ISSN 1977-0774 |
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Jornal Oficial da União Europeia |
L 351 |
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Edição em língua portuguesa |
Legislação |
59.° ano |
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(1) Texto relevante para efeitos do EEE |
PT |
Os actos cujos títulos são impressos em tipo fino são actos de gestão corrente adoptados no âmbito da política agrícola e que têm, em geral, um período de validade limitado. Os actos cujos títulos são impressos em tipo negro e precedidos de um asterisco são todos os restantes. |
II Atos não legislativos
DECISÕES
22.12.2016 |
PT |
Jornal Oficial da União Europeia |
L 351/1 |
DECISÃO (UE) 2016/2326 DA COMISSÃO
de 21 de outubro de 2015
relativa ao auxílio estatal SA.38375 (2014/C ex 2014/NN) concedido pelo Luxemburgo à Fiat
[notificada com o número C(2015) 7152]
(Apenas faz fé o texto em língua francesa)
(Texto relevante para efeitos do EEE)
A COMISSÃO EUROPEIA,
Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 108.o, n.o 2, primeiro parágrafo (1),
Tendo em conta o Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, nomeadamente o artigo 62.o, n.o 1, alínea a),
Após ter convidado as partes interessadas a apresentarem as suas observações em conformidade com os referidos artigos (2), e tendo em conta essas observações,
Considerando o seguinte:
1. PROCEDIMENTO
(1) |
Por carta de 19 de junho de 2013, a Comissão enviou ao Luxemburgo um pedido de prestação de informações pormenorizadas sobre as práticas nacionais em matéria de ruling fiscal (3). |
(2) |
Por carta de 17 de julho de 2013, as autoridades luxemburguesas responderam de um modo geral e forneceram uma parte das informações solicitadas. Em especial, a sua resposta continha uma descrição dos princípios jurídicos e das regras nacionais que vinculam a administração fiscal luxemburguesa (Administration des contributions directes) aquando da adoção de uma decisão fiscal antecipada em matéria de tributação das sociedades («ruling fiscal» ou «ruling» (4)), especificava o procedimento que permite obter uma decisão dessa natureza e as informações que o contribuinte deve apresentar e indicava se os rulings adotados pela administração fiscal eram publicados ou não. As autoridades luxemburguesas não forneceram, conforme lhe foi pedido pela Comissão, uma lista dos rulings fiscais aprovados em 2010, 2011 e 2012 pela sua administração fiscal, bem como outras informações úteis, como o nome das sociedades, a respetiva atividade, a data dos rulings, o período de validade dos rulings e o tipo de transações abrangidas por esses rulings. |
(3) |
Por carta de 30 de agosto de 2013, a Comissão enviou uma carta de insistência às autoridades luxemburguesas, pedindo-lhes que fornecessem uma lista dos rulings fiscais aprovados em 2010, 2011 e 2012 (5). |
(4) |
Por cartas de 20 e 23 de setembro de 2013, as autoridades luxemburguesas lamentaram o facto de algumas das informações relativas ao pedido de prestação de informações da Comissão terem sido publicadas na imprensa. Além disso, contestaram a base jurídica do pedido de prestação de informações da Comissão. |
(5) |
Por carta de 2 de outubro de 2013, a Comissão respondeu às autoridades luxemburguesas, indicando-lhes a base jurídica que a habilitava a abrir um inquérito por iniciativa própria sobre a prática do Luxemburgo em matéria de ruling fiscal, e concedendo-lhes um prazo adicional para apresentar a lista dos rulings fiscais solicitada. |
(6) |
Em 11 de outubro de 2013, realizou-se uma reunião entre as autoridades luxemburguesas e a Comissão. No dia 14 de outubro seguinte, as autoridades luxemburguesas indicaram, numa carta, terem dúvidas de que a base jurídica invocada pela Comissão pudesse justificar o caráter alargado e geral do pedido de prestação de informações. A Comissão respondeu a essa carta em 15 de outubro de 2013. |
(7) |
Houve uma nova troca de cartas entre as autoridades luxemburguesas (cartas de 11 de novembro e de 2 de dezembro de 2013) e a Comissão (cartas de 14 de novembro e de 12 de dezembro de 2013), ao longo da qual as autoridades luxemburguesas explicaram que, devido à formação de um novo governo, não podiam responder ao pedido de prestação de informações. Por conseguinte, a Comissão concedeu uma prorrogação do prazo de resposta até 15 de janeiro de 2014, especificando, nas suas duas cartas, que poderia ser obrigada a adotar uma injunção para prestação de informações, caso o seu pedido de prestação de informações se mantivesse sem resposta. |
(8) |
Por carta de 15 de janeiro de 2014, as autoridades luxemburguesas forneceram 22 rulings fiscais relativos ao período 2010-2013, depois de expurgados os nomes dos contribuintes dos documentos. Segundo as autoridades luxemburguesas, esses 22 rulings — um dos quais dizia respeito a um acordo prévio de preços («APP») dirigido a uma empresa referida como «FFT» («APP da FFT» ou o «ruling fiscal controvertido») — eram representativos da prática luxemburguesa em matéria de ruling fiscal. |
(9) |
O APP da FFT continha os seguintes documentos (6):
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(10) |
Por carta de 7 de março de 2014, a Comissão pediu às autoridades luxemburguesas que confirmassem se a «Fiat Finance and Trade Ltd» era o contribuinte referido como FFT no APP da FFT. Indicou igualmente que, com base nas informações apresentadas, não podia excluir que o APP da FFT constituísse um auxílio estatal incompatível com o mercado interno a favor da FFT. A Comissão pediu às autoridades luxemburguesas que lhe prestassem informações complementares úteis para a apreciação do APP da FFT. Na ausência de resposta das autoridades luxemburguesas a esta carta, a Comissão enviou-lhes uma carta de insistência em 7 de abril de 2014 (7). |
(11) |
Em 24 de abril de 2014, as autoridades luxemburguesas responderam à carta de 7 de março de 2014 e confirmaram que não dispunham de quaisquer informações complementares úteis à apreciação do APP da FFT. No atinente à questão de saber se a sigla «FFT» correspondia à Fiat Finance and Trade Ltd, as autoridades luxemburguesas invocaram as disposições em matéria de confidencialidade da legislação luxemburguesa, alegando que as mesmas as impediam de confirmar a identidade do contribuinte em questão. |
(12) |
Em 24 de março de 2014, a Comissão adotou uma decisão de injunção para a prestação de informações, com base no artigo 10.o do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho (8), exigindo às autoridades luxemburguesas a lista dos rulings fiscais visada no considerando 2. |
(13) |
Por decisão de 11 de junho de 2014, a Comissão deu início a um procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, do TFUE («decisão de início do procedimento») (9), relativo ao APP da FFT. A decisão de início do procedimento foi acompanhada de uma decisão de injunção para a prestação de informações («decisão de injunção»), que ordenava o Luxemburgo a fornecer, no prazo de um mês a contar da notificação da referida decisão, todos os documentos, informações e dados necessários que permitissem à Comissão pronunciar-se sobre a existência do alegado auxílio e, se fosse o caso, sobre a compatibilidade desse auxílio com o mercado interno. Concretamente, a Comissão pedia ao Luxemburgo que confirmasse a identidade do beneficiário da medida. |
(14) |
Por carta de 14 de julho de 2014, o Luxemburgo apresentou as suas observações sobre a decisão de início do procedimento. Indicou igualmente que, dado não ter sido possível à Comissão constatar a existência de um auxílio estatal, não tinha de responder às questões colocadas na decisão de início do procedimento, nem na decisão de injunção. |
(15) |
Por carta de 14 de agosto de 2014, a Comissão solicitou ao Luxemburgo que lhe prestasse as informações em falta visadas na decisão de início do procedimento e na decisão de injunção. Solicitou ainda ao Luxemburgo autorização para contactar diretamente a FFT, a fim de lhe colocar as questões que ficaram por responder, nos termos do artigo 6.o-A do Regulamento (CE) n.o 659/1999. |
(16) |
Em 3 de setembro de 2014, o Luxemburgo respondeu parcialmente às questões que até então tinham permanecido sem resposta e indicou que uma parte das informações solicitadas constituíam segredos comerciais da FFT, que não estavam na sua posse. Por outro lado, confirmou que a FFT era efetivamente a empresa Fiat Finance and Trade Ltd. e autorizou a Comissão a dirigir as suas questões diretamente à FFT. |
(17) |
Em 17 de outubro de 2014, a decisão de início do procedimento foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia (10). No âmbito dessa decisão, a Comissão convidava as partes interessadas a apresentarem as suas observações sobre a medida de auxílio em causa. Por carta de 30 de outubro de 2014, recebeu observações da FFT. |
(18) |
Em 22 de dezembro de 2014, o Luxemburgo apresentou uma lista dos beneficiários de rulings fiscais, no intuito de dar cumprimento ao pedido de prestação de informações formulado na carta da Comissão de 19 de junho de 2013. Essa lista elenca os rulings aprovados pela administração fiscal luxemburguesa em 2010, 2011 e 2012. |
(19) |
Por carta de 5 de janeiro de 2015, o Luxemburgo apresentou os seus comentários sobre as observações recebidas em resposta à decisão de início do procedimento. |
(20) |
Em 12 de fevereiro de 2015, a Comissão adotou uma decisão que informava o Luxemburgo de que, nos termos do artigo 6.o-A do Regulamento (CE) n.o 659/1999, tinha constatado que o processo formal de investigação relativo ao ruling fiscal controvertido tinha, até o momento, permanecido ineficaz. Assim, e com a autorização do Luxemburgo (11), a Comissão pôde dirigir as suas questões diretamente à FFT. |
(21) |
Por cartas de 20 de fevereiro de 2015, a Comissão enviou um pedido de prestação de informações ao Luxemburgo e à FFT. O pedido de prestação de informações dirigido à FFT tinha por base o artigo 6.o-A, n.o 6, do Regulamento (CE) n.o 659/1999. |
(22) |
Por carta de 24 de fevereiro de 2015, o Luxemburgo respondeu à decisão da Comissão,de 12 de fevereiro de 2015, manifestando a sua surpresa relativamente à evolução do procedimento no caso vertente e as suas dúvidas quanto ao fundamento de declarar o procedimento ineficaz, atendendo ao volume considerável de informações que o Luxemburgo tinha fornecido à Comissão no decurso da investigação. |
(23) |
Por mensagens de correio eletrónico de 26 de fevereiro e de 3 de março de 2015, a FFT pediu esclarecimentos sobre o pedido de prestação de informações e uma prorrogação do prazo de resposta, que lhe foi concedida pela Comissão por mensagem de correio eletrónico de 5 de março de 2015. |
(24) |
Por carta de 5 de março de 2015, a Comissão respondeu à carta do Luxemburgo de 24 de fevereiro de 2015. |
(25) |
Em 23 de março de 2015 (12), a Comissão pediu ao Luxemburgo, em resposta à lista dos rulings fiscais que este havia transmitido em 22 de dezembro de 2014, que lhe fornecesse informações complementares sobre os rulings referidos para os anos de 2010, 2011 e 2012. Mais concretamente, pediu ao Luxemburgo que especificasse que rulings diziam respeito a uma função de tesouraria e que rulings diziam respeito a sociedades não integradas ou autónomas. A Comissão pediu ainda ao Luxemburgo que lhe comunicasse um determinado número de rulings relativos a certos grupos específicos de sociedades. |
(26) |
Por carta de 24 de março de 2015, o Luxemburgo respondeu ao pedido de prestação de informações da Comissão de 20 de fevereiro de 2015 (13). |
(27) |
Por carta de 31 de março de 2015, a FFT respondeu ao pedido de prestação de informações da Comissão de 20 de fevereiro de 2015. A sua resposta continha, nomeadamente, as orientações do grupo Fiat relativamente aos preços de transferência. |
(28) |
Em 23 de abril de 2015, o Luxemburgo forneceu informações complementares sobre 1 900rulings, de entre aqueles que constavam da sua resposta de 22 de dezembro de 2014. Indicou que três dos rulings enumerados diziam respeito a uma função de tesouraria: dois deles tinham sido aprovados em 2010 e um em 2011. Em 23 de março de 2015, a Comissão tinha pedido que fossem apresentados dois desses rulings, uma vez que diziam respeito a sociedades referidas no seu pedido de 23 de março de 2015. |
(29) |
Em 27 de abril de 2015, realizou-se uma reunião entre a FFT, as autoridades luxemburguesas e a Comissão. |
(30) |
Em 4 de junho de 2015, o Luxemburgo forneceu as informações complementares pedidas pela Comissão em 23 de março de 2015, sobre 5 327rulings de entre os enumerados na sua resposta de 22 de dezembro de 2014. Concretamente, indicou que outros dez rulings diziam respeito a funções de tesouraria […]. Por outro lado, foi comunicado à Comissão um ruling relativo à sociedade G em 25 de junho de 2015. |
(31) |
Em 18 de junho de 2015, o Luxemburgo comunicou um ruling relativo à sociedade E (ruling de 2011). |
(32) |
Por carta de 10 de julho de 2015, o Luxemburgo apresentou uma argumentação segundo a qual, em caso de decisão final negativa, a Comissão não deveria poder recuperar retroativamente um eventual auxílio junto do beneficiário, ou seja, remontando até a data do ruling fiscal. |
(33) |
Em 15 de julho de 2015, realizou-se uma reunião entre o diretor financeiro da Fiat Chrysler Automobiles N.V., a sociedade que sucedeu à Fiat S.p.A., as autoridades luxemburguesas e a Comissão. |
2. DESCRIÇÃO DA MEDIDA
2.1. Descrição do beneficiário
(34) |
A FFT faz parte do grupo Fiat. Na altura do ruling fiscal controvertido, o grupo Fiat era composto pela S.p.A., uma sociedade de direito italiano com sede social em Turim, e por todas as sociedades controladas pela Fiat S.p.A. (coletivamente designadas na presente decisão «Fiat» ou «grupo Fiat»). Na sequência da fusão da Fiat S.p.A. com a Fiat Investments N.V., em 12 de outubro de 2014, a Fiat Chrysler Automobiles N.V. sucedeu à Fiat S.p.A. (14). |
(35) |
A Fiat exerce atividades industriais e de serviços financeiros no setor automóvel. A Comissão remete para os considerandos 20 e 21 da decisão de início do procedimento para uma descrição mais exata das atividades da Fiat. |
(36) |
A FFT presta serviços de tesouraria e de financiamentos às sociedades do grupo Fiat sediadas (sobretudo) na Europa (excetuando a Itália); gere igualmente várias estruturas de gestão central de tesouraria para as sociedades do grupo Fiat estabelecidas no Reino Unido, na Dinamarca, na Bélgica, nos Países Baixos, na Suíça, na Áustria, na Alemanha e em Espanha. A FFT opera a partir do Luxemburgo, onde está estabelecida a sua sede social, e através de duas sucursais, uma das quais está sediada em Londres (Reino Unido) e a outra em Madrid (Espanha). |
(37) |
O relatório em matéria de preços de transferência apresentado à Comissão pelo Luxemburgo em 15 de janeiro de 2014 contém informações, no que diz respeito à FFT, resumidas nos considerandos 38 a 51 (15). |
(38) |
A Fiat decidiu centralizar as funções financeiras e de tesouraria, para as quais todas as atividades em matéria de financiamento, serviços financeiros prestados às sociedades, relações bancárias, gestão dos riscos cambiais e de taxa de juro, gestão central de tesouraria, operações no mercado monetário, gestão de tesouraria, iniciação de cobrança e de pagamento são realizadas pelas «sociedades de tesouraria». |
(39) |
As sociedades de tesouraria encontram-se organizadas do seguinte modo:
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(40) |
As transações transfronteiriças entre sociedades intragrupo nas quais a FFT participa podem ser agrupadas em duas categorias principais:
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(41) |
A figura abaixo descreve as operações de financiamento (de T1 a T3). Principais transações transfronteiriças intragrupo |
(42) |
No tocante às funções assumidas, a FFT encontra-se ativa no financiamento pelo mercado e os investimentos de fundos líquidos, as relações com os agentes do mercado financeiro, os serviços de coordenação e de aconselhamento financeiros prestados às empresas do grupo, os serviços de gestão de tesouraria prestados às empresas do grupo, o financiamento intersociedades a curto prazo («C/P») e médio prazo («M/P») e a coordenação com as demais sociedades de financiamento. |
(43) |
No que diz respeito ao financiamento pelo mercado e aos investimentos em fundos líquidos, a FFT mobiliza os fundos com o intuito de dispor dos mesmos para apoiar as operações e o crescimento das sociedades do grupo e investi-los adequadamente. Em relação à gestão dos riscos financeiros, a FFT segue as orientações estabelecidas pelas políticas internas relevantes do grupo (risco cambial e risco de taxa de juro). O financiamento da FFT é proveniente de instrumentos como a emissão de obrigações (através de um «Global Medium Term Note» ou o programa «GMTN no qual a FFT, juntamente com a FFNA e a FFC, é um emitente), de empréstimos bancários a prazo, das linhas de crédito afetadas e não afetadas, entre outros. Para a gestão dos fundos líquidos, a FFT investe a te»souraria excedentária em instituições bancárias de primeira ordem ou em fundos de liquidez bem cotados. |
(44) |
No atinente à exposição ao risco cambial, a FFT gere esta exposição recorrendo, essencialmente, a contratos a prazo sobre divisas e a swaps de divisas. A exposição ao risco cambial está em grande parte associada à duração diferente do passivo e do ativo, bem como à gestão. A FFT utiliza sobretudo swaps de taxas de juro («IRS») e contratos a prazo relativos a taxas de juro («FRA»). |
(45) |
No que diz respeito às relações com os agentes do mercado financeiro, a FFT, em coordenação com a FF, lida com os mercados e os estabelecimentos financeiros para lhes fornecer informações e dados relativos ao grupo em apoio da solvência e posição financeira deste último. |
(46) |
No quadro dos serviços de coordenação e de aconselhamento financeiros prestados às sociedades do grupo, a FFT está encarregada de prestar a estas últimas assistência financeira, examinar as respetivas necessidades financeiras, identificar as melhores soluções financeiras, celebrar os contratos financeiros e controlar os desempenhos dos produtos financeiros no tocante às necessidades das sociedades do grupo. |
(47) |
O fluxo de caixa, as necessidades de financiamento e a liquidez das sociedades do grupo são supervisionados pela FFT, a fim de otimizar a eficiência e a eficácia da gestão dos recursos em fundos próprios do grupo. A FFT gere as estruturas de gestão central de tesouraria no Reino Unido, na Dinamarca, na Bélgica, nos Países Baixos, na Suíça, na Áustria, na Alemanha e em Espanha. Todos os dias, os saldos por países são centralizados numa conta centralizadora da FFT, a fim de gerir a posição financeira global. Mais concretamente, durante o dia, as contas das sociedades do grupo (detidas em bancos) recebem e efetuam pagamentos no âmbito das suas atividades normais. No fim do dia, os saldos das contas das sociedades do grupo apresentam uma posição positiva ou negativa. Em ambos os casos, são automaticamente cobertos pela conta centralizadora da FFT, aberta em cada país. Em seguida, através de transferências manuais, os montantes das diferentes contas centralizadoras nacionais são redirecionados (entrada ou saída) para uma conta centralizadora única. Por conseguinte, todos os dias, as contas correntes das sociedades do grupo são repostas a zero. Em função da posição diária das contas correntes, aos participantes das sociedades do grupo nos regimes de centralização de tesouraria serão creditados ou debitados os juros calculados de acordo com uma grelha de fixação de preços intersociedades. |
(48) |
A taxa de juro sobre os empréstimos intragrupo é fixada como sendo a soma do custo médio ponderado do capital do grupo, ao qual é aditada uma margem. A taxa de juro sobre os depósitos é fixada ao nível da taxa sem risco, acrescida de uma margem sobre os depósitos a curto prazo em bancos, conforme definido pela política de liquidez do grupo. |
(49) |
No tocante ao financiamento intersociedades C/P e M/P e à coordenação com as demais sociedades de financiamento, a FFT procede do seguinte modo: em relação ao primeiro, a FFT disponibiliza às sociedades do grupo fundos que foram financiados em grandes quantidades em condições de comércio por grosso nos mercados regulamentados (mercado obrigacionista) ou negociando com as instituições financeiras; em relação ao segundo, as transferências de fundos são recorrentes entre as sociedades de financiamento, a fim de satisfazer as solicitações financeiras das sociedades do grupo sem recorrer ao mercado quando a posição financeira global do grupo é positiva. |
(50) |
Os principais riscos com os quais as sociedades de tesouraria são normalmente confrontadas, salientados no relatório sobre os preços de transferência, são os seguintes:
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(51) |
A FFT gere um volume considerável de ativos financeiros, que estão principalmente associados aos empréstimos entre as sociedades do grupo, às dívidas das sociedades do grupo e, em menor grau, aos depósitos bancários. A FFT utiliza sistemas informáticos que se afiguram necessários para efetuar as operações diárias e acompanhar os resultados dos mercados financeiros. |
2.2. O ruling fiscal controvertido
(52) |
A presente decisão diz respeito ao APP da FFT, um ruling fiscal em matéria de preços de transferência aprovado pelo Luxemburgo a favor da FFT, por carta de 3 de setembro de 2012. O ruling fiscal controvertido autoriza um método de afetação dos lucros à FFT no seio do grupo Fiat, proposto pelo consultor fiscal desta última, e permite à FFT determinar, anualmente, o montante do seu imposto sobre as sociedades a pagar no Luxemburgo. |
2.2.1. O APP da FFT
(53) |
Os documentos fornecidos à Comissão pelo Luxemburgo como constituindo o conjunto dos elementos essenciais que fundamentam o ruling fiscal controvertido incluem duas cartas e o relatório sobre os preços de transferência mencionado no considerando 9. |
(54) |
Por carta de 3 de setembro de 2012, a administração fiscal luxemburguesa confirmou que «a análise dos preços de transferência infra foi realizada nos termos da Circular 164/2, de 28 de janeiro de 2011, e respeita o princípio da plena concorrência» (sic). Dito de outra forma, a administração fiscal luxemburguesa admitiu que a análise dos preços de transferência efetuada pelo consultor fiscal e que consta do relatório sobre os preços de transferência conduzia a uma remuneração em condições de plena concorrência para as funções exercidas e o risco suportado pela FFT. A «remuneração em condições de plena concorrência» da FFT, conforme estabelecida no relatório sobre os preços de transferência e aceite pelo ruling fiscal controvertido, é a seguinte: «O estudo dos preços de transferência determina uma remuneração adequada dos fundos próprios expostos ao risco e dos fundos próprios destinados a remunerar as funções executadas pela sociedade de 2 542 milhões de EUR sobre os quais está previsto um desvio de +/– 10 %». A taxa de tributação normal das sociedades no Luxemburgo de 28,80 % é aplicada ao lucro líquido realizado pela FFT com base nesta remuneração. Além disso, a carta indica que a decisão aprovada pela administração fiscal é vinculativa durante 5 anos (isto é, do exercício de 2012 ao exercício de 2016) (18). |
2.2.2. O relatório sobre os preços de transferência
(55) |
Segundo o relatório sobre os preços de transferência, o método considerado mais apropriado para determinar o lucro tributável da FFT no seio do grupo Fiat é o método da margem líquida da operação (o «MMLO»). Na opinião do consultor fiscal, o MMLO é particularmente adequado quando, no âmbito transação, uma das partes não faça contribuições únicas e de valor; dado que, segundo o consultor fiscal, a FFT presta exclusivamente serviços financeiros, este método é considerado o mais apropriado para determinar preços de plena concorrência consentâneos com os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência. Além disso, uma vez que a FFT apenas exerce as suas funções para as sociedades do grupo Fiat, que não recebem qualquer tipo de serviços similares de terceiros, não é possível qualquer comparação interna. Por conseguinte, o consultor fiscal considera ser mais apropriado proceder a uma comparação externa, determinando as margens líquidas que teriam sido recebidas aquando de transações comparáveis efetuadas por sociedades independentes (19). |
(56) |
No relatório sobre os preços de transferência, o consultor fiscal estabelece a remuneração devida à FFT, que constitui o lucro tributável, em relação aos capitais que são necessários para que esta última exerça as suas funções e suporte os riscos em que incorre, devido aos ativos utilizados (20). |
(57) |
Essa remuneração é estabelecida do seguinte modo: i) estimativa dos «fundos próprios expostos ao risco» da FFT; ii) identificação dos fundos próprios da FFT utilizados para exercer as funções e apoiar os investimentos financeiros; iii) estimativa da remuneração esperada dos «fundos próprios expostos ao risco» da FFT, utilizando o modelo de equilíbrio de ativos financeiros (Capital asset pricing model — «CAPM») (21) e identificação do rendimento para recompensar os fundos próprios utilizados, a fim de exercer as funções; e iv) cálculo da rentabilidade global a ser deixada à FFT para remunerar os riscos suportados e as funções exercidas, combinando os resultados das etapas i) a iii). |
(58) |
No tocante à etapa i), com base na análise funcional contida no relatório sobre os preços de transferência, o consultor fiscal considera que a FFT suporta os seguintes riscos: riscos operacionais, de crédito e de incumprimento pela contraparte, ao passo que o consultor fiscal considera que o risco cambial suportado pela FFT é nulo. Aplicando o Quadro de Basileia II (22) por analogia (23), o consultor fiscal estimou os requisitos mínimos de fundos próprios da FFT para cobrir os seguintes riscos: riscos operacionais de incumprimento pela contraparte, cambial e de crédito, como se segue:
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(59) |
Estes cálculos levam o consultor fiscal a designar os «fundos próprios expostos ao risco» da FFT, que correspondem aos fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT, segundo o Quadro de Basileia II aplicado pelo consultor fiscal da FFT, sintetizados no quadro 1. Quadro 1 Requisitos mínimos de fundos próprios da FFT
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(60) |
No que diz respeito à etapa ii), aquilo que o relatório sobre os preços de transferência designa de «fundos próprios utilizados para exercer as funções» (24) é estimado subtraindo do total dos fundos próprios da FFT a parte dos requisitos mínimos de fundos próprios da FFT resultante do Quadro de Basileia II, conforme estimados pelo consultor fiscal, e a dos fundos próprios da FFT utilizados para apoiar os investimentos financeiros na FFNA e na FFC. |
(61) |
Segundo o consultor fiscal da FFT, no fim de 2011, os capitas próprios da FFT ascendiam a 287,5 milhões de EUR, dos quais:
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(62) |
O quadro 2 indica a distribuição do conjunto de capitais próprios da FFT, conforme apresentada pelo consultor fiscal no relatório sobre os preços de transferência. Quadro 2 Distribuição dos capitais próprios da FFT
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(63) |
Quanto à etapa iii), o consultor fiscal propõe, em primeiro lugar, remunerar a parte dos capitais próprios da FFT, que designa de «fundos próprios mínimos expostos ao risco», que correspondem aos fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT consoante determinados pelo consultor fiscal na etapa i), estimando a rendibilidade dos capitais próprios que os investidores esperavam receber («rendibilidade esperada antes de impostos») utilizando o CAPM, ou seja: Rendibilidade esperada antes de impostos = (Taxa de juro sem risco + β × Prémio de risco sobre fundos próprios)/(1 — Taxa de imposto) |
(64) |
Aquando da aplicação do CAPM, o consultor fiscal da FFT utilizou as seguintes variáveis:
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(65) |
Aplicando essas variáveis à fórmula que consta do considerando 63, o consultor fiscal da FFT obtém uma «rendibilidade dos capitais próprios que os investidores esperavam receber para os riscos assumidos» de 6,05 %. |
(66) |
O quadro 3 fornece a lista das sociedades selecionadas pelo consultor fiscal da FFT enquanto sociedades comparáveis que atuam de forma independente no setor financeiro, bem como a lista dos respetivos betas, utilizados no cálculo do beta a utilizar no CAPM. Quadro 3 Lista das sociedades comparáveis que prestam serviços financeiros
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(67) |
O quadro 4 mostra o «intervalo de plena concorrência» dos betas das sociedades comparáveis selecionadas obtido pelo consultor fiscal da FFT. Quadro 4 Intervalo de plena concorrência dos betas das sociedades comparáveis
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(68) |
Em seguida, o consultor fiscal da FFT propõe remunerar a parte dos capitais próprios da FFT, que designa no quadro 2 de «fundos próprios que cobrem as funções exercidas», correspondente aos «fundos próprios utilizados para exercer as funções», identificados na etapa ii), utilizando a taxa de juro do mercado aplicada aos depósitos a curto prazo (30), que, segundo o consultor fiscal da FFT, seria igual a 0,87 %. |
(69) |
O consultor fiscal da FFT propõe, em seguida, a não remuneração da parte dos capitais próprios da FFT, que designa como os que cobrem os investimentos financeiros da FFT na FFNA e na FFC, denominada no quadro 2 «fundos próprios que cobrem os investimentos financeiros na FFNA e na FFC», ou seja, a parte que tem uma remuneração nula para efeitos de tributação. |
(70) |
Por último, na etapa iv), o consultor fiscal calcula a remuneração global devida à FFT pelas suas atividades de financiamento e de tesouraria e para os riscos que assume. Essa remuneração é composta pelos elementos que se seguem, resultantes das etapas i) a iii) supra:
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(71) |
O quadro 5 mostra a estimativa feita pelo consultor fiscal da rendibilidade global a deixar à FFT para efeitos de tributação no Luxemburgo. Quadro 5 Estimativa da matéria coletável da FFT
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(72) |
O montante total de 2 542 milhões de EUR corresponde ao montante do ruling fiscal controvertido que a administração fiscal luxemburguesa considera constituir uma remuneração de plena concorrência (32). |
(73) |
O quadro 6 sintetiza as conclusões a que o consultor fiscal da FFT chegou no fim das etapas i) a iv) supra, nos considerandos 58 a 72. Quadro 6 Cálculo recapitulativo dos requisitos mínimos de fundos próprios e do impacto no resultado antes de impostos da FFT
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2.3. Descrição das normas luxemburguesas relativas aos preços de transferência
(74) |
O ruling fiscal a favor da FFT foi aprovado com base no artigo 164.o, n.o 3, do Código luxemburguês dos Impostos sobre o Rendimento [lei, alterada, de 4 de dezembro de 1967, relativa ao imposto sobre o rendimento, («L.I.R.»)] e na Circular L.I.R. n.o 164/2, de 28 de janeiro de 2011 («Circular») (33). |
2.3.1. Artigo 164.o do Código luxemburguês dos Impostos sobre o Rendimento
(75) |
O artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R. estabelece que «as distribuições dissimuladas de lucros devem ser incluídas no rendimento tributável. Existem distribuições dissimuladas de lucros, nomeadamente, se um associado, sócio ou interessado, receber direta ou indiretamente vantagens de uma sociedade ou de uma associação das quais não teria normalmente beneficiado se não tivesse essa qualidade». Esta disposição estabelece o princípio da plena concorrência no direito fiscal luxemburguês, segundo o qual as transações entre sociedades de um mesmo grupo devem ser remuneradas como se tivessem sido aceites por sociedades independentes negociando em circunstâncias comparáveis em condições de plena concorrência. |
2.3.2. Circular L.I.R. n.o 164/2
(76) |
O artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R. é esclarecido pela Circular, com a seguinte redação: a secção 1 define os termos «sociedade de financiamento de grupo» (34), «transação de financiamento intragrupo» (35) e «empresas associadas» (36). |
(77) |
A secção 2, intitulada «Aspetos Gerais», começa por descrever como se segue os serviços intragrupo aos quais a Circular se aplica: «Um serviço intragrupo (incluindo uma transação de financiamento intragrupo) foi prestado se, em circunstâncias comparáveis, uma empresa independente tivesse estado disposta a pagar a outra empresa independente para executar essa atividade, ou se ela própria a tivesse executado.» A secção 2 da Circular contém igualmente uma descrição do princípio da plena concorrência conforme definido nos princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência e transposto para o direito nacional. A este respeito, indica que «se um serviço intragrupo tiver sido prestado, há que determinar, tal como para os outros tipos de transferências intragrupo, se a remuneração acordada está conforme com o princípio de plena concorrência, isto é, se corresponde ao preço que teria sido praticado e aceite por empresas independentes em circunstâncias comparáveis» (37). |
(78) |
No tocante à referência a «circunstâncias comparáveis», a Circular especifica que a análise de comparabilidade deve incluir elementos como «as características dos bens ou dos serviços transferidos, as funções assumidas pelas partes, as cláusulas contratuais, as circunstâncias económicas das partes e as estratégias industriais ou comerciais que elas perseguem» (38). |
(79) |
A secção 3 da Circular explica como determinar uma remuneração de plena concorrência no que diz respeito, em particular, às sociedades de financiamento do grupo. As funções assumidas por estas sociedades, que determinam a remuneração de cada uma delas, devem, nos termos da Circular, ser comparáveis às funções assumidas pelas instituições financeiras independentes sujeitas à supervisão da Comissão de Supervisão do Setor Financeiro. Por conseguinte, a remuneração de plena concorrência para as funções assumidas (tendo em conta os ativos utilizados e os riscos assumidos) «deverá basear-se na remuneração exigida por essas instituições para operações de crédito comparáveis» (39). |
(80) |
Por outro lado, as instituições financeiras, antes de concederem um crédito ou um adiantamento de fundos, realizam uma análise de riscos, avaliando designadamente o risco financeiro associado à transação, o risco inerente ao mutuário, o risco da empresa mutuante e o risco estrutural. No atinente aos custos associados à concessão de empréstimos, os custos suplementares devem, além disso, ter em conta, nomeadamente, os «custos suplementares suportados para cumprir os requisitos em matéria de solvência, os custos suplementares associados ao risco de crédito, os custos de processamento ou encargos suplementares devidos ao risco cambial» (40). O risco de crédito é determinado com base nas condições que regem o contrato de crédito e nos resultados da análise dos riscos. |
(81) |
Por último, nos termos da Circular, os prestadores de serviços financeiros independentes relacionam, por regra, o montante da remuneração com o montante da verba emprestada, ou com o valor real dos ativos sob gestão. De igual modo, à semelhança dos prestadores de serviços independentes, «as sociedades de financiamento do grupo que efetuem operações de crédito intragrupo devem, portanto, realizar igualmente uma análise dos riscos antes de conceder um crédito a uma empresa associada e ter em consideração qualquer outro fator suscetível de influenciar a determinação dos seus preços de transferência» (41). |
(82) |
A secção 4 da Circular especifica que as autoridades fiscais apenas prestam informações com efeitos vinculativos se a sociedade em causa tiver uma presença real no Luxemburgo. Em seguida, elenca as diferentes condições que uma sociedade de financiamento de grupo deve satisfazer para dispor de uma presença real no país. Os capitais próprios da sociedade, nomeadamente, devem ser adequados em relação às funções exercidas (tendo em conta os ativos utilizados e os riscos assumidos) e o montante dos capitais próprios deve corresponder, no mínimo, a 1 % do valor nominal do(s) crédito(s) concedido(s) ou a dois milhões de EUR, na ausência de outra indicação. |
(83) |
A Circular indica igualmente as informações e os documentos a fornecer para obter informações com efeitos vinculativos para a administração fiscal. Enquanto tal, um pedido de informações vinculativo deve conter, nomeadamente, «um estudo de preços de transferência que observe os princípios enunciados pela OCDE neste domínio e inclua, nomeadamente, uma descrição completa da metodologia proposta e informações e análises pormenorizadas que sustentem essa metodologia, por exemplo, a identificação de comparáveis e o conjunto de resultados que se espera obter» (42). Por último, a Circular especifica que um ruling fiscal tem normalmente um prazo de validade de cinco anos, salvo se os factos e as circunstâncias se alterarem, as prescrições jurídicas na qual o ruling se baseou forem alteradas ou uma das características essenciais da transação for alterada (43). |
2.4. Descrição das orientações da OCDE em matéria de preços de transferência
(84) |
A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico («OCDE») proporciona aos seus países membros orientações em matéria de fiscalidade, expostas nos seus «princípios aplicáveis em matéria de preços de transferência» («princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência») que constituem um instrumento jurídico não vinculativo que fornece orientações sobre os preços de transferência (44). |
(85) |
Os preços de transferência são os preços faturados para transações comerciais entre diversas partes do mesmo grupo de sociedades. As sociedades multinacionais têm um incentivo financeiro em declarar o mínimo possível de lucros nos territórios em que a tributação desses lucros é mais significativa, o que é suscetível de conduzir a preços de transferência excessivos, que é conveniente não aceitar como base para efeitos do cálculo do rendimento tributável. Para evitar este problema, as administrações fiscais apenas devem aceitar os preços de transferência entre sociedades de um mesmo grupo quando as transações são remuneradas como se tivessem sido aceites por sociedades independentes que negociem em circunstâncias comparáveis em condições de plena concorrência (45). É aquilo que se designa de «princípio da plena concorrência». |
(86) |
A declaração de princípio relativa ao princípio da plena concorrência consta do artigo 9.o, n.o 1, do modelo de convenção fiscal da OCDE, que constitui o fundamento das convenções fiscais bilaterais dos quais são partes os países membros da OCDE e um número crescente de países não membros. O artigo 9.o estabelece que «quando as duas empresas [associadas] na suas relações comerciais ou financeiras, estiverem ligadas por condições aceites ou impostas que difiram das que seriam estabelecidas entre empresas independentes, os lucros que, se não existissem essas condições, teriam sido obtidos por uma das empresas, mas não o foram por causa dessas condições, podem ser incluídos nos lucros dessa empresa e, consequentemente, tributados.». |
(87) |
Em 27 de junho de 1995, o Comité dos Assuntos Fiscais da OCDE adotou os princípios aplicáveis em matéria de preços de transferência na sua versão original (46); a mesma foi ligeiramente atualizada em julho de 2010 (47). Atendendo ao caráter não vinculativo destes princípios, as administrações fiscais dos países membros da OCDE são meramente incentivadas a segui-los. Em geral, contudo, estes servem de referência e têm um efeito claro nas práticas fiscais dos países membros (e mesmo não membros) da OCDE. Além disso, em vários países membros da OCDE, estes princípios assumiram força de lei ou servem de referência para efeitos de interpretação da legislação fiscal nacional. Se a Comissão cita os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência na presente decisão, é porque os referidos princípios constituem um manual existente neste domínio que é fruto de debates entre peritos no âmbito da OCDE e introduz esclarecimentos sobre técnicas destinadas a superar os desafios comuns que a aplicação do princípio da plena concorrência coloca em situações concretas. Os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência fornecem, portanto, às administrações fiscais e às empresas multinacionais, orientações úteis sobre a aplicação do princípio da plena concorrência. Realçam ainda o consenso internacional em matéria de preços de transferência. |
(88) |
Os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência enumeram cinco métodos para estabelecer uma aproximação dos preços de plena concorrência para as transações e a distribuição dos lucros entre sociedades de um mesmo grupo: i) o método do preço comparável de mercado («método CUP»); ii) o método do custo majorado; iii) o método do preço de revenda; iv) o método da margem líquida da operação (MMLO) e v) o método do fracionamento do lucro. Estabelecem uma distinção entre os métodos tradicionais baseados nas transações (os três primeiros) e os métodos de fracionamento do lucro (os dois últimos). As empresas multinacionais gozam da liberdade de aplicar métodos não descritos nestes princípios a fim de determinar os preços de transferência, desde que tais preços cumpram o princípio da plena concorrência. |
(89) |
O método CUP e o MMLO são relevantes para a presente decisão e são, portanto, apresentados mais pormenorizadamente nos considerandos 90 a 92. |
(90) |
O método CUP compara o preço faturado para a transferência de bens ou de serviços no quadro de uma transação controlada (transação entre duas empresas que estão associadas entre si) com o preço faturado para a transferência de bens ou serviços no quadro de uma transação comparável efetuada no mercado livre (transação entre duas empresas independentes uma da outra) em circunstâncias comparáveis. |
(91) |
O MMLO é um dos «métodos indiretos» utilizados para estabelecer uma aproximação dos preços de plena concorrência para as transações e a distribuição de lucros entre as sociedades de um mesmo grupo. Consiste em estimar o montante potencial do lucro em virtude do princípio da plena concorrência para uma atividade considerada no seu todo, e não para transações específicas. Não visa determinar o preço dos bens vendidos, mas estima os lucros que sociedades independentes poderiam esperar realizar numa determinada atividade, tal como a atividade de venda de bens. Para o fazer, seleciona uma base adequada (um «indicador de nível de lucros»), como os custos, o volume de negócios ou de investimentos fixos, e aplica-lhe uma taxa de lucro que reflete a observada em transações comparáveis efetuadas no mercado livre. |
(92) |
Como o MMLO não estabelece um preço para transações individuais, o rendimento tributável de uma entidade à qual se aplica poderá não ter impacto direto no rendimento tributável de outra entidade do mesmo grupo de sociedades. O método difere, por conseguinte, da aplicação do método CUP, que estabelece o preço de transferência como sendo o preço de um bem ou de um serviço específico, que é depois inscrito no rendimento tributável, no mesmo montante, pela sociedade do grupo que vende e por aquela que compra o bem ou serviço em causa. |
2.5. Informações complementares comunicadas após o início do procedimento formal de investigação
2.5.1. Carta do Luxemburgo de 3 de setembro de 2014
(93) |
Em resposta às questões formuladas na decisão de início do procedimento, o Luxemburgo informou a Comissão de que os créditos concedidos no seio do grupo Fiat não estavam sujeitos a um limite máximo. |
(94) |
O Luxemburgo também forneceu esclarecimentos relativamente aos preços médios das concessões e contrações de empréstimos intragrupo da FFT ao longo do período compreendido entre 2011 e 2013. A taxa de juro aplicável às concessões de empréstimos intragrupos concedidas pela FFT é […]. No fim de 2011, correspondia à taxa Euribor acrescida de uma margem de [6-9 %]. A taxa de juro média cobrada aos saldos das contas correntes das sociedades do grupo era, em 2012 e 2013, respetivamente de [6-9 %] e [6-9 %]. Em 2011, 2012 e 2013, a taxa média paga pela FFT sobre os depósitos intragrupo ascendia, respetivamente, a [0-3 %], a [0-3 %] e a [0-3 %] (taxas fixas médias). |
(95) |
O Luxemburgo também se pronunciou sobre a remuneração do capital autorizada pelo ruling fiscal controvertido. Indicou, nomeadamente, que o capital investido nas participações era remunerado mediante a distribuição de dividendos e que estes, devido à sua natureza, não são objeto de uma análise em matéria de preços de transferência, porquanto são recebidos por uma sociedade na sua qualidade exclusiva de acionista. Portanto, os dividendos não são tidos em consideração para efeitos da determinação da importância das funções exercidas e dos riscos assumidos. |
(96) |
O Luxemburgo explicou ainda que a aquisição das participações da FFT foi financiada na íntegra com fundos próprios e que este modo de financiamento significa automaticamente que estes fundos não estão disponíveis para cobrir outros riscos suportados pela FFT. |
(97) |
O Luxemburgo remeteu também para o artigo 57.o da Diretiva 2006/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (48), em virtude do qual os fundos próprios não consolidados das instituições de crédito não incluem as participações noutras instituições de crédito superiores a 10 % do capital destas últimas. |
(98) |
Além disso, o Luxemburgo remeteu para a abordagem elementar definida pelo Quadro de Basileia II, que fixa em 15 % a taxa a aplicar à média de três períodos de rendimentos brutos anuais positivos. |
2.5.2. Carta do Luxemburgo de 24 de março de 2015
(99) |
Em resposta ao pedido da Comissão, que solicitava ao país que lhe comunicasse exemplos de rulings cujos destinatários fossem contribuintes que se encontrassem na mesma situação da FFT, o Luxemburgo indicou, na sua carta de 24 de março de 2015, que a situação da FFT era muito específica. Isso deve-se, segundo a explicação do país, ao facto de a FFT ser uma instituição financeira que angaria fundos no mercado, contrariamente à maior parte das instituições financeiras do Luxemburgo, que emprestam, com uma margem, fundos que lhes são disponibilizados por outras sociedades do grupo a que pertencem. |
(100) |
Além disso, segundo a administração fiscal luxemburguesa, a situação de cada contribuinte é suficientemente específica para tornar impossível qualquer comparação com a de outros contribuintes. Tal explicaria o facto de o direito nacional luxemburguês apenas conter uma disposição geral que serve de enquadramento aos preços de transferência (ou seja, o artigo 164.o da L.I.R.), que lhe permite apreender da forma mais precisa possível a realidade económica de cada caso, seja ou não objeto de um ruling fiscal. |
(101) |
O Luxemburgo comunicou igualmente a matéria coletável da FFT para o período compreendido entre 2009 e 2013, com base nas declarações fiscais da sociedade (49), reproduzida no quadro 7. Quadro 7 Matéria coletável da FFT para o período compreendido entre 2009 e 2013
|
(102) |
O Luxemburgo indicou que a declaração fiscal da FFT de 2013 mostrava que os receios manifestados no considerando 64 da decisão de início do procedimento, segundo os quais a matéria coletável está estabelecida num intervalo entre 2 288 000 EUR e 2 796 000 EUR, não tinham qualquer fundamento. Afigura-se evidente que o ruling fiscal controvertido autoriza unicamente o método selecionado e que os parâmetros do mercado são variáveis. |
(103) |
Por último, a pedido da Comissão, o Luxemburgo comunicou igualmente todos os rulings fiscais anteriores aprovados pela administração fiscal luxemburguesa em relação às sociedades do grupo Fiat. |
(104) |
Em primeiro lugar, um pedido de ruling datado de 9 de dezembro de 2009 e aceite pela administração fiscal luxemburguesa incidia sobre a autorização da matéria coletável da FFT […]. |
(105) |
Em segundo lugar, a administração fiscal luxemburguesa comunicou duas cartas datadas de 3 de setembro de 2012. A primeira é o ruling fiscal controvertido, que tem por base um pedido de ruling datado de 14 de março de 2012, como indicado no considerando 9. Este pedido de ruling foi novamente apresentado à Comissão, na íntegra, na carta do Luxemburgo de 24 de março de 2015, que incluía informações que o Luxemburgo tinha anteriormente ocultado na sua comunicação inicial deste ruling à Comissão. |
(106) |
Uma segunda carta, quase idêntica, foi comunicada em resposta a um pedido de ruling paralelo depositado […] na administração fiscal luxemburguesa, em 18 de abril de 2012, para uma sociedade denominada [F], que parece corresponder à FFT numa outra estrutura de sociedades de financiamento do grupo. Neste segundo pedido de ruling, a descrição das funções da [sociedade F] é idêntica à das funções da FFT conforme consta do pedido de 14 de março de 2012. Esta outra estrutura apenas diferia no sentido de que a sociedade só possuiria uma única sucursal no Reino Unido, que não teria nenhuma em Espanha e que [a sociedade F] não seria proprietária [de nenhuma filial]. |
(107) |
O segundo pedido de ruling, apoiado por um relatório sobre preços de transferência, inclui uma conclusão cuja apresentação é idêntica à que consta do pedido de ruling da FFT (reproduzida no considerando 54). Todavia, o resultado da análise dos preços de transferência é bastante diferente. A remuneração em condições de plena concorrência [da sociedade F], conforme estabelecida no relatório relativo aos preços de transferência, é a seguinte: «O estudo sobre os preços de transferência determina uma remuneração adequada assente i) no capital de risco no valor de 44,6 milhões de EUR e ii) no capital que permite remunerar as funções exercidas pela sociedade no valor de 8,8 milhões de EUR, com um intervalo de +/– 10 %.» |
(108) |
Os dois rulings constavam da lista comunicada à Comissão pelo Luxemburgo em 4 de junho de 2015 relativa aos rulings fiscais que cobrem uma função de tesouraria (ver o considerando 29). |
(109) |
Em terceiro lugar, foram igualmente comunicados à Comissão dois outros pedidos de ruling […], aceites pela administração fiscal luxemburguesa. Estes pedidos de rulings datavam de 2002 e 2012 e incidem sobre outros aspetos da estrutura do grupo Fiat no Luxemburgo. Estes rulings não são examinados na presente decisão. |
2.5.3. Informações comunicadas pela Fiat em 31 de março de 2015
2.5.3.1.
(110) |
A Fiat recorda que é detida a cerca de 40 % pela Fiat S.p.A. e a cerca de 60 % pela FF, que é uma filial detida a 100 % da Fiat S.p.A (50). Por sua vez, a FFT detém a FFNA e a FFC a 100 % (51). A Fiat recorda igualmente que a FFT é uma das sociedades de financiamento do grupo Fiat que são enumeradas no considerando 39. |
(111) |
A pedido da Comissão, a Fiat prestou informações financeiras circunstanciadas sobre as sociedades de financiamento do grupo. Comunicou, nomeadamente, o relatório anual das sociedades FFT, FF, FFNA, FFC e FFB para os exercícios de 2011 a 2013, bem como uma descrição das funções dessas sociedades. Segundo essas informações, a FF emprega 52 pessoas, das quais [20-30) no departamento «financiamento» e [10-20] no departamento «contabilidade». A FFT conta com 14 trabalhadores, um diretor, [0-10] colaboradores em contacto direto com os clientes (a partir do Reino Unido), [0-10] colaboradores encarregados de funções administrativas e [0-10] pessoas encarregadas da contabilidade e dos controlos. A FFNA emprega cinco pessoas, ao passo que a FFC exerce atividades limitadas. |
(112) |
Segundo as informações comunicadas pela Fiat, o valor contabilístico das filiais da FFT (FFNA e FFC) […]. O relatório anual da FFT indica que a FFNA e a FFC foram readquiridas à Fiat S.p.A. e à FF em 2011. A partir de 2011, a FFT elaborava, no Luxemburgo, demonstrações financeiras consolidadas. |
(113) |
A FF e a FFT são as sociedades de financiamento para a área do euro. Os dados financeiros relativos às mesmas para o período 2010-2013 com base nos relatórios anuais comunicados, são apresentados nos quadros 8 e 9 (52). Quadro 8 Dados financeiros da FFT para o período compreendido entre 2010 e 2013
|
(114) |
No fim de 2011, 2012 e 2013, a FFT emitiu junto de diferentes bancos garantias a favor das sociedades do grupo, perfazendo um montante total de, respetivamente, 2 560 802 EUR, 10 772 314 EUR e 10 155 339 EUR. Quadro 9 Dados financeiros da FF para o período compreendido entre 2010 e 2013
|
(115) |
No final de 2013 (e no final de 2012), a participação da FF no capital das empresas associadas consistia em participações na FFT, no valor de 157 269 000 EUR (ou seja, 60 % do capital social da FFT), e na FFB, no valor de 2 013 000 EUR, bem como em detenção de juros que não conferia qualquer controlo nas demais sociedades do grupo, no valor de 725 000 EUR. No final de 2011, 100 % das ações da FFT estavam contabilizadas nas participações da FF, perfazendo um montante total de 202 102 000 EUR. No final de 2010, antes da venda da FFNA e da FFC à FFT em 2011, a FF detinha uma participação de 7 213 000 EUR na FFC, de 262 077 000 EUR na FFT, de 87 055 EUR na FFNA e de 2 013 000 EUR na FFB, ou seja, uma participação total de 358 000 000 EUR nas filiais a 100 % da Fiat, como indicado no quadro 8. |
2.5.3.2.
(116) |
A Fiat facultou os nomes de 61 contrapartes no seio do grupo com as quais a FFT tinha efetuado transações ao longo do período 2011-2013. Comunicou o saldo médio entre a FFT e essas contrapartes para os seis principais credores e devedores para os anos 2011, 2012 e 2013. As informações relativas a 2013 encontram-se reproduzidas no quadro 10 (a coluna relativa aos juros sobre o saldo médio foi aditada pela Comissão). Quadro 10 Contrapartes da FFT em 2013
|
(117) |
A Fiat também prestou informações sobre a emissão de dívida por parte da FFT desde 2009 em aplicação do programa EMTN (54), principal fonte de financiamento da FFT, bem como sobre o seu prospeto. A FFT efetuou durante esse período 14 emissões com vencimentos máximos de 7 anos. Emitiu obrigações denominadas em euros, com cupões compreendidos entre 5,75 % e 7,75 % (excetuando um emissão com uma taxa de 9 %), e em francos suíços, com cupões de 4 % a 5 %. |
(118) |
As informações comunicadas pela Fiat indicam o vencimento das operações de financiamento intragrupo. No final de 2013, o prazo de vencimento contratual dos créditos era inferior a um ano para um montante de créditos de 12 613 000 EUR, num montante total de 12 858 000 EUR (os fundos líquidos e os empréstimos concedidos às sociedades do grupo são apresentados no quadro 9). |
(119) |
Resulta das informações comunicadas sobre as diferentes transações intragrupo que várias transações são operações quotidianas. Contudo, a FFT efetuou igualmente transações acompanhadas de prazos de vencimento diferentes […]. A FFT concede empréstimos ao grupo de diferentes formas […]. No final de 2013, a quase totalidade dos depósitos tinha um prazo de vencimento […]. As emissões de obrigações tinham prazos de vencimento diferentes […]. |
(120) |
A Fiat comunicou igualmente o documento relativo à política do grupo em matéria de fundos líquidos, referido no relatório sobre preços de transferência no qual se baseia o pedido de ruling. Esse documento enuncia as regras internas aplicáveis às aplicações de tesouraria do grupo. […] |
2.5.3.3.
(121) |
Na sua carta de 20 de fevereiro de 2015, a Comissão pediu à Fiat que explicasse o mecanismo que lhe permite chegar a um resultado líquido igual a uma percentagem estável dos capitais próprios ao longo dos anos 2009, 2010 e 2011 [conforme resulta do quadro 4 que consta do considerando 51 da decisão de início do procedimento], apesar de desvios consideráveis no que diz respeito aos ativos, aos passivos e aos encargos financeiros e receitas. |
(122) |
A Fiat forneceu um documento intitulado «Transfer Pricing Policy» (política em matéria de preços de transferência) em resposta a este pedido que a convidava a explicar a tarifação dos empréstimos e depósitos intragrupo. Resulta desse documento que a Fiat fixa os preços dos empréstimos intragrupo concedidos pelas sociedades de financiamento do grupo de forma a que estas últimas obtenham um rendimento determinado previamente. |
(123) |
As funções descritas como sendo as exercidas pela FFT e o risco assumido são idênticos à descrição que consta do relatório sobre preços de transferência, conforme resumida nos considerandos 38 a 51, excetuando certas informações. […] o documento relativo à política em matéria de preços de transferência refere-se ao risco de crédito e ao risco de incumprimento pela contraparte, descritos no pedido de ruling como não existentes no que diz respeito aos ativos do grupo, ao passo que o documento classifica este risco de «limitado». |
(124) |
O documento relativo à política em matéria de preços de transferência explica que a fixação dos preços das transações intragrupo é estimada como se segue. […], estima o montante da concessão de empréstimos intragrupo a financiar. […], estima uma margem a aplicar aos empréstimos intragrupo nesta base, dividindo a soma da rendibilidade-alvo, acrescida das despesas de exploração, pelo montante total dos empréstimos a financiar. Por último, adita esta margem aos custos de financiamento das sociedades de financiamento para obter uma estimativa da tarificação dos empréstimos intragrupo. |
(125) |
O documento relativo à política em matéria de preços de transferência ilustra este método de tarifação dos empréstimos intragrupo com base em dados quantitativos de 2012. No que diz respeito à rendibilidade dos capitais próprios esperado, esta é estimada para 2012 em [4-7 %] para a FF e a FFT numa base consolidada. O documento inclui estimativas dos betas para a União Europeia para 2012, bem como taxas sem risco e prémios de risco para Itália e o Luxemburgo, apresentados separadamente, e é nesta base que estima a seguinte rendibilidade esperada: Quadro 11 Informações contidas no documento interno relativo à política em matéria de preços de transferência
|
(126) |
O documento distingue, além disso, os empréstimos com duração predeterminada, que foram estabelecidos no passado, para os quais não é possível modificar as condições de tarifação, e os empréstimos intragrupo suscetíveis de serem revistos com taxa variável. […] |
2.5.4. Carta do Luxemburgo de 10 de julho de 2015
(127) |
Na sua carta de 10 de julho de 2015, o Luxemburgo declara que a Comissão infringiria o princípio da segurança jurídica se ordenasse a recuperação do alegado auxílio junto do beneficiário na sua decisão de encerrar o procedimento formal de investigação. Remete para decisões anteriores da Comissão relativas a regimes de auxílios fiscais relevantes neste ponto, no âmbito das quais a Comissão admitiu que esse princípio podia impedir a recuperação do auxílio (56) e autorizou um período transitório com base na existência de uma confiança legítima (57). |
(128) |
Além disso, o Luxemburgo declara que, uma vez que, aquando da fixação dos preços de transferência, o preço de plena concorrência exato não pode nem deve ser determinado segundo os princípios da OCDE, não é possível ordenar a recuperação de um montante de auxílio exato. Por outro lado, o Luxemburgo invocou que, tendo em conta o caráter novo da medida e nos termos das decisões anteriores, a Comissão não deveria ordenar a recuperação do auxílio, em conformidade com o princípio da proteção da confiança legítima (58). |
3. FUNDAMENTAÇÃO PARA DAR INÍCIO AO PROCEDIMENTO
(129) |
A Comissão decidiu dar início ao procedimento formal de investigação, porque considerou, a título preliminar, que o ruling fiscal controvertido concedia à FFT um auxílio estatal incompatível com o mercado interno na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
(130) |
A Comissão manifestou, nomeadamente, dúvidas quanto à compatibilidade do ruling fiscal controvertido com o princípio da plena concorrência. As suas dúvidas prendiam-se com os elementos especificados a seguir, nos considerandos 131 a 137. |
(131) |
Em primeiro lugar, o ruling parecia aceitar uma matéria coletável fixa de 2 542 milhões de EUR (+/– 10 %) para as atividades da FFT no Luxemburgo, que apenas poderia variar ligeiramente, e manter-se estável mesmo se, por exemplo, as atividades da FFT nas quais se baseia a determinação da matéria coletável crescessem consideravelmente. |
(132) |
Em segundo lugar, a Comissão manifestou dúvidas quanto à adequação do método escolhido pelo consultor fiscal da FFT para estimar a remuneração desta última para as funções que ela exerce. Na sua análise dos preços de transferência, o consultor fiscal utilizou um método indireto, o MMLO, para calcular esta remuneração, mas a Comissão considera ser conveniente privilegiar a utilização de métodos diretos e, em especial, o método CUP, nos casos em que possam ser observadas no mercado transações comparáveis. A esse respeito, a Comissão observou que a Chrysler, a sociedade americana do grupo Fiat, recorre diretamente aos mercados de capitais para financiar as suas operações e algumas dessas transações são comparáveis às realizadas pela FFT. |
(133) |
Em terceiro lugar, no atinente à utilização do CAPM para estimar a rendibilidade necessária gerada pelos capitais próprios, a Comissão manifestou dúvidas quando à aplicação correta do CAPM por parte do consultor fiscal da FFT. Salientou que as duas componentes que determinam a remuneração da FFT com base no CAPM, o montante dos capitais próprios remunerados e o nível de remuneração aplicado a este montante de capitais próprios, estavam fixadas num nível demasiado baixo. |
(134) |
No tocante ao montante dos capitais próprios remunerados, o ruling fiscal aceitava a aplicação do CAPM unicamente a uma fração dos capitais próprios, os quais estavam rotulados de «fundos próprios expostos ao risco», ao passo que os capitais próprios injetados na FFNA e na FFC eram deduzidos dos capitais próprios a remunerar sem uma explicação plausível (59). Por outro lado, verificou-se que o cálculo dos «fundos próprios expostos ao risco» se traduzia pelo estabelecimento de uma matéria coletável demasiado baixa, dado que não incluía os ativos intragrupos, mais uma vez sem motivo convincente. Na sua decisão de início do procedimento, a Comissão colocou em causa a hipótese segundo a qual não haveria risco de crédito sobre as transações realizadas com as sociedades do grupo. A Comissão também manifestou dúvidas quanto ao cálculo dos requisitos mínimos de fundos próprios para o risco de incumprimento pela contraparte e o risco de crédito. Concretamente, a escolha de um fator de ponderação dos riscos relativamente baixo, de 20 %, para o risco de incumprimento pela contraparte não se justificava e nada indicava o que estaria previsto na eventualidade de haver uma alteração significativa do quadro regulamentar. O relatório sobre preços de transferência do consultor fiscal não explica em que medida a «diferença entre os juros vencidos credores sobre os depósitos bancários e os juros vencidos devedores sobre os empréstimos bancários» constitui uma boa indicação do risco operacional e não explica a razão pela qual se impõe uma ponderação do risco de 15 %. De igual modo, não explica por que motivo o risco de incumprimento pela contraparte é multiplicado por 6 % e não por 8 %, tendo em conta que os requisitos mínimos de fundos próprios previstos pelo Quadro de Basileia II para o risco de incumprimento pela contraparte, às quais o relatório sobre preços de transferência faz explicitamente referência, são de 8 %. |
(135) |
No que diz respeito à remuneração aplicada a este capital, a Comissão manifestou dúvidas quanto à determinação do beta, dado que o mesmo parecia demasiado baixo comparativamente ao de outras sociedades que prestam serviços financeiros. Também manifestou dúvidas quanto à escolha, por parte do consultor fiscal, do percentil 25 em vez da mediana para o cálculo do beta. |
(136) |
Em quarto lugar, no tocante à rendibilidade esperada gerada pelos capitais próprios considerados como excedentários no pedido de ruling, a Comissão manifestou dúvidas quanto à aceitação, no ruling fiscal controvertido, da utilização de uma taxa muito baixa de 0,87 % sem qualquer justificação. |
(137) |
Uma vez que a análise do preço de transferência aceite pelo ruling fiscal controvertido não parecia respeitar o princípio da plena concorrência, a Comissão considerou, a título preliminar, que esse ruling conferia uma vantagem à FFT. Considerou-se que essa vantagem foi obtida todos os anos e perpetuou-se todas as vezes que o imposto exigível calculado com base neste ruling era aceite pela administração fiscal luxemburguesa. Segundo a Comissão, essa vantagem foi também concedida de forma seletiva, porquanto constituía um desvio relativamente à prática administrativa que favorece especificamente a FFT em relação a sociedades que se encontram numa situação factual e jurídica similar. |
(138) |
Estando todas as demais condições do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE satisfeitas, e na ausência de um motivo aparente de compatibilidade, a Comissão concluiu, a título preliminar, que o ruling fiscal controvertido constituía um auxílio estatal incompatível com o mercado interno. Por conseguinte, decidiu dar início ao processo formal de investigação no que diz respeito a esse ruling fiscal. |
(139) |
Na sua decisão de dar início ao processo, a Comissão solicitou, além disso, ao Luxemburgo, ao abrigo do artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento (CE) n.o 659/1999, que apresentasse todos os documentos, informações e dados relativos à medida impugnada necessários para lhe permitir deliberar sobre a existência de um auxílio estatal e, se for o caso, sobre a compatibilidade desse auxílio com o mercado interno. Caso o Luxemburgo não fornecesse todas as informações pedidas, convidou-o a aceitar, nos termos do artigo 6.o-A, n.o 2, alínea b), do Regulamento (CE) n.o 659/1999, que a Comissão pedisse ao beneficiário da medida impugnada, a FFT, que apresentasse as informações pedidas. |
4. OBSERVAÇÕES APRESENTADAS PELO LUXEMBURGO
(140) |
O Luxemburgo apresentou as suas observações sobre a decisão de início do procedimento em 19 de julho de 2014. Em primeiro lugar, afirma que o procedimento está viciado e, em seguida, que a Comissão cometeu erros quanto ao mérito na decisão de início do procedimento. |
4.1. Observações apresentadas pelo Luxemburgo sobre o procedimento da Comissão
(141) |
No que diz respeito ao procedimento, o Luxemburgo sustenta que o procedimento correto para adotar a injunção para prestação de informações não foi seguido no caso vertente, dado que o Regulamento (CE) n.o 659/1999 não permite que a Comissão emita injunções numa decisão de início do procedimento. Antes de poder emitir tal injunção, o procedimento previsto no artigo 10.o do Regulamento (CE) n.o 659/1999 deveria ter sido seguido. |
(142) |
Por outro lado, o Luxemburgo afirma que, no que diz respeito às informações pedidas na decisão de injunção, a Comissão não explicou por que motivo a divulgação da identidade do beneficiário era necessária para apreciar a medida relativamente às regras em matéria de auxílios estatais. Devido a várias fugas e afirmações proferidas com ligeireza pela Comissão em público, o Luxemburgo não podia divulgar a identidade do beneficiário nesta fase. Além disso, a decisão de injunção não especificava qualquer outra informação em concreto que devesse ser prestada. Ora, segundo o manual dos procedimentos da Comissão, uma injunção deve explicar claramente que informações são necessárias no âmbito do procedimento em causa. |
(143) |
O Luxemburgo sustenta igualmente que, como a decisão de início do procedimento não explica em que medida o ruling fiscal controvertido constitui um auxílio estatal, não pode executar a obrigação de suspensão. A FFT tem de apresentar uma declaração fiscal e, como a Comissão não especificou, na decisão de início do procedimento, qual era o método indicado para calcular o imposto exigível, a administração fiscal luxemburguesa utilizará a metodologia acordada no ruling fiscal. |
(144) |
O Luxemburgo afirma ainda que a Comissão violou os princípios da cooperação leal, da imparcialidade e da boa administração, nomeadamente ao não dar qualquer seguimento às suas propostas de reunião que teriam permitido às autoridades luxemburguesas explicar-lhe a metodologia utilizada no ruling fiscal controvertido. |
(145) |
O Luxemburgo contesta a decisão da Comissão de dar início a um procedimento relativo à FFT (com um novo número de processo, SA.38375) distinto do procedimento geral sobre as práticas do Luxemburgo em matéria de ruling fiscal, iniciado com o número de processo SA.37267. Dado que o Luxemburgo tinha interposto recurso da injunção para prestação de informações adotada pela Comissão no quadro do processo SA.37267 perante o Tribunal Geral, a Comissão conseguiu contornar artificialmente uma anulação da referida injunção, abrindo um novo processo. |
(146) |
Por último, o Luxemburgo afirma que a Comissão cometeu um abuso de poder ao confundir o exercício de um poder discricionário com a simples interpretação de uma regra de direito comum. Concretamente, o ruling fiscal relativo à FFT não decorre do exercício de um poder discricionário por parte da administração fiscal luxemburguesa, mas da aplicação do artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R., e da Circular. Segundo o Luxemburgo, aquando da aplicação destas disposições, é inevitável que as mesmas devam ser interpretadas à luz de cada caso, a fim de chegar a soluções determinadas pelas circunstâncias específicas e baseadas nestas últimas. A Comissão ignora a distinção entre, por um lado, o poder discricionário e, por outro, a interpretação das regras que incluem termos jurídicos abstratos que devem depois ser aplicadas ao processo em causa. Além disso, ao substituir-se às autoridades luxemburguesas na interpretação do direito luxemburguês, a Comissão viola a competência dos Estados-Membros em matéria de fiscalidade direta. |
(147) |
Segundo o Luxemburgo, uma vez que sua administração fiscal não exerceu o seu poder discricionário no caso da FFT, a Comissão não conseguiu provar que o ruling fiscal controvertido derrogava a prática administrativa comum. O Luxemburgo explica que sua ação administrativa assenta nos princípios da legalidade e da igualdade, reservando assim o mesmo tratamento para todos os contribuintes que se encontrem essencialmente na mesma situação. O Luxemburgo invoca que a decisão de início do procedimento apenas é examinada à luz dos princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência e não à luz da prática administrativa luxemburguesa. |
4.2. Observações apresentadas pelo Luxemburgo relativas a erros quanto à matéria de fundo da decisão de início do procedimento
(148) |
De um modo geral, o Luxemburgo afirma que a Comissão cometeu um erro quanto ao mérito, tomando como sistema de referência para determinar a vantagem seletiva o princípio da plena concorrência consagrado pelos princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência, e não a legislação e as práticas nacionais. |
(149) |
Além disso, o Luxemburgo afirma que a Comissão interpretou incorretamente os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência. No considerando 65 da decisão de início do procedimento, a Comissão parece estabelecer uma hierarquia dos métodos de fixação dos preços de transferência, afirmando que é conveniente privilegiar a utilização de métodos diretos e, em especial, o método CUP, relativamente aos métodos indiretos como o MMLO. A Comissão ignora o facto de que, desde 2010, os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência já não consideram que uma hierarquia dos métodos é consentânea com os requisitos e práticas em vigor. Remetendo para o n.o 1.13 dos referidos princípios, o Luxemburgo indica que os mesmos reconhecem que «a fixação dos preços de transferência não é uma ciência exata» e que «a escolha do método de fixação do preço de plena concorrência não será, em muitos casos, perfeitamente clara». Uma vez que o consultor fiscal da FFT considerou que a escolha do MMLO se justificava e aplicou o artigo 164.o da L.I.R., a administração fiscal luxemburguesa apenas confirmou a correção jurídica da análise. |
(150) |
Segundo o Luxemburgo, a Comissão reconhece que a interpretação e aplicação do princípio da plena concorrência variam consoante as administrações fiscais e entre as administrações fiscais e as sociedades (60); não pode, portanto, por um lado, permitir que o princípio da plena concorrência seja objeto de interpretações e aplicações divergentes e, por outro, considerar que existiria um único método correto segundo o qual o Luxemburgo deveria ter aplicado o princípio da plena concorrência. |
(151) |
Por outro lado, o Luxemburgo acusa a Comissão de não ter aplicado, no caso vertente, a disposição legislativa nacional pertinente, isto é, o artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R., bem como a prática administrativa que daí resulta, mas ter tomado como referência apenas os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência. Assim, a Comissão determina o método de cálculo que lhe parece ser o mais adequado, ao passo que o direito luxemburguês não estabelece a utilização de métodos específicos de determinação do preço de transferência. A Comissão ignora pois totalmente o quadro jurídico e a prática administrativa luxemburguesa nesta matéria. Além disso, para efeitos de análise de seletividade, a Comissão não faz uma comparação do tratamento fiscal da FFT com o de outras sociedades que se encontram numa situação factual e jurídica similar ao Luxemburgo. |
(152) |
No atinente às dúvidas manifestadas pela Comissão na sua decisão de início do procedimento, o Luxemburgo acusa a Comissão de se concentrar demasiado, e de forma demasiado unilateral, na suposta estratégia fiscal da Fiat a nível do grupo, sem ter em conta o facto de que a Fiat, por se tratar de um grupo, pode ter sido motivada por outras razões para se estruturar da forma que o fez. |
(153) |
Em primeiro lugar, as autoridades luxemburguesas não acordaram seguramente uma «matéria coletável fixa», como alegado no considerando 64 da decisão de início do procedimento. O rendimento tributável da FFT depende do volume dos empréstimos concedidos e o relatório sobre preços de transferência apenas consegue reter um intervalo em termos de pontos de base a título da margem a realizar. |
(154) |
Em segundo lugar, no que diz respeito ao montante dos fundos próprios exigidos e às dúvidas manifestadas pela Comissão a este respeito, o Luxemburgo considera que a escolha do Quadro de Basileia II é razoável, assim como a opção de excluir as participações. O Luxemburgo afirma que era lógico que as participações financeiras fossem excluídas dos cálculos, porquanto não têm cabimento no quadro de um exercício limitado aos preços de transferência sobre os empréstimos intragrupo. Além disso, segundo o relatório sobre preços de transferência, o montante que serve para financiar as participações ascende a 165 244 000 EUR, o que corresponde ao preço de compra das participações detidas pela FFT e, por conseguinte, no entender do Luxemburgo, não pode ser criticável. Por outro lado, estando as receitas das participações isentas por força do direito luxemburguês, os encargos relativos às mesmas, como os encargos de juros, também não são dedutíveis. Por último, dado que a remuneração das participações é feita através de dividendos provenientes das filiais, cujo montante é suscetível de variar em função dos resultados das filiais e das suas necessidades em matéria de reinvestimento, o conceito de margem a aplicar sobre o fluxo de receitas não faz sentido no plano comercial. |
(155) |
Em terceiro lugar, o Luxemburgo afirma que a exclusão dos créditos intragrupo do cálculo também se justifica, uma vez que as dívidas da FFT estão acompanhadas de uma garantia explícita a favor dos mutuantes da FFT. Atendendo à estratégia industrial, aos interesses económicos e ao risco de uma eventual falência para a reputação da sociedade, o risco de incumprimento da FFT é muito baixo e o montante «livre» de 93 710 000 EUR é amplamente suficiente para cobrir esse risco. |
(156) |
Em quarto lugar, o Luxemburgo acusa a Comissão de ter colocado em causa a forma como o beta era calculado para determinar o prémio de risco. Em primeiro lugar, estes cálculos não são puramente matemáticos e podem justificar-se resultados diferentes; consequentemente, os resultados obtidos no relatório sobre preços de transferência são perfeitamente justificáveis e sólidos. Em segundo lugar, mesmo supondo que os resultados aos quais a Comissão chegasse fossem diferentes, esta deve ainda assim examinar se tal confere à FFT uma vantagem em relação às demais empresas estabelecidas no Luxemburgo. Em terceiro lugar, mesmo no âmbito de uma avaliação alternativa que compara o prémio de risco calculado para a FFT com a remuneração paga aos acionistas da sociedade cotada em bolsa, que dá uma percentagem de 3,5 a 4 %, sensivelmente mais baixo do que o prémio de risco de 6,05 % calculado para a FFT, a comparação indica que o prémio de risco de 6,05 % é absolutamente justificável e satisfaz cabalmente os requisitos do artigo 164.o da L.I.R. |
(157) |
Por último, o Luxemburgo afirma que dado que o Grupo «Código de Conduta (fiscalidade das empresas)» confirmou explicitamente que a prática dos rulings fiscais no Luxemburgo era consentânea com o código de conduta e os princípios da OCDE, o princípio da confiança legítima implica que a FFT deverá poder apoiar-se no ruling fiscal de 3 de setembro de 2012 durante todo o seu período de validade, que é de cinco anos. |
5. OBSERVAÇÕES APRESENTADAS PELAS PARTES INTERESSADAS
(158) |
A FFT enviou as suas observações relativas à decisão de início do procedimento em 30 de outubro de 2014. Essas observações chegaram em dois documentos distintos. |
5.1. Primeiro conjunto de observações da FFT
(159) |
O primeiro conjunto de observações da FFT está dividido em duas partes. A primeira parte expõe a razão pela qual a FFT considera que a Comissão aplicou incorretamente os princípios da OCDE em matéria de preços de transferência ao APP da FFT. A segunda parte descreve em que medida a decisão de início do procedimento não respeita a norma jurídica exigida, que consiste em estabelecer a seletividade nos termos do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado. |
5.1.1. Aplicação incorreta dos princípios da OCDE
(160) |
Em primeiro lugar, contrariamente ao que a Comissão afirma na sua decisão de início do procedimento, a FFT indica que não chegou a acordo com a administração fiscal luxemburguesa sobre um rendimento tributável fixo. O acordo apenas incidia sobre um método de remuneração das funções de tesouraria exercidas pela FFT. Todos os anos desde 2011, a FFT atualiza todos os parâmetros utilizados para estimar os seus capitais próprios expostos ao risco e a sua rendibilidade sobre capitais próprios a fim de calcular o lucro visado. Além disso, o APP da FFT apenas é válido para um período de cinco anos, contanto que os factos e as circunstâncias nos quais se baseia não se alterem; esta duração corresponde à prática dos rulings fiscais noutros Estados-Membros. |
(161) |
Em segundo lugar, nada impede que o consultor fiscal da FFT escolha o MMLO, uma vez que não existe nenhum elemento de comparação interna em relação às transações da FFT que pudesse ser utilizado para aplicar o método CUP. As razões são: i) a FFT não concede empréstimos a terceiros e ii) as sociedades do grupo Fiat não obtêm empréstimos similares de terceiros. A FFT faz referência ao ponto 2.2 dos princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência, segundo o qual o método de seleção visa sempre encontrar o método mais apropriado num caso específico. Em seguida, a FFT refere o ponto 2.4 dos mesmos princípios, segundo o qual existem situações nas quais os métodos de transação de lucros se revelam mais apropriados do que os métodos tradicionais que se baseiam nas transações. |
(162) |
Segundo a FFT, se o consultor fiscal tivesse utilizado a valorização das suas obrigações no método CUP para fixar os preços de transferência aplicados aos empréstimos concedidos às sociedades do grupo, a FFT teria incorrido em perdas porque não teria recuperado o custo da liquidez necessária para cobrir as necessidades financeiras do grupo. A FFT forma uma entidade menos complexa do que as outras sociedades do grupo, cujas margens poderiam ser verificadas através do MMLO. Este método é utilizado com uma frequência cada vez maior nas análises dos preços de transferência e os princípios da OCDE de 2010 aplicáveis em matéria de preços de transferência não estabelecem qualquer hierarquia entre os métodos. |
(163) |
Além disso, segundo a FFT, os capitais próprios podem amiúde ser o fruto de decisões anteriores relacionadas com as atividades de uma sociedade e não terem ligação direta com o nível de capitais próprios necessário para assumir os riscos associados à atividade da sociedade. |
(164) |
Por último, a FFT salienta que os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência reconhecem que a fixação dos preços de transferência não se trata de uma ciência exata. A este respeito, remete para o ponto 1.13 desses princípios e, mais concretamente, para a seguinte consideração: «é importante não perder de vista o objetivo de alcançar uma aproximação razoável de um resultado de plena concorrência com base em informações fiáveis. Cumpre também recordar que a fixação dos preços de transferência não é uma ciência exata e requer uma apreciação por parte da administração fiscal e do contribuinte.» Todavia, a FFT indica que se esforçou, na medida do possível, para estimar uma remuneração de plena concorrência para suas atividades. |
(165) |
Em terceiro lugar, no tocante à adequação dos capitais próprios da FFT, esta última deve demonstrar que os seus capitais próprios são suficientes para suportar os riscos associados à sua atividade de financiamento. A Circular não dá qualquer orientação específica a ser seguida para determinar o nível apropriado de fundos próprios expostos ao risco. É por esta razão que a FFT decidiu analisar os seus capitais próprios no intuito de avaliar que parte desses capitais próprios era necessária para exercer as suas atividades e suportar os riscos à luz do Quadro de Basileia II. De igual modo, a Circular compara as sociedades que exercem atividades de financiamento intercalar com instituições financeiras independentes. A Circular também estabelece que os contribuintes que efetuem transações de financiamento intragrupo devem dispor de fundos próprios suficientes para suportar os riscos de financiamento associados a essas transações. Em contrapartida, as atividades de participação não são tidas em conta para efeitos do APP da FFT, razão pela qual se justificava excluir as participações da FFT dos seus fundos próprios com risco. Além disso, o montante dos capitais próprios equivalente ao investimento nas filiais da FFT não foi considerado, porquanto integra os investimentos extra carteira nas filiais remunerados através de dividendos. Contudo, os dividendos não estão sujeitos às análises dos preços de transferência, uma vez que não têm em conta a importância das funções exercidas, nem os riscos suportados. Uma decisão dessa natureza está também em conformidade com o Quadro de Basileia II (61) e com o artigo 57.o da Diretiva 2006/48/CE («DRFP III») (62). |
(166) |
Em quarto lugar, no que diz respeito à análise, realizada pela Comissão, do tratamento dos créditos intragrupo e o facto de o APP da FFT não ter em conta o conjunto dos ativos que não os pertencentes a terceiros, a FFT afirma que a notação de crédito do grupo já se encontra integrada no custo de financiamento do grupo pela FFT. Dado que a FFT e todas as sociedades associadas do grupo têm uma notação de crédito equivalente à da Fiat S.p.A. (63), a FFT não está confrontada com um risco de crédito suplementar relativamente aos seus empréstimos às suas sociedades associadas no seio do grupo. Por conseguinte, a taxa de juro solicitada pela FFT às suas sociedades associadas no seio do grupo corresponde à soma i) do custo de financiamento do grupo, ii) das comissões de garantia pagas à Fiat S.p.A.; iii) dos custos operacionais suportados para poder prestar os seus próprios serviços às outras sociedades do grupo; iv) da «transferência negativa» que surge pelo facto de que as somas avultadas emprestadas pela FFT devem ser a curto prazo e com taxas de juro mais baixas para responder às necessidades de liquidez do grupo a curto prazo; e v) da remuneração dos capitais para os riscos suportados, que está associado às funções assumidas pela FFT na gestão da tesouraria do grupo. |
(167) |
Em quinto lugar, segundo a FFT, justificava-se utilizar o coeficiente de 6 % aplicado aos ativos ponderados em função do risco («APR»), dado que isso corresponde à conceção que a FFT tem do Quadro de Basileia II transposto para as instituições financeiras não bancárias em certos territórios da UE (em Itália, por exemplo) pelas autoridades regulamentares locais, nos termos da DRFP. Além disso, como a exposição dos ativos da FFT a terceiros consiste essencialmente em depósitos bancários, a ponderação dos riscos de 20 % era aplicada em conformidade com a abordagem normalizada do Quadro de Basileia II (64). Da mesma forma, no tocante à ponderação do risco de 15 % aplicada ao risco operacional, a FFT remete a Comissão para a abordagem indicador de base na qual, segundo o ponto 649 do Quadro de Basileia II, é conveniente aplicar tal coeficiente. De igual modo, no âmbito da mesma abordagem, o produto bruto corresponde aos produtos de juros líquidos acrescidos dos produtos líquidos com exclusão dos juros, brutos de todas as provisões e dos custos de exploração, mas líquidos dos elementos excecionais. Como a FFT não tem receitas com exclusão dos juros, a referência aos juros credores sobre os depósitos bancários, líquidos de juros devedores sobre empréstimos bancários, justifica-se como sendo a melhor aproximação dos riscos operacionais da FFT. No que diz respeito a qualquer potencial alteração do quadro regulamentar, a FFT afirma que, mesmo no âmbito do Quadro de Basileia III (65) e da Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (66) («DRFP IV») relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, os critérios correspondentes continuam válidos. |
(168) |
Em sexto lugar, no que diz respeito às dúvidas manifestadas pela Comissão sobre o beta utilizado, a FFT afirma que, mesmo excluindo certos elementos de comparação (por exemplo, os bancos nacionais), o intervalo de plena concorrência mantém-se quase exatamente o mesmo. Dado que a FFT atua como uma sociedade de financiamento e não pode ser equiparada a um banco, os betas das sociedades de financiamento são considerados pela FFT e [o consultor fiscal] como os elementos de comparação mais apropriados. Acresce que a Circular faz claramente referência aos prestadores de serviços financeiros. Nesta base, afigura-se razoável ter em conta um conjunto de sociedades ativas no setor dos serviços financeiros para determinar um beta apropriado. No atinente à adoção do percentil 25 do intervalo de plena concorrência, o mesmo é consentâneo com os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência, que consideram que todos os pontos de intervalo de plena concorrência dão origem a preços/lucros de plena concorrência. Além disso, estima-se que a FFT suporta riscos limitados dado que trabalha exclusivamente para sociedades do grupo, que as atividades do grupo estão fortemente integradas e que a sociedade-mãe tem todo o interesse em apoiar as atividades das suas filiais. |
(169) |
Em sétimo lugar, a FFT não partilha as dúvidas da Comissão quanto ao facto de a rendibilidade dos capitais próprios de 0,87 % ser demasiado baixa. Os capitais próprios excedentários, isto é, os que não são necessários para cobrir os riscos suportados pela FFT no âmbito da sua atividade de financiamento, são emprestados a outra sociedade do grupo que necessite de financiamentos suplementares ou utilizados para financiar os custos de exploração da FFT no quadro da prestação de serviços financeiros. A respetiva remuneração deve, portanto, ser adaptada aos investimentos em fundos líquidos a curto prazo. |
5.1.2. Análise da seletividade realizada pela Comissão
(170) |
A FFT afirma que, mesmo que a análise da Comissão relativa à observância do princípio da plena concorrência estivesse correta, a decisão de início do procedimento não fornece qualquer prova de que a FFT tenha beneficiado de um tratamento mais favorável do que o reservado a qualquer contribuinte luxemburguês que se encontre numa situação de direito e factual comparável. A decisão de início do procedimento não inclui qualquer comparação da posição da FFT com a de outros contribuintes luxemburgueses, como os outros 21 contribuintes cujos APP foram examinados pelas Comissão. |
(171) |
A FFT foi autorizada a celebrar um APP com a administração fiscal luxemburguesa como qualquer outro contribuinte que tenha uma presença real no Luxemburgo. |
(172) |
Além disso, dado que a taxa global do imposto sobre as sociedades no Luxemburgo para a FFT era de 28,8 % (para o exercício de 2011), ao passo que na Itália a taxa de tributação das sociedades principal é de cerca de 33 %, um lucro mais elevado da FFT teria resultado em custos deduzíveis mais elevados em Itália, porquanto a maior parte dos empréstimos concedidos pela FFT destina-se à Fiat Finance S.p.A. Por conseguinte, não se afigura claro que tipo de «auxílio» o grupo no seu todo obteve, se a FFT declarou um lucro mais baixo no Luxemburgo e, portanto, beneficiou de deduções de juros menos elevadas do que em Itália. |
5.2. Segundo conjunto de observações da FFT
5.2.1. O APP não confere nenhuma «vantagem»
(173) |
O segundo conjunto de observações apresentadas pela FFT começa por explicar a importância dos APP em geral; estes são considerados como fazendo parte do sistema fiscal geral e são aceites pelo sistema fiscal luxemburguês. O APP da FFT segue as orientações fixadas pela Circular e não se desvia do sistema fiscal geral luxemburguês. A duração do APP da FFT, que é de cinco anos, é consentânea com a duração normalizada dos APP celebrados noutros Estados-Membros. |
(174) |
As regras luxemburguesas em matéria de preços de transferência, que constituem a base da Circular, fazem parte do regime fiscal geral, dado que se aplicam entre sociedades associadas no seio de um grupo no quadro de transações interempresas. As regras luxemburguesas em matéria de preços de transferência não derrogam o sistema fiscal geral dado que respeitam, na prática, os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência e visam determinar um lucro de plena concorrência. |
(175) |
No tocante às dúvidas manifestadas pela Comissão na sua decisão de início do procedimento relativamente à escolha do método de fixação dos preços de transferência, a FFT afirma que o MMLO é uma metodologia normalmente aceite, aprovada pela OCDE, que é consentânea com o sistema fiscal geral luxemburguês. A Comissão reconheceu a utilização generalizada do MMLO, bem como o facto de que a sua aplicação pode causar dificuldades (67). As orientações sobre determinados aspetos especificados são insuficientes, mas a Comissão confere a si própria o direito de resolver questões de preços de transferência controversas através da sua própria visão de como deveria ser aplicado o MMLO no caso vertente. Além disso, os benefícios fiscais da FFT estão alinhados com os benefícios legais, o que confirma ainda que a utilização do MMLO não conferiu qualquer vantagem económica à FFT. |
(176) |
Segundo a FFT, as autoridades fiscais deveriam beneficiar de uma certa margem de apreciação quando aplicam o MMLO que, no tocante à determinação do lucro tributável, nunca chega a um resultado único, mas a uma série de resultados válidos. Por conseguinte, a diferença entre as receitas tributáveis obtidas pela FFT (e aceite pelas autoridades fiscais luxemburguesas) e as receitas tributáveis presumidas segundo a Comissão não deverá ser considerada uma vantagem na aceção das regras em matéria de auxílios estatais. Tal vantagem apenas ocorre se a medida se afastar de forma flagrante das regras normalizadas de fixação dos preços de transferência e for além da margem de apreciação da administração fiscal (68). Caso contrário, tratar-se-ia de uma ingerência da Comissão nos poderes de um Estado-Membro em matéria de tributação. |
(177) |
Por último, a FFT sustenta que, quando a Comissão avaliou a existência de uma vantagem, deveria ter previsto o efeito global «no grupo». A este respeito, o grupo Fiat não beneficia de qualquer vantagem, porque qualquer aumento da matéria coletável no Luxemburgo é compensado por um aumento da dedução fiscal noutros países europeus (nestes últimos anos, sobretudo na Itália). Segundo a FFT, este efeito foi reconhecido em várias decisões da Comissão (69). |
5.2.2. Ausência de «seletividade»
(178) |
Segundo a FFT, o sistema de referência a considerar para avaliar a seletividade não pode incluir sociedades sujeitas a regras em matéria de preços de transferência, ou seja, que lidem exclusivamente com terceiros que lhes estão associados. Tal é reconhecido na decisão da Comissão relativa ao regime groepsrentebox (70), na qual se afirma, no que diz respeito às atividades de financiamento através da obtenção de empréstimos, que as sociedades associadas se encontram numa situação factual e jurídica que não é comparável à das sociedades não associadas. Além disso, para demonstrar a seletividade, a Comissão deveria provar que a FFT obteve um APP em condições diferentes das aplicadas a outras entidades de grupo luxemburguesas que exerçam atividades de financiamento. Todavia, a Circular explica que os APP estão disponíveis para todas as sociedades de grupos financeiros. Não existe, portanto, seletividade. |
(179) |
Em regra, a Comissão aceita os rulings fiscais como meios para fornecer aos contribuintes uma segurança e uma previsibilidade jurídicas no atinente à sua posição fiscal. Os rulings fiscais aprovados pela administração fiscal luxemburguesa não são discricionários, uma vez que respeitam os princípios da Circular, que refere especificamente o princípio da plena concorrência definido no artigo 9.o do modelo de acordo fiscal da OCDE e fornece orientações e precisões sobre os requisitos mínimos de fundos próprios e a análise de preços de transferência que uma sociedade luxemburguesa que exerça uma atividade de financiamento intragrupo deve cumprir. Por conseguinte, a margem de apreciação da administração fiscal luxemburguesa, partindo do princípio de que haja alguma, é limitada pelas orientações da Circular. Por outro lado, esta margem de apreciação limitada deixada à administração fiscal é inerente à aplicação dos princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência. Este simples elemento não pode, por si só, implicar a presença de um auxílio estatal. Além disso, a FFT afirma que o APP da FFT está sujeito a um exame periódico, com um período de validade máximo de cinco anos. |
(180) |
A FFT afirma ainda que a Comissão não demonstrou que a aplicação do método MMLO no APP da FFT divergia de outros rulings fiscais celebrados por sociedades que se encontram em situações comparáveis à da FFT. Segundo a FFT, não existe qualquer dúvida de que uma sociedade comparável que se encontre numa situação similar à sua teria condições de solicitar um ruling fiscal e de determinar os seus lucros tributáveis com base no MMLO. Como a FFT e as sociedades comparáveis estão sujeitas ao mesmo regime fiscal, não faz sentido determinar se o método de fixação dos preços de transferência aplicado à FFT cumpria ou não os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência (que, de qualquer modo, cumpria). |
5.2.3. A situação factual da FFT é substancialmente diferente da observada nas decisões relativas aos centros de coordenação
(181) |
Segundo a FFT, a decisão de início do procedimento ilustra várias diferenças consideráveis relativamente a decisões anteriores nas quais a Comissão colocou em causa a aplicação de um método de fixação dos preços de transferência (nomeadamente, o método do custo majorado) como medida fiscal que deu origem à vantagem seletiva (71). Nessas decisões, o regime apenas estava disponível para os contribuintes que cumprissem determinados requisitos, ao passo que na decisão de início do procedimento a Comissão coloca unicamente em causa a aplicação do MMLO, isto é, a determinação específica dos lucros tributáveis, no contexto de um procedimento APP disponível para todos os contribuintes luxemburgueses que exerçam atividades de financiamento com partes associadas. |
(182) |
Além disso, no âmbito dessas decisões, a receita determinada através do método do custo majorado podia desviar-se substancialmente do lucro estatutário, o que não é o caso da FFT, cuja receita determinada pelo MMLO está em conformidade com o resultado contabilístico da própria sociedade. De igual modo, a aplicação do método de fixação dos preços de transferência nas decisões anteriores não era manifestamente consentâneo com os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência. No caso em apreço, não existe violação desses princípios. Contudo, ao contrário do que foi observado nas decisões relativas aos centros de coordenação, os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência também não contêm orientações claras em matéria de fixação dos preços de transferência para determinadas atividades exercidas pela FFT (tais como as atividades de financiamento e de tesouraria). |
(183) |
Por outro lado, a FFT sustenta que a Comissão também não teve em conta o facto de que o APP da FFT assentava num estudo económico consentâneo com os princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência, o que demonstra, no entanto, que a determinação do lucro não era arbitrária e que as autoridades fiscais luxemburguesas não tinham exercido qualquer poder discricionário. |
6. RESPOSTA DO LUXEMBURGO ÀS OBSERVAÇÕES DAS PARTES INTERESSADAS
(184) |
Por carta de 5 de janeiro de 2015, o Luxemburgo indicou que subscrevia totalmente as observações apresentadas pela Fiat. |
7. APRECIAÇÃO DA MEDIDA CONTROVERTIDA
7.1. Existência de auxílio
(185) |
Nos termos do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, são incompatíveis com o mercado interno, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados-Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções. |
(186) |
Segundo jurisprudência assente, a qualificação de auxílio estatal, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, exige que todos os requisitos a que se refere essa disposição estejam preenchidos (72). É assim estabelecido que, para que uma medida possa ser qualificada de auxílio estatal na aceção dessa disposição, em primeiro lugar, deve tratar-se de uma intervenção do Estado ou através de recursos do Estado, em segundo lugar, essa intervenção deve ser suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados-Membros, em terceiro lugar, deve conceder uma vantagem seletiva a uma empresa e, em quarto lugar, deve falsear ou ameaçar falsear a concorrência (73). |
(187) |
No que diz respeito ao primeiro requisito para a existência de um auxílio, o ruling controvertido foi emitido pela Administration des contributions directes, que pertence à administração fiscal do Grão-Ducado do Luxemburgo. Este ruling inclui a aceitação, por parte da administração fiscal luxemburguesa, de um método de imputação dos lucros à FFT no seio do grupo Fiat, proposto pelo consultor fiscal desta última, que vincula a administração fiscal luxemburguesa durante um período de cinco anos e com base no qual a FFT calcula todos os anos o montante do imposto sobre as sociedades que deve pagar ao Luxemburgo. O ruling controvertido é, portanto, imputável ao Luxemburgo. |
(188) |
No tocante ao financiamento da medida através de recursos do Estado, segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, uma medida através da qual as autoridades públicas concedam a certas empresas uma isenção fiscal que, embora não implique uma transferência positiva de recursos do Estado, coloca os seus beneficiários numa situação financeira mais favorável que os outros contribuintes constitui um auxílio estatal (74). Na secção 7.2, a Comissão demonstrará que o ruling controvertido implica uma redução do imposto devido pela FFT ao Luxemburgo, afastando-se do imposto que a FFT teria, caso contrário, de pagar em virtude do sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo. Consequentemente, importa considerar o ruling controvertido como dando origem a uma perda de recursos do Estado, dado que qualquer redução do imposto devido pela FFT implica uma perda de receitas fiscais de que o Luxemburgo poderia dispor na ausência dessa redução. |
(189) |
No que se refere ao segundo requisito para a existência de um auxílio, a FFT pertence ao grupo Fiat, que é uma entidade com presença à escala mundial e que exerce atividades em todos os Estados-Membros da União, de tal forma que qualquer auxílio a seu favor é suscetível de afetar as trocas no interior da União. Além disso, considera-se que uma medida concedida pelo Estado falseia ou ameaça falsear a concorrência quando é suscetível de melhorar a posição concorrencial do beneficiário em relação a outras empresas com as quais concorre (75). Na medida em que o ruling controvertido isenta a FFT de uma dívida fiscal que normalmente seria obrigada a pagar em virtude do sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo, este ruling falseia ou ameaça falsear a concorrência ao melhorar a posição financeira da FFT e do grupo Fiat, de tal modo que o quarto requisito para a existência de um auxílio estatal está também preenchido no caso vertente. |
(190) |
No que diz respeito ao terceiro requisito para a existência de um auxílio, a Comissão explicará, na secção 7.2, os motivos pelos quais considera que o ruling controvertido confere uma vantagem seletiva à FFT, na medida em que implica uma redução do imposto devido pela interessada ao Luxemburgo, afastando-se do imposto que a FFT deveria ter pagado em virtude do sistema comum do imposto sobre as sociedades, preenchendo, por isso, todos os requisitos para a existência de um auxílio na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
7.2. Existência de uma vantagem seletiva
(191) |
Segundo a jurisprudência constante, «o artigo 107.o, n.o 1, do Tratado impõe que se determine se, no quadro de um dado regime jurídico, uma medida nacional é suscetível de favorecer “certas empresas ou certas produções” relativamente a outras empresas que se encontrem, na perspetiva do objetivo prosseguido pelo referido regime, numa situação factual e jurídica comparável. Em caso afirmativo, a medida preenche a condição de seletividade.» (76). |
(192) |
Nos processos relativos ao domínio da fiscalidade, o Tribunal de Justiça criou uma análise em três etapas para determinar se uma determinada medida fiscal é seletiva (77). Numa primeira fase, convém determinar qual é o regime fiscal comum ou normal aplicável no Estado-Membro: o «sistema de referência». Numa segunda fase, é necessário determinar se a medida fiscal em questão constitui uma derrogação a esse sistema, na medida em que estabelece uma diferenciação entre operadores económicos que, à luz dos objetivos intrínsecos ao sistema, se encontram numa situação factual e jurídica comparável. Se a medida constituir uma derrogação ao sistema de referência, é conveniente, numa terceira fase, determinar se essa medida se justifica pela natureza ou pela economia geral do sistema de referência. Uma medida fiscal que constitua uma derrogação à aplicação do sistema de referência pode justificar-se se o Estado-Membro em causa conseguir demonstrar que a medida resulta diretamente dos princípios fundadores ou diretores do seu sistema fiscal (78). Se for esse o caso, a medida fiscal não é seletiva. O ónus da prova ao longo desta terceira fase compete ao Estado-Membro. |
7.2.1. Determinação do sistema de referência
7.2.1.1.
(193) |
Por norma, para efeitos da análise do caráter seletivo de uma medida de auxílio, um sistema de referência é composto por um conjunto coerente de regras que se aplicam, com base em critérios objetivos, a todas as empresas abrangidas pelo seu âmbito de aplicação, conforme definido pelo seu objetivo. |
(194) |
No caso vertente, a Comissão considera que o sistema de referência é o sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo, cujo objetivo é a tributação dos lucros de todas as sociedades sujeitas ao imposto no Luxemburgo (79). O sistema do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo aplica-se às sociedades nacionais e às sociedades estrangeiras residentes no Luxemburgo, incluindo as sucursais luxemburguesas das sociedades estrangeiras. No Luxemburgo, uma sociedade é considerada como residente se a sua sede social ou a sua administração central se encontrar no Luxemburgo. As sociedades nacionais e as sociedades estrangeiras residentes no Luxemburgo devem pagar o imposto sobre as sociedades relativamente aos lucros que realizem a nível mundial, salvo nos casos em que seja aplicável uma convenção contra a dupla tributação. As sociedades não residentes apenas estão sujeitas ao imposto sobre as sociedades em relação a determinados tipos específicos de receitas de fonte luxemburguesa (80). O imposto é devido sobre os lucros realizados, subtraídos das despesas e perdas fiscalmente dedutíveis, que podem ser transitar indefinidamente. |
(195) |
O imposto sobre as sociedades luxemburguesas é composto por um imposto sobre os lucros das sociedades («imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas» ou «IRC»), cuja taxa está fixada nos 21 %, e, para as sociedades estabelecidas na cidade do Luxemburgo, um imposto municipal sobre os lucros das sociedades comerciais («imposto comercial municipal»), cuja taxa está fixada nos 6,75 %. Além disso, é aplicada uma majoração de 5 % ao IRC de 21 %, a fim de alimentar um fundo para o emprego (81). Desde 1 de janeiro de 2011, a taxa de tributação total acumulada das receitas das sociedades no Luxemburgo é, portanto, de 28,80 % (82) (83). |
(196) |
O cálculo dos lucros tributáveis para efeitos do imposto luxemburguês sobre as sociedades tem por base, normalmente, a contabilidade comercial do contribuinte, sob reserva de ajustamentos impostos pela legislação fiscal luxemburguesa, os quais estão essencialmente associados à isenção dos dividendos/mais-valias, à reintegração de despesas não dedutíveis (84), às correções introduzidas ao resultado fiscal das transações que não são efetuadas em condições de plena concorrência, e à aplicação de regras de amortização diferentes a nível contabilístico e a nível fiscal. |
(197) |
Se o cálculo dos lucros tributáveis no caso das sociedades autónomas não integradas/nacionais que efetuem transações no mercado é relativamente simples, dado que assenta na diferença entre as receitas e os encargos num mercado onde exista concorrência, o dos cálculos tributáveis no caso das sociedades de grupo fiscalmente integradas, como a FFT, requer, em contrapartida, a utilização de dados indiretos. As sociedades autónomas não integradas podem usar os seus lucros contabilísticos como ponto de partida para determinar a matéria coletável do imposto sobre as sociedades, dado que estes lucros dependem dos preços ditados pelo mercado para os fatores de produção e os produtos e serviços vendidos pela sociedade. Em contrapartida, uma sociedade integrada que efetue transações com sociedades pertencentes ao mesmo grupo deverá realizar uma estimativa dos preços aplicados a essas transações intragrupo a fim de determinar os seus lucros tributáveis para efeitos fiscais, sendo esta estimativa efetuada pela mesma sociedade que controla o grupo, em vez de ser ditada pelo mercado. |
(198) |
Esta diferença em matéria de cálculo dos lucros tributáveis entre as sociedades não integradas, isto é, não pertencentes a um grupo e, portanto, qualificadas como «autónomas», e as sociedades integradas, ou seja, que pertencem a um grupo, não tem, contudo, qualquer impacto no objetivo do sistema do imposto sobre as sociedades residentes no Luxemburgo, independentemente de estarem ou não integradas. O IRC diz respeito às entidades presentes no Luxemburgo que estão sujeitas ao imposto sobre as sociedades e inclui «qualquer entidade económica que possa estar diretamente sujeita ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas». Nem a forma da empresa, nem a sua estrutura (grupo de empresas ou não) constituem um critério determinante no que diz respeito à cobrança do imposto sobre as sociedades no Luxemburgo. Além disso, mesmo que se possa considerar que as decisões de financiamento são aprovadas no superior interesse do grupo no seu todo, o imposto luxemburguês sobre as sociedades é cobrado a entidades individuais e não a grupos, e o ruling fiscal controvertido diz exclusivamente respeito aos lucros tributáveis da FFT, de tal modo que qualquer redução das receitas fiscais se baseia individualmente nos resultados dessa sociedade. Embora seja verdade que a legislação fiscal prevê disposições específicas aplicáveis ao grupo (por exemplo, o regime de integração fiscal (85)), as mesmas visam colocar em pé de igualdade as sociedades não integradas e as entidades económicas estruturadas na forma de grupos, e não a concessão de um tratamento mais favorável aos grupos (86). |
(199) |
Por conseguinte, o facto de que os lucros tributáveis sejam necessariamente calculados de forma diferente para as sociedades integradas e para as sociedades não integradas não tem qualquer relevância para a determinação do sistema de referência para efeitos da análise de seletividade no caso vertente. Uma vez que, por força do sistema do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo, os lucros de todas as sociedades residentes no Luxemburgo são tributados da mesma forma, sem qualquer tipo de distinção entre as sociedades integradas e as sociedades não integradas, é conveniente considerar os dois tipos de sociedades como encontrando-se numa situação factual e jurídica similar relativamente ao objetivo intrínseco deste sistema (87). Com efeito, sendo o objetivo do ruling fiscal controvertido o de determinar os lucros tributáveis da FFT para fins da cobrança do imposto sobre as sociedades a título do sistema geral de imposto sobre as sociedades do Luxemburgo, é este sistema que constitui o sistema de referência relativamente ao qual o ruling deve ser examinado para determinar se a FFT beneficiou de uma vantagem seletiva. |
(200) |
Por último, para responder aos diversos argumentos que a FFT apresenta quando defende que as sociedades do grupo e as sociedades autónomas não são abrangidas pelo mesmo sistema de referência, a Comissão salienta o que a seguir se expõe. |
(201) |
Segundo a FFT, o sistema de referência a considerar para apreciar a seletividade do ruling controvertido apenas deverá incluir empresas sujeitas às regras em matéria de preços de transferência, isto é, que lidem exclusivamente com empresas associadas (88), de tal modo que para demonstrar a seletividade desta medida, a Comissão deverá provar que a FFT obteve um ruling fiscal em condições diferentes das aplicadas a outras entidades do grupo que operam no Luxemburgo e exercem atividades de financiamento (89). A FFT considera que esta interpretação é confirmada pelas decisões da Comissão relativas ao regime Groepsrentebox e ao regime fiscal dos juros para os grupos na Hungria (90). |
(202) |
A título preliminar, a Comissão recorda que não está vinculada pela sua prática decisória. Cada medida de eventual auxílio deve ser apreciada individualmente em relação a critérios objetivos enunciados no artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, de forma a que, mesmo se for estabelecida a existência de uma prática decisória contrária, esta última não afetará a validade das conclusões da presente decisão (91). |
(203) |
Em qualquer caso, contrariamente ao que a FFT sustenta, nenhuma destas decisões confirma que quando uma medida fiscal beneficia uma sociedade integrada, o sistema de referência deve necessariamente restringir-se a este tipo de sociedade. Além disso, em ambos os casos, o objetivo da medida fiscal objeto da decisão da Comissão não é comparável ao da medida apreciada no caso vertente e as conclusões que é possível extrair dessas decisões não se aplicam, portanto, ao presente processo. |
(204) |
O regime Groepsrentebox foi criado pelas autoridades neerlandesas com o intuito de reduzir a diferença de tratamento fiscal entre o financiamento através de injeções de capitais e o financiamento através da contração de empréstimos no contexto de um grupo e, assim, reduzir a arbitragem entre estes dois modos de financiamento intragrupo (92). Na sua decisão final, a Comissão salientou que, tendo em conta objetivo da medida, que era o de reduzir a diferença de tratamento fiscal entre o financiamento através de tomadas de participações e o financiamento através da contração de empréstimos a nível do grupo e, assim, reduzir a arbitragem entre estes dois modos de financiamento intragrupo, «só nos grupos pode haver arbitragem entre o financiamento através de injeções de capitais e os empréstimos.[e não para as sociedades autónomas]» (93). É à luz desta observação, bem como do objetivo do regime, que visava «reduzir os incentivos para a arbitragem entre o financiamento através de uma injeção de capital e um empréstimo, e de garantir a neutralidade fiscal nesta matéria» (94), que a Comissão considerou que o sistema de referência neste processo não incluía as empresas sujeitas ao imposto sobre as sociedades envolvidas em relações intragrupos (95). |
(205) |
O objetivo do ruling fiscal controvertido, por sua vez, consiste em determinar a matéria coletável da FFT que serve para calcular o imposto devido por esta última a título do imposto sobre as sociedades luxemburguesas. Em primeiro lugar, uma vez que o objetivo que justifica a decisão Groepsrentebox apenas pode ser considerado válido no contexto de um grupo (pelo facto de as sociedades autónomas não estarem confrontadas com o problema da arbitragem entre as diferentes formas de financiamento), a determinação da matéria coletável para efeitos do cálculo do imposto devido todos os anos a título do imposto sobre as sociedades diz tanto respeito às entidades que pertencem a um grupo quanto às sociedades autónomas. |
(206) |
Em segundo lugar, a FFT exerce a função de sociedade de financiamento e presta os seus serviços unicamente a outras sociedades do grupo Fiat. As transações que efetua poderão, no entanto, ser igualmente efetuadas noutro contexto que não o de um grupo. A Circular compara este tipo de transações de financiamento intragrupo às transações efetuadas por instituições financeiras independentes (96) e exige que a remuneração desses serviços financeiros esteja relacionada com o montante do dinheiro emprestado, ou com o valor real dos ativos sob gestão, isto é, consoante a remuneração que seria exigida por uma instituição financeira independente. Por conseguinte, a Circular reconhece que as transações, ainda que efetuadas no contexto de um grupo, são diretamente comparáveis às transações normais efetuadas no mercado. |
(207) |
Estas características do presente processo vêm igualmente confirmar que a observação formulada pela Comissão na decisão Groepsrentebox — nomeadamente, que no que diz respeito às atividades de financiamento através de empréstimos, as sociedades associadas não se encontram numa situação jurídica e factual comparável à das sociedades não associadas — não pode ser generalizada a situações nas quais um ruling fiscal tem por objeto determinar a matéria coletável para efeitos da cobrança do imposto sobre as sociedades. A afirmação que consta da Circular sobre a comparabilidade das transações reflete os princípios nos quais assenta o princípio da plena concorrência e segundo os quais as relações comerciais e financeiras entre as empresas associadas não devem diferir das que seriam acordadas entre empresas independentes (97). As regras em matéria de preços de transferência têm precisamente por objetivo comparar as transações entre sociedades associadas/de um mesmo grupo com as transações entre sociedades independentes e fazer com que qualquer desvio seja corrigido. Atendendo a estes elementos, a FFT apoia-se erradamente na decisão Groepsrentebox para substanciar os seus argumentos. |
(208) |
A mesma conclusão é válida para a decisão relativa ao regime fiscal dos juros para os grupos na Hungria, na qual a FFT também se baseia. Esta decisão dizia respeito a um regime cujo objetivo era a redução da arbitragem (nas relações entre sociedades húngaras), aproximando a tributação dos juros intragrupo da tributação dos dividendos internos no grupo, reforçando, assim, a neutralidade do sistema fiscal do ponto de vista técnico (98). O objetivo de redução da arbitragem, que a Comissão, na altura, considerou como próprio das relações intragrupo, é diferente do objetivo da medida em questão, que consiste em determinar a matéria coletável da FFT à qual se aplica o imposto sobre as sociedades no Luxemburgo. Este último objetivo não diferencia a FFT enquanto entidade de um grupo de nenhuma outra entidade (autónoma) que se dirija às autoridades fiscais luxemburguesas para fins de determinação da sua matéria coletável. Evidentemente, no caso da FFT, a determinação da matéria coletável é mais complexa de efetuar, dado que pressupõe a aplicação das regras em matéria de preços de transferência e do princípio da plena concorrência, ao passo que no caso de uma sociedade autónoma, o rendimento tributável será, em princípio, equivalente ao rendimento contabilístico, sob reserva de eventuais ajustamentos previstos na legislação fiscal. No entanto, o objetivo da legislação relativa à tributação das sociedades, bem como dos rulings fiscais, é a de cobrar o imposto sobre todos os lucros das sociedades sujeitas a tributação no Luxemburgo, a qual se aplica independentemente de o contribuinte fazer ou não parte de um grupo. |
(209) |
A Comissão conclui que o sistema de referência em relação ao qual o ruling controvertido deve ser examinado é o sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo, constituído pelas regras relativas ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC) do Luxemburgo descritas nos considerandos 193 a 208. Concretamente, este sistema de referência é composto por um conjunto coerente de regras aplicáveis com base em critérios objetivos para a tributação dos lucros das sociedades autónomas, para as quais o lucro tributável coincide, normalmente, com o lucro contabilístico (sob reserva de certos ajustamentos previstos pela legislação fiscal), bem como das sociedades de grupo, as quais recorrem aos preços de transferência tendo em vista a distribuição dos lucros. Em relação ao objetivo intrínseco deste sistema, os dois tipos de sociedade — as sociedades não integradas e as sociedades integradas — devem ser considerados como encontrando-se numa situação factual e jurídica similar. |
7.2.1.2.
(210) |
O Luxemburgo considera que o sistema de referência deverá apenas incluir as sociedades de grupo abrangidas pelo artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R. (99), ao passo que a FFT parece ir mais longe ao considerar que o sistema de referência deverá ter por base a Circular e apenas incluir as sociedades de grupo que exerçam atividades de financiamento (100). De acordo com estes pontos de vista, para se poder concluir pela seletividade da medida seria necessário provar que a FFT beneficiou de um tratamento diferente do concedido a outras entidades de grupo que exercem atividades de financiamento, as quais se encontram numa situação factual e jurídica similar à da FFT em relação aos objetivos do artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R. e/ou à Circular. Por conseguinte, a Comissão devia ter comparado o ruling fiscal controvertido com os acordos prévios em matéria de preços dos outros 21 contribuintes que lhe foram comunicados (ver considerando 8) (101). Segundo o Luxemburgo e a FFT, dado que o tratamento concedido à FFT etstá conforme com o artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R., a Circular e a prática administrativa nesses casos, não é concedida qualquer vantagem seletiva através do ruling fiscal. |
(211) |
A Comissão rejeita esta fundamentação. |
(212) |
Como explicado no considerando 198, o sistema do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo visa tributar os lucros de todas as sociedades que se encontram sob a sua competência fiscal, quer se trate de sociedades integradas ou de sociedades não integradas. Conforme explicado no considerando 194, o imposto sobre as sociedades do Luxemburgo é cobrado sobre os lucros realizados a nível mundial pelas sociedades nacionais e as sociedades estrangeiras residentes no Luxemburgo (excetuando os casos em que se aplique uma convenção contra a dupla tributação), inclusive pelas sucursais luxemburguesas de sociedades estrangeiras, ao passo que às sociedades não residentes apenas são tributados determinados tipos de rendimentos específicos de fonte luxemburguesa. |
(213) |
O facto de considerar, como o fazem o Luxemburgo e a FFT, que o sistema de referência apenas inclui as sociedades do grupo, uma vez que apenas estas últimas devem chegar a uma tarifação conforme com o princípio da plena concorrência para determinar a respetiva matéria coletável, constitui uma distinção artificial entre as sociedades com base na sua estrutura para efeitos da determinação dos seus lucros tributáveis, distinção essa que o sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo não reconhece na tributação dos lucros das sociedades que se encontram sob a sua competência fiscal. |
(214) |
De igual modo, a distinção feita pela FFT entre os grupos e as sociedades autónomas com base nas atividades exercidas pela entidade do grupo considerada, afirmando que o sistema de referência apenas inclui as sociedades que aplicam a Circular, não é consentânea com o objetivo do sistema de imposto sobre as sociedades do Luxemburgo. Embora seja verdade que as atividades da FFT dizem quase exclusivamente respeito a transações intragrupo (102), as transações financeiras que efetua poderiam também muito bem ser efetuadas fora de um grupo, por instituições financeiras independentes, como indicado na Circular. Para efeitos da cobrança do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo, convém, pois, comparar a FFT com qualquer outro tipo de sociedade, integrada ou não integrada, que efetue atividades económicas, dado que, por força da legislação luxemburguesa relativa à tributação das sociedades, os lucros das instituições financeiras independentes estão sujeitos às mesmas regras de tributação das sociedades que os lucros gerados por transações intragrupo, calculados com base no princípio da plena concorrência. Por conseguinte, a Comissão rejeita o argumento da FFT segundo o qual o sistema de referência apenas deverá incluir as sociedades de grupo que efetuem transações de financiamento de grupo. |
(215) |
Consequentemente, a Comissão conclui que, no caso vertente, o sistema de referência relativamente ao qual o ruling fiscal controvertido deve ser examinado é o sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo descrito nos considerandos 193 a 208, independentemente do facto de o imposto sobre as sociedades ser cobrado sobre os lucros de sociedades de grupo ou de sociedades autónomas, e quaisquer que sejam as atividades que estas sociedades exerçam. |
7.2.2. Vantagem seletiva resultante de uma derrogação do sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo
(216) |
Sendo o sistema geral do imposto sobre as sociedades considerado como o sistema de referência em relação ao qual o ruling controvertido deve ser analisado, importa determinar se o referido ruling constitui uma derrogação desse sistema de referência que implica uma desigualdade de tratamento entre sociedades que se encontram numa situação factual e jurídica idêntica. |
(217) |
No que diz respeito a esta segunda etapa da apreciação de seletividade, a questão de saber se uma medida fiscal constitui uma derrogação do sistema de referência coincide geralmente com a constatação de uma vantagem conferida ao beneficiário por intermédio desta medida. Com efeito, quando uma medida fiscal implica uma redução injustificada do imposto devido pelo beneficiário que, na ausência dessa medida, deveria pagar um imposto mais elevado nos termos do sistema de referência, essa redução constitui, ao mesmo tempo, a vantagem conferida pela medida fiscal e a derrogação do sistema de referência. |
(218) |
Segundo o Tribunal de Justiça, no caso de uma medida de auxílio individual, por oposição a um regime, «a identificação da vantagem económica permite, em princípio, presumir a sua seletividade» (103). No presente caso, a medida de auxílio individual de que beneficia a FFT é o ruling fiscal controvertido, o qual aprova uma metodologia de cálculo dos lucros tributáveis da parte interessada no Luxemburgo para as funções que exerce no grupo Fiat, sendo então estes lucros tributados no âmbito do sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo. |
7.2.2.1.
(219) |
Em princípio, o objeto de um ruling fiscal é o de definir antecipadamente a aplicação do sistema fiscal geral a um caso particular, tendo em conta uma série de factos e circunstâncias específicos a esse caso, ao longo de um determinado período e desde que esses factos e circunstâncias não sofram qualquer alteração substancial durante o prazo de aplicação desse ruling. Considera-se que um ruling fiscal baseado num método de avaliação que se afasta sem justificação do resultado da aplicação normal do sistema fiscal geral confere uma vantagem seletiva ao seu beneficiário, uma vez que esse tratamento seletivo conduz a uma redução da dívida fiscal do referido beneficiário no Estado-Membro em causa, relativamente às sociedades que se encontram numa situação factual e jurídica idêntica. |
(220) |
Na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, uma vantagem é um benefício económico que uma empresa não teria obtido em condições normais de mercado, isto é, na ausência de intervenção do Estado (104). Assim, sempre que a situação financeira da empresa melhora em resultado de uma intervenção estatal, estamos perante uma vantagem (105). Essa melhoria é demonstrada comparando a situação financeira da empresa resultante da medida contestada e a situação financeira dessa mesma empresa na ausência da medida em causa (106). Uma vantagem pode consistir na concessão de vantagens económicas positivas, assim como na redução dos encargos que normalmente oneram o orçamento das empresas (107). |
(221) |
Como foi explicado nos considerandos 52 e seguintes, o Luxemburgo, ao adotar o ruling fiscal controvertido, aprovou um método de determinação do lucro tributável da FFT no Luxemburgo, tal como proposto pelo consultor fiscal desta última no seu relatório em matéria de preços de transferência, que permite à FFT calcular o imposto sobre as sociedades que deve pagar ao Luxemburgo numa base anual ao longo de todo o prazo de aplicação do ruling fiscal. Em particular, o relatório em matéria de preços de transferência aprovado pelo ruling fiscal controvertido determina, na ausência de transações ditadas pelo mercado como aconteceria no caso de uma sociedade independente não integrada, os lucros a distribuir a esta sociedade do grupo Fiat, que se traduzem na fixação dos preços das transações que esta realiza com as outras sociedades do grupo. |
(222) |
O Tribunal de Justiça já decidiu que uma redução da matéria coletável que resulte de uma medida fiscal que permita a um contribuinte utilizar preços de transferência, no quadro de transações intragrupo, que não são próximos dos preços que seriam praticados em condições de livre concorrência entre empresas independentes a negociar em condições comparáveis em conformidade com o princípio da plena concorrência, confere uma vantagem seletiva a esse contribuinte, na medida em que o imposto que deve pagar resultante da aplicação do sistema fiscal geral é menos elevado do que o que devem pagar as sociedades independentes que calculam a sua matéria coletável com base nos seus lucros contabilísticos (108). |
(223) |
No acórdão que proferiu relativamente ao regime fiscal aplicado pela Bélgica aos centros de coordenação (109), o Tribunal de Justiça apreciou um recurso de uma decisão da Comissão que concluiu que o modo de determinação do rendimento tributável previsto por este regime conferia uma vantagem seletiva a esses centros (110). Segundo o regime em causa, o lucro tributável era fixado num montante fixo, correspondente a uma percentagem do montante total das despesas e dos custos de funcionamento, de que se excluíam as despesas com pessoal e os encargos financeiros. Segundo o Tribunal de Justiça, «[p]ara examinar se a determinação dos lucros tributáveis, como prevista no regime dos centros de coordenação, confere uma vantagem a estes últimos, importa, como sugere a Comissão no n.o 95 da decisão impugnada, comparar o referido regime com o do direito comum baseado na diferença entre receitas e despesas de uma empresa que exerça as suas atividades em condições de livre concorrência». O Tribunal de Justiça indicou igualmente que «a exclusão destas despesas [com pessoal] e encargos [financeiros], que servem para a determinação dos rendimentos tributáveis dos referidos centros, não permite obter preços de transferência próximos dos que seriam praticados em condições de livre concorrência», o que, segundo o Tribunal, «[proporciona] uma vantagem económica aos referidos centros» (111). |
(224) |
Consequentemente, o Tribunal de Justiça admite que uma medida fiscal que leva uma sociedade pertencente a um grupo a faturar preços de transferência que não refletem os que seriam faturados em condições de livre concorrência, ou seja, preços negociados por empresas independentes em circunstâncias comparáveis em virtude do princípio da plena concorrência, confere uma vantagem a essa sociedade, na medida em que consegue uma redução da sua matéria coletável e, por conseguinte, do imposto exigível em resultado da aplicação do sistema geral do imposto sobre as sociedades. |
(225) |
O princípio segundo o qual as transações realizadas entre sociedades de um mesmo grupo deveriam ser remuneradas como se fossem acordadas por sociedades independentes a negociar em circunstâncias comparáveis e em condições de plena concorrência é geralmente denominado «princípio da plena concorrência». No seu acórdão relativo aos centros de coordenação belgas, o Tribunal de Justiça aprovou o princípio da plena concorrência como critério de referência para determinar se uma sociedade do grupo beneficia de uma vantagem na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE devido a uma medida fiscal que determina os seus preços de transferência e, por conseguinte, a sua matéria coletável. |
(226) |
O princípio da plena concorrência visa garantir que as transações realizadas entre sociedades de um mesmo grupo são tratadas para efeitos fiscais tendo em conta o montante do lucro que teria sido gerado se essas mesmas transações tivessem sido realizadas por sociedades independentes, sem o qual as sociedades do grupo beneficiariam de um tratamento favorável em relação ao sistema geral do imposto sobre as sociedades no que diz respeito ao cálculo dos seus lucros tributáveis, contrariamente às sociedades independentes, o que conduziria a uma desigualdade de tratamento entre as sociedades que se encontram numa situação factual e jurídica idêntica, tendo em consideração que o objetivo de um tal sistema é tributar os lucros do conjunto das sociedades sob a sua jurisdição fiscal. |
(227) |
Consequentemente, para apreciar se o Luxemburgo concedeu uma vantagem seletiva à FFT, a Comissão deve verificar se o método aprovado pela administração fiscal luxemburguesa através do ruling fiscal controvertido para efeitos da determinação dos lucros tributáveis da FFT no Luxemburgo se afasta de um método que resulta numa aproximação fiável de um resultado baseado no mercado e, por conseguinte, do princípio da plena concorrência. Na medida em que o método aprovado pelo Luxemburgo através do ruling fiscal controvertido conduz a uma redução da dívida fiscal da FFT em aplicação do sistema geral do imposto sobre as sociedade do Luxemburgo em relação à das sociedades não integradas cujos lucros tributáveis de acordo com esse sistema são determinados pelo mercado, considera-se que o ruling fiscal em causa confere uma vantagem seletiva à FFT na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
(228) |
O princípio da plena concorrência faz necessariamente parte da apreciação efetuada pela Comissão das medidas fiscais concedidas a empresas de um grupo, nos termos do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, independentemente da questão de saber se um Estado-Membro incorporou este princípio no seu sistema jurídico nacional. Este princípio é aplicado para determinar se os lucros tributáveis de uma sociedade pertencente a um grupo para efeitos do cálculo do imposto sobre as sociedades foram calculados aplicando um método que se aproxima das condições de mercado, por forma a que essa sociedade não beneficie de um tratamento mais favorável, em aplicação do sistema geral do imposto sobre as sociedade, do que aquele que está reservado às sociedade não integradas cujos lucros tributáveis são determinados pelo mercado. Assim, para evitar qualquer tipo de ambiguidade, o princípio da plena concorrência que a Comissão aplica no âmbito da sua apreciação dos auxílios estatais não é aquele que decorre do artigo 9.o do modelo de convenção fiscal da OCDE, que constitui um instrumento não vinculativo. Trata-se de um princípio geral de igualdade de tratamento em matéria de tributação que resulta da aplicação do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, que vincula os Estados-Membros e cujo campo de aplicação não exclui as normas fiscais nacionais (112). |
(229) |
Consequentemente, em resposta ao argumento do Luxemburgo segundo o qual a Comissão, ao efetuar uma tal apreciação, se substitui às autoridades fiscais nacionais no que toca à interpretação do direito luxemburguês (113), a Comissão relembra que o seu exame não passou por determinar se o ruling fiscal controvertido respeita o princípio da plena concorrência tal como se encontra definido no artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R. ou na Circular, mas por tentar determinar se a administração fiscal luxemburguesa conferiu uma vantagem seletiva à FFT na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, ao adotar um ruling fiscal que aprova uma repartição dos lucros que se afasta do montante dos lucros que seriam tributados aplicando o sistema geral do imposto sobre as sociedade do Luxemburgo se as mesmas transações tivessem sido efetuadas por sociedades independentes negociando em circunstâncias comparáveis e respeitando o princípio da plena concorrência. |
(230) |
Por fim, respondendo ao argumento do Luxemburgo e da FFT segundo o qual a apreciação da Comissão do acordo em matéria de preços de transferência aprovado pelo ruling fiscal controvertido deveria necessariamente estar limitada, não sendo a fixação dos preços de transferência uma ciência exata, a Comissão relembra que o elemento «aproximação» dos preços de transferência deve ser considerado à luz desse objetivo. Se é verdade que, no n.o 1.13 dos princípios da OCDE em matéria de preços de transferência, se reconhece que os preços de transferência não são uma ciência exata, também é verdade que nesse mesmo número se explica que, em primeiro lugar, «[é] importante não perder de vista o objetivo de chegar a uma aproximação razoável de um resultado de plena concorrência com base em informações fiáveis». Os princípios da OCDE em matéria de preços de transferência visam definir, em prol das administrações fiscais e das empresas multinacionais, os métodos mais adequados para estimar os preços de plena concorrência das transações transfronteiras realizadas por empresas associadas para efeitos fiscais. Este objetivo não poderia ser alcançado se o caráter de aproximação da fixação dos preços de transferência pudesse ser aproveitado para ignorar o consenso existente sobre os métodos adequados de definição dos preços de transferência que estes princípios representam. Como tal, o caráter de aproximação do princípio da plena concorrência não pode ser invocado para justificar uma análise dos preços de transferência que não seja coerente no plano metodológico ou que se apoie numa seleção desadequada de elementos comparáveis. |
(231) |
Em conclusão, se se puder demonstrar que o método aprovado pela administração fiscal luxemburguesa através do ruling fiscal controvertido para efeitos da determinação dos lucros tributáveis da FFT no Luxemburgo se afasta de um método que conduz a uma aproximação fiável de um resultado baseado no mercado e, por conseguinte, do princípio da plena concorrência, considera-se que esse ruling fiscal confere uma vantagem seletiva à FFT na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, na medida em que conduz a uma redução da dívida fiscal da FFT em aplicação do sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo em relação às sociedades não integradas cuja matéria coletável é determinada com base nos lucros que conseguem obter em condições de mercado. |
7.2.2.2.
(232) |
A primeira dúvida manifestada pela Comissão na decisão de início do procedimento dizia respeito ao facto de a matéria coletável da FFT, tal como aprovada pelo ruling fiscal controvertido, parecer constituir um intervalo fixo de valores. Além disso, os documentos fornecidos durante a investigação formal mostram que a matéria coletável da FFT já estava fixada em 2 milhões de EUR por ano antes de o ruling fiscal controvertido ter sido adotado. Embora a FFT tenha sido obrigada, em virtude da Circular, a renovar o seu pedido de ruling fiscal anterior com base num relatório em matéria de preços de transferência, o relatório em matéria de preços de transferência elaborado tendo em vista o ruling fiscal controvertido conduziu a um resultado, no que diz respeito à matéria coletável, praticamente idêntico ao montante fixo que tinha sido aprovado anteriormente. |
(233) |
Todavia, à luz dos esclarecimentos fornecidos durante o procedimento administrativo pelo Luxemburgo, que explicou que o ruling fiscal controvertido aprovava um método e não um intervalo fixo de valores (114), bem como dos dados que demonstram que, nos anos 2012 e 2013, a matéria coletável da FFT era inferior ao limite inferior do intervalo de valores alegadamente aprovado pelo ruling fiscal (115), a Comissão considera que as suas dúvidas foram devidamente esclarecidas. |
7.2.2.3.
(234) |
O ruling fiscal controvertido aprova um método de determinação de uma repartição de lucros em prol da FFT que assenta numa análise dos preços de transferência realizada pelo consultor fiscal desta última, que calculou uma remuneração para as funções de financiamento intragrupo e de tesouraria desempenhadas pela FFT e para o risco assumido por esta. |
(235) |
São várias as opções metodológicas subjacentes a esta análise dos preços de transferência: i) a decisão de aplicar o MMLO para estimar o lucro tributável da FFT no Luxemburgo; ii) a opção pelos capitais como indicador do lucro para efeitos do MMLO; iii) a opção pelo Quadro de Basileia II para efeitos do cálculo desses capitais; e iv) a decisão de aplicar o CAPM baseado nos preços das ações para determinar uma rendibilidade exigida para esses capitais próprios. |
(236) |
Tal como foi explicado nas secções seguintes, nos considerandos 241 e 301, a opção i) foi tomada de entre os cinco métodos descritos e analisados ao pormenor nos princípios da OCDE. Os princípios da OCDE abordam igualmente a opção ii) de um indicador de lucro para efeitos da aplicação do MMLO. Contudo, as opções metodológicas iii) e iv) seguintes não se encontram abrangidas por estes princípios. |
(237) |
O consultor fiscal da FFT procede então a uma seleção de vários parâmetros, ou seja, dados quantificados efetivos, que serão utilizados para estimar o montante dos capitais próprios que devem ser remunerados [para a opção iii)] e o nível de rendibilidade exigido relativamente a esses fundos próprios [para a opção iv)]. No que diz respeito ao montante dos capitais próprios a remunerar, o consultor fiscal seleciona parâmetros para a ponderação dos riscos e para os requisitos mínimos de fundos próprios, a fim de estimar os fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT. No que toca ao nível de rendibilidade exigido a aplicar a esses capitais próprios, o consultor fiscal seleciona parâmetros para uma taxa sem risco, um fator beta e um prémio de risco de mercado exigidos para efeitos da aplicação do CAPM (116). |
(238) |
Por último, o consultor fiscal opta por não ter em conta o nível total dos capitais próprios da FFT para efeitos do cálculo de uma remuneração de plena concorrência: para o efeito, deduz a esses capitais próprios o montante das participações que a FFT detém na FFNA e na FFC e calcula uma remuneração para as funções exercidas sobre o montante remanescente (117). Contudo, estas opções não parecem basear-se em parâmetros. Parecem servir, pelo contrário, para fazer ajustes à metodologia por forma a permitir determinar uma repartição dos lucros favorável à FFT, não correspondendo a nenhuma metodologia geralmente aplicada. |
(239) |
Em função destas opções metodológicas, das opções relativas aos parâmetros para efeitos da aplicação destes e dos ajustamentos […], o consultor fiscal obtém um nível de remuneração, para as atividades de financiamento intragrupo e de tesouraria da FFT, que é aprovado pelo ruling fiscal controvertido como estando em conformidade com a Circular e com o princípio da plena concorrência. |
(240) |
Nas próximas secções, do considerando 241 ao considerando 301, a Comissão irá explicar as razões pelas quais considera que várias destas opções metodológicas, opções relativas aos parâmetros e ajustamentos […] conduzem a uma redução do imposto devido pela FFT em aplicação do sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo em relação ao imposto que deveria ser suportado pelas sociedades não integradas cujos lucros tributáveis são determinados pelas transações que efetuam em condições de mercado e, consequentemente, por que razão o ruling fiscal controvertido, que aprova as referidas opções e ajustamentos, confere uma vantagem seletiva à FFT na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, afastando-se do princípio da plena concorrência. |
7.2.2.4.
(241) |
No que diz respeito à opção i), a remuneração aprovada pelo ruling fiscal controvertido para as funções desempenhadas e para o risco assumido pela FFT é estimada pelo consultor fiscal com recurso ao MMLO (118). Esta opção é tomada de entre os cinco métodos descritos e analisados ao pormenor nos princípios da OCDE em matéria de preços de transferência. Regra geral, estes princípios exigem que se encontre o método mais adequado para estimar um preço de plena concorrência no contexto dos preços de transferência (119). |
(242) |
A aplicação de um método exige, além disso, a utilização de um ou mais parâmetros para que esse método possa conduzir a um resultado efetivo. As opções relativamente ao método e aos parâmetros não podem ser tomadas de forma aleatória. O facto de se deixar estas opções totalmente ao critério do contribuinte favoreceria os grupos transfronteiras integrados em relação às sociedades que realizam transações no mercado: com efeito, os primeiros poderiam escolher eles próprios o método e os parâmetros de fixação dos preços das transações intragrupo para efeitos do cálculo da sua matéria coletável, enquanto os segundos realizam as transações em condições de mercado e não têm a possibilidade de ajustar as suas matérias coletáveis. Por conseguinte, estas opções devem ser orientadas pelo objetivo de um preço de plena concorrência para as transações intragrupo. |
(243) |
Todavia, quando se estima um preço de plena concorrência para efeitos de preços de transferência, a aplicação de um método que constitua uma segunda melhor opção não confere sistematicamente uma vantagem aos grupos transfronteiras integrados. Assim, se um tal método for escolhido, sendo aplicado conjuntamente com uma série de parâmetros exageradamente prudentes, a remuneração calculada pode ainda assim conduzir a um resultado que, neste caso preciso, seja igual a um resultado baseado no mercado ou possa resultar numa carga fiscal exagerada, caso em que um ruling fiscal que aprovasse este segundo método não conferiria qualquer vantagem na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
(244) |
Em contrapartida, mesmo que seja escolhido o método mais adequado, quando este é utilizado conjuntamente com parâmetros exageradamente favoráveis, a remuneração obtida graças a este método é suscetível de subestimar o imposto devido pelo contribuinte e, por conseguinte, conferir a este último uma vantagem na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
(245) |
Na decisão de início do procedimento, a Comissão manifestou as suas dúvidas quanto ao facto de o MMLO poder não constituir o método mais adequado para efeitos da determinação de uma remuneração de plena concorrência e, por conseguinte, do lucro tributável da FFT. Em relação aos quatro outros métodos descritos nos princípios da OCDE em matéria de preços de transferência, o método CUP é o mais direto e, caso fosse aplicado, forneceria uma aproximação mais fiável de um resultado baseado no mercado. |
(246) |
Todavia, à luz das informações comunicadas durante o procedimento formal de investigação, a Comissão aceita o argumento da FFT segundo o qual o método CUP poderia não ser o mais adequado no caso da FFT. Decorre dessas informações que a FFT realiza transações com diferentes contrapartes do grupo Fiat e que as taxas aplicáveis, a forma e os prazos de vencimento dos empréstimos concedidos e das obrigações emitidas pela FFT variam, mesmo se o tipo de instrumentos correspondentes não pareça diferir. Consequentemente, dado que, para aplicar o método CUP para efeitos dos preços de transferência, seria necessário encontrar transações comparáveis para cada empréstimo individual concedido pela FFT, a aplicação do MMLO por parte do consultor fiscal, tendo em vista a estimativa de uma remuneração de plena concorrência para as funções exercidas e o risco suportado pela FFT, parece adequada. |
(247) |
Além disso, a Comissão reconhece que a análise dos preços de transferência relativos à FFT se baseia numa rendibilidade dos capitais próprios que constitui um indicador de desempenho aceitável para o setor financeiro e que as funções desempenhadas pela FFT podem ser comparadas às das instituições financeiras. Com efeito, a complexidade da estrutura dos ativos e dos passivos da FFT confirma que esta assume uma função de transformação de prazos de vencimento, bem como uma função de intermediação financeira, tendo em conta que se dirige a investidores externos para satisfazer as necessidades de financiamento do grupo (120). Como tal, a Comissão considera que a aplicação do MMLO para efeitos dos preços de transferência no caso da FFT constitui uma escolha adequada. |
7.2.2.5.
(248) |
A Comissão, apesar de considerar adequada a utilização do MMLO por parte do consultor fiscal no caso da FFT, considera contudo que várias opções metodológicas, escolhas de parâmetros e ajustamentos […] efetuados pelo consultor fiscal aquando da aplicação do método, não são apropriadas para o cálculo da matéria coletável da FFT no Luxemburgo. |
7.2.2.6.
(249) |
A Comissão considera que os fundos próprios regulamentares escolhidos pelo consultor fiscal não constituem um indicador adequado do nível de lucros aquando da aplicação do MMLO para fazer uma estimativa da remuneração de plena concorrência para as funções exercidas pela FFT. A Comissão considera sobretudo que, tendo em conta que o consultor fiscal escolheu o MMLO, associado à rendibilidade dos capitais próprios estimada através do CAPM, seria conveniente utilizar os capitais próprios contabilísticos como indicador do nível de lucros ao qual é aplicada uma rendibilidade dos capitais próprios para calcular essa remuneração, isto se o resultado pretendido for uma aproximação fiável de um resultado baseado no mercado. |
(250) |
De forma mais específica, para assegurar que a matéria coletável da FFT reflete uma aproximação fiável de um resultado baseado no mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência, o método utilizado para chegar a uma remuneração de plena concorrência no caso das funções exercidas pela FFT deve apresentar uma coerência metodológica do ponto de vista contabilístico, o que não é o caso nas opções do consultor fiscal. |
(251) |
O relatório em matéria de preços de transferência afirma que a matéria coletável estimada da FFT é composta por dois elementos: uma «remuneração do risco» e uma «remuneração das funções» (121). O consultor fiscal determina o primeiro elemento, a remuneração do risco da FFT, multiplicando uma estimativa dos capitais próprios a remunerar, obtida através do cálculo dos fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT baseando-se por analogia no Quadro de Basileia II (122), por uma rendibilidade exigida para esses capitais próprios estimada com base no CAPM. |
(252) |
Todavia, a estimativa do CAPM incide sobre uma taxa teórica exigida de rendibilidade dos investimentos em capitais próprios e o fator beta utilizado para esse cálculo assenta numa variação da rendibilidade do preço das ações das sociedades (ou das rendibilidades dos capitais próprios) (123). Consequentemente, o cálculo do CAPM, por construção, resulta mais numa rendibilidade de capitais próprios do que numa rendibilidade de qualquer outro tipo de fundos próprios, como os fundos próprios regulamentares hipotéticos determinados aplicando por analogia o Quadro de Basileia II (124). |
(253) |
A rendibilidade dos capitais próprios é um rácio de rendibilidade. Os fundos próprios são remunerados em função dos lucros líquidos de uma sociedade, ou seja, os rendimentos deduzidos do total dos encargos que esta última suporta no exercício da sua atividade, mas também deduzidos de todos os encargos financeiros pagos aos credores. Assim, esse lucro líquido é o lucro que resta à sociedade para remunerar os acionistas: constitui a rendibilidade dos capitais próprios, quer seja para distribuição quer seja para aumento do valor da sociedade. Por uma questão de coerência, importa que a rendibilidade dos capitais próprios seja igual ao lucro líquido em termos contabilísticos deixado aos acionistas após o pagamento de todos os outros encargos, dividido pelo valor das ações em termos contabilísticos (ou seja, os fundos próprios) que o lucro remunera. |
(254) |
Inversamente, não é coerente ter em conta o lucro líquido contabilístico da sociedade para remunerar os fundos próprios regulamentares. Os fundos próprios regulamentares constituem uma estimativa feita por um regulador de um nível mínimo de capitalização que um banco ou uma outra instituição financeira deve manter; não constituem, enquanto tal, um direito nessa mesma proporção aos lucros da entidade regulamentada. Além disso, as instituições financeiras devem deter esse nível de fundos próprios em qualquer altura; o que quer dizer que, de facto, detêm geralmente mais do que o nível dos fundos próprios regulamentares exigidos, a fim de disporem de uma almofada que lhes permita não infringir os requisitos mínimos de fundos próprios em caso de perdas, o que reduz os fundos próprios disponíveis. Todos os capitais próprios que se juntam ao nível mínimo exigido devem ser remunerados de forma idêntica do ponto de vista dos investidores. |
(255) |
Consequentemente, para garantir uma metodologia coerente do ponto de vista contabilístico e, portanto, uma aproximação fiável de um resultado baseado no mercado, o consultor fiscal da FFT deveria ter aplicado aos capitais próprios contabilísticos da FFT a rendibilidade dos capitais próprios calculada através do CAPM. As setas horizontais do quadro apresentado abaixo indicam quais seriam as abordagens coerentes do ponto de vista metodológico; a seta diagonal, por seu turno, mostra a abordagem seguida pelo consultor fiscal da FFT:
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(256) |
Ao adotar uma metodologia incoerente, que consistiu em aplicar uma rendibilidade dos capitais próprios aos fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT, o consultor fiscal da FFT obteve um nível estimado de remuneração das funções exercidas e dos riscos incorridos pela FFT que não constitui uma aproximação fiável de um resultado baseado no mercado. Com efeito, esta falta de coerência tem um impacto considerável na remuneração tributável da FFT no Luxemburgo. Em 2011, os capitais próprios contabilísticos da FFT totalizaram 287,5 milhões de EUR, mas o consultor fiscal utiliza os fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT — 28,5 milhões de EUR — como indicador do nível de lucros aquando da aplicação do MMLO. Ao aplicar a rendibilidade estimada dos capitais próprios que o consultor fiscal obteve através do CAPM aos fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT e não aos capitais próprios contabilísticos, a remuneração tributável da FFT no Luxemburgo é dividida por dez (125). Dito de outra forma, as opções metodológicas tomadas pelo consultor fiscal acarretam uma diminuição da matéria coletável da FFT no Luxemburgo em relação às sociedades não integradas fiscalmente cujos lucros tributáveis são definidos pelas condições do mercado. |
(257) |
Tendo em conta que o nível dos capitais próprios da FFT é observável e que o CAPM fornece uma estimativa da rendibilidade dos capitais próprios, o consultor fiscal deveria ter utilizado os capitais próprios contabilísticos da FFT aquando da aplicação do MMLO, em vez de um nível hipotético de fundos próprios regulamentares para determinar a matéria coletável da FFT no Luxemburgo, em conformidade com o princípio da plena concorrência. |
(258) |
A Comissão refuta o argumento apresentado pela FFT sobre esta questão, segundo o qual não é necessário ter em conta o seu nível efetivo de capitais próprios para estabelecer os preços de transferência, uma vez que esse nível é fruto de decisões anteriores (126). Este argumento dá a entender que o nível de capitais próprios contabilísticos da FFT seria demasiado elevado por razões históricas e que, consequentemente, não deve ser remunerado. Todavia, este argumento não está em conformidade com as exigências do mercado, uma vez que um nível de capitais próprios insuficiente não é viável num mercado concorrencial. Com efeito, custa mais caro às sociedades remunerar os capitais próprios do que os créditos. Consequentemente, se uma sociedade que exercesse a sua atividade numa situação de livre concorrência estivesse sobrecapitalizada por razões históricas, como afirma a FFT, essa sociedade restituiria os capitais próprios excedentários aos seus acionistas (através do resgate ou da distribuição das ações, por exemplo), pelo facto de esses fundos poderem ser investidos de forma mais eficaz noutros projetos de investimento. Aquando do cálculo da matéria coletável das sociedades que exercem as suas atividades em situação de livre concorrência, essas sociedades são obrigadas a remunerar a totalidade dos capitais próprios disponibilizados pelos seus acionistas a um nível que pode ser considerado conforme às exigências do mercado. |
(259) |
Os princípios da OCDE em matéria de preços de transferência indicam, por seu turno, que a rendibilidade dos capitais pode ser um bom indicador do nível de lucros aquando da aplicação do MMLO em atividades financeiras com grande intensidade de capital (127). Esses mesmos princípios remetem igualmente para os «capitais investidos» enquanto possível indicador adequado do nível de lucros aquando da aplicação do MMLO (128). Apesar de a noção de «capitais investidos» não estar definida da maneira mais precisa nos princípios da OCDE, essa noção não parece corresponder à denominação de fundos próprios regulamentares utilizada nos Quadros de Basileia II ou de Basileia III, ou mesmo nas respetivas diretivas de transposição. |
(260) |
A Circular também não define quais os capitais que devem servir de indicador ao nível de lucros aquando da aplicação do MMLO (129). Distingue sim duas bases possíveis de remuneração das funções de financiamento e de tesouraria, ou seja: o valor dos créditos concedidos e o volume dos ativos sob gestão (130). Ao escolher o MMLO com os fundos próprios regulamentares hipotéticos como base, a FFT não opta porém por uma remuneração diretamente baseada no valor dos créditos concedidos, ao passo que os ativos sob gestão remetem para ativos detidos em nome de terceiros (dos gestores dos fundos, por exemplo), função que, em princípio, não é exercida pela FFT. |
(261) |
De qualquer modo, se os capitais próprios contabilísticos são habitualmente utilizados no setor financeiro como base de cálculo da rendibilidade de uma sociedade, a Comissão aceita que uma outra base de capital possa, em princípio, ser utilizada para aplicar o MMLO para efeitos dos preços de transferência, desde que a metodologia utilizada para chegar a uma remuneração das transações intragrupo seja coerente. Porém, no caso particular da FFT, a Comissão considera que a opção tomada nesta perspetiva pelo consultor fiscal, designadamente, escolher os fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT, é desadequada para obter uma aproximação fiável de um resultado baseado no mercado, pelas razões que passa a expor. |
(262) |
Em primeiro lugar, tendo em conta que a FFT não é uma entidade financeira regulamentada à qual se aplique o Quadro de Basileia II, dado que este é utilizado unicamente para efeitos fiscais, é difícil verificar a sua aplicação para estimar os fundos próprios regulamentares hipotéticos. Com efeito, o Quadro de Basileia II define os fundos próprios regulamentares exigidos como uma percentagem dos ativos detidos pela instituição, ponderada pelo risco subjacente de cada um desses ativos. Concretamente, a ponderação dos riscos que recaem sobre cada ativo atribuída para estes fins regulamentares depende, nomeadamente, da notação de crédito da contraparte, mas também de outros critérios avaliados ativo a ativo. A tarefa que incumbe à administração de verificar a ponderação dos riscos que recaem sobre cada ativo não se insere no seu âmbito de supervisão prudencial quando esta ponderação serve para calcular a matéria coletável para determinar os preços de transferência e não os requisitos mínimos dos fundos próprios regulamentares. Assim, é pouco provável que os resultados obtidos no final deste exercício possam ser facilmente verificados pela administração fiscal e considerados como uma aproximação fiável de um resultado baseado no mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência. |
(263) |
Em segundo lugar, tendo em conta que a rendibilidade dos fundos próprios regulamentares mínimos não é um indicador de desempenho habitualmente utilizado no setor financeiro, as médias dessas rendibilidades não são geralmente analisadas nem estão disponíveis (131). Consequentemente, qualquer resultado obtido graças a esta base de capital dará certamente uma aproximação menos fiável de um resultado baseado no mercado do que o recurso aos capitais próprios contabilísticos enquanto indicador do nível de lucros ao qual é aplicado uma rendibilidade dos capitais próprios em conformidade com as normas do setor. |
(264) |
Em terceiro lugar, as 66 sociedades comparáveis selecionadas pelo consultor fiscal para estimar a rendibilidade dos capitais próprios através do CAPM são claramente desadequadas para estimar os fundos próprios regulamentares médios do setor ou a rendibilidade exigida desses fundos próprios. Com efeito, várias dessas sociedades não são entidades regulamentadas abrangidas pelos quadros de Basileia (como as bolsas). Consequentemente, essas sociedades não poderiam calcular uma estimativa dos seus requisitos de fundos próprios regulamentares e seria impossível estimar as existências regulamentares mínimas de cada instituição não regulamentada unicamente com base nas informações tornadas públicas. |
(265) |
Além disso, no presente caso, se os capitais próprios contabilísticos tivessem sido utilizados como indicador do nível de lucros, não teria sido necessário ao consultor fiscal calcular uma «remuneração das funções» distinta, o segundo elemento da matéria coletável estimada da FFT no Luxemburgo, que em si mesmo não parece assentar em qualquer tipo de método sólido, tal como explicado no considerando 80 da decisão de início do procedimento. Com efeito, aquilo que o consultor fiscal da FFT intitula, no relatório em matéria de preços de transferência, de «fundos próprios utilizados para exercer as funções» não parece corresponder a nenhuma das componentes habituais dos fundos próprios utilizadas no cálculo dos requisitos de rendibilidade no quadro de uma avaliação de mercado. Esta noção não é definida no relatório em matéria de preços de transferência e não há nada que indique que um tal risco baseado na denominação utilizada pelo consultor fiscal não estivesse coberto numa ou noutra categoria de fundos próprios regulamentares, por exemplo os fundos próprios detidos para cobrir o risco operacional e, nomeadamente, o risco associado ao processo, se os fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT tivessem sido corretamente avaliados pelo consultor fiscal, o que não foi o caso. Existem outras preocupações ligadas à repartição dos fundos próprios em componentes distintas às quais se aplicam diferentes níveis de rendibilidade, que vão até zero, e que serão apresentadas em pormenor mais adiante, nos considerandos 277 a 289. |
(266) |
Por conseguinte, a Comissão conclui que o ruling fiscal controvertido se afasta de um resultado baseado no mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência pelo facto de aceitar a opção do consultor fiscal, designadamente a de escolher os fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT como indicador do nível de lucros aquando da aplicação do MMLO, ao aplicar-lhes uma rendibilidade dos fundos próprios estimada com base no CAPM, para obter uma componente dos lucros tributáveis da FFT no Luxemburgo. Tendo em conta que esta opção metodológica implica uma diminuição do imposto exigível à FFT no que diz respeito ao sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo em relação às sociedades não integradas fiscalmente que realizam transações em condições de mercado (132), importa considerar que o ruling fiscal controvertido confere uma vantagem seletiva à FFT na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
7.2.2.7.
(267) |
Além disso, e sem prejuízo das objeções da Comissão relativamente à utilização dos fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT aquando da aplicação do MMLO, a Comissão considera também que a maneira incoerente como o consultor fiscal da FFT aplicou o Quadro de Basileia II por analogia para chegar àquele nível hipotético de fundos próprios regulamentares confere uma vantagem seletiva à FFT para efeitos do artigo 107.o, n.o 7, do TFUE, uma vez que daí resulta uma diminuição do imposto exigível à FFT no que diz respeito ao sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo em relação às sociedades não integradas fiscalmente que realizam transações em condições de mercado. |
(268) |
Uma aplicação correta do Quadro de Basileia II requer, antes de mais, uma estimativa dos APR da FFT e depois a aplicação de um rácio adequado de fundos próprios regulamentares a essa estimativa. O consultor fiscal da FFT subestima estes dois elementos no relatório em matéria de preços de transferência. |
(269) |
Em primeiro lugar, os APR hipotéticos da FFT não foram corretamente calculados, dado que o consultor fiscal atribui aos ativos intragrupo uma ponderação de riscos nula (133). Como mostra claramente o considerando 123, os empréstimos intragrupo, que representam a maior parte dos ativos da FFT, não são desprovidos de risco, contrariamente ao que afirmam o Luxemburgo e a FFT, e nada indica que esses empréstimos apresentem um risco menor do que os empréstimos concedidos pelos bancos. De qualquer modo, tendo em conta o facto de o documento interno da Fiat sobre a política de preços de transferência classificar os riscos de crédito e de incumprimento pela contraparte da FFT como «limitados» e não como inexistentes, uma ponderação de riscos igual a zero é claramente desadequada. Além disso, os APR hipotéticos da FFT não foram corretamente calculados, uma vez que a ponderação de 20 % dos ativos terceiros nunca foi fundamentada, nem pelo Luxemburgo nem pela FFT. |
(270) |
Se a ponderação europeia média dos riscos dos ativos dos bancos de 36 % em vigor em 2010 tivesse sido aplicada enquanto comparador pertinente (134) (que estava disponível quando o ruling controvertido foi emitido) ao total dos ativos da FFT de 14 827 674 000 EUR, para mostrar o que poderia ter sido o nível correto dos APR hipotéticos da FFT, esses APR hipotéticos seriam aproximadamente de 5 338 000 000 EUR. Se o rácio dos requisitos de fundos próprios de 8 % previsto pelo Quadro de Basileia tivesse sido escolhido enquanto nível de capitalização mínimo, a FFT deveria dispor de um nível mínimo hipotético de fundos próprios regulamentares de acordo com o Basileia II de cerca de 427 milhões de EUR e não do nível mínimo de 28,5 milhões de EUR estimado pelo consultor fiscal da FFT no relatório em matéria de preços de transferência. |
(271) |
Em segundo lugar, o cálculo dos riscos de crédito e de incumprimento pela contraparte suportados pela FFT que o consultor fiscal efetua por analogia com o Quadro de Basileia II (135), com base no qual os bancos são obrigados a deter fundos próprios na proporção dos seus APR, está em contradição com esse quadro. Para determinar os fundos próprios da FFT expostos ao risco na análise dos preços de transferência, o consultor fiscal da FFT utiliza um requisito de rácio de fundos próprios de 6 % para calcular os riscos, ao passo que o rácio correto previsto no quadro é de 8 %. |
(272) |
Em resposta aos receios expressos pela Comissão sobre esta questão na decisão de início do procedimento (136), a FFT justificou o rácio de 6 % invocando a transposição, em Itália, do requisito para as instituições financeiras não bancárias (137). Todavia, a FFT não forneceu qualquer outra referência a essa transposição, nem tão-pouco explicou por que razão uma transposição por parte do legislador italiano seria aplicável no Luxemburgo ou utilizada como referência. |
(273) |
Além disso, ainda que, no âmbito do Quadro de Basileia II, metade do requisito de 8 % pudesse ser composta por fundos próprios da categoria 2, a FFT não parece possuir este tipo de fundos próprios que poderiam ser utilizados para efeitos regulamentares, se o requisito tivesse sido aplicado. Na ausência de outras formas elegíveis de capitais disponíveis, os 8 % deveriam ter sido cobertos pelos capitais próprios. |
(274) |
Por conseguinte, a Comissão mantém o seu parecer segundo o qual o rácio de requisitos de fundos próprios ao abrigo do Quadro de Basileia II é de 8 % e que a utilização por parte do consultor fiscal do rácio de 6 % e a sua aceitação pela administração fiscal do Luxemburgo põem em causa a conclusão formulada no ruling controvertido, designadamente que a afetação dos lucros à FFT daí decorrente reflete uma aproximação fiável de um resultado baseado no mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência. |
(275) |
Por último, no que diz respeito ao cálculo do risco operacional efetuado pelo consultor fiscal, se a Comissão aceita a utilização da percentagem de 15 % com base nas explicações fornecidas pela FFT (138) e pelo Luxemburgo (139), a base à qual será aplicada esta margem de 15 % não parece corresponder a uma estimativa correta dos rendimentos anuais brutos da FFT. O consultor fiscal da FFT aplica unicamente esta percentagem ao rendimento líquido proveniente dos depósitos bancários e dos empréstimos (140), o que não está em conformidade com a metodologia avançada pelo Luxemburgo (141), ao passo que toda a atividade intragrupo é ignorada no cálculo do rendimento anual bruto. Os empréstimos e os depósitos junto dos bancos representam apenas uma pequena parte dos ativos e dos passivos da FFT. |
(276) |
Em suma, a Comissão conclui que, mesmo que os fundos próprios regulamentares mínimos hipotéticos da FFT pudessem ter sido aceites enquanto indicador de nível dos lucros aquando da aplicação do MMLO, o consultor fiscal subestimou esses fundos próprios ao aplicar aos ativos um fator de ponderação dos riscos arbitrário e fraco (excluindo a maior parte dos ativos da ponderação dos riscos), ao aplicar um rácio inferior ao mínimo previsto pelo Quadro de Basileia II e ao não incluir o rendimento gerado pelos ativos e passivos do grupo no rendimento anual bruto da FFT. Consequentemente, a Comissão conclui que o ruling fiscal controvertido, ao aceitar estas opções, se afasta de um resultado baseado no mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência. Tendo em conta que estas opções implicam uma redução do imposto exigível à FFT no que diz respeito ao sistema geral do imposto sobre as sociedades no Luxemburgo em relação às sociedades não integradas fiscalmente que realizam transações em condições de mercado, importa considerar que o ruling fiscal controvertido confere uma vantagem seletiva à FFT na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
7.2.2.8.
(277) |
O consultor fiscal, para além de subestimar os fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT, efetua várias deduções aplicáveis aos capitais próprios remanescentes da FFT, que se afastam de um resultado baseado no mercado. Como decorre do Q 2, para chegar a um montante que o consultor fiscal intitula de «fundos próprios que cobrem as funções exercidas», os capitais próprios remanescentes da FFT, menos os seus fundos próprios regulamentares hipotéticos subestimados, são subtraídos àquilo que o consultor fiscal intitula de «fundos próprios que cobrem os investimentos financeiros na FFNA e na FFC». Todavia, se os fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT tivessem sido corretamente estimados, é provável que os capitais próprios não fossem superiores aos fundos próprios regulamentares (142). Consequentemente, nenhuma das duas componentes dos fundos próprios estimadas poderia ser aplicada. |
(278) |
Não obstante esta observação, a Comissão considera igualmente que a decisão do consultor fiscal de isolar a componente dos fundos próprios denominada «fundos próprios que cobrem os investimentos financeiros na FFNA e na FFC» e de lhe atribuir uma remuneração nula a fim de estimar a matéria coletável da FFT é desadequada (143), uma vez que conduz a uma redução do imposto exigível à FFT relativamente ao sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo em relação às sociedades não integradas fiscalmente que realizam as suas transações em condições de mercado. |
(279) |
A título preliminar, não é totalmente claro se a opção do consultor fiscal de separar as duas componentes dos capitais próprios é uma suposta aplicação do Quadro de Basileia II ou se a dedução por parte do consultor fiscal das participações na FFNA e na FFC era um ajuste ad hoc. Também teria deduzido essas participações que aos capitais próprios da FFT a fim de calcular a matéria coletável da FFT se tivesse optado corretamente pelos capitais próprios contabilísticos da FFT como indicador do nível de lucros aquando da aplicação do MMLO. Como foi explicado no considerando 238, a razão para tal é que o consultor fiscal, ao dividir os capitais próprios da FFT em três componentes, parece não se ter baseado em qualquer metodologia geralmente utilizada (144). |
(280) |
De qualquer modo, pelas razões apresentadas nos considerandos 281 e 290, a opção do consultor fiscal de atribuir uma remuneração nula a esta componente dos capitais próprios da FFT intitulada «fundos próprios que cobrem os investimentos financeiros na FFNA e na FFC» é desadequada. Dado que esta opção conduz efetivamente a uma redução injustificada dos capitais próprios a remunerar e, assim, da matéria coletável da FFT para efeitos fiscais, qualquer metodologia em matéria de preços de transferência baseada nesta opção não pode ser considerada como uma opção que resulte numa aproximação fiável de um resultado baseado no mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência. |
(281) |
Em primeiro lugar, os argumentos do Luxemburgo relativos à dedutibilidade das participações noutras instituições de crédito ao abrigo do Quadro de Basileia II não são aplicáveis no caso da FFT (145). A razão não se prende exclusivamente, como indicado no considerando 262, com o facto de a FFT não ser uma instituição regulamentada, mas prende-se também com o facto de os números desse Quadro, aos quais o Luxemburgo e a FFT fazem referência, serem aplicáveis a entidades não consolidadas quando, neste caso, a FFNA e a FFC são entidades consolidadas. Com efeito, como foi explicado no considerando 112, a FFT apresenta contas consolidadas no Luxemburgo. Em princípio, os fundos próprios consolidados seriam superiores aos fundos próprios apresentados nas contas não consolidadas da FFT antes de qualquer dedução por participações. Consequentemente, se o Luxemburgo e a Fiat tivessem aplicado de forma correta e sistemática as deduções regulamentares, a estimativa dos capitais próprios à qual a rendibilidade dos capitais próprios seria aplicada teria sido superior e, por conseguinte, a matéria fiscal da FFT daí resultante no Luxemburgo também teria sido superior. |
(282) |
Em segundo lugar, e de maneira mais geral no que diz respeito às deduções aplicáveis aos capitais próprios no âmbito do Quadro de Basileia II e no âmbito da apreciação dos capitais próprios contabilísticos da FFT, o argumento do Luxemburgo segundo o qual a aquisição das participações por parte da FFT era financiada na íntegra com capitais próprios (146), ou seja, através de um modo de financiamento que significaria automaticamente que esses fundos deixariam de estar disponíveis para cobrir outros riscos assumidos pela FFT, não é admissível para a Comissão. As fontes de financiamento, quer se tratem de capitais próprios ou de dívidas que constem do passivo do balanço, não são atribuídas a um ativo identificável, a menos que disposições jurídicas específicas associem o passivo a um ativo ou a um conjunto de ativos específico (como acontece nas obrigações hipotecárias). Se nenhum crédito específico está associado aos passivos da sociedade, os capitais próprios e os passivos contribuem conjuntamente para o financiamento dos ativos de uma sociedade. Em caso de insolvência, estes fundos estariam disponíveis para absorver as perdas decorrentes dos ativos da FFT, contrariamente ao argumento acima exposto pelo Luxemburgo. O facto de os montantes deduzidos aos capitais próprios da FFT mencionados no relatório em matéria de preços de transferência corresponderem aos preços de compra da FFNA e da FFC (147) não tem qualquer implicação no facto de as fontes de financiamento não poderem, em princípio, ser afetadas a ativos específicos, o que é válido para qualquer montante de participação. Os capitais próprios da FFT estão inteiramente disponíveis para sustentar a solvabilidade da FFT e deveriam ser remunerados na sua totalidade de acordo com os riscos dos ativos da FFT. |
(283) |
De qualquer modo, os relatórios anuais da FFT não parecem confirmar a alegação do Luxemburgo segundo a qual estas aquisições foram financiadas com capitais próprios, caso esta afirmação signifique que o grupo forneceu capitais próprios suplementares à FFT com vista à aquisição da FFNA e da FFC. Com efeito, o nível dos fundos próprios da FFT (isto é, capital social e reservas) era em 2010, ou seja, antes da aquisição, de 286 000 000 EUR e manteve-se em 287 000 000 EUR em 2011, ou seja, após a referida aquisição. |
(284) |
O Luxemburgo alega igualmente que os encargos decorrentes das participações não são fiscalmente dedutíveis no Luxemburgo e que os dividendos não são tributáveis (148). Tendo em conta que as participações na FFNA e na FFC são remuneradas através de dividendos, essas participações não deveriam ser tributadas nem consideradas na apreciação das funções exercidas e dos riscos assumidos (149). Este argumento também deve ser rejeitado, tal como o argumento idêntico da FFT (150). Neste contexto, a Comissão constata que a FFNA e a FFC não pagaram qualquer dividendo ao longo do período de aplicação do ruling fiscal controvertido. Todavia, se uma delas o tivesse feito, tal não alteraria em nada o cálculo da remuneração tributável da FFT, dado que a referida remuneração foi definida pelo consultor fiscal através do MMLO aplicado aos capitais próprios. O MMLO é um método baseado nos lucros das operações e é aplicado aos capitais próprios para as funções de tesouraria exercidas pela FFT. Se o consultor fiscal da FFT tivesse utilizado o método CUP para determinar os preços de transferência, as transações individuais ou os fluxos de remuneração, como os empréstimos individuais ou, no caso da FFT, os pagamentos de dividendos, teriam sido pertinentes para calcular a remuneração tributável da FFT. Com efeito, o método CUP consiste em determinar o preço das transações individuais, enquanto o MMLO visa estimar a rendibilidade de uma função. Todavia, pelas razões indicadas no considerando 161, o consultor fiscal da FFT considerou que o MMLO era o método mais adequado no caso da FFT. Assim, ao salientarem a pertinência de determinados tipos de remunerações pagas por determinados ativos da FFT (dividendos), o Luxemburgo e a FFT tentam combinar o método CUP com o método MMLO para calcular a remuneração tributável da FFT, sem darem qualquer justificação para este método híbrido no relatório em matéria de preços de transferência. Tendo em conta o facto de o consultor fiscal ter justificado a utilização do MMLO no referido relatório, a utilização desta combinação sem outra justificação não resultaria numa aproximação fiável de um resultado baseado no mercado. |
(285) |
Em terceiro lugar, aquando da aplicação do MMLO baseado nos capitais próprios, qualquer estimativa destes capitais próprios deveria assegurar que a FFT estivesse corretamente capitalizada em conformidade com as normas do setor. Tal decorre igualmente da abordagem preconizada na Circular, que considera que as funções exercidas pelas sociedades de financiamento intragrupo são, no essencial, comparáveis às exercidas pelas instituições financeiras independentes. |
(286) |
Em finais de 2011, ou seja, a data de referência indicada no relatório em matéria de preços de transferência, o rácio de alavancagem médio, definido como a relação entre os fundos próprios da categoria 1 e a exposição total do balanço (151), era, segundo a autoridade bancária europeia, de 2,9 % para os bancos do grupo 1 controlado (bancos europeus de grandes dimensões) e de 3,3 % para os bancos do grupo 2 controlado (bancos europeus de pequenas dimensões). A aplicação de um rácio de alavancagem (fundos próprios/ativos totais) em conformidade com as normas do setor (e do novo Quadro de Basileia III) mostra que os capitais próprios IFRS da FFT não eram superiores ao mercado. Com efeito, com base nesse cálculo, o rácio de alavancagem da FFT totalizava [2-3 %] (152), […]. Dito de outra forma, o […] nível de capitais próprios da FFT não permite qualquer dedução, seja dos fundos próprios excedentários estimados ou de qualquer outra participação, dado que essas deduções fariam com que o nível dos capitais próprios da FFT passasse […]. |
(287) |
Consequentemente, o nível de capitalização da FFT não permitiria qualquer redução dos capitais próprios ou dos fundos próprios regulamentares hipotéticos para efeitos fiscais (153), […]. Perante esta conclusão, os receios expressos no considerando 80 da decisão de início do procedimento relativamente ao nível da reduzida taxa de remuneração dos fundos próprios excedentários são infundados, dado que não há lugar a uma remuneração diferenciada. |
(288) |
Em quarto lugar, o facto de deduzir dos capitais próprios da FFT as suas participações na FFNA e na FFC para calcular uma estimativa dos capitais a remunerar no âmbito da análise dos preços de transferência revela toda a sua incoerência quando a mesma metodologia é aplicada às contas da FF. Segundo o documento interno da Fiat sobre a política de preços de transferência (154), a remuneração da FFT e da FF para a fixação do preço dos empréstimos segue o mesmo método, mas este documento descreve unicamente a aplicação deste método para estimar pormenorizadamente a matéria coletável da FFT. Todavia, se os capitais próprios da FF a remunerar fossem estimados de acordo com o mesmo método que foi aplicado à FFT no relatório em matéria de preços de transferência, em 2010, quando a FF detinha as participações na FFNA e na FFC, esta estimativa teria indicado que os capitais próprios estimados da FF eram negativos (155). Com efeito, em finais de 2010, os capitais próprios da FF totalizavam 271 milhões de EUR, ao passo que o valor total das participações que deveriam ter sido deduzidas destes capitais próprios se tivesse sido aplicado o mesmo método que foi aprovado no ruling fiscal controvertido seria de 358 milhões de EUR. Por conseguinte, os capitais próprios da FF a remunerar teriam sido negativos em 87 milhões de EUR. Como o valor das participações era mais elevado do que o montante total dos capitais próprios da FF, a estimativa dos capitais a remunerar através do mesmo método que foi aplicado no relatório em matéria de preços de transferência para determinar a matéria coletável da FFT no Luxemburgo teria como resultado capitais próprios negativos, como acontece com as sociedades insolventes. Todavia, como a FF não estava insolvente nessa altura, tal seria suficiente para demonstrar que deduzir participações dos capitais próprios da FFT não parecia ser um bom método para calcular uma estimativa dos capitais a remunerar com vista a determinar a matéria coletável da FFT no Luxemburgo. |
(289) |
Além disso, este resultado incoerente ocorreria igualmente caso a FFT adquirisse novas participações enquanto estivesse em vigor o ruling fiscal controvertido. Ao validar uma dedução de participações metodologicamente enviesada, o ruling fiscal controvertido poderia efetivamente ter como resultado uma tributação nula da FFT no Luxemburgo, desde que o valor das participações adquiridas ulteriormente reduzisse a zero, ou mesmo a valores negativos, os capitais a remunerar da FFT. Nesse caso, as funções de financiamento intragrupo exercidas pela FFT poderiam permanecer idênticas, mas a tributação seria claramente menos elevada, ou mesmo nula, se o método validado no ruling fiscal controvertido fosse aplicado. |
(290) |
Se o consultor fiscal da FFT tivesse aplicado corretamente o Quadro de Basileia II a fim de determinar os preços de transferência, estas deduções não teriam sido possíveis, tendo em conta o nível atual de capitalização da FFT. Contudo, tendo em conta que a FFT não é uma entidade regulamentada, não se encontra disponível qualquer informação sobre o nível dos APR considerado aceitável por uma autoridade de regulação das instituições financeiras. Esse nível hipotético de fundos próprios regulamentares também não permitiria à FFT deter participações se o valor destas devesse ser deduzido desses fundos próprios (156). |
(291) |
À luz destas observações, a Comissão conclui que o ruling fiscal controvertido, ao aceitar a proposta do consultor fiscal de aplicar uma rendibilidade estimada através do CAPM aos fundos próprios regulamentares hipotéticos — sendo que estes fundos próprios regulamentares hipotéticos estão subestimados em resultado de uma má aplicação do Quadro de Basileia II e de deduções inadequadas — se afasta do princípio da plena concorrência. Tendo em conta que este afastamento implica uma diminuição da matéria coletável da FFT relativamente ao sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo em relação às sociedades não integradas fiscalmente que realizam transações em condições de mercado, importa considerar que o ruling fiscal controvertido confere uma vantagem seletiva à FFT na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
7.2.2.9.
(292) |
Para além da sua conclusão sobre a maneira incoerente como o consultor fiscal da FFT chega ao montante estimado de capitais a remunerar aquando da aplicação do MMLO, a Comissão considera que a maneira como o consultor fiscal da FFT obtém o nível estimado de rendibilidade exigida aplicável a esta base de capitais não se traduz numa aproximação fiável de um resultado baseado no mercado e que, como tal, não está em conformidade com o princípio da plena concorrência pelas razões apresentadas a seguir, nos considerandos 293 a 300. |
(293) |
Em primeiro lugar, o fator beta de 0,29 escolhido pelo consultor fiscal para ser utilizado no CAPM não se coaduna verosimilmente com o fator beta das sociedades do setor financeiro consideradas como validamente comparáveis na análise dos preços de transferência e que deveriam ter sido escolhidas como parâmetro de referência para o nível estimado da rendibilidade exigida. O nível do fator beta destas sociedades é tendencialmente muito elevado (ver quadro 3), sendo muito vezes superior ao fator beta médio do mercado, que é equivalente a 1. A Comissão remete, por exemplo, para o fator beta do subíndice Stoxx 50 Bank, que chegou a 1,36 no período compreendido entre 31 de dezembro de 2009 e 31 de dezembro de 2011 (157), e para o facto de quase todos os bancos que participam nesse subíndice terem um fator beta superior a 1. |
(294) |
Em segundo lugar, a lista das 66 sociedades que constam do quadro 3 contém sociedades cuja atividade pertence a setores comerciais muito diferentes dos da FFT e inclui mesmo dois bancos centrais: o Banque Nationale de Belgique (Bélgica) e o Schweizerische Nationalbank (Suíça). Várias sociedades presentes na amostra desenvolvem atividades financeiras especializadas, como a locação financeira ou o factoring, ou são bolsas, ao invés de bancos (158), enquanto vários bancos europeus que, em princípio, participariam em atividades de financiamento do comércio grossista não estão incluídos na amostra. Logo, as sociedades comparáveis selecionadas pelo consultor fiscal para o cálculo do fator beta não são adequadas para este exercício, em que se pretende encontrar uma aproximação fiável de um resultado baseado no mercado. |
(295) |
Em terceiro lugar, e independentemente do caráter adequado ou não das sociedades comparáveis que constam da amostra escolhida pelo consultor fiscal da FFT, a análise dos preços de transferência, em vez de utilizar a mediana para o cálculo do fator beta, utiliza o percentil 25 sem a menor justificação. Ao proceder desta forma, a FFT fica com um fator beta relativamente baixo, de 0,29, ao passo que a mediana da amostra teria dado origem a um fator beta de 0,64 (159). Todavia, segundo o n.o 3.57 dos princípios da OCDE em matéria de preços de transferência, quanto mais problemas de comparabilidade existirem, mais o intervalo da plena concorrência deve ter em conta a tendência central da amostra. |
(296) |
A este respeito, a Comissão refere que o fator beta representa o risco não diversificável de uma rendibilidade dos capitais próprios. Neste contexto, as carteiras de empréstimos dos bancos seriam, em princípio, mais diversificadas do que a da FFT, cuja exposição está concentrada em sociedades do setor automóvel pertencentes ao grupo Fiat. Por esta razão, considera-se que o consultor fiscal da FFT deveria ter optado por um elemento situado mais acima na lista dos elementos de comparação para a determinação do fator beta, sem dúvida acima da mediana, e não no percentil 25. |
(297) |
Com efeito, a própria Circular remete especificamente para o risco de incumprimento pela contraparte e, mais particularmente, para o risco setorial, que aqui é amplificado pela concentração da FFT num único setor, aquando da determinação de uma remuneração adequada. Embora a Circular não indique especificamente de que forma estes riscos devem ser integrados no cálculo efetivo da remuneração, o método escolhido pelo consultor fiscal da FFT, nos termos do qual os riscos dos empréstimos intragrupo (por oposição aos créditos sobre terceiros) não são afetados por qualquer ponderação de risco e, logo, também não implicam qualquer requisito de fundos próprios e qualquer remuneração, não está em conformidade com a Circular. Consequentemente, as considerações relativas ao risco reduzido das atividades da FFT não podem ser aceites. |
(298) |
Além disso, o documento interno da Fiat sobre a política de preços de transferência sublinha uma função importante que não consta do relatório em matéria de preços de transferência. Como indicado no considerando 123, a FFT não exerce unicamente as funções que constam desse relatório, mas fornece também garantias a favor das sociedades do grupo Fiat. Assim, em 2013, essas garantias totalizavam 10 milhões de EUR (160). Para além disso, o documento sobre a política de preços de transferência reconhece igualmente que, ao contrário do que consta do relatório em matéria de preços de transferência, os empréstimos intragrupo apresentam um certo risco de incumprimento pela contraparte e de crédito (161). […] |
(299) |
No que diz respeito às garantias prestadas pela Fiat S.p.A. à FFT, invocadas nas observações do Luxemburgo (162), essas garantias cobrem os passivos da FFT e não os seus ativos. Como tal, beneficiam os titulares dos títulos de dívida garantidos emitidos, mas não reduzem o risco dos ativos da FFT. O lucro em termos de custos de financiamento gerado pela garantia sobre os títulos da dívida e as obrigações emitidas pela Fiat S.p.A. é repercutido nas sociedades do grupo através do mecanismo de fixação dos preços descrito no considerando 124. Com efeito, o preço dos empréstimos às sociedades é calculado aplicando uma margem dos custos de financiamento das sociedades de financiamento, que reflete o lucro eventualmente gerado pela garantia da sociedade-mãe. |
(300) |
À luz destas observações, a Comissão considera que nem as garantias implícitas nem as garantias explícitas diminuem razoavelmente o risco assumido pela FFT no exercício das suas funções. Esse risco é superior ao risco apresentado no relatório em matéria de preços de transferência pelo facto de existirem garantias fornecidas às sociedades do grupo que conduzem a uma exposição extrapatrimonial significativa, sendo por esta razão que deveria ter sido escolhido um fator beta superior ao percentil 25. |
(301) |
Em conclusão, a Comissão considera que o ruling fiscal controvertido, ao aprovar a opção tomada pelo consultor fiscal de um fator beta de 0,29 aquando da aplicação do CAPM para determinar a rendibilidade dos capitais próprios a aplicar aos fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT, implica uma afetação de lucros à FFT que se afasta das condições de mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência. Tendo em conta que este afastamento implica uma diminuição do imposto da FFT exigível relativamente ao sistema geral do imposto sobre as sociedade do Luxemburgo em relação às sociedade não integradas que realizam transações em condições de mercado, importa considerar que o ruling fiscal controvertido confere uma vantagem seletiva à FFT na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
7.2.2.10.
(302) |
Tendo em conta que o consultor fiscal optou pelo MMLO para analisar os preços de transferência, e à luz das observações acima, a Comissão considera que, para assegurar à FFT um nível adequado de remuneração baseado no mercado para as funções de financiamento e de tesouraria que exerce dentro do grupo Fiat, em conformidade com o princípio da plena concorrência, essa remuneração deve ser determinada com base nos fundos próprios contabilísticos da FFT com base nos seus factos e circunstâncias específicos. |
(303) |
A Comissão aceita 2012 como ano de referência para a apreciação da matéria coletável da FFT no Luxemburgo. A Comissão também não se opõe a que se procurem sociedades comparáveis para estimar as rendibilidades de plena concorrência, mas reitera as suas objeções no que diz respeito à escolha adequada das sociedades comparáveis, objeções essas que foram expressas no considerando 294. |
(304) |
Com efeito, a análise que consta da secção 7.2.2.9 indica que os riscos incorridos pela FFT que devem ser tidos em conta para o cálculo de uma remuneração de plena concorrência são superiores aos riscos apresentados no relatório em matéria de preços de transferência e que, consequentemente, a rendibilidade dos capitais próprios antes de impostos de 6,05 % (e de 4,3 % depois de impostos) aceite pelo ruling fiscal controvertido, calculada pelo consultor fiscal da FFT utilizando o CAPM, fica muito aquém das rendibilidades dos capitais próprios exigidas no setor financeiro, que se situam invariavelmente nos 10 % ou em valores superiores, o que confirma a conclusão da Comissão de que as sociedades comparáveis escolhidas pelo consultor fiscal não eram adequadas. |
(305) |
Além disso, uma comparação da rendibilidade declarada da FF e da FFT, as sociedades de financiamento para a área do euro da Fiat, indica que a diferença de lucros entre a FF e a FFT, não obstante as semelhanças na estrutura dos ativos, nas funções e nos rendimentos, é explicada pela intenção de reduzir o nível da rendibilidade declarada no Luxemburgo. Com base na estrutura dos ativos e dos passivos e na conta de lucros e perdas da FF e da FFT (163), as duas sociedades apresentam uma dimensão de balanço e uma estrutura de ativos muito semelhantes. Os montantes das receitas de juros e das despesas de ambas também são comparáveis. A FF é a principal contraparte da FFT, que recorre ao mercado para obter fontes de financiamento e transmite uma parte do financiamento à FF, que, por sua vez, o empresta às sociedades italianas do grupo Fiat. […] |
(306) |
O documento interno da Fiat sobre a política de preços de transferência parece ter como objetivo remunerar as duas sociedades com rendibilidades idênticas (164). Todavia, ao nível das sociedades, as rendibilidades efetivas dos capitais próprios registados e tributáveis são muito mais elevadas para a FF do que para a FFT. Com base nos dados que constam dos quadros dos considerandos 113 e 114, os quadros apresentados a seguir apresentam a rendibilidade dos capitais próprios (RCP) realizada, calculada pela FF e pela FFT.
|
(307) |
Resulta dos quadros que constam do considerando 306 que, no período 2010-2013, a rendibilidade média dos capitais próprios da FF era de 7,2 % e a da FFT de 0,5 %, o que confirma, uma vez mais, que a escolha das sociedades comparáveis efetuada pelo consultor fiscal no relatório em matéria de preços de transferência e a rendibilidade dos fundos próprios daí resultante não foram as mais adequadas. |
(308) |
Para determinar uma rendibilidade dos capitais próprios adequada para aplicar aos capitais próprios contabilísticos da FFT, as estatísticas agregadas do setor bancário parecem mais adequadas do que as do conjunto das 66 sociedades financeiras, que parecem, na sua grande maioria, desenvolver atividades financeiras específicas. Em todo o caso, a primeira solução permitiria uma melhor aproximação a uma tendência central. |
(309) |
Como foi indicado no considerando 304, a atual rendibilidade dos capitais próprios exigida para os bancos europeus é de cerca de 10 %, um nível que foi mantido mesmo durante a crise financeira. Com efeito, as informações que datam da época do ruling fiscal controvertido confirmam este nível de rendibilidade exigida para os capitais próprios. Assim, segundo a publicação de 2011 do Banco de Pagamentos Internacionais, «[A] mais longo prazo, as rendibilidades dos fundos próprios das empresas financeiras situam-se, com efeito, nos 11-12 %» (165). Além disso, um estudo do BCE de 2011 constatou que «a um nível de capitalização médio na amostra [de 54 bancos internacionais], a rendibilidade dos capitais próprios exigida é de cerca de […] 10,3 %» (166). Os relatórios de investigação em valor imobiliário datados de 2011 confirmam igualmente estes níveis; assim, segundo o Deutsche Bank «[o Deutsche Bank] prossegue um [objetivo de preços por ação], que reflete as RCP viáveis acima mas próximas de dez e um custo dos fundos próprios que [o Deutsche Bank] espera manter acima dos 10 % no ciclo atual» (167), ao passo que um relatório de investigação em valor imobiliário da Morgan Stanley e da Oliver Wyman, de 19 de março de 2015, fixa as rendibilidades pretendidas em 10-12 %. |
(310) |
A Comissão salienta igualmente que uma remuneração de plena concorrência não deve ser inferior à diferença entre o rendimento e os encargos da sociedade. Consequentemente, se a remuneração dos empréstimos concedidos e dos depósitos recebidos pela FFT devesse ser ajustada e se a remuneração da FFT daí resultante fosse mais elevada do que a remuneração calculada através dos preços de transferência, deveria ser tributada a totalidade do lucro registado, uma vez que um terceiro não aceitaria reduzir a sua remuneração sem uma reivindicação justificada das suas contrapartes para aumentar a remuneração recebida nos seus depósitos ou para diminuir a remuneração paga nos seus empréstimos obtidos. |
(311) |
Como tal, a Comissão considera que, se o MMLO é utilizado para efeitos dos preços de transferência para calcular a remuneração adequada devida à FFT para as funções que esta exerce no grupo Fiat, a estimativa correta da matéria coletável da FFT no Luxemburgo corresponderia, pelo menos, a 10 % após impostos aplicado ao montante total dos seus capitais próprios contabilísticos, que são considerados globalmente como estando em conformidade com a média do setor em termos de rácio de alavancagem financeira. Uma matéria coletável calculada nesta base daria lugar a uma repartição dos lucros que refletiria as condições do mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência, uma vez que se trata de um nível de lucros que as instituições financeiras autónomas esperariam receber no mercado, pelo que qualquer ruling fiscal que aceitasse esta base para determinar o imposto exigível à FFT ao abrigo do sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo não conferiria qualquer tipo de vantagem seletiva na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
7.2.3. «Vantagem para o grupo»
(312) |
Nos seus comentários sobre a decisão de início do procedimento, a FFT alega que a Comissão deveria considerar o «efeito no grupo» da medida, ou seja, que o grupo Fiat não beneficiou de qualquer vantagem dado que qualquer aumento da matéria coletável no Luxemburgo seria totalmente compensado por um aumento da dedução fiscal nos outros Estados-Membros (168). Segundo a FFT, esse efeito foi reconhecido em várias decisões da Comissão (169). |
(313) |
A Comissão relembra, a título preliminar, que não está vinculada pela sua prática decisória, e que cada medida deve ser apreciada com base nos seus próprios méritos ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE (170). De qualquer modo, a referência da FFT à decisão relativa ao auxílio estatal concedido pela Hungria sob a forma de deduções fiscais dos juros intragrupo, em que a Comissão teria reconhecido um tal «efeito no grupo», baseia-se numa leitura errada da decisão. Nessa decisão, a Comissão rejeitou o argumento da Hungria que visava a apreciação da existência de uma vantagem ao nível do grupo e concluiu que a vantagem deveria ser apreciada ao nível de cada entidade. |
(314) |
A presente decisão aprecia se o Luxemburgo, ao emitir o ruling fiscal controvertido, conferiu uma vantagem seletiva à FFT, ao diminuir o imposto exigível a esta última no referido Estado-Membro. Consequentemente, a apreciação segundo a qual este ruling confere uma vantagem deve recair no tratamento do qual é objeto a sociedade no Estado-Membro em causa, ou seja, a FFT e o Luxemburgo, e não deve ter em conta a possibilidade de que o impacto seja neutro ao nível das outras sociedades do grupo Fiat resultante do tratamento de que são objeto noutros Estados-Membros (171). De qualquer modo, segundo a jurisprudência (172), a mera circunstância de determinada medida de isenção ser compensada pelo agravamento de um encargo específico distinto e sem relação com a primeira não permite que essa primeira escape à qualificação de auxílio estatal. Dito de outra forma, uma vantagem conferida a uma sociedade por um Estado-Membro não pode ser compensada pela desvantagem de outra sociedade, mesmo que façam parte do mesmo grupo. |
7.2.4. Argumentação a título subsidiário: vantagem seletiva devido a uma derrogação do artigo 164.o da L.I.R. e/ou da Circular
(315) |
O Luxemburgo e a FFT alegaram que o artigo 164.o da L.I.R. ou a Circular constitui o sistema de referência em relação ao qual importa determinar a existência de uma vantagem seletiva decorrente do ruling fiscal controvertido. O Luxemburgo alegou igualmente que a administração fiscal luxemburguesa se limitou a interpretar as normas e que nada indica, no caso da FFT, que se tenha afastado das disposições fiscais geralmente aplicáveis, mesmo que a Comissão as tenha examinado (173). |
(316) |
Como indicado nos considerandos 210 a 215, a Comissão não concorda com os argumentos do Luxemburgo e da FFT no que diz respeito ao sistema de referência aplicável. Todavia, na qualidade de argumentação subsidiária, a Comissão conclui que o ruling fiscal controvertido também confere à FFT uma vantagem seletiva no quadro do sistema de referência mais limitado composto por sociedades pertencentes a grupos que aplicam preços de transferência e que são abrangidas pelo artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R. e pela Circular. Esta disposição estabelece o princípio da plena concorrência no direito fiscal luxemburguês, segundo o qual as transações entre sociedades de um mesmo grupo devem ser remuneradas a um nível de preços que teria sido aceite por sociedades independentes negociando em circunstâncias comparáveis em condições de plena concorrência. A secção 2 da Circular contém, nomeadamente, uma descrição do princípio da plena concorrência conforme definido nos princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência e transposto para o direito nacional (174). |
(317) |
Considerando que a Comissão já demonstrou, na secção 7.2.2, que o ruling fiscal controvertido aprova um determinado número de opções metodológicas, opções de parâmetros de aplicação e ajustamentos ad hoc que o consultor fiscal da FFT efetuou com vista a estabelecer preços de transferência que não podem ser considerados como dando lugar a uma aproximação fiável de um resultado baseado no mercado resultando numa redução da matéria coletável da FFT no Luxemburgo, a Comissão pode igualmente concluir que esse ruling confere uma vantagem seletiva no âmbito do sistema de referência mais limitado do artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R. ou da Circular, tendo em conta que implica uma diminuição do imposto exigível à FFT relativamente à situação em que o princípio da plena concorrência enunciado nessa disposição teria sido corretamente aplicado. |
7.2.5. A Comissão não identificou qualquer prática coerente de rulings fiscais baseada na Circular que possa constituir um sistema de referência adequado
(318) |
A FFT afirmou igualmente que, para demonstrar a existência de um tratamento seletivo a seu favor decorrente do ruling fiscal controvertido, a Comissão deveria comparar esse ruling com a prática administrativa da administração fiscal luxemburguesa com base na Circular, em particular com os rulings concedidos a outras sociedades de financiamento e de tesouraria que o Luxemburgo apresentou à Comissão para servirem de amostra representativa da sua prática em matéria de ruling (175). |
(319) |
A Comissão discorda desta argumentação, uma vez que isso significaria que o sistema de referência à luz do qual deve examinar-se o ruling fiscal controvertido seria a prática luxemburguesa de rulings fiscais baseada na Circular referente a outras sociedades de financiamento e de tesouraria. A Comissão já demonstrou por que razão o sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo constitui o quadro de referência adequado para as necessidades de análise da seletividade (176). |
(320) |
Seja como for, a Comissão demonstrará, a título de argumentação subsidiária complementar, por que razão a prática luxemburguesa de rulings fiscais baseada na Circular constitui um sistema de referência adequado para determinar se o ruling fiscal controvertido confere uma vantagem seletiva à FFT. Tal pode desde logo ser explicado pelo facto de a Circular estar redigida em termos demasiado gerais, não permitindo identificar critérios objetivos aplicáveis ao conjunto das sociedades de financiamento e tesouraria que introduzam um pedido de ruling fiscal para efeitos da fixação dos preços de transferência. Em seguida, o exame que a Comissão efetuou aos rulings fornecidos pelo Luxemburgo demonstra igualmente que não existe qualquer conjunto coerente de regras aplicáveis de maneira generalizada com base em critérios objetivos à luz dos quais o ruling fiscal controvertido possa ser examinado para determinar se a FFT beneficiou de uma vantagem seletiva decorrente do referido ruling. |
7.2.5.1.
(321) |
Como indicado no considerando 193, um sistema de referência é constituído por um conjunto coerente de normas que são, em geral, aplicáveis — com base em critérios objetivos — a todas as empresas abrangidas pelo seu âmbito de aplicação, tal como definido pelo seu objetivo. A Comissão considera que, para as sociedades de financiamento e de tesouraria pertencentes a um grupo, a Circular não pode constituir um tal sistema, tendo em conta a ausência de critérios objetivos que permitam uma aplicação coerente do princípio da plena concorrência às transações de financiamento intragrupo. |
(322) |
A Circular está formulada em termos muito gerais e os fatores a ter em conta pela administração fiscal para efeitos da aplicação do princípio da plena concorrência às sociedades de financiamento intragrupo estão descritos de maneira sucinta. Estes fatores incluem a necessidade de as sociedades procederem a uma análise dos riscos incorridos e determinarem os custos suplementares associados à concessão de um crédito que vêm juntar-se ao custo de base, o que, por sua vez, requer uma análise do risco de crédito. A circular prevê igualmente que «a sociedade de financiamento pertencente a um grupo deve dispor de capitais próprios suficientes para poder assumir os riscos associados à sua atividade» e que «importa […] apreciar com base nos factos e nas circunstâncias específicos a cada caso individual quais são os riscos assumidos […] e se a sociedade que efetua as transações de financiamento do grupo dispõe de um nível de capitais próprios suficiente para poder assumir esses riscos» (177). |
(323) |
Contudo, a Circular não fornece qualquer informação sobre a maneira de estimar a rendibilidade esperada dos capitais próprios, sobre a questão de saber se o recurso ao CAPM é aceitável e, se for caso disso, sobre a maneira de determinar os parâmetros pertinentes deste modelo. Contém também poucas informações sobre os fundos próprios a tomar em consideração, salvo que estes devem ser «suficiente[s] para poder assumir esses riscos». |
(324) |
Nas suas observações relativas à decisão de início do procedimento, o Luxemburgo afirma que o ruling fiscal se baseia no exercício de um poder discricionário limitado conferido pelo artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R. que consagra o princípio da plena concorrência no direito fiscal luxemburguês (178), mas refere igualmente que «as normas em matéria fiscal […] interpretam-se à luz da situação factual encontrada em cada caso, o que requer por definição que sejam tidas em conta as características das atividades efetivamente exercidas pelo contribuinte e as condições em que são exercidas» (179). O Luxemburgo admite assim, por um lado, que as regras devem ser interpretadas à luz das circunstâncias de cada caso, mas não explica, por outro lado, como traduzir os critérios gerais enunciados na Circular numa avaliação concreta da situação fiscal da FFT, nem como garantir um tratamento coerente de todos os contribuintes quando se trata de aplicar a Circular. Não é, pois, surpreendente que, à exceção de uma referência à Circular no início do texto, o relatório da FFT em matéria de preços de transferência não inclua qualquer outra referência aos critérios da Circular nem refira a maneira como aplica a Circular ao caso particular da FFT. |
(325) |
Consequentemente, ao concluir que a análise dos preços de transferência «foi realizada em conformidade com a Circular 164/2 de 28 de janeiro de 2011 e respeita o princípio da plena concorrência», a administração fiscal luxemburguesa não se baseou em qualquer critério objetivo que tenha sido enunciado na Circular, uma vez que este documento não inclui qualquer critério específico e objetivo que permita uma aplicação coerente do princípio da plena concorrência às transações de financiamento intragrupo. |
7.2.5.2.
(326) |
Além do caráter geral da Circular, a Comissão examinou os rulings fiscais que lhe foram comunicados pelo Luxemburgo e constatou que a sua prática na matéria em relação às sociedades de financiamento e de tesouraria pertencentes a um grupo demonstra igualmente a ausência de um conjunto coerente de regras que seriam aplicáveis de forma generalizada ao conjunto dos contribuintes que se encontram numa situação idêntica com base em critérios objetivos. |
(327) |
Dos 21 rulings inicialmente apresentados ao mesmo tempo que o APP da FFT, só dois dizem respeito a atividades de financiamento aprovadas com base na Circular e estão acompanhados por um relatório em matéria de preços de transferência:
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(328) |
Uma leitura rápida destes dois rulings e uma comparação com o ruling fiscal controvertido revelam a ausência de coerência no tratamento conferido às sociedades de financiamento ao abrigo da Circular e na análise do lucro tributável realizada pela administração fiscal luxemburguesa. Independentemente da questão de saber se os dois rulings em causa aplicam corretamente o método CUP, estes reconhecem expressamente que, para as transações de financiamento intercalar, este método é, em todo o caso, o mais adequado com base na análise funcional e na disponibilidade de sociedades comparáveis, que incluem nomeadamente bancos. Este aspeto está em consonância com a Circular, que considera as funções exercidas pelas sociedades de financiamento intragrupo como comparáveis, no essencial, às exercidas pelas instituições financeiras independentes. Contrariamente ao que aconteceu em relação a estes dois rulings, o método CUP não foi aplicado ao ruling fiscal controvertido, porque o consultor fiscal da FFT considerou o método MMLO mais adequado invocando que «o método MMLO parece adequado» (181). |
(329) |
Três outros rulings apresentados pelo Luxemburgo também dizem respeito a atividades de financiamento intragrupo baseadas na Circular, mas não estão acompanhados pelo relatório em matéria de preços de transferência que justifica o pedido:
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(330) |
No que diz respeito à comparação entre os rulings n.os 1, 5 e 22 e o ruling fiscal controvertido, a manifesta diferença de tratamento estabelecida pela administração fiscal luxemburguesa reside no facto de, contrariamente ao ruling fiscal controvertido, os pedidos dos rulings n.os 1, 5 e 22 não estarem acompanhados por um relatório em matéria de preços de transferência, ainda que a Circular o exija expressamente (182). |
(331) |
Dois outros rulings fornecidos pelo Luxemburgo à Comissão dizem respeito a atividades de financiamento, mas não se baseiam na Circular:
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(332) |
Por fim, a Comissão examinou os dois rulings fiscais fornecidos pelo Luxemburgo entre os 13 rulings relativos a uma função de tesouraria que foram identificados na lista de 5 323rulings comunicados pelo país em 22 de dezembro de 2014 (183). Cada um destes dois rulings baseia-se na Circular:
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(333) |
A Comissão observa que, contrariamente ao ruling fiscal controvertido, nenhum destes dois rulings aplica o método MMLO nem o CAPM e que nenhum dos dois parece determinar o lucro tributável da sociedade como a rendibilidade dos fundos próprios regulamentares hipotéticos. Além disso, ainda que o pedido de ruling da sociedade G faça referência a um relatório em matéria de preços de transferência a fornecer posteriormente, parece que esse relatório nunca foi entregue à administração fiscal luxemburguesa (184). Por fim, o ruling da sociedade G, mesmo não indicando claramente o nível da margem nem àquilo que se aplica, é diferente do ruling fiscal controvertido, porque, segundo o pedido de ruling, a margem teria como base os ativos e juntar-se-ia a uma rendibilidade dos capitais próprios. Em resumo, o tratamento fiscal concedido a estas duas sociedades pelas suas funções de tesouraria não parece obedecer a qualquer abordagem ou método coerente com o ruling fiscal controvertido. |
(334) |
O Luxemburgo afirma que a FFT não pode ser comparada às outras sociedades de financiamento, dado que angaria fundos no mercado, ao passo que as outras sociedades de financiamento obtêm geralmente financiamentos intragrupo. Afirma igualmente que a FFT não pode ser comparada com nenhuma outra sociedade tributável no Luxemburgo: «a situação de cada contribuinte é suficientemente específica para impedir qualquer comparação pertinente com os processos de outros contribuintes» (185). |
(335) |
A Comissão não concorda com estas afirmações e, a este respeito, reitera que a ausência de um conjunto coerente de regras que sejam aplicáveis de maneira generalizada às sociedades de financiamento e de tesouraria que tenham apresentado um pedido de ruling com base em critérios objetivos é perfeitamente ilustrada pela existência de um outro ruling fiscal a favor da [sociedade F]. O ruling relativo à [sociedade F], que foi adotado no mesmo dia e incide sobre as mesmas funções do que o ruling fiscal controvertido ([a sociedade F] financiaria o segmento industrial […] numa outra estrutura de sociedades de financiamento pertencentes a um grupo), chega a uma conclusão substancialmente diferente em relação às respetivas matérias coletáveis das sociedades, sem justificação aparente para uma tal diferença de tratamento. Com efeito, o ruling fiscal controvertido aprova uma matéria coletável de cerca de 2,5 milhões de EUR, enquanto o ruling fiscal a favor da [sociedade F] aprova uma remuneração das atividades de financiamento e de tesouraria equivalentes que resulta numa matéria coletável de […] de EUR. Esta diferença de tratamento entre sociedades praticamente idênticas sem justificação aparente demonstra igualmente que a prática luxemburguesa dos rulings fiscais, que se baseia em formulações gerais da Circular, não constitui um sistema de referência adequado para efeitos da análise de seletividade. |
(336) |
Em resumo, a avaliação da prática da administração fiscal luxemburguesa em matéria de rulings fiscais não permite identificar um conjunto coerente de regras que sejam, em geral, aplicáveis, com base em critérios objetivos, a todas as empresas abrangidas pelo seu âmbito de aplicação, tal como definido pelo seu objetivo. Como tal, esta prática não pode constituir o quadro à luz do qual o ruling fiscal controvertido é examinado para determinar se a FFT beneficiou de uma vantagem seletiva na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
7.2.6. Justificação baseada na natureza ou na estrutura geral do sistema fiscal
(337) |
Nem o Luxemburgo nem a FFT apresentarem qualquer motivo que possa justificar o tratamento seletivo da FFT resultante do ruling fiscal controvertido. A Comissão relembra que cabe ao Estado-Membro apresentar essa justificação. |
(338) |
De qualquer modo, não foi possível identificar nenhum motivo suscetível de justificar o tratamento preferencial de que beneficia a FFT por força do ruling fiscal controvertido e que possa ser considerado como diretamente resultante dos princípios fundadores ou diretores do sistema de referência ou que resulte de mecanismos inerentes ao sistema necessários para o seu funcionamento e para a sua eficácia (186), quer o sistema de referência seja o sistema geral do imposto sobre as sociedades no Luxemburgo, como afirma a Comissão, quer o artigo 164.o da L.I.R. e a Circular, como afirmam o Luxemburgo e a Fiat. |
7.2.7. Conclusão quanto à existência de uma vantagem seletiva
(339) |
A Comissão conclui que o ruling fiscal controvertido, ao aprovar um método que permite conseguir uma distribuição de lucros a favor da FFT dentro do grupo Fiat que se afasta de um resultado de mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência e implica uma redução do imposto devido pela FFT ao abrigo do sistema geral do imposto sobre as sociedades do Luxemburgo, em comparação com o imposto devido pelas sociedades não integradas tributáveis no país que realizam transações em condições de mercado, confere uma vantagem seletiva à FFT na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
(340) |
No que toca à argumentação subsidiária, a Comissão conclui que o ruling controvertido, ao aprovar um método que permite conseguir uma distribuição de lucros a favor da FFT dentro do grupo Fiat que se afasta de um resultado de mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência e implica uma redução do imposto devido pela FFT ao abrigo do artigo 164.o, n.o 3, da L.I.R. e da Circular, em comparação com o imposto devido por outras sociedades pertencentes a grupos tributáveis no Luxemburgo, confere uma vantagem seletiva à FFT para efeitos do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado. |
7.3. Beneficiário da medida impugnada
(341) |
A Comissão considera que o ruling fiscal controvertido confere uma vantagem seletiva à FFT na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, dado que tem o efeito de reduzir o lucro tributável da referida entidade no Luxemburgo em relação às sociedades não integradas cujos lucros tributáveis são determinados com base nas transações realizadas em condições de mercado. Todavia, a Comissão salienta que a FFT faz parte de um grupo multinacional, neste caso o grupo Fiat Chrysler Automobiles («FCA»), e que a sua função dentro deste grupo consiste em prestar serviços de financiamento e de tesouraria às outras empresas do grupo Fiat, sendo a remuneração desta função o objeto do ruling fiscal controvertido. |
(342) |
Pode considerar-se que várias entidades jurídicas distintas formam uma única unidade económica para efeitos da aplicação das regras em matéria de auxílios estatais. Esta unidade económica é assim considerada como a empresa em causa que beneficia da medida de auxílio. Tal como o Tribunal de Justiça já proferiu no passado, «[e]m matéria de direito da concorrência, o termo “empresa” deve ser entendido como a designação de uma unidade económica […] ainda que juridicamente essa unidade económica seja constituída por várias pessoas, singulares ou coletivas» (187). Para estabelecer se várias entidades constituem uma unidade económica, o Tribunal de Justiça verifica a existência de uma participação de controlo ou de ligações de natureza funcional, económica ou orgânica (188). No presente caso, a FFT é detida pela Fiat S.p.A. (atualmente Fiat Chrysler Automobiles, NV) e pela FF, que por sua vez é detida a 100 % pela Fiat S.p.A. (189). Assim, a FFT é controlada a 100 % pela Fiat S.p.A., que por sua vez controla o grupo Fiat (190). |
(343) |
Além disso, foi o grupo Fiat que tomou a decisão de estabelecer a FFT no Luxemburgo e é ele que, desta forma, beneficia do ruling fiscal controvertido porque, como indicado no considerando 52, este último determina o lucro que deve ser distribuído à FFT dentro do grupo pelos serviços de financiamento e de tesouraria que presta às sociedades do grupo. Em última análise, o ruling fiscal controvertido é uma decisão que aprova um método de fixação de preços de transferência para as transações efetuadas dentro do grupo Fiat e, assim, qualquer tratamento fiscal favorável conferido à FFT pela administração fiscal luxemburguesa beneficiará o grupo Fiat no seu conjunto, ao conceder recursos suplementares não apenas à FFT mas a todo o grupo. Dito de outra forma, tal como indicado no considerando 221, quando é preciso fixar preços de transferência para determinar os preços dos produtos e dos serviços prestados dentro de diversas entidades jurídicas de um único grupo, o mecanismo de fixação dos preços de transferência tem, pela sua própria natureza, efeitos sobre mais do que uma sociedade do grupo (um aumento dos preços de uma sociedade reduzirá o lucro de outra). |
(344) |
Consequentemente, não obstante o facto de o grupo estar organizado em personalidades jurídicas distintas, no contexto de um acordo em matéria de fixação de preços, estas empresas devem ser consideradas como um único grupo que beneficia da medida de auxílio impugnada (191). |
(345) |
Por fim, no presente caso, o montante de imposto pago pela FFT no Luxemburgo tem influência nas condições de preço dos empréstimos que ela concede às sociedades do grupo Fiat, tendo em conta o facto de estes se basearem no custo médio ponderado do capital e numa margem (192), pelo que as reduções do imposto devido pela FFT resultam necessariamente numa diminuição das condições de preço dos seus empréstimos intragrupo. Uma redução do imposto da FFT no Luxemburgo beneficia não apenas esta última mas também o conjunto das sociedades do grupo que obtêm financiamento junto da FFT e, por conseguinte, o grupo Fiat. |
7.4. Conclusão quanto à existência de auxílio
(346) |
Tendo em conta o que precede, a Comissão conclui que o ruling fiscal controvertido concedido pelo Luxemburgo à FFT confere a esta última e ao grupo Fiat uma vantagem seletiva que é imputável a este Estado-Membro e financiada com os recursos estatais e que falseia ou ameaça falsear a concorrência, sendo suscetível de afetar as trocas comerciais no interior da União. O ruling fiscal controvertido constitui, por isso, um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
(347) |
Tendo em conta que o ruling fiscal controvertido dá lugar a uma redução dos encargos que a FFT deveria normalmente suportar no quadro das suas atividades correntes, deve ser considerado que esse ruling concede um auxílio ao funcionamento da FFT e do grupo Fiat. |
8. CARÁTER INCOMPATÍVEL DO AUXÍLIO COM O MERCADO INTERNO
(348) |
Um auxílio estatal é considerado compatível com o mercado interno se se enquadrar numa das categorias enumeradas no artigo 107.o, n.o 2, do TFUE (193). Pode igualmente ser considerado compatível com o mercado interno se a Comissão determinar que se enquadra numa das categorias enumeradas no artigo 107.o, n.o 3, do TFUE. Todavia, cabe ao Estado-Membro que concede o auxílio demonstrar que o auxílio estatal que concedeu é compatível com o mercado interno com base no artigo 107.o, n.os 2 e 3, do TFUE. |
(349) |
O Luxemburgo não invoca qualquer das derrogações previstas nas disposições mencionadas no considerando 345 para estabelecer a compatibilidade do auxílio concedido à FFT e ao grupo Fiat através do ruling fiscal controvertido. |
(350) |
Além disso, tal como indicado no considerando 347, deve considerar-se que o ruling fiscal controvertido concede um auxílio ao funcionamento da FFT e do grupo Fiat. Regra geral, um tal auxílio não pode normalmente ser considerado compatível com o mercado interno com base no artigo 107.o, n.o 3, alínea c), do TFUE, pelo facto de não favorecer o desenvolvimento de certas atividades ou regiões económicas e pelo facto de os incentivos fiscais não serem limitados no tempo, não se reduzirem progressivamente e não serem proporcionais ao que é necessário para compensar uma desvantagem económica específica das regiões em causa. |
(351) |
Resulta daqui que o auxílio estatal concedido à FFT e ao grupo Fiat pelo Luxemburgo através do ruling fiscal controvertido é incompatível com o mercado interno. |
9. CARÁTER ILEGAL DO AUXÍLIO
(352) |
Nos termos do artigo 108.o, n.o 3, do TFUE, os Estados-Membros são obrigados a informar a Comissão de qualquer projeto de concessão de um auxílio (obrigação de notificação) e não podem pôr em execução as medidas de auxílio propostas enquanto a Comissão não adotar uma decisão definitiva quanto às mesmas (obrigação de suspensão). |
(353) |
A Comissão salienta que o Luxemburgo não notificou qualquer projeto de adoção do ruling fiscal controvertido e não respeitou a obrigação de suspensão que lhe incumbe nos termos do artigo 108.o, n.o 3, do TFUE. Consequentemente, em conformidade com artigo 1.o, alínea f), do Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho (194), o ruling fiscal controvertido constitui um auxílio estatal ilegal executado em violação do artigo 108.o, n.o 3, do TFUE. |
10. RECUPERAÇÃO
(354) |
O artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento (UE) 2015/1589 estipula que a Comissão deve ordenar a recuperação de qualquer auxílio ilegal e incompatível com o mercado interno. A referida disposição prevê igualmente que o Estado-Membro em causa tome todas as medidas necessárias para recuperar o auxílio ilegal declarado incompatível com o mercado interno. O artigo 16.o, n.o 2, do referido regulamento estabelece que o auxílio a recuperar deve incluir juros a contar da data em que o auxílio ilegal foi colocado à disposição do beneficiário até ao momento da sua recuperação. O Regulamento (CE) n.o 794/2004 da Comissão (195) especifica os métodos de cálculo dos juros a recuperar. Por último, o artigo 16.o, n.o 3, do Regulamento (UE) 2015/1589 estabelece que: «a recuperação será efetuada imediatamente e segundo as formalidades do direito nacional do Estado-Membro em causa, desde que estas permitam uma execução imediata e efetiva da decisão da Comissão». |
10.1. Confiança legítima e segurança jurídica
(355) |
O artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento (UE) 2015/1589 estabelece igualmente que a Comissão não deve exigir a recuperação do auxílio se tal for contrário a um princípio geral de direito. |
(356) |
O Luxemburgo afirma, em primeiro lugar, que, em virtude do princípio da confiança legítima, uma decisão que determine a existência de um auxílio não pode produzir efeitos antes do fim do período de validade do ruling fiscal controvertido, ou seja, no presente caso, antes do fim do ano fiscal de 2016. Segundo o Luxemburgo, tanto o grupo «Código de Conduta» como o fórum da OCDE sobre práticas fiscais prejudiciais asseguraram que a sua prática de rulings fiscais baseada na Circular estava em conformidade com o código de conduta e com os princípios da OCDE. O Luxemburgo alega que foi explicitamente confirmado na reunião do Conselho de 27 de maio de 2011 que, tendo em conta a adoção da Circular, a prática dos rulings fiscais não deveria ser examinada com base no código de conduta (196). |
(357) |
Segundo jurisprudência já assente, um Estado-Membro, cujas autoridades tenham concedido um auxílio em violação das normas de processo previstas no artigo 108.o, n.o 3, do TFUE, não pode invocar a confiança legítima de um beneficiário para justificar o desrespeito da obrigação de tomar as medidas necessárias com vista ao cumprimento de uma decisão da Comissão que lhe ordena a recuperação do auxílio. Admitir tal possibilidade significaria desprover os artigos 107.o e 108.o do TFUE de qualquer efeito útil, na medida em que as autoridades nacionais poderiam basear-se no seu próprio comportamento ilegal para anular a eficácia das decisões tomadas pela Comissão ao abrigo dos referidos artigos do TFUE (197). Assim, não incumbe ao Estado-Membro em causa, mas sim à empresa beneficiária, invocar a existência das circunstâncias excecionais que puderam criar a sua confiança legítima a fim de se opor à restituição de um auxílio ilegal (198). Como a FFT não invocou qualquer argumento neste sentido nas observações que comunicou à Comissão, esta última considera que o argumento do Luxemburgo relativo ao princípio da confiança legítima não pode ser aceite para efeitos da presente decisão. |
(358) |
De qualquer modo, para que um argumento que invoque a confiança legítima possa ser aceite, esta deve ter sido suscitada por uma ação anterior da Comissão que tenha consistido em fornecer garantias precisas (199). Segundo o Luxemburgo, o acordo alcançado aquando de uma reunião do grupo «Código de Conduta» sobre o facto de não ser necessário avaliar a medida fiscal luxemburguesa relativa às empresas que exercem atividades de financiamento intragrupo em função dos critérios do código de conduta constitui uma garantia precisa suscetível de criar uma confiança legítima. A Comissão relembra que o código de conduta adotado pelo Conselho ECOFIN (200) é um instrumento juridicamente não vinculativo que visa oferecer aos Estados-Membros um espaço de discussão consagrado às medidas que tenham, ou possam ter, impacto significativo na localização das atividades económicas das empresas dentro da União. O código de conduta e a regulamentação em matéria de auxílios estatais visam objetivos diferentes. Com efeito, enquanto o código de conduta visa lutar contra a concorrência fiscal desleal entre os Estados-Membros, a regulamentação em matéria de auxílios estatais tem como objetivo corrigir as distorções da concorrência que resultam do tratamento favorável concedido pelos Estados-Membros a certas empresas, nomeadamente sob a forma de reduções de impostos. Além disso, embora o grupo «Código de Conduta» disponha de uma certa margem de apreciação, a Comissão, por seu lado, não tem qualquer poder discricionário para determinar se uma medida é abrangida pela noção de auxílio estatal, sendo essa noção objetiva. Consequentemente, um acordo alcançado dentro do grupo «Código de Conduta» não pode nem vincular nem enquadrar a ação da Comissão no exercício dos poderes que lhe foram conferidos pelo TFUE no domínio dos auxílios estatais (201). |
(359) |
O mesmo raciocínio é válido para os acordos formulados no fórum da OCDE sobre as práticas fiscais prejudiciais. Aquando da sua reunião de 6 de dezembro de 2011, o fórum da OCDE acordou o seguinte: «[…] os 10 regimes seguintes não foram examinados mais pormenorizadamente… Luxemburgo — análise fiscal avançada do financiamento intragrupo» (tradução livre). A OCDE não é uma instituição da União e a União não é membro desta organização (202). As suas conclusões, que são de caráter não vinculativo, não podem vincular as instituições da União. O fórum da OCDE, longe de fornecer uma garantia precisa, absteve-se de examinar mais pormenorizadamente a análise fiscal luxemburguesa das atividades de financiamento intragrupo. Torna-se pois impossível, com base nesta citação, retirar qualquer tipo de conclusão ou fazer qualquer tipo de dedução quanto à aplicação das regras em matéria de auxílios estatais ao ruling fiscal controvertido. |
(360) |
Em segundo lugar, o Luxemburgo argumenta que a Comissão infringiu o princípio da segurança jurídica. Refere-se a uma prática decisória anterior da Comissão, segundo a qual aceitou limitar a recuperação com base neste princípio. |
(361) |
Ora, não existe qualquer prática decisória anterior suscetível de ter criado incertezas quando ao facto de os rulings fiscais poderem dar lugar à concessão de um auxílio estatal. Com efeito, na decisão a que se refere o Luxemburgo, a Comissão limitou a recuperação devido à incerteza criada por uma decisão anterior da Comissão. No presente caso, pelo contrário, a comunicação sobre a fiscalidade direta das empresas faz expressamente referência aos rulings fiscais e às circunstâncias em que estes devem ser considerados como dando lugar à concessão de um auxílio estatal. |
(362) |
No que diz respeito ao argumento do Luxemburgo segundo o qual o montante do auxílio não pode ser quantificado com precisão tendo em conta, designadamente, a novidade da abordagem seguida, e segundo o qual deveria assim ser excluída uma recuperação, a Comissão salienta que aplicou o princípio da plena concorrência na sua prática decisória anterior, em particular para as medidas adotadas pelo Luxemburgo, e concluiu que uma violação deste princípio poderia constituir um auxílio estatal (203). Além disso, esta conclusão foi confirmada pelo Tribunal de Justiça (204). Como tal, a abordagem da Comissão relativamente ao ruling fiscal controvertido não tem nada de novo. Os Estados-Membros não podem ignorar que um acordo celebrado entre uma autoridade fiscal e uma sociedade, que confere a esta última um tratamento favorável, ao reduzir artificialmente a sua matéria coletável, pelo facto de os preços de transferência utilizados não constituírem uma aproximação fiável de um resultado baseado no mercado, conduz a uma violação da regulamentação em matéria de auxílios estatais e deve, em caso de dúvida, ser notificado à Comissão. |
(363) |
Por último, no que diz respeito à pretensa dificuldade de quantificar o montante do auxílio que justificaria não ordenar a recuperação, o Tribunal de Justiça decidiu anteriormente (205) que a Comissão não é obrigada a indicar o montante exato do auxílio a recuperar. O direito da União exige simplesmente que o auxílio concedido ilegalmente seja recuperado para restabelecer a situação anterior e que a restituição seja efetuada em conformidade com as normas do direito nacional (206). Consequentemente, a Comissão pode limitar-se a declarar a obrigação de restituição dos auxílios em questão e deixar às autoridades nacionais a tarefa de calcular o montante preciso dos auxílios a restituir (207). |
(364) |
Como tal, a Comissão está em condições de concluir que os argumentos relativos aos princípios da confiança legítima e da segurança jurídica invocados pelo Luxemburgo são desprovidos de fundamento relativamente à obrigação de recuperação do auxílio que este concedeu ilegalmente à FFT através do ruling fiscal controvertido. |
10.2. Método de recuperação
(365) |
De acordo com o TFUE e a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, ao verificar a incompatibilidade de um auxílio estatal com o mercado interno, a Comissão é competente para decidir se o Estado-Membro interessado deve suprimi-lo ou modificá-lo. O Tribunal de Justiça também decidiu de forma constante que a obrigação imposta a um Estado-Membro de suprimir um auxílio considerado pela Comissão como sendo incompatível com o mercado interno visa restabelecer a situação anterior. Neste contexto, o Tribunal de Justiça estabeleceu que tal objetivo é alcançado quando o beneficiário tiver reembolsado os montantes concedidos a título de auxílio ilegal, perdendo então o beneficiário a vantagem de que tinha beneficiado no mercado relativamente aos seus concorrentes, e a situação anterior à concessão do auxílio se encontrar reposta. |
(366) |
No caso em que um auxílio estatal ilegal assuma a forma de uma medida fiscal, a comunicação sobre a fiscalidade direta das empresas (208) refere, no seu ponto 35, que o montante a recuperar é calculado com base numa comparação entre o imposto efetivamente pago e aquele que deveria ter sido pago se tivesse sido aplicada a regra geral. Para calcular o montante do imposto que deveria ter sido pago se tivessem sido aplicadas as regras gerais, designadamente se o princípio da plena concorrência tivesse sido corretamente aplicado com vista a fixar a matéria coletável da FFT no Luxemburgo, a administração fiscal luxemburguesa deve modificar o método de cálculo anual utilizado pela FFT no âmbito do método MMLO com base no CAPM, ou seja, i) o montante dos capitais próprios remunerados e ii) o nível de remuneração aplicado a esse montante de capitais próprios exigido em conformidade com a apreciação exposta no considerando 311 acima. |
(367) |
Nenhuma disposição do direito da União exige que a Comissão, quando ordena a recuperação de um auxílio declarado incompatível com o mercado comum, fixe o montante exato do auxílio a recuperar. Basta, pelo contrário, que a decisão da Comissão contenha indicações que permitam ao seu destinatário determinar por si próprio, sem dificuldades excessivas, esse montante (209). |
(368) |
A Comissão propôs, na secção 7.2.2.10 e em particular no considerando 311, um método suscetível de eliminar a vantagem seletiva conferida à FFT pelo ruling fiscal controvertido (210), caso o Luxemburgo conserve o método MMLO para fixar a matéria coletável da FFT. Está, todavia, consciente de que outros métodos de fixação dos preços de transferência podem igualmente resultar numa aproximação fiável de um resultado de mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência. Consequentemente, se o Luxemburgo propuser, antes da data de aplicação da presente decisão, um método de recuperação que utilize outro método de fixação dos preços de transferência, a Comissão estaria disposta a aceitar esse método desde que resulte numa aproximação fiável de um resultado baseado no mercado e que, independentemente da opção escolhida, não reproduza as opções e os ajustamentos efetuados pelo consultor fiscal da FFT no relatório em matéria de preços de transferência, que a Comissão considera como desvios ao princípio da plena concorrência. |
(369) |
Mais especificamente, a Comissão não vê qualquer razão para que sejam efetuados ajustamentos aos fundos próprios contabilísticos para efeitos do cálculo do montante de fundos próprios a remunerar. Além disso, no que toca à remuneração de plena concorrência estimada destes fundos próprios, se o recurso ao CAPM pode parecer inutilmente vinculativo, nada obsta a que seja utilizado para efeitos de fixação dos preços de transferência, salvo se for utilizado para se afastar claramente de um resultado baseado no mercado, o que transpareceria na rendibilidade dos capitais próprios observável junto de empresas comparáveis. |
10.3. Entidade junto da qual o auxílio deve ser recuperado
(370) |
À luz das considerações formuladas nos considerandos 341 e 345, a Comissão considera que o Luxemburgo deve, desde logo, recuperar junto da FFT o auxílio ilegal e incompatível com o mercado interno concedido através do ruling fiscal controvertido. Se a FFT não estiver em condições de restituir o montante integral do auxílio obtido através do ruling fiscal controvertido, o Luxemburgo deve recuperar o montante remanescente desse auxílio junto da Fiat Chrysler Automobiles, N.V., que sucedeu à Fiat S.p.A., uma vez que é esta entidade que controla o grupo Fiat, de forma a restabelecer a situação concorrencial que prevalecia anteriormente no mercado. |
11. CONCLUSÃO
(371) |
A Comissão constata que o Luxemburgo, através do ruling fiscal controvertido, concedeu ilegalmente um auxílio estatal à FFT e ao grupo Fiat, em violação do artigo 108.o, n.o 3, do TFUE, que esse auxílio é incompatível com o mercado interno e que, consequentemente, nos termos do artigo 16.o do Regulamento (UE) 2015/1589, deve ser recuperado pelo Luxemburgo junto da FFT e, se esta última não restituir o montante total do auxílio, junto da Fiat Chrysler Automobiles N.V., no montante do auxílio não restituído, |
ADOTOU A PRESENTE DECISÃO:
Artigo 1.o
O ruling fiscal adotado pelo Luxemburgo em 3 de setembro de 2012 a favor da Fiat Finance and Trade Ltd, que permite a esta última fixar a sua matéria coletável no Luxemburgo numa base anual por um período de cinco anos, constitui um auxílio na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, que é incompatível com o mercado interno e que foi executado ilegalmente pelo Luxemburgo em violação do artigo 108.o, n.o 3, do TFUE.
Artigo 2.o
1. O Luxemburgo deve recuperar o auxílio incompatível e ilegal referido no artigo 1.o junto da Fiat Finance and Trade, Ltd.
2. Qualquer montante que não possa ser recuperado junto da Fiat Finance and Trade, Ltd na sequência da recuperação descrita na alínea a) será recuperado junto da Fiat Chrysler Automobiles N.V.
3. Os montantes a recuperar vencem juros desde a data em que foram postos à disposição dos beneficiários até à data da sua recuperação efetiva.
4. Os juros são calculados de acordo com uma base composta, em conformidade com o Capítulo V do Regulamento (CE) n.o 794/2004.
Artigo 3.o
1. A recuperação do auxílio a que se refere no artigo 1.o deve ser imediata e efetiva.
2. O Luxemburgo deve garantir a aplicação da presente decisão no prazo de quatro meses a contar da data da sua notificação.
Artigo 4.o
1. Nos dois meses seguintes à notificação da presente decisão, o Luxemburgo comunica à Comissão as informações relativas ao método utilizado para o cálculo do montante exato do auxílio.
2. O Luxemburgo mantém a Comissão informada sobre a evolução das medidas nacionais adotadas para aplicar a presente decisão até estar concluída a recuperação do auxílio referido no artigo 1.o. A pedido da Comissão, o Luxemburgo transmite de imediato informações sobre as medidas já adotadas e previstas para dar cumprimento à presente decisão.
Artigo 5.o
O Grão-Ducado do Luxemburgo é o destinatário da presente decisão.
Feito em Bruxelas, em 21 de outubro de 2015.
Pela Comissão
Margrethe VESTAGER
Membro da Comissão
(1) Com efeitos a partir de 1 de dezembro de 2009, os artigos 87.o e 88.o do Tratado CE passaram a ser, respetivamente, os artigos 107.o e 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia («TFUE»). As duas séries de disposições são idênticas em termos de substância. Para efeitos da presente decisão, deve entender-se que as referências aos artigos 107.o e 108.o do TFUE são, quando apropriado, referências aos artigos 87.o e 88.o do Tratado CE. O TFUE introduziu igualmente algumas alterações de terminologia, como a substituição de «Comunidade» por «União» e «mercado comum» por «mercado interno». Na presente decisão utiliza-se a terminologia do TFUE.
(2) JO C 369 de 17.10.2014, p. 37.
(3) Referência HT.4020 — Práticas em matéria de ruling fiscal.
(4) Nas suas cartas, as autoridades luxemburguesas utilizam o termo «decisão fiscal antecipada» em vez de «ruling fiscal». Todavia, as duas expressões remetem para um procedimento do mesmo tipo, que confere ao contribuinte um certo grau de certeza quanto à forma como a legislação relativa à tributação das sociedades será aplicada num determinado caso. Na presente decisão, será utilizado o termo «ruling fiscal», mas o seu significado é idêntico ao de «decisão fiscal antecipada».
(5) Com o número de processo SA.37267 (2013/CP) — Práticas em matéria de ruling fiscal — LU.
(6) As autoridades luxemburguesas tinham ocultado informações específicas, designadamente o nome de sociedades e filiais.
(*1) Algumas partes deste texto foram eliminadas para não divulgar informações confidenciais; estas partes são assinaladas através de reticências entre parênteses retos.
(7) No tocante à investigação da Comissão relativa à FFT, a Comissão atribuiu-lhe um novo número de processo e enviou a carta de insistência de 7 de abril de 2014 e todas as comunicações seguintes com o número de processo SA.38375 (2014/CP) — Luxemburgo — Alegado auxílio à FFT.
(8) Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo 93.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (JO L 83 de 27.3.1999, p. 1). O Regulamento (CE) n.o 659/1999 foi revogado pelo Regulamento (UE) 2015/1589, de 13 de julho de 2015, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (JO L 248 de 24.9.2015, p. 9) com efeitos a partir de 14 de outubro de 2015. Todas as medidas processuais adotadas durante o procedimento foram adotadas nos termos do Regulamento (CE) n.o 659/1999. Qualquer referência ao Regulamento (CE) n.o 659/1999 deve ser entendida como uma referência ao Regulamento (UE) 2015/1589 e deve ser lida de acordo com o quadro de correspondência incluído no anexo II deste último.
(9) Ver nota de rodapé 2.
(10) Ver nota de rodapé 2.
(11) Ver considerando 16.
(12) Com o número de processo SA.37267 — Práticas em matéria de ruling fiscal — Luxemburgo.
(13) A carta de 24 de março de 2015 foi transmitida à Comissão no dia 24 de março de 2014 e novamente em 26 de março de 2015.
(14) Consultar o relatório anual da Fiat Chrysler Automobiles relativo ao exercício de 2014. Na presente decisão, as referências feitas à Fiat S.p.A. podem ser entendidas como sendo feitas à Fiat Chrysler Automobiles N.V. e vice-versa.
(15) O relatório em matéria de preços de transferência faz, por vezes, referência à FFT e, por vezes, à «FF&T», designando a mesma entidade.
(16) A descrição das funções exercidas «pela Fiat S.p.A.» contida na versão do ruling fiscal controvertido fornecida pelo Luxemburgo, descrita na decisão de início do procedimento, foi parcialmente ocultada. A menção «pela Fiat S.p.A.» foi aditada a esta descrição, com base na versão não editada deste ruling, fornecida pelo Luxemburgo em 24 de março de 2014.
(17) O relatório sobre os preços de transferência não inclui qualquer justificação para esta declaração.
(18) Todavia, o ruling fiscal controvertido cessará se os factos ou as circunstâncias descritas no pedido se revelarem incompletos ou inexatos, se elementos-chave das transações efetivas divergirem da descrição apresentada no pedido de prestação de informações, ou se o acordo prévio de preços de transferência deixar de estar em conformidade com o direito nacional ou internacional.
(19) Os considerandos 44 a 46 da decisão de início do procedimento fornecem explicações mais aprofundadas das justificações apresentadas pelo consultor fiscal para a escolha do MMLO a fim de determinar o lucro tributável da FFT.
(20) Ver considerando 51.
(21) O CAPM é utilizado para estimar uma taxa de rendimento teórico necessário para os ativos e, mais concretamente, para os capitais próprios. Os considerandos 39 a 42 da decisão de início do procedimento fornecem uma descrição mais pormenorizada do CAPM.
(22) Comité de Basileia de Supervisão Bancária, Convergência internacional do cálculo e dos requisitos de fundos próprios — Quadro revisto, junho de 2004 («Quadro de Basileia II»).
(23) Não sendo a FFT uma entidade regulamentada, a interpretação do Quadro de Basileia II no caso da FFT por parte do consultor fiscal, para efeitos de aprovação do ruling fiscal controvertido, não foi nem examinada, nem validada por uma autoridade de regulamentação das instituições financeiras.
(24) Os «fundos próprios utilizados para exercer as funções» não parecem corresponder a nenhuma categoria regulamentar de fundos próprios especificamente definida.
(25) As expressões «fundos próprios expostos ao risco», «requisitos mínimos de fundos próprios», «fundos próprios mínimos exigidos pelo Quadro de Basileia II», «fundos próprios mínimos expostos ao risco» e «fundos próprios mínimos» são utilizadas indistintamente ao longo do relatório sobre os preços de transferência, mas remetem para o mesmo conceito, nomeadamente, os fundos próprios regulamentares hipotéticos da FFT, consoante estimados pelo consultor fiscal aplicando o Quadro de Basileia II por analogia.
(26) Aos fundos próprios da FFT foi subtraído o valor das participações na FFNA e na FFC, sendo estas últimas remuneradas por dividendos.
(27) Os «fundos próprios que cobrem as funções exercidas» são outra denominação utilizada pelo consultor fiscal para evocar os «fundos próprios utilizados para exercer as funções», expressão introduzida no relatório pelo consultor fiscal.
(28) O percentil 25 dos betas foi utilizado pelo consultor fiscal aquando da aplicação do CAPM, dado que considerou que a FFT suportaria riscos limitados.
(29) Dados compilados pelo Professor A. Damoradan, acessíveis no seguinte endereço eletrónico: http://pages.stern.nyu.edu/~adamodar/
(30) Média anual 2011 do índice EONIA (Euro OverNight Index Average).
(31) Entende-se por participação um investimento nas ações (fundos próprios) de uma sociedade.
(32) Considerando 54.
(33) Disponível no seguinte endereço eletrónico: http://www.impotsdirects.public.lu/legislation/legi11/Circulaire_L_I_R__n___164-2_du_28_janvier_2011.pdf.
(34) Por «sociedade de financiamento de grup», entende-se qualquer entidade que exerça principalmente transações de financiamento intragrupo, com exceção da detenção de participações (Circular, p. 1).
(35) Por «transação de financiamento intragrupo», entende-se qualquer atividade que consista na concessão de empréstimos ou de adiantamento de fundos a empresas associadas, refinanciadas através de meios e instrumentos financeiros como emissões públicas, empréstimos privados, adiantamento de fundos ou empréstimos bancários (Circular, p. 1).
(36) Duas empresas são «empresas associadas», se uma dela participar direta ou indiretamente na administração, no controlo ou no capital da outra, ou se as mesmas pessoas participarem direta ou indiretamente na administração, no controlo ou no capital das duas empresas (Circular, p. 1).
(37) Circular, p. 2.
(38) Ibid.
(39) Ibid.
(40) Circular, p. 3.
(41) Circular, p. 4.
(42) Circular, p. 7.
(43) Circular, pp. 5 a 8.
(44) As administrações fiscais dos países membros da OCDE são incentivadas a seguir estes princípios. Em geral, contudo, estes servem de referência e têm um efeito claro nas práticas fiscais dos países membros (e mesmo não membros) da OCDE.
(45) As administrações fiscais e os legisladores estão cientes deste problema e a legislação fiscal permite, em geral, à administração fiscal corrigir as declarações fiscais de empresas integradas que não apliquem corretamente os preços de transferência, substituindo estes últimos por preços que correspondam a uma aproximação fiável dos preços aceites por empresas independentes que negoceiam em circunstâncias comparáveis em condições de plena concorrência.
(46) Princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência destinados às empresas multinacionais e às administrações fiscais, OCDE, julho de 1995.
(47) Princípios da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência destinados às empresas multinacionais e às administrações fiscais, OCDE, 22 de julho de 2010.
(48) Diretiva 2006/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2006, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e ao seu exercício (JO L 177 de 30.6.2006, p. 1).
(49) Estes valores foram comunicados pelo Luxemburgo nas informações prestadas em 24 de março de 2015. Os valores relativos à matéria coletável não são completamente idênticos aos lucros tributáveis declarados nas contas.
(50) Ver considerando 21 da decisão de início do procedimento.
(51) Ver considerando 24 da decisão de início do procedimento.
(52) Ver o considerando 51 da decisão de início do procedimento para os dados financeiros relativos à FFT para o período 2009-2011 apresentados no relatório sobre preços de transferência. No quadro 8, remete-se para a terminologia utilizada no relatório anual e nas informações comunicadas pela Fiat em 31 de março de 2015, terminologia essa que poderá não corresponder exatamente à utilizada pelo consultor fiscal no relatório sobre preços de transferência.
(53) O Luxemburgo especificou que, para os anos 2011-2013, o prémio de garantia é pago à Fiat S.p.A.; para 2010, esta informação não constava do relatório anual.
(*2) Os números entre parêntesis devem ser lidos em articulação com o prefixo «cerca de». Os números são arredondados em múltiplos de 50, 500, 5 000, 500 000 ou 5 000 000.
(54) «Euro Medium Term Note» — Programa europeu de emissões de títulos do tesouro a médio prazo.
(55) Rendimento do capital próprio.
(56) Decisão 2014/200/UE da Comissão, de 17 de julho de 2013, relativa ao auxílio estatal SA.21233 C/11 (ex NN/11, ex CP 137/06) concedido por Espanha — Regime fiscal aplicável a certos acordos de locação financeira também conhecido por Sistema de arrendamento fiscal espanhol (JO L 114 de 16.4.2014, p. 1).
(57) Decisão 2008/283/CE da Comissão, de 13 de novembro de 2007, relativa ao regime de auxílio criado pela Bélgica a favor dos centros de coordenação estabelecidos neste país e que altera a Decisão 2003/757/CE (JO L 90 de 2.4.2008, p. 7).
(58) Decisão 2006/621/CE da Comissão, de 2 de agosto de 2004, relativa ao auxílio estatal concedido pela França a favor da France Télécom (JO L 257 de 20.9.2006, p. 11).
(59) Tal é explicado no relatório sobre preços de transferência pelo facto de que os investimentos na FFNA e na FFC seriam remunerados através de dividendos.
(60) O Luxemburgo remete, neste sentido, para a comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho e ao Comité Económico e Social Europeu, de 4 de junho de 2014, sobre os trabalhos efetuados pelo Fórum Conjunto da UE em matéria de Preços de Transferência entre julho de 2012 e janeiro de 2014 [COM(2014) 315 final].
(61) É citada a seguinte secção: «49(xv). Foi decidido operar as seguintes deduções sobre os fundos próprios para o cálculo do rácio de fundos próprios ponderado em função dos riscos. Estas deduções incluirão: […] os investimentos nas filiais que tenham uma atividade bancária e financeira que não estejam consolidadas nos sistemas nacionais. A prática normal consistirá em consolidar as filiais para avaliar o nível de fundos próprios dos grupos bancários. Quando essa prática não for seguida, deve-se efetuar uma dedução com vista a evitar a utilização múltipla dos mesmos fundos próprios em diferentes unidades do grupo. Esses investimentos serão deduzidos nos termos do n.o 37 supra. Os ativos que representem participações nas filiais cujo capital foi deduzido do da empresa-mãe não serão incluídos no total dos ativos para efeitos do cálculo do rácio.»
(62) O artigo 57.o estabelece que os fundos próprios não consolidados das instituições de crédito não incluem «as participações noutras instituições de crédito e em instituições financeiras superiores a 10 % do capital dessas instituições».
(63) Tal pode explicar-se pelo nível elevado de integração das atividades do grupo e pelo apoio histórico da Fiat S.p.A. às suas filiais. Segundo a FFT, as agências de crédito utilizam as contas consolidadas do grupo para avaliar a nota de crédito da Fiat S.p.A.
(64) A FFT trabalha apenas com grandes instituições financeiras situadas em países da área do euro, essencialmente nos quais a «opção 1» (a opção que permite uma referência à notação da entidade soberana e não à nota do banco) foi validada pelos supervisores nacionais. Por outro lado, a DRFP III atribui uma ponderação de risco de 0 % para as entidades soberanas que emitem obrigações na sua própria moeda independentemente da sua notação (anexo VI, parte 1, ponto 1.2, n.o 4). Consequentemente, segundo o entendimento que a FFT e [o consultor fiscal] têm do Quadro de Basileia II e das regras da DRFP, uma ponderação de risco inferior à aplicável no Estado no qual o banco opera poderia aplicar-se aos bancos em causa. Essa aplicação do Quadro de Basileia II conduz à seleção da ponderação de risco de 20 % para a exposição da FFT aos bancos. Esta lógica aplica-se simultaneamente aos riscos de crédito e aos riscos de incumprimento pela contraparte da FFT perante os bancos.
(65) Comité de Supervisão Bancária de Basileia, Quadro Regulamentar Internacional do Setor Bancário (Basileia III).
(66) Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (JO L 176 de 27.6.2013, p. 338).
(67) A FFT sustenta este argumento remetendo para o ponto 5.3.2 da Comunicação da Comissão relativa ao imposto sobre as sociedades no mercado interno [COM(2001) 582 final, de 23 de outubro de 2001].
(68) Neste contexto, a FFT faz referência à decisão da Comissão relativa à Umicore [Decisão da Comissão, de 26 de maio de 2010, relativa ao auxílio estatal concedido à Umicore S.A., C 76/2003 (ex NN 68/2003)], onde afirmou que uma vantagem fiscal devia ser «desproporcional» para ser examinada à luz das regras em matéria de auxílios estatais.
(69) Nomeadamente a Decisão da Comissão, de 28 de outubro de 2009, relativa ao auxílio estatal C 10/07 (ex NN 13/07) concedido pela Hungria sob a forma de deduções fiscais dos juros intragrupo («decisão relativa ao regime fiscal dos juros para os grupos na Hungria»).
(70) Decisão 2009/809/CE da Comissão, de 8 de julho de 2009, relativa ao regime groepsrentebox que os Países Baixos pretendem executar [C 4/07 (ex N 465/2006)] (JO L 288 de 4.11.2009, p. 26) («Decisão Groepsrentebox»).
(71) Decisão 2004/77/CE da Comissão, de 24 de junho de 2003, relativa ao regime de auxílios executado pela Bélgica sob a forma de regime fiscal de ruling aplicável às sociedades de vendas americanas (US Foreign Sales Corporations) (JO L 23 de 28.1.2004, p. 14); Decisão 2003/755/CE da Comissão, de 17 de fevereiro de 2003, relativa ao regime de auxílios criado pela Bélgica a favor dos centros de coordenação estabelecidos neste país (JO L 282 de 30.10.2003, p. 25); Decisão 2003/501/CE da Comissão, de 16 de outubro de 2002, relativa ao regime de auxílio estatal C 49/2001 (ex NN 46/2000) — Centros de coordenação — do Luxemburgo (JO L 170 de 9.7.2003, p. 20); Decisão 2004/76/CE da Comissão, de 13 de maio de 2003, relativa ao regime de auxílio estatal executado pela França a favor dos centros gerais de operações e dos centros logísticos (JO L 23 de 28.1.2004, p. 1); Decisão 2003/512/CE da Comissão, de 5 de setembro de 2002, relativa ao regime de auxílios aplicado pela Alemanha a favor dos centros de controlo e de coordenação (JO L 177 de 16.7.2003, p. 17).
(72) Ver acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de setembro de 2010 no Processo C-399/08 P, Comissão/Deutsche Post, ECLI:EU:C:2010:481, n.o 38, e a jurisprudência aí citada.
(73) Ver acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de setembro de 2010 no Processo C-399/08 P, Comissão Europeia/Deutsche Post, ECLI:EU:C:2010:481, n.o 39, e a jurisprudência aí citada.
(74) Ver o acórdão de 15 de novembro de 2011 nos Processos apensos C-106/09 P e C-107/09 P, Comissão/Government of Gibraltar e Reino Unido, ECLI:EU:C:2011:732, n.o 72, e a jurisprudência aí citada.
(75) Ver o acórdão de 17 de setembro de 1980 no Processo 730/79, Philip Morris, ECLI:EU:C:1980:209, n.o 11; e o acórdão de 15 de junho de 2000 nos Processos apensos T-298/97, T-312/97, etc., Alzetta, ECLI:EU:T:2000:151, n.o 80.
(76) Ver acórdão de 3 de março de 2005 no Processo C-172/03, Heiser ECLI:EU:C:2005:130, n.o 40.
(77) Ver acórdão de 8 de setembro de 2011 nos Processos apensos C-78/08 a C-80/08, Paint Graphos e.a. ECLI:EU:C:2011:550.
(78) Ver acórdão de 8 de setembro de 2011 nos Processos apensos C-78/08 a C-80/08, Paint Graphos e.a. ECLI:EU:C:2011:550, n.o 65.
(79) Ver também acórdão de 8 de setembro de 2011 nos Processos apensos C-78/08 a C-80/08, Paint Graphos e.a. ECLI:EU:C:2011:550, n.o 50.
(80) Pertencem a esta categoria as receitas atribuíveis a um estabelecimento estável situado no Luxemburgo, as receitas dos serviços profissionais prestados no país, os dividendos, os juros de empréstimos participativos e os juros das obrigações se o agente pagador for o Estado, uma pessoa singular residente ou uma sociedade residente, bem como as mais-valias geradas com a venda de participações de, no mínimo, 10 % no capital das sociedades residentes (excetuando os fundos de capital de risco).
(81) Em 2012. A majoração de solidariedade passou de 5 % para 7 % a partir do ano fiscal de 2013.
(82) Tendo em conta as alterações introduzidas para o ano fiscal de 2013, a taxa de tributação acumulada das receitas das sociedades passou de 28,80 % para 29,22 % na cidade do Luxemburgo.
(83) Além disso, as sociedades do Luxemburgo estão também sujeitas a um imposto anual sobre o património que incide sobre o seu ativo líquido, que consiste numa contribuição de 0,5 % sobre o valor líquido do património mundial da sociedade em 1 de janeiro de cada ano.
(84) Por exemplo, as despesas de juros sobre ativos que geram receitas isentas ou as senhas de presença, que não decorrem da gestão corrente da sociedade.
(85) Aplica-se o regime de integração fiscal se estiverem preenchidas determinadas condições: a sociedade-mãe detém, direta ou indiretamente, uma participação de pelo menos 95 % no capital da filial desde o início do período contabilístico durante o qual o pedido de aplicação do regime de integração fiscal é apresentado; a filial é uma sociedade de capitais residente plenamente tributável no Luxemburgo; a sociedade-mãe é igualmente uma sociedade de capitais residente plenamente tributável no Luxemburgo ou uma sucursal de uma sociedade não residente plenamente tributável, no seu território de estabelecimento, com um imposto correspondente ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas do Luxemburgo; e o regime de integração fiscal é pedido para um mínimo de cinco anos de exercícios de exploração.
(86) Uma sociedade integrada pode compensar as perdas incorridas em alguns dos seus estabelecimentos com os lucros realizados noutros. O regime de integração fiscal equipara um grupo de sociedades a um único contribuinte, o que permite eliminar os inconvenientes com que os grupos de sociedades são confrontados em relação às sociedades integradas em matéria de tributação dos rendimentos. O regime de integração fiscal não constitui uma medida de auxílio se, quando integrado, o grupo de sociedades não beneficiar de um tratamento mais favorável do que o concedido a uma sociedade integrada.
(87) Regra geral, todas as empresas que auferem rendimentos são consideradas como encontrando-se numa situação factual e jurídica similar do ponto de vista da fiscalidade direta das empresas.
(88) Observações da FFT relativas à decisão de início do procedimento, ponto 2.1.
(89) Observações da FFT relativas à decisão de início do procedimento, ponto 2.1.3.
(90) Ver notas de rodapé 66 e 67.
(91) Ver acórdão de 20 de maio de 2010 no Processo C-138/09, Todaro Nunziatina & C., ECLI:EU:C:2010:291, n.o 21.
(92) O regime previa que o saldo positivo entre os juros recebidos sobre os empréstimos do grupo e os juros pagos no quadro de transações de financiamento intragrupo era tributado num groepsrentebox, à taxa de 5 % em vez da taxa normal de 25,5 % aplicável na altura para o imposto sobre as sociedades.
(93) Decisão Groepsrentebox, considerando 85.
(94) Decisão Groepsrentebox, considerando 101.
(95) Decisão Groepsrentebox, considerando 107.
(96) A Circular estabelece que «no que diz respeito às sociedades de financiamento de grupo, as funções assumidas no âmbito da concessão de empréstimos a entidades do grupo são, quanto ao fundo, comparáveis às funções assumidas pelas instituições financeiras independentes sujeitas à supervisão da Commission de Surveillance du Secteur Financier (CSSF) (Comissão de Supervisão do Setor Financeiro)».
(97) Ver artigo 9.o do modelo de convenção fiscal da OCDE.
(98) Neste caso, a medida previa a possibilidade de as sociedades deduzirem da sua matéria coletável na Hungria 50 % do montante dos juros líquidos recebidos das sociedades que lhes estavam associadas — ou seja, 50 % da diferença entre os juros recebidos dessas sociedades e os que elas lhes pagavam. Em consequência, apenas metade dos juros líquidos recebidos é tributada enquanto, se o sistema fiscal fosse aplicado normalmente, seria tributável a totalidade desse montante. Em contrapartida, a matéria coletável da empresa associada que paga os juros líquidos é acrescida de 50 % do montante total dos juros líquidos pagos. Por conseguinte, em vez de deduzir a totalidade do montante de juros líquidos pagos, como aconteceria se o sistema fiscal fosse aplicado normalmente, essas sociedades apenas podem deduzir metade de sua matéria coletável. Este regime é aplicável unicamente a juros recebidos de empresas associadas e a elas pagos e tem por objetivo diminuir a diferença entre o financiamento através de fundos próprios e o financiamento através de empréstimo intragrupo.
(99) Observações do Luxemburgo relativas à decisão de início do procedimento, ponto 73.
(100) Segundo conjunto de observações da FFT, pontos 2.1.3. e 2.1.4.
(101) Primeiro conjunto de observações da FFT, ponto 60.
(102) Conforme indicado no considerando 206.
(103) Ver acórdão de 4 de junho de 2015 no Processo C-15/14 P, Comissão/MOL, ECLI:EU:C:2015:362, n.o 60. Ver também o acórdão de 26 de fevereiro de 2015 no Processo T-385/12, Orange/Comissão, ECLI:UE:T:2015:117.
(104) Processo C-39/94, SFEI e outros, ECLI:EU:C:1996:285, n.o 60; processo C-342/96, Espanha/Comissão, ECLI:EU:C:1999:210, n.o 41.
(105) Essa vantagem não deve ser «desproporcionada», tal como a FFT argumenta nas suas observações (secções 1.7.1 e 1.7.2). Para que uma vantagem constitua um auxílio estatal, basta que satisfaça as outras condições enunciadas no artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. A decisão relativa à Umicore [Decisão da Comissão, de 26 de maio de 2010, relativa ao auxílio estatal sob a forma de um acordo de transação fiscal concedido pela Bélgica a favor da sociedade Umicore, S.A., C 76/03 (ex NN 69/03)], citada pela FFT, não é relevante no presente caso, dado que a Comissão não está vinculada pela sua prática decisória (ver considerando 202). De qualquer modo, a diferença entre o presente processo e o processo Umicore não permite estabelecer paralelismos entre os dois processos. O processo Umicore dizia respeito à aplicação pela Umicore de isenções de IVA no âmbito de determinadas vendas de prata a empresas estabelecidas noutros Estados-Membros. Em dezembro de 2000, aInspection spéciale des impôts (ISI) (Inspeção Especial dos Impostos) belga concluiu uma transação com a empresa. Tal transação constituía uma prática administrativa da parte das autoridades belgas, mas unicamente na medida em que esta se reportava aos factos em causa e não ao nível da tributação: «Contudo, de acordo com o artigo 84.o do CIVA, tais transações só são possíveis na medida em que não envolvam uma isenção ou uma redução do imposto. Em aplicação deste princípio, uma transação não pode, pois incidir, sobre o montante do imposto, mas unicamente sobre questões de facto» (ponto 154).
(106) Ver Processo 173/73, Itália/Comissão, ECLI:EU:C:1974:71, n.o 13.
(107) Ver, por exemplo, Processo C-387/92, Banco Exterior de Espana, ECLI:EU:C:1994:100.
(108) Ver Processos apensos C-182/03 e C-217/03, Bélgica e Forum 187 ASBL/Comissão, ECLI:EU:C:2006:416.
(109) Ibid.
(110) Decisão da Comissão, de 17 de fevereiro de 2003, relativa ao regime de auxílios criado pela Bélgica a favor dos centros de coordenação estabelecidos neste país (JO L 282 de 30.10.2003, p. 25).
(111) Ver Processos apensos C-182/03 e C-217/03, Bélgica e Forum 187 ASBL/Comissão, ECLI:EU:C:2006:416, n.os 96 e 97.
(112) Ver Processos apensos C-182/03 e C-217/03, Bélgica e Forum 187 ASBL/Comissão, ECLI:EU:C:2006:416, ponto 81.
(113) Observações do Luxemburgo relativas à decisão de início do procedimento, pontos 38 a 40.
(114) Ver considerando 102.
(115) Ver quadro 7.
(116) Ver considerando 64.
(117) Ver considerando 70.
(118) Para uma descrição do MMLO, ver considerando 91.
(119) A Comissão não aceita o argumento da FFT, apresentado no considerando 162, segundo o qual o facto de o MMLO ser cada vez mais frequentemente utilizado justificaria a sua aplicação. Este argumento contradiz a FFT quando esta remete para o n.o 2.2 dos princípios da OCDE, como indicado no considerando 161, segundo o qual «a seleção de um método de preços de transferência visa sempre encontrar o método mais adequado para um caso específico». Este objetivo dos princípios da OCDE não é compatível com a interpretação de que o contribuinte poderia escolher livremente entre os diferentes métodos, não obstante os factos e as circunstâncias do caso em questão.
(120) Tal contrasta com uma situação em que uma sociedade, ainda que concedendo empréstimos intragrupo, limita as suas funções às transações diretas (face to face), para as quais uma sociedade autónoma não aceitaria remunerar terceiros, não tendo tais transações justificação económica isoladamente de outras funções e operações (as transações diretas podem ser utilizadas para cobrir os riscos decorrentes de uma atividade diferente). Consequentemente, tais transações, tal como outras funções, não podem ser comparadas às funções principais de uma instituição financeira. Os seus preços não podem ser determinados corretamente com base nos fundos próprios tendo em conta que, noutros setores, indicadores diferentes, como a rendibilidade dos ativos totais ou a rendibilidade das vendas, podem ser mais adequados.
(121) Ver nota de rodapé 114.
(122) Ver considerandos 58 e 59.
(123) Ver igualmente o considerando 68 da decisão de início do procedimento.
(124) Para outros exemplos de diferenças entre diversos indicadores de lucros baseados nos fundos próprios, ver nomeadamente McKinsey Working Papers on Risk, número 24, «The use of economic capital in performance management for banks», janeiro de 2011, e mais especificamente o gráfico 10, página 13.
(125) No relatório em matéria de preços de transferência, o consultor fiscal obtém uma remuneração do risco de 1 726 000 EUR, ao passo que, se aplicássemos aos fundos próprios contabilísticos da FFT a rendibilidade de 6,05 % dos capitais próprios calculada pelo consultor fiscal, a remuneração do risco seria de 17 392 000 EUR.
(126) Considerando 163.
(127) Ver n.o 2.97 dos princípios da OCDE.
(128) Ver n.o 2.86 dos princípios da OCDE.
(129) A Circular salienta que os prestadores de serviços por ela visados exercem essencialmente funções similares às que são exercidas pelas instituições regulamentadas. A Circular faz também referência a possíveis suplementos que fazem aumentar os encargos associados à concessão de um crédito e que têm em conta a obrigação de respeitar os requisitos em matéria de solvabilidade. Todavia, a Circular não limita os fundos próprios a remunerar a esses requisitos de solvabilidade.
(130) Ver considerando 81.
(131) O recurso à rendibilidade dos fundos próprios regulamentares torna-se mais difícil em termos práticos, devido aos diferentes tipos de fundos próprios regulamentares detidos pelas instituições regulamentadas, como os fundos próprios da categoria 1 e os da categoria 2, ao passo que os capitais próprios são o único tipo de capitais de que a FFT dispõe. Esta complexidade é acentuada no âmbito do Quadro de Basileia III. As instituições financeiras regulamentadas não comunicam geralmente o montante dos seus fundos próprios regulamentares mínimos, mas estes podem ser recalculados indiretamente. O que costumam comunicar é o nível efetivo de fundos próprios regulamentares que detêm, que é sempre mais elevado do que o mínimo exigido. Por fim, a rendibilidade dos capitais próprios ajustada em função do risco, que pode ser considerada idêntica a uma rendibilidade dos fundos próprios regulamentares, é por vezes utilizada pelas instituições regulamentadas para efeitos da fixação dos preços a nível interno. Todavia, nestes casos, é mais utilizada ativo a ativo do que sob a forma de agregado como indicador dos lucros da instituição no seu conjunto e, logo, em princípio, também não é divulgada.
(132) Ver considerando 256.
(133) Ver quadro 6.
(134) FMI WP/12/36, How Risky Are Banks' Risk Weighted Assets? Sonali Das e Amadou N.R. Sy, 2012, p. 6.
(135) Considerandos 58 e 59.
(136) Decisão de início do procedimento, considerando 72.
(137) Considerando 167.
(138) Ibid.
(139) Considerando 98.
(140) Ver considerando 58.
(141) Ver nota de rodapé 136.
(142) Na ausência de dados suficientes para calcular uma estimativa correta dos fundos próprios mínimos regulamentares da FFT, a média do setor teria conduzido a fundos próprios regulamentares mínimos de 427 milhões de EUR (ver considerando 270), o que é superior ao total dos fundos próprios da FFT de 287 milhões de EUR.
(143) Considerando 69 e quadro 1.
(144) Considerando 61.
(145) Considerando 97.
(146) Considerando 96.
(147) Conforme indicado pelo Luxemburgo no considerando 154.
(148) Ver considerando 154.
(149) Ver considerando 95.
(150) Ver considerando 165.
(151) A alavanca é a proporção dos ativos financiados pelos fundos próprios. Dado que o resto dos ativos é financiado pelas dívidas, a alavanca é uma medida de endividamento e, inversamente, de capitalização de uma sociedade.
(152) No caso da FFT, todos os fundos próprios são fundos próprios da categoria 1, uma vez que a FFT não recorre a instrumentos de outras categorias.
(153) Ver considerando 268.
(154) Descrito nos considerandos 121 a 126.
(155) Com base nos dados contabilísticos da FF apresentados no quadro do considerando 114.
(156) Os fundos próprios regulamentares hipotéticos de 427 milhões de EUR seriam igualmente superiores aos fundos próprios de 286 milhões de EUR detidos pela FFT no momento das aquisições da FFNA e da FFC.
(157) O relatório em matéria de preços de transferência data de 2011. Utiliza-se, assim, este período de referência. Por comparação, no período entre 12 de maio de 2012 e 12 de maio de 2014, o fator beta do índice correspondia a 1,3.
(158) Ver o quadro 6 da decisão de início do procedimento.
(159) Ver quadro 4.
(160) Ver considerando 114.
(161) Como se indica no considerando 123.
(162) Ver considerando 155.
(163) Ver considerandos 113 e 114.
(164) Ver quadro no considerando 125.
(165) Banco de Pagamentos Internacionais, 81.o Relatório Anual, 1 de abril de 2010-31 de março de 2011, 26 de junho de 2011, p. 90.
(166) BCE, Relatório sobre a estabilidade financeira, dezembro de 2011, p. 130 (tradução livre).
(167) Deutsche Bank, European Banks: Running the Numbers: Spring edition, 5 de abril de 2011 (tradução livre). No relatório do Deutsche Bank de 20 de março de 2015, a estimativa relativa ao custo implícito dos fundos próprios para os bancos europeus é de 10 %.
(168) Primeiro conjunto de observações da FFT, ponto 64; segundo conjunto de observações da FFT, pontos 1.8.1 e seguintes, ponto 3.1.8.
(169) Principalmente a decisão relativa ao auxílio estatal concedido pela Hungria sob a forma de deduções fiscais dos juros intragrupo.
(170) Ver considerando 202.
(171) Ver também a decisão Groepsrentebox, pontos 80-82; a decisão relativa ao auxílio estatal concedido pela Hungria sob a forma de deduções fiscais dos juros intragrupo, pontos 131 e 132.
(172) Ver Processo C-81/10 P, France Télécom/Comissão, ECLI:EU:C:2011:811, n.o 43; processo C-66/02, Itália/Comissão, ECLI:EU:C:2005:768, n.o 34; ver também Processos apensos T-427/04 e T-17/05, França e France Télécom/Comissão, ECLI:EU:T:2009:474, n.o 207 e n.o 215.
(173) Observações do Luxemburgo relativas à decisão de início do procedimento, ponto 28.
(174) Ver considerando 77.
(175) Primeiro conjunto de observações da FFT, ponto 60; segundo conjunto de observações da FFT, ponto 1.4.
(176) Secção 7.2.1.1.
(177) Circular, pp. 3 e 4.
(178) Observações do Luxemburgo sobre a decisão de início do procedimento, ponto 34.
(179) Observações do Luxemburgo sobre a decisão de início do procedimento, ponto 36.
(180) A numeração corresponde à dos rulings tal como foram comunicados pelo Luxemburgo à Comissão.
(181) Página 34 do relatório da FFT em matéria de preços de transferência.
(182) Ver considerando 83.
(183) Entre estes, dois rulings relativos aos pedidos da FFT e da [sociedade F], ver considerandos 28 e 29.
(184) O pedido da Comissão de 23 de junho de 2015 abrange todos os relatórios em matéria de preços de transferência fornecidos pela sociedade e a comunicação do Luxemburgo de 25 de junho de 2015 não inclui qualquer relatório posterior deste tipo.
(185) Carta do Luxemburgo, de 24 de março de 2015, respondendo à questão n.o 6.
(186) Acórdão nos Processos apensos C-78/08 a C-80/08 Paint Graphos e outros ECLI:EU:C:2011:550, n.o 69.
(187) Acórdão no processo C-170/83, Hydrotherm, ECLI:EU:C:1984:271, n.o 11. Acórdão no processo T-137/02, Pollmeier Malchow/Comissão, ECLI:EU:T:2004:304, n.o 50.
(188) Acórdãos no processo C-480/09 P, AceaElectrabel Produzione SpA/Comissão Europeia, ECLI:EU:C:2010:787, n.oss 47 a 55, e no processo C-222/04, Cassa di Risparmio di Firenze SpA e outros. ECLI:EU:C:2006:8, n.o 112.
(189) Ver considerando 110.
(190) Ver considerando 34.
(191) Ver, por analogia, o n.o 11 do acórdão no processo 323/82, Intermills, ECLI:EU:C:1984:345, que estipula o seguinte: «Decorre das informações fornecidas pelas próprias demandantes que, após a restruturação, tanto a sociedade Intermills como as três sociedades industriais são controladas pela Região da Valónia e que, após a transferência das instalações de produção para as três sociedades recém-constituídas, a sociedade continua a deter interesses nessas sociedades. Importa pois constatar que, não obstante o facto de as três sociedades industriais possuírem cada uma individualidade jurídica distinta da antiga sociedade Intermills, todas estas sociedades formam em conjunto um único grupo, em todo o caso no que se refere ao auxílio concedido pelas autoridades belgas […].»
(192) Ver considerando 48.
(193) As derrogações previstas no artigo 107.o, n.o 2, do TFUE — que dizem respeito aos auxílios de natureza social atribuídos a consumidores individuais, aos auxílios destinados a remediar os danos causados por calamidades naturais ou por outros acontecimentos extraordinários e os auxílios atribuídos à economia de certas regiões da República Federal da Alemanha — não são aplicáveis neste caso concreto.
(194) Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho, de 13 de julho de 2015, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (JO L 248 de 24.9.2015, p. 9).
(195) Regulamento (CE) n.o 794/2004 da Comissão, de 21 de abril de 2004, relativo à aplicação do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho que estabelece as regras de execução do artigo 93.o do Tratado CE (JO L 140 de 30.4.2004, p. 1).
(196) Observações do Luxemburgo relativamente à decisão de início do procedimento, pontos 104 e seguintes. O Luxemburgo cita o ponto 19 do relatório do grupo «Código de Conduta» (fiscalidade direta das empresas) ao Conselho (ECOFIN), que refere o seguinte (em inglês): «With respect to the Luxembourg tax measure concerning companies engaged in intra-group financing activities the Group discussed the agreed description at the meeting on 17 February 2011. Luxembourg informed the Group that Circular No 164/2 dated 28 January 2011 determines the conditions for providing advance pricing agreements confirming the remuneration of the transactions. At the meeting on 11 April 2011, Luxembourg informed that Group that Circular No 164/2 bis dated 8 April 2011 ensured that advance confirmations granted prior to the entry into force of Circular No 164/2 would cease to be valid by 31 December 2011. With the benefit of this information, the Group agreed that there was no need for this measure to be assessed against the criteria of the Code of Conduct.»
(197) Ver os acórdãos no Processo C-5/89, Comissão/República Federal da Alemanha, ECLI:EU:C:1990:320, n.o 17, e no Processo C-310/99, República Italiana/Comissão, ECLI:EU:C:2002:143, n.o 104.
(198) Ver o acórdão no Processo T-67/94, Ladbroke Racing/Comissão, ECLI:EU:T:1998:7,n.o 183; ver também o acórdão nos Processos apensos T-116/01 e T-118/01, P&O European Ferries (Vizcaya) SA e Diputación Foral de Vizcaya/Comissão, ECLI:EU:T:2003:217, n.o 202.
(199) Ver os acórdãos no Processo T-290/97, Mehibas Dordtselaan/Comissão, ECLI:EU:T:2000:8, n.o 59 e nos Processos apensos C-182/03 e C-217/03, Bélgica e Forum 187 ASBL/Comissão, ECLI:EU:C:2006:416, n.o 147.
(200) Conclusões do Conselho ECOFIN de 1 de dezembro de 1997 em matéria de política fiscal (JO C 2 de 6.1.1998, p. 1). Ver também os documentos disponíveis no seguinte endereço: http://ec.europa.eu/taxation_customs/taxation/company_tax/harmful_tax_practices/index_fr.htm
(201) Ver, a este propósito, as conclusões do advogado-geral Léger no processo C-217/03, Bélgica e Forum 187 ASBL/Comissão, ECLI:EU:C:2006:89, n.o 376.
(202) No protocolo adicional n.o 1 à Convenção relativa à OCDE, de 14 de dezembro de 1960, os signatários da Convenção acordaram que a Comissão Europeia participa nos trabalhos da organização. Os representantes da Comissão Europeia participam, ao lado dos membros, nas discussões relativas ao programa de trabalho da OCDE e são associados aos trabalhos do conjunto da organização e dos seus diferentes órgãos. Todavia, embora a participação da Comissão Europeia seja bem mais alargada do que a de um observador, esta última não dispõe de qualquer direito de voto nem participa oficialmente na adoção dos instrumentos que são submetidos ao Conselho para adoção.
(203) Decisão da Comissão, de 11 de julho de 2001, no processo C 47/2001 (ex NN 42/2000) — Alemanha: Centros de controlo e de coordenação de empresas estrangeiras (JO C 304 de 30.10.2001, p. 2). Decisão 2003/501/CE.
(204) Ver nota de rodapé 105.
(205) Embora seja no contexto de uma «impossibilidade de recuperar» e não de uma «dificuldade em quantificar o montante do auxílio».
(206) Acórdão nos Processos apensos T-427/04 e T-17/05, França/Comissão, ECLI:EU:T:2009:474, n.o 297.
(207) Acórdão nos Processos apensos T-427/04 e T-17/05, França/Comissão, ECLI:EU:T:2009:474, n.o 299.
(208) Comunicação da Comissão sobre a aplicação das regras relativas aos auxílios estatais às medidas que respeitam à fiscalidade direta das empresas (JO C 384 de 10.12.1998, p. 3).
(209) Acórdão no Processo C-441/06, Comissão/França, ECLI:EU:C:2007:616, n.o 29 e a jurisprudência aí citada.
(210) Ver, em particular, os considerandos 308 a 311.
22.12.2016 |
PT |
Jornal Oficial da União Europeia |
L 351/68 |
DECISÃO (UE) 2016/2327 DA COMISSÃO
de 5 de julho de 2016
relativa ao auxílio estatal SA. 19864 — 2014/C (ex 2009/NN54) concedido pela Bélgica — Financiamento dos hospitais públicos IRIS na Região de Bruxelas-Capital
[notificada com o número C(2016) 4051]
(Apenas fazem fé os textos nas línguas francesa e neerlandesa)
(Texto relevante para efeitos do EEE)
A COMISSÃO EUROPEIA,
Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 108.o, n.o 2, primeiro parágrafo (1),
Tendo em conta o Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, nomeadamente o artigo 62.o, n.o 1, alínea a),
Após ter convidado as partes interessadas a apresentarem as suas observações em conformidade com as referidas disposições (2) e tendo em conta essas observações,
Considerando o seguinte:
1. PROCEDIMENTO
(1) |
Por cartas de 7 de setembro de 2005 e de 17 de outubro de 2005, registadas, respetivamente, a 12 de setembro de 2005 e 19 de outubro de 2005, a Comissão recebeu uma denúncia contra o Estado belga no que respeita à alegada concessão, desde 1995, de auxílios ilegais e incompatíveis com o mercado interno aos cinco hospitais públicos (3) (a seguir, «hospitais IRIS») (4) da rede IRIS (5) (a seguir, «IRIS») da Região de Bruxelas-Capital. A denúncia foi apresentada por duas associações [a Coordination bruxelloise d'institutions sociales et de santé (CBI) e a Association bruxelloise des institutions de soins privées (ABISP)] que representam os hospitais geridos por pessoas coletivas de direito privado (a seguir, «hospitais privados») bem como por vários dos seus membros, a título individual (6). |
(2) |
A denúncia incidia sobre os seguintes conjuntos de argumentos: i) a ausência ou falta de clareza na definição e atribuição das missões específicas de serviço público exclusivamente impostas aos hospitais IRIS, mas não aos hospitais privados de Bruxelas; ii) a compensação pelas autoridades públicas das perdas dos hospitais IRIS; iii) a sobrecompensação dos custos relacionados com as missões de serviço público dos hospitais IRIS através do Fonds régional bruxellois de refinancement des trésories communales; iv) a falta de transparência no método de financiamento público dos hospitais IRIS; e, por último, v) a subsidiação cruzada das atividades não hospitalares dos hospitais IRIS através das compensações recebidas pelo exercício das suas missões hospitalares (7). |
(3) |
Na sequência das informações complementares transmitidas pelas autoridades belgas em 10 de janeiro de 2008, os serviços da Comissão transmitiram por carta aos autores da denúncia o seu parecer preliminar sobre a mesma (8) e convidaram os interessados a apresentarem novas informações que lhes permitissem reexaminar essa apreciação preliminar; caso contrário, considerar-se-ia que a denúncia tinha sido retirada. Após receberam a resposta dos autores da denúncia, os serviços da Comissão confirmaram a sua apreciação preliminar por carta de 10 de abril de 2008. |
(4) |
Posteriormente, os autores da denúncia informaram a Comissão de que tinham interposto no Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (que, a partir de 1 de dezembro de 2009, se passou a denominar Tribunal Geral da União Europeia, a seguir «Tribunal Geral») um recurso de anulação da carta de 10 de janeiro de 2008, que consideravam ser uma decisão da Comissão (9). Além disso, em 20 de junho de 2008, os autores da denúncia interpuseram um recurso de anulação da carta dos serviços da Comissão de 10 de abril de 2008 (10). Os dois processos intentados no Tribunal Geral foram suspensos por este até 31 de outubro de 2009, visto que a Comissão o informou de que tencionava adotar uma decisão ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho (11). Com vista à adoção desta decisão, os serviços da Comissão solicitaram informações complementares às autoridades belgas, bem como aos autores da denúncia. |
(5) |
Na sua decisão de 28 de outubro de 2009 (12) (a seguir «Decisão da Comissão de 2009», ver também secção 4.1), a Comissão decidiu não levantar objeções ao auxílio ao financiamento dos hospitais públicos da rede IRIS da Região de Bruxelas-Capital, por o financiamento em causa ter sido considerado compatível com o mercado interno à luz das condições estabelecidas na Decisão 2005/842/CE da Comissão (13) («Decisão SIEG de 2005»), bem como, diretamente, à luz do artigo 86.o, n.o 2, do Tratado CE (atual artigo 106.o, n.o 2, do TFUE), no que diz respeito às missões de serviço público atribuídas antes da entrada em vigor da Decisão SIEG de 2005, em 19 de dezembro do mesmo ano. |
(6) |
Subsequentemente, os autores da denúncia interpuseram perante o Tribunal Geral um recurso de anulação desta decisão da Comissão. Este anulou a decisão da Comissão por acórdão de 7 de novembro de 2012, no processo T-137/10 (14) (ver também secção 4.2), considerando que a mesma tinha sido adotada em violação dos direitos processuais dos autores da denúncia. O Tribunal Geral concluiu, em particular, que a Comissão devia ter expressado dúvidas quanto à compatibilidade das medidas examinadas com o mercado interno, tendo em conta os argumentos apresentados pelos autores da denúncia a esse propósito. Concluiu, por conseguinte, que a Comissão era obrigada a dar início ao procedimento formal de investigação, a fim de obter qualquer elemento pertinente para a apreciação da compatibilidade do conjunto das medidas de auxílio em causa com o mercado interno, bem como para permitir aos autores da denúncia e às outras partes interessadas apresentar as suas observações no âmbito do referido procedimento (15). |
(7) |
Por carta de 1 de outubro de 2014, a Comissão informou a Bélgica da sua decisão de dar início ao procedimento previsto no artigo 108.o, n.o 2, do TFUE relativamente às medidas de financiamento público dos hospitais IRIS da Região de Bruxelas-Capital. |
(8) |
A decisão da Comissão de dar início ao procedimento (a seguir «decisão de início do procedimento») foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia (16). A Comissão convidou os interessados a apresentarem as suas observações sobre as medidas em causa. |
(9) |
Por carta de 22 de outubro de 2014, as autoridades belgas solicitaram uma prorrogação do prazo para apresentarem as suas observações em resposta à decisão de início do procedimento. A Comissão concedeu essa prorrogação por carta de 23 de outubro de 2014. Em 1 de dezembro de 2014, foi solicitada, por correio eletrónico, uma nova prorrogação do prazo, que a Comissão concedeu por carta de 2 de dezembro de 2014. Por carta de 16 de dezembro de 2014, o Reino da Bélgica apresentou as suas observações sobre a decisão de início do procedimento. |
(10) |
A Comissão recebeu observações de partes interessadas (ver secção 5, infra) em 15 de dezembro de 2014, 5 de janeiro de 2015 e 9 de janeiro de 2015. Por cartas de 13 e 20 de fevereiro de 2015, a Comissão transmitiu estas observações à Bélgica, que teve a oportunidade de se pronunciar a seu respeito. As observações da Bélgica foram recebidas por carta de 13 de março de 2015, registada em 17 de março de 2015. |
(11) |
Nessa base, a Comissão reapreciou o processo e interpretou alguns dos seus elementos de forma diferente relativamente à apreciação formulada na sua decisão anulada de 2009. |
2. CONTEXTO
(12) |
Os hospitais IRIS operam num ambiente legislativo e regulamentar complexo, determinado por diversas autoridades públicas. Uma apreciação global da conformidade do financiamento público de que estes hospitais beneficiam com as regras em matéria de auxílios estatais exige, em primeiro lugar, uma descrição sucinta do quadro legislativo e regulamentar aplicável aos hospitais IRIS. Esta descrição inclui uma apresentação da Lei CPAS (com base na qual os hospitais IRIS foram criados), um breve historial da criação dos hospitais IRIS, um resumo dos documentos legislativos e de outra natureza que regem as atividades destes hospitais, uma descrição sucinta das suas principais atividades e uma enumeração dos diversos mecanismos de financiamento aplicáveis. |
2.1. O direito à assistência social e a Lei CPAS
(13) |
Na Bélgica, o direito à assistência social é um direito constitucional. O artigo 23.o da Constituição belga, em especial, dispõe o seguinte: «Todas as pessoas têm o direito de ter uma vida compatível com a dignidade humana. Para o efeito, a lei, o decreto ou a regra a que o artigo 134.o se refere garantem, tendo simultaneamente em conta as obrigações correspondentes, os direitos económicos, sociais e culturais, e determinam as condições do seu exercício. Estes direitos incluem, nomeadamente: […]
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(14) |
O acesso efetivo dos cidadãos à assistência social é essencialmente regido pela lei orgânica de 8 de julho de 1976 (17) (a «Lei CPAS») que institui os centros públicos de ação social («CPAS»). Trata-se de organismos públicos dotados de personalidade jurídica e presentes em todos os municípios belgas. Os CPAS são dirigidos por um conselho cujos membros são eleitos pelo conselho municipal do município em causa. Nos termos do artigo 1.o da Lei CPAS: «Todas as pessoas têm direito à assistência social. O seu objetivo é permitir que cada pessoa tenha uma vida compatível com a dignidade humana. São criados centros públicos de assistência social que, nas condições definidas pela presente lei, têm a missão de assegurar tal assistência». |
(15) |
Na prática, o CPAS presta assistência social às pessoas que não dispõem dos recursos necessários para terem uma vida compatível com a dignidade humana e que não podem beneficiar de outras formas de segurança social (por exemplo, do subsídio de desemprego). Neste contexto, o artigo 57.o, n.o 1, da Lei CPAS especifica que o CPAS tem por missão garantir às pessoas e às famílias o auxílio devido pela autarquia e descreve essa missão da seguinte forma: «Assegura não apenas um auxílio paliativo ou curativo, mas ainda um auxílio preventivo. Incentiva a participação social dos utentes. […] Esse auxílio pode ser material, social, médico, médico-social ou psicológico.» |
(16) |
Cada CPAS é obrigado a prestar assistência social às pessoas e às famílias, mas dispõe de um certo poder discricionário quanto à forma como essa assistência é prestada. Mais precisamente, pode prestá-la:
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(17) |
Nestes dois últimos casos, o CPAS delega as suas obrigações de assistência social (ou parte delas) unicamente na medida em que essa delegação é compatível com a finalidade do estabelecimento colaborador. Por um lado, se o estabelecimento for criado pelo CPAS, este último controla a sua finalidade. Em contrapartida, caso se trate de um estabelecimento completamente distinto (estabelecimento terceiro), a colaboração será limitada pela finalidade desse estabelecimento. |
(18) |
A obrigação jurídica imposta ao CPAS de prestar assistência social, quer se trate de um auxílio material, social, médico ou psicológico, é idêntica, independentemente de o CPAS prestar esse auxílio diretamente ou por intermédio de estabelecimentos que cria ou com os quais colabora. O artigo 57.o da Lei CPAS impõe ao CPAS (e unicamente a este) a obrigação de prestar essa assistência em todos os casos. Qualquer tipo de delegação constitui uma forma de execução desta obrigação e não isenta o CPAS da sua responsabilidade de cumprir, e continuar a cumprir, a sua obrigação. |
(19) |
Os requisitos aplicáveis nos casos em que um CPAS queira criar um estabelecimento ou um serviço (por exemplo, um hospital) com o objetivo de cumprir a sua missão de assistência social, ou parte dela, estão definidos no artigo 60.o, n.o 6, da Lei CPAS: «O centro público de assistência social cria, quando tal se revela necessário e, se for caso disso, no âmbito de uma programação existente, estabelecimentos ou serviços de caráter social, curativo ou preventivo, desenvolve-os e gere-os. A necessidade da criação ou do desenvolvimento de um estabelecimento ou serviço deve resultar de um processo que inclua uma análise das necessidades do município e/ou da região e dos estabelecimentos ou serviços semelhantes que já estão em funções, uma descrição do funcionamento, uma avaliação precisa do preço de custo e das despesas a efetuar, bem como, se possível, informações que permitam estabelecer uma comparação com estabelecimentos ou serviços semelhantes. A criação ou o desenvolvimento de estabelecimentos ou serviços suscetíveis de beneficiarem de subvenções a nível dos investimentos ou do funcionamento, só podem ser decididos com base num processo que demonstre que as condições previstas na legislação ou na regulamentação orgânica aplicável à concessão destas subvenções serão respeitadas. Sem prejuízo das autorizações de outras autoridades públicas que devam ser obtidas, a decisão de criar ou desenvolver um estabelecimento ou um serviço, desde que seja suscetível de implicar uma intervenção a cargo do orçamento municipal ou um aumento da mesma, está sujeita à aprovação do conselho municipal.» |
(20) |
A obrigação imposta pelo artigo 57.o da Lei CPAS de prestação de assistência (social, médica, médico-social ou psicológica) às pessoas e às famílias é:
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(21) |
Com base no princípio da autonomia municipal, cada CPAS, no respetivo município, toma as suas decisões autonomamente, em conformidade com a Lei CPAS, sobre a forma mais adequada de cumprir a sua obrigação de assistência social (incluindo médica). A opção constitucional de organizar a assistência social a nível municipal também é orientada pelo desejo e pela necessidade de adotar uma política de assistência social o mais próxima possível da população. Quando um CPAS decide criar um estabelecimento de cuidados de saúde de caráter curativo para responder às necessidades da população local, o estabelecimento assim criado é simultaneamente regido pela Lei CPAS e pelo quadro regulamentar federal aplicável a todos os hospitais (ver considerando 32), seja qual for o seu estatuto (público ou privado), e que garante um sistema organizacional comum em todo o país. Todavia, ao contrário dos hospitais privados, o principal objetivo dos hospitais criados por um CPAS, como os hospitais IRIS, é contribuir permanentemente para a prestação de assistência social. A natureza exata das obrigações impostas aos hospitais IRIS nesta matéria (ver também secção 7.3.4.1 infra) é definida nos estatutos dos hospitais IRIS e nos planos estratégicos da IRIS, em conformidade com a Lei CPAS (e nomeadamente com os seus artigos 120.o e 135.o-D). |
(22) |
Por último, por força do artigo 106.o da Lei CPAS, os municípios são obrigados a cobrir o défice dos seus CPAS quando estes não dispõem de meios suficientes para cobrir as despesas relacionadas com as suas obrigações de assistência social. |
2.2. A criação dos hospitais IRIS
(23) |
Como se explicou anteriormente (ver considerando 15), a assistência social prestada pelo CPAS inclui a assistência médica e médico-social, e pode ter um caráter tanto preventivo como curativo. Pode ser prestada quer i) diretamente pelo CPAS, quer ii) por intermédio de terceiros (por exemplo, um hospital privado), respeitando a sua autonomia jurídica, quer ainda, iii) sobretudo se o CPAS quiser controlar a forma como esses objetivos são alcançados, através da criação de um estabelecimento ou de um serviço incumbido de cumprir parte da sua missão (a qual será, então, definida nos estatutos desse estabelecimento ou serviço e, no caso dos hospitais IRIS, nos planos estratégicos da IRIS (ver considerandos 16 e 21). A fim de executarem a sua missão de assistência médica, os CPAS criaram e continuam a (co-)gerir hospitais em várias cidades e municípios belgas. |
(24) |
No passado, os CPAS dos cinco municípios de Bruxelas em causa (18) prestavam eles próprios uma assistência social de caráter médico e médico-social através de oito hospitais públicos (19) repartidos por oito locais diferentes. Esses hospitais eram diretamente geridos pelos respetivos CPAS e não tinham personalidade jurídica. Por conseguinte, era claro que contribuíam para satisfazer a obrigação de assistência social dos CPAS a que estavam ligados. No entanto, durante a primeira metade da década de 1990, os poderes públicos de Bruxelas consideraram que os défices estruturais destes hospitais punham em perigo a sua sustentabilidade. Decidiram, assim, reestruturar os hospitais públicos de Bruxelas para garantir a sua sustentabilidade e viabilidade a longo prazo. |
(25) |
A primeira etapa dessa reestruturação foi iniciada em 19 de maio de 1994, com a assinatura de um acordo de cooperação em matéria de política hospitalar entre o Governo federal belga, a Região de Bruxelas-Capital e a Commission communautaire commune bruxelloise. O acordo previa a aplicação de um pacto de reestruturação destinado a garantir a sustentabilidade dos serviços hospitalares públicos e locais. Como indica o artigo 2.o desse acordo de cooperação: «O presente pacto de reestruturação deve cumprir as seguintes condições:
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(26) |
Para o efeito, o preâmbulo do acordo de cooperação refere o seguinte: «Considerando que o défice financeiro registado pelas instituições hospitalares públicas situadas no território da Região de Bruxelas-Capital atingiu, efetivamente, proporções preocupantes; Que, apesar de vários planos de consolidação, o equilíbrio financeiro destas instituições se revela extremamente precário e conduz ao endividamento estrutural dos orçamentos municipais; Considerando que, nestas condições, há que incentivar a criação de mecanismos de coordenação e cooperação entre os municípios e os centros públicos de assistência social e associações criadas em aplicação do capítulo XII da Lei orgânica dos centros públicos de assistência social responsáveis pelas diversas instituições hospitalares públicas situadas na Região de Bruxelas-Capital, de 8 de julho de 1976; Considerando que tais mecanismos de coordenação e cooperação são suscetíveis de assegurar a sustentabilidade dos hospitais públicos, encorajando as sinergias em matéria de equipamentos e infraestruturas, bem como dos seus meios de gestão e desenvolvimento, e de contribuir para corrigir o défice dos orçamentos municipais; Considerando que o presente acordo em nada altera as regras de financiamento dos hospitais, visando apenas corrigir o défice estrutural que afeta os centros públicos de assistência social e os municípios.» (21) |
(27) |
Foi nesta base que, em 22 de dezembro de 1995, a Commission communautaire commune bruxelloise adotou um despacho que inseria um capítulo XII-A na versão da Lei CPAS aplicável à Região de Bruxelas-Capital. Os trabalhos preparatórios desse despacho (22) remetem para o acordo de cooperação de 19 de maio de 1994 (ver considerando 25), cujo principal objetivo era garantir, através da reestruturação proposta, a sustentabilidade dos hospitais públicos de Bruxelas (23). |
(28) |
A reestruturação baseou-se, essencialmente, nos seguintes elementos:
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(29) |
Nos termos do capítulo XII da Lei CPAS, cada uma das associações hospitalares locais é criada com base em estatutos que definem, entre outros aspetos, o seu objeto, os direitos e deveres dos seus membros, bem como os seus órgãos de decisão (27). Cada associação tem uma assembleia geral e um conselho de administração, nos quais estão representadas as diversas partes que criaram a associação (ver considerando 28), mas os representantes dos poderes públicos (ou seja, o município e o CPAS) detêm a maioria dos lugares nestes órgãos de decisão (28). Não subsiste qualquer dúvida de que todos os hospitais IRIS são controlados pelos poderes públicos. Do mesmo modo, os municípios e o CPAS dispõem de uma ampla maioria na assembleia geral e no conselho de administração da estrutura matriz IRIS. |
(30) |
O capítulo XII-A da Lei CPAS estabelece, nomeadamente, as regras de controlo e de tutela administrativa aplicáveis às associações hospitalares locais. Mais precisamente, a organização matriz IRIS é obrigada a elaborar um plano estratégico que envolva as associações locais criadas ao abrigo do capítulo XII. Com base neste plano, cada associação hospitalar local deve elaborar planos de gestão e planos financeiros e submetê-los à aprovação da IRIS (ver artigo 135.o-D da Lei CPAS). Além disso, as associações hospitalares locais devem pedir autorização à IRIS antes de tomarem certas decisões importantes (ver artigo 135.o-E) e estão sujeitas a um controlo trimestral da IRIS (ver artigo 135.o-G). A IRIS também designa um comissário para cada associação hospitalar local, o qual assiste às reuniões dos órgãos de decisão destas associações e tem direito de veto sobre as decisões que não estejam conformes com as decisões tomadas pela IRIS (ver artigo 135.o-H). |
(31) |
Por último, tal como se explica nos considerandos 31 e 32 da decisão de início do procedimento, a reestruturação dos hospitais públicos de Bruxelas supervisionados e geridos pelos CPAS incluía igualmente uma componente financeira. Mais precisamente, através do Fonds régional bruxellois de refinancement des trésories communales («FRBRTC»), a Região de Bruxelas-Capital concedeu um empréstimo de 4 mil milhões de francos belgas (cerca de 100 milhões de EUR), por um período de 20 anos, aos municípios que gerem um hospital público (por meio dos respetivos CPAS) (29). Estes municípios transferiram seguidamente estes fundos para os seus hospitais públicos, a fim de cobrirem parte do seu passivo financeiro (30). Em 6 de junho de 1996, a Região de Bruxelas-Capital decidiu não exigir o reembolso do empréstimo e dos juros, desde que os acordos relativos à reestruturação fossem integralmente aplicados e os planos financeiros respeitados. |
2.3. O quadro regulamentar aplicável aos hospitais IRIS
(32) |
Resulta claramente da secção precedente que os hospitais IRIS foram criados com base na Lei CPAS para permitir que os CPAS respeitassem as suas obrigações em matéria de assistência social. Por conseguinte, estes hospitais são principalmente regidos pela Lei CPAS. Todavia, enquanto hospitais, estão igualmente sujeitos à Lei coordenada sobre os hospitais (LCH) (31), de 7 de agosto de 1987, cujo artigo 147.o (atual artigo 163.o da LCH na sua versão de 10 de julho de 2008) (32) dispõe o seguinte: «Relativamente aos hospitais geridos por um Centro Público de Assistência Social e aos médicos que trabalham nestes hospitais, as disposições da presente lei coordenada completam a lei orgânica de 8 de julho de 1976 dos Centros Públicos de Assistência Social e, muito em especial, os artigos 48.o, 51.o, 52.o, 53.o, 54.o, 55.o, 56.o e 94.o desta lei.» |
(33) |
A LCH define, nomeadamente, os tipos de hospitais que podem ser aprovados oficialmente (33); as condições de gestão de um hospital e a estruturação da atividade médica (34); a programação hospitalar (35); as normas e condições de aprovação dos hospitais e dos serviços hospitalares (36); as relações jurídicas entre um hospital e os médicos hospitalares, o estatuto pecuniário dos mesmos, incluindo, nomeadamente, a cobrança e a fixação dos honorários, o conteúdo destes e a afetação dos honorários cobrados a nível central (37). |
(34) |
Além disso, os hospitais IRIS também estão sujeitos às regras estabelecidas pelos estatutos das associações hospitalares locais, as quais especificam a finalidade dos hospitais IRIS, bem como os direitos e deveres dos membros da associação (ver também considerando 29). |
(35) |
Por último, as associações hospitalares locais estão sob a tutela da organização matriz IRIS, o que limita a sua capacidade de tomar autonomamente certas decisões financeiras e de gestão (ver considerando 30). Importa notar que a organização matriz IRIS adota planos estratégicos plurianuais que envolvem as associações hospitalares locais, como prevê o artigo 135.o-E da Lei CPAS. |
(36) |
Em conclusão, o quadro regulamentar em que os hospitais IRIS operam é composto pela Lei CPAS, pela LCH, pelos estatutos das associações hospitalares locais e pelos planos estratégicos vinculativos adotados pela organização matriz IRIS. |
2.4. Atividades principais dos hospitais IRIS
(37) |
A atividade principal dos hospitais IRIS consiste em prestar serviços hospitalares aos doentes da Região de Bruxelas-Capital. Os hospitais IRIS empregam quase 10 000 pessoas no total, asseguram mais de um milhão de consultas por ano e constituem o maior serviço de urgências da Bélgica. Prestam serviços médicos completos em todos os grandes domínios da medicina. Dois deles são especializados em disciplinas específicas (o Hôpital universitaire des enfants Reine Fabiola em pediatria e o Institut Bordet em oncologia). |
(38) |
Além dos serviços médicos, os hospitais IRIS asseguram uma série de atividades sociais acessórias. Em particular, os assistentes sociais dos hospitais IRIS prestam auxílio aos doentes mais desfavorecidos e suas famílias, na resolução e gestão de dificuldades administrativas, financeiras, relacionais e sociais. |
(39) |
Os cinco hospitais IRIS fornecem atualmente os seus serviços médicos e os serviços sociais conexos através de uma rede de onze centros situados em Bruxelas. Estes centros estão repartidos por seis municípios (a saber, Anderlecht, a cidade de Bruxelas, Etterbeek, Forest, Ixelles e Schaerbeek). |
(40) |
Os hospitais IRIS descrevem a sua missão da seguinte forma: «[d]esde o nascimento até ao fim da vida, os nossos hospitais estão ao serviço de todos, em todos os momentos da sua existência, sejam quais forem os seus problemas de saúde.» (38). Dez dos 11 centros hospitalares IRIS estão localizados em municípios onde o rendimento médio não ultrapassa o rendimento mediano (39) da Região de Bruxelas-Capital. Com base numa classificação estabelecida pelo serviço público federal de saúde pública (ver quadro relativo a esta classificação no considerando 185), os três grandes hospitais IRIS que prestam serviços completos [CHU Saint-Pierre, CHU Brugmann e hospitais Iris Sud (HIS)] são aqueles cujos doentes têm o perfil socioeconómico mais vulnerável da Bélgica. Esta situação é ainda confirmada pelo facto de, em 2012, quase 11 % dos doentes admitidos no CHU Saint-Pierre e no CHU Brugmann não estarem cobertos pelo seguro de saúde obrigatório na Bélgica, nem terem condições para pagar o seu tratamento, e de 15 % dos doentes destes hospitais (também) dependerem do apoio do CPAS. |
(41) |
Por último, os hospitais IRIS asseguram também várias atividades acessórias (por exemplo, o transporte de doentes em ambulâncias entre hospitais, uma creche/jardim de infância para os filhos dos seus trabalhadores, casas de saúde e de repouso para pessoas idosas, escolas de enfermagem, investigação, infraestruturas residenciais com serviços, estabelecimentos de cuidados psiquiátricos, uma loja para os doentes e as visitas, o aluguer de televisores aos doentes, o aluguer de quartos a terceiros, uma cantina e infraestruturas de estacionamento). Estas atividades acessórias representam apenas uma percentagem muito modesta do conjunto de atividades dos hospitais IRIS, como demonstrado pela sua reduzida contribuição (menos de 2 %, em média) para as receitas totais dos hospitais IRIS. |
(42) |
No total, estas atividades representam os custos e receitas dos hospitais IRIS. Os custos incorridos por estes são igualmente determinados, adicionalmente às suas atividades específicas, pelo seu estatuto de hospitais públicos, que lhes impõe vários constrangimentos a que os hospitais privados não estão sujeitos. Os custos operacionais incorridos pelos hospitais IRIS no âmbito dos seus serviços de interesse económico geral («SIEG») e das atividades acessórias são acrescidos, em particular, por fatores como:
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(43) |
Estes custos residuais devem ser suportados pelos hospitais IRIS e não estão cobertos por outras fontes de financiamento público (como por exemplo o BMF, ver considerando 46, alínea a)). |
2.5. Os mecanismos de financiamento e os mecanismos contabilísticos dos hospitais IRIS
2.5.1. Mecanismos de financiamento
(44) |
O princípio fundamental de financiamento dos hospitais IRIS está previsto no artigo 46.o (47) dos estatutos de cada uma das cinco associações hospitalares locais (ver considerandos 28-29), os quais dispõem o seguinte: «Sem prejuízo do artigo 109.o da Lei de 7 de agosto de 1987 sobre os hospitais, o resultado do exercício é imputado por deliberação da Assembleia Geral, entre os associados que disponham de, pelo menos, um quinto dos votos nesta assembleia» (48) Nesta base, os municípios e o CPAS são obrigados a absorver a totalidade do défice dos hospitais IRIS, declarado nas suas contas financeiras. Além disso, por força do artigo 106.o da Lei CPAS, os municípios são obrigados a cobrir todo e qualquer défice gerado pelos seus CPAS (ver considerando 22). Em consequência, os municípios (diretamente e devido à sua obrigação de financiamento dos respetivos CPAS) garantem, em última instância, a sustentabilidade dos hospitais IRIS, cobrindo a totalidade dos défices que estes hospitais são suscetíveis de gerar. |
(45) |
É evidente que a medida em que os municípios e os CPAS devem intervir para cobrir os eventuais défices gerados pelos hospitais IRIS, ao abrigo do artigo 46.o dos respetivos estatutos, depende da capacidade destes hospitais para cobrir os seus custos através de outras fontes de financiamento. |
(46) |
A LCH descreve cinco fontes de financiamento a que tanto os hospitais públicos como os hospitais privados podem aceder em pé de igualdade. As despesas de exploração dos hospitais belgas são essencialmente cobertas pelas três primeiras (49), enquanto a quarta e a quinta dizem respeito às despesas de investimento dos hospitais.
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(47) |
O artigo 109.o da LCH (atual artigo 125.o da LCH na sua versão de 10 de julho de 2008 (58)) prevê um mecanismo de financiamento complementar de que só os hospitais públicos (como os hospitais IRIS) podem beneficiar. Ao abrigo desta disposição, os défices dos hospitais públicos decorrentes das suas atividades hospitalares devem ser cobertos pelos municípios que os controlam (através do seu CPAS ou de uma estrutura central como a IRIS). O princípio da cobertura (parcial) dos défices pelos municípios já constava da lei anterior à LCH, ou seja, da Lei de 23 de dezembro de 1963 (59), e foi confirmado pelo artigo 34.o da Lei de 28 de dezembro de 1973 (60). Os critérios a ter em conta na fixação dos défices que os municípios são obrigados a cobrir são definidos por decreto real (61). Nessa base, o ministro federal da Saúde Pública determina anualmente o montante dos défices de cada hospital público. Na prática, o défice a cobrir determinado pelo ministro não é exatamente equivalente ao défice constatado nas contas de gestão do hospital, dado que certos elementos dos custos (por exemplo, o resultado das atividades não hospitalares que, como se explica no considerando 155 (62), são puramente acessórias em relação às atividades hospitalares no caso dos hospitais IRIS) nelas contidos são excluídos do défice coberto pelo artigo 109.o da LCH. |
(48) |
Em conclusão, os hospitais IRIS beneficiam de um mecanismo de financiamento integral que garante a cobertura de qualquer défice que possam gerar. As cinco medidas gerais de financiamento previstas pela LCH (ver considerando 46) cobrem a maioria dos custos de exploração e de investimento dos hospitais. Na medida em que estas fontes não são suficientes para cobrir os custos relacionados com as atividades destes hospitais, o artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS obriga os municípios a cobrirem integralmente todo e qualquer défice gerado pelos hospitais IRIS (ver considerandos 44-45). O défice contabilístico coberto pelo artigo 46.o dos estatutos inclui obrigatoriamente o «défice coberto pelo artigo 109.o da LCH» (63) (ver considerando 47). Ao cobrirem inteiramente o défice contabilístico, os municípios satisfazem também a obrigação que lhes incumbe por força do artigo 109.o da LCH. As modalidades de pagamento deste mecanismo de compensação do défice serão descritos abaixo (ver secção 7.3.5). |
2.5.2. Obrigações contabilísticas
(49) |
Todos os hospitais (públicos e privados) estão sujeitos a obrigações em matéria de contabilidade e transparência. Especificamente, cada hospital deve manter uma contabilidade distinta, que indique o preço de custo de cada serviço e respeite certos elementos da Lei de 17 de julho de 1975 (64) relativa à contabilidade e às contas anuais das empresas (65). As atividades não hospitalares devem ser registadas em contas separadas. Os hospitais são igualmente obrigados a designar um auditor incumbido de certificar a sua contabilidade e as suas contas anuais (66). Por último, são obrigados a comunicar determinadas informações (financeiras) ao ministro federal da Saúde Pública (67), cujo serviço público federal da saúde pública está incumbido de controlar o cumprimento das disposições da LCH (68). |
3. DESCRIÇÃO DAS MEDIDAS VISADAS PELA DENÚNCIA
(50) |
Os autores da denúncia alegam que a Região de Bruxelas-Capital decidiu assumir, de facto, o papel que cabia aos municípios de Bruxelas no que respeita à compensação dos défices dos hospitais IRIS. Mencionam especificamente as intervenções do Fonds régional bruxellois de refinancement des trésories communales («FRBRTC»), criado pela Região de Bruxelas-Capital (69). Acrescentam ainda que a própria Região de Bruxelas-Capital também teria concedido aos municípios subsídios especiais (70) (de até 10 milhões de EUR por ano, desde 2003), os quais consideravam ter sido pagos aos hospitais IRIS a título de auxílio. |
(51) |
Embora os autores da denúncia não questionem a competência da Região de Bruxelas-Capital em relação aos municípios, consideram que aquilo que qualificam de financiamento regional dos hospitais IRIS ultrapassa a cobertura dos défices prevista pelo artigo 109.o da LCH (ver também considerando 47). Afirmam ainda que os hospitais IRIS beneficiaram amplamente dos financiamentos regionais concedidos aos municípios onde estão situados e que esses financiamentos não podem ser justificados com base nas disposições da LCH. Os autores da denúncia não referem a obrigação de cobertura dos défices prevista no artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS. |
(52) |
Finalmente, os autores da denúncia mencionam a concessão de cerca de 100 milhões de EUR através do FRBRTC, no contexto da reestruturação dos hospitais públicos de Bruxelas que levou à criação dos hospitais IRIS (ver também secção 2.2). Essa operação, segundo afirmam, implicou uma sobrecompensação dos hospitais IRIS. |
4. MOTIVOS PARA DAR INÍCIO AO PROCEDIMENTO
4.1. A Decisão da Comissão de 2009
(53) |
Como já foi dito (ver considerando 5), em 28 de outubro de 2009 a Comissão adotou uma decisão de não levantar objeções (71), concluindo que o financiamento público dos hospitais IRIS na Região de Bruxelas-Capital constituía um auxílio estatal compatível com o mercado interno, a título de compensação pela prestação de serviços de interesse económico geral. A Comissão baseou esta decisão na Decisão SIEG de 2005, bem como, diretamente, no artigo 86.o, n.o 2, do Tratado CE (atual artigo 106.o, n.o 2, do TFUE). |
(54) |
Na sua decisão, a Comissão considerou que os hospitais IRIS estavam encarregados de três missões de serviço público hospitalares: em primeiro lugar, a missão hospitalar geral que incumbe a qualquer hospital (público ou privado) por força da LCH (72); em segundo lugar, a obrigação de tratar todos os doentes em todas as circunstâncias, incluindo em situações em que não existe urgência (73); e, em terceiro lugar, a obrigação de prestar cuidados de saúde hospitalares completos em múltiplos locais (74). Além disso, a Comissão concluiu que os hospitais IRIS estavam incumbidos da missão de serviço público não hospitalar de prestar assistência social complementarmente aos cuidados médicos (75). Finalmente, a decisão faz também referência à obrigação de bilinguismo (76). Considerou-se que estas missões tinham sido confiadas aos hospitais IRIS pela LCH, a Lei CPAS, os planos estratégicos da IRIS e, finalmente, por uma convenção assinada pelos hospitais IRIS e os CPAS. A Comissão considerou igualmente que os parâmetros de compensação tinham sido fixados ex ante (77) e que existiam procedimentos suficientes para impedir e corrigir as sobrecompensações (78). Por último, a Comissão observou também, com satisfação, que os hospitais IRIS mantinham contas separadas para as suas atividades hospitalares e não hospitalares (79), garantindo deste modo a inexistência de subsidiação cruzada das atividades comerciais (para além dos SIEG) dos hospitais IRIS (80). |
(55) |
A Comissão analisou também se os hospitais IRIS tinham recebido sobrecompensações no passado (ou seja, entre 1996 e 2007) (81), concluindo que isso não tinha acontecido (82). Para além da apreciação das medidas de financiamento no seu conjunto, a Comissão examinou também um alegado mecanismo de pagamentos antecipados. Dado que a compensação ao abrigo do artigo 109.o da LCH era frequentemente paga com grande atraso, que podia chegar a 10 anos, os hospitais IRIS teriam recebido adiantamentos sobre esses pagamentos pendentes através do FRBRTC. A Comissão concluiu que, na medida em que os alegados adiantamentos tinham de ser, de qualquer modo, reembolsados após o pagamento da compensação do défice, em conformidade com o artigo 109.o da LCH, não podiam levar a uma sobrecompensação dos hospitais IRIS (83). |
4.2. O acórdão de anulação do Tribunal Geral de 2012
(56) |
Em resposta à Decisão de 2009 da Comissão, os autores da denúncia intentaram uma ação de anulação dessa decisão perante o Tribunal Geral (84). Segundo afirmavam, a Comissão tinha violado os seus direitos processuais ao não dar início a um procedimento formal de investigação, na medida em que a Comissão deveria ter constatado a existência de dificuldades sérias aquando do exame em causa (85). |
(57) |
No seu acórdão de 7 de novembro de 2012 no processo T-137/10, o Tribunal Geral anulou a Decisão de 2009 da Comissão e concluiu que esta era obrigada a dar início ao procedimento formal de investigação (86). |
(58) |
O Tribunal Geral começou por se debruçar sobre a questão de saber se os hospitais IRIS tinham sido incumbidos de missões de serviço público claramente definidas (87). Em primeiro lugar, salientou que todas as partes eram unânimes em considerar que a LCH incumbia todos os hospitais, públicos e privados, de uma missão de serviço público geral (88). A única dúvida prendia-se, assim, com a questão de saber se a Comissão tinha cometido um erro ao concluir, na sua análise preliminar, que os hospitais IRIS estavam incumbidos de missões de serviço público, hospitalares e não hospitalares, suplementares (89). O Tribunal Geral concluiu que existiam dúvidas quanto à questão de saber se as disposições em que a Comissão baseou a sua decisão eram suficientes para encarregar os hospitais IRIS das missões suplementares de tratar quaisquer doentes, em quaisquer circunstâncias (90), prestar cuidados de saúde hospitalares em múltiplos locais (91) e assegurar serviços sociais adicionais (92). Além disso, no que respeita à alegada missão de prestar cuidados de saúde hospitalares em múltiplos locais, o Tribunal Geral indicou que era difícil discernir em que aspeto essa missão diferia dos requisitos gerais de programação e de funcionamento aplicáveis a todos os hospitais sujeitos à LCH (93). |
(59) |
O Tribunal Geral debruçou-se, em seguida, sobre a questão de saber se a Comissão tinha demonstrado a existência de parâmetros de compensação claros (94). No que toca às missões hospitalares, o Tribunal Geral examinou o mecanismo de compensação do défice baseado no artigo 109.o da LCH (95), salientando que os autores da denúncia não tinham contestado esse mecanismo (96), bem como o alegado mecanismo de financiamento regional através do FRBRTC, instituído com o propósito de adiantar temporariamente os montantes necessários para cobrir os défices dos hospitais IRIS, antes de a cobertura dos défices prevista no artigo 109.o da LCH se concretizar (97). No que diz respeito ao artigo 109.o, o Tribunal Geral considerou que os autores da denúncia não tinham apresentado argumentos que pusessem em causa a avaliação positiva da Comissão relativamente a esse artigo (98). Em contrapartida, no que respeita aos alegados adiantamentos pagos através do mecanismo do FRBRTC, o Tribunal Geral concluiu que a Comissão não tinha identificado os parâmetros de cálculo desses adiantamentos (99) e que, por conseguinte, não tinha procedido a um exame completo dos mesmos (100). Acrescentou ainda que a Comissão contradiz a sua própria decisão ao afirmar, nas audiências, que o FRBRTC era apenas um mecanismo que servia para a Região de Bruxelas-Capital financiar os municípios de Bruxelas, e não os hospitais IRIS (101). |
(60) |
Quanto ao financiamento público da alegada missão social complementar dos hospitais IRIS (102), o Tribunal Geral realçou que, também neste caso, o financiamento parecia provir do FRBRTC, que tinha celebrado com os municípios de Bruxelas em causa um acordo de concessão de um subsídio especial para lhes permitir financiar as missões sociais asseguradas pelos ditos hospitais (103). Concluiu ainda que esse acordo não especificava os parâmetros prévios de compensação relativos às alegadas missões sociais complementares dos hospitais IRIS (104). |
(61) |
Seguidamente, o Tribunal Geral avaliou se a Comissão tinha demonstrado a existência de um procedimento para evitar as sobrecompensações e a inexistência de qualquer sobrecompensação (105). O Tribunal Geral concluiu, em primeiro lugar, que a LCH oferecia garantias suficientes para que o procedimento previsto no seu artigo 109.o não levasse a sobrecompensações (106). Concluiu também que a Comissão não tinha demonstrado a existência de um mecanismo similar em relação ao alegado pagamento de adiantamentos pelos municípios (107), realçando, em particular, a aparente ausência de uma obrigação legal de reembolso desses adiantamentos pelos hospitais IRIS, quando recebem o financiamento dos seus défices ao abrigo do artigo 109.o da LCH (108). Em relação aos subsídios especiais que a Comissão afirma serem destinados a financiar a missão social complementar, o Tribunal Geral considerou que as apreciações da Comissão sobre as modalidades que permitem evitar a sobrecompensação no âmbito do financiamento das missões sociais eram insuficientes (109). |
(62) |
Relativamente à questão de saber se os hospitais IRIS beneficiaram de uma sobrecompensação na prática (110), o Tribunal Geral limitou-se a observar que a extensão da análise era muito importante e abrangia a totalidade dos resultados financeiros dos hospitais IRIS durante um período de mais de dez anos (111). Sem se pronunciar especificamente sobre a conclusão da Comissão segundo a qual não tinha havido sobrecompensação, o Tribunal Geral considerou que a amplitude e a complexidade da apreciação feita pela Comissão constituíam, em si mesmas, um indício em apoio da tese dos autores da denúncia relativa à existência de dificuldades sérias (112). |
(63) |
Por último, os autores da denúncia alegaram que a Comissão devia ter tido em conta, nas suas apreciações, o critério da eficácia económica do prestador de SIEG (113). Todavia, o Tribunal Geral rejeitou este argumento e concluiu que: «o critério ligado à eficácia económica de uma empresa no fornecimento do SIEG não cabe na apreciação da compatibilidade de um auxílio de Estado tendo em conta o artigo 86.o, n.o 2, CE [atual artigo 106.o, n.o 2, do TFUE], pelo que a opção quanto à eficácia económica do operador público efetuada pelas autoridades nacionais não pode, portanto, ser criticada neste ponto.» (114) |
(64) |
Resumindo as suas conclusões, o Tribunal Geral afirmou o seguinte: «[A autora da denúncia] invocou um conjunto de indícios concordantes que demonstram a existência de dúvidas sérias quanto à compatibilidade das medidas examinadas tendo em conta os critérios relativos à aplicação do artigo 86.o, n.o 2, CE [atual artigo 106.o, n.o 2, do TFUE], no que diz respeito, em primeiro lugar, à existência de um mandato claramente definido relativo às missões de serviço público hospitalares e sociais, específicas dos hospitais IRIS, em segundo lugar, à existência de parâmetros de compensação previamente estabelecidos e, em terceiro lugar, à existência de modalidades que permitem evitar a sobrecompensação no âmbito do financiamento dessas missões de serviço público […].» (115) |
4.3. A decisão de início do procedimento da Comissão, de 1 de outubro de 2014 (116)
(65) |
À luz das conclusões do Tribunal Geral (117), segundo as quais a Comissão devia ter tido dúvidas quanto à compatibilidade do financiamento público controvertido dos hospitais IRIS com o mercado interno, com base no artigo 106.o, n.o 2, do TFUE, a Comissão tinha o dever de iniciar o procedimento formal de investigação, o que fez por decisão de 1 de outubro de 2014. Na sua decisão de início do procedimento, a Comissão observou que, de acordo com as autoridades belgas, os municípios e os CPAS de Bruxelas em causa optaram por impor aos hospitais IRIS, mas não aos hospitais privados, as seguintes obrigações adicionais (118), que justificam as medidas de compensação do défice adotadas a favor dos hospitais IRIS:
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(66) |
Tendo em conta as dúvidas expressas pelo Tribunal Geral (119), a Comissão convidou as autoridades belgas, os autores da denúncia e qualquer outra parte interessada a comunicarem todas as informações pertinentes para verificar a compatibilidade do financiamento público controvertido com o mercado interno, nomeadamente no que respeita aos seguintes aspetos:
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(67) |
A Comissão também aproveitou a adoção da decisão de início do procedimento para tentar obter esclarecimentos sobre as seguintes questões factuais suplementares:
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5. OBSERVAÇÕES DAS PARTES INTERESSADAS
(68) |
A Comissão recebeu observações de quatro partes interessadas (CBI, ABISP, Zorgnet Vlaanderen e UNCPSY), que a seguir se resumem: |
5.1. A CBI
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Em resposta à decisão de início do procedimento, a CBI, autora da denúncia, observa que, no seu entender, esta decisão não contém qualquer elemento ou argumento novo, nem qualquer nova explicação que permita confirmar a existência de uma missão especificamente confiada aos hospitais IRIS ou esclarecer os mecanismos de compensação dessa alegada missão e os controlos adotados neste contexto. A autora da denúncia refere-se assim, principalmente, aos argumentos apresentados nas suas observações anteriores. |
(70) |
A CBI confirma a sua posição de que: 1) os hospitais IRIS não estão incumbidos de SIEG específicos, complementares das missões impostas a todos os hospitais belgas (públicos ou privados) e 2) mesmo que a Comissão concluísse que existiam missões complementares deste tipo, estas não estão definidas de forma suficientemente clara para satisfazer os requisitos da legislação da União nesta matéria. A CBI observa igualmente que a proposta de programa político do novo governo de Bruxelas (publicado em julho de 2014) prevê «alterar o Despacho de 13 de fevereiro de 2003 para especificar as missões de interesse municipal que justificam a concessão de subsídios específicos aos municípios». Os autores da denúncia consideram que esta redação indica que atualmente não existe nenhuma missão desse tipo, mas que tais missões seriam definidas futuramente. |
(71) |
No que respeita aos requisitos do artigo 60.o, n.o 6, da Lei CPAS, a CBI entende que estes nada acrescentam à LCH em termos de definições de SIEG adicionais ou específicos que sejam unicamente aplicáveis a hospitais públicos como os hospitais IRIS. A autora da denúncia afirma ainda que a missão social complementar parece consistir apenas num volume de serviços sociais superior ao assegurado por outros hospitais e que designa como «missão social básica (comum aos hospitais públicos e privados)». No seu entender, isso não é suficiente para considerar que os hospitais IRIS têm uma missão social complementar. Além do mais, no que respeita à questão de saber se estes serviços têm um caráter económico, a CBI afirma que o facto de serem assegurados gratuitamente não os priva do seu caráter económico. Por último, a CBI considera que os serviços sociais complementares são indissociáveis de um vasto serviço de cuidados de saúde, que possui indubitavelmente um caráter económico intrínseco, o qual nunca foi questionado. |
(72) |
Segundo a CBI, a missão de cuidados universais aplica-se tanto aos hospitais privados como aos hospitais públicos. No seu entender, não deveria haver qualquer diferença entre hospitais públicos e privados no que diz respeito ao tratamento dos «pacientes sociais», tanto em situações de urgência como de «pós-urgência». Neste contexto, a CBI refere um acórdão do Tribunal de Primeira Instância de Bruxelas (120) sobre o apoio médico urgente (121) aos estrangeiros que estejam em situação irregular na Bélgica (a seguir designados por «migrantes sem documentos»), o qual demonstraria que, neste contexto, esse apoio pode ser prestado tanto por hospitais públicos como por hospitais privados. A CBI acrescenta que, segundo uma publicação (122) de 2004 das Mutualités Chrétiennes (123), os hospitais privados prestam assistência a mais de 60 % dos «pacientes sociais» da Região de Bruxelas-Capital. A autora da denúncia entende também que nenhuma missão adicional é imposta pela Lei CPAS, pelos planos estratégicos da IRIS nem pelas convenções relativas ao «domicílio de socorro» (124). |
(73) |
Quanto à «missão em múltiplos locais», a CBI considera que ainda não foi explicado o teor exato da obrigação de oferecer cuidados de saúde hospitalares completos «em múltiplos locais», nem em que medida essa obrigação impõe encargos adicionais aos hospitais IRIS. Relativamente à missão social complementar, a CBI entende que o artigo 57.o da Lei CPAS não impõe obrigações suplementares aos hospitais IRIS e que, em qualquer caso, não as define de forma clara (tal como não o fazem os planos estratégicos da IRIS nem as convenções relativas ao «domicílio de socorro»). |
(74) |
No que respeita à questão de uma definição clara dos parâmetros de compensação, a CBI observa que, segundo as autoridades belgas, os hospitais IRIS cumprem uma missão específica, distinta da dos hospitais privados, e que essa missão específica não está definida na LCH, assentando noutra base jurídica. Segundo a CBI, está claramente excluído que a LCH possa definir os parâmetros de compensação relativos a uma ou mais missões de serviço público que ela não prevê. Além disso, a CBI salienta que não existe nenhuma correspondência entre as alegadas bases jurídicas das missões específicas em causa e os mecanismos de compensação. A autora da denúncia observa que, aparentemente, não se faz qualquer distinção entre os défices decorrentes dos custos das alegadas missões específicas e os défices resultantes dos custos da missão básica. Por último, a CBI refere vários pareceres da Inspeção das Finanças belga, que concluem ser impossível controlar a utilização dos subsídios especiais concedidos com base no Despacho de 13 de fevereiro de 2003, uma vez qur esse despacho não especifica as tarefas de interesse municipal para as quais esses subsídios são concedidos. |
(75) |
A CBI reitera ainda as suas afirmações anteriores de que não foi tomada qualquer medida para evitar a sobrecompensação. Acrescenta que, na ausência de uma definição precisa das missões específicas dos hospitais IRIS, é impossível determinar que atividades devem ou não ser objeto de compensação. Por conseguinte, na opinião da CBI, é impossível verificar a existência de um mecanismo de controlo que permita evitar as sobrecompensações. |
(76) |
Finalmente, a CBI realça que, embora a sustentabilidade dos hospitais públicos seja referida no acordo de cooperação de 19 de maio de 1994, este documento não define nenhuma missão desse tipo nem constitui um ato de atribuição de mandato. A CBI considera, em particular, que esse acordo não obriga os municípios ou as cidades a possuírem um hospital público no seu território, nem fixa qualquer regra relativa à programação dos serviços hospitalares na Bélgica que exija a exploração de determinados serviços num hospital público. |
5.2. A ABISP
(77) |
A Association bruxelloise des institutions de soins privées (ABISP), uma das autoras iniciais da denúncia (ver considerando 1), afirma, nas suas observações relativas à decisão de início do procedimento, que todos os hospitais belgas, independentemente dos seus estatutos ou dos seus proprietários, são obrigados por lei a cumprir uma missão de interesse geral. A ABISP refere, neste contexto, o artigo 2.o da LCH (125). Por último, a ABISP recorda que retirou a sua denúncia. |
5.3. A Zorgnet Vlaanderen
(78) |
A Zorgnet Vlaanderen representa mais de 500 prestadores flamengos de cuidados de saúde (tais como hospitais gerais, clínicas psiquiátricas e lares de terceira idade). Nas suas observações sobre a decisão de início do procedimento, a Zorgnet Vlaanderen sublinha que todos os hospitais belgas, públicos ou privados, estão sujeitos às mesmas obrigações de serviço público no âmbito da LCH. Menciona ainda que a LCH não define quaisquer condições relativas à forma jurídica (organismo público ou privado) necessária para que um estabelecimento seja reconhecido como hospital. Além disso, a Zorgnet Vlaanderen observa que a definição das obrigações de serviço público dos hospitais não faz referência a uma especificidade regional. Por último, afirma que os hospitais da Flandres e da Região de Bruxelas-Capital não cumprem uma missão social diferente. |
5.4. A UNCPSY
(79) |
A Union Nationale des Cliniques Psychiatriques Privées (UNCPSY) é a federação das clínicas psiquiátricas privadas de França. Nas suas observações relativas à decisão de início do procedimento, a UNCPSY afirma que, para determinar se o financiamento público não ultrapassa o custo líquido do serviço público, este custo não pode ser ilimitado. Além disso, no seu entender, essa apreciação deve ter em conta a qualidade da gestão do prestador de serviços. Neste contexto, a UNCPSY entende que a Comissão devia comparar os hospitais públicos e privados, a fim de determinar se o auxílio é proporcionado, na aceção do artigo 106.o, n.o 2, do TFUE. |
(80) |
Neste contexto, a Comissão constata que as observações da UNCPSY são contrárias à conclusão formulada pelo Tribunal Geral no n.o 300 do seu acórdão de 7 de novembro de 2012 (T-137/10), segundo as quais a eficácia económica de uma empresa no fornecimento do SIEG não cabe na apreciação, a título do artigo 106.o, n.o 2, do TFUE, da compatibilidade do financiamento público recebido pela empresa à luz das regras em matéria de auxílios estatais (ver, a este respeito, o considerando 63). |
6. OBSERVAÇÕES DO REINO DA BÉLGICA
6.1. Observações da Bélgica sobre a decisão de início do procedimento
(81) |
Na sua resposta à decisão da Comissão de 1 de outubro de 2014 e, em especial, ao considerando 17 dessa decisão, as autoridades belgas observam que as intervenções financeiras da Região de Bruxelas-Capital (ou seja, os subsídios especiais num montante máximo de 10 milhões de EUR por ano) e do FRBRTC eram transferências financeiras unicamente concedidas aos municípios e não aos hospitais IRIS. Consequentemente, as autoridades belgas consideram que se trata de transferências financeiras entre autoridades públicas, não abrangidas pelo artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. Segundo afirmam, nem a Região de Bruxelas-Capital, nem o FRBRTC concederam qualquer auxílio aos hospitais IRIS. No seu entender, estas transferências tiveram lugar no âmbito das competências da Região em matéria de financiamento geral dos municípios, as quais lhes permitem cumprir as suas missões de interesse geral e, nomeadamente, as missões do CPAS. Neste contexto, as referências dos autores da denúncia aos pareceres da Inspeção das Finanças dizem unicamente respeito à Região de Bruxelas-Capital e aos municípios, mas não aos hospitais IRIS. Finalmente, as autoridades belgas afirmam que, com base na lei especial de 8 de agosto de 1980, relativa às reformas institucionais, e no parecer do Conselho de Estado belga (126), a Região de Bruxelas-Capital só pode financiar os municípios e não os hospitais IRIS, uma vez que o financiamento de missões hospitalares específicas não é uma competência da Região. |
(82) |
Quanto às dúvidas expressas no considerando 26 da decisão de início do procedimento, as autoridades belgas esclarecem a diferença entre a exigência do artigo 60.o, n.o 6, da Lei CPAS, por um lado, e as possibilidades de encerramento de um hospital público com o mecanismo de programação hospitalar, por outro. Segundo afirmam, o artigo 60.o, n.o 6, da Lei CPAS (127) estabelece as condições que devem ser respeitadas para que um CPAS possa fundar um hospital. Nomeadamente, um CPAS deve analisar se o hospital é realmente necessário, tendo em conta as necessidades da região, sobretudo as suas necessidades médico-sociais, e a presença de infraestruturas similares. As autoridades belgas sublinham igualmente que, através do mecanismo de programação hospitalar, o Governo federal determina o número máximo de camas de hospital por região, baseando a sua decisão exclusivamente nas necessidades hospitalares identificadas, sem ter em conta o nível de necessidades sociais em cada região (128). As autoridades belgas explicam que, para a Região de Bruxelas-Capital, o número máximo de camas de hospital é determinado para a região no seu conjunto e não para cada um dos 19 municípios, tomados individualmente. Em contrapartida, cada um dos 19 CPAS da Região de Bruxelas-Capital decide autonomamente se deve ou não criar um hospital no seu município em função das necessidades locais. |
(83) |
As autoridades belgas explicaram também que o encerramento de um hospital público ou a sua transferência para um parceiro do setor privado não são regidos de modo formal ou específico pela LCH ou pela Lei CPAS (129). Todavia, segundo afirmam, a jurisprudência do Conselho de Estado belga esclareceu as modalidades e condições de encerramento e/ou de transferência de estabelecimentos criados por um CPAS. No Acórdão n.o 113.428 de 9 de dezembro de 2002, o Conselho de Estado ordenou a anulação da transferência de uma casa de saúde pertencente a um CPAS para um operador privado. Considerou, em particular, que era necessário avaliar a necessidade de prestar serviços médico-sociais antes de tomar a decisão de encerrar ou transferir um estabelecimento. Essa avaliação deve tomar devidamente em consideração a avaliação efetuada aquando da criação do estabelecimento, bem como todas as alterações efetuadas desde que tal decisão foi tomada. As autoridades belgas referem ainda que essa avaliação não pode basear-se exclusivamente na situação financeira do estabelecimento, nem nos custos incorridos com a sua manutenção. Nesta base, concluem que um CPAS não pode encerrar o seu hospital sem ter determinado previamente se as necessidades médicas e sociais que levaram à sua criação deixaram de existir. |
(84) |
Segundo as autoridades belgas, a criação de um hospital público tem de respeitar simultaneamente as obrigações previstas no artigo 60.o, n.o 6, da Lei CPAS e a programação hospitalar dos poderes públicos, enquanto aos hospitais privados só se aplica a programação. Nos termos do artigo 60.o, n.o 6, da Lei CPAS, a abertura de um novo hospital público deve ser justificada pela existência de uma necessidade real. Além disso, as autoridades belgas explicam que, se for aberto um hospital público com uma capacidade igual ao número de camas previsto pela programação hospitalar, deixa de haver lugar para outro hospital (público ou privado) na zona, no âmbito desta programação, não existindo, portanto, qualquer resposta alternativa às necessidades da população. As autoridades belgas observam que se, a dado momento, um CPAS quiser encerrar o seu hospital público, deve certificar-se primeiramente de que esse hospital deixou de ser necessário à luz da jurisprudência do Conselho de Estado. Ao contrário de um CPAS, um operador privado que decida encerrar o seu hospital não é obrigado por lei a garantir que a população continua a beneficiar de cuidados de saúde. No entender das autoridades belgas, um hospital privado permanece aberto apenas por decisão própria e pode mudá-la a qualquer momento. A título de exemplo, citam o encerramento repentino do Hôpital français, um hospital privado de Berchem-Sainte-Agathe (Bruxelas), em 2008 (130). Para concluir, as autoridades belgas explicam que o mecanismo de programação hospitalar limita a liberdade de criar um hospital tanto para os operadores públicos como para os privados (sendo a sua criação unicamente possível se o número máximo de camas na zona ainda não tiver sido atingido). Segundo afirmam, porém, as obrigações decorrentes da Lei CPAS impõem aos CPAS restrições suplementares em matéria de abertura e de encerramento de um hospital público, enquanto os hospitais privados podem encerrar em qualquer momento. |
(85) |
Quanto às obrigações que, alegadamente, só são aplicáveis aos hospitais IRIS (ver considerandos 87 a 89 da decisão de início do procedimento), as autoridades belgas afirmam que tais obrigações decorrem diretamente do facto de os hospitais IRIS terem sido criados com o intuito de contribuírem para a assistência social prestada pelo CPAS (ver secção 2.2). No seu entender, estas obrigações resultam da Lei CPAS, ao abrigo da qual os hospitais IRIS foram criados, e são impostas a estes hospitais pelos respetivos estatutos e pelos planos estratégicos da IRIS. As autoridades belgas remetem igualmente para estes documentos no que respeita à definição exata das obrigações. Por uma questão de concisão e para evitar repetições, a Comissão citará apenas as passagens pertinentes na sua apreciação (ver secção 7.3.4.1). |
(86) |
Na decisão de início do procedimento (ver considerando 48), a Comissão manifestou dúvidas quanto ao caráter económico ou não económico dos serviços sociais complementares prestados pelos hospitais IRIS. Na sua resposta a esta decisão, as autoridades belgas consideram que estes serviços sociais não têm um caráter económico. Afirmam, essencialmente, que a assistência social prestada pelos CPAS de Bruxelas sob a forma de auxílio material, social, médico, médico-social e psicológico não se insere num mercado concorrencial, e que esta situação não se altera apesar de parte da assistência social (ou seja, os serviços sociais complementares) ser assegurada pelos hospitais IRIS com base num mandato. |
(87) |
Relativamente à base jurídica da compensação do défice (ver ponto 91 da decisão de início do procedimento), as autoridades belgas consideram que a obrigação imposta aos municípios de cobrirem o défice dos seus hospitais públicos está prevista no artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS, bem como no artigo 109.o da LCH. Explicam que este artigo enuncia um princípio geral aplicável a todos os hospitais públicos belgas e que determina a obrigação mínima imposta aos municípios (uma vez que estes só são obrigados a cobrir parte do défice, ver também considerando 47). As autoridades belgas referem também que o artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS define uma obrigação específica, unicamente aplicável aos seis municípios que criaram hospitais IRIS e que decidiram ultrapassar o valor mínimo imposto pelo artigo 109.o da LCH, cobrindo a totalidade do défice contabilístico desses hospitais. |
(88) |
No considerando 92 da sua decisão de início do procedimento, a Comissão inquire se a transferência dos subsídios especiais (que a Região de Bruxelas-Capital concede aos municípios) dos municípios para os hospitais IRIS poderá ser ou não considerada como uma operação distinta do mecanismo de cobertura do défice. Na sua resposta, as autoridades belgas afirmam que os municípios de Bruxelas só utilizam os subsídios especiais para satisfazer (parcialmente) a sua obrigação de cobrir o défice dos hospitais IRIS. Tal como adiante se explica mais pormenorizadamente (ver secção 7.3.5), a compensação dos défices é paga em várias etapas, uma das quais é a transferência dos subsídios especiais do município para o hospital IRIS, mas todos estes pagamentos são efetuados na mesma base, ou seja, a obrigação de cobertura do défice imposta aos municípios. |
(89) |
A Comissão também pediu esclarecimentos sobre um alegado mecanismo de pagamentos antecipados (se for caso disso), a base jurídica desse mecanismo e o seu modo de funcionamento, a diferença em relação ao mecanismo de cobertura do défice e o papel do FRBRTC no seu financiamento (ver considerando 93 da decisão de início do procedimento). As autoridades belgas consideram que não existe nenhum mecanismo de pagamentos antecipados. Mais precisamente, explicam que a obrigação de cobrir o défice dos hospitais IRIS produz efeitos desde o surgimento desse défice. Efetivamente, de acordo com as autoridades belgas, o artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS faz referência ao défice contabilístico, que é indicado nas demonstrações financeiras dos hospitais no máximo até seis meses depois de o exercício financeiro terminar. Em contrapartida, o cálculo do défice previsto no artigo 109.o da LCH pelo serviço público federal da saúde pública leva muito mais tempo (até 10 anos). Todavia, as autoridades belgas afirmam que, visto que o défice previsto no artigo 109.o da LCH constitui apenas uma parte do défice contabilístico imediatamente coberto ao abrigo do artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS, estes não recebem adiantamentos que possam ser considerados como auxílios distintos do mecanismo de cobertura do défice. Finalmente, as autoridades belgas repetem que o FRBRTC forneceu aos municípios um financiamento que os ajudou a respeitar a sua obrigação de cobertura do défice, a qual, como já foi explicado, não constitui um mecanismo de pagamento de adiantamentos. |
(90) |
No que se refere às medidas destinadas a evitar a sobrecompensação e à ausência efetiva de sobrecompensação (ver pontos 95-97 da decisão de início do procedimento), as autoridades belgas apresentam os seguintes argumentos. Em primeiro lugar, explicam que as decisões relativas à compensação do défice são tomadas anualmente, quando o défice estimado para o exercício em causa é conhecido, pelo que não existe qualquer risco de sobrecompensação. Explicam ainda que o quadro jurídico belga (nomeadamente a Lei de 14 de novembro de 1983 e a Lei CPAS) permite que os municípios se certifiquem de que os hospitais IRIS utilizam o auxílio estatal corretamente, e recuperem esse auxílio caso as condições não sejam respeitadas ou haja sobrecompensação. Além disso, para demonstrar a ausência de sobrecompensação, as autoridades belgas referem diversos quadros apresentados à Comissão e que indicam o défice e as intervenções dos municípios em relação a cada um dos cinco hospitais IRIS, no período de 1996-2014 (ver também secção 7.3.5 relativamente a estes dados). |
(91) |
Tal como solicitado, as autoridades belgas fornecem ainda, na sua resposta, esclarecimentos adicionais sobre o conceito de «pérennité» (ver considerandos 102-103 da decisão de início do procedimentos). Segundo afirmam, a obrigação de assegurar a sustentabilidade dos hospitais IRIS é diretamente baseada na Lei CPAS. Tal como já foi explicado (ver secção 2.1), cada CPAS pode criar estabelecimentos encarregados de prestar assistência social, incluindo assistência médica e médico-social, se puder demonstrar que essa medida é necessária para dar resposta a uma necessidade real, em conformidade com o artigo 60.o, n.o 6, da Lei CPAS. Explicam que, no passado, seis dos 19 CPAS da Região de Bruxelas-Capital criaram hospitais (sem personalidade jurídica distinta), para prestar assistência social e que geriram eles próprios esses hospitais até ao final de 1995. Segundo afirmam, a reestruturação desses hospitais públicos conducente à criação dos hospitais públicos IRIS, que se tornaram juridicamente independentes dos CPAS em 1 de janeiro de 1996 (ver também a secção 2.2), em nada alterou a obrigação imposta aos CPAS de prestarem assistência social, quer diretamente quer através dos hospitais IRIS. Neste contexto, as autoridades belgas observam que o objetivo principal da reestruturação e da criação da rede IRIS e dos hospitais IRIS era garantir a continuidade dos serviços hospitalares públicos na Região de Bruxelas-Capital (ver também considerando 27). Observam assim que, para assegurar a sustentabilidade dos hospitais IRIS e garantir, deste modo, a satisfação das necessidades sociais da população, os municípios e os CPAS são obrigados a absorver os défices desses hospitais com base no artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS. As autoridades belgas concluem ainda que, enquanto essa necessidade real existir, em conformidade com a jurisprudência do Conselho de Estado (ver considerando 83), os poderes públicos não podem fechar os hospitais IRIS nem cedê-los a um proprietário do setor privado. |
(92) |
Por último, no considerando 103 da decisão de início do procedimento, a Comissão inquire se existem outras razões que possam justificar o financiamento adicional dos hospitais IRIS. A este respeito, as autoridades belgas referem que os hospitais IRIS não têm apenas o objetivo de criar serviços, missões e programas hospitalares «viáveis», como poderiam fazer os hospitais privados belgas. Pelo contrário, segundo afirmam, os hospitais IRIS devem assegurar uma gama o mais ampla possível de cuidados de saúde, em especial para garantir o acesso de todos e, nomeadamente, dos membros mais desfavorecidos da sociedade, a todos os tratamentos necessários para as suas patologias, mesmo que esses tratamentos ultrapassem de longe as normas de planeamento e de aprovação aplicáveis a todos os hospitais ao abrigo da LCH. Neste contexto, as autoridades belgas remetem igualmente para o n.o 162 do acórdão do Tribunal Geral de novembro de 2012, no qual se afirma que «a compensação dos défices dos hospitais públicos pode revelar-se necessária por razões de ordem sanitária e social com vista a assegurar a continuidade e a viabilidade do sistema hospitalar». As autoridades belgas observam igualmente que o estatuto de um hospital público implica certos custos que não são inteiramente compensados pelas medidas de financiamento federais. Realçam que estes custos incluem, entre outros, o pagamento de prémios de competências linguísticas aos membros bilingues do pessoal, das despesas com pensões e seguros de doença mais elevados para os trabalhadores do quadro permanente (funcionários) e dos aumentos tabelados impostos (mas só parcialmente pagos) pela Região de Bruxelas-Capital. |
6.2. Observações da Bélgica sobre os comentários de terceiros
(93) |
As autoridades belgas começam por salientar que as observações formuladas pela CBI, a ABISP e a Zorgnet Vlaanderen sobre a decisão de início do procedimento da Comissão se baseiam no mesmo argumento, ou seja, o de que, segundo estas organizações, os hospitais IRIS não estão incumbidos de SIEG adicionais para além dos SIEG impostos a todos os hospitais (públicos ou privados) na Bélgica. No seu entender, esta afirmação assenta no mesmo fundamento, ou seja, o de que a LCH impõe aos hospitais privados e públicos a mesma obrigação de serviço público, independentemente de qualquer consideração regional. Todavia, segundo as autoridades belgas, os intervenientes não explicam em que medida a Lei CPAS não se aplicaria aos hospitais IRIS quando, no entender da Bélgica, esta lei constitui a própria base jurídica da existência destes hospitais. As autoridades belgas observam que o artigo 147.o da LCH admite explicitamente que, no caso dos hospitais geridos por um CPAS (como os hospitais IRIS (131)), a LCH completa a Lei CPAS, o que confirma que a LCH não é a única base jurídica pertinente aplicável aos hospitais geridos por um CPAS. |
(94) |
As autoridades belgas consideram incorreta a afirmação da CBI de que a intenção anunciada pelo governo de Bruxelas de alterar o despacho de 13 de fevereiro de 2003 de modo a especificar as missões de interesse geral que justificam o pagamento de subsídios especiais aos municípios (ver considerando 70) indicaria que atualmente não existe nenhuma missão específica (unicamente aplicável aos hospitais IRIS). Realçam, em particular, que os subsídios especiais previstos por esse despacho apenas são concedidos aos municípios, e não aos hospitais IRIS. A Bélgica confirma, além disso, que as intervenções do FRBRTC e da própria Região de Bruxelas-Capital (num montante máximo de 10 milhões de EUR por ano (132)) para apoiar os municípios são transferências financeiras entre autoridades públicas, não estando abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. As autoridades belgas reiteram que nenhum desses montantes foi concedido pela região nem pelo FRBRTC aos hospitais IRIS. Pelo contrário, de acordo com a Bélgica, trata-se apenas de transferências entre a região e os municípios, no âmbito das competências de financiamento geral dos municípios pela região. Este financiamento global destina-se a permitir que os municípios cumpram as suas missões de interesse municipal, que incluem as missões dos CPAS. Segundo as autoridades belgas, a reforma anunciada do despacho de 13 de fevereiro de 2003 não constitui, em caso algum, uma admissão da ausência de SIEG adicionais confiados aos hospitais IRIS. Compete aos municípios especificar os SIEG confiados aos hospitais que fundam, não sendo o despacho em questão pertinente neste contexto, uma vez que diz unicamente respeito ao financiamento intra-estatal. |
(95) |
As autoridades belgas refutam igualmente a descrição das missões sociais, no seu entender inexata, que a CBI apresenta nas suas observações. A CBI afirma, nomeadamente, que a LCH define uma «missão social básica» comum aos hospitais públicos e privados, mas que só os hospitais IRIS a cumpririam de forma mais intensiva. Deste ponto de vista, as missões sociais «complementares» dos hospitais IRIS não poderiam ser separadas dos serviços hospitalares e fariam parte integrante dos mesmos. As autoridades belgas não partilham desta opinião. Consideram que, para além do facto de a CBI admitir expressamente a existência de uma diferença intrínseca entre os hospitais públicos e privados (ou seja, o maior volume de serviços sociais prestados pelos hospitais IRIS), a CBI não define o que entende exatamente por «missão social básica», que considera ser um SIEG hospitalar, e que também não define a base jurídica em que essa missão assentaria, nem o mandato específico que lhe impõe. As autoridades belgas consideram que só a Lei CPAS pode servir para atribuir «missões sociais básicas» aos hospitais públicos. De facto, no seu entender, no que diz exclusivamente respeito aos hospitais públicos, a LCH limita-se a completar a Lei CPAS (ver artigo 147.o da LCH). A missão essencial, ou «missão básica», dos hospitais IRIS é definida pela Lei CPAS ou ao abrigo desta, não sendo, portanto, «comum» a todos os hospitais. De acordo com as autoridades belgas, esta missão não tem um caráter económico. Por conseguinte, os hospitais IRIS são estabelecidos ao abrigo da Lei CPAS e, uma vez criados, são obrigados a cumprir as regras adicionais estabelecidas pela LCH (133). |
(96) |
Quanto às observações da CBI a respeito da missão de cuidados universal, as autoridades belgas salientam que a CBI limita esta missão, que afirma ser comum a todos os hospitais, unicamente às urgências e às situações pós-urgência. Deste modo, as autoridades belgas consideram que a CBI reconhece implicitamente que os hospitais privados de Bruxelas não têm qualquer obrigação de tratar doentes fora das situações de urgência e pós-urgência, as quais representam, no entanto, a maior parte dos cuidados dispensados às pessoas desfavorecidas. As autoridades belgas afirmam ainda que a referência da CBI à missão de interesse público descrita no artigo 2.o da LCH não constitui o fundamento de tal obrigação. No seu entender, o facto de se ser incumbido de uma missão hospitalar básica não implica que se seja igualmente incumbido da missão de dispensar cuidados a todas as pessoas em quaisquer circunstâncias, independentemente da capacidade que elas tenham de os pagar. A própria existência de regras específicas para as urgências prova-o claramente. As autoridades belgas afirmam que a missão de interesse geral não pode ser implícita, mas sim imposta de forma explícita. Consideram que foi necessário estabelecer exigências específicas para as urgências porque a definição da missão hospitalar básica estabelecida pela LCH não menciona as urgências. As autoridades belgas argumentam que a Lei de 8 de julho de 1964 (134) e os seus decretos executórios tratam da assistência médica de urgência (135) e dos serviços de urgência (incluindo as ambulâncias). É nesta base que certos hospitais, públicos e privados, desempenham certas funções em matéria de assistência médica de urgência. |
(97) |
As autoridades belgas afirmam, contudo, que a obrigação de prestar cuidados de urgência nos hospitais públicos e privados não decorre da LCH. Pelo contrário, resulta da obrigação geral de prestar assistência a qualquer pessoa que esteja em perigo. De acordo com as autoridades belgas, os hospitais são obrigados a prestar assistência nas situações de urgência médica em função da sua estrutura e das competências disponíveis (136). Esta obrigação aplica-se tanto aos hospitais públicos como aos hospitais privados e, aliás, a qualquer pessoa, em virtude da obrigação de assistência às pessoas em perigo. As autoridades belgas explicam igualmente que, nos termos do artigo 422.o-B do Código Penal belga, esta obrigação só se aplica nas situações de urgência e, em especial, nos casos de urgência médica que impliquem risco de vida. Salientam, porém, que em todas as outras situações (ou seja, naquelas em que não há urgência), os hospitais não são incumbidos de uma missão de assistência universal nem obrigados a tratar doentes que não possam pagar o seu tratamento. Por último, as autoridades belgas observam que, embora seja evidente que os hospitais belgas não têm o direito de discriminar os doentes com base na sua situação financeira (e, portanto, unicamente pelo facto de uma pessoa ser pobre), não podem ser obrigados a prestar assistência fora das situações de urgência, se um doente não puder ou não quiser pagar. |
(98) |
Nas suas observações em resposta aos comentários da CBI, as autoridades belgas também contextualizam a referência que esta faz a um acórdão do Tribunal de primeira instância de Bruxelas (ver considerando 72). Segundo afirmam, o acórdão citado pela CBI diz unicamente respeito a um caso muito particular de apoio médico urgente (137) a um migrante sem documentos que necessitava de cuidados psiquiátricos e realçam que os hospitais IRIS não prestam este tipo de cuidados. No seu entender, esse acórdão confirma que o apoio médico urgente aos migrantes sem documentos é normalmente assegurado por hospitais estabelecidos por um CPAS ou por hospitais com os quais os CPAS celebraram uma convenção (138). Por último, as autoridades belgas observam que a CBI não justifica, nem tenta sequer justificar, a alegada obrigação imposta aos hospitais privados de tratar todos os doentes nas situações «pós-urgência». Na sua opinião, não é imposta aos hospitais privados qualquer obrigação deste tipo em relação às situações «pós-urgência», ao passo que os hospitais IRIS são obrigados a tratar todos os pacientes em quaisquer circunstâncias, mesmo que não haja urgência médica. |
7. APRECIAÇÃO DAS MEDIDAS
7.1. Objeto da presente decisão
(99) |
A denúncia fazia referência a uma medida de auxílio, no montante de cerca de 100 milhões de EUR, concedida no contexto da reestruturação conducente à criação dos hospitais IRIS (ver secção 2.2). No entanto, tal como explicado na secção 3.1 da decisão de início do procedimento, a Comissão só tomou uma medida relativa a esse auxílio depois de terminar o prazo de prescrição aplicável à recuperação do auxílio à reestruturação. Por conseguinte, esta medida de auxílio não foi incluída no procedimento formal de investigação iniciado pela Comissão e, logo, não será abordada na presente decisão. |
(100) |
Além da medida visada pelo prazo de prescrição, a denúncia incidia formalmente sobre i) os fundos pagos pelo FRBRTC aos municípios responsáveis pelos hospitais IRIS e ii) os subsídios especiais (no valor de 10 milhões de EUR por ano) concedidos a estes municípios pela Região de Bruxelas-Capital, com base no despacho de 13 de fevereiro de 2003. |
(101) |
Todavia, estes dois tipos de fundos são concedidos apenas aos municípios responsáveis pelos hospitais IRIS e não aos próprios hospitais IRIS. Na realidade, são apenas fluxos de financiamento entre a Região de Bruxelas-Capital e os seis municípios de Bruxelas responsáveis pelos hospitais IRIS e, portanto, não constituem auxílios estatais concedidos aos hospitais IRIS. |
(102) |
É certo que, na sua decisão anulada de 2009, a Comissão tendia a confundir os pagamentos a título do FRBRTC com o mecanismo de compensação do défice previsto pelo artigo 109.o da LCH, e que não procedeu a uma apreciação distinta dos parâmetros de compensação destas duas medidas (139). Além disso, os fundos do FRBRTC são utilizados pelos municípios para compensar o défice dos hospitais IRIS (140) e os municípios tinham a obrigação de pagar os fundos FRBRTC a estes hospitais no prazo máximo de sete dias úteis (141). |
(103) |
No entanto, como confirmam as informações recebidas em reação à sua decisão de início do procedimento e se explica mais adiante (ver considerando 230), as transferências financeiras do FRBRTC e da Região de Bruxelas-Capital para os municípios responsáveis pelos hospitais IRIS são necessárias, uma vez que os recursos próprios de que estes municípios dispõem são insuficientes para satisfazer a obrigação de compensação do défice municipal respeitante aos hospitais IRIS. É neste contexto que o FRBRTC e a Região de Bruxelas-Capital exigiram aos municípios de Bruxelas que pusessem os fundos FRBRTC e os subsídios especiais à disposição dos hospitais IRIS, quase imediatamente após a receção desses pagamentos. Independentemente desta obrigação de transferência, a obrigação de compensar os défices dos hospitais IRIS só incumbe aos municípios em causa e estes hospitais não têm direito a nenhuma compensação por parte da Região de Bruxelas-Capital ou do FRBRTC. Do mesmo modo, foram os municípios e não a Região de Bruxelas-Capital que impuseram determinadas obrigações aos hospitais IRIS (ver secção 7.3.4.1). Por conseguinte, só os pagamentos dos municípios aos hospitais IRIS para compensar os seus défices, independentemente de serem financiados pelos recursos próprios dos municípios ou pelos fundos fornecidos aos municípios pela Região de Bruxelas-Capital, podem ser considerados como um auxílio estatal na aceção do artigo 107, n.o 1, do TFUE. |
(104) |
A Comissão conclui que o financiamento intra-estatal (concedido aos municípios pela Região de Bruxelas-Capital, direta ou indiretamente, através do FRBRTC) é apenas uma fonte de financiamento dos pagamentos efetuados pelos municípios a título de compensação do défice e não uma medida de que os hospitais IRIS possam beneficiar adicionalmente a essa compensação do défice. Em consequência, os fluxos financeiros entre a Região de Bruxelas-Capital e os municípios de Bruxelas em causa, bem como as suas bases jurídicas (nomeadamente o despacho de 13 de fevereiro de 2003), não serão avaliados enquanto tais na presente decisão. Esta dedicar-se-á antes à apreciação dos pagamentos efetuados pelos municípios aos hospitais IRIS para compensar os seus défices, e em relação aos quais os municípios dependem largamente do financiamento intra-estatal fornecido pela Região de Bruxelas-Capital (142). Contudo, embora não aprofunde a análise das medidas oficialmente visadas pelos autores da denúncia, a apreciação relativa às regras em matéria de auxílios estatais de que será objeto a compensação do défice dos hospitais pelos municípios responderá plenamente, no essencial, às preocupações dos autores da denúncia quanto à existência de um auxílio estatal, visto que também abrangerá, de facto, os fundos concedidos pela Região de Bruxelas-Capital, diretamente ou através do FRBRTC, e integralmente utilizados pelos municípios para compensar os défices dos hospitais IRIS. É por isso que a análise da existência de uma sobrecompensação a seguir descrita (ver quadros 9 a 13 na secção 7.3.5) também identifica os pagamentos efetuados a título de compensação do défice que foram financiados através de fundos FRBRTC e dos subsídios especiais provenientes da Região de Bruxelas-Capital. Finalmente, importa salientar que a parte dos pagamentos efetuados pelos municípios a título de compensação do défice que foi financiada pela Região de Bruxelas-Capital ou através do FRBRTC (143) não era suficiente para cobrir integralmente os défices incorridos pelos hospitais IRIS e que, em nenhum momento do período de 1996 a 2014, estes pagamentos geraram uma situação em que um hospital IRIS tenha sido efetivamente sobrecompensado e obrigado a reembolsar (em parte) a compensação do seu défice (ver também considerandos 234 e 238). |
(105) |
A Comissão apreciará, portanto, as compensações pagas pelos municípios desde 1996 para cobrir os défices dos hospitais IRIS (144). Nesta base, o gráfico 1 infra resume os financiamentos públicos que são objeto da presente decisão (no retângulo a traço contínuo) e indica também as medidas de financiamento intra-estatal visadas pelos autores da denúncia (no retângulo a tracejado). Serão fornecidas informações mais exaustivas sobre estas medidas na secção 7.3.5 infra. Gráfico 1 Fluxo de financiamento e objeto da presente decisão |
7.2. Existência de um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE
(106) |
Nos termos do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, «são incompatíveis com o mercado interno, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados-Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções». Em consequência, uma medida constitui um auxílio estatal se preencher cumulativamente as quatro condições seguintes (145):
|
7.2.1. Vantagem económica seletiva conferida a uma empresa
7.2.1.1.
Princípios gerais
(107) |
A concessão de fundos públicos a uma entidade só pode ser qualificada de auxílio estatal se essa entidade for uma «empresa» na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. Em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o conceito de empresa abrange qualquer entidade que exerça uma atividade económica (146). A qualificação de uma entidade como empresa depende, assim, da natureza da sua atividade, independentemente do estatuto jurídico dessa entidade e do seu modo de financiamento (147). De um modo geral, deve considerar-se que qualquer atividade consistente na oferta de bens ou serviços no mercado tem um caráter económico (148). Se exercer simultaneamente atividades económicas e não económicas, deve ser considerada como uma empresa apenas no que se refere às primeiras (149). O simples facto de uma empresa não ter fins lucrativos não significa necessariamente que as suas atividades não tenham um caráter económico (150). |
Serviços médicos
(108) |
Quando os cuidados de saúde são prestados por hospitais e outros prestadores de cuidados de saúde mediante remuneração (151), quer esta seja diretamente paga pelos doentes ou proveniente de outras fontes, deve considerar-se, de um modo geral, que estes cuidados constituem uma atividade económica (152). O financiamento de que beneficiam os hospitais IRIS através de diversas subvenções das autoridades federais ou federadas (ver, por exemplo, o considerando 46, alíneas a), d) e e), no que respeita ao financiamento público concedido aos hospitais no seu conjunto e o considerando 44 no que se refere à compensação do défice concedida aos hospitais IRIS), complementado pelos pagamentos diretos dos doentes (ver considerando 46, alínea c)) e pelos pagamentos do INAMI (ver considerando 46, alínea b)), remunera os hospitais IRIS pelos serviços médicos prestados e pode, por conseguinte, ser considerado, neste contexto, como a contrapartida económica dos serviços hospitalares prestados. Tal sistema implica algum grau de concorrência entre os hospitais no que respeita à prestação dos serviços de cuidados de saúde. O facto de um hospital que preste tais serviços mediante remuneração ser um hospital público não obsta ao caráter económico dessas atividades (153). |
(109) |
No caso em apreço, as atividades principais dos hospitais IRIS são atividades hospitalares que consistem na prestação de serviços de cuidados de saúde. Estas atividades também são exercidas por outros tipos de entidades e, nomeadamente, por clínicas, hospitais privados e outros centros especializados, entre os quais os hospitais privados dos autores da denúncia. Por conseguinte, deve considerar-se que estas atividades hospitalares exercidas pelos hospitais IRIS mediante remuneração e num ambiente concorrencial têm um caráter económico. |
(110) |
Os elementos de solidariedade subjacentes ao sistema nacional de saúde belga não põem em causa o caráter económico destas atividades. Convém recordar, com efeito, que o Tribunal Geral constatou, a respeito de um sistema nacional de saúde gerido por ministérios e outros organismos, e que funcionava «em conformidade com o princípio da solidariedade quanto ao seu modo de financiamento através de contribuições sociais e outras contribuições estatais e quanto à prestação gratuita de serviços aos seus beneficiários com base na cobertura universal», que os organismos de gestão em causa não atuavam como empresas na sua atividade de gestão do sistema nacional de saúde (154). A Comissão considera, porém, que se deve fazer uma distinção entre a gestão do sistema nacional de saúde, exercida por organismos públicos que, para o efeito, exercem prerrogativas de autoridade pública, e a prestação de cuidados hospitalares mediante remuneração num ambiente concorrencial (que está em causa no caso em apreço, tal como indicado nos considerandos 108 e 109). |
(111) |
Consequentemente, no que respeita à prestação de serviços de cuidados de saúde, deve considerar-se que os hospitais IRIS são empresas na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
Serviços sociais
(112) |
Tal como explicado no considerando 38, os hospitais IRIS prestam um conjunto de serviços sociais aos seus doentes socialmente desfavorecidos e respetivas famílias. Estes serviços compreendem, em função das necessidades dos doentes, uma assistência psicossocial, sócio-administrativa ou sócio-material. O caráter específico desses serviços sociais implica que os operadores autorizados a prestá-los dispõem de recursos específicos, nomeadamente de pessoal com formação específica para o efeito. |
(113) |
É indiscutível que as atividades sociais complementares que os hospitais IRIS têm alegadamente a obrigação de assumir servem um objetivo exclusivamente social. No entanto, conforme resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, a vocação puramente social de um sistema ao abrigo do qual são confiadas tarefas específicas a uma entidade não é, por si só, suficiente para excluir de um modo geral o caráter económico das referidas tarefas (155). |
(114) |
Na sua decisão de início do procedimento, a Comissão procurou determinar se as atividades sociais complementares alegadamente exercidas pelos hospitais IRIS constituíam ou não uma atividade económica. Na sua resposta a essa decisão, as autoridades belgas sustentam que as atividades sociais não têm um caráter económico, uma vez que não fazem parte de um mercado concorrencial. Os autores da denúncia defendem, contudo, que não é possível distinguir as atividades sociais das atividades hospitalares que apresentam um caráter económico. Embora a Comissão tenha analisado cuidadosamente os argumentos das autoridades belgas, não pode excluir que o exercício das atividades sociais complementares constitua uma atividade económica. Além disso, como adiante se explica (ver considerando 165), a Comissão considera que as atividades sociais complementares não podem ser, na realidade, distinguidas das atividades hospitalares de caráter económico. |
(115) |
A fim de prosseguir a apreciação, a presente decisão baseia-se seguidamente na hipótese de que a prestação de serviços sociais complementares tem, efetivamente, um caráter económico. |
Atividades acessórias
(116) |
Tal como indicado no considerando 41, os hospitais IRIS participam também num conjunto de atividades acessórias. A Comissão constata que algumas dessas atividades, quando avaliadas separadamente das atividades principais dos hospitais IRIS, não parecem ter um caráter económico (por exemplo, as atividades de investigação), enquanto outras parecem, à primeira vista, constituir atividades económicas (por exemplo, a cantina ou a loja para os doentes e as visitas). Pode adiantar-se, contudo, que, devido à sua estreita ligação às atividades (económicas) principais dos hospitais IRIS, as atividades acessórias mencionadas também devem ser, no seu conjunto, consideradas como atividades económicas. |
(117) |
A fim de prosseguir a avaliação, a presente decisão baseia-se seguidamente na hipótese de que as atividades acessórias apresentam, efetivamente, um caráter económico. |
7.2.1.2.
Apreciação geral
(118) |
Na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, uma vantagem corresponde a um benefício económico que uma empresa não teria obtido em condições normais de mercado, isto é, sem a intervenção do Estado (156). Só importa o efeito da medida sobre a empresa e não a causa nem o objetivo da intervenção estatal (157). Existe uma vantagem sempre que a situação financeira de uma empresa melhora na sequência da intervenção do Estado. |
(119) |
No caso em apreço, importa referir que os diversos sistemas de financiamento público (descritos na secção 2.5.1) que cobrem as atividades hospitalares gerais e complementares, entre os quais a compensação do défice, permitiram que os hospitais IRIS beneficiassem de um conjunto de medidas destinadas a aliviar os encargos normalmente suportados pelos prestadores deste tipo de atividades. Por conseguinte, sob reserva do exame à luz dos princípios do acórdão Altmark, efetuada nos considerandos seguintes, pode considerar-se que o mecanismo de compensação do défice visado pela presente decisão confere aos hospitais IRIS uma vantagem económica que estes não teriam obtido nas condições normais de mercado, ou seja, sem a intervenção do Estado. |
Altmark
(120) |
A Comissão observa que se poderá considerar que o financiamento público dos hospitais IRIS não lhes conferiu qualquer vantagem, na medida em que consistiu somente na concessão de uma compensação pelos serviços prestados por estes hospitais em conformidade com as obrigações de serviço público que lhes incumbiam, desde que as condições estabelecidas no acórdão Altmark estejam preenchidas. |
(121) |
Neste acórdão, o Tribunal de Justiça especificou que a compensação, através de recursos estatais, dos custos suportados para prestar um serviço de interesse económico geral não constitui uma vantagem desde que quatro condições cumulativas estejam reunidas (158):
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(122) |
Os princípios e considerações enunciados no acórdão Altmark são aplicáveis ex tunc, ou seja, também se aplicam às relações jurídicas existentes antes de ser proferido o acórdão em questão (159). Em consequência, os critérios de apreciação expostos no acórdão Altmark são plenamente aplicáveis à situação factual e jurídica do caso em apreço, mesmo no que respeita aos auxílios concedidos aos hospitais IRIS antes da data do acórdão Altmark (160). |
(123) |
Para efeitos da presente decisão, a Comissão decidiu examinar, em primeiro lugar, o quarto critério Altmark (em relação ao qual importa determinar se a escolha da empresa que presta um SIEG foi efetuada através de um procedimento de concurso público ou, caso contrário, se a compensação paga por este SIEG foi determinada com base numa análise dos custos suportados por uma empresa média e bem gerida). A Comissão constata que os hospitais IRIS não foram selecionados através de um procedimento de concurso público relativo às obrigações de serviço público confiadas pelas autoridades belgas. Por conseguinte, pode concluir-se que a primeira parte do critério em questão está preenchida no caso em apreço. |
(124) |
Quanto à segunda parte do critério em análise, a Comissão observou, em primeiro lugar, que as autoridades belgas não alegaram que os hospitais IRIS eram empresas eficientes nesse sentido. A Comissão constata, seguidamente, que as informações fornecidas tanto pelas autoridades belgas como pelos autores da denúncia não são suficientes para determinar que os mecanismos de compensação das obrigações de serviço público confiadas aos hospitais IRIS respeitam o critério do operador eficiente na aceção da quarta condição enunciada no acórdão Altmark. Nada indica que a compensação paga se baseie numa análise dos custos de uma empresa média com as características exigidas pela jurisprudência relevante dos órgãos jurisdicionais da União. Além disso, não existem elementos suficientes para demonstrar que os próprios hospitais IRIS podem ser considerados empresas médias, bem geridas e adequadamente equipadas. Não se afigura que tenham sido tidas em conta, para efeitos da determinação da compensação concedida, quaisquer considerações relativas a uma boa gestão ou à adequação dos equipamentos. Por último, importa referir que um mecanismo de compensação que cobre o défice dos hospitais IRIS resultante do cumprimento de SIEG e de atividades acessórias, sem ter em conta a eficácia com que os hospitais são geridos, não pode preencher o quarto critério Altmark. |
(125) |
A Comissão considera, por conseguinte, que o quarto critério enunciado no acórdão Altmark não se encontra preenchido no caso em apreço. Uma vez que as condições enunciadas neste acórdão são cumulativas, o não preenchimento de uma das quatro condições leva necessariamente à conclusão de que o mecanismo de compensação do défice examinado na presente decisão confere uma vantagem económica na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
7.2.1.3.
(126) |
Para estar abrangida pelo artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, uma medida estatal deve favorecer «certas empresas ou certas produções». Por conseguinte, só são abrangidas pelo conceito de auxílio estatal as medidas que favorecem empresas conferindo-lhes uma vantagem de forma seletiva. |
(127) |
A Comissão salienta que se deve considerar que o mecanismo de compensação criado para cobrir o défice dos hospitais públicos de Bruxelas (ver considerando 44), mas não o dos hospitais privados, tem um caráter seletivo, visto excluir os hospitais privados e todos os outros prestadores de cuidados de saúde, bem como os operadores pertencentes a outros setores de atividade. |
7.2.2. Recursos estatais
(128) |
Para que uma medida constitua um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, deve ser concedida pelo Estado ou ser proveniente de recursos estatais. Os recursos estatais incluem todos os recursos do setor público (161), incluindo os das entidades intra-estatais (descentralizadas, federadas, regionais ou outras) (162). |
(129) |
No caso vertente, as compensações de défices que os hospitais IRIS recebem dos respetivos municípios pelo cumprimento de SIEG e de atividades acessórias provêm de recursos públicos e são imputáveis ao Estado. |
7.2.3. Distorção da concorrência e efeitos sobre as trocas comerciais
(130) |
Nos termos do artigo 107.o, n.o 1 do TFUE, só constituem auxílios estatais os apoios públicos concedidos às empresas «que falseiem ou ameacem falsear a concorrência», e apenas na medida em que «afetem as trocas comerciais entre os Estados-Membros». |
7.2.3.1.
(131) |
Considera-se que uma medida de auxílio concedida por um Estado falseia ou ameaça falsear a concorrência quando é suscetível de melhorar a posição concorrencial do seu beneficiário em detrimento das empresas concorrentes (163). Na prática, presume-se que existe distorção da concorrência desde que um Estado conceda uma vantagem financeira a uma empresa num setor liberalizado em que existe, ou poderia existir, concorrência. |
(132) |
Tendo em conta que existe um certo grau de concorrência entre os hospitais públicos, os hospitais privados e outros estabelecimentos de cuidados de saúde, o financiamento público concedido a certos estabelecimentos de cuidados de saúde (como os hospitais IRIS), para financiar atividades hospitalares por eles exercidas, é suscetível de falsear a concorrência. O mesmo se aplica às atividades sociais complementares dos hospitais IRIS. |
7.2.3.2.
Princípios gerais
(133) |
Os órgãos jurisdicionais da União consideraram que, «quando um auxílio financeiro concedido por um Estado reforça a posição de uma empresa relativamente a outras empresas concorrentes nas trocas comerciais intracomunitárias, estas últimas devem ser consideradas influenciadas pelo auxílio» (164). |
(134) |
Os apoios públicos podem ser considerados suscetíveis de afetar as trocas intra-UE mesmo que os beneficiários não participem diretamente no comércio transfronteiriço. Por exemplo, ao manter ou aumentar a oferta local (165), uma subvenção pode dificultar a entrada dos operadores de outros Estados-Membros no mercado, ou o exercício do seu direito de estabelecimento. |
(135) |
É jurisprudência assente que a Comissão não está obrigada a proceder a uma análise económica da situação real dos mercados em causa, da quota de mercado das empresas beneficiárias do auxílio, da posição das empresas concorrentes ou das trocas comerciais entre os Estados-Membros (166). Em caso de auxílios estatais ilegalmente concedidos, a Comissão não tem o dever de demonstrar os efeitos reais desses auxílios sobre a concorrência e as trocas comerciais entre os Estados-Membros. |
(136) |
Todavia, um efeito sobre as trocas comerciais intra-UE não pode ser meramente hipotético ou presumido. Há que demonstrar, com base nos efeitos previsíveis da medida (167), por que razão esta falseia ou ameaça falsear a concorrência e é suscetível de ter um efeito sobre as trocas comerciais entre os Estados-Membros. |
(137) |
A este respeito, a Comissão considerou, em vários processos (168), que certas atividades têm uma dimensão meramente local e não produzem tal efeito. Afigura-se oportuno verificar, em especial, se o beneficiário fornece bens ou serviços num território limitado de um Estado-Membro e não consegue atrair clientes provenientes de outros Estados-Membros, e se é previsível que a medida apenas terá um efeito marginal sobre as condições de investimento ou de estabelecimento a nível transfronteiriço. |
Apreciação
(138) |
De acordo com os princípios acima mencionados, a Comissão observa que o efeito sobre as trocas comerciais pode ser demonstrado com base em diversos fatores, sobretudo a parte «cliente» (ligada ao território onde os bens e serviços são fornecidos e ao território de onde os clientes são originários) e a parte «fornecedor» (em que é necessário apurar se uma medida cria obstáculos ao investimento e ao estabelecimento transfronteiras dos prestadores que exercem uma concorrência real ou potencial). Para determinar se uma medida afeta as trocas comerciais entre os Estados-Membros basta provar a existência de um efeito sobre essas trocas resultante de, pelo menos, um destes fatores. |
(139) |
Quanto ao efeito das medidas sobre a parte «cliente», a Comissão observa, no caso em apreço, que o setor dos cuidados de saúde, em geral, e dos cuidados de saúde prestados em meio hospitalar, em particular, é objeto de trocas comerciais na União. A Comissão refere também que a mobilidade transfronteiriça dos doentes está a crescer. É certo que os cuidados de saúde continuam a ser da competência dos Estados-Membros e que a mobilidade dos doentes está sujeita às rigorosas disposições que regem as intervenções dos sistemas de segurança social nacionais. Com efeito, na prática, os cuidados hospitalares são geralmente prestados nas proximidades do local de residência do doente, num ambiente cultural que lhe é familiar e que lhe permite estabelecer uma relação de confiança com os médicos que o tratam. As deslocações transfronteiriças têm sobretudo lugar nas regiões fronteiriças ou quando os doentes pretendem beneficiar de um tratamento muito especializado para um problema de saúde específico. |
(140) |
No caso vertente, a Comissão considera que as medidas em causa são suscetíveis de afetar as trocas comerciais entre Estados-Membros. Em particular, este processo tem especificidades que o distinguem dos processos em que se considerou que os auxílios públicos aos hospitais não afetavam tais trocas (169). Para chegar a esta conclusão, a Comissão baseou-se, designadamente, numa combinação dos seguintes elementos:
|
(141) |
No que se refere às atividades sociais complementares dos hospitais IRIS, a Comissão observa que, dado não se poder excluir que o exercício destas atividades constitua uma atividade económica, e atendendo aos estreitos laços existentes entre elas e as atividades hospitalares gerais dos hospitais IRIS, o raciocínio acima exposto lhes pode ser igualmente aplicado. Todavia, tendo em conta as considerações a seguir enunciadas (ver secção 7.3), a Comissão entende que, mesmo afetando as trocas comerciais entre Estados-Membros, o financiamento público dos serviços sociais complementares constituiria um auxílio estatal compatível com o mercado interno. Por motivos de eficácia processual, não é, assim, necessário determinar, em última instância, se o financiamento público das atividades sociais complementares afeta ou não essas trocas comerciais. |
(142) |
As mesmas considerações são aplicáveis às atividades acessórias dos hospitais IRIS (ver considerandos 41, 116 e 117). No entender da Comissão, se o financiamento público (se for caso disso) da maior parte das atividades acessórias dos hospitais IRIS (por exemplo, uma creche para os filhos dos trabalhadores, o aluguer de quartos, uma pequena loja para os doentes e as visitas, a cantina e um parque de estacionamento ou o aluguer de televisores aos doentes) fosse objeto de uma apreciação separada, seria possível adiantar que ele não teria qualquer efeito sobre as trocas comerciais entre os Estados-Membros. No entanto, devido à estreita ligação existente entre as atividades acessórias e a atividade principal dos hospitais IRIS, é possível supor que o financiamento público (caso exista) dessas atividades também afeta tais trocas. Em qualquer caso, uma vez que o financiamento público das atividades acessórias constituiria um auxílio estatal compatível com o mercado interno (ver secção 7.3), a Comissão não considera necessário pronunciar-se definitivamente sobre esta questão. |
(143) |
A fim de prosseguir a apreciação, a presente decisão baseia-se seguidamente na hipótese de que o financiamento público das atividades sociais complementares e das atividades acessórias é suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados-Membros. |
(144) |
Tendo concluído, deste modo, que as medidas visadas por esta investigação são suscetíveis de afetar as trocas comerciais entre os Estados-Membros em, pelo menos, um aspeto (a parte «cliente»), a Comissão não considera necessário determinar se são igualmente suscetíveis de afetar essas trocas no que se refere aos investimentos transfronteiriços e ao direito de estabelecimento (ver considerando 138). |
7.2.4. Conclusão
(145) |
À luz das considerações precedentes, a Comissão conclui que, no que respeita às medidas em análise, as condições cumulativas da existência de um auxílio estatal estão preenchidas e que estas medidas constituem, por conseguinte, um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE. |
7.3. Compatibilidade com o mercado interno
7.3.1. Base jurídica
7.3.1.1.
(146) |
Dado que a compensação do défice aplicável aos hospitais IRIS constitui um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE, há que apreciar a sua compatibilidade com o mercado interno. As razões que levam a que uma medida de auxílio estatal possa ou deva ser declarada compatível com o mercado interno estão enumeradas no artigo 106.o, n.o 2, e no artigo 107.o, n.os 2 e 3, do TFUE. |
(147) |
Uma vez que as autoridades belgas afirmaram repetidamente que o financiamento público dos hospitais IRIS constitui uma compensação pelo exercício de SIEG, a compatibilidade da compensação do défice com o mercado interno deve ser principalmente apreciada à luz do artigo 106.o, n.o 2, do TFUE. Este artigo dispõe que: «as empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral ou que tenham a natureza de monopólio fiscal ficam submetidas ao disposto nos Tratados, designadamente às regras de concorrência, na medida em que a aplicação destas regras não constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular que lhes foi confiada. TO desenvolvimento das trocas comerciais não deve ser afetado de maneira que contrarie os interesses da União.» |
7.3.1.2.
(148) |
A Comissão definiu as condições específicas em que aplica o artigo 106.o, n.o 2, do TFUE numa série de instrumentos jurídicos e, mais recentemente, entre outros, no Enquadramento SIEG de 2012 (171) e na Decisão SIEG de 2012 (172) (conjuntamente designados, a seguir, por «pacote SIEG de 2012»); anteriormente, a Comissão tinha publicado e aplicado o Enquadramento SIEG de 2005 (173) e a Decisão SIEG de 2005 (174). Qualquer medida de auxílio que satisfaça os critérios enunciados na Decisão SIEG de 2012 é considerada compatível com o mercado interno e está isenta de notificação. As medidas de auxílio que não estejam abrangidas pela Decisão SIEG de 2012 por não preencherem todos os critérios nela estabelecidos devem ser apreciadas em conformidade com o Enquadramento SIEG de 2012, após terem sido notificadas. |
(149) |
No caso vertente, a compensação dos défices dos hospitais IRIS em análise remonta a 1996, sendo, por isso anterior à Decisão e ao Enquadramento SIEG de 2012. Contudo, o pacote SIEG de 2012 estabelece — no artigo 10.o da Decisão SIEG de 2012 e no n.o 69 do Enquadramento SIEG de 2012 — regras relativas à sua aplicação aos auxílios concedidos antes da sua entrada em vigor, em 31 de janeiro de 2012. Em especial, o artigo 10.o, alínea b), da Decisão SIEG de 2012 dispõe que «Os auxílios executados antes da entrada em vigor da presente decisão [ou seja, antes de 31 de janeiro de 2012] e que não sejam compatíveis com o mercado interno, nem isentos da obrigação de notificação em conformidade com a Decisão 2005/842/CE, mas que cumpram as condições estabelecidas na presente decisão, são compatíveis com o mercado interno e estão isentos da obrigação de notificação prévia.» Quanto ao Enquadramento SIEG de 2012, os seus n.os 68 e 69 especificam que a Comissão aplicará os princípios nele enunciados a todos os projetos de auxílios que lhe sejam notificados, independentemente de a notificação ser anterior ou posterior ao início da aplicação do enquadramento, ou seja, 31 de janeiro de 2012, assim como a auxílios ilegais sobre os quais venha a tomar uma decisão após 31 de janeiro de 2012, mesmo que o auxílio tenha sido concedido antes dessa data. |
(150) |
Consequentemente, as regras relativas à aplicação da Decisão SIEG de 2012 e do Enquadramento SIEG de 2012, tal como são acima descritas, implicam que o financiamento público dos hospitais IRIS a partir de 1996 pode ser apreciado com base no pacote SIEG de 2012. Se o mecanismo de compensação do défice preencher as condições da Decisão SIEG de 2012 ou do Enquadramento SIEG de 2012, é compatível com o mercado interno durante todo o período desde 1996. |
(151) |
Por último, importa chamar a atenção para a disposição transitória constante do artigo 10.o, alínea a), da Decisão SIEG de 2012, nos termos da qual os regimes de auxílio executados antes da entrada em vigor da dita decisão (ou seja, antes de 31 de janeiro de 2012) que sejam compatíveis com o mercado interno e isentos da obrigação de notificação em conformidade com a Decisão 2005/842/CE continuam a ser compatíveis com o mercado interno e a estar isentos da obrigação de notificação por um período suplementar de dois anos (ou seja, até 30 de janeiro de 2014 inclusive). Isso significa que os auxílios concedidos ao abrigo do regime em questão durante o período compreendido entre a entrada em vigor da Decisão SIEG de 2005, em 19 de dezembro de 2005, e a entrada em vigor da Decisão SIEG de 2012, em 31 de janeiro de 2012, serão considerados compatíveis com o mercado interno, mas apenas desde a data em que foram concedidos até 30 de janeiro de 2014 inclusive. Em qualquer caso, a disposição transitória do artigo 10.o, alínea a), da Decisão SIEG de 2012 não é aplicável aos auxílios concedidos a partir de 31 de janeiro de 2012 e a apreciação da compatibilidade deve ser efetuada com base na Decisão SIEG de 2012. |
(152) |
Consequentemente, a Comissão irá apreciar, primeiramente, se o financiamento público visado pela presente decisão e concedido aos hospitais IRIS a partir de 1996 preenche as condições enunciadas na Decisão SIEG de 2012. Só em caso contrário a Comissão apreciará este mesmo financiamento com base na Decisão SIEG de 2005 (relativamente ao auxílio concedido entre 19 de dezembro de 2005 e 31 de janeiro de 2012) e no Enquadramento SIEG de 2012. |
7.3.2. Aplicabilidade do artigo 106.o, n.o 2, do TFUE: SIEG genuíno
(153) |
O artigo 106.o, n.o 2, do TFUE e a Decisão SIEG de 2012 nele baseada são exclusivamente aplicáveis às compensações pagas a uma empresa encarregada da gestão de um «verdadeiro serviço de interesse económico geral» (175). O Tribunal de Justiça estabeleceu que os SIEG são serviços que apresentam características específicas em relação às de outras atividades económicas (176). Além disso, é ponto assente que, na falta de regulamentação específica que defina a nível da União os critérios para determinar a existência de um SIEG, os Estados-Membros dispõem de um amplo poder de apreciação quanto à definição do que consideram ser um SIEG e no que respeita à concessão da compensação ao prestador desse serviço (177). Nesta matéria, a Comissão apenas pode verificar se o Estado-Membro não cometeu um erro manifesto ao qualificar um serviço de SIEG. |
(154) |
A Comissão considera que todas as atividades económicas dos hospitais IRIS que beneficiam de financiamentos públicos (isto é, toda a gama de tarefas sociais e hospitalares levadas a cabo por estes hospitais) são verdadeiros serviços de interesse económico geral, como sustentam as autoridades belgas, ou atividades acessórias com estes relacionadas. Em especial, todos os serviços médicos e sociais em análise apresentam características específicas em relação às das outras atividades económicas, ou seja, essencialmente, a sua importância para o bem-estar médico e social da sociedade. Consequentemente, as autoridades belgas não cometeram qualquer erro manifesto ao qualificarem estes serviços de SIEG. |
(155) |
Quanto às atividades acessórias especificadas no considerando 41, a Comissão observou que uma atividade pode ser considerada acessória de um SIEG se estiver diretamente associada e for necessária à prestação desse SIEG, ou se estiver intrinsecamente ligada ao mesmo. Neste último caso, as atividades em questão consomem os mesmos recursos que o SIEG, por exemplo, os mesmos materiais, equipamentos, mão de obra e capital fixo. Além disso, as atividades acessórias devem ter uma escala limitada. A Comissão entende que todas as atividades descritas no considerando 41 podem ser consideradas acessórias da atividade SIEG principal dos hospitais IRIS. Com efeito, as atividades consideradas acessórias 1) estão diretamente associadas e são necessárias à execução da atividade SIEG dos hospitais IRIS, pois constituem atividades esperadas de um hospital moderno, complementarmente à prestação de serviços médicos e sociais, e/ou 2) estão intrinsecamente ligadas a essas atividades, uma vez que utilizam as infraestruturas dos hospitais (ou seja, os seus edifícios e terrenos). Tendo em conta a reduzida percentagem das atividades acessórias nas receitas globais dos hospitais IRIS (menos de 2 %, em média), a Comissão também conclui que todas as atividades acessórias mantêm uma escala muito limitada. |
7.3.3. Aplicabilidade da Decisão SIEG de 2012
(156) |
A Comissão considera, por outro lado, que a concessão de fundos públicos aos hospitais IRIS com vista à execução de SIEG está abrangida pelo âmbito de aplicação material da Decisão SIEG de 2012, de acordo com o previsto no seu artigo 2.o. Em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, alíneas b) e c), da Decisão SIEG de 2012, esta é aplicável aos auxílios estatais concedidos sob a forma de compensação de SIEG aos hospitais que prestam cuidados médicos (o que inclui o exercício de atividades acessórias diretamente relacionadas com a sua atividade principal, nomeadamente, mas não de forma exclusiva, no domínio da investigação) e às empresas que prestam SIEG destinados a satisfazer necessidades sociais, nomeadamente em matéria de cuidados de saúde e da inclusão social de grupos vulneráveis. Dado que os SIEG e as atividades acessórias financiados por fundos públicos e executados pelos hospitais IRIS podem ser incluídos nestas categorias de atividades, a Comissão conclui que o mecanismo de compensação do défice em apreço está abrangido pelo âmbito de aplicação material da Decisão SIEG de 2012. Por conseguinte, os custos resultantes do conjunto de atividades dos hospitais IRIS (SIEG e atividades acessórias) podem ser cobertos pelas compensações concedidas em conformidade com a Decisão SIEG de 2012. |
7.3.4. O ato de atribuição do mandato
(157) |
A primeira condição de compatibilidade fundamental inscrita na Decisão SIEG de 2012 é que a gestão do SIEG deve ser confiada à empresa em causa através de um ou vários atos, cuja forma pode ser determinada por cada Estado-Membro (178). Este(s) ato(s) deve(m) referir claramente:
|
(158) |
Além disso, a Decisão SIEG de 2012 exige que a atribuição inclua uma referência a esta decisão (184). |
7.3.4.1.
(159) |
No seu acórdão de anulação de 7 de novembro de 2012, o Tribunal Geral formulou a observação preliminar segundo a qual «quando incumbem exigências diferentes às entidades, públicas e privadas, encarregadas do mesmo serviço público, o que pressupõe um nível diferente dos custos e da compensação, essas diferenças devem resultar claramente dos seus mandatos respetivos, nomeadamente, a fim de permitir verificar a compatibilidade da subvenção com o princípio da igualdade de tratamento. Com efeito, um auxílio de Estado que, em algumas das suas modalidades, viole os princípios gerais do direito da União, como o princípio da igualdade de tratamento, não pode ser declarado compatível com o mercado interno pela Comissão (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de abril de 2008, Nuova Agricast, C-390/06, Colet., p. I-2577, n.o 51)» (185). |
(160) |
O n.o 66 do acórdão no processo Nuova Agricast (186) especifica que «[o] respeito do princípio da igualdade de tratamento exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de modo igual, exceto se esse tratamento for objetivamente justificado (v., nomeadamente, acórdão de 26 de outubro de 2006, Koninklijke Coöperatie Cosun, C-248/04, Colect., p. I-10211, n.o 72 e a jurisprudência aí referida).» |
(161) |
Contudo, a Comissão sublinha que o princípio da não discriminação não é mencionado como um critério de compatibilidade na Decisão SIEG de 2012. Não obstante, a Comissão tenciona averiguar se os hospitais públicos IRIS e os hospitais privados de Bruxelas se encontram numa situação jurídica e factual comparável ou diferente. Neste contexto, ao descrever a natureza das obrigações de serviço público que são confiadas aos hospitais IRIS, a Comissão indicará se sim ou não uma obrigação comparável foi imposta aos hospitais privados de Bruxelas. |
(162) |
Como foi explicado acima (ver secção 2.3), os hospitais IRIS estão sujeitos a um quadro regulamentar que é composto pela lei relativa aos CPAS (com base na qual foram criados os hospitais IRIS), pela LCH, pelos estatutos das associações hospitalares locais e pelos planos estratégicos adotados pela organização matriz IRIS. Tendo em conta que os poderes públicos (designadamente os municípios e os CPAS) exercem o controlo maioritário sobre as associações locais ao abrigo do capítulo XII da lei relativa aos CPAS e sobre a organização matriz IRIS, os estatutos e os planos estratégicos são obrigatórios para os hospitais IRIS e podem ser considerados como atos de atribuição válidos, cuja natureza será especificada abaixo (ver considerandos 164, 170 e seguintes). Neste contexto, é igualmente interessante sublinhar que os poderes públicos podem controlar diretamente as operações quotidianas dos hospitais IRIS e fornecer, se necessário, instruções complementares. |
(163) |
Também foi sublinhado (ver considerando 24) que os hospitais IRIS eram originalmente geridos e controlados diretamente pelos CPAS que os criaram com vista a que a sua obrigação de apoio social fosse cumprida em conformidade com a lei relativa aos CPAS. A fim de garantir a sustentabilidade e a viabilidade dos hospitais públicos de Bruxelas (ver considerando 24), foi necessário efetuar uma restruturação que resultou na criação dos hospitais IRIS (que assumiram a forma de associações locais ao abrigo do capítulo XII da lei relativa aos CPAS, dotadas de independência financeira e jurídica). Contudo, a referida restruturação não alterou a missão fundamental dos hospitais públicos IRIS de Bruxelas (187), que consiste em prestar cuidados médicos e médico-sociais e, desta forma, contribuir para a obrigação de apoio social do CPAS que as criou. |
(164) |
Os cuidados médicos prestados pelos hospitais IRIS encontram-se igualmente definidos na LCH, que fixa o quadro pertinente aplicável à organização do setor hospitalar belga no seu conjunto. Nesta base, a LCH confia uma missão hospitalar básica a todos os hospitais belgas, sejam eles públicos ou privados, incluindo os hospitais IRIS. Em particular, o artigo 2.o da LCH define os estabelecimentos que podem ser considerados como hospitais, enquanto os seus artigos 68.o a 76.o-E definem as condições de aprovação dos hospitais e serviços hospitalares (as quais se encontram pormenorizadas nos decretos de aplicação que definem as condições em matéria de qualidade, as exigências em matéria de pessoal, etc.). Os artigos 23.o a 45.o da LCH determinam as exigências relativas ao mecanismo de programação hospitalar, que fixa os limites para o número de camas de hospitais, de serviços hospitalares e de certos equipamentos médicos (como os aparelhos ecográficos) que podem ser disponibilizados e utilizados. Só são elegíveis para financiamento público os serviços hospitalares acreditados que preencham as condições da programação. Como indicado na decisão de início do procedimento (188) e confirmado pela ausência de observações de terceiros sobre esta questão, não existia nem existe qualquer dúvida quanto à clareza da missão hospitalar básica tal como definida pela LCH. É igualmente claro que os hospitais IRIS respondem a estas exigências, uma vez que possuem todas as acreditações necessárias e que o seu funcionamento está aprovado no âmbito do mecanismo de programação. |
(165) |
Para além da missão hospitalar básica que é confiada a todos os hospitais públicos e privados belgas, a decisão da Comissão de 28 de outubro de 2009 (ver secção 4.1 acima), o acórdão de anulação do Tribunal Geral de 7 de novembro de 2012 (ver secção 4.2 acima) e a decisão de início do procedimento da Comissão de 1 de outubro de 2014 (ver secção 4.3 acima) fazem referência a três SIEG complementares (ou específicos) relativos no essencial: 1) ao acesso universal aos cuidados de saúde; 2) à obrigação de prestação de cuidados em múltiplos estabelecimentos; e 3) aos serviços sociais complementares, que foram única e exclusivamente confiados aos hospitais IRIS. Contudo, tal não significa que a missão hospitalar básica e os SIEG complementares devam necessariamente ser apreciados independentemente uns dos outros. A este respeito, foi mencionado no considerando 23 da decisão de início do procedimento que as autoridades belgas alegaram que a missão hospitalar básica está inscrita num SIEG mais alargado, nomeadamente a obrigação de prestar o apoio social exigido pela lei relativa aos CPAS, ou é complementar a esse SIEG. |
(166) |
Neste contexto, a Comissão considera que a associação da missão hospitalar básica confiada a todos os hospitais em virtude da LCH e das três obrigações SIEG complementares impostas (189) unicamente aos hospitais IRIS constitui de facto um «SIEG de cuidados de saúde sociais» que é próprio dos hospitais IRIS e exercido unicamente por estes. Ao examinar a realidade de todas as obrigações de SIEG impostas aos hospitais IRIS e baseando-se na análise que fez à natureza e às características de todas essas obrigações, a Comissão é de opinião que não seria adequado examinar as três obrigações de SIEG complementares impostas ao nível municipal independentemente da missão hospitalar básica confiada em virtude da LCH. Com efeito, as obrigações de SIEG complementares, por um lado, baseiam-se e apoiam-se na missão hospitalar básica confiada aos hospitais IRIS em virtude da LCH e, por outro lado, também vão muito além dessa obrigação básica ao obrigarem os hospitais IRIS: 1) a oferecerem uma gama alargada de serviços de cuidados de saúde a todos os pacientes, sem ter em conta a capacidade que estes têm de pagar (acesso universal aos cuidados de saúde) (ver considerandos 170-190), 2) em vários estabelecimentos hospitalares (assegurando cuidados de proximidade) (ver considerandos 191-204) enquanto 3) dão especial atenção às necessidades sociais dos pacientes (através de serviços sociais complementares) (ver considerandos 205-214). No que diz respeito à missão hospitalar básica confiada em virtude da LCH (ver considerando 164), as três obrigações complementares não podem ser consideradas como atividades autónomas, como demonstra claramente o facto de estas obrigações nunca serem impostas sem a obrigação fundamental de realizar a missão hospitalar básica nos termos da LCH. Por fim, esta abordagem é confirmada em certa medida pelos autores da denúncia quando argumentam (ver considerando 71) que os serviços sociais complementares não podem ser separados de um serviço geral de cuidados de saúde. |
(167) |
No que diz respeito à abordagem desenvolvida nos considerandos anteriores (ver considerandos 162 a 166), a Comissão sublinha os três pontos seguintes. Em primeiro lugar, o SIEG de cuidados de saúde sociais executado pelos hospitais IRIS é composto, nem mais nem menos, pela missão hospitalar básica que lhes é imposta (ver considerando 164) e pelas três obrigações SIEG complementares que lhes incumbem (ver considerandos 170 e seguintes). Em segundo lugar, como será demonstrado em seguida, os hospitais IRIS e os hospitais privados de Bruxelas não se encontram numa situação comparável, especialmente na medida em que os hospitais IRIS são os únicos aos quais incumbem as três obrigações SIEG complementares (ver considerandos 170 e seguintes), sendo assim os únicos a exercer o SIEG de cuidados de saúde sociais tal como definido acima (ver considerandos 166 a 167). Em terceiro lugar, os hospitais IRIS estão igualmente sujeitos a restrições que têm impacto na execução do SIEG de cuidados de saúde sociais, nomeadamente o seu estatuto público (ver considerando 42) e a necessidade de assegurar a sustentabilidade da prestação deste SIEG (ver considerandos 91 a 168). O gráfico 2 apresentado abaixo ilustra estes dois elementos. Gráfico 2 Obrigações, restrições e mecanismos de financiamento público aplicáveis aos hospitais públicos IRIS em relação aos hospitais privados |
(168) |
Tendo em conta que as três obrigações de SIEG complementares vão além das exigências mínimas aplicáveis a todos os hospitais (públicos ou privados na Bélgica), essas obrigações acarretam custos que não são ou só são parcialmente cobertos pelo BMF (ver secção 2.5.1) e pelo sistema de segurança social. Se a isto acrescentarmos os custos mais elevados que decorrem do seu estatuto público (funcionários, bilinguismo, etc., ver também considerando 42), é possível explicar por que razão os hospitais IRIS declararam défices na maior parte dos anos do período de 1996 a 2014. No total, os défices contabilísticos dos hospitais IRIS no período 1996-2014 ascendem a cerca de 250 milhões de EUR (ver considerando 234). Os CPAS e os municípios de Bruxelas em causa querem e devem (190) assegurar a sustentabilidade dos seus hospitais IRIS a fim de garantir que o SIEG de cuidados de saúde sociais seja prestado e que a obrigação de apoio social do CPAS seja cumprida (ver também secção 2.2). É por esta razão que cobrem integralmente os défices, o que permite compensar os custos residuais do SIEG de cuidados de saúde sociais (composto pela missão hospitalar básica e pelas três obrigações SIEG complementares) (191) e, desta forma, assegurar a sustentabilidade dos hospitais IRIS (ver considerando 91). Deste modo, a compensação do défice não faz distinção entre as diferentes obrigações SIEG. Neste contexto, convém verificar se é possível excluir qualquer sobrecompensação de maneira global (por exemplo, para os diferentes SIEG combinados), como explicado abaixo (ver quadros 9 a 13 na secção 7.3.5). |
(169) |
Como indicado nos considerandos 165 a 167, a Comissão chegou à conclusão de que as obrigações complementares dos hospitais IRIS e a missão hospitalar básica devem ser consideradas conjuntamente como constituindo de facto um SIEG de cuidados de saúde sociais. Enquanto a missão hospitalar básica foi definida acima (ver considerando 164), a natureza exata de cada uma das obrigações de SIEG complementares será definida a seguir nesta secção. Além disso, será igualmente explicado como estão estas obrigações de SIEG complementares ligadas entre si e como contribuem para o SIEG de cuidados de saúde sociais. |
I. Obrigação de tratar qualquer paciente em qualquer circunstância sem ter em conta a sua capacidade de pagar (obrigação de cuidados universais)
(170) |
De acordo com as autoridades belgas, os hospitais IRIS são obrigados a tratar todos os pacientes, mesmo quando estes últimos não estão em condições de pagar e/ou não têm seguro, e devem fazê-lo em qualquer circunstância, incluindo quando estes pacientes não necessitam de cuidados médicos urgentes. Os autores da denúncia colocam em causa o facto de esta obrigação se aplicar aos hospitais IRIS e afirmam que os hospitais privados de Bruxelas não podem recusar pacientes e que, na verdade, tratam um grande número de pacientes ditos «sociais». Para corroborarem as suas afirmações, os autores da denúncia alegam que a LCH confere a mesma missão hospitalar a todos os hospitais e, como indicado no n.o 150 do acórdão de anulação de 7 de novembro de 2012, também fazem referência ao princípio geral de não discriminação que impediria os hospitais de selecionar os pacientes de acordo com as suas convicções ideológicas, filosóficas, religiosas ou sua situação de indigência. Segundo os autores da denúncia, os hospitais públicos e privados estão sujeitos à mesma obrigação de tratar os pacientes, tanto em situações de urgência como de «pós-urgência». |
(171) |
Desde logo, a Comissão constata que a LCH não contém qualquer formulação que possa ser interpretada como algo que obrigue os hospitais (públicos ou privados) a tratar os pacientes em qualquer circunstância, independentemente de sua capacidade de pagar. Porém, o direito belga prevê uma obrigação geral de assistência às pessoas que correm perigo. Como sublinharam as autoridades belgas, em conformidade com o artigo 422.o-B do Código Penal belga, essa obrigação é aplicável às situações de urgência e, em particular, aos casos de urgência médica que constituam uma ameaça para a vida. Os hospitais são, assim, obrigados a prestar assistência em casos de urgência médica, em função de sua organização e dos conhecimentos especializados disponíveis. Tanto os hospitais públicos como os hospitais privados estão sujeitos a essa obrigação, como aliás está qualquer cidadão em virtude do seu dever de prestar ajuda a pessoas que correm perigo. Não resta assim qualquer dúvida de que os hospitais públicos e privados de Bruxelas são obrigados a tratar os pacientes em situação de urgência, independentemente da sua capacidade de pagar. Da mesma forma, o código de deontologia aplicável aos médicos permite-lhes explicitamente recusar pacientes, exceto em situações de urgência (192). |
(172) |
Seguidamente, os autores da denúncia apoiam-se numa decisão do Tribunal de Primeira Instância de Bruxelas (193) para justificar que não existe qualquer diferença entre os hospitais públicos e os hospitais privados no que diz respeito ao tratamento de «pacientes sociais», tanto numa situação de «urgência» como de «pós-urgência». A referida decisão incide sobre um caso muito específico de apoio médico urgente que o CPAS deve prestar com base no artigo 57.o, n.o 2, da lei relativa aos CPAS. O Tribunal de Primeira Instância de Bruxelas salientou que o apoio médico urgente nunca é efetivamente prestado pelo próprio CPAS, mas sim por serviços médicos especializados, e que nada permite justificar uma qualquer distinção entre serviço público e serviço privado neste contexto. Não obstante, a Comissão observa que a obrigação de prestação de apoio médico urgente é aplicável aos CPAS e não aos hospitais que prestam os cuidados. No referido caso, um migrante sem documentos foi admitido de urgência por um hospital psiquiátrico privado de Bruxelas, que solicitou ao CPAS o pagamento deste apoio médico urgente devido à situação de indigência manifesta do migrante. O Tribunal de Bruxelas concluiu que se um CPAS não presta apoio médico urgente num hospital que gere, esse CPAS deve pagar os custos dos cuidados prestados por um hospital privado para onde os serviços de urgência decidiram levar o paciente devido à urgência da situação. Esta decisão diz claramente respeito a uma situação excecional em derrogação do quadro normal de assistência social em virtude do qual o CPAS se apoia nos seus próprios hospitais (públicos). No referido caso, a derrogação resultava do facto de os hospitais públicos não prestarem os cuidados psiquiátricos que eram necessários naquela situação. Além disso, o Tribunal de Bruxelas sublinhou que «se o apoio é frequentemente prestado num estabelecimento que depende do CPAS em causa ou com o qual este celebrou uma convenção, pode acontecer que a hospitalização se faça num outro estabelecimento, devido à urgência resultante da situação da pessoa a hospitalizar». O Tribunal de Bruxelas salientou igualmente que, se o CPAS em causa (designadamente, o de Uccle, no caso em apreço) tivesse criado o seu próprio hospital psiquiátrico ou tivesse celebrado um acordo com um tal hospital, o hospital privado em causa não teria necessidade de prestar os cuidados ao referido migrante sem documentos, mas teria podido solicitar a sua transferência para esse hospital. Como não era esse o caso, não havia qualquer outra solução possível e, consequentemente, foi exigido ao CPAS que reembolsasse o hospital privado pelos cuidados prestados ao paciente. Assim, a decisão do Tribunal de Bruxelas citada pelos autores da denúncia permite concluir que, em determinados casos, por motivos de urgência, os hospitais privados podem igualmente prestar apoio médico urgente a migrantes sem documentos e que o CPAS deve reembolsar esses hospitais privados quando deixa de cumprir a sua obrigação de prestar apoio médico urgente dessa maneira particular. Consequentemente, o facto de os hospitais privados de Bruxelas poderem prestar apoio médico urgente num número limitado de casos (194) não deve ser interpretado como uma obrigação geral imposta a esses hospitais de tratar todos os pacientes independentemente de sua capacidade de pagar. |
(173) |
Por último, no que diz respeito ao princípio de não discriminação [mencionado pelos autores da denúncia, ver considerando 170, é evidente que nenhum hospital na Bélgica está autorizado a exercer uma discriminação com base na situação financeira de um paciente (e logo no simples facto de este ser rico ou pobre) ou em qualquer outro critério pessoal (por exemplo: origem étnica ou religiosa). Todavia, na ausência de situação de urgência, o princípio de não discriminação não pode forçar os hospitais a prestarem cuidados gratuitamente se for claramente previsível que um paciente não estará em condições de pagar. Se estiverem reunidas estas condições nas situações não urgentes, os hospitais dispõem de uma justificação objetiva para criar uma distinção ao recusarem esses pacientes (195). Como indicado acima (ver considerando 171), o código de deontologia aplicável aos médicos belgas permite-lhes explicitamente recusar pacientes em situações não urgentes. Um inquérito realizado junto de mediadores de dívidas (196) indica, além disso, que os médicos e os hospitais por vezes recusam pacientes que tiveram dificuldades em pagar o seu tratamento médico no passado. Neste contexto, é interessante sublinhar que, em si, os hospitais não recusam indistintamente os pacientes, mas pedem-lhes um adiantamento, o que pode assim dissuadir aqueles que não possuem meios financeiros. Os dados empíricos sugerem igualmente que os hospitais privados por vezes enviam os pacientes para um hospital abrangido por um CPAS (197). Por esta razão, em 2013, foi proposta (mas não aprovada) uma lei no Senado belga com vista a proibir a recusa de prestação de cuidados de saúde aos pacientes com dificuldades financeiras, bem como a solicitação de adiantamentos (198). O princípio de não discriminação não pode assim ser invocado como impondo a todos os hospitais belgas (públicos e privados) uma obrigação de tratar todos os pacientes em quaisquer circunstâncias (ou seja, que não sejam situações de urgência), mesmo se os pacientes não tiverem condições de pagar o tratamento. |
(174) |
Com base no que foi exposto, a Comissão conclui que convém estabelecer uma distinção entre as situações urgentes e não urgentes. Em caso de urgência, os hospitais públicos e privados estão sujeitos à mesma obrigação geral (baseada no Código Penal belga) de tratar os pacientes que se encontrem numa situação de urgência médica. Contudo, nenhuma base jurídica encarrega os hospitais privados ou lhes impõe a obrigação de tratar os pacientes de igual forma em situações não urgentes e independentemente da sua capacidade de pagar. Com efeito, nem a LCH nem o Código Penal preveem tal obrigação e também não se pode considerar que o princípio de não discriminação imponha tal obrigação. Por último, a obrigação de prestar apoio médico urgente aos migrantes sem documentos é aplicável aos CPAS e não aos hospitais que prestam esses cuidados. |
A obrigação universal de acesso aos cuidados que incumbe aos hospitais IRIS
(175) |
Contudo, contrariamente aos hospitais privados, os hospitais IRIS são obrigados (199) a tratar todos os pacientes em qualquer circunstância, incluindo situações não urgentes, independentemente da capacidade que os pacientes têm de pagar e/ou da sua situação em matéria de seguros, com base em disposições específicas aplicáveis unicamente aos hospitais IRIS, designadamente os seus estatutos e os planos estratégicos IRIS, como indicado abaixo. Como foi explicado acima (ver considerando 24), os hospitais IRIS foram criados pelos CPAS para permitir que estes últimos cumpram a sua tarefa de prestar apoio social a todos aqueles que dele necessitam. Os CPAS são obrigados a prestar esse apoio (incluindo cuidados médicos e médico-sociais) a qualquer pessoa e qualquer família que deles necessite (200). Os CPAS prestam os seus serviços gratuitamente e foram criados especialmente para ajudar as pessoas desfavorecidas. Neste contexto, o artigo 5.o dos estatutos dos hospitais IRIS inclui as seguintes disposições:
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(176) |
Da mesma forma, a introdução do plano estratégico IRIS 1996-2001 indica o seguinte: «A fim de cumprir a sua função social em cada momento, o hospital público da rede IRIS oferecerá a gama de serviços que garanta a cada pessoa cuidados de qualidade ótima em condições financeiras geralmente aceitáveis para todos e será acessível a qualquer paciente, independentemente dos seus rendimentos, da sua condição em matéria de seguros, das suas origens e das suas convicções ideológicas» (202). |
(177) |
Esta mesma introdução acrescenta: «O principal objetivo do plano iris é a manutenção em Bruxelas de uma rede hospitalar pública reforçada e acessível a cada pessoa, sejam quais forem os seus rendimentos, a sua situação em matéria de seguros, as suas origens, as suas convicções ideológicas e filosóficas.» (203) |
(178) |
Numa outra secção do referido plano, refere-se que a carta do paciente IRIS garantirá «o acesso por parte de todos os pacientes, sem distinção em razão das suas origens, dos seus rendimentos, das suas convicções filosóficas e ideológicas, da sua situação em matéria de seguros.» (204) |
(179) |
Além disso, o plano estratégico IRIS 1996-2001 inclui uma subsecção 2.5.4 intitulada «Assumir a responsabilidade e tratar qualquer pessoa que se apresente num dos hospitais da rede iris» que contém as seguintes prescrições: «Os hospitais públicos [designadamente os hospitais IRIS] têm como vocação básica a disponibilização de serviços de medicina social; esta vocação impõe que respondam às exigências de missões sociais, mesmo que esta função não seja reconhecida no acervo legislativo e regulamentar que rege o setor hospitalar. Os hospitais públicos têm como vocação acolher e prestar cuidados médicos a todos os pacientes quaisquer que sejam as suas origens, as suas condições, a sua cultura, as suas convicções e as suas patologias. Advém daí que, por serem públicos, os nossos hospitais devem responder aos princípios da universalidade, da igualdade, da continuidade e da mudança.
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(180) |
Decorre claramente do que foi exposto que a capacidade que os pacientes têm de pagar e a sua situação em matéria de seguros não são tomadas em consideração aquando da sua admissão nos hospitais IRIS, pelo que o acesso aos cuidados de saúde está garantido para todos, inclusivamente em situações não urgentes. Vários elementos do plano estratégico IRIS 1996-2001 demonstram igualmente a natureza social dos cuidados hospitalares prestados pelos hospitais IRIS (por exemplo: «para estar em condições de prosseguir a prestação de serviços de medicina desprovidos de toda e qualquer lógica comercial» (206)) e a intensa vontade de oferecer cuidados médicos de qualidade a todas as camadas da população de Bruxelas, em especial aos mais desfavorecidos (207). |
(181) |
O plano estratégico IRIS que abrange o período 2002-2014 retoma alguns princípios fundamentais (acesso para todos os pacientes, aumento da acessibilidade para os pobres), nomeadamente ao citar o artigo 5.o dos estatutos dos hospitais IRIS (208) (ver também considerando 175) e o principal objetivo do plano estratégico IRIS que abrange o período 1996-2001 (209) (ver considerando 177), bem como ao remeter para a carta do paciente IRIS (210) (ver considerando 178), e acrescenta o seguinte: «Os serviços públicos definem-se segundo três princípios fundamentais: a universalidade, a igualdade e a continuidade. Segundo estes três princípios, e por serem públicos, os hospitais da rede IRIS
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(182) |
Com base nos elementos apresentados acima, a Comissão conclui que os hospitais IRIS são obrigados a tratar todos os pacientes, em qualquer circunstância (tanto em situações urgentes como não urgentes), mesmo que estes não possam, presentemente ou previsivelmente no futuro, pagar o seu tratamento e/ou não estejam assegurados. Esta obrigação está prevista e é imposta aos hospitais IRIS através dos seus estatutos e dos planos estratégicos IRIS citados acima, que são vinculativos para os hospitais IRIS e que se baseiam na obrigação de prestar apoio social decorrente da lei relativa aos CPAS (uma obrigação que foi delegada pelos CPAS aos hospitais IRIS através dos seus estatutos e planos estratégicos). |
Incidência prática da obrigação universal de acesso aos cuidados que incumbe aos hospitais IRIS
(183) |
A Comissão observa igualmente que a conclusão acima, designadamente o facto de os hospitais IRIS serem obrigados a tratar todos os pacientes em qualquer circunstância (ou seja, tanto em situações urgentes como em situações não urgentes) e independentemente da capacidade que os pacientes têm de pagar, enquanto os hospitais privados só são obrigados a tratar todos os pacientes numa situação de urgência (ou seja, quando os cuidados são necessários imediatamente numa situação que constitui uma ameaça à vida), é além disso confirmada pelos diferentes perfis dos pacientes tratados pelos hospitais IRIS e pelos hospitais privados da Região de Bruxelas-Capital e pelas respetivas políticas de aplicação de tarifas dos referidos hospitais. |
(184) |
Convém desde logo referir que o plano estratégico 2002-2014 menciona igualmente as receitas menos elevadas (212) e os custos superiores (213) ligados ao tratamento dos pacientes que se encontram numa situação precária no plano socioeconómico, constituindo estes uma parte significativa dos pacientes dos hospitais IRIS. Neste contexto, é interessante sublinhar que os hospitais IRIS chegaram a acordo com os seus médicos quanto ao facto de os suplementos (ver considerando 46c) para mais informações) não poderem ser faturados aos pacientes do CPAS nem aos pacientes com rendimentos baixos (ou seja, àqueles que têm direito a um reembolso mais elevado por parte do INAMI). Além disso, a percentagem de admissões em quartos individuais (ou seja, os únicos quartos onde os suplementos podem ser faturados) é muito inferior à média na Região de Bruxelas-Capital (214). Os dados disponíveis fornecidos por uma das sociedades mútuas (215) revelam ainda que, quando um suplemento é cobrado pelos hospitais IRIS, o seu montante é igualmente muito mais baixo do que a média da região (entre 25 % a 67 % a menos). Comparativamente, para o período considerado, alguns hospitais privados de Bruxelas cobraram aos seus pacientes, em média, um montante 180 % superior em relação aos preços fixados pelo sistema de segurança social. |
(185) |
A obrigação universal de acesso aos cuidados foi confiada aos hospitais IRIS a fim de garantir que os pacientes que não estão em condições de pagar, que não dispõem de seguro privado e que não são suscetíveis de receber um reembolso (mesmo que parcial) da segurança social, beneficiam dos cuidados médicos de que necessitam. Um subgrupo significativo destes pacientes inclui os migrantes sem documentos previamente referidos, uma vez que estes não se encontram cobertos pela segurança social belga e, em geral, não estão em condições de pagar os cuidados médicos. Em 85 % dos casos na Região de Bruxelas-Capital, esses migrantes recebem apoio médico urgente da parte dos hospitais IRIS (ver considerando 172), ainda que estes hospitais explorem apenas 35 % das camas de hospitais desta região. Um outro indicador revelador é a classificação (216) do serviço público federal da saúde pública que classifica a totalidade dos hospitais belgas com base no perfil socioeconómico dos seus pacientes (ver quadro 1 e considerando 40). Esta classificação reflete, entre outros, a proporção de pacientes que não podem pagar e não se encontram cobertos pela segurança social e para os quais os CPAS (217) podem reembolsar as despesas de tratamento (ver também considerandos 187 a 188) (218). Para o período 2007-2013 e para a Bélgica no seu conjunto, os três primeiros lugares da classificação são todos ocupados pelos hospitais IRIS (sendo os hospitais Institut Bordet e HUDERF as exceções devido ao seu caráter especializado). Em contrapartida, no mesmo período, os hospitais privados de Bruxelas não ocupam nenhuma das 20 primeiras posições, o que indica que o perfil socioeconómico médio dos seus pacientes é sensivelmente melhor do que o dos pacientes dos hospitais IRIS. Mesmo que os critérios utilizados para definir esta classificação não digam apenas respeito aos pacientes que não podem pagar ou que não estão assegurados, esta última também contradiz a afirmação dos autores da denúncia segundo a qual os hospitais privados de Bruxelas têm obrigação de tratar todos os pacientes em qualquer circunstância e confirma que tal obrigação incumbe unicamente aos hospitais IRIS. Com efeito, se tal obrigação incumbisse aos hospitais privados de Bruxelas, seria expectável que estes ocupassem uma posição mais elevada na classificação. Quadro 1 Classificação dos hospitais em função do perfil socioeconómico dos seus pacientes, elaborada pelo serviço público federal da saúde pública (*= hospitais IRIS, += hospitais privados de Bruxelas)
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(186) |
Convém recolocar no seu contexto a referência que os autores da denúncia fazem a uma publicação da organização Mutualités Chrétiennes de fevereiro de 2004 (ver considerando 72), que diz apenas respeito ao ano 2001 e que demonstraria que os hospitais privados tratam mais de 60 % dos «pacientes sociais» na Região de Bruxelas-Capital. A expressão «pacientes sociais» pode dar a impressão de incluir os pacientes que não têm condições de pagar um tratamento e que todos estariam assim abrangidos pela obrigação universal de acesso aos cuidados médicos. No entanto, não é este o caso, pelas razões seguintes:
Por estas razões, a Comissão considera que a publicação da organização Mutualités Chrétiennes que apresenta estatísticas para o ano 2001 não prova que os hospitais IRIS não estão sujeitos à obrigação universal de acesso aos cuidados médicos, nem que os hospitais privados de Bruxelas têm uma obrigação comparável. |
(187) |
A obrigação universal de acesso aos cuidados médicos que incumbe aos hospitais IRIS garante que os pacientes confrontados com dificuldades financeiras extremas, os refugiados políticos, os imigrantes ilegais, etc. recebem tratamento em qualquer circunstância. Se estes pacientes não puderem pagar o seu tratamento e não tiverem qualquer tipo de seguro (ou seja, não estão abrangidos nem pela segurança social nem por um seguro de saúde privado), os CPAS só cobrem os custos destes pacientes sob reserva do respeito de determinadas condições. A fim de fixar as regras aplicáveis a um tal reembolso, os hospitais IRIS e 17 dos 19 CPAS da Região de Bruxelas-Capital celebraram convenções multilaterais denominadas «domicílio de socorro». Para os cuidados não urgentes, os CPAS orientam as pessoas em causa para os hospitais IRIS e comprometem-se por escrito (através de uma «requisição») a cobrir o custo do tratamento. Se os pacientes apresentarem esta requisição, os hospitais IRIS enviam a fatura diretamente ao CPAS. Para os cuidados urgentes, este procedimento não pode, obviamente, ser seguido. Em vez disso, o reembolso pelo CPAS está subordinado: i) à apresentação de um certificado médico que confirme a necessidade de uma admissão de urgência ou de um tratamento imediato da pessoa; e ii) à situação de indigência da pessoa tal como confirmada pelos CPAS utilizando as informações recolhidas pelo hospital para realizar um inquérito social. A recolha das informações necessárias é uma tarefa importante para os departamentos dos serviços sociais dos hospitais IRIS (ver também considerandos 210 a 211) (222). |
(188) |
Na medida em que as condições mencionadas acima estejam preenchidas (designadamente, a apresentação de uma requisição para os cuidados não urgentes e de um certificado médico e do inquérito social para os cuidados urgentes), o CPAS reembolsa os hospitais IRIS dos custos associados ao tratamento dos pacientes que não têm condições de pagar o seu tratamento e que não estão abrangidos por um seguro. Todavia, tal não isenta os hospitais IRIS da totalidade da responsabilidade decorrente da obrigação universal de acesso aos cuidados médicos. Com efeito, para obter o reembolso por parte do CPAS, os hospitais IRIS devem recolher informações para o inquérito social (algo que fizeram para 25 749 casos em 2012). É, por exemplo, uma das razões pelas quais os hospitais IRIS empregam mais do dobro de assistentes sociais do que os hospitais universitários (ver considerando 213). Contudo, os CPAS não reembolsam os hospitais IRIS dos custos associados à recolha de informações para os inquéritos sociais (223). Além disso, os CPAS têm prazos de pagamento mais dilatados (ultrapassando por vezes um ano) do que as sociedades mútuas e as companhias de seguros (que pagam num prazo de um a dois meses após a receção da fatura). Consequentemente, os hospitais IRIS devem pré-financiar estes custos durante um período de tempo mais longo do que para os pacientes «normais». Em 31 de dezembro de 2010, o CPAS de Bruxelas devia aos hospitais IRIS perto de 35 milhões de EUR (dos quais cerca de 71 % dizem respeito a faturas de 2010, 12 % a faturas de 2009 e cerca de 13 % a faturas de anos anteriores). Se fosse aplicada uma taxa de juro nominal anual de 2 %, os hospitais IRIS estimam que o custo inerente aos prazos de pagamento mais dilatados ascenderia naquela data a quase 700 000 EUR (224). Por último, nem todas as pessoas que podem ter dificuldades em pagar a sua fatura são elegíveis para uma cobertura por parte do CPAS (225). Não obstante, com base na sua obrigação universal de acesso aos cuidados médicos, os hospitais IRIS tratam os pacientes para os quais os CPAS não se comprometem a cobrir os custos. Numa situação como esta, os hospitais IRIS enviam uma fatura aos pacientes que, em certos casos, não estão em condições de pagar. Resulta daí que os hospitais IRIS devem enfrentar um nível de dívidas incobráveis que é muito mais elevado do que o dos outros hospitais públicos e dos hospitais privados da Bélgica (226). Os hospitais IRIS estimaram que, em 2010, o seu montante de dívida anulada excedia a média dos hospitais públicos da Bélgica em cerca de […] milhões de EUR. |
(189) |
Por último, é importante voltar a contextualizar o financiamento previsto pela secção B8 do BMF, que é concedido aos hospitais cujos pacientes apresentem um perfil socioeconómico baixo. Este financiamento federal restrito destina-se a compensar uma parte dos custos associados aos «pacientes sociais» (por exemplo, devido ao facto de, em média, estes pacientes permanecerem mais tempo no hospital do que os outros), mas não constitui uma compensação pela obrigação universal de acesso aos cuidados médicos. O financiamento ao abrigo da secção B8 não compensa os custos reais suportados pelos hospitais para o tratamento dos pacientes sociais (por exemplo, as faturas não pagas pelos pacientes sociais, a necessidade de disporem de assistentes sociais suplementares). Em contrapartida, é alocado um orçamento fixo (cerca de 25 milhões de EUR por ano para a Bélgica no seu conjunto) com base na classificação dos hospitais estabelecida em função do perfil socioeconómico dos seus pacientes (ver considerando 185). Tendo em conta que os três primeiros lugares desta classificação são ocupados pelos hospitais IRIS, estes últimos também recebem uma maior parte do financiamento ao abrigo da secção B8 do que os hospitais menos bem classificados (tais como os hospitais privados de Bruxelas). A razão pela qual os hospitais, tanto públicos como privados, são em princípio elegíveis para este financiamento prende-se com o facto de, mesmo na ausência da obrigação universal de acesso aos cuidados médicos, como a que incumbe aos hospitais IRIS, os hospitais poderem optar livremente por tratar pacientes sociais. Esta opção é possível porque alguns pacientes sociais estão em condições de pagar ou estão assegurados. De facto, no caso dos pacientes sociais que estão abrangidos pela segurança social, são muitas vezes aplicadas tarifas inferiores e o INAMI paga uma parte bem maior dos custos, o que reduz o risco financeiro para o hospital. Verifica-se igualmente que nem todos os CPAS da Bélgica optaram por criar o seu próprio hospital. Consequentemente, para cumprirem a sua obrigação de apoio social, os CPAS podem apoiar-se nos hospitais privados. Em situações como esta, um hospital privado trataria logicamente um determinado número de pacientes sociais e poderia igualmente beneficiar de um financiamento ao abrigo da secção B8 previsto no BMF. Contudo, na Região de Bruxelas-Capital, os CPAS podem contar com os hospitais públicos IRIS, o que explica por que razão a classificação definida no considerando 185 mostra que o perfil socioeconómico médio dos pacientes dos hospitais privados de Bruxelas é manifestamente melhor do que o dos pacientes dos hospitais IRIS. Por todas estas razões, o financiamento ao abrigo da secção B8 do BMF não seria considerado como indicativo da existência de uma obrigação universal de acesso aos cuidados médicos para todos os hospitais belgas. |
Conclusão sobre a obrigação universal De acesso aos cuidados médicos dos hospitais IRIS
(190) |
Com base nos elementos expostos, a Comissão conclui que a obrigação universal de acesso aos cuidados médicos incumbe unicamente aos hospitais IRIS, é objeto de uma atribuição claramente estabelecida e encontra-se definida nos estatutos dos hospitais IRIS e nos planos estratégicos IRIS em conformidade com as exigências da lei relativa aos CPAS (ver considerandos 29 a 30). Essa obrigação aparece igualmente refletida na classificação dos hospitais estabelecida em função do perfil socioeconómico dos seus pacientes (ver considerando 185). A referida obrigação garante que as pessoas desfavorecidas da Região de Bruxelas-Capital recebam tratamento médico adequado, mesmo quando não têm condições de o pagar, incluindo em situações não urgentes. Os hospitais IRIS disponibilizam assim cuidados de saúde sociais que correspondem às necessidades da população local. Como é explicado no considerando anterior, só uma parte do encargo associado a esta obrigação está coberta diretamente (por exemplo, através do reembolso das despesas de tratamento por parte dos CPAS). É por essa razão que o encargo remanescente é coberto pela compensação dos défices que são objeto da presente decisão. |
II. Obrigação de assegurar uma oferta completa de cuidados hospitalares básicos em múltiplos estabelecimentos
(191) |
As autoridades belgas estimam que os hospitais IRIS também têm a obrigação específica de assegurar uma oferta completa de cuidados hospitalares básicos em múltiplos estabelecimentos ou a obrigação «de estabelecimentos múltiplos» na Região de Bruxelas-Capital. Segundo os autores da denúncia, não se sabe contudo claramente o que abrange a obrigação de «assegurar uma oferta completa de cuidados hospitalares básicos em múltiplos estabelecimentos», nem em que medida essa obrigação impõe encargos suplementares aos hospitais IRIS. Todavia, os autores da denúncia não alegam que os hospitais privados de Bruxelas tenham essa obrigação. |
(192) |
A Comissão constata que a LCH não impõe que os hospitais (públicos ou privados) estejam ativos em múltiplos estabelecimentos. Em contrapartida, o mecanismo de programação hospitalar determina o número máximo de camas de hospitais que podem ser disponibilizadas em cada região da Bélgica. Na Região de Bruxelas-Capital, o número de camas de hospitais (gerais) está limitado a cerca de 7 260, e cada hospital de Bruxelas está autorizado a disponibilizar um determinado número de camas dentro desse limite. Em princípio, se a capacidade de um hospital foi aprovada ao abrigo do sistema de programação, o hospital pode decidir livremente reunir essas camas num único estabelecimento ou reparti-las por múltiplos estabelecimentos nessa região específica, e isto na medida do que pretenda. Da mesma forma, pode decidir duplicar ou não certos serviços ou propor apenas tipos de cuidados distintos em cada um dos seus estabelecimentos. Neste contexto, alguns hospitais privados de Bruxelas optaram livremente por estar ativos em múltiplos estabelecimentos, enquanto outros apenas estão ativos num único estabelecimento (227). Contudo, os hospitais privados podem optar em qualquer momento por reunir as suas camas e os seus serviços num único estabelecimento (228). Convém igualmente observar que, dentro dos limites fixados pelo mecanismo de programação (229), os hospitais privados também são livres de escolher os tipos de cuidados médicos que propõem, o que lhes dá a possibilidade de se especializarem nos tipos de cuidados de saúde mais rentáveis (230). |
A obrigação de estabelecimentos múltiplos que incumbe aos hospitais IRIS
(193) |
No que diz respeito aos hospitais IRIS, os municípios e os CPAS privilegiam a manutenção de uma oferta de cuidados local em relação à concentração de camas de hospitais. Optaram expressamente por assegurar uma oferta completa de cuidados básicos em todos os estabelecimentos, o que, devido à necessidade de duplicação das infraestruturas, dos equipamentos e das atividades, acarreta custos adicionais. Foi nesta base que, aquando da restruturação dos hospitais de Bruxelas em 1995, os CPAS e os municípios optaram deliberadamente por conservar os serviços hospitalares locais existentes em múltiplos estabelecimentos, assegurando assim uma oferta completa de cuidados tendo em conta as necessidades da população. Consideraram que as necessidades médico-sociais a nível local, que estiveram na origem da criação dos hospitais públicos, não deixaram de existir. Neste contexto, importa referir que a maior parte dos hospitais IRIS se encontram nos municípios mais pobres da Região de Bruxelas-Capital (ver também considerando 202). As autoridades públicas renunciaram assim de livre vontade aos ganhos de eficiência, em detrimento do seu interesse puramente financeiro, e optaram por conservar todos os estabelecimentos hospitalares existentes, sabendo contudo que as medidas federais de financiamento dos hospitais não cobriam todos os custos (devido, por exemplo, à duplicação das infraestruturas e das despesas de exploração, ver também considerando 203). Esta opção está confirmada nos planos estratégicos IRIS, obrigando assim os hospitais IRIS a manterem todos os estabelecimentos hospitalares com vista a que todos os pacientes possam receber os cuidados básicos tão perto quanto possível do seu domicílio. |
(194) |
Em especial, a secção «Eixos estruturantes» do plano estratégico IRIS 1996-2001 refere-se a: «Manutenção de uma atividade de hospitalização descentralizada e de uma ampla cobertura ambulatória. A atividade será mantida nos nove estabelecimentos.» (231) (232) […] «Manutenção da atividade básica em diferentes estabelecimentos. Os pacientes, em especial os idosos, podem assim continuar a receber cuidados hospitalares a uma distância razoável do seu domicílio.» (233) |
(195) |
O plano estratégico 1996-2001 sublinha igualmente que os hospitais IRIS tratam essencialmente pacientes que vivem nas proximidades, podendo assim ser qualificados de «hospitais de proximidade» (234). Além disso, os hospitais IRIS pretendem «aumentar a adequação dos [seus] serviços às necessidades da população de Bruxelas, […] e reforçar [a sua] acessibilidade a todas as camadas da população, em especial aos menos favorecidos» (235). |
(196) |
O plano estratégico 2002-2014 acrescenta: «a IRIS adota o princípio de uma organização centrada nos pacientes, inscrita numa rede pública de instituições que colaboram entre si com o objetivo de assegurar uma oferta de cuidados de proximidade e especializada» (236). |
(197) |
No que diz respeito aos cuidados de proximidade, este plano estratégico refere ainda: «Tendo em conta a repartição geográfica dos estabelecimentos IRIS, o seu impacto na cobertura de uma população geral, por vezes em sofrimento social, o primeiro objetivo desenvolvido é garantir em cada estabelecimento serviços de medicina de proximidade, de qualidade, com altos índices de desempenho e acessíveis. Os hospitais IRIS — com exceção do hospital Institut Bordet e do Hospital das Crianças [HUDERF] (237) que são hospitais monoespecializados de referência — têm como principal vocação oferecer serviços de medicina de proximidade, que correspondam à procura local dos pacientes que vivem nos municípios circundantes» (238). |
(198) |
O plano estratégico IRIS 2002-2014 também especifica que, para além dos serviços de medicina de proximidade relativa aos cuidados básicos, os hospitais IRIS propõem cuidados especializados (dito de outra forma, uma gama de cuidados mais alargada ou mais desenvolvida (239)). Contudo, estes cuidados não são propostos em todos os estabelecimentos (embora o sejam geralmente na maior parte deles) e são objeto de uma planificação ao nível da rede IRIS (240). O objetivo passa sempre por garantir à população de Bruxelas o acesso universal a uma oferta de cuidados ótima (através de uma medicina de proximidade ou de cuidados especializados) (241). Este plano estratégico também contém quadros pormenorizados que especificam o tipo de cuidados básicos e cuidados especializados propostos em cada um dos estabelecimentos dos hospitais IRIS. As atividades de cuidados básicos são designadas «nível 1 — nível de proximidade», ao passo que as atividades de cuidados especializados são designadas «nível 2 — nível de especialização» e «nível 3 — nível de referência» (242). Assim, os hospitais IRIS sabem claramente que tipos de cuidados devem prestar em cada um dos seus estabelecimentos. |
(199) |
A fim de garantir que cada hospital IRIS esteja plenamente consciente das necessidades médico-sociais da população local e seja gerido em conformidade, a criação dos hospitais IRIS também se encontra expressamente ligada à manutenção de uma «base local» para os serviços hospitalares públicos. São disso testemunhas o acordo de restruturação confirmado pelo acordo de cooperação de 19 de maio de 1994 (243), bem como a composição dos órgãos de direção dos hospitais IRIS (244). Mais especificamente, em conformidade com o artigo 11.o dos estatutos, a maioria dos membros da assembleia-geral das associações de hospitais IRIS é eleita pelo conselho municipal e pelo conselho dos serviços sociais (organizado ao nível municipal), ao passo que o burgomestre e o presidente do CPAS são nomeados membros ex-officio. Da mesma forma, 10 dos 14 membros do conselho de administração são nomeados pelos membros da delegação das autoridades públicas à assembleia-geral (como exigido pelo artigo 27.o dos estatutos). |
(200) |
A intenção de gerir os hospitais IRIS em função das necessidades médico-sociais da população local foi confirmada pela reunião do conselho de administração da rede IRIS de 20 de novembro de 1996, onde foi aprovada uma alteração do plano estratégico 1996-2001 que afirma claramente, a este respeito: «Este conjunto de restrições, que necessitam de uma restruturação, deve constar do quadro mais alargado dos nossos objetivos estratégicos. Estes podem ser recapitulados do seguinte modo:
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(201) |
Esta alteração acrescenta ainda: «Neste contexto, a restruturação deve garantir:
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A obrigação de estabelecimentos múltiplos dos hospitais IRIS, uma verdadeira obrigação de serviço público (SIEG)
(202) |
A Comissão também analisou o argumento dos autores da denúncia no contexto do processo julgado pelo Tribunal Geral (ver secção 4.2), segundo o qual as necessidades em matéria de cuidados de proximidade devem ser consideradas em relação ao grande número de hospitais públicos e privados existentes na Região de Bruxelas-Capital. Como foi explicado acima, o mecanismo de programação hospitalar fixa o número máximo de camas de hospitais gerais na Região de Bruxelas-Capital em 7 260, com o objetivo de evitar uma oferta excessiva de serviços médicos. Este número de camas é colocado à disposição conjuntamente para os hospitais públicos e para os hospitais privados, a fim de corresponder às necessidades de cuidados hospitalares na Região de Bruxelas-Capital. Contudo, o mecanismo de programação só toma em consideração as necessidades médicas ao nível regional e não leva em conta as necessidades sociais de uma população específica nem a situação social própria de uma zona geográfica. Estas necessidades sociais são avaliadas ao abrigo da política de apoio social dos CPAS (dito de outra forma, ao nível municipal). Os predecessores dos hospitais IRIS foram criados para dar resposta às necessidades sociais e, após a restruturação, os diferentes estabelecimentos IRIS foram mantidos porque continuam a corresponder a uma verdadeira necessidade social (ver considerandos 82 a 84 e 91). Com efeito, é precisamente porque os hospitais IRIS fornecem o SIEG de cuidados de saúde sociais que também há uma necessidade e uma obrigação de dispor de estabelecimentos múltiplos. Para os habitantes desfavorecidos da Região de Bruxelas-Capital, é importante não apenas poderem deslocar-se até um hospital próximo do seu domicílio, mas também terem a certeza de que receberão os cuidados mesmo se não estiverem em condições de os pagar, bem como de poderem solicitar o apoio dos serviços sociais. Ao obrigarem os hospitais IRIS a manter os diferentes estabelecimentos de que dispõem, a Região de Bruxelas-Capital e os CPAS pretendem garantir que os cuidados de saúde sociais também são prestados tão perto quanto possível do local onde existe uma necessidade. Neste contexto, convém sublinhar que dez dos onze estabelecimentos dos hospitais IRIS estão localizados em municípios onde o rendimento médio não ultrapassa a mediana (246) para a Região de Bruxelas-Capital. Pelo contrário, cinco dos onze estabelecimentos dos hospitais privados estão localizados em municípios onde o rendimento médio é superior a essa mediana (247). Como indica o mapa apresentado abaixo (248) (ver gráfico 3), não parece existir uma sobreposição geográfica significativa entre os hospitais públicos (círculos a tracejado) e os hospitais privados gerais e universitários (círculos a traço contínuo) na Região de Bruxelas-Capital. Esta situação leva a crer que o simples facto de muitos hospitais estarem ativos na Região de Bruxelas-Capital não é suficiente para garantir o acesso de todos os habitantes aos cuidados hospitalares. Por outro lado, como foi explicado acima, os hospitais IRIS são os únicos hospitais da Região de Bruxelas-Capital a prestar um SIEG de cuidados de saúde sociais, pelo que os hospitais privados não podem ser considerados equivalentes quando se trata de corresponder às necessidades sociais da população local. Atendendo às considerações anteriores, a Comissão conclui que a presença de vários hospitais privados na Região de Bruxelas-Capital não constitui um motivo que permita pôr em causa a natureza da verdadeira obrigação de serviço público (SIEG) da obrigação de estabelecimentos múltiplos que incumbe aos hospitais IRIS e não aos hospitais privados de Bruxelas, especialmente à luz do SIEG de cuidados de saúde sociais. Gráfico 3 Mapa dos estabelecimentos hospitalares na Região de Bruxelas-Capital |
Incidência prática da obrigação de estabelecimentos múltiplos dos hospitais IRIS
(203) |
A obrigação de estabelecimentos múltiplos pode também ser considerada como um encargo para os hospitais IRIS, uma vez que lhes impõe a duplicação de certas infraestruturas e gera despesas de exploração mais elevadas. Estas despesas estão principalmente ligadas à necessidade de dotar cada um dos estabelecimentos de serviços, tais como um serviço de urgência, um serviço de esterilização, um serviço de controlo e segurança, bem como de uma administração própria. Na verdade, o financiamento BMF (ver considerando 46a)) é concedido apenas a um único destes serviços por cada hospital, seja qual for o número de estabelecimentos que ocupe. As despesas de exploração relativas a diversas rubricas (manutenção, aquecimento, limpeza, etc.) acrescem às despesas com infraestruturas e equipamentos. Um estudo realizado pela associação matriz IRIS em 2009 estimou que os custos decorrentes da obrigação de estabelecimentos múltiplos que não estão cobertos pelo financiamento BMF totalizavam […] milhões de EUR em 2008 e […] milhões de EUR em 2009 para os cinco hospitais IRIS considerados no seu conjunto. |
Conclusão em relação à obrigação de estabelecimentos múltiplos que incumbe aos hospitais IRIS
(204) |
A Comissão conclui que, em virtude dos planos estratégicos IRIS, os hospitais IRIS têm a obrigação clara: 1) de manter todos os seus estabelecimentos hospitalares a fim de corresponderem às necessidades médico-sociais das respetivas populações locais e 2) de assegurar uma oferta completa de atividades de cuidados básicos no conjunto desses estabelecimentos. Em especial, o plano estratégico IRIS define as atividades que são consideradas cuidados básicos e cuidados especializados e indica para cada estabelecimento hospitalar IRIS quais os tipos de cuidados que devem ser propostos. Por outro lado, as disposições dos estatutos dos hospitais IRIS e da lei relativa aos CPAS garantem que os hospitais IRIS estão plenamente conscientes das necessidades médico-sociais da população local e são geridos em conformidade. Além disso, a obrigação de estabelecimentos múltiplos ultrapassa as exigências da LCH e do mecanismo de programação, uma vez que este último não tem em conta as necessidades sociais de uma população específica nem a situação social própria de cada zona geográfica. Os hospitais privados não são assim obrigados a estarem ativos em vários estabelecimentos nem a assegurarem uma oferta completa de cuidados básicos em cada estabelecimento (quando optam por ocupar vários estabelecimentos). Por último, como foi explicado no considerando anterior, a obrigação de estabelecimentos múltiplos gera custos não negligenciáveis para os hospitais IRIS, que não são cobertos pelo BMF e, logo, contribuem para o défice dos hospitais IRIS. |
III. Obrigação de prestar serviços sociais alargados
(205) |
Finalmente, as autoridades belgas estimam que os hospitais IRIS têm a obrigação de prestar serviços sociais alargados aos pacientes e suas famílias. Segundo os autores da denúncia, a obrigação parece consistir unicamente num volume de serviços sociais superior ao proposto pelos outros hospitais. Neste contexto, importa sublinhar que nem a LCH nem as condições de aprovação dos hospitais (com base no decreto real de 23 de outubro de 1964) impõem uma obrigação geral de prestação de serviços sociais dentro de um hospital. Somente algumas regras isoladas relacionadas com determinados serviços hospitalares (serviços geriátricos e psiquiátricos (249)) preveem a intervenção de assistentes sociais. Além disso, uma regra específica dos hospitais universitários prevê a presença de um só assistente social por cada 2 000 admissões (250). Fora estas situações específicas, os hospitais privados não têm qualquer obrigação de prestar serviços sociais a todos os seus pacientes. Em contrapartida, os hospitais IRIS são obrigados, com base nos planos estratégicos IRIS, a dispor de serviços sociais que ajudem todos os pacientes que deles têm necessidade. |
A obrigação de prestar serviços sociais alargados que incumbe aos hospitais IRIS
(206) |
O plano estratégico IRIS 1996-2001 apresenta o contexto geral da responsabilidade global pelos pacientes que é assumida dentro dos hospitais IRIS, inclusive no que diz respeito aos aspetos psicossociais e ambientais: «Responsabilidade global pelos pacientes: O paciente não pode ser reduzido à patologia para a qual necessita de cuidados. Algumas categorias de pacientes em especial devem beneficiar de um acolhimento global, tanto nos aspetos puramente médicos como nos aspetos psicossociais e ambientais: pacientes geriátricos, pacientes pediátricos, pacientes em fase terminal, pacientes psiquiátricos, pacientes socialmente desfavorecidos, etc. (251).» |
(207) |
O papel dos serviços sociais e as suas principais missões são descritos mais pormenorizadamente neste plano: «Os hospitais [IRIS] devem dispor de serviços sociais cujo papel fundamental seja contribuir para o bem-estar dos pacientes, a qualidade médica e o funcionamento ótimo da instituição. O serviço social é um colaborador do funcionário dirigente e um parceiro de todos os serviços do hospital. É responsável pela humanização das condições de permanência [dos pacientes no hospital]. A sua preocupação deve incidir nas dificuldades de ordem social dos pacientes, no caso ideal antes, mas também durante a permanência e à saída da hospitalização. É o elo de ligação privilegiado entre o paciente, o hospital, a sua família e o seu ambiente. Para tal, deve:
A missão de medicina social que os hospitais públicos têm como vocação implica que estes exerçam uma função de coordenação dos intervenientes no domínio da saúde, que participem nas redes sanitárias e sociais, inclusivamente que as suscitem, e que participem diretamente na criação dos serviços anexos IRIS necessários para ir ao encontro das necessidades da população (hotel de cuidados de saúde, hotel das famílias, cuidados paliativos no domicílio, estruturas de acolhimento para toxicodependentes e sem-abrigo, serviços de cuidados no domicílio, etc.). Os serviços sociais procederão à acreditação dos organismos com os quais cooperarão (252).» |
(208) |
Segundo este plano estratégico, o serviço social pode também desempenhar um papel importante aquando da admissão dos pacientes: «O acolhimento deve ser pensado de forma diferente consoante o paciente chegue às urgências, à consulta ou às admissões; o acolhimento deve, em todo caso, assegurar ao paciente discrição e conforto e contribuir para atenuar ao máximo as suas inquietações e as da sua família. Os serviços sociais dos nossos hospitais desempenham, neste aspeto, um papel primordial (253).» |
(209) |
O plano estratégico IRIS 2002-2014 acrescenta: «O serviço social é indispensável no hospital público para acompanhar os pacientes, tanto os ambulantes como os hospitalizados. Consiste em dar assistência aos pacientes e respetiva família para resolver e gerir problemas e dificuldades administrativas, financeiras, relacionais e sociais ligadas ao estado da doença, à permanência e ao tratamento no hospital, bem como às novas perspetivas e situações. O serviço social:
[…] Em conclusão, as tarefas do serviço social são múltiplas:
Neste aspeto, o serviço social e todos os assistentes sociais procuram alcançar os mesmos objetivos e interesses do que o hospital, sendo que a sua atividade específica tem impacto na redução do tempo de permanência no hospital e na recuperação por parte do hospital das despesas incorridas (254).» |
(210) |
O papel dos serviços sociais na recuperação das despesas de tratamento junto dos CPAS (ver considerando 187) também é confirmado no texto do plano estratégico IRIS 2002-2014. Este último sublinha, em especial, que entre as tarefas dos serviços sociais consta a preparação de inquéritos de solvabilidade relativamente aos pacientes: «O serviço social estabelece um processo social informatizado que deve poder seguir os pacientes na rede [IRIS]. Este serviço realiza inquéritos de solvabilidade [relativamente aos pacientes], preenche os códigos «V» do RCM (255) e outros registos impostos pela regulamentação. Este processo[social] será logo que possível associado ao processo médico e aos sistemas informáticos centrais. Este registo do processo social deve poder constituir um painel de avaliação das missões sociais do hospital público [IRIS] (256).» |
(211) |
Essas tarefas dizem respeito à recolha das informações exigidas para os «inquéritos sociais» que são necessários para determinar se os pacientes preenchem as condições necessárias para que os CPAS cubram as suas despesas médicas (ver também considerandos 187-188). Mais precisamente, os assistentes sociais do hospital recolhem informações úteis (257) que permitem ao CPAS verificar, em conformidade com as suas obrigações jurídicas (258), a situação de indigência de um paciente e, logo, poder decidir se um reembolso por parte do CPAS se justifica. |
Incidência prática da obrigação de prestar serviços sociais alargados que incumbe aos hospitais IRIS
(212) |
O pessoal dos serviços sociais dos hospitais IRIS recebe formação específica e segue um código de ética profissional tendo em conta o papel de ligação que desempenha entre os diferentes serviços dentro do hospital (nomeadamente os médicos, os enfermeiros, os encarregados da faturação e das admissões) ou fora do hospital (por exemplo: cobertura de segurança social, cuidados e apoio no domicílio, aspetos linguísticos e culturais). |
(213) |
A fim de avaliar o custo dos seus serviços sociais, a rede IRIS comparou o custo real dos assistentes sociais empregados nos hospitais IRIS com um nível razoável correspondente a um assistente social por cada 2 000 admissões (ou seja, a obrigação aplicável aos hospitais universitários). Esta análise mostra que os cinco hospitais IRIS empregavam 81,1 assistentes sociais (259), ao passo que, com base no nível razoável, empregariam apenas 36,7. A diferença é pois de 44,4, o que indica que os hospitais IRIS empregam mais do dobro do número de assistentes sociais que pressupõe a regra aplicável aos hospitais universitários. Isto ilustra bem que as exigências dos planos estratégicos obrigam os hospitais IRIS a prestarem uma gama de serviços sociais muito mais alargada do que o mínimo (por exemplo, para os serviços geriátricos e psiquiátricos) aplicável aos outros hospitais não universitários (quer sejam públicos ou privados). O facto de os hospitais privados não universitários de Bruxelas também empregarem assistentes sociais pode ser explicado por essas exigências mínimas, e não tanto por uma obrigação global de prestar serviços sociais aos seus pacientes. Da mesma forma, como foi demonstrado acima, os hospitais IRIS vão muito além da exigência básica de terem um assistente social por cada 2 000 admissões, aplicável aos hospitais universitários na Bélgica. Consequentemente, o custo não financiado dos serviços sociais dos hospitais IRIS ascendia a […] milhões de EUR em 2010 (260). A obrigação de prestar serviços sociais alargados representa assim um encargo significativo para os hospitais IRIS, encargo esse que os hospitais privados de Bruxelas não têm de assumir. |
Conclusão relativamente à obrigação de prestar serviços sociais alargados que incumbe aos hospitais IRIS
(214) |
Atendendo às considerações precedentes, a Comissão conclui que, contrariamente aos hospitais privados de Bruxelas, os hospitais IRIS têm a obrigação de assegurar um serviço social sofisticado que ajuda os pacientes e suas famílias a resolver e gerir problemas administrativos, financeiros, relacionais e sociais. Esta obrigação está definida nos planos estratégicos IRIS, que a impõem aos hospitais IRIS. A existência desta obrigação de prestar serviços sociais alargados traduz-se no grande número de assistentes sociais empregados pelos hospitais IRIS, número esse muito superior ao que se aplica aos outros hospitais belgas. Os serviços sociais dos hospitais IRIS têm nomeadamente a tarefa de se encarregarem das dificuldades acima mencionadas com que os pacientes se confrontam, não apenas no decurso da sua permanência, mas também quando saem do hospital, e também as tarefas de ajudar os pacientes a obterem uma cobertura de segurança social que lhes permita pagar as despesas médicas, de realizar inquéritos sociais e de trocar informações com os outros serviços do hospital e com os CPAS. Esta obrigação e o encargo que representa estão estreitamente ligados às outras obrigações que constituem o SIEG de cuidados de saúde sociais (ver considerando 167). Com efeito, é por terem a obrigação de tratar todos os seus pacientes em qualquer circunstância e independentemente da capacidade que estes têm de pagar que os hospitais IRIS são confrontados com uma cada vez maior procura de assistentes sociais. São precisamente os pacientes desfavorecidos e respetivas famílias que têm necessidade de serviços sociais suplementares, e é por esta razão que se deve realizar um inquérito social. Por outro lado, também é pelo facto de os hospitais IRIS terem a obrigação de manter estabelecimentos múltiplos que o número de assistentes sociais é superior ao número que pode razoavelmente ser esperado (isto é, um assistente social por cada 2 000 admissões, ver considerando 213). |
IV. Conclusão relativamente às obrigações suplementares
(215) |
A Comissão conclui que os hospitais IRIS asseguram um SIEG em matéria de serviços de saúde sociais que, para além da sua missão hospitalar básica, inclui uma obrigação: 1) de tratar qualquer paciente em qualquer circunstância (incluindo em situação de não urgência), independentemente da capacidade que os pacientes têm de pagar; 2) de assegurar uma oferta completa de cuidados hospitalares básicos em múltiplos estabelecimentos e 3) de complementar os cuidados médicos com um apoio alargado assegurado pelos seus serviços sociais sofisticados. Este conjunto de obrigações garante que as necessidades sociais específicas da população de Bruxelas em matéria de serviços hospitalares são satisfeitas e garante a acessibilidade de todos, em especial dos mais desfavorecidos, a cuidados hospitalares de qualidade. Nenhuma obrigação suplementar deste tipo é aplicável aos hospitais privados de Bruxelas, que são unicamente responsáveis pela missão hospitalar básica definida pela LCH. O SIEG de cuidados de saúde sociais é prestado exclusivamente pelos hospitais IRIS, uma vez que são os únicos que têm de cumprir obrigações mais rigorosas e mais vastas para além das exigências mínimas (ou seja, a missão hospitalar básica) que são aplicáveis a todos os hospitais da Bélgica em virtude da LCH. A execução deste SIEG de cuidados de saúde sociais implica custos consideráveis para os hospitais IRIS, que não estão, ou estão apenas parcialmente, cobertos por fontes de financiamento comuns aos hospitais públicos e privados e que, consequentemente, contribuem para os défices declarados pelos hospitais IRIS. A fim de assegurar a continuidade dos seus hospitais públicos, os CPAS e os municípios de Bruxelas em causa têm pois de compensar os défices dos hospitais IRIS como descrito nos pontos 7.3.4.4 e 7.3.5 abaixo. |
7.3.4.2.
(216) |
Cada hospital IRIS possui estatutos próprios que especificam o seu objetivo, e os planos estratégicos IRIS são aplicáveis a cada um dos cinco hospitais IRIS. Além disso, como todos os hospitais belgas, os hospitais IRIS receberam uma autorização individual, necessária para poderem beneficiar de outros tipos de financiamento público (como o BMF). Estas atribuições não especificam o território para a execução do respetivo SIEG. |
7.3.4.3.
(217) |
Os hospitais IRIS não gozam de nenhum direito exclusivo ou especial. |
7.3.4.4.
(218) |
O mecanismo de compensação dos défices encontra-se descrito no artigo 46.o dos estatutos de cada um dos cinco hospitais IRIS. Atualmente, a redação desse artigo é a seguinte (ver também nota de rodapé 48): «Sem prejuízo do artigo centésimo nono [da LCH], o resultado do exercício é atribuído entre os sócios que disponham de, pelo menos, um quinto da totalidade de votos na assembleia-geral, por deliberação da assembleia-geral.» |
(219) |
Decorre claramente do artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS que:
|
(220) |
Tendo em conta que os hospitais IRIS executam apenas um SIEG e atividades conexas, o artigo 46.o dos estatutos de cada hospital IRIS estabelece um mecanismo de compensação claro ao indicar que o resultado do exercício (sem qualquer exceção) deve ser coberto. Esse resultado é determinado com base num conjunto claro de princípios contabilísticos que são aplicáveis da mesma forma aos hospitais públicos e privados belgas. Além disso, cada hospital é obrigado (em virtude dos artigos 80.o a 85.o da LCH) a nomear um auditor independente que verifica as suas contas e os seus resultados (ver considerando 49). |
(221) |
Ao exigir que a totalidade do défice do hospital IRIS seja coberta, o artigo 46.o dos estatutos vai além da exigência mínima prevista no artigo 109.o da LCH. A razão de ser desta cobertura total do défice para a execução do SIEG e atividades conexas (263) prende-se com o facto de as autoridades locais de Bruxelas quererem garantir a continuidade e a viabilidade dos hospitais IRIS (ver considerando 91) a qualquer momento. O artigo 46.o inscreve-se igualmente na lógica do artigo 61.o da lei relativa aos CPAS, cuja redação é a seguinte: «O centro pode recorrer à colaboração de pessoas, estabelecimentos ou serviços que, criados por poderes públicos ou pela iniciativa privada, disponham dos meios necessários para realizar as diversas soluções que se impõem, respeitando a livre escolha do interessado. O centro pode suportar as eventuais despesas desta colaboração, caso estas não estejam cobertas em virtude da execução de uma outra lei, de um regulamento, de um contrato ou de uma decisão judicial.» |
(222) |
Por último, como foi explicado acima (ver considerandos 22 e 44), os municípios são obrigados a cobrir o défice dos seus CPAS. Consequentemente, é ao município que incumbe a responsabilidade final de cobrir a totalidade do défice do seu hospital público. |
7.3.4.5.
(223) |
Como será explicado a seguir, o mecanismo de compensação dos défices funciona de tal maneira que o risco de sobrecompensação já se encontra muito reduzido na origem (ver considerando 247). Além disso, a lei de 14 de novembro de 1983 [ver considerandos 248 a 250 e a lei relativa aos CPAS (ver considerandos 251 e 252) dão aos municípios os meios jurídicos necessários para controlar a sobrecompensação e, se for caso disso, recuperar essas sobrecompensações. |
7.3.4.6.
(224) |
O artigo 4.o, alínea f), da Decisão SIEG de 2012 exige que a atribuição contenha uma referência a essa decisão. O artigo 10.o, alínea a), dessa mesma decisão prevê um período de transição de dois anos para os regimes de auxílios aplicados antes de 31 de janeiro de 2012 e que sejam compatíveis com o mercado interno em virtude da decisão SIEG de 2005. É por esta razão que, neste caso concreto, a referência à decisão SIEG de 2012 só foi introduzida em 2014. Em especial, a partir de 2014, cada decisão dos municípios de Bruxelas de efetuar um pagamento a favor de um hospital IRIS ao abrigo do artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS também faz referência à decisão SIEG de 2012. Além disso, importa observar que foi acrescentada uma referência à decisão SIEG de 2012 ao artigo 108.o da versão atual da LCH através da lei de 10 de abril de 2014 (264). Mais precisamente, este artigo exige que cada decisão relativa ao montante do BMF que deve ser concedido a um hospital contenha uma referência explícita à decisão SIEG de 2012. Assim, a Comissão conclui que esta condição formal está preenchida. |
7.3.5. Compensação
(225) |
A segunda condição fundamental de compatibilidade prevista na decisão SIEG de 2012 é que o montante da compensação pago pela prestação do SIEG não exceda o necessário para cobrir os custos líquidos ocasionados pelo cumprimento das obrigações de serviço público, assim como um lucro razoável (265). A decisão SIEG de 2012 define, além disso, de que forma o custo líquido deve ser calculado (nomeadamente, definindo os custos e as receitas que podem ser considerados), indica de que forma o lucro razoável deve ser determinado e exige que uma empresa que exerça atividades situadas tanto no âmbito do SIEG como fora deste tenha uma contabilidade interna separada para as atividades ligadas ao SIEG e para as outras atividades (266). |
(226) |
No caso concreto, os hospitais IRIS executam apenas um SIEG e as atividades conexas limitadas associadas a esse SIEG descritas acima (ver considerandos 41 e 155). Ao executarem todas estas atividades (o SIEG e as atividades conexas limitadas), os hospitais IRIS incorrem em custos que, em grande medida (267), são cobertos pelas diferentes fontes de financiamento públicas e privadas descritas acima (ver considerando 46). Não obstante, tal como será ilustrado seguidamente (ver quadros 3 a 7), durante a maior parte dos anos desde 1996, a execução destas atividades pelos hospitais IRIS gerou um défice. A Comissão estima que esses défices são o custo líquido residual (dito de outra forma, a parte do custo líquido que não está coberta pelas fontes de financiamento descritas no considerando 46) do SIEG e das atividades conexas limitadas executadas pelos hospitais IRIS. Ao compensarem esses défices, os municípios não cobrem nada mais do que o custo líquido residual suportado pelos hospitais IRIS aquando da execução do SIEG e das atividades conexas, e nem sequer concedem um lucro razoável. Consequentemente, com base na sua própria definição, a compensação dos défices registados pelos hospitais IRIS não deveria gerar nem gerou uma sobrecompensação real (ver também considerandos 234 a 245 apresentados a seguir). |
(227) |
Nos termos do artigo 77.o da LCH, todos os hospitais são obrigados a manter contas separadas que indiquem o custo de cada serviço. Os princípios contabilísticos aplicáveis aos hospitais públicos e privados são definidos pelo decreto real de 19 de junho de 2007 (268). Nos termos deste decreto real, as atividades não hospitalares (ou seja, no caso concreto, as atividades conexas descritas acima nos considerandos 41 e 155) devem ser registadas separadamente (mais precisamente, devem ser inscritas nos códigos contabilísticos 900 a 999, ver também considerando 49). A Comissão recebeu garantias dos auditores independentes de cada hospital IRIS que confirmam que a separação de contas foi aplicada em conformidade com as exigências do Direito belga (269). Como tal, a Comissão conclui que a obrigação prevista no artigo 5.o, n.o 9, da Decisão SIEG de 2012 de manter contas separadas foi cumprida. |
(228) |
Como explicado acima (ver considerando 44), nos termos do artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS, os municípios e os CPAS de Bruxelas são obrigados a cobrir a totalidade do défice contabilístico dos seus hospitais. Esta obrigação, que existe desde a criação dos hospitais IRIS, vai além do mecanismo de compensação parcial dos défices previsto no artigo 109.o da LCH (ver considerando 47). Todavia, a compensação concedida com base no artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS nunca pode exceder o défice contabilístico do exercício financeiro. Por último, o artigo 46.o, ao criar uma obrigação clara de compensação dos défices, não especifica contudo explicitamente em que momento os municípios e os CPAS devem efetivamente transferir os fundos (270). |
(229) |
Na prática, o momento em que os pagamentos dos municípios a favor dos hospitais IRIS devem ser efetuados sempre dependeu dos fundos disponíveis nas tesourarias dos municípios. Tendo em conta que os fundos disponíveis eram geralmente insuficientes, os municípios tinham tendência a adiar o pagamento da compensação dos défices dos hospitais. Em teoria, podiam continuar a adiar esse pagamento até que o serviço público federal da saúde pública determinasse o défice nos termos do artigo 109.o da LCH, uma vez que tal os obrigaria a efetuar o pagamento (parcial) da compensação dos défices dos hospitais. Contudo, podia decorrer um longo período de tempo (por vezes 10 anos) entre o momento em que o défice contabilístico era conhecido e o momento em que o défice era calculado nos termos dos artigo 109.o da LCH. Isto significa que, entre 1996 e 2002, os hospitais IRIS acumularam défices enormes (mais de 50 milhões de EUR). Para cobrir este buraco no seu financiamento, os hospitais IRIS foram forçados a contrair empréstimos bancários cujos custos fizeram aumentar ainda mais os défices. |
(230) |
Os municípios perceberam que esta situação não abonava a seu favor, uma vez que acabariam por pagar os juros destes empréstimos a título da cobertura dos défices; quiseram então começar a pagar aos hospitais IRIS mais rapidamente, em vez de esperarem pelo momento em que o serviço público federal da saúde pública os obrigasse a cobrir o défice nos termos do artigo 109.o da LCH. Tendo em conta a insuficiência de recursos financeiros ao nível municipal, a Região de Bruxelas-Capital teve de intervir para tornar isso possível. A Região acabou por dar um financiamento aos municípios em causa: 1) de forma indireta através do FRBRTC (ver considerando 231) e 2) a partir de 2003, também de forma direta, concedendo subvenções especiais (ver considerandos 232 e 233). Isto permitiu aos municípios cumprirem mais rapidamente, embora apenas parcialmente (271), a sua obrigação de compensação dos défices perante os hospitais IRIS. Como foi explicado acima (ver ponto 7.1), a Região de Bruxelas-Capital concedeu e continua a conceder financiamento público unicamente aos municípios de Bruxelas em causa e não aos hospitais IRIS. |
(231) |
Os défices dos hospitais IRIS relativos aos exercícios de 1996 a 2002 só foram compensados pelos municípios a partir de 2002 com a ajuda do financiamento recebido do FRBRTC. A compensação dos défices para esse período só terminou em 2008. Para a compensação dos défices registados a partir de 2003, os municípios já não puderam recorrer ao financiamento do FRBRTC. |
(232) |
A contar do exercício de 2003, a Região de Bruxelas-Capital começou a conceder, em média, 10 milhões de EUR por ano (para os montantes exatos, ver o quadro 2 apresentado abaixo) aos municípios sob a forma de subvenções especiais. Por seu lado, cada município pagou a sua parte desta subvenção especial, geralmente no início do ano seguinte, com base no défice estimado do hospital (por exemplo, no início de 2015 para o exercício de 2014). O défice é estimado com base na auditoria das atividades do hospital e no resultado previsional para os nove primeiros meses do ano. No prazo de seis meses a contar do fim do exercício financeiro (ou seja, antes do fim do mês de junho), a assembleia-geral de cada hospital IRIS aprova as contas financeiras do hospital e aprova o défice contabilístico definitivo. O montante do défice contabilístico que resta após o pagamento da parte da subvenção especial é liquidado em função dos fundos disponíveis nas tesourarias dos municípios. O processo de liquidação pode levar vários anos mais e, ao longo de todo o período em apreciação (1996-2014), os hospitais IRIS estiveram constantemente à espera de pagamentos dos municípios (ver quadros do considerando 234 para pormenores sobre os saldos restantes em dívida). Quadro 2 Pagamentos (financiados pela subvenção especial) dos municípios a favor dos hospitais IRIS
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(233) |
No plano contabilístico, a parte da subvenção especial foi, em alguns anos, diretamente considerada no resultado do hospital (reduzindo assim o défice remanescente), ao passo que, noutros anos, o montante foi considerado enquanto compensação do défice (ou seja, na atribuição do resultado). Além disso, o hospital CHU Saint-Pierre sofreu um atraso contabilístico em 2004, pelo que a sua parte da subvenção especial só foi registada nas contas do ano seguinte. É por esta razão que o montante total da subvenção especial para os cinco hospitais IRIS em 2004 totaliza apenas 8 867 072 EUR, ao passo que em 2005 totalizava 11 132 928 EUR, ou seja, um montante total de 20 milhões de EUR (ou 10 milhões de EUR por ano, como estava previsto). Não obstante estas diferenças no tratamento contabilístico, o princípio subjacente a estes pagamentos foi sempre o de dar uma compensação rápida (e geralmente parcial) do défice, sem que isso implicasse uma sobrecompensação (ver o resto da presente secção). |
(234) |
Os quadros 3 a 7 apresentados a seguir indicam, para cada um dos cinco hospitais IRIS, os défices contabilísticos registados em cada ano (em conjunto, esses défices totalizam aproximadamente 250 milhões de EUR ao longo do período 1996-2014) e os pagamentos efetuados em cada ano pelos municípios (estes pagamentos podem dizer respeito aos défices de anos anteriores). Os quadros 3 a 7 indicam as datas (ou seja, os anos) em que os municípios efetuaram os pagamentos destinados a compensar os défices dos diferentes hospitais IRIS, mas não especificam os anos a que se referem esses pagamentos (272). Estes quadros também ilustram a acumulação de défices ao longo do período 1996-2002 e o atraso nos pagamentos por parte dos municípios. Além disso, fica claro que, ao longo do período 1996-2014, os diferentes municípios envolvidos estiveram permanentemente a dever aos hospitais IRIS montantes significativos a título de compensação dos défices. O saldo remanescente em dívida até final de 2014 para os cinco hospitais IRIS considerados no seu todo ultrapassava os 15 milhões de EUR. Neste contexto, importa sublinhar que, quando os hospitais IRIS geram lucro, este não é distribuído e é utilizado para cobrir os défices passados ou futuros, reduzindo assim a intervenção dos municípios. Por último, estes quadros também mostram com clareza que, como alegam as autoridades belgas (ver considerando 89), e contrariamente ao que defendem os autores da denúncia, não existe qualquer mecanismo de pagamento de adiantamentos (ver considerando 55). Com efeito, os pagamentos dos municípios são efetuados com um atraso considerável em relação ao momento em que o défice é registado e em que a obrigação nos termos do artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS se torna aplicável. Consequentemente, a data dos pagamentos da compensação dos défices para a execução do SIEG e das atividades conexas não pode ser considerada como conferindo uma vantagem aos hospitais IRIS. Quadro 3 Data dos pagamentos do défice e saldo remanescente em dívida do hospital CHU Saint-Pierre
Quadro 4 Data dos pagamentos do défice e saldo remanescente em dívida do hospital CHU Brugmann (273)
Quadro 5 Data dos pagamentos do défice e saldo remanescente em dívida do hospital HUDERF
Quadro 6 Data dos pagamentos do défice e saldo remanescente em dívida do hospital Institut Bordet
Quadro 7 Data dos pagamentos do défice e saldo remanescente em dívida dos hospitais HIS (274)
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(235) |
Na prática, a compensação do défice nos termos do artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS prevalece em relação à compensação do défice nos termos do artigo 109.o da LCH. Na verdade, depois de o ministro federal da saúde pública determinar o défice nos termos do artigo 109.o da LCH (ver considerando 47), é enviada uma carta ao município e o seu banco recebe a ordem de efetuar imediatamente o pagamento desse montante ao hospital em causa tendo em conta os eventuais pagamentos de compensação do défice já efetuados pelo município a favor desse hospital nos termos do artigo 46.o dos seus estatutos. Além disso, os municípios e os hospitais IRIS acordaram que estes últimos reembolsariam imediatamente os municípios dos montantes que tivessem sido pagos nos termos do artigo 109.o da LCH a fim de evitar a duplicação da cobertura do mesmo défice. A este respeito, a Comissão recebeu do Belfius, o banco dos municípios, uma carta e um quadro que confirmam que, em cada ano e no conjunto dos cinco hospitais IRIS, estes reembolsos foram imediatamente efetuados, o que exclui a duplicação da cobertura do défice. O quadro 8 abaixo apresenta uma perspetiva geral e completa de todos os montantes das compensações do «défice nos termos do artigo 109.o da LCH» que foram pagos pelos municípios aos hospitais IRIS e que foram imediatamente reembolsados, pelo que essas transações foram neutralizadas. Consequentemente, os hospitais IRIS não receberam nenhuma vantagem decorrente dos pagamentos efetuados nos termos do artigo 109.o da LCH, sendo a compensação do défice nos termos do artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS a única que importa para a continuação da avaliação no âmbito da presente decisão. O quadro 8 inclui apenas os pagamentos até ao exercício de 2006, porque se trata atualmente do ano mais recente para o qual o défice nos termos do artigo 109.o da LCH foi determinado pelo serviço público federal da saúde pública. Este facto ilustra bem o atraso significativo que caracteriza na prática o pagamento da compensação desse défice nos termos do mecanismo do artigo 109.o da LCH e explica também por que razão os hospitais IRIS não o utilizam (e restituem imediatamente esta compensação depois de a terem recebido). Com efeito, a compensação nos termos do artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS é um mecanismo mais rápido (especialmente após a introdução das subvenções especiais aos municípios, ver considerando 232) do que o mecanismo do artigo 109.o da LCH. Por outro lado, a cobertura do défice nos termos do artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS vai além da cobertura parcial do défice prevista no artigo 109.o da LCH (ver considerandos 47 e 48) uma vez que compensa integralmente o défice contabilístico registado pelos hospitais IRIS. Por todas estas razões, a apreciação no âmbito da presente decisão passa a incidir unicamente no mecanismo de compensação nos termos do artigo 46.o e deixa de procurar avaliar o mecanismo de compensação do défice nos termos do artigo 109.o da LCH, contrariamente à decisão da Comissão de 2009, que foi anulada e que apreciava o mecanismo do artigo 109.o da LCH. Quadro 8 Perspetiva geral e completa dos montantes do défice nos termos do artigo 109.o da LCH (275) que foram pagos e imediatamente reembolsados (situação em 9 de novembro de 2015)
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(236) |
A Comissão também apreciou se, ao longo do período 1996-2014 (276), os hospitais IRIS beneficiaram efetivamente de uma sobrecompensação. Devido às fusões que ocorreram em 1 de julho de 1999 (ver também considerando 28) e ao longo período que decorreu desde então, a análise da sobrecompensação não pode abranger os anos 1996-1998 no caso do hospital CHU Brugmann, porque os arquivos em causa não foram encontrados. Pelas mesmas razões, no caso dos HIS, esta análise só pôde ser efetuada de maneira agregada para os anos 1996-1998. Neste contexto, importa igualmente sublinhar que as autoridades belgas forneceram todas as informações contabilísticas úteis dos hospitais IRIS, assim como sobre os pagamentos do défice efetuados pelos municípios na medida em que esses dados estavam disponíveis. Com efeito, até à entrada em vigor da Decisão SIEG de 2005 no dia 19 de dezembro de 2005, os Estados-Membros só eram obrigados a manter informações à disposição da Comissão durante cinco anos (277) (em vez de dez anos em virtude das decisões SIEG de 2005 e 2012 (278)). Embora o primeiro pedido de informações por parte da Comissão só tenha sido enviado em 22 de março de 2006, as autoridades belgas conseguiram ainda assim fornecer os dados a partir de 1996 no caso dos hospitais CHU Saint-Pierre, HUDERF e Institut Bordet, e a partir de 1999 no caso dos hospitais HIS (e os dados agregados referentes a 1996-1998) e CHU Brugmann. |
(237) |
A Comissão examinou se os pagamentos de compensação do défice por parte dos municípios num dado ano (com a ajuda do financiamento do FRBRTC e das subvenções especiais da Região de Bruxelas-Capital e pelos seus próprios meios) ultrapassavam o défice contabilístico desse ano. Neste contexto, a Comissão relembra que os hospitais IRIS apenas receberam uma compensação para os défices registados em função da execução do SIEG e de certas atividades conexas limitadas. Os quadros 9 a 13 apresentados a seguir mostram os dados pertinentes para cada um dos hospitais IRIS. Contudo, é importante recordar que estes quadros não permitem saber em que momento o município compensou (parcialmente) o défice. Com efeito, é nos quadros 3 a 7 apresentados acima (ver considerando 234) que são especificados os anos em que os municípios efetuaram os pagamentos a título de compensação dos défices a favor dos hospitais IRIS. Os quadros 9 a 13 indicam unicamente os montantes pagos aos hospitais IRIS pelos municípios (geralmente, em várias parcelas) para compensar o défice de um dado ano, sem especificar em que momento esses montantes foram efetivamente pagos. Apesar de os quadros 9 a 13 terem sido elaborados por forma a permitir determinar a existência de uma eventual sobrecompensação para um ano específico, considerado isoladamente, na prática, nenhum dos hospitais IRIS alguma vez beneficiou de uma sobrecompensação real, como será explicado abaixo (ver considerando 238). |
(238) |
Como ilustram os quadros seguintes, a comparação do défice contabilístico com a compensação paga num determinado ano revela apenas alguns casos (279) de sobrecompensação técnica se esse ano for considerado isoladamente. Todavia, decorre claramente dos quadros 3 e 7 do considerando 234 que, na prática, nenhum dos hospitais IRIS alguma vez beneficiou de uma sobrecompensação real, tendo em conta que, ao longo do período em análise (1996-2014), os municípios estiveram permanentemente a dever aos hospitais IRIS montantes significativos a título de compensação dos défices. As sobrecompensações técnicas podem ter sido motivadas pela vontade do município, ao longo de um dado ano, não apenas de cobrir o défice contabilístico desse ano, mas também recuperar o seu atraso na cobertura dos défices relativos a anos precedentes. Mesmo que essa motivação não possa ser provada, é um facto que, em cada um dos anos durante os quais os hospitais IRIS receberam pagamentos que, se considerados isoladamente nesse ano, equivaleriam tecnicamente a uma sobrecompensação em relação ao SIEG e às atividades conexas limitadas executadas nesse mesmo ano, o hospital beneficiário recebeu de facto, globalmente, uma compensação insuficiente para os mesmos SIEG e atividades limitadas do que os executados no decurso dos anos anteriores e do ano em questão (280). |
(239) |
No caso do hospital CHU Saint-Pierre, é possível verificar a partir do quadro 9 apresentado a seguir que, se considerarmos cada ano isoladamente, a sobrecompensação técnica está limitada aos anos 1996, 1997 e 2012. Em cada um dos casos, essas sobrecompensações totalizavam menos de 1,5 % da compensação concedida para o ano considerado e, logo, poderiam transitar para o ano seguinte, como previsto na Decisão SIEG (281). Todavia, na prática, como ficou demonstrado acima (ver quadro 3 no considerando 234), o hospital CHU Saint-Pierre recebeu permanentemente uma compensação insuficiente ao longo do período 1996-2014 e o município sempre lhe deveu dinheiro. No período 1996-2014, essa subcompensação totalizava 3 666 541 EUR. Em conformidade com a obrigação que lhes é imposta pelo artigo 46.o dos estatutos dos hospitais IRIS, os municípios em causa devem contudo, no futuro, compensar esse défice contabilístico residual (282). Quadro 9 Défice contabilístico e compensação concedida no caso do hospital CHU Saint-Pierre
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(240) |
Como foi explicado acima (ver considerando 236), a análise da existência de uma sobrecompensação para os hospitais Iris Sud (HIS) não pôde ser realizada individualmente para os anos 1996-1998 devido à ausência dos dados necessários. Não obstante, as autoridades belgas conseguiram encontrar os montantes agregados referentes ao período durante o qual os HIS ainda constituíam quatro hospitais independentes. Ao longo desses três anos, alguns dos HIS sofreram perdas num montante total de 2 622 714 EUR, ao passo que outros conseguiram lucros que totalizaram 703 624 EUR. As perdas foram totalmente cobertas com o auxílio dos fundos do FRBRTC concedidos ao município. Os lucros transitaram para o ano seguinte, o que explica por que razão a compensação do défice registado em 1999 só cobre parcialmente esse défice. O remanescente do défice foi compensado pelos lucros não distribuídos no período 1996-1998. O quadro 10 mostra igualmente que, exceto sobrecompensações muito ligeiras técnicas em 2000, 2010, 2011, 2013 e 2014 (em cada um dos casos, nunca mais de 0,12 % da compensação atribuída para esses anos), os HIS receberam em cada ano uma compensação insuficiente. Essa subcompensação global totaliza mais de 9 milhões de EUR no período 1999-2014. Quadro 10 Défice contabilístico e compensação concedida no caso dos HIS
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(241) |
No caso do hospital HUDERF, o quadro 11 apresentado a seguir mostra sobrecompensações técnicas muito ligeiras em 1998, 2002 e 2007 (em cada um dos casos, menos de 0,15 % da compensação atribuída para o ano em causa). Em 2013, foi registada uma sobrecompensação técnica mais consequente (cerca de 17 % da compensação atribuída para o ano em causa). Contudo, ainda que a compensação que recebia fosse já manifestamente insuficiente em 2010 e 2011, o hospital HUDERF encontrava-se ainda globalmente na mesma situação em 2013 no que diz respeito ao SIEG e às atividades conexas que tinha executado até então. Em todo o período 1996-2014, a subcompensação real total totaliza mais de 700 000 EUR. Além disso, como foi demonstrado acima (ver quadro 5 no considerando 234), na prática, o hospital HUDERF nunca se encontrou numa situação de sobrecompensação efetiva que o obrigasse a reembolsar (parcialmente) a compensação do défice. Na verdade, encontrava-se permanentemente numa situação de subcompensação, sendo que o município sempre lhe deveu dinheiro ao longo do período 1996-2014. Quadro 11 Défice contabilístico e compensação concedida no caso do HUDERF
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(242) |
No caso do hospital Institut Bordet, os resultados contabilísticos entre 1996 e 2001 foram positivos e, portanto, não houve intervenção do município nesses anos. Contudo, a partir de 2002, o resultado contabilístico passou a ser negativo e, logo, foram efetuados pagamentos para compensar os défices. O quadro 12 apresentado a seguir mostra sobrecompensações técnicas ligeiras em 2005 e em 2011 (ou seja, menos de 4 % e 0,5 %, respetivamente, da compensação concedida para esses anos). Em 2009, parece existir uma sobrecompensação técnica significativa de cerca de 580 000 EUR (ou seja, quase 46 % da compensação concedida para o referido ano). Contudo, em 2008, foi registada uma subcompensação de cerca de 533 000 EUR (quase 505 000 EUR numa base agregada). Globalmente, resulta daí uma sobrecompensação técnica agregada de somente 73 702 EUR (menos de 6 % da compensação concedida para 2009), que poderia ter sido transferida para 2010 (284) (ao passo que para 2010, até ao presente, não foi concedida qualquer compensação). Além disso, em cada um dos anos examinados, o Institut Bordet esteve sempre a aguardar uma compensação dos défices registados (ver quadro 6 no considerando 234). Em 2009, o município devia ao Institut cerca de 3 milhões de EUR. Para todo o período de 1996 a 2014, a subcompensação efetiva totaliza mais de 2,4 milhões de EUR. Como foi explicado no considerando 234, os lucros dos anos 1996-2001 reduzem o saldo remanescente em dívida dos municípios, uma vez que estes deduzem esses lucros antes de intervir. Quadro 12 Défice contabilístico e compensação concedida no caso do Institut Bordet
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(243) |
Como foi explicado acima (ver considerando 236), a análise da existência de uma sobrecompensação a favor do hospital CHU Brugmann nos anos 1996-1998 não pôde ser realizada por falta de dados quantificados. O quadro 13 apresentado a seguir mostra sobrecompensações técnicas ligeiras em 2000, 2003, 2004, 2008 e 2011 (ou seja, em cada um dos casos, nunca mais de 7 % da compensação concedida para o ano considerado). No caso de dois anos, em 1999 e 2012, a sobrecompensação técnica totalizou mais de 10 % da compensação concedida para o ano considerado (ou seja, 15,3 % e 12,9 % respetivamente). Contudo, em 2012, o CHU Brugmann encontrava-se globalmente numa situação de subcompensação, depois de ter recebido compensações manifestamente insuficientes em 2009 e 2010 (ou seja, uma subcompensação de 558 858 EUR). No que diz respeito ao ano de 1999, não existem dados quantificados para os anos anteriores suscetíveis de serem utilizados para avaliar a situação global, em termos de compensação, do CHU Brugmann em 1999. Contudo, importa observar que os primeiros pagamentos efetuados pelo município (com base no financiamento do FRBRTC) começaram apenas em 2003 e que, como demonstra o quadro 4 do considerando 234, o CHU Brugmann nunca se encontrou numa situação de sobrecompensação que o obrigasse a reembolsar (parcialmente) a compensação do défice ao município. Com efeito, ao longo de todo o período 1996-2014, o CHU Brugmann encontrou-se sempre globalmente numa situação de subcompensação, sendo que o município lhe devia dinheiro para cobrir os défices passados. Nesse período, a subcompensação efetiva totalizava cerca de 935 000 EUR. Quadro 13 Défice contabilístico e compensação concedida no caso do CHU Brugmann
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(244) |
Por último, os lucros limitados declarados por alguns dos hospitais IRIS (ou seja, o CHU Saint-Pierre em 2006, o HUDERF em 1999 e o Institut Bordet entre 1996 e 2001) não podem ser considerados como uma indicação de sobrecompensação. Com efeito, com base na separação de contas em vigor (ver considerando 226) nesses hospitais IRIS, a Comissão conclui que esses lucros, em todos os casos exceto num, decorrem de lucros gerados pelas atividades conexas (ver considerandos 41, 116 e 117) executadas pelos hospitais IRIS. As atividades ligadas ao SIEG do Institut Bordet geraram um lucro limitado em 1996, na ordem de 1 % das receitas totais do hospital nesse ano. A Comissão considera que, em todo o caso, um lucro tão limitado seria razoável e, portanto, não poderia levar a uma sobrecompensação. Além disso, como explicado acima (ver considerando 234), todos os lucros (quer decorram do SIEG quer das atividades conexas) são conservados e utilizados para compensar futuros défices (ou défices passados por pagar), reduzindo desse modo a contribuição dos municípios. |
(245) |
Atendendo às considerações anteriores, a Comissão conclui que, devido ao atraso nos pagamentos da compensação do défice, pelo facto de ao longo de todo o período 1996-2014 os municípios em causa deverem sempre a cada um dos hospitais IRIS montantes significativos a título de compensação dos défices, e pelo facto de cada um dos hospitais IRIS se encontrar globalmente numa situação de subcompensação, nenhum dos hospitais IRIS beneficiou, na prática, de uma sobrecompensação. |
7.3.6. Controlo da sobrecompensação
(246) |
A terceira condição de compatibilidade fundamental prevista na Decisão SIEG de 2012 impõe aos Estados-Membros a tomada de medidas a fim de assegurar que as empresas responsáveis pela prestação do SIEG não recebam qualquer sobrecompensação, e obriga os Estados-Membros a procederem ou a assegurarem a realização de controlos periódicos, no mínimo, de três em três anos (285). Além disso, se uma empresa tiver efetivamente recebido uma sobrecompensação, os Estados-Membros devem exigir à empresa em causa que a reembolse (286). |
(247) |
Em primeiro lugar, importa observar que, no que diz respeito à cobertura do défice em causa, a própria natureza deste mecanismo de compensação já reduz significativamente o risco de sobrecompensação, sendo assim uma medida que contribui para evitar a sobrecompensação. Com efeito, os municípios só podem cobrir o défice real registado pelos hospitais IRIS no seguimento da sua prestação de serviços económicos de interesse geral e das atividades conexas limitadas. Assim, a compensação cobre apenas os custos líquidos residuais (ver considerando 226) suportados aquando da execução desses SIEG e das atividades conexas e nem sequer inclui um lucro razoável. Todos os pagamentos são efetuados ex post, ou seja depois de os défices serem registados (ver a este respeito os quadros do considerando 234). Os pagamentos são efetuados em várias parcelas (tal como demonstram os quadros do considerando 234), o que garante que os municípios podem reter um pagamento ao menor sinal de risco de sobrecompensação. Os municípios também verificam o montante dos défices por pagar agregados antes de efetuarem um pagamento a favor dos hospitais IRIS. Como foi explicado acima (ver considerando 235), os municípios e os hospitais IRIS também acordaram reembolsar imediatamente a compensação do défice decorrente do artigo 109.o da LCH, a fim de evitar qualquer duplicação da cobertura do mesmo défice. Assim, existe apenas um risco residual limitado e teórico de sobrecompensação técnica quando a análise da compensação é feita para cada ano considerado isoladamente (ver considerandos 237 e 238). Contudo, na prática, nunca qualquer dos hospitais IRIS beneficiou globalmente de uma sobrecompensação real uma vez que, ao longo de todo o período 1996-2014, os municípios sempre deveram aos hospitais IRIS montantes significativos de compensação de défice por pagar (como confirmam os quadros do considerando 234). |
(248) |
Em segundo lugar, a lei de 14 de novembro de 1983 (287) relativa ao controlo da concessão e da utilização de determinadas subvenções define as regras aplicáveis ao controlo das subvenções concedidas, em especial pelas autoridades locais. A referida lei contém as mesmas regras do que o despacho orgânico de Bruxelas, de 23 de fevereiro de 2006, que define as disposições aplicáveis ao orçamento, às contas e às auditorias (288) e que incorpora ela própria, para a Região de Bruxelas-Capital, as regras gerais definidas na lei de 16 de maio de 2003 que fixa as disposições gerais aplicáveis aos orçamentos, ao controlo das subvenções e à contabilidade dos municípios e das regiões, bem como a organização do controlo do Tribunal de Contas belga (289). O artigo 1.o da lei de 14 de novembro de 1983 prevê que: «A presente lei é aplicável a qualquer subvenção concedida:
O artigo 2.o da referida lei define igualmente o seu âmbito de aplicação muito alargado e prevê que: «Entende-se por subvenção […] qualquer contribuição, vantagem ou auxílio, seja qual for a sua forma ou denominação, onde se incluem adiantamentos de fundos recuperáveis concedidos sem juros, concedidos com vista a promover atividades úteis de interesse geral […]». Decorre claramente dos artigos supracitados que a compensação do défice concedida pelos municípios de Bruxelas aos hospitais IRIS pela execução do SIEG e das atividades conexas está abrangida pelo campo de aplicação desta lei. |
(249) |
O artigo 3.o da lei de 14 de novembro de 1983 estabelece o princípio segundo o qual a subvenção deve ser exclusivamente utilizada para os fins para a qual foi concedida e o beneficiário deve conseguir justificar a sua utilização. Os artigos 4.o e 5.o definem outras regras relativas à concessão de tais subvenções e as obrigações de transparência impostas ao beneficiário. Os artigos 6.o e 7.o definem as regras relativas ao controlo efetuado por ou em nome da entidade que concede as subvenções no que toca à utilização das subvenções. Em especial, o artigo 6.o prevê que: «Qualquer entidade que conceda [subvenções] tem o direito de proceder no local ao controlo da utilização da subvenção concedida.» O artigo 7.o prevê as obrigações de reembolso e de recuperação das subvenções. Este artigo tem a seguinte redação: «Sem prejuízo das disposições resolutivas às quais a subvenção está sujeita, o beneficiário é obrigado a restituí-la nos seguintes casos:
Todavia, nos casos previstos nos pontos 1 e 2, o beneficiário deve apenas restituir a parte da subvenção que não está justificada. As pessoas coletivas de direito público que estejam habilitadas a definir tributações diretas estão autorizadas a recuperar coercivamente as subvenções sujeitas a restituição. A medida coerciva é determinada pelo contador responsável pela recuperação. A medida é tornada executória pela autoridade administrativa habilitada para tornar executório o papel das respetivas disposições diretas das referidas pessoas coletivas de direito público.» |
(250) |
A lei permite assim que os municípios garantam que as subvenções são concedidas em conformidade com as condições necessárias e controlem a utilização e a recuperação dos montantes não necessários. O pagamento da compensação dos défices por parte dos municípios está, pois, sujeito a regras muito estritas. A sua aceitação pelos hospitais em causa implica um direito de inspeção por parte de uma autoridade independente, que pode garantir que a subvenção foi efetivamente afetada para o fim para o qual foi concedida. Caso contrário, o hospital é obrigado a restituí-la imediatamente, o que garante a recuperação de qualquer sobrecompensação a favor dos hospitais IRIS. |
(251) |
Isto é corroborado pela lei relativa aos CPAS, cujo artigo 60.o, n.o 6, prevê que: «A criação ou o alargamento de estabelecimentos ou serviços suscetíveis de beneficiarem de subvenções quer a nível dos investimentos quer a nível do funcionamento, só podem ser decididos com base num processo que demonstre que as condições previstas na legislação ou na regulamentação orgânica relativa à concessão dessas subvenções serão respeitadas.» Se um CPAS apoia um hospital público, importa comprovar que as regras relativas à concessão do financiamento serão observadas. |
(252) |
Da mesma forma, o artigo 135.o-G da lei relativa aos CPAS define as modalidades de fiscalização das associações locais referidas no capítulo XII (no caso concreto, os hospitais IRIS) por parte da associação matriz (no caso concreto, IRIS) todos os trimestres. Em especial, isto significa que a IRIS controla a conformidade das decisões tomadas pelos hospitais IRIS com:
Em caso de não conformidade, a associação matriz toma todas as medidas que considerar úteis para pôr fim à não conformidade e comunica-as para execução no prazo que determinar à associação local em causa. Em caso de não execução das medidas por parte da associação local em causa no prazo estabelecido, a associação matriz pode sem demora encarregar o comissário referido no artigo 135.o-H de se substituir ao órgão em falta da associação local.» |
(253) |
Decorre das disposições supracitadas que tanto a lei relativa aos CPAS como a lei de 14 de novembro de 1983 permitem que os municípios de Bruxelas garantam que as subvenções concedidas aos hospitais IRIS são corretamente utilizadas e não constituem uma sobrecompensação. A aplicação conjunta destas disposições facilita o controlo da sobrecompensação e prevê a recuperação das sobrecompensações. Além disso, em caso de não conformidade, são conferidos a um terceiro poderes de substituição a fim de garantir que essas obrigações impostas aos hospitais IRIS são cumpridas, especialmente no que diz respeito ao orçamento. Os municípios, os CPAS e a associação matriz IRIS dispõem assim de poderes de controlo alargados, mesmo não existindo praticamente qualquer risco de sobrecompensação em virtude do mecanismo de compensação dos défices em causa na presente decisão. |
(254) |
Para além disso, quando as contas de exploração do hospital público apresentam um défice, o colégio de burgomestres e vereadores pode, nos termos dos artigos 111.o, n.o 2, e 126.o, da lei relativa aos CPAS, suspender a execução de «qualquer decisão do CPAS que lese o interesse municipal e nomeadamente os interesses financeiros do município.» |
(255) |
Por último, convém sublinhar que as autoridades que concedem a medida de auxílio em causa (designadamente, os municípios e os CPAS) controlam diretamente os beneficiários. Em especial, estas autoridades dispõem da maioria dos votos nos conselhos de administração dos hospitais IRIS que, entre outras competências, nomeiam o diretor-geral dos respetivos hospitais. Na hipótese pouco provável de um hospital IRIS se recusar a reembolsar a sobrecompensação, as autoridades públicas podem facilmente substituir o diretor-geral a fim de solucionar essa situação. Por outro lado, tal como é exigido pelos estatutos de cada hospital IRIS, o conselho de administração reúne-se, pelo menos, oito vezes por ano, o que permite às autoridades que concederam o auxílio acompanhar de perto a situação financeira dos hospitais IRIS (nomeadamente através dos relatórios trimestrais que abrangem este assunto, tal como exigido pelos estatutos). |
(256) |
Atendendo às considerações anteriores, a Comissão conclui que existem modalidades suficientes para evitar, detetar e recuperar as sobrecompensações, ao passo que o risco de sobrecompensação parece muito limitado tendo em conta a natureza da medida de auxílio em causa. |
7.3.7. Período de atribuição e duração dos mandatos
(257) |
O artigo 2.o, n.o 2, da decisão SIEG de 2012 prevê que a decisão só é aplicável às atribuições cujo período de atribuição não exceda dez anos, salvo se um período superior a dez anos não puder ser justificado pela necessidade de a empresa a quem foi atribuído o serviço amortizar investimentos significativos durante um período mais longo, em conformidade com os princípios contabilísticos geralmente aceites. |
(258) |
A duração dos estatutos dos hospitais IRIS, que, ao nível municipal, são as atribuições pertinentes no caso concreto, está fixada em 30 anos. A Comissão considera que uma duração tão longa se justifica pela necessidade de os hospitais IRIS realizarem investimentos significativos enquanto prestadores dos SIEG atribuídos. Mais precisamente, os ativos mais importantes dos hospitais IRIS são os seus imóveis (que representam mais de 60 % do valor dos seus ativos), que são amortizados ao longo de um período de 30 anos, em conformidade com os princípios contabilísticos geralmente aceites (290). Por outro lado, os planos estratégicos IRIS, que especificam as obrigações suplementares que incumbem aos hospitais IRIS, também têm uma duração limitada, que é inferior à supracitada. O primeiro plano estratégico abrangia o período 1996-2001. O segundo plano estratégico abrangia inicialmente o período 2002-2006, mas foi posteriormente modificado e prorrogado até final de 2014. Em janeiro de 2015, foi aprovado um novo plano estratégico para o período 2015-2018. |
(259) |
Além disso, a lei de 10 de abril de 2014 (291) limitou o período de atribuição federal relativo à missão hospitalar básica (292), ao modificar o artigo 105.o da versão atual da LCH (293). Em especial, o artigo 105.o exige atualmente que o período para o qual o BMF é concedido não exceda dez anos, salvo para os elementos do BMF que cobrem o custo de investimentos hospitalares significativos que necessitam de uma amortização ao longo de um período mais longo, em conformidade com os princípios contabilísticos geralmente aceites. Por último, a autorização individual que os hospitais devem possuir para serem elegíveis para o financiamento BMF também tem uma duração limitada (que depende da região, mas que é geralmente de cerca de cinco anos e, em todo o caso, de dez anos no máximo). |
(260) |
A Comissão considera assim que a obrigação prevista no artigo 2.o, n.o 2, da Decisão SIEG de 2012 de limitar o período de atribuição e justificar esse período foi cumprida. |
7.3.8. Transparência
(261) |
Por último, a Decisão SIEG de 2012 exige que os Estados-Membros publiquem determinadas informações. Mais precisamente, para as compensações que excedem os 15 milhões de EUR concedidas a uma empresa que também exerce atividades fora do âmbito do serviço de interesse económico geral, o artigo 7.o da Decisão SIEG de 2012 exige que os Estados-Membros divulguem na Internet ou por outros meios adequados o ato de atribuição (ou um resumo que inclua os elementos referidos no artigo 4.o da referida decisão) e os montantes anuais correspondentes ao auxílio concedido à empresa. |
(262) |
A obrigação de transparência da Decisão SIEG de 2012 é aplicável às «compensações superiores a 15 milhões de EUR concedidas a uma empresa que também exerce atividades fora do âmbito do serviço de interesse económico geral». Como indicado nos quadros 9 a 13, o montante da compensação municipal do défice por hospital IRIS nunca excede, em cada ano, o limiar de 15 milhões de EUR. Assim, a Comissão considera que a obrigação de transparência prevista no artigo 7.o da Decisão SIEG de 2012 não é aplicável neste caso concreto. |
7.3.9. Síntese das conclusões sobre a compatibilidade do auxílio com o mercado interno
(263) |
Atendendo às considerações anteriores, a Comissão conclui que a compensação dos défices dos hospitais públicos de Bruxelas IRIS por parte dos municípios de Bruxelas desde 1996, que é objeto da presente decisão, está em conformidade com as exigências da Decisão SIEG de 2012 e, portanto, é compatível com o mercado interno em aplicação do artigo 106.o, n.o 2, do TFUE. |
(264) |
Decorre da conclusão apresentada acima e das explicações dadas nos considerandos 148 a 152 que a Comissão não tem necessidade de apreciar se a compensação dos défices dos hospitais públicos de Bruxelas IRIS por parte dos municípios de Bruxelas também é compatível com o mercado interno nos termos da Decisão SIEG de 2005 (para o auxílio concedido entre 19 de dezembro de 2005 e 31 de janeiro de 2012) ou do enquadramento SIEG de 2012. |
7.4. Observações finais
(265) |
Como foi explicado acima (ver considerando 159), no seu acórdão de anulação de 7 de novembro de 2012, o Tribunal Geral remeteu para o princípio de igualdade de tratamento. Neste contexto, a Comissão relembra que o princípio da não discriminação/igualdade de tratamento não consta dos critérios de compatibilidade da Decisão SIEG de 2012. Não obstante, no caso concreto, a Comissão conclui que, em todo caso, este princípio é respeitado uma vez que os hospitais IRIS e os hospitais privados de Bruxelas se encontram numa situação diferente no plano jurídico e no plano factual tendo em conta que o âmbito da missão de SIEG dos hospitais IRIS públicos é mais alargado do que o dos hospitais privados e, logo, é mais dispendioso de executar (como foi explicado acima, ver ponto 7.3.4.1). A título acessório, a Comissão observa que os hospitais IRIS públicos estão sujeitos a um determinado número de restrições, bem como a custos suplementares (ver considerandos 42 e 43) aquando da execução do SIEG que lhes está confiado. |
(266) |
Dado que os hospitais IRIS e os hospitais privados de Bruxelas se encontram em situações diferentes/não comparáveis, a compensação dos défices dos hospitais IRIS não pode ser considerada uma violação do princípio de igualdade de tratamento. |
8. CONCLUSÃO
(267) |
Atendendo à apreciação feita acima, a Comissão decide que, no caso em apreço, o auxílio estatal em causa é compatível com o mercado interno nos termos do artigo 106.o, n.o 2, do TFUE, |
ADOTOU A PRESENTE DECISÃO:
Artigo 1.o
O auxílio estatal concedido sob a forma de uma compensação dos défices dos hospitais públicos de Bruxelas IRIS por parte dos municípios de Bruxelas desde 1996 é compatível com o mercado interno nos termos do artigo 106.o, n.o 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
Artigo 2.o
O destinatário da presente decisão é o Reino da Bélgica.
Feito em Bruxelas, em 5 de julho de 2016.
Pela Comissão
Margrethe VESTAGER
Membro da Comissão
(1) Com efeitos a partir de 1 de dezembro de 2009, os artigos 87.o e 88.o do Tratado CE passaram a ser os artigos 107.o e 108.o, respetivamente, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia («TFUE»). As duas séries de disposições são idênticas em termos de substância. Para efeitos da presente decisão, deve entender-se que as referências aos artigos 107.o e 108.o do TFUE são, quando apropriado, referências aos artigos 87.o e 88.o do Tratado CE. O TFUE também introduziu algumas alterações de terminologia, como a substituição de «Comunidade» por «União», mercado comum por «mercado interno» e «Tribunal de Primeira Instância» por «Tribunal Geral». A terminologia do TFUE é utilizada na presente decisão.
(2) JO C 437 de 5.12.2014, p. 10.
(3) Em conjunto, estes cinco hospitais públicos gerem aproximadamente 2 425 das cerca de 7 260 camas existentes nos hospitais gerais e nos hospitais universitários da Região de Bruxelas-Capital (excluindo hospitais psiquiátricos, geriátricos e outros hospitais especializados). Empregam cerca de 10 000 pessoas e efetuam mais de um milhão de consultas médicas por ano. O número de camas de hospital aprovadas foi fornecido pelas autoridades belgas (que consultaram a Commission Communautaire Commune e o Service Public Fédéral «Santé publique») e refere-se ao ano de 2015. As restantes informações estão disponíveis no sítio Web da IRIS (ver http://www.iris-hopitaux.be).
(4) Ver secções 2.2 e 2.4 para mais informações sobre estes hospitais públicos e as suas atividades.
(5) A abreviatura IRIS corresponde à denominação Interhospitalière régionale des infrastructures de soins.
(6) Os autores da denúncia tinham solicitado que as respetivas identidades não fossem divulgadas. No entanto, devido aos recursos de anulação interpostos por estas partes e ao acórdão de anulação proferido pelo Tribunal Geral em 7 de novembro de 2012 no processo T-137/10, estas identidades tornaram-se públicas (ver considerandos 4 e 6. Importa também referir que a ABISP e os seus membros retiraram a sua denúncia.
(7) Este último argumento foi pela primeira vez invocado pelos autores da denúncia na sua carta de 15 de dezembro de 2008.
(8) Essencialmente, os serviços da Comissão consideraram, a título preliminar, que tudo indicava que os hospitais IRIS tinham sido devidamente incumbidos de missões de serviço público, que a compensação recebida estava claramente definida e que esta compensação não era excessiva. Em consequência, os serviços da Comissão concluíram que não existiam quaisquer problemas à luz das regras relativas aos auxílios estatais. Além disso, constataram que os requisitos em matéria de transparência pareciam ter sido igualmente respeitados. Os serviços da Comissão concluíram, portanto, que não havia motivos suficientes para dar seguimento à investigação, caso os autores da denúncia não apresentassem elementos novos.
(9) Processo T-128/08, ainda não publicado.
(10) Processo T-241/08, ainda não publicado.
(11) Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (JO L 83 de 27.3.1999, p. 1).
(12) JO C 74 de 24.3.2010, p. 1.
(13) Decisão 2005/842/CE da Comissão, de 28 de novembro de 2005, relativa à aplicação do n.o 2 do artigo 86.o do Tratado CE aos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público concedidos a certas empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral (JO L 312 de 29.11.2005, p. 67).
(14) Processo T-137/10, CBI/Comissão, ECLI:EU:T:2012:584.
(15) Ibidem, n.o 313.
(16) Ver nota de rodapé 2.
(17) Moniteur belge de 5 de agosto de 1976, p. 9876.
(18) Dos dezanove municípios que constituem a Região de Bruxelas-Capital estão em causa seis: Anderlecht, a cidade de Bruxelas, Etterbeek, Ixelles, Schaerbeek e Saint-Gilles.
(19) Mais precisamente, dos seguintes hospitais: CHU Brugmann-Huderf (entidade única até 1 de janeiro de 1997), CHU Saint-Pierre, Institut Bordet, Centre Hospitalier Baron Lambert, Centre Hospitalier Bracops, Centre Hospitalier Molière, Centre Hospitalier Brien e Centre Hospitalier Etterbeek-Ixelles.
(20) Negrito acrescentado.
(21) Negrito acrescentado.
(22) Sessão ordinária 1995-1996. Documentos da Assembleia reunida da Commission communautaire commune Projeto de despacho: B-10/1. — Relatório: B-10/2. Atas integrais. — Discussão e adoção: reunião de 22 de dezembro de 1995.
(23) Os trabalhos preparatórios especificam, em particular, que o acordo de cooperação de 19 de maio de 1994 foi celebrado «com vista a assegurar a sustentabilidade dos hospitais públicos de Bruxelas incentivando, nomeadamente, a criação de mecanismos de coordenação e cooperação entre os responsáveis das diversas instituições hospitalares públicas situadas no território da Região de Bruxelas-Capital, ou seja, os municípios, os [CPAS] e as associações criadas em aplicação do capítulo XII da [Lei CPAS].»
(24) O artigo 121.o da Lei CPAS especifica que as associações ao abrigo do capítulo XII têm personalidade jurídica.
(25) Alguns dos hospitais IRIS exercem as suas atividades em diversos locais. Neste momento, o CHU-B funciona em três sítios (Victor Horta, Paul Brien e Reine Astrid), o CHU-SP em dois (Porte de Hal e César de Paepe) e os HIS em quatro (Etterbeek-Ixelles, J. Bracops, Molière-Longchamp e Baron Lambert).
(26) O controlo exercido pela IRIS está sujeito às condições especificadas no despacho (da Região de Bruxelas-Capital) de 22 de dezembro de 1995 (Moniteur belge de 7 de fevereiro de 1996, p. 2737).
(27) O artigo 120.o da Lei CPAS especifica os requisitos mínimos aplicáveis aos estatutos das associações criadas por um CPAS com base no capítulo XII da Lei CPAS.
(28) O artigo 125.o da Lei CPAS dispõe que: «Seja qual for a proporção das contribuições dos diversos associados, as pessoas de direito público dispõem sempre da maioria dos votos nos diversos órgãos de administração e de gestão da associação.»
(29) O FRBRTC foi instituído pelo despacho de 8 de abril de 1993, Moniteur belge de 12 de maio de 1993, p. 10889 (alterado pelo despacho de 2 de maio de 2002).
(30) O montante de 100 milhões de EUR não era suficiente para cobrir a totalidade do passivo financeiro dos hospitais existente em finais de 1995, com um défice acumulado estimado em quase 200 milhões de EUR.
(31) Moniteur belge de 7 de outubro de 1987, p. 14652. Substituída pela Lei coordenada sobre os hospitais e outros estabelecimentos de cuidados de saúde, de 10 de julho de 2008 (Moniteur belge de 7 de novembro de 2008, p. 58624).
(32) A fim de facilitar as referências, a presente decisão menciona apenas o artigo 147.o da LCH, entendendo-se que esta referência diz respeito ao artigo 163.o da LCH a partir da entrada em vigor da Lei de 10 de julho de 2008.
(33) Ver artigos 2.o a 7.o da Lei de 7 de agosto de 1987.
(34) Ver artigos 10.o a 17.o da Lei de 7 de agosto de 1987.
(35) Ver artigos 23.o a 45.o da Lei de 7 de agosto de 1987. O mecanismo de programação determina, com base nas necessidades médicas avaliadas pelas autoridades federais, um número máximo de camas de hospital por região. Em consequência, a menos que a procura de camas de hospital aumente, a criação de novas camas (ou de novos hospitais) só é autorizada se forem suprimidas camas noutros hospitais.
(36) Ver artigos 68.o a 76.o-E da Lei de 7 de agosto de 1987.
(37) Ver artigos 130.o a 142.o da Lei de 7 de agosto de 1987.
(38) Ver http://www.iris-hopitaux.be/fr (sítio consultado em 19 de agosto de 2015).
(39) Ver nota de rodapé 246 em relação ao rendimento médio mediano.
(40) Esta obrigação baseia-se, nomeadamente, na Lei de 18 de julho de 1966, no artigo 42.o, n.o 5, da Lei CPAS, na Lei de 24 de junho de 1988, no decreto do Exécutif de la Région de Bruxelles-Capitale de 25 de julho de 1991 e no decreto do governo da Região de Bruxelas-Capital, de 6 de maio de 1999.
(41) Todas as estimativas de custos indicadas no presente considerando e no seguinte referem-se ao ano de 2010 e refletem o custo residual a suportar pelos hospitais IRIS após dedução do financiamento público, se for caso disso, concedido pela Região de Bruxelas-Capital ou pelo Governo federal.
(42) Abrangido pela obrigação de sigilo profissional.
(43) Esta obrigação baseia-se, em especial, no artigo 156.o e no artigo 161.o, n.os 1 e 2, da Lei de 24 de junho de 1988, no artigo 42.o, n.o 5, da Lei CPAS e no n.o 3.4 do protocolo sindical 95/3 de 27 de outubro de 1995.
(44) Esta obrigação baseia-se, nomeadamente, na Lei de 14 de fevereiro de 1961, no artigo 42.o, n.o 5 da Lei CPAS, na Lei de 24 de junho de 1988 e no decreto do governo da Região de Bruxelas-Capital, de 6 de maio de 1999.
(45) Estes aumentos tabelados são definidos pelas convenções 2003/1, 2004/10, 2007/1 e 2009/1.
(46) A Região de Bruxelas-Capital impôs uma estrutura matriz responsável pela coordenação e pela tutela das atividades hospitalares dos hospitais IRIS, em conformidade com o capítulo XII-A da Lei CPAS.
(47) Note-se que, no caso de alguns hospitais IRIS, este princípio estava inicialmente previsto no artigo 44.o ou 47.o. Seja como for, na sua essência, já era mencionado nos respetivos estatutos originais.
(48) Quando os hospitais IRIS foram criados, este princípio foi inscrito no artigo 44.o dos estatutos, com a seguinte redação: «O resultado da exploração é imputado por deliberação da Assembleia Geral, entre os associados que disponham de, pelo menos, um quinto dos votos nessa assembleia, proporcionalmente à sua representação na mesma.»
(49) Em setembro de 2013, a Mutualité chrétienne, uma das sociedades mútuas mais importantes da Bélgica (as sociedades mútuas são organismos privados, sem fins lucrativos, responsáveis pelo reembolso das despesas médicas comparticipadas pela segurança social) publicou um artigo no qual se afirmava que, em 2011, as receitas dos hospitais belgas se repartiam, em média, da seguinte forma entre essas três fontes de financiamento: 1) BMF: 49 %, 2) INAMI: 42 %, e 3) pacientes (ou as suas seguradoras privadas): 9 %.
(50) Ver artigos 87.o e seguintes da Lei de 7 de agosto de 1987.
(51) Ver artigos 24.o a 87.o do Decreto real de 25 de abril de 2002 (Moniteur belge de 5 de julho de 2002, p. 30290).
(52) Ver Lei de 9 de agosto de 1963, alterada (Moniteur belge de 1 de novembro de 1963, p. 10555).
(53) Moniteur belge de 27 de agosto de 1994, p. 21524.
(54) Ver artigos 133.o a 135.o da Lei de 7 de agosto de 1987.
(55) Ver artigo 140.o da Lei de 7 de agosto de 1987.
(56) Ver artigos 46.o e seguintes da Lei de 7 de agosto de 1987.
(57) Ver artigo 47.o da Lei de 7 de agosto de 1987.
(58) A fim de facilitar as referências, a presente decisão menciona apenas o artigo 109.o da LCH, entendendo-se que essa referência diz respeito ao artigo 125.o da LCH a partir da entrada em vigor da Lei de 10 de julho de 2008.
(59) Moniteur belge de 1 de janeiro de 1964, p. 2. Essa lei exigia que 10 % do défice fossem cobertos pelo município onde o hospital estava situado e os restantes 90 % pelos municípios belgas onde os doentes residiam.
(60) Moniteur belge de 29 de dezembro de 1973, p. 15027.
(61) Foram inicialmente definidos no Decreto real de 8 de dezembro de 1986 (Moniteur belge de 12 de dezembro de 1986, p. 17023), alterado pelo Decreto real de 10 de novembro de 1989 e posteriormente substituído pelo Decreto real de 8 de março de 2006 (Moniteur belge de 12 de abril de 2006, p. 20232).
(62) Os outros elementos excluídos do défice coberto pelo artigo 109.o da LCH são, nomeadamente, a estimativa dos pagamentos retificativos no contexto do BMF, certas reservas e determinados tipos de amortização.
(63) Com efeito, o défice visado no artigo 109.o da LCH é calculado a partir do défice contabilístico, excluindo do mesmo determinados elementos.
(64) Moniteur belge de 4 de setembro de 1975, p. 10847.
(65) Ver artigos 77.o e 78.o da Lei de 7 de agosto de 1987.
(66) Ver artigos 80.o a 85.o da Lei de 7 de agosto de 1987.
(67) Ver artigos 86.o a 86.o-B da Lei de 7 de agosto de 1987.
(68) Ver artigo 115.o da Lei de 7 de agosto de 1987.
(69) Ver nota de rodapé 29.
(70) Estes subsídios especiais foram concedidos com base no Despacho de 13 de fevereiro de 2003 (Moniteur belge de 5 de maio de 2003, p. 24098).
(71) Decisão da Comissão no processo SA.19864 (ex NN 54/2009) (JO C 74 de 24.3.2010, p. 1).
(72) Ibidem, considerandos 140-145.
(73) Ibidem, considerandos 146-150.
(74) Ibidem, considerandos.
(75) Ibidem, considerandos 151-155.
(76) Ibidem, considerando 156.
(77) Ibidem, considerandos 175-181.
(78) Ibidem, considerandos 182-193.
(79) Ibidem, considerandos 204-205.
(80) Ibidem, considerando 206.
(81) Ibidem, considerando 198.
(82) Ibidem, considerando 199.
(83) Ibidem, considerando 201.
(84) Ver nota de rodapé 14.
(85) Ibidem, n.o 70.
(86) Ibidem, n.o 313.
(87) Ibidem, n.os 97-188.
(88) Ibidem, n.os 119-120.
(89) Ibidem, n.o 104.
(90) Ibidem, n.os 123-151.
(91) Ibidem, n.os 152-159.
(92) Ibidem, n.os 174-188.
(93) Ibidem, n.o 159.
(94) Ibidem, n.os 189-244.
(95) Ibidem, n.os 194 e 195-202.
(96) Ibidem, n.o 196.
(97) Ibidem, n.o 194.
(98) Ibidem, n.os 203-207.
(99) Ibidem, n.os 208-211.
(100) Ibidem, n.o 215.
(101) Ibidem, n.os 216-218.
(102) Ibidem, n.os 231-244.
(103) Ibidem, n.o 238.
(104) Ibidem, n.os 239-244.
(105) Ibidem, n.os 245-301.
(106) Ibidem, n.os 253-255.
(107) Ibidem, n.os 257-258 e 265.
(108) Ibidem, n.os 259-264.
(109) Ibidem, n.os 266-278.
(110) Ibidem, n.os 279-288.
(111) Ibidem, n.o 286.
(112) Ibidem, n.o 288.
(113) Ibidem, n.o 290.
(114) Ibidem, n.o 300.
(115) Ibidem, n.o 308.
(116) Ver nota de rodapé 2.
(117) A este respeito, ver o acórdão do processo T-137/10, n.os 310 e 313.
(118) A questão de saber se estas atividades constituem efetivamente serviços de interesse económico geral, na aceção do artigo 106.o, n.o 2, do TFUE, ou não, e se foram confiadas através de um ato de atribuição devidamente estabelecido será apreciada mais adiante (na secção 7.3.4).
(119) A este respeito, ver o acórdão do processo T-137/10, n.o 308.
(120) Ver acórdão de 25 de janeiro de 2013 no processo RG 2010/15534/A, ASBL La Clinique Fond'Roy / […] e os CPAS de Uccle e de Anderlecht.
(121) O Decreto real de 12 de dezembro de 1996 relativo ao apoio médico urgente especifica que a urgência é avaliada e atestada por um médico ou um dentista. A urgência não é definida por lei, mas apreciada pelo profissional de saúde consultado. O apoio médico urgente pode englobar, por conseguinte, todos os cuidados médicos de caráter curativo e preventivo, prestados num hospital ou em regime ambulatório, bem como as prescrições de medicamentos. O apoio médico urgente é, por conseguinte, diferente das situações de urgência que implicam risco de vida descritas no considerando 97.
(122) MC-Informations n.o 211 (fevereiro de 2004), p. 8-14.
(123) Ver nota de rodapé 9 para uma descrição sucinta dessa organização.
(124) As convenções relativas ao «domicílio de socorro» foram celebradas entre os hospitais IRIS e 17 dos 19 CPAS da Região de Bruxelas-Capital (ver também considerandos 187-188). Estas convenções estabelecem as modalidades de reembolso dos custos de tratamento pelo CPAS relativos aos doentes que não possam pagar o seu tratamento e que não possuam qualquer seguro, sob reserva do preenchimento de determinadas condições. Estas convenções especificam, nomeadamente, que os hospitais IRIS devem recolher, na medida do possível, as informações necessárias para os «inquéritos sociais» (ver também considerandos 210-211).
(125) O artigo 2.o da LCH tem a seguinte redação: «Para efeitos da aplicação da presente lei, consideram-se como hospitais os estabelecimentos de cuidados de saúde onde podem ser efetuados ou aplicados, em qualquer momento, exames e/ou tratamentos médicos especializados específicos, nos domínios da medicina, da cirurgia e, eventualmente, da obstetrícia, num contexto pluridisciplinar, em condições de assistência e enquadramento médico, médico-tecnológico, paramédico e logístico necessários e apropriados, a doentes que sejam admitidos e aí possam permanecer em virtude de o seu estado de saúde exigir esse conjunto de cuidados para tratar ou aliviar a doença, restabelecer ou melhorar o estado de saúde ou estabilizar as lesões o mais rapidamente possível».
(126) Parecer da secção legislativa do Conselho de Estado sobre o anteprojeto de despacho de 13 de fevereiro de 2003 sobre a concessão de subsídios especiais aos municípios da Região de Bruxelas-Capital.
(127) Ver considerando 19 para a redação exata deste artigo.
(128) O Governo federal adota o plano em matéria de camas de hospital («programação hospitalar») com base em diversos índices (médicos, cirúrgicos, geriátricos, de maternidade, pediátricos, de reabilitação, de psiquiatria, de neonatologia, etc.), tendo em conta a população total de Bruxelas, da Região flamenga e da Região da Valónia, e do Reino no seu conjunto, com base numa proposta apresentada pelo Conselho Nacional dos Estabelecimentos Hospitalares.
(129) Mais precisamente, as autoridades belgas salientam que, quando muito, a LCH estabelece as modalidades de compensação do défice em caso de transferência de um hospital público para um proprietário privado, enquanto a Lei CPAS apenas enuncia princípios gerais aplicáveis à abertura e à gestão de estabelecimentos criados pelo CPAS.
(130) As autoridades belgas recordam que, quando se procurava um comprador, o Hôpital Français fechou repentinamente as portas a novas admissões, em 9 de maio de 2008. Acrescentam que este hospital tinha encerrado anteriormente o seu serviço pediátrico e a sua maternidade, tendo os doentes destes serviços sido transferidos para outros hospitais da região de Bruxelas ao longo desse dia.
(131) Para efeitos da LCH, presume-se que os hospitais IRIS são geridos por um CPAS.
(132) O montante anual depende dos recursos disponíveis no orçamento da Região de Bruxelas-Capital e dos pedidos dos municípios em causa. Durante o período de 2003-2014, o subsídio especial atingiu o limite máximo de 10 milhões de EUR todos os anos, exceto em 2010 (9 milhões) e em 2011 (9,5 milhões).
(133) Neste contexto, as autoridades belgas observam que os hospitais privados, estabelecidos, por exemplo, com base na lei relativa às associações sem fins lucrativos (a «lei sobre as ASBL»), também devem cumprir a LCH relativamente às suas funções hospitalares. Todavia, na medida em que a lei sobre as ASBL não incumbe as instituições que rege de qualquer missão específica, as missões desses hospitais privados apenas são regidas pela LCH.
(134) Ver Lei de 8 de julho de 1964, alterada (Moniteur belge de 25 de julho de 1964, p. 8153).
(135) Ao contrário do apoio médico urgente acima mencionado (ver considerando 72), que inclui os cuidados programados, a assistência médica de urgência diz respeito aos cuidados imediatamente exigidos em situações de risco de vida.
(136) Isso significa que, mesmo que um hospital não execute determinadas tarefas em matéria de assistência médica de urgência tal como indicado na Lei de 8 de julho de 1964, é obrigado a prestar a melhor assistência possível nas situações de urgência médica (isto é, tendo em conta as suas infraestruturas e o seu pessoal).
(137) O apoio médico urgente é regido pelo artigo 57.o, n.o 2, e pelo Decreto real de 12 de dezembro de 1996.
(138) No seu acórdão de 25 de janeiro de 2013, o Tribunal de primeira instância de Bruxelas observa o seguinte: «A economia geral do sistema obriga o próprio CPAS a prestar apoio médico urgente, tratando uma pessoa que necessite de cuidados urgentes num hospital que gira, ou a tomar a seu cargo os custos dos cuidados dispensados a essa pessoa por um hospital privado. Embora o apoio seja geralmente dispensado num estabelecimento dependente do CPAS em causa ou com o qual este tenha celebrado uma convenção, pode acontecer que a hospitalização se faça noutro estabelecimento, devido à urgência decorrente da situação da pessoa a hospitalizar. Não há, neste caso, nem consulta prévia ao CPAS, nem mesmo, na maioria das vezes, à pessoa em causa, sendo uma decisão rápida e unilateral do pessoal das ambulâncias do serviço de emergência chamado ou, como no caso em apreço, do Procureur du Roi (Ministério Público). O caráter invulgar ou excecional deste procedimento célere não autoriza os CPAS a recusar a tomada a cargo das despesas de hospitalização noutro estabelecimento que não seja o seu […]» [negrito acrescentado].
(139) Processo T-137/10, n.os 208 a 215.
(140) Ibidem, n.o 217.
(141) Ibidem, n.o 218.
(142) Daqui se conclui que a apreciação realizada na presente decisão difere da efetuada na decisão de 2009 da Comissão, que foi anulada, na qual as intervenções a título do FRBRTC e os subsídios especiais foram, em certa medida, apreciados separadamente da compensação dos défices.
(143) Em média, entre 68 % e 90 % dos défices dos diversos hospitais, registados em todo o período de 1996-2014, foram compensados pelos municípios através dos fundos do FRBRTC ou dos subsídios especiais da Região de Bruxelas-Capital. Para cobrir o remanescente, os municípios tiveram de recorrer aos seus próprios fundos e, como adiante se explica (ver considerando 234), no final de 2014, ainda tiveram de pagar (novamente com recurso aos seus próprios fundos) uma compensação suplementar de aproximadamente 15 milhões de EUR, no total, para cobrir os défices dos cinco hospitais IRIS.
(144) Quando são necessários cálculos para levar a cabo esta avaliação, a Comissão baseia-se nos dados disponíveis, ou seja, relativos ao período de 1996 a 2014 (ver exceções no considerando 236).
(145) Processo C-222/04, Ministero dell'Economia e delle Finanze/Cassa di Risparmio di Firenze SpA, Fondazione Cassa di Risparmio di San Miniato, Cassa di Risparmio di San Miniato, ECLI:EU:C:2006:8, n.o 129.
(146) Processos apensos C-180/98 a C-184/98, Pavel Pavlov e o./Stichting Pensioenfonds Medische Specialisten, ECLI:EU:C:2000:428, n.o 74.
(147) Processo C-41/90, Höfner e Fritz Elser/Macrotron GmbH, ECLI:EU:C:1991:161, n.o 21 e processos apensos C-180/98 a C-184/98, Pavel Pavlov e o./Stichting Pensioenfonds Medische Specialisten, ECLI:EU:C:2000:428, n.o 74.
(148) Processo C-118/85, Comissão das Comunidades Europeias/República Italiana, ECLI:EU:C:1987:283, n.o 7 e processo C-35/96, Comissão das Comunidades Europeias/República Italiana, ECLI:EU:C:1998:303, n.o 36.
(149) Processo C-82/01 P, Aéroports de Paris/Comissão das Comunidades Europeias, ECLI:EU:C:2002:617, n.o 74 e processo C-49/07, Motosykletistiki Omospondia Ellados NPID (MOTOE)/Elliniko Dimosio, ECLI:EU:C:2008:376, n.o 25. Ver a também a Comunicação da Comissão relativa à aplicação das regras em matéria de auxílios estatais da União Europeia à compensação concedida pela prestação de serviços de interesse económico geral (JO C 8 de 11.1.2012, p. 4, ponto 9).
(150) Processo C-49/07, Motosykletistiki Omospondia Ellados NPID (MOTOE)/Elliniko Dimosio, ECLI:EU:C:2008:376, n.o 27 e processo C-244/94, Fédération française des sociétés d'assurance, Société Paternelle-Vie, Union des assurances de Paris-Vie e Caisse d'assurance et de prévoyance mutuelle des agriculteurs/Ministério da Agricultura e da Pesca, ECLI:EU:C:1995:392, n.o 21.
(151) Processo C-157/99, B.S.M. Smits Geraets/Stichting Ziekenfonds VGZ e H.T.M. Peerbooms/Stichting CZ Groep Zorgverzekeringen ECLI:EU:C:2001:404, n.o 58, no âmbito do qual o Tribunal de Justiça considerou que o facto de um tratamento médico dispensado por um hospital ser diretamente financiado pelas caixas de seguro de saúde com base em convénios e tarifas preestabelecidas não é suscetível de excluir esse tratamento do âmbito de aplicação das atividades económicas na aceção do TFUE e que os pagamentos efetuados pelas caixas de seguro de saúde «ainda que forfetários, constituem efetivamente a contrapartida económica das prestações hospitalares e possuem, indubitavelmente, caráter remuneratório relativamente ao estabelecimento hospitalar que dela beneficia e que está comprometido numa atividade de tipo económico». O Tribunal de Justiça acrescentou ainda, a este respeito, que não era necessário que tal remuneração fosse paga pelos beneficiários deste serviço.
(152) Processo C-157/99, B.S.M. Smits Geraets/Stichting Ziekenfonds VGZ e H.T.M. Peerbooms/Stichting CZ Groep Zorgverzekeringen ECLI:EU:C:2001:404, n.o 53; processos apensos 286/82 e 26/83, Graziana Luisi e Giuseppe Carbone/Ministero del Tesoro ECLI:EU:C:1984:35, n.o 16; processo C-159/90, The Society for the Protection of Unborn Children Ireland Ltd/Stephen Grogan e outros, ECLI:EU:C:1991:378, n.o 18; processo C-368/98, Abdon Vanbraekel e outros/Alliance nationale des mutualités chrétiennes (ANMC), ECLI:EU:C:2001:400, n.o 43; e processo T-167/04, Asklepios Kliniken GmbH/Comissão das Comunidades Europeias, ECLI:EU:T:2007:215, n.os 49 a 55.
(153) Ver a também a Comunicação da Comissão relativa à aplicação das regras em matéria de auxílios estatais da União Europeia à compensação concedida pela prestação de serviços de interesse económico geral (JO C 8 de 11.1.2012, p. 4, ponto 24).
(154) Processo T-319/99, Federación Nacional de Empresas de Instrumentación Científica, Médica, Técnica y Dental (FENIN)/Comissão das Comunidades Europeias, ECLI:EU:T:2003:50, n.o 39. Ver também o processo T-137/10, n.os 90 e 91, bem como a Comunicação da Comissão relativa à aplicação das regras em matéria de auxílios estatais da União Europeia à compensação concedida pela prestação de serviços de interesse económico geral (JO C 8 de 11.1.2012, p. 4, n.o 22).
(155) Ver a este respeito o processo C-355/00, Freskot AE/Elliniko Dimosio, ECLI:EU:C:2003:298, n.o 53. Neste processo, o Tribunal de Justiça salientou também que os serviços e contribuições prestados ao abrigo do regime de seguro obrigatório eram fixados de forma circunstanciada pelo legislador nacional.
(156) Processo C-39/94, Syndicat français de l'Express international (SFEI) e o./La Poste e o., ECLI:EU:C:1996:285, n.o 60, e processo C-342/96, Reino de Espanha/Comissão das Comunidades Europeias, ECLI:EU:C:1999:210, n.o 41.
(157) Processo 173/73, República Italiana/Comissão das Comunidades Europeias, ECLI:EU:C:1974:71, n.o 13.
(158) Processo C-280/00, Altmark Trans GmbH e Regierungspräsidium Magdeburg/Nahverkehrsgesellschaft Altmark GmbH, e Oberbundesanwalt beim Bundesverwaltungsgericht, ECLI:EU:C:2003:415, n.os 87 a 95).
(159) Processo T-289/03, British United Provident Association Ltd (BUPA), BUPA Insurance Ltd e BUPA Ireland Ltd/Comissão das Comunidades Europeias, ECLI:EU:T:2008:29, n.o 159). O Tribunal de Justiça considerou que «[…] a interpretação que o Tribunal de Justiça dá a uma norma do direito comunitário se limita a esclarecer e precisar o seu significado e alcance, tal como deveria ter sido compreendida e aplicada desde o momento da sua entrada em vigor. Daí resulta que a norma assim interpretada pode e deve ser aplicada pelo juiz mesmo às relações jurídicas surgidas e constituídas antes de ser proferido o acórdão em questão e que só a título excecional o Tribunal de Justiça pode, por aplicação do princípio geral da segurança jurídica inerente à ordem jurídica comunitária, ser levado a limitar a possibilidade de qualquer interessado invocar uma disposição que haja sido interpretada pelo Tribunal para pôr em causa relações jurídicas estabelecidas de boa fé».
(160) Processo C-209/03, The Queen, a pedido de Dany Bidar/London Borough of Ealing e Secretary of State for Education and Skills, ECLI:EU:C:2005:169, n.os 66 e 67, e processo C-292/04, Wienand Meilicke, Heidi Christa Weyde e Marina Stöffler/Finanzamt Bonn-Innenstadt, ECLI:EU:C:2007:132, n.os 34 a 36).
(161) Processo T-358/94, Compagnie nationale Air France/Comissão das Comunidades Europeias, ECLI:EU:T:1996:194, n.o 56.
(162) Processo 248/84, República Federal da Alemanha/Comissão das Comunidades Europeias, ECLI:EU:C:1987:437, n.o 17, e processos apensos T-92/00 e T-103/00, Territorio Histórico de Álava — Diputación Foral de Álava, EU:T:2002:61, Ramondín, SA e Ramondín Cápsulas, SA (T-103/00)/Comissão das Comunidades Europeias, EU:T:2002:61, n.o 57.
(163) Processo 730/79, Philip Morris Holland BV/Comissão das Comunidades Europeias, ECLI:EU:C:1980:209, n.o 11 e processos apensos T-298/97, T-312/97, T-313/97, T-315/97, T-600/97 a 607/97, T-1/98, T-3/98 a T-6/98 e T-23/98, Alzetta Mauro e o./Comissão das Comunidades Europeias, ECLI:EU:T:2000:151, n.o 80.
(164) Processo T-288/97, Regione autonoma Friuli-Venezia Giulia/Comissão, ECLI:EU:T:1999:125, n.o 41.
(165) Ver, por exemplo, processo C-280/00, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg ECLI:EU:C:2003:415, n.o 78; processos apensos C-197/11 e C-203/11, Libert e outros, ECLI:EU:C:2013:288, n.o 78; e processo C-518/13, Eventech, ECLI:EU:C:2015:9, n.o 67.
(166) Processo C-279/08 P, Comissão/Países Baixos, ECLI:EU:C:2011:551, n.o 131.
(167) Ver processos apensos T-447/93, T-448/93 e T-449/93, AITEC e outros/Comissão, ECLI:EU:T:1995:130, n.o 141.
(168) Ver, por exemplo, as decisões da Comissão nos processos de auxílios estatais N 258/2000, Piscine Dorsten (JO C 172 de 16.6.2001, p. 16); Decisão 2004/114/CE da Comissão, de 29 de outubro de 2003, relativa às medidas de auxílio executadas pelos Países Baixos a favor dos portos sem fins lucrativos para embarcações de recreio nos Países Baixos (JO L 34 de 6.2.2004, p. 63); N 458/2004, Editorial Andaluza Holding (JO C 131 de 28.5.2005, p. 12); SA.33243, Jornal de Madeira (JO C 131 de 28.5.2005, p. 12); SA.34576, Portugal — Unidade de cuidados continuados Jean Piaget/Nordeste, (JO C 73 de 13.3.2013, p. 1); N 543/2001, Irlanda — Concessões de capitais a hospitais (JO C 154 de 28.6.2002, p. 4); SA.37432, Financiamento dos hospitais públicos na região de Hradec Králové (JO C 203 de 19.6.2015, p. 1); SA.37904, Alegado auxílio estatal ao centro médico de Durmersheim (JO C 188 de 5.6.2015, p. 1); SA.33149, Städtische Projektgesellschaft «Wirtschaftsbüro Gaarden-Kiel» (JO C 188 de 5.6.2015, p. 1); SA.38035, Alegado auxílio a uma clínica de reabilitação especializada em medicina ortopédica e cirurgia traumatológica (JO C 188 de 5.6.2015, p. 1); SA.39403 Países Baixos — Auxílio ao investimento no porto de Lauwersoog (JO C 259 de 7.8.2015, p. 1); SA.37963 Reino Unido — Glenmore Lodge (JO C 277 de 21.8.2015, p. 1); e SA. 38208 Reino Unido — Clubes de golfe propriedade dos membros (JO C 277 de 21.8.2015, p. 1).
(169) Ver N 543/2001, Irlanda — Concessões de capitais a hospitais (JO C 154 de 28.6.2002, p. 4); SA.37432, Financiamento dos hospitais públicos na região de Hradec Králové (JO C 203 de 19.6.2015, p. 1); SA.38035, Alegado auxílio a uma clínica de readaptação especializada em medicina ortopédica e cirurgia traumatológica (JO C 188 de 5.6.2015, p. 1).
(170) http://ec.europa.eu/eurostat/statistics-explained/index.php/Statistics_on_European_cities/fr, consultado em 8 de julho de 2015.
(171) Comunicação da Comissão — Enquadramento da União Europeia aplicável aos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público (JO C 8 de 11.1.2012, p. 15).
(172) Decisão 2012/21/UE da Comissão, de 20 de dezembro de 2011, relativa à aplicação do artigo 106.o, n.o 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia aos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público concedidos a certas empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral (JO L 7 de 11.1.2012, p. 3).
(173) Enquadramento comunitário dos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público (JO C 297 de 29.11.2005, p. 4).
(174) Ver nota de rodapé 13.
(175) Ver considerando 8 da Decisão SIEG de 2012.
(176) Processo C-179/90, Merci convenzionali porto di Genova, ECLI:EU:C:1991:464, n.o 27; processo C-242/95, GT-Link A/S, ECLI:EU:C:1997:376, n.o 53; e processo C-266/96, Corsica Ferries France SA, ECLI:EU:C:1997:376, ECLI:EU:C:1998:306, n.o 45.
(177) Processo T-289/03, BUPA e o./Comissão, ECLI:EU:T:2008:29, os 166 a 169 e 172; processo T-17/02, Fred Olsen, ECLI:EU:T:2005:218, n.o 216.
(178) Ver artigo 4.o da Decisão SIEG de 2012.
(179) Ver artigo 4.o, alínea a), da Decisão SIEG de 2012.
(180) Ver artigo 4.o, alínea b), da Decisão SIEG de 2012.
(181) Ver artigo 4.o, alínea c), da Decisão SIEG de 2012.
(182) Ver artigo 4.o, alínea d), da Decisão SIEG de 2012.
(183) Ver artigo 4.o, alínea e), da Decisão SIEG de 2012.
(184) Ver artigo 4.o, alínea f), da Decisão SIEG de 2012.
(185) Processo T-137/10, n.o 95.
(186) Processo C-390/06, Nuova Agricast Srl/Ministero delle Attività Produttive, ECLI:EU:C:2008:224.
(187) Ver considerando 25 e em especial a referência, no acordo de cooperação de 19 de maio de 1994, relativa à necessidade de «apresentar garantias quanto à manutenção […]da especificidade dos hospitais públicos» [negrito acrescentado]. Ver igualmente o plano estratégico IRIS 1996-2001, em especial: a secção «Eixos estruturantes» (p. 3), «para estar em condições de prosseguir a prestação de serviços de medicina desprovidos de toda e qualquer a lógica comercial» e a secção «Objetivos contributivos» (p. 54), «Os hospitais públicos [designadamente os hospitais IRIS] têm como vocação básica a prática de uma medicina social; sendo que esta lhes impõe que respondam às exigências de missões sociais» [negrito acrescentado].
(188) Ver considerando 87 da decisão de início do procedimento.
(189) Para mais informações sobre as atribuições relativas a estas três obrigações, ver considerandos 170 e seguintes.
(190) Como foi explicado acima (ver considerandos 83 e 91), em conformidade com a jurisprudência do Conselho de Estado belga, enquanto existirem os cuidados médicos e sociais para os quais os hospitais IRIS foram criados, os poderes públicos não podem fechar estes hospitais nem cedê-los a um proprietário do setor privado.
(191) Os custos inerentes ao estatuto público dos hospitais IRIS são tomados em consideração nos custos da missão hospitalar básica e das obrigações de SIEG complementares e, por conseguinte, podem contribuir para os défices dessas atividades.
(192) Ver em particular o artigo 28.o do código de deontologia médica elaborado pelo Conselho Nacional da Ordem dos Médicos (versão de 27 de julho de 2015).
(193) Ver nota de rodapé 120.
(194) Com efeito, os dados fornecidos pelas autoridades belgas mostram que em mais de 85 % dos casos na Região de Bruxelas-Capital, o apoio médico urgente é prestado pelos hospitais IRIS. Esta percentagem deve ser analisada à luz do facto de os hospitais IRIS explorarem apenas 35 % das camas dos hospitais da região (ver também nota de rodapé 3). Os demais casos são tratados por outros prestadores de cuidados, nomeadamente médicos de medicina geral e hospitais privados. O mesmo acontece nomeadamente com os cuidados psiquiátricos, como no caso descrito no considerando 172, uma vez que os hospitais IRIS não prestam este tipo de cuidados.
(195) Uma justificação similar poderia ser invocada, por exemplo, por um operador postal que garanta o serviço postal universal. Esse operador é responsável por um SIEG, mas não está obrigado a transportar cartas gratuitamente se o cliente não pode ou não quer pagar este serviço.
(196) Ver o estudo publicado em 2008 por Verbruikersateljee e intitulado «Is uw portemonnee ook ziek? — Een onderzoek naar medische kosten en schulden».
(197) Ibidem.
(198) Reunião do Senado da Bélgica, de 16 de julho de 2013, Projeto de lei que visa melhorar a acessibilidade aos cuidados de saúde, apresentada por Leona Detiège e seus pares. O projeto expirou devido às eleições federais de 2014.
(199) Na prática, os hospitais são responsáveis pela admissão de pacientes (tanto para consultas como para hospitalizações), pela faturação e pelo acompanhamento em caso de não pagamento. A maioria dos médicos dos hospitais CHU Saint-Pierre, CHU Brugmann, HUDERF e Institut Bordet recebem um salário, ao passo que os outros médicos são pagos com base nas faturas associadas ao tratamento que prestam, independentemente do facto de o paciente pagar ou não. Consequentemente, nenhum dos médicos destes hospitais tem motivo para recusar os pacientes que não têm condições de pagar. Os médicos que trabalham para os hospitais Iris Sud devem respeitar as regras gerais do hospital em, pelo menos, 80 % de seu horário de serviço, podendo escolher gerir um consultório privado em, no máximo, 20 % de seu horário de serviço. Durante esses 80 % de seu horário de serviço, os médicos devem aplicar as tarifas INAMI e trabalhar com base no princípio segundo o qual todos os pacientes devem ser tratados em conformidade com a obrigação que incumbe aos hospitais IRIS. Desta forma, os hospitais Iris Sud garantem que todos os pacientes são tratados, independentemente da sua capacidade de pagar.
(200) O artigo 57.o, n.o 2, da lei relativa aos CPAS restringe a missão do CPAS em duas circunstâncias específicas, designadamente para os estrangeiros que estejam ilegalmente na Bélgica (ou seja, migrantes sem documentos) e para os filhos desses estrangeiros.
(201) Negrito acrescentado.
(202) Secção «Objetivos gerais do plano estratégico» (p. 2). Negrito acrescentado.
(203) Ibidem. Negrito acrescentado.
(204) Secção «Objetivos contributivos» (p. 52). Negrito acrescentado.
(205) Ibidem (p. 54). Negrito acrescentado.
(206) Secção «Eixos estruturantes» (p. 3). Negrito acrescentado.
(207) Ver a este respeito a secção «Objetivos contributivos» (p. 74): aumentar nossa acessibilidade a todas as camadas da população e, em especial, aos menos favorecidos [negrito acrescentado].
(208) Ver secção «Introdução» (p. 7).
(209) Ibidem (p. 10).
(210) Ver secção «O projeto hospitalar — Um hospital orientado para o paciente» (p. 79).
(211) Ver secção «Missões específicas do hospital público» (p. 85) [negrito acrescentado].
(212) Ver secção «Introdução» (p. 12), que refere que os hospitais IRIS tratam proporcionalmente menos pacientes aos quais o hospital possa cobrar suplementos (que constituem uma fonte suplementar de receitas para os hospitais).
(213) Ver secção «Introdução» (p. 13), que faz referência a uma estimativa (de 2001) do custo suplementar decorrente da admissão de pacientes que apresentam um perfil socioeconómico (mais) baixo. Esse custo ascenderia a cerca de 10,4 milhões de EUR por ano e estaria a aumentar.
(214) A exceção é o hospital «Institut Bordet», onde a percentagem é superior à média, o que pode ser explicado pela gravidade da patologia (ou seja, o cancro) tratada neste hospital.
(215) Trata-se de organismos privados responsáveis pelo reembolso das despesas médicas no sistema belga de segurança social (em especial, o seguro de saúde e de invalidez obrigatório).
(216) A afetação do financiamento nos termos da secção B8 do BMF tem por base esta classificação (ver também considerando 189).
(217) O serviço público federal para a integração social pode pois reembolsar os CPAS desde que estejam preenchidas determinadas condições (ver também a nota de rodapé da página 258 relativa à base jurídica aplicável).
(218) A classificação tem igualmente em conta a proporção de pacientes que são cobertos pela segurança social, mas que devem pagar uma contribuição adequada menos elevada ao hospital porque são elegíveis para 1) o «máximo a faturar social» ou para 2) o «máximo a faturar para pacientes isolados com rendimentos baixos».
(219) A publicação da organização Mutualités Chrétiennes define pacientes sociais como pacientes que beneficiam da «franquia social» (por exemplo: os reformados que recebem um rendimento garantido, as pessoas elegíveis para uma intervenção ou uma prestação de invalidez mais elevadas, uma prestação de integração, abonos de família mais elevados, bem como os desempregados de longa duração). De acordo com as autoridades belgas, a noção de «franquia social» foi abolida em 1993 e foi substituída no direito belga pelo «máximo a faturar social».
(220) Isto é confirmado pelo facto de os quadros da referida publicação se basearem em dados de «entidades seguradoras», ou seja, organizações, tais como as sociedades mútuas, que são responsáveis pelo reembolso das despesas médicas nos termos da segurança social belga que é regida pelo INAMI.
(221) A publicação da organização Mutualités Chrétiennes define-os como pacientes que estão matriculados no CPAS.
(222) Neste contexto, convém sublinhar que, embora sejam os hospitais IRIS a fornecer os dados que alimentam o inquérito social, são os CPAS que decidem se uma pessoa é elegível ou não para um reembolso das despesas de tratamento. A convenção do «domicílio de socorro» especifica, a este respeito, que cada hospital IRIS «reúne, na medida do possível, os primeiros elementos constitutivos do inquérito social e transmite-os ao CPAS».
(223) Tendo em conta que a recolha de informações para os inquéritos sociais constitui apenas uma tarefa entre várias outras para os departamentos dos serviços sociais dos hospitais IRIS, este custo faz parte do encargo global associado à obrigação mais alargada dos hospitais IRIS em matéria de serviços sociais, que será analisada abaixo (ver considerando 213).
(224) A Comissão observa que a taxa de juro aplicada pelos hospitais IRIS parece estar em conformidade com a taxa de juro do mercado naquela data (ou seja, início de 2011). Atualmente (em 2016), as taxas de juro são muito mais baixas, o que reduz o custo para os hospitais IRIS. Não obstante, o prazo de pagamento mais dilatado permanece um encargo que pesa sobre os hospitais IRIS uma vez que estes têm sempre de gerir o desfasamento de liquidez entre os pagamentos efetuados e recebidos.
(225) O reembolso por parte do CPAS não é automático para os pacientes pobres, sendo antes o resultado de uma avaliação realizada caso a caso por cada CPAS com base no inquérito social (para os cuidados urgentes). Neste contexto, as autoridades belgas observam que, ao longo dos três primeiros trimestres de 2015, 749 pedidos de reembolso apresentados pelos hospitais IRIS foram recusados pelo CPAS, o que representa um montante não pago de cerca de 3 milhões de EUR. Em 2012, os CPAS recusaram o reembolso de faturas solicitado pelos hospitais IRIS num montante total de 4 174 200 EUR. Cerca de 80 % destas faturas diziam respeito a cuidados prestados a migrantes sem documentos.
(226) Mais precisamente, um relatório publicado pelo Belfius Banque indica que, em 2010, os custos líquidos das dívidas de curto prazo anuladas (ou seja, faturas que não serão pagas) representavam em média 0,28 % das receitas dos hospitais privados da Bélgica e 0,40 % das receitas dos hospitais públicos do país. Comparativamente, este custo equivale a 1,22 % das receitas dos hospitais IRIS ou três vezes a média dos hospitais públicos.
(227) Por exemplo, o hospital privado Cliniques de l'Europe possui um estabelecimento em Uccle e outro em Etterbeek, ao passo que o hospital privado Cliniques universitaires Saint-Luc possui apenas um estabelecimento em Woluwe-Saint-Lambert.
(228) Uma tal opção pode muito bem acarretar custos que deveriam ser compensados por ganhos de eficiência ou que poderiam justificar-se por outras considerações julgadas pertinentes pela direção dos hospitais privados.
(229) O mecanismo de programação não determina apenas o número total de camas de hospitais por região, fixa também os limites por tipo de serviço (por exemplo: maternidade, geriatria, pediatria, psiquiatria, etc.).
(230) Por exemplo, nem todos os hospitais privados propõem serviços geriátricos, que são menos rentáveis.
(231) Ver secção «Eixos estruturantes» (p. 6). Negrito acrescentado.
(232) O plano estratégico faz referência a nove estabelecimentos em vez de onze (o número atual de estabelecimentos) porque dois campus hospitalares albergam, cada um, dois hospitais, designadamente, o HUDERF e o CHU-B no estabelecimento Victor Horta em Laeken e o IB e o CHU-SP no estabelecimento Porte de Hal na cidade de Bruxelas.
(233) Ver secção «Eixos estruturantes» (p. 10). Negrito acrescentado.
(234) Ver secção «Contexto e ambiente» (p. 21). «[…] os hospitais públicos [os hospitais IRIS] cuja atividade é uma atividade básica a 80 %, no mínimo, são hospitais de proximidade, atraindo uma boa parte dos pacientes do município central ou dos bairros vizinhos.»
(235) Ver secção «Objetivos contributivos» (p. 74). Negrito acrescentado.
(236) Ver secção «O projeto hospitalar» (p. 36). Negrito acrescentado.
(237) Convém observar que esses dois hospitais especializados partilham ambos um campus com outro hospital IRIS (ver nota 232), o que garante a prestação de todos os cuidados de saúde básicos em cada estabelecimento. Nota de rodapé acrescentada.
(238) Ver secção «O projeto hospitalar» (p. 53). Negrito acrescentado.
(239) Desta forma, os hospitais Institut Bordet e HUDERF, que oferecem principalmente cuidados especializados, completam os três outros hospitais IRIS a fim de dar resposta às necessidades em matéria de cuidados de saúde da população local.
(240) Ver secção «O projeto hospitalar» (p. 53-54).
(241) Ver secção «O projeto hospitalar» (p. 62).
(242) Ver secção «O projeto hospitalar» para uma descrição destes níveis (p. 37) e os quadros (p. 55-59).
(243) O artigo 2.o do acordo de cooperação entre o Estado federal, a Região de Bruxelas-Capital e a comissão comunitária municipal prevê a este respeito: «Este pacto de restruturação deve satisfazer as seguintes condições: 1. Oferecer garantias quanto à manutenção, por um lado, da especificidade dos hospitais públicos, nomeadamente através da escolha das estruturas jurídicas e de coordenação que assegurem uma preponderância do setor público nos órgãos de gestão e nos processos de decisão e, por outro lado, da implantação local, através de um reforço da representação dos membros eleitos por sufrágio direto na composição dos órgãos de gestão» [negrito acrescentado].
(244) Segundo o artigo 125.o da lei relativa aos CPAS, as pessoas de direito público dispõem sempre da maioria dos votos nos diferentes órgãos de administração e de gestão da associação e na estrutura matriz IRIS.
(245) Negrito acrescentado.
(246) A mediana dos rendimentos médios para o ano 2012 nos 19 municípios da Região de Bruxelas-Capital era de 13 746 EUR por habitante. O estabelecimento hospitalar IRIS que resta está localizado em Ixelles, onde o rendimento médio é de 14 513 EUR, ou seja, entre a mediana e o terceiro quartil (ou seja, o percentil 75) da Região de Bruxelas-Capital. Fonte: Centro de informação, documentação e investigação sobre Bruxelas (http://www.briobrussel.be/ned/webpage.asp?WebpageId=345).
(247) Três dos cinco estabelecimentos dos hospitais privados encontram-se nos municípios onde o rendimento médio por habitante ultrapassa o terceiro quartil (ou seja, o percentil 75) da Região de Bruxelas-Capital.
(248) O mapa original foi publicado no Tableau de bord de la santé en Région bruxelloise 2010 [Painel de avaliação da saúde na Região de Bruxelas 2010] e reflete a situação em 1 de julho de 2009. A Comissão acrescentou os círculos e eliminou um hospital geral do mapa (o hospital Clinique des Deux Alice, localizado em Uccle), uma vez que este fechou no final de 2011 (as suas atividades foram transferidas para o estabelecimento de Sainte-Élisabeth do hospital privado Cliniques de l'Europe). Um dos estabelecimentos dos HIS (Baron Lambert, em Etterbeek) não consta do mapa porque só oferece cuidados ambulatórios, não dispondo assim de camas de hospitais sujeitas ao mecanismo de programação.
(249) Por exemplo, o anexo 19 do decreto real de 23 de outubro de 1964 (Moniteur belge de 7 de novembro de 1964, p. 11709) especifica que os serviços neuropsiquiátricos que tratam pacientes adultos devem dispor de, pelo menos, um assistente social por cada 120 pacientes.
(250) Decreto real de 15 de dezembro de 1978 que fixa normas especiais para os hospitais universitários (Moniteur belge de 4 de julho de 1979, p. 7818).
(251) Ver secção «Eixos estruturantes» (p. 6). Negrito acrescentado.
(252) Ver secção «Objetivos contributivos» (p. 54-55). Negrito acrescentado.
(253) Ver plano estratégico 1996-2000, secção «Eixos estruturantes» (p. 10). Negrito acrescentado.
(254) Ver secção «Missões específicas do hospital público» (p. 82). Negrito acrescentado.
(255) O RMC, o resumo clínico mínimo, é um resumo normalizado conciso dos antecedentes médicos do paciente que os hospitais gerais são obrigados a registar desde 1990. Entre outros, é utilizado para determinar as necessidades de equipamento hospitalar, para definir as normas qualitativas e quantitativas para a acreditação dos hospitais e dos seus serviços e para organizar o financiamento dos hospitais. Os códigos «V» dizem respeito aos fatores que influenciam o estado de saúde do paciente e o contacto com os serviços de saúde. Estes códigos podem ser utilizados para indicar os problemas socioeconómicos, jurídicos e familiares que podem ter incidência na permanência do paciente no hospital.
(256) Ver secção «Missões específicas do hospital público» (p. 83). Negrito acrescentado.
(257) Por exemplo, os assistentes sociais dos hospitais IRIS recolheram informações no âmbito de 25 749 inquéritos sociais em 2012, o que representa cerca de 5,4 % dos pacientes hospitalizados nesse ano.
(258) Esta obrigação decorre do artigo 60.o, n.o 1, da lei relativa aos CPAS, do artigo 9.o-A da lei de 2 de abril de 1965 (para o eventual reembolso por parte do serviço público federal para a integração social ao CPAS desde que estejam preenchidas determinadas condições) e da circular de 25 de março de 2010 relativa ao inquérito social (Moniteur belge de 6 de maio de 2010, p. 25432).
(259) Este dado representa o número de equivalentes a tempo inteiro (ETI).
(260) O BMF prevê um financiamento para os assistentes sociais (para domínios tais como a geriatria, onde existe uma exigência mínima), mas este financiamento totalizou apenas cerca de 400 000 EUR em 2010.
(261) Um decreto real (atualmente, o decreto real de 8 de março de 2006) fixa o método de cálculo do défice que os municípios têm de cobrir em virtude do artigo 109.o da LCH.
(262) A associação que representa os médicos do hospital em causa e, se for caso disso, a Universidade Livre de Bruxelas ou a Vrije Universiteit Brussel, possuem sempre menos de 20 % dos votos nas associações locais dos hospitais IRIS. Da mesma forma, desde 2000, o município e o CPAS de Jette são membros da associação do CHU Brugmann, mas, como possuem menos de 20 % dos votos nessa associação, não contribuem para a compensação do défice. Por último, a partir do exercício de 2014, o município e o CPAS de Schaerbeek também possuem menos de 20 % dos votos na associação do CHU Brugmann e, logo, não contribuem para colmatar o défice deste hospital. Tal significa que, a partir de 2014, somente a cidade de Bruxelas e o seu CPAS são obrigados a cobrir o défice do CHU Brugmann.
(263) Todas as despesas suportadas para a execução do SIEG e das atividades conexas constituem custos de serviço público que incluem o custo das atividades conexas.
(264) Moniteur belge de 30 de abril de 2014, p. 35442. Aplicável a partir de 10 de maio de 2014.
(265) Artigo 5.o da Decisão SIEG de 2012.
(266) Artigo 5.o, n.os 2 a 9, da Decisão SIEG de 2012.
(267) Entre 2007 e 2011, em média […] % das despesas dos hospitais IRIS foram cobertas por este financiamento.
(268) Moniteur belge de 29 de junho de 2007, p. 35929. Aplicável a partir de 9 de julho de 2007. Este decreto real substituiu o decreto real de 14 de dezembro de 1987 relativo às contas anuais dos hospitais, que prevê exigências muito semelhantes.
(269) Neste contexto, importa observar que alguns fluxos contabilísticos ligados às atividades hospitalares também devem ser registados nos códigos contabilísticos 900 a 999. Dizem respeito a alguns fluxos que não são considerados na determinação do financiamento do BMF (que segue uma lógica de contabilidade de tesouraria e não a abordagem de contabilidade do exercício aplicável à contabilidade hospitalar).
(270) Em teoria, os hospitais IRIS podem solicitar aos municípios o pagamento da compensação do défice logo que seja conhecido o resultado do exercício financeiro. Na prática, não o fazem porque são controlados pelos municípios e porque estes últimos não dispõem (sempre) das verbas necessárias para efetuar imediatamente os pagamentos.
(271) Na verdade, durante o período 1996-2014, o financiamento regional concedido aos municípios foi insuficiente para cobrir integralmente os défices dos hospitais IRIS (ver também nota 143).
(272) A título de exemplo, o quadro 3 mostra que, embora o CHU Saint-Pierre tenha registado défices todos os anos desde 1996, o primeiro pagamento (no montante de 3 368 351 EUR) efetuado pelo município a título de compensação do seu défice só aconteceu em 2002. Os quadros não permitem saber qual foi, entre os défices anuais registados desde 1996, aquele que foi compensado pelo pagamento efetuado em 2002. Contudo, as informações pormenorizadas fornecidas à Comissão pelas autoridades belgas indicam que, na realidade, esse pagamento foi efetuado com vista a cobrir uma parte do défice registado em 1996.
(273) Ver considerando 236 para explicação da razão pela qual os dados relativos aos anos 1996, 1997 e 1998 não estão disponíveis.
(274) Ver considerando 236 para explicação da razão pela qual os dados relativos aos anos 1996, 1997 e 1998 não estão disponíveis.
(275) Trata-se dos montantes que foram efetivamente pagos e reembolsados após terem sido considerados eventuais pagamentos de compensação do défice já efetuados pelo município.
(276) 2014 é o exercício contabilístico mais recente para o qual estavam disponíveis dados quantificados.
(277) Ver artigo 5.o da Diretiva 80/723/CEE da Comissão, de 25 de junho de 1980, relativa à transparência das relações financeiras entre os Estados-Membros e as empresas públicas (JO L 195 de 29.7.1980, p. 35).
(278) Ver a este respeito o artigo 7.o da Decisão SIEG de 2005 e o artigo 8.o da Decisão SIEG de 2012.
(279) Em especial, somente em quatro anos, relativamente aos 89 avaliados para os cinco hospitais IRIS, é que a sobrecompensação técnica para esses anos considerados isoladamente excedia 10 % do montante da compensação anual.
(280) Além disso, importa recordar que os montantes da compensação do défice representam apenas uma parte limitada do financiamento público total recebido pelos hospitais IRIS para o SIEG que prestam. Ao longo do período 2007-2011, os pagamentos BMF anuais médios do governo federal totalizaram cerca de 323 milhões de EUR para os hospitais IRIS no seu conjunto. Ao longo do mesmo período, os hospitais IRIS no seu conjunto apresentaram défices contabilísticos médios de 13,4 milhões de EUR por ano, enquanto os municípios pagaram 16,4 milhões de EUR por ano em média de compensações dos défices (que cobriam também os défices dos anos anteriores). Portanto, as compensações dos défices representavam apenas cerca de 5 % do financiamento BMF federal concedido aos hospitais IRIS. Consequentemente, se estes montantes significativos de financiamento público concedido através do BMF tivessem sido considerados no momento de calcular se a sobrecompensação ultrapassava 10 % da compensação paga num dado ano (e logo se poderia ser reportada para o ano seguinte, tal como autorizado pelo artigo 6.o, n.o 2, da Decisão SIEG de 2012), a percentagem de sobrecompensação seria provavelmente um pouco inferior. Esta conclusão baseia-se na importância relativa dos pagamentos BMF quando comparados com os défices e no facto de o risco de sobrecompensação através do BMF ser mínimo. Em especial, o BMF foi concebido principalmente como um financiamento de montante fixo calculado com base nos custos reais dos hospitais em anos anteriores (e não implica qualquer sobrecompensação). Por outro lado, o serviço público federal da saúde pública efetua controlos ex post rigorosos aos custos reais suportados por cada hospital e recalcula o montante BMF ao qual o hospital tem direito. Por último, convém observar que não foi considerado qualquer lucro razoável aquando da comparação das compensações pagas pelos municípios com os défices contabilísticos registados pelos hospitais IRIS.
(281) O excerto em questão do artigo 6.o, n.o 2, da Decisão SIEG de 2012 apresenta a seguinte redação: «Quando o excesso de compensação não ultrapassar 10 % do montante da compensação média anual, pode transitar para o período anual seguinte, sendo deduzido ao montante da compensação relativa a esse período.» Tendo em conta que a ausência de sobrecompensação real (porque, globalmente, o hospital esteve permanentemente numa situação de compensação insuficiente no período 1996-2014), uma tal transição nunca foi efetuada na prática. Esta observação é válida para todos os hospitais IRIS (ver considerando 240 a 243).
(282) Uma outra solução, se o hospital CHU Saint-Pierre se tornasse rentável em anos futuros, consistiria normalmente em conservar os lucros e utilizá-los para compensar as perdas passadas. Nesse caso, os municípios não deveriam compensar, ou só deveriam compensar parcialmente, o défice contabilístico residual. Contudo, tal cenário é hipotético, uma vez que o hospital CHU Saint-Pierre apresentou um lucro limitado somente num dos anos (2006) do período 1996-2014.
(283) Como explicado no considerando 104, o FRBRTC e as subvenções especiais concedidas pela Região de Bruxelas-Capital aos municípios são medidas de financiamento intraestatais que constituem uma fonte de financiamento para o mecanismo de pagamentos efetuados pelos municípios a título de compensação dos défices. Estes montantes são indicados numa coluna separada a fim de ilustrar que os municípios utilizam integralmente esses fundos regionais para os pagamentos da compensação do défice. Esta apresentação não pode ser interpretada como uma indicação de que os montantes foram transferidos do FRBRTC ou da Região de Bruxelas-Capital para os hospitais IRIS. Estas transferências foram efetuadas a favor dos municípios que, por sua vez, os utilizaram para financiar a sua obrigação de compensação do défice perante os hospitais IRIS.
(*1) Após serem acrescentados os lucros não distribuídos no período 1996-1998, ou seja, 703 624 EUR.
(284) Ver, a este respeito, o artigo 6.o da Decisão SIEG de 2005 e o artigo 6.o, n.o 2, da Decisão SIEG de 2012.
(285) Artigo 6.o, n.o 1, da Decisão SIEG de 2012.
(286) Artigo 6.o, n.o 2, da Decisão SIEG de 2012.
(287) Moniteur belge de 6 de dezembro de 1983, p. 15009.
(288) Moniteur belge de 23 de março de 2006, p. 16710.
(289) Moniteur belge de 25 de junho de 2003, p. 33692.
(290) Este período de amortização é imposto pelo decreto real de 19 de junho de 2007 que é aplicável a todos os hospitais belgas (ver também considerando 226).
(291) Ver nota de rodapé 264.
(292) Como explicado no considerando 166, a Comissão considera que as três obrigações suplementares não seriam confiadas na ausência da missão hospitalar básica. Neste contexto, a Comissão entende que deve apreciar o período de atribuição relativo à missão hospitalar básica.
(293) Dito de outra forma, a lei coordenada sobre os hospitais de 10 de julho de 2008 (Moniteur belge de 7 de novembro de 2008, p. 58624).