ISSN 1725-2482

Jornal Oficial

da União Europeia

C 120

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Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

48.o ano
20 de Maio de 2005


Número de informação

Índice

Página

 

II   Actos preparatórios

 

Comité Económico e Social Europeu

 

412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004

2005/C 120/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao resseguro e que altera as Directivas 73/239/CEE, 92/49/CEE do Conselho e as Directivas 98/78/CE e 2002/83/CE[COM(2004) 273 final — 2004/0097 (COD)]

1

2005/C 120/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à limitação da colocação no mercado e da utilização de tolueno e triclorobenzeno (vigésima oitava alteração da Directiva 76/769/CEE do Conselho)[COM(2004) 320 final — 2004/0111 (COD)]

6

2005/C 120/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre A capacidade de adaptação das PME e das empresas da economia social às mutações impostas pelo dinamismo económico

10

2005/C 120/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Os corredores paneuropeus de transporte.

17

2005/C 120/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Ligações de elevado débito na Europa: evolução recente no sector das comunicações electrónicas [COM(2004) 61 final]

22

2005/C 120/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta alterada de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao reforço da segurança nos portos[COM(2004) 393 final — 2004/0031 (COD)]

28

2005/C 120/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à limitação da colocação no mercado e da utilização de alguns hidrocarbonetos aromáticos policíclicos em óleos de diluição e pneumáticos (vigésima sétima alteração da Directiva 76/769/CEE do Conselho)COM(2004) 98 final – 2004/0036 (COD)

30

2005/C 120/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 2702/1999 relativo a acções de informação e promoção a favor de produtos agrícolas em países terceiros e o Regulamento (CE) n.o 2826/2000 relativo a acções de informação e promoção a favor dos produtos agrícolas no mercado interno[COM(2004) 233 final — 2004/0073 (CNS)]

34

2005/C 120/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as Mutações industriais e auxílios estatais no sector siderúrgico

37

2005/C 120/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre A segurança sanitária: uma obrigação colectiva, um direito novo

47

2005/C 120/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão — Acompanhamento do processo de reflexão de alto nível sobre a mobilidade dos doentes e a evolução dos cuidados de saúde na União Europeia[COM(2004) 301 final]

54

2005/C 120/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as:

60

2005/C 120/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Formação e produtividade

64

2005/C 120/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Conselho que altera a Decisão 2002/463/CE que adopta um programa de acção de cooperação administrativa em matéria de fronteiras externas, vistos, asilo e imigração (programa ARGO)[COM(2004) 384 final — 2004/0122 (CNS)]

76

2005/C 120/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Conselho relativo ao Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência[COM(2003) 808 final — 2003/0311 (CNS)]

78

2005/C 120/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Melhorar a aplicação da Estratégia de Lisboa

79

2005/C 120/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O desafio competitivo das empresas europeias

89

2005/C 120/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Verde sobre as parcerias público-privadas e o direito comunitário em matéria de contratos públicos e concessões[COM(2004) 327 final]

103

2005/C 120/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Conselho que altera a Directiva 92/12/CEE relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo[COM(2004) 227 final — 2004/0072 (CNS)]

111

2005/C 120/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Conselho que adapta a Directiva 77/388/CEE, em virtude da adesão da República Checa, da Estónia, de Chipre, da Letónia, da Lituânia, da Hungria, de Malta, da Polónia, da Eslovénia e da Eslováquia[COM(2004) 295 final]

114

2005/C 120/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à eficiência na utilização final de energia e aos serviços energéticos[COM(2003) 739 final — 2003/0300 (COD)]

115

2005/C 120/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a medidas destinadas a garantir a segurança do fornecimento de electricidade e o investimento em infra-estruturas[COM(2003) 740 final — 2003/0301 (COD)]

119

2005/C 120/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa

123

2005/C 120/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O ambiente: uma oportunidade económica

128

2005/C 120/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Modernizar a protecção social para o desenvolvimento de cuidados de saúde e de cuidados prolongados de qualidade, acessíveis e duradouros: um apoio às estratégias nacionais pelo Método aberto de coordenação[COM(2004) 304 final]

135

PT

 


II Actos preparatórios

Comité Económico e Social Europeu

412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004

20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao resseguro e que altera as Directivas 73/239/CEE, 92/49/CEE do Conselho e as Directivas 98/78/CE e 2002/83/CE»

[COM(2004) 273 final — 2004/0097 (COD)]

(2005/C 120/01)

Em 10 de Junho de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 6 de Outubro de 2004, tendo sido relator FRANK von FÜRSTENWERTH.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 158 votos a favor, 4 votos contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

Presentemente, não há na UE um quadro harmonizado para a supervisão de empresas de resseguros. Daí que, os sistemas de supervisão desta actividade diferem muito entre os Estados-Membros.

1.2

Por este motivo, em 21 de Abril de 2004, a Comissão apresentou a proposta de directiva relativa ao resseguro e que altera as Directivas 73/239/CEE, 92/49/CEE do Conselho e as Directivas 98/78/CE e 2002/83/CE. Os principais elementos dessa proposta são os seguintes:

uma abordagem prudencial baseada na harmonização e no reconhecimento mútuo e nas regras sobre supervisão do seguro directo;

uma abordagem acelerada, que prevê a introdução de uma directiva baseada nas regras sobre supervisão do seguro directo;

um sistema de autorização obrigatório;

requisitos da margem de solvência conformes aos aplicáveis ao seguro directo, com a possibilidade de recorrer a um procedimento de comitologia para aumentar essa margem.

2.   Propostas da Comissão

2.1

A directiva tem por objectivo estabelecer um quadro harmonizado de supervisão das empresas de resseguros e empresas de resseguros cativas (1) na União Europeia.

2.2

A proposta de directiva estabelece as condições mínimas necessárias para a obtenção da autorização oficial. Trata-se nomeadamente da obrigação de uma determinada forma jurídica, de apresentar um plano de empresa e de deter um fundo mínimo de garantia. O objecto da empresa de resseguros deve ser limitado às actividades de resseguros e operações conexas. Os accionistas qualificados e a administração da empresa são também sujeitos a supervisão. Uma autorização concedida é válida para toda a Comunidade.

2.3

A directiva visa impedir a constituição de garantias pelo ressegurador junto das empresas de seguro primário, desde que aquelas sejam obrigatórias nos termos das legislações nacionais. As garantias contratuais não estão abrangidas. Para além da instauração de um mercado interno efectivo, a Comissão procura igualmente estabelecer uma avaliação comparativa internacional, a fim de reduzir os encargos para as empresas de resseguros europeias em todo o mundo através da constituição de garantias.

2.4

No quadro das disposições para a solvência das empresas, as actividades de resseguro não vida devem ser abrangidas pelos requisitos de solvência aplicáveis às empresas de seguro não vida directo. A margem de solvência pode ser aumentada até 50 % no quadro do procedimento de comitologia. Os requisitos de solvência das empresas de resseguros de vida devem ser conformes aos requisitos de solvência aplicáveis às empresas de seguro de vida directo. Sempre que uma empresa de resseguro oferecer simultaneamente resseguros vida e não vida, o valor total deve ser coberto por fundos próprios. Tal como as empresas de seguro directo, as empresas de resseguros também devem possuir um fundo mínimo de garantia igual ou superior a três milhões de euros. No tocante às empresas de resseguros cativas, esse valor pode ser reduzido para um milhão de euros.

2.5

A proposta de directiva define os poderes de supervisão apropriados para quando a situação financeira da empresa se deteriora, quando não constitui provisões técnicas adequadas ou quando a margem de solvência não atinge o nível exigido. Esses poderes correspondem aos existentes no domínio do seguro primário e englobam a apresentação de um plano de reequilíbrio da sua situação financeira e de um plano financeiro e a revogação da autorização.

2.6

As empresas de resseguros que podem ou estão autorizadas a realizar negócios no sector dos resseguros antes da data de aplicação da presente directiva podem continuar a fazê-lo sem pedir autorização. Estão sujeitas às disposições essenciais da directiva, embora os Estados-Membros possam conceder um período de transição suplementar de dois anos.

2.7

Na proposta são conferidos poderes de execução à Comissão para introduzir ajustamentos técnicos na directiva «comitologia».

2.8

Segundo as normas de supervisão das empresas de resseguros, as disposições das directivas vida, não vida e grupos de seguros devem ser adaptadas. Assim:

a autoridade supervisora não pode recusar um contrato de resseguro por razões directamente relacionadas com a solidez financeira de uma empresa de resseguros comunitária;

não é possível operar um sistema de reservas brutas em que os activos devem cobrir as transferências de contribuições e as provisões técnicas para sinistros por regularizar (proibição de constituição de garantias);

as empresas de seguros directos que também ofereçam resseguros estão sujeitas aos mesmos requisitos de solvência que as empresas de resseguros;

a directiva relativa aos grupos de seguros está a ser alterada para pôr ao mesmo nível as empresas de resseguros e as empresas de seguros directos.

3.   Observações na generalidade

3.1

O Comité congratula-se com a proposta da Comissão que contribui para consolidar o mercado financeiro europeu, garantindo que as empresas de resseguros e empresas de resseguros cativas dispõem de capital suficiente para respeitarem os compromissos assumidos. Assim, a posição das empresas de resseguros europeias nos mercados de seguros internacionais é reforçada de forma sustentada.

3.2

O Comité refere explicitamente a importância do sector de resseguros para o mercado financeiro europeu. Em 2002, o prémio total de resseguros dos 40 maiores resseguradores elevou-se a 138 601 200 000 de dólares americanos, dos quais 58 544 000 000 de dólares americanos provinham de empresas de resseguros da UE.

3.3

As actividades de resseguros referem-se em primeiro lugar às relações entre uma seguradora e uma resseguradora. As perdas de uma ou mais empresas de resseguros podem, porém, ter impacto no consumidor, se, devido a essas perdas, um segurador deixa de estar em condições de cumprir os seus compromissos. O Comité reconhece que a proposta de directiva aumenta indirectamente o nível de protecção dos consumidores comunitários. Ao mesmo tempo, o Comité refere que uma protecção suficiente da resseguradora também é do interesse do consumidor. Isso implica a existência no mercado europeu de uma capacidade de resseguro suficiente para os prémios apropriados.

3.4

O Comité acolhe com satisfação a abordagem acelerada da Comissão, ou seja, que as regras de supervisão dos resseguros sejam conformes às actuais regras de supervisão dos seguros primários. Esta é a posição correcta, em especial face ao projecto Solvência II em curso.

3.5

O facto de o mercado dos resseguros ser um mercado caracterizado pela globalidade é muito importante. Assim, o Comité solicita ao Parlamento Europeu, ao Conselho e à Comissão que, nas consultas em curso sobre a presente directiva, dêem especial atenção à questão da competitividade internacional do sector de resseguros europeu.

3.6

O Comité reconhece que o sector de resseguros europeu já comprovou a sua solidez financeira após os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001. Desta forma, qualquer novo encargo que onere o sector de resseguros europeu deve ser objecto de uma análise custo-benefício pormenorizada.

3.7

O Comité reconhece que, até ao momento, existiam diversos sistemas de supervisão na UE. Estes caracterizavam-se por uma combinação de disposições de solvência, de investimentos e de garantias. Segundo a proposta da Comissão, serão suprimidas disposições em vigor até agora em especial no domínio da constituição de garantias. Há que garantir que as autoridades de supervisão competentes desenvolvem confiança suficiente na futura legislação de supervisão e na sua utilização uniforme.

4.   Requisitos de solvência no resseguro de vida (artigo 38.o)

4.1

Segundo a proposta de directiva, as regras de cálculo da margem de solvência das empresas de seguros de vida directos serão também utilizadas para as empresas de resseguros. No que se refere aos resseguros de vida, a Comissão propõe a adopção na íntegra das regras de solvência do sector de seguros directos. O cálculo da solvência inclui dois elementos: 3 % do montante em risco e 4 % das provisões matemáticas. Na opinião do Comité, isto representa um encargo desproporcionado para as empresas europeias de resseguros de vida. A proposta da Comissão:

não tem em conta o perfil comercial/de risco do resseguro de vida e leva a uma capitalização excessiva inadequada da empresa de resseguro de vida;

penaliza consideravelmente os resseguradores europeus em relação aos seus concorrentes internacionais (ver anexo); provoca receios de maior escassez de capacidades de resseguro;

encarece bastante a protecção de resseguro;

pode contribuir para desestabilizar os mercados financeiros, se, devido ao aumento dos custos, a empresa de seguro directo não adquirir a cobertura de resseguro necessária;

sobrecarrega com novos custos consideráveis os sistemas privados de reforma por capitalização.

4.2

As empresas de seguro de vida e de resseguros de vida na Europa diferem bastante na sua estrutura de risco. No tocante ao resseguro de vida, os riscos de investimento permanecem em geral nos seguradores primários. Esta diferença já indica que a fórmula de solvência para os seguros de vida primários não reflecte adequadamente a estrutura de risco no domínio do resseguro de vida.

4.3

Uma comparação com os métodos de cálculo utilizados pelas agências de classificação revela que as exigências da proposta da UE seriam aparentemente excessivas. Assim, os requisitos de solvência nos EUA, assentes nos capitais em risco, também introduzem uma variável que depende da dimensão da carteira pertinente (0,8‰ para as carteiras de mais de 25 mil milhões de euros, ver anexo). A posição das autoridades de supervisão canadianas e das agências de classificação é similar.

4.4

Enquanto no domínio do seguro directo a relação entre o segurador e o cliente é ainda conduzida a nível nacional, o resseguro sempre foi uma operação internacional. Isso deve-se sobretudo à necessidade de diversificar os riscos no plano internacional. É, pois, preciso garantir uma igualdade de tratamento entre os fornecedores da União e entre os concorrentes internacionais estabelecidos nos EUA, nas Bermudas e na Suíça.

4.5

As empresas europeias de resseguros, que se confrontam com a concorrência mundial, deviam temer as consideráveis desvantagens em relação aos seus concorrentes extracomunitários, dado que estes últimos estão sujeitos a requisitos menos estritos em matéria de capitais próprios. As empresas de resseguros poderão provavelmente estabelecer-se em massa em centros de resseguros não europeus, tais como as Bermudas ou os EUA. Uma transferência das capacidades de resseguros debilitaria consideravelmente o mercado financeiro europeu. As exigências excessivas conduzirão inevitavelmente a uma escassez da capacidade de resseguro e/ou a um agravamento da cobertura de resseguro. O aumento dos preços do resseguro terá obviamente um impacto nos custos de produção do segurador directo e, portanto, no consumidor. Os preços mais elevados terão, assim, forçosamente uma influência negativa na criação de sistemas privados de reforma por capitalização.

4.6

Na opinião do Comité, semelhante panorama não contribui para o fomento do mercado interno europeu. Os novos Estados-Membros da UE, em particular, têm interesse em que o mercado interno europeu de resseguros funcione bem e serão especialmente afectados por qualquer alteração desvantajosa da estrutura do sector de resseguros.

4.7

O Comité chega, pois, à conclusão de que as propostas relativas ao cálculo da margem de solvência pelas actividades de resseguro de vida podem prejudicar a competitividade dos resseguradores europeus. Por isso, o Comité considera que se devem modificar claramente essas disposições da proposta.

4.8

Neste contexto, o Comité propõe aplicar também ao sector do resseguro de vida os cálculos de solvência utilizados no domínio do resseguro não vida.

4.8.1

O método de cálculo de solvência utilizado no domínio do resseguro não vida é mais que suficiente, tanto do ponto de vista do risco como da concorrência. A fórmula de solvência não vida está em perfeita harmonia com as exigências de solvência internacionais, o que exclui as desvantagens competitivas para as empresas de resseguros europeias.

4.8.2

A fórmula dos seguros não vida retrata adequadamente as empresas de resseguros vida. Dada a grande cobertura de riscos de mortalidade, as actividades de resseguros vida encontram-se mais próximas das actividades de seguros e resseguros não vida do que das dos seguros vida.

4.8.3

Os riscos que não são considerados na fórmula do seguro não vida podem facilmente ser tidos em conta no âmbito do projecto Solvência II.

4.8.4

Na perspectiva da técnica jurídica, essa fórmula é fácil de aplicar, pois a Comissão já apresentou um texto de directiva definitivo no projecto de proposta de directiva (terceira revisão).

4.8.5

A fórmula do seguro não vida permite às empresas de resseguros vida determinar atempadamente os seus requisitos de solvência, pois os dados necessários já existem na empresa e não devem ser coligidos primeiro. Esta fórmula parece vantajosa em especial devido à falta de informações disponíveis nas actividades internacionais.

4.8.6

A fórmula de solvência do domínio de seguros não vida presta-se especialmente bem a uma abordagem acelerada. É de aplicação fácil, pois não exige adaptações suplementares da fórmula para os casos, por exemplo, com garantias contratuais.

5.   Requisitos de solvência no resseguro não vida (artigos 37.o e 55.o)

5.1

Segundo a proposta de directiva, as regras de cálculo da margem de solvência das empresas de seguros não vida directos serão também utilizadas para as empresas de resseguros não vida. Nesse contexto, esses requisitos devem poder ser aumentados até 50 %, no âmbito do método Lamfalussy.

5.2

O Comité considera adequado aplicar ao ressegurador não vida as mesmas disposições relativas à solvência que ao segurador não vida no quadro da abordagem acelerada. O Comité manifesta, porém, grandes reservas quanto ao alargamento do método Lamfalussy aos requisitos de solvência.

5.3

A proposta de directiva em apreço foi concebida como um projecto acelerado e não como uma directiva-quadro no âmbito do método Lamfalussy. A adaptação dos requisitos de solvência deve ser feita, em primeiro lugar, no âmbito do projecto Solvência II mais vasto.

5.4

Neste caso também não se justifica a utilização do método Lamfalussy. Os requisitos de capitais próprios das empresas de resseguros não constituem em caso algum medidas de aplicação que podem ser adoptadas no âmbito do método Lamfalussy. Tendo em conta as longas negociações do sector bancário sobre o acordo de Basileia II, é fácil compreender que os requisitos de capitais próprios constituem a «peça fulcral» do futuro sistema de supervisão e não devem nunca ser considerados apenas um detalhe a resolver posteriormente.

5.5

Na opinião do Comité, os requisitos concretos de capitais próprios devem constar da própria directiva e não de uma legislação comunitária posterior. Essa distinção é também defendida pelo actual projecto da Convenção, que estipula que as disposições essenciais devem constar da própria directiva. Assim, a referência da Comissão a uma vasta consulta das partes envolvidas não é suficientemente abrangente.

6.   Factores para resseguros e retrocessão (artigos 37.o e 38.o)

6.1

A proposta de directiva prevê que, no cálculo da margem de solvência, as retrocessões a outros resseguradores só devem ser tidas em conta num máximo de 50 % do montante bruto dos sinistros. Isso está em conformidade com a legislação em vigor no domínio do seguro vida e não vida. No que se refere à supervisão das empresas de resseguros, a proposta de directiva deve contribuir bastante para o reforço da solidez financeira do sector de resseguros da União Europeia. Nesse contexto, o Comité considera que se justifica reconhecer plenamente as cessões do segurador e as retrocessões do ressegurador, desde que o cessionário ou o retrocessionário estejam sujeitos a um controlo na União Europeia.

6.2

O Comité recomenda um aumento dos factores de resseguro e de retrocessão, tendo em conta nomeadamente os requisitos acrescidos no sector dos seguros para a resolução de problemas que afectam a sociedade em geral. Em especial depois dos atentados de 11 de Setembro de 2001, nem sempre foi possível encontrar soluções financeiramente vantajosas para responder aos pedidos de cobertura de riscos terroristas para a indústria e aviação, em virtude dos fracos factores de resseguro e de retrocessão. Em alguns Estados-Membros, ainda não se encontrou qualquer solução para o seguro contra os riscos terroristas por causa do fraco factor de retrocessão.

7.   Regras relativas ao investimento (artigo 34.o)

7.1

O Comité aceita o princípio de investimento qualitativo (o denominado princípio do «gestor prudente»), constante do artigo 34.o. Tendo em conta as particularidades e sobretudo o carácter internacional da actividade de resseguro, esta abordagem é mais apropriada do que uma abordagem rígida quantitativa. A UE adopta, assim, uma abordagem moderna, também recomendada pela Associação Internacional das Autoridades de Supervisão dos Seguros (IAIS). Ao mesmo tempo, o Comité reconhece evidentemente que uma abordagem qualitativa não é um salvo-conduto, exigindo que as empresas controlem e melhorem permanentemente os seus processos de investimento.

7.2

Como, com a directiva, são para reduzir ou revogar regras de supervisão até agora vigentes (como o depósito), recomenda-se que se conceda, na directiva, aos Estados-Membros a possibilidade de exigirem às resseguradoras domiciliadas no seu território a utilização de prescrições de estabelecimento quantitativas adicionais, com a condição de tais prescrições se justificarem com base no «princípio do gestor prudente» assim como nas obrigações assumidas.

8.   Período de transição (artigo 51.o)

As empresas de resseguros não estão, presentemente, sujeitas a nenhum quadro jurídico europeu uniforme. O Comité recomenda que a Comissão examine em profundidade a eventual necessidade de outras disposições transitórias. Estas poderão referir-se, por exemplo, aos instrumentos de capital próprio utilizados neste momento pelo ressegurador, que não são reconhecidos no âmbito dos requisitos de capitais próprios para o segurador primário.

9.   Conclusões

9.1

O Comité aprova, com as reservas mencionadas, a proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao resseguro e que altera as Directivas 73/239/CEE, 92/49/CEE do Conselho e as Directivas 98/78/CE e 2002/83/CE, apresentada pela Comissão. Considera que a proposta abrange quase todos os domínios da supervisão das empresas de resseguros. Quando a directiva estiver plenamente em vigor, contribuirá para o reforço e para a estabilidade dos mercados de resseguros da União Europeia, em conformidade com o objectivo da Comissão.

9.2

Depois de examinada a proposta da Comissão, o Comité debruçou-se sobre alguns aspectos da proposta de directiva, a fim de dar à Comissão indicações e propostas concretas quanto a reflexões e análises mais aprofundadas. O Comité propõe aplicar também ao sector do resseguro de vida os cálculos de solvência utilizados no domínio do resseguro não vida. Acresce que, os requisitos de solvência não deviam entrar no campo de aplicação do método Lamfalussy. Salientando a importância da proposta de directiva, o Comité solicita um processo legislativo célere.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Por cativa que exerce a actividade de resseguro entende-se uma resseguradora que pretence a uma empresa ou grupo de empresas que não operam como primeiro segurador ou ressegurador. A actividade empresarial de uma resseguradora cativa limita-se, por isso, à oferta de protecção por resseguro à empresa ou ao grupo de empresas a que pertence.


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/6


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à limitação da colocação no mercado e da utilização de tolueno e triclorobenzeno (vigésima oitava alteração da Directiva 76/769/CEE do Conselho)»

[COM(2004) 320 final — 2004/0111 (COD)]

(2005/C 120/02)

Em 11 de Maio de 2004, o Conselho decidiu, em conformidade com o disposto no artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

A Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 6 de Outubro de 2004, sendo relator David SEARS.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 165 votos a favor, 1 voto contra e 5 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

«Substâncias existentes» são substâncias que se considera terem estado disponíveis no mercado comunitário entre 1 de Janeiro de 1971 e 18 de Setembro de 1981. O Inventário Europeu das Substâncias Químicas Comerciais Existentes (EINECS), publicado no Jornal Oficial em 1990 (1), identificou e listou 100 195 dessas substâncias. As substâncias colocadas no mercado após 18 de Setembro de 1981 são definidas como «novas» e a sua entrada no mercado deve ser precedida de notificação nos termos da legislação comunitária relevante.

1.2

Os riscos que estas substâncias existentes podem comportar para a saúde humana e para o ambiente têm sido constantemente avaliadas em cumprimento do Regulamento (CEE) n.o 793/93 do Conselho (2). Até à data, foram elaboradas quatro listas de substâncias prioritárias a utilizar pelas autoridades competentes nos Estados-Membros. A última destas listas data de 25 de Outubro de 2000 (3). As listas identificaram 141 substâncias das quais poderiam advir riscos devido quer à sua estrutura específica e às suas interacções bioquímicas conhecidas ou previstas, quer aos seus elevados volumes de produção (EVP).

1.3

Os Estados-Membros avaliam o factor de risco e de exposição de cada substância em todas as fases da manufactura e da utilização de forma a determinar se há ou não riscos para a saúde ou para o ambiente e para estabelecer as medidas de redução dos riscos caso necessário. Se se concluir, ainda que a substância conste de uma lista de substâncias prioritárias, que os riscos são nulos ou reduzidos na utilização corrente ou prevista, as medidas de controlo podem ser desnecessárias ou ter um impacto muito limitado.

1.4

Os Relatórios de Avaliação dos Riscos (RAR) elaborados pelos Estados-Membros são por sua vez examinados pelo Comité Científico da Toxicidade, Ecotoxicidade e do Ambiente (CCTEA). Se o CCTEA concordar com as conclusões e com o processo geral de avaliação, podem ser propostas, se necessário, medidas de redução dos riscos sob a forma de alteração ao Anexo I da Directiva n.o 76/769/CEE do Conselho relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros respeitantes à limitação da colocação no mercado e da utilização de algumas substâncias e preparações perigosas (4). A proposta em apreço constitui a vigésima oitava alteração.

1.5

As duas substâncias (tolueno e triclorobenzeno) de que se ocupa a proposta foram avaliadas de acordo com o procedimento acima descrito. Ambas foram incluídas na segunda lista de substâncias prioritárias publicada como Regulamento (CE) n.o 2268/95 da Comissão de 27 de Setembro de 1995 (5). Ambas foram atribuídas à Dinamarca para o processo de avaliação. O CCTEA apoiou e concordou, no essencial, com os RAR subsequentemente apresentados em pareceres emitidos nas suas 24.a e 25.a reuniões plenárias de 12 de Junho de 2001 e de 20 de Julho de 2001, respectivamente.

1.6

A proposta em apreço define medidas de redução dos riscos para as duas substâncias, a aplicar pelos Estados-Membros nos dezoito meses a contar da entrada em vigor da directiva. A Comissão publicou a proposta em 28 de Abril de 2004. Após os procedimentos devidos, e se for obtido acordo sobre eventuais alterações necessárias, a directiva deverá entrar em vigor nos Estados-Membros o mais tardar em Junho de 2006.

2.   Síntese da proposta da Comissão

2.1

A proposta visa proteger a saúde humana e o ambiente e estabelecer (ou manter) o mercado interno para as duas substâncias referidas. Entende a Comissão que isso pode ser conseguido a custo reduzido ou nulo dado que o seu uso nas aplicações especificadas está em declínio e que se estima que há vários produtos alternativos disponíveis.

2.2

No caso do tolueno, reconhecido como uma substância versátil de EVP utilizada como matéria-prima essencial para a síntese química e como solvente em diversas aplicações industriais e de consumo, as restrições deverão aplicar-se a qualquer utilização acima dos 0,1 % em massa em produtos adesivos e tintas para pulverização destinados à venda ao público em geral. Esta restrição não é válida para as aplicações industriais e destina-se a proteger a saúde dos consumidores.

2.3

Quanto ao triclorobenzeno, cuja utilização é mais limitada como produto intermediário no fabrico de herbicidas e como solvente de processo em sistemas fechados, as restrições aplicar-se-ão a qualquer utilização acima dos 0,1 % em massa, excepto como produto intermediário. Isto limita qualquer eventual venda ao público em geral e providencia uma maior protecção da saúde no local de trabalho.

2.4

Os dois produtos a que esta alteração se refere são definidos pelos números CAS 108-88-3 (tolueno) e 120-82-1 (triclorobenzeno) no Anexo à proposta. As restrições à sua utilização serão aditadas ao Anexo I da Directiva 76/769/CEE.

2.5

A partir da entrada em vigor da directiva, após consulta do Comité Económico e Social Europeu (em cumprimento do art. 95.o do Tratado) e de acordo com o processo de co-decisão com o Parlamento Europeu, os Estados-Membros disporão de um ano para promulgar a legislação necessária para dar cumprimento às disposições da mesma, cuja aplicação se tornará efectiva o mais tardar seis meses após esse prazo.

3.   Observações na generalidade

3.1

Como foi o caso da vigésima sexta alteração da Directiva 76/769/CEE do Conselho (limitação da colocação no mercado e da utilização de certas substâncias e preparações perigosas [nonilfenol, etoxilado de nonilfenol e cimento]) (6), sobre a qual o CESE emitiu parecer em Março de 2003 (7), a proposta em apreço refere-se a substâncias não relacionadas, as quais serão aqui tratadas separadamente para maior clareza. (A vigésima sétima alteração, respeitante aos hidrocarbonetos aromáticos policíclicos em óleos de diluição e pneumáticos, foi já publicada mas está ainda em exame.)

4.   Tolueno

4.1

O tolueno é um líquido incolor de odor característico. Também conhecido como metilbenzeno, possui a segunda estrutura aromática mais simples (depois do benzeno) – um anel de seis átomos de carbono ligado a uma cadeia de carbono de um átomo (alquilo). Ocorre naturalmente no petróleo bruto, em algumas plantas e árvores e nas emissões dos vulcões e dos fogos florestais, e pode ser produzido em grandes quantidades a partir do carvão ou do petróleo não refinado.

4.2

De acordo com fontes industriais, a capacidade mundial e os níveis de produção do tolueno manufacturado foram, em 2002, de 20 e de 14 milhões de toneladas, respectivamente. 75 % desta capacidade concentra-se nos EUA, na Ásia e no Japão. O parecer do CCTEA estima em 2,6 milhões de toneladas a produção da UE em 1995. Quantidades muito superiores resultam da produção normal de gasolina e contribuem para os níveis globais de exposição; essas quantidades não estão incluídas nos totais referidos (8).

4.3

O tolueno é utilizado principalmente como matéria-prima em sistemas fechados para a produção deliberada de benzeno, de produtos à base de uretano e de outros produtos químicos; é ainda empregue, em muito menores quantidades, como solvente em tintas, adesivos, produtos farmacêuticos e cosméticos. Os seus efeitos na saúde humana e no ambiente têm sido abundantemente estudados e são geralmente aceites por todos os implicados. É obviamente necessário reduzir ao mínimo qualquer exposição desnecessária não controlada, real ou eventual, sobretudo em presença de produtos alternativos com igual poder solvente.

4.4

As duas utilizações finais concretamente referidas na proposta em apreço cabem nesta última categoria. O uso de tolueno como solvente em produtos adesivos ou tintas para pulverização destinados à venda ao público em geral não é nem necessário nem defendido pelos seus produtores europeus. Pensa-se que a venda do produto nestas duas utilizações finais é muito reduzida ou inexistente. Trata-se, pois, de uma medida essencialmente preventiva, com impacto mínimo nos custos para os produtores e na liberdade escolha ou na saúde dos consumidores.

4.5

O CESE reconhece que a principal prioridade é garantir que o tolueno possa ser manuseado sem risco em grandes quantidades em sistemas fechados no local de trabalho. A proposta em apreço assegura a protecção adequada, actualmente e no futuro, do público em geral fora de um ambiente de trabalho controlado. O CESE apoia, por isso, esta parte da proposta.

5.   Triclorobenzeno

5.1

No que respeita ao triclorobenzeno, a situação é muito diferente da acima descrita e é necessário fazer algumas alterações e clarificações à proposta.

5.2

O triclorobenzeno é uma substância química produzida artificialmente que não ocorre na natureza a não ser pela degradação de outros compostos aromáticos clorados. Há três isómeros diferentes, dependendo da localização dos átomos de cloro em relação ao anel de seis átomos de carbono. Cada um apresenta propriedades físicas e interacções bioquímicas (marginalmente) distintas, patentes, por exemplo, nos seus valores de LD50. Cada um tem um número CAS e EINECS diferente. Além disso, há um registo para o triclorobenzeno em geral quer no CAS quer no EINECS. Todos os isómeros podem ser adquiridos comercialmente nos EUA e noutras partes do mundo. Pensa-se que o 1,3,5-triclorobenzeno já não é produzido na Europa. As propriedades correspondentes são as seguintes (9):

Número EINECS

201-757-1

204-428-0

203-686-6

234-413-4

Número CAS

87-61-6

120-82-1

108-70-3

12002-48-1

Isómero

1,2,3-

1,2,4-

1,3,5-

-

Forma

Flocos brancos

Líquido claro

Flocos brancos

Líquido claro

Ponto de fusão °C

52-55

17

63-65

-

LD50 mg/kg

1830

756

800

-

Número NU

2811

2321

2811

-

5.3

O RAR e o parecer do CCTEA ocupam-se especificamente do 1,2,4-triclorobenzeno, com os números EINECS e CAS acima referidos. A proposta em apreço confirma este número CAS único (sendo, portanto, o único isómero estudado) no Anexo, mas não no título ou no texto.

5.4

Os diferentes isómeros são produzidos em elevados graus de pureza como intermediários em sistemas fechados para a síntese de determinados herbicidas, pesticidas, corantes e outros produtos químicos especializados. Quando a estrutura isomérica específica é menos relevante, pode ser usada uma mistura de isómeros em sistemas fechados como solventes para corantes, como reguladores do processo, como meios de transferência de calor, como inibidor de corrosão em pulverizadores e em fluidos para trabalho de metais.

5.5

Na UE e noutros países, o isómero mais utilizado é o 1,2,4-triclorobenzeno (1,2,4-TCB), a diferentes graus de pureza. A produção parece ter diminuído de forma constante desde os anos 80. Os dados apresentados à Comissão para a Protecção do Ambiente Marinho da Convenção OSPAR estimavam a produção de 1,2,4-TCB em 1994 entre sete e dez mil toneladas; de 1,2,3-TCB em menos de duas mil toneladas; e de 1,3,5-TCB em menos de 200 toneladas (10). Em Junho de 2000, a OSPAR acrescentou os três isómeros individualmente à sua lista de substâncias perigosas de acção prioritária. O parecer do CCTEA de Julho de 2001 aponta igualmente para sete mil toneladas de produção para a Europa em 1994/95. Os níveis de produção têm continuado a diminuir e parecem corresponder actualmente a metade desses valores, sendo a maior destinada à exportação (11).

5.6

Actualmente, pensa-se que só há um produtor na região da UE/OSPAR. As vendas parecem limitar-se aos isómeros 1,2,4-TCB e 1,2,3-TCB a utilizar apenas como intermediários, o que é garantido por declarações escritas de cada consumidor apresentadas antes da aquisição.

5.7

A Comissão e o CCTEA reconhecem um número limitado de outras utilizações em sistema fechado, por exemplo, como solventes de processo sem emissões para o exterior. Visto que a proposta em apreço visa permitir a produção no essencial mas restringir severamente as emissões devidas à utilização em sistema aberto, parece justificada a sua adição às utilizações permitidas pelo Anexo I da proposta.

5.8

O CESE entende, à luz das observações anteriores, que a proposta deveria garantir uma maior protecção no local de trabalho e eliminar quaisquer riscos de exposição fora dele. Os produtores e os utilizadores de triclorobenzeno e dos produtos concorrentes parecem ter antecipado em grande medida as disposições contidas na proposta. Assim, os custos para os produtores e para os utilizadores não serão grandemente afectados. O CESE dá, pois, o seu apoio a esta parte da proposta.

6.   Observações na especialidade

6.1

O CESE reitera que a proposta em apreço tem de basear-se no RAR e no parecer do CCTEA relevantes e se aplica, por conseguinte, exclusivamente ao 1,2,4-TCB. O título e o texto da proposta devem deixar isso bem claro. Felizmente, o efeito das restrições na utilização não sofrerá alteração na prática, dado que este isómero é o principal constituinte dos TCB de isómeros mistos anteriormente comercializado para uso em solventes e pulverizadores.

6.2

A proposta deveria permitir outras utilizações em sistema fechado, acrescentando «... ou noutros sistemas fechados em que não seja possível qualquer emissão para o exterior» ao final da restrição respectiva.

6.3

O CESE deplora o tratamento de substâncias não relacionadas num texto único, como sucedeu já com outras alterações da Directiva 76/769/CEE do Conselho, dado que cada substância pode necessitar de alterações específicas para reflectir as condições externas. A combinação de várias substâncias num mesmo texto não condiz com uma governação adequada e eficaz. Se se deve à escassez de recursos durante esta fase final e crítica da definição de medidas específicas de redução de recursos, essa escassez deve ser corrigida o mais rapidamente possível.

6.4

O CESE recorda que a última lista de substâncias prioritárias foi publicada em Outubro de 2002 e lastima que esta prática pareça ter sido abandonada muito antes do início da aplicação de outros processos, como o REACH. Uma tal quebra de ritmo é contraproducente.

6.5

O CESE chama a atenção para o papel essencial desempenhado pelo CCTEA no passado e espera que tenham sido tomadas as providências necessárias para a continuação do mesmo no futuro, apesar das mudanças recentemente anunciadas na estrutura e nas competências dos comités científicos.

6.6

O CESE partilha das apreensões expressas pela generalidade dos implicados quanto ao tempo necessário para a avaliação das substâncias no actual sistema. Para as duas substâncias em apreço, terão decorrido onze anos antes da entrada em vigor da legislação. Cinco desses anos transcorreram depois que o CCTEA declarou satisfatórias as conclusões do RAR. Quando a legislação entrar efectivamente em vigor, não haverá praticamente quaisquer custos (ou benefícios visíveis para a saúde ou para o ambiente) para nenhuma das partes implicados. Na ausência de mais informação, resulta impossível concluir se isso é positivo (ou seja, se o mercado se adaptou sob a pressão das constantes avaliações dos riscos) ou negativo (isto é, se o processo teve um impacto quase nulo, apesar dos custos consideráveis) ou proceder aos melhoramentos necessários.

6.7

O CESE considera, por conseguinte, que em complemento de outras iniciativas, como o REACH, e para assegurar que as mesmas permitirão efectivamente melhorar os processos actuais em vez de os abandonarem, as razões desta lenta evolução deverão ser analisadas o quanto antes. Essa análise deverá decorrer em paralelo com os estudos actualmente em curso para avaliar o impacto, os custos e os benefícios para todos os interessados destes processos, concebidos para proteger a saúde e o ambiente no quadro de uma economia europeia bem-sucedida e competitiva baseada no conhecimento.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 146A, de 15 de Junho de 1990.

(2)  JO L 84, de 5 de Abril de 1993.

(3)  JO L 273, de 26 de Outubro de 2000.

(4)  JO L 262, de 27 de Setembro de 1976.

(5)  JO L 231, de 28 de Setembro de 1995.

(6)  JO L 178, de 17 de Julho de 2003.

(7)  JO C 133, de 6 de Junho de 2003.

(8)  Dados da APA (Associação de Produtores de Aromáticos), membro do CEFIC (Conselho Europeu da Indústria Química).

(9)  Sítio do European Chemicals Bureau (Gabinete Europeu de Produtos Químicos) na Internet (http://ecb.jrc.it).

(10)  Dados da Eurochlor, membro do CEFIC.

(11)  Os pareceres do CCTEA podem ser consultados no sítio da DG Saúde dos Consumidores na Internet.


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/10


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A capacidade de adaptação das PME e das empresas da economia social às mutações impostas pelo dinamismo económico»

(2005/C 120/03)

Em 27 de Abril de 2004, Loyola de PALACIO, vice-presidente da Comissão Europeia, solicitou, em nome da Comissão, um parecer exploratório do Comité Económico e Social Europeu sobre «A capacidade de adaptação das PME e das empresas da economia social às mutações impostas pelo dinamismo económico».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 6 de Outubro de 2004 (relatora: L. FUSCO).

Na sua 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 169 votos a favor, 2 votos contra e 5 abstenções, o presente parecer.

Observação preliminar

No espírito do pedido manifestado pela Comissão Europeia, o presente parecer tem como finalidade examinar o tema proposto na perspectiva da interacção existente e potencial entre as PME, por um lado, incluindo as microempresas, e as empresas da economia social (EES) por outro, e examinar diferentes tipos de instrumentos e de modelos provenientes das EES que tenham ou possam ter um impacto fundamental sobre esta capacidade de adaptação, tanto para as PME como para as EES.

1.   Objectivos e quadro regulamentar

1.1

A Comissão Europeia solicitou ao CESE o presente parecer exploratório considerando que o papel das PME e das EES é de particular importância na Estratégia de Lisboa, e sugerindo que fossem desenvolvidos elementos que permitam definir o quadro regulamentar e de apoio necessário para estes operadores.

1.2

Este pedido surgiu na esteira da publicação de um parecer de iniciativa do CESE sobre o papel das PME e das EES na diversificação económica dos países aderentes, que foi adoptado por unanimidade em 1 de Abril de 2004. Este parecer já abordava em conjunto estes dois tipos de operadores, definido-os e referindo a sua importância em todos os países da UE em termos de contributo para a economia, para o emprego e para a coesão social, bem como as suas profundas interacções e sinergias. O documento também esclarecia que a noção de transformação económica era bem mais ampla e dinâmica do que a de reestruturação. O parecer mencionava o Relatório Gyllenhammer do Grupo de Alto Nível instituído pela Comissão Europeia Gerir a Mudança, que coloca a tónica na criação de emprego, reconhecendo a validade de uma estratégia que visa a «aferição de desempenhos» (benchmarking), a inovação e a coesão social. O parecer propunha um programa integrado em 10 pontos a favor da promoção das PME e das EES na diversificação económica dos países aderentes, programa este que se inspira, em grande parte, em vários tipos de boas práticas das EES na UE.

1.3

Com efeito, as boas práticas das EES na UE poderiam constituir a base de interacções e de sinergias entre as EES e as PME, abrindo pistas inovadoras mercê do espírito de cooperação e inovação, e do dinamismo das EES e das suas consideráveis possibilidades de utilização pelas PME, garantindo a estas últimas um verdadeiro valor acrescentado na sua expansão e gerando, através da sua estrutura própria, a cooperação, a representatividade e a confiança necessárias entre estas últimas.

1.4

A Estratégia de Lisboa proposta pelo Conselho Europeu de Março de 2000, fixou o objectivo de fazer da Europa a economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, sublinhando, ao mesmo tempo, a necessidade de criar um ambiente favorável ao lançamento e ao desenvolvimento de empresas inovadoras, especialmente de PME, e acrescentando que a competitividade e o dinamismo das empresas dependem directamente de um ambiente regulamentar conducente ao investimento, à inovação e ao espírito empresarial  (1). Nesta base, o Conselho Europeu de Santa Maria da Feira, de 19 e 20 de Junho de 2000, aprovou a Carta Europeia das Pequenas Empresas que afirma que estas últimas são a espinha dorsal da economia europeia, constituindo uma fonte insubstituível de emprego e um terreno fértil para o surgimento de ideias empreendedoras  (2). Além disso, a Estratégia de Lisboa defende que o crescimento económico é um factor crucial para garantir a coesão social na Europa. A Comissão fez notar, em seguida, que os desafios para adoptar a Agenda de Lisboa são as necessidades de aumentar a oferta de emprego e a taxa de emprego, de melhorar os conhecimentos técnicos e de garantir uma transição harmoniosa do sector agrícola e industrial para o sector dos serviços, sem agravar as disparidades regionais dentro de cada país. (3)

1.5

As PME, termo que inclui igualmente as microempresas com as suas particularidades próprias, são empresas que obedecem a critérios numéricos específicos, que a Comissão Europeia teve ocasião de definir do seguinte modo (4):

Categoria de empresa

Número de trabalhadores

Volume de negócios

ou

Balanço total

Média

< 250

≤ € 50 milhões

 

≤ € 43 milhões

Pequena

< 50

≤ € 10 milhões

≤ € 10 milhões

Micro

< 10

≤ € 2 milhões

≤ € 2 milhões

1.6

As EES pertencem a um conjunto de quatro famílias: as cooperativas, as mútuas, as associações e as fundações. Estas empresas caracterizam-se pelo primado do seu objecto social sobre a maximização do lucro, o que frequentemente cria um vínculo com o território e o desenvolvimento local. Os seus valores essenciais são a solidariedade, a coesão social, a responsabilidade social, a gestão democrática, a participação e a autonomia (5).

1.7

A maior parte das EES estão incluídas na definição-padrão de PME (6) adoptada pela UE. As que não estão incluídas nessa definição por força das suas dimensões, têm geralmente características comuns com as PME como, por exemplo, uma reduzida taxa de investimento externo, a não cotação na bolsa, a proximidade dos proprietários/accionistas e um vínculo estreito com o tecido local.

1.8

As instituições europeias estabeleceram um quadro regulamentar para as políticas das PME. Até 2005, existe uma medida vinculativa principal para as PME propriamente ditas: a Decisão 2000/819/CE do Conselho sobre o programa plurianual 2001-2005 para as empresas e o empresariado, e em particular para as PME. Este programa, que também é utilizado para progredir na realização dos objectivos estabelecidos pela Carta Europeia das Pequenas Empresas, persegue os seguintes objectivos:

Reforçar o crescimento e a competitividade das empresas

Promover o espírito empresarial

Simplificar o ambiente administrativo e regulamentar das empresas

Melhorar o ambiente financeiro das empresas

Facilitar o acesso das empresas aos serviços de apoio, aos programas e às redes comunitários.

1.9

Em 21 de Janeiro de 2003, a Comunicação da Comissão COM(2003) 26 final apresentou cinco relatórios sobre as políticas da UE para as PME: dois relatórios sobre a aplicação da Carta Europeia das Pequenas Empresas na UE e nos países aderentes; um relatório sobre as actividades da UE a favor das PME; um relatório do representante das PME; e o Livro Verde sobre o Espírito Empresarial na Europa. De entre os vários desafios mencionados, o relatório sobre as actividades da UE revela o empenho da UE através, nomeadamente, dos Fundos Estruturais, do programa plurianual já referido e do FP6. Por fim, com base no Livro Verde, foi elaborado um plano de acção comunitário sobre o espírito empresarial e a competitividade das empresas (2006-2010).

1.10

A Comissão Europeia também apresentou um quadro regulamentar para as empresas da economia social. As mais importantes, as cooperativas, foram tema da «Comunicação sobre as sociedades cooperativas na Europa», de 23 de Fevereiro de 2004. Esta comunicação propõe que se melhore a visibilidade e a compreensão das cooperativas e que se favoreça a convergência do respectivo quadro jurídico nos países da UE; também refere as normas de base para este tipo de empresas, tal como são definidas na Recomendação da OIT sobre a Promoção das Cooperativas, aprovada em Junho de 2002 ao nível mundial e, nomeadamente, através dos representantes dos governos dos 25 Estados-Membros da UE e da maior parte das organizações nacionais de empregadores e trabalhadores; esta recomendação faz igualmente referência às principais normas internacionais do trabalho, indicando que estas se aplicam na íntegra aos trabalhadores das cooperativas. (7) Por outro lado, foi recentemente publicado pela Comissão Europeia um documento de trabalho sobre as sociedades mútuas («As mútuas numa Europa alargada», de 3 de Outubro de 2003), que indica as normas de base deste tipo de EES (8).

2.   Quadro socioeconómico

2.1

A Comissão reconheceu que as PME são o alicerce da economia europeia, pois representam 66 % do emprego total e 60 % do valor acrescentado total da UE, não incluindo o sector agrícola. As regiões com elevada concentração de PME, como a Emilia Romagna, Bade-Wurtenberg e Jutland, são as que beneficiam igualmente do PIB por habitante e da taxa de emprego mais elevados (9).

2.2

No seu parecer intitulado «Economia social e Mercado Único» (10), o CESE sublinhou a importância socioeconómica das EES, afirmando que elas são fundamentais para o pluralismo empresarial e a diversificação da economia (11). Este reconhecimento vem da própria Comissão, nomeadamente através da «Comunicação sobre as Sociedades Cooperativas na Europa» e do documento de consulta «As mútuas numa Europa alargada», mencionados mais acima no ponto 1.10. É crescente a importância social e económica das empresas e das organizações da economia social na UE: com cerca de 9 milhões de trabalhadores directos ETI (equivalente em tempo inteiro), estas empresas representam 7,9 % do emprego assalariado civil (12). Além disso, associam uma parte significativa da sociedade civil: segundo a Comissão Europeia, as cooperativas têm 140 milhões de membros e as sociedades mútuas 120 milhões. Assim, calcula-se que mais de 25 % dos cidadãos da UE são membros de EES, desempenhando nelas um papel socioeconómico bem definido: produtores, consumidores, aforradores, inquilinos, segurados, estudantes, trabalhadores voluntários, etc.. As EES desenvolvem-se em todos os sectores, designadamente nos serviços de utilidade pública e de interesse geral (13) como, por exemplo, a saúde, o ambiente, os serviços sociais e a educação (14). Estas empresas desempenham portanto um papel essencial na criação de capital social, na capacidade de empregar pessoas desfavorecidas, no bem-estar social, na revitalização das economias locais e na modernização dos modelos de gestão local. Algumas delas criaram sistemas de balanço societário para avaliar o seu impacto social e ambiental.

2.3

As PME e as EES são um factor importante de emprego e de reintegração profissional no contexto das grandes mutações industriais em curso, tanto nos sectores em declínio e naqueles que reduzem os postos de trabalho como nos sectores tradicionais (artesanato, artes e ofícios) e noutros em expansão, como os serviços às empresas, as novas tecnologias da informação e da comunicação (NTIC), os sectores de alta tecnologia, a construção e as obras públicas, os serviços de proximidade (incluindo a saúde) e o turismo.

2.4

Todavia, as PME e as EES enfrentam desafios particulares. A Carta Europeia das Pequenas Empresas reconhece que estas últimas são as mais sensíveis às mutações do meio empresarial. O Livro Verde da Comissão Europeia sobre o Espírito Empresarial na Europa afirma que as EES, pelo facto de terem de aplicar «princípios empresariais e de desempenho para atingir os seus objectivos sociais e societários ..., enfrentam desafios específicos no que se refere ao acesso ao financiamento, à formação para a gestão e ao aconselhamento» (15).

2.5

As PME e as EES podem desempenhar um papel importante nas mutações socioeconómicas de diferentes maneiras. Há vários exemplos de boas práticas: mediante a contratação de novos trabalhadores para o mercado do trabalho, o apoio à capacidade inovadora das micro e das pequenas empresas, a reintegração profissional de desempregados no âmbito da redução de efectivos ou do encerramento de indústrias, a criação de caixas de previdência social, a criação de novas empresas nos sectores em desenvolvimento, o desenvolvimento dos serviços e das sub-empreitadas, a transferência de empresas em crise para os seus trabalhadores, o apoio à criação de microempresas e de empregos independentes, e a transformação qualitativa dentro do mesmo sector. Além disso, as EES podem dar contributos específicos para estas mutações quer através da sua capacidade de formação do espírito empresarial já demonstrada, quer através dos valores que promovem: o empresariado socialmente responsável, a democracia e a participação cidadã, a participação, inclusivamente financeira, dos trabalhadores na empresa, a integração social, e o interesse pelo desenvolvimento local e o desenvolvimento sustentável.

2.6

Existe na UE uma forte interacção entre as PME convencionais e as EES, com possibilidades de desenvolvimento ainda muito maiores. Esta interacção realiza-se pelo menos segundo as três modalidades seguintes:

a)

As PME utilizam em grande medida os serviços das EES que lhes são externos. Assim, os bancos cooperativos promovem frequentemente projectos de arranque (start-up) e de desenvolvimento de PME convencionais.

b)

As PME utilizam entre si estruturas próprias das EES: para criarem sistemas de empresas (redes, grupos, estruturas comuns de apoio) ou para realizarem economias de escala (cooperativas de PME de compras e de «marketing»), bem como para estabelecerem mecanismos de garantia mútua de empréstimos bancários, etc. Estas estruturas permitem que as empresas aumentem sensivelmente a sua competitividade.

c)

Os modelos de EES (fundos mútuos, prestação de serviços de interesse geral, redes de comércio justo, etc.) podem inspirar o desenvolvimento de PME.

3.   Tipos de boas práticas úteis para inspirar políticas públicas, e sobre os quais seria necessário um estudo mais aprofundado

3.1   Observações na generalidade

3.1.1

A Comissão Europeia publicou casos de boas práticas em vários documentos relativos às acções BEST no quadro do programa plurianual, «ou seja, práticas que parecem efectivamente ilustrar a abordagem de um desenvolvimento em curso (actual) no apoio às empresas que merece a atenção e o interesse dos operadores» (16). Não se trata necessariamente das melhores práticas («best practice»), mas o seu objectivo é inspirar mudanças e práticas melhores («better practice») que permitam chegar a conclusões e definir orientações para as políticas da UE.

3.1.2

O CESE está consciente de que, nos últimos anos, já foi realizado um considerável trabalho de codificação de boas práticas no domínio das PME (ver as acções BEST mencionadas mais acima). Os tipos de boas práticas indicados mais adiante dizem exclusivamente respeito à interacção existente ou potencial entre PME e EES. Estes tipos são ilustrados na documentação anexa através de exemplos concretos que revelam igualmente a capacidade de adaptação destes modelos e o seu carácter evolutivo face ao dinamismo económico, no quadro do mercado único e da globalização.

3.1.3

A extrapolação por tipo é útil para induzir propostas de políticas públicas capazes de reforçar o dinamismo das PME e das EES na perspectiva da Estratégia de Lisboa. Trata-se de casos de boas práticas entre as EES que poderiam ser utilizadas pelas PME, ou de interacções entre PME e EES, em que determinadas EES são utilizadas directamente pelas PME e poderiam ser mais utilizadas.

3.1.4

A hipótese de trabalho, que em certos casos já foi parcialmente demonstrada, é que cada uma destas modalidades representa um elevado custo de oportunidade («opportunity cost») (17), ou mesmo ganhos líquidos para o orçamento público a médio prazo.

3.2   Tipos de boas práticas

3.2.1.

Criação e manutenção de postos de trabalho através do arranque e da reestruturação de empresas. Algumas experiências levadas a cabo pelas EES em vários países da UE tendem a revelar que os sistemas de financiamentos destinados aos trabalhadores que perderam o emprego para ajudá-los a reabilitar as suas empresas em crise ou a criar novas empresas, combinados com um acompanhamento suficiente, são de natureza a possibilitar não só a criação de empregos ou a salvaguarda dos empregos e a criação ou manutenção das actividades económicas, mas também permitem que o Estado e/ou os outros organismos de financiamento recuperem, dentro de um prazo relativamente curto, a totalidade do financiamento concedido ou mais (18).

3.2.2

Sistemas e agrupamentos («clusters») de empresas para o desenvolvimento, a inovação e a competitividade. Algumas EES formaram «clusters» regionais que se integraram posteriormente em sistemas ou grupos horizontais ou mistos, nomeadamente no Norte de Itália e no País Basco espanhol, transformando estas empresas (na maior parte dos casos pequenas e médias empresas) num dos principais operadores económicos das respectivas regiões, e criando centros de inovação tecnológica e empresarial de ponta.

3.2.3

Gestão em comum de recursos para realizar economias de escala. Em vários países europeus, uma parte substancial das PME convencionais de certos sectores, incluindo microempresas e trabalhadores independentes, (como os retalhistas em Itália, os cabeleireiros e os talhantes em França e os padeiros na Alemanha) organizam-se em agrupamentos, geralmente sob a forma de cooperativas, com uma gestão comum das vendas, do «marketing» ou dos serviços. Cada PME permanece completamente autónoma, ao mesmo tempo que pode aumentar a sua competitividade, conservar e alargar os seus mercados, evitar as sub-empreitadas e os intermediários e realizar economias de escala. Para a colectividade, este sistema é garante da manutenção do emprego e do desenvolvimento local (19).

3.2.4

Acesso ao financiamento e diminuição dos riscos. A garantia mútua permite o acesso ao crédito às PME, incluindo microempresas e trabalhadores independentes, que não dispõem de garantias suficientes. A sociedade de garantia mútua (que frequentemente se apresenta sob a forma de uma sociedade mútua) está vocacionada para ser garante em proveito exclusivo do prestamista. No caso de não reembolso, a sociedade assume a responsabilidade final recorrendo ao fundo de garantia alimentado pelas PME associadas. Foram utilizados fundos comuns das EES em projectos de criação, reconversão e desenvolvimento de empresas como estímulo ao crédito bancário ao introduzir um elemento de confiança junto dos bancos (20).

3.2.5

Serviços prestados à colectividade. As EES mostraram que são um operador importante nos serviços sociais, de saúde, educativos e culturais, nomeadamente no quadro das privatizações, aliando o espírito empresarial à salvaguarda do interesse geral que está na base destes serviços. Deste modo, foi demonstrado que estas empresas fornecem muitas vezes prestações de melhor qualidade por um preço inferior ao que era fornecido pelo Estado. Em certos casos, estes serviços são objecto de parcerias locais entre o sector público e o privado, entre as EES e os governos locais das parcerias para prestar serviços de utilidade pública, como os centros de emprego, os centros de cuidados de saúde, os serviços ao domicílio, etc..

3.2.6

Cadeias de produção e de comercialização com qualidade e ética. Determinadas EES especializaram-se na venda de produtos cuja qualidade podem garantir numa base permanente, e segundo um processo de produção cujo carácter ético também tem as mesmas garantias (ausência de exploração, respeito das normas do trabalho, remuneração justa, etc.).

4.   Recomendações que incidem num programa de investigação-acção com vista a definir políticas a longo prazo para a promoção das PME e das EES através da sua interacção mútua

4.1   Observações na generalidade

4.1.1

A importância fundamental combinada das PME e das EES na economia europeia e na aplicação da Estratégia de Lisboa, e as possibilidades de interacção positiva existentes entre os dois tipos de operadores através da utilização dos modelos e das estruturas das EES, reclamam um novo esforço combinado ao nível da UE com vista à sua promoção e apoio.

4.1.2

O CESE teve em conta os actuais programas de apoio às PME em particular, mas nota igualmente que são insatisfatórias as estruturas existentes de apoio às EES, bem como para a promoção de iniciativas que favoreçam a interacção entre PME e EES.

4.1.3

O CESE assinala igualmente a falta de estudos concludentes, exaustivos, transeuropeus e pluridisciplinares que demonstrem e calculem o custo de oportunidade das boas práticas que favorecem o reforço das PME e das EES através da sua interacção mútua.

4.1.4

Esta carência limita seriamente a elaboração de políticas públicas de promoção das PME e das EES através da sua interacção mútua. Com efeito, para que estas políticas sejam definidas, é essencial um acompanhamento permanente e análises sobre a respectiva relação custos-benefícios.

4.2   Recomendações na especialidade

4.2.1   Estabelecimento de um Observatório Intereuropeu das Empresas da Economia Social e realização de uma investigação plurianal sobre a interacção EES-EES e PME-EES

4.2.1.1

O CESE propõe o estabelecimento de um Observatório Europeu das Empresas da Economia Social com funções de investigação, não só sobre as próprias EES e sobre a interacção existente e potencial entre PME e EES, mas também sobre o modo como tal interacção poderá ser fundamental para o desenvolvimento económico das PME e das EES e para a promoção da responsabilidade social das empresas e da luta contra a exclusão.

4.2.1.2

Este observatório seria apoiado pela Comissão Europeia e pelos governos dos 25 Estados-Membros da UE e implicaria as organizações de EES, bem como centros de investigação sobre as EES de nível universitário. Este observatório funcionaria em colaboração com o Observatório das PME.

4.2.1.3

O CESE propõe igualmente a realização, através deste observatório, de um estudo pluridisciplinar e intereuropeu ao longo de três anos, com vista a proceder a uma recolha das boas práticas que comportam sistemas de EES que desenvolvem directamente as PME, ou cujo modelo oferece um potencial de desenvolvimento das PME, nomeadamente nos domínios referidos no ponto 3.

4.2.1.4

Este estudo tem em vista demonstrar os custos de oportunidade, concentrando-se nomeadamente no cálculo:

dos custos-benefícios microeconómicos directos;

dos custos-benefícios a montante e a jusante da cadeia económica;

do valor dos bens imateriais;

dos custos-benefícios sociais, através da auditoria social;

dos efeitos multiplicadores;

do diferencial de custos na hipótese de não existir o modelo em questão; por exemplo, o «custo do não-cooperativo» é o custo suplementar para o Estado e a colectividade no caso de desaparecimento súbito das cooperativas.

4.2.1.5

As conclusões das investigações do Observatório Europeu das EES deverão ser divulgadas, através de um importante esforço de comunicação, junto das instituições europeias, dos governos dos Estados-Membros e da população em geral.

4.2.1.6

O CESE velará pelo correcto desenvolvimento da investigação através do Observatório das Empresas da Economia Social e procederá a uma avaliação das suas conclusões findo o período de três anos, estudando o impacto possível destas conclusões nas políticas da Comissão Europeia para as PME e as EES.

4.2.2   Participação total das PME e EES nos programas europeus de apoio às empresas

4.2.2.1

O CESE solicita à Comissão que dê a possibilidade às EES de participarem de modo equitativo no novo programa plurianual de estímulo ao espírito empresarial 2006-2010, e de promoverem as iniciativas com vista a estabelecer uma interacção entre as PME e as EES, nomeadamente a utilização das EES na cooperação entre PME.

4.2.2.2

O CESE solicita igualmente que o nível de participação das PME e das EES nos programas da UE sobre o acesso à investigação, à inovação e aos mercados mundiais faça parte das principais prioridades políticas europeias.

4.2.2.3

O CESE considera que deverá ser mantida a importância dos projectos a favor das PME no quadro dos Fundos Estruturais, e que deveria ser dada mais importância aos projectos a favor das EES e da interacção entre EES e PME, sobretudo quando estes projectos favorecem a criação de novos empregos e o desenvolvimento das regiões rurais. O acesso aos Fundos Estruturais não deve ser limitado em função do domínio de actividade da empresa.

4.2.3   Integração das conclusões da Conferência Interministerial da OCDE, realizada em Istambul, sobre as PME e o seu alargamento às EES

4.2.3.1

O CESE propõe igualmente à Comissão Europeia que tenha em conta as conclusões políticas da Conferência Interministerial da OCDE de Istambul sobre as PME, e que as alargue às EES. Solicita pois uma abordagem mais adaptada às necessidades e às características das PME e das EES, em particular:

Uma melhoria do acesso ao financiamento das PME e das EES, numa altura em que os critérios de Basileia para os empréstimos bancários estão a ficar mais severos para as empresas de risco ou subcapitalizadas;

A promoção das parcerias, das redes e dos «clusters» entre PME e EES;

Uma actualização e uma integração constante dos dados empíricos sobre a situação das PME e das EES;

A redução dos obstáculos aos mercados globais para as PME e as EES, nomeadamente através de uma redução dos encargos administrativos e jurídicos que lhes são impostos;

A prevenção e a resolução das crises das empresas e das falências;

A promoção da educação e do desenvolvimento dos recursos humanos;

A promoção das tecnologias da informação e da comunicação (21).

4.2.4   Melhoria do diálogo social ao nível regional, nacional e comunitário

4.2.4.1

Em vários países da UE, nomeadamente em alguns dos novos países, as PME não estão suficientemente representadas nas instâncias nacionais de diálogo social. O CESE considera que estas deveriam estar mais representadas, quanto mais não seja por uma questão de eficácia das políticas públicas de promoção e de regulação destas empresas e para que as grandes empresas e as PME possam exprimir os seus pontos de vista em pé de igualdade.

4.2.4.2

Na maioria dos países da UE, bem como ao nível comunitário, as EES não estão de modo algum representadas no diálogo social. O CESE sugere que as organizações representativas das EES, quer ao nível comunitário quer nos vários Estados da UE, se estruturem e se reforcem ainda mais, e que sejam incluídas no diálogo social tanto ao nível comunitário como ao nível dos Estados-Membros. O ponto de vista destas organizações deveria merecer mais consideração no âmbito da elaboração das normas relativas às empresas (22).

4.2.5   Estudo sobre as modalidades de promoção da participação dos trabalhadores nas decisões e no capital da empresa.

4.2.5.1

As EES desenvolveram um saber-fazer especial no domínio da participação dos trabalhadores no sistema de tomada de decisões e no capital das suas próprias empresas. Em particular, uma parte das cooperativas desenvolveu o «trabalho associado cooperativo» (23), através do qual a totalidade ou a maioria dos associados da cooperativa são trabalhadores e vice-versa, e cada um tem uma palavra a dizer na tomada de decisões, independentemente do montante da respectiva participação financeira na empresa. Aliás, estas participações são nominais e não transferíveis. Esta forma de associação é um dos principais factores que explicam o êxito de vários exemplos de boas práticas. Este sistema apela para a responsabilidade directa dos trabalhadores no futuro da respectiva empresa e permite que estes participem plenamente na sua estratégia de desenvolvimento. Numa altura em que se reconhece cada vez mais, no quadro da «economia do conhecimento» preconizada pelos objectivos de Lisboa, que o recurso fundamental da empresa é o seu «capital humano», esta forma de associação revela progressivamente o seu carácter moderno e inovador.

4.2.5.2

O CESE propõe à Comissão que, no Observatório mencionado mais acima e nos seminários temáticos que costuma organizar, esta forma específica de associação seja examinada sob as seguintes perspectivas:

Custo de oportunidade, para definir em que medida e com que adaptações possíveis poderá ser útil e aplicável às PME convencionais;

Quadro jurídico e regulamentar.

5.   Conclusões

5.1

As PME são o alicerce da economia e do emprego na Europa, sendo a este título o principal operador envolvido na realização dos objectivos de Lisboa. As EES desempenham um papel cada vez maior na coesão social e no desenvolvimento local. A capacidade de interacção entre PME e EES, nomeadamente através de uma maior utilização das EES pelas PME, no interesse destes dois tipos de empresas, tem sido insuficientemente explorada.

5.2

Por conseguinte, o CESE propõe à Comissão Europeia que examine de novo a interacção existente e potencial entre PME e EES, e que contribua para demonstrar que esta interacção é benéfica para o desenvolvimento destes dois tipos de empresas no quadro das profundas mutações impostas pelo dinamismo económico, designadamente nas políticas de desenvolvimento regional, de coesão social e de inovação.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Conclusões da Presidência — Lisboa, 23 e 24 de Março de 2000, ponto 14.

(2)  Carta Europeia das Pequenas Empresas. Luxemburgo: Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias, 2002. A Comissão afirma que a Carta foi assinada em Maribor, em 23 de Abril de 2002 (ver http://europa.eu.int/comm/entreprise/entrprise_policy/sme-package/index.htm). O Comité, tal como o Parlamento, continuam a recomendar veementemente que seja conferido à Carta valor jurídico, e que a mesma seja vertida para a Convenção Europeia, para o capítulo respeitante à indústria.

(3)  «Uma estratégia de pleno emprego e melhores postos de trabalho para todos» — COM(2003) 6 final.

(4)  Recomendação 2003/361/CE que substitui a Recomendação 96/280/CE (JO L 124 de 20 de Maio de 2003, p. 36), que entrará em vigor a partir de 1 de Janeiro de 2005. As definições constantes tanto da recomendação em vigor como da nova recomendação são idênticas, diferindo apenas os dados relativos ao volume de negócios e ao balanço total.

(5)  B. ROELANTS (coordenador): Dossier preparatório da Primeira Conferência da Economia Social nos Países da Europa Central e Oriental, 2002, p. 34. Denominadores comuns estabelecidos com base nas definições apresentadas pela Comissão Europeia, o Comité das Regiões, a CEP-CMAF (Conferência Europeia Permanente das Cooperativas, Mútuas, Associações e Fundações) e a FONDA (ligada a organizações que estão na origem do conceito de economia social).

(6)  McIntyre et al: «Small and medium enterprises in transitional economies», Houndmills: MacMillian, p. 10.

(7)  Nomeadamente no quadro da aplicação do Regulamento sobre a Sociedade Cooperativa Europeia. Ver o Regulamento CE n.o 1435/2003 do Conselho, de 22/7/2003, relativo ao Estatuto da Sociedade Cooperativa Europeia (SCE).

(8)  Comissão Europeia: Documento de trabalho — As mútuas numa Europa alargada, 3 de Outubro de 2003, p. 5.

(9)  Comissão Europeia (2004): Uma nova parceria para a Coesão — Convergência, Competitividade, Cooperação — Terceiro Relatório sobre a Coesão Económica e Social, p. 5 e 8.

(10)  Parecer CES 242/2000, JO C 117 de 26/04/2000.

(11)  Num estudo recente, a OCDE esclarece que a «economia social» é um conceito mais amplo do que o sector não lucrativo porque não está tão intimamente ligada a condicionalismos de não-distribuição, segundo os quais as organizações não podem legalmente distribuir dividendos pelos seus titulares (OECD 2003, «The non-profit sector in a changing economy», Paris, p. 299).

(12)  Estes empregos não incluem os empregos indirectos, como os trabalhadores agrícolas independentes ou as PME que são sócias de cooperativas. CIRIEC 2000: «The enterprises and organisations of the third system: Strategic challenge for employment», Universidade de Liège.

(13)  Tang et al, 2002, p. 44.

(14)  Ver Carta da CEP-CMAF (Conferência Europeia Permanente das Cooperativas, Mútuas, Associações e Fundações).

(15)  Comissão Europeia: Livro Verde — Espírito empresarial na Europa, COM(2003) 27 final, ponto C, ii).

(16)  DG Empresas (2002): «Helping business grow – A “good practice guide” for business support organisations», p. 11.

(17)  O custo de oportunidade (opportunity cost) é o rendimento ou o benefício antecipado que resulta da aplicação de uma determinada decisão, quando os recursos são limitados ou quando estão envolvidos projectos que se excluem mutuamente. Por exemplo, o custo de oportunidade da construção de uma fábrica num terreno é o rendimento antecipado resultante da não construção de um edifício de escritórios nesse terreno. De igual modo, o rendimento antecipado resultante da não construção de uma fábrica no caso de se optar pela construção de um edifício de escritórios, representa o custo de oportunidade de um edifício de escritórios. O custo de oportunidade é um factor importante na tomada de decisões, embora represente custos que não estão registados nas contas da respectiva organização (Oxford Dictionary of Finance and Banking: Oxford, Oxford University Press, 1997, p. 252).

(18)  Ver igualmente o sistema do «pagamento único» (pago único) em Espanha. Esta medida consiste na possibilidade de obter, através de um pagamento único, dois anos de subsídios de desemprego para os trabalhadores que decidem criar uma cooperativa ou uma sociedade de trabalhadores (sociedad laboral) ou que decidem incorporar-se nestas empresas como sócios/trabalhadores, na condição de terem trabalhado na empresa durante pelo menos 12 meses.

(19)  Ver nomeadamente o sítio Internet da Fédération Française des Coopératives et Groupements d'Artisans: http://www.ffcga.coop, e o sítio Internet da Associazione Nazionale Cooperative fra Dettaglianti: http://www.ancd.it/.

(20)  Nomeadamente o Fundo SOCODEN de entre as cooperativas de produção francesas, ver: http://www.scop-entreprises.com/outils.htm.

(21)  Ver: Cordis Focus n.o 247, de 14 de Junho de 2004, p. 14.

(22)  Normas jurídicas, de contabilidade, etc.

(23)  «Cooperative worker ownership» em inglês. As principais normas deste sistema particular de trabalho foram estabelecidas na World Declaration of Cooperative Worker Ownership (Fevereiro de 2004) da Organização Internacional das Cooperativas de Produção Industrial, Artesanal e de Serviços da Aliança Cooperativa Internacional (CICOPA), o que foi fruto de um ano e meio de consultas entre os seus membros no mundo inteiro. Estas normas específicas das cooperativas de trabalho associado (worker cooperatives em inglês) são complementares das normas cooperativas gerais referidas na «Déclaration sur l'Identité Coopérative» (Statement on the Cooperative Identity) da Aliança Cooperativa Internacional, bem como na Recomendação 193/2002 da Organização Internacional do Trabalho (Recommandation sur la Promotion des Coopératives).


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/17


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Os corredores paneuropeus de transporte».

(2005/C 120/04)

Em 23 de Janeiro de 2003, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer de iniciativa sobre «Os corredores paneuropeus de transporte».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 5 de Outubro de 2004, sendo relatora K. ALLEWELDT.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité adoptou, por 164 votos a favor, 2 votos contra e 9 abstenções, o presente parecer.

1.   Introdução

1.1

Com o alargamento do seu âmbito de trabalho (1) a todas as questões relacionadas com o desenvolvimento dos corredores pan-europeus de transportes, o grupo de estudo permanente retomou a sua actividade em Janeiro de 2003. Em Dezembro de 2002, a assembleia plenária tomara conhecimento das actividades do anterior período de mandato, que aprovara. A par do prosseguimento e desenvolvimento dos trabalhos relativos aos corredores, a Comissão Europeia tomou igualmente, em 2003-2004, novas e importantes decisões de orientação em matéria de desenvolvimento das redes transeuropeias de transportes (RTE-T), incluindo o desenvolvimento dos 10 corredores prioritários definidos em Helsínquia. Por outro lado, o alargamento da União Europeia em Maio de 2004 e as perspectivas de adesão nos países da Europa de Sueste irão também modificar as condições da política comum de infra-estruturas e da cooperação nos corredores.

1.2

O presente parecer de iniciativa tem por objectivo não só recapitular as actividades e as tomadas de posição do Comité Económico e Social Europeu sobre os corredores pan-europeus de transporte durante os dois últimos anos, mas também fornecer recomendações para a actuação futura dos implicados em cada um dos domínios tratados, bem como sobre a forma como o Comité pode contribuir para esse processo.

2.   Novas condições da política paneuropeia das infra-estruturas de transportes

2.1

Com o relatório do grupo de peritos dirigido por Karel van MIERT, a Comissão iniciou em meados de 2003 a revisão das RTE-T. Nas conclusões, previa-se o alargamento da lista de projectos prioritários definida em 1996 e propunha-se novas modalidades de financiamento comunitário e novas formas de melhorar a coordenação (2). Previa-se a inserção dos corredores de transportes na política de infra-estruturas da UE. Em vez de uma política comunitária geral de redes de infra-estruturas, haverá que se concentrar no futuro em determinados eixos de transporte prioritários. Esta perspectiva do Grupo Miert não recebeu qualquer apoio.

2.2

O CESE discutiu o «Futuro das RTE-T» em detalhe no âmbito da reunião externa do seu grupo de estudo realizada em Roma, em Setembro de 2003, em conjunto com a V Comissão «Grandes Obras e Redes Infra-estruturais» do Conselho Nacional da Economia e do Trabalho (CNEL) de Itália, de que resultou uma resolução comum sobre o tema (3). Este documento recomenda um reforço do empenhamento na criação de uma rede de transportes global que integre os novos Estados-Membros e se projecte para além deles. A intermodalidade e a sustentabilidade devem ser princípios centrais e haverá que reforçar o financiamento e apoiá-lo, em certas circunstâncias, através de um fundo comunitário especificamente consagrado à realização das redes transeuropeias de transporte.

2.3

Um pedido endereçado ao CESE pela presidência italiana conduziu à elaboração de um parecer que visava aprofundar o debate iniciado em Roma. Sob o título «As infra-estruturas de transportes do futuro: planificação e países limítrofes, mobilidade sustentável, financiamento» (4), o Comité sintetizava as suas posições fundamentais sobre a política europeia das infra-estruturas de transportes. Apontando para o futuro, o CESE propõe que se experimente novas formas e meios de financiamento, se atribua maior prioridade à protecção do ambiente e à sustentabilidade social e ecológica, se preserve os resultados do trabalho desenvolvido nos corredores definidos em Helsínquia ao planear e concretizar uma rede de transportes paneuropeia e se reaja aos novos desafios com novos métodos.

2.4

A União Europeia considerou de elevada prioridade a reconstrução pacífica da Europa de Sueste e decidiu, por consequência, impulsionar com firmeza o estabelecimento de uma infra-estrutura de transportes funcional. Em complemento dos corredores já existentes e relevantes para a região (X, V, VII, IV e VIII) e com base na Declaração de Helsínquia de 1997 e na experiência do processo TINA (5), foi elaborado um plano de transportes para o Sueste da Europa. Este plano engloba uma rede de infra-estruturas intermodal, designada por South East Europe Core Regional Transport Network, a realizar em conjunto e de forma coordenada. Os Estados envolvidos (6) elaboraram um Memorando de Acordo (MA), que prevê, nomeadamente, a cooperação com as associações representativas dos interesses sociais e económicos da região e com o grupo de estudo permanente do CESE.

2.5

A coordenação do trabalho dos comités directores dos 10 corredores de Helsínquia (7) e das 4 zonas de transporte (PETRAS) (8) adquiriu uma nova feição. A Comissão passa a convidar uma vez por ano os presidentes e directores dos secretariados dos corredores, bem como um conjunto de outros representantes de instituições europeias ou da UE para se debruçarem sobre a situação e as perspectivas futuras do trabalho. O anterior Grupo de Trabalho de Transportes G-24 deverá ser substituído por uma estrutura mais pequena e eficaz. Por outro lado, é agora evidente para os responsáveis da Comissão que só esta instituição poderá assegurar determinados aspectos da coordenação e do apoio técnico-organizativo. Os últimos encontros realizaram-se em Junho de 2003 e em 15 de Março de 2004. As principais conclusões são referidas nas considerações dos capítulos 3 e 4.

2.6

O alargamento e a nova política de vizinhança da UE irão influenciar também o planeamento futuro da política de transportes. Em Junho realizou-se uma reunião de estratégia entre a Comissão e o Parlamento Europeu, para a qual foram convidados representantes do sector europeu de transportes, bem como dos países vizinhos da UE. Decidiu-se criar um grupo de alto nível que seria responsável por acordos de alargamento dos eixos de transporte transeuropeus, em especial na direcção dos países vizinhos de Leste, Federação Russa, região do mar Negro e Balcãs. No tocante ao Mediterrâneo, foi lançado um projecto para a criação de uma rede de transportes euromediterrânica. Em relação à Turquia, está em curso uma investigação sobre as respectivas necessidades de infra-estruturas de transporte.

3.   Organização do trabalho do grupo de estudo permanente

3.1   Novas evoluções e antigas questões sobre informação e transparência

3.1.1

Cerca de sete anos de implantação da Declaração de Helsínquia, de consolidação da cooperação através de comités directores e de envolvimento geral da Comissão Europeia pouco contribuíram para o reforço da transparência e para uma melhor articulação dos diversos processos de planeamento. As novas directrizes para as RTE-T, os corredores e zonas de transporte, a «SEE Core Regional Transport Network», o trabalho da ECMT (Conferência Europeia dos Ministros dos Transportes) e da UN-ECE (ONU – Comissão Económica para a Europa), bem como várias iniciativas regionais de cooperação reforçada, estão confinadas a um pequeno grupo de peritos.

3.1.2

A falta de transparência é um fenómeno que se tem vindo a acentuar ao nível da sociedade civil. Um dos papéis importantes do grupo de estudo permanente tem sido - e continua a ser — transmitir informação a órgãos oficiais e às organizações da sociedade civil. A Comissão está a trabalhar para desenvolver um novo sistema de informação que deverá, genericamente, servir o planeamento e a avaliação de impacto (GIS). Este sistema de informação só era até agora utilizável a nível interno, mas, em determinadas condições, pode alargar-se a dados de carácter social e económico, sendo assim, também, de maior utilidade para o CESE. Esta possibilidade devia ser debatida com a Comissão.

3.2   Utilização do processo de consulta: as vias de transporte «europeias» exigem um «consenso europeu»

3.2.1

Os resultados do trabalho do Grupo de Miert salientaram as dificuldades em eliminar a discrepância existente entre os planos ambiciosos a nível europeu e a sua execução. Foi correctamente apontado que, para se obterem melhores resultados no futuro, são necessários processos de planeamento transfronteiriços e maior participação dos grupos de interesse da sociedade civil, parecer reflectido nas novas orientações comunitárias para o desenvolvimento da rede transeuropeia de transportes.

3.2.2

A participação das organizações da sociedade civil é condição essencial para um desenvolvimento equilibrado que tenha em conta os interesses locais e regionais e revitalize o funcionamento e a utilização das vias de transporte. Os projectos de infra-estruturas de interesse europeu só cumprem a sua função se corresponderem aos interesses de sustentabilidade e os tiverem em conta ao nível europeu. Para tal, é necessária a participação de associações empresariais, empresas de transportes, sindicatos e associações ambientais e representativas dos consumidores, que deverão agir num plano transfronteiriço. A realização das vias de transporte «europeias» só pode assentar num entendimento e num consenso europeus socialmente sustentados.

3.2.3

O CESE tem-se repetidamente disponibilizado para participar na construção desse consenso. Para tal, haverá que recorrer sistematicamente ao instrumento das audições ao nível europeu. O CESE desaconselha, no entanto, o lançamento desta iniciativa por razões meramente formais, sem que sejam assegurados a avaliação e o aproveitamento das suas conclusões. A audição levada a cabo pelo CESE em cooperação com a Comissão sobre o processo TINA de 1998, apesar de ter despertado bastante interesse e conduzido a conclusões claras, não foi tida em consideração no relatório final.

3.3   Da consulta à cooperação conceptual e prática

3.3.1

O trabalho prolongado do CESE sobre a política paneuropeia de transportes orientou-se sempre pela necessidade básica de consulta e participação. Presentemente, esta preocupação foi em grande medida tida em conta pelos actores europeus, e o CESE estabeleceu bons contactos de trabalho. Assim, o passo seguinte deverá ser a colaboração conceptual e prática nos trabalhos dos comités directores e outros organismos.

3.3.2

A base para a cooperação conceptual poderá ser, em especial, o recente parecer de iniciativa «As infra-estruturas de transportes do futuro», que definia explicitamente os princípios básicos da política europeia de transportes da perspectiva do Comité. Os três pontos principais versavam sobre o objectivo de sustentabilidade, considerações sobre melhor financiamento e a organização das infra-estruturas paneuropeias de transportes. No tocante ao alargamento dos corredores de transportes foram definidas as prioridades para o desenvolvimento. O trabalho do grupo de estudo permanente esteve orientado para essas prioridades que podem aqui ser resumidas (9):

Constituir uma ligação tão eficaz quanto possível entre espaços económicos.

Reforçar a intermodalidade com base em critérios de qualidade compreensíveis.

Melhorar a ligação às vias de navegação interior.

Integrar na planificação o transporte marítimo de curta distância.

Promover a cooperação no transporte ferroviário, que já obteve algum sucesso.

Dedicar maior atenção à ligação entre as redes regionais e locais de transporte e os grandes eixos.

Integrar mais sistematicamente no trabalho sobre os corredores objectivos de desenvolvimento qualitativos de carácter funcional (segurança, defesa dos consumidores, condições sociais em especial para o transporte rodoviário, qualidade dos serviços, impacto ambiental).

Preservar e alargar em grande medida a abordagem aos corredores.

3.3.3

A Comissão teve parcialmente em consideração estes objectivos aquando da revisão das orientações comunitárias para o desenvolvimento da rede transeuropeia de transportes. O problema reside na sua aplicação prática e compreensível, a nível transfronteiriço. O CESE está bem posicionado para contribuir com acções específicas e pertinentes.

3.4   Criação de uma rede de corredores e cooperação regional

3.4.1

Entretanto, o trabalho dos comités directores decorre com análoga intensidade em todos os corredores. Verifica-se, por outro lado, a existência de articulações regionais, sendo assim mais adequado falar de uma rede de corredores do que de eixos de transporte isolados. Em conjunto com o trabalho nas zonas de transporte, há uma componente regional que se vem afirmando, por exemplo, nos corredores IV, V, VII e X na Europa de Sueste ou nos corredores I e IX na zona do mar Báltico. Opostamente, há poucas actividades nas zonas de transportes oficialmente designadas (PETRAS).

3.4.2

As duas abordagens, designadamente a criação de eixos de transporte prioritários e as articulações regionais amplas, complementam-se. De futuro, o trabalho do grupo de estudo permanente deve orientar-se mais para as possibilidades de desenvolvimento regional. A aproximação da política dos transportes, do desenvolvimento regional e dos domínios principais das relações externas do CESE (países orientais vizinhos, dimensão nórdica, Europa de Sueste) representa um contributo importante do CESE e das suas secções especializadas.

3.5   Objectivo futuro: estabelecer novas ligações

3.5.1

A reunião estratégica da Comissão e do Parlamento Europeu, em Junho de 2004, é muito positiva; o CESE tem salientado que o alargamento não devia enfraquecer a iniciativa da UE de realização de ligações europeias de transportes. Numa missiva enviada ao CESE, a Comissão descreve a reunião como um ponto de partida para um processo de coordenação mais aberto e mais amplo, para o qual todas as partes interessadas poderiam contribuir. Esta abertura é essencial para o êxito e a sustentabilidade do novo planeamento dos transportes a nível europeu.

3.5.2

As experiências anteriores, em especial o trabalho dos comités directores, constituem uma base importante e irrecusável para o novo planeamento. O contributo específico do CESE, descrito no presente parecer e resultante de muitos anos de experiência prática, podia ser utilizado numa fase precoce do planeamento das infra-estruturas. É importante utilizar este recurso.

4.   Actividades do grupo de estudo permanente nos corredores de transporte

4.1

No corredor II (10), foi constituído um grupo de trabalho sindical, que efectuou uma primeira reunião em Moscovo, em 10 e 11 de Abril de 2003. O CESE participou também na reunião oficial do comité director, que se realizou em Berlim, em 15 e 16 de Maio de 2003. As duas reuniões permitiram colher elementos valiosos para o nosso trabalho. Os problemas registados no corredor II têm a ver com as dificuldades de cooperação com a Bielorússia. Desenha-se entretanto uma tendência para contornar este país – e, portanto, um grande segmento do corredor – pelo norte. A razão para tal são as dificuldades experimentadas na fronteira. Regista-se actualmente um reforço da cooperação entre as companhias ferroviárias. Foi recentemente proposto um prolongamento do corredor até Ecaterinburgo. É especialmente importante encontrar melhores soluções para os problemas do transporte rodoviário e dos procedimentos práticos inerentes à travessia das fronteiras, domínio em que o CESE poderá ajudar.

4.2

Tem-se consolidado a participação nos trabalhos relativos ao corredor IV (11). Por ocasião da reunião do comité director realizada em Sopron (Hungria) em 20 e 21 de Maio de 2003, efectuou-se também um encontro entre representantes das empresas ferroviárias e dos sindicatos correspondentes do corredor IV, que permitiu um debate frutuoso sobre a promoção dos caminhos-de-ferro, o qual importaria prosseguir. Foi o que ocorreu na última reunião, efectuada em 10 e 11 de Novembro de 2003, em Dortmund. O debate centrou-se na identificação de obstáculos técnico-organizativos nas fronteiras e em propostas de solução para os mesmos. Para assegurar a continuidade, o comité director passará a integrar também, como observador, um representante sindical dos trabalhadores ferroviários. Haverá agora que abordar a situação económica e social e os aspectos técnico-organizativos do sector do transporte rodoviário de mercadorias no corredor IV.

4.3

O CESE valoriza em especial a promoção do desenvolvimento do corredor X (12). Neste sentido, foi intensificado o contacto com o respectivo comité director. A participação na reunião do comité director realizada em 18 e 19 de Julho de 2003, na Eslovénia, permitiu ao CESE definir possíveis actividades a desenvolver. Em 3 de Novembro de 2003, o Comité promoveu uma conferência-debate em Belgrado, que teve pleno êxito e se concluiu pela aprovação de uma resolução conjunta (13). Esta realização apontou, em particular, para novas iniciativas de intensificação do transporte ferroviário. Contactos de trabalho em Saraievo e a cooperação com o grupo director da SEE Core Network são outras actividades que influenciarão este trabalho. Da perspectiva de uma política equilibrada de portos marítimos e articulação com o transporte para o interior, o corredor V  (14) constitui, neste contexto, um eixo de ligação importante.

4.3.1

Está previsto para o início de Novembro de 2004 um evento conjunto com a associação das companhias de caminho-de-ferro, ARGE KorridorXLine, que pretende promover melhores serviços ferroviários e irá incluir um comboio de demonstração especial e acções em Villach (Áustria), Zagrebe (Croácia) e Saraievo (Bósnia-Herzegovina) (15).

4.4

No que se refere ao reforço da navegação interna e do corredor VII  (16), o Danúbio, o CESE elaborou uma série de propostas (17). Em Julho de 2004 realizou-se a última reunião do comité director. Neste momento, os debates prosseguem sob os auspícios do grupo de estudo permanente, concentrando-se nos obstáculos existentes ao crescimento dos transportes no corredor VII e nas disposições adequadas que permitam a redução desses obstáculos. Estão também a ser examinadas as possibilidades e a escolha dos inerentes investimentos para uma melhor integração num sistema de transportes intermodal (18).

4.4.1

No parecer sobre «As infra-estruturas de transportes do futuro», adoptado em 28 de Janeiro de 2004 (19), o CESE evocava a necessidade de «promoção especial do corredor (...) VII, Danúbio, a articulação com a ferrovia, bem como uma adequada regulamentação técnica e social em matéria de navegação interior transfronteiriça».

4.4.2

Também o Comité Consultivo Misto UE-Roménia propôs, numa reunião que se realizou em Bucareste, em 23 e 24 de Maio de 2002, tomar medidas e aumentar o apoio financeiro à navegabilidade do Danúbio e à sua ligação ao mar Negro, tendo em vista o seu máximo aproveitamento enquanto corredor paneuropeu de transporte.

4.5

Desde a conferência-debate de 2001 sobre os corredores III  (20) e VI  (21), em Catovice, o CESE não desenvolveu actividades próprias para estes corredores. Em Agosto de 2004, o secretariado do corredor III enviou uma carta instando a contributos para novos desenvolvimentos sob a forma de propostas para o programa de trabalho 2003/2004.

4.6

O CESE tem recebido um apoio especial, nos últimos um a dois anos, por parte da cooperação recentemente estabelecida entre os sindicatos dos trabalhadores do sector dos transportes nos corredores e num contexto paneuropeu, organizada pela European Transport Workers' Federation (ETF). O projecto EFT contribuiu imenso, em termos de ideias e de actividades práticas, para o êxito das acções do CESE em todos os sectores de transporte, e essa cooperação será reforçada.

4.7

Por último, cabe referir que para cada corredor foi elaborada uma ficha, com dados de base (22), pelo presidente do grupo de estudo permanente, com a colaboração do secretariado da Secção TEN e com o apoio dos serviços competentes da Comissão Europeia.

5.   Recomendações para a actuação futura

5.1

O grupo de estudo permanente teve em consideração os novos objectivos da política paneuropeia de transportes supramencionados e integrou-os nos planos regionais conceptuais e práticos. Cada vez mais a força do CESE reside na sua capacidade de integrar interesses e apresentar propostas práticas. As acções e a presença no terreno deverão ser dominantes.

5.2

O grupo de estudo permanente proporciona ao CESE uma espécie de ponto de intercâmbio de informações e ponto de contacto para os interessados dentro e fora do Comité. Informação, moderação, coordenação das actividades do CESE e participação responsável nas actividades de coordenação mais gerais a nível europeu são as tarefas principais do grupo de estudo permanente, que se baseia em treze anos de envolvimento activo do Comité na política pan-europeia de transportes.

5.3

Nos próximos dois anos, o CESE deverá centrar as suas actividades na colaboração prática e na participação das organizações da sociedade civil in loco. Pretende-se, deste modo, contribuir para a realização dos objectivos da política de transportes referidos no ponto 3.3.2, dando às organizações relevantes a possibilidade de articularem as suas estimativas, críticas e propostas de melhoramento no tocante a cada um dos corredores, regiões ou projectos de infra-estruturas.

5.4

A cooperação do CESE com os comités directores dos corredores e com a Comissão Europeia deve continuar a ser intensificada. Sobretudo o grupo de estudo permanente deverá levar a fundo o seu novo papel no âmbito da realização do South East Europe Core Regional Transport Network (cf. ponto 2.4).

5.5

O grupo de estudo permanente deveria reflectir sobre a melhor forma de a realização dos eixos pan-europeus de transporte ter em consideração os aspectos operacionais do transporte. Sobretudo os aspectos relacionados com a intermodalidade, a protecção ambiental, a segurança, as condições sociais e a eficácia devem ser conjugados com a política dos corredores.

5.6

Está em curso o planeamento de novos eixos de transporte no âmbito da política de vizinhança da UE. A Comissão Europeia deu sinais de abertura a este planeamento, para o qual o grupo de estudo permanente deverá contribuir.

5.7

Os trabalhos da Comissão Europeia e do comité director relacionados com os corredores e as zonas de transporte deveriam estar mais interligados. A Comissão Europeia desempenha aqui um papel decisivo enquanto coordenadora, embora o seu apoio devesse ter também uma vertente técnica e organizacional. O ideal seria criar um espaço mais aberto a uma orientação comum das diversas actividades ao nível paneuropeu, que integre todos os implicados, e obter uma maior participação do Parlamento Europeu.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Decisão da Mesa de 23 de Outubro de 2002.

(2)  Ver parecer do CESE JO C 10 de 14 de Janeiro de 2004, p. 70.

(3)  CESE 1043/2003 fin, que pode ser consultado no secretariado da Secção Especializada TEN.

(4)  JO C 108, de 30/4/2004, p. 35.

(5)  TINA: Transport Infrastructure Needs Assessment, planeamento das infra-estruturas em conjunto com os Estados da adesão na segunda metade dos anos 1990.

(6)  Albânia, Bósnia-Herzegovina, Croácia, Sérvia-Montenegro, Antiga República Jugoslava da Macedónia.

(7)  Essa informação pode ser solicitada ao secretariado da Secção Especializada TEN.

(8)  PETRAS: 4 zonas de transporte segundo a Declaração de Helsínquia de 1997: a região euro-árctica do mar de Barents, a Bacia do mar Negro, a Bacia do Mediterrâneo e a região do mar Adriático e do mar Jónico.

(9)  JO C 108, de 30/4/2004, p. 35, pontos 1.8.1 a 1.8.8.

(10)  Alemanha, Polónia, Bielorússia, Rússia.

(11)  Alemanha, República Checa, Áustria, Eslováquia, Hungria, Roménia, Bulgária, Grécia, Turquia.

(12)  Áustria, Croácia, Sérvia, Antiga República Jugoslava da Macedónia, Eslovénia, Hungria, Sérvia, Bulgária.

(13)  Ver Anexo I.

(14)  Itália, Eslovénia, Hungria, Ucrânia, Eslováquia, Croácia, Bósnia-Herzegovina.

(15)  Os pormenores das acções estão a ser definidos e, por isso, não são incluídos no presente parecer. Essa informação pode ser solicitada ao secretariado da Secção Especializada TEN.

(16)  «Rumo a um regime paneuropeu da navegação fluvial», JO C 10 de 14 de Janeiro de 2004, p. 49.

(17)  Alemanha, Áustria, Eslováquia, Hungria, Croácia, Sérvia, Bulgária, Moldávia, Ucrânia, Roménia.

(18)  Para mais informações, ver documento de trabalho de P. LEVAUX, que pode ser solicitado ao secretariado da Secção Especializada TEN.

(19)  Ver nota de rodapé 4.

(20)  Alemanha, Polónia, Ucrânia.

(21)  Polónia, Eslováquia, República Checa.

(22)  Ver anexo II: Informações provenientes de fontes não oficiais, sujeitas a eventuais alterações.


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/22


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Ligações de elevado débito na Europa: evolução recente no sector das comunicações electrónicas

[COM(2004) 61 final]

(2005/C 120/05)

Em 29 de Março de 2004, a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 5 de Outubro de 2004, sendo relator Thomas McDONOGH.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 163 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

O Comité acolhe favoravelmente a análise e as recomendações contidas na comunicação da Comissão intitulada «Ligações de elevado débito na Europa: evolução recente no sector das comunicações electrónicas» (COM(2004) 61 final). A comunicação surge na altura certa e combina um sentido de oportunidade estratégica e a necessária vontade executiva para orientar o sector europeu das comunicações electrónicas na sua próxima fase de crescimento.

1.2

Embora apoie incondicionalmente a análise e o teor da comunicação, o presente parecer dá igualmente destaque a domínios de interesse específico para o Comité.

2.   Antecedentes

2.1

Em 3 de Fevereiro de 2004, a Comissão adoptou uma comunicação sobre as «Ligações de elevado débito na Europa: evolução recente no sector das comunicações electrónicas». A comunicação veio responder à solicitação do Conselho Europeu da Primavera de 2003 quanto à elaboração de um relatório sobre a evolução deste sector antes do Conselho Europeu da Primavera de 2004. O documento faz uma apresentação resumida do sector das comunicações electrónicas na Europa do ponto de vista da estratégia de Lisboa, incluindo uma análise das principais questões susceptíveis de condicionar o crescimento no futuro. Apela igualmente ao apoio político às acções necessárias para fomentar o desenvolvimento do sector.

2.2

A estratégia de Lisboa reconhece que as tecnologias da informação e da comunicação (TIC) são factores essenciais do crescimento e promovem a produtividade e a competitividade. As TIC ajudam a melhorar o desempenho económico e a coesão social. A comunicação destaca a importância do sector das comunicações electrónicas (que inclui tanto uma componente de serviços como uma componente de equipamentos) para o bom funcionamento da economia europeia e para o aumento da produtividade. O sector desempenha esse papel devido à sua dimensão, dinamismo e impacto em quase todas as outras actividades económicas. Dados recentes revelam que este sector tem sido o que mais contribuiu para o crescimento da produtividade do trabalho na Europa.

2.3

Apesar de um crescimento marcado no início dos anos 90 e dos objectivos ambiciosos da estratégia de Lisboa, a Europa tem perdido terreno em relação aos Estados Unidos e a alguns países asiáticos no que respeita ao ritmo de produção e utilização das TIC, e esta quebra nos investimentos nas TIC tem comprometido a competitividade europeia (1). O progresso no sector das comunicações electrónicas nos próximos 18 meses é fulcral para o êxito do Plano de Acção eEurope 2005 e para os objectivos a longo prazo da estratégia de Lisboa. O sector cresceu rapidamente nos finais da década de 1990, mas conheceu uma quebra acentuada em 2000 e 2001, levando o Conselho e a Comissão a acompanhar de perto a situação e publicar um relatório na perspectiva do Conselho Europeu da Primavera de 2003.

2.4

Após dois anos de consolidação, as condições parecem agora adequadas para que o sector volte a apresentar taxas de crescimento mais elevadas. De acordo com a Comissão, estas condições incluem um melhor ambiente financeiro para os operadores e um crescimento contínuo das receitas dos serviços. No entanto, o crescimento sustentável do sector só pode ser conseguido através de uma retoma nas despesas de capital e de uma maior implantação de novos serviços inovadores.

2.5

Depois do colapso dos mercados da Internet, os operadores das telecomunicações têm vindo a reduzir as despesas de capital como parte dos seus programas de consolidação. O regresso a uma via de crescimento sustentável exige uma retoma nas despesas de capital. Por seu lado, a taxa de investimento será afectada pela acção pública: a aplicação do novo quadro regulamentar proporcionará uma maior segurança jurídica, a execução de estratégias nacionais de banda larga melhorará o acesso aos serviços, o encorajamento de novos serviços e de conteúdos inovadores estimulará a procura e a eliminação de entraves regulamentares e tecnológicos facilitará a implantação de redes 3G.

É por isso que são identificados quatro domínios prioritários na comunicação:

a)

Remover os entraves regulamentares. A transposição tardia ou incorrecta do novo quadro regulamentar das comunicações electrónicas por parte dos Estados-Membros está a retardar a concorrência e a fomentar a insegurança. Foram iniciados procedimentos de infracção contra Estados-Membros que não transpuseram as novas medidas. Garantir a aplicação efectiva destas regras por todos os Estados-Membros continuará a ser uma prioridade em 2004. Além disso, as novas regras devem ser aplicadas de maneira coerente pelas autoridades reguladoras nacionais. As orientações comuns a adoptar antes do final do ano sobre medidas correctivas que poderão ser impostas a empresas com poder de mercado significativo serão particularmente importantes: ajudarão as autoridades competentes a escolher os incentivos aos investimentos mais adequados e a garantir que os mercados emergentes não são sujeitos a obrigações desnecessárias.

b)

Maior cobertura de zonas insuficientemente servidas. De acordo com o Plano de Acção eEurope 2005, os Estados-Membros concordaram em publicar as suas estratégias nacionais de banda larga, o que já foi feito por todos os 15 antigos Estados-Membros e por alguns dos novos. Deve dar-se especial destaque à detecção das zonas que correm o risco de ser deixadas para trás na sociedade da informação devido a uma procura insuficiente, face aos critérios de rentabilidade dos operadores, para justificar a implantação de redes de banda larga. Poder-se-á contemplar a concessão de fundos comunitários, ao lado dos subsídios nacionais, regionais ou locais. Há directrizes para a utilização dos fundos estruturais nestes casos. O intercâmbio das melhores práticas e de soluções inovadoras será favorecido pela criação de um Fórum sobre Clivagem Digital ainda este ano. No Verão, a Comissão publicará um relatório sobre estas estratégias nacionais.

c)

Estimular a procura. Embora a maioria dos lares da UE tenha acesso à banda larga, muito poucos optam por esse serviço. A procura, mais do que a implantação, está a tornar-se a preocupação dominante para o mercado de banda larga. A experiência dos países com os níveis mais elevados de utilização da banda larga demonstra a importância de uma verdadeira concorrência entre redes para diminuir os preços e promover serviços inovadores em linha. Além disso, os Estados-Membros podem igualmente estimular a procura, nomeadamente promovendo o uso das TIC em cada vez mais serviços essenciais – governação nacional e local, saúde e educação – e transferindo-os para a internet. Estes estímulos têm de ser acompanhados por medidas de melhoria da segurança, da gestão dos direitos digitais e da interoperabilidade dos vários serviços. A revisão intercalar do plano de acção eEurope 2005, que deverá estar concluída no Verão, será uma oportunidade para definir novas medidas de apoio.

d)

Comunicações móveis de terceira geração (3G). O relatório da Plataforma para as Comunicações e Tecnologias Móveis (composta pelos principais intervenientes do sector) esboçou uma visão estratégica dos principais intervenientes do sector para o futuro dos serviços móveis, salientando uma série de entraves comerciais e regulamentares. Um mundo em que as comunicações serão mais fáceis graças às tecnologias de terceira geração será igualmente mais complexo do que o actual mundo das comunicações por telefonia móvel, baseadas na voz. Se os desafios puderem ser superados, as novas tecnologias têm o potencial de criar novos serviços mais aliciantes e de darem um enorme impulso à produtividade na UE. A Comissão enunciou a sua estratégia para o sector das comunicações móveis na sua comunicação de 30 de Junho (2) e continuará a trabalhar com os interessados para definir as prioridades de investigação no sector das comunicações móveis.

2.6

Na reunião do Conselho das Telecomunicações, que se realizou em Bruxelas em 8 e 9 de Março de 2004, o Conselho reiterou o seu empenho político na consecução dos objectivos da estratégia de Lisboa de crescimento sustentável, promoção do emprego e da coesão social, subscrevendo as recomendações da comunicação (COM(2004) 61 final final) e da revisão intercalar do programa eEuropa (COM(2004) 108 final).

Observações

3.   Observações na generalidade

3.1

A comunicação abarca um vasto e complexo domínio de importância fundamental para os objectivos de Lisboa – a indústria das comunicações electrónicas. Ao longo dos anos, o CESE adoptou vários pareceres sobre aspectos relacionados com o sector (3), e acolhe positivamente esta oportunidade de se pronunciar sobre o desenvolvimento geral do sector das comunicações electrónicas, os serviços de banda larga, o desenvolvimento do sector das comunicações móveis e o novo quadro regulamentar da indústria.

3.2

A Comissão tem realizado um excelente trabalho de apoio à formulação e execução de políticas de promoção do crescimento do sector das comunicações electrónicas. Graças aos importantes interesses económicos e sociais envolvidos e ao forte apoio político do Conselho, dos governos nacionais e das autarquias regionais, este é um sector que tem evoluído muito rapidamente.

3.3

Dado o cariz complexo e dinâmico deste tema e a sua importância para o desenvolvimento económico e social da União, o Comité defende que todos os interessados devem ter a possibilidade de dar a conhecer regularmente a sua posição, permitindo a execução de uma política mais completa e integrada. O Comité apoia a intenção da Comissão de continuar a cooperar com os interessados na configuração das políticas em domínios como os direitos de propriedade intelectual, os sistemas de gestão dos direitos digitais (GDD), segurança e confiança dos consumidores, interoperabilidade e estandardização, gestão do espectro e cobertura das zonas rurais e remotas. O Comité continuará a acompanhar com interesse a evolução do sector e de todas estas questões.

3.4

O CESE louva a ênfase dada pela Comissão à necessidade de interoperabilidade e de abertura a vários níveis da tecnologia e dos serviços: dos aparelhos para a rede; de aparelho a aparelho; de rede para rede; e entre conteúdos e/ou aplicações. Sem a interoperabilidade e a abertura adequadas entre plataformas, o desenvolvimento de um mercado de massas para as novas tecnologias ver-se-á seriamente comprometido.

3.5

Conforme referido no ponto 1.1 supra, o Comité apoia a comunicação e felicita a Comissão pelo excelente trabalho realizado neste domínio. Apraz-lhe notar que foram realizados estudos e consultas aprofundados para compreender o funcionamento do sector e elaborar políticas que permitam um crescimento marcado e sustentável: o Comité dá o seu apoio ao Plano de Acção eEurope 2005 e às acções recomendadas na comunicação COM(2004) 61 final.

3.6

O Comité gostaria, no entanto, de frisar o seu interesse particular nos pontos seguintes:

3.6.1   Quadro regulamentar

3.6.1.1

O CESE apoia o novo quadro regulamentar das comunicações electrónicas, que proporciona maior previsibilidade e coerência e uma abordagem mais harmonizada do funcionamento dos mercados na União. O acréscimo de segurança e de transparência possibilitado pelo novo quadro encorajará os investimentos no sector das comunicações electrónicas e promoverá a competitividade e a introdução de novos serviços inovadores.

3.6.1.2

O CESE concorda com a Comissão em que a criação de um mercado competitivo e dinâmico requer da parte dos fornecedores das TIC uma estratégia coordenada, independente da tecnologia utilizada e de especificações abertas para o desenvolvimento da concorrência baseada nos recursos. Apraz ao Comité constatar que o novo quadro estimula a livre concorrência entre as diferentes tecnologias de acesso (banda larga, 3G, televisão digital, etc.). Isso reduzirá os custos de uso da rede e dos serviços e aumentará a mobilidade e a facilidade de utilização para os consumidores. Um tratamento aberto e equitativo de todas as tecnologias do sector estimulará a procura de serviços.

3.6.1.3

O CESE acolhe, por isso, a solução seguida pelo novo quadro regulamentar, que oferece as mesmas condições qualquer que seja a tecnologia utilizada e reflecte a convergência entre serviços fixos e móveis, conteúdos em linha ou radiodifundidos e um vasto leque de plataformas de fornecimento. A Comissão deveria garantir que as plataformas interoperáveis são utilizadas de acordo com a Directiva-Quadro 2002/21/CE.

3.6.1.4

Um mercado verdadeiramente competitivo dos serviços requer uma política de preços competitiva para a conexão ao domicílio ou às instalações dos consumidores (lacete local). Actualmente, na maior parte dos mercados, a introdução de novos serviços é dificultada pelo monopólio que os operadores mais importantes detêm sobre o lacete local. Importa rever continuamente a capacidade do quadro regulamentar de desagregar o lacete local do domínio dos operadores principais em todos os mercados.

3.6.1.5

O CESE lamenta que a Comissão tenha tido de mover processos judiciais contra certos Estados-Membros pela não aplicação do novo quadro regulamentar. O Comité insta a Comissão a continuar a velar pelo pleno cumprimento do quadro em todos os Estados-Membros, incluindo os mais recentes.

3.6.1.6

O CESE louva a posição comum recentemente acordada pelo Grupo dos Reguladores Europeus sobre as soluções a adoptar para resolver os problemas de concorrência nos novos mercados das comunicações electrónicas (4). Dado que o objectivo do novo quadro regulamentar é diminuir a regulamentação e fomentar a concorrência, a Comissão deve assegurar que o quadro é aplicado de forma a estimular os mercados e os serviços emergentes sem entravar o seu desenvolvimento. A Comissão deve analisar a adequação das sanções por infracção e a sua aplicação rigorosa em todos os Estados-Membros.

3.6.2   Implantação da banda larga

3.6.2.1

Uma infra-estrutura de banda larga segura e com uma boa cobertura territorial é essencial para o desenvolvimento e o fornecimento de serviços e aplicações como acesso aos cuidados de saúde, ao comércio, à governação ou à educação por via cibernética, tornando a banda larga vital para o crescimento europeu e para a qualidade de vida no futuro. O acesso à banda larga é um direito público que deve ser garantido a todos os cidadãos europeus. O CESE recomenda que a Comissão inclua a banda larga na sua lista de serviços de interesse geral.

3.6.2.2

O Plano de Acção eEurope 2005 preconiza a disponibilização da banda larga em todo o território e a sua utilização generalizada na UE até 2005, mas a concretização deste objectivo está consideravelmente atrasada. A não ser que a expansão da banda larga progrida a um ritmo mais rápido, em especial fora dos centros urbanos, a União Europeia não alcançará o objectivo de Barcelona (5).

3.6.2.3

O CESE congratula-se pela apresentação pelos 15 Estados-Membros mais antigos de estratégias nacionais de implantação da banda larga e observa que os novos Estados-Membros apresentarão as suas próprias estratégias antes do fim de 2004. O Comité toma nota que a Comissão fez uma primeira avaliação positiva destas estratégias (6) e aguarda com expectativa a publicação de um relatório mais detalhado sobre as mesmas em Junho.

3.6.2.4

Não obstante, o CESE discorda da definição excessivamente vaga do conceito de banda larga usada em vários estudos e relatórios (por exemplo, o relatório final COCOM04-20, referenciado mais adiante, define como de banda larga uma capacidade de acesso de apenas 144 kbs e inclui as conexões 3G no número total de linhas de acesso de banda larga no caso da Itália, mas não no que se refere aos outros Estados-Membros). Esta indefinição reduz grandemente a transparência e a produtividade do termo «banda larga» em todas as deliberações. A Comissão deve impor uma definição precisa e inequívoca do termo para utilização na União Europeia.

3.6.2.5

O Comité lastima igualmente que as estatísticas sobre banda larga não refiram a qualidade do acesso disponível e apela a que a Comissão inclua um padrão mínimo de qualidade da conexão na sua definição de banda larga. Só então as estatísticas relativas à banda larga serão úteis.

3.6.2.6

O CESE está consciente da necessidade de colmatar a clivagem digital que é cada vez mais larga na Europa, em detrimento dos mais desfavorecidos e da inclusão digital. Apesar de o Conselho ter já recomendado uma mudança de ênfase da conectabilidade para o desenvolvimento e uso efectivo de serviços inovadores, o Comité exprime algumas reservas quanto ao ritmo e à distribuição territorial da expansão da banda larga. Particularmente preocupante é a disparidade entre determinados países e regiões manifesta nas estatísticas mais recentes sobre a penetração da banda larga do Comité das Comunicações da Comissão Europeia (7). Nos 15 Estados-Membros mais antigos, 20 % da população está excluída do acesso à banda larga por cobertura insuficiente da rede. É de louvar que a comunicação da Comissão se concentre na necessidade de fazer chegar a banda larga às zonas não abrangidas. Na sua avaliação pormenorizada das estratégias nacionais de banda larga, a Comissão deve salientar a necessidade de estender as redes de banda larga a todo o território da União Europeia o mais rapidamente possível e de destacar as lacunas na rede em futuros relatórios.

3.6.2.7

O CESE louva os projectos de arranque rápido e a possibilidade de recorrer aos fundos estruturais para financiar o acesso nas zonas rurais e nas regiões menos atraentes da União, mas recomenda um controlo estrito da aplicação das estratégias nacionais de banda larga e uma maior atenção às questões da rapidez, da cobertura e da qualidade.

3.6.2.8

O Comité lamenta que a comunicação da Comissão se concentre apenas na clivagem digital geográfica (zonas mal servidas) e não na clivagem digital financeira (falta de recursos financeiros para pagar o acesso ao rede). O argumento da Comissão de que os serviços de elevado débito podem melhorar as condições de vida ao reduzirem as distâncias e facilitarem o acesso aos cuidados de saúde, à educação e aos serviços públicos aplica-se tanto aos cidadãos geograficamente isolados como aos menos favorecidos.

3.6.2.9

A opinião da Comissão de que a intervenção dos poderes públicos para combater a clivagem digital deve fazer-se no respeito dos princípios e do direito da concorrência é, no entender do CESE, contraditória: a clivagem digital existe porque o mercado se desinteressa da população visada. É, pois, indispensável um serviço público, a adjudicar por um contrato oficial que defina claramente a natureza das obrigações de serviço público.

3.6.3   Implantação e desenvolvimento das tecnologias de terceira geração (3G)

3.6.3.1

O CESE acolhe favoravelmente a criação pela Comissão, em Outubro passado, da Plataforma para as Comunicações e Tecnologias Móveis, que reúne representantes dos operadores das TIC móveis, dos produtores de equipamentos e componentes e dos criadores de conteúdos. Acolhe igualmente o primeiro relatório desta Plataforma (8), que avançou vinte recomendações sobre as medidas necessárias para apoiar e manter a expansão das redes de serviços e comunicações móveis em toda a Europa – incluindo acções nos domínios da investigação, das especificações, dos conteúdos, da segurança, do espectro, da cooperação internacional e da regulamentação.

3.6.3.2

O CESE constata para seu agrado que o relatório da Plataforma e os documentos da Comissão colocam a tónica, no que respeita às tecnologias de terceira geração, na criação de um ambiente seguro e orientado para os clientes, com vista a assegurar o acesso a qualquer hora e em qualquer lugar a ligações de alta velocidade e a serviços de entretenimento através de diferentes sistemas de banda larga.

3.6.3.3

O CESE subscreve inteiramente a opinião expressa por todas as partes de que o estabelecimento de redes abertas e interconectadas e a interoperabilidade das aplicações e dos serviços são objectivos prioritários e saúda o empenho da Plataforma na elaboração de uma agenda estratégica de inovação para um mundo ligado por tecnologias sem fio no futuro no âmbito do 7.o Programa-Quadro de IDT.

3.6.3.4

O CESE exorta a Comissão a envidar todos os esforços no sentido de facilitar a expansão das novas redes 3G e de reduzir o seu custo. Em particular, os Estados-Membros devem ajudar a solucionar rapidamente os problemas de ordem ambiental e de planeamento que estão a atrasar a expansão desta importante nova plataforma.

3.6.3.5

O Comité está receoso quanto aos elevados custos exigidos aos operadores de rede pelas licenças de 3G em alguns Estados-Membros e quanto ao impacto negativo que esta situação poderá ter nas futuras estratégias. Convida, pois, a Comissão a tornar públicas as suas posições detalhadas sobre a matéria e a propor medidas para obviar aos efeitos adversos na estratégia comunitária de expansão e utilização das TIC.

3.6.3.6

No interesse dos consumidores e do aproveitamento racional dos recursos na UE, há que contemplar a adopção de normas em matéria de partilha dos recursos entre operadores 3G sempre que possível, aumentando assim a rapidez do acesso, mitigando os problemas ambientais e diminuindo os custos do serviço fornecido. É certo, como afirma a Comissão, que alguns dos principais operadores se opõem à partilha de recursos por razões de concorrência, mas os interesses da União no seu todo devem prevalecer sobre os motivos meramente económicos de alguns operadores.

3.6.3.7

A Plataforma para as Comunicações e Tecnologias Móveis considera necessário um novo enquadramento político global para responder adequadamente aos problemas das tecnologias de terceira geração. A Plataforma reunir-se-á novamente em Junho, e o Comité aguarda com expectativa a comunicação anunciada pela Comissão em resposta às conclusões dessa reunião.

3.6.4   Novos serviços para encorajar a procura

3.6.4.1

A Comissão afirma que mesmo nas zonas em que a possibilidade de acesso à banda larga é de 90 %, a adesão é lenta (média de 12 %) e tende a diminuir. Isso deve-se aos elevados preços, à baixa qualidade e à falta de conteúdos relevantes, que tornam os serviços pouco interessantes para os consumidores.

3.6.4.2

O desenvolvimento dos conteúdos e dos serviços para estimular a adesão às conexões de banda larga é tido como imprescindível para a expansão das TIC e para o aumento da competitividade, da produtividade e do emprego na União Europeia. A este respeito, o Comité acolhe positivamente a recente proposta sobre um programa «eContentplus 2005-2008» (9), destinado a criar condições para um acesso mais alargado e para um uso mais generalizado dos conteúdos digitais.

3.6.4.3

O CESE reconhece que o encorajamento da procura das redes de banda larga e 3G, a necessidade de novos serviços inovadores, a concorrência e a expansão das redes são questões interconexas. O desenvolvimento de qualquer destes domínios ajudará os outros. Da mesma forma que para os problemas do fornecimento, o Comité acolhe todas as iniciativas da Comissão para incentivar o desenvolvimento de novos serviços inovadores capazes de estimular a procura e de aproveitar o potencial das novas redes e tecnologias.

3.6.4.4

O CESE tem para si que a interoperabilidade das redes, das plataformas e dos dispositivos constituirá um importante incentivo à adesão aos serviços e ao seu crescimento, e exorta a Comissão a promover a interoperabilidade através do quadro regulamentar e a manter o contacto com todos os interessados no sector das comunicações electrónicas.

3.6.4.5

O CESE apoia o apelo lançado pela Comissão aos Estados-Membros para não perderem o ímpeto na expansão dos serviços de governação cibernética (saúde, educação, etc.) e reconhecerem o sector público como um dos principais motores da procura na fase inicial do desenvolvimento destes novos serviços de informação.

3.6.4.6

Em particular, o CESE louva a vontade da Comissão de trabalhar com as empresas para resolver os problemas identificados que estorvam o desenvolvimento de novos serviços (sistemas de gestão dos direitos digitais [GDD], interoperabilidade, micro-pagamentos, etc.). A este respeito, o Comité elogia a comunicação (10) e o processo de consulta recentes sobre os direitos da propriedade intelectual e chama a atenção da Comissão para o seu parecer de 2003 sobre a propriedade intelectual.

3.6.4.7

O CESE destaca a importância da segurança para a adesão aos novos serviços pelos consumidores. A confiança destes nos novos serviços e tecnologias dependerá das garantias que lhes forem dadas quanto à protecção dos seus interesses.

3.6.4.8

O Comité apela a que a Comissão continue as suas sessões de trabalho com os operadores, os fornecedores de serviços Internet, os fornecedores de conteúdos, as empresas de radiodifusão e a indústria dos espectáculos sobre como adaptar as suas actividades através de novas formas de parceria para a criação de novos modelos e serviços empresariais para uma União Europeia móvel e convergente.

3.6.4.9

O CESE vê com bons olhos o apoio dado à investigação e ao desenvolvimento tecnológico (IDT) no âmbito do 6.o Programa-Quadro de IDT. No que respeita ao sector das tecnologias de comunicações electrónicas, como aos outros domínios de desenvolvimento tecnológico, o Comité chama a atenção para a necessidade de a Europa investir em IDT e na inovação, de harmonia com os objectivos da estratégia de Lisboa. Reconhecendo que este sector tem atravessado um período de consolidação e de reforço dos investimentos, o Comité faz agora apelo a todas as partes – a União Europeia, os Estados-Membros e o sector privado – para que demonstrem um empenho redobrado no futuro das comunicações electrónicas aumentando significativamente a escala e o número de actividades de IDT.

3.7   Observações finais

A concluir, o CESE acolhe positivamente a publicação da Avaliação intercalar do plano de acção eEurope 2005 (COM(2004) 108 final) e a confirmação de que as metas do eEurope 2005 continuam a ter validade após o alargamento da União a 25 membros. O Comité aguarda com expectativa a ocasião de se pronunciar sobre o Plano de Acção eEurope 2005 revisto e sobre as observações que sobre ele expenderá o Conselho Europeu de Junho.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  B. Van ARK, e O. MAHONY, (2003), EU Productivity and Competitiveness: An Industry Perspective, http://europa.eu.int/comm/enterprise/enterprise_policy/competitiveness/doc/eu_competitiveness_a_sectoral_perspective.pdf.

(2)  COM(2004) 447 final – Serviços móveis de banda larga.

(3)  Vd. JO C 169 de 16/6/1999, p. 30; JO C 368 de 20/12/1999, p. 51; JO C 14 de 16/1/2001, p. 35; JO C 123 de 25/4/2001, p. 61; JO C 123 de 25/4/2001, p. 36; JO C 139 de 11/5/2001, p. 15; JO C 311 de 7/2/2001, p. 19; JO C 48 de 21/2/2002, p. 33; JO C 48 de 21/2/2002, p. 27; JO C 221 de 17/9/2002, p. 22; JO C 241 de 7/10/2002, p. 119; JO C 61 de 14/3/2003, p. 32; JO C 61 de 14/3/2003, p. 184; JO C 220 de 16/9/2003, p. 33; JO C 220 de 16/9/2003, p. 36; JO C 80 de 30/3/2004, p. 66.

(4)  http://erg.eu.int/doc/whatsnew/erg_0330rev1_remedies_common_position.pdf.

(5)  COM(2002) 263 final — eEurope 2005: Uma sociedade da informação para todos.

(6)  IP/04/626 Connecting Europe at High Speed: Commission takes stock of national broadband strategies (Ligações de alto débito na Europa: A Comissão avalia as estratégias nacionais de banda larga).

(7)  COCOM04-20 final. Documento de trabalho do Comité das Comunicações da Comissão Europeia: Broadband Access in the EU: Situation at 1 January 2004 (Acesso à banda larga na UE: situação em 1 de Janeiro de 2004).

(8)  IP/04/23 3rd Wave Mobile for Europe (Redes e serviços móveis de terceira geração para a Europa).

(9)  COM(2004) 96 final: Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um programa comunitário plurianual destinado a tornar os conteúdos digitais na Europa mais acessíveis, utilizáveis e exploráveis. Parecer do CESE: JO C 117 de 30/4/2004, p. 49.

(10)  COM(2004) 261 final: Gestão do direito de autor e direitos conexos no mercado interno.


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/28


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta alterada de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao reforço da segurança nos portos»

[COM(2004) 393 final — 2004/0031 (COD)]

(2005/C 120/06)

Em 11 de Junho de 2004, o Conselho da União Europeia decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 80.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos trabalhos correspondentes, a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação emitiu parecer em 5 de Outubro de 2004, tendo sido relatora A. BREDIMA SAVOPOULOU.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 169 votos a favor e 6 abstenções, o presente parecer.

1.   Introdução

1.1

Os atentados terroristas de 11 de Setembro de 2001 e de 11 de Março de 2004 fizeram com que o mundo tomasse consciência de que a guerra contra o terrorismo vai ser muito longa. Assim, a comissária L. de PALACIO não tardou a solicitar ao CESE um parecer exploratório sobre a segurança dos transportes. O CESE propôs um conjunto de critérios (1) para as futuras acções da UE em matéria de segurança dos transportes e regista, com satisfação, que a Comissão os tem vindo a adoptar.

1.2

Na sequência de uma Comunicação da UE relativa ao reforço da protecção do transporte marítimo e de um regulamento relativo ao reforço da segurança dos navios e das instalações portuárias, o CESE emitiu um parecer (2) sobre a segurança dos terminais portuários.

1.3

Em 30 de Junho de 2004, o CESE adoptou um outro parecer (3) sobre a proposta de directiva relativa ao reforço da segurança nos portos. A proposta de directiva complementa as medidas de segurança introduzidas pelo regulamento relativo ao reforço da segurança dos navios e das instalações portuárias, na medida em que assegura que todo o recinto portuário fica abrangido por um sistema de segurança.

2.   Proposta da Comissão

2.1

À luz dos debates do Conselho sobre a proposta de directiva relativa ao reforço da segurança nos portos, a Comissão propõe (4) uma alteração ao artigo 7.o, segundo a qual o plano de segurança do porto deve prever a realização pelas autoridades nacionais competentes, com base numa avaliação do risco, de controlos de segurança adequados aos veículos de passageiros ou mercadorias que vão embarcar em navios que transportem também passageiros.

2.2

A proposta aplica-se a navios ro-ro em viagens domésticas e internacionais, devendo, neste último caso, os Estados-Membros em causa cooperar na avaliação de risco.

3.   Observações na generalidade

3.1

O CESE apoia decididamente uma abordagem equilibrada que garanta medidas de segurança, sem pôr em causa a fluidez dos fluxos comerciais. Compreende, por conseguinte, a preocupação da Comissão manifestada no novo oitavo considerando da proposta de directiva.

3.2

Na esteira dos seus anteriores pareceres, o CESE concorda plenamente com a alteração à proposta de directiva relativa ao reforço da segurança nos portos. Mesmo sabendo que é impossível obter segurança absoluta, o CESE reitera a necessidade de se aplicar medidas de segurança em toda a cadeia logística de transporte, e eliminar todos os «pontos fracos». A prioridade deve incidir no transporte de passageiros, em que as consequências de um acto ilícito intencional são mais graves devido ao número de vidas humanas em jogo.

3.2.1

Os navios ro-ro são particularmente vulneráveis a actos ilícitos intencionais, em especial se transportarem passageiros. Em termos de segurança, os veículos embarcados em navios ro-ro podem, efectivamente, tornar-se em «cavalos de Tróia» modernos.

3.2.2

Afigura-se, portanto, necessário tomar medidas adequadas para evitar que veículos de passageiros ou mercadorias embarcados em navios ro-ro constituam um risco. Tais medidas deverão ser executadas no interior do porto ou nas zonas portuárias adjacentes, antes de os veículos embarcarem no navio, e de forma a perturbar o menos possível o desenrolar das operações.

3.2.3

As inspecções de segurança aos veículos de passageiros ou mercadorias a embarcar em ferries ro-ro de passageiros apresentam certas dificuldades devido à natureza da carga transportada nos veículos. A experiência mostra que o controlo da carga destes veículos deve ser efectuado, antes do embarque, no recinto portuário, por forma a poder ser utilizado equipamento de segurança sofisticado operado por pessoal com formação adequada.

3.3

O CESE chama a atenção para a questão da responsabilidade ligada às inspecções. É óbvio que a responsabilidade pelos controlos de segurança de veículos de passageiros e mercadorias recai sobre as respectivas autoridades nacionais envolvidas e não sobre o navio em que embarcam os veículos.

3.4

No tocante à identificação dos marítimos e do pessoal dos portos envolvidos nos controlos de segurança, o cumprimento dos requisitos exigidos requer sentido prático para não perturbar demasiado as operações comerciais.

3.5

O CESE nota que, através da alteração proposta, a Comissão, em cooperação com as autoridades nacionais, dará início à realização de inspecções para verificar as modalidades de controlo da aplicação dos planos nacionais adoptados no quadro da directiva, seis meses após a data de aplicação da proposta de directiva. Salienta a necessidade de preparar o quanto antes os portos da UE e os portos de países terceiros para a aplicação das novas medidas de segurança (código ISPS) nos terminais portuários, em vigor internacionalmente desde 1 de Julho de 2004.

3.6

Por fim, o CESE insiste na urgência de analisar a dimensão económica da segurança portuária ao nível comunitário e de desenvolver uma abordagem harmonizada para evitar distorções de concorrência entre os diferentes modos de transporte, e em especial em detrimento do transporte ro-ro. O CESE convida a Comissão a elaborar um estudo do impacto geral, que analise as implicações financeiras das medidas de segurança portuárias, e a conceber um sistema comunitário destinado a financiar, se necessário, a aplicação destas medidas.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 61 de 14/3/2003, pág. 174.

(2)  COM(2003) 229 final — JO C 32 de 5/2/2004, pág. 4.

(3)  COM(2004) 76 final — JO C 241 de 28/9/2004.

(4)  COM(2004) 393 final.


20.5.2005   

PT

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C 120/30


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à limitação da colocação no mercado e da utilização de alguns hidrocarbonetos aromáticos policíclicos em óleos de diluição e pneumáticos (vigésima sétima alteração da Directiva 76/769/CEE do Conselho)»

COM(2004) 98 final – 2004/0036 (COD)

(2005/C 120/07)

Em 22 de Março de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

A Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 21 de Setembro de 2004, sendo relator D. SEARS.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 154 votos a favor, 3 votos contra e 7 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

Os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAP) são substâncias naturais que se formam sempre que haja combustão incontrolada a baixas temperaturas de compostos contendo carvão. Isto sucede nos incêndios de floresta e nos vulcões; em actividades humanas, como fumar; na produção de energia para aquecimento doméstico, e nos motores de veículos que utilizem combustíveis fósseis; ao cozinhar alimentos e ao queimar resíduos; bem como numa série de processos industriais. Os HAP estão presentes de forma natural no petróleo bruto e no carvão e, visto que se formam e estabilizam facilmente, acumulam-se durante as fases iniciais da fendilhação e da destilação.

1.2

Este processo de oxidação parcial resulta numa mistura de compostos com anéis de carbono de cinco ou seis átomos não saturados que podem repetir-se praticamente em qualquer direcção. Foram identificadas cerca de 600 estruturas: apenas algumas foram caracterizadas ou isoladas para utilização intermédia. Nenhuma foi intencionalmente produzida em quantidades significativas. Uma maior oxidação resulta na formação de fuligem (isto é, partículas de carvão impuro), com que frequentemente são associados os HAP.

1.3

Dado que se formam sempre em grupos indiferenciados, é difícil determinar as características específicas dos HAP (e, pelos mesmos motivos, são altamente irrelevantes). Contudo, ao ficar demonstrado que alguns podem ser carcinogénicos para os animais, é lógico classificar as misturas como substâncias que podem provocar cancro nos seres humanos. Os óleos e algumas outras preparações que se sabe conterem HAP impõem assim uma etiquetagem quanto a riscos e protecção, bem como quanto à adequada manipulação para garantir segurança no local de trabalho. Os processos que poderiam libertar HAP no ambiente deveriam, sempre que possível, ser controlados ou evitados.

1.4

Um desses processos é a utilização de óleos de diluição em pneumáticos para veículos automóveis, veículos de mercadorias, motociclos, veículos de competição e aviões. Estes óleos, que podem alcançar até 28 % do piso do pneumático, conferem as características essenciais de aderência que não são necessárias na carcaça Se o piso do pneumático não tiver o desempenho pretendido ou não se mantiver estável quanto utilizado, estarão comprometidos o desempenho e a segurança, com consequências óbvias para os condutores dos veículos.

1.5

Tecnicamente, os óleos devem ter a capacidade de diluir as borrachas naturais e sintéticas, bem como outros materiais utilizados nos pneumáticos, devem ter longa duração e devem ser estáveis, devem incorporar-se bem e permanecer integrados na matriz de borracha, devem funcionar em diferentes condições de temperatura e humidade e devem ser seguros de manusear na produção e na utilização. Os óleos também devem estar disponíveis em grande quantidade e ser produzidos de acordo com as especificações estabelecidas a nível mundial, por diversos fornecedores que concorrem entre si, e com custos inferiores aos da borracha para reduzir o custo geral dos pneumáticos.

1.6

Os óleos de alto teor aromático que cumprem estas especificações têm sido tradicionalmente fornecidos por importantes produtores de óleos com a denominação de extractos aromáticos destilados (DAE). O necessário poder de diluição depende da aromaticidade total dos óleos que por sua vez depende da presença de níveis significativos de HAP. À medida que o piso do pneumático se desgasta, deve-se concluir que estes HAP são descarregados no ambiente. Está em debate saber se estas descargas, comparadas com outras, são significativas. Contudo, na Europa está em marcha o processo de mudança para outros óleos e impõe-se que tenha uma conclusão satisfatória.

1.7

Isto é tanto mais importante quanto o fornecimento de DAE a nível mundial também está a ficar limitado, com as melhorias nas refinarias a dirigirem-se agora para a produção de produtos hidrogenados de maior valor (isto é, pouco aromáticos e de reduzido poder de diluição) e em gasolina e combustíveis «limpos».

1.8

Na Europa são produzidos anualmente cerca de 300 milhões de pneumáticos e o mercado mundial de óleos de diluição e de processamento para a indústria de pneumáticos avizinha-se do milhão de toneladas; para conseguir a mudança eficaz em termos de custos, mantendo ao mesmo tempo o esforço em favor da segurança e de um melhor desempenho a custo baixo ou aceitável, é um enorme desafio tanto para os fornecedores de óleos, como para os produtores de pneumáticos e reguladores.

1.9

Até agora, foram propostas duas formulações para óleos não carcinogénicos, que exigem graus diversos de investimento por parte dos fornecedores de óleos e novas formulações por parte da indústria de pneumáticos. Estes óleos são conhecidos, respectivamente, como Extracção Suave por Solvente (MES) e Extracto Aromático Tratado e Destilado (TDAE). É provável que possam ser fabricados outros óleos, por outros fornecedores fora da Europa.

1.10

Tanto quanto pode ser determinado (dado que os pormenores não estão publicamente disponíveis, no altamente competitivo mercado dos pneumáticos), já se deram algumas substituições – por exemplo, nos pneumáticos para Inverno e para camiões, em que a tracção em molhado é menos importante para o piso. Todavia, é geralmente consensual que será muito mais demorada a conversão dos pneumáticos de Verão, de desempenho mais elevado e, mais ainda, dos pneumáticos para veículos de competição e para aviões. Verifica-se também falta de capacidade instalada de MES e TDAE, além da limitada disponibilidade de DAE já referida.

1.11

De forma a alcançar as alterações mencionadas, no momento adequado e conforme à demais legislação comunitária tanto em matéria de concorrência, como de saúde e segurança, os representantes de sectores da indústria (CONCAWE, IISRP e BLIC) colaboraram com a Comissão e com outros organismos reguladores para obter consenso acerca da abordagem correcta em termos de produção e de quadro legislativo. Nesta matéria, são imprescindíveis ensaios para definir os óleos cuja utilização é aceitável na Europa, bem como ensaios para todos os pneumáticos existentes no mercado, quer sejam fabricados na União Europeia, quer fora, que permitam verificar se são incorporados nos artigos finais óleos com baixo teor em HAP.

2.   Síntese da proposta da Comissão

2.1

Em Julho de 2003, a Comissão propôs uma restrição geral dos metais pesados e dos HAP no ar ambiente. O CESE emitiu parecer sobre esta primeira proposta em Fevereiro de 2004. A proposta em apreço, também publicada em Fevereiro de 2004, procura estabelecer um mercado interno, bem como proporcionar um elevado nível de protecção da saúde humana e do ambiente aditando determinados HAP ao Anexo I da Directiva 76/769/EEC. Os HAP elencados não são substâncias de elevado volume de produção (HPV) e não constaram de nenhuma das quatro listas prioritárias para a avaliação das substâncias existentes. São contudo encarados em termos de grupo como sendo Poluentes Orgânicos Persistentes (POP) nos termos do Protocolo e da Convenção UNECE correspondentes.

2.2

Um HAP específico, o Benzo(a)pireno ((BaP) N.o CAS 50-32-8) está classificado como uma substância carcinogénica, mutagénica e tóxica para a reprodução de categoria 2, nos termos da Directiva 67/548/CEE e propõe-se agora que seja um marcador quantitativo e qualitativo da presença de outros HAP.

2.3

Os óleos de diluição não podem ser colocados no mercado, nem utilizados no fabrico de pneumáticos se contiverem mais de 1mg/kg de BaP, ou mais de 10mg/kg da soma de todos os HAP indicados na lista.

2.4

A Comissão reconhece que há ainda uma série de problemas técnicos que tem que ser resolvida e, por isso, a data de aplicação geral é estabelecida para 1 de Janeiro de 2009. Os pneumáticos dos veículos de competição seriam abrangidos a partir de 1 de Janeiro de 2012 e os pneumáticos de aviões numa data a determinar futuramente. A inexistência de relevantes métodos de ensaio harmonizados sobre os conteúdos em HAP dos óleos de diluição e dos pneumáticos, por exemplo, do CEN ou da ISO, não deveria retardar a entrada em vigor da presente directiva.

2.5

A Comissão indica ter consultado o Comité Científico para a Toxidade, a Ecotoxidade e o Ambiente (CSTEE) relativamente aos resultados científicos sobre os efeitos nocivos dos HAP para a saúde.

2.6

Os Estados-Membros terão um ano para publicar a legislação necessária para dar cumprimento à presente directiva. Este prazo será contado a partir da data da entrada em vigor da proposta, após consulta do Comité Económico e Social Europeu (CESE), nos termos do artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, dando cumprimento ao processo de co-decisão com o Parlamento Europeu.

3.   Observações na generalidade

3.1

A presente proposta, que complementa outros controlos sobre os HAP, assenta em relatórios sobre os alegados efeitos na saúde e no ambiente de resíduos de pneumáticos, de 18 de Março de 2003, e, publicados pelo Umweltbundesamt (UBV) alemão e pela Swedish National Chemicals Inspectorate (KEMI), de 27 de Março de 2003. Estes foram avaliados pelo CSTEE, como referido num parecer adoptado na sua 40.a reunião plenária, de 12 e 13 de Novembro de 2003.

3.2

O CSTEE afirmou, pelas razões acima expostas, que os HAP, como grupo, deveriam ser considerados como susceptíveis de serem carcinogénicos para os seres humanos e que os HAP são emitidos para o ambiente em resultado do desgaste dos pneumáticos. Contudo, apoiou apenas parcialmente a utilização do BaP como marcador qualitativo e quantitativo de outros HAP e colocou drasticamente em dúvida o impacte global desta via de emissões.

3.3

Em resumo, as emissões de HAP devido ao desgaste dos pneumáticos correspondem a menos de 2 % da exposição total dos seres humanos, em que as fontes referidas no ponto 1.1 contribuem com os restantes 98 %. Esta afirmação coincide com repetidas avaliações da OMS, segundo as quais as principais causas da poluição atmosférica e doenças conexas, incluindo cancro, são o tabaco e a combustão de madeira e carvão para aquecimento e preparação de alimentos. Assim, o CSTEE concluiu que a limitação dos HAP em pneumáticos não afectará consideravelmente as concentrações de HAP na atmosfera e nos sedimentos.

3.4

Deve também assinalar-se que a afirmação de rotina de que a directiva trará benefícios no que respeita a proporcionar um elevado nível de protecção da saúde humana e do ambiente não se aplica em força neste caso. Os óleos de diluição são já etiquetados e podem ser manuseados em segurança no local de trabalho ao abrigo da legislação existente em matéria de substâncias perigosas. Assim, esta proposta não trará vantagens para o local de trabalho e terá vantagens mínimas em termos de ambiente.

3.5

Deve-se também registar que esta proposta, bem como a vigésima sexta alteração à Directiva 76/769/CEE do Conselho destinada a limitar a concentração natural de crómio VI no cimento, sobre a qual o CESE emitiu parecer em Março de 2003, alarga o âmbito dessa directiva para os limites previstos, que até podem ser superados. Os HAP não são deliberadamente produzidos ou colocados no mercado como tais. Este facto é reconhecido no Anexo – em que as limitações são, justamente, sobre produtos que contêm HAP, mas não constam do título que, portanto, deveria ser corrigido.

3.6

O título e o texto também são confusos ao fazerem referência a «alguns HAP» como um grupo específico e significativo. Dado que, como o CSTEE observa, foram caracterizados muito poucos HAP e, destes, ainda são menos os que foram indicados como sendo provavelmente carcinogénicos, deve-se concluir que todo o grupo apresenta riscos sempre que houver a exposição humana. Por isso, as restrições à colocação no mercado e à utilização devem incidir em óleos ricos em HAP utilizados no fabrico de pneumáticos e nos pneumáticos que contenham tais óleos.

3.7

Tendo em atenção o supramencionado e a sobreposição com a anterior proposta da Comissão sobre metais pesados e HAP na atmosfera, foi defendido ser esta directiva desnecessária e que deveria ser retirada. O mercado fragmentou-se, e existem pelo menos dois produtos para substituir o único que estava a ser utilizado. A capacidade instalada é insuficiente para satisfazer a procura. Há também preocupações com a segurança das formulações de substituição, porque se o piso dos pneumáticos fabricados com óleos de baixo teor de HAP falharem durante a utilização, as mortes reais virão substituir as mortes hipotéticas que serviram para justificar uma acção preventiva.

3.8

O CESE compreende estas preocupações mas, considera efectivamente que a directiva deve servir para, em estreita consulta com as indústrias afectadas, alcançar uma bem sucedida transição para a utilização a nível mundial de óleos de diluição de baixo teor de HAP na produção de pneumáticos. Estes óleos de substituição devem nitidamente responder aos mesmos padrões mínimos de desempenho em todas as questões relacionadas com a segurança. A conclusão de um mercado interno destes novos produtos, na Europa, que seja eficaz, competitivo e fiável é, assim, um motivo adequado e suficiente para que esta proposta seja apresentada.

3.9

Crucial é, em termos de prazos, o acordo sobre os ensaios que se devem efectuar para determinar que óleos poderão ser utilizados. O presente Anexo sugere a realização de testes para detectar a presença de HAP específicos. Isto não é adequado ao funcionamento contínuo das operações de refinaria em larga escala, em que os actuais componentes químicos de misturas específicas variam à medida que se processa o petróleo bruto. Outros ensaios, como o IP-346 do Instituto do Petróleo (que controla o teor total de HAP medindo a quantidade de HAP com entre três a sete anéis que pode ser extraído por meio do solvente DMSO) já estão a ser utilizados nas indústrias do petróleo como medida aceitável de carcinogenecidade, em conformidade com a Directiva 67/548/CEE. Os estudos efectuados pela CONCAWE para a indústria petrolífera apoiam o parecer do CSTEE, que afirma que a medida específica do BaP não dá uma indicação correcta quanto à carcinogenecidade potencial global. É, portanto, fortemente recomendada a utilização do IP-346 para definir e testar os diferentes óleos de diluição.

3.10

De modo a proteger a indústria europeia de pneumáticos, bem como o ambiente, pressupondo que haja benefícios, deveria criar-se um teste semelhante para os óleos utilizados nos pneumáticos importados. Um projecto de norma da Organização Internacional da Normalização (ISO TC 45/SC 3 N, de 29 de Outubro de 2003) propõe, para análise e estudo, um método de ensaio para determinar o tipo de óleo que entra nos compostos de borracha. Este trabalho deveria ter uma conclusão satisfatória antes que a presente directiva seja aplicada.

3.11

Tendo em consideração o supramencionado, deveria ser possível resolver as actuais restrições de fornecimento, em particular de TDAE, que obrigam a níveis de investimento mais elevados que a MES. No entanto, todo este processo leva tempo e a presente exigência de que a mudança para todos os pneumáticos de utilização normal se efectue até 1 de Janeiro de 2009 parece cada vez mais irrealista. Dado que as vantagens desta proposta serão certamente mínimas, ao passo que os custos e os riscos de reformulações mal sucedidas são consideráveis, o CESE propõe que este prazo-limite inicial seja alargado por mais 12 meses, até 1 de Janeiro de 2010. Mesmo isto acarretará grandes negociações entre as diversas partes interessadas concorrentes. A Comissão continuará a desempenhar um papel-chave em termos de agilizar este processo, dentro dos limites da legislação comunitária e para que este venha por fim a ter êxito.

4.   Observações na especialidade

4.1

Tendo em consideração o que anteriormente foi exposto, o título da proposta em apreço e as referências subsequentes deveriam ser coerentes com o objectivo geral de introduzir restrições à colocação no mercado e à utilização de óleos ricos em HAP que são utilizados no fabrico de pneumáticos e em pneumáticos que contenham tais óleos.

4.2

Esta questão deveria estar reflectida no Anexo, impondo restrições à colocação no mercado e ao uso de óleos utilizados no fabrico de pneumáticos que contenham mais de 3 % de DMSO extraídos mediante o IP-346 e, assim, classificados como carcinogénicos nos termos da Directiva 67/548/CEE. Deveriam ser suprimidas todas as referências ao BaP como marcador, bem como a quaisquer outros HAP concretos.

4.3

Deveria ser elaborado um método de ensaio normalizado a nível internacional para a caracterização de óleos presentes nos compostos de borracha, particularmente dos pneumáticos, e incorporado na presente directiva.

4.4

Deveria ser concedido um prazo adequado para que as indústrias de borracha e de pneumáticos completem o trabalho de reformulação já em curso, e para que a indústria petrolífera invista e forneça as matérias-primas necessárias. Actualmente, considera-se que todas as partes estariam aptas a cumprir com tais exigências antes de 1 de Janeiro de 2010 e, assim, esta data deveria constar na proposta como dada-limite inicial. As derrogações para os pneumáticos dos veículos de competição, dos aviões e demais utilizações finais de elevado desempenho deveriam ser objecto de consenso com as partes interessadas. À luz do que se afirma, é difícil entrever quaisquer vantagens quantificáveis que resultem destas alterações, se comparadas com os riscos evidentes de falta de rendimento para todos os interessados.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004

A Presidente do

Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/34


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 2702/1999 relativo a acções de informação e promoção a favor de produtos agrícolas em países terceiros e o Regulamento (CE) n.o 2826/2000 relativo a acções de informação e promoção a favor dos produtos agrícolas no mercado interno»

[COM(2004) 233 final — 2004/0073 (CNS)]

(2005/C 120/08)

Em 21 de Abril de 2004, o Conselho da União Europeia decidiu, nos termos dos artigos 36.o e 37.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente adoptou parecer em 21 de Setembro de 2004, sendo relator Leif NIELSEN.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 171 votos a favor, 1 voto contra e 6 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Antecedentes

1.1

Até 1999, o co-financiamento comunitário das campanhas de informação e das acções de promoção dos produtos agrícolas no interior e no exterior da EU desenrolou-se de acordo com os diferentes regimes de organização comum de mercado. Desde essa data, as disposições sectoriais foram substituídas por uma estratégia mais horizontal através do Regulamento (CE) n.o 2702/1999 e do Regulamento (CE) n.o 2826/2000, respeitantes às medidas relacionadas, respectivamente, com os países terceiros e o mercado interno, e com o objectivo de apoiar as acções de promoção dos Estados-Membros e das próprias empresas. Caso não venham a ser renovados, os sobreditos regulamentos expirarão no final de 2004, e a Comissão apresentou, dando cumprimento a uma disposição neles contida, um relatório completo em Março de 2004 sobre a aplicação desses regulamentos, incluindo propostas de simplificação e racionalização.

1.2

Problemas como a doença das vacas loucas, a crise das dioxinas e a listeriose vieram agudizar a necessidade de garantir a confiança nos produtos alimentares europeus e de divulgar informações sobre os sistemas de controlo a fim de assegurar a qualidade e a rastreabilidade. É por esse motivo que é dada uma importância particular à questão da informação nos domínios seguintes: legislação destinada a garantir a qualidade, segurança, rotulagem, rastreabilidade, regimes aplicáveis às denominações geográficas protegidas, às indicações de origem, aos certificados de especificidade, à agricultura biológica e à produção integrada, tudo no intuito de melhorar a imagem dos produtos europeus junto dos consumidores.

1.3

Nos países terceiros, o regime actual tem igualmente por objectivo a difusão de informações sobre os esforços realizados pela União Europeia com vista a assegurar a qualidade e a segurança, assim como sobre as características dos produtos de zonas específicas e sobre os requisitos para a produção biológica. Tanto na UE como em países terceiros têm sido utilizadas campanhas de informação, actividades de relações públicas, medidas de promoção e publicidade, bem como a participação em feiras e exposições susceptíveis de preparar o terreno para as campanhas nacionais e privadas destinadas a aumentar a quota de mercado dos produtos dos interessados.

1.4

Regra geral, o financiamento dos programas de promoção é suportado em 50 % pela União Europeia, em 30 % pelas associações profissionais e em 20 % pelos Estados-Membros (no caso dos dois últimos contributários, o financiamento pode processar-se por meio de taxas parafiscais). As despesas incorridas pelos Estados-Membros são consideradas como intervenções estatais e são reembolsadas pela Comissão.

1.5

As organizações europeias ou nacionais implicadas devem tomar elas próprias a iniciativa de lançar os programas, cabendo aos Estados-Membros a gestão, o controlo e o pagamento dos mesmos. Para promover a dimensão europeia, dá-se prioridade aos programas propostos por pelo menos dois Estados-Membros e organizações comerciais. Na prática, contudo, estes programas enfrentam uma série de dificuldades resultantes das disparidades a nível regulamentar e processual e da falta de empenho verificada em certos Estados-Membros. De um modo geral, a coordenação, o controlo e a gestão dos programas exigem um enorme investimento em tempo e recursos da parte dos proponentes.

1.6

As propostas em apreço visam reduzir os problemas que se fazem sentir sob a forma de entraves e burocracia, conforme explicado no relatório da Comissão. Por outro lado, as alterações propostas procurar garantir que os programas apresentem em maior medida um conteúdo substancial de genuíno interesse europeu.

2.   Observações na generalidade

2.1

A reforma da Política Agrícola Comum e a intensificação da concorrência nos mercados mundiais tornam mais urgente a aplicação do regime em apreço, da mesma forma que o apoio dado pelos países envolvidos nessa concorrência às campanhas de informação e à promoção nos mercados de exportação justifica a manutenção do regime comunitário, tanto no interior como no exterior da União.

2.1.1

Entretanto, é incontestável a necessidade de proceder a simplificações e a melhoramentos. Mercê das consultas que levou a cabo junto de organizações profissionais e outros intervenientes, a Comissão logrou estabelecer uma base completa para a revisão agora proposta, com vista a simplificar os procedimentos administrativos e a velar pelo bom funcionamento do regime.

2.2

Como observado pela Comissão, é ainda demasiado cedo para avaliar os resultados do novo regime. A sua aplicação só teve início, gradualmente, em 2001 para os países terceiros e em 2002 para o mercado interno, e 2003 foi o primeiro ano em que o regime foi aplicado na íntegra. É por esse motivo que convirá, conforme recomenda a Comissão, elaborar um novo relatório em finais de 2006 para avaliar o funcionamento do regime após a reforma.

2.3

Muitas organizações só agora estão a familiarizar-se com as disposições e as exigências administrativas do novo regime. Como a própria Comissão constata, boa parte das propostas de programas apresentadas revestem um interesse apenas limitado do ponto de vista comunitário. Importa, pois, por um lado, colocar a ênfase em programas de âmbito mais marcadamente europeu e, por outro, salientar a necessidade de coordenar melhor as actividades nacionais e as actividades comunitárias. Deve igualmente avaliar-se a sua aplicação nos novos Estados-Membros da UE.

2.4

A União Europeia deveria, sobretudo em face do recente alargamento, esforçar-se por simplificar ao máximo a regulamentação, no interesse da transparência. Independentemente dos diferentes objectivos internos e externos e do conteúdo dos programas, a separação em dois regulamentos justifica-se por razões históricas. Com vista a uma maior simplificação, os dois regulamentos deveriam ser unidos o quanto antes numa regulamentação comum, facilitando a sua aplicação. As disposições são, pela maior parte, idênticas e as diferenças não têm, em muitos dos casos, qualquer razão de ser. As propostas de revisão dos regulamentos em apreço são, além disso, idênticas no que toca à apresentação de propostas de programas, à tomada de decisões e ao controlo.

2.5

Acresce que no que respeita às disposições em matéria de desenvolvimento rural, as actividades de informação, promoção e publicidade relativas aos produtos agrícolas e aos géneros alimentares beneficiam de ajudas concedidas com base em disposições cuja formulação difere das dos regulamentos em apreço. Sem prejuízo do facto de a Comissão ter recentemente definido de forma mais clara os diferentes domínios de aplicação dos regimes em causa, caberia realizar desde já uma avaliação das possibilidades de suprimir esta sobreposição. Do mesmo modo, não há qualquer motivo para adiar esta discussão, como sugere a Comissão.

2.6

O co-financiamento pela União Europeia deve continuar a efectuar-se nas mesmas condições que até à data e os meios financeiros para esse efeito deveriam ser aumentados conta tida do alargamento e das necessidades futuras. Dessa forma, o regime poderá contribuir para a integração e para a concretização do mercado interno para os diferentes sectores de produção, tendo em conta as variedades e a diversidade gastronómica. As organizações profissionais europeias deveriam igualmente dar maior atenção às campanhas de informação sobre as características dos produtos e sobre as variações nas preferências dos consumidores europeus. No que respeita aos mercados de países terceiros, seria conveniente, ao mesmo tempo que se suprime gradualmente as restituições à exportação, estabelecer prioridades quanto às possibilidades reais de executar programas eficazes.

2.7

O facto de o regime actual só ser utilizado de forma limitada nos mercados dos países terceiros deve-se nomeadamente à exigência de os programas abrangerem apenas campanhas genéricas. Daí resulta que as empresas mais importantes afiliadas às organizações profissionais hesitam, em muitos casos, em participar e abstêm-se de contribuir para o financiamento dos programas. Está fora de questão apoiar marcas ou empresas individuais, mas para que as medidas possam surtir efeitos sensíveis nos mercados de exportação, a Comissão deve fazer prova de flexibilidade nas campanhas e actividades afins, aceitando um número equilibrado de marcas como elemento integrante da campanha genérica e facilitando a associação entre a mensagem da campanha e os produtos disponíveis no mercado, procurando conciliar o genérico com o particular e criando sinergias comuns. O objectivo não é condicionar o teor da campanha, mas sim fazer com que os responsáveis pelas vendas e os consumidores possam encontrar efectivamente os produtos que são objecto das campanhas. Vai-se dando igualmente cada vez mais importância à origem dos produtos no interior da União Europeia. Se, por outro lado, um mercado já for dominado por marcas específicas, o valor acrescentado da promoção comercial pela União Europeia será limitado, na medida em que as marcas se entregam as mais das vezes a uma concorrência intensa para aumentar as suas quotas de mercado que envolve quantiosos recursos publicitários.

2.8

Não há qualquer justificação para alterar as taxas de co-financiamento entre os Estados-Membros e os organismos comerciais. Um dos problemas é que alguns Estados-Membros se mostram pouco empenhados ou consideram não terem condições para satisfazer as obrigações de financiamento, o que impede os organismos comerciais em questão de utilizar os regimes, salvo quando o financiamento provém de taxas parafiscais. No interesse da simplificação administrativa, seria útil suprimir as actuais taxas de financiamento degressivas para os programas plurianuais e fixar em 50 % o co-financiamento pela União Europeia.

2.9

A aceitação de taxas parafiscais como forma de financiamento tem levado a que alguns organismos financiem na realidade 50 % dos programas. Deve manter-se esta possibilidade, tornando, por conseguinte, mais flexíveis as regras em matéria de participação dos Estados-Membros, que é de 20 %, e permitindo que estes decidam, caso a caso, do montante do financiamento que desejam conceder a um programa. Deveria, porém, ser fixada uma contribuição mínima obrigatória da parte da organização implicada, que poderia elevar-se, por exemplo, a 20 %.

2.10

O CESE considera que deve ser possível adoptar medidas de promoção das flores e das plantas nos mercados de países terceiros da mesma forma que no mercado interno.

2.11

A sujeição das contribuições financeiras dos Estados-Membros às disposições do Tratado em matéria de ajudas de Estado comporta encargos administrativos onerosos e não traz benefícios palpáveis. Assim, deveria prever-se desde o início a possibilidade de derrogação do procedimento de notificação, analogamente ao disposto no Regulamento sobre o desenvolvimento rural.

2.12

A possibilidade de determinar um orçamento mínimo e um orçamento máximo para os programas seleccionados é um aspecto positivo em vista dos encargos administrativos e do número elevado de programas de pequena envergadura com impacto reduzido nos mercados em questão. Deve dar-se prioridade a programas cuja duração seja suficientemente longa e cujo orçamento seja assaz elevado para assegurar efeitos mais visíveis.

2.13

No que respeita aos produtos da agricultura biológica no interior da UE, há que integrar o máximo possível os regimes nacionais e os regimes privados de certificação e controlo no regime comum da União Europeia aplicável à produção da agricultura biológica. Esta integração está no bom caminho e deve ser apoiada ao máximo através de campanhas de informação com vista a criar um verdadeiro mercado interno dos produtos da agricultura biológica que substitua os regimes nacionais e privados. As campanhas de informação organizadas em países terceiros sobre produtos da agricultura biológica oriundos da UE tiveram, até ao presente, um impacto muito limitado. A concretização do mercado interno dos produtos da agricultura biológica é uma condição imprescindível para a comercialização desses produtos em países terceiros. Refiram-se ainda os problemas no domínio do reconhecimento mútuo (por exemplo, entre a UE e os EUA) dos diversos regimes.

3.   Observações na especialidade

3.1

Importa analisar se é possível ir mais longe do que o agora proposto no sentido da repartição interna do trabalho e das competências entre os Estados-Membros e a Comissão. O mesmo vale para a necessidade de simplificar e de proceder a uma repartição mais inequívoca das competências em matéria de participação dos vários comités e outros órgãos associados à elaboração das regras e à selecção, à execução, ao acompanhamento e ao controlo dos programas. O CESE propõe, pois, que para além desses comités e órgãos sejam criados grupos de trabalho eventuais compostos por representantes dos Estados-Membros e/ou peritos com conhecimentos especializados no domínio da promoção e da publicidade e capazes de orientar a Comissão na elaboração da estratégia de aplicação do regime e das medidas necessárias para esse efeito.

3.2

A alteração proposta quanto à selecção dos organismos de execução constitui uma importante simplificação. Importa igualmente que as organizações implicadas possam elas próprias realizar actividades no âmbito de um programa e respeitando o teor da campanha e que a escolha do órgão de execução possa ser adiada para depois da decisão da Comissão.

3.3

Em quanto respeita às restantes críticas formuladas, e em particular à utilização do período entre a apresentação das propostas e a decisão final, ao nível de pormenor exigido numa fase precoce e à falta de transparência nas decisões, as alterações sugeridas marcam um assinalável progresso no sentido da resolução desses problemas. Entretanto, importa igualmente contemplar um relaxamento das exigências em matéria de apresentação de relatórios.

3.4

O CESE considera de louvar a proposta de dar à Comissão a possibilidade de lançar ela própria campanhas de informação e de promoção com vista a garantir uma repartição mais equitativa entre os diferentes sectores de produção, uma vez que há uma procura excessiva do sector das frutas e legumes, ao passo que outros sectores merecem muito pouca atenção. No entanto, a aplicação desta possibilidade na prática suscita uma série de questões, agravadas pela limitação taxativa, estabelecida nos Anexos, dos países e dos produtos que podem ser objecto de promoção por parte da UE.

3.5

Há que associar expressamente o rótulo comunitário da agricultura biológica às actividades de informação e de comercialização no intuito de divulgar melhor o regime comunitário de certificação e de controlo e de promover a harmonização dos regimes nacionais. Este rótulo apresenta as doze estrelas e simboliza a União Europeia, pelo que pode contemplar-se uma atenuação da obrigação de apor a bandeira da União no material das campanhas, de acordo com princípios a definir. As obrigações actualmente em vigor redundam no aparecimento de símbolos da UE diferentes num mesmo material de campanha. Acrescentem-se a isso os rótulos nacionais da agricultura biológica e o carimbo do expeditor e a clareza da mensagem pode ficar comprometida. Já as campanhas que são financiadas pelo programa LIFE apresentam o símbolo do LIFE, que contém as doze estrelas, mas não a bandeira da União.

3.6

A disposição ainda em vigor que autoriza a aposição unicamente dos rótulos nacionais de agricultura biológica, contanto que as regras seguidas sejam regras nacionais de alcance mais vasto, constitui um tratamento discriminatório e é contrária à harmonização. O projecto de plano de acção europeu para os alimentos e a agricultura biológicos (1) propõe, ao invés, a utilização de rótulos nacionais paralelamente ao rótulo comunitário.

3.7

O CESE apela a que a Comissão elabore um guia para os operadores que ajude tanto estes como as autoridades nas suas actividades de controlo e favoreça, assim, esta nova política promocional comunitária no seu conjunto.

3.8

A aplicação destes regulamentos é recente, mas começam já a notar-se os primeiros problemas, que deverão ser encarados numa perspectiva de futuro. A Comissão deve coordenar as acções em diferentes mercados para evitar, no futuro, mensagens sobrepostas ou cruzadas que comprometam a eficácia da promoção.

4.   Conclusão

4.1

O CESE endossa a proposta da Comissão, sem prejuízo das observações expendidas sobre a necessidade de maior simplificação.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Plano de acção europeu para os alimentos e a agricultura biológicos — COM(2004) 415 final.


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/37


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as «Mutações industriais e auxílios estatais no sector siderúrgico»

(2005/C 120/09)

Em 29 de Janeiro de 2004, nos termos do disposto no n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, o Comité Económico e Social Europeu decidiu elaborar parecer sobre as «Mutações industriais e auxílios estatais no sector siderúrgico».

A Comissão Consultiva das Mutações Industriais, incumbida da elaboração dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 9 de Setembro de 2004, tendo sido relator Göran LAGERHOLM e co-relator Albrecht KORMANN.

Na 412.a reunião plenária, de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 154 votos a favor, 3 votos contra e 11 abstenções, o presente parecer.

1.   Introdução, objectivo e âmbito do parecer — Definições

1.1

O presente parecer de iniciativa foca a relação existente entre a mutação industrial e os auxílios de Estado, à luz do exemplo do sector siderúrgico.

1.2

Os autores do presente parecer de iniciativa entendem por «mutação industrial», o processo normal e constante de adaptação activa de um sector industrial aos movimentos dinâmicos ocorridos num determinado ramo económico por forma a manter a competitividade e criar oportunidades de crescimento.

1.3

A Europa não pode subtrair-se a uma mutação industrial constante. Ante uma globalização crescente dos mercados, as estruturas económicas terão, mais tarde ou mais cedo, de se adaptar aos acontecimentos que ocorrem no mercado mundial. Perante este contexto, a União Europeia tem de esforçar-se por desempenhar um papel activo na definição do enquadramento internacional.

1.4

O presente parecer de iniciativa tem por fundamento:

a cessação de vigência do Tratado CECA em 2002;

a privatização e reestruturação das indústrias siderúrgicas dos países da Europa Central e Oriental (PECO) no contexto do processo de adesão à UE;

as negociações na OCDE sobre um acordo internacional em matéria de subvenções ao sector siderúrgico;

a última edição do painel de avaliação dos auxílios estatais da UE;

a comunicação da Comissão Europeia — «Acompanhar as mutações estruturais: uma política industrial para a Europa alargada» (COM(2004) 274) publicada em Abril de 2004; e

o relatório da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu – «Primeiro relatório de acompanhamento da reestruturação do sector siderúrgico na República Checa e na Polónia» (COM(2004) 443 final) de 7 de Julho de 2004.

À luz do exemplo da indústria siderúrgica, o presente parecer de iniciativa analisa o modo como os auxílios estatais actuam sobre mutações industriais que se asseveram necessárias.

1.5

As empresas que não beneficiam de auxílios de Estado para assegurar a respectiva competitividade apresentam, frequentemente, uma desvantagem competitiva em relação aos seus concorrentes que beneficiam destas ajudas. As consequências negativas para o desenvolvimento destas empresas podem ser graves, podendo, em última instância, forçá-las a sair do mercado. Não obstante este facto, a experiência recolhida ao longo de várias décadas de reestruturação da indústria siderúrgica na Europa revela que os decisores políticos resistem com frequência a tomar a decisão de inviabilizar o pagamento de subvenções a grandes empresas, que empregam naturalmente um elevado número de trabalhadores, em risco de encerramento. Regra geral, isto significa que as sobrecapacidades e as actividades não rentáveis são mantidas no mercado para além do momento de saída por este imposto. Os indispensáveis processos de adaptação são postos em prática com hesitação.

1.6

Contudo, reina actualmente nos sectores político, económico e sindical consenso geral quanto à inevitabilidade da mutação industrial e também quanto à necessidade de estruturar esta mutação no âmbito de acordos-quadro internacionais (p. ex., OMC, OCDE, OIT, etc.). Este reconhecimento baseia-se na experiência adquirida ao longo de décadas de mutação industrial na indústria siderúrgica e do carvão. A reestruturação e a consolidação, bem como o diálogo social que as acompanha, são actualmente globalmente reconhecidos como pré-requisitos ou melhor enquadramentos necessários para assegurar a competitividade das empresas europeias em mercados cada vez mais integrados.

1.7

A Comissão Europeia referiu na sua comunicação sobre política industrial apresentada em finais de Abril de 2004 (1) que a mutação industrial não deve ser equiparada a um processo de desindustrialização absoluta. Esta última, caracteriza-se por uma diminuição concomitante do emprego, da produção e do crescimento da produtividade. A desindustrialização absoluta tem por consequência a perda de empregos de fraca produtividade para países em desenvolvimento e emergentes caracterizados por custos de trabalho mais baixos. A causa principal desta transferência de empregos reside no facto de as estruturas dos custos comparados serem mais favoráveis em países terceiros.

1.8

A Comissão Europeia conclui, no entanto, na sua análise em matéria de política industrial que, actualmente, para além da indústria mineira, a desindustrialização só ocorre num número reduzido de sectores (têxtil, vestuário, couro-calçado, construção e reparação navais, refinação de petróleo, produção e transformação de carvão e combustíveis nucleares). A mutação industrial é, sem dúvida, dolorosa para uma região, mas de um ponto de vista económico global é benéfica desde que antecipada, identificada e acompanhada de forma adequada.

1.9

A diminuição proporcional da percentagem da indústria na actividade económica global reflecte um processo estrutural a longo prazo. Apesar de a maioria dos sectores industriais, como o sector siderúrgico, ter reduzido consideravelmente o número dos seus trabalhadores ao longo das últimas décadas, estes sectores testemunharam, simultaneamente, um notório aumento do valor acrescentado dos seus produtos e da produtividade do seu trabalho.

1.10

O aumento da importância social do sector dos serviços é geralmente considerado pela opinião pública como um exemplo de um processo de mutação estrutural a expensas da indústria. Esta transferência carece, no entanto, de ser perspectivada à luz da interligação crescente entre estes dois sectores. Ao longo das últimas décadas, as indústrias de transformação têm «externalizado» inúmeras actividades (transporte, logística, processamento de dados, etc.), passando-as para fornecedores de serviços externos. Assim, há que fazer prova de prudência e de extrema cautela ao interpretar as estatísticas sobre mutação industrial. As ilações incorrectas, baseadas em análises superficiais ou em meias verdades de cariz político, podem despoletar rapidamente consequências industriais fatídicas.

1.11

Numa União Europeia baseada no conhecimento, o valor acrescentado da indústria continua a ser um elemento essencial. Tendo em conta o valor acrescentado global gerado por outros sectores da economia para a indústria, é evidente que, desde o início dos anos noventa, a indústria manteve a sua extrema importância para a UE. Na Alemanha, por exemplo, tendo em conta estes valores de prestação combinados, a indústria continua a representar uns bons 40 % do valor acrescentado bruto.

1.12

À luz da experiência (por vezes muito dolorosa) passada e com a privatização e a reestruturação a remontarem a há já cerca de 30 anos, a Comissão Europeia vem agora propor que as futuras medidas estruturais (tomadas nos PECO no sector do aço e noutros sectores) se baseiem na experiência adquirida pelo sector siderúrgico da UE na aplicação de medidas de adaptação.

1.13

As últimas décadas viram surgir alterações consideráveis no ambiente político, tecnológico e económico em que opera o sector siderúrgico comunitário. As crises petrolíferas, o mercado interno comunitário, o alargamento da UE e ainda a globalização deixaram uma marca profunda neste sector de produção de matéria-prima, importante para tantos outros sectores industriais. Não obstante todas as flutuações estruturais e conjunturais ocorridas desde a primeira crise em 1975, o nível de produção de aço na UE tem, contudo, permanecido virtualmente estável. Praticamente todos os quinze Estados-Membros da UE ainda produzem aço nos dias de hoje. Actualmente, porém, a produção de aço requer apenas aproximadamente um terço dos trabalhadores necessários em 1975, em virtude do progresso tecnológico. A percentagem de siderurgias na UE-15 em que o Estado detém uma posição dominante caiu de 53 % em 1985 para menos de 10 % nos dias de hoje. Ademais, as empresas estatais estão actualmente sujeitas às mesmas condições económicas que as empresas privadas.

1.14

Perante este contexto, a Comissão Consultiva das Mutações Industriais (CCMI) do Comité Económico e Social Europeu sente-se entusiasmada com a tarefa de examinar o papel que os auxílios estatais desempenham em geral no âmbito da mutação estrutural, bem como o papel que desempenharam especificamente ao nível da indústria siderúrgica comunitária. Para efeitos do presente parecer de iniciativa, entende-se por «sector siderúrgico» todas as actividades industriais relacionadas com a produção e comercialização do aço, bem como o papel fundamental que este sector desempenha para os sectores utilizadores de aço na UE.

2.   Auxílios de Estado e respectivo impacto geral

2.1

Os auxílios estatais são benefícios selectivos concedidos por organismos públicos a determinados ramos de produção e, em última análise, a determinados grupos. Por forma a determinar que tipo de medidas constitui um auxílio estatal, há que efectuar uma distinção entre as medidas que pretendem favorecer certas empresas ou certas produções, nos termos do n.o 1 do artigo 87.o do Tratado CE, e as medidas gerais, também aplicadas nos Estados-Membros, mas que visam beneficiar a economia no seu conjunto. As medidas que recaem nesta última categoria não constituem auxílio estatal na acepção do n.o 1 do artigo 87.o do Tratado, sendo consideradas como medidas gerais de política económica, igualmente aplicáveis a todas as empresas (por exemplo, benefícios fiscais gerais para prémios ao investimento).

2.2

Contudo, há que ter em mente que as actividades económicas em economias de mercado orientam-se pela situação da oferta e da procura e coordenam-se através do mecanismo dos preços. Assim, quaisquer medidas que comprometam o papel do factor preço no fornecimento de informação, orientação e estímulo podem, em princípio, vir a ser prejudiciais.

2.3

Os auxílios estatais podem comprometer de forma duradoura a livre concorrência, obstar a uma afectação eficaz dos recursos e constituir uma ameaça ao mercado interno da UE. A União Europeia reconhece, portanto, que a salvaguarda de uma concorrência livre e isenta de distorções é um dos princípios basilares da Comunidade.

2.4

A atribuição de auxílios estatais específicos (ajuda financeira ou benefícios fiscais) só se justifica se o mercado não estiver ainda totalmente operacional e se houver uma possibilidade realista de a concessão de subvenções conduzir a um melhor resultado económico. Em caso de inoperância do mercado, a intervenção do Estado, sob a forma de ajuda financeira, pode ser útil para evitar uma atribuição deficiente de recursos. Contudo, raras vezes o Estado possui o conhecimento necessário para assegurar a injecção do montante correcto de financiamento público necessário em caso de inoperância do mercado. As empresas que lutam com grandes dificuldades só com alguma reserva podem ser consideradas como fontes de informação em matéria de auxílios estatais.

2.5

A perpétua mutação do mercado é outro factor que dificulta a situação. Um auxílio estatal justificado inicialmente, pode, com o passar do tempo, deixar de ser necessário de um ponto de vista económico, mas continuar, porém, a ser concedido, simplesmente devido à lentidão do processo político ou devido à influência exercida por grupos de interesses regionais ou sectoriais.

2.6

A concessão de auxílios estatais fomenta, igualmente, com frequência, alterações nos padrões de comportamento dos intervenientes no mercado. Estes ao receberem subvenções tendem a perder a motivação para efectuar as adaptações necessários à manutenção ou restabelecimento da competitividade das respectivas empresas. As empresas subvencionadas podem também desenvolver uma mentalidade de «subsídio-dependência».

2.7

No mínimo a médio prazo, os auxílios estatais podem igualmente conduzir a um aumento da carga fiscal. A redução dos auxílios estatais é vital não só como meio para alcançar uma consolidação orçamental duradoura, mas também por razões de ordem económica e reguladora. A adopção de uma abordagem incorrecta em matéria de subvenções irá obstar às mutações estruturais.

2.8

Com o objectivo de proceder à necessária redução do volume global de auxílios estatais concedidos, fizeram-se vários apelos nas conclusões de diversas reuniões dos conselhos de ministros para que se passasse a apoiar mais os objectivos horizontais de interesse comum, incluindo objectivos de coesão, em vez de empresas individuais ou de ramos económicos. Os auxílios estatais concedidos a título de concretização de objectivos horizontais visam compensar, regra geral, uma inoperância do mercado, acarretando normalmente menos distorções da concorrência do que os auxílios sectoriais e os auxílios ad hoc. A grande maioria dos auxílios concedidos sob esta última forma serve para salvar ou reestruturar empresas em dificuldades.

2.9

Os principais objectivos horizontais que se pretende alcançar com financiamento público são os seguintes:

investigação e desenvolvimento,

preservação do ambiente,

poupança de energia,

apoio às PME,

criação de emprego e

incentivo à formação.

Influência estatal na indústria siderúrgica europeia

2.10

O Estado tem exercido tradicionalmente influência considerável no âmbito da indústria siderúrgica. Não são estranhas a este facto considerações de ordem militar e de segurança, podendo-se mesmo afirmar que desempenharam um papel preponderante. Para ilustrar a ordem de grandeza da influência do Estado, realça-se o facto de, em 1980, cerca de 60 % da produção mundial de aço ser ainda oriunda de empresas que estavam directa ou indirectamente sob a alçada do Estado.

2.11

Quando as empresas siderúrgicas são propriedade do Estado, é este que, regra geral, assume largamente as perdas, o que corresponde na prática a uma garantia de sobrevivência para as empresas. Do ponto de vista da eficácia da concorrência, esta situação é tão prejudicial como a concessão de auxílios estatais para consolidar a posição concorrencial de empresas ou para prevenir o encerramento iminente de empresas que não são directamente controladas pelo Estado. Para além das medidas económicas tomadas para impedir estes encerramentos, acrescem ainda medidas de ordem política. Daqui pode resultar que o ónus de adaptação seja transferido para empresas mais competitivas ou que se desencadeie uma espiral de intervenção.

2.12

Assim, actualmente, para além da ajuda ao encerramento, a única ajuda que pode ser concedida à indústria siderúrgica europeia são os auxílios horizontais. Ante o ritmo extremamente lento do processo de mutação estrutural até finais da década de noventa, a indústria siderúrgica europeia reconheceu finalmente a necessidade de deixar os auxílios sectoriais e ad hoc e passar para os auxílios horizontais. Este reconhecimento foi ainda mais longe tendo o sector renunciado inclusive aos auxílios regionais no âmbito do seu regime de auxílios (2).

2.13

Na União Europeia dá-se extrema importância ao controlo de toda a despesa pública nacional. A Comissão Europeia tem de assegurar que a política de auxílios comunitária assenta numa supervisão e utilização transparentes dos auxílios estatais, como já acontece no sector siderúrgico.

2.14

A Comissão Europeia está actualmente a proceder ao exame das orientações gerais e das condições básicas que regem os auxílios estatais, as quais carecem de redacção mais simples e clara. Há discrepâncias que têm de ser eliminadas. A Comissão dará prioridade às seguintes medidas: novo exame das disposições que regem os auxílios de emergência e à reestruturação concedidos a empresas em dificuldades; reforma das disposições comunitárias que regem os auxílios regionais, na sequência do alargamento da UE; elaboração de novas condições básicas para avaliação do que constitui um montante relativamente pequeno de auxílio; e clarificações em matéria de serviços de interesse económico geral.

2.15

A evolução futura do regime geral de auxílios comunitários ao longo dos próximos anos tem de ter em conta o contexto internacional, em particular os compromissos multilaterais. Os auxílios a mercadorias e produtos não agrícolas estão sujeitos ao acordo da OMC sobre as subvenções e as medidas compensatórias.

3.   Política comunitária de auxílios e respectiva importância para as mutações industriais do sector siderúrgico

Contorno da proibição geral CECA à concessão de auxílios

3.1

O Tratado da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço de 1952 contém regras claras quanto à autorização de auxílios concedidos pelos Estados-Membros a empresas no sector da indústria do carvão e do aço: «Consideram-se incompatíveis com o mercado comum do carvão e do aço e, consequentemente (...) proibidos, na Comunidade, nas condições previstas no presente Tratado: (...) c) As subvenções ou auxílios concedidos pelos Estados (...), independentemente da forma que assumam». Esta proibição de qualquer forma de apoio por parte dos Estados às empresas, constante da alínea c) do artigo 4.o, era uma consequência lógica da supressão de todas as medidas nacionais proteccionistas no mercado comum.

3.2

No seguimento do estabelecimento do mercado comum, tornou-se, contudo, evidente que sem apoio estatal não seria possível assegurar nem o abastecimento energético da Europa nem a produção de ferro e de aço a partir de fontes internas de carvão. A procura de uma solução que não acarretasse uma alteração do Tratado CECA levou os decisores políticos a propor a reinterpretação de determinados tipos de auxílios de Estado como ajuda comunitária, a qual era, em princípio, autorizada. Recorreu-se ao artigo 95.o, adoptado para abranger todos os casos não previstos no Tratado, para se chegar a essa interpretação. Este artigo autoriza a intervenção comunitária sempre que necessária para alcançar um ou mais objectivos do Tratado.

3.3

A manutenção em funcionamento da indústria de extracção do carvão, em particular dos empregos a ela associados, era um desses objectivos. Desde então, os auxílios concedidos pelos Estados-Membros às suas empresas mineiras em troca de um abastecimento energético e de uma produção de aço garantidos passaram a ser considerados ajuda comunitária.

3.4

Na década de setenta, muitos Estados-Membros nem sequer se preocupavam em recorrer a este subterfúgio para justificar a ajuda que concediam às empresas siderúrgicas. Pelo contrário, pagavam milhões, a maior parte sem que fossem levantadas quaisquer objecções, inicialmente para fomentar a expansão do sector do aço e, posteriormente, para manter em funcionamento estas empresas, a maioria das quais controlada pelo Estado. Já no início dos anos oitenta, o então Director-Geral para a Concorrência da Comissão declarou abertamente que a proibição dos auxílios constante do Tratado CECA era obsoleta.

3.5

A partir de 1978, as empresas siderúrgicas privadas, que tinham sofrido consideravelmente devido a distorções da concorrência resultantes da «corrida aos auxílios» começaram a ver as suas tentativas para repor a proibição às subvenções a dar fruto.

3.6

O Código dos Auxílios à Siderurgia, baseado no artigo 95.o, estipulava que a partir de 1980 os auxílios a empresas siderúrgicas só seriam autorizados no âmbito de circunstâncias rigorosamente definidas. Contudo, os tipos de auxílios permitidos inicialmente incluíam, de qualquer das maneiras, a quase totalidade das ajudas já concedidas pelos Estados-Membros às suas empresas. Assim, na sua grande maioria, o primeiro código dos auxílios só serviu para legalizar as práticas existentes. Só gradualmente se começaram a proibir por completo os tipos de auxílios que mais prejudicavam a concorrência, nomeadamente os auxílios de emergência e ao funcionamento e investimento.

3.7

A partir da segunda metade da década de oitenta, o código dos auxílios só autorizava ajudas à investigação e desenvolvimento, ao ambiente e ao encerramento. Não obstante, algumas empresas controladas pelo Estado ainda receberam financiamento público até meados dos anos noventa para pagamento de dívidas e para reestruturação, financiamento este fundamentado em mais derrogações feitas ao abrigo do artigo 95.o

3.8

Por fim, a concessão de mais «ajudas comunitárias» passou a ser subordinada a reduções importantes da capacidade de produção. Finalmente, chegou-se a um consenso entre os Estados-Membros, segundo o qual não seriam permitidas mais derrogações à proibição das subvenções, para além das permitidas no código dos auxílios.

3.9

Esta legislação estrita em matéria de auxílios à siderurgia, que os fundadores da Tratado CECA já tinham tido em mente e cuja responsabilidade passou a ser assumida pela Comissão após o termo de vigência do mesmo em 2002, foi igualmente conseguida graças aos esforços políticos contínuos e às acções judiciais interpostas pela indústria siderúrgica. Mesmo que nem todas as queixas apresentadas perante o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias tenham culminado na supressão da autorização da concessão de auxílio objecto de contestação, serviram contudo para ajudar a definir de forma precisa e restringir ainda mais os limites jurídicos das derrogações à proibição dos auxílios à siderurgia.

3.10

O valor total do financiamento canalizado para as empresas siderúrgicas CECA é considerável: mais de 70 mil milhões de euros desde 1975! Este montante reparte-se como segue:

entre 1975 e 1980, na altura da entrada em vigor do código dos auxílios, foram concedidos cerca de 12 mil milhões de euros em auxílios de Estado na UE;

entre 1980 e 1985, ou seja no período em que as subvenções eram autorizadas sem grandes restrições em matéria de redução de capacidades, a Comissão Europeia autorizou o pagamento de cerca de 41 mil milhões de euros em auxílios estatais;

entre 1986 e 1995, foram concedidos mais 17 mil milhões de euros, dos quais 7 mil milhões foram concedidos unicamente em 1994, no seguimento de uma decisão «first time, last time» (auxílio único) baseada no artigo 95.o

3.11

Segundo o mais recente painel de avaliação dos auxílios da Comissão Europeia, a percentagem dos auxílios à indústria siderúrgica no quadro total dos auxílios da UE eleva-se, actualmente, a menos de dois milésimos do total. Este auxílio dirige-se na sua quase totalidade a medidas de protecção ambiental. Hoje em dia, a legislação e as práticas em matéria de auxílios à siderurgia são claramente mais rigorosas do que as disposições de auxílios da CE para outros sectores industriais.

Desenvolvimento da mentalidade dependente de auxílios estatais no sector do aço nos anos 70

3.12

Nos anos sessenta e durante a primeira metade dos anos setenta, o consumo mundial de aço deu mostras de crescimento forte e contínuo com uma média de mais de 5 % ao ano. Em 1974, a produção de aço bruto na então Comunidade Europeia dos Nove atingiu níveis históricos de quase 156 milhões de toneladas com uma capacidade de utilização de 87 %.

3.13

Todavia, um ano mais tarde, em 1975, a crise do preço do petróleo provocou uma forte queda na produção do aço e, em consequência, no espaço de um ano a produção na CE decaíra em 30 milhões de toneladas (19 %). A queda correspondente dos preços do aço ultrapassou o declínio da produção. Simultaneamente, as empresas siderúrgicas da CECA viram-se confrontadas com o aumento das importações, acompanhado por uma clara quebra das suas exportações. O declínio da utilização do aço no mercado único foi exacerbado por uma supressão das existências de aço.

3.14

Inicialmente, pensou-se que seria apenas uma fase descendente particularmente aguda do ciclo conjuntural. Todos os peritos acreditavam, portanto, que se lhe seguiria, em breve, a fase ascendente. Os institutos económicos questionados pela Comissão Europeia confirmaram que a recuperação seria particularmente forte e duradoura. As previsões a longo prazo da Comissão, Objectivos Gerais para 1985, elaboradas juntamente com produtores, consumidores e comerciantes, previam que a produção de aço para esse ano atingiria no mínimo 188 milhões de toneladas nos nove países da CE. Na verdade, apenas 120 milhões foram com efeito produzidos. Os planos de investimento a médio e longo prazo das empresas siderúrgicas basearam-se, portanto, em parâmetros totalmente incorrectos; geraram-se capacidades excedentárias e o fosso entre a oferta e a procura alargou-se cada vez mais.

3.15

A actividade de investimento dos consumidores de aço diminuiu drasticamente devido ao arrefecimento do crescimento económico a nível mundial, com um impacto particularmente negativo no consumo de aço, já que cerca de dois terços deste consumo nos países altamente industrializados está associado ao investimento.

3.16

Outra razão fundamental que explica a estagnação da procura de aço ao nível mundial desde 1975 prende-se com a menor utilização de aço para fins específicos, uma vez que é agora utilizado de forma mais racional. A transferência constante de crescimento quantitativo para qualitativo e a expansão do sector terciário levaram, igualmente, a uma queda na procura de aço na Europa.

3.17

Não obstante a estagnação do consumo de aço desde 1975, as capacidades de aço foram novamente aumentadas de forma significativa. A capacidade mundial de aço bruto nominal aumentou cerca de 150 milhões de toneladas unicamente entre 1974 e 1983, ao passo que a procura global caiu em 44 milhões de toneladas durante o mesmo período. Paralelamente, o desenvolvimento de capacidades nos «novos» países do aço e nos países do bloco de Leste foi particularmente notório. Comparado com o verdadeiro consumo de aço, o excedente de capacidade nominal em 1974 era de 130 milhões de toneladas a nível mundial, tendo praticamente triplicado no espaço de dez anos (343 milhões de toneladas).

3.18

Uma vez que o colapso da procura nessa altura era ainda considerado como um fenómeno puramente conjuntural, as capacidades mantiveram-se, não obstante as medidas de crise, que não tiveram êxito para conter a pressão da oferta, impedir as guerras de preços no mercado europeu do aço e travar a queda dos preços. As empresas com elevados custos de produção e poucas reservas começaram a enfrentar dificuldades cada vez maiores e a exigir apoio do Estado que, regra geral, acabavam por receber dos seus governos nacionais. Os problemas com que algumas empresas se confrontavam passaram, assim, a ser problemas inerentes a todo o sector. O sistema de restrições voluntárias, em que participavam os membros da Confederação Europeia da Indústria Siderúrgica «Eurofer» acabada de criar, acabou por ruir, quando todas as grandes empresas se retiraram do mesmo.

Regulamentação forçada do mercado (1980-1985)

3.19

Após o colapso do sistema voluntário, no Outono de 1980, a Comissão viu-se forçada a declarar a existência de «crise manifesta» e introduziu um sistema vinculativo de quotas de produção (sistema de quotas obrigatórias) que abrangia todas as fábricas da CE. A partir dessa data, as quotas de produção passaram a ser estipuladas trimestralmente pela Comissão. O sistema previa a possibilidade de sanções em caso de incumprimento e fixava temporariamente preços mínimos para produtos específicos. A abordagem adoptada centrava-se numa estabilização dos preços e numa redução sustentável em termos sociais e regionais das capacidades. Cada empresa siderúrgica da CE viu serem-lhe atribuídas quotas de produção e quotas de abastecimento do mercado comum. Foram concluídos acordos de restrição voluntária com 15 países importadores. Tendo em conta o baixo nível dos preços no mercado mundial para os produtos siderúrgicos, convinha sobretudo evitar perdas nas exportações que, à luz do sistema de crise, iriam requerer subvenções adicionais da parte da CE. No início dos anos oitenta, cerca de 70 % da produção europeia de aço estava sujeita ao sistema de quotas.

3.20

Inicialmente, porém, o objectivo político de uma redução gradual das capacidades não foi atingido. A expectativa que as empresas envolvidas colocaram num relançamento da procura e na eliminação dos concorrentes, a par dos auxílios estatais e da limitação da oferta, obstaram a uma redução das capacidades pelas empresas menos competitivas. A redução das capacidades só se iniciou gradualmente com o segundo código dos auxílios que estipulava como condição para a concessão de auxílios a realização de um programa de reestruturação. O sistema de quotas obrigatórias, previsto inicialmente para decorrer unicamente até 1981, teve de ser prorrogado inúmeras vezes por razões de concorrência.

3.21

Para pôr em prática a imperiosa redução das capacidades, a Comissão optou por recorrer aos auxílios de Estado proibidos nos termos do Tratado CECA como meio de pressão, legalizando, ao mesmo tempo, com a introdução do código dos auxílios, esta prática até então ilegal. Simultaneamente, porém, reclamou um direito de autorização que associou à obrigação de redução das capacidades. Esta fase da política siderúrgica durou até ao fim de 1985. A contrapartida à autorização dos auxílios estatais foi o desmantelamento de capacidades equivalentes a cerca de 44 milhões de toneladas de aço bruto e 32 milhões de toneladas de aço laminado a quente ao abrigo da protecção das existências do sistema de quotas.

Liberalização gradual do mercado (a partir de 1985)

3.22

Exclusivamente entre 1983 e 1985, as empresas siderúrgicas receberam cerca de 15 mil milhões de euros em auxílios de Estado. Em vez de harmonizarem as regras da concorrência, os decisores políticos fizeram pouco uso da possibilidade de imporem um encerramento de capacidades adequado às empresas financeiramente fortes. Adiaram, assim, a supressão das capacidades excedentárias há muito exigida pelo mercado.

3.23

Em 1985, afirmando que a crise manifesta havia passado, a Comissão Europeia apelou finalmente a uma reorientação radical da política comunitária do mercado do aço. Pouco depois da concessão de 15 mil milhões de euros em auxílios estatais, as forças do mercado deveriam, primeiro no âmbito de uma flexibilização do sistema de quotas e depois de uma total «liberalização», ser capazes de proceder a uma eliminação das capacidades excedentárias, o que visivelmente não poderia ser conseguido com medidas dirigistas de Bruxelas. Contudo, durante esta súbita mudança de direcção, a Comissão ignorou o facto de que os milhões de ajuda que autorizara até finais de 1985 só iriam ter efeito sobre a concorrência a partir dos anos seguintes. Em finais de 1986, a Comissão reduzira drasticamente o número de produtos regulamentados.

3.24

No entanto, não obstante uma supressão de capacidades de cerca de 40 milhões de toneladas e da perda de dezenas de milhar de empregos, havia ainda um potencial de produção excedentária de cerca de 25 milhões de toneladas que pressionava o mercado na altura.

3.25

A partir de 1987, um ligeiro aumento a curto prazo da procura veio finalmente confirmar os argumentos da Comissão de que a indústria siderúrgica já não deveria ser considerada como estando em «crise manifesta». As medidas reguladoras como os certificados de produção e a notificação obrigatória das quantidades fornecidas foram abolidas. A pressão exercida sobre os governos nacionais e a Comissão aumentou, de molde que em 1985 foi adoptado o terceiro código dos auxílios, em 1989, o quarto e, em 1992, o quinto, com o objectivo de interromper definitivamente o caudal de auxílios comunitários. De futuro, os auxílios só poderiam ser concedidos nos Estados-Membros para investigação e desenvolvimento, protecção do ambiente e algumas ajudas ao encerramento (3), devendo provir quase exclusivamente do Fundo da CECA financiado pelas contribuições das empresas do carvão e do aço.

3.26

Após um curto aumento passageiro em 1990, a procura de aço diminuiu novamente. Os preços caíram também em cerca de 20 %. Assim, em 1992, multiplicaram-se novamente as vozes que reclamavam uma nova intervenção da Comissão. Reivindicavam, em particular, previsões trimestrais da produção e da oferta por produto, a simplificação das fusões, a protecção contra as importações da Europa de Leste e ajudas à reestruturação. Por forma a reduzir as sobrecapacidades, propunham a criação de um cartel de crise estrutural, uma repartição interna dos encargos entre as empresas e uma redução definitiva das capacidades de 20 % até ao fim de 1996, associada ao despedimento de 50 mil trabalhadores.

3.27

A Comissão rejeitou, contudo, a ideia de um cartel de crise estrutural e de um novo sistema de quotas de produção. Em 1993, apresentou a sua própria proposta que consistia apenas em medidas indirectas, as quais previam um pré-financiamento pela Comissão ao encerramento das capacidades, a promoção das fusões e cooperativas de produção, uma protecção temporária do mercado do aço contra as importações da Europa de Leste, um aumento da transparência do mercado através de informação sobre a produção e a oferta dentro da UE e medidas sociais de acompanhamento como incentivo para a supressão de capacidades. Introduziu-se um processo de reestruturação durante o qual a capacidade de produção foi reduzida em mais 19 milhões de toneladas, tendo sido despedidas cerca de cem mil pessoas na indústria siderúrgica da CE. Nunca se chegou, contudo, a utilizar o modelo de pré-financiamento que fora, entretanto, aprovado em Conselho de Ministros.

3.28

Em Dezembro de 1993, não obstante o quinto código dos auxílios, o Conselho de Ministros da UE aprovou, por unanimidade, a concessão de mais auxílios de Estado, elevando-se a quase 7 mil milhões de euros a diferentes empresas siderúrgicas da UE no seguimento de proposta da Comissão e em contrapartida da redução de capacidades; foi, porém, salientado que estas ajudas não se repetiriam.

Resumindo:

3.29

O Tratado CECA caracterizava-se por uma proibição rigorosa dos auxílios estatais nos termos do seu artigo 4.o, alínea c). Contudo, esta proibição teve um resultado mitigado para impedir os Estados-Membros da CE de apoiar as indústrias siderúrgicas, com a conivência total do mais alto nível europeu. Mais de 70 mil milhões de euros provenientes do dinheiro dos contribuintes, concedidos até ao termo de vigência do Tratado CECA, atrasaram as adaptações necessárias devido às mutações industriais, mas foram incapazes, no fim, de as impedir. Durante a década de 90, a Comissão Europeia manteve a abordagem já experimentada e com provas dadas de autorizar auxílios estatais em contrapartida da redução de capacidades, aquando da reestruturação das indústrias siderúrgicas dos PECO, no âmbito dos preparativos para a adesão à UE.

3.30

Em 1982, os Estados-Membros da CE contornaram os princípios do mercado ao chegarem a acordo político visando repartir as necessárias reduções de capacidades de forma homogénea pelos países da Comunidade, e isto em contradição com o Tratado CECA que estipulava no seu artigo 2.o que o aço deveria ser produzido no local onde os custos de produção fossem os menos elevados. Em vez de promover a saída atempada do mercado das empresas não rentáveis, prevendo ao mesmo tempo medidas de acompanhamento sociais e assim restabelecer rapidamente o equilíbrio entre a oferta e a procura, os Estados-Membros da UE e a Comissão Europeia recorreram aos instrumentos previstos pelo Tratado CECA em caso de crise, o que não foi necessariamente bom para todas as empresas siderúrgicas. Por razões de política social, regional e de repartição, as capacidades não rentáveis foram mantidas, ao passo que as rentáveis (sobretudo privadas) desapareceram, juntamente com postos de trabalho que, no âmbito de uma comparação dos desempenhos, deveriam, no entanto, ser considerados como seguros.

3.31

Contudo, há que ter presente que os anos de crise do sector siderúrgico da UE já estão ultrapassados, mesmo que com imensas dificuldades. No final de contas, a indústria siderúrgica comunitária conseguiu, porém, adquirir as necessárias estruturas competitivas ao nível internacional. É verdade que teve de pagar um preço muito elevado com a supressão de mais de 550 mil empregos, a maior parte dos quais no âmbito de acordos sociais. Este processo só pôde ser concluído graças a um diálogo intenso realizado com os parceiros sociais.

Estímulo da competitividade mediante auxílios à investigação e desenvolvimento

3.32

Muitas das inovações tecnológicas que transformaram a indústria siderúrgica europeia foram lançadas ou aprofundadas consideravelmente no âmbito do programa de investigação da CECA, financiado pelas contribuições das empresas do carvão e do aço. O Tratado CECA previa disponibilizar meios para a investigação comunitária, por forma a fomentar a competitividade geral da indústria e melhorar a segurança no local de trabalho.

3.33

O primeiro programa de investigação CECA começou já no ano de 1955. A partir desta data, investigadores e engenheiros a trabalhar na inovação tecnológica de ponta orientaram cada vez mais o seu trabalho para uma abordagem europeia alicerçada na cooperação. A indústria siderúrgica, e com ela toda a sociedade europeia, beneficiaram deste tipo de investigação «cooperativa», no âmbito da qual os esforços são coordenados, as diligências são efectuadas conjuntamente e os resultados são postos à disposição de todos os envolvidos. A inovação industrial progrediu, portanto, rapidamente graças a melhorias constantes.

3.34

A investigação CECA conseguiu igualmente obter resultados palpáveis num domínio de importância capital para a sociedade como o ambiente. As emissões de dióxido de enxofre foram reduzidas em 70 % e as de fuligem em 60 %. As emissões de dióxido de carbono diminuíram em metade em relação aos níveis no início dos anos oitenta. Os produtores europeus de aço utilizam actualmente menos 40 % de energia por tonelada de aço produzido do que há vinte anos atrás.

3.35

Inicialmente, apenas sete milhões de euros foram atribuídos para investigação comunitária a título do orçamento CECA para 1955. Nos anos noventa, na Europa dos 15, este valor subira para aproximadamente 50 milhões de euros por ano. O programa de investigação CECA financiava no âmbito dos projectos comunitários até 60 % as actividades de investigação com vista a melhorar procedimentos, materiais e o ambiente. A partir de 1983, atribuíam-se ainda auxílios de 40 % para projectos-piloto e de investigação.

3.36

Deste modo, cada euro investido na investigação CECA rendeu em média 13 euros. Tendo em conta este contexto, não é portanto de estranhar que, com o termo de vigência do Tratado CECA, os Estados-Membros da UE tenham decidido por unanimidade utilizar os recursos remanescentes das contribuições das empresas do carvão e do aço, exclusivamente para a prossecução da investigação sectorial específica ao sector siderúrgico. As orientações adoptadas previam a utilização do produto anual dos juros pós-CECA, de cerca de 60 milhões de euros, exclusivamente para a investigação siderúrgica e no sector do carvão, em particular, no que respeita ao aço, para:

concepção e continuação do desenvolvimento dos métodos de produção e de transformação,

desenvolvimento e utilização de materiais,

melhoria da utilização dos recursos,

protecção do ambiente e

saúde e segurança no local de trabalho.

Uma indústria siderúrgica competitiva no dealbar do século XXI

3.37

A indústria siderúrgica da Europa está bem equipada para enfrentar a concorrência global após o alargamento da UE. Ao longo dos últimos anos, a indústria siderúrgica comunitária reforçou a sua posição, não só em termos tecnológicos e económicos, mas também ambientais. Algumas das empresas anteriormente nacionalizadas fizeram um uso orientado do apoio financeiro que receberam, conseguindo assim chegar, através de uma adaptação tecnológica e de uma racionalização das suas estruturas, a uma posição de líderes do mercado mundial.

3.38

A indústria siderúrgica conseguiu adaptar-se às exigências da globalização e do desenvolvimento sustentável. É notório que a indústria siderúrgica europeia soube aprender com as lições das crises do aço dos anos setenta, oitenta e noventa. Este sector é actualmente tão competitivo que mesmo em período de dificuldades económicas é fundamentalmente capaz de não entrar no vermelho.

3.39

A forte procura de aço registada no mercado interno da UE salienta os grandes esforços efectuados pelas empresas europeias no sentido de aumentarem, com êxito, a sua rentabilidade melhorando paralelamente a qualidade e a proximidade com o cliente. Graças às fusões e aquisições, ao aumento de eficácia e aos cortes nos custos, os produtores de aço europeus estabeleceram os fundamentos de uma indústria siderúrgica competitiva para o século XXI. Expressões como «auxílios estatais de emergência e à reestruturação» desapareceram do vocabulário dos empresários. Ao fazerem um claro apelo à manutenção das rigorosas regras em matéria de concessão de auxílios estatais mesmo após o termo de vigência do Tratado CECA, as empresas siderúrgicas da UE deram um claro sinal de que gostariam de dar por concluído, de uma vez por todas, o tempo da mentalidade da «subsídio-dependência» e das distorções da concorrência.

3.40

Contudo, a consolidação e a mutação industrial estão longe ainda de estar concluídas. Algumas empresas preparam já fusões transcontinentais. O aparecimento da China enquanto potência industrial está a ter actualmente grande impacto na competitividade das empresas. O rápido crescimento da procura de aço na China está a exacerbar a situação da procura nos mercados internacionais de matérias-primas. As importações chinesas, por exemplo de minério de ferro e resíduos de metal, estão a levar a estrangulamentos nos mercados mundiais e a conduzir a uma explosão dos preços no sector das matérias-primas e nas tarifas de transporte.

3.41

Na indústrias siderúrgicas dos novos Estados-Membros assiste-se também actualmente a um ritmo mais acelerado de mutação estrutural. Os desafios com que estes países se confrontam na reestruturação da sua indústria siderúrgica são mais ou menos comparáveis com a situação vivida na Europa Ocidental há 25 anos, não obstante o facto de a globalização dos mercados se ter acentuado consideravelmente desde então. Perante este contexto, é essencial que os parceiros da Europa Central e Oriental beneficiem da experiência adquirida com a reestruturação da indústria siderúrgica na Europa Ocidental, incluindo o diálogo social.

3.42

Em contrapartida aos auxílios especiais concedidos («période de grâce»), já nos acordos de adesão no início dos anos noventa se exigia aos PECO que aplicassem medidas de reestruturação eficazes, eliminassem largamente as capacidades excessivas e demonstrassem que as empresas destinatárias dos auxílios tinham aumentado a sua viabilidade comercial. Por forma a assegurar uma concorrência livre e equitativa no mercado do aço da UE, mesmo após o alargamento, os novos Estados-Membros têm a obrigação, nos termos dos tratados de adesão, de respeitar o acervo comunitário (ou seja, directivas e decisões-quadro nos domínios da concorrência e dos auxílios estatais, fiscalidade, ambiente, política social, etc.). A Comissão Europeia deve vigiar de forma rigorosa que os apoios estatais concedidos pelos governos nacionais dos países da Europa Central e Oriental não violam o rigoroso regime de auxílios comunitários acordado e que as capacidades ineficazes, tendo em conta o verdadeiro nível da procura, são realmente eliminadas como previsto.

4.   O actual regime de auxílios estatais da UE para o sector siderúrgico – Um modelo para os acordos internacionais em matéria de auxílios?

4.1

As consequências nos Estados Unidos da difícil situação do mercado mundial do aço levaram a Administração norte-americana a introduzir, em Março de 2002, direitos aduaneiros temporários ao abrigo do artigo 201.o do direito comercial americano com o intuito de proteger o mercado do aço nacional, violando deste modo as regras da OMC. Perante o contexto de uma extrema volatilidade do comércio do aço devido à existência ao nível mundial de capacidades de produção ineficazes e excedentárias, a Administração Bush anunciou ao mesmo tempo que estava disposta a apoiar a abertura de negociações internacionais sobre a eliminação das capacidades ineficazes e a restrição ao nível mundial dos auxílios estatais na indústria siderúrgica.

4.2

Os Estados-Membros da UE e a Comissão Europeia apoiam qualquer iniciativa com o objectivo de estabelecer uma maior disciplina ao nível mundial no que concerne a concessão de auxílios no sector do aço. A abertura de negociações multilaterais sob a égide da OCDE em Paris, em Dezembro de 2002, constituiu uma oportunidade para a UE de propor o seu regime de auxílios para a indústria siderúrgica, o qual já deu provas da sua eficácia, como base de um acordo internacional sobre as subvenções ao sector siderúrgico.

4.3

O Comité Económico e Social Europeu apoia a acção da Comissão Europeia, não obstante o facto de a indústria siderúrgica comunitária parecer duvidar fortemente da determinação dos outros países e regiões quanto à eliminação dos auxílios à siderurgia e, logicamente, quanto à possibilidade de ratificarem um acordo eficaz nesta matéria, prevendo obrigações de notificação e sanções. Ademais, é causa de preocupação para o Comité o facto de a questão dos auxílios e das capacidades não estar a ser examinada em simultâneo com a questão dos mecanismos de defesa comercial, utilizados frequentemente sem justificação, o que resulta em distorções da concorrência.

4.4

Os produtores de aço comunitários vão mais longe do que a maioria dos representantes nacionais na OCDE quanto ao âmbito de aplicação de um eventual acordo em matéria de auxílios. Nas negociações na OCDE, os produtores de aço da UE requerem em uníssono a proibição ao abrigo do acordo de todos os auxílios estatais que contribuam para um aumento de capacidades ou para a manutenção de capacidades não rentáveis. Esta exigência não diz, portanto, respeito unicamente aos auxílios específicos atribuídos a determinadas empresas siderúrgicas, mas abrange igualmente os auxílios não-específicos, ditos genéricos.

4.5

O Comité Económico e Social Europeu partilha da opinião dos produtores europeus de aço de que os auxílios estatais só devem ser permitidos caso não tenham qualquer impacto negativo no desenvolvimento de capacidades no sector siderúrgico, na concorrência leal e no fluxo comercial. Sendo este o caso, eis as derrogações que o Comité preconiza sejam debatidas no âmbito da OCDE:

ajuda aos encerramentos definitivos: inclui auxílios ao desmantelamento, recuperação dos terrenos e atenuação do impacto social dos encerramentos;

ajuda limitada e claramente definida à investigação e ao desenvolvimento, bem como para protecção do ambiente, incluindo o desagravamento da energia e das ecotaxas. No que concerne o auxílio à protecção ambiental, deve ficar claro que não é autorizado um apoio financeiro do Estado para cumprimento de normas ambientais obrigatórias. Aliás, tal não é sequer exigido pela indústria siderúrgica. Contudo, pode-se conceder uma ajuda limitada a investimentos voluntários, por forma a incentivar as empresas a irem além do cumprimento dos requisitos ambientais mínimos da UE nas suas actividades comerciais.

4.6

No âmbito do acordo sobre as subvenções, há que considerar igualmente pelo menos que algumas economias em desenvolvimento já têm uma indústria siderúrgica plenamente competitiva. Os produtores de aço de países em desenvolvimento ou emergentes beneficiam de vantagens competitivas como o baixo custo da mão-de-obra, acesso às matérias-primas, normas ambientais menos rigorosas e a protecção de direitos de importação elevados. Assim, os auxílios estatais às empresas siderúrgicas nestas economias só podem ser considerados caso preencham as seguintes condições:

o auxílio estatal é autorizado caso a caso, consoante a situação da empresa e do país e a utilização do financiamento tem de ser acompanhada à luz dos respectivos objectivos;

o auxílio estatal está sujeito a prazos de termo de vigência rigorosos;

o auxílio é aplicado no contexto de um plano de reestruturação aprovado que assegure a viabilidade a longo prazo das empresas envolvidas;

em circunstâncias normais, o auxílio resultará numa redução das capacidades e não leva, em circunstância alguma, a um aumento destas.

5.   Conclusões

5.1

A experiência do passado com a reestruturação da indústria siderúrgica europeia revela que os auxílios estatais são uma faca de dois gumes. Se forem atribuídos enquanto auxílios ao funcionamento beneficiam apenas determinadas empresas e conduzem a uma atribuição deficiente dos recursos, já que são mantidas a médio prazo no mercado capacidades não-rentáveis. Contudo, se os auxílios estatais forem atribuídos no âmbito de uma programa de reestruturação previamente negociado, podem atenuar as dificuldades sociais e as consequências da mutação industrial, promovendo assim a sua aceitação. A gestão deste processo através do diálogo social já deu bons resultados.

5.2

Paira igualmente a questão de saber se não se poderia ter feito melhor uso das avultadas somas de recursos financeiros provenientes do contribuinte, nomeadamente no domínio da formação ou da investigação.

5.3

Outro problema que surgiu durante os anos de crise na indústria siderúrgica foi que, apesar de existir uma base jurídica (artigo 4.o, alínea c) do Tratado CECA) aparentemente clara em relação aos auxílios de Estado (proibição de todos os auxílios estatais), os vários códigos dos auxílios, as decisões em Conselho de Ministros e os acórdãos do Tribunal diluíram esta primeira linha de acção enveredada tornando-a imprevisível. As empresas siderúrgicas sofreram com a incerteza do planeamento e do calendário e de execução.

5.4

No contexto da adesão de dez ou mesmo doze novos Estados-Membros, torna-se ainda mais premente insistir na aplicação rigorosa das regras claras em matéria de auxílios à indústria siderúrgica, sancionando-se de imediato qualquer infracção, à semelhança do ocorrido com a USS Kosice.

5.5

Os erros cometidos durante a época da UE dos quinze não podem ser repetidos.

5.6

As negociações, entretanto interrompidas, no âmbito da OCDE só fazem sentido se conduzirem a uma melhoria duradoura da presente situação, ou seja:

ausência de concessões excessivas a países em vias de desenvolvimento, emergentes ou de transição, como a China,

ausência de proibições de regulamentação necessária no âmbito da UE nos domínios da investigação e do desenvolvimento, da política ambiental (por exemplo, limites para os custos de adaptação de empresas para prevenção de distorções da concorrência no caso de medidas a favor do ambiente) e do encerramento de capacidades inviáveis, assim como

inexistência de direitos de compensação para as exportações de aço devido a tais derrogações.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2004) 274 final: esta comunicação é actualmente objecto de parecer no âmbito do dossiê CCMI/017 (relator: Joost Van IERSEL) e do parecer de iniciativa CCMI/014 sobre a deslocalização de empresas (relator: Jose Ignacio RODRIGUEZ GARCIA-CARO).

(2)  A última derrogação à proibição geral dos auxílios estatais registou-se no âmbito de subvenções ao investimento regional para os produtores de aço gregos que chegou ao seu termo em 2000.

(3)  Ao lado destes auxílios subsistem ainda ajudas regionais ao investimento em Portugal, na Grécia e no território da ex-RDA.


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/47


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A segurança sanitária: uma obrigação colectiva, um direito novo»

(2005/C 120/10)

Processo

Em 28 de Janeiro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre «A segurança sanitária: uma obrigação colectiva, um direito novo».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos do Comité, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 22 de Setembro de 2004, sendo relator A. BEDOSSA.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 164 votos a favor, 3 votos contra e 7 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

Para os cidadãos europeus, a segurança sanitária, que constitui um dos vectores elementares da saúde pública, implica por parte das autoridades competentes o reforço da obrigação colectiva (mesmo quando por vezes se tratar de bioterrorismo) e, consequentemente, o exercício pelos cidadãos do seu direito novo a serem informados de modo transparente sobre as decisões destas autoridades tutelares.

1.2

Segurança e sistema de cuidados de saúde: dois termos habitualmente associados entre si, mas que apenas o estão de modo invisível, ao passo que o conceito de saúde pública é ainda vítima de pressões sociológicas e de hábitos médicos em função de diagnósticos e de terapêuticas individuais.

1.3

Numa altura em que as crises surgidas na Europa demonstram de modo claro que o risco sanitário já não é apenas uma questão de ordem médica mas irrompeu no campo social, económico e político, definir uma estratégia de saúde sanitária passou a ser responsabilidade de todos, em particular dos responsáveis políticos: doravante, os cidadãos devem ter a certeza de dispor destas garantias.

1.4

A segurança sanitária não parte do nada, antes, enriquece e completa os domínios tradicionais da saúde pública, designadamente a epidemiologia, baseia-se na reflexão e nos sistemas de controlo desenvolvidos em torno dos medicamentos, impõe-se à medida que se descobrem os efeitos iatrogénicos de todas as práticas médicas.

1.5

A abordagem em matéria de segurança sanitária não é diferente da abordagem médica. Evolui por etapas, numa sequência de escolhas de probabilidades em dado momento, ditadas pela avaliação da relação benefício-custo e dos possíveis riscos. A qualidade da segurança sanitária reflecte a qualidade do sistema de cuidados de saúde.

1.6

A segurança sanitária baseia-se numa abordagem de tipo médico e necessita também urgentemente de uma metodologia que constitua uma verdadeira promessa de actuação pública. O âmbito da segurança sanitária é, sem dúvida, muito mais vasto, pois acompanha as constantes inovações médicas.

1.7

O conceito de segurança sanitária é necessariamente evolutivo; perante as ameaças latentes de bioterrorismo, por exemplo, não pode satisfazer–se com receitas estáticas: há que encontrar o equilíbrio entre a busca de uma segurança absoluta inatingível e a negligência ou a inacção positiva. A eficácia crescente do sistema de saúde carece inexoravelmente de segurança sanitária, embora não se deva esquecer de cotejar esta necessidade com a situação dos países mais pobres, para os quais o único problema actualmente reside em conseguir, antes de mais, as bases de um sistema de saúde pública.

1.8

Na União Europeia, mais rica e mais inclinada aos mecanismos de mutualização dos riscos, o passo a dar agora é a institucionalização da segurança sanitária. Para debater as decisões no âmbito da segurança sanitária e, sobretudo, divulgá-las é necessário utilizar todos os meios disponíveis, dando aos cidadãos da União Europeia outras alternativas que não o pânico ou a dissimulação; só assim é que a União Europeia se tornará numa democracia adulta em matéria de saúde pública.

2.   Historial da abordagem da União Europeia

2.1

Anteriormente ao Tratado de Maastricht de 7 de Fevereiro de 1992 sobre a União Europeia, os textos comunitários apenas faziam referências periféricas às políticas de saúde. O Tratado de 25 de Março de 1957 que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica (Euratom) continha disposições específicas sobre a protecção sanitária da população contra os perigos das radiações ionizantes.

2.2

Em contrapartida, o Tratado de Roma de 25 de Março de 1957 apenas se refere à «protecção da saúde» no seu artigo 36.o, que previa:

2.2.1

«As disposições dos artigos 30.o a 34.o, inclusive, são aplicáveis sem prejuízo das proibições ou restrições à importação, exportação ou trânsito justificadas por razões de moralidade pública, ordem pública e segurança pública; de protecção da saúde e da vida das pessoas e animais ou de preservação das plantas; de protecção do património nacional de valor artístico, histórico ou arqueológico; ou de protecção da propriedade industrial e comercial. Todavia, tais proibições ou restrições não devem constituir nem um meio de discriminação arbitrária nem qualquer restrição dissimulada ao comércio entre os Estados-Membros».

2.3

A introdução de um artigo 118.o-A no Acto Único Europeu, em 1986, alargava as competências comunitárias permitindo à Comissão Europeia apresentar propostas em matéria de saúde, tendo por base um «elevado nível de protecção».

2.4

Uma outra referência indirecta à protecção da saúde encontra-se no artigo 130.o-R do Tratado de Roma, aditado pelo Acto Único Europeu, que estipulava que a política da Comunidade no domínio do ambiente tinha designadamente por objectivo «contribuir para a protecção da saúde das pessoas».

2.5

O Tratado da União Europeia modificou profundamente as perspectivas da construção europeia no domínio da saúde, uma vez que introduziu um Título X intitulado «Saúde Pública», em virtude do qual «A Comunidade contribuirá para assegurar um elevado nível de protecção da saúde humana». O número 4 do artigo 129.o prevê que o Conselho pode adoptar, para realização dos objectivos, acções de incentivo, previstas no artigo 189.o-B, ou recomendações.

2.6

Do mesmo modo, o conceito de protecção da saúde surge em outros artigos do Tratado da União Europeia, uma vez que o artigo 129.o-A, relativo à defesa dos consumidores, refere designadamente a protecção da saúde e da segurança dos consumidores.

2.7

Um quadro jurídico preciso permitirá às instituições europeias desenvolverem todas as suas actividades no domínio da saúde pública, quadro esse que seria melhorado no artigo 179.o do projecto de Tratado Constitucional Europeu:

«1.

Na definição e execução de todas as políticas e acções da União é assegurado um elevado nível de protecção da saúde.

2.

A acção da União, que é complementar das políticas nacionais, incide na melhoria da saúde pública e na prevenção das doenças e afecções humanas e das causas de perigo para a saúde física e mental. Esta acção abrangerá a luta contra os grandes flagelos, fomentando a investigação sobre as respectivas causas, formas de transmissão e prevenção, bem como a informação e a educação sanitária ...».

2.8

As novas estruturas criadas (Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos, etc.) podem ter uma incidência tanto mais importante quanto as instituições europeias estão empenhadas numa política de crescente cooperação com os países terceiros e com as grandes organizações internacionais – em particular, a cooperação com a Organização Mundial de Saúde, o Conselho da Europa, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico, a Agência Internacional da Energia Atómica para a protecção contra radiações, o Secretariado das Nações Unidas para o Controlo dos Estupefacientes e a Prevenção da Criminalidade –, que deve ser prosseguida e reforçada.

3.   Princípios da segurança sanitária

3.1   Decisão sanitária

3.1.1

É num universo de incertezas que são tomadas as decisões médicas: incertezas quanto às patologias, aos efeitos dos tratamentos e respectivos riscos; informações médicas sobre os pacientes incorrectas, má escolha dos exames complementares e dos equipamentos sanitários, imprecisões do interrogatório médico dominado pela emoção ou preocupação, lacunas do exame médico, por natureza, aproximativo.

3.1.2

Todo o acto médico é, muitas vezes, o resultado de uma série de decisões de probabilidade, tomadas em situação de incerteza: quanto mais escolhas ou decisões forem necessárias para o diagnóstico ou o tratamento, mais aumenta o risco ou até a probabilidade de erro, sem que tal implique necessariamente uma falta indesculpável.

3.1.3

Cada decisão ou acto médico contém uma certa dose de imponderável, um imprevisto incontrolável no actual estado dos conhecimentos científicos, um risco estatístico inevitável, que faz parte integrante da ciência médica.

3.1.4

Na origem da insegurança sanitária estão causas humanas – o erro ou a negligência do médico – e causas factuais – os riscos conhecidos mas estatisticamente inevitáveis no actual estado dos conhecimentos científicos e os riscos desconhecidos, sempre possíveis.

3.1.5

Não é possível falar de segurança sanitária sem recordar estas características essenciais da decisão médica. Quando está em jogo a saúde ou a vida, é muitas vezes difícil concordar em pedir apenas o possível. Todavia, não há actividade médica sem riscos, porque não existe vida sem riscos.

3.2.   A relação benefícios-riscos

3.2.1

As mesmas observações valem tanto para as decisões em matéria de segurança sanitária como para as decisões médicas; a inacção, tal como a acção, implica uma decisão e pode ser indesculpável.

3.2.2

Trata-se de ponderar o risco terapêutico e os riscos de evolução espontânea. A recusa irracional de que existe risco em questões de saúde é tão irresponsável quanto a negligência.

3.2.3

A cultura da relação benefícios-riscos está muito longe das preocupações de uma sociedade europeia que conseguiu reduzir consideravelmente os riscos naturais.

3.2.4

Para avaliar a segurança sanitária de um acto ou de um produto, há que o situar numa escala de risco que permita identificar o risco menor e não o risco nulo. Nesta relação benefícios-riscos, devem-se ter em conta cinco critérios:

grau

realidade

frequência

duração

necessidade.

3.2.5

Assim, compete aos poderes públicos, expostos às pressões convergentes ou contraditórias da opinião pública e dos produtores de cuidados médicos, decidir, em situação de incerteza, entre adoptar a hipótese mais pessimista e, consequentemente, a mais conservadora em termos de saúde pública, ou optar pela estimativa mais plausível.

3.2.6

Além disso, as decisões sanitárias têm, por vezes, de ser tomadas em situação de crise. As autoridades confrontam–se, então, simultaneamente, com um turbilhão de problemas, os disfuncionamentos de certos sistemas e profundas divergências sobre as decisões a tomar.

3.2.7

Para não ceder à improvisação, face à urgência da situação, deve ser possível contar com processos de avaliação, controlo e intervenção previamente definidos e testados, pelo que se impõe uma reflexão sobre as crises anteriores e sobre a metodologia a adoptar em matéria de segurança sanitária.

3.2.8

Sejam quais forem as garantias científicas e médicas, a avaliação da relação benefícios/custos inclui muitas vezes, em última análise, uma certa convicção íntima.

4.   Factores médicos da segurança sanitária

São cinco os factores essenciais para definir a segurança sanitária.

4.1   Vigilância sanitária

4.1.1

Tal como a vigilância epidemiológica é componente fundamental da protecção da saúde pública, a vigilância sanitária específica deve ser assegurada através de um centro europeu (ver ponto 6.3).

4.1.2

A missão desta vigilância consiste em detectar os acidentes médicos e as patologias iatrogénicas, identificar os efeitos imprevistos ou indesejáveis relacionados com a utilização de protocolos terapêuticos, efectuar controlos e analisar as conclusões, avaliar a eficácia dos sistemas de intervenção sanitária, todas elas actividades essenciais para a segurança sanitária que dependem desta vigilância.

4.1.3

Esta função de vigilância tem evoluído no plano internacional, uma vez que se introduziram mecanismos de intercâmbio de informações e de alerta mútuo sob o patrocínio da OMS e da União Europeia.

4.1.4

Textos multilaterais regem cooperações a todos os níveis, em todas as especialidades e em todos os continentes, o que permite tomar rapidamente as medidas sanitárias destinadas a garantir a máxima segurança sanitária.

4.2.   Escolha das estratégias terapêuticas

4.2.1

A qualidade e a segurança da escolha da estratégia terapêutica dependem, prioritariamente, do estado de desenvolvimento da ciência e, por conseguinte, do grau de actualização dos conhecimentos do médico.

O primeiro factor para a melhoria destes conhecimentos passa, sem dúvida, pela investigação médica e farmacêutica e pelos progressos terapêuticos ou de diagnóstico que dela resultam.

A formação médica de base constitui o segundo factor-chave da segurança sanitária em matéria de escolha das estratégias e adaptada aos progressos da ciência e à organização do sistema de saúde.

Terceira vertente, a formação médica permanente: a assimilação dos dados mais recentes constitui, como em todos os sectores de risco e de alta tecnologia, um dos factores determinantes da segurança.

O último factor que contribui para a segurança das escolhas terapêuticas é a avaliação médica, que se tornou no elo de ligação entre a investigação, a formação e a prática diária dos profissionais da saúde.

Pode-se definir a avaliação médica como o conjunto dos processos de controlo da qualidade do sistema de cuidados médicos.

A avaliação das técnicas e das estratégias de diagnóstico e terapêuticas consiste em garantir a avaliação dos instrumentos à disposição dos profissionais da saúde: tecnologias médicas, métodos de diagnóstico, medicamentos, conjunto de procedimentos e serviços.

A avaliação da qualidade, e, por conseguinte da qualidade dos cuidados de saúde, é definida retomando os termos da OMS do seguinte modo:

«Processo que permite assegurar a cada paciente o conjunto de actos diagnósticos e terapêuticos que lhe garantirão o melhor resultado do ponto de vista da saúde em função do estado actual de desenvolvimento da ciência, ao melhor custo para resultado idêntico, com o menor risco iatrogénico e para sua maior satisfação quanto a procedimentos, resultados e contactos humanos no sistema de saúde.».

A avaliação deverá, por último, definir os termos de referência, ou seja, elaborar recomendações com base num consenso mais ou menos alargado obtido em colégio de médicos ou de sociedades/associações de sábios, as chamadas «conferências de consenso», a fim de se estabelecerem orientações.

4.3   Administração dos cuidados de saúde e realização dos actos médicos

4.3.1

O cumprimento das obrigações é controlado por todas as autoridades; existe abundante e constante jurisprudência que estabelece as obrigações dos profissionais da saúde e define o conceito de cuidados conscienciosos, escrupulosos e conformes aos conhecimentos científicos actuais.

4.3.2

A realização dos actos médicos depende dos regimes de segurança sanitária, muito variáveis consoante a natureza dos actos e a existência de riscos «naturais».

4.3.3

A comparação das dificuldades inerentes à realização dos actos, ou seja, com excepção dos riscos estatisticamente evitáveis, mesmo que marginais, permite por si só definir as condições de segurança sanitária a respeitar. Trata–se de algo semelhante a uma relação benefícios/riscos, que permite fixar o nível normal de segurança sanitária aceite e desejado.

4.4   Organização e funcionamento das estruturas de cuidados de saúde

A qualidade da organização e do funcionamento do sistema de cuidados de saúde condiciona em grande medida a segurança sanitária.

Na verdade, a segurança sanitária impõe uma obrigação de meios a todos os estabelecimentos públicos ou privados, meios previstos por lei e submetidos a autorizações específicas. O sistema de saúde deve estar em condições de dar resposta às necessidades das populações e de assumir a cobertura sanitária nas melhores condições de segurança.

4.5   Recurso aos bens de saúde

4.5.1

Os produtos e bens de saúde utilizados na prevenção, diagnóstico ou tratamento estão sujeitos a regimes jurídicos rigorosos e a regulamentações por temas:

medicamentos

dispositivos médicos utilizados em medicina

produtos de origem humana

reagentes de laboratório

base jurídica para a utilização de produtos e partes do corpo humano com fins terapêuticos.

4.5.2

As regras de segurança sanitária aplicáveis a estes produtos e bens constituem um verdadeiro mecanismo de segurança.

5.   Propostas – recomendações do CESE

5.1   Factores administrativos da segurança sanitária

5.1.1

Nos Estados-Membros da União Europeia, a saúde pública ainda não tem em conta os princípios da segurança sanitária.

5.1.2

A segurança sanitária não é o resultado de uma equação nem a aplicação de receitas, assenta, antes, no espírito de precaução e de contradição.

5.1.3

Requer sensibilização e articulação transfronteiras. Deve-se pôr de lado a ilusão de uma linha Maginot que impedisse, com facilidade, o avanço da próxima epidemia. Os riscos sanitários são proteiformes, infinitamente variados e, na generalidade, inesperados. Os comportamentos face à doença evoluem, os vírus sofrem mutações, os agentes infecciosos renovam-se ou dissimulam-se.

5.2   Competências claramente reconhecidas

5.2.1

Na ausência de instrumentos jurídicos específicos em matéria de protecção da saúde pública, tornou-se, por vezes, hábito em alguns Estados-Membros da União Europeia recorrer a outras vias dúbias ou incertas – designadamente o recurso abusivo à regulamentação da segurança social – por, desde logo, se confundirem num mesmo debate os desafios sanitários e económicos: se é legítimo avaliar o custo da saúde e procurar uma utilização o mais racional possível dos recursos disponíveis, torna-se todavia perigoso misturar as duas problemáticas.

5.2.2

Uma coisa é avaliar a eficácia, a qualidade e a inocuidade de um produto ou de uma terapêutica, outra é decidir o seu reembolso através da segurança social. As dificuldades das decisões em matéria de saúde pública são exacerbadas devido à concorrência entre vários poderes.

5.2.3

Definir as competências é definir as responsabilidades e, logo, identificar quem exerce a autoridade sanitária e quem carrega o fardo moral, administrativo e/ou judiciário. A responsabilidade só pode ser plenamente assumida se os textos, com as suas lacunas ou ambiguidades, não favorecerem os conflitos e as intervenções susceptíveis de desvirtuarem as opções feitas.

5.3   Uma administração sanitária reconhecida

5.3.1

Ao nível europeu, a administração sanitária em saúde pública é insuficiente e o seu suporte legal fraco. Falta–lhe também legitimidade médica devido à escassez de recursos. Todos estes aspectos devem ser melhorados.

5.3.2

A acção pública só pode ser eficaz se dispuser de efectiva legitimidade, e a administração da saúde só poderá exercer plenamente a sua missão de segurança sanitária se estiver investida de dupla legitimidade: ser reconhecida pelas autoridades de tutela de cada um dos países da União Europeia e, evidentemente, pela opinião pública, ou seja, pelos consumidores.

5.3.3

A credibilidade científica e técnico–clínica pressupõe reforço dos recursos, recrutamento de pessoal técnico de alto nível, mas igualmente a cooperação entre todas as instituições europeias e nacionais.

5.3.4

Identificam-se cinco funções fundamentais: recomendação, vigilância, controlo, peritagem e avaliação.

5.3.5

A realização da rede europeia de saúde pública atesta a vontade todos os poderes públicos europeus de associar os actores da saúde pública e de dar coerência e nova eficácia aos instrumentos de vigilância sanitária existentes em cada Estado-Membro.

5.4   Necessidade de uma peritagem externa à administração

5.4.1

Qualquer que seja a excelência técnica e científica dos serviços de segurança sanitária, o tradicional e respeitado princípio do contraditório deverá imperativamente ter lugar no exercício das missões de segurança sanitária.

5.4.2

O recurso a peritos independentes dá resposta à preocupação de as autoridades europeias poderem dispor dos mais eminentes especialistas, o que permitirá, através do diálogo, aperfeiçoar e completar a informação em fase anterior à tomada de decisões.

5.4.3

Nos domínios mais sensíveis ou mais prementes, parece ser mesmo indispensável alargar a peritagem externa a individualidades estrangeiras mundialmente reconhecidas. Esta abertura internacional pode permitir obter um consenso em todos os países implicados, evitando-se deste modo desfasamentos temporais que a todos prejudicam (doentes e intervenientes de todo o tipo).

5.4.4

Esta abertura poderá ultrapassar as especificidades inerentes aos hábitos culturais na administração dos cuidados médicos e às modalidades de formação dos profissionais de saúde dos diferentes países.

5.5   Separação das funções de perito, decisor e gestor

5.5.1

O poder no domínio da política sanitária, que é, com efeito, da competência do decisor (autorizar ou não, proibir ou não) só pode ser legitimamente exercido se tiver em conta o conjunto das informações relativas ao problema de saúde pública em questão.

5.5.2

Trata-se, sempre, de avaliar a relação benefícios/riscos. A avaliação não pode ser exclusivamente científica nem deve ser imposta pelo gestor ou por um actor com interesses materiais ou intelectuais na sua divulgação.

5.5.3

A clarificação dos papéis de perito e de decisor tem como corolário garantir a transparência das relações entre peritos e gestores. Deve ser declarada e respeitada uma ética rigorosa para a peritagem. Tal nem sempre é evidente, sobretudo quando o problema é muito sensível, em que os peritos são escassos e estabeleceram, muitas vezes, relações com as instituições ou as empresas implicadas.

5.5.4

A transparência que deve caracterizar as decisões neste domínio exige que os peritos apresentem às autoridades sanitárias uma declaração sobre as possíveis relações com os organismos, empresas ou pessoas implicadas nas peritagens.

5.5.5

A Comunidade Europeia começou a definir tais procedimentos: a generalização dos procedimentos transparentes desejada pelos próprios peritos permite uma maior objectividade das peritagens.

5.6   Transparência dos processos de decisão

5.6.1

Existem perigos sanitários novos que, como a inovação em geral, questionam e põem em causa certezas e hábitos.

5.6.2

A atitude intelectual deve ser a mesma, «escutar o silêncio».

5.6.3

Seja qual for a qualidade do sistema de vigilância em vigor, não se deve ignorar a possibilidade de uma cegueira colectiva.

5.6.4

O debate público é uma necessidade. Os pacientes e os médicos exteriores ao círculo de peritos devem poder fazer–se ouvir, ventilar as questões que os inquietam, dar o alerta.

5.6.5

O debate deve ser organizado para não alarmar inutilmente.

5.6.6

Este «pluralismo sanitário», indispensável para aumentar as possibilidades de evitar novas tragédias, pressupõe a evolução dos processos de decisão no sentido de uma maior transparência. Sem prejuízo da protecção do sigilo médico ou do segredo industrial, os resultados das peritagens bem como as justificações das decisões sanitárias devem ser do domínio público.

5.7   Um código de conduta para a comunicação em matéria de segurança sanitária

5.7.1

Apesar da sua vulgarização, a comunicação no domínio da saúde pública apresenta características fundamentais que são ainda mais notórias no vector da segurança sanitária.

5.7.2

A comunicação sobre estas matérias é, muitas vezes, uma comunicação sobre doença ou morte. Transparência e comedimento devem ser os elementos que presidem à organização desta função sensível do sistema de saúde.

5.7.3

A transparência é essencial para garantir a confiança e evitar a preocupação que é suscitada pelo divulgar de uma informação que pode parecer sensacionalista devido à impressão de segredo que a rodeava.

5.7.4

A ela estão obrigadas as autoridades e as instituições sanitárias, tal como o médico é obrigado a informar o paciente. Em matéria de riscos para a saúde do cidadão, impõe-se o «dever da verdade».

5.7.5

Todavia, esta obrigação moral é acompanhada de um dever de comedimento. Muitas vezes divulgada na urgência, a informação deve ser compreensível e científica e evitar o risco de cacofonia, sensacionalismo e alarmismo. Pressupõe regras de trabalho comuns para os meios de comunicação social, os profissionais de saúde, as associações de pacientes e os poderes públicos. O pânico ou a dissimulação não são alternativas.

5.8   Comunicação de rotina

5.8.1

Em matéria de saúde, a informação é sempre susceptível de ser entendida pelos pacientes com particular intensidade.

5.8.2

Há uma distinção de fundo entre a informação destinada aos médicos e a informação destinada ao público.

5.8.3

A primeira beneficia do acervo científico da população a que se destina, que dispõe dos seus próprios canais: cursos, conferências, congressos, órgãos profissionais e associações industriais.

5.8.4

Em contrapartida, a comunicação destinada ao público em geral não pode pressupor, sem correr o risco de não ser entendida ou de provocar o pânico, que a população possui os conhecimentos médicos necessários para avaliar o alcance da informação divulgada. Deve procurar um equilíbrio entre, por um lado, a necessidade de informar sobre as terapêuticas novas ou tradicionais e, por outro, os riscos de uma má interpretação destas informações.

5.8.5

A informação divulgada pode provocar pânico inútil ou exagerado na população ou, pelo contrário, alimentar esperanças de tratamento infundadas. A informação é parte da educação sanitária da população, que contribui de modo directo para a eficácia das políticas de higiene, prevenção dos riscos e responsabilização precoce do sistema de saúde.

5.9   Comunicação de crise

5.9.1

Em caso de urgência sanitária ou de sérios riscos para a saúde pública, a comunicação vê-se confrontada com uma necessidade tripla:

em primeiro lugar, a informação fornecida deve ser proporcional ao risco sanitário;

a segunda preocupação prende-se com o facto de que a informação não se destina apenas a aumentar a consciencialização do público, mas também a levar a alterações de comportamento. Assim, a informação deve atingir o seu objectivo, ou seja, prevenir ou limitar o acidente sem, por um lado, provocar alarme desnecessariamente e, por outro, garantir o direito dos cidadãos a saberem o que se passa e a obrigação ética da imprensa de evitar uma comunicação alarmista e sensacionalista;

por último, a informação final deve ser fornecida tendo em conta os públicos a que se destina e a ordem em que devem ser informados.

5.9.2

Em todo o caso, o papel da imprensa é determinante para o sucesso de uma comunicação de crise. Os meios de comunicação social devem, por vezes, aceitar o facto de não poderem divulgar a informação ao público antes de os profissionais de saúde terem sido amplamente informados. É, por conseguinte, necessário formar jornalistas especializados, que sejam capazes de compreender as questões de segurança sanitária e de as comunicar de modo correcto.

5.9.3

Trata-se de um exercício difícil, pois a quantificação dos efeitos indesejáveis e a determinação da sua origem, o efeito dos meios de comunicação social na taxa de notificação, a avaliação geral do risco, por exemplo, implicam análises difíceis e complexas, quando é certo que a opinião pública espera ser informada imediatamente numa linguagem simples e emocional.

6.   Conclusão

6.1.

Consciente das sucessivas crises que sacudiram o mundo nas duas últimas décadas, (a explosão da SIDA, as catástrofes do sangue contaminado, a crise de saúde pública devida à síndrome respiratória aguda, a doença do legionário, a ameaça de bioterrorismo através do carbúnculo), o Comité Económico e Social Europeu propõe a realização periódica de congressos europeus de alto nível em matéria de saúde pública.

6.2.

Estas conferências têm por objectivo debater medidas colectivas a tomar, fornecer informações precisas sobre as crises, dar respostas coordenadas, avaliar as ameaças de riscos externos, contribuir para diagnósticos rápidos e encontrar as respostas adequadas.

6.3.

O CESE preconiza que seja conferido, desde já, ao futuro Centro Europeu de Vigilância Sanitária de Estocolmo um mandato alargado e reforçado para elaborar relatórios relevantes e permanentes em matéria de saúde pública e obrigar os países da União Europeia a tomarem as medidas necessárias em conformidade como princípio de subsidiariedade.

6.4.

O Comité Económico e Social Europeu considera ser o local privilegiado de sensibilização e alerta da sociedade civil europeia.

6.5.

Apela a que todos os implicados adoptem uma atitude activa em matéria de saúde pública: a visão global das crises de saúde pública deverá permitir o intercâmbio de todas as experiências numa época de globalização das crises sanitárias.

6.6.

Entende que se deve promover uma grande política de informação à escala europeia, mediante a formação específica de todos os actores e de todos os órgãos de comunicação social com especiais responsabilidades nesta matéria.

6.7.

Recorda que as suas recomendações estão interligadas e que, para serem aplicadas, requerem uma vontade forte por parte dos países da União Europeia, a saber:

reforço das capacidades administrativas com articulações transfronteiras e gestão universalmente reconhecida e aceite;

competências e instrumentos jurídicos de apoio;

processos de decisão transparentes e uma deontologia mais rigorosa e compartilhada por todos no que toca às comunicações em matéria de segurança sanitária;

cooperação reforçada e ligação em rede entre todos os organismos de vigilância e de fiscalização (União Europeia, Organização Mundial de Saúde, Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico, Conselho da Europa e grandes organizações nacionais, tais como o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças em Atlanta, nos Estados Unidos).

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004

A Presidente do

Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/54


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão — Acompanhamento do processo de reflexão de alto nível sobre a mobilidade dos doentes e a evolução dos cuidados de saúde na União Europeia»

[COM(2004) 301 final]

(2005/C 120/11)

Procedimento

Em 20 de Abril de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 22 de Setembro de 2004, tendo sido relator A. BEDOSSA.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 170 votos a favor, 3 votos contra e 6 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

Os sistemas e políticas de saúde dos Estados-Membros estão cada vez mais interligados. Por outro lado, os responsáveis políticos nacionais, antes de tomarem decisões, efectuam, de modo insuficiente, uma análise comparativa dos sistemas em vigor, sejam europeus ou não, e quando o fazem é de modo informal.

1.1

Várias razões explicam esta evolução, as quais estão estreitamente relacionadas:

antes de mais, a população europeia (e não só) mostra-se cada vez mais exigente no que toca a este sector;

o recente alargamento da União Europeia obrigará os novos Estados-Membros a garantir aos seus cidadãos um sistema cada vez mais moderno;

as importantes inovações tecnológicas conduzem a novas práticas e atitudes clínicas que permitem prestar serviços de saúde com uma qualidade crescente;

os novos meios de informação à disposição dos cidadãos da União Europeia permitem-lhes comparar, de forma quase imediata, os diagnósticos e os cuidados de saúde praticados nos vários Estados-Membros, o que pode trazer, por motivos compreensíveis e justificados, uma maior exigência quanto aos meios para alcançar os melhores resultados.

1.2

O exposto suscitará necessariamente problemas em matéria de política de saúde no que toca à qualidade e acessibilidade dos cuidados transfronteiriços e às exigências de informação dos doentes, dos profissionais de saúde e dos responsáveis políticos.

1.3

Neste contexto, urge avaliar desde já as políticas nacionais, as quais devem ter em conta estas exigências à luz das normas europeias que se vão acumulando ao longo do tempo e conferem novos direitos aos cidadãos europeus.

1.4

Esta nova situação orienta o debate entre dois campos: os que afirmam que os novos direitos conferidos aos doentes provocarão a instabilidade dos sistemas de saúde actuais, alegando que a limitação da mobilidade dos doentes permite um controlo mais fácil daqueles em matéria de custos e prioridades, enquanto outros, pelo contrário, defendem a mobilidade dos doentes, porque permite a interoperabilidade dos sistemas, a utilização dos mesmos indicadores, o intercâmbio de boas práticas e uma congregação mais racional dos recursos. O objectivo que se impõe é, claramente, desenvolver a segunda hipótese, tirando todas as consequências em matéria de harmonização dos sistemas nacionais.

2.   Contexto

2.1

No parecer de iniciativa de 16 de Julho de 2003 (1), o Comité Económico e Social Europeu definiu a saúde como «um bem superior nas nossas sociedades, tanto para os cidadãos e respectivas famílias, como para os Estados» e afirmou «pretender converter as questões relativas à saúde num domínio de intervenção, respeitando ao mesmo tempo o quadro político e jurídico comunitário existente».

2.2

No referido parecer, o Comité Económico e Social Europeu expõe os seus argumentos propondo possíveis métodos de trabalho e de análise que coincidem com as duas comunicações recentemente propostas pela Comissão Europeia, em 20 de Abril de 2004, ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões.

2.3

A presente comunicação justifica-se igualmente pela publicação recente, em 9 de Fevereiro último, da proposta de directiva relativa aos serviços no mercado interno, cujos textos relativos aos serviços sociais e de saúde, infelizmente, prestam-se a demasiadas interpretações, o que suscitou várias críticas negativas à directiva. Assim, estes pontos da directiva carecem de definições mais precisas, por forma que se possam ter em devida conta as especificidades destes serviços relacionadas com a segurança e a igualdade de tratamento dos cidadãos.

2.4

A publicação das duas comunicações em simultâneo deve-se também ao facto de o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias ter, desde o acórdão Kroll de 28 de Abril de 1998 ao acórdão Leichte de 18 de Março de 2004, criado jurisprudência que permite aos cidadãos da União Europeia receberem cuidados médicos num outro Estado-Membro. O Tribunal clarificou igualmente o regime de autorização do reembolso das despesas médicas efectuadas.

2.5

Desde 1 de Junho de 2004 que o cidadão europeu pode atestar este direito mediante a apresentação do cartão europeu de seguro de doença (2), que substitui o formulário E111.

2.6

A assimetria da situação da saúde nos Estados-Membros pode levar os seus cidadãos a procurar sistemas de saúde mais eficazes, provocando o bloqueio ou mesmo a paralisia dos centros europeus de referência, bem como um dumping dos instrumentos de segurança social, incapazes de responder às flutuações de doentes estrangeiros. Face ao exposto, é forçoso constatar que o novo Regulamento n.o 1408/71 pode contribuir para a criação de situações inéditas e difíceis.

2.7

Assim, o repto consiste em desenvolver uma política que permita orientar-se para objectivos mais positivos mesmo alterando as prerrogativas dos sistemas nacionais de saúde, quando absolutamente necessário.

2.8

A análise exaustiva do parecer de iniciativa do Comité Económico e Social Europeu de 16 de Julho de 2003 vai ao encontro do processo de reflexão de alto nível levado a cabo pela Comissão Europeia porquanto retoma e analisa o conteúdo das recomendações: cooperação europeia, informação dos doentes, dos profissionais de saúde e dos responsáveis políticos, prestação de cuidados de alta qualidade, compatibilidade entre as políticas nacionais de saúde e as obrigações europeias, etc.

3.   Observações na generalidade

3.1

A comunicação relativa à mobilidade dos doentes propõe um conjunto de medidas concretas em vários domínios e permite a integração do objectivo (definido pelo Tratado) de elevado nível de protecção da saúde humana nas políticas comunitárias.

3.2

A legislação comunitária confere aos cidadãos o direito de receberem tratamento médico noutros Estados-Membros e de serem reembolsados; o regime de autorização de reembolso é definido pela jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e pela proposta de directiva relativa aos serviços no mercado interno. Na prática, o exercício destes direitos continua a ser difícil.

3.3

Neste contexto, afigura-se necessário formular uma estratégia europeia que:

3.3.1

Favoreça uma cooperação europeia com vista a uma melhor utilização dos recursos;

Direitos e deveres dos doentes: a Comissão Europeia tomará medidas para aprofundar a possibilidade de alcançar um entendimento comum, a nível europeu, acerca dos direitos e deveres dos doentes, tanto no plano pessoal como social.

Partilha da capacidade não utilizada e cuidados transnacionais: a Comissão Europeia prestará assistência à avaliação de projectos transfronteiriços no domínio da saúde, nomeadamente os projectos Euregio e à criação de redes entre esses projectos, de modo a partilhar as melhores práticas.

3.3.2

De modo a definir um quadro regulamentar claro e transparente no que tange à aquisição de cuidados de saúde, que as instâncias competentes dos Estados-Membros poderiam utilizar para celebrarem acordos mútuos, a Comissão Europeia convidará os Estados-Membros a reunir informações sobre os eventuais acordos existentes em matéria de aquisição de cuidados de saúde e a apresentar as propostas que forem adequadas.

Profissionais de saúde: a Comissão solicitará aos Estados-Membros que forneçam estatísticas actualizadas e completas sobre os movimentos dos profissionais de saúde através das estruturas que regem o reconhecimento das qualificações profissionais. A Comissão continuará também a trabalhar, em conjunto com o Conselho e o Parlamento Europeu, por forma a garantir procedimentos de reconhecimento claros, simples e transparentes.

A Comissão dará também seguimento aos trabalhos preparatórios com os Estados-Membros para garantir, com a confidencialidade adequada, a troca de informações que sejam relevantes para a livre circulação de profissionais de saúde.

A Comissão convidará os Estados-Membros a analisar as questões relacionadas com a escassez de profissionais de saúde na União, tanto na actualidade como no futuro.

Centros europeus de referência: a Comissão Europeia lançará um concurso ao abrigo do programa de saúde pública para realizar o levantamento dos centros de referência, antes de elaborar propostas.

Avaliação das tecnologias da saúde: a Comissão criará um mecanismo de colaboração enquanto parte da cooperação em matéria de serviços de saúde e apresentará, se for caso disso, outras propostas.

3.3.3

Satisfaça os requisitos em matéria de informação para doentes, profissionais e responsáveis pela elaboração das políticas.

Estratégia de informação sobre os sistemas de saúde: a Comissão Europeia desenvolverá um enquadramento para a informação sobre saúde ao nível da União Europeia, que contemple os resultados do programa no domínio da saúde, que inclua a identificação das diferentes necessidades de informação do ponto de vista dos responsáveis pela elaboração das políticas, doentes e profissionais, o modo como essa informação poderá ser disponibilizada e as responsabilidades dos diferentes intervenientes, tomando em consideração os trabalhos na matéria efectuados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico (OCDE).

Motivação e âmbito dos cuidados transfronteiriços: para determinar o motivo que leva os doentes a deslocar-se além fronteiras, quais as especialidades em questão, a natureza dos acordos bilaterais, etc., a Comissão elaborará um estudo específico ao abrigo do programa de saúde pública e ainda mediante um projecto de investigação «A Europa dos doentes».

Protecção de dados: a Comissão Europeia trabalhará com os Estados-Membros e com as entidades nacionais em matéria de protecção de dados, a fim de aumentar a sensibilização para estas disposições.

e-Saúde: convidada a considerar o estabelecimento de princípios europeus relativamente à competência e à responsabilidade de quantos se encontrem envolvidos na prestação de serviços de e-Saúde, a Comissão analisará esta questão como parte do plano de acção em matéria de e-Saúde, como estabelecido na Comunicação «e-Saúde – melhorar os cuidados de saúde para os cidadãos europeus: um plano de acção para um espaço europeu da e-Saúde».

3.3.4

Reforce a contribuição europeia para os objectivos em termos de saúde:

Melhorar a integração dos objectivos em termos de saúde em todas as políticas e actividades a nível europeu: a Comissão Europeia trabalhará em conjunto com os Estados-Membros para reunir informações sobre o modo de funcionamento, em cada país, das diferentes vias de acesso aos cuidados de saúde de outros Estados-Membros, em especial no tocante às vias de acesso decorrentes das normas europeias.

A Comissão basear-se-á nos projectos existentes relativos à avaliação do impacto sobre a saúde para garantir que, nas futuras propostas da Comissão, o impacto sobre a saúde e os cuidados de saúde sejam devidamente levados em consideração na avaliação global de impacto.

Estabelecimento de um mecanismo para apoiar a cooperação em matéria de serviços de saúde e cuidados médicos: convidada a considerar o desenvolvimento de um mecanismo permanente, a nível da União, que apoie a cooperação europeia no domínio dos cuidados de saúde e acompanhe o impacto da acção da União Europeia sobre os sistemas de saúde, a Comissão criou um Grupo de Alto Nível sobre Serviços de Saúde e Cuidados Médicos.

3.3.5

Responda ao alargamento através do investimento na saúde e nas infra-estruturas sanitárias.

3.3.5.1

O processo de reflexão convidou a Comissão, os Estados-Membros e os países aderentes a ponderarem os meios de facilitar a inclusão de investimentos nos domínios da saúde, do desenvolvimento de infra-estruturas sanitárias e do desenvolvimento de competências como domínios devendo beneficiar prioritariamente de auxílio, no âmbito dos instrumentos financeiros existentes, em particular nas regiões do Objectivo 1. Na realidade, a União já dá apoio a investimentos na saúde nos actuais Estados-Membros, sempre que tal tiver sido identificado como prioritário pelos países ou regiões em causa. A observância desta recomendação depende, pois, de as regiões e os países interessados identificarem o investimento na saúde e nas infra-estruturas sanitárias como uma prioridade para o apoio europeu. A Comissão envidará esforços, conjuntamente com os Estados-Membros, através do Grupo de Alto Nível sobre Serviços de Saúde e Cuidados Médicos, bem como das estruturas adequadas para os instrumentos financeiros em causa, por forma a garantir que a saúde seja devidamente ponderada aquando do desenvolvimento de planos globais. A necessidade de um investimento europeu nas infra-estruturas sanitárias será também abordada enquanto parte do desenvolvimento das novas perspectivas financeiras para a União a partir de 2006.

4.   Observações na especialidade

4.1

A livre circulação de doentes nos Estados-Membros tem várias implicações, cujas consequências urge calcular, ponderar, analisar e ter em conta. Sendo a primeira consequência o conhecimento profundo dos diferentes sistemas de segurança social existentes, importa definir da melhor forma possível – e de forma dinâmica – os critérios que presidiram à sua criação, nomeadamente analisando as tendências actuais e futuras.

4.2

A prevenção pertence indubitavelmente aos objectivos prioritários, visto poder (e dever) permitir uma redução notável de custos, sendo a melhor estratégia das políticas de saúde: note-se, por exemplo, os resultados de uma boa política de prevenção de acidentes de viação, da propagação da SIDA ou do tabagismo. A conjugação das actividades de prevenção nestes domínios surte resultados espectaculares.

4.3

A esta lista parcial há que somar as políticas de prevenção que, actualmente, concitam a atenção de todos os interessados, nomeadamente profissionais de saúde, meios de comunicação social e responsáveis políticos: o uso abusivo de intoxicantes (estupefacientes, álcool, medicamentos), a promoção de vida sã (exercício físico, alimentação, repouso), os acidentes de trabalho, as doenças profissionais, etc.

4.4

A avaliação dos factores de risco individuais, sociais e familiares permite conhecer o índice de mortalidade prematura evitável e respectivos custos.

4.5

Os avanços tecnológicos em matéria de fármacos ou de técnicas de investigação devem levar à substituição efectiva e real das antigas técnicas pelas mais recentes.

4.6

Trata-se, sobretudo, de atingir uma nova eficiência, decididamente uma redução de custos para o conjunto da sociedade, ainda que tal implique, necessariamente, enfrentar obstáculos sociais, culturais e/ou corporativos.

4.6.1

Trata-se igualmente de apoiar a investigação de acções mais precisas e eficazes destinadas a incentivar as iniciativas dos meios socioprofissionais, de modo a melhorar as políticas comuns de saúde.

4.7

Para preparar correctamente a mobilidade dos doentes no espaço europeu, a União Europeia deve poder garantir aos doentes que se deslocam a existência de centros de excelência sanitária e hospitalar que não estejam exclusivamente concentrados nos países mais ricos que investiram de forma considerável nos seus sistemas de assistência médica. A União Europeia deve ajudar à criação de instrumentos de avaliação, certificação e aprovação que valorizem as novas tecnologias e as novas terapias. A eficácia dos meios hospitalares e de estabelecimentos análogos deve basear-se nesses mecanismos de aprovação e certificação.

4.8

Este esforço de qualidade pode permitir à União estabelecer no seu território uma rede de centros de referência onde residam igualmente cientistas e profissionais de alto nível que contribuam para a sua existência. É de esperar que estes centros surjam rapidamente em certos países da União Europeia a 25, sobretudo se a União Europeia se esforçar por conceber um instrumento de observação, análise e intercâmbio das políticas nacionais, respeitando os princípios fundamentais dos tratados, nomeadamente os princípios da subsidiariedade e da competência nacional.

4.9

Neste contexto, importa não esquecer a harmonização dos indicadores de saúde pública, a qual permite um melhor conhecimento dos objectivos de saúde que a União Europeia se propõe: os índices pertinentes de mortalidade e de mortalidade evitável, de morbilidade e de morbilidade evitável, índices que não têm necessariamente a mesma acepção em todos os países da União Europeia.

4.10

A disparidade expressa o facto de poderem ser melhorados os resultados obtidos elevando os cuidados de saúde ao nível do país com o melhor desempenho. No que respeita ao cancro do pulmão, por exemplo, a taxa de sobrevivência após 5 anos não é actualmente a mesma em França ou na Polónia. O tratamento de hemopatias (leucemia) revela diferentes resultados em França ou no Reino Unido, consoante os protocolos utilizados.

4.11

A informação dos doentes, dos profissionais de saúde e dos responsáveis políticos é um objectivo fundamental das presentes orientações da Comissão Europeia.

4.12

Para os doentes, a educação em matéria de saúde permite clarificar as suas noções de «saúde» enquanto cidadãos europeus, nomeadamente no que toca à expectativa e ao comportamento. A saúde é considerada como um bem absoluto e é, de qualquer modo, um estado a ser garantido por todas as entidades competentes. A satisfação desta expectativa implica um aumento dos recursos afectados aos objectivos de saúde, em matéria de cuidados médicos, mas muitas vezes de prevenção e de ambiente, para não desequilibrar os sistemas de segurança social.

4.13

A segurança em matéria de saúde tornou-se um direito e um novo poder reivindicado pelo cidadão da União Europeia (3).

4.14

Importa debater da forma o mais transparente possível questões como as soluções tecnológicas, o respeito pela vida privada, a co-gestão da ficha clínica, a liberdade de informação e a protecção dos dados, de forma a permitir a consciencialização de todos os actores. A continuidade deste debate é um aspecto importante, dada a evolução rápida e a necessidade de tomar decisões urgentes e/ou difíceis. Cada um destes aspectos representa um desafio para os três principais actores no domínio da saúde.

4.15

Conciliar os objectivos nacionais com as obrigações europeias: a análise comparativa dos sistemas de saúde acarreta considerações estratégicas difíceis que devem ser utilizadas de modo a apoiar a cooperação europeia no domínio dos cuidados de saúde e para acompanhar a incidência da União Europeia nos regimes de saúde. Importa, por exemplo, analisar de forma mais aprofundada temas transversais com eventuais consequências importantes: boas práticas e eficácia no sector da saúde, o envelhecimento e a saúde, a saúde nos novos Estados-Membros da União Europeia, a avaliação do impacto de vários factores na saúde, etc.

4.16

Por outro lado, urge analisar os meios de garantir a segurança jurídica que confere aos doentes o direito de beneficiar de um tratamento de alta qualidade num país da União Europeia, para o que se deverão fazer propostas adequadas (clarificação da aplicação das jurisprudências, simplificação das normas de coordenação dos sistemas de segurança social, facilitação da cooperação intraeuropeia).

4.17

A novidade mais inesperada — e também a mais útil — da comunicação da Comissão é a mobilização do Fundo de Coesão e dos Fundos Estruturais da União Europeia de modo a facilitar os investimentos no domínio da saúde e o desenvolvimento de infra-estruturas sanitárias e de competências médicas, objectivos prioritários de intervenção para os instrumentos financeiros comunitários.

4.18

O Comité Económico e Social Europeu concorda plenamente com esta decisão, que dá uma nova oportunidade ao desenvolvimento e ao êxito da União Europeia, nomeadamente no quadro da estratégia de Lisboa.

4.19

Por último, o Comité Económico e Social Europeu aprova, em princípio, a estratégia da Comissão no que diz respeito às profissões no domínio da saúde. A evolução dos cuidados de saúde passa por uma dinâmica das profissões e das competências. Os cuidados de saúde exigem pessoal formado e altamente qualificado, sujeito a uma aprendizagem contínua ao longo da vida.

4.20

O Comité Económico e Social Europeu deve esforçar-se por favorecer a consciencialização dos desafios fundamentais que são os problemas sanitários para a União Europeia, para a sua coesão e para a sua capacidade de se tornar a economia do conhecimento.

4.21

Importa analisar e antever os problemas de modo a fomentar a mobilidade profissional dos actores envolvidos sem perturbar os sistemas nacionais. Neste contexto, o Comité Económico e Social Europeu espera que a proposta de directiva relativa às qualificações profissionais constitua um documento essencial, útil e necessário para completar o mercado interno.

4.22

Os mecanismos previstos são pertinentes e estão bem estruturados. O Comité Económico e Social Europeu crê que será igualmente de grande utilidade harmonizar os códigos de conduta de todos os profissionais de saúde, esperando que tal medida tenha boa recepção.

4.23

O objectivo é antever a escassez de profissionais de saúde anunciada para os próximos anos. O investimento nas profissões ligadas à saúde é rentável, útil e necessário de modo a oferecer aos cidadãos da União Europeia uma assistência médica de qualidade.

4.23.1

Importa melhorar a saúde e a assistência médica graças às tecnologias de informação e à comunicação.

4.24

O Comité Económico e Social Europeu considera que os melhores argumentos a favor da aplicação de uma reforma dos sistemas de saúde e da melhoria da qualidade na União Europeia advêm deste projecto, encontrando-se já sobre a mesa vários elementos:

A ficha clínica informatizada e partilhada que confere a cada cidadão um direito social, um direito à saúde e um melhor conhecimento sobre a mesma. De resto, este sistema permitirá evitar abusos e custos redundantes, incompatibilidades medicamentosas e o «nomadismo médico», além de facilitar os procedimentos de recepção, registo e informação do doente.

A telemedicina, com um enorme êxito potencial, permitirá a realização de consultas à distância dos especialistas e de todos os profissionais de saúde, bem como informar de forma precisa o doente.

A utilização dos cartões de saúde, que permite, em tempo real, verificar a abertura dos direitos e a situação do doente em matéria de cobertura de doença.

Existem ainda muitas outras aplicações, actuais e futuras, úteis para uma melhor gestão dos sistemas, para elaborar estratégias sanitárias e de saúde pública, para obter bases de dados eficazes e para avaliar a produtividade dos centros e conhecer os pormenores dos serviços prestados.

4.25

Já existem redes de informação e as associações de doentes podem constatar que as suas solicitações tiveram resposta. No entanto, importa garantir a protecção do segredo profissional na relação doente/médico.

5.   Propostas do Comité Económico e Social Europeu

5.1

No parecer de 16 de Julho de 2003, o Comité Económico e Social Europeu, após reconhecer a importância destas políticas, apresentou propostas, as quais foram aparentemente tidas em conta pela Comissão Europeia, visto os seus argumentos seguirem o mesmo fio condutor.

5.2

A cooperação entre os Estados-Membros deverá permitir estabelecer objectivos comuns que conduzam à criação de planos nacionais. A escolha de indicadores adequados permitirá, por outro lado, acompanhar de perto a evolução das políticas de saúde de cada país da União Europeia.

5.3

O Comité Económico e Social Europeu recorda que um instrumento se torna indispensável: um observatório ou uma agência que recolha observações, análises e dados partilhados sobre as políticas de saúde nacionais, sem prejuízo das disposições dos Tratados em vigor (subsidiariedade e competência nacional); processo de aperfeiçoamento da qualidade da assistência médica, preocupações das entidades públicas e dos gestores para melhorar a eficácia de todos os centros de assistência médica (públicos ou privados) e criação de pólos de excelência e de redes entre os mesmos em toda a União Europeia, nas regiões ricas e nas pobres.

5.4

Uma política de emprego forte e permanente que responda espontaneamente quando confrontada com penúrias previsíveis.

5.5

O apoio de uma política de informação em matéria de saúde que radique nos resultados de programas de saúde, identificando as necessidades de informação dos actores envolvidos (doentes, profissionais e entidades públicas), tendo igualmente em conta fontes como a OMS e a OCDE.

5.6

O Comité Económico e Social Europeu apoia sem reservas a intenção da Comissão de recorrer a um método aberto de coordenação (cf. parecer do CESE de Julho de 2003), definindo previamente, de forma precisa, o seu funcionamento e condições, que incluem os seguintes factores fundamentais:

o intercâmbio de boas práticas (acreditações), padrões de qualidade, equivalência de competências, reconhecimento mútuo das práticas de modo a reduzir custos, tendo em conta a grande disparidade dos sistemas nacionais;

os indicadores pertinentes das estruturas e das práticas;

o aperfeiçoamento da oferta de produtos de saúde, tendo em conta os imperativos da inovação e a luta contra os flagelos da saúde pública, tais como a SIDA, a tuberculose, o paludismo nos países mais pobres, bem como a luta contra o desperdício;

a coordenação dos sistemas nacionais de modo a evitar qualquer efeito de dumping e de fuga de competências a nível transfronteiriço;

a concretização necessária do mercado único dos medicamentos.

6.   Conclusão

6.1

O Comité Económico e Social Europeu é muito sensível ao facto de as três últimas comunicações serem fruto da reflexão de cinco direcções-gerais da Comissão Europeia.

6.2

Este facto demonstra que a Comissão Europeia entendeu os desafios destas políticas de saúde no contexto da conclusão do mercado interno e do alargamento.

6.3

Esta é uma das primeiras vezes que cinco direcções-gerais da Comissão Europeia aliam a sua vontade política, competências e meios com o objectivo de garantir que todos os países europeus terão os meios para aplicar uma política de saúde e de segurança social coerente, para benefício de todos os cidadãos da União Europeia.

6.4

O Comité Económico e Social Europeu tenciona, neste contexto, criar uma task force simples mas permanente, para acompanhar estas políticas e permitir ao CESE contribuir com o seu ponto de vista, saber e experiência para esta questão delicada e importante para todos os cidadãos da União Europeia.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Parecer de iniciativa do CESE sobre «Os cuidados de saúde» — Relator: A. BEDOSSA — JO C 234 de 30/09/2003.

(2)  Cf. parecer do CESE sobre o «Cartão europeu de seguro de doença» — Relator: Gérard DANTIN — JO C 220 de 16/09/2003.

(3)  Parecer de iniciativa actualmente em fase de elaboração sobre «Segurança sanitária — Uma obrigação colectiva, um novo direito» — Relator: A. BEDOSSA (SOC/171).


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/60


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as:

«Proposta de directiva do Conselho relativa a um procedimento específico de admissão de nacionais de países terceiros para efeitos de investigação científica»;

«Proposta de recomendação do Conselho destinada a facilitar a admissão de nacionais de países terceiros para efeitos de investigação científica na Comunidade Europeia»;

«Proposta de recomendação do Conselho destinada a facilitar a emissão pelos Estados-Membros de vistos uniformes de curta duração para os investigadores nacionais de países terceiros que se desloquem para efeitos de investigação científica na Comunidade Europeia»

[COM(2004) 178 final — 2004/0061 (CNS)]

(2005/C 120/12)

Em 7 de Abril de 2004, o Conselho decidiu, em conformidade com o artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social sobre a proposta supra mencionada.

A Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 22 de Setembro de 2004, sendo relatora B. King.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004, (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o seguinte parecer por 181 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções.

1.   Síntese do documento da Comissão

1.1

A Comunicação em apreço comporta uma proposta de directiva e duas propostas de recomendação relativas à admissão de nacionais de países terceiros para efeitos de investigação científica na Comunidade Europeia.

1.2

Estas propostas inserem-se no âmbito do objectivo estratégico de Lisboa de desenvolver a investigação para que a União Europeia se torne a economia do conhecimento mais competitiva e dinâmica do mundo até 2010. Calcula-se que, para atingir este objectivo, a União Europeu precisará de 700 000 investigadores suplementares. Foram definidas as seguintes medidas convergentes:

reforço da atracção dos jovens pelas áreas científicas na educação;

melhoria das perspectivas de carreira para os investigadores na União Europeia;

aumento das oportunidades em matéria de formação e de mobilidade.

1.3

Se bem que o objectivo de 700 000 investigadores suplementares se refira principalmente a nacionais da UE, reconhece-se que, para o realizar, serão necessários investigadores de países terceiros. Assim, esta Comunicação da Comissão centra-se especificamente na admissão na Europa de talentos em matéria de investigação de alta qualidade provenientes de países terceiros, através das seguintes medidas:

facilitar a admissão e residência de investigadores de países terceiros;

remover os obstáculos à sua mobilidade na Europa.

1.4

A Comissão reconhece igualmente a necessidade de dar um forte impulso à mobilidade dos investigadores europeus para outras partes do mundo, já que a sua mobilidade constitui um elemento fundamental da aquisição e da transmissão dos conhecimentos.

2.   Observações na generalidade

2.1

O CESE acolhe favoravelmente a Comunicação relativa à admissão de nacionais de países terceiros para efeitos de investigação científica na Comunidade Europeia.

2.2

Dado que o objectivo da Comissão de 700 000 investigadores suplementares até 2010 diz essencialmente respeito a nacionais da UE, o CESE remete a Comissão para o seu anterior parecer (1) sobre a Comunicação da Comissão relativa aos problemas com que os investigadores se deparam no Espaço Europeu da Investigação e as propostas e iniciativas para os resolver (2).

2.3

No que respeita às medidas convergentes «para o reforço da atracção dos jovens pelas áreas científicas na educação», o presente parecer salienta que a importância da ciência está insuficientemente reflectida nos curricula escolares, recomenda que se dê mais peso ao ensino da ciência, da tecnologia e da matemática nas escolas e sublinha a importância de apresentar estas matérias de uma forma atractiva para os estudantes. Importa igualmente ter em mira as raparigas, já que tendem a estar subrepresentadas nestas áreas. Há diversas indicações de que quem procura ingresso no ensino superior está a optar por áreas não científicas, pelo que a Comissão não logrará obter um elevado número de investigadores se não se debruçar sobre esta questão com urgência e de forma aprofundada.

2.4

Quanto à segunda medida convergente, que visa a «melhoria das perspectivas de carreira para os investigadores na União Europeia», o anterior parecer examina o dilema dos cientistas que trabalham no meio académico ou em organismos de investigação com financiamento público, que são, em regra, remunerados de acordo com as tabelas salariais do sector público, mas sem segurança de emprego ou outras vantagens concedidas a outras carreiras do sector público (por exemplo, funcionários ou professores). Com efeito, os investigadores beneficiam de pouca ou nenhuma segurança de emprego, já que, com frequência, lhes são propostos contratos a termo sempre que mudam de emprego ou avançam na carreira.

2.5

A última referência que o CES gostaria de fazer ao seu anterior parecer é sobre a mobilidade dos investigadores europeus. O CESE reconhece que uma carreira no Espaço Europeu da Investigação exige mobilidade e flexibilidade na UE, o que não deve, porém, afectar negativamente as condições de vida pessoal e familiar e a segurança social. Acresce que a Comissão tem de actuar contra uma possível fuga de cérebros unívoca em que os melhores investigadores jovens abandonariam a UE, especialmente para se fixarem nos EUA. É provável que os actuais problemas relativos à obtenção de vistos de entrada nos EUA sejam de curta duração, visto que os círculos científicos e académicos dos EUA estão já a exercer pressão sobre o governo norte-americano para que os requisitos de entrada sejam agilizados, de forma a poderem recrutar mais nacionais de países terceiros.

2.6

Voltando à Comunicação da Comissão em apreço, relativa à admissão de nacionais de países terceiros para efeitos de investigação científica na Comunidade Europeia, o Comité concorda que a remoção dos obstáculos à mobilidade dos investigadores de países terceiros é vital para que a União Europeia seja mais atractiva para os investigadores de todo o mundo, especialmente se quiser ter êxito na concorrência global para atrair investigadores altamente qualificados.

2.7

O Comité concorda com a afirmação da Comissão de que a globalização da economia, cada vez mais assente no saber, confere uma importância crescente à dimensão internacional da ciência. Contudo, o CESE considera que a globalização deveria ter ficado mais explícita na Comunicação, através da inclusão de dados comparativos sobre o nível dos recursos que países como o Japão e os EUA consagram à promoção da formação, da mobilidade e do desenvolvimento da carreira dos investigadores.

2.8

O CESE está também muito preocupado com a estrutura etária dos actuais investigadores da UE. Muitos deles estão a atingir a idade de reforma, e é escasso o número de jovens investigadores suficientemente motivados para os substituir ou incentivados a fazê-lo. Se não se reconhecer este facto e não se tomarem medidas urgentemente, o objectivo da UE não será atingido. Esta situação deve-se igualmente ao envelhecimento da população europeia e à diminuição da taxa de natalidade. Em diversos países da UE, prevê-se que a população comece a diminuir após 2010, o que torna o objectivo de 700.000 investigadores suplementares até 2010 muito ambicioso, mesmo contando com investigadores de países terceiros.

2.9

O CESE compreende que a Comunicação se centra exclusivamente na questão da admissão, pelo que os investigadores de países terceiros que já se encontram na União Europeia, alguns dos quais são profissionais de topo no seu sector, não serão visados pela proposta de directiva e pelas recomendações. Considera, porém, que é necessária uma directiva futura que aborde o problema específico do acesso desta categoria de investigadores a postos de trabalho altamente qualificados, o que contribuiria para a realização do objectivo de dispor de 700 000 investigadores suplementares. Alguns destes investigadores beneficiam do estatuto de refugiado na UE. Lamentavelmente, o seu talento e o seu contributo estão a ser subaproveitados. Não está previsto o apoio sistemático a esta categoria de investigadores na UE, a não ser através de subsídios concedidos por organizações de voluntariado ou de beneficência. Com um financiamento modesto para apoio a estes investigadores, é provável que o número de investigadores na UE aumente em, pelo menos, 40 000 (3). Assim, o CESE recomenda vivamente que a Comissão inicie um processo que permita que os investigadores em questão sejam identificados e considerados como tais e tenham acesso mais fácil a postos de investigação.

2.10

O Comité toma nota da definição de «investigador» proposta pela Comissão. Também neste caso, gostaria de remeter para a definição recomendada no seu anterior parecer 305/2004, ponto 5.1.1.7: «Profissionais que trabalham na concepção ou criação de novos conhecimentos, produtos, métodos e sistemas e na gestão dos respectivos projectos, para o que possuem as qualificações necessárias em virtude da sua formação e experiência». Esta definição tem a vantagem de reconhecer as capacidades de gestão do investigador.

3.   Observações na especialidade

3.1   Propostas na linha da Política Europeia da Investigação

3.1.1

O CESE entende que a criação de um título de residência específico para os investigadores de países terceiros não é a única questão a tratar. Existem outros problemas a resolver, como o estatuto de imigrante do investigador e o estatuto dos investigadores na UE, como referido no parecer do CESE 305/2004. O Comité considera ainda que a mobilidade dos investigadores na Comunidade será uma questão crucial. Os investigadores devem poder procurar emprego independentemente do seu estatuto de imigrante.

3.1.2

O Comité verifica que os títulos de residência dos investigadores dispensam a obtenção de uma autorização de trabalho e acolhe favoravelmente esta tentativa de racionalização de procedimentos.

3.2   Propostas que completam os instrumentos da política europeia em matéria de imigração

3.2.1

A recomendação da Comissão de reabertura controlada dos canais de imigração legal em função de vários parâmetros e consoante as categorias de migrantes em causa merece acolhimento favorável. Todavia, o Comité solicita que estes parâmetros sejam desprovidos de ambiguidade e específicos. Algumas das pessoas admitidas podem carecer de refúgio e de protecção ao abrigo da Convenção de Genebra de 1951. Para além de lhes ser dada a oportunidade de se tornarem migrantes, poderão, uma vez chegados, desejar requerer o estatuto de refugiado. O Comité compreende que a Comissão não pode pronunciar-se claramente sobre estas questões neste momento, mas gostaria que as mesmas fossem resolvidas num futuro próximo.

3.2.2

O CESE concorda com as recomendações relativas ao visto de curta duração, que permite aos investigadores de países terceiros deslocar-se livremente no espaço Schengen. Concorda igualmente que os residentes de longa duração provenientes de países terceiros que residem legalmente num Estado-Membro da UE há cinco anos devem gozar do direito de residência em toda a UE.

3.2.3

O CESE congratula-se com o facto de a Comissão reconhecer que a possibilidade de os investigadores de países terceiros procederem ao reagrupamento familiar constitui um aspecto essencial da problemática da mobilidade.

3.2.4

O CESE observa que esta questão é tratada na Directiva 2003/86, de 22 de Setembro de 2003, relativa ao direito ao reagrupamento familiar, e que a presente Comunicação completa a proposta de directiva COM (2002) 548 relativa às condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeitos de estudos, de formação profissional ou de voluntariado.

3.3   O papel central dos organismos de investigação

3.3.1

O CESE nota que a convenção de acolhimento se inspira no protocolo de acolhimento existente em França. O Comité observa que a repartição de funções entre o organismo de investigação e as autoridades dos Estados-Membros em matéria de imigração facilitariam a entrada na UE de nacionais de países terceiros altamente qualificados, satisfazendo simultaneamente os requisitos de segurança dos Estados-Membros da UE.

3.3.2

Os Estados-Membros têm poder para verificar se a convenção de acolhimento respeita as condições estabelecidas no n.o 2 do artigo 5.o. Esta medida merece acolhimento favorável do CESE, já que deverá impedir eventuais abusos.

3.4   Responsabilização dos organismos de investigação

3.4.1

O Comité considera que a definição de «organismo de investigação» apresentada pela Comissão está incompleta, devendo ser alargada para incluir as organizações públicas ou privadas que concedem subsídios de investigação, bem como as que realizam trabalhos de investigação.

3.4.2

O CESE verifica com agrado a reafirmação do compromisso do Conselho Europeu de Barcelona de aumentar o investimento em investigação e desenvolvimento tecnológico para 3 % do PIB até 2010, sendo dois terços desse investimento provenientes do sector privado.

3.4.3

O Comité recomenda vivamente que a Comissão consulte o sector privado sobre esta proposta em geral e, especificamente, sobre a recomendação segundo a qual o organismo de investigação deverá celebrar uma convenção de acolhimento, que dará início ao procedimento de admissão de um investigador num Estado-Membro.

3.5   Uma concepção lata da noção de investigador, centrada nas necessidades da União Europeia

3.5.1

O CESE concorda com a recomendação da Comissão de não limitar o procedimento às pessoas que já tenham o estatuto de investigador no seu país de origem.

3.5.2

Todavia, o CESE não concorda com a restrição relativa ao objecto da admissão. Com efeito, há pessoas que satisfazem os requisitos mínimos estabelecidos na directiva para serem consideradas investigadores sem que o objectivo inicial da sua admissão num Estado-Membro seja a realização de um projecto de investigação. Estes investigadores podem ter obtido uma qualificação na UE e pretender obter um posto de trabalho correspondente.

3.5.3

O CESE regozija-se com o facto de as exigências em matéria de qualificações das pessoas cuja admissão é solicitada e o interesse científico da investigação prevista serem claras e desprovidas de ambiguidade. Se bem que tal não se insira no âmbito da presente Comunicação, o CESE considera que é necessário dispor de uma certa margem de manobra na avaliação das qualidades dos investigadores, de modo que a UE possa ter em conta a evolução das exigências da investigação. Isto deve-se ao constante surgimento de novas tecnologias, devendo a UE procurar recrutar investigadores capazes de as desenvolver e expandir.

3.5.4

O Comité chama a atenção da Comissão para um anterior parecer (4) que salienta outro obstáculo à mobilidade, designadamente a falta de transparência em matéria de qualificações e de competências, verificando-se, por esse motivo, numerosos casos de qualificações não aceites, particularmente as obtidas em países em desenvolvimento. Os investigadores são forçados a requalificar-se ou a obter qualificações pós-doutoramento para poderem exercer a sua actividade profissional na UE. O Comité sugere que o Plano de Acção (5) da Comissão que visa facilitar a mobilidade na UE, nomeadamente a aplicação e desenvolvimento de instrumentos de apoio à transparência e à transferibilidade das qualificações e a criação de um sítio internet europeu único de informação sobre a mobilidade, seja utilizado para resolver esta questão.

3.6   Um título de residência independente do estatuto do investigador

3.6.1

O CESE acolhe favoravelmente a proposta de uniformização do estatuto dos investigadores de países terceiros em toda a UE.

3.6.2

Igualmente se congratula com a recomendação segundo a qual os investigadores que forem admitidos com base num contrato de trabalho deixarão de estar sujeitos à obtenção de uma autorização de trabalho.

3.7   A mobilidade dos investigadores na União Europeia

3.7.1

O CESE regozija-se com a recomendação da Comissão que visa simplificar o procedimento de admissão para promover a mobilidade, de modo a permitir aos nacionais de países terceiros prosseguir um projecto de investigação em vários Estados-Membros sem se confrontarem com dificuldades de admissão.

3.7.2

O Comité toma igualmente boa nota de que esta medida se aplicará aos nacionais de países terceiros residentes de longa duração.

3.8   Escolha da base jurídica da proposta de directiva

3.8.1

O CESE concorda com a base jurídica escolhida, mas lamenta que a directiva não vincule a Dinamarca, a Irlanda e o Reino Unido. O Comité regista a decisão tomada pela Irlanda de aderir a esta directiva e espera que o Reino Unido adopte decisão idêntica. Manifesta a sua forte convicção de que este assunto deve ser reexaminado, dado que os referidos países, e especialmente o Reino Unido, dispõem de uma base de investigação de tal modo importante que os esforços da UE para atrair o número de investigadores necessário serão seriamente dificultados sem a sua participação.

3.9   Outras questões

3.9.1

O CESE considera que é necessário reconhecer a necessidade de atrair investigadores potenciais e que a questão da «fuga de cérebros» de alguns países terceiros deve ser examinada em profundidade. São dois aspectos interligados. A questão da formação dos investigadores no Reino Unido merece particular atenção. Alguns investigadores potenciais poderão carecer de uma formação ou de um período de estudo adicional, após o que, em muitos casos, poderão rapidamente candidatar-se a um posto de investigador na UE. A directiva deve ser examinada tendo presente este facto.

3.9.2

O Comité está seriamente preocupado com as consequências de uma «fuga de cérebros» de determinados países em desenvolvimento e considera necessário promover um debate aprofundado sobre a forma como se poderia aumentar o número de investigadores em todo o mundo. De notar que alguns governos incentivam os investigadores a irem para o estrangeiro, a fim de adquirirem experiência que reverta em benefício do país de origem. A presidência neerlandesa vai levar a efeito uma conferência em Haia intitulada «Brain Gain: The Instruments». A questão do impacte da fuga ou do «ganho» de cérebros nos países em desenvolvimento será examinada nessa conferência e a Comissão apresentará um relatório sobre a matéria até ao final do ano. O CESE considera que se trata de um primeiro passo para a resolução de uma questão muito séria.

3.9.3

Um dos temas abordados na anterior Comunicação da Comissão sobre os investigadores — COM(2003) 436 final — que o Comité gostaria de salientar é a questão do género. Importa realçar a subrepresentação das mulheres, especialmente em funções de gestão e de direcção. Trata-se de algo que afecta, em especial, as investigadoras de países terceiros. O Comité gostaria de lembrar a recomendação da Comissão de elaborar um código de conduta para o recrutamento de investigadores baseado nas melhores práticas, especialmente no domínio da igualdade de oportunidades. O Comité tem a firme convicção de que as investigadoras são objecto de uma acentuada desigualdade de tratamento. Com efeito, é insuficiente o número de investigadoras que apresentam a sua candidatura e, quando o fazem, são-lhes oferecidos menos lugares de topo do que aqueles que estão em condições de desempenhar. É necessário melhorar a transparência do processo de recrutamento e aumentar a proporção de candidaturas femininas.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 110 de 30.4.2004, pág. 3. Relator: G. Wolf.

(2)  COM(2003) 436 final.

(3)  Este número baseia-se numa estimativa constante da informação estatística actualmente disponível.

(4)  Parecer do CESE 658/2004, de 28 de Abril de 2004. Relator: G. Dantin.

(5)  COM(2002) 72 final


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/64


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Formação e produtividade»

(2005/C 120/13)

Por carta do ministro dos Assuntos Europeus, Atzo NICOLAÏ, de 22 de Abril de 2004, a futura Presidência neerlandesa solicitou ao Comité Económico e Social Europeu, conformemente ao disposto no artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, a elaboração de um parecer sobre «Formação e produtividade».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania adoptou parecer em 22 de Setembro de 2004, sendo relator C. KORYFIDIS.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 28 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 81 votos a favor, 1 voto contra e 1 abstenção o seguinte parecer.

1.   Âmbito do parecer

1.1

Em resposta à solicitação da Presidência neerlandesa ao CESE, o presente parecer exploratório analisará:

o programa da Presidência neerlandesa, e antes de mais o capítulo sobre a Europa social e sua abertura à mudança (1),

a decisão do Conselho Europeu de Bruxelas (2), de 25 e 26 de Março de 2004, de superar o desafio de Lisboa e, em particular, o convite lançado ao CESE para que este determine «como assegurar uma aplicação mais eficaz da Estratégia de Lisboa» (3),

os esforços envidados, no segundo semestre de 2004, no sentido de concluir um acordo entre os 25 Estados-Membros sobre a nova agenda de política social (2006-2010) (4),

o exame e a inclusão dos objectivos de Lisboa e de Gotemburgo no quadro deste acordo (5),

a análise e a exposição das razões por trás das dificuldades detectadas na execução das políticas de aprendizagem ao longo da vida e o aumento da eficácia das políticas de formação ao longo da vida.

1.1.1

Registe-se que o quadro global proposto pela Presidência neerlandesa para as questões de política social e de política de emprego será examinado na conferência de alto nível sobre «Fazer entrar mais pessoas no mercado de trabalho: Activar o potencial laboral da Europa », que será organizada em Amesterdão em 25 e 26 de Outubro de 2004.

1.1.2

Recorde-se ainda que o objectivo desta conferência é analisar as alterações estruturais a introduzir nos quatro domínios de acção política (6), sem prejuízo do fomento da participação e da coesão social.

1.1.3

Por último, deve destacar-se que a Presidência neerlandesa solicitou que o CESE se concentrasse nos pontos seguintes:

Quais os principais obstáculos à execução das políticas nacionais e comunitárias em matéria de formação ao longo da vida em cada Estado-Membro e na União Europeia em geral e de que forma podem ser superados?

Quais as formas mais eficazes de melhorar a formação ao longo da vida?

De que forma a partilha de responsabilidades entre os diversos intervenientes no processo de formação (p. ex., o governo e os parceiros sociais, mas igualmente os trabalhadores e os empregadores) influi na organização e no êxito da formação ao longo da vida? Qual é a repartição mais eficaz dos papéis e das responsabilidades e como consegui-la?

2.   Introdução

2.1

O CESE atribui enorme importância à iniciativa da Presidência neerlandesa de solicitar a elaboração do presente parecer, e ainda mais ao conteúdo e aos elementos dessa solicitação, que se prendem com os objectivos mais alargados e os grandes problemas da União Europeia no domínio do desenvolvimento sustentável, muito particularmente em matéria de emprego, produtividade e crescimento económico.

2.2

Sem se desviar do seu dever de se concentrar nas questões colocadas a este respeito pela Presidência neerlandesa, o CESE julga não obstante necessário integrar a sua análise num quadro mais geral (7) que reflicta a totalidade da sua posição sobre a estratégia global da UE nos domínios em questão e na conjuntura actual.

3.   Definição dos conceitos (8)

3.1

A noção de «formação (profissional)» pode ser entendida como a «aquisição, a renovação e a actualização de conhecimentos e competências essencialmente técnicos».

3.2

A formação e o ensino iniciais referem-se à fase de aquisição por um indivíduo de conhecimentos e de competências primários e gerais relacionados com a profissão que exercerá. Em vários Estados-Membros, a formação e o ensino iniciais são reforçados pela instituição da aprendizagem, que combina diversas formas de formação e de ensino com a prática através de estágios em empresas.

3.3

O conceito de formação profissional contínua denota uma aprendizagem orientada para o mercado de trabalho ou as empresas. Baseia-se em qualificações e experiências já adquiridas e visa actualizar o saber e as competências, ampliá-los e qualificar o indivíduo para domínios profissionais e actividades empresariais que sejam diferentes ou novos. A formação contínua destina-se em primeiro lugar aos membros da população activa, isto é, a pessoas que efectuaram uma formação e um ensino iniciais (em certos casos, como trabalhadores formados no interior da empresa, sem diploma no sentido próprio do termo) e que estão vinculadas a um contrato de trabalho ou inscritas nos centros de emprego (e que, neste caso, participam em medidas de promoção da formação profissional contínua e em cursos de reciclagem). Por outro lado, cada uma dessas pessoas tem a possibilidade de aproveitar as múltiplas ofertas de formação geral e profissional, que podem assumir as formas mais diversas e provir quer do sector público quer do sector privado.

3.4

Os sistemas europeus de formação profissional diferem consideravelmente de um Estado-Membro para outro e apresentam igualmente diferenças intrínsecas no interior de cada Estado-Membro uma vez que devem adaptar-se continuamente às exigências do mundo profissional e do mundo do trabalho. Formular uma definição conceptual precisa e directamente aplicável da formação profissional constitui um desafio permanente, quer do ponto de vista semântico quer do ponto de vista linguístico. De um modo geral, o elemento essencial de todos os sistemas é a articulação da oferta profissional em duas vertentes: as instituições de formação e os locais de aprendizagem na empresa. A tónica pode ser colocada no domínio da formação e do ensino iniciais, mas também no da formação e do ensino contínuos, em função do nível de qualificação, do sector industrial e dos sectores profissionais. O mesmo vale para o tipo de oferta, que pode englobar seminários, módulos e cursos de duração variável, mas também percursos mais completos orientados para uma profissão. Além disso, os sistemas de formação profissional, os sistemas de qualificação, as instituições de formação e os empregadores reconhecem processos de aprendizagem não formais e informais (9).

3.5

Por aprendizagem ao longo da vida entende-se «toda e qualquer actividade de aprendizagem, com um objectivo, empreendida numa base contínua e visando melhorar conhecimentos, aptidões e competências» (10). Depois das conclusões do Conselho de Lisboa, o conceito de aprendizagem ao longo da vida adquiriu uma importância considerável no plano político e tornou-se um conceito-chave que traduz a necessidade universalmente reconhecida de reformar radicalmente o modelo europeu de formação, colocando-o sob o signo da transição para uma economia e uma sociedade do conhecimento (11). Para alcançar os objectivos de Lisboa, será essencial promover uma evolução consequente, uma modificação das estruturas, do funcionamento e dos métodos de ensino e de aprendizagem dos sistemas de formação geral e profissional. É dessa forma que a nova geração de programas de acção comunitária destinados à formação geral e à formação profissional se integrará, a partir de 2007, na aprendizagem ao longo da vida (12).

3.5.1

Continua a haver muito por fazer para aplicar esta noção de aprendizagem ao longo da vida de forma satisfatória, sobretudo no que diz respeito à estruturação da oferta, às possibilidades de acesso, à procura social ou à taxa de participação da população na sua composição global. As agências europeias do CEDEFOP (Centro Europeu para o Desenvolvimento da Formação Profissional) e da FEF (Fundação Europeia da Formação) envidaram esforços notáveis para permitir, de um modo geral, aos Estados-Membros, mas também, de forma mais orientada, às diferentes partes implicadas e aos intervenientes no sector da formação, um intercâmbio de ideias, de informações e de experiências (13). A prática, porém, continua a suscitar uma série de questões importantes, como:

inscrever todo e qualquer processo de aprendizagem (clássica ou não) na lógica da aprendizagem ao longo da vida;

articular esse processo com a edificação da sociedade e da economia do conhecimento;

combiná-lo com o desenvolvimento sustentável e os desafios contemporâneos da globalização;

mais especificamente, promover a aprendizagem ao longo da vida como motor do desenvolvimento da produção, da sociedade e da cultura a nível local;

criar um espaço europeu sobre a matéria;

aproveitar os benefícios dessa criação e identificar os diferentes resultados;

encontrar os meios de financiar a criação desse espaço.

3.5.2

No âmbito do processo de regulamentação da aprendizagem ao longo da vida conforme anteriormente descrito, procura-se uma nova repartição dos papéis e das competências, assim como um novo enquadramento para a cooperação a todos os níveis, mas sobretudo a nível local, onde é preciso, na perspectiva da concretização dos objectivos de Lisboa, dispor de uma colaboração forte entre os poderes públicos, os parceiros sociais e a sociedade civil em geral.

3.6

Em termos formais, e de acordo com a Comissão (14), a produtividade do trabalho corresponde à quantidade de trabalho necessário para produzir uma unidade de um bem qualquer. Do ponto de vista macro-económico, a produtividade do trabalho mede-se dividindo o produto interno bruto (PIB) pelo número de pessoas activas (15). O aumento da produtividade é o principal factor do crescimento económico (16).

4.   As políticas da UE em matéria de formação

4.1

A União Europeia «desenvolve uma política de formação profissional que apoie e complete as acções dos Estados-Membros, respeitando plenamente a responsabilidade dos Estados-Membros pelo conteúdo e pela organização da formação profissional» (17). As decisões de Copenhaga de 2002 marcam um avanço qualitativo na evolução desta política, que procura igualmente fomentar a coerência e a sinergia com a agenda de Lisboa sobre educação geral e formação profissional no horizonte 2010 (18). O relatório intercalar conjunto do Conselho e da Comissão sobre a execução do programa de trabalho detalhado para acompanhamento dos objectivos dos sistemas de educação e de formação na Europa (Abril de 2004) (19) constitui outro passo na direcção certa.

4.1.1

Agências europeias como o CEDEFOP e a FEF apoiam o desenvolvimento da formação profissional de forma específica. Em particular, complementam a aplicação das orientações da política europeia em matéria de formação profissional através da recolha, da difusão e do intercâmbio de informações, de experiências e de exemplos de boas práticas, encomendando estudos e relatórios, e analisando as investigações e as experiências práticas sobre a matéria. O dispositivo europeu de informação EURYDICE (20) coloca em rede, de forma semelhante, os actores dos sistemas de formação geral. A cooperação construtiva que estas três organizações sustentam é reforçada pela importância da aprendizagem ao longo da vida, que implica ela própria uma colaboração e uma articulação maiores da formação geral e da formação profissional.

4.1.2

O programa Leonardo da Vinci (21) tem como objectivo concretizar a política da União Europeia em prol da formação profissional, contribuindo para a «promoção de uma Europa do conhecimento mediante a criação de um espaço europeu de cooperação no domínio da educação e da formação profissional “e apoiando” as políticas dos Estados-Membros em matéria de formação ao longo da vida e do desenvolvimento dos conhecimentos, das aptidões e das competências susceptíveis de favorecer o exercício da cidadania activa e a capacidade de integração profissional» (22). A execução do programa é dirigida pelos Estados-Membros.

4.1.3

No quadro do desenvolvimento e da aplicação da aprendizagem ao longo da vida deve destacar-se a acção Grundvig do actual programa Sócrates II, que se dedica a promover uma estratégia educativa integrada abrangendo todo o actual espectro da formação profissional (23).

4.2

Há que assinalar que os sistemas nacionais de ensino geral e de formação profissional foram inicialmente organizados e desenvolvidos de acordo com necessidades específicas geradas pelo mercado de trabalho com o passar dos anos e para cada situação concreta. Por conseguinte, a sua evolução dava-se a um ritmo lento, correspondente ao do desenvolvimento do mercado. Por outro lado, e pelas mesmas razões, há grandes diferenças entre ambos, os quais provocam actualmente problemas de coordenação, de assimilação das boas práticas sobre a matéria e de compreensão mútua dos termos e dos conceitos que cada um utiliza.

4.3

Em 2004, as dotações que a União Europeia afectou ao ensino geral e à formação profissional ascenderam a 194 533 900 euros, dos quais 163 milhões de euros para o programa Leonardo da Vinci. Em comparação, as despesas com a formação, independentemente do tipo à excepção da formação profissional, elevaram-se a 268 848 500 euros. O orçamento global da DG Educação e Formação foi, quanto a ele, de 783 770 054 euros, para um orçamento global da UE de 92 370 071 153 euros (24).

4.3.1

Considerada à luz da importância económica e política da formação profissional, a exiguidade do orçamento que lhe é assinado verifica-se igualmente a nível nacional. Todos os intervenientes a todos os níveis de decisão concordam em que o montante global reservado à formação é insuficiente para a realização dos objectivos definidos.

4.4

Além disso, refira-se que a percentagem média de cidadãos da UE que beneficiam de uma formação profissional contínua é reduzida (8,4 %) (25). O objectivo que a União se fixou neste domínio para 2010 consiste em elevar essa percentagem a 12,5 % da população potencialmente activa, ou seja, da faixa etária entre 25 e 64 anos (26).

4.5

O êxito da formação contínua passa por uma formação profissional contínua e orientada para o futuro. É forçoso constatar que os sistemas actuais, os processos de aprendizagem e os seus resultados não permitem responder à exigências, nem do ponto de vista da qualidade nem do ponto de vista da quan- tidade. Esta apreciação global não significa que não haja ofertas de formação profissional eficazes e de alta qualidade em determinados sectores e contextos profissionais. As formações organizadas no interior das empresas para satisfazer uma necessidade particular e as ofertas destinadas ao nível sectorial (27) e concebidas pelos parceiros sociais ou em cooperação com eles podem ser citadas como exemplos.

5.   As políticas comunitárias a favor da produtividade

5.1

Todos os dados dos últimos anos dos estudos da Comissão Europeia sobre a matéria revelam que a evolução no domínio da produtividade na UE tem sido negativa. «Durante a segunda metade da década de noventa, e após um período de abrandamento considerável, os Estados Unidos registaram uma aceleração, quer no crescimento da produtividade do trabalho (de uma média de 1,2 %, no período compreendido entre 1990 e 1995, para 1,9 %, no período compreendido entre 1995 e 2001), quer no crescimento do emprego (de 0,9 % para 1,3 %). Na UE, o crescimento da produtividade do trabalho abrandou (de uma média de 1,9 %, na primeira metade da década, para 1,2 % no período compreendido entre 1995 e 2001), mas o crescimento do emprego registou uma retoma considerável (de uma diminuição de 0,6 %, na primeira metade da década, para um aumento de 1,2 % no período compreendido entre 1995 e 2001)» (28).

5.2

Verificam-se grandes disparidades entre as taxas de produtividade dos Estados-Membros da UE. A Comissão Europeia, na sua comunicação intitulada «Produtividade: a chave para a competitividade das economias e das empresas europeias» (29), procurou expor as causas e os efeitos que esta situação pode ter nos objectivos de Lisboa. Após indicar e explicar as enormes diferenças entre Estados-Membros a este nível, a comunicação afirma que «o aumento do crescimento económico depende acima de tudo do reforço da produtividade. Os progressos ao nível das TIC e da inovação e uma mão-de-obra mais adaptada às necessidades da indústria podem ser considerados como decisivos para a melhoria da produtividade das empresas» (30).

5.3

O CESE considera que o aumento da produtividade na UE é a chave para o seu futuro global. O CESE entende igualmente que os esforços envidados para aumentar a produtividade, quaisquer que sejam, podem e devem inscrever-se no quadro do modelo social europeu e ser aplicados com o auxílio do mesmo. Por outro lado, o CESE é de opinião que esses esforços devem ter por alvo todos os cidadãos europeus (que devem aceitá-los), ser orientados para o médio e o longo prazo, ser sistemáticos e associar políticas e acções baseadas no conhecimento. Por último, o CESE defende que a coordenação entre os parceiros sociais (e, de forma geral, a sociedade civil) e os poderes públicos, sobretudo a nível local, deve desempenhar um papel motor na promoção desses esforços.

6.   Relação entre formação e produtividade

6.1

No entender do CESE e no que respeita ao cerne do problema, convém precisar que:

A produtividade representa um valor que é influenciado apenas parcialmente pela formação: «Questões como o nível dos investimentos, a organização no local de trabalho, as políticas de participação, a criação de ambientes de trabalho que estimulem a inovação, novas formas de cooperação entre as universidades e as empresas, novas formas de disponibilizar capitais de risco devem fazer parte de uma abordagem mais geral em defesa do crescimento da produtividade na União Europeia» (31). Por conseguinte, o aumento da produtividade é um problema de alcance mais longo do que quaisquer melhorias, por mais radicais que sejam, ao sistema de formação.

Na conjuntura actual, a formação pode influenciar a produtividade – e daí a competitividade e a necessidade de cumprir os objectivos de Lisboa –, na medida em que se insere no quadro de uma política educativa mais alargada e integrada (32), um quadro que deverá incluir um sistema de comunicação interna, elementar mas operacional, aos níveis regional, nacional e comunitário, no qual todas as formas de educação e de formação constituirão módulos da aprendizagem ao longo da vida e que será estruturado e orientado, no que se refere quer aos objectivos quer ao conteúdo, para responder a um ambiente de mobilidade acrescida e de múltiplas facetas (33).

A produtividade e a formação devem ser encaradas em conjunto e coordenadas a todos os níveis, incluindo o local de trabalho onde são tomadas quase todas as decisões quanto ao financiamento e o acesso à formação profissional contínua (CVT). É essencial também que esse trabalho se efectue colectivamente, mesmo nos casos que possam parecer, à primeira vista, de ordem privada.

Em qualquer caso, o apoio comunitário às regiões que revelem atraso no desenvolvimento de uma formação moderna, em particular nos novos Estados-Membros, assume uma importância destacada.

6.2

Nesta lógica, é inaceitável que as duas noções que constituem os sistemas de formação e, ainda mais, a de formação profissional contínua, permaneçam imóveis e distanciadas da conjuntura devem ser revistos de forma a funcionarem de forma mais eficaz do que actualmente, o que explica que os seus resultados concretos estejam em desproporção quer com os esforços envidados quer com os meios empregues (34).

6.2.1

Hoje em dia, o desenvolvimento de um sistema moderno de actualização dos conhecimentos, das aptidões e das qualificações implica uma composição diferente no que respeita às orientações, aos conhecimentos, aos objectivos, ao quadro de funcionamento e aos incentivos. Mais precisamente, impõe-se:

uma familiarização com os novos valores mundiais (designadamente em matéria de ordenamento do território, de economia, de tecnologia, de civilização e de população),

um conhecimento, geral e específico, válido da lógica e do modo de funcionamento do mercado planetário e das novas formas de governação política e económica mundial,

uma maior receptividade às necessidades e às aspirações da sociedade e da economia do conhecimento, mediante a criação de programas inovadores, atraentes e flexíveis,

uma sensibilização para as novas disparidades do actual sistema mundial de produção e para a necessidade de encontrar soluções para mitigar essas disparidades,

uma reformulação da actividade empresarial, pela via da sua legitimação social, por um lado, e pela acentuação da sua responsabilidade social, por outro,

o reforço dos estímulos à participação no processo de formação, nomeadamente através de uma definição mais clara do modo de repartição do valor acrescentado engendrado por esse processo,

o reconhecimento das três dimensões do conceito de sustentabilidade e respectiva promoção como modo de vida individual e colectivo (35).

6.2.2

As condições acima esboçadas não podem ser respeitadas em todas as formas e em todos os tipos de formação profissional, contínua ou não. Antes devem ser objecto de uma intervenção educativa sistemática e de longo alento (36) (aprendizagem e ensino) que conte com o concurso de vários aspectos. Essa intervenção deverá resultar numa instrução (socialização) em que se exercerá, no interesse do desenvolvimento sustentável, uma interacção entre o saber, que é a força motriz do progresso, e a sinergia.

6.3

Assim sendo, uma resposta lógica às duas primeiras questões da Presidência neerlandesa seria, no entender do CESE, a seguinte:

6.3.1

Actualmente, a natureza e o modo de funcionamento dos sistemas europeus de formação profissional, tanto no domínio do ensino inicial como no da formação contínua, têm dificuldade em responder às exigências da sociedade do conhecimento e do desenvolvimento económico sustentável. Os problemas concretos com que se deparam devem-se nomeadamente:

à sua orientação: estes sistemas têm estado tradicionalmente (e em grande medida estão ainda) orientados para a resolução dos diferentes problemas de um ambiente de produção muito pouco evolutivo;

ao seu âmbito de acção: no âmbito da sua orientação acima descrita, os sistemas europeus de ensino e de formação profissional devem integrar melhor o particular no geral como parte de uma visão de conjunto, como o exige a globalização da economia;

à sua capacidade de evolução: a orientação e o âmbito de acção dos sistemas de formação entravam parcialmente as suas possibilidades de evoluir, sob qualquer forma, tanto interiormente como face ao exterior. Esta evolução implica a circulação de ideias novas, o desenvolvimento de redes, a cultura da inovação e a formulação de políticas com base nos problemas;

ao seu contacto com o saber actual: independentemente da sensibilidade de cada educador, os sistemas de formação permanecem, regra geral, isentos de toda e qualquer obrigação de acompanhar a evolução da ciência, da tecnologia, da produção, etc.;

ao seu contacto com a evolução dos mercados de trabalho: os sistemas de educação e de formação não correspondem às necessidades do mercado do trabalho, na medida em que há escassez de determinadas novas qualificações emergentes ou de competências mais amplas, sociais ou pessoais;

à sua coordenação: em muitos dos Estados-Membros, a coordenação dos sistemas de educação e de formação contínua apresenta problemas. Por este facto, cada um deles está isolado de todo o restante sistema educativo, dos outros regimes comunitários e, evidentemente, da vida social e económica envolvente.

6.3.2

Por outro lado, é sensível a falta de estratégias, de objectivos, de recursos e de práticas educativas, o que imobiliza os sistemas europeus de educação e formação. Podem destacar-se os elementos seguintes:

a realização concreta da aprendizagem ao longo da vida deveria ser encetada sem demora, a todos os níveis da política e da prática;

uma coesão social e uma mobilidade acrescidas são objectivos essenciais da formação europeia e deveriam ser considerados como prioritários nas medidas a tomar pelas instâncias e pelos actores responsáveis;

muitos cursos de formação carecem de orientação para a vida prática, o que se repercute negativamente na capacidade de inserção profissional dos formandos;

frequentemente, o conteúdo das formações é demasiado dependente da situação no mercado de trabalho a curto prazo, o que a longo prazo conduz à sua inadequação às exigências do mercado de trabalho;

persistem importantes obstáculos à mobilidade entre Estados-Membros, devido ao não reconhecimento dos diplomas e da qualificações e ao conhecimento insuficiente de línguas estrangeiras.

7.   Preocupações e avaliações sobre o combate pela produtividade europeia

7.1

As constatações acima enumeradas impõem um diagnóstico grave: o combate pela produtividade não se tem desenrolado, na Europa, ao nível adequado nem ao ritmo necessário. Esse combate deveria centrar-se antes de mais nos domínios de educação e da formação de base, com vista à aquisição de aptidões de base (37), e prosseguir-se, com idêntica intensidade, no quadro da aprendizagem ao longo da vida (38) anteriormente definido (ponto 3.5).

7.2

Por esse motivo, as propostas seguintes referem-se à totalidade das acções educacionais independentemente do nível de poder de cuja competência sejam e inscrevem-se numa lógica única, que apela ao lançamento de uma vasta campanha coordenada com vista a adaptar o mais rapidamente possível todos os regimes europeus de educação e formação profissional às condições actuais na Europa e no mundo. Concretamente, propõem-se as acções seguintes:

7.2.1

Uma nova estratégia crítica para o conjunto das estruturas e dos objectivos dos sistemas educativos europeus (sistemas europeus de ensino geral e de formação profissional) e das relações entre eles. Esta nova estratégia deverá favorecer o desenvolvimento de um melhor nível de comunicação, de colaboração e de sinergia entre os módulos das diversas formas de educação, permitindo-lhes responder melhor aos desafios da globalização e da mutabilidade que ela pressupõe. Por outro lado, caracterizar-se-á por uma sensibilização para a posição e o papel que cabem à Europa como parceiro mundial nas novas formas de governação política e económica a nível mundial.

7.2.1.1

Importa destacar que esta estratégia não deve prejudicar, e sim promover, a dimensão humanista clássica da identidade europeia em matéria de educação e cultura.

7.2.1.2

No âmbito da estratégia referida, a formação não poderá ser encarada como um domínio autónomo nem ser analisada isoladamente. Deve ser integrada, como as outras formas de educação, incluindo os processos de aprendizagem não formais e informais, num sistema mais geral de aprendizagem ao longo da vida, destinado a suprir as necessidades dos cidadãos em matéria de aprendizagem e que, ao nível local, será directa e inteiramente ligado ao grande objectivo do desenvolvimento sustentável.

7.2.2

Uma segunda proposta do CESE está relacionada com a óptica europeia e com a participação na nova estratégia crítica para os novos objectivos e estruturas dos sistemas europeus de aprendizagem (sistemas de ensino geral e formação profissional) e suas relações mútuas.

7.2.2.1

O CESE reconhece que a amplitude e a urgência dos problemas, aliadas aos elevados custos da sua resolução, requerem acções imediatas e estudos a nível europeu.

7.2.2.2

O objectivo dessas acções e desses estudos não deve, como é evidente, ser uma qualquer intervenção da UE nas estruturas existentes dos sistemas europeus de aprendizagem (sistemas de ensino geral e de formação profissional). A diversidade destes constitui uma riqueza de valor inestimável que é preciso reforçar.

7.2.2.3

As acções e os estudos supracitados podem abrir novas possibilidades, revelar boas práticas de familiarização dos sistemas educativos com os novos dados e permitir medidas-piloto e novos modelos de associação dos sistemas de aprendizagem (sistemas de ensino geral e de formação profissional) aos objectivos de Lisboa, aos outros grandes objectivos comunitários e às novas formas de encarar, investigar, divulgar e explorar o novo saber mundial.

7.2.2.4

Nesta ordem de ideias, e nomeadamente no que respeita à produtividade e questões afins, a União Europeia tem o direito de se pronunciar e de agir, com base no acervo comunitário sobre a matéria, um direito que lhe compete analisar, justificar e promover, sobretudo a nível local e regional.

7.2.2.5

A participação da União Europeia na nova estratégia para os objectivos e estruturas dos sistemas europeus de aprendizagem (sistemas de ensino geral e de formação profissional) apresenta uma outra dimensão extremamente importante. A UE pode reduzir drasticamente o custo das investigações tomando a seu cargo, em lugar dos Estados-Membros e em cooperação com estes, a análise, a divulgação e a promoção de outras boas práticas. Mediante o método aberto de coordenação, a UE pode igualmente conferir uma maior mobilidade e uma maior dinâmica aos esforços de concretização dos objectivos comuns.

7.2.3

A terceira proposta do CESE diz respeito à forma como o processo de aprendizagem, independentemente do tipo, pode ser associado à viabilidade das políticas económicas, sociais e ambientais. Esta posição do CESE é a mais complexa, mas também a mais concreta. Baseia-se na sua experiência e pode ser considerada uma boa prática (39).

7.2.3.1

A proposta do CESE parte do princípio de que problemas difíceis como os da sobrevivência, do desenvolvimento sustentável, da produtividade, da competitividade ou da criação de uma sociedade do conhecimento não podem ser resolvidos à revelia da realidade, através de estratégias isoladas ou de opções de ponta. Esses problemas não podem ser tratados como casos isolados, com acções fragmentadas, mas sim ao nível da sociedade, com intervenções integradas e participações conscientes, individuais e colectivas. Assim, a proposta central do CESE quanto à produtividade vai além do nível europeu, nacional e sectorial e passa pelo nível local, por políticas integradas de desenvolvimento sustentável e pelo reforço de todas as formas de cooperação entre parceiros sociais (40), e de forma mais geral entre a sociedade civil e as autarquias locais, para a realização de objectivos comuns (41).

7.2.3.2

O saber, a experiência e a inovação são destacados pela proposta enquanto elementos essenciais para a coerência das cooperações, mas também dos objectivos comuns.

7.2.3.3

A viabilidade individual e empresarial, a familiarização com a evolução a nível mundial e o apoio mútuo aos esforços de desenvolvimento a nível individual e colectivo são a força motriz indispensável ao bom funcionamento desta teoria.

7.2.3.4

O instrumento propugnado para concretizar esta proposta é o dispositivo de aprendizagem ao longo da vida, que pode ser desenvolvido livre da rigidez actual dos sistemas nacionais de aprendizagem, que se manifesta através de polarizações de todos os tipos geradas pela própria natureza do processo produtivo concorrencial interno.

7.2.3.5

De qualquer forma, independentemente dos serviços que a aprendizagem ao longo da vida, enquanto sistema integrado de aprendizagem e de educação, poderá oferecer actual ou posteriormente, há que desenvolver directamente um sistema de incentivos e de pressões (políticos e sociais) para que os sistemas europeus de aprendizagem adaptem desde já (42) os seus objectivos aos de Lisboa. Esses objectivos assim adaptados devem pois satisfazer:

as necessidades da economia da ciência, da nova economia e do mercado globalizado;

as necessidades do mercado de trabalho, que se formam e evoluem em função do impacto da evolução científica e tecnológica;

as necessidades em matéria de cultura empresarial, de espírito global produtivo, de legitimação social e de reconhecimento da inovação em geral, e mais particularmente das acções produtivas inovadoras.

7.2.3.6

Os incentivos pré-citados devem criar um ambiente de formação e aprendizagem ao longo da vida favorável e atraente. Será possível criar este ambiente se forem consolidadas as sinergias entre os estabelecimentos de educação, e nomeadamente as que existem entre esses estabelecimentos, as empresas, a sociedade civil e as autarquias locais, com vista a desenvolver procedimentos e acções que sirvam os objectivos de Lisboa.

8.   A repartição das responsabilidades e o problema do financiamento

8.1

Num processo multilateral que vise alcançar objectivos comuns, e sobretudo quando esse processo se insere no quadro da globalização, a repartição das responsabilidades constitui um problema complexo influenciado por diversos factores objectivos e subjectivos, entre os quais se destacam:

a identificação do quadro de funcionamento pelas partes e sua adesão ao mesmo;

o reconhecimento e a aceitação de fins comuns e da necessidade de os alcançar;

o ambiente e o equilíbrio da estratégia destinada a alcançar tais fins;

os incentivos associados à realização de objectivos precisos;

as perspectivas de êxito do esforço global.

8.1.1

No quadro assim delineado, clarificar os objectivos, os instrumentos e os incentivos em causa constitui um pré-requisito imprescindível a toda a participação de um indivíduo, de um grupo de pessoas, de uma empresa ou de uma autarquia local num processo de formação, de formação contínua ou de aprendizagem ao longo de vida. Por conseguinte, as responsabilidades na matéria não podem caber exclusivamente aos sujeitos da educação e da formação, mas comportam igualmente uma vertente política e social, que pode ser descrita como segue:

8.1.1.1

As responsabilidades políticas consistem antes de mais na criação de um quadro de funcionamento regular e transparente no que respeita aos termos e aos limites do funcionamento político, social ou outro do processo. Desenvolver políticas proactivas sobre a matéria, apoiar as formas de governação política e económica seleccionadas e financiar as acções com elas relacionadas é do domínio das responsabilidades políticas.

8.1.1.2

A sociedade civil, os parceiros sociais e as autarquias locais e regionais detêm igualmente importantes responsabilidades na promoção de uma política integrada de aprendizagem ao longo da vida. No essencial, prendem-se com a divulgação dos seus objectivos, da sua metodologia e dos seus instrumentos, para criar condições propícias à aquisição do saber; mas incluem também o lançamento de iniciativas conjuntas específicas e a elaboração de actividades integradas no âmbito dessas iniciativas, bem como a oferta de incentivos à participação nas diferentes políticas e acções seleccionadas e adoptadas em comum.

8.1.1.3

As responsabilidades das empresas apresentam uma dimensão económica e uma dimensão social. É a elas que compete determinar as condições e os limites da viabilidade das suas iniciativas. São igualmente elas quem deve continuamente avaliar as suas necessidades em matéria de aptidões e conhecimentos, desenvolvendo elas próprias ou em cooperação com outros actores do seu meio programas de formação específicos. Sobretudo as PME, que mantém relações próximos com o meio em que exercem a sua actividade, têm o dever de contribuir com o seu apoio, o seu aconselhamento e o seu empenho para o enquadramento socioeconómico em que se inserem, dado que lhes é difícil desenvolver por si sós intervenções educativas integradas. Esta observação vem, por outro lado, chamar a atenção para a responsabilidade social das empresas e, no contexto de uma produção globalizada, assume uma importância especial para a sua sobrevivência e para o tecido social que as envolve.

8.1.1.4

Por último, os indivíduos devem assumir, na sua participação num processo de aprendizagem ao longo da vida, diversas responsabilidades, como sejam modificar os seus pontos de vista, a sua atitude para com os factos e fenómenos que os rodeiam, a sua relação com a aprendizagem e com o saber e, de maneira mais geral, o seu modo de vida e de organização e aproveitamento do seu tempo livre. Desde logo, e em particular no caso dos cidadãos activos de uma certa idade, toda e qualquer obrigação de se inserir num processo de aprendizagem ao longo da vida deverá ser associado a obrigações concretas e a medidas de encorajamento reforçadas. Neste equilíbrio de obrigações e de incentivos pesa seguramente o tempo livre de que dispõe cada indivíduo, assim como a sua participação no valor acrescentado gerado pelas inovações e tecnologias modernas.

8.2

Igualmente complexo é o problema do financiamento da formação e, mais ainda, da aprendizagem ao longo da vida.

8.2.1

O artigo 14.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia estipula que «todas as pessoas têm direito à educação, bem como ao acesso à formação profissional e contínua». Logo, todos os níveis e todas as instâncias têm o dever de criar as condições necessárias ao respeito desses direitos. Para isso, um dos requisitos essenciais é garantir o financiamento necessário.

8.2.2

No entanto, e sem prejuízo deste dever constitucional, a dinâmica da sustentabilidade dependerá no essencial, e de um modo geral, da competitividade da economia (sobretudo face ao exterior) e das alianças que a esse nível serão contraídas.

8.2.2.1

A responsabilidade pública em matéria de financiamento da formação não exclui em momento algum a co-responsabilidade dos empregadores e das empresas. Esta co-responsabilidade não está relacionada, de forma geral, com o domínio da formação profissional e das ofertas de qualificação ou de formação contínua propostas pelas empresas, com vista a adquirir competências específicas próprias a certas empresas. As empresas devem manter permanentemente os seus trabalhadores em formação a fim de se adaptarem às evolução da tecnologia e da organização e às necessidades da sua expansão. Convém facilitar este esforço e apoiá-lo mediante diversas medidas de encorajamento como a criação de fundos comuns ou incitações fiscais a favor das empresas mas também dos trabalhadores. Essas medidas já foram referidas pelos parceiros sociais no segundo relatório conjunto, de 2004, sobre o acompanhamento, no âmbito dos esforços de promoção da aquisição de aptidões e competências ao longo da vida. O ponto 2. do primeiro capítulo desse relatório afirma o seguinte: «Os relatórios nacionais documentam a variedade de instrumentos de que se servem os parceiros sociais para mobilizar recursos para promover investimentos eficazes na aquisição de competências ao longo da vida. Alguns desses instrumentos são aplicados em cooperação com os poderes públicos, a nível europeu ou nacional (uso de fundos comunitários, incentivos fiscais, criação de novos fundos, etc.). Alguns deles são mais especificamente orientados para a promoção das capacidades individuais de aquisição de competências».

8.2.2.2

Em todo o caso, os investimentos na formação e na aquisição de conhecimentos que representam uma vantagem concorrencial inscrevem-se no quadro de parcerias duráveis e produtivas entre os actores e as instâncias do nível local, regional, nacional ou sectorial. Tais operações não podem limitar-se ao apoio aos poderes públicos; devem igualmente socorrer-se de uma série de recursos de origem distinta. Todas as alocações de fundos, todas as despesas e todas as actividades neste domínio contribuem para a qualificação enquanto processo de longa duração.

8.2.3

A missão essencial dos poderes públicos em matéria de formação, que abrange também o domínio da formação profissional, requer, além disso, soluções diferentes para cada caso. Há regiões e grupos populacionais que reclamam um tratamento financeiro específico. Por outro lado, certos sectores profissionais e certas empresas, em particular PME, necessitam igualmente de um tratamento particular.

8.2.3.1

As instâncias de financiamento da formação a todos os níveis deveriam reagir positivamente à inovação e mostrar-se mais compreensivos da realidade das empresas, sobretudo no caso das PME.

8.2.3.2

Estas estratégias individualizadas de financiamento da aprendizagem ao longo da vida deveriam ser decididas em toda a transparência, ao nível apropriado, e com a participação e o acordo dos parceiros sociais e da sociedade civil.

8.2.4

No que toca ao financiamento da aprendizagem ao longo da vida, o CESE salienta a urgência de gerir os recursos de maneira mais racional, tanto na sua atribuição como na sua eficácia enquanto investimentos.

8.2.4.1

O CESE propõe a elaboração de um relatório de alto nível, baseado nos estudos sobre a questão, o qual incluirá:

um inventário dos recursos e dos modos de financiamento da aprendizagem ao longo da vida, a todos os níveis;

uma avaliação da respectiva qualidade;

uma avaliação relativamente aos sistemas escolares oficiais;

uma avaliação e comparação da sua eficácia enquanto investimentos.

8.2.4.2

Este relatório permitiria chamar igualmente a atenção para problemas que não são ainda patentes. Além disso, revelará exemplos de boas práticas que poderão servir para elaborar um mapa de orientações gerais para o desenvolvimento da formação a partir deste momento, com o objectivo de criar um sistema integrado de aprendizagem ao longo da vida.

9.   Um exemplo de boa prática: um processo integrado de desenvolvimento sustentável a nível local

9.1

O ADEDY, central sindical da função pública na Grécia, elaborou recentemente um programa sobre a aprendizagem ao longo da vida intitulado «A aprendizagem ao longo da vida como direito individual no quadro do modelo social europeu do século XXI». Cofinanciado pela DG Educação, esse programa foi aplicado durante dois anos, até Janeiro de 2004, em três administrações regionais gregas geograficamente distintas (Kozani, Kalamata, na Messénia, e Cálcis, em Eubeia).

9.2

O objectivo da iniciativa era sensibilizar os quadros sindicais regionais, mas também, de forma mais geral, os responsáveis da sociedade civil organizada e das administrações municipais em toda a região para a necessidade de desenvolver, pelo fomento da aprendizagem ao longo da vida, formas de coordenação e cooperação locais com vista a alcançar os objectivos de Lisboa.

9.3

No que respeita aos resultados da acção: em cada um dos casos, os participantes concordaram unanimemente sobre planos de acção comuns (43), cujo conteúdo geral consistia em:

reconhecer as novas condições políticas, tecnológicas, económicas, sociais e culturais que a globalização da economia e a evolução tecnológica formam quotidianamente;

aceitar que a cooperação e a colaboração entre as administrações locais e a sociedade civil organizada constituem o quadro fundamental para enfrentar os problemas funcionais criados por essas novas condições e para realizar os objectivos concretos e mensuráveis de desenvolvimento sustentável que tenham sido decididos de comum acordo;

explorar o dispositivo de aprendizagem ao longo da vida como factor do desenvolvimento sustentável (no plano económico, social e ambiental) e para a aquisição e constituição de um saber mundial actualizado e válido;

criar e gerir para esse fim um centro polivalente consagrado, consoante os casos, à aprendizagem, ao desenvolvimento sustentável e à cultura.

10.   Recomendações

10.1

Partindo da perspectiva mais geral da qual considera o problema da competitividade como ele se faz hoje sentir, da sua concepção das noções de educação e de formação, mas também do seu realismo quanto aos resultados que podem ser esperados, o CESE formula as seguintes recomendações sobre formação ao longo da vida à atenção da Presidência neerlandesa:

10.1.1

Em teoria, a formação ao longo da vida destina-se a adultos activos. Ainda há poucos anos, ela bastava para satisfazer a procura de competências simples, durante períodos e em sectores que apresentavam uma evolução tecnológica correspondente. Isto explica como este tipo de formação se desenvolveu de forma privilegiada no sector secundário do aparelho produtivo.

10.1.2

Actualmente, a evolução das tecnologias e de outros sectores desenrola-se a uma cadência e a um ritmo muito diferentes, assume uma dimensão muito mais vasta e, sobretudo, é muito mais complexa. Acompanhar e assimilar essa evolução exige não só competências mas também aptidões (44). Por isso, a formação ao longo da vida tal como é hoje ministrada revela-se deficiente e ineficaz, perseguindo objectivos que não são os seus e que não está em posição de cumprir.

10.1.3

Além da rapidez crescente, a evolução tecnológica revela igualmente uma amplitude que impõe exigências de formação (uma formação actualizada a nível do conteúdo e da forma) a um leque muito mais alargado de trabalhadores e, em todo o caso, a todos os sectores de produção. Por um lado, tem-se tentado satisfazer estas necessidades por meio de práticas de formação antiquadas, as quais se revelaram, obviamente, inférteis dado que não correspondiam às necessidades objectivas da nossa época. Certas iniciativas dos parceiros sociais lançadas a nível sectorial constituem, porventura, a única excepção a esta regra.

10.1.4

A formação ao longo da vida na Europa encontra-se, pois, actualmente no estado acima descrito, isto é, numa situação em que é urgente o seu desenvolvimento mas em que não é capaz de responder à exigências modernas devido à falta de infra-estruturas, de cultura ou de boas práticas que possam servir de orientação.

10.1.5

A constatação desta realidade impõe a adopção de uma estratégia diferente quanto:

à significação da formação ao longo da vida nos nossos dias,

aos seus destinatários (faixas etárias, sectores),

à forma de a desenvolver com a máxima eficácia,

à forma de financiamento.

10.1.5.1

As respostas a dar às duas primeiras questões são de âmbito teórico e foram já formuladas no contexto da agenda de Lisboa, da aprendizagem ao longo da vida e do objectivo de uma sociedade e de uma economia do conhecimento. No entanto, não foi ainda dada resposta à terceira. Nas suas decisões, o Conselho Europeu (45) procurou em várias ocasiões concitar o empenho necessário para consubstanciar os compromissos assumidos na matéria, os quais são por vezes muito pormenorizados, mas sem obter resultados significativos.

10.1.6

A ligação em rede, à escala europeia, de numerosas empresas e a mobilidade dos trabalhadores tornam necessário que a política de emprego assuma uma dimensão europeia. Não obstando todas as diferenças entre os seus sistemas de formação, os Estados-Membros da UE devem ser encarados, no seu conjunto, como um «espaço de formação». Para o CESE, é importante:

inserir a formação ao longo da vida, entendida como processo de aprendizagem pós-escolar, num programa comunitário integrado de aprendizagem ao longo da vida que seja de aplicação imediata (46), formulando objectivos europeus de formação capazes de dar aos responsáveis ideias de reformas abertas para o futuro que abranjam os diferentes sistemas de ensino profissional e tenham conta da promoção da capacidade de inserção profissional. Importa que este programa se coadune com a dimensão europeia da aprendizagem ao longo da vida e que assegure que a formação profissional de base se inscreva numa óptica de actualização permanente dos conhecimentos;

associar e integrar de forma funcional e criativa o referido programa no processo de concretização do objectivo global de desenvolvimento sustentável;

materializar esta articulação da forma mais descentralizada e individualizada possível, no âmbito das directrizes comunitárias, das correspondentes estratégias nacionais e, sobretudo, da colaboração da sociedade civil com os poderes públicos e com o mundo da educação no sentido mais lato;

recorrer tanto quanto possível aos parceiros sociais e, mais particularmente, à colaboração por eles sustentada a nível europeu, nacional, local e sectorial;

apoiar e explorar formas de cooperação já instauradas neste domínio, a nível essencialmente local, pelos poderes públicos e pela sociedade civil;

orientar os conteúdos de formação para determinadas competências emergentes que correspondem às necessidades do mercado de trabalho e para um leque de conteúdos de formação tão alargado quanto possível;

permitir a aprendizagem ao longo da vida tornando a capacidade de aprendizagem no objectivo da formação. A melhor prova da capacidade de inserção profissional é a capacidade de aprendizagem;

encorajar a transmissão dos conhecimentos económicos a partir da formação escolar e educar com vistas a moldar as personalidades realizadas e mais particularmente inculcar o sentido da responsabilidade e da autonomia individuais;

facilitar a aprendizagem ao longo da vida definindo como objectivo da formação a capacidade de aprender, que é o melhor passaporte para aumentar a capacidade de inserção profissional;

incentivar a aprendizagem de línguas estrangeiras para fomentar a mobilidade e o intercâmbio entre os Estados-Membros. Essa aprendizagem deve ser intensificada a todos os níveis;

assegurar uma formação orientada para o pessoal, e sobretudo para os trabalhadores idosos, com vista a uma boa gestão das empresas e dos colaboradores, introduzindo planos de formação e de formação contínua nas empresas;

redobrar os esforços envidados para conseguir a equivalência e o reconhecimento dos diplomas de estudos e qualificações profissionais.

10.1.7

A estratégia aqui esboçada, que preconiza uma cooperação educativa reforçada à escala europeia e visa paliar de forma global e homogénea os atrasos constatados na prossecução dos objectivos de Lisboa, requer opções políticas claras, nomeadamente:

disponibilizar recursos suficientes para cobrir todo o leque de trabalhadores implicados e todos os tipos de formação exigidos pela conjuntura actual;

explorar o indispensável e entusiasta potencial educativo europeu;

criar um quadro e um ambiente de aprendizagem contemporâneos;

sensibilizar as administrações a todos os níveis, os parceiros sociais e, mais geralmente, a sociedade civil e assegurar a sua presença e participação activas;

definir melhor os papéis e as responsabilidades que competem aos diferentes beneficiários das iniciativas educativas e às instâncias que as oferecem; zelar também por uma determinação mais clara dos mecanismos de controlo de todas essas iniciativas a nível local, nacional e europeu;

angariar um empenho sustentado na promoção de todas as iniciativas e de todas as implicações do seu conteúdo e dos seus objectivos.

10.1.8

No entender do CESE, os obstáculos mais difíceis para a concretização da proposta acima descrita consistem na liberação dos recursos adequados e do potencial de acção dos actores locais (poderes públicos e sociedade civil).

10.1.8.1

Em parecer anterior, o CESE havia demonstrado a «necessidade de excluir da contabilização do défice público os investimentos de interesse europeu destinados à realização dos objectivos de Lisboa» (47). Parece ao CESE que os montantes destinados à aprendizagem ao longo da vida teriam efeitos positivos tanto para a edificação da Europa do conhecimento como para a promoção do desenvolvimento sustentável.

10.1.8.2

Transferir para o nível local o centro de gravidade da aprendizagem ao longo da vida permitiria activar novos potenciais, motivar uma maior mobilização e conferir maior transparência a todo o processo.

10.1.8.3

Um procedimento mais concertado, mais integrado e mais eficaz para a elaboração, promoção e acompanhamento da aplicação e da eficácia das decisões europeias em matéria de educação facilitaria a recuperação do atraso revelado pela União a nível da produtividade e da realização dos objectivos de Lisboa.

10.1.8.4

Por último, uma utilização mais generalizada e uma melhor coordenação dos vectores clássicos da educação (família, escola, emprego) proveria esta estratégia de uma dinâmica considerável, a qual é indispensável para alcançar o objectivo primordial de tornar a Europa na economia baseada no conhecimento mais dinâmica do mundo até 2010.

Bruxelas, 28 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Cf. a este respeito o programa da Presidência neerlandesa.

(2)  Cf. as conclusões da Presidência, capítulo III.

(3)  Cf. o ponto 45 das conclusões.

(4)  A nova agenda social será apresentada pela Comissão no primeiro semestre de 2005.

(5)  Note-se que o relatório de avaliação intercalar da Estratégia de Lisboa é aguardado para o Conselho Europeu da Primavera (Março de 2005).

(6)  A Presidência neerlandesa integrou as alterações estruturais previstas durante o seu mandato em quatro domínios de acção (redefinição eficaz das relações de trabalho e da vida social e familiar, activação do sistema de protecção social, promoção das mutações no local de trabalho, formação e produtividade).

(7)  Os trabalhos do CESE caracterizam-se presentemente por um tratamento dos problemas que consiste a integrar o particular no geral. Os pareceres JO C 110 de 30/04/04 (HORNUNG-DRAUS/GREIF) e JO C 117 de 30/04/04 (RIBBE/EHNMARK) oferecem dois exemplos recentes desta metodologia.

(8)  As publicações do CEDEFOP contêm informações muito detalhadas sobre as definições de conceitos no domínio da formação profissional; cf. nomeadamente o glossário do CEDEFOP, os relatórios de investigação sobre a formação profissional e os relatórios sobre a política de formação profissional (www.cedefop.eu.int e www.trainingvillage.gr). O anexo do parecer complementa essas informações. Sobre este ponto, vd. o anexo do parecer.

(9)  Para a definição conceptual, ver SEC(2000) 1832 (Memorando sobre a educação e a aprendizagem ao longo da vida) e COM(2001) 678 final (Tornar o espaço Europeu de aprendizagem ao longo da vida uma realidade).

(10)  COM(2001) 678 final.

(11)  Para a definição do conceito, ver SEC(2000) 1832, assim como a comunicação da Comissão Europeia COM(1997) 563 final «Por uma Europa do conhecimento».

(12)  COM(2004) 156 final.

(13)  Ver a este respeito as publicações de CEDEFOP sobre a matéria, compiladas sob o título «Trabalhar por uma formação ao longo da vida» (www.trainingvillage.gr), assim como os estudos e os relatórios da FEF sobre a situação nos novos Estados-Membros e nos países candidatos (www.etf.eu.int).

(14)  Para este ponto, ver SCADPlus: Produtividade: A chave da competitividade das economias e das empresas europeias. Note-se que independentemente do conceito de «produtividade do trabalho» são empregados igualmente outros conceitos que, sem terem o mesmo conteúdo, dizem respeito ao mesmo domínio. Podem citar-se os da produtividade da economia, da empresa, do país, do indivíduo, do capital, etc.

(15)  Para este aspecto, cf. COM(2002) 262 final (síntese: SCADPlus: Produtividade: A chave para a competitividade das economias e das empresas europeias.

(16)  Ver COM(2002) 262 final (síntese: SCADPlus: Produtividade: A chave para a competitividade das economias e das empresas europeias.

(17)  Artigo III-183.o do projecto de Constituição. Observe-se que as competências da União em matéria de formação profissional são descritas nestes termos: «A União desenvolve», ao passo que para a educação, a formulação é «A União contribui para o desenvolvimento de uma educação de qualidade ...».

(18)  http://europa.eu.int/comm/education/copenhagen/copenhagen_declaration_en.pdf.

(19)  Cf. «Educação e formação 2010: PRINCIPAIS MENSAGENS DO CONSELHO E DA COMISSÃO AO CONSELHO EUROPEU» (2004/C 104/01).

(20)  www.eurydice.org.

(21)  Os programas anteriores em matéria de formação profissional intitularam-se Comett (1986-1989 e 1990-1994), Iris (1988-1993 e 1994-1998), Petra (1988-1991 e 1992-1994), Eurotecnet e Force.

(22)  Artigo 1.o, n.o 3, da decisão do Conselho que cria um programa de acção para a execução da política comunitária em matéria de formação profissional (programa Leonardo da Vinci).

(23)  http://europa.eu.int/comm/education/programmes/socrates/grundtvig/overview_en.html.

(24)  O orçamento da DG Educação e Cultura representa 0,85 % do orçamento total da UE. As dotações afectadas à formação: 0,25 % do orçamento da DG Educ, e 0,002 % (0,003 % para a educação de todos os tipos e níveis) do orçamento global da União (todos os dados são extraídos ou baseiam-se no orçamento geral da União Europeia para 2004).

(25)  Um inquérito do EUROSTAT (CVTS 2/Data 1999/EDIÇÃO 2002) expende observações de nimiamente importantes sobre as componentes quantitativas e qualitativas da formação numa amostra de Estados-Membros e em função do sector.

(26)  De salientar que a proposta inicial da Comissão previa que «Até 2010, o nível médio de participação na aprendizagem ao longo da vida na UE deverá abranger, no mínimo, 15 % da população adulta em idade activa (faixa etária dos 25-64 anos), não devendo em nenhum país essa percentagem ser inferior a 10 %.». O Conselho de 5 de Maio de 2003 alterou esta prescrição no sentido acima descrito (fonte: http://europa.eu.int/scadplus/leg/pt/cha/c11064.htm).

(27)  O nível sectorial da formação parece revestir uma importância saliente para a obtenção de qualificações e competências internacionais. Os actores que intervêm a este nível vêem-se directamente confrontados com problemas e desafios inerentes à globalização e ao desenvolvimento de novas tecnologias e estão, por isso, bem posicionados para propor e aplicar soluções (Leonardo da Vinci, EAC/11/04, capítulo III).

(28)  COM(2002) 262 final, ponto 2, segundo parágrafo.

(29)  COM(2002) 262 final.

(30)  http://europa.eu.int/scadplus/leg/pt/lvb/n26027.htm (conclusões).

(31)  Cf. ponto 4.4 do documento JO C 85 de 8.4.03 (SIRKEINEN-EHNMARK).

(32)  Cf. JO C 311 de 7.11.2001, em particular o ponto 3.4.1 (KORYFIDIS-RODRÍGUEZ GARCÍA CARO-RUPP).

(33)  Actualmente, o problema central dos sistemas educativos europeus é a sua inadequação ao meio envolvente: ao passo que este se caracteriza, via de regra, por uma extrema mobilidade, esses sistemas acusam em geral uma total inércia.

(34)  Para mais pormenores, vd.Eurostat, Inquérito sobre a formação profissional contínua (CVTS 2), dados de 1999. Vd. igualmente os dados constantes do relatório intercalar conjunto do Conselho e da Comissão sobre a aplicação do programa de trabalho pormenorizado para acompanhamento dos objectivos dos sistemas de educação e de formação na Europa (2004/C 104/01).

(35)  Cf. ..., ponto 7.2.3.

(36)  A educação é entendida como a combinação entre a formação através do meio social e a aprendizagem (anexo).

(37)  As aptidões de base são formadas pelo conjunto das competências que complementam as qualificações fundamentais e gerais e permitem às pessoas adquirir competências mais facilmente, adaptar-se à evolução tecnológica ou organizacional e mostrar a mobilidade necessária no mercado de trabalho e na progressão da carreira (fonte: Segundo relatório sobre a investigação sobre formação e ensino profissionais na Europa, edições do CEDEFOP).

(38)  O ponto 39 das conclusões do Conselho Europeu de 25 e 26 de Março de 2004 refere-se a este ponto nos seguintes termos: «Reconhece ainda que a aprendizagem ao longo da vida tem efeitos positivos na produtividade e na oferta de emprego; é favorável à aprovação de um programa integrado da UE em 2005, assim como à implementação de estratégias nacionais em todos os Estados-Membros até 2006».

(39)  Para mais pormenores, vd. o plano de acção anexo para o desenvolvimento de um centro local polivalente de aprendizagem, desenvolvimento sustentável e instrução.

(40)  Um exemplo típico são as prioridades definidas pelos parceiros sociais a nível europeu em Março de 2002, no âmbito dos seus esforços de promoção da aquisição ao longo da vida de aptidões e competências, as quais devem ser apoiadas.

(41)  Nas suas conclusões (ponto 43), o Conselho Europeu de 25 e 26 de Março de 2004 coloca a questão nestes termos: «O apoio e o incentivo à mudança devem transcender o âmbito dos governos. A fim de suscitar esse apoio, o Conselho Europeu exorta os Estados-Membros a criarem parcerias para a reforma que envolvam os parceiros sociais, a sociedade civil e as entidades públicas, de acordo com os mecanismos e tradições nacionais».

(42)  Para mais pormenores, ver o estudo e a análise da Federação das Indústrias Gregas sobre as necessidades das empresa para 2005-2007; esse estudo foi publicado em Junho último ( http://www.fgi.org.gr/frames.asp).

(43)  Anexo ao presente parecer está o mais recente destes planos de acção (disponível apenas em grego e em inglês), relativo à ilha de Eubeia (Cálcis). O conteúdo dos outros dois é semelhante.

(44)  A aptidão é a capacidade comprovada de um indivíduo de explorar a sua experiência, as suas competências, as suas qualificações ou os seus conhecimentos para gerir adequadamente situações e exigências profissionais, familiares ou inéditas (fonte: síntese dos principais pontos do segundo relatório sobre a investigação sobre formação e ensino profissionais na Europa, edições do CEDEFOP).

(45)  Uma frase do ponto 10 das conclusões do Conselho de 25 e 26 de Março de 2004 é sintomática disso mesmo: «O Conselho Europeu reconhece que a questão essencial é agora a necessidade de uma melhor implementação dos compromissos já assumidos».

(46)  Saliente-se a posição tomada a este respeito pelo Conselho Europeu de 25 e 26 de Março de 2004: Reconhece ainda que a aprendizagem ao longo da vida tem efeitos positivos na produtividade e na oferta de emprego; é favorável à aprovação de um programa integrado da UE em 2005, assim como à implementação de estratégias nacionais em todos os Estados-Membros até 2006.

(47)  Cf. a este respeito o ponto 5. do documento JO C 110 de 30.04.04 (FLORIO)


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/76


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Conselho que altera a Decisão 2002/463/CE que adopta um programa de acção de cooperação administrativa em matéria de fronteiras externas, vistos, asilo e imigração (programa ARGO)»

[COM(2004) 384 final — 2004/0122 (CNS)]

(2005/C 120/14)

Em 10 de Junho de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 22 de Setembro de 2004, tendo sido relator L. PARIZA CASTAÑOS.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 172 votos a favor, 2 votos contra e 5 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

O Tratado de Amesterdão passou a incluir um novo pilar de política comunitária assente na criação de um espaço europeu de liberdade, segurança e justiça abrangendo políticas comunitárias de controlo das fronteiras externas, de vistos, de asilo e de imigração.

1.2

Em Outubro de 1999, o Conselho Europeu de Tampere avançou com diversas propostas sobre uma política comunitária comum de imigração e de asilo.

1.3

Uma das propostas de Tampere centra-se no reforço da cooperação e da assistência técnica mútua entre os serviços de controlo das fronteiras dos Estados-Membros corroborada posteriormente nos Conselhos de Sevilha (2002) e de Salónica (2003).

2.   Proposta da Comissão

2.1

O programa ARGO promove a cooperação administrativa em matéria de fronteiras externas, vistos, asilo e imigração. O Conselho adoptou em 13 de Junho de 2002 o programa ARGO e nesse mesmo dia adoptou igualmente um Plano de gestão das fronteiras externas.

2.2

Os objectivos deste programa consistem em promover a cooperação, favorecer a aplicação uniforme do direito comunitário, melhorar a eficácia na execução das regras comunitárias, assegurar a dimensão comunitária na organização dos serviços e incentivar a transparência das acções.

2.3

Para o efeito, são indicados quatro campos de actuação concretos articulados entre si: fronteiras externas, políticas de vistos, política de asilo e política de imigração.

2.4

No atinente às fronteiras, a intenção é estabelecer acções de controlo em conformidade com as disposições comunitárias, muito em particular com o conteúdo e o acervo de Schengen, uniformizar os critérios de fiscalização e de protecção das fronteiras e aumentar a eficácia dos instrumentos.

2.5

Com respeito aos vistos, importa garantir que os processos de emissão estejam em sintonia com o estabelecido na legislação da UE, segundo a qual é necessário garantir um nível equivalente de controlo e de segurança na emissão dos vistos, harmonizar os modelos de pedido e os requisitos exigidos, bem como as excepções ao sistema geral de emissão de vistos, e ao mesmo tempo consolidar a cooperação consular.

2.6

Em matéria de asilo, prevê-se criar um sistema de asilo europeu comum para se obter um estatuto uniforme para o refugiado, facilitar mediante procedimento adequado a determinação do Estado responsável pela análise de um pedido de asilo e harmonizar as legislações nacionais fixando normas mínimas para os procedimentos de asilo.

2.7

No atinente à imigração, a ideia é elaborar legislação comum sobre condições de entrada e residência de nacionais de países terceiros e criar um estatuto europeu de residente de longa duração. O mais importante neste contexto é abrir os canais legais para a imigração económica e lutar contra a imigração clandestina.

2.8

Em Sevilha, o Conselho Europeu convidou a Comissão a analisar as questões relativas à repartição dos encargos financeiros no que se refere à gestão das fronteiras externas. A Comissão considera que para uma solução adequada se terá de aguardar as perspectivas financeiras a partir de 2006. A proposta de alteração do programa ARGO tem, por conseguinte, um carácter temporário até ser aprovado o quadro orçamental para o futuro.

2.9

A Comissão concluiu da sua avaliação do primeiro ano de funcionamento (2003) que o programa ARGO não tem sido explorado em todas as suas potencialidades. Gastaram-se menos de 50 % dos fundos disponíveis dada a dificuldade que têm tido as administrações nacionais em associar-se com as suas congéneres dos outros Estados-Membros na elaboração dos projectos promovidos e financiados por este mesmo programa.

2.10

Com esta alteração pretende-se que a ajuda financeira passe a contemplar igualmente projectos nacionais no domínio das fronteiras externas para compensar certas deficiências estruturais verificadas em pontos da passagem fronteiriços estratégicos, identificados com base em critérios objectivos (avaliação de riscos), os quais serão definidos no programa de trabalho anual estabelecido pela Comissão em concertação com o Comité ARGO.

2.11

O programa ARGO disporá de uma dotação orçamental de 46,1 milhões de euros até 2006, dos quais 21,3 milhões se destinam a 2004.

2.12

O interesse comunitário encontra-se salvaguardado pelos artigos 62.o, 63.o e 66.o do Tratado e pelo acervo de Schengen. O Reino Unido e a Irlanda adoptarão a respectiva decisão nos termos do Tratado.

3.   Observações

3.1

O CESE saúda a alteração do programa ARGO que tem por finalidade ampliar as ajudas financeiras nele previstas aos projectos nacionais no domínio das fronteiras externas, mas não quer deixar de salientar que o carácter estratégico dos projectos deve ser estabelecido pelo Comité ARGO, por proposta da Comissão, através da avaliação de riscos com base em critérios objectivos aprovados pela maioria dos Estados-Membros.

3.2

As dificuldades que as administrações têm tido para colaborarem entre si no âmbito do programa ARGO são o espelho da falta de cooperação entre os Estados-Membros na gestão das fronteiras externas.

3.3

O CESE vê toda a oportunidade em que, futuramente, se procure ir mais além do que a mera cooperação administrativa e se construa um sistema de solidariedade comunitária no domínio das fronteiras externas, dos vistos, do asilo e da imigração, no âmbito de uma política comum. Convém que esta abordagem seja tida em conta nas perspectivas financeiras a partir de 2007.

3.4

O CESE não entende por que tem sido tão demorada e problemática para o Conselho a criação da Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas (1).

3.5

O CESE exige que, na cooperação administrativa no domínio das fronteiras externas, de vistos, de asilo e imigração, as autoridades garantam sempre um tratamento humanitário e digno a todas as pessoas, de acordo com a Carta de Direitos Fundamentais da UE e as convenções internacionais em matéria de direitos humanos.

3.6

O parecer do CESE (2) sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que cria uma Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas» tecia as seguintes considerações:

3.6.1

«O CESE deseja que a eficácia no controlo das fronteiras respeite o direito de asilo. Muitos dos que necessitam de protecção internacional chegam às fronteiras externas através de vias clandestinas. As autoridades devem garantir que essas pessoas possam apresentar o seu pedido de protecção e que este seja analisado em conformidade com as convenções internacionais e a legislação comunitária e nacional. Enquanto não se resolverem os procedimentos administrativos e judiciais dos requerentes de asilo, estas pessoas não podem ser expulsas e devem dispor da protecção correspondente.».

3.6.2

«A falta de eficácia no controlo das fronteiras externas é utilizada muitas vezes pelas redes de criminosos que traficam com seres humanos, que não têm dúvidas em colocar em grave risco a vida das pessoas para aumentar os seus benefícios económicos ilícitos. No parecer sobre uma autorização de residência de curta duração para as vítimas da imigração clandestina ou tráfico de seres humanos  (3) , o CESE afirmou que, com a mesma energia com que se combatem as redes de criminosos que traficam e exploram os seres humanos, devem as autoridades proteger as vítimas, especialmente as mais vulneráveis, como o são os menores e as vítimas do tráfico e exploração sexual.».

3.6.3

«O CESE já afirmara em pareceres anteriores que para uma boa gestão das fronteiras exteriores, era necessária uma intensa cooperação entre as autoridades de fronteiras dos Estados-Membros e a colaboração das autoridades dos países de origem e de trânsito através dos funcionários de ligação.».

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2003) 687 final — 2003/0273 (CNS).

(2)  Vide parecer do CESE sobre a «Proposta de regulamento do Conselho relativo à criação de uma Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas» de 29 de Janeiro de 2004 (JO C 108 de 30/4/2004 — Relator: L. PARIZA CASTAÑOS).

(3)  JO C 221 de 17/9/2004 (relator: L. PARIZA CASTAÑOS).


20.5.2005   

PT

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C 120/78


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Regulamento do Conselho relativo ao Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência»

[COM(2003) 808 final — 2003/0311 (CNS)]

(2005/C 120/15)

Em 23 de Setembro de 2004, em conformidade com o artigo 152.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, o Comité Económico e Social Europeu decidiu elaborar um parecer sobre a proposta supra mencionada.

Foi designado relator-geral Jan Olsson.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o seguinte parecer por 159 votos a favor, sem votos contra e 1 abstenção.

1.   Síntese da proposta

1.1

A Comissão propõe a reformulação do Regulamento (CEE) n.o 302/93 do Conselho que institui um Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência.

1.2

As alterações propostas repartem-se por diferentes categorias:

as alterações destinadas a reforçar o papel do Observatório; trata-se, em especial, da necessidade de ter em conta as novas práticas em matéria de consumo de droga, sobretudo pelos jovens, entre os quais se regista uma tendência crescente para combinar o consumo de substâncias ilícitas com o consumo de substâncias lícitas como, por exemplo, o álcool, e o desenvolvimento pelo Observatório de indicadores para avaliar as políticas e as estratégias levadas a cabo pela União Europeia em matéria de droga;

as alterações destinadas a adaptar o modo de funcionamento dos órgãos do OEDT para ter em conta o alargamento. É prevista a criação de um Comité de Direcção, que terá por funções assistir o Conselho de Administração. Além disso, propõe-se a revisão da composição do Comité Científico do Observatório;

as alterações destinadas a eliminar determinadas incertezas que surgiram no decurso da aplicação do regulamento inicial. Trata-se, em especial, da menção relativa aos pontos focais REITOX em vez dos centros especializados.

2.   Observações na generalidade

2.1

O Comité Económico e Social Europeu lamenta o prazo muito curto imposto pelo Conselho para emitir parecer sobre uma proposta de regulamento apresentada pela Comissão em Dezembro de 2003.

2.2

O Observatório Europeu das Drogas e da Toxicodependência (OEDT) tem por objectivo fornecer à Comunidade e aos seus Estados-Membros informações objectivas, fiáveis e comparáveis a nível europeu sobre o fenómeno da droga e da toxicodependência e respectivas consequências.

2.3

O Comité acolhe favoravelmente a proposta de regulamento, cujo objectivo é alargar o papel do Observatório, adaptar o funcionamento dos seus órgãos e clarificar um certo número de incertezas sobre a aplicação do regulamento inicial.

3.   Observações na especialidade

3.1

O CESE urge a associação das organizações interessadas da sociedade civil aos trabalhos do OEDT. Assim, o Comité apoia sem reservas a proposta que figura no n.o 5 do artigo 5.o da proposta de regulamento, que diz que o Observatório pode «... recorrer a pareceres técnicos e fontes de informação complementares, em especial as redes transnacionais que exercem actividades no domínio da droga e da toxicodependência».

3.2

O CESE propõe que o Observatório disponha de um comité de contacto composto por representantes das redes europeias activas neste domínio e que estão em condições de fornecer informações complementares às fornecidas pelos pontos focais (1).

3.3

Em virtude do contributo financeiro comunitário para os pontos focais nacionais, o Comité

recomenda uma harmonização mais estrita na recolha de dados estatísticos por parte dos Estados-Membros, para uma maior fiabilidade e comparabilidade das informações, à semelhança do que se faz para o Eurostat. Assim, o n.o 2 do artigo 5.o da proposta de regulamento deverá ser reforçado nesse sentido;

recomenda igualmente a associação estreita das organizações interessadas da sociedade civil aos trabalhos dos pontos focais nacionais.

3.4

O Comité examinará com grande atenção o novo Plano de Acção da União Europeia em matéria de luta contra a droga, cuja publicação se prevê para o início de 2005.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Os pontos focais nacionais fazem parte da Rede Europeia de Informação sobre a Droga e a Toxicodependência (REITOX), de que dispõe o Observatório.


20.5.2005   

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C 120/79


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Melhorar a aplicação da Estratégia de Lisboa»

(2005/C 120/16)

Em 25 e 26 de Março de 2004, nas Conclusões da Presidência, o Conselho Europeu convidou o Comité Económico e Social Europeu, em conformidade com o artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, a examinar as formas de «Melhorar a aplicação da Estratégia de Lisboa».

A Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 7 de Outubro de 2004, sendo relator Bruno VEVER e co-relatores Ernst EHNMARK e John SIMPSON.

Na 412.a reunião plenária, realizada em 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o seguinte parecer por 169 votos a favor e 4 votos contra, com 8 abstenções:

1.   Introdução

1.1

O Comité Económico e Social Europeu congratula-se com o facto de o Conselho Europeu de 25 e 26 de Março de 2004 o ter convidado a examinar as formas de aplicar mais eficazmente a Estratégia de Lisboa, que está agora a meio caminho.

1.2

O Comité lembra que, desde o início, o mandato de Lisboa de 24 de Março de 2000:

salientou a necessidade de participação activa dos parceiros sociais e da sociedade civil na estratégia, recorrendo a diversas formas de parceria;

precisou que o êxito da estratégia dependeria principalmente do sector privado e das parcerias público-privado;

defendeu um desenvolvimento equilibrado das suas três dimensões, i.e. o crescimento económico, a coesão social e a sustentabilidade ambiental, incentivando a competitividade europeia e a criação de empregos com base em políticas ambientais adequadas.

1.3

Nos debates, audições e pareceres dos últimos anos, o Comité sublinhou sistematicamente a importância da Estratégia de Lisboa para o futuro económico e social da União e instou todos os actores socioprofissionais a nela participarem activamente. Em particular, o CESE adoptou recentemente pareceres sobre a competitividade das empresas europeias (1), a estratégia de desenvolvimento sustentável, a boa governação económica (2) e medidas de apoio ao emprego. O CESE tem repetidamente salientado que os objectivos da estratégia de Lisboa não poderão ser alcançados sem o pleno envolvimento da sociedade civil.

1.4

Em resposta ao convite do Conselho Europeu, o Comité, atendo-se embora aos seus recentes pontos de vista sobre a Estratégia de Lisboa:

envolveu todas as suas secções especializadas nesta tarefa;

procurou conhecer os pontos de vista dos conselhos económicos e sociais dos Estados-Membros e das principais organizações europeias representativas da sociedade civil organizada;

levou a efeito uma audição em Bruxelas, em 9 e 10 de Setembro, para este fim.

2.   Apreciação global

2.1

A Estratégia de Lisboa é conhecida, sobretudo, mas de maneira redutora, como um compromisso para fazer da Europa a economia baseada no conhecimento mais dinâmica e mais competitiva do mundo.

2.2

Esta descrição sumária da Estratégia de Lisboa tem sido frequentemente repetida, mas nem sempre com compreensão do seu alcance e de todas as suas implicações.

2.3

A Estratégia de Lisboa é uma visão muito ambiciosa para a sociedade da União Europeia no seu todo. A formulação da estratégia é a reafirmação dos objectivos fundamentais da UE, agora à escala mais vasta de uma União com 25 Estados-Membros.

2.4

A Estratégia de Lisboa não é:

um conceito apenas para economistas profissionais;

uma ambição do establishment de Bruxelas actuando isoladamente;

uma perspectiva estreita que apenas diz respeito à mudança económica;

uma ambição que pode ser considerada incompatível com o desenvolvimento sustentável;

um conceito que desconhece as consequências sociais do crescimento económico.

2.5

A Estratégia de Lisboa, quando correctamente apresentada e compreendida, é:

um método para traçar o futuro da Europa;

uma estratégia para manter e melhorar a qualidade de vida dos cidadãos europeus;

a necessidade de explorar as novas oportunidades da economia baseada no conhecimento;

o reconhecimento de que tanto a manutenção do emprego e a melhoria do nível de vida como a competitividade exigem uma nova dinâmica;

uma estratégia que promova a sinergia entre medidas económicas, sociais e ambientais;

uma estratégia que tira proveito do êxito já alcançado pela União Europeia.

capaz de um crescimento económico duradouro, acompanhado de uma melhoria quantitativa e qualitativa do emprego e de maior coesão social.

2.6

Na evolução da Estratégia de Lisboa, a busca da competitividade e do crescimento é um elemento fundamental para melhorar o bem-estar económico, criar emprego, manter e melhorar a qualidade dos estilos de vida. Por seu turno, uma melhor qualidade de vida, as melhorias sociais e a sustentabilidade ambiental criam crescimento. O progresso económico conseguido graças à estratégia de Lisboa permitirá intensificar o apoio às pessoas que vivem abaixo do limiar de pobreza, alargando a aplicação da inclusão social e tendo em conta a sustentabilidade destas conquistas para as gerações futuras.

2.7

Sustentar que a Estratégia de Lisboa diz apenas respeito à competitividade é não compreender a sua tese.

2.8

O Comité gostaria de começar por observar que a Estratégia de Lisboa já possibilitou diversos resultados positivos nos últimos cinco anos, incluindo:

tomada de consciência da necessidade de reformas, ultrapassando as clivagens tradicionais;

difusão acelerada das tecnologias da informação e dos processos de inovação;

maior apoio à criação de empresas e ao financiamento das PME;

maior preocupação com um desenvolvimento sustentável que visa reduzir os défices públicos, reequilibrar o orçamento da protecção social e proteger o ambiente;

iniciativas dos parceiros sociais no âmbito das reformas sociais;

medidas de simplificação legislativa e administrativa, ainda que de âmbito limitado.

2.9

Apesar destes aspectos positivos, a principal constatação é a de que os últimos cinco anos foram decepcionantes face às ambições de Lisboa. A Europa, «espartilhada» entre os seus grandes concorrentes industrializados e as economias emergentes com baixos custos de produção e que utilizam cada vez mais as novas tecnologias, enfrenta crescentes desafios competitivos. Há diversos indicadores preocupantes, nomeadamente os seguintes:

fraca procura interna, reduzido investimento e baixo nível de crescimento na União Europeia (cerca de 1 % por ano entre 2001 e 2003);

a impossibilidade de atingir os objectivos de emprego, a deterioração da qualidade do emprego e a perda da segurança de emprego;

aceleração dos encerramentos e das deslocalizações das unidades de produção europeias;

significativo êxodo para países terceiros de investigadores e de jovens que concluem os seus estudos;

persistência ou mesmo agravamento dos défices públicos em diversos Estados-Membros;

normas fiscais e taxas de imposição demasiado díspares para as empresas;

aumento do custo da protecção social, envelhecimento demográfico acelerado e crescente vulnerabilidade de alguns grupos;

a orientação da especialização de produtos, que não corresponde à ideia normalmente associada a uma economia do conhecimento.

2.10

Ao mesmo tempo, as reformas previstas na Estratégia de Lisboa registam atrasos.

2.10.1

Ao nível europeu, os 25 Estados-Membros comprometeram-se a concluir o mercado único em diversos domínios (energia, serviços, contratos públicos, redes transeuropeias, adaptação dos serviços públicos), mas não aplicam as medidas necessárias dentro dos prazos.

2.10.2

Ao nível nacional, os resultados são variáveis. Os pontos fracos são principalmente os seguintes:

complexidade estrutural dos regulamentos e dos procedimentos administrativos;

persistente inadequação entre oferta e procura de emprego;

taxa demasiado elevada de reformas antecipadas, apesar dos compromissos assumidos;

sistemas educativos;

oferta insuficiente de formação ao longo da vida;

despesas de investigação que de uma maneira geral foram decrescendo em vez de tenderem para o objectivo de 3 % do PIB fixado em Lisboa;

insuficiente atenção aos problemas societais suscitados pela necessidade de inovação.

2.10.3

Os novos Estados-Membros têm, não raro, de ultrapassar outras dificuldades decorrentes de um défice de desenvolvimento, por exemplo, em termos de emprego, tecnologias ou ambiente, se bem que essas desvantagens sejam, por vezes, compensadas por medidas de renovação que são mais radicais do que na UE dos 15. Entre estes últimos, os países nórdicos em geral avançaram mais nas reformas do que os países do Sul. Esta mesma observação é válida em relação à situação orçamental: houve Estados-Membros que conseguiram equilibrar os seus orçamentos, enquanto outros permitiram que o défice aumentasse. Mesmo os Estados-Membros mais avançados estão a passar por alguns atrasos em certos domínios comparativamente com países terceiros com melhor desempenho. O objectivo das reformas não é apenas fazer melhor do que anteriormente, mas fazer melhor do que em qualquer outro lado.

2.11

A Estratégia de Lisboa está, pois, enredada num ciclo vicioso. O baixo nível de crescimento dificulta a realização das reformas, cujo atraso, por seu turno, penaliza ainda mais o crescimento e o emprego. As reformas realizadas dizem sobretudo respeito à oferta como vertente económica. Estas não surtiram o efeito desejado porque não têm por contrapartida uma procura suficiente.

2.12

Nas Cimeiras da Primavera, os Estados-Membros têm dado a impressão de privilegiar novos debates sobre os objectivos já definidos em Lisboa – ainda que isso implique ainda mais recomendações – em vez de uma avaliação rigorosa da situação das reformas em curso e empenhar-se com determinação para realizar as acções pendentes dentro de prazos estabelecidos. É demasiado frequente não explicarem claramente em Bruxelas as iniciativas tomadas a nível nacional ou que sectores não realizaram os objectivos acordados em Bruxelas. A multiplicação de objectivos, de reformas, de compromissos e de Estados participantes, leva à diluição de responsabilidades, a uma deficiente execução e coordenação e, por conseguinte, a um insucesso em termos de impacto económico e de emprego.

2.13

Assim, corre-se o risco de, mau grado se acreditar na viabilidade da estratégia, não existir determinação suficiente para empreender as reformas necessárias. Seria improvável que esta «bolha» de Lisboa esperasse por 2010 para rebentar.

2.14

O objectivo definido em Lisboa de aumentar a competitivade através de reformas bem direccionadas, a par de um crescimento económico sustentável capaz de criar emprego e reforçar a coesão social, continua a ser pertinente para a Europa, que, neste momento, se encontra numa encruzilhada:

por um lado, é o primeiro exportador do mundo e o maior mercado único do mundo (em termos de PIB) e tem capacidade para levar por diante um projecto dinâmico, como ficou demonstrado com o euro e com o alargamento;

por outro lado, fica para trás em termos de crescimento económico, as deslocalizações de empresas fragilizam-na e sente-se desorientada e ameaçada pelo recuo registado devido à menor concorrência no mercado.

2.15

O objectivo de Lisboa é também um objectivo equilibrado, que concilia a meta económica da competitividade com as exigências sociais (emprego, formação, coesão social, condições de vida e de trabalho) e – como salientado na Cimeira de Gotemburgo – com as exigências ambientais, de uma forma proporcionada e interactiva.

2.16

Os métodos da Estratégia de Lisboa continuam válidos, baseando-se em:

um calendário plurianual para a conclusão do mercado único até 2010, que compreende diversas fases distintas;

uma avaliação conjunta anual na Cimeira da Primavera;

um método aberto de coordenação com os Estados-Membros com base em objectivos comuns, valorizando as melhores práticas, que pode ser um complemento útil do método comunitário em domínios de competência nacional;

ênfase no papel central do sector privado, parcerias público-privado, envolvimento da sociedade civil por parte das autoridades públicas e diálogo entre os parceiros sociais.

2.17

A colaboração segundo o método aberto de coordenação tem assumido até aqui o carácter de cooperação interestatal entre governos. Mas ainda é bastante insuficiente a sua implantação democrática nos parlamentos nacionais. Seria, portanto, oportuno lançar nos Estados-Membros um debate parlamentar anual sobre questões relacionadas com a Estratégia de Lisboa.

2.18

A participação e o apoio da sociedade civil, que são cruciais, têm sido muito insuficientes em diversos Estados-Membros. Esta falha importante constitui a maior desilusão em relação à aplicação da Estratégia de Lisboa e explica, em grande medida, as preocupações manifestadas e as insuficiências verificadas. Os persistentes défices em matéria de comunicação e de parceria são disso testemunho.

2.18.1

O défice de comunicação é óbvio. Nem os Estados-Membros nem os meios de comunicação social comunicam com a opinião pública sobre a Estratégia de Lisboa, apesar dos debates nacionais em curso sobre emprego, formação, protecção social, deslocalizações de empresas e concorrência tecnológica. Quando informada sobre o objectivo de competitividade definido em Lisboa, a maioria dos cidadãos europeus não compreende nem o seu sentido nem o seu alcance. Muitos consideram que fazer da Europa «a economia mais competitiva do mundo» ou é irrealista ou anuncia o fim do modelo social europeu, que resultaria do nivelamento com os países menos avançados nesse domínio. Estas reacções mostram que o objectivo tem de ser explicado, deixando claro que a finalidade é enfrentar com êxito a concorrência mundial, reduzindo algumas das nossas desvantagens e compensando outras mediante uma melhor utilização dos trunfos de que dispomos.

2.18.2

Muitos europeus estão a dar-se conta de que, enquanto as conquistas sociais são postas em causa, os benefícios que é suposto receberem em troca – em termos de emprego e de protecção social sustentável – permanecem pouco claros. As pessoas estão profundamente preocupadas com:

o número crescente de deslocalizações para países rivais que têm baixos custos de produção;

pressão crescente sobre o emprego e as condições de trabalho e perda da segurança de emprego;

dificuldade de reconversão das regiões e sectores mais afectados pelo desemprego;

fragilização dos sistemas de protecção social (desemprego, doença, velhice).

2.18.3

É também demasiado elevado o número de cidadãos europeus que consideram não ter uma palavra a dizer em matéria de reformas que, todavia, os afectam directamente e que, de uma maneira geral, põem em causa garantias e benefícios adquiridos. Acresce que os relatórios da Comissão e dos Estados-Membros contêm, em regra, escassa informação sobre os dispositivos de consulta e de participação da sociedade civil ou sobre as parcerias com os diversos actores da sociedade civil (papel do sector privado, papel dos parceiros sociais, parcerias público-privado, ONG, etc.), não obstante estes aspectos terem sido considerados de fundamental importância no mandato de Lisboa.

3.   Melhorar a competitividade

3.1

A ênfase na competitividade é o reconhecimento da necessidade de alcançar uma competitividade sustentável numa economia aberta e global, através de uma maior utilização das novas tecnologias, de uma formação profissional mais eficaz, de trabalhadores qualificados e da melhoria da produtividade. O conceito de qualidade (qualidade dos produtos, dos serviços, da regulamentação, da governação, do emprego, das relações sociais e do ambiente) é fundamental para a estratégia.

3.2

A melhor forma de alcançar estes objectivos seria dispor de um quadro internacional mais eficaz para o comércio e para os pagamentos.

3.3

Além de novas regras ao nível internacional, a economia europeia tem de simplificar a sua regulamentação interna, tanto ao nível comunitário como ao nível nacional. O excesso de burocracia desincentiva a tomada de iniciativas que são necessárias para competir.

3.4

Ao contrário da Comissão e do Conselho, o CESE é da opinião de que só uma reorientação radical da política económica – e, em especial, da macroeconómica – poderá resolver os bloqueios europeus internos a um relançamento conjuntural duradouro e promissor. A UE terá de se socorrer dos seus pontos fortes se quiser voltar a colocar a sua economia na via do crescimento e do pleno emprego. Uma política macroeconómica equilibrada, tendo por escopo declarado os objectivos da Estratégia de Lisboa, nomeadamente o pleno emprego, o reforço da competitividade, bem como a tomada em conta real da obrigação de um desenvolvimento «sustentável», de acordo com as conclusões da Cimeira de Gotemburgo.

3.5

O objectivo da política monetária também deveria consistir em obter um equilíbrio entre a estabilidade dos preços, o crescimento da economia e o emprego. O conjunto de políticas recomendadas pelo Conselho peca por não exigir claramente ao BCE que assuma as suas responsabilidades no âmbito da economia real (crescimento e emprego). Faria, pois, todo o sentido incentivar o BCE a perseguir um objectivo de estabilidade no sentido lato, que não procurasse apenas a estabilidade do valor da moeda, mas também a estabilidade do crescimento, do pleno emprego e do sistema da coesão social. O Comité Económico e Social Europeu já por diversas vezes (por exemplo, na sua resolução destinada à Convenção Europeia, de 19 de Setembro de 2002) reivindicou que a política monetária passasse a contribuir para a concretização dos objectivos de crescimento e pleno emprego.

3.6

As políticas de apoio à criação e desenvolvimento de empresas deveriam ser intensificadas e incluir, nomeadamente, a redução dos prazos e dos custos necessários para a constituição de sociedades, medidas para melhorar o acesso ao capital de risco, mais programas de formação para empresários e uma rede mais vasta de serviços de apoio às pequenas empresas.

3.7

A formação ao longo da vida deveria estar à disposição de todos os cidadãos de todas as idades e em todos os Estados-Membros, devendo-se incentivar as pessoas a dela beneficiarem.

3.8

É necessário libertar o potencial do Mercado Único. Nesta altura, a União Europeia deveria estar a colher os benefícios de um mercado maior do que o dos EUA ou da China. Todavia:

há demasiadas directivas que ainda não foram devidamente transpostas para a legislação nacional;

não se avançou o suficiente no sentido de assegurar a harmonização e o reconhecimento mútuo para o fornecimento de serviços;

têm-se registado atrasos na liberalização dos mercados, inclusive os do sector público;

têm surgido dificuldades para se chegar a acordo em matéria de direitos de propriedade intelectual europeus viáveis;

existem distorções decorrentes de diferenças em matéria de fiscalidade.

3.9

Deveria fazer-se depender a ajuda comunitária dos progressos realizados nos Estados-Membros em que as deficiências «estruturais» impedem a transposição.

3.10

O comércio e os pagamentos deveriam ser facilitados através do reforço da cooperação administrativa entre a Comissão e os Estados-Membros em diversos domínios, como, por exemplo, os procedimentos aduaneiros, os contratos do sector público e os serviços públicos transnacionais.

3.11

Os Estados-Membros registam ainda atrasos nos seguintes domínios:

interligação e modernização da infra-estrutura de transportes, o que tem afectado a realização de projectos da rede transeuropeia;

acesso das PME ao capital de risco;

défices públicos em alguns países;

as despesas de investigação, que, de uma maneira geral, têm diminuído em vez de aumentarem em relação ao PIB (1,9 % do PIB, contra 2,6 % nos EUA), estagnaram a um nível bastante inferior à meta dos 3 %;

elevada taxa de reformas antecipadas, apesar dos compromissos assumidos em Barcelona em 2002;

os sistemas educativos continuam a estar desfasados das realidades económicas e das perspectivas de emprego.

3.12

Por seu lado, as empresas europeias registam atrasos:

na investigação e desenvolvimento: em 2002, o sector privado americano dedicou à investigação 100 milhares de milhão de euros a mais do que o sector privado europeu. O Conselho Europeu de Lisboa definiu o objectivo de atribuir 3 % do PIB à investigação e desenvolvimento, devendo 2/3 do respectivo montante advir do sector privado. A contribuição actual deste sector corresponde a 56 %.

na formação ao longo da vida: desde que se definiu a Estratégia de Lisboa, a taxa de participação dos adultos na educação e na formação ao longo da vida aumentou apenas 0,5 %, sendo actualmente de 8,5 %. Esta evolução antevê o incumprimento do objectivo de 12,5 % até 2010, definido em Lisboa.

4.   Integrar a dimensão social

4.1

É necessária uma estratégia clara para incentivar a competitividade e manter a coesão social, o que poderia constituir um novo pacto para a política social. Este quadro deveria ser desenvolvido pelos parceiros sociais em colaboração com a Comissão e os governos dos Estados-Membros. A dimensão social da Estratégia de Lisboa deveria ser reconhecida sem reservas como factor fundamental para a realização dos objectivos de prosperidade, produtividade e inclusão social e terá de ser actualizada nos próximos cinco anos de aplicação da Estratégia de Lisboa.

4.2

O CESE exorta os governos dos Estados-Membros a avançar com as medidas necessárias para realizar a estratégia de Lisboa e promover o desenvolvimento económico, o que é altamente desejável para se poder traçar um novo rumo para a sociedade europeia, em torno de quatro eixos que merecem particular atenção:

mais e melhores empregos;

os idosos na vida profissional;

uma política de inclusão social mais activa;

os cuidados de saúde e a relação entre saúde e ambiente.

4.3

É igualmente necessário um esforço conjunto dos parceiros sociais, ONG e governos na concepção e financiamento de uma formação complementar mais qualificada a um nível consideravelmente mais elevado do que actualmente e para uma percentagem muito mais significativa das pessoas que procuram emprego, bem como as respectivas formas de financiamento, particularmente nos sectores que exigem qualificações baseadas no conhecimento mais avançadas.

4.4

É necessário que os parceiros sociais desenvolvam esforços conjuntos no sentido de melhorar o ambiente laboral e a organização do trabalho, de modo a associar a melhoria da produtividade a um maior valor acrescentado por trabalhador. Para minorar alguns dos problemas suscitados pelo envelhecimento da força de trabalho (e pela redução do número de jovens que entram no mercado de trabalho), os governos, as empresas e as organizações dos trabalhadores terão de lidar com estas características demográficas.

4.5

Dado que as pessoas negativamente afectadas pelos processos de mudança enfrentam problemas específicos, serão necessárias orientações para a definição de uma política de inclusão social mais activa.

4.6

Os objectivos globais definidos para a política social no âmbito da Estratégia de Lisboa continuam válidos, com ligeiras alterações. Por outro lado, a natureza e a dimensão dos desafios globais mudaram consideravelmente nos últimos quatro anos. O surgimento das economias em rápido crescimento da China e da Índia tem consequências directas para a Estratégia de Lisboa: são lançados cada vez mais produtos e serviços de alta tecnologia a preços muito atractivos. Verificando-se um forte aumento sustentado da produtividade nos Estados Unidos, a Estratégia de Lisboa persegue objectivos que se alteram rapidamente. A crer nas estatísticas, dá a impressão de que o aumento da produtividade horária média registado na Europa nos anos noventa, superior à dos EUA, é um fenómeno que pertence ao passado.

4.7

O alargamento da União Europeia é um factor positivo e um desafio. A entrada de novos Estados-Membros representou um enorme aumento do Mercado Interno, do poder de compra e dos recursos humanos qualificados. Todavia, os novos Estados-Membros colocam também novos desafios à inclusão social. No que respeita aos recursos humanos, há que desenvolver a educação e a formação em áreas de alta tecnologia, como é também o caso nos quinze Estados-Membros anteriores ao alargamento.

4.8

O CESE examinou o interesse de uma eventual Carta do Desenvolvimento Social Sustentável que abrangeria os aludidos domínios de política social e enunciaria os direitos fundamentais dos cidadãos na matéria. Com base nestas reflexões, o CESE propõe que o programa de trabalho no domínio da política social inclua uma Carta do Desenvolvimento Social Sustentável. A Carta teria de ser acompanhada de um programa de acção da UE, cujo objectivo seria coordenar as diversas acções e ajudar os Estados-Membros a definir os domínios prioritários.

5.   Desenvolvimento Sustentável

5.1

Está-se a proceder à revisão da Estratégia de Desenvolvimento Sustentável da UE, prevendo-se que será tomada uma decisão sobre os seus resultados no Conselho Europeu de Março de 2005. Esta estratégia inclui acções nos domínios económico, social e ambiental, a realizar segundo um método de ajuda mútua.

5.1.1

A Estratégia de Lisboa, tal como resultou das reuniões do Conselho Europeu realizadas na Primavera de 2002, inclui acções paralelas nos domínios económico, social e ambiental. A dimensão ambiental foi acrescentada por decisão do Conselho Europeu de Gotemburgo.

5.2

Seria um erro considerar a Estratégia de Lisboa e o princípio subjacente à estratégia de desenvolvimento sustentável como ambições contraditórias. A Estratégia de Lisboa tem um horizonte temporal preciso (até 2010). A estratégia de desenvolvimento sustentável tem duração ilimitada, abordando questões intergeracionais.

5.3

Tendo em conta a intenção do Conselho Europeu de rever simultaneamente as duas estratégias, em Março de 2005, é essencial reconhecer três aspectos:

a Estratégia de Lisboa, que tem apenas cinco anos pela frente, terá de começar a abordar questões cujo horizonte temporal vai para além de 2010. Em relação às questões e acções desta natureza, é necessário efectuar avaliações de acordo com os critérios aplicados para a estratégia de desenvolvimento sustentável. Com esta abordagem, a Estratégia de Lisboa possibilita o lançamento concreto de projectos que podem ser igualmente caracterizados como acções no âmbito da estratégia de desenvolvimento sustentável;

é essencial que a estratégia de desenvolvimento sustentável revista reconheça, no que respeita à definição de objectivos e de acções a longo prazo, as funções da Estratégia de Lisboa e preveja, quando for caso disso, a coordenação das acções e dos programas;

a Estratégia de Lisboa pode ter uma certa multiplicidade de objectivos e de acções, mas a estratégia de desenvolvimento sustentável terá, por definição, um leque ainda mais amplo de objectivos e de acções que, todavia, surgirão progressivamente. Em ambos os casos, é essencial que os níveis nacional e local possam desempenhar um papel decisivo. Nenhuma das duas estratégias pode funcionar se for fundamentalmente descendente. Ambas terão de ser estratégias ascendentes.

6.   Parcerias

6.1

As propostas ambiciosas para uma aplicação mais dinâmica do processo de Lisboa abarcam diversos temas. Se bem que nenhuma política ou plano de acção constitua o tema-chave, há um tema que se destaca. A aplicação eficaz da Estratégia de Lisboa exige o reconhecimento, ao nível comunitário, da interacção de muitas pessoas, governos, agências, organizações e instituições comunitárias.

6.2

Numa perspectiva positiva, uma dinâmica renovada depende de uma «parceria para a mudança» a vários níveis. O conceito de parceria é elucidativo de que os objectivos de Lisboa não relevam de uma abordagem descendente nem estão afastados dos problemas que afectam a vida quotidiana dos cidadãos.

6.3

O Comité recorda que um dos principais pontos fracos da aplicação da Estratégia de Lisboa é o facto de não se ter assegurado uma participação adequada dos agentes da sociedade civil, apesar de o mandato de Lisboa insistir expressamente nesse ponto. Tal fragilidade poderá ser fatal para o êxito da estratégia. O Comité congratula-se com o facto de, em 24 de Março de 2004, o Conselho Europeu ter defendido uma solução para este problema através de parcerias para a reforma. O Comité concordou em participar no processo através da apresentação de um plano de acção.

6.4

O Comité pretende trabalhar com os conselhos económicos e sociais dos Estados-Membros e com todos os parceiros socioprofissionais que desejem participar na criação de uma rede de iniciativas da sociedade civil para promover o êxito das reformas.

6.5

Será uma rede interactiva e descentralizada, que reunirá os sítios Internet dos participantes com vista a:

apresentar as iniciativas socioprofissionais (já em curso e projectadas) que contribuem para impulsionar as reformas previstas na Estratégia de Lisboa ao nível europeu, nacional ou regional;

pôr em evidência as melhores práticas nestes domínios, inclusive no que respeita às questões transfronteiriças;

partilhar as experiências e análises pertinentes dos actores da sociedade civil;

organizar fóruns consultivos e debates sobre as reformas.

6.6

Será elaborado um código de conduta para promover tais iniciativas, o qual será aplicado pelos participantes na rede.

6.7

Os parceiros da rede levarão a efeito uma conferência anual no quadro da preparação da Cimeira da Primavera em que será feito o balanço das iniciativas da sociedade civil.

6.8

O Comité pretende servir de fórum europeu para o diálogo sobre as «parcerias para a reforma», tirando proveito da experiência nacional e europeia.

6.9

Através desta ligação com os órgãos representativos nacionais, beneficiar-se-ia de uma experiência consolidada, o que permitiria que o CESE contribuísse mais eficazmente para as avaliações anuais a efectuar nos Conselhos da Primavera.

7.   Condições prévias para uma aplicação eficaz da Estratégia de Lisboa

7.1

Sublinhando embora a necessidade de conciliar as reformas previstas na Estratégia de Lisboa com a sociedade civil europeia, o Comité considera que o processo de revisão necessário para aplicar a Estratégia de Lisboa tem de satisfazer três requisitos.

7.2

Em primeiro lugar, a aplicação da Estratégia de Lisboa não pode ser adiada. A concorrência internacional aumenta todos os dias. A indústria está, por isso, a deslocalizar-se, fenómeno que afecta um número crescente de regiões e de sectores, já que têm de competir com economias emergentes que pagam salários baixos, têm baixos custos de produção e dispõem, não raras vezes, de tecnologias de vanguarda e inovadoras. Não é possível adiar a adopção de medidas eficazes e a longo prazo para restaurar a competitividade da Europa enquanto local de instalação de empresas.

7.3

A Estratégia de Lisboa é um conceito estratégico. Nesta acepção é comparável a conceitos estratégicos anteriores que fizeram avançar a integração de forma considerável. Nestes casos, havia uma programação com um calendário com etapas bem definidas, resultante da cooperação entre a Comissão e os Estados Membros. Foi o que aconteceu, no fim dos anos sessenta, com a União Aduaneira consagrada no Tratado. O êxito da «Europa 92» foi também fruto de um plano deste tipo. A União Monetária é outro exemplo de sucesso. Nos casos antes citados, ou foi o método comunitário que funcionou com eficácia, como na União Aduaneira e na «Europa 92», ou foi o contributo positivo dos Estados-Membros que os ajudou a alcançar o resultado que ambicionavam, ou seja, a participação na UEM. O problema é que actualmente não se verifica nenhuma destas situações. Assim, para conseguir avanços satisfatórios depende-se única e exclusivamente da vontade política.

7.4

Em segundo lugar, a Estratégia de Lisboa não pode ter êxito sem regras internacionais. Os empregadores e os trabalhadores europeus não querem entrar numa competição desenfreada e ficar enredados numa espiral incontrolável de redução de custos sem que se tenha em atenção a saúde, a segurança, o progresso social e ambiental e o desenvolvimento equilibrado e sustentável. Assim, as reformas previstas na Estratégia de Lisboa só podem ser bem sucedidas se, paralelamente, a União exercer pressão no quadro da OMC, do FMI, da OMPI, da OIT e de outras organizações internacionais, com o objectivo de definir um quadro para a globalização através de regras mais justas e mais eficazes. É essencial criar um quadro de referência para a competitividade internacionalmente reconhecido que estabeleça regras mínimas em matéria de competitividade, segurança, padrões de qualidade, direitos sociais, protecção dos menores, protecção do ambiente e propriedade intelectual. Seria irrealista tentar granjear o apoio da opinião pública europeia sem tais garantias.

7.5

Em terceiro lugar, a aplicação da Estratégia de Lisboa não pode ser contraditória com o modelo social europeu, sob pena de matar o doente que é suposto curar.

7.5.1

É fundamental dissipar os receios quanto ao alcance e ao custo social das reformas. Há que consciencializar as pessoas de que estas reformas são essenciais para a sustentabilidade do modelo de desenvolvimento europeu enquanto componente de uma economia aberta. A Estratégia de Lisboa deve ter como principal objectivo assegurar que o modelo social europeu consignado na Carta Social dos Direitos Fundamentais, que é tão caro aos nossos cidadãos, continue a ser viável e, simultaneamente, conciliar esse modelo com as exigências da competitividade.

7.5.2

A Estratégia de Lisboa deve também ter plenamente em conta as preocupações ambientais. Os compromissos assumidos em Gotemburgo, em 2001, confirmam e completam claramente a vontade expressa em Lisboa de conciliar uma economia competitiva com uma boa qualidade de vida.

7.6

Em quarto lugar, é evidente que o êxito da Estratégia de Lisboa depende do reforço das parcerias ao nível europeu, nacional e regional, tanto entre Estados como com representantes dos grupos de interesses socioprofissionais e com os parceiros sociais. Nos primeiros anos de aplicação da Estratégia de Lisboa, houve demasiados Estados que não envolveram plenamente os parceiros sociais na concepção e aplicação das reformas, consultando-os de forma insuficiente e fazendo-lhes apenas uma breve referência nos relatórios anuais de progresso. Nos cinco anos que restam para atingir o objectivo de Lisboa, estas falhas não podem repetir-se. O objectivo não será atingido sem que a sociedade civil seja informada, alertada, envolvida e efectivamente mobilizada.

8.   O CESE propõe oito prioridades para melhorar a aplicação da Estratégia de Lisboa

Com base na análise que efectuou e nas amplas consultas a que procedeu, o CESE gostaria de corresponder ao convite do Conselho Europeu apresentando as seguintes propostas:

8.1   Os Estados-Membros devem assumir maior responsabilidade pela estratégia

8.1.1

Os governos dos Estados-Membros têm de assumir uma responsabilidade clara e mais activa pela aplicação da agenda da Estratégia de Lisboa. É essencial que os governos e os parlamentos dos Estados-Membros assumam a estratégia como sua e apresentem programas claros e respectivos calendários para as acções que tencionam desenvolver para realizar os objectivos de Lisboa definidos nas reuniões de acompanhamento da cimeira.

8.1.2

A Estratégia de Lisboa deve ser reconhecida pelo que é: uma agenda muito ambiciosa para a construção de uma sociedade europeia de prosperidade, bem-estar, competitividade, inclusão social e forte consciencialização da dimensão ambiental. Nesta base, é fundamental comunicar mais activamente com os parceiros sociais e com a sociedade civil organizada. A Estratégia de Lisboa tem sido por demais considerada unicamente como uma agenda económica.

8.1.3

O Método Aberto de Coordenação tem de ser mais incisivo: as análises comparativas anuais devem ser mais pormenorizadas e os Estados-Membros terão de demonstrar mais claramente se existem obstáculos estruturais ou de outra natureza à realização dos objectivos definidos conjuntamente.

8.2   Reforçar o crescimento e a coesão

8.2.1

O Pacto de Estabilidade e Crescimento deve passar a ser um instrumento de crescimento e de melhoria da produtividade, sendo os objectivos de estabilidade definidos para ciclos económicos completos, e não para cada ano. É necessária uma combinação de políticas macroeconómicas liberta de tensões para apoiar a procura.

8.2.2

O BCE deveria ter mais em conta o impacte económico mais vasto das suas decisões e apoiar os objectivos de Lisboa, embora com as condicionantes resultantes do controlo da inflação.

8.2.3

Na coordenação das políticas económicas entre (e nos) Estados-Membros, os governos deveriam definir objectivos de desempenho e controlar os indicadores-chave para a demonstração dos resultados alcançados.

8.2.4

As políticas de coesão devem ser concebidas de forma a melhorar activamente os progressos em matéria de competitividade, o que, por sua vez, ajudará a reduzir as diferenças de níveis de rendimento na Comunidade. Deveria ser adoptado um código de práticas aceitáveis em matéria de utilização de Auxílios Estatais como um dos elementos das políticas de coesão.

8.3   Um mercado interno mais eficiente

8.3.1

Importa dar particular atenção à agenda para a realização do Mercado Interno, agora alargado a 25 Estados-Membros. A Comissão Europeia deveria incluir nas avaliações anuais da Estratégia de Lisboa um relatório pormenorizado sobre as questões pendentes no que respeita à sua aplicação.

8.3.2

Há diversas medidas relativas ao mercado único que há muito deveriam ter sido tomadas, sendo necessário adoptá-las de imediato: um regulamento que ponha termo à dupla tributação no mercado único; disponibilização imediata de uma patente comunitária simples, eficaz e pouco onerosa; relançamento da conclusão de um verdadeiro mercado interno dos serviços numa base equilibrada.

8.4   Promover a inovação e a qualidade

8.4.1

O BEI e o FEI deveriam concentrar-se mais em identificar, promover e estruturar projectos e programas de investimento, tanto públicos como privados, em cooperação com a Comissão e os Estados-Membros. O FEI deveria continuar a focar a necessidade de maior crescimento e de PME mais inovadoras através dos mecanismos do capital de risco e dos mandatos nas PME e por uma maior promoção das possibilidades de financiamento pelo BEI.

8.4.2

O conceito de qualidade (qualidade dos produtos e dos serviços, da regulamentação, da governação, do emprego, das relações sociais e do ambiente) é fundamental para a aplicação da Estratégia e deveria ser parte integrante das avaliações anuais dos progressos realizados ao nível nacional e comunitário.

8.5   Redefinir a política social

8.5.1

Há que reconhecer que a política social é condição prévia da competitividade e da produtividade e vice-versa. Importa elaborar uma agenda de política social renovada para a União Europeia alargada, que poderia revestir a forma de uma Carta do Desenvolvimento Social Sustentável abrangendo os principais domínios de política social e os direitos fundamentais dos cidadãos.

8.5.2

Há quatro domínios de política social que são particularmente importantes para promover a competitividade: políticas de emprego, os idosos na vida profissional, políticas de inclusão social mais activas e cuidados de saúde, incluindo a relação entre saúde, protecção social e ambiente. São necessárias novas iniciativas em todos estes domínios, associadas a uma consulta estreita entre a UE, os governos nacionais e os parceiros sociais.

8.5.3

Construir uma sociedade assente no conhecimento exige elevados níveis de recursos para educação e formação básica e contínua. A formação ao longo da vida, embora em expansão em todos os Estados-Membros, deve ser ainda mais desenvolvida, incluindo a formação ao longo da vida a níveis avançados. A Comissão Europeia deveria, em consulta com os parceiros sociais, explorar as possibilidades de se chegar a uma Carta da formação ao longo da vida ao nível europeu, incluindo opções financeiras alternativas.

8.5.4

De harmonia com os Conselhos Europeus de Tampere e Salónica, deve a UE adoptar uma política comum de imigração mais activa. Por razões demográficas, económicas e sociais, a imigração para a Europa continuará a ser uma questão essencial nos próximos anos. A estratégia de Lisboa requer que a UE tenha uma legislação transparente sobre admissão de imigrantes legais, que haja uma boa coordenação entre a política de imigração e a estratégia para o emprego, bem como novas políticas de imigração e de luta contra a discriminação.

8.6   Promover as parcerias púlico-privado no domínio da investigação

8.6.1

A investigação básica e a investigação aplicada são um dos principais pilares da sociedade assente no conhecimento. As empresas e os governos da UE estão aquém dos objectivos de aumento das despesas com a investigação. É possível gerar mais recursos através de parcerias público-privado no domínio da investigação. A Europa deve ter políticas activas para atrair investigadores estrangeiros e incentivar o regresso dos investigadores europeus que estão a trabalhar noutras paragens.

8.6.2

A Comissão Europeia deveria apresentar um plano de aumento dos investimentos em investigação, para uma melhor coordenação dos programas comunitários e nacionais e para a criação de um Conselho Europeu da Investigação.

8.6.3

A transferência de conhecimentos da investigação para a aplicação industrial é ineficaz e lenta na União Europeia, em comparação com o que se verifica nos Estados Unidos. A Comissão Europeia deveria apresentar um plano concreto de medidas para promover a transferência de conhecimentos para a aplicação industrial.

8.6.4

As pequenas e médias empresas têm particular necessidade de acesso à investigação e de apoio à introdução de soluções técnicas avançadas. O BCE deveria, juntamente com a Comissão Europeia, desenvolver formas e meios de promover a transferência de conhecimentos.

8.7   Proteger o ambiente de forma mais activa

8.7.1

A Estratégia de Lisboa assenta ainda num terceiro pilar: a dimensão ambiental. Há que promover mais activamente o desenvolvimento de tecnologias amigas do ambiente e aumentar os esforços conjuntos dos sectores público e privado no domínio do fornecimento e transporte de energia. Numa perspectiva de mais longo prazo, o sector do ambiente poderá gerar importantes efeitos de sinergia.

8.7.2

O desenvolvimento sustentável é necessariamente parte integrante da Estratégia de Lisboa para os próximos cinco anos, mas com um horizonte temporal bem mais vasto do que o da Estratégia de Lisboa. A Estratégia de Desenvolvimento Sustentável revista deveria incluir medidas concretas compatíveis com a segunda metade da Estratégia de Lisboa.

8.8   Obter o apoio dos cidadãos

8.8.1

Devolver a Estratégia de Lisboa aos cidadãos europeus! A sociedade civil organizada e os parceiros sociais devem desempenhar um papel mais claro e mais abrangente na aplicação da Estratégia de Lisboa. O CESE subscreve inteiramente as declarações do Conselho Europeu neste contexto.

8.8.2

Para que a realização dos objectivos de Lisboa seja uma meta realista, a União Europeia deve propor uma abordagem coerente, dinâmica e progressiva, tanto em termos de objectivos para a União como em termos de dinâmica institucional. O novo Tratado Constitucional Europeu, possivelmente a mais importante expressão destes objectivos, tem de ser explicado de maneira convincente e adoptado pelos Estados-Membros, devendo granjear o apoio dos cidadãos europeus.

8.8.3

O CESE considera assim essencial que uma Estratégia de Lisboa de «novo estilo» se guie pela metodologia da «Europa 92». Valer-se da prática existente implica sintetizar os relatórios sobre as Orientações de Política Económica, mercado interno, emprego e Estratégia de Lisboa num plano estratégico único munido de um calendário indicando claramente quem (a Comissão, o Conselho, o Parlamento Europeu ou os Estados-Membros) terá de realizar que acções, com base em que decisões e em que prazos

8.8.4

Ao nível nacional, os conselhos económicos e sociais podem desempenhar um papel muito importante, em conjunto com os parceiros sociais e diversas organizações da sociedade civil. A aplicação da Estratégia de Lisboa pode atribuir aos conselhos um papel muito específico.

8.8.5

Ao nível da UE, o CESE está pronto a assumir uma responsabilidade activa no apoio à aplicação e seguimento da Estratégia de Lisboa, em estreito contacto com os parceiros sociais e com as organizações da sociedade civil ao nível europeu.

8.8.6

Informar os cidadãos europeus sobre a Estratégia de Lisboa! Realçar os objectivos finais da Estratégia: construir uma Europa de prosperidade e de bem-estar, com elevada competitividade e consciência das questões ambientais. A aplicação da Estratégia não poderá ser bem sucedida sem a participação activa dos cidadãos. O CESE pretende contribuir activamente para este esforço de informação.

8.8.7

A aplicação da Estratégia de Lisboa exige uma coerência política clara aos níveis comunitário e nacional. Os três pilares da Estratégia oferecem oportunidades únicas para a obtenção de efeitos de sinergia em termos económicos, sociais e ambientais. É necessário relançar o processo da Estratégia de Lisboa – com os três pilares – em termos de política comum coerente.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO 117, de 30/4/2004.

(2)  JO 110, de 3/4/2004.


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/89


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O desafio competitivo das empresas europeias»

(2005/C 120/17)

Em 20 de Fevereiro de 2004, R. PRODI, em nome da Comissão Europeia, a que preside, solicitou ao Comité Económico e Social Europeu que elaborasse um parecer exploratório sobre: «O desafio competitivo das empresas europeias».

A Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 20 de Setembro de 2004, sendo relator B. VEVER e co-relatora L. FLORIO.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 105 votos a favor, 3 votos contra e 2 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Síntese

1.1

A Europa, espartilhada entre os seus grandes parceiros industrializados e as economias emergentes com baixos custos de produção, confronta-se com desafios acrescidos de competitividade. Esta situação é acompanhada de um défice comparativo de crescimento e de um considerável atraso de investimentos na formação, investigação e novas tecnologias, ao mesmo tempo que aumentam as deslocalizações de empresas europeias face à concorrência internacional.

1.2

À Europa, mesmo com o seu modelo de sociedade que valoriza as relações sociais, não faltam, todavia, trunfos competitivos para as suas empresas:

o seu comércio internacional testemunha a sua forte implicação na globalização;

o seu mercado interno alargado é, actualmente, o maior do mundo;

a sua união monetária, apesar de ainda restrita, constitui um progresso sem equivalente em qualquer outro lugar;

o seu programa de Lisboa em curso comporta reformas económicas, sociais e ambientais que visam, designadamente, renovar a competitividade de forma sustentável.

1.3

Quando alguns destes trunfos continuam a constituir ainda processos em curso mais do que propriamente conquistas irreversíveis, a Europa sofre também de graves limitações que penalizam as empresas e contribuem para os seus actuais fracos resultados em matéria de crescimento e emprego. A título de exemplo:

o ambiente legal e administrativo na Europa não apoia devidamente o espírito empresarial;

persistem demasiados entraves a nível do mercado único, ainda por concluir;

mau grado já existir a união monetária, continua-se à espera de uma verdadeira união económica;

avolumam-se também os atrasos no que respeita a aplicação da Estratégia de Lisboa em matéria de competitividade.

1.4

Para restabelecer a competitividade das empresas na Europa, o Comité realça quatro exigências, que se lhe afiguram indissociáveis umas das outras.

1.4.1

A primeira prioridade é reanimar a confiança dos actores económicos mediante:

uma visão mais nítida do projecto europeu integrado no seu ambiente global;

simplificação da regulamentação, tanto no plano europeu como nacional, dando maior margem de manobra à auto-regulação e à co-regulação socioprofissional;

medidas que facilitem a criação e o desenvolvimento das empresas — cf. capital de risco, formação dos empresários, serviços de apoio às PME;

mais apoio às iniciativas europeias inovadoras promovidas pelas empresas e a uma participação activa dos outros sectores socioprofissionais;

mais programas de formação, qualificação e reconversão profissional dos trabalhadores, nomeadamente para os mais velhos.

1.4.2

Uma outra prioridade é assegurar a finalização das disposições essenciais à consecução do mercado único, que não deveria sofrer mais nenhum adiamento para além de 2010, prazo fixado em Lisboa no que toca à competitividade — sem, no entanto, ignorar as necessidades de permanente manutenção que, mais tarde, se farão sentir. Isto implica:

maior rigor na transposição, com uma maior responsabilização dos governos neste domínio, podendo as ajudas da UE aos Estados em falta ser reorientadas, se necessário, para a redução dos atrasos de transposição;

decisões, que as empresas aguardam há demasiado tempo, para suprimir a dupla tributação, simplificar o regime europeu de IVA, criar um estatuto de sociedade europeia simplificada aberto às PME, desbloquear a patente comunitária;

um funcionamento mais seguro e mais fluido dos intercâmbios graças ao reforço da cooperação administrativa, inspecções comunitárias do mercado único, alfândegas unificadas nas fronteiras externas e maior eficácia e cooperação mútua dos serviços públicos, que poderia também justificar que se encarasse, em certos casos, a perspectiva de desenvolver serviços de interesse geral à escala europeia.

1.4.3

A competitividade das empresas europeias implica também que, utilizando uma abordagem igualmente sincronizada em relação ao dito prazo de 2010, se desenvolva uma união económica dinâmica em torno do euro, apta a estimular o crescimento e o emprego e apoiando-se numa política monetária adequada mediante:

a extensão progressiva mas sem atrasos injustificados da união monetária aos novos Estados-Membros;

a exigência de um parecer comunitário prévio e não a posteriori sobre os projectos de lei de finanças dos Estados;

um processo de aproximação das fiscalidades em condições compatíveis com uma economia aberta às trocas, atraente para os investimentos mas também preocupada com a sua coesão social, se necessário, através do reforço das cooperações;

medidas de apoio directo à actividade e ao crescimento económico na Europa: desenvolvimento de parcerias entre o sector público e o privado para o financiamento de novas infra-estruturas transeuropeias à escala da União alargada, afirmação de uma abordagem industrial europeia que contribua para realizar investimentos nas novas tecnologias, investigação e formação e orientar também a política de concorrência e a política comercial, mobilização dos meios tecnológicos europeus em torno de grandes projectos de interesse estratégico comum, incluindo no plano da segurança;

o reforço e a reafectação das dotações do orçamento comunitário de modo a corresponder às prioridades desta política económica comum.

1.4.4

A aplicação das reformas estruturais da Estratégia de Lisboa exige, enfim, mais determinação e coerência, que se conseguirá:

avaliando mais claramente o estado comparativo real das reformas económicas e dos investimentos (abertura dos mercados, acesso aos financiamentos, reforço da investigação), sociais (formação, mercado de trabalho, protecção social, investimento das empresas no capital humano), administrativas (redução dos défices públicos, simplificação da regulamentação) e ambientais;

garantindo uma melhor coordenação destas reformas em função, designadamente, do objectivo programado da competitividade com um forte envolvimento das instituições comunitárias e a simplificação dos processos de coordenação;

valorizando mais o papel dos parceiros sociais na concepção, execução e enquadramento das reformas, assim como na atractividade para os investimentos.

1.5

Em conclusão, o Comité verifica que as desvantagens competitivas das empresas europeias representam hoje o preço a pagar por uma Europa insuficientemente empreendedora, lenta na tomada de decisões e na adaptação às transformações internacionais, sempre inacabada em muitos domínios, atrasada nas suas reformas e explorando os seus trunfos de um modo medíocre, frequentemente hesitante, por vezes incoerente e, portanto, contraproducente. Para obviar a esta situação impõe-se uma acção determinada. Para ter êxito, necessita de se inscrever numa abordagem de crescimento mais determinada, que dinamize os factores económicos tanto da oferta como da procura num mercado único europeu mais fluido e mais eficiente. O Comité apoia, em particular, o apelo da última Cimeira da Primavera para que sejam promovidas novas parcerias para a reforma, tanto a nível nacional como europeu, associando mais estreitamente os parceiros sociais. O Comité salienta a necessidade de rumar firmemente em direcção ao objectivo de 2010, que deve englobar tanto a execução das reformas de Lisboa como a conclusão do mercado único e a realização de uma verdadeira união económica, competitiva, que extraia todas as lições da união monetária e, ao mesmo tempo, integre plenamente as exigências do desenvolvimento sustentável.

2.   Introdução

2.1

O presente parecer exploratório foi elaborado a pedido de Romano PRODI, presidente da Comissão Europeia, que, em 20 de Fevereiro de 2004, solicitou ao Comité Económico e Social Europeu que lhe apresentasse a sua análise e recomendações relativas à competitividade das empresas europeias. Trata-se sobretudo de identificar as dificuldades mais significativas das empresas, os obstáculos criados pelo meio em que operam, bem como propostas alternativas para os solucionar no contexto do modelo de sociedade europeu.

2.2

Muitas análises recentes, à semelhança do relatório «Sapir» de Julho de 2003, realçam o desafio competitivo crescente que se põe à Europa, espartilhada entre os seus grandes parceiros industrializados (nomeadamente os Estados Unidos e o Japão) e as economias emergentes caracterizadas por baixos custos de produção (cf. China, Índia), e com uma integração crescente das novas tecnologias e investimento na formação, na educação e nas infra-estruturas. Os dados disponíveis (por exemplo, exportações, balança de transacções correntes, evolução dos lucros das empresas, etc.) demonstram que a economia europeia e a grande maioria das empresas europeias são altamente competitivas. No entanto, muitos indicadores são alarmantes: crescimento reduzido, nível insatisfatório do investimento e da procura, deterioração quantitativa e por vezes qualitativa (precarização) do emprego, encerramento de instalações de produção europeias, êxodo dos investigadores, aumento dos défices públicos, custos crescentes da segurança social, acompanhados de um envelhecimento acelerado da população, suscitando problemas acrescidos de financiamento.

2.3

Para minorar os custos elevados (laborais, fiscalidade, regulamentação) na Europa, muitas empresas optaram pela automatização (produção, gestão) ou por deslocalizações mais ou menos parciais e significativas para países terceiros com menores custos e menos regulamentações, nomeadamente para as economias emergentes.

2.4

Seria certamente ilusório tentar contrariar essas estratégias através de medidas autoritárias. A economia europeia é parte inseparável de uma economia cada vez mais globalizada. O processo é irreversível e, na verdade, contribui tanto para o desenvolvimento dos diversos países que nele participam como para a estabilidade internacional, desde que devidamente enquadrado a fim de garantir verdadeiros progressos económicos e sociais.

2.5

Neste contexto,, identificam-se claramente duas exigências:

2.5.1

é mais do que nunca necessário que a globalização se processe num quadro de normas internacionais mais eficazes e equitativas. O desafio da competitividade não poderá de modo algum assemelhar-se a uma espiral incontrolada impelindo a uma redução exacerbada dos custos, sem atender às condições de saúde, segurança e progresso social, de desenvolvimento equilibrado e sustentável e de protecção do ambiente. Deve, pelo contrário, situar-se num quadro de referência internacionalmente reconhecido, que comporte condições mínimas em matéria de concorrência, segurança, qualidade, direitos sociais e ambiente, o que implica a intervenção activa dos organismos internacionais de regulação e desenvolvimento — por exemplo, a Organização Mundial do Comércio, o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e a Organização Internacional do Trabalho — ainda insuficientemente eficazes, demasiadamente isolados uns dos outros e, para alguns, pouco transparentes e pouco participativos no modo de funcionamento. Nesse sentido, o Comité reivindicou e apoiou a agenda da OMC na Cimeira de Doha, embora actualmente esteja bastante preocupado com as dificuldades relativas ao evoluir das negociações;

2.5.2

urge também reforçar a competitividade do espaço europeu face à concorrência em condições que garantam o seu desenvolvimento económico e social, a coesão, o emprego e a protecção do ambiente: tal implica, no âmbito do modelo europeu de relações sociais, aproveitar melhor as vantagens das empresas na Europa e eliminar as suas deficiências ou compensá-las quando forem estruturalmente irremediáveis (por exemplo, os diferenciais de custos salariais entre a Europa e os países em desenvolvimento) melhorando a qualidade e aumentando a produtividade.

2.5.3

Não é realista nem desejável que a União Europeia entre em concorrência de preços e custos com zonas claramente menos desenvolvidas, quando a Europa não pode compensar a diferença com produtividade mais elevada. Isto compele a economia europeia a progredir continuamente e a competir em qualidade reforçando sobretudo a sua produtividade tanto quantitativa como qualitativamente, bem como a sua capacidade de inovação designadamente tecnológica. Tal implica um aumento proporcional dos investimentos humanos, tecnológicos, industriais e financeiros.

3.   Trunfos das empresas europeias em matéria de competitividade

3.1   Forte implicação na globalização

3.1.1

Enquanto primeiro importador e exportador mundial, a Europa é actualmente um parceiro comercial primordial no mundo. As suas empresas mantêm-se competitivas em termos de exportações e face à concorrência internacional realizando ganhos de produtividade que lhes permitem optimizar os seus custos, incluindo os salariais, garantindo a qualidade dos seus produtos e serviços e inovando para melhor se adaptarem aos mercados. Conseguem assim operar na maior parte dos sectores económicos, nomeadamente:

no sector agro-alimentar, em que são as primeiras no que diz respeito às trocas comerciais;

nas principais indústrias (automóvel, aeroespacial, química, de construção, obras públicas, telecomunicações, etc.), em que se contam entre as que têm melhor desempenho;

no sector de produção e distribuição energética — petróleo, energia nuclear, gás, energias alternativas — e de tecnologias ambientais;

no sector de serviços, em que ocupam frequentemente o primeiro lugar ao nível mundial no que toca ao comércio, finanças, seguros, transportes, engenharia, programas informáticos, turismo, saúde, etc.

3.1.2

As empresas europeias investem igualmente de forma significativa em todo o mundo, contribuindo para o crescimento económico de várias regiões, nomeadamente das economias emergentes da Ásia, as quais, embora eventuais concorrentes da Europa em vários sectores, são também parceiros industriais e comerciais indispensáveis à economia europeia e suas indústrias, enquanto fornecedoras, associadas, distribuidoras, subcontratantes e clientes.

3.1.3

Atendendo exactamente ao papel importantíssimo que desempenham nos países em vias de desenvolvimento, as empresas europeias deveriam dar o exemplo quanto ao desenvolvimento das normas sociais nesses países, nomeadamente no que toca ao cumprimento dos direitos sociais definidos pela OIT. O Comité vai continuar a emprenhar-se e a participar em iniciativas para activar a necessária consideração da dimensão social nas trocas internacionais.

3.1.4

O comércio e os investimentos internacionais das empresas europeias são apoiados pela UE, que se organizou para defender a uma só voz, através da Comissão Europeia, os interesses daquelas nas reuniões internacionais, nomeadamente no âmbito da OMC.

3.2   O grande mercado continental

3.2.1

O mercado único é o primeiro trunfo das empresas europeias e baseia-se em regras comuns enquadradas por um princípio geral de reconhecimento mútuo completado por numerosas harmonizações através de aproximadamente 1500 directivas, 300 regulamentos e mais de 20 000 normas comuns. A grande maioria da legislação relativa à actividade empresarial advém destes instrumentos. As vantagens económicas e em matéria de emprego do mercado único, realçadas pelo relatório Cecchini no final dos anos 80, mantêm-se actuais — ainda que as projecções desse relatório não tenham podido ser totalmente confirmadas à data de 1992 devido a uma conjuntura económica perturbada e à não conclusão do programa comunitário.

3.2.2

O mercado único europeu é hoje o primeiro mercado mundial, que conta com 25 Estados-Membros, outros países europeus a ele estreitamente associados, entre os quais a Suíça e a Noruega, e a perspectiva futuros alargamentos. Deste modo, mais de 500 milhões de europeus estão reunidos num único mercado interno com um peso económico superior ao dos mercados americano e chinês. É importante sublinhar este facto importantíssimo junto dos cidadãos europeus.

3.2.3

Embora contribuindo para a coesão da Europa, estas liberdades permitiram às empresas desenvolver intercâmbios e cooperações, bem como levar a cabo restruturações e fusões, o que conferiu a muitas delas uma dimensão internacional. As PME beneficiaram igualmente das subcontratações europeias e da eliminação das formalidades intracomunitárias. As redes transeuropeias de transportes, energia e telecomunicações levaram ao desenvolvimento de infra-estruturas. Grandes programas industriais (por exemplo, a Airbus ou a Agência Espacial) estimularam a investigação e a inovação em empresas de diferentes dimensões. O grande mercado europeu, além dos benefícios que trouxe para o emprego, estimulou a mobilidade dos trabalhadores, dos investigadores e dos estudantes (mais de um milhão participaram no programa Erasmus).

3.2.4

De mencionar ainda a abertura dos monopólios públicos existentes antes do mercado único, já concretizada ou em curso, na sequência de várias directivas nos sectores dos transportes, da energia, dos correios, etc.. Ao fazê-lo, a Comissão procura também de forma pertinente não pôr em causa o conceito de serviços de interesse geral, que é parte integrante do modo de desenvolvimento económico e social europeu, para além mesmo das necessárias aberturas impostas pelo mercado único.

3.3   A união monetária

3.3.1

A introdução do euro constituiu a etapa mais significativa do mercado único e foi um avanço fundamental para a competitividade das empresas europeias. Enquanto moeda única utilizada já em 12 Estados-Membros por 300 milhões de cidadãos europeus, o euro eliminou os riscos cambiais na zona euro, neutralizou os custos de transacção nas trocas comerciais e assegurou a transparência permanente dos dados económicos. É também uma moeda de dimensão internacional. Embora a sua elevada cotação actual relativamente ao dólar penalize as exportações (beneficiando, contudo, as importações, nomeadamente de petróleo e de matérias-primas), a relação cambial, inversa há ainda poucos anos, continuará a evoluir.

3.3.2

A união monetária europeia, sem equivalente actualmente em qualquer outro lugar, demonstrou igualmente a capacidade da Europa de levar a cabo um projecto de grande envergadura, inovador e mobilizador, com um impacto considerável nos cidadãos e nas empresas. Por outro lado, a união monetária reforçou a visibilidade externa da Europa e confirmou a sua posição de negociadora internacional, para benefício das suas empresas.

3.3.3

O pacto de estabilidade e crescimento, que acompanha o euro, tem por objectivo garantir um mínimo de convergência económica através de normas que limitem os défices públicos e a inflação e assegura uma maior previsibilidade para as empresas num quadro estável e favorável à sua competitividade. Constitui o primeiro passo para uma união económica realmente integrada. É evidente que não se poderá esperar uma união monetária sustentável sem medidas suplementares, que interessem, designadamente, para a competitividade das empresas e que constituem um importante vector da Estratégia de Lisboa.

3.4   A ambição de Lisboa em matéria de reformas

3.4.1

Em Março de 2000, o Conselho Europeu de Lisboa decidiu iniciar, tanto ao nível nacional como europeu, um programa abrangente de reformas económicas, sociais e administrativas com o objectivo de transformar a Europa, até 2010, na economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de assegurar um crescimento económico sustentável, a melhoria quantitativa e qualitativa do emprego e uma melhor coesão social. A Estratégia de Lisboa é o itinerário para a economia europeia unir as suas forças face à globalização num espaço europeu mais competitivo.

3.4.2

As reformas são importantes e vão ao encontro dos principais desafios das empresas europeias em matéria de competitividade. Têm por objectivo:

facilitar o acesso nomeadamente das PME e das empresas inovadoras aos financiamentos, incluindo ao capital de risco;

reduzir a pressão fiscal sobre o emprego, nomeadamente o emprego pouco qualificado e pouco remunerado para tornar o custo do trabalho menos dissuasivo;

reduzir os défices públicos, o que está associado à estabilidade de preços e à moderação fiscal;

estimular o processo de inovação, do qual depende a capacidade tecnológica das empresas europeias;

adaptar a educação e a formação de modo a responder de forma mais eficaz aos novos dados económicos, profissionais e tecnológicos;

modernizar o mercado de trabalho, facilitando um melhor ajustamento da procura e da oferta de emprego, melhorando a taxa de emprego bem como a qualidade e as condições de trabalho e, ao mesmo tempo, assegurando uma utilização mais intensiva dos equipamentos, o que conduzirá a uma maior produtividade;

garantir a eficácia e a sustentabilidade da segurança social, tendo em conta os problemas decorrentes do aumento das despesas devido, nomeadamente, ao envelhecimento da população;

simplificar as regulamentações ao nível nacional e europeu;

por último, na sequência da Cimeira de Gotemburgo (Junho de 2001), garantir uma melhor integração da protecção ambiental e das implicações do desenvolvimento sustentável.

3.4.3

Os métodos da Estratégia de Lisboa são igualmente importantes e incluem:

um novo calendário para finalizar o mercado único, com etapas intermediárias;

uma avaliação anual na Cimeira Europeia da Primavera do primeiro semestre;

um método aberto de coordenação no âmbito de objectivos comuns, valorizando as boas práticas;

o papel central atribuído ao sector privado e à parceria entre o poder público e a sociedade civil;

o ênfase no diálogo entre os parceiros sociais.

3.4.4

A Estratégia de Lisboa já permitiu obter alguns resultados positivos:

tomada de consciência da necessidade de reformas que se sobrepõe às divergências tradicionais;

aceleração na difusão das tecnologias de informação e dos processos de inovação;

mais apoios à criação de empresas e ao financiamento das PME;

maior preocupação com o desenvolvimento sustentável, acompanhada de medidas tendo em vista melhorar a eficácia dos serviços públicos, reduzindo, ao mesmo tempo, os défices públicos, consolidar a segurança social, mas reequilibrando as contas, instaurar disposições legislativas e introduzir tecnologias energéticas e industriais protegendo melhor o ambiente;

participação dos parceiros sociais nas reformas sociais;

medidas de simplificação legislativa e administrativa, ainda que de alcance limitado.

3.4.5

A competitividade ambicionada pela Estratégia de Lisboa seria irrealista sem uma reforma institucional da UE, que constituiu a missão da Convenção Europeia, cuja composição inovadora reuniu representantes dos Estados-Membros e das instituições da UE e representantes dos países candidatos e dos parlamentos nacionais, bem como observadores da sociedade civil. A Convenção propôs uma reformulação dos Tratados com vista a um quadro institucional moderno, simplificado, melhor adaptado ao alargamento em larga escala, mais acessível e mais atraente para a opinião pública. Trata-se também de exarar no tratado os méritos próprios do modelo europeu de sociedade, em que a busca da competitividade acompanha a valorização do emprego e do progresso social. O novo Tratado adoptado em 25 de Junho de 2004 refere, pois, entre os objectivos da União, uma economia social de mercado altamente competitiva conducente ao pleno emprego e ao progresso social, bem como um nível elevado de protecção e melhoria da qualidade do ambiente. O Comité apoia a exigência de uma coerência global, que integre a competitividade com outros objectivos de progresso social e qualitativo, constatando, no entanto, que tal coerência ainda não se encontra garantida devido a várias falhas que continuam a afectar a competitividade europeia.

4.   Deficiências das empresas europeias em matéria de competitividade

4.1   Apoio insuficiente ao espírito empresarial

4.1.1

Quando algumas das vantagens competitivas da Europa constituem ainda processos em curso mais do que propriamente conquistas irreversíveis, há limitações que penalizam as empresas europeias e contribuem para os seus actuais fracos resultados em matéria de crescimento e emprego.

4.1.2

Os recentes debates sobre o espírito empresarial, realizados na sequência do Livro Verde publicado pela Comissão, confirmaram que empresas de diferentes dimensões afirmam enfrentar, na maioria dos países europeus, problemas quotidianos relacionados com:

a complexidade excessiva das regulamentações nacionais e europeias;

uma carga fiscal e social demasiado elevada;

a dificuldade recorrente de conseguir fundos;

o apoio insuficiente aos actores que assumem riscos, nomeadamente a negação frequente de uma segunda oportunidade quando um primeiro projecto empresarial falhou;

a relação desequilibrada entre a oferta de emprego das empresas e as qualificações profissionais.

4.1.3

Por outro lado, importa sublinhar a baixa taxa de emprego na Europa quando comparada com a taxa de emprego norte-americana, situação que se reflecte negativamente na competitividade europeia, bem como na pressão fiscal (geralmente elevada) e no equilíbrio dos regimes de segurança social.

4.1.4

Prevalece, por fim, em muitos empresários o sentimento de que a União tem tendência mais para ir acumulando relatórios de análise sobre os atrasos europeus de competitividade do que para encetar iniciativas concretas que conduzam a resultados verificáveis — como os principais concorrentes da Europa, dos Estados Unidos à China, souberam, pelo contrário, fazer.

4.1.5

O Comité verifica que os próprios parceiros sociais estão bem colocados para empreender tais acções operacionais de apoio à competitividade e ao espírito empresarial. Numerosos exemplos confirmam que eles desempenham, muitas vezes, um papel importante neste sentido. Este papel motor dos parceiros sociais mereceria ser realçado no Livro Verde da Comissão.

4.1.6

O CESE sublinha que as entidades activas na designada economia social enfrentam muitas vezes os mesmos obstáculos que os supramencionados no que respeita, por exemplo, à fiscalidade, e a outros aspectos, como os contratos públicos e as regras da concorrência. O CESE crê que soluções específicas para estes problemas contribuiriam de modo significativo para a melhoria da economia e do emprego na UE.

4.2   Imbróglio persistente dos obstáculos

4.2.1

Não obstante os avanços alcançados, o mercado único progrediu insuficientemente em vários domínios, nomeadamente no domínio dos serviços, que representam 70 % da actividade económica mas carecem, ainda, de harmonização (por exemplo, ao nível dos reconhecimentos mútuos). Quanto à abertura do sector público subsistem ainda vários atrasos:

entraves relativos a sectores nos quais se mantiveram os monopólios — por exemplo, nos transportes, energia, correios e, actualmente em menor grau, nas telecomunicações;

abertura limitada dos contratos públicos (apenas 10 % são concluídos com empresas estrangeiras);

compartimentação ao nível da administração, quando a gestão do mercado único exige uma cooperação reforçada em vários domínios — por exemplo, na fiscalidade, questões aduaneiras, polícia, justiça, concorrência, combate à fraude, ambiente, etc.

4.2.2

Para além das aberturas efectuadas, em curso ou programadas, para além também dos atrasos que se podem por vezes verificar neste domínios, falta ainda clarificar a questão do estatuto dos serviços de interesse geral no mercado único. O papel específico desses serviços, já integrado em várias directivas de abertura sectorial, foi consagrado de forma global pelos Tratados de Amesterdão e de Nice. A Comissão está a preparar um instrumento horizontal para melhor clarificar o papel dos serviços de interesse geral no mercado único. No entanto, é forçoso constatar que o debate continua limitado ao papel dos serviços públicos nacionais face ao mercado único europeu, sem, em todo o caso, abordar a possível relevância de um desenvolvimento focalizado de serviços de interesse geral à escala europeia e em que condições. Essa questão não poderá, contudo, ser evitada actualmente num verdadeiro debate sobre o futuro do mercado único alargado e da competitividade das empresas europeias.

4.2.3

Para além do desenvolvimento da regulamentação comunitária, os Estados-Membros continuam a criar regulamentações cujos moldes podem dificultar — ou impedir — a actividade empresarial no mercado único. Foi criado um procedimento de notificação prévia à Comissão (Directiva 83/189), que, com as múltiplas tarefas que lhe foram impostas, não consegue, porém, reagir com eficácia senão nos casos mais flagrantes. O alargamento vai dificultar ainda mais a sua missão.

4.2.4

Por outro lado, as directivas ainda não estão suficientemente transpostas por todos os Estados-Membros: 10 % evidenciam falhas na aplicação (nalguns sectores, este valor chega aos 25 %). Verifica-se igualmente um número muito elevado de infracções, havendo actualmente 1500 inquéritos e acções legais em curso ao nível da Comissão Europeia.

4.2.5

A convergência fiscal no mercado único ainda não é satisfatória, em parte devido à exigência de unanimidade no Conselho. Importa, em particular, eliminar a dupla tributação, chegar a uma base harmonizada para o imposto sobre as sociedades e simplificar o regime intracomunitário do IVA.

4.2.6

A complexidade e o custo de obtenção da protecção intelectual europeia constitui igualmente um obstáculo para as empresas europeias, como atesta o atraso persistente de 30 anos e o custo previsível da patente comunitária.

4.2.7

Neste contexto, cabe ainda mencionar o adiamento de vários projectos de redes transeuropeias na Europa alargada, inviabilizados pela falta de financiamento público, privado ou misto.

4.2.8

Os atrasos na realização do mercado único têm alguma responsabilidade directa na situação bastante insatisfatória do emprego e do mercado do trabalho. O alargamento da União Europeia de 15 para 25 Estados-Membros coloca com acuidade ainda a questão da melhoria do emprego nas suas diferentes vertentes (formação, mobilidade profissional e geográfica, qualidade dos postos de trabalho, reconversões, etc.).

4.2.9

Por último, com o alargamento a aplicação do princípio da livre circulação e da liberdade de estabelecimento no mercado único encontra-se provisoriamente limitado devido às derrogações decididas, que podem ir até sete anos e que têm como destinatários os nacionais dos novos Estados-Membros. Estas restrições prejudicam o livre funcionamento do mercado de trabalho na Europa alargada e podem penalizar os esforços de formação e de adaptação profissional desenvolvidos nesses novos Estados. Também os nacionais dos novos Estados-Membros que desejam iniciar a actividade como trabalhadores independentes na antiga Europa dos 15 se deparam com dificuldades.

4.3   Uma união económica incompleta

4.3.1

A união monetária não acompanhou o crescimento económico dinâmico que deveria ter favorecido. Uma razão essencial prende-se com o facto de a ela não se ter seguido ainda uma verdadeira união económica. O embrião constituído pelo pacto de estabilidade e crescimento foi recentemente fonte de controvérsia, sendo desrespeitado por vários Estados-Membros, incluindo a Alemanha e a França, que ultrapassaram o limiar de 3 % de défice público. Surgiram interrogações sobre os efeitos do pacto (muito mais preciso no que respeita à estabilidade do que ao crescimento) na apatia da actividade económica. Para compensar as limitações do pacto, importaria desenvolver uma abordagem económica mais integrada, o que quase não existe actualmente com a coordenação ainda mínima das orientações gerais da política económica (OGPE).

4.3.2

O Eurogrupo, que reúne os Estados da zona euro, continua pouco estruturado, pouco dinâmico e de carácter sobretudo intergovernamental, face a um Banco Central Europeu baseado no modelo federal. O governo económico europeu continua na sua fase de projecto.

4.3.3

O próprio Conselho Economia-Finanças está longe de constituir um governo económico da UE, com os seus membros instalando-se de bom grado nos respectivos interesses nacionais e apoiados pela prática tradicional da unanimidade. Um exemplo claro é a falta de harmonização fiscal da Europa.

4.3.4

O Conselho Competitividade, que tem poucos anos de existência, não trabalha em estreita cooperação com o Conselho Economia-Finanças e tem dificuldade em levar a cabo de forma eficaz uma missão necessariamente pluridisciplinar, que interessa a todas as formações do Conselho.

4.3.5

É lamentável que o novo Tratado Constitucional se mostre tão pouco desenvolvido e inovador no que diz respeito ao aprofundar da união económica, ao contrário de muitas das suas disposições em outros domínios. Teria sido, pois, mais pertinente para a coesão e a convergência competitiva da economia europeia outorgar à Comissão o papel efectivo de apresentação de propostas e não de simples recomendações tanto em relação às grandes orientações de política económica como aos défices públicos.

4.4   Défice de reformas estruturais

4.4.1

Nas Cimeiras da Primavera, os Estados-Membros pareceram privilegiar novos debates sobre os objectivos definidos em Lisboa, correndo o risco de aditar novas disposições, em detrimento de uma análise comparativa das reformas nacionais. Demasiados Estados também não associaram plenamente os parceiros sociais à definição e aplicação das reformas e nem sequer os consultaram ou mencionaram quando da publicação dos relatórios sobre os progressos alcançados.

4.4.2

À discrição dos Estados quanto ao avanço das reformas somam-se atrasos de vários tipos:

4.4.2.1

ao nível europeu, os 25 chegaram a acordo quanto à conclusão de um mercado único em vários domínios (por exemplo, energia, serviços, contratos públicos, redes transeuropeias, adaptação dos serviços públicos), mas mostram-se reticentes em adoptar as medidas necessárias nos prazos fixados.

4.4.2.2

ao nível nacional, os resultados são díspares. Mesmo os Estados mais avançados em matéria de reformas têm atrasos em comparação com países terceiros que têm um melhor desempenho. Os países europeus continuam, na generalidade, a evidenciar pouca competitividade, esquecendo que o desafio que as reformas comportam não é apenas fazer melhor do que antes, mas também sobretudo fazer melhor do que os outros. Neste contexto, cabe referir:

4.4.2.2.1

no atinente à abertura de contratos públicos, obtiveram-se avanços significativos no sector das telecomunicações e, em menor grau, no da energia (gás, electricidade), em que os preços se mantêm muitas vezes demasiado elevados. A abertura dos correios progride com grande lentidão em alguns países, com um objectivo que continua a ser parcial, através de etapas sucessivas acordadas até 2009. Persistem atrasos na interconexão e modernização das infra-estruturas de transporte, o que afecta negativamente a realização de projectos de redes transeuropeias;

4.4.2.2.2

no que diz respeito ao acesso ao financiamento, está em curso a integração do mercado financeiro europeu, apoiado pela introdução do euro. Foram tomadas várias medidas de modo a facilitar o financiamento de empresas em fase de arranques e de PME. No entanto, o acesso ao capital de risco é ainda insuficiente e a unificação do mercado financeiro continua excessivamente dependente de regulamentações, quando a auto-regulamentação e a co-regulação socioprofissionais, tal como definidas e enquadradas pelo acordo concluído entre as instituições da UE em 16 de Dezembro de 2003, mereceriam ser encorajadas;

4.4.2.2.3

no que toca aos défices públicos, a situação varia consideravelmente consoante o país: alguns Estados conseguem manter um saldo positivo das respectivas finanças públicas (Dinamarca, Finlândia, Luxemburgo, Suécia), enquanto outros alcançam ou ultrapassam os limites estabelecidos pelo pacto de estabilidade (Alemanha, França, Itália, Portugal). Estes últimos são igualmente aqueles que estão mais atrasados na aplicação das reformas estruturais;

4.4.2.2.4

no que respeita ao estímulo da inovação, as despesas de investigação continuam a ser insuficientes. Representam 1,9 % do PIB, face aos 2,6 % nos EUA, e os investimentos das empresas são duas vezes mais elevados nos EUA do que na EU a 15. Está-se longe do objectivo de Lisboa, que fixa em 3 % do PIB as despesas em investigação e desenvolvimento, de que dois terços devem ser financiados pelo sector privado. Há pouca coerência entre elas e o programa-quadro europeu em matéria de investigação. A falta de uma política comum da Europa em domínios estratégicos afecta os seus investimentos na tecnologia. As patentes registadas na Europa, designadamente no domínio das novas tecnologias, evidenciam um atraso notável em relação aos EUA e ao Japão devido, entre outros factores, à inexistência constante de uma patente comunitária eficaz e barata;

4.4.2.2.5

no que se refere à melhoria do mercado de trabalho, a situação varia consoante os países: alguns têm um nível de emprego globalmente elevado, enquanto outros enfrentam um subemprego estrutural. Actualmente estão em curso importantes reformas tendo em vista melhorar o funcionamento do mercado de trabalho, aumentar a sua flexibilidade e procurar adequar a oferta e a procura de empregos. No entanto, para assegurar a adesão dos europeus à Estratégia de Lisboa é imperioso que estas reformas se traduzam rapidamente em progressos quantitativos e qualitativos sustentados em matéria de formação permanente e emprego devidamente enquadrados por legislação ou convenções colectivas. Em particular, nota-se ainda uma falta de investimentos bastante considerável, nomeadamente através da formação, em empregos e qualificações profissionais centrados na valorização competitiva da qualidade. A consulta dos parceiros sociais e as negociações com e entre eles devem ter por objectivo, entre outros, garantir que as novas disposições conduzem efectivamente a esta melhoria da situação do emprego e das respectivas condições face às implicações da competitividade internacional. O relatório Kok sublinhou de forma precisa as prioridades a aplicar a fim de reparar a situação de forma sustentável;

4.4.2.2.6

no domínio da solvabilidade da segurança social, estão em curso várias reformas para restaurar o equilíbrio financeiro posto em causa devido ao envelhecimento da população, que aumenta em toda a Europa. Trata-se, nomeadamente, de adaptar a duração das quotizações ao aumento da esperança de vida e de promover o recurso aos regimes complementares de previdência e aos fundos de pensões. Embora evoluindo, as reformas deparam-se com atrasos consideráveis no que toca à previdência social ao abrigo de regimes complementares e enfrentam também vários problemas de aplicação e eficácia, nomeadamente o número elevado de abandono precoce do mercado de trabalho, não obstante os compromissos assumidos em 2002, em Barcelona. Por isso, importa, designadamente, velar por que as reformas dos sistemas de protecção social sejam conduzidas de modo equitativo, evitando criar novas situações de exclusão que teriam efeitos social mas também economicamente negativos para a economia europeia;

4.4.2.2.7

relativamente à educação e à formação, a maioria dos países europeus têm sistemas de ensinos globalmente desenvolvidos e com bons resultados, mas, por vezes, demasiado desligados das realidades económicas e das perspectivas de adequada inserção no mercado de trabalho, de acesso frequentemente demasiado selectivo e pouco articulados para poderem garantir um apoio eficaz ao longo da vida. Têm-se vindo a desenvolver programas de intercâmbio destinados a aprofundar a relação ensino-vida profissional e a desenvolver formas de aprendizagem. A generalização do acesso à Internet contribui igualmente para intensificar as formações;

4.4.2.2.8

a simplificação da regulamentação aliada à melhoria da sua qualidade e eficácia constitui uma necessidade comum a todos os países europeus, embora alguns tenham tomado iniciativas mais cedo do que outros. Geralmente é dada prioridade à simplificação dos procedimentos relativos à criação de empresas e às pequenas empresas devido ao seu impacto na actividade económica e no emprego. Importa, igualmente, apoiar mais as empresas no desenvolvimento e na gestão de procedimentos operacionais, tendo em vista reduzir as ineficiências e apoiar o aumento da produtividade, originando, assim, maior competitividade.

4.4.2.2.9

quanto ao desenvolvimento sustentável, as medidas nacionais de aplicação dos acordos de Quioto evoluem de forma diversa. A protecção do ambiente é um princípio muito mais enraizado nos países nórdicos. No entanto, os outros países têm vindo a adoptar novas medidas, e a troca de boas práticas permite registar modelos positivos para o futuro (por exemplo, códigos voluntários, cartas relativas a assuntos ambientais, etiquetas, distribuição das autorizações de emissão, etc.). Afigura-se bastante necessário envidar esforços para que a estratégia competitiva da União esteja ao serviço de uma política atenta à protecção do ambiente e aos compromissos assumidos neste domínio e não lhe crie qualquer obstáculo.

4.4.3

O balanço das reformas é, na generalidade, bastante modesto. Não obstante a acumulação de relatórios sobre os retrocessos ao nível da competitividade e de «processos» ou estratégias de estímulo à competitividade (Luxemburgo, Cardife, Colónia, Lisboa, Gotemburgo, Barcelona, etc.), a União tarda em aplicar as suas sucessivas escolhas declaradas (mercado único, espaço financeiro, economia do conhecimento, excelência ambiental, etc.).

4.4.4

Simultaneamente, a situação económica e do emprego na Europa não cessa de se degradar desde a conjuntura favorável do Conselho Europeu de Lisboa de 2000, devido a uma insuficiência de investimentos e da procura, inclusivamente na sequência das restrições da política monetária e financeira, bem como por razões diversas mas cumulativas relacionadas com o clima de insegurança provocado pelos atentados terroristas, pelas tensões internacionais, pelas perturbações dos mercados financeiro e bolsista e o preço do petróleo, com repercussões negativas na confiança e na actividade dos agentes económicos. As taxas de crescimento passaram de 3,5 % em 2000 para 1,6 % em 2001 e para cerca de 1 % desde 2002. A situação do emprego piorou consideravelmente, tendo a taxa de desemprego ultrapassado a fasquia dos 8 %. O retrocesso da conjuntura económica e social europeia contrasta com o actual dinamismo do crescimento norte-americano (cerca de 5 %), ainda que sustentado por um contexto muito específico (cf. cotação do dólar, défice orçamental, despesas militares, etc.).

4.4.5

A Estratégia de Lisboa encontra-se num ciclo vicioso: a falta de crescimento dificulta a aplicação das reformas, cujos atrasos penalizam, por sua vez, o crescimento e a criação de postos de trabalho. Com a inflação de objectivos de reformas, compromissos e Estados participantes contracenam outros tantos défices de co-responsabilidade, aplicação, coordenação e, por conseguinte, de impacto na economia e no emprego. O risco de ilusão existe se, não aplicando as reformas com a determinação necessária, se fizer crer que a Estratégia avança. Uma tal «bolha de Lisboa» explodiria muito antes de 2010.

5.   Recomendações do Comité

5.1   Reanimar a confiança dos actores da vida económica

5.1.1

A competitividade do espaço europeu deve inscrever-se num projecto global, tanto político como económico e social, capaz de suscitar uma ampla adesão e participação dos actores socioprofissionais. O novo Tratado deverá contribuir para dar resposta a essas expectativas.

5.1.2

É particularmente importante que esse projecto europeu seja melhor entendido no seu contexto global, no que toca às relações tanto com os seus vizinhos como com os seus parceiros internacionais. A questão da atractividade do espaço europeu e da sua adaptação às mudanças estruturais deveria ser objecto de um debate mais aprofundado e de mais esclarecimentos sobre, nomeadamente, as questões respeitantes aos investimentos internacionais, as instalações na Europa e as deslocalizações para outras regiões do mundo. O Comité espera que as negociações em curso na OMC contribuam para definir melhores regras internacionais para enquadrar o comércio e os investimentos à escala mundial.

5.1.3

Tal como são necessárias novas regras a nível internacional, pois as existentes são claramente insuficientes, há também que simplificar a regulamentação na Europa, que continua, ela própria, a confrontar-se com regras e procedimentos administrativos excessivos. Para o efeito, urge:

reformar a análise prévia do impacto com garantias de autonomia de análise, testes sistemáticos de estudo das alternativas a uma regulamentação clássica, verificação dos efeitos do projecto na simplificação e na competitividade, publicação sistemática da análise com o projecto de regulamentação;

prever que todas as alterações eventualmente não conformes com a análise de impacto sejam justificadas;

associar as empresas e outros utentes à simplificação a montante da regulamentação (intervenção dos comités SLIM a priori de preferência a posteriori);

encorajar a auto-regulação e a co-regulação socioprofissional à escala europeia, designadamente nos serviços;

incitar os Estados a procederem a uma simplificação nacional paralela, acompanhada de um teste de euro-compatibilidade;

5.1.4

Deverão ser adoptadas políticas destinadas a apoiar mais determinadamente a criação e o desenvolvimento de empresas com um acesso mais fácil ao capital de risco — o que justificaria alargar as intervenções do Banco Europeu de Investimento neste domínio –, bem como criados mais programas de formação de empresários por outros empresários e uma rede mais densa de serviços de apoio às pequenas empresas em todos os Estados-Membros com coordenação a nível europeu.

5.1.5

Convirá também, de um modo geral, encorajar as empresas, as associações profissionais e os diferentes actores da sociedade civil a tomarem mais iniciativas à escala europeia, aproveitando melhor as novas oportunidades de cooperação e de intercâmbios que os progressos realizados na construção europeia lhes facultaram. As suas iniciativas no terreno, assim como as novas medidas que se esperam das instituições europeias ou dos Estados vão desempenhar um papel determinante para assegurar que os processos de recuperação da competitividade em curso na Europa tenham um verdadeiro impacto e resultados positivos e que os diversos entraves e obstáculos que continuam a opor-se-lhe sejam finalmente eliminados. A realização de uma Europa mais eficaz e mais competitiva será, em última análise, condicionada sobretudo pela multiplicação e o reforço mútuo de tais iniciativas económicas e associativas, que o poder público europeu, nacional e regional, deverá principalmente facilitar e enquadrar num ambiente competitivo favorável.

5.2   Concluir o mercado único

5.2.1

Já é altura de assegurar, a breve trecho, a conclusão das disposições essenciais do mercado único, actualmente alargado de 15 para 25 Estados-Membros, conclusão essa que não deveria sofrer mais nenhum adiamento para além de 2010, prazo fixado em Lisboa no que toca à competitividade. Um tal objectivo afigura-se actualmente indispensável, sem, no entanto, ignorar as necessidades de permanente manutenção e de reajustamentos deste mercado único, que, mais tarde, se farão sentir.

5.2.2

A primeira condição é garantir que as directivas sejam transpostas para o direito nacional com mais rigor e respeitando os prazos, como a isso se havia comprometido a Cimeira Europeia. Tal pressupõe uma maior responsabilização dos governos nesta questão e, se necessário, uma recentragem das ajudas comunitárias aos países em falta, reorientando-as para o objectivo de uma melhor transposição. Por outro lado, face à preponderância das directivas, um maior recurso aos regulamentos, de aplicação directa e uniforme, facilitaria a melhoria da transposição.

5.2.3

De entre as prioridades de harmonização com implicações para a competitividade destacam-se as seguintes:

um regulamento destinado a eliminar a dupla tributação no mercado único, que substituiria a miríade, tão inextricável quanto incompleta, de convenções bilaterais entre Estados-Membros;

um estatuto simplificado de sociedade europeia aberto às PME — várias vezes reivindicado pelo Comité –, que lhes daria novas possibilidades de desenvolvimento, cooperação e subcontratação à escala europeia, a começar pelas zonas fronteiriças;

a colocação à disposição, a breve trecho, de uma patente comunitária simples, eficaz e pouco onerosa, cujos contínuos atrasos na adopção estão a dar a ideia de incapacidade estrutural da Europa para respeitar os seus alegados compromissos em matéria de competitividade;

a conclusão de um verdadeiro mercado interno dos serviços (1), com a participação activa das profissões implicadas.

5.2.4

A supressão das compartimentações administrativas é também uma condição indispensável para o reforço do mercado único, que mereceria ser mais directamente apoiado pela União. Deveria implicar:

uma melhor cooperação europeia das administrações nacionais, actualmente obrigadas a co-gerir um mercado único de 25 Estados-Membros;

inspecções comunitárias nos Estados com relatórios que evidenciem eventuais disfuncionamentos e sugiram propostas para os sanar;

a unificação das alfândegas nas fronteiras externas na sequência do alargamento, cuja primeira etapa deveria incluir já um tronco comum de formação e a intensificação dos estágios e intercâmbios europeus de agentes aduaneiros;

a publicação de comparações europeias de contratos públicos efectivamente adjudicados;

uma melhor coordenação transnacional dos serviços públicos, que poderá, se for caso disso, preparar, nos domínios em que tal se justificar, a criação desses serviços a nível europeu.

5.3   Desenvolver a união económica

5.3.1

A afirmação de uma união económica mais real é um elemento fundamental para a competitividade das empresas europeias e uma necessidade para garantir plenamente a viabilidade da união monetária. Importa, designadamente, dotar a Europa de uma resposta macroeconómica mais adequada e mais estável face aos riscos da conjuntura internacional, no que respeita as políticas de apoio tanto à oferta como à procura. É indispensável desenvolver esta política económica comum em sincronia com o prazo fixado em Lisboa para a competitividade — 2010, o que implica:

alargar a zona aos novos Estados da UE, logo que estejam em condições de respeitar os critérios numa base duradoura;

desenvolver as vantagens do método comunitário (relatórios e propostas da Comissão, votação por maioria no Conselho) sobre todas as questões de interesse verdadeiramente comum em matéria económica;

fazer respeitar o pacto de estabilidade e de crescimento em condições que tenham também em conta os desafios da competitividade, isto é, privilegiando as condições de investimento em vez das despesas administrativas.

5.3.2

De entre as medidas que consentirão progressos significativos na via da união económica destacam-se:

um parecer comunitário prévio e não a posteriori sobre os projectos de lei de finanças dos Estados, que assegure a sua conformidade com as orientações gerais de política económica (OGPE);

uma melhor articulação entre as linhas directrizes para o emprego e as OGPE, que não se fique por uma simples justaposição de disposições;

aceleração da organização do espaço financeiro europeu, utilizando inclusivamente a auto-regulação e a co-regulação socioprofissionais.

5.3.3

Condição para a união económica é a aproximação das fiscalidades, designadamente da matéria colectável, em condições compatíveis com uma economia aberta às trocas e atraente para os investimentos. A liberdade das taxas poderia ser regulada em sectores que dizem respeito directamente ao mercado único. Em matéria de emprego, seriam necessárias reduções fiscais concertadas. Na ausência de unanimidade, o reforço da cooperação entre os Estados desejosos de avançar nesta direcção permitiria já os primeiros progressos.

5.3.4

Uma política económica melhor coordenada deveria ter como objectivos:

desenvolver uma política de crescimento em prol da actividade económica e do emprego, tal como reconhecido nas últimas cimeiras europeias: isto pressupõe, para além de intervenções suplementares do BEI, cujas repercussões, não sendo negligenciáveis, permanecerão limitadas, dar uma nova dimensão às parcerias entre o sector público e o privado tendo em vista financiar novas infra-estruturas transeuropeias à escala da União alargada;

afirmar uma abordagem industrial mais activa, que clarifique os interesses europeus com uma política de concorrência compatível, uma política comercial mais centrada na defesa destes interesses, o apoio de grandes projectos comuns e ajudas do orçamento comunitário;

garantir o necessário desenvolvimento dos investimentos das empresas na inovação e na investigação, a fim de, nomeadamente, reforçar a competitividade europeia no plano qualitativo;

assegurar, em particular, a autonomia da Europa em áreas tecnológicas essenciais para a sua segurança (se necessário, mediante o reforço da cooperação, dando preferência à abertura dos correspondentes concursos públicos);

centrar a política comum de I&D em projectos comuns com abordagens nacionais euro-compatíveis.

5.3.5

A nova agenda orçamental para 2007-2013 deveria orientar-se em torno deste desafio de competitividade do espaço europeu. Para o efeito, será necessário:

antecipar mais as mutações económicas, industriais, regionais e sociais e promover as adaptações a montante;

prosseguir a reforma da política agrícola com os meios interessados, na mira de uma indústria agro-alimentar europeia competitiva, dos imperativos ambientais e da segurança dos consumidores, bem como de um desenvolvimento rural equilibrado;

reforçar a presença internacional da União, melhorando a eficácia da ajuda ao desenvolvimento, desenvolvendo parcerias, apoiando os investimentos das empresas europeias nos mercados de países terceiros com forte potencial de crescimento;

adaptar as modalidades da ajuda comunitária, isto é, alargar a condicionalidade das ajudas (nomeadamente em matéria de convergência económica, mas também de transposição das directivas), obter mais reciprocidade da parte dos Estados beneficiários (ambiente competitivo para as empresas, simplificação administrativa, supressão de entraves), controlar a compatibilidade das ajudas comunitárias com as regras de concorrência, tal como acontece com os auxílios estatais (controlar as distorções prejudiciais e as perturbações que podem decorrer de deslocalizações artificiais) e desenvolver mais o recurso a empréstimos em condições bonificadas de preferência a centrar o essencial da ajuda em subsídios.

5.4   Assegurar uma aplicação das reformas estruturais mais coerente

5.4.1

A credibilidade do mandato de Lisboa deve estar melhor enraizada junto dos europeus. É necessário eliminar as apreensões quanto ao seu significado e ao seu custo social. Estas reformas condicionam o futuro do nosso desenvolvimento numa economia aberta. Trata-se de garantir a sustentabilidade do modelo europeu de sociedade, ao qual os europeus dão grande importância e tal como está expresso na Carta dos Direitos Fundamentais, conciliando-o, ao mesmo tempo, com o objectivo de competitividade.

5.4.2

O próprio objectivo de competitividade só teria a ganhar também se fosse melhor explicitado. Para o Comité, não se trata de ser os mais competitivos do mundo visando a máxima compressão dos custos em todos os domínios: um tal objectivo seria tão ilusório quão impraticável e, em vários aspectos, nefasto e não sustentável devido ao seu custo qualitativo, social e ambiental. O importante, pelo contrário, é dotarmo-nos de todos os meios para sermos plena e sustentavelmente competitivos numa economia aberta e globalizada, nomeadamente através do domínio das novas tecnologias e de uma organização do trabalho e da produtividade mais inovadora, sempre com a preocupação de preservar e consolidar o modo social de desenvolvimento na Europa.

5.4.3

Deverá proceder-se a uma melhor coordenação, por um lado, entre as reformas económicas, sociais, administrativas e ambientais e, por outro, entre os Estados-Membros. Conviria assegurar a comparabilidade e o reforço mútuo. Tendo em vista a situação actual das reformas estruturais nos Estados-Membros, conviria sobretudo:

assegurar a interconexão das redes de telecomunicações, energia e transportes em condições que permitam, tanto quanto possível, melhor relação custo/qualidade/segurança;

acelerar a integração do mercado financeiro europeu conciliando fluidez, harmonização, segurança, concorrência e auto-regulação;

obter ganhos de produtividade, por um lado, directamente nas empresas — organização do trabalho, informática e novas tecnologias — e, por outro, reforçando a eficácia económica e social das transferências públicas incluindo através de economias de escala — abertura do sector público, cooperação europeia dos serviços públicos –, que facilitam a absorção dos défices públicos;

assegurar que os orçamentos da investigação respeitam o objectivo de 3 % do PIB fixado pela UE, dos quais dois terços devem ser financiados pelo sector privado, e que haja coerência nos programas nacionais, entre si e com o programa-quadro em matéria de investigação e desenvolvimento;

estimular a aprendizagem e a formação em alternância escola/empresa, abrir mais o acesso a elas e desenvolver os programas europeus de intercâmbio a uma maior escala;

melhorar a empregabilidade dos desempregados através de programas de formação e de apoios personalizados à integração no mercado de trabalho;

encorajar também os desempregados, quer sejam mulheres ou homens, mais velhos ou mais novos, a exercerem uma actividade económica autónoma, facilitando os procedimentos administrativos e não os penalizando no que toca ao regime de protecção social;

assegurar a solvabilidade da segurança social, garantia da sua sustentabilidade, tendo em conta o envelhecimento demográfico na Europa e, ao mesmo tempo, dissuadindo e reprimindo o trabalho ilegal não declarado;

simplificar a regulamentação e os procedimentos, nomeadamente para as PME, assegurando, ao mesmo tempo, como atrás referido, uma luta mais eficaz contra a economia subterrânea;

atribuir atenção prioritária à criação de empresas e ao encorajamento do espírito empresarial, reformando nesse sentido as disposições administrativas e fiscais;

consolidar o desenvolvimento sustentável e promover as novas tecnologias neste domínio — graças às quais novos mercados à escala mundial se abrem para as empresas europeias –, com um maior número de intercâmbios de boas práticas, que haveria toda a vantagem em reunir numa base de dados.

5.4.4

Esta coordenação das reformas deveria ser apoiada a nível europeu:

atribuindo ao presidente da Comissão Europeia, em ligação com os demais comissários, responsabilidade especial pelo estudo dos desafios do espaço europeu em matéria de competitividade que justificam a inclusão na política da Comissão de iniciativas específicas para o efeito, podendo ele designar um membro da Comissão para o assistir nesta tarefa;

reforçando o painel de avaliação comparativo da execução das reformas de Lisboa, em que ressalte o papel não só do poder público, mas também da sociedade civil;

pautando mais as ajudas da UE pelos objectivos de Lisboa e avaliando esta coerência nos relatórios anuais.

5.4.5

Uma exigência central hoje em dia é motivar mais os europeus para a construção europeia e o seu objectivo de competitividade, que ela própria fixou. Isto pressupõe uma visão mais nítida das finalidades e dos contornos da Europa em construção, bem como do quadro económico e social global em que se inscrevem as reformas estruturais, o que implica, nomeadamente, uma melhor percepção do devir do modelo europeu de relações sociais.

5.4.6

Aumentar a competitividade das empresas europeias implica, nomeadamente, melhorar as qualificações profissionais dos assalariados, estimular a sua participação na organização do trabalho, reforçar a coesão social na empresa com base em relações sociais apertadas e renovadas.

5.4.6.1

O investimento humano das empresas é, de facto, determinante: a mão-de-obra de uma empresa, que constitui o seu capital humano, é um factor essencial da produtividade. Do investimento nesta área, em particular na formação, depende a motivação dos trabalhadores e a sua capacidade produtiva.

5.4.6.2

Uma vez que a «educação e a formação ao longo da vida» passaram a ser um elemento central da política europeia de emprego, é preocupante a baixa percentagem de trabalhadores que participam em acções de educação e de formação: começando por se situar, em média, em 14 % no grupo etário dos 25 aos 29 anos, vai diminuindo regularmente à medida que se acentua o envelhecimento até que, no grupo etário dos 55 aos 64 anos, não representa mais do que 5 %.

5.4.6.3

Num sistema de produção em que os postos de trabalho requerem cada vez mais tecnicidade e saber-fazer, esta situação não deixa de ser inquietante em termos de competitividade europeia. É desejável, senão mesmo imprescindível, ultrapassar esta situação. Para o efeito, as empresas devem integrar a formação na sua estratégia, enquanto investimento a médio e a longo prazo e não como uma acção que permite um retorno de investimento rápido ou mesmo imediato.

5.4.6.4

No entanto, a formação profissional, a formação e a educação ao longo da vida não devem ser consideradas isoladamente. Devem fazer parte da gestão da carreira dos trabalhadores. O que está em causa é, através da formação, assegurar as motivações, seja qual for a idade, valorizando as competências e dinamizando os percursos profissionais. Deste ponto de vista, o balanço de competências e a validação dos resultados adquiridos são utensílios que devem ser desenvolvidos no âmbito de projectos profissionais individuais em articulação com o projecto da empresa.

5.4.7

O Comité gostaria, também, de salientar o papel da economia social, que foi objecto de vários pareceres. O Comité lembra que a economia social pode trazer um modelo de competitividade acrescida, assente na cooperação entre os indivíduos e as empresas e na sua capacidade de dar resposta às necessidades dos indivíduos e de desenvolver o capital humano.

5.4.8

Para além das empresas e dos seus assalariados, os parceiros sociais têm um papel prioritário na redefinição das relações sociais. O mandato de Lisboa tinha inicialmente atribuído às empresas, aos parceiros sociais e à sociedade civil uma responsabilidade essencial pelo êxito das reformas. O Comité lamenta profundamente que esta atribuição tenha sido subvalorizada nas primeiras Cimeiras da Primavera, tanto nos relatórios dos Estados-Membros como nos debates e conclusões do Conselho Europeu.

5.4.9

Esta situação começou a melhorar com a realização na véspera das Cimeiras da Primavera de reuniões dos parceiros sociais com a presidência do Conselho e da Comissão. A agenda do diálogo social plurianual para 2003-2005 acordada pelos parceiros sociais (UNICE, CEEP, UEAPME e Confederação Europeia de Sindicatos) contribuiu também para encorajar o seu envolvimento na execução da estratégia das reformas. Centrada em três vectores (emprego, aspectos sociais do alargamento, mobilidade), esta agenda de concertação e de iniciativas comuns dá particular ênfase ao reforço da formação e das qualificações profissionais. Contribui também para a definição de um modelo europeu de sociedade que alia uma melhor competitividade empresarial a medidas sociais reforçadas.

5.4.10

Estes parceiros sociais iniciaram já nos Estados-Membros reformas determinantes, quer se trate da formação, do mercado de trabalho ou da protecção social. É essencial encorajar a sua co-responsabilidade nas reformas, valorizando as suas iniciativas e acordos nos relatório destinados às Cimeiras da Primavera e incluindo-os nos intercâmbios de boas práticas. O Comité está pronto a divulgar através de uma base de dados esta informação sobre a participação dos actores socioeconómicos nas reformas.

6.   Conclusões

6.1

O Comité conclui que as desvantagens que afectam a competitividade das empresas europeias são hoje o preço a pagar por uma Europa insuficientemente empreendedora, sempre inacabada em muitos domínios, atrasada nas suas reformas e explorando os seus trunfos de um modo medíocre, frequentemente hesitante, por vezes incoerente e, portanto, contraproducente. Esta constatação é confirmada por quatro disfuncionamentos centrais:

uma promoção insuficiente do espírito empresarial apesar das liberdade europeias;

um mercado interno por concluir, apesar de alargado;

uma união económica por realizar, apesar da união monetária;

reformas estruturais mal assumidas, apesar de programadas.

6.2

Sanar estes disfuncionamentos é uma responsabilidade colectiva, a fim de assegurar uma melhor coerência entre a Europa e os seus Estados, que tire partido das complementaridades. O Comité congratula-se por a última Cimeira Europeia da Primavera ter

convidado os Estados-Membros a promoverem parcerias para a reforma que associem os parceiros sociais, a sociedade civil e o poder público;

apoiado a vontade dos parceiros sociais europeus em consolidarem o seu empenhamento numa nova parceria europeia para a mudança.

6.3

O Comité considera que essas parcerias, tanto a nível nacional como europeu, se deveriam esforçar de imediato por criar as condições para o êxito da recuperação da competitividade na Europa e contribuir, nomeadamente, para

acelerar a melhor organização possível do mercado interno;

desenvolver a união económica ao nível da união monetária;

implicar nas reformas todos os meios interessados;

lançar para o efeito iniciativas inovadoras, tanto públicas como privadas e associativas;

avaliar nas próximas Cimeiras da Primavera os progressos realizados nesta parceria.

6.4

O Comité salienta a necessidade de rumar firmemente em direcção ao objectivo de 2010, que deve englobar tanto a execução das reformas de Lisboa como a conclusão do mercado único e a realização de uma verdadeira união económica, competitiva, que extraia todas as lições da união monetária e, ao mesmo tempo, integre plenamente as exigências do desenvolvimento sustentável.

6.5

Verifica, por último, que a necessária aceleração das reformas seria consideravelmente facilitada através de um crescimento económico mais forte. A União Europeia deveria assegurar sem mais demora as medidas que permitem reforçar o mercado único estimulando a oferta e a procura e, desse modo, criar as condições duradouras para aumentar os investimentos, as trocas comerciais, o consumo e o emprego.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  O CESE está a preparar um parecer sobre o projecto de directiva.


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/103


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde sobre as parcerias público-privadas e o direito comunitário em matéria de contratos públicos e concessões»

[COM(2004) 327 final]

(2005/C 120/18)

Em 30 de Abril de 2004, a Comissão decidiu, em conformidade com o artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde sobre as parcerias público-privadas e o direito comunitário em matéria de contratos públicos e concessões».

A Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 8 de Setembro de 2004 (P. LEVAUX, relator).

Na 412.a reunião plenária, realizada em 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 96 votos a favor, 2 votos contra e 2 abstenções o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

A Comissão publicou um Livro Verde sobre as parcerias público-privadas (PPP) em 30 de Abril de 2004. O objectivo é lançar o debate sobre a aplicação do direito comunitário relativo a concessões/PPP.

1.2

No seu parecer de iniciativa de Outubro de 2000 (1), o CESE fez recomendações que permanecem actuais. O fenómeno das PPP expandiu-se e continua a ser uma questão estratégica para a Europa alargada, após a adopção das novas directivas do passado 30 de Abril (2).

1.3

Entretanto já há em vários países algumas experiências com projectos PPP, sendo os resultados variáveis. Seria, pois, aconselhável proceder a uma avaliação sistemática destas experiências tendo em conta determinados critérios, por exemplo, custos, acesso à prestação de serviços, qualidade dos serviços, consequências para o mercado de emprego, etc. Seria, sobretudo, de examinar em que medida as PPP poderão contribuir para manter a competitividade da Europa em relação ao resto do mundo e que vantagens e inconvenientes estas apresentam quando comparadas com formas tradicionais de prestação do mesmo tipo de serviços.

2.   Os direitos nacionais e as realizações em PPP desenvolveram-se fortemente na Europa

2.1

Todos os países europeus já recorreram, ou ainda recorrem, ao sistema de PPP e concessões. Contudo, até à data, a Comissão não pôde fazer um inventário. O BEI possui estatísticas parciais relativas a uma centena de projectos. Não devemos esquecer que a «primeira Europa», a de Roma, utilizava o mesmo sistema já há dois mil anos. Ao longo do século XIX, a rede europeia de caminhos-de-ferro foi construída com base em contratos de concessão. Estes eram consideravelmente desenvolvidos não só nas vias férreas, como também nos serviços públicos municipais: água, gás, electricidade, tratamento de lixos domésticos, telefones, etc.

2.2

Já há muito tempo que, a nível mundial, contratos globais permitem financiar, conceber, executar e gerir ao longo do tempo não só auto-estradas e parques de estacionamento, mas também redes de abastecimento de água, museus, aeroportos, eléctricos ou metropolitano, ordenamentos urbanos, renovações integrais de escolas e hospitais, etc.

2.3   Países com novas legislações relativas a PPP: As descrições que seguem limitam-se a factos constatados num número limitado de países: Itália, Espanha, Reino Unido e França.

2.3.1   Itália

2.3.1.1

A lei-quadro de 1994 (lei Merloni) define a concessão de construção e gestão. Esta forma de concessão caracteriza-se pelo facto de o concessionário realizar a obra com os seus próprios meios, recuperando o capital que avançou por meio da exploração económica da obra realizada (n 2 do artigo 19 da lei 109/94) (3).

O programa de recuperação das infra-estruturas tem como objectivo 220 realizações consideradas estratégicas:

de 2002 a 2011, o investimento é estimado em 125 mil milhões de euros;

metade desta verba provém do Estado e a outra metade de financiamento privado.

A lei criou quadros jurídicos adaptados: o contratante geral, o concessionário, o arrendamento e o promotor.

Para pôr fim aos atrasos de entrega e aumentar a eficácia da construção, a lei de 2001 criou o «contratante geral». Este entrega a obra «chave na mão» e encarrega-se da manutenção. Deverá igualmente assumir o pré-financiamento da obra.

2.3.1.2   O concessionário

A concessão da construção e da gestão constitui a alternativa ao contratante geral: a escassez de recursos financeiros leva, geralmente, a que se recorra a este sistema baseado no pagamento total ou parcial pelo utilizador, uma vez que no regime de «contratante geral» a administração tem de pagar de forma escalonada.

2.3.1.3   O arrendamento ou a gestão

As concessões são utilizadas também para a gestão das obras existentes: hospitais, escolas, estabelecimentos prisionais. Uma recomendação do Tesouro permitirá o recentramento da administração nas suas tarefas essenciais e beneficiar, desta forma, das inovações do sector privado.

2.3.1.4   O contrato de promotor

Consiste na possibilidade de apresentar uma oferta de quem quer que seja para a realização de uma obra, no âmbito da programação trienal dos investimentos da colectividade pública em questão. A administração pode seguir ou não a ideia proposta e, se for o caso, é aberto concurso. O promotor dispõe de um direito de preferência e redige o contrato.

No país em questão constata-se um grande desenvolvimento do sistema de promotor, em:

1163 iniciativas apresentadas em três anos e meio (Janeiro de 2000 a Junho de 2003);

660 são de promotores (concessões de iniciativa privada, das quais 302 em 2003!);

503 de concessões de iniciativa pública.

2.3.2   Espanha

2.3.2.1

Em Espanha, a Lei 13/2003, de 23 de Maio, regula o contrato de concessão de obras públicas. Esta lei veio alterar a Lei de Contratos das Administrações Públicas, texto reformulado aprovado pelo Decreto Legislativo Real 2/2000, de 16 de Junho, por força do qual é introduzido na regulação dos distintos tipos de contratos administrativos um novo título, «Do contrato de concessão de obras públicas», que consagra o regime jurídico deste contrato, entretanto já típico devido às singularidades que apresenta e na linha da tradição do direito espanhol.

2.3.2.2

A nova definição do contrato de concessão articula-se em torno de quatro características: «obras públicas», «riscos ligados ao concessionário», «equilíbrio económico de concessão» e «diversificação do financiamento».

2.3.3   Reino Unido

2.3.3.1

Nos anos de 1993-1994, o governo lançou uma vasta política de delegação de serviços e obras públicas intitulada «Private Finance Initiative». O mecanismo em questão confia a uma empresa privada, para um determinado equipamento público, uma missão global que inclui «Concepção-Financiamento-Construção-Gestão-Manutenção». Na sua aplicação, a PFI traduziu-se em:

mais de 650 projectos lançados em PPP, dos quais 45 hospitais e mais de 200 escolas;

400 projectos em execução;

48 mil milhões de libras investidas (60 mil milhões de euros);

um programa em preparação;

aproximadamente 12 % do orçamento de investimento nacional em capital anual.

2.3.3.2

O Tesouro britânico baseou-se em dois elementos determinantes que justificam o interesse da PFI: «o sector privado deve assumir verdadeiramente o risco», e «o sector público deve obter serviços ao melhor preço através da aplicação do princípio de “Best Value for Money”» (valor condizente com o dinheiro gasto) que pretende optimizar os custos de utilização dos equipamentos construídos, uma vez que estando o próprio construtor encarregado da exploração do equipamento, o mesmo terá todo o interesse em conceber e construir uma obra de qualidade, menos dispendiosa em termos de exploração e cuja durabilidade será maior.

2.3.3.3

Os contratos em curso abrangem todos os domínios: água, saneamento, transportes públicos, exército, hospitais, escolas, edifícios públicos, estradas e auto-estradas, etc.

2.3.3.4

O Reino Unido conta com um grande número de projectos de PPP, o que explica que este país tenha uma vasta experiência neste domínio, com os mais diversos resultados. Seria oportuno proceder a uma análise e avaliação sistemática da experiência britânica, a qual se teria em conta para futuros desenvolvimentos nesta matéria.

2.3.4   França

2.3.4.1

O direito de adjudicação de contratos de concessão pagos pelo utilizador foi regulado pela lei de 29/1/1993, conhecida por lei Sapin, e a prática destes contratos está bastante desenvolvida para:

serviços urbanos de água, limpeza, transportes públicos, etc.,

grandes infra-estruturas: auto-estradas, pontes, grandes estádios, túneis, etc.

2.3.4.2

Os contratos de PPP com financiamento público encontram-se em pleno desenvolvimento em França.

2.3.4.2.1

Desde a lei de 5 de Janeiro de 1988, a França dispõe dos ditos Contratos Enfitêuticos Administrativos de longa duração com financiamento público. Os contratos em questão são utilizados nos edifícios públicos (nomeadamente de ensino) como variante do «leasing» a que o Estado francês também recorre (4). Além disso, o Estado desenvolveu os arrendamentos com opção de compra no domínio dos edifícios e infra-estruturas (leis de 29 de Agosto de 2002 para a «polícia» e início de 2003 para o «exército»).

2.3.4.2.2

Por último, uma lei de 2 de Julho de 2003 previu a aprovação de despachos para os contratos de longa duração, incluindo «a concepção, construção, financiamento e gestão com financiamento público». Um primeiro despacho para o sector hospitalar foi publicado em Setembro de 2003, e um outro foi aprovado pelo Estado francês e colectividades territoriais locais. Trata-se do despacho de 17 de Junho de 2004, sobre os contratos de parceria (5).

2.3.5   Alemanha

2.3.5.1

Na Alemanha, como noutros Estados-Membros, existe um direito detalhado de adjudicação de contratos para os contratos públicos (contratos de construção) que permite às empresas públicas e privadas e às PPP participar nos concursos livres de qualquer discriminação.

2.3.5.2

Essencialmente diferente é o processo de concessão da prestação de serviços básicos. Na Alemanha, os municípios preferem, em muitos casos, parcerias público-privadas (PPP) para prestar tais serviços de interesse económico geral, nomeadamente nos domínios da energia, da água e da recolha de resíduos. Os contratos podem assumir as mais variadas formas. Ao lado de amplas concessões para a prestação de serviços há contratos públicos (como por exemplo, para o fornecimento de electricidade) e PPP institucionalizadas a nível municipal. Estas PPP ajudam a criar postos de trabalho na região e contribuem para a economia regional.

2.3.5.3

Tais PPP são possíveis graças à competência que a Constituição reconhece aos municípios de decidirem livremente do tipo e da organização da prestação de serviços de interesse económico geral na sua circunscrição sob a forma de concessões. Os municípios têm o direito de criar as suas próprias empresas, de constituir PPP com os parceiros que lhes parecerem mais adequados e mesmo de adjudicar a prestação dos serviços de interesse económico geral a privados. Estas PPP não estão sujeitas ao direito de adjudicação de contratos.

2.4   Observações sobre o contrato de promotor

2.4.1

O sistema resulta da tradição de concessões na Europa. Encontra-se em pleno desenvolvimento na Europa e levanta a questão do seu quadro ser harmonizado ou não e da sua ligação ao direito europeu.

2.4.2

França e Espanha adoptam-no após a Itália, onde a legislação neste domínio é bastante minuciosa. Neste país, a colectividade territorial organiza um convite à apresentação de candidaturas fazendo referência ao projecto preliminar do promotor, eventualmente alterado pela colectividade, bem como ao seu plano financeiro (duração proposta, tarifa solicitada …).

2.4.3

A concessão é atribuída, após procedimento negociado, ao promotor ou a uma das duas melhores propostas do concurso. O promotor e os candidatos devem entregar uma garantia no montante de 2,5 % do valor total do investimento.

2.4.4

Se a administração não mantiver o promotor, este recebe o montante da garantia da parte do candidato vencedor como forma de compensação das despesas efectuadas, incluindo a propriedade intelectual. Se o promotor receber o contrato, a sua garantia de 2,5 % é entregue aos dois outros candidatos (60 % ao melhor e 40 % ao segundo).

2.4.5

Da mesma forma que, no artigo 19 da Directiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 31 de Março de 2004, relativa à coordenação dos procedimentos de adjudicação de contratos de empreitadas, de fornecimentos e serviços, se inclui uma reserva de contratos para as organizações que contratam uma maioria de trabalhadores portadores de deficiência, o CESE considera que certos critérios sociais deveriam favorecer o promotor, ou um dos contratantes, aquando da constituição desta forma de parceria público-privada.

2.5   Países onde as PPP e as concessões se encontram pouco desenvolvidas. As descrições que seguem limitam-se a factos constatados num número limitado de países.

2.5.1   Bélgica

2.5.1.1

A concessão encontra-se definida nos artigos 24.o e 25.o da lei de 24 de Dezembro de 1993 e nos artigos 123.o e seguintes do decreto real de 8 de Janeiro de 1996 (6). Além da execução e concepção eventual dos trabalhos, estes artigos prevêem a exploração da obra pelo concessionário. Contudo, o contrato de promoção não parece muito aprofundado no direito belga.

2.5.1.2

O contrato de promoção (7) caracteriza-se pela associação do financiamento, da realização e, por vezes, da concepção de uma obra, cuja entidade adjudicante será o utente, em troca de uma remuneração em rendas (8).

2.5.2   Portugal

2.5.2.1

Para melhorar a rede viária, este país instituiu o contrato SCUT, um regime de delegação que permite a um construtor privado receber uma taxa pública. O SCUT inspira-se no sistema «shadow toll» ou «portagem virtual» nas estradas britânicas. Os concursos relativos a estes contratos SCUT tiveram lugar em 1997. Parece que presentemente são menos utilizados.

2.5.3   Hungria

2.5.3.1

Não existe uma lei específica que se aplique aos projectos de PPP, contudo, as regras de compromissos financeiros do Estado encontram-se no decreto n.o 2098/2003 (V29).

2.5.3.2

Em 1997, o país tomou a iniciativa de lançar um programa em parceria com o sector privado para o desenvolvimento de parques de actividades industriais, cujo número atingia os 165 no início de 2004.

3.   Como definir a concessão e a PPP?

3.1

O direito europeu não conseguiu dar definições realistas e úteis das PPP e das concessões. As noções de PPP e de concessão de obras públicas e de serviço público na legislação comunitária são inexistentes ou discutíveis. A crítica da noção actual incide sobre:

a ligação estabelecida entre as concessões e a noção de contratos de empreitadas de obras (ponto 3.1.1);

a ausência de dissociação dos contratos de longa e dos de curta duração, que representa a fronteira do financiamento externo à entidade administrativa e, como tal, o suporte da delegação (ponto 3.1.2);

a ausência de tratamento das propostas autónomas de concessões do sector privado (ponto 3.1.3).

3.1.1   A ligação das PPP e concessões aos contratos de empreitadas de obras

3.1.1.1

A questão das concessões, em direito comunitário, tem as suas fontes, por um lado, nos princípios e normas do Tratado e, por outro, nas directivas que aplicam estes princípios.

3.1.1.2

As directivas elaboradas pela União têm como objectivo a garantia da transparência da concorrência nos mercados públicos. O respectivo âmbito é por vezes confuso quando se trata de contratos complexos de concessão ou de parceria público-privada.

3.1.1.3

Apenas a Directiva 93/37 (9), que coordena os processos de adjudicação de contratos públicos de empreitadas de obras públicas, definia o contrato de concessão de obras públicas, no artigo 1.o, alínea d). Porém, fazia-o, infelizmente, através de uma referência apenas aos contratos de empreitadas de obras públicas (10). A Directiva 92/50  (11) sobre os contratos públicos de serviço não definia «concessão». Por último, a Directiva 93/38  (12) não abordava a questão da definição ou da adjudicação de concessões, mas regulamentava a adjudicação de todos os contratos adjudicados pelos concessionários nos sectores ditos especiais, substituindo desta forma as outras directivas. O CESE lamenta esta abordagem lacónica e irrealista, que infelizmente se manteve nas Directivas 2004/17 e 2004/18 (13).

3.1.1.4

Consciente do recurso crescente às PPP, a Comissão publicou uma comunicação interpretativa sobre as concessões de contratos públicos em direito comunitário, em Abril de 2000 (14). Esta comunicação pretendia eliminar a ambiguidade jurídica fundamental relacionada com a ausência de definição correcta de concessões e PPP nas directivas relativas aos contratos públicos. Recorde-se que, presentemente, as legislações nacionais acolhem as concessões e as PPP de forma extremamente variada.

3.1.1.5

O CESE considera que são necessárias definições de concessão e de contratos de PPP ou de delegação que esclareçam o seu conteúdo e extensão. Com efeito, a concessão e, mais amplamente, a delegação não se resumem a um único critério — o risco ou o pagamento — como o considerou a Directiva 93/37 e em seguida a comunicação interpretativa, mas definem-se por todo um conjunto de elementos.

3.1.1.6   Como definir melhor uma concessão ou uma PPP?

3.1.1.6.1

O contrato ou o acto unilateral através do qual uma autoridade pública atribui direitos específicos a uma organização externa para «conceber, construir, financiar, manter e gerir» uma infra-estrutura ou um serviço por um período longo e determinado:

denomina-se concessão quando a empresa é remunerada com um valor pago maioritariamente pelos utilizadores;

denomina-se contrato de parceria público-privada quando a remuneração é efectuada maioritariamente pela autoridade pública.

3.1.1.6.2

Destas definições importa extrair dois critérios relacionados com este tipo de contratos:

A necessidade de transferência de responsabilidade da autoridade pública para o titular do contrato;

A noção de globalidade do contrato, que inclui inúmeras funções (construção, financiamento, exploração, manutenção, etc.) a longo prazo (período médio de 10 a 75 anos).

3.1.1.6.3

O CESE considera que, ao contrário do que faz a comunicação interpretativa de Abril de 2000, não podemos limitar-nos a considerar que o contrato (de concessão) se resume à simples assunção de risco de exploração, pois tal representaria uma visão demasiado parcial e limitativa do tipo de contratos em questão.

3.1.2   A necessidade de dissociação entre contratos de curta duração e contratos de longa duração

3.1.2.1

Na sequência da publicação do Livro Verde pela Comissão Europeia em Novembro de 1996 (15), o CESE adoptou um parecer em 28 de Maio de 1997 (16), no qual solicitava à Comissão a revisão da sua abordagem relativamente às concessões, com o objectivo de as tornar mais autónomas face à definição de contratos públicos de obras: «A questão das concessões deveria também constituir objecto de exame profundo, sendo claro que a sua atribuição deve pautar-se pela transparência e por critérios objectivos. Existem diferenças fundamentais entre uma concessão e um contrato de mercado: objecto, duração, condições de financiamento, modo de gestão, âmbito da responsabilidade. Para facilitar o desenvolvimento destes contratos, a Comissão poderia estudar um instrumento jurídico adequado, relativo ao seu regime de execução.»  (17).

3.1.2.2

O CESE considera necessário que, ao debruçarmo-nos sobre a natureza dos contratos e respectiva classificação, se reconheça a sua funcionalidade própria.

3.1.2.3

Um contrato de concessão ou de PPP não se pode resumir, sem referência à duração, a uma transferência de risco de exploração, uma vez que se trata sobretudo de transferir para o candidato seleccionado a concepção, a construção, o financiamento e a gestão-manutenção de uma obra ou de um serviço.

3.1.3

No tocante aos contratos de promotores já referidos, vários países já instituíram um direito específico que reconhece a possibilidade de actores privados proporem um projecto às autoridades públicas responsáveis. Esta prática, já corrente em Itália, deveria poder ser estendida aos outros Estados-Membros que, presentemente, não dispõem de procedimentos semelhantes.

3.2   Aplicações diferentes do direito comunitário originam diferenças jurídicas

3.2.1

Os conceitos contratuais públicos europeus não são fonte de unidade na Europa. Como tal, num país um contrato pode ser considerado contrato público e noutro pode ser entendido como concessão. O mesmo contrato terá desta forma dois regimes de adjudicação em função do país. O Reino Unido, menos sensível à classificação dos contratos do que os países de tradição latina e de direito administrativo, sempre considerou que as PPP eram simples contratos públicos, quando poderia ter considerado que se tratava de concessão de empreitadas de obras públicas.

3.2.2

A emergência do direito específico das PPP em vários Estados-Membros comprova a especificidade do tipo de contratos em questão, situados na charneira entre a gestão administrativa e o contrato, o que dificulta toda a regulamentação a priori.

3.3   O direito comunitário pode contentar-se com classificar os contratos exclusivamente na óptica da adjudicação, deixando numa zona obscura a delegação de serviço público num sentido institucional? O regime de adjudicação de um contrato, por si só, terá tanta importância?

3.3.1

O âmbito das directivas vai sensivelmente além da harmonização da adjudicação de contratos públicos. De facto, as definições por elas adoptadas foram integralmente retiradas de várias legislações nacionais, conduzindo a uma implantação de conceitos contratuais comuns em vários países europeus.

3.3.2

Contudo, as Directivas 2004/17 e 2004/18 deixam o regime jurídico dos contratos nacionais a cargo das legislações nacionais que organizam o direito do seu modo de execução. Coloca-se então a questão do lugar atribuído ao privado na gestão pública.

3.4   A hierarquia das normas atribui, com base nos princípios da economia de mercado, um enorme valor às tarefas de prestação dos serviços públicos e de protecção dos interesses sociais.

3.4.1

O CESE reafirma:

em conformidade com a futura Constituição aprovada pelo Conselho, estes objectivos incluem o desenvolvimento sustentável assente num crescimento económico equilibrado e na estabilidade de preços, numa economia social de mercado altamente competitiva que tenha como meta o pleno emprego e a protecção social, bem como num elevado nível de protecção e de melhoramento da qualidade do ambiente;

que, quando as houver, as PPP devem contribuir para atingir os objectivos da União;

que a estratégia adoptada na Cimeira de Lisboa confirmou o respeito pelo princípio de uma economia de mercado aberta, completando-a com um crescimento forte respeitador da dimensão social da Europa (educação, formação, emprego, etc.).

3.4.2

Com observância do princípio da subsidiariedade para atingir este objectivo de economia de mercado aberta, a autoridade pública competente deve ter em conta as possibilidades de concorrência e optar pela solução mais apropriada.

3.4.3

Qualquer solução contratual de delegação da gestão pública assenta na aplicação de obrigações sociais do país em questão e na observância dos desempenhos previstos no contrato. Em caso de desrespeito dos aspectos sociais ou do desempenho, as cláusulas de rescisão do contrato devem aplicar-se.

4.   Propostas com vista a melhorar e clarificar o direito das PPP e das concessões

4.1

Para criar um quadro harmonizado a nível europeu, o CESE considera desejável que se acompanhe o desenvolvimento destes contratos através de uma ou várias comunicações interpretativas que sigam a diversidade e complexidade do fenómeno ao longo do tempo, em vez de se lançar de imediato numa directiva que poderá rapidamente revelar-se inadaptada.

4.2

Por outro lado, o CESE convida a Comissão a debruçar-se sobre o tema das PPP de forma global e, no âmbito das suas comunicações, a elaborar (após inquérito junto dos Estados) uma lista de critérios que as entidades públicas poderiam considerar no tocante aos aspectos sociais e ambientais. Desta forma, completando a legislação existente com estes critérios, os poderes políticos em questão poderiam torná-los condições de execução dos contratos.

4.3

O CESE considera que:

a PPP é um instrumento económico flexível e dinâmico que pode servir de catalisador à integração de determinados objectivos económicos, sociais e ambientais, como o desenvolvimento sustentável, o emprego e a integração social;

a PPP permite melhorar as culturas respectivas dos parceiros públicos e privados.

4.4

A Directiva 2004/18 regula várias questões importantes relativas à adjudicação de contratos públicos com possibilidade de serem adaptados às PPP e concessões, entre elas os critérios, o diálogo competitivo e a confidencialidade das propostas. Considera-se útil precisar os seguintes pontos:

4.4.1   Manutenção da abordagem aberta das concessões

4.4.1.1

A abordagem aberta da redacção da Directiva 2004/18 deve ser mantida, uma vez que nem todos os Estados-Membros recorrem aos procedimentos concessionários.

4.4.2   Dar uma definição jurídica harmonizada de concessões e PPP na Europa

4.4.2.1

É necessário proceder à unificação da definição nos Estados-Membros dos dois contratos em questão. A definição proposta acima pelo CESE (cf. 3.1.1.6) pode permitir a confirmação do lugar especial que tem este tipo de contrato na fronteira com as noções de contrato e de administração pública.

4.4.3   Respeito pela inovação

4.4.3.1

A regulamentação comunitária relativa às concessões de empreitadas de obras não obriga o concedente a especificar no anúncio de concessão de empreitada de obras públicas, se aceita variantes inovadoras.

4.4.3.2

O CESE considera desejável que as variantes de todo o tipo sejam acolhidas aquando das consultas destes contratos, favorecendo a inovação.

4.4.3.3

A resposta de um candidato considerado para uma concessão pode ter um caracter original, trazendo consigo inovações de vulto e essenciais em todos aspectos técnicos, financeiros ou comerciais e contribuindo para uma melhoria das condições de vida e de trabalho, do ponto de vista social e económico, dos consumidores e trabalhadores implicados.

4.4.3.4

Este incentivo a que os candidatos consintam um investimento intelectual dispendioso numa consulta que permita tais inovações vai ao encontro do espírito da Estratégia de Lisboa. É igualmente necessário evitar que a propriedade intelectual das disposições originais do candidato em questão possa ser prejudicada por serem tais disposições colocadas ao dispor dos outros concorrentes. Trata-se de uma questão de ética e de incentivo à inovação, que deverá ser objecto de transposição para os sistemas jurídicos nacionais, a título do novo procedimento de «diálogo concorrencial» ligado às PPP.

4.4.4   Procedimento negociado

4.4.4.1

Uma proposta de contrato de concessão deverá obedecer ao objectivo de serviço a definir pelo concedente. Mas deverá também beneficiar do máximo de liberdade de modo a atingir este objectivo: concepção da obra, faseamento da obra, assunção de riscos técnicos, etc. Após entrega das propostas por um ou vários candidatos, o CESE gostaria de ver encetado um diálogo entre o concedente e os potenciais concessionários com o objectivo de aperfeiçoar definitivamente o contrato de concessão ou de PPP, em função das escolhas propostas face às necessidades da autoridade pública. A antiga Directiva 94/37 reservava os casos de procedimento negociado para excepções. Doravante, o diálogo competitivo adopta o princípio da negociação para os contratos ditos complexos.

4.4.4.2

O procedimento de diálogo competitivo adoptado deverá, pois:

explicitar que os casos de abertura (dificuldade de apreciar as respostas do privado ou a natureza exacta das necessidades ou as montagens financeiras) estão incluídos num sentido muito lato e liberal;

afirmar que cada empresa pode apresentar a sua própria proposta, salvaguardando-se a propriedade intelectual de cada concorrente.

4.4.4.3

Por último, cabe aqui recordar que a conclusão de um contrato entre a autoridade pública concedente e o concessionário do contrato é obrigatória, estabelecendo as responsabilidades de cada uma das partes, à semelhança do que propõe a legislação dos países em questão.

4.4.5   Afirmação de princípios gerais

4.4.5.1

A importância de um quadro jurídico bem adaptado às concessões e PPP deve ser concretizada em particular na adopção de princípios relacionados com a execução de contratos de concessão ou de PPP.

4.4.5.2

A possibilidade de celebração de contratos de parceria depende, fundamentalmente, da possibilidade de alcançar o equilíbrio contratual e de o respeitar ao longo do tempo.

4.4.5.3

O CESE preconiza que numa comunicação interpretativa, a Comissão favoreça uma repartição equilibrada dos riscos entre o concedente e o concessionário, permitindo a cada Estado a escolha de determinar os meios, que podem evoluir ao longo do tempo. Com este objectivo, deveriam constar várias ideias entre os princípios desta comunicação:

Os riscos de uma concessão de infra-estrutura ou de uma PPP devem ser identificados, quantificados e claramente afectados à parte com melhores condições para os segurar.

O concedente e o concessionário deverão definir previamente as respectivas obrigações contratuais relativamente a determinados riscos, por exemplo face a um acontecimento imprevisível que aumente o custo do contrato (alteração inesperada de imposições de carácter público, condições técnicas imprevisíveis durante a construção, alterações repentinas do comportamento dos consumidores, etc).

Deve ser garantida uma indemnização pelo concessionário que não respeite as cláusulas do contrato.

O concessionário que assegura o financiamento deve ter a garantia, como em qualquer contrato privado, de que eventuais alterações jurídicas e fiscais por parte do poder legislativo não terão efeitos sobre o(s) contrato(s) em causa.

Deve ser prevista uma indemnização imediata ao titular do contrato a partir do momento em que ocorra uma alteração do contrato na sequência de uma nova exigência do concedente, sem que haja alteração das condições iniciais do contrato.

O concessionário deverá poder beneficiar de flexibilidade suficiente para assumir a missão que lhe foi delegada pelo concedente, que se reserva o conjunto das questões do domínio de acção dos poderes públicos ou de ordem pública.

4.4.5.4

O êxito da aplicação do sistema de concessões, como forma de colaboração eficaz entre a gestão e o financiamento privado e o investimento público na prestação de serviços de interesse geral depende de um quadro jurídico e contabilístico apropriado, que se adapte à estrutura específica da concessão. Os grandes investimentos e custos que a empresa privada é obrigada a suportar nos primeiros anos para realizar as infra-estruturas e iniciar a prestação do serviço em causa devem poder ser contabilizados ao longo de todo o período da concessão. O projecto de harmonização contabilística europeia, tal como se está a delinear, inviabiliza o processo de concessão. A experiência espanhola em matéria de contabilidade, com o tratamento que está a ser dado às novas concessões, poderia ser um exemplo a ter em conta se o objectivo for conseguir formas de colaboração entre o sector público e o privado em projectos de construção e ou de fornecimento de serviços à escala da União Europeia.

5.   Clarificar sensivelmente as regras de concorrência entre as entidades públicas ou para-públicas e as entidades privadas

5.1

Muitas vezes, é às sociedades mistas que são atribuídas directamente as concessões ou direitos especiais ou exclusivos, podendo em determinados casos estender o seu campo de actividade para além da zona em que foram criadas, através da simples alteração dos estatutos. Como resultado, a competição, quando a haja, é por vezes falseada. Nesse caso, devem dispor de contabilidade separada, para que se possa verificar que não praticam subvenções cruzadas, o que falsearia a concorrência.

5.2   O CESE recomenda a clarificação das regras da seguinte forma

5.2.1

Antes da criação de uma entidade mista, a autoridade competente deve considerar as possibilidades de concorrência do mercado e determinar a solução mais apropriada.

5.2.2

Por questões de transparência e eficácia, os processos de criação de entidades mistas devem ser anunciados previamente aos concursos, e os concorrentes privados devem ser convidados de forma clara a eventualmente participarem na criação de sociedades para-públicas. Por último, a abertura de concurso por uma autoridade pública para uma nova prestação, numa entidade mista local deve ser efectuada:

Obrigando a entidade mista, caso saia do seu território de origem, a possuir uma contabilidade separada para que seja possível verificar que não pratica subvenções cruzadas que falseiem a concorrência;

Respeitando os procedimentos comunitários, incluindo os que se relacionam com ajudas estatais;

Controlando as condições de concorrência equitativas em relação ao sector privado (fiscalidade e custos de funcionamento da empresa mista).

6.   Conclusões

O CESE considera que, actualmente, está a emergir um direito específico de PPP em vários Estados. Tendo em conta as experiências em curso, seria preferível:

Permitir a evolução das PPP sob várias formas, ao longo de vários anos;

Obter dos Estados-Membros a comunicação sistemática das diversas formas de PPP, bem como das dificuldades encontradas (vantagens e inconvenientes em relação às formas tradicionais);

Criar juntamente com representantes dos Estados, da Comissão e da sociedade civil (entre os quais o CESE), um observatório da evolução das PPP (para avaliar as experiências em função de diversos critérios, nomeadamente os custos, o acesso à prestação de serviços, consequências para o mercado de trabalho, competitividade, ambiente, etc.);

Sublinhar que para as PPP e concessões, se aplicam os limiares europeus de publicidade (obras, serviços); abaixo destes limiares cada Estado aplicará as suas próprias regras, para evitar um peso administrativo inútil;

Publicar, antes de 2007, uma comunicação interpretativa que clarifique:

a definição das concessões e das PPP,

a posição concorrencial das entidades mistas ou para-públicas,

o diálogo competitivo e o procedimento de publicidade,

a modalidade do «promotor» que favorece a inovação,

a pertinência das ajudas estatais para as entidades mistas ou para-públicas.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 14 de 16.1.2001.

(2)  JO L 134 de 30.4.2004.

(3)  Lei-quadro (L 109/94) (G.U. n.o 41 de 19.2.1994) alterada pela lei n.o 216, de 2 de Junho de 1995 (G.U. n.o 127 de 2.6.1995).

(4)  O Ministério das Finanças em Bercy (Paris) foi parcialmente construído com recurso a este instrumento financeiro.

(5)  Despacho n.o 2004-559 sobre os contratos de parceria, publicado no JO de 19 de Junho de 2004.

(6)  Lei de 24/12/93 —contratos públicos— Jornal Oficial Belga (Moniteur belge), 22 Janeiro de 1994. Decretos reais de 8 e 10/1/96 — Jornal Oficial Belga de 26 de Janeiro de 1996, decreto real relativo aos contratos públicos de empreitadas, de fornecimento e de serviços e às concessões de OP.

(7)  Idem.

(8)  Lei de 24 de Dezembro de 1993 (artigo 9) — decreto real de 8 de Janeiro de 1996 (artigo 21) — decreto real de 26 de Setembro de 1996, Maurice-André FLAMME. A lei de 24 de Dezembro de 1993, Journal des Tribunaux (Colectânea de Jurisprudência), 1994. Regime de construção.

(9)  JO L 199, de 9.8.1993.

(10)  A «concessão de empreitadas», consiste num contrato que apresenta os mesmos elementos referidos no ponto a), com a excepção do facto de a contrapartida das empreitadas consistir unicamente no direito de exploração da obra, com um preço estabelecido.

(11)  JO L 209, de 24.7.1992.

(12)  JO L 199, de 9.8.1993.

(13)  JO L 134, de 30.4.2004.

(14)  JO C 121, de 29/4/2000.

(15)  COM(96) 583 final.

(16)  JO C 287 de 22.9.1997.

(17)  Outros pontos do parecer merecem ser citados:

 

«Em diversos países, têm-se desenvolvido os métodos de financiamento privado das obras públicas. Trata-se de contratos de longa duração com participação financeira privada, o que os diferencia dos contratos públicos.».

 

«Recomenda que a actividade das concessões constitua objecto de um regime específico, designadamente para as redes transeuropeias (RTE).».

 

«O CESE propõe que a Comissão Europeia favoreça a promoção dos novos métodos contratuais baseados no financiamento privado das infra-estruturas públicas.».


20.5.2005   

PT

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C 120/111


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Conselho que altera a Directiva 92/12/CEE relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo»

[COM(2004) 227 final — 2004/0072 (CNS)]

(2005/C 120/19)

Em 24 de Maio de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Foi encarregada da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, que emitiu parecer em 7 de Outubro de 2004, sendo relator C. WILKINSON.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 27 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 84 votos a favor, 11 votos contra e 5 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

Antes da entrada em funcionamento do mercado interno havia grandes discrepâncias nos sistemas e nas taxas aplicadas aos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, devido às diferenças históricas e culturais entre os Estados-Membros. A Directiva 92/12/CEE assentia em harmonizar o regime geral, a detenção, a circulação e os controlos dos produtos (1) sujeitos a impostos especiais de consumo (2).

1.2

O artigo 27.o desta Directiva previa que, até 1 de Janeiro de 1997, o Conselho voltasse a analisar os artigos 7.o a 10.o com vista a introduzir, se fosse caso disso, as alterações necessárias (3). Verificou-se, contudo, que este prazo de 1 de Janeiro de 1997 seria demasiado prematuro para formar uma opinião fundamentada sobre as dificuldades eventualmente suscitadas pela aplicação destes artigos.

1.3

Desde a entrada em vigor da directiva, tem aumentado consideravelmente o interesse pelos movimentos de produtos em relação aos quais foi já efectuado o pagamento dos impostos especiais de consumo correspondentes abrangidos pelos seus artigos 7.o e 10.o. Alguns Estados-Membros acabaram mesmo por simplificar, a pedido dos operadores económicos, certos procedimentos. Foi também grande o número de queixas apresentadas por particulares relativamente à aplicação dos artigos pertinentes.

1.4

A Comissão entende que, havendo já uma percepção suficiente dos problemas causados por diversas categorias de movimentos (4), chegou a altura de propor as alterações necessárias.

2.   Observações na generalidade

2.1

A complexidade dos detalhes das operações do mercado interno de bens sujeitos a impostos especiais de consumo tem provocado incerteza quanto à forma de aplicação das regras em certos casos e tem significado para as empresas que nelas intervêm uma substancial carga administrativa. A proposta da Comissão contempla as transacções comerciais, as vendas a particulares e as vendas à distância e propõe-se clarificar, simplificar e harmonizar as disposições em vigor aplicáveis aos movimentos intracomunitários, cujos impostos especiais de consumo já foram pagos num Estado-Membro sobre os produtos em causa, e a liberalizar esses movimentos para que os consumidores passem a retirar maiores benefícios do mercado interno. O Comité associa-se inteiramente a estes dois objectivos.

2.2

Face ao montante das receitas dos Estados-Membros resultantes dos impostos especiais de consumo (5) e às discrepâncias nacionais no modo de aplicar a regulamentação, tem sido muito difícil à Comissão chegar a um acordo com os Estados-Membros sobre as alterações a efectuar. Convém referir que os dez «novos» Estados-Membros não participaram nos debates com a Comissão que deram origem às propostas. O Comité não hesita em reconhecer a necessidade de os Estados-Membros utilizarem os impostos especiais de consumo como um factor de aumento das receitas fiscais, mas duvida que estas propostas modifiquem os hábitos dos consumidores a tal ponto que isso se venha a repercutir substancialmente nas suas receitas globais.

2.3

No caso dos bens sujeitos a impostos especiais de consumo, os preços ao consumidor são em geral visivelmente influenciados pela tributação em vigor. Isto é sobretudo patente nos tabacos manufacturados e nas bebidas alcoólicas (6). Desde que foi introduzido o mercado interno, as diferenças entre as taxas aplicadas nos Estados-Membros sofreram uma pequena redução, mas como as taxas aplicadas estão sujeitas, no mínimo, a uma forte medida de harmonização, o motivo de procurar os negócios mais vantajosos não desaparecerá e as actividades criminosas neste domínio decerto que não abrandarão.

2.4

Os cidadãos da UE esperam poder beneficiar do mercado interno das mais variadas formas, mas o direito de comprar produtos em qualquer parte do território da UE aos preços praticados localmente já é uma enorme vantagem. Privar os cidadãos deste direito não é a forma mais inteligente para aumentar a popularidade da UE.

2.5

Conforme salienta a Comissão, os movimentos intracomunitários dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo a coberto das referidas disposições dizem essencialmente respeito a particulares, assim como a pequenos operadores económicos que não dispõem de infra-estruturas comerciais nem meios financeiros importantes. É, portanto, fundamental que todas as medidas acordadas sejam claras, simples e compreensíveis e, dentro do possível, de fácil aplicação. Terão de ser igualmente realistas e exequíveis.

2.6

Num mercado interno genuíno haverá que liberalizar as regras sobre produtos de tabaco. No entanto, o Comité está ciente de que os Estados-Membros, no momento de decidir que mercadorias devem ser incluídas na directiva modificada, terão de sopesar devidamente todas as implicações dessa decisão, o que poderá ter por consequência a exclusão de certos produtos.

2.7

Observa igualmente que os óleos minerais só muito raramente circulam sem fins comerciais. É, portanto, evidente que as propostas, conforme estão formuladas, afectarão sobretudo os movimentos comerciais de bebidas alcoólicas.

2.8

O Comité congratula-se por muitas das propostas terem origem nos conselhos e nas reivindicações das organizações empresariais envolvidas nestas operações e terem em linha de conta o seu impacto nas empresas de menores dimensões.

3.   Observações na especialidade

3.1

O artigo 7.o determina essencialmente quem deve pagar impostos especiais de consumo nas mais diversas circunstâncias, os trâmites administrativos necessários, regulando as vendas a bordo de uma aeronave ou de uma embarcação no decurso de um transporte intracomunitário de passageiros e o tratamento das perdas ocorridas durante a circulação intracomunitária de produtos já introduzidos no consumo.

3.1.1

O Comité saúda a clarificação e a harmonização em resultado das propostas da Comissão. Compraz-se igualmente com o facto de se admitir a necessidade de reduzir os complicados trâmites administrativos exigidos para cumprir inteiramente com as disposições em vigor. O Comité associa-se ao apelo feito pela Comissão aos Estados-Membros para autorizarem procedimentos simplificados por meio de acordos administrativos bilaterais entre si.

3.2

O artigo 8.o diz respeito aos produtos adquiridos por particulares, para satisfação das suas necessidades. O que está aqui sobretudo em causa é o imperativo de os respectivos produtos serem transportados pessoalmente pelos compradores.

3.2.1

O Comité aplaude a proposta da Comissão de liberalizar o sistema actualmente aplicável a compras à distância por particulares para evitar que estes tenham de continuar a transportar consigo os bens que adquiriram directamente.

3.2.2

Na interpretação do Comité, a nova proposta de incumbir os próprios particulares dos trâmites inerentes à expedição dos bens para outro Estado-Membro (por não poderem ficar a cargo do vendedor) está em sintonia com o regime geral de IVA aplicado actualmente às vendas à distância. No entanto, assim à primeira vista, não se sabe muito bem como aplicá-lo. Uma possibilidade seria que os vendedores indicassem eventualmente um agente local que se encarregaria de organizar o transporte, satisfazendo assim o preceito legal de não serem eles a tratar dessas formalidades, mas o efeito seria o mesmo. Deveria ficar bem explícito que este tipo de conselho ao abrigo da directiva modificada não vai contra as regras estabelecidas.

3.3

A proposta de abolir os «limites indicativos» (7) como possível evidência para detectar se os produtos são detidos para fins comerciais ou para as necessidades próprias de particulares, também tem o aval do Comité. Com efeito, os particulares consideram geralmente estes números como limites quantitativos e os limites estabelecidos têm sido levados demasiado à letra pelos Estados-Membros. O Comité admite que ao remover estes limites se dificulte ainda mais o combate às actividades de contrabando, só que eles foram pensados apenas como orientação para determinar se um movimento é realizado para fins pessoais ou comerciais, não oferecendo sequer evidência bastante ao nível jurídico.

3.3.1

O Comité pensa que não seria má ideia impor certo tipo de restrições quantitativas às vendas à distância (nos casos em que os bens adquiridos não são transportados pelos próprios particulares).

3.4

Artigo 9.o — É improvável que as propostas que cobrem movimentos realizados para fins pessoais de óleos minerais causem problemas de monta.

3.5

Artigo 10.o — O Comité congratula-se com a clarificação proposta dos casos em que são devidos impostos especiais de consumo.

4.   Resumo

4.1

O Comité considera muito louváveis as propostas apresentadas pela Comissão num domínio tão complexo e delicado.

4.2

As propostas são realistas e tanto a clarificação como a simplificação sugeridas merecem todo o aplauso. A harmonização é absolutamente necessária e a liberalização será acolhida de braços abertos pelos cidadãos da União Europeia que verão nisso mais uma vantagem do mercado interno.

Bruxelas, 27 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Estes produtos são: tabacos manufacturados, óleos minerais e bebidas alcoólicas.

(2)  Regra geral, a circulação comercial intracomunitária de produtos sujeitos a impostos especiais de consumo efectua-se em «regime de suspensão» desses impostos. Os produtos que não são introduzidos no consumo com pagamento dos impostos especiais de consumo, circulam de um Estado-Membro para outro entre entrepostos fiscais, ao abrigo de documentos acordados. Assim se garante que os impostos especiais de consumo são recuperados no Estado-Membro no qual se presume ter lugar o consumo.

(3)  Os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo que já tenham sido introduzidos no mercado e em relação aos quais, consequentemente, já tenha sido pago o imposto especial de consumo num Estado-Membro podem igualmente ser objecto de um movimento intracomunitário. Este tipo de movimento é, precisamente, o objecto do disposto nos artigos 7.o a 10.o da directiva.

(4)  Estas categorias correspondem a movimentos de produtos entre Estados-Membros para fins comerciais (com excepção das «vendas à distância»), definidos como todos os fins que não sejam necessidades próprias dos particulares, de produtos adquiridos directamente pelos particulares para satisfação das suas necessidades e vendas à distância.

(5)  O montante total em relação ao PIB dos Estados-Membros em 2001 (15 mil milhões de euros) excedeu 8,8 mil milhões de euros, correspondendo a média comunitária das receitas provenientes dos impostos especiais de consumo a 2,72 % do PIB.

(6)  No caso dos produtos de tabaco manufacturados, os preços ao consumidor no Estado-Membro mais tributado são cerca de 3,7 vezes superiores aos praticados no Estado-Membro menos tributado. As taxas especiais aplicadas às bebidas alcoólicas variam entre o Estado-Membro mais tributado e o menos tributado umas 15,9 vezes no caso da cerveja e «produtos intermediários» e umas 9,2 vezes no caso das bebidas espirituosas. Não é possível fazer uma comparação deste tipo nos produtos vinícolas uma vez que o vinho não é tributado em 12 dos 25 Estados-Membros, sendo aplicada uma taxa mínima de 2 cêntimos por garrafa em dois outros Estados-Membros.

(7)  Os limites indicativos são actualmente: 800 cigarros, 10 litros de bebidas espirituosas, 90 litros de vinho e 110 litros de cerveja.


20.5.2005   

PT

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C 120/114


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Conselho que adapta a Directiva 77/388/CEE, em virtude da adesão da República Checa, da Estónia, de Chipre, da Letónia, da Lituânia, da Hungria, de Malta, da Polónia, da Eslovénia e da Eslováquia»

[COM(2004) 295 final]

(2005/C 120/20)

Em 30 de Junho de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Dada a urgência dos trabalhos, na 412.a reunião plenária, de 27 e 28 de Outubro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu nomeou relator-geral A. PEZZINI e adoptou, com 121 votos a favor, sem votos contra e 3 abstenções, o presente parecer.

1.   Introdução e historial

1.1

O Conselho Europeu de Viena de 11 e 12 de Dezembro de 1998, no âmbito da «Estratégia de Viena para a Europa», havia recomendado que os Estados-Membros, que assim o desejassem, pudessem testar os efeitos que uma redução do IVA aplicado a serviços com grande intensidade do factor trabalho (1)teria sobre a criação de emprego e o combate à economia paralela.

1.2

No seguimento desta recomendação, o Conselho adoptou, em 22 de Outubro de 1999, a Directiva 1999/85/CE, com um período de vigência de quatro anos (2000-2003). Nove Estados-Membros utilizaram esta possibilidade, a saber, Bélgica, Grécia, Espanha, França, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Portugal e Reino Unido.

1.3

Em 23 de Julho de 2003, e no seguimento dos relatórios de avaliação sobre o impacto das medidas, a Comissão apresentou uma proposta de directiva que procedia a uma revisão global da taxa reduzida de IVA (2), tendo em vista a sua simplificação e a sua racionalização. As numerosas divergências no Conselho impossibilitaram a adopção da proposta de directiva, dado que nesta matéria é necessária unanimidade.

1.4

Por conseguinte, para evitar toda a insegurança jurídica nos Estados-Membros que aplicavam taxa reduzida, a Comissão propôs, com o acordo do Conselho, uma prorrogação por dois anos do prazo de validade da autorização da Directiva 1999/85/CE, ou seja até 31 de Dezembro de 2005.

2.   Observações na generalidade

2.1

O CESE já teve a ocasião de manifestar o seu apoio à aplicação de uma taxa reduzida de IVA a serviços com grande intensidade do factor trabalho (3).

2.2

Nos seus pareceres regozijou-se com o impacto das medidas em matéria de criação de emprego e de combate ao trabalho ilegal.

2.3

Fez além disso uma série de sugestões no sentido de essas reduções de taxa do IVA serem alargadas a novos sectores como, por exemplo, os serviços de restauração; restauro de edifícios históricos, religiosos bem assim edifícios que fazem parte do património cultural e arquitectónico privado.

2.4

Por conseguinte, o CESE concorda que, até 31 de Dezembro de 2005, se autorize os novos Estados-Membros, que o solicitem ao abrigo da Directiva 1999/85/CE, a aplicar uma taxa reduzida de IVA a serviços com grande intensidade do factor trabalho.

2.5

Lamenta, no entanto, que o Conselho não tenha logrado chegar a acordo sobre a proposta de directiva da Comissão Europeia com vista a simplificar e racionalizar todo o sistema.

2.6

Várias vezes teve o CESE a ocasião de afirmar que, em seu entender, o princípio de unanimidade impede que a União faça progressos em numerosos aspectos das questões fiscais.

Bruxelas, 28 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Nessa altura o desemprego na UE rondava os 10 %. O Conselho Europeu extraordinário de Luxemburgo (1997) centrara os seus trabalho no desemprego. Os estudos da Academia Europeia de Avinhão sobre o trabalho ilegal revelaram que na UE este tipo de trabalho chegava a atingir os 28 % . Ver parecer CESE sobre trabalho não declarado (JO C 101 de 12.04.1999, pág. 30).

(2)  COM(2003) 397 final de 23/7/2003.

(3)  JO C 209 de 22.7.1999.

JO C 32 de 5.2.2004.


20.5.2005   

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Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à eficiência na utilização final de energia e aos serviços energéticos»

[COM(2003) 739 final — 2003/0300 (COD)]

(2005/C 120/21)

Em 23 de Janeiro de 2004, o Conselho decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo 175.o, n.o 1, do Tratado que institui a Comunidade Europeia, sobre a proposta supra mencionada.

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu o parecer em 5 de Outubro 2004. A relatora foi U. B. SIRKEINEN.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 28 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 117 votos a favor, 10 votos contra e 14 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

Ao longo dos últimos anos, a política energética da UE seguiu três grandes linhas de orientação:

criar mercados de electricidade e de gás abertos e eficazes,

segurança do aprovisionamento energético, e

alcançar objectivos ambientais rigorosos e, em particular, combater as alterações climáticas.

A legislação essencial adoptada nestas áreas inclui as directivas revistas de electricidade e mercado de gás, que abrem os mercados aos utilizadores não domésticos em meados de 2004, e a todos os consumidores em 2007. Em 2001, foi publicado um livro verde relativo à segurança do fornecimento de electricidade, sublinhando a gestão da procura energética como uma medida-chave na segurança do aprovisionamento e no combate às alterações climáticas.

1.2

O aprovisionamento energético de confiança, a preços razoáveis, é uma condição prévia importante para o crescimento económico e bem-estar dos cidadãos da Europa. Assim sendo, nos seus pareceres, o CESE apoiou os objectivos e a abordagem da Comissão.

1.3

A proposta de directiva relativa à eficiência na utilização final de energia e aos serviços energéticos foi apresentada pela Comissão como parte integrante de um pacote de propostas sobre infra-estruturas energéticas e segurança do aprovisionamento. A Comissão assinala que, neste contexto, não se pode negligenciar a questão do equilíbrio entre a oferta e a procura. Uma causa subjacente ao aumento da pressão nas redes é o crescimento da procura, que pode ser parcialmente contrabalançado pela gestão da procura.

1.4

A eficiência da utilização final de energia, ou a poupança de energia, já é há muito reconhecida como um poderoso elemento do mercado energético. Um menor uso de energia poupa dinheiro e contribui directamente para a segurança do aprovisionamento e muitas vezes para a redução dos gases com efeito de estufa, através da diminuição da necessidade de produção e de investimentos em nova produção, transmissão e distribuição.

1.5

Há um grande potencial de melhor eficiência energética. A Comunicação faz referência a estudos que mostram que, em média, o consumo final de energia na UE poderia ser reduzido pelo menos em 20 %, sem diminuir o conforto e sem custos adicionais. O potencial de eficiência da utilização de electricidade é geralmente inferior a este valor total e superior no tocante a outros tipos de energia.

1.6

Na Comunicação que acompanha o pacote energia, a Comissão refere que o aumento futuro na procura de electricidade será da competência da gestão da procura. Contudo, pensa-se que serão necessários novos investimentos, simplesmente para renovar fábricas que atingiram o limite de vida. A Comissão espera que grande parte desse investimento incida em fontes de energia renováveis e na produção combinada de calor e electricidade em pequena escala.

1.6.1

O Comité discorda totalmente desta descrição de tendências e necessidades futuras no sector da electricidade. Espera-se que num comunicado sobre a segurança do aprovisionamento haja informação mais clara e realista quanto a tendências futuras e potenciais, sobretudo quando estiverem disponíveis cenários e informação mais bem quantificada, incluindo material produzido pela própria Comissão. Ninguém ganha ao evitar informação de base mais clara e mais realista — apesar de esta ser, para muitos, impopular.

1.6.2

Um cálculo aproximado pode dar uma ideia da magnitude do problema, bem como as opções para o resolver: a procura de electricidade está a aumentar a uma média anual de 1-2 % na UE. O objectivo da UE para o aumento da produção de electricidade a partir de fontes de energia renováveis representa um aumento inferior a 1 %. O objectivo proposto para a eficiência energética diminuiria o aumento anual em 1 %. Por conseguinte, as renováveis e a eficiência poderiam compensar o aumento da procura e substituir possivelmente a capacidade existente por muito menos do que 1 % ao ano. As centrais eléctricas funcionam durante 30 a 50 anos, o que, teoricamente, significa que a substituição tem de ter lugar numa média anual de 43 %. A Agência Internacional de Energia (AIE) assinala uma necessidade de novas centrais eléctricas na UE de mais de 200 000 MW ao longo dos próximos 20 anos.

2.   Proposta da Comissão

2.1

O objectivo da proposta da Comissão é garantir que, anualmente, seja poupado mais 1 % da energia utilizada anteriormente em cada Estado-Membro através de uma maior eficácia energética. Este 1 % de energia a poupar é calculado com base na média anual de utilização de energia ao longo dos últimos cinco anos nos Estados-Membros, o que teria como resultado uma poupança energética de cerca de 6 % em 2012. De acordo com as disposições da directiva, os Estados-Membros serão obrigados a comunicar e verificar se esta quantidade de energia foi poupada todos os anos até 2012. A utilização de energia no Estado-Membro poderá aumentar, mas a uma velocidade inferior à constatada antes da aplicação das medidas.

2.2

O projecto de directiva encoraja medidas de eficácia energética e o seu objectivo é promover o mercado de serviços energéticos tais como iluminação, aquecimento, água quente, ventilação, etc. Os Estados-Membros seriam obrigados a respeitar dois objectivos de poupança de energia e a garantir que os fornecedores de energia oferecessem serviços energéticos no período de 2006 a 2012.

2.3

O objectivo geral de poupança de utilização final de energia de 1 % por ano representa 1 % da quantidade média de energia distribuída ou vendida aos clientes finais nos últimos cinco anos. As poupanças em questão teriam de ocorrer nos seguintes sectores: casas particulares, agricultura, sector comercial e público, transportes e indústria. Os transportes marítimos e aéreos estão excluídos por razões de quantificação. Também estão excluídas as indústrias de energia intensiva, já abrangidas pela directiva relativa à comercialização de emissões e pela directiva relativa à prevenção e controlo integrados da poluição. Serão tidos em consideração todos os tipos de energia: da electricidade e gás natural, ao aquecimento urbano e arrefecimento, combustível para aquecimento, carvão e lignite, produtos de energia florestal e agrícola e combustíveis para transportes.

2.4

É estabelecido um objectivo sectorial para os sectores públicos dos Estados-Membros, que têm de poupar pelo menos 1,5 % de energia por ano, nomeadamente graças aos contratos públicos energeticamente eficientes. As poupanças em questão também contribuiriam para o objectivo de poupança anual de 1 %.

2.5

É estabelecida uma obrigação de fornecimento em matéria de venda de serviços energéticos. Distribuidores de energia e/ou empresas de fornecimento a retalho teriam de integrar serviços energéticos na distribuição e venda de energia até que 5 % dos seus clientes estivessem abrangidos. Como alternativa, seriam oferecidas auditorias energéticas.

2.6

Um método de cálculo permite que medidas tomadas anteriormente sejam consideradas. Os Estados-Membros podem medir e verificar o impacto continuado dos serviços energéticos já existentes e medidas de eficiência que não tenham sido introduzidas antes de 1991. Impostos sobre a energia e campanhas informativas sobre poupança de energia podem ser levadas em consideração, desde que o seu impacto também possa ser quantificável e verificável.

2.7

Os Estados-Membros decidirão quais os sectores alvo e com quanto cada sector deveria contribuir para alcançar o objectivo nacional, apesar de se pensar que deveria ser oferecida alguma forma de serviço energético ou programa ou medidas de eficácia energética a todos os clientes elegíveis.

2.8

As poupanças serão calculadas com base no total das reduções verificadas ou estimadas no consumo final de energia atribuível a todos os serviços energéticos, programas de eficiência energética e outras medidas elegíveis. Os Estados-Membros prestarão regularmente informações sobre os objectivos alcançados. Na proposta, são apresentados exemplos de serviços energéticos elegíveis e orientações de eficácia energética para medir e verificar as poupanças energéticas.

3.   Observações na generalidade

3.1

Em várias ocasiões anteriores, o CESE sublinhou a importância da poupança de energia e reforçou a eficiência da utilização final da energia de forma a alcançar o objectivo do desenvolvimento sustentável e, em particular, combater as alterações climáticas. A iniciativa da Comissão de prestar seriamente atenção a esta questão é bem-vinda. O CESE apoia fortemente o objectivo da eficiência energética, bem como algumas das propostas do projecto de directiva, mas também tem propostas de alteração.

3.2

Em vários Estados-Membros, houve acções nesta área, o que presentemente resulta numa grande variedade de medidas de política, resultados e experiências práticas. As medidas voluntárias, de forma não organizada ou com base em acordos, são talvez as mais usuais nesta área, também com alguns exemplos sectoriais a nível da UE.

3.3

A nível da UE, existem requisitos para a rotulagem de aparelhos domésticos e com outras finalidades e uma directiva relativa à utilização de energia em edifícios. Outras medidas estão prestes a surgir, tais como a directiva relativa ao design de produtos que utilizam energia. Muitas outras áreas de políticas da UE apoiam igualmente a eficiência na utilização final de energia, tais como o IPPC (1) e directivas relativas à tributação sobre a energia. Infelizmente, em grande medida estas políticas incluem acções que aumentam consideravelmente o custo da energia. Tal pode ser visto como um incentivo à poupança de energia, mas os prejuízos causados pelos custos mais elevados para as famílias e a competitividade das indústrias podem superar os efeitos positivos.

3.4

As acções relevantes para reforçar a eficácia energética variam consideravelmente devido a diferentes circunstâncias locais e acções levadas a cabo até ao presente. Os efeitos das acções em questão no mercado interno parecem limitadas. Neste contexto, tendo em conta o princípio de subsidiariedade, é importante que medidas adicionais a nível da UE contribuam como uma verdadeira mais valia.

3.5

Na sua proposta, a Comissão parece tentar ter em consideração as diferenças e variedades de medidas. Mas tendo em conta todos os regulamentos nacionais e da UE já existentes, e em particular todas as actividades voluntárias, do ponto de vista do CESE, a proposta carece de alguns ajustamentos, de forma a acrescentar um valor optimal às medidas existentes. Também deveria ser esclarecida a coerência com outros requisitos relacionados, tais como os previstos na directiva relativa aos edifícios.

3.6

O potencial da maior eficácia energética tem sido objecto de vários estudos. Em geral, o CESE concorda com a Comissão quanto aos valores apresentados. O potencial é grande, mas parte tem de ser vista de um ponto de vista crítico, levando mais em conta as realidades económicas. A rentabilidade de investimentos de eficiência foi calculada com base num curto período de recuperação do investimento, o que muitas vezes não é viável na prática. Por exemplo, se o custo adicional de um sistema de aquecimento mais eficaz numa casa particular tem um período de recuperação de dezenas de anos, o dono dificilmente veria o investimento em questão como rentável. Da mesma forma, o gerente de uma pequena empresa com um orçamento para investimento limitado, não colocaria a substituição de um aparelho que ainda funcionasse por um outro que consumisse menos energia no topo da lista das suas prioridades, acima de um projecto que aumentasse a produção total e o volume de negócios.

3.7

Neste contexto, o objectivo estabelecido pela directiva de um aumento de 1 % anual na eficácia é ambicioso, mas não é de todo irrealista. O objectivo de 1,5 % no sector público, que diz respeito sobretudo à utilização de energia em edifícios, poderá será consideravelmente difícil e dispendioso de alcançar em alguns Estados-Membros nos prazos propostos.

3.8

O principal argumento a favor da fixação de um objectivo obrigatório é o facto de os objectivos serem motivadores. Porém, há vários argumentos contra um objectivo vinculativo.

3.8.1

Há diferenças tais entre medidas presentes e passadas que um objectivo único implicaria custos diferentes para utilizadores de energia em Estados-Membros distintos. Não é possível fixar objectivos individuais para os Estados-Membros devido à falta de informação comparativa como base de cálculo.

3.8.2

Outro argumento é o facto de um objectivo ser encarado como um «bastão», em vez de uma cenoura, o que transmitiria a ideia errada. Os potenciais e vantagens do reforço da eficiência energética deveriam ser comunicados e reforçados de uma forma positiva e estimulante.

3.8.3

A base de informação sobre a actual utilização de energia, a situação da eficiência energética e os efeitos das actuais medidas é escassa em muitos Estados-Membros. Os métodos de cálculo de poupança apresentados pelo projecto de directiva não se encontram bem definidos. A flexibilidade a este respeito é valorizada, porém, os resultados só são comparáveis e fiáveis face ao objectivo quando tanto a informação de base como os métodos de cálculo são fiáveis e comparáveis.

3.8.4

O CESE manifesta igualmente apreensão quanto ao facto de a sub-optimização (neste caso da eficiência energética através do estabelecimento de objectivos vinculativos) não servir de forma adequada a optimização em relação aos objectivos gerais, tais como a eficiência total da economia ou a diminuição das emissões de gases com efeitos de estufa de uma forma eficiente do ponto de vista dos custos.

3.9

Pelas razões supracitadas, o CESE não apoia a fixação de um objectivo obrigatório para os Estados-Membros. Para que um objectivo seja estabelecido, têm de estar pelo menos definidos métodos de cálculo totalmente satisfatórios e exequíveis.

3.9.1

Em vez de objectivos nacionais óptimos e vinculativos, o CESE propõe que os Estados-Membros sejam obrigados a estabelecer programas de eficiência energética ou a actualizar os já existentes, incluindo o acompanhamento. Os objectivos de 1 % e 1,5 % para o sector público devem ser estabelecidos para a média dos Estados-Membros.

3.10

Os Estados-Membros devem ter a liberdade de decidir sobre como orientar objectivos e acções para sectores e formas de energia. Porém, é importante que todos os sectores e combustíveis diferentes sejam incluídos e que participem em função dos seus potenciais.

3.11

As disposições do projecto de directiva relativa à documentação, verificação e acompanhamento (artigo 4.o, n.o 5) representam um volume de trabalho que pode ser desproporcional em relação às vantagens dos resultados esperados. A qualidade do trabalho permanece questionável, uma vez que é difícil relacionar de forma clara uma medida específica com uma quantidade particular de energia poupada. É necessária uma abordagem consideravelmente mais simples e clara, mas de confiança.

3.12

Os mesmos resultados destas medidas obrigatórias poderão ser mais facilmente bem sucedidos se os problemas de informação e financiamento subjacentes forem atacados de forma mais directa. As disposições do artigo 8.o, que versam sobre o estabelecimento de sistemas de qualificação, acreditação e/ou certificação para serviços energéticos, constituem medidas nesse sentido. Tais disposições deveriam ser mais desenvolvidas e aprofundadas. É igualmente necessário desenvolver métodos de financiamento inovadores, como empréstimos com taxas de juro baixas, de forma a auxiliar em casos de longos períodos de recuperação, como mencionado nos exemplos de 3.6.

3.13

Também deveriam ser adicionadas medidas de apoio e desenvolvimento de acções voluntárias já existentes e provadas. De acordo com o artigo 12.o, informação e fácil acesso de auditorias energéticas, desenvolvimento de aplicações de auditorias energéticas adequadas às PMEs ou a um ramo de actividade em particular e apoiar a formação continua de forma a que as pessoas possam actuar como gestores de energia, são exemplos de medidas que mostraram resultados positivos e que deveriam ser reforçadas pela Comissão.

3.14

Em vez de relatórios em massa, a Comissão deveria apoiar os Estados-Membros nos seus esforços no sentido de alcançar uma maior eficiência energética, ajudando-os a criar melhor informação de base, tanto nos Estados-Membros como para eles próprios. É necessária uma análise exaustiva das barreiras existentes à melhor eficiência energética. A Comissão deveria também reforçar a cooperação e intercâmbio de melhores práticas entre Estados-Membros.

3.15

Uma proposta como esta, com implicações para os mercados e custos para os consumidores, deveria ser submetida a uma avaliação de impacto apropriada. Uma vez que tal não foi efectuado na fase preparatória, o CESE solicita uma avaliação imediata, previamente às do Conselho e do Parlamento.

3.16

A Comissão apresenta a ideia da possível introdução de um sistema dos chamados certificados brancos numa fase posterior. O sistema só poderia funcionar se fossem introduzidas obrigações para a conservação ou eficiência de energia. O CESE não apoia a introdução de obrigações para esta finalidade e, como tal, também não pode apoiar a introdução de certificados brancos. Além disso, o funcionamento do comércio de emissões e dos certificados verdes deveriam ser cautelosamente acompanhados e avaliados antes mesmo de se pensar em introduzir novos sistemas num mercado relacionado com a energia, já por si complicados.

4.   Observações na especialidade

4.1

O conceito de serviços energéticos deveria ser definido de forma mais clara no artigo 3.o. Da mesma forma, o limiar de 50GWh na definição de «pequenos distribuidores e empresas de venda de energia a retalho» deveria ser reavaliada — poderá ser impraticavelmente baixo.

4.2

O artigo 4.o deveria ser revisto de acordo com as observações na generalidade deste parecer.

4.3

Alínea a) do artigo 6.o e alínea b) do artigo 10.o: é desejável um aumento do aprovisionamento de serviços energéticos. Porém, o CESE discorda da abordagem da Comissão, segundo a qual os mesmos deveriam ser fornecidos apenas por distribuidores de energia e empresas de aprovisionamento de retalho, e o custo incluído nos seus preços de distribuição e de venda até haver uma determinada penetração no mercado. Os serviços energéticos também já são fornecidos por outros — tais como empresas de manutenção doméstica, consultores e empresas de serviços energéticos — e este mercado dever ser aberto a todos, nas mesmas condições. A proposta de oferecer uma percentagem de 5 % dos serviços ao cliente de forma gratuita, ao preço de todos os consumidores, não é justa para os clientes e discrimina outros fornecedores.

4.4

O conceito de «cliente elegível» no artigo 7.o necessita de ser esclarecido.

4.5

Artigo 10.o, alínea a): é difícil verificar a forma como as tarifas de transmissão podem ser estabelecidas de forma a reforçar especificamente a eficiência energética. Não é fácil compreender os mecanismos dos exemplos no parágrafo.

4.6

Os requisitos de quantificação do artigo 13.o podem revelar-se consideravelmente dispendiosos e no final será sempre o consumidor a suportar os custos. Motivo por que, as medidas de quantificação deveriam ser abordadas de forma cautelosa.

Bruxelas, 28 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Controlo e Prevenção de Poluição Integrados.


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/119


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a medidas destinadas a garantir a segurança do fornecimento de electricidade e o investimento em infra-estruturas»

[COM(2003) 740 final — 2003/0301 (COD)]

(2005/C 120/22)

Em 23 de Janeiro de 2004, o Conselho decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, sobre a proposta supra mencionada.

A Secção Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu o parecer em 5 de Outubro de 2004. A relatora foi U. B. Sirkeinen.

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 28 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o seguinte parecer por 134 votos a favor e 7 votos contra, com 14 abstenções.

1.   Introdução

1.1

Ao longo dos últimos anos, a política energética da UE seguiu três grandes linhas de orientação:

criar mercados de electricidade e de gás abertos e eficazes,

segurança do aprovisionamento energético, e

alcançar objectivos ambientais rigorosos e, em particular, combater as alterações climáticas.

A legislação essencial adoptada nestas áreas inclui as directivas revistas de electricidade e mercado de gás, que abrem os mercados aos utilizadores não domésticos em meados de 2004, e a todos os consumidores em 2007. Em 2001, foi publicado um livro verde relativo à segurança do fornecimento de electricidade, sublinhando a gestão da procura energética como uma medida-chave na segurança do aprovisionamento e no combate às alterações climáticas.

1.2

O aprovisionamento energético de confiança, a preços razoáveis, é uma condição prévia importante para o crescimento económico e bem-estar dos cidadãos da Europa. Como tal, nos seus pareceres, o CESE apoiou os objectivos e a abordagem da Comissão.

1.3

Os mercados energéticos da UE ainda não cumprem os objectivos supracitados. Talvez o mesmo não seja de esperar quando a legislação essencial ainda está apenas a começar a sua fase de aplicação. Segundo a Comissão, o presente projecto de legislação é um suplemento à legislação existente, com o objectivo de melhorar deficiências actuais ou futuras.

1.4

A falha de energia em Itália, no passado mês de Setembro de 2003, bem como outros incidentes na Europa e nos Estados-Unidos, constituiu uma forte motivação para a apresentação do pacote regulamentar. A falha de energia foi provocada por uma série de falhas operacionais que se seguiram a uma outra que ocorreu numa linha fortemente sobrecarregada na Suíça. Também revelou problemas na coordenação entre operadores de sistemas de transporte. O infeliz incidente constitui uma importante lição a aprender. Os mercados abertos aumentarão a transmissão e eventuais problemas daí adjacentes.

1.5

É surpreendente que a Comissão mencione apenas a mais profunda causa das falha de energia. Algumas zonas ou países apresentam um défice na produção de electricidade e necessitam continuamente de grandes importações de electricidade dos seus vizinhos e até mesmo de regiões mais distantes com excesso de oferta. O comércio transfronteiriço no mercado comum da electricidade é benéfico para lidar com variações na oferta e na procura e, por conseguinte, contribui para a segurança do fornecimento e reforça a competição. Contudo, não pode e não deverá compensar a capacidade de produção insuficiente em algumas áreas do mercado.

1.6

Segundo a Comissão, num mercado saudável, quando a procura aumenta e a oferta não, os preços aumentam. Em teoria, os consumidores reagem aos preços mais elevados limitando a utilização, mas sabe-se que nos mercados de electricidade a elasticidade dos preços é fraca por várias razões. A um determinado nível de preços, o investimento no reforço do fornecimento torna-se vantajoso, e assim cessa o aumento contínuo dos preços. Se não houver investimentos suficientes, os preços continuam a aumentar criando, pelo menos a curto e médio prazo, graves problemas aos consumidores e à concorrência industrial, e por conseguinte a economias inteiras. Há um problema particular no tocante aos investimentos em produção de electricidade: os sinais de preço não podem ter uma reacção imediata, uma vez que os projectos de investimento — desde o planeamento, à construção, passando pelo licenciamento — levam algum tempo a ser executados. Embora, em certos casos, os mercados a prazo e de futuros possam, em certa medida, diminuir este problema, estas práticas são recentes demais para a sua viabilidade ser segura.

1.7

A UE decidiu abrir os seus mercados de gás e electricidade à concorrência. Contudo, há dúvidas quanto ao facto de vir a haver investimentos suficientes no mercado aberto, em particular na capacidade de produção. A directiva relativa ao mercado de electricidade exige que os Estados-Membros criem um sistema de controlo do equilíbrio entre a oferta e a procura e que abram concurso sempre que seja necessária uma maior capacidade energética. Os Estados-Membros são responsáveis pela estrutura geral do aprovisionamento energético, bem como pela escolha das fontes de energia, situação que não é alterada pelo projecto de tratado constitucional.

1.8

Os investimentos insuficientes podem ser justificados tanto por carências do mercado (tomando insuficientemente em conta as necessidades a longo prazo, os factores ambientais e as circunstâncias regionais e locais, etc.) como por uma concorrência ineficaz, falta de um quadro regulamentar estável, procedimentos de licenciamento proibitivos e/ou oposição pública. A obrigação de converter a rede num actor económico independente (unbundling) condena-a a uma gestão sem ambição, dado que a inovação e o valor acrescentado se concentram nos serviços aos clientes. Assim, a rede encontra-se espartilhada entre as taxas fixadas pelos reguladores e os encargos e investimentos impostos pelos operadores clientes, sem qualquer visibilidade ou possibilidade de influenciar a evolução do sector.

1.9

A eficiência da utilização final de energia, ou a poupança de energia, já é há muito reconhecida como um poderoso elemento do mercado energético. Um menor uso de energia poupa dinheiro e contribui directamente para a segurança do aprovisionamento e muitas vezes para a redução dos gases com efeito de estufa, através da diminuição da necessidade de produção e de investimentos em nova produção e transmissão. As novas tecnologias podem contribuir para este objectivo e são necessárias medidas no sentido de reforçar o seu desenvolvimento e introdução no mercado.

1.10

A Comissão refere que, neste contexto, a questão do equilíbrio da procura do fornecimento não pode ser ignorada. Uma causa subjacente ao aumento da pressão nas redes é o aumento da procura, que pode ser parcialmente contrabalançada pela gestão da procura. Contudo, também são necessários incentivos apropriados ao investimento nas redes e produção de electricidade.

1.11

Segundo a Comissão, o aumento futuro na procura de electricidade será da competência da gestão da procura. Contudo, pensa-se que serão necessários novos investimentos, simplesmente para renovar fábricas que atingiram o limite de vida. A Comissão espera que grande parte desse investimento incida em fontes de energia renováveis e na produção combinada de calor e electricidade em pequena escala.

1.11.1

O Comité discorda totalmente desta descrição de tendências futuras no sector da electricidade. Espera-se que num comunicado sobre a segurança do aprovisionamento surja informação mais clara e realista quanto a tendências futuras e potenciais, sobretudo quando estiverem disponíveis cenários e informação mais bem quantificada, incluindo material produzido pela própria Comissão. Ninguém ganha ao evitar informação de base mais clara e mais realista — apesar de esta ser, para muitos, impopular.

1.11.2

Um cálculo aproximado pode dar uma ideia da magnitude do problema, bem como as opções para o resolver: a procura de electricidade está a aumentar a uma média anual de 1-2 % na UE. O objectivo da UE para o aumento da produção de electricidade a partir de fontes de energia renováveis representa um aumento inferior a 1 %. O objectivo proposto para a eficiência energética diminuiria o aumento anual em 1 %. Por conseguinte, as renováveis e a eficiência poderiam compensar o aumento da procura e substituir possivelmente a capacidade existente por muito menos do que 1 % ao ano. As centrais eléctricas funcionam durante 30 a 50 anos, o que, teoricamente, significa que a substituição tem de ter lugar numa média anual de 4 %. A Agência Internacional de Energia (AIE) assinala uma necessidade de novas centrais eléctricas na UE de mais de 200 000 MW ao longo dos próximos 20 anos.

2.   Proposta da Comissão

2.1

O objectivo da directiva proposta é a promoção do investimento no sector energético europeu para reforçar a competitividade e ajudar a prevenir falhas de energia. Frisa a necessidade de um quadro legislativo da UE claro para o funcionamento adequado de um mercado eléctrico interno competitivo, através da salvaguarda da segurança do fornecimento energético e da garantia de um nível de interligação adequado entre Estados-Membros, por meio de políticas gerais, transparentes e não discriminatórias.

2.2

O projecto de directiva solicita aos Estados-Membros que:

tenham uma política claramente definida, dirigida para o equilíbrio da procura de fornecimento, o que permite que se estabeleçam objectivos em matéria de capacidade de reserva ou alternativas como medidas de gestão de procura, e que

tenham normas definidas para serem respeitadas em matéria de segurança das redes de transmissão e distribuição.

2.3

Os operadores de rede de transmissão deverão apresentar à entidade reguladora nacional uma estratégia (pluri)anual de investimento. A entidade reguladora poderá adicionar à lista projectos transfronteiriços importantes.

2.4

As entidades reguladoras devem apresentar à Comissão uma síntese dos programas para consulta junto do Grupo europeu de reguladores da electricidade e do gás, prestando a devida atenção aos eixos de interesse europeu prioritário das redes transeuropeias de energia.

2.5

As autoridades nacionais têm o direito de intervir na aceleração da execução dos projectos e, se necessário, lançar concursos para certos projectos caso o operador da rede de transporte não possa ou não os queira concluir.

3.   Observações na generalidade

3.1

A directiva relativa ao mercado eléctrico e o regulamento sobre o comércio transfronteiriço constituem o quadro para um mercado interno eléctrico liberalizado. A sua aplicação terá início em 1 de Julho de 2004. De forma a proporcionar estabilidade regulamentar aos investidores e aos outros actores do mercado, crucial para o ambiente adequado a investimentos, qualquer alteração a este quadro deverá ser feita com especial cautela.

3.2

A própria Comissão refere-se de uma forma mais ou menos clara às razões que justificam a preocupação com o fornecimento de energia e a apresentação do projecto de directiva. Contudo, a directiva proposta não aborda directamente estas questões.

3.3

A primeira razão é a falta de capacidade de geração suficiente em algumas partes/Estados-Membros da União, tendo em conta a orientação da política energética. A Comissão descreve este problema face à capacidade de reserva, mas o problema existe também para a geração de base.

3.4

A segunda razão é a falta de concorrência, devido à falta de vontade política por alguns Estados-Membros de tomarem medidas quanto a monopólios ou oligopólios estabelecidos ou posições de mercado dominantes. A Comissão toma nota e refere as limitações das suas capacidades para fazer algo mais a este respeito. A opção escolhida foi a de reforçar a concorrência de operadores noutros Estados-Membros através da tentativa de assegurar uma capacidade de interligação suficiente.

3.5

Uma terceira razão é a falta de vontade ou capacidade de alguns operadores de sistema de transporte de aplicar orientações para o comércio transfronteiriço, apesar de estas orientações terem sido acordadas de livre vontade pelos operadores de sistema de transporte nas suas próprias organizações. Resta saber se uma razão subjacente é a insuficiente dissociação energética e actividades de rede.

3.6

O maior obstáculo ao investimento nas redes de transmissão é a resistência política e pública a projectos de transmissão semelhantes. Em alguns Estados-Membros não se recusa quase nenhuma forma de produção. O direito das pessoas a serem ouvidas quanto a projectos que têm influência sobre si próprias é um direito básico importante. Porém, os processos de planeamento e de tomada de decisões tendem a prolongar-se e a tornar-se complexos, colocando desta forma em risco até os projectos mais urgentes e necessários.

3.7

A questão relevante que a directiva levanta e que carece de uma solução a nível da UE é a de garantir, de uma forma ou de outra, que há investimento suficiente em interligações, em função do mercado.

3.8

O projecto de directiva atribui ao regulador o direito de interferir através da alteração do plano de investimento do operador de rede de transporte e solicitar um determinado investimento e, por último, introduz o processo de concurso. A presente proposta vai mais além do que a directiva relativa ao mercado energético, que prevê o controlo do equilíbrio entra a oferta e a procura e, sempre que necessário, a abertura de concurso tendo em vista o aumento da capacidade energética. Para evitar alterações regulamentares demasiado frequentes e sobre-regulação, a legislação não deve ser alterada antes de haver experiência suficiente do funcionamento das disposições vigentes.

3.9

Parte do conteúdo do projecto de directiva, tal como as disposições gerais do artigo 3.o, são elementos relevantes de qualquer boa política energética amplamente aplicada. Apresentá-las enquanto disposições numa directiva pode levar a uma confusão de responsabilidades.

3.10

Uma questão que teria merecido a atenção da Comissão é a gestão da procura. Reforçar as possibilidades de os utilizadores de energia, em particular utilizadores de energia médios, de reagirem à flutuação dos preços grossistas da electricidade poderia contribuir para a diminuição dos picos de procura.

4.   Observações na especialidade

4.1

Artigo 4.o: O CESE concorda com as disposições, uma vez que o n.o 1 refere que todos os operadores de rede de transporte terão de seguir as orientações da ETSO.

4.2

Artigo 5.o: O CESE é da opinião que a abordagem do artigo é algo confusa no que se refere às responsabilidades da UE e dos Estados-Membros. À partida, fora de contexto, o CESE concorda com a maior parte das medidas mencionadas no artigo, enquanto parte integrante de uma política energética nacional sólida.

4.3

O significado de «capacidade de reserva», no segundo parágrafo do artigo 5.o, n.o 1 é pouco claro. O artigo deveria tratar apenas de reservas técnicas a curto prazo, necessárias à fiabilidade do sistema.

4.4

Artigo 6.o: é difícil encontrar um sentido na ligação de investimentos na rede com a gestão da procura de electricidade, em particular da forma como surge no n.o 1 do artigo 6.o. Quanto ao n.o 2 do artigo 6.o, estes requisitos seriam tidos em consideração, se possível, quando se estabelecesse a metodologia para as tarifas de acesso à rede. No tocante ao n.o 2 do artigo 6.o, são necessárias medidas para as interligações, como se refere no ponto 3.7.

4.5

Artigo 7.o: O CESE discorda das medidas propostas no presente artigo, por razões mencionadas no ponto 3.8.

Bruxelas, 28 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


ANEXO

do Parecer do Comité Económico e Social Europeu

As seguintes partes do parecer da secção especializada foram rejeitadas a favor de alterações adoptadas pela plenária, mas obtiveram pelo menos um quarto dos votos expressos:

Ponto 1.8, última frase:

«A nova legislação que é frequentemente adicionada, em particular legislação que possibilita a interferência pública nos mercados, não cria o quadro regulamentar estável necessário, pelo contrário: aumenta os riscos do investidor, atrasa os investimentos e, por conseguinte, aumenta os preços

Resultado da votação:

Votos a favor: 78

Votos contra: 67

Abstenções: 9


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/123


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa»

(2005/C 120/23)

Em 29 de Setembro de 2004, o Parlamento Europeu decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o «Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa».

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 411.a reunião plenária de 15 e 16 de Setembro de 2004, designou relator-geral Henri MALOSSE. Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 28 de Outubro) adoptou, por 166 votos a favor, 4 votos contra e 6 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1.

Em parecer de 24 de Setembro de 2003 (1), o Comité Económico e Social Europeu apoiou o projecto de Tratado Constitucional, realçando que, após o esperado acordo dos Estados-Membros, o repto fundamental seria conseguir que também os cidadãos e a sociedade civil dos Estados-Membros da União aceitassem o Tratado.

1.2.

Essa etapa chegou agora, quando se iniciam os debates sobre a ratificação do Tratado nos países da União, independentemente do modo de ratificação escolhido, parlamentar ou referendário.

1.3.

Ante esta meta determinante para o futuro da construção europeia, há que incentivar todos intervenientes a porem de parte os seus interesses pessoais, sectoriais, profissionais, locais ou nacionais: o Tratado deve ser examinado à luz da sua significação política global no processo iniciado há já mais de 50 anos pelos fundadores das Comunidades Europeias.

1.4.

Neste contexto, o CESE congratula-se com a iniciativa da Comissão dos Assuntos Constitucionais do Parlamento Europeu de solicitar parecer do CESE sobre o Tratado Constitucional, oportunidade esta que pretende aproveitar plenamente para transmitir:

mensagens claras à sociedade civil organizada da União sobre o conteúdo e o alcance do Tratado Constitucional;

recomendações sobre a estratégia de comunicação a adoptar para mobilizar a sociedade civil para o Tratado Constitucional.

2.   Mensagens claras

2.1.   O método da Convenção – Um passo em frente na democratização da construção europeia.

2.1.1.

O modo de elaboração do Tratado Constitucional constitui em si um progresso em relação ao passado, merecendo ser destacado aos olhos dos cidadãos: uma Convenção composta maioritariamente por parlamentares nacionais e europeus. Os esforços para envolver a sociedade civil organi- zada, através de audições, de consultas e da participação de observadores escolhidos pelos parceiros sociais e o CESE, foram um progresso notável, inclusive em relação às práticas institucionais da maioria dos Estados-Membros. Ademais, em parecer de 24 de Setembro de 2003 (2), o CESE apresentou sugestões para reforçar, no futuro, o processo de envolvimento da sociedade civil.

2.1.2.

Apesar de alguns recuos, a CIG não desvirtuou o texto proposto pela Convenção. O Tratado Constitucional assenta num consenso entre todas as formações políticas, sendo fruto de um verdadeiro debate democrático.

2.1.3.

Apesar de a Convenção não ter tido poder constitutivo, dada a natureza mista da UE – União de Estados e de povos –, marcou uma verdadeira ruptura em relação às práticas anteriores que punham completamente de parte a representação parlamentar e a sociedade civil.

2.1.4.

O abandono do Tratado Constitucional representaria um fracasso do método seguido. É, por conseguinte, fundamental defender a perpetuação deste método (previsto, aliás, pelo próprio Tratado Constitucional).

2.1.5.

Por esta razão, o CESE, que participou nos trabalhos da Convenção, sustenta a legitimidade deste Tratado e solicita a todos os membros da Convenção e aos observadores, que apuseram as suas assinaturas no final do Tratado, que façam o mesmo.

2.2.   Uma Constituição – Uma «revolução» na história da construção europeia

2.2.1.

A Constituição consagra um novo quadro de funcionamento para a União. É composta por três partes principais, sendo as duas primeiras completamente inovadoras: a primeira parte define os princípios e os valores em que assenta a União e a segunda os direitos fundamentais dos cidadãos. A terceira parte retoma e actualiza as políticas comunitárias constantes dos Tratados precedentes.

2.2.2.

A Constituição permite substituir os Tratados vigentes por um texto único e completo, tornando assim o funcionamento da UE mais compreensível e acessível a todos.

2.2.3.

A Constituição não substitui as constituições nacionais, mas coexiste com as mesmas, e é aplicável a todo o território da União Europeia.

2.2.4.

Ainda que o conteúdo não seja verdadeiramente «revolucionário», a natureza constitucional do novo Tratado deve marcar uma ruptura na consciência colectiva dos europeus em torno de uma ambição e de um destino comum. O CESE considera ter por missão dar a conhecer este progresso na construção europeia.

2.3.   Uma União mais democrática que reconhece os cidadãos enquanto soberanos da construção europeia (Parte I do Tratado)

2.3.1.

A finalidade do Tratado Constitucional é clara: estabelecer uma União política em nome dos cidadãos e dos Estados da Europa.

2.3.2.

As principais expectativas dos cidadãos europeus estão no centro das ambições da União. Com efeito, «o pleno emprego, uma economia social de mercado altamente competitiva e um elevado nível de protecção e de melhoramento da qualidade do ambiente» são mencionados explicitamente como objectivos da União. Do mesmo modo, a União promove «a coesão económica, social e territorial, e a solidariedade entre os Estados-Membros» e proporciona «aos seus cidadãos um espaço de liberdade, segurança e justiça».

2.3.3.

A legitimidade democrática do processo de decisão foi visivelmente melhorada:

2.3.3.1.

As competências do Parlamento Europeu enquanto co-legislador foram alargadas. Esta evolução poderá contribuir para reforçar a percepção, pelos cidadãos, da importância desta instituição.

2.3.3.2.

O novo papel atribuído aos parlamentos nacionais é uma garantia contra eventuais excessos de regulamentação do nível europeu. A Comissão é obrigada a informar os parlamentos nacionais de qualquer nova iniciativa e o «mecanismo de alerta precoce» confere-lhes um poder de controlo da subsidiariedade.

2.3.4.

Doravante, os cidadãos terão a possibilidade de serem informados das posições do seu governo no Conselho, pois este estará adstrito a uma obrigação de transparência, quando actua como legislador.

2.3.5.

Pela primeira vez, a democracia participativa é reconhecida enquanto princípio de funcionamento da União, complemento indispensável da democracia representativa:

2.3.5.1.

Ao manterem um diálogo aberto e regular com as associações representativas da sociedade civil, as instituições europeias deverão agir de forma mais coerente e transparente. Espera-se, nomeadamente, evitar regulamentações demasiado minuciosas ou inaplicáveis no terreno graças à consulta das partes interessadas. A Comissão será, igualmente, obrigada a avaliar melhor o impacto económico e social das suas propostas, incluindo ao nível regional e local.

2.3.5.2.

Uma das grandes inovações da Constituição reside na instauração de um direito de iniciativa popular. Os cidadãos europeus, no mínimo um milhão oriundo de um número significativo de Estados-Membros, poderão, doravante, solicitar à Comissão Europeia que apresente uma proposta de iniciativa legislativa correspondente às suas expectativas.

2.3.6.

O papel dos parceiros sociais é confirmado enquanto elemento fundamental da vida democrática da União no respeito da autonomia do diálogo social.

2.3.7.

A introdução desta nova parte (I) permitirá reduzir o défice democrático numa União que se alarga.

2.4.   Uma União que protege melhor os direitos fundamentais dos cidadãos europeus (Parte II do Tratado)

2.4.1.

A Carta dos Direitos Fundamentais foi elaborada por uma Convenção, cuja legitimidade democrática foi amplamente reconhecida. Os contributos das organizações da sociedade civil desempenharam um papel importante na redacção do texto da Carta.

2.4.2.

A Carta é considerada como um progresso, na medida em que integra – sem dissociá-los – todos os tipos de direitos individuais ou colectivos: direitos civis e políticos, direitos sociais e económicos, e inova reconhecendo aos cidadãos direitos mais «contemporâneos» (em relação com o desenvolvimento sustentável, a protecção dos consumidores, a igualdade entre os sexos, a bioética, a protecção dos dados pessoais, etc.).

2.4.3.

Os direitos fundamentais dos cidadãos são parte integrante do Tratado Constitucional e não de um preâmbulo.

2.4.4.

A introdução da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais no Tratado, reivindicada por inúmeras organizações europeias da sociedade civil, tem um significado importante, já que lhes confere, doravante, força jurídica vinculativa.

2.4.5.

Na prática, este progresso significa que os cidadãos beneficiarão de uma melhor protecção jurídica. Com efeito, poderão passar a invocar a Carta perante qualquer jurisdição nacional contra decisões das instituições europeias ou dos Estados-Membros quando aplicam o direito comunitário.

2.4.6.

O CESE, que foi associado à elaboração da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais, considera a sua inclusão no Tratado como um avanço significativo na protecção dos direitos das pessoas singulares e colectivas.

2.5.   Uma União que graças ao seu método e às suas políticas comunitárias pode dar resposta às aspirações dos cidadãos (Parte III do Tratado)

2.5.1.

Os Tratados existentes e, nomeadamente, o método comunitário demonstraram amplamente a sua eficácia. Por esta razão, a terceira parte do Tratado Constitucional retoma as principais disposições dos Tratados em vigor relativas às políticas comuns da União, alargando a maioria qualificada a cerca de vinte domínios regidos, até agora, pela unanimidade. Mais, consagra a co-decisão como «processo legislativo ordinário», reforçando efectivamente os poderes do Parlamento Europeu. A maior parte das decisões da União referentes às políticas comuns poderão, por conseguinte, ser tomadas de forma mais eficaz e democrática.

2.5.2.

Nesta terceira parte, estão alicerçados os princípios gerais dos domínios nos quais os Estados-Membros decidiram partilhar os seus recursos ou cooperar. Contudo, o conteúdo das políticas não é rígido, dependendo das decisões e, portanto, da vontade dos governos e das maiorias no Parlamento Europeu.

2.5.3.

É o caso, por exemplo, da política social com a inserção de uma disposição geral (a «cláusula social») de acordo com a qual a União deve ter em conta, na definição e na execução das políticas, «as exigências relacionadas com a promoção de um nível elevado de emprego, a garantia de uma protecção social adequada, a luta contra a exclusão social e um nível elevado de educação, formação e protecção da saúde humana». O mesmo se dirá da luta contra todas as formas de discriminação e de exclusão e do reconhecimento do papel dos serviços de interesse geral na promoção da coesão social e territorial da União ou, ainda, como já consta do Tratado, da consideração da dimensão ambiental e das exigências da protecção dos consumidores.

2.5.4.

A dificuldade em fazer partilhar o Tratado Constitucional com os cidadãos reside precisamente na circunstância de que estes estão habituados a serem consultados sobre as acções a levar a cabo, sobre um projecto político e não sobre um quadro de funcionamento. Para os mobilizar, há que abrir o debate sobre o que os cidadãos e os Estados-Membros pretendem fazer, agora que os princípios, os valores, os objectivos e as regras de funcionamento fora claramente expostos pela constituição.

2.5.5.

Por esta razão, o CESE gostaria de estabelecer, nesta fase, uma ligação entre o Tratado Constitucional e a estratégia de Lisboa, cuja revisão intercalar se realizará dentro em breve. Esta estratégia deveria ser introduzida nos debates, pois oferece a visão de um futuro para cada cidadão europeu: a competitividade, o pleno emprego, o intercâmbio de conhecimentos, o investimento no capital humano, o crescimento, mas também a preservação do quadro e da qualidade de vida através de um desenvolvimento sustentável. Actualmente, esta estratégia está estagnada, pois os instrumentos de aplicação são deficientes e há uma falta crónica de associação dos cidadãos e da sociedade civil. É, portanto, indispensável, nesta fase, um novo impulso com novas iniciativas comunitárias, por forma a tornar credível o projecto económico e social da União.

2.5.6.

Em parecer ao Conselho Europeu (3), o CESE pede que a revisão intercalar reponha a estratégia de Lisboa nas mãos dos cidadãos e dos actores da sociedade civil. Esta é uma ocasião única, que não deve ser desperdiçada, para transmitir uma mensagem política clara sobre o conteúdo do projecto da União.

2.5.7.

É necessário consciencializar os cidadãos de que, graças aos progressos democráticos da Constituição, têm agora os meios para decidir sobre o conteúdo das políticas e das acções que a União deve realizar em concreto para responder às suas expectativas. Dizer «NÃO» ao Tratado Constitucional corresponde a cristalizar os Tratados nas suas versões actuais.

2.6.   Mobilizar a sociedade civil europeia para os progressos do Tratado Constitucional para ultrapassar as suas insuficiências

2.6.1.

Não se trata de ocultar as insuficiências do Tratado Constitucional tal como foi adoptado. Grande número das reivindicações da sociedade civil não foram tidas em conta durante os trabalhos da Convenção e menos ainda por ocasião dos trabalhos da CIG. No seu parecer de 24 de Setembro de 2003 (4), o CESE enumerou uma série de deficiências no projecto de Tratado Constitucional, nomeadamente:

2.6.1.1.

A insuficiência de disposições operacionais tendentes à aplicação do princípio da democracia participativa. Deste modo, o papel do CESE não foi reforçado de forma satisfatória de modo a assegurar um diálogo civil eficiente.

2.6.1.2.

A ausência de disposições reconhecendo o papel da sociedade civil organizada na aplicação do princípio da subsidiariedade (nomeadamente, a subsidiariedade funcional) no protocolo sobre a aplicação deste princípio.

2.6.1.3.

A fragilidade da governação comunitária em matéria de política económica e de emprego, bem como a ausência de normas prevendo a consulta do Parlamento Europeu e do CESE nestes domínios que dizem respeito, em primeiro plano, aos actores da sociedade civil.

2.6.1.4.

A ausência de consulta obrigatória do CESE para a aplicação do princípio da não-discriminação, a política comum de asilo e imigração ou ainda a cultura, não obstante o conhecimento específico desta instituição nestes domínios.

2.6.2.

Dever-se-á, por estas razões, rejeitar o Tratado? O CESE considera que esta política da terra queimada enviaria um sinal negativo à construção europeia, tanto no interior como no exterior da União, onde forças hostis ou concorrentes se regozijariam com este fracasso. O CESE julga, pelo contrário, que é possível valorizar o quadro institucional proposto e melhorá-lo com medidas operacionais:

2.6.2.1.

As disposições sobre a democracia participativa deveriam ser objecto de comunicações definindo os métodos de consulta e o papel do CESE.

2.6.2.2.

A sociedade civil deveria pronunciar-se sobre o conteúdo da lei europeia que define os procedimentos para exercício do direito de iniciativa popular. O CESE poderia, deste modo, ser consultado através de um pedido de parecer exploratório. Poderia, por outro lado, apoiar as iniciativas da sociedade civil.

2.6.2.3.

O princípio da democracia participativa deveria aplicar-se às grandes estratégias da União em prol do crescimento, do emprego e do desenvolvimento sustentável.

2.6.3.

Ainda no âmbito do Tratado Constitucional adoptado, importa igualmente informar os cidadãos sobre os mecanismos que introduzem flexibilidade e abrem caminho a mais progressos sem revisão do Tratado:

2.6.3.1.

Para os Estados-Membros que desejem ir mais longe no processo de integração europeia é agora mais fácil instaurar uma cooperação reforçada.

2.6.3.2.

Caso haja vontade política de todos os Estados-Membros, será possível aprofundar a integração em domínios sensíveis, em que se manteve a unanimidade, como a fiscalidade e a política social, por exemplo. Há uma cláusula «ponte» que permite, na verdade, alargar o voto pela maioria qualificada a estes domínios.

2.6.4.

Ao optar por uma atitude empenhada, crítica e construtiva, a sociedade civil organizada contribuirá para informar bem o cidadão e continuará a exercer pressão sobre os governos. A pior coisa que poderia acontecer seria que o mundo político persistisse na ideia, infelizmente largamente generalizada, de que a construção europeia não interessa ao cidadão. Esta ideia é totalmente falsa, pois os cidadãos esperam muito da Europa, nomeadamente que esta contribua para melhorar o seu quotidiano trazendo uma visão do seu futuro.

2.6.5.

O CESE estima que a adopção do Tratado Constitucional não é um fim em si mesmo, mas abre caminho para um reforço da democracia participativa. Rejeitar o Tratado seria renunciar aos avanços que a sociedade civil conseguiu obter através do método tradicional.

3.   Uma comunicação eficaz

O CESE considera que a qualidade da estratégia de comunicação será determinante para a aceitação pelos europeus do Tratado Constitucional. Preconiza-se, portanto, uma abordagem pragmática e profissional para garantir a eficácia desta estratégia. O CESE recomenda que se articule a estratégia de comunicação em torno das quatro acções seguintes:

3.1.   Disponibilização de recursos: instrumentos de informação e financiamento

3.1.1.

A complexidade do Tratado Constitucional requer a preparação de instrumentos de informação que poderão ser utilizados a montante do processo de comunicação para lançar campanhas ou organizar debates.

3.1.2.

Compete aos Estados-Membros, com o apoio dos gabinetes de informação do Parlamento Europeu e das representações da Comissão nos Estados-Membros, conceber estes instrumentos de informação e torná-los acessíveis.

3.1.3.

Estes instrumentos poderão assumir a forma de grelhas de leitura do Tratado Constitucional adaptadas às preocupações das diferentes categorias da população em cada Estado-Membro. Quanto mais «à medida» esses instrumentos forem feitos, mais eficazmente poderão ser utilizados pelos meios de comunicação, pelas organizações da sociedade civil, pelos grupos políticos e pelas autarquias locais e regionais para divulgar a informação e mobilizar os cidadãos.

3.1.4.

É necessário disponibilizar recursos financeiros adequados para aplicar uma estratégia de comunicação à altura das expectativas dos cidadãos.

3.2.   Lançamento de campanhas de comunicação assentes nos meios de comunicação e nos vectores de comunicação próximos do cidadão

3.2.1.

Após a disponibilização destes recursos, os meios de comunicação, as autarquias locais e regionais, os grupos políticos e as organizações da sociedade civil terão os meios para desempenhar o seu papel de vector de informação, podendo transmitir mensagens claras e adaptadas às preocupações do seu público local sobre o alcance do Tratado Constitucional.

3.2.2.

Seria útil, num primeiro momento, determinar, ao nível de cada Estado-Membro, como as diferentes categorias da população apreendem o Tratado Constitucional para reflectir no teor das mensagens a transmitir. Em função destas conclusões, as mensagens terão por objectivo ultrapassar os receios sentidos pelos cidadãos e dar resposta às suas expectativas.

3.2.3.

Do mesmo modo, é necessário escolher criteriosamente os transmissores da mensagem, bem como os suportes de comunicação. A diversidade dos actores envolvidos é necessária para garantir o carácter pluralista da campanha. Do mesmo modo, a sua proximidade com os cidadãos favorecerá a credibilidade e a aceitação das mensagens transmitidas, pelo que é importante realizar acções no plano local e regional.

3.2.4.

O CESE recomenda ao Parlamento Europeu que crie grupos de trabalho com profissionais da comunicação institucional em cada Estado-Membro, de forma a apresentar aos governos propostas concretas quanto às acções e aos meios necessários para uma campanha de comunicação eficaz. O CESE está pronto a dar o seu contributo específico neste domínio e o apoio dos seus porta-vozes nos Estados-Membros: os CES nacionais ou instituições similares.

3.3.   Organizar debates abertos a todos os cidadãos para suscitar intercâmbios de ideias e permitir que se forjem convicções

3.3.1.

As campanhas de comunicação deverão conduzir à abertura de um verdadeiro diálogo com os cidadãos. Com efeito, há que proporcionar aos cidadãos a oportunidade de questionar e de serem confrontados com diversos argumentos, por forma a formarem a sua própria opinião e a exprimi-la.

3.3.2.

Este diálogo só poderá ser possível no âmbito de debates descentralizados. A informação que será assim transmitida mais perto do cidadão permitirá responder melhor às suas expectativas e às suas questões e garantirá o carácter democrático dos debates.

3.3.3.

As instituições nacionais e comunitárias devem prestar apoio logístico a estas iniciativas. Os CES nacionais ou instituições similares poderão coordenar os debates ao nível nacional, estabelecendo um calendário de eventos e estabelecendo ligação com o CES Europeu que poderá fornecer-lhes documentação e pô-los em contacto com intervenientes.

3.3.4.

Por forma a assegurar uma certa coerência, o CESE solicita ao Parlamento Europeu e à Comissão Europeia que as iniciativas dos representantes da sociedade civil organizada beneficiem do mesmo apoio prestado às dos eleitos e representantes das autoridades europeias, nacionais, regionais e locais, no âmbito da operação «1 000 debates sobre a Europa». A participação da sociedade civil não pode ser afastada.

3.3.5.

O CESE solicita ao Parlamento Europeu que um montante significativo dos orçamentos de comunicação da União seja atribuído aos debates sobre o Tratado Constitucional, como complemento aos recursos das autoridades públicas nacionais e locais e aos recursos próprios das organizações da sociedade civil.

3.4.   Dar uma dimensão europeia aos debates e à ratificação

3.4.1.

É indispensável evitar que a adopção do Tratado Constitucional pelos europeus seja condicionada unicamente por questões de política interna.

3.4.2.

Neste contexto, o CESE recomenda que se dê uma verdadeira dimensão transnacional aos debates e à ratificação do Tratado Constitucional:

3.4.2.1.

Por um lado, as instituições europeias deverão contribuir para a coordenação das acções de comunicação dos movimentos políticos, das autarquias locais e regionais e das organizações da sociedade civil. Convém, na verdade, promover o intercâmbio das boas práticas neste domínio e repartir os esforços. O CESE poderá, por exemplo, facilitar o intercâmbio de boas práticas (e de know-how) ao nível europeu entre as organizações da sociedade civil que empreendem acções de comunicação. Poderá, igualmente, pôr em prática um sistema para «fazer subir» a informação de modo a avaliar, ao nível europeu, as sugestões, críticas e recomendações formuladas pelos cidadãos no âmbito dos debates organizados pela sociedade civil. Por fim, apoiará iniciativas transfronteiriças ou multinacionais.

3.4.2.2.

Por outro lado, o CESE apoia a proposta da Comissão dos Assuntos Constitucionais do Parlamento Europeu de concentrar, na medida do possível, as ratificações em torno de uma data simbólica (como o 8 ou o 9 de Maio).

3.4.3.

O CESE defende, portanto, uma participação activa das instituições europeias na elaboração e na aplicação da estratégia de comunicação sobre Tratado Constitucional. Há que complementar a actuação dos Estados-Membros e enviar aos cidadãos um sinal forte e positivo da Europa.

3.4.4.

Por seu turno, o CESE empenha-se em transmitir à sociedade civil europeia mensagens claras sobre os progressos democráticos do Tratado Constitucional, nomeadamente a cidadania e a participação.

Bruxelas, 28 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Ver Jornal Oficial C 10 de 14.1.2004, página 43.

(2)  Cf. nota de rodapé n.o 1.

(3)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu ao Conselho Europeu sobre a revisão intercalar da estratégia de Lisboa (n.o 1438/2004).

(4)  Cf. nota de rodapé n.o 1.


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/128


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O ambiente: uma oportunidade económica»

(2005/C 120/24)

Por carta de Atzo NICOLAÏ, ministro dos Assuntos Europeus, a futura Presidência neerlandesa do Conselho solicitou, em 22 de Abril de 2004, ao Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, que elaborasse um parecer sobre «O ambiente: uma oportunidade económica».

Incumbida a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente de preparar os correspondentes trabalhos do Comité emitiu parecer em 21 de Setembro de 2004 (relator: Stéphane BUFFETAUT).

Na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 28 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 130 votos a favor, 2 votos contra e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

Por carta de Abril de 2004, a futura Presidência neerlandesa solicitou ao CESE um parecer exploratório sobre «o ambiente: uma oportunidade económica». A Presidência neerlandesa deseja com efeito acentuar as oportunidades vantajosas para todos da protecção do ambiente que, graças aos progressos realizados, está em condições de contribuir para a concretização simultânea dos objectivos económicos e sociais fixados na Estratégia de Lisboa.

1.2

O Conselho Europeu ao atribuir o objectivo extremamente ambicioso para a União Europeia de a tornar «a economia baseada no conhecimento mais competitiva e mais dinâmica do mundo, capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos e com maior coesão social» não mencionou os aspectos ambientais, limitando-se a evocar a noção de desenvolvimento sustentável.

1.3

Foram necessários mais dois anos para que o Conselho Europeu tomasse as decisões que culminaram na formulação de uma estratégia para o desenvolvimento sustentável, que veio assim juntar-se à Estratégia de Lisboa.

1.4

Mas poder-se-á realmente afirmar que a protecção do ambiente faz parte da Estratégia de Lisboa? A apatia que entorpece certas economias da União Europeia conferiu prioridade absoluta ao crescimento económico e à criação de emprego, fazendo passar o ambiente para segundo plano, conforme o adágio romano «primum vivere, deinde philosophare». No entanto, pode argumentar-se que o ambiente determina as condições de vida e, por isso, deve ser um assunto que diz respeito a todos e não apenas aos especialistas.

1.5

Neste contexto, importantes sectores da economia europeia alarmaram-se com a vontade da União — e, nomeadamente, da Comissão — de dar o exemplo no plano internacional em matéria de ambiente, correndo o risco de avançar isolada.

1.6

Assim a vontade de aplicar o protocolo de Quioto, apesar de não estar ratificado pelos principais concorrentes da Europa, suscitou forte reacção em alguns meios económicos europeus, que viram nela uma forma perigosa de ingenuidade, passível de comprometer a competitividade da economia europeia, sabendo-se que a concorrência mundial é muito aguerrida. Outros consideraram que os objectivos de Quioto podiam contribuir para a racionalização dos métodos de produção, a redução dos custos, a menor pressão sobre os recursos energéticos e as matérias-primas, significando, dessa sorte, o aumento da competitividade da economia europeia. É, pois, necessário prosseguir o debate, ilustrando-o com exemplos concretos.

1.7

Na mesma ordem de ideias, as indústrias utilizadoras de substâncias químicas reagiram à proposta de regulamento relativo ao registo, à avaliação, à autorização e à restrição de produtos químicos (Reach), cujo estudo de impacto, da iniciativa da Comissão Europeia, foi alvo de duras críticas.

1.8

Estas preocupações e críticas não podem ser caladas e esquecidas. Elas não têm por objecto princípios ou políticas. Traduzem a convicção de um conflito entre, por um lado, os imperativos do crescimento económico, da criação de emprego, e as práticas actuais e, por outro, as preocupações ambientais interpretadas por regulamentações excessivas que esquecem a realidade da concorrência económica. Os problemas parecem ser o resultado de uma subavaliação e de uma gestão errada dos instrumentos, do procedimento e das estratégias de execução.

1.9

Mas, simultaneamente, certas empresas, e, entre elas, algumas muito grandes, e até segmentos inteiros do sector industrial fazem da integração do desenvolvimento sustentável um elemento forte da sua estratégia. Assim, o presidente do grupo francês Veolia Environnement, convidado para um seminário governamental, declarou: «o desempenho de uma empresa em função do critério do desenvolvimento sustentável tornou-se não só elemento de legitimidade perante a sociedade civil, mas também, cada vez mais, um trunfo na concorrência mundial e no poder de atracção dos investidores». Esta abordagem tende, hoje, a tornar-se a norma na esfera económica.

1.10

O debate existe, é intenso, permeia toda a sociedade e reflecte o mundo económico e social e as organizações de protecção do ambiente. A questão é clara: a integração dos imperativos ambientais constitui tão-só um entrave à competitividade das empresas ou pode representar uma oportunidade de desenvolvimento de novas profissões, novos mercados e novas tecnologias?

1.11

As opiniões públicas, os governos, os responsáveis empresariais e sindicais, os consumidores e os representantes das associações de protecção do ambiente não podem contentar-se com discursos teóricos e cheios de boas intenções, sem tradução prática. Esperam doravante análises precisas e exemplos concretos, porque a política é a arte do real, mesmo se esta deve ser galvanizada por um ideal que lhe dê sentido. A estratégia de promoção do desenvolvimento sustentável da indústria europeia do papel é muito representativa desta abordagem.

2.   O ambiente: uma oportunidade económica?

2.1

Fazer esta pergunta significa indagar, por um lado, se o desenvolvimento de certos sectores económicos não será condicionado pela existência de um ambiente natural ou patrimonial de qualidade e, por outro, se as tecnologias ambientais poderão dar uma contribuição real para os objectivos de desenvolvimento económico e social definidos pela Estratégia de Lisboa. Significa ainda interrogar-se honestamente sobre o facto de saber se as normas e os imperativos ambientais se reduzem a um mero entrave ao crescimento económico, à competitividade e, logo, ao emprego.

2.2

O sector do turismo e do lazer depende obviamente da existência de um ambiente de qualidade. O desenvolvimento económico e social de regiões inteiras da Europa, ou mesmo Estados, depende em larga medida do turismo. A qualidade do ambiente é, pois, a condição primordial do equilíbrio dessas sociedades. Paisagens desfiguradas, cidades devastadas pelos excessos da especulação imobiliária, natureza corrompida e oceanos poluídos provocariam, e provocam, desastres económicos irremediáveis. O mesmo vale para sectores como a pesca, a agricultura e a caça. No que diz respeito às tecnologias ambientais, convém saber se podem ser factor de crescimento e de inovação, e, nesse caso, definir o modo de encorajar o seu desenvolvimento e generalização sem falsear injustificadamente o jogo da concorrência.

2.3

Face à aspiração legítima das populações dos países emergentes de aceder a um modo de vida comparável ao da Europa e considerando as pressões sobre os recursos naturais e o ambiente que tal supõe se este desenvolvimento se operar nas actuais condições técnicas e económicas, afigura-se necessária uma verdadeira revolução tecnológica. Inovações marginais não bastariam para resolver o problema. Na prática, 80 % da população mundial aspiram ao mesmo nível de vida dos 20 % mais ricos. É impensável, pois, continuar a viver com base num statu quo que seria catastrófico, evitando-se, porém, fazer extrapolações excessivas das previsões mais pessimistas. Um certo número de fenómenos (degelo dos glaciares, ameaças à diversidade biológica, desflorestação, inundações, etc.) constituem outros tantos indícios de alterações climáticas a nível mundial onde se misturam causas naturais e acção humana. As acções desenvolvidas para diminuir os efeitos ambientais adversos, por exemplo, a redução das chuvas ácidas ao mínimo por meio de técnicas de dessulfuração, têm dado um contributo considerável para evitar a extinção da floresta europeia. Os alarmes lançados pelos ambientalistas em termos oportunos, embora por vezes um tanto exagerados, têm o mérito de fazer reagir a opinião pública e os poderes públicos. É do interesse de todos contribuir para soluções equilibradas que promovam a protecção do ambiente através de medidas preventivas.

2.4

Pensa-se naturalmente nas técnicas de produção industriais, mas convém salientar que as técnicas de produção agrícolas, os transportes e os modos de produção de energia têm efeitos no ambiente e na saúde pública que estão longe de ser despiciendos. A inovação e as tecnologias ambientais podem igualmente beneficiar estes sectores económicos vitais.

2.5

A evolução e as mutações das ciências e das técnicas têm forçosamente efeitos sociais. O que é verdade para todas as inovações, também o é para as tecnologias ambientais, tanto mais se forem chamadas a substituir tecnologias tradicionais e experimentadas mas pouco respeitadoras do ambiente. Há que estudar a forma de preparar a montante estas mudanças que devem ser acompanhadas, nomeadamente, por esforços no domínio da formação profissional e por aperfeiçoamentos da formação inicial. A protecção do ambiente não deve emergir como factor de aumento do desemprego e da desindustrialização desde que assente em procedimentos e instrumentos sãos e bem concebidos. Convém, pois, organizar um diálogo constante entre os responsáveis pelo direito ambiental e os representantes das forças económicas e sociais a fim de prever e medir, de maneira apropriada, o impacte, mesmo negativo, das medidas previstas na actividade e no emprego.

2.6

Estamos, pois, na presença de um verdadeiro repto tecnológico. A Europa, graças à sua capacidade científica e técnica, poderia, havendo vontade política, desempenhar um papel de líder no desenvolvimento de inovações ambientais de grande envergadura. Proteger o ambiente tem, evidentemente, um custo, mas o custo da acção será sempre inferior ao da inacção.

3.   O que são tecnologias ambientais?

3.1

Na prática, as tecnologias ambientais dividem-se em dois tipos:

as tecnologias ambientais que melhoram os processos técnicos e os métodos de produção para os tornar mais «limpos», mais «compatíveis com o ambiente». Citam-se, a título de exemplo, os catalisadores, os sistemas de filtragem das chaminés de fábricas, as soluções para a melhoria do rendimento energético, etc.

as inovações tecnológicas concebidas especificamente para respeitar o ambiente e os princípios do desenvolvimento sustentável. Por exemplo, as turbinas eólicas, a produção combinada de calor e de electricidade, as células de combustível, as fontes de luz da nova geração (LED), etc.

Nem sempre é fácil traçar a fronteira entre tecnologia preventiva e tecnologia regenerativa. Assim os princípios, muito pertinentes e úteis, da política integrada de produtos (PIP) (1) e da directiva relativa à prevenção e redução integradas da poluição (PRIP) (1) reflectem, simultaneamente, uma intervenção regenerativa e uma preocupação preventiva que se inscrevem perfeitamente numa estratégia de desenvolvimento sustentável. É claro que as reflexões que se articulam em torno da concepção de produtos atendendo a todo o seu ciclo de vida conduzem à introdução de tecnologias mais coerentes com a necessidade de assegurar um desenvolvimento sustentável.

3.2

Convém sublinhar que estes dois tipos de tecnologias têm um efeito favorável no ambiente e podem gerar actividade económica e emprego.

3.3

De resto, o CESE frisou várias vezes a necessidade de considerar a eco-indústria na globalidade, recordando que o repto consistia igualmente em «melhorar progressivamente todos os modos de produção e todos os produtos do ponto de vista do ambiente e dos recursos disponíveis» (2).

3.4

Foram identificados quatro tipos de tecnologias ambientais: as tecnologias de fim de linha, as tecnologias integradas, as tecnologias progressivas, as inovações radicais (por exemplo, a química sem cloro). Reconhece-se geralmente que as tecnologias integradas e radicais podem induzir vantagens competitivas a longo prazo. A dificuldade está em que, em mercados muito competitivos, as empresas nem sempre podem fazer escolhas de longo prazo, virando-se mais para processos progressivos que asseguram uma difusão em grande escala de melhorias ambientais no âmbito dos respectivos ciclos habituais de investimento.

3.5

Com efeito, a crescente eficácia ecológica que a indústria e o sector terciário têm realizado e continuam a realizar permite uma melhoria constante do ambiente. No entanto, o crescimento económico é tal, nomeadamente nos países emergentes, que, apesar dos progressos tecnológicos, a pressão sobre o ambiente e sobre os recursos naturais não cessa de aumentar.

4.   Os imperativos ambientais constituem um entrave ao desenvolvimento económico?

4.1

Nos últimos trinta anos, período durante o qual os factores de crescimento se tornaram mais complexos do que na era dita dos «trinta gloriosos», a capacidade da empresa para inovar e para garantir a qualidade dos seus produtos e dos seus métodos de produção nas relações com os clientes, com o ambiente e com os trabalhadores tem-se revelado o melhor garante do seu futuro e, in fine, dos interesses dos seus accionistas.

4.2

Antes mesmo da emergência de toda e qualquer legislação, cada vez mais empresas estão empenhadas no desenvolvimento sustentável e decidem divulgar as suas acções e os resultados obtidos, sob o olhar sempre atento da clientela, da sociedade civil, do mercado e da opinião pública.

4.3

No contexto de forte concorrência fruto da mundialização da economia, a qualidade do ambiente e o equilíbrio social tornaram-se igualmente factores determinantes para atrair ou reter os homens e os capitais. Importa que estes factores sejam considerados no âmbito das negociações da OMC.

4.4

O desempenho de uma empresa em matéria de desenvolvimento sustentável é, por isso, cada vez mais considerado como um trunfo na concorrência mundial e na atracção dos investidores.

4.5

Assim, os imperativos ambientais não são geralmente, como se afirma com excessiva facilidade, um entrave à competitividade e ao desenvolvimento económico. O mercado já deu resposta a vários reptos ambientais lançados pela legislação. As exigências em matéria de qualidade da água e de tratamento dos resíduos são disso exemplo. Nestes dois sectores, as tecnologias ambientais conhecem um desenvolvimento contínuo. Para dar uma resposta económica a estes reptos, as empresas do sector terciário ambiental tiveram de criar e preservar postos de trabalho. Por exemplo, estimam-se em 300 000 os postos de trabalho criados pelo sector do tratamento dos resíduos em França.

4.6

A preocupação de economizar recursos naturais traduziu-se em inovações técnicas que vão no sentido de uma gestão económica e de uma redução dos custos. Assim, por exemplo, a indústria papeleira reduziu significativamente o consumo de água nestes últimos anos. Quando, há uma quinzena de anos, precisava de perto de 100 m3 de água para produzir uma tonelada de papel, hoje bastam-lhe cerca de 48 m3 em média, tendo as emissões poluentes sido reduzidas em cerca de 90 %. Os benefícios são, à uma, ambientais e económicos.

4.7

Como já foi dito, o sector económico do turismo e do lazer depende em larga medida da qualidade do ambiente natural e patrimonial. Os imperativos ambientais não são, no caso vertente, um entrave à competitividade e ao desenvolvimento económico, mas a sua condição principal. Ora o turismo representa um sector essencial para a economia de muitos Estados-Membros. A título de exemplo, em 2003, as receitas do turismo representaram em Espanha 41,7 mil milhões de euros, em França 36,6 mil milhões de euros, em Itália 31,3 mil milhões de euros, na Alemanha 23 mil milhões de euros, no Reino Unido 19,4 mil milhões de euros, na Áustria 13,6 mil milhões de euros e na Grécia 10,7 mil milhões de euros. Convém notar que podem existir contradições entre imperativos ambientais. Assim, a preservação da qualidade da paisagem e do ambiente pode ser ameaçada pela implantação de turbinas eólicas. Note-se, enfim, que o turismo contribui amplamente para o equilíbrio da balança de pagamentos de muitos Estados-Membros, que cria emprego e que é uma actividade que, por definição, não se pode deslocalizar.

4.8

No entanto, é imperativo que as normas ambientais obedeçam ao princípio da proporcionalidade. Com efeito, há que evitar que o custo económico da legislação seja desproporcionado em relação ao benefício socioambiental previsto, embora o CESE esteja inteiramente ciente da dificuldade de o calcular: quanto vale uma vida humana? Mas é mesmo assim evidente que deveria haver um real equilíbrio entre o custo de uma medida ambiental e o custo do risco evitado. Paralelamente, os procedimentos de aplicação da legislação devem ser acessíveis a todas as partes. Esquecer estes aspectos poderia ter o efeito oposto: dificuldade de aplicar a lei, por razões económicas e sociais e em virtude da resistência por parte dos consumidores.

4.8.1

As empresas do sector automóvel que têm de operar num meio muito espartilhado com margens de manobra muito estreitas por força de uma pressão concorrencial muito forte e do comportamento dos consumidores, menos interessados nos aspectos ambientais do que no preço, no conforto e na segurança, são um exemplo interessante. Nestas condições, a introdução de tecnologias ambientais faz-se gradualmente, mais por vagas sucessivas do que por revoluções tecnológicas que, hoje, são demasiadamente dispendiosas para poderem encontrar um verdadeiro mercado. O Toyota Prius um veículo automóvel híbrido gasolina-electricidade) ilustra perfeitamente a mudança de atitude dos consumidores, pois a produção teve, recentemente, de ser aumentada em 50 % para responder à procura mundial, o que, em valor absoluto, continua a ser relativamente marginal em relação à produção automóvel mundial. Este dado não deixa, porém, de ser um elemento encorajador.

4.8.2

O caso dos filtros de partículas é interessante. Os motores a diesel produzem menos 25 % de CO2 do que os motores a gasolina, mas emitem partículas de substâncias nocivas para a saúde. O custo adicional do filtro de partículas equivale a cerca de 500 € (5 a 10 % do custo de um veículo pequeno). Enquanto o filtro de partículas não for prescrito por lei, os construtores têm de escolher entre propô-lo como opção ou instalá-lo sistematicamente, reduzindo as suas margens, na medida em que o aumento do preço seria difícil nas condições do mercado. Na prática, se 90 % dos clientes alemães optaram pelo filtro de partículas, a percentagem foi de 5 % no resto da Europa! Alguns construtores (3) decidiram, pois, equipar os seus veículos com filtro de partículas reduzindo as suas margens mas é óbvio que esta situação não poderá continuar indefinidamente, sobretudo quando a concorrência internacional é muito aguerrida. A generalização dos filtros de partículas far-se-á naturalmente mas a um ritmo compatível com o poder de compra dos clientes, nomeadamente de veículos pequenos.

Este exemplo mostra claramente como surgem os mercados de tecnologias ambientais: ou em resultado da tomada de consciência do consumidor que vê no investimento uma vantagem para si próprio ou para o seu meio ou então de medidas legislativas. A maioria dos êxitos alcançados até à data na protecção do ambiente deve-se a legislação adequada. O sector automóvel é justamente um bom exemplo disso (designadamente, graças à introdução de um catalisador de três vias).

4.8.3

Existem outras possibilidades de inovação ao nível das tecnologias ambientais: veículos com arranque eléctrico, melhoria da reciclagem, luta contra o ruído, aumento da segurança. O problema principal continua a ser o seu custo.

4.8.4

A conclusão a extrair do exemplo do sector automóvel é que as tecnologias ambientais só se generalizam se forem economicamente viáveis ou, para serem eficazes, têm de criar economias de escala. Na prática, num mercado extremamente concorrencial, a introdução das tecnologias ambientais far-se-á de modo gradual e contínuo. Isto implica estudos de impacto sólidos e documentados, que integrem não só a situação do ambiente e do mercado na União, mas também no plano internacional.

4.8.5

Outro exemplo da importância de observar a proporcionalidade são os desafios das indústrias transformadoras — metalúrgica, química, pasta e papel, etc. Estas indústrias laboram sob uma feroz concorrência global e têm uma interacção particularmente estreita com o ambiente. As unidades de produção destas indústrias, na UE, são, de acordo com estudos comparativos, usualmente muito eco-eficientes, isto é, a sua utilização de matérias-primas e de energia, bem como a suas emissões, são tão reduzidas quanto é tecnologicamente possível. A legislação ambiental relacionada com estas indústrias é a mais estrita do mundo. É possível conseguir resultados ambientais melhores passo a passo, investindo nas tecnologias mais recentes e mais eficientes, o que impõe que estas empresas sejam competitivas no respectivo mercado global. É essencial que se exijam melhores resultados ambientais correspondentes ao desenvolvimento técnico e aos ciclos de investimento de cada indústria. Se os requisitos endurecerem demasiado depressa, a sobrecarga dos custos adicionais ou a inexistência de tecnologia exequível podem pôr a competitividade, e, portanto, a continuação da laboração, em risco na UE.

5.   Como desenvolver tecnologias ambientais inovadoras?

5.1

Se por tecnologias ambientais inovadoras se entendem as que, desde a sua concepção, integram as necessidades do ambiente e uma correcta utilização dos recursos, ao contrário das tecnologias poluentes, há que reconhecer que estão ainda em fase de lançamento ou mesmo de experimentação.

5.2

Mais, as situações são muito divergentes. Se a técnica de produção de energia eólica ultrapassou a fase experimental e chegou à fase do desenvolvimento industrial, graças a um mercado sustentado por uma regulamentação muito favorável, só poderá ser complementar de outras formas de produção de energia tal como o processo de produção combinada de calor e de electricidade. As fontes de luz da nova geração (LED) entram agora num mercado que pode tornar-se promissor com os progressos técnicos. Assim, a «Oriental Pearl Tower» de Xangai (480 m) é iluminada de noite por este processo que foi executado por uma PME europeia (4) com blocos de LED fabricados por uma empresa chinesa (5). Os reactores de membrana para o tratamento de águas residuais, estão ainda na fase de investigação. Existem, por fim, outras tecnologias que, sendo úteis, têm aplicação limitada.

5.3

Esta variedade de situações requer, pois, instrumentos adaptados tanto no plano do financiamento como no do intercâmbio das informações e da articulação em rede ou dos instrumentos regulamentares e fiscais. Convém igualmente ter presente a necessidade de uma abordagem selectiva a fim de identificar as tecnologias ambientais realmente promissórias para evitar a dissipação dos fundos.

5.4

Os diversos instrumentos financeiros, fiscais e regulamentares que podem ser contemplados correspondem às várias etapas na aplicação de tecnologias ambientais inovadoras:

subvenções para investigação, estudos de viabilidade, centros de incubação de empresas;

capital de risco para a fase de arranque;

empréstimos bonificados ou clássicos para a fase de desenvolvimento;

incentivos fiscais para consolidar o mercado;

eco-taxas ou eco-impostos para dissuadir da utilização de técnicas não ecológicas, quando existem técnicas alternativas, e para contribuir para a investigação ambiental.

A título de exemplo, os combustíveis de origem agrícola ou biocombustíveis (o diester), cujo preço de custo é superior ao dos produtos petrolíferos, não se desenvolvem em França porque são sujeitos à mesma pesada tributação que os produtos petrolíferos. Se o que se pretende é desenvolver a sua produção e a utilização, seria desejável aplicar uma tributação mais vantajosa ou recorrer à via regulamentar para impor a mistura, numa determinada proporção, com os combustíveis clássicos. Trata-se de estabelecer o equilíbrio entre o custo económico, o risco evitado e o benefício ecológico.

5.5

Devem igualmente ser desenvolvidas redes de intercâmbio e de informação sobre as boas práticas e as novas tecnologias. Este elemento é particularmente relevante tanto para os empresários como para os responsáveis das pessoas colectivas públicas que precisam de instrumentos de apoio à decisão fiáveis e eficazes para fazerem escolhas informadas entre técnicas tradicionais comprovadas e «tranquilizantes» e novas técnicas mais ecológicas mas menos conhecidas e experimentadas.

5.6

Isto reveste particular acuidade se os contratos realizados por entidades públicas passarem a servir de instrumento de difusão e de desenvolvimento das tecnologias ambientais. Se os contratos realizados por entidades públicas são dignos de atenção, convém não negligenciar os contratos realizados por entidades privadas, porque mais flexíveis e reactivos. Para já, certas empresas introduziram o respeito do desenvolvimento sustentável na lista dos critérios de selecção dos fornecedores, adoptaram cláusulas em matéria de desenvolvimento sustentável que são gradualmente incorporadas nos contratos com os fornecedores e criaram acções de formação em desenvolvimento sustentável para os seus compradores.

5.7

Devem ser utilizados rótulos ecológicos, bem como sistemas de prémios e de recompensas para valorizar e promover as tecnologias ambientais.

5.7.1

Por iniciativa da Presidência finlandesa em 1999, foi promovida uma reflexão sobre uma visão europeia da qualidade, que prosseguiu ao longo do ano 2000 sob as Presidências portuguesa e francesa. Dela surgiu a publicação de um importante documento sob a égide da Organização Europeia da Qualidade. Alguns dos conceitos desenvolvidos poderiam ser utilmente integrados nas tecnologias ambientais.

6.   Problema de todos

6.1

Fazer da protecção do ambiente uma verdadeira oportunidade económica não compete a especialistas do ambiente. Ela é já um elemento fundamental de um sector económico tão importante como o turismo e o lazer. Quanto às tecnologias ambientais, a chave do sucesso está na criação de um verdadeiro mercado e na capacidade de reacção das empresas. Seria necessário valorizar mais as iniciativas voluntárias em matéria de inovação tecnológica e de protecção do ambiente promovidas pelas empresas ou pelos sectores profissionais.

6.2

É evidente que se as tecnologias ambientais permitirem efectivamente reduzir os custos de produção, graças a um menor consumo de energia e de matérias-primas, dar uma melhor imagem da empresa e dos seus produtos, aumentar as vendas e diminuir os custos ambientais, as empresas não deixarão de se interessar e de assegurar o seu desenvolvimento. Para tanto, é preciso que as conheçam e estejam em condições de apreciar a sua eficácia. Donde a necessidade de criar uma verdadeira rede de informação e de intercâmbio sobre as boas práticas e as tecnologias ambientais, que poderia associar poderes públicos, associações profissionais, centros técnicos e centros de investigação.

6.3

É necessária a mobilização dos empresários e dos profissionais, bem como dos clientes e dos consumidores. Sem eles, o mercado não existe. As tecnologias ambientais devem, pois, revelar-se eficazes ao grande público tanto no plano da protecção do ambiente como no da produção, na falta do que serão um elemento marginal e atractivo do desenvolvimento económico, que se fará sem elas.

6.3.1

É imperativo que as políticas ambientais atentem no seu impacto económico, tal como as políticas económicas devem integrar os imperativos ambientais. Devem ser, de algum modo, interactivas, porque as políticas que não têm em conta a viabilidade económica nem os seus efeitos ambientais positivos não reúnem todos os ingredientes do sucesso.

6.3.2

Da mesma maneira, as consequências sociais das normas ambientais e da introdução das tecnologias ambientais devem ser previstas o mais a montante possível, bem como a execução das acções de formação profissional necessárias para que os trabalhadores incumbidos da sua aplicação o possam fazer nas melhores condições e sem pôr em risco os seus empregos.

6.4

O acesso à modernização e ao crescimento económico de países muito populosos e dinâmicos torna crucial o desenvolvimento de tecnologias ambientais eficazes em grande escala. Trata-se de um novo modelo de desenvolvimento económico, social e ambiental que importa conceber e aplicar concretamente. A União Europeia, por força das suas competências específicas no domínio das tecnologias ambientais, poderia tornar-se um parceiro privilegiado dos países emergentes e explorar as oportunidades de desenvolvimento de novos mercados.

6.5

A investigação e o desenvolvimento de tecnologias ambientais são e podem vir a ser mais ainda trunfos económicos, como o mostram exemplos concretos de aplicação de tecnologias progressivas, integradas ou, ainda, radicais. Mas constituem também uma necessidade, pois o futuro do mundo depende disso e ninguém o pode ignorar. Somos responsáveis pela herança que legaremos aos nossos filhos.

Bruxelas, 28 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 80 de 30.3.2004.

(2)  JO C 32 de 5.2.2004.

(3)  PSA e Opel, por exemplo.

(4)  Citélum.

(5)  Shangai Communication Technology Developments Co. Ltd.


ANEXO

ao parecer do Comité Económico e Social Europeu

A alteração seguinte foi rejeitada mas obteve mais de um quarto dos votos expressos:

Alterar o ponto 1.8 como segue:

«1.8

Estas preocupações e críticas, manifestadas por alguns, não podem ser caladas e esquecidas. Elas não têm por objecto princípios ou políticas. Traduzem a convicção de alguns actores económicos de que há um conflito entre, por um lado, os imperativos do crescimento económico, da criação de emprego, e as práticas actuais e, por outro, as preocupações ambientais interpretadas por regulamentações excessivas que esquecem a realidade da concorrência económica. Os problemas parecem ser o resultado de uma subavaliação e de uma gestão errada dos instrumentos, do procedimento e das estratégias de execução.».

Resultado da votação

Votos a favor: 46

Votos contra: 71

Abstenções: 9


20.5.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 120/135


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Modernizar a protecção social para o desenvolvimento de cuidados de saúde e de cuidados prolongados de qualidade, acessíveis e duradouros: um apoio às estratégias nacionais pelo “Método aberto de coordenação”»

[COM(2004) 304 final]

(2005/C 120/25)

A Comissão decidiu, em 20 de Abril de 2004, ao abrigo do disposto no artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

A Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 22 de Setembro de 2004, de que foi relator Paolo BRAGHIN.

O Comité Económico e Social Europeu, adoptou na 412.a reunião plenária de 27 e 28 de Outubro de 2004 (sessão de 28 de Outubro), por 104 votos a favor e 3 abstenções, o presente parecer.

1.   Síntese da comunicação

1.1

A comunicação em apreço, anunciada no Relatório da Primavera de 2004  (1), visa favorecer a definição de um quadro comum que permita apoiar os esforços nacionais de reforma e de desenvolvimento dos cuidados de saúde e dos cuidados prolongados, graças à aplicação do «Método aberto de coordenação».

1.2

A Comissão Europeia identificou três orientações (2), aprovadas pelo Conselho Europeu de Barcelona em Março de 2002, que podem representar um contexto para inserir esta reforma: a acessibilidade dos cuidados com base nos princípios da universalidade, da equidade e da solidariedade; a oferta de cuidados de qualidade; a viabilidade financeira a longo prazo dos cuidados com vista a uma maior eficiência do sistema.

1.3

A qualificação dos cuidados de saúde como serviço na acepção do Tratado e a constatação da persistência de desigualdades e dificuldades de acesso, de serviços de qualidade por vezes insuficiente e de desequilíbrios financeiros, puseram em evidência a necessidade de potenciar a coordenação das políticas nacionais para apoiar o esforço de modernização e desenvolvimento do sector, tendo em conta o impacte na coesão social e no emprego e os complexos efeitos resultantes do envelhecimento da população.

1.4

Para enfrentar estes desafios, a reforma dos sistemas de protecção social deve ser prosseguida de maneira integrada e coordenada e os cuidados de saúde e os cuidados prestados a idosos devem representar um dos domínios a que há que aplicar a «racionalização» dos processos de coordenação em matéria de protecção social, ou «streamlining» (3); o «Método aberto de coordenação» é um instrumento flexível, respeitador da diversidade de situações e competências nacionais e, portanto, particularmente adequado a este contexto (4).

1.5

A comunicação identifica como as próximas etapas:

um acordo sobre os «objectivos comuns» em 2004, com o compromisso da parte dos Estados-Membros de apresentarem, antes da próxima cimeira da Primavera, «relatórios preliminares» sobre os desafios com que são confrontados os seus sistemas a nível nacional;

a elaboração de uma primeira série de «estratégias de desenvolvimento e de reforma» dos cuidados de saúde e dos cuidados prolongados, abarcando o período de 2006-2009, que a Comissão apresentará no Relatório conjunto sobre a protecção social e a inserção social previsto para 2007;

a constituição de um grupo de alto nível em matéria de serviços de saúde e de cuidados médicos com a competência principal de elaborar um programa de trabalho, coordenado com os grupos de alto nível a funcionar em campos afins;

a identificação de possíveis indicadores para estes objectivos, para a qual contribuirão os «relatórios intercalares» da Primavera de 2005, o que permitirá elaborar um primeiro quadro comparativo das diferentes situações nacionais e medir os respectivos progressos em relação aos objectivos definidos.

2.   Considerações gerais sobre as problemáticas de fundo

2.1   Factores socioeconómicos e demográficos

2.1.1

O CESE confirma o inteiro apoio, já expresso em pareceres precedentes, aos objectivos comuns para o desenvolvimento dos sistemas de saúde, mais precisamente:

garantir o acesso a cuidados de qualidade, com base nos princípios da universalidade, da equidade e da solidariedade, e prevenir o risco de pobreza ou de exclusão social ligado à doença, aos acidentes, à invalidez ou aos cuidados tornados necessários pela idade avançada, tanto para os beneficiários de cuidados como para as respectivas famílias;

promover cuidados de qualidade para melhorar o estado de saúde e a qualidade de vida das pessoas;

assegurar a viabilidade financeira a longo prazo de cuidados acessíveis a todos e de qualidade;

e subscreve a afirmação de que estes constituem um conjunto global e integrado, cujos desenvolvimento e racionalização requerem um governo eficiente, baseado na inclusão e na responsabilização dos actores em questão, pois os parceiros sociais e a sociedade civil no seu conjunto devem contribuir para o esforço de reforma.

2.1.2

O CESE salientou, de resto, em recente parecer de iniciativa, que a capacidade dos sistemas nacionais de cuidados de saúde de atingir tais objectivos depende de uma série de factores socioeconómicos e demográficos que devem ser mais aprofundados para compreender a complexidade do problema e prever tendências que poderão ter um efeito explosivo (5).

2.1.3

Tais factores influem, de facto, nas necessidades e nos recursos disponíveis, actuais e futuros. A eficiência dos cuidados de saúde impõe-se, até porque interage com as outras componentes do sistema de protecção social: as suas necessidades financeiras competem com as de outros sectores da protecção social e os seus disfuncionamentos reflectem-se neles e vice-versa.

2.1.4

Mecanismos análogos de competição pelos recursos e de interacção actuam no âmbito dos próprios cuidados de saúde (por exemplo, na distribuição das despesas a intervenção racionalizadora num sector pode ter efeitos em direcção oposta noutro sector, ou enviar o pessoal de uma tipologia de estruturas para outra pode provocar diminuições imprevistas de qualidade dos serviços). Estes mecanismos devem ser atentamente analisados em cada processo de requalificação dos sistema de cuidados.

2.1.5

O CESE considera que intervir num aspecto do problema sem considerar as repercussões sobre os outros, ou não monitorar as tendências interrelacionadas de mais sectores, comporta o risco de efeitos distorçores ou de não se atingirem os objectivos pretendidos. Por isso defende que se partilhe uma visão global dos problemas, das suas interdependências, das oportunidades que se podem conseguir graças a estratégias comuns.

2.1.6

Os cuidados de saúde têm um valor social e, também, psicológico muito relevante: perante a doença, o sofrimento e o risco de morte o cidadão pretende a máxima qualidade, sem se pôr a questão da relação custos-benefícios e da sustentabilidade. Disto resulta um delicado aspecto político, porque o decisor público deve fazer uma escolha de prioridades e de serviços de saúde eficazes e sustentáveis, escolha tornada difícil pelos interesses de categoria e pelas percepções subjectivas, que, por vezes, dificultam a aplicação das intervenções de requalificação da procura e da oferta de serviços.

2.1.7

As necessidades e as expectativas da população relativamente à sua saúde — que implica a procura não apenas de qualidade de vida, mas também de uma vida de qualidade — devem ser adequadamente tidas em consideração na avaliação da relação custo-benefício e da sustentabilidade financeira para tornar mais racionais e válidas a longo prazo as escolhas de requalificação dos cuidados e para facilitar decisões públicas em função das reais necessidades da população no seu conjunto, assim como dos doentes e de quem necessita de cuidados em particular.

2.1.8

O CESE reafirma que a defesa da saúde é um direito e uma prioridade nas políticas comunitárias. Considera, porém, que para a própria salvaguarda de tal direito a longo prazo é necessário identificar instrumentos eficazes para garantir a todos um nível equitativo de prestações compatíveis com os recursos disponíveis e fazer um cotejo aprofundado para trazer ao de cima quais as necessidades e expectativas da população justificadas no campo da saúde e quais os mecanismos de responsabilização dos actores que favorecem a utilização apropriada dos recursos e a eficiência do sistema de saúde, permitindo, portanto, o seu financiamento sustentável.

2.2   Envelhecimento demográfico e nova epidemiologia

2.2.1

O envelhecimento demográfico não significa um simples incremento da população com mais de 65 anos (ainda mais acelerado o da população com mais de oitenta). Comporta esse mesmo envelhecimento demográfico também, na realidade, um certo número de problemas conexos, que às vezes são descuidados, quando deviam ser enfrentados:

a alteração da pirâmide demográfica, na ausência de intervenções na idade da reforma, implicará uma relação mais desfavorável entre contribuintes (isto é, a população em idade activa) e utilizadores de serviços, e não só de saúde (em especial a população idosa); portanto um problema prioritário é encontrar novas soluções para reorientar e acumular recursos específicos com o objectivo de garantir serviços idóneos à população não auto-suficiente (6) (predominantemente a mais idosa) sem retirar recursos a outros pilares da protecção social;

muda também a tipologia da doença, e não apenas a frequência do seu aparecimento: as patologias das idades mais avançadas frequentemente não têm cura mas podem retirar benefícios notórios de cuidados a médio e longo prazo, com intervenções médicas e cirúrgicas destinadas a aliviar-lhes os efeitos negativos, ainda que sem poder restabelecer o estado de saúde precedente. Isto implica uma abordagem médica diferente, capaz de integrar «treatment» (tratamento) e «care» (cuidados) — envolvendo a investigação, os produtos farmacêuticos, os meios de diagnóstico, as tecnologias de intervenção — porque se deve passar da abordagem «aguda» à «crónica» (o que implica a gestão dos problemas médicos com bons resultados no longo prazo, embora sem poder resolver os próprios problemas);

no plano epidemiológico assiste-se a um progressivo incremento das doenças de natureza crónica ou prolongada, ligadas também à eficácia das intervenções sanitárias que, sem garantirem a cura, permitem um alongamento substancial da esperança de vida, com a consequência do aparecimento crescente de incapacidades físicas e mentais, em especial de traumatismos e doenças neuro-degenerativas que requerem uma resposta de maior integração de intervenções sanitárias e sociais e comportam um fardo de cuidados para a família (7);

o conceito de «saúde» não pode limitar-se à componente física, devendo antes tomar em consideração os aspectos psíquicos e sociais, como já se mostra na definição da OMS (8) (isto implica a avaliação do contexto em que a pessoa idosa está inserida e da satisfação das suas outras necessidades, como a segurança, os afectos e os contactos sociais, a auto-estima e a auto-realização, etc.).

2.2.2

A fileira dos cuidados de saúde, consolidada em períodos históricos com estrutura demográfica e necessidades diferentes das actuais, deve ser repensada, combatendo a rigidez e a inércia em relação à mudança que caracterizam estruturas organizativas, papéis profissionais e atitudes culturais. O CESE considera que isto pode ser feito partindo da análise do estado e das necessidades de saúde da população (muito diferenciados de Estado-Membro para Estado-Membro, assim como em cada um deles), prevendo as alterações demográficas já em curso e que haverão de acentuar-se, amplamente previsíveis porém.

2.2.3

Devem, além disso, ser desenvolvidas soluções para gerir melhor a relação entre a procura e a oferta de serviços, qualificando a acessibilidade às prestações, o acolhimento da procura, ajudando as pessoas débeis na fruição das respostas, garantindo a avaliação integrada das necessidades e projectos personalizados de intervenção, num quadro de continuidade de cuidados e de avaliação sistemática dos resultados. O método aberto de coordenação deveria compreender também esses aspectos e favorecer, portanto, abordagens mais homogéneas e mecanismos reforçados de coesão social.

2.2.4

O segundo aspecto das alterações demográficas referidas na comunicação — isto é, as transformações das famílias e o aumento da taxa de emprego feminino — inclui uma menor capacidade de cuidados informais a cargo das famílias. Esta realidade requer que se repensem as modalidades de prestação de cuidados de saúde no domicílio, que não pode ser confiada apenas a prestadores profissionais de serviços, pelo custo e pela dificuldade de recrutamento de pessoal, assim como pela perda da cobertura de cuidados de saúde durante as 24 horas e, em muitos casos, por uma prestação de cuidados «à medida do homem». Impõe-se, pois, repensar as políticas de apoio para a prestação de cuidados em família, através mesmo de mecanismos retributivos a quem os presta, bem como um apoio para garantir condições de habitação, serviços de transporte e outros serviços que a favoreçam.

2.2.5

Os cuidados no domicílio são actualmente garantidos, de forma muito diferenciada, pelo poder nacional local, estruturas e mecanismos seguradores, bem como mútuas, organismos e associações de serviços às pessoas. Em geral, verifica-se que ainda não estão bastante desenvolvidos nos diversos países, devendo ser mais qualificados para ter em conta a natureza diversificada das necessidades resultantes do peso epidemiológico crescente das demências, das patologias neurovasculares e, mais em geral, das polipatologias com perda de autosuficiência que, depois dos 75 anos, afectam pelo menos 30 % dos idosos.

2.2.6

O CESE sugere que sejam confrontadas e aprofundadas experiências já em curso em alguns Estados-Membros, onde se apoiam, de forma articulada, os prestadores informais de cuidados (por exemplo, através de benefícios fiscais, direito à reforma e à segurança social para os prestadores de cuidados de saúde, direitos a licenças laborais, oferta de substitutos nos períodos de repouso, acesso aos centros diurnos, etc. (9).

2.2.7

Soluções deste tipo parecem vir a ser mais económicas para o ente prestador e mais satisfatórias para o assistido idoso, porque permitem integrar recursos profissionais e recursos da solidariedade, com substancial redução dos custos da prestação de cuidados. Criam, noutros termos, uma situação «win-win»: em paridade de necessidades, de facto tais custos são bem mais elevados no caso de uma prestação de cuidados feita apenas em estruturas residenciais, ao mesmo tempo que deveria ser protegida a prestação informal de cuidados, ainda assim.

2.3   Emprego

2.3.1

O Sector dos cuidados de saúde e o dos cuidados prolongados representam uma percentagem significativa do emprego global na União e é o segundo sector criador de emprego com 1,7 milhões de novos postos de trabalho criados na UE-15 entre 1997 e 2002. Apesar disso, anuncia-se uma grave crise profissional ligada ao envelhecimento dos trabalhadores e à qualidade das prestações oferecidas.

2.3.2

A estrutura profissional deve ser repensada nos processos de formação e na educação permanente para responder às novas necessidades que vão surgindo, se se quiser garantir a qualidade dos cuidados e a permanência em actividade do pessoal:

o pessoal médico deve ser formado para uma abordagem diferente, que tenha em conta a multifactorialidade da saúde do idoso e não apenas os sintomas e intervenções em situação aguda, pelo que, neste sentido, deve ser desenvolvida a formação em geriatria;

o pessoal de enfermagem deve adquirir características condizentes com a tipologia da estrutura em que opera, ou seja, os diversos níveis da fileira dos cuidados de saúde (serviços de terapia intensiva, de cuidados hospitalares, de cuidados primários, de cuidados prolongados, de cuidados domiciliários, etc.);

o pessoal dos cuidados em geral deve enriquecer a sua formação profissional para alargar o horizonte dos serviços sociais aos serviços sociossanitários destinados a pessoas idosas mais ou menos auto-suficientes, mas com necessidades e dignidade a respeitar;

a coesão social implica situações na fronteira incerta entre os cuidados de saúde e a assistência social: as figuras profissionais requeridas deverão, também neste caso, ser repensadas para uma população de estrutura e composição muito diferente da actual.

2.3.3

O CESE considera que, além de desenvolver a formação dos diversos tipos de operadores no sentido acima indicado, devem ser desenvolvidas novas capacidades como, em especial:

recolher, dar, trocar informações, funcionando em rede e disfrutando das novas tecnologias informáticas;

trabalhar em grupo, portanto com competências de comunicação e de estilos comunicativos interprofissionais e interinstitucionais;

trabalhar numa óptica de prevenção e de promoção de novas abordagens mais apropriadas às necessidades emergentes;

trabalhar para projectos de cuidados que visem faixas específicas de população, superando as estritas fronteiras disciplinares tradicionais;

captar a dimensão económica do próprio trabalho e avaliar os resultados conseguidos na óptica do serviço prestado, para melhor gerir os recursos destinados a tais serviços.

2.3.4

O CESE apoia vivamente a utilização do Fundo Social Europeu para processo de formação e para adequar a qualidade do emprego nos sectores dos cuidados de saúde e dos cuidados prolongados, para prevenir saídas prematuras e melhorar a qualidade, a flexibilidade, e portanto, a eficiência da fileira dos cuidados. Esta abordagem é particularmente importante para os novos Estados-Membros, onde o processo de modernização é mais profundo e rápido e as necessidades de formação profissional são, pois, mais agudas.

2.3.5

Para obter resultados eficientes deve ser repensado, além disso, de modo positivo o contributo do sector público do sector privado: deve ser activamente procurado não só para evitar a concorrência entre prestadores de serviços ante uma população activa que se prevê que seja cada vez menos numerosa em relação à população total (com os consequentes riscos de estrangulamentos a nível de pessoal ou do custo excessivo do mesmo), mas também para inserir plenamente nos sistemas de cuidados tanto eficiência como atenção às necessidades, que, hoje, parecem apanágio de um ou do outro sector, mas antes estão presentes em ambos.

2.4   Sustentabilidade financeira

2.4.1

Continuar a oferecer cuidados acessíveis e de qualidade, sem reduzir o financiamento de outros sectores ou políticas prioritários é um desafio importante para todos os Estados-Membros, actuais e aderentes; isto implica uma abordagem atenta às dinâmicas de longo prazo e às intervenções que têm que ver conjuntamente com a procura e a oferta (intervenções em um só destes aspectos não se mostraram eficazes em termos de contenção dos custos no médio prazo).

2.4.1.1

As restrições de despesa, resultantes até do Pacto de Estabilidade, não possibilitam um incremento da despesa com cuidados proporcional ao incremento da procura social. São, todavia, possíveis melhoramentos consistentes na oferta requalificando a oferta actual com prestações de comprovada eficácia e travando consumos injustificados de prestações de saúde. Uma política sanitária eficiente implica que se repensem as interacções entre cuidados de saúde e assistência social, para identificar estruturas, processos de tratamento e tipologias de prestações profissionais mais adequadas ao contexto actual e futuro e às necessidades da população.

2.4.1.2

Foram experimentadas várias abordagens para controlar tal incremento: vão das medidas destinadas a transferir parte dos custos para os utentes (o que serve não só para transferir os encargos do financiamento para os privados, mas também para limitar a procura de serviços) ao controlo dos preços e dos volumes tanto do lado da procura como do lado da oferta; das reformas destinadas a incentivar o uso eficiente dos recursos à deslocação de recursos dos cuidados hospitalares e de saúde para os cuidados no domicílio.

2.4.1.3

A preconizada aplicação do método aberto de coordenação nesta análise permitirá avaliar quais destas medidas se mostraram eficazes e qual «mix» de medidas se pode mostrar mais válido, com base em conhecimento mais apropriado das variegadas condições de partida e do impacte previsível nos outros sectores do sistema de protecção social.

2.4.2

As políticas de prevenção são, seguramente, importantes e necessárias, mas, infelizmente, muitas vezes negligenciadas. Um plano concreto de medidas de prevenção, de preferência de longo alcance e assente em instrumentos de âmbito global, deveria tornar-se alavanca primária no quadro das anunciadas estratégias de desenvolvimento e de reforma dos cuidados de saúde e dos cuidados prolongados. As várias medidas de prevenção possíveis, em especial as já experimentadas a nível nacional, deveriam ser verificadas no exercício do método aberto de coordenação e submetidas a uma análise aprofundada para se chegar a acções concretas. O CESE está ciente da dificuldade de realizar tal prevenção; esta implica uma coerência de políticas ainda longe de ser uma realidade, bem como projectos para a educação da população para estilos de vida diversos (incluídas uma alimentação mais saudável e actividades físicas e mentais mais intensas e vivas), para o envolvimento, especialmente, das faixas da população mais sujeitas a factores de risco e mais débeis no plano socioeconómico e para modalidades de trabalho mais salubres, cuja realização requer esforços substanciais e conscientes, prazos longos e implica resultados, de qualquer modo, incertos.

2.4.3

A diferenciação da despesa em função de fileira de cuidados e das correspondentes modalidades de ingresso e de tratamento no seu interior é uma forma desejável de racionalização, devendo todo o investimento que torne tal fileira mais apta a responder às necessidades ou favoreça a sua modernização ser visto como um meio para tornar a despesa com os cuidados sustentável a longo prazo. Em contrapartida, às vezes este género de investimentos é sacrificado por exigências financeiras conjunturais. O CESE considera que devem ser acompanhados de investimentos para racionalizar a fileira dos cuidados e de intervenções quer sobre a procura (modalidades de intervenção especializadas, tectos de prestações para lá dos quais o custo fica a cargo do privado, taxa moderadora, etc.) quer sobre a oferta (tipologia das estruturas sanitárias, custo de tecnologias e fármacos inovadores, cuja relação custo-benefício não é, muitas vezes, evidente, procedimentos e modalidades de tomada a cargo, responsabilização dos operadores sanitários pelos custos sanitários, etc.).

2.4.3.1

A estrutura e as modalidades de funcionamento da fileira e a mobilidade de um segmento para outro devem ser atentamente analisadas para verificar se a sua articulação e o seu funcionamento são realmente eficazes e eficientes; deveria este ser um dos temas prioritários do método aberto de coordenação.

2.4.3.2

Os novos Estados-Membros estão a actuar intensamente no sentido de modernizar os seus sistemas de cuidados de saúde e o CESE apoia a utilização dos fundos estruturais, em especial o FEDER e o Fundo de Coesão, para ajudar o desenvolvimento de infra-estruturas e de estruturas de cuidados. Considera, além disso, que a avaliação da experiência vivida, através do método aberto de coordenação, pode ser particularmente útil para os novos Estados-Membros, para evitar que se projectem para modelos que se arriscam a tornar-se rapidamente obsoletos.

2.4.4

A coordenação reforçada entre prestadores de serviços que operam agora isoladamente (serviços de terapia intensiva, cuidados primários, serviços sociais), como se sugere na comunicação, é seguramente oportuno, porque as pessoas não auto-suficientes geralmente têm necessidade de uma pluralidade de prestações de cuidados, médicos ou não; a colaboração positiva entre famílias, operadores que trabalham na prestação de cuidados e pessoal médico garante resultados melhores e menor dispêndio de recursos. O CESE preconiza que se dê um mandato claro ao «Grupo de alto nível em matéria de serviços de saúde e de cuidados médicos», recentemente instituído, estabelecendo como competência institucional dele, entre outras, propor modalidades operacionais concretas de realizar tal coordenação.

2.4.5

A inovação tecnológica e os comportamentos mais atentos dos pacientes influenciam de forma potencialmente positiva a despesa, porque é possível tratar de modo menos dispendiosos patologias específicas ou atrasar a sua manifestação, ao mesmo tempo, porém, induzem novas necessidades, cuja satisfação se torna «ipso facto» um direito, com a consequência do abandono de abordagens diagnósticas e terapêuticas consolidadas, com custo inferior e geralmente adequadas. Se estes processos inovadores não forem orientados para uma abordagem mais eficaz no tratamento específico dos idosos, o efeito a longo prazo da inovação poderá ser mais negativo que positivo no balanço dos cuidados de saúde. A pressão da parte da população mais instruída e atenta às necessidades de saúde poderá induzir um declínio ulterior das prestações previstas para a parte mais frágil da população, a que já sofre com um acesso reduzido aos cuidados de saúde.

3.   Observações na especialidade sobre os instrumentos operativos

3.1

O CESE, na impossibilidade legal de uma política comunitária para os cuidados de saúde e os cuidados prolongados, concorda com a importância primordial do método aberto de coordenação como instrumento para perseguir de modo eficaz os objectivos de modernização e de desenvolvimento de cuidados de saúde e de cuidados prolongados de qualidade, acessíveis e sustentáveis, e para garantir a protecção de saúde pública, mas em contextos diferenciados e sujeitos a crescentes pressões e desafios.

3.1.1

A análise e a troca de experiências deverão concentrar-se:

na articulação e na estrutura interna dos sistemas e das instituições de prestação de cuidados (dos cuidados médicos primários aos cuidados prolongados e aos cuidados no domicílio);

nas modalidades e tempos de acesso, bem como na mobilidade de uma estrutura para a outra;

nos processos internos e nos «ouput» (monitorização e avaliação da qualidade das prestações do sistema);

nos volumes e na tipologia dos serviços prestados, em especial na utilização das novas tecnologias e no seu emprego racional;

nos meios utilizados para perseguir um uso mais eficaz dos recursos, e nos mecanismos de controlo dos custos mais eficazes;

na participação do pessoal médico e dos operadores dos sectores sanitários e assistenciais na gestão dos recursos;

no respeito dos direitos dos pacientes, bem como no seu acesso a informações adequadas, às opções terapêuticas e às fichas clínicas;

no respeito da transparência dos serviços.

3.2

A realização deste método aberto de coordenação implica a identificação de uma série de indicadores que permitam colmatar as actuais carências de conhecimento e, ao mesmo tempo, tomar em consideração as situações existentes e as dinâmicas macro-sociais que influem no sistema de cuidados de saúde e de cuidados prolongados, em especial. Esse conjunto de indicadores deve integrar os aspectos estruturais (fileira dos cuidados, dotação de equipamentos e de pessoal e as respectivas formação e experiência, etc.), os aspectos inerentes à qualidade do processo de prestação de cuidados (modalidades de prestação dos serviços e de realização das intervenções, orientações operacionais, normas e práticas médicas, salvaguarda dos direitos dos pacientes, etc.) e, finalmente, os aspectos da qualidade dos resultados específicos dos cuidados, em função da sua tipologia e das expectativas sociais atinentes.

3.2.1

Deve ser feito um esforço especial para que tais indicadores permitam, especificamente, a observação e a avaliação das dinâmicas respeitantes aos idosos e aos cuidados a eles prestados, aspecto ausente nos indicadores actualmente utilizados ou identificados. Paralelamente à identificação dos indicadores, dever-se-á proceder a uma clarificação dos objectivos comuns. Entretanto, seria útil examinar os dados fornecidos por fontes como a OMS, a OCDE e o projecto ECHI (indicadores de saúde da Comunidade Europeia). Importará, todavia, ter em conta as novas estatísticas comunitárias sobre o rendimento e as condições de vida (EU-SILC), que deverão estar disponíveis em 2004.

3.3

As próximas etapas propostas na comunicação dizem respeito a aspectos muito relevantes do problema e abrem a observação a campos de grande interesse. Todavia, as propostas são gerais, arriscando-se, portanto, a ser genéricas e a não levarem a passos significativos em frente no método aberto de coordenação.

3.3.1

O CESE preconiza a identificação de objectivos comuns mais concretos, que não sejam exageradamente prescritivos nem interfiram negativamente com a organização dos sistemas nacionais, e transformação dos relatórios preliminares previstos num instrumento útil sem incremento dos custos administrativos nem encargos excessivos para as limitadas capacidades dos novos Estados-Membros.

3.4

O CESE preconiza, pois, que quanto antes, a Comissão:

dê uma definição precisa de termos como protecção social, previdência social, cuidados de saúde, ajuda social, cuidados domiciliários e outras que são recorrentes na comunicação, que nem sempre têm o mesmo significado nos vários Estados-Membros em consequência da sua tradição histórica e das modalidades de realização dos sistemas de «welfare»;

proponha um modelo concreto para a elaboração dos relatórios preliminares, de modo que as informações neles contidas cubram os mesmos temas e sejam, potencialmente, comparáveis e não se refiram a toda a gama de objectivos parciais, mas aos instrumentos mais significativos para identificar e ilustrar os principais desafios e as orientações das suas políticas a nível nacional;

constitua um grupo de peritos (valorizando os contributos de instituições e organismos especializados nacionais que já operam neste campo) para definir os indicadores específicos a procurar para os cuidados prolongados (para conseguir uma medida eficaz das tendências macro-sociais e macro-económicas que influem nos cuidados de saúde e nos cuidados prolongados) e em condições de lhes avaliar os vários aspectos numa visão global, mas especialmente de lhes avaliar o impacte predictivo;

desenvolva um modelo europeu de avaliação de impacto socio-sanitário, baseado em índices tripolares de investimento-financiamento (input), de organização das respostas (output) e de eficácia das acções (outcome), de modo a poder representar com indicadores fiáveis os níveis de protecção social (welfare) conseguidos nos diversos países (10);

enfrente o problema das diferenças de género, tendo em consideração o facto de as mulheres viverem mais 5 anos (ou mais) do que os homens, o que, somando-se às características biológicas e fisiológicas próprias do género, determina uma diferença relevante em termos de necessidades de saúde a satisfazer;

facilite a elaboração conjunta de orientações para os cuidados de saúde que não se limitem aos aspectos dos tratamentos farmacológicos, mas tomem em conta outros aspectos sociais e organizativos, tornando-se referência para os operadores dos vários sistemas de saúde.

3.5

Especialmente importante e urgente é promover acções destinadas à qualificação dos operadores e profissionais, desenvolvendo, com acções de formação idóneas, a área de qualificação profissional comum às profissões da saúde e sociais que realizam trabalho de prestação de cuidados; isto implica uma preparação sobre aspectos não meramente técnicos e a aquisição de novas capacidades, por exemplo a gestão da informação em especial sobre redes informáticas e a gestão da despesa numa lógica de largo espectro. Estes novos modelos de formação devem ser apoiados e incentivados pela acção comunitária para se enriquecer com as experiências trocadas no método aberto de coordenação.

Bruxelas, 28 de Outubro de 2004.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  «Concretizar Lisboa — Reformas para a União alargada», COM(2004) 29 final.

(2)  COM(2001) 723 final.

(3)  O CESE já se pronunciou a favor da racionalização dos processos no parecer publicado no JO C 32, de 5/2/2004 — Relator: W. BEIRNAERT.

(4)  A Comunicação da Comissão Reforçar a dimensão social da Estratégia de Lisboa: racionalizar a coordenação aberta no domínio da protecção social COM(2003) 261 final.

(5)  Parecer do CESE sobre «Os cuidados de saúde» — JO C 234, de 30/9/2003 — Relator: A. BEDOSSA (2003).

(6)  Utiliza-se a terminologia da OMS, que define pessoa não auto-suficiente como a que tem incapacidade parcial ou total de executar funções autónomas a nível orgânico, cognitivo, comportamental, a nível interpessoal ou de interacção com o ambiente (cf. International Classification of Functioning, Disability and Health, 2001 (ICF)).

(7)  As pessoas não auto-suficientes, na Europa, são cerca de 60 milhões e passaram a ser 75 milhões em 2003 (Fonte: EUROSTAT, La situation sociale dans l'Union européenne 2003, Comissão Europeia, DG Emprego e Assuntos Sociais, 2003).

(8)  Ver a International Classification of Functioning, Disability and Health, 2001 (ICF) cit.

(9)  Veja-se, em especial, o relatório conjunto «Cuidados de saúde e cuidados aos idosos: apoiar as estratégias nacionais destinadas a garantir um elevado nível de protecção social», comunicação da Comissão COM(2002) 774 final, de 3/1/2003, pág. 11.

(10)  Ver parecer do CESE — JO C 80, de 30/3/2004, ponto 4.5.2 – Relator: JAHIER.