ISSN 1725-2482

Jornal Oficial

da União Europeia

C 302

European flag  

Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

47.o ano
7 de Dezembro de 2004


Número de informação

Índice

Página

 

II   Actos preparatórios

 

Comité Económico e Social Europeu

 

410.a Reunião Plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004

2004/C 302/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — LeaderSHIP 2015 — Definir o futuro da indústria europeia da construção e reparação de navios — A competitividade por excelência [COM(2003) 717 final]

1

2004/C 302/2

Parecer da Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Decisão 2000/819/CE relativa a um programa plurianual para a empresa e o espírito empresarial, em especial para as pequenas e médias empresas (PME) (2001-2005) — COM(2003) 758 final — 2003/0292 (COD)

8

2004/C 302/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre um novo quadro jurídico relativo aos pagamentos no Mercado Interno — COM(2003) 718 final

12

2004/C 302/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Conselho relativa aos procedimentos de consulta e de informação nos domínios do seguro de crédito das garantias e dos créditos financeiros (Versão codificada) — COM(2004) 159 final — 2004/0056 (CNS)

19

2004/C 302/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à aplicação do Código Internacional de Gestão da Segurança na Comunidade — COM(2003) 767 final — 2003/0291 (COD)

20

2004/C 302/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao reforço da segurança nos portos — COM(2004) 76 final — 2004/0031 (COD)

23

2004/C 302/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Fusão nuclear

27

2004/C 302/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho — Ponto da situação do Programa de investigação GALILEO no início de 2004 — COM(2004) 112 final

35

2004/C 302/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às licenças das empresas de transporte ferroviário (versão codificada) — COM(2004) 232 final — 2004/0074 (COD)

38

2004/C 302/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1228/2003 no que respeita à data de aplicação de certas disposições à Eslovénia — COM(2004) 309 final — 2004/0109 (COD)

39

2004/C 302/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as Mutações industriais e a coesão económica, social e territorial

41

2004/C 302/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Convenção internacional para os trabalhadores migrantes

49

2004/C 302/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Segundo pilar da PAC: perspectivas de adaptação da política de desenvolvimento dos territórios rurais (Consolidação dos resultados da Conferência de Salzburgo)

53

2004/C 302/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Terceiro relatório sobre a coesão económica e social — Uma nova parceria para a coesão: convergência, competitividade e cooperação [COM(2004) 107 final]

60

2004/C 302/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu — Tributação dos dividendos das pessoas singulares no mercado interno — COM(2003) 810 final

70

2004/C 302/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões e aos parceiros sociais a nível comunitário no que respeita ao reexame da Directiva 93/104/CE referente a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho [COM(2003) 843 final]

74

2004/C 302/7

Parecer do CESE sobre As relações UE-Turquia na perspectiva do Conselho Europeu de Dezembro de 2004

80

2004/C 302/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Modernizar a protecção social para mais e melhores empregos: uma abordagem global para tornar o trabalho compensador — COM(2003) 842 final

86

2004/C 302/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — O futuro do sector dos têxteis e do vestuário na União Europeia alargada — COM(2003) 649 final

90

2004/C 302/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre As áreas metropolitanas: implicações socioeconómicas para o futuro da Europa

101

PT

 


II Actos preparatórios

Comité Económico e Social Europeu

410.a Reunião Plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004

7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — LeaderSHIP 2015 — Definir o futuro da indústria europeia da construção e reparação de navios — A competitividade por excelência»

[COM(2003) 717 final]

(2004/C 302/01)

Em 21 de Novembro de 2003, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 9 de Junho de 2004 sendo relator Joost van IERSEL.

Na 410.a Reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 109 votos a favor, 3 votos contra e 1 abstenção, o seguinte parecer.

1.   Síntese

A Comissão procedeu, em estreita colaboração com a indústria europeia de construção e de reparação naval, a um primeiro esboço da política industrial para o sector. É surpreendente como as partes envolvidas lograram reunir com grande celeridade um elenco de medidas destinadas a salvaguardar a produtividade e a competitividade deste sector. O CESE aplaude a metodologia seguida e o conteúdo da iniciativa LeaderShip 2015. Todos os intervenientes reconhecem que uma abordagem nacional deixou de ter sentido e que só uma abordagem europeia estará à altura de oferecer soluções duradouras. Nesta abordagem optou-se acertadamente por um pacote coeso e pelo respeito da conformidade com as regras do mercado. Dependendo a credibilidade das propostas inteiramente da sua execução, o CESE considera fundamental o seu acompanhamento. Haverá que assegurar a participação, a transparência e o tratamento escrupuloso dos vários processos. O CESE concorda plenamente que a aplicação das medidas previstas criará condições equitativas de concorrência para a Europa, o que por seu turno constitui uma premissa fundamental para uma igualdade de condições ao nível mundial.

2.   Contexto

2.1   O mercado da construção naval

2.1.1

Há mais de duas décadas que a produção de navios tem registado um forte e incessante crescimento. Os rápidos progressos tecnológicos permitiram uma redução considerável dos custos dos transportes por via aquática a qual representa um real incentivo para o comércio global e transforma a marinha mercante internacional no motor principal da globalização.

2.1.2

Os navios são, numa perspectiva económica, bens móveis de investimento que não são importados mas registados sob um pavilhão escolhido pelo armador. Assim sendo, este produto não exige esforços de comercialização extensivos nem redes de revenda ou de manutenção. É óbvio que os custos de transporte são igualmente baixos. Com custos de transacção geralmente reduzidos e a inexistência de regras antidumping, o mercado da construção naval é fortemente determinado pelos preços da oferta.

2.1.3

Dado o seu papel crucial no fornecimento dos meios de transporte de que o comércio global necessita, na construção de equipamento moderno para as necessidades de segurança e de defesa e no desenvolvimento de tecnologias avançadas com numerosos efeitos derivados (spin-offs) noutros sectores, a construção naval é uma indústria de grande importância estratégica para a maioria dos países industrializados e dos que se encontram em processo de industrialização.

2.1.4

Na Europa, tem-se desenvolvido uma rede diversificada de empresas de produção de navios, incluindo estaleiros, fabricantes de equipamento marítimo e uma série de prestadores de serviços especializados que proporcionam directamente mais de 350 000 empregos a uma mão-de-obra altamente qualificada. O sector é responsável na UE por um volume de negócios de cerca de 34 mil milhões de euros (1).

2.1.5

A construção naval comercial na UE tem, contudo, perdido importantes quotas de mercado em virtude de práticas comerciais nocivas, principalmente por parte da Coreia do Sul, e enfrenta agora sérias dificuldades. Desde 2000 que a quota de mercado para novas encomendas (em toneladas brutas compensadas– tbc) sofreu uma queda de dois terços, tendo passado de 19 % em 2000 para 6,5 % em 2003 (2). A situação piorou em meados de 2003 com preços que atingiram o nível mais baixo dos últimos treze anos a par de uma nova alta da taxa cambial do euro em relação à divisa de referência no sector – o dólar americano – e em relação às moedas dos principais concorrentes asiáticos. Especialmente no ano transacto o comércio internacional teve um aumento retumbante originado pelo extraordinário crescimento da procura de energia e de matérias-primas por parte da China, bem como pela importação e exportação de bens manufacturados. Esta procura redundou num recorde de novas encomendas no segmento dos navios petroleiros, graneleiros e porta-contentores. Os armadores europeus beneficiaram deste aumento da procura, tendo a entrada de encomendas em 2003 quase duplicado em relação à de 2002. Não obstante isso, a sua quota-parte na construção naval mundial não cessou de diminuir.

2.1.6

Pode-se dizer que esta tendência estabilizou de certo modo até meados de 2003 em diversos Estados-Membros. No entanto, é possível que os últimos desenvolvimentos não prossigam, pelo que a Europa terá de procurar, no futuro próximo, encontrar soluções duradouras para o sector da construção naval. Se tal não acontecer, a Europa corre seriamente o risco de perder este sector vital da tecnologia de ponta. A experiência mostra que as capacidades da construção naval, uma vez perdidas, dificilmente se recuperam.

2.2   Evolução da política de construção naval

2.2.1

Sendo um sector estratégico importante, a construção naval conta tradicionalmente em todo o mundo com a forte intervenção dos governos. Também na Comunidade Europeia, a política de construção naval tem-se concentrado desde os anos setenta na definição das condições dos sistemas de auxílios estatais. O limite autorizado das ajudas ao funcionamento foi decrescendo gradualmente de 28 % do valor do contrato em 1987 até 9 % em 1992 e foi, por fim, totalmente suprimido em 2000.

2.2.2

Por iniciativa dos EUA, foram encetadas em 1989 negociações no contexto da OCDE com o propósito de instaurar uma nova disciplina internacional para todos os tipos de apoio governamental à construção naval. Estas negociações foram concluídas com êxito em 1994 com a assinatura do Acto Final do «Acordo sobre as condições normais de concorrência da indústria da construção e da reparação naval comercial» pelas Comunidades Europeias, a Finlândia, o Japão, a República da Coreia, a Noruega, a Suécia e os Estados Unidos. No entanto, como os Estados Unidos não lograram concluir a ratificação, este Acordo não chegou a entrar em vigor.

2.2.3

Na ausência de um acordo internacional, o Conselho adoptou, em 1998, o Regulamento (CE) n.o 1540/98 sobre novas regras de auxílio à construção naval, prevendo, unilateralmente, a total abolição das ajudas ao funcionamento em finais de 2000. O Regulamento exigia igualmente da Comissão que controlasse com mais rigor o mercado mundial da construção naval e determinasse os casos em que os estaleiros europeus estivessem a ser afectados por práticas anti-concorrenciais.

2.2.4

Logo no seu primeiro relatório de controlo apresentado ao Conselho em 1999, a Comissão forneceu provas inegáveis de práticas comerciais lesivas, especialmente nos estaleiros da Coreia do Sul que operavam com preços inferiores aos custos. Todos os relatórios de controlo (um total de sete até 2003) subsequentes confirmaram as primeiras conclusões com provas cada vez mais convincentes.

2.2.5

Perante factos tão concludentes, o Conselho exprimiu por várias vezes a sua apreensão e decidiu iniciar consultas bilaterais com a Coreia do Sul. Após diversas rondas de conversações, as partes assinaram em Junho de 2000 um acordo na forma de «Acta Aprovada» sobre a situação do mercado mundial da construção naval (Agreed Minutes relating to the World Shipbuilding Market). No entanto, nos encontros ulteriores com os representantes do governo coreano ficou provada a impossibilidade de concretizar os princípios estabelecidos pelo acordo.

2.2.6

Uma vez que as consultas bilaterais com a Coreia foram infrutíferas, a indústria da construção naval apresentou em Outubro de 2000 uma denúncia ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 3286/94 do Conselho) relativo aos entraves ao comércio (REC).

2.2.7

A Comissão continuou a opor-se veementemente à extensão das ajudas ao funcionamento até finais de 2000. Acedeu, todavia, a apresentar o caso à OMC para encontrar uma forma de contrariar as práticas desleais da Coreia se, até 2001, não fosse possível negociar uma solução satisfatória para a UE. A Comissão propôs simultaneamente um mecanismo de apoio temporário com carácter defensivo destinado especificamente a contrariar as práticas desleais da Coreia durante o período necessário para a conclusão do processo da OMC.

2.2.8

Finalmente em 2002, a Comunidade logrou concretizar esta política dúplice requerendo à OMC a criação de um grupo especial e adoptando uma decisão sobre o Mecanismo de Defesa Temporário (Regulamento do Conselho n.o 1177/2002).

2.2.9

Em 2002, houve tentativas, novamente no contexto da OCDE, para a criação de condições equitativas no sector da construção naval, mas desta vez sem a participação dos EUA. O Conselho da OCDE instituiu um Grupo Especial de Negociação incumbido de encontrar uma solução nova e eficaz para o problema. Até à data, os progressos têm sido muito lentos e não se sabe ainda até que ponto é exequível esta abordagem.

3.   Uma nova abordagem

3.1

A título de sinopse, passamos a enunciar por ordem cronológica as várias fases que confluíram na iniciativa LeaderSHIP 2015:

Fevereiro de 2002

O sector europeu de construção e de reparação de navios apresenta ao comissário Liikanen o esboço de uma proposta de iniciativa designada por LeaderSHIP 2015;

Maio de 2002

O presidente da Comissão Europeia Romano Prodi dá o seu aval a esta iniciativa e pede ao comissário Liikanen que coordene o seu acompanhamento;

Outubro de 2002

A indústria entrega um roteiro ao comissário Liikanen;

Janeiro de 2003

O comissário Liikanen preside à reunião inaugural do Grupo Consultivo de Alto Nível LeaderSHIP 2015;

Outubro de 2003

O Grupo Consultivo de Alto Nível envia o seu relatório à Comissão Europeia;

Novembro de 2003

A Comissão Europeia publica a comunicação sobre o LeaderSHIP 2015;

Novembro de 2003

O Conselho «Competitividade» analisa o LeaderSHIP 2015 no contexto da política industrial;

Janeiro de 2004

Entra em vigor o novo quadro comunitário para os auxílios estatais à construção naval, tendo já em conta alguns dos elementos fundamentais do LeaderSHIP 2015 e concretizando assim as primeiras recomendações do Grupo Consultivo de Alto Nível;

3.2   O roteiro da indústria

3.2.1

Enquanto a Comunidade tem focado essencialmente a concorrência e a política comercial, a indústria sentiu que faltava uma terceira pedra angular, mais concretamente, a política da concorrência, e uma sólida coordenação entre as três vertentes políticas. Reconheceu igualmente a sua incapacidade de avançar com uma resposta concertada aos desafios da concorrência.

3.2.2

Com a extinção das ajudas ao funcionamento, a indústria admitiu que os subsídios não representavam um avanço nem o proteccionismo fora capaz de tornar menos competitivas as indústrias da construção naval de países fora da Comunidade Europeia. Urgia desafiar a agressiva política industrial da Coreia do Sul e para tal impunha-se uma perspectiva de novo tipo.

3.2.3

Quando a Associação de Construtores Navais da Comunidade Europeia (CESA) apresentou à Comissão Europeia, na Primavera de 2002, um primeiro esboço da sua proposta no âmbito da iniciativa LeaderSHIP 2015, foi imediatamente reconhecido o valor do projecto como reacção específica do sector à estratégia a longo prazo da UE definida pelo Conselho de Lisboa. Esta iniciativa focava com efeito os principais elementos da estratégia de Lisboa.

3.2.4

Havia que conceber uma estratégia global, com base nos elementos da abordagem anterior mas com uma nova componente, sendo ela o convite da Comissão à indústria para a elaboração de um plano integrado. Em Outubro de 2002, a CESA apresentou o LeaderSHIP 2015, um roteiro para o futuro da indústria europeia da construção e reparação de navios.

3.2.5

O objectivo dos construtores navais europeus é melhorar a liderança em segmentos seleccionados do mercado, reforçando a sua competitividade através da inovação e de I&D selectivos, da focagem sobre o cliente, da optimização da produção e da promoção das estruturas industriais. Na opinião da indústria, a UE deveria participar directamente na realização de certos objectivos, como o desenvolvimento de sistemas avançados de financiamento e garantia, a definição de padrões ambientais e de segurança mais elevados para as encomendas de navios de qualidade elevada, bem como a salvaguarda e o aumento da protecção dos direitos de propriedade intelectual na Europa.

3.2.6

Uma abordagem europeia da defesa naval implica uma política comum de aquisição de material de defesa.

3.2.7

As macrotendências neste sector a partir de 2015 exigem, em particular, o desenvolvimento dos transportes multimodais, das vias de navegação interna e do transporte marítimo de curta distância, bem como o reforço da inovação e da I&D, do alargamento da UE, da regulamentação em matéria de ambiente e de saúde e mais progressos na Política Comum de Defesa. Face ao impacto das políticas nacionais e comunitárias em todos estes domínios, na opinião da indústria a Comissão deveria procurar desenvolver ideias para políticas futuras.

3.2.8

O próprio sector da construção naval aceita a grande responsabilidade de se organizar internamente. Para o efeito, o roteiro preconiza novos tipos de navios e novas gerações de equipamento marítimo, combinando eficiência, segurança, conforto, ambiente e especialização.

3.2.9

No que toca à indústria, estão previstas duas vertentes complementares que pressupõem o envolvimento das empresas:

reestruturação da indústria até haver um número restrito de empresas de grandes dimensões;

rede de pequenas empresas muito flexíveis para responder às necessidades dos nichos de mercado de menores dimensões.

3.3   O Grupo Consultivo de Alto Nível

3.3.1

No início de 2003, um Grupo Consultivo de Alto Nível, presidido pelo comissário Liikanen, iniciou um ciclo de debates sobre o LeaderSHIP 2015 com base no roteiro estabelecido pela CESA. Dele faziam parte sete comissários europeus, dois proeminentes deputados do Parlamento Europeu, os CEO (directores-executivos) dos dez principais estaleiros, o presidente da associação da indústria de equipamento marítimo e o secretário-geral da Federação Europeia dos Sindicatos dos Metalúrgicos.

3.3.2

O Grupo Consultivo de Alto Nível publicou o seu relatório LeaderSHIP 2015 em Outubro de 2003 (3). Este engloba oito capítulos que reflectem os temas abrangidos pelo roteiro da indústria e ainda um capítulo final sobre a necessidade de consolidação da indústria naval europeia. A conclusão global do Grupo é que o LeaderSHIP poderá ser um bom exemplo para uma política industrial europeia sectorial eficaz.

3.3.3

Nestes oito capítulos, o Grupo define os objectivos a alcançar pelo sector da construção naval e pela União Europeia propriamente dita. Em primeiro lugar, propõe o estabelecimento de condições de concorrência equitativas a nível mundial na construção naval mediante a aplicação integral da regulamentação da OMC e de medidas disciplinares da OCDE.

3.3.4

No atinente à questão central da I&D e da inovação, é imprescindível uma cooperação estreita entre a UE e o sector da construção naval. A regulamentação comunitária relevante não tinha inteiramente em conta as necessidades específicas da construção naval e da sua tecnologia.

3.3.5

O mesmo se aplica a sistemas avançados de financiamento e garantia. Os instrumentos existentes não são competitivos no mercado mundial. A possibilidade de estabelecer um fundo de garantia na UE para o financiamento pré- e pós-entrega deveria ser explorada, bem como uma cooperação mais intensa com as companhias de seguros de crédito à exportação, cobertas por resseguros adequados.

3.3.6

A protecção do ambiente marinho é racionalizada pela Agência Europeia de Segurança Marítima. Haverá que instituir um comité conjunto de peritos representando os intervenientes mais importantes do sector marítimo com conhecimentos técnicos para assessorar quer a Agência, quer a Comissão. Por outro lado, é imperativo aperfeiçoar ainda mais a avaliação da qualidade e melhorar a segurança e o controlo nos sectores de construção e de reparação naval, pois é esta a única forma de garantir a aplicação em todo o mundo de padrões de qualidade adequados.

3.3.7

O apelo da indústria a uma maior cooperação no sector da defesa poderá, no entender do Grupo, ser secundado no plano comunitário pela promoção da cooperação industrial entre estaleiros e entre estes e os seus fornecedores, pela melhoria do acesso aos mercados de exportação e pela consolidação da indústria. Haverá que definir, além disso, por intermédio da futura Agência Europeia de Defesa, os requisitos operacionais comuns para as marinhas de guerra nacionais, bem como regras comuns para o equipamento de defesa.

3.3.8

Uma vez que os construtores navais dependem essencialmente da sua liderança tecnológica, convém explorar plenamente os instrumentos existentes de protecção dos direitos de propriedade intelectual. É imperioso promover as bases de dados de conhecimentos e reforçar as regras internacionais de protecção das patentes.

3.3.9

O sector da construção naval criou oficialmente um comité sectorial para o diálogo social (o primeiro do género no sector da indústria metalúrgica) em que são analisados programas para responder às novas necessidades de formação.

3.3.10

Para alcançar os resultados almejados, é imprescindível optimizar a estrutura industrial. Um processo de desenvolvimento dinâmico está a redundar em novas relações e em parcerias em torno de projectos em que participam os estaleiros navais e os seus fornecedores, os quais são, actualmente, responsáveis por 70 a 80 % da produção de um estaleiro naval. Importa favorecer o processo de consolidação com incentivos especiais, com base no conceito de «ajuda à consolidação».

3.4   A comunicação da Comissão

3.4.1

Com a sua comunicação sobre o LeaderSHIP 2015 (4), a Comissão plasmou os resultados dos trabalhos do Grupo Consultivo de Alto Nível numa política comunitária formal. Volta a realçar aqui que uma política horizontal tem de ser completada com abordagens sectoriais específicas. A Comissão tece considerações sobre cada um dos capítulos e dá o seu aval às recomendações do relatório do Grupo Consultivo LeaderSHIP 2015.

3.4.2

Nesta comunicação, em que é reconhecida a dimensão estratégica da construção e da reparação naval, a Comissão confirma em sintonia com o relatório LeaderSHIP a sua responsabilidade e co-responsabilidade nos seguintes domínios abrangidos pelos oito capítulos do relatório do Grupo Consultivo:

o acordo da OCDE sobre créditos à exportação para navios e outros acordos da OCDE, bem como a promoção de condições equitativas ao nível mundial, por intermédio da OMC;

a Comissão adoptou regras sobre auxílios à inovação e acompanhará de perto os efeitos das actuais condições para a investigação e desenvolvimento do sector com financiamento comunitário;

ombro a ombro com a indústria, a Comissão aproveitará as possibilidades oferecidas por um fundo de garantia para o financiamento pré– e pós-entrega, em cooperação com o Banco Europeu de Investimento;

a Comissão apoia inteiramente as recomendações do Grupo Consultivo LeaderSHIP sobre promoção de navios mais seguros e ecológicos e sobre as políticas destinadas a explorar as possibilidades de transporte marítimo a curta distância em toda a Europa;

no atinente à construção naval, a Comissão comunga com as recomendações que estão em conformidade com a abordagem desenvolvida na sua comunicação sobre defesa de Março de 2003, relacionada com os preparativos para a criação de uma Agência Europeia de Defesa em 2004 com o propósito de reforçar a defesa europeia, a base tecnológica e a competitividade do sector. Neste contexto, é válido notar que os estaleiros privados trazem à luz as diferenças estruturais entre os produtores europeus, por reclamarem «que a propriedade privada é uma premissa para se ter êxito em qualquer esforço de consolidação» (5);

a Comissão cooperará com a indústria na exploração dos instrumentos existentes com vista à protecção dos direitos de propriedade intelectual, bem como na criação de bases de dados de conhecimentos pertinentes;

a Comissão colaborará com a indústria através de um diálogo social intenso incidindo nas novas exigências de formação, no intercâmbio de pessoal, a todos os níveis, em cursos de formação especiais e na promoção de uma indústria de construção naval dinâmica e sustentável;

como a construção naval comercial e a reparação naval carecem de um processo de consolidação, cuja responsabilidade cabe em primeira instância ao próprio sector e aos Estados-Membros, a Comissão está disposta a facilitar esse mesmo processo no respeito das regras de concorrência.

3.5   As conclusões do Conselho de Novembro de 2003

3.5.1

Em 27 de Novembro de 2003, o Conselho «Competitividade» debateu a comunicação da Comissão sobre o LeaderSHIP 2015 no contexto mais lato da política industrial (6). O Conselho reconheceu a importância da análise sectorial para afinar as políticas horizontais e convidou os Estados-Membros e a Comissão a reforçar a competitividade industrial, nomeadamente, com a preocupação de ter em conta as necessidades e as especificidades de cada um dos sectores.

3.5.2

O Conselho dedicou atenção especial aos sectores da construção naval, da indústria aeroespecial e ao sector dos têxteis e vestuário.

3.5.3

Os pontos de vista do Conselho inspiram-se no imperativo de uma abordagem totalmente integrada tendo em vista o aumento da competitividade, o que se aplica igualmente ao LeaderSHIP 2015.

3.5.4

Os objectivos da estratégia de Lisboa exigem análises sectoriais, a melhoria das condições regulamentares e uma consulta aberta e transparente de todos os intervenientes incluindo o diálogo social. O Conselho adverte para a necessidade de dar continuidade às iniciativas neste contexto.

3.5.5

No atinente ao LeaderSHIP 2015, o Conselho recomenda que a indústria e a administração pública multipliquem esforços nos seguintes domínios:

a regulamentação comunitária em matéria de auxílios estatais, ao investimento e à inovação;

incentivos à investigação, ao desenvolvimento e à inovação;

protecção dos direitos de propriedade intelectual pelos Estados-Membros e a indústria;

encorajar o agrupamento dos produtores europeus;

cooperação entre os recursos militares e civis da construção naval europeia;

procurar responder às novas necessidades de formação no contexto de um diálogo social dentro do sector.

3.5.6

O Conselho pede para ser informado regularmente sobre os resultados da iniciativa LeaderSHIP 2015 e sobre a aplicação das suas recomendações.

4.   Observações na generalidade

4.1

O CESE concorda que a Europa carece de uma indústria de construção naval viável e que é imprescindível prever políticas para os sectores específicos.

4.2

Convém sublinhar que a indústria definiu um programa coerente por um período que vai até 2015. Este modelo sectorial funda-se acertadamente nas regras comunitárias no atinente à conformidade com o mercado e à concorrência.

4.3

Também é digno de nota o facto de a própria indústria e sete comissários terem apresentado um plano comum para o futuro: LeaderSHIP 2015. Este empenhamento recíproco culminou na aprovação do LeaderSHIP pela Comissão.

4.4

O CESE louva a nova abordagem do Conselho «Competitividade» no que toca à política industrial horizontal e sectorial. O LeaderSHIP é um exemplo elucidativo de como uma política industrial nestes termos é capaz de sintonizar as exigências sectoriais com as abordagens horizontais.

4.5

O CESE saúda as recomendações específicas do Conselho no atinente aos sectores de construção e de reparação naval. Estas recomendações têm muitos pontos em comum com as recomendações da Comissão e do próprio sector no LeaderSHIP 2015.

4.6

O CESE congratula-se com esta mudança de perspectiva da política de construção naval que é fruto, por um lado, de um novo método de trabalho e, por outro, de uma nova abordagem da política industrial ao nível sectorial. Tal poderia servir de modelo para iniciativas análogas noutros sectores.

4.7

Mais concretamente, o CESE entende que, para criar uma base sã para uma indústria de construção e de reparação naval sustentável, se deve optar por visões e princípios partilhados e práticas concertadas na UE, em vez de obstinar-se nas políticas nacionais.

4.8

O alargamento da União Europeia oferece oportunidades que podem transformar-se num valioso trunfo susceptível de garantir uma presença europeia nos segmentos de mercado que deixaram de ser servidos pelos estaleiros da UE (7). Mas também aqui é preciso respeitar as regras comunitárias em vigor.

4.9

O LeaderSHIP 2015 apenas terá êxito se todos os parceiros participantes (parceiros industriais, a Comissão e, em certos casos, os Estados-Membros) actuarem simultaneamente em todos os capítulos, cada actor nas áreas de que é responsável.

5.   Conclusões e recomendações

5.1

A credibilidade da política proposta depende da sua boa execução. O acompanhamento é crucial desde que permeado de transparência e devidamente supervisionado. Importa, além disso, garantir a participação, a transparência e o seguimento adequado do processo. À semelhança do Conselho, o CESE está convicto da utilidade da apresentação pela Comissão ao Conselho «Competitividade» de um relatório anual de progressos.

5.2

O LeaderSHIP 2015 coloca em primeiro plano o objectivo de criar condições de concorrência equitativas ao nível mundial. Esta área política é para o CESE a pedra angular de toda a estratégia. O CESE apoia incondicionalmente a actual política comercial da UE cujo desígnio é a conclusão de um acordo internacional eficaz que garanta uma disciplina severa em todo o mundo.

5.3

O CESE considera que o impacto da concorrência desleal dos estaleiros asiáticos não só constitui uma grave ameaça para os estaleiros europeus como deveria ser igualmente um alerta para a indústria europeia de equipamento marítimo. Deve levar-se a sério o facto de alguns dos países que lideram a construção naval na Ásia terem anunciado que, para suprirem as suas necessidades, iriam recorrer essencialmente aos fornecedores locais.

5.4

No contexto da igualdade de condições, não se menciona especificamente a vertente da disciplina do sector dentro da UE, embora se saiba que persistem ainda diferenças de níveis e métodos de auxílio estatal dos Estados-Membros à construção naval. A prática de condições de concorrência equitativas no plano interno bem como a transparência e o seu controlo são motivo de preocupação especial. Para promover a credibilidade do processo e estimular a confiança de acordo com as regras e objectivos, o CESE considera fundamental que a Comissão siga de perto a aplicação das regras em matéria de auxílios estatais e, eventualmente as possíveis práticas desleais.

5.5

A I&D e a inovação são de importância vital, porque a Europa continua a ser no mundo a fonte das ideias inspiradoras da construção naval. Este é, pois, mais um elemento fundamental para assegurar o êxito. É, assim, importante, o apoio eficaz e a aplicação de modo prático dos vários instrumentos. A indústria pode dar uma ajuda valiosa aos decisores políticos através de conselhos concretos. Seja como for, a aplicação de instrumentos de inovação terá de ser transparente.

5.6

O CESE tem para si que, para racionalizar os instrumentos do financiamento dos navios quer ao nível nacional quer comunitário, o fundo europeu de garantia sugerido no Leader SHIP deverá ser activado o mais rapidamente possível. A sua aplicação deverá, por conseguinte, ser uma prioridade para a Comissão. Graças a este fundo, será possível criar condições equitativas reais dentro da própria União Europeia.

5.7

O CESE acolhe favoravelmente o acordo entre a indústria e a Comissão sobre o tipo de exigências e políticas ambientais requeridas para este sector. A UE deveria continuar a liderar a protecção do ambiente marinho e a providenciar pela aplicação estrita das normas internacionais relevantes. Uma abordagem europeia coordenada em torno da Organização Marítima Internacional (OMI) poderia garantir um nível de eficácia satisfatório para secundar a sua autoridade de ser a única organização a estabelecer regras ao nível mundial.

5.8

É verdade que, nos últimos anos, tem havido progressos consideráveis na legislação sobre a navegação segura. Tal não significa que não se tenha de prestar ainda mais atenção à elaboração de padrões adequados para a manutenção dos navios, conforme sugere o LeaderSHIP.

5.9

No âmbito da segurança do transporte marítimo, a UE ainda continua a ter problemas para impor as disposições em vigor. O CESE defende, por isso, com veemência uma cooperação eficaz entre as guardas costeiras da Europa.

5.10

O reforço do transporte marítimo de curta distância e o propósito de deslocar o tráfego de mercadorias da estrada para o mar são também objectivos dignos de aplauso. Mas para alcançá-los, haverá que continuar a desenvolver infra-estruturas modernas, tanto ao nível dos navios como dos portos. Quanto ao seu financiamento, as instâncias públicas devem zelar por que os investimentos realizados revertam a favor dos produtores da UE.

5.11

Sendo o factor humano um elemento fundamental, o CESE saúda a intenção de intensificar o diálogo sectorial em que a Comissão, empregadores e sindicatos têm um papel específico a desempenhar. É de assinalar o facto de ter sido na construção naval que foi estabelecido o primeiro Comité de Diálogo Social Sectorial de todos os sectores da indústria metalúrgica. Mais um sinal da atitude inovadora do sector.

5.12

O diálogo social já está a dar contribuições muito úteis num vasto leque de temas sociais, como por exemplo a formação, o recrutamento, a aprendizagem ao longo da vida e a adaptação às ondas cíclicas da economia. Até à data foram criados dois grupos de trabalho, um incumbido de promover a imagem da indústria e o outro de identificar novas necessidades ao nível das competências no sector da construção naval.

5.13

O diálogo social deveria focar também as diferenças consideráveis na produtividade do trabalho à escala mundial.

5.14

O CESE apraz-se em registar que na Europa se esteja a optar cada vez mais pela abordagem favorável dos segmentos específicos da indústria transformadora, tais como a construção naval e a aeronáutica, em relação aos objectivos de defesa, com uma interacção entre a indústria civil e a militar.

5.15

Sobre este pano de fundo, é de louvar o facto de o LeaderSHIP dar ênfase aos projectos marítimos europeus e à colaboração dos estaleiros navais. Até à data, estes têm deparado com obstáculos relacionados com considerações de segurança e tradições divergentes. Mas enquanto os europeus não decidirem cooperar mais estreitamente entre si, os custos não cessarão de crescer e serão cada vez mais comprometidos os avanços na inovação e na tecnologia.

5.16

Já existem projectos de cooperação bem sucedidos, por exemplo, entre a Alemanha e os Países Baixos, na construção de fragatas, e entre a França e a Grã-Bretanha nos navios de transporte (carriers). É possível programar outros projectos em colaboração com a futura Agência Europeia para Aquisição de Armamento. É fundamental criar sinergias entre os estaleiros através da preservação e do reforço dos conhecimentos e da perícia. Seria oportuno solicitar a esta Agência um inventário das capacidades disponíveis, da tecnologia e da inovação nos estaleiros da marinha, para que em cada nova aquisição se possa almejar a melhor relação possível entre qualidade e preço. Tendo em conta o facto de serem os governos os clientes dos estaleiros navais, dever-se-ia evitar a transferência de subsídios entre os sectores de produção de navios mercantes e militares.

5.17

A consolidação da indústria é considerada uma pedra angular na futura viabilidade do sector. Falta saber como este processo se realizará, dada a relação um tanto complexa entre as empresas de base e a elevada percentagem de fornecedores.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Dados retirados do estudo sobre o Impacto Económico das Indústrias Marítimas na Europa encomendado pela comissão Europeia à Policy Research Corporation N.V. & ISL.

(2)  Fonte: Lloyds Register.

(3)  «LeaderSHIP 2015 – Definir o futuro da indústria europeia da construção e reparação de navios», publicado pela Comissão Europeia, Bruxelas 2003.

(4)  COM(2003) 717 final

(5)  COM(2003) 717 final, pág. 16, segunda linha.

(6)  Conclusão do Conselho de 27 de Novembro de 2003 sobre o contributo da política industrial para a competitividade europeia — Bruxelas, 24 de Novembro de 2003 (15472/03).

(7)  Tais como, por exemplo, grandes petroleiros e cargueiros que requerem qualificações tecnológicas menos elevadas e em cujos custos a componente laboral representa uma parte relativamente importante.


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/8


Parecer da Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Decisão 2000/819/CE relativa a um programa plurianual para a empresa e o espírito empresarial, em especial para as pequenas e médias empresas (PME)» (2001-2005)

COM(2003) 758 final — 2003/0292 (COD)

(2004/C 302/02)

Em 23 de Dezembro de 2003, o Conselho, em conformidade com o artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

A Secção Especializada de Relações Externas, incumbida de preparar os correspondentes trabalhos do Comité, emitiu parecer em 9 de Junho de 2004, de que foi relator D. DIMITRIADIS.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o seguinte parecer por 140 votos a favor, 1 voto contra e 4 abstenções.

1.   Preâmbulo

1.1

Antes e depois da definição dos objectivos de Lisboa, a União Europeia debatia-se, e debate-se ainda, com sérios problemas: a) de competitividade e modernização das empresas europeias, designadamente PME; b) de ineficiência e de excesso de burocracia das administrações públicas ao promoverem o espírito empresarial; c) de insuficiência de coordenação entre as organizações representativas de PME, os poderes públicos e a Comissão na promoção do espírito empresarial, d) de falta de coordenação das políticas nacionais no apoio às PME, e) de ausência, nos Estados-Membros, de uma estratégia a longo prazo para as PME, f) de apoio financeiro às empresas (designadamente PME) pelo sector bancário e pelas sociedades de capital de risco g) de custo elevado dos empréstimos em razão da pequenez das PME e do risco acrescido e h) a inexistência de uma política permanente para as PME.

1.2

Embora do ponto de vista normativo e legislativo se tenha completado o mercado único, a UE reconhece que o actual sistema e as suas vantagens potenciais não foram totalmente aceites e aproveitados pelas PME, nem por estas plenamente utilizado esse potencial.

1.3

A UE está a travar um duro combate contra a concorrência internacional, contra a considerável influência económica e política dos Estados Unidos (1) que conseguiu um alto grau de competitividade e produtividade, e contra o Japão, os países do Sueste Asiático (2) e as economias emergentes, como a China, a Índia e o Brasil.

1.4

O desemprego é o maior problema económico e social enfrentado pela UE e tornou a criação de empregos, designadamente nas PME, que constituem a maioria esmagadora das empresas europeias, em objectivos prioritários.

1.5

A UE envida esforços consideráveis no sentido de reforçar a investigação e a tecnologia, pois sabe que as melhorias nestes domínios constituem a única garantia de desenvolvimento e de progresso; no entanto, a estratégia proposta nem sempre traz os resultados esperados, por falta de flexibilidade dos mecanismos e dos quadros jurídicos, que reforçam a burocracia, diminuem a eficácia e ocasionam atrasos indesejáveis.

1.6

Para fazer face ao acima mencionado, o Conselho de Amesterdão (Julho de 1997) e a cimeira consagrada ao emprego (Novembro de 1997, no Luxemburgo) lançaram os alicerces da iniciativa a favor do desenvolvimento e do emprego. Por outro lado, com as decisões 98/347/CE (3) e 2000/819/CE (4), o Conselho de Ministros lançou os fundamentos de um apoio organizado e contínuo ao espírito empresarial europeu, juntamente com a criação de mais empregos por intermédio de programas específicos.

2.   Introdução

2.1   Objectivos

Os objectivos do programa são, por um lado, promover a criação de empregos, e, por outro lado, constituir e desenvolver pequenas e médias empresas inovadoras, tais como as definidas na Recomendação 96/280/CE da Comissão, reforçando os recursos financeiros disponíveis e, com isso, aumentando o investimento nas PME.

2.1.1

A justificação para o apoio às PME é ter sido demonstrado que criam mais facilmente novos empregos, dada a adaptabilidade que mostram ter à mudança das condições do mercado, a facilidade da tomada de decisões e a aplicação rápida destas no interior da empresa. Além disso, são, muitas vezes, as PME que encontram a maior parte dos problemas quando da sua criação em razão dos processos burocráticos e da falta de recursos financeiros, quando tentam promover projectos inovadores, dada a ausência de possibilidades de acesso aos financiamentos bancários e, nos novos Estados-Membros, a inexistência de um sistema bancário que possa conceder créditos semelhantes, ou quando desenvolvem parcerias internacionais.

2.2   Descrição — Âmbito do programa

O programa comporta três mecanismos: a) um mecanismo de capital de risco para as empresas (ajudas ao arranque do MET (5)), aplicado pelo Fundo Europeu de Investimento (FEI), b) um mecanismo de apoio financeiro para promover a criação de «joint ventures» internacionais entre PME da União Europeia (Joint European Venture – JEV), aplicado pela Comissão e c) um mecanismo de garantias (mecanismo de garantias em favor das PME) aplicado pelo FEI.

2.2.1

O orçamento do programa eleva-se a 423,56 milhões de euros, dos quais 168 milhões para o mecanismo de ajuda ao arranque — MET, 57 milhões para o JEV e 198, 56 milhões para o mecanismo de garantia em favor das PME. Dada a ampla utilização do mecanismo de garantia em favor das PME, um montante de 30,56 milhões de euros foi transferido do JEV para o mecanismo de garantia em favor das PME. Até 29 de Maio de 2002, data de expiração do prazo de atribuição de fundos, o orçamento inicial previsto para o mecanismo de ajudas ao arranque do MET e para o mecanismo de garantia em favor das PME tinha sido totalmente cativado por autorizações pelo FEI. No mecanismo das JEV, estava disponível a verba de 14,5 milhões de euros para a realização de diversos projectos.

2.2.2

O mecanismo de capitais de risco (ajuda ao arranque do MET) apoia o investimento de capitais de risco nas PME, designadamente durante a constituição e arranque e nas primeiras fases de desenvolvimento e ou nas PME inovadoras, mediante investimentos nas sociedades especializadas de capitais de risco.

2.2.2.1

No quadro da JEV, a União Europeia contribui financeiramente para as PME criarem novas «joint ventures» transnacionais no interior da UE.

2.2.2.2

No âmbito do mecanismo de garantia em favor das PME, a UE proporciona financiamento para cobrir os custos das garantias e das contra garantias que o FEI oferece para a promoção do aumento de empréstimos concedidos às PME inovadoras. O objectivo é alcançado com o aumento da capacidade dos mecanismos de garantia que funcionam nos Estados-Membros e diz respeito a programa novos como a existentes. O mecanismo cobre uma parte das perdas originadas pelas garantias até um montante pré-determinado e dá uma atenção particular ao financiamento dos activos imateriais das PME.

3.   Resultados do programa

3.1

Segundo o relatório da Comissão, cerca de 206 PME do sector das altas tecnologias (Biotecnologia / Ciências da Vida e Tecnologia da Informação) que obtiveram resultados extremamente positivos no domínio da criação de novos empregos, utilizaram, até Junho de 2002 (6), o mecanismo de ajuda ao arranque do FEI; por outro lado, 112 000 empresas mais pequenas, cujo número de empregos aumentou em mais de 30 %, utilizaram o mecanismo de garantias em favor das PME. Muito poucas propostas foram apoiadas pelo mecanismo da JEV (apenas 137 propostas foram aceites).

4.   Observações

4.1

O relatório da Comissão (7) apoiou-se, para os três programas, numa amostra muita pequena de empresas, de modo que as conclusões comportam uma probabilidade elevada de erros estatísticos, mas também factuais.

4.2

Entre 1998 (ano de lançamento) e 2002 (ano de avaliação) cerca de 206 PME utilizaram o mecanismo de ajuda ao arranque MET. O Comité considera que este número é reduzido, comparado com os resultados de iniciativas equivalentes nos Estados Unidos, onde se assistiu a uma explosão do número de empresas criadas e a um espírito empresarial muito florescente, mediante mecanismos equivalentes que se apoiaram no capital de alto risco. O mecanismo JEV permitiu criar apenas 31 «joint ventures» internacionais e 252 novos empregos, resultado que não correspondem ao pretendido nem às previsões. Os resultados do mecanismo de garantia em favor das PME foram considerados positivos.

4.3

As previsões do relatório relativas à criação de emprego nas empresas que beneficiam de ajuda, apoiam-se em elementos mais antigos (2001 — meados de 2002) e não podem ser suficientemente adequados para os três mecanismos.

4.4

O CESE não possui elementos definitivos, concretos e completos sobre criação de novos empregos (1998-2003). Por consequência, a avaliação e a apresentação de posições e conclusões tornam-se muito difíceis. Apesar disso, o CESE sublinha, uma vez mais, o especial interesse que consagra ao esforço envidado na criação de empregos e convida a Comissão a continuar a fazer dela uma prioridade essencial após a revisão do programa plurianual.

4.5

O investimento de alto risco constitui condição prévia essencial da promoção de ideias inovadoras, que serão transformadas em projectos empresariais e terão como resultado iniciativas coroadas de êxito. O sucesso espantoso de determinados projectos deste género compensa os insucessos de outras tentativas inovadoras que não foram aceites pelo mercado.

4.6

O programa ignora totalmente a economia tradicional. A referência constante a acções inovadoras exclui a possibilidade de as pequenas e médias empresas tradicionais terem acesso ao financiamento. A inovação é um instrumento muito importante para a modernização da economia e o reforço da sua competitividade. Dever-se-á, no entanto, observar que: a) as empresas europeias correm o risco de perder definitivamente partes de mercado, no mercado europeu, por causa das importações de produtos de baixo preço da economia tradicional de países terceiros; b) a ausência de apoio às pequenas e médias empresas tradicionais pode levar à criação de oligopólios no domínio da distribuição e do comércio, com reacções em cadeia em todo o processo de produção, o que levará a uma perda global de emprego.

4.7.

Reduzir as formalidades burocráticas, criando balcões únicos para pôr em execução os processos e suprimir os formulários supérfluos graças à utilização da tecnologia moderna constituem condições prévias essenciais para as PME participarem nos programas em questão.

5.   Conclusões

5.1

O CESE aprova as alterações da Decisão 2000/819/CE propostas pela Comissão.

5.2

O CESE concorda com a Comissão quando considera que o impacto global dos três instrumentos de financiamento poderá ser medido apenas após um lapso de tempo razoavelmente longo. No entanto, entende que, por um lado, passou tempo suficiente entre o lançamento e a avaliação para se poder tirar conclusões que levem a ajustamentos e que, por outro lado, no contexto actual da mundialização da economia, marcada por uma feroz concorrência, não se pode ficar à espera, pois as tendências e as perspectivas mudam constantemente.

5.3

O Comité reconhece que durante os anos de 2001 e 2002, o ambiente internacional foi desfavorável e houve uma baixa da oferta de capitais de risco na UE, assim como relutância dos grandes bancos em conceder empréstimos às PME. Em 2002, a procura de garantias aumentou consideravelmente na Europa, pois os bancos começaram a exigir mais segurança, uma vez que consideravam que os riscos e os custos da gestão eram elevados. Atento o exposto, o Comité considera ainda mais útil a existências destes mecanismos, designadamente do mecanismo de garantias e do mecanismo de ajuda ao arranque. O Comité propõe também o reforço da cooperação com os pequenos bancos especializados, dotados de mecanismos de comunicação flexíveis e cujo objectivo essencial é prestar serviço às PME.

5.4

O Comité apoia os esforços dos três subprogramas e tem-nos por necessários. Considera, no entanto, que o processo que as PME devem seguir para integrar esses programas é difícil, burocrático e rígido e que as PME têm muitas vezes sérios problemas de informação e de organização interna.

5.5

O Comité considera que o mecanismo de garantia PME é especialmente útil e solicita que se aumente o financiamento e que se envidem todos os esforços para englobar directamente os países que ainda não foram abrangidos (Grécia, Irlanda, Luxemburgo).

5.6

O Comité apoia o reforço do mecanismo de garantia tendo em vista a entrada dos novos Estados-Membros que contam milhares de PME sem acesso a empréstimos bancários e, consequentemente, não podem proceder a investimentos produtivos nem criar novos empregos.

5.7

O Comité estima necessário rever o orçamento do programa a fim de cobrir as necessidades dos novos Estados-Membros. O orçamento actualmente disponível diz respeito a 15 Estados-Membros (tantos quantos engloba) e não aos 10 novos Estados-Membros que serão os que mais necessidade terão.

5.8

O Comité convida a Comissão a tomar as medidas necessárias para reforçar mais o mecanismo de ajuda ao arranque, pois constitui um instrumento necessário ao desenvolvimento de PME inovadoras e ao reforço de projectos empresariais de alto risco que são necessários para o desenvolvimento da investigação e da tecnologia, mas também outros projectos de investimento de PME que não fazem parte do domínio da alta tecnologia, mas apresentam grande interesse empresarial e devem ter acesso a todas as formas de financiamento e a todos os instrumentos. Por consequência, propõe:

a)

dar caução a qualquer forma jurídica de empresa, independentemente do objecto da sua actividade;

b)

reforçar o financiamento de todas as formas de empresas, na base do MET;

c)

reforçar quantitativamente o apoio às iniciativas inovadoras de alto risco;

d)

aumentar gradualmente as ajudas em capital de arranque (MET), com base nos postos de trabalho ou no aumento do emprego e da inovação;

e)

fazer participar o sistema bancário na difusão da informação e no apoio aos programas de financiamento e de garantias;

f)

examinar a possibilidade de negociar as taxas de juros das empresas caucionadas, num acordo central entre o mecanismo de caução e os bancos;

g)

examinar a possibilidade de reforçar as iniciativas nacionais mediante o mecanismo de caução.

5.9

O Comité considera que os capitais, públicos ou privados, à disposição da UE no domínio da investigação e da tecnologia são insuficientes e não podem cobrir as necessidades acrescidas das PME em matéria de informação, de novas tecnologias e de biotecnologia. O CESE solicita que se encontrem mais fundos a fim de cobrir estas necessidades.

5.10

Dever-se-á estudar, avaliar e utilizar, quando necessário, os mecanismos rápidos e flexíveis existentes, que produzem excelentes resultados, nos Estados Unidos, e permitir maior cooperação com os balcões especializados de capitais de risco nos casos em que houver interesse para o investimento (8). O CESE convida a Comissão a desempenhar um papel de primeiro plano neste domínio.

5.11

O Comité considera que se devem envidar mais esforços para informar as PME sobre a existência e o funcionamento do mecanismo de garantia, mas também para encontrar melhores modos de acesso e de comunicação com o BEI e o FEI. Sobressai do inquérito realizado que a maior parte das PME ignoram que a UE desenvolve uma acção metódica para as apoiar. Por esta razão, é necessário misturar os actores das empresas (câmaras de comércio, associações comerciais, organizações de PME, etc.) para uma melhor difusão da informação, uma comunicação mais directa e mais eficaz com as PME e uma resolução mais prática e rápida dos problemas que se apresentam na aplicação do programa.

5.12

O Comité considera que, em breve, a partir da adesão dos novos países, será necessário proceder a uma avaliação especial dos instrumentos do programa, uma vez que apesar do inventário dos problemas existentes actualmente nos países aderentes, sem dúvida alguma a situação é menos lisonjeira que a que foi descrita, serão necessários encorajamentos consideráveis que não se podem avaliar agora, e haverá um período de adaptação que ocasionará riscos sérios para as PME locais.

5.13

O CESE aprova a proposta da Comissão de suprimir gradualmente, mas o mais depressa possível, a JEV, dadas as críticas à sua estrutura actual. O CESE não pode, porém, deixar de salientar que continua favorável às «joint ventures» de carácter internacional, pois considera que a UE evidencia um atraso considerável em matéria de cooperação e iniciativas empresariais de carácter transnacional e que é necessário suprimir as fronteiras para as empresas, na Europa.

5.14

Convirá, também, examinar o relançamento do mecanismo JEV ou outro semelhante, com a condição de que existam as condições, após o alargamento, e criar parcerias internacionais no interior da UE e do EEE. Será necessária uma política que apoie as cooperações internacionais entre as PME a fim de permitir a realização deste objectivo e que desapareça o peso burocrático extremo que afligia o programa JEV e constituiu uma das razões do seu insucesso.

5.15

O CESE considera que, após a experiência adquirida com o 6.o programa-quadro de investigação e desenvolvimento tecnológico, se deverão reactivar pequenos programas para as PME, programas que hoje estão ausentes da filosofia do programa plurianual.

5.16

O CESE reconhece que a realização de programas de fraco financiamento leva a um custe elevado de gestão e que, por esta razão, se tenta reduzir substancialmente o seu número. O CESE observa, no entanto, que a limitação do número destes programas se faz em detrimento das PME, que não podem participar neles e que não têm a possibilidade de participar em programas de financiamento elevado. Por todas estas razões, o CESE aprova a posição do Parlamento Europeu e convida a Comissão a estar particularmente atenta à redução ou supressão dos programas que correspondem às necessidades essenciais das PME. Por esta razão, o CESE considera necessário que a Comissão coopere com os representantes das empresas.

5.17

O CESE considera a Carta Europeia das Pequenas Empresas, adoptada pelo Conselho Europeu da Feira (19 de Junho de 2002), uma iniciativa especialmente importante, e tomou posição sobre o assunto por várias vezes, no passado, por intermédio de pareceres. Considera necessário recordar a necessidade de aplicar a Carta na prática, com base em disposições claras.

5.18

O CESE aprova os objectivos de financiamento fixados no Anexo I (descrição dos domínios de acção), no que diz respeito aos mecanismos de garantia em favor das PME (número 1.4. a, ii), mas considera que é possível alargar estes objectivos mediante um diálogo sério e contínuo com os representantes das PME (sistemas de qualidade, estudos ambientais, estudos de qualidade, ajuda técnica e tecnológica, transferência de saber-fazer, etc.).

5.19

O CESE considera que a UE deve envidar esforços mais intensos e mais determinados para reforçar as PME inovadoras, reduzindo, nos programas, os processos burocráticos (documentos inúteis, progressão dos processos a acelerar) que têm repercussões negativas e ocasionam atrasos.

5.20

O CESE aprecia positivamente a realização dos programas e deseja que continuem a ser apoiados e aperfeiçoados.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de acção: Agenda Europeia da política do espírito de empresa, COM(2004) 70 final, de 11 de Fevereiro de 2004.

(2)  Documento de trabalho da Comissão «Relatório 2003 sobre a competitividade europeia» SEC(2003) 1299, de 12 de Novembro de 2003.

(3)  Decisão do Conselho (98/347/CE) relativa às medidas de auxílio financeiro às pequenas e médias empresas (PME) inovadoras e criadoras de empregos — Iniciativa para o desenvolvimento e o emprego — JO L 155 de 29 de Maio de 1998

(4)  Decisão do Conselho 2000/819/CE relativa a um programa plurianual par as empresas e para o espírito empresarial, em especial para as pequenas e médias empresas (PME) (2001-2005)

(5)  MET: o Mecanismo Europeu para as Tecnologias foi criado pelo Banco Europeu de Investimentos (BEI) com o objectivo de fornecer capitais de risco às pequenas e médias empresas activas no sector das altas tecnologias, mediante financiamento para investimento através dos fundos de capital de risco existentes.

(6)  Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho — COM(2003) 758 final — 8.12.2003

(7)  Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho — COM(2003) 758 final — 8.12.2003

(8)  Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre a realização do plano de acção para o capital-investimento (PACI)


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/12


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre um novo quadro jurídico relativo aos pagamentos no Mercado Interno»

COM(2003) 718 final

(2004/C 302/03)

Em 2 de Dezembro de 2003, a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

A Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, incumbida de preparar os trabalhos correspondentes, adoptou o seu parecer em 9 de Junho de 2004 (relator: G. RAVOET).

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 140 votos a favor, nenhum voto contra e 5 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conteúdo e alcance da proposta

1.1

Em 2 de Dezembro de 2003, a Comissão publicou um documento de carácter consultivo intitulado Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre um novo quadro jurídico relativo aos pagamentos no Mercado Interno.

1.1.1

A Comissão Europeia detectou lacunas de carácter técnico e jurídico em matéria de pagamentos transfronteiras de pequeno montante em euros, considerando que as mesmas se devem, em grande parte, ao quadro jurídico europeu, o qual é inadequado. De facto, apesar dos actos jurídicos adoptados na área dos pagamentos, que incluem o Regulamento 2560/2001/CE (1) (o qual introduz o princípio de igualdade de encargos aplicados aos pagamentos nacionais e transfronteiros em euros) e a Directiva 97/5/CE (2) relativa à protecção dos utilizadores de meios de pagamento electrónicos, não existe, ainda, um quadro jurídico coerente. No entanto, o funcionamento eficaz do mercado interno de bens e serviços exige a utilização de serviços de pagamento baratos, eficientes e seguros. A Comissão definiu uma série de princípios orientadores que considera serem particularmente relevantes no contexto da legislação europeia em matéria de pagamentos. Estes princípios são: a) a eficiência enquanto objectivo constante, b) a segurança como condição sine qua non, c) concorrência: acesso aos mercados e igualdade das condições de concorrência, d) elevado grau de protecção dos clientes (3), e) os actos jurídicos devem ser tecnicamente neutros, f) a reformulação da legislação no âmbito dos pagamentos deve induzir um valor acrescentado e, por último, g) a natureza de um futuro instrumento jurídico (ou de vários).

1.2

O documento consultivo publicado pela Comissão advém de um trabalho preliminar desenvolvido ao longo de um período de tempo relativamente longo e pretende conduzir a uma proposta legislativa em 2004.

1.3

A Comissão aspira a, através da eliminação de obstáculos técnicos e jurídicos, permitir a eficiência dos serviços de pagamentos, garantir a concorrência em condições equitativas, proteger eficazmente o consumidor, garantir a segurança de pagamentos e oferecer segurança jurídica a todos os actores envolvidos num processo de pagamento.

1.4

A Comissão reconhece os esforços envidados pelos bancos europeus (4). Com efeito, foi criado em Junho de 2002 o Conselho Europeu de Pagamentos (European Payment Council), o qual definiu um programa de trabalho abrangente para um Espaço de Pagamentos Único na zona do euro e propôs alterações significativas à organização dos serviços de pagamento na União Europeia. O programa inclui, nomeadamente, a decisão – de carácter prioritário – de criar uma nova infra-estrutura (5) para as transferências bancárias em euros a um custo muito reduzido por operação e com um prazo-limite de execução de três dias.

1.5

A Comissão considera que a liberalização dos movimentos de capitais facilitou as transferências transfronteiras na UE. No entanto, o mercado interno, nomeadamente o sector dos pagamentos de pequeno montante, continua a pautar-se por um grau de eficiência inferior ao prevalecente a nível nacional. Verificam-se igualmente diferenças entre as legislações nacionais e as convenções relativas aos serviços de pagamento no Mercado Interno. O novo quadro jurídico deve suprimir, quando necessário, estes entraves jurídicos a um Espaço de Pagamentos Único, nomeadamente quando obstam ao bom funcionamento das infra-estruturas e dos sistemas de pagamentos à escala da UE como sucede, por exemplo, com as normas respeitantes à revogação de uma ordem de pagamento, que variam consoante o país em que essa ordem foi dada no Mercado Interno. A interoperabilidade, a utilização de normas técnicas comuns e a harmonização de normas jurídicas essenciais assumem uma importância fundamental neste contexto.

1.6

A insegurança jurídica constitui um elemento que leva os prestadores de serviços de pagamento e respectivos utilizadores a manifestarem reticências à realização de operações transfronteiras ou mesmo a renunciarem às mesmas. Trata-se, por exemplo, do caso das operações de débito directo, que ainda não existem a nível da UE (cf. anexo 16). É nomeadamente o caso de pagamentos regulares e recorrentes (por exemplo, ordem permanente a favor de um jornal estrangeiro ou de um serviço público numa residência de Verão situada noutro Estado-Membro) em relação aos quais não é possível a «domiciliação». Para que os utilizadores, ou seja, os consumidores e as PME, possam tirar pleno partido do Mercado Interno, os serviços de pagamento transfronteiras devem ser tão eficientes como a nível nacional. Por conseguinte, o novo quadro jurídico deve traduzir-se em vantagens concretas neste domínio e reforçar a confiança e o bem-estar dos consumidores no Espaço de Pagamentos Únicos no Mercado Interno.

1.7

No Mercado Interno, a confiança dos consumidores nas operações de pagamento é particularmente relevante, dado que estas assumem muitas vezes uma dimensão transfronteiras e visto que a confiança se revela essencial para tirar partido do potencial do comércio electrónico no mercado mais lato da UE. O artigo 153.o do Tratado exige, por conseguinte, um elevado grau de protecção do consumidor, que constitui assim um princípio de orientação que deve presidir ao novo quadro jurídico. No entanto, os custos dessa protecção devem ser avaliados, uma vez que serão suportados, em última instância, pelos clientes, de alguma ou outra forma.

1.8

Em nome da protecção do consumidor, importa prestar informações coerentes e facilmente compreensíveis aos utilizadores, antes e após a execução de uma operação de pagamento. A actual legislação comunitária relativa aos pagamentos já contém muitas disposições neste sentido, as quais devem ser reexaminadas. Uma das maiores dificuldades é estabelecer o devido equilíbrio no que respeita ao teor e ao volume da informação, por forma a que o utilizador do serviço de pagamento a quem se destina possa compreendê-la e estar consciente dos seus direitos e obrigações.

1.9

A Comissão considera fundamental estabelecer salvaguardas jurídicas que protejam o consumidor em caso de não realização das operações de pagamento ou em caso de realização incorrecta ou não autorizada.

1.10

A parte mais importante da Comunicação da Comissão são os seus 21 anexos, cada um dos quais aborda uma questão técnica e/ou jurídica relativa ao funcionamento eficaz do Mercado Interno de pagamentos.

2.   Observações na generalidade

2.1

O Comité partilha do objectivo da iniciativa da Comissão que consiste em criar um quadro jurídico coerente e abrangente que reja o Espaço de Pagamentos Único no mercado interno. Se é inegável que existem obstáculos àquele, estes advêm das diferenças entre as legislações nacionais. Os pagamentos no mercado interno continuam a reger-se, em grande parte, por normas nacionais e/ou por convenções. Tendo em conta que 98 % dos pagamentos europeus de pequeno montante são feitos ao nível nacional (6), a procura do consumidor em matéria de pagamentos transfronteiras é, obviamente, limitada.

2.2

Muitos mercados nacionais de pagamentos da Europa são altamente eficientes. A legislação a adoptar deverá limitar-se a eliminar os obstáculos aos pagamentos transfronteiras de modo a assegurar um nível de eficiência comum. Importa garantir que o aperfeiçoamento dos sistemas de pagamento transfronteiras não interfira negativamente com os sistemas eficientes de pagamento ao nível nacional actualmente existentes.

2.3

A Comissão deverá eliminar os obstáculos jurídicos que impedem a criação de convenções e acordos europeus relativos ao mercado, mas não deverá adoptar legislação sobre factores que possam ser abrangidos por essas mesmas convenções e acordos, i.e. deverá garantir um equilíbrio adequado entre a auto-regulamentação/co-regulamentação e a legislação europeia.

2.4

O CESE apoia (7) tanto a auto-regulamentação como a co-regulamentação. No entanto, deve ser adoptada uma regulamentação estrita em todos os domínios em que as medidas de auto-regulação ou co-regulação se revelem inadaptadas, insuficientes ou não sejam correctamente aplicadas.

2.5

O Comité aprova sem reservas o princípio de um alto nível de protecção do consumidor comum a todos os Estados-Membros, princípio esse que é, aliás, um objectivo primordial definido pelo Tratado.

2.6

O Mercado Interno de pagamentos deverá ser competitivo ao nível internacional. Caso o novo quadro legislativo europeu conduza a um aumento dos custos relativos aos pagamentos, existe o risco real de que as transacções sejam cada vez mais efectuadas por actores não europeus de países terceiros e que a legislação falhe no cumprimento dos seus objectivos.

2.7

Quanto ao âmbito dos pagamentos abrangidos pelo novo instrumento, o Comité não considera desejável excluir os cheques, pois em alguns Estados-Membros é ainda corrente a utilização deste meio de pagamento.

2.8

Será ainda necessário, através da auto-regulação, que, no novo regime, os cartões de crédito ou de débito, emitidos ou autorizados por qualquer instituição financeira reconhecida num Estado-Membro, sejam aceites por qualquer ATM em qualquer outro Estado-Membro.

3.   Observações na especialidade

3.1   Direito de prestar um serviço de pagamento ao público (Anexo 1)

A atenção dada a este assunto por um novo quadro legislativo relativo a pagamentos é de enorme importância no que diz respeito à segurança do sistema financeiro. Sendo o sistema de pagamentos a base de toda a economia de serviços de pagamentos, o mesmo deverá ser regulado por todos os Estados-Membros. O princípio de reconhecimento mútuo não deverá ser aplicado sem uma harmonização prévia das condições mínimas de autorização de serviços de pagamentos. Este princípio não garantiria aos consumidores um nível suficiente de segurança nem uma igualdade das condições de concorrência. Um instrumento jurídico de carácter obrigatório e de aplicabilidade directa (i.e. um regulamento) para aplicar a segunda proposta da Comissão (autorização especial para os serviços de pagamentos) seria o quadro jurídico mais adequado. Não deverá haver dúvidas quanto à obrigação de uma entidade prestadora de serviços de pagamentos, ao ser autorizada a aceitar depósitos, ter licença bancária (requisitos de solvência, etc.). Parte-se do princípio que qualquer regulamento relativo a esta área será igualmente aplicável a entidades prestadoras de serviços de pagamentos não europeias que operem na União.

3.2   Requisitos em matéria de informação (Anexo 2)

As instituições de crédito são obrigadas a respeitar a Directiva 97/5/CE relativa às transferências transfronteiras, bem como o Regulamento 2560/2001/CE relativo aos pagamentos transfronteiros em euros e a Recomendação 97/489/CE relativa às transacções realizadas através de um instrumento de pagamento electrónico. Alguns Estados-Membros têm a sua própria legislação sobre o assunto, existindo igualmente normas europeias específicas sobre questões ligadas à informação do consumidor, nomeadamente a Directiva 2002/65/CE relativa à comercialização à distância de serviços financeiros prestados a consumidores e a Directiva 2000/31/CE («Directiva sobre o comércio electrónico»). Estes instrumentos são suficientes no que toca ao conteúdo e ao alcance das medidas previstas e a sua aplicação é da responsabilidade dos bancos. O Comité apoia incondicionalmente a iniciativa da Comissão no sentido de consolidar as disposições jurídicas actuais, elaborando um texto inequívoco que abranja todos os requisitos em matéria de informação. Estes devem ser suficientemente abrangentes de modo a incluir instrumentos de pagamento actualmente inexistentes, mas que possam vir a ser criados.

3.3   Contas de não residentes (Anexo 3)

Este assunto abrange um vasto leque de questões além da questão dos serviços de pagamentos, o que justifica uma análise à parte.

3.4   Datas-valor (Anexo 4)

3.4.1

As datas-valor não dizem respeito apenas aos pagamentos. De facto, muitas vezes as datas-valor não se referem especificamente a uma transacção, mas a qualquer operação bancária.

3.4.2

Como afirma a Comissão, as datas-valor são sobretudo uma questão de determinação de preços relativos à gestão de produtos e à gestão de clientela. Por serem uma questão de gestão de produtos, as datas-valor são independentes das datas de registo, as quais dizem respeito à data do movimento da conta.

3.4.3

As datas-valor podem variar consoante o banco, os clientes de um mesmo banco ou mesmo consoante o tipo de operações realizadas pelo mesmo cliente de um determinado banco.

3.4.4

O Comité acolhe com agrado a ideia de requisitos de transparência aplicáveis às entidades prestadoras de serviços de pagamentos no que toca às datas-valor. A convergência do sistema de data-valor através da Europa deve também ser encarada, ainda que, variando consideravelmente os sistemas nacionais dos Estados-Membros, esta convergência deva ser considerada um objectivo de médio prazo.

3.4.5

Neste processo de convergência, a linha de conduta deveria ser de fazer coincidir a data-valor da operação de pagamento com a data em que ocorre o fluxo monetário correspondente à ordem de pagamento executado junto do prestador de serviço.

3.5   Portabilidade dos números das contas bancárias (Anexo 5)

3.5.1

O actual Regulamento 2560/2001/CE estabelece o IBAN (8) e o BIC (9), promovidos e patrocinados pelas autoridades europeias, incluindo o SEBC (Sistema Europeu de Bancos Centrais). O código IBAN é aceite e está operacional em toda a UE, o que atesta o êxito da iniciativa. Este código não permite a portabilidade. Os bancos devem, pelo menos, garantir que o consumidor poderá manter o seu número de conta bancária ao mudar de sucursal bancária (sem mudar de banco).

3.6   Mobilidade dos clientes (Anexo 6)

Normalmente, um mercado competitivo proporcionará espontaneamente uma maior mobilidade dos clientes. Os bancos devem facilitar o mais possível a mudança das contas comunicando aos clientes todas as informações necessárias. O Comité apoia incondicionalmente a auto-regulamentação tendo em vista uma maior mobilidade dos clientes. Mais ainda, o Comité apela à transparência no que diz respeito às penalidades ligadas ao encerramento de uma conta bancária, as quais devem ser razoáveis e orientadas para os custos administrativos efectivos relativos ao encerramento e à transferência das contas. O banco deverá informar o cliente sobre tais penalidades antes deste último abrir conta.

3.7   Avaliação da segurança dos instrumentos de pagamento e suas componentes (Anexo 7)

Uma vez que existe o risco de as iniciativas de carácter legislativo proporem soluções tecnológicas antiquadas (os mecanismos de segurança estão, por definição, em constante mutação), seria preferível a uniformização ficar a cargo do sector industrial, no quadro de auto-regulamentação que constitui a primeira possibilidade proposta pela Comissão. O Comité é da opinião que a certificação em matéria de segurança levada a cabo pelo sector industrial deveria ser harmonizada com princípios comunitários comuns a ser criados, de modo a evitar falta de transparência.

3.8   Informação sobre o ordenante de uma ordem de pagamento (R.E. VII do GAFI) (Anexo 8)

O GAFI é um organismo intergovernamental que define normas comuns e desenvolve estratégias de combate, ao nível internacional, contra a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo. A Recomendação Especial VII em matéria de financiamento do terrorismo diz respeito às transferências electrónicas e apela a que «[o]s países [tomem] medidas para exigir às instituições financeiras, incluindo àquelas que se dedicam à transferência de fundos, a inclusão de informação exacta e útil, relativa ao ordenante (nome, endereço, e número de conta), nas transferências de fundos e mensagens relativas às mesmas; tais informações deveriam acompanhar a transferência ou a mensagem relativa a esta ao longo de toda a cadeia de pagamentos. Os países deveriam tomar medidas para garantir que as instituições financeiras, incluindo aquelas que se dedicam à transferência de fundos, realizam uma vigilância aprofundada e um controlo adequado, para fins de detecção de actividades suspeitas, das transferências de fundos que não contenham informação completa acerca do ordenante (nome, endereço e número de conta)». O Comité propõe a harmonização da Recomendação especial VII em todo o Mercado Interno sob a forma de um regulamento, de modo a permitir a sua aplicação consistente e uniforme. Neste contexto, importa garantir que os requisitos de privacidade serão respeitados. Por outro lado, seria preferível incluir os países do Espaço Económico Europeu. Por último, as informações relativas ao ordenante deveriam incluir o nome do titular da conta em vez do nome do indivíduo que faz o pagamento, dado poder tratar-se de duas pessoas diferentes. Deste modo as informações relativas ao titular da conta ficarão registadas e serão facilmente acessíveis à entidade que presta o serviço de pagamento.

3.9   Sistema alternativo de resolução de litígios (Anexo 9)

No parecer sobre o «Livro Verde da Comissão sobre os modos alternativos de resolução dos litígios em matéria civil e comercial» (10), o Comité apoiou a FIN-NET desde a sua criação pela Comissão Europeia. Esta rede demonstra que é possível criar estratégias eficientes de conciliação a um nível transfronteiras sem burocracia e utilizando mecanismos já existentes. A eficácia da FIN-NET deve-se ao facto de ter sido aplicada ao então recente domínio da resolução alternativa de litígios ligados a pagamentos transfronteiras baseando-se em mecanismos nacionais já em vigor. A rapidez da execução dos pagamentos é um factor particularmente importante para o consumidor.

3.10   Revogabilidade de uma ordem de pagamento (Anexo 10)

3.10.1

De modo a proteger juridicamente os clientes, seria oportuno debater a definição e comunicação do «ponto de irrevogabilidade» da ordem de pagamento consoante o instrumento de pagamento utilizado. O Comité considera que o cliente deveria ser informado sobre as condições de revogabilidade relativas aos vários sistemas e instrumentos de pagamento.

3.10.2

Por outro lado, importa ter em conta o facto de os clientes não apenas fazerem pagamentos, mas também os receberem. Ora, períodos de revogabilidade excessivamente longos poderiam ter efeitos negativos para os clientes que aguardam pagamentos.

3.10.3

É igualmente importante distinguir a revogabilidade desejada pelo cliente da revogabilidade do sistema. Tendo em vista a clareza e a segurança jurídica, as ordens de pagamento deveriam ser geralmente irrevogáveis uma vez inseridas num sistema de pagamentos, tal como previsto pela directiva relativa ao carácter definitivo da liquidação.

3.10.4

O Comité chama a atenção para o carácter complexo da questão da revogabilidade, a qual exige a realização de um debate aprofundado. A entidade que presta o serviço de pagamento deverá, a pedido do consumidor, informar este último sobre o ponto de irrevogabilidade relativo ao pagamento individual que aquele deseja efectuar.

3.11   O papel do prestador do serviço de pagamento no caso de litígios entre o cliente e o operador comercial – litígios no comércio à distância (Anexo 11)

O Comité considera necessário distinguir transacção de base de execução do pagamento; a operação de pagamento em si tem um carácter absolutamente neutro. O banco que procede à transferência e o banco que a recebe não têm qualquer influência sobre a transacção entre o ordenante (cliente do comerciante) e o beneficiário (comerciante). O Comité reconhece que o assunto tratado por este anexo é bastante complexo e exige um debate mais aprofundado.

3.12   Não execução ou execução incorrecta (Anexo 12)

3.12.1

O Comité concorda que a entidade que presta o serviço de pagamento seja responsável pela correcta execução de uma ordem de pagamento e pelo registo adequado da transacção, bem como pelo depósito efectuado na conta do beneficiário. A mesma entidade é responsável pela parte do sistema de pagamento (em termos técnicos) que está sob o seu controlo. No entanto, a mesma entidade não poderá ser responsabilizada por falhas que ultrapassam a sua responsabilidade civil, sobretudo quando não se trata de um caso de negligência ou quando a falha em questão se deva a motivos de força maior. Será, no entanto, ao prestador do serviço que incumbirá demonstrar que a transacção de pagamento foi correctamente registada, executada e contabilizada de forma adequada nos termos em que foi ordenada, e esta obrigação não poderá ser limitada nem contornada por via contratual.

3.12.2

O Comité crê que a entidade que presta o serviço de pagamento poderia oferecer-se para prestar um serviço adicional, nomeadamente assumindo a responsabilidade por questões fora do seu controlo, o que seria positivo para o consumidor e estimularia a concorrência.

3.13   Obrigações e responsabilidades das partes contratuais relativamente a transacções não autorizadas (Anexo 13)

3.13.1

No que respeita a pagamentos com cartão bancário, as instituições de crédito estão sujeitas às disposições da Recomendação 97/489/CE, nomeadamente no que toca a dois assuntos:

a responsabilidade pecuniária do detentor do cartão (excepto no caso de acto grave) limita-se a 150€ no caso de transacções efectuadas com cartões perdidos ou furtados antes da notificação de perda/furto;

o reembolso de débitos (e de encargos eventualmente existentes relacionados com aqueles) solicitados em boa-fé pelo cliente e devidos a transacções fraudulentas efectuadas à distância, sem uso físico do cartão, ou no caso de transacções efectuadas com um cartão falso.

3.13.2

As transacções fraudulentas estão frequentemente associadas ao crime organizado. Dado o limite de 150€ poder incentivar a fraude, o Comité propõe a introdução de um limite baseado no risco, i.e. a responsabilidade do titular do cartão deveria ser uma percentagem do limite de crédito total do cartão, percentagem essa que deverá constar do contrato que o consumidor assina. Esta medida reflectiria o risco e custos reais e desencorajaria mais eficazmente a tentativa de fraude, reduzindo os custos comuns.

3.13.3

Uma actualização parcial da Recomendação 97/489/CE, em concordância com o novo quadro jurídico, é um avanço positivo. O Comité defende que este anexo seja interpretado tendo em conta as possibilidades de utilizar a assinatura electrónica prevista na Directiva relativa a este assunto.

3.13.4

É lícito suscitar a questão de as entidades prestadoras de serviços de pagamentos estarem em condições de poderem provar de forma conclusiva – ou de, pura e simplesmente, provar – que foi ou não o cliente que procedeu à transacção efectuada com um instrumento de pagamento electrónico tecnicamente seguro. De facto, não parece refutável a hipótese de as mesmas entidades terem dificuldades em provar o referido, sobretudo no âmbito de transacções bancárias online, uma vez que estas transacções podem ser feitas a partir de computadores privados que escapam ao controlo da entidade que presta o serviço de pagamento.

3.14   Utilização de «OUR», «BEN» e «SHARE» (11) (Anexo 14)

3.14.1

O princípio da transferência do montante total para a conta do beneficiário é um aspecto fulcral deste anexo. A importância deste princípio foi consolidada pelo Regulamento 2560/2001 no que toca a pagamentos que podem ser processados de forma totalmente automática (Straight-Through-Processing) desde que os pagamentos domésticos correspondentes sejam totalmente efectuados sem deduções do montante recebido pelo beneficiário.

3.14.2

Por outro lado, a Auto-regulamentação existe na forma da ICP (Convenção Interbancária sobre Pagamentos – Interbank Convention on Payments) (12), cujo alcance actual se limita às transferências em euros. A ICP defende a abolição da possibilidade de os bancos intermediários, quando utilizados, cobrarem taxas sobre o montante transferido.

3.14.3

Qualquer quadro jurídico deverá evitar termos técnicos utilizados em formatos de mensagens e sistemas (tais como SHARE, BEN e OUR) específicos, uma vez que os mesmos são frequentemente inadequados num contexto nacional. O Comité propõe que não se criem disposições adicionais para substituir a Directiva 97/5/CE. As opções de cobrança actuais visam permitir ao cliente escolher a que prefere, o que faz parte dos termos e condições negociadas entre o cliente e o respectivo banco. Importa evitar o risco de uma simplificação excessiva que limitasse as opções disponíveis, uma vez que estas constituem uma resposta às necessidades de mercado, as quais não se limitam aos instrumentos básicos de transferência bancária intra-europeia e são necessárias para os vários tipos de pagamentos e para o comércio à distância. O Comité convida o sector industrial a aumentar a transparência no atinente à opção de cobrança aplicada.

3.14.4

O Comité propõe à Comissão suprimir a discrepância entre a opção por defeito «OUR» da Directiva, a qual é um mecanismo de cobrança inexistente na maioria dos Estados-Membros e a opção «SHA», preferida pelo Regulamento.

3.15   Prazos de execução das transferências (Anexo 15)

3.15.1

O Comité lembra que os bancos europeus membros do Conselho Europeu de Pagamentos (European Payments Council – EPC) estabeleceram como prazo de execução por defeito das transferências um período de 3 dias úteis do sector bancário (após a data de aceitação da ordem de transferência), num quadro de auto-regulamentação previsto pela Convenção CREDEURO. No entanto, os bancos poderão, se o desejarem, executar a ordem mais rapidamente do que no limite de tempo referido. Sendo o período entre a ordem de transferência e a sua execução um factor essencial dos serviços bancários, a tarefa de aperfeiçoamento destes mesmos serviços deverá ser deixada à competitividade do mercado.

3.15.2

Só se deverá ponderar nova legislação no caso de a iniciativa do sector falhar.

3.16   Débito directo (Anexo 16)

3.16.1

Quando o Sistema Paneuropeu de Débito Directo for formalmente aprovado pelo Conselho Europeu de Pagamentos, o EPC definirá de forma clara a legislação a aprovar e/ou as barreiras jurídicas a suprimir e comunicará o seu parecer à Comissão. O quadro jurídico necessário para uma aplicação correcta do sistema dependerá em grande medida do modelo escolhido. Neste sentido, seria importante o sector industrial e o legislador (a UE) cooperarem de forma aprofundada.

3.17   Supressão dos entraves ao transporte de numerário por operadores profissionais (Anexo 17) (13)

3.17.1

Este anexo não diz respeito à questão dos pagamentos, não sendo abrangido pelo novo quadro jurídico relativo àqueles.

3.17.2

As normas aplicáveis aos pagamentos em líquido deverão aplicar-se igualmente às outras formas de pagamento. Existem vários obstáculos jurídicos e técnicos ao desenvolvimento do transporte transfronteiras de fundos no interior da zona euro, em particular entre as sucursais de bancos centrais nacionais de um país e as sucursais de instituições financeiras num outro país.

3.17.3

O acesso a serviços transfronteiras dos Bancos Centrais Nacionais (BCN) insere-se no contexto da evolução da utilização da moeda única na zona euro.

3.17.4

O Comité considera que se deveria estimular a concorrência no sector do transporte de fundos no interior da zona euro de modo a optimizar a eficiência, sendo necessário, contudo, criar uma «autorização de transporte transfronteiras de fundos» e um mecanismo de controlo mínimo da aplicação da mesma.

3.18   Questões relacionadas com a protecção de dados (Anexo 18)

A Comissão optou por incluir num regulamento um artigo correspondente à alínea d) do artigo 13.o da actual Directiva 95/46/CE relativa à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (14). Esta opção constitui a melhor estratégia para harmonizar, no curto prazo, as possibilidades de troca de informações para efeitos de prevenção de fraude no domínio dos sistemas de pagamentos (entre as entidades operadoras e as autoridades e entre várias entidades operadoras, mediante uma excepção à directiva supramencionada: por exemplo, no caso de uma base de dados de comerciantes que tenham efectuado transacções fraudulentas com cartões bancários).

3.19   Assinaturas digitais (Anexo 19)

O Comité acolhe com agrado eventuais propostas da Comissão relativas a novas medidas neste domínio, mas apela à Comissão que publique, antes de elaborar tais propostas, o seu relatório sobre a aplicação da Directiva 1999/63/CE relativa às assinaturas digitais (15). O Comité sublinha o facto de a certificação digital ser um sector de gestão de produtos que exige ter em conta os princípios de neutralidade e concorrência técnica.

3.20   Segurança das redes (Anexo 20)

O Comité acolhe com agrado acções e iniciativas no sentido de uma maior penalização da cibercriminalidade e de harmonizar as legislações nacionais da UE neste domínio, em cooperação com outras jurisdições (por exemplo, os EUA). O Comité aprova a aplicação de sanções dissuasivas no caso de acesso não autorizado e com intenções fraudulentas a um sistema automático de processamento de dados, de destruição ou alteração de dados e de alteração do funcionamento do sistema. É igualmente necessário sancionar os indivíduos ou entidades que disponibilizam dados, programas, equipamentos ou informação especialmente concebidos ou adaptados de modo a permitir um acesso não autorizado e com intenção fraudulenta a um sistema automático de processamento de dados. Neste contexto, importa distinguir a criminalização de actividades fraudulentas relativas a redes de pagamentos (área em que seria positivo uma maior harmonização europeia, através de legislação adequada) das medidas preventivas relativas à segurança das redes de pagamentos (as quais deverão ficar a cargo do sector industrial, de modo a ter em conta os avanços tecnológicos).

3.21   Avaria de uma rede de pagamentos (Anexo 21)

3.21.1

O Comité considera que a questão tratada pelo Anexo 21 é um sub-tema do Anexo 12 (não execução ou execução incorrecta). De facto, é forçoso constatar que:

raramente há avarias de redes de pagamentos;

as avarias de redes de pagamentos podem afectar sistemas e aparelhos que não são directamente controlados pela instituição de crédito (externalidades de rede);

as instituições de crédito têm de cumprir as obrigações de adaptabilidade e continuidade que lhes são impostas pelas autoridades reguladoras competentes.

3.21.2

As entidades prestadoras de serviços de pagamentos não poderão ser responsabilizadas por operações não introduzidas no sistema antes da avaria. A responsabilidade da entidade prestadora de serviços de pagamentos limita-se e depende da sua responsabilidade civil. A entidade deve provar que tomou todas as medidas necessárias de modo a evitar a avaria.

3.21.3

Aquando do recente ataque contra sítios internet de bancos britânicos, que resultou na obtenção fraudulenta, por via electrónica, de dados que permitem o acesso a contas bancárias (phishing), uma entidade prestadora de serviços online optou por suspender os seus serviços de forma a responder ao ataque. Estes ataques escapam ao controlo directo das entidades prestadoras de serviços online, uma vez que o «atacante» contacta directamente o cliente por correio electrónico. As entidades prestadoras de serviços de pagamentos deveriam informar os respectivos clientes, se possível, antes de encerrarem o sistema por razões de segurança. O Comité considera totalmente inadequado penalizar uma entidade prestadora de serviços online por tomar medidas que visam proteger os seus clientes da situação exposta. Mais ainda, o Comité encoraja tais entidades a terem uma atitude pró-activa na prevenção deste tipo de fraude.

4.   Conclusão

4.1

O novo quadro jurídico deveria ser consistente com a estratégia europeia em matéria de protecção do consumidor, a qual tem por objectivo central alcançar um alto nível de protecção do consumidor comum a todos os Estados-Membros.

4.1.1

O Comité apoia os esforços da Comissão Europeia no sentido de aumentar a confiança do consumidor, a segurança jurídica e a eficiência do mercado na área de pagamentos no Mercado Interno e congratula-se por a Comissão considerar a auto-regulamentação e a co-regulamentação uma estratégia possível a aplicar a várias áreas citadas nos 21 anexos.

4.2

Dever-se-ia dar prioridade às medidas legislativas relativas aos anexos 1, 2, 8, 12, 13, 18 e 19. Os anexos sobre os requisitos em matéria de informação (2), de informação sobre o ordenante de uma ordem de pagamento (8) e relativos a questões relacionadas com a protecção de dados (18) exigem uma atenção particularmente urgente.

4.3

Importa aumentar o nível de cooperação entre a Comissão e o sector bancário no que toca à criação do Sistema Paneuropeu de Débito Directo (Anexo 16), à determinação das entidades que têm o direito de prestar serviços de pagamentos (Anexo 1) e à questão da certificação de segurança dos instrumentos de pagamento e suas componentes (Anexo 7).

4.4

No que diz respeito aos outros anexos, o Comité é da opinião que a auto ou a co-regulamentação seria o modo mais apropriado de cumprir o objectivo da Comissão, i.e. criar um Mercado Interno de pagamentos eficiente. No caso de as medidas de auto-regulamentação não terem êxito, dever-se-á ponderar um regulamento europeu.

4.5

O Comité defende igualmente que o quadro jurídico se deveria concentrar na questão da transparência face ao consumidor, baseando-se o mais possível nas práticas e nas normas de auto-regulamentação actuais. Por exemplo, não é pertinente legislar quando o mercado já cumpriu os objectivos do legislador (por exemplo, não é por enquanto necessário actualizar a Directiva relativa às transferências de modo a reduzir os prazos de execução das ordens de pagamentos). No entanto, uma abordagem comum é a solução acertada em determinadas áreas.

4.6

A Comunicação abrange vários pontos que vão além da questão dos pagamentos e a Comissão deve esclarecer de forma inequívoca a diferença entre serviços comerciais e sistemas de pagamentos. Qualquer acto legislativo relativo a pagamentos deveria excluir assuntos relativos a outras actividades que não os pagamentos propriamente ditos.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  JO L 344 de 28.12.2001.

(2)  JO L 43 de 14.2.1997.

(3)  Por «clientes», deve entender-se os consumidores e outras entidades, tais como os operadores comerciais e as PME, que utilizamserviços de pagamento.

(4)  Por exemplo, os sistemas EURO1 e STEP1 da Associação Bancária para o Euro (ABE).

(5)  O sistema da ABE realizou as suas primeiras operações em 28.4.2003.

(6)  Percentagem total a partir de várias fontes (Swift, ABE, Card Schemes) analisadas pela Federação Europeia de Bancos (2003).

(7)  CESE 500/2004 (relator: D. Retureau).

(8)  International Bank Account Number.

(9)  Código de identificação bancária.

(10)  In JO C 85 de 8 de Abril de 2003.

(11)  Três opções de cobrança relativa a transferências bancárias.

(12)  No que diz respeito a transferências de pequeno montante, a Convenção Interbancária sobre pagamentos está sujeita ao Regulamento n.o 2560/2001/CE.

(13)  Convirá prestar particular atenção à exactidão das traduções. Em italiano, por exemplo, o título deveria ser antes «Rimozione delle barriere al transporto di fondi», de modo a aproximar-se do sentido da versão original.

(14)  JO L 281 de 23.11.1995.

(15)  JO L 13 de 19.1.2000.


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/19


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Conselho relativa aos procedimentos de consulta e de informação nos domínios do seguro de crédito das garantias e dos créditos financeiros» (Versão codificada)

COM(2004) 159 final — 2004/0056 (CNS)

(2004/C 302/04)

Em 13 de Maio de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do TCE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Foi incumbida da preparação dos trabalhos correspondentes a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, a qual emitiu parecer em 9 de Junho de 2004 (relator: J. FRANK von FÜRSTENWERTH).

O Comité Económico e Social Europeu adoptou, na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), por 133 votos a favor, 1 voto contra e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conteúdo

1.1

O objectivo da proposta em apreço é proceder a uma codificação da Decisão 73/391/CEE do Conselho de 3 de Dezembro de 1973 relativa aos procedimentos de consulta e de informação nos domínios do seguro de crédito das garantias e dos créditos financeiros. Esta decisão foi alterada pela Decisão 76/641/CEE do Conselho, pelo Acto de Adesão de Espanha e Portugal, bem como pelo Acto de Adesão da Áustria, da Suécia e da Finlândia.

1.2

As decisões dizem respeito exclusivamente ao domínio das garantias de crédito à exportação do sector público e definem, nomeadamente, as condições em que os Estados-Membros que tencionam conceder ou garantir créditos externos são obrigados a consultar os outros Estados-Membros e a Comissão. As decisões não abrangem os seguros de crédito à exportação do sector privado.

1.3

A decisão proposta substitui os vários actos jurídicos que são objecto da codificação.

1.4

A proposta não altera o conteúdo material dos actos jurídicos codificados, limitando-se a reuni-los num único acto. Assim, apenas serão feitas alterações formais quando a própria codificação as justifique.

2.   Avaliação

2.1

A proposta vai ao encontro do interesse da Comissão em codificar, por uma questão de clareza e de transparência, os actos jurídicos frequentemente alterados.

2.2

As medidas em questão estão actualmente dispersas por vários actos jurídicos, sendo necessárias uma análise considerável e uma comparação de vários actos de modo a identificar as normas vigentes.

2.3

A proposta limita-se a reunir num único acto jurídico os vários actos existentes sem prejuízo do conteúdo material destes últimos, que não será alterado em nada. Não é necessário proceder a alterações do conteúdo material.

2.4

O Comité acolhe com agrado a proposta em apreço, a qual tem por objectivo garantir a transparência e compreensibilidade da legislação comunitária.

2.5

O Comité considera que a Comissão deveria, no âmbito da codificação e de modo a completar a proposta:

garantir que o considerando (2) da Decisão do Conselho de 3 de Dezembro de 1973 («Considerando que, pela sua Decisão de 26 de Janeiro de 1965, o Conselho instituiu um procedimento de consulta nos domínios do seguro de crédito, das garantias e dos créditos financeiros»), que não consta da proposta, é incluído na mesma;

incluir, no artigo 20.o da proposta, a revogação da Decisão 76/641/CEE do Conselho (e não apenas a revogação da Decisão 73/391/CEE do Conselho), visto a rubrica «Decisão revogada com a sua alteração» do anexo III da proposta mencionar igualmente a Decisão 76/641/CEE do Conselho.

2.6

Dever-se-ia prestar especial atenção à exactidão das traduções, tendo em conta que qualquer imprecisão pode levar a incertezas jurídicas e, consequentemente, a uma aplicação errónea do texto.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/20


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à aplicação do Código Internacional de Gestão da Segurança na Comunidade»

COM(2003) 767 final — 2003/0291 (COD)

(2004/C 302/05)

Em 13 de Janeiro de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 80.o, n.o 2, do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estrutura e Sociedade da Informação da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 10 de Maio de 2004 (relatora: A. BREDIMA-SAVOPOULOU).

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu aprovou, por 115 votos a favor, 2 votos contra e 4 abstenções, o presente parecer:

1.   Introdução

1.1

O Código Internacional de Gestão para a Segurança da Exploração dos Navios e a Prevenção da Poluição (Código Internacional de Gestão da Segurança – Código ISM) foi adoptado pela Organização Marítima Internacional (OMI) em 1979 com o objectivo de promover uma cultura da segurança e a sensibilização para o ambiente no sector dos transportes marítimos. A OMI decidiu, em 1994, tornar o código obrigatório, mediante a incorporação de um novo capítulo IX «Gestão para a exploração segura de navios» na Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar, 1974 (SOLAS).

1.2

A aplicação obrigatória do Código ISM decorreu em duas fases. Em 1 de Julho de 1998, passou a ser obrigatório para as companhias que exploram navios de passageiros, navios petroleiros, navios químicos, navios de transporte de gás e navios graneleiros, de arqueação bruta igual ou superior a 500 toneladas, no tráfego internacional. Em 1 de Julho de 2002, tornou-se obrigatório para as companhias que exploram outros navios de carga, de arqueação bruta igual ou superior a 500 toneladas, no tráfego internacional marítimo.

1.3

Na sequência da catástrofe do «Estonia», a UE decidiu aplicar de forma antecipada o Código ISM aos navios transbordadores ro-ro de passageiros no tráfego internacional e doméstico na Comunidade, mediante a aprovação pelo Conselho do Regulamento (CE) n.o 3051/95, de 8 de Dezembro de 1995 (1), que entrou em vigor em 1 de Julho de 1996. O CESE apoiou sem reservas esta medida no parecer emitido sobre o assunto (2).

1.4.

O dito regulamento foi alterado duas vezes: a) pelo Regulamento (CE) n.o 179/1998 (3) que versa sobre a aplicação uniforme das disposições do Código ISM sobre documentos de conformidade e certificados de gestão da segurança aos transbordadores ro-ro que efectuam serviços regulares com partida ou destino em portos da União Europeia e b) pelo Regulamento (CE) n.o 1970/2002 (4) que tem em conta as alterações subsequentes ao Código ISM adoptadas pela OMI. Este último regulamento entrou em vigor em 26 de Novembro de 2002.

2.   Proposta da Comissão

2.1

Quando o Regulamento (CE) n.o 3051/95 foi adoptado, os Estados-Membros e o Parlamento Europeu declararam que a aplicação do Código ISM aos navios transbordadores ro-ro de passageiros era uma prioridade e constituía a primeira de uma série de iniciativas destinadas a reforçar a segurança marítima.

2.2

O regulamento em apreço tem carácter mais geral, substituirá o Regulamento (CE) n.o 3051/95 e o seu principal objectivo é facilitar a aplicação correcta, rigorosa e harmonizada do código em todos os Estados-Membros e países aderentes. O regulamento proposto pretende manter paralelamente as regras ISM comunitárias aplicáveis aos navios transbordadores ro-ro que efectuam serviços regulares com partida ou destino em portos da União Europeia, qualquer que seja o seu pavilhão.

2.3

Todas as companhias marítimas que explorem os seguintes navios terão de aplicar o regulamento:

navios de carga que arvoram pavilhão de um Estado-Membro e operam no tráfego doméstico ou internacional;

navios de passageiros que arvoram pavilhão de um Estado-Membro e operam no tráfego internacional;

navios de passageiros que operam no tráfego doméstico nas zonas marítimas das classes A e B, conforme definido no artigo 4.o da Directiva 98/18/CE, qualquer que seja o seu pavilhão;

navios transbordadores ro-ro de passageiros que efectuam serviços regulares com partida ou destino em portos dos Estados-Membros da Comunidade, qualquer que seja o seu pavilhão; e

navios de carga que efectuam serviços feeder de cabotagem com partida ou destino em portos dos Estados-Membros da Comunidade, qualquer que seja o seu pavilhão.

2.4

O âmbito de aplicação do regulamento tem por base as disposições do capítulo IX da Convenção SOLAS e inclui todos os navios abrangidos pela convenção que arvorem pavilhão de um Estado-Membro, mesmo que operem no tráfego doméstico. No entanto, relativamente aos navios de passageiros que operam no tráfego doméstico, as suas disposições aplicar-se-ão apenas aos que operam a mais de 5 milhas da costa, independentemente, todavia, do seu pavilhão.

2.5

Todas as companhias de navegação que operem um ou mais dos referidos navios estarão submetidas ao Código ISM, reproduzido no título I do anexo. Os Estados-Membros terão de cumprir as directrizes sobre o processo de certificação (disposições destinadas às administrações e relativas à aplicação do Código ISM), em conformidade com o disposto no título II do anexo.

3.   Observações na generalidade

3.1

O Código ISM é uma das medidas mais significativas da OMI na área da segurança marítima porque proporciona um quadro de referência para a aplicação das Convenções da OMI. O ponto de vista do CESE, vertido em pareceres anteriores, é que o Regulamento (CE) n.o 3051/95 cumpriu um objectivo útil ao antecipar de dois anos a aplicação do Código ISM aos navios transbordadores ro-ro de passageiros e ao alargar a sua aplicação a esses navios que operam no tráfego doméstico marítimo.

3.2

O CESE, no que toca às empresas que exploram navios de passageiros e de carga no tráfego internacional, faz notar que o objectivo do regulamento proposto já foi atingido, uma vez que a obrigação de aplicar o Código ISM decorre da Convenção SOLAS. E o mesmo ocorreu, para as empresas que exploram transbordadores ro-ro de passageiros no tráfego doméstico, mediante a aplicação do Regulamento (CE) n.o 3051/95.

3.3

O motivo fundamental apontado pela Comissão na justificação da proposta é que a transposição integral do Código ISM e das directrizes pertinentes da OMI para a legislação comunitária reforçará a aplicação efectiva daquele código na UE. O CESE concorda com a justificação e subscreve tal objectivo na medida em que se refere a navios a que o Código ISM já é aplicável. No entanto, quanto ao valor acrescentado que a extensão da aplicação do Código ISM a outros tipos de navios possa trazer, o CESE tece os seguintes comentários.

3.3.1

O Código ISM surgiu de uma iniciativa industrial como instrumento voluntário para promover a qualidade da navegação. A experiência com a aplicação obrigatória do Código ISM a todos os navios desde a primeira fase em 1998, revelou, como se antevia, os pontos fortes e fracos do código. Gerou-se um certo consenso em torno da necessidade de um melhor entendimento por parte da comunidade marítima (Estados de pavilhão, sociedades de classificação e companhias de navegação) dos objectivos do código, a fim de melhorar as relações entre as organizações que emitem os certificados e produzir normas uniformes de formação para os auditores encarregues de verificar o cumprimento do Código ISM. A pedra angular de um bom sistema de gestão da segurança é o empenhamento a partir do topo. Em matéria de segurança marítima e de prevenção da poluição, são o empenhamento e a motivação de todos que determinam o resultado final. Sem o entendimento do sector marítimo, o Código ISM poderia não passar de um mero exercício teórico, como os cépticos predizem.

3.3.2

Hoje em dia, a avaliação dos riscos é largamente utilizada como instrumento objectivo e válido para apreciar as melhorias em termos de segurança. Com base nesta abordagem e considerada a necessidade expressa, a aplicação obrigatória do Código ISM na UE aos transbordadores ro-ro de passageiros que efectuam serviços regulares com partida ou destino em portos dos Estados-Membros da Comunidade tinha plena justificação e foi subscrita. Pelos mesmos motivos, a aplicação das directrizes aos demais navios que operam no tráfego doméstico na Comunidade tem sido judiciosamente deixada ao critério das administrações nacionais em virtude do princípio da subsidiariedade. O CESE não tem conhecimento de qualquer legislação nacional que alargue a aplicação obrigatória do Código ISM aos navios que operam no trafego doméstico.

3.3.3

O Código ISM, concebido para os navios que operam no tráfego internacional e que, por isso, estão distantes das administrações e das companhias, impõe obrigações significativas às companhias e aos navios por elas explorados, exige o cumprimento das convenções internacionais e fomenta a adesão às normas industriais. Ademais, o regime de segurança dos navios de carga que operam exclusivamente no tráfego doméstico é regulado pela legislação nacional e esses navios poderão, implicitamente, ter de cumprir o regime aplicável aos navios de carga que operam no tráfego internacional.

3.3.4

Preocupa o CESE, enquanto defensor, entre outros, dos interesses das pequenas e médias empresas na Europa, a aplicação obrigatória do Código ISM às companhias de navegação de pequena e média dimensão que operam exclusivamente no tráfego doméstico. À luz do expendido, a proposta de regulamento deveria ter em consideração as formalidades burocráticas e o custo que comportaria a sua aplicação aos navios de tais companhias. Seriam, pois, necessárias uma aplicação flexível e/ou a previsão de derrogações.

4.   Observações na especialidade

4.1   Artigo 3.o — Aplicação

4.1.1

O CESE crê que podem ser necessárias derrogações por motivos de ordem prática nos casos de pequenos navios de carga e navios de passageiros que operam no tráfego doméstico e, especialmente, quando a frota está sob a exploração directa ou a supervisão do seu proprietário.

4.2   Artigo 4.o — Prescrições relativas à gestão da segurança

4.2.1

Os navios acima mencionados poderão, implicitamente, ter de cumprir o regime aplicável aos navios de carga que operam no tráfego internacional. O CESE entende que o regulamento deveria indicar claramente as prescrições essenciais do Código ISM que podem ser relevantes para tais navios.

4.3   Artigo 5.o — Certificação

4.3.1

O CESE subscreve a aplicação obrigatória do processo de certificação, que constitui a principal justificação válida do regulamento proposto.

4.3.2

Cabe notar, no que diz respeito aos n.os 2 e 6, que os documentos de conformidade e os certificados de gestão da segurança, respectivamente, também podem ser emitidos por uma administração a pedido do Governo do Estado de pavilhão.

4.3.3

O CESE mantém que os n.os 4 e 9 do artigo 5.o, devem ser clarificados e racionalizados à luz do disposto no Código ISM na medida em que impõem restrições escusadas e suscitam confusão.

4.4   Artigo 7.o — Procedimento de salvaguarda

4.4.1

O procedimento de salvaguarda não envolve, como devia, o Estado-Membro ou o Estado de pavilhão que emitiu o documento de conformidade e que pode ter de suspender a validade ou retirar o documento.

4.5   Artigo 9.o — Apresentação de relatórios

4.5.1

O artigo faz referência a um modelo harmonizado para apresentação dos relatórios estabelecido pela Comissão, sem indicar, porém, sobre que matéria deverão versar. Conviria esclarecer se os relatórios devem incidir sobre o cumprimento pelos Estados-Membros e, mais concretamente, sobre o processo de certificação, ou sobre o cumprimento pelas companhias de navegação e respectivas frotas, no âmbito do controlo pelo Estado de pavilhão e pelo Estado de porto.

4.6   Artigo 13.o — Entrada em vigor

4.6.1

Na sequência das observações formuladas a propósito dos artigos 3.o e 4.o, o CESE reputa adequado o período transitório de um ano concedido aos navios de carga e de passageiros que operam exclusivamente no tráfego doméstico.

5.   Conclusões

5.1

O CESE subscreve a transposição integral do Código ISM e das directrizes relevantes da OMI para a legislação comunitária mediante o novo regulamento que altera o Regulamento (CE) n.o 3051/95. No entanto, em termos reais, o valor acrescentado pela extensão do âmbito de aplicação do regulamento proposto poderia ser limitado, dado que os navios que operam no trafego internacional e os transbordadores ro-ro de passageiros que operam no tráfego doméstico já cumprem o Código ISM.

5.2

O CESE faz notar que a experiência com a aplicação obrigatória do Código ISM a todos os navios desde a primeira fase em 1998 revelou os seus pontos fortes e fracos. Todo o sector marítimo envolvido na aplicação do Código ISM deverá entender os seus objectivos, pois, sem isso, poderia não passar de um mero exercício teórico, como os cépticos predizem. A necessidade é ainda mais premente no que toca às companhias de navegação e aos navios que até à data estavam excluídos da aplicação do Código ISM.

5.3

A iniciativa de alargar a aplicação do Código ISM a todos os navios que operam no tráfego doméstico precisa de ser revista a bem da flexibilidade. Inadvertida e desproporcionalmente, novos tipos de navios poderão ter de cumprir o regime aplicável a navios que operam no tráfego internacional, o que comportará provavelmente custos insustentáveis, sobretudo no caso de navios sob a exploração directa ou supervisão do seu proprietário. O processo de certificação previsto no regulamento proposto terá de ser adaptado a fim de não impor restrições inúteis às pequenas e médias empresas que operam no tráfego doméstico. Por isso, poderá ser necessário prever derrogações ou, em alternativa, indicar claramente as prescrições essenciais do Código ISM que são relevantes para tais navios.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Regulamento (CE) n.o 3051/95 do Conselho, de 8 de Dezembro de 1995, relativo à gestão da segurança dos ferries roll-on/roll off de passageiros (ferries ro-ro), JO L 320 de 30/12/1995, p. 14.

(2)  JO C 236 de 11.9.1995, p. 42.

(3)  JO L 19 de 24.1.1998 p. 35.

(4)  JO L 302 de 6.11.2002, p. 3.


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/23


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao reforço da segurança nos portos»

COM(2004) 76 final — 2004/0031 (COD)

(2004/C 302/06)

Em 24 de Fevereiro de 2004, o Conselho da União Europeia decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 80.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra referida.

Incumbida da preparação dos trabalhos na matéria, a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação emitiu parecer em 10 de Maio de 2004, sendo relatora A. Bredima Savopoulou.

Na 410.a reunião plenária, de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 154 votos a favor e 4 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

Com a sua comunicação (1) sobre o reforço da protecção do transporte marítimo e a sua proposta (2) de regulamento relativo ao reforço da segurança dos navios e das instalações portuárias, a Comissão abordou o problema da segurança dos navios e da interface navio/porto, propondo uma acção específica actualmente em fase de tramitação legislativa. O âmbito de aplicação do regulamento proposto limitou-se, todavia, à parte do porto que constitui a interface navio/porto, ou seja, o terminal.

1.2

O CESE saudou em parecer (3) as acções previstas e apoiou a intenção da Comissão de aplicar, numa segunda etapa, medidas comunitárias adicionais para garantir a segurança quer do porto quer da interface porto/hinterland.

1.3

A segunda etapa da iniciativa da Comissão, que é também a mais difícil, reconhece a necessidade de se definir uma política global de segurança nos portos, dada a vulnerabilidade das zonas portuárias em sentido lato, as quais constituem um elo fundamental da cadeia de transporte e dos fluxos de passageiros.

2.   Proposta da Comissão

2.1

A proposta complementa as medidas de segurança introduzidas pelo regulamento relativo ao reforço da segurança dos navios e das instalações portuárias, na medida em que assegura que todo o porto fica coberto por um sistema de segurança. A directiva garante um nível adequado de segurança nos portos comunitários e assegura uma aplicação uniforme das medidas de segurança aplicáveis a todas as zonas portuárias.

2.2

A Comissão afirma que as medidas conjuntas da OMI-OIT, previstas sob a forma de um código voluntário de boas práticas em matéria de segurança portuária actualmente em fase de elaboração, não irão assegurar o estabelecimento antecipado do sistema de segurança necessário. Impõe-se, assim, uma acção comunitária específica, de preferência sob a forma de directiva, para instaurar a requerida flexibilidade.

2.3

A directiva proposta autoriza a manutenção dos sistemas de segurança portuária vigentes que cumpram o disposto em matéria de princípios e requisitos. A directiva prevê a obrigação de efectuar avaliações de segurança, definir níveis de segurança, elaborar e aprovar planos de segurança, designar uma autoridade de segurança portuária, designar agentes de segurança, instituir comités de segurança e apoiar a execução das medidas.

3.   Observações na generalidade

3.1

Os acontecimentos desde os ataques terroristas do 11 de Setembro deram razão às previsões de que a guerra contra o terrorismo vai ser muito longa. Os trágicos eventos do dia 11 de Março de 2004 em Madrid trouxeram para o primeiro plano a vulnerabilidade a ataques terroristas da globalidade dos sistemas de transporte e provaram que a segurança absoluta não pode nunca ser atingida. No seu parecer exploratório sobre a segurança dos transportes (4) e no seu parecer subsequente sobre o reforço da protecção do transporte marítimo (5), o CESE defendeu que a UE deveria assumir a liderança a nível internacional, traçando um quadro para a segurança que englobe as causas do terrorismo e não procure apenas prevenir ou eliminar os seus efeitos.

3.2

Dado que a protecção do transporte marítimo é um problema global, este foi alvo da merecida atenção da parte da UE. A segurança ferroviária, contudo, parece centrar-se sobretudo em iniciativas ao nível nacional, ao passo que o problema do terrorismo nas vias de transporte rodoviário e nas vias navegáveis interiores recebeu, até agora, relativamente pouca atenção. O CESE salienta que, a menos que os outros modos de transporte assumam a sua quota-parte de responsabilidade, o «elo mais fraco» será o alvo escolhido pelos terroristas para se infiltrarem no sistema. É irrealista pensar que os portos podem colmatar as falhas de segurança dos outros modos de transporte, assim como é injusto impor-lhes esse ónus financeiro.

3.3

O CESE reitera que as medidas de combate ao terrorismo devem estar associadas a medidas de combate aos problemas clássicos de segurança (criminalidade organizada, pirataria, fraude, contrabando e imigração clandestina). Estes problemas de segurança estão presentes nas zonas portuárias em sentido lato e deveriam ter sido tratados com urgência, como solicitado pelo CESE. Neste contexto, o CESE lamenta que alguns Estados-Membros da UE não tenham ainda assinado a Convenção para a Supressão de Actos Ilícitos (Convenção SUA) nem o seu protocolo e sublinha a necessidade e a urgência de uma ratificação célere que permitiria reforçar os meios legais para combater o terrorismo.

3.4

O CESE (6) apoiou a iniciativa da UE para assegurar um acordo mútuo de colaboração com os Estados Unidos que garanta igualdade de tratamento a todos os carregamentos (em contentores) provenientes da UE e para introduzir/integrar os acordos bilaterais num acordo multilateral no âmbito da Organização Mundial das Alfândegas (OMA). Há que negociar acordos mútuos semelhantes com outras regiões/países que sejam apoiados por um sistema de intercâmbio de informação. Quando necessário, os acordos devem prever cooperação técnica e ajuda financeira aos países em desenvolvimento para que estes possam melhorar a infra-estrutura de segurança nos seus portos.

3.5

O conjunto de medidas propostas é semelhante ao previsto para as instalações portuárias (terminais). A grande novidade é o alargamento do âmbito geográfico de forma a abranger a totalidade das zonas portuárias, âmbito este que será definido pelos Estados-Membros tal como aconteceu nos Estados Unidos com uma acção semelhante. O CESE é de opinião de que se teria contribuído de melhor forma para este objectivo caso se tivesse alargado o âmbito de aplicação do Regulamento (CE) n.o 725/2004 (7) Não obstante, o CESE reconhece as dificuldades que o alargamento antecipado da globalidade do sistema de segurança do regulamento supra mencionado acarretaria para abranger todas as zonas portuárias e a necessidade de se dotar, mediante a directiva, os Estados-Membros da necessária flexibilidade para aplicar as medidas adequadas, tendo em conta a grande diversidade de portos comunitários e as diferentes actividades aí realizadas. A flexibilidade não deve conduzir a grandes diferenças nas medidas em prática nos portos comunitários que possam dar origem à classificação de alguns portos estrangeiros como «seguros» e à colocação de outros na lista negra como «inseguros», em matéria de detecção de imigrantes ilegais e terroristas, pois podem levar a distorção do mercado e comprometer o decurso normal do comércio internacional.

3.6

O CESE reafirma a sua posição (8) de que a importância do mar Mediterrâneo torna-se ainda maior com a iminência do alargamento da UE. A sua proximidade de regiões donde podem advir problemas de segurança potenciais aponta para a necessidade de uma dimensão mediterrânica para a protecção do transporte marítimo. O CESE acolheu favoravelmente (9) a criação da Rede de Transportes Euromediterrânica e a inclusão da protecção do tráfego marítimo na consecução dos seus objectivos. Concordou que era essencial que os parceiros mediterrânicos reforçassem as medidas de segurança e que o Instituto Euromediterrânico para a Segurança e a Protecção seria um primeiro passo nesse sentido.

3.7

Na sua redacção actual, a directiva centra-se em aspectos administrativos e não estipula procedimentos harmonizados para a aplicação dos pormenores relacionados com os anexos. Prevê, em contrapartida, a possibilidade de adaptações futuras. O CESE compreende a urgência de melhorar a segurança para além da interface navio/porto, mas sustenta que teria sido mais criterioso fazer um balanço do progresso efectuado até agora ao nível internacional nesta matéria, em particular na Organização Marítima Internacional (OMI), na Organização Internacional do Trabalho (OIT) e na Organização Mundial das Alfândegas (OMA), e dar orientações claras e diligentes para a concretização do seu objectivo.

3.8

O CESE nota que a directiva não prevê obrigações adicionais em domínios já abrangidos pelo Regulamento (CE) n.o 725/2004 (10), nem mesmo nas zonas portuárias alargadas. Contudo, aproveita a oportunidade para reiterar o princípio fundamental de que as medidas de segurança nos portos devem ser equilibradas com os objectivos que perseguem, os custos que representam e o impacto que têm no tráfego e nos fluxos comerciais. Daí ser necessário estudar cuidadosamente a sua oportunidade e avaliar se são realistas e praticáveis. As medidas têm de respeitar os direitos fundamentais e cumprir os princípios reconhecidos, designadamente, na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, por forma a não restringir os direitos dos cidadãos nem a ordem constitucional, o que significaria servir o objectivo dos terroristas. Por isso, há que exercer cautela por forma a evitar:

o desvio do tráfego para alguns portos (em virtude do aumento das medidas de segurança) em detrimento de outros. Os pequenos portos, em particular, poderão ser afectados por este desvio para outros portos. As medidas de segurança não devem passar a ser um elemento de concorrência entre os portos;

a imposição de burocracia ou custos excessivos;

qualquer tipo de desequilíbrio entre a segurança dos navios e a segurança portuária, o que pode vir a forçar os navios e os seus operadores a assegurarem uma segurança adicional nos cais para corrigirem esse desequilíbrio. Os portos não devem acarretar injustificadamente os custos decorrentes do cumprimento das medidas em benefício de outros modos de transporte;

infra-estruturas técnicas desproporcionadas que possam ser consideradas promotoras de determinados interesses comerciais.

3.9

Os custos decorrentes do cumprimento de medidas adicionais de protecção da zona geográfica do porto em sentido mais lato, nomeadamente restrição do acesso, controlo da carga e das bagagens e identificação dos indivíduos, irão multiplicar para a maior parte dos portos, pois a extensão da aplicação das medidas de segurança acarreta disposições adicionais em matéria de infra-estrutura, equipamento, pessoal e formação. Recordando pareceres anteriores sobre o financiamento dos custos relacionados com a segurança, o CESE reitera o seu convite à Comissão para que conceba um sistema comunitário destinado a financiar a aplicação destas medidas. O CESE afirmou especificamente que «Mesmo que uma parte desses custos (de cumprimento) venha a ser suportada pelos consumidores, seria justo que uma parte corresse por conta dos governos, pois o terrorismo surge como reacção às suas políticas.». Além disso, o CESE convida mais uma vez a Comissão a elaborar um estudo de impacto geral que analise as implicações financeiras do reforço das medidas de segurança no domínio marítimo, associando-se ao Parlamento Europeu e ao seu pedido no mesmo sentido.

3.9.1

Os portos marítimos são bens nacionais importantíssimos, pelo que as medidas destinadas a proteger toda a zona portuária devem ser logicamente classificadas de medidas de interesse geral. O financiamento público destas medidas não estaria, por conseguinte, sujeito às disposições sobre os auxílios estatais previstas no Tratado da UE. Contudo, uma vez que a concessão de apoio público a essas medidas é uma opção dos Estados-Membros, seria melhor conceber uma abordagem harmonizada ao nível comunitário para evitar distorções da concorrência. Esta abordagem, tendo também em conta o financiamento das medidas de protecção das instalações portuárias, deverá basear-se nos seguintes princípios:

Custos inerentes a medidas de segurança no porto decorrentes da directiva de segurança nos portos são de interesse geral, pelo que devem ser cobertos por financiamento público nacional ou comunitário.

Custos inerentes a medidas de segurança das instalações portuárias decorrentes do regulamento sobre a segurança dos navios e das instalações portuárias devem ser financiados como segue:

a)

todos os custos decorrentes da acção da autoridade designada (avaliação, aprovação das avaliações, aprovação dos planos, auditoria e certificado de cumprimento) devem ser cobertos por financiamento público nacional ou comunitário;

b)

encargos gerais recorrentes de controlo e auditoria dos planos de segurança das instalações portuárias devem ser cobertos por financiamento público nacional ou comunitário;

c)

todos os outros custos de segurança relacionados com as instalações portuárias devem ser recuperados dos utilizadores dessas instalações de forma transparente.

3.9.2

É extremamente difícil fazer uma estimativa dos custos de segurança nos portos. Contudo, a título de comparação, estima-se que os custos decorrentes da segurança nos portos da UE serão mais elevados do que nos EUA, por razões geográficas e por razões que se prendem com o elevado número de portos na UE. Prevê-se que em termos de comparação os custos decorrentes da aplicação das medidas para os portos de maiores dimensões (11) e para os mais pequenos serão elevadíssimos.

3.10

A incapacidade de dar resposta expedita a esta nova realidade terrorista pode resultar no encerramento de portos, o que custará muitos milhões de euros. Daí o risco de a segurança vir a tornar-se um obstáculo não pautal ao comércio.

4.   Observações na especialidade

4.1

Os portos estão geralmente bem definidos em matéria de cobertura geográfica e administração, coexistindo no seu meio diversas actividades. O perímetro dos portos abrange normalmente as instalações portuárias e não o inverso como se depreende do n.o 4 do artigo 2.o ou da definição de «porto» ou «porto marítimo» constante do artigo 3.o. A definição parece sugerir que a zona portuária é mais pequena do que a zona da «instalação portuária» que inclui, ainda, os fundeadouros, os cais de espera e os acessos pelo lado do mar. Assim, é necessário clarificar o que se entende pelo termo «prevalecem» referido no n.o 4 do artigo 2.o.

4.2

Como primeira etapa, uma vez que é um plano geral, o plano de segurança do porto tem de ser compatível com as decisões já tomadas durante a fase de aplicação do Código Internacional de Segurança dos Navios e das Instalações Portuárias (Código ISPS) e do Regulamento (CE) n.o 725/2004 (12), referente aos requisitos para as instalações portuárias. Deveria abranger os planos de segurança integrados para instalações portuárias existentes no perímetro do porto. Por fim, as instalações portuárias subordinadas deveriam funcionar como secções do porto e os respectivos planos de segurança deveriam fazer parte do seu plano global de segurança, adaptado se necessário para estar de harmonia e coordenado com os seus objectivos globais. A autoridade e responsabilidade final pertenceria, por conseguinte, à autoridade de segurança portuária.

4.3

O papel consultivo dos comités de segurança portuária previstos irá melhorar a aplicação eficaz do plano de segurança do porto. O CESE pressupõe que os comités serão instituídos pelas autoridades de segurança portuária para facilitar a identificação dos elementos do plano de segurança do porto. O CESE subscreve a participação dos representantes dos marinheiros e dos trabalhadores portuários nos comités de segurança portuária com vista a estabelecer soluções práticas.

4.4

A carga e os passageiros não devem ser objecto de duplo controlo, primeiro ao entrarem na zona portuária e eventualmente também ao entrarem na zona da instalação portuária. É ainda necessária uma abordagem prática em relação à mobilidade das tripulações dos navios, visitantes e fornecedores dos navios.

4.5

As inspecções para verificar o cumprimento das medidas de segurança do porto de um Estado-Membro por funcionários de segurança de outro Estado-Membro deverão efectuar-se ao abrigo da autoridade da Comissão Europeia (n.o 2 do artigo 17.o e n.o 3 do artigo 14.o).

5.   Conclusões

5.1

Os trágicos eventos do dia 11 de Março de 2004 em Madrid deram razão aos receios de que a globalidade dos sistemas de transporte é vulnerável a ataques terroristas e à convicção de que a segurança absoluta não pode nunca ser atingida.

5.2

O CESE salienta que, a menos que todos os modos de transporte assumam a sua quota-parte de responsabilidade, o «elo mais fraco» será o alvo escolhido pelos terroristas para se infiltrarem no sistema. É irrealista pensar que os portos podem colmatar as falhas de segurança dos outros modos de transporte, assim como é injusto impor-lhes esse ónus financeiro.

5.3

O CESE crê que uma estratégia de policiamento não será a mais eficaz num mundo que vive em clima de grande insegurança. Por isso, a UE deveria assumir a liderança a nível internacional, desenvolvendo um quadro de acção em prol da segurança que ataque as causas do terrorismo e não procure apenas prevenir ou eliminar os seus efeitos.

5.4

O CESE apoia plenamente a proposta de directiva que visa aplicar medidas de segurança em todas as zonas portuárias. A flexibilidade concedida aos Estados-Membros pela proposta de directiva não deve dar origem à classificação de alguns portos estrangeiros como «seguros» e à colocação de outros na lista negra como «inseguros», pois podem levar a distorção do mercado e comprometer o decurso normal do comércio internacional.

5.5

O CESE reitera que as medidas de combate ao terrorismo devem estar associadas a medidas de combate aos problemas clássicos de segurança (criminalidade organizada, pirataria, fraude, contrabando e imigração clandestina).

5.6

Os portos marítimos são bens nacionais importantíssimos, pelo que as medidas destinadas a proteger toda a zona portuária devem ser logicamente classificadas de medidas de interesse geral. O financiamento público destas medidas não estaria, por conseguinte, sujeito às disposições sobre os auxílios estatais previstas no Tratado da UE. Seria melhor conceber ao nível comunitário uma abordagem harmonizada dos Estados-Membros para a concessão de apoio público de modo a evitar distorções da concorrência. O CESE reitera o seu convite à Comissão para que conceba um sistema comunitário destinado a financiar, se necessário, a aplicação destas medidas. Assim, o CESE está convicto que a dimensão económica da segurança portuária é um aspecto fundamental do comércio internacional e, como tal, deveria ser abordado com toda a urgência pela UE.

5.7

As medidas de segurança nas zonas portuárias têm de respeitar os direitos fundamentais e cumprir os princípios reconhecidos na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, por forma a não restringir os direitos dos cidadãos nem a ordem constitucional.

5.8

O CESE salienta a necessidade premente de dar uma dimensão mediterrânica à política de protecção dos portos da UE que, com o alargamento, se tornará vital.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  COM(2003) 229 final — 2003/0089 (COD).

(2)  COM(2003) 229 final — 2003/0089 (COD).

(3)  JO C 32 de 5.2.2004, p. 21.

(4)  JO C 61 de 14.3.2003, p. 174.

(5)  JO C 32 de 5.2.2004, p. 21.

(6)  JO C 61 de 14.3.2003 e JO C 32 de 5.2.2004.

(7)  JO L 129 de 29.4.2004, p. 6.

(8)  CESE 856/2003 — JO C 32 de 5.2.2004.

(9)  JO C de 5.2.2004 e COM(2003) 376 final.

(10)  JO L 129 de 29.4.2004, p. 6.

(11)  Os scanners para contentores no porto de Roterdão custam 14 milhões de euros: JO C 32 de 5.2.2004.

(12)  JO L 129 de 29.4.2004, p. 6.


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/27


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Fusão nuclear»

(2004/C 302/07)

Em 29 de Janeiro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre: «Fusão nuclear».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 10 de Junho de 2004, tendo sido relator G. WOLF.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 141 votos a favor e 9 abstenções, o seguinte parecer.

O presente parecer vem completar anteriores pareceres do Comité sobre as políticas de energia e de investigação. O parecer analisa o desenvolvimento dos reactores de fusão nuclear e as vantagens que estes apresentam em termos de segurança e de protecção ambiental. Tendo em conta o problema global do aprovisionamento energético. As actividades de IDT necessárias para desenvolver a fusão nuclear são sucintamente consideradas. O parecer emite igualmente considerações sobre a posição europeia nas actuais negociações sobre a localização do ITER.

Índice

1.

A questão da energia

2.

Fissão nuclear e fusão nuclear

3.

Antecedentes

4.

Para a criação de centrais de fusão

5.

A questão da localização do ITER

6.

Resumo e recomendações

1.   A questão da energia

1.1

A energia aproveitável (1) está na base do nosso modo de vida e da nossa cultura actuais. Só um aprovisionamento suficiente de energia tornou possível o nível de vida das sociedades actuais: a esperança média de vida, a alimentação, o bem-estar geral e as possibilidades de deslocação atingiram nas nações industriais um nível nunca antes alcançado. Sem um aprovisionamento suficiente de energia, estes progressos estariam comprometidos.

1.2

A necessidade de um aprovisionamento seguro, acessível, ecológico e sustentável de energia aproveitável está no cerne das decisões dos Conselhos de Lisboa, Gotemburgo e Barcelona. Por conseguinte, a União Europeia persegue uma política energética com três objectivos estreitamente relacionados e de igual importância, a saber, a protecção e a melhoria (1) da competitividade, (2) da segurança do aprovisionamento e (3) do ambiente, com vista a um desenvolvimento sustentável.

1.3

O CESE defendeu já em vários pareceres que a concretização destes objectivos se vê dificultada por entraves consideráveis e analisou já por várias vezes os problemas energéticos daí resultantes, os seus diferentes aspectos e possíveis soluções (2). Destaquem-se a esse respeito os pareceres do CESE sobre o Livro Verde da Comissão «Para uma estratégia europeia de segurança do aprovisionamento energético» (3) e sobre «Necessidades em matéria de investigação para um fornecimento seguro e fiável de energia» (4).

1.4

Nesses pareceres, o Comité salientou que o fornecimento e o consumo de energia implicam riscos, danos para o ambiente, o esgotamento dos recursos e o problema da dependência de fontes estrangeiras e de factores imponderáveis, e defendeu que a forma mais segura de reduzir os riscos consistia num consumo tão variado e equilibrado quanto possível, incluindo a poupança e a utilização racional da energia. O CESE descreveu também brevemente (5) as vantagens e desvantagens das diferentes soluções, pelo que o presente parecer se absterá de o repetir.

1.5

Nenhuma das opções a contemplar para o futuro aprovisionamento energético é tecnicamente irrepreensível, nenhuma permite uma protecção total do ambiente, nenhuma satisfaz totalmente todas as necessidades e nenhuma tem um potencial suficientemente previsível a longo prazo. É por isso que uma política energética europeia prudente e responsável não pode partir do pressuposto de que um fornecimento energético suficiente, de acordo com os objectivos acima enumerados, poderá ser garantido por apenas uma forma de energia, nomeadamente tendo em conta a necessidade de um consumo racional e da poupança de energia.

1.6

Não há, portanto, qualquer garantia de um fornecimento de energia económico, ecológico e acessível a longo prazo, nem na Europa nem a nível mundial (6). Só a investigação intensiva e o desenvolvimento poderão trazer eventuais soluções. A investigação energética (7) é o fundamento estratégico imprescindível para qualquer política energética bem-sucedida a longo prazo. No parecer citado, o Comité preconizou um programa europeu coerente de investigação sobre energia; essa proposta encontrou em grande medida eco no sexto programa-quadro de IDT e no programa EURATOM de investigação e formação, mas as dotações aí previstas para as actividades de IDT devem ser consideravelmente aumentadas.

1.7

O Comité recomendou ainda que a análise do problema da energia deveria ser mais global e abranger um espaço de tempo mais vasto, dado que as alterações do sector energético se dão a um ritmo lento, que a emissão de gases com efeito de estufa não é um problema regional mas global e que a situação tenderá a agravar-se na segunda metade deste século.

1.8

Tanto a diminuição dos recursos energéticos como a questão das emissões de gases com efeito de estufa tornam-se por se prever que as necessidades mundiais de energia aumentarão, até 2060, para o dobro ou para o triplo dos níveis actuais, mercê do aumento da população e do progresso económico dos países menos desenvolvidos. As estratégias e perspectivas de desenvolvimento devem, pois, ser concebidas com um horizonte temporal mais alargado.

1.9

No seu recente parecer sobre a utilização sustentável dos recursos naturais, o Comité voltou a recordar que uma estratégia sustentável deve prolongar-se por um período muito mais alargado.

1.10

Entretanto, e tal como o Comité fez já notar, esta realidade nem sempre merece a devida atenção por parte dos cidadãos e nos debates públicos, em que as posições vão do exagero ao menosprezo total dos riscos e das oportunidades. Esse leque de opiniões vai desde a tese de que os problemas energéticos são inexistentes, dado que até à data não se assistiu a qualquer carência e que em caso de necessidade será possível encontrar novas fontes de energia (com o argumento de que já há várias décadas se prevê o desaparecimento das florestas ou que as reservas de gás e petróleo só durariam 40 anos) até à teoria de que as necessidades energéticas mundiais poderão ser providas exclusivamente por fontes de energia renováveis se a investigação se concentrar nas formas de aproveitamento dessas fontes e se a sociedade se adaptar a elas.

1.11

Esta divergência de opinião é responsáveis pela actual ausência de uma política energética coerente a nível global e pela falta de consenso quanto à questão energética mesmo entre os Estados-Membros da União Europeia.

2.   Fissão nuclear e fusão nuclear

2.1

Tanto a fissão dos núcleos de átomos muito pesados como a fusão dos núcleos de átomos muito leves são processos que permitem a produção de quantidades de energia cerca de um milhão de vezes superiores (tendo em conta o volume de energia necessário para a sua produção) às libertadas por processos químicos.

2.2

Em 1928, foi descoberto que a fusão nuclear era a fonte de energia (até então inexplicada) do Sol e da maior parte das estrelas. Desse modo, a fusão nuclear é igualmente, graças à radiação solar, a fonte da vida na Terra, permitindo o crescimento das plantas, a formação dos combustíveis fósseis e as fontes de energia renováveis.

2.3

Assim que foi descoberta a fissão nuclear (1938) e reconhecido o seu enorme potencial como fonte de energia, mesmo para fins pacíficos, foram envidados todos os esforços para permitir a sua utilização.

2.4

A fissão nuclear permitiu muito rapidamente a produção de energia, ao passo que as expectativas geradas pela fusão nuclear como fonte praticamente inesgotável de energia não puderam ser confirmadas de forma satisfatória.

2.5

A utilização na prática de ambas as formas de energia nuclear tem como objectivos (1) gerar electricidade sem emissão de gases com efeito de estufa e (2) reservar para o sector dos transportes o consumo dos combustíveis fósseis (petróleo e gás natural), cuja combustão produz comparativamente menos CO2 do que o carvão e é por isso usada cada vez mais mesmo para a produção de electricidade (8).

2.6

Os processos de fusão e de fissão nucleares diferem enormemente quanto às modalidades e às condições de exploração, aos aspectos ambientais e de segurança e à extensão e disponibilidade dos recursos; a todos os níveis, a fusão nuclear apresenta vantagens conceptuais (cf. ponto 2.11 e seguintes).

2.7

Fissão nuclear. Há décadas que a fissão nuclear é utilizada para a produção de energia. As centrais nucleares contribuíram já em grande medida para a redução das emissões de gases com efeito de estufa (como o CO2) e para atenuar a dependência das importações de petróleo ou de gás natural. É por isso que o debate sobre a energia nuclear voltou à ordem do dia, sobretudo no que toca à redução das emissões de CO2 e aos instrumentos previstos para esse efeito (incentivos/sanções). A questão foi recentemente analisada num parecer do CESE (9).

2.8

Para a fissão nuclear são utilizados isótopos (10) dos elementos mais pesados da tabela periódica, sobretudo o tório, o urânio e o plutónio. Os neutrões libertados pela fissão nuclear provocam nos núcleos dos átomos desses elementos novos processos de fissão, gerando uma reacção em cadeia com produção de energia em quantidades controláveis. Este processo gera elementos radioactivos e actinídios (alguns de muito longa duração) que devem ser isolados da biosfera durante milhares de anos. Daí os receios que levam muitos dos cidadãos a rejeitar completamente a utilização da energia nuclear. Ao mesmo tempo, a fissão gera novos elementos físseis como o plutónio [do (11)urânio], os quais, por poderem ser utilizados na produção de armas nucleares, estão sujeitos a controlos estritos.

2.9

Os reactores para a fissão nuclear funcionam aproximadamente como as pilhas. A reserva de combustível nuclear para alguns anos (da ordem das 100 toneladas por central nuclear) é armazenada no núcleo do reactor e a energia necessária é libertada por processos reguladores que provocam as reacções de fissão desejadas. Apesar das avançadas técnicas de controlo empregues para garantir a segurança destas reacções, a simples quantidade de energia acumulada não faz senão alimentar os receios acima referidos. Acresce que o processo produz um nível considerável de calor residual, pelo que quase todos os tipos de reactor devem ser arrefecidos durante muito tempo após a paragem para evitar o sobreaquecimento dos revestimentos.

2.10

A este respeito, o Comité recordou em parecer recente (12) que está actualmente a ser desenvolvida a quarta geração de centrais de fissão nuclear, cujos níveis de segurança passiva são ainda mais elevados do que os actuais.

2.11

Fusão nuclear. A fusão nuclear é o mais rentável de todos os processos potencialmente viáveis de produção de energia, tendo em conta a proporção entre a energia necessária para desencadear o processo e a energia obtida. Os reactores de fusão são aparelhos destinados à geração de processos controlados de fusão e ao aproveitamento da energia assim libertada, funcionando continuamente (13) como centrais eléctricas, de preferência em regime de carga de base. Como combustível são utilizados isótopos pesados de hidrogénio (cf. infra). O hélio, um gás nobre (14) sem efeitos nocivos e com aplicações práticas, é o subproduto do reactor de fusão.

2.12

No entanto, durante a reacção de fusão — que só ocorre quando os elementos da reacção chocam uns com os outros a alta velocidade (15) — são libertados neutrões, que provocam radioactividade nas paredes do reactor, podendo alterar as suas propriedades mecânicas. É por isso que um dos objectivos do correspondente programa de IDT é desenvolver materiais cuja radiotoxicidade (16), após uma centena ou, no máximo, algumas centenas de anos, desça ao nível da das cinzas do carvão, abrindo nomeadamente a possibilidade de reutilizar uma boa parte desses materiais.

2.13

Estes requisitos científicos e técnicos para a produção de energia por fusão nuclear são extremamente exigentes. No essencial, o que está em causa é o difícil processo de aquecimento de um gás composto de isótopos de hidrogénio (uma mistura de deutério e de trítio) a temperaturas de mais de 100 milhões de graus [transformando-o em plasma (17)] para que os núcleos adquiram velocidade suficiente para permitir a fusão. Além disso, é necessário manter este plasma durante o tempo suficiente para desencadear a energia de fusão e aproveitá-la.

2.14

Este processo decorre na câmara de combustão do reactor de fusão e o combustível nele introduzido continuamente para o desencadear (da ordem de apenas algumas gramas) é suficiente, sem alimentação contínua, apenas para alguns minutos de cada vez, pelo que não são possíveis excursões de potência descontroladas). Acresce que a dificuldade de alcançar e manter as temperaturas necessárias constitui em si uma garantia de segurança, porque qualquer falha no processo conduz ao arrefecimento e, logo, ao termo da combustão «termonuclear» (18).

2.15

Estas considerações de segurança, aliadas à possibilidade de reduzir drasticamente o volume de resíduos radiotóxicos de longa duração (os subprodutos da fissão, como sobretudo os actinídios, especialmente perigosos e duráveis, não ocorrem na fusão) e à quase inesgotabilidade das fontes explicam a atractividade da fusão nuclear, à qual poderá vir a caber uma parte considerável do futuro aprovisionamento sustentável de energia, contribuindo assim para a resolução dos actuais problemas energéticos.

2.16

Também o CESE havia já observado em anteriores pareceres que as actividades de IDT orientadas para o aproveitamento da energia de fusão constituem um elemento importantíssimo da futura política energética, são um excelente exemplo de integração europeia e devem, por isso, ser expressamente promovidos no programa-quadro comunitário de IDT e nas actividades de investigação e formação da EURATOM.

3.   Antecedentes

3.1

As primeiras reflexões sobre a utilização pacífica da fusão nuclear começaram há quase 50 anos. Embora nessa altura alguns países dispusessem já da tecnologia para utilizar o processo de fusão como arma (bomba de hidrogénio), a passagem para a utilização pacífica, posto que prometedora, anunciava-se extremamente complexa e morosa.

3.2

Duas opiniões dessa época, ainda hoje citadas, ilustram perfeitamente o fosso já então detectado entre, por um lado, as elevadas expectativas e, por outro lado, as enormes dificuldades de ordem física e técnica envolvidas. H. J. BHABHA, na sua alocução de abertura à primeira conferência de Genebra sobre a utilização da energia nuclear para fins pacíficos, afirmou: «I venture to predict that a method will be found for liberating fusion energy in a controlled manner within the next two decades» (19). Por outro lado, R. F. POST escrevia em 1956 no primeiro artigo publicado nos EUA sobre a fusão nuclear (20) que, «However, the technical problems to be solved seem great indeed. When made aware of these, some physicists would not hesitate to pronounce the problem impossible of solution» (21).

3.3

Retrospectivamente, pode constatar-se que de entre as muitas ideias então propostas se encontravam já projectos para desenvolver a técnica do confinamento magnético, a qual se tem revelado a mais promissora para atingir os resultados esperados. Todavia, foram necessários anos de experiências científicas e técnicas, a par de inúmeros obstáculos e insucessos, para se chegar a esse resultado. A técnica requer um TOKAMAK (abreviatura russa de câmara magnética toroidal (22)) e um STELLARATOR. Trata-se de variantes de um mesmo conceito de base, a saber, confinar o plasma quente, nas condições necessárias, em campos magnéticos estruturados em forma de anel.

3.4

O papel de pioneiro coube ao projecto comunitário europeu JET (Joint European Torus), cuja concepção técnica (23) fora iniciada cerca de 20 anos antes (24). O JET permitiu, durante a sua fase experimental, não só atingir pela primeira vez as temperaturas necessárias para o plasma como também produzir, nos anos 90 (pelo processo de fusão de deutério com trítio), quantidades apreciáveis (ca. 20 Mj por experiência) de energia por fusão nuclear controlada. Desse modo, foi já possível libertar do plasma quase a mesma energia do que a necessária para aquecer o gás e iniciar o processo de fusão.

3.5

Este êxito só foi possível graças à combinação de todos os esforços na execução do programa comunitário de desenvolvimento da fusão nuclear, realizado no âmbito do programa Euratom. Esta rede reuniu os diferentes laboratórios associados dos Estados-Membros, com as suas instalações de pesquisa e os seus resultados e através da sua participação no JET, em redor de uma identidade comum, dando um testemunho precoce da concretização na prática do Espaço Europeu da Investigação.

3.6

Com o JET foi concluída com êxito a primeira e decisiva etapa da investigação mundial sobre fusão nuclear e demonstrado o princípio físico da produção e do confinamento magnético do plasma de fusão.

3.7

Este avanço foi possível graças a uma cooperação global exemplar, coordenada em boa parte por organizações como a AIEA (Agência Internacional da Energia Atómica) e a AIE (Agência Internacional da Energia). Especialmente importante foi o contributo da investigação europeia. que hoje assume, após intensos esforços para recuperar o seu atraso, sobretudo em relação aos EUA, a liderança que lhe é reconhecida internacionalmente.

3.8

Partindo de uma iniciativa lançada dezassete anos antes pelos presidentes GORBACHEV e REAGAN, a que se associou mais tarde o presidente François MITTERAND, surgiu o ITER (25), projecto internacional comum destinado a desenvolver, construir e explorar, se possível em conjunto, o primeiro reactor experimental com um balanço energético positivo do plasma (i.e., a energia obtida do plasma pela fusão é claramente superior à despendida). O ITER deverá demonstrar a possibilidade científica e técnica de produzir em centrais nucleares energia aproveitável através da fusão nuclear do plasma em combustão.

3.9

Por «combustão» (também chamada «combustão termonuclear») entende-se o estado em que a energia libertada pelo processo de fusão (ou mais precisamente, a energia transportada pelos núcleos do hélio assim gerado) contribui de maneira significativa para manter o plasma à temperatura extremamente elevada necessária. As experiências realizadas até à data revelaram que isso só é possível com aparelhos de dimensão suficiente, ou seja, semelhante à das actuais centrais eléctricas. Foi desse modo que foram definidas as dimensões do ITER.

3.10

O programa encontra-se assim numa fase de transição entre investigação e desenvolvimento, sem que seja possível distinguir claramente um aspecto do outro. Para alcançar os objectivos do ITER importa, por um lado, resolver as questões do domínio da física, o que só será possível quando se conseguir manter um plasma de fusão durante um espaço de tempo mais longo. Por outro lado, haverá que criar componentes técnicos (p. ex., ímans supercondutores de grandes dimensões, uma câmara de combustão capaz de resistir ao plasma (26), antena para aquecimento do plasma, etc.) com as mesmas características que os que serão necessários mais tarde para um reactor de fusão operacional. Trata-se, pois, de passar da física para a tecnologia das centrais eléctricas.

3.11

As actividades de concepção do ITER a nível global permitiram estabelecer os dados explicativos e os projectos detalhados de construção, assim como os protótipos e os componentes já testados do modelo. Estes resultados baseiam-se em todas as experiências realizadas e na extrapolação dos dados obtidos, tendo o JET sido pioneiro não só do programa de fusão europeu como mundial.

3.12

As dimensões lineares do ITER (diâmetro médio do anel de plasma: 12 metros; volume da câmara de combustão: cerca de 1 000 cm3) serão assim cerca do dobro das do JET. O ITER permitirá [com um balanço energético multiplicado por 10 (27)] uma produção de energia da ordem dos 500 MW para um período de combustão mínimo de cerca de 8 minutos (sendo o balanço energético inferior para períodos de combustão essencialmente ilimitados).

3.13

Os custos de construção do ITER serão da ordem dos 5 mil milhões de euros (28).

3.13.1

A maior parte desses custos beneficiará as empresas às quais for adjudicada a construção e a montagem dos diferentes elementos das instalações do ITER. Desse modo, uma grande parte da participação comunitária na construção do ITER ajudará a melhorar a inovatividade e o avanço técnico da indústria europeia, contribuindo para os objectivos da estratégia de Lisboa.

3.13.2

Já no passado o programa de fusão trouxe numerosas vantagens à indústria europeia (29). É de esperar que a construção do ITER surta estes efeitos benéficos em ainda maior medida.

3.13.3

Durante a fase de construção do ITER, as despesas europeias (da União Europeia e dos Estados-Membros) com o programa global de fusão elevar-se-iam a menos de 0,2 % dos custos do consumo final de energia na Europa.

3.14

A parceria para o desenvolvimento do ITER, a que se associaram inicialmente a UE, o Japão, a Rússia e os EUA e que assistiu, no decurso de uma evolução acidentada (30), à saída dos EUA há sensivelmente cinco anos, à sua re-adesão em 2003 e à adesão da China e da Coreia, permitiu não só repartir os custos da planificação por todos os principais parceiros como também enriquecer o projecto com todos os dados disponíveis a nível mundial.

3.15

A parceria permitiu acentuar a importância do programa enquanto projecto global para a resolução de um problema global.

3.16

A construção e a exploração comuns do ITER traria a todos os países participantes um enorme aumento de conhecimentos e de competências técnicas (cf. ponto 5), não só no domínio da fusão nuclear, mas também em quanto respeita às inovações nas tecnologias de ponta.

3.17

Construir uma única máquina em todo o mundo para a concretização dos objectivos do ITER, isto é, renunciar à tentação de desenvolver e testar, em concorrência, variantes de nível mais ou menos equivalente (como tem sido o caso na evolução da aeronáutica, da astronáutica ou da fissão nuclear), constituiria uma novidade no desenvolvimento tecnológico.

3.18

Essa renúncia, que se impõe por motivos económicos, deveria ser compensada por um programa de acompanhamento particularmente eficaz que não exclua ideias e projectos inovadores nem os riscos associados ao desenvolvimento de variantes do conceito de base (31), mas preveja, numa fase inicial, a sua exploração a uma escala mais reduzida e, logo, a menores custos.

4.   Para a criação de centrais de fusão

4.1

Os resultados aguardados e acumulados durante cerca de 20 anos após a construção do ITER servirão de base para a concepção e construção da DEMO, primeira central de fusão experimental capaz de produzir electricidade. A construção da DEMO poderá, assim, começar dentro de 20 a 25 anos.

4.2

O actual estado da investigação permite conceber centrais de fusão com as seguintes características:

Produção de energia eléctrica em regime de carga de base em blocos semelhantes aos das actuais centrais eléctricas. Possibilidade de produzir igualmente hidrogénio;

Consumo de combustível por hora (32) para, por exemplo, um bloco de 1GW (33) (produção de energia eléctrica): cerca de 14g de hidrogénio pesado (deutério) como parte de aproximadamente 420kg de água natural; cerca de 21g de hidrogénio muito pesado (trítio), obtido a partir de cerca de 42g (6) de Li como parte de cerca de 570g de lítio natural;

Reservas de combustível disponíveis em todo o mundo e muito superiores às necessidades previstas para o futuro (34);

Produção horária de resíduos de um bloco de 1 GW: cerca de 56g de hélio (35);

Ciclo interno do trítio38 radioactivo (com um tempo de meia-vida de 12,5 anos) gerado no revestimento da câmara de combustão a partir do lítio;

Radiotoxicidade dos materiais da câmara de fusão provocada por neutrões; essa radiotoxicidade poderá, em função dos materiais escolhidos, descer ao nível da das cinzas do carvão após uma centena ou algumas centenas de anos;

Ausência de risco de uma excursão de potência descontrolada. Tal como num carburador a gás, o combustível é injectado a partir do exterior e, uma vez interrompido, é suficiente para apenas alguns minutos de combustão;

Impossibilidade de fugas de radioactividade (poeira, trítio, etc.) susceptíveis de obrigar à evacuação das zonas limítrofes;

Risco reduzido em caso de ataques terroristas, devido às suas características de segurança intrínsecas e do reduzido volume de substâncias tóxicas libertadas;

Dimensões semelhantes às das actuais centrais eléctricas;

Custos semelhantes aos das actuais centrais eléctricas: os custos decorrem essencialmente dos investimentos para construção das instalações, ao passo que o aprovisionamento de combustível envolve custos mínimos.

4.3

Para desenvolver a DEMO importa não só resolver questões centrais como o rendimento energético e os processos que limitam a duração da combustão (cuja investigação e demonstração deverão ser já possíveis graças ao ITER) e aperfeiçoar os processos complexos já disponíveis para esse efeito, mas também prosseguir e intensificar a investigação sobre outros progressos técnicos.

4.4

Estes respeitam sobretudo ao ciclo interno do combustível (obtenção e tratamento do trítio), à extracção de energia, à resistência dos materiais em contacto com o plasma (interacção entre o plasma e as paredes do reactor) e com o bombardeamento de neutrões, às técnicas de reparação, ao aperfeiçoamento do comando à distância e à tecnologia de prolongamento da duração de combustão de modo a conseguir um funcionamento contínuo. Especialmente urgente é o desenvolvimento de materiais estruturais adequados de baixa activação ou activados unicamente durante um curto espaço de tempo, devido ao longo prazo de experimentação e de validação desses materiais.

4.5

Seria, porém, erróneo pensar que a construção da DEMO marcará o fim das actividades de IDT. A história da tecnologia demonstra que a investigação e o desenvolvimento só se intensificam verdadeiramente após o surgimento do primeiro protótipo.

4.5.1

A história revela ainda que os primeiros protótipos de uma nova tecnologia eram muitas vezes versões grosseiras e imperfeitas dos aparelhos elegantes que os substituíram progressivamente.

4.5.2

A optimização actual dos motores a gasóleo só foi possível quase 100 anos após a sua invenção. Também as centrais de fusão terão de ser melhoradas, optimizadas e gradualmente adaptadas ao progresso técnico.

5.   A questão da localização do ITER

5.1

Actualmente, importa decidir ao mais alto nível político entre os dois locais candidatos para a construção do ITER (Cadarache (36) na Europa ou Rokkasho-Mura (37) no Japão), decisão da qual dependerá a participação financeira dos diversos parceiros e a configuração do indispensável programa de acompanhamento.

5.2

Antes do regresso dos EUA e da adesão da China e da Coreia à parceria ITER havia poucas dúvidas de que a localização escolhida para o projecto seria na Europa, em grande medida porque essa opção seria a que melhor garantiria o êxito do ITER, como sucedera no caso do JET.

5.3

No entanto, os Estados Unidos e a Coreia apoiam agora a opção de Rokkasho-Mura, no Japão, apesar das claras e universalmente reconhecidas vantagens técnicas de Cadarache. Isto acarreta, para a Europa, o risco de perder a sua posição cimeira e de ter de abrir mão dos resultados dos investimentos e do trabalho já realizados, com as inevitáveis consequências para a sua investigação e a sua indústria.

5.4

Por conseguinte, o Comité aplaude a decisão do Conselho Europeu de 25 e 26 de Março de 2004 de reafirmar «o apoio unânime à oferta europeia» e de convidar «a Comissão a avançar nas negociações sobre o projecto ITER, na perspectiva de se proceder rapidamente ao seu lançamento no local europeu candidato».

6.   Conclusão e recomendações do Comité

6.1

O Comité partilha da opinião da Comissão de que a utilização pacífica da energia da fusão nuclear pode constituir uma solução duradoura para o aprovisionamento energético por ser sustentável, compatível com o ambiente e competitiva.

6.1.1

Isso deve-se às vantagens potenciais desta tecnologia de futuro, nomeadamente:

o facto de as reservas de deutério e lítio serem ilimitadas;

a não produção de gases nocivos para o ambiente ou de subprodutos da fusão, como os actinídios;

as características intrínsecas de segurança, que impedem uma excursão descontrolada de energia (38);

o facto de a radioactividade dos materiais da câmara de combustão poder ser reduzida ao nível da do carvão após cem anos ou, no máximo, algumas centenas de anos, desagravando o problema do armazenamento;

os riscos reduzidos em caso de ataque terrorista devido às características acima descritas.

6.1.2

A fusão nuclear poderá eventualmente completar as fontes de energia renováveis, com a vantagem acrescida, em relação à energia eólica ou solar, de não ser dependente das condições climáticas, das estações, ou da altura do dia; essa complementaridade deve valer igualmente para a relação entre os sistemas centralizados e descentralizados, que deve ser adaptável ás circunstâncias.

6.1.3

É por isso que o CESE advogou já em vários pareceres (39) uma maior promoção do programa de IDT sobre a fusão nuclear.

6.2

O Comité regozija-se pelo facto de graças ao programa europeu de fusão nuclear e ao seu projecto comum JET ter sido concluída com êxito a primeira e decisiva etapa da investigação mundial sobre fusão nuclear e demonstrado o princípio físico da produção de energia por fusão nuclear. Foram assim lançadas as bases para a construção do reactor experimental ITER, em que pela primeira vez se produzirá e investigará um plasma de fusão capaz de libertar muito mais energia do que a que lhe é fornecida.

6.3

As actividades de IDT e os investimentos realizados ao longo de vários anos permitiram, graças à cooperação internacional, conduzir os trabalhos de concepção e as medidas políticas para a construção e operação do reactor experimental ITER (cujas dimensões são já próximas das de uma central eléctrica) até à fase de decisão.

6.4

O Comité destaca o papel pioneiro do programa europeu de fusão nuclear, sem o contributo do qual o projecto ITER nunca teria sido possível.

6.5

Os resultados do ITER servirão de base para a concepção e construção da DEMO, primeira central de fusão experimental capaz de produzir electricidade. A construção da DEMO poderá, assim, começar dentro de 20 a 25 anos.

6.6

O Comité apoia os esforços da Comissão no sentido da preparação estratégica da Europa para assumir a liderança também na fase de comercialização, devendo para tal orientar desde já uma parte do seu programa de investigação sobre a fusão para as fases posteriores ao ITER e para o desenvolvimento da DEMO.

6.7

Para desenvolver a DEMO importa não só resolver questões centrais cuja investigação e demonstração deverão ser já possíveis graças ao ITER mas também obter novos avanços em domínios importantes como a optimização da configuração magnética, o desenvolvimento dos materiais (p. ex., redução da erosão provocada pelo plasma, danos causados pelos neutrões, o tempo de extinção da radioactividade gerada), o ciclo dos combustíveis, a extracção de energia, a activação dos fluxos de plasma e o controlo da sua distribuição interna, o rendimento, e a fiabilidade dos componentes.

6.7.1

O Comité observa que esses avanços só serão possíveis através de um programa europeu de acompanhamento IDT de grande envergadura que envolva todos os Estados-Membros e disponha de uma rede de grandes instalações e de experiências físicas e sobretudo técnicas que deverão estar disponíveis como complemento do ITER.

6.8

O Comité considera especialmente importante manter o ritmo actual e enfrentar com determinação e com os meios necessários os desafios de um objectivo tão complexo e tão essencial para o aprovisionamento energético a longo prazo. Caso contrário, as estratégias de Lisboa e de Gotemburgo poderão estar comprometidas.

6.8.1

Para tal há que prever, no quadro do futuro sétimo programa-quadro de IDT e do programa EURATOM, meios financeiros mais elevados, indispensáveis para o êxito continuado da investigação em matéria energética em geral, e do programa de fusão em particular, e que explorar plenamente as outras possibilidades de financiamento do ITER.

6.8.2

Importa criar igualmente os recursos humanos necessários, de modo a que haja um número suficiente de peritos europeus no domínio da tecnologia e da física para operar o ITER. A este respeito, o Comité remete para o seu recente parecer sobre a matéria (40).

6.8.3

Importa também que as universidades e os centros de investigação continuem a fazer parte da rede, quer para permitir que os futuros cientistas e engenheiros possam receber a formação necessária neste domínio, quer para poderem contribuir com a experiência e o equipamento académicos para a realização das tarefas que se anunciam, quer ainda para poderem servir de elemento de ligação com a sociedade civil.

6.8.4

Por último, importa sobretudo angariar o apoio e o empenho cada vez mais urgentes da indústria europeia neste domínio caracterizado por múltiplos progressos científicos e técnicos de ponta. No actual programa de fusão, a indústria europeia tem se limitado a desenhar e a fornecer componentes isolados altamente especializados e sofisticados, uma experiência que deve ser preservada e encorajada; importa agora que a indústria comece a assumir gradualmente, à medida que se torna cada vez mais iminente a aplicação dos reactores de fusão, um papel mais autónomo e com maior responsabilidade de decisão.

6.8.5

Os elevados recursos financeiros previstos para a construção do ITER e para o desenvolvimento da DEMO, que beneficiarão a indústria europeia, permitirão não só uma retoma económica como também (o que é ainda mais importante), um aumento de competências e da inovação em domínios técnicos de ponta. Os múltiplos efeitos benéficos do actual programa de fusão dão já testemunho disso.

6.9

No plano internacional, a Europa enfrenta um múltiplo desafio: deve manter a sua liderança no domínio da fusão nuclear não só em relação aos avançados projectos de investigação dos EUA, mas também face ao progresso crescente dos três parceiros asiáticos do ITER (41). Mas por outro lado, deve tentar preservar e desenvolver da melhor maneira possível a actual cooperação internacional, que constitui um êxito sem precedentes.

6.10

O Comité dá, pois, todo o seu apoio aos esforços da Comissão no sentido de superar este desafio e exorta o Conselho, o Parlamento e os Estados-Membros a fazerem todo o possível para que a Europa não perca a sua liderança neste sector tão importante para o futuro. Trata-se, no entanto, de um objectivo difícil.

6.11

Antes do regresso dos EUA e da adesão da China e da Coreia à parceria ITER havia poucas dúvidas de que a localização escolhida para o projecto seria na Europa, em grande medida porque essa opção seria a que melhor garantiria o êxito do ITER, como sucedera no caso do JET.

6.12

No entanto, os Estados Unidos e a Coreia apoiam agora a opção de Rokkasho-Mura, no Japão, apesar das claras e universalmente reconhecidas vantagens técnicas de Cadarache. Isto acarreta, para a Europa, o risco de perder a sua posição cimeira e de ter de abrir mão dos resultados dos investimentos e do trabalho já realizados, com as inevitáveis consequências para a sua investigação e a sua indústria.

6.13

Por conseguinte, o Comité aplaude a decisão do Conselho Europeu de 25 e 26 de Março de 2004 de reafirmar «o apoio unânime à oferta europeia» e de convidar «a Comissão a avançar nas negociações sobre o projecto ITER, na perspectiva de se proceder rapidamente ao seu lançamento no local europeu candidato».

6.14

Em reforço desta posição, e em jeito de síntese, o Comité apela a que o Conselho, o Parlamento e a Comissão envidem todos os seus esforços, esgotem todas as possibilidades e, se necessário, proponham mesmo novos conceitos estruturais de repartição das actividades para permitir a construção do ITER na Europa, dada a sua importância estratégica crucial para o desenvolvimento de uma fonte de energia sustentável.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  A energia não é consumida, apenas transformada e aproveitada. Isto é possível graças a processos de transformação específicos como a combustão do carvão, a conversão da energia eólica em electricidade ou a fusão nuclear (obtenção de energia; E=mc2; Fala-se assim de «abastecimento energético», de «obtenção de energia» e de «aproveitamento da energia».

(2)  Fontes de energia renováveis, «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à promoção da cogeração baseada na procura de calor útil no mercado interno da energia», «Proposta de directiva (Euratom) do Conselho que define as obrigações de base e os princípios gerais no domínio da segurança das instalações nucleares»«Os desafios colocados pela energia nuclear na produção de electricidade».

(3)  «Parecer sobre o Livro Verde — Para uma estratégia Europeia de segurança do aprovisionamento energético».

(4)  «Necessidades em matéria de investigação para um fornecimento seguro e fiável de energia».

(5)  «Necessidades em matéria de investigação para um fornecimento seguro e fiável de energia» ponto 2.1.3 e seguintes.

(6)  O problema que hoje se coloca foi prenunciado pelas anteriores crises petrolíferas (1973 e 1979) e pela actual controvérsia quanto à repartição dos certificados de emissões, que opõe interesses económicos a ecológicos.

(7)  Face ao exposto, «o Comité recomenda à Comissão que elabore uma estratégia europeia para uma investigação energética integrada que sirva de inspiração a um futuro programa europeu de investigação energética.».

(8)  Pelo que é de recear uma falta desastrosa de combustíveis fósseis mais cedo do que o previsto.

(9)  «Os desafios colocados pela energia nuclear na produção de electricidade».

(10)  Átomos do mesmo elemento mas de massa diferente (com um número diferente de neutrões no núcleo).

(11)  «Os desafios colocados pela energia nuclear na produção de electricidade».

(12)  Em certos casos, o processo de fusão deve ser interrompido todas as horas.

(13)  O hélio tem um núcleo extremamente estável e é quimicamente inerte (daí a designação de «gás nobre, ou raro»).

(14)  Normalmente, 1 000km/segundo.

(15)  A radiotoxicidade é a medida da nocividade do rádio em contacto com um organismo humano em função da radiação emitida.

(16)  A tais temperaturas, um gás encontra-se inteiramente ionizado (i.e., os electrões, de carga eléctrica negativa, deixam de estar confinados às paredes do átomo e deslocam-se livremente, tal como os núcleos, com carga eléctrica positiva) e torna-se condutor de electricidade, podendo ser contido nomeadamente por campos magnéticos. «Plasma» é o gás que se encontra neste estado.

(17)  O processo de combustão «termonuclear» é explicado no ponto 3.9.

(18)  «É legítimo prever a descoberta de um método para aproveitar energia da fusão nuclear de forma controlada nas duas décadas que se seguem».

(19)  In Modern Physics 28, 338 (1956).

(20)  «no entanto, os problemas de ordem técnica a solucionar são extraordinários. Quando confrontados com esses problemas, muitos físicos não hesitam em qualificá-los de insuperáveis».

(21)  Toroidal: em forma de anel.

(22)  Concebido segundo uma variante do princípio do TOKAMAK.

(23)  O JET tornou realidade o método anunciado por Bhabha e confirmou as suas previsões.

(24)  Acrónimo de «International Thermonuclear Experimental Reactor» (Reactor termonuclear experimental internacional).

(25)  Interacção plasma-parede.

(26)  Ou seja, o plasma de fusão produzirá 10 vezes mais energia do que a que lhe é fornecida do exterior através de antenas de aquecimento como injectores de raios neutros ou emissores de alta frequência.

(27)  De acordo com o documento COM(2003) 215 final, os custos do ITER durante a fase de construção elevar-se-ão a 4,570 mil milhões de euros (câmbio de 2000).

(28)  Vd., p.ex., «Spin-off benefits from Fusion R&D», EUR 20229-Fusion Energy-Moving Forward ISBN 92-894-4721-4, assim como a brochura «Making a Difference» do Culham Science Centre, Abingdon, Oxfordshire OX14 3DB, Reino Unido.

(29)  Por razões de espaço não pode ser dada aqui uma descrição circunstanciada da história política complexa e inconstante do projecto.

(30)  Refira-se aqui, em particular, o Stellarator.

(31)  Compare-se com as cerca de 1 000 toneladas de carvão necessárias para uma central a carvão.

(32)  1GW (gigawatt) corresponde a 1 000MW (megawatt).

(33)  O lítio pode ser extraído de diversos minerais, do solo marinho, de fontes geotérmicas ou de água mineral, da água pompeada de lençóis petrolíferos e da água do mar. As reservas conhecidas permitiriam cobrir dez vezes as necessidades energéticas actuais por vários milénios.

(34)  Compare-se com as cerca de 1 000 toneladas de CO2 emitidas por uma central a carvão para um bloco semelhante.

(35)  À excepção das primeiras instalações, cujas necessidades podem ser supridas com recurso, por exemplo, aos reactores de fissão que utilizam a água pesada como moderador (no Canadá).

(36)  Perto de Aix-en-Provence, a noroeste de Marselha, França.

(37)  No norte do Japão.

(38)  I.e., uma libertação excessiva de energia para um dado período.

(39)  «… maior promoção da opção da fusão nuclear».

(40)  «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Investigadores no Espaço Europeu da Investigação: uma profissão, múltiplas carreiras».

(41)  China, Japão e Coreia do Sul.


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/35


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho — Ponto da situação do Programa de investigação GALILEO no início de 2004»

COM(2004) 112 final

(2004/C 302/08)

Em 5 de Maio de 2004, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 10 de Junho de 2004, sendo relator BUFFETAUT.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 161 votos a favor e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Preâmbulo

1.1

O programa GALILEO tem destacada importância para a União Europeia, para a sua independência, as suas capacidades tecnológicas e científicas, a sua economia e, sobretudo, o seu sector espacial e o seu sector das telecomunicações. O desenvolvimento do sector espacial tem-se concentrado essencialmente, nos últimos anos, na actividade comercial ligada às telecomunicações por satélite. As dificuldades que a indústria das telecomunicações tem atravessado afectaram seriamente, por arrastamento, um sector espacial insuficientemente apoiado a nível institucional e político, sobretudo quando comparado com os principais concorrentes da União Europeia.

1.2

Adiado devido aos desentendimentos sobre a repartição dos lucros do programa entre os países membros da Agência Espacial Europeia e por causa de pressões exteriores à Europa, o projecto GALILEO pôde enfim ter início graças ao acordo concluído no Conselho da AEE em 26 de Março de 2003 sobre as contribuições financeiras dos seus membros.

1.3

O programa GALILEO possui sobre o GPS a grande vantagem de ser um programa civil. Este grande projecto infra-estrutural assume uma importância estratégica decisiva para a Europa e para a sua autonomia, como salientaram já o CESE, o Parlamento Europeu e o Conselho, e enquadra-se perfeitamente na estratégia de Lisboa. Nunca será demais salientar a importância de um programa de tal envergadura para o progresso da construção europeia.

1.4

O sistema GALILEO fornecerá cinco serviços:

o serviço aberto (comparável ao serviço de base do GPS);

o serviço de segurança da vida (safety of life), destinado essencialmente ao transporte aéreo, ferroviário e marítimo;

o serviço comercial, de maior precisão que o serviço aberto e dedicado a utilizações comerciais;

o serviço de busca e salvamento;

o serviço governamental reservado aos poderes públicos para as actividades da polícia, das alfândegas e da protecção civil. Para estas actividades serão utilizados sinais codificados de alta precisão, que poderão servir também para fins militares, e serão tomadas todas as disposições necessárias para evitar o seu aproveitamento criminoso.

1.5

Entretanto, por se tratar de um sistema civil, o seu uso será consagrado essencialmente à vida quotidiana, designadamente em matéria de transporte. O sistema deverá, pois, ser capaz de assegurar a continuidade e a segurança do serviço, podendo a sua responsabilidade civil ser invocada em caso de falha (ao contrário do que sucede com o GPS).

1.6

Por último, o GALILEO terá um nível de precisão ligeiramente superior ao GPS e cobrirá todo o planeta. Possui, além disso, uma capacidade de verificação em tempo real da integridade do sinal que é essencial para certas aplicações, e, em particular, para a aviação civil.

1.7

A comunicação em apreço visa, no essencial, fazer o ponto da situação sobre o programa GALILEO, considerar as perspectivas para o futuro e identificar as incertezas que continuam a perseguir um projecto que deverá mobilizar 3,2 mil milhões de euros em três fases:

uma fase de desenvolvimento e validação, de 2002 a 2005;

uma fase de implantação, de 2006 a 2007;

uma fase de exploração comercial, com início em 2008.

2.   Estrutura e síntese da comunicação

A comunicação analisa três temas principais:

o ponto da situação da fase de desenvolvimento;

os progressos registados em matéria de cooperação internacional;

a passagem para as fases de implantação e de exploração.

2.1   A fase de desenvolvimento

2.1.1   Empresa comum

O acordo de Maio de 2003 no Conselho da AEE permitiu desbloquear a situação e a empresa comum GALILEO está plenamente operacional desde o Verão passado. Foi nomeado um director, aprovado o organigrama e adoptado o orçamento para 2003/2004. O EGNOS (European Geostationary Navigation Overlay Service) ficará sob a sua tutela. Subsiste o problema do seu estatuto fiscal e social, que está em debate com o governo belga e que envolve somas consideráveis (5 milhões de euros por ano). Importa definir, para as 32 pessoas da empresa comum, um regime semelhante ao aplicável aos membros da AEA ou à Comissão. As autoridades belgas não se opõem a esta solução, mas querem estar certas da cobertura social dos colaboradores da empresa comum. O problema que se coloca é, pois, mais de cariz administrativo do que de fundo.

2.1.2   Estudos técnicos e trabalhos de investigação

Incluem:

os últimos trabalhos da fase de definição;

a infra-estrutura de base;

o EGNOS, que estará brevemente operacional;

e o Plano Europeu de Radionavegação.

2.1.3   A Conferência Mundial das Radiocomunicações de Junho de 2003

2.1.3.1

Estavam em jogo interesses extremamente importantes para a UE, que tinha como objectivos:

obter a confirmação do espectro das frequências atribuídas em 2000;

assegurar-se de que a repartição deste espectro de frequências não seja demasiado desfavorável ao sistema europeu e que o acesso ao espectro seja equitativo e se baseie no princípio da interoperabilidade.

2.1.3.2

Os debates realizaram-se num quadro dominado pelo monopólio histórico do sistema americano GPS, mas a União Europeia acabou por alcançar os resultados esperados, quer quanto às condições de utilização do espectro de frequência quer quanto à exigência de uma coordenação multilateral imparcial.

2.1.4   Integração dos futuros Estados-Membros e dos países candidatos

Foram lançadas iniciativas a nível industrial a fim de permitir a plena participação destes países no programa GALILEO de acordo com o desejo expresso pela Comissão.

2.2   Progressos na cooperação internacional

2.2.1

Conforme foi salientado pelo Conselho em diversas ocasiões, para tirar o máximo proveito do programa GALILEO é essencial a cooperação internacional. Entretanto, as solicitações da parte de países terceiros são cada vez mais numerosas. Para dar resposta a essas solicitações, a Comissão adoptou duas abordagens paralelas: uma abordagem bilateral e uma abordagem regional.

2.2.2

Em 30 de Outubro de 2003 foi firmado um primeiro acordo com a China, e foram já iniciadas negociações com a Índia e com Israel. Estão a ser efectuadas diligências similares junto de outros países, designadamente a Coreia do Sul, Brasil, Japão, Canadá, Austrália, México e Chile.

2.2.3

No que diz respeito à cooperação regional, o diálogo abrange a bacia do Mediterrâneo, a América Latina e a África.

2.2.4

Por último, estão em curso negociações com países que já dispõem de um sistema de navegação por satélite, ou seja, a Rússia e os Estados Unidos. Estas negociações são particularmente importantes, já que se destinam a garantir a compatibilidade técnica e a interoperabilidade dos sistemas desses dois países com o GALILEO. Há que recordar que, numa primeira fase, os Estados Unidos contestaram o fundamento do programa GALILEO. Em todo o caso, o mecanismo de concertação em debate deverá prever os mesmos direitos e obrigações para cada parceiro, nomeadamente no que concerne ao direito de veto.

2.3   Passagem às fases de implantação e de exploração

Trata-se do ponto fulcral. As fases de implantação e de exploração do sistema terão início, respectivamente, em 2006 e em 2008.

2.3.1   Concessão do sistema

2.3.1.1

A concessão do sistema é gerida pela empresa comum. O processo foi iniciado em Outubro de 2003. Foram já recebidas e aceites quatro candidaturas, originárias de consórcios compostos por parceiros principais e por uma variedade de empresas associadas. Todos os candidatos consideram que o futuro sistema europeu poderá gerar receitas comerciais quantiosas e asseveram poder financiar uma parte não despicienda do programa com fundos próprios.

2.3.1.2

Este é um ponto decisivo, dado que o Conselho pretende que o financiamento por fundos comunitários não ultrapasse um terço do orçamento da fase de implantação. Finalmente, para a fase dita de «negociação competitiva» foram seleccionados três consórcios (Alcatel/Alenia/Vinci, EADS/Thalès/Inmarsat, Eutelsat).

2.3.1.3

A Comissão prevê seis tipos de financiamento:

a venda dos serviços criados pelo GALILEO;

as licenças e os direitos de propriedade intelectual;

o financiamento comunitário;

os empréstimos do Banco Europeu de Investimento;

a participação de países terceiros;

eventualmente, uma taxa sobre os receptores de sinais de radionavegação por satélite.

2.3.2   Enquadramento do sistema

2.3.2.1

A Comissão apresentou ao Conselho e ao Parlamento Europeu uma proposta de regulamento sobre as estruturas de gestão do programa comunitário de radionavegação por satélite. Fora proposto criar, por um lado, uma Autoridade de Controlo e, por outro lado, um Centro para a Protecção e a Segurança sob a alçada directa do Secretário Geral/Alto Representante para a Política Externa e de Segurança Comum. A decisão final foi de criar uma Autoridade de Controlo, com competências em matéria de segurança. O Centro para a Protecção e a Segurança não será criado, e caberá ao Conselho tomar as decisões em tempo real em caso de crise.

2.3.2.2

Uma outra questão importante para o enquadramento do sistema é o da protecção da privacidade. Recorde-se que o sistema GALILEO não representa por si só qualquer ameaça à privacidade, uma vez que não recebe quaisquer dados dos seus utilizadores (a informação não passa dos utentes para o sistema). No entanto, a informação obtida pelo utilizador pode ser retransmitida por um outro sistema — por exemplo, telemóveis —, que permitam localizá-lo. A responsabilidade pela regulamentação dessas formas de aproveitamento da informação fornecida pelo GALILEO não cabe às instâncias europeias de gestão do programa, mas sim às autoridades nacionais competentes. Deve chamar-se a atenção destas últimas para as disposições que lhes compete tomar para regulamentar a utilização do GALILEO e, doravante, do GPS.

3.   Observações na generalidade

3.1

O Comité acolhe com apreço a atitude de abertura de que dá provas o documento da Comissão, mormente por se tratar de um projecto complexo e de grande importância. Nessa óptica de chegar a bom termo, há que dar uma atenção particular a certas questões:

a integração dos requisitos de segurança na concepção do sistema e na sua gestão;

a conclusão das negociações com os Estados Unidos para chegar a um acordo baseado em compromissos simétricos e num objectivo de interoperabilidade;

a obtenção de um financiamento privado suficiente e a garantia de empréstimos a longo prazo por parte do BEI;

a manutenção dos custos de realização do programa nos limites do orçamento previsional.

3.2

O êxito deste grande projecto depende de uma vontade política e financeira clara e firme da parte do Conselho. Ao manifestar o seu empenho no GALILEO, o Conselho demonstrou as ambições que nutria para a União Europeia e para a sua política espacial.

4.   Conclusão

4.1

Nas suas conclusões, a Comissão parece exprimir uma certa inquietude ou incerteza quanto ao financiamento. Esta questão é fundamental, dado que, se o financiamento for posto em causa, todo o programa poderá periclitar. O CESE concorda inteiramente com a Comissão quanto à importância estratégica do projecto GALILEO para a União Europeia e para o futuro do seu programa espacial e da construção europeia, como já declarou firmemente e de forma pormenorizada nos pareceres sobre o Livro Verde e o Livro Branco da Comissão sobre a política espacial europeia (1). Do mesmo modo, partilha da satisfação da Comissão quanto aos excelentes progressos concretos realizados na fase de lançamento do projecto, mas espera que o optimismo predominante não seja ensombrado por dificuldades de última hora.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Branco «Espaço: uma nova fronteira europeia para uma União em expansão – Plano de acção para implementação da Política Espacial Europeia» (COM(2003) 673 final).

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde – Política Espacial Europeia» (COM(2003) 17 final), JO C 220 de 16.9.2003.


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/38


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às licenças das empresas de transporte ferroviário» (versão codificada)

COM(2004) 232 final — 2004/0074 (COD)

(2004/C 302/09)

Em 27 de Abril de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 71.a do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 10 de Junho de 2004, sendo relator E. CHAGAS.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 160 votos a favor e 10 abstenções, o seguinte parecer.

1.

O objectivo da presente proposta consiste em proceder a uma codificação da Directiva 95/18/CE do Conselho de 19 de Junho de 1995, relativa às licenças das empresas de transporte ferroviário (1).

2.

No contexto da Europa dos cidadãos, a simplificação e a clarificação da legislação comunitária revestem-se de grande importância. Por isso, o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão realçaram a necessidade de codificar os actos legislativos que tenham sido objecto de alterações frequentes e celebraram, em 20 de Dezembro de 1994, um Acordo Interinstitucional autorizando o recurso a um procedimento acelerado. Da codificação não pode resultar qualquer modificação substancial nos actos que dela são objecto.

3.

A proposta da Comissão em apreço vem precisamente neste sentido, pelo que o CESE não tem qualquer objecção a apresentar.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  JO L 143 de 27.6.1995, p. 70 — Parecer do CESE, JO C 393 de 31.12.1994, p. 56.


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/39


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1228/2003 no que respeita à data de aplicação de certas disposições à Eslovénia»

COM(2004) 309 final — 2004/0109 (COD)

(2004/C 302/10)

Em 11 de Maio de 2004, o Conselho decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo 95.o do Tratado CE, sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação emitiu parecer em 10 de Junho de 2004, do qual foi relator J. SIMONS.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o presente parecer por 158 votos a favor, 2 votos contra e 7 abstenções.

1.   Introdução

1.1

O Regulamento (CE) n.o 1228/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Junho de 2003, relativo às condições de acesso à rede para o comércio transfronteiriço de electricidade estabelece regras equitativas para o comércio transfronteiriço de electricidade. Para definir os preços do transporte transfronteiriço e regulamentar a atribuição das capacidades disponíveis de interligação deverão ser adoptadas regras equitativas, transparentes e imediatamente aplicáveis que sejam definidas em função dos custos, permitam uma comparação entre operadores da rede de regiões estruturalmente semelhantes e complementem as disposições da Directiva 96/92/CE, garantindo um acesso efectivo às redes de transporte para as transacções transfronteiriças.

2.   Conteúdo da proposta da Comissão

2.1

A República da Eslovénia apresentou à Comissão um pedido de alteração do Regulamento da Electricidade, para continuar a aplicar o seu actual sistema de gestão de congestionamentos nas interligações com a Áustria e a Itália até 1 de Julho de 2007. Neste momento, metade da capacidade total disponível em cada uma das duas interligações em causa é atribuída pela Eslovénia com base neste sistema. De facto, nos termos de um protocolo entre os operadores de redes de transporte em causa, a outra metade da capacidade de cada interligação é atribuída, respectivamente, pelo operador de rede italiano e pelo austríaco. Segundo o actual sistema esloveno, a capacidade disponível, no caso de a procura total de capacidade exceder a capacidade disponível (congestionamento), é atribuída aos candidatos à capacidade numa base pro-rata (redução pro-rata nos pedidos de capacidade). A capacidade é atribuída gratuitamente. Tal sistema não pode ser considerado uma solução não discriminatória baseada no mercado, na acepção do Regulamento da Electricidade. A Eslovénia justifica o pedido alegando que o processo de restruturação da indústria eslovena ainda não está concluído e que a adaptação da produção eslovena de electricidade às novas condições do mercado está ainda em curso (investimentos vultosos na protecção do ambiente).

3.   Observações na generalidade

3.1

A Comissão Europeia baseia a sua proposta no artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia incluído no capítulo sobre a aproximação das legislações. No entanto, os factos — o Regulamento n.o 1228/2003 apenas foi adoptado após o desfecho das negociações de adesão e da assinatura do Tratado de Adesão o que impediu a Eslovénia de participar no processo de adopção — são mais que suficientes para justificar como ponto de partida o Tratado de Adesão e o Acto de Adesão.

3.2

Este último contém disposições a respeito da adaptação das decisões institucionais, nomeadamente, no caso de um novo Estado-Membro não ter podido participar nas negociações de uma decisão adoptada entre a data da assinatura do Tratado e do Acto e a adesão efectiva em 1 de Maio de 2004. Ora foi justamente o que aconteceu com a Eslovénia.

3.3

É no espírito destas disposições que se deve analisar o pedido do governo esloveno de adiar até 1 de Julho de 2007 a aplicação do n.o1 do artigo 6.o e das disposições correlatas constantes do Anexo ao Regulamento e, por conseguinte, da proposta da Comissão em análise.

3.4

Na sua apreciação, atento o princípio de «pacta sunt servanda», apenas será de ponderar a rejeição do pedido se a aceitação da proposta apresentada implicar danos irremediáveis para a União Europeia no seu todo.

3.5

A Comissão argumenta, todavia, na sua proposta que o período de transição terá um impacto prático muito reduzido no funcionamento do mercado interno da electricidade. O Comité ainda consegue acompanhar este raciocínio. Mas é difícil sustentar que a Eslovénia logrará no período transitório requerido transformar em realidade as suas potencialidades de relevante plataforma giratória regional do mercado interno.

3.6

Também o argumento segundo o qual o Regulamento n.o 1228/2003 foi adoptado justamente para finalmente fazer singrar o comércio internacional de electricidade (1) e de que o pedido da Eslovénia iria contrariar esse processo não é, face à sua duração, dimensões e limitações geográficas, suficientemente convincente para impedir a sua aceitação.

3.7

A constatação, em si correcta, de que uma concorrência em pé de igualdade quer entre os produtores de alumínio e de aço quer entre os produtores de electricidade é uma componente fundamental do mercado interno não pode ser tão pouco determinante.

3.8

Por outro lado, a garantia de um sistema de abastecimento de electricidade fiável e seguro na Eslovénia e a promoção de investimentos ambientais durante o período de transição é mais um argumento para a aceitação da proposta da Comissão.

3.9

O Comité está cada vez mais convicto da necessidade de aceitar a proposta tanto mais que já no seu parecer de 17 de Outubro de 2001 (2) sobre o Regulamento n.o 1228/2003 se referiu às consequências para os então países candidatos nos seguintes termos: «… Os sectores da electricidade e do gás natural dos países candidatos caracterizam-se, em geral, por um elevado nível de apoio e de intervenção do poder público e por manter infra-estruturas e métodos de gestão pouco competitivos. A consequência imediata pode ser uma forte redução do emprego nas empresas destes sectores, que provocaria tensões sociais insuportáveis nos países candidatos, especialmente para os que não disponham de um sistema de segurança social semelhante ao existente nos Estados-Membros. Por isso, a União Europeia deve fazer beneficiar estes países das experiências adquiridas nos processos de liberalização em curso na Europa e contribuir financeiramente para ajudar à modernização das empresas. É preciso portanto adequar a abertura destes novos mercados à restruturação dos seus sectores energéticos, de forma a que as empresas dos países candidatos estejam em condições de concorrer em pé de igualdade.».

4.   Resumo e conclusões

4.1

Os argumentos apresentados na proposta da Comissão de adiar até 1 de Julho de 2007, a pedido da Eslovénia, a aplicação do n.o 1 do artigo 6.o e as disposições correlatas do Regulamento n.o 1228/2003, que tratam das soluções para os problemas de congestionamento da rede, não justificam por si só a alteração desse regulamento, simplesmente por uma questão de óptica e pelo interesse de salvaguardar a igualdade das condições de concorrência no mercado interno.

4.2

No entanto, considerando as circunstâncias do tempo em que o Regulamento foi adoptado e as negociações de adesão concluídas, entende o CESE que os argumentos têm justificação. Uma vez que a autorização do adiamento solicitado não implica danos irremediáveis para a União Europeia no seu todo — antes pelo contrário, visto serem assim garantidas a segurança e a fiabilidade bem como os investimentos ambientais no sistema esloveno — e o Comité exortou a UE no seu parecer sobre o Regulamento n.o 1228/2003 (3), nos pontos sobre a concorrência dos então países candidatos, a prestar-lhes a ajuda necessária, defende o CESE que na apreciação do pedido deverá ser decisivo o facto de a Eslovénia não ter podido participar na aprovação desse mesmo Regulamento nem exprimir a sua opinião.

4.3

Não obstante a exposição de motivos e as considerações da proposta da Comissão, que deveriam ser completadas ou adaptadas pelas considerações supra, o Comité é favorável à aceitação do pedido de alteração (adiamento da aplicação do Regulamento n.o 1228/2003 até 1 de Julho de 2007).

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Parecer do CESE sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às condições de acesso à rede para o comércio transfronteiriço de electricidade», JO C 36 de 8 de Fevereiro de 2002, p. 10.

(2)  Parecer do CESE sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às condições de acesso à rede para o comércio transfronteiriço de electricidade», JO C 36 de 8 de Fevereiro de 2002, p. 10.

(3)  Ponto 6.6 do parecer do CESE, JO C 36 de 8.2.2002, p. 10.


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/41


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as «Mutações industriais e a coesão económica, social e territorial»

(2004/C 302/11)

Em 29 de Janeiro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre as «Mutações industriais e a coesão económica, social e territorial».

A Comissão Consultiva das Mutações Industriais, incumbida da elaboração dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 7 Junho de 2004, sendo relator J. LEIRIÃO e co-relator N. CUÉ.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por, 155 votos a favor e 13 abstenções, o seguinte parecer.

Resumo

O objectivo deste parecer é verificar se os instrumentos ao serviço da coesão económica, social e territorial estão adequados e se existem ou não condições de enquadramento favoráveis às empresas, que permitam as mutações industriais decorrerem de forma compatível com a necessidade de competitividade das empresas.

O facto de o capítulo das conclusões e recomendações incorporar 17 pontos indica que a nossa análise aponta para a necessidade de melhorias ao nível das políticas, instrumentos, critérios de elegibilidade das regiões aos fundos comunitários, implementação de boas práticas e procura de sinergias entre as políticas e instrumentos, bem como coordenação geral da implementação das estratégias estruturantes da UE, como a Estratégia de Lisboa, as Reformas Estruturais e o Desenvolvimento Sustentável.

A argumentação sustenta-se nas seguintes vertentes apresentadas em sequência e como fio condutor dos capítulos do parecer:

desenvolvimento regional como regulador da globalização através da criação de «clusters» a nível regional enquanto meio eficaz de atracção e fixação das empresas;

responsabilidade social das empresas e implementação de «boas práticas» numa abordagem preventiva e de antecipação da gestão da mudança;

negociação e diálogo social nas empresas para que a reestruturação seja abordada de forma socialmente responsável, através de uma atitude positiva da administração das empresas e trabalhadores no sentido de serem encontradas soluções que sejam um sucesso para as empresas, trabalhadores e comunidades e deste modo encontrar um equilíbrio entre o social e o económico;

actuação em parceria dos empresários, parceiros sociais, sociedade civil (universidades, centros de investigação e inovação, associações, etc.) e autoridades locais, de forma a criar condições para o aumento da produtividade e melhorar o potencial de crescimento das regiões;

proposta de criação da figura de «região mais favorecida» para as situações de regiões que, apresentando elevados níveis de coesão social e emprego, perdem subitamente competências devido à deslocalização de empresas e à não existência de actividades económicas alternativas que possam sustentar essa região em termos de emprego; essas regiões seriam beneficiadas com apoios financeiros, com o objectivo específico de regenerar o tecido económico.

Introdução

No seu parecer de iniciativa «As mutações industriais na Europa: balanço e prospectivas — uma abordagem global» (1), o CESE afirmou considerar que «os futuros trabalhos da CCMI deveriam visar (…) promover condições de enquadramento que permitam à mutação industrial decorrer de forma compatível quer com a necessidade de competitividade das empresas quer com a coesão económica, social e territorial» lançando assim as bases e configurado o tipo de intervenção e de temas que esta Comissão deve desenvolver através da emissão de pareceres. A decisão da elaboração do presente parecer de iniciativa sobre o tema «Mutações Industriais e Coesão, Económica, Social e Territorial» insere-se nesta perspectiva.

1.   Definições

1.1

Para o enquadramento correcto e interpretativo deste parecer de iniciativa é definida «mutação industrial» como «a reacção permanente e regular de um sector industrial à evolução contínua do ambiente económico em que está inserido de forma a manter a competitividade e criar oportunidades de crescimento» (2); é definida «reestruturação» como «uma forma específica de mutação industrial que consiste geralmente num processo extraordinário e de adaptação (muitas vezes forçada) às condições do contexto comercial com vista a recuperar a competitividade, gerando uma descontinuidade na actividade comercial» (3). O conceito de «antecipação» é a chave para uma boa gestão da mutação, porque pode evitar uma reestruturação problemática. Precisamente, a antecipação é o processo de estudo e previsão das condições futuras de concorrência e exigência dos mercados que permite programar atempadamente as adaptações, minimizando os problemas sociais e de produtividade da empresa.

1.2

A globalização podemos defini-la como a procura de um cenário em que as relações comerciais entre os países sejam mais frequentes e facilitadas, contribuindo para essa possibilidade a eliminação de barreiras comerciais entre os países, a redução (eliminação) dos impostos sobre as importações, o fortalecimento de grupos internacionais (como a UE e o Mercosul). Neste processo, o governo de cada país oferece incentivos à instalação de empresas estrangeiras no seu território e proporciona a internacionalização de todas as actividades do seu negócio. A globalização exige também o estabelecimento e o respeito de regras comuns básicas e válidas a nível global.

1.3

A política de coesão económica, social e territorial tem como objectivo a redução das disparidades económicas e sociais existentes entre os Estados-Membros e entre regiões e de acelerar o crescimento e promover um desenvolvimento mais sustentável ajudando as regiões mais desfavorecidas a ajustar-se aos desafios da economia com base no conhecimento e deste modo ajudando todas as regiões a concretizarem os objectivos da Estratégia de Lisboa.

Concretamente esta política deve materializar-se no campo das infra-estruturas, ambiente, espírito empresarial, rendimento «per-capita», acesso ao emprego e segurança social, também no combate à exclusão social, ao acesso às novas tecnologias de informação, à educação e à formação ao longo da vida, a uma melhor administração e reforço das capacidades dos actores económicos e sociais.

1.4

Uma boa definição de «cluster» é aquela definida por Michael PORTER, (professor da Harvard Business School) no seu livro «A competitividade das nações», isto é, «a geographically proximate group of interconnected companies and associated institutions (universities, public agencies or trade associations) in a particular field, linked by competition and cooperation» (4).

2.   Os efeitos da globalização e a inevitabilidade das mutações industriais

2.1

É certamente aceite por toda a sociedade europeia que as mutações industriais são inevitáveis, sendo motivadas pelos efeitos da globalização e em consequência das permanentes alterações da economia mundial, marcadas pela evolução rápida e profunda dos mercados e dos comportamentos, crescente complexidade técnica e elevada participação dos consumidores no processo de concepção e produção de bens, de produtos e de prestação de serviços.

2.2

A globalização é a força condutora da competição global dos mercados de trabalho e da produtividade. As empresas multinacionais redireccionam o investimento para países de baixos custos laborais, de acesso directo aos mercados e competências tecnológicas.

2.3

O aumento da concorrência, o envelhecimento da população, as exigências e o nível dos consumidores em suma configuram um quadro de referência actual e projectado em que se geram grandes tensões e problemas.

2.4

Estas tensões e problemas têm de ser enfrentados com determinação pela União Europeia através de medidas que previnam a desindustrialização da Europa, isto é, evitar que simultaneamente aconteçam os seguintes três aspectos:

fenómenos de deslocalização (5);

declínio do emprego e da produção;

declínio da balança comercial.

Podemos dizer que estes três aspectos ainda não estão a acontecer ao mesmo tempo, mas é evidente que o declínio no emprego e da balança comercial são reais.

2.5

As respostas da UE a estes desafios só poderão ter sucesso se for revista a política industrial de forma a ser mais pró-activa e que forneça uma completa e sistemática transparência quanto aos efeitos específicos e cumulativos de qualquer decisão que afecte as estruturas de custo e eficiência da indústria europeia, tanto nos aspectos horizontal como nos sectores industriais específicos tais como os do aço e do têxtil e sempre tendo em conta os efeitos do alargamento para 25 países.

3.   O desenvolvimento regional como regulador da globalização; os clusters

3.1

O paradoxo do nosso tempo são as desigualdades que persistem numa época em que os progressos da ciência e da técnica deveriam permitir saciar a fome a todos; simultaneamente constata-se o facto de a «nova economia global», por se apoiar numa concorrência desregulada, envolver riscos sérios de agravamento dessas assimetrias.

É neste contexto que o desenvolvimento regional é indispensável como um instrumento regulador da própria globalização, sendo necessária uma aproximação às pessoas — onde quer que estejam — facultando-lhes o acesso aos bens, e serviços e às oportunidades.

3.2

O desenvolvimento tem de chegar às pessoas, aonde elas estão, não podendo assumir-se despreocupadamente que a mobilidade de que algumas pessoas dispõem para procurarem o desenvolvimento seja a regra, até porque as mais carenciadas de meios são também as que carecem de capacidade de deslocação.

As regiões devem definir as suas ambições no que respeita às mutações e reestruturações industriais, definir os investimentos a realizar e a cooperação entre os sectores público e privado, e muito particularmente as infra-estruturas ligadas à educação e à formação profissional.

3.3

O CESE considera que a criação de «clusters» regionais será o meio mais eficaz de atracção e de fixação das empresas, sendo um importante factor de competitividade regional e ao mesmo tempo um processo impulsionador da coesão económica, social e territorial e uma forma de prevenção dos efeitos económicos, sociais e territoriais negativos que as mutações e reestruturações industriais possam vir a provocar.

De entre os factores susceptíveis de tornar o «cluster» um sistema que facilite a fixação das empresas e de manter as competências territoriais, podemos referir os seguintes:

o reforço e o melhoramento do processo de cooperação entre empresas;

as oportunidades de melhoramento das competências tecnológicas ligadas à presença de institutos de I&D do processo «cluster» (ex: caso do «cluster» automóvel);

a integração em rede das relações entre clientes, sub-contratação e fornecedores, a qual favorece a constituição e a extensão de ligações mais estreitas entre os actores socioeconómicos e sobretudo entre os territórios;

a inserção de empresas em redes transnacionais permitem o acesso a novos mercados;

o desenvolvimento da experiência de mobilidade dos trabalhadores dentro do «cluster».

3.4

O facto de as empresas no actual ambiente económico estarem ligadas em competição a nível global, elas localizam-se ou deslocalizam-se para os «clusters» relacionados com o seu negócio e dos quais possam beneficiar de vantagens competitivas, as quais são baseadas em factores genéricos tais como: o nível e qualificação da população trabalhadora, a qualidade da governação, a infra-estrutura territorial e o nível local ou regional de inovação e desenvolvimento (I&D) e, em geral, a qualidade de vida no território (a qual pode exigir, por exemplo, uma intervenção pública para sanear áreas industriais abandonadas). Os «clusters» a nível regional podem ser factores relevantes para o aumento da coesão económica, social e territorial e motivo de localização de empresas em regiões em desenvolvimento desde que, a nível da EU e dos governos nacionais, sejam implementados e financiados programas de apoio à instalação de empresas de base tecnológica, de desenvolvimento e inovação (I&D), de formação profissional e promoção de parcerias entre empresas, universidades, autoridades locais, parceiros sociais e sociedade civil.

3.5

As áreas metropolitanas, como centros de cultura e de diversas actividades em que os actores público e privado trabalham em conjunto para encontrar soluções de mudança e modernidade, têm um papel decisivo na consecução e sucesso na construção dos «clusters» dado que elas «are in the front line of technological change, affecting transport, construction and public works, information and comunication technologies, infrastructure management, etc. This technological change is also at the root of industrial restructuring and the relocation of workforce activities and services with high added value. Economic specialisation also has a spatial manifestation: »clusters« or groups of businesses working as part of a network with research and innovation centres and universities.» (6).

O grande desafio das áreas metropolitanas europeias prende-se também com os problemas da coesão social, tais como a exclusão e a pobreza, e cuja solução passa evidentemente pelo desenvolvimento harmonioso, equilibrado e sustentado das grandes áreas metropolitanas europeias e incluindo sua ligação com as áreas vizinhas. No entanto, a procura de soluções adequadas apresenta-se difícil devido à falta de estatísticas coerentes.

4.   Os efeitos da mutação e da restruturação industriais

O processo de mutação e de restruturação industrial repercute-se em diferentes aspectos em cada sector e região.

4.1   Aspectos sociais

Todos os actores económicos reconhecem que a restruturação e a consolidação são uma condição da sobrevivência das empresas e da melhoria da sua competitividade.

A restruturação torna-se um problema social quando não existem alternativas de emprego adequadas na região afectada ou quando a mobilidade é limitada.

Por outro lado, as empresas devem assumir a sua responsabilidade social, envolvendo atempadamente nas suas estratégias de restruturação os órgãos representativos dos trabalhadores e as autarquias locais e regionais.

A competitividade industrial deve ser conquistada através do diálogo social.

4.2   Desafios enfrentados pelas empresas

Para as empresas, o grande desafio consiste em reagir da melhor maneira à mutação, preservando a sua competitividade e adequando-se a um contexto complexo e a um determinado enquadramento social e institucional.

As mutações industriais iniciadas pelas grandes empresas têm consequências para as pequenas e médias empresas que com elas trabalham em regime de subcontratação, e essas consequências não podem ser subestimadas.

4.3   Impacto sobre o alargamento, e em particular sobre o emprego

Importa definir políticas específicas de apoio ao desenvolvimento e ao emprego para que a mutação e a restruturação industriais sejam encaradas nos países do alargamento como uma oportunidade a não perder de promover o crescimento económico, melhorar a qualidade de vida e proteger o ambiente.

Os investimentos directos estrangeiros provêm principalmente da EU (mais de 60 % em 1998) e destinam-se sobretudo à República Checa, à Hungria e à Polónia. Estes três países recebiam, em finais de 2001, cerca de três quartos dos investimentos nos países do alargamento. A título de exemplo de êxito no sector do aço pode citar-se o caso de Košice (na Eslováquia), em que o investimento directo estrangeiro permitiu a modernização das instalações locais sem redução da mão-de-obra, mercê de acordos com empresas locais, da mobilidade dos trabalhadores e dos incentivos à inovação e à competitividade. O impacto da estratégia das empresas multinacionais sobre o emprego varia em função do tipo de investimento a realizar.

IMPACTO SOBRE O EMPREGO: 3 CENÁRIOS POSSÍVEIS

Estratégia multinacional

Impacto sobre o emprego

País de origem dos IDE

País receptor dos IDE

(1)

Extensão da rede: produtos ou serviços muito «locais» ou pouco «exportáveis» — energia, transportes, bancos, comércio, indústria agro-alimentar, turismo.

Fraco ou inexistente a curto prazo. A médio/longo prazo, reorganização das funções administrativas.

Mais ou menos importante segundo a aquisição das actividades existentes (com ou sem ganho de produtividade) ou criação ex nihilo.

(2)

Extensão horizontal de capacidades: produtos ou serviços reexportáveis — indústria automóvel, indústria químico-siderúrgica

Impacto imediato indirecto (não criação de capacidades), efeitos de substituição possíveis a médio prazo (p. ex., SEAT, Skoda)

Forte restruturação em caso de retoma de actividades anteriores.

Criação de emprego em empresas «greenfield» (local ainda não industrializado)

(3)

Relocalização para reduzir custos: produtos ou serviços fortemente exportáveis — têxteis, fundição, equipamento automóvel, aparelhos electrónicos de grande volume, serviços informáticos de valor acrescentado baixo ou médio.

Grande impacto a curto ou médio prazo (tempo do ciclo de substituição variável em função das actividades)

Forte restruturação em caso de retoma das anteriores actividades

Criação de emprego em empresas «greenfield»

Riscos a médio/longo prazo: relocalização

(1) & (2):

Nestes dois cenários, encontramo-nos perante estratégias horizontais de investimento. No primeiro, as multinacionais procuram principalmente conquistar novos mercados e alargar a sua rede de serviços, como sejam os serviços bancários ou as redes de transporte e energia. No segundo caso, as multinacionais procuram desenvolver as suas capacidades de produção de serviços ou de produtos facilmente exportáveis.

(3):

Neste cenário, encontramo-nos face a uma estratégia vertical de relocalização com um maior impacto sobre o emprego.

As empresas cujas actividades principais exigem uma mão-de-obra numerosa (por exemplo, a indústria têxtil e a dos componentes electrónicos dos automóveis) estão mais expostas a este tipo de cenário.

4.4   Impacto territorial

4.4.1

Em caso de restruturação industrial ou da relocalização de uma empresa, é necessário avaliar os seus activos em infra-estruturas, equipamentos e recursos humanos e encorajar a instalação de novas empresas. Em certos casos, o saneamento dos solos e do subsolo antes da partida de uma região é essencial para que esta possa recuperar.

A responsabilidade social dos investidores que tenham beneficiado de ajudas estatais deve ser reforçada e controlada.

São necessários acordos de cooperação entre todos os intervenientes nas regiões afectadas pelas mutações industriais.

4.5   Impacto nos recursos humanos

Todos os intervenientes devem comprometer-se a garantir o acesso à formação às pessoas menos qualificadas, condição indispensável para a viabilidade económica.

A nível das empresas, a gestão das competências deve prever um acordo e uma estratégia comuns entre a empresa e os seus trabalhadores no que diz respeita às suas necessidades de formação, de competências e de qualificações.

4.6   Impacto no modelo social europeu

Alcançar um nível elevado de coesão económica, social, ambiental e territorial é um pilar essencial do modelo social europeu.

A restruturação industrial no quadro do modelo social europeu só terá êxito se trouxer vantagens a todos os intervenientes.

4.7   Aspectos da interacção entre o sector da indústria e o sector dos serviços

4.7.1

A partir dos anos 70, o crescimento económico caracterizou-se pela predominância do sector dos serviços sobre o da indústria transformadora. No entanto, a interdependência e a interacção entre os dois sectores são fundamentais para o aumento da produtividade e da inovação e para melhorar a qualidade dos produtos e dos serviços.

No que concerne à restruturação e às mutações industriais, essa interacção é crucial, tanto mais que as empresas que fornecem serviços (p. ex., de IDT) às empresas industriais tendem a segui-las em caso de relocalização.

5.   A responsabilidade social das empresas e a coesão económica e social

5.1

No parecer do CESE sobre «As mutações industriais na Europa: balanço e prospectivas — uma abordagem global» (7) é afirmado que a Europa necessita de viver um «novo paradigma concentrado na mutação industrial com um rosto humano» e baseado na competitividade, desenvolvimento sustentável e coesão económica, social e territorial. Esta perspectiva tem por pano de fundo os objectivos estabelecidos pela Estratégia de Lisboa e nesta linha a UE fez um apelo especial ao sentido de responsabilidade social das empresas, tendo em conta as necessidades e melhores práticas na formação profissional para a vida, organização do trabalho, igualdade de oportunidades, inclusão social e desenvolvimento sustentado.

5.2

É reconhecido, tendo por base um comportamento ético, que a responsabilidade social das empresas pode ser exercida em dois aspectos fundamentais:

no campo das condições de trabalho e emprego;

no aspecto das condições de vida na área em que estão localizadas, isto é, o envolvimento das empresas na regeneração económica e a promoção de práticas ambientais aceitáveis na comunidade local.

Em geral é solicitado às empresas o envolvimento dos parceiros sociais, das autoridades locais, dos consumidores e dos fornecedores, cada um no seu nível de competência respectivo.

5.3

Este exercício da responsabilidade social pelas empresas (nos aspectos acima referidos) pode ser uma ferramenta que ajude a coesão económica, social e territorial se de uma forma pró-activa, for implementada uma abordagem preventiva da gestão da mutação ou reestruturação a qual será benéfica para todos os intervenientes.

6.   «Boas práticas» de reestruturação no que respeita à responsabilidade social e territorial

6.1

O Fundo Social Europeu encoraja e apoia as experiências de «boas práticas» em matéria da condução das mutações industriais. O Observatório Europeu da Mudança (EMCC) no seio da Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho, com sede em Dublim, faz regularmente eco de tais experiências na valorização da responsabilidade social e territorial das empresas. De outro lado, a primeira fase da consulta lançada pela Comissão Europeia com o título «Anticipating and managing change – a dynamic approach to the social aspects of corporate restructuring» também permitiu identificar uma serie de boas práticas no âmbito considerado.

De uma maneira geral essas experiências de boas práticas expressam-se através de:

a necessidade de antecipar e de tratar a montante as questões do emprego ligadas às reestruturações a considerar;

a necessidade de estudo de impacto directo e indirecto na região;

a intervenção e a mobilização dos actores sobre o terreno (empresas, sindicatos, poderes públicos locais e regionais, associações e sociedade civil, etc.);

a valorização da negociação colectiva e o imperativo do «diálogo social» entre as empresas, os representantes dos trabalhadores e as autoridades locais e regionais são aspectos cruciais na procura de soluções e alternativas às decisões estratégicas de deslocalização de empresas;

o acompanhamento social da mutação (reciclagem, formação, valorização das competências dos trabalhadores e seguir as suas trajectórias profissionais, revitalização das bases do emprego, desenvolvimento do tecido industrial, os trabalhadores se tornarem empresários, etc.);

o compromisso das empresas em realizar negócios com os trabalhadores que saíram da empresa em regime de sub-contratação de serviços através da externalização das actividades;

a emergência de soluções inovadoras através do desenvolvimento do espírito empresarial;

a informação em devido tempo a toda a rede de pequenas e médias empresas subcontratadas, serviços públicos e autoridades, universidades, associações empresariais sobre as intenções de reestruturação das empresas instaladas na região; isto torna-se mais difícil de implementar quando se trata de empresas multinacionais cujo centro de decisão se encontra fora da região, do país e até de Europa.

6.2

É fundamental a negociação e o diálogo social para que a reestruturação seja realizada de uma forma socialmente responsável sendo por isso muito importante que tanto da parte das empresas como dos sindicatos exista uma atitude positiva no sentido de serem encontradas fórmulas de reestruturação que sejam um sucesso para as empresas, trabalhadores e comunidades. A Comissão tem impulsionado estas boas práticas através de directivas (98/59/CE, 2001/23/CE, 94/45/CE e 2002/12/CE) que estabelecem determinadas orientações e obrigações. Salienta-se a nível europeu a iniciativa tomada em 2002 em que é preconizada uma «reestruturação socialmente inteligente» que conduziu a algumas linhas de orientação emitidas em Junho 2003. Todas as alternativas ao despedimento devem ser exploradas.

6.3

Existem muitos bons exemplos de boas práticas, neste domínio, de empresas europeias que têm recorrido à implementação de práticas socialmente responsáveis para resolver as suas estratégias de mutação ou reestruturação industriais, como — por citar apenas um – o grupo siderúrgico Arcelor, resultado da fusão entre a Arbed, a Aceralia e a Usinor, que decidiu — num contexto de excesso estrutural de capacidade de produção de fita de aço e para melhorar as sinergias – encerrar gradualmente os altos fornos de Liège e reduzir a produção em Bremen e Eisenhüttenstadt. Ante a perda de postos de trabalho que estas medidas originam, Arcelor comprometeu-se a não deixar ninguém sozinho perante um problema de emprego, a recuperar os sítios em causa e, com a ajuda de todas as partes interessadas, a contribuir para a reindustrialização dos tecidos económicos locais.

Por outro lado, um exemplo negativo da não adopção de boas práticas é aquele da reestruturação da indústria automóvel em Mezzogiorno (Itália), que pretendia transferir parte dos seus negócios de sub-contratação para um país estrangeiro sem prever nem organizar medidas suficientes de acompanhamento e solução dos problemas sociais gerados.

6.4

As mutações industriais necessárias para que as empresas se mantenham competitivas devem ser apoiadas pelas autoridades e financiadas no âmbito da educação e formação da força de trabalho; neste contexto, convém promover a utilização das novas tecnologias. Além disso, impõe-se ter em vista o reforço da responsabilidade social das empresas e os interesses sociais na criação de mais e melhores empregos, bem como a sustentabilidade ambiental das regiões onde as empresas estão localizadas.

7.   As mutações industriais e a coesão económica, social e territorial como instrumentos do desenvolvimento sustentável

7.1

O objectivo do desenvolvimento sustentável é central para a UE. Os grandes projectos transeuropeus como as redes de comunicações viárias e outras infra-estruturas em projecto ao nível europeu não são suficientes para a promoção do desenvolvimento sustentável e a abertura ao desenvolvimento em geral das regiões mais desfavorecidas. As disparidades em produção, produtividade e acesso ao emprego que persistem entre países e regiões provêm de deficientes estruturas em factores chave da competitividade, isto é, inadequadas estruturas em capital humano e físico, problemas ambientais e carências de capacidade de inovação e governação regional.

7.2

As oportunidades que as mutações industriais oferecem, dados os efeitos induzidos que produzem no tecido económico, no social, no científico e no envolvimento da sociedade civil e autoridades locais através da utilização combinada dos instrumentos e políticas da coesão social e das políticas estruturais comunitárias, podem ajudar significativamente e contribuir no processo do desenvolvimento sustentável e equilibrado.Com efeito, as mutações exigem um esforço de adaptação, de investigação, de inovação e de novas atitudes tanto da parte dos empresários como dos parceiros sociais e sociedade civil, actuando em parceria, sendo o objectivo o de ajudar as regiões a preservar e melhorar as suas estruturas económicas e sociais de uma forma equilibrada nas regiões em causa.

8.   As propostas de reforma do 3.o Relatório da Coesão Económica e Social

8.1

A Comissão propõe uma nova arquitectura para a política de coesão económica, social e territorial da UE, organizada em torno de três prioridades:

Convergência

O objectivo é o de apoiar o crescimento e a criação de emprego nos Estados-Membros e nas regiões menos desenvolvidas.

Competitividade regional e emprego — antecipar e promover a mudança

Esta prioridade é bem vinda no âmbito deste parecer, porque relaciona as mutações industriais com uma política de coesão, através de programas nacionais e regionais especificamente direccionados para os efeitos, a prevenção, a antecipação e a adaptação à evolução económica. Tudo isso, em ligação com as prioridades políticas da estratégia europeia para o emprego e promovendo a qualidade e a produtividade do trabalho, bem como a inclusão social.

Cooperação territorial europeia

O objectivo é o de promover um desenvolvimento harmonioso e equilibrado do território da União Europeia através de medidas que impulsionem a cooperação transfronteiriça e transnacional.

9.   Comentários sobre as propostas do 3.o relatório no âmbito da mutação e reestruturação industrial

9.1

O CESE congratula-se por o 3.o Relatório sobre a Coesão Económica e Social, apresentado em 18 Fevereiro, ter abordado o tema das «mutações industriais e económicas em geral» de uma forma explícita e objectiva.

9.2

Em particular dá o seu acordo aos princípios que estão na base das estratégias do terceiro Relatório de Coesão, bem como a ligação entre a estratégia de Lisboa e a futura política regional no que respeita aos programas orientados para o conhecimento e os programas nacionais e regionais com o fim de impulsionar o desenvolvimento económico das regiões menos favorecidas. No entanto, considera estas medidas insuficientes e formula as seguintes críticas:

a ausência de objectivos quantificados de concretização das medidas de coesão quer seja ao nível dos Estados-Membros quer seja a nível das regiões evidenciando à partida um afrouxamento das exigências de concretização dos objectivos;

a ausência da garantia que no próximo programa 2007-2013 exista uma maior coesão entre as regiões e não apenas entre os Estados-Membros conforme tem acontecido com os programas anteriores 1994-1999 e 2000-2006, o que, a não acontecer, evidencia a fraqueza da implementação das políticas e o fracasso da UE na sua política de coesão económica, social e territorial para as regiões menos favorecidas;

a ausência de um processo de controle específico para garantir que as regiões mais desfavorecidas serão contempladas com os meios financeiros necessários ao seu desenvolvimento, sendo de admitir, como aconteceu no passado, que as regiões mais favorecidas venham a beneficiar ainda mais que as menos desfavorecidas, dado a sua situação privilegiada em infra-estruturas produtivas e de prestação de serviços;

a ausência de propostas de incentivos às empresas que implementem uma política de responsabilidade social com efeitos positivos na política de coesão económica, social e territorial;

a ausência de um método eficaz de coordenação dos resultados das políticas de coesão e com penalizações para os Estados-Membros que não atingirem os objectivos estabelecidos para a política de coesão;

não é reconhecido o movimento das mutações industriais como um factor que pode gerar e contribuir para os desequilíbrios nas regiões devido à possibilidade de deslocação de empresas causando enormes perturbações a vários níveis; com efeito, as regiões afectadas correm o risco de o seu nível de coesão, em dado momento elevado, poder ficar muito afectado negativamente e colocando em risco a capacidade das regiões de recuperação a médio e longo prazo, não sendo percebidas no relatório quaisquer propostas específicas para a sua prevenção.

10.   Conclusões e recomendações

10.1

O CESE considera que as propostas de reforma da política de coesão apresentadas pela Comissão são insuficientes e que não se aproveita totalmente esta oportunidade de gestão da mudança, que é não só inevitável mas essencial, como expressão do dinamismo económico e como uma alavanca para o desenvolvimento sustentável. Todo isto, devido à falta de optimização et de combinação das oportunidades geradas pela Estratégia de Lisboa; da sua positiva abordagem das mutações, competitividade e coesão; da Agenda Política Social, que identifica a antecipação e gestão da mudança como um desafio chave; e da Estratégia Europeia do Emprego no que se refere ao pilar da adaptabilidade.

10.2

O CESE considera que é necessário atingir um equilíbrio entre o económico e o social e adoptar uma gestão das mutações industriais com um duplo objectivo, o qual deve ser a garantia e a promoção de objectivos sociais globais (formação, emprego, oportunidades e protecção social) e o assegurar da sobrevivência das empresas, através de políticas específicas de apoio que garantam a reestruturação e consolidação como uma condição da sua sobrevivência e de maior competitividade, através de acções integradas e complementares que envolvam os principais actores, isto é, o Estado (nos seus vários níveis: central, regional e local) e as empresas.

10.3

O CESE considera que é imprescindível para o sucesso da política de coesão económica, social e territorial uma maior e melhor coordenação na aplicação das políticas de desenvolvimento existentes na UE que envolvam: as directivas existentes que regulam o envolvimento dos trabalhadores nas empresas; o diálogo social transversal nos sectores industriais; a consulta regular à Comissão Consultiva das Mutações Industriais (CCMI) do próprio Comité; o Observatório Europeu das Mutações Industriais (EMCC); a aplicação dos fundos estruturais; a política de concorrência e a promoção da aplicação da responsabilidade social das empresas. Para este fim, é crucial o compromisso e empenhamento de todas as partes interessadas.

10.4

O CESE considera que é necessário estabelecer no âmbito das situações de reestruturação um conjunto de princípios que sejam a base e o suporte das boas práticas, envolvendo a necessidade de impulsionar a competitividade das empresas e as exigências de coesão económica, social e territorial.

10.5

O CESE considera que a continuada deterioração da competitividade da Europa em relação aos EUA resulta da ausência de exigência em relação ao cumprimento dos prazos pelos Estados-Membros na implementação das estratégias e instrumentos de base da UE, tais como: Estratégia de Lisboa, Reformas estruturais e Desenvolvimento sustentável.

A manter-se esta tendência, a UE corre o risco de passar de segunda para terceira potência mundial (atenção ao Japão, China e Índia!). É preciso evitar que isso aconteça. Por isso o CESE conclui que são necessários uma maior exigência e um papel mais activo da Comissão na coordenação e monitorização da implementação efectiva das estratégias referidas. Uma das principais medidas de coordenação seria a nomeação de um Comissário responsável pelo acompanhamento das mutações e deslocalizações industriais, a qual permitiria uma melhor articulação entre a política industrial e a protecção do meio ambiente.

No âmbito deste parecer de iniciativa, o CESE recomenda o seguinte:

a)

Impõe-se revisitar a visão estratégica sobre a coesão no contexto dos actuais desafios da UE através de uma definição renovada e reforçada do conceito de coesão, em que os seus contornos não se esgotem no economicismo dos fundos estruturais e de coesão e sejam reconsiderados à luz do seu triplo desígnio:

reforçar a coerência da economia europeia;

promover o «espírito de família europeia»;

promover a solidariedade entre os Estados e as regiões comunitárias.

b)

Convém alterar o critério absoluto do PIB per capita para determinar as elegibilidades, dado que este critério é fonte de iniquidades relativas na implementação das políticas estruturais. Como se sabe a riqueza relativa não é apenas traduzida pela frieza de um número como o PIB per capita. Os níveis de qualificação dos recursos humanos, os défices infra-estruturais, a distância do centro motor da economia europeia, a estrutura demográfica, devem ser factores relevantes para as elegibilidades das regiões comunitárias.

c)

Impõe-se criar uma nova matriz de critérios de avaliação das regiões de modo a produzir um renovado mapa da coesão europeia.

d)

No que respeita à coesão territorial, a gestão do território comunitário deve ser redesenhada de tal forma a permitir um desenvolvimento policêntrico, harmonioso, equilibrado e sustentado. Este planeamento espacial deve considerar a coesão inter-regional nas dimensões física e económica, integrando as autoridades locais, regionais, nacionais e europeias no sentido da construção de um modelo de desenvolvimento territorial europeu que conduzisse a novas estratégias económicas (investimento, I&D) e sociais (emprego).

e)

É necessário implementar uma lógica aceleradora na formulação das políticas estruturais relativas à coesão económica, social e territorial como forma de antecipação das mutações económicas em geral e em particular as restruturações industriais. O actual tecto de recursos financeiros da UE (1,24 % do Rendimento Nacional Bruto (RNB)) – e existe a possibilidade de reduzir esta percentagem nas perspectivas financeiras para 2007-2013 – é insuficiente para as necessidades e impõe uma lógica redutora na acção, o que impede atingir mais rapidamente os objectivos de coesão.

f)

Importa centrar-se nos recursos humanos, concentrando meios na educação profissionalizante e na formação profissional propriamente dita, mas com uma abordagem flexível, passível de se adaptar a diferentes matrizes de problemas que nesta área se colocam nos Estados-Membros e nas regiões.

g)

Há que apoiar especificamente as regiões que enfrentam dramáticas reestruturações da sua estrutura produtiva industrial através da identificação dos sectores e regiões em elevado risco de perda de competitividade e apresentar propostas específicas de apoio tendo em conta cada sector na sua especificidade. Deve existir um cuidado especial no que se refere ao impacto da reestruturação industrial nos novos Estados-Membros.

h)

No contexto da alínea anterior, é necessário estabelecer o «princípio de região mais favorecida» em que seria possível aplicar apoios monetários específicos com o objectivo de promover a reconversão da região. Neste contexto, o diálogo social tem um papel fundamental, bem como o diálogo civil que envolva todas as forças vivas presentes nela (empresas, universidades, centros de investigação, autoridades locais, associações, sindicatos, etc.). Conseguir-se-ia assim revitalizar o seu tecido económico através da criação de novas alternativas de actividade económica.

i)

Importa apoiar o desenvolvimento de «clusters» regionais através do impulso da expansão dos sectores de tecnologias de informação e comunicação e de industrias criativas e de forte base tecnológica que desenvolvam as potencialidades e competências das regiões promovendo a sua capacidade de atrair e fixar empresas. Deste modo contribuir-se-ia para que as mutações e reestruturações industriais sejam realizadas com o reforço da competitividade das regiões e do aumento da coesão económica, social e territorial e do emprego.

É crucial que sejam realizados estudos regionais e programar em conjunto com os governos nacionais e regionais como utilizar todo o potencial de uma região na construção do «cluster».

j)

Deve ser tida em conta a experiência positiva, no passado, com os programas sectoriais tais como RECHAR, RESIDER e RETEXT, na formulação de políticas de modernização industrial das regiões, para que possa ser aproveitado todo o seu crescimento potencial.

k)

A Comissão deve continuar a modernizar e activar a política industrial numa perspectiva de adequar as regras ao novo quadro mundial. Neste sentido, o CESE congratula-se pela recente proposta de revisão da política industrial, apresentada em 20 de Abril de 2004 (8). Importa especialmente velar pela coordenação entre a política industrial e outras políticas comunitárias e, especialmente, a ambiental.

l)

A Europa é levada a cumprir e fazer cumprir rigorosamente as regras da OIT e pode entrar numa crise económica devido à falta de competitividade das empresas europeias se nada for feito para terminar o «dumping» social e fiscal noutras regiões que não seguem no mesmo plano de igualdade as regras do jogo do mercado.

m)

A Europa tem de entrar no jogo mundial através da elevada competência técnica, tecnológica e humana, mas para isso necessita rever a sua política de apoios à investigação e principalmente ao capital humano. É sabido que dos cerca de 14000 investigadores europeus a estudar no EUA apenas cerca de 3000 pretendem regressar à Europa. Esta é uma situação gravíssima, que exige tomar as medidas adequadas imediatamente. Um bom passo nesta direcção é a iniciativa «Regions for Knowledge» (KnowREG), no quadro da qual foi decidida a criação, em 27 de Abril de 2004, de 14 projectos pilotos promovendo a economia do conhecimento a nível local e regional.

n)

O CESE salienta a necessidade do Conselho Europeu estabelecer uma ligação clara dos objectivos de competitividade e conhecimento com a futura política regional.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  JO C 10 de 14.1.2004, páginas 105 e seguintes.

(2)  Parecer de iniciativa do CESE sobre «As repercussões da política comercial sobre as mutações industriais, em particular no sector do aço» (CESE 668/2004).

(3)  Ibid.

(4)  N.T.: Tradução livre.

(5)  O CESE adoptará, em Setembro de 2004, um parecer de iniciativa sobre o «Alcance e consequências da deslocalização de empresas» (CCMI/014).

(6)  Parecer de iniciativa do CESE sobre «As áreas metropolitanas: implicações socioeconómicas para o futuro da Europa» (CESE 968/2004).

(7)  JO C 10 de 14.1.2004, páginas 105 e seguintes.

(8)  Comunicação da Comissão «Fostering structural change: an industrial policy for an enlarged Europe» (COM(2004) 274 final).


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/49


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Convenção internacional para os trabalhadores migrantes»

(2004/C 302/12)

Em 29 de Janeiro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu, nos termos do n.o 2 do artigo 23.o do Regimento, decidiu elaborar um parecer sobre a «Convenção internacional para os trabalhadores migrantes»

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 14 de Junho de 2004, sendo relator L. PARIZA CASTAÑOS.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o presente parecer por 162 votos a favor, 3 votos contra e 11 abstenções.

1.   Introdução

1.1

A «Convenção internacional sobre a protecção dos direitos de todos os trabalhadores migrantes e dos membros das suas famílias» foi adoptada pela Resolução 45/158 da Assembleia Geral das Nações Unidas, 18 de Dezembro de 1990, e entrou em vigor em 1 de Julho de 2003 após a ratificação pelos primeiros vinte Estados. Até agora, foi ratificada por 25 Estados (1). Trata-se de um tratado internacional que vincula os Estados que o ratifiquem.

1.2

A Convenção tem por objectivo a protecção dos direitos humanos e da dignidade das pessoas que emigram por razões económicas ou laborais em todo o mundo, mediante legislações adequadas e boas práticas nacionais. A promoção da democracia e dos direitos humanos devem constituir a base comum para uma adequada legislação internacional relativa às políticas migratórias. A Convenção garante igualmente o equilíbrio das diversas situações, tanto nos países de origem como nos países de acolhimento.

1.3

É um dos sete tratados internacionais sobre os direitos humanos das Nações Unidas e reconhece a protecção internacional de determinados direitos humanos fundamentais, definidos na Declaração Universal dos Direitos do Homem, para todos os trabalhadores migrantes e suas famílias. A Convenção codifica de modo integral e universal os direitos dos trabalhadores migrantes e dos membros das suas famílias, com base no princípio da igualdade de tratamento. Define os direitos aplicáveis a todos os imigrantes em situação regular e irregular, estabelece normas mínimas de protecção dos direitos civis, económicos, políticos, sociais e de trabalho e reconhece que todos os trabalhadores migrantes devem gozar de determinados direitos fundamentais protegidos por normas internacionais.

1.4

Desenvolvendo convénios anteriores da OIT (2), esta Convenção alarga o quadro jurídico a todas as migrações internacionais; promove um tratamento justo para todos os imigrantes e pretende impedir a exploração dos trabalhadores em situação irregular. Abrange todo o processo migratório: formação, selecção, saída e trânsito, residência nos Estados de emprego e regresso e reinstalação nos países de origem.

1.5

A gestão dos fluxos migratórios cabe aos Estados. O CESE, de acordo com o secretário-geral das Nações Unidas, pretende ver melhorar a cooperação bilateral, regional e internacional entre os países de origem e os países de acolhimento dos migrantes. O convénio não promove nem gere os fluxos migratórios, pretendendo apenas garantir o reconhecimento universal dos direitos humanos fundamentais e reforçar a sua protecção internacional.

1.6

A Convenção abrange de modo diferente a situação administrativa dos migrantes: garantia universal da protecção dos direitos humanos fundamentais, aplicando-se aos imigrantes em situação legal direitos mais desenvolvidos.

1.7

Através da Convenção, a comunidade internacional e a Organização das Nações Unidas reiteram a sua vontade de melhorar a cooperação entre os países a fim de prevenir e eliminar o tráfico e o trabalho clandestino dos imigrantes em situação irregular, e alargar a protecção dos direitos humanos fundamentais dos imigrantes em todo o mundo (3).

2.   Direitos dos imigrantes

2.1

A Convenção pretende garantir a igualdade de tratamento e as mesmas condições legais para os trabalhadores imigrantes e os trabalhadores nacionais, o que implica:

prevenir condições de vida e de trabalho desumanas, abuso físico e sexual e tratamento degradante, inclusivamente a escravatura (artigos 10.o, 11.o, 25.o, 54.o);

garantir os direitos dos imigrantes à liberdade de pensamento, de expressão e de religião (artigos 12.o, 13.o);

reconhecer o direito à vida privada e à segurança pessoal (artigos 14.o, 15.o, 16.o);

estabelecer o acesso à tutela judicial efectiva mediante processos judiciais justos que garantam o direito à igualdade perante a lei e à não-discriminação, aplicando-se a todos os trabalhadores imigrantes processos jurídicos adequados e com serviços de interpretação (artigos 18.o, 19.o, 20.o);

garantir aos imigrantes o acesso à informação sobre os respectivos direitos (artigos 33.o, 37.o);

garantir aos imigrantes a igualdade de acesso aos serviços de educação e sociais (artigos 27.o, 28.o, 30.o, 43.o, 45.o, 54.o);

reconhecer aos imigrantes o direito de se inscreverem e participarem em sindicatos (artigos 26.o, 40.o).

2.2

A Convenção também reconhece aos imigrantes o direito de manter a ligação ao respectivo país de origem, o que implica:

garantir o direito de regressar ao seu país de origem se assim o desejarem; permitir-lhes efectuar viagens ocasionais e manter laços culturais (artigos 8.o, 31.o, 38.o);

garantir a participação política dos imigrantes no seu país de origem (artigos 41.o, 42.o);

garantir aos imigrantes o direito de transferirem os seus ganhos e poupança para o país de origem (artigos 32.o, 46.o, 48.o).

2.3

A Convenção baseia-se na noção fundamental de que todos os imigrantes devem ter acesso a um nível mínimo de protecção. A Convenção abrange as duas situações (regular ou irregular) dos trabalhadores imigrantes; define uma lista de direitos mais alargados para os que se encontram em situação legal, reconhecendo igualmente alguns direitos fundamentais para os irregulares.

2.4

A Convenção propõe acções para erradicar a imigração ilegal, essencialmente através do combate à informação enganosa, tendente a incitar à imigração irregular, e mediante sanções contra os traficantes e os empregadores de imigrantes sem documentos.

2.5

Institui-se um comité de protecção dos direitos dos trabalhadores migrantes e dos membros das suas famílias, composto de dez peritos incumbidos de velar pela aplicação da Convenção e das suas disposições pelos Estados ratificantes.

3.   Os países ocidentais não ratificaram a Convenção

3.1

As migrações internacionais são consequência das grandes desigualdades económicas e sociais entre os países ricos do Norte e os países em desenvolvimento; desigualdades que estão a aumentar num sistema económico cada vez mais globalizado. Todavia, a maioria dos países que ratificaram a Convenção são países de origem dos imigrantes. Os Estados-Membros da União Europeia, os EUA, Canadá, Austrália, Japão e os outros países ocidentais, que acolhem grande número de imigrantes, (4) não ratificaram nem assinaram (5) a Convenção até à data.

3.2

A União Europeia, que pretende estabelecer normas internacionais em diversos domínios (na OMC para o comércio internacional, no âmbito de Quioto para o ambiente, etc.), também deverá promover a garantia dos direitos fundamentais dos imigrantes mediante normas internacionais.

4.   Política de imigração na União Europeia

4.1

A União Europeia constitui um espaço em que os direitos humanos são garantidos e respeitados, e em que se aplica a maior parte dos instrumentos jurídicos internacionais das Nações Unidas. Dispõe, igualmente, de instrumentos próprios, como a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e a Carta dos Direitos Fundamentais.

4.2

A União Europeia instituiu diversos instrumentos jurídicos de combate à discriminação (6). Todavia, diversos especialistas, bem como o Observatório Europeu do Racismo e da Xenofobia, (7), informaram das discriminações de que são alvo os imigrantes nas suas condições de trabalho.

4.3

A União Europeia está a elaborar, desde o Conselho Europeu de Tampere, uma legislação comum em matéria de asilo e imigração. Tampere definiu uma boa base política para a harmonização da legislação comunitária em matéria de imigração e asilo; bem como para melhorar a cooperação com os países terceiros na gestão dos fluxos migratórios. Foi igualmente acordado em Tampere o tratamento justo das pessoas e a necessidade de políticas de integração e de combate à discriminação.

4.4

A Comissão elaborou numerosas iniciativas legislativas que, todavia, enfrentam grandes dificuldades no Conselho (8). O resultado é escasso, quatro anos depois de Tampere. A legislação adoptada é decepcionante, muito afastada dos objectivos de Tampere, das propostas da Comissão, do parecer do Parlamento Europeu e do parecer do CESE. Torna-se muito difícil, no Conselho, alcançar acordos, em virtude dos bloqueios permitidos pelo sistema actual e da atitude de alguns governantes.

4.5

O Comité Económico e Social Europeu solicitou ao Conselho, em diversos pareceres, uma actuação mais responsável, com espírito mais construtivo e de maior cooperação. Torna-se cada vez mais necessário dotar a União Europeia de legislação comum adequada para gerir a imigração de modo legal e transparente.

4.6

O CESE elaborou diversos pareceres (9), nos quais propõe a adopção pela União Europeia de uma política adequada para a canalização da imigração económica através de vias legais, a fim de evitar a imigração clandestina e de combater o tráfico ilegal de pessoas.

4.7

É urgente a aprovação da directiva relativa às condições de entrada e residência e acesso dos imigrantes ao emprego, com base na proposta da Comissão (10) e tendo em conta o parecer do CESE (11).

4.8

O Conselho Europeu de Salónica considerou positiva a Comunicação da Comissão sobre imigração, integração e emprego (12), a qual assinala que haverá aumento considerável da imigração laboral para a União Europeia, o que tornará necessário dispor de legislação adequada para gerir a imigração de modo legal. A Comissão afirma, igualmente, a necessidade de políticas de integração da população imigrada, bem como de luta contra todas as formas de exploração e discriminação.

4.9

Algumas legislações nacionais sobre imigração não respeitam inteiramente os convénios internacionais sobre os direitos humanos, e até algumas directivas europeias (relativas ao reagrupamento familiar, por exemplo) são consideradas contrárias aos direitos humanos fundamentais por diversas ONG e pelo Parlamento Europeu. O CESE entende que os convénios internacionais sobre direitos humanos e a Carta dos Direitos Fundamentais da UE devem constituir a base de toda a estrutura legislativa europeia em matéria de imigração.

5.   Os valores da União Europeia no mundo

5.1

Ultimamente, os EUA implantaram uma lógica unilateral na governação dos assuntos internacionais. O que é grave para o sistema das Nações Unidas, colocando em perigo o único mecanismo existente para a resolução multilateral dos conflitos internacionais.

5.2

Com grandes dificuldades, a União Europeia está a construir uma política externa comum em que a ONU há-de desempenhar um papel crucial. O futuro tratado constitucional consolidará este mandato no domínio da política externa entre as missões comunitárias.

5.3

O multilateralismo constitui a base das relações externas da União Europeia, bem como o compromisso activo com o sistema das Nações Unidas. Num documento recente (13), a Comissão Europeia afirma: «O desafio que enfrentam actualmente as Nações Unidas é claro: a “governança” mundial continuará a ter um impacto reduzido enquanto as instituições multilaterais não puderem assegurar uma aplicação eficaz das suas decisões e regras, quer a nível das altas esferas políticas responsáveis pela paz e segurança internacionais, quer no que respeita à aplicação concreta dos compromissos assumidos durante as recentes conferências das Nações Unidas nos domínios social, económico e ambiental. A UE tem uma responsabilidade especial no que se refere a este aspecto: por um lado, fez do multilateralismo um princípio constante das suas relações externas, por outro, ao respeitar a aplicação dos seus compromissos internacionais (ou indo mesmo mais longe) pode e deve servir de modelo a muitos outros países.».

5.4

A globalização está a criar novas oportunidades e novos problemas na governação do mundo. As migrações implicam, actualmente, grandes problemas para os emigrantes e para os países de origem e de acolhimento. O desafio que se nos coloca consiste em transformar os problemas em oportunidades para todos, para os emigrantes, para os países de origem e de acolhimento. O multilateralismo e a cooperação internacional são a via para uma boa governação global, para se dispor de um sistema de regras e instituições estabelecidas pela comunidade internacional e universalmente reconhecidas.

5.5

Como afirmou o Secretário-Geral das Nações Unidas, Kofi ANNAN, no Parlamento Europeu, em 29 de Janeiro de 2004, a cooperação internacional é a melhor maneira de gerir as migrações internacionais, que crescerão nos próximos anos. Só através da cooperação internacional, bilateral, regional e global, se podem estabelecer alianças entre os países de origem e os países que acolhem imigrantes, no interesse de todos; fazer da imigração um motor de desenvolvimento; combater eficazmente os traficantes de pessoas; e acordar regras comuns para o tratamento dos imigrantes e a gestão da imigração.

5.6

A Europa é um espaço de liberdade, democracia, respeito dos direitos humanos de todas as pessoas. A fim de reforçar, no futuro, estes valores, os convénios internacionais que protegem os direitos humanos fundamentais devem ser ratificados por todos os Estados-Membros da União e os seus preceitos jurídicos incorporados na legislação comunitária e nacional.

5.7

O artigo 7.o do Projecto de Constituição para a Europa propõe a adesão da União à Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, que o CESE apoia. O CESE apoia, igualmente, a integração na Constituição da Carta dos Direitos Fundamentais da União, que constituirá uma base comum para os direitos de todas as pessoas na União Europeia.

5.8

Estes valores devem-se integrar igualmente nas relações internacionais da União. Com base nos convénios internacionais patrocinados pelas Nações Unidas, a Europa deve promover a criação de um quadro jurídico comum de protecção internacional dos direitos fundamentais de todos os seres humanos, sem distinção de origem nacional e seja qual for o seu lugar de residência.

6.   Proposta do CESE

6.1

Em conformidade com os pareceres que elaborou sobre a política europeia de imigração e com o parecer do Parlamento Europeu, o CESE propõe que os Estados-Membros da União Europeia ratifiquem a Convenção Internacional para a protecção dos Direitos de todos os imigrantes e dos membros das suas famílias, adoptada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas (Resolução n.o 45/158 de 18 de Dezembro de 1990), em vigor desde 1 de Julho de 2003.

6.2

O CESE apela ao presidente da Comissão e à Presidência em exercício do Conselho para que adoptem as iniciativas políticas adequadas, por forma que os Estados-Membros ratifiquem a Convenção durante os próximos 24 meses e que a UE ratifique também a Convenção quando o tratado constitucional autorizar a assinatura de acordos internacionais. A fim de facilitar a ratificação, a Comissão efectuará uma análise das legislações nacionais e comunitárias em relação com a Convenção. Acresce que os interlocutores sociais e outras organizações da sociedade civil associar-se-ão ao CESE e à Comissão na promoção da ratificação.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Azerbaijão, Belize, Bolívia, Bósnia e Herzegovina, Cabo Verde, Colômbia, Equador, Egipto, El Salvador, Gana, Guatemala, Guiné, Mali, México, Marrocos, Filipinas, Senegal, Seicheles, Sri Lanka, Tadjiquistão, Uganda, Uruguai.

(2)  Convenções n.o 97, de 1949 e n.o 143, de 1975.

(3)  Segundo a Organização Internacional para as Migrações, 175 milhões de pessoas residem actualmente em países distintos do de nascimento ou de nacionalidade.

(4)  55 % dos imigrantes residem na América do Norte e na Europa Ocidental.

(5)  Os signatários são Estados que manifestaram a vontade de uma futura adesão: Chile, Bangladesh, Turquia, Comores, Guiné-Bissau, Paraguai, São Tomé e Príncipe, Serra Leoa, Togo.

(6)  Directivas 2000/43 e 2000/78.

(7)  Ver o relatório de informação «Migrants, minorities and employment: exclusion, discrimination in 15 Member States of the European Union», Outubro de 2003.

(8)  Em 1994, a Comissão recomendou aos Estados-Membros a ratificação da Convenção no Livro Branco sobre Política Social Europeia (COM(1994) 333 final).

(9)  Ver os pareceres do CESE sobre o reagrupamento familiar, JO C 204 de 18.7.2000 e JO C 241 de 7.10.2002; sobre a comunicação da Comissão sobre uma política da Comunidade em matéria de imigração, JO C 260 de 17.9.2001; sobre o estatuto dos residentes de longa duração, JO C 36 de 8.2.2002; sobre as condições de entrada e residência para efeitos de trabalho, JO C 80 de 3.4.2002; sobre uma política comum em matéria de imigração clandestina, JO C 149 de 21.6.2002; sobre as condições de entrada e residência para efeitos de estudos, formação profissional ou voluntariado, JO C 133 de 6.6.2003, e sobre o acesso à cidadania da União Europeia, JO C 208 de 3.9.2003.

(10)  JO C 332 de 27.11.2001.

(11)  Parecer do CESE, JO C 80 de 3.4.2002 (relator: L. PARIZA CASTAÑOS).

(12)  Comunicação da Comissão COM(2003) 336 final e o parecer do CESE — JO C 80 de 30.3.2004 (relator: L. PARIZA CASTAÑOS).

(13)  COM(526) 2003 final «A União Europeia e as Nações Unidas: a escolha do multilateralismo».


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/53


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Segundo pilar da PAC: perspectivas de adaptação da política de desenvolvimento dos territórios rurais (Consolidação dos resultados da Conferência de Salzburgo)»

(2004/C 302/13)

Em 29 de Janeiro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o artigo 29.o, n.o 2, do Regimento, elaborar um parecer sobre: «Segundo pilar da PAC: perspectivas de adaptação da política de desenvolvimento dos territórios rurais (Consolidação dos resultados da Conferência de Salzburgo).»

A Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos.

Por ofício de 3 de Maio de 2004, remetido ao Comité Económico e Social Europeu por José Manuel Silva Rodríguez, da DG Agricultura, a Comissão Europeia fez saber que gostaria de conhecer em tempo útil a posição do Comité Económico e Social Europeu sobre o assunto. Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho de 2004), designou relator-geral Gilbert BROS e adoptou o presente parecer por 127 votos a favor e 9 abstenções.

1.   Introdução

1.1

A Comissão organizou, em Novembro de 2003, uma conferência, em Salzburgo, sobre o futuro da política comunitária de desenvolvimento rural na perspectiva do alargamento da União Europeia, que permitiu, à semelhança da Conferência de Cork a favor de um «meio rural vivo» (1):

reunir os principais intervenientes na elaboração e na execução da política de desenvolvimento rural;

propor, numa declaração, as principais orientações políticas dos intervenientes no desenvolvimento rural;

precisar os eixos de intervenção de um «fundo rural» a montante do debate orçamental sobre as perspectivas financeiras para o período de 2007-2013.

Por isso, o Comité propõe que a reflexão sobre as adaptações da política de desenvolvimento dos territórios rurais para o período de 2007-2013 assente nas conclusões da dita conferência.

1.2

O Comité, constatando que o alargamento da União Europeia introduz uma maior diversidade de territórios rurais mas sobretudo a preeminência da questão social e do emprego nos novos Estados-Membros, considera essencial circunscrever a coerência e a articulação entre a política regional e o segundo pilar da PAC.

1.3

A Comissão publicou dois documentos que apresentam as perspectivas financeiras para o futuro período de programação (2) e o terceiro relatório sobre a coesão (3). Ressalta destes documentos que a política regional integra plenamente a estratégia de Lisboa para tornar a União na economia baseada no conhecimento mais dinâmica do mundo e a futura política de desenvolvimento rural figura numa rubrica intitulada «Gestão e protecção sustentáveis dos recursos naturais», que faz referência à estratégia para o desenvolvimento sustentável. Esta rubrica abrange o primeiro pilar da PAC e os programas comunitários de protecção do ambiente.

1.4

As conclusões do Conselho Europeu de Gotemburgo, de 15 e 16 de Junho de 2001 (4), permitiram a adopção de uma estratégia europeia para o desenvolvimento sustentável, que precisa que a política agrícola comum e a sua evolução futura «deverão incluir, entre os seus objectivos, o de contribuir para alcançar um desenvolvimento sustentável, pondo maior ênfase em produtos saudáveis de elevada qualidade, em métodos de produção sustentáveis, incluindo a produção biológica, as matérias-primas renováveis e a protecção da biodiversidade» (5).

1.5

As conclusões do Conselho «Agricultura e Pesca», que teve lugar no Luxemburgo, em Junho de 2003, confirmam o reforço do segundo pilar da PAC em vista «… de promover o ambiente, a qualidade e o bem-estar dos animais e ajudar os agricultores a respeitar as normas de produção europeia que entrarão em vigor em 2005 (6)». Por isso, o presente parecer de iniciativa deverá analisar e aprofundar a reflexão sobre os três eixos de acção identificados em Salzburgo, nomeadamente, a agricultura competitiva, a protecção do ambiente e a contribuição para a coesão económica e social nos territórios rurais.

1.6

Os intervenientes no desenvolvimento rural frisaram igualmente na declaração final de Salzburgo que «é necessário e urgente proceder a uma simplificação significativa da política de desenvolvimento rural». Esta simplificação deve simultaneamente atribuir mais responsabilidade às parcerias dos programas na formulação e execução de estratégias globais.

1.7

O Comité, no presente parecer de iniciativa, propõe-se examinar a coerência entre a futura política regional e a futura política de desenvolvimento rural a fim de limitar as «zonas cinzentas», aprofundar a proposta dos três futuros eixos que constituem a política de desenvolvimento rural e identificar os factores de simplificação administrativa.

A.   COMPLEMENTARIDADE ENTRE POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL E DE DESENVOLVIMENTO RURAL

2.   Política regional: do princípio da coesão económica e social ao princípio da solidariedade territorial

2.1

A adopção do Acto Único, em 1986, acelerou o processo de integração das economias dos Estados-Membros. Não obstante, a diversidade dos níveis de desenvolvimento das regiões do território da União Europeia e a sua concorrência lançaram as bases de uma verdadeira política de coesão, enquanto contrapartida das restrições impostas pelo mercado único aos países do Sul da Europa e às regiões desfavorecidas. Posteriormente, o Tratado da União Europeia, entrado em vigor em 1993, consagrou a política de coesão económica e social.

2.2

Paralelamente, o desenvolvimento das relações comerciais da União e a abertura gradual do mercado interno exacerbaram a concorrência entre as regiões europeias quando elas não dispunham dos mesmos trunfos. Nos anos noventa, a política estrutural procurou, pois, dar resposta aos principais reptos seguintes:

reduzir as diferenças de desenvolvimento apoiando a criação de emprego nas zonas desfavorecidas;

compensar as desvantagens das regiões que não beneficiam de condições idênticas nem de acesso ao mercado mundial;

apoiar os factores criadores de riqueza nas zonas desfavorecidas.

2.3

No prolongamento dos elementos da política estrutural existente, a reforma decidida em 1999 (Agenda 2000) teve em vista:

intensificar a transferência financeira das regiões «mais bem dotadas» para as regiões menos desenvolvidas (redução do número dos objectivos e 75 % dos fundos consagrados ao objectivo 1),

fomentar as relações económicas entre estas regiões (Interreg III),

apoiar a integração das regiões menos desenvolvidas no mercado único graças ao Fundo de Coesão.

2.4

A declaração dos ministros dos Estados-Membros da União Europeia responsáveis pelo ordenamento do território [Postdam, 10 e 11 de Maio de 1999 (7)] e as conclusões do Conselho Europeu de Gotemburgo (Junho de 2001) sobre a elaboração de uma estratégia europeia para o desenvolvimento sustentável sublinham a necessidade de uma coesão territorial para um desenvolvimento equilibrado e sustentável dos territórios da União Europeia. No extremo desta evolução, a Convenção propõe, no artigo 3.o do projecto de Constituição da Europa, a inclusão da coesão territorial nos objectivos da União (8).

2.5

Mais, o Regulamento (CE) n.o 1260/99 (9), que estabelece disposições gerais sobre os Fundos Estruturais, reconhece que o desenvolvimento do potencial endógeno das zonas rurais permanece um objectivo prioritário de desenvolvimento e de ajustamento estrutural das regiões menos desenvolvidas.

2.6

À luz da evolução dos princípios que regem a política estrutural — o apoio ao crescimento e o desenvolvimento sustentável — o Comité convida a Comissão e o Conselho a recordar, no âmbito da coesão territorial, que o desenvolvimento dos territórios rurais deve permanecer um dos objectivos prioritários da política regional. Assim, as problemáticas da criação de emprego, da formação contínua e do acesso às novas tecnologias da informação no meio rural devem encontrar resposta nesta política.

3.   Política de desenvolvimento rural: da Europa verde ao Compromisso do Luxemburgo

3.1

As mudanças ocorridas na agricultura nos últimos cinquenta anos são substanciais. Com o decorrer do tempo, ditaram a evolução da política comunitária das estruturas agrícolas. De 1962 a 1972, a intervenção comunitária cingiu-se à coordenação das medidas de gestão dos mercados, que davam os primeiros passos. De 1972 a 1985, emergiram duas grandes categorias de acções complementares: por um lado, as acções horizontais, aplicáveis em todos os Estados-Membros (formação profissional, reforma antecipada, etc.) e, por outro, as acções regionais vocacionadas para reduzir os obstáculos naturais e estruturais e para promover a agricultura em geral.

3.2

De 1985 a 1999, a procura de um equilíbrio entre a necessária melhoria da competitividade da agricultura europeia e o adaptação do potencial de produção às necessidades do mercado, a protecção do ambiente e o desenvolvimento das regiões desfavorecidas fizeram da política das estruturas agrícolas a vertente agrícola da nova estratégia da política regional. Assim, a política das estruturas leva a efeito, para além das acções horizontais, acções de manutenção do espaço rural, de protecção do ambiente, de desenvolvimento das infra-estruturas rurais e turísticas e das actividades agrícolas.

3.3

Com base na conferência de Cork, a «Agenda 2000» permitiu instaurar uma política integrada de desenvolvimento rural mediante dois instrumentos jurídicos (FEOGA-Garantia e FEOGA-Orientação), cujo objectivo era melhorar a coerência entre política de desenvolvimento rural (segundo pilar da PAC) e política de mercados (primeiro pilar da PAC), promovendo, nomeadamente, a diversificação da economia rural.

3.4

De resto, foi introduzido o mecanismo voluntário de modulação das ajudas directas, que permite aumentar os meios financeiros para as medidas agroambientais, a reforma antecipada, a arborização das zonas agrícolas ou as medidas destinadas às zonas desfavorecidas mediante um direito nivelador sobre as ajudas compensatórias à redução dos preços institucionais decidida nas organizações comuns de mercado dos produtos agrícolas.

3.5

O Regulamento (CE) n.o 1257/99 (10), que versa sobre o apoio do FEOGA ao desenvolvimento rural, assenta nas considerações seguintes:

as medidas de desenvolvimento rural devem acompanhar e complementar as políticas de mercado;

as três medidas de acompanhamento instituídas pela reforma da PAC de 1992 devem ser complementadas pelo regime para as zonas desfavorecidas (desvantagens naturais) e as regiões com condicionantes ambientais;

as outras medidas de desenvolvimento rural devem fazer parte de programas de desenvolvimento integrado a favor das regiões dos objectivos n.os 1 e 2.

3.6

O grupo de 22 medidas, que os Estados-Membros podem incluir na sua programação em matéria de desenvolvimento rural, reparte-se do modo seguinte na programação de 2000-2006 (11): 39,2 % para o reforço da competitividade e a adaptação da agricultura, 35 % para as zonas desfavorecidas e as medidas agroambientais e 25,8 % para a adaptação e o desenvolvimento das zonas rurais.

3.7

A reforma da PAC, aprovada em Junho de 2003, consolidou uma das missões da política de desenvolvimento rural, isto é, o acompanhamento da adaptação da agricultura às exigências da sociedade. O âmbito das medidas foi alargado à promoção da qualidade dos produtos, à melhoria das normas de produção (ambiente, bem-estar dos animais), à execução do programa Natura 2000 e ao reforço das medidas a favor da instalação dos jovens agricultores.

3.8

De resto, o mecanismo de modulação passa a ser obrigatório a nível europeu, devendo corresponder a uma transferência financeira de cerca de 1,2 mil milhões de euros, num ano completo, da política de mercado para a política de desenvolvimento rural.

3.9

À luz desta evolução, o Comité frisa que o segundo pilar da PAC deve prosseguir como primeiro objectivo o acompanhamento da agricultura na sua adaptação para responder às evoluções estruturais das expectativas dos cidadãos.

3.10

A comunicação da Comissão sobre as perspectivas financeiras para o período de 2007 a 2013 apresenta um orçamento estável, mas modesto, traduzindo-se num nível dos recursos próprios da União Europeia em 1,24 % do PNB. O Comité subscreve a proposta da Comissão e frisa que uma redução dos recursos comunitários emitiria um sinal negativo no momento da realização do alargamento da União Europeia.

3.11

Esta observação vale também para a política de desenvolvimento rural. Com efeito, o único recurso «suplementar» para esta política seria a aplicação do princípio de modulação, o que equivale a permitir unicamente uma transferência financeira entre o primeiro e o segundo pilares da PAC. Por isso, o Comité insta com o Conselho e com o Parlamento Europeu para que atribuam a esta política meios financeiros congruentes, sob pena de a exaurir.

3.12

A futura política de desenvolvimento rural será posta em prática por uma nova Comissão constituída por 25 comissários. A gestão dos dois pilares da PAC por comissários diferentes implicaria um risco real de perda de coerência entre estas duas políticas. O Comité faz questão de manifestar a sua oposição a toda a vontade de criar direcções-gerais distintas e de nomear comissários diferentes para a agricultura e para o desenvolvimento rural.

4.   Papel da multifuncionalidade da agricultura na política de desenvolvimento rural

4.1

O Comité frisou, em pareceres anteriores (12), que os mercados agrícolas são instáveis por natureza e estão sujeitos, em larga medida, a variações de preços. Por isso, os mecanismos de regulação da procura e da oferta são o imperativo para que as explorações agrícolas possam satisfazer as condições de uma produção agrícola sustentável. O Comité sublinha que a manutenção de uma política a favor da regulação dos mercados dos produtos agrícolas contribui igualmente para o êxito de uma política de desenvolvimento dos territórios rurais.

4.2

Aliás, a supressão do vínculo entre o acto de produção e o auxílio público à agricultura foi introduzida na última reforma da PAC, em 26 de Junho de 2003. Esta evolução acentua a necessidade de uma perspectiva de desenvolvimento económico das actividades agrícolas para reflectir melhor as novas exigências, como a biodiversidade, a preservação de paisagens ou a criação de emprego pelo sector. O Comité faz, pois, questão de recordar que a actividade de produção agrícola concorre, em primeira instância, para a emergência de um mundo rural vivo porque estabelece um vínculo directo entre a actividade humana e o seu território.

4.2.1

A implantação territorial dos sistemas de produção, os meios de valorização da produção agrícola, nomeadamente mediante o desenvolvimento das denominações de origem protegida (DOP) e das indicações geográficas protegidas (IGP), e a venda directa são alguns dos aspectos da multifuncionalidade da agricultura em prol do desenvolvimento rural.

4.3

A agricultura representará na União dos 25 mais de 13 milhões de empregos directos e mais de 5 milhões de empregos indirectos nos sectores a montante e a jusante da agricultura. Estes empregos são, por natureza, fortemente «territorializados» e a evolução das trocas intracomunitárias, para uma parcela cada vez mais preponderante dos produtos agroalimentares transformados, reforça o vínculo entre o sector agrícola e o sector agroalimentar. Manter e repartir a actividade agrícola nos territórios rurais converte-se, pois, numa prioridade para evitar que se transforme em factor restritivo da integração das zonas rurais na economia regional.

4.4

A actividade agrícola estender-se-á a 45 % do território europeu, o que corresponde a 190 milhões de hectares (UE dos 27). Em 2001, mais de 10 % da superfície agrícola útil (SAU) estava sujeita a medidas agroambientais. 15 % das zonas classificadas ao abrigo da directiva «preservação dos habitats naturais e conservação das aves selvagens» são terras agrícolas e 38 % das terras agrícolas (UE dos 15) foram designadas «zonas vulneráveis aos nitratos». Estas medidas respondem a objectivos locais de preservação do ambiente e/ou ordenamento do território. Escusado será dizer que a actividade agrícola ocupará sempre um lugar primordial na gestão do território.

4.5

O Comité faz questão de recordar que a multifuncionalidade da produção agrícola concorre, sob vários aspectos, para a manutenção de um mundo rural vivo. A Comissão e o Conselho devem recordá-lo antes de qualquer nova orientação da política de desenvolvimento rural.

4.6

Embora subscrevendo as conclusões da Conferência de Salzburgo sobre a diversificação da economia rural, o Comité frisa que conviria evitar o senão do «processo de rurbanização», isto é, aplicar às zonas rurais as mesmas acções de desenvolvimento das zonas urbanas. A este título, o Comité elabora actualmente um parecer de iniciativa sobre a agricultura periurbana (13). Por isso, o eixo «diversificação da economia rural», no âmbito da política de desenvolvimento rural, deveria concentrar-se em torno de certas temáticas em ligação estreita com a agricultura, nomeadamente os serviços prestados à população agrícola para melhorar a sua qualidade de vida, o desenvolvimento do agroturismo e o apoio à pluriactividade associada à agricultura.

5.   Especificidades e limites da política de desenvolvimento rural

5.1

As conclusões do terceiro relatório sobre a coesão apontam que as disparidades persistentes entre as regiões em matéria de produção sustentável, de produtividade e de criação de emprego são fruto de insuficiências estruturais que afectam os principais factores de competitividade. O Comité frisa que a política de desenvolvimento rural deve igualmente inspirar-se nestes princípios para que se inscreva num processo de desenvolvimento estrutural dos territórios rurais.

5.2

O alargamento da União Europeia agrava a problemática do desenvolvimento económico dos territórios rurais devido à forte presença de um «desemprego oculto» nos novos Estados-Membros, o que complica ainda mais a distinção entre política regional e política de desenvolvimento rural. O Comité propõe que as temáticas comuns à política regional e ao desenvolvimento rural sejam especificadas num novo regulamento sobre os fundos estruturais e que o número de medidas que podem ser financiadas por estas políticas seja limitado a fim de favorecer uma melhor visibilidade de cada uma delas.

5.3

Se a agricultura, por si só, não pode pretender assumir o desenvolvimento dos territórios rurais, não é menos verdade que este sector de actividade é indispensável ao sucesso de uma política de desenvolvimento rural. O vínculo dos empregos directos e indirectos ao território e a extensão do espaço em causa fazem que o acompanhamento da agricultura na sua adaptação às evoluções das expectativas dos cidadãos conserve a prioridade. De resto, o primeiro e o segundo pilares da PAC participam nos objectivos de desenvolvimento rural mantendo ou reforçando as actividades agrícolas.

5.4

O alargamento da União Europeia representa igualmente um repto importante para o futuro da PAC. O Comité sublinha que os intercâmbios de experiências e as transferências de metodologias deveriam igualmente ocupar um lugar marcante nas condições de aplicação do segundo pilar da PAC no próximo período.

5.5

O Comité assinala ainda que as regiões muito escassamente povoadas, como as ilhas, os espaços árcticos e as zonas de montanha, traduzem sempre, por força das suas desvantagens naturais permanentes, uma problemática concreta face à conclusão do mercado único. A política regional e a política de desenvolvimento rural devem contemplar este aspecto nas suas modalidades de aplicação, nomeadamente propondo uma taxa de co-financiamento superior que reflicta estas restrições. Ademais, o Comité elabora actualmente um parecer de iniciativa (14) que versa, mais particularmente, sobre as modalidades que permitem uma melhor integração das zonas em situação de desvantagem natural na economia regional.

5.6

Por fim, o Comité acentua que a política de desenvolvimento rural e a política regional não são os únicos meios de acção dos poderes públicos em prol de um desenvolvimento harmonioso dos territórios da União Europeia. O Comité recorda que a implantação territorial adequada dos serviços públicos prestados à população participa igualmente no objectivo de coesão territorial.

B.   ANÁLISE DAS PROPOSTAS DE APERFEIÇOAMENTO DAS MEDIDAS

6.   Medidas decididas no âmbito do Compromisso do Luxemburgo de 26 de Junho de 2003

6.1

A reforma da PAC de Junho de 2003 confirmou a necessidade de reforçar o vínculo entre o segundo pilar da PAC, dedicado ao desenvolvimento rural, e a adaptação do primeiro pilar. Assim, foram estabelecidas novas medidas de acompanhamento do primeiro pilar da PAC, que passaram de 22 a 26.

6.1.1

Foram introduzidas duas novas medidas a fim de promover a qualidade dos alimentos (participação voluntária num programa nacional de marcas de qualidade reconhecidas e acções de promoção e de informação destes produtos junto dos consumidores). Outras duas medidas prendem-se com a adaptação das técnicas de produção às normas europeias em matéria de ambiente, de bem-estar dos animais, de fitossanidade e de sanidade animal.

6.1.2

Foram adaptadas várias medidas vigentes (consideração de questões de bem-estar dos animais nas medidas agroambientais, reforço do apoio público à instalação dos jovens agricultores, aplicação da directiva relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens e financiamento dos investimentos em florestas geridas segundo critérios ambientais e sociais).

6.2

Quanto aos novos Estados-Membros, foi adoptado um instrumento temporário de desenvolvimento rural para o período de 2004-2006, que financiará, para além das quatro novas medidas de acompanhamento, a ajuda ao agrupamento dos agricultores, as medidas especiais para as explorações agrícolas em regime de semi-subsistência, a assistência técnica e um complemento às ajudas directas do primeiro pilar da PAC.

7.   Novas pistas para os 3 eixos adoptados em Salzburgo

7.1

A conclusão do mercado único e a abertura gradual do mercado interno a economias agrícolas que beneficiam de vantagens comparativas naturais ou de normas ambientais mínimas fazem que o modelo agrícola europeu se veja forçado a melhorar a sua competitividade.

7.2

O Comité sustenta, pois, que o eixo da «ajuda aos investimentos nas explorações agrícolas», no âmbito da política de desenvolvimento rural, deveria ser reforçado. Os investimentos que permitem às explorações agrícolas contemplar tanto as exigências ambientais como a melhoria do bem-estar dos animais e das condições de trabalho deveriam ser apoiados, tanto mais que contribuem para consolidar a actividade agrícola num dado território

7.3

O Comité acentua que a aplicação da medida «assessoria agrícola», que permite apoiar a adaptação às novas normas de produção, deverá ser antecipada. Com efeito, ela só poderá ser aplicada eficazmente nos Estados-Membros a partir de 2006, quando a condicionalidade será aplicada em 2005.

7.4

O enfraquecimento dos instrumentos de regulação dos mercados de produtos agrícolas, as alterações climáticas e as medidas ligadas às crises sanitárias fazem ressaltar, há vários anos, a importância de controlar o volume de negócios das explorações. No contexto da reforma da PAC aprovada em 2003, a Comissão prevê estudar num relatório a utilização a nível nacional de uma taxa de modulação para medidas específicas destinadas a fazer face aos riscos, às crises e às catástrofes naturais. O Comité recorda que a Comissão deve transmitir este relatório até ao fim de 2004 e abordar igualmente as pistas, nacionais e comunitárias, de desenvolvimento dos regimes de seguro agrícola. Solicita, eventualmente, que a contribuição do segundo pilar da PAC seja analisada como instrumento de acompanhamento.

7.5

A futura política de desenvolvimento rural deveria confirmar como segundo eixo a protecção do ambiente e o ordenamento do território, recorrendo principalmente às medidas agroambientais e à compensação de desvantagens naturais, com base em critérios comuns para assegurar a manutenção do equilíbrio territorial.

7.6

A reforma da PAC introduziu o princípio da condicionalidade das ajudas directas à agricultura ao respeito da legislação comunitária (19 directivas e regulamentos) em matéria de ambiente, saúde pública, sanidade animal e fitossanidade e bem-estar dos animais. O Comité sublinha que este novo aspecto do primeiro pilar da PAC não deve ser confundido com as medidas agroambientais, que não respondem a uma lógica regulamentar mas apoiam acções voluntárias e participativas dos agricultores com vista a introduzir métodos de produção agrícola concebidos para proteger o ambiente e preservar o espaço natural.

7.7

O Comité frisa que as disposições administrativas para a aplicação das medidas agroambientais deveriam ser simplificadas. Assim, a definição dos objectivos destas medidas deveria pautar-se pelo princípio da subsidiariedade. Interroga-se igualmente sobre a necessidade de alargar ainda o âmbito destas medidas a outras problemáticas ambientais, vista a estabilidade orçamental. No entanto, deveria ser dada uma atenção especial às medidas agroambientais que privilegiassem a diversidade dos sistemas de produção agrícola no intuito de preservar o equilíbrio dos sistemas.

7.7.1

À luz da declaração do Conselho Europeu de Gotemburgo, as medidas agroambientais em cada programa nacional deveriam passar a ser obrigatórias.

7.7.2

O Comité frisa que o financiamento do programa Natura 2000 não deveria fazer-se em detrimento de outras medidas. Por isso, deseja que a Comissão identifique novos financiamentos para compensar os custos incorridos pela aplicação da directiva «preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens».

7.8

O terceiro eixo da futura política de desenvolvimento rural deveria centrar-se na diversificação da economia rural em relação com a actividade agrícola a fim de contribuir para a permanência da população no espaço rural.

7.9

A Comissão assinala no terceiro relatório sobre a coesão que três tipos de acções, nomeadamente o turismo, o artesanato e o património rural, devem inscrever-se no âmbito comum da política regional e da política de desenvolvimento rural. No entender do Comité, convém conservar este equilíbrio. Por outro lado, parece que as infra-estruturas rurais deixariam de ser financiadas pelos fundos estruturais. O Comité opõe-se, pois, a que uma transferência da responsabilidade por este tipo de investimento se opere da política regional para a política de desenvolvimento rural.

7.10

De resto, o Comité propõe que, à luz da evolução da política regional, as acções de renovação ou de valorização do património rural não inseridas num projecto agroturístico deixem de competir à política de desenvolvimento rural.

7.11

Por fim, o Comité propõe que o eixo «economia rural» integre uma série de serviços que permitem melhorar a qualidade de vida da população agrícola (serviços de substituição dos agricultores, por exemplo).

C.   MELHORIA DAS CONDIÇÕES DE GESTÃO DA POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO RURAL

8.

O primeiro ponto a requerer a melhoria das condições de gestão é a continuidade da programação dos planos de desenvolvimento rural. O Comité apoia, pois, a Comissão no seu esforço de elaboração da nova política de desenvolvimento rural a fim de limitar ao máximo o «tempo de latência» entre dois períodos de programação.

8.1

As dificuldades surgidas em certos Estados-Membros na aplicação administrativa da política de desenvolvimento rural revelam que a intervenção de vários instrumentos financeiros com regras diferentes pode obstar a uma melhor visibilidade da acção pública. Assim, o progresso que representava o agrupamento das acções em prol do desenvolvimento rural no mesmo regulamento foi entendido pelos beneficiários como uma fonte de complexidade administrativa suplementar.

8.2

A simplificação da programação implica que não haja mais do que um fundo para gerir as acções relativas à política de desenvolvimento rural. No entanto, o Comité sublinha que as modalidades de gestão deste fundo único devem ser coerentes com as aplicadas aos demais fundos estruturais.

8.3

A estruturação da futura política de desenvolvimento rural em três eixos (competitividade da agricultura, ordenamento do território e diversificação da economia rural) deveria igualmente reflectir-se na elaboração do próximo regulamento sobre o desenvolvimento rural. Este poderia indicar os princípios de intervenção e os objectivos dos três eixos e enumerar os tipos de acção possíveis (ajuda ao investimento, empréstimo bonificado, financiamento público plurianual em garantia de certas especificações, assistência técnica, engenharia financeira, etc.). As modalidades de aplicação de cada uma das medidas adoptadas deveriam competir à subsidiariedade nacional. O Comité acentua que a gestão de uma única decisão por Estado-Membro através de um documento estratégico teria a vantagem de estabelecer um quadro comunitário fixo para o período de programação.

8.4

O actual processo de adopção das alterações das medidas em comité STAR (Comité de Gestão das Estruturas Agrícolas e do Desenvolvimento Rural) carece de flexibilidade porque a fase de avaliação ex-ante é excessivamente longa. O Comité propõe que o novo processo se inspire no da validação dos auxílios estatais, isto é, quando o plano de desenvolvimento rural for adoptado no princípio da programação, as alterações das medidas poderiam ser transmitidas à Comissão para exame da legalidade (avaliação ex-post).

8.5

A validação dos programas operacionais deveria competir à subsidiariedade nacional ou infranacional, consoante a organização dos Estados. A Comissão assumiria, pois, a responsabilidade de garantir que as acções dos Estados-Membros não prejudicassem o mercado interno, evitando qualquer distorção de concorrência, de verificar a legalidade das modalidades de intervenção e de assegurar a coerência com os fundos estruturais. O Comité sublinha igualmente que a Comissão, por força da experiência acumulada, poderia acompanhar as acções de transferência de experiências no âmbito da assistência técnica, nomeadamente no caso dos novos Estados-Membros.

8.6

O Comité faz votos por que o número das etapas para a validação dos programas seja reduzido, delimitando a responsabilidade de cada um dos níveis de decisão: Comissão – Estados-Membros – pessoas colectivas territoriais.

8.7

A escolha de um fundo único para as acções relativas à política de desenvolvimento rural tende igualmente a simplificar a gestão financeira. Na lógica dos fundos estruturais, este novo fundo deveria incorporar as suas principais características:

basear-se num calendário previsional e anual,

efectuar uma programação plurianual,

beneficiar de modalidades de pagamento mais flexíveis do que as do FEOGA-Garantia (dotações para autorizações — dotações para pagamentos).

8.8

A questão dos controlos prende-se igualmente com a simplificação da gestão administrativa da política de desenvolvimento rural. O Comité subscreve as orientações da Comissão apresentadas no âmbito do terceiro relatório sobre a coesão, nomeadamente a respeitante à proporcionalidade das missões de controlo. Abaixo de um determinado limite, o Estado-Membro poderia optar por aplicar o sistema nacional de controlo aos programas em causa. O Comité sublinha que estas orientações deveriam aplicar-se à gestão da política de desenvolvimento rural na medida em que assegurassem a mesma eficácia de controlo e, logo, a boa utilização dos fundos comunitários.

8.9

A reserva de eficiência instituída pelos fundos estruturais, no âmbito da Agenda 2000, é entendida como uma medida de frustração na sequência das vicissitudes da aplicação administrativa dos programas. De resto, a sua atribuição tão-só em função do critério da utilização das dotações poderia ter repercussões negativas incitando a uma programação rápida seguida de um acompanhamento rigoroso da execução destas operações, o que não se coaduna com um programa plurianual de desenvolvimento rural. Por isso, o Comité frisa que o princípio da reserva de eficiência não deveria ser aplicado à futura política de desenvolvimento rural.

8.10

A questão da parceria responde igualmente a uma lógica de simplificação da aplicação dos programas. À semelhança do que se passa no âmbito da política regional, o Comité pretende que cada Estado-Membro se esforce por organizar a cooperação não só entre os diferentes escalões da administração mas também com os parceiros sociais e os representantes da sociedade civil organizada, desde a fase de concepção à fase de execução e de acompanhamento dos programas.

8.11

Desde o lançamento da iniciativa Leader em 1989, o lugar central conferido à procura de novas pistas de desenvolvimento nas zonas rurais tem contribuído para o sucesso desta iniciativa da Comissão. Mais, a actual fase de programação evidenciou o efeito multiplicador do intercâmbio de experiências facilitando as parcerias entre agrupamentos de acções locais de países diferentes. O Comité acentua que a iniciativa Leader deveria continuar a acompanhar as iniciativas locais explorando novas pistas de desenvolvimento para as zonas rurais, nomeadamente através de uma rubrica identificada na política de desenvolvimento rural: capacidade de antecipar as necessidades de formação contínua num território, procura de novas saídas para os produtos agrícolas e desenvolvimento de sinergias entre agentes económicos num mesmo território são outros tantos assuntos que podem vir a projectar uma nova luz sobre o futuro da política de desenvolvimento rural. O Comité subscreve, pois, a continuação da iniciativa Leader no âmbito da política de desenvolvimento com vista à procura de soluções inovadoras para o desenvolvimento das zonas rurais.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Conferência Europeia sobre o Desenvolvimento Rural, Cork (Irlanda), de 7 a 9 de Novembro de 1996.

http://www.europa.eu.int/comm/agriculture/rur/cork_fr.htm (também em EN e DE).

(2)  COM(2004)101.

(3)  COM(2004)107.

(4)  Conselho Europeu de Gotemburgo, 15-16 de Junho de 2001;

http://europa.eu.int/comm/gothenburg_council/sustainable_fr.htm (também em EN).

(5)  Conclusões da Presidência, Conselho Europeu de Gotemburgo, 15 e 16 de Junho de 2001, ponto 31, documento n.o 200/1/01.

(6)  2516.a sessão do Conselho — Agricultura e Pesca — Luxemburgo, 11, 12, 17, 18, 19, 25 e 26 de Junho de 2003; 10272/03 (Imprensa 164), p. 7, ponto 3.

(7)  Potsdam, Maio de 1999.

http://europa.eu.int/comm/regional_policy/sources/docoffic/official/reports/som_fr.htm (também em EN e DE)

(8)  Artigo 3.o: Os objectivos da União: «3. A União […] promove a coesão económica, social e territorial, e a solidariedade entre os Estados-Membros».

http://european-convention.eu.int/docs/Treaty/cv00850.pt03.pdf

(9)  Regulamento (CE) n.o 1260/1999 do Conselho, de 21 de Junho de 1999, que estabelece disposições gerais sobre os Fundos Estruturais, JO L 161 de 26.6.1999, p. 1– 42 .

(10)  Regulamento (CE) n.o 1257/1999 do Conselho de 17 de Maio de 1999 relativo ao apoio do Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA) ao desenvolvimento rural e que altera e revoga determinados regulamentos, JO L 160 de 26.06.1999 p. 80–102.

(11)  Fact Sheet «O desenvolvimento rural na União Europeia» — p. 9, Serviço das Publicações Oficiais da União Europeia, 2003.

(12)  «Uma política para a consolidação do modelo agrícola europeu», JO C 368 de 20.12.1999, p. 76-86.

«O futuro da PAC», JO C 125 de 27.5.2002, p. 87-99.

(13)  «A agricultura periurbana», projecto de parecer CES 1324/2003 (aprovação prevista na plenária de Setembro de 2004).

(14)  «Como garantir uma melhor integração das regiões em situação de desvantagem natural e estrutural permanente», anteprojecto de parecer, R/CESE 631/2004 (aprovação prevista na plenária de Setembro de 2004).


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/60


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Terceiro relatório sobre a coesão económica e social — Uma nova parceria para a coesão: convergência, competitividade e cooperação»

[COM(2004) 107 final]

(2004/C 302/14)

Em 8 de Dezembro de 2003, a Comissão Europeia decidiu, de harmonia com o disposto no artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o «Terceiro relatório sobre a coesão económica e social — Uma nova parceria para a coesão: convergência, competitividade e cooperação»

Em 8 de Junho de 2004, a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer com base no projecto do relator P. BARROS VALE.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 118 votos a favor, nenhum voto contra e 5 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

O Terceiro Relatório da Coesão económica e social, designado «Uma nova parceria para a Coesão — Convergência, Competitividade, Cooperação», apresenta o balanço da política de coesão na União Europeia (UE), designadamente os progressos registados nas vertentes económica, social e territorial, e as perspectivas para o futuro.

1.2

O documento está estruturado em quatro partes fundamentais, incluindo ainda uma síntese do relatório nas suas páginas iniciais, bem como a proposta para a reforma da política de coesão, que é apresentada como conclusão:

Parte I — Coesão, competitividade, emprego e crescimento — Situação e tendências;

Parte II — Contributo das políticas dos Estados-Membros para a coesão;

Parte III — Contributo das políticas comunitárias: competitividade emprego e coesão;

Parte IV — Valor acrescentado e impacto das políticas estruturais.

1.3

O Comité Económico e Social Europeu acolhe com grande agrado os resultados conseguidos durante os últimos anos nesta que é uma das políticas fundamentais da União Europeia, e considera as propostas contidas no Relatório em apreço como correspondendo aos objectivos que têm vindo a ser defendidos pelo CESE nos documentos que tem sucessivamente adoptado.

1.3.1

A este propósito o CESE congratula-se pela Comissão não ter dado acolhimento a algumas teses no sentido da renacionalização da Política de Coesão.

1.4

Pela complexidade e diversidade dos aspectos contidos no relatório, e por forma a permitir uma melhor visão da problemática contida neste parecer, optou-se pela estruturação do presente documento seguindo a fórmula adoptada no Relatório da Comissão, e termina avaliando as evoluções registadas e interpretando as perspectivas futuras.

2.   Parte I — Coesão, competitividade, emprego e crescimento — situação e tendências

2.1

Com base em vários resultados estatísticos, o relatório aborda o estado da coesão na Europa nas vertentes económica, social e territorial, nomeadamente no que diz respeito aos efeitos positivos sobre a convergência.

2.2

No documento é avaliado, com algum detalhe, o progresso dos «países de coesão» em matéria de convergência real, com informação referente a 2001, embora alguns dados se refiram a 2002, e são traçadas algumas perspectivas. A análise estende-se também à situação da coesão na Europa alargada.

2.3

Assim, o crescimento do produto e do emprego nos países da coesão nos anos recentes relativamente ao resto da UE e a evolução na última década das disparidades entre as regiões na UE15, com particular ênfase para as regiões Objectivo 1, são aspectos abordados nesta parte do relatório. É também analisado o desenvolvimento económico recente nos novos Estados-Membros, com referência às diferentes performances no seio destes países e ao facto da aproximação destes países ao nível de rendimento médio da UE exigir elevadas taxas de crescimento durante um prolongado período de tempo.

2.4

O envelhecimento da população europeia, os factores determinantes da competitividade, crescimento e emprego, como a inovação e o conhecimento, são, a par da protecção do ambiente no âmbito dos objectivos de Gotemburgo, aspectos realçados nesta parte do relatório.

2.5   Aspectos de carácter geral

2.5.1

Na última década, em particular na segunda metade dos anos noventa, a coesão nacional e regional progrediu significativamente, tendo-se reduzido as disparidades quer entre os países quer entre as regiões da UE. Contudo, a coesão entre Estados-Membros foi maior que entre as regiões.

2.5.2

Apesar do contributo positivo dos Fundos Estruturais e dos progressos alcançados, permanecem ainda diferenças relativas muito significativas em termos de prosperidade/performance económica, reflexo das fraquezas estruturais de alguns países/regiões.

2.5.3

Mantêm-se ainda diversos problemas ao nível da competitividade das regiões menos favorecidas. Algumas regiões da Europa encontram-se ainda demasiado isoladas, carecem de mão-de-obra qualificada, de investimentos e não possuem os meios para aceder à sociedade da informação.

2.5.4

Em matéria de coesão social e de emprego, os progressos parecem ter sido menores:

2.5.4.1

o desemprego de longa duração mostra-se rígido;

2.5.4.2

um crescimento limitado, em 2001, do emprego na União Europeia a Quinze, combinado com uma diminuição do emprego, nos últimos anos, nos países candidatos, contribuiu para um fosso cada vez maior das disparidades regionais;

2.5.4.3

o crescimento natural da população tem diminuído em várias regiões da Europa e é previsível que diminua ainda mais nos próximos anos (as projecções demográficas apontam para uma diminuição nos vários Estados-Membros e nos países de adesão, com algumas excepções);

2.5.4.4

mais relevante, em termos de emprego, é o facto da população em idade de trabalho diminuir mais cedo do que a queda da população global. As projecções para 2025 apontam para que 35 % da população em idade de trabalho seja de pessoas com mais de 50 anos na UE15 contra 26 % em 2000. Isto será acompanhado pelo contínuo crescimento do peso de pessoas com idade superior a 65 anos;

2.5.4.5

os dados apontam para um aumento da taxa de dependência de velhos. Na UE15, o número de pessoas com 65 ou mais anos representa actualmente quase 25 % da população em idade de trabalho, isto é, há quatro pessoas com idade compreendida entre 15-65 anos por cada pessoa em idade de reforma. Em 2025 esta percentagem passará para 36 %, isto é, menos de três pessoas em idade de trabalho por cada pessoa em idade de reforma. Nos países candidatos, o rácio aumentará de menos de 20 % para mais de 30 %.

2.5.4.6

O relatório chama, contudo, a atenção para o facto destes dados não revelarem qual será o número de pessoas em idade de trabalho que estarão empregadas para suportar as pessoas com 65 ou mais anos (em 2002, 64 % da população em idade de trabalho está empregada na UE15 e nos países candidatos só 56 %, com grandes diferenças entre países e regiões).

2.5.5

O relatório alerta para que as disparidades entre países e entre regiões da União Europeia, quer ao nível do rendimento quer do emprego, se tornarão ainda maiores com a entrada dos novos Estados-Membros, em Maio de 2004. Estes países têm conhecido elevadas taxas de crescimento mas apresentam ainda um mais baixo nível de PIB per capita e, em muitos casos, de emprego relativamente à média da UE15.

2.5.6

Dada a crescente interdependência que existe em termos de comércio e de investimento, o desenvolvimento económico nos novos Estados-Membros poderá sustentar elevadas taxas de crescimento por toda a UE. Os ganhos sentir-se-ão em particular na Alemanha e Itália.

2.5.7

Com o alargamento, os Estados-Membros podem ser divididos em três grupos, de acordo com o PIB per capita em PPC:

um primeiro grupo que inclui 12 dos actuais 15 Estados-Membros, que têm um PIB per capita em PPC acima da média da UE (10 pontos percentuais ou mais);

um segundo grupo de 7 países, compreendendo os restantes três actuais Estados-Membros, Espanha, Portugal e Grécia, mais Chipre, Eslovénia, Malta e República Checa, onde o PIB per capita em PPC se situa entre 73 % e 92 % da média da UE25;

finalmente, um terceiro grupo de 8 países (incluindo a Roménia e a Bulgária), cujo PIB por habitante está abaixo de 60 % da média comunitária.

2.5.8

No ponto dedicado à coesão territorial, reconhece-se que a cooperação entre regiões, nas dimensões transfronteiriça, transnacional e inter-regional, tem sido importante na promoção de um desenvolvimento equilibrado do território comunitário.

2.5.9

Ao nível dos factores determinantes do crescimento e da competitividade, o relatório dá conta de que as assimetrias regionais são persistentes:

ao nível dos recursos humanos, as regiões menos prósperas apresentam um elevado nível de abandono escolar, a taxa de participação na formação contínua é muito menor nos países de coesão, à excepção da Irlanda, e em muitos casos é significativamente mais baixa nos países candidatos.

o relatório apresenta vários indicadores que mostram a elevada disparidade entre países da UE15 no que diz respeito às actividades de inovação. As despesas em I&D confirmam o atraso das regiões Objectivo 1 (no sector empresarial, a despesa em I&D em relação ao PIB situa-se muito aquém da média europeia, pouco mais de um quinto da média da UE).

2.5.9.1

Nos países candidatos, os gastos em I&D em relação ao PIB são menores do que em grande parte dos países da UE15, mas pouco menores que nas regiões Objectivo 1.

2.5.9.2

Tal como na UE15, também ao nível dos países do alargamento há uma concentração relativa dos gastos em I&D nas regiões mais prósperas.

2.5.9.3

Permanecem também as disparidades regionais em termos de acesso às Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC).

2.5.10

O relatório refere a necessidade de serem estabelecidas determinadas condições no sentido de se atingir um desenvolvimento regional sustentado, bem como a prossecução de estratégias de promoção do emprego. A nível nacional, aponta para a necessidade de se garantir um ambiente macroeconómico conducente à estabilidade e crescimento, e um sistema fiscal e regulador que encoraje as empresas. A nível regional, o relatório aponta para a necessidade da disponibilidade de infra-estruturas físicas e de uma força de trabalho qualificada, em particular nas regiões Objectivo 1 e nos países candidatos, onde persistem sérias deficiências em ambas as áreas, e aponta fundamentalmente para a necessidade das regiões reunirem um conjunto de condições que estão mais directamente relacionadas com os factores intangíveis da competitividade, como a inovação, I&D e utilização das TIC, no sentido de alcançar os objectivos traçados na Estratégia de Lisboa.

2.5.11

O relatório dá igualmente conta da existência de diferenças substanciais entre os Estados-Membros e entre as regiões, em matéria de protecção do ambiente, tendo em vista a realização dos objectivos de Gotemburgo.

2.6   Países da coesão

2.6.1

A análise detalhada sobre a convergência em termos de PIB per capita, emprego e produtividade nos países de coesão permite constatar que estes países continuam a recuperar dos respectivos atrasos, tendo registado no período 1994-2001 um crescimento acima da média da UE. É dado relevo ao caso irlandês como demonstração efectiva da contribuição positiva dos Fundos Estruturais quando combinados com políticas nacionais orientadas para o crescimento.

2.6.2

O Relatório chama a atenção para o apreciável abrandamento do crescimento económico na UE desde a data de publicação do último relatório, que afectou inevitavelmente a coesão, não só por ter conduzido a um aumento do desemprego mas também por ter criado um clima desfavorável para uma continuada redução das disparidades regionais ao nível do produto e do emprego.

2.6.3

O abrandamento do crescimento económico na UE afectou praticamente todos os Estados-Membros. Dos países da coesão, Portugal parece ter sido o país mais afectado. O Relatório refere mesmo que, tendo em conta os dados referentes a 2001 e se as previsões para 2004 se confirmarem, Portugal poderá inverter a trajectória de convergência com a média da UE.

2.6.4

O relatório refere, pois, que até 2001 as disparidades no rendimento (PIB per capita) entre as regiões menos prósperas da UE (aquelas que foram o principal alvo da política de coesão) e as outras regiões se reduziram. Não é, no entanto, possível dizer-se o que se passou desde 2001, uma vez que desde aí não se encontram disponíveis os dados regionalizados.

2.7   Países candidatos

2.7.1

Acentuaram-se as disparidades no PIB per capita entre as regiões dos países candidatos. Na República Checa e Eslováquia, 20 % da população que vive nas regiões mais prósperas tem um rendimento per capita duas vezes superior a 20 % da população que vive nas regiões mais pobres.

2.7.2

O relatório aponta para que a aproximação do nível de rendimento destes países ao nível de rendimento médio da UE exige a obtenção de elevadas taxas de crescimento durante um período prolongado. O relatório evidencia que o crescimento destes países contribuirá para o crescimento da comunidade como um todo e ajudará a reduzir o desemprego e a aumentar a coesão social.

2.7.3

Desde 2001, registou-se um abrandamento do crescimento económico nos países candidatos, em parte devido à queda do crescimento na UE, seu principal mercado de exportação, o que conduziu a uma queda no emprego.

2.7.4

Em 2002, a taxa média de emprego nos 10 países candidatos era de 56 %, bastante mais baixa de que a da média da UE15, que se situava em torno dos 64 %. Em todos os países candidatos, com excepção de Chipre, a taxa de emprego situa-se abaixo das metas definidas para a Europa na Estratégia de Lisboa (67 % em 2005 e 70 % em 2010).

2.8   O alargamento

2.8.1

O alargamento fará aumentar a disparidade entre os Estados-Membros mais e menos prósperos. Apesar dos novos Estados-Membros terem registado recentemente um crescimento mais rápido do que a UE15, o gap em termos de PIB per capita permanece bastante pronunciado. Em 2002, apenas Malta, Chipre, República Checa e Eslovénia possuíam um PIB per capita em PPC bastante acima de 60 % da média da UE15. Polónia, Estónia e Lituânia apresentavam cerca de 40 %, Letónia apresentava cerca de 35 % e Bulgária e Roménia à volta de 25 % da média.

2.8.2

O alargamento terá um maior efeito ao nível das disparidades entre regiões do que entre países. De acordo com as últimas estimativas (2001), cerca de 73 milhões de pessoas, que representam cerca de 19 % da população da UE15, têm um rendimento per capita inferior a 75 % da média comunitária. O alargamento aumentará o número de pessoas a viver em regiões com um PIB per capita inferior a 75 % da média da UE25. Serão cerca de 123 milhões numa UE25 e se se incluir a Bulgária e a Roménia este total aumentará para 153 milhões, isto é mais do dobro do que se verifica actualmente.

2.8.3

O relatório constata que face ao efeito estatístico que o alargamento irá implicar, reduzindo o PIB per capita médio, se os critérios que determinam o estatuto de Objectivo 1 não se alterassem, algumas regiões deixariam de ser elegíveis, mesmo que o seu rendimento não se tenha alterado (antes e depois do alargamento). Estarão nesta situação, por exemplo, diversas regiões da Alemanha, Espanha, Grécia, Itália e Portugal.

3.   Parte II — Contributo das políticas dos Estados-Membros para a coesão

3.1.

Na parte II do relatório, analisa-se o contributo das políticas nacionais como complemento da política de coesão da União Europeia, no sentido de que ambas pretendem contribuir não só para uma distribuição mais equilibrada do rendimento e das oportunidades de vida entre as regiões como também para um desenvolvimento territorial mais equilibrado ao nível do país e da UE como um todo.

3.1.1

A Comissão dá conta de que as restrições impostas para a redução da Despesa Pública implicam um incentivo para melhorar a qualidade dos Programas, não sendo contudo possível saber até que ponto tal resultou numa maior eficácia da política em termos de coesão regional.

3.1.2

Os dados sobre a Despesa Pública nos diferentes Estados-Membros, apesar de incompletos, indicam claramente que uma parte substancial da despesa pública nos Estados-Membros da UE, em particular na protecção social, está associada ao Modelo Social Europeu e, deliberadamente ou não, tem contribuído de forma positiva para uma redução das disparidades ao nível do rendimento e das oportunidades de vida.

3.1.3

Ao nível das alterações na composição da despesa pública, salienta-se o facto de, apesar do envelhecimento da população e do aumento do número de pensionistas, se ter verificado na UE, entre 1995-2002, uma tendência para a redução das despesas com benefícios sociais em relação ao PIB, com excepção de alguns países como a Alemanha, Grécia, Portugal e, em menor grau, Itália.

3.1.4

No ponto dedicado à política de desenvolvimento regional nos Estados-Membros, o relatório refere que a abordagem do desenvolvimento territorial difere entre os Estados-Membros, em consequência de factores institucionais (fundamentalmente do grau de descentralização da política de desenvolvimento económico) bem como dos diferentes pontos de vista acerca dos factores determinantes do desenvolvimento económico.

3.1.5

Pelo seu contributo para a criação de emprego e por constituírem um mecanismo de transferência de tecnologia e de know-how, o relatório refere que as políticas de atracção de investimento directo estrangeiro são uma parte importante da estratégia de desenvolvimento regional, pelo que uma parte significativa do apoio regional visa precisamente aumentar a atractividade das regiões para os investidores estrangeiros.

3.1.6

Apesar de incompletos, os dados sugerem que os fluxos de investimento tendem desproporcionalmente a localizar-se nas regiões economicamente mais dinâmicas dentro do país e entre os países da UE.

3.1.7

Deste modo, coloca-se um particular dilema aos governos dos países de coesão, e também dos países candidatos, face à existência de um potencial trade-off entre a necessidade de atrair investimento para as regiões menos desenvolvidas e o facto do investimento tender naturalmente a ser atraído pelas regiões mais dinâmicas.

4.   Parte III — Contributo das políticas comunitárias: competitividade, emprego e coesão

4.1

Depois do segundo relatório sobre a coesão ter apresentado os contributos das políticas comunitárias para a coesão, nesta parte do terceiro relatório apresentam-se as principais alterações ocorridas desde 2001 tendo em conta os objectivos definidos na Estratégia de Lisboa e em Gotenburgo.

4.1.1

Os resultados das diversas iniciativas lançadas à luz da Estratégia de Lisboa dão conta dos progressos registados designadamente na utilização das novas tecnologias (escolas com computadores ligados à Internet, desenvolvimento dos serviços públicos on-line em todos os países candidatos, alguns dos quais apresentam um maior avanço em certas áreas relativamente a alguns Estados-Membros da actual UE).

4.1.2

Apesar de existirem diferenças entre os Estados-Membros, o relatório permite constatar os efeitos positivos que a Estratégia Europeia de Emprego teve no mercado de trabalho (reduzindo a taxa média de desemprego na UE e elevando a taxa de participação da força de trabalho na população activa).

4.1.3

Do papel de outras políticas comunitárias para fortalecer a coesão económica e social, nomeadamente da política de transportes, telecomunicações, energética, agrícola e pescas e protecção do ambiente, é dado destaque ao desenvolvimento das redes transeuropeias de transporte e comunicações e energia, que permitiram um aumento das acessibilidades, sobretudo desde 1991, esperando-se ainda maiores efeitos nos próximos anos, especialmente nos países candidatos.

4.1.4

Tendo em conta que o desenvolvimento sustentável é uma das prioridades da política energética, em linha com o Protocolo de Quioto, o relatório aponta para que o desenvolvimento de novas fontes energéticas permitirá às regiões periféricas diversificar as suas fontes energéticas e aumentar a sua qualidade de vida. Os investimentos na protecção do ambiente poderão também contribuir de forma muito positiva para a criação de empregos.

4.1.5

O relatório constata a existência de uma complementaridade entre as ajudas estatais e a política de coesão e reconhece a necessidade de um estreito controlo das ajudas estatais no sentido de atingir os objectivos traçados na Estratégia de Lisboa e em Gotemburgo, pelo que os Estados-Membros têm sido chamados para uma reorientação estratégica para áreas horizontais.

4.2

Por fim, é feita referência à necessidade de garantir um ambiente de segurança, onde as leis sejam respeitadas, como condição de partida para um desenvolvimento económico sustentável.

5.   Parte IV — Valor acrescentado e impacto das políticas estruturais

5.1.

Nesta parte do relatório, são apresentados os resultados do contributo da política de coesão relativamente ao período 1994-1999 e os resultados preliminares da implementação de alguns programas relativos ao período de programação 2000-2006. São analisados vários aspectos da política de coesão, como o contributo das políticas estruturais para o crescimento sustentado das regiões mais atrasadas, o efeito destas políticas fora das regiões Objectivo 1, o papel específico do FSE ao nível do investimento em educação, emprego e formação, o papel das políticas estruturais no sentido de encorajar a cooperação e o contributo das ajudas de pré-adesão nos novos Estados-Membros.

5.2.

Dos resultados apresentados salientamos os seguintes:

5.2.1

Entre os períodos 1989-1993 e 1994-1999 quase todos os países abrangidos pelo Objectivo 1 registaram um considerável aumento do investimento público.

5.2.2

Os Fundos Estruturais suportaram o desenvolvimento das redes transeuropeias de transporte, aumentando a atractividade das regiões e desenvolvendo a actividade económica.

5.2.3

Reconhece-se que o investimento em infra-estruturas e equipamento não é suficiente para por si só desenvolver uma economia baseada no conhecimento, pelo que na última década as políticas estruturais também pretenderam contribuir para aumentar a capacidade de I&D, especialmente nas regiões Objectivo 1.

5.2.4

As intervenções estruturais contribuíram também de forma positiva para a protecção do ambiente.

5.2.5

Estudos empíricos recentes analisaram a convergência real entre as regiões e indicam a existência de uma correlação positiva entre o montante de ajudas estruturais e o crescimento do PIB em termos reais.

5.2.6

Com base em simulações feitas sobre os efeitos macroeconómicos das políticas estruturais 1994-1999, estima-se que as intervenções estruturais permitiram que em 1999 o PIB em termos reais fosse mais elevado em 2,2 % na Grécia, em 1,4 % em Espanha, em 2,8 % na Irlanda e em 4,7 % em Portugal. Estas diferenças reflectem o diferente grau de abertura das economias, mais elevado nos dois últimos casos.

5.2.7

As intervenções estruturais estão associadas a um aumento significativo do investimento, em particular em infra-estruturas e capital humano, que se estima ter sido 24 % mais elevado em Portugal e 18 % na Grécia, em 1999.

5.2.8

A experiência tem demonstrado que, em alguns casos, os Fundos Estruturais têm favorecido a convergência em termos nacionais (Irlanda) enquanto noutros casos tende a neutralizar os efeitos de uma polarização das actividades económicas (Espanha). A experiência indica, contudo, que a existência deste trade-off entre convergência regional e nacional depende sobretudo da distribuição espacial da actividade económica/povoamento no país em questão.

5.2.9

Os Fundos Estruturais contribuíram para uma maior integração económica. As economias europeias tornaram-se mais integradas, reflexo do crescimento dos fluxos de comércio e de investimento. O comércio entre os países de coesão e o resto da UE mais que duplicaram na última década. Esta situação reflecte também os benefícios para os outros países da UE decorrentes das ajudas estruturais às regiões menos prósperas. Estima-se que no período 2002-2006 cerca de um quarto da despesa (24,1 %) retorna ao resto da Europa, fundamentalmente sob a forma de aumento das suas exportações para os países de coesão, sobretudo em máquinas e equipamentos. Esta percentagem é particularmente elevada na Grécia (42,3 % das ajudas estruturais) e em Portugal (35,2 % das ajudas estruturais).

5.2.10

As intervenções dos Fundos Estruturais também ajudaram ao desenvolvimento económico de outras regiões da UE, fora das regiões Objectivo 1, que sofrem de problemas estruturais (zonas de declínio industrial, zonas rurais). No relatório são apresentados os resultados de estudos recentes sobre os principais efeitos no período 1994-1999. As ajudas comunitárias contribuíram para a reestruturação das indústrias tradicionais, para a diversificação da actividade económica e para a criação de emprego nas áreas assistidas no período 1994-1999.

5.2.11

Estudos detalhados mostram que a despesa em I&, em inovação e transferência de tecnologia parece ter sido particularmente eficaz na criação de novos postos de trabalho bem como na salvaguarda dos já existentes. Contudo, com algumas excepções, a capacidade de inovação continua nestas áreas bastante abaixo das regiões mais desenvolvidas da UE. Esta situação contrasta com a dotação de infra-estruturas, em particular de sistemas de transporte e telecomunicações, e de capital humano. Foram também feitos esforços substanciais ao nível da reconversão de velhas zonas industriais e da melhoria do ambiente, em especial nas áreas urbanas.

5.2.12

No que se refere às ajudas para a agricultura, desenvolvimento rural e pescas, são apresentados, entre outros, os resultados das medidas no âmbito do Objectivo 5a e 5b cobrindo o período 1994-1999.

5.2.13

Uma parte substancial do Fundo Social Europeu (FSE) destinou-se a ajudar, para além das regiões Objectivo 1, outras regiões da UE. No período 1994-1999 as ajudas do FSE para regiões Objectivos 3 e 4 tiveram efeitos positivos ao nível do desemprego, em especial o de longa duração, ao nível das minorias étnicas e da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres.

5.2.14

Algumas Iniciativas Comunitárias com vista a promover a cooperação e as redes de ligação têm constituído um importante complemento da política de coesão. O INTERREG II contribuiu para desenvolver as ligações entre os países, troca de experiências entre regiões e disseminação do conhecimento, embora os resultados em termos de redução do isolamento tenham sido mistos, isto é, algumas regiões desenvolveram de forma significativa as ligações por terra, bem como as facilidades nos portos (como foi o caso da Grécia, Alemanha e da Finlândia) enquanto noutras áreas fronteiriças, como Portugal-Espanha, os efeitos foram mais limitados.

5.2.15

É também salientada a contribuição da iniciativa comunitária URBAN para o desenvolvimento das zonas urbanas e para a melhoria da qualidade de vida.

5.2.16

O relatório constata que o alargamento representa um desafio acrescido em matéria de política de coesão. Reconhece-se que o apoio dos Fundos Estruturais terão uma importância central para os novos Estados-Membros, no sentido de fortalecer a sua competitividade e aproximar o seu nível de PIB per capita com o resto da UE, mas requerem por parte destes países uma cuidada preparação em termos de capacidade administrativa e de gestão do montante financeiro recebido. As ajudas de pré-adesão constituem, em parte, um exercício de aprendizagem para os países abrangidos de como utilizar eficazmente a ajuda financeira antes de receberem um montante mais alargado de fundos, mas a capacidade administrativa e de descentralização na implementação dos programas deverá ser ainda mais reforçada após 2006.

6.   Considerações do Comité Económico e Social Europeu

6.1

Os resultados apresentados no relatório revelam que a política de coesão teve efeitos positivos claramente visíveis.

6.2

O CESE chama, no entanto, a atenção para a sua preocupação quanto ao facto dos objectivos da política de coesão terem sido atingidos de forma mais visível entre os Estados-Membros do que entre as regiões. Apesar da evolução positiva, continuam a persistir disparidades regionais em termos de desenvolvimento económico e social. O CESE alerta ainda para o facto do alargamento tornar ainda maiores essas disparidades, colocando assim um importante desafio à política de coesão.

6.3

Concorda o CESE com a perspectiva de que o alargamento fará aumentar de forma considerável o mercado interno comunitário, oferecendo novas oportunidades, tendo, contudo um impacto diferenciado nos vários países da UE. Dada a crescente interdependência que existe em termos de comércio e de investimento, o desenvolvimento económico nos novos Estados-Membros poderá sustentar elevadas taxas de crescimento por toda a UE (tem-se verificado que os Fundos Estruturais contribuem para uma maior integração económica, reflexo também do crescimento dos fluxos de comércio e de investimento).

6.4

De igual modo, constata o CESE que os Fundos Estruturais não beneficiam apenas as economias das regiões elegíveis para ajuda. Uma parte substancial da ajuda canalizada para as regiões com atraso de desenvolvimento reverte para as regiões mais desenvolvidas da União Europeia, sob a forma de aumento das suas exportações. Note-se que a estimativa para o período 2000-2006 relativamente a este efeito de retorno é de cerca de um quarto (24,1 %) das intervenções estruturais no âmbito do Objectivo 1. No longo prazo, o efeito do desenvolvimento provocado nessas regiões abrirá também novos mercados para as regiões e países contribuintes líquidos, criando efeitos favoráveis nas suas próprias economias.

6.5

Os dados sugerem que os fluxos de investimento tendem desproporcionalmente a localizar-se nas regiões economicamente mais dinâmicas dentro do país e entre os países da UE, colocando um particular dilema aos governos dos países de coesão e também dos países candidatos.

6.6

Mostra-se positiva a coordenação das diversas políticas comunitárias sectoriais, designadamente as políticas agrícola, das pescas, dos transportes, de investigação e tecnologia e de educação e formação profissional, para o objectivo da coesão.

6.7

Reconhece-se também a importância dos apoios comunitários para as regiões fora do Objectivo 1, no sentido de reduzir as disparidades económicas e sociais.

6.8

O abrandamento do crescimento económico teve, em geral, consequências desfavoráveis no emprego. A taxa de emprego na UE15 situa-se ainda muito aquém do ambicioso objectivo fixado pelo Conselho Europeu de Lisboa. Contudo, o valor médio esconde diferenças substanciais em toda a União.

6.9

A tendência demográfica, designadamente o envelhecimento da força de trabalho, influenciará fortemente a perspectiva do mercado de trabalho na UE e evidencia a necessidade de reforçar a formação/aprendizagem ao longo da vida.

6.10

As prospectivas demográficas enfatizam a importância de se atingir um elevado nível de emprego nos próximos anos de forma a não conduzir a um aumento de tensão social, o que deverá andar em paralelo com o aumento sustentado da produtividade.

6.11

Há um entendimento para a necessidade de focalização da economia europeia para as actividades baseadas no conhecimento, na inovação e nas novas tecnologias de informação e comunicação, no sentido de tornar a economia europeia mais competitiva e aumentar o emprego e o nível de vida. Em suma, concretizar os objectivos traçados na Estratégia de Lisboa.

7.   Prioridades da Política de Coesão

7.1

O CESE concorda com a nova arquitectura definida para a Política de Coesão da UE para período após 2006, organizada em torno de um número limitado de prioridades (I – Convergência; II – Competitividade regional e emprego; III – Cooperação territorial europeia), focalizando a sua concretização nas estratégias de Lisboa e de Gotemburgo aos níveis nacional e regional.

7.2

É opinião do CESE que os dados apresentados no relatório tornam clara a necessidade de prosseguir com maior esforço o objectivo de coesão numa União alargada, pelo que está de acordo que o objectivo da Convergência se dirija em primeiro lugar a apoiar as regiões com um PIB per capita inferior a 75 % da média comunitária e congratula-se com o tratamento especial a dar às regiões abrangidas pelo «efeito estatístico», para as quais se prevê um apoio a um nível mais elevado do que o decidido em 1999 para as regiões em regime de phasing out.

7.3

O CESE acolhe favoravelmente a proposta de afectação do Fundo de Coesão ao objectivo da Convergência e considera que o mesmo deve continuar a funcionar numa lógica nacional (Estados-Membros com um RNB inferior a 90 % da média comunitária), não sendo a sua aplicação limitada por critérios regionais.

7.4

O CESE concorda com o sentido a dar à Política de Coesão fora dos Estados-Membros e regiões menos desenvolvidas (designadamente o de encorajar a competitividade e reduzir as disparidades entre regiões, bem como o de acompanhar a Estratégia Europeia do Emprego) e defende a concentração temática num número limitado de prioridades para a competitividade (economia do conhecimento, acessibilidades, ambiente e serviços de interesse geral).

7.5

Concorda também que, ao nível da segunda prioridade, seja dado um tratamento especial às regiões actualmente elegíveis no âmbito do Objectivo 1 e que não respeitem os critérios de elegibilidade no âmbito da prioridade da Convergência, que passarão a beneficiar de um apoio acrescido durante um período transitório (phasing in).

7.6

O apoio à cooperação transfronteiriça, transnacional e inter-regional tem sido importante para a integração territorial europeia, pelo que o CESE apoia a proposta da Comissão em criar um novo objectivo, aproveitando a experiência da Iniciativa INTERREG. Este objectivo, dedicado à cooperação territorial, mantém as dimensões transfronteiriça, inter-regional e transnacional e a possibilidade dos Estados-Membros incluírem as regiões marítimas na dimensão transfronteiriça. Acresce ainda que as regiões com fronteiras com os novos Estados-Membros têm que se adaptar à nova situação, razão pela qual deveria ser criado um programa especial para estas regiões. O CESE concorda, assim, com o claro aumento dos recursos financeiros afectos ao Objectivo «Cooperação Territorial Europeia», relativamente ao que era atribuído anteriormente ao INTERREG.

7.7

Acolhe com agrado a intenção da Comissão em propor a criação de um novo instrumento legal, sob a forma de «colectividades regionais transfronteiriças», de modo a facilitar a cooperação entre os Estados-Membros e as autoridades locais e a reforçar as ligações com fronteiras externas, nomeadamente com os novos vizinhos.

7.8

Concorda com a Comissão de que a generalidade dos Programas preveja uma resposta integrada às especificidades territoriais, e não esqueça que os mesmos devem ter em conta a necessidade de contrariar os diversos tipos de discriminação social.

7.9

Acolhe favoravelmente a importância dada à dimensão urbana, integrando nos Programas acções neste domínio, dando especial relevância aos problemas das cidades e reconhecendo o papel destas como motores do desenvolvimento regional. Tal como a Comissão, o CESE reconhece a importância da cooperação entre cidades como um elemento chave da cooperação territorial.

7.10

O CESE retém como particularmente importante a garantia de que os novos instrumentos utilizados nas zonas rurais passam a integrar-se na Política Agrícola Comunitária, mantendo o actual grau de concentração em matéria de ajudas às regiões e países menos desenvolvidos abrangidos pelos programas de Convergência. Chama ainda a atenção para a necessidade do apoio às referidas zonas rurais dever abranger não só projectos agrícolas, mas outros que permitam o desenvolvimento do mundo rural.

8.   Sistema de gestão

8.1

O CESE concorda que o número de Instrumentos Financeiros para a Política de Coesão seja limitado a três (FEDER, FSE e Fundo de Coesão) e com o princípio da redução tanto de objectivos, como de Instrumentos Financeiros a si associados, o que contribuirá para uma maior simplificação e eficácia na programação.

8.2

Defende o reforço de cooperação entre os Estados-Membros, as autoridades locais e os parceiros económicos e sociais.

8.3

Concorda com a importância dada à avaliação regular do impacto territorial na Política Regional e também à avaliação do impacto territorial da política regional, incluindo, como é recomendado pela Comissão, as avaliações do impacto da evolução das trocas comerciais.

8.4

O CESE considera importante que a Comissão em futuros relatórios dê maior relevância à igualdade de oportunidades entre homens e mulheres e à avaliação do contributo da Política de Coesão para aquele objectivo.

8.5

Ao nível do sistema de gestão o CESE concorda com a manutenção dos quatro princípios (Programação, Partenariado, Concentração e Adicionalidade) e com a simplificação baseada na maior descentralização. É, contudo, opinião do CESE de que esta maior descentralização não deve pôr em causa a necessidade da Comissão manter um acompanhamento próximo da execução dos Programas, garantindo a coerência da Política Regional ao nível da União e evitando desvios que desvirtuem os respectivos objectivos. O controlo por parte da Comissão deve, pois, ser muito apertado, não só ao nível da correcta aplicação dos fundos garantindo a inexistência de desvios, mas também no que diz respeito aos projectos financiados, se cumprem, ou não, as funções para que foram desenvolvidos.

9.   A Temática da Parceria para a Execução dos Fundos Estruturais

9.1

O CESE ratifica o seu parecer sobre a «Parceria para a Execução dos Fundos Estruturais» (1) de cujas opiniões se destacam as seguintes:

9.2

É fundamental uma reflexão sobre os Comités de Acompanhamento previstos no artigo 35.o do Regulamento relativo aos Fundos Estruturais. As novas e importantes funções a desempenhar por estes órgãos, ou os que os substituam, exigem a revisão dos mecanismos de participação dos parceiros sociais.

9.3

É necessário, antes de mais, que a participação dos parceiros económicos e sociais nos Comités de Acompanhamento passe a ser obrigatória e seja valorizada mediante a atribuição do direito de voto, que torne clara a posição dos mesmos em relação às matérias discutidas nessa instância.

9.4

A Comissão deveria mandar elaborar um estudo actualizado dos tipos diferenciados de modelos de participação que têm vindo a ser utilizados aos níveis nacional e regional, possibilitando por essa via de informação avaliar e disseminar um conjunto de práticas menos conhecidas, mas de grande relevância para o futuro.

9.5

O CESE considera indispensável a garantia de independência de quem avalia um determinado programa relativamente à autoridade nacional responsável pela sua execução, e também aqui os Parceiros Institucionais e os Económicos e Sociais poderão ter um papel acrescido pelo conhecimento adquirido quanto aos resultados práticos alcançados nas diversas intervenções.

9.6

A selecção dos parceiros, e a transparência quanto às suas funções e responsabilidades é no entender do CESE de primordial importância.

9.7

A compatibilidade ou não, dos parceiros terem envolvimento efectivo nas várias fases de implementação dos programas e serem, simultaneamente, promotores de projectos, exige a necessidade de estabelecer regras que definam a selecção dos parceiros de modo a que não sejam envolvidas na Parceria entidades que dependem do Estado e que, portanto, estejam limitadas funcional ou estruturalmente na independência da sua acção.

9.8

Para além das entidades que tradicionalmente constituem os parceiros económicos e sociais (sindicatos de trabalhadores, associações de industriais, agricultores, artesãos e de comerciantes, terceiro sector, cooperativas, etc.) importa reforçar o envolvimento dos chamados organismos funcionalmente autónomos, como as Câmaras de Comércio, as Universidades, os organismos promotores de habitação social, etc., nas políticas estruturais comunitárias.

9.9

A composição da Parceria e eventual ineficácia dos processos por via da acumulação de funções incompatíveis com a transparência e independência das decisões, por exemplo, envolvimento das mesmas pessoas nas fases de programação/acompanhamento/avaliação, sendo muitas vezes os próprios beneficiários dos programas, pode ser prejudicial.

9.10

Muitas vezes parece existir eventual incompatibilidade, ou conflitos de interesse, quando quem decide, pode também ser beneficiário dos Fundos Estruturais.

9.11

Parece ainda ao CESE que os Parceiros Económicos e Sociais deverão ter acesso a financiamento e formação para cabalmente desempenharem as funções para que são chamados, sendo essa prática muito rara ou praticamente inexistente até ao momento.

9.12

A debilidade da participação dos Parceiros, fica nalguns casos a dever-se ao facto de não possuírem os técnicos em número e habilitações suficientes para participarem de forma activa, nos fóruns associados aos Fundos Comunitários, onde poderiam e deveriam participar.

9.13

O CESE considera a necessidade dos Estados-Membros prestarem particular atenção a todo o processo burocrático, diminuindo-o ao seu mínimo desejável. Muitas vezes é a complexidade administrativa exagerada e desproporcionada que põe em causa o próprio princípio da parceria, pelo estabelecimento de barreiras e práticas tantas vezes contraproducentes.

9.14

O CESE considera serem grandes as vantagens do estabelecimento de um patamar mínimo de participação, regulamentada à cabeça por Regulamento Comunitário, deixando aos Estados-Membros o estabelecimento de níveis mais aprofundados de participação, ao nível da legislação ou disposições nacionais. As regras a estabelecer deverão possibilitar mais informação e formas mais intensas, estáveis e permanentes de envolvimento dos parceiros económicos e sociais.

9.15

O papel dos parceiros económicos e sociais, o conteúdo das propostas e os procedimentos de participação são necessariamente diferentes nas fases de preparação, financiamento, acompanhamento e avaliação das intervenções estruturais da Comunidade. Importa, por isso, clarificar o que se espera dos parceiros, as disposições que os parceiros devem tomar para que os programas tenham o maior êxito possível, em que níveis se articula a actividade da parceria e quais são as instâncias políticas e técnicas em que os parceiros devem intervir.

9.16

A parceria tem importância decisiva em duas fases das intervenções estruturais:

na fase «política» de programação dos fundos e de opções gerais, seja a nível comunitário, seja a nível dos Estados-Membros;

na fase de acompanhamento e avaliação das intervenções.

10.   Contributos do CESE para o debate em curso e a construção de um novo partenariado para a coesão — Convergência, Competitividade e Cooperação

10.1   Prioridades da Política de Coesão

10.1.1

Acolhe favoravelmente a intenção da Comissão de estabelecer, no quadro da Convergência, um mecanismo específico para compensar todas as debilidades das regiões ultraperiféricas, bem como daquelas com debilidades estruturais permanentes.

10.1.2

O CESE recomenda que na estratégia de apoio às diferentes regiões se analise até que ponto os dados quantitativos disponíveis reflectem fielmente o progresso económico e social, e não são fruto do impacto estatístico de externalidades muitas vezes irrelevantes para a realidade económica e social dessas regiões, como é o caso da sediação de sistemas off-shore, distorcedores dos indicadores utilizados.

10.2   Complementaridade das políticas comunitárias sectoriais

10.2.1

O CESE chama a atenção para a complementaridade das políticas comunitárias sectoriais para o objectivo da coesão, em particular nas áreas de I&, Sociedade de Informação e Transportes, e aplaude a intenção de se considerar a coerência entre coesão e política da concorrência como um ponto essencial nas diversas políticas comunitárias.

10.2.2

Ao constatar que mais de 50 % dos fundos destinados à I&D estão concentrados num reduzidíssimo número de regiões da UE, o CESE insta para que a complementaridade com as políticas sectoriais deve contrariar esta excessiva concentração e contribuir para o reforço dos incentivos à transferência de tecnologia entre as regiões.

10.3   Orçamento

10.3.1

Tendo em conta a ambição que os Estados-Membros colocam à UE, relativamente aos objectivos do Alargamento e da Estratégia de Lisboa, é pouco razoável pensar que o nível de recursos possa manter-se ao mesmo nível. O CESE tem pedido, em pareceres emitidos ao longo dos últimos anos, a subida do tecto do orçamento comunitário. Tendo em conta o limite proposto pela Comissão em 1,24 %, no quadro das perspectivas financeiras para o período 2007-2013, o CESE só entende os 0,41 % dedicados à Política de Coesão (0,46 % antes de transferências destinadas ao desenvolvimento rural e das pescas) como resultado da fixação de um tecto máximo dos recursos totais num nível que nos parece insuficiente para conseguir atingir os ambiciosos objectivos propostos.

10.3.1.1

Neste cenário, e num contexto de maiores necessidades financeiras para enfrentar o aumento das disparidades regionais resultantes do alargamento, significa que serão fundamentalmente as regiões actualmente beneficiárias da Política de Coesão que irão suportar os custos do alargamento, através da diminuição dos apoios comunitários que lhes virão a caber.

10.3.1.2

É opinião do CESE de que esta situação é insustentável dos pontos de vista político e económico, por ser absolutamente contrária a qualquer princípio de equidade na repartição dos custos do alargamento.

10.3.1.3

OCESE não compreende, assim, como seria possível compatibilizar o objectivo político unanimemente assumido com o alargamento e aprofundamento da União, com a manutenção, ou mesmo redução, do esforço financeiro que o mesmo exige dos Estados-Membros, opondo-se a uma visão redutora da construção europeia, só justificável por dificuldades conjunturais e falta de visão futura por parte de alguns dos actores mais fundamentais neste processo.

11.   Outras recomendações

11.1

O CESE considera da máxima importância que os critérios económicos, sociais e territoriais, com base nos quais serão distribuídos entre os Estados-Membros os recursos destinados à Prioridade «Competitividade Regional e Emprego» sejam definidos com a maior objectividade e o maior rigor, incluindo uma atenção especial aos indicadores sociais e não só económicos.

11.2

Na execução dos Fundos, o CESE é de opinião de que cada vez mais se deve avançar para novas formas de envolvimento dos Parceiros Institucionais e Económicos e Sociais, muito para lá de uma participação nos órgãos de planeamento, gestão, controlo e avaliação.

11.3

A concretização de mecanismos inspirados nas Subvenções Globais é a este propósito uma via a reforçar, impondo aos Estados-Membros a exigência da adopção deste tipo de modelos, pelo menos numa reduzida parte dos Quadros Comunitários de Apoio, pelas vantagens que possivelmente decorrerão de menor burocratização, celeridade e ausência de esforço dos orçamentos dos Estados-Membros, tendo em conta os actuais constrangimentos generalizados das Finanças Públicas.

11.4

Para além disso, são de incentivar as Parcerias Público Privado como forma de ultrapassar os actuais constrangimentos ao nível das Finanças Públicas, bem como de garantir o seu financiamento a longo prazo.

11.5

Considera o CESE que deveria ser implementado um reforço de regras para abusos na deslocalização empresarial, prevendo-se designadamente o estabelecimento de penalidades exemplares e devolução dos incentivos recebidos se se provar que o desinvestimento não tem como fundamento a perda de viabilidade da unidade produtiva mas apenas a intenção de deslocalização de modo a beneficiar de mais apoios.

11.6

Considera igualmente desejável que, no âmbito do apoio às empresas, seja dada importância às PMEs, reconhecido o seu papel no contexto socioeconómico, designadamente na capacidade de gerar emprego e riqueza, e o seu maior «compromisso» para com o desenvolvimento da região onde se localizam.

11.7

Finalmente, a ambição de prosseguir uma política de coesão económica, social e territorial, no contexto de uma Europa alargada, representa seguramente um dos maiores desafios a que UE vai ter de responder. Constituindo a Política de Coesão um pilar essencial da integração entre os povos e os territórios da União Europeia, o CESE chama a particular atenção dos Estados-Membros de levar a bom porto esta Reforma, tendo em conta os fracassos recentes no processo de construção da União, de modo a fazer com que os cidadãos voltem a acreditar na construção europeia.

11.8

Parece ao CESE crucial, que os Estados-Membros mantenham e reforcem o seu próprio esforço de políticas de coesão, independentemente daquele que é proveniente das políticas da União.

11.9

A nova estrutura e prioridades da Política de Coesão da União, é condicionada pelo alargamento, bem como pelos limitados recursos disponíveis, e não propriamente porque tenham sido eliminadas as diferenças regionais e sociais. Assim, alguns Estados-Membros e regiões que até agora têm sido importantes beneficiários da Política de Coesão Europeia, ficarão progressivamente de fora da elegibilidade para parte substancial dos Instrumentos disponíveis. Tal não quer, obviamente, dizer que tenham atingido já o desejado nível de desenvolvimento e coesão, pelo que deverão merecer a atenção devida das políticas orçamentais nacionais.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Ponto 9 proveniente do parecer «Parceria para a Execução dos Fundos Estruturais» do CESE., JO C 10 de 14.1.2004, p. 21.


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/70


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu — Tributação dos dividendos das pessoas singulares no mercado interno»

COM(2003) 810 final

(2004/C 302/15)

Em 19 de Dezembro de 2003, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, emitiu parecer em 8 de Junho de 2004, tendo sido relator D. RETUREAU.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 151 votos a favor, 1 voto contra e 12 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

A Comunicação em apreço diz respeito principalmente à tributação dos dividendos recebidos por pessoas singulares, na qualidade de investidores em títulos.

1.2

A Comunicação vem na sequência de uma outra sobre o estudo sobre a fiscalidade das empresas (1), na qual se propunha a definição de linhas orientadoras para a aplicação dos principais acórdãos do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias neste domínio e, quanto aos dividendos recebidos por pessoas singulares, remete para o acórdão Verkooijen (2). A assimilação dos dividendos a uma circulação de capitais é uma construção judicial; os dividendos não são mencionados expressamente nem no Tratado nem na directiva.

1.3

As divergências, entre os sistemas fiscais dos Estados-Membros, na «dupla tributação dos rendimentos das empresas distribuídos a pessoas singulares accionistas sob forma de dividendos» (3) constituiriam uma forma de discriminação importante e um obstáculo à livre circulação de capitais no Mercado Único.

1.4

As linhas orientadoras propostas referem-se à incidência do Direito Comunitário nas variantes de tributação dos dividendos pelos Estados-Membros e visam, também, à luz da jurisprudência do Tribunal de Justiça, eliminar os obstáculos enfrentados pelas pessoas singulares no plano da tributação de rendimentos provenientes de dividendos de carteiras de acções. Acresce que a proposta visa também reduzir as taxas de tributação demasiado elevadas nos Estados de origem dos dividendos.

1.5

O objectivo consiste, por um lado, em «ajudar estes últimos (os Estados-Membros) a assegurar a compatibilidade dos referidos sistemas com as exigências do mercado interno em conformidade com os princípios do Tratado no que respeita à livre circulação de capitais».

1.6

Se os Estados-Membros não aceitarem o método proposto para suprimir os obstáculos à livre circulação dos investimentos de rendimentos de títulos em acções, a Comissão poderia, nesse caso, fazer uso do disposto no artigo 226.o do Tratado CE, na qualidade de guardiã dos Tratados.

1.7

A este respeito, recorde-se que o Tribunal de Justiça pode deduzir do texto das questões prejudiciais suscitadas por um tribunal nacional, com base nos dados que lhe foram submetidos, os elementos que tenham a ver com a interpretação do Direito Comunitário, permitindo, assim, ao juiz nacional resolver o problema jurídico de que deve conhecer (4).

2.   Tributação dos dividendos no mercado interno

2.1

A tributação dos resultados obtidos por uma sociedade inclui um imposto sobre o lucro, cuja taxa varia segundo os países entre 12,5 e 40 % (sendo a média de 30 % aproximadamente). A tributação de dividendos distribuídos de lucros após o pagamento do imposto sobre as sociedades pode efectuar-se mediante retenção na fonte e ser deduzida do dividendo distribuído, mas pode igualmente estar sujeita ao IRS à taxa marginal ou a uma taxa específica.

2.2

A tributação dos resultados de uma sociedade e dos dividendos pode constituir, segundo a Comissão, uma «dupla tributação económica», podendo as pessoas singulares ser passíveis de dupla tributação jurídica internacional (tributação por dois países diferentes sobre os dividendos recebidos no estrangeiro).

2.2.1

O modelo de convenção proposto pela OCDE para evitar a dupla tributação jurídica internacional não trata a dupla tributação económica.

2.2.2

Segundo a convenção-modelo da OCDE, o imposto sobre dividendos retido na fonte no Estado de origem deveria ser deduzido do imposto a pagar no Estado de residência fiscal do accionista, havendo lugar a uma simples tributação limitada ao montante do imposto que pode ser devido sobre os dividendos no Estado de residência fiscal.

2.2.3

O modelo da OCDE aplica-se, segundo a Comissão, a todos os sistemas de tributação de dividendos, numa forma pura ou mista (sistema clássico, cedular, imputação, isenção).

3.   Acórdão Verkooijen e outros acórdãos pertinentes

3.1

No acórdão no processo Verkooijen, o Tribunal de Justiça pronunciou-se sobre a recusa, a este último, de isenção de impostos sobre o rendimento quanto aos dividendos recebidos de acções de sociedade com sede em Estado-Membro diferente dos Países Baixos.

3.2

Esta isenção aplicava-se ao rendimento de acções ou partes sociais sobre o qual foi efectuada retenção do imposto neerlandês na fonte pelos Países Baixos, o que excluía os rendimentos de acções obtidos noutros países.

3.2.1

Em primeiro lugar, a isenção era concebida como medida para melhorar o nível dos fundos próprios das empresas e estimular o interesse dos particulares por acções neerlandesas; em segundo lugar, em especial quanto aos pequenos investidores, a isenção tinha por objectivo compensar, em certa medida, a dupla tributação económica através de uma isenção de mil florins neerlandeses.

3.2.1.1

No caso do imposto sobre os rendimentos do recorrente Verkooijen, o inspector dos impostos não aplicou a isenção dos dividendos, por entender que não tinha direito uma vez que os dividendos que recebera «não estavam sujeitos a imposto neerlandês sobre os dividendos».

3.2.2

A questão prejudicial suscitada pelo órgão jurisdicional nacional competente, levou o Tribunal de Justiça a entender que o recebimento de dividendos estrangeiros estava indissoluvelmente ligado a um movimento de capitais; um tratamento fiscal diferente, e menos vantajoso, dos dividendos entrados em relação aos dividendos nacionais constituía, assim, uma restrição proibida à liberdade de circulação de capitais.

3.2.2.1

O Tribunal de Justiça precisou que uma disposição geral como a que está em causa «(...) tem como efeito dissuadir os nacionais de um Estado-Membro que residam nos Países Baixos de investirem os respectivos capitais em sociedades com sede noutro Estado-Membro».

3.2.2.2

«Uma tal disposição tem também efeito restritivo quanto às sociedades com sede noutros Estados-Membros na medida em que lhes levanta um obstáculo à recolha de capitais nos Países Baixos.»

3.3

No processo Schmid (5), o advogado-geral assinalou que os dividendos provenientes de acções estrangeiras, não sujeitos na Áustria à retenção na fonte de carácter liberatório a título do imposto sobre os rendimentos de capitais, estão, por isso, integralmente sujeitos ao imposto sobre o rendimento e não podem beneficiar da aplicação da taxa reduzida a metade. O advogado-geral concluiu que se estava perante uma violação à livre circulação de capitais.

4.   Observações na generalidade

4.1

Em matéria fiscal, os Estados-Membros têm uma competência limitada. Os artigos 56.o e 58.o do Tratado CE actualmente em vigor restringem esta competência nacional, cujo exercício não deve prejudicar nenhuma liberdade fundamental, nem contornar o Direito Comunitário: o artigo 56.o proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais, enquanto que o artigo 58.o reconhece que as disposições fiscais nacionais podem estabelecer «uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido», e embora os Estados-Membros possam tomar «todas as medidas indispensáveis para impedir infracções às suas leis e regulamentos, nomeadamente em matéria fiscal e de supervisão prudencial das instituições financeiras (...) ou (...) medidas justificadas por razões de ordem pública ou de segurança pública», essas medidas «não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos».

4.2

A jurisprudência do Tribunal de Justiça exige um tratamento igual dos sujeitos passivos e condena a dupla tributação internacional.

4.3

Face ao alargamento da União, e devido às diferenças de taxas, ainda mais acentuadas, do imposto sobre as sociedades e do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares proveniente de dividendos, o Comité considera urgente encorajar todos os Estados-Membros que não tenham ainda celebrado convenções internacionais para evitar a dupla tributação, a darem, baseando-se minimamente no modelo da OCDE, igualdade de tratamento, ao nível nacional, dos dividendos obtidos pelos investidores em títulos, independentemente da sua origem na UE.

4.4

O Comité assinala que o Tratado prevê igualmente a livre circulação de capitais destinados a e provenientes de países terceiros, e que há várias convenções internacionais bilaterais entre Estados-Membros e países terceiros.

4.5

Idealmente, a plena neutralidade só poderia ser atingida, combinando todas as condições exigidas na Comunicação e limitando a acção ao espaço comunitário, através da aplicação à escala comunitária de uma única taxa de imposto sobre as sociedades no âmbito de um sistema de isenção, e na condição de que a tributação do IRS fosse igual em todos os países interessados, assente na suposição de que os rendimentos provenientes de dividendos de acções constituem o único rendimento do investidor em títulos. De facto, a Comissão é a própria a reconhecer que a plena neutralidade fiscal só pode ser assegurada através de uma completa harmonização dos regimes fiscais dos Estados-Membros.

4.6

A soberania fiscal dos parlamentos e dos Estados, que decidem quanto à tributação das pessoas singulares e colectivas e ao orçamento nacional, constitui historicamente o fundamento das democracias europeias. A igualdade dos cidadãos perante a carga fiscal constitui um princípio fundamental do valor constitucional. Tendo em conta o nível actual de integração europeia, os Estados-Membros têm ainda sérias razões para manterem, como previsto nos Tratados, as suas competências nacionais em matéria fiscal. Esta situação poderá, bem entendido, vir a alterar-se. Contudo, o Comité deseja que a liberdade de que dispõem os Estados-Membros não conduza a situações de dumping fiscal.

4.7

O Comité considera que as linhas orientadoras propostas, na condição de se limitarem às questões sobre as quais o Tribunal de Justiça efectivamente se pronunciou, inscrevem-se no quadro das respectivas competências da Comissão e dos Estados-Membros e, se assim se decidir, o Parlamento Europeu e os órgãos comunitários consultivos deveriam ser plenamente implicados no acompanhamento de um tal procedimento.

4.8

O Comité pergunta, finalmente, se a ameaça de interposição de recurso para o Tribunal de Justiça é verdadeiramente de natureza a facilitar a procura inevitável de soluções; no entanto, o Comité entende que os Estados-Membros em causa devem adoptar rapidamente disposições para evitar discriminação dos dividendos. O que poderia equivaler, por outro lado, a querer fazer do Tribunal de Justiça um «legislador comunitário» em matéria fiscal, para além das competências que incumbem aos Estados-Membros, correndo-se, assim, o risco de confundir poderes.

5.   Observações na especialidade

5.1

O Comité assinala que o modelo de análise relativamente simples da Comissão apenas considera uma das possibilidades de investimento em acções, ou seja, a de uma carteira individual composta por acções de sociedades estabelecidas em dois ou mais Estados-Membros. Uma carteira pode ser composta por acções de sociedades estabelecidas em vários Estados-Membros e fora da UE.

5.2

O Comité assinala também que os rendimentos de valores mobiliários podem também provir de sociedades de investimento colectivo ou de fundos de pensão, sob formas que não permitem apurar a origem nacional das várias partes que compõem os dividendos e as mais-valias distribuídos. Por outro lado, às mais-valias desses investimentos e aos rendimentos distribuídos são, por vezes, aplicadas regras fiscais diferentes das aplicáveis ao recebimento directo de dividendos por parte de uma pessoa singular titular da sua própria carteira de acções. A Comissão não foca estas questões.

5.3

O Comité constata que a questão da tributação de mais-valias em Bolsa também não é tratada na comunicação. A percepção de dividendos não é o único objectivo dos particulares que investem em carteiras de acções. A valorização dos títulos na Bolsa para obtenção de benefícios constitui um motivo ainda mais forte para investir, para além de fazer parte da gestão de uma carteira e dos respectivos rendimentos. Este é, sem dúvida, um problema que deveria também ser tratado.

5.4

No que diz respeito à dupla tributação económica, o Comité considera que não é ilegítimo estabelecer uma distinção entre pessoas singulares e colectivas, independentemente dos métodos e das taxas de tributação praticados. A quota distribuída aos accionistas representa para estes um rendimento disponível, mas os resultados não são necessariamente distribuídos na totalidade. Parte deles serve para o autofinanciamento da empresa, o que valoriza o título e a riqueza do accionista; nas hipóteses avançadas pela Comissão, esta parcela dos resultados não está sujeita ao IRS, mas sim ao imposto sobre as sociedades. Convém, pois, saber também se as mais-valias são tributadas ou não quando da sua realização, e em que condições. A comunicação não aborda este assunto que o Comité considera tão importante.

6.   Conclusões

6.1

O Comité considera que o tratamento não discriminatório da dupla tributação e das retenções eventuais na fonte de dividendos internos e os dividendos entrados e saídos constitui objectivo importante, sem pôr em causa o princípio fundamental da igualdade das pessoas singulares perante a carga fiscal ao nível nacional. Os Estados-Membros poderiam, também, prever formas de cooperação entre países com práticas fiscais semelhantes, para estudo das melhores práticas disponíveis.

6.2

Tendo em vista o melhor funcionamento do mercado interno, as questões abordadas pelo Comité no ponto «Observações na especialidade» poderiam ser examinadas no intuito de mais harmonização dos sistemas fiscais em matéria de impostos sobre sociedades e mais-valias resultantes de valores mobiliários.

6.3

Por fim, o Comité considera que a Comunicação da Comissão abre a perspectiva de encontrar soluções para problemas que são objecto de numerosos recursos para o Tribunal de Justiça, os quais, por constituírem uma sobrecarga inútil neste domínio, conviria, de futuro, evitar.

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  «Mercado Interno sem obstáculos em matéria de fiscalidade» COM (2001) 582 final.

(2)  Processo C-35/98 Verkooijen [2000] Colectânea I-4071.

(3)  Relatório Ruding, de Março de 1992, pp. 207-208.

(4)  Acórdão de 28 de Janeiro de 1992, Bachmann, CR 204/90, Colectânea pág. I-249.

(5)  Processo C-516/99, de 30 de Maio de 2002.


ANEXO

ao parecer do Comité Económico e Social Europeu

As seguintes propostas de alteração, que recolheram um número de votos favoráveis que representam pelo menos um quarto dos sufrágios expressos, foram rejeitadas:

Ponto 4.6

Elidir a última frase.

Resultado da votação:

Votos contra:

84

Votos a favor:

58

Abstenções:

9

Ponto 4.8

Elidir.

Resultado da votação:

Votos contra:

85

Votos a favor:

53

Abstenções:

16


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/74


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões e aos parceiros sociais a nível comunitário no que respeita ao reexame da Directiva 93/104/CE referente a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho»

[COM(2003) 843 final]

(2004/C 302/16)

Em 5 de Janeiro de 2004, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos trabalhos correspondentes, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 14 de Junho de 2004, sendo relator Erik HAHR.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 154 votos a favor, 71 votos contra e 13 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Síntese da comunicação da Comissão

1.1

A comunicação da Comissão incide na Directiva 93/104/CE, de 23 de Novembro de 1993, alterada pela Directiva 2000/34/EC relativa aos requisitos mínimos da organização do tempo de trabalho, a fim de garantir um melhor nível de segurança e protecção da saúde dos trabalhadores.

1.2

A presente comunicação prossegue um objectivo triplo:

1.2.1

Em primeiro lugar, pretende avaliar a aplicação de duas das disposições da directiva sujeitas a reexame antes do termo de um período de sete anos a contar do fim do prazo de transposição pelos Estados-Membros, ou seja, antes de 23 de Novembro de 2003. Estas disposições referem-se às derrogações, previstas no n.o 4 do artigo 17.o, ao período de referência para a aplicação do artigo 6.o (duração máxima semanal de trabalho) e à faculdade de não aplicar o artigo 6.o [recurso ao artigo 18.o, n.o 1, alínea b), i)] se o trabalhador der o seu acordo para efectuar esse trabalho (geralmente conhecido e a seguir designado como opt-out).

1.2.2

Em segundo lugar, visa analisar o impacto da jurisprudência do Tribunal no que se refere à definição do tempo de trabalho e à qualificação dos períodos de guarda, bem como aos novos desenvolvimentos relativos a uma melhor compatibilidade entre a vida profissional e a vida familiar.

1.2.3

A comunicação tem ainda como objectivo consultar o Parlamento Europeu, o Conselho, o Comité Económico e Social Europeu e o Comité das Regiões, bem como os parceiros sociais, sobre uma possível revisão do texto.

1.2.4

Cabe notar que o Parlamento Europeu adoptou, em 11 de Fevereiro de 2004, um relatório no qual preconizava a eliminação progressiva de todas as disposições relativas à opção de exclusão (opt-out). Em 19 de Maio, a Comissão publicou um segundo documento de consulta. Segundo a Comissão, o objectivo desse documento é instar os parceiros sociais a negociar e, em caso de insucesso, apresentar indicações gerais sobre a orientação de qualquer legislação que venha a ser posteriormente proposta pela Comissão.

2.   Observações na generalidade

2.1

O CESE considera inadequado o método de consulta utilizado pela Comissão sobre matéria sujeita a negociação colectiva a nível nacional. A Comissão deveria ter começado por consultar os parceiros sociais antes de lançar o processo de consulta com as instituições europeias, o CESE e o Comité das Regiões.

2.2

Apesar de a Comissão não apresentar propostas concretas de alteração à directiva, a consulta solicita respostas a cinco grandes questões, na perspectiva de uma revisão futura da directiva:

Duração dos períodos de referência — actualmente quatro meses, em determinadas situações seis meses ou 1 ano.

Definição do tempo de trabalho, de acordo com os recentes acórdãos do Tribunal de Justiça sobre o tempo de guarda.

Condições de aplicação da opção de exclusão (opt-out).

Medidas para compatibilizar a vida profissional com a vida familiar.

Obtenção do melhor equilíbrio possível entre essas medidas.

2.2.1

Para poder responder exaustivamente às cinco questões suscitadas pela Comissão é necessário não só um conhecimento aprofundado da Directiva 93/104/CE relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, mas também uma análise da forma como essa directiva é aplicada na legislação dos Estados-Membros e quais as consequências dessa aplicação na legislação nacional anterior sobre o tempo de trabalho e na negociação colectiva a nível nacional. O Comité considera que o relatório (1) publicado pela Comissão e o conteúdo da presente comunicação esclarecem apenas parcialmente as questões referidas. As observações do Comité terão, por isso, necessariamente um carácter mais global.

2.2.2.

A fim de assegurar um melhor nível de protecção da saúde e da segurança dos trabalhadores em harmonia com as disposições sociais constantes no Tratado que institui a Comunidade Europeia (artigo 136.o e seguintes) e a Directiva 89/391/CEE, a Directiva 93/104/CE relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho prevê nomeadamente:

uma duração máxima de trabalho de 48 horas em média por semana, incluindo as horas suplementares;

um período mínimo de descanso de 11 horas consecutivas por cada período de vinte e quatro horas;

uma pausa em caso de trabalho diário superior a seis horas;

um período mínimo de descanso de um dia por semana;

férias anuais remuneradas de quatro semanas;

uma duração máxima diária de trabalho nocturno de oito horas em média.

2.2.3

A directiva define ainda as regras a respeitar pelos Estados-Membros, através de legislação, e pelos parceiros sociais nacionais, através de convenções colectivas, para poderem derrogar as normas da directiva. As derrogações só serão permitidas se os princípios gerais da segurança e da saúde dos trabalhadores forem observados.

2.2.4

Infelizmente não há uma avaliação completa sobre se a aplicação da directiva nos Estados-Membros deu azo às melhorias das condições de vida e de trabalho originalmente desejadas para os trabalhadores da União Europeia, mas o Comité parte desse princípio, pelo menos a longo prazo. As alterações à directiva devem, pois, ser bem ponderadas e justificadas, em especial da perspectiva dos parceiros sociais.

2.2.5

Há, todavia, que ter em atenção o facto de a directiva se basear em discussões e reflexões com mais de catorze anos. As decisões do Tribunal de Justiça sobre a interpretação do conceito de «tempo de trabalho» e de «descanso compensatório» suscitaram graves dificuldades em vários Estados-Membros. Nesse contexto, o Comité acolhe com interesse, salientando embora os limites já referidos, o processo de consulta iniciado agora pela Comissão. Isso possibilita a recolha de pontos de vista valiosos de diversas proveniências sobre a forma como a directiva e a legislação dela resultante funcionaram nos Estados-Membros, colmatando, dessa forma, a falta de informação já referida. Nos termos das disposições do Tratado que institui a Comunidade Europeia, os parceiros sociais têm naturalmente um importante papel a desempenhar.

2.2.6

O tempo de trabalho e a organização do tempo de trabalho são extremamente importantes nas relações entre as associações empresariais e as sindicais e nas relações entre empregador e trabalhador. A concepção de regras aplicáveis ao tempo de trabalho nas convenções colectivas apresenta, pois, um interesse fundamental para os parceiros sociais, que têm grande competência e experiência nessas questões.

2.2.7

A legislação nacional sobre o tempo de trabalho funda-se geralmente na ideia de que os empregadores e os trabalhadores têm uma responsabilidade comum em relação à organização satisfatória do tempo de trabalho. Cabe aos parceiros sociais em diversos níveis nos Estados-Membros resolver os problemas de tempo de trabalho que surgem no local de trabalho, em função das regras aplicáveis ao tempo de trabalho e no âmbito de convenções colectivas.

2.2.8

Uma revisão estritamente jurídica das regras estabelecidas na directiva relativa ao tempo de trabalho em matéria de descanso diário, períodos de pausa, descanso semanal e tempo de trabalho semanal demonstra que, em comparação com as disposições relativas às derrogações previstas no artigo 17.o, a directiva permite alguma flexibilidade negociada, pelo menos se não for tido em conta o impacto das decisões do Tribunal sobre o tempo de guarda. Note-se que a directiva relativa ao tempo de trabalho constitui uma parte relativamente complicada do direito comunitário. O Comité propõe, pois, à Comissão que não só reveja a directiva, como também analise e tenha em atenção as condições para simplificar a directiva. Todavia, uma simplificação não deve levar ao incumprimento do requisito essencial de protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores.

3.   Observações na especialidade

3.1   Períodos de referência

3.1.1

Desde a origem da directiva que se debatem na Europa as questões do tempo de trabalho anual. O conceito de tempo de trabalho anual é simplesmente definido como um sistema em que os períodos de referência para a duração média de trabalho semanal correspondem a um ano ou a 365 dias.

3.1.2

A directiva relativa ao tempo de trabalho, nomeadamente o artigo 6.o, prevê uma duração de trabalho de 48 horas em média por semana. Esse tempo de trabalho pode repartir-se por quatro meses ou, nos termos das disposições derrogatórias constantes do n.o 4 do artigo 17.o, por seis ou doze meses (2). Assim, a directiva permite uma certa flexibilidade no que se refere à repartição do tempo de trabalho durante um período de referência. A organização do tempo de trabalho deve, naturalmente, ter em atenção as disposições relativas ao descanso diário, descanso semanal, trabalho nocturno, etc., bem como os princípios gerais da segurança e da saúde do trabalhadores.

3.1.3

Na comunicação, a Comissão assinala que «nem sempre é fácil analisar as legislações nacionais em matéria de transposição dos artigos 6.o e 16.o  (3) (referentes ao tempo de trabalho máximo semanal e aos períodos de referência, respectivamente), mas que de uma forma geral, é possível constatar a afirmação de uma tendência para um período de referência anual» (4).

3.1.4

A questão reside em saber quais as consequências do período de referência para a saúde e segurança dos trabalhadores, questão não abordada pela Comissão. É patente que concentrar muito trabalho num período de tempo relativamente curto pode ser inconveniente, mas dado que o período de referência anual é efectivamente muito utilizado — precisamente no âmbito de convenções colectivas — é possível inferir que o impacto negativo de um período de referência mais longo na saúde e na segurança é, em geral, considerado limitado pelas partes no processo de negociação, se estiver prevista a concessão de um período de repouso equivalente.

3.1.5

Um dos argumentos avançados para o alargamento do período de referência era permitir às empresas maior flexibilidade na gestão do tempo de trabalho. Essa flexibilidade já existe em muitos países, graças a convenções colectivas, e o problema da falta de flexibilidade afecta primeiramente os países em que as convenções colectivas de trabalho desempenham tradicionalmente um papel menos significativo. Afigura-se importante procurar reforçar as convenções colectivas sobre a questão do tempo de trabalho, particularmente nos países em que o processo de negociação não é particularmente forte.

3.1.6

O artigo 137.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, em que se funda a directiva relativa ao tempo de trabalho, determina que as directivas aprovadas com base nesse artigo «devem evitar impor disciplinas administrativas, financeiras e jurídicas contrárias à criação e desenvolvimento de pequenas e médias empresas».

3.1.7

Dado que muitos Estados-Membros já utilizam um período de referência de doze meses, recorrendo a convenções colectivas de trabalho, o CESE considera que a regulamentação em vigor ao prever a possibilidade de prolongar esse período de referência mediante convenções colectivas garante aos parceiros sociais flexibilidade necessária para adaptarem o tempo de trabalho às diversas situações existentes nos Estados-Membros, sectores e empresas. Convém, portanto, mantê-la.

3.1.8

Vista a peculiaridade do tempo de trabalho dos quadros, o CESE propõe que a Comissão examine a possibilidade de associar directamente as organizações representativas desta categoria profissional ao processo de negociação das condições respeitantes ao tempo de trabalho, o que exige disposições especiais.

3.2   Definição do tempo de trabalho

3.2.1

A directiva relativa ao tempo de trabalho define, no artigo 2.o, tempo de trabalho como «qualquer período durante o qual o trabalhador está a trabalhar ou se encontra à disposição da entidade patronal e no exercício da sua actividade ou das suas funções, de acordo com a legislação e/ou a prática nacional». Por outro lado, no n.o 2 do artigo 2.o, o período de descanso é definido como «qualquer período que não é tempo de trabalho».

3.2.2

O Tribunal de Justiça foi já duas vezes levado a interpretar a definição de tempo de trabalho da directiva. No primeiro acórdão (5), referente aos períodos de guarda dos médicos nos estabelecimentos de saúde, o Tribunal determinou que o tempo de guarda dos médicos deve ser considerado como tempo de trabalho, nos termos do n.o 1 do artigo 2.o da directiva, de acordo com o regime da presença física no estabelecimento de saúde. O tempo de guarda ou os períodos de serviço de urgência interna prevêem, pois, a obrigação de estar fisicamente presentes no local determinado pela entidade patronal e de aí estarem à sua disposição para prestarem os seus serviços. No seu acórdão no processo Jaeger (6), o Tribunal confirmou a sua interpretação anterior e afirmou que mesmo o período de inactividade de um médico durante o serviço de guarda deve ser considerado tempo de trabalho na acepção da directiva. Preceituou ainda que o descanso compensatório deve ser tomado imediatamente.

3.2.3

O CESE chama a atenção para o facto de que os acórdãos poderão ter consequências significativas para a organização do trabalho, principalmente no tocante ao pessoal do sector da saúde, e noutros sectores que também irão ser afectados. As legislações nacionais de vários Estados-Membros incluem normas para os períodos de guarda. Essas normas, embora diferentes, têm em comum o facto de não considerarem o tempo de guarda como tempo de trabalho, ou considerarem-no apenas parcialmente. Este tempo também não é considerado tempo de descanso.

3.2.4

De assinalar é o facto de o âmbito da definição de tempo de trabalho constante do n.o 1 do artigo 2.o aparentemente não ter sido analisado ou discutido de forma satisfatória antes da aprovação da directiva. Não há outra explicação para a surpresa provocada pelos acórdãos nas instituições comunitárias e nos Estados-Membros, em especial dado que as legislações nacionais de vários Estados-Membros incluem normas para o tempo de guarda.

3.2.5

O CESE concorda com a posição da Comissão, segundo a qual existem várias soluções para o problema. Nas circunstâncias actuais, o CESE não propugna uma solução específica. No entanto, a abordagem escolhida deverá:

garantir uma melhor protecção da saúde e segurança dos trabalhadores em matéria de tempo de trabalho;

dar às empresas e aos Estados-Membros maior flexibilidade na gestão do tempo de trabalho;

permitir uma melhor compatibilidade entre a vida profissional e a vida familiar;

evitar impor constrangimentos excessivos às empresas, nomeadamente às PME.

3.3   Recurso à opção de exclusão nos termos do artigo 18.o, n.o 1, alínea b), i) (opt-out)

3.3.1

Essa disposição dá aos Estados-Membros o direito, por via legislativa, de derrogação ao artigo 6.o da directiva que limita a 48 horas a duração média semanal de trabalho. A aplicação da derrogação depende do preenchimento de várias condições:

a)

O trabalhador tem de ter aceite trabalhar mais horas.

b)

O trabalhador não pode sofrer represálias pelo facto de não querer prestar mais horas.

c)

A entidade patronal deve dispor de registos actualizados de todos os trabalhadores que efectuem esse trabalho.

d)

Os registos devem ser postos à disposição das autoridades competentes.

O CESE observa que mesmo os trabalhadores que optam pela exclusão (opt-out) ao abrigo do artigo 18.o têm direito a um período mínimo de descanso de 11 horas consecutivas por cada período de vinte e quatro horas e a uma pausa no caso de o período de trabalho diário exceder seis horas.

3.3.2

A directiva relativa ao tempo de trabalho baseia-se em premissas vagas e implícitas sobre aquilo a que se pode chamar «uma cultura sã de tempo de trabalho». De acordo com o artigo 137.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, «a Comunidade apoiará e completará a acção dos Estados-Membros» para melhorar o ambiente de trabalho e «proteger a saúde e a segurança dos trabalhadores». A própria existência da directiva relativa ao tempo de trabalho e sobretudo a sua aplicação prática na maior parte dos Estados-Membros comprova que existe, em todo o caso, uma ampla vontade de limitar a possibilidade de uma cultura pouco sã de tempo de trabalho. É referido expressamente que a opção de exclusão constante do artigo 18.o, n.o 1, alínea b), i) só é aplicável se os Estados-Membros respeitarem «os princípios gerais de protecção da segurança e saúde dos trabalhadores».

3.3.3

A eventual pertinência da opção de exclusão só pode ser avaliada se se demonstrar a ligação entre um tempo de trabalho semanal superior a 48 horas e a saúde e a segurança dos trabalhadores. Na comunicação, a Comissão afirma que uma análise dos efeitos do opt-out sobre a saúde e segurança dos trabalhadores «não parece ser possível, por falta de dados fiáveis» (7). Todavia, a Comissão refere ainda um estudo recente segundo o qual «os elementos tangíveis de que se dispõe apoiam a existência de uma relação entre as longas horas de trabalho e o cansaço» em especial quando a semana de trabalho conta mais de 48 a 50 horas. No seu parecer sobre a proposta de directiva de 1990, o CESE já assinalara que «numerosos estudos feitos indicam que tempos de trabalho demasiado longos sem períodos de repouso e o trabalho por turnos sem intervalos prejudicam a saúde dos trabalhadores e podem tornar-se responsáveis por doenças profissionais e pelo desgaste da saúde» (8).

3.3.4

Uma questão importante ligada à opção de exclusão prende-se com o voluntariado. Nos termos das disposições da directiva, os trabalhadores têm a liberdade de escolher não trabalhar em média mais de 48 horas por semana. Essas disposições foram criticadas na medida em que essa possibilidade não existe verdadeiramente, por exemplo, numa situação de contratação em que será difícil para o trabalhador recusar-se a assinar um acordo.

3.3.5

De acordo com a comunicação da Comissão, uma sondagem junto dos empregadores no Reino Unido revela que, no sector da construção, 48 % dos trabalhadores operacionais trabalham mais de 48 horas por semana (9). Este é um valor surpreendentemente elevado se se pensar que é provável que em muitos casos se refira a um trabalho que exige tanto resistência física como precisão. O rendimento que o empregador pode ter dessas últimas horas de trabalho, em que o custo da mão-de-obra é ainda maior por serem horas extraordinárias, deve ser relativamente pequeno. É, pois, pertinente questionar-se se, em geral, as longas horas de trabalho no Reino Unido não se prenderão com outros problemas estruturais.

3.3.6

Um ponto importante é saber de que forma as longas horas de trabalho afectam as famílias. Como vivem as crianças cujos pais trabalham mais de 48 horas por semana? Será que as longas horas de trabalho contribuem para manter um dos elementos do casal — na maior parte dos casos a mulher — totalmente ou em parte afastado do mercado de trabalho? Assim sendo, a opção de exclusão pode ir contra a realização dos objectivos da estratégia de Lisboa de conseguir que 60 % da população feminina seja profissionalmente activa até 2010. É surpreendente que as disparidades entre homens e mulheres britânicos no emprego se situem ligeiramente abaixo da média comunitária. Por outro lado, o Reino Unido é, depois dos Países Baixos, o país da UE com mais mulheres, quase metade, a trabalhar a tempo parcial (10). Segundo a comunicação da Comissão, 26,2 % dos homens britânicos trabalham mais de 48 horas por semana, contra 11,5 % de mulheres (11). Um estudo publicado no British Medical Journal concluiu que a ausência de controlo das horas suplementares constitui um risco para a saúde das mulheres trabalhadoras, particularmente as trabalhadoras manuais com responsabilidades familiares (12). A opção de opt-out parece, assim, ter também influência negativa na igualdade entre homens e mulheres, mas é necessária uma análise mais aprofundada desse aspecto.

3.3.7

Nesta fase, o CESE não toma uma posição sobre a opção de exclusão. Antes de tomar uma posição sobre essa questão, será necessária uma análise pormenorizada da situação envolvendo os parceiros sociais.

3.4   Melhor compatibilidade entre a vida profissional e a vida familiar

3.4.1

O que significa para o trabalhador uma melhor compatibilidade entre a vida profissional e a vida familiar? O que significa vida familiar? Se a questão for colocada a pais de crianças pequenas obtém-se uma resposta. A mesma pergunta feita a um casal sem filhos obterá certamente uma resposta diferente. Um pai solteiro dará ainda uma terceira resposta. Não é, pois, possível dar uma resposta unívoca a esta questão.

3.4.2

De um modo geral, pode dizer-se, porém, que, para a maioria das pessoas, a possibilidade de influenciar ou controlar a sua situação laboral é considerada positiva e contribui para um bom ambiente de trabalho. Isso aplica-se em especial aos pais de crianças pequenas, como salientado pelo Parlamento Europeu na sua resolução sobre a organização do tempo de trabalho:

as mulheres estão mais expostas a efeitos negativos na sua saúde e no seu bem-estar quando têm o duplo encargo do trabalho profissional e das responsabilidades familiares;

a preocupante tendência de as mulheres executarem dois trabalhos em regime de tempo parcial, a que acresce uma semana de trabalho que excede o limite legal, a fim de auferirem um rendimento suficiente para a sua subsistência;

a cultura de longas horas de trabalho em cargos superiores e de gestão constitui um obstáculo à mobilidade ascendente das mulheres e fomenta uma segregação em razão do sexo no local de trabalho (13).

O CESE concorda com essa análise, embora assinale que os problemas referidos não se aplicam apenas às mulheres, mas aos pais em geral que têm dificuldade em compatibilizar a vida profissional e a vida familiar, o que implica um risco para a saúde.

3.4.3

O CESE frisa que a faculdade de cada pessoa libertar tempo não totalmente absorvido pela vida profissional e familiar para desenvolver a sua capacidade participativa na vida social e democrática deveria constituir uma finalidade essencial de toda e qualquer política de organização do tempo de trabalho.

3.4.4

Presentemente, tanto no direito comunitário como no direito nacional, há normas que têm em consideração a necessidade de conciliar a vida familiar e a educação dos filhos com uma actividade profissional remunerada, designadamente as disposições sobre licença parental, tempo parcial, teletrabalho, tempo de trabalho flexível, etc. O CESE acolheria com agrado uma identificação das disposições já existentes na matéria, com a participação dos parceiros sociais, antes de apresentar propostas de novas medidas e realizar uma avaliação comparativa entre elas. O CESE propõe que a Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho seja responsável por essa identificação. A Fundação já publicou um relatório que aborda parcialmente os problemas existentes (14).

Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Relatório da Comissão — Situação relativa à transposição da Directiva 93/104/CE do Conselho, de 23 de Novembro de 1993, referente a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho («Directiva relativa ao tempo de trabalho»), COM(2000) 787 final.

(2)  

1.

De quatro a seis meses mediante convenção colectiva ou acordos celebrados entre parceiros sociais (a primeira frase do n.o 4 do artigo 17.o refere o n.o 3 do mesmo artigo).

2.

Todavia, os Estados-Membros têm a possibilidade, «desde que respeitem os princípios gerais de protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores», de permitir que, «por razões objectivas, técnicas ou de organização do trabalho», as convenções colectivas ou acordos celebrados entre parceiros sociais fixem períodos de referência que não ultrapassem em caso algum doze meses..

(3)  COM(2003) 843 final, p. 6.

(4)  COM(2003) 843 final, p. 7.

(5)  Acórdão do Tribunal de Justiça de 3 de Outubro de 2000 no processo C-303/98 (Simap).

(6)  Acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Outubro de 2003 no processo C-151/02 (Jaeger), ainda não publicado.

(7)  COM(2003) 843 final, p. 16.

(8)  JO C 60 de 8.3.1991, p. 26.

(9)  COM(2003) 843 final, p. 14.

(10)  Relatório da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Relatório sobre a igualdade entre homens e mulheres — 2004 (COM(2004) 115 final, p. 16)

(11)  COM(2003) 843 final, p. 13.

(12)  Ala-Mursula et al: «Effect of employee worktime control on health: a prospective cohort study», Occupational and Environment Medicine, 61: 254-261, n.o 3, Março de 2004.

(13)  Resolução do Parlamento Europeu de 11 de Fevereiro de 2004 sobre a organização do tempo de trabalho (Revisão da Directiva 93/104/CEE), P5 TA-PROV(2004)0089, ponto 20-22.

(14)  «Uma nova organização do tempo ao longo da vida profissional», Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho, 2003 ( http://www.eurofound.eu.int/publications/files/EF0344PT.pdf).


ANEXO

ao parecer do Comité Económico e Social Europeu

Foi rejeitada no curso das deliberações, tendo embora obtido mais de 25 % dos votos expressos, a seguinte alteração:

Ponto 3.1.7

Substituir pelo seguinte texto:

«Na sua comunicação de 19 de Maio, a Comissão propõe que o período de referência seja alargado sem apresentar ainda uma proposta concreta. Por conseguinte, o CESE não pretende tomar posição sobre a matéria nesta fase. O CESE fa-lo-á quando for consultado sobre um projecto de directiva.»

Justificação

Nas outras duas questões (definição do tempo de trabalho, ponto 3.2.5, e opção de exclusão, ponto 3.3.7), o CESE não toma posição, aguardando propostas mais concretas. Por isso, justifica-se adoptar a mesma atitude em relação ao período de referência.

Resultado da votação

Votos a favor:

84

Votos contra:

135

Abstenções:

7


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/80


Parecer do CESE sobre «As relações UE-Turquia na perspectiva do Conselho Europeu de Dezembro de 2004»

(2004/C 302/17)

Em 28 de Janeiro de 2004, nos termos do disposto no artigo 29.o do Regimento, o Comité Económico e Social Europeu decidiu elaborar um parecer sobre «As relações UE-Turquia na perspectiva do Conselho Europeu de Dezembro de 2004».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Relações Externas emitiu parecer em 7 de Junho de 2004. Foi relator T. ETTY.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 1 de Julho de 2004), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 166 votos a favor, 17 votos contra e 28 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Contexto

1.1

O CESE vem, há muitos anos, acompanhando a evolução na Turquia. A Turquia associou-se com a CE em 1963, solicitou a adesão em 1987 e tornou-se um parceiro da UE na União Aduaneira, em 1995.

1.2

Através de um Comité Consultivo Misto, estabelecido com a sociedade civil organizada da Turquia e em correcto funcionamento desde 1995, o CESE está bem informado das aspirações dos grupos de interesse económicos e sociais da Turquia em matéria de adesão do país à UE. Sempre teve em consideração as referidas aspirações e espera sinceramente que a Cimeira Europeia de Dezembro de 2004 possa chegar à conclusão de que a Turquia cumpriu os critérios políticos estabelecidos em 1993, em Copenhaga e, portanto, decida que as negociações para a adesão serão abertas sem delongas.

1.3

Durante diversas décadas a Turquia demonstrou ter, inequivocamente, escolhido a Europa.

1.4

A Turquia é um país com um Estado laico e uma maioria de população islâmica. Pretende funcionar como uma democracia moderna e secular. É um exemplo muito importante para os países com uma população islâmica predominante e que pretendem reforçar as suas estruturas políticas em termos de laicidade e democracia. A adesão da Turquia à UE demonstraria o alto nível de pluralismo atingido pela UE, a sua capacidade de gerir o diálogo entre culturas e religiões e o seu papel na promoção da paz e da justiça no mundo.

1.5

A Turquia é um país demograficamente jovem, com uma forte economia de grande potencial. Todavia, seria incorrecto continuar a considerá-la apenas como um grande mercado para as exportações da UE ou uma zona para investimentos de baixo custo.

1.6

A Turquia desenvolveu, ao longo de muitos anos, um papel, por um lado, de zona tampão e, por outro, de ponte entre o Ocidente e o Oriente, sem no entanto jamais deixar de se considerar europeia. Se a Turquia conseguir tornar-se membro da UE, poderia apoiar mais directamente as actividades da UE em matéria da prevenção de conflitos, em particular graças às excelentes relações com a região da Ásia Central, o Médio Oriente e a área do Golfo.

2.   Introdução

2.1

A partir de agora, as relações entre a UE e a Turquia continuarão, durante o resto do ano, dominadas pela questão de uma eventual abertura das negociações de adesão. A Cimeira Europeia tomará uma decisão na sua reunião de Dezembro de 2004.

2.2

Essa decisão será um acontecimento decisivo após um período de mais de quinze anos durante o qual a Turquia tem estado à espera de uma resposta clara ao seu pedido de adesão à UE. O Conselho de Helsínquia, de Dezembro de 1999, outorgou à Turquia a condição de candidato à adesão. O Conselho de Copenhaga, de Dezembro de 2002, decidiu que, no prazo de um ano, se adoptaria uma decisão sobre o início das negociações, tomando como base o resultado de uma avaliação, para verificar se a Turquia satisfaria os critérios políticos de Copenhaga de 1993, o que se considera uma condição fundamental para empreender a via da adesão de pleno direito.

2.3

A decisão a tomar é, obviamente, não só da maior importância para a Turquia, como também para a UE.

2.4

Até agora, o resultado da supervisão por parte da Comissão Europeia dos progressos realizados pela Turquia nos aspectos pertinentes tem sido positivo. Segundo a Comissão, os resultados do processo de reforma têm sido especialmente impressionantes nos últimos dois ou três anos. Todavia, é necessário realizar novos progressos significativos no que se refere à independência do poder judicial, liberdade de expressão, papel do exército e direitos culturais – estes últimos sobretudo no sudeste.

No seu mais recente relatório sobre a Turquia, o Parlamento Europeu fez uma avaliação similar. Considera que a Turquia, apesar de todos os esforços até agora efectuados, ainda não cumpre os critérios políticos de Copenhaga. As principais deficiências encontram-se na Constituição de 1982, adoptada durante o regime militar. As reformas efectuadas desde 2001 ainda não removeram o seu carácter basicamente autoritário. As suas preocupações principais, segundo o relatório do Parlamento, são a aplicação prática das reformas, a persistência das torturas nas esquadras de polícia, assédio às organizações defensoras dos direitos humanos e desrespeito dos direitos das minorias (em particular, dos curdos).

2.5

A Turquia não só realizou um programa impressionante no âmbito legislativo, como também adoptou medidas importantes para supervisar a aplicação prática da nova legislação.

2.6

O presente parecer foi elaborado, inter alia, com base no importante trabalho efectuado pelo Comité Consultivo Misto EU-Turquia. Tal permitiu ao CESE ter em consideração os pontos de vista, as aspirações e as expectativas de parte significativa da sociedade civil turca.

3.   Observações na generalidade

3.1

Deve ficar claro desde o início que os assuntos cruciais que haverá que debater no CESE neste momento são basicamente as questões políticas da democracia, o Estado de Direito, os direitos humanos e a protecção das minorias, como se decidiu no Conselho Europeu de Copenhaga, de Dezembro de 2002.

3.2

Os critérios económicos e o acervo só serão analisados no presente documento na medida em que os progressos que a Turquia tenha efectuado na matéria possam ser considerados como contributo para o reforço dos direitos humanos, da sociedade civil e da democracia.

3.3

O CESE tomou boa nota das recentes e importantes informações, particularmente do Relatório Periódico 2003 da Comissão sobre os progressos da Turquia, com vista à adesão, do Relatório do Parlamento Europeu sobre a Turquia, de Abril de 2004 e do Relatório do Conselho da Europa sobre os Direitos Humanos na Turquia, de Dezembro de 2003. Partilha das declarações gerais sobre o processo de reforma constantes destes relatórios. Considera que o valor acrescentado deste parecer está na sua visão dos critérios políticos que apresentam especial importância para os meios económicos e sociais. Por isso, o parecer incidirá nos referidos aspectos.

3.4

Para o CESE, os aspectos que apresentam especial importância sob o ponto de vista dos critérios políticos são:

o respeito dos direitos humanos e, em particular, o direito de organização e de negociação colectiva; direitos das mulheres e direitos culturais das minorias;

a democracia, e, em particular, o contributo que podem dar os meios económicos e sociais e a sociedade civil em geral para o processo de decisão político;

a liberdade de expressão, meios de comunicação livres; e

o papel do exército na sociedade turca e, em particular, na vida económica e social.

3.5

O Conselho de Helsínquia de 1999 tinha deixado claro que os resultados da reforma na Turquia seriam avaliados com base nos mesmos critérios de adesão aplicáveis aos demais países candidatos.

3.6

Neste contexto, também deveria dizer-se que alguns países cujas negociações de adesão se iniciaram há vários anos aparentemente não satisfaziam plenamente os critérios políticos no momento de com eles se abrirem as negociações. Em alguns deles ainda persistem discrepâncias importantes, mesmo agora que se tornaram membros da UE. Assim, pode falar-se em elementos importantes como a corrupção, a independência do poder judicial e o tratamento dado às minorias. Com este pano de fundo é importante assinalar que, na opinião do Comité, a Turquia não só deveria ser avaliada com base nos mesmos critérios que os demais países candidatos, como esses critérios deveriam ser aplicados de maneira igual.

3.7

Em Dezembro de 2002, quando o Conselho fixou o prazo para tomar uma decisão sobre a eventual abertura de negociações com a Turquia, a sua decisão só podia significar que considerava que nesse preciso momento a Turquia tinha realizado suficientes progressos para justificar as expectativas de que, se efectuasse um grande esforço nos vinte e quatro meses seguintes, os restantes obstáculos poderiam efectivamente ser superados. Se assim não fosse, teria sido inútil e injusto colocar a Turquia perante esta perspectiva.

3.7.1

Relativamente a alguns dos problemas remanescentes, como o papel do exército na sociedade e o tratamento das minorias (em particular os curdos no sudeste), que têm tido, ao longo de décadas, uma história complicada, dois anos é um período muito curto. Por isso, é plausível deduzir que o Conselho não poderia ter querido dizer que a Turquia estaria apta a cumprir plenamente os critérios políticos até Dezembro de 2004.

3.7.2

Se esta for uma interpretação correcta da decisão do Conselho de Dezembro de 2002, a questão é saber que progressos e que aspectos dos critérios políticos se poderão realisticamente pedir à Turquia antes da abertura das negociações.

3.8

No actual debate sobre a abertura de negociações de adesão com a Turquia, faz-se normalmente referência ao problema de Chipre. O papel positivo que a Turquia desempenhou nos esforços desenvolvidos para encontrar uma solução e a consequente votação de 65 % em favor da reunificação da ilha pela comunidade cipriota turca deve ser tido em consideração. Não há dúvida de que Chipre continua a ser um assunto de importância capital, tanto no que se refere a princípios, como às realidades políticas. No entanto, se nos cingirmos com fidelidade e sinceridade à decisão do Conselho de Copenhaga de Dezembro de 2002 referida no ponto 2.2, a UE não pode converter esta questão numa nova condição para iniciar as negociações, já que tal significaria introduzir a posteriori uma nova condição.

4.   Observações na especialidade

4.1   Direitos do Homem

4.1.1

Os meios económicos e sociais estão muito implicados em questões relacionadas com o direito de organização e o direito de negociação colectiva, consagrados nas Convenções 87 e 98 da OIT e na Carta Social Europeia. A Turquia ratificou ambas as Convenções da OIT e subscreveu a Carta Social Europeia. Manteve reservas sobre os artigos 5 (direito de organização) e 6 (direito de negociação colectiva e direito de greve) da Carta.

4.1.2

Nas duas últimas décadas, e, em particular, como consequência do golpe de Estado militar de Setembro 1980, foram gravemente violados estes direitos. O regime militar chegou ao extremo de incluir uma série de violações graves dos direitos sindicais fundamentais na Constituição de 1982.

4.1.3

Alguns destes artigos e actos legislativos neles baseados foram modificados nos últimos anos.

4.1.4

No entanto, persistem ainda alguns desvios importantes em relação com as Convenções fundamentais da OIT. Em particular, o artigo 54.o da Constituição ainda inclui restrições do direito de greve. O artigo 51.o da Constituição, que estabelece as condições prévias para a eleição de representantes sindicais, foi modificado para ser adaptado à Convenção 87 da OIT. Estão em curso iniciativas destinadas a modificar disposições similares incluídas na Lei 2821 sobre sindicatos e na Lei 2822 sobre convenções colectivas, greves e encerramentos por parte patronal. Todavia, de acordo com o relatório de 2004 do Comité de Peritos à Conferência Internacional do Trabalho sobre as Convenções da OIT ratificadas, o Governo deu recentemente início a procedimentos judiciais baseados nesta legislação contra a DISK, uma das confederações de sindicatos representadas no Comité Consultivo Misto UE-Turquia.

4.1.5

Durante mais de vinte anos, os órgãos de supervisão da OIT (a Comissão independente de Peritos na Aplicação de Convenções, a Comissão de Aplicação de Convenções e Recomendações da Conferência Internacional do Trabalho, bem como a Comissão de Liberdade Sindical do Conselho de Administração) criticaram energicamente estas violações e sublinharam a maneira como a Turquia deveria pôr-lhes fim. A actuação dos sucessivos governos turcos para obviar à situação foi decepcionantemente lenta e é de lamentar que ainda não existam indícios de melhoria.

4.1.6

Um documento relativo ao diálogo social e aos direitos económicos e sociais na Turquia, elaborado para a 12.o reunião do CCM UE-Turquia (1), sublinhava as restrições do direito de organização e do direito de greve no sector público. Apesar de diversas reformas na legislação em matéria de relações sindicais e industriais essa situação, infelizmente, ainda persiste.

4.1.7

No que se refere ao direito de organização de ONG, existem restrições legais na Lei de Associações, entre outras, quanto ao direito de associação, financiamento e âmbito de actividades. De facto, o funcionamento destas organizações é muitas vezes gravemente dificultado. Quando se considera que uma ONG adopta posições antigovernamentais de modo pacífico é objecto de infiltrações, vigilância minuciosa, censura, etc.

4.1.8

As fundações em favor das minorias (religiosas) enfrentam especiais dificuldades no que se refere aos direitos de propriedade. O Governo parece estar disposto a levantar estas restrições ao seu livre funcionamento. Estavam prometidas melhorias para a Primavera de 2004, que se não concretizaram até agora.

4.1.8.1

Continuam a existir graves problemas relativamente à formação do clero de religiões minoritárias, em particular da Igreja ortodoxa grega. A faculdade de teologia de Halki foi encerrada, há mais de trinta anos.

4.1.9

Relativamente aos direitos das mulheres, o Comité observa diversas infracções graves, apesar da ratificação pela Turquia das Convenções fundamentais da OIT sobre Igualdade de Remuneração (n.o 100) e sobre Discriminação (Emprego e Profissão) (n.o 111). As Convenções estão transpostas em leis, com algumas excepções (por exemplo, existem obstáculos legais ao acesso das mulheres a determinados empregos). A aplicação na prática denota, porém, muitas debilidades, nomeadamente no que respeita à igualdade de remuneração para trabalho igual com idênticas qualificações e acesso a determinados tipos de emprego de qualidade. Existem problemas semelhantes em muitos Estados-Membros da UE.

4.1.9.1

Um ponto de grande preocupação é constituído pela existência de poderosas redes criminosas que exploram a prostituição forçada e o tráfico internacional e nacional de mulheres, crianças, raparigas e órgãos.

4.1.10

Apesar de importantes alterações da legislação, persistem, por ora, graves problemas no que se refere ao tratamento dado na prática aos curdos. Os seus direitos culturais como minoria ainda não são suficientemente respeitados, apesar de algumas recentes melhorias significativas, em particular relativamente a emissões de rádio em língua curda. Na Turquia, a condição de minoria está reservada para os grupos religiosos do país, tomando como base o Tratado de Lausana de 1923, onde só se fala de minorias religiosas.

4.2   Democracia

4.2.1

Neste capítulo, o CESE deseja assinalar uma vez mais a relevância que poderia ter o novo Conselho Económico e Social da Turquia. Pode contribuir de maneira importante para fortalecer o processo democrático no âmbito da tomada de decisões sobre questões económicas e sociais importantes, mediante consultas significativas dos grupos de interesse mais representativos por parte do Governo. Nesse sentido, é muito mais que um mero elemento do diálogo social, como afirma a Comissão no seu Relatório periódico.

4.2.2

O Conselho Económico e Social turco foi criado em 2001. É presidido pelo Primeiro Ministro e outros ministros do Governo participam nos seus trabalhos. Desde a sua criação, não tinha sido convocado, até que chegou ao poder o actual Governo, há ano e meio. Reuniu-se em três ocasiões, conforme previsto, mas sem dúvida não funcionou da forma recomendada no documento do CCM UE-Turquia sobre o diálogo social e os direitos económicos e sociais, mencionado no ponto 4.1.6 supra. Parece sobretudo um lugar de conversação onde se lêem discursos e se realizam debates pouco concludentes, em vez de um órgão influente onde os meios económicos e sociais, consultados oficialmente pelo Governo, fazem sérios esforços para alcançar consenso sobre questões difíceis dos seus âmbitos de competência e actividade. Sem duvida, este tipo de órgão e de actividades não se pode criar da noite para o dia. Mas, até agora, o Governo não conseguiu proporcionar às organizações representadas no Conselho incentivos para negociar realmente entre si, por exemplo, inspirando-lhes confiança e demostrando-lhes que, se conseguirem alcançar compromissos significativos, estes se reflectirão de maneira importante nas políticas do Governo. O CESE gostaria que o Governo da Turquia cooperasse de forma séria e construtiva com o Conselho Económico e Social possibilitando que este evoluísse no sentido de ser um elemento significativo no processo de democratização na Turquia. Em Fevereiro deste ano, o Governo anunciou a sua intenção de rever a composição do Conselho Económico e Social, e, em particular, a sua própria posição dominante no processo.

4.2.3

O Comité também quer sublinhar a importância da liberdade de expressão e dos meios de comunicação livres para o processo democrático na Turquia. Reconhece o grande número de reformas neste domínio específico. Contudo, partilha as preocupações do Comissário para os Direitos Humanos do Conselho da Europa de que algumas das mudanças (por exemplo, na Constituição) poderiam ser interpretadas de forma a serem ainda mais restritivas do que as disposições que vieram substituir. Além disso, a aplicação e a interpretação práticas dos novos artigos constituem o teste essencial destas reformas, tal como os referentes a outros domínios. Recentes experiências em processos legais mostram, infelizmente, pouca consistência, pelo menos nesta matéria.

4.3   O papel das forças armadas na sociedade turca

4.3.1

O CESE está consciente do importante papel que desempenharam e continuam a desempenhar as forças armadas na história do país bem como na sociedade turca, hoje. Reconhece que tem havido casos em que este papel foi positivo. Todavia, também há que assinalar que muitas das dificuldades com que actualmente a Turquia se depara para satisfazer os critérios políticos de Copenhaga, de 1993, são o resultado da enorme e muito profunda influência do exército na sociedade. Deve pôr-se fim a essa influência com base num programa concreto e num calendário rigoroso.

4.3.2

O CESE está consciente de que é impossível erradicar este papel dominante em muitas esferas da vida, que vai mais além da função normal de um exército (defesa, segurança interna), num período de tempo muito breve. No entanto, deve deixar-se absolutamente claro à Turquia que, se quer ser membro da UE, o papel do exército deve limitar-se às acções que o exército desempenha nos demais Estados-Membros; por exemplo, limitado à protecção da segurança interna e externa do país e participação em operações internacionais, sob o controlo democrático do Parlamento.

4.3.3

Além dos pontos que já foram debatidos pela Comissão Europeia e pelo Parlamento Europeu (entre outros, o papel e a composição do Conselho de Segurança Nacional, a responsabilidade política relativa ao orçamento do exército, a representação dos militares em órgãos civis do sector educativo e meios audiovisuais), há que assinalar aqui que as forças armadas e os seus oficiais também ocupam posições destacadas na vida económica. Uma lei de 2003 dispõe que os dois fundos extra-orçamentais das forças armadas serão incluídos no orçamento geral do Estado até final de 2004 e cessarão de existir como rubrica separada até 2007. Isto significa que a partir de 2007 o orçamento das forças armadas estará totalmente sob controlo democrático. Contudo, por enquanto, as forças armadas detêm um poder considerável na sociedade e na economia turcas: há uma vasta área de influência – tanto formal, como informal – dos militares, que deve ser tornada transparente, da mesma forma que todas as outras actividades económicas. (2) Este aspecto económico tem, até agora, sido negligenciado nos debates pela UE do poderoso papel do exército na sociedade turca apenas. O Parlamento Europeu, no seu mais recente relatório, abordou a questão.

5.   Conclusões e recomendações

5.1

O CESE considera a Turquia uma democracia em evolução, que conseguiu progressos importantes nos seus esforços para cumprir os critérios políticos de Copenhaga, especialmente desde Dezembro de 2002.

5.2

A Turquia não só deveria satisfazer os mesmos critérios políticos que os demais países candidatos antes de que se iniciem as negociações, como também se deveriam avaliar os seus resultados no processo de reforma com referência aos mesmos critérios que foram utilizados para outros Estados candidatos. A UE deveria realizar todos os esforços possíveis para evitar a mínima insinuação relativamente à aplicação de um duplo critério.

5.3

A decisão adoptada pelo Conselho de Copenhaga em 2002 significa que a UE estava convencida nesse momento que a Turquia, se se esforçasse realmente, podia satisfazer os critérios políticos no prazo de dois anos. Em algumas matérias, que tinham sido dominadas por tradições e práticas arraigadas durante muitos anos, este facto apenas poderia ter significado que é, contudo, impossível satisfazer inteiramente os critérios políticos até Dezembro de 2004 e que procuram, sobretudo, conseguir uma massa crítica de progressos reais que bastaria para abrir as negociações. Inclusivamente, alguns dos novos Estados-Membros, que já completaram o processo de negociação, não satisfazem por completo, hoje, os critérios políticos.

5.3.1

Nesta matéria concreta, o que a UE pode e deve exigir de maneira realista à Turquia é que se tenham efectuado progressos credíveis até finais de 2004 e que se possa esperar ter então chegado a um «ponto sem retorno». O papel do exército e o tratamento das minorias, e, em particular, dos curdos no sudeste do país, constituem exemplos óbvios. O CESE insiste em que as reformas relativas à redução do poder das forças armadas na sociedade em geral, bem como as que respeitam aos direitos culturais das minorias continuarão ao ritmo e orientação actuais, e espera que futuramente não haja nenhum retrocesso que coloque em risco o processo das negociações de adesão.

5.3.2

O papel do exército, fora do âmbito das suas funções básicas de defesa e segurança, deve reduzir-se de maneira decidida para que a UE acredite que está em marcha um processo sem recuo. O orçamento do exército tem de estar sob controlo democrático pleno. Convém tornar transparente a influência económica do exército e tomar medidas apropriadas para garantir essa transparência ao longo do tempo

5.3.3

A UE deveria continuar a debater com a Turquia a definição das minorias (que a Turquia baseia no Tratado de Lausana), com vista às dificuldades que tem para Turquia ratificar sem reservas, bem como aplicar na prática, instrumentos internacionais relevantes. Neste debate, a UE deveria prestar a máxima atenção ao facto de que alguns dos seus 25 Estados-Membros também subscrevem uma definição restrita das minorias, que ocasiona os mesmos problemas.

5.3.3.1

O CESE remete para os recentes trabalhos do CCM sobre o desenvolvimento regional (3) e frisa a importância de uma política activa de desenvolvimento regional na Turquia, apoiada pela UE, que criaria a oportunidade para que a população do sudeste da Turquia (e de outras zonas do país) participasse activamente no desenvolvimento económico e social da sua região. A adopção gradual por parte da Turquia das normas da UE em matéria de política regional representa uma oportunidade para fomentar uma maior colaboração coerente entre a sociedade civil organizada – em particular, os meios económicos e sociais livres, independentes e representativos, por um lado, e as autoridades de todos os níveis relevantes, por outra. Deveriam desenvolver conjuntamente um ponto de vista compartilhado sobre a política de desenvolvimento. Deveriam ser fomentados os intercâmbios de experiências entre a UE e as organizações socioeconómicas turcas.

5.3.3.2

O CESE observa com interesse iniciativas do Governo turco, como a Lei de 2000 sobre a compensação pelos prejuízos causados pelas forças de segurança durante as actividades anti-terroristas, bem como o projecto relativo às pessoas deslocadas no interior do país e para o retorno às aldeias e à reabilitação. O CESE considera de grande importância para a credibilidade das reformas relativas aos direitos da população das províncias do sudeste que,antes de Dezembro de 2004, estas iniciativas tenham começado a beneficiar concretamente as vítimas.

5.4

Noutras matérias, como os direitos humanos, sobre os quais a Turquia tem estado em negociações com a OIT e o Conselho de Europa durante um longo período e nas que a mudança não exige, ou não exige tanto, a erradicação de posições de poder, tradições e crenças muito arraigadas, a Turquia deveria poder mostrar grandes progressos e satisfazer os requisitos que ela conhece desde há muito tempo, até finais de 2004. Por exemplo, nessa data deverá ter posto fim às violações das Convenções 87 e 98 da OIT, que se prolongaram por um quarto de século. Também deverão ser eliminadas as restrições não democráticas ao funcionamento das ONG da Lei de Associações, bem como da prática diária. O processo de reformas que a Turquia está actualmente a atravessar suscita expectativas positivas. No entanto, nesta matéria deverão ser apresentados resultados concretos e completos no prazo mencionado.

5.5

E, já durante o presente ano, o Conselho Económico e Social de Turquia deveria participar muito mais nos preparativos da política económica e social. O Governo deverá consultá-lo sobre assuntos-chave nestas matérias e deverá demostrar que toma a sério os seus pareceres e a sua assessoria. Só dando uma responsabilidade real aos meios económicos e sociais e recompensando-os por isso, é que o governo poderá esperar que estes últimos tomem a sério o Conselho, bem como as intenções do Governo para com o mesmo. O CESE observa com interesse que o Governo está a preparar uma revisão do Conselho Económico e Social. No entanto, este facto não deverá ser utilizado como argumento para atrasar novamente a participação activa da sociedade civil organizada na elaboração da política económica e social na Turquia.

5.6

Para fortalecer a sociedade civil na Turquia, o Governo não deverá, apenas, deixar de interferir nas actividades das ONG e dos meios económicos e sociais genuínos. Deve antes fomentar o seu surgimento, facilitar o seu trabalho e cooperar com umas e outros.

5.7

O CESE tem para si que deve ser tomada uma decisão positiva quanto à abertura das negociações para a adesão da Turquia à UE, se até Dezembro próximo o Governo da Turquia tiver:

tomado medidas para responder às solicitações quanto ao papel do exército na sociedade turca (pontos 4.3.1. e 4.3.2. supra);

demonstrado, com medidas concretas, determinação em aplicar plenamente na prática as reformas legais relativas aos direitos culturais dos curdos nas províncias do sudeste do país;

começado a concretizar as intenções manifestadas e o compromisso assumido relativamente ao regresso voluntário, reabilitação e compensação das vítimas de violência deslocadas no sudeste nas décadas de 80 e 90;

adaptado a sua legislação e prática relativamente aos direitos e liberdades básicos dos sindicatos totalmente em conformidade com as Convenções 87 e 98 da OIT;

expurgado a Lei de Associação de todas as contaminações antidemocráticas e se tenha abstido, na prática, de restringir o livre funcionamento das organizações genuínas da sociedade civil, fundações religiosas incluídas, e

criado condições para o funcionamento livre e independente do Conselho Económico e Social da Turquia, bem como uma base para uma cooperação significativa e construtiva com este Conselho.

5.8

O CESE considera que as reformas até agora feitas pelo Governo da Turquia relativamente aos problemas ligados ao papel das forças armadas na sociedade e em relação aos direitos culturais dos curdos na Sudeste representam o progresso credível requerido em 5.3.1.

5.9

Além disso, se os pontos enumerados nos restantes quatro travessões de 5.7 forem satisfeitos até Dezembro de 2004, o CESE considera que terá sido criada uma base fiável para a abertura de negociações que, em devida altura, conduzirão a resultados mutuamente benéficos. Neste caso, o CESE é de opinião de que cada uma das instituições europeias, entre as quais ele próprio, dê conta de todos os elementos de impacto que teria a adesão da Turquia no funcionamento e no próprio conceito de União Europeia, que seria assim profundamente alargada, o que necessitaria de uma forte compreensão da opinião pública europeia.

5.10

Independentemente da decisão do Conselho de Dezembro, o CESE continuará a sua cooperação frutífera com a sociedade civil organizada da Turquia.

Bruxelas, 1 de Julho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  «Diálogo social e direitos económicos e sociais na Turquia».

(2)  Exemplos disso são o fundo de pensões dos oficiais do exército, que é proprietário de um banco e de uma holding e que é, entre outras, a contrapartida turca na maior «joint venture» da indústria automóvel. De acordo com informações de OYAK, foi constituída como entidade empresarial, financeira e administrativamente autónoma, sujeita ao disposto nos códigos civil e comercial da Turquia, como qualquer outra instituição similar. A sua principal função é proporcionar benefícios aos seus membros, além dos proporcionados pelo plano de segurança social do Estado turco, e corresponde, basicamente aos fundos de pensões do segundo pilar que funcionam na UE.

Todos os membros militares e civis das forças armadas são membros do Fundo de Pensões OYAK. Continuam como membros permanentes de OYAK. Todavia, excepto pelos seus membros, OYAK não tem qualquer relação com o Estado nem com as forças armadas turcas em termos de investimento ou de actividade empresarial, transferências de fundos ou ajudas estatais, ou qualquer outro tipo de apoio financeiro. OYAK é um fundo de pensões profissional que se parece com os equivalentes da UE.

No quadro da sua política de transferência, os relatórios anuais do OYAK são publicados para informação do público em geral e as contas da instituição e das suas subsidiárias estão a ser auditadas todos os anos por empresas internacionais de auditoria. OYAK demonstrou benefícios suplementares de reforma.

(3)  Relatórios sobre os desequilíbrios regionais na Turquia/desenvolvimento regional de Cassina e Guvenc.


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/86


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Modernizar a protecção social para mais e melhores empregos: uma abordagem global para tornar o trabalho compensador»

COM(2003) 842 final

(2004/C 302/18)

Em 5 de Janeiro de 2004, a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos trabalhos correspondentes, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 14 de Junho de 2004, sendo relatora Dona St HILL.

Na 410.a Reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 1 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 130 votos a favor, 13 votos contra e 24 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

Na passada Primavera, o Conselho solicitou a emissão da Comunicação em apreço e reuniu-se para examinar os progressos na melhoria e modernização dos sistemas de protecção social, com o objectivo de dar-lhes uma configuração mais propícia ao emprego. O objectivo é atribuir um papel mais importante à eficácia dos incentivos (a saber, os regimes de segurança social dos Estados-Membros, a conciliação entre a família e a vida profissional, as pensões de reforma e as subvenções para reduzir a pobreza e a exclusão social). Esta reunião seguiu-se à publicação do relatório final transmitido à Comissão Europeia pela task-force sobre o Emprego (1) em Novembro de 2003. As comunicações resultantes destes dois importantes eventos salientam os principais desafios que a Europa enfrenta no domínio do emprego e identificam as reformas a empreender para que a UE cumpra os objectivos que se fixou no âmbito da estratégia de Lisboa.

É consensual que a União Europeia se encontra atrasada no cumprimento do ambicioso objectivo definido na Cimeira de Lisboa de 2000, de se tornar, até 2010, na economia mais competitiva e dinâmica do mundo, baseada no conhecimento, com capacidade de crescimento sustentável, criação de mais e melhores empregos e maior coesão social. Ambos os documentos reconhecem que, embora os objectivos de Lisboa sejam ambiciosos, a Europa não pode deixar de os cumprir e que a condição necessária para a sua concretização é o redobrar de esforços por parte dos Estados-Membros.

Nesta conjuntura, todos os indicadores oficiais indicam que o êxito na criação de mais e melhor emprego dependerá de quatro requisitos essenciais:

1.

Aumento da adaptabilidade de trabalhadores e empresas;

2.

Integração e atracção de mais pessoas para o mercado de trabalho;

3.

Investimento cada vez mais eficaz em capital humano;

4.

Garantia da eficaz execução de reformas através de uma melhor governação.

Embora estes requisitos muito do lado da oferta estejam claramente na esfera de acção dos governos nacionais, o presente parecer introduz o requisito adicional de uma verdadeira parceria público-privado para tornar o trabalho compensador incluindo as responsabilidades do empregador neste importante esforço.

1.2

Subjacente às avaliações recentes está a motivação adicional de assegurar que os incentivos ao aumento da oferta de trabalho sejam eficazmente contrabalançados por medidas para proporcionar protecção social adequada a todos, mantendo a eficácia da despesa pública nesta área. Este equilíbrio é crucial se se pretende que os países evitem o risco potencial a longo prazo do envelhecimento da população europeia, perspectiva com sérias implicações para a manutenção de uma força de trabalho óptima mas que também pode pôr em risco a viabilidade dos próprios sistemas sociais europeus. Aumentar a vinculação ao mercado de trabalho dos grupos menos favorecidos, especialmente mães, minorias raciais, pessoas com deficiência e jovens com emprego precário, é uma meta importante na eficaz combinação da protecção social com a expansão do emprego. O presente parecer põe estes grupos em evidência porque faz menos sentido para a política um registo exaustivo de todas as desvantagens concebíveis e porque os grupos atrás identificados consideram difícil ultrapassar a sua desvantagem precisamente por causa das imprecisas tradições políticas que continuam a pôr em pé de igualdade todas as desvantagens existentes no mercado de trabalho.

1.3

Na UE, os esforços dos Estados-Membros no sentido de reformar os sistemas de protecção social para os tornar mais propícios ao emprego são desenvolvidos através da coordenação reforçada das políticas económica, de emprego e social. Foram estabelecidas, ao nível da UE, metas ambiciosas para 2010: aumentar a taxa global de emprego para 70 %, a taxa de emprego das mulheres para 60 % e a taxa de emprego das pessoas na faixa etária dos 55 aos 66 anos de idade para 50 %. Estas metas são apoiadas por várias orientações e recomendações, inclusivamente nas Orientações Gerais de Política Económica e nas Orientações para o Emprego, bem como nos objectivos comuns do método aberto de coordenação nos domínios das pensões e da inclusão social.

2.   Observações na generalidade

2.1

É importante que esta revisão seja abordada de uma perspectiva de médio a longo prazo, pois trazer mais pessoas para o mercado de trabalho tem custos associados, tanto para os desempregados ou economicamente inactivos como para os governos, de modo que as reformas podem implicar custos acrescidos antes de o encargo económico do subemprego ou desemprego para o governo acabar por diminuir. São o investimento público e privado na preparação das pessoas para uma economia assente no conhecimento e o contínuo desenvolvimento do capital humano em idade activa, apesar de serem processos de longo prazo, que podem levar 20 anos a amadurecer plenamente, que proporcionam a maior rentabilidade do investimento destinado a transformar o mercado de trabalho do país. São sobretudo os trabalhadores com menos competências que mais carecem dos investimentos públicos e privados em melhores qualificações e de oportunidades de aperfeiçoamento profissional oferecidas quer pelas instituições públicas quer pelas entidades patronais, sendo esta a forma de os qualificar para satisfazerem as novas exigências de uma economia assente no conhecimento. Os efeitos das medidas de produtividade de mais longo prazo do lado da oferta são a redução da oferta de pessoas com poucas competências ou competências de baixo gabarito, a redução do desemprego (especialmente o desemprego de longa duração), o aumento das taxas de participação na força de trabalho (especialmente das mulheres) e o aumento da produtividade geral. Trata-se de resultados permanentes. Porém, uma estratégia orientada para a oferta não é por si só suficiente. Terá de ser acompanhada pelo reforço da procura de mão-de-obra, ou seja, pelo aumento da oferta de postos de trabalho graças a uma política económica e financeira enérgica e promotora do emprego. Todavia, alguns Estados-Membros que privilegiaram os ganhos rápidos de porem a trabalhar as pessoas com menos competências em detrimento do desenvolvimento do capital humano provavelmente não encontrarão soluções duradouras para o dilema de baixo salário ou nenhum salário para este tipo de trabalhadores em vários momentos das suas vidas activas. Assim, os efeitos podem aparecer instantaneamente mas desaparecer também rapidamente, porque a subsistência com poucas competências ou competências de baixo gabarito não é sustentável na economia global de hoje em dia. Por isso a eficiência de custos é uma divisa tão importante como a redução de custos, neste particular.

2.2

Ao mesmo tempo que os incentivos financeiros implícitos nos sistemas fiscais e de benefícios continuam a ser o fulcro das políticas para tornar o trabalho compensador, outras iniciativas, como os cuidados a crianças, o acesso e medidas especiais para pessoas com deficiência, vantagens educacionais e de saúde pública, são cada vez mais aceites como tendo uma função complementar a desempenhar. Por isso, são de recomendar abordagens nacionais globais que envolvam um vasto leque de incentivos financeiros e outros que apoiem a consecução e a manutenção do emprego de preferência a uma abordagem que só privilegie um ou o outro dos métodos. De uma perspectiva de longo prazo da sustentabilidade, os aspectos dos cuidados e do investimento no capital humano devem ser considerados do ponto de vista do receptor (isto é, os filhos de pais que trabalham e não os próprios pais), porque estes direitos e dispositivos constituem um alicerce imutável para o desenvolvimento acelerado do capital humano num quadro de mercado de trabalho daqui a alguns anos. Dever-se-ia recorrer aos fundos estruturais europeus para melhor ajudar as pessoas com reduzidas competências ou com competências de baixo gabarito à procura de emprego e para investimentos essenciais a longo prazo no capital humano e na infra-estrutura social.

2.3

Enquanto muitos Estados-Membros, juntamente com os parceiros sociais, aumentaram o investimento em medidas activas de ajuda aos que reentram ou progridem no mercado de trabalho, melhorando as suas competências e a sua empregabilidade, tem de ser dada muito mais atenção aos determinantes da procura, inclusivamente à utilização dos incentivos fiscais e à promoção das melhores práticas dos empregadores para auxiliar os grupos vulneráveis da economia, como os trabalhadores mais idosos e os trabalhadores com deficiência. O CESE insta com as autoridades apropriadas da UE para que promovam e melhorem as políticas de incentivo da procura que influenciem positivamente os níveis e a qualidade do emprego e insiste na inclusão de exemplos e perspectivas sobre o papel da responsabilidade social das empresas na consecução dos objectivos de Lisboa para o emprego. Tanto os empregadores como os trabalhadores precisam de tomar parte em tornar o trabalho compensador. As políticas de incentivo da procura requerem, por conseguinte, uma abordagem equilibrada com que todos ganhem e que permita aos empregadores concentrarem-se nas suas actividades empresariais nucleares e criarem emprego, sem deixar de possibilitar que quem procura emprego encontre trabalho com um nível de remuneração superior ao que receberia como subsídio de desemprego ou outro subsídio da segurança social e que garanta a sua subsistência. Como o Comité já afirmou: «Os sistemas fiscais e de prestações sociais dos Estados-Membros devem ser orientados de forma que, para os trabalhadores, seja compensador entrar no mercado de trabalho, nele permanecer e avançar na carreira profissional. […] tal política só pode ter êxito se for acompanhada de medidas destinadas a aumentar o número de postos de trabalho disponíveis […]» (2).

2.4

O apoio público à conciliação do trabalho com a vida familiar pretende ajudar as famílias na realização de tarefas fundamentais para a própria organização e perpetuação da sociedade. Em especial, tal implica apoiar as famílias quando geram, cuidam e educam crianças e quando cuidam de membros dependentes da família, principalmente doentes, portadores de deficiência e idosos. No contexto do envelhecimento da população, estas políticas estão a tornar-se cada vez mais importantes como meio de inverter a tendência de declínio das taxas de fertilidade.

2.5

Mas é importante que os mecanismos utilizados para pagar os benefícios às famílias não interfiram desfavoravelmente com os incentivos à actividade laboral. Em alguns países, a separação entre os complementos familiares para os dependentes e os subsídios de desemprego ajuda a reforçar os incentivos financeiros para a aceitação de emprego, especialmente para as mães e mulheres que cuidam de parentes idosos. A indisponibilidade de cuidados abordáveis às crianças, devido aos custos ou à inacessibilidade física, é considerada um obstáculo-chave à participação dos pais, especialmente das mulheres. Assim, o papel essencial da prestação subsidiada, adequada e acessível de cuidados às crianças na promoção da participação no emprego, em particular das mulheres, deve ser vivamente saudado e apoiado. Em alguns Estados-Membros, as mulheres em idade de serem mães estão a perder o empenho em procriar por os custos pessoais associados à maternidade serem demasiado elevados, tendo como resultado o que equivale a um imposto sobre as mães trabalhadoras. Podendo estas atitudes ser curtas de vistas de um ponto de vista nacional, são ainda mais uma falsa economia da parte dos decisores políticos, que podem fazer mais para parar o contínuo declínio das taxas de natalidade europeias através da garantia de que a taxa de participação das mulheres no trabalho aumentará graças a incentivos financeiros e não financeiros.

2.6

A mobilidade laboral e a geográfica são cruciais para um elevado nível de eficiência económica, por isso é necessário tomar medidas para assegurar que se mantenham os direitos de segurança social e os regimes de pensões profissionais, no caso de mudança de empregador ou de domicílio dentro do território da União Europeia. É também importante visar os que entram no mercado de trabalho ou mudam de trabalhadores para empresários para garantir que sejam adequadamente apoiados pela protecção social. Tem igualmente cabimento a redução da mobilidade laboral de último recurso, estimulando as economias locais estagnadas através de parcerias de investimento público-privado que maximizem os mercados locais de emprego. Se um aspecto da mobilidade profissional em aumento pode ser a perda de competências particulares de uma zona para a outra, a outra face da mobilidade é serem os indivíduos livres de se deslocarem para onde haja real procura das suas competências assim como oportunidades de experimentarem o tipo de transferência de tecnologia que acrescenta valor à sua base actual de competências. Portanto, a mobilidade não pode ser entendida de maneira estreita como representando uma perda, mas antes como uma atribuição mais eficaz de competências e talentos pertinentes no local onde eles são mais necessários.

2.7

A incapacidade física e mental reduz significativamente a oferta de mão-de-obra, particularmente no caso dos trabalhadores de 50 ou 60 anos de idade, que são o alvo primordial da estratégia europeia «Tornar o trabalho compensador». Em alguns Estados-Membros cerca de um quinto ou mesmo um quarto das pessoas dos grupos etários dos 55-59 anos e dos 60-64 recebem prestações de invalidez ou estão fora do mercado de trabalho. Este facto evidencia a existência de pressões enormes no actual mundo laboral que acarretam um elevado desgaste físico e psíquico. Este problema, que pode ter a ver com a saúde no trabalho, requer a adopção de estratégias adequadas de protecção preventiva da saúde dos trabalhadores e a melhoria das condições de trabalho. Enquanto não existir uma total incapacidade mas apenas uma redução da capacidade para o trabalho, são poucas as possibilidades de as pessoas envolvidas conseguirem um emprego em harmonia com as suas limitações. Será, pois, necessário aumentar a oferta de empregos deste tipo para dar uma oportunidade às pessoas com uma capacidade de trabalho reduzida. Todavia, muitas pessoas que estão nesta situação de desemprego disfarçado prefeririam continuar a ter uma actividade remunerada, no caso de ainda terem capacidade de trabalho significativa. Os Estados-Membros devem adoptar as medidas necessárias para garantir que o emprego e as prestações de invalidez não levam os trabalhadores com deficiência a cair na armadilha do desemprego, mas antes reforçam a complementaridade de diferentes vertentes da política social em prol dos trabalhadores com deficiência. Há que reconhecer, porém, que a deficiência se insere num espectro de capacidades e uma nova maneira de pensar define a deficiência como a resposta da sociedade a um indivíduo que se está a incapacitar e não como a limitação física, ou outra, em si mesma, que determina se uma pessoa está ou não incapacitada. Neste contexto, o Comité é crítico de políticas que acabam, inadvertidamente, por ocultar os níveis reais de emprego. É vital que, sem prejuízo da protecção e do apoio em resposta às necessidades das pessoas com deficiência, se estabeleça uma cooperação mais estreita para a observação e o reforço do intercâmbio de melhores práticas, de país para país, em matéria de política de invalidez. O mesmo se dirá da necessidade de um quadro aberto de coordenação das boas práticas e das acções positivas que proporcione benefícios relacionados com a promoção do emprego e do trabalho independente entre os que se situam ao longo do espectro de capacidade física e mental.

2.8

Em relação aos trabalhadores maduros, o Conselho Europeu de Estocolmo estabeleceu o objectivo ambicioso de aumentar a taxa de emprego das pessoas entre os 55 e os 64 anos de idade para 50 % (40,1 %, em 2002, para esta faixa etária; um quarto das pessoas de 60 a 64 anos, tão pouco quanto isto). O Conselho Europeu de Barcelona introduziu uma meta complementar ambiciosa a alcançar pelos Estados-Membros – adoptar medidas, até 2010, tendo em vista o aumento em cinco anos da idade média de saída efectiva do mercado de trabalho. A consecução destes objectivos será crucial para garantir a sustentabilidade financeira futura da protecção social, nomeadamente para garantir um rendimento de nível adequado para os futuros pensionistas. O Comité aprova o exposto, contanto que o mercado de trabalho permita aos trabalhadores mais idosos exercer uma actividade e que sejam aprovadas medidas específicas relativas àqueles de modo a melhorar, de forma sustentável, as suas oportunidades no mercado de trabalho. Na ausência de suficientes postos de trabalho ocupados por esta faixa da população, a consequência desta disposição seria sobretudo um desemprego crescente da população idosa e uma redução das pensões.

3.   Observações na especialidade

3.1

A par de políticas económicas específicas e precisamente direccionadas, tornar o trabalho compensador é também uma questão de processos. Uma área que está madura para a reforma do sector público é a situação dos trabalhadores que abandonam prematuramente a vida activa antes de atingir a idade da reforma. Por exemplo, em muitos Estados-Membros as pessoas com longas carreiras contributivas podem pedir a reforma ou a aposentação muito antes de atingirem a idade normal de reforma ou aposentação, o que está, porém, frequentemente aliado a consideráveis desvantagens financeiras. Estes trabalhadores podem eventualmente ter um contributo económico a prestar, devendo esta decisão ser facilitada, sobretudo através da criação no mercado laboral de condições a pensar nesta faixa etária. No caso das mulheres, o abandono precoce do mercado de trabalho nem sempre é voluntário, mas está com frequência ligado à discriminação das mulheres no local de trabalho e repercute-se nos direitos à pensão de todas aquelas cujas carreiras laborais foram interrompidas devido à maternidade e a cuidarem das crianças ou dos idosos, foram vítimas de segregação profissional ou lançadas em profissões «femininizadas» inseguras e mal remuneradas, sujeitas à disparidade salarial entre os sexos, tudo factores de redução da duração e do montante das contribuições para os regimes de reforma ou aposentação e de deterioração das perspectivas económicas das mulheres na reforma ou aposentação ao truncar prematuramente o seu emprego remunerado. De há muito que a feminização da pobreza é motivo de preocupação e o processo de envelhecimento na Europa exige uma atenção premente tendo em vista melhorar a autonomia económica das mulheres ao longo de toda a vida. Seria essencial que no cálculo dos direitos à pensão os períodos de substituição pela prestação de cuidados a um filho fossem mais valorizados, o que permitiria atenuar durante a reforma os efeitos da discriminação sofrida pelas mulheres durante a sua vida profissional.

3.2

Outro exemplo de casos em que reformas administrativas apropriadas têm de ter precedência sobre a inércia pública é quando se trata de garantir que os esforços para tornar o trabalho compensador sejam equitativos para ambos os sexos. Enquanto alguns novos Estados-Membros se empenham em políticas sociais e de emprego que restringem o acesso das mulheres ao emprego, outros têm impostos complementares e políticas sociais que promovem um alto nível de presença das mulheres na força de trabalho. As taxas de emprego, antes excepcionalmente altas, foram diminuindo durante a transição para uma economia de mercado. É importante que as conquistas que as mulheres trabalhadoras conseguiram na via para o pleno emprego não sejam sacrificadas num esforço, cego em relação aos sexos, de restruturação das economias dos países aderentes. Os decisores políticos nacionais têm de ser encorajados a dar prioridade aos trabalhadores para quem tornar o trabalho compensador representa o maior desafio em vez de continuarem a actuar como se todos os desempregados/subempregados fossem igualmente desfavorecidos.

4.   Observações na especialidade sobre algumas das 7 lições políticas da Comissão

4.1

O CESE considera (1.a lição) que a hipótese da «introdução de novos instrumentos de segurança social» em conjunto com uma melhor utilização dos já existentes não deve ser afastada mas, pelo contrário, aprofundada, tornando os dois objectivos complementares. Por exemplo, os sistemas muito fragmentados e muito heterogéneos de ajudas e de prestações dirigidos à juventude já não parecem corresponder ao actual prolongamento, sem precedentes, desta fase da vida. A ausência de um instrumento de segurança social mais especificamente dedicado a esta faixa etária obriga uma parte dos jovens a efectuar escolhas demasiado apressadas em matéria de formação e de inserção profissionais muito pouco qualificadas, com consequências estruturais muito pesadas para toda a duração da sua trajectória de vida, bem como para as correlativas despesas sociais. Igualmente, a ausência de instrumentos novos que possam assegurar uma segurança social profissional ao longo da vida – fazendo alternar, sem exclusão nem pobreza, os períodos de formação, de actividade e de exercício de responsabilidades familiares ou outras – trava consideravelmente a mobilidade e a flexibilidade no mercado de trabalho (6.o lição).

4.2

O CESE considera extremamente importante dar uma atenção muito particular às consequências a médio prazo geradas pela multiplicidade das iniciativas que foram tomadas pelos Estados-Membros no sentido de uma «activação» das prestações sociais.

4.3

O CESE considera que chegou o momento de lançar incentivos europeus fortes (nomeadamente para e em cooperação com os parceiros sociais) a favor de uma coordenação dos regimes de segurança social complementar que, como sublinha a Comissão, se tornam elementos importantes da protecção social (7.a lição).

5.   Conclusões e recomendações

5.1

O Comité apela à convergência dos esforços dos Estados-Membros para tornar o trabalho compensador fazendo verdadeiramente do emprego uma opção economicamente atraente em relação ao desemprego ou à segurança social através do combate focado a todo o leque de barreiras ao trabalho remunerado. As políticas internas devem oferecer aos trabalhadores mal remunerados e com poucas competências a possibilidade de escaparem à pobreza e ao desemprego através do trabalho. Donde o aspecto essencial com que os Estados-Membros estão confrontados para tornarem o trabalho compensador ser conceber um sistema comum e de nível razoável de apoios ao emprego e ao abandono do emprego que mantenha os incentivos às pessoas para que se sintam ligadas ao mercado de trabalho. O Comité distinguiu entre as contribuições das políticas de ganhos rápidos que proporcionam benefícios a curto prazo, mas terminais, para as pessoas com poucas competências ou competências de baixo gabarito e os investimentos de mais longo prazo no capital humano, que são a chave para tornar o trabalho compensador (especialmente para os mais vulneráveis) no longo prazo sustentável.

5.2

O Comité salienta a margem substancial que há de contribuição das empresas e dos empregadores privados para a consecução dos objectivos de emprego europeus. Devem fazer-se esforços para identificar políticas de emprego exequíveis que visem mudar o comportamento dos empregadores de modo a promover a realização dos objectivos de Lisboa de emprego sustentável de qualidade por toda a Europa. A Comissão deve proporcionar e disseminar provas e experiências de como o bom comportamento das empresas tem melhorado a quantidade e a qualidade dos empregos, assim como procurar meios de reproduzir os casos de êxito.

5.3

Além de apoiar as boas práticas, devem aplicar-se sanções a comportamentos inapropriados dos empregadores, incluindo a discriminação com base no género, na raça, na orientação sexual, na religião ou na idade, para apoiar a inovação, o aumento da oferta de força de trabalho e a possibilidade de ter uma vida de trabalho mais longa nas economias europeias. A discriminação no emprego empurra pessoas talentosas para o sector ilegal ou informal onde a produtividade é baixa, os incentivos à formação e ao investimento são escassos e a protecção social é inexistente. Este comportamento económico irracional não só priva a Europa de competitividade económica, como rouba às economias nacionais muito do rendimento fiscal necessário.

5.4

Assim sendo, é preciso aplicar uma série de instrumentos e de sistemas de benefícios, nos Estados-Membros, respaldada por uma forte coordenação nacional que equilibre os instrumentos de oferta e de procura de mão-de-obra. Os efeitos combinados nas famílias dos benefícios e dos níveis de tributação do rendimento têm de ser cuidadosamente equilibrados e previstos, dando especial atenção às estruturas de incentivos que criam para as famílias pobres. Também foram salientadas outras medidas, como a prestação de cuidados às crianças, o tempo de trabalho flexível, a segurança do emprego, a mobilidade de emprego e as oportunidades de formação, como essenciais para um quadro global de política que vise tornar o trabalho compensador.

Bruxelas, 1 de Julho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  «Jobs, Jobs, Jobs, Creating more employment in Europe», relatório da task-force sobre o Emprego presidida por Wim KOK (Novembro de 2003). Ver também o parecer do CESE sobre «Medidas de apoio ao emprego» JO C 110 de 30 de Abril de 2004.

(2)  Ver parecer do CESE sobre «Medidas de apoio ao emprego», JO C 110 de 30 de Abril de 2004, ponto 4.1.


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/90


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — O futuro do sector dos têxteis e do vestuário na União Europeia alargada»

COM(2003) 649 final

(2004/C 302/19)

Em 28 de Outubro de 2003, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Em 4 de Maio de 2004, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer com base no projecto do relator A. PEZZINI e do co-relator M. NOLLET.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 1 de Julho ), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 81 votos a favor, 1 voto contra e nenhuma abstenção, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

Os 2,1 milhões de trabalhadores empregados na indústria têxtil europeia a que se juntou mais meio milhão proveniente dos países em vias de adesão são um sinal evidente da sua vitalidade e das suas enormes potencialidades. Graças aos notáveis esforços de inovação dos processos e dos produtos, este sector contribui anualmente para a riqueza europeia com um volume de negócios de 200 mil milhões de euros, isto sem contar com as novas actividades produtivas em forte crescimento, sobretudo ao nível dos têxteis ditos «não convencionais» (ou seja, os têxteis técnicos e de alta tecnologia (1)), que representam quase 30 % da produção total. Refira-se ainda que os gastos com investigação e desenvolvimento ascendem a 8 % – 10 % da facturação total.

1.2

A União Europeia é o principal actor comercial do mundo no sector dos têxteis e do vestuário. A ideia de que a divisão internacional do trabalho teria afastado irremediavelmente os países industriais da produção têxtil mundial revelou-se falsa e, de qualquer modo, não aplicável à Europa. O continente europeu continua a ser, com efeito, o maior exportador de produtos têxteis do mundo, ocupando o segundo lugar no sector do vestuário, num mercado global onde as importações e as exportações atingiram e superaram mesmo em 2002 os 350 mil milhões de euros (6 % do mercado mundial).

1.2.1

É oportuno recordar aqui que a China é o primeiro exportador mundial no sector de vestuário.

1.3

A Europa tem sabido, até agora, valorizar as suas vantagens qualitativas e organizativas: séries limitadas, sistema de moda, gama alta com elevado conteúdo criativo, rapidez de adaptação à procura, de confecção e de entrega. Tem, além disso, inovado no campo dos processos e dos materiais inteligentes graças às nanotecnologias e às novas fibras e, no seu prolongamento, dos têxteis técnicos, altamente competitivos, e tem registado um superavit comercial crescente. As recentes aplicações da química aos tecidos também favoreceram o surgimento de novos produtos. Convém salientar neste contexto que as condições de acesso do sector aos mercados são muito diversas à escala mundial. Enquanto a UE aplica direitos inferiores, em média, aos 9 %, a maioria dos outros países pratica direitos aduaneiros que chegam aos 30 % a que é preciso aduzir ainda barreiras não pautais muito onerosas.

1.4

Na Europa, o sector têxtil e de vestuário revelou-se capaz de enfrentar uma série de transformações radicais, de tirar partido das mutações tecnológicas em curso, de ter devidamente em conta a evolução dos diversos custos de produção e de responder com prontidão à emergência de novos concorrentes mundiais. As respostas da indústria europeia obrigaram, por um lado, a um grande esforço de modernização através da reestruturação competitiva e da integração dos processos tecnológicos e traduziram-se, por outro lado, numa nova posição no mercado, obtida graças à articulação em rede ao nível da produção, da distribuição, da inovação e do marketing tecnológico.

1.5

Em 2002, os investimentos brutos representaram cerca de 9 % do valor acrescentado do sector, elevando-se a um montante aproximado de 5 mil milhões de euros. É óbvio que quase 70 % foram canalizados para o sector têxtil enquanto os do vestuário não chegaram aos 30 %. Nos têxteis, é positivo o saldo da balança comercial, mas no sector de vestuário as importações excedem as exportações. De resto, o sector têxteis-vestuário, ao qual vem juntar-se o do calçado, é uma indústria muito heterogénea e multifacetada, com uma enorme variedade de produtos que vão das fibras sintéticas de tecnologia muito avançada ao fabrico da lã, do algodão aos filtros industriais, dos trapos à alta moda, das pantufas ao calçado profissional de protecção contra os corrosivos químicos.

1.6

A indústria têxtil, do vestuário e do calçado está concentrada nos cinco países mais populosos da União Europeia, cujas empresas são responsáveis por mais de três quartos da produção europeia. O valor acrescentado também se condensa nestes países com a Itália à cabeça, seguida do reino Unido, da França, da Alemanha e, a uma distância considerável, da Espanha. Entre os países mais pequenos, tanto Portugal como a Bélgica e a Grécia ocupam uma posição particularmente relevante em termos de valor acrescentado. A Bélgica distingue-se especialmente no campo dos têxteis técnicos e inteligentes. No que se refere aos novos Estados-Membros, o sector tem particular relevância na Polónia, na Estónia e na Lituânia; entre os países candidatos à adesão os mais destacados são a Turquia, a Roménia e a Bulgária.

1.7

A taxa relativa de emprego tem diminuído, nos últimos cinco anos, a uma média de 2,6 % ao ano. Os únicos exemplos que contrariam esta tendência são os da Espanha e da Suécia (+ 2 %) onde o emprego no sector aumentou entre 1995 e 2002. Plenamente inserida na globalização dos mercados, a indústria europeia reestruturou e racionalizou de modo global as suas empresas recorrendo à subcontratação, no caso das operações com maior intensidade de mão-de-obra, e especializando-se, em contrapartida, nas actividades que requerem mais qualificações, sobretudo devido à aplicação das tecnologias da informação, das novas tecnologias e de técnicas de produção mais eficientes.

1.8

Ao nível do comércio, a abolição em 2005 das quotas à importação, com o termo do Acordo Multifibras (AMF), leva as partes envolvidas a reflectir sobre a melhor forma de criar novas condições comerciais para produtos têxteis que assegurem a competitividade da indústria europeia ao nível mundial e, ao mesmo tempo, garantam a necessária equidade aos países mais desfavorecidos e aos países particularmente vulneráveis. É cada vez mais evidente a prioridade de aplicar o processo de Barcelona que prevê um zona de comércio livre envolvendo a Europa e toda a bacia do Mediterrâneo e que, deste modo, daria um conteúdo concreto à zona pan-euro-mediterrânica.

2.   A proposta da Comissão

2.1

A comunicação da Comissão analisa o complexo problema dos têxteis e do vestuário tendo em mira o reforço da sua competitividade e a sua dinamização, numa óptica de aplicação específica da estratégia de Lisboa ao sector.

2.2

Propõe medidas baseadas nas políticas industriais e comerciais, lançando um olhar especial sobre o emprego, a investigação e o desenvolvimento, a inovação, a formação profissional, o desenvolvimento regional, o desenvolvimento sustentável, a responsabilidade social das empresas, a saúde pública, a protecção dos consumidores, o combate à contrafacção, os direitos de rótulo e de propriedade industrial e intelectual, a política da concorrência e o regime de auxílios estatais.

2.3

A Comissão sugere ainda alguns campos de acção onde haverá que aumentar a eficácia das medidas de política industrial, designadamente:

investigação, desenvolvimento e inovação: novos materiais e materiais inteligentes, nanotecnologias, novos processos de produção e tecnologias limpas, concentração na moda e na promoção da criatividade;

responsabilidade social das empresas: respeito das normas laborais e ambientais internacionais, gestão responsável das mutações industriais e consulta dos trabalhadores;

educação e formação: acesso mais fácil das PME aos financiamentos previstos mediante simplificação dos procedimentos, disseminação da informação e coordenação das acções;

desenvolvimento das possibilidades e das capacidades de articulação em rede;

programa de Doha para a redução e a harmonização das pautas aduaneiras e a eliminação de todos os entraves de carácter não pautal às transacções comerciais;

realizar a zona euromediterrânica até 2005 para garantir a livre circulação de produtos têxteis nos países com regras de origem idênticas e com sistemas acordados de cooperação administrativa;

programas de rotulagem para o acesso à UE: verificação da sua utilização para os artigos produzidos no respeito das normas laborais e ambientais internacionais;

preferências comerciais da UE: concentrar-se nos 49 países mais pobres (PMD — países menos desenvolvidos) (2), oferecendo-lhes esta possibilidade também no caso de produtos de vestuário intermédios;

luta contra a fraude e a contrafacção, reforço das medidas existentes e adopção de novas medidas em defesa da propriedade industrial e intelectual, controlos para evitar práticas comerciais desleais; consolidação do sistema aduaneiro comum;

rótulo de origem MADE IN EUROPE para promover os produtos europeus de qualidade e para proteger os consumidores;

Fundos Estruturais: utilização e novas orientações, sobretudo no âmbito das perspectivas financeiras para 2007-2013.

2.4

A comunicação da Comissão sugere algumas pistas de reflexão:

acções ao nível das partes interessadas;

acções ao nível nacional;

acções ao nível da UE.

2.4.1

É proposta a criação de um grupo de alto nível composto de representantes da Comissão, dos Estados-Membros e dos parceiros sociais para verificar as iniciativas nos vários níveis e a sua concretização. Encontra-se também prevista a elaboração de relatórios periódicos entre a Primavera de 2005 e finais de 2006.

3.   Pontos de vista dos representantes da indústria têxtil

Em 21 de Janeiro de 2004, o Comité organizou uma audição dos representantes da indústria têxtil na sua sede, em Bruxelas. As posições expressas neste capítulo reflectem as contribuições escritas recebidas e as intervenções durante a audição (3).

3.1

As forças sociais presentes – empresários, representantes sindicais e administrações locais — pediram por unanimidade uma intervenção urgente a fim de refrear o impacto, extremamente veloz, das importações de alguns países, particularmente da China, da Índia e do Paquistão, nas empresas europeias do sector.

3.2

Face à aproximação de 2005, ou seja, com o fim do regime de quotas, urge tomar as seguintes medidas:

possibilidade de utilizar novos recursos financeiros;

uma intervenção especial ao abrigo dos Fundos Estruturais;

investimentos na formação e, portanto, nos recursos humanos;

obrigatoriedade da rotulagem para todos os países de origem dos produtos;

obrigatoriedade da rastreabilidade em todas as fases produtivas;

respeito pela saúde do consumidor, através da etiqueta que indica a ausência de perigo;

reciprocidade nas pautas aduaneiras com os países com grande desenvolvimento no sector;

revisão dos acordos com os países terceiros, eliminando as facilidades pautais aos países que não respeitem as regras comerciais, as regras sociais, o desenvolvimento sustentável ou que produzam armas nucleares;

reexame da organização europeia das alfândegas para simplificá-la e realizar controlos mais pontuais e, sobretudo, reduzir as fraudes que alcançaram níveis insustentáveis;

meios financeiros mais elevados para a investigação e a inovação e ajuda às empresas, sobretudo às PME, para poderem diversificar a produção e fabricar têxteis técnicos e inteligentes.

3.3

O sector italiano dos têxteis e do vestuário, o mais exposto de todos os países europeus, apresentou um documento unitário, elaborado com o consenso de todos os produtores, das grandes e das pequenas empresas, e de todos os representantes sindicais do país, realçando algumas prioridades e preconizando a sua tradução em acções concretas, eficazes e atempadas. Segundo a posição unitária do documento, «neste momento, a inércia poderia significar para a Europa custos sociais e económicos muito elevados».

3.3.1

Eis os pontos enunciados:

3.3.2

Os produtos comunitários acedem a taxas zero aos mercados de apenas 22 países, ao passo que noutros mercados estão sujeitos a uma taxa média que oscila entre os 15 e os 60 %, tendo além disso de superar inúmeros entraves não pautais. O sector dos têxteis e do vestuário, sobretudo a partir de 2005, deixará de poder suportar os privilégios de que beneficiam actualmente os maiores concorrentes da UE (China, Índia, Paquistão e Indonésia). Estas vantagens deveriam, por conseguinte, circunscrever-se aos países menos desenvolvidos e aos pequenos países produtores que, em 2005, estarão por seu turno numa posição extremamente vulnerável.

3.3.3

Solicita-se, por este motivo, que o rótulo contenha em vez do genérico «Made in UE» uma inscrição mais explícita, por exemplo, «Made in Italy/UE» ou «Made in France/UE». Já hoje mais de 60 % dos produtos comercializados são rotulados voluntariamente com a indicação da sua origem. Se essa inscrição fosse obrigatória, haveria igualmente controlos e sanções, já que a actual margem de liberdade permite numerosas contrafacções e fraudes, duplamente lesivas para a indústria europeia. Além disso, o comprador europeu encontra-se em desvantagem relativamente ao consumidor americano, japonês, chinês e australiano. Não se entende por que motivo ele não pode dispor das mesmas informações prestadas aos outros consumidores pelo rótulo obrigatório. Se o consumidor europeu conhecesse a proveniência dos produtos poderia avaliar melhor não só a congruência dos preços mas também a relação entre preço e qualidade, em função das suas necessidades.

3.3.4

Ficou provada já por várias vezes a relação entre têxteis e saúde. Muitas dermatites são causadas pela utilização de produtos têxteis de baixa qualidade. Também por este motivo parece oportuno deixar ao consumidor a escolha da zona de proveniência do produto.

3.3.5

As importações ilegais de vestuário assumem proporções inquietantes e a aposição enganosa do dístico «Made in …» está cada vez mais difundida nos mercados internacionais. É, pois, imprescindível intensificar os controlos e tornar as sanções mais severas.

3.3.6

A concepção de novos materiais, de novos processos de produção e de tecnologias limpas favoráveis ao desenvolvimento sustentável é crucial para o sector.

3.3.7

As associações de empresas e as organizações sindicais não se cansam de afirmar que sempre partilharam os princípios que estão na base do «Código de conduta do sector dos têxteis e do vestuário europeu», facto este, aliás, comprovado pela sua integração directa nas convenções colectivas de trabalho dos Estados-Membros. Face a esta evidência, solicita-se à Comissão que integre a dimensão social no âmbito dos acordos internacionais.

3.3.8

O dumping social (fabrico de produtos com custos de mão-de-obra reduzidos em virtude do desprezo dos direitos dos trabalhadores e do recurso ao trabalho infantil e, portanto, forçado) é um comportamento moralmente condenável, mas não permite a imposição imediata de direitos anti-dumping. Os países industrializados, sobretudo da Europa, deveriam, pois, combatê-lo com maior vigor através de cláusulas mais severas e, particularmente, do SPG (Sistema de Preferências Generalizadas) (4). Na vertente ambiental, o dumping ecológico significa a redução dos custos de fabrico em detrimento do respeito pelo ambiente.

3.3.9

É oportuno que as instâncias internacionais, com o apoio dos países industrializados, elaborem projectos específicos para disseminar os conhecimentos intrínsecos ao princípio do desenvolvimento sustentável, tendo em mente os países em desenvolvimento, como está, de resto, a fazer a Comunidade com os países da nova vaga de adesões.

3.3.10

Para alcançar este objectivo, poderia ser estimulante e conveniente utilizar rótulos comprovando que na UE o acesso dos produtos está subordinado ao respeito das normas ambientais internacionais.

3.3.11

Não se deve perder de vista a meta fundamental de proteger o ambiente e garantir às empresas europeias condições operacionais e competitivas realistas e de rever criteriosamente os acordos celebrados.

4.   Observações do CESE

4.1

O CESE tem seguido muito atentamente as iniciativas promovidas pela Comissão, sobretudo nos últimos anos, para voltar a colocar no centro do interesse comunitário o sector dos têxteis e do vestuário. Frisa, em particular, que a apresentação das melhores práticas nas diversas áreas da inovação, da comercialização e do marketing tem estimulado a participação no debate do público bastante numeroso que tem acorrido às conferências organizadas recentemente em Bruxelas pelas várias Direcções-Gerais (5).

4.2

Mas, infelizmente, estas iniciativas à primeira vista tão estimuladoras não têm tido o impacto local que se esperava. E isto leva-nos, uma vez mais, a reflectir nas formas que permitam tirar partido dos valores do conhecimento e da informação e difundi-los mais amplamente a todos os interessados.

4.2.1

O forte envolvimento das associações sectoriais de empregadores e de trabalhadores, a todos os níveis, fará avançar e ajudará a estruturar todo o processo de inovação.

4.2.2

Somente graças a uma política bem pensada de concertação entre os parceiros sociais, valendo-se das experiências dos «entes bilaterais» (6) e dos esforços conjugados para apoiar a evolução do sector, será possível fazer face ao desafio da globalização que, sobretudo neste segmento específico, «… suscita enorme apreensão...», para citar as palavras do comissário LAMY.

4.3

«A competitividade industrial é uma das áreas essenciais em que tanto a União Europeia como os Estados-Membros têm um papel activo a desempenhar para cumprirem os objectivos estabelecidos na estratégia de Lisboa...». Assim se exprimiu o Conselho «Indústria» de 27 de Novembro de 2003 (JO C 317 de 30/12/2003, p. 2). O sector actualmente mais exposto ao fenómeno da desindustrialização que acompanha os novos aspectos do comércio mundial é, sem sombra de dúvida, o dos têxteis.

4.3.1

São sobretudo estes motivos que colocam o sector dos têxteis perante um processo constante de restruturação e de modernização, a par de um acentuado abrandamento da actividade económica, da produção e do emprego. Trata-se, além disso, de um sector estratégico que continua a dar emprego especialmente às mulheres. Ciente do seu valor, o Conselho convida a Comissão nas suas conclusões a informá-lo, antes do final de Julho de 2004, das iniciativas que considerar apropriadas neste contexto e que poderão confluir num Plano de Acção de apoio aos têxteis.

4.4

Na opinião do Comité, a Comissão deveria, à luz das considerações tecidas no seu documento, ponderar com a máxima brevidade e com atenção renovada:

4.4.1

A reabertura das negociações sobre a Agenda de Desenvolvimento de Doha, consolidando o seu documento (COM(2003) 734 final, de 26 de Novembro de 2003), em conformidade com algumas indicações inequívocas do mundo laboral, dos empresários e dos consumidores (7).

4.4.2

O papel das alfândegas na gestão integrada das fronteiras externas (8), de acordo com as recomendações expressas pelo Comité num parecer anterior e com outras sugestões avançadas no presente parecer.

4.4.3

As regras de origem nos regimes comerciais preferenciais (COM(2003) 787 final) para estabelecer o montante dos direitos que emergirão do novo ciclo de negociações multilaterais, dos acordos de livre comércio e do apoio ao desenvolvimento sustentável. Conforme se reivindica em diversas passagens deste parecer, haverá que definir «procedimentos de gestão e mecanismos de controlo e salvaguarda que assegurem a utilização leal dos regimes preferenciais, a fim de preservar os meios económicos e de assegurar a protecção dos interesses financeiros em jogo em relação aos abusos» (9).

4.4.4

Os termos da parceria com a China (10) que prevêem a afectação de diversos recursos comunitários para aumentar a concorrência entre aquele país e a UE (programa de formação para jovens empresários, desenvolvimento da formação profissional, capítulo B7-3).

4.4.5

A concepção de um programa comunitário dotado dos recursos adequados para apoiar a investigação, a inovação, e não só a tecnológica, e a formação profissional do sector (capacidade de adaptação, sobretudo dos pequenos empresários e dos trabalhadores, ao novo contexto internacional e às exigências dos consumidores). Este princípio está, aliás, bem explícito na resolução do Parlamento Europeu sobre o futuro dos têxteis e do vestuário aprovada em Fevereiro último.

4.4.6

Medidas para proteger os consumidores que têm cada vez mais consciência dos efeitos potenciais sobre a sua saúde de alguns produtos frequentemente em contacto directo com a pele e da propagação crescente das alergias de contacto ou de outros distúrbios cutâneos (11). Na esteira de tudo o que se fez na legislação europeia para garantir a transparência do sector alimentar, afigura-se fundamental a introdução de disposições análogas que permitam ao consumidor conhecer, mediante rotulagem obrigatória, a proveniência do fio e do tecido e o local da confecção do produto final.

4.5

Sem sombra de dúvida que a introdução de um rótulo obrigatório «Made in …» poderia contribuir para aumentar a confiança dos consumidores e persuadi-los de que quando compram um artigo com este rótulo estão a pagar um preço que corresponde aos mais elevados padrões da produção e do estilo aplicados aos países de origem, isto na condição de estar nele indicado o país onde foi confeccionado e não qualquer outro país envolvido na produção. Mas a proposta da Comissão de indicar «Made in Europe» não é convincente. Uma denominação europeia única não distingue a especificidade e a excelência de cada um dos países: «Unidos na diversidade».

4.5.1

Quanto às alternativas enunciadas na proposta da Comissão para a denominação de origem, o Comité considera importante seguir a abordagem que prevê a obrigatoriedade do rótulo tanto para os produtos importados como para os manufacturados no mercado interno quando comercializados na União Europeia. Esta abordagem permitirá sobretudo orientar mais facilmente o consumidor para a aquisição de produtos éticos, tendo em conta não só as suas qualidades intrínsecas mas também o respeito dos direitos dos trabalhadores nos processos da produção.

4.6

A cultura da «responsabilidade social das empresas» deve, por um lado, consolidar-se como modelo europeu mas é essencial aplicá-la igualmente aos países em desenvolvimento através de instrumentos concretos sujeitos ao controlo dos consumidores, adquirindo assim pertinência sob o ponto de vista comercial (12).

4.7

É fundamental que o consumidor final tenha uma noção muito clara das normas ambientais e da legislação da segurança no trabalho já em vigor nos processos produtivos, pois só assim é que estas se transformarão em vantagem concorrencial.

4.7.1

A posição inequívoca da União Europeia sobre o desenvolvimento sustentável, ou seja, de respeito do protocolo de Quioto nos prazos acordados, poderá ter êxito e contar com a aceitação do mundo produtivo europeu, se contar com o reconhecimento e o respeito dos esforços exigidos por estes compromissos. Não ter em conta a concorrência desleal ou não fazer nada para impedi-la para além de não favorecer a disseminação de uma cultura do progresso, enraizada nos empresários e nos trabalhadores europeus, poderia encorajar ainda mais a desindustrialização do nosso continente em benefício exclusivo de algumas multinacionais do comércio (13) que têm a possibilidade de recorrer à produção de países menos sensíveis aos nossos princípios. Não devemos esquecer-nos que fazemos parte de uma «economia social de mercado».

4.7.2

Os esforços envidados pela Comissão para a redução do consumo de energia, designadamente, através da propagação da «Concepção ecológica dos produtos que consomem energia» (14), poderão vir a surtir efeito gradualmente se as indústrias europeias, particularmente a dos têxteis e do vestuário, continuarem a dispor de um mercado e, por conseguinte, das máquinas necessárias para a produção. Caso contrário, não nos restará senão estender a proposta a alguns países considerados em vias de desenvolvimento instigando-os a melhorar o consumo de energia das máquinas utilizadas na manufactura dos seus produtos.

4.8

O Comité espera que se dedique atenção constante, também ao nível europeu, às pequenas e microempresas, as mais vulgarizadas neste sector, procurando encontrar para elas um sistema financeiro semelhante ao actual que tende a privilegiar as grandes empresas. O Comité aplaude igualmente a preocupação da Comissão em evidenciar os problemas das pequenas e microempresas e em desenvolver o espírito empresarial na cultura europeia (15).

4.9

O Comité considera que, para além da diminuição do número de países contemplados pelo SPG, já reivindicada acima, não se deve reduzir as pautas aduaneiras actualmente em vigor na UE, entre as mais baixas do mundo, enquanto alguns países exportadores de produtos têxteis e de vestuário, muito competitivos, não tiverem atingido um nível semelhante. O critério da reciprocidade ou «um acesso aos mercados mundiais em condições análogas às que a União aplicará relativamente à importação a partir de 2005» é também uma das recomendações do Parlamento Europeu constantes da sua resolução sobre a indústria têxtil e do vestuário na UE, de 29 de Janeiro de 2004. O Comité é a favor da liberalização do comércio mas é contrário a uma liberalização de sentido único. É preciso oferecer também a outros países a possibilidade de abrirem os seus mercados aos fabricantes de têxteis e de vestuário da União Europeia.

4.9.1

Para erradicar o grave problema da pirataria e da contrafacção, é necessário reforçar os controlos aduaneiros nas fronteiras externas e providenciar pela sua unificação em verdadeiras alfândegas comuns, prevendo medidas de apoio especiais para os novos Estados-Membros.

4.9.2

O Comité partilha da viva preocupação das categorias profissionais afectadas pela incidência das fraudes e entende que devem ser adoptadas as medidas necessárias para atenuá-la. Os serviços aduaneiros já alertaram por várias vezes para o facto de não terem pessoal suficiente para controlar as mercadorias em trânsito, sobretudo nos portos. No porto de Nápoles, por exemplo, entram por dia em média 1 000 contentores e o seu controlo é efectuado por apenas três pessoas. A consequência disso é que a percentagem dos contentores abertos (apenas abertos sem inspecção do conteúdo) nem chega sequer a 1 %!

4.9.3

Perante uma situação desta natureza, agravada pelas fraudes arquitectadas por meios criminosos com implicações desastrosas para as actividades de muitos portos europeus, convinha ponderar a hipótese de concentrar a chegada de certos produtos a determinados portos especialmente bem equipados onde se poderia organizar, a par de um controlo mais rigoroso dos serviços aduaneiros, um sistema de vigilância a cargo dos representantes dos sectores envolvidos.

4.9.4

O Parlamento Europeu exprime-se neste sentido, pelo menos em substância, no ponto 11 da sua resolução, ao convidar a Comissão a incentivar e a auxiliar os fabricantes a criarem uma rede de vigilância e de informação destinada a identificar e a eliminar as fontes dos produtos que são objecto de contrafacção.

4.9.5

Outra solução possível seria distribuir os contentores, selados, pelos vários destinos, o que reduziria drasticamente o número de contentores a controlar nos portos e aumentaria, por conseguinte, a eficácia dos controlos.

4.10

Os Estados-Membros de origem das mercadorias também devem ser convidados a melhorar os seus controlos. Os países que se tornam cúmplices de práticas fraudulentas por utilizarem mecanismos de controlo ineficazes deveriam ser privados temporariamente do benefício de exportar em condições vantajosas. O sistema único SPG tão largamente utilizado no sector dos têxteis e do vestuário custa anualmente à União Europeia 2,2 mil milhões de euros, que significa perdas de receitas aduaneiras e contempla anualmente os países que dele usufruem com um montante idêntico. Se a UE concede benefícios desta ordem de grandeza, muitas vezes com incidência na crise de emprego de muitas regiões da Europa, deve ter o direito de estabelecer os termos e as condições que entender.

4.10.1

O Comité está perfeitamente consciente de que, na realidade, as fronteiras da UE não coincidem exactamente com os limites físicos dos seus Estados-Membros, mas situam-se cada vez mais no território dos países de origem das suas importações. O CESE já se pronunciou a este respeito num seu parecer.

4.11

As regras de origem são demasiado complexas e difíceis de aplicar, são facilmente mal interpretadas e exigem o conhecimento profundo de uma profusão de textos jurídicos. Constituem, por consequência, um obstáculo ao comércio e um incentivo à fraude. Os países beneficiários servem apenas, e com demasiada frequência, de pontos de trânsito para os produtos de países não beneficiários.

4.12

O Comité recomenda à Comissão, e muito em particular à DG Comércio, que estabeleça requisitos bem explícitos ao nível da protecção dos direitos dos trabalhadores, da protecção do ambiente, da eliminação do tráfico de droga, da observância dos direitos humanos fundamentais, do desenvolvimento sustentável e de outras questões preocupantes como, por exemplo, a protecção dos consumidores e o bem-estar dos animais.

4.13

No atinente à Pauta Aduaneira Comum (PAC), o Comité observa que o último Regulamento n.o 1789/2003 que altera o Regulamento n.o 2658/87, entrado em vigor em 1 de Janeiro de 2004, também é fruto de uma série de compromissos que tornam difícil e complexa a aplicação da Pauta Aduaneira Comum e favorecem, por conseguinte, a fraude e a evasão fiscal. A posição «vestuário e seus acessórios», que corresponde aos capítulos 61, 62 e 63, compreende 466 subposições das quais 398 estão sujeitas a uma taxa de 12 %, sendo aplicadas às restantes 68 pautas aduaneiras que vão da exoneração completa a taxas de 2 %, 4 %, 5,3 %, 6,2 %, 6,3 %, 6,5 %, 6,9 %, 7,2 %, 7,5 %, 7,6 %, 7,7 %, 8 %, 8,9 %, 10 % e 10,5 %. Também os outros capítulos: 64 (calçado e polainas), 65 (chapéus e suas partes), 66 (guarda-chuvas) e 67 (penas e flores artificiais) estão sujeitos a taxas que podem ascender a 1,7 %, 2,2 %, 2,7 %, 4,7 %, 5 %, 5,2 %, 7 % e 8 %.

4.13.1

Num total de 1 516 subposições, nos capítulos 50 a 67 da Nomenclatura Comum dos têxteis, vestuário e calçado existem mais de 20 níveis pautais. A coexistência de taxas tão próximas entre si só causa problemas e ilustra bem a fragilidade de um sistema que poderia ser mais racional e menos vulnerável às pressões dos centros económicos que, para maximizar os seus lucros, criam inconvenientes a inúmeras empresas. O Comité é de opinião que o estabelecimento de um número restrito de taxas, três ou quatro no máximo, reduziria visivelmente as fraudes e tornaria o sistema infinitamente mais simples.

4.14

O Comité dá importância especial à promoção do respeito das normas fundamentais do trabalho e do comércio equitativo, à protecção do ambiente e à luta contra o tráfico de droga. O actual SPG (Sistema de Preferências Generalizadas) se, por um lado, reduz em 40 % os direitos da Pauta Aduaneira Comum (PAC), permitindo a todos os países em desenvolvimento a exportação dos seus produtos dos sectores dos têxteis, do vestuário e do calçado para os países europeus a taxas inferiores a 5 %, desde que se esforcem por respeitar as cláusulas sociais e ambientais, tem-se mostrado incapaz de levar ao cumprimento dos objectivos de moralização almejados. Aparentemente, os regimes especiais de incentivo que visam o combate à produção e ao tráfico de droga, de que beneficiaram doze países, não tiveram qualquer impacto na sua limitação, quando se sabe que muitas pequenas empresas europeias foram obrigadas a suspender a sua actividade dada a concorrência insustentável gerada por custos de produção que nada têm a ver com os exigidos por uma regulamentação moderna e orientada para o desenvolvimento sustentável (16).

4.15

O CESE entende que o Conselho, a Comissão e o Parlamento Europeu devem multiplicar esforços no sentido de excluírem das preferências generalizadas todos os países que, embora confrontados com a necessidade de exportarem os seus têxteis, vestuário e calçado para a Europa, não respeitam os direitos fundamentais da OIT (17) (Organização Internacional do Trabalho) (18).

4.16

O Comité está convicto de que o PIB per capita não deve ser o único critério para determinar a elegibilidade de um país para as reduções pautais previstas pelo SPG para o sector dos têxteis. Partilha, também, da preocupação perceptível em diversos meios, de que uma parte indevida do benefício acabe por reverter a favor dos países que menos precisam. A fim de assegurar que as ajudas ao abrigo do SPG contemplem os países mais carenciados, o CESE defende que as novas orientações excluam a participação das seguintes categorias de países:

países membros da OPEP (19);

países que não sejam designados pela ONU como «países em desenvolvimento»;

países que têm um programa de armamento nuclear;

países que são paraísos fiscais;

países que celebraram acordos comerciais bilaterais ou regionais com a UE (20);

países que não respeitem os direitos fundamentais da OIT/BIT (Secretariado Internacional do Trabalho) (21).

4.17

É essencial que os pólos tecnológicos e os centros de inovação existentes nos países da União Europeia consolidem as ligações em rede e a disseminação das experiências com as empresas do sector, as universidades e as organizações da sociedade civil.

4.18

Os têxteis técnicos, os que envolvem alta tecnologia e o calçado técnico têm-se apropriado de quotas de mercado cada vez mais elevadas na Europa e no resto do mundo. As pequenas e médias empresas europeias estão em condições de desempenhar agora e futuramente, graças a uma experiência de base consolidada, um papel fundamental na produção de peças de vestuário que sintetizam os resultados de novos processos químicos e de novas tecnologias.

4.19

O Comité vê a necessidade de ensaiar e realizar acções concertadas entre a Comissão e os Estados-Membros para financiar e apoiar uma gama de serviços avançados capazes de melhorar o desempenho das empresas e propiciar, deste modo, o encontro entre a procura e a oferta de vestuário inovador.

4.19.1

Seria oportuno recorrer às intervenções previstas pelo Fundo Social Europeu (FSE) e às enquadradas no Sexto Programa de Investigação e Desenvolvimento para intensificar e aprofundar a formação de novos agentes profissionais dotados de capacidades técnicas e operacionais especiais e com o talento para assumir, no âmbito de futuros projectos, o papel de animadores da inovação, ombro a ombro com as PME. Deve prestar-se aqui especial atenção aos Estados-Membros cuja indústria têxtil e de vestuário possui importância estratégica.

4.19.2

Entre os perfis profissionais necessários para ajudar as empresas a melhorar e a ampliar a produção de têxteis e de calçado técnicos figuram por exemplo os analistas das audições tecnológicas, os facilitadores de projectos de reconversão e pessoas capazes de identificar novas oportunidades.

4.19.3

O CESE está persuadido de que as empresas e, particularmente, as PME deveriam tirar partido das oportunidades existentes no seu local de implantação — pólos tecnológicos, universidades, diálogo estruturado entre empregadores, trabalhadores e autarquias locais — e valer-se da colaboração destes actores para se alçarem a um nível tecnológico e competitivo mais elevado (22).

4.20

O Comité está ciente, tal como a Comissão e o Parlamento, de que o segmento de têxteis, vestuário e calçado da União Europeia é constituído por cerca de 70 % de pequenas empresas (com menos de 50 trabalhadores), 20 % de empresas com um número de trabalhadores situado entre 50 e 249 e 10 % de empresas com 250 ou mais trabalhadores. Por outro lado, a concentração de trabalho feminino é aqui mais elevada do que noutros sectores. Esta fragmentação tão acentuada das empresas no território europeu torna obviamente mais difícil levar a cabo iniciativas de apoio à inovação e à actualização tecnológica.

4.21

O CESE tem denunciado em várias ocasiões, pela voz dos seus representantes que estão em contacto directo com a sociedade civil organizada, o fenómeno incessante das fraudes que afecta uma vasta gama de mercadorias que atravessam as fronteiras comunitárias. Entre as fraudes mais notórias referimos:

declarações que não correspondem aos produtos desalfandegados (23),

mercadorias desprovidas de certificado de conformidade e que são muitas vezes perigosas para os consumidores,

mercadorias produzidas sem respeitar os princípios da propriedade intelectual,

mercadorias sujeitas a operações de triangulação entre diversos Estados (24),

mercadorias que não respeitam as regras de origem (25),

produtos que são objecto da contrafacção ou da pirataria.

4.21.1

O fenómeno foi recentemente alvo de inquéritos estatísticos muito úteis. O CESE compraz-se em verificar que a União Europeia aprovou finalmente um regulamento que permite queimar ou destruir doutro modo na alfândega os artigos de contrafacção (26).

4.21.2

Porém, na opinião do Comité, os resultados ainda deixam muito a desejar.

4.21.3

Os próprios responsáveis pelos serviços aduaneiros queixam-se das insuficiências da regulamentação comunitária que, a seu ver, deveria pôr termo à fragmentação das leis nacionais, bem como da falta de pessoal e de meios para fazer face a um mercado tão vasto e dinâmico.

4.21.4

No primeiro semestre de 2003, foram interceptados pelas alfândegas europeias mais de 50 milhões de artigos de contrafacção ou de pirataria (27). As fraudes no sector do vestuário duplicaram entre 2000 e 2002, tendo mesmo triplicado no caso dos perfumes e dos cosméticos (28). Mas isto é só a ponta do icebergue se pensarmos em todas as mercadorias que conseguiram infiltrar-se no mercado.

4.21.5

Destes produtos, 66 % é de origem asiática, com a China e a Tailândia à cabeça. Citando o comissário BOLKENSTEIN, a contrafacção deixou de circunscrever-se aos artigos de luxo e passou a incidir nos produtos de uso diário, lesando cada vez mais directamente as PME (29).

4.21.6

A amplitude deste fenómeno torna a vida das empresas europeias cada vez mais difícil e obriga frequentemente as mais pequenas a suspenderem a sua actividade face à impossibilidade de se manterem no mercado.

5.   Observações na especialidade

5.1

Desde 1971 que a Comunidade Europeia, inicialmente através do GATT e depois da OMC (Organização Mundial do Comércio), concede aos países em desenvolvimento reduções consideráveis relativamente à Pauta Aduaneira Comum (PAC).

5.1.1

Os produtos considerados não sensíveis importados destes países pela Comunidade estão totalmente isentos do pagamento de direitos aduaneiros.

5.1.2

Os produtos deste tipo, entre os quais os têxteis, o vestuário e o calçado, beneficiam de uma redução de 20 % (no regime geral) que chega a 40 % nos regimes especiais (30).

5.1.3

Em 2003 as Nações Unidas deram a 116 Estados o estatuto de países em desenvolvimento. Mas, na realidade, os benefícios da UE estendem-se a 174 países (31).

5.1.4

A Ásia é de longe o principal beneficiário das facilidades aduaneiras concedidas pela Comunidade com quase 70 % do seu total em 2002. A China retira, sozinha, proveito de cerca de 25 % destas facilidades.

5.1.5

As taxas médias impostas pela UE aos produtos TVC (têxteis/vestuário/calçado) dos países supracitados elevam-se a 4,8 %; as praticadas pelos EUA são de 8,8 % enquanto no Japão são de 6,6 % e no Canadá de 12 %. As taxas impostas pela China ascendem a 20 % e as praticadas pela Tailândia a 29 %, pela Índia a 35 % e pela Indonésia a 40 % (32).

5.2

Os produtores euromediterrânicos de TVC continuam a deparar com obstáculos consideráveis no acesso aos mercados asiáticos. Nestes mercados, os países envolvidos criaram barreiras não pautais para entravar as trocas comerciais o que causa graves problemas a toda a indústria europeia (33).

5.3

Na indústria transformadora da UE, considerada globalmente, o valor acrescentado dos têxteis (34) é de cerca de 2,5 %. Há, todavia, países com médias relativamente elevadas: Luxemburgo com 8,7 %, Portugal com 6,3 %, a Grécia com 5,1 %, a Itália com 4,6 % e a Bélgica (35) com 4,3 %. A importância da indústria têxtil e de vestuário é ainda maior nos novos Estados-Membros da UE: 16,1 % na Lituânia (36), 10,5 % na Estónia (37), etc.

6.   Conclusões

6.1

Frequentemente, os numerosos empresários europeus do sector, ao verem-se forçados a desistir de um combate que é por vezes conduzido em arenas onde não há vestígios de lealdade comercial, de capacidade empresarial e de respeito pelo direito ao trabalho, ficam com a sensação de serem punidos injustamente. Mas tal não impede que tanto os empresários como os trabalhadores e os decisores políticos da UE a vários níveis tenham uma visão de futuro a médio e a longo prazo partilhada e consensual de um sector têxtil e de vestuário europeu competitivo e avançado.

6.1.1

O respeito dos direitos fundamentais do trabalho expressos nas normas da OIT deve ser reforçado simultaneamente por mecanismos de controlo específicos da OIT e pela estreita cooperação entre a OIT e a OMC. A UE terá de redobrar esforços para transformar os princípios da OIT, cujo objectivo é proteger os trabalhadores, em ponto de referência para a OMC.

6.2

As facilidades aduaneiras ficariam reservadas apenas a 49 países menos desenvolvidos. As negociações iniciadas em Doha deveriam redundar em situações de verdadeira reciprocidade entre a zona pan-euro-mediterrânica e os países asiáticos. Seria essencial que nestas negociações se procurasse chegar a um acordo mundial prevendo a redução de todos os direitos aduaneiros no sector dos têxteis e do vestuário, dentro de um período determinado, por exemplo, de cinco anos, até a um nível unitário de 15 %, no máximo.

6.3

É imperioso reforçar os controlos nas fronteiras da União Europeia no intuito de chegar quanto antes a um sistema aduaneiro comum coerente com a legislação do mercado interno.

6.4

Para combater a falsificação e a fraude e para prestar informações mais detalhadas aos consumidores, poder-se-ia estudar a hipótese de criar um sistema de rotulagem de origem (geográfica, social e ambiental).

6.4.1

Ainda por este motivo o CESE sugere que se explore a possibilidade de activar eventualmente a rastreabilidade dos têxteis, o que poderia contribuir para reduzir as fraudes com incidência nas regras de origem (38) e a contrafacção.

6.5

O Comité secunda a Comissão nos seus esforços para aumentar a eficácia dos instrumentos de defesa comercial, bem como as medidas antidumping e de combate às subvenções e convida-a a aplicar medidas cautelares, sobretudo no caso de fraudes denunciadas e comprovadas. Nas negociações de Doha, a UE deveria tentar obter uma disciplina muito mais rigorosa quanto à utilização de medidas cautelares, de acções antidumping e de outros meios de protecção, tais como alterações à regulamentação sobre a origem, etc.

6.6

A Comissão terá de empenhar-se com maior denodo para garantir o respeito pela OMC e pelos Estados dos ADPIC (aspectos dos direitos da propriedade intelectual no comércio).

6.7

Importa promover a capacidade de inovação, sobretudo nas PME, através de programas acordados ao nível local, com o contributo de todas as forças sociais e o envolvimento dos centros de investigação. Existem na Europa institutos superiores com longa tradição no sector dos têxteis. Seria extremamente oportuno criar uma rede de excelência para aproveitar, através de laços estreitos com o mundo empresarial e laboral, as oportunidades oferecidas pelo Sexto Programa-Quadro e fazer um prognóstico sobre o desenvolvimento tecnológico do segmento.

6.7.1

Um dos pontos fortes dos têxteis europeus, para além da moda e da beleza dos artigos confeccionados, deverá ser a capacidade de inovar com o intuito de descobrir novas fibras, novos tecidos compostos enriquecidos com pós identificados por estudos sobre a nanotecnologia susceptíveis de aumentar a sua funcionalidade, segurança, protecção térmica e qualidade.

6.7.2

Os têxteis não tecidos, ou seja, têxteis muito particulares tratados com substâncias químicas que agem como aderentes, são cada vez mais comuns em vários sectores: desporto, construção civil, aeronáutica, meios de transporte, etc. e, como se recordou já, constituem um mercado em crescimento constante caracterizado por uma diversificação produtiva e com boas perspectivas de futuro (39).

6.8

O CCMI (Comité Consultivo de Mutações Industriais) com o seu manancial de experiências adquiridas ao longo de vários decénios de gestão dos problemas ligados à evolução do mercado do carvão e do aço (40) poderia ter um papel muito importante de intermediário entre a Comissão e o segmento dos têxteis, para facilitar a diversificação da produção.

6.8.1

Prevê-se a necessidade de reconversão profissional do pessoal que perderá o emprego em consequência da restruturação. Seria oportuno despertar e nutrir o interesse dos empresários por estes novos produtos compostos. Apenas será possível consolidar o desenvolvimento sustentável no futuro se os jovens aprenderem a conhecer e a valorizar os novos produtos e a vislumbrar neles os valores do respeito do ambiente. Para lograr mais facilmente este objectivo é conveniente apelar à ajuda dos organismos europeus, como o CCMI, que dispõem de uma experiência social e técnica muito valiosa.

6.9

Os têxteis, o vestuário e as peles são o primeiro sector a ser objecto da nova política vertical recentemente instaurada pela Comissão, em aditamento às tradicionais políticas horizontais dirigidas à indústria. Todos os observadores e, em particular, os activos no sector quer na qualidade de directores de empresa quer de trabalhadores, consideram fundamental que a Comissão consiga, com a participação dos Estados-Membros e dos parceiros sociais, ajudar este sector a evoluir tecnicamente para fazer face aos desafios da globalização.

6.9.1

A par das «plataformas tecnológicas» já ventiladas pelas políticas comunitárias (41), poder-se-ia aventar a hipótese de criar uma quarta plataforma associada aos aspectos múltiplos e inovadores dos têxteis de concepção moderna.

6.10

Nos países mais avançados está em curso um processo de desindustrialização, tendo o valor acrescentado do sector terciário na UE alcançado já 70 % do PIB (representando a indústria 22 %, a construção civil 5 % e a agricultura 3 %) (42). Mas este fenómeno não é atenuado porque grande parte do valor acrescentado dos serviços é canalizado para as empresas ou provém delas: comércio e transportes (21,6 %), serviços financeiros e serviços prestados às empresas (27,2 %) e administração pública (21,6 %) (43).

6.11

O CESE pensa que a UE terá de agir servindo-se de todo o peso intrínseco à visão europeia resumida na expressão «economia social de mercado» para alterar as regras da OMC. As regras em vigor não permitem interditar a importação de produtos a não ser que sejam perigosos. Deveria, portanto, impor-se sem demora o respeito por certas prioridades sociais, ambientais e económicas, a partir do momento em que a UE, na sua qualidade de actor económico, aumente a eficácia da governação mundial «... ao generalizar o desenvolvimento sustentável à escala planetária através de uma combinação de cooperação internacional e de boas políticas internas» (44).

6.11.1

Os custos para os países em desenvolvimento decorrentes da aplicação destas políticas de progresso poderão ser, parcialmente, suportados por programas de cooperação e de ajuda ao desenvolvimento que tenham por alvo melhorar os comportamentos comerciais e sejam avaliados periodicamente.

6.12

Encontramo-nos, provavelmente, numa fase do processo de globalização em que é necessário prestar mais atenção às «preferências e sensibilidades colectivas» expressas pelos cidadãos para reduzir as tensões internacionais e evitar conflitos comerciais «ideológicos» que aumentam sem cessar e que os mecanismos e as regras existentes aparentemente não são capazes de resolver.

Bruxelas, 1 de Julho de 2004

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Os referidos têxteis técnicos encontram cada vez mais aplicações nos seguintes sectores: vestuário, agrotécnico, construção civil, na geotécnica, tecnologia doméstica, tecnologia para a indústria, tecnologia aplicada à medicina, tecnologia de transportes, tecnologia ambiental, tecnologia de embalagens, tecnologia aplicada aos sistemas de protecção, tecnologia desportiva. Vide anexo II.

(2)  Os países menos desenvolvidos são 49, dos quais 40 ACP (África, Caraíbas e Pacífico) e 9 não ACP, isto é, Afeganistão, Bangladesh, Butão, Camboja, Laos, Myanmar, Maldivas, Nepal e Iémen.

(3)  A audição contou com a presença da deputada europeia e presidente do Fórum Europeu de Têxteis, Vestuário e Curtumes, Concepciò FERRER i CASALS. A Comissão Europeia era representada por Luís Filipe GIRÃO, chefe da Unidade DG EMPRESAS e por Ghazi Ben AHMED da DG COMÉRCIO. Assistiram à audição 60 pessoas, entre as quais, italianos, alemães, franceses, turcos, lituanos e belgas.

(4)  Parecer: CESE 313/2004 (REX/141).

(5)  Conferência de 15 de Outubro de 2002«A indústria europeia do vestuário entra na tecnologia de ponta», no Centro Borschette, em Bruxelas. Conferência de 20 de Março de 2002«O futuro dos têxteis e do vestuário numa Europa alargada». Conferência de 5 e 6 de Maio de 2003«O futuro dos têxteis e do vestuário após 2005», no edifício Charlemagne, em Bruxelas.

(6)  Os «entes bilaterais» são constituídos por representantes dos pequenos empresários e trabalhadores que, guiando-se pelo princípio da mutualidade, intervêm para financiar acções de apoio, de actualização e de inovação em benefício de trabalhadores independentes e de assalariados das pequenas e microempresas.

(7)  Audição de 21 de Janeiro de 2004 e o ponto 13 das conclusões.

(8)  COM(2003) 452 final, de 24 de Julho de 2003.

(9)  COM(2003) 734 final, de 26 de Novembro de 2003.

(10)  COM(2003) 533 final, de 10 de Setembro de 2003.

(11)  São cerca de 1 000 as substâncias químicas geralmente utilizadas, num total de 5 000, que concorrem entre si no sector dos têxteis. A estas se adiciona uma quantidade não definida de misturas heterogéneas de outras substâncias, algumas das quais tóxicas. Estas são utilizadas na tinturaria e noutras transformações do tecido. Na UE as substâncias tóxicas são preventivamente seleccionadas, afastadas ou tratadas em conformidade com a legislação em matéria de ambiente e saúde. A imputação relativa dos custos continua a cargo das empresas europeias.

(12)  COM(2004) 101 final de 10.2.2004. Comunicação da Comissão: «Construir o nosso futuro em comum» — Parceria mundial, ponto C.

(13)  Eurostat: O PIB no mundo. Do PIB mundial que em 2002 ascendia a 34 biliões de euros, mais de 55 % estava nas mãos de cerca de 45 000 multinacionais.

(14)  Proposta de directiva COM(2003) 453 final de 1 de Agosto de 2003.

(15)  Por exemplo, os documentos COM(2001) 98 final de 1 de Março de 2001, COM(2001) 366 final de 18 de Julho de 2001, COM(2003) 21 final de 21 de Janeiro de 2003, COM(2002) 345 final de 1 de Agosto de 2003, COM(2001) 122 final de 7 de Março de 2001, COM(2002) 68 final de 6 de Fevereiro de 2002 e COM(2003) 27 final de 21 de Janeiro de 2003.

(16)  Parecer do CESE sobre o SPG (REX/141), pontos 6.6.2, 6.6.2.1, 6.6.2.2 e 6.6.2.3.

(17)  Convenção n.o 29 sobre o trabalho forçado, Convenção n.o 87 sobre a liberdade sindical e a protecção do direito sindical, Convenção n.o 98 sobre o direito de organização e de negociação colectiva, Convenção n.o 100 sobre a igualdade de remuneração, Convenção n.o 105 sobre a abolição do trabalho forçado, Convenção n.o 111 sobre a discriminação (emprego e profissão), Convenção n.o 138 sobre a idade mínima e Convenção n.o 182 sobre as piores formas de trabalho infantil.

(18)  Parecer do CESE sobre o SPG (REX/141) — ponto 6.6.3.

(19)  Venezuela, Argélia, Nigéria, Líbia, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Qatar, Kuwait, Iraque, Irão e Indonésia.

(20)  (Sistema de preferências generalizadas) pt. 6.6.1.2.

(21)  Idem.

(22)  Muitas vezes, os pequenos empresários desejariam passar da produção e da confecção de artigos fabricados à base de têxteis tradicionais para a produção de artigos fabricados à base de novos têxteis técnicos e inteligentes, mas não dispõem das informações nem dos conhecimentos necessários sobre os processos técnicos e comerciais que lhes estão associados.

(23)  A percentagem dos direitos aduaneiros depende do tipo de produto importado. É frequente serem são declarados produtos diferentes, com direitos mais baixos, dos efectivamente importados.

(24)  Livro Verde «O futuro das regras de origem nos regimes comerciais preferenciais» — COM(2003) 787, ponto 1.2.2.

(25)  Idem.

(26)  Regulamento n.o 1383/2003 de 22 de Julho de 2003 que entrará em vigor em 1 de Julho de 2004.

(27)  IP 03/1589 de 24 de Novembro de 2003.

(28)  Idem.

(29)  Idem.

(30)  Regime especial para a protecção dos direitos dos trabalhadores e regimes especiais para a protecção do ambiente e para suprimir a produção e tráfico de droga.

(31)  Anexo I ao Regulamento 2501/2001.

(32)  Fonte: Comissão da UE.

(33)  Entraves não pautais mais comuns: impostos ou tributações suplementares, preços mínimos para importações mínimas, despesas de avaliação na alfândega não repercutidas nos preços pagos pelas mercadorias importadas, práticas onerosas e discriminatórias ao nível da rotulagem e da marcação, regimes de autorização das importações e procedimentos de antecipação muito complexos.

(34)  Capítulos 17.1 a 17.6.

(35)  Fonte: Eurostat — A indústria transformadora na UE de 1992 a 2002.

(36)  Instituo Nacional de Estatística da Lituânia, 2003.

(37)  Instituo Nacional de Estatística da Estónia, 2003

(38)  Livro Verde «O futuro das regras de origem nos regimes comerciais preferenciais» — COM(2003) 787 final, de 18 de Dezembro de 2003.

(39)  Os tecidos de fibra de carbono e de kevlar são mais resistentes do que os metais tradicionais e são, além disso, mais leves e mais maleáveis.

(40)  Comparar com as actividades desenvolvidas pelo Conselho da CECA que confluíram no CCMI.

(41)  Aeroespacial, Comunicações e Aço.

(42)  Fonte: Eurostat, idem.

(43)  Fonte: Eurostat, Estrutura do Valor Acrescentado Bruto, 2002.

(44)  COM(2004) 101 final de 10.2.2004« Construir o nosso futuro em comum — Desafios políticos e recursos orçamentais da União alargada, 2007-201», p. 27 (n.o 2).


Anexo I ao Parecer da Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo

Foi rejeitada, recolhendo, contudo, pelo menos um quarto dos votos expressos, a seguinte proposta de alteração:

Pontos 6.1.1

Suprimir.

Resultado da votação

Votos a favor:

31

Votos contra:

32

Abstenções:

9


7.12.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 302/101


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «As áreas metropolitanas: implicações socioeconómicas para o futuro da Europa»

(2004/C 302/20)

Em 15 de Julho de 2003, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre o tema «As áreas metropolitanas: implicações socioeconómicas para o futuro da Europa»

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social emitiu parecer em 8 de Junho de 2004, sendo relator Joost VAN IERSEL.

Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 1 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 129 votos a favor, sem votos contra e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Síntese

1.1

No contexto do prosseguimento da política regional na União europeia, o CESE chama a atenção no presente relatório para a importância das áreas metropolitanas da Europa.

1.2

As áreas metropolitanas têm um significado fundamental para o futuro quer do ponto de vista económico quer demográfico. Mas não são poucos os desafios que estas terão de enfrentar. O facto é que até à data não tem havido qualquer interesse concreto nem da parte da União Europeia nem das instituições comunitárias por este tema.

1.3

O CESE defende que o desenvolvimento económico, social e ambiental das metrópoles europeias passe a ocupar um lugar cativo na agenda comunitária. Mas para tal são imprescindíveis não só dados concretos e intercâmbio de informações ao nível europeu por intermédio do Eurostat como também a atenção específica da Comissão.

1.4

É do interesse da União Europeia que, na sequência dos debates nacionais sobre a configuração futura das áreas metropolitanas, se lance um debate ao nível europeu e se apure a mais-valia que se pode esperar da União Europeia. O CESE realça especialmente a relação directa entre o papel das metrópoles europeias e a estratégia de Lisboa. Com efeito, a consecução dos objectivos da estratégia de Lisboa depende, em grande parte, da forma como estes forem concretizados nas áreas metropolitanas.

1.5

Por este motivo, o CESE preconiza que, para além da constituição do Fórum das Áreas Metropolitanas, este tema seja objecto de debate no Conselho Competitividade e no Conselho informal sobre Ordenamento do Território e Questões Urbanas.

2.   Introdução

2.1

Neste mundo em rápida mutação, assistimos por toda a parte a inovações económicas, tecnológicas e sociais que têm enormes repercussões não só sobre a indústria, os serviços e o mercado do trabalho, mas também no que diz respeito ao território e à sociedade e, por conseguinte, à forma de governar os países e as regiões.

2.2

O presente parecer do CESE centra-se nas áreas metropolitanas, isto é, grandes aglomerações e suas zonas de influência económica, por três razões principais, a saber: encontram-se no cerne destas transformações rápidas, contribuem fortemente para a estratégia europeia de crescimento e, por último, são parceiros de muitos outros centros de excelência europeus de dimensão mais modesta.

2.3

Uma área metropolitana é constituída por um núcleo central — cidade isolada ou aglomeração urbana — e por uma periferia composta por um conjunto de municípios contíguos em que parte significativa dos seus residentes se desloca ao núcleo central para trabalhar. Assim, a noção de área metropolitana aproxima-se da de bacia de emprego ou de região urbana funcional (1). Tem esta noção em conta a existência de zonas periféricas que gravitam em torno de um centro e em função do qual se expandem. As áreas metropolitanas estendem-se para englobar um espaço/tempo que pode representar uma hora de trajecto. Estas zonas compreendem espaços urbanos e espaços rurais.

2.4

Para ser reconhecido como fulcro de uma região metropolitana, o núcleo central deve satisfazer certos critérios como seja um número mínimo de habitantes (2) ou de postos de trabalho. Do mesmo modo, para que o município seja incluído na área metropolitana (3), é necessário um determinado limiar de intensidade de deslocações pendulares domicílio/ trabalho entre um município da periferia e o núcleo central. Na prática, estes mínimos foram fixados de forma arbitrária, pelo que a sua importância é variável. O facto de as definições não serem harmonizadas à escala europeia dificulta as comparações a nível internacional.

2.5

Na última década surgiu um novo tipo de áreas metropolitanas. Sempre que várias área metropolitanas funcionam em rede e que as suas bacias de emprego se sobrepõem, gera-se um conjunto policêntrico de áreas metropolitanas, como são por exemplo Randstad e a região Reno-Ruhr, respectivamente com 7 e 11 milhões de habitantes, a região de Viena-Bratislava, com 4,6 milhões, a região de Oresund, com 2,5 milhões e a região de Lille, com 1,9 milhões (4).

2.6

De acordo com a importância de que se revestem e das funções que exercem, as áreas metropolitanas têm uma projecção regional, nacional, europeia ou mundial. Segundo as últimas estimativas, a União Europeia conta cerca de 50 áreas metropolitanas com mais de um milhão de habitantes.

2.7

Importa assinalar que as áreas metropolitanas objecto do presente parecer abarcam territórios e realidades socioeconómicas que não correspondem às entidades administrativas regionais europeias do sistema NUTS (Nomenclatura das Unidades Territoriais para fins Estatísticos) utilizadas pelo Eurostat e as instituições europeias. O conceito de região administrativa na Europa é particularmente ambíguo. Salvo raras excepções, os limites geográficos destas regiões são ou mais amplos ou mais reduzidos do que os das áreas metropolitanas. (5) Por conseguinte, os territórios das regiões administrativas não são critério pertinente para analisar e comparar a evolução socioeconómica das metrópoles à escala europeia.

2.8

Em Fevereiro de 2004, a Comissão Europeia publicou o Terceiro Relatório sobre a Coesão, que abre novas pistas de discussão sobre política regional, progresso económico, desenvolvimento do território e desenvolvimento urbano. Em relação ao futuro, o terceiro relatório clarifica o nexo existente entre a política regional e a estratégia de Lisboa. Com a política de coesão, a política de cooperação territorial e o emprego, a competitividade será o terceiro pilar da política regional. Deste ponto de vista, o Terceiro Relatório vinca o papel das cidades e das grandes aglomerações.

2.9

O impulso para introduzir novas abordagens e ideias inovadoras nasce essencialmente da globalização, da realização do mercado único (inclusivamente nos novos Estados-Membros) e da estratégia de Lisboa. Para as regiões metropolitanas, como é óbvio, não se trata apenas de política regional, mas também de política industrial, de conhecimento, de transportes, de redes transeuropeias, de desenvolvimento sustentável e de qualidade de vida.

2.10

A atenção crescente ao «renascimento urbano» é um fenómeno mundial e tema de actualidade na maior parte dos Estados-Membros da União.

2.11

A situação das áreas metropolitanas e a questão da sua governação nunca foram estudadas em profundidade na União Europeia e, por conseguinte, nunca constituíram um objectivo específico das políticas comunitárias. O CESE considera que chegou o momento de aprofundar a análise e de examinar de que maneira uma boa governação regional, com a participação de todos os actores presentes nesses territórios, pode ser benéfica para as populações locais e para a União Europeia em geral. Um exame da situação das áreas metropolitanas só será concludente se assentar em dados quantitativos fidedignos e comparáveis à escala europeia. Como estes escasseiam na maior parte dos casos, o CESE considera que a União Europeia deveria envidar todos os esforços para que seja possível elaborar dados que satisfaçam estes critérios.

3.   Situação das áreas metropolitanas

3.1

Mais de três quartos da população europeia vive em zonas urbanas ou periurbanas. Existe uma ligação directa entre a Estratégia de Lisboa e as áreas metropolitanas, concentrando-se nestas grande parte dos factores que estão na base da competitividade da Europa. São as metrópoles que difundem a inovação e a informação para as outras cidades europeias. A prosperidade das áreas metropolitanas é, portanto, condição necessária para resolver os problemas de coesão social e territorial que se colocam nos seus próprios territórios e nas outras cidades ou regiões europeias.

3.2

Na Europa, como aliás no resto do mundo, as áreas metropolitanas estão confrontadas com vários desafios cruciais: a globalização, ligada aos processos de integração dos mercados internacionais de bens, de serviços, de capitais, de conhecimentos e de mão-de-obra não qualificada e não qualificada, que traz consigo a rápida transformação dos sistemas de produção; o desenvolvimento sustentável que requer uma gestão prudente dos recursos naturais; a coesão social; a qualidade de vida e a coesão territorial.

3.2.1

Numerosas cidades e metrópoles estão a adaptar eficazmente as estruturas económicas, sociais e institucionais. É o caso das regiões urbanas mais fortes, verdadeiros nós de redes de comunicação nacionais e internacionais, servidas por todos os modos de transportes rápidos e por redes de telecomunicação de alta frequência, cuja economia assenta, há muito, na actividade diversificada e, em particular, em serviços de alto nível de qualidade às pessoas e às empresas. Depois de terem atravessado um período de crise, algumas regiões, outrora dependentes das indústrias tradicionais, são hoje um excelente exemplo desta evolução. Lille Barcelona e Bilbao ilustram este processo de reestruturação.

3.2.2.

Nos dez novos Estados-Membros da União Europeia algo de semelhante se passa, por exemplo, nas áreas metropolitanas de Varsóvia, Praga e Budapeste.

3.3

A política regional comunitária tem vindo a prosseguir, há já alguns anos, o objectivo de melhorar as condições de crescimento, emprego e competitividade das regiões menos desenvolvidas, tendo sido criados, para o efeito, programas específicos e instaurado um sistema sofisticado de repartição de recursos financeiros. Graças a estas políticas comunitárias, a maior parte das regiões envolvidas deram passos em frente e, por vezes, realizaram progressos notáveis.

3.4

Por conseguinte, a análise das regiões europeias cingiu-se às que beneficiaram dos fundos estruturais.

3.5

Não se podem ignorar os desenvolvimento económicos e sociais, mais ou menos favoráveis, que se verificaram nas outras regiões. No entender do CESE, é necessário analisar estas evoluções em profundidade ao nível europeu, sobretudo na perspectiva da discussão sobre o Terceiro Relatório sobre Coesão Regional, que tem em vista abrir novas pistas de intervenção. Uma análise deste tipo pode melhorar ulteriormente a nossa compreensão das actuais transformações económicas e dos seus efeitos sobre a evolução das sociedades e as condições de vida e de trabalho. Pode também permitir rever determinadas políticas europeias no sentido de apoiarem capazmente as exigências específicas de desenvolvimento das regiões, incluindo o das áreas metropolitanas.

3.6

Um pouco por toda a parte — nos países de poder centralizado e naqueles em que vigora a descentralização de competências — debate-se a questão de um equilíbrio, novo e desejável, entre centralização e descentralização, segundo novas abordagens que as autoridades estão a examinar (da base para o topo e do topo para a base). Estes processos, como é óbvio, são difíceis de pôr em prática devido a hábitos de governo institucionalizados e a interesses enraizados nas regiões em questão. Apesar destes bloqueios, é inegável a tendência para reconhecer que o bem-estar e a prosperidade dos cidadãos e das empresas passam pela gestão integrada das áreas metropolitanas.

3.7

Existem várias categorias de áreas metropolitanas. Por um lado, as megametrópoles como Londres, Paris Reno-Rhur, Randstad e Madrid, com uma população superior a 5 milhões de habitantes e, por outro lado, uma série de áreas metropolitanas de menor dimensão, mas por vezes prósperas e com forte potencial de desenvolvimento e de grandes ambições, como as que circundam as capitais e os grandes centros económicos de quase todos os Estados-Membros.

3.8

Como atrás referido, alguns destes centros económicos foram, outrora, zonas em declínio, entretanto revitalizadas graças ao empenho comum das forças vivas (públicas e privadas) da região. De referir, também, que as áreas metropolitanas dos novos Estados-Membros se encontram numa fase de transição e estão a criar vantagens comparativas para se tornarem competitivas nos mercados internacionais.

3.9

As regiões metropolitanas que se manifestam a nível europeu são cada vez mais numerosas. A partir de 2003, o grupo das áreas metropolitanas alemãs organizou-se em torno do projecto «Regiões do Futuro». No mesmo ano, o governo britânico convidou algumas regiões a definirem estratégias para se tornarem competitivas a nível mundial. O governo dinamarquês apoia de bom grado a iniciativa de cooperação transfronteiras em curso entre as cidades de Copenhaga e Malmö (Suécia) destinada a criar um grande centro económico no Báltico. Nos Países Baixos, é muito recente a promoção de Randstad como área metropolitana de nível internacional. Na mesma linha se inscrevem os programas de gestão territorial de Barcelona e Bilbao, em Espanha, e outros mais que poderíamos citar.

3.10

Nos Estados-Membros a regionalização instala-se progressivamente, o que tem repercussões sobre a organização da governação nas áreas metropolitanas e a capacidade que estas têm para conduzir o desenvolvimento económico. Ao mesmo tempo, alguns governos desempenham um papel activo no que toca ao desenvolvimento económico das grandes cidades. É disto exemplo a iniciativa do governo britânico de criar um grupo de trabalho composto por oito principais Core Cities (cidades-centro), nove agências regionais de desenvolvimento e vários serviços ministeriais, a fim de definir um programa de acções para melhorar os resultados económicos das metrópoles e, por conseguinte, a competitividade do país. Na sequência da publicação, em França, de um relatório sobre as cidades europeias (6), o Governo definiu uma estratégia nacional para aumentar a projecção das metrópoles francesas à escala europeia (7).

3.11

A história recente mostra claramente que atravessamos um período em que está a emergir uma nova atitude perante o desenvolvimento das grandes regiões urbanas, ainda que só a nível nacional existam (na melhor das hipóteses) estruturas de consulta sobre a matéria. Paralelamente a estas estruturas de consulta nacional, decorrem iniciativas para promover plataformas europeias onde os principais actores do desenvolvimento urbano se podem reunir. São exemplo disto as Eurocidades, em torno do tema da sociedade do conhecimento e, mais recentemente, a Metrex, rede das regiões e áreas metropolitanas europeias. No entanto, estes encontros são em geral esporádicos, mas, ao mesmo tempo, nota-se um clima propício a iniciativas mais estruturadas.

4.   Dinâmicas em curso

4.1

A metropolização é um processo que se caracteriza pela multiplicação das grandes aglomerações e pela crescente concentração de população, actividades e produção de riqueza num espaço geográfico em expansão, mas com contornos imprecisos. Em muitos casos, este crescimento é acompanhado de fragmentação social e espacial (segregação social, especialização espacial, criminalidade e insegurança). Ao contrário da cidade, a metrópole não dispõe de órgão político, devendo resolver os seus problemas através de múltiplas negociações com diversos actores. A fragmentação espacial pode refrear e dificultar investimentos públicos e privados. Uma política regional que vise reduzir este fenómeno e conciliar a governação das áreas metropolitanas com as dinâmicas em curso é, por conseguinte, salutar. As áreas metropolitanas de Barcelona e de Estugarda são exemplos válidos neste campo, e põem em evidência o papel positivo da sociedade civil.

4.2

Processo de mundialização: as zonas urbanas europeias estão estruturadas por processos e dinâmicas que se enquadram cada vez mais num contexto mundial. As grandes cidades europeias são as articulações de um esqueleto mundial de metrópoles em constante evolução, no qual Nova Iorque, Londres, Tóquio, Hong Kong, mas também Francoforte, Paris, Radstad, Bruxelas, Milão ou Madrid desempenham um papel de primeiro plano. Estas áreas metropolitanas «pilotam» a economia mundial através das instituições internacionais, dos bancos e das grandes empresas internacionais que nelas estabeleceram as sedes de comando e de controlo, mercê das tecnologias de informação e de comunicação. Nos próximos anos as principais metrópoles asiáticas farão parte desta estrutura mundial.

4.3

Processo de europeização: o processo interactivo de adaptação das políticas económicas, sociais, ambientais e de ordenamento do território à integração e ao alargamento da Europa. A realização, ainda em curso, do mercado único, o euro e o alargamento vão continuar a contribuir para o fenómeno de integração e de dispersão da actividade económica no território europeu. Quanto mais as fronteiras nacionais se esbaterem, mais os pólos económicos tenderão naturalmente a reforçar-se à escala continental. A organização progressiva de pólos inter-regionais e, eventualmente, transfronteiras (Copenhaga-Malmö, Limburgo neerlandês-Limburgo belga-Aquisgrana (Aachen), metrópole franco-belga de Lille) mostra que o desenvolvimento económico vai passar a ignorar cada vez mais as fronteiras políticas e administrativas, tantas vezes artificiais, herdadas do passado.

4.4

As áreas metropolitanas são os principais centros da investigação, da inovação e da criação de novas actividades, nelas se concentrando as actividades de alto valor acrescentado, em especial os serviços às empresas. As novas tecnologias da informação e comunicação desempenham, neste contexto, um papel primordial, sendo também nas áreas metropolitanas – como local privilegiado para a inovação, a sociedade do conhecimento e a formação — que principalmente se concretiza a dinâmica económica.

4.5

Estas áreas estão ligadas entre si por uma grande diversidade de redes físicas e virtuais, em função da dimensão e da importância dos pólos económicos presentes nas várias regiões. Este processo tende a ampliar-se e intensificar-se, mercê especialmente da política europeia de transportes (Transport European Networks) e da liberalização do sector aéreo.

4.6

A estratégia de Lisboa, que visa criar uma economia competitiva assente no conhecimento e baseada na coesão social e na sustentabilidade, reveste-se de particular significado, podendo a sua execução constituir até uma nova missão para as áreas metropolitanas.

4.7

Esta nova missão é, em parte, fruto do peso crescente das redes na sociedade, as quais modificam os pressupostos do bem-estar, atraem novos investimentos e introduzem novas formas de abordar a educação dos jovens e o mercado de trabalho em geral. O recente interesse pelas cidades e pelas áreas metropolitanas está ligado às novas tecnologias aplicadas, designadamente as TIC (Tecnologias da Informação e Comunicação) e as redes Internet com débito de acesso, que têm um impacto considerável na vida dos cidadãos e das empresas. Actualmente, as TIC influenciam consideravelmente as estruturas de produção e dos serviços e, por conseguinte, o ordenamento do território e a evolução das cidades e das áreas metropolitanas.

4.8

A internacionalização dos investimentos, a mobilidade dos cérebros e a interacção entre universidades, institutos de tecnologia e sector privado poderão promover clusters económicos segundo o célebre modelo «Porter diamond». Trata-se de uma base importante da sociedade em rede (network society), na qual as áreas metropolitanas desempenham uma função de primeiríssimo plano.

4.9

As áreas metropolitanas são também importantes pólos culturais, turísticos e de lazer, sendo o seu património arquitectónico um elemento fundamental da sua história e da sua identidade. As universidades, bibliotecas, museus, teatros, óperas, salas de espectáculo, são locais privilegiados para a conservação e a difusão da cultura europeia. A função das áreas metropolitanas é importante na criação e difusão da cultura, sobretudo da cultura popular, sendo também nestas metrópoles que se realizam os principais encontros desportivos e os concertos musicais que atraem as multidões.

4.10

O cosmopolitismo é um elemento muito importante para o desenvolvimento da indústria dos media. Esta indústria – imprensa, edição, radio, televisão, cinema, vídeo, publicidade, telecomunicações — e de uma forma geral as indústria de criação são nas áreas metropolitanas um sector de actividade em plena expansão.

4.11

Actores, grupos socioeconómicos e organizações culturais mobilizam-se para reinventar processos de integração e de participação. Juntamente com a acção das autoridades públicas, a sociedade civil desempenha um papel muito importante na dinâmica urbana; muitos dos casos de sucesso em zonas metropolitanas devem-se, em grande medida, à cooperação e à interacção entre sector público e privado.

4.12

Cooperação e interacção são determinantes para as áreas metropolitanas e a experiência mostra que é possível desenvolvê-las mais facilmente e obter melhores resultados ao nível de grandes entidades territoriais do que a nível nacional. A escala da área metropolitana é, em princípio, a mais adequada para definir os objectivos de ordenamento de uma região urbana com todos os actores envolvidos e accionar os meios necessários para o efeito.

4.13

Ao contrário do que sucede nos Estados Unidos, as cidades europeias tendem hoje a desenvolver-se como centros urbanos e como aglomerações. Os centros das cidades funcionam também como núcleo de actividade e local de encontro. O papel das áreas metropolitanas é igualmente determinante para reforçar o modelo de sociedade europeia.

4.14

A economia europeia está a atravessar uma fase de transição crucial devido ao processo de alargamento e de integração do mercado único, o qual gera um duplo jogo de concorrência e de parceria entre territórios e, em particular, entre áreas metropolitanas, que desempenham um papel decisivo nestas dinâmicas complexas. No entanto, o facto de não existirem órgãos de governo à escala das áreas metropolitanas enfraquece-as quando se trata de definir e aplicar estratégias de desenvolvimento económico competitivas e realizar acções de parceria.

5.   Aspectos sociais específicos

5.1

As grandes cidades vivem problemas de coesão social e de desequilíbrio territorial muito mais graves do que noutros territórios. As áreas metropolitanas podem ser os locais por excelência para restabelecer equilíbrios sociais e territoriais na União Europeia. Mas tais melhorias só verão a luz do dia num contexto de desenvolvimento económico sustentável e duradouro.

5.2

Cada área metropolitana tem o seu próprio perfil, mas, um pouco por toda a Europa, registam-se fenómenos semelhantes, não obstante diferenças de ordem cultural, social e de desenvolvimento económico. Felizmente, na maior parte dos casos, os intervenientes, sejam eles do sector público ou privado, estão cada vez mais conscientes de que é necessário melhorar as condições de vida e de trabalho de todos os cidadãos, embora se tenha de admitir que o caminho a percorrer ainda é longo.

5.3

Sempre que há reestruturações económicas, a passagem de um ciclo económico para outro provoca forte desemprego, sobretudo entre os jovens e as pessoas de mais de cinquenta anos. Este fenómeno afecta muito particularmente as áreas metropolitanas. Convém assinalar que este processo doloroso conduz frequentemente à criação de actividades inovadoras que geram novos empregos mais adequados às exigências futuras.

5.4

A reestruturação económica implica também deslocalizações, em especial das actividades tributárias de mão-de-obra, o que tende a criar desemprego estrutural nas regiões de mono-indústria. Este fenómeno ocorre também nas áreas metropolitanas, mas elas conseguem frequentemente modificar a sua base económica. Nestes processos de modernização assiste-se, muitas vezes, à transição de uma forte base industrial para uma sociedade de serviços e de alta tecnologia, por exemplo nas regiões de Bilbao, Lille e Reno-Ruhr.

5.5

A União está confrontada com um fluxo crescente de migrantes oriundos de países terceiros. Não obstante diferenças significativas na maneira como os países e as cidades inserem os imigrantes, este desafio é colocado a toda a Europa e questiona muito particularmente as áreas metropolitanas. O CESE solicitou em vários pareceres que a União se dote de legislação comum sobre imigração e asilo. A União absorverá novos migrantes económicos por razões demográficas, sociais e de emprego (8). Tratar-se-á de pessoas muito qualificadas mas também pouco qualificadas. A legislação comunitária deve promover a imigração legal e erradicar a clandestina. A União deva ainda favorecer a inserção dos migrantes na sociedade de acolhimento e evitar discriminações (9).

5.6

Em inúmeras cidades e áreas metropolitanas, assiste-se à concentração de migrantes que encontram sérias dificuldades para aceder a postos de trabalho de qualidade, em virtude da falta de qualificações profissionais, do escasso conhecimento da língua, das discriminações sociais e da falta de política de integração. Esta situação origina desigualdades em matéria de rendimento e, por conseguinte, de habitação e de acesso aos serviços públicos, incluindo a educação e saúde. Os bairros pobres gravemente afectados por este problema requerem maior atenção.

5.7

A metropolização acentua muitas vezes as desigualdades sociais e agrava as disparidades ligadas ao espaço. Os grupos sociais desfavorecidos, entre os quais grande número de jovens desempregados e pessoas de idade com baixos rendimentos, concentram-se em determinados bairros que acumulam inúmeras desvantagens. A exclusão das populações desfavorecidas e a insuficiente qualidade dos serviços públicos nesses bairros auto-alimentam-se e acabam por atirar as pessoas para verdadeiros becos sem saída. Casos há em que as forças de exclusão urbanas se acumulam e persistem mesmo depois de alguns anos de políticas de reabilitação de bairros degradados. Por isso, é necessário empreender uma acção em grande escala, coordenada ao nível da área metropolitana.

5.8

As segurança nas áreas metropolitanas passou a ser uma questão preocupante que pode ter repercussões consideráveis na coesão social e no desenvolvimento equilibrado. Paradoxalmente, elas estão mais expostas a certos riscos em virtude das vantagens que lhes são próprias e das suas características demográficas. Por um lado, o funcionamento do sistema corre o risco de ser fragilizado, quando um factor de insegurança, mesmo mínimo, atinge um dos seus elementos vitais. Por outro lado, as características metropolitanas favoreçam os fluxos de pessoas e de bens propícios ao desenvolvimento de actividades ilícitas, em ligação com redes de criminalidade nacionais e internacionais. Ao oferecerem anonimato, logística e base de recrutamento, as áreas metropolitanas podem também facilitar a presença de movimentos activistas. Os centros nevrálgicos das metrópoles são alvos privilegiados de novas formas de terrorismo, sendo esta evolução preocupante no contexto político actual.

5.9

A defesa do ambiente e o respeito dos objectivos de desenvolvimento sustentável são outros tantos desafios para as áreas metropolitanas que devem respeitar os compromissos internacionais como o Protocolo de Quioto, a Agenda 21, o Tratado de Maastricht e os programas comunitários de desenvolvimento sustentável de 1993 e 1998. Para tal, têm de conciliar desenvolvimento económico e protecção do ambiente, podendo estes reforçar-se mutuamente através da organização do desenvolvimento urbano (sistema de transportes, criação de zonas de habitação, gestão dos resíduos e das águas residuais, redução do ruído, protecção dos centros históricos, salvaguarda do património natural e agrícola, etc.).

5.10

O rápido crescimento de algumas áreas metropolitanas, a par do desenvolvimento e da intensificação da respectiva actividade económica, constitui um desafio que requer novas infra-estruturas e possibilidades de transportes públicos e privados. Razões de ordem ambiental e económica impõem soluções tecnológicas avançadas para obviar aos problemas de congestão. Toda e qualquer política ambiental comporta custos elevados para os sectores público e privado. Ora, em geral, os financiamentos públicos são insuficientes e, por enquanto, modestos os resultados da parceria entre os dois sectores.

5.11

Os problemas das zonas metropolitanas acentuam-se ainda mais, quando a gestão administrativa não acompanha o ritmo do desenvolvimento económico, do aumento da população, do parque habitacional e das deslocações pendulares casa/trabalho. Nas áreas metropolitanas, a gestão administrativa é, muitas vezes, obsoleta, o que obsta ao bom funcionamento da administração e, por conseguinte, à condução de uma política económica eficaz. A boa coordenação entre gestão administrativa e os agentes económicos e, em geral, entre os sectores público e privado, é condição indispensável da boa governação das áreas metropolitanas.

5.12

Mas neste campo, as situações são muito diversas. Por vezes, a área metropolitana é mais pequena do que a zona administrativa a que pertence, mas, na maior parte dos casos, abarca mais do que uma zona administrativa. Quase sempre uma área metropolitana é formada por vários municípios ou unidades administrativas. As autoridades regionais e nacionais consideram estas situações como um dado adquirido e inquestionável.

5.13

Cada governo adopta métodos próprios para encontrar soluções. As grandes cidades tentam aprender umas com as outras, mas existem poucas consultas e intercâmbios a nível da União para se poder estabelecer termos de comparação ou critérios de boas práticas.

5.14

Se bem que os fenómenos descritos sejam comuns a todas a áreas metropolitanas, existem grandes discrepâncias na maneira como cada uma delas lida com a situação. Existem numerosos exemplos de governos regionais que lograram mudar o curso dos acontecimentos e criar novos modelos para o futuro, geralmente com o apoio do governo nacional e em colaboração com o sector privado e a sociedade civil organizada. Realizando tais políticas, as regiões melhoram as suas condições socioeconómicas, tornando-se mais competitivas e socialmente mais aptas para responder às novas exigências. A União Europeia deveria aproveitar estes exemplos e instaurar formas de consulta para identificar as melhores práticas e discutir as modalidades e os instrumentos de que dispõe para melhorar a situação.

6.   Dados europeus regionais e áreas metropolitanas

6.1

O sistema estatístico europeu desenvolveu-se em função das políticas comunitárias. É graças à PAC que se conhece o número de bovinos e de suínos, mas desconhece-se o emprego e o valor acrescentado por sector de actividade das grandes cidades e a respectiva esfera de influência económica, porque não existe uma política específica, mas também porque são escassos os meios que a Europa tem consagrado às estatísticas urbanas. A Unidade de Eurostat que se ocupa das cidades-regiões tem apenas 5 pessoas. Os meios de que Eurostat dispõe não estão à altura da importância da missão que lhe incumbe.

6.2

Os estudos socioeconómicos comparativos sobre as áreas metropolitanas, realizados à escala europeia por organismos ligados ao desenvolvimento económico e à promoção regional, por universidades, por consultores e pela Comissão Europeia, cingem-se na maior parte dos casos a descrições vagas e incompletas, baseando-se essencialmente em estatísticas regionais publicadas por Eurostat. Estas estatísticas têm a vantagem de integrar definições estatísticas harmonizadas a nível europeu, mas também o grande inconveniente que é o facto de a subdivisão regional de Eurostat e da Nomenclatura das Unidades Territoriais Estatísticas (NUTS) ser um mosaico de unidades administrativas nacionais que correspondem às delimitações que foram surgindo ao longo da história política e administrativa de cada país. Salvo raras excepções, aquelas subdivisões, porque desajustadas do ponto de vista geográfico, não permitem apreender e comparar com fiabilidade as realidades económicas, sociais e ambientais das áreas metropolitanas à escala europeia. A subdivisão NUTS não foi concebida para este fim.

6.3

Por consequência, as estatísticas de Eurostat não permitem acompanhar a evolução demográfica da população, a evolução das actividades, do desemprego e da produção das áreas metropolitanas e, por conseguinte, avaliar e comparar indicadores estratégicos, como sejam os ritmos de crescimento da população, do valor acrescentado da produção, do emprego, do desemprego e da produtividade global por emprego. Os resultados dos estudos sobre as áreas metropolitanas efectuados por consultores privados ou por organismos públicos nacionais mostram que a ausência de dados fiáveis e geograficamente comparáveis pode levar a conclusões não só erradas como, por vezes, contraditórias quanto aos desenvolvimentos socioeconómicos «observados» nas áreas metropolitanas europeias (por exemplo no que diz respeito à evolução da produtividade numa determinada).

6.4

A falta de dados sobre a evolução socioeconómica das regiões e das áreas metropolitanas da Europa é prejudicial essencialmente por dois motivos:

6.4.1

as áreas metropolitanas são os motores do crescimento. A actividade económica que geram e as vantagens daí decorrentes irradiam para outros centros urbanos nacionais. Para tirar o maior partido das oportunidades e dos condicionalismos ligados às mudanças operadas no contexto internacional, é necessário que as áreas metropolitanas possam dispor de avaliação dos seus desempenhos à escala europeia regularmente actualizada;

6.4.2

também é desejável efectuar ao nível europeu análises e comparações de aspectos importantes, tais como os problemas respeitantes à imigração, à qualidade de trabalho, à pobreza e exclusão, ao ambiente e à imigração, etc.

6.5

Os Estados Unidos produzem, há várias décadas, elevado número de dados comparáveis e actualizados sobre as suas 276 áreas metropolitanas e colocam-nos à disposição de todos os interessados na Internet (10). Visto que cada Estado-Membro possui a sua própria definição de cidade (e por vezes de metrópole) é muito mais difícil encontrar uma definição de área metropolitana que seja comum. Dado que para aplicar a estratégia de Lisboa é necessário dispor de dados fiáveis e comparáveis sobre as áreas metropolitanas europeias, o Comité Económico e Social Europeu considera que é tempo de o Eurostat as delimitar, em colaboração com os institutos nacionais de estatística e de recolher dados pertinentes.

6.6

A auditoria lançada pela Comissão no âmbito do programa Urbain II, e actualmente em fase de realização, fornecerá dados sobre as condições de vida da população nas 258 cidades e aglomerações. Este projecto representa um enorme progresso nas reflexões sobre a coesão social, mas, não permitirá obter indicadores socioeconómicos comparáveis à escala europeia sobre as regiões metropolitanas. Com efeito, os indicadores são avaliados ao nível das cidades e das aglomerações urbanas de cada país segundo a respectiva definição nacional. Os indicadores para Londres, Paris e Berlim serão avaliados dentro dos limites das respectivas regiões administrativas (Grande Londres, Île-de France e Land de Berlim).

6.7

O projecto ORATE (Observatório em Rede do Ordenamento do Território Europeu), que tem em vista um melhor conhecimento do território, está confrontado com a falta de dados económicos ao nível municipal, mas também ao nível dos NUTS III, em todo o território europeu, patenteando assim as numerosíssimas lacunas do sistema estatístico europeu.

6.8

O atrás exposto vem sublinhar que o Eurostat tem de dispor de mais recursos financeiros e humanos para produzir dados fiáveis e comparáveis sobre as cidades e as áreas metropolitanas.

6.9

Um estudo recente contendo dados extraídos de um inquérito europeu às forças do trabalho, realizado nas áreas metropolitanas da Europa do Noroeste de mais de um milhão de habitantes, merece ser divulgado (11), pois mostra que é possível produzir, a baixo custo, numerosos dados socioeconómicos comparáveis à escala europeia, para as áreas metropolitanas de grande dimensão delimitadas por critérios comuns, utilizando um inquérito efectuado anualmente pelos Institutos Nacionais de Estatística com a coordenação do Eurostat. A título experimental, é desejável alargar este estudo às outras grandes metrópoles europeias.

7.   Conclusões e recomendações

7.1

Na última década sucedem-se as análises e discussões em vários Estados-Membros, e também a nível regional, acerca da nova realidade que são as áreas metropolitanas na Europa. Se bem que o protagonismo nacional e internacional destas áreas seja maior do que outrora, ainda não foi devidamente reconhecido o papel que elas desempenham na execução da Estratégia de Lisboa.

7.2

As áreas metropolitanas são o local privilegiado para a realização dos objectivos económicos, sociais e ambientais da Estratégia de Lisboa, porque são os principais territórios para a formação, investigação, inovação, tecnologias de ponta, criação de actividades novas e a promoção do espírito empresarial. São também os principais nós de transporte e de telecomunicações, o que facilita a ligação em rede das empresas, universidades e centros de investigação. O CESE sublinha que uma melhor mobilização do potencial de crescimento económico da Europa carece da participação activa de todos os agentes públicos e privados que trabalham para o desenvolvimento sustentável das áreas metropolitanas. Ou seja, tendo em consideração o papel que as áreas metropolitanas desempenham na Europa, os objectivos da Estratégia de Lisboa não serão alcançados se não forem realizados nas áreas metropolitanas.

7.3

Uma das principais razões por que os governos não prestam a devida atenção a este fenómeno prende-se com o facto de que os limites das regiões politico-administrativas só raramente coincidem com os limites geográficos das áreas metropolitanas. Por conseguinte, salvo algumas excepções, não existem dados fiáveis e comparáveis à escala europeia que permitam descrever a situação socioeconómica e as dinâmicas em curso.

7.4

O CESE sublinha que a União Europeia tem todo o interesse em que:

se definam as áreas metropolitanas dos 25 países da União;

se produzam todos os anos dados pertinentes em todos aqueles territórios, especialmente dados dos inquéritos europeus às forças do trabalho;

se avaliem nesses territórios os principais indicadores da Estratégia de Lisboa;

se identifiquem neles clusters de alto valor acrescentado;

a Comissão apresente regularmente um relatório sobre a situação socioeconómica das áreas metropolitanas.

7.5

Produzir este tipo de informações e colocá-las a disposição de todos os interessados teria resultados vantajosos, pois permitiria:

contribuir para o reconhecimento das áreas metropolitanas e para melhor conhecer a sua realidade social, económica e ambiental;

facilitar a avaliação dos pontos fortes e das fraquezas destes territórios à escala europeia;

melhorar a definição e aplicação das políticas europeias e nacionais, adaptando-as às características específicas dos territórios;

fornecer aos governos regionais e locais uma avaliação da posição dos territórios em termos de concorrência à escala europeia, porquanto a avaliação ou ainda não existe ou, quando existe, é onerosa e feita em bases pouco fiáveis;

enriquecer o debate sobre a política regional europeia, facilitando o diálogo entre todas as partes envolvidas a partir de bases objectivas;

facultar ao sector privado informações úteis à definição pertinente das estratégias de empresas.

7.6

O CESE apoia plenamente a proposta feita pela METREX em 2003 de criar um programa europeu consagrado às áreas metropolitanas (12). Esse programa — o Metropolitan — poderia tornar-se um fórum de encontro e de troca de pontos de vista, mas também incluir grupos de trabalho encarregados de definir e difundir as boas práticas nos domínios tratados no presente parecer.

7.7

O CESE regozija-se com a importância conferida à «competitividade» e ao nexo que o Terceiro Relatório sobre Coesão Social estabelece entre a política regional tal como foi agora definida e a estratégia de Lisboa, aspecto que se reveste de particular significado para as áreas metropolitanas. Para estas áreas, alguns dos objectivos de «competitividade» e «conhecimento» poderão ser financiados pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional.

7.8

O CESE considera indispensável que se crie uma célula «áreas metropolitanas» no Eurostat, a quem caberá produzir anualmente os dados atrás referidos.

7.9

As dificuldades que possam surgir para definir os limites geográficos de todas às áreas metropolitanas para produzir informações e dados comparáveis não podem servir de pretexto à inacção. Por conseguinte, o CESE sugere que se lance, quanto antes, um programa-piloto sobre um número limitado de áreas metropolitanas, que satisfaça as recomendações acima descritas. Sugere também que o programa-piloto seja realizado em parceria entre a DG de Política Regional, o Eurostat, os institutos nacionais de estatística e as áreas metropolitanas em causa.

7.10

O CESE espera que as instituições europeias apoiem as orientações gizadas neste parecer. Por isso, o Comité deseja que, paralelamente à constituição de um fórum que reuna as áreas metropolitanas e a Comissão, este tema seja objecto de debate no Conselho Competitividade e no Conselho informal sobre Ordenamento do Território e Questões urbanas.

Bruxelas, 1 de Julho de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  No seu parecer de 14 de Maio de 1988«Para uma agenda urbana da União Europeia», o Comité das Regiões desenvolveu o conceito de zona urbana funcional para descrever a metrópole e sua área de influência, reconhecendo-se desta forma que as cidades se transformaram em aglomerações, depois em metrópoles, que se expandiram para formar regiões urbanas. O conceito sublinha igualmente as relações de interdependência entre as unidades territoriais que foram a zona urbana: mercado de trabalho, deslocações pendulares entre o domicílio e o trabalho, redes de transporte, centros comerciais, localização das actividades novas, mercado imobiliário, parques de lazer, protecção do ambiente.

(2)  Por exemplo, 500 000 habitantes (limiar adoptado por METREX); ver em anexo a lista das aglomerações europeias de mais de 500 000 habitantes.

(3)  Por exemplo, 10 % da população activa que trabalha no núcleo central e que reside nos municípios da periferia (limiar adoptado por GEMACA).

(4)  A Randstad é composta pelas aglomerações de Amesterdão, Haia, Roterdão e Utreque. A região do Reno-Ruhr compreende as aglomerações de Bona, Colónia, Dusseldórfia, Duisburgo, Essen e Dortmund. A região de Viena-Bratislava é constituída pelas aglomerações de Viena e de Bratislava, a de Oresund pelas aglomerações de Copenhaga e Malmö, ao passo que a região de Lille franco-belga compreende algumas cidades de média dimensão e um grande número de cidades e de vilas mais pequenas.

(5)  Por exemplo, Londres: 7 400 000 habitantes na região administrativa (NUTS 2) e 13 230 000 na área metropolitana.- Departamento do Norte (NUTS 3): 2 600 000 habitantes e 9 700 000 para a parte francesa da área metropolitana de Lille.

(6)  «Cities, regions and competitiveness», Office of the Deputy Prime Minister and other public partners, Junho de 2003).

(7)  Les villes européennes, analyse comparative — Celine Rozenblat, Patricia Cicille (DATAR, 2003)

(8)  www.datar.gouv.fr — CIADT, de 13 de Dezembro de 2003.

(9)  COM(2003) 336 final, Comunicação sobre a imigração, a integração e o emprego

(10)  Parecer do CESE sobre «Imigração, integração e emprego», JO C n.o 80 de 30.3.2004, pág. 92.

(11)  http://data.bls/gov/servlet/SurveyOutputSerlet.

(12)  Estudo realizado no âmbito do programa INTERREG por GEMACA (Group for European Metropolitan Comparative Analysis). Publicado nos Cadernos IAURIF n.o 135, www.iaurif.org/en/doc/studies/cahiers/cahier_135/index.htm.