ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

9 de junho de 2016 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Artigo 81.o CE — Acordos, decisões e práticas concertadas — Mercado espanhol do betume rodoviário — Repartição do mercado e coordenação dos preços — Comunicação relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (2002) — Ponto 23, alínea b), último parágrafo — Imunidade parcial de coima — Elementos de prova de factos anteriormente desconhecidos pela Comissão Europeia»

No processo C‑617/13 P,

que tem por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 27 de novembro de 2013,

Repsol Lubricantes y Especialidades SA, anteriormente Repsol Lubricantes YPF y Especialidades SA, com sede em Madrid (Espanha),

Repsol Petróleo SA, com sede em Madrid,

Repsol SA, com sede em Madrid,

representadas por L. Ortiz Blanco, J. Buendía Sierra, M. Muñoz de Juan, A. Givaja Sanz e A. Lamadrid de Pablo, abogados,

recorrentes,

sendo a outra parte no processo:

Comissão Europeia, representada por C. Urraca Caviedes e F. Castillo de la Torre, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: T. von Danwitz, presidente da Quarta Secção, exercendo funções de presidente da Quinta Secção, K. Lenaerts, presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Quinta Secção, D. Šváby (relator), A. Rosas e C. Vajda, juízes,

advogado‑geral: N. Jääskinen,

secretário: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 15 de abril de 2015,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 16 de julho de 2015,

profere o presente

Acórdão

1

Com o seu recurso, a Repsol Lubricantes y Especialidades SA, anteriormente Repsol Lubricantes YPF y Especialidades SA (a seguir «RPA/Rylesa»), a Repsol Petróleo SA e a Repsol SA pedem a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 16 de setembro de 2013, Repsol Lubricantes y Especialidades e o./Comissão (T‑496/07, EU:T:2013:464, a seguir «acórdão recorrido»), pelo qual este negou provimento ao recurso de anulação da Decisão C(2007) 4441 final da Comissão, de 3 de outubro de 2007, relativa a um processo de aplicação do artigo [81.° CE] [processo COMP/38.710 — Betume (Espanha)] (a seguir «decisão controvertida»), na medida em que a mesma lhe diz respeito e, a título subsidiário, a redução do montante da coima que lhes foi aplicada.

Quadro jurídico

Regulamento (CE) n.o 1/2003

2

Sob a epígrafe «Coimas», o artigo 23.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos [81.° e 82.° CE] (JO 2003, L 1, p. 1), dispõe, no seu n.o 3, que, «[q]uando se determinar o montante da coima, deve tomar‑se em consideração a gravidade e a duração da infração».

3

O artigo 31.o deste regulamento dispõe:

«O Tribunal de Justiça conhece com plena jurisdição dos recursos interpostos das decisões em que tenha sido fixada pela Comissão uma coima ou uma sanção pecuniária compulsória. O Tribunal de Justiça da União Europeia pode suprimir, reduzir ou aumentar a multa ou a sanção pecuniária compulsória aplicada.»

Orientações de 1998

4

Nos termos do ponto 1 da Comunicação da Comissão intitulada «Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.o 2 do artigo 15.o do Regulamento n.o 17 e do n.o 5 do artigo 65.o [CA]» (JO 1998, C 9, p. 3, a seguir «orientações de 1998»), «[o] montante de base é determinado em função da gravidade e da duração da infração que constituem os únicos critérios referidos no n.o 2 do artigo 15.o do Regulamento n.o 17» [do Conselho, de 6 de fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos [81.° e 82.° CE] (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22)].

5

No que diz respeito à gravidade da infração, o ponto 1, A, das orientações de 1998 prevê que a avaliação do grau de gravidade da infração deve ter em consideração o caráter da própria infração, o seu impacto concreto no mercado quando este for quantificável e a dimensão do mercado geográfico de referência. Por força desta disposição, as infrações são classificadas em três categorias que correspondem às infrações pouco graves, às infrações graves e às infrações muito graves.

6

Segundo as orientações de 1998, as infrações muito graves são nomeadamente restrições horizontais de tipo «cartel de preços» e quotas de repartição dos mercados. Para estas infrações, os montantes de base previstos das coimas são «superiores a 20 milhões de [euros]».

Comunicação de 2002 sobre a cooperação

7

A Comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2002, C 45, p. 3, a seguir «comunicação de 2002 sobre a cooperação») estabelece as condições em que as empresas que cooperem com a Comissão durante as suas investigações sobre um acordo, decisão ou prática concertada poderão ficar isentas ou beneficiar de uma redução da coima que, de outro modo, deveriam pagar.

8

O ponto 7 desta comunicação dispõe:

«[A] cooperação por parte de uma ou mais empresas pode justificar que a Comissão reduza a coima. Qualquer redução da coima deverá refletir a contribuição efetiva da empresa, em termos de qualidade e de oportunidade, para a determinação da existência da infração por parte da Comissão. As reduções deverão limitar‑se às empresas que fornecem à Comissão elementos de prova que apresentem um valor acrescentado significativo relativamente àqueles de que a Comissão já dispõe.»

9

No título B da referida comunicação, sob a epígrafe «Redução do montante da coima», os pontos 21 e 23 dispõem:

«21.

Por forma a poder beneficiar desta redução, a empresa deve fornecer à Comissão elementos de prova da infração presumida, que apresentem um valor acrescentado significativo relativamente aos elementos de prova já na posse da Comissão e deverá pôr termo à sua participação na infração presumida o mais tardar na altura em que apresenta tais elementos de prova.

[...]

23.

Na decisão final adotada no termo do processo administrativo, a Comissão determinará:

a)

Se os elementos de prova fornecidos por uma empresa apresentaram um valor acrescentado significativo relativamente aos elementos de prova na posse da Comissão nesse momento;

[…]

Além disso, se uma empresa fornecer elementos de prova relacionados com factos anteriormente desconhecidos da Comissão, com incidência direta sobre a gravidade ou duração do cartel presumido, a Comissão não tomará em consideração estes elementos ao fixar o montante de qualquer coima a aplicar à empresa que os forneceu.»

Antecedentes do litígio e decisão controvertida

10

Os antecedentes do litígio foram expostos nos n.os 1 a 91 do acórdão recorrido e podem ser resumidos da seguinte forma.

11

O produto abrangido pela infração é o betume de penetração, um betume que não foi objeto de transformação e é utilizado para a construção e manutenção das estradas.

12

O mercado espanhol do betume tem, por um lado, três produtores, os grupos Repsol, CEPSA‑PROAS e BP, e, por outro, importadores, entre os quais figuram os grupos Nynäs e a Petróleos de Portugal (Petrogal).

13

A RPA/Rylesa foi detida, durante o período correspondente aos anos 1991 a 2002, em 99,99% pela Repsol Petróleo, ela própria filial detida em 99,97% pela Repsol YPF SA, que se tornou Repsol, sociedade‑mãe do grupo Repsol.

14

A RPA/Rylesa produz e comercializa produtos de betume. Uma das atividades da Repsol Petróleo é a produção de betume de penetração e a respetiva venda à RPA/Rylesa para ser comercializado.

15

Duas outras sociedades do grupo Repsol, a Petróleos del Norte SA e a Asfalnor SA, exercem, em Espanha, atividade ligada ao betume de penetração.

16

A RPA/Rylesa e a Petróleos del Norte realizaram em Espanha, com as suas vendas de betume de penetração a terceiros, um volume de negócios de 97500000 euros no exercício comercial de 2001, ou seja, 34,04% do mercado em causa. O volume de negócios total consolidado do grupo Repsol foi de 51355000000 euros em 2006, que corresponde ao exercício anterior à adoção da decisão controvertida.

17

Na sequência de um pedido de imunidade apresentado em 20 de junho de 2002 pela BP em aplicação da comunicação de 2002 sobre a cooperação, em 1 e 2 de outubro de 2002 foram efetuadas diligências de investigação em sociedades dos grupos Repsol, CEPSA‑PROAS, BP, Nynäs e Petrogal.

18

Em 6 de fevereiro de 2004, a Comissão enviou às sociedades em causa uma primeira série de pedidos de informação, nos termos do artigo 11.o, n.o 3, do Regulamento n.o 17.

19

Por telecópias de 31 de março de 2004 e 5 de abril de 2004, respetivamente, as recorrentes e a PROAS apresentaram à Comissão um pedido nos termos da comunicação de 2002 sobre a cooperação, acompanhado de uma declaração da empresa.

20

Após ter remetido quatro outros pedidos de informação às empresas em causa, a Comissão iniciou formalmente um procedimento e, entre 24 e 28 de agosto de 2006, notificou uma comunicação de acusações às sociedades dos grupos BP, Repsol, CEPSA‑PROAS, Nynäs e Petrogal.

21

Em 3 de outubro de 2007, a Comissão adotou a decisão controvertida pela qual declarou que as treze sociedades dela destinatárias tinham participado num conjunto de acordos de repartição de mercado e de concertação dos preços do betume de penetração rodoviário em Espanha (com exceção das Ilhas Canárias).

22

A Comissão considerou que ambas as restrições da concorrência constatadas, concretamente os acordos horizontais de partilha do mercado e a concertação dos preços, estavam compreendidas, pela sua própria natureza, nos mais graves tipos de infrações ao artigo 81.o CE, que são suscetíveis de justificar, segundo a jurisprudência, a qualificação de infrações «muito graves».

23

A Comissão fixou o «montante de partida» das coimas a aplicar em 40000000 euros, tomando em consideração a gravidade da infração, o valor do mercado em causa estimado em 286400000 euros em 2001, último ano completo da infração, e o facto de a mesma estar limitada às vendas de betume efetuadas num único Estado‑Membro.

24

Em seguida, a Comissão classificou as empresas destinatárias da decisão controvertida em diferentes categorias, definidas em função da sua importância relativa no mercado em causa, para efeitos da aplicação do tratamento diferenciado, de forma a ter em conta a sua capacidade económica efetiva de causar um prejuízo grave à concorrência.

25

O grupo Repsol e a PROAS, cujas quotas do mercado em causa ascendiam, respetivamente, a 34,04% e a 31,67% no exercício de 2001, foram classificados na primeira categoria, o grupo BP, com uma quota de mercado de 15,19%, na segunda categoria, e os grupos Nynäs e Petrogal, cujas quotas de mercado se situavam entre 4,54% e 5,24%, na terceira categoria. Com esta base, os montantes de partida das coimas a aplicar foram adaptados do seguinte modo:

primeira categoria, para o grupo Repsol e a PROAS: 40000000 euros;

segunda categoria, para o grupo BP: 18000000 euros; e

terceira categoria, para os grupos Nynäs e Petrogal: 5500000 euros.

26

A fim de determinar o montante das coimas a um nível que assegure o efeito suficientemente dissuasor das mesmas, a Comissão considerou adequado aplicar ao montante de base da coima a aplicar ao grupo Repsol um coeficiente multiplicador de 1,2.

27

Após majoração do montante de partida das coimas em função da duração da infração, em concreto um período de onze anos e sete meses (de 1 de março de 1991 a 1 de outubro de 2002), no que respeita ao grupo REPSOL, a Comissão considerou que o montante da coima a aplicar a este último devia ser majorado em 30% em razão das circunstâncias agravantes, uma vez que este grupo tinha feito parte dos «motores» relevantes do cartel em causa.

28

A Comissão decidiu igualmente que, em aplicação da comunicação de 2002 sobre a cooperação, o grupo REPSOL tinha direito a uma redução de 40% do montante da coima que, em condições normais, lhe deveria ter sido aplicada.

29

Com base nestes elementos, a RPA/Rylesa, a Repsol Petróleo e a Repsol YPF foram condenadas, conjunta e solidariamente, no pagamento de uma coima no montante de 80496000 euros.

Processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

30

Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 18 de dezembro de 2007, as recorrentes pediram a anulação da decisão controvertida e, subsidiariamente, a redução do montante da coima que lhes foi aplicada.

31

As recorrentes invocaram oito fundamentos de recurso, dos quais apenas o quarto a sexto e oitavo são relevantes para o presente recurso.

32

O quarto e quinto fundamentos, que o Tribunal Geral analisou conjuntamente, eram relativos, por um lado, a um erro de facto e de direito que afetava o exame dos elementos de prova apresentados pelas recorrentes, nas suas respostas à comunicação de acusações, em apoio da demonstração da autonomia comercial da RPA/Rylesa relativamente à Repsol Petróleo e à Repsol YPF, e, por outro, ao facto de os indícios complementares relativos às relações de participação destas três sociedades não serem suscetíveis de sustentar a presunção de exercício efetivo de uma influência determinante destas duas últimas sociedades sobre a primeira.

33

O sexto fundamento era relativo ao facto de o montante da coima aplicada ter sido fixado em violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento.

34

Com o oitavo fundamento, as recorrentes contestaram, em substância, a aplicação pela Comissão da comunicação de 2002 sobre a cooperação e, em especial, do seu ponto 23, alínea b), último parágrafo.

35

O Tribunal Geral considerou que todos estes fundamentos eram improcedentes e negou integralmente provimento ao recurso.

36

Julgou também improcedente o pedido reconvencional da Comissão, no sentido de que o montante da coima aplicada às recorrentes fosse aumentado.

Pedidos das partes

37

Com o presente recurso, as recorrentes pedem que o Tribunal se digne:

anular o acórdão recorrido e a decisão controvertida;

reduzir o montante da coima aplicada;

declarar a duração excessiva e injustificada do processo no Tribunal Geral; e

condenar a Comissão nas despesas.

38

A Comissão pede que o Tribunal se digne:

negar provimento ao recurso; e

condenar as recorrentes na totalidade das despesas.

Quanto ao presente recurso

39

As recorrentes invocam quatro fundamentos de recurso.

Quanto ao primeiro fundamento, relativo a um erro de direito na apreciação da autonomia comercial da RPA/Rylesa ou, a título subsidiário, a uma falta de fundamentação desta apreciação

Argumentos das partes

40

Em apoio do seu primeiro fundamento, que tem por objeto os n.os 179 a 207 do acórdão recorrido, as recorrentes alegam que este último enferma de um duplo erro de direito na apreciação das provas apresentadas em apoio da sua argumentação destinada a demonstrar a autonomia comercial da RPA/Rylesa relativamente à Repsol Petróleo e à Repsol YPF.

41

Acusam o Tribunal Geral de ter considerado, especialmente nos n.os 202 e 203 do acórdão recorrido, que a prova de que o controlo de uma sociedade‑mãe sobre as suas filiais detidas em 100% ou quase 100% não foi exercido na prática é insuficiente para ilidir a presunção de exercício efetivo de uma influência determinante desta sociedade‑mãe nessas filiais.

42

As recorrentes consideram, a título subsidiário, que o Tribunal Geral não cumpriu o seu dever de fundamentação, resultante do artigo 36.o e do artigo 53.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, ao efetuar uma apreciação excessivamente individualizada de cada elemento de prova apresentado pelas recorrentes, sem proceder a uma apreciação global dos referidos elementos, com exceção da que consta de uma formulação lacónica no n.o 207 do acórdão recorrido.

43

A Comissão alega que este primeiro fundamento é improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

44

No que respeita ao aspeto principal deste fundamento, basta salientar que procede de uma leitura errada do acórdão recorrido.

45

Com efeito, não resulta de nenhum dos números referidos pelas recorrentes que o Tribunal Geral considerou que a prova de que o controlo de uma sociedade‑mãe sobre as suas filiais detidas em 100% ou quase 100% não foi exercido na prática é insuficiente para ilidir a presunção de exercício efetivo de uma influência determinante desta sociedade‑mãe nessas filiais.

46

Resulta unicamente do acórdão recorrido e, em especial, dos seus n.os 207 e 211 que o Tribunal Geral considerou que os elementos de prova apresentados pelas recorrentes não eram suscetíveis de demonstrar a autonomia de comportamento da RPA/Rylesa relativamente à Repsol Petróleo e à Repsol YPF e, portanto, não permitiam ilidir a presunção de exercício efetivo de uma influência determinante destas duas sociedades na primeira.

47

Além disso, há que salientar que, em conformidade com o disposto no artigo 58.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, as apreciações de natureza factual no âmbito de um recurso para o Tribunal de Justiça não são da competência deste último (v., neste sentido, acórdão de 11 de setembro de 2014, MasterCard e o./Comissão, C‑382/12 P, EU:C:2014:2201, n.o 113).

48

Quanto ao aspeto subsidiário do primeiro fundamento de recurso, cumpre certamente salientar que, no n.o 207 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou, sem fundamentação prévia, que, globalmente considerados, os elementos apresentados pelas recorrentes no seu recurso de anulação não permitiam ilidir a presunção de exercício efetivo de uma influência determinante da Repsol Petróleo e da Repsol YPF na RPA/Rylesa.

49

No entanto, decorre do acórdão recorrido que, para refutar, nos n.os 207 e 211 do mesmo, a argumentação das recorrentes destinada a demonstrar a autonomia comercial da RPA/Rylesa relativamente à Repsol Petróleo e à Repsol YPF, o Tribunal Geral não se limitou a proceder a uma análise descontextualizada de cada um dos elementos de prova apresentados pelas recorrentes.

50

Além de, nos n.os 164 a 206 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, no âmbito da sua apreciação soberana dos factos, ter efetuado uma análise pormenorizada de cada um dos elementos de prova apresentados pelas partes, de que não se pode abstrair para efeitos de uma apreciação global dos mesmos, resulta dos n.os 208 a 210 desse acórdão que o Tribunal Geral analisou e apreciou igualmente alguns indícios suplementares, em que a Comissão se tinha baseado na decisão controvertida, e que este considerou que vinham sustentar o facto de as recorrentes constituírem efetivamente uma única entidade económica.

51

Ao fazê‑lo, o Tribunal Geral pôde constatar, sem cometer nenhum erro de direito e, em especial, sem violar o seu dever de fundamentar a sua decisão, que as recorrentes não tinham demonstrado a autonomia do comportamento da RPA/Rylesa relativamente à Repsol Petróleo e à Repsol YPF.

52

Por conseguinte, o primeiro fundamento do presente recurso deve ser julgado improcedente.

Quanto ao segundo fundamento, relativo a um erro de direito na interpretação da comunicação de 2002 sobre a cooperação

Argumentos das partes

53

Com o segundo fundamento, que tem por objeto os n.os 339 a 349 do acórdão recorrido, as recorrentes sustentam que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na interpretação do ponto 23, alínea b), último parágrafo, da comunicação de 2002 sobre a cooperação, ao recusar conceder‑lhes uma imunidade parcial de coima com o fundamento de que elas defendiam erradamente que a Repsol é que tinha apresentado, na sua declaração nos termos desta comunicação, as informações que permitiram à Comissão tomar conhecimento de que o cartel tinha continuado durante o período correspondente aos anos 1998 a 2002.

54

Ora, no caso em apreço, as recorrentes, embora admitindo que a Comissão dispunha, previamente à sua declaração nos termos da comunicação de 2002 sobre a cooperação, de documentos que demonstravam a duração efetiva da infração imputada, consideram que foi a sua exposição dos factos, constante dessa declaração, que permitiu à Comissão descobrir que o grupo BP tinha dissimulado a verdade quanto à verdadeira duração do cartel controvertido e que essa infração tinha continuado durante o referido período.

55

A este respeito, as recorrentes alegam que a redação do ponto 23, alínea b), último parágrafo, da comunicação de 2002 sobre a cooperação e, especialmente, a utilização, na versão em língua espanhola, dos termos «hechos de los quales la Comisión no tenga conocimiento previo», os quais correspondem aos termos «facts previously unknown» e «faits précédemment ignorés», especificamente nas versões em línguas inglesa e francesa, devem ser entendidos como não abrangendo uma simples posse física de documentos pela Comissão, mas como exigindo igualmente um «elemento cognitivo», ou seja, o conhecimento pela Comissão da infração atestada pelos referidos documentos.

56

Além disso, e em quaisquer circunstâncias, as recorrentes consideram que a ambiguidade da referida disposição deveria ter levado o Tribunal Geral a adotar a interpretação que lhes era mais favorável.

57

No entender da Comissão, o segundo fundamento de recurso deve ser qualificado de novo e, portanto, é inadmissível uma vez que o recurso de anulação interposto pelas recorrentes não continha argumentação relativa à exigência de um «elemento cognitivo», para efeitos do benefício da disposição invocada. Subsidiariamente, este fundamento é improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

58

A título preliminar, há que recordar que, nos termos do artigo 170.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, o recurso não pode modificar o objeto do litígio perante o Tribunal Geral. A competência do Tribunal de Justiça, em sede de recurso de decisões do Tribunal Geral, está, com efeito, limitada à apreciação da solução legal que foi dada aos fundamentos debatidos perante os juízes de mérito (v., neste sentido, acórdão de 22 de maio de 2014, ASPLA/Comissão, C‑35/12 P, EU:C:2014:348, n.o 39 e jurisprudência aí referida).

59

Uma parte não pode, por conseguinte, suscitar no Tribunal de Justiça, pela primeira vez, um fundamento que não suscitou no Tribunal Geral, uma vez que isso equivale a permitir‑lhe submeter ao Tribunal de Justiça, cuja competência em sede de recurso é limitada, um litígio mais amplo do que aquele que foi submetido ao Tribunal Geral (acórdão de 3 de setembro de 2015, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Comissão, C‑398/13 P, EU:C:2015:535, n.o 57 e jurisprudência aí referida).

60

No entanto, como salientou o advogado‑geral nos n.os 17 e 18 das suas conclusões, há que observar que as recorrentes tinham invocado, em substância, a argumentação em causa no seu recurso de anulação perante o Tribunal Geral.

61

Contrariamente ao que alega a Comissão, o segundo fundamento de recurso deve, pois, ser julgado admissível.

62

Com esse fundamento, as recorrentes acusam o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito nos n.os 339 a 349 do acórdão recorrido, na medida em que validou a interpretação e a aplicação pela Comissão do conceito de «factos anteriormente desconhecidos» na aceção do ponto 23, alínea b), último parágrafo, da comunicação de 2002 sobre a cooperação. Ora, esta disposição não faz referência a uma mera posse física de documentos, exigindo antes a tomada em conta de um critério distinto que as recorrentes qualificam de «critério cognitivo».

63

A este propósito, cumpre, em primeiro lugar, recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, compete exclusivamente ao Tribunal Geral constatar e apreciar os factos e, em princípio, analisar as provas que considera sustentarem esses factos. Se estes elementos tiverem sido obtidos regularmente e os princípios gerais de direito e as regras de processo aplicáveis em matéria de ónus e de produção da prova tiverem sido respeitados, cabe exclusivamente ao Tribunal Geral a apreciação do valor a atribuir aos elementos que lhe foram submetidos. Esta apreciação não constitui, por isso, exceto em caso de desvirtuação desses elementos, uma questão de direito sujeita, como tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça (acórdão de 20 de janeiro de 2016, Toshiba Corporation/Comissão, C‑373/14 P, EU:C:2016:26, n.o 40).

64

Por conseguinte, não podem ser postas em causa as constatações de facto efetuadas pelo Tribunal Geral, que são contestadas no âmbito do segundo fundamento do presente recurso, e, em especial, a que figura no n.o 341 do acórdão recorrido, nos termos da qual a Comissão já tinha na sua posse, ainda antes de receber, em 31 de março de 2004, a declaração das recorrentes junta ao pedido da Repsol nos termos da comunicação de 2002 sobre a cooperação, informações pertinentes constantes de documentos contemporâneos recolhidos nas diligências de investigação de 1 e 2 de outubro de 2002. O mesmo acontece no que respeita à rejeição, por parte do Tribunal Geral, designadamente no n.o 345 do acórdão recorrido, do argumento relativo ao alegado valor acrescentado dos factos relatados pela Repsol, quanto ao período correspondente aos anos 1998 a 2002.

65

Em segundo lugar, no que respeita ao erro de direito invocado pelas recorrentes, saliente‑se que o ponto 23, alínea b), último parágrafo, da comunicação de 2002 sobre a cooperação dispõe que, «se uma empresa fornecer elementos de prova relacionados com factos anteriormente desconhecidos da Comissão, com incidência direta sobre a gravidade ou duração do cartel presumido, a Comissão não tomará em consideração estes elementos ao fixar o montante de qualquer coima a aplicar à empresa que os forneceu».

66

Resulta da própria redação desta disposição que a imunidade parcial prevista pela mesma exige que estejam preenchidos dois requisitos, em concreto, em primeiro lugar, que a empresa em causa seja a primeira a provar factos anteriormente desconhecidos da Comissão e, em segundo lugar, que esses factos, na medida em que têm uma incidência direta sobre a gravidade ou a duração do cartel presumido, permitam que a Comissão chegue a novas conclusões sobre a infração (acórdão de 23 de abril de 2015, LG Display e LG Display Taiwan/Comissão, C‑227/14 P, EU:C:2015:258, n.o 78).

67

O Tribunal de Justiça teve ocasião de salientar que a expressão «factos [...] desconhecidos da Comissão» não é ambígua e permite que se proceda a uma interpretação restritiva do ponto 23, alínea b), último parágrafo, da comunicação de 2002 sobre a cooperação, limitando‑o aos casos em que uma sociedade parte num cartel fornece uma informação nova à Comissão, relativa à gravidade ou à duração da infração (v., neste sentido, acórdão de 23 de abril de 2015, LG Display e LG Display Taiwan/Comissão, C‑227/14 P, EU:C:2015:258, n.o 79 e jurisprudência aí referida).

68

O Tribunal de Justiça decidiu igualmente que o sentido a dar a esta expressão deve permitir assegurar os objetivos prosseguidos pelo ponto 23, alínea b), último parágrafo, da referida comunicação, em especial, a eficácia do programa de clemência (v., neste sentido, acórdão de 23 de abril de 2015, LG Display e LG Display Taiwan/Comissão, C‑227/14 P, EU:C:2015:258, n.o 84 e jurisprudência aí referida). A este propósito, como salientou o advogado‑geral no n.o 22 das suas conclusões, o objetivo dos programas de clemência é obter a denúncia da infração pelos seus autores para lhe pôr termo rápida e completamente.

69

Deve assim ser assegurado o efeito útil desta disposição, que, quando uma empresa tenha sido a primeira a fornecer à Comissão, com vista a obter imunidade total de coima a título da comunicação de 2002 sobre a cooperação, elementos de prova suscetíveis de lhe permitir constatar a existência de uma infração ao artigo 101.o TFUE, mas se tenha abstido de transmitir informações que provem que a duração da infração em causa foi superior à revelada por aqueles elementos, visa incentivar, através da concessão de uma imunidade parcial de coima, qualquer outra empresa que tenha participado nessa infração a ser a primeira a divulgar tais informações (v., neste sentido, acórdão de 23 de abril de 2015, LG Display e LG Display Taiwan/Comissão, C‑227/14 P, EU:C:2015:258, n.o 85).

70

Tendo em conta o exposto, o critério «cognitivo» evocado pelas recorrentes não pode ser acolhido. Com efeito, o ponto 23, alínea b), último parágrafo, da comunicação de 2002 sobre a cooperação deve ser interpretado no sentido de que um elemento de prova apresentado por uma empresa no âmbito do seu pedido nos termos desta comunicação só pode ser considerado como um elemento de prova de «factos anteriormente desconhecidos da Comissão» se apresentar objetivamente um valor acrescentado significativo relativamente aos elementos já na posse da Comissão.

71

Esta interpretação resulta, por um lado, da economia geral da comunicação de 2002 sobre a cooperação. Com efeito, de acordo com os pontos 7 e 21, bem como com o ponto 23, alínea a), desta comunicação, o benefício de uma redução da coima aplicada pela Comissão a título da referida comunicação pressupõe que as empresas que pretendam beneficiar dessa redução facultem à Comissão elementos de prova que apresentem um valor acrescentado significativo relativamente aos que já estão na posse desta. O mesmo deve acontecer no que respeita à imunidade parcial prevista no ponto 23, alínea b), último parágrafo, desta mesma comunicação.

72

Por outro lado, para efeitos da aplicação desta última disposição, há que considerar que a posse, pela Comissão, de um elemento de prova equivale ao conhecimento do seu conteúdo, independentemente da questão de saber se esse elemento foi efetivamente examinado e analisado pelos seus serviços.

73

No caso em apreço, como resulta do n.o 64 do presente acórdão, o Tribunal Geral declarou, de forma definitiva, no n.o 341 do acórdão recorrido, o qual remete para o n.o 592 da decisão controvertida, que, anteriormente à declaração das recorrentes a título da comunicação de 2002 sobre a cooperação, a Comissão dispunha de informações que relatavam factos ocorridos no período correspondente aos anos 1998 a 2002, recolhidas durante as diligências de investigação efetuadas em 1 e 2 de outubro de 2002. Além disso, o Tribunal Geral rejeitou definitivamente o argumento relativo ao alegado valor acrescentado dos factos relatados pela Repsol respeitantes a esse período.

74

Assim sendo, o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito ao considerar, no n.o 344 do acórdão recorrido, que as recorrentes não tinham fundamento para pedir, com base no ponto 23, alínea b), terceiro parágrafo, da referida comunicação, que não sejam tidos em conta, para a fixação do montante da coima, factos relativos a este cartel, ocorridos no período correspondente aos anos 1998 a 2002.

75

Por conseguinte, o segundo fundamento do recurso deve ser julgado improcedente.

Quanto ao terceiro fundamento, relativo a uma violação do artigo 261.o TFUE e do princípio da proporcionalidade, na medida em que o Tribunal Geral não cumpriu o seu dever de proceder a uma fiscalização de plena jurisdição das sanções aplicadas

Argumentos das partes

76

As recorrentes alegam que o Tribunal Geral violou o artigo 261.o TFUE e o princípio da proporcionalidade ao não proceder a uma fiscalização autónoma e exaustiva da decisão controvertida no que respeita à determinação do montante de base da coima aplicada, o qual foi fixado em 40000000 euros, ou seja, o dobro do montante de base indicativo previsto pelas orientações de 1998 para as infrações qualificadas de «muito graves», apesar de os fatores referidos na decisão controvertida deverem ter conduzido à fixação desse montante de base num valor inferior ou igual a 20000000 euros.

77

A este respeito, as recorrentes alegam que, em resposta ao sexto fundamento do seu recurso de anulação, pelo qual contestavam o montante de base da coima fixado pela Comissão, invocando, designadamente, uma violação do princípio da proporcionalidade, o Tribunal Geral se limitou a declarar, por um lado, que a infração imputada devia efetivamente ser qualificada de «muito grave» e, por outro, que a Comissão tinha afirmado que tinha tomado em consideração os fatores adicionais indicados na decisão controvertida, sem ter verificado se a apreciação desses elementos por essa instituição tinha sido corretamente efetuada.

78

Nos n.os 245 a 250 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral limitou‑se, pois, a consignar os fatores tomados em consideração na decisão controvertida sem ter ele mesmo procedido a uma apreciação efetiva e autónoma, o que não permitiu às recorrentes compreenderem os motivos pelos quais esses fatores tinham podido levar a Comissão e, em seguida, o Tribunal Geral a fixar um montante de base da coima aplicada correspondente ao dobro do mínimo previsto pelas orientações de 1998 para infrações qualificadas de «muito graves».

79

Por último, as recorrentes alegam que, no âmbito do exercício da sua competência de plena jurisdição nos termos do artigo 261.o TFUE, o Tribunal Geral, a fim de apreciar a proporcionalidade do montante de base da coima aplicada, deveria ter tido em consideração a falta de efeito da infração e a importância desse montante de base relativamente ao seu volume de negócios.

80

A Comissão considera que o terceiro fundamento de recurso deve ser julgado improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

81

A título preliminar, importa recordar que não cabe ao Tribunal de Justiça, quando se pronuncia sobre questões de direito no âmbito de um recurso de decisão do Tribunal Geral, substituir, por motivos de equidade, pela sua própria apreciação a apreciação do Tribunal Geral que se pronunciou, no exercício da sua plena jurisdição, sobre o montante das coimas aplicadas a empresas devido à violação por estas do direito da União (v., designadamente, acórdão de 22 de novembro de 2012, E.ON Energie/Comissão, C‑89/11 P, EU:C:2012:738, n.o 125).

82

Só na medida em que o Tribunal de Justiça entenda que o nível da sanção é não só inapropriado mas também excessivo, a ponto de ser desproporcionado, é que se deverá declarar um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral, devido ao caráter inadequado do montante de uma coima (acórdão de 30 de maio de 2013, Quinn Barlo e o./Comissão, C‑70/12 P, EU:C:2013:351, n.o 57 e jurisprudência aí referida).

83

Por conseguinte, na medida em que, com o terceiro fundamento de recurso, as recorrentes contestam a apreciação do Tribunal Geral quanto ao caráter proporcionado do montante de base da coima aplicada à luz das circunstâncias de facto do caso em apreço, sem no entanto demonstrarem ou mesmo alegarem que esse montante é não só inapropriado mas também excessivo, a ponto de ser desproporcionado, o referido fundamento deve ser julgado improcedente.

84

Quanto ao mais, recorde‑se que, no que diz respeito à fiscalização jurisdicional das decisões da Comissão pelas quais esta decide aplicar uma coima ou uma sanção pecuniária compulsória por violação das regras de concorrência, o juiz da União dispõe, para além da fiscalização da legalidade prevista no artigo 263.o TFUE, de uma competência de plena jurisdição que lhe é reconhecida pelo artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003, em conformidade com o artigo 261.o TFUE, e que o habilita a substituir a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação e, por conseguinte, a suprimir, reduzir ou aumentar a coima ou a sanção pecuniária compulsória aplicada (acórdão de 22 de outubro de 2015, AC‑Treuhand/Comissão, C‑194/14 P, EU:C:2015:717, n.o 74 e jurisprudência aí referida).

85

Contudo, importa recordar que o exercício da competência de plena jurisdição prevista no artigo 261.o TFUE e no artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003 não equivale a um conhecimento oficioso e que no processo nos órgãos jurisdicionais da União vigora o contraditório. Com exceção dos fundamentos de ordem pública que o juiz tem o dever de suscitar oficiosamente, é pois ao recorrente que compete suscitar fundamentos contra a decisão controvertida e apresentar elementos de prova que alicercem estes fundamentos (acórdão de 22 de outubro de 2015, AC‑Treuhand/Comissão, C‑194/14 P, EU:C:2015:717, n.o 75 e jurisprudência aí referida).

86

Em contrapartida, a fim de cumprir as exigências do princípio da proteção jurisdicional efetiva consagrado no artigo 49.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), e atendendo ao facto de o artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1/2003 dispor que o montante da coima deve ser determinado em função da gravidade e da duração da infração, o Tribunal Geral tem o dever de, no exercício das competências previstas nos artigos 261.° TFUE e 263.° TFUE, analisar todas as alegações, de direito ou de facto, destinadas a demonstrar que o montante da coima não é adequado à gravidade e à duração da infração (acórdão de 22 de outubro de 2015, AC‑Treuhand/Comissão, C‑194/14 P, EU:C:2015:717, n.o 76 e jurisprudência aí referida).

87

No presente processo, importa observar que o Tribunal Geral considerou, nos n.os 250 e 258 do acórdão recorrido, que não se podia indicar nenhum erro quanto à determinação, pela Comissão, do montante de 40000000 euros que serviu de base ao cálculo da coima aplicada às recorrentes e que o mesmo não se mostrava desproporcionado.

88

Para o efeito, o Tribunal Geral, por um lado, apreciou, nos n.os 245 a 249 desse acórdão, a gravidade da infração cometida, a dimensão do mercado geográfico abrangido pela mesma e a quota de mercado das recorrentes e, por outro, nos n.os 251 a 257 do referido acórdão, respondeu, de forma juridicamente bastante e com suficiente fundamentação, aos argumentos relativos, designadamente, à inexistência de impacto concreto do cartel em causa ou ao facto de o montante de base da coima aplicada às recorrentes corresponder a uma percentagem significativa do seu volume de negócios.

89

Ao fazê‑lo, o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito no exercício da sua fiscalização jurisdicional.

90

Importa igualmente salientar que as orientações de 1998 preveem, no seu ponto 1, A, terceiro travessão, que o montante de base previsto em caso de infrações muito graves é superior a 20 milhões de euros. Assim, o montante de 20 milhões de euros constitui apenas o montante mínimo previsto pelas orientações de 1998 para além do qual a Comissão fixa o montante de partida para o cálculo das coimas para tais infrações.

91

Na medida em que as recorrentes acusam o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito ao julgar improcedente a sua argumentação segundo a qual a Comissão deveria ter tido em consideração a inexistência de impacto concreto da infração no mercado, basta salientar, à semelhança da Comissão, que as recorrentes, quanto a este aspeto, não contestaram perante o Tribunal Geral a decisão controvertida, a qual, de resto, não mencionava essa inexistência de impacto, e também não provaram perante o Tribunal Geral que os efeitos da infração eram mensuráveis. Nestas condições, a argumentação das recorrentes deve ser julgada inadmissível.

92

Consequentemente, o terceiro fundamento de recurso deve ser julgado parcialmente inadmissível e parcialmente improcedente.

Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do princípio do prazo razoável pelo Tribunal Geral

Argumentos das partes

93

Com o quarto fundamento, as recorrentes alegam que o Tribunal Geral violou o artigo 47.o da Carta e o artigo 6.o, n.o 1, da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950, ao não observar um prazo de julgamento razoável, o que justifica uma redução substancial da coima que lhes foi aplicada ou a declaração da existência de tal violação.

94

A este respeito, referem que o seu recurso de anulação foi interposto em 18 de dezembro de 2007, que a fase escrita foi concluída em 25 de setembro de 2008, que foram consultadas sobre a oportunidade de uma apensação do presente processo aos processos T‑462/07, T‑482/07, T‑495/07 e T‑497/07 em 11 de julho de 2012, que a audiência teve lugar em 14 de janeiro de 2013 e que o acórdão recorrido foi proferido em 16 de setembro de 2013.

95

Salientam que o processo durou, no total, cinco anos e nove meses, com um período de inatividade, entre a entrada da petição e a consulta sobre a oportunidade de apensação do presente processo a outros, de quatro anos e meio, análoga à observada pelo Tribunal de Justiça no processo de 26 de novembro de 2013, Groupe Gascogne/Comissão (C‑58/12 P, EU:C:2013:770).

96

A este propósito, as recorrentes alegam que nenhuma circunstância excecional é suscetível de justificar o atraso verificado na instrução do processo, o qual não é devido nem a intervenções ou omissões por sua parte nem à especial complexidade do caso.

97

A Comissão alega que o quarto fundamento de recurso é improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

98

Importa recordar que uma violação, por um órgão jurisdicional da União, da sua obrigação resultante do artigo 47.o, segundo parágrafo, da Carta de julgar os processos que lhe são submetidos num prazo razoável deve ser objeto de sanção mediante uma ação de indemnização intentada no Tribunal Geral, uma vez que essa ação constitui uma solução eficaz. Assim, um pedido destinado a obter a reparação do prejuízo causado pela inobservância, por parte do Tribunal Geral, de um prazo de julgamento razoável não pode ser submetido diretamente ao Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso, devendo ser submetido ao próprio Tribunal Geral (acórdãos de 10 de julho de 2014, Telefónica e Telefónica de España/Comissão, C‑295/12 P, EU:C:2014:2062, n.o 66; de 9 de outubro de 2014, ICF/Comissão, C‑467/13 P, EU:C:2014:2274, n.o 57; e de 12 de novembro de 2014, Guardian Industries e Guardian Europe/Comissão, C‑580/12 P, EU:C:2014:2363, n.os 17 e 18).

99

O Tribunal Geral, competente por força do artigo 256.o, n.o 1, TFUE, e chamado a pronunciar‑se sobre um pedido de indemnização, tem a obrigação de decidir com uma formação diferente da que decidiu o litígio que deu origem ao processo cuja duração é criticada (v., neste sentido, acórdãos de 10 de julho de 2014, Telefónica e Telefónica de España/Comissão, C‑295/12 P, EU:C:2014:2062, n.o 67; de 9 de outubro de 2014, ICF/Comissão, EU:C:2014:2274, n.o 58; e de 12 de novembro de 2014, Guardian Industries e Guardian Europe/Comissão, C‑580/12 P, EU:C:2014:2363, n.o 19).

100

Assim sendo, dado que é manifesto, sem que as partes tenham de produzir elementos de prova adicionais a esse respeito, que o Tribunal Geral violou de forma suficientemente caracterizada a sua obrigação de julgar o processo num prazo razoável, o Tribunal de Justiça pode constatar essa violação (v., neste sentido, acórdãos de 9 de outubro de 2014, ICF/Comissão, EU:C:2014:2274, n.o 59, e de 12 de novembro de 2014, Guardian Industries e Guardian Europe/Comissão, C‑580/12 P, EU:C:2014:2363, n.o 20).

101

É o que acontece no presente caso. A duração do processo no Tribunal Geral, a saber, cerca de cinco anos e nove meses, a qual inclui, em especial, um período de cerca de quatro anos e quatro meses que decorreu entre o fim da fase escrita do processo e a audiência, não pode ser explicada nem pela natureza nem pela complexidade do processo, nem mesmo pelo seu contexto. Com efeito, por um lado, o litígio submetido ao Tribunal Geral não tinha um especial nível de complexidade. Por outro, não resulta do acórdão recorrido nem dos elementos apresentados pelas partes que este período de inatividade fosse objetivamente justificado ou ainda que as recorrentes tivessem contribuído para ele. A este propósito, é indiferente o facto de o Tribunal Geral ter consultado as recorrentes em 11 de julho de 2012 sobre a oportunidade de uma apensação do presente processo aos processos T‑462/07, T‑482/07, T‑495/07 e T‑497/07.

102

Resulta, no entanto, das observações apresentadas no n.o 98 do presente acórdão que o quarto fundamento do presente recurso deve ser julgado improcedente.

103

Não sendo nenhum dos fundamentos de recurso invocados pelas recorrentes suscetível de ser julgado procedente, deve ser negado provimento ao recurso.

Quanto às despesas

104

Por força do disposto no artigo 184.o, n.o 2, do seu Regulamento de Processo, se o recurso da decisão do Tribunal Geral for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decide sobre as despesas.

105

Por força do disposto no artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável ao processo de recurso de decisão do Tribunal de Geral nos termos do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

106

Tendo a Comissão pedido a condenação da Repsol Lubricantes y Especialidades, da Repsol Petróleo e da Repsol e tendo estas sido vencidas, há que condená‑las nas despesas relativas ao presente processo de recurso.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A Repsol Lubricantes y Especialidades SA, a Repsol Petróleo SA e a Repsol SA são condenadas nas despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.