30.8.2008   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 224/106


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao Ano Europeu do Combate à Pobreza e à Exclusão Social (2010)»

COM(2007) 797 final — 2007/0278 (COD)

(2008/C 224/24)

Em 30 de Janeiro de 2008, o Conselho da União Europeia decidiu, em conformidade com o artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

«Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao Ano Europeu do Combate à Pobreza e à Exclusão Social (2010)»

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 7 de Maio de 2008, sendo relator Krzysztof PATER e co-relatora Erika KOLLER.

Na 445.a reunião plenária de 28 e 29 de Maio de 2008 (sessão de 29 de Maio), o Comité adoptou, por 116 votos a favor e 1 contra, com 5 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Síntese da posição do CESE

1.1

O Comité Económico e Social Europeu acolhe favoravelmente a proposta da Comissão que designa 2010 como Ano Europeu do Combate à Pobreza e à Exclusão Social. Trata-se de uma iniciativa válida que visa a sensibilização da opinião pública para as bolsas de pobreza persistentes e a marginalização na Europa e o apoio a medidas eficazes de combate aos problemas em causa.

1.2

O CESE saúda que a abordagem adoptada tenha em conta a natureza multidimensional da pobreza e da exclusão social, que não pode ser reduzida às desigualdades relativas em matéria salarial. Para transmitir de forma mais eficaz a mensagem de que a pobreza e a marginalização social são intoleráveis num continente tão rico como a Europa, bem como para ganhar o apoio dos cidadãos necessário à sua resolução efectiva, os eventos do Ano Europeu 2010 devem, à excepção da pobreza relativa, basear-se em indicadores de pobreza que reflictam a escala da privação real, as zonas afectadas e a dimensão do problema, tendo em conta as disparidades ao nível comunitário.

1.3

O Ano Europeu 2010 deve tratar temáticas precisas, concretas e transversais. Em primeiro lugar, para reduzir a pobreza e a exclusão social através da activação profissional e social são necessários mais e melhores sistemas e programas de apoio social. Assim, a política social é um verdadeiro factor de produção. Em segundo lugar, a redução da pobreza e da exclusão social é do interesse de todos os cidadãos. Por conseguinte, todos devem contribuir para alcançar este objectivo. Há, porém, que recordar que a luta contra a pobreza e a marginalização cabe primeiramente ao nível político e, por conseguinte, às instituições estatais e conexas e a todos os actores sociais.

1.4

O Ano Europeu 2010 deve representar uma oportunidade para sensibilizar a opinião pública para a necessidade de modernizar e reforçar o modelo social europeu e para as respectivas consequências. A inclusão activa é crucial na preservação e na consolidação da coesão e da solidariedade da sociedade numa época de crise financeira e alimentar mundial, de globalização e de mudanças demográficas na Europa. Todavia, implicará uma evolução no actual estilo de vida de muitos europeus, num momento em que os receios de precariedade laboral aumentam. Os eventos do Ano Europeu devem servir para aumentar o apoio dos cidadãos às reformas em causa.

1.5

O Ano Europeu 2010 deve servir igualmente de plataforma para um debate público sobre as formas de proteger e proporcionar coesão social face às crescentes disparidades salariais que se verificam entre os europeus. É preciso encontrar respostas políticas inovadoras e integradas.

O CESE recorda que uma luta eficaz contra a pobreza e a exclusão exige um esforço conjunto nos diferentes domínios de acção política. Assim, seria de fixar como objectivo político fundamental a nível europeu a necessidade de garantir uma partilha mais equitativa da prosperidade adquirida.

Os objectivos do Ano Europeu devem reflectir melhor a importância de uma política activa de combate à pobreza e à exclusão social no alcance dos objectivos da estratégia de crescimento e emprego da UE (1).

A sua eficácia dependerá da participação contínua dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil, bem como da participação activa dos cidadãos no reforço das comunidades locais.

1.6

O CESE considera que o carácter operacional da iniciativa está bem estruturado. Merecedor de especial referência é o facto de a proposta tomar em consideração as características próprias de cada país, assumindo uma cooperação estreita com os parceiros sociais e outras instituições da sociedade civil, bem como a participação directa das pessoas afectadas pela pobreza e exclusão social.

1.7

O CESE saúda o facto de o financiamento destinado à aplicação dos objectivos do Ano Europeu ser o maior alguma vez atribuído a uma iniciativa comunitária desta natureza. Contudo, dada a escala das medidas previstas, apela, ainda assim, a um aumento do financiamento.

2.   Síntese da proposta da Comissão

2.1

O objectivo da decisão de designar 2010 como Ano Europeu do Combate à Pobreza e à Exclusão Social é contribuir para a consecução do objectivo de exercer um impacto determinante na erradicação da pobreza, estabelecido na Estratégia de Lisboa e reafirmado na nova Agenda Social Europeia para 2005-2010 (2).

2.2

As medidas previstas para o Ano Europeu centrar-se-ão em quatro objectivos: 1) reconhecimento de que as pessoas pobres e excluídas socialmente têm direito a uma vida digna e à participação na sociedade, 2) apropriação, ou seja, todos os elementos da sociedade devem assumir responsabilidade conjunta pela redução da pobreza e da marginalização, 3) coesão, acreditar que manter a coesão social é do interesse de todos e 4) empenho, sublinhar a vontade política da UE de dar prioridade ao combate à pobreza e à exclusão social.

2.3

Estas medidas, a serem tomadas à escala nacional e comunitária, incluirão reuniões e conferências, campanhas promocionais e de informação, bem como estudos e relatórios. Deverão envolver todas as partes interessadas, representando uma oportunidade para dar voz às necessidades e às opiniões das vítimas da pobreza e da exclusão.

2.4

Aos projectos relacionados com o Ano Europeu foi destinada uma quantia de 17 milhões de euros do orçamento comunitário. Se adicionarmos o co-financiamento antecipado dos órgãos públicos e privados dos Estados-Membros, o valor poderá ascender a 26 175 milhões de euros.

3.   Observações gerais sobre o objectivo da iniciativa prevista

3.1

O Comité Económico e Social Europeu saúda a proposta da Comissão, que, se bem aplicada, pode ajudar a sensibilizar os cidadãos e a estimular o debate sobre o combate eficaz à pobreza e à exclusão social.

3.2

O CESE entende que o tema do Ano Europeu é importante e actual. Não só chamará a atenção do público, como também será objecto de reflexão. O CESE apoia os objectivos gerais e pormenorizados, os temas específicos do Ano Europeu e os métodos de aplicação propostos. As observações infra visam aperfeiçoar a imagem pública e a eficácia política do Ano Europeu.

3.3

A protecção e a melhoria da qualidade de vida dos europeus dependem do seu empenho em combater com eficácia a pobreza e a marginalização social numa Europa de relativa abundância. Os eventos do Ano Europeu devem reforçar este empenho entre os europeus de todos os estratos sociais e económicos.

3.4

É, por conseguinte, importante que os eventos do Ano Europeu assentem no conhecimento e na experiência acumulados desde o lançamento da Estratégia Europeia de Combate à Pobreza e à Exclusão Social pelo Conselho Europeu de Nice em 2000. Os eventos organizados por outras instituições, como o Conselho da Europa, no contexto do relatório da Task Force de Alto Nível sobre a Coesão Social no Século XXI (3), ou as Nações Unidas, no âmbito da observância anual do 17 de Outubro — Dia Internacional da Erradicação da Pobreza –, assegurarão sinergias.

3.5

O CESE recorda que uma série de questões e temas tratados em pareceres anteriores (4) devem ter o seu devido lugar nos eventos do Ano Europeu:

apoio a uma política social actualizada como um verdadeiro factor produtivo susceptível de favorecer o emprego para as pessoas fisicamente aptas e a integração social para todos;

modernização do modelo social europeu, concebido em sentido lato, para enfrentar eficazmente os novos desafios nos domínios do emprego e da inclusão social e combater a pobreza e as consequências sociais da globalização e, por último, manter a Europa enquanto «(…) espaço (para todos os cidadãos da Europa) de bem-estar social simultaneamente democrático, capaz de assegurar a protecção do ambiente, competitivo, assente na solidariedade e socialmente inclusivo» (5);

necessidade de políticas mais eficazes visando a integração no mercado de trabalho de grupos alvo de discriminação ou desfavorecidos, em particular os trabalhadores pobres e os indivíduos com trabalho precário (6);

necessidade de lançar um debate público aberto e de orientar a modernização no sentido da criação de emprego e da participação social; o CESE sublinhou que «para que o Modelo Social Europeu seja uma mais-valia na configuração da sociedade europeia de amanhã, terá de ser dinâmico e aberto a desafios, mudanças e reformas» e que «o Modelo Social Europeu será relevante apenas enquanto for apreciado e apoiado pelos cidadãos da Europa» (7);

colocar a tónica na acção local, nos parceiros sociais, na participação e na motivação da sociedade civil, bem como na apreciação do activismo cívico, sobretudo no combate à pobreza e exclusão social;

necessidade de ópticas transversais, indo para além das políticas sociais e de emprego tradicionais e abrangendo as políticas económica, educativa, regional, cultural e de infra-estruturas, sobretudo no combate à pobreza e à exclusão social;

reconhecimento que os homens e as mulheres vivem a pobreza de forma diferente e que as políticas sociais devem ser definidas em conformidade;

necessidade de um Método Aberto de Coordenação mais eficaz ao nível europeu em matéria de combate à pobreza e exclusão social;

situar a luta contra a pobreza e a exclusão social no contexto internacional, sobretudo promovendo direitos fundamentais no trabalho e condições de trabalho dignas no mundo inteiro.

Abaixo, o CESE desenvolve algumas vertentes das ideias em causa, pois são especialmente relevantes para os eventos do Ano Europeu.

3.6

Durante o ano em curso haverá que prestar a devida atenção a possíveis medidas positivas, a saber:

impacto da luta contra o trabalho não declarado;

acções para a reinserção no emprego;

investimento em actividades industriais e de serviços criadoras de emprego e avaliação de possíveis impactos negativos ou que agravem, designadamente:

o crescimento económico futuro, durante e após o ano de luta contra a pobreza e a exclusão social;

a situação energética e alimentar das populações mais expostas ou em situações de pobreza ou de grande pobreza.

4.   Passar a mensagem de modo mais eficaz

4.1

A decisão de instituir o Ano Europeu do Combate à Pobreza e à Exclusão Social sublinha que 78 milhões de pessoas na UE, 16 % da população, estão em risco de pobreza. O CESE considera que para transmitir eficazmente a mensagem política do Ano Europeu, deve tomar-se como referência e recorrer-se, para além do indicador habitual de pobreza monetária relativa, a outros indicadores de pobreza, demonstrando a sua persistência e a privação real de que muitos europeus ainda são vítimas. Por conseguinte, também os eventos do Ano Europeu devem tomar como referência uma vasta gama de indicadores de pobreza relativa e absoluta para sensibilizar o público em geral para as situações descritas e fazê-lo sentir que são intoleráveis.

4.2

O CESE considera, além disso, que os indicadores usados «descrevem» o problema da pobreza e da exclusão social. Perante os desafios que se colocam à coesão social na UE e à consequente modernização do modelo social europeu, é importante que esses indicadores impliquem uma resposta política equilibrada, contemplando uma melhor distribuição dos rendimentos, as políticas de flexigurança correctamente financiadas e geridas no mercado de trabalho e a inclusão activa. Este «modelo dinâmico» de políticas de emprego e sociais foi sugerido pelo CESE no seu parecer sobre a matéria (8).

4.3

O CESE saúda o facto de a Comissão ter reconhecido que a natureza multifacetada da pobreza e da exclusão social requer medidas adequadas. Na comunicação sobre a Agenda Social Europeia para o período 2005-2010, que visa, entre outros, persuadir os Estados-Membros a consolidar, integrar e racionalizar medidas de combate à pobreza e exclusão social, a Comissão complementou — acertadamente — o indicador de pobreza relativa com o de pobreza persistente (9). Mais tarde, ao propor que a protecção social, cuidados de saúde e cuidados a longo prazo fossem também objecto de uma melhor coordenação, a Comissão chamou a atenção para a necessidade de dar mais ênfase aos «indicadores de privação» (10).

4.4

Tendo em conta o acima exposto, o CESE entende que a decisão sobre o Ano Europeu 2010 deve basear-se em indicadores de pobreza que definam com mais exactidão o nível de privação, as zonas afectadas e a gravidade do problema. Tal aumentaria a sensibilização pública e o apoio às políticas de emprego e de protecção social na esfera nacional e comunitária, dirigidas às pessoas e às comunidades ameaçadas ou afectadas pela pobreza profunda e absoluta (11).

5.   Os principais temas do Ano Europeu — Objectivos e acções

5.1

A pobreza é um fenómeno multifacetado, cujos riscos se distribuem de forma desigual pela sociedade. Sobretudo quando associados, tornam determinados grupos particularmente vulneráveis.

5.2

Em regra, a pobreza está relacionada com o desemprego, sobretudo o de longo prazo. Assim, tal como se afirma no Relatório Conjunto sobre a Protecção Social e a Inclusão Social de 2007, o emprego é a melhor salvaguarda contra a pobreza e a exclusão social (12). Mas, como também se afirma no Relatório Conjunto, não pode ser a única salvaguarda. O fenómeno dos trabalhadores pobres prova-o inequivocamente.

5.3

A pobreza pode também estar relacionada com poucas habilitações ou falta de qualificações para uma oferta de emprego ou com qualificações diferentes das requeridas para um emprego de qualidade que ofereça uma remuneração adequada. Os grupos mais susceptíveis de correrem este risco são os jovens, sobretudo os que abandonam a escola precocemente e os trabalhadores mais velhos.

5.4

Os indivíduos são apanhados pela pobreza devido aos ineficazes sistemas de apoio ao rendimento que desmotivam a actividade no mercado de emprego oficial e, em última instância, os condenam à pobreza também na terceira idade.

5.5

A estrutura familiar também poderá representar um risco: as famílias em que apenas um membro aufere remuneração, sobretudo as monoparentais, ou as famílias com três ou mais filhos. A ruptura familiar, a perda do emprego e a consequente perda da casa são situações potencialmente perigosas.

5.6

Outros grandes grupos de risco são as pessoas com problemas de saúde (por exemplo devido à idade), as limitações cognitivas, as pessoas com deficiência, sobretudo as que têm poucas habilitações, ou os toxicodependentes.

5.7

Em risco estão também as pessoas que vivem nas periferias ou em zonas de alguma forma desfavorecidas.

5.8

Uma categoria em risco de pobreza são os migrantes e as minorias étnicas, que, para além de ser frequente não terem as competências sociais, linguísticas ou culturais adequadas, podem também ser vítimas de discriminação.

5.9

Os exemplos acima expostos demonstram a magnitude do desafio e a complexidade das respostas públicas eficazes. Para reduzir consideravelmente a pobreza e a exclusão social, as autoridades públicas de todos os níveis devem envidar esforços, que devem ser complementados pelos dos parceiros sociais, das organizações da sociedade civil e pelos cidadãos. Os exemplos referidos revelam também um paradoxo: se todas as pessoas fisicamente aptas devem, em primeiro lugar, ser integradas socialmente através do emprego para contribuir para o crescimento económico e atenuar o declínio populacional, impõem-se mais e melhores sistemas e programas de apoio, e não menos. Estes deverão ser os dois principais temas do Ano Europeu.

5.10

O CESE entende que os objectivos gerais e específicos do Ano Europeu, bem como os temas de actividade escolhidos procuram alcançar um novo equilíbrio entre o requisito social de se ser economicamente activo e a necessidade de segurança. A necessidade de se proceder a uma adaptação provém da globalização, das alterações demográficas, do progresso tecnológico e da evolução do mercado de trabalho europeu, que se traduziram em mudanças significativas no estilo de vida de muitos europeus. Ademais, têm de se modernizar e aperfeiçoar as políticas sociais e do mercado de trabalho para facilitar as transições necessárias e disponibilizar uma rede de segurança sustentável correctamente gerida e financiada. Embora haja quem tire partido das oportunidades dos novos mercados de trabalho e programas de activação, outros entendem-nas como uma ameaça ao seu estatuto social e profissional. O CESE opina que os eventos do Ano Europeu devem centrar-se nestas preocupações genuínas (13).

5.11

Quando se trata de pessoas em risco de desemprego e/ou exclusão social, a activação profissional das pessoas aptas a trabalhar, actualmente encorajada, permite à sociedade beneficiar dos seus talentos, satisfazendo, em simultâneo, a necessidade individual de evolução profissional e social (14). Para além do apoio ao rendimento adequado, coloca-se a tónica no melhor acesso de todos aos serviços sociais, em particular aos que ajudam os indivíduos a melhorar, actualizar ou mudar as suas qualificações ou a manterem-se saudáveis. Contudo, para beneficiar dessas oportunidades, exige-se muito mais actividade individual, iniciativa, esforço intelectual e cooperação com vários serviços de apoio do que anteriormente. Há uma necessidade concreta de comunicar o propósito das políticas que requerem esse esforço tendo em vista merecer o apoio dos cidadãos (15). Os eventos do Ano Europeu devem procurar alcançá-lo. Os objectivos do Ano Europeu devem reflectir melhor a importância de uma política activa de combate à pobreza e à exclusão social no alcance dos objectivos da estratégia de crescimento e emprego da UE (16). Os eventos do Ano Europeu devem transmitir de forma persuasiva e comprovar a ideia de que uma política social modernizada e aperfeiçoada melhora o funcionamento do mercado de trabalho e contribui para a criação de emprego. De igual modo, as medidas de apoio ao rendimento concebidas adequadamente beneficiam as pessoas em risco de desemprego e marginalização social ao reduzir as diversas pressões que os afastam do mercado de trabalho oficial, o que contribui, portanto, para a redução da economia informal.

5.12

O projecto de decisão inclui diversas afirmações que requerem clarificação.

5.13

O CESE observa que identificar «crianças, famílias monoparentais, idosos, migrantes e minorias étnicas, pessoas com deficiência, sem-abrigo, reclusos, mulheres e crianças vítimas de violência e toxicodependentes» (17) como grupos que estão expostos a alto risco de pobreza e/ou exclusão, sem acrescentar qualquer outra classificação, poderá ter o efeito contrário ao desejado. Estes grupos englobam tanto as pessoas em risco de pobreza como as que não correm esse risco. Como referido supra, é normalmente a falta de qualificações adequadas e/ou o elevado ratio de membros da família por indivíduo com vencimento que colocam essas camadas da população em risco de pobreza.

6.   A coesão social e a persistência e o aumento das disparidades salariais

6.1

A Ano Europeu 2010 também pode representar uma oportunidade para lançar o debate público sobre os desafios actuais e futuros para a solidariedade social e a coesão social à medida que a Europa caminha rumo à sociedade e à economia baseadas no conhecimento e se depara com as alterações demográficas (18). Esta reflexão é particularmente necessária num continente que dispõe, de facto, dos meios para reduzir a pobreza e a exclusão social.

6.2

Em contrapartida, muitos jovens, ao terminarem o liceu, não dispõem das competências de cognição, numeracia e literacia requeridas para uma carreira bem sucedida na nova economia. São necessárias soluções eficazes não apenas para evitar a sua marginalização social, como também para satisfazer a procura da economia relativamente a trabalhadores de qualidade. Além disso, assiste-se na Europa a uma bifurcação crescente do mercado de trabalho entre o segmento altamente qualificado que recebe elevadas remunerações e a camada populacional com poucas habilitações e baixos salários, o que origina as disparidades salariais. Importa que os europeus desenvolvam e aceitem a visão segundo a qual se pode preservar a justiça e a coesão social, mantendo, em simultâneo, a competitividade da UE na economia global.

6.3

Se os governos aplicarem as medidas do topo para a base não garantirão a coesão social, a não ser que sejam complementadas por iniciativas de cidadania. Tal como o Conselho Europeu de Nice de 2000 reconheceu a participação das organizações da sociedade civil como elemento-chave na mobilização de esforços para combater a pobreza e a exclusão social, o CESE considera que a importância da participação de cada cidadão na construção de comunidades inclusivas também deve ser reconhecida e promovida ao longo do Ano Europeu. Neste contexto, seria importante transmitir a mensagem de que a participação cívica é do interesse de todos os membros da comunidade, independentemente do estatuto económico ou social.

6.4

O CESE recorda o seu parecer sobre o voluntariado onde se afirma, inter alia, que «Haverá que instigar os governos do Estados-Membros a definirem uma política nacional em matéria de voluntariado e a conceberem uma estratégia que promova directamente estas actividades e conduza ao seu reconhecimento. Esta política nacional deverá prever igualmente a criação da infra-estrutura necessária» (19). Tal implica que as pessoas que pretendam oferecer o seu tempo e qualificações às comunidades em que vivem não deverão ser impedidas de o fazer por quaisquer obstáculos jurídicos ou burocráticos (20). Embora o CESE opine que o voluntariado merece o seu próprio Ano Europeu, também os eventos do Ano 2010 devem salientar os aspectos relevantes da participação cívica.

6.5

O CESE apela a que os eventos do Ano Europeu não transmitam a ideia de que, no quadro das políticas de flexigurança e inclusão activa actualmente promovidas, a obrigação de envidar esforços para sair do desemprego e da pobreza (assim contribuindo para a coesão social) se restringe aos empregadores, aos governos e aos beneficiários dos programas do mercado de trabalho e de protecção social. Pelo contrário, devem difundir a ideia de que esta responsabilidade compete a cada cidadão.

6.6

Vale a pena analisar também o facto de que face às disparidades económicas persistentes ou mesmo crescentes, pode facilitar-se a manutenção da coesão social através da criação de espaços públicos de elevada qualidade (espaços urbanos, escolas, universidades, bibliotecas, parques, instalações recreativas), onde pessoas de todos os quadrantes e de diferentes estratos sociais e económicos gostem de socializar e passar o tempo.

6.7

A maioria dos novos desafios e dilemas que se colocam à coesão social e à política geral podem ser enfrentados ao abrigo dos objectivos gerais do projecto de decisão. Todavia, devem ser mais bem articulados para estimular debates públicos úteis ao longo do Ano Europeu. As possíveis acções de promoção da coesão social aqui propostas podem complementar o debate de 2010 sobre as ideias de inclusão social activa e políticas de emprego eficazes.

7.   Política social no sentido lato

7.1

O CESE considera que o conceito proposto para o Ano Europeu, sobretudo o leque de actividades, também possibilitará sublinhar e sensibilizar para o facto de que alcançar o objectivo da Estratégia de Lisboa de exercer um impacto determinante na erradicação da pobreza e da exclusão social até 2010 requererá medidas multifacetadas (21).

7.2

As medidas educacionais executadas ao longo do Ano Europeu devem incluir campanhas de sensibilização nos diferentes Estados-Membros para os factores que determinam o valor da pensão futura e motivar as pessoas para agirem no sentido de garantirem uma vida digna no período da reforma.

7.3

O CESE é de opinião que a questão de como o Banco Central Europeu irá utilizar as suas competências nos termos do Tratado para se juntar aos esforços envidados para combater a pobreza e a exclusão social também merece ser focada nos eventos do Ano.

7.4

O CESE entende que é preciso demonstrar que é possível esbater a marginalização social através de políticas que ultrapassem o domínio tradicional do mercado de trabalho e das protecções sociais, como políticas de ordenamento do território que previnam a compartimentação da pobreza, políticas de transporte que reduzam as barreiras geográficas à mobilidade social e políticas económicas que desenvolvam as zonas periféricas, bem como a garantia dos serviços de interesse geral e a política de redistribuição da riqueza, de forma a inverter a tendência observada nos últimos anos de um aprofundamento do fosso entre os pobres e os ricos.

7.5

A este respeito, o CESE chama a atenção para as diferenças entre as circunstâncias nacionais, que se acentuaram após o alargamento da UE. Um estudo afirma que mesmo os mais pobres dos Estados-Membros mais ricos sofrem menos privações do que os mais abastados dos países pobres (22). Tal sublinha a importância de pôr em prática uma acção eficaz rumo à coesão socioeconómica e à redução das actuais disparidades económicas na UE para diminuir os domínios de privação e de exclusão social. Por seu turno, permitiria o desenvolvimento do Método Aberto de Coordenação da política social comunitária (23). Este ponto merece especial atenção e consideração nos eventos do Ano Europeu.

8.   Observações sobre a aplicação da iniciativa prevista

8.1

O CESE opina que a óptica operacional do Ano Europeu foi bem concebida, pois tem na devida conta as prioridades e sensibilidades nacionais (como a questão delicada do mercado de trabalho e da integração social dos imigrantes e minorias étnicas). Também é importante o facto de estabelecer uma cooperação estreita com os parceiros sociais e as instituições da sociedade civil.

8.2

A tónica colocada na participação dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil no alcance dos objectivos do Ano Europeu reflecte o seu carácter indispensável na concretização da agenda social da Estratégia de Lisboa, reconhecida em 2000 pelo Conselho Europeu de Nice no âmbito da Estratégia Europeia de Combate à Pobreza e Exclusão Social. Mais do que nunca, as iniciativas dos cidadãos têm de complementar, corrigir e consolidar a acção governamental. Igualmente importante é que a concepção e aplicação da política social dê voz aos que necessitam de apoio. Justifica-se, portanto, que estas organizações tenham sido convidadas a cooperar activamente na aplicação dos objectivos do Ano Europeu 2010.

8.3

O Comité saúda o facto de o financiamento destinado à aplicação dos objectivos do Ano Europeu ser o valor mais elevado alguma vez atribuído a uma iniciativa desta natureza na UE. Todavia, tendo considerado as medidas pormenorizadas apresentadas no anexo à proposta de decisão e para garantir a sua eficácia, o CESE apela a um financiamento acrescido para as medidas relativas ao Ano Europeu.

8.4

O CESE congratula-se também com o facto de a concepção e a aplicação das actividades do Ano Europeu reconhecerem as diferentes maneiras segundo as quais mulheres e homens vivem a pobreza e a exclusão social.

8.5

O CESE julga que às prioridades do Ano Europeu, enumeradas no referido anexo, deve acrescentar-se a pobreza que afecta as pessoas com emprego precário. As questões relacionadas com as pessoas com deficiência devem ser analisadas separadamente e não associadas às que dizem respeito a outros grupos vulneráveis.

Bruxelas, 29 de Maio de 2008.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Ver, por exemplo, o parecer do CESE de 18.1.2007 sobre «Balanço da realidade da sociedade europeia», ponto 2.2, relator: Jan OLSSON (JO C 93 de 27.4.2007) e o parecer do CESE de 13.7.2005 sobre a «Comunicação da Comissão relativa à Agenda Social», ponto 6.1, relatora: Ursula ENGELEN-KEFER (JO C 294 de 25.11.2005).

(2)  Comunicação da Comissão relativa à Agenda Social, COM(2005) 33 final de 9.2.2005, ponto 2.2, p. 9.

(3)  Vide «Towards an Active, Fair and Socially Cohesive Europe», relatório da Task Force de Alto Nível sobre a Coesão Social no Século XXI, Conselho da Europa, Estrasburgo, 26 de Outubro de 2007, TFSC (2007) 31 E.

(4)  Parecer do CESE de 13.7.2005 sobre a «Comunicação da Comissão relativa à Agenda Social», relatora: Ursula ENGELEN-KEFER (JO C 294 de 25.11.2005); parecer do CESE de 29.9.2005 sobre a «Pobreza das mulheres na Europa», relatora: Brenda KING (JO C 24 de 31.1.2006); parecer do CESE de 6.7.2006 sobre «Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu», relator: Ernst Erik EHNMARK (JO C 309 de 16.12.2006); parecer do CESE de 13.12.2006 sobre «Voluntariado — papel na sociedade europeia e impacto», relatora: Erika KOLLER e co-relatora: Soscha GRÄFIN ZU EULENBURG (JO C 325 de 30.12.2006); parecer do CESE de 18.1.2007 sobre «Avaliação da realidade da actual sociedade europeia», relator: Jan OLSSON (JO C 93 de 27.4.2007); parecer do CESE de 25.10.2007 sobre «Crédito e exclusão social na sociedade da abundância», relator: Jorge PEGADO LIZ (JO C 44 de 16.2.2008); parecer do CESE de 13.12.2007 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Promover a solidariedade entre as gerações», relator: Luca JAHIER (JO C 120 de 16.5.2008).

(5)  Ver parecer do CESE de 6.7.2006 sobre «Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu», ponto 2.1.2.5, relator: Ernst Erik EHNMARK (JO C 309 de 16.12.2006).

(6)  Ver o parecer de iniciativa do CESE de 12.7.2007 sobre «O emprego para as categorias prioritárias (Estratégia de Lisboa)», relator: Wolfgang GREIF (JO C 256 de 27.10.2007).

(7)  Ver parecer do CESE de 6.7.2006 sobre «Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu», pontos 1.8 e 1.9, relator: Ernst Erik EHNMARK (JO C 309 de 16.12.2006).

(8)  Ver parecer do CESE de 6.7.2006 sobre «Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu», ponto 2.4, relator: Ernst Erik EHNMARK (JO C 309 de 16.12.2006).

(9)  A taxa de pobreza persistente refere-se ao número de pessoas afectadas pela pobreza relativa em dois dos últimos três anos (definição do Eurostat).

(10)  Comunicação da Comissão «Trabalhar em conjunto, trabalhar melhor: Um novo quadro para a coordenação aberta no domínio da protecção social e das políticas de inclusão na União Europeia», COM(2005) 706 final, 22.12.2005, ponto 3.5, p. 9.

(11)  Nos seus pareceres, o CESE referiu-se com frequência a descrições mais específicas de pobreza, chamando a atenção, por exemplo, para as pessoas que «sofrem privações» e «estão em forte desvantagem» (parecer do CESE de 13.12.2007 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Promover a solidariedade entre as gerações», ponto 2.5, relator: Luca JAHIER, JO C 120 de 16.5.2008), para a «pobreza de longa duração» (parecer do CESE de 29.9.2005 sobre a «Pobreza entre as mulheres na Europa», ponto 1.7, relatora: Brenda KING, JO C 24 de 31.1.2006) e para a pobreza «em termos qualitativos», no sentido de «ausência ou insuficiência de recursos materiais para a satisfação das necessidades vitais do indivíduo» (parecer do CESE de 25.10.2007 sobre «Crédito e exclusão social na sociedade da abundância», ponto 3.1.3, relator: Jorge PEGADO LIZ, JO C 44 de 16.2.2008). Chegou mesmo a afirmar: «O Comité recomenda que a Comissão reveja a sua definição de pobreza, dado que esta só destaca as causas aparentes da pobreza e subestima o nível de pobreza das mulheres e o impacto dessa pobreza» (parecer do CESE de 29.9.2005 sobre a «Pobreza entre as mulheres na Europa», ponto 2.1, relatora: Brenda KING, JO C 24 de 31.1.2006). Naturalmente, este ponto fraco do indicador de pobreza relativa não se aplica apenas à pobreza das mulheres, mas à pobreza em geral.

(12)  Relatório Conjunto sobre Protecção Social e Inclusão Social 2007, Comissão Europeia (Comunidades Europeias: 2007), p. 45.

(13)  Ver parecer do CESE de 6.7.2006 sobre «Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu», sobretudo pontos 1.6–1.8, 2.3.1–2.3.5, relator: Ernst Erik EHNMARK (JO C 309 de 16.12.2006). Ver igualmente parecer do CESE de 18.1.2007 sobre «Avaliação da realidade da actual sociedade europeia», sobretudo ponto 2.4, relator: Jan OLSSON (JO C 93 de 27.4.2007).

(14)  The social situation in the European Union 2005-2006: The Balance between Generations in an Ageing Europe, Comissão Europeia, (Comunidades Europeias: 2007), p. 17. O inquérito sobre o grau de satisfação pessoal demonstra que a importância do emprego para a satisfação pessoal dos cidadãos da UE ultrapassa em muito o rendimento que auferem.

(15)  «Apresentar as questões aos cidadãos da Europa» foi uma recomendação-chave do parecer do CESE de 6.7.2006 sobre «Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu», ponto 2.6, relator: Ernst Erik EHNMARK (JO C 309 de 16.12.2006).

(16)  Vide parecer do CESE de 18.1.2007 sobre «Avaliação da realidade da actual sociedade europeia», ponto 2.2, relator: Jan OLSSON (JO C 93 de 27.4.2007) e o parecer do CESE de 13.7.2005 sobre a «Comunicação da Comissão relativa à Agenda Social», ponto 6.1, relatora: Ursula ENGELEN-KEFER (JO C 294 de 25.11.2005).

(17)  Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao Ano Europeu do Combateà Pobreza e à Exclusão Social, [COM(2007) 797 final, 2007/0278 (COD)], 12.12.2007, Introdução, ponto 11, p. 9.

(18)  Já no seu parecer de 6.7.2006 sobre «Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu», ponto 2.4.5, relator: Ernst Erik EHNMARK (JO C 309 de 16.12.2006), o CESE se mostrou inquieto com certos «efeitos sociais da revolução do conhecimento», sugerindo que importava enfrentá-los através do diálogo social.

(19)  Parecer do CESE de 13.12.2006 sobre «Voluntariado — papel na sociedade europeia e impacto», ponto 1.2, relatora: Erika KOLLER e co-relatora: Soscha GRÄFIN ZU EULENBURG (JO C 325 de 30.12.2006).

(20)  Parecer do CESE de 13.12.2007 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Promover a solidariedade entre as gerações» que salienta as vantagens da participação cívica por parte dos idosos e apela a mais investigação no domínio do envelhecimento activo, ponto 4.5, relator: Luca JAHIER (JO C 120 de 16.5.2008).

(21)  Apesar de a Estratégia de Lisboa terminar em 2010, é um ponto de referência permanente no tocante aos programas, documentos e medidas concretas ao nível nacional e comunitário. Embora ainda não tenha sido tomada nenhuma decisão, prevê-se que a Estratégia de Lisboa continue de algum modo após 2010, sobretudo porque os objectivos sociais e de emprego da estratégia não serão plenamente alcançados até esta data.

(22)  Anne-Catherine Guio, «Material deprivation in the EU», Statistics in Focus: Population and Social Conditions, Living Conditions and Welfare, 21/2005, Eurostat, p. 9.

(23)  Parecer do CESE de 18.1.2007 sobre «Avaliação da realidade da actual sociedade europeia», pontos 2.7 e 5.3, relator: Jan OLSSON (JO C 93 de 27.4.2007).