a estratégia comunitária de desenvolvimento sustentável aprovada pelo Conselho Europeu de Gotemburgo e a Estratégia de Lisboa, o sector florestal e a indústria baseada na floresta da UE devem ser desenvolvidos por forma a desempenharem em pleno um papel na realização dos objectivos de competitividade, crescimento económico, emprego e coesão social.

2.7.4

Embora possa variar grandemente, consoante os países e regiões, o equilíbrio entre as diferentes modalidades de utilização, a produção de madeira continua a ser a actividade florestal mais importante, se bem que apenas 60 % do crescimento florestal anual seja abatido. Pode-se aumentar a exploração dos recursos de madeira da UE sem pôr em risco a produção sustentável da madeira e outras modalidades de utilização das florestas. Um aproveitamento mais eficiente dos recursos florestais da UE tornaria possível aumentar o emprego no sector, a capacidade da indústria florestal e a auto-suficiência da UE em produtos florestais.

2.7.5

Uma comunicação específica e a respectiva avaliação abordaram a competitividade da indústria florestal da UE. É, todavia, importante, no sector florestal, uma coordenação das actividades da silvicultura e das indústrias baseadas na floresta

2.7.6

A UE necessita de uma atractiva indústria da madeira. Tal requer cooperação entre o sector florestal e as comunidades locais a fim de aumentar a qualificação profissional no sector. É fundamentalmente importante para a indústria florestal a salvaguarda da sustentabilidade e do fornecimento da matéria-prima produzida pelas florestas.

2.7.7

A gestão sustentável da floresta há-de servir de base para uma indústria florestal europeia competitiva, por isso têm de se encontrar maneiras de torná-la viável em termos económicos.

2.7.8

A eficiência, a rentabilidade e a competitividade da silvicultura e da produção de madeira europeias devem ser igualmente consideradas separadamente da competitividade da indústria florestal. A estratégia florestal não foca de modo suficiente a importância económica das florestas nem, por exemplo, o funcionamento do mercado da madeira. Conservar e aumentar a competitividade significa desenvolver o factor custo-eficácia da silvicultura, mediante o estabelecimento de condições de operação favoráveis à exploração eficiente das florestas comerciais e ao desenvolvimento de métodos de produção de madeira. Uma produção de madeira rentável torna possível investir na salvaguarda e desenvolvimento da sustentabilidade ecológica e económica das florestas. Todavia, isto não pode prejudicar a exploração ambiental e socialmente sustentável das florestas. Importa, pois, desenvolver investigação neste campo, para se conseguir algum grau de clareza relativamente ao impacto da gestão cada vez mais mecanizada das florestas nos factores ambientais e sociais e para evitar efeitos negativos.

2.7.9

A maximização do aproveitamento multifuncional das florestas gera valor acrescentado e aumenta a sustentabilidade, tanto para a economia do sector privado como para a economia em geral. Devem-se concentrar recursos, especialmente em investigação e desenvolvimento, no desenvolvimento de novas modalidades de utilização das florestas e das respectivas matérias-primas, bem como na criação de mercados eficientes para os produtos e serviços.

2.8   Promover a utilização da madeira

2.8.1

A madeira é uma matéria-prima renovável, reciclável, cujos produtos armazenam quantidades consideráveis de carbono e, assim, abrandam o aquecimento global. A energia florestal pode ser utilizada para substituir a produção de energia nociva para o ambiente baseada em recursos de energia não renováveis.

2.8.2

Para promover a utilização da madeira, deve-se conceber uma estratégia a longo prazo focando, entre outros, os obstáculos à utilização da madeira constantes da legislação e normas, as actividades de investigação e desenvolvimento, utilizações inovadoras da madeira, melhoria das qualificações profissionais, comunicação e informação.

2.8.3

Deve-se promover a energia baseada na madeira como parte de uma estratégia da UE para incentivar formas de energia inovadoras e o Plano de Acção Biomassa. Deve-se desenvolver o mercado da energia baseada na madeira com base na procura. A promoção da utilização de energia baseada na madeira deveria ter em conta as necessidades de matéria-prima da indústria de transformação da madeira.

2.8.4

Quando se definirem o papel da silvicultura e as suas condições de funcionamento, será igualmente importante reconhecer que a utilização sustentável de recursos naturais renováveis é crucial para a competitividade e para a sustentabilidade económica. A estratégia de desenvolvimento sustentável e a política ambiental da UE, em particular a estratégia de utilização sustentável de recursos naturais, devem ter em conta o papel especial dos recursos naturais renováveis na construção de uma sociedade mais sustentável.

2.9   Desenvolver a capacidade e as qualificações profissionais no sector florestal

2.9.1

O regime de propriedade florestal na Europa assenta numa base alargada. O Estado, as empresas públicas e as grandes empresas são proprietários de áreas florestais consideráveis, enquanto as explorações familiares são de pequena dimensão. A silvicultura estatal pode desempenhar um papel importante, tanto na produção de madeira como, e em particular, na prestação de serviços sociais e ambientais.

2.9.2

É importante desenvolver as qualificações profissionais de todas as diferentes partes envolvidas no sector florestal (por exemplo, trabalhadores, indústria, proprietários florestais, organizações de aconselhamento e serviços, autoridades florestais públicas) e a capacidade de enfrentarem futuros desafios. Um aspecto deste esforço consiste em melhorar as condições e capacidades das organizações das partes interessadas e desenvolver medidas práticas. Deve-se reforçar a cooperação entre o sector florestal e a sociedade civil a fim de desenvolver uma silvicultura sustentável.

2.9.3

Cerca de 60 % das florestas da UE pertencem a proprietários privados, cujo número se aproxima dos 16 milhões. Devem-se garantir condições equitativas às explorações familiares em matéria de silvicultura sustentável, produção de madeira e acesso ao mercado. As associações de proprietários florestais demonstraram ser um canal efectivo de prestação de informações sobre silvicultura sustentável e sobre a maneira de a pôr em prática. O desenvolvimento das associações de proprietários florestais também tornaram possível combater a fragmentação da propriedade florestal.

2.10   Certificação de florestas

2.10.1

A certificação de florestas é um processo voluntário baseado no mercado para promover a silvicultura sustentável e informar os clientes e outros grupos de interesses sobre o seu compromisso em matéria de silvicultura sustentável. A certificação de florestas pode ser utilizada para salientar outras actividades de promoção da silvicultura sustentável. Os regimes de certificação de florestas devem respeitar o princípio da voluntariedade e os princípios da credibilidade, transparência, custo-eficácia e não-discriminação, e a possibilidade de participação das partes envolvidas.

2.10.2

É importante que a certificação de florestas continue a ser um instrumento voluntário. Ao nível comunitário, não se devem estabelecer regras que poderiam abolir efectivamente o carácter voluntário da certificação e impor aos proprietários e a outras partes envolvidas na silvicultura regras imperativas de gestão florestal mais severas do que a legislação em vigor.

2.10.3

Dado que a certificação de florestas é um instrumento orientado para o mercado, o papel da UE ou dos governos nacionais limita-se ao apoio de iniciativas do sector privado e das ONG para a promoção da certificação de florestas. Os governos não podem, todavia, desempenhar um papel preponderante no processo de certificação de florestas.

2.10.4

A UE deve garantir o funcionamento sem restrições do mercado interno. Na perspectiva do sector florestal, é importante que os governos não favoreçam, através das suas actuações, um regime particular de certificação de florestas. O mercado deve oferecer alternativas e deve haver livre concorrência. O papel dos governos consiste em assegurar que não se levantem obstáculos artificiais ao comércio.

2.11   A UE e a estratégia florestal

2.11.1

O sector florestal só poderá enfrentar estes desafios, por exemplo em relação à competitividade e ao desenvolvimento sustentável, mediante o desenvolvimento de processos, métodos de produção e de produtos novos e inovadores. Deve-se intensificar o papel das actividades de investigação e desenvolvimento relacionadas com a silvicultura no actual e futuro programas-quadro de investigação da UE.

2.11.2

O 7.o Programa-Quadro de Investigação da UE abrange o período de 2007-2013. As plataformas de tecnologia europeias são um novo instrumento para elaborar e executar o programa-quadro. A confederação europeia das indústrias de papel (CEPI), as indústrias da madeira (CEI-Bois) e a confederação europeia de proprietários de florestas familiares (CEPF) apresentaram à Comissão uma iniciativa comum de plataforma de tecnologia do sector florestal («Utilização inovadora e sustentável dos recursos florestais»).

2.11.3

É urgente intensificar a investigação sobre os efeitos da mudança do clima, a saúde das florestas e sistemas de controlo adequados. Mediante essa investigação e o consequente intercâmbio de informações, a UE poderá sensibilizar os proprietários florestais para a necessidade de adaptarem as suas florestas às mudanças climáticas.

2.12   Coordenação de questões florestais

2.12.1

Uma condição prévia para gerir as questões florestais e executar medidas florestais é a coordenação eficaz entre os domínios de política que têm impacto nas florestas e na silvicultura. Pretende-se que a Comunidade tenha melhor em conta do que actualmente as consequências para a silvicultura das suas tomadas de decisões nos diferentes domínios de política.

2.12.2

O Comité Económico e Social Europeu tem apreço pelo trabalho do Grupo Interserviços para a floresta, da Comissão, no sentido de melhorar a coordenação sobre questões relacionadas com as florestas e a silvicultura. Todavia, melhorar a coordenação e clarificar as competências requer um órgão único responsável pela execução da coordenação, intercâmbio de informações e interacção entre as várias DG, bem como pela comunicação e informação das autoridades florestais dos Estados-Membros e grupos de intervenientes competentes. Será importante assegurar que a coordenação se efectua a um nível suficientemente elevado. É necessário garantir a existência de pessoal e de outros recursos em número suficiente, por forma que as medidas comunitárias possam apoiar o desenvolvimento sustentável.

2.12.3

Tanto o Comité Permanente da Floresta como o Comité Consultivo da Silvicultura e Cortiça devem ser dotados de recursos adequados às suas missões. Deve-se reforçar a possibilidade de envolver os grupos de intervenientes na tomada de decisão nas reuniões estatutárias dos comités consultivos. Deve-se destacar a perícia florestal dos Estados-Membros nos outros grupos de trabalho do Conselho, em particular no Comité STAR, quando são debatidas questões de silvicultura. A coordenação das actividades efectuadas pelos comité e grupos de trabalho em matéria florestal deve ser eficaz, no que respeita às questões florestais tanto comunitárias como internacionais. As reuniões dos comités consultivos e grupos de trabalho devem-se desenvolver por forma que as DG competentes em matéria relevante para a silvicultura (agricultura, energia, ambiente, empresas, investigação) realizem debates com grupos importantes de intervenientes (proprietários florestais e fundiários, indústria florestal, ONG e outros intervenientes).

2.12.4

Na execução de obrigações internacionais, será importante clarificar a repartição de poderes entre a Comunidade e os Estados-Membros, e respeitar o princípio da subsidiariedade. No plano internacional, os Estados-Membros e a Comissão coordenam as suas posições no âmbito do grupo de trabalho do Conselho sobre as florestas. Deve-se reforçar a posição deste grupo de trabalho, a que se deveria conferir um papel formal e coerente.

3.   Plano de acção para reforçar a execução da estratégia florestal

3.1.1

Há necessidade de desenvolver com eficácia a silvicultura sustentável e de tirar partido do potencial das florestas para promover o desenvolvimento sustentável. O Comité apoia o plano de acção proposto pela Comissão, que deveria ser um instrumento de coordenação e quadro de referência para a execução de medidas no sector florestal.

3.1.2

O Comité recomenda que a Comissão, em conjunto com os Estados-Membros, delineie uma visão clara e objectivos estratégicos para as florestas europeias subjacente ao modelo europeu de silvicultura. Estes objectivos deveriam basear-se e orientar-se nas decisões da Declaração do Rio e da Agenda 21 e orientar-se por elas, reiteradas que foram na cimeira mundial sobre desenvolvimento sustentável em Joanesburgo. Confirmou-se nesta cimeira que a gestão sustentável das florestas é um elemento do desenvolvimento sustentável. As acções comunitárias relacionadas com a silvicultura deveriam ainda realçar o contributo das florestas para criar uma sociedade sustentável e para os objectivos globais de desenvolvimento, inclusivamente a Estratégia de Lisboa, o Acordo de Gotemburgo e os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.

3.1.3

Com base nas recomendações deste parecer, a visão que se pretende deveria incluir as seguintes questões. As florestas europeias, o sector florestal e o sector madeireiro serão factores primordiais para contribuir para uma sociedade sustentável europeia. Uma silvicultura e uma indústria florestal e madeireira de mercado, economicamente viáveis e competitivas que reforcem as redes económicas regionais criariam emprego e rendimentos, e poderiam ter particular impacto na economia e desenvolvimento regionais. As florestas são um alicerce essencial dos serviços de interesse geral e desempenham um importante papel recreativo, cultural e ambiental. O sector florestal europeu fornece saber-fazer inovador e alta tecnologia. A UE deveria contribuir de modo activo para os processos florestais internacionais conforme as decisões da CMSD e do FNUF (Fórum das Nações Unidas sobre as Florestas).

3.1.4

Os objectivos estratégicos do plano de acção deveriam basear-se nos princípios de coordenação e contribuir com um valor acrescentado para a política florestal. O sector florestal deveria ser reconhecido como um sector autónomo, e dever-se-ia efectuar uma avaliação ex-ante de todas as futuras políticas e medidas com ele relacionadas.

3.1.5

O plano de acção para a gestão sustentável das florestas deveria abranger todas as dimensões da silvicultura sustentável e toda a sua cadeia de produção. Mas, para garantir a utilização eficaz dos recursos comunitários atribuídos ao plano de acção, deve-se especificar que actividades e medidas serão prioritariamente beneficiadas.

3.1.6

É importante que o plano de acção tenha em conta a perspectiva florestal na execução de outras políticas comunitárias, por exemplo, a política ambiental, energética, de desenvolvimento rural e industrial, por forma a promover a silvicultura, tendo em igual conta as dimensões económica, ecológica, social e cultural da sustentabilidade.

3.1.7

A concentração de informação sobre serviços e avaliação ambientais deve ser desenvolvida no âmbito do plano de acção. O plano deveria apoiar o desenvolvimento de modelos operacionais inovadores e de mercado para a produção de serviços ambientais florestais. Devem-se explorar as possibilidades de sistemas de pagamento baseados no mercado para compensar os serviços ambientais não provenientes da madeira (por exemplo, protecção dos recursos hídricos, sequestro de carbono) prestados pelos proprietários florestais.

3.1.8

Deve-se dar prioridade à criação de um ambiente óptimo para garantir a competitividade e a viabilidade económica do sector florestal. O plano de acção deveria especificar modalidades de apoio aos modelos operacionais inovadores com valor acrescentado para a silvicultura, e de promoção de iniciativas de empresas no sector florestal. Devem-se incluir disposições para a criação de uma bolsa visual da madeira europeia que possa dar uma imagem instantânea, global e transparente das tendências económicas (procura e oferta) no respeitante a tipos de madeira, acessível aos proprietários florestais em qualquer momento (na Internet).

3.1.9

Um elemento-chave do plano de acção deverá ser a promoção da utilização da madeira e de outros produtos florestais como materiais renováveis e ecológicos. Deve-se elaborar um programa de informação e comunicação sobre a madeira e outros produtos florestais a executar no âmbito do plano de acção. O plano de acção deverá igualmente ter em conta a utilização da madeira como fonte de energia renovável.

3.1.10

O plano de acção deverá ainda apoiar a promoção da investigação e desenvolvimento sobre florestas. Um aspecto desta actividade seria a integração de importantes projectos de investigação sobre silvicultura no 7.o Programa-Quadro de Investigação da UE, e o apoio à plataforma tecnológica do sector florestal. Estudos científicos (contratos de investigação) conduzidos conjuntamente com faculdades universitárias de silvicultura deveriam estabelecer a quantidade de mão-de-obra necessária à indústria florestal europeia, e as respectivas qualificações, por forma que o sector possa operar com eficácia numa base sustentável e ecológica conforme as disposições legais, regulamentares e de certificação. Deve-se igualmente efectuar um estudo sobre «clusters» da silvicultura.

3.1.11

O plano de acção deveria igualmente tentar estabelecer como os esforços comunitários poderão servir de apoio ao processo da conferência ministerial de silvicultura europeia e à execução das decisões da conferência. O plano de acção deveria reforçar, em particular, a execução dos programas florestais nacionais conforme a abordagem abrangente estabelecida na conferência ministerial de silvicultura europeia.

3.1.12

O plano de acção deveria prever programas de intercâmbio de trabalhadores florestais entre países, por forma que possam tirar lições dos pontos fortes e fracos dos sistemas nacionais e desenvolver novas abordagens das suas tarefas nos respectivos países.

3.1.13

Um aspecto do plano de acção prende-se com a identificação de modalidades práticas para melhorar a coordenação e a comunicação em matéria de tomada de decisão sobre florestas. Uma plataforma europeia de informação e comunicação concebida para aproximar os cidadãos da Europa deveria coligir as inúmeras e diferentes actividades interessantes do sector florestal europeu, e informar os intervenientes individuais do sector da silvicultura nos países e regiões em que se inserem.

3.1.14

A execução do plano de acção requer igualmente a atribuição de responsabilidade e a dotação de recursos adequados.

3.1.15

Um elemento importante do plano de acção deve ser as medidas de promoção e preservação da biodiversidade nas florestas. Por um lado, a biodiversidade deve ser fomentada nas zonas protegidas através de programas de apoio específicos (por exemplo, Natura-2000) pelo que a consciencialização e a aceitação da população, dos proprietários florestais e das organizações devem ser promovidas. Por outro lado, para preservar a biodiversidade nas restantes zonas florestais haverá que criar instrumentos que assegurem a protecção e a melhoria das espécies florestais típicas. Além disso, deve prever-se a instituição de zonas de protecção total. Atendendo às obrigações especiais que daí decorrem, as florestas estatais devem constituir o núcleo destas actividades, ao passo que para as florestas privadas deverão ser criados sistemas de compensação adequados.

3.1.16

Para ser possível a avaliação da eficácia das medidas e dos instrumentos previstos será indispensável intensificar os sistemas de monitorização do plano de acção e integrá-los num todo coerente. Para tal a biodiversidade dentro e fora das zonas protegidas deve ser cartografada, estudada e acompanhada. Da mesma forma, são imprescindíveis levantamentos regulares e exaustivos do estado das florestas. A investigação e o acompanhamento permitirão determinar até que ponto as medidas de promoção das florestas contribuem para preservar a biodiversidade.

4.   Conclusões

4.1

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) crê que a estratégia florestal e a sua execução devem continuar a basear-se no princípio da subsidiariedade e no conceito de silvicultura sustentável em termos económicos, ecológicos, sociais e culturais.

4.2

O CESE salienta que se deve prestar atenção, na execução da estratégia florestal, ao alinhamento dos seus objectivos com as Estratégias de Lisboa e de Gotemburgo.

4.3

O CESE crê que a União Europeia deve trabalhar com consistência no sentido de um acordo global e juridicamente vinculativo sobre a gestão, conservação e desenvolvimento sustentável de todos os tipos de florestas, que respeite os princípios da silvicultura adoptados na Conferência da ONU sobre Ambiente e Desenvolvimento, de 1992, e apoia a execução das propostas de medidas adoptadas pelo Painel Intergovernamental para as Florestas e pelo Fórum Intergovernamental para as Florestas. O CESE salienta, igualmente, que a União Europeia deve tomar medidas para garantir que os actuais processos e instrumentos concebidos para promover a silvicultura sustentável sejam tidos em plena conta nos acordos ambientais internacionais.

4.4

O CESE constata que as conferências ministeriais de debate sobre a protecção das florestas europeias têm um importante papel a desempenhar na cooperação florestal entre os países europeus e crê que as decisões tomadas nessas conferências devem, quando necessário, ser incorporadas na estratégia florestal comunitária.

4.5

O CESE destaca o impacto positivo do sector florestal no emprego e na vitalidade das zonas rurais e no desenvolvimento das actividades empresariais rurais. Medidas florestais aplicadas no âmbito da política de desenvolvimento rural devem basear-se nos programas florestais nacionais, e estes, por seu lado, deveriam fomentar a realização dos objectivos da estratégia florestal. O CESE apela igualmente à criação de sistemas de acompanhamento das medidas florestais dos Estados-Membros no âmbito da directiva de desenvolvimento rural, co-financiadas pela UE, bem como do seu impacto. O CESE salienta que o apoio atribuído à silvicultura no âmbito da política de desenvolvimento rural não deve distorcer a concorrência no mercado da madeira e de outros produtos florestais.

4.6

O CESE desejaria salientar os efeitos benéficos das florestas para a saúde humana, tanto física como psíquica, e para a recreação dos trabalhadores. Assim, apela aos Estados Membros a respeitarem o princípio de acesso público aos recursos da natureza, permitindo o livre acesso das pessoas às florestas e bosques, fixando simultaneamente a responsabilidade do público em matéria de observância da legislação e dos horários de acesso às florestas determinados pelos proprietários, e das regras de protecção do ambiente.

4.7

O CESE é de opinião que a execução equilibrada da estratégia florestal exige que as decisões tomadas no âmbito da política ambiental da União Europeia e os objectivos do desenvolvimento florestal da UE deveriam ser coerentes com os outros e complementares.

4.8

O CESE constata que a protecção das florestas e a salvaguarda dos serviços ambientais e sociais das florestas são um aspecto importante da silvicultura sustentável, e que, na protecção das florestas e na produção de serviços ambientais, devem-se atribuir recursos para desenvolver modelos operacionais que encorajem uma abordagem voluntária e orientada para o mercado. A produção de benefícios sociais e ambientais necessários à sociedade não deve restringir desnecessariamente os direitos de propriedade e de decisão dos proprietários, nem colocar em risco a rentabilidade da silvicultura que actue conforme a legislação e os princípios da silvicultura sustentável.

4.9

O CESE crê importante reconhecer a importância das florestas e dos seus produtos para o controlo das alterações climáticas, e que a UE promova a investigação e o intercâmbio de informações sobre a adaptação àquelas alterações.

4.10

O CESE tem para si que a Comissão Europeia deve prestar particular atenção às questões que podem reforçar os esforços da UE para criar um clima favorável à silvicultura sustentável. O CESE crê que a execução equilibrada da política florestal, bem como das Estratégias de Lisboa e Gotemburgo, requer uma maior concentração na promoção da exploração comercial das florestas, na rentabilidade, competitividade e emprego no sector florestal.

4.11

O CESE crê ser necessário promover a utilização da madeira e de outros produtos florestais como matéria-prima renovável e ecológica e como fonte de energia, e que se deve elaborar uma estratégia a longo prazo para esse efeito.

4.12

O CESE considera importante promover a capacidade dos actores para desenvolverem uma silvicultura sustentável. O CESE tem por relevante que os proprietários de explorações florestais de pequenas dimensões tenham a oportunidade de desenvolver a sua própria silvicultura de modo sustentável, através do reforço das organizações representativas dos proprietários da floresta privada. É necessário aumentar a capacidade institucional para promover uma silvicultura sustentável nos novos Estados-Membros; um desafio particular prende-se com o desenvolvimento de estruturas de propriedade privada e institucionais.

4.13

O CESE assinala que a certificação de florestas é um instrumento facultativo, baseado no mercado, para promover a silvicultura sustentável. O CESE considera importante que a UE tenha a responsabilidade do bom funcionamento do mercado interno e garanta que a certificação de florestas não se transforme num obstáculo artificial ao comércio.

4.14

O CESE crê importante reforçar a sustentabilidade, a capacidade e a competitividade do sector florestal através das actividades da investigação e desenvolvimento.

4.15

O CESE crê ainda essencial intensificar a coordenação entre as várias questões prioritárias de política e que as implicações para o sector florestal se reflictam melhor na tomada de decisão sobre as várias políticas sectoriais. Para melhorar a coordenação, deve-se designar um órgão único responsável pela execução da estratégia florestal e pela comunicação com as diferentes direcções-gerais, os Estados-Membros, as autoridades florestais e os grupos de intervenientes no sector.

4.16

O CESE apoia a proposta da Comissão de elaborar um plano de acção especial para a execução da estratégia florestal. O CESE crê importante que este plano de acção inclua uma definição das prioridades e competências e que seja dotado de recursos suficientes para a execução.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/66


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que estabelece a organização comum de mercado no sector das sementes»

COM(2005) 384 final — 2005/0164 (CNS)

(2006/C 28/12)

Em 21 de Setembro de 2005, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 36.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Em 27 de Setembro de 2005, a Mesa do Comité Económico e Social Europeu incumbiu a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro), designou relator-geral G. BROS e adoptou, por 61 votos a favor, sem votos contra e 3 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité aprova a redacção de um novo regulamento que retoma as numerosas alterações do Regulamento n.o 2358/71. Contudo, a proposta da Comissão é restritiva e deverá ser alterada. Em particular, a cláusula de salvaguarda deverá ser extensível a todos os países terceiros e não apenas aos países não membros da Organização Mundial do Comércio (OMC).

1.2

O Comité propõe que se reintroduza o segundo Considerando do Regulamento (CEE) n.o 2358/71:

«Considerando que a situação especial do mercado de certas sementes é caracterizada pela necessidade de manter preços concorrenciais em relação aos preços mundiais destes produtos; que, por consequência é conveniente assegurar, com medidas adequadas, a estabilidade do mercado como rendimentos equitativos para os produtores interessados».

1.3

O Comité propõe que se reintroduza o sexto Considerando do Regulamento (CEE) n.o 2358/71, tornando-o aplicável a todos os produtos sensíveis:

«Considerando que, para o milho híbrido destinado á sementeira para as produções de sementes sensíveis, é necessário evitar, no mercado da Comunidade, perturbações devidas a ofertas feitas no mercado mundial a preços anormais; que, com este fim, convém fixar para estes produtos preços de referência e acrescentar aos direitos aduaneiros uma taxa compensatória quando os preços de oferta franco-fronteira, aumentados dos direitos aduaneiros, se situem abaixo dos preços de referência».

1.4

O Comité propõe a seguinte redacção para o n.o 1 do artigo 7.o:

«Se, devido às importações ou às exportações, o mercado comunitário de um ou vários produtos referidos no artigo 1.o sofrer, ou correr o risco de sofrer, perturbações graves que possam pôr em perigo a realização dos objectivos do artigo 33.o do Tratado, podem ser aplicadas medidas adequadas ao comércio com países não membros da Organização Mundial do Comércio terceiros até que desapareça a perturbação ou o risco de perturbação.».

2.   Observações na generalidade

2.1

Esta proposta da Comissão Europeia sobre a revisão da OCM no sector das sementes visa essencialmente consolidar o Regulamento (CEE) n.o 2358/71 na sequência das numerosas alterações que lhe foram introduzidas e, mais recentemente, da reforma da PAC. Mas ela reduz a política agrícola em matéria de sementes à sua mais simples expressão, ou seja, mantém uma cláusula de salvaguarda e exige o intercâmbio de informações estatísticas entre os Estados-Membros.

2.2

As sementes não podem ser consideradas como uma simples matéria-prima agrícola. Elas constituem um factor de produção estratégica, quer para adaptar os sectores agrícolas e agro-alimentares, quer para dar resposta às expectativas dos consumidores (por exemplo, para uma produção isenta de OGM). Devido à sua constituição genética e às suas qualidades, a semente é, de facto, o primeiro elo de uma cadeia, tendo em vista responder às exigências de competitividade do mercado e às exigências dos cidadãos em matéria de segurança alimentar e de respeito pelo ambiente. A OCM no sector das sementes deve definir os meios mais ambiciosos para preservar, acompanhar e orientar a produção agrícola europeia.

3.   Observações na especialidade

3.1

Ao proceder-se à revisão do regulamento será necessário ter efectivamente em conta os artigos 33.o e 34.o do Tratado. No mínimo, devem ser reintroduzidos os segundo e sexto Considerandos do Regulamento (CEE) n.o 2358/71. Trata-se de reforçar a capacidade da Comissão Europeia de agir em caso de dificuldades nos mercados das sementes, a fim de respeitar o Tratado e as exigências dos consumidores europeus.

3.2

Na lista dos produtos abrangidos pela OCM (artigo 1.o), seria mais coerente, do ponto de vista legislativo, enumerá-los fazendo referência às Directivas n.os 66/401 e 66/402 (1) de 1966 relativas à comercialização de sementes, em complemento da nomenclatura pautal.

3.3

Na proposta da Comissão, o accionamento da cláusula de salvaguarda que autoriza a Comissão a tomar as medidas necessárias em caso de perturbações graves susceptíveis de pôr em perigo a realização dos objectivos do artigo 33.o do Tratado fica significativamente limitado aos países não membros da OMC. Os actuais concorrentes da União Europeia no respeitante a produtos de alta tecnologia como as sementes são todos países desenvolvidos (Estados Unidos, Chile, Austrália, Nova Zelândia, etc.). Todos eles são, evidentemente, membros da OMC. Por isso, não será adequado limitar a aplicação da cláusula de salvaguarda aos países não membros da OMC.

3.4

A qualidade das sementes e o seu controlo regem-se, nos Estados-Membros, pelas directivas n.os 66/401, 66/402, 2002/54 e 2002/57. Nos países terceiros, há que garantir o mesmo nível de qualidade das sementes. Dado que este último ponto faz parte das negociações para concessão de equivalência a sementes produzidas na União Europeia e em países terceiros, a OMC deveria mencionar esta exigência de qualidade, por exemplo, nos Considerandos.

3.5

A OMC deve definir uma verdadeira política de auxílio à organização dos produtores. A produção de sementes organiza-se obrigatoriamente no âmbito de uma relação contratual entre uma empresa produtora de sementes e um agricultor. O agricultor produtor de sementes está, de facto, obrigado a fornecer a totalidade da colheita à empresa com a qual mantém um vínculo contratual, nos termos do Regulamento de 1994 (2) sobre a protecção das variedades vegetais. Neste quadro, seria interessante que a organização comum de mercado ajudasse a organização dos agricultores, os quais, não raro, se encontram numa posição de desvantagem face às empresas, e definisse regras mínimas de contratualização.

3.6

A OCM deveria definir os meios susceptíveis de reforçar a recolha de informação estatística, no sentido da realização dos objectivos enunciados no oitavo Considerando da proposta.

3.7

A Comissão deveria definir um procedimento operacional de aplicação das cláusulas de salvaguarda. De facto, é muito difícil provar que as importações pontuais a preços muito baixos possam «pôr em perigo a realização dos objectivos do artigo 33.o do Tratado», tal como se afirma no projecto da Comissão, ou gorar as expectativas dos consumidores europeus.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO 125 de 11/07/66.

(2)  Regulamento (CE) n.o 2100/94 do Conselho de 27/07/1994, JO L 227 de 01/09/1994.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/68


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1493/1999 que estabelece a organização comum do mercado vitivinícola»

COM(2005) 395 final — 2005/0160 (CNS)

(2006/C 28/13)

Em 21 de Setembro de 2005, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 37.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Em 27 de Setembro de 2005, a Mesa do Comité Económico e Social Europeu incumbiu a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro), designou relator-geral Pedro BARATO TRIGUERO e aprovou o presente parecer por 88 votos a favor, 1 voto contra e 1 abstenção.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité Económico e Social Europeu acolhe favoravelmente as alterações propostas pela Comissão ao articulado e aos anexos do Regulamento (CE) n.o 1493/1999 (1) do Conselho. As alterações em causa são necessárias para adequar o regulamento à realidade do sector vitivinícola. No entanto, o CESE propõe a aceitação de carvões de uso enológico também para os vinhos tranquilos na ausência de motivos que justifiquem a sua exclusão das práticas autorizadas.

1.2

Segundo critérios técnicos, o citado uso constitui o único tratamento, sob controlo, que não apresenta contra-indicações para eliminar a ocratoxina (OTA) no caso dos vinhos tintos que o requeiram.

1.3

O Comité entende que a proposta da Comissão de substituir a alínea i) do ponto 1 do anexo IV pelo texto seguinte: «Tratamento dos mostos e dos vinhos novos ainda em fermentação por carvões de uso enológico, dentro de certos limites» deveria ser modificada, de forma que os vinhos tranquilos também pudessem ser tratados com carvão de uso enológico.

1.4

A proposta da Comissão deveria, pois, ser formulada do seguinte modo «Tratamento dos mostos, dos vinhos novos ainda em fermentação e dos vinhos tranquilos por carvões de uso enológico, dentro de certos limites».

2.   Motivação

2.1

A Comissão Europeia propõe-se alterar o Regulamento n.o 1493/1999 do Conselho que estabelece a organização comum do mercado vitivinícola.

2.2

O CESE considera que a proposta da Comissão é uma consequência lógica da necessária adaptação da regulamentação comunitária em virtude da adesão de novos Estados-Membros à União Europeia e das alterações operadas no sector vitivinícola europeu. A proposta contribuirá para uma maior transparência e clareza, dando cobertura legal a práticas enológicas reconhecidas e admitidas pela Organização Internacional da Vinha e do Vinho.

2.3

O CESE concorda com a adição do dicarbonato dimetílico (DMDC) como nova prática enológica mas frisa que, se a DG Saúde e Protecção do Consumidor decidir reduzir o teor máximo de sulfitos e, por sua vez, reduzir ou eliminar o DMDC devido ao seu efeito multiplicador dos teores em metanol, o sector vitivinícola ver-se-ia desprovido de alternativas técnicas.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO L 179 de 14/7/1999, p. 1. Regulamento alterado em último lugar pelo Regulamento (CE) n.o 1795/2003 da Comissão (JO L 262 de 14/10/2003, p. 13).


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/69


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao Fundo de Solidariedade da União Europeia»

COM(2005) 108 final — 2005/0033 (COD)

(2006/C 28/14)

Em 27 de Setembro de 2005, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, que emitiu parecer em 3 de Outubro de 2005, sendo relator P. BARROS VALE.

Na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 74 votos a favor, sem votos contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

O Fundo de Solidariedade da União Europeia (FSUE) foi criado em 2002, com o objectivo de prestar assistência às regiões do Estados-Membros ou países em processo de adesão que viessem a sofrer catástrofes de grandes proporções.

1.2

O FSUE deveria ser ágil e o mais desburocratizado possível, de modo a possibilitar uma assistência imediata às regiões afectadas.

1.3

A dotação do FSUE para o período 2002-2006 foi prevista em cerca de mil milhões de euros anuais.

1.4

O Regulamento do FSUE deverá ser revisto até final de 2006, e é sobre a mesma que este parecer se debruçará.

1.5

O actual FSUE limita-se aos desastres naturais, sendo extremamente difícil a assistência no caso de acidentes industriais, de actos terroristas e mesmo no caso de uma grave crise de saúde pública.

1.6

A actual barreira financeira para a mobilização do FSUE é muito elevada (situa-se nos 3 biliões de euros de custos com estragos directos ou mais de 0,6 % do PNB) o que resultou no facto de mais de 2/3 das ajudas terem sido efectuadas ao abrigo de uma cláusula de excepção (cuja dotação anual é limitada a 75 milhões de euros).

2.   A nova proposta

2.1   Questões genéricas

2.1.1

O âmbito geográfico do FSUE mantém-se, englobando os actuais Estados-Membros e os países em processo de adesão.

2.1.2

O âmbito temático do FSUE alarga-se, contemplando, para além de catástrofes naturais, catástrofes tecnológicas ou industriais, ameaças para a saúde pública e actos de terrorismo.

2.1.3

A definição de «catástrofe» elegível no âmbito do Fundo é feita por meio de um duplo critério, quantitativo ou político:

2.1.3.1

Quantitativo — a barreira financeira para a mobilização do FSUE diminui de 3 para 1 bilião de euros ou de 0,6 % para 0,5 % no PNB, o que permite a mobilização num maior número de casos.

2.1.3.2

Político — em determinadas e bem justificadas circunstâncias (designadamente aquelas em que, no momento da decisão, não seja ainda totalmente conhecida a dimensão dos estragos) a Comissão pode accionar o Fundo, ainda que o critério quantitativo não seja cumprido.

2.1.4

Os países vizinhos do país afectado, quando sofram também consequências, são elegíveis.

2.1.5

Deve ser assegurado, também no caso do FSUE, o princípio da subsidiariedade.

2.1.6

É contemplada na Proposta da Comissão a possibilidade de ser solicitado um adiantamento por parte do país afectado (cerca de 5 % do total do custo previsto das operações elegíveis, num máximo de 5 milhões de euros) a conceder imediatamente após o pedido de ajuda, que deverá ser devolvido pelo país em causa, caso se verifique a sua não elegibilidade.

2.1.7

Deverá ser aplicado o princípio da proporcionalidade na atribuição do apoio, considerando, quer o total dos estragos, quer a dimensão do país e a gravidade futura da catástrofe.

2.1.8

A utilização do apoio é da total responsabilidade do país que o recebe, que terá que apresentar um relatório onde conste a aplicação do dinheiro, devidamente justificada, e que deverá estar de acordo com o regulamento.

2.1.9

O valor proposto pela Comissão para o FSUE mantém-se em 1 bilião de euros por ano.

2.1.10

O orçamento da UE não contempla a verba destinada ao FSUE. Cada vez que o Fundo é mobilizado, é-o por via de um orçamento rectificativo.

2.1.11

Caso o montante anual seja ultrapassado, utiliza-se o do ano seguinte, garantindo que a ajuda é concedida, sempre que se justifique.

3.   Observações gerais e específicas

3.1

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe favoravelmente o objectivo da Comissão em tornar o Fundo de Solidariedade de aplicação mais abrangente e dar-lhe capacidade de rápida resposta em situações de crise.

3.2

Parece, no entanto, ao CESE que deverão ser ajustadas diversas questões na Proposta da Comissão, de forma a melhorá-la e torná-la mais eficaz, levando a que o Fundo seja um instrumento poderoso e flexível ao dispor da União Europeia, para que as populações dos territórios abrangidos pela sua aplicação possam beneficiar efectivamente do apoio solidário da mesma. Esse contributo, necessariamente desburocratizado e com regras capazes de dar cobertura aos diversos tipos de catástrofe, qualquer que seja a sua origem, nos momentos mais críticos das comunidades que pretende servir, tem de ser não só um precioso auxiliar na reconstrução da normalidade e funcionamento das infra-estruturas e da vida económica e social, mas também um sinal político inequívoco que a Europa possa dar aos cidadãos afectados por graves situações de emergência.

3.3

Assim, o CESE entende que a dimensão do envelope financeiro proposto parece ajustar-se às exigências das solicitações registadas nos últimos anos, mas duvida que a grandeza proposta possa corresponder às necessidades de uma grande catástrofe, como um terramoto ou maremoto de grandes proporções, uma pandemia de dimensão europeia ou, por exemplo, um acidente ou atentado com armas de destruição massiva. Essas situações, verdadeiramente excepcionais, deveriam ser previstas através de um mecanismo, também ele de carácter excepcional, mas ao qual a União possa lançar mão, se uma desgraça desse calibre um dia possa suceder.

3.4

As regras de acessibilidade ao Fundo de Solidariedade da União Europeia devem ser, no entender do CESE, simples e claras, o mais possível desprovidas de burocracia, mas possuir mecanismos que possibilitem a transparência, bem como a posterior avaliação e fiscalização dos fins para que foram canalizados os recursos postos ao dispor do Estado beneficiário.

3.5

Tendo em conta a actual conjuntura orçamental da União e a realidade económica com que a Europa se confronta, o CESE não é contrário à forma de orçamentação variável plafonada por limite pré-estabelecido, que o Regulamento propõe, mas considera que mal seja possível, o FSUE deveria vir a ser estabelecido como um Fundo Permanente Autónomo, com uma dotação anual fixa própria, cujas «sobras» provenientes das não utilizações anuais serviriam como reserva para grandes catástrofes.

3.6

Quanto às regras referentes aos prazos de utilização, considera o CESE que a proposta da Comissão vai no bom sentido, e aplaude o mecanismo de resposta rápida previsto, que possibilite um apoio célere, imediatamente após a constatação dos factos, objecto do accionamento do FSUE.

3.7

Quanto à problemática da Avaliação de Danos, o CESE considera que tal processo não só não é simples, tendo em conta a dimensão das situações cobertas pelo Regulamento proposto, como ainda é previsivelmente muito falível, tendo em conta a multiplicidade de custos e agentes afectados, já que não são só os danos públicos que estão em questão, mas sim também os privados. O curto espaço de tempo em que o pedido deve ser apresentado aos serviços da Comissão, conjugado com a multiplicidade de interesses e bens materiais afectados, pode levar a uma especial sobrevalorização ou subvalorização do impacto da crise em questão, pelo que a avaliação dos pedidos feitos pelos Estados, deve ser criteriosa, recorrendo-se a especialistas, dados históricos e registos anteriores, e ponderando-se os referenciais económicos, pelo nível de preços no Estado objecto do apoio.

3.8

No que diz respeito ao tipo de custos a comparticipar pelo Fundo, o CESE considera correctas as operações elegíveis listadas no art. 4 da proposta de Regulamento, mas gostaria que fosse incluída uma alínea suplementar com a seguinte designação: «outras operações de interesse público, tendentes à normalização da vida social e económica das populações e/ou zonas afectadas, e a tornar o FSUE acessível a todos os intervenientes da sociedade civil, segundo modalidades e regras a definir». A intenção da inclusão desta nova alínea, prende-se com a imprevisibilidade de todos os tipos e consequências dos factos a cobrir pelo FSUE, introduzindo flexibilidade decisional, em situações mais especiais nas quais a organização social e o dispositivo de produção poderiam estar ameaçadas caso não fosse possível indemnizar os danos privados.

3.8.1

No que respeita a esta abertura, cabe notar que as dotações previstas estão longe de estar esgotadas, devido nomeadamente à cláusula de reserva dos fundos, que impõe a sua limitação apenas às despesas públicas e proíbe que sejam tidas em consideração situações que muitas vezes correspondem perfeitamente à filosofia do FSUE.

3.8.2

Da mesma forma, a noção de limite deveria ser revista de forma a adequar as possibilidades de intervenção do fundo às exigências no terreno e à dimensão regional de certos fenómenos naturais.

3.9

O CESE considera que os beneficiários finais devem ser os Cidadãos da União Europeia, através das operações elegíveis a levar a cabo. Só por razões logísticas e organizacionais os beneficiários intermediários são os Estados, que recebem os meios para esse fim do orçamento do FSUE. Também por aquele facto não devem ser somente Organizações Estatais a receber os meios públicos que ficam disponíveis pela intervenção do Fundo, mas também a Sociedade Civil Organizada, envolvida nas operações elegíveis, uma vez que no geral os Estados não dispõem dos recursos de intervenção para acorrer sem a sua ajuda aos efeitos deste tipo de catástrofes. Os corpos de bombeiros, organizações voluntárias da sociedade civil ligadas à saúde ou apoio social e outros actores da sociedade civil, devem ser compensados devidamente pelo seu esforço, dedicação, e custos suportados, já que em geral não possuem orçamentos compatíveis com a singularidade deste tido de eventos de expressiva dimensão.

3.10

O CESE considera que o âmbito geográfico dos países a abranger, em caso de catástrofe, deve ser revisto, de forma a garantir a cobertura e extensão do apoio a outros países, para além dos imediatamente vizinhos. Em catástrofes de grandes dimensões (em que o nuclear é um simples exemplo), podem vir a ser afectados outros Estados, que não só os que fazem fronteira com o Estado em que ocorreu a origem da tragédia, pelo que os diversos Estados afectados devem ser elegíveis para apoio. Nas situações em que existem outros Estados afectados, e desde que o Fundo tenha sido activado, ele deve ter aplicação nos diversos Estados envolvidos, mesmo que alguns deles não cumpram os limiares expressos no art. 2 da proposta de Regulamento.

3.11

A questão da vizinhança coloca-se também, no entender do CESE, para os Estados não membros, ou não candidatos, desde que afectados por um evento originado no território da União, ou nos territórios dos Estados candidatos — se o FSUE vier a ser accionado para um acontecimento originado ou provocado nesse âmbito geográfico, os outros Estados vizinhos deverão merecer também a solidariedade da União, ou através do FSUE, ou dos outros instrumentos que estão em vigor para a cooperação internacional, desde que tal não afecte, reduzindo por esse facto, os programas de cooperação que em concreto estejam em vigor.

3.12

O CESE considera indispensável a inclusão, como elegíveis, de catástrofes decorrentes de situações de acumulação ou prolongamento de factos não imediatamente identificados como especialmente gravosos (ex. seca grave), bem como a clarificação do momento da sua aferição. As alterações climatéricas a que temos vindo a assistir, em parte motivadas pelo aquecimento global de que o conjunto da União é também responsável, afectam mais uns Estados do que outros, e não seria razoável nem solidário que a União Europeia se colocasse fora das suas obrigações, tanto no que diz respeito ao problema das suas origens, bem como das suas consequências.

3.12.1

As observações efectuadas in loco durante a missão de estudo do CESE a Espanha e a Portugal entre 14 e 16 de Setembro de 2005 revelaram, em muitos casos, a necessidade de combinar:

o FSUE, na sua capacidade de intervenção rápida, para trazer uma solução imediata às necessidades mais prementes quer junto das populações quer de forma material,

com os fundos de intervenção mais estruturais, a fim de solucionar a longo prazo os problemas de fundo, nomeadamente pela criação de infra-estruturas de prevenção da seca, pela reflorestação e pela promoção de actividades alternativas quando os incêndios tenham sido particularmente destrutivos.

3.12.2

A integração do FSUE num conjunto mais amplo de intervenções intensivas a longo prazo deveria constituir um critério importante de selecção de projectos pela Comissão. Obter-se-ia assim uma maior eficácia do conjunto do FSUE e dos Fundos Estruturais.

3.12.3

A problemática do abastecimento de agua, do funcionamento de infra-estruturas, e do apoio às populações, no pano social ou da saúde em situações imprevisíveis de seca ou de ondas de calor, não poderá ficar de fora dos fenómenos a apoiar pelo FSUE, da mesma forma que as cheias, tornados ou trombas de água, se encontram abrangidos. O regulamento deve prever essas situações e definir com clareza a partir de que momento essas situações são atendíveis, já que não são provenientes de um acontecimento rápido e imediatamente identificável e sim do agravamento continuado de uma determinada situação (climatérica ou outra).

3.13

Poderá para este fim ser estabelecido o requisito obrigatório da «Declaração Oficial de Seca Grave» a declarar pela autoridade nacional responsável pela gestão da água, através da observância de critérios objectivos uniformes, a seguir pelas diferentes autoridades gestoras da água em cada um dos Estados-Membros.

3.14

Parece também ao CESE que os Estados Membros e a União devem estabelecer regras claras quanto à obrigação do sistema de seguros da União Europeia incluir coberturas de determinado tipo de riscos, a que as empresas do sector muitas vezes tentam fugir. Esse objectivo é tanto mais importante quanto este FSUE e os apoios públicos que os Estados prestam, não cobrem de uma maneira geral os prejuízos suportados pelos privados que são usualmente bem superiores aos custos decorrentes da intervenção pública na minimização ou resolução dos problemas de índole colectiva, a que os poderes públicos se sentem obrigados.

3.15

Finalmente o CESE considera que os esforços no plano da prevenção de riscos devem ser incentivados nos múltiplos planos que possam minimizar ou anular as consequências das situações, prevendo acontecimentos, evitando catástrofes, e preparando e accionando mecanismos prévios de resposta, por forma a proteger a vida e a saúde humanas e a destruição de infra-estruturas e bens materiais ou imateriais. Nesse sentido, não chocaria o CESE a inclusão de uma cláusula restritiva no âmbito do Regulamento proposto que, a fim de incentivar a prevenção, limitasse, reduzisse ou anulasse a intervenção do FSUE, nos casos provados de negligência das autoridades públicas do Estado em causa, desde que o mesmo esteja em condições orçamentais de corresponder à dimensão das consequências do facto. A intervenção do FSUE poderia fazer-se, mesmo assim, nessas circunstâncias, a título de empréstimo e não de subvenção ao Estado considerado negligente, tendo em conta que os beneficiários finais que se pretendem apoiar são os Cidadãos afectados pelo acontecimento. O desembolso definitivo de verbas da União, em casos de negligência dos Estados, provoca um ambiente de laxismo e irresponsabilidade e aumenta os riscos de determinado tipo de catástrofes, por vezes evitáveis.

4.   Conclusões

4.1.

O CESE, reforça a sua desde sempre defendida perspectiva de prevenção, responsabilização, e previsão de acontecimentos graves, mas considera altamente importante a existência de um mecanismo como o FSUE, desde que ajustado às críticas e sugestões enunciadas no ponto 3 de «Observações Gerais e Específicas», que entendeu fazer à proposta da Comissão.

4.2.

Acolhe-se com agrado as melhorias que o Regulamento proposto vem introduzir, mas que são no entender do CESE insuficientes para dotar o FSUE de todo o seu potencial, capacidade e correcção de intervenção.

4.3

O CESE considera que o projecto da Comissão devera ser corrigido em 3 diferentes áreas, por forma a torná-lo ajustado às verdadeiras necessidades:

a)

Alargar o âmbito de aplicação incluindo outras catástrofes não previstas, nomeadamente a seca;

b)

Reduzir os limiares dos valores relativos referentes à dimensão dos prejuízos verificados que são demasiado elevados e deixam de fora a maior parte das catástrofes verificadas nos tempos recentes, e/ou dar flexibilidade política à Comissão, por forma a aceitar catástrofes com grave impacto regional;

c)

Flexibilizar os tipos de despesas elegíveis através de uma nova alínea mais abrangente que possa cobrir outros custos relevantes não previstos nas alíneas que a Comissão propõe no âmbito da «operações elegíveis».

4.4

Um parecer de iniciativa sobre «Avaliação dos princípios e funcionamento do Fundo de Solidariedade e sua adequação às necessidades dos Países e Regiões da União Europeia» poderia ser elaborado o mais cedo possível, contribuindo para a resolução dos problemas já identificados.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/72


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Comércio ético e programas de garantias aos consumidores»

(2006/C 28/15)

Em 8 de Fevereiro de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, a instâncias da futura presidência inglesa da UE, elaborar um parecer sobre Comércio ético e programas de garantias aos consumidores

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Relações Externas emitiu parecer em 10 de Outubro de 2005. Foi relator R. ADAMS.

Na 421.a reunião plenária, de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 75 votos a favor, 2 votos contra e 10 abstenções, o seguinte parecer:

Resumo

1.

O comércio ético (nas várias acepções definidas pelo presente parecer (1)) pode dar um contributo importante ao desenvolvimento sustentável e ao empenho directo dos consumidores numa reacção positiva e responsável à globalização.

2.

Partindo de um conjunto de sistemas baseados no conhecimento, o comércio ético pode manter informados quer os fornecedores quer os produtores de bens e serviços e estimular acções orientadas para o mercado e reacções por parte dos consumidores. A Europa é líder mundial neste domínio. Estas actividades coadunam-se com a estratégia de Lisboa e contribuem, ao mesmo tempo, para o alcance dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.

3.

Os programas de garantias aos consumidores, cada vez mais numerosos, procuram fixar uma série de vantagens éticas, sociais e ambientais. A maior parte lida com um problema ou uma série de problemas específicos a um produto, como o comércio equitativo, a produção orgânica, a gestão sustentável das florestas, o impacto ambiental, o trabalho infantil ou o bem-estar dos animais.

4.

O parecer faz uma análise crítica das condições para que tais programas sejam eficazes, da adequação das políticas comunitárias na matéria e da urgência de maior clarificação e coordenação. Sugere medidas práticas que as instituições da UE, os Estados-Membros e as comunidades e autarquias locais e regionais podem tomar para consolidar e promover estas iniciativas.

5.

O presente parecer também recomenda um quadro que ajudará as instituições da UE e uma variedade de programas de comércio ético a analisar questões sobre como garantir e demonstrar o impacto e partilhar experiências sobre como resolver essas questões. Isso contribuirá para maior eficácia e para evitar a duplicação das acções de controlo.

6.

Este quadro deve criar uma base adequada para a aferição dos programas de garantias aos consumidores com outros instrumentos políticos a fim de perseguir objectivos semelhantes e proporcionar às instituições da UE e aos Estados-Membros indicadores de coerência política e um instrumento prático de avaliação da aplicação dos recursos.

7.

A elaboração do parecer suscitou grande interesse e envolvimento dos serviços da Comissão, dos principais actores económicos e das ONG. Através de novos trabalhos práticos, o CESE procurará:

facilitar o diálogo entre os interessados em 2006 para estabelecer um quadro comum de garantias do «comércio ético» para a avaliação do impacto e da qualidade;

facilitar o diálogo entre os interessados em 2006 para preparar a participação da UE nos trabalhos da Organização Internacional de Normalização o contributo do CESE para a definição da norma OIN 26000 em matéria de responsabilidade social;

lançar um programa de sensibilização dos consumidores (com início na infância e abrangendo todas as fases da aprendizagem) para o seu poder de influenciar a dinâmica social e ambiental através de tendências de consumo bem fundamentadas.

1.   Introdução

1.1

Em Fevereiro de 2005, o governo do Reino Unido solicitou ao CESE a elaboração de um parecer exploratório sobre Comércio Ético e Programas de Garantias aos Consumidores, no âmbito da sua presidência do Conselho entre Julho e Dezembro de 2005 e como contributo para as suas iniciativas no domínio do desenvolvimento sustentável. O «comércio ético», nas suas múltiplas formas, tem sido objecto de vários pareceres recentes do CESE, nomeadamente nos domínios do desenvolvimento sustentável (CESE 661/2004) e da responsabilidade social das empresas (CESE 355/2002). Sobretudo o comércio equitativo tem sido desde há muito alvo da atenção do CESE, começando com o seu parecer de 1996 (2). O CESE regozija-se, pois, por esta nova oportunidade de analisar a questão.

1.2

O comércio é geralmente motor de crescimento económico positivo, de criação de riqueza e de oportunidades sociais, mas também pode conduzir à exploração de mão-de-obra e de recursos e provocar danos ambientais. O «comércio ético» oferece a possibilidade de despoletar algumas destas tensões. Os consumidores podem alterar os seus padrões de consumo, com efeitos inequívocos; as empresas são extremamente sensíveis às tendências do consumo, e procuram também minimizar os riscos para a sua reputação. O poder de pressão do «comércio ético» é considerável. Das 100 maiores economias do mundo, 51 são sociedades, 49 são países (3). Em 2003, as trocas comerciais globais entre nações excederam 9,1 biliões de dólares — cerca de 25 % do PIB total — e aumentaram a um ritmo médio de 6 % ao ano por mais de 20 anos (4). O volume total de «comércio ético» é difícil de avaliar, mas pode fazer-se uma estimativa com base nos bens e serviços vendidos pelas sociedades que aderem a programas de auditoria social e ambiental. Essa estimativa é de cerca de 5 a 7 % do comércio mundial.

1.3

A globalização da economia, a transformação do mundo pelas sociedades de consumo e a crescente influência das sociedades tem acicatado o debate sobre o «comércio ético» e levado a apelos a uma maior responsabilidade social e ambiental das empresas — da parte dos fornecedores de bens e serviços e dos consumidores e graças a um quadro regulamentar nacional e internacional mais coerente. As tentativas de quantificação do «comércio ético» através de diversos processos de avaliação têm registado bons progressos.

1.4

O «comércio ético» prende-se directamente com os interesses estratégicos da UE. Um aspecto importante da estratégia de Lisboa é a ênfase numa economia baseada no conhecimento para construir uma base fortemente competitiva. O «comércio ético» depende de um conjunto de sistemas baseados no conhecimento e concebidos de modo a manter informados quer os fornecedores quer os produtores de bens e serviços e a estimular acções orientadas para o mercado e reacções por parte dos consumidores. A Europa é líder mundial nas iniciativas de «comércio ético», e o consolidar desta posição contribuirá igualmente para os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. Acrescente-se que o sexto Programa-Quadro para o Ambiente (5), actualmente em curso, destaca o importante papel dos produtos e serviços orientados para a consecução de objectivos específicos de redução do impacto ambiental.

1.5

As várias estratégias e iniciativas para promover o «comércio ético» têm em comum a sua base informal e o reconhecimento do poder dos consumidores e dos investidores; também complementam e partilham boa parte dos seus métodos e análises com o movimento por uma maior responsabilidade social das empresas (RSE). A Comissão Europeia adoptou novas orientações para a promoção da RSE em Julho de 2002 e publicará proximamente uma «Estratégia de promoção e desenvolvimento da RSE na União Europeia».

1.6

Este domínio específico foi analisado em profundidade pelo recente parecer de iniciativa do CESE sobre «Instrumentos de informação e de avaliação da responsabilidade social das empresas numa economia mundializada» (6).

1.7

O presente parecer faz uma análise complementar e parte de premissas semelhantes, reconhecendo que estão já em vigor ou em desenvolvimento quadros e convenções internacionais amplamente aceites nos domínios da actividade empresarial transnacional, do desenvolvimento internacional, do ambiente, da corrupção, dos negócios estrangeiros, das questões laborais e dos direitos humanos. Esses quadros e convenções baseiam-se numa mistura de ética humanitária e legislação internacional.

1.8

Têm expressão concreta num conjunto de convenções que proporcionam padrões de aferição a nível internacional, como p. ex., a Declaração Tripartida da OIT sobre Empresas Multinacionais e Política Social; a Declaração da OIT sobre Direitos Fundamentais e as Convenções da OIT sobre as condições de trabalho e os direitos laborais; as orientações para as multinacionais definidas pela OCDE; a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas; ou as convenções referidas em relação às novas medidas em matéria de preferências pautais (ver Anexo 1).

1.9

A promoção da responsabilidade social das empresas, nomeadamente através do Fórum dos Interessados promovido pela Comissão (7) e da Iniciativa Comércio Ético (8) do governo britânico, tem contribuído para estabelecer um enquadramento para a participação dos consumidores. Os conceitos e instrumentos que têm sido desenvolvidos por estas e outras iniciativas começam a proporcionar um consenso de trabalho no domínio das cadeias de produção e de fornecimento.

1.10

A responsabilidade social das empresas depende da iniciativa dos fornecedores, ao passo que o «comércio ético» tem uma maior amplitude e inclui iniciativas da parte dos consumidores. Os comerciantes, em particular, têm desenvolvido programas de auditoria da cadeia de fornecimento (9), alguns dos quais mereceram o apoio de ONG e dos sindicatos. Algumas ONG também têm apoiado a rotulagem independente de produtos. Estas iniciativas alertam os produtores e/ou os consumidores para a dimensão social do mercado e podem constituir uma forma de exercer influência social e moral através do poder de compra.

1.11

O presente parecer reconhece que nem todos os consumidores têm a capacidade económica de optar por produtos «éticos», mas concentrar-se-á na forma como os consumidores que optam por programas «éticos» podem assegurar-se que esses programas (e empresas) realmente cumprem o que prometem. O parecer analisará a adequação da formulação de políticas sobre esta matéria na UE, averiguará as responsabilidades, determinará o grau de coordenação necessário e sugerirá medidas práticas a tomar pelas instituições da UE, pelos Estados-Membros e/ou pelas autarquias locais e regionais.

1.12

Os resultados desta iniciativa beneficiarão igualmente outros interessados. Os sindicatos desejarão garantir que os programas que reconhecem a dignidade do trabalho e melhoram as condições de trabalho dos seus membros e de outros trabalhadores em desvantagem se distinguem dos programas que o não fazem. Do mesmo modo, as empresas terão todo o interesse em aumentar a confiança dos consumidores graças ao apoio público a programas de garantia da qualidade alimentar. Os poderes públicos, ainda que constrangidos pelas regras comunitárias em matéria de contratos públicos, podem igualmente promover normas de qualidade baseadas no «comércio ético» nas suas políticas de adjudicação, apoiando dessa forma os seus objectivos políticos.

1.13

Assim, o parecer contribuirá para desenvolver programas de garantias com um bom equilíbrio entre custos e benefícios, que garantam verdadeiras melhorias sociais e ambientais e a satisfação dos consumidores, e permitam aos empregadores responsáveis distinguir-se de outros cujo objectivo principal seja apenas a obtenção de vantagens comerciais.

2.   Âmbito de aplicação

2.1

O «comércio ético» compreende estratégias que permitem aos consumidores responder a alguns dos custos sociais e ambientais da produção e do comércio. Dado que os Estados-Membros atribuem diferentes graus de prioridade a estas questões, é importante definir claramente o âmbito do parecer.

2.2

Ao passo que a responsabilidade social das empresas se refere à gestão e à redução do impacto negativo da actividade de uma empresa, tem surgido uma série de iniciativas de acompanhamento, gestão e melhoria do impacto social, económico e ambiental das operações de aquisição de matérias-primas de uma empresa. Essas iniciativas incluem as formas de as empresas melhorarem o desempenho social e ambiental dos seus fornecedores e têm vindo a ser designadas por Comércio Ético.

2.3

Neste campo, há que distinguir as iniciativas orientadas para a gestão dos riscos das que se destinam a melhorar a imagem da empresa ou a sua posição no mercado através de relações públicas. A maior parte das iniciativas de Comércio Ético são essencialmente defensivas: instrumentos através dos quais as empresas se protegem contra representações negativas nos meios de comunicação e/ou antecipam uma defesa credível a um ataque eventual. Outras procuram melhorar as oportunidades de mercado oferecendo garantias ao público ou a outras empresas.

2.4

Convém distinguir igualmente as iniciativas cujos resultados se centram sobretudo em garantias das que incluem a intenção de melhorar uma situação dada. Em muitos casos, os programas orientados exclusivamente para a obtenção de garantias funcionarão por coacção, com recurso a sanções. Ao contrário, os que se orientam à melhoria da situação procurarão menos coagir do que resolver as causas do incumprimento. Tenderão a valorizar relações e uma gestão de longo prazo mais do que a necessidade de controlo.

2.5

Por último, há programas especialmente orientados para o mercado geral, em contraste com os que se concentram numa minoria de consumidores que já procuram expressar os seus valores sociais ou ambientais através do seu poder de compra. Os programas que procuram melhorar a situação ou alcançar uma posição mais vantajosa no mercado baseiam-se frequentemente na disposição dos consumidores de pagar mais por um produto — pelo menos para marcarem a sua preferência. Os outros programas têm geralmente custos inferiores, sendo os custos adicionais integrados na cadeia de fornecimento e justificados pelas garantias adicionais obtidas para a reputação da empresa.

2.6

O presente parecer focará apenas as iniciativas publicitadas junto dos consumidores para lhes garantir que a sua preferência por um produto ou serviço traz benefícios sociais e ambientais específicos. Nalguns casos, estes programas são conhecidos e definidos pela aposição de um rótulo ao produto, e quase todos procuram solucionar um ou vários problemas associados a esse produto. Exemplos conhecidos no Reino Unido são o Fairtrade (comércio justo), Organic (produtos biológicos), Marine and Forest Stewardship (guarda dos mares e das florestas), a Eco-Label (rótulo ecológico) e a iniciativa Child Labour contra o trabalho infantil. Outros programas podem ser promovidos por uma empresa ou uma associação comercial apenas pela configuração da embalagem, pela escolha dos pontos de venda ou por material de relações públicas, sem envolverem o rótulo de outra empresa ou associação.

2.7

Todos estes programas estão sujeitos a um risco; se alguns deles exagerarem o impacto/os benefícios ou induzirem o público em erro, a perda de confiança decorrente afectará todos os programas. Torna-se pois necessária uma avaliação fiável da qualidade dos programas de garantias aos consumidores. Dado que os programas têm um amplo leque de objectivos, não é possível nem recomendável estabelecer uma definição central de «comércio ético». Em vez disso, é preferível um enquadramento global que determine como a qualidade deve ser assegurada. Este enquadramento deve ser definido por um organismo livre de pressões comerciais/operacionais, como por exemplo um grupo composto por vários interessados.

2.8

Nem todas as iniciativas são tão específicas. A Iniciativa Comércio Ético (ICE) do Reino Unido, por exemplo, baseia-se na cooperação entre organizações da sociedade civil para estudar como tornar esses programas mais eficazes e alcançar os resultados esperados. Embora a ICE não seja um programa no sentido próprio do termo, as experiências obtidas poderão ser aplicadas a programas em várias categorias e os seus membros poderão, com o tempo, tornar-se fornecedores ou membros de programas específicos.

2.9

Na prática, é difícil distinguir entre as diferentes categorias, e a maior parte dos programas alegará contribuir para a sensibilização e para o desenvolvimento sustentável. O presente parecer concentra-se nos programas que dependem de uma acção fundamentada por parte dos consumidores para alcançarem os seus objectivos.

3.   Importância do «comércio ético» para a UE

3.1

Os cidadãos europeus gozam de uma protecção social financiada por níveis de impostos que se elevam, em média, a 40 % do PIB. A manufactura e a prestação de serviços na UE obedecem a uma legislação laboral, ambiental e social cujos custos são integrados no preço final pelo produtor e sustentados pelo consumidor.

3.2

Porém, ainda que este modelo europeu tenha contribuído para a implantação de padrões elevados em muitos domínios, ao nível global o mercado continua a influenciar enormemente a difusão das boas práticas. O preço e a qualidade continuam a ser as principais considerações, mas alguns consumidores começam a mostrar-se dispostos a preferir produtos e serviços de empresas que declaram contribuir mais para o progresso social e ambiental, quer na UE quer noutros países, e sobretudo nos menos desenvolvidos. Programas de garantias aos consumidores que sejam eficazes, transparentes e fiáveis podem complementar o papel da legislação na promoção das boas práticas. O poder dos consumidores orientado por valores sociais está a tornar-se uma força no mundo comercial, premiando as empresas que reagem aos anseios dos consumidores e permitindo-lhes reflectir valores socioeconómicos em mutação — os quais, evidentemente, divergirão entre Estados-Membros em função da sua capacidade económica e das suas prioridades.

3.3

O carácter informal desses programas de garantias aos consumidores significa que os custos da sua aplicação são suportados pelos consumidores (através do funcionamento do mercado), pelo que são eles a determinar o crescimento, e que o respeito das normas de concorrência e das regras comerciais da OMC não é posto em causa pelos esforços de promoção das boas práticas. Por outro lado, os programas voluntários não eliminam a necessidade de quadros regulamentares adequados no âmbito da OMC para garantir o respeito de normas mínimas em todas as relações comerciais internacionais.

3.4

Tanto os diferentes Estados-Membros como a Comissão têm dado apoio financeiro ao desenvolvimento de vários dos programas de garantias aos consumidores actualmente em curso no mercado, reconhecendo não só o seu potencial impacto ambiental e social mas também o seu papel na sensibilização e educação dos consumidores. É importante avaliar a qualidade destes programas, no que se refere quer à consecução dos seus objectivos quer à relação custos-benefícios.

3.5

A UE e os Estados-Membros também têm apoiado, através de assistência financeira e da adopção de legislação, sistemas de produção e de manufactura que prevêem programas de garantias aos consumidores desse tipo. A definição de padrões, bem como o auxílio aos produtores para lhes permitir atingir esses padrões, foi reconhecida como um aspecto importante de uma abordagem distintamente europeia. Há já exemplos firmemente implantados de embalagem adequada, eficiência energética, eliminação de produtos e agricultura orgânica. Observe-se que a legislação aplicável a estes programas se baseou numa extensa experiência prática na gestão de programas voluntários bem definidos.

3.6

Foi prestada particular atenção às implicações de uma economia baseada no conhecimento para o aspecto da oferta das indústrias europeias de produção de serviços (tecnologia, aprendizagem ao longo da vida, investigação, etc), mas pouco tem sido feito no atinente às suas implicações do significado de economia baseada no conhecimento para a procura na economia. Se os consumidores europeus forem os mais conhecedores do mundo, serão também os mais selectivos e discriminadores — os que mais provavelmente farão uma escolha com base numa série de factores sociais e ambientais, acrescidos dos tradicionais factores do preço e da qualidade. A rotulagem dos produtos é uma forma simples de transmitir questões complexas. Contudo, a complexidade inerente às questões do «comércio ético» requer uma nova perspectiva sobre a educação e a informação dos consumidores, baseada na valorização do desenvolvimento sustentável.

3.7

A evolução da economia internacional — produção diversificada e globalizada e aumento da informação comparativa à disposição do consumidor — estão a gerar novos tipos de mercado. Os consumidores estão cada vez mais em posição de exigir, e obter, bens e serviços adequados às suas preferências pessoais. Estas preferências vão além das exigências tradicionais de preço, estilo e qualidade e incluem doravante uma série de valores sociais e ambientais que abrangem aspectos mais a montante da cadeia de fornecimento e as repercussões da utilização e eliminação dos produtos. Incentivar esta abordagem sofisticada é do interesse das empresas e dos trabalhadores europeus, que devem ser capazes de lhe dar resposta. Vai igualmente ao encontro das necessidades de um mercado livre eficiente no qual os consumidores dispõem de informação e conhecimento. Sem este conhecimento, ocorrem distorções de mercado que não consideram de forma eficaz os custos sociais e ambientais.

3.8

Não obstante, há que reconhecer que os consumidores dos 25 Estados-Membros têm anseios e prioridades muito diferentes. Nos novos Estados-Membros, sobretudo, a preocupação dos consumidores com a qualidade e o valor é, justificadamente, elevada, por não terem ainda sido criadas as garantias necessárias nesse domínio em muitos desses países. O Comité frisa mais uma vez o carácter informal dos programas de garantias, que permite a adequação da procura às prioridades dos consumidores.

4.   Iniciativas de «comércio ético» na Europa

4.1

Há vários programas (ver ponto 2.6) que oferecem garantias aos consumidores na Europa e no resto do mundo através da melhoria da reputação das empresas, das inspecções in situ e da rotulagem de produtos específicos. Todos estes programas implicam gastos significativos, tanto para alcançar os padrões definidos como para documentar e assegurar o respeito dos mesmos; esses gastos são em geral imputados, pelo preço dos produtos, aos consumidores que desejem contribuir para o progresso social e ambiental. Obter informação suficiente sobre esses programas revela-se problemático, dado que não há uma instituição central, uma associação comercial ou um ponto de referência comummente aceite. Pode, no entanto, concluir-se que nos 25 Estados-Membros há mais cem programas de promoção da confiança dos consumidores à base de rótulos, com um volume de vendas de mais de 20 mil milhões de euros.

4.2

Cada sistema possui os seus próprios mecanismos para garantir que os padrões são efectivamente respeitados. Estão actualmente em curso iniciativas para desenvolver uma abordagem comum destes padrões entre diferentes programas. Esta abordagem convergente pode e deve levar a sistemas de gestão equivalentes e permitir maior eficiência com menos encargos, beneficiando todos os participantes.

4.3

É igualmente necessário definir e adoptar soluções comuns para a avaliação do impacto, dado que o respeito dos padrões não garante por si só que haja melhorias gerais ou em locais específicos. Por exemplo, o cumprimento das normas mínimas de trabalho pode ser assegurado por uma pré-selecção de fornecedores que já respeitem essas normas ou pela retirada dos certificados aos fornecedores que as não cumpram. Embora esta prática respeite os requisitos técnicos e possa assegurar os consumidores, pode na realidade levar a uma redução dos padrões globais ao colocar os produtores mais fracos em desvantagem.

4.4

Muitos dos programas controlados por instâncias independentes (mas não todos) estão a elaborar soluções comuns para comprovar o cumprimento das normas. Por exemplo, a International Social and Environmental Accreditation and Labelling Alliance (ISEAL) tem desenvolvido estratégias comuns de garantia da qualidade entre os seus membros. Importa lançar iniciativas semelhantes em todo o sector dos programas de promoção da confiança dos consumidores, para garantir que as normas têm o impacto esperado. Para isso é necessária uma avaliação de impacto. Uma estratégia comum para a avaliação do impacto, que espelhe as expectativas dos consumidores e justifique os custos adicionais por eles suportados, permitirá uma avaliação mais transparente destes programas. Possibilitará igualmente uma definição das qualidades que esses programas devem demonstrar para se tornarem elegíveis para as ajudas da Comissão, as quais, por sua vez, terão de basear-se em dados sobre o impacto se pretendem contribuir para os objectivos políticos adoptados.

4.5

Para que os consumidores e os fornecedores tenham confiança no «comércio ético», devem ter garantias de que os custos e os benefícios para consumidores e empresas são proporcionais ao objectivo dos benefícios sociais/ambientais. A promoção de melhores condições para os trabalhadores nos países em desenvolvimento pode não levar senão à transferência da produção para países menos regulamentados; iniciativas de redução do impacto ambiental podem custar mais por auditoria do que o que seria normal esperar, e mesmo gerar ineficiência; as normas de criação de animais segundo modelos biológicos podem reduzir o bem-estar dos animais se aplicadas mecanicamente; e uma iniciativa que pretenda dar aos consumidores garantias da inexistência de trabalho infantil pode levar a que as crianças procurem profissões mais arriscadas ou impedi-las de financiar a sua educação a tempo parcial.

4.6

Dado que vários dos principais produtores e fornecedores de serviços encaram o «comércio ético» como uma importante tendência do mercado, esses produtores e fornecedores assumem um papel importante na conversão das expectativas idealistas dos consumidores em programas práticos e funcionais. A disparidade inevitável entre as expectativas e a realidade expõe o movimento do «comércio ético» (nas suas muitas formas) a acusações de ingenuidade. No mundo empresarial, as atitudes variam em função da sensibilidade à pressão do consumidor e do poder relativo que têm dentro da cadeia comercial. Algumas respostas estão condicionadas por uma preocupação a nível de relações públicas (protecção do valor da marca), muitas estão dependentes do mercado (criar produtos para estas novas áreas de preocupação) e outras dependentes de contratos (uma cultura de diligência e gestão de risco). Todas estas abordagens são válidas, mas as diferentes motivações das empresas persuadem da necessidade de um quadro analítico uniforme.

5.   Quadro comum

5.1

Qualquer sistema de «comércio ético» que dependa em grande parte das garantias aos consumidores comporta tensões inevitáveis. Por um lado, o sistema procura alcançar objectivos sociais e ambientais dentro da cadeia de fornecimento; por outro, tenta oferecer garantias aos consumidores. Esta situação gera vários problemas potenciais:

5.2

As disposições que têm de ser tomadas para oferecer as garantias podem não ser proporcionais ao impacto real sobre os objectivos — por exemplo, a auditoria pode ser onerosa, as mudanças administrativas necessárias para maior transparência podem ser dispendiosas e complexas.

5.3

Pior, as garantias oferecidas podem ter repercussões negativas para os objectivos do programa (p. ex., concentrar-se no que pode ser quantificado e controlado pode distorcer as prioridades; os requisitos e os custos das auditorias podem excluir os produtores que mais necessitam de melhorar os seus métodos de produção).

5.4

Acresce que em muitos casos, a compreensão e, por conseguinte, as prioridades dos consumidores podem ser limitadas e levar a uma distorção do programa: por exemplo, os consumidores podem dar prioridade a uma cadeia de fornecimento «limpa» (sem trabalho infantil, sem vestígios de pesticidas) mais do que ao progresso real no terreno (melhores salários, abertura de escolas, melhor gestão ambiental).

5.5

Isto pode, por sua vez, levar as empresas a procurar novos fornecedores que já cumpram as normas prescritas, em vez de investir na melhoria a longo prazo da sua cadeia de fornecimento tradicional, que pode não colher qualquer benefício em termos de objectivos globais.

5.6

Por último, um programa que não esteja sujeito a auditorias independentes poderá publicitar garantias que exageram, simplificam ou mesmo falseiam o impacto do programa, subvertendo, a curto prazo, os objectivos propostos e comprometendo, a longo prazo, a confiança dos consumidores neste tipo de programas em geral.

5.7

Nos programas que são financiados por apenas alguns dadores principais, estes problemas podem ser solucionados por uma boa gestão, mas os programas que são financiados pela maior parte por um acréscimo do preço ao consumidor não dispõem necessariamente dos processos de gestão mais adequados e os próprios consumidores não estão em posição de julgar da qualidade ou da adequação dos custos.

5.8

Uma crítica frequentemente lançada aos programas de garantias aos consumidores é a de que, por estarem em grande medida dependente das atitudes dos consumidores e por estes não terem sempre uma boa compreensão dos problemas em jogo, esses programas tendem a oferecer garantias mais simples e completas do que seria necessário. Apenas um debate mais aberto e aprofundado pode resolver este problema e levar à implantação de um mercado aberto e bem informado, baseado no conhecimento.

5.9

Não cabe, porém, à UE ou aos Estados-Membros impor de forma centralista as definições ou as normas concretas para as diferentes vertentes do «comércio ético»: esse controlo central não disporia da flexibilidade necessária para ter em conta a melhoria dos desempenhos e a evolução dos condicionalismos. Da mesma forma, também contrastaria com o direito dos consumidores de fazerem as suas próprias escolhas em função dos seus valores. O que pode e deve ser definido a nível central são as regras de base que garantem aos consumidores que os programas alcançam os objectivos que se propõem.

5.10

O presente parecer pretende propor um quadro no âmbito do qual vários programas poderão analisar questões sobre como garantir e demonstrar o impacto e partilhar experiências sobre como resolver essas questões. A dinâmica é apresentada esquematicamente no Anexo 2. Diferentes programas de garantias têm objectivos diferentes, pelo que uma simples análise dos custos e dos benefícios seria complexa e teria poucas probabilidades de êxito, dada a dificuldade de avaliar metas tão diversas e subjectivas. Contudo, é possível definir um quadro comum que coloque as mesmas perguntas sobre a qualidade de todos os programas e proporcione respostas comparáveis. Em última análise, é aos consumidores e às organizações de consumidores que caberá aplicar os seus valores pessoais à informação obtida.

5.11

Embora os pormenores e os indicadores de desempenho possam variar em função do âmbito e dos objectivos de cada programa, há várias questões relacionadas com a qualidade subjacentes a todos os programas. Após novos estudos e consultas, será possível identificar algumas das questões essenciais que cada programa deverá poder responder com base em provas concretas de qualidade. O mais importante será identificar os objectivos sociais, ambientais ou económicos globais para os quais os programas pretendam contribuir: são estes os que determinam os elementos básicos dos programas, como os interessados, o âmbito e as medidas de impacto.

5.12

O CESE recomenda as seguintes questões como ponto de partida (embora no âmbito de consultas posteriores deva procurar-se a convergência com quadros fiáveis e de qualidade já existentes):

a)   Gestão do programa

Quem controla o programa?

Trata-se de um programa com vários interessados que tomam juntos as decisões?

O programa é tutelado por um grupo independente e desinteressado para o qual os interessados podem recorrer?

b)   Objectivos do programa

Os objectivos estão claramente definidos?

Esses objectivos correspondem às necessidades dos interessados mais afectados pelo sistema comercial?

Esses objectivos correspondem aos anseios dos consumidores e à «visão» promovida pelo programa?

Os interessados (incluindo os dos países em desenvolvimento) estão envolvidos na clarificação e codificação dos objectivos?

Os objectivos do programa são acessíveis ao público?

c)   Âmbito do programa

O programa procura resolver o «problema» tal como ele é normalmente encarado?

As condições do programa adequam-se razoavelmente ao âmbito do «problema» ou concentram-se apenas em aspectos menores, fáceis de solucionar?

Os perfis dos locais certificados («produtores») correspondem à visão e aos objectivos propugnados?

Os locais cumprem já as normas ou o programa promove a melhoria progressiva como elemento central?

d)   Padrões ou condições do programa

Os padrões definidos e controlados pelo programa reflectem os seus objectivos?

Os padrões são definidos com a participação dos interessados (incluindo os dos países em desenvolvimento)?

Há algum mecanismo credível através do qual a adopção dos padrões possa contribuir para a consecução dos objectivos?

Os padrões ou condições são acessíveis ao público?

e)   Avaliação do impacto

Há uma avaliação fiável do impacto do programa nos objectivos?

O impacto a longo prazo no sector é avaliado, e a evolução registada corresponde aos objectivos do programa?

Os interessados locais estão activa e conscientemente envolvidos na definição das condições da avaliação do impacto e na sua realização?

Há algum processo de detecção e correcção de um impacto negativo?

f)   Monitoria independente

O funcionamento do programa está sujeito a uma monitoria independente?

Os interessados (incluindo os dos países em desenvolvimento) podem participar na definição dos termos dessa monitoria ou na própria monitoria?

Os resultados dessa monitoria são divulgados publicamente?

g)   Análise custos/benefícios

Há alguma forma de controlar e avaliar os custos do programa suportados pelos fornecedores, comerciantes e consumidores em comparação com os progressos realizados para alcançar os objectivos?

h)   Declarações ao público

As declarações ao público da parte das empresas ou dos fornecedores certificados correspondem aos objectivos, padrões e resultados do programa?

A monitoria por independentes/interessados analisa as declarações feitas pelas empresas que participam no programa?

5.13

Padrões de qualidade como os acima esboçados (que terão de ser revistos e postos à prova) devem ser respeitados por qualquer programa que se proponha promover a confiança dos consumidores ou obter apoios da Comissão ou dos governos nacionais. Os programas que os não respeitem podem ser tidos como tendo uma má relação qualidade/preço.

5.14

A credibilidade da definição e promoção destes padrões deve ser cimentada pelo envolvimento de um grande número de interessados, com o apoio das autoridades públicas a nível europeu.

5.15

Vários desafios se apresentam ao desenvolvimento de uma avaliação comparativa dos custos e dos benefícios neste domínio, mas ela proporcionará uma base sólida para a comparação dos programas de garantias aos consumidores com outros instrumentos políticos com fins semelhantes.

6.   Quadro político e responsabilidades

6.1

É essencial um enquadramento político adequado para este sector em rápida mutação, e a secção 7 apresenta várias sugestões práticas nesse sentido. A UE e os Estados-Membros consideram que elevados padrões éticos e humanitários devem ser um elemento essencial do comércio e da diplomacia globais. Não só é perfeitamente legítimo aspirar a um «mundo melhor» como estas prioridades comuns contribuem a desenvolver uma cultura pan-europeia baseada nos valores. Mais concretamente, a sensibilização dos consumidores para os aspectos «éticos» pode constituir uma boa oportunidade para a indústria europeia, bem colocada para aproveitar as oportunidades comerciais. A UE e os Estados-Membros não devem defender uma marca específica, mas dar a sua autoridade a um programa de garantias que possa ser subscrito por todas as iniciativas fiáveis de promoção da confiança dos consumidores.

6.2

A coordenação entre as políticas deve, pois, ser um objectivo prioritário. Durante a elaboração do presente parecer tiveram já lugar extensos e muito úteis intercâmbios de informação, pontos de vista e perspectivas políticas. Propõe-se que um diálogo activo e estruturado entre os interessados nas questões relacionadas com o «comércio ético» e os programas de garantias ao consumidor seja formalmente instaurado no seguimento do presente parecer, sob os auspícios do CESE.

6.3

Esse diálogo procuraria determinar:

os elementos indispensáveis para uma política coordenada sobre os programas de garantias sociais e ambientais aos consumidores,

as medidas necessárias para promover essa política na UE,

como promover a tomada em consideração dessa política nos Estados-Membros.

7.   Medidas práticas

7.1

O presente parecer analisa a coerência dos processos que estimulam a apresentação aos consumidores de programas de garantias éticas. Propõe indicadores e instrumentos políticos que permitam à UE decidir da continuação dos apoios neste domínio e como fazê-lo da forma mais racional e acessível. Há várias medidas práticas ao alcance da UE para estimular e apoiar o desenvolvimento contínuo do «comércio ético» (na acepção do presente parecer) de forma a garantir a sua coerência com os objectivos políticos globais da UE.

7.2

O parecer reconhece que a UE e alguns Estados-Membros poderão desejar continuar a apoiar o desenvolvimento de iniciativas específicas neste domínio. O CESE recomenda que esse apoio se concentre nos programas que não só ofereçam garantias como sejam capazes de demonstrar objectivamente que estão a contribuir para melhorias tangíveis das condições socioeconómicas e ambientais nas comunidades afectadas pelas cadeias de fornecimento em questão. Cumpre encorajar mormente os programas que incentivem a formação de capacidades nos países do sul.

7.3

Para facilitar esta tarefa, a UE deveria encomendar estudos exploratórios para definir critérios de qualidade claros e com um vasto âmbito de aplicação à luz dos quais os programas de garantias possam ser avaliados. Para além das organizações de consumidores, esses estudos devem contar com a participação de vários programas, nomeadamente de rotulagem ambiental e social, e colaborar com os interessados ao longo de toda a cadeia de fornecimento para assegurar a universalidade das conclusões e facilitar a criação de instrumentos adequados no sector.

7.4

As questões propostas na secção 5 podem ser um ponto de partida útil para um quadro de avaliação mais completo. O CESE recorda que o objectivo não é criar um nível adicional de burocracia ou mais um entrave ao acesso das empresas e dos programas de garantias ao mercado. É sua convicção que qualquer programa deve poder atestar o seu impacto, a sua qualidade e a análise dos seus custos/benefícios, e um quadro comum ajudará a reduzir a duplicação dos esforços.

7.5

Os estudos também serão úteis para consolidar a confiança dos consumidores nestes programas, justificando que as organizações da sociedade civil aconselhem aos seus membros que apoiem os programas relevantes para os seus problemas sociais e ambientais específicos. Dado que estas questões entram na esfera de competência de várias DG, será necessário um ponto de coordenação capaz de concentrar a informação e formular uma política coerente.

7.6

Uma vez que os consumidores dependem actualmente dos rótulos para identificar os produtos manufacturados e comercializados de acordo com padrões sociais, ambientais e de bem-estar animal específicos, e dado que muitos produtos apresentam vários rótulos, é cada vez mais provável que os consumidores se sintam confusos e que os rótulos se tornem ineficazes. O CESE propõe pois que a UE investigue a possibilidade de formas alternativas de avaliar e comunicar aos consumidores os valores sociais e ambientais de cada produto.

7.7

Deveriam ser lançados programas estratégicos de educação dos consumidores nos Estados-Membros, centrados na sensibilização dos consumidores para a forma como as suas preferências de consumo podem ser usadas para alcançar objectivos sociais e ambientais condizentes com as suas prioridades.

7.8

O CESE faz notar que com o rápido desenvolvimento de sistemas de informação sobre o produto acessíveis nos locais de venda, pela Internet ou outros canais será cada vez mais fácil criar bases de dados sobre a origem e a qualidade de cada produto. Para além das questões sociais e ambientais tratadas no presente parecer, essas bases de dados poderão registar igualmente aspectos relacionados com a qualidade e a segurança, assim como factores dietéticos específicos, e permitir aos consumidores dar a prioridade às questões que lhes pareçam mais importantes.

7.9

O desenvolvimento de um quadro comum para a avaliação do impacto e da qualidade dos programas de garantias do «comércio ético» facilitará a formulação pela Comissão e pelos Estados-Membros de políticas de produção ética mais objectivas e sustentáveis.

7.10

A adjudicação de contratos públicos pode dar um estímulo adicional à procura de produtos éticos. Os últimos cinco anos assistiram a enormes progressos no sentido da consolidação e clarificação do papel dos contratos públicos no domínio social e as propostas acima avançadas pretendem garantir que, se as autoridades adjudicantes optarem, no âmbito do quadro legislativo comunitário, por produtos com benefícios sociais e ambientais, essa opção tenha resultados positivos.

8.   Caminho a seguir

8.1

O seguimento do presente parecer oferece aos principais interessados a oportunidade de participar no diálogo, ainda que de forma limitada. Os resultados dessa consulta darão ao CESE o ensejo de incentivar o prosseguimento dos trabalhos sobre cinco novas iniciativas:

Um diálogo contínuo entre os principais interessados (incluindo associações de consumidores) de toda a UE e, quando necessário, de todo o mundo sobre a coordenação das políticas do «comércio ético» e sobre os programas de garantias aos consumidores. O CESE propõe-se assumir a liderança em 2006 com a criação de um fórum de interessados semelhante aos que já se revelaram úteis. Essa liderança pode ser reforçada pela averiguação da viabilidade de criar uma base de dados exaustiva sobre produtos que permita coligir informação sobre factores sociais, ambientais e outros que determinem a qualidade e o desempenho, objectivamente comprovados através de critérios de avaliação inequívocos e públicos. A DG Desenvolvimento já manifestou o seu interesse em disponibilizar dados comparativos sobre as iniciativas de «comércio ético» para ajudar os produtores e os exportadores a penetrar no mercado europeu. (10)

O estabelecimento, através de uma consulta mais ampla e aprofundada dos interessados nos Estados-Membros e a nível mundial, de um quadro comum de garantias do «comércio ético» para a avaliação do impacto e normas de qualidade. Desta forma, a UE e os Estados-Membros poderão distinguir de forma mais objectivo as iniciativas com um real valor acrescentado das que oferecem garantias mínimas. Este trabalho apoiará os objectivos políticos da DG Desenvolvimento, ao encorajar relações comerciais mais sustentáveis, e os esforços da DG SANCO no sentido de divulgar informação fiável junto dos consumidores.

A participação na definição de uma norma OIN 26000, com vista a apresentar orientações práticas para fomentar a responsabilidade social, identificar e interagir com os interessados e promover a credibilidade dos relatórios e das declarações sobre responsabilidade social. Embora estes trabalhos se destinem essencialmente a desenvolver uma norma de responsabilidade social, podem proporcionar igualmente um padrão de avaliação dos vários programas de comércio ético.

Um programa de sensibilização dos consumidores (com início no infância e abrangendo todas as fases da aprendizagem) para o seu poder de influenciar a dinâmica social e ambiental através de tendências de consumo bem fundamentadas. A DG SANCO já mostrou interesse em promover a educação dos consumidores sobre o comércio equitativo, e uma sociedade melhor informada e responsável, capaz de fazer as escolhas acertadas nos mercados, é essencial para os seus objectivos.

A criação de um centro internacional de investigação centrado no fornecimento e nos mercados, na informação técnica e comercial, em iniciativas pedagógicas e na elaboração de políticas, a financiar conjuntamente pela Comissão, pelos Estados-Membros e por todos os principais interessados.

9.   Nota final: definição dos termos usados no presente parecer

O impacto global da actividade comercial na sociedade e no ambiente motivou o surgimento de vários novos termos e conceitos. Os termos e noções empregues no presente parecer são definidos a seguir. Os termos e as definições correntes neste domínio variam de país para país, e para evitar problemas de tradução é fundamental recorrer constantemente a este glossário.

Responsabilidade social das empresas (RSE) Este termo está já bem estabelecido. É consensual que a geração de riqueza e o respeito das regras nacionais pertinentes são inerentes a toda a actividade económica responsável. A RSE refere-se pois especificamente às políticas e práticas voluntárias de uma empresa para manter e melhorar o desempenho social e ambiental da sua actividade. Estas práticas podem ser asseguradas quer pela gestão interna e por sistemas internos de avaliação quer por auditorias externas.

Comércio ético

Trata-se de um elemento integrante da (e um conceito mais recente do que a) RSE e é empregue com dois sentidos principais.

Na linguagem corrente, tem o significado de uma tentativa consciente de adequar a actividade comercial (produção, retalho ou aquisição) de uma empresa, organização ou pessoa singular a um conjunto de valores éticos . A ética é um campo da filosofia dedicado à conduta e ao carácter humanos. Neste sentido, o comércio ético pode reflectir pode reflectir um amplo espectro de valores e pode incluir uma grande diversidade de produtos e serviços (nomeadamente serviços financeiros e turismo) baseados em qualquer país, incluindo os Estados-Membros. Sempre que a expressão for usada com este sentido no presente parecer, será apresentada como «comércio ético». O título do parecer também deve ser entendido com este significado.

A segunda acepção, distinta, é comum na Comissão e em várias iniciativas europeias, como a Iniciativa Comércio Ético do Reino Unido, a Iniciativa Cláusula Social (ICS) em França e a Iniciativa sobre a Compatibilidade Social das Empresas (ICSE), que abrange vários países. Nesta acepção, a expressão geralmente significa as políticas e as práticas de uma empresa destinadas a gerir o impacto social e ambiental das suas operações de obtenção de matérias-primas, e em particular as condições de trabalho dos fornecedores . Para esta acepção, o presente parecer utilizará a forma Comércio Ético.

Comércio equitativo

O comércio equitativo pode ser encarado como uma subdivisão do comércio ético; na sua acepção mais corrente, esta expressão refere-se ao comércio em que os intervenientes quer sejam produtores, consumidores, compradores ou vendedores não são prejudicados e auferem benefícios razoáveis e proporcionais. Quando se referir a esta acepção, o parecer usará a forma «comércio equitativo».

A segunda acepção, distinta, considera o comércio equitativo como uma parceria comercial, assente no diálogo, na transparência e no respeito, que propugna condições mais equitáveis no comércio internacional. Contribui para o desenvolvimento sustentável ao proporcionar melhores condições de comércio e ao garantir os direitos de produtores e trabalhadores marginalizados, sobretudo no Sul. Por exemplo, as organizações representadas na Associação Europeia de Comércio Livre aceitam esta definição. Para esta acepção, o presente parecer utilizará a forma Comércio Equitativo.

Programas de garantias aos consumidores

No presente parecer importa destacar um aspecto específico do «comércio equitativo» e do «comércio ético», que é o da distinção entre a pressão dos consumidores e a escolha dos consumidores como factor da mudança. Para efeitos do parecer, entende-se por programa de garantias aos consumidores: Um sistema que promova e encoraje os consumidores a participar no comércio ético pela aquisição de bens e serviços produzidos de forma a obter resultados sociais e ambientais específicos, beneficiando certas comunidades ou a sociedade no seu todo.

Note-se que o termo «programa» abrange garantias sociais e ambientais oferecidas por empresas ou grupos de empresas, assim como programas independentes lançados por terceiros ou com a participação de vários interessados.

Desenvolvimento sustentável

Desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento «que satisfaz as necessidades presentes sem comprometer a capacidade de as gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades» (11).

Bruxelas, 27 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Os termos aqui empregues podem ser interpretados e usados de formas díspares, pelo que o capítulo 9 apresenta uma definição dos mais importantes para efeitos do presente parecer.

(2)  Movimento europeu de rotulagem «Comércio equitativo», EXT/134, Abril de 1996.

(3)  Top 200: The Rise of Corporate Global Power [Top 200: A ascensão do poder global das empresas]. Instituto de Estudos Políticos, 2000. (Avaliação das transacções das empresas e dos PIB nacionais.)

(4)  Estatísticas comerciais da OMC para Abril de 2004.

(5)  COM(2001) 31 final.

(6)  Instrumentos de informação e de avaliação da responsabilidade social das empresas numa economia mundializada – SOC/192.

(7)  Relatório do Fórum Europeu dos Interessados sobre Responsabilidade Social das Empresas, Junho de 2004.

(8)  Uma aliança de empresas, ONG e organizações sindicais que promove e revê a aplicação nas empresas dos códigos de conduta que abranjam as condições de trabalho.

(9)  Por exemplo, a Iniciativa de Conformidade Social das Empresas (BSCI) (www.bsci-eu.org) e o Serviço de Cooperação ao Desenvolvimento (www.scd.asso.fr).

(10)  Vale a pena explorar a cooperação com os serviços de cruzamento de dados e de informação como o projecto PRISMA da UE.

(11)  Comissão Mundial para o Ambiente e o Desenvolvimento (CMAD). O nosso futuro comum, 1987.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/82


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que estabelece a organização comum de mercado no sector do lúpulo»

COM(2005) 386 final — 2005/0162 (CNS)

(2006/C 28/16)

Em 21 de Setembro de 2005, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 36.o e do terceiro parágrafo do n.o 2 do artigo 37.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre proposta supramencionada.

Em 27 de Setembro de 2005, a Mesa do Comité Económico e Social Europeu incumbiu a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 27 de Outubro), designou relator-geral A. KIENLE e adoptou, por 63 votos a favor, sem votos contra e 3 abstenções, o presente parecer.

1.   Resumo da posição do Comité

1.1

O CESE subscreve a proposta da Comissão Europeia de substituir os diversos regulamentos sobre a organização comum de mercado (OCM) no sector do lúpulo por um único regulamento.

2.   Observações

2.1

O Regulamento (CEE) n.o 1696/71 do Conselho, de 26 de Julho de 1971, que estabelece uma organização comum de mercado no sector do lúpulo, foi objecto de várias alterações substanciais. Com a revogação dos regulamentos que deixaram de ter objecto e a redacção de um novo regulamento com base na versão consolidada dos precedentes textos pretende-se contribuir para a clareza e boa compreensão da legislação comunitária.

2.2

O CESE já emitiu vários pareceres sobre a organização de mercado no sector do lúpulo (1). No seu parecer datado de 26 de Fevereiro de 2004, o Comité considerou positivo que após as «decisões do Luxemburgo» de 2003 sobre a reforma da PAC se passasse a incluir também os pagamentos directos para o lúpulo no regulamento geral sobre pagamentos directos.

2.3

O CESE volta aqui a referir que o lúpulo (humulus lupulus) é um ingrediente indispensável na produção de cerveja e que nos 8 Estados-Membros produtores, o lúpulo é principalmente cultivado em explorações familiares que dispõem em média de 8 hectares. Os produtores europeus de lúpulo lograram manter a sua liderança do mercado. A organização do mercado do lúpulo soube acompanhar as profundas mudanças que o mercado sofreu nos últimos anos, aceitando e promovendo a aplicação do sistema contratual de garantias de segurança, fundamental para o êxito da produção e comercialização e que impende sobre os agrupamentos de produtores como a «alma» da organização de mercado no sector do lúpulo. Estes princípios devem ser mantidos na nova organização de mercado.

2.4

O CESE chama a atenção para o facto de que as despesas com o sector do lúpulo têm-se mantido em redor dos 13 milhões de euros nos últimos anos.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 110 de 30/04/04, pp. 116-124.

JO C 80 de 30/3/2004, p. 46.

JO C 193 de 10/07/2001, pp. 38-39.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/83


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias»

COM(2005) 181 final — 2005/0090 (CNS)

(2006/C 28/17)

Em 15 de Julho de 2005, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro), designou relator-geral U. BURANI e adoptou, por 82 votos a favor, sem votos contra e 1 abstenção, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

O novo Regulamento Financeiro (RF) foi adoptado pelo Conselho em Junho de 2002. Em Dezembro de 2002, foram adoptadas as Normas de Execução (NE). Na altura da adopção destas normas, a Comissão comprometeu-se a apresentar um relatório, antes de 1 de Janeiro de 2006, sobre a aplicação do regulamento e eventuais propostas de alteração. O documento em apreço, que é, neste momento, objecto de consulta entre o Conselho e o Tribunal de Contas, cumpre precisamente esse compromisso. Todavia, e tendo em conta o tempo necessário para respeitar os procedimentos, a sua aplicação não será possível, no melhor dos casos, antes de 1 de Janeiro de 2007. Com efeito, o Comité Orçamental do Conselho dará a conhecer a posição dos diversos Estados-Membros no final do ano em curso, e só depois disso se dará início ao procedimento de consulta e, eventualmente, ao procedimento de conciliação com o Parlamento Europeu.

1.2

Ao elaborar o presente parecer sobre a proposta da Comissão, o CESE pretende concentrar-se principalmente nos aspectos do regulamento ligados, directa ou indirectamente, às relações com as organizações da sociedade civil. Considera dever abster-se, em princípio, de formular observações sobre as normas relativas aos aspectos mais estritamente técnicos e «internos», que já foram objecto de observações e propostas dos órgãos institucionais com competência profissional e experiência directa na matéria, ou seja, a Rede de Unidades Financeiras da Comissão (RUF), a administração do Conselho, o Tribunal de Justiça, o Tribunal de Contas e os serviços de contabilidade do Parlamento Europeu, do CESE e do Comité das Regiões.

1.3

O CESE regista o ponto de vista, partilhado por muitas organizações da sociedade civil, particularmente as ONG, de que o actual RF e a sua aplicação são demasiado complicados, não facilitando uma verdadeira colaboração e prejudicando as relações entre aquelas organizações e a Comissão. Acresce que as organizações da sociedade civil lamentam a falta de consulta e de diálogo por parte da Comissão, o que gerou um sentimento de confusão, frustração e desilusão geral.

1.4

O CESE defende uma colaboração cada vez mais estreita entre as instituições europeias e a sociedade civil organizada, através de consultas estruturadas, mas não ignora que as instituições têm responsabilidades e prerrogativas que devem ser mantidas, ainda que tal implique a impossibilidade de corresponder a todas as solicitações. Em qualquer caso, importa que as partes estabeleçam relações de compreensão e respeito das posições recíprocas. Deveria, nomeadamente, ficar claramente estabelecido, no RF ou noutra sede, que a recusa de todo e qualquer pedido deve ser comunicada aos interessados e devidamente justificada.

2.   Observações na generalidade

2.1

As novas regras do Regulamento Financeiro e as normas de execução, em vigor desde 1 de Janeiro de 2003, baseiam-se em alguns princípios gerais. O mais importante desses princípios é a ideia de suprimir os controlos ex ante centralizados, conferindo-se mais poderes e responsabilidades aos gestores orçamentais e prevendo-se um conjunto de controlos cruzados por parte dos auditores financeiros e dos contabilistas. O sistema parece ter dado boas provas, ainda que sejam necessários alguns ajustamentos à luz da experiência adquirida.

2.2

Os órgãos técnicos mencionados no ponto 1.2 supra e as organizações da sociedade civil têm sublinhado, de uma maneira geral, o imperativo de um melhor equilíbrio entre a necessidade de controlo e uma maior «flexibilidade» das regras, particularmente quando se trata de pequenos montantes. A Comissão parece estar receptiva a esta exigência. O CESE, por seu lado, gostaria de salientar que «um montante não significativo» para as instituições comunitárias — que lidam com montantes globalmente muito elevados — tem outra relevância para os sectores da sociedade civil (fornecedores, consultores, ONG, etc.) de dimensão relativamente reduzida: 10 000 euros podem ser um montante não significativo para a UE e uma quantia considerável para um pequeno ou médio empresário.

2.3

A este propósito, recorda-se que, na exposição de motivos da proposta de regulamento, a Comissão afirma, nomeadamente, que «qualquer proposta de alteração deve […] promover a protecção dos interesses financeiros da União Europeia contra a fraude e as actividades ilegais». Por outras palavras, e noutra perspectiva, as regras contabilísticas da UE devem (ou deveriam) contribuir para a «moralização» do mercado, funcionando como elemento dissuasor contra a tentação fácil de aproveitar a «flexibilidade» das próprias normas. O CESE está consciente de que os controlos contabilísticos minuciosos e complicados são gravosos para a UE, mas considera que a intenção legítima de reduzir as despesas administrativas não deve conduzir a soluções laxistas ou demasiado simplistas. Como demonstram os relatórios do OLAF, existem fraudes a todos os níveis. Neste contexto, o CESE faz notar que a Comissão poderia porventura ter retirado valiosos ensinamentos — convertíveis em regras adequadas — se o OLAF tivesse sido consultado na fase de redacção do novo RF.

2.3.1

Dito isto, o CESE regista a necessidade, sublinhada pelas organizações da sociedade civil, de estabelecer um equilíbrio entre eficiência, eficácia e responsabilidade, de modo a não pôr em causa o princípio da parceria entre quem concede os fundos e quem os recebe, não impedindo assim nem as evoluções inovadoras nem a utilização prudente dos fundos públicos. O CESE concorda com esta necessidade, mas sublinha que em caso algum deverão ser desrespeitados os princípios fundamentais da utilização de dinheiros públicos: transparência, eficácia na utilização e obrigação de prestar contas.

2.4

Outra observação que merece comentário é a de que «alterações demasiado frequentes das regras ou alterações sem uma justificação adequada poderão ter um impacto negativo para esses beneficiários e para a imagem da União Europeia». O CESE não pode deixar de concordar com esta posição, a qual deveria, todavia, ser mitigada pela consideração de que poderiam justificar-se novas regras nos sectores em que os abusos são mais frequentes. Também neste caso, poder-se-ia retirar sugestões úteis da leitura dos relatórios do OLAF.

3.   Observações na especialidade

3.1

Em matéria de cobrança de créditos da UE (artigos 72.o a 73.o-B), o novo RF prevê que os créditos das Comunidades beneficiam igualmente dos instrumentos já adoptados ao abrigo das directivas em matéria de cooperação judiciária, e preceitua que os Estados-Membros devem tratar estas cobranças da mesma forma que as dívidas fiscais nacionais, concedendo-lhes os mesmos privilégios. Embora ciente de que um regulamento é directamente aplicável em todos os Estados-Membros, o CESE interroga-se se esta regra não exigirá a alteração das legislações nacionais, particularmente das leis relativas à falência, que, normalmente, concedem um direito de preferência aos créditos fiscais (nacionais), mas não mencionam os débitos à UE. Para ser oponível a terceiros, todo e qualquer tipo de direito de preferência deveria estar previsto nas leis nacionais.

3.2

A adopção, em 2004, da nova directiva CE em matéria de contratos públicos implica que a nova proposta de RF se ajuste às novas regras. Já em 2002 a União adoptara uma directiva relativa aos contratos públicos para que as instituições comunitárias aplicassem as mesmas regras que os Estados-Membros. O CESE não considera necessário pronunciar-se sobre regras já adoptadas, dado que só a experiência poderá julgá-las e fornecer indicações para eventuais alterações.

3.2.1

O CESE gostaria de chamar a atenção para o parágrafo aditado ao artigo 95.o, que prevê a criação de uma base de dados comum a duas ou mais instituições para identificar os candidatos que se encontram em situação de exclusão (artigos 93.o e 94.o). Seria desejável a criação de uma base de dados centralizada (que não se restringisse a uma só instituição) seria desejável, mas a Comissão diz apenas que duas ou mais instituições podem decidir utilizar conjuntamente os dados de que dispõem. O CESE concorda com a utilidade dos bancos de dados em geral, mas interroga-se se, neste caso específico, os resultados justificariam os custos de unificação, já que se trataria de uma colaboração entre instituições em grande medida diferentes e nem sempre os critérios de recolha de dados são homogéneos.

3.3

Os motivos de exclusão (artigo 93.o), que incluem (alínea a) do n.o 1 do artigo 93.o) o facto de os candidatos ou os proponentes «terem sido condenados por sentença transitada em julgado», suscitam também perplexidade. Esta disposição é conforme às leis e aos princípios consignados na Constituição da maior parte dos Estados-Membros e, como tal, inquestionável. Todavia, o CESE observa que, em alguns Estados-Membros, os procedimentos de recurso contra uma sentença de um tribunal de primeira instância podem passar por mais dois níveis do sistema judicial (tribunal de recurso e tribunal de cassação) e que uma sentença só é considerada «definitiva» depois de esgotadas todas as possibilidades de recurso. Entre estes dois níveis, podem decorrer longos períodos. Entretanto, a condenação por um tribunal de primeira ou segunda instância, ainda que claramente fundada, não pode ser considerada como um motivo de exclusão juridicamente válido. No plano prático, os responsáveis deverão ter a máxima cautela na adjudicação de contratos públicos ou outros contratos, mas nem sempre será fácil — sobretudo em determinados casos — tomar decisões que respeitem a lei e sejam, ao mesmo tempo, devidamente prudentes.

3.3.1

A referida disposição, apesar de inquestionável, suscita grande perplexidade e parece não ser coerente com a alínea b) do n.o 1 do artigo 93.o, de acordo com a qual serão excluídos da participação nos contratos os candidatos ou os proponentes que estejam, nesse momento, sujeitos a uma sanção administrativa, nos termos do artigo 96.o. É possível o recurso, por via administrativa ou judicial, contra a aplicação de uma sanção administrativa, mas o texto proposto parece querer implicar que uma sanção administrativa é definitiva, embora, nesse momento, os candidatos ou proponentes apenas estejam «sujeitos» a essa sanção. A comparação das duas disposições suscita dúvidas quanto aos critérios lógicos e jurídicos que lhes estão subjacentes: por um lado, a alínea a) do n.o 1 do artigo 93.o permite que os «presumíveis» culpados de crimes graves gozem de presunção de inocência até à sua condenação definitiva, e, por outro lado, de acordo com a alínea b) do n.o 1 do artigo 93.o, as sanções administrativas a que os candidatos ou proponentes estiverem, nesse momento, sujeitos (e que são, portanto, passíveis de recurso) constituem um motivo de exclusão imediata. O CESE não pretende que a alínea b) do n.o 1 do artigo 93.o seja mais flexível, mas sim que se defina um critério complementar que torne a alínea a) do n.o 1 do artigo 93.o menos «aberta».

3.4

O capítulo relativo às subvenções (artigo 108.o e seguintes) merece particular atenção, não só por se tratar de uma questão delicada, mas também porque a concessão de dinheiros públicos a muitos beneficiários diferentes e pelas razões mais diversas pode prestar-se a críticas da opinião pública. Essas críticas podem ser mais ou menos justificadas, mas resultam, não raras vezes, de uma falta de transparência real ou suposta, entendendo-se também como tal a dificuldade de compreensão das regras e dos respectivos critérios de aplicação. Há que reconhecer que não é fácil elaborar disposições aplicáveis a um universo tão variado e multiforme, com uma casuística que dificilmente se enquadra em esquemas precisos. A transparência (entendida aqui sobretudo como clareza de conceitos e de linguagem) constitui, pois, a maior garantia da administração face às responsabilidades decorrentes da sua ampla margem de discricionariedade.

3.4.1

Um dos principais exemplos de dificuldade de compreensão é o n.o 2 do artigo 109.o, que preceitua que «as subvenções não podem ter por objecto ou como efeito a produção de um lucro», enquanto na alínea c) do n.o 3 do mesmo artigo se lê que «o n. o 2 não é aplicável às acções cujo objectivo seja o reforço da capacidade financeira de um beneficiário ou a produção de receitas». Não é clara a diferença, na prática, entre «lucro» e «produção de receitas».

3.4.2

A alínea d) do n.o 3 do artigo 109.o preceitua que a excepção à regra do fim não lucrativo se aplica igualmente às subvenções de reduzido valor, quando estas forem de montante fixo ou assumirem a forma de financiamento a uma taxa fixa (alíneas c) e d) do n.o 1 do artigo 113.o-A). Quanto ao conceito de «reduzido valor» ou de «valor não significativo», o CESE reitera as observações formuladas no ponto 2.2 supra: parece necessário encontrar um ponto de equilíbrio entre o que a UE entende por «reduzido valor» e a relevância que uma tal quantia pode ter para os beneficiários das subvenções. Em qualquer caso, a questão deveria ser resolvida e contemplada no RF, e não nas NE.

3.4.3

Ainda a propósito das subvenções, e particularmente das subvenções de reduzido valor, em nenhum passo do RF se alude à obrigação de prestação de contas, nem a qualquer compromisso de apresentar um relatório sobre a utilização efectiva dos montantes recebidos. O CESE regista a vontade da Comissão de reduzir as despesas administrativas, mas não pode aceitar que se atribuam dinheiros públicos sem se fazer uma ideia de como serão utilizados. Importaria prever um controlo por amostragem das contas e a aplicação de sanções a quem não as apresentasse, pelo menos para afirmar o princípio de boa administração da coisa pública.

3.4.4

O artigo 114.o suscita igualmente algumas considerações. No n.o 4, preceitua-se que «o gestor orçamental pode aplicar sanções administrativas e financeiras com carácter efectivo, proporcionado e dissuasivo ...». Todavia, parece lícito perguntar quais são as garantias que oferecem os beneficiários de subvenções (cujas características e consistência patrimonial são, em muitos casos, bem diferentes das dos titulares de contratos públicos e outros contratos) de que podem, ou querem, cumprir as obrigações decorrentes das sanções. No entender do CESE, seria necessário — no caso de requerentes estabelecidos no território de um Estado-Membro — que fosse esse Estado-Membro a servir de intermediário nos pedidos e a garantir o cumprimento das obrigações resultantes de eventuais sanções administrativas ou pecuniárias.

4.   Conclusões

4.1

O CESE concorda com a abordagem adoptada pela Comissão na sua proposta de novo regulamento financeiro, particularmente no que diz respeito à supressão dos controlos ex ante centralizados e sua substituição por controlos a efectuar antes da autorização dos pagamentos relativos a projectos já aprovados.

4.2

Por outro lado, o CESE aconselha prudência face às solicitações dos serviços financeiros de muitas instituições no sentido da simplificação ou supressão de diversas formalidades e controlos no que se refere aos contratos e às subvenções «de valor modesto». Ainda que concorde que os controlos são onerosos, em termos de recursos e de tempo, o CESE considera que a intenção de contenção de despesas, que é de apoiar, deveria ser mitigada por uma preocupação de sinal contrário, isto é, a necessidade de não dar aos cidadãos europeus e aos operadores a impressão de que os «pequenos» montantes são tratados de forma simplista ou negligente.

4.3

As organizações da sociedade civil, por seu turno, reclamam que toda e qualquer revisão do RF seja conduzida em consulta com a Comissão, num espírito de compreensão mútua e tendo em conta a necessidade de uma boa gestão financeira de ambas as partes. O CESE apoia esta posição, mas recorda que toda e qualquer decisão deve obedecer ao princípio de uma gestão correcta e transparente dos dinheiros públicos.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/86


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Conselho que define as disposições de aplicação relativas ao reembolso do imposto sobre o valor acrescentado, previsto na Directiva 77/388/CEE, a sujeitos passivos não estabelecidos no interior do país mas estabelecidos num outro Estado-Membro»

COM(2004) 728 final — 2005/0807 (CNS)

(2006/C 28/18)

Em 20 de Julho de 2005, o Conselho da União Europeia decidiu, nos termos do artigo 93.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Dada a urgência dos trabalhos, na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 26 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu designou relator-geral U. BURANI e adoptou, por 79 votos a favor, sem votos contra e 1 abstenção, o seguinte parecer.

1.   Introdução: o documento da Comissão

1.1

Em Outubro de 2003, a Comissão apresentou um documento (1) que reexaminava a estratégia no domínio do IVA delineada em Junho de 2000. Um dos objectivos dessa estratégia era a simplificação dos procedimentos, tendo sido propostas, através de um documento da Comissão de Outubro de 2004 (2), três iniciativas concretas, duas das quais (3) já foram objecto de um parecer do CESE (4). O Comité pronuncia-se sobre a terceira dessas iniciativas no presente documento.

1.2

A proposta da Comissão visa acelerar e simplificar os procedimentos de reembolso aos sujeitos passivos não estabelecidos do IVA aplicado em relação a bens que lhes tenham sido entregues ou a serviços que lhes tenham sido prestados no interior do país por outros sujeitos passivos ou em relação à importação de bens para o seu território.

1.3

Em substância, as regras gerais que regulam esta matéria permanecem inalteradas. O verdadeiro progresso reside na proposta de simplificar substancialmente as formalidades administrativas a cumprir pelos sujeitos passivos com direito ao reembolso, estabelecendo-se simultaneamente o seu direito a ressarcimento caso a administração fiscal devedora não efectue o pagamento em determinado prazo.

1.4

A simplificação das formalidades administrativas está consagrada no artigo 5.o da proposta de directiva, o qual prevê que, para obter o reembolso, o interessado deve apenas apresentar um pedido por via electrónica, em vez de ter de preencher um formulário uniformizado, acompanhado dos originais das facturas e dos documentos alfandegários. O pedido deve, obviamente, conter todas as informações indicadas no artigo, que permitirão à administração fiscal identificar e controlar a regularidade da operação.

1.5

Em princípio, o pedido deve respeitar às aquisições de bens ou de serviços facturados ou a importações efectuadas durante um período que não pode ser inferior a três meses nem superior a um ano civil, devendo ser apresentado no prazo de seis meses a contar do final do ano civil no decurso do qual o imposto é exigível. Todavia, é possível alterar, em determinadas circunstâncias, tanto o período de referência como os prazos para apresentação do pedido.

1.6

A administração fiscal do Estado-Membro em que o IVA foi pago deve comunicar a sua decisão no prazo de três meses a contar da data de apresentação do pedido de reembolso, devendo o pagamento ser efectuado no mesmo prazo. As decisões de indeferimento devem ser fundamentadas. São admitidos recursos nas mesmas condições, quanto à forma e aos prazos previstos, que são aplicáveis aos sujeitos passivos estabelecidos nesse Estado-Membro. Podem ser exigidas informações complementares, mas apenas no prazo de três meses a contar da data de apresentação do pedido. Nesse caso, porém, o prazo de pagamento é contado a partir da data do pedido das referidas informações. Na falta de uma decisão explícita de indeferimento nos prazos fixados, considera-se que o pedido foi deferido.

1.7

Como referido no ponto 1.6 supra, o pagamento dos montantes devidos deve ser efectuado no prazo de três meses a contar da data de apresentação do pedido. Caso o montante a reembolsar não seja pago nesse prazo, o Estado-Membro deve pagar ao requerente um juro de 1 % ao mês sobre o montante do reembolso.

2.   Observações do CESE

2.1

Toda e qualquer proposta que vise simplificar as formalidades administrativas a cumprir pelos contribuintes não pode deixar de merecer o acordo do CESE, sobretudo se, como no caso em apreço, a simplificação se traduz igualmente, no que concerne às administrações, em procedimentos mais céleres e no incentivo a uma melhor organização do trabalho. No caso da proposta em exame, porém, a simplificação corresponde a uma real necessidade, e não apenas à vontade de acelerar os procedimentos. Com efeito, recorda-se que, como já foi salientado pelo CESE (5) a Comissão afirma, na exposição de motivos das três propostas (6), que «...o actual procedimento de reembolso ... parece tão complexo que, de acordo com as estimativas, 53,5 % das grandes empresas não solicitaram, pelo menos numa ocasião, os reembolsos a que tinham direito».

2.2

A directiva aplica-se, como indicado no próprio título, aos «sujeitos passivos não estabelecidos no interior do país mas estabelecidos num outro Estado-Membro», nas condições e em relação às operações previstas nas disposições em vigor.

2.3

A inovação verdadeiramente importante consta do artigo 5.o da proposta de directiva, o qual prevê que, em vez de um pedido de reembolso em papel, contendo em anexo as facturas, os originais dos documentos aduaneiros e outros documentos justificativos, será aceite um pedido apresentado por via electrónica, contendo todas as informações que permitam identificar a documentação necessária já na posse da administração. O CESE está naturalmente de acordo com a proposta, mas não pode deixar de observar que as administrações poderiam, ainda que sem o auxílio da electrónica, adoptar desde já o mesmo procedimento se estivessem melhor e mais eficazmente organizadas.

2.4

Esta última observação é menos banal do que pode parecer e encerra uma mensagem concreta: caso o tempo necessário para a aplicação da directiva se torne demasiado longo, seria desejável que, entretanto, as administrações fiscais e aduaneiras se empenhassem em proceder à racionalização dos seus métodos, quer «em papel», quer com base na electrónica, de forma que o contribuinte possa apresentar uma documentação simplificada.

2.5

O conteúdo do artigo 6.o da proposta (7) merece total aprovação do CESE. O Comité salienta, com agrado, os esforços desenvolvidos pela Comissão para impor aos Estados-Membros uma regra que deveria estar sempre na base das suas relações com os cidadãos, sejam eles agentes económicos ou não: a administração pública tem o dever de responder rapidamente aos pedidos que lhe são apresentados. Os prazos fixados para tal — particularmente o prazo de três meses imposto à administração pública para proceder ao reembolso ou para tomar uma decisão de indeferimento — parecem adequados e razoáveis. É lícito, no entanto, interrogarmo-nos sobre se esses prazos são realistas para os vinte e cinco Estados-Membros da União. Com efeito, em alguns deles os atrasos nos reembolsos são muito significativos, o que faz supor a existência de uma ineficiência fundamental difícil de eliminar a curto prazo.

2.6

O artigo 8.o, por seu turno, estabelece um princípio de equidade que deveria sempre nortear as relações entre a administração pública e os contribuintes. Com efeito, aquele artigo prevê que, sempre que o montante a reembolsar não seja pago no prazo de três meses a contar da data de apresentação do pedido ou da prestação das informações complementares exigidas, a administração pública deve pagar ao requerente juros de mora de 1 % ao mês. O CESE concorda com o princípio, mas considera que esta medida não é facilmente aplicável. Recorda, com efeito, que um juro de 1 % ao mês corresponde a um juro composto de 12,68 % ao ano. Dado que, em alguns países, a legislação de defesa do consumidor fixa o limiar acima do qual uma taxa é considerada usurária, se os 12,68 % ultrapassarem esse limiar, dar-se-á a circunstância de a taxa de juro a pagar pela administração pública, fixada ao abrigo de determinada legislação, ser considerada ilegal por outra legislação. O CESE propõe, pois, que se altere o artigo 8.o, de forma que os juros de mora sejam calculados, em cada país, com base nos que a legislação nacional aplica aos contribuintes que não respeitam os prazos de pagamento.

2.7

Em conclusão, o CESE concorda com os princípios introduzidos na proposta de directiva, sobretudo os que dizem respeito ao direito dos requerentes ao reembolso e ao incentivo — indirecto, mas eficaz — à melhoria do funcionamento da administração pública. O CESE recomenda apenas que as regras sejam mais realistas, tendo em conta que os vinte e cinco Estados-Membros continuam a apresentar níveis de defesa do consumidor, de eficiência e de recursos tecnológicos assaz diferentes.

Bruxelas, 26 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2003) 614 final.

(2)  COM(2004) 728 final.

(3)  «Proposta de directiva do Conselho que altera a Directiva 77/388/CEE a fim de simplificar as obrigações relativas ao imposto sobre o valor acrescentado» e «Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1798/2003 no que respeita à introdução de modalidades de cooperação administrativa no âmbito do regime de balcão único e do procedimento de reembolso do imposto sobre o valor acrescentado».

(4)  Parecer do CESE sobre a «Proposta de directiva do Conselho que altera a Directiva 77/388/CEE a fim de simplificar as obrigações relativas ao imposto sobre o valor acrescentado» e a «Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1798/2003 no que respeita à introdução de modalidades de cooperação administrativa no âmbito do regime de balcão único e do procedimento de reembolso do imposto sobre o valor acrescentado» (COM(2004) 728 final — 2004/0261 (CNS) – 2004/0262 (CNS)).

(5)  JO C 267 de 27.10.2001.

(6)  COM(2004) 728 final, de 29.10.2004, ponto 1, sétimo parágrafo.

(7)  Ver pontos 1.6 e 1.7 do presente documento.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/88


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que revoga a Directiva 90/544/CEE do Conselho relativa às bandas de frequências designadas para a introdução coordenada na Comunidade de um sistema público pan-europeu terrestre de chamada de pessoas»

COM(2005) 361 final — 2005/0147 (COD)

(2006/C 28/19)

Em 15 de Setembro de 2005, o Conselho decidiu, em conformidade com o artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Em 27 de Setembro de 2005, a Mesa do Comité incumbiu a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 27 de Outubro) designou relator-geral D. RETUREAU e adoptou, por 664 votos a favor e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Proposta da Comissão

1.1

A directiva proposta (1) visa revogar a Directiva ERMES de 1990 (2) que reserva a banda de frequências 169,4 — 169,8 MHz para o serviço europeu de chamada de pessoas. Uma directiva só pode ser revogada por outra (princípio do paralelismo das formas).

1.2

A Comissão adopta como base jurídica os artigos 95.o do TCE (mercado interno, aplicação do artigo 14.o do TCE) e o artigo 251.o do TCE (processo de coordenação).

1.3

Motivação: a utilização desta banda de frequências para serviços de chamada de pessoas está a cair em desuso e o seu espectro é cada vez menos utilizado; já há outras utilizações (sistemas de mensagens curtas (SMS) via GSM). Ao abrigo da Decisão do Parlamento Europeu e do Conselho «espectro de radiofrequências» de 2002 (3), a Comissão pretende introduzir outros serviços mediante um plano harmonizado de utilização, preparado em conjunto com a Conferência Europeia das Administrações Postais e de Telecomunicações (CEPT) (4), que será posteriormente objecto de uma decisão da Comissão.

1.4

As principais utilizações comunitárias pretendidas para a banda de frequências 169,4-169,8 MHz são, nomeadamente, maior inclusão social, mobilidade dos deficientes auditivos e dos idosos na Comunidade (5), protecção contra roubos, segurança de uma monitorização mais eficiente por parte das companhias de abastecimento público de água, gás e electricidade, e ferramentas para comunicações electrónicas. Tudo isto terá um impacto positivo nas indústrias do sector dos serviços de comunicações à distância.

1.5

Ao nível nacional, os Estados-Membros poderão atribuir frequências dentro da banda atrás referida, que não serão atribuídas pela Comissão e pela CEPT ao nível comunitário.

2.   Observações do Comité

2.1

As necessidades em matéria de espectro de radiofrequências para o desenvolvimento de novos serviços são cada vez maiores e a proposta de revogação da Directiva ERMES visa abrir um sector actualmente subutilizado do espectro a novas utilizações, sobretudo em favor de pessoas idosas e com deficiência, assim como ao reforço da segurança e aos serviços móveis, etc..

2.2

O Comité aprova, portanto, a proposta, tendo esperança que venha a ser dada prioridade ao desenvolvimento dos serviços ligados à inclusão social, e que tal medida conduza à criação de empresas e emprego nas actividades indispensáveis aos cidadãos europeus. Insta, igualmente, os Estados-Membros a privilegiarem a inclusão social e o emprego na sociedade da informação quando da atribuição de frequências aos novos serviços à distância.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2005) 361 final.

(2)  Directiva 90/544/CEE do Conselho relativa às bandas de frequências designadas para a introdução coordenada na Comunidade de um sistema público pan-europeu terrestre de chamada de pessoas (Directiva ERMES), JO L 310, de 9/11/1990, p. 28.

(3)  Decisão n.o 676/2002/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa a um quadro regulamentar para a política do espectro de radiofrequências na Comunidade Europeia (Decisão «Espectro de Radiofrequências»), JO L 108, de 24/4/2002, p. 1.

(4)  Conferência Europeia das Administrações Postais e de Telecomunicações (CEPT). Vide relatório final da CEPT, Comité do Espectro de Radiofrequências, «Revisão da faixa de frequências 169,4-169,8 MHz», documento RSCOM04-69, Bruxelas, 24 de Novembro de 2004.

(5)  A Directiva-Quadro 2002/21/CE exige que sejam tomadas em consideração as necessidades de grupos sociais especiais, como os utilizadores com deficiência; conclusões do Conselho Informal dos Ministros das Telecomunicações e da Sociedade da Informação, reunido em Vitoria, que apelam a que seja assegurada a acessibilidade de todos os serviços electrónicos para pessoas idosas ou com deficiência; Plano de Acção eEurope, adoptado pelo Conselho Europeu de 21-22 de Junho de 2002, em Sevilha.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/89


Parecer do Comité Económico e a Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Decisão n.o 2256/2003/CE com vista ao prolongamento até ao final de 2006 do programa para a difusão das boas práticas e o acompanhamento da adopção das TIC»

COM(2005) 347 final — 2005/0144 (COD)

(2006/C 28/20)

Em 10 de Outubro de 2005, o Conselho decidiu, nos termos do n.o 3 do artigo 157.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Em 27 de Setembro de 2005, a Mesa do Comité incumbiu da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação.

Tendo em conta a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 27 de Outubro), nomear D. RETUREAU relator-geral e adoptou, por 79 votos a favor, 1 voto contra e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

O programa MODINIS (1) inscrevia-se no prolongamento dos Conselhos de Lisboa de 23 e 24 de Março de 2000 (tornar a economia da UE uma economia do conhecimento, a mais competitiva do mundo) e de Feira de 19 e 20 de Junho de 2000, que adoptou o plano de acção eEurope 2005 e as perspectivas de incentivar a longo prazo uma economia do saber favorecendo o acesso de todos os cidadãos e de todas as cidadãs da União às novas tecnologias da informação e da comunicação (TIC).

1.2

Tratava-se de um programa plurianual de financiamento da Sociedade da Informação (SI), para o período de 2003 a 2005, no quadro do acompanhamento da iniciativa e-Europe que termina no final do presente ano; a Comissão propõe o prolongamento do programa MODINIS em 2006 no que se refere à cooperação e promoção de boas práticas em matéria de TIC e de análise da SI pelo método de coordenação aberto (as questões referentes à segurança das redes e da informação que faziam parte do programa inicial são agora transferidas para a ENISA, e deixam de ser financiadas pelo programa MODINIS).

1.3

Com efeito, há que garantir a continuidade de acção entre o termo do plano e-Europe no final de 2005, o lançamento da iniciativa i2010 em 2006 e o lançamento antecipado, em 2007, do programa de apoio estratégico em matéria de TIC. O prolongamento de MODINIS de l de Janeiro para 31 de Dezembro de 2006 evita qualquer solução de continuidade; o custo está calculado em 7,72 milhões de euros. Será em breve publicado um programa de trabalho pormenorizado indicando as prioridades e as acções para 2006. A decisão proposta tem interesse para o EEE.

2.   Observações na generalidade

2.1

O Comité, já por diversas vezes, em inúmeros pareceres, manifestou o seu apoio e incentivou todas as iniciativas de promoção da SI, como o plano eEurope, e pronunciar-se-á em breve sobre i2010; tem para si que o intercâmbio de experiências e de boas práticas, e que o estabelecimento de indicadores para a análise da SI são indispensáveis e dão valor acrescentado para promover a competitividade da economia europeia do conhecimento, a coesão e a inclusão sociais, bem como o emprego qualificado e o crescimento sustentável.

2.2

A este respeito, o Comité tinha, nomeadamente, solicitado que os Estados-Membros fossem incentivados a instituir procedimentos de consulta sobre os temas do programa para ter em conta da melhor forma as propostas e as necessidades expressas pelos utilizadores, os peritos e a economia das redes. Tal é igualmente desejável no âmbito do programa-quadro que dará continuidade a eEurope, onde particularmente as questões das qualificações e de emprego na SI deveriam ser alvo de consultas aprofundadas com os parceiros sociais.

2.3

O Comité apoia a proposta de decisão apresentada pela Comissão para prolongar por um ano o programa MODINIS. Deseja ser informado muito em breve acerca do programa de trabalho elaborado pela Comissão para 2006.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Maria SIGMUND


(1)  COM(2002) 425 final — 2002/0187 (COD); Decisão n.o 2256/2003/CE; parecer do JO C 61 de 14.3.2003 — relator: Daniel RETUREAU.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/90


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Preparação da sexta conferência ministerial da OMC — Posição do CESE»

(2006/C 28/21)

Em 10 de Fevereiro de 2005, o Comité Económico e Social decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre o tema: «Preparação da sexta conferência ministerial da OMC — Posição do CESE».

Incumbida da preparação dos trabalhos correspondentes, a Secção Especializada de Relações Externas emitiu parecer em 10 de Outubro de 2005, sendo relator Staffan NILSSON.

Na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 102 votos, 95 a favor, 4 contra e 3 abstenções, o seguinte parecer.

Síntese

1.

O CESE está convencido de que o êxito da conferência ministerial de Hong Kong será um sinal muito positivo e promissor de que os Estados-Membros são capazes de reforçar o sistema comercial multilateral. Tal aumentará igualmente a confiança na economia global e contrabalançará certas incertezas criadas pela crise do petróleo, pelas ameaças à segurança à escala mundial e pelas crescentes pressões proteccionistas.

2.

O CESE está preocupado com o ritmo lento das negociações que desaguarão na Conferência Ministerial de Hong Kong. Nas semanas que se aproximam deverá haver progressos consideráveis em todos os domínios para ser possível resolver a tempo certos contenciosos e cumprir ao calendário das negociações preestabelecido.

3.

O CESE apela a que se faça uma distinção mais acurada entre os países em desenvolvimento. Aproveita para reafirmar que as disposições no âmbito do tratamento especial e diferenciado são parte integrante dos acordos da OMC e deverão ser observadas durante todo o curso de negociações. Importa ter em conta, neste contexto, os interesses de todos os países menos avançados (PMA). É necessário prestar assistência técnica comercial aos países com baixos rendimentos e promover o desenvolvimento das suas capacidades, facilitando assim a sua participação no comércio internacional.

4.

O CESE considera que em Hong Kong as posições dos Estados-Membros deverão convergir quanto à fixação de modalidades obrigatórias para a totalidade dos apoios à exportação, quanto ao tratamento e ao alcance da diminuição das ajudas à agricultura susceptíveis de distorcer o mercado, e quanto a uma fórmula de reduções pautais que permita simultaneamente aos Estados-Membros a melhoria do acesso aos mercados e a flexibilidade necessária para a preservação dos sectores agrícolas estratégicos.

5.

O êxito das negociações agrícolas é a chave para resultados palpáveis em outras áreas das negociações. O CESE realça que a União Europeia já fez muitas concessões no domínio da agricultura ao longo destas negociações: a iniciativa «Tudo menos armas» em 2001, a dissociação dos auxílios da PAC em 2003, o compromisso quanto à supressão dos subsídios à exportação em 2004. Os esforços necessários para chegar a um acordo global deverão agora partir dos outros países.

6.

O CESE insiste que os países membros da NAMA (Acesso ao mercado não agrícola) deverão chegar a um acordo sobre a estrutura da fórmula de reduções pautais e sobre outros elementos fundamentais do pacote NAMA e corresponder aos critérios numéricos necessários para a reunião de Hong Kong.

7.

O CESE lamenta os resultados até agora decepcionantes das negociações no âmbito dos serviços e aplaude todas as tentativas no sentido de encontrar métodos e modalidades de negociação complementares nos meses que precedem a conferência ministerial de Hong Kong.

8.

O CESE entende que os Estados-Membros deverão chegar a um consenso, pelo menos no que diz respeito às questões de antidumping e de subsídios e que os ministros participantes deverão acordar no lançamento de negociações com base num texto legal.

9.

O CESE apela à remoção, o mais breve possível, das barreiras ao comércio de bens e serviços ambientais e à finalização de uma lista destes bens ainda a tempo da conferência ministerial de Hong Kong.

10.

O CESE vê toda a conveniência em incorporar as normas de trabalho fundamentais da OIT reconhecidas internacionalmente no sistema comercial internacional e espera que seja conferido à OIT o estatuto de observador permanente junto da OMC. O CESE sente que é necessário fazer avançar o debate mundial sobre os direitos sociais.

11.

O CESE incita as várias organizações da sociedade civil a participarem nas campanhas de sensibilização sobre os temas tratados na Agenda de Doha e a contribuírem com as suas avaliações e propostas para o êxito do desenvolvimento sustentável. Defende o estabelecimento do diálogo institucional entre a OMC e a sociedade civil e que esta siga de mais perto o procedimento de resolução de litígios.

12.

Importa reforçar o carácter democrático e a transparência da OMC. O CESE sugeriu oportunamente que se dotasse esta organização de uma dimensão parlamentar.

1.   Introdução

1.1

O CESE exprimiu em pareceres anteriores os seus pontos de vista e a sua posição com vista às conferências de ministros anteriores no âmbito da OMC: a quarta em Doha (1) e a quinta em Cancun (2). Esses pareceres continuam a ter grande relevância. O presente parecer em preparação da sexta conferência ministerial, que terá lugar em Hong Kong em Dezembro de 2005, incidirá especialmente nas novas negociações em curso no âmbito da Ronda de Doha (designada mais correctamente por «Agenda de Desenvolvimento de Doha» (DDA)).

1.2

O CESE emitiu outros pareceres que exprimem a sua posição perante o processo da OMC, por exemplo, o parecer sobre «A dimensão social da globalização» (3) em reacção a uma comunicação da Comissão Europeia sobre o mesmo assunto (4). Também os trabalhos em curso do CESE no âmbito da cooperação com os países ACP tratam directamente de questões que tangem as negociações da OMC, uma vez que os chamados «Acordos de Parceria Económica» (EPA), cuja conclusão está prevista para 2007 no âmbito do Acordo de Cotonou, terão de ser consentâneos com o Tratado da OMC. Além disso, o CESE adoptou o parecer sobre o «Acordo geral sobre o comércio de serviços (GATS) — negociações sobre o modo 4 (circulação ocasional de pessoas singulares)» (5).

1.3

A Ronda de Doha foi iniciada com a quinta conferência ministerial que teve lugar em Doha em 2001. Nos documentos oficiais esta é designada por «Programa de Trabalho de Doha», mas adoptou posteriormente a denominação de «Agenda de Desenvolvimento de Doha» (DDA). O objectivo era concluir a ronda de negociações em Janeiro de 2005. Mas na quinta reunião ministerial de Cancun foi feita uma revisão intercalar que levou à suspensão das negociações por não ter sido possível concluir a reunião com uma declaração ministerial. Houve mesmo assim alguns progressos em questões técnicas. Em Julho de 2004 foi adoptada uma iniciativa renovada e foi possível arrancar de novo com as negociações graças ao acordo-quadro aprovado pelo Conselho Geral da OMC em 1 de Agosto de 2004 (designado geralmente por Pacote de Julho). Desta vez o objectivo era chegar a um acordo até Dezembro de 2005. Realizaram-se entretanto várias mini-reuniões de ministros para dar uma dimensão política a negociações de cariz bastante técnico. Agora resta esperar que se avance o suficiente até à sexta conferência ministerial em Hong Kong de molde a concluir as negociações no decurso de 2006.

1.4.

Embora faltem escassas semanas para a sexta conferência ministerial de Hong Kong, em Dezembro de 2005, continua a haver graves lacunas que impedem de avançar em todos os domínios abrangidos pelas negociações. De momento são quase nulas as hipóteses de a Ronda de Doha ficar concluída antes do fim de Dezembro. Se a conferência ministerial de Hong Kong redundar em fracasso, há o perigo de este arrastar consigo uma série de consequências negativas. Eis algumas delas:

A OMC ficar debilitada como organização.

O sistema multilateral de negociações no âmbito da OMC ser preterido a favor de acordos bilaterais e regionais que não correspondem às necessidades dos países em desenvolvimento.

Os golpes sofridos pela economia global e a falta de confiança no desenvolvimento económico provocarem insegurança a respeito do futuro.

O facto de o mandato de negociações dos EUA conferido pelo Congresso expirarem 30 de Junho de 2007 cria uma certa insegurança, sobretudo por não haver nenhuma certeza quanto à sua renovação.

2.   A reiniciada Ronda de Doha — Pontos de vista do CESE na perspectiva da sexta conferência ministerial da OMC

2.1

A Agenda de Desenvolvimento de Doha (DDA) foca especialmente as necessidades dos países em desenvolvimento. Os domínios que são agora objecto de negociações e em que é preciso um acordo para a liberalização do comércio são, designadamente:

Agricultura com o pedido de um maior acesso ao mercado, reduções das ajudas internas aos produtos agrícolas que distorcem a concorrência e redução dos subsídios à exportação,

Acesso ao mercado não agrícola (NAMA) que trata do maior acesso ao mercado de outros produtos que não os agrícolas e industriais.

Serviços em que a liberalização e o maior acesso ao mercado no âmbito do Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS) estão no centro das negociações.

Trocas comerciais

Tratamento especial e diferenciado (SDT)Agenda para o Desenvolvimento, em que são tratadas questões de importância diversa para os países em desenvolvimento.

Regras antidumping

Questões sociais

Perspectiva ambiental

3.   Negociações no âmbito da agricultura

3.1

O CESE também constata que a UE desempenhou um papel fundamental nas negociações no âmbito da agricultura. A UE procedeu já a amplas reformas da Política Agrícola Comum e comprometeu-se a suprimir progressivamente as actuais ajudas à exportação, sob duas condições. Por um lado, os outros países deverão adoptar medidas equivalentes em todas as formas de apoio directo e indirecto à exportação, incluindo a ajuda alimentar que é utilizada para regular o mercado. Por outro, tal como recordaram em ofício de Maio de 2004 os comissários europeus para o Comércio Externo, Pascal LAMY, e para a Agricultura, Franz FISCHLER, a supressão dos subsídios à exportação só será possível no quadro de um acordo agrícola equilibrado entre as três vertentes das negociações: abertura do mercado, ajudas à exportação e ajudas à agricultura susceptíveis de distorcer a concorrência.

3.2

Na opinião do CESE, é necessário um progresso equilibrado e simultâneo nos três domínios abrangidos pelas negociações agrícolas: acesso ao mercado, ajudas internas e concorrência nas exportações. Nada está decidido antes de tudo estar decidido.

3.3

O CESE pensa igualmente que basta perfeitamente os outros países fazerem ofertas semelhantes às sugeridas pela UE. O CESE considera, por seu turno, que sobretudo os países com empresas comerciais estatais (State Trading Enterprises) que recebem créditos à exportação e utilizam as ajudas alimentares para fins comerciais avancem com iniciativas que façam progredir as negociações.

3.4

No âmbito da Política Agrícola Comum da UE foram realizadas, entre outras, reformas no intuito de obter um futuro acordo no âmbito da OMC. O CESE entende que este deverá ser respeitado em todos os seus capítulos. Certos Estados-Membros têm defendido a radicalização desta política, a sua devolução ao nível nacional ou, pura e simplesmente, a sua supressão. As negociações no âmbito da OMC e a necessidade de receitas por parte dos países em desenvolvimento são utilizadas muitas vezes como argumento para apoiar estas exigências. Na opinião do Comité, isto não é compatível com um mercado comum dentro da UE. Além disso, as reformas realizadas não foram aplicadas inteiramente nem é possível ter uma ideia das suas repercussões. O desfecho da Ronda de Doha não poderá, portanto, ir neste contexto mais longe do que as reformas da PAC realizadas.

3.5

Uma questão de extrema importância é saber como as negociações abordam certos problemas que não dizem directamente respeito às trocas comerciais: a multifuncionalidade, a protecção da saúde e do bem-estar dos animais, a qualidade dos alimentos e a segurança. O Acordo sobre a Agricultura estipula que se tenha em conta estes interesses não relacionados com as trocas comerciais. Mas continua sem se saber como fazê-lo. O difícil é sopesar estas questões tão cruciais, mas também no âmbito fitossanitário e outros, sem recorrer ao proteccionismo que coarcta a concorrência. Mas se se pretende que a OMC e os seus acordos tenham a legitimação e a aceitação da opinião pública, é preciso levar a sério estas questões não só nas actuais negociações como nas futuras.

3.6

Neste contexto, não se poderá tão pouco negligenciar o facto de os vários intervenientes no mercado lançarem mão dos seus próprios programas e das suas próprias normas. Por exemplo, numa conferência com participantes dos vários continentes, a Certificação em Boas Práticas Agrícolas (EUREPGAP) decidiu recentemente ampliar o âmbito de aplicação das suas normas às boas práticas agrícolas. Não obstante estas normas se situarem, em parte, a um nível bastante baixo, inferior às obrigações legais impostas por certos países, isso prova, na opinião do CESE, que os intervenientes do mercado precisam e preferem seguir a tendência global segundo a qual os consumidores deverão confiar cegamente nos produtos à venda.

3.7

Pela primeira vez, há também desde Maio de 2005 uma norma aceite internacionalmente no âmbito da Organização Internacional das Epizootias (World organisation for Animal Health — OIE) que poderia representar um primeiro passo para regras internacionais no âmbito da OMC.

4.   Acesso ao Mercado Não Agrícola (NAMA)

4.1

No mundo, a UE está entre aqueles que praticam os direitos aduaneiros mais baixos para produtos comerciais e industriais. Além disso, as importações de muitos países chegam ao mercado da UE através de acordos bilaterais que dão a certos países uma preferência e uma posição de vantagem graças ao Sistema de Preferências Generalizadas (SGP) e ao programa «Tudo menos armas». O CESE manifestou já anteriormente o seu apoio a reduções especiais acordadas multilateralmente, sobretudo para os bens ambientais e produtos com especial interesse para os países em desenvolvimento.

4.2

Direitos aduaneiros mais baixos facilitam o acesso dos países em desenvolvimento pobres e dos países menos avançados (PMA) a alguns dos mercados dos países desenvolvidos e, o que porventura seja mais importante, permitem trocas comerciais Sul-Sul. Sobretudo os mais avançados dentre os países em desenvolvimento terão de conquistar maiores aberturas no mercado. O CESE considera que países como a Argentina, o Brasil e a Índia lograram um desenvolvimento económico notável. Estes países deverão, por isso, participar nas negociações com propostas consentâneas com o seu desenvolvimento económico e poder contar, no mínimo, com a mesma flexibilidade de que usufruem geralmente os países em desenvolvimento. Os países menos avançados (PMA) não precisarão de reduzir os seus direitos alfandegários de acordo com o chamado «Pacote de Julho».

4.3

Para o CESE é essencial acordar, a exemplo do que se fez já nas negociações no domínio da agricultura, a fixação dos direitos alfandegários para aumentar a transparência e a segurança das trocas e transacções comerciais. Direitos alfandegários flexíveis prejudicarão os países em desenvolvimento e, dentre eles, os PMA que praticam direitos alfandegários fixos.

4.4

Na opinião do CESE, as barreiras não pautais (Non-Trade-Barriers/NTB), como por exemplo normas técnicas, normas administrativas e processos não coordenados, deveriam ser identificadas e reduzidas sempre que possível. Importa desenvolver acordos sobre barreiras técnicas ao comércio, como parte integrante do empenho em obter regras comuns de rotulagem e de certificação. Será necessário ter mais em conta as normas internacionais em vigor no âmbito das negociações da OMC.

4.5

Poder-se-á recorrer ao acordo GATT e às regras da OMC para entravar trocas comerciais se o objectivo for proteger a saúde dos seres humanos, dos animais ou das plantas ou para preservar recursos naturais exauríveis, desde que tais medidas sejam adoptadas em conjugação com restrições à produção ou ao consumo nacionais. Por exemplo, se houver conflito entre o GATT e o Acordo sobre a Aplicação de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (Acordo SPS), dar-se-á primazia a este último. O CESE preconiza que esta protecção seja plenamente observada também em futuros acordos.

4.6

O CESE dá o seu aval à proposta da Comissão sobre a chamada «Fórmula suíça» que estabelece um coeficiente para todos os países em desenvolvimento e diversos coeficientes para os países em desenvolvimento que dependem do recurso ao ponto 8 «grau de flexibilidade» (p.ex. a menor utilização desta possibilidade resultará num coeficiente mais elevado e, por conseguinte, em menores reduções segundo a fórmula). É importante que os países membros da OMC cheguem a um acordo sobre a estrutura que deverá traduzir-se em reduções pautais e incidir noutros elementos fundamentais do Pacote NAMA nas semanas que restam até ao início da conferência ministerial de Hong Kong.

4.7

O CESE apoia o acordo do Grupo de Negociações segundo o qual as negociações NAMA deveriam englobar todos os produtos não cobertos pelo Anexo 1 do Acordo sobre a Agricultura. O CESE é igualmente a favor da participação activa da UE nas negociações sobre as componentes aduaneiras sectoriais, partindo do conceito de «massa crítica». O CESE assinala que há outras questões importantes, tais como a conversão dos equivalentes ad valorem e a abordagem das linhas pautais variáveis que deverão ser tratadas com toda a celeridade até ao mês de Dezembro.

4.8

Até à data, os progressos registados nas negociações são demasiado incipientes para se poder esperar, de forma realista, algum resultado da reunião de Hong Kong.

5.   Serviços

5.1

O Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS) é aquele que oferece melhores perspectivas para o futuro. Apesar disso, este capítulo das negociações parece ser aquele em que foram alcançados menos progressos. Os compromissos assumidos pelos Estados-Membros são insuficientes em qualidade e quantidade, não obstante este sector ser tão essencial para a UE. A prestação de serviços nos países ricos equivale a 65 % da produção total, mas mesmo nos países mais pobres esta é relativamente elevada com cerca de 40 % da produção total, o que contrasta com a prestação de serviços internacional que não passa de uns escassos 20 % do comércio mundial.

5.2

Sectores de serviços eficazes são essenciais para o crescimento de qualquer economia. É difícil imaginar um país que apresenta um crescimento económico elevado e sustentável e um volume acrescido de trocas comerciais internacionais sem um infra-estrutura moderna em sectores tais como serviços financeiros, serviços legais e profissionais de outro carácter, telecomunicações e transportes. Não se deve esquecer que também os serviços (comunicações, distribuição, serviços bancários, etc.) têm um papel fundamental na produção de mercadorias.

5.3

O CESE lamenta a má qualidade das ofertas iniciais e revistas que não permitem a maior liberalização dos sectores de serviços. Os grandes países em desenvolvimento com economias avançadas (p.ex. África do Sul, Brasil e Venezuela) e alguns países desenvolvidos (p.ex. EUA) deverão ir mais além dos actuais níveis de acesso ao mercado para proporcionarem novas oportunidades comerciais, de investimento e de emprego aos prestadores de serviços mundiais. É digno de nota o papel construtivo da Índia nestas negociações por se tratar de um exemplo muito encorajador.

5.4

O CESE é favorável a que se tenha em conta o grau de desenvolvimento dos países em desenvolvimentos mais pobres e se reduza as exigências colocadas ao países menos avançados (PMA). No entanto, é importante que estes continuem motivados a participar nas negociações sobre serviços, antes de mais em proveito das suas próprias economias.

5.5

No seu parecer sobre o GATS-Modo 4, o CESE concorda com a proposta da UE de facilitar a prestação temporária de serviços. O CESE realça a importância de adoptar medidas para assegurar a protecção dos trabalhadores temporários, a não discriminação e a introdução de mecanismos de vigilância apropriados. O CESE é, em princípio, favorável à proposta apresentada pelo Fórum Europeu dos Serviços de criar uma Autorização GATS que facilitaria a circulação dos prestadores de serviços de e para a UE e daria mais transparência ao controlo da utilização do Modo 4. O CESE insta a UE a não aceitar, por enquanto, a extensão do modo 4 aos trabalhadores semi-qualificados ou não qualificados.

5.6

O CESE recorda o imperativo de os países manterem a faculdade de regular os serviços públicos perseguindo os objectivos de desenvolvimento e sociais, e advoga que serviços essenciais como a educação, o abastecimento de água, a saúde e a energia sejam excluídos das negociações.

5.7

O CESE observa que estas negociações, que tiveram como ponto de partida durante mais de cinco anos a relação oferta-procura, pouco ou nada influíram na liberalização do mercado de serviços. Por outro lado, há alguns negociadores que põem em causa a eficácia desta abordagem. O CESE espera que, nos meses que precedem a conferência ministerial de Hong Kong, se procure encontrar métodos e formas de negociação que imponham obrigações mais severas para os membros da OMC (p.ex. fórmulas assentes em abordagens ao nível multilateral, o recurso a uma abordagem sectorial, etc.).

5.8

O CESE está disposto a analisar a proposta da UE de «compromissos numa linha de base comum» para o comércio de serviços. Mas esta poderá comprometer o princípio central de base do GATS, que garante uma certa flexibilidade quanto à escolha e à dimensão das obrigações da liberalização. Alguns países em desenvolvimento reagiram igualmente com a apresentação de propostas.

5.9

O CESE defende que o acesso ampliado através do Modo 4 seja associado à eliminação das restrições à propriedade aplicáveis aos estrangeiros de empresas prestadoras de serviços ao abrigo do Modo 3 (p.ex. presença comercial). Esta abordagem compensatória («trade-off») talvez persuada os diversos países em desenvolvimento a empenhar-se mais resolutamente nas negociações no âmbito dos serviços.

6.   Facilitação do comércio

6.1

A facilitação do comércio, o único «sobrevivente» dos Temas de Singapura, é crucial para o crescimento económico de qualquer país, mas, particularmente, dos países pobres e menos avançados que poderão reduzir os níveis de pobreza graças à sua maior participação no comércio internacional. A modernização e a simplificação das exportações e das importações, os pagamentos internacionais, o transporte, a logística e os regimes aduaneiros, a par de uma utilização mais intensa das tecnologias da informação e do maior acesso aos canais de distribuição, poderão reduzir substancialmente os custos da transferência de mercadorias dos produtores para os consumidores, aumentar os fluxos comerciais internacionais e favorecer novos investimentos nos países em desenvolvimento. O CESE expressou em diversas ocasiões o seu apoio à adopção de regras acordadas numa base multilateral para tratar estas questões.

6.2

A modernização dos procedimentos aduaneiros e de transporte, bem como das infra-estruturas, pode ser muito onerosa para os países pobres, pelo que os países desenvolvidos deverão prestar-lhes assistência técnica e apoiar o desenvolvimento das suas capacidades. Os respectivos países deverão igualmente empenhar-se na adopção de medidas por forma a garantir que os recursos mencionados sejam utilizados de forma transparente e eficaz. Embora os PMA estejam em geral isentos dos requisitos de facilitação do comércio, o CESE observa que a RÀPIDA modernização dos procedimentos comerciais serviria melhor os seus interesses do que a assunção lenta e gradual de compromissos.

6.3

Nas próximas semanas que precedem a Conferência Ministerial, serão avaliadas pelo Grupo de Negociações da Facilitação do Comércio mais de trinta propostas provenientes de vários países membros da OMC de medidas destinadas a facilitar as trocas comerciais e a assistência técnica. O CESE espera que os países em desenvolvimento venham eventualmente a beneficiar das medidas de facilitação do comércio e que o alcance dos seus compromissos seja associado à sua capacidade de concretizá-los.

7.   Agenda do Desenvolvimento — Tratamento Especial e Diferenciado/SDT

7.1

Não há dúvidas de que os maiores benefícios para o desenvolvimento deverão resultar do melhor acesso a bens industriais, serviços e mercados agrícolas, de procedimentos aduaneiros mais simples, de normas SPS mais claras, de regras mais severas da OMC, etc. Para ilustrá-lo basta referir que o Banco Mundial calcula que um resultado realista das negociações de Doha poderia aumentar o rendimento global 100 mil milhões de dólares americanos por ano, grande parte dos quais fluiria para os países pobres e em desenvolvimento.

7.2

O CESE apela à Comissão Europeia que dedique especial atenção durante as negociações que precedem a conferência ministerial de Hong Kong, e no período que se seguirá, aos seguintes aspectos:

progressos reais na aplicação das propostas mediante o reforço do tratamento especial e diferenciado dos países em desenvolvimento mais fracos e dos PMA, isentando estes últimos de quaisquer obrigações de abertura dos mercados e permitindo-lhes continuar a proteger produtos essenciais para um aprovisionamento alimentar seguro e o desenvolvimento da agricultura mediante uma protecção aduaneira relevante;

clarificação da situação e das categorias dos países em desenvolvimento fazendo uma distinção bem clara entre os países que ficam persistentemente para trás e os países que já usufruem dos benefícios de uma economia emergente;

apoio eficaz, sob a forma de financiamento e de projectos, à assistência técnica e ao desenvolvimento das capacidades nos países menos desenvolvidos;

abordagem séria do problema da erosão das pautas preferenciais para os países pobres, incluindo as potenciais compensações financeiras;

aplicação das decisões destinadas a suprimir os subsídios causadores de distorções da concorrência em produtos essenciais como o algodão e o açúcar;

aplicação da Decisão de 30 de Agosto de 2003 sobre o ponto 6 da Declaração de Doha a respeito do Acordo TRIPS e Saúde Pública para encontrar uma solução para as dificuldades dos membros da OMC com capacidades produtivas limitadas ou inexistentes no sector farmacêutico que lhes dê a possibilidade de utilizarem a disposição do Acordo TRIPS que os autoriza a recorrer a licenças obrigatórias em casos de emergência nacional no combate a grandes epidemias.

7.3

Outros países industrializados também deveriam oferecer o acesso ao mercado com isenção de direitos aduaneiros e de contingentes para os produtos provenientes dos PMA, a exemplo do que fez a UE com o programa «Tudo menos armas». Até à data, não houve ainda uma reacção a esta iniciativa por parte dos EUA, do Japão e do Canadá não obstante as promessas feitas na Conferência do Milénio em 2001.

7.4

A abertura dos mercados a produtos dos países mais pobres deverá ser completada por substanciais recursos financeiros para promover o reforço das capacidades e das infra-estruturas que permita a estes países penetrarem com as suas mercadorias nos mercados mundiais. O CESE apoia incondicionalmente o compromisso da UE na Cimeira do G8 em Gleneagles de elevar para um milhar de milhão de euros por ano o nível da sua assistência ao desenvolvimento comercial. Os Estados Unidos, bem como instituições financeiras internacionais como o Banco Mundial e o FMI, deveriam seguir o exemplo da Europa e disponibilizar mais recursos para prover à necessidade de desenvolvimento das capacidades comerciais.

8.   Regras anti-dumping

8.1

O número de casos de anti-dumping aumentou espectacularmente desde a Ronda do Uruguai em muitos países em desenvolvimento e de economias emergentes. E, face às grandes reduções pautais, as regras anti-dumping são usadas cada vez mais para fins proteccionistas, conforme ilustram alguns casos de anti-dumping nos EUA e noutros países. Abusa-se frequentemente de distorções metodológicas e de práticas de investigação anti-dumping falaciosas (p.ex. cálculo dos danos) para evitar a entrada no mercado de empresas estrangeiras. Este fenómeno serve normalmente apenas os interesses de um grupo selecto de empresas em detrimento dos interesses do público em geral.

8.2

O CESE dá o seu aval à revisão das disposições do Acordo Anti-Dumping da OMC no sentido de restringir a utilização de medidas anti-dumping por motivos proteccionistas ou políticos. Algumas das medidas propostas, como a proibição de reclamações em cadeia, a regra do direito mais reduzido (lesser duty rule), o teste de interesse público, a limitação dos períodos de investigação e a duração das medidas anti-dumping, dificultariam ainda mais o recurso às regras anti-dumping com fins proteccionistas.

8.3

O CESE partilha da análise crítica da Comissão sobre o avanço das negociações das regras anti-dumping. Falta, é certo, pouco tempo para o início da conferência ministerial de Hong Kong, mas é preciso chegar a um consenso pelo menos nestas questões. Espera-se, além disso, que os ministros participantes acordem no lançamento de negociações com base num texto legal.

9.   Questões sociais

9.1

Vale a pena transcrever o ponto 8 da Declaração Ministerial de Doha que refere: «Reafirmamos a declaração que formulámos na Conferência Ministerial de Singapura com respeito às normas fundamentais do trabalho internacionalmente reconhecidas. Tomamos nota das actividades em curso na Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre a dimensão social da globalização.»

9.2

O CESE considera essencial incorporar as normas laborais fundamentais da OIT no sistema internacional de comércio. Embora estas questões não façam parte do âmbito de aplicação das negociações da Agenda de Doha, o Comité apoia as iniciativas da OIT neste campo e a atribuição a esta organização do estatuto de observador permanente da OMC. Será difícil conseguir a aceitação da opinião pública para um sistema internacional de comércio em que os trabalhadores perdem os seus empregos pelo facto de as empresas recorrerem a mão-de-obra barata a trabalhar em condições desumanas e sem quaisquer direitos sindicais. Além disso, as oito convenções fundamentais da OIT universalmente reconhecidas devem ser incluídas no sistema de comércio internacional da OMC. Isso porque justamente o Acordo GATS, que regula a liberdade de prestação temporária e transfronteiriça de serviços por pessoas singulares (Modo 4), tornará necessárias medidas de protecção social.

9.3

O CESE saúda as recomendações da Comissão a respeito da aplicação do relatório da Comissão Mundial sobre a Dimensão Social da Globalização (CMDSG) da OIT. Secunda, por outro lado, a estratégia da Comissão de introduzir normas laborais fundamentais no sistema de comércio e investimento internacional integrando-as nos acordos comerciais bilaterais e regionais. Preconiza também a inclusão de um capítulo social nas negociações em curso entre a UE e o Mercosul.

9.4

O CESE é de opinião que a Comissão se deverá manter fiel à sua política de constituir um fórum permanente institucionalizado congregando a OMC, a OIT, a UNCTAD, o Banco Mundial, a FMI e outras entidades internacionais em torno do objectivo de salvaguardar a coerência das políticas ao nível internacional.

10.   Perspectiva ambiental

10.1

A palavra «ambiente» nem sequer aparece no antigo Acordo GATT. Embora as competências da OMC se situem no âmbito comercial, há cada vez mais considerações ambientais entre os objectivos do Acordo da OMC. A Declaração de Doha conferiu um mandato de negociações para o «Comércio e Ambiente» com vista a aclarar eventuais contradições entre as regras das trocas comerciais nas convenções internacionais em matéria de ambiente e a regulamentação da OMC.

10.2

O CESE defende que o Comité de Comércio e Ambiente prossiga as negociações sobre a relação entre as normas da OMC e os acordos ambientais multilaterais (MEA), não obstante os escassos progressos conseguidos até à data. O CESE solicita para os secretariados dos MEA e ao Programa das Nações Unidas para o Ambiente (UNEP) o estatuto de observadores junto da OMC.

10.3

O CESE entende que seria conveniente remover o mais depressa possível os obstáculos ao comércio de bens ambientais (p.ex. saneamento, gestão das águas residuais e fontes de energia renováveis) e dos serviços neste mesmo âmbito. O CESE espera que seja concluída a tempo da conferência ministerial de Hong Kong uma lista exaustiva dos bens e serviços ambientais.

11.   OMC e sociedade civil

11.1

O CESE convida os vários actores da sociedade civil (empresários, organizações socioprofissionais, parceiros sociais, ONG) a tomarem medidas no sentido de:

participarem nas campanhas de sensibilização focando questões tratadas na Agenda de Doha;

organizarem encontros internacionais ao nível multisectorial ou dentro de cada sector de actividade;

contribuírem com as suas avaliações, propostas e participação para o êxito do desenvolvimento sustentável em todo o mundo.

11.2

Para além do diálogo institucionalizado entre a OMC e a sociedade civil, dever-se-ia dar início o mais depressa possível a um debate sobre a forma como a sociedade civil organizada e os grupos de interesses (na acepção das categorias 1 e 2 das NU, que regulam o envolvimento de ONG e dos parceiros sociais) poderiam seguir mais de perto o procedimento de resolução de litígios.

11.3

O Comité participará nestas iniciativas e organizará antes da Conferência Ministerial de Hong Kong, tal como em 2004, uma conferência para debater propostas destinadas a promover a democracia participativa através da associação da sociedade civil organizada às actividades da OMC.

11.4

O CESE tencionar intensificar o diálogo sobre o comércio internacional com os representantes de outros conselhos económicos nacionais tanto dos Estados-Membros como de países terceiros, por exemplo, os países ACP, os países menos avançados (PMA) e os blocos comerciais regionais das Américas (Mercosul e Comunidade Andina) e também da Ásia (ADEAN e SAARC) e da África (ECOWAS e SADC) e ainda de outros países em desenvolvimento.

11.5

O parecer de 2003 intitulado «Um rosto humano para a OMC: as propostas do CESE» também contém propostas específicas para reforçar a participação dos países em desenvolvimento e da sociedade civil nas actividades da OMC. Este parecer do CESE propõe a criação de uma dimensão parlamentar da OMC, o estabelecimento de um diálogo formal entre a OMC e os representantes da sociedade civil organizada, a prestação de assistência contínua aos países menos desenvolvidos mediante a transferência de recursos e tecnologias e o estabelecimento de um diálogo formal entre a OMC e os demais organismos internacionais (ONU, BM, FMI, OCDE, OIT).

11.6

O CESE considera que antes da entrada em vigor de um novo acordo, será necessário avaliar rigorosamente as suas consequências na segurança alimentar, no emprego, nas normas sociais e na igualdade de oportunidades sobretudo no caso dos países em desenvolvimento. Neste contexto, o CESE saúda o programa Avaliação do Impacto na Sustentabilidade (AIS) através do qual a Comissão chamou a si a iniciativa de averiguar a orientação a dar à ronda de negociações para obter os resultados realmente pretendidos. O CESE apreciaria igualmente que os actores das sociedade civil fossem consultados sobre a realização dos respectivos estudos.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  «Preparação da 4.a Conferência Ministerial da OMC: Posição do CES», relator: Bruno Vever, co-relatora: .Maria Candelas Sánchez (JO C 36 de 8.2.2002, p. 99).

(2)  «Preparação da 5.a. Conferência de Ministros da OMC: Posição do CESE» – Relator: Bruno Vever — JO C 234, 30.9.2003, p. 95.

(3)  «A dimensão social da globalização — Contributo das políticas da UE para tornar os benefícios extensíveis a todos» — Relatores: Thomas Etty e Renate Hornung-Draus (JO C 234 de 30.9.2005, p.41).

(4)  COM(2004) 383 final..

(5)  «Acordo geral sobre o comércio de serviços (GATS) — negociações sobre o modo 4 (circulação de pessoas singulares)» – Relatora: Susanna Florio.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/97


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Diálogo entre as sociedades civis da UE e dos países candidatos»

COM(2005) 290 final

(2006/C 28/22)

Em 29 de Junho de 2005, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Relações Externas, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 10 de Outubro de 2005, sendo relator A. PEZZINI.

Na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 99 votos a favor, 5 votos contra e 9 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Síntese do comunicação da Comissão

1.1

A experiência dos alargamentos realizados até agora diz-nos que os cidadãos foram pouco informados e preparados sobre quanto foi feito no sentido de facilitar o processo. Com vista aos futuros compromissos da Europa é necessário potenciar diálogo, entre as sociedades civis e que é conhecido por Terceiro Pilar (1).

1.2

A potenciação do diálogo entre as sociedades civis deve perseguir os seguintes objectivos:

Fortalecer os contactos e a troca de experiências entre todos os sectores da sociedade civil dos Estados-Membros e dos países candidatos;

Promover, a nível da União Europeia, um melhor conhecimento e uma maior compreensão dos países candidatos, incluindo a sua história e cultura, contribuindo assim para uma tomada de consciência das oportunidades e desafios dos futuros alargamentos;

Garantir um melhor conhecimento e maior compreensão da União Europeia por parte dos países candidatos, no que respeita nomeadamente aos valores em que se baseia, ao seu funcionamento e às suas políticas.

o conceito de sociedade civil foi definido de muitas maneiras. A Comissão opta pela mais lata e mais abrangente e cita, a este propósito, o CESE: «o conjunto de todas as estruturas organizativas cujos membros perseguem o interesse geral, mediante um processo democrático baseado no diálogo e no consenso, desempenhando, ao mesmo tempo, um papel de mediação entre poderes políticos e cidadãos» (2).

1.3

A Comissão define um quadro estratégico que prevê, por um lado, o reforço de algumas actividades já em curso, entre as quais a experiência de dez anos do Comité Económico e Social Europeu e, por outro lado, novas actividades, que reforcem e aprofundem o processo actual.

1.3.1

Entre as acções a realizar na Croácia e na Turquia citam-se os programas Sócrates, Juventude e Leonardo da Vinci, as acções Jean Monnet, Marie Curie, Cultura e Meios de Comunicação. Prevê-se, além disso, a aplicação de um programa destinado às ONG e aos outros organismos da sociedade civil.

1.3.2

Relativamente às acções futuras, a comunicação, embora sublinhando que será a sociedade civil, com a sua experiência, a elaborar novos programas, apresenta uma amplo leque de propostas e sugere a realização de:

uma parceria a longo prazo entre as ONG, os parceiros sociais e as organizações profissionais, que poderá contar com financiamentos comunitários,

ligações estreitas entre as organizações de defesa dos direitos das mulheres,

a criação de um Conselho Empresarial UE-Turquia,

novas geminações entre comunidades locais

intercâmbios de jovens, universitários e profissionais,

intercâmbios culturais,

uma participação mais intensa nos programas comunitários nos domínios da cultura e dos meios de comunicação,

melhor formação linguística,

promoção de debates públicos, nomeadamente em linha,

intercâmbio de jornalistas e acções de sensibilização,

diálogo entre as igrejas e as religiões.

1.3.3

Também os vistos, quando necessários, deverão ser simplificados e concedidos em prazos mais breves.

1.4

Para realizar o programado no diálogo social, prevê-se um investimento de cerca de 40 milhões de euros. Este montante, no entender do CESE, é bastante exíguo.

2.   Observações

2.1

O título do documento da Comissão subentende um diálogo com todos os países candidatos, mas, de facto, salvo um rápido aceno à Croácia, o conteúdo da comunicação refere-se quase exclusivamente à Turquia.

2.2

Para o CESE, teria sido útil desenvolver o tema também em relação à Croácia, à Sérvia e aos Balcãs Ocidentais (3).

2.3

A Turquia ocupa um lugar importante na orla do Mediterrâneo, fazendo parte também da política euromediterrânica. Seria oportuno que a Comissão esclarecesse as características e as particularidades deste duplo papel.

2.4

A partir da década de '90, os trabalhadores e os empresários dos países candidatos foram associados aos organismos europeus de representação (CES, UNICE, UEAPME, EUROCHAMBRE) e participaram em diversas fases do diálogo social. A Turquia, em especial, distinguiu-se pelo seu empenho e pela sua presença. Para o CESE, seria oportuno reflectir sobre as repercussões deste empenho e destas experiências nos sindicatos e nos empresários que operam na Turquia.

2.5

O diálogo social, entendido como diálogo tendente à preparação para as negociações de adesão, tem um papel considerável no acervo comunitário e nas estratégias comunitárias que não pode ser improvisado. No entender do CESE, a Comissão deve dar especial atenção a isto, para que todos os organismos de representação sejam continuamente envolvidos nele.

2.5.1

Na Turquia, há muitas fundações e organizações culturais, nas quais a participação dos jovens é relevante. Para o CESE, estas agremiações culturais poderão constituir uma óptima oportunidade para aprofundar as problemáticas comuns e pôr em evidência os instrumentos melhores para influir no desenvolvimento da sociedade.

2.5.2

Também as geminações entre autarquias locais e entes de formação devem ser promovidas e apoiadas, porque têm a qualidade de permitirem a circulação das experiências e de induzirem os actores da sociedade civil a avaliar os diversos modos de enfrentar e resolver os problemas culturais, sociais e económicos.

2.6

Para se poder chegar a resultados concretos, dever-se-ia incentivar, mediante instrumentos adequados, a participação de representantes de países candidatos nos trabalhos da DG Social e das organizações representativas que operam no âmbito comunitário.

2.7

Também a colaboração entre as várias confissões, sobretudo entre as cristãs e as islâmicas, deveria ser favorecida e apoiada.

2.8

Do mesmo modo, deve ser aprofundado, em todas as suas facetas, o diálogo sobre as várias formas de cultura.

2.9

A propósito do programa sobre as ONG, em breve publicado pela Comissão, o CESE deseja que possa conter propostas concretas e úteis para um intercâmbio construtivo de experiências.

3.   A acção do CESE

3.1

Em estreita ligação com a Comissão, o Comité Económico e Social Europeu instituiu, desde 1995, uma série de Comités Consultivos Mistos (CCM) com todos os países do alargamento.

3.2

Foi instituído um CCM com os países ACP (África, Caraíbas, Pacífico) que representa, hoje, um ponto de referência da Comissão para a aplicação do Acordo de Cotonou e para a gestão dos Acordos de Parceria Económica (APE).

3.3

O CESE, além disso, conta com um Comité de Acompanhamento para a América Latina, encarregado de promover o reforço das organizações socioeconómicas dos países da América Latina, favorecer a participação de tais organizações nos processos de integração regional em curso (América Central, Comunidade Andina, Mercosul) e submeter a acompanhamento os Acordos de Associação existentes ou em negociação.

3.4

Na segunda metade da década de 90, foi constituído, no CESE, um Comité para o Euromed, para secundar a Comissão na realização da política social e económica na orla sul do Meditrerrâneo.

3.4.1

A Mesa-Redonda UE-Índia e a Agenda Transatlântica permitiram que a União Europeia tornasse mais visível para o resto do mundo a sua organização social e cultural.

3.5

Em 2004, foi constituído um Grupo de Contacto para os Balcãs Ocidentais, com o objectivo de promover a cooperação entre o CESE e as organizações da sociedade civil dos Balcãs Ocidentais, incluindo conselhos económicos e sociais nacionais (4), para ajudar a sociedade civil dos países dos Balcãs Ocidentais a reforçar a integração com a União Europeia e, no final, a adesão à UE.

3.5.1

O CESE interessou-se pelo Sueste Europeu ao preparar:

Um relatório de informação sobre as relações entre a União e alguns países do Sueste Europeu (5).

Um parecer de iniciativa sobre «O desenvolvimento dos recursos humanos nos Balcãs Ocidentais» (6),

Um parecer de iniciativa sobre o tema «Promover a participação das organizações da sociedade civil no Sueste Europeu — Experiências do passado e desafios do futuro» (7),

Um parecer exploratório sobre «O papel da sociedade civil no âmbito da nova estratégia para os Balcãs Ocidentais» (8),

Um parecer sobre a candidatura da Croácia à adesão à UE (9).

3.5.2

O Comité adoptou também pareceres de iniciativa sobre a Bulgária, a Roménia e a Croácia.

3.5.3

O CESE realizou já duas avaliações parciais da política europeia de proximidade (10) e, actualmente, está a elaborar um parecer exploratório sobre o mesmo tema (11).

3.6

Contrariamente aos outros comités, que contam, da parte do CESE, com a participação de 6 ou 9 membros (2 ou 3 por Grupo), o CCM UE-Turquia foi instituído já com 18 membros do CESE e 18 da Turquia. O dobro dos membros encontrava justificação na extensão do país e na complexidade dos problemas que poderiam aparecer por se tratar do primeiro país de religião islâmica a solicitar a entrada para a família europeia.

3.6.1

O CCM UE-Turquia é um órgão paritário, composto por representantes da sociedade civil organizada da UE e da Turquia. Os seus membros são provenientes das diferentes organizações da sociedade civil, das câmaras de comércio, do sector industrial e artesanal, do sector do comércio, das associações de empregadores, dos sindicatos, das cooperativas, das organizações de agricultores, das associações de consumidores, das ONG, e representantes do sector terciário, etc.

3.6.2

As reuniões do CCM UE-Turquia (12) realizaram-se alternadamente em Bruxelas e em várias localidades da Turquia: em todas as reuniões foram tratados e debatidos temas de interesse social e económico. A 19.a reunião realizou-se em Istambul, em 7 e 8 de Julho de 2005 (13).

3.6.3

Entre os temas mais interessantes que constituíram objecto de reflexão e debate nos encontros recordamos:

as relações entre a Turquia e a UE no campo da energia (1996),

a cooperação entre a UE e a Turquia no campo das pequenas e médias empresas e da formação profissional (1996),

os produtos agrícolas no contexto da união aduaneira CE-Turquia (1997),

o impacto social da união aduaneira (1998),

o papel da mulher no desenvolvimento e no processo de decisão (1999),

as migrações (2000),

a investigação e o desenvolvimento (2000),

a liberalização dos serviços (2000),

o diálogo social e os direitos económicos e sociais na Turquia (2001),

o impacto da crise económica na Turquia (2002),

as disparidades regionais na Turquia (2002),

a evolução da agricultura na Turquia (2002),

os progressos realizados pela Turquia na via da adesão à UE (2003),

a integração das pessoas portadoras de deficiência na vida social (2004),

as microempresas e os processos de normalização (2004),

o desenvolvimento das relações UE-Turquia, a participação da sociedade civil no processo das negociações para a adesão (2005).

3.7

Como se pode ver, muitos temas do acervo comunitário tiveram eco e ressonância nos encontros com a sociedade civil turca. Sublinhe-se que nos encontros, sobretudo nos realizados na Turquia (14), estiveram presentes numerosos representantes das organizações mais representativas da sociedade turca.

3.8

Sobretudo nas reuniões realizadas na Turquia, além dos membros do CCM, estavam presentes numerosos representantes das várias organizações turcas, que deram um bom contributo para o conhecimento mútuo.

3.9

Entre as iniciativas desenvolvidas pelo CCM sublinhe-se o empenho em fazer nascer, também na Turquia, um Conselho Económico e Social, a exemplo do europeu e dos existentes em muitos países europeus (15).

3.10

A comunicação da Comissão reconhece formalmente ao CESE um papel muito activo, nos últimos anos dez anos, nas relações com a Turquia (16). A Comissão deseja que o Comité das Regiões possa desempenhar um papel similar com as regiões turcas.

4.   A realização do terceiro pilar e a democracia de proximidade

4.1

Entre as tendências dos últimos anos, para além da afirmação da subsidiariedade, adquiriu importância a questão da proximidade, que se torna numa atitude cultural pela qual o cidadão exprime o desejo de se sentir protagonista nas decisões que envolvem a esfera social.

4.2

Paralelamente ao desenvolvimento da democracia de proximidade, verificam-se dois fenómenos importantes:

as novas funções dos Parlamentos nacionais,

a afirmação do princípio da subsidiariedade.

4.3

O Parlamento é encarado frequentemente como demasiado lento e disperso nas suas decisões. Impõe-se, pois, um esforço para definir uma nova composição e um novo papel (17).

4.3.1

A cultura da subsidiariedade difundiu-se graças, sobretudo, ao impulso da União Europeia e baseia-se no princípio de que as decisões devem ser tomadas a diversos níveis. A questão está em identificar o nível mais apropriado. É inútil fazer em Bruxelas o que pode ser mais bem feito a nível nacional ou local e vice-versa.

4.4

Com as novas tecnologias, o conhecimento está a difundir-se a uma velocidade e com uma amplitude antes impensáveis. Muitos cidadãos, outrora excluídos das fontes de informação, têm hoje melhor preparação, melhor orientação e sentem que podem contribuir para as decisões com o seu juízo sobre as coisas (18).

4.4.1

Uma democracia aplicada segundo os princípios da proximidade pode certamente oferecer melhores respostas a estas exigências, que são a expressão de uma sociedade que cresce culturalmente, graças também às experiências partilhadas com outros Estados europeus.

4.4.2

O processo de alargamento recém-concluído e os futuros alargamentos à Turquia e à Croácia impõem a partilha destes modelos culturais e sociais.

4.5

Estes modelos têm em vista integrar as diversas dimensões (económicas, industriais, sindicais, profissionais, etc.) no próprio sistema de organização do consenso.

4.5.1

Integrar as diversas culturas. As várias categorias profissionais têm, frequentemente, maneiras diversas de enfrentar os problemas. Mesmo se, graças à evolução cultural, muitas exigências parecem hoje assemelhar-se, são ainda diversos os instrumentos e os percursos para satisfazerem as necessidades e aspirações cada vez mais evoluídas. Segundo os modelos em uso, a síntese das posições dá-se a nível de cimeiras, através da mediação política.

4.5.2

Mas este processo dá origem, cada vez mais, a insatisfação e indiferença em relação à classe política e às associações de categoria. Exige-se, pois, um esforço considerável e diverso para integrar melhor, e desde os níveis mais baixos, as diversas visões dos problemas. Não se trata de criar uma homologação cultural, mas de identificar conjuntamente as linhas de evolução que possam alcançar o mais amplo consenso.

4.5.3

No mesmo sistema. O processo de integração pode-se realizar, e já se realiza, de diversas maneiras. Mas é necessário, apesar de tudo, organizar-se de acordo com sistemas e métodos. Os sistemas que encontraram maior sucesso, a nível dos organismos europeus e dos Estados-Membros, organizaram a sociedade civil em três grupos (19), nos quais estão representados os empresários, os representantes dos trabalhadores, os que desenvolvem a sua actividade em profissões liberais, nas ONG, nos comités para a igualdade de oportunidades, nos organismos de defesa dos consumidores e nos grupos sociais de base.

4.6

Aos vários níveis. Uma organização deste tipo tem como objectivo enfrentar um certo número de problemas, muitas vezes complexos, a nível regional, nacional ou europeu. Por este motivo, o Tratado de Roma de 1957, quando deu vida à União, previu, com acerto, entre os vários organismos, também o Comité Económico e Social Europeu.

4.6.1

Identificar os níveis mais oportunos para organizar a procura de soluções partilhadas faz parte do crescimento cultural e do percurso para uma democracia de proximidade.

4.7

O método do diálogo activo com e no interior da sociedade civil organizada. O diálogo contínuo com e no interior da sociedade civil organizada emerge e adquire espaço numa democracia madura, onde os conhecimentos e a informação são difundidas entre os cidadãos e permitem enfrentar os problemas, mesmo os mais complexos, sem condicionamentos ideológicos nem limites ditados pela ignorância.

4.7.1

A continuidade do diálogo. Um elemento importante é a continuidade do diálogo, que possibilita a superação dos limites próprios da ocasionalidade. Sobretudo nos problemas mais complexos, o confronto contínuo e organizado, a nível metodológico, pode dar resultados inesperados.

4.8

A interacção  (20) como método para chegar a soluções rápidas e partilhadas. A interacção é a consequência normal de um trabalho comum, conduzido com continuidade e método. Graças à partilha, os resultados adquirem valor e perduram no tempo. Nas fases de elaboração dos pareceres, muitas posições, no início distantes, acabam por aproximar-se e ser partilhadas.

4.9

Estes processos são, normalmente, aplicados nos Parlamentos, mas não envolvem, na base, a sociedade civil organizada. Conseguir estender estes modelos ao nível regional, com organização, continuidade e método, significa entrar no fluxo de uma democracia mais madura, que caminha para a democracia de proximidade.

5.   As negociações de adesão e a sociedade civil

5.1

Como é sabido, os critérios de Copenhaga, no momento em que fixaram os princípios a seguir pelos processos de alargamento, impuseram a obrigação, para os novos Estados-Membros, de integrarem plenamente o acervo comunitário nas suas políticas e nos seus comportamentos. Também por isto, o CESE acolhe favoravelmente e concorda plenamente com a comunicação da Comissão, de 29 de Junho, sobre o diálogo entre a sociedade civil da UE e a da Turquia.

5.2

Para o Comité, é necessário pôr de lado os estereótipos e apresentar a UE e a Turquia como são actualmente, identificando os percursos mais oportunos para chegar a um melhor conhecimento mútuo e a uma mais eficiente aplicação da democracia de proximidade.

5.3

O Comité regozija-se com o facto de um novo projecto de lei sobre a reforma do Conselho Económico e Social turco ter sido preparado conjuntamente com alguns representantes da sociedade civil organizada, entre os quais vários membros do Comité Consultivo Misto.

5.3.1

Este projecto de lei confere, por um lado, um papel mais central e melhor representatividade aos expoentes da sociedade civil organizada, no âmbito do Conselho, e, por outro, reduz a intervenção do governo.

5.4

O CESE preconiza que tal projecto seja adoptado e aplicado quanto antes e reitera, com firmeza, o princípio de que o novo Conselho Económico e Social turco possa agir com plena autonomia, dispondo dos recursos financeiros e humanos necessários.

5.5

É muito importante que as relações entre a UE e a Turquia sejam caracterizadas pela transparência, participação e responsabilização.

5.6

Dadas as características das relações entre a UE e a Turquia e a experiência dos países que aderiram recentemente, o Comité, através dos trabalhos do CCM, propôs diversas medidas destinadas a fazer participar a sociedade civil organizada nas negociações de adesão.

5.6.1

O desenvolvimento das competências é necessário para permitir às organizações da sociedade civil intervir nas consultas sobre a adesão. Para alcançar este objectivo, essas organizações terão necessidade de assistência e de financiamento.

5.6.2

Este tipo de apoio deveria provir essencialmente do governo turco e, numa via de integração, das instituições da UE e das organizações da sociedade civil dos Estados-Membros actuais.

5.7

Para o desenvolvimento das competências das organizações turcas, é útil que estas reforcem os contactos com as organizações europeias e participem em projectos transacionais europeus.

5.7.1

Também os membros do CCM poderão dar um contributo útil neste campo, e as suas organizações são convidadas a lançar programas de diálogo da sociedade civil. Estes projectos deverão ter em vista o aperfeiçoamento do conhecimento mútuo e garantir a colaboração, em especial mediante o intercâmbio das melhores práticas.

5.8

Os representantes das organizações turcas poderiam participar, com continuidade, nos trabalhos dos grupos de estudo que se realizam a nível europeu para a aplicação das políticas europeias, como acontece com o Processo do Luxemburgo.

5.9

Segundo as observações do CCM, os processos de concessão de vistos nos Estados-Membros representam um obstáculo ao desenvolvimento das relações no interior da sociedade civil. O CESE convida, pois, os governos a simplificarem tais processos, para que se:

reforce o diálogo entre os representantes da sociedade civil,

intensifique a cooperação sindical,

facilitem os encontros entre empresários e homens de negócios,

tornem mais fáceis as relações comerciais e económicas,

realize uma plataforma das ONG.

5.10

Deve-se acelerar a criação do Conselho Económico e Social turco com as características de autonomia atrás referidas, porque tal representará um válido instrumento de diálogo permanente entre o governo e a sociedade civil organizada, com o envolvimento de todos os parceiros sociais.

5.10.1

Este organismo, que permitirá realizar melhor a democracia de proximidade, deve responder às legítimas aspirações de toda a sociedade civil organizada e reflectir as suas exigências e potencialidades, no decorrer da integração na vida da União.

5.10.2

Para ter uma base muito ampla, o Conselho Económico e Social turco deverá ter uma articulação regional e intervir nas consultas sobre todos os capítulos que digam respeito ao acervo comunitário. As consultas sobre os capítulos das negociações deverão ser contínuas e em tempo útil.

5.11

A fim de que as negociações tenham o êxito almejado, é indispensável a promoção, tanto na Turquia como na UE, da consciência e da compreensão dos respectivos modelos e tradições culturais. Em especial, é necessário fazer com que a percepção pública da UE em relação à Turquia, e vice-versa, coincida com a realidade.

5.11.1

A melhor maneira de conseguir este resultado é dar a oportunidade às organizações da sociedade civil, tanto da UE como da Turquia, de organizarem campanhas apropriadas de informação.

5.12

O CESE, mediante a contínua e ampla acção do CCM, sempre se sentiu empenhado:

em promover a participação da sociedade civil nas negociações relativas a cada um dos capítulos debatidos,

em examinar com atenção as consequências socioeconómicas da adopção do acervo pela Turquia,

em intensificar e consolidar o diálogo e a colaboração entre os representantes da sociedade civil organizada dos Estados-Membros e da Turquia.

5.12.1

Deste modo, o CESE e o CCM poderão servir-se da experiência dos membros provenientes dos novos Estados-Membros e, portanto, do modo como estes resolveram os problemas encontrados durante as respectivas negociações.

5.12.2

O objectivo é valorizar todas as forças organizadas activas no território, mediante um processo de democracia de proximidade, objectivo que, por si só, a classe política não poderá realizar.

5.13

Com a Turquia, em especial, dada a vastidão da região e a complexidade dos problemas, os encontros e o confronto de experiências foram mais intensos e mais frequentes. No entanto, tudo isto ainda não é suficiente.

5.14

É necessário destinar mais fundos, intensificar o empenho, multiplicar os encontros e a troca de experiências e identificar melhor as categorias sociais e profissionais a envolver.

6.   Conclusões

6.1

O CESE considera oportuno organizar, de acordo com o Conselho Económico e Social turco, e com o seu contributo efectivo, uma estrutura permanente, constituída por representantes da sociedade civil, para acompanhar as negociações de adesão (21), para que estas levem a uma efectiva e integral aplicação do acervo comunitário.

6.1.1

Tendo em conta a vastidão do território e a pluralidade das culturas, esta estrutura deverá ter a possibilidade de actuar, não só ao nível nacional, mas também ao nível regional.

6.2

É muito importante que o confronto entre as culturas e o valor do acervo não sejam monopólio de Istambul, Ancara e das principais cidades da Turquia, mas se estendam também às províncias e às zonas rurais.

6.3

As aspirações, os receios, as expectativas dos povos encontram eco e concretizam-se nos organismos da sociedade civil. A estes organismos deve ser atribuído um papel fundamental na programação e na realização da campanha de informação ligada à adesão da Turquia à UE.

6.3.1

No entender do CESE, é também muito importante estabelecer uma plataforma comum de comunicação (22), ou até um Fórum, no qual as associações e as ONG tenham a possibilidade de pôr em evidência os principais problemas e de encontrar soluções partilhadas.

6.4

O percurso de pré-adesão é sempre acompanhado por programas de apoio e assistência financeira. Apenas poucas pessoas, o mesmo é dizer, as ligadas aos trabalhos, conhecem os procedimentos, os prazos e as oportunidades financeiras. É necessário preparar material informativo claro, para ser difundido entre todas as organizações e se tornar objecto de projectos e propostas.

6.4.1

Até os procedimentos para obter financiamentos deverão ser, tanto quanto possível, simplificados e oportunamente explicados aos organismos de representação da sociedade.

6.5

A delegação da Comissão na Turquia, também mediante o apoio e a experiência do CCM, do CESE e do Comité das Regiões, tem a possibilidade de contribuir consideravelmente para a organização de um diálogo concreto e estruturado entre os diversos representantes dos sectores da sociedade civil (incluídos os actores do diálogo social) na Turquia e entre a Turquia e a UE (23). Através dos fundos previstos para o reforço da sociedade civil, é muito importante dar aos parceiros sociais da Turquia e da UE a possibilidade de elaborarem projectos conjuntos de formação, nos numerosos campos previstos nos 31 capítulos do acervo comunitário.

6.6

No entender do Comité, é importante reforçar, quanto antes, a «capacity building» das organizações turcas, dando-lhes a possibilidade de incrementar os conhecimentos relativos às suas homólogas europeias, em especial sobre as suas funções e o seu papel de representação numa democracia de proximidade.

6.6.1

Ao mesmo tempo, no contexto da absorção do acervo, adquire importância a elaboração de uma legislação sobre as associações, cuja letra e espírito sejam conformes com os existentes a nível europeu.

6.7

O governo turco, ao abrigo do previsto pelo acervo comunitário, deveria aperfeiçoar a legislação destinada às organizações e suprimir os obstáculos que limitam o desenvolvimento das ONG.

6.8

No que se refere ao género, o Comité convida a Comissão a velar por que as mulheres sejam suficientemente envolvidas em todas as acções de cooperação e estejam oportunamente representadas nos organismos de diálogo e nas acções programadas.

6.9

O CESE considera que se deverão apoiar as diversas organizações turcas, para que possam tornar-se, nos respectivos sectores e a breve prazo, membros dos organismos europeus e internacionais.

6.10

A participação da Turquia nos programas relativos à educação e à formação deve ser incentivada de todos os modos, também com novos programas para tal elaborados que acompanhem os programas já existentes.

6.10.1

As experiências dos estágios universitários com o programa Erasmus, oportunamente incrementado, poderiam constituir uma óptima ocasião para permitir a muitos estudantes de nações diversas encontrar-se e chegar a estimar-se mutuamente.

6.11

O Comité está convencido de que se poderiam reduzir ou mesmo eliminar muitas das formalidades que os ministérios turcos exigem dos empresários ou dos operadores económicos turcos que pretendem organizar actividades em países europeus.

6.12

As relações entre representantes de organizações similares, entre a Turquia e a UE, devem ser apoiadas, incentivadas e encorajadas, para que possam facilitar e tornar mais rápida a homogeneização de experiências e de culturas.

6.13

Em suma, todos os esforços devem ser concentrados no objectivo de permitir que o maior número possível de europeus conheça a Turquia e que o povo turco conheça a Europa.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  O Primeiro Pilar é representado pela reforma política; o Segundo pelas negociações de adesão; o Terceiro pelo diálogo entre as sociedades civis.

(2)  Os parceiros sociais (sindicatos e federações de empregadores), as organizações representativas dos actores económicos e sociais em sentido lato (por exemplo as associações de consumidores); as ONG; as associações de base (por exemplo, as associações de famílias e de jovens); as comunidades religiosas e os meios de comunicação, as câmaras de comércio.

(3)  Por Balcãs Ocidentais entende-se em geral, o território da ex-Jugoslávia (excepto a Eslovénia) e da Albânia, isto é, a Croácia, a Bósnia e Herzegovina, a Sérvia, o Montenegro (incluindo o Kosovo), a ex-República jugoslava da Macedónia e a Albânia.

(4)  A Croácia e o Montenegro criaram Conselhos Económicos e Sociais.

(5)  Relatório de informação CESE 1025/98 fin – Relator: SKLAVOUNOS.

(6)  Parecer do CESE – Relator: SKLAVOUNOS – JO C 193 de 10/7/2001, pág. 99.

(7)  Parecer do CESE –Relator: WILKINSON – JO C 208 de 3/9/2003, pág. 82.

(8)  Parecer do CESE – Relator: CONFALONIERI – JO C 80 de 30/3/2004, pág. 158.

(9)  Parecer do CESE – Relator: STRASSER – JO C 112 de 30/4/2004, pág. 68.

(10)  Uma refere-se à parte oriental da Europa Central – Parecer do CESE – Relatora Karin ALLEWELDT — JO C 80 de 30/3/2004, pág. 148; e a outra à zona mediterrânica — Relatório de informação CESE 520/2005 fin — Relatora: Giacomina CASSINA.

(11)  Relatora: Giacomina CASSINA (REX/204).

(12)  Até ao momento foram realizadas 19 reuniões.

(13)  A primeira reunião foi realizada em Bruxelas, em 16 de Novembro de 1995, com a presença de OZULKER, Embaixador da Turquia junto da UE.

(14)  Os encontros na Turquia foram 9: 3 em Istambul 1 em Gaziantep; 2 em Ancara; 1 em Trebisonda; 1 em Esmirna e 1 em Erzurum.

(15)  Têm um Conselho Económico e Social os seguinte países: Áustria, Bélgica, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Itália, Luxemburgo, Malta, Polónia, Portugal, Eslovénia, Bulgária, Roménia (Fonte: CESE).

(16)  COM(2005) 290 final de 29/06/05, ponto 2.2.2.

(17)  Sobre este assunto houve uma interessante intervenção de Jacques DELORS por ocasião do seu encontro no CESE, em 1999.

(18)  O conceito de democracia de proximidade amplia e concretiza o conceito de participação, porquanto estrutura e organiza o consenso através de instrumentos e organismos (como o CESE, como os CES nacionais e regionais) que contribuem para resolver problemas e para encontrar soluções para as grandes transformações sociais e económicas. Um exemplo típico é o processo da liberalização do mercado dos serviços, da energia e do gás nos vários países da UE, em particular dos serviços de interesse geral.

(19)  Esta subdivisão foi adoptada, com poucas diferenças, pelos Comités Económicos e Sociais instituídos nos países europeus. São 15.

(20)  A interacção leva a áreas mentais mútuas e isomorfas; mútuas, isto é, uma implica a outra; isomorfas, isto é, tendem a encontrar analogias e pontos comuns no raciocínio (em Alberoni e outros...)

(21)  Trata-se de constituir uma parceria horizontal e vertical com os representantes da sociedade civil (horizontal) e das instituições (vertical), como acontece nas regiões NUTS II do Objectivo 1. A consulta e a informação dos parceiros supramencionados permitiu melhorar sensivelmente a solução dos problemas das regiões com atraso de desenvolvimento. Cf. documentos da DG Regio sobre os POR e sobre os DOCUP regionais.

(22)  Uma estrutura de diálogo.

(23)  Um diálogo difundido já existe. As organizações sindicais, as empresariais e os representantes da microempresa têm já contactos frequentes sobre matérias da representação sindical, sobre matérias do emprego, sobre os problemas do crédito, da formação profissional e da comercialização e da internacionalização dos produtos. Os encontros realizam-se em Bruxelas (UNICE, UEAPME, CES, etc.) ou na Turquia, mas estas relações deveriam ser melhor estruturadas. Sobre o problema dos têxteis, com a mediação da DG da Empresa, enfrentou-se o assunto da zona pan-euro-mediterrânica, como alternativa produtiva, com produtos de qualidade, à China.


3.2.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 28/104


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 2000/14/CE relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros em matéria de emissões sonoras para o ambiente dos equipamentos para utilização no exterior»

COM(2005) 370 final — 2005/0149 (COD)

(2006/C 28/23)

Em 16 de Setembro de 2005, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Em 27 de Setembro de 2005, a Mesa do Comité Económico e Social Europeu incumbiu a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 421.a reunião plenária de 26 e 27 de Outubro de 2005 (sessão de 27 de Outubro), designou relator-geral A. PEZZINI e adoptou, por 81 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe favoravelmente a proposta da Comissão que prevê a alteração da Directiva 2000/14/CE («Directiva Ruído») (1).

1.2

O CESE aproveita a ocasião para sublinhar que as principais fontes de ruído, na construção e nas actividades de jardinagem e florestais, são precisamente os equipamentos mencionados na Directiva 2000/14/CE, e que as informações técnicas e as garantias prestadas pelos fabricantes desses equipamentos são fundamentais para uma gestão correcta do ruído por parte dos empregadores.

1.3

O CESE salienta ainda a importância que a aplicação plena da Directiva 2000/14/CE poderá assumir para efeitos de contenção do ruído ambiental quando os donos da obra públicos e privados incluírem nos cadernos de encargos os requisitos relativos aos equipamentos de baixo ruído.

1.4

Por último, o CESE lembra que existem normas harmonizadas para a medição das emissões sonoras. A «Directiva Ruído» (2000/14/CE) assenta nos princípios e conceitos da nova estratégia em matéria de harmonização técnica e de normalização referidos na Resolução do Conselho de 7 de Maio de 1985 (2) e na Decisão 93/465/CEE do Conselho de 22 de Julho de 1993 (3).

2.   Exposição de motivos

2.1

A proposta em apreço prevê uma alteração à Directiva 2000/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de Maio de 2000, relativa à aproximação das legislações dos Estados Membros em matéria de emissões sonoras para o ambiente dos equipamentos para utilização no exterior («Directiva Ruído»).

2.2

Desde 3 de Janeiro de 2002 que os 57 tipos de equipamento abrangidos devem satisfazer os requisitos da Directiva Ruído antes de serem colocados no mercado ou em serviço na Comunidade Europeia.

2.3

A «Directiva Ruído» fixa níveis admissíveis de potência sonora máximos e a rotulagem obrigatória das emissões sonoras para 22 tipos de equipamento, bem como a rotulagem obrigatória das emissões sonoras para os restantes 35 tipos de equipamento.

2.3.1

Para estes 22 tipos de equipamento, a que se aplicam níveis admissíveis de potência sonora máximos, há duas fases de aplicação. A primeira entrou em vigor em 3 de Janeiro de 2002 («fase I»). A segunda série de limites reduzidos deverá entrar em vigor em 3 de Janeiro de 2006 («fase II»).

2.3.2

O Grupo de Trabalho sobre Equipamentos para Utilização no Exterior (GL7) (4), nomeado pela Comissão, concordou que, para alguns tipos de equipamento, seria tecnicamente impossível atingir os níveis de potência sonora medidos a aplicar na fase II.

2.3.3

Por este motivo, a Comissão propõe que os níveis admissíveis de potência sonora da fase II relativos aos equipamentos mencionados sejam meramente indicativos. Os números definitivos dependerão de uma eventual alteração da Directiva Ruído em consequência do relatório previsto no artigo 20.o

2.4

Caso a directiva não seja alterada, os valores previstos para a fase I deverão continuar a ser aplicáveis na fase II.

3.   Observações na generalidade

3.1

O CESE emite parecer positivo sobre a proposta de alteração da Directiva 2000/14/CE e gostaria de salientar dois aspectos importantes:

3.2

O primeiro aspecto é a manutenção e confirmação das orientações contidas na Directiva 2000/14/CE, na medida em que a presente proposta de alteração deverá completar o conjunto de medidas comunitárias em matéria de ruído emitido pelas principais fontes de ruído, em especial veículos e infra-estruturas rodoviárias e ferroviárias, aeronaves, equipamentos para utilização no exterior, equipamento industrial e material móvel, e proporcionar uma base para o desenvolvimento de medidas complementares a curto, médio e longo prazo.

3.2.1

Com efeito, a directiva está relacionada com a legislação relativa às emissões sonoras de algumas categorias de equipamentos:

Directiva 70/157/CEE do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1970, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes ao nível sonoro admissível e ao dispositivo de escape dos veículos a motor;

Directiva 77/311/CEE do Conselho, de 29 de Março de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes ao nível sonoro à altura dos ouvidos dos condutores de tractores agrícolas ou florestais de rodas;

Directiva 80/51/CEE do Conselho, de 20 de Dezembro de 1979, relativa à limitação das emissões sonoras das aeronaves subsónicas e respectivas directivas complementares;

Directiva 92/61/CEE do Conselho, de 30 de Junho de 1992, relativa à recepção dos veículos a motor de duas ou três rodas;

Directiva 2000/14/CEE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de Maio de 2000, sobre a aproximação das legislações dos Estados-Membros em matéria de emissões sonoras para o ambiente dos equipamentos para utilização no exterior.

3.2.2

Antes da consolidação da política ambiental, as intervenções em matéria de protecção contra a poluição sonora estavam orientadas não apenas para o respeito do ambiente, mas sobretudo para a aplicação dos princípios de livre concorrência e de livre circulação das mercadorias (5).

3.2.3

Na presente proposta, as exigências de protecção do ambiente e de salvaguarda do mercado livre afiguram-se convenientemente equilibradas.

3.3

O segundo aspecto é a coerência da proposta com os programas, as acções e os objectivos da UE em matéria de protecção do ambiente e da saúde e de protecção contra a poluição sonora.

3.3.1

No âmbito da política comunitária, importa atingir um elevado nível de protecção da saúde e do ambiente, sendo a protecção contra a poluição sonora um dos objectivos a perseguir nesse contexto.

3.3.2

No Livro Verde sobre a futura política de ruído, a Comissão considera o ruído como um dos principais problemas ambientais na Europa.

3.4

A proposta da Comissão insere-se directamente no âmbito das medidas adoptadas com vista à aplicação dos programas de acção e da estratégia europeia no domínio do ambiente e da saúde, referida nas conclusões do Conselho da União de 27 de Outubro de 2003.

3.4.1

Cabe recordar que a Comunidade tomou medidas de combate à poluição sonora através da Directiva 2002/49, acto fundamental que regulamenta e especifica os critérios para determinar o nível de ruído ambiente aceitável.

3.5

As instituições comunitárias estabeleceram métodos comuns de avaliação e introduziram a noção de valor-limite. Cabe aos Estados-Membros fixar valores referentes às diversas zonas urbanas e proceder à coordenação com as leis nacionais.

3.5.1

A adopção de critérios comuns tornou-se indispensável, já que, de outro modo, os resultados relativos ao nível máximo de ruído admissível poderiam variar de país para país, o que poderia levar, por exemplo, à proibição do trânsito de alguns veículos automóveis ou aeronaves e à imposição de diversas restrições à utilização de determinados meios de transporte no território nacional.

3.6

A Directiva 2002/49 tem por objectivo o combate à poluição sonora, definindo como prioridade a eliminação dos efeitos prejudiciais para o ser humano da exposição ao ruído ambiente.

3.6.1

No que concerne à exposição a elevados níveis de ruído durante a actividade laboral, que pode provocar danos irreversíveis à audição, e mesmo acidentes de trabalho, são bem conhecidas as directivas que estabelecem prescrições mínimas de saúde e segurança:

Directiva 89/391/CEE do Conselho, de 12 de Junho de 1989, relativa à aplicação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde no trabalho;

Directiva 2003/10/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Fevereiro de 2003, relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde em matéria de exposição dos trabalhadores aos riscos devidos aos agentes físicos (ruído);

Directiva 89/655/CEE do Conselho, de 30 de Novembro de 1989, relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde para a utilização pelos trabalhadores de equipamentos de protecção individual no trabalho. Em relação a todas as actividades laborais que produzem ruído, estas directivas prevêem que o empregador planifique o trabalho de forma a reduzir ao mínimo a exposição, sobretudo através da utilização de equipamentos de baixo ruído, da realização de controlos na fonte e da participação dos trabalhadores.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO L 162 de 3.7.2000, pág. 1.

(2)  JO C 136 de 4.6.1985, pág. 1.

(3)  JO L 220 de 30.8.1993, pág. 23.

(4)  Grupo de Trabalho para os equipamentos para utilização no exterior (Grupo de Trabalho criado pelos serviços da Comissão).

(5)  Veja-se a decisão do Tribunal de Justiça de 12 de Março de 2002, processos C-27/00 e C-122/00.