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Jornal Oficial
da União Europeia

PT

Série C


C/2023/1389

6.12.2023

RECOMENDAÇÃO DO CONSELHO

de 12 de junho de 2023

relativa ao reforço do diálogo social na União Europeia

(C/2023/1389)

O CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA,

Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), nomeadamente o artigo 292.o em conjugação com o artigo 153.o, n.o 1, alínea f),

Tendo em conta a proposta da Comissão Europeia,

Considerando o seguinte:

(1)

O Conselho, nas suas Conclusões de 24 de outubro de 2019, intituladas "O futuro do trabalho: a União Europeia promove a Declaração do Centenário da OIT" incentiva os Estados-Membros a prosseguirem os seus esforços para ratificar e aplicar as convenções e protocolos da OIT atualizados. O Conselho apela igualmente aos Estados-Membros e à Comissão para que reforcem o diálogo social a todos os níveis e em todas as suas formas, incluindo a cooperação transfronteiras, a fim de assegurar a participação ativa dos parceiros sociais na definição do futuro do trabalho e na construção da justiça social, inclusive através do reconhecimento efetivo do direito à negociação coletiva e de uma reflexão sobre salários mínimos adequados, legais ou negociados.

(2)

Na declaração conjunta de 2016 intitulada "Um novo começo para o diálogo social", assinada em 27 de junho de 2016 pela Comissão, pela Presidência neerlandesa do Conselho e pelos parceiros sociais europeus, os parceiros sociais intersetoriais e setoriais a nível da União comprometeram-se a prosseguir os esforços e a avaliar a necessidade de novas ações nos respetivos diálogos sociais para chegar aos filiados ainda não abrangidos pelos Estados-Membros e melhorar a filiação e a representatividade dos sindicatos e das organizações de empregadores.

(3)

O princípio 8 do Pilar Europeu dos Direitos Sociais estabelece que os parceiros sociais devem ser consultados sobre a conceção e a execução das políticas económicas, sociais e de emprego, em conformidade com as práticas nacionais. Devem ser incentivados a negociar e a celebrar convenções coletivas em matérias que lhes digam respeito, tendo em atenção, ao mesmo tempo, a sua autonomia e o direito de recorrer à ação coletiva. O Pilar dos Direitos Sociais afirma igualmente que devem ser incentivados os apoios para reforçar a capacidade de os parceiros sociais promoverem o diálogo social. O Compromisso Social do Porto (1) exortou ainda todos os intervenientes relevantes a promoverem o diálogo social autónomo como componente estrutural do Modelo Social Europeu e a reforçá-lo aos níveis europeu, nacional, regional, setorial e empresarial, tendo em vista, nomeadamente, garantir um enquadramento que possibilite a negociação coletiva por parte dos Estados-Membros, com os seus vários modelos vigentes.

(4)

Na sua Resolução sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, de 19 de janeiro de 2017, o Parlamento Europeu sublinha a importância do direito à negociação e à ação coletiva como direito fundamental consagrado no direito primário da União. O Parlamento Europeu espera igualmente que a Comissão intensifique o apoio concreto ao reforço e ao respeito do diálogo social a todos os níveis e em todos os setores, em particular naqueles em que este não esteja suficientemente desenvolvido, tendo em conta as diferentes práticas nacionais. Na sua Resolução, de 10 de outubro de 2019, sobre as políticas de emprego e sociais da área do euro o Parlamento Europeu afirma que o diálogo social e a negociação coletiva são fundamentais para conceber e aplicar políticas capazes de melhorar as condições de trabalho e as condições de emprego, e apela a uma iniciativa coordenada da União para alargar a cobertura das convenções coletivas aos trabalhadores de plataformas. O Parlamento Europeu insta igualmente os Estados-Membros a reforçar, se necessário, as oportunidades de negociação coletiva.

(5)

A Orientação n.o 7 da Decisão (UE) 2022/2296 (2) do Conselho insta os Estados-Membros, entre outros aspetos, a colaborarem com os parceiros sociais na definição de condições de trabalho justas, transparentes e previsíveis, garantindo o equilíbrio entre direitos e obrigações, e a assegurarem a participação atempada e significativa dos parceiros sociais na conceção e na implementação de reformas e políticas laborais, sociais e, se for caso disso, económicas, inclusive mediante um apoio ao reforço das capacidades dos parceiros sociais. A orientação insta igualmente os Estados-Membros a promoverem o diálogo social e a negociação coletiva e a incentivarem os parceiros sociais a negociarem e a celebrarem convenções coletivas em matérias que lhes digam respeito, no pleno respeito da sua autonomia e do direito de recorrer à ação coletiva. A Análise Anual do Crescimento para 2019 (3) relembra que num contexto caracterizado pelo declínio da prática das negociações coletivas, as políticas que reforçam a capacidade institucional dos parceiros sociais podem ser benéficas nos países em que as estruturas de diálogo social são frágeis ou tenham sido adversamente afetadas pela crise económica e financeira. A Análise Anual do Crescimento sustentável para 2022 (4) afirma que a participação sistemática dos parceiros sociais e de outras partes interessadas pertinentes é fundamental para o êxito da coordenação e da execução das políticas económicas e de emprego. Embora, nalguns Estados-Membros, os parceiros sociais desempenhem um papel significativo e estejam devidamente envolvidos na elaboração e execução de políticas, foram emitidas várias recomendações específicas por país no contexto do Semestre Europeu dirigidas a outros Estados-Membros no que diz respeito à melhoria do diálogo social e à participação dos parceiros sociais na conceção e/ou execução das reformas.

(6)

No seu Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais (5), a Comissão anunciou uma iniciativa para favorecer o diálogo social a nível nacional e da União. O referido plano de ação sublinhou igualmente que o diálogo social deve ser reforçado a nível nacional e da UE e apelou a esforços redobrados para ampliar a cobertura da negociação coletiva e evitar uma diminuição da filiação em organizações de parceiros sociais e a densidade organizacional.

(7)

O diálogo social, incluindo a negociação coletiva, é um instrumento crucial e benéfico para o bom funcionamento da economia social de mercado, impulsionando a resiliência económica e social, a competitividade, a estabilidade e o crescimento e desenvolvimento sustentáveis e inclusivos. O diálogo social desempenha igualmente um papel importante na definição do futuro do trabalho, tendo em conta as tendências específicas da globalização, da tecnologia, da demografia e das alterações climáticas. Os Estados-Membros com quadros de diálogo social sólidos e uma ampla cobertura da negociação coletiva tendem a ter economias mais competitivas e resilientes.

(8)

A experiência mostra que o diálogo social contribui para uma gestão eficaz de crises. As economias foram mais resilientes no rescaldo da crise de 2008, sempre que os parceiros sociais conseguiram gerir e adaptar rapidamente as estruturas de negociação coletiva. A recente crise da COVID-19 demonstrou que o diálogo social é um instrumento essencial para uma gestão equilibrada de crises e para encontrar políticas de atenuação e recuperação eficazes. Para além da crise humanitária, a guerra de agressão não provocada e injustificada da Federação da Rússia contra a Ucrânia conduziu a aumentos sem precedentes dos preços dos alimentos e da energia. Os parceiros sociais desempenham um papel importante na resposta a alguns desses desafios, em especial no que diz respeito à integração no mercado de trabalho da União das pessoas que fogem da guerra na Ucrânia e de outros conflitos e no que respeita à procura de soluções sustentáveis para ajustar os salários e as convenções coletivas.

(9)

As mudanças tecnológicas em curso, o aumento da automatização e a transição ecológica para a neutralidade climática estão a evoluir rapidamente em toda a economia, com impactos variáveis entre setores, profissões, regiões e países. Os parceiros sociais têm um papel vital a desempenhar para ajudar a antecipar, a mudar e a abordar, através do diálogo, da negociação e da ação conjunta, se for caso disso, as consequências sociais e em matéria de emprego dos desafios da reestruturação económica e da dupla transição em curso. No contexto do Pacto Ecológico Europeu e do plano REPowerEU, a Recomendação do Conselho que visa assegurar uma transição justa para a neutralidade climática (6) convida os Estados-Membros a adotar e a aplicar, em estreita cooperação com os parceiros sociais, se for caso disso, pacotes de medidas abrangentes e coerentes, seguindo ao mesmo tempo uma abordagem holística da sociedade e otimizando a utilização do financiamento público e privado.

(10)

As modalidades e os processos de diálogo social variam entre os Estados-Membros, refletindo as suas respetivas histórias, instituições e situações económicas e políticas. Um diálogo social efetivo implica, entre outros aspetos, a existência de modelos de relações laborais em que os parceiros sociais possam negociar de boa-fé e exercer de forma autónoma as suas práticas de negociação coletiva e de participação dos trabalhadores. Entre as condições propícias ao bom funcionamento do diálogo social contam-se a existência de sindicatos e organizações patronais sólidas e independentes com a capacidade técnica adequada; acesso a informações pertinentes necessárias para participar no diálogo social; um compromisso de todas as partes no sentido de participarem no diálogo social; respeito pelos direitos fundamentais da liberdade de associação e de negociação coletiva, disponibilidade de apoio institucional adequado e respeito pela autonomia dos parceiros sociais.

(11)

O diálogo social engloba consultas e negociações tripartidas e bipartidas, no setor privado e público, a todos os níveis, incluindo o diálogo a nível intersetorial, setorial, empresarial ou nacional, regional ou local. O diálogo social tripartido nacional reúne o governo, os trabalhadores e os empregadores para debater políticas públicas, leis e regulamentos, e outras decisões que afetam os parceiros sociais. As consultas tripartidas conseguem assegurar uma maior cooperação entre os parceiros tripartidos e criar um consenso sobre as políticas nacionais pertinentes. Uma abordagem tripartida tem de assentar num forte diálogo social bipartido. A fim de melhorar os processos tripartidos, é essencial que os governos também aumentem a transparência da elaboração de políticas, nomeadamente a elaboração de políticas relativas à qualidade e à relevância das oportunidades de formação para o mercado de trabalho.

(12)

As negociações bipartidas, em especial a negociação coletiva, têm lugar entre as organizações de trabalhadores e as organizações de empregadores, tal como definidas pela legislação ou prática nacionais. Geralmente, uma organização de trabalhadores é um sindicato formado pela associação de trabalhadores ou por outros sindicatos, ou ambos, constituídos com o objetivo de promover e defender os interesses dos trabalhadores, em conformidade com a legislação e/ou a prática nacionais. Uma organização de empregadores é uma organização constituída por empregadores individuais, outras associações patronais ou ambas, constituída com o objetivo de promover e defender os interesses dos seus membros, em conformidade com a legislação e/ou a prática nacionais.

(13)

De acordo com a Convenção 135 da Organização Internacional do Trabalho relativa aos Representantes dos Trabalhadores, atualmente ratificada por 24 Estados-Membros, os representantes dos trabalhadores podem ser pessoas reconhecidas como tal pela legislação ou pelas prática nacionais, quer sejam representantes sindicais, nomeadamente representantes designados ou eleitos por sindicatos ou por membros dessas organizações; ou representantes eleitos, ou seja, representantes livremente eleitos pelos trabalhadores da empresa, em conformidade com as disposições constantes das legislações ou regulamentações nacionais ou das convenções coletivas, e cujas funções não incluam atividades que sejam reconhecidas como prerrogativa exclusiva dos sindicatos no país em causa. Caso numa empresa existam tanto representantes sindicais como representantes eleitos, essa representação não deve ser utilizada para prejudicar as posições dos sindicatos em causa ou dos seus representantes. Deverá ser incentivada a cooperação entre os representantes eleitos e os sindicatos em causa ou os seus representantes.

(14)

Tanto o reconhecimento mútuo dos parceiros sociais como o reconhecimento legal dos sindicatos e das organizações de empregadores pelas autoridades de cada Estado-Membro são fundamentais para o êxito do quadro de negociação coletiva, desde que os empregadores e os trabalhadores possam escolher livremente a organização ou as organizações que os representarão. Nalguns Estados-Membros, esse reconhecimento limita-se às organizações que preenchem critérios de representatividade específicos. Tais critérios deverão ser objetivos e proporcionados e estabelecidos em consulta com os parceiros sociais. Deverão ser avaliados no âmbito de um processo de aprovação aberto e transparente, que não obste ao pleno desenvolvimento da negociação coletiva. Na ausência da representação sindical a nível da empresa, as convenções coletivas podem ser negociadas e celebradas pelos representantes dos trabalhadores que tenham sido por eles livremente eleitos e autorizados em conformidade com a legislação ou prática nacionais.

(15)

A negociação coletiva pode abranger questões relacionadas com as condições de trabalho e de emprego, nomeadamente salários, horas de trabalho, gratificações anuais, férias anuais, licença parental, formação, saúde e segurança no trabalho, bem como outras questões relevantes para os parceiros sociais. Por conseguinte, a negociação coletiva é particularmente importante na prevenção de conflitos laborais, na melhoria dos salários e das condições de trabalho e na redução das desigualdades salariais. A negociação coletiva é um instrumento crucial para ajudar os trabalhadores e as empresas a adaptarem-se à evolução do mundo do trabalho. É igualmente crucial para moldar a conceção e a definição de novos elementos de proteção laboral, como o direito a desligar-se do trabalho, ou para melhorar os existentes, como a igualdade de oportunidades, a proteção contra a violência e o assédio no trabalho, a formação e a aprendizagem ao longo da vida, a melhoria do equilíbrio entre a vida profissional e a vida familiar e a resposta aos desafios em matéria de saúde mental. A negociação coletiva tem também um papel fundamental a desempenhar na resposta aos impactos de crises inesperadas, como a pandemia de COVID-19.

(16)

O funcionamento de um sistema de negociação coletiva é determinado por uma combinação de características, tais como a utilização de cláusulas erga omnes e prorrogações de convenções coletivas, e a sua duração média, a utilização do princípio da preferência, a hierarquia das normas e a utilização de práticas de desvio relativamente às convenções coletivas ou à legislação, bem como às taxas de densidade dos sindicatos e das organizações de empregadores. Existe uma grande diversidade de abordagens em relação às cláusulas erga omnes e aos alargamentos administrativos nos Estados-Membros em conformidade com a legislação e prática respetivas. O bom funcionamento do sistema de negociação coletiva inclui o respeito pela autonomia dos parceiros sociais, procedimentos de cooperação, partilha de informações e a resolução de litígios entre partes.

(17)

A negociação coletiva pode ter lugar a diferentes níveis. A negociação pode ser muito descentralizada e decorrer sobretudo a nível das empresas, muito centralizada e decorrer a nível nacional, ou ter lugar a níveis intermédios, como os níveis setorial, regional ou local. A negociação coletiva está crescentemente a ocorrer a mais do que um nível. Nalguns casos, os acordos setoriais ou ao nível das empresas seguem as orientações estabelecidas pelas organizações de nível superior, enquanto noutros casos os setores ou empresas respeitam as normas estabelecidas noutro setor. Por conseguinte, a coordenação entre os níveis de negociação é um pilar fundamental dos sistemas de negociação coletiva.

(18)

Na maioria dos Estados-Membros, as taxas de negociação coletiva tendem a ser mais elevadas para os trabalhadores com contratos permanentes e para os que trabalham em empresas de maior dimensão ou em setores específicos, como o setor público. De um modo geral, os trabalhadores das pequenas empresas são menos suscetíveis de serem abrangidos por acordos de negociação coletiva, uma vez que, muitas vezes, essas empresas não têm capacidade para negociar um acordo a nível da empresa, ou porque não existe um sindicato ou outra forma de representação dos trabalhadores no local de trabalho. A organização dos trabalhadores é particularmente difícil em situações de emprego atípico e a maioria das formas de emprego mais recentes carece de representação. A considerável falta de representação desses tipos de trabalhadores pode ser atribuída, por um lado, ao custo da sua representação e, por outro, à flexibilidade em termos de tempo e de local de trabalho, o que dificulta a tarefa dos representantes dos trabalhadores de organizarem esta mão de obra bastante fragmentada. Uma maior capacidade dos parceiros sociais ajudá-los-ia a continuar a melhorar o seu contributo para a elaboração de políticas e a criar um diálogo social e uma capacidade de negociação coletiva mais eficazes. Normalmente, as atividades de reforço das capacidades ajudam os parceiros sociais a melhorar a dimensão da sua base de membros, nomeadamente através da utilização de tecnologia, da prestação de novos serviços e atividades a nível escolar ou universitário, etc., e as suas capacidades humanas e administrativas, a promover as suas capacidades orientadas para os processos e a apoiar o seu desenvolvimento organizacional. Essas atividades incluem a ministração de formação especializada, a prestação de apoio técnico e logístico e o financiamento. O reforço das capacidades é essencialmente um processo ascendente, dependente da vontade e dos esforços dos próprios parceiros sociais, que estão em melhor posição para identificar as suas necessidades e indicar as medidas que já estão a tomar para reforçar as suas capacidades. Esses esforços podem ser complementados e/ou apoiados pelas autoridades públicas e através do recurso ao financiamento da União, respeitando simultaneamente a autonomia dos parceiros sociais.

(19)

Alguns Estados-Membros tomaram medidas para apoiar o diálogo social e a negociação coletiva ampliando as oportunidades de diálogo social: promovendo a autonomia dos parceiros sociais e o respeito pela sua liberdade contratual; incentivando pareceres, programas e projetos conjuntos; participando na partilha regular de informações; promovendo a formação no domínio da negociação; prevendo mecanismos de resolução alternativa de litígios, como a conciliação, a mediação e a arbitragem, e reforçando a proteção dos trabalhadores contra atos de retaliação ou discriminação em resultado da sua participação na negociação coletiva.

(20)

No entanto, em muitos Estados-Membros, o diálogo social está sob pressão. Embora a densidade dos empregadores se mantenha relativamente estável, mesmo registando uma tendência decrescente em vários Estados-Membros, a densidade sindical tem vindo a diminuir, em média, em toda a União. Além disso, a percentagem de trabalhadores abrangidos por convenções coletivas (cobertura da negociação coletiva) é baixa na maioria dos Estados-Membros e, apesar de terem sido adotadas várias estratégias pelas organizações sindicais para ampliar a sua cobertura a formas atípicas de emprego, essa percentagem diminuiu significativamente nos últimos 30 anos. Nalguns casos, as regras em vigor podem apresentar lacunas com um efeito potencialmente negativo no diálogo social. Tais lacunas podem incluir: condições de representatividade estritas; interferência no processo de negociação ou limitações indevidas dos temas da negociação coletiva; uma delimitação inadequada dos setores económicos que impede a formação de estruturas de negociação coletiva a nível setorial; falta de aplicação das convenções coletivas; uma proteção ineficaz contra a discriminação sindical; processos de consulta ineficazes; falta de capacidade de construção nas negociações e falta de capacidade para negociar ou para participar plenamente nos processos de consulta.

(21)

A representatividade e a capacidade dos parceiros sociais nacionais devem também ser reforçadas, tendo em vista a aplicação, a nível nacional, de acordos autónomos entre parceiros sociais a nível da União. Por conseguinte, deverá ser dada especial atenção à criação de um quadro propício ao diálogo social, incluindo a negociação coletiva, e uma capacidade suficiente dos parceiros sociais nacionais, de modo a que possam contribuir eficazmente para o diálogo social na União e para a aplicação nacional dos acordos-quadro assinados pelos parceiros sociais ao nível da União.

(22)

A Diretiva 2014/24/UE (7) relativa aos contratos públicos, a Diretiva 2014/25/UE (8) relativa aos contratos públicos celebrados pelas entidades que operam nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais e a Diretiva 2014/23/UE (9) relativa à adjudicação de contratos de concessão exigem que os Estados-Membros respeitem o direito de organização e o direito de negociação coletiva, em conformidade com a Convenção n.o 87 da OIT sobre a Liberdade Sindical e a Proteção do Direito Sindical e com a Convenção n.o 98 da OIT sobre o Direito de Organização e de Negociação Coletiva.

(23)

O Tribunal de Justiça da União Europeia declarou que uma convenção coletiva que abranja prestadores de serviços independentes pode ser considerada o resultado do diálogo entre empregadores e trabalhadores se os prestadores de serviços constituírem "falsos trabalhadores independentes" e se encontrarem numa situação comparável à dos trabalhadores (10). O Tribunal confirmou que "nem sempre é fácil determinar, na economia atual, o estatuto de empresa de determinados prestadores independentes" (11).

(24)

Nas suas orientações sobre a aplicação do direito da concorrência da União às convenções coletivas relativas às condições de trabalho dos trabalhadores independentes individuais (12), a Comissão esclarece que, na sua opinião, as convenções coletivas de trabalhadores independentes individuais que se encontrem numa situação comparável à dos trabalhadores por conta de outrem não se encontram abrangidas pelo artigo 101.o do TFUE; e que a Comissão não intervirá contra convenções coletivas de trabalhadores independentes individuais que se encontrem numa situação de desequilíbrio quanto ao seu poder de negociação face à(s) sua(s) contraparte(s).

(25)

O Regulamento (UE) 2021/1057 do Parlamento Europeu e do Conselho (13) mantém a obrigação de os Estados-Membros assegurarem uma participação significativa dos parceiros sociais na execução das políticas apoiadas pelo Fundo Social Europeu Mais (FSE+) e fortalece a sua obrigação de apoiar o reforço das capacidades dos parceiros sociais. Sempre que adequado, os Estados-Membros deverão afetar um montante adequado de recursos do FSE+ para o reforço das capacidades dos parceiros sociais e da sociedade civil. O artigo 9.o do regulamento referido prevê que os Estados-Membros que tenham uma recomendação específica por país no âmbito do Semestre Europeu neste domínio devem afetar, pelo menos, 0,25 % dos seus recursos do FSE+ em regime de gestão partilhada a este objetivo.

(26)

A presente recomendação apoiará a aplicação do princípio 8 do Pilar Europeu dos Direitos Sociais. Incentiva medidas adaptadas às tradições, regras e práticas nacionais, respeitando assim as especificidades nacionais, bem como a autonomia dos parceiros sociais. A presente recomendação complementa e não prejudica os instrumentos da União já existentes. Além disso, a presente recomendação tem em conta as circunstâncias específicas dos Estados-Membros e reconhece que a escolha das medidas individuais para a sua aplicação pode ser determinada por essas circunstâncias.

(27)

A presente recomendação não pode, em caso algum, ser invocada como justificação para reduzir o nível de apoio já concedido ao diálogo social, incluindo a negociação coletiva, nos Estados-Membros. Além disso, a presente recomendação também não impede os Estados-Membros de adotarem medidas de apoio mais fortes e disposições mais avançadas em matéria de diálogo social, incluindo a negociação coletiva, do que as incluídas na presente recomendação.

(28)

A presente recomendação não prejudica as competências dos Estados-Membros no que diz respeito ao direito sindical, ao direito de greve e ao direito de lock-out, em conformidade com o disposto no artigo 153.o, n.o 5, do TFUE, ou a autonomia dos parceiros sociais.

ADOTOU A PRESENTE RECOMENDAÇÃO:

DEFINIÇÕES

Para efeitos da presente recomendação, entende-se por:

1)

"Diálogo social", todos os tipos de negociação, consulta ou intercâmbio de informações entre representantes dos governos, empregadores e trabalhadores sobre questões de interesse comum relativas à política económica, de emprego e social existentes, como relações bipartidas entre trabalhadores e empregadores, incluindo a negociação coletiva, ou como processo tripartido com o governo como parte oficial no diálogo, e que podem ser informais ou institucionalizados ou uma combinação de ambos, a nível nacional, regional, local ou empresarial em todas as indústrias ou setores, ou em vários níveis simultaneamente.

2)

"Negociação coletiva", todas as negociações, de acordo com as legislações e práticas nacionais, em cada Estado-Membro, entre um empregador, um grupo de empregadores ou uma ou mais organizações de empregadores, por um lado, e um ou mais sindicatos, por outro, para a determinação das condições de trabalho e de emprego.

3)

"Convenção coletiva", um acordo escrito relativo às disposições em matéria de condições de trabalho e emprego celebrado pelos parceiros sociais com capacidade para negociar em nome dos trabalhadores e dos empregadores, respetivamente, de acordo com a legislação e práticas nacionais, incluindo as convenções coletivas que tenham sido declaradas de aplicação geral.

4)

"Reforço das capacidades", o reforço das competências, das capacidades e dos poderes dos parceiros sociais para participarem de forma eficaz e a diferentes níveis no diálogo social.

O CONSELHO RECOMENDA AOS ESTADOS-MEMBROS, EM CONFORMIDADE COM A LEGISLAÇÃO E/OU A PRÁTICA NACIONAIS, APÓS CONSULTA E EM ESTREITA COOPERAÇÃO COM OS PARCEIROS SOCIAIS, NO RESPEITO DA SUA AUTONOMIA, QUE:

1)

Assegurem, tal como especificado na presente recomendação, um ambiente propício ao diálogo social bipartido e tripartido, incluindo a negociação coletiva, nos setores público e privado, a todos os níveis, que:

a)

Respeite os direitos fundamentais de liberdade de associação e de negociação coletiva;

b)

Promova sindicatos e organizações de empregadores sólidos e independentes com o objetivo de promover um diálogo social significativo;

c)

Inclua medidas para reforçar a capacidade dos sindicatos e das organizações de empregadores;

d)

Assegure o acesso às informações úteis necessárias para participar no diálogo social;

e)

Promova a participação de todas as partes no diálogo social;

f)

Se adapte à era digital e promova a negociação coletiva no novo mundo do trabalho e uma transição justa e equitativa para a neutralidade climática; e

g)

Preste apoio institucional adequado para promover um diálogo social significativo;

2)

Envolvam os parceiros sociais de forma sistemática, significativa e em tempo útil na conceção e execução das políticas sociais e de emprego e, se for caso disso, das políticas económicas e de outras políticas públicas, nomeadamente no contexto do Semestre Europeu;

3)

Assegurem que os parceiros sociais têm acesso a informações úteis sobre a situação económica e social global do respetivo Estado-Membro e sobre a situação e as políticas pertinentes para os respetivos setores de atividade, que sejam necessárias para participar no diálogo social e na negociação coletiva;

4)

Assegurem que as organizações de empregadores e os sindicatos representativos são reconhecidos para efeitos de diálogo social e de negociação coletiva, nomeadamente:

a)

Assegurando que, sempre que as autoridades competentes apliquem procedimentos de reconhecimento e representatividade com vista a determinar as organizações às quais deve ser concedido o direito de negociação coletiva, essas determinações sejam abertas e transparentes, baseadas em critérios preestabelecidos e objetivos no que diz respeito às características representativas dessas organizações, e que esses critérios e procedimentos sejam estabelecidos em consulta com os sindicatos e as organizações de empregadores;

b)

Caso tanto os representantes sindicais como os representantes dos trabalhadores eleitos estejam presentes na mesma empresa, tomando medidas adequadas sempre que necessário para garantir que a existência de representantes dos trabalhadores eleitos não seja utilizada para prejudicar as posições dos sindicatos em causa ou dos seus representantes; e

c)

Assegurando que o seu papel específico é plenamente reconhecido e respeitado nas estruturas e processos de diálogo social, reconhecendo simultaneamente que o diálogo que envolve um conjunto mais vasto de partes interessadas constitui um processo distinto;

5)

Assegurem que os trabalhadores, os membros de sindicatos e os seus representantes estão protegidos no exercício do seu direito de negociação coletiva contra qualquer medida que lhes possa ser prejudicial ou que possa ter um impacto negativo no seu emprego. Os empregadores e os seus representantes deverão ser protegidos contra quaisquer medidas ilegais no exercício do seu direito à negociação coletiva;

6)

Fomentem a confiança nos parceiros sociais e entre eles, nomeadamente através da promoção de mecanismos de resolução de litígios laborais, sem afetar os direitos de acesso aos processos administrativos e judiciais adequados para fazer respeitar os direitos e obrigações previstos na lei ou decorrentes de convenções coletivas, e tendo em conta quaisquer processos estabelecidos pelos parceiros sociais, tais como:

a)

O recurso à conciliação, mediação ou arbitragem, com o acordo de ambas as partes, a fim de facilitar as negociações e melhorar a aplicação das convenções coletivas; e

b)

Se ainda não existir, a constituição de uma função de mediação a que se possa recorrer em caso de conflito entre sindicatos e organizações de empregadores;

7)

Permitam a negociação coletiva a todos os níveis adequados e incentivar a coordenação entre esses níveis;

8)

Promovam um nível maior de cobertura da negociação coletiva e permitam uma negociação coletiva eficaz, nomeadamente:

a)

Eliminando os obstáculos institucionais ou jurídicos ao diálogo social e à negociação coletiva que abranjam novas formas de trabalho ou formas atípicas de trabalho;

b)

Assegurando que as partes nas negociações têm, no quadro jurídico aplicável, liberdade para decidir sobre as questões a negociar;

c)

Aplicando um sistema de aplicação das convenções coletivas, tanto por lei como conforme acordado em convenção coletiva, dependendo da legislação ou das práticas nacionais, incluindo, se for caso disso, inspeções e sanções.

9)

Promovam ativamente os benefícios e o valor acrescentado do diálogo social e da negociação coletiva, em especial através de meios de comunicação específicos e de outros meios, e incentivar os parceiros sociais a tornar as convenções coletivas amplamente acessíveis, nomeadamente através de meios digitais e em repositórios públicos;

10)

Apoiem os parceiros sociais nacionais, a pedido, a participarem efetivamente no diálogo social, em especial na negociação coletiva e na aplicação de acordos de parceiros sociais autónomos a nível da União, tomando medidas, tais como:

a)

Promover a criação e o reforço das suas capacidades a todos os níveis em função das suas necessidades;

b)

Utilizar diferentes formas de apoio, que podem incluir apoio logístico, formação e disponibilização de conhecimentos jurídicos e técnicos;

c)

Incentivar projetos conjuntos entre parceiros sociais em vários domínios de interesse, como a ministração de formação;

d)

Incentivar e, se for caso disso, apoiar os parceiros sociais a apresentar iniciativas e a desenvolver abordagens e estratégias novas e inovadoras para aumentar a sua base de representatividade e filiação;

e)

Apoiar os parceiros sociais a adaptarem as suas atividades à era digital, bem como a explorarem novas atividades adaptadas ao futuro do trabalho, às transições ecológica e demográfica e às novas condições do mercado de trabalho;

f)

Promover a igualdade de género e a igualdade de oportunidades para todos em termos de representação e prioridades temáticas;

g)

Promover e facilitar a sua colaboração com parceiros sociais a nível da União;

h)

Prestar um apoio adequado à aplicação, nos Estados-Membros, dos acordos dos parceiros sociais celebrados a nível da União;

i)

Otimizar a utilização do financiamento nacional e da União, quando disponível, incluindo o apoio ao abrigo do FSE + e do Instrumento de Assistência Técnica, e incentivar os parceiros sociais a utilizarem financiamento nacional e da União existente;

11)

Apresentem à Comissão, até 7 de dezembro de 2025, uma lista das medidas, elaboradas em consulta com os parceiros sociais, a tomar ou já tomadas em cada Estado-Membro para aplicar a presente recomendação. Quando essas informações já tiverem sido apresentadas à Comissão ao abrigo de outros mecanismos de comunicação de informações, quando elaborarem a lista os Estados-Membros podem remeter para esses relatórios;

12)

Confiem aos parceiros sociais a aplicação das partes pertinentes da presente recomendação, se for caso disso, e de acordo com a legislação ou prática nacionais;

CONVIDA O COMITÉ DO EMPREGO E O COMITÉ DA PROTEÇÃO SOCIAL, NO ÂMBITO DOS RESPETIVOS MANDATOS, COM O APOIO DA COMISSÃO, A:

13)

Explorar, em consulta com os parceiros sociais pertinentes, e emitir um parecer ao Conselho sobre a possibilidade de melhorar o âmbito e a pertinência da recolha de dados relativos ao diálogo social, incluindo os relativos à negociação coletiva, a nível da União e a nível nacional, adequados para acompanhar a aplicação da presente recomendação;

14)

Acompanhar regularmente, no âmbito das atividades de supervisão multilateral no contexto do Semestre Europeu, a aplicação da presente recomendação com os parceiros sociais pertinentes a nível nacional e da União, sempre que tal acompanhamento permita aos parceiros sociais, entre outros aspetos, identificar as situações em que foram excluídos ou inadequadamente envolvidos nas consultas a nível nacional sobre as políticas da União e nacionais;

CONVIDA A COMISSÃO A

15)

Avaliar a recomendação em cooperação com os Estados-Membros, os parceiros sociais, e após consulta de outras partes interessadas pertinentes, as medidas tomadas em resposta à presente recomendação e a apresentar um relatório ao Conselho no prazo de 7 de dezembro de 2029.

Feito no Luxemburgo, de 12 de junho de 2023.

Pelo Conselho

O Presidente

J. PEHRSON


(1)  Compromisso Social do Porto, foi assinado na Cimeira Social do Porto, em 7 de maio de 2021, pela Presidência portuguesa do Conselho da UE, pela Comissão Europeia, pelo Parlamento Europeu e pelos parceiros sociais a nível da UE e pela Plataforma Social, para reforçar o empenho na aplicação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais (https://www.2021portugal.eu/pt/cimeira-social-do-porto/compromisso-social-do-porto/)

(2)  Decisão (UE) 2022/2296 do Conselho, de 21 de novembro de 2022, relativa às orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros (JO L 304 de 24.11.2022, p. 67).

(3)  Comunicação da Comissão intitulada "Análise Anual do Crescimento para 2019: Para uma Europa mais forte num contexto incerto à escala mundial", COM/2018/770 final.

(4)  Comunicação da Comissão intitulada "Análise Anual do Crescimento Sustentável 2022", COM/2021/740 final.

(5)  Comunicação da Comissão intitulada "Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais", COM/2021/102 final.

(6)  Recomendação do Conselho, de 16 de junho de 2022, que visa assegurar uma transição justa para a neutralidade climática 2022/C 243/04 (JO C 243 de 27.6.2022, p. 35).

(7)   JO L 94 de 28.3.2014, p. 65.

(8)   JO L 94 de 28.3.2014, p. 243.

(9)   JO L 94 de 28.3.2014, p. 1.

(10)  Acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de dezembro de 2014, FNV Kunsten Informatie en Media/Staat der Nederlanden, C-413/13, ECLI:EU:C:2014:2411, n.os 31 e 42.

(11)  Acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de dezembro de 2014, FNV Kunsten Informatie en Media/Staat der Nederlanden, C-413/13, ECLI:EU:C:2014:2411, n.o 32.

(12)  Comunicação da Comissão intitulada "Orientações sobre a aplicação do direito da concorrência da União às convenções coletivas relativas às condições de trabalho dos trabalhadores independentes individuais" (2022/C 374/02) (JO C 374 de 30.9.2022, p. 2).

(13)  Regulamento (UE) 2021/1057 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de junho de 2021, que cria o Fundo Social Europeu Mais (FSE+) e que revoga o Regulamento (UE) n.o 1296/2013 (JO L 231 de 30.6.2021, p. 21).


ELI: http://data.europa.eu/eli/C/2023/1389/oj

ISSN 1977-1010 (electronic edition)