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Document 61995CJ0185

Acórdão do Tribunal de 17 de Dezembro de 1998.
Baustahlgewebe GmbH contra Comissão das Comunidades Europeias.
Recurso - Admissibilidade - Duração do processo - Medidas de instrução - Acesso ao processo - Concorrência - Acordos - Coimas.
Processo C-185/95 P.

Colectânea de Jurisprudência 1998 I-08417

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1998:608

61995J0185

Acórdão do Tribunal de 17 de Dezembro de 1998. - Baustahlgewebe GmbH contra Comissão das Comunidades Europeias. - Recurso - Admissibilidade - Duração do processo - Medidas de instrução - Acesso ao processo - Concorrência - Acordos - Coimas. - Processo C-185/95 P.

Colectânea da Jurisprudência 1998 página I-08417


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1 Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Fundamentos - Irregularidade processual - Violação do princípio do prazo razoável do processo

(Tratado CE, artigo 168-A; Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, artigo 51._, primeiro parágrafo)

2 Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Fundamentos - Controlo pelo Tribunal de Justiça da apreciação dos elementos de prova - Exclusão, salvo em caso de desnaturação

3 Processo - Duração do processo no Tribunal de Primeira Instância - Prazo razoável - Critérios de apreciação

4 Processo - Duração do processo no Tribunal de Primeira Instância - Prazo razoável - Litígio a respeito da existência de uma infracção às regras de concorrência - Desrespeito do prazo razoável - Consequências

5 Processo - Prazo determinado entre o encerramento da fase oral do processo e o acórdão - Inexistência

(Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigo 55._, n._ 1)

6 Processo - Prazo para produção de provas - Artigo 48._, n._ 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância - Âmbito de aplicação

(Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigos 48._, n._ 1, e 66._, n._ 2)

7 Processo - Litígio a respeito da existência de uma infracção às regras de concorrência - Direito de acesso ao processo da Comissão - Medidas de organização do processo - Pedido de apresentação de documentos - Obrigações do requerente

(Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigo 64._, n.os 3, alínea d) e 4)

8 Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Fundamentos - Mera repetição dos fundamentos e argumentos apresentados no Tribunal de Primeira Instância - Inadmissibilidade

[Tratado CE, artigo 168-A; Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, artigo 51._; Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, artigo 112._, n._ 1, alínea c)]

9 Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Competência do Tribunal de Justiça - Questionabilidade, por razões de equidade, da apreciação feita pelo Tribunal de Primeira Instância quanto ao montante das coimas aplicáveis às empresas - Exclusão

10 Concorrência - Coimas - Montante - Determinação - Critérios - Volume de negócios tido em consideração - Volume de negócios global da empresa em questão - Volume de negócios realizado com as mercadorias objecto da infracção

(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._, n._ 2)

Sumário


1 Resulta dos artigos 168._-A do Tratado e 51._, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça que, no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância, o Tribunal de Justiça tem competência para fiscalizar se ali foram cometidas irregularidades processuais que violem os interesses da recorrente e deve assegurar-se de que foram respeitados os princípios gerais de direito comunitário.

Entre estes princípios encontra-se o de que qualquer pessoa tem direito a um julgamento equitativo, consagrado no artigo 6._, n._ 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e designadamente o direito ao julgamento num prazo razoável.

2 No âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância, o Tribunal de Justiça não tem competência para apreciar a matéria de facto nem, em princípio, para examinar as provas que o Tribunal de Primeira Instância considerou determinantes no apuramento de tais factos. Com efeito, tendo as provas sido obtidas regularmente, e os princípios gerais de direito e as regras processuais em matéria de prova sido respeitados, compete exclusivamente ao Tribunal de Primeira Instância a apreciação do valor a atribuir aos elementos que lhe foram submetidos. Esta apreciação não constitui, por isso, excepto em caso de desnaturação desses elementos, uma questão de direito sujeita, como tal, ao controlo do Tribunal de Justiça.

3 A estrutura do sistema judicial comunitário justifica, sob certos aspectos, que o Tribunal de Primeira Instância, a quem cabe apurar a matéria de facto e proceder à análise material do litígio, possa dispor de um período de tempo suficiente para a instrução dos processos que necessitam de uma análise aprofundada de matéria de facto complexa. Contudo, esta missão não dispensa o órgão jurisdicional comunitário, instituído especialmente para este efeito, de respeitar o prazo razoável na tramitação dos processos que lhe são submetidos.

O carácter razoável do prazo para tramitação do processo no Tribunal de Primeira Instância deve ser apreciado em função das circunstâncias próprias de cada processo e, designadamente, da importância do litígio para o interessado, da complexidade do processo, bem como do comportamento do requerente e das autoridades competentes.

4 Um processo no Tribunal de Primeira Instância relativo à existência de uma infracção às regras de concorrência, que teve a duração de cerca de cinco anos e seis meses, ultrapassa, mesmo tendo em conta a relativa complexidade do processo, as exigências do respeito do prazo razoável se se provar que:

- o processo apresentava um interesse considerável não apenas para a recorrente, mesmo que a sua sobrevivência económica não fosse directamente posta em causa pelo litígio, e para os seus concorrentes, mas também para os terceiros, em função do elevado número de entidades interessadas e dos interesses financeiros em jogo;

- a recorrente não contribuiu de modo significativo para prolongar a duração do processo;

- essa duração não se justificava pelas dificuldades inerentes à tramitação nos órgãos jurisdicionais comunitários, resultantes, designadamente, do regime linguístico do processo, nem por circunstâncias excepcionais, designadamente a ausência de qualquer suspensão da instância, nos termos dos artigos 77._ e 78._ do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

Esta irregularidade processual justifica, para uma reparação imediata e efectiva da mesma, por um lado, a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância na parte em que fixa o montante da coima aplicada pela infracção declarada e, por outro, a fixação do referido montante pelo Tribunal de Justiça num nível que tenha em conta a exigência de atribuir ao recorrente uma reparação equitativa.

Em contrapartida, na falta de qualquer indício de que a duração do processo tenha tido reflexos sobre a solução dada ao litígio, a referida irregularidade processual não pode levar à anulação do acórdão impugnado na totalidade.

5 No que respeita à alegada violação do princípio da imediação do processo, nem o artigo 55._, n._ 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância nem qualquer outra disposição do mesmo regulamento ou do Estatuto do Tribunal de Justiça prevêem que os acórdãos deste tenham de ser proferidos num prazo determinado após a fase oral do processo.

6 Nos termos do artigo 48._, n._ 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, as partes podem ainda, em apoio da sua argumentação, oferecer provas na réplica na tréplica, mas devem justificar o atraso no oferecimento das provas.

Não são abrangidas pela norma de preclusão constante da disposição acima referida a contraprova e a ampliação das provas na sequência da apresentação de uma prova contrária pela outra parte na contestação. Efectivamente, esta disposição diz respeito ao oferecimento de novas provas e deve ser interpretada à luz do artigo 66._, n._ 2, que prevê expressamente que a contraprova e a ampliação das provas dependem da decisão do Tribunal.

7 Os princípios gerais de direito comunitário que regem o direito de acesso ao processo da Comissão nos processos de concorrência não se aplicam, enquanto tais, ao processo judicial, uma vez que este se rege pelo Estatuto do Tribunal de Justiça e pelo Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

Em especial, nos termos do artigo 64._, n.os 3, alínea d), e 4._, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, as medidas de organização do processo podem ser propostas pelas partes em qualquer fase do processo e podem consistir no pedido de apresentação de documentos ou de quaisquer outros elementos relativos ao processo.

Apesar disso, para permitir ao Tribunal apreciar se é útil ao bom andamento do processo que seja ordenada a apresentação de determinados documentos, a parte que formula o pedido deve identificar os documentos solicitados e fornecer ao Tribunal pelo menos um mínimo de elementos que justifiquem a utilidade dos referidos documentos para a instância.

8 Resulta dos artigos 168._-A do Tratado, 51._ do Estatuto do Tribunal de Justiça e 112._, n._ 1, alínea c), do Regulamento de Processo que um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância deve indicar de modo preciso os elementos contestados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos em que se apoia especificamente esse pedido. Não respeita esta exigência um recurso que se limite a repetir ou a reproduzir textualmente os fundamentos e argumentos já alegados no Tribunal de Primeira Instância, incluindo os que se baseavam em factos expressamente afastados por aquele órgão jurisdicional. Com efeito, tal recurso constitui, na realidade, um pedido de simples reanálise da petição apresentada no Tribunal de Primeira Instância, o que escapa à competência do Tribunal de Justiça.

9 Não compete ao Tribunal de Justiça, quando se pronuncia sobre questões de direito no âmbito de um recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância, substituir, por motivos de equidade, a sua própria apreciação à apreciação efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância, que se pronunciou, no exercício da sua plena jurisdição, sobre o montante das coimas aplicadas a empresas devido à violação, por estas, do direito comunitário.

10 Dos elementos de apreciação da gravidade de uma infracção às regras de concorrência do Tratado, podem constar o volume e os valores das mercadorias que são objecto da infracção, a dimensão e o poder económico da empresa e, consequentemente, a influência que a mesma pôde exercer no mercado.

Daqui resulta que, para determinação do montante da coima, é legítimo ter em conta tanto o volume de negócios global da empresa, que constitui uma indicação, mesmo que aproximada e imperfeita, da sua dimensão e poder económico, como a parte do referido volume de negócios que provém das mercadorias que são objecto da infracção e que pode, assim, dar uma indicação quanto à dimensão da mesma. Ora, embora as quotas de mercado de uma empresa não possam ser determinantes para se concluir que essa empresa pertence a uma entidade económica poderosa, são, em contrapartida, relevantes para determinar a influência que a mesma pôde exercer no mercado.

Partes


No processo C-185/95 P,

Baustahlgewebe GmbH, sociedade de direito alemão, com sede em Gelsenkirchen (Alemanha), representada por Jochim Sedemund e Frank Montag, advogados em Colónia, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado Aloyse May, 31, Grand-rue,

recorrente,

que tem por objecto um recurso em que é pedida a anulação do acórdão proferido pelo Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (Primeira Secção) em 6 de Abril de 1995, Baustahlgewebe/Comissão (T-145/89, Colect., p. II-987),

sendo recorrida:

Comissão das Comunidades Europeias, representada inicialmente por Bernd Langeheine, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, e seguidamente por Paul Nemitz, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, assistido por Alexander Böhlke, advogado no foro de Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do mesmo serviço, Centre Wagner, Kirchberg,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, J.-P. Puissochet e G. Hirsch, presidentes de secção, G. F. Mancini, J. C. Moitinho de Almeida, D. A. O. Edward, H. Ragnemalm (relator), L. Sevón, M. Wathelet, R. Schintgen e K. M. Ioannou, juízes,

advogado-geral: P. Léger,

secretário: H. A. Rühl, administrador principal,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 4 de Novembro de 1997,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 3 de Fevereiro de 1998,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 14 de Junho de 1995, a Baustahlgewebe GmbH interpôs, nos termos do artigo 49._ do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, recurso do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Baustahlgewebe/Comissão (T-145/89, Colect., p. II-987, a seguir «acórdão impugnado»), pelo qual o Tribunal de Primeira Instância anulou parcialmente o artigo 1._ da Decisão 89/515/CEE da Comissão, de 2 de Agosto de 1989, relativa a um processo de aplicação do artigo 85._ do Tratado CEE (IV/31.553 - Rede electrossoldada para betão) (JO L 260, p. 1, a seguir «decisão»), fixou em 3 milhões de ecus o montante da coima imposta à recorrente pela Comissão, negou provimento ao recurso quanto ao restante, e condenou a recorrente a suportar as suas próprias despesas e um terço das despesas da Comissão.

A matéria de facto na origem do recurso e o acórdão do Tribunal de Primeira Instância

2 Resulta do acórdão impugnado que, a partir de 1980, um certo número de acordos e de práticas se desenvolveram no sector da rede electrossoldada para betão nos mercados alemão, francês e do Benelux. A rede electrossoldada para betão é um produto prefabricado de armadura, utilizado em quase todos os domínios da construção em betão armado, constituído por fios de aço para betão, lisos ou com nervuras, que são montados através da soldadura de cada ponto de cruzamento para formar uma rede.

3 Existem diversos tipos de rede electrossoldada para betão, designadamente os painéis normalizados, os painéis por catálogo tipo «Lettermatten» ou seminormalizados, os painéis por catálogo tipo «Listenmatten» e painéis por projecto.

4 Em 31 de Maio de 1983, o Bundeskartellamt autorizou, relativamente ao mercado alemão, a constituição de um cartel de crise estrutural dos produtores alemães de rede electrossoldada para betão, que, após ter sido prorrogado uma vez, expirou em 1988. O cartel tinha por objectivo uma redução das capacidades e previa também quotas de fornecimento e regulamentações de preços que, no entanto, só foram aprovadas para os dois primeiros anos da sua aplicação. Os serviços da Comissão foram informados em 1983 pelo Bundeskartellamt da constituição deste cartel de crise estrutural.

5 Em 6 e 7 de Novembro de 1985, nos termos do artigo 14._, n._ 3, do Regulamento n._ 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, primeiro regulamento de execução dos artigos 85._ e 86._ do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22), funcionários da Comissão procederam, simultaneamente e sem aviso, a inspecções nos escritórios de sete empresas e de duas associações: a saber, Tréfilunion SA, Sotralentz SA, Tréfilarbed Luxembourg-Saarbrücken SARL, Ferriere Nord SpA (Pittini), Baustahlgewebe GmbH, Thibo Draad- en Bouwstaalprodukten BV (Thibodraad), NV Bekaert, Syndicat national du tréfilage d'acier (STA) e Fachverband Betonstahlmatten eV; em 4 e 5 de Dezembro de 1985, procederam a outras inspecções nos escritórios das empresas ILRO SpA, G. B. Martinelli, NV Usines Gustave Boël (afdeling Trébos), Tréfileries de Fontaine-l'Évêque (TFE), Frère-Bourgeois Commerciale SA (FBC), Van Merksteijn Staalbouw BV e ZND Bouwstaal BV.

6 Os elementos encontrados no âmbito dessas diligências bem como as informações obtidas nos termos do artigo 11._ do Regulamento n._ 17 levaram a Comissão a concluir que, entre 1980 e 1985, os produtores em causa tinham violado o artigo 85._ do Tratado através de uma série de acordos ou de práticas concertadas relativos às quotas de fornecimento e aos preços da rede electrossoldada para betão. A Comissão deu início ao procedimento previsto no artigo 3._, n._ 1, do Regulamento n._ 17 e, em 12 de Março de 1987, foi enviada às empresas em causa uma comunicação das acusações, a que elas responderam. Em 23 e 24 de Novembro de 1987 realizou-se uma audição dos seus representantes.

7 No termo desse procedimento, a Comissão adoptou a decisão, pela qual aplicou a catorze produtores de rede electrossoldada para betão uma coima por violação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado. Resulta do n._ 22 da decisão que, as restrições da concorrência consistiam numa série de acordos e/ou de práticas concertadas tendo por objecto a fixação de preços e/ou de quotas de fornecimento, bem como a repartição dos mercados da rede electrossoldada para betão. Esses acordos diziam respeito, segundo a decisão, a diferentes mercados parciais (os mercados francês, alemão e do Benelux), mas afectavam o comércio entre Estados-Membros, uma vez que neles participavam empresas estabelecidas em vários Estados-Membros.

8 No que respeita à matéria de facto na origem do recurso interposto para o Tribunal de Primeira Instância, resulta do acórdão impugnado que a decisão acusa a recorrente, em especial, de:

No mercado alemão,

- ter participado em acordos relativos às trocas de interpenetração entre a Alemanha e a França com a empresa francesa Tréfilunion. Estes acordos foram celebrados durante um encontro que teve lugar em 7 de Junho de 1985 entre, por um lado, o Sr. Müller, administrador da recorrente, legal representante do cartel de crise estrutural e presidente do Fachverband Betonstahlmatten e, por outro, o Sr. Marie, director da Tréfilunion e presidente da Association française technique pour le développement de l'emploi des treillis soudés (ADETS). No n._ 63 do acórdão impugnado, o Tribunal de Primeira Instância verificou que a decisão (ponto 140) imputa à recorrente uma concertação geral com a Tréfilunion, no sentido de limitar a penetração recíproca dos respectivos produtos na Alemanha e em França (v. n.os 135 a 143 e 176 da decisão e n.os 59 a 68 do acórdão impugnado);

- de ter participado em acordos no mercado alemão que tinham por objectivo, por um lado, regular as exportações dos produtores do Benelux para a Alemanha e, por outro, respeitar os preços em vigor no mercado alemão (v. n.os 147, 178 e 182 da decisão e n.os 83 a 94 do acórdão impugnado);

- com o propósito de limitar ou regular as exportações estrangeiras para a Alemanha, de ter celebrado dois contratos de fornecimento, em 24 de Novembro de 1976 e 22 de Março de 1982, com a Bouwstaal Roermond BV (posteriormente Tréfilarbed Bouwstaal Roermond) e a Arbed SA afdeling Nederland. Nos termos desses contratos, a recorrente assegurava a venda exclusiva na Alemanha, a um preço a fixar segundo critérios determinados, de um certo volume anual de redes electrossoldadas para betão provenientes da fábrica de Roermond. A Bouwstaal Roermond BV e a Arbed SA afdeling Nederland comprometiam-se, durante a vigência desses contratos, a não efectuar, directa ou indirectamente, quaisquer fornecimentos na Alemanha. A decisão salienta que esses acordos de distribuição exclusiva não preenchiam as condições previstas no Regulamento n._ 67/67/CEE da Comissão, de 22 de Março de 1967, relativo à aplicação do n._ 3 do artigo 85._ do Tratado a certas categorias de acordos de exclusividade (JO 1967, 57, p. 849; EE 08 F1 p. 94), pelo menos desde a existência dos acordos sobre as trocas de interpenetração entre a Alemanha e o Benelux. Desde então, estes acordos devem ser considerados parte de um acordo global de repartição dos mercados (v. n.os 148 e 189 da decisão e n.os 95 a 109 do acórdão impugnado);

- de ter participado num acordo com a Tréfilarbed que tinha por objecto a cessação das reexportações de rede electrossoldada para betão da fábrica de St Ingbert para a Alemanha através do Luxemburgo (v. n.os 152 e 180 da decisão e n.os 110 a 122 do acórdão impugnado).

No mercado do Benelux,

- de ter participado em acordos entre os produtores alemães que exportam para o Benelux e os outros produtores que vendem no Benelux sobre o respeito dos preços fixados para esse mercado. Segundo a decisão, estes acordos foram adoptados em reuniões que tiveram lugar em Breda e em Bunnik entre Agosto de 1982 e Novembro de 1985. A decisão acusa também a recorrente de ter participado em acordos entre os produtores alemães, por um lado, e os produtores do Benelux («club de Breda»), por outro, relativos à aplicação de restrições quantitativas às exportações de produtos alemães para a Bélgica e os Países Baixos, bem como à comunicação dos volumes de exportação de certos produtores alemães ao grupo belgo-neerlandês [n.os 78, alínea b), 163, 168 e 171 da decisão e n.os 123 a 138 do acórdão impugnado].

9 A decisão tem a seguinte parte dispositiva:

«Artigo 1._

As empresas Tréfilunion SA, Société Métallurgique de Normandie (SMN), CCG (TECNOR), Société des treillis et panneaux soudés (STPS), Sotralentz SA, Tréfilarbed SA ou Tréfilarbed Luxembourg-Saarbrücken SARL, Tréfileries de Fontaine-l'Évêque, Frères-Bourgeois Commerciale SA (Steelinter SA), NV Usines Gustave Boël, Usines afdeling Trébos Thibo Droad- en Bouwstaalprodukten BV (actualmente Thibo Bouwstaal BV), Van Merksteijn Staalbouw BV, ZND Bouwstaal BV, Baustahlgewebe GmbH, ILRO SpA, Ferriere Nord SpA (Pittini) e G. B. Martinelli fu G. B. Metallurgica SpA violaram o disposto no n._ 1 do artigo 85._ do Tratado CE, dado que, entre 27 de Maio de 1980 e 5 de Novembro de 1985, participaram, num caso ou em vários, num ou vários acordos e/ou práticas concertadas, que consistiram na fixação de preços de venda, na limitação das vendas, na repartição dos mercados, bem como em medidas de aplicação e de controlo desses acordos e práticas concertadas.

Artigo 2._

As empresas designadas no artigo 1._, na medida em que, tal como antigamente, desenvolvam actividades no sector da rede electrossoldada para betão na Comunidade, devem pôr termo imediatamente às infracções verificadas (caso ainda não o tenham efectuado), e devem renunciar no futuro, relativamente às actividades no referido sector, a quaisquer acordos e/ou práticas concertadas que tenham o mesmo objecto ou efeito que os anteriores.

Artigo 3._

São infligidas às seguintes empresas e associações de empresas coimas nos montantes seguintes devido à prática das infracções mencionadas no artigo 1._:

1) Tréfilunion SA (TU) - uma coima de 1 375 000 ecus;

2) Société Métallurgique de Normandie (SMN) - uma coima de 50 000 ecus;

3) Société des treillis et panneaux soudés (STPS) - uma coima de 150 000 ecus;

4) Sotralentz SA - uma coima de 228 000 ecus;

5) Tréfilarbed Luxembourg-Saarbrücken SARL - uma coima de 1 143 000 ecus;

6) Steelinter SA - uma coima de 315 000 ecus;

7) NV Usines Gustave Boël, afdeling Trébos - uma coima de 550 000 ecus;

8) Thibo Bouwstaal BV - uma coima de 420 000 ecus;

9) Van Merksteijn Staalbouw BV - uma coima de 375 000 ecus;

10) ZND Bouwstaal BV - uma coima de 42 000 ecus;

11) Baustahlgewebe GmbH (BStG) - uma coima de 4 500 000 ecus;

12) ILRO SpA - uma coima de 13 000 ecus;

13) Ferriere Nord SpA (Pittini) - uma coima de 320 000 ecus;

14) G. B. Martinelli fu G. B. Metallurgica SpA - uma coima de 20 000 ecus.

...»

10 Foi nestas circunstâncias que a recorrente interpôs, em 20 de Outubro de 1989, um recurso no Tribunal de Justiça visando, a título principal, a anulação da decisão e, subsidiariamente, a redução da coima e a condenação da Comissão nas despesas do processo. Por despachos de 15 de Novembro de 1989, o Tribunal de Justiça remeteu este processo, bem como os dez outros interpostos da mesma decisão, ao Tribunal de Primeira Instância, nos termos do artigo 14._ da Decisão 88/591/CECA, CEE, Euratom do Conselho, de 24 de Outubro de 1988, que institui um Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (JO L 319, p. 1).

11 Estes recursos foram registados no Tribunal de Primeira Instância sob os números T-141/89 a T-145/89 e T-147/89 a T-152/89. Por despacho de 13 de Outubro de 1992, o Tribunal de Primeira Instância, por razões de conexão, ordenou a apensação dos referidos processos para efeitos da fase oral, nos termos do artigo 50._ do Regulamento de Processo. No processo objecto do presente recurso, a fase escrita no Tribunal de Primeira Instância terminou em 5 de Junho de 1990. A Primeira Secção do Tribunal de Primeira Instância, na conferência de 16 de Fevereiro de 1993, com base no relatório preliminar do juiz-relator, decidiu dar início à fase oral do processo e convidar as partes a responderem por escrito, antes da audiência, a determinadas questões. Em 18 de Maio de 1993, o relatório para audiência foi notificado às partes, tendo sido ouvidas as alegações das mesmas e as respectivas respostas às questões do Tribunal de Primeira Instância na audiência que teve lugar de 14 a 18 de Junho de 1993. O Tribunal de Primeira Instância proferiu o acórdão em 6 de Abril de 1995.

12 No acórdão impugnado, o mesmo Tribunal decidiu que, atendendo à falta de participação da recorrente, por um lado, num acordo com a Tréfilunion, tendo por objecto subordinar as respectivas exportações futuras à fixação de quotas, e, por outro, num acordo com a Sotralentz sobre o contingentamento das exportações desta no mercado alemão, e tendo em conta a aplicação de uma circunstância atenuante ao acordo entre a recorrente e a Tréfilarbed tendo por objecto a cessação das reexportações de St Ingbert para a Alemanha, o artigo 1._ da decisão devia ser parcialmente anulado e o montante da coima de 4,5 milhões de ecus imposta à recorrente reduzido e fixado em 3 milhões de ecus. O Tribunal negou provimento ao recurso quanto ao restante e condenou a recorrente a suportar as suas próprias despesas e um terço das despesas da Comissão.

O recurso

13 No presente recurso, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

- anular o acórdão impugnado, na medida em que aplica à recorrente uma coima de 3 milhões de ecus, nega provimento ao seu recurso e a condena ao pagamento das suas próprias despesas e num terço das despesas da Comissão, e julgar extinta a instância;

- subsidiariamente, anular o acórdão impugnado e remeter o processo ao Tribunal de Primeira Instância a fim prosseguir a respectiva tramitação;

- anular os artigos 1._, 2._ e 3._ da decisão, na parte em que se referem à recorrente e que não foram anulados pelo acórdão impugnado;

- subsidiariamente, reduzir a coima para um montante razoável;

- condenar a Comissão nas despesas da primeira instância e do presente recurso.

14 A Comissão pede que o Tribunal de Justiça negue provimento ao recurso e condene a recorrente nas despesas.

15 Em apoio do recurso, a recorrente alega que, com a duração excessiva do processo, o Tribunal de Primeira Instância violou o direito da recorrente a que a sua causa fosse examinada num prazo razoável conforme o previsto no artigo 6._, n._ 1, da Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais de 4 de Novembro de 1950 (a seguir «CEDH») e, ao proferir o acórdão 22 meses após o encerramento da fase oral do processo, violou o princípio geral da imediação. Além disso, o Tribunal aplicou um critério de análise errado na apreciação das provas, ao não verificar se os factos indicados pela Comissão podiam ser explicados de outra forma que não a existência de um acordo, e não analisou as provas oferecidas pela recorrente. Ao proceder assim, o Tribunal de Primeira Instância violou os princípios aplicáveis em matéria de provas. Acresce que o mesmo Tribunal violou os direitos da defesa ao indeferir o pedido formulado pela recorrente de que fosse ordenado à Comissão que permitisse à recorrente consultar, por um lado, todos os documentos do processo administrativo e, por outro, determinados documentos relativos ao cartel de crise estrutural alemão.

16 A recorrente afirma também que, no que respeita à delimitação do mercado em causa, bem como aos alegados acordos

- entre a recorrente e a Tréfilunion relativos às trocas de interpenetração entre a Alemanha e a França,

- com os produtores da Benelux quanto ao mercado alemão e

- sobre quotas e preços no mercado do Benelux,

o Tribunal de Primeira Instância violou o artigo 85._, n._ 1, do Tratado, por falta de fundamentação e/ou por errada qualificação da matéria de facto. No que respeita aos contratos de distribuição exclusiva celebrados entre, por um lado, a recorrente e, por outro, a Bouwstaal Roermond BV e a Arbed SA afdeling Nederland, o Tribunal não teve em conta as condições de aplicação do Regulamento n._ 67/67.

17 Por último, a recorrente acusa o Tribunal de Primeira Instância de violar as disposições do artigo 5._ do Regulamento n._ 17 no que se refere à aplicação das coimas.

18 Convém desde logo recordar que, no que respeita a eventuais irregularidades do processo, nos termos dos artigos 168._-A do Tratado CE e 51._, primeiro parágrafo, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, o recurso é limitado às questões de direito. Nos termos desta disposição, o recurso pode ter por fundamento a incompetência do Tribunal de Primeira Instância, irregularidades processuais perante este Tribunal que prejudiquem os interesses da parte recorrente, bem como a violação do direito comunitário pelo mesmo Tribunal.

19 Assim, o Tribunal de Justiça tem competência para fiscalizar se foram cometidas no Tribunal de Primeira Instância irregularidades processuais que violem os interesses da recorrente e deve assegurar-se de que foram respeitados os princípios gerais de direito comunitário e as regras processuais aplicáveis em matéria de ónus e de produção da prova (v., designadamente, despacho de 17 de Setembro de 1996, San Marco/Comissão, C-19/95 P, Colect., p. I-4435, n._ 40).

20 A este respeito, deve recordar-se que o artigo 6._, n._ 1, da CEDH dispõe que qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela.

21 O princípio geral de direito comunitário nos termos do qual qualquer pessoa tem direito a um julgamento equitativo, que se inspira nos referidos direitos fundamentais (v., designadamente, parecer 2/94, de 28 de Março de 1996, Colect., p. I-1759, n._ 33, e acórdão de 29 de Maio de 1997, Kremzow, C-299/95, Colect., p. I-2629, n._ 14), e nomeadamente o direito ao julgamento num prazo razoável, é aplicável no âmbito de um recurso judicial de uma decisão da Comissão que aplica a uma empresa coimas por violação do direito da concorrência.

22 Compete, por isso, ao Tribunal de Justiça, em sede de recurso, analisar estes fundamentos invocados relativamente ao processo no Tribunal de Primeira Instância.

23 Além disso, tratando-se de uma análise dos factos alegadamente incorrecta, resulta dos artigos 168._-A do Tratado e 51._, primeiro parágrafo, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça que o Tribunal de Primeira Instância é o único competente para, por um lado, apurar a matéria de facto, excepto em casos nos quais a inexactidão material das suas conclusões resulte dos documentos dos autos que lhe foram apresentados, e, por outro, para apreciar esses factos. Quando o Tribunal de Primeira Instância tenha conhecido ou apreciado os factos, o Tribunal de Justiça é competente, por força do artigo 168._-A do Tratado, para exercer a fiscalização da qualificação jurídica desses factos e das consequências jurídicas daí retiradas pelo Tribunal de Primeira Instância (v., designadamente, despacho San Marco/Comissão, já referido, n._ 39).

24 O Tribunal de Justiça não tem, portanto, competência para apreciar a matéria de facto nem, em princípio, para examinar as provas que o Tribunal de Primeira Instância considerou determinantes no apuramento de tais factos. Com efeito, tendo as provas sido obtidas regularmente, e os princípios gerais de direito em matéria de prova sido respeitados, compete exclusivamente ao Tribunal de Primeira Instância a apreciação do valor a atribuir aos elementos que lhe foram submetidos (v., designadamente, despacho San Marco/Comissão já referido, n._ 40). Esta apreciação não constitui, por isso, excepto em caso de desnaturação desses elementos, uma questão de direito sujeita, como tal, ao controlo do Tribunal de Justiça (acórdão de 2 de Março de 1994, Hilti/Comissão, C-53/92 P, Colect., p. I-667, n._ 42).

25 Contudo, a questão de saber se a fundamentação de um acórdão do Tribunal de Primeira Instância é contraditória ou suficiente constitui uma questão de direito que pode, enquanto tal, ser invocada no quadro de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância (v., nomeadamente, acórdãos de 1 de Outubro de 1991, Vidrányi/Comissão, C-283/90 P, Colect., p. I-4339, n._ 29; de 20 de Novembro de 1997, Comissão/V, C-188/96 P, Colect., p. I-6561, n._ 24, e de 7 de Maio de 1998, Somaco/Comissão, C-401/96 P, Colect., p. I-2587, n._ 53).

Quanto aos fundamentos que assentam em irregularidades processuais

Quanto à violação do princípio do prazo razoável do processo

26 A recorrente afirma que o tempo que o Tribunal de Primeira Instância levou para decidir é excessivo, pelo que viola o artigo 6._, n._ 1, da CEDH. A duração do processo de modo nenhum se deveu às circunstâncias do caso concreto, mas, pelo contrário, deve ser imputada ao Tribunal de Primeira Instância. Este atraso constitui uma «Prozeßhindernis» (causa de extinção da instância) que justifica a anulação do acórdão impugnado e da decisão, bem como o encerramento do processo. Subsidiariamente, a recorrente alega que a duração excessiva da fase administrativa do processo e, seguidamente, da judicial constitui, por si só, uma circunstância atenuante e um motivo para redução do montante da coima nos termos do princípio da atenuação da pena reconhecido tanto pelas ordens jurídicas dos Estados-Membros como pela jurisprudência do Tribunal de Primeira Instância.

27 A Comissão contesta o carácter excessivo da duração do processo e considera que, mesmo que a duração do processo no Tribunal de Primeira Instância possa parecer longa, não pode constituir uma causa de extinção da instância.

28 A título liminar, deve esclarecer-se que a duração da tramitação que, no presente processo, é objecto da análise do Tribunal de Justiça, para efeitos de determinar se foi cometida uma irregularidade processual susceptível de afectar os interesses da recorrente, teve como ponto de partida o dia 20 de Outubro de 1989, data da apresentação do pedido de anulação, e terminou em 6 de Abril de 1995, data em que foi proferido o acórdão impugnado. Consequentemente, a duração do processo que é objecto da análise do Tribunal de Justiça é de cerca de cinco anos e seis meses.

29 Deve desde logo declarar-se que esta duração é, à primeira vista, considerável. Contudo, há que apreciar o carácter razoável de tal prazo em função das circunstâncias próprias de cada processo e, designadamente, da importância do litígio para o interessado, da complexidade do processo, bem como do comportamento do requerente e das autoridades competentes (v., por analogia, Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, acórdãos Erkner e Hofauer de 23 de Abril de 1987, série A, n._ 127, § 66; Kemmache de 27 de Novembro de 1991, série A, n._ 218, § 60; Phocas c. France de 23 de Abril de 1996, Recueil des arrêts et décisions 1996-II, p. 546, § 71, e Garyfallou AEBE c. Grécia de 27 de Setembro de 1997, Recueil des arrêts et décisions 1997-V, p. 1821, § 39).

30 No que respeita à importância do litígio para a recorrente, deve salientar-se que a sua sobrevivência económica não foi directamente posta em causa pelo litígio. Não é menos certo que, em caso de litígio sobre a existência de uma infracção às regras de concorrência, a exigência fundamental da segurança jurídica de que devem beneficiar os operadores económicos, bem como o objectivo de garantir que a concorrência não seja falseada no mercado interno, revestem um interesse considerável não apenas para o próprio recorrente e para os seus concorrentes, mas também para os terceiros, em função do elevado número de entidades interessadas e dos interesses financeiros em jogo.

31 Efectivamente, a recorrente arrisca-se a que, nos termos do artigo 15._, n._ 2, do Regulamento n._ 17, lhe seja aplicada uma coima máxima equivalente a 10% do volume de negócios realizado no exercício antecedente. No presente processo, a Comissão aplicou à recorrente, nos termos dos artigos 3._ e 4._ da decisão, uma coima do montante de 4,5 milhões de ecus, a pagar no prazo de três meses a contar da respectiva notificação, acrescida de juros de mora à taxa de 12,50% ao ano a partir do termo do referido prazo.

32 A este respeito, o artigo 192._ do Tratado CE dispõe, designadamente, que as decisões da Comissão que imponham uma obrigação pecuniária a entidades que não sejam Estados constituem título executivo e que a execução é regulada pelas normas de processo civil em vigor no Estado em cujo território se efectuar. Por força das disposições conjugadas dos artigos 185._, 186._ e 192._ do Tratado CE e do artigo 4._ da Decisão 88/591, os recursos interpostos para o Tribunal de Primeira Instância não têm efeito suspensivo; caso o Tribunal de Primeira Instância entenda que as circunstâncias o impõem, pode ordenar a suspensão da execução do acto impugnado, determinar as medidas provisórias necessárias e, se for caso disso, suspender a execução.

33 No presente caso, resulta do processo que não se procedeu a qualquer medida de cobrança da coima na pendência do processo judicial, uma vez que a recorrente prestou garantia bancária, como a Comissão exigiu. Esta circunstância não pode, contudo, privar a recorrente do direito que lhe assiste a um julgamento equitativo num prazo razoável e, designadamente, a que seja apreciado o fundamento das acusações de violação do direito da concorrência que lhe foram imputadas pela Comissão e das coimas que lhe foram aplicadas a este respeito.

34 Tendo presentes todas estas circunstâncias, deve concluir-se que o processo no Tribunal de Primeira Instância assumia uma real importância para a recorrente.

35 Quanto à complexidade do processo, deve recordar-se que, na sua decisão, a Comissão concluiu que catorze produtores de rede electrossoldada de betão tinham violado o artigo 85._ do Tratado através de uma série de acordos ou de práticas concertadas relativos a quotas de fornecimento e preços do referido produto. O recurso da recorrente constitui um de onze recursos, interpostos em três línguas processuais diferentes, que foram formalmente apensos para efeitos da audiência.

36 A este respeito, resulta do processo e do acórdão impugnado que o processo relativo à recorrente necessitava de uma análise aprofundada de documentos relativamente volumosos e de questões de facto e de direito de certa complexidade.

37 No que respeita à conduta da recorrente no Tribunal de Primeira Instância, resulta do processo que o prazo previsto para apresentação da tréplica foi prolongado, a seu pedido, em cerca de um mês.

38 A este respeito, não é de aceitar o argumento da Comissão de que o processo no Tribunal de Primeira Instância foi atrasado pelo facto de o advogado da recorrente não ter inicialmente tido intervenção no processo administrativo que correu na Comissão e de ter apresentado posteriormente, de modo incorrecto, o essencial da sua argumentação relativamente à coima que a Comissão lhe aplicou devido à sua participação no cartel de crise estrutural.

39 Efectivamente, uma empresa visada por uma decisão da Comissão que considera verificadas infracções ao direito da concorrência e lhe aplica coimas deve poder contestar por todos os meios que entenda úteis o fundamento das acusações que lhe são imputadas.

40 Assim, não ficou demonstrado que a recorrente tenha contribuído de modo significativo para prolongar a duração do processo.

41 Quanto ao comportamento das autoridades competentes, há que recordar que a instituição do Tribunal de Primeira Instância junto do Tribunal de Justiça, e a criação de um segundo nível de jurisdição, teve por objectivo, por um lado, melhorar a protecção judicial dos particulares, designadamente no que respeita aos recursos que requerem uma análise aprofundada de matéria de facto complexa, e, por outro, manter a qualidade e a eficácia do controlo judicial na ordem jurídica comunitária, permitindo dessa forma ao Tribunal de Justiça concentrar a sua actividade na sua tarefa essencial, ou seja, a de assegurar o respeito do direito na interpretação e aplicação do direito comunitário.

42 Esta a razão pela qual a estrutura do sistema judicial comunitário justifica, sobre certos aspectos, que o Tribunal de Primeira Instância, a quem cabe apurar a matéria de facto e proceder à análise material do litígio, possa dispor de um período de tempo relativamente mais alargado para a instrução dos processos que necessitam de uma análise aprofundada de matéria de facto complexa. Contudo, esta missão não dispensa o órgão jurisdicional comunitário instituído especialmente para este efeito de respeitar o prazo razoável na tramitação dos processos que lhe são submetidos.

43 Devem ainda ser tidas em conta as dificuldades inerentes à tramitação nos órgãos jurisdicionais comunitários, resultantes, designadamente, do regime linguístico do processo previsto no artigo 35._ do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, e da obrigação, constante do artigo 36._, n._ 2, do referido Regulamento de Processo, de publicar os acórdãos nas línguas referidas no artigo 1._ do Regulamento n._ 1 do Conselho, de 15 de Abril de 1958, que estabelece o regime linguístico da Comunidade Económica Europeia (JO 1958, 17, p. 385; EE 01 F1 p. 8).

44 Contudo, deve concluir-se que não resulta das circunstâncias do presente processo que dificuldades desta natureza possam justificar a duração do processo no Tribunal de Primeira Instância.

45 Efectivamente, deve salientar-se que existem dois períodos significativos na tramitação do processo no Tribunal de Primeira Instância, para efeitos do princípio do prazo razoável. Assim, decorreram cerca de 32 meses entre o final da fase escrita do processo e a decisão de iniciar a fase oral. É certo que, por despacho de 13 de Outubro de 1992, foi ordenada a apensação dos onze processos para efeitos da audiência, mas há que salientar a ausência, durante esse período, de qualquer outra medida de organização do processo ou de instrução. A isto acresce o facto de terem decorrido 22 meses entre o encerramento da fase oral do processo e a prolação do acórdão pelo Tribunal de Primeira Instância.

46 Mesmo tendo em conta as dificuldades inerentes à tramitação processual nos órgãos jurisdicionais comunitários, tais demoras de instrução e de decisão só podem ser justificadas por circunstâncias excepcionais. Na ausência de qualquer suspensão da instância no Tribunal de Primeira Instância, designadamente nos termos dos artigos 77._ e 78._ do seu Regulamento de Processo, há que concluir que, no presente caso, não se verificaram essas circunstâncias.

47 À luz dos elementos que antecedem, deve concluir-se, tendo em conta a relativa complexidade do processo, que a tramitação no Tribunal de Primeira Instância ultrapassou as exigências do respeito do prazo razoável.

48 Por razões de economia processual e para garantir uma reparação imediata e efectiva desta irregularidade processual, deve ser julgado procedente o fundamento assente na duração excessiva do processo para efeitos de anulação do acórdão impugnado, na parte em que fixa o montante da coima aplicada à recorrente em 3 milhões de ecus.

49 Em contrapartida, na falta de qualquer indício de que a duração do processo tenha tido reflexos sobre a solução dada ao litígio, o referido fundamento não pode levar à anulação do acórdão impugnado na totalidade.

Quanto à violação do princípio da imediação

50 A recorrente considera que o Tribunal de Primeira Instância violou o princípio geral de direito comunitário da imediação do processo judicial ao proferir o acórdão 22 meses após o encerramento da fase oral do processo, pelo que a utilidade da mesma desapareceu com o esfumar da sua recordação no espírito dos juízes. No essencial, alega que o princípio da oralidade do processo judicial implica o carácter imediato do processo que, a exemplo do que sucede nos códigos de processo civil e penal da maioria dos Estados-Membros, acarreta a obrigação de o Tribunal de Primeira Instância passar à fase decisória dos processos imediatamente após a audiência e de proferir os acórdãos num prazo próximo da mesma.

51 A Comissão considera que o princípio da imediação do processo, tal como é interpretado pela recorrente, não existe no direito comunitário, pelo que este fundamento deve ser julgado improcedente.

52 A este respeito, deve declarar-se que, por um lado, ao contrário do que a recorrente afirmou na audiência, nem o artigo 55._, n._ 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância nem qualquer outra disposição do mesmo regulamento ou do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça prevêem que os acórdãos deste tenham de ser proferidos num prazo determinado após a fase oral do processo.

53 Por outro lado, deve salientar-se que a recorrente não demonstrou que a duração da fase decisória teve qualquer incidência na solução dada ao litígio submetido ao Tribunal de Primeira Instância, designadamente no que respeita ao desaparecimento das provas.

54 Nestas condições, este fundamento deve ser julgado improcedente.

Quanto à violação dos princípios aplicáveis em matéria de prova

55 A recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância, em primeiro lugar, utilizou um critério de análise incorrecto na apreciação da prova, limitando-se a verificar se a Comissão demonstrou a participação da recorrente nos acordos, sem tomar em consideração as alegações desta, e, em segundo lugar, desrespeitou as regras relativas à preclusão ao indeferir os pedidos de inquirição de testemunhas por extemporâneos. Ao limitar-se a analisar as alegações da Comissão e ao recusar-se a analisar as provas oferecidas pela recorrente, o Tribunal de Primeira Instância violou o dever de instrução e o direito a um julgamento equitativo, bem como os princípios da livre apreciação da prova e do benefício da dúvida.

56 No que respeita ao primeiro ponto, a recorrente critica o Tribunal de Primeira Instância, no essencial, por não ter apreciado se a matéria de facto apresentada pela Comissão podia ser explicada de outra forma que não pela existência de um acordo, embora a recorrente tenha apresentado outra justificação plausível e coerente.

57 A Comissão alega que esta crítica, na realidade, constitui um pedido de reanálise da matéria de facto.

58 A este respeito, na medida em que a referida crítica não se refere à apreciação da matéria de facto efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância, deve recordar-se que, em caso de litígio quanto à existência de uma infracção às regras da concorrência, compete à Comissão apresentar a prova das infracções por ela verificadas e produzir os elementos probatórios adequados à demonstração juridicamente satisfatória da existência dos factos constitutivos da infracção.

59 Contudo, nada permite concluir que o Tribunal de Primeira Instância não tenha tido em consideração os elementos apresentados pela recorrente, ao analisar os apresentados pela Comissão. Resulta, desde logo, dos n._ 64 a 67 do acórdão impugnado, que, no que respeita ao acordo entre a recorrente e a Tréfilunion, o Tribunal de Primeira Instância, perante a análise das notas apresentadas pela Comissão, concluiu que esta demonstrou, de modo juridicamente suficiente, apenas dois dos três pontos de concertação imputados. Além disso, os n.os 90 a 92 do acórdão impugnado, relativos aos acordos sobre quotas e preços com os produtores do Benelux, os n.os 115 a 118, relativos ao acordo entre a recorrente e a Tréfilarbed, e os n.os 131 a 136, relativos aos acordos sobre preços e quotas no mercado do Benelux, mostram que o Tribunal de Primeira Instância, ao ter em conta os argumentos da recorrente, procedeu à análise dos factos apresentados pela Comissão para daí concluir que esta demonstrou, de modo juridicamente suficiente, que a recorrente tinha participado nos acordos em questão.

60 No que respeita ao segundo ponto, a recorrente acusa o Tribunal de ter feito uma errada interpretação do respectivo Regulamento de Processo ao indeferir os seus pedidos de produção de prova por extemporâneos. A recorrente não contesta que estes oferecimentos de prova tiveram lugar pela primeira vez na réplica. Em contrapartida, alega que os elementos de prova apresentados na réplica não eram novos nem extemporâneos na acepção do artigo 48._, n._ 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, uma vez que sugeriu a inquirição das testemunhas e a sua comparência pessoal na réplica para centralizar as provas invocadas pela Comissão na sua contestação.

61 A recorrente afirma, também, que o dever de instrução e os princípios do contraditório e do julgamento equitativo obrigavam o Tribunal de Primeira Instância a deferir os pedidos de inquirição, salvo em casos limitados, cuja existência não ficou demonstrada no presente processo. Considera que o indeferimento dos seus pedidos de inquirição de testemunhas e dos pedidos de comparência pessoal equivalem a uma apreciação antecipada da prova e acrescenta que, mesmo na ausência de pedidos de produção de prova, o princípio do inquisitório exige que o Tribunal de Primeira Instância, designadamente nos processos que podem levar à aplicação de coimas, alargue oficiosamente a instrução a todos os meios de prova ao seu dispor e se esforce por obter a melhor prova possível.

62 A Comissão considera que o Tribunal de Primeira Instância actuou em conformidade com a sua jurisprudência constante ao considerar que os pedidos de produção de prova apresentados pela primeira vez na réplica representavam um atraso que devia, por isso, ser justificado.

63 A título liminar, deve recordar-se que, para prova das suas afirmações, a recorrente, na petição apresentada no Tribunal de Primeira Instância, solicitou que fosse ouvido, na qualidade de testemunha, o seu consultor jurídico, o advogado Pillmann e, na réplica, que ela própria fosse admitida a comparecer na pessoa do seu representante legal, o Sr. Müller, e que, na qualidade de testemunha, fosse ouvido o Sr. Broekman, antigo presidente dos produtores do Benelux.

64 Resulta do processo que, na conferência de 18 e 24 de Março de 1993, o Tribunal de Primeira Instância decidiu colocar questões às partes. Tendo em conta o pedido de inquirição da recorrente e de quatro telex de 15 de Dezembro de 1983, 11 de Janeiro, 4 de Março e 4 de Abril de 1984, a recorrente foi convidada a «indicar quais as razões exactas e de facto que [a levaram] a contradizer o conteúdo aparente dos documentos referidos para além da negação global avançada nos seus articulados».

65 Na conferência de 13 e 17 de Maio de 1993, o Tribunal de Primeira Instância decidiu colher as observações das partes sobre a eventual inquirição dos Srs. Müller e Broekman e sobre a comparência pessoal, na audiência, das recorrentes Boël, Steelinter e Tréfilunion, na pessoa de representantes conhecedores dos contactos que tiveram lugar na época.

66 Por carta de 19 de Maio de 1993, a Comissão opôs-se à inquirição das testemunhas referidas pelo facto de as mesmas serem, de qualquer modo, representantes das empresas em causa na decisão. Em 26 de Maio de 1993, o Tribunal de Primeira Instância decidiu reservar para final a sua decisão quanto a uma eventual inquirição das testemunhas.

67 No n._ 68 do acórdão impugnado, o Tribunal de Primeira Instância declarou que não havia necessidade de ouvir as testemunhas nem de ordenar a comparência da recorrente. Nos n.os 94, 120 e 168 do mesmo acórdão, o Tribunal de Primeira Instância, nos termos do artigo 48._, n._ 1, do seu Regulamento de Processo, indeferiu os pedidos de inquirição de testemunhas e o pedido de comparência da recorrente pelo facto de os referidos pedidos de produção de prova, apresentados na réplica, serem extemporâneos, uma vez que a recorrente não alegou qualquer circunstância que a tivesse impedido de os formular na petição inicial.

68 Tendo em conta as circunstâncias do processo, não pode ser posta em causa a apreciação do Tribunal de Primeira Instância no que respeita à relevância da inquirição do advogado Pillmann e do Sr. Müller a respeito do acordo entre a Baustahlgewebe e a Tréfilunion.

69 No que respeita à recusa, por parte do Tribunal de Primeira Instância, da inquirição dos Srs. Müller e Broekman pelo facto de estes oferecimentos de prova serem extemporâneos, deve recordar-se que o artigo 68._, n._ 1 do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância dispõe que o Tribunal pode, oficiosamente ou a pedido das partes, ouvidas estas, submeter certos factos a prova testemunhal. O pedido de inquirição de testemunhas formulado por uma das partes deve indicar com precisão os factos sobre que devem ser ouvidas e as razões que justificam a sua inquirição. O artigo 44._, n._ 1, alínea e), do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância dispõe que, se for caso disso, a petição deve conter as provas oferecidas.

70 Quando um pedido de inquirição de testemunhas, apresentado na petição inicial, refere com precisão os factos sobre os quais devem ser ouvidas as testemunhas e as razões que justificam a respectiva inquirição, compete ao Tribunal de Primeira Instância apreciar a relevância do pedido tendo em conta o objecto do litígio e a necessidade de proceder à inquirição das testemunhas citadas.

71 Nos termos do artigo 48._, n._ 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, as partes podem ainda, em apoio da sua argumentação, oferecer provas na réplica e na tréplica. Devem, porém, justificar o atraso no oferecimento das provas.

72 Assim, a contraprova e a ampliação da prova oferecidas na sequência da apresentação de uma prova contrária pela outra parte na contestação não são abrangidas pela norma de preclusão do artigo 48._, n._ 1, do Regulamento de Processo. Efectivamente, esta disposição diz respeito ao oferecimento de novas provas e deve ser interpretada à luz do artigo 66._, n._ 2, que prevê expressamente que a contraprova e a ampliação das provas dependem da decisão do Tribunal.

73 Contudo, dado que se trata, no presente processo, do pedido de inquirição da testemunha Sr. Broekman e de comparência da própria recorrente, basta verificar que resulta do processo que os elementos de prova invocados pela Comissão na sua contestação já estavam referidos na decisão e na comunicação das acusações, ou foram anexos à mesma, e tinham sido apresentados pela própria recorrente no anexo 3 à petição apresentada no Tribunal de Primeira Instância. Do mesmo modo, no que respeita às declarações do Sr. Müller quando da audição na Comissão em 24 de Novembro de 1987, à qual o Tribunal de Primeira Instância se refere nos n.os 92 e 135 do acórdão impugnado, é pacífico que as mesmas já constavam na acta da referida reunião, também apresentada pela própria recorrente no anexo 9 da sua petição ao Tribunal de Primeira Instância.

74 Consequentemente, deve concluir-se que o pedido de inquirição do Sr. Broekman e o de comparência da recorrente na pessoa do seu representante legal, o Sr. Müller, não podem ser considerados como oferecimentos de contraprova, e que a recorrente podia oferecer estas provas com a sua petição inicial ao Tribunal de Primeira Instância.

75 Nestas condições, o Tribunal de Primeira Instância considerou correctamente que os pedidos de produção de prova apresentados na réplica eram extemporâneos e indeferiu-os pelo facto de a recorrente não ter justificado o atraso na respectiva apresentação.

76 Por outro lado, não pode ser aceite o argumento da recorrente segundo o qual o Tribunal violou o dever de instrução que lhe incumbe, uma vez que é pacífico que o mesmo adoptou medidas de organização do processo que têm por objecto facilitar a produção das provas e esclarecer a argumentação das partes, nos termos do artigo 64, n._ 2, do seu Regulamento de Processo.

77 Por último, deve salientar-se que o Tribunal de Primeira Instância não é obrigado a notificar oficiosamente as testemunhas, uma vez que o artigo 66._, n._ 1, do Regulamento de Processo esclarece que é o Tribunal de Primeira Instância que determina as medidas de instrução que julgar convenientes mediante despacho em que se especifiquem os factos a provar.

78 Consequentemente, deve ser rejeitado o fundamento assente na inobservância por parte do Tribunal de Primeira Instância dos princípios aplicáveis em matéria de prova.

Quanto à violação do direito de consulta de determinados documentos

79 A recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância violou os direitos da defesa ao indeferir o seu pedido de apresentação do conjunto das peças do processo administrativo, apesar de o direito de acesso ao processo decorrer de um princípio fundamental do direito comunitário cujo respeito se impõe em quaisquer circunstâncias. Assim, a Comissão tem obrigação de facultar o acesso das empresas implicadas num procedimento instaurado nos termos do artigo 85._, n._ 1, do Tratado, a todos os documentos de acusação e de defesa que obteve ao longo do inquérito. Estes princípios aplicam-se igualmente no âmbito do processo no Tribunal de Primeira Instância, quando os documentos eventualmente relevantes para a defesa do recorrente lhe não hajam sido comunicados durante a fase administrativa do processo. Em qualquer hipótese, a recorrente entende que o Tribunal de Primeira Instância não podia indeferir o seu pedido de apresentação de documentos pelo facto de a recorrente não ter apresentado indícios susceptíveis de demonstrar que os referidos documentos eram relevantes para a sua defesa. Efectivamente, a parte e os seus advogados só podem apreciar a importância de um documento para a defesa se conhecerem a respectiva existência e conteúdo.

80 Por outro lado, a recorrente afirma que o Tribunal de Primeira Instância violou os direitos da defesa ao não ordenar a apresentação de documentos relativos ao cartel de crise estrutural alemão.

81 A Comissão salienta que, no que respeita ao pedido de acesso ao conjunto dos documentos do processo, o Tribunal de Primeira Instância entendeu correctamente que a recorrente não tinha apresentado indícios susceptíveis de demonstrar que os referidos documentos eram relevantes para a sua defesa. Quanto aos documentos relativos ao cartel de crise estrutural, uma irregularidade processual deste tipo não é susceptível de recurso, uma vez que não pode prejudicar os interesses da recorrente e constitui um alargamento do objecto do litígio submetido ao Tribunal, inadmissível, por isso, no âmbito do recurso.

82 Desde logo, no que respeita à questão prévia de admissibilidade deduzida pela Comissão, basta verificar que, em primeiro lugar, a questão de saber se a existência do cartel de crise estrutural alemão influenciou a decisão foi debatida no Tribunal de Primeira Instância e, em segundo lugar, que a recorrente afirma no Tribunal de Justiça que o referido cartel de crise influenciou, pelo menos, o montante das coimas aplicadas. Nestas circunstâncias, não se trata, neste ponto, de um alargamento do objecto do litígio no Tribunal de Primeira Instância. O fundamento assente no direito de consulta dos documentos relativos ao cartel de crise é, por isso, admissível.

83 Em segundo lugar, no que respeita ao acesso aos documentos, deve recordar-se que resulta do n._ 23 do acórdão impugnado que a Comissão, na fase administrativa do processo, transmitiu à recorrente os documentos que directa ou indirectamente lhe diziam respeito, com excepção dos confidenciais, recordando, contudo, que a recorrente, para preparação das suas observações, tinha a possibilidade de tomar conhecimento de outros documentos em posse da Comissão, mediante autorização.

84 Resulta do n._ 28 do acórdão impugnado e do processo que o advogado da recorrente, recentemente mandatado, afirmou na Comissão que tinha ainda direito a consultar o processo após a adopção da decisão. A troca de correspondência entre as partes mostra que a Comissão recordou à recorrente que a mesma lhe tinha transmitido, em anexo à comunicação das acusações, os documentos em que esta se baseava. Por telecópia de 11 de Outubro de 1989, a Comissão apresentou uma lista de todas as peças do processo, na parte em que as mesmas se referiam à recorrente, propondo enviar-lhe cópia. Na sequência desta proposta, a recorrente, por telecópia de 16 de Outubro de 1989, solicitou, por um lado, o envio do relatório e do processo relativo à inspecção efectuada em 6 e 7 de Novembro de 1985 nas suas instalações, bem como do relatório relativo à inspecção efectuada, nos mesmos dias, nas instalações do Fachverband Betonstahlmatten, e, por outro, autorização para consultar as actas e outros documentos através dos quais o Bundeskartellamt tinha informado a Comissão da existência, na Alemanha, de um cartel de crise estrutural. A Comissão, contudo, não respondeu a este pedido até à interposição do recurso.

85 Na petição inicial, a recorrente solicitou, consequentemente, ao Tribunal de Primeira Instância que ordenasse à Comissão que lhe facultasse a consulta: a) do conjunto das peças processuais que lhe diziam respeito, b) de todos os documentos, correspondência, actas e notas relativas à informação da Comissão pelo Bundeskartellamt a respeito da existência do cartel de crise estrutural, bem como c) de todos os documentos, peças processuais, actas e notas relativos às negociações trilaterais entre a Comissão, o Bundeskartellamt e os representantes da comunidade alemã do cartel de crise estrutural.

86 Como se refere no n._ 33 do acórdão impugnado, o Tribunal de Primeira Instância entendeu que o pedido da recorrente devia ser considerado um pedido de medidas de organização do processo, na acepção do artigo 64._, n._ 3, alínea d), do Regulamento de Processo.

87 No n._ 34 do acórdão impugnado, o Tribunal indeferiu o pedido de acesso ao processo da Comissão, pelo facto de a recorrente não negar ter recebido, durante o procedimento administrativo promovido pela Comissão, todos os documentos do processo que lhe diziam directa ou indirectamente respeito e nos quais se baseava a comunicação das acusações, e por a recorrente não ter apresentado elementos susceptíveis de provar que outros documentos teriam sido relevantes para a sua defesa. Consequentemente, considerou que a recorrente teve a possibilidade de expor, como melhor entendesse, o seu ponto de vista sobre todos os factos que a Comissão lhe imputou na comunicação das acusações que lhe foi dirigida, bem como sobre os elementos probatórios destinados a fundamentar estas acusações, mencionados pela Comissão na referida comunicação das acusações ou a ela anexos, pelo que foi, assim, garantido o respeito pelos direitos da defesa. O Tribunal de Primeira Instância concluiu daqui que, tanto quando da preparação da petição como durante o processo no Tribunal de Primeira Instância, os advogados da recorrente tiveram a possibilidade de examinar, com perfeito conhecimento de causa, a legalidade da decisão e de garantir plenamente a defesa da recorrente.

88 No n._ 35 do acórdão impugnado, o Tribunal de Primeira Instância indeferiu, igualmente, o pedido de apresentação de documentos relativos ao cartel de crise estrutural alemão pelo facto de a recorrente não ter demonstrado que, na falta dos referidos documentos, não podia defender-se das acusações que lhe foram feitas, e não ter fornecido nenhum elemento susceptível de demonstrar em que medida essas peças podiam ter interesse para a resolução do litígio. O Tribunal acrescentou que, em qualquer caso, se tratava de elementos de prova alheios ao objecto do processo.

89 A este respeito, deve declarar-se que o acesso ao processo nos casos de concorrência tem designadamente por objecto permitir aos destinatários de uma comunicação de acusações tomar conhecimento dos elementos de prova que constam do dossier da Comissão, a fim de que se possam pronunciar de forma útil, com base nesses elementos, sobre as conclusões a que a Comissão chegou na comunicação de acusações (acórdãos de 9 de Novembro de 1983, Michelin/Comissão, 322/81 Recueil, p. 3461, n._ 7; de 13 de Fevereiro de 1979, Hoffmann-La Roche/Comissão, 85/96, Colect., p. 217, n.os 9 e 11, e de 6 de Abril de 1995, BPB Industries e British Gypsum/Comissão, C-310/93 P, Colect., p. I-865, n._ 21).

90 Contudo, ao contrário do que a recorrente afirma, os princípios gerais de direito comunitário que regem o direito de acesso ao processo da Comissão não se aplicam, enquanto tais, ao processo judicial, uma vez que este se rege pelo Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça e pelo Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

91 Efectivamente, nos termos do artigo 21._ do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, o Tribunal pode pedir às partes que exibam todos os documentos e prestem todas as informações que considere pertinentes. O artigo 64._, n._ 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância dispõe que «As medidas de organização do processo têm por objectivo garantir, nas melhores condições, a preparação dos processos para julgamento, a respectiva tramitação e a resolução dos litígios.»

92 Segundo o artigo 64._, n._ 2, alíneas a) e b), do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, as medidas de organização do processo têm designadamente como objectivo assegurar uma boa tramitação da fase escrita ou oral do processo e facilitar a produção da prova, bem como determinar os pontos sobre que as partes devem completar a sua argumentação ou que necessitam de instrução. Nos termos do artigo 64._, n.os 3, alínea b), e 4, as referidas medidas podem ser propostas pelas partes em qualquer fase do processo e podem consistir no pedido de apresentação de documentos ou de quaisquer outros elementos relativos ao processo.

93 Daqui resulta que a recorrente podia solicitar ao Tribunal de Primeira Instância que ordenasse à parte contrária a apresentação de documentos que estavam na sua posse. Apesar disso, para permitir ao Tribunal apreciar se é útil ao bom andamento do processo que seja ordenada a apresentação de determinados documentos, a parte que formula o pedido deve identificar os documentos solicitados e fornecer ao Tribunal pelo menos um mínimo de elementos que justifiquem a utilidade dos referidos documentos para a instância.

94 Deve salientar-se que resulta do acórdão impugnado e do processo do Tribunal de Primeira Instância que, embora a Comissão tenha apresentado ao Tribunal uma lista de todos os elementos do processo que diziam respeito à recorrente, esta não identificou suficientemente, no pedido que apresentou ao Tribunal de Primeira Instância, os documentos do processo cuja apresentação requeria. No que respeita aos documentos relativos ao cartel de crise estrutural alemão, embora a recorrente tenha acusado a Comissão de ter considerado a sua participação no cartel como circunstância agravante, não precisou, contudo, de que modo os documentos solicitados podiam ser de utilidade para ela.

95 O Tribunal de Primeira Instância, nos n.os 34 e 35 do acórdão impugnado, indeferiu, assim, correctamente, o pedido de apresentação de documentos. Este fundamento deve, por isso, ser julgado improcedente.

Quanto aos fundamentos baseados na violação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado

Quanto à delimitação do mercado

96 A recorrente afirma que o Tribunal de Primeira Instância não fundamentou suficientemente a parte do acórdão impugnado relativa à determinação do mercado em causa. Alega designadamente que, ao contrário do que o Tribunal de Primeira Instância indica nos n.os 38 e 40 do acórdão impugnado, a recorrente nunca afirmou, na audiência, que podia fabricar painéis normalizados com as suas máquinas ou que os painéis por catálogo e os painéis normalizados eram, entre si, substituíveis. Nestas condições, o mercado não podia ser definido de modo a incluir os dois tipos de painéis.

97 A Comissão considera que a recorrente tenta por este meio submeter ao controlo do Tribunal de Justiça a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal de Primeira Instância.

98 Deve recordar-se que, na medida em que este fundamento assenta na fundamentação insuficiente do acórdão impugnado, o mesmo é admissível na fase de recurso.

99 A este respeito, basta verificar que o Tribunal de Primeira Instância, ao delimitar o mercado relevante, salientou, no n._ 39 do acórdão impugnado, que os preços dos painéis normalizados e dos painéis «Listenmatten» não são muito diferentes. Por outro lado, no n._ 40 do acórdão impugnado, declarou que, na audiência, se concluiu que a utilização de painéis normalizados em estaleiros onde habitualmente seriam utilizados painéis por projecto é, efectivamente, possível quando o preço dos painéis normalizados é tão baixo que garante ao empreiteiro uma economia significativa, que cobre os custos suplementares e compensa os inconvenientes técnicos relacionados com a mudança do material utilizado, e que esta situação se verificou durante uma parte do período abrangido pelos acordos.

100 Consequentemente, o Tribunal de Primeira Instância referiu, de forma juridicamente bastante, as razões pelas quais determinadas circunstâncias relacionadas com o nível dos preços podem levar os operadores económicos à substituição dos painéis normalizados por painéis por catálogo, e limitou, dessa forma, um mercado comum a ambos os produtos.

101 Deve, por isso, ser julgado improcedente o fundamento assente na falta de fundamentação da delimitação do mercado.

Quanto aos acordos entre a recorrente e a Tréfilunion

102 A recorrente afirma que o acórdão impugnado não especifica as razões pelas quais os acordos celebrados com a Tréfilunion constituem uma infracção às disposições do artigo 85._, n._ 1, do Tratado e acusa o Tribunal de Primeira Instância de não ter procedido à qualificação da matéria de facto tendo em conta as condições exigidas por esta disposição.

103 Em apoio deste fundamento, a recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância, por um lado, não analisou o argumento segundo o qual o compromisso da Tréfilunion de não apresentar queixa à Comissão sobre o cartel de crise estrutural alemão não constituía uma restrição da concorrência e, por outro lado, não se pronunciou quanto à questão de saber se o compromisso da recorrente de não exportar painéis por catálogo para França durante dois ou três meses era susceptível de produzir uma restrição desse tipo, ou ainda de afectar de modo sensível o comércio entre os Estados-Membros.

104 A Comissão considera que o Tribunal de Primeira Instância qualificou correctamente a matéria de facto controvertida e subsumiu-a à regra aplicável.

105 A este respeito, deve recordar-se que, no n._ 63 do acórdão impugnado, o Tribunal de Primeira Instância declarou que a decisão imputava à recorrente uma «concertação geral com a Tréfilunion, no sentido de limitar a penetração recíproca dos respectivos produtos na Alemanha e em França». Esta concertação concretizou-se em três pontos: 1) a Tréfilunion não denunciaria à Comissão o cartel de crise estrutural alemão; 2) a fábrica da recorrente de Gelsenkirchen deixaria de exportar painéis por catálogo para França durante um período de dois a três meses; 3) as duas partes subordinariam as suas exportações futuras à fixação de quotas.

106 Tendo em conta a análise de duas notas internas elaboradas em 16 de Julho de 1985 pelo Sr. Marie e em 27 de Agosto de 1985 pelo Sr. Müller, o Tribunal de Primeira Instância concluiu que a Comissão apresentou prova suficiente do compromisso da Tréfilunion de não apresentar queixa contra o cartel de crise estrutural alemão, bem como da renúncia da recorrente a exportar para França painéis por catálogo durante um período de dois a três meses. Em contrapartida, o Tribunal de Primeira Instância considerou que a Comissão não tinha feito prova bastante da existência de um acordo tendo por objecto subordinar no futuro as respectivas exportações à fixação de quotas.

107 Deve salientar-se que, no n._ 64 do acórdão impugnado, o Tribunal de Primeira Instância considerou que o compromisso do Sr. Marie de não apresentar queixa contra o cartel de crise estrutural alemão deve ser visto como um comportamento adoptado em relação a um concorrente, em contrapartida de concessões do mesmo, no âmbito de um acordo que viola o artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

108 Ao definir que o referido compromisso, bem como a renúncia da recorrente a exportar para França painéis por catálogo durante um período de dois a três meses, fazem parte de uma concertação geral no que respeita à penetração recíproca dos seus produtos na Alemanha e na França, o Tribunal de Primeira Instância concluiu correctamente que a Comissão não cometeu um erro ao considerar que a recorrente participou num acordo contrário ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

109 Na ausência de prova visando demonstrar um erro manifesto de apreciação por parte do Tribunal de Primeira Instância, deve este fundamento ser julgado improcedente.

Quanto aos acordos sobre quotas e preços no mercado do Benelux e, com os produtores do Benelux, no mercado alemão

110 A recorrente afirma que o Tribunal de Primeira Instância fez uma errada aplicação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado ao não ter em consideração elementos importantes por si invocados e afirma que este órgão jurisdicional ignorou o facto de os seus colaboradores só terem tomado parte nas reuniões de produtores na sua qualidade de representantes da comunidade do cartel de crise estrutural ou do Fachverband Betonstahlmatten, e não da recorrente. No que respeita ao mercado do Benelux, a recorrente acrescenta que a fundamentação do acórdão é contraditória, dado que a mera participação numa reunião em que outras empresas celebraram um acordo relativo aos preços não pode constituir uma infracção ao artigo 85._ se a própria empresa não distribuir os produtos que são objecto do acordo.

111 A Comissão considera que as críticas da recorrente pretendem pôr em causa a apreciação feita pelo Tribunal de Primeira Instância das provas que lhe foram apresentadas, o que, salvo a hipótese de desnaturação dos referidos elementos de prova, não constitui uma questão de direito submetida ao controlo do Tribunal de Justiça. Acrescenta que não ficou demonstrada qualquer desnaturação deste tipo. Por último, alega que a fundamentação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância não é contraditória.

112 A este respeito, deve salientar-se, como referiu o advogado-geral nos n.os 200 e 246 das suas conclusões, que a recorrente se limita essencialmente a reproduzir extensas passagens das respostas por si dadas às questões colocadas pelo Tribunal de Primeira Instância, para concluir, como o fez em juízo, que os documentos em questão demonstram que o Sr. Müller actuava como representante do Fachverband Betonstahlmatten e do conselho de fiscalização do cartel de crise estrutural alemão e não enquanto presidente do conselho de administração da recorrente.

113 Deve recordar-se que resulta dos artigos 168._-A do Tratado, 51._ do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça e 112._, n._ 1, alínea c) do Regulamento de Processo que um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância deve indicar de modo preciso os elementos contestados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos em que se apoia especificamente esse pedido. Não respeita esta exigência um recurso que se limite a repetir ou a reproduzir textualmente os fundamentos e argumentos já alegados no Tribunal de Primeira Instância, incluindo os que se baseavam em factos expressamente afastados por aquele órgão jurisdicional. Com efeito, tal recurso constitui, na realidade, um pedido de simples reanálise da petição apresentada na primeira instância, o que escapa à competência do Tribunal de Justiça (despacho San Marco/Comissão, já referido, n.os 36 a 38).

114 Mesmo sem apresentar uma repetição ou reprodução desse tipo, o presente recurso pretende, efectivamente, obter a reanálise da apreciação da matéria de facto efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância.

115 Daqui resulta que estes fundamentos devem ser julgados inadmissíveis.

Quanto à não aplicação do Regulamento n._ 67/67 aos contratos de distribuição exclusiva

116 No entender da recorrente, o Tribunal de Primeira Instância não demonstrou que os contratos de distribuição exclusiva celebrados entre, por um lado, a recorrente e, por outro, a Bouwstaal Roermond e a Arbed SA afdeling Nederland implicavam a proibição de importações paralelas, nem se pronunciou sobre a tolerância da Comissão para com os referidos contratos que lhe foram apresentados quando da reestruturação da indústria siderúrgica luxemburguesa e do Sarre.

117 A Comissão afirma que a argumentação relativa à ausência de proibição de importações paralelas tem a ver com a apreciação da matéria de facto feita pelo Tribunal de Primeira Instância e que a argumentação assente na tolerância demonstrada pela Comissão para com contratos controvertidos constitui um fundamento novo.

118 A este respeito, deve ser julgada inadmissível a argumentação da recorrente no sentido de que não foi demonstrado que os contratos por ela celebrados com a Bouwstaal Roermond BV e a Arbed SA afdeling Nederland implicavam a proibição de importações paralelas, dado que esta argumentação, como referiu o advogado-geral nos n.os 210 e 223 das suas conclusões, pretende pôr em causa a apreciação da matéria de facto efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância.

119 No que respeita ao argumento da recorrente de que o Tribunal de Primeira Instância não se pronunciou quanto à tolerância da Comissão para com os contratos em causa, é de referir, tal como salientou o advogado-geral nos n.os 228 a 232 das suas conclusões, que os argumentos deduzidos no Tribunal de Primeira Instância a este respeito eram meras alegações destituídas de precisão e não se apoiavam em qualquer justificação. O Tribunal de Primeira Instância não pode, por isso, ser acusado de não se ter pronunciado sobre esses argumentos.

120 Este fundamento deve, por isso, ser julgado improcedente.

Quanto aos fundamentos baseados na violação do artigo 15._ do Regulamento n._ 17

121 Em primeiro lugar, deve recordar-se que a possibilidade de aplicação de coimas no caso de violação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado está expressamente prevista no artigo 15._, n._ 2, do Regulamento n._ 17, nos termos do qual:

«A Comissão pode, mediante decisão, aplicar às empresas e associações de empresas multas de mil unidades de conta, no mínimo, a um milhão de unidades de conta, podendo este montante ser superior desde que não exceda dez por cento do volume de negócios realizado, durante o exercício social anterior, por cada uma das empresas que tenha participado na infracção sempre que, deliberada ou negligentemente:

a) Cometam uma infracção ao disposto no n._ 1 do artigo 85._...

b) ...

Para determinar o montante da multa, deve tomar-se em consideração, além da gravidade da infracção a duração da mesma.»

122 Em primeiro lugar, a recorrente critica o Tribunal de Primeira Instância por ter cometido erros de direito na apreciação que fez das circunstâncias atenuantes e agravantes das infracções. Em seu entender, o Tribunal de Primeira Instância considerou, erradamente, que a Comissão procedeu a uma apreciação individual dos critérios de determinação da gravidade das infracções. A recorrente alega, designadamente, que tanto a Comissão como o Tribunal de Primeira Instância consideraram a sua participação no cartel de crise estrutural como circunstância agravante para efeitos da fixação da coima. Por outro lado, a coima aplicada à recorrente é desproporcionada, dado que não foram tomadas em consideração várias circunstâncias atenuantes.

123 A Comissão responde que esta crítica é inadmissível, na medida em que a mesma retoma os argumentos desenvolvidos pela recorrente no Tribunal de Primeira Instância. Quanto ao cartel de crise estrutural alemão, a Comissão entende que o Tribunal de Primeira Instância justificou a opção adoptada na sua decisão de não considerar a respectiva existência uma circunstância atenuante relativamente à recorrente.

124 Em segundo lugar, a recorrente afirma que não foi tida em conta a sua ignorância quanto à ilegalidade do cartel de crise estrutural alemão e quanto às acções realizadas para assegurar a respectiva protecção.

125 Quanto a este aspecto, a Comissão considera que esta acusação é inadmissível, uma vez que foi invocada pela primeira vez na fase do recurso.

126 Por último, a recorrente pede, a título subsidiário, a redução da coima para um montante razoável.

127 A Comissão salienta que não compete ao Tribunal de Justiça, por razões de equidade, sobrepor a sua apreciação à efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância.

128 A título liminar, deve recordar-se que o Tribunal de Primeira Instância tem competência exclusiva para fiscalizar o modo como a Comissão apreciou num caso em especial a gravidade dos comportamentos ilegais. No âmbito do recurso, o controlo do Tribunal de Justiça tem por objecto, por um lado, verificar em que medida o Tribunal de Primeira Instância tomou em consideração, de modo juridicamente correcto, todos os factores essenciais para apreciar a gravidade de um determinado comportamento à luz dos artigos 85._ do Tratado e 15._ do Regulamento n._ 17 e, por outro lado, apreciar se o Tribunal de Primeira Instância respondeu correctamente a todos os argumentos invocados pela recorrente tendentes à supressão ou à redução da coima (v., quanto a este último aspecto, acórdão de 17 de Julho de 1997, Ferriere Nord/Comissão, C-219/95 P, Colect., p. I-4411, n._ 31).

OS FUNDAMENTOS CONTINUAN NO NUM.DOC: 695J0185.1

129 Quanto ao alegado carácter desproporcionado da coima, deve recordar-se que não compete ao Tribunal de Justiça, quando se pronuncia sobre questões de direito no âmbito de um recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância, substituir, por motivos de equidade, a sua própria apreciação à apreciação efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância que se pronunciou, no exercício da sua plena jurisdição, sobre o montante das coimas aplicadas a empresas devido à violação, por estas, do direito comunitário (acórdãos, já referidos, BPB Industries et British Gypsum/Comissão, n._ 34, e Ferriere Nord/Comissão, n._ 31). Esta acusação deve, por isso, ser julgada inadmissível na medida em que tem por objecto a reanálise global das coimas e pretende, subsidiariamente, a redução da coima para um montante razoável. O mesmo sucede relativamente à crítica, não formulada pela recorrente no Tribunal de Primeira Instância, baseada na sua alegada ignorância quanto ao carácter ilícito dos comportamentos que se destinavam à defesa do cartel de crise estrutural alemão, como salientou o advogado-geral no n._ 286 das suas conclusões.

130 No que respeita à não apreciação das circunstâncias atenuantes e agravantes, basta, desde logo, referir que o acórdão impugnado resume as infracções cometidas pela recorrente e individualiza o seu comportamento, bem como o seu papel na aplicação ou no funcionamento de cada um dos acordos.

131 Além disso, o Tribunal de Primeira Instância, no n._ 146 do acórdão impugnado, considerou que a decisão, tomada no seu todo, forneceu à recorrente as indicações necessárias para esta conhecer as diferentes infracções de que era acusada, bem como as circunstâncias específicas do seu comportamento e, mais concretamente, os elementos relativos à duração da sua participação nas diferentes infracções. O Tribunal de Primeira Instância verificou também que, na parte da decisão consagrada à apreciação jurídica, a Comissão expôs os diferentes critérios de avaliação da gravidade das infracções imputadas à recorrente, bem como as diversas circunstâncias que atenuaram as consequências económicas das infracções.

132 Por outro lado, no que se refere às circunstâncias atenuantes da acusação imputada à recorrente, o Tribunal de Primeira Instância, no n._ 149 do acórdão impugnado, afirmou que a recorrente não apresentou nenhum elemento que permita contradizer as provas apresentadas pela Comissão para comprovar o papel activo que desempenhou nos acordos. Como o advogado-geral salientou no n._ 268 das suas conclusões, o Tribunal de Primeira Instância referiu-se a passagens precisas da decisão que caracterizam os comportamentos da recorrente susceptíveis de justificar um maior rigor na fixação da penalidade aplicada. Nestes desenvolvimentos especiais, a Comissão realçou simultaneamente o papel motor desempenhado pela recorrente na concretização das infracções e a intervenção do Sr. Müller na sua tripla qualidade de administrador da recorrente, representante legal do cartel de crise alemão e presidente do Fachverband Betonstahlmatten. No n._ 207 da decisão, a Comissão afirmou que as coimas mais elevadas deviam ser aplicadas às empresas cujos dirigentes desempenhavam funções importantes nas respectivas associações de empresas, como o Fachverband Betonstahlmatten.

133 Quanto à acusação de participação da recorrente no cartel de crise estrutural, basta referir que, uma vez que a recorrente foi condenada em função de acordos que não estavam indissociavelmente ligados à constituição do cartel e que tinham em vista proteger o mercado alemão de importações não controladas de outros Estados-Membros, o Tribunal de Primeira Instância pôde correctamente considerar que a existência do referido cartel autorizado não podia ser considerada como circunstância atenuante geral relativamente aos comportamentos da recorrente, a qual assumiu uma especial responsabilidade sob este aspecto devido às funções do seu administrador.

134 Por último, no que respeita, mais exactamente, à existência de circunstâncias atenuantes, a recorrente afirma que o Tribunal de Primeira Instância não teve em conta diversas circunstâncias deste tipo. Assim, critica a Comissão e o Tribunal de Primeira Instância por terem calculado a coima que lhe foi aplicada com base no seu volume de negócios global, em lugar de a fixarem em função do volume de negócios resultante dos acordos. A recorrente invoca ainda a manifesta violação do princípio da igualdade, dado o montante anormalmente elevado, relativamente às outras coimas, da que lhe foi aplicada. Além disso, contesta a tomada em consideração pelo Tribunal de Primeira Instância do critério da sua quota no mercado alemão para fixação do montante da coima, pelo facto de os recursos financeiros de uma empresa não serem necessariamente proporcionais à sua posição no mercado.

135 A este respeito, deve recordar-se que o Tribunal de Primeira Instância, no n._ 158 do acórdão impugnado, referiu que a Comissão não teve em conta o volume de negócios global realizado pela recorrente, mas apenas o volume de negócios relativo à rede electrossoldada para betão na Comunidade a seis e que não ultrapassou o limite de 10%; assim, tendo em conta a gravidade e a duração da infracção, o Tribunal de Primeira Instância considerou que a Comissão não violou o disposto no artigo 15._ do Regulamento n._ 17.

136 No n._ 160 do acórdão impugnado, no que se refere à fixação do montante da coima numa percentagem de 3,15% do volume de negócios, o Tribunal de Primeira Instância considerou que à recorrente, que não beneficiava de qualquer circunstância atenuante em geral, foi, em contrapartida, imputada uma circunstância agravante - tal como à Tréfilunion - que corresponde ao número e à importância das infracções de que é acusada.

137 Deve, ainda, analisar-se se o Tribunal de Primeira Instância teve em consideração, de modo juridicamente correcto, as quotas de mercado da recorrente no mercado alemão ao declarar, no n._ 147 do acórdão impugnado, que a Comissão se recusou, correctamente, a considerar como circunstância atenuante o facto de a recorrente não pertencer a uma entidade económica poderosa, com o fundamento de a mesma ser de longe a empresa que detinha a maior quota do mercado alemão.

138 A este respeito, deve salientar-se que, entre os elementos de apreciação da gravidade da infracção, podem constar o volume e os valores das mercadorias que são objecto da infracção, a dimensão e o poder económico da empresa e, consequentemente, a influência que a mesma pôde exercer no mercado (v. acórdão de 7 de Junho de 1983, Musique Diffusion française e o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825, n._ 120).

139 Daqui resulta que, para determinação da coima, é legítimo ter em conta tanto o volume de negócios global da empresa, que constitui uma indicação, mesmo que aproximada e imperfeita, da sua dimensão e poder económico, como a parte do referido volume de negócios que provém das mercadorias que são objecto da infracção e que pode, assim, dar uma indicação quanto à dimensão da mesma (acórdão Musique Diffusion française e o./ Comissão, já referido, n._ 121). Ora, embora as quotas de mercado de uma empresa não possam ser determinantes para se concluir que essa empresa pertence a uma entidade económica poderosa, são, em contrapartida, relevantes para determinar a influência que a mesma pôde exercer no mercado.

140 Consequentemente, esta crítica deve ser julgada improcedente.

Quanto às consequências da anulação do acórdão impugnado na parte em que fixa o montante da coima

141 Tendo em conta todas as circunstâncias do presente processo, o Tribunal de Justiça considera que o montante de 50 mil ecus constitui uma reparação equitativa pela duração excessiva do processo.

142 Consequentemente, e anulando o acórdão impugnado na parte em fixa o montante da coima (v. n._ 48 do presente acórdão), o Tribunal de Justiça, pronunciando-se a título definitivo nos termos do artigo 54._ do seu Estatuto, fixa a referida coima no montante de 2 950 000 ecus.

143 É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

144 Nos termos do artigo 122._ do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas. Nos termos do artigo 69._, n._ 2, aplicável ao recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 118._, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Contudo, nos termos do n._ 3 do mesmo artigo, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas. Dado que a Comissão foi parcialmente vencida, tendo a recorrente sido vencida no restante, há que decidir que a recorrente suporte as suas próprias despesas e três quartos das despesas da Comissão.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

decide:

1) É anulado o n._ 2 do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Baustahlgewebe/Comissão (T-145/89), na parte em fixa em 3 milhões de ecus o montante da coima aplicada à recorrente.

2) O montante da coima aplicada à recorrente é fixado no montante de 2 950 000 ecus.

3) É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

4) A recorrente suportará as suas próprias despesas e três quartos das despesas da Comissão.

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