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Document 61994TJ0067

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Segunda Secção Alargada) de 27 de Janeiro de 1998.
Ladbroke Racing Ltd contra Comissão das Comunidades Europeias.
Recurso de anulação - Auxílios de Estado - Mercado de aceitação de apostas - Artigo 92., n. 1 e 3, do Tratado CE - Conceito de auxílio - Medidas fiscais - Obrigação de restituição.
Processo T-67/94.

European Court Reports 1998 II-00001

ECLI identifier: ECLI:EU:T:1998:7

61994A0067

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Segunda Secção Alargada) de 27 de Janeiro de 1998. - Ladbroke Racing Ltd contra Comissão das Comunidades Europeias. - Recurso de anulação - Auxílios de Estado - Mercado de aceitação de apostas - Artigo 92., n. 1 e 3, do Tratado CE - Conceito de auxílio - Medidas fiscais - Obrigação de restituição. - Processo T-67/94.

Colectânea da Jurisprudência 1998 página II-00001


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1 Auxílios concedidos pelos Estados - Conceito - Competência conferida à Comissão e ao juiz nacional para qualificar uma medida nacional de auxílio de Estado - Inexistência de um amplo poder de apreciação da Comissão

(Tratado CE, artigo 92._, n._ 1)

2 Auxílios concedidos pelos Estados - Conceito - Redução da parte deduzida por um Estado-Membro sobre as receitas das apostas aceites, sobre as corridas de cavalos, pelo organismo encarregado, a título exclusivo, da gestão das apostas mútuas nesse Estado - Inclusão - Medida fiscal de natureza permanente, de carácter limitado e não destinada ao financiamento de uma operação pontual - Não incidência

(Tratado CE, artigo 92._, n._ 1)

3 Auxílios concedidos pelos Estados - Conceito - Benefícios de tesouraria resultantes da autorização de diferimento do pagamento das deduções sobre as receitas das apostas em corridas de cavalos que revertem em favor do Estado - Inclusão - Medida que beneficia indirectamente outros operadores económicos - Não incidência

[Tratado CE, artigo 92._, n.os 1 e 3, alínea c)]

4 Recurso de anulação - Fundamentos - Fundamentos susceptíveis de ser suscitados pelo denunciante contra uma decisão final da Comissão relativa a um auxílio de Estado - Fundamento assente na omissão de examinar certas medidas estatais indicadas na denúncia - Medidas que não foram objecto de uma decisão de início do processo - Ausência de tomada de posição da Comissão não contestada pelo denunciante - Inadmissibilidade

(Tratado CE, artigos 93._, n._ 2, 173._, quarto parágrafo, e 175._)

5 Auxílios concedidos pelos Estados - Conceito - Medida estatal que põe à disposição do organismo nacional encarregado da gestão das apostas mútuas os prémios não reclamados, para financiar despesas sociais - Inclusão

(Tratado CE, artigo 92._, n._ 1)

6 Auxílios concedidos pelos Estados - Proibição - Derrogações - Auxílios que podem ser considerados compatíveis com o mercado comum - Poder de apreciação da Comissão - Fiscalização jurisdicional - Limites

(Tratado CE, artigos 92._, n._ 3, e 173._)

7 Auxílios concedidos pelos Estados - Decisão da Comissão que declara a incompatibilidade de um auxílio com o mercado comum e que ordena a sua restituição - Limitação no tempo da obrigação de restituição devido à confiança legítima do beneficiário na legalidade do auxílio, invocada pelas autoridades nacionais - Inadmissibilidade

(Tratado CE, artigos 92._ e 93._)

8 Auxílios concedidos pelos Estados - Decisão da Comissão que declara a incompatibilidade de um auxílio com o mercado comum e que ordena a sua restituição - Obrigações dos Estados-Membros - Obrigação de restituição - Alcance - Restabelecimento da situação anterior - Possibilidade de a Comissão deixar às autoridades nacionais a tarefa de calcular o montante preciso a restituir

(Tratado CE, artigo 93._, n._ 2)

9 Recurso de anulação - Competência do juiz comunitário - Pedidos para que seja ordenado o reexame de uma denúncia - Inadmissibilidade

(Tratado CE, artigos 173._ e 176._)

Sumário


10 Para determinar a extensão da fiscalização jurisdicional sobre os critérios escolhidos pela Comissão a fim de apreciar se uma medida nacional cai ou não no âmbito de aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, há que ter em conta que esta disposição não faz a distinção segundo as causas ou os objectivos das intervenções estatais, mas define-as em função dos seus efeitos. Daqui resulta que o conceito de auxílio é um conceito objectivo e função da mera questão de saber se uma medida estatal confere ou não um benefício a uma ou a certas empresas. Por conseguinte, a qualificação de uma medida como auxílio de Estado, que, segundo o Tratado, incumbe tanto à Comissão como ao juiz nacional, não pode, em princípio, justificar, na ausência de circunstâncias especiais devidas nomeadamente à natureza complexa da intervenção estatal em causa, o reconhecimento de um amplo poder de apreciação à Comissão.

11 Embora seja um facto que a fiscalidade bem como a introdução dos regimes fiscais são da competência das autoridades nacionais, não deixa também de ser verdade que o exercício de tal competência pode, eventualmente, revelar-se incompatível com o artigo 92._, n._ 1, do Tratado.

A este respeito, a Comissão não pode validamente concluir que uma medida fiscal, consistente na redução da parte deduzida por um Estado-Membro sobre as receitas das apostas aceites, sobre as corridas de cavalos, pelo organismo encarregado, a título exclusivo, da gestão das apostas mútuas nesse Estado, não constitui um auxílio de Estado na acepção do artigo 92._, n._ 1, mas uma «reforma sob a forma de ajustamento fiscal, justificada pela natureza e pela economia do regime em causa» porque a medida tem carácter permanente, não se destina a financiar uma operação pontual e mais não constitui que uma baixa limitada do montante das deduções.

Com efeito, no que diz respeito ao critério relacionado com a natureza permanente da medida em questão, o artigo 92._, n._ 1, não distingue entre medidas estatais permanentes e temporárias. Além disso, tendo em conta a frequência dos ajustamentos das taxas de fiscalidade pelas autoridades nacionais e a possibilidade de transformar uma medida permanente numa medida provisória, e vice-versa, a aplicação de tal critério daria origem a incertezas tais, na aplicação do artigo 92._ do Tratado, que este critério não seria conforme ao princípio da segurança jurídica.

Quanto ao critério segundo o qual a medida em questão não se destina a financiar uma operação pontual, o artigo 92._, n._ 1, não faz a distinção segundo as causas ou os objectivos das intervenções estatais, mas define-as em função dos seus efeitos.

Por fim, quanto ao critério relativo ao carácter limitado da baixa do montante da dedução pública decidida pelas autoridades nacionais, a importância relativamente fraca de um auxílio não exclui a priori a aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado.

12 A decisão de um Estado-Membro autorizar o organismo encarregado da gestão das apostas mútuas nesse Estado a diferir o pagamento da parte das deduções sobre as receitas das apostas aceites sobre as corridas de cavalos que reverte em seu favor não pode escapar à qualificação de auxílio de Estado, na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado.

Com efeito, uma tal medida destina-se a conceder benefícios financeiros a uma empresa e a melhorar a sua situação financeira. Se pode igualmente beneficiar, indirectamente, outros operadores cujas actividades dependem da actividade principal do beneficiário directo da medida em questão, tal consideração não basta para concluir que é uma medida de natureza geral que não cai no âmbito de aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, mas quando muito que pode, eventualmente, beneficiar da derrogação sectorial prevista para o efeito pelo artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado.

13 O direito de terceiros apresentarem uma denúncia à Comissão por violação do artigo 92._ do Tratado, e levá-la assim a iniciar o processo previsto pelo artigo 93._, n._ 2, contra o Estado-Membro em causa e a adoptar eventualmente no termo deste uma decisão final, não é regido por qualquer texto ou disposição de direito derivado equivalente ao Regulamento n._ 17.

Todavia, se a Comissão decidir rejeitar uma denúncia adoptando uma decisão para o efeito, a mesma, deve, por força do artigo 190._ do Tratado, ser fundamentada a fim de permitir ao interessado conhecer as justificações e, se for caso disso, invocar os seus direitos perante o juiz comunitário.

Numa situação em que não houve decisão expressa de rejeição da denúncia mas, pelo contrário, adopção de uma decisão de início do processo nos termos do artigo 93._, n._ 2, se o denunciante considerar que, ao agir deste modo, a Comissão não tomou posição sobre a totalidade das medidas estatais indicadas na sua denúncia, pode interpelar a Comissão nos termos do artigo 175._ do Tratado para que esta tome posição em relação às medidas que não foram objecto desta decisão, e se considerar que a resposta da Comissão à interpelação constitui uma tomada de posição, consistindo numa rejeição tácita da parte da sua denúncia que indica estas medidas, pode interpor um recurso de anulação, nos termos do artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado.

Daqui resulta que, por não ter iniciado e prosseguido o processo previsto no artigo 175._ do Tratado, ou interposto, atempadamente, um recurso de anulação, o denunciante não pode, de qualquer modo, contestar, no âmbito do recurso da decisão final sobre as medidas denunciadas, o facto de a Comissão, que não deu início ao processo em relação a algumas destas medidas, não se ter pronunciado sobre as mesmas na decisão final.

14 A condição de aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, relativa à transferência dos recursos estatais em favor do beneficiário, encontra-se satisfeita quando um Estado-Membro põe à disposição do organismo encarregado da gestão das apostas mútuas os prémios não reclamados, para financiar despesas sociais, renunciando assim, efectivamente, o legislador do referido Estado a recursos que, de outro modo, deviam ter sido pagos ao orçamento do Estado.

Ora, na medida em que estes recursos são utilizados para financiar despesas sociais, constituem uma redução dos encargos sociais que uma empresa deve normalmente suportar, e portanto um auxílio em seu favor.

15 O artigo 92._, n._ 3, do Tratado concede à Comissão um largo poder de apreciação para adoptar uma decisão de derrogação à proibição geral do n._ 1 do referido artigo. A apreciação, neste caso, da compatibilidade ou incompatibilidade de um auxílio estatal com o mercado comum levanta problemas que exigem a tomada em consideração e a apreciação de factos e circunstâncias económicas complexos e susceptíveis de rápida alteração.

Não podendo o juiz comunitário, no âmbito de um recurso de anulação, substituir a sua apreciação quanto aos factos, nomeadamente no plano económico, à efectuada pelo autor da decisão, a fiscalização que o Tribunal é chamado a exercer sobre a apreciação da Comissão deve limitar-se à verificação do respeito das regras processuais e de fundamentação, da exactidão material dos factos em que se baseou a opção contestada e da ausência de erro manifesto na apreciação destes factos ou de desvio de poder.

16 Quando a Comissão declara a incompatibilidade de um auxílio de Estado com o mercado comum, pode impor ao Estado-Membro em causa que ordene à empresa beneficiária a sua restituição, sendo a supressão de um auxílio ilegal por recuperação a consequência lógica desta verificação na medida em que tal permite o restabelecimento da situação anterior.

No âmbito do poder discricionário de que dispõe a este respeito, a Comissão não pode limitar no tempo a obrigação que incumbe às autoridades do Estado-Membro em causa de exigirem a restituição do auxílio porque estas invocam a confiança legítima do beneficiário na sua legalidade. Com efeito, não incumbe ao Estado-Membro em causa, mas sim à empresa beneficiária, invocar a existência das circunstâncias excepcionais que puderam criar a sua confiança legítima a fim de se opor à restituição de um auxílio ilegal, e isso no âmbito dos processos perante as autoridades estatais ou o juiz nacional.

17 A obrigação de um Estado-Membro suprimir, em conformidade com o artigo 93._, n._ 2, do Tratado, um auxílio considerado incompatível com o mercado comum, visa o restabelecimento da situação anterior, objectivo que é atingido a partir do momento em que o auxílio em causa, acrescido, se for caso disso, dos juros de mora, é restituído pelo beneficiário ao Estado.

Todavia, nenhuma disposição do direito comunitário exige que a Comissão, quando ordena a restituição de um auxílio declarado incompatível com o mercado comum, determine o montante do auxílio a restituir, limitando-se as exigências na matéria a que, por um lado, a recuperação dos auxílios ilegalmente concedidos conduza ao restabelecimento da situação anterior e, por outro, que esta restituição seja efectuada segundo as modalidades previstas pelo direito nacional, sem que a aplicação das disposições deste último possa prejudicar o alcance e a eficácia do direito comunitário.

Na medida em que, tratando-se de intervenções em matéria fiscal, o cálculo do montante do auxílio a recuperar pode exigir a tomada em consideração da legislação nacional aplicável na matéria, a Comissão pode validamente limitar-se a verificar de maneira geral a obrigação de o beneficiário restituir o auxílio em questão e deixar às autoridades nacionais a tarefa de calcular o montante preciso do auxílio a restituir.

Longe de constituir uma delegação ilegal de poderes, tal decisão da Comissão insere-se no âmbito mais lato da obrigação de cooperação leal que vincula mutuamente a Comissão e os Estados-Membros na execução do artigo 93._ do Tratado.

18 Os pedidos apresentados no âmbito de um recurso de anulação para que seja ordenado à Comissão que reexamine uma denúncia são inadmissíveis. Com efeito, não cabe ao juiz comunitário dirigir, no quadro da fiscalização da legalidade por ele exercida, injunções às instituições ou substituir estas últimas, incumbindo à instituição em causa tomar, por força do artigo 176._ do Tratado, as medidas que comporta a execução de um acórdão proferido no quadro de um recurso de anulação.

Partes


No processo T-67/94,

Ladbroke Racing Ltd, sociedade de direito inglês estabelecida em Londres, representada por Jeremy Lever, QC, Christopher Vajda, barrister, do foro de Inglaterra e do País de Gales, e Stephen Kon, solicitor, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Winandy e Err, 60, avenue Gaston Diderich,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Michel Nolin e Richard Lyal, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Goméz de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

apoiada por

República Francesa, representada por Catherine de Salins, subdirectora na direcção dos assuntos jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Jean-Marc Belorgey, encarregado de missão na mesma direcção, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada de França, 8 B, boulevard Joseph II,

interveniente,

que tem por objecto principal um pedido de anulação da Decisão 93/625/CEE da Comissão, de 22 de Setembro de 1993, relativa a vários auxílios concedidos pela França a favor do Pari Mutuel Urbain (PMU) e das sociedades de corridas (JO L 300, p. 15),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS

(Segunda Secção Alargada),

composto por: C. W. Bellamy, presidente, B. Vesterdorf, C. P. Briët, A. Kalogeropoulos e A. Potocki, juízes,

secretário: B. Pastor, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 11 de Março de 1997,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


Matéria de facto e tramitação processual

1 A recorrente, Ladbroke Racing Ltd (a seguir «Ladbroke»), é uma sociedade de direito inglês, controlada por Ladbroke Group plc, da qual uma das actividades consiste na organização e no fornecimento de serviços de apostas sobre as corridas de cavalos no Reino Unido e noutros países da Comunidade Europeia.

2 O Pari mutuel urbain (a seguir «PMU») é um agrupamento de interesse económico (a seguir «AIE»), composto pelas principais sociedades de corridas em França (artigo 21._ do Decreto 83-878, de 4 de Outubro de 1983, relativo às sociedades de corridas de cavalos e à aposta mútua, a seguir «Decreto 83/878»), criado para gerir os direitos destas sociedades na organização de apostas mútuas fora do hipódromo. A gestão pelo PMU destes direitos era inicialmente assegurada sob a forma de «serviço comum» (Decreto de 11 de Julho de 1930, relativo à extensão das apostas mútuas fora do hipódromo). Segundo as disposições do artigo 13._ do Decreto 74-954, de 14 de Novembro de 1974, relativo às sociedades de corridas de cavalos (a seguir «Decreto 74-954»), o PMU assegura, desde então, a gestão, a título exclusivo, dos direitos das sociedades de corridas sobre as apostas mútuas fora do hipódromo. Esta exclusividade do PMU é, além disso, protegida pela proibição, por outras pessoas que não o PMU, de fazer ou aceitar apostas sobre as corridas de cavalos (artigo 8._ do Despacho interministerial de 13 de Setembro de 1985, que aprova o regulamento do PMU). A mesma é extensiva às apostas aceites sobre as corridas organizadas em França, bem como às apostas aceites em França sobre as corridas organizadas no estrangeiro, que só podem, igualmente, ser feitas pelas sociedades autorizadas e/ou pelo PMU (artigo 15._, n._ 3, da Lei 64-1279, de 23 de Dezembro de 1964, que aprova a Lei de Finanças para 1965, e artigo 21._ do Decreto 83-878, já referido).

3 Em 7 de Abril de 1989, sete sociedades pertencentes ao grupo Ladbroke, entre as quais a recorrente, apresentaram uma denúncia à Comissão contra uma certo número de auxílios que as autoridades francesas teriam concedido ao PMU e que seriam incompatíveis com o mercado comum.

4 Os auxílios indicados na denúncia da Ladbroke eram os seguintes:

1) facilidades de tesouraria concedidas ao PMU pela autorização de diferir o pagamento ao Estado francês de certas deduções feitas sobre as apostas aceites sobre as corridas de cavalos;

2) renúncia, em 1986, a 180 milhões de FF de deduções sobre as apostas a fim de ajudar o PMU a controlar o seu défice e desde que este último adopte um plano de recuperação;

3) isenção da regra de adiamento de um mês respeitante ao pagamento do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA»);

4) utilização pelo PMU dos prémios não reclamados pelos apostadores para financiar indemnizações de despedimento;

5) isenção do PMU das contribuições relativas à participação dos empregadores na política de habitação;

6) renúncia, entre 1982 e 1985, a quantias provenientes do arredondamento dos prémios dos apostadores à décima inferior;

7) isenção das sociedades de corridas do pagamento do imposto sobre as sociedades, o que teria representado, em 1989, um auxílio de cerca de 546 milhões de FF;

8) isenção das sociedades de corridas do pagamento do imposto sobre o rendimento devido pelas associações não sujeitas ao imposto sobre as sociedades.

5 Por carta de 11 de Janeiro de 1991, a Comissão informou as autoridades francesas da sua decisão de dar início ao processo previsto no artigo 93._, n._ 2, do Tratado CEE em relação às sete medidas seguintes em favor do PMU (JO C 38, p. 3):

«1) facilidades de tesouraria sob a forma de concessão de prazos para o pagamento de direitos do Tesouro a partir de 1980 e 1981;

2) cedência de 180 milhões de francos franceses sobre os direitos de 1986;

3) isenção da regra de pagamento do IVA um mês após o respectivo recebimento;

4) utilização dos prémios não reclamados para pagar um complemento de indemnização de despedimento em 1985;

5) isenção da participação dos empregadores no esforço de construção;

6) cedência, durante o período compreendido entre 1982 e 1985, dos montantes provenientes do arredondamento para baixo dos prémios dos apostadores;

7) isenção do imposto sobre o rendimento das sociedades».

6 Por carta de 19 de Março de 1991, a Ladbroke solicitou à Comissão que adoptasse medidas provisórias para suspender quatro das sete medidas em favor do PMU, a saber, a) as facilidades de tesouraria, b) a isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA, c) a isenção da contribuição a título da participação financeira dos empregadores na política de habitação, e d) a isenção do imposto sobre as sociedades.

7 Pela Decisão 92/35/CEE, adoptada em 11 de Junho de 1991, a Comissão convidou o Governo francês a suspender três destas quatro medidas em favor do PMU, que tinham sido adoptadas em violação do artigo 93._, n._ 3, do Tratado e que tinham carácter permanente (JO 1992, L 14, p. 35; a seguir «decisão provisória»), a saber, a) as facilidades de tesouraria, b) a isenção da regra de pagamento do IVA um mês após o respectivo recebimento, e c) a isenção da participação dos empregadores no esforço de construção.

8 Por carta de 24 de Junho de 1992, a Ladbroke solicitou à Comissão que se pronunciasse definitivamente sobre a questão de saber se o Governo francês tinha ou não suspendido os auxílios que eram objecto da decisão provisória.

9 Não tendo a Comissão respondido a esta carta, a Ladbroke, por carta de 11 de Agosto de 1992, convidou-a a tomar posição, ao abrigo do artigo 175._ do Tratado, a respeito a) dos auxílios indicados na sua denúncia que não tinham sido objecto da decisão provisória, b) das medidas tomadas pela Comissão para implementar a sua decisão provisória, e c) do processo em sede de mérito, quanto aos auxílios que tinham sido objecto da decisão provisória.

10 Por carta de 12 de Outubro de 1992, a Comissão respondeu à interpelação, acima referida, de 11 de Agosto de 1992. Nesta resposta, a Comissão referiu-se às medidas tomadas pelas autoridades francesas para dar cumprimento à decisão provisória e sublinhou que, quanto aos outros auxílios mencionados na sua decisão de início do processo, a compatibilidade dos mesmos com o mercado comum seria apreciada no quadro da sua decisão final nos termos do artigo 93._, n._ 2, do Tratado.

11 Por carta de 5 de Novembro de 1992, a Ladbroke respondeu à carta da Comissão de 12 de Outubro de 1992, sublinhando que, tal como resultava desta mesma carta, quinze meses depois da adopção da decisão provisória, a Comissão continuava sem saber se o Governo francês tinha efectivamente suspendido as facilidades de tesouraria e a isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA e que, além disso, a isenção das sociedades de corridas da participação no esforço de construção continuava em vigor, em violação flagrante da decisão provisória. Deste modo, a Ladbroke interpelou novamente a Comissão, nos termos do artigo 175._ do Tratado CE, convidando-a: a) a confirmar que os dois primeiros auxílios, a saber as facilidades de tesouraria e a isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA, tinham sido suspensos, b) a obter a suspensão do terceiro auxílio, ou seja, a isenção da participação dos empregadores no esforço de construção, c) a terminar o processo iniciado no prazo de dois meses a contar da data da recepção desta carta, d) a declarar os sete auxílios concedidos ao PMU incompatíveis com o mercado comum, e e) a ordenar a restituição destes auxílios, acrescidos de juros à taxa comercial.

12 Tendo esta interpelação ficado sem resposta, a Ladbroke intentou, em 5 de Março de 1993, uma acção por omissão contra a Comissão, nos termos do artigo 175._ do Tratado, registada sob o número T-467/93.

13 Em 22 de Setembro de 1993, a Comissão adoptou a Decisão 93/625/CEE, relativa a vários auxílios concedidos pela França a favor do Pari Mutuel Urbain (PMU) e das sociedades de corridas (JO L 300, p. 15, a seguir «Decisão 93/625» ou «decisão impugnada») pondo termo ao processo iniciado contra a França.

14 Por cartas de 13 e 20 de Dezembro de 1993, a Ladbroke informou o Tribunal de que, na sequência da adopção da Decisão 93/625, a sua acção tinha ficado sem objecto e que desistia da instância.

15 Por despacho do presidente da Segunda Secção do Tribunal de Primeira Instância, de 2 de Maio de 1994, o processo T-467/93 foi cancelado no registo.

A decisão impugnada

16 Na decisão impugnada, a Comissão distinguiu entre duas categorias de quantias deduzidas das apostas feitas sobre as corridas hípicas, a saber, por um lado, as «deduções» ou «deduções públicas», que representam as quantias pagas para o orçamento geral do Estado e, por outro, as «deduções não públicas» que são as quantias distribuídas aos apostadores. Com efeito, segundo a decisão impugnada, de 100 FF de apostas registadas, o PMU deduz mais ou menos 30 FF e paga mais ou menos 70 FF aos apostadores. Dos 30 FF, o PMU cobre as suas despesas, ou seja mais ou menos 5,5 FF, as autoridades nacionais e a cidade de Paris retêm mais ou menos 18 FF e o remanescente é atribuído às sociedades de corridas.

17 A Comissão sublinhou em seguida que, embora os mercados dos jogos de azar estivessem tradicionalmente compartimentados em mercados nacionais, as apostas nas corridas de cavalos realizadas em hipódromos nacionais eram no entanto organizadas a nível internacional, e foi só desde Janeiro de 1989, com a criação do Pari mutuel international (a seguir «PMI»), que o PMU manifestou expressamente a sua intenção de alargar as suas actividades além França, concluindo acordos na Alemanha e na Bélgica e entrando assim em concorrência com outros corretores de apostas e, em especial, com a Ladbroke (parte III da decisão impugnada).

18 A Comissão considerou que três das sete medidas tomadas pelo Governo francês em favor do PMU, abrangidas pelo processo iniciado nos termos do artigo 93._, n._ 2, do Tratado, constituíam auxílios estatais na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado.

19 Com efeito, a Comissão considerou que a renúncia, de 1982 a 1985, a uma parte da dedução (315 milhões de FF) sobre o produto do arredondamento dos prémios à décima inferior, que reverte, desde 1967, segundo a Lei de Finanças de 17 de Dezembro de 1966, para o orçamento geral do Estado, constituía um auxílio, porque era uma «medida temporária destinada a solucionar um problema pontual», a informatização das operações do PMU, com o objectivo de reforçar a sua posição no mercado (partes IV e V, 2.).

20 A Comissão considerou igualmente que a isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA constituía uma facilidade de tesouraria equiparada a um auxílio estatal, que era, no entanto compensada, desde 1989 até à sua abolição em 1 de Julho de 1993, por um depósito permanente junto do Tesouro público (partes IV e V, 6.).

21 Por último, quanto à isenção da participação no esforço de construção de que o PMU beneficia, a Comissão considerou que, embora um acórdão do Conselho de Estado, de 1962, tivesse confirmado a natureza agrícola das actividades das sociedades de corridas e, deste modo, a sua isenção desta participação, a actividade do próprio PMU, a saber a organização e o tratamento das apostas, manifestamente não constituía uma actividade agrícola de modo que, não sendo a isenção em causa justificada pelo estatuto do PMU, constituía um auxílio de Estado (partes IV e V, 7.).

22 Todavia, a Comissão considerou que as três medidas em questão podiam ser consideradas compatíveis com o mercado comum nos termos do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado.

23 No que diz respeito ao auxílio resultante da renúncia ao produto do arredondamento dos prémios à décima inferior, a Comissão considerou que, se bem que se tratasse de um auxílio de elevada intensidade (cerca de 29% do custo total da informatização), «tendo em conta o desenvolvimento da concorrência e das trocas comerciais verificado antes da criação do PMI em Janeiro de 1989, os auxílios concedidos durante o período compreendido entre 1982 e 1985 a favor da informatização do PMU, não produziram efeitos negativos no mercado, contrários ao interesse comum, tendo em conta os efeitos directos e indirectos desses auxílios sobre o desenvolvimento do sector em todas as suas componentes económicas, incluindo a melhoria da raça cavalar» (parte VII, 1.).

24 No que respeita à isenção da regra de adiamento para a dedução do IVA, a Comissão considerou que, pelas mesmas razões que as evocadas a propósito do auxílio anterior, este auxílio devia igualmente considerar-se ter sido compatível com o mercado comum até Janeiro de 1989. Quanto ao período posterior a 1989, os efeitos negativos do auxílio em questão sobre a concorrência foram integralmente compensados por um depósito permanente junto do Tesouro público (parte VII, 2.).

25 No que diz respeito ao auxílio resultante da isenção da participação no esforço de construção, a Comissão considerou que, à semelhança do auxílio constituído pela isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA, o mesmo podia beneficiar da derrogação prevista no artigo 92._, n._ 3, alínea c), até 1989, mas devia ser declarado incompatível a partir de 1989 (parte VII, 3.).

26 Quanto à restituição deste último auxílio, a partir de 1989, a Comissão considerou contudo que, se não se devia «exigir o reembolso desde essa data, tendo em conta a posição adoptada pelas autoridades francesas segundo a qual a retenção da contribuição em causa não pôde ser efectuada a fim de respeitar o acórdão do Conselho de Estado de 1962 evocado no ponto 7 da parte IV supra» (v., supra, n._ 21), este argumento deixa de «poder ser considerado após a notificação às autoridades francesas do início do processo, a saber, em 11 de Janeiro de 1991». Além disso, a Comissão declarou não se encontrar em condições de quantificar ela própria o montante do auxílio a recuperar e solicitou às autoridades francesas que determinassem o montante do auxílio a reembolsar e o comunicassem à Comissão (parte VIII).

27 Quanto às outras quatro medidas, a Comissão considerou não se encontrarem reunidas as condições de aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado.

28 No que diz respeito às quantias representadas pelos prémios não reclamados, a Comissão considerou que, uma vez que estes montantes foram sempre considerados recursos normais, os mesmos faziam parte das deduções não públicas. A sua utilização para cobrir, nomeadamente, despesas sociais bem como custos de vigilância, de controlo e de incentivo à criação e para financiar investimentos ligados à organização das corridas de cavalos e das apostas mútuas, não pode, por conseguinte, ser considerada um auxílio estatal, na medida em que não está preenchido o critério recursos estatais (partes IV e V, 1.).

29 Quanto à modificação da repartição das deduções públicas (v., supra, n._ 16), a Comissão referiu que os regimes fiscais aplicáveis às corridas hípicas eram da competência dos Estados-Membros e que os ajustamentos no sentido da alta ou da baixa das taxas de imposição fixadas não constituíam auxílios de Estado desde que aplicáveis de modo uniforme a todas as empresas interessadas. A existência de um auxílio de Estado só podia ser encarada quando uma baixa importante da taxa de imposição conduzisse ao reforço da situação financeira de uma empresa em posição de monopólio. Não seria esse aqui o caso, na medida em que a baixa em 1984 da dedução pública sobre as apostas foi limitada (cerca de 1,6%) e subsequentemente mantida, não tendo assim por objectivo financiar uma operação pontual. As autoridades francesas teriam agido com a finalidade de aumentar os recursos dos beneficiários das deduções não públicas de um modo permanente. Tendo em conta a especificidade da situação dos seus beneficiários, a medida em questão teria sido, deste modo, não um auxílio de Estado, mas uma «reforma sob a forma de acertamento `fiscal' justificada pela natureza e pela economia do regime em causa» (partes IV e V, 3.).

30 No que diz respeito à isenção do imposto sobre as sociedades, a Comissão considerou que, na medida em que este imposto «não (podia) aplicar-se ao (AIE) PMU devido ao seu estatuto jurídico», tal isenção devia «ser considerada como uma consequência da aplicação normal do regime fiscal geral» (parte V, 4.).

31 Quanto às facilidades de tesouraria decorrentes do adiamento do prazo concedido para o pagamento das deduções públicas, representando uma entrada de tesouraria de quase dois meses, concedido ao PMU por decisões de 24 de Abril de 1980 e 19 de Fevereiro de 1982, do Ministro do Orçamento, a Comissão considerou que, na medida em que estas facilidades tiveram por efeito aumentar a parte das deduções não públicas de uma forma constante desde 1981, não se tratava «de uma renúncia temporária a recursos por parte das autoridades públicas nem de uma medida pontual», devendo assim ser apreciada da mesma forma que a medida anterior relativa à repartição das deduções (v., supra, n._ 29) (partes IV e V, 5.).

32 Foi nestas circunstâncias que, por petição apresentada na Secretaria do Tribunal em 4 de Fevereiro de 1994, a Ladbroke interpôs o presente recurso.

33 Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal em 22 de Junho de 1994, o Governo da República Francesa pediu para intervir em apoio dos pedidos da Comissão.

34 Por despacho do presidente da Segunda Secção do Tribunal, de 30 de Agosto de 1994, esse pedido foi acolhido favoravelmente e, em 21 de Dezembro de 1994, a interveniente apresentou o seu memorando de intervenção, tendo a recorrente apresentado, em 31 de Março de 1995, as suas observações quanto ao mesmo.

35 Com base no relatório preliminar do juiz-relator, o Tribunal (Segunda Secção Alargada) decidiu dar início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo, convidou a recorrida a apresentar certos documentos e peças da correspondência trocada por ela com as autoridades francesas quanto aos auxílios concedidos ao PMU.

36 As partes foram ouvidas em alegações e nas suas respostas às questões orais do Tribunal na audiência pública de 11 de Março de 1997.

Pedidos das partes

37 A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

- anular a Decisão 93/625 na medida em que na mesma a Comissão decide

1) que as medidas seguintes escapam à aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado:

a) facilidades de tesouraria permitindo ao PMU adiar o pagamento ao Estado de certas deduções sobre as apostas;

b) isenção do imposto sobre as sociedades;

c) isenção do imposto sobre o rendimento;

d) renúncia a 180 milhões de FF de deduções sobre as apostas em 1986;

e) direito de o PMU conservar os prémios não reclamados;

f) excepção à regra do adiamento de um mês para a dedução do IVA a partir de 1 de Janeiro de 1989;

2) que as medidas seguintes eram compatíveis com o mercado comum por força do artigo 92._ do Tratado:

a) o arredondamento à décima inferior dos prémios dos apostadores entre 1982 e 1985, representando 315 milhões de FF;

b) a excepção à regra do adiamento de um mês para a dedução do IVA antes de 1 de Janeiro de 1989;

c) a isenção da participação dos empregadores no esforço de construção antes de 1 de Janeiro de 1989;

3) a) que em relação ao período anterior a 11 de Janeiro de 1991, não é necessário restituir o auxílio concedido ao PMU sob a forma de uma isenção da participação dos empregadores no esforço de construção;

b) que a Comissão não tem a obrigação de determinar ela própria o montante do auxílio resultante da isenção da participação dos empregadores no esforço de construção, cuja restituição foi ordenada pela Comissão relativamente ao período posterior a 11 de Janeiro de 1991;

- ordenar à Comissão:

1) que calcule no prazo de um mês após a data do acórdão do Tribunal:

a) o montante do auxílio concedido ao PMU sob a forma de uma isenção da participação dos empregadores no esforço de construção em relação ao período posterior a 11 de Janeiro de 1991, sendo o montante deste auxílio o das receitas a que o Estado francês renunciou isentando o PMU desta dedução durante esse período;

b) o montante dos juros sobre esta quantia, juros que devem ser calculados conforme o disposto no artigo 3._ da Decisão 93/625;

2) que exija, no decurso do mês seguinte, a restituição de todas as quantias devidas em conformidade com o n._ 1), alíneas a) e b), supra, que ainda não tenham sido restituídas ao Estado francês pelo PMU (bem como os juros sobre as mesmas);

3) que exija imediatamente a restituição de todas as receitas a que o Estado francês teria renunciado em razão da isenção da participação dos empregadores no esforço de construção concedida ao PMU durante o período compreendido entre 11 de Janeiro de 1989 e 11 de Janeiro de 1991, com os juros sobre esta quantia calculados conforme o disposto no artigo 3._ da Decisão 93/625;

4) sem prejuízo do n._ 3) supra, que reexamine imediatamente a denúncia feita em 7 de Abril de 1989 à luz do acórdão que o Tribunal de Primeira Instância proferir e que proceda a este reexame nos seis meses seguintes à data deste acórdão;

- condenar a Comissão nas despesas.

38 A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

- negar provimento ao recurso;

- condenar a recorrente nas despesas.

39 A interveniente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

- negar provimento ao recurso.

Quanto ao mérito

40 A recorrente invoca quatro fundamentos em apoio do seu recurso. Os dois primeiros assentam numa aplicação errada, respectivamente, do artigo 92._, n._ 1, e do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado, o terceiro numa violação das obrigações que incumbem à Comissão quando ordena a restituição de um auxílio de Estado e o quarto numa violação do artigo 190._ do Tratado.

Quanto à aplicação incorrecta do artigo 92._, n._ 1, do Tratado

41 A recorrente sustenta que a Comissão aplicou o artigo 92._, n._ 1, do Tratado, de maneira incorrecta, na medida em que considerou que quatro das sete medidas estatais em causa não constituíam auxílios de Estado e, no que diz respeito à medida sob a forma de isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA, que a mesma já não constituía um auxílio de Estado a partir de 1989, porque os seus efeitos eram compensados por um depósito permanente junto do Tesouro público.

Quanto à modificação da repartição das deduções e à renúncia consecutiva a 180 milhões de FF sobre as deduções a partir de 1985

- Exposição sumária da argumentação das partes

42 A recorrente sustenta que, tal como resultaria das provas produzidas na sua denúncia, a renúncia, por decretos de 23 de Janeiro de 1985 e de 12 de Março de 1986, a uma parte da dedução do Estado, estimada em 180 milhões de FF, estaria directamente ligada ao plano de recuperação do PMU e uma grande parte desta quantia teria servido para financiar os despedimentos em grande escala do pessoal do PMU. Faz referência a um comunicado da agência noticiosa AFP segundo o qual o Secretário de Estado francês do Orçamento na altura dos factos tinha aprovado o programa de recuperação do PMU declarando que «o Estado, por seu turno, contribui com um auxílio de 180 milhões de FF, obtidos graças à renúncia a uma parte da dedução sobre as apostas que lhe era destinada, em benefício das sociedades de corridas».

43 O facto de a alteração legislativa da repartição das deduções ter sido posteriormente mantida em nada prejudica o facto de que a mesma estava estreitamente ligada ao plano de recuperação do PMU. Segundo a recorrente, um Estado-Membro não pode escapar à aplicação das regras sobre os auxílios de Estado tornando permanente o que, inicialmente, mais não era que um auxílio temporário. De qualquer modo, todo o sistema de deduções constituiria um sistema de auxílios de Estado, de modo que qualquer modificação deste sistema em benefício do PMU constituiria, igualmente, um auxílio de Estado.

44 Quanto ao argumento da Comissão segundo o qual é legítimo que um Estado-Membro contribua para a reestruturação das empresas no contexto de uma fiscalidade gravosa e derrogatória, a recorrente invoca o acórdão de 2 de Julho de 1974, Itália/Comissão (173/73, Colect., p. 357), no qual o Tribunal de Justiça rejeitou um argumento segundo o qual uma redução da carga fiscal com um tal objectivo não era abrangida pela proibição do artigo 92._ do Tratado. Além disso, a recorrente contesta que o PMU esteja sujeito a uma pesada carga fiscal, superior à que onera as outras actividades económicas, sublinhando que este argumento invocado pela Comissão na sua contestação, não constava da decisão impugnada.

45 A Comissão sustenta que a redução, a partir de 1985, da parte deduzida pelo Estado francês sobre as receitas das apostas constituía uma modificação permanente do regime de imposição e não pode, por conseguinte, ser considerada um auxílio de Estado.

46 A Comissão, refutando a existência de um nexo directo entre a modificação do regime de imposição das deduções e o plano de recuperação do PMU, sustenta que, mesmo que ele existisse, tal não significaria que a medida em questão constituía um auxílio de Estado, porque no contexto de uma fiscalidade gravosa e derrogatória, como aquela a que o PMU se encontra sujeito, seria legítimo que o Estado contribuísse para a reestruturação das empresas interessadas a fim de garantir as suas próprias receitas para o futuro, retirando o Tesouro francês um lucro substancial de qualquer melhoria da eficácia do PMU.

47 Por fim, como resultaria da declaração do Secretário de Estado do Orçamento, citada pela recorrente (v., supra, n._ 42), a medida em questão foi adoptada «em benefício das sociedades de corridas» e não em benefício do PMU. Tendo o processo nos termos do artigo 92._, n._ 3, do Tratado dito respeito apenas ao PMU e não às sociedades de corridas, a Comissão não podia portanto pronunciar-se sobre um auxílio que teria sido concedido às sociedades de corridas.

48 Além disso, e de qualquer modo, as condições essenciais para que uma medida seja qualificada de auxílio de Estado incompatível e ilegal face ao Tratado, não se encontrariam reunidas no caso das sociedades de corridas, devido à inexistência de uma relação de concorrência entre elas e a recorrente.

49 Por fim, na audiência, a Comissão, invocando o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Fevereiro de 1997, FFSA e o./Comissão (T-106/95, Colect., p. II-229), sustentou que lhe deve ser reconhecido um certo poder de apreciação para decidir qual o método mais adequado para se assegurar de que as actividades sujeitas ao livre jogo da concorrência não recebem subsídios, apreciação que só deve ser alvo de sanções em caso de erro manifesto.

50 A interveniente subscreve os pedidos da Comissão e quanto ao restante remete para os seus argumentos desenvolvidos a propósito das facilidades de tesouraria (v., infra, n.os 72 e 73).

- Apreciação do Tribunal

51 O Tribunal salienta que resulta da decisão impugnada que a modificação da repartição das deduções ocorrida em 1985 e em 1986 não constituía um auxílio de Estado mas uma «reforma sob a forma de acertamento fiscal, justificada pela natureza e pela economia do regime em causa», na medida em que os três critérios exigidos pela Comissão para apreciar a sua compatibilidade com o artigo 92._, n._ 1, do Tratado, não se encontravam preenchidos. Com efeito, segundo a decisão impugnada, a medida em questão, a) só constituía uma redução limitada da taxa das deduções (cerca de 1,6%), não reforçando a situação financeira de uma empresa em posição de monopólio, b) tinha carácter permanente, e, c) não se destinava a financiar uma operação pontual, mas «a aumentar os recursos dos beneficiários das deduções não públicas» (parte V, 3., da decisão impugnada).

52 O Tribunal considera que, tratando-se aqui da questão de saber qual a extensão da fiscalização do juiz comunitário sobre os critérios escolhidos pela Comissão a fim de apreciar se a medida fiscal em causa caía ou não no âmbito de aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, convém recordar, em primeiro lugar, que esta última disposição, que declara incompatível com o mercado comum toda e qualquer intervenção estatal que, independentemente da forma que assuma, falseie ou ameace falsear a concorrência no mercado comum, favorecendo certas empresas, não faz a distinção segundo as causas ou os objectivos das intervenções estatais, mas define-as em função dos seus efeitos (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Setembro de 1996, França/Comissão, C-241/94, Colect., p. I-4551, n.os 19 e 20). Daqui resulta que o conceito de auxílio é um conceito objectivo e função da mera questão de saber se uma medida estatal confere ou não um benefício a uma ou a certas empresas. Por conseguinte, o Tribunal considera que a qualificação de uma medida como auxílio de Estado, que segundo o Tratado, incumbe tanto à Comissão como ao juiz nacional, não pode, em princípio, justificar, na ausência de circunstâncias especiais devidas nomeadamente à natureza complexa da intervenção estatal em causa (acórdãos do Tribunal de Justiça de 29 de Fevereiro de 1996, Bélgica/Comissão, C-56/93, Colect., p. I-723, n.os 10 e 11, e do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 1996, Air France/Comissão, T-358/94, Colect., p. II-2109, n._ 71), o reconhecimento de um amplo poder de apreciação à Comissão. Com efeito, a apreciação da pertinência das causas ou objectivos das intervenções estatais apenas faz parte do exame da compatibilidade eventual destas medidas com o mercado comum, como previsto no artigo 92._, n._ 3, do Tratado. Ora, é apenas na aplicação desta disposição, que implica a tomada em consideração pela Comissão de apreciações complexas de ordem económica, social, regional e sectorial, que é efectivamente conferido à Comissão um amplo poder discricionário (acórdãos do Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 1997, Espanha/Comissão, C-169/95, Colect., p. I-135, n._ 18, e de 15 de Maio de 1997, TWD/Comissão, C-355/95 P, Colect., p. I-2549, n._ 26).

53 Esta conclusão não é afectada pelo acórdão FFSA e o./Comissão, já referido, invocado pela Comissão, no qual o Tribunal, a respeito da questão de saber se uma medida estatal que preenche as condições de aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado (n.os 167 e 168 do acórdão), pode, no entanto, beneficiar da derrogação prevista no artigo 90._, n._ 2, do Tratado, reconheceu à Comissão um amplo pode de apreciação (n.os 170 a 187 do acórdão), porque diferentemente desse acórdão, o presente processo não diz respeito à apreciação da medida estatal em causa face ao artigo 90._, n._ 2, do Tratado.

54 Em segundo lugar, há que recordar que, embora seja um facto, como a Comissão, aliás, salientou na decisão impugnada, que a fiscalidade bem como a introdução dos regimes fiscais são da competência das autoridades nacionais, não deixa também de ser verdade que o exercício de tal competência pode, eventualmente, revelar-se incompatível com o artigo 92._, n._ 1, do Tratado (acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de Junho de 1970, França/Comissão, 47/69, Colect. 1969-1970, p. 391).

55 É, portanto, à luz das considerações que precedem que se deve examinar se, no caso de figura, a Comissão podia validamente fundar-se nos três critérios já mencionados (v., supra, n._ 51) para concluir que a medida fiscal em questão não constituía um auxílio de Estado na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, mas uma «reforma sob a forma de acertamento fiscal, justificada pela natureza e pela economia do regime em causa».

56 Em primeiro lugar, no que diz respeito ao critério relacionado com a natureza permanente da medida em questão, como se acaba de expor, o artigo 92._, n._ 1, do Tratado, não distingue entre medidas estatais permanentes e temporárias. Além disso, tal critério seria de difícil aplicação na matéria porque, como a interveniente acertadamente sublinhou na audiência, não é fácil, tendo em conta a frequência dos ajustamentos das taxas de fiscalidade pelas autoridades nacionais, determinar se uma medida que, inicialmente, foi considerada permanente, não deve, subsequentemente, ser qualificada de provisória em razão de um novo ajustamento destas taxas e, portanto, ser considerada, segundo a argumentação da Comissão, um auxílio de Estado em razão da sua duração limitada no tempo. Inversamente, uma medida que, inicialmente, seria considerada temporária, de modo que, segundo a argumentação da Comissão, o artigo 92._, n._ 1, do Tratado seria aplicável, pode, subsequentemente, ser transformada numa medida permanente tendo por consequência, ainda segundo a Comissão, que deixaríamos de estar perante um auxílio de Estado. Nestas condições, a aplicação do critério assente no carácter permanente de uma medida estatal, como proposto pela Comissão, daria origem a incertezas tais na aplicação do artigo 92._ do Tratado, que este critério não seria conforme ao princípio da segurança jurídica.

57 Quanto ao segundo critério, segundo o qual a medida em questão não se destinava a financiar uma operação pontual, o Tribunal salienta que, como acaba de se recordar, o artigo 92._, n._ 1, não faz a distinção segundo as causas ou os objectivos das intervenções estatais, mas define-as em função dos seus efeitos (acórdão de 26 de Setembro de 1996, França/Comissão, já referido, n._ 20). Ora, tal como resulta da própria decisão impugnada, a medida em questão destinava-se efectivamente «a aumentar os recursos dos beneficiários das deduções não públicas de uma forma permanente».

58 De qualquer modo, mesmo pressupondo que tal critério possa validamente ser invocado a fim de distinguir as medidas fiscais que caem no âmbito de aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado daquelas a que tal não acontece, não deixa de ser um facto que a verificação da Comissão, segundo a qual a alteração das taxas das deduções não se destinava a financiar uma operação pontual é, no caso de figura, contrariada por outra afirmação, constante da decisão impugnada, que esclarece que «a partir de 1984, a situação das sociedades de corridas era deficitária» e que «em consequência e a título de complemento a um plano de recuperação... as autoridades francesas alteraram o sistema de repartição das deduções» (v. parte IV, 3., da decisão impugnada). Esta verificação da Comissão na decisão impugnada deve, além disso, ser lida à luz da carta que dá início ao processo, segundo a qual o conjunto dos benefícios financeiros concedidos ao PMU permitiram a este último fazer face aos custos de informatização e de reestruturação das suas operações, necessárias à organização das suas missões de gestão.

59 Por fim, quanto ao terceiro critério seguido pela Comissão, relativo ao carácter limitado da baixa da taxa da dedução pública decidida pelas autoridades francesas, o Tribunal salienta, antes de mais, que, como resulta da jurisprudência na matéria, a importância relativamente fraca de um auxílio não exclui a priori a aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado (acórdãos do Tribunal de Justiça de 21 de Março de 1990, Bélgica/Comissão, C-142/87, Colect., p. I-959, n._ 43, e de 14 de Setembro de 1994, Espanha/Comissão, C-278/92, C-279/92 e C-280/92, Colect., p. I-4103, n._ 42). Todavia, mesmo pressupondo que o carácter limitado da baixa da taxa de uma dedução pública possa, em certos casos, justificar a não aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, não deixa de ser um facto que no caso sub judice não é contestado que, segundo a decisão impugnada, o ajustamento da taxa das deduções teve por efeito «aumentar os recursos dos beneficiários das deduções não públicas». Por outro lado, se a baixa da dedução pública podia ser considerada «limitada» em termos de taxa (cerca de 1,6%), tal não significa que se tratava, igualmente, de uma baixa limitada em números absolutos. Com efeito, como resulta da carta que dá início ao processo e dos autos (v., supra, n._ 5), o PMU beneficiou, só para o ano de 1986, de 180 milhões de FF. Dado que a medida em questão tinha carácter permanente, o facto de o PMU poder beneficiar de tal quantia numa base anual, não podia justificar a conclusão segundo a qual uma baixa «limitada» da taxa da dedução só concedia benefícios mínimos ao PMU. Acrescente-se, a este respeito, que a quantia de 180 milhões de FF de que o PMU beneficiou só para o ano de 1986, também não pode ser considerada, segundo as orientações da política da Comissão em matéria de auxílios, como expostas na sua comunicação de 20 de Maio de 1992 relativa ao enquadramento comunitário dos auxílios estatais às pequenas e médias empresas (JO C 213, p. 2), um auxílio de minimis. Com efeito, segundo esta comunicação, que era aplicável quando da adopção da decisão impugnada, o montante de um auxílio abaixo do qual o artigo 92._, n._ 1, podia ser considerado não aplicável era fixado em 50 000 ecus pagos num período de três anos. Ora, correspondendo um montante de 180 milhões de FF a cerca de 27 137 000 ecus, pago num só ano, o mesmo era manifestamente superior ao referido limiar.

60 Quanto ao argumento da Comissão segundo o qual resultaria da declaração do Secretário de Estado do Orçamento, citada pela recorrente (v., supra, n._ 42) que, de qualquer modo, a medida em questão só diria respeito às sociedades de corridas e não ao PMU, saliente-se que tal é contestado pela própria decisão impugnada, que só respeitava às medidas tomadas pelas autoridades francesas em benefício apenas do PMU (v., na matéria, a carta que dá início ao processo do artigo 93._, n._ 3, do Tratado bem como a parte V da decisão impugnada). Com efeito, a decisão impugnada não contém qualquer consideração segundo a qual a razão por que não era aplicável no caso concreto o artigo 92._, n._ 1, do Tratado, era que a medida em questão não dizia respeito ao PMU, empresa directamente visada pelo início do processo, mas sim às sociedades de corridas.

61 Além disso, este mesmo argumento da Comissão é contestado pelo conjunto da sua argumentação, como exposta nomeadamente na sua contestação, onde alegou que a apreciação na decisão impugnada da medida em questão se justificava pelo facto de que «as actividades do PMU se encontravam dificultadas nomeadamente devido à fiscalidade, sendo necessário obviar a tal» e que tendo esta medida por efeito «a melhoria da eficácia do PMU», que permitiria «ao Tesouro francês obter um lucro substancial». Por último, se é um facto, tal como resulta da declaração já mencionada (v., supra, n._ 42), que o Estado francês concedeu um auxílio de 180 milhões de FF, «em benefício das sociedades», daí resulta igualmente que este «auxílio» era objecto de um acordo concluído entre o Estado francês, as sociedades de corridas e o PMU e que se destinava, designadamente, a ajudar as sociedades de corridas, membros do PMU, a proceder a «cerca de mil despedimentos sobretudo no PMU». Por conseguinte, este argumento da Comissão não pode ser acolhido.

62 Resulta do que precede que os três critérios já referidos, como aplicados no caso de figura, não eram susceptíveis de justificar a conclusão de acordo com a qual a redução da taxa da dedução não assumia a natureza de um auxílio na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, assemelhando-se a uma reforma sob a forma de ajustamento fiscal justificado pela natureza e pela economia do regime em causa. Por conseguinte, esta parte da decisão impugnada deve ser anulada.

Quanto às facilidades de tesouraria permitindo ao PMU diferir o pagamento de certas deduções sobre as apostas

- Exposição sumária da argumentação das partes

63 A recorrente sustenta que as deduções cujo pagamento é adiado constituem deduções públicas, como a Comissão teria, aliás, reconhecido na parte IV, 5., da decisão impugnada. Ora, a imposição de tais deduções públicas pelo Estado e o desembolso de todo ou parte do produto destas por este último constituiriam, segundo a jurisprudência na matéria, um auxílio de Estado na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado. Em consequência, a decisão do Estado francês de autorizar o PMU a adiar o pagamento da parte das deduções que lhe é devida seria abrangida pela proibição deste artigo do Tratado (acórdãos do Tribunal de Justiça de 22 de Março de 1977, Steinike & Weinlig, 78/76, Colect., p. 203, de 13 de Dezembro de 1983, Apple and Pear Development Council, 222/82, Recueil, p. 4083, e de 30 de Janeiro de 1985, Comissão/França, 290/83, Recueil, p. 439).

64 Segundo a recorrente, a modificação das regras sobre o pagamento das deduções ao Estado não pode ser considerada, contrariamente ao que sustenta a Comissão, uma modificação de carácter geral da taxa de tributação das corridas de cavalos, porque esta modificação beneficiaria o PMU e não o sector das corridas hípicas em geral. A recorrente considera que o facto de as «facilidades de tesouraria» beneficiarem igualmente as sociedades de corridas, membros do PMU, não impede a existência de um auxílio concedido em favor deste último e a ausência de carácter geral do auxílio em questão, uma vez que as sociedades de corridas membros do PMU só são dez sobre 275 outras sociedades de corridas em França e que o PMU só aceita apostas sobre menos de 1% das corridas organizadas nos hipódromos não pertencentes aos seus membros. Tal seria confirmado, por um lado, por um relatório do Tribunal de Contas francês, de 1987, segundo o qual a modificação das regras de pagamento das deduções ao Estado se destinava a ajudar o PMU a cobrir o custo do aumento das comissões devidas aos seus postos de venda e, por outro, pela resposta do Ministério da Economia, das Finanças e das Privatizações francês ao referido relatório, segundo a qual o regime fiscal do PMU é «derrogatório do direito comum».

65 A recorrente conclui que estamos em presença de uma modificação ad hoc e temporária do sistema das deduções em favor de uma empresa determinada, de modo que, tendo em conta a jurisprudência segundo a qual um regime fiscal que favoreça, mesmo de modo permanente, um sector determinado constitui um auxílio de Estado (acórdãos do Tribunal de Justiça de 12 de Julho de 1973, Comissão/Alemanha, 70/72, Colect., p. 309, e de 24 de Fevereiro de 1987, Deufil/Comissão, 310/85, Colect., p. 901), o mesmo sucederia, a fortiori, quanto a medidas que favorecem uma só empresa.

66 Quanto ao argumento da Comissão segundo o qual a modificação do regime do pagamento das deduções ao Estado seria justificada pela preocupação das autoridades francesas em alinhar o regime do pagamento das deduções do PMU pelo das deduções do Loto (parte IV, 5.), o mesmo deveria, segundo a recorrente, ser afastado na medida em que, por um lado, não faz parte da apreciação jurídica da Comissão na decisão impugnada e, por outro, esta última não teria explicado as razões por que as conclusões contrárias do Tribunal de Contas sobre este ponto seriam erradas.

67 A título subsidiário, a recorrente convida o Tribunal a anular esta parte da decisão impugnada por falta de fundamentação.

68 A Comissão sustenta que a jurisprudência citada pela recorrente, segundo a qual medidas fiscais especiais tomadas em favor de um sector económico particular constituiriam auxílios de Estado, a mesma não é aplicável porque o presente processo não diz respeito a um sistema de fiscalidade normal, aplicável a todas as empresas, mas a um sistema de tributação excepcional destinado a um único operador. As modificações introduzidas em tal sistema não poderiam, assim, ser apreciadas na mesma base que as introduzidas num sistema de tributação geral. Segundo a Comissão, a tese da recorrente teria por consequência que as autoridades francesas nunca poderiam alterar a tributação das apostas sobre as corridas de cavalos, o que de modo algum seria o objectivo do artigo 92._ do Tratado.

69 A Comissão acrescenta, a este respeito, que embora nas suas conclusões no processo Sloman Neptun, acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Março de 1993, C-72/91 e C-73/91, Colect., p. I-887, I-903, o advogado-geral M. Darmon tenha utilizado o conceito de «derrogação», no sentido de que uma medida que não se aplica a todas as empresas ou a todos os sectores industriais que dela podiam beneficiar constitui um auxílio, tal critério não seria sem mais aplicável ao sector das apostas sobre as corridas de cavalos. Tratando-se, com efeito, de um sector sujeito a uma tributação mais gravosa do que a fiscalidade normal, o único critério utilizável para determinar se uma modificação desta fiscalidade especial constitui ou não um auxílio de Estado é, segundo a Comissão, o que permite estabelecer se se trata de uma modificação permanente ou de uma modificação temporária, sendo esta última a única susceptível de constituir um auxílio de Estado.

70 Além disso, a Comissão contesta que a medida em causa não tenha só beneficiado o PMU, dado que as receitas obtidas pelo PMU são em seguida repartidas entre os seus membros, as sociedades de corridas, de modo que a medida em causa teria beneficiado cada uma delas. O facto de as sociedades de corridas, que são membros do PMU, representarem apenas uma parte da totalidade das sociedades de corridas em França, seria irrelevante, dado que elas são as únicas sujeitas ao sistema de tributação em questão.

71 Por fim, a Comissão sustenta que as referências feitas várias vezes pela recorrente ao relatório do Tribunal de Contas francês, de 1987, são irrelevantes uma vez que este não é competente para se pronunciar sobre a questão de saber se medidas fiscais ou parafiscais constituem auxílios de Estado na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado.

72 A interveniente subscreve os argumentos da Comissão e acrescenta que a tese da recorrente, segundo a qual os auxílios concedidos ao PMU só beneficiam um número limitado de pessoas do sector da criação de cavalos em França não é fundada, porque todas as sociedades de corridas podem beneficiar virtualmente dos serviços deste organismo.

73 Quanto aos recursos obtidos do PMU, a interveniente sublinha que os mesmos se destinam à totalidade do sector francês da criação de cavalos, uma vez que os prémios e incentivos são dados aos criadores, proprietários e outros profissionais do mundo equestre, destinando-se assim, em grande parte, a sociedades de corridas que não são membros do PMU.

- Apreciação do Tribunal

74 A recusa da Comissão em qualificar a medida aqui em análise de auxílio de Estado na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, funda-se na consideração de que o regime fiscal aplicável ao PMU, e mais em geral ao sector das corridas hípicas, não é um regime derrogatório do regime fiscal geral, mas um regime «excepcional», justificado pelas características particulares do sector em causa, e que, analisada à luz dos critérios aplicados pela Comissão ao auxílio resultante da modificação da taxa das deduções pagas pelo PMU (v., supra, n.os 68 e 69), esta medida não constituiria um auxílio de Estado visto que não seria pontual e teve «por efeito aumentar a parte das deduções não públicas de uma forma constante desde 1981», sem «renúncia temporária a recursos por parte das autoridades públicas» (parte V, 5., da decisão impugnada).

75 Há, por conseguinte, que examinar, antes de mais, se a Comissão podia defender que o regime fiscal aplicável ao sector das corridas hípicas não constituía, em si, um regime derrogatório do regime fiscal geral, mas um regime específico, destinado a reger apenas o sector em causa.

76 Na medida em que as actividades do PMU são objecto de uma regulamentação específica, que lhe garante uma exclusividade na organização das apostas mútuas em França (v., supra, n._ 2), e em que o regime fiscal que lhe é aplicável tem em conta não só esta especificidade, mas a globalidade dos traços característicos da instituição das corridas hípicas em França, a Comissão podia considerar que o sistema específico das deduções, que determina a parte dos recursos provenientes das apostas que cabe respectivamente ao Estado, aos apostadores, ao PMU e às sociedades de corridas, não constituía um sistema derrogatório em relação ao regime fiscal geralmente aplicável a outras actividades e que, por conseguinte, a medida em causa devia ser examinada apenas no âmbito do regime fiscal específico do sector das corridas hípicas.

77 Todavia, o mero facto de esta medida fazer parte de um regime específico, e não de um regime derrogatório ao regime fiscal geral, não a pode subtrair à aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado. Há, portanto, que examinar os efeitos desta medida para verificar se o artigo 92._, n._ 1, do Tratado foi, no caso sub judice, correctamente declarado não aplicável.

78 O Tribunal salienta que a Comissão admite na decisão impugnada que a medida em exame constituiu uma renúncia por parte das autoridades estatais a recursos a que tinha direito, tendo «por efeito aumentar a parte das deduções não públicas de uma forma constante desde 1981». Ora, como se acaba de recordar, uma medida estatal, permanente ou temporária, que tenha por efeito conceder benefícios financeiros a uma empresa e melhorar a sua situação financeira, é abrangida pelo conceito de auxílio de Estado na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado (v., supra, n._ 52), de modo que a distinção entre uma modificação permanente e uma modificação temporária das modalidades do pagamento das deduções não constitui um critério suficiente para afastar a aplicação, no caso concreto, do artigo 92._, n._ 1, do Tratado (v., supra, n._ 56).

79 Quanto ao facto de que a alteração do regime do pagamento ao Tesouro público das deduções públicas não constituiu uma medida pontual e derrogatória, mas uma alteração de ordem geral do regime fiscal beneficiando todo o sector das corridas hípicas, o Tribunal salienta que, contrariamente ao que afirma a Comissão, a decisão impugnada não contém qualquer consideração neste sentido e que, segundo a parte IV, 5., desta decisão, o diferimento dos pagamentos devidos ao Tesouro público foi concedido pelo Ministro do Orçamento unicamente em benefício do PMU. O facto de a instituição das apostas mútuas em França poder trazer, em geral, vantagens não só para os membros do PMU, mas também, de modo indirecto, para as sociedades que o não são, não pode constituir um elemento de apreciação determinante. Com efeito, se é certo que um auxílio concedido a um operador económico determinado pode igualmente beneficiar, indirectamente, outros operadores cujas actividades dependem da actividade principal do beneficiário directo do auxílio em questão, tal consideração não basta para concluir que a medida em questão é uma medida de natureza geral que não cai no âmbito de aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, mas quando muito que pode, eventualmente, beneficiar da derrogação sectorial prevista para o efeito pelo artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado.

80 Além disso, como a Comissão sublinha na decisão impugnada (v. parte V, 7.), para efeitos da aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, há que distinguir entre a actividade principal do PMU, a saber, a organização e o tratamento das apostas, e a actividade dos seus membros, ou seja, a organização das corridas hípicas. Por conseguinte, mesmo pressupondo que as facilidades de tesouraria concedidas ao PMU beneficiam, de um modo ou de outro, todo o sector das corridas hípicas, não deixa de ser um facto que estes benefícios financeiros permitem ao PMU melhorar a sua posição no mercado da aceitação de apostas, tanto no mercado nacional como nos mercados estrangeiros, por intermédio do PMI, em concorrência directa com a recorrente (parte III da decisão impugnada). De qualquer modo, verifica-se que os argumentos adiantados a este respeito pela Comissão e pela interveniente, não figuram na apreciação jurídica da decisão impugnada, de modo que esta decisão deve, igualmente, considerar-se, a este respeito, viciada por insuficiência ou até mesmo ausência de fundamentação.

81 Por fim, o argumento da Comissão segundo o qual a intervenção estatal em questão se inseria no quadro de uma tributação especialmente gravosa do sector das corridas, que seria manifestamente superior à de outros sectores, adiantado pela primeira vez no Tribunal, sem ser acompanhado de elementos de prova suficientes, o mesmo não é susceptível de demonstrar, por si só, a razoabilidade da tese da Comissão.

82 Nestas condições, a acusação da recorrente assente numa aplicação errada do artigo 92._, n._ 1, a respeito das facilidades de tesouraria concedidas ao PMU é procedente e esta parte da decisão impugnada deve ser anulada.

Quanto à isenção do imposto sobre as sociedades

- Exposição sumária da argumentação das partes

83 A recorrente sustenta que a decisão se encontra viciada por erro de direito, na medida em que a Comissão considerou que a isenção do imposto sobre as sociedades de que o PMU beneficia era a consequência da aplicação normal do regime fiscal geral que exclui do âmbito de aplicação deste imposto os AIE.

84 Explica que não se trata, no caso de figura, da isenção do imposto sobre as sociedades em benefício do PMU, mas em benefício das sociedades membros do PMU, como indicava na sua denúncia de 7 de Abril de 1989 e na sua interpelação de 5 de Novembro de 1992. Acrescenta que, segundo o Tribunal de Contas francês, tal isenção em benefício de sociedades de corridas era ilegal mesmo segundo o direito francês. Além disso, não haveria qualquer isenção desta natureza relativamente a outras sociedades de corridas ou membros de um AIE.

85 Por fim, a recorrente contesta a rejeição tácita da acusação constante da sua denúncia, segundo a qual a isenção do imposto sobre o rendimento de que beneficia o PMU constitui igualmente uma medida de auxílio de Estado, alegando que, neste ponto, a decisão impugnada é desprovida de fundamentação.

86 A Comissão explica que, se o PMU não está sujeito ao imposto sobre as sociedades, tal deve-se ao facto de que não dispõe, enquanto AIE, de capital próprio, podendo os seus resultados financeiros ser directamente integrados nos dos seus membros, de modo que se torna fiscalmente transparente, ou seja, que o imposto é devido não por ele, mas pelos seus membros. Quanto ao argumento da recorrente segundo o qual este imposto devia ter sido pago pelas sociedades de corridas, a Comissão contrapõe que só iniciou o processo do artigo 93._, n._ 2, do Tratado em relação aos auxílios concedidos em favor do PMU e não em favor das sociedades de corridas.

87 Quanto à pretensa rejeição tácita da acusação da recorrente quanto à isenção do imposto sobre o rendimento em benefício do PMU, a Comissão salienta que esta medida não foi abordada na decisão que inicia o processo nos termos do artigo 93._, n._ 2, e não podia, por conseguinte, ser tratada na decisão impugnada.

88 A interveniente sublinha que, admitindo que a actividade das apostas permanece isolada do resto da actividade das sociedades de corridas e que a parte reservada aos apostadores se mantém constante, se as sociedades de corridas estivessem sujeitas ao imposto sobre as sociedades e a uma fiscalidade de direito comum, o montante dos seus pagamentos seria menor. Segundo a interveniente, se o IVA à taxa normal (18,6%) fosse aplicado à parte que não é distribuída aos apostadores (28% das apostas), os recursos brutos das sociedades de corridas elevar-se-iam a 22,8% das apostas [28% - (28% x 18,6%) = 28% - 5,2%]. O «lucro» antes do imposto do PMU seria então igual a este resultado, menos as despesas de gestão do PMU, ou seja, 17,3% (22,8% - 5,5%). O imposto sobre as sociedades, calculado à taxa actual de 33% sobre os lucros, elevar-se-ia a 5,7% das apostas (17,3% x 33%). A parte final das sociedades de corridas seria portanto, após dedução das despesas de gestão do PMU, de 11,6% das apostas (17,3% - 5,7%), ao passo que actualmente se encontra compreendida entre 4,5% e 5%. Daqui resulta que o mecanismo actual de tributação do PMU, que prevê a isenção do imposto sobre as sociedades, não constitui um auxílio de Estado em benefício das sociedades de corridas.

- Apreciação do Tribunal

89 O Tribunal salienta que, segundo a decisão impugnada, a isenção do imposto sobre as sociedades de que o PMU beneficia é a consequência da aplicação normal do regime fiscal geral na medida em que tal imposto não se aplica aos AIE. Todavia, a recorrente, sem contestar a razoabilidade desta conclusão, alegou que, tal como resultava da sua denúncia, no caso de figura não é a isenção do pagamento deste imposto em benefício do PMU que está em causa, mas a isenção de que beneficiam as sociedades de corridas.

90 Há, por conseguinte, que examinar se o facto de a Comissão, contrariamente ao que era indicado na denúncia da recorrente, não ter julgado necessário iniciar o processo em relação às sociedades de corridas, mas apenas em relação ao PMU, é susceptível de afectar a legalidade da decisão impugnada.

91 Saliente-se a este respeito, que o direito de terceiros apresentarem uma denúncia à Comissão por violação do artigo 92._ do Tratado e levá-la assim a iniciar o processo previsto pelo artigo 93._, n._ 2, do Tratado, contra o Estado-Membro em causa, e a adoptar eventualmente no termo deste uma decisão final, não é regido por qualquer texto ou disposição de direito derivado equivalente ao Regulamento n._ 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos 85._ e 86._ do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22).

92 Todavia, se a Comissão decidir rejeitar uma denúncia adoptando uma decisão para o efeito, a mesma, deve, por força do artigo 190._ do Tratado, ser fundamentada a fim de permitir ao interessado conhecer as suas justificações e, se for caso disso, invocar os seus direitos perante o juiz comunitário. No caso concreto, no entanto, não houve decisão expressa de rejeição da denúncia da recorrente mas, pelo contrário, adopção de uma decisão de início do processo nos termos do artigo 93._, n._ 2, do Tratado, por carta dirigida ao Governo francês e publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias (v., supra, n._ 5). Nestas condições, se a recorrente considerava que, ao agir deste modo, a Comissão não tinha tomado posição sobre a totalidade das medidas estatais indicadas na sua denúncia, devia ter interpelado a Comissão nos termos do artigo 175._ do Tratado.

93 A este respeito, o Tribunal salienta que resulta dos autos que, na sua carta de 11 de Agosto de 1992, a Ladbroke convidou efectivamente a Comissão a tomar posição por força do artigo 175._ do Tratado quanto aos auxílios indicados na sua denúncia que não tinham sido objecto da decisão provisória (v., supra, n._ 9) e que a Comissão, por carta de 12 de Outubro de 1992, respondeu a esta interpelação (v., supra, n._ 10). Todavia, após esta resposta da Comissão, a Ladbroke interpelou-a de novo, mas convidando-a apenas a tomar posição em relação às medidas que tinham sido objecto da decisão de início do processo (v., supra, n._ 11). Não tendo a Comissão dado seguimento a esta segunda interpelação, a Ladbroke intentou uma acção por omissão no Tribunal de Primeira Instância, da qual contudo desistiu, no seguimento da adopção da decisão impugnada (v., supra, n.os 12 a 14). Ora, se a Ladbroke considerava que a resposta da Comissão à sua primeira interpelação não constituía uma tomada de posição sobre todas as medidas indicadas na sua denúncia, devia, de novo, interpelar a Comissão para que esta tomasse posição sobre a totalidade das medidas denunciadas, e não se limitar a convidá-la a tomar posição apenas em relação às medidas abrangidas pelo início do processo. Se, em contrapartida, a Ladbroke julgava que a resposta da Comissão à sua primeira interpelação constituía uma tomada de posição, consistindo numa rejeição tácita da parte da sua denúncia que indicava a medida aqui em exame, devia ter interposto um recurso de anulação, nos termos do artigo 173._, quinto parágrafo, do Tratado.

94 Daqui resulta que, por não ter iniciado e prosseguido o processo previsto no artigo 175._ do Tratado, ou interposto, atempadamente, um recurso de anulação, a recorrente não pode, de qualquer modo, contestar, no âmbito do presente recurso, o facto de a Comissão, que não deu início ao processo em relação à medida em causa, não se ter pronunciado sobre esta mesma medida na decisão impugnada.

95 O mesmo acontece, e pelas mesmas razões, quanto ao argumento da recorrente assente na rejeição tácita da acusação constante da sua denúncia relativa à isenção do imposto sobre o rendimento de que beneficia o PMU.

Quanto à colocação à disposição do PMU dos prémios não reclamados

- Exposição sumária da argumentação das partes

96 A recorrente sustenta, antes de mais, que a decisão impugnada se encontra viciada por erro de direito na medida em que a Comissão considerou que a colocação à disposição do PMU dos prémios não reclamados, em conformidade com o Decreto 83-878, para financiar despesas sociais, não constituía um auxílio de Estado, porque estes prémios eram considerados «recursos normais», fazendo parte das deduções não públicas, e não «recursos estatais» na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado.

97 Segundo a recorrente, dado que a tributação das deduções e a sua repartição são decididas pelo Estado francês, seria errado qualificar os recursos em questão de deduções não públicas, constituindo toda e qualquer transferência de recursos para o PMU prevista por medidas de direito público um auxílio de Estado. De qualquer modo, mesmo se os prémios não reclamados devessem ser considerados recursos normais das sociedades de corridas, não deixaria de ser um facto que a alteração introduzida pelo artigo 27._ do Decreto 83-879, constituiu um auxílio de Estado, na medida em que a decisão que permite ao PMU dispor destas quantias tinha sido tomada por iniciativa e com a aprovação do Estado (acórdãos do Tribunal de Justiça, Comissão/França, já referido, n.os 14-15, e de 2 de Fevereiro de 1988, Van der Kooy/Comissão, 67/85, 68/85 e 70/85, Colect., p. 219, n.os 32 a 38).

98 A recorrente sustenta, em seguida, que os recursos provenientes dos prémios não reclamados e colocados à disposição do PMU destinavam-se na realidade a financiar as despesas de funcionamento do PMU ocasionadas pela informatização das suas operações de tratamento das apostas. Explica a este respeito que, antes da adopção do Decreto 83-878, um decreto de 18 de Julho de 1941 previa que as sociedades de corridas podiam ficar com os prémios não reclamados desde que essas quantias fossem utilizadas exclusivamente para uma categoria determinada de empregados do sector das corridas de cavalos e que o restante devia ser entregue ao Estado. Ora, a alteração introduzida pelo Decreto 83-878, consiste, precisamente, em permitir ao PMU utilizar estes prémios em benefício próprio. Em apoio da sua argumentação, a recorrente refere-se ao relatório do Tribunal de Contas francês segundo o qual os recursos colocados à disposição do PMU «não sujeitos a IVA e geradores de produtos financeiros substanciais (24,6 milhões de FF em 1985)» seriam utilizados «para financiar em 105 milhões o plano social do sector das corridas», dos quais três quartos seriam reservados «ao PMU a fim de pagar um complemento de indemnização de despedimento ao pessoal que terá que suprimir na sequência da informatização das operações de tratamento de apostas (da ordem dos 75 milhões de FF para 750 trabalhadores)».

99 Por fim, a recorrente sublinha que, na medida em que o artigo 281._ bis do code général des impôts prevê que a remuneração obtida pelos organizadores de apostas mútuas está sujeita a IVA, o facto de o PMU não ser devedor do IVA sobre os prémios não reclamados constitui, também, um auxílio de Estado na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, de modo que, igualmente por esta razão, a decisão estaria viciada por erro de direito.

100 A Comissão recorda que em França, as quantias em causa só podem ser utilizadas para certas categorias de despesas sociais. Sublinha que, desde o Decreto 74-954, toda e qualquer quantia não afectada a este fim reverte para o Estado e que o Decreto 83-878 mais não fez do que modificar as categorias de despesas em que podiam ser utilizados os prémios não reclamados. O facto de esta alteração ter tido por efeito reduzir a parte dos prémios não reclamados revertendo para o Estado não significaria, portanto, que se trata de um auxílio de Estado.

101 A Comissão sustenta que a contestação pela recorrente da qualificação dos montantes em questão de «deduções não públicas» («non-public levies») se deve a uma confusão causada pela utilização do termo inglês «levy», que se refere a uma dedução fiscal. A recorrente teria, assim, considerado erradamente que os 30 FF deduzidos pelo PMU sobre 100 FF de apostas (v., supra, n._ 16) constituíam uma dedução do Estado e que qualquer distribuição de uma parte deste montante constituía um auxílio de Estado. Na realidade, só uma parte destes 30 FF, a saber 18 FF retidos pelas autoridades francesas, devia ser considerada uma dedução fiscal na acepção própria do termo. Tratando-se, assim, de uma dedução não pública que não reverte para o Estado e que não pode deste modo ser considerado uma dedução fiscal, faltaria, neste caso, o critério de recurso de Estado.

102 A Comissão acrescenta que, se bem que não tenha procurado refutar, nos seus articulados, a afirmação da recorrente segundo a qual a medida em questão tinha por objectivo contribuir para a informatização do PMU, o facto de permitir a utilização dos prémios não reclamados para dar um complemento de indemnização de despedimento ao pessoal excedentário era uma medida social que beneficiava mais o pessoal despedido do que o próprio PMU.

103 Quanto à afirmação da recorrente segundo a qual o facto de os prémios não reclamados não estarem sujeitos a IVA constituiria, igualmente, um auxílio de Estado, a Comissão sustenta que se trata de um argumento novo que não figurava na sua denúncia e não podia portanto ser tomado em consideração na decisão impugnada.

104 A interveniente explica que, até à adopção do Decreto 74-954, os prémios não reclamados revertiam integralmente para as sociedades de corridas, e que este decreto só limitou a utilização possível destes prémios para certas despesas sociais das sociedades de corridas, revertendo sempre para o Estado os prémios não utilizados (artigo 20._, n._ 4, do decreto). O Decreto 83-878 mais não fez do que alargar as utilizações possíveis deste prémios a outras acções directamente relacionadas com a actividade das sociedades de corridas, como as despesas de controlo e de funcionamento, os incentivos à criação e os investimentos relacionados com a organização das corridas e com a aceitação de apostas (artigo 27._ do decreto). Tanto antes de 1974, de 1974 a 1983, como depois de 1983, as sociedades de corridas teriam sempre tido a possibilidade de utilizar a totalidade dos prémios não reclamados, só tendo mudado o leque de utilizações possíveis, de modo que era justificado considerar esses recursos recursos normais das sociedades de corridas.

- Apreciação do Tribunal

105 O Tribunal salienta, a título preliminar, que resulta dos argumentos das partes que a medida em questão teve por efeito permitir às sociedades de corridas fazer face, nomeadamente, aos encargos sociais do PMU resultantes do despedimento de uma parte do seu pessoal excedentário. O Tribunal considera que se deve examinar, antes de mais, se os recursos provenientes dos prémios não reclamados constituem «recursos normais», na acepção defendida pela Comissão, que alega assim não estar preenchida uma das condições de aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, a saber a transferência dos recursos estatais em favor de um beneficiário.

106 A este respeito, basta verificar que, tal como resulta dos autos, se antes de 1974, os prémios não reclamados revertiam integralmente para as sociedades de corridas, o Decreto 74-954 limitou, pela primeira vez, a utilização destes prémios em certas despesas sociais, devendo os prémios não utilizados para o efeito ser pagos ao Estado. O artigo 20._, n._ 4, do referido decreto, dispunha com efeito que «as sociedades de corridas podem ser autorizadas cada ano, pelas autoridades competentes para aprovar o seu orçamento, a afectar o produto dos prémios não pagos ao subsídio de socorro, de prestações de assistência ou de benefícios de previdência ou de reformas complementares em favor do seu pessoal, com exclusão de quaisquer outros benefícios. Estas quantias devem ser pagas a um dos organismos previstos no artigo 25._ seguinte ou a um centro de formação profissional. A fracção do produto dos prémios não reclamados que não for afectada ao financiamento das acções definidas no parágrafo anterior reverte para o orçamento geral do Estado».

107 Resulta desta disposição da legislação francesa que a possibilidade de as sociedades de corridas utilizarem os prémios não reclamados não só estava sujeita a uma restrição quanto à sua utilização (despesas sociais), mas dependia, além disso, de uma autorização prévia das «autoridades competentes para aprovar o seu orçamento». Estas autoridades encontram-se definidas no referido decreto como sendo o Ministro da Agricultura e o Ministro da Economia e das Finanças (v. artigos 22._ e 23._ do decreto) e, no Decreto 83-878 que substituiu o Decreto 74-954, como sendo o Ministro da Agricultura e o Ministro encarregado do Orçamento (artigos 29._ e 30._ do Decreto 83-878). Ora, se se devesse considerar que a utilização dos prémios não reclamados constituíam, como sublinhado na decisão impugnada, «recursos normais», o legislador francês não teria que limitar, por via regulamentar, a sua utilização a despesas estritamente determinadas, que a não se realizarem fariam com que estes recursos revertessem automaticamente para o orçamento de Estado.

OS FUNDAMENTOS CONTINUAN NO NUM.DOC: 694A0067.1

108 Nestas condições, os recursos em questão não podem ser considerados «recursos normais» das sociedades de corridas e do PMU, mas «recursos estatais» cuja afectação eventual ao orçamento do Estado depende da reunião de certas condições definidas pelo legislador.

109 Esta mesma conclusão pode, igualmente, tirar-se do Decreto 83-878, através do qual o legislador francês, bem como o Governo francês e a Comissão sublinharam, alargou as utilizações possíveis de prémios não reclamados a outras actividades das sociedades de corridas, como a atribuição «de créditos de formação profissional ou de benefícios de previdência ou de reforma complementar em favor do pessoal das sociedades e das escuderias de corridas bem como dos jóqueis» (artigo 27._, n._ 5, do referido decreto). Ao agir deste modo, o legislador francês mais não fez portanto do que renunciar efectivamente a recursos, que, de outro modo, deviam ter sido pagos ao orçamento do Estado, de modo que, igualmente por esta razão, se encontra satisfeita no caso concreto a condição de aplicação do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, relativa à transferência dos recursos estatais em favor do beneficiário.

110 Ora, na medida em que estes recursos foram utilizados «para financiar despesas sociais, nomeadamente», como indicado na decisão impugnada, constituem, segundo jurisprudência constante, uma redução dos encargos sociais que uma empresa deve normalmente suportar, e portanto um auxílio em seu favor (acórdãos do Tribunal de Justiça Itália/Comissão e Steinike & Weinlig, já referidos).

111 Por conseguinte, a conclusão da Comissão segundo a qual a medida em questão, se bem que se destine a financiar as despesas sociais das sociedades de corridas ligadas à organização das apostas mútuas, não constitui um auxílio de Estado, por não haver uma transferência de recursos estatais, assenta em premissas erradas e deve, deste modo, ser anulada.

112 Por último, quanto ao argumento da recorrente segundo o qual o facto de o PMU não ser devedor de IVA sobre os prémios não reclamados constitui, igualmente, um auxílio de Estado, verifica-se que este ponto não figurava na sua denúncia e também não tinha sido posto em causa quando do início do processo do artigo 92._, e modo que a recorrente não pode acusar a Comissão de não o ter tratado na decisão impugnada.

Quanto à isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA, depois de 1 de Janeiro de 1989

- Exposição sumária da argumentação das partes

113 A recorrente sustenta que, embora a Comissão, na decisão impugnada, considere que os efeitos da isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA em benefício do PMU foram neutralizados a partir de 1989, por um depósito permanente pelas sociedades de corridas junto do Tesouro público, não menciona, em contrapartida, nem o montante exacto deste depósito nem em que base este montante é periodicamente revisto. A ausência destas informações ainda é mais criticável porque foi em razão da pretensa existência deste depósito que a Comissão chegou a uma conclusão diferente da que tinha inicialmente exposto na sua decisão provisória.

114 A recorrente solicita ao Tribunal, a título de medidas de instrução, que ordene, por um lado, à Comissão que indique o montante do depósito permanente efectuado em 1989 junto do Tesouro público, os critérios utilizados para a sua revisão e a data em que ocorreram tais revisões, e, por outro, ao Governo francês que indique o custo anual que representava a derrogação ao regime do IVA para o Estado francês e os juros anuais do depósito em causa entre 1 de Julho de 1989 e 1 de Julho de 1993, data em que foi finalmente abolida a medida controvertida.

115 A Comissão sustenta que, o facto de a sua decisão provisória ter inicialmente chegado a uma conclusão diferente da constante da decisão impugnada no que diz respeito à isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA, não é susceptível de afectar a validade desta última decisão.

116 No que diz respeito ao montante do depósito em causa, a Comissão salienta que se tratava até 1988 de um montante fixo de 14 milhões de FF, aumentado para mais de 16 milhões de FF em 1989 e para quase 20 milhões de FF em 1993.

117 A interveniente salienta que, como resulta dos autos, o depósito junto do Tesouro público existe desde 1969 e não desde 1989, conforme indicado na decisão impugnada, de modo que a medida estatal em questão nunca teria constituído um auxílio de Estado. Acrescenta que, se as autoridades francesas nunca chamaram a atenção da Comissão para este aspecto quando do desenrolar do processo, foi porque este erro da parte da Comissão não tinha consequências práticas em relação à apreciação da medida controvertida.

- Apreciação do Tribunal

118 O Tribunal salienta, com base na correspondência que a Comissão e a interveniente trocaram na matéria, desde o início do processo, apresentada na sequência de um pedido do Tribunal, que dos mesmos documentos resulta que, quando do desenrolar do processo, as autoridades francesas tinham claramente indicado à Comissão que, em contrapartida da isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA concedida às sociedades de corridas em 1 de Agosto de 1969, estas últimas foram obrigadas a proceder, a partir dessa data, a um depósito permanente junto do Tesouro público (carta à Comissão da Representação Permanente da França junto das Comunidades Europeias, de 7 de Fevereiro de 1992).

119 Além disso, na audiência, a Comissão admitiu, com efeito, que o depósito permanente em questão existia, não desde 1989, mas desde 1969, e que a decisão impugnada está viciada, neste ponto, por erro manifesto.

120 Daqui resulta que o exame pela Comissão da questão de saber se o depósito permanente junto do Tesouro público tinha por efeito neutralizar os benefícios de tesouraria resultantes do adiamento para a dedução do IVA, devia ter incidido sobre o período que remonta a 1969 ou, pelo menos, a 1985, quando o PMU foi criado enquanto entidade jurídica autónoma e não a partir de 1989. Por conseguinte, na ausência de exame circunstanciado pela Comissão, que remonte a 1969 ou a 1985, o Tribunal não pode pronunciar-se sobre a questão de saber se o depósito permanente já referido pôde, desde 1969, neutralizar efectivamente os benefícios de tesouraria denunciados, de modo que a medida em questão nunca teria constituído um auxílio de Estado, e na hipótese contrária, a partir de que data o alegado auxílio teria efectivamente existido por não haver uma compensação dos benefícios denunciados.

121 Esta conclusão não é afectada pelos números que a Comissão produziu no âmbito das suas respostas às questões do Tribunal, constantes de uma carta que lhe foi dirigida pela Representação Permanente da França junto das Comunidades Europeias (v., supra, n._ 118). Como resulta deste números, se é verdade que em relação a 1985, 1986 e 1990, o montante do depósito permanente parece compensar o «efeito mensal médio» do benefício que o PMU retirava da isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA, também não deixa de ser verdade que, em 1987, 1988 e 1989, o PMU tinha beneficiado de uma quantia total de 7 968 000 FF. Todavia, na medida em que a apreciação destes números não pôde, pelas razões acima expostas (v. n._ 119), ser efectuada pela Comissão quando da adopção da sua decisão, o Tribunal não pode, fundando-se nas referidas respostas escritas das partes às suas questões, pronunciar-se sobre a existência ou não de um auxílio de Estado, porque ao fazê-lo, invadiria a competência que o artigo 92._ do Tratado só reconhece à Comissão e ao juiz nacional.

122 Além disso, estando, de qualquer modo, a apreciação pela Comissão da medida em questão, viciada por erro, há que acolher os pedidos da recorrente e anular esta parte da decisão impugnada.

Quanto à aplicação errada do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado

Fundamentos e argumentos da recorrente

123 A recorrente sustenta que nenhuma das medidas estatais qualificadas de auxílio de Estado na decisão impugnada pode ser declarada compatível com o mercado comum, por força do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado, a saber 1) a renúncia pelo Estado francês, de 1982 a 1985, em benefício do PMU, às quantias provenientes do arredondamento dos prémios dos apostadores à décima inferior, 2) a isenção, antes de 1989, da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA e 3) a isenção do PMU, até 1989, da participação dos empregadores no esforço de construção de habitações subsidiadas.

1. Quanto à renúncia, de 1982 a 1985, das quantias provenientes do arredondamento à décima inferior dos prémios dos apostadores

124 A recorrente sublinha, a título preliminar, que, enquanto excepção à regra fundamental da proibição dos auxílios de Estado, o artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado, deve ser interpretado restritivamente e que a sua aplicação depende da reunião de duas condições, uma positiva, ou seja, que o auxílio em questão facilite o desenvolvimento de certas actividades ou regiões económicas, e a outra negativa, ou seja, que este auxílio não altere as condições das trocas comerciais de maneira contrária ao interesse comum. Segundo a recorrente, nenhuma destas duas condições estaria aqui satisfeita.

125 Em primeiro lugar, a referência na decisão impugnada aos «efeitos directos e indirectos desses auxílios sobre o desenvolvimento do sector em todas as suas componentes económicas, incluindo a melhoria da raça cavalar» para demonstrar que o auxílio em questão facilitava o desenvolvimento de certas actividades (condição positiva), não pode satisfazer esta exigência dado que o auxílio em questão não se destinava nem ao melhoramento da raça equídea nem às corridas hípicas, dizendo respeito a uma actividade específica, a da aceitação de apostas fora do hipódromo. Acrescenta que as actividades do PMU não têm uma relação directa com a criação de cavalos e que a percentagem do volume de negócios do PMU consagrada à criação de cavalos é inferior à parte das deduções recebidas pelo Estado.

126 Esta apreciação da Comissão seria, além disso, contrária, não só à jurisprudência do Tribunal de Justiça na matéria (acórdão de 17 de Setembro de 1980, Philip Morris Holland/Comissão, 730/79, Recueil, p. 2671), mas também às regras de conduta que a Comissão se impôs a si própria nos seus Décimo e Décimo Segundo Relatórios sobre a política da concorrência. Resulta do Décimo Relatório que um auxílio só é compatível com o mercado comum se contribuir «para a realização dos objectivos e interesses comunitários enunciados no artigo 92._, n._ 3, do Tratado». Além disso, no seu Décimo Segundo Relatório, a Comissão teria declarado que para que se possa considerar que um auxílio não falseia a concorrência de maneira contrária ao interesse comum, 1) devia contribuir para favorecer o desenvolvimento do sector em causa no interesse da Comunidade no seu conjunto, 2) devia ser necessário para a realização do projecto em causa, e 3) as suas modalidades (intensidade, duração, grau de distorção da concorrência, etc.) deviam ser proporcionadas aos objectivos prosseguidos.

127 A decisão impugnada ignorou completamente o primeiro dos referidos critérios. A afirmação feita na contestação da Comissão, segundo a qual o auxílio em questão contribui para o desenvolvimento de uma melhor eficácia das apostas mútuas e «sobretudo para a melhoria da raça cavalar, o que constitui um objectivo legítimo e conforme ao interesse da Comunidade», constitui um fundamento novo, não podendo, assim, ser tido em conta pelo Tribunal.

128 Quanto ao segundo critério, relativo à questão de saber se o auxílio em questão é necessário à realização do projecto em causa, a recorrente sublinha que esta questão só foi abordada pela Comissão na sua contestação, onde se indica que, sem o auxílio em questão, a informatização das actividades do PMU não se teria podido realizar. Na ausência de qualquer análise deste efeito, não se pode excluir que as sociedades de corridas tivessem podido financiar a informatização das suas actividades quer reduzindo o nível dos preços quer recorrendo a empréstimos bancários.

129 Quanto ao terceiro critério, a saber o carácter proporcionado da intensidade do auxílio em relação ao seu objectivo, a recorrente sustenta que, se as outras medidas estatais tomadas em favor do PMU e indicadas na sua denúncia constituem auxílios de Estado, a decisão encontra-se viciada, porque a Comissão não avaliou a intensidade de todos os auxílios concedidos ao PMU de modo cumulativo e não isolado. De qualquer modo, mesmo se estas medidas não fossem consideradas auxílios de Estado, não deixaria de ser um facto que, elevando-se os efeitos do auxílio em questão a 315 milhões de FF, os mesmos deviam ter sido apreciados à luz de todas as vantagens financeiras de que o PMU tinha beneficiado e cujo montante, segundo o relatório do Tribunal de Contas francês já referido, representava 1,3 mil milhões de FF apenas em relação ao período de 1982 a 1985.

130 Em segundo lugar, quanto à questão de saber se o auxílio em questão falseava a concorrência de maneira contrária ao interesse comum (condição negativa), a recorrente sublinha que a resposta dada pela Comissão na decisão impugnada, segundo a qual a informatização das actividades do PMU tinha sido concebida numa altura em que o PMU não tinha alargado as suas actividades ao estrangeiro e não encarava tal possibilidade, assenta em premissas erradas. Como resultaria do relatório de uma exposição apresentada pelo director-geral do PMU na Sexta Conferência das Associações Europeias de PMU em Londres, no mês de Maio de 1987, ou seja, antes da criação do PMI, o PMU encarava já a possibilidade de alargar as suas actividades ao estrangeiro. Esta conclusão seria, aliás, corroborada pela resposta dada, ao mesmo tempo que a referida declaração, pelo presidente do PMU ao primeiro presidente do Tribunal de Contas francês a respeito de um «projecto de inserção no relatório público (do Tribunal de Contas) relativo às corridas e ao funcionamento do PMU», em que o presidente do PMU lamentava os efeitos da publicação do referido relatório num «momento em que (o PMU prosseguia) negociações com países estrangeiros que deseja(vam) beneficiar da (sua) experiência em matéria de tratamento das apostas sobre as corridas e no momento em (que o PMU ia) dever enfrentar, em 1992, a concorrência dos países da Europa dos Doze».

131 Por fim, a recorrente sustenta que, quando uma empresa a) recebe um auxílio de elevada intensidade, b) não tem de enfrentar a concorrência em razão do seu monopólio e c) utiliza este auxílio para concorrer com outras empresas em mercados estrangeiros, a condição negativa do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado, não pode, em princípio, considerar-se preenchida, uma vez que tal situação é contrária ao princípio fundamental do mercado único caracterizado por uma concorrência livre.

2. Quanto à isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA antes de 1989

132 A recorrente sustenta que, na medida em que, segundo a decisão impugnada, o auxílio resultante da isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA foi julgada compatível com o mercado comum até 1989, e isto pelas mesmas razões que as adiantadas para o auxílio constituído pela renúncia, de 1982 a 1985, às quantias resultantes do arredondamento dos prémios dos apostadores à décima inferior, daqui resulta que, pelas razões acima expostas (v. n.os 124 a 131), esta isenção também não pode ser vista como preenchendo as condições de aplicação do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado.

133 Acrescenta que o argumento adiantado pela Comissão na sua contestação, segundo o qual a condição positiva exigida para que um auxílio seja declarado compatível com o mercado comum ao abrigo do artigo 92._, n._ 3, alínea c), estaria aqui preenchida porque o auxílio em questão tinha «por objectivo final a melhoria da raça cavalar e não apenas a prossecução das actividades do PMU ou das sociedades de corridas enquanto tais», constitui uma nova fundamentação relativamente à constante da decisão impugnada, onde foi afirmado que os efeitos negativos do auxílio em questão não eram susceptíveis de anular os eventuais efeitos «no desenvolvimento do sector», que respeitaria tanto ao melhoramento da raça equídea como às actividades de aceitação de apostas fora do hipódromo.

134 Por fim, a recorrente sustenta que, tratando-se, no caso concreto, de um auxílio ao funcionamento, o mesmo só pode ser declarado compatível com o mercado comum no caso de circunstâncias excepcionais (Décimo Segundo Relatório sobre a Política de Concorrência, ponto 160, acórdão Deufil/Comissão, já referido), o que aqui não acontece.

3. Quanto à isenção, até 1989, da participação no esforço de construção

135 A recorrente sustenta que, na medida em que a Comissão considerou que o auxílio concedido ao PMU sob a forma de isenção da participação no esforço de construção podia, «à semelhança do auxílio concedido pela isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA», beneficiar até 1989 da derrogação prevista no artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado, a decisão impugnada encontra-se viciada por erro de direito pelas mesmas razões que as expostas a respeito dos auxílios provenientes do arredondamento no sentido da baixa dos prémios dos apostadores e da derrogação às regras do IVA (n.os 124 a 133).

136 Acrescenta que um auxílio permanente ao funcionamento, de cerca de 5 milhões FF por ano, como o auxílio em causa, não pode, de modo algum, satisfazer a condição positiva do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado.

Fundamentos e argumentos da Comissão

137 A Comissão, partindo das considerações tecidas na decisão impugnada quanto à compatibilidade do auxílio resultante do arredondamento à décima inferior dos prémios dos apostadores, e com base nas quais os dois outros auxílios de Estado foram, igualmente, declarados compatíveis com o mercado comum, faz uma refutação global do conjunto dos argumentos da recorrente. Só discute, quanto ao restante, os aspectos essenciais da execução do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado, a saber, por um lado, a legitimidade dos objectivos prosseguidos pelos auxílios em questão (condição positiva) e, por outro, a ausência de efeitos negativos no mercado, contrários ao interesse comum (condição negativa). Por fim, contesta a afirmação da recorrente segundo a qual, ao adoptar a decisão impugnada, não respeitou as suas próprias linhas de conduta, expostas nos seus relatórios sobre a política de concorrência, já referidos.

1. Quanto à legitimidade dos objectivos prosseguidos pelos auxílios de Estado concedidos ao PMU, a saber, à informatização do PMU e ao melhoramento da raça equídea

138 A Comissão expõe que, de 1930 até ao início dos anos 80, o PMU efectuava as operações de tratamento das apostas por processos manuais, o que causava vários problemas de gestão, cujo custo representava cerca de 60% dos seus encargos totais de funcionamento. Foi para fazer face a estes problemas que o PMU decidiu, a partir de 1972, informatizar todas as suas operações, decisão que, segundo a Comissão, não foi de modo algum concebida com vista a uma extensão das actividades do PMU ao estrangeiro, mas sim destinada a adaptá-lo à evolução económica e técnica do mercado nacional. Estas medidas tiveram por resultado, por um lado, a criação de um sistema mais fiável, permitindo fornecer aos apostadores serviços mais adaptados às suas exigências, o que, na decisão impugnada, é descrito como «efeitos directos e indirectos desses auxílios sobre o desenvolvimento do sector em todas as suas componentes», e, por outro, o aumento das receitas do Estado francês, o que seria do interesse da Comunidade, porque é sempre preferível que uma determinada actividade económica disponha de uma organização eficaz.

139 Segundo a Comissão, o nível dos custos de gestão do PMU diminuiu de modo constante, depois de 1986, precisamente devido à informatização das operações de recolha e de tratamento das apostas, passando de 5,95% em 1986 para 5,45% em 1990, o que representou uma diminuição dos encargos de cerca de 170 milhões FF, o que permitiu às sociedades de corridas consagrar mais recursos à sua função de incentivo ao melhoramento da raça equídea.

2. Quanto à ausência de efeitos negativos no mercado

140 A Comissão explica que, na medida em que, antes de 1989, as actividades do PMU se limitavam à França e que não existia qualquer concorrência entre o PMU e outros operadores económicos em França ou em qualquer outro lugar, teria podido concluir no sentido da ausência de efeito significativo das medidas em questão no comércio dos Estados-Membros, e que só a inexistência de uma regra de minimis em matéria de auxílios de Estado é que a levou a tratar as medidas em questão como auxílios de Estado, para os declarar, finalmente, compatíveis com o mercado comum.

141 Quanto à afirmação da recorrente segundo a qual, resultaria das declarações feitas em Maio de 1987 por representantes do PMU (v., supra, n._ 130), que o auxílio à informatização do PMU teve efeitos negativos no mercado porque permitiu ao PMU estender as suas actividades ao estrangeiro, a Comissão sustenta que o processo de informatização das operações do PMU foi concebido e posto em prática muito antes destas declarações. De qualquer modo, não estaria demonstrada a existência de um nexo directo entre a decisão do PMU de proceder à informatização da sua rede e a sua decisão ulterior de oferecer os seus serviços a outras empresas no estrangeiro.

142 Por fim, a Comissão sustenta que as actividades do PMI no estrangeiro não são da mesma natureza que as do PMU, o que seria corroborado pelas observações do director-geral do PMU, citadas pela recorrente (v., supra, n._ 130).

3. Quanto ao respeito pela Comissão das exigências jurisprudenciais e das suas próprias linhas de conduta

143 A Comissão sustenta que, se um auxílio deve ser apreciado num contexto comunitário, tal não significa no entanto que um auxílio deva ter um efeito positivo para a Comunidade no seu conjunto. No caso sub judice, a contribuição para o desenvolvimento e para uma melhor eficácia do sector das apostas mútuas, e sobretudo para o melhoramento da raça equídea, constituiria um objectivo legítimo e seria conforme ao interesse da Comunidade. Sublinha que, embora esta razão não fosse invocada expressamente na decisão impugnada, a mesma não deixa de ser inerente a qualquer decisão de autorização de um auxílio nos termos do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado.

144 Quanto à exigência segundo a qual o auxílio deve ser necessário à realização do objectivo prosseguido, a Comissão sublinha que, contrariamente ao que sustenta a recorrente, a decisão impugnada não ignora esta questão, dado que é na mesma claramente indicado que «as sociedades de corridas não possuíam meios próprios para o financiamento de todos os investimentos necessários» (v. parte IV, 2., da decisão).

145 Quanto à intensidade do auxílio proveniente do arredondamento dos prémios à décima inferior, a Comissão observa que, se bem que segundo a decisão impugnada a mesma seja de 29%, não deixa de ser verdade que é difícil determinar a intensidade de um auxílio no caso de um organismo como o PMU, que não dispõe de recursos próprios. Por fim, a Comissão rejeita a afirmação da recorrente segundo a qual apreciou o auxílio em questão de modo isolado sem ter em conta as outras medidas estatais indicadas na sua denúncia como auxílios de Estado.

146 A interveniente subscreve os argumentos da Comissão e sustenta que esta última aplicou correctamente o artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado, em relação aos auxílios em causa.

- Apreciação do Tribunal

147 Recorde-se, a título preliminar, que, segundo jurisprudência constante, o artigo 92._, n._ 3, do Tratado concede à Comissão um largo poder de apreciação com vista a uma derrogação à proibição geral do n._ 1 do referido artigo. A apreciação, neste caso, da compatibilidade ou incompatibilidade de um auxílio estatal com o mercado comum levanta problemas que exigem a tomada em consideração e a apreciação de factos e circunstâncias económicas complexos e susceptíveis de rápida alteração (acórdãos do Tribunal de Justiça de 14 de Fevereiro de 1990, França/Comissão, C-301/87, Colect., p. I-307, n._ 15, de 11 de Julho de 1996, SFEI e o., C-39/94, Colect., p. I-3547, n._ 36, e de 14 de Janeiro de 1997, Espanha/Comissão, já referido, n._ 18). Além disso, resulta da jurisprudência que, no quadro de um recurso de anulação, ao juiz comunitário incumbe apenas verificar se a decisão impugnada está ferida de uma das causas de ilegalidade que o artigo 173._ do Tratado prevê, não podendo substituir a sua apreciação quanto aos factos, nomeadamente no plano económico, à efectuada pelo autor da decisão (acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de Junho de 1993, Matra/Comissão, C-225/91, Colect., p. I-3203, n._ 23, e de 29 de Fevereiro de 1996, Bélgica/Comissão, já referido, e acórdão FFSA e o./Comissão, já referido, n._ 101).

148 Daqui resulta que a fiscalização que o Tribunal é chamado a exercer, no caso concreto, deve limitar-se à verificação do respeito das regras processuais e de fundamentação, da exactidão material dos factos em que se baseou a opção contestada e da ausência de erro manifesto na apreciação destes factos ou de desvio de poder (acórdãos Matra/Comissão, já referido, n._ 25, de 29 de Fevereiro de 1996, Bélgica/Comissão, já referido, n._ 11, e FFSA e o./Comissão, já referido, n._ 101).

149 É à luz destas orientações da jurisprudência que deve ser examinada a razoabilidade das acusações da recorrente assentes em que, ao declarar os três auxílios de Estado em causa compatíveis com o mercado comum, a Comissão violou as condições de aplicação do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado, bem como a sua própria linha de conduta como exposta, nomeadamente, no seu Décimo Segundo Relatório sobre a política de concorrência.

- Quanto à renúncia de 1982 a 1985 às quantias provenientes do arredondamento dos prémios dos apostadores à décima inferior

150 O Tribunal salienta que, segundo a decisão impugnada, tendo em conta o desenvolvimento da concorrência e das trocas comerciais antes da criação do PMI em Janeiro de 1989, os auxílios concedidos entre 1982 e 1985 a favor da informatização do PMU e resultantes do arredondamento dos prémios à décima inferior «não produziram efeitos negativos no mercado, contrários ao interesse comum, tendo em conta os efeitos directos e indirectos desses auxílios sobre o desenvolvimento do sector em todas as suas componentes económicas, incluindo a melhoria da raça cavalar» (parte VII, oitavo parágrafo, 1., da decisão impugnada).

151 Resulta da referida passagem da decisão impugnada que a recorrente não pode acusar a Comissão de não ter examinado se a condição positiva de aplicação do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado se encontrava aqui preenchida.

152 Quanto à questão de saber se tal apreciação da Comissão se funda, apesar disso, em premissas erradas, porque o auxílio em questão só beneficiava a actividade da aceitação de apostas e não o melhoramento da raça equídea, o Tribunal salienta que resulta dos autos que a informatização das actividades do PMU teve por efeito não só uma melhor eficácia da aceitação das apostas, mas igualmente uma diminuição, a partir de 1986, dos seus encargos e custos de funcionamento, o que permitiu às sociedades de corridas libertar e portanto consagrar mais recursos ao incentivo do melhoramento da raça equídea. Com efeito, na medida em que a organização das apostas mútuas em França tem fim não lucrativo e só visa permitir às sociedades de corridas prosseguir a sua actividade principal de melhoramento da raça equídea, não se pode considerar que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação ao julgar que o auxílio em questão era compatível com o mercado comum em razão dos seus efeitos sobre o desenvolvimento do sector da aceitação de apostas em todas as suas componentes económicas, «incluindo a melhoria da raça cavalar».

153 O Tribunal considera que a recorrente também não pode alegar que foi só na fase escrita que a Comissão pôs a tónica nos efeitos do auxílio em questão e, nomeadamente, no melhoramento da raça equídea. Esta consideração figura, com efeito, de modo claro na própria decisão. Além disso, verifica-se que a decisão impugnada não se refere apenas aos efeitos do auxílio em causa no melhoramento da raça equídea, mas sublinha os seus efeitos directos e indirectos sobre o desenvolvimento do sector das corridas «em todas as suas componentes económicas, incluindo a melhoria da raça cavalar».

154 No que diz respeito à questão de saber se o auxílio em questão satisfazia igualmente a condição negativa do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado, no sentido de que os seus efeitos no mercado não alteravam as condições das trocas comerciais de maneira contrária ao interesse comum, resulta da decisão impugnada que, antes da criação do PMI, em Janeiro de 1989, não existiam trocas comerciais entre a França e os outros Estados-Membros, o que implica que antes desta data nem sequer havia concorrência entre o PMU e os outros operadores económicos presentes no mercado comunitário da aceitação de apostas. Nestas condições, a Comissão pôde validamente concluir que os auxílios concedidos ao PMU entre 1982 e 1985 em favor da informatização das suas actividades não tinham podido produzir efeitos negativos no mercado, contrários ao interesse comunitário.

155 Esta conclusão não é afectada pelo relatório da exposição feita pelo director-geral do PMU numa conferência das associações europeias de PMU, em Londres, em Maio de 1987 (v., supra, n._ 130), que só respeitava, em termos genéricos, à política do PMU a longo prazo e que se realizou dois anos depois de o auxílio em questão ter sido abolido, de modo que não é susceptível de pôr em causa a verificação da Comissão relativa à ausência de efeitos negativos no mercado, antes de 1989.

156 O mesmo acontece quanto à resposta do presidente do PMU dada em 1987 ao primeiro presidente do Tribunal de Contas francês (v., supra, n._ 130), que ocorreu, de facto, dois anos após a data de abolição do auxílio em questão e dois anos antes da criação do PMI, num período durante o qual a expansão do PMU no estrangeiro só era um dos objectivos da sua política a longo prazo. Por fim, como a Comissão acertadamente sublinhou, a decisão de ajudar as sociedades de corridas a proceder à informatização das operações de organização das apostas mútuas foi tomada muito antes da criação como entidade jurídica autónoma, em 1985, do PMU e a decisão deste último de alargar as suas actividades ao estrangeiro através da criação do PMI em 1989.

157 Resulta do que precede que a Comissão podia validamente concluir que o auxílio em questão era compatível com o mercado comum.

158 Além disso, o Tribunal considera que esta conclusão da Comissão também não pode ser posta em causa pela acusação da recorrente assente no facto de que a Comissão teria completamente ignorado o primeiros dos três critérios que tinha adoptado no seu Décimo Segundo Relatório sobre a política de concorrência, a saber, a apreciação de um auxílio sectorial num contexto comunitário. Com efeito, resulta da parte VII, terceiro parágrafo, da decisão impugnada, que o auxílio em questão foi apreciado no «contexto da Comunidade e não no de um único Estado-Membro». Assim, a recorrente não pode defender que foi só na fase escrita que a Comissão invocou, pela primeira vez, a consideração, que é de resto inerente a qualquer exame de compatibilidade de um auxílio sectorial com o mercado comum, de que a contribuição do auxílio em questão para o desenvolvimento das apostas mútuas e para o melhoramento da raça equídea constituía um objectivo legítimo e conforme ao interesse da Comunidade. Por fim, e contrariamente ao que a recorrente parece defender, a apreciação de um auxílio num contexto comunitário não significa que um auxílio tendo efeitos positivos para o desenvolvimento de um sector num único Estado-Membro, tal como a aceitação de apostas em França, não possa beneficiar de uma derrogação ao abrigo do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado, na medida em que, tal como a Comissão sublinhou, é do interesse da Comunidade que um sector económico determinado disponha num Estado-Membro de uma organização e de uma estrutura eficazes.

159 O Tribunal considera que a recorrente também não pode acusar a Comissão de não ter examinado se o auxílio em questão era necessário à realização do objectivo prosseguido. Com efeito, é claramente indicado na decisão impugnada que «as derrogações são aplicáveis se a Comissão puder verificar que o livre jogo das forças do mercado, na ausência de auxílios, não levaria o potencial beneficiário a adoptar um comportamento que se situasse na linha da realização de um dos objectivos acima referidos» (parte VII, quarto parágrafo, da decisão impugnada), e que, no que diz respeito ao auxílio à informatização do PMU, «as sociedades de corridas não possuíam meios próprios para o financiamento de todos os investimentos necessários». Além disso, é sabido que, desde o início dos anos 80, as sociedades de corridas apresentavam uma situação financeira deficitária grave, o que explica por que razão só uma intervenção das autoridades estatais, e não dos organismos financeiros privados, era susceptível de garantir o saneamento dessa situação (v. parte IV, 2. e 3., da decisão impugnada).

160 Quanto ao carácter proporcionado da intensidade do auxílio em questão, é incontestável que, na decisão impugnada, a mesma foi qualificada pela Comissão de elevada. Todavia, não deixa de ser verdade que, segundo a decisão impugnada, este auxílio foi concedido bem antes da criação do PMI, em Janeiro de 1989, data em que, devido ao estado do desenvolvimento da concorrência e das trocas comerciais entre os Estados-Membros, não era susceptível de produzir efeitos contrários ao interesse comunitário.

161 Por fim, o Tribunal considera que o argumento da recorrente, segundo o qual a Comissão não aplicou correctamente este mesmo critério porque apreciou a intensidade do auxílio em questão de modo isolado, também não pode ser acolhido. Com efeito, embora seja um facto que a Comissão, por não ter aplicado correctamente o artigo 92._, n._ 1, às quatro outras medidas estatais denunciadas pela recorrente (v., supra, n.os 62, 82, 111 e 122), não podia apreciar os seus efeitos cumulativos com os efeitos do auxílio em causa, o facto é que esses benefícios cumulativos respeitam a um período durante o qual não existia concorrência nem comércio intracomunitário. Por conseguinte, a apreciação da compatibilidade com o mercado comum da medida em questão, cujos efeitos eram, além disso, de uma duração limitada, de 1982 a 1985, não é afectada pela existência de outros auxílios concedidos antes de 1989 ao PMU.

162 Daqui resulta que a Comissão podia validamente considerar que, tendo em conta o estado das trocas comerciais intracomunitárias na altura dos factos, o auxílio em questão, se bem que de elevada intensidade, era, no entanto, compatível com o mercado comum.

- Quanto à isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA antes de 1989

163 Como resulta da decisão impugnada, este auxílio foi considerado compatível com o mercado comum até 1989, data a partir da qual as sociedades de corridas tiveram que proceder a um depósito permanente junto do Tesouro público, a fim de compensar o benefício dele resultante. Ora, como se verificou, a apreciação da Comissão assenta num erro quanto ao quadro temporal em que a mesma devia ser efectuada (v., supra, n.os 118 a 122), o que impede o Tribunal de se pronunciar sobre a própria existência do auxílio em questão. Todavia, o Tribunal considera que, na medida em que a compatibilidade do auxílio com o mercado comum até 1989 é fundada pela Comissão nos mesmos motivos que os respeitantes ao auxílio resultante do arredondamento dos prémios à décima inferior, esta verificação da Comissão não pode ser contestada, dado que esses motivos, como se verificou, não estão viciados por um erro de apreciação manifesto (v., supra, n.os 150 a 159). Daqui resulta que, apesar do erro aqui cometido pela Comissão, a mesma podia considerar que o auxílio em questão era, até 1989, compatível com o mercado comum.

- Quanto à isenção, até 1989, da participação no esforço de construção

164 A recorrente sustenta que, igualmente nesta matéria, a decisão se encontra viciada pelas mesmas razões que as expostas a respeito de dois outros auxílios declarados compatíveis com o mercado comum. Ora, na medida em que os argumentos da recorrente relativos a essas outras medidas não são procedentes (v., supra, n.os 150 a 163), o mesmo acontece quanto às acusações suscitadas contra o auxílio em questão.

165 Do que precede resulta que o fundamento da recorrente assente numa aplicação errada do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado não é procedente, devendo, por conseguinte, ser rejeitado.

Quanto à obrigação de restituição de um auxílio incompatível com o mercado comum

Exposição sumária da argumentação das partes

166 No quadro deste fundamento, a recorrente sustenta que a decisão impugnada deve ser anulada porque, por um lado, limita a obrigação de restituição do auxílio resultante da isenção da participação no esforço de construção, não ao período que teve início em 1989, quando o PMU começou a ter actividades noutros países da Comunidade, mas apenas ao período posterior ao início do processo, ou seja, 11 de Janeiro de 1991, em razão de um acórdão do Conselho de Estado francês de 1962, que se pronuncia no sentido do carácter agrícola das actividades das sociedades de corridas e, deste modo, da isenção da participação no esforço de construção em benefício desta últimas, e, por outro, porque confia às autoridades francesas a missão de calcular o montante do auxílio a restituir.

167 No que respeita, em primeiro lugar, à obrigação de restituir o auxílio em questão, a recorrente sustenta que o recurso a este acórdão do Conselho de Estado para justificar a limitação no tempo desta obrigação está em contradição com a parte V, 7., da decisão impugnada, onde a Comissão afirmou precisamente que esse acórdão, relativo a duas sociedades de corridas não membros do PMU, não se refere, de nenhum modo, às suas actividades de aceitação de apostas nem, por conseguinte, à actividade do PMU, a saber, a organização e o tratamento das apostas, que seria manifestamente alheia a qualquer actividade agrícola.

168 A este respeito, a recorrente sublinha que o argumento da Comissão constante da sua contestação, segundo o qual o acórdão do Conselho de Estado, já referido, teria criado na esfera do beneficiário uma confiança legítima no carácter regular da medida em questão, o que impediria as autoridades francesas de exigirem a restituição do auxílio em relação ao período anterior a 11 de Janeiro de 1991, data do início do processo, não figura na decisão impugnada. Além disso, a Comissão teria confundido a «confiança legítima» do beneficiário de um auxílio com a impossibilidade de um Estado-Membro recuperar um auxílio ilegal. De qualquer modo, tal justificação seria contrária à jurisprudência na matéria, segundo a qual um Estado-Membro que concedeu um auxílio violando as regras processuais do artigo 93._ do Tratado, não pode invocar a confiança legítima dos beneficiários para não exigir a restituição desse auxílio (acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Setembro de 1990, Comissão/Alemanha, C-5/89, Colect., p. I-3437). Por fim, na medida em que o acórdão do Conselho de Estado francês não dizia respeito nem às actividades de aceitação de apostas sobre as corridas hípicas nem à compatibilidade da medida em questão com as regras dos artigos 92._ e seguintes do Tratado, não se pode falar na existência de qualquer confiança legítima na esfera do PMU.

169 No que respeita, em segundo lugar, à acusação de que a Comissão não devia ter deixado ao Governo francês a responsabilidade de calcular ele próprio o montante do auxílio a recuperar, a recorrente sustenta que, na medida em que a contribuição de que o PMU foi dispensado é determinada com base na folha e salários pagos por um empregador, bastaria conhecer a taxa da contribuição aplicada bem como os salários pagos pelo PMU durante o período em causa, para calcular esse montante. Além disso, uma vez que a Comissão possuía os números relativos ao montante das contribuições a que o Estado francês renunciou em 1986 e em 1990, como resulta da decisão impugnada, não devia ter dificuldades em obter os números relativos aos outros anos. Por fim, a Comissão não pode invocar a insuficiência das informações de que dispunha para justificar a decisão de confiar ao Estado francês a tarefa de ser ele próprio a determinar o montante dos auxílios a restituir, dado que dispôs de mais de quatro anos para obter do Estado francês os dados quantificados.

170 A recorrente acrescenta que, segundo um princípio fundamental do direito comunitário, a Comissão não tem, de qualquer modo, o direito de delegar poderes discricionários que lhe são conferidos pelo Tratado (acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade, 9/56, Colect. 1954-1961, p. 175), e que não teria aqui delimitado o alcance dos poderes delegados nem as modalidades do seu exercício. Além disso, tal delegação de poderes teria por efeito privar os particulares da protecção jurisdicional que o artigo 173._ do Tratado lhes garante.

171 Por fim, a recorrente sustenta que a restituição do auxílio em questão não foi reclamada na sua totalidade pelas autoridades francesas. Salienta que, como resulta da correspondência da Comissão com as autoridades francesas e, em especial, da carta do representante da França, de 10 de Janeiro de 1994, a isenção da participação dos empregadores no esforço de construção tinha sido abolida com efeitos em 1 de Janeiro de 1994, o que significa que a restituição em causa devia cobrir um período de quase três anos, ou seja, de 1991 a 1993, inclusive. Ora, resulta dessa mesma carta que as autoridades francesas só procederam à recuperação em causa relativamente a 1992 e a 1993, e não a 1991.

172 A Comissão sustenta que, se os beneficiários de um auxílio só podem ter, em princípio, uma confiança legítima na regularidade do auxílio se o mesmo tiver sido concedido regularmente, têm, no entanto, a possibilidade de invocar circunstâncias excepcionais, que puderam legitimamente fundar a sua confiança no carácter regular desse auxílio e oporem-se por conseguinte ao seu reembolso (acórdão de 20 de Setembro de 1990, Comissão/Alemanha, já referido).

173 Quanto à possibilidade de um Estado-Membro invocar a confiança legítima dos beneficiários de um auxílio para não exigir o seu reembolso, a Comissão salienta que, segundo o acórdão de 20 de Setembro de 1990, Comissão/Alemanha, já referido, um Estado-Membro «não pode invocar a confiança legítima dos beneficiários para se subtrair à obrigação de tomar as medidas necessárias com vista ao cumprimento de uma decisão da Comissão que lhe ordena a recuperação do auxílio», o que não seria aqui o caso (n._ 17 do acórdão).

174 A Comissão considera que o acórdão do Conselho de Estado francês de 1962, qualificando de agrícolas as actividades das sociedades de corridas e, deste modo, justificando a sua isenção da participação no esforço de construção, era susceptível de criar, na sua esfera jurídica, uma confiança legítima no carácter regular da medida em questão até ao início do processo, quando esta medida foi expressamente qualificada de auxílio de Estado na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado.

175 Acrescenta que, embora seja incontestável que o acórdão do Conselho de Estado francês de 1962 não dizia respeito aos membros do PMU e não tratava nem das actividades de aceitação de apostas sobre cavalos nem da questão da compatibilidade da medida em causa com as regras do Tratado, resultava apesar de tudo desse acórdão que as sociedades de corridas deviam ser consideradas empresas agrícolas, e, portanto, não sujeitas à participação no esforço de construção.

176 No que diz respeito à tarefa confiada às autoridades francesas de determinar o montante do auxílio a recuperar, a Comissão alega que, contrariamente ao que a recorrente sustenta, não se trata de uma delegação de poderes, mas de um caso de cooperação recíproca entre a Comissão e o Estado-Membro em causa, abrangida pelo artigo 5._ do Tratado. Sublinha que esta prática foi seguida noutros casos [Decisão 88/468/CEE da Comissão, de 29 de Março de 1988, relativa aos auxílios concedidos pelo Governo francês a uma empresa de máquinas agrícolas situada em St. Dizier, Angers e Croix (International Harvester/Tenneco), JO L 229, p. 37] e que no caso concreto as autoridades francesas não dispõem de qualquer poder discricionário e são obrigadas a justificar o cálculo do montante do auxílio a recuperar.

177 Quanto às críticas formuladas pela recorrente quanto ao controlo do processo de restituição do auxílio, a Comissão sustenta que as mesmas se prendem com a execução da decisão impugnada e não com a sua legalidade, que constitui o objecto do recurso.

178 A interveniente subscreve os argumentos da Comissão e sublinha que a Comissão não é obrigada a exigir a restituição de um auxílio e que dispõe na matéria de um amplo poder de apreciação, que só pode ser alvo de sanções do juiz comunitário em caso de erro manifesto (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Novembro de 1991, Fédération nationale du commerce extérieur des produits alimentaires e Syndicat national des négociants et transformateurs de saumons, C-354/90, Colect., p. I-5505).

Apreciação do Tribunal

179 O Tribunal recorda, a título preliminar, que, quando a Comissão declara a incompatibilidade de um auxílio de Estado com o mercado comum, pode impor ao Estado-Membro em causa que ordene à empresa beneficiária a sua restituição (acórdão Deufil/Comissão, já referido, n._ 24), sendo a supressão de auxílio ilegal por recuperação a consequência lógica desta verificação na medida em que tal permite o restabelecimento da situação anterior (acórdãos de 21 de Março de 1990, Bélgica/Comissão, já referido, n._ 66, e de 14 de Janeiro de 1997, Espanha/Comissão, já referido, n._ 47). Ao agir deste modo, a Comissão dispõe de um poder discricionário, que é necessário para a execução das decisões tomadas em aplicação do artigo 93._, n._ 2, do Tratado, na medida em que a sua adopção implica o exercício de tal poder discricionário (acórdão de 14 de Fevereiro de 1990, França/Comissão, já referido, n._ 15).

180 Assim, há que examinar se a Comissão, quando exerce o seu poder discricionário para ordenar ao Estado-Membro em causa que recupere um auxílio declarado incompatível com o mercado comum, pode limitar no tempo os efeitos desta decisão, porque um acórdão de um órgão jurisdicional nacional, em razão do seu teor, seria, segundo o Estado-Membro em causa, susceptível de criar na esfera do beneficiário do auxílio uma confiança legítima na legalidade do mesmo.

181 A este respeito, o Tribunal recorda que, segundo jurisprudência constante, um Estado-Membro, cujas autoridades concederam um auxílio em violação das normas previstas no artigo 93._ não pode invocar a confiança legítima da empresa beneficiária para se subtrair à obrigação de tomar as medidas necessárias com vista ao cumprimento de uma decisão da Comissão que lhe ordena a recuperação do auxílio. Reconhecer tal possibilidade aos Estados-Membros significaria, com efeito, privar os artigos 92._ e 93._ do Tratado de qualquer efeito útil, na medida em que as autoridades nacionais poderiam, dessa forma, basear-se no seu próprio comportamento ilegal para anular a eficácia das decisões tomadas pela Comissão ao abrigo dessas disposições do Tratado (v., em último lugar, acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 1997, Espanha/Comissão, já referido, n._ 48).

182 Recorde-se, todavia, que não se pode excluir a possibilidade de o beneficiário de um auxílio ilegal invocar circunstâncias excepcionais que legitimamente originaram a sua confiança no carácter regular desse auxílio. Nesse caso, o reconhecimento dessa confiança legítima pressupõe que o auxílio tenha sido concedido no respeito do processo previsto pelo artigo 93._ do Tratado (acórdãos do Tribunal de Justiça de 10 de Junho de 1993, Comissão/Grécia, C-183/91, Colect., p. I-3131, n._ 18, e de 14 de Janeiro de 1997, Espanha/Comissão, já referido, n._ 51).

183 Resulta das considerações que precedem que não incumbe ao Estado-Membro em causa, mas sim à empresa beneficiária, invocar a existência das circunstâncias excepcionais que puderam criar a sua confiança legítima a fim de se opor à restituição de um auxílio ilegal, e isso no âmbito dos processos perante as autoridades estatais ou o juiz nacional (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Junho de 1995, Siemens/Comissão, T-459/93, Colect., p. II-1675, n._ 104).

184 Por conseguinte, a Comissão não podia fundamentar a sua decisão de limitar no tempo a obrigação que incumbe às autoridades francesas de recuperarem o auxílio ilegalmente concedido ao PMU limitando-se a invocar a posição adoptada por est últimas quanto à pretensa confiança legítima criada na esfera do PMU.

185 Daqui resulta que a decisão impugnada, na medida em que limita no tempo a obrigação de as autoridades francesas exigirem a restituição do auxílio resultante da isenção da participação no esforço de construção em benefício do PMU, não a partir de 1989, data a partir da qual foi declarada incompatível, mas a partir do início do processo, ou seja, 11 de Janeiro de 1991, se encontra viciada por violação do artigo 93._, n._ 2, do Tratado, e deve ser anulada.

186 Quanto à segunda acusação da recorrente, de que a Comissão teria cometido um erro de direito ao confiar ao Governo francês a tarefa de calcular o montante exacto do auxílio a restituir, recorde-se que, segundo a jurisprudência na matéria, a obrigação de um Estado-Membro suprimir, em conformidade com o artigo 93._, n._ 2, do Tratado, um auxílio considerado incompatível com o mercado comum, visa o restabelecimento da situação anterior, objectivo que é atingido a partir do momento em que o auxílio em causa, acrescido, se for caso disso, dos juros de mora, é restituído pelo beneficiário ao Estado (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Abril de 1995, Comissão/Itália, C-350/93, Colect., p. I-699, n.os 20 a 22).

187 Todavia, nem a jurisprudência, nem qualquer disposição do direito comunitário exige que a Comissão, quando ordena a restituição de um auxílio declarado incompatível com o mercado comum, determine o montante do auxílio a restituir. Com efeito, as exigências da jurisprudência na matéria limitam-se a que, por um lado, a recuperação dos auxílios ilegalmente concedidos conduza ao restabelecimento da situação anterior e, por outro, que esta restituição seja efectuada segundo as modalidades previstas pelo direito nacional, sem que a aplicação das disposições deste último possa prejudicar o alcance e a eficácia do direito comunitário (acórdãos do Tribunal de Justiça de 21 de Setembro de 1983, Deutsche Milchkontor e o., 205/82 a 215/82, Recueil, p. 2633, n.os 18 a 25, e de 2 de Fevereiro de 1989, Comissão/Alemanha, 94/87, Colect., p. 175, n._ 12; acórdão Siemens/Comissão, já referido, n._ 82).

188 Acrescente-se que, na medida em que o cálculo do montante do auxílio a recuperar pode, como no caso de figura, exigir a tomada em consideração de regimes de imposição cuja base tributável, taxa e modalidades de cobrança são fixadas directamente pela legislação nacional aplicável na matéria, a Comissão pode validamente limitar-se a verificar de maneira geral a obrigação de o beneficiário restituir o auxílio em questão e deixar às autoridades nacionais a tarefa de calcular o montante preciso do auxílio a restituir (v., por analogia, acórdão Air France/Comissão, já referido, n._ 165).

189 O Tribunal considera que, contrariamente ao que a recorrente sustenta, longe de constituir uma delegação ilegal de poderes, a decisão da Comissão de confiar ao Governo francês a tarefa de calcular o montante do auxílio a restituir insere-se no âmbito mais lato da obrigação de cooperação leal que vincula mutuamente a Comissão e os Estados-Membros na execução do artigo 93._ do Tratado (no que se refere à execução do artigo 93._, n._ 1, que prevê o exame permanente pela Comissão dos auxílios existentes, v. acórdãos do Tribunal de Justiça de 29 de Junho de 1995, Espanha/Comissão, C-135/93, Colect., p. I-1651, n._ 24, e de 15 de Outubro de 1996, Ijssel-Vliet Combinatie, C-311/94, Colect., p. I-5023, n._ 36; no que se refere às dificuldades encontradas pelos Estados-Membros quando da execução de uma decisão da Comissão que decide a restituição de um auxílio, v. acórdãos do Tribunal de Justiça de 2 de Fevereiro de 1989, Comissão/Alemanha, já referido, n._ 9, de 20 de Setembro de 1990, Comissão/Alemanha, já referido, n.os 13 a 16, e de 10 de Junho de 1993, Comissão/Grécia, já referido, n._ 19).

190 Quanto aos argumentos da recorrente de que o auxílio em questão não teria finalmente sido restituído na sua totalidade, recorde-se que, segundo a jurisprudência, a legalidade de uma decisão em matéria de auxílios deve ser apreciada em função dos elementos de informação de que a Comissão podia dispor no momento em que a adoptou (acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de Março de 1994, Banco Exterior de España, C-387/92, Colect., p. I-877, n.os 12 e 13, e de 26 de Setembro de 1996, França/Comissão, já referido, n._ 33). Ora, os argumentos da recorrente não se referem à legalidade da sua execução, de modo que são aqui irrelevantes.

191 Do que precede resulta que a acusação da recorrente segundo a qual, a decisão impugnada, ao confiar às autoridades francesas a tarefa de calcular o montante do auxílio a restituir, estaria viciada por um erro de direito, não é procedente e deve, por isso, ser rejeitada.

Quanto à violação do artigo 190._ do Tratado

Exposição sumária da argumentação das partes

192 A recorrente sustenta que, como resulta das considerações consagradas aos fundamentos anteriores, a decisão impugnada se encontra viciada por falta de fundamentos e deve, por conseguinte, ser anulada.

193 Acrescenta que a fundamentação de uma decisão deve ser examinada em função dos fundamentos nela contidos e não de fundamentos suplementares suscitados pela primeira vez na fase contenciosa. Por conseguinte, o Tribunal devia, no quadro do exercício da sua fiscalização jurisdicional, afastar os fundamentos aduzidos pela Comissão pela primeira vez na sua contestação, segundo os quais a) o PMU «é objecto de uma tributação gravosa, claramente superior à de outras actividades ou de outras empresas», b) «no contexto de tal fiscalidade gravosa e derrogatória, é legítimo que o Estado contribua para a reestruturação das empresas em causa a fim de garantir as suas próprias receitas para o futuro», c) o auxílio à informatização do PMU devia contribuir «sobretudo para o melhoramento da raça equídea, o que constitui um objectivo legítimo e conforme ao interesse da Comunidade», d) «o objectivo final da isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA era o melhoramento da raça equídea» e e) a limitação no tempo da obrigação de restituir o auxílio resultante da isenção do PMU da participação no esforço de construção seria justificada pela confiança legítima criada na esfera do PMU pelo acórdão do Conselho de Estado francês de 1962, já referido.

194 Por fim, a recorrente sustenta que a decisão impugnada deve igualmente ser anulada, por violação do artigo 190._ do Tratado, porque a Comissão não tomou posição quanto ao auxílio indicado na sua denúncia relativo à isenção do PMU do pagamento de qualquer forma de imposto sobre o rendimento.

195 A Comissão considera que este fundamento não constitui um fundamento autónomo e remete para o efeito para as suas observações quanto ao mérito. Esclarece, todavia, que se só se referiu especialmente na fase escrita ao objectivo do auxílio à reestruturação concedido ao PMU, consistente em preservar as receitas do Estado (v., supra, n._ 46), tal deve-se ao facto de tal consideração ser inerente a toda e qualquer decisão em matéria de auxílios de Estado. Além disso, tal afirmação visava apenas responder ao argumento da recorrente suscitado pela primeira vez na petição, segundo o qual a diminuição das deduções do Estado sobre as apostas em 1985 era uma medida ad hoc especialmente destinada a financiar o plano de recuperação do PMU.

196 Quanto à referência feita na sua contestação à confiança legítima do PMU, a Comissão sustenta que este argumento mais não faz do que completar a fundamentação constante da decisão impugnada relativa à impossibilidade de as autoridades francesas cobrarem a imposição em questão em razão do referido acórdão do Conselho de Estado de 1962.

Apreciação do Tribunal

197 Tendo o conjunto das acusações da recorrente assentes, no âmbito do presente fundamento, numa violação do artigo 190._ do Tratado sido já examinado no âmbito dos fundamentos precedentes, o Tribunal considera que não há que lhe responder no quadro do presente fundamento.

198 Resulta das considerações que precedem que a decisão impugnada deve ser anulada na parte em que, por um lado, considera que os benefícios concedidos ao PMU resultantes a) das facilidades de tesouraria concedidas ao PMU que lhe permitem diferir o pagamento de certas deduções sobre as apostas, b) da modificação da repartição das deduções ocorrida em 1985 e 1986, c) da colocação à disposição dos prémios não reclamados e d) da isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA, depois de 1 de Janeiro de 1989, não constituem auxílios de Estado, na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado. Por outro lado, a decisão impugnada deve igualmente ser anulada na parte em que limita a obrigação do Estado francês de exigir a restituição do auxílio resultante da isenção do PMU da participação no esforço de construção, não a partir de 1989, mas a partir de 11 de Janeiro de 1991.

Quanto aos pedidos destinados a dirigir uma injunção à Comissão

199 Nos seus pedidos, a recorrente solicita ao Tribunal que ordene à Comissão que reexamine imediatamente a sua denúncia e que tome as medidas que se impõem em aplicação do artigo 176._ do Tratado.

200 O Tribunal recorda que, segundo uma jurisprudência constante, não cabe ao juiz comunitário dirigir, no quadro da fiscalização da legalidade por ele exercida, injunções às instituições ou substituir estas últimas, mas que incumbe à administração em causa tomar as medidas que comporta a execução de um acórdão proferido no quadro de um recurso de anulação. Assim estes pedidos da recorrente devem ser rejeitados por inadmissíveis (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Junho de 1997, Tiercé Ladbroke/Comissão, T-504/93, Colect., p. II-923, n._ 45).

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

201 Por força do artigo 87._, n._ 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Todavia, nos termos do artigo 87._, n._ 3, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes. Tendo sido dado provimento parcial ao recurso, e tendo ambas as partes pedido a condenação da outra nas despesas, decide-se que cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

202 Nos termos do artigo 87._, n._ 4, do Regulamento de Processo, a interveniente suportará as suas próprias despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

(Segunda Secção Alargada)

decide:

203 A Decisão 93/625/CEE da Comissão, de 22 de Setembro de 1993, relativa a vários auxílios concedidos pela França a favor do Pari Mutuel Urbain (PMU) e das sociedades de corridas, é anulada na parte em que decide que os benefícios concedidos ao PMU resultantes a) da modificação da repartição das deduções ocorrida em 1985 e 1986, b) das facilidades de tesouraria concedidas a este último pela autorização de adiar o pagamento de certas deduções sobre as apostas, c) da colocação à disposição dos prémios não reclamados e d) da isenção da regra de adiamento de um mês para a dedução do IVA, depois de 1 de Janeiro de 1989, não constituem auxílios de Estado, na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, bem como na parte em que decide que a obrigação do Estado francês exigir a restituição do auxílio resultante da isenção do PMU da participação no esforço de construção não remonta a 1989, mas a 11 de Janeiro de 1991.

204 Quanto ao restante é negado provimento ao recurso.

205 Cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

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