10.3.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 75/6


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Promover as empresas inovadoras e de elevado crescimento»

(parecer de iniciativa)

(2017/C 075/02)

Relator:

Antonio GARCÍA DEL RIEGO

Decisão da plenária

21 de janeiro de 2016

Base jurídica

Artigo 29.o, n.o 2, do Regimento

 

Parecer de iniciativa

Competência

Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social

Adoção em secção

29 de novembro de 2016

Adoção em plenária

14 de dezembro de 2016

Reunião plenária n.o

521

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

220/1/8

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE encoraja a Comissão a prosseguir os seus esforços no sentido de elaborar propostas políticas que promovam a criação de empresas inovadoras e de elevado crescimento, e recomenda que essas iniciativas sejam levadas a cabo, dirigidas e coordenadas por uma única entidade responsável pela avaliação, monitorização e criação de sinergias entre as políticas inovadoras propostas pelas diversas direções-gerais. Estas propostas políticas devem reforçar o mercado único, consolidar os agrupamentos e os ecossistemas em que são criadas as empresas inovadoras em fase de arranque, desenvolver a componente de capitais próprios dos mercados de capitais europeus, promover uma agenda académica centrada nos empregos do futuro e minimizar os custos e a burocracia associados à criação de novas empresas.

1.1.1.

A Comissão deve continuar a envidar esforços para assegurar o respeito pelas regras existentes do mercado único: os projetos de harmonização a longo prazo, como as normas de contabilidade e insolvência, o reconhecimento automático das qualificações profissionais e académicas, a implementação acelerada da Estratégia para o Mercado Único Digital e a plena realização da iniciativa para a União dos Mercados de Capitais (1) contribuiriam muito para que a UE tirasse partido de todas as potencialidades de um verdadeiro mercado único. A existência de normas simples e eficazes em matéria de contratos transfronteiras fomentaria o comércio eletrónico transfronteiras, reduzindo a fragmentação jurídica no domínio do direito do consumidor, bem como os custos de conformidade para as empresas.

1.1.2.

Importa continuar a ampliar o financiamento por capitais próprios, a fim de apoiar as empresas em fase de arranque na sua fase de desenvolvimento. Entre outros fatores, tal implica um regime fiscal mais neutro, que trate da mesma forma os financiamentos por empréstimos e por capitais próprios, permitindo a dedução tanto dos juros como dos dividendos (2). As empresas em fase de arranque devem poder recorrer a pacotes de «opções de aquisição de ações» para atrair e reter talentos.

1.1.3.

Há que criar e promover uma cultura de capitais próprios, nomeadamente através de iniciativas educativas e não legislativas. O sistema financeiro europeu deve desenvolver produtos de investimento líquido adaptados aos pequenos investidores, a fim de os incentivar a investir em pequenas empresas inovadoras.

1.1.4.

É igualmente fundamental eliminar a burocracia desnecessária e reduzir a sobrerregulamentação, a fim de minimizar os encargos administrativos e evitar custos desnecessários e perdas de tempo para os empresários.

1.1.5.

Há que reforçar e acelerar o desenvolvimento de novos tipos de colaboração entre as universidades e as empresas, sejam estas de pequena ou grande dimensão, em todos os Estados-Membros que adotem novas políticas destinadas a atrair talentos para a UE.

1.1.5.1.

O CESE encoraja a Comissão a eliminar quaisquer restrições jurídicas aos intercâmbios de estudantes e de jovens empresários (3), por exemplo mediante a criação de um programa Erasmus para jovens empresários.

1.1.5.2.

A fim de aumentar a sensibilização para as empresas promissoras, o CESE preconiza a criação de uma base de dados informativa baseada numa plataforma, integrada na Plataforma Europeia de Aconselhamento ao Investimento (PEAI) e no Portal Europeu de Projetos de Investimento (PEPI) (4). Esta base de dados incluiria as empresas europeias de elevado crescimento, em diversos setores, selecionadas com base em critérios objetivos e transparentes, e permitiria realizar comparações e avaliações comparativas entre empresas.

1.1.6.

O CESE considera que a partilha e a avaliação de boas práticas oferecem informações valiosas para a experimentação de novas políticas (5).

1.2.

O Fundo Europeu de Investimento (FEI) e o Banco Europeu de Investimento (BEI) são convidados a apoiar as empresas inovadoras com capital de risco e capital semente específicos, a fim de facilitar a transferência de tecnologia das universidades e centros de investigação. Este apoio poderia assumir a forma de garantias para o primeiro empréstimo, que ajudariam a ultrapassar a resistência inicial ao financiamento privado.

1.3.

O Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos (FEIE), um fundo de 21 mil milhões de euros constituído por garantias da União Europeia e capital do Banco Europeu de Investimento, deve desempenhar um papel fundamental para ajudar os projetos inovadores a alcançar dimensão suficiente e aceder ao mercado. Além disso, o FEIE pode servir de modelo para os futuros orçamentos da UE: o método tradicional de financiamento de projetos mediante subvenções seria substituído por um modelo mais eficaz orientado para os investimentos, suscetível de atrair fundos para os projetos. O FEIE permitiu financiar com êxito setores que apresentam um risco relativamente elevado e poderiam ter sido facilmente ignorados (6).

1.4.

O CESE insta à criação de um conjunto mais amplo de instrumentos de investimento para promover o investimento na fase de crescimento, incluindo «fundos assimétricos», com diferentes resultados para diferentes categorias de investidores, e instrumentos de financiamento alternativos, tais como o financiamento colaborativo (7). Importa considerar igualmente a criação de submercados, a fim de permitir às PME europeias aceder mais facilmente aos mercados.

1.5.

A Comissão deve corrigir as assimetrias regulamentares entre a UE e os EUA relativamente ao tratamento dos investimentos em software e eliminar os obstáculos regulamentares que impedem o setor financeiro europeu de investir no desenvolvimento digital.

2.   Análise da situação atual

2.1.

As pequenas e médias empresas (PME) são um elemento essencial da economia europeia, contribuindo de forma significativa para a criação de emprego e o crescimento económico (8).

2.1.1.

Em 2015, o número de PME na União Europeia ascendia a mais de 22,3 milhões, representando 99,8 % de todas as empresas não financeiras. Estas PME empregavam 90 milhões de pessoas (66,9 % do emprego total), geraram 57,8 % do valor acrescentado total (9) e criaram 85 % dos novos empregos. A Europa deve assegurar a criação de uma nova geração de PME para compensar as 200 000 que todos os anos vão à falência (10), afetando 1,7 milhões de trabalhadores. Contudo, as empresas mais importantes para o futuro crescimento económico são aquelas que pretendem inovar, crescer e exportar.

2.2.

É fundamental criar empresas em fase de arranque com taxas de crescimento elevadas, devido à sua focalização na inovação em setores de rápido crescimento com um elevado valor acrescentado. São estas as empresas que, no futuro, serão responsáveis pela criação de emprego e pelo aumento da produtividade, dois elementos essenciais para a melhoria do nível de vida. Numa altura em que a Europa regista progressos em alguns domínios, continua atrasada no que se refere à transição das empresas em fase de arranque para a fase de expansão, que deve conduzir, em última análise, ao crescimento e à criação de emprego de que o continente precisa (11).

2.3.

O presente parecer de iniciativa centra-se nas empresas em fase de expansão: empresas de elevado crescimento, com um aumento médio anual de trabalhadores (ou volume de negócios) superior a 20 % ao longo de um período de três anos, e com 10 ou mais trabalhadores no início do período de observação (12). Uma das principais características das empresas em fase de expansão reside no facto de as suas atividades assentarem em modelos empresariais com um alto grau de escalabilidade. Entende-se por escalabilidade a capacidade de crescer em termos de acesso ao mercado, volume de negócios e estrutura, um crescimento impulsionado, por exemplo, por uma rápida reprodução do modelo de negócios em diferentes mercados ou por novas práticas de gestão.

2.3.1.

Um estudo da OCDE realizado em 11 países (13) concluiu que as empresas em fase de expansão representavam menos de 10 % do tecido empresarial nesses países, apesar de chegarem a criar dois terços da totalidade dos novos empregos (14).

2.4.

As empresas em fase de arranque tendem a ser menos rentáveis a curto prazo e dependem de financiamento externo. Se estas empresas inovadoras não forem capazes de financiar os seus planos de expansão, não conseguirão crescer, o que poderá prejudicar o seu potencial de aumento da produtividade e criação de emprego.

2.4.1.

Segundo uma análise realizada pelo Banco Mundial (15), a taxa média de créditos malparados das PME nos mercados desenvolvidos ascendeu a 6,93 % em 2007, mais do dobro do valor registado no caso das grandes empresas, que se situava em 2,54 %. O crédito malparado aumentou drasticamente durante a crise em Portugal, Espanha, Itália e Irlanda, atingindo um nível entre 10 % e 25 %.

2.4.1.1.

Políticas que incentivem a concessão de créditos bancários a empresas mais expostas a riscos, sobretudo novas empresas com garantias limitadas, poderiam criar uma série de bancos de risco, conduzir a restrições de crédito e a uma maior instabilidade financeira (16).

2.5.

A Europa deve centrar-se no bom funcionamento do «financiamento da transição», que falta atualmente.

2.5.1.

O financiamento da transição comporta quatro vertentes: fase de arranque (financiamento mediante subvenções, capital semente, familiares e amigos); fase de crescimento dos capitais próprios (financiamento colaborativo, microfinanciamento, investidores providenciais); crescimento sustentado (titularização, capitais fechados, capital de risco, investidores institucionais, colocação privada de dívida) e saída (aquisição, mercados de ações).

3.   Elementos de base do desenvolvimento de um ecossistema de inovação favorável à expansão

3.1.

Os ecossistemas de inovação bem-sucedidos que favorecem as empresas em fase de expansão são caracterizados por redes fortemente interligadas de institutos de investigação e ensino, grandes empresas, investidores de capital de risco, e pela presença de talento criativo e empresarial (17).

3.1.1.

Geralmente, as empresas em fase de arranque são criadas em polos tecnológicos localizados junto a universidades de excelência, que desempenham um papel fundamental no desenvolvimento de um ambiente empresarial dinâmico, uma vez que são uma fonte de talentos, tanto em termos de estudantes como de pessoal académico. Os agrupamentos de empresas fortes e com boas conexões aumentam a produtividade das empresas, determinam a direção e o ritmo da inovação e estimulam a criação de novas empresas. Os EUA e a China, bem como alguns centros na Europa, estão a levar a cabo um combate a longo prazo para atrair talentos e capital e promover a inovação.

3.1.2.

No entanto, a fragmentação dos mercados de trabalho europeus impede a transição das empresas em fase de arranque para a fase de expansão. A este respeito, é da máxima importância facilitar a mobilidade da mão de obra em toda a UE, bem como atrair talentos de países terceiros, que funcionam como um íman, criando, assim, um círculo virtuoso.

3.1.3.

A criação de um programa Erasmus para jovens empresários poderia ser fomentada. Uma tal iniciativa está em consonância com o princípio orientador de crescimento e emprego, facilitaria a mobilidade e seria bem acolhida pelas empresas.

3.1.3.1.

Foram recentemente adotadas algumas políticas para atrair talentos de países terceiros. O Cartão Azul, criado em 2009, facilitou a entrada de trabalhadores qualificados com contrato de trabalho na UE (18). A nível nacional, alguns países europeus já criaram procedimentos de concessão de vistos especificamente destinados a empresários, e outros países estão a começar a adotar esta prática (19).

3.1.4.

Oxbridge, um termo que se refere à zona de influência das universidades de Oxford e Cambridge, no Reino Unido, oferece um exemplo notável de êxito de um polo tecnológico. A comunidade do setor de alta tecnologia do Reino Unido continuou a crescer e a inovar durante o prolongado período de recessão e estagnação económica que se verificou entre 2008 e 2012 (20).

3.1.4.1.

No entanto, muitas das universidades da UE não possuem a reputação, a estrutura ou a disposição para a criação de condições favoráveis ao desenvolvimento de projetos empresariais nos campus ou para defender estes programas junto das autoridades governamentais (21). Os responsáveis universitários e os governos devem criar ligações com a indústria, investindo em serviços de transferência de tecnologias nos campus e na educação para o empreendedorismo (22).

3.1.5.

As empresas derivadas criadas em resultado de transferências tecnológicas das universidades enfrentam dificuldades de expansão devido à falta de recursos e de gestão especializada. Por conseguinte, é essencial as empresas derivadas poderem contar com um apoio público institucional para ultrapassar a relutância inicial dos fornecedores de financiamento privado em investir neste tipo de empresas com um perfil técnico, uma vez que são consideradas demasiado técnicas e arriscadas e, muitas vezes, não são bem compreendidas.

3.2.

Apesar de possuírem um nível de instrução semelhante, os cidadãos europeus criam com muito menos frequência novas empresas do que os norte-americanos. Entre as causas desta situação incluem-se um elevado nível de aversão ao risco, os encargos administrativos, o fraco desenvolvimento de uma cultura da segunda oportunidade e de programas de ensino relacionados com o empreendedorismo, bem como a falta de uma cultura de capitais próprios. Importa também prestar atenção ao desenvolvimento precoce de uma cultura empresarial no ensino primário e secundário.

3.2.1.

De facto, o risco de falência é o maior receio dos europeus quando ponderam criar uma nova empresa: 43 %, em comparação com 19 % nos EUA. Nos EUA (23), a existência de um regime de falências razoavelmente eficiente e não punitivo, bem como uma maior aceitação geral da falência empresarial, contribui para uma maior disposição para assumir riscos. O desenvolvimento de uma cultura mais orientada para o empreendedorismo deve tornar-se uma prioridade, quer para os decisores políticos, quer para as instituições de ensino.

3.2.1.1.

Um estudo recente revela que as empresas criadas por empresários em recomeço de atividade apresentam um volume de negócios e um crescimento do emprego superiores, bem como mais possibilidades de obter financiamento externo (24). Em Espanha, apenas 20 % dos empresários que criam uma empresa pela primeira vez têm êxito, ao passo que a taxa de êxito daqueles que fazem uma segunda tentativa aumenta para uns surpreendentes 80 %.

3.3.

As empresas inovadoras e de elevado crescimento têm mais tendência a verem os seus pedidos de crédito rejeitados por não possuírem capital, um elemento crucial nas avaliações de crédito dos bancos (25). O financiamento por capitais próprios é, por conseguinte, fundamental para as empresas em fase de arranque e para as empresas que têm planos de expansão ambiciosos mas cujos fluxos de caixa são incertos ou são objeto de previsões negativas. O crédito bancário deve, portanto, ser complementado por uma maior diversidade e flexibilidade das fontes de financiamento, com especial ênfase para o papel desempenhado pelo financiamento por capitais próprios.

3.4.

Há que criar e promover uma cultura de capitais próprios na Europa, e os sistemas financeiros europeus devem desenvolver produtos de investimento que sejam adequados aos pequenos investidores e lhes forneçam a liquidez necessária para investir em pequenas empresas inovadoras.

3.4.1.

Devido à ausência de financiamento nas fases posteriores do seu desenvolvimento, as empresas em fase de arranque europeias não conseguem acompanhar o ritmo de crescimento das suas homólogas norte-americanas, sendo forçadas a gerar receitas mais rapidamente para se manterem em atividade, sob pena de serem vendidas numa fase precoce a preço de desconto. Com efeito, em 2009, apenas 5 % das empresas europeias criadas a partir do zero desde 1980 ocupavam os 1000 primeiros lugares em termos de capitalização bolsista. Nos Estados Unidos, a percentagem ascendia a 22 % (26).

3.4.1.1.

É de salientar que mais de metade de todo o capital de risco a nível mundial é concedido nos Estados Unidos, contra apenas 15 % na Europa. Em 2013, foram concedidos 26 mil milhões de euros de capital de risco nos EUA, e 5 mil milhões de euros na Europa, enquanto os investidores providenciais forneceram 6 mil milhões de euros às empresas em fase de arranque europeias e 20 mil milhões de euros às norte-americanas.

3.4.1.2.

Por conseguinte, a UE sofre de um importante défice em matéria de investidores providenciais e de financiamento de capital de risco, que representavam, respetivamente, um valor três e cinco vezes superior nos EUA. Esta diferença é crucial, uma vez que este é o tipo de capital necessário para que as empresas cresçam e tenham mais êxito.

3.4.1.3.

Este fenómeno deve-se, principalmente, à elevada fragmentação do setor de capital de risco da UE ao longo das fronteiras nacionais. Representando cerca de 60 milhões de euros, os fundos de capital de risco europeus têm, em média, apenas metade da dimensão dos fundos dos EUA, e 90 % do investimento em capital de risco na UE concentra-se em apenas oito Estados-Membros (Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Países Baixos, Espanha, Suécia e Reino Unido) (27). Devido à diversidade de normas aplicáveis nos Estados-Membros, as empresas de capital de risco enfrentam custos elevados na angariação de fundos em toda a Europa. Como resultado, têm pequena dimensão e dispõem de menos capital para apoiar as empresas em crescimento. Se os mercados europeus de capital de risco fossem tão avançados como os dos EUA, cerca de 90 mil milhões de euros de fundos adicionais teriam estado disponíveis para financiar as empresas entre 2008 e 2013 (28).

3.4.1.4.

A insuficiente participação dos investidores privados é uma questão igualmente problemática. Ao longo da última década, o setor europeu do capital de risco tem vindo a depender cada vez mais das instituições do setor público, cuja contribuição representou 31 % (29) do investimento total em 2015, contra apenas 15 % (30) em 2007. O objetivo não deve ser diminuir o dinheiro público mas aumentar as fontes do setor privado. A base de investidores deve ser alargada e diversificada, para que o setor se torne autónomo a longo prazo.

3.4.1.5.

A fim de incentivar as parcerias público-privadas, poderia ponderar-se o recurso a fundos assimétricos. Trata-se de fundos de capital de risco em que os investidores beneficiam de condições e rendimentos diferentes em função dos seus objetivos de investimento, sendo os diversos interesses dos parceiros reconhecidos nas diferentes formas de colaboração. Estes fundos já existem na Finlândia, na Grécia, no Reino Unido e nos Países Baixos.

3.4.2.

Importa considerar igualmente a criação de submercados, a fim de permitir às PME europeias aceder mais facilmente aos mercados. Estes mercados devem prever custos de cotação baixos e uma abordagem flexível, adaptada às necessidades das empresas mais pequenas e dinâmicas. O Alternative Investment Market (AIM) de Londres, o Nouveau Marché de Paris e o Mercado Alternativo Bursatil (MAB) de Madrid constituem bons exemplos. Este sistema de regulamentação flexível pode ser uma faca de dois gumes. As pequenas empresas podem aceder mais facilmente à bolsa para emitir ações, mas, por outro lado, os investidores inexperientes podem ter dificuldade em avaliar com rigor o perfil de risco de uma empresa (31).

3.4.3.

A regulamentação específica do setor limita, por vezes, a capacidade das empresas da UE em investir no desenvolvimento de tecnologias, em comparação com os seus homólogos dos EUA. Por exemplo, existe uma assimetria regulamentar entre as entidades financeiras europeias, norte-americanas e suíças no que diz respeito aos investimentos necessários em software e em outros ativos incorpóreos, essenciais para o desenvolvimento digital.

3.4.3.1.

O setor bancário representa, de longe, o maior setor de tecnologias da informação do mundo: este setor gasta 700 mil milhões de dólares em inovação em matéria de tecnologias da informação — o setor financeiro gasta 1 em cada 5 euros e representa 5 % a 10 % do investimento (32). Por conseguinte, os bancos desempenham um papel importante na transformação digital e são os principais financiadores da economia digital.

3.4.3.2.

No entanto, o quadro regulamentar penaliza os seus tão necessários investimentos em tecnologias da informação. A regulamentação financeira deve tratar o software como um ativo ordinário e não deve obrigar os bancos da UE a deduzir este investimento para efeitos dos requisitos de capital.

3.5.

As diferenças de tratamento fiscal entre os Estados-Membros e entre diversos tipos de financiamento constituem um obstáculo para o desenvolvimento dos mercados de capitais pan-europeus, com impacto tanto nos investidores como nos emissores.

3.5.1.

Na Europa, a maior parte dos regimes de tributação das empresas favorece o financiamento por empréstimos em detrimento do recurso a capitais próprios, ao permitir a dedução dos encargos com juros; quando são utilizados capitais próprios, não há lugar à dedução do pagamento de dividendos. Esta distorção a favor do endividamento poderia ser resolvida aplicando deduções fiscais tanto ao financiamento por capitais próprios como ao financiamento por empréstimos (33).

3.5.1.1.

Os incentivos fiscais desempenham um papel importante no financiamento da fase inicial das empresas de elevado crescimento, e vários governos de todo o mundo permitem deduções fiscais a particulares e empresas que investem em empresas de alta tecnologia em fase de arranque ou em fundos de capital de risco qualificados (34).

3.5.1.2.

A introdução de programas de opções de aquisição de ações é um benefício tradicionalmente atraente tanto para os trabalhadores como para os empresários no caso das empresas em fase de arranque, uma vez que muitos estariam dispostos a renunciar a uma compensação salarial. Na maior parte dos Estados-Membros, o tratamento fiscal das opções de aquisição de ações é muito penalizante, uma vez que estas são consideradas um rendimento normal e tributadas a uma taxa marginal. Há que promover um tratamento fiscal preferencial para as opções de aquisição de ações, à semelhança do sistema de Incentive Stock Options (ISO) [planos de incentivos] (35) dos EUA.

3.5.2.

O cumprimento das obrigações em matéria de IVA é oneroso para as empresas, sobretudo no caso das vendas transfronteiras de bens ou serviços. O CESE regista com satisfação que a Comissão anunciou, como parte da sua Estratégia para o Mercado Único Digital, a apresentação de propostas legislativas até ao final de 2016, com vista a reduzir os encargos administrativos sobre as empresas causados pelos diversos regimes de IVA. Entre estas medidas, a Comissão propõe a introdução de um limiar de isenção do IVA, para ajudar as empresas em fase de arranque e as microempresas (36).

3.6.

É fundamental libertar todo o potencial do mercado único para que, logo na fase inicial, as empresas em fase de arranque possam oferecer os seus serviços e produtos em toda a UE e possam desenvolver-se rapidamente para competir nos mercados mundiais.

3.6.1.

Regras simples e eficazes em matéria de contratos transfronteiras em benefício dos consumidores e das empresas são uma prioridade no âmbito da Estratégia para o Mercado Único Digital. Fomentariam o comércio eletrónico transfronteiras na UE, reduzindo a fragmentação jurídica no domínio do direito dos contratos de consumo. A eliminação dos obstáculos decorrentes das diferenças em matéria de direito contratual seria traduzida num acréscimo do consumo na UE de 18 mil milhões de euros e num aumento de 4 mil milhões de euros do produto interno bruto em relação ao seu nível atual (37).

3.7.

Os encargos administrativos desnecessários constituem igualmente custos adicionais e uma fonte de perda de tempo para os empresários.

3.7.1.

No período 2013-2015, o custo médio para criar uma empresa na UE atingiu 4,1 % do PIB per capita, enquanto nos EUA esse valor se situou em 1,17 % (38).

3.7.2.

No que diz respeito ao tempo necessário para criar uma empresa na UE, em média, o processo de registo demorava 11,6 dias a ficar concluído. Nos EUA, bastam seis dias para criar uma empresa.

3.8.

A assimetria de informação constitui um motivo adicional para que a Europa não produza um número suficiente de empresas de elevado crescimento. Os investidores não dispõem de uma visão completa de todas as oportunidades de investimento. Além disso, os investidores de países terceiros enfrentam limitações adicionais, uma vez que têm de tentar compreender as especificidades dos diferentes mercados nacionais. Um portal especializado, integrado na Plataforma Europeia de Aconselhamento ao Investimento (PEAI) e no Portal Europeu de Projetos de Investimento (PEPI) (39), contribuiria para conferir visibilidade a projetos com um elevado crescimento e reduzir a assimetria de informação.

4.   Alguns exemplos de boas práticas entre os muitos existentes atualmente

4.1.

Vários países desenvolveram boas práticas para apoiar as empresas em fase de arranque e em fase de expansão. O CESE recomenda à Comissão que analise atentamente as possibilidades da sua aplicação a nível europeu.

4.1.1.

Na Alemanha, as empresas devem aderir a uma câmara de comércio (IHK) que, em contrapartida, lhes fornece apoio e consultoria (40).

4.1.2.

As garantias de empréstimo concedidas pelo Estado, utilizadas em Itália, Polónia e França, bem como o cofinanciamento público utilizado na Alemanha e na Suécia, constituem soluções a explorar (41).

4.1.3.

Através dos programas EIS, SEIS e VCT (42), o Reino Unido oferece regimes de incentivos fiscais com vista a aumentar o fluxo de fundos para ativos de maior risco.

4.1.4.

A região do Piemonte, em Itália, desenvolveu redes em 12 agrupamentos industriais nos quais reuniu empresas, universidades e o governo local (43).

4.1.5.

Na região basca de Espanha, a cooperativa Elkar-Lan promove a criação de outras cooperativas, mediante uma análise completa da viabilidade do projeto, de ações de formação e de apoio ao acesso a subvenções e auxílios financeiros (44).

4.1.6.

A digitalização dos serviços públicos, como demonstra o caso da Estónia, pode facilitar substancialmente o crescimento de empresas inovadoras e de alta tecnologia. À escala pan-europeia, o impacto do desenvolvimento da administração em linha seria enorme.

4.1.7.

Na era da economia dos dados, os ativos incorpóreos, que são difíceis de analisar e avaliar utilizando os mecanismos de financiamento tradicionais, podem representar uma vantagem competitiva. O Instituto da Propriedade Intelectual do Reino Unido criou métodos para identificar e avaliar estes ativos em termos de fluxo de caixa (45).

4.1.8.

No Reino Unido, uma equipa especializada da Tech City UK denominada Future Fifty apoia as 50 principais empresas digitais do país em fase de crescimento. O programa permite que as empresas beneficiem de conhecimentos especializados do setor público e privado, cria ligações com a base de investidores institucionais do Reino Unido, e oferece apoio específico para ajudar as empresas a crescer rapidamente e a preparar a OPI (46), fusões e aquisições e a expansão a nível mundial (47).

4.1.9.

Em 2015, o Governo federal dos EUA lançou o programa STEM, que tem por objetivo incentivar as crianças a prosseguirem os seus estudos nas áreas da ciência, da tecnologia, da engenharia e da matemática. Um dos principais pilares deste programa consiste em preparar os estudantes para as necessidades futuras do mercado de trabalho (48). É dada uma atenção crescente às qualificações transferíveis e à iniciativa STEAM, em que o «A» se refere às artes.

5.   Iniciativas adotadas pela Comissão Europeia para promover a criação e o crescimento das empresas em fase de arranque

5.1.

A Comissão Europeia tem realizado um esforço notável para apoiar os empreendedores, lançando numerosas iniciativas nestes últimos anos, no âmbito de um processo liderado por várias direções-gerais, nomeadamente a DG Redes de Comunicação, Conteúdos e Tecnologias (49), a DG Educação e Cultura (50), a DG Mercado Interno, Indústria, Empreendedorismo e PME (51), a DG Investigação e Inovação (52), e a DG Estabilidade Financeira, Serviços Financeiros e União dos Mercados de Capitais (53).

5.2.

Muitas destas iniciativas são recentes e ainda é muito cedo para avaliar os seus efeitos. Contudo, o CESE considera que a Comissão se encontra no caminho certo, e encoraja-a a continuar a trabalhar nesta direção, sempre em consulta com as partes interessadas europeias e nacionais relevantes.

Bruxelas, 14 de dezembro de 2016.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  O CESE expressou o seu apoio a iniciativas relativas à União dos Mercados de Capitais nos seus pareceres sobre o «Plano de Ação para a Criação de uma União dos Mercados de Capitais» (JO C 133 de 14.4.2016, p. 17), «Titularização» (JO C 82 de 3.3.2016, p. 1) e «Diretiva Prospeto» (JO C 177 de 18.5.2016, p. 9).

(2)  O CESE tem apelado repetidamente para a adoção de medidas que eliminem as distorções a favor do endividamento nos regimes fiscais, por exemplo no seu parecer, intitulado «Financiamento das empresas — Mecanismos de oferta alternativos» (JO C 451 de 16.12.2014, p.20).

(3)  Ver o parecer do CESE sobre «Universidades empenhadas em formar a Europa» (JO C 71 de 24.2.2016, p. 11).

(4)  Plataforma Europeia de Aconselhamento ao Investimento: http://www.eib.org/eiah/index.htm.

Informações sobre o Portal Europeu de Projetos de Investimento: https://ec.europa.eu/eipp/desktop/pt/index.html.

(5)  Ver o ponto 4.

(6)  European Digital Forum, From Start-up to Scale-up: Growing Europe’s Digital Economy [Da fase de arranque à fase de expansão: Fazer crescer a economia digital europeia], Sergey Filippov e Paul Hofheinz, 2016, p. 3-5.

(7)  Idem, p. 5.

(8)  Definição de PME adotada pela UE (JO L 124 de 20.5.2003, p. 36).

(9)  http://www.eif.org/news_centre/publications/eif_annual_report_2015.pdf.

(10)  Bankruptcy and second chance for honest failed entrepreneurs — the European Commission’s policy [Falência e uma segunda oportunidade para os empresários honestos em situação de falência — Política da Comissão Europeia]. Dia do Empresário, 12 de novembro de 2015.

(11)  Uma empresa em fase de arranque é normalmente definida como um projeto empresarial concebido para procurar um modelo de negócios repetível e escalável. Estas novas empresas são geralmente muito inovadoras e costumam basear-se em ideias, tecnologias ou modelos de negócios que não existiam anteriormente. Em contrapartida, uma empresa em expansão caracteriza-se por um desenvolvimento e crescimento rápidos em termos de acesso ao mercado, volume de negócios ou número de trabalhadores. Ver o Octopus High Growth Small Business Report 2015 [Relatório de 2015 da Octopus sobre as pequenas empresas de elevado crescimento] (Londres, Octopus, 2015).

(12)  https://www.linkedin.com/pulse/20141201163113-4330901-understanding-scale-up-companies.

(13)  Reino Unido, Finlândia, Espanha, Itália, EUA, Canadá, Noruega, Países Baixos, Dinamarca, Nova Zelândia, Áustria.

(14)  Supporting investors and growth firms [Apoio aos investidores e às empresas em crescimento] — T. Aubrey, R. Thillaye e A. Reed, 2015, p. 11.

(15)  http://siteresources.worldbank.org/INTFR/Resources/BeckDemirgucKuntMartinezPeria.pdf.

(16)  Supporting investors and growth firms [Apoio aos investidores e às empresas em crescimento] — T. Aubrey, R. Thillaye e A. Reed, 2015, p. 21.

(17)  Tataj D., Innovation and Entrepreneurship. A Growth Model for Europe beyond the Crisis [Inovação e empreendedorismo. Um modelo de crescimento para a Europa para além da crise], Tataj Innovation Library, Nova Iorque, 2015.

(18)  https://www.apply.eu/directives/.

(19)  http://tech.eu/features/6500/European-start-up-visa.

(20)  www.cambridge.gov.uk/sites/default/files/documents/cnfe-aap-io-employment-sector-profile.pdf.

(21)  Clustering for Growth, How to build dynamic innovation clusters in Europe [Criação de agrupamentos para o crescimento, como criar agrupamentos de inovação dinâmicos na Europa], p. 11.

(22)  Ver o parecer do CESE sobre «Universidades empenhadas em formar a Europa» (JO C 71 de 24.2.2016, p. 11).

(23)  Bankruptcy and second chance for honest failed entrepreneurs — the European Commission’s policy [Falência e uma segunda oportunidade para os empresários honestos em situação de falência — Política da Comissão Europeia].

(24)  Investigação realizada por Kathryn Shaw, professora da Stanford Graduate School of Business.

(25)  Supporting investors and growth firms [Apoio aos investidores e às empresas em crescimento] — T. Aubrey, R. Thillaye e A. Reed, 2015, p. 40.

(26)  http://eref.knowledge-economy.net/uploads/documents/Born%20to%20Grow.pdf.

(27)  Comissão Europeia, Construção de uma União dos Mercados de Capitais, Livro Verde, op. cit.

(28)  Idem.

(29)  http://www.investeurope.eu/media/476271/2015-european-private-equity-activity.pdf.

(30)  http://www.investeurope.eu/media/340371/141109_EVCA_FOF_scheme.pdf.

(31)  www.ft.com/intl/cms/s/0/851d118c-0516-11e4-b098-00144feab7de.html.

(32)  Federação Bancária Europeia, 16 de setembro de 2016.

(33)  Serena Fatica, Thomas Hemmelgarn e Gaëtan Nicodème, The Debt-Equity Tax Bias: Consequences and Solutions [A distorção dívida-capital próprio na tributação: Consequências e soluções], Documentos sobre fiscalidade da Comissão Europeia/Documento de trabalho 33-2012: http://ec.europa.eu/taxation_customs/resources/documents/taxation/gen_info/economic_analysis/tax_papers/taxation_paper_33_en.pdf.

(34)  Ver, por exemplo, o ponto 4.3.

(35)  https://www.law.cornell.edu/cfr/text/26/1.422-2.

(36)  http://europa.eu/rapid/press-release_MEMO-16-1024_en.htm.

(37)  http://europa.eu/rapid/press-release_IP-15-6264_pt.htm.

(38)  www.theglobaleconomy.com/USA/Cost_of_starting_business.

(39)  Ver nota de rodapé 4.

(40)  http://www.dihk.de/en.

(41)  Supporting investors and growth firms [Apoiar os investidores e as empresas em crescimento] — T. Aubrey, R. Thillaye e A. Reed, 2015, p. 36.

(42)  Enterprise Investment Scheme (EIS) [Programa de investimento nas empresas], Seed Enterprise Investment Scheme (SEIS) [Programa de investimento em novas empresas] e Venture Capital Trust (VCT) [Fundo de capital de risco].

(43)  cordis.europa.eu/piedmont/infra-science_technology_en.html.

(44)  www.elkarlan.coop.

(45)  https://www.gov.uk/government/publications/banking-on-ip.

(46)  Oferta pública inicial ou colocação no mercado bolsista.

(47)  http://futurefifty.com/.

(48)  https://www.whitehouse.gov/the-press-office/2015/03/23/fact-sheet-president-obama-announces-over-240-million-new-stem-commitmen.

(49)  Plano de Ação «Empreendedorismo 2020».

(50)  Programa Erasmus.

(51)  Estratégia para o Mercado Único.

(52)  Horizonte 2020 — Programa-Quadro de Investigação e Inovação.

(53)  União dos Mercados de Capitais.