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Document 62015CJ0191

Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 28 de julho de 2016.
Verein für Konsumenteninformation contra Amazon EU Sàrl.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Oberster Gerichtshof.
Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria civil — Regulamentos (CE) n.° 864/2007 e (CE) n.° 593/2008 — Proteção dos consumidores — Diretiva 93/13/CEE — Proteção de dados — Diretiva 95/46/CE — Contratos de compra e venda em linha celebrados com consumidores residentes noutros Estados‑Membros — Cláusulas abusivas — Condições gerais que contêm uma cláusula de escolha do direito aplicável a favor do direito do Estado‑Membro em que a empresa tem a sua sede — Determinação da lei aplicável à apreciação do caráter abusivo das cláusulas dessas condições gerais no âmbito de uma ação inibitória — Determinação da lei que regula o tratamento de dados pessoais dos consumidores.
Processo C-191/15.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:612

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

28 de julho de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria civil — Regulamentos (CE) n.o 864/2007 e (CE) n.o 593/2008 — Proteção dos consumidores — Diretiva 93/13/CEE — Proteção de dados — Diretiva 95/46/CE — Contratos de compra e venda em linha celebrados com consumidores residentes noutros Estados‑Membros — Cláusulas abusivas — Condições gerais que contêm uma cláusula de escolha do direito aplicável a favor do direito do Estado‑Membro em que a empresa tem a sua sede — Determinação da lei aplicável à apreciação do caráter abusivo das cláusulas dessas condições gerais no âmbito de uma ação inibitória — Determinação da lei que regula o tratamento de dados pessoais dos consumidores»

No processo C‑191/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Oberster Gerichtshof (Tribunal Supremo, Áustria), por decisão de 9 de abril de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 27 de abril de 2015, no processo

Verein für Konsumenteninformation

contra

Amazon EU Sàrl,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: L. Bay Larsen, presidente de secção, D. Švaby, J. Malenovský, M. Safjan (relator) e M. Vilaras, juízes,

advogado‑geral: H. Saugmandsgaard Øe,

secretário: I. Illéssy, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 2 de março de 2016,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Verein für Konsumenteninformation, por S. Langer, Rechtsanwalt,

em representação da Amazon EU Sàrl, por G. Berrisch, Rechtsanwalt,

em representação do Governo austríaco, por G. Eberhard, na qualidade de agente,

em representação do Governo alemão, por T. Henze, A. Lippstreu, M. Hellmann, T. Laut e J. Mentgen, na qualidade de agentes,

em representação do Governo do Reino Unido, por M. Holt, na qualidade de agente, assistido por M. Gray, barrister,

em representação da Comissão Europeia, por M. Wilderspin e J. Vondung, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 2 de junho de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos Regulamentos (CE) n.o 864/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de julho de 2007, relativo à lei aplicável às obrigações extracontratuais («Roma II») (JO 2007, L 199, p. 40, a seguir «Regulamento Roma II»), e (CE) n.o 593/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de junho de 2008, sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (Roma I) (JO 2008, L 177, p. 6, a seguir «Regulamento Roma I»), bem como das Diretivas 93/13/CEE do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores (JO 1993, L 95, p. 29), e 95/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de outubro de 1995, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (JO 1995, L 281, p. 31).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Verein für Konsumenteninformation (Associação de proteção dos consumidores, a seguir «VKI») à Amazon EU Sàrl, com sede no Luxemburgo, a respeito de uma ação inibitória apresentada pela VKI.

Quadro jurídico

Direito da União

Regulamento Roma I

3

Segundo o considerando 7 do Regulamento Roma I:

«O âmbito de aplicação material e as disposições do presente regulamento deverão ser coerentes com o Regulamento (CE) n.o 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial [(JO 2001, L 12, p. 1)] e com o Regulamento [Roma II].»

4

O artigo 1.o, n.os 1 e 3, do Regulamento Roma I dispõe:

«1.   O presente regulamento é aplicável às obrigações contratuais em matéria civil e comercial que impliquem um conflito de leis.

Não se aplica, em especial, às matérias fiscais, aduaneiras e administrativas.

[…]

3.   Sem prejuízo do artigo 18.o, o presente regulamento não se aplica à prova e ao processo.»

5

O artigo 4.o deste regulamento, com a epígrafe «Lei aplicável na falta de escolha», prevê:

«1.   Na falta de escolha nos termos do artigo 3.o e sem prejuízo dos artigos 5.° a 8.°, a lei aplicável aos contratos é determinada do seguinte modo:

a)

O contrato de compra e venda de mercadorias é regulado pela lei do país em que o vendedor tem a sua residência habitual;

b)

O contrato de prestação de serviços é regulado pela lei do país em que o prestador de serviços tem a sua residência habitual;

c)

O contrato que tem por objeto um direito real sobre um bem imóvel ou o arrendamento de um bem imóvel é regulado pela lei do país onde o imóvel se situa;

d)

Sem prejuízo da alínea c), o arrendamento de um bem imóvel celebrado para uso pessoal temporário por um período máximo de seis meses consecutivos é regulado pela lei do país em que o proprietário tem a sua residência habitual, desde que o locatário seja uma pessoa singular e tenha a sua residência habitual nesse mesmo país;

e)

O contrato de franquia é regulado pela lei do país em que o franqueado tem a sua residência habitual;

f)

O contrato de distribuição é regulado pela lei do país em que o distribuidor tem a sua residência habitual;

g)

O contrato de compra e venda de mercadorias em hasta pública é regulado pela lei do país em que se realiza a compra e venda em hasta pública, caso seja possível determinar essa localização;

h)

Um contrato celebrado no âmbito de um sistema multilateral que permita ou facilite o encontro de múltiplos interesses de terceiros, na compra ou venda de instrumentos financeiros, na aceção do ponto 17) do n.o 1 do artigo 4.o da Diretiva 2004/39/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de abril de 2004, relativa aos mercados de instrumentos financeiros, que altera as Diretivas 85/611/CEE e 93/6/CEE do Conselho e a Diretiva 2000/12/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e que revoga a Diretiva 93/22/CEE do Conselho (JO 2004, L 145, p. 1)], de acordo com regras não discricionárias e regulado por uma única lei, é regulado por essa lei.

2.   Caso os contratos não sejam abrangidos pelo n.o 1, ou se partes dos contratos forem abrangidas por mais do que uma das alíneas a) a h) do n.o 1, esses contratos são regulados pela lei do país em que o contraente que deve efetuar a prestação característica do contrato tem a sua residência habitual.

3.   Caso resulte claramente do conjunto das circunstâncias do caso que o contrato apresenta uma conexão manifestamente mais estreita com um país diferente do indicado nos n.os 1 ou 2, é aplicável a lei desse outro país.

4.   Caso a lei aplicável não possa ser determinada nem em aplicação do n.o 1 nem do n.o 2, o contrato é regulado pela lei do país com o qual apresenta uma conexão mais estreita.»

6

O artigo 6.o deste mesmo regulamento, com a epígrafe «Contratos celebrados por consumidores», tem a seguinte redação:

«1.   Sem prejuízo do disposto nos artigos 5.° e 7.°, os contratos celebrados por uma pessoa singular, para uma finalidade que possa considerar‑se estranha à sua atividade comercial ou profissional (‘o consumidor’), com outra pessoa que aja no quadro das suas atividades comerciais ou profissionais (‘o profissional’), são regulados pela lei do país em que o consumidor tem a sua residência habitual desde que o profissional:

a)

Exerça as suas atividades comerciais ou profissionais no país em que o consumidor tem a sua residência habitual, ou

b)

Por qualquer meio, dirija essas atividades para este ou vários países, incluindo aquele país,

e o contrato seja abrangido pelo âmbito dessas atividades.

2.   Sem prejuízo do n.o 1, as partes podem escolher a lei aplicável a um contrato que observe os requisitos do n.o 1, nos termos do artigo 3.o Esta escolha não pode, porém, ter como consequência privar o consumidor da proteção que lhe proporcionam as disposições não derrogáveis por acordo da lei que, na falta de escolha, seria aplicável com base no n.o 1.

[…]»

7

O artigo 9.o do Regulamento Roma I, com a epígrafe «Normas de aplicação imediata», dispõe:

«1.   As normas de aplicação imediata são disposições cujo respeito é considerado fundamental por um país para a salvaguarda do interesse público, designadamente a sua organização política, social ou económica, ao ponto de exigir a sua aplicação em qualquer situação abrangida pelo seu âmbito de aplicação, independentemente da lei que de outro modo seria aplicável ao contrato, por força do presente regulamento.

2.   As disposições do presente regulamento não podem limitar a aplicação das normas de aplicação imediata do país do foro.

3.   Pode ser dada prevalência às normas de aplicação imediata da lei do país em que as obrigações decorrentes do contrato devam ser ou tenham sido executadas, na medida em que, segundo essas normas de aplicação imediata, a execução do contrato seja ilegal. Para decidir se deve ser dada prevalência a essas normas, devem ser tidos em conta a sua natureza e o seu objeto, bem como as consequências da sua aplicação ou não aplicação.»

8

Nos termos do artigo 10.o do referido regulamento, com a epígrafe «Aceitação e validade substancial»:

«1.   A existência e a validade substancial do contrato ou de alguma das suas disposições são reguladas pela lei que seria aplicável, por força do presente regulamento, se o contrato ou a disposição fossem válidos.

2.   Todavia, um contraente, para demonstrar que não deu o seu acordo, pode invocar a lei do país em que tenha a sua residência habitual, se resultar das circunstâncias que não seria razoável determinar os efeitos do seu comportamento nos termos da lei designada no n.o 1.»

9

O artigo 23.o deste mesmo regulamento, com a epígrafe «Relação com outras disposições do direito comunitário», prevê:

«À exceção do artigo 7.o, o presente regulamento não prejudica a aplicação das disposições do direito comunitário que, em matérias específicas, regulem os conflitos de leis em matéria de obrigações contratuais.»

Regulamento Roma II

10

Segundo os considerandos 7 e 21 do Regulamento Roma II:

«(7)

O âmbito de aplicação material e as disposições do presente regulamento deverão ser coerentes com o Regulamento [n.o 44/2001] e com os instrumentos referentes à lei aplicável às obrigações contratuais.

[…]

(21)

A regra especial do artigo 6.o não constitui uma exceção à regra geral do n.o 1 do artigo 4.o, mas sim uma clarificação da mesma. Em matéria de concorrência desleal, a regra de conflito de leis deverá proteger os concorrentes, os consumidores e o público em geral, bem como garantir o bom funcionamento da economia de mercado. A conexão à lei do país onde as relações concorrenciais ou os interesses coletivos dos consumidores sejam afetados ou sejam suscetíveis de ser afetados cumpre, em geral, estes objetivos.»

11

O artigo 1.o, n.os 1 e 3, do referido regulamento dispõe:

«1.   O presente regulamento é aplicável, em situações que envolvam um conflito de leis, às obrigações extracontratuais em matéria civil e comercial. Não é aplicável, em especial, às matérias fiscais, aduaneiras e administrativas, nem à responsabilidade do Estado por atos e omissões no exercício do poder público (acta iure imperii).

[…]

3.   Sem prejuízo dos artigos 21.° e 22.°, o presente regulamento não se aplica à prova e ao processo.»

12

Nos termos do artigo 4.o deste mesmo regulamento, com a epígrafe «Regra geral», que figura no seu capítulo II intitulado «Responsabilidade fundada em ato lícito, ilícito ou no risco»:

«1.   Salvo disposição em contrário do presente regulamento, a lei aplicável às obrigações extracontratuais decorrentes da responsabilidade fundada em ato lícito, ilícito ou no risco é a lei do país onde ocorre o dano, independentemente do país onde tenha ocorrido o facto que deu origem ao dano e independentemente do país ou países onde ocorram as consequências indiretas desse facto.

2.   Todavia, sempre que a pessoa cuja responsabilidade é invocada e o lesado tenham a sua residência habitual no mesmo país no momento em que ocorre o dano, é aplicável a lei desse país.

3.   Se resultar claramente do conjunto das circunstâncias que a responsabilidade fundada em ato lícito, ilícito ou no risco tem uma conexão manifestamente mais estreita com um país diferente do indicado nos n.os 1 ou 2, é aplicável a lei desse outro país. Uma conexão manifestamente mais estreita com um outro país poderá ter por base, nomeadamente, uma relação preexistente entre as partes, tal como um contrato, que tenha uma ligação estreita com a responsabilidade fundada no ato lícito, ilícito ou no risco em causa.»

13

O artigo 6.o do Regulamento Roma II, com a epígrafe «Concorrência desleal e atos que restrinjam a livre concorrência», que também figura no capítulo II deste regulamento, tem a seguinte redação:

«1.   A lei aplicável a uma obrigação extracontratual decorrente de um ato de concorrência desleal é a lei do país em que as relações de concorrência ou os interesses coletivos dos consumidores sejam afetados ou sejam suscetíveis de ser afetados.

2.   Se um ato de concorrência desleal afetar apenas os interesses de um concorrente específico, aplica‑se o artigo 4.o

a)

A lei aplicável a uma obrigação extracontratual decorrente de uma restrição de concorrência é a lei do país em que o mercado seja afetado ou seja suscetível de ser afetado;

b)

Quando o mercado for afetado ou for suscetível de ser afetado em mais do que um país, a pessoa que requer a reparação do dano e propõe a ação no tribunal do domicílio do réu pode optar por basear o seu pedido na lei do tribunal em que a ação é proposta, desde que o mercado desse Estado‑Membro seja um dos direta e substancialmente afetados pela restrição à concorrência de que decorre a obrigação extracontratual em que se baseia o pedido. Caso o requerente proponha nesse tribunal, de acordo com as regras aplicáveis em matéria de competência judiciária, uma ação contra mais do que um réu, só pode optar por basear o seu pedido na lei desse tribunal se a restrição à concorrência em que se baseia a ação contra cada um desses réus também afetar direta e substancialmente o mercado do Estado‑Membro em que se situa esse tribunal.

4.   A lei aplicável ao abrigo do presente artigo não pode ser afastada por acordos celebrados em aplicação do artigo 14.o»

14

O artigo 14.o deste regulamento, com a epígrafe «Liberdade de escolha», dispõe:

«1.   As partes podem acordar em subordinar obrigações extracontratuais à lei da sua escolha:

a)

Mediante convenção posterior ao facto que dê origem ao dano;

ou,

b)

Caso todas as partes desenvolvam atividades económicas, também mediante uma convenção livremente negociada, anterior ao facto que dê origem ao dano.

A escolha deve ser expressa ou decorrer, de modo razoavelmente certo, das circunstâncias do caso, e não prejudica os direitos de terceiros.

2.   Sempre que todos os elementos relevantes da situação se situem, no momento em que ocorre o facto que dá origem ao dano, num país que não seja o país da lei escolhida, a escolha das partes não prejudica a aplicação das disposições da lei desse país não derrogáveis por acordo.

3.   Sempre que todos os elementos relevantes da situação se situem, no momento em que ocorre o facto que dá origem ao dano, num ou em vários Estados‑Membros, a escolha, pelas partes, de uma lei aplicável que não a de um Estado‑Membro, não prejudica a aplicação, se for esse o caso, das disposições de direito comunitário não derrogáveis por convenção, tal como aplicadas pelo Estado‑Membro do foro.»

15

Nos termos do artigo 16.o do referido regulamento, com a epígrafe «Normas de aplicação imediata»:

«O disposto no presente regulamento em nada afeta a aplicação das disposições da lei do país do foro que regulem imperativamente o caso concreto independentemente da lei normalmente aplicável à obrigação extracontratual.»

Regulamento (CE) n.o 2006/2004

16

O artigo 3.o do Regulamento (CE) n.o 2006/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de outubro de 2004, relativo à cooperação entre as autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da legislação de defesa do consumidor («regulamento relativo à cooperação no domínio da defesa do consumidor») (JO 2004, L 364, p. 1), com a epígrafe «Definições», prevê:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

[…]

b)

‘Infração intracomunitária’, qualquer ato ou omissão contrários à legislação de defesa dos interesses dos consumidores, tal como definida na alínea a), que prejudique ou seja suscetível de prejudicar os interesses coletivos dos consumidores residentes num ou em vários Estados‑Membros diferentes do Estado‑Membro onde o ato ou omissão teve origem ou foi cometido, ou onde está estabelecido o vendedor ou o fornecedor responsável, ou onde sejam encontradas provas ou bens referentes ao ato ou omissão;

[…]»

17

O artigo 4.o do referido regulamento, com a epígrafe «Autoridades competentes», dispõe:

«1.   Os Estados‑Membros designarão as autoridades competentes e um serviço de ligação único.

2.   Se necessário para o cumprimento das obrigações decorrentes do presente regulamento, os Estados‑Membros podem designar outras autoridades públicas. Podem ainda designar organismos que tenham um interesse legítimo na cessação ou proibição de infrações intracomunitárias, nos termos do n.o 3 do artigo 8.o

3.   Sem prejuízo do n.o 4, cada autoridade competente disporá dos poderes de investigação e de aplicação da legislação necessários para dar cumprimento ao presente regulamento, devendo exercer esses poderes de acordo com o seu direito nacional.

4.   As autoridades competentes podem exercer os poderes referidos no n.o 3 de acordo com o seu direito nacional:

a)

Diretamente sob a sua própria autoridade ou sob a supervisão das autoridades judiciais; ou

b)

Deferindo para os tribunais competentes para que se pronunciem, incluindo, sempre que adequado, através de recurso, se não tiver sido dado provimento a esse deferimento.

5.   Na medida em que as autoridades competentes exerçam os seus poderes mediante deferimento para os tribunais, nos termos da alínea b) do n.o 4, esses tribunais devem ter competência para proferir as decisões necessárias.

6.   Os poderes referidos no n.o 3 apenas serão exercidos quando existir uma suspeita razoável de existência de uma infração intracomunitária e incluirão, pelo menos, o direito de:

a)

Aceder a qualquer documento pertinente, independentemente da sua forma, respeitante à infração intracomunitária;

b)

Solicitar a prestação de informações pertinentes respeitantes à infração intracomunitária, por qualquer pessoa;

c)

Realizar no local as inspeções necessárias;

d)

Solicitar por escrito que o vendedor ou fornecedor em questão ponha termo à infração intracomunitária;

e)

Obter do vendedor ou do fornecedor responsável pela infração intracomunitária um compromisso de cessação da infração em questão e, se necessário, publicar o referido compromisso;

f)

Requerer a cessação ou proibição de qualquer infração intracomunitária e, se for caso disso, publicar as decisões daí resultantes;

g)

Requerer que a parte vencida indemnize o erário público ou qualquer beneficiário designado ou previsto na legislação nacional, em caso de incumprimento da decisão.

[…]»

Diretiva 2009/22/CE

18

O artigo 2.o, n.o 2, da Diretiva 2009/22/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, relativa às ações inibitórias em matéria de proteção dos interesses dos consumidores (JO 2009, L 110, p. 30), dispõe:

«A presente diretiva não prejudica as normas de direito internacional privado no que se refere à lei aplicável, conduzindo normalmente à aplicação da lei do Estado‑Membro em que a infração tem origem ou da lei do Estado‑Membro em que a infração produz efeitos.»

Diretiva 93/13

19

Nos termos do quinto e sexto considerandos da Diretiva 93/13:

«Considerando que, regra geral, os consumidores de um Estado‑Membro desconhecem as regras por que se regem, nos outros Estados‑Membros, os contratos relativos à venda de bens ou à oferta de serviços; que esse desconhecimento pode dissuadi‑los de efetuarem transações de diretas de compra de bens ou de fornecimento de serviços noutro Estado‑Membro;

Considerando que, para facilitar o estabelecimento do mercado interno e proteger os cidadãos que, na qualidade de consumidores, adquiram bens e serviços mediante contratos regidos pela legislação de outros Estados‑Membros, é essencial eliminar desses contratos as cláusulas abusivas.»

20

O artigo 3.o desta diretiva prevê:

«1.   Uma cláusula contratual que não tenha sido objeto de negociação individual é considerada abusiva quando, a despeito da exigência de boa‑fé, der origem a um desequilíbrio significativo em detrimento do consumidor, entre os direitos e obrigações das partes decorrentes do contrato.

[…]

3.   O anexo contém uma lista indicativa e não exaustiva de cláusulas que podem ser consideradas abusivas.»

21

Segundo o artigo 5.o da referida diretiva:

«No caso dos contratos em que as cláusulas propostas ao consumidor estejam, na totalidade ou em parte, consignadas por escrito, essas cláusulas deverão ser sempre redigidas de forma clara e compreensível. Em caso de dúvida sobre o significado de uma cláusula, prevalecerá a interpretação mais favorável ao consumidor. Esta regra de interpretação não é aplicável no âmbito dos processos previstos no n.o 2 do artigo 7.o»

22

O artigo 6.o da Diretiva 93/13 dispõe:

«1.   Os Estados‑Membros estipularão que, nas condições fixadas pelos respetivos direitos nacionais, as cláusulas abusivas constantes de um contrato celebrado com um consumidor por um profissional não vinculem o consumidor e que o contrato continue a vincular as partes nos mesmos termos, se puder subsistir sem as cláusulas abusivas.

2.   Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para que o consumidor não seja privado da proteção concedida pela presente diretiva pelo facto de ter sido escolhido o direito de um país terceiro como direito aplicável ao contrato, desde que o contrato apresente uma relação estreita com o território dos Estados‑Membros.»

23

O artigo 7.o desta diretiva está redigido nos seguintes termos:

«1.   Os Estados‑Membros providenciarão para que, no interesse dos consumidores e dos profissionais concorrentes, existam meios adequados e eficazes para pôr termo à utilização das cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores por um profissional.

2.   Os meios a que se refere o n.o 1 incluirão disposições que habilitem as pessoas ou organizações que, segundo a legislação nacional, têm um interesse legítimo na defesa do consumidor, a recorrer, segundo o direito nacional, aos tribunais ou aos órgãos administrativos competentes para decidir se determinadas cláusulas contratuais, redigidas com vista a uma utilização generalizada, têm ou não um caráter abusivo, e para aplicar os meios adequados e eficazes para pôr termo à utilização dessas cláusulas.

[…]»

24

Nos termos do artigo 8.o da referida diretiva:

«Os Estados‑Membros podem adotar ou manter, no domínio regido pela presente diretiva, disposições mais rigorosas, compatíveis com o Tratado, para garantir um nível de proteção mais elevado para o consumidor.»

25

O anexo da Diretiva 93/13 enumera as cláusulas previstas no artigo 3.o, n.o 3, desta diretiva. O ponto 1, alínea q), deste anexo tem a seguinte redação:

«Cláusulas que têm como objetivo ou como efeito:

[…]

q)

Suprimir ou entravar a possibilidade de intentar ações judiciais ou seguir outras vias de recurso, por parte do consumidor [...]»

Diretiva 95/46

26

O artigo 4.o da Diretiva 95/46, com a epígrafe «Direito nacional aplicável», dispõe:

«1.   Cada Estado‑Membro aplicará as suas disposições nacionais adotadas por força da presente diretiva ao tratamento de dados pessoais quando:

a)

O tratamento for efetuado no contexto das atividades de um estabelecimento do responsável pelo tratamento no território desse Estado‑Membro; se o mesmo responsável pelo tratamento estiver estabelecido no território de vários Estados‑Membros, deverá tomar as medidas necessárias para garantir que cada um desses estabelecimentos cumpra as obrigações estabelecidas no direito nacional que lhe for aplicável;

b)

O responsável pelo tratamento não estiver estabelecido no território do Estado‑Membro, mas num local onde a sua legislação nacional seja aplicável por força do direito internacional público;

c)

O responsável pelo tratamento não estiver estabelecido no território da Comunidade e recorrer, para tratamento de dados pessoais, a meios, automatizados ou não, situados no território desse Estado‑Membro, salvo se esses meios só forem utilizados para trânsito no território da Comunidade.

2.   No caso referido na alínea c) do n.o 1, o responsável pelo tratamento deve designar um representante estabelecido no território desse Estado‑Membro, sem prejuízo das ações que possam vir a ser intentadas contra o próprio responsável pelo tratamento.»

Direito austríaco

27

O § 6 da Konsumentenschutzgesetz (Lei relativa à proteção dos consumidores), de 8 de março de 1979 (BGBl. 140/1979), com a epígrafe «Elementos do contrato inadmissíveis», prevê, no seu n.o 3, que uma cláusula constante das cláusulas contratuais gerais ou de formulários de contratos é inválida se estiver redigida de forma pouco clara ou incompreensível.

28

Segundo o § 13a desta lei, o § 6 da mesma é aplicável para efeitos de proteção dos consumidores, independentemente da lei que rege o contrato, se este tiver sido celebrado no contexto de uma atividade que a empresa, ou as pessoas que a mesma disso incumbiu, tenha exercido na Áustria com vista à celebração deste tipo de contratos.

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

29

A Amazon EU é uma sociedade com sede no Luxemburgo, pertencente a um grupo internacional de comércio por correspondência, que, entre outras atividades, celebra contratos com consumidores residentes na Áustria, no âmbito do comércio eletrónico, através de um sítio Internet com um nome de domínio com a extensão «.de». Esta sociedade não tem sede nem estabelecimento na Áustria.

30

Até meados de 2012, as condições gerais que figuravam nos contratos celebrados com esses consumidores tinham a seguinte redação:

«1.

A Amazon.de não reconhece quaisquer condições divergentes por parte do adquirente, a menos que a Amazon.de tenha consentido por escrito na aplicação das mesmas.

[…]

6.

Nos casos de pagamento contra a apresentação de fatura e, nos outros casos, quando haja motivo justificado, a Amazon.de examina e avalia os dados pessoais transmitidos pelos adquirentes e procede ao intercâmbio de dados com outras empresas pertencentes ao grupo Amazon, com empresas especializadas na obtenção e prestação de informações comerciais e, em caso de necessidade, com a Bürgel Wirtschaftsinformationen GmbH & Co. KG, Caixa Postal 5001 66, 22701 Hamburgo, Alemanha.

[…]

9.

Para a decisão sobre a modalidade de pagamento, utilizamos — além de dados próprios — valores de probabilidade para avaliar o risco de incumprimento, que são disponibilizados pela Bürgel Wirtschaftsinformationen GmbH & Co. KG, Gasstraße 18, 22761 Hamburgo, e pela informa Solutions GmbH, Rheinstrasse 99, 76532 Baden Baden. [(Alemanha)]. As referidas empresas são ainda incumbidas de validar a morada indicada pelos adquirentes.

[…]

11.

Caso o utilizador opte por colocar conteúdos no site Amazon.de (por exemplo, comentários aos produtos enquanto cliente), está a conferir à Amazon.de, pelo período correspondente à duração do direito subjacente, uma licença geográfica e temporalmente ilimitada de posterior utilização, tanto online como offline, dos conteúdos para outras finalidades.

12.

É aplicável a lei luxemburguesa, com exclusão das disposições da Convenção das Nações Unidas para a Venda Internacional de Mercadorias (CVIM).»

31

A VKI, entidade com legitimidade para intentar ações inibitórias na aceção da Diretiva 2009/22, apresentou nos tribunais austríacos um pedido de cessação de utilização de todas as cláusulas contidas naquelas condições gerais, bem como um pedido de publicação da sentença a proferir, por considerar que todas essas cláusulas violavam proibições legais ou boas práticas.

32

O tribunal de primeira instância julgou procedentes todos os pedidos, com exceção do pedido relativo à cláusula 8.a, respeitante ao pagamento de um suplemento em caso de pagamento contra a apresentação de fatura. Fundando‑se na aplicação de princípio do Regulamento Roma I, esse tribunal considerou, com base no artigo 6.o, n.o 2, deste regulamento, que a cláusula 12.a, relativa à escolha da lei aplicável, era inválida, com o fundamento de que a escolha da lei não devia privar o consumidor da proteção que lhe era garantida pela legislação do Estado da sua residência habitual. O referido tribunal deduziu deste facto que a validade das outras cláusulas deveria ter sido avaliada à luz do direito austríaco. Por último, no que se refere às cláusulas 6.a, 9.a e 11.a, esse mesmo tribunal observou que apenas as questões relativas à proteção de dados deviam ser apreciadas à luz do direito luxemburguês pertinente, uma vez que o Regulamento Roma I não excluía a aplicação da Diretiva 95/46.

33

O tribunal de segunda instância, no qual as duas partes no processo principal interpuseram recurso, anulou a sentença proferida pelo tribunal de primeira instância e remeteu‑lhe o processo para nova apreciação. Aquele tribunal considerou que o Regulamento Roma I era pertinente para a determinação da lei aplicável e apenas analisou quanto ao mérito a cláusula 12.a, relativa à escolha da lei aplicável. A esse respeito, declarou que o artigo 6.o, n.o 2, deste regulamento não permitia concluir pela ilegalidade dessa cláusula e que, por força do artigo 10.o, n.o 1, do mesmo regulamento, a análise da referida cláusula devia, pelo contrário, ter sido feita à luz do direito luxemburguês. Depois de ter convidado o tribunal de primeira instância a proceder a essa análise, o tribunal de segunda instância observou que, se esta cláusula devesse ser considerada legal à luz do direito luxemburguês, as outras cláusulas também deveriam ser avaliadas à luz desse direito e que haveria, então, que proceder a uma comparação com o direito austríaco para determinar a lei mais favorável, na aceção do artigo 6.o, n.o 2, do Regulamento Roma I.

34

O Oberster Gerichtshof (Tribunal Supremo, Áustria), para o qual a VKI recorreu, interroga‑se sobre a lei aplicável no âmbito do processo principal. Nestas circunstâncias, esse tribunal decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

A lei aplicável a uma ação inibitória, na aceção da [Diretiva 2009/22] deve ser determinada, nos termos do artigo 4.o do [Regulamento Roma II] quando a ação tem por objeto a utilização de cláusulas contratuais ilícitas por uma empresa estabelecida num Estado‑Membro que celebra, no âmbito do comércio eletrónico, contratos com consumidores estabelecidos noutros Estados‑Membros, em particular no Estado do órgão jurisdicional chamado a decidir a causa?

2)

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

a)

Deve ser entendido como país da ocorrência do dano (artigo 4.o, n.o 1, [do Regulamento] Roma II) qualquer Estado ao qual se destina a atividade económica da empresa ré, pelo que as cláusulas impugnadas devem ser apreciadas à luz da lei do Estado do foro, quando a entidade com legitimidade para intentar uma ação se opõe à utilização das referidas cláusulas nas relações comerciais com consumidores estabelecidos nesse mesmo Estado?

b)

Verifica‑se uma conexão manifestamente mais estreita (artigo 4.o, n.o 3, Regulamento Roma II) com a lei do país em que a empresa ré tem a sua sede quando as suas cláusulas contratuais gerais preveem que os contratos celebrados pela empresa estão sujeitos à lei desse país?

c)

Uma cláusula [de escolha da lei aplicável] deste tipo pode levar a concluir, por outros motivos, que as cláusulas contratuais impugnadas devem ser analisadas à luz da lei do Estado em que a empresa ré tem a sua sede?

3)

Em caso de resposta negativa à primeira questão:

De que forma deve então ser determinada a lei aplicável à ação inibitória?

4)

Independentemente da resposta às questões anteriores:

a)

Uma cláusula constante das cláusulas contratuais gerais, nos termos da qual ao contrato celebrado no âmbito do comércio eletrónico entre um consumidor e uma empresa sediada noutro Estado‑Membro se aplica a lei do Estado da sede dessa empresa, é abusiva na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da [Diretiva 93/13]?

b)

Por força do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da [Diretiva 95/46] e independentemente de qualquer outra norma jurídica aplicável, o tratamento de dados pessoais por uma empresa que celebra, no âmbito do comércio eletrónico, contratos com consumidores estabelecidos noutro Estado‑Membro está sujeito exclusivamente à lei do Estado em que está localizado o estabelecimento da empresa em que se procede a esse tratamento, ou a empresa deve também respeitar as disposições em matéria de proteção de dados dos Estados‑Membros a que a sua atividade económica se destina?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto às três primeiras questões

35

Com as suas três primeiras questões, que importa analisar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, de que modo devem ser interpretados os Regulamentos Roma I e Roma II para determinar a ou as leis aplicáveis a uma ação inibitória na aceção da Diretiva 2009/22, destinada à cessação da utilização de cláusulas contratuais pretensamente ilícitas, por uma empresa sedeada num Estado‑Membro que celebra contratos, no âmbito do comércio eletrónico, com consumidores estabelecidos noutros Estados‑Membros e, nomeadamente, no Estado do foro.

36

A título preliminar, importa sublinhar, no que respeita ao âmbito de aplicação respetivo dos Regulamentos Roma I e Roma II, que os conceitos de «obrigação contratual» e de «obrigação extracontratual» que neles figuram devem ser interpretados de forma autónoma, por referência principalmente à sistemática e à finalidade desses regulamentos. Deve igualmente ser tido em consideração, em conformidade com o considerando 7 de cada um dos dois regulamentos, o objetivo de coerência na aplicação recíproca destes regulamentos, mas igualmente do Regulamento n.o 44/2001 (a seguir «Regulamento Bruxelas I»), que procede, designadamente, a uma distinção, no seu artigo 5.o, entre as matérias contratual e extracontratual (v. acórdão de 21 de janeiro de 2016, ERGO Insurance e Gjensidige Baltic, C‑359/14 e C‑475/14, EU:C:2016:40, n.o 43).

37

No que respeita ao conceito de «obrigação extracontratual», na aceção do artigo 1.o do Regulamento Roma II, há que recordar que o conceito de «matéria extracontratual», na aceção do artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento Bruxelas I, abrange qualquer ação destinada a acionar a responsabilidade do demandado e que não esteja relacionada com a «matéria contratual» na aceção do artigo 5.o, ponto 1, deste último regulamento (acórdão de 21 de janeiro de 2016, ERGO Insurance e Gjensidige Baltic, C‑359/14 e C‑475/14, EU:C:2016:40, n.o 45).

38

No contexto da Convenção de 27 de setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 1972, L 299, p. 32; EE 01 F1 p. 186; a seguir «Convenção de Bruxelas»), o Tribunal de Justiça já declarou que uma ação contenciosa preventiva, intentada por uma associação de proteção dos consumidores com vista a fazer proibir a utilização por um comerciante de cláusulas consideradas abusivas, em contratos com particulares, é de natureza extracontratual na aceção do artigo 5.o, ponto 3, desta convenção (acórdão de 1 de outubro de 2002, Henkel, C‑167/00, EU:C:2002:555, n.o 50), valendo esta interpretação igualmente para o Regulamento Bruxelas I (v., neste sentido, acórdão de 13 de março de 2014, Brogsitter, C‑548/12, EU:C:2014:148, n.o 19).

39

Ora, à luz do objetivo de aplicação coerente recordado no n.o 36 do presente acórdão, a consideração de que, no domínio da proteção dos consumidores, a responsabilidade extracontratual abrange também os danos causados à ordem jurídica resultantes da utilização de cláusulas abusivas que associações de proteção dos consumidores têm por missão impedir (v., neste sentido, acórdão de 1 de outubro de 2002, Henkel, C‑167/00, EU:C:2002:555, n.o 42) é totalmente transponível para a interpretação dos Regulamentos Roma I e Roma II. Há, assim, que considerar que a ação inibitória prevista na Diretiva 2009/22 tem por objeto uma obrigação extracontratual decorrente da responsabilidade fundada em ato lícito, ilícito ou no risco, na aceção do capítulo II do Regulamento Roma II.

40

O artigo 6.o, n.o 1, deste regulamento, que figura no seu capítulo II, consagra, como regra especial relativa às obrigações extracontratuais resultantes de um ato de concorrência desleal, a aplicação da lei do país em que as relações de concorrência ou os interesses coletivos dos consumidores sejam afetados ou sejam suscetíveis de ser afetados.

41

A este respeito, resulta do considerando 21 do Regulamento Roma II que o artigo 6.o, n.o 1, deste regulamento concretiza, no domínio particular da concorrência desleal, o princípio da lex loci damni, consagrado no artigo 4.o, n.o 1, do referido regulamento.

42

Como salientou o advogado‑geral no n.o 73 das suas conclusões, a concorrência desleal na aceção do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento Roma II engloba a utilização de cláusulas abusivas inseridas nas condições gerais do contrato de venda quando seja suscetível de afetar os interesses coletivos dos consumidores enquanto classe e, portanto, influenciar as condições de concorrência no mercado.

43

No caso da ação inibitória prevista na Diretiva 2009/22, o país em que os interesses coletivos dos consumidores são afetados na aceção do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento Roma II é aquele onde residem os consumidores a quem a empresa dirige as suas atividades e cujos interesses são defendidos pela associação de proteção dos consumidores em causa através dessa ação.

44

Importa precisar que o artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento Roma II, nos termos do qual é aplicável a lei de outro país se resultar do conjunto das circunstâncias que a responsabilidade fundada em ato lícito, ilícito ou no risco tem uma conexão manifestamente mais estreita com um país diferente do indicado no artigo 4.o, n.o 1, deste regulamento, não pode conduzir a um resultado diferente.

45

Com efeito, como salientou o advogado‑geral no n.o 77 das suas conclusões, a regra alternativa prevista no artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento Roma II não é adaptada à matéria da concorrência desleal, uma vez que o artigo 6.o, n.o 1, deste regulamento visa proteger interesses coletivos — que ultrapassam o âmbito das relações entre as partes no litígio — ao prever uma regra especificamente adaptada para esse efeito. Este objetivo seria prejudicado se fosse permitido pôr em causa esta regra com base nos vínculos de conexão pessoais entre as partes.

46

Em todo o caso, o facto de a Amazon EU prever nas suas condições gerais que a lei do país onde tem a sede se aplica aos contratos que celebrou não pode constituir legitimamente essa conexão manifestamente mais estreita.

47

De outro modo, um profissional como a Amazon EU poderia de facto, através dessa cláusula, escolher a lei à qual deve ser submetida uma obrigação extracontratual e subtrair‑se assim às condições impostas, a este respeito, pelo artigo 14.o, n.o 1, primeiro parágrafo, alínea a), do Regulamento Roma II.

48

Por conseguinte, há que considerar que a lei aplicável a uma ação inibitória na aceção da Diretiva 2009/22 deve ser determinada, sem prejuízo do artigo 1.o, n.o 3, do Regulamento Roma II, em conformidade com o disposto no artigo 6.o, n.o 1, deste regulamento quando for alegada uma violação de uma legislação destinada a proteger os interesses dos consumidores relativamente à utilização de cláusulas abusivas nas condições gerais de venda.

49

Em contrapartida, a lei aplicável à análise do caráter abusivo das cláusulas constantes em contratos celebrados por consumidores e que são objeto de uma ação inibitória deve ser determinada autonomamente, em função da natureza dessas cláusulas. Assim, no caso de a ação inibitória se destinar a impedir que tais cláusulas sejam inseridas em contratos celebrados por consumidores para neles criarem obrigações contratuais, a lei aplicável à apreciação das referidas cláusulas deve ser determinada em conformidade com o Regulamento Roma I.

50

No caso em apreço, as cláusulas pretensamente abusivas que são objeto da ação inibitória em causa no processo principal têm, relativamente aos consumidores a quem se dirigem, a natureza de obrigações contratuais na aceção do artigo 1.o, n.o 1, do Regulamento Roma I.

51

Esta conclusão não é infirmada pelo caráter coletivo da ação que põe em causa a validade das referidas cláusulas. Com efeito, a circunstância de esta ação não ter por objeto contratos individuais efetivamente celebrados é inerente à própria natureza de tal ação coletiva e preventiva, no âmbito da qual é feito uma fiscalização abstrata.

52

Importa assim distinguir, para efeitos de determinação do direito aplicável, entre, por um lado, a apreciação das cláusulas em causa e, por outro, a ação inibitória da utilização dessas cláusulas, intentada por uma associação como a VKI.

53

Esta distinção impõe‑se para garantir uma aplicação uniforme dos Regulamentos Roma I e Roma II. Acresce que a conexão autónoma das cláusulas em questão garante que o direito aplicável não varia em função do tipo de ação escolhido.

54

Se, no âmbito de um processo intentado na sequência da instauração de uma ação coletiva, as cláusulas contratuais em causa devessem ser examinadas à luz do direito designado como aplicável nos termos do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento Roma II, haveria o risco de os critérios de análise serem diferentes dos utilizados no âmbito de um processo individual instaurado por um consumidor.

55

Com efeito, no que se refere ao exame das cláusulas no âmbito de um processo individual instaurado por um consumidor, a lei designada como aplicável, enquanto lei do contrato, pode ser diferente da lei designada como aplicável, enquanto lei do delito, à ação inibitória. A este respeito, importa observar que o nível de proteção dos consumidores varia ainda de um Estado‑Membro para outro, em conformidade com o disposto no artigo 8.o da Diretiva 93/13, pelo que a apreciação de uma cláusula pode variar, mantendo‑se tudo o resto inalterado, em função do direito aplicável.

56

Tal conexão diferente de uma cláusula, relativamente à lei aplicável, em função do tipo de ação proposta teria por efeito neutralizar, nomeadamente, a concordância da apreciação entre ações coletivas e ações individuais que o Tribunal de Justiça estabeleceu ao obrigar os órgãos jurisdicionais nacionais a retirar oficiosamente, também no futuro, todas as consequências previstas pelo direito nacional do reconhecimento do caráter abusivo de uma cláusula que faz parte das condições gerais dos contratos celebrados por consumidores no âmbito de uma ação inibitória, para que essa cláusula não vincule os consumidores que tenham celebrado um contrato que contenha as mesmas condições gerais (v. acórdão de 26 de 2012, Invitel, C‑472/10, EU:C:2012:242, n.o 43).

57

A incoerência que resultaria de uma conexão diferente de uma cláusula em função do tipo de ação proposta violaria o objetivo prosseguido pelas Diretivas 2009/22 e 93/13 que é fazer cessar eficazmente a utilização das cláusulas abusivas.

58

Resulta do que precede que a lei aplicável a uma ação inibitória, na aceção da Diretiva 2009/22, deve ser determinada em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento Roma II quando seja alegada uma violação de uma legislação destinada a proteger os interesses dos consumidores relativamente à utilização de cláusulas abusivas nas condições gerais de venda, ao passo que a lei aplicável à apreciação de uma determinada cláusula contratual deve ser sempre determinada em aplicação do Regulamento Roma I, quer no âmbito de uma ação individual quer no de uma ação coletiva.

59

Todavia, importa precisar que, quando da apreciação do caráter abusivo de uma determinada cláusula contratual no âmbito de uma ação inibitória, resulta do artigo 6.o, n.o 2, do Regulamento Roma I que a escolha da lei aplicável não prejudica a aplicação das disposições imperativas previstas pela lei do país onde residem os consumidores cujos interesses são defendidos através desta ação. Essas disposições podem compreender as que transpõem a Diretiva 93/13 desde que assegurem, em conformidade com o artigo 8.o desta última, um nível de proteção mais elevado ao consumidor.

60

Assim, há que responder às três primeiras questões que os Regulamentos Roma I e Roma II devem ser interpretados no sentido de que, sem prejuízo do disposto no artigo 1.o, n.o 3, de cada um destes regulamentos, a lei aplicável a uma ação inibitória na aceção da Diretiva 2009/22, destinada a fazer cessar a utilização de cláusulas contratuais pretensamente ilícitas por uma empresa estabelecida num Estado‑Membro que celebra contratos, no âmbito do comércio eletrónico, com consumidores que residem noutros Estados‑Membros, nomeadamente no Estado do foro, deve ser determinada em conformidade com o disposto no artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento Roma II, ao passo que a lei aplicável à apreciação de uma dada cláusula contratual deve ser sempre determinada em aplicação do Regulamento Roma I, quer essa apreciação seja efetuada no âmbito de uma ação individual ou de uma ação coletiva.

Quanto à quarta questão, alínea a)

61

Com a sua quarta questão, alínea a), o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se uma cláusula constante das condições gerais de venda de um contrato celebrado no âmbito do comércio eletrónico entre um consumidor e uma empresa, nos termos da qual esse contrato é regido pela lei do Estado da sede dessa empresa, é abusiva na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 93/13.

62

Resulta desta última disposição que uma cláusula contratual que não tenha sido objeto de negociação individual é considerada abusiva quando, a despeito da exigência de boa‑fé, der origem a um desequilíbrio significativo entre os direitos e obrigações das partes em detrimento do consumidor.

63

O artigo 3.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 precisa que se considera que uma cláusula não foi objeto de negociação individual sempre que a mesma tenha sido previamente redigida pelo profissional e, consequentemente, o consumidor não tenha podido influir no seu conteúdo, em especial no âmbito de um contrato de adesão. Como salientou o advogado‑geral no n.o 84 das suas conclusões, esta hipótese engloba condições gerais de venda como as em causa no processo principal.

64

Em conformidade com o artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, o caráter abusivo de uma cláusula só pode ser declarado após um exame caso a caso tendo em conta todas as circunstâncias pertinentes, incluindo a natureza dos bens e dos serviços que são objeto do contrato.

65

É ao tribunal nacional que compete determinar se, tendo em conta as circunstâncias concretas do caso em apreço, uma cláusula respeita as exigências de boa‑fé, de equilíbrio e de transparência. Todavia, o Tribunal de Justiça é competente para inferir das disposições da Diretiva 93/13 os critérios que o juiz nacional pode ou deve aplicar nessa apreciação (v., neste sentido, acórdão de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai, C‑26/13, EU:C:2014:282, n.os 40 e 45 e jurisprudência referida).

66

Tratando‑se de uma cláusula como a cláusula 12.a das condições gerais em causa no processo principal, relativa ao direito aplicável, importa salientar, antes de mais, que a legislação da União autoriza, em princípio, as cláusulas de escolha da lei. Com efeito, o artigo 6.o, n.o 2, do Regulamento Roma I consagra a faculdade de as partes acordarem sobre o direito aplicável aos contratos celebrados por consumidores, desde que esteja assegurado o respeito pela proteção de que o consumidor beneficia por força das disposições da lei do seu foro não derrogáveis por acordo.

67

Nestas condições, como também salientou o advogado‑geral no n.o 94 das suas conclusões, uma cláusula previamente redigida de escolha da lei aplicável que designa a lei do Estado‑Membro da sede do profissional só é abusiva na medida em que apresente determinadas especificidades, próprias da sua redação ou do seu contexto, que provoquem um desequilíbrio significativo entre os direitos e as obrigações das partes.

68

Em especial, o caráter abusivo dessa cláusula pode resultar de uma formulação que não satisfaça a exigência de uma redação clara e compreensível enunciada no artigo 5.o da Diretiva 93/13. Esta exigência deve, tendo em conta a situação de inferioridade em que se encontra o consumidor face ao profissional no que respeita, designadamente, ao nível de informação, ser objeto de uma interpretação extensiva (v., neste sentido, acórdão de 23 de abril de 2015, Van Hove, C‑96/14, EU:C:2015:262, n.o 40 e jurisprudência referida).

69

Acresce que, quando os efeitos de uma cláusula são determinados por disposições legislativas imperativas, é essencial que o profissional informe o consumidor dessas disposições (v., neste sentido, acórdão de 26 de abril de 2012, Invitel, C‑472/10, EU:C:2012:242, n.o 29). É o caso do artigo 6.o, n.o 2, do Regulamento Roma I, que dispõe que a escolha da lei aplicável não pode ter como consequência privar o consumidor da proteção que lhe proporcionam as disposições não derrogáveis por acordo da lei que, na falta de escolha, seria aplicável.

70

Tendo em consideração o caráter imperativo da exigência que figura no artigo 6.o, n.o 2, do Regulamento Roma I, um juiz confrontado com uma cláusula de escolha da lei aplicável deverá aplicar, quando esteja em causa um consumidor que tenha a residência principal na Áustria, as disposições legais austríacas que, segundo o direito austríaco, não são derrogáveis por acordo. Se for caso disso, incumbirá ao órgão jurisdicional de reenvio identificar essas disposições.

71

Há, assim, que responder à quarta questão, alínea a), que o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 deve ser interpretado no sentido de que uma cláusula constante das condições gerais de venda de um profissional, que não foi objeto de negociação individual, nos termos da qual o contrato celebrado com um consumidor no âmbito do comércio eletrónico é regido pela lei do Estado‑Membro da sede desse profissional é abusiva na medida em que induza esse consumidor em erro, dando‑lhe a impressão de que só a lei desse Estado‑Membro é aplicável ao contrato, sem o informar de que beneficia igualmente, nos termos do artigo 6.o, n.o 2, do Regulamento Roma I, da proteção que lhe proporcionam as disposições imperativas do direito que seria aplicável na falta dessa cláusula, o que cabe ao órgão jurisdicional nacional verificar à luz de todas as circunstâncias pertinentes.

Quanto à quarta questão, alínea b)

72

Com a sua quarta questão, alínea b), o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 95/46 deve ser interpretado no sentido de que o tratamento de dados pessoais efetuado por uma empresa de comércio eletrónico é regido pelo direito do Estado‑Membro a que se destinam as atividades dessa empresa.

73

Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 95/46, cada Estado‑Membro aplicará as suas disposições nacionais adotadas por força desta diretiva ao tratamento de dados pessoais quando o tratamento for efetuado no contexto das atividades de um estabelecimento do responsável pelo tratamento situado no território desse Estado‑Membro.

74

Daqui resulta que um tratamento de dados efetuado no contexto das atividades de um estabelecimento é regido pelo direito do Estado‑Membro em cujo território se situa esse estabelecimento.

75

Em primeiro lugar, no que se refere ao conceito de «estabelecimento» na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 95/46, o Tribunal de Justiça precisou que abrange qualquer atividade real e efetiva, ainda que mínima, exercida através de uma instalação estável (acórdão de 1 de outubro de 2015, Weltimmo, C‑230/14, EU:C:2015:639, n.o 31).

76

A este respeito, como salientou o advogado‑geral no n.o 119 das suas conclusões, embora a circunstância de a empresa responsável pelo tratamento de dados não ter filial nem sucursal num Estado‑Membro não exclua que possa ter aí um estabelecimento na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 95/46, tal estabelecimento não pode existir pelo simples facto de o sítio Internet da empresa em questão ser acessível nesse Estado‑Membro.

77

Importa antes avaliar, como o Tribunal de Justiça salientou, tanto o grau de estabilidade da instalação como a realidade do exercício das atividades no Estado‑Membro em questão (v., neste sentido, acórdão de 1 de outubro de 2015, Weltimmo, C‑230/14, EU:C:2015:639, n.o 29).

78

Em segundo lugar, quanto à questão de saber se o tratamento de dados pessoais em causa é efetuado «no contexto das atividades» desse estabelecimento, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 95/46, o Tribunal de Justiça já recordou que esta disposição exige que o tratamento de dados pessoais em questão seja efetuado não «pelo» próprio estabelecimento em causa, mas apenas «no contexto das atividades» deste (acórdão de 1 de outubro de 2015, Weltimmo, C‑230/14, EU:C:2015:639, n.o 35).

79

Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar, à luz desta jurisprudência e tendo em consideração todas as circunstâncias pertinentes do processo principal, se a Amazon EU procede ao tratamento dos dados em questão no contexto das atividades de um estabelecimento situado noutro Estado‑Membro diferente do Luxemburgo.

80

Conforme referiu o advogado‑geral no n.o 128 das suas conclusões, se o órgão jurisdicional de reenvio concluir que o estabelecimento em que a Amazon EU procede ao tratamento desses dados se situa na Alemanha, compete ao direito alemão reger esse tratamento.

81

À luz do que precede, há que responder à quarta questão, alínea b), que o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 95/46 deve ser interpretado no sentido de que o tratamento de dados pessoais efetuado por uma empresa de comércio eletrónico é regido pelo direito do Estado‑Membro a que se destinam as atividades dessa empresa, se se constatar que essa empresa procede ao tratamento dos dados em questão no contexto das atividades de um estabelecimento situado nesse Estado‑Membro. Cabe ao órgão jurisdicional nacional apreciar se é esse o caso.

Quanto às despesas

82

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

 

1)

O Regulamento (CE) n.o 593/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de junho de 2008, sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (Roma I), e o Regulamento (CE) n.o 864/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de julho de 2007, relativo à lei aplicável às obrigações extracontratuais («Roma II»), devem ser interpretados no sentido de que, sem prejuízo do disposto no artigo 1.o, n.o 3, de cada um destes regulamentos, a lei aplicável a uma ação inibitória, na aceção da Diretiva 2009/22/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, relativa às ações inibitórias em matéria de proteção dos interesses dos consumidores, destinada a fazer cessar a utilização de cláusulas contratuais pretensamente ilícitas por uma empresa estabelecida num Estado‑Membro que celebra contratos, no âmbito do comércio eletrónico, com consumidores que residem noutros Estados‑Membros, nomeadamente no Estado do foro, deve ser determinada em conformidade com o disposto no artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 864/2007, ao passo que a lei aplicável à apreciação de uma dada cláusula contratual deve ser sempre determinada em aplicação do Regulamento n.o 593/2008, quer esse apreciação seja efetuada no âmbito de uma ação individual ou de uma ação coletiva.

 

2)

O artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 93/13/CEE do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores, deve ser interpretado no sentido de que uma cláusula constante das condições gerais de venda de um profissional, que não foi objeto de negociação individual, nos termos da qual o contrato celebrado com um consumidor no âmbito do comércio eletrónico é regido pela lei do Estado‑Membro da sede desse profissional é abusiva na medida em que induza esse consumidor em erro, dando‑lhe a impressão de que só a lei desse Estado‑Membro é aplicável ao contrato, sem o informar de que beneficia igualmente, nos termos do artigo 6.o, n.o 2, do Regulamento n.o 593/2008, da proteção que lhe proporcionam as disposições imperativas do direito que seria aplicável na falta dessa cláusula, o que cabe ao órgão jurisdicional nacional verificar à luz de todas as circunstâncias pertinentes.

 

3)

O artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 95/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de outubro de 1995, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados, deve ser interpretado no sentido de que o tratamento de dados pessoais efetuado por uma empresa de comércio eletrónico é regido pelo direito do Estado‑Membro a que se destinam as atividades dessa empresa, se se constatar que essa empresa procede ao tratamento dos dados em questão no contexto das atividades de um estabelecimento situado nesse Estado‑Membro. Cabe ao órgão jurisdicional nacional apreciar se é esse o caso.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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