22.12.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 376/66


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a determinadas utilizações permitidas de obras órfãs

COM(2011) 289 final — 2011/0136 (COD)

2011/C 376/12

Relator: Thomas McDONOGH

Em 15 e 7 de Junho de 2011, respectivamente, o Conselho e o Parlamento Europeu decidiram, nos termos do artigo 114.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a determinadas utilizações permitidas de obras órfãs

COM(2011) 289 final — 2011/0136 (COD).

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo que emitiu parecer em 30 de Agosto de 2011.

Na 474.a reunião plenária de 21 e 22 de Setembro de 2011 (sessão de 21 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 131 votos a favor com 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Observações e recomendações

1.1   O Comité congratula-se com a proposta da Comissão sobre a directiva relativa à utilização de obras órfãs. O êxito da iniciativa reforçará o desenvolvimento de bibliotecas digitais como a Europeana (1) e outras instituições públicas que exercem missões de interesse público referidas no artigo 1.o, n.o 1, da proposta de directiva, através das quais os cidadãos podem aceder à diversidade e riqueza do património cultural da Europa.

1.2   O Comité está a elaborar um parecer específico sobre a comunicação da Comissão relativa a uma estratégia para o mercado único para os direitos de propriedade intelectual (2). Estes direitos são um impulsionador fundamental da inovação tecnológica e comercial, da qual a Europa dependerá para o seu relançamento económico e crescimento futuro (3). A natureza da gestão dos DPI é também crucial para o florescimento da cultura europeia e a qualidade de vida de que os cidadãos europeus usufruem.

1.3   O Comité não acredita que a Estratégia Europa 2020 para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo se possa concretizar sem a criação de um verdadeiro mercado único da propriedade intelectual. Há muitos anos que apela à harmonização das regras europeias e nacionais para promover a inovação, a criatividade e o bem-estar dos cidadãos, ao mesmo tempo que apoia iniciativas que facilitam o acesso do maior número possível de pessoas a postos de trabalho, bens e serviços (4).

1.4   O Comité concorda, em geral, com a directiva proposta, que visa criar um enquadramento jurídico a fim de assegurar o acesso transfronteiras em linha, em toda a legalidade, às obras órfãs (5). No seu parecer sobre Uma Agenda Digital para a Europa  (6), o CESE pronuncia-se abertamente a favor de medidas como a aplicação deste enquadramento, que resolveria os problemas de fragmentação cultural e económica no mercado único.

1.5   Apoia resolutamente a digitalização e a ampla difusão do património cultural da Europa (7). Crê que a disponibilização deste material em linha é um elemento-chave para o desenvolvimento da economia do conhecimento na Europa e que é essencial proporcionar aos cidadãos uma vida cultural rica e diversificada. Congratula-se, por conseguinte, com o facto de a Comissão propor uma directiva que aborda o problema específico das obras órfãs.

1.6   Reconhece a necessidade de uma directiva, pois são muito poucos os Estados-Membros que se dotaram de legislação sobre a matéria e, quando existe legislação nacional, o acesso a essas obras é limitado aos residentes em território nacional.

1.7   O Comité concorda, em princípio, com a abordagem em quatro pilares proposta na directiva:

Definição de regras para identificar obras órfãs através de uma pesquisa diligente dos titulares de direitos de autor;

Reconhecimento como obra órfã caso a pesquisa não identifique o titular dos direitos de autor;

Estabelecimento das utilizações permitidas das obras órfãs, incluindo a sua difusão em todos os Estados-Membros;

Reconhecimento mútuo do estatuto de obra órfã em todos os Estados-Membros.

1.8   Para facilitar uma pesquisa eficiente dos titulares dos direitos de autor e a ampla difusão de obras órfãs é essencial que todos os sectores disponham de bases de dados e registos dos direitos em linha, semelhantes ao instrumento que existe para o sector editorial (8). O Comité apela à Comissão para que facilite o trabalho das organizações representativas no desenvolvimento destas ferramentas.

1.9   Entende que os Estados-Membros deveriam manter um registo das bases de dados nacionais que estão oficialmente autorizadas a registar os resultados de pesquisas diligentes efectuadas nos respectivos territórios, como preceituado no artigo 3.o, n.o 4 da directiva. Esses registos contribuiriam para garantir oficialmente às instituições de outros países da UE a fiabilidade das fontes.

1.10   O Comité chama a atenção da Comissão para a importância da música tradicional, da história oral e dos trabalhos fotográficos e cinematográficos para o património cultural da UE e apela para que tais registos e imagens conservados nos arquivos das instituições referidas no artigo 1.o, n.o 1, recebam tratamento igual no tocante à identificação e publicação de obras órfãs. Assinala que o artigo 11.o da directiva prevê a possível inclusão no âmbito de aplicação da directiva de obras ou de outro material protegido que não estejam actualmente incluídos, em particular, fonogramas e fotografias isoladas, e apela à Comissão para que o faça o mais rapidamente possível.

1.11   Regozija-se também com a ambição da Comissão de celebrar um memorando de entendimento entre bibliotecas, editoras, autores e sociedades de gestão colectiva de direitos de autor no sentido de facilitar soluções de licenciamento que permitam a digitalização e disponibilização dos livros que já não são publicados (9).

2.   Antecedentes

2.1   A Comissão propôs uma estratégia para os direitos de propriedade intelectual (10) como parte de uma agenda global visando o crescimento e o emprego sustentáveis no mercado único e a melhoria da competitividade da Europa no mundo. Esta estratégia é um elemento complementar e importante da Estratégia Europa 2020, do Acto para o Mercado Único (11) e da Agenda Digital para a Europa.

2.2   Numa recente comunicação, sobre a qual o Comité está a elaborar um parecer específico, a Comissão prevê a criação de um mercado único da propriedade intelectual (12). Entre os primeiros resultados desta estratégia em matéria de DPI encontra-se a proposta de directiva que visa simplificar a autorização para utilizar as obras órfãs, o que permitirá o acesso em linha a muitas obras culturais em todos os Estados-Membros, facilitando, assim, o desenvolvimento de bibliotecas digitais europeias que preservem e difundam o rico património cultural e intelectual da Europa.

2.3   A digitalização e a difusão de obras órfãs representam um desafio cultural e económico específico. Não sendo conhecido o titular dos direitos, os utilizadores não podem obter a necessária autorização para, por exemplo, digitalizar um livro. As obras órfãs representam uma parte substancial das colecções de instituições culturais europeias. A British Library, por exemplo, estima que 40 % das suas colecções protegidas por direitos de autor (150 milhões no total) são obras órfãs.

2.4   A Comissão propõe agora uma directiva que impõe regras comuns a todos os Estados-Membros quanto ao tratamento destas obras, de modo a facilitar os projectos de digitalização em larga escala previstos pela Agenda Digital para a Europa.

2.5   A Comissão realizou uma avaliação de impacto e considerou seis opções diferentes para pôr em marcha a iniciativa sobre as obras órfãs (13), tendo concluído que a melhor abordagem seria o reconhecimento mútuo pelos Estados-Membros do estatuto de obra órfã. Tal permite às bibliotecas e outros beneficiários referidos no artigo 1.o, n.o 1, da proposta de directiva gozar de certeza jurídica quanto ao estatuto de «obra órfã» de uma determinada obra. Além disso, o reconhecimento mútuo garante que as obras órfãs contidas numa biblioteca digital ficariam ao dispor dos cidadãos em toda a Europa.

2.6   A directiva assenta em quatro pilares:

i.

Primeiro, a fim de estabelecer o estatuto de «obra órfã», as bibliotecas, os estabelecimentos de ensino, os museus ou arquivos, as instituições responsáveis pelo património cinematográfico e as organizações de radiodifusão de serviço público são obrigadas a previamente efectuar uma pesquisa diligente, em conformidade com os requisitos especificados na directiva proposta, no Estado-Membro em que a obra foi publicada pela primeira vez.

ii.

Uma vez estabelecido o estatuto de «obra órfã» na sequência dessa pesquisa diligente, a obra em questão será considerada obra órfã em toda a UE, eliminando a necessidade de múltiplas pesquisas diligentes.

iii.

Nesta base, será possível disponibilizar obras órfãs em linha para fins culturais e educativos sem autorização prévia, salvo se o titular dos direitos da obra puser termo ao estatuto de obra órfã. Nesse caso, os titulares dos direitos que se apresentem para reclamar as suas obras devem ser remunerados, e a remuneração deve ter em conta o tipo de obra e a utilização em causa.

iv.

O reconhecimento mútuo do estatuto de obra órfã em todos os Estados-Membros.

3.   Observações

3.1   O Comité considera importante que todas as iniciativas políticas relativas aos direitos de propriedade intelectual estabelecer o equilíbrio entre, por um lado, os direitos dos autores e dos titulares e, por outro, os direitos dos utilizadores e dos consumidores finais, de modo a que o maior número possível de pessoas tenha acesso às obras em todos os Estados-Membros.

3.2   Para facilitar a pesquisa dos direitos de propriedade intelectual, a Comissão poderia publicar e actualizar regularmente a lista de instituições referidas no artigo 1.o, n.o 1, da directiva que são responsáveis pela gestão de obras órfãs.

3.3   Além disso, essas instituições necessitam de estar cientes de que as fontes para os registos de pesquisas diligentes num outro país da UE merecem a confiança das entidades oficiais. Os Estados-Membros deveriam, por conseguinte, manter um registo das bases de dados nacionais que estão oficialmente autorizadas a registar os resultados de pesquisas diligentes efectuadas nos respectivos territórios, como preceituado no artigo 3.o, n.o 4, da directiva.

3.4   O Comité assinala que o artigo 11.o da directiva proposta prevê a possível inclusão no âmbito de aplicação da directiva de obras ou de outro material protegido que não estejam actualmente incluídos, em particular, fonogramas e fotografias isoladas. Não obstante esta cláusula de revisão, há que apelar desde já à pronta publicação destes produtos culturais.

3.4.1   A música tradicional e a história oral são muito importantes para o património cultural europeu e há em toda a Europa um arquivo rico em material gravado, não só nas organizações de radiodifusão de serviço público, mas também nas outras instituições referidas no artigo 1.o, n.o 1. Todo este material áudio e audiovisual deveria estar sujeito às mesmas regras de pesquisa, classificação e utilização que se aplicam às obras elencadas no artigo 1.o, n.o 2, da directiva.

3.4.2   Também o material fotográfico e cinematográfico constitui todo um manancial de informações para o conhecimento e a compreensão da civilização europeia. Tratando-se de obras que possam ser consideradas órfãs, há que envidar todos os esforços para as retirar dos arquivos esconsos das instituições públicas.

Bruxelas, 21 de Setembro de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  A Europeana permite aos cidadãos explorar os recursos digitais de museus, bibliotecas, arquivos e colecções audiovisuais europeus. O projecto é financiado pela Comissão Europeia e foi lançado em 2008 com o objectivo de tornar o património cultural e científico europeu acessível ao público. Consultar o sítio web: www.europeana.eu.

(2)  COM(2011) 287 final – Um Mercado Único para os Direitos de Propriedade Intelectual.

(3)  Estratégia Europa 2020 (COM(2010) 2020 final), Análise Anual do Crescimento 2011 (COM(2011) 11 final), Agenda Digital para a Europa (COM(2010) 245 final), Acto para o Mercado Único (COM(2011) 206 final) e União da Inovação (COM(2010) 546 final).

(4)  JO C 116 de 28.4.1999, p. 35; JO C 155 de 29.5.2001, p. 80; JO C 221 de 7.8.2001, p. 20; JO C 32 de 2.2.2004, p. 15; JO C 108 de 30.4.2004, p. 23; JO C 324 de 30.12.2006, p. 7; JO C 256 de 27.10.2007, p. 3; JO C 182 de 4.8.2009, p. 36; JO C 218 de 11.9.2009, p. 8; JO C 228 de 22.9.2009, p. 52; JO C 306 de 16.12.2009, p. 7; JO C 18 de 19.1.2011, p. 105; JO C 54 de 19.2.2011, p. 58.

(5)  Entende-se por «obras órfãs» livros e artigos de jornais ou revistas que ainda estão sob protecção dos direitos de autor, mas cujos titulares não conseguem ser localizados para efeitos de autorização de distribuição. O termo inclui também obras cinematográficas e audiovisuais. Encontram-se obras órfãs nos acervos de bibliotecas europeias.

(6)  JO C 54 de 19.2.2011, p. 58.

(7)  JO C 324 de 30.12.2006, p. 7; JO C 182 de 4.8.2009, p. 36; JO C 228 de 22.9.2009, p. 52; JO C 18 de 19.1.2011, p. 105; JO C 54 de 19.2.2011, p. 58.

(8)  ARROW (Accessible Registries of Rights Information and Orphan Works towards Europeana – Registos acessíveis de informações sobre direitos e de obras órfãs para a Europeana) é um projecto de um consórcio de bibliotecas, editores e organizações de gestão colectiva nacionais da Europa e onde os escritores também estão representados através das suas principais associações europeias e organizações nacionais: www.arrow-net.eu.

(9)  IP/11/630, Bruxelas, 24 de Maio de 2011.

(10)  COM(2011) 287 final – Um Mercado Único para os Direitos de Propriedade Intelectual.

(11)  COM(2011) 206 final – Acto para o Mercado Único – Doze alavancas para estimular o crescimento e reforçar a confiança mútua – «Juntos para um novo crescimento».

(12)  COM(2011) 287 final.

(13)  SEC(2011) 615 final «Impact assessment on the cross-border online access to orphan works» [Avaliação do impacto do acesso transfronteiras em linha a obras órfãs].