ISSN 1977-1010

Jornal Oficial

da União Europeia

C 517

European flag  

Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

64.° ano
22 de dezembro de 2021


Índice

Página

 

I   Resoluções, recomendações e pareceres

 

PARECERES

 

Comité Económico e Social Europeu

 

563.a reunião plenária do Comité Económico e Social Europeu – por Interactio, 22.9.2021-23.9.2021

2021/C 517/01

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O papel da política de coesão no combate às desigualdades no novo período de programação após a crise da COVID-19. Complementaridades e eventuais sobreposições com o Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR) e os planos nacionais de recuperação (parecer de iniciativa)

1

2021/C 517/02

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o tema Assegurar a liberdade e a diversidade dos meios de comunicação social na Europa (parecer de iniciativa)

9

2021/C 517/03

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Medidas de urgência para apoiar o emprego e os rendimentos durante a crise pandémica (parecer de iniciativa)

16

2021/C 517/04

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação (parecer exploratório a pedido da presidência eslovena)

23

2021/C 517/05

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o tema Rumo a uma cadeia de abastecimento alimentar justa (parecer exploratório)

38


 

III   Atos preparatórios

 

Comité Económico e Social Europeu

 

563.a reunião plenária do Comité Económico e Social Europeu – por Interactio, 22.9.2021-23.9.2021

2021/C 517/06

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões Legislar melhor: unir as nossas forças para melhorar a legislação[COM(2021) 219 final]

45

2021/C 517/07

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2013/34/UE, a Diretiva 2004/109/CE, a Diretiva 2006/43/CE e o Regulamento (UE) n.o 537/2014, no que respeita à comunicação de informações sobre a sustentabilidade das empresas [COM (2021) 189 final — 2021/104 (COD)]

51

2021/C 517/08

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões Fomentar uma abordagem europeia da inteligência artificial[COM(2021) 205 final]

56

2021/C 517/09

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece regras harmonizadas em matéria de inteligência artificial (Regulamento Inteligência Artificial) e altera determinados atos legislativos da União [COM(2021) 206 final — 2021/106 (COD)]

61

2021/C 517/10

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às máquinas e seus componentes e acessórios[COM(2021) 202 final — 2021/0105 (COD)]

67

2021/C 517/11

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Taxonomia da UE, divulgação de informações sobre sustentabilidade das empresas, preferências em termos de sustentabilidade e deveres fiduciários: Direcionar as atividades financeiras para os objetivos do Pacto Ecológico Europeu [COM(2021) 188 final]

72

2021/C 517/12

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a estratégia da UE em matéria de luta contra o tráfico de seres humanos 2021-2025 [COM(2021) 171 final]

78

2021/C 517/13

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho Estratégia da UE sobre o regresso voluntário e a reintegração[COM(2021) 120 final]

86

2021/C 517/14

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a estratégia da UE para lutar contra a criminalidade organizada (2021- 2025) [COM(2021) 170 final]

91

2021/C 517/15

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Conselho relativa às orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros [COM(2021) 282 final — 2021/0137 (NLE)]

97

2021/C 517/16

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões Orientações estratégicas para uma aquicultura na UE mais sustentável e competitiva para o período de 2021 a 2030[COM(2021) 236 final]

103

2021/C 517/17

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões relativa a uma nova abordagem para uma economia azul sustentável na UE Transformar a economia azul da UE para assegurar um futuro sustentável[COM(2021) 240 final]

108

2021/C 517/18

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre um plano de ação para o desenvolvimento da produção biológica [COM (2021) 141 final]

114

2021/C 517/19

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) 2020/2222 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a determinados aspetos da segurança e da conectividade ferroviárias respeitantes à infraestrutura transfronteiriça que liga a União e o Reino Unido através da ligação fixa do canal da Mancha [COM(2021) 402 final — 2021/0228(COD)]

120

2021/C 517/20

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Conselho relativa à posição a tomar em nome da União Europeia no âmbito do Comité Diretor Regional da Comunidade dos Transportes no que diz respeito à adoção do orçamento da Comunidade dos Transportes para 2022 [COM(2021) 479 final — 2021/0272 (NLE)]

121

2021/C 517/21

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a determinadas disposições aplicáveis à pesca na zona do acordo da CGPM (Comissão Geral das Pescas do Mediterrâneo) (reformulação) [COM(2021) 434 final — 2021/0248 (COD)]

122

2021/C 517/22

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.o 1380/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, no que respeita às restrições do acesso às águas da União [COM(2021) 356 final — 2021/0176 (COD)]

123


PT

 


I Resoluções, recomendações e pareceres

PARECERES

Comité Económico e Social Europeu

563.a reunião plenária do Comité Económico e Social Europeu – por Interactio, 22.9.2021-23.9.2021

22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O papel da política de coesão no combate às desigualdades no novo período de programação após a crise da COVID-19. Complementaridades e eventuais sobreposições com o Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR) e os planos nacionais de recuperação»

(parecer de iniciativa)

(2021/C 517/01)

Relator:

Ioannis VARDAKASTANIS

Correlatora:

Judith VORBACH

Decisão da plenária

25.3.2021

Base jurídica

Artigo 32.o, n.o 2, do Regimento

 

Parecer de iniciativa

Competência

Secção da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social

Adoção em secção

8.9.2021

Adoção em plenária

23.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

211/0/6

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Instrumento de Recuperação da União Europeia (Next Generation EU) não só se baseia na solidariedade entre os Estados-Membros, como também simboliza o facto de estes partilharem uma visão comum para o futuro. O seu efeito no reforço da confiança já contribuiu para reduzir a probabilidade de uma crise profunda em alguns países, e o seu impacto positivo manifestar-se-á plenamente quando forem iniciadas as despesas efetivas. Embora o CESE aprecie vivamente o facto de a UE ter conseguido elaborar e adotar um mecanismo tão abrangente num espaço de tempo tão curto, exige também que sejam envidados todos os esforços para o aperfeiçoar e colmatar eventuais lacunas.

1.2.

De um modo geral, o CESE defende uma política económica e social centrada na prosperidade, cuja prioridade é o bem-estar das pessoas, sem que ninguém seja deixado para trás. O presente parecer centra-se na forma como a política de coesão e o Instrumento de Recuperação da UE, principalmente através do seu emblemático Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR) (1), preveem corrigir as desigualdades. Com efeito, o Instrumento de Recuperação da UE contribuirá para a convergência ascendente entre os Estados-Membros e poderá também aumentar a margem de manobra orçamental para as medidas de política social. No entanto, em última análise, o grande desafio para os próximos anos consiste em saber em que medida e de que forma este instrumento combaterá as desigualdades nos países e os desequilíbrios entre as regiões.

1.3.

As desigualdades já representavam um enorme problema antes da pandemia de COVID-19. A crise acentuou e exacerbou ainda mais estas disparidades que existem há muito tempo nas nossas sociedades, nomeadamente a repartição desigual do rendimento e da riqueza, bem como o acesso à saúde e à educação. Estas desigualdades variam em função do género, da idade, do nível de instrução e da deficiência, bem como entre regiões, setores e profissões. A pandemia afetou desproporcionalmente as mulheres e os jovens. A incidência de infeções pelo vírus da COVID-19 tem sido mais elevada entre as pessoas mais desfavorecidas, o que, por sua vez, pode afetar negativamente os seus rendimentos. As pessoas mais pobres também têm menos probabilidades de aceder ao teletrabalho, o que provou ser um fator importante na perda de emprego.

1.4.

A UE deve aproveitar a oportunidade única representada pelo Instrumento de Recuperação da UE para colmatar lacunas nas políticas sociais, económicas e ambientais, bem como para aplicar uma abordagem centrada na prosperidade. O CESE congratula-se com o facto de os objetivos sociais e, em particular, o objetivo da coesão económica, social e territorial estarem integrados nos seis pilares do MRR e de os critérios de avaliação dos planos nacionais de recuperação e resiliência (PRR) incluírem o seu impacto social. Os Estados-Membros devem também explicar, a justo título, a forma como os PRR contribuem para a igualdade de género e para a igualdade de oportunidades para todos. No entanto, o CESE considera que é necessário reforçar a ênfase na distribuição equitativa no âmbito dos PRR e do Instrumento de Recuperação da UE no seu conjunto, e torná-la mais específica.

1.5.

A fim de assegurar que os PRR tenham uma dimensão social mais forte, o CESE propõe que a Comissão não só defina uma metodologia para a comunicação das despesas sociais, conforme previsto no artigo 29.o, n.o 4, do Regulamento MRR, como também uma metodologia para a avaliação do impacto social das reformas estruturais propostas nos PRR. Nesse contexto, é altamente discutível que o ato delegado, que fornecerá especificações relativas à dimensão social, só seja disponibilizado após a elaboração dos PRR e mesmo após a sua aprovação.

1.6.

Um dos grandes desafios consiste em assegurar a coerência e as sinergias entre a política de coesão e o Instrumento de Recuperação da UE, em particular o MRR e a REACT-EU. Embora seja importante evitar sobreposições e confusão na aplicação dos programas, é igualmente crucial assegurar que os programas não se contradigam ou prejudiquem mutuamente. Além disso, a potencial priorização do financiamento do MRR em relação à política de coesão devido à pressão no sentido de uma rápida absorção pode reduzir a atenção e a capacidade de gerir a programação e a aplicação do financiamento da política de coesão para 2021-2027, contribuindo para atrasos suplementares e problemas na utilização dos recursos da política de coesão.

1.7.

O CESE manifesta preocupação com o facto de, devido à sua base jurídica diferente (ver ponto 3.4), as disposições relativas à redução das desigualdades consagradas na política de coesão não se refletirem de forma adequada nas regras de utilização do Instrumento de Recuperação da UE e do MRR. É importante que a amplitude e a clareza da dimensão social no âmbito da política de coesão sirvam de modelo para o Instrumento de Recuperação da UE e o MRR. Ademais, as regras estritas previstas na política de coesão em matéria de consulta das partes interessadas e, em particular, o princípio da parceria, devem ser adotadas, pelo menos, como modelo para os procedimentos do MRR, a fim de direcionar os investimentos de forma eficaz para as medidas de inclusão social e de combate à desigualdade.

1.8.

Tendo em conta que o desembolso dos fundos está condicionado à aplicação das recomendações específicas por país, a reforma do Semestre Europeu reveste-se de ainda maior importância, incluindo normas mínimas para a consulta dos parceiros sociais e da sociedade civil, como indicado na Resolução do CESE «Participação da sociedade civil organizada nos planos nacionais de recuperação e resiliência» (2). No contexto da política de coesão, do Instrumento de Recuperação da UE e das recomendações específicas por país, o CESE recomenda vivamente que se preste uma atenção especial a todos os diferentes aspetos da desigualdade e à procura de um crescimento sustentável e inclusivo, bem como um acompanhamento rigoroso da forma como os fundos são gastos.

1.9.

Além disso, o CESE apela à integração sistemática do Pilar Europeu dos Direitos Sociais e do painel de indicadores sociais no Instrumento de Recuperação da UE e na avaliação dos PRR. Neste contexto, cabe assegurar que o Instrumento de Recuperação da UE está alinhado com a criação de empregos dignos. Por conseguinte, o pagamento de fundos do MRR às empresas deve estar condicionado a determinados critérios, como a aplicação de convenções coletivas ou a criação de empregos de elevada qualidade com base na legislação e regulamentação nacionais resultantes do acordo dos parceiros sociais nacionais. Importa assegurar que os benefícios da recuperação e das transições ecológica e digital sejam partilhados por todas as pessoas que vivem na União Europeia.

2.   Observações gerais

2.1.

A UE confia há muito na sua política de coesão e, em particular, em fundos como o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional e o Fundo Social Europeu para reduzir as desigualdades tanto entre os Estados-Membros como no interior dos mesmos. Em 2020, a pandemia de COVID-19 provocou um choque sistémico e económico extraordinário e exacerbou os desequilíbrios existentes entre os Estados-Membros de uma forma que os fundos no âmbito da política de coesão não conseguiram resolver por si sós. Esta situação resultou na criação de uma nova iniciativa de financiamento conhecida como Instrumento de Recuperação da UE (Next Generation EU), um pacote de recuperação de 750 mil milhões de euros a repartir entre os Estados-Membros.

2.2.

O Instrumento de Recuperação da UE não só se baseia na solidariedade entre os Estados-Membros, como também constitui um avanço significativo no processo de integração europeia, prevendo, por exemplo, a mutualização da dívida, que aqui se entende como a emissão comum de obrigações e a contração coletiva de dívida. O seu efeito no reforço da confiança já contribuiu para reduzir a probabilidade de uma crise profunda em alguns países, e o seu impacto positivo manifestar-se-á plenamente quando forem iniciadas as despesas efetivas. Graças ao seu efeito impulsionador do crescimento económico, ajudará a reduzir o desemprego. A longo prazo, espera-se que o Instrumento de Recuperação da UE contribua consideravelmente para a sustentabilidade ambiental, económica e social. O CESE considera que o Instrumento de Recuperação da UE representa uma oportunidade única para reforçar o modelo social europeu e construir uma UE competitiva e integrada, contribuindo para uma recuperação económica rápida, justa e sustentável. Em última análise, é provável que todos os Estados-Membros se tornem beneficiários líquidos (3). Por último, o CESE considera que os fundos europeus não são apenas números, objetivos e prazos, mas também simbolizam o facto de os Estados-Membros da UE partilharem uma visão comum para o futuro.

2.3.

O MRR constitui o elemento central do Instrumento de Recuperação da UE, com 672,5 mil milhões de euros sob a forma de empréstimos e subvenções para apoiar as reformas e os investimentos empreendidos pelos Estados-Membros da UE. O objetivo é atenuar o impacto económico e social da pandemia de COVID-19, tornar as economias e sociedades europeias mais sustentáveis, inclusivas e resilientes e prepará-las melhor para os desafios e as oportunidades da dupla transição ecológica e digital.

2.3.1.

O MRR está estruturado em seis «pilares», incluindo a coesão económica, social e territorial, a saúde e a resiliência social e as políticas para a próxima geração, as crianças e os jovens. Os Estados-Membros devem promover sinergias e uma coordenação estreita entre os planos nacionais de recuperação e resiliência (PRR) e a programação da política de coesão. Além disso, os PRR devem abordar de forma eficaz os desafios colocados por desenvolvimentos económicos cada vez mais divergentes e estratégias de recuperação diferentes, que não são identificados diretamente no Semestre Europeu. As recomendações específicas por país de 2019 e 2020 são particularmente relevantes.

2.4.

Para além do MRR, o Instrumento de Recuperação da UE inclui também a Assistência à Recuperação para a Coesão e os Territórios da Europa (REACT-EU), com uma dotação de 47,5 mil milhões de euros. Trata-se de uma nova iniciativa que visa alargar as medidas de resposta à crise e de recuperação da crise previstas através da Iniciativa de Investimento de Resposta ao Coronavírus e da Iniciativa de Investimento de Resposta ao Coronavírus+. No entanto, em comparação com outras medidas, o orçamento disponível é bastante reduzido. Por conseguinte, apenas pode contribuir de forma limitada para a recuperação ecológica, digital, sustentável, inclusiva e resiliente da economia. Os fundos da REACT-EU serão disponibilizados para o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), o Fundo Social Europeu (FSE) e o Fundo de Auxílio Europeu às Pessoas mais Carenciadas (FAEPMC).

2.5.

Além disso, através dos programas de coesão para o período de programação 2021-2027, será concedido aos Estados-Membros um total de 377,8 mil milhões de euros. Este montante será distribuído através dos seguintes fundos:

o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), que visa corrigir os desequilíbrios entre as regiões;

o Fundo de Coesão, que apoia projetos da UE em redes transeuropeias de transportes e infraestruturas ambientais, bem como projetos no domínio da eficiência energética e da utilização de energias renováveis ou da mobilidade urbana sustentável;

o Fundo Social Europeu (FSE); e

o recém-criado Fundo para uma Transição Justa.

3.   Complementaridades, sinergias e lacunas entre o MRR e a política de coesão

3.1.

De um modo geral, o CESE defende uma política económica e social centrada na prosperidade, cuja prioridade é o bem-estar das pessoas, sem que ninguém seja deixado para trás. Entre os principais objetivos estratégicos devem figurar o crescimento sustentável e inclusivo, a qualidade de vida e a redução das desigualdades. O CESE apela para que estes objetivos sejam integrados em vários domínios de intervenção, nomeadamente a política fiscal, do mercado de trabalho, industrial e monetária. No âmbito do Semestre Europeu, no quadro de governação económica e no Quadro Financeiro Plurianual, recomenda-se vivamente que seja dada maior atenção à resolução do problema do aumento da desigualdade. O presente parecer centra-se na forma como a política de coesão e o Instrumento de Recuperação da UE, principalmente através do seu emblemático MRR, preveem corrigir estas desigualdades.

3.2.

Os pagamentos brutos do Instrumento de Recuperação da UE não se baseiam em critérios muito claros. Por conseguinte, é muito provável que o Instrumento de Recuperação da UE permita às economias mais frágeis da UE recuperarem mais rapidamente e contribuírem para uma convergência ascendente efetiva, o que o CESE considera muito positivo. No entanto, a medida e a forma como as desigualdades nos países e os desequilíbrios entre as regiões devem ser combatidos através do Instrumento de Recuperação da UE são menos claras. Em todo o caso, é muito provável que as sobreposições entre a política de coesão e o Instrumento de Recuperação da UE provoquem até efeitos adversos.

3.2.1.

A igualdade de condições nas políticas sociais e de emprego é de extrema importância e as disposições do Instrumento de Recuperação da UE devem exigir reformas nesse sentido. O CESE destaca as suas diversas propostas de combate às desigualdades no interior dos países, por exemplo, através da introdução de determinados critérios no sistema de contratos públicos e de programas de apoio aos grupos vulneráveis (como a Garantia para a Juventude). Neste contexto, importa também promover a qualidade dos empregos e os sistemas de negociação coletiva.

3.2.2.

O apoio prestado através do Instrumento de Recuperação da UE pode aliviar a pressão sobre os orçamentos públicos e aumentar a margem de manobra orçamental, em particular dos países com maiores níveis de endividamento, o que pode igualmente contribuir para melhorar as medidas de política social, a fim de atenuar as desigualdades. Além disso, o CESE recomenda a análise dos fatores que desempenharam um papel significativo na deterioração das finanças públicas em alguns Estados-Membros no contexto da crise da COVID-19.

3.3.

Um dos grandes desafios consiste em assegurar a coerência e as sinergias entre a política de coesão e o Instrumento de Recuperação da UE, em particular o MRR e a REACT-EU. Com base nos PRR que foram apresentados e divulgados publicamente no âmbito do processo do MRR, os programas do MRR e da política de coesão parecem, à primeira vista, ter vários objetivos comuns (4). No entanto, os processos utilizados para determinar em que domínios serão realizados os investimentos parecem diferir muito, levantando a questão de saber se os dois programas podem funcionar em harmonia. Embora seja importante evitar sobreposições e confusão na aplicação dos programas, é igualmente crucial assegurar que os programas não se contradigam ou prejudiquem mutuamente. Os procedimentos do MRR devem adotar os princípios da política de coesão, aplicando as suas regras estritas em matéria de consulta das partes interessadas, a fim de direcionar os investimentos de forma eficaz para as medidas de inclusão social.

3.4.

A política de coesão tem uma longa tradição no que diz respeito à afetação estratégica de fundos e recursos para objetivos sociais, bem como à parceria e à criação obrigatória de comités de acompanhamento, que representam um vasto leque de partes interessadas e parceiros sociais na seleção de projetos. A eficácia destes princípios, embora não assegure de forma infalível investimentos de qualidade, tem sido geralmente comprovada ao longo do tempo por auditorias e avaliações ex post. Lamentavelmente, estas práticas comprovadas foram utilizadas apenas de forma parcial aquando da elaboração dos PRR. O CESE convida os Estados-Membros a adotarem práticas como a criação de comités de acompanhamento durante a fase de aplicação dos PRR. Os comités de acompanhamento devem incluir representantes dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil.

3.5.

Se analisarmos o mais recente Regulamento Disposições Comuns (RDC) (5), que rege a forma como os fundos no âmbito da política de coesão são utilizados, as regras que determinam a elegibilidade das ações para financiamento são bastante claras. Por exemplo, o artigo 73.o estipula que «[p]ara a seleção das operações, a autoridade de gestão estabelece e aplica critérios e procedimentos que sejam não discriminatórios e transparentes, garantam a acessibilidade para as pessoas com deficiência, a igualdade de género». O CESE manifesta preocupação com o facto de, devido à sua base jurídica diferente (ver ponto 3.4), as disposições relativas à redução das desigualdades consagradas na política de coesão não se refletirem de forma adequada nas regras de utilização do Instrumento de Recuperação da UE e do MRR. É importante que a amplitude e a clareza da dimensão social no âmbito da política de coesão sirvam de modelo para o Instrumento de Recuperação da UE e o MRR.

3.6.

Em relação à parceria, o artigo 8.o estabelece que «[p]ara o acordo de parceria e para cada programa, cada Estado-Membro organiza e executa uma parceria abrangente», que inclui «[o]s organismos pertinentes que representam a sociedade civil, tais como parceiros ambientais, organizações não governamentais e organismos responsáveis pela promoção da inclusão social, dos direitos fundamentais, dos direitos das pessoas com deficiência, da igualdade de género e da não discriminação». As condições habilitadoras constantes no anexo do regulamento especificam ainda claramente que o financiamento da UE não deve contribuir para a segregação das pessoas que se encontram em instituições de acolhimento.

3.7.

Tal como na política de coesão, a coesão económica, social e territorial é mencionada explicitamente no âmbito de aplicação e nos objetivos do MRR. No entanto, dado que o Instrumento de Recuperação da UE se baseia no artigo 122.o do TFUE, destinado a situações de emergência, em caso de dificuldades económicas graves e imprevisíveis, o princípio fundamental é a solidariedade. Por outro lado, o MRR baseia-se no artigo 175.o do TFUE, o que significa que a coesão deve ser um objetivo refletido nos PRR (6). Uma fraca dimensão territorial nos PRR pode acarretar potenciais repercussões para a política de coesão e a coesão territorial, nomeadamente no que diz respeito à redução das disparidades internas, ao papel dos níveis infranacionais e ao princípio da governação a vários níveis.

3.8.

A sobreposição entre a política de coesão e o MRR em alguns domínios, nomeadamente as transições ecológica e digital, suscita particular preocupação. Além disso, o amplo âmbito de aplicação do MRR em diferentes domínios temáticos dificulta a definição de um foco claro e a garantia da coordenação com as intervenções da política de coesão em termos da demarcação das suas diversas fontes, o que se reveste de extrema importância pelos motivos expostos abaixo. Trata-se de mais um motivo pelo qual o acompanhamento e a participação da sociedade civil organizada são tão importantes.

3.9.

A potencial priorização do financiamento do MRR em relação à política de coesão devido à pressão no sentido de uma rápida aplicação/absorção (por exemplo, o caráter de emergência, a duração mais curta e o calendário apertado para os PRR) pode reduzir a atenção e a capacidade de gerir a programação e a aplicação do financiamento da política de coesão para 2021-2027, contribuindo para atrasos suplementares e problemas na utilização dos recursos da política de coesão.

3.10.

A sociedade civil e os parceiros sociais têm trabalhado incansavelmente para assegurar uma formulação incisiva no Regulamento Disposições Comuns (RDC), que rege a utilização dos fundos no âmbito da política de coesão, bem como de outros financiamentos da UE. O regulamento para o período 2021-2027 define claramente a forma como os recursos devem ser utilizados no sentido de promover a inclusão social dos grupos marginalizados, ao invés de os segregar ainda mais. Estabelece também regras claras para a inclusão da sociedade civil e dos parceiros sociais na seleção, governação e supervisão das operações financiadas pela UE, o que contrasta fortemente com o MRR. O artigo 18.o, n.o 4, alínea q), exige apenas que as autoridades nacionais forneçam um resumo do processo de consulta. Na prática, a falta de disposições jurídicas mais pormenorizadas sobre o envolvimento dos parceiros sociais e da sociedade civil resultou numa consulta pública completamente inadequada por parte dos Estados-Membros e em níveis de transparência extremamente baixos, com muitos Estados-Membros a não disponibilizarem publicamente os seus projetos de PRR.

3.10.1.

O CESE entende que o intervalo de tempo entre a aprovação do Instrumento de Recuperação da UE e o prazo para a apresentação dos PRR foi curto. No entanto, considera que os Estados-Membros deveriam ter aproveitado a consulta plena e significativa da sociedade civil e dos parceiros sociais enquanto oportunidade para ajudar a elaborar mais facilmente PRR de qualidade, em vez de a considerarem um fardo a que muitos Estados-Membros optaram por resistir.

3.11.

A falta de escrutínio público durante o período de elaboração suscitou a preocupação de que os Estados-Membros utilizem o MRR para contornar as regras que os impedem de utilizar os fundos no âmbito da política de coesão para determinados tipos de investimento. Esta situação já se verificou em alguns dos poucos projetos de PRR disponibilizados ao público, nomeadamente no que diz respeito às regras de investimento na inclusão social. As regras estabelecidas no RDC, nomeadamente nas suas condições habilitadoras, foram introduzidas a pedido da sociedade civil e dos parceiros sociais. Caso não seja necessário demonstrar que as ações financiadas em paralelo pelo MRR respeitarão os princípios estritos defendidos no RDC para serem aprovadas, há muito menos garantias do respeito por estes princípios. Embora se deva admitir que o próprio RDC nem sempre conseguiu evitar a utilização indevida dos fundos, o regulamento prevê ao menos uma base para contestar ou solicitar a suspensão dos financiamentos que não cumpram as condições habilitadoras. Com o MRR, a possibilidade de contestar ou impedir a utilização indevida dos fundos continua a ser incerta.

3.12.

O CESE critica o facto de o princípio da parceria não ter sido respeitado aquando da elaboração de muitos PRR. Considera que o princípio da parceria e a participação da sociedade civil organizada são fundamentais para a eficácia das políticas e a sua apropriação. O princípio da parceria faz parte do ADN da política de coesão. Verificaram-se bons exemplos de participação ativa dos cidadãos, das comunidades locais e da sociedade civil. Para a aplicação e uma eventual reformulação dos PRR, deve ser estabelecido um sistema mais ambicioso de consulta às partes interessadas, utilizando como modelo o princípio da parceria. No que diz respeito às questões locais, as estratégias de desenvolvimento de base comunitária, os investimentos territoriais integrados nas cidades, as Ações Urbanas Inovadoras e a cooperação transfronteiriça Interreg fornecem muitos exemplos de projetos em toda a UE, o que também se deve refletir na aplicação do PRR.

4.   Combate às desigualdades através da política de coesão, do Instrumento de Recuperação da UE e do MRR

4.1.

Os responsáveis políticos continuam a enfrentar um elevado grau de incerteza quanto à evolução da pandemia. As previsões de crescimento para o período de 2019 a 2023 foram revistas em baixa em vários países. Haverá uma divergência considerável e cada vez maior no crescimento dentro da UE, que pode, em grande medida, ser explicada pelos diferentes efeitos da pandemia nos diversos setores económicos. Por exemplo, os países em que o setor do turismo se reveste de grande importância foram duramente afetados, e os setores das artes, do entretenimento, do comércio, das viagens, do alojamento, da venda a retalho e dos transportes, também sofreram graves prejuízos (7).

4.1.1.

Além disso, a pandemia acentuou disparidades que existem há muito nas nossas sociedades, nomeadamente a repartição desigual dos rendimentos e da riqueza, o acesso desigual à saúde e educação e uma exposição diferente aos danos ambientais, tendo igualmente sido uma causa de exclusão social e financeira. Por exemplo, na Alemanha, o número de desempregados de longa duração aumentou para mais de um milhão. Foram sobretudo os trabalhadores precários que perderam o emprego, tendo o número de desempregados aumentado em 40 % nesta categoria, na sua maioria jovens e mulheres. Em geral, as desigualdades variam em função do género, da idade e do nível de instrução, bem como entre regiões, setores e profissões. Os grupos vulneráveis, como por exemplo, as pessoas com deficiência e os migrantes, são os que mais sofrem as consequências da crise sanitária.

4.2.

Geralmente, as perdas de rendimentos provocadas pelas recessões tendem a causar mais sofrimento para as pessoas mais pobres do que para as mais ricas. No entanto, quando ocorre uma retoma económica, as pessoas mais pobres não são as primeiras a recuperar, o que significa que as desigualdades sociais causadas, por exemplo, por uma crise financeira, podem perdurar décadas. O aumento das desigualdades resultante da crise atual pode ser ainda mais acentuado devido ao impacto adverso da pandemia. Já se referiu que a incidência de infeções pelo vírus da COVID-19 é mais elevada entre as pessoas mais desfavorecidas, o que, por sua vez, pode afetar negativamente os seus rendimentos. As pessoas mais pobres também têm menos probabilidades de aceder ao teletrabalho, o que provou ser um fator importante na perda de emprego.

4.2.1.

Além disso, os setores em que predominam os trabalhadores com baixos rendimentos (por exemplo, restaurantes, viagens, entretenimento) foram particularmente afetados (8). À medida que a pandemia acelerou a automação e a digitalização, incluindo a inteligência artificial, a procura de mão de obra altamente qualificada aumentou, ao passo que os trabalhadores pouco qualificados saíram do mercado de trabalho (9). É igualmente provável que o desemprego de longa duração tenha efeitos duradouros, como a perda de competências, e possa impedir a reintegração destes trabalhadores no mercado de trabalho. Ademais, o encerramento de escolas e universidades afetou em particular os grupos vulneráveis da sociedade.

4.3.

Além das repercussões da pandemia no bem-estar material, o CESE gostaria ainda de salientar o impacto desproporcionado da pandemia na segurança das pessoas e no usufruto dos seus direitos fundamentais. É sabido que os estabelecimentos de saúde e de prestação de cuidados se tornaram focos de infeções, registando um elevado número de mortes, em particular entre os idosos e as pessoas com deficiência.

4.3.1.

Em alguns Estados-Membros, os hospitais sobrecarregados também implementaram um sistema de triagem para determinar quem poderia ou não receber tratamento de emergência. Em alguns casos, verificaram-se graves descriminações. A idade e a deficiência foram utilizadas para justificar a rejeição de pacientes, expondo claramente as prioridades pelas quais os governos avaliam o valor dos seus diferentes cidadãos. É de suma importância que esta situação nunca se volte a repetir e que as pessoas vulneráveis não sejam tratadas como cidadãos de segunda classe.

4.4.

O CESE também chama a atenção para a falta de dados de elevada qualidade sobre a distribuição da riqueza. No entanto, já em 2016, o BCE concluiu, no seu inquérito sobre as finanças e o consumo das famílias, que a distribuição da riqueza líquida das famílias na área do euro registava um «grande desequilíbrio», sendo que os 10 % mais ricos detinham 51,2 % da riqueza líquida total (10). Outras projeções estimam uma distribuição ainda mais desigual da riqueza, sugerindo que 1 % das famílias mais ricas detém uma percentagem que pode chegar a 32 % da riqueza total. É muito provável que a COVID-19 agrave ainda mais a desigualdade na repartição da riqueza. De uma forma geral, parece ter induzido um aumento nas poupanças. No entanto, as famílias com rendimentos mais baixos reduziram as suas despesas em menor escala do que as famílias com mais rendimentos. Para satisfazerem as necessidades de subsistência, as famílias com baixos rendimentos voltaram mais rapidamente aos níveis anteriores à crise do que as famílias com mais rendimentos (11).

4.5.

A pandemia afetou de forma desproporcionada as mulheres, que se confrontaram com um maior risco de serem despedidas, colocadas em regime de suspensão da prestação de trabalho ou terem de reduzir o seu horário de trabalho, por diversos motivos. As mulheres têm uma maior representação em algumas das profissões mais duramente afetadas pelos confinamentos, e têm uma maior proporção de contratos a tempo parcial ou atípicos. As empresas deram prioridade à proteção dos trabalhadores com contratos de trabalho sem termo. Além disso, as mulheres deixaram os seus empregos ou reduziram o seu horário de trabalho devido ao aumento das obrigações de cuidados às crianças decorrente do encerramento das escolas. A pandemia aumentou ainda a disparidade de género no trabalho doméstico não remunerado (12).

4.6.

O Instrumento de Recuperação da UE pretende ser um dos principais instrumentos da UE para atenuar o impacto social negativo da crise, reforçando a resiliência social e aumentando o emprego. No entanto, o seu sucesso depende da forma como é aplicado. Importa assegurar uma aplicação eficaz e oportuna dos vários recursos, para que se possa alcançar a recuperação. Além disso, uma utilização eficiente dos recursos também promoverá um clima de confiança entre os Estados-Membros. Em suma, será essencial que o Instrumento de Recuperação da UE não seja utilizado meramente para dar continuidade aos investimentos já planeados antes da pandemia, mas para reagir com assertividade, aplicando reformas para ajudar a prevenir a recorrência dos piores impactos que a COVID-19 teve na nossa sociedade.

4.7.

O CESE congratula-se com o facto de os objetivos sociais e, em particular, o objetivo da coesão económica, social e territorial estarem integrados nos seus seis pilares, e de os critérios de avaliação dos planos de recuperação e resiliência incluírem o seu impacto social, devendo os Estados-Membros explicar a forma como os PRR contribuem para a igualdade de género e para a igualdade de oportunidades para todos. No entanto, o CESE receia que a dimensão social não esteja representada de forma adequada nos PRR ou que algumas medidas sejam rotuladas como «sociais», embora não contribuam para os objetivos sociais especificados no regulamento. Até agora, parece improvável que os PRR abordem eficazmente as disparidades sociais. A fim de assegurar que cada PRR tenha uma dimensão social forte, o CESE propõe que a Comissão não só defina uma metodologia para a comunicação das despesas sociais, conforme previsto no artigo 29.o, n.o 4, do Regulamento MRR, como também uma metodologia para a avaliação do impacto social das reformas estruturais propostas nos PRR. Além disso, é necessário reforçar a ênfase na distribuição equitativa e torná-la mais específica.

4.8.

O MRR deve ser utilizado para levar a cabo reformas que ajudem os Estados-Membros a recuperar do impacto da pandemia. O CESE apela para que os investimentos se destinem, em primeiro lugar, aos grupos mais duramente afetados pela COVID-19, e para que se extraiam ensinamentos dos contextos em que se encontravam as pessoas que sofreram mais durante esta crise sanitária. Devem ser realizados investimentos específicos para ajudar as pessoas a regressarem a empregos de qualidade, em particular as mulheres, os jovens, os desempregados de longa duração, as pessoas de minorias étnicas, as pessoas com deficiência e os idosos, cuja percentagem na sociedade em geral tende a aumentar. Por último, é necessário salvaguardar a sustentabilidade dos sistemas de pensões.

4.8.1.

É imperativo reforçar os serviços públicos de saúde e de prestação de cuidados, especialmente nos Estados-Membros em que a crise da COVID-19 expôs graves carências. O CESE considera que o MRR constitui uma oportunidade única para os Estados-Membros reformarem este tipo de serviços, bem como para criarem ofertas de apoio personalizado para as pessoas na sua comunidade, nomeadamente o apoio à assistência pessoal e o apoio ao domicílio.

4.9.

Além disso, cabe assegurar que o Instrumento de Recuperação da UE está alinhado com a criação de empregos dignos. O CESE recomenda a adoção de uma abordagem política com provas dadas no contexto dos fundos estruturais europeus, a saber, condicionar o pagamento dos fundos do MRR a determinados critérios. Por exemplo, as empresas só devem beneficiar dos recursos do MRR se aplicarem convenções coletivas ou criarem empregos de elevada qualidade com base na legislação e regulamentação nacionais resultantes do acordo dos parceiros sociais nacionais, aceitarem reduzir o número de empregos precários (por exemplo, contratos a termo ou temporários impostos unilateralmente pelo empregador) ou tiverem instituições de representação do pessoal robustas.

4.10.

Os atos delegados relativos à grelha de avaliação da recuperação e resiliência e à metodologia para a comunicação das despesas sociais, incluindo no que diz respeito às crianças e aos jovens, ainda não foram apresentados. O CESE apoia explicitamente o apelo do Parlamento Europeu à Comissão para «assegurar total transparência no que diz respeito ao calendário para a aprovação» destes atos, bem como a «rápida aprovação destes atos delegados antes das férias de verão» (13). É altamente discutível que as especificações relativas às dimensões sociais sejam fornecidas após a elaboração dos PRR e mesmo após a sua aprovação.

4.11.

Lamentavelmente, também não existe nenhuma condição específica que preveja o desembolso de um determinado montante dos recursos do MRR em prol de projetos sociais. Na verdade, a proporção de despesas diretamente associada a metas sociais não é clara e parece ser bastante reduzida. O CESE exige um relatório claro sobre a repartição e a conceção das despesas e dos projetos que se considera cumprirem as metas sociais em geral e a coesão social em particular. Importa também garantir que os investimentos ecológicos e digitais e todas as outras despesas no âmbito do Instrumento de Recuperação da UE sejam realizados no respeito do objetivo da sustentabilidade social. Também neste caso, é necessário um panorama mais claro do investimento previsto.

4.12.

A dependência dos PRR relativamente ao processo do Semestre Europeu, às recomendações específicas por país e às condicionalidades é problemática, pois nos últimos anos foram formuladas várias recomendações discutíveis, por exemplo, em matéria de despesas de saúde ou pensões. Em vez de interligar o MRR com o Semestre Europeu, teria sido mais adequado uma afetação clara dos fundos como uma condicionalidade estrita que garante uma absorção eficaz dos fundos da UE. Tendo em conta que o desembolso dos fundos está condicionado à aplicação das recomendações específicas por país, a reforma do Semestre Europeu reveste-se de ainda maior importância, incluindo normas mínimas para a consulta dos parceiros sociais e da sociedade civil, como indicado na Resolução do CESE «Participação da sociedade civil organizada nos planos nacionais de recuperação e resiliência» (14). É igualmente necessário associar de forma eficaz os parlamentos nacionais e o Parlamento Europeu.

4.12.1.

No contexto da política de coesão, do Instrumento de Recuperação da UE e das recomendações específicas por país, o CESE recomenda vivamente que se preste uma atenção especial a todos os diferentes aspetos da desigualdade e à procura de um crescimento sustentável, resiliente e inclusivo, bem como um acompanhamento rigoroso da forma como os fundos são utilizados. Cabe assegurar que os benefícios da recuperação e das transições ecológica e digital beneficiam todos os europeus, não esquecendo o trabalho de combate à exclusão digital e à pobreza energética, que poderão ser exacerbadas pela transição.

4.12.2.

O CESE congratula-se com a ênfase colocada no Pilar Europeu dos Direitos Sociais e no painel de indicadores sociais no processo do Semestre Europeu e, por conseguinte, também no Instrumento de Recuperação da UE. No entanto, apela explicitamente à sua integração sistemática no Instrumento de Recuperação da UE e na avaliação dos PRR. O CESE destaca, em particular, o sinal positivo transmitido pela Cimeira do Porto de que devemos ir além do PIB como medida da prosperidade. O Instrumento de Recuperação da UE não deve apenas ser avaliado com base na sua interação com o Semestre Europeu, mas deve ser visto também como um meio de coesão territorial e social e de aplicação dos respetivos programas.

4.13.

Em suma, o CESE insta a União Europeia a aproveitar a oportunidade única representada pelo Instrumento de Recuperação da UE para acelerar e promover as reformas estruturais urgentemente necessárias e colmatar lacunas nas políticas sociais, económicas e ambientais, bem como para aplicar uma abordagem centrada na prosperidade. Tendo em conta o impacto e a mobilização dos fundos a longo prazo, o CESE recomenda a formação de um consenso entre os partidos políticos, as partes interessadas sociais, os empresários, os sindicatos e a sociedade civil, a fim de garantir o maior êxito possível desta oportunidade. O CESE considera que os fundos europeus não são apenas números, objetivos e prazos, mas também simbolizam o facto de a União Europeia partilhar uma visão comum para o futuro.

Bruxelas, 23 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Regulamento (UE) 2021/241 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de fevereiro de 2021, que cria o Mecanismo de Recuperação e Resiliência (JO L 57 de 18.2.2021, p. 17).

(2)  Participação da sociedade civil organizada nos planos nacionais de recuperação e resiliência — O que funciona e o que não funciona? — Comité Económico e Social Europeu (JO C 155 de 30.4.2021, p. 1).

(3)  «The nonsense of Next Generation EU net balance calculations» [O absurdo dos cálculos do saldo líquido do Instrumento de Recuperação da UE], Bruegel.

(4)  Mecanismo de Recuperação e Resiliência, Comissão Europeia

(5)  Regulamento (UE) 2021/1060 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de junho de 2021, que estabelece disposições comuns relativas ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, ao Fundo Social Europeu Mais, ao Fundo de Coesão, ao Fundo para uma Transição Justa e ao Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos, das Pescas e da Aquicultura e regras financeiras aplicáveis a esses fundos e ao Fundo para o Asilo, a Migração e a Integração, ao Fundo para a Segurança Interna e ao Instrumento de Apoio Financeiro à Gestão das Fronteiras e à Política de Vistos (JO L 231 de 30.6.2021, p. 159).

(6)  Mecanismo de Recuperação e Resiliência, Comissão Europeia

(7)  «The great COVID-19 divergence: managing a sustainable and equitable recovery in the European Union» [A grande divergência da COVID-19: gerir uma recuperação sustentável e equitativa na União Europeia], Bruegel

(8)  WP-2021-06_30032021.pdf

(9)  Stantcheva_covid19_policy.pdf

(10)  Banco Central Europeu, «The Household Finance and Consumption Survey: results from the Second wave» [Inquérito sobre as finanças e o consumo das famílias: resultados da segunda fase], n.o 18, dezembro de 2016

(11)  Stantcheva_covid19_policy.pdf

(12)  Stantcheva_covid19_policy.pdf

(13)  Proposta de resolução sobre o direito do Parlamento à informação no que respeita à avaliação em curso dos planos nacionais de recuperação e resiliência

(14)  Participação da sociedade civil organizada nos planos nacionais de recuperação e resiliência — O que funciona e o que não funciona? — Comité Económico e Social Europeu


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/9


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o tema «Assegurar a liberdade e a diversidade dos meios de comunicação social na Europa»

(parecer de iniciativa)

(2021/C 517/02)

Relator:

Christian MOOS

Decisão da Plenária

20.2.2020

Base jurídica

Artigo 32.o, n.o 2, do Regimento

 

Parecer de iniciativa

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

7.9.2021

Adoção em plenária

22.9/2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

 

(votos a favor/votos contra/abstenções)

223/2/8

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

A liberdade dos meios de comunicação social, incluindo a proteção e a segurança dos jornalistas, e o pluralismo dos meios de comunicação social são pedras angulares da democracia liberal, tal como acordado por todos os Estados-Membros nos Tratados da UE.

1.2.

Embora a Europa continue a ser, de modo geral, um continente com meios de comunicação social livres e diversificados, a evolução da situação na UE é alarmante. Alguns Estados-Membros da UE deixaram de ser democracias liberais, sujeitando os meios de comunicação social independentes ao controlo político e limitando ativamente a diversidade dos meios de comunicação social.

1.3.

As ameaças à liberdade dos meios de comunicação social e a diminuição do pluralismo dos mesmos não se limitam a alguns Estados-Membros, mas constituem uma tendência geral em toda a UE. Todos os Estados-Membros devem tomar medidas urgentes para preservar a liberdade e o pluralismo dos meios de comunicação social.

1.4.

Como alguns Estados-Membros não estão dispostos a adotar as medidas necessárias, é obrigação das instituições da UE fazer cumprir os valores europeus e garantir o funcionamento da democracia liberal e do Estado de direito em todos os Estados-Membros da UE.

1.5.

Os principais desafios incluem a garantia da segurança, proteção e independência dos jornalistas em todos os Estados-Membros em qualquer altura, a defesa dos meios de comunicação social independentes contra a influência política e medidas contra a diminuição do pluralismo dos meios de comunicação social impulsionada pela vontade política e por imperativos económicos.

1.6.

O CESE congratula-se com o vasto leque de iniciativas e relatórios do Parlamento Europeu (1) e da Comissão Europeia; sublinha, porém, que a principal tarefa a realizar consiste em obter melhorias concretas em matéria de liberdade e pluralismo dos meios de comunicação social a nível nacional, tal como salientado no relatório anual de 2021 pelas organizações parceiras da Plataforma do Conselho da Europa para promover a proteção do jornalismo e a segurança dos jornalistas (2).

1.7.

O CESE exorta a Comissão a utilizar o Regulamento (UE, Euratom) 2020/2092 do Parlamento Europeu e do Conselho (3) relativo a um regime geral de condicionalidade para a proteção do orçamento da União sem demora, a fim de combater as ameaças graves à liberdade e ao pluralismo dos meios de comunicação social em alguns Estados-Membros.

1.8.

O CESE congratula-se com o plano da Comissão de propor medidas para aumentar a segurança dos jornalistas e sublinha a necessidade de uma proibição legal das ações judiciais estratégicas contra a participação pública (SLAPP).

1.9.

O CESE exorta a Comissão a tornar mais transparentes e justos os concursos públicos no setor dos meios de comunicação social e o apoio público às empresas de comunicação social.

1.10.

O CESE apoia firmemente o plano da Comissão de criar uma «Lei europeia da liberdade dos meios de comunicação social» para dotar a Comissão de instrumentos legais eficazes para impor a liberdade e o pluralismo dos meios de comunicação social no mercado comum.

1.11.

O CESE considera que o apoio público e imparcial às empresas de comunicação social é um investimento em jornalismo de qualidade e que as empresas públicas de radiodifusão independentes e imparciais são um elemento indispensável para o pluralismo dos meios de comunicação social.

1.12.

O CESE propõe a criação de um serviço público europeu de radiodifusão, totalmente independente.

1.13.

O CESE sublinha a importância de continuar a desenvolver a literacia mediática e apoia a proposta de criação de uma agência europeia para reforçar as competências mediáticas dos cidadãos da UE através de programas educativos.

2.   Liberdade e diversidade dos meios de comunicação social como condição prévia para a democracia

2.1.

O artigo 19.o da Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH), o artigo 10.o, n.o 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e o artigo 11.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (CDF) garantem o direito de procurar, receber e transmitir informações e ideias sem interferência das autoridades públicas e independentemente das fronteiras. A independência e a diversidade dos meios de comunicação social são essenciais para garantir essa liberdade de informação.

2.2.

A liberdade e o pluralismo dos meios de comunicação social garantidos pelo artigo 11.o, n.o 2, da CDF são também uma condição prévia para a democracia. Devem ser respeitados a todos os níveis para que os cidadãos da União possam exercer efetivamente o seu direito de participação na sua vida democrática, tal como consagrado no artigo 10.o, n.o 3, do Tratado da União Europeia (TUE).

2.3.

Uma paisagem mediática diversificada, a par dos partidos políticos e da sociedade civil, constitui um contributo indispensável para a formação de opiniões e intenções nos processos democráticos de tomada de decisão.

2.4.

Os meios de comunicação independentes fornecem um contributo indispensável para a aplicação do princípio de transparência a que as instituições e outros organismos da União estão vinculados pelo artigo 15.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).

2.5.

Enquanto «quarto património», os jornalistas de investigação desempenham um papel de vigilância sobre as ações dos poderes executivo, legislativo e judicial, bem como de entidades privadas. Ao fazê-lo, aumentam a responsabilização dos decisores eleitos a todos os níveis.

2.6.

Os Estados-Membros em que a liberdade ou diversidade dos meios de comunicação social é restringida não são democracias e atentam contra os valores (artigo 2.o do TUE) e objetivos (artigo 3.o do TUE) da UE.

2.7.

Embora alguns Estados-Membros da UE continuem a estar na vanguarda mundial na garantia da liberdade e diversidade dos meios de comunicação social, as ameaças à liberdade dos meios de comunicação social e a diminuição do pluralismo dos mesmos na UE não se limitam aos países individuais — as tendências adversas são evidentes em diferentes graus em toda a UE.

2.8.

A diminuição da liberdade e do pluralismo dos meios de comunicação social a nível interno compromete a capacidade da UE para apoiar a democracia na sua vizinhança, onde crises recentes em alguns Estados demonstraram que a situação relativa à liberdade e ao pluralismo dos meios de comunicação social, bem como à segurança dos jornalistas é ainda pior em alguns países.

2.9.

Alguns Estados-Membros da UE deixaram agora o círculo dos Estados democráticos e, na última década, manifestaram a evolução mais rápida na via da autocracia no mundo. A restrição da liberdade e diversidade dos meios de comunicação social tem sido uma característica dessa evolução.

2.10.

A pandemia acelerou ainda mais essa evolução ou foi utilizada para legitimar novas incursões na liberdade dos meios de comunicação social.

2.11.

A edição de 2021 do Índice Mundial da Liberdade de Imprensa da Repórteres sem Fronteiras e os relatórios anuais da Freedom House sobre a liberdade e sobre os meios de comunicação e a liberdade na Internet demonstram claramente que a UE enfrenta dificuldades na defesa de valores a nível interno (4).

3.   Ameaças à liberdade e à diversidade dos meios de comunicação social

3.1.   A ameaça aos jornalistas

3.1.1.

Para que os meios de comunicação social cumpram a sua missão, os jornalistas devem poder trabalhar sem entraves e estar confiantes de que estão sempre plenamente protegidos como indivíduos pela UE e por todos os seus Estados-Membros. Hoje em dia já não é assim.

3.1.2.

Desde 2015, pelo menos 16 jornalistas foram mortos na UE no decurso — ou em resultado — do seu trabalho. Daphne Caruana Galizia, Giorgos Karaivaz, Ján Kuciak e a sua noiva Martina Kušnírová, Lyra McKee, Peter de Vries e os seus colegas não devem ser esquecidos.

3.1.3.

Os jornalistas estão cada vez mais expostos a ataques verbais e físicos, estando a cobertura de protestos e manifestações em particular a tornar-se mais perigosa, e o perigo provém tanto dos manifestantes como das forças policiais. Com mais de cem casos relacionados com a pandemia, a ameaça atingiu novas proporções na Europa (5).

3.1.4.

Nalguns países europeus que não pertencem à UE, a situação dos jornalistas é dramática: o caso da Bielorrússia é um exemplo muito alarmante da acentuada deterioração da situação dos jornalistas independentes.

3.1.5.

Os meios de comunicação social e as dinâmicas de grupo aí observadas baixam o limiar para o assédio e as ameaças. Existem algumas campanhas coordenadas destinadas a dificultar o trabalho dos meios de comunicação social ou de jornalistas individuais. Tal levanta a questão da eventual necessidade de regulamentar as plataformas de redes sociais, sem restringir as liberdades fundamentais.

3.1.6.

As jornalistas são mais suscetíveis do que os seus colegas do sexo masculino de serem alvo de agressões verbais e físicas, bem como de assédio e ameaças em linha, que são frequentemente de natureza misógina, sexual ou machista.

3.1.7.

Em alguns Estados-Membros, as medidas para combater a desinformação e as proibições de difamação são concebidas de modo a poderem ser utilizadas para criminalizar reportagens críticas e ameaçar jornalistas com pena de prisão ou multas pesadas.

3.1.8.

As ações judiciais estratégicas contra a participação pública (SLAPP) são cada vez mais utilizadas para silenciar as partes interessadas da sociedade civil e os jornalistas.

3.1.9.

Os atuais desafios económicos enfrentados pelas empresas de comunicação social levaram a cortes no número de jornalistas com emprego regular. Para os jornalistas independentes, cada vez mais precários e vulneráveis, os litígios representam uma ameaça à subsistência, mesmo que as alegações apresentadas sejam infundadas.

3.1.10.

Em particular a nível local, existem «desertos noticiosos» sem precedentes, e os meios de comunicação social independentes são frequentemente substituídos pelas denominadas notícias municipais, jornais gratuitos, que são propriedade das elites económicas e políticas locais e podem comprometer a liberdade e o pluralismo dos meios de comunicação social.

3.1.11.

O objetivo das ameaças é induzir a autocensura. Comprometem a liberdade dos meios de comunicação social na Europa.

3.2.   Ameaças à liberdade dos meios de comunicação social

3.2.1.

Para os meios de comunicação social funcionarem livremente, o quadro jurídico que garante a sua liberdade e diversidade deve assegurar que os jornalistas e as empresas de comunicação social possam realizar o seu trabalho sem qualquer ingerência política.

3.2.2.

Existem sérias preocupações em vários Estados-Membros quanto à independência dos reguladores dos meios de comunicação social, que em alguns casos servem como um instrumento de facto para os governos exercerem influência sobre o panorama dos meios de comunicação social. A existência de órgãos genuinamente independentes de autorregulamentação voluntária dos meios de comunicação social pode proteger os meios de comunicação social da influência política.

3.2.3.

Alguns Estados-Membros utilizam legislação fiscal discriminatória e orçamentos de publicidade específicos para influenciar os meios de comunicação social.

3.2.4.

Alguns Estados-Membros utilizaram o perigo da disseminação de desinformação sobre a pandemia para legitimar as restrições à liberdade de imprensa, a fim de impedir a divulgação de reportagens críticas sobre a gestão da crise.

3.2.5.

Os meios de comunicação social públicos sujeitos a controlo político, direto ou indireto, através de organismos de supervisão que não são geridos em plena conformidade com a liberdade dos jornalistas constituem uma séria ameaça à liberdade dos meios de comunicação social. Há tentativas crescentes de exercer influência política direta sobre a cobertura dos meios de comunicação social independentes, bem como agressões verbais por parte de políticos e ações judiciais contra jornalistas e meios de comunicação social críticos.

3.2.6.

Em vários Estados-Membros, a proximidade excessiva dos empresários dos meios de comunicação social com o governo ou aqueles que colocaram em cargos governamentais, bem como a propriedade por partidos políticos ou Estados de empresas de meios de comunicação social com uma quota de mercado indevidamente elevada, conduzem a restrições consideráveis à liberdade e diversidade dos meios de comunicação social.

3.2.7.

Mesmo nas democracias liberais que funcionam, a existência de um serviço público de radiodifusão independente e imparcial como garantia da diversidade de opiniões está a ser questionada e estão a ser feitos apelos à influência política sobre a composição dos programas e sobre os conteúdos distribuídos.

3.3.   Ameaças à diversidade dos meios de comunicação social

3.3.1.

Nos últimos três anos, a consolidação no mercado dos meios de comunicação social da UE, incluindo o mercado publicitário e os canais de distribuição, aumentou acentuadamente e constitui um risco médio ou elevado para a liberdade dos meios de comunicação social em toda a UE, de acordo com o estudo Media Pluralism Monitor [do Pluralismo nos Meios de Comunicação Social] de 2020 (6).

3.3.2.

As mudanças nos padrões de utilização dos meios de comunicação social em resultado da revolução digital estão a pôr em causa os modelos de negócio dos meios de comunicação social estabelecidos. Jornais e pequenos meios de comunicação a nível local, que são a espinha dorsal da diversidade dos meios de comunicação na UE, são particularmente afetados. Estão a tornar-se alvos fáceis de consolidação impulsionada por questões políticas.

3.3.3.

A importância crescente dos meios de comunicação social digitais aumenta o poder de mercado — e, por conseguinte, a influência nas opiniões — das grandes plataformas, que, tal como as empresas estrangeiras, contornam frequentemente a regulamentação europeia.

3.3.4.

As consequências económicas da pandemia, em especial a queda das receitas de publicidade, estão a acelerar as mudanças em curso no mercado dos meios de comunicação social e a restringir ainda mais a sua diversidade.

4.   Recomendações para reforçar a liberdade e a diversidade dos meios de comunicação social na Europa

4.1.   Recomendações gerais

4.1.1.

O CESE assinala que os indivíduos e governos que colocam em causa a liberdade ou o pluralismo dos meios de comunicação social pelas suas palavras ou ações não são adequados para presidir às instituições da UE ou às suas instâncias preparatórias ou para representar a União.

4.1.2.

O CESE congratula-se com o facto de o Regulamento (UE, Euratom) 2020/2092 relativo a um regime geral de condicionalidade para a proteção do orçamento da União ter reforçado a vertente corretiva da caixa de ferramentas do Estado de direito, incluindo a liberdade e o pluralismo dos meios de comunicação social.

4.1.3.

O CESE congratula-se com o facto de o Relatório da Comissão Europeia sobre o Estado de Direito, incluindo a supervisão do pluralismo e da liberdade dos meios de comunicação social a nível nacional, e o debate no Conselho da União Europeia terem também reforçado a vertente preventiva da caixa de ferramentas do Estado de direito na UE.

4.1.4.

O CESE apela ao reforço da eficácia da vertente preventiva através da inclusão, no futuro, de recomendações de reforma específicas para os Estados-Membros nos capítulos por país do Relatório sobre o Estado de Direito, cuja aplicação será avaliada no relatório do ano seguinte.

4.1.5.

O CESE está empenhado em fazer da proteção da liberdade e da diversidade dos meios de comunicação social uma das questões essenciais a ser discutida na Conferência sobre o Futuro da Europa, a fim de aumentar a sensibilização para a importância deste desafio e intensificar ainda mais o debate sobre as medidas necessárias.

4.2.   Recomendações sobre a proteção dos jornalistas

4.2.1.

O CESE salienta que a melhor proteção para os jornalistas passa por uma ação judicial firme em todos os casos de assédio, ameaças e agressões que enfrentem.

4.2.2.

O CESE exorta a Comissão a utilizar o Regulamento (UE, Euratom) 2020/2092 relativo a um regime geral de condicionalidade para a proteção do orçamento da União sem demora, a fim de combater as ameaças graves à liberdade e ao pluralismo dos meios de comunicação social em alguns Estados-Membros. Tal inclui claramente a recusa de acesso a fundos europeus pelos Estados-Membros que violam a liberdade dos meios de comunicação social.

4.2.3.

O CESE apoia a posição do Parlamento Europeu (7) de intentar uma ação ao abrigo do artigo 256.o do TFUE no caso de a Comissão não agir.

4.2.4.

O CESE congratula-se com o plano da Comissão de apresentar propostas concretas para a aplicação coerente da Recomendação do Comité de Ministros sobre a proteção do jornalismo e a segurança de jornalistas e outros agentes dos meios de comunicação (8) em todos os Estados-Membros da UE e de controlar o seu cumprimento no âmbito do seu Relatório sobre o Estado de Direito.

4.2.5.

O CESE congratula-se com os compromissos da Comissão de apoiar financeiramente os projetos relativos à proteção jurídica e prática dos jornalistas e propõe que, além disso, sejam consideradas formas de assegurar que os sistemas de segurança social dos Estados-Membros cubram os riscos profissionais dos jornalistas, em particular os que trabalham por conta própria.

4.2.6.

O CESE salienta que as autoridades de segurança dos Estados-Membros são obrigadas a proteger os jornalistas. Propõe o reforço da formação policial no tratamento dos jornalistas, com a participação das associações e organizações de jornalistas, a fim de promover o intercâmbio de boas práticas.

4.2.7.

No que respeita à proteção dos jornalistas contra o assédio e as ameaças em linha, o CESE chama a atenção para o seu parecer sobre o combate aos conteúdos ilegais em linha (9) e salienta a sua particular vulnerabilidade devido ao seu papel público altamente visível.

4.2.8.

O CESE salienta que quaisquer medidas a serem adotadas devem ter em conta a igualdade de género e a proteção dos jornalistas pertencentes a minorias.

4.2.9.

O CESE reconhece que a garantia do princípio da transparência e do direito à liberdade de informação tem melhorado a nível da UE, mas não em todos os Estados-Membros. Apela a todos os Estados-Membros para que cumpram infalivelmente as normas da UE e aponta para a necessidade de mais melhorias, nomeadamente a nível da UE (10).

4.2.10.

O CESE congratula-se com a criação do grupo de peritos sobre as SLAPP e com o plano da Comissão de apresentar uma proposta até ao final de 2021 para proteger os jornalistas e a sociedade civil das SLAPP. Considera que uma proibição legal das SLAPP deve prevalecer sobre as medidas complementares de apoio às pessoas afetadas.

4.2.11.

O CESE sublinha a importância de iniciativas da sociedade civil, tais como a Coalition Against SLAPPs in Europe (CASE) (11), para proteger os jornalistas das SLAPP e apela a um maior apoio da UE.

4.2.12.

O CESE observa que, em relação às SLAPP, as disposições dos regulamentos de Bruxelas I (12) e Roma II (13) não devem levar a uma redução da proteção jurídica através da escolha de jurisdição em processos judiciais vexatórios (turismo de calúnia). Salienta a necessidade de abordar esta questão na próxima revisão dos dois regulamentos.

4.3.   Recomendações para reforçar a independência dos meios de comunicação social

4.3.1.

O CESE convida a Comissão a complementar a metodologia do Relatório sobre o Estado de Direito, avaliando a independência do Estado e da radiodifusão pública.

4.3.2.

O CESE assinala que a repressão eficaz da corrupção proporciona alguma proteção contra a interferência governamental nos meios de comunicação social e, por conseguinte, solicita à Comissão que, para além de aplicar as normas anticorrupção, tome todas as medidas necessárias, independentemente de considerações políticas, para assegurar que não seja utilizado dinheiro do novo quadro financeiro plurianual e do Instrumento de Recuperação da União Europeia para reduzir a diversidade dos meios de comunicação social ou outras formas de corrupção.

4.3.3.

O CESE apela a todos os Estados-Membros para que estabeleçam registos nacionais de transparência segundo o Registo de Transparência da União Europeia, uma vez que estes também tornam transparentes os contactos entre políticos e empresários dos meios de comunicação social. Os registos de transparência devem ser integrados num registo de transparência a vários níveis à escala da UE.

4.3.4.

O CESE solicita à Comissão que avalie se o projeto-piloto para a criação de uma base de dados de informações acessíveis ao público sobre a propriedade dos meios de comunicação social pode ser desenvolvido de modo a incluir informações sobre a promoção e contratação de empresas de comunicação social pela UE, pelos seus Estados-Membros, pelos órgãos de poder regional e local, pelos organismos de direito público e pelas empresas públicas e privadas em que uma ou mais destas entidades sejam acionistas maioritários com direito de voto.

4.3.5.

O CESE solicita à Comissão que apresente uma proposta de normas mínimas a nível da UE para todos os concursos públicos e de apoio às empresas de comunicação social pelas entidades mencionadas no ponto 4.3.4.

4.3.6.

O CESE congratula-se com as propostas da Comissão para combater a desinformação em geral (14) e no contexto da COVID-19 nos meios de comunicação social (15), mas assinala o risco de os Estados-Membros poderem utilizar a luta contra a desinformação para justificarem a restrição da liberdade dos meios de comunicação social. Os fenómenos da desinformação e do discurso de ódio devem ser analisados em profundidade, com caráter de urgência, nomeadamente em pareceres futuros do CESE.

4.4.   Recomendações para reforçar a diversidade dos meios de comunicação social

4.4.1.

O CESE critica o facto de o Relatório da Comissão sobre o Estado de Direito reduzir a questão do pluralismo do mercado à questão da transparência na propriedade dos meios de comunicação social e negligenciar o nível de consolidação do mercado. Convida a Comissão a adaptar a metodologia do relatório, a fim de refletir melhor, no futuro, em que medida a diversidade dos meios de comunicação social está em risco em todos os Estados-Membros.

4.4.2.

O CESE congratula-se com o plano de ação da Comissão «Os meios de comunicação social da Europa na Década Digital» (16) e com o seu objetivo de preservar os meios de comunicação social noticiosos como um bem público, em particular a prestação de apoio europeu para evitar que a diversidade dos meios de comunicação social seja cerceada pelas consequências da pandemia.

4.4.3.

O CESE sublinha que o jornalismo de qualidade requer uma base económica sustentável e apela à continuação do apoio da UE às empresas de comunicação social como um investimento em bom jornalismo. Os investimentos servirão para pôr fim ao processo de consolidação no setor dos meios de comunicação social, que ameaça a pluralidade no mercado dos meios de comunicação social. Isto não exclui a possibilidade de as empresas de comunicação social comprarem legitimamente outros meios de comunicação social ou estabelecerem alianças estratégicas, uma vez que as empresas de comunicação social economicamente sustentáveis são um garante da sua independência, desde que o princípio da transparência seja respeitado e que não sejam criados monopólios.

4.4.4.

O CESE assinala que o valor das empresas de comunicação social reside na sua diversidade e que a criação de «campeões nacionais» destrói esse valor, o que é algo que distingue os meios de comunicação social e as indústrias criativas de outros setores da economia.

4.4.5.

A diminuição do espaço para os meios de comunicação social independentes exige mecanismos urgentes de apoio público e privado para sustentar o jornalismo como um bem público. É necessária mais investigação para mecanismos eficientes de apoio público que garantam critérios de plena concorrência e novos modelos empresariais inovadores e sustentáveis para o jornalismo de interesse público.

4.4.6.

O CESE apoia firmemente o plano da Comissão para uma «Lei europeia da liberdade dos meios de comunicação social», com vista a dotar a Comissão Europeia de instrumentos legais eficazes para impor a liberdade e o pluralismo dos meios de comunicação social em todos os Estados-Membros da UE. O CESE exorta a Comissão a analisar a forma como o direito europeu da concorrência pode ser aplicado e desenvolvido para impedir uma maior consolidação no mercado dos meios de comunicação social, em particular a impulsionada pelos governos nacionais, para evitar a criação de monopólios de comunicação social nos mercados nacionais de meios de comunicação social da UE, nomeadamente por governos ou agentes próximos deles.

4.4.7.

O CESE chama a atenção para o seu parecer sobre a iniciativa da Comissão relativa a um sistema comum de imposto sobre os serviços digitais aplicável às receitas da prestação de determinados serviços digitais (17) e salienta que este imposto (ISD) é suscetível de compensar distorções de concorrência entre os meios de comunicação tradicionais e digitais (nomeadamente os sediados no estrangeiro).

4.4.8.

O CESE sublinha a importância do serviço público de radiodifusão independente e imparcial para assegurar a diversidade dos meios de comunicação social e chama a atenção para o acordo previsto no Protocolo n.o 29 do TUE.

4.4.9.

O CESE observa que o mercado livre é incapaz de fornecer serviços de comunicação social à escala da UE no domínio da radiodifusão e, por conseguinte, apela à criação de um serviço público europeu de radiodifusão independente e imparcial.

4.4.10.

Em todos os casos em que o mercado livre é incapaz de assegurar a diversidade dos meios de comunicação social, o CESE considera o serviço público de radiodifusão independente e imparcial como um modelo para a garantir, nomeadamente nos meios de comunicação social em linha e na imprensa escrita.

4.4.11.

O CESE salienta que o livre acesso aos meios de comunicação social é um aspeto fundamental da liberdade dos meios de comunicação social e está preocupado com o aumento das formas de discriminação, direta ou indireta, em razão da deficiência nos meios de comunicação social. O CESE apela à aplicação de legislação que elimine as práticas restritivas que tenham o efeito de prejudicar ou anular a participação de um indivíduo na liberdade e diversidade dos meios de comunicação social.

4.5.   Recomendações para reforçar a literacia mediática

4.5.1.

O CESE congratula-se com as numerosas propostas da Comissão para reforçar a literacia mediática dos cidadãos (18), com especial destaque para as competências digitais. Este aspeto reveste-se da maior importância para aumentar a resistência dos cidadãos à desinformação.

4.5.2.

O CESE apoia a proposta de criação de uma «Agência Europeia de Educação para a Cidadania», com vista a reforçar a literacia mediática dos cidadãos da UE através de programas educativos. Convida a Comissão a estudar a possibilidade de criar atempadamente uma instituição central deste tipo e a assegurar que uma das suas competências seja a prestação de formação no tratamento — especialmente digital — dos meios de comunicação social.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Relatório da deputada Magdalena Adamowicz, Parlamento Europeu — Resolução do Parlamento Europeu, de 25 de novembro de 2020, sobre o reforço da liberdade dos meios de comunicação social: proteção dos jornalistas na Europa, discursos de ódio, desinformação e o papel das plataformas (JO C 425 de 20.10.2021, p. 28).

(2)  https://www.coe.int/en/web/media-freedom

(3)  Regulamento (UE, Euratom) 2020/2092 do Parlamento Europeu e do Conselho de 16 de dezembro de 2020 relativo a um regime geral de condicionalidade para a proteção do orçamento da União (JO L 433 I de 22.12.2020, p. 1).

(4)  Repórteres sem Fronteiras: Classificação Mundial da Liberdade de Imprensa 2021, https://rsf.org/pt/ranking (acedido em 24 de maio de 2021).

(5)  International Press Institute: COVID-19: Number of Media Freedom Violations by Region [COVID-19: Número de violações da liberdade de imprensa por região], https://ipi.media/covid19-media-freedom-monitoring/ (acedido em 8 de abril de 2021).

(6)  Elda Brogi et al. 2020: Monitoring Media Pluralism in the Digital Age. Application of the Media Pluralism Monitor in the European Union, Albania and Turkey in the years 2018-2019 [Supervisão do pluralismo nos meios de comunicação social na era digital. Aplicação do Monitor do Pluralismo nos Meios de Comunicação Social na União Europeia, Albânia e Turquia nos anos 2018-2019], Fiesole, p. 50.

(7)  P9_TA(2021)0103

(8)  CM/Rec(2016)4

(9)  JO C 237 de 6.7.2018, p. 19

(10)  JO C 487 de 28.12.2016, p. 51; JO C 13 de 15.1.2016, p. 192

(11)  https://www.the-case.eu

(12)  Regulamento (UE) n.o 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO L 351 de 20.2.2012, p. 1).

(13)  Regulamento (CE) n.o 864/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Julho de 2007 , relativo à lei aplicável às obrigações extracontratuais (Roma II) (JO L 199 de 31.7.2007, p. 40).

(14)  COM(2020) 790 final

(15)  JOIN(2020) 8 final

(16)  COM(2020) 784 final

(17)  JO C 367 de 10.10.2018, p. 73

(18)  JOIN(2020) 8 final; COM(2020) 624 final; COM(2020) 784 final; COM(2020) 790 final


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/16


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Medidas de urgência para apoiar o emprego e os rendimentos durante a crise pandémica»

(parecer de iniciativa)

(2021/C 517/03)

Relatora:

Cinzia DEL RIO

Decisão da Plenária

26.4.2021

Base jurídica

Artigo 32.o, n.o 2, do Regimento

 

Parecer de iniciativa

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

7.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

211/1/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE apoia a estratégia da UE para enfrentar a crise pandémica, para assegurar a recuperação e resiliência dos sistemas económicos, sociais e de saúde dos Estados-Membros, bem como para salvaguardar o sistema produtivo, o emprego e o apoio ao rendimento das pessoas.

1.2.

O CESE apoia a criação do SURE enquanto instrumento financeiro inovador de solidariedade europeia para preservar postos de trabalho, fornecer apoio ao rendimento dos trabalhadores e apoiar as empresas, bem como enquanto instrumento de integração e de resiliência socioeconómica da UE.

1.3.

O CESE sublinha o valor social do SURE, que, ao emitir obrigações para financiar iniciativas sociais, antecipa o mecanismo do Instrumento de Recuperação da União Europeia («Next Generation EU»).

1.4.

O CESE congratula-se com a aplicação do SURE, que, através do financiamento de regimes de tempo de trabalho reduzido, de apoio ao rendimento e de apoio às empresas, protegeu um quarto da população ativa total, salvaguardando postos de trabalho e a capacidade produtiva das empresas, tendo, assim, um impacto positivo na economia e no mercado de trabalho. Contudo, é de notar que estes dados não realçam suficientemente as medidas individuais financiadas pelos vários países, os seus montantes e as categorias de trabalhadores abrangidas pela ajuda.

1.5.

O CESE propõe a criação de um observatório para acompanhar o funcionamento do SURE ao longo da sua duração, com a participação dos parceiros sociais e outras organizações da sociedade civil, a fim de acompanhar e avaliar o impacto das medidas financiadas em cada país, nomeadamente para identificar modelos de regimes de redução do horário de trabalho e de apoio ao rendimento replicáveis no futuro em situações de crise semelhantes.

1.6.

Em tempos de crise económica, a rapidez das decisões e escolhas é um fator determinante. Assim, o CESE aprecia a rapidez com que a Comissão Europeia criou o SURE e a celeridade com que concluiu as negociações com os Estados-Membros, demonstrando capacidade de reação à gravidade da crise.

1.7.

O CESE recomenda a combinação do SURE com medidas políticas ativas do mercado de trabalho e programas de formação profissional e requalificação destinados a criar emprego estável e de qualidade, combatendo, assim, formas de trabalho mal remunerado, fragmentado e instável que não dão garantias de uma cobertura de segurança social adequada e afetam os sistemas públicos de proteção social.

1.8.

O CESE considera que o SURE é um dos instrumentos apropriados para proporcionar incentivos aos empregadores para que continuem a dar emprego aos seus trabalhadores apesar da redução da atividade de produção. É possível encorajar, através de acordos coletivos, ações destinadas a consagrar parte do horário de trabalho à formação. Tal permite às empresas atualizarem as competências dos trabalhadores reservando parte do horário à formação, ficando o salário dessas horas a cargo do SURE.

1.9.

O CESE salienta a necessidade de, assegurando a competitividade da Europa no contexto mundial, definir e concluir, de forma mais abrangente e coesa, a dimensão social europeia, nomeadamente face aos novos desafios da transição ecológica e da transição digital, tendo em conta as medidas identificadas no Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, incluindo ações e investimentos para apoiar o emprego, a formação e as políticas ativas do mercado de trabalho.

1.10.

O CESE apoia a comunicação da Comissão que anuncia a intenção de suspender a cláusula de derrogação de âmbito geral do Pacto de Estabilidade e Crescimento e defende uma «transição» para um quadro de governação económica revisto e reequilibrado, orientado para a promoção do investimento produtivo. Será essencial ajudar os Estados-Membros a tornar sustentáveis as suas finanças públicas, reforçando assim a confiança no investimento.

1.11.

O CESE considera que o consenso e a participação dos parceiros sociais são um valor acrescentado das políticas europeias e nacionais. É, portanto, essencial que estes também sejam associados às ações cofinanciadas pelo SURE, inclusivamente através da negociação coletiva nos setores mais afetados pela crise. É, contudo, fundamental que a participação dos parceiros sociais seja efetiva e legítima, e não apenas formal.

1.12.

O CESE reconhece plenamente os resultados positivos do SURE salientados no relatório da Comissão de março de 2021 e subscreve a proposta de converter o SURE num instrumento permanente para apoiar os trabalhadores e as empresas enquanto mecanismo de integração e resiliência socioeconómica da UE em períodos de crise como o atual, designadamente através do acompanhamento e da avaliação levados a cabo pelo observatório sobre a aplicação do SURE que o CESE propõe criar.

1.13.

O CESE congratula-se com a Recomendação (UE) 2021/402 da Comissão (1) (EASE), cuja abordagem estratégica consiste em passar gradualmente das medidas de urgência adotadas durante a pandemia para novas medidas capazes de assegurar uma recuperação geradora de emprego, nomeadamente através de políticas ativas do mercado de trabalho, como os incentivos temporários à contratação de pessoas pertencentes a grupos vulneráveis, as possibilidades de melhoria de competências e de requalificação e o apoio às empresas, incluindo da economia social.

2.   Introdução

2.1.

A economia europeia foi seriamente afetada pela pandemia em curso. O CESE congratula-se com as medidas económicas e sociais que a UE implementou, com base em instrumentos extraordinários para lidar com os efeitos da crise pandémica, pois representam uma excelente oportunidade para criar uma Europa mais justa e mais solidária, uma economia social de mercado competitiva e também para enfrentar os novos desafios ligados às transições ecológica e digital. Além do Instrumento de Recuperação da União Europeia, estes instrumentos incluem:

medidas nacionais adotadas no contexto da flexibilidade das regras orçamentais da UE;

medidas nacionais de apoio à liquidez, aprovadas ao abrigo das regras temporárias e mais flexíveis em matéria de auxílios estatais;

reforço das linhas de crédito garantidas pelo Banco Europeu de Investimento (BEI) às empresas, através da criação de um novo fundo de garantia;

o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE), introduzido através de alterações ao Tratado de Lisboa para oferecer empréstimos incondicionais no setor da saúde;

o instrumento europeu de apoio temporário para atenuar os riscos de desemprego numa situação de emergência (SURE).

2.2.

O objetivo do presente parecer consiste em analisar o impacto das medidas de urgência para combater o desemprego, apoiar os rendimentos e ajudar as empresas, com particular ênfase no instrumento SURE.

2.3.

Até abril de 2020, mais de 50 milhões de trabalhadores em vários países europeus tinham sido integrados em programas de redução do horário de trabalho (2), ou em medidas pontuais semelhantes para lidar com a perda, parcial ou total, de horas de trabalho. A Eurofound registou 500 medidas, a maioria das quais destinada ao apoio às empresas (35 %), ao apoio ao rendimento (além das medidas de redução do horário de trabalho, 20 %) e à proteção do emprego (13 %) (3). As empresas que operam nos setores da produção, comércio, serviços, turismo e cultura foram as mais atingidas pela crise (4).

2.4.

Os regimes de redução do tempo de trabalho para compensar as horas de trabalho não prestadas existem na maioria dos países europeus e são o instrumento mais amplamente utilizado para proteger os postos de trabalho em períodos de crise económica, já que têm um impacto positivo nos trabalhadores e nas empresas. No seu relatório de 2020 sobre a apresentação do programa SURE, a Comissão Europeia sublinha que «[a]o evitar despedimentos desnecessários, os regimes de redução do horário de trabalho podem impedir que um choque temporário tenha repercussões negativas mais graves e duradouras na economia e no mercado de trabalho dos Estados-Membros. Deste modo, contribuem para manter os rendimentos das famílias e preservar a capacidade produtiva e o capital humano das empresas e da economia na sua globalidade» (5).

2.5.

Nos países onde estes programas já existiam, os governos adotaram medidas pontuais para facilitar o acesso e os critérios de elegibilidade, bem como para alargar a cobertura e aumentar o apoio económico, mas com grandes diferenças entre países (6).

2.6.

Estas medidas permitiram às empresas cobrir a redução do horário de trabalho de acordo com a redução da atividade económica a baixo ou nenhum custo, diminuindo significativamente o número de postos de trabalho em risco devido à falta de liquidez. Algumas categorias de trabalhadores com empregos atípicos permaneceram excluídas do apoio em vários países da UE, em particular os trabalhadores com contratos ocasionais e, em alguns casos, os trabalhadores temporários e os trabalhadores com contratos a termo, enquanto noutros países o apoio público foi alargado a algumas formas de trabalho por conta própria (7). Além disso, existem, em diferentes países, diferentes modalidades e critérios de acesso a estes subsídios no que diz respeito a cobertura, beneficiários, duração, etc. (8)

2.7.

Os regimes de tempo de trabalho reduzido ajudaram a evitar a rutura da relação laboral, muito dispendiosa para as empresas e os trabalhadores. No segundo trimestre de 2020, estas medidas de manutenção de emprego reduziram significativamente a perda de postos de trabalho de 12 % para 4 %, segundo as estimativas, nos países da OCDE. Na UE, os dados demonstram que os trabalhadores oficialmente empregados mas com zero horas tinham duplicado, para 17 %, no segundo trimestre de 2020 em comparação com o mesmo período de 2019 (9).

2.8.

A crise do emprego atingiu de forma particularmente grave as mulheres e os jovens, muitas vezes empregados com contratos atípicos, baixos salários e mais expostos à instabilidade, situações que não dão garantias de uma cobertura de segurança social adequada. Além disso, representam uma percentagem muito elevada da mão de obra nos setores do turismo, hotelaria e restauração, que foram particularmente afetados, bem como no setor da cultura e do lazer e no setor sem fins lucrativos que se dedica aos serviços sociais. A recuperação económica terá também de incluir reformas e medidas específicas, acordadas com os parceiros sociais, para fazer frente às desigualdades de género e de idade, incluindo as que existiam antes da atual crise, e aplicar medidas a curto, médio e longo prazo (10).

2.9.

A par de medidas de apoio à redução do horário de trabalho, vários países adotaram medidas de proteção contra despedimentos em empresas que recebem ajudas públicas à redução da atividade, tanto para evitar abusos durante o período de crise como para condicionar a utilização da ajuda pública nacional e europeia, que deve servir para evitar despedimentos e apoiar temporariamente as empresas até à recuperação. Em alguns países, são os próprios acordos coletivos que preveem a proibição do despedimento em caso de ajuda pública (11).

2.10.

Papel importante foi o desempenhado pela negociação coletiva com acordos e protocolos específicos tanto para enfrentar e gerir a emergência sanitária no local de trabalho como para introduzir disposições contratuais pontuais durante a pandemia, modificando a organização e as condições de trabalho (por exemplo, Alemanha, França, Itália, Suécia, Espanha, Áustria, Dinamarca). Alguns países adotaram outras formas de apoio às empresas (moratória sobre o pagamento de empréstimos, adiamento ou suspensão do pagamento de impostos, de rendas ou de contribuições para a segurança social), as quais adiam as obrigações de pagamento e se destinam a apoiar as empresas, particularmente as PME, ou os trabalhadores por conta própria, com o objetivo de manter os empregos e permitir a liquidez a curto prazo.

3.   Características, regulamento e primeiros resultados do SURE

3.1.

O instrumento europeu SURE é um fundo de natureza temporária que presta assistência financeira sob a forma de empréstimos, em condições favoráveis, até 100 mil milhões de euros aos Estados-Membros para combater o desemprego, apoiar os regimes de tempo de trabalho reduzido e o rendimento de todos os trabalhadores. O fundo permanece operacional até 31 de dezembro de 2022.

3.2.

As obrigações emitidas pela primeira vez pela Comissão Europeia ao abrigo do instrumento SURE são «obrigações sociais», garantindo àqueles que nelas investem que os fundos mobilizados são realmente destinados a fins sociais. A procura foi dez vezes superior à oferta e proporcionou retornos competitivos no mercado.

3.3.

Desde a sua introdução, o Conselho afetou, com base em propostas da Comissão, mais de 90 % da dotação total a 19 Estados-Membros (12). Destes, 15 países utilizaram o fundo para ajudar a financiar regimes de tempo de trabalho reduzido ou medidas semelhantes e 14 países financiaram igualmente medidas de apoio aos trabalhadores por conta própria.

3.4.

Alguns países não se candidataram aos fundos SURE. As razões apresentadas pelos governos variam: em alguns países, os fundos nacionais disponíveis eram suficientes para cobrir as despesas públicas adicionais relacionadas com o aumento do desemprego; noutros, era possível obter recursos adicionais no mercado a taxas igualmente vantajosas; noutros casos ainda, a escolha ficou a dever-se aos custos ligados aos procedimentos administrativos de acesso ao SURE; por fim, certos países recorreram às medidas temporárias adotadas pela Comissão em matéria de flexibilidade orçamental e de auxílios estatais (13).

3.5.

Com base nos relatórios apresentados pelos Estados-Membros, a Comissão estima, no relatório de março de 2021 (14), que em 2020 o SURE apoiou entre 25 e 30 milhões de trabalhadores, ou seja, um quarto do total da população empregada nos Estados-Membros beneficiários. Trata-se de aproximadamente 21,5 milhões de trabalhadores por conta de outrem e 5 milhões de trabalhadores por conta própria. Além disso, entre 1,5 milhões e 2,5 milhões de empresas beneficiaram deste instrumento, o que representa 12-16 % das empresas dos Estados-Membros beneficiários (15).

3.6.

O relatório salienta que os regimes de apoio público financiados pelo SURE estão a reduzir os custos do trabalho para as empresas e a fornecer apoio alternativo ao rendimento das famílias, com melhores resultados do que os subsídios de desemprego tradicionais. A Comissão salienta ainda que os regimes de apoio ao emprego são mais eficazes nos países que já dispunham de regimes de apoio nacionais para mitigar o impacto do desemprego.

3.7.

No final de 2020, 80 % do total da despesa pública prevista com medidas elegíveis já tinha sido utilizado. Quase todos os Estados-Membros gastaram já ou preveem gastar o montante total concedido no âmbito do SURE.

3.8.

Os Estados-Membros gastaram cerca de 5,8 mil milhões de euros menos em juros utilizando o SURE do que se tivessem emitido dívida soberana, devido à elevada notação de crédito da Comissão. Os pagamentos futuros permitirão provavelmente poupanças adicionais.

4.   Observações na generalidade

4.1.

O CESE apoia a estratégia da UE para enfrentar a crise pandémica, para assegurar a recuperação e resiliência dos sistemas económicos, sociais e de saúde dos Estados-Membros, bem como para salvaguardar o emprego, considerando-a adequada para definir e concluir a dimensão social europeia, assegurando simultaneamente a competitividade da Europa no contexto mundial. O Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais estabelece as medidas que visam encorajar o investimento necessário para um crescimento sustentável e inclusivo.

4.2.

O CESE salientou repetidamente a necessidade de uma maior convergência económica e social na UE para reforçar a competitividade da economia social de mercado europeia e assegurar que todos os cidadãos possam usufruir plenamente dos seus direitos, assim como para apoiar a construção de um mercado de trabalho que possa refletir as mudanças em curso com ações e estratégias em conformidade com o Pilar Europeu dos Direitos Sociais e com as transições ecológica e digital. É essencial que os Estados-Membros façam bom uso do apoio que recebem do Mecanismo de Recuperação e Resiliência (16).

4.3.

É importante apoiar o crescimento e a produtividade das empresas sustentáveis, incluindo as PME e as microempresas. O SURE é um dos instrumentos apropriados para proporcionar incentivos aos empregadores para que continuem a dar emprego aos seus trabalhadores apesar da redução da atividade de produção. Os acordos coletivos devem também ser encorajados sob a forma de novas modalidades de reescalonamento do horário de trabalho para permitir o acesso à formação, bem como as medidas de apoio às empresas, a fim de contribuírem para a manutenção do emprego e das competências e para a continuidade dos rendimentos.

4.4.

O SURE é um instrumento-chave para proteger os trabalhadores e mitigar o grave impacto socioeconómico da pandemia nos sistemas de emprego, uma vez que, por um lado, apoia financeiramente regimes nacionais de tempo de trabalho reduzido e medidas semelhantes, incluindo no âmbito das relações laborais, protegendo empregos, limitando o desemprego e a perda de rendimentos dos trabalhadores; por outro lado, apoia os custos das empresas relacionados com os subsídios de desemprego e as contribuições para a segurança social, que são amplamente cobertos por recursos públicos, através de medidas de urgência.

4.5.

O CESE saúda a rapidez com que foi elaborada a proposta da Comissão para estabelecer o SURE e as subsequentes negociações com os Estados-Membros, que foram concluídas numa questão de semanas. O SURE sublinha a importância dos programas de redução do horário de trabalho e dos regimes de apoio ao rendimento a curto prazo e incentiva os Estados-Membros a utilizá-los. Um dos objetivos do Semestre Europeu a médio e longo prazo é a promoção de investimentos orientados para o pleno emprego estável e para o combate às novas formas de pobreza, nomeadamente através de reformas estruturais socialmente sustentáveis.

4.6.

O CESE considera importante o apoio financeiro da UE aos Estados-Membros sob a forma de empréstimos em condições favoráveis e congratula-se com o facto de as obrigações emitidas pela Comissão serem «obrigações sociais» com um objetivo específico.

4.7.

O financiamento dos regimes de tempo de trabalho reduzido e de apoio ao rendimento tem um efeito positivo na economia no seu todo, visto que mantém o vínculo entre empregadores e trabalhadores, ajudando a preservar as competências dos mesmos e a capacidade produtiva das empresas, e evita que os efeitos da pandemia sejam ainda mais negativos e persistentes na economia e no mercado de trabalho.

4.8.

O CESE considera que a criação do SURE é mais um passo no sentido de um sistema de solidariedade na UE que respeita os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, uma vez que se trata de uma forma de «ativo seguro europeu» («European safety asset»), que pode ser reforçado com as obrigações europeias utilizadas para financiar o Instrumento de Recuperação da União Europeia (17). O CESE salienta que uma vantagem importante do SURE é o facto de demonstrar que, se necessário, a UE pode criar uma capacidade de empréstimo e emitir um «ativo seguro comum» («common safe asset») utilizando o método comunitário, em vez de acordos intergovernamentais, como acontece com o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) e o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF).

4.9.

O CESE apela para uma revisão dos procedimentos de assistência e acesso ao financiamento do SURE e espera que os procedimentos administrativos e os mecanismos de comunicação sejam simplificados.

4.10.

O CESE recomenda a combinação do SURE com medidas de política ativa e cursos de formação profissional e requalificação que sejam úteis tanto para os trabalhadores como para as empresas (18). Neste contexto, retoma-se o debate sobre a forma de tornar os serviços de emprego mais eficientes, também em tempos de crise. Em períodos de redução involuntária do horário de trabalho, a formação deve ser encorajada, com vista à requalificação ou ao acompanhamento da fase de transição para novas oportunidades de emprego qualificado e estável. Infelizmente, os exemplos de políticas ativas neste contexto são bastante modestos (19).

4.11.

O CESE considera que as medidas do SURE em cada Estado-Membro devem abranger todos os trabalhadores por conta de outrem e todos os tipos de trabalho por conta própria e atípico, que afetam particularmente os jovens.

4.12.

Os dados limitados disponíveis sugerem que os parceiros sociais não foram ativamente associados pelas instituições europeias ou nacionais à melhoria da utilização do SURE; o CESE recomenda que seja criado um mecanismo de consulta permanente adequado para este fim.

4.13.

O CESE tomou conhecimento das estimativas que dizem respeito a pessoas e empresas beneficiárias do SURE (20), mas nota que esses dados não são suficientemente claros quanto às diferentes medidas financiadas pelos vários países e respetivos montantes, nem quanto ao impacto que possam ter tido nos esforços para atenuar o risco de desemprego e para proteger os rendimentos.

5.   Observações na especialidade — Qual o impacto?

5.1.

A crise pandémica pressionou os sistemas económicos, sociais e de saúde da UE e afetou a vida das pessoas e as atividades das empresas, aumentando as desigualdades dentro de cada país e, em alguns casos, entre países. Por conseguinte, o CESE aponta para a necessidade de definir e concluir, de forma mais abrangente e coesa, a dimensão social europeia, tendo em conta as medidas identificadas no Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais e assegurando simultaneamente a competitividade da Europa no contexto mundial.

5.2.

O CESE já salientou (21) que importa retomar o processo de revisão do quadro de governação económica da UE, que foi suspenso até 2022 pela comunicação da Comissão de 20 de março de 2020 (22). O CESE apoia esta comunicação, na qual a Comissão expressa a intenção de suspender no futuro a cláusula de derrogação de âmbito geral do Pacto de Estabilidade e Crescimento com base numa avaliação exaustiva da situação da economia segundo critérios quantitativos. Por esse motivo, o CESE reclama uma «transição» para um quadro de governação económica revisto e reequilibrado, orientado para a prosperidade, de preferência dotado de regras simplificadas e de uma menor pró-ciclicidade, que reflita o contexto pós-pandemia. Será essencial ajudar os Estados-Membros a tornar sustentáveis as suas finanças públicas, reforçando assim a confiança no investimento.

5.3.

De entre as medidas do pacote económico e social que visam combater os efeitos da pandemia, o CESE apoia a adoção do SURE enquanto instrumento financeiro inovador de solidariedade europeia que, antecipando o mecanismo do Instrumento de Recuperação da União Europeia, emitiu pela primeira vez obrigações para fins sociais.

5.4.

O SURE provou ser uma rede de segurança e proteção dos postos de trabalho existentes, bem como de salvaguarda das empresas, nas suas várias formas e de acordo com as prerrogativas nacionais de proteção social. No entanto, é necessário combinar as medidas de proteção social adotadas no âmbito do SURE com políticas ativas do mercado de trabalho para a criação de empregos de qualidade e estáveis, bem como com sistemas de adequação de competências, combatendo as formas de trabalho mal remunerado, fragmentado e instável que não dão garantias de uma cobertura de segurança social adequada e afetam os sistemas públicos de proteção social.

5.5.

O CESE congratula-se com a Recomendação «EASE» da Comissão Europeia, adotada como parte da implementação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais e destinada a um apoio ativo e efetivo ao emprego na sequência da crise da COVID-19. Sublinha ainda a abordagem estratégica de passar gradualmente das medidas de urgência adotadas durante a pandemia para novas medidas necessárias para assegurar uma recuperação geradora de emprego, particularmente nos setores ecológico e digital. As políticas eficazes de promoção da criação de emprego de qualidade e de transição profissional devem ser acompanhadas por serviços de emprego eficientes, que prestem apoio personalizado aos candidatos a emprego, em especial aos jovens, às mulheres e aos empresários sociais.

5.6.

Para o CESE, o consenso e a participação dos parceiros sociais é uma mais-valia, razão pela qual é essencial associá-los, tanto a nível europeu como nacional, à discussão, à participação e à negociação das ações cofinanciadas pelo SURE, com enfoque também na negociação coletiva em setores específicos mais afetados pela crise. É, contudo, fundamental que a participação dos parceiros sociais seja efetiva e legítima, e não apenas formal.

5.7.

O CESE considera importante salientar que os recursos do SURE também devem ser utilizados para financiar medidas destinadas a conter a propagação do vírus no local de trabalho, com medidas e ações que visem prevenir e proteger a saúde e a segurança, mitigando os custos incorridos pelas empresas na adaptação da produção aos protocolos de segurança.

5.8.

O CESE propõe a criação de um observatório para acompanhar o funcionamento do SURE ao longo da sua duração, aberto à participação ativa dos parceiros sociais e de outras organizações da sociedade civil, com o objetivo de monitorizar e avaliar o impacto das medidas financiadas em cada país, analisando as boas práticas e os regimes de proteção implementados em cada país, a fim de identificar modelos de regimes de horário de trabalho reduzido e de apoio ao rendimento replicáveis no futuro em períodos de crise.

5.9.

O CESE reconhece plenamente os resultados positivos do SURE salientados no relatório da Comissão de março de 2021. O programa SURE obedece a critérios temporários de apoio aos Estados-Membros para ajudar os trabalhadores e as empresas a superar a crise, preservar postos de trabalho e preparar a via para a recuperação económica e social. O CESE subscreve a proposta de converter o SURE num instrumento permanente para apoiar os trabalhadores e as empresas enquanto mecanismo de integração e resiliência socioeconómica da UE em períodos de crise como o atual, designadamente através do acompanhamento e da avaliação levados a cabo pelo observatório sobre a aplicação do SURE. A proposta em apreço resulta de um debate que contou com a participação de governos, dos parceiros sociais e económicos, de organizações da sociedade civil, do meio académico e de investigadores dos vários países europeus, assim como de um debate no interior da própria Comissão (23).

5.10.

Em caso de crise económica, o CESE exorta as instituições europeias a desempenharem um papel mais eficaz e de apoio no domínio social, em particular, na regulação e no financiamento de medidas de apoio aos trabalhadores e às empresas, promovendo um debate público com vista a estabelecer um sistema europeu permanente de resseguro de desemprego com uma base jurídica diferente, tendo igualmente em conta pareceres anteriores seus (24).

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Recomendação (UE) 2021/402 da Comissão, de 4 de março de 2021, sobre um apoio ativo e eficaz ao emprego na sequência da crise da COVID-19 (EASE) (JO L 80 de 8.3.2021, p. 1).

(2)  Eurofound, Covid-19: implications for employment and working life [COVID-19: Implicações para o emprego e para a vida profissional], março de 2021.

(3)  Eurofound, Covid-19: Policy responses across Europe [COVID-19: Respostas políticas em toda a Europa], junho de 2020.

(4)  OECD Employment Outlook 2021 [Perspetivas da OCDE sobre o Emprego para 2021], capítulo 2.

(5)  COM(2021) 148 final. SURE: balanço após seis meses, 22 de março de 2021; ver ainda Parlamento Europeu, Briefing SURE Implementation [Informação sobre a aplicação do SURE], abril de 2021.

(6)  OECD Employment Outlook 2021 [Perspetivas da OCDE sobre o Emprego para 2021], capítulo 2, tabela 2.1, «Job retention schemes in OECD countries» [Programas de preservação do emprego nos países da OCDE] — ibidem, Eurofound.

(7)  Eurofound, Covid-19: Policy responses across Europe [COVID-19: Respostas políticas em toda a Europa], junho de 2020.

(8)  Dados da OCDE, do ETUI e da Comissão Europeia, ficha do PE.

(9)  Eurofound, Covid-19: Policy responses across Europe [COVID-19: Respostas políticas em toda a Europa], junho de 2020.

(10)  Análise da Comissão Europeia e da Eurofound; ver também o Programa Conjunto OIT-ONU para as Mulheres, Policy tool — Assessing the gendered employment impacts of Covid-19 and supporting a gender-responsive recovery [Instrumento político, Avaliar o impacto da COVID-19 no emprego por género e apoiar uma recuperação sensível às questões de género], março de 2021.

(11)  ETUI, Documento estratégico n.o 7, 2020

(12)  COM(2021) 148 final. SURE: balanço após seis meses, 22 de março de 2021; ver ainda Parlamento Europeu, Briefing SURE Implementation [Informação sobre a aplicação do SURE], abril de 2021.

(13)  Eurofound, ibidem, capítulo 3, 2021.

(14)  COM(2021) 105 final, Comunicação da Comissão ao Conselho «Um ano após o início do surto de COVID-19: resposta em termos de política orçamental».

(15)  COM(2021) 148 final. SURE: balanço após seis meses, 22 de março de 2021; ver ainda Parlamento Europeu, Briefing SURE Implementation [Informação sobre a aplicação do SURE], abril de 2021.

(16)  Resolução do CESE «Contributo do Comité Económico e Social Europeu para o programa de trabalho da Comissão Europeia para 2022» (junho de 2021) (JO C 341 de 24.8.2021, p.1 ).

(17)  Christina Katami, «Protecting employment in 2021 and beyond: what can the new SURE instrument do?» [Proteger o emprego em 2021 e mais além: qual pode ser o papel do novo instrumento SURE?], documento estratégico da ELIAMEP, 2021; L. Andor, «Protecting Jobs and Incomes in Europe: Towards an EU Capacity for Employment Stabilisation in the Pandemic Period» [Proteger o emprego e os rendimentos na Europa: rumo a uma capacidade da UE de estabilização do emprego no período da pandemia], 2021, in Caetano, J., Vieira, I., Caleiro, A., New Challenges for the Eurozone Governance [Novos desafios para a governação da área do euro].

(18)  Eurofound, Covid-19: implications for employment and working life [COVID-19: Implicações para o emprego e para a vida profissional], março de 2021.

(19)  OCDE Employment Outlook 2021 [Perspetivas da OCDE sobre o Emprego para 2021], capítulo 2.5, «Combining job retention policies with job reallocation» [Conjugar políticas de preservação do emprego e a reafetação do emprego], e Eurofound, ibidem, com exemplos de medidas adotadas em alguns países.

(20)  COM(2021) 148 final

(21)  Resolução «Contributo do Comité Económico e Social Europeu para o programa de trabalho da Comissão Europeia para 2022», adotada na reunião plenária de junho de 2021 (JO C 341, 24.8.2021, p.1).

(22)  COM(2021) 123 final

(23)  Ver Christina Katami, «Protecting employment in 2021 and beyond: what can the new SURE instrument do?» [Proteger o emprego em 2021 e mais além: qual pode ser o papel do novo instrumento SURE?], documento estratégico da ELIAMEP, 2021; L. Andor, «Protecting Jobs and Incomes in Europe: Towards an EU Capacity for Employment Stabilisation in the Pandemic Period» [Proteger o emprego e os rendimentos na Europa: rumo a uma capacidade da UE de estabilização do emprego no período da pandemia], 2021, in Caetano, J., Vieira, I., Caleiro, A., New Challenges for the Eurozone Governance [Novos desafios para a governação da área do euro]; Eurofound, Covid-19: Implications for employment and working life [COVID-19: Implicações para o emprego e para a vida profissional], março de 2021; COM(2021) 148 final. SURE: balanço após seis meses, 22 de março de 2021; ver ainda Parlamento Europeu, Briefing SURE Implementation [Informação sobre a aplicação do SURE], abril de 2021.

(24)  Parecer «Normas mínimas comuns» (JO C 97 de 24.3.2020, p. 32); Beblavy Miroslav, Karolien Lenaerts, Feasibility and added value of a European Unemployment Benefits Scheme [Viabilidade e valor acrescentado de um regime europeu de prestações de desemprego»], CEPS, 2017.


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/23


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação»

(parecer exploratório a pedido da presidência eslovena)

(2021/C 517/04)

Relator:

Andrej ZORKO

Pedido da presidência eslovena do Conselho

Carta de 19.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

7.9.2021

Adoção em plenária

23.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

146/24/54

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

A qualidade do trabalho constitui um elemento fundamental da qualidade de vida. É necessário seguir esse princípio, uma vez que se trata de uma condição imprescindível para o desenvolvimento social sustentável. Por conseguinte, o Comité Económico e Social Europeu (CESE) manifesta a firme convicção de que as políticas da UE devem consagrar especial atenção a este princípio, a fim de evitar os riscos de desigualdade, pobreza, exclusão social e concorrência desleal.

1.2.

O CESE acredita firmemente que os problemas e desafios que existem no domínio do trabalho de qualidade devem ser enfrentados à luz dos princípios do Pilar Europeu dos Direitos Sociais e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030. Deve também ter-se em conta as normas internacionais da OIT em matéria de trabalho digno (1), a par da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (2). Por conseguinte, insta os Estados-Membros e os parceiros sociais, no contexto do diálogo social e da negociação coletiva, ao nível adequado e de acordo com as especificidades nacionais, a identificarem e definirem soluções para as mudanças no mercado de trabalho que se intensificaram com a pandemia.

1.3.

O CESE considera que a União Europeia e os Estados-Membros devem adotar uma abordagem mais ambiciosa para apoiar, coordenar e concretizar os esforços destinados a promover as políticas ativas do mercado de trabalho, protegendo, simultaneamente, os direitos fundamentais dos trabalhadores e assegurando um ambiente empresarial competitivo e sustentável para as empresas na economia mundial. O Pilar Europeu dos Direitos Sociais deve orientar a aplicação dos princípios da Europa social, da justiça social e da recuperação sustentável.

1.4.

Com base nos ensinamentos retirados da pandemia no domínio do trabalho, a Comissão Europeia e os Estados-Membros poderiam, através da participação ativa dos parceiros sociais e outras partes interessadas, acompanhar a aplicação ou, se necessário, rever e alterar a regulamentação em vigor e desenvolver políticas adequadas para assegurar um trabalho de qualidade, digno e sustentável. Tal pode abranger a proteção dos trabalhadores e uma organização adequada do trabalho que leve a uma maior produtividade e inovação e, ao mesmo tempo, promova os elementos positivos da digitalização, incluindo a necessidade de os trabalhadores receberem formação digital para promover a sua empregabilidade (3). Deve ser dada especial atenção à legislação e às políticas em matéria de inteligência artificial e à garantia de que todas as partes interessadas têm a possibilidade de participar na adoção de novas soluções, através de consultas e negociações com os trabalhadores e os empregadores.

1.5.

O CESE insta a Comissão Europeia a criar novos mecanismos e/ou (4) a continuar a identificar as necessidades do mercado de trabalho a médio e longo prazo, nomeadamente no âmbito do Semestre Europeu reforçado e de outros mecanismos existentes. Tal permitiria aos Estados-Membros desenvolverem um planeamento e uma aplicação a mais longo prazo das políticas de emprego, incluindo o planeamento da formação e da aprendizagem ao longo da vida dos trabalhadores e a disponibilização de soluções para colmatar o défice de competências, sempre com a participação ativa dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil. Importa também reforçar os serviços públicos de emprego e a respetiva cooperação com o setor privado para ajudar a integrar os grupos mais vulneráveis no mercado de trabalho de forma mais eficaz.

1.6.

O CESE reitera que as políticas ativas do mercado de trabalho devem ser eficazes e balizadas, a fim de alcançar bons resultados em matéria de emprego (5), e salienta a necessidade de os Estados-Membros e os parceiros sociais se empenharem na definição de políticas ativas do mercado de trabalho que promovam a qualidade do trabalho. O CESE salienta também o seu apoio a uma abordagem gradual em matéria de normas mínimas comuns no domínio do seguro de desemprego, a fim de garantir a qualidade do trabalho nos Estados-Membros (6).

1.7.

Os Estados-Membros devem criar as condições necessárias para assegurar uma participação adequada (governação coletiva) nos processos de elaboração e aplicação das políticas de emprego ou do mercado de trabalho.

1.8.

O CESE incentiva os Estados-Membros e os parceiros sociais a reforçarem o diálogo social a nível nacional. Recomenda igualmente que se tire partido do conteúdo tradicional do diálogo social, de forma a incluir outros conteúdos mais estratégicos e orientados para a sustentabilidade e soluções. Tal poderá traduzir-se, por exemplo, em antecipar as necessidades futuras das empresas e dos trabalhadores com determinadas competências e aptidões, atividades conjuntas para formar trabalhadores, garantir uma transição justa para a economia digital e a economia verde e regulamentar e elaborar soluções equilibradas para o trabalho das plataformas em linha e outras questões igualmente importantes para o desenvolvimento.

1.9.

O CESE reconhece a importância dos parceiros sociais e das convenções coletivas para manter o equilíbrio do mercado de trabalho. Para continuar a desenvolver o diálogo social, é essencial que os parceiros sociais disponham de uma formação adequada (7). Trata-se de um aspeto crítico e essencial para o futuro desenvolvimento do diálogo social, que também deve contribuir para garantir um trabalho sustentável e de qualidade.

1.10.

O CESE considera que a Comissão e os Estados-Membros devem reforçar a capacidade dos parceiros sociais e da sociedade civil. É necessário criar um ambiente de confiança no diálogo social, reconhecer a sua importância e associar atempadamente os parceiros sociais e demais partes interessadas à formulação de medidas e ao próprio processo decisório, se for caso disso e de acordo com as necessidades de desenvolvimento. É necessário um quadro sólido para a informação e a consulta dos trabalhadores que lide adequadamente com a transição ecológica e digital, assegurando ao mesmo tempo a qualidade do trabalho (8).

1.11.

O CESE reconhece que o Mecanismo de Recuperação e Resiliência pode contribuir de forma positiva para reforçar e assegurar a qualidade do trabalho e o papel dos parceiros sociais na sua concretização. Por conseguinte, propõe que a Comissão realize reuniões anuais com os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil, a fim de recolher os seus pontos de vista sobre a aplicação do mecanismo. Tendo em conta a diversidade das situações nos Estados-Membros, faria sentido realizar consultas separadamente e formular diretrizes e recomendações em conjunto, para continuar a aplicar o mecanismo com êxito.

1.12.

O CESE constata que o Mecanismo de Recuperação e Resiliência não aborda diretamente as componentes do trabalho de qualidade, pelo que insta a Comissão a complementar esta parte do mecanismo. A qualidade do trabalho é fundamental para atingir as metas estabelecidas no Mecanismo de Recuperação e Resiliência. Os grupos vulneráveis, como os trabalhadores precários e jovens, os mais afetados pela epidemia, não devem ser ignorados.

1.13.

O CESE apela à realização de estudos que acompanhem mais de perto a evolução do mercado de trabalho durante o período de recuperação. É também necessário ter em conta as alterações dos modelos de negócio com impacto na forma de realização do trabalho e nos direitos fundamentais dos trabalhadores, bem como a digitalização e a introdução de novas tecnologias, concentrando-se em particular nos défices de competências e na transição do mercado de trabalho. As implicações para a organização do trabalho e outros aspetos importantes do trabalho de qualidade devem ser cuidadosamente examinados e explorados, tendo em conta as soluções positivas e os perigos da rápida digitalização. O Comité sublinha a necessidade de levar em consideração a diversidade dos países e as consequências da pandemia para a sociedade e para o mercado de trabalho. As mudanças devem ser avaliadas segundo uma abordagem holística.

2.   Contexto

2.1.

O CESE reconhece a diversidade e o caráter multifacetado do conceito de trabalho sustentável e de qualidade e salienta que este é constituído por várias componentes que afetam direta ou indiretamente a qualidade de vida das pessoas, os direitos dos trabalhadores e a segurança social dos trabalhadores. Ao mesmo tempo, o CESE também reconhece que os empregadores e os Estados-Membros têm um papel fundamental na garantia de um trabalho de qualidade, nomeadamente na promoção das competências, do emprego de qualidade, das diversas novas formas de trabalho, da segurança, do bem-estar dos trabalhadores e da competitividade das empresas. A Comissão parece estar ciente disso, dado que uma quantidade considerável de programas e assistência financeira durante a pandemia de COVID-19, nomeadamente o Programa SURE, visaram a retoma económica e a manutenção da segurança social das pessoas. O CESE está convicto de que a retoma económica e o desenvolvimento da economia europeia não são possíveis sem a preservação e o desenvolvimento da segurança social, assegurando igualmente um ambiente competitivo para as empresas europeias na economia mundial, e que a retoma económica deve ser indissociável da recuperação social.

2.2.

O CESE considera que cabe à Comissão, aos Estados-Membros e aos parceiros sociais europeus e nacionais planear e aplicar medidas que garantam um trabalho sustentável e de qualidade. Por conseguinte, cumpre desenvolver e adotar medidas e uma estratégia para assegurar um trabalho sustentável e de qualidade o mais rapidamente possível, com base em esforços conjuntos envidados por todos os intervenientes pertinentes.

2.3.

Garantir condições equitativas e competitivas para a economia europeia, investir na inovação e no desenvolvimento, evitar o dumping social, incentivar a criação de emprego e assegurar condições de trabalho equitativas e subvenções adequadas devem ser elementos essenciais das estratégias da União Europeia e dos Estados-Membros e podem contribuir significativamente para melhorar a qualidade do trabalho.

2.4.

Com as condições adequadas, as empresas europeias podem contribuir para a prosperidade sustentável, para mais emprego de qualidade e para o reforço do bem-estar. Para tal, são necessárias condições-quadro favoráveis no tocante, em especial, à garantia de um abastecimento fiável de energia, uma mão de obra qualificada, boas infraestruturas de transportes e mercados de trabalho modernos.

2.5.

O conceito de trabalho sustentável e de qualidade no contexto mais amplo do crescimento e do emprego sustentáveis é um dos fatores essenciais da qualidade de vida e deve ser considerado em conjunto com o conceito de desenvolvimento sustentável, em especial a transição para uma economia verde e a digitalização, que deve ser justa para todas as partes interessadas. Neste contexto, o CESE chama particularmente a atenção para os pareceres que já adotou nesta matéria.

2.6.

O CESE está firmemente convicto de que a aplicação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030, nomeadamente o Objetivo 8, adotados pelos 193 Estados membros das Nações Unidas em 2015 (9), pode contribuir significativamente para garantir um trabalho sustentável e de qualidade, considerando também o crescimento económico e o pleno emprego produtivo. Especialmente durante o período de recuperação, a Comissão Europeia deve concentrar-se mais em alcançar estes objetivos e incentivar os Estados-Membros a alcançá-los.

2.7.

O CESE salienta também que a aplicação dos princípios enunciados no Pilar Europeu dos Direitos Sociais e do respetivo plano de ação, bem como das normas jurídicas internacionais (10) pertinentes, é essencial para garantir um trabalho sustentável e de qualidade. O CESE já adotou diversos pareceres neste contexto e apela às instituições europeias e aos Estados-Membros, no âmbito das respetivas competências, para que participem ativamente na sua aplicação, em conjunto com os parceiros sociais e outras partes interessadas.

2.8.

A conceção de medidas que garantam um trabalho sustentável e de qualidade deve levar em conta os vários fatores que afetam a qualidade de vida, asseguram um trabalho digno, reduzem as desigualdades e a exclusão social, previnem a pobreza e asseguram a competitividade da economia europeia, promovendo igualmente a transição harmoniosa para uma sociedade e economia digitais e ecológicas. Cumpre conciliar todos esses fatores com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e associar ativamente os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil à conceção das medidas. Neste contexto, o CESE sublinha a importância de um consenso social mais amplo.

2.9.

O CESE está ciente de uma série de elementos, fatores e circunstâncias que influenciam a qualidade do trabalho e a sua sustentabilidade, tendo-o reconhecido num parecer seu (11). Entre estes, são de referir o nível e a previsibilidade dos salários dos trabalhadores, as formas e os métodos de trabalho, o ambiente de trabalho, a saúde e segurança no trabalho, a estabilidade do emprego, a aprendizagem ao longo da vida, a formação dos trabalhadores, horários de trabalho regulares e previsíveis, a proteção dos direitos dos trabalhadores, o equilíbrio entre vida profissional e pessoal e o diálogo social ativo e eficaz.

2.10.

O CESE assinala que a garantia de um trabalho digno é um dos elementos essenciais para assegurar um trabalho de qualidade. Por conseguinte, insta a Comissão, os Estados-Membros e os parceiros sociais a concederem maior atenção às questões do trabalho digno e de qualidade.

2.11.

O CESE está ciente de que a garantia de um trabalho de qualidade depende também da capacidade de resistência das empresas europeias no mercado mundial, bem como da situação do mercado interno, dos diversos modelos de negócio e das políticas económicas. Por conseguinte, insta a Comissão e os Estados-Membros a criarem, em conjunto com os parceiros sociais, condições que incentivem o investimento sustentável e, dessa forma, permitam aos empregadores garantir trabalho de qualidade numa base sustentável e combater as práticas desleais. Os Estados-Membros devem contribuir para acelerar esta situação através de vários incentivos, políticas e regulamentação adequada.

3.   A COVID-19

3.1.

O CESE reconhece que a atividade económica diminuiu de forma assimétrica durante a epidemia e que o mecanismo SURE, criado pela Comissão durante a pandemia, ajudou a preservar um grande número de postos de trabalho. A fim de evitar despedimentos e prevenir a deterioração da segurança dos rendimentos das pessoas, os Estados-Membros adotaram vários regimes de trabalho de curta duração, subvenções salariais para empregados, licenças (por exemplo, trabalhadores em atividades cujo exercício não foi autorizado) com uma percentagem de salários inferior, medidas ativas de política de emprego, proteção para jovens e idosos, subsídios que parcialmente compensam perdas de rendimento e rendimento básico para certos grupos de pessoas, etc. O CESE sublinha, porém, que tais medidas temporárias não devem sobrepor-se à necessidade de políticas económicas sólidas e sustentáveis da UE e dos Estados-Membros que visem gerar mais crescimento e emprego.

3.1.1.

O CESE lamenta que a Comissão não tenha tornado ativamente a participação adequada dos parceiros sociais e de outras partes interessadas num critério importante para a utilização destes fundos. Em alguns Estados-Membros, os parceiros sociais não têm participado ativamente na definição de medidas e políticas do mercado de trabalho. Nesses países, a recuperação e a garantia de um trabalho de qualidade serão mais difíceis.

3.2.

O CESE reconhece que, durante a epidemia, a forma como algumas atividades profissionais são realizadas se alterou, pelo que irão continuar a verificar-se algumas mudanças durante o período de recuperação e posteriormente. É, assim, fundamental reconhecer essas mudanças, enfrentá-las de forma adequada, acompanhá-las e desenvolvê-las no sentido de garantir uma qualidade de trabalho duradoura, com o objetivo de criar oportunidades adicionais para empresas e trabalhadores. Deve ser dada especial atenção ao impacto e às consequências da digitalização e da introdução da inteligência artificial nos empregos.

3.3.

O CESE recorda que a epidemia pôs em evidência determinados modelos económicos e de negócio e formas e modos de trabalho que eram ignorados ou pouco valorizados antes da epidemia. Importa garantir que essas formas mais frequentes de atividade empresarial e de trabalho não afetam negativamente o mercado de trabalho ou a qualidade do trabalho e não constituem práticas desleais.

3.4.

O CESE acolhe favoravelmente a Recomendação da Comissão sobre um apoio ativo e eficaz ao emprego na sequência da crise da COVID-19 (EASE) e insta os Estados-Membros a darem prioridade às políticas do mercado de trabalho de forma a tornar o investimento nas pessoas um dos elementos essenciais para superar a crise, levando em consideração a necessidade das transições ecológica e digital. Os Estados-Membros devem incluir medidas EASE acordadas com os parceiros sociais nos seus planos nacionais de recuperação e resiliência.

3.5.

O CESE está preocupado por o bem-estar mental dos trabalhadores europeus se ter deteriorado consideravelmente durante a pandemia, em especial entre os jovens e os que perderam o emprego (12). Por conseguinte, o CESE apela a uma abordagem holística e conjunta, que combine políticas ambiciosas em matéria de saúde, segurança e bem-estar mental.

3.6.

O CESE reitera a posição e as propostas que formulou em vários pareceres (13) sobre questões relacionadas com o futuro do trabalho, a digitalização, o trabalho no domicílio, a organização do tempo de trabalho, a aprendizagem e formação ao longo da vida e a conciliação entre vida profissional e pessoal. Tudo o que foi afirmado sobre o trabalho de qualidade é válido para todos os que trabalham, independentemente da sua nacionalidade, razão pela qual a imigração e a integração de nacionais de países terceiros é importante.

3.7.

Tendo em conta as mudanças provocadas pela pandemia, a evolução paralela da digitalização e o facto de a qualidade do trabalho ser afetada por muitos fatores, o presente parecer centra-se apenas em alguns aspetos destacados pela Presidência eslovena que requerem particular atenção no que diz respeito ao desenvolvimento de um trabalho de qualidade. São eles: 1) adaptar o ambiente de trabalho ao envelhecimento da população, 2) a formação e aprendizagem ao longo da vida, 3) garantir a igualdade, 4) levar em consideração os benefícios e as armadilhas da digitalização e da inteligência artificial, e 5) o papel dos parceiros sociais.

4.   Adaptar o ambiente de trabalho ao envelhecimento da população

4.1.

Com o envelhecimento da população europeia, a vida ativa também está a tornar-se mais longa na maioria dos Estados-Membros e a idade efetiva de reforma está a aumentar. Por sua vez, essa situação requer a criação de condições de trabalho adequadas para os idosos, que consistem, acima de tudo, na adaptação às suas capacidades psicofísicas, garantindo também que a sua base de competências se mantém atualizada de acordo com as necessidades do mercado de trabalho. A melhoria da proteção da saúde no local de trabalho e o acesso à aprendizagem ao longo da vida para os trabalhadores mais idosos também são indispensáveis para garantir a qualidade do trabalho desses trabalhadores.

4.2.

Embora a garantia de condições de trabalho adequadas seja um dever primordial do empregador, a cooperação tripartida entre os parceiros sociais e os governos também tem um papel importante a desempenhar a este respeito, uma vez que, com o seu conhecimento dos procedimentos de trabalho e dos próprios trabalhadores, podem, através do diálogo social e de convenções coletivas ao nível apropriado, contribuir para criar um ambiente de trabalho que permita que os trabalhadores mais idosos trabalhem de forma adequada.

4.3.

Os Estados-Membros também desempenham um papel de relevo nesta matéria. Ao assegurar um nível adequado de proteção social, o acesso a serviços de saúde de qualidade e vários incentivos e subsídios para os empregadores, podem contribuir para criar um ambiente de trabalho que permita às pessoas trabalhar com segurança e produtividade à medida que envelhecem.

4.4.

O CESE propõe que se conceda uma maior atenção à aplicação de políticas de mercado de trabalho relacionadas com a demografia no contexto do Semestre Europeu. É essencial associar ativamente os parceiros sociais às estratégias e à aplicação de políticas e medidas relacionadas com os idosos no mercado de trabalho, incluindo a integração adequada no mercado de trabalho.

4.5.

Cumpre desenvolver formas modernas e inovadoras de as gerações mais jovens e mais idosas trabalharem em conjunto, sendo essencial uma transferência adequada e bidirecional dos conhecimentos e experiências.

5.   Formação e aprendizagem ao longo da vida

5.1.

Nos seus pareceres, o CESE sublinhou repetidamente a importância da aprendizagem e da formação ao longo da vida, tanto para os trabalhadores desempregados como para os trabalhadores assalariados (14).

5.2.

O CESE sublinha a importância da antecipação atempada das necessidades dos trabalhadores e dos empregadores em termos de competências e planeamento estratégico neste domínio. Tal exige que os parceiros sociais trabalhem em conjunto, especialmente a nível setorial e empresarial.

5.3.

Cumpre dar especial atenção aos desempregados de longa duração e àqueles que se encontram há muito tempo fora do mercado de trabalho. A ausência prolongada do mercado de trabalho restringe significativamente a empregabilidade, especialmente devido à velocidade da mudança digital (15). A pandemia agravou o problema, ao ditar o encerramento de determinadas atividades, obrigando, assim, os trabalhadores a ficar em casa. É por este motivo que, nestas situações, são necessárias políticas ativas de emprego eficazes.

5.4.

As atividades de formação devem centrar-se em sensibilizar devidamente os empregadores para a importância do planeamento atempado das necessidades de aptidões e competências para o trabalho no futuro. Neste contexto, o CESE recomenda que se preste especial atenção aos planos de formação digital para os trabalhadores.

5.5.

O CESE recomenda que os Estados-Membros considerem também incentivos financeiros e fiscais para uma formação mais ativa dos trabalhadores por parte do seu empregador, quer sob a forma de financiamento direto, quer sob a forma de incentivos fiscais para as empresas.

6.   Garantir a igualdade

6.1.

O CESE considera que, durante e após a recuperação, é essencial manter a igualdade no que diz respeito às circunstâncias pessoais e prevenir todas as formas de práticas discriminatórias. Embora reconheça as oportunidades oferecidas pela diversidade de novas formas de trabalho, há o perigo de aumentarem a desigualdade entre os trabalhadores, incluindo a desigualdade entre homens e mulheres (16). É necessário encontrar formas de assegurar a igualdade de tratamento dos trabalhadores, através de todos os canais apropriados, incluindo da legislação e de convenções coletivas.

6.2.

O CESE constata que não foi assegurada a igualdade durante a pandemia, uma vez que as medidas adotadas não abrangeram todos os trabalhadores e todas as empresas. As pequenas e médias empresas, os trabalhadores em modalidades de trabalho precário, os trabalhadores por conta própria, os migrantes, os jovens e as mulheres não tiveram frequentemente acesso a compensações por perda de rendimento ou não são abrangidos por medidas, o que significa que a pobreza e a exclusão social aumentaram durante a epidemia. Muitas empresas também cessaram atividade, resultando na perda de postos de trabalho.

6.3.

O CESE constata que a situação das mulheres no mercado de trabalho se deteriorou significativamente durante a pandemia (17): muitas mulheres perderam os seus empregos, o equilíbrio entre a vida profissional e a vida pessoal piorou e, por último, a precariedade aumentou.

6.4.

Agravou-se também a situação dos migrantes no mercado de trabalho e dos jovens, que cada vez têm maior dificuldade em encontrar emprego, além de se confrontarem ainda mais com formas de trabalho precárias, o que não garante uma vida de qualidade.

6.5.

A desigualdade reflete-se sobretudo ao nível da remuneração e da estabilidade do emprego. O CESE está, por isso, firmemente convicto de que as políticas do mercado de trabalho devem abordar as disparidades salariais, juntamente com medidas que promovam a transparência salarial, combatam a segregação horizontal e vertical no mercado de trabalho, incentivem o trabalho a tempo inteiro para as mulheres e abordem os condicionalismos relacionados com a prestação de cuidados não remunerados e a aplicação do princípio da igualdade de remuneração por trabalho de valor igual. Também devem ser tomadas medidas para garantir que os direitos dos trabalhadores são respeitados. Importa incentivar também o diálogo social orientado para a negociação coletiva em atividades atípicas, como o trabalho doméstico, o trabalho de prestação de cuidados, o trabalho em plataformas em linha e afins.

7.   Digitalização e inteligência artificial

7.1.

A digitalização tem um grande impacto nas relações laborais, dadas as consequências positivas e negativas da sua implementação nos processos de trabalho por parte dos empregadores.

7.2.

As soluções digitais também causam preocupação quanto às relações contratuais entre os trabalhadores e os empregadores. A fim de garantir componentes sustentáveis de um trabalho de qualidade, é necessário acompanhar a evolução do mercado de trabalho e garantir a existência de mecanismos adequados para proteger os direitos fundamentais dos trabalhadores, sem prejudicar o desenvolvimento de soluções digitais. A UE, os Estados-Membros, os parceiros sociais e outras partes interessadas devem participar na procura de soluções justas para as preocupações dos cidadãos. O CESE sublinha que o reforço da digitalização na vida profissional pode trazer benefícios, ao mesmo tempo que coloca desafios. Neste contexto, o CESE reconhece que a aplicação célere do Acordo-Quadro dos Parceiros Sociais Europeus sobre Digitalização pode ter um papel importante (18).

7.3.

É urgente gerir a inteligência artificial no local de trabalho, em especial no que diz respeito à prevenção de práticas discriminatórias, vigilância ilegal dos trabalhadores, nomeadamente o direito a desligar-se, e outras práticas prejudiciais aos trabalhadores. Os parceiros sociais devem participar nos processos de adoção e aplicação da legislação sobre inteligência artificial.

Bruxelas, 23 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  https://www.ilo.org/global/topics/decent-work/lang--en/index.htm

(2)  JO C 326 de 26.10.2012, p. 391

(3)  JO C 374 de 16.9.2021, p. 16

(4)  Em função da situação dos Estados-Membros.

(5)  JO C 125 de 21.4.2017, p. 10, ponto 3.19.

(6)  JO C 97 de 24.3.2020, p. 32; JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 1.6.

(7)  Voss, Eckhard, Broughton, Andrea, Pulignano, Valeria, Franca, Valentina, Rodriguez, Contreras, Ricardo — «Exploring the connections between EU and national-level social dialogue» [Explorar as ligações entre a UE e o diálogo social a nível nacional], Serviço das Publicações da União Europeia, Luxemburgo, 2018.

(8)  Ver, por exemplo, a resolução do CESE para a Cimeira Social do Porto, JO C 286 de 16.7.2021, p. 6, e o JO C 341 de 24.8.2021, p. 23

(9)  «Transforming our world: the 2030 Agenda for Sustainable Development» [Transformar o nosso mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável].

(10)  Normas da OIT e artigos 151.o e 151.o do TFUE

(11)  JO C 125 de 21.4.2017, p. 10, ponto 3.4.

(12)  Eurofound (2021), «Living, working and COVID-19 (Update April 2021): Mental health and trust decline across EU as pandemic enters another year» [Viver, trabalhar e a COVID-19 (atualização de abril de 2021): Saúde mental e confiança diminuem em toda a UE à medida que a pandemia se prolonga a outro ano]. Serviço das Publicações da União Europeia, Luxemburgo, página 4.

(13)  JO C 129 de 11.4.2018, p. 44, JO C 197 de 8.6.2018, p. 45, JO C 237 de 6.7.2018, p. 8, JO C 367 de 10.10.2018, p. 15, JO C 440 de 6.12.2018, p. 37, JO C 232 de 14.7.2020, p. 18

(14)  Como expresso no JO C 374 de 16.9.2021, p. 38

(15)  As competências digitais e a formação dos trabalhadores variam significativamente entre os países da UE, o que agrava as disparidades entre as situações dos trabalhadores. Em 2019, em média, menos de 25 % das empresas na UE ofereciam formação digital, correspondendo essa situação a 6 % na Roménia e 37 % na Finlândia.

(16)  JO C 220 de 9.6.2021, p. 13

(17)  https://eige.europa.eu/news/covid-19-derails-gender-equality-gains

(18)  Acordo-Quadro dos Parceiros Sociais Europeus sobre Digitalização


ANEXO

As seguintes propostas de alteração foram rejeitadas durante o debate, tendo recolhido, contudo, pelo menos um quarto dos sufrágios expressos (artigo 43.o, n.o 2, do Regimento):

ALTERAÇÃO 3

Proposta por

ARDHE Christian

HOŠTÁK Martin

KONTKANEN Mira-Maria

LE BRETON Marie-Pierre

SOC/685

Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação

Ponto 2.9

Alterar:

Parecer da secção

Alteração

O CESE está ciente de uma série de elementos, fatores e circunstâncias que influenciam a qualidade do trabalho e a sua sustentabilidade, tendo-o reconhecido num parecer seu (11). Entre estes, são de referir o nível e a previsibilidade dos salários dos trabalhadores, as formas e os métodos de trabalho, o ambiente de trabalho, a saúde e segurança no trabalho, a estabilidade do emprego, a aprendizagem ao longo da vida, a formação dos trabalhadores, horários de trabalho regulares e previsíveis, a proteção dos direitos dos trabalhadores, o equilíbrio entre vida profissional e pessoal, o diálogo social ativo e eficaz e elementos afins.

O CESE está ciente de uma série de elementos, fatores e circunstâncias que influenciam a qualidade do trabalho e a sua sustentabilidade, tendo-o reconhecido num parecer seu (11). Entre estes, são de referir o nível e a previsibilidade dos salários dos trabalhadores, as formas e os métodos de trabalho, incluindo a necessidade de formas diversas de trabalho e flexibilidade no quadro do diálogo social, o ambiente de trabalho, a saúde e segurança no trabalho, a estabilidade do emprego, a aprendizagem ao longo da vida, a formação dos trabalhadores, horários de trabalho regulares e previsíveis, a proteção dos direitos dos trabalhadores, o equilíbrio entre vida profissional e pessoal, o diálogo social ativo e eficaz e elementos afins.

Resultado da votação

Votos a favor:

92

Votos contra:

120

Abstenções:

15

ALTERAÇÃO 4

Proposta por

ARDHE Christian

HOŠTÁK Martin

KONTKANEN Mira-Maria

LE BRETON Marie-Pierre

SOC/685

Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação

Ponto 3.3

Alterar:

Parecer da secção

Alteração

O CESE recorda que a epidemia pôs em evidência determinados modelos económicos e de negócio e formas e modos de trabalho que eram ignorados ou pouco valorizados antes da epidemia. Deverá zelar-se para garantir que essas formas mais frequentes de atividade empresarial e de trabalho não afetam negativamente o mercado de trabalho ou a qualidade do trabalho e não constituem práticas desleais.

O CESE recorda que a epidemia pôs em evidência determinados modelos económicos e de negócio e formas e modos de trabalho que eram ignorados ou pouco valorizados antes da epidemia. Embora seja importante reforçar as políticas favoráveis ao empreendedorismo e ao trabalho por conta própria, tanto a nível europeu como nacional, e promover o desenvolvimento sustentável dessas formas mais frequentes de atividade empresarial e de trabalho , cabe garantir que estas não afetam negativamente o mercado de trabalho ou a qualidade do trabalho e não constituem práticas desleais.

Resultado da votação

Votos a favor:

90

Votos contra:

125

Abstenções:

16

ALTERAÇÃO 5

Proposta por

ARDHE Christian

HOŠTÁK Martin

KONTKANEN Mira-Maria

LE BRETON Marie-Pierre

SOC/685

Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação

Ponto 6.2

Alterar:

Parecer da secção

Alteração

O CESE constata que não foi assegurada a igualdade durante a pandemia, uma vez que as medidas adotadas não abrangeram todos os trabalhadores e todas as empresas. As pequenas e médias empresas, os trabalhadores em modalidades de trabalho precário , os trabalhadores por conta própria, os migrantes, os jovens e as mulheres não tiveram frequentemente acesso a compensações por perda de rendimento ou não são abrangidos por medidas, o que significa que a pobreza e a exclusão social aumentaram durante a epidemia. Muitas empresas também cessaram atividade, resultando na perda de postos de trabalho.

O CESE constata que não foi assegurada a igualdade durante a pandemia, uma vez que as medidas adotadas não abrangeram todos os trabalhadores e todas as empresas. As pequenas e médias empresas, os trabalhadores em modalidades de trabalho menos estáveis e menos seguras , os trabalhadores por conta própria, os migrantes, os jovens e as mulheres não tiveram frequentemente acesso a compensações por perda de rendimento ou não são abrangidos por medidas, o que significa que a pobreza e a exclusão social aumentaram durante a epidemia. Muitas empresas também cessaram atividade, resultando na perda de postos de trabalho.

Resultado da votação

Votos a favor:

88

Votos contra:

138

Abstenções:

14

ALTERAÇÃO 6

Proposta por

ARDHE Christian

HOŠTÁK Martin

KONTKANEN Mira-Maria

LE BRETON Marie-Pierre

SOC/685

Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação

Ponto 6.3

Alterar:

Parecer da secção

Alteração

O CESE constata que a situação das mulheres no mercado de trabalho se deteriorou significativamente durante a pandemia (17): muitas mulheres perderam os seus empregos, o equilíbrio entre a vida profissional e a vida pessoal piorou e, por último, a precariedade aumentou .

O CESE constata que a situação das mulheres no mercado de trabalho se deteriorou significativamente durante a pandemia (17): muitas mulheres perderam os seus empregos, o equilíbrio entre a vida profissional e a vida pessoal piorou e, por último, encontrar um emprego mais estável e mais seguro tornou-se mais desafiante .

Resultado da votação

Votos a favor:

80

Votos contra:

143

Abstenções:

10

ALTERAÇÃO 7

Proposta por

ARDHE Christian

HOŠTÁK Martin

KONTKANEN Mira-Maria

LE BRETON Marie-Pierre

SOC/685

Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação

Ponto 6.4

Alterar:

Parecer da secção

Alteração

Agravou-se também a situação dos migrantes no mercado de trabalho e dos jovens, que cada vez têm maior dificuldade em encontrar emprego, além de se confrontarem ainda mais com formas de trabalho precárias, o que não garante uma vida de qualidade .

Agravou-se também a situação dos migrantes no mercado de trabalho e dos jovens, que cada vez têm maior dificuldade em encontrar emprego, além de se confrontarem ainda mais com o desafio de encontrar formas de trabalho mais estáveis e mais seguras .

Resultado da votação

Votos a favor:

80

Votos contra:

143

Abstenções:

10

ALTERAÇÃO 8

Proposta por

BARRERA CHAMORRO Maria del Carmen

MEYNENT Denis

SALIS-MADINIER Franca

ZORKO Andrej

SOC/685

Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação

Ponto 6.5

Alterar:

Parecer da secção

Alteração

A desigualdade reflete-se sobretudo ao nível da remuneração e da estabilidade do emprego. O CESE está, por isso, firmemente convicto de que as políticas do mercado de trabalho devem abordar as disparidades salariais, juntamente com medidas que promovam a transparência salarial, combatam a segregação horizontal e vertical no mercado de trabalho, incentivem o trabalho a tempo inteiro para as mulheres e abordem os condicionalismos relacionados com a prestação de cuidados não remunerados e a aplicação do princípio da igualdade de remuneração por trabalho de valor igual. Também devem ser tomadas medidas para garantir que os direitos dos trabalhadores são respeitados. Importa incentivar também o diálogo social orientado para a negociação coletiva em atividades atípicas, como o trabalho doméstico, o trabalho de prestação de cuidados, o trabalho em plataformas em linha e afins.

A desigualdade reflete-se sobretudo ao nível da remuneração e da estabilidade do emprego. O CESE está, por isso, firmemente convicto de que as políticas do mercado de trabalho devem abordar as disparidades salariais, juntamente com medidas vinculativas que promovam a transparência salarial, combatam a segregação horizontal e vertical no mercado de trabalho, incentivem o trabalho a tempo inteiro para as mulheres e abordem os condicionalismos relacionados com a prestação de cuidados não remunerados e a aplicação do princípio da igualdade de remuneração por trabalho de valor igual. Também devem ser tomadas medidas para garantir que os direitos dos trabalhadores são respeitados. Importa incentivar também o diálogo social orientado para a negociação coletiva em atividades atípicas, como o trabalho doméstico, o trabalho de prestação de cuidados, o trabalho em plataformas em linha e afins.

Resultado da votação

Votos a favor:

102

Votos contra:

113

Abstenções:

16

ALTERAÇÃO 10

Proposta por

ARDHE Christian

HOŠTÁK Martin

KONTKANEN Mira-Maria

LE BRETON Marie-Pierre

SOC/685

Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação

Ponto 7.3

Alterar:

Parecer da secção

Alteração

É urgente gerir a inteligência artificial no local de trabalho, em especial no que diz respeito à prevenção de práticas discriminatórias, vigilância ilegal dos trabalhadores , nomeadamente o direito a desligar-se, e outras práticas prejudiciais aos trabalhadores. Os parceiros sociais devem participar nos processos de adoção e aplicação da legislação sobre inteligência artificial.

A fim de assegurar o desenvolvimento equilibrado e transparente da inteligência artificial, é urgente geri-la no local de trabalho, em especial no que diz respeito à redução das preocupações infundadas, à promoção da autonomia dos trabalhadores e à prevenção de práticas discriminatórias, à vigilância ilegal dos trabalhadores e a outras práticas prejudiciais aos trabalhadores. Os parceiros sociais devem participar nos processos de adoção e aplicação da legislação sobre inteligência artificial.

Resultado da votação

Votos a favor:

88

Votos contra:

136

Abstenções:

10

ALTERAÇÃO 11

Proposta por

ARDHE Christian

HOŠTÁK Martin

KONTKANEN Mira-Maria

LE BRETON Marie-Pierre

SOC/685

Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação

Ponto 1.1

Alterar:

Parecer da secção

Alteração

A qualidade do trabalho constitui um elemento fundamental da qualidade de vida. É necessário seguir esse princípio, uma vez que se trata de uma condição imprescindível para o desenvolvimento social sustentável. Por conseguinte, o Comité Económico e Social Europeu (CESE) manifesta a firme convicção de que as políticas da UE devem consagrar especial atenção a este princípio, a fim de evitar os riscos de desigualdade, pobreza, exclusão social e concorrência desleal.

A qualidade do trabalho constitui um elemento fundamental da qualidade de vida e deve ser considerado em conjunto com o conceito de desenvolvimento sustentável, no contexto mais amplo do crescimento e do emprego sustentáveis, em especial a transição para uma economia verde e a digitalização . Ao mesmo tempo, o CESE reconhece o papel dos empregadores na promoção das competências, do emprego, das diversas formas de trabalho, da segurança, do bem-estar dos trabalhadores e da competitividade das empresas. Por conseguinte, o Comité Económico e Social Europeu (CESE) manifesta a firme convicção de que as políticas da UE devem consagrar especial atenção à qualidade do trabalho enquanto elemento do crescimento económico e do emprego , uma vez que pode contribuir significativamente quer para o reforço do crescimento sustentável, o emprego e a produtividade, quer para o combate aos riscos de desigualdade, pobreza, exclusão social e concorrência desleal.

Resultado da votação

Votos a favor:

79

Votos contra:

136

Abstenções:

11

ALTERAÇÃO 12

Proposta por

ARDHE Christian

HOŠTÁK Martin

KONTKANEN Mira-Maria

LE BRETON Marie-Pierre

SOC/685

Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação

Ponto 1.2

Aditar:

Posição: após o ponto existente — mesmo nível

Parecer da secção

Alteração

 

O CESE salienta que são necessárias medidas abrangentes e assestadas para garantir mercados de trabalho nacionais reativos, resilientes, inclusivos, nomeadamente à luz da pandemia, e especialmente orientados para a criação de empregos flexíveis. No entanto, o CESE assinala que a evolução do mercado de trabalho deve ser apoiada, e não excessivamente regulamentada ou entravada. Importa prestar especial atenção aos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade no que diz respeito às competências da UE e dos Estados-Membros e aos vários instrumentos ao seu dispor. No que toca a garantir uma base económica sólida para apoiar transições justas na Europa, a tónica deve ser colocada na criação de um quadro regulamentar justo, estável e previsível para as empresas, que, entre outros aspetos, evite impor-lhes encargos administrativos.

Resultado da votação

Votos a favor:

79

Votos contra:

144

Abstenções:

7

ALTERAÇÃO 15

Proposta por

ARDHE Christian

HOŠTÁK Martin

KONTKANEN Mira-Maria

LE BRETON Marie-Pierre

SOC/685

Elementos essenciais para um trabalho sustentável e de qualidade durante e após a recuperação

Ponto 1.12

Alterar:

Parecer da secção

Alteração

O CESE constata que o Mecanismo de Recuperação e Resiliência não aborda diretamente as componentes do trabalho de qualidade, pelo que insta a Comissão a complementar esta parte do mecanismo. A qualidade do trabalho é fundamental para atingir as metas estabelecidas no Mecanismo de Recuperação e Resiliência. Os grupos vulneráveis, como os trabalhadores precários e jovens, os mais afetados pela epidemia, não devem ser ignorados.

O CESE constata que o Mecanismo de Recuperação e Resiliência não aborda diretamente as componentes do trabalho de qualidade, pelo que insta a Comissão a garantir que tais componentes são abordadas de forma adequada quando da concretização do mecanismo. A qualidade do trabalho é fundamental para atingir as metas estabelecidas no Mecanismo de Recuperação e Resiliência. Os grupos vulneráveis, que foram mais afetados pela epidemia, não devem ser ignorados.

Resultado da votação

Votos a favor:

82

Votos contra:

140

Abstenções:

8


(11)   JO C 125 de 21.4.2017, p. 10, ponto 3.4.

(11)   JO C 125 de 21.4.2017, p. 10, ponto 3.4.

(17)  https://eige.europa.eu/news/covid-19-derails-gender-equality-gains

(17)  https://eige.europa.eu/news/covid-19-derails-gender-equality-gains


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/38


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o tema «Rumo a uma cadeia de abastecimento alimentar justa»

(parecer exploratório)

(2021/C 517/05)

Relator:

Branko RAVNIK

Correlator:

Peter SCHMIDT

Consulta

Carta da presidência eslovena do Conselho, 19.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

9.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

211/1/6

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE saúda a Diretiva da UE relativa a práticas comerciais desleais na cadeia de abastecimento agrícola e alimentar como um passo decisivo para fazer face aos desequilíbrios de poder ao longo da cadeia. As práticas comerciais desleais são um fenómeno complexo, com amplas implicações na sociedade, e a regulamentação tem um papel fundamental neste contexto. O Comité insta os Estados-Membros a transporem e aplicarem a diretiva e a fazerem face às práticas comerciais desleais com urgência.

1.2.

A cadeia agroalimentar europeia mostrou-se notavelmente resiliente durante a pandemia de COVID-19. Os consumidores tiveram sempre acesso a quase todos os produtos alimentares. Apesar de estarem expostos aos riscos de infeção, os trabalhadores em toda a cadeia de abastecimento alimentar fizeram um trabalho extraordinário.

1.3.

No entanto, as observações iniciais revelam que há também alterações de comportamentos visíveis na produção, na distribuição e no consumo. O CESE preconiza que se apoie a transformação dos sistemas alimentares da Europa para que estes se tornem mais sustentáveis do ponto de vista ambiental, económico e social, resilientes, justos e inclusivos e, acima de tudo, para que forneçam aos consumidores europeus alimentos saudáveis, produzidos de forma sustentável e seguros. O CESE observa que a cooperação (e não a concorrência) entre os operadores da cadeia alimentar é essencial para promover um sistema alimentar mais resiliente e sustentável, a fim de assegurar uma partilha equitativa entre os operadores e evitar o descrédito.

1.4.

O CESE salienta a sua recomendação de que os operadores mais fracos, em especial os agricultores, recebam, pela venda dos seus produtos, um preço justo e equitativo, que assegure aos fornecedores um rendimento adequado que lhes permita investir, inovar e produzir de modo sustentável (1). Cumpre criar um mecanismo que acompanhe a distribuição do valor acrescentado bruto na cadeia de abastecimento alimentar. De acordo com os dados da Comissão, a parte do valor acrescentado bruto na cadeia de abastecimento alimentar destinada ao produtor primário diminuiu de 31 % em 1995 para 23,4 % em 2015 (últimos dados disponíveis).

1.5.

O CESE também realça a sua recomendação de que sejam combatidas as práticas comerciais desleais que não são tidas em conta no âmbito dos requisitos mínimos da diretiva (2) e saúda os esforços empreendidos por vários Estados-Membros para fazer face a problemas como a compra abaixo do custo de produção, os leilões de «dupla corrida» (double race auctions, em inglês) ou a proteção de todos os intervenientes na cadeia de abastecimento, independentemente da sua dimensão ou da sua posição na cadeia alimentar. Congratula-se com a decisão da Comissão de regular as práticas comerciais desleais na cadeia de abastecimento alimentar. No entanto, lamenta que a Comissão não tenha promovido uma abordagem uniformizada, a fim de evitar a fragmentação do mercado único. O CESE considera que as futuras medidas adicionais devem ser compatíveis com o mercado único e sujeitas a uma avaliação de impacto adequada. Apraz-lhe, contudo, que os Estados-Membros estejam a transpor e a aplicar a diretiva, garantindo uma cadeia de abastecimento alimentar mais justa, e apela para uma abordagem mais uniformizada no futuro.

1.6.

O CESE insta os Estados-Membros a adotarem legislação que proteja todos os intervenientes comerciais. A dimensão não é necessariamente representativa do poder de mercado, pelo que todos os operadores económicos, grandes e pequenos, devem ser protegidos contra as práticas comerciais desleais.

1.7.

O CESE encoraja também os Estados-Membros a estabelecer mecanismos que lhes permitam acompanhar, avaliar e assegurar a aplicação da legislação que transpõe a diretiva e a criar fóruns de diálogo em cooperação com as partes interessadas.

1.8.

Atualmente, os desequilíbrios do poder económico e de negociação nos sistemas alimentares europeus (mas também mundiais) condicionam a rendibilidade do setor agrícola e os salários, levando à redução do potencial de investimento das pequenas e médias empresas do setor alimentar e ao abandono dos estabelecimentos retalhistas locais de natureza familiar. Por conseguinte, são necessários mecanismos de correção baseados em dados concretos para assegurar um desenvolvimento equilibrado dos intervenientes na cadeia de abastecimento alimentar europeia e permitir uma partilha equitativa dos benefícios económicos da produção e distribuição alimentares dentro e fora da UE, fomentando assim sistemas alimentares sustentáveis. A Comissão não retirou conclusões das avaliações de impacto da Estratégia do Prado ao Prato.

1.9.

O CESE sublinha a importância de todas as partes interessadas disporem das ferramentas e informações corretas para poderem beneficiar da diretiva. Consequentemente, o CESE insta a Comissão Europeia, os Estados-Membros e o Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE) a assegurarem que as partes interessadas conhecem os seus direitos e os procedimentos para a sua aplicação, nomeadamente em relação ao comércio transnacional, tanto no interior da UE como a partir de países terceiros.

1.10.

O CESE reafirma que a promoção de práticas comerciais mais justas deve ser parte integrante de uma política alimentar e comercial abrangente da UE, que englobe toda a cadeia de abastecimento e assegure a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.

2.   Introdução

2.1.

As práticas comerciais desleais são definidas como «práticas [comerciais] que se desviam […] da boa conduta comercial, são contrárias à boa-fé e às práticas comerciais leais e são impostas unilateralmente por um parceiro comercial a outro» (3). A cadeia de abastecimento alimentar é particularmente vulnerável às práticas comerciais desleais, devido a fortes desequilíbrios de poder entre operadores. As práticas comerciais desleais podem ocorrer em todas as fases da cadeia de abastecimento, e quando ocorrem a um nível da cadeia podem ter repercussões noutras partes da mesma, consoante o poder de mercado das partes envolvidas (4).

2.2.

Tal como descrito em pormenor no Parecer do CESE «Uma cadeia de abastecimento agroalimentar mais justa», adotado em 2016 (5), e no Parecer do CESE «Melhorar a cadeia de abastecimento alimentar», adotado em 2018 (6), a concentração do poder negocial conduziu ao abuso de posições dominantes, o que torna os operadores mais fracos cada vez mais vulneráveis às práticas comerciais desleais. Esta situação transfere risco económico do mercado para a cadeia de abastecimento e tem um impacto particularmente negativo nos consumidores e em alguns operadores, por exemplo agricultores, trabalhadores e PME. De acordo com os dados da Comissão, a parte do valor acrescentado bruto na cadeia de abastecimento alimentar destinada ao produtor primário diminuiu de 31 % em 1995 para 23,4 % em 2015 (últimos dados disponíveis). De acordo com a Comissão, o problema das práticas comerciais desleais foi reconhecido por todas as partes interessadas da cadeia de abastecimento alimentar, tendo sido referido que a maioria dos operadores já se confrontou com práticas comerciais desleais (7).

2.3.

A Diretiva (UE) 2019/633 do Parlamento Europeu e do Conselho (8) relativa a práticas comerciais desleais na cadeia de abastecimento agrícola e alimentar foi adotada em abril de 2019. A diretiva é curta, concisa e assenta num número limitado de princípios essenciais. Os Estados-Membros tinham a obrigação de transpor a diretiva para o direito nacional até 1 de maio de 2021 e de aplicá-la no prazo de seis meses. A diretiva faz parte de uma agenda de governação mais ampla, que visa alcançar uma cadeia de abastecimento alimentar mais eficiente e mais justa, e inclui igualmente a cooperação entre produtores e medidas para aumentar a transparência no mercado. A Estratégia do Prado ao Prato (9) também visa contribuir para melhorar a posição dos agricultores na cadeia de abastecimento alimentar.

2.4.

A presidência eslovena da UE solicitou ao CESE que elaborasse um parecer exploratório sobre a realização efetiva, na prática, dos objetivos da diretiva, sobre as boas práticas dos Estados-Membros em matéria de regulamentação da cadeia de abastecimento alimentar, bem como sobre as medidas necessárias para garantir que este processo continue a avançar.

3.   Posição do CESE sobre as práticas comerciais desleais

3.1.

No seu parecer de 2018 (10), o CESE acolheu com agrado a proposta da Comissão que visa reduzir a ocorrência de práticas comerciais desleais, encarando-a como um primeiro passo necessário para proteger os operadores mais fracos, nomeadamente os agricultores, os trabalhadores e determinados operadores, e melhorar a governação da cadeia de abastecimento alimentar. A forma de combater eficazmente as práticas comerciais desleais a nível da UE é através de uma abordagem regulamentar e um quadro legislativo dotados de mecanismos de execução sólidos e eficazes. Esta afirmação foi também reiterada no Parecer do CESE — Do prado ao prato: uma estratégia de alimentação sustentável, de 2020 (11).

3.2.

O CESE lamentou, porém, que a Comissão apenas tenha introduzido um nível mínimo comum de proteção em toda a UE, limitando-se a proibir determinadas práticas comerciais desleais. Impõe-se a proibição de todas as práticas abusivas.

3.3.

No que respeita à execução, o CESE acolheu favoravelmente a proposta da Comissão de criar uma rede de autoridades executoras harmonizada ao nível da UE.

3.4.

O CESE recomendou que a Comissão, para além de combater as práticas comerciais desleais, incentive e apoie modelos de negócio que contribuam não só para tornar a cadeia de abastecimento sustentável, mas também para assegurar o seu reequilíbrio e melhorar a sua eficiência, a fim de reforçar a posição dos operadores mais fracos.

4.   Transposição e aplicação da Diretiva relativa às práticas comerciais desleais — ponto da situação

4.1.

Os Estados-Membros estão atualmente em processo de transposição e aplicação da diretiva (12). A maioria das associações de agricultores, dos sindicatos e dos transformadores considera que as medidas previstas não são suficientes para os proteger. Não obstante, apoiaram as medidas propostas para aplicar a Diretiva relativa às práticas comerciais desleais, tendo mesmo solicitado maiores ambições, ao passo que, em certos casos, os retalhistas manifestaram opiniões divergentes.

4.2.

Até novembro de 2021, a Comissão apresentará um relatório intercalar sobre a transposição da diretiva e, em 2025, fará uma avaliação da sua eficácia. Esta avaliação terá por base os relatórios anuais dos Estados-Membros e os resultados de inquéritos realizados pela Comissão junto das partes interessadas sobre o estado das práticas comerciais desleais na cadeia de abastecimento alimentar (13). O CESE propõe à Comissão que consulte igualmente os compradores e recolha informações sobre a sua experiência com a diretiva. O mecanismo de cooperação instituído pela diretiva deve constituir um fórum adequado para que as autoridades competentes pela execução e a Comissão possam debater a eficácia da diretiva, com base nos relatórios anuais dos Estados-Membros. Estas reuniões regulares permitirão identificar as boas práticas e as lacunas e comparar as abordagens dos Estados-Membros.

4.3.

O CESE congratula-se com a decisão da Comissão de regular as práticas comerciais desleais na cadeia de abastecimento alimentar. No entanto, lamenta que a Comissão não tenha promovido uma abordagem uniformizada, o que causa a fragmentação do mercado único. Apraz-lhe, contudo, que os Estados-Membros estejam a transpor e a aplicar a diretiva, garantindo uma cadeia de abastecimento alimentar mais justa, e apela para uma abordagem mais uniformizada no futuro.

5.   Boas práticas no processo de transposição/aplicação

5.1.

O CESE congratula-se com a ambiciosa legislação de transposição nacional (a seguir designada «boas práticas») que proíbe algumas práticas comerciais desleais que são permitidas na diretiva em certas condições. São disto exemplo a proibição de devolver ao fornecedor os produtos não vendidos sem pagar por esses produtos ou de cobrar ao fornecedor os custos de armazenamento do comprador, decretadas pela legislação de transposição alemã (14).

5.2.

O CESE saúda a introdução na legislação de transposição de artigos que proíbem a compra abaixo do custo de produção, aplicáveis a todos os operadores. É o que acontece na legislação espanhola (15), que, além de proibir a compra abaixo do custo de produção a todos os operadores, proíbe também a destruição de valor ao longo da cadeia de abastecimento alimentar. De igual forma, o legislador italiano foi mandatado para fazer face a esta questão na legislação de transposição (16). Na Alemanha, o Parlamento Federal alemão realizará uma auditoria à possível proibição de compra abaixo do custo de produção no âmbito da avaliação que terá lugar dois anos após a entrada em vigor da legislação.

5.3.

Tal faz parte de um conjunto mais vasto de iniciativas promovidas pela Comissão Europeia, que inclui, por exemplo, observatórios de mercado relativos aos preços (17), e que é essencial para apoiar a transparência e equidade no setor. Além disso, importa também mencionar a importância da reciprocidade no comércio internacional (18).

5.4.

O CESE congratula-se com as leis que estabelecem um provedor de justiça para acompanhar a respetiva execução. Em Espanha, foi criada uma agência independente (AICA) para acompanhar a aplicação da lei, enquanto um provedor de justiça está mandatado para incentivar a adoção voluntária de códigos de conduta. Na Alemanha, as pessoas afetadas por práticas comerciais desleais poderão apresentar queixas anónimas a um provedor de justiça independente, nomeadamente denunciando práticas desleais não elencadas na legislação. O provedor de justiça poderá igualmente iniciar inquéritos e remeter as infrações ao Gabinete Federal para a Agricultura e a Alimentação (BLE), bem como acompanhar os custos de produção e a evolução dos preços (19).

5.5.

A dimensão não é necessariamente representativa do poder de mercado, pelo que todos os operadores económicos, grandes e pequenos, devem ser protegidos contra as práticas comerciais desleais. O CESE insta os Estados-Membros a adotarem legislação que proteja todos os intervenientes comerciais. Nos casos em que este nível de ambição não é atingido, o Comité reconhece o mérito dos países cuja legislação abrange intervenientes de maiores dimensões pelo menos em setores essenciais. Na Alemanha, por exemplo, é mantido o limiar de 350 milhões de euros para as empresas dos setores agrícola, piscícola e da produção alimentar, mas no caso da carne, das frutas e dos produtos hortícolas, o limiar será definido num volume de negócios de 4 mil milhões de euros, o que fará com que mais intervenientes fiquem protegidos pela legislação (20). O anteprojeto de lei belga elimina a «abordagem faseada», oferecendo proteção a todos os intervenientes comerciais abaixo do limiar de 350 milhões de euros contra práticas comerciais desleais, independentemente da sua dimensão relativamente ao comprador. Espanha oferece uma proteção especial aos produtores primários, mas todos os operadores, independentemente da sua dimensão e/ou posição no mercado, estão protegidos por lei.

5.6.

Os leilões de «dupla corrida» (21) têm estado associados a impactos negativos graves para os agricultores (22), que são efetivamente forçados a participar nesta prática devido ao desequilíbrio de poder entre compradores e vendedores. A proibição dos leilões de «dupla corrida» contribuiria para evitar casos em que os fornecedores são levados a vender abaixo do custo de produção. Embora o processo de transposição da diretiva em Itália não esteja ainda concluído, o CESE acompanha com interesse o debate em curso sobre a possibilidade de proibir os leilões de «dupla corrida» no país, em que o legislador foi mandatado para fazer face a este problema na legislação de transposição.

5.7.

O CESE também considera boa prática a obrigação de redigir contratos para cada operação e de os incluir numa base de dados para maior transparência e controlo. A legislação espanhola inclui uma obrigação deste género, que teve um impacto muito positivo nas relações comerciais. O contrato deve incluir conceitos como a qualidade, a duração, o preço, o indicador de preço, a renegociação, a renovação e a saída com aviso prévio.

5.8.

O CESE acolhe favoravelmente a cláusula da legislação alemã que estabelece uma primeira avaliação dois anos após a entrada em vigor da legislação e o facto de, para além de analisar o cumprimento das obrigações existentes, o Parlamento Federal alemão poder também aumentar a lista de práticas comerciais desleais proibidas (23); assinala também o anteprojeto de lei belga, que prevê a possibilidade de acrescentar práticas comerciais desleais à lista em qualquer momento, através de um decreto real após consulta das partes interessadas.

6.   Lacunas identificadas

6.1.

O CESE insiste que todas as práticas comerciais desleais referidas na diretiva podem ter um impacto prejudicial nos intervenientes mais fracos da cadeia de abastecimento, incluindo as denominadas «práticas cinzentas». Os fornecedores mais fracos podem sentir-se obrigados a assinar um acordo com um comprador mais poderoso com termos contratuais que não são do seu interesse. Embora a possibilidade de uma «proibição geral» de todas as práticas comerciais desleais tenha sido debatida em vários Estados-Membros, tem havido dificuldade em chegar a este nível de ambição sem intervenção da UE. De forma semelhante, no seu parecer de 2018, o CESE apelou para uma proibição total das práticas comerciais desleais e para a possibilidade de os Estados-Membros alargarem a lista de práticas comerciais desleais inicialmente proibidas. Resta saber que mecanismos de revisão serão introduzidos pela legislação de transposição.

6.2.

A diretiva confere a fornecedores, organizações de fornecedores e organizações sem fins lucrativos que operem em nome de fornecedores o direito de apresentar uma queixa. Todavia, o CESE manifesta-se apreensivo com o facto de poder haver casos em que se verifique uma prática comercial desleal ilegal e em que uma parte afetada (por exemplo, um trabalhador) obtém informações pertinentes, mas as autoridades executoras não podem lidar com a situação devido à ausência de uma queixa formal de um operador afetado ou da sua organização. Uma vez que os operadores afetados podem sentir-se relutantes em apresentar queixa, mesmo que os seus direitos não estejam a ser respeitados, o CESE exorta a Comissão a acompanhar de perto e a avaliar em que medida podem ser necessárias alterações para proteger melhor as partes mais vulneráveis que dependem dos operadores, como os trabalhadores, os agricultores e os pescadores. A Diretiva relativa às práticas comerciais desleais não requer um contrato escrito. No entanto, requer uma relação de venda. Por conseguinte, o CESE chama a atenção para a sua sugestão de alargar a proteção a casos em que a prática comercial desleal ocorre mas não existe um contrato (por escrito). O CESE já apelou para a introdução do direito de intentar ações coletivas (24).

6.3.

A «abordagem faseada» da diretiva implica que, em certas situações, um operador que seja fraco em termos de poder de mercado mas grande em volume de negócios não seja protegido pela lei. Esta situação introduz incerteza para os fornecedores que não têm conhecimento do volume de negócios anual dos seus parceiros comerciais. O CESE convida a Comissão e os Estados-Membros da UE a acompanharem e fazerem face às consequências negativas desta «abordagem faseada» e a ponderarem proteger todos os intervenientes comerciais, independentemente da sua dimensão.

6.4.

Ao se assegurarem relações comerciais estáveis, equilibradas e duradouras entre os operadores da cadeia alimentar, os agricultores poderão participar mais no valor acrescentado dos produtos, pois, ao longo do tempo, têm vindo a receber uma percentagem cada vez menor e mais reduzida do preço final. Os aspetos relativos à regionalidade e à qualidade podem manter o valor acrescentado na região em comparação com as importações de matérias-primas de países terceiros com normas de produção, na sua maioria, inferiores às da UE. A melhoria da rotulagem de origem aumentaria a transparência nas cadeias de abastecimento alimentar.

7.   Vulnerabilidades na cadeia de abastecimento agroalimentar expostas pela COVID-19

7.1.

De um modo geral, a cadeia agroalimentar europeia mostrou-se notavelmente resiliente durante a crise da COVID-19. Os consumidores tiveram sempre acesso a quase todos os produtos alimentares. Apesar de estarem expostos aos riscos de infeção, os trabalhadores em toda a cadeia de abastecimento alimentar fizeram um trabalho extraordinário. Porém, a COVID-19 afeta todo o sistema agroalimentar mundial. Exerce um choque simétrico mas assíncrono nos sistemas alimentares mundial e nacionais que afeta: 1) os canais de oferta e procura em momentos diferentes; 2) todos os elementos do sistema alimentar, da produção primária à transformação de alimentos, revenda e serviços de restauração (HORECA), o comércio internacional e os sistemas logísticos, bem como a procura intermédia e final; 3) os mercados de fatores (mão de obra e capital) e bens de produção intermédios. Os canais de transmissão destes efeitos incluem inúmeros fatores macroeconómicos (por exemplo, taxas de câmbio, preços da energia, acesso aos mercados financeiros) e, acima de tudo, a contração da atividade económica global e um aumento do desemprego.

7.2.

As restrições à livre circulação de trabalhadores (a Comissão emitiu orientações sobre pessoas com funções essenciais, como, por exemplo, os trabalhadores sazonais) de um Estado-Membro para outro afetaram muitos domínios da produção e transformação alimentares (por exemplo, a colheita de frutas e produtos hortícolas e a transformação de carne e laticínios) que dependem do trabalho de trabalhadores sazonais de outros Estados-Membros ou de países terceiros. Além disso, muitas vezes os trabalhadores migrantes vivem e trabalham em más condições e estão em maior risco de infeção, como comprovaram os surtos em matadouros e em fábricas de embalamento de carne de todo o mundo. Esta situação cria simultaneamente um grave problema de saúde pública e uma quebra na cadeia de abastecimento alimentar.

7.3.

Além disso, ao perturbar o transporte de alimentos devido às medidas de confinamento e às perturbações logísticas, esta pandemia também levou ao protecionismo, que afeta as importações e exportações de alimentos. Ao mesmo tempo, muitas pessoas salientaram a importância dos alimentos produzidos regionalmente na UE e os benefícios tradicionais das cadeias de abastecimento curtas, da produção local e do comércio local, que se revelaram ainda mais atrativos durante a crise, pois as pessoas procuram formas novas e mais diretas de comprarem os seus alimentos e os produtores encontram novas formas de escoarem os seus produtos. Porém, um dos aspetos mais importantes é a constatação da necessidade de continuar o comércio justo e sustentável a nível regional e internacional. As restrições ao comércio podem pôr em causa a estabilidade, o que poderia afetar especialmente as populações de baixos rendimentos.

7.4.

O confinamento abalou fortemente os serviços de acolhimento e parte da indústria alimentar (por exemplo, o setor da hotelaria e restauração e outras indústrias e serviços de entrega de alimentos associados à restauração, grossistas e retalhistas em zonas turísticas), com consequências profundas. Para além dos estabelecimentos propriamente ditos, a perturbação das atividades também quebrou o sistema de abastecimento alimentar consolidado de que dependiam muitos agricultores e fornecedores de produtos agrícolas. Os fornecedores de produtos frescos foram severamente atingidos, uma vez que o vinho e o queijo de elevada qualidade e as carnes mais nobres normalmente vendidos em restaurantes foram substituídos por produtos comuns comprados em supermercados e consumidos em casa (FAO, 2020; OCDE, 2020). Alguns produtores reagiram aproximando-se dos mercados retalhistas ou em linha, que, em muitos casos, lhes permitiram chegar a ótimos compromissos e acordos, mas muitos foram incapazes de se adaptar, tendo perdido clientes e rendimentos. O turismo rural, que frequentemente ajuda os agricultores a diversificarem as suas fontes de rendimento, foi também duramente atingido pelas restrições associadas à COVID-19.

7.5.

A crise da COVID-19 acelerou drasticamente a transição para os serviços em linha, que deverá continuar. Um estudo recente da empresa de consultoria McKinsey & Company (25) mostra que, em 2020, o número de canais de vendas de mercearias em linha na Europa cresceu 55 %, uma tendência que deverá continuar, uma vez que 50 % dos consumidores que os utilizaram durante a pandemia tencionam continuar a fazê-lo.

7.6.

O surgimento da COVID-19 e a sua rápida propagação mundial constituem um enorme choque para a economia da UE e para a economia mundial. Foram tomadas medidas imediatas e abrangentes a nível do orçamento, da liquidez e das políticas, a fim de prestar ajuda aos setores mais afetados. A UE dispõe de um conjunto alargado de medidas de intervenção no mercado, tendo várias destas medidas sido ativadas durante a crise da COVID-19 para apoiar os rendimentos agrícolas. Todavia, a resposta foi limitada, uma vez que praticamente não havia fundos no orçamento da UE para financiar medidas de emergência suplementares para a agricultura no último ano do período orçamental de 2014-2020.

7.7.

Por fim, a Comissão lançou o Pacto Ecológico Europeu, com implicações também para a agricultura (Estratégia do Prado ao Prato e Estratégia da Biodiversidade) e o pacote de medidas de estímulo do Instrumento de Recuperação da União Europeia («Next Generation EU») afetou mais 7,5 mil milhões de euros ao FEADER. As avaliações de impacto da Estratégia do Prado ao Prato são preocupantes para a UE. Não obstante, o CESE solicita um apoio político mais equilibrado a favor do setor agroalimentar comparativamente a outros setores da economia em que a estrutura económica é muito mais resiliente e os níveis de rentabilidade bem mais elevados.

8.   Próximas etapas

8.1.

A margem de manobra que a diretiva deixa aos Estados-Membros para a redação dos textos legislativos de execução da diretiva permitiu que cada um deles instituísse legislação personalizada e perfeitamente adequada aos respetivos contextos nacionais. Como referido anteriormente, alguns Estados-Membros elevaram o nível de ambição acima das normas mínimas de harmonização da diretiva, tendo adotado legislação que oferece proteção suplementar a fornecedores da UE e de países terceiros.

8.2.

Embora seja expectável que os fornecedores de um determinado Estado-Membro tenham facilmente acesso às especificidades da sua legislação nacional de transposição (nomeadamente ao mecanismo de apresentação de queixas e à autoridade competente), o mesmo pode não ser verdade para os fornecedores que exportam para outros Estados-Membros da UE e para os fornecedores de países terceiros que exportam para a UE. O CESE congratula-se com o esforço de divulgação empreendido pela Comissão com a publicação da brochura sobre a Diretiva relativa às práticas comerciais desleais (26), mas salienta que este documento contém apenas informações relacionadas com as normas mínimas de harmonização. A fim de oferecer aos exportadores as ferramentas certas para que possam beneficiar da legislação nacional de transposição, o CESE convida a Comissão a garantir que a disponibilização aos exportadores de todas as informações mais pertinentes em relação a cada uma das leis seja facilitada.

8.3.

O CESE salienta que é do interesse de todas as partes interessadas que a diretiva seja aplicável a qualquer relação comercial em que pelo menos o comprador ou o vendedor seja uma empresa da UE, mesmo quando o fornecedor é um interveniente de fora da UE. O CESE convida a Comissão e o SEAE a tirar partido do potencial de divulgação das delegações da UE nos países terceiros para prestar informações aos fornecedores desses países. Estas informações têm de ir além das orientações gerais da diretiva e incluir informações práticas sobre as especificidades e as autoridades executoras dos Estados-Membros.

8.4.

O CESE acolhe favoravelmente que a cadeia de abastecimento agroalimentar seja considerada um ecossistema estratégico para a recuperação europeia e apela para uma maior cooperação na cadeia de abastecimento e para o diálogo com as partes interessadas, a fim de facilitar a transição para sistemas alimentares mais sustentáveis de uma forma tão inclusiva quanto possível. A este respeito, o CESE assinala a importância, a diversidade e a escala das iniciativas empreendidas ao longo da cadeia de abastecimento alimentar para apoiar a transição para a sustentabilidade através do investimento em medidas de incentivo à produção sustentável e local.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Parecer do CESE «Melhorar a cadeia de abastecimento alimentar» (JO C 440 de 6.12.2018, p. 165).

(2)  Parecer do CESE «Uma cadeia de abastecimento agroalimentar mais justa» (JO C 34 de 2.2.2017, p. 130) e Parecer do CESE «Melhorar a cadeia de abastecimento alimentar» (JO C 440 de 6.12.2018, p. 165).

(3)  CE, 2014.

(4)  Grupo de Missão para os Mercados Agrícolas, 2016

(5)  Parecer do CESE «Uma cadeia de abastecimento agroalimentar mais justa» (JO C 34 de 2.2.2017, p. 130).

(6)  Parecer do CESE «Melhorar a cadeia de abastecimento alimentar» (JO C 440 de 6.12.2018, p. 165).

(7)  Comunicação da Comissão, 2014

(8)  Diretiva (UE) 2019/633 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de abril de 2019, relativa a práticas comerciais desleais nas relações entre empresas na cadeia de abastecimento agrícola e alimentar (JO L 111 de 25.4.2019, p. 59) (https://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/TXT/?uri=uriserv%3AOJ.L_.2019.111.01.0059.01.ENG)

(9)  Estratégia do Prado ao Prato

(10)  Parecer do CESE «Melhorar a cadeia de abastecimento alimentar» (JO C 440 de 6.12.2018, p. 165).

(11)  Parecer do CESE «Estratégia do Prado ao Prato para um sistema alimentar justo, saudável e respeitador do ambiente» (JO C 429 de 11.12.2020, p. 268).

(12)  Transposição para o direito nacional pelos Estados-Membros

(13)  Sítio Web da Comissão

(14)  Aguarda aprovação na câmara alta, pelo que ainda não foi comunicada oficialmente à Comissão. Prevista para 28 de maio de 2021.

(15)  Ley 12/2013, de 2 de agosto, de medidas para mejorar el funcionamiento de la cadena alimentaria. Esta lei será alterada por uma outra lei atualmente em negociação, conhecida em espanhol por Proyecto de Ley por el que se modifica la Ley 12/2013 de medidas para mejorar el funcionamiento de la cadena alimentaria.

(16)  Gazzetta Ufficiale della Republica Italiana, 23 de abril de 2021.

(17)  Observatórios de mercado da Comissão Europeia. Ver também o exemplo do programa de vigilância dos preços e margens de lucro do setor alimentar francês

(18)  Parecer do CESE «Compatibilidade da política comercial da UE com o Pacto Ecológico Europeu» (JO C 429 de 11.12.2020, p. 66).

(19)  Sítio Web do BLE

(20)  Esta cláusula só é aplicável até maio de 2025, data após a qual o limiar será reduzido para 350 milhões de euros.

(21)  Os leilões de «dupla corrida» são mecanismos utilizados pelos compradores para colocarem os fornecedores uns contra os outros em leilões em linha organizados com pouca antecedência, nos quais são incentivados a oferecerem os seus produtos ao preço mais baixo possível.

(22)  Estudo de caso da Oxfam

(23)  A avaliação inclui também os resultados do exame a uma eventual proibição da compra de produtos alimentares e agrícolas abaixo dos respetivos custos de produção.

(24)  Parecer do CESE «Uma cadeia de abastecimento agroalimentar mais justa» (JO C 34 de 2.2.2017, p. 130).

(25)  https://www.mckinsey.com/industries/retail/our-insights/disruption-and-uncertainty-the-state-of-european-grocery-retail-2021

(26)  Brochura da Comissão


III Atos preparatórios

Comité Económico e Social Europeu

563.a reunião plenária do Comité Económico e Social Europeu – por Interactio, 22.9.2021-23.9.2021

22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/45


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões «Legislar melhor: unir as nossas forças para melhorar a legislação»

[COM(2021) 219 final]

(2021/C 517/06)

Relator:

Heiko WILLEMS

Consulta

Carta da Comissão, 1.7.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

2.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

231/0/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com o facto de a nova Comissão manter como prioridade as medidas para legislar melhor. Solicita à Comissão e aos legisladores da UE que aprofundem e façam avançar de forma coerente o sistema da UE para legislar melhor em todos os seus aspetos e que utilizem metodicamente os instrumentos e orientações para legislar melhor no quadro dos seus trabalhos.

1.2.

O CESE sublinha que legislar melhor é uma componente essencial da boa governação e do processo legislativo. Pode contribuir para assegurar processos de elaboração de políticas transparentes, responsáveis e participativos que definam de forma independente regras assentes em dados factuais, e que sejam simples, claras, coerentes, eficazes, sustentáveis, adequadas à finalidade, proporcionais, orientadas para o futuro e fáceis de aplicar. Esta é uma condição prévia essencial para assegurar a legitimidade democrática e a confiança das pessoas na UE e nas suas instituições.

1.3.

O CESE sublinha que os instrumentos para legislar melhor devem continuar a ser neutros do ponto de vista político e estar claramente separados da tomada de decisões políticas, que deve ser deixada aos órgãos políticos designados e legítimos. Os aspetos económicos, ambientais e sociais da legislação da UE devem ser sempre considerados em pé de igualdade, com base numa análise tanto quantitativa como qualitativa que avalie os seus impactos.

1.4.

O CESE chama a atenção para o facto de a pandemia de COVID-19 ser uma crise sanitária, social e económica sem precedentes na Europa desde 1945. Por conseguinte, insta a Comissão a prestar especial atenção, nas circunstâncias extraordinárias atuais, aos múltiplos impactos das medidas que propõe nas diferentes dimensões desta crise, a fim de apoiar uma recuperação rápida e total.

2.   Observações na generalidade

2.1.

O CESE toma nota do atraso significativo na publicação da comunicação. Insta a Comissão a recuperar o tempo perdido, a clarificar as suas propostas de acordo com as observações que se seguem e a aplicar as medidas propostas com a maior rapidez possível.

2.2.

O CESE sublinha que legislar melhor pode contribuir para criar os melhores quadros regulamentares possíveis para os cidadãos, os trabalhadores, as empresas e as administrações públicas. Salienta que legislar melhor deve contribuir para a conclusão do mercado único em todos os domínios, melhorar o seu funcionamento e reforçar a sua resiliência e competitividade, promover a investigação e a inovação, estimular o crescimento sustentável e a criação de empregos de qualidade, apoiar a transição ecológica e digital e reforçar a sua dimensão social e a economia social de mercado, tal como estabelecido no artigo 3.o do TFUE.

2.3.

O CESE anima a Comissão a continuar a promover os princípios e instrumentos para legislar melhor em todos os seus serviços, nomeadamente através da formação regular do pessoal a todos os níveis a fim de assegurar o conhecimento e o cumprimento desses princípios e instrumentos.

2.4.

Referindo-se a pareceres anteriores seus (1), o CESE recorda que legislar melhor «não significa “mais” ou “menos” legislação da UE, nem se trata de desregulamentar ou de deixar de conceder prioridade a determinados domínios de intervenção, comprometendo assim os valores da UE, como a proteção social e ambiental e os direitos fundamentais» (2). Além disso, salienta que legislar melhor não deve burocratizar excessivamente a elaboração das políticas da UE nem substituir as decisões políticas por procedimentos técnicos.

3.   Observações na especialidade

3.1.

O CESE é a voz institucional da sociedade civil organizada na UE e desempenha o papel de intermediário entre os legisladores da UE e as organizações da sociedade civil e os parceiros sociais. O CESE acumulou uma vasta experiência e conhecimentos especializados sobre todas as questões relacionadas com legislar melhor. A seguir, apresenta a sua avaliação sobre aspetos específicos abrangidos pela comunicação em apreço, considerando necessário destacar outros aspetos importantes que a mesma não aborda.

3.2.   Subsidiariedade e proporcionalidade

3.2.1.

O CESE recorda as suas recomendações sobre subsidiariedade e proporcionalidade nos seus anteriores pareceres (3). Reitera que a União só deve agir quando estes princípios são plenamente respeitados e quando a ação comum acrescenta valor para todos. Para tal, o CESE anima a Comissão a aplicar plenamente as sugestões apresentadas pelo Grupo de Trabalho Subsidiariedade, Proporcionalidade e «Fazer menos com maior Eficiência» (4).

3.3.   Recolha de dados e consultas públicas

3.3.1.

O CESE felicita a Comissão por pretender agilizar e facilitar a recolha de dados. Saúda igualmente o objetivo de melhorar a participação das partes interessadas pertinentes e da comunidade científica na elaboração de políticas e de facilitar o acesso do público aos dados que sustentam as propostas.

3.3.2.

No que se refere à consulta das partes interessadas, o CESE remete para o seu parecer (5) e para o parecer da Plataforma REFIT (6), em cuja elaboração participou. Salienta que as consultas públicas são uma parte essencial da recolha de dados e nunca devem ser realizadas pro forma, com base em resultados pré-determinados. A Comissão deve sempre procurar consultar as pessoas mais imediatamente afetadas pelas medidas propostas e garantir a representatividade. Além disso, as consultas públicas não devem prejudicar o papel consultivo do CESE nem a autonomia ou as prerrogativas dos parceiros sociais previstas nos Tratados, nomeadamente no que diz respeito às questões sociais e laborais (diálogo social).

3.3.3.

O CESE anima a Comissão a seguir escrupulosamente as orientações do capítulo VII das ferramentas para legislar melhor relativas à consulta das partes interessadas (7) aquando do planeamento e da realização das consultas. Salienta, em particular, que os questionários devem ser sempre claros, simples e conviviais, ser fornecidos num formato editável, permitir respostas abertas e comentários, bem como o carregamento de documentos adicionais e evitar perguntas tendenciosas.

3.3.4.

O CESE recorda à Comissão que, dada a sua função representativa, está devidamente habilitado para ajudar a identificar as partes interessadas mais afetadas pelas medidas políticas propostas. Insta a Comissão a consultar o CESE mais estreitamente aquando da elaboração de estratégias de consulta e da identificação dos grupos-alvo pertinentes.

3.3.5.

O CESE congratula-se com a intenção da Comissão de informar melhor as partes interessadas sobre a forma como os seus contributos foram utilizados. Para garantir a confiança das pessoas no processo de elaboração de políticas e a sua participação contínua no mesmo, é essencial fornecer informações adequadas sobre o modo como os seus contributos influenciaram a tomada de decisões.

3.3.6.

O CESE continua a aguardar da Comissão uma resposta ao pedido que há muito lhe endereçou para que explicasse concretamente o modo como avalia os contributos recebidos durante as consultas públicas em termos de representatividade. Numa era marcada pela desinformação, pelas campanhas maciças (nomeadamente através das redes sociais) e pela utilização de robôs digitais, essa avaliação é cada vez mais importante.

3.4.   Avaliações de impacto

3.4.1.

O CESE remete para o seu parecer (8) sobre a forma de melhorar o ecossistema europeu em matéria de avaliação de impacto.

3.4.2.

O CESE salienta que, por definição, a Comissão deve fundamentar cada proposta legislativa com uma avaliação de impacto plenamente desenvolvida. Se a Comissão não o fizer, deve explicar em pormenor as razões da sua decisão e fornecer todas as informações e dados que sustentam e/ou apoiam a proposta.

3.4.3.

O CESE insta o Parlamento Europeu e o Conselho a respeitar o compromisso assumido no acordo interinstitucional sobre legislar melhor (9) e a realizar as suas próprias avaliações de impacto sobre as alterações substanciais introduzidas durante o processo legislativo, incluindo as alterações efetuadas durante as negociações do trílogo. Sugere que a Comissão e os legisladores, em conjunto com o Comité de Controlo da Regulamentação (a seguir «Comité de Controlo»), elaborem uma série de critérios comuns que ajudem a definir o que é «substancial» e a determinar melhor quando as alterações necessitam de uma análise de impacto adicional.

3.4.4.

O CESE recorda o convite (10) que dirigiu à Comissão para que estabeleça uma matriz de avaliação inteligente que permita uma modelização dinâmica do impacto das alterações substanciais apresentadas pelos colegisladores, objetivando o impacto de determinados parâmetros, mas também de dados qualitativos. A este respeito, o CESE apela para a criação de um projeto-piloto de modelização inteligente.

3.4.5.

O CESE observa com preocupação as conclusões do relatório anual 2020 do Comité de Controlo (11) sobre a qualidade das avaliações de impacto da Comissão, no qual se afirma que, em 2020, este emitiu muito menos pareceres positivos (12 % dos pareceres) e mais pareceres negativos (46 % dos pareceres). No relatório, o Comité de Controlo prossegue referindo que a classificação qualitativa média das sugestões apresentadas inicialmente foi também sensivelmente inferior à dos anos anteriores e que em muitos casos, a qualidade foi afetada por não ter havido tempo suficiente para preparar as avaliações de impacto, o que se deveu aos ambiciosos prazos definidos para cumprir as prioridades da nova Comissão. Por conseguinte, o CESE insta a Comissão a estabelecer prazos realistas para que os seus serviços possam sempre realizar avaliações de impacto plenamente desenvolvidas.

3.4.6.

O CESE observa com preocupação a conclusão do relatório do Comité de Controlo sobre as informações da Comissão relativas às opções segundo as quais o conjunto de opções estava amiúde incompleto. As opções tendiam a centrar-se unicamente na escolha (política) privilegiada, sem incluir as alternativas apoiadas pelos principais grupos de partes interessadas. Outras avaliações de impacto omitiram escolhas importantes pelo facto de os serviços considerarem que deviam primeiro receber orientações políticas. O CESE salienta que o objetivo das avaliações de impacto é apresentar dados e análises para fazer escolhas políticas e não para justificar a escolha privilegiada da Comissão. Insta a Comissão a prestar informações de forma imparcial.

3.4.7.

O CESE acolhe favoravelmente a intenção da Comissão de «integrar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas», o que está em consonância com o pedido anterior do CESE (12), e de alinhar as avaliações de impacto para apoiar a «dupla transição». Do mesmo modo, o CESE salienta que as avaliações de impacto devem continuar a ser um exercício factual, baseado em dados concretos e neutro do ponto de vista político, e que o processo de avaliação de impacto não deve visar justificar um resultado privilegiado no plano político nem substituir a tomada de decisões políticas pelos órgãos competentes. Os impactos relevantes não devem ser classificados segundo as preferências políticas, mas ser sempre analisados em igualdade de condições. O CESE permanecerá particularmente atento à aplicação prática desta integração no quadro da revisão das ferramentas para legislar melhor, que analisará, se necessário, num parecer complementar.

3.4.8.

O CESE insiste na necessidade de sistematicamente «pensar primeiro em pequena escala» e de aplicar o «teste das PME» de forma exaustiva nas suas avaliações de impacto. Recorda à Comissão os dez princípios que devem nortear a elaboração de políticas para as PME, tal como estabelecido na Lei das Pequenas Empresas (SBA) para a Europa. O CESE sublinha que, para as PME, e em especial para as microempresas, a legislação da União deve ser eficaz e facilmente aplicável. O CESE congratula-se com a intenção da Comissão de consultar o representante da UE para as PME durante as suas deliberações sobre a avaliação de impacto e solicita a este último que mantenha um diálogo e uma colaboração estruturados com as organizações nacionais que defendem os interesses das PME. Por último, o CESE insta a Comissão a limitar os encargos para as PME, incluindo as microempresas, e a explorar de forma mais sistemática a possibilidade de regimes mais flexíveis, procedendo-se a uma avaliação caso a caso para determinar se todas as PME são visadas ou apenas as microempresas, tal como estipulado na ferramenta n.o 22 das ferramentas para legislar melhor, sem comprometer a consecução dos objetivos definidos pela legislação ou pelas normas e padrões estabelecidos.

3.4.9.

O CESE remete para um anterior parecer (13), no qual afirma que as avaliações de impacto podem e devem também ser realizadas de forma sistemática para os atos delegados e os atos de execução. Recorda à Comissão que «o facto de ter sido realizada uma avaliação de impacto do texto legislativo que está na origem do ato delegado ou do ato de execução não é suficiente para justificar a não realização de uma avaliação de impacto dos atos derivados. Cada ato individual deve ser avaliado com base nas suas próprias características […]».

3.4.10.

O CESE congratula-se com o compromisso da Comissão de integrar uma prospetiva estratégica na elaboração das políticas da UE e remete para o seu parecer sobre esta questão (14). Enquanto representante de uma grande diversidade de pontos de vista provenientes de todos os Estados-Membros, e na sua qualidade de membro observador do Sistema de Análise da Estratégia e Política Europeias, o CESE está disposto a fornecer contributos e informações importantes para o processo de prospetiva.

3.5.   Comité de Controlo da Regulamentação

3.5.1.

O CESE congratula-se vivamente com o trabalho do Comité de Controlo da Regulamentação (a seguir «Comité de Controlo») com vista a assegurar a supervisão regulamentar. Para que o Comité de Controlo possa cumprir plenamente o seu mandato, o CESE insta a Comissão a assegurar que o mesmo dispõe de recursos e capacidades suficientes.

3.5.2.

O CESE assinala que o Comité de Controlo não é formalmente independente. Quatro dos seus sete membros são membros da Comissão. A fim de garantir um melhor equilíbrio, o CESE sugere que o Comité de Controlo seja alargado de modo a incluir um membro externo adicional.

3.6.   Redução dos encargos e o princípio do «entra um, sai um»

3.6.1.

O CESE toma nota da intenção da Comissão de limitar o fluxo de custos e encargos da regulamentação decorrentes das novas regulamentações e de reduzir os custos e encargos desnecessários para os cidadãos, as empresas e as administrações públicas. Do mesmo modo, o CESE reitera o seu apelo para a adoção de uma abordagem qualitativa a par da avaliação quantitativa que tome em consideração a procura dos benefícios esperados da legislação (15). Como o CESE afirmou no seu parecer (16), «os custos da regulamentação devem ser proporcionais aos benefícios gerados». Insiste, portanto, na importância capital do princípio da proporcionalidade na introdução de nova legislação. Além disso, a Comissão deve sempre avaliar o custo da inação, por exemplo, no que respeita ao aprofundamento do mercado único, bem como aos desafios sociais e ambientais.

3.6.2.

Do mesmo modo, o CESE salienta que a redução dos encargos não deve conduzir a uma desarmonização no mercado único nem criar uma pressão no sentido da desregulamentação. Tão-pouco deve comprometer os objetivos políticos, reduzir as elevadas normas económicas, sociais e ambientais da UE, nem impedir a adoção de novas iniciativas quando estas trazem um claro valor acrescentado. No entanto, os encargos devem ser reduzidos quando estiver demonstrado que não são necessários para alcançar o objetivo político.

3.6.3.

Em relação ao princípio do «entra um, sai um», segundo o qual cada proposta legislativa que cria novos encargos deve libertar as pessoas e as empresas de um encargo equivalente já existente a nível da UE no mesmo domínio de intervenção, o CESE observa com preocupação que, contrariamente ao anunciado pela Comissão, a comunicação não apresenta os pormenores operacionais e metodológicos da sua aplicação. Este facto complica a capacidade do CESE de analisar os eventuais benefícios e desafios relacionados com a aplicação do princípio do «entra um, sai um». Por conseguinte, o CESE insta a Comissão a fornecer estes pormenores sem mais demora e reserva-se o direito de realizar uma avaliação adicional sobre a metodologia do princípio do «entra um, sai um», uma vez publicada.

3.6.4.

O CESE salienta que, embora o princípio do «entra um, sai um» possa constituir um instrumento para legislar melhor, não deve em caso algum ser considerado um instrumento «autónomo» de redução de encargos. Pelo contrário, deve constituir um instrumento complementar, a utilizar em sinergia com os instrumentos existentes da UE para legislar melhor, incluindo as avaliações de impacto, as consultas públicas, as avaliações e o controlo regulamentar. O CESE congratula-se com a garantia dada pela Comissão de que o princípio do «entra um, sai um» não será aplicado de forma mecânica ou com base em objetivos numéricos ex ante, mas sim com base numa avaliação caso a caso, que determinará especificamente o que pode ser simplificado, racionalizado ou eliminado, tendo simultaneamente em conta os benefícios da legislação. O CESE manter-se-á particularmente atento a que a Comissão concretize esta garantia. Além disso, destaca o papel da Plataforma Prontos para o Futuro, da qual é membro, no aconselhamento da Comissão sobre a simplificação da legislação da União e a redução dos encargos desnecessários, garantindo ao mesmo tempo que as políticas da União sejam orientadas para o futuro e pertinentes à luz dos novos desafios, nomeadamente as evoluções sociais, ambientais, geopolíticas, tecnológicas e digitais.

3.6.5.

O CESE salienta que a aplicação do princípio do «entra um, sai um» deve ser considerada um esforço institucional conjunto que requer uma estreita cooperação entre todas as instituições da UE ao longo de todo o ciclo legislativo. Em consonância com o ponto 3.4.3 do presente parecer, o CESE insta o Parlamento Europeu e o Conselho a assegurar que a legislação da União cumpra os seus objetivos da forma mais rentável possível. Isto exige uma cooperação estreita entre os legisladores e a Comissão em todas as fases do processo político, bem como a partilha de informações entre os Estados-Membros e a Comissão sobre os custos e benefícios resultantes da legislação da UE, uma vez aplicada.

3.6.6.

O CESE congratula-se com a intenção da Comissão de fornecer, em cada avaliação de impacto, uma estimativa dos custos administrativos e de ajustamento decorrentes da intervenção que propõe. Observa, no entanto, que só os custos administrativos serão compensados pelo princípio do «entra um, sai um», enquanto os custos de ajustamento serão compensados por outros instrumentos, como o Mecanismo de Recuperação e Resiliência, a política de coesão e os fundos agrícolas, bem como o Mecanismo para uma Transição Justa. Dado que os custos de ajustamento podem representar um encargo importante para as empresas, sobretudo para as PME e as microempresas, o CESE convida a Comissão a incluir, a par da estimativa de custos, propostas concretas de medidas para apoiar as empresas a adaptar-se ao cumprimento dos novos quadros regulamentares, a manter a estabilidade do emprego e a assegurar a formação profissional e a reconversão profissional dos trabalhadores.

3.6.7.

O CESE toma nota da intenção da Comissão de considerar automaticamente como «saída» a substituição de 27 regulamentos nacionais por um quadro harmonizado. Trata-se de uma abordagem mecânica da qual a Comissão diz abster-se. A harmonização não implica por definição ganhos de eficiência; os seus efeitos devem ser avaliados caso a caso. Por conseguinte, o CESE insta a Comissão a definir «saídas» sempre com base numa análise individual de custo-benefício.

3.6.8.

No que respeita às disposições em matéria de flexibilidade para o princípio do «entra um, sai um», o CESE solicita à Comissão que clarifique os critérios com base nos quais decidirá sobre as isenções e determinará as «circunstâncias excecionais» que permitem o intercâmbio entre domínios de intervenção.

3.6.9.

O CESE observa que o princípio do «entra um, sai um» será aplicado apenas às iniciativas incluídas no programa de trabalho anual da Comissão para 2022, excluindo assim as principais iniciativas políticas apresentadas durante a primeira metade do mandato da Comissão. Portanto, a Comissão não leva em conta o compromisso assumido pela sua presidente, Ursula von der Leyen, na apresentação dos métodos de trabalho da Comissão (17), bem como nas suas cartas de missão aos comissários, segundo a qual o Colégio aplicará o princípio do «entra um, sai um» a cada proposta legislativa que gere novos encargos.

3.6.10.

O CESE insta a Comissão a criar um quadro adequado de comunicação sobre a aplicação do princípio do «entra um, sai um» de forma a garantir uma avaliação adequada nos próximos anos.

3.7.   Plataforma Prontos para o Futuro

3.7.1.

O CESE congratula-se com a criação da Plataforma Prontos para o Futuro (a seguir «a plataforma»). Lembra que o mandato da plataforma diz respeito à avaliação ex post e não à proposta de nova legislação. O CESE participará ativamente nos seus trabalhos.

3.7.2.

O CESE salienta que as sugestões apresentadas através do portal «Dê a sua opinião: Simplificar!» devem continuar a contribuir para o programa de trabalho anual da plataforma, mesmo que não estejam abrangidas pelo anexo II do programa de trabalho da Comissão. Além disso, a plataforma deve continuar a poder aconselhar a Comissão sobre os fluxos de trabalho horizontais para legislar melhor.

3.7.3.

O CESE sugere que a pessoa, ou a organização, que apresenta as sugestões à plataforma receba informações fundamentadas da Comissão sobre o seguimento dado às sugestões.

3.8.   Acompanhamento e avaliações ex post

3.8.1.

O CESE apoia firmemente o princípio «primeiro avaliar» e incentiva a Comissão a garantir a sua aplicação sistemática.

3.8.2.

O CESE congratula-se com o êxito da cooperação estabelecida com a Comissão no quadro dos trabalhos de avaliação ex post, nos quais a sua contribuição se revelou útil para melhorar as avaliações da Comissão graças aos contributos da sociedade civil organizada. O CESE apela para o reforço contínuo desta cooperação. Insta igualmente para que as avaliações do CESE sejam incluídas no registo comum de dados previsto, o portal legislativo conjunto.

3.8.3.

No que se refere ao acompanhamento da legislação da União já aplicada, o CESE adverte que as obrigações de acompanhamento e de comunicação com vista a recolher as informações e os dados necessários devem ser sempre proporcionadas e não acarretar encargos excessivos para os cidadãos, as empresas ou as administrações públicas.

3.8.4.

O CESE observa com preocupação as conclusões do relatório do Comité de Controlo sobre as avaliações da Comissão. Como o Comité de Controlo indica no seu relatório, as conclusões da avaliação não refletem corretamente os resultados. O Comité de Controlo tem vindo a manifestar a sua preocupação pelo facto de as conclusões serem leituras seletivas dos dados, ou não serem suficientemente claras quanto à fragilidade dos dados recolhidos. Trata-se de uma deficiência crucial, já que impede a avaliação de cumprir a sua função principal como exercício de aprendizagem. O CESE insta a Comissão a informar de forma imparcial sobre a eficácia da legislação da União.

3.8.5.

O CESE observa com preocupação que não impende sobre os serviços da Comissão a obrigação de nova apresentação de um relatório de avaliação em caso de parecer negativo do Comité de Controlo. Propõe a aplicação às avaliações do regime previsto para as avaliações de impacto, impondo-se a obrigação de os serviços da Comissão reverem os relatórios em caso de um primeiro parecer negativo e obterem formalmente um parecer positivo do Comité de Controlo.

3.9.   Aplicação e cumprimento

3.9.1.

O CESE remete para as suas recomendações sobre a aplicação e o cumprimento da legislação que formulou num anterior parecer (18).

3.9.2.

O CESE acolhe favoravelmente o Plano de Ação a Longo Prazo para Melhorar a Aplicação e o Cumprimento das Regras do Mercado Único (19) e incentiva a Comissão a aplicar rapidamente as medidas propostas.

3.9.3.

O CESE reitera que a maior parte da carga regulamentar que pesa sobre os cidadãos e as empresas continua a ser gerada a nível nacional devido ao procedimento e método de transposição e a uma aplicação inadequada do direito da UE pelas autoridades nacionais. Se os legisladores nacionais, fazendo uso da margem de apreciação que lhes cabe, decidirem acrescentar requisitos a nível nacional, devem fazê-lo de forma transparente, informar disso a Comissão e outras autoridades nacionais e explicar as suas razões, em conformidade com o compromisso que assumiram no âmbito do acordo interinstitucional sobre legislar melhor. Os Estados-Membros devem igualmente ter em mente os possíveis impactos dos seus aditamentos na integridade e no bom funcionamento do mercado único e, se possível, abster-se de adotar medidas suscetíveis de causar distorções e fragmentações significativas.

3.9.4.

Além disso, como já referido em anteriores pareceres (20), o CESE entende que se deve optar por regulamentos em vez de diretivas, a fim de evitar uma falta de coerência regulamentar na UE e de apoiar a integração do mercado único. No entanto, assinala que os níveis atuais de proteção dos cidadãos, dos consumidores, dos trabalhadores e do ambiente não devem em caso algum ser reduzidos.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  JO C 13 de 15.1.2016, p. 192; JO C 262 de 25.7.2018, p. 22

(2)  COM(2015) 215 final.

(3)  JO C 487 de 28.12.2016, p. 51 e JO C 262 de 25.07.2018, p. 22

(4)  C(2017) 7810.

(5)  JO C 383 de 17.11.2015, p. 57

(6)  «REFIT Platform Opinion on submissions XXII.4.a by the DIHK and XXII.4.b by a citizen on Stakeholder consultation mechanisms» [Parecer da Plataforma REFIT sobre as observações XXII.4.a, apresentadas pela Câmara de Comércio e Indústria Alemã, e XXII.4.b, apresentadas por um cidadão, sobre os mecanismos de consulta das partes interessadas]. Data da adoção: 7 de junho de 2017.

(7)  Ferramentas para legislar melhor, Comissão Europeia (europa.eu)

(8)  JO C 434 de 15.12.2017, p. 11

(9)  JO L 123 de 12.5.2016, p. 72 (https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:32016Q0512(01)&from=PT).

(10)  JO C 14 de 15.1.2020, p. 72

(11)  https://ec.europa.eu/info/sites/default/files/rsb_report_2020_en_0.pdf

(12)  JO C 14 de 15.1.2020, p. 72

(13)  JO C 262 de 25.7.2018, p. 22

(14)  JO C 220 de 9.6.2021, p. 67

(15)  JO C 434 de 15.12.2017, p. 11

(16)  JO C 487 de 28.12.2016, p. 51

(17)  P(2019) 2.

(18)  JO C 262 de 25.7.2018, p. 22

(19)  https://ec.europa.eu/info/sites/default/files/communication-enforcement-implementation-single-market-rules_en_0.pdf

(20)  JO C 18 de 19.1.2011, p. 95


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/51


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2013/34/UE, a Diretiva 2004/109/CE, a Diretiva 2006/43/CE e o Regulamento (UE) n.o 537/2014, no que respeita à comunicação de informações sobre a sustentabilidade das empresas

[COM (2021) 189 final — 2021/104 (COD)]

(2021/C 517/07)

Relator:

Marinel Dănuț MURESAN

Consulta

Conselho da União Europeia, 22.6.2021

Parlamento Europeu, 23.6.2021

Base jurídica

Artigos 50.o e 114.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

2.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

226/0/7

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe favoravelmente a proposta de diretiva relativa à comunicação de informações sobre a sustentabilidade das empresas e considera que a comunicação de informações de elevada qualidade em matéria de sustentabilidade será um elemento fundamental para aplicar o Pacto Ecológico Europeu, incluindo os objetivos ambiciosos do pacote Objetivo 55.

1.2.

Em particular, a expansão do âmbito de aplicação desta diretiva a todas as grandes empresas que preencham determinadas condições, bem como às pequenas e médias empresas (PME) cotadas, apoiará a transformação da economia europeia em conformidade com o Acordo de Paris, do mesmo modo que o mandato do Grupo Consultivo para a Informação Financeira na Europa (EFRAG) para desenvolver normas coerentes da UE sobre a comunicação de informações não financeiras.

1.3.

No seguimento do Plano de Ação «Financiar um crescimento sustentável», o CESE congratula-se com a ênfase colocada pela Comissão Europeia no incentivo à divulgação de dados de elevada qualidade em matéria de sustentabilidade pelas empresas e pelas instituições financeiras. Os setores público e privado devem trabalhar em conjunto para alcançar este resultado, e o quadro legislativo relativo ao financiamento sustentável e à comunicação de informações pelas empresas desempenha um papel crucial neste contexto.

1.4.

O CESE insta os colegisladores a avaliar os custos operacionais e administrativos associados à inclusão gradual e voluntária das PME no âmbito de aplicação da diretiva e a ponderar eventuais medidas de apoio suplementares que ajudem a compensar quaisquer encargos administrativos e operacionais para este segmento fundamental da economia.

1.5.

O CESE considera muito positivo que a Comissão Europeia clarifique o princípio da «dupla materialidade» e adira ao mesmo, descrevendo-o no ponto 3 da proposta.

1.6.

O CESE apoia o mandato conferido ao EFRAG para elaborar um parecer técnico tendo em vista a criação de uma norma europeia de comunicação de informações não financeiras. Este processo de normalização deve integrar todas as partes com interesse material na elaboração e na utilização do quadro para a comunicação de informações sobre sustentabilidade: é necessário assegurar que as partes interessadas empresariais financeiras e não financeiras pertinentes, os parceiros sociais e a sociedade civil desempenham um papel claro em todas as etapas.

1.7.

O CESE insta a Comissão Europeia, as autoridades europeias de supervisão e os colegisladores a assegurar um alinhamento criterioso — quanto ao conteúdo e à sequenciação — das diferentes componentes do quadro de comunicação de informações sobre sustentabilidade, incluindo as que abrangem as instituições financeiras.

1.8.

O CESE insta igualmente a Comissão Europeia e o EFRAG a ponderar de que forma os requisitos específicos de apresentação de relatórios por país sobre riscos e impactos em matéria de sustentabilidade, aplicáveis a todas as entidades abrangidas pela diretiva, podem incentivar a divulgação de informações mais pormenorizadas e materiais.

1.9.

Por último, o CESE insta a Comissão Europeia a ponderar o reforço da educação financeira e em matéria de sustentabilidade. Embora a proposta em apreço assegure que as empresas e as instituições financeiras estarão em condições de fornecer dados exatos aos utilizadores finais, aos futuros beneficiários e a outros investidores finais, é necessário um esforço complementar no sentido de capacitar estes destinatários para canalizarem as suas poupanças para investimentos sustentáveis com confiança suficiente. Por conseguinte, o CESE congratula-se com os compromissos assumidos a este respeito no âmbito da estratégia de financiamento da transição para uma economia sustentável (1).

2.   Proposta da Comissão

2.1.

A Diretiva Divulgação de Informações Não Financeiras (Diretiva 2014/95/UE do Parlamento Europeu e do Conselho) (2), que altera a Diretiva Contabilística, foi adotada em 2041. As empresas abrangidas pela Diretiva Divulgação de Informações Não Financeiras tiveram de comunicar informações em conformidade com as disposições desta diretiva pela primeira vez em 2018 (relativamente ao exercício financeiro de 2017).

2.2.

Em conformidade com a Diretiva Divulgação de Informações Não Financeiras, a Comissão publicou, em 2017, orientações não vinculativas sobre a comunicação de informações para as empresas (3). Em 2019, publicou orientações adicionais sobre a comunicação de informações relacionadas com o clima (4). As referidas orientações não melhoraram suficientemente a qualidade das informações divulgadas pelas empresas ao abrigo da Diretiva Divulgação de Informações Não Financeiras.

2.3.

A Comissão Europeia comprometeu-se a propor uma revisão da Diretiva Divulgação de Informações Não Financeiras no âmbito do Pacto Ecológico Europeu e do seu programa de trabalho para 2020 (5).

2.4.

Em março de 2018, a Comissão Europeia publicou o Plano de Ação: Financiar um crescimento sustentável (6), no qual reiterou a necessidade de reforçar a normalização das informações não financeiras a comunicar pelas empresas, como forma de orientar as decisões de investimento. Na sequência do plano de ação, a Comissão Europeia publicou três propostas legislativas, nas quais definiu de forma mais precisa os dados exigidos às entidades empresariais para este efeito: o Regulamento Taxonomia (7), o Regulamento relativo à divulgação de informações relacionadas com a sustentabilidade no setor dos serviços financeiros (8) e o Regulamento relativo ao índice de referência hipocarbónico (9).

2.5.

No seu relatório de iniciativa, de maio de 2018, sobre finanças sustentáveis, o Parlamento Europeu solicitou o desenvolvimento adicional dos requisitos de informação no âmbito da Diretiva Divulgação de Informações Não Financeiras (10). Na sua resolução, de dezembro de 2020, sobre a governação sustentável das empresas, o Parlamento congratulou-se com o compromisso da Comissão no sentido de rever a Diretiva Divulgação de Informações Não Financeiras, apelou para o alargamento do âmbito de aplicação da mesma diretiva para abranger mais categorias de empresas e saudou o compromisso da Comissão de desenvolver normas da UE em matéria de comunicação de informações não financeiras (11). O Parlamento Europeu também considerou que as informações não financeiras publicadas pelas empresas nos termos da Diretiva Divulgação de Informações Não Financeiras deveriam ser sujeitas a uma auditoria obrigatória.

2.6.

A Diretiva Divulgação de Informações Não Financeiras, assim como o Regulamento relativo à divulgação de informações relacionadas com a sustentabilidade no setor dos serviços financeiros e o Regulamento Taxonomia constituem as componentes centrais dos requisitos de comunicação de informações sobre sustentabilidade que estão na base da estratégia de financiamento sustentável da UE.

2.7.

Por conseguinte, a proposta em apreço tem como objetivo melhorar a comunicação de informações sobre sustentabilidade, a fim de aproveitar da melhor forma o potencial do mercado único europeu para contribuir para um sistema económico e financeiro plenamente sustentável e inclusivo, em conformidade com o Pacto Ecológico Europeu, incluindo o pacote Objetivo 55, e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas.

3.   Observações na generalidade

3.1.

A Europa está a sair de uma crise sanitária que colocou em destaque a necessidade de um sistema financeiro e económico resiliente que proporcione proteção contra crises inesperadas no futuro. De acordo com o Banco Central Europeu (BCE), a pandemia foi um «sinal claro de que, para evitar que as alterações climáticas prejudiquem irreversivelmente a economia mundial, é necessária uma alteração estrutural da nossa economia, que introduza mudanças sistémicas na forma como a energia é produzida e consumida» (12). Além disso, o BCE salienta que a ausência de ação urgente ameaça a própria vida humana, em particular as pessoas mais pobres e mais vulneráveis. A comunicação de informações não financeiras de elevada qualidade pelas empresas é uma componente fundamental para assegurar uma resposta adequada a ambas as dimensões desta questão.

3.2.

Ao mesmo tempo, a evolução da União dos Mercados de Capitais assegurará que a indústria europeia, cuja espinha dorsal é constituída por PME, responsáveis por mais de metade do produto interno bruto europeu (13), continue a prosperar, a criar postos de trabalho de qualidade e a contribuir para a competitividade da União Europeia a longo prazo. Esta evolução depende da afetação de capital às empresas que estão em transição para cumprir os objetivos do Acordo de Paris e que apoiarão a realização dos objetivos do Pacto Ecológico Europeu, mas também da garantia de que a educação financeira e em matéria de sustentabilidade se torna parte integrante dos compromissos europeus.

3.3.

A disponibilidade de dados de elevada qualidade, comparáveis e pertinentes sobre as empresas, em conformidade com a abordagem da dupla materialidade, constitui um requisito de base para que o setor financeiro possa avaliar o perfil de sustentabilidade dos clientes e contrapartes financeiros e não financeiros, permitindo-lhe apoiar os seus clientes na realização dos objetivos do Acordo de Paris. O CESE insta os colegisladores a assegurarem que a proposta em apreço cumpre este objetivo fundamental, que constituirá a base de uma recuperação sustentável na sequência da pandemia de COVID-19 e garantirá a competitividade e o crescimento a longo prazo do mercado único.

3.4.

O EFRAG tem como missão desenvolver as normas técnicas («normas») que porão em prática o texto legislativo. No seguimento do relatório final do EFRAG sobre este tema (14), o CESE insta a Plataforma para o Financiamento Sustentável da UE e a Plataforma Internacional de Financiamento Sustentável a manterem consultas estreitas com o EFRAG sobre a avaliação de um nível adequado de granularidade das normas, assegurando que as entidades que comunicam informações fornecem dados materiais e comparáveis. Tendo em conta a rápida evolução internacional no domínio da comunicação de informações sobre sustentabilidade, incluindo a utilização generalizada dos quadros da Iniciativa Global Reporting, do Conselho de Normas de Contabilidade de Sustentabilidade e do Grupo de Trabalho para a Divulgação de Informações sobre a Exposição Financeira às Alterações Climáticas, tanto por empresas como por instituições financeiras, o CESE recomenda que as normas se baseiem nas disposições fundamentais destes quadros. Contudo, conforme referido também pelo EFRAG, a cooperação internacional neste domínio não deve pôr em causa a ambição da UE enquanto líder mundial em matéria de sustentabilidade, no que diz respeito ao âmbito de aplicação e ao ritmo do desenvolvimento do quadro regulamentar da UE. Uma representação equilibrada dos principais grupos de partes interessadas, incluindo os parceiros sociais, na estrutura de governação do EFRAG garantirá a execução mais sólida possível deste processo.

3.5.

A coerência na adoção de práticas de comunicação de informações sobre sustentabilidade em todas as jurisdições da UE27 será essencial para o fornecimento de dados comparáveis e de elevada qualidade. O CESE insta os colegisladores a assegurarem que as negociações conduzem a um resultado suficientemente flexível para que as disposições da diretiva não sejam objeto de alterações profundas no processo de transposição, uma vez que não foi adotado um regulamento. Este elemento será fundamental para garantir que os requisitos de comunicação de informações sejam coerentes em toda a UE27, evitando a fragmentação do mercado e incentivando um fluxo de capital sem entraves e equitativo entre todas as jurisdições. Embora o CESE tenha a firme expectativa de que as futuras normas sejam aplicadas de forma coerente em toda a UE27, convém sublinhar a importância de assegurar que o resultado da transposição da diretiva relativa à comunicação de informações sobre a sustentabilidade das empresas e da normalização conduza à comunicação de informações de elevada qualidade, comparáveis e pertinentes sobre sustentabilidade em toda a UE27. Algum do trabalho empírico anteriormente realizado pela sociedade civil revelou diferenças regionais significativas, que podem comprometer este objetivo (15).

4.   Observações na especialidade

4.1.   Âmbito de aplicação

4.1.1.

O CESE congratula-se com o alargamento do âmbito de aplicação da diretiva às PME cotadas — exceto as cotadas em sistemas de negociação multilateral ou em mercados de PME em crescimento –, com as disposições em matéria de comunicação de informações voluntária para empresas não cotadas e com o período de transição de três anos e a norma simplificada para PME cotadas. Tendo em conta os encargos administrativos e operacionais significativos que as PME enfrentam na compilação de dados adequados e na elaboração dos seus relatórios, que aumentaram devido à pandemia de COVID-19, o CESE apoia o atual âmbito de aplicação da proposta neste contexto. Esta abordagem equilibrada permite um rumo previsível para as PME na resposta às expectativas crescentes dos seus investidores e das partes interessadas em geral em matéria de informações sobre sustentabilidade, permitindo simultaneamente flexibilidade e tempo para cumprir estes requisitos de forma gradual e voluntária.

4.1.2.

O CESE recomenda que a Comissão Europeia agilize uma avaliação de impacto específica e uma análise custo-benefício relativas aos efeitos do período de introdução gradual e da norma simplificada de comunicação de informações nas PME cotadas e não cotadas. Esta análise deve incluir como elemento significativo dados empíricos concretos e recomendações quanto à inclusão, num prazo razoável, das PME cotadas e não cotadas que operam em setores de risco elevado no âmbito de aplicação da diretiva. Se for caso disso, a Comissão Europeia deverá também ponderar medidas de apoio suplementares para ajudar as PME a cumprir os futuros requisitos de comunicação de informações.

4.2.   Divulgação dos riscos e impactos ao longo das cadeias de valor

4.2.1.

O CESE acolhe favoravelmente a abordagem da proposta de diretiva no sentido de incluir requisitos de comunicação de informações relacionados com a cadeia de valor das entidades abrangidas pelo âmbito de aplicação. Tendo em conta a complexidade das cadeias de valor modernas, o CESE recomenda a utilização de elementos mais claros e mais pormenorizados para identificar os casos em que é necessário adotar a abordagem da comunicação de informações baseada em toda a cadeia de valor, em conformidade com o disposto no considerando 29 da proposta de diretiva, segundo o qual esta comunicação de informações deve ter lugar «conforme adequado». Uma vez que as atividades nas cadeias de valor geram riscos e impactos significativos em matéria ambiental, social e de governação, o CESE salienta que estas especificações suplementares não devem afetar o requisito de comunicar informações de uma forma que promova a total transparência dos impactos das atividades realizadas nas cadeias de valor.

4.3.   Alinhamento dos requisitos de comunicação de informações em matéria de prazos e conteúdo

4.3.1.

O CESE salienta que o êxito da proposta está dependente de uma sequenciação e de um alinhamento criteriosos dos requisitos de comunicação de informações entre a diretiva relativa à comunicação de informações sobre a sustentabilidade das empresas e outros quadros legislativos. Será importante permitir tempo suficiente para a recolha, a avaliação e a divulgação dos dados pertinentes, principalmente porque estão em causa as necessidades das entidades abrangidas pelo âmbito de aplicação que são simultaneamente utilizadores e responsáveis pela elaboração de informações não financeiras. Esta coordenação deverá assegurar que os clientes não financeiros de entidades financeiras abrangidas pelo âmbito de aplicação sejam obrigados divulgar os dados necessários em primeira instância, permitindo posteriormente que as entidades financeiras as avaliem e elaborem as suas próprias divulgações.

4.3.2.

A Comissão Europeia e os colegisladores devem avaliar estes requisitos de sequenciação, principalmente porque influenciam as entidades abrangidas pelo âmbito de aplicação que estarão sujeitas a requisitos de comunicação de informações sobre sustentabilidade ao abrigo do Regulamento Requisitos Fundos Próprios (16), do artigo 8.o do Regulamento Taxonomia, dos atos delegados do Regulamento relativo à divulgação de informações relacionadas com a sustentabilidade no setor dos serviços financeiros (17) e de quaisquer futuras normas relacionadas com o desenvolvimento da taxonomia social e de outras taxonomias. O cumprimento destes requisitos dependerá da disponibilidade de dados de elevada qualidade fornecidos com base na proposta em apreço. As informações exigidas através de divulgações no âmbito da diretiva relativa à comunicação de informações sobre a sustentabilidade das empresas devem ter um âmbito semelhante ao dos dados a divulgar ao abrigo destes requisitos conexos, incluindo os dos atos delegados do Regulamento Taxonomia, que podem ser clarificados, conforme adequado, na proposta de diretiva e no trabalho do EFRAG na criação das normas.

4.4.   Garantia de fiabilidade

4.4.1.

O CESE reconhece a importância de assegurar a qualidade elevada e a possibilidade de verificação dos dados não financeiros divulgados ao abrigo da proposta de diretiva. O papel da garantia de fiabilidade é vital neste contexto, e o CESE saúda a recomendação da proposta no sentido da utilização de uma garantia de fiabilidade limitada para verificar os dados não financeiros das entidades abrangidas pelo âmbito de aplicação.

4.4.2.

Devido à ausência de um quadro mutuamente acordado para uma garantia de fiabilidade razoável das informações sobre sustentabilidade e ao caráter prematuro de algumas formas de dados não financeiros, recomenda-se que os requisitos de garantia de fiabilidade permaneçam ao nível da avaliação exigida para a garantia de fiabilidade limitada.

4.5.   Direitos humanos

4.5.1.

O CESE saúda a identificação mais pormenorizada dos temas de sustentabilidade que devem ser objeto de divulgação de dados, incluindo os temas relacionados com os impactos nas comunidades e nos trabalhadores vulneráveis. O CESE considera que, paralelamente à evolução prevista com a publicação de uma proposta sobre a governação sustentável das empresas, a proposta em apreço constitui uma oportunidade significativa para o desenvolvimento de um quadro prático para a avaliação dos riscos financeiros decorrentes de operações empresariais que influenciam as comunidades, promovendo simultaneamente uma boa compreensão dos impactos dessas operações empresariais nessas comunidades. A especificação adicional dos requisitos em matéria de comunicação de informações e de dever de diligência deve equilibrar criteriosamente as necessidades dos parceiros sociais, através de um direito de consulta formal.

4.5.2.

O CESE insta os colegisladores a ponderarem uma definição mais clara das partes interessadas a considerar e a consultar neste processo e a assegurarem o total alinhamento destes requisitos com as disposições da futura proposta relativa à governação sustentável das empresas. Importa realçar o processo que as empresas devem executar para cumprir os requisitos de consulta das partes interessadas, por um lado identificando apenas as partes interessadas mais importantes e, por outro, assegurando que estes processos são adequadamente concebidos, são simples e não introduzem uma complexidade injustificada para as empresas no âmbito de aplicação alargado da proposta de diretiva.

4.6.   Planos de transição

4.6.1.

O CESE reconhece que as empresas em transição necessitam de atrair financiamento. Por conseguinte, considera crucial a ênfase que a proposta coloca na necessidade de comunicar informações sobre a compatibilidade dos modelos e estratégias empresariais com a transição para uma economia sustentável e a limitação do aquecimento global a 1,5oC. Tendo em conta o relatório da Agência Internacional de Energia sobre a consecução da neutralidade carbónica até 2050 (18), a garantia de dados sólidos e de elevada qualidade para cumprir este requisito da proposta de diretiva será um fator impulsionador fundamental para assegurar que as empresas possuam planos de transição credíveis e que os bancos e os mercados de capitais as possam ajudar a cumprir os seus objetivos. O CESE defende uma maior granularidade dos requisitos que demonstram este alinhamento, de forma proporcionada. Tais requisitos deverão incluir informações adicionais sobre os cenários de transição adotados pelas empresas, bem como os elementos que determinam a sua compatibilidade com os objetivos da transição justa.

4.7.   Criação de normas da UE relativas à comunicação de informações não financeiras

4.7.1.

O CESE reitera o seu apoio ao mandato conferido ao EFRAG para emitir pareceres técnicos sobre a criação de normas da UE relativas à comunicação de informações não financeiras. O CESE chama a atenção para o facto de este mandato exigir um «processo adequado, sob supervisão pública e num quadro de transparência», incluindo a consulta de um amplo conjunto de partes interessadas na elaboração das normas, e salienta a importância de integrar e consultar ao longo de todo o processo de elaboração dos pareceres técnicos os sindicatos, os parceiros sociais em geral, as PME e outros intervenientes com interesse material na elaboração dessas normas, incluindo empresas financeiras e não financeiras e organizações da sociedade civil. A este respeito, o CESE apoia os esforços do EFRAG para recolher os pontos de vista das partes interessadas sobre o desenvolvimento do seu processo adequado (19) e espera um resultado que assegure a inclusão de todas as partes interessadas supramencionadas.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  COM(2021) 390 final

(2)  Diretiva 2014/95/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2014, que altera a Diretiva 2013/34/UE no que se refere à divulgação de informações não financeiras e de informações sobre a diversidade por parte de certas grandes empresas e grupos (JO L 330 de 15.11.2014, p. 1).

(3)  Comunicação da Comissão C(2017) 4234 final (JO C 215 de 5.7.2017, p. 1).

(4)  Comunicação da Comissão C(2019) 4490 final (JO C 209 de 20.6.2019, p. 1).

(5)  Comunicação da Comissão «Pacto Ecológico Europeu» [COM(2019) 640 final]. Adaptação do Programa de Trabalho da Comissão 2020 [COM(2020) 440 final].

(6)  COM(2018) 97 final.

(7)  Regulamento (UE) 2020/852 do Parlamento Europeu e do Conselho de 18 de junho de 2020 relativo ao estabelecimento de um regime para a promoção do investimento sustentável, e que altera o Regulamento (UE) 2019/2088 (JO L 198 de 22.6.2020, p. 13).

(8)  Regulamento (UE) 2019/2088 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de novembro de 2019, relativo à divulgação de informações relacionadas com a sustentabilidade no setor dos serviços financeiros (JO L 317 de 9.12.2019, p. 1).

(9)  Regulamento (UE) 2019/2089 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de novembro de 2019, que altera o Regulamento (UE) 2016/1011 no que diz respeito aos índices de referência da UE para a transição climática, aos índices de referência da UE alinhados com o Acordo de Paris e à divulgação das informações relacionadas com a sustentabilidade relativamente aos índices de referência Resolução do Parlamento Europeu, de 17 de dezembro de 2020, sobre a governação sustentável das empresas (JO L 317 de 9.12.2019, p. 17).Regulamento (UE) 2019/2088 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de novembro de 2019, relativo à divulgação de informações relacionadas com a sustentabilidade no setor dos serviços financeiros (JO L 317 de 9.12.2019, p. 1).

(10)  Resolução do Parlamento Europeu, de 29 de maio de 2018, sobre finanças sustentáveis (JO C 76 de 9.3.2020, p. 23).

(11)  Resolução do Parlamento Europeu, de 17 de dezembro de 2020, sobre a governação sustentável das empresas (JO C 445 de 29.10.2021, p. 94).

(12)  https://www.ecb.europa.eu/press/key/date/2020/html/ecb.sp200717~1556b0f988.en.html

(13)  https://ec.europa.eu/growth/smes_pt

(14)  https://ec.europa.eu/info/sites/default/files/business_economy_euro/banking_and_finance/documents/210308-report-efrag-sustainability-reporting-standard-setting_en.pdf

(15)  https://www.allianceforcorporatetransparency.org/assets/Research_Report_EUKI_2020.pdf, p. 51

(16)  Regulamento (UE) n.o 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO L 176 de 27.6.2013, p. 1).

(17)  C(2021) 2800 final

(18)  https://www.iea.org/reports/net-zero-by-2050

(19)  https://www.efrag.org/Assets/Download?assetUrl=%2fsites%2fwebpublishing%2fSiteAssets%2fEFRAG%2520Due%2520Process%2520Procedures_V04.pdf


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/56


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões «Fomentar uma abordagem europeia da inteligência artificial»

[COM(2021) 205 final]

(2021/C 517/08)

Relatora:

Marie-Françoise GONDARD-ARGENTI

Consulta

Comissão Europeia, 1.7.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Adoção em secção

2.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

235/0/7

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe com agrado a revisão em apreço do Plano Coordenado para a Inteligência Artificial, que resulta do trabalho conjunto da Comissão Europeia e dos Estados-Membros, e apela para que se acelere a sua execução mobilizando todos os intervenientes em causa.

1.2.

O CESE apoia a abordagem holística da Comissão relativamente à sua estratégia para uma inteligência artificial (IA) inclusiva e sustentável, assente na criação de um ecossistema de excelência e de confiança. As propostas relativas ao plano e ao quadro regulamentar, cada uma objeto de um parecer separado, constituem os dois pilares para fazer da Europa um interveniente mundial no domínio da IA.

1.3.

A fim de alcançar os benefícios esperados em termos económicos, sociais, ambientais e de saúde pública para todos os cidadãos europeus sem discriminação, o plano deve dar um novo impulso à educação, integrando as questões éticas e ambientais, a formação e o desenvolvimento de competências ao longo da vida, bem como os desafios em matéria de inovação e o apoio aos trabalhadores e às empresas, incluindo as de menor dimensão.

1.4.

No mundo do trabalho, a confiança é a chave para o êxito, e a IA não foge a esta regra. O CESE considera legítimo que este novo plano atribua ao diálogo social e aos parceiros sociais um papel fundamental ao longo de todo o processo. Embora a questão das competências seja essencial, a reflexão deve abranger todos os problemas relacionados com a automatização no mundo do trabalho.

1.5.

O CESE recomenda que a Comissão, no quadro político que pretende estabelecer, incentive fortemente os Estados-Membros a reforçar o diálogo social e cívico sobre as questões e os instrumentos relativos à IA.

1.6.

O CESE recorda que a confiança exige que todos os trabalhadores, consumidores ou cidadãos tenham o direito à explicabilidade dos processos algorítmicos, na medida em que estes têm impacto nas suas vidas e no mundo que os rodeia. O novo plano coordenado deve inscrever-se neste requisito de transparência e de explicabilidade, indissociável do direito de cada cidadão de contestar decisões tomadas exclusivamente por um algoritmo.

1.7.

O CESE considera que a UE se pode afirmar como um líder mundial credível no domínio da IA, desde que exista uma coordenação plena entre as instituições da UE, os Estados-Membros e a sociedade civil organizada — parceiros sociais, consumidores e cidadãos — com uma definição clara das respetivas responsabilidades. A realização desta coordenação entre as instituições europeias, entre estas e os Estados-Membros, e entre os mesmos, maximizará o impacto global, assegurando simultaneamente a execução rápida e coerente das políticas e programas de investimento.

1.8.

Embora seja intrinsecamente mundial, a IA é sensível à escala da sua implantação, da qual depende diretamente. Ao tornar os Estados-Membros intervenientes fundamentais na cena mundial da IA, o plano coordenado funciona como pedra angular da estratégia europeia em matéria de IA.

1.9.

O CESE congratula-se com o facto de o plano coordenado revisto propor medidas concretas para promover a execução das estratégias nacionais e multiplicar as sinergias. Contudo, o plano só adquire pleno sentido em articulação estreita com a Estratégia Europeia para os Dados (criação de um espaço europeu de dados e proteção de dados) e com a Estratégia da União Europeia para a Cibersegurança.

1.10.

A fim de compensar a falta de obrigatoriedade de coordenação, o CESE apela para que se crie um dispositivo de acompanhamento permanente dos progressos realizados através de indicadores de desempenho elaborados por todas as partes interessadas.

1.11.

O CESE incentiva os Estados-Membros a utilizar o Mecanismo de Recuperação e Resiliência — bem como outros instrumentos financeiros, como o Horizonte Europa, o Programa Europa Digital e o Programa InvestEU — para apoiar o desenvolvimento e a adoção da IA, nomeadamente junto das pequenas empresas. Um relatório recente do Banco Europeu de Investimento clarifica o caminho a seguir (1).

2.   Observações na generalidade

2.1.

A Comissão pretende transformar a UE no motor mundial de uma IA centrada no ser humano, inclusiva, segura, sustentável e fiável. Retirando ensinamentos da crise sanitária, a Comissão pretende acelerar o investimento, reforçar as medidas atuais e alinhá-las de forma rigorosa para promover as sinergias e a agilidade (2). O CESE apoia a aplicação urgente e resoluta desta abordagem para reforçar a excelência interna e internacional da UE.

2.2.

O CESE regista os progressos realizados desde o primeiro plano coordenado, de 2018. O plano atualizado identifica claramente as prioridades: investir nas infraestruturas e na partilha de dados, promover a excelência através da mobilização da inovação e das competências e garantir a fiabilidade e a transparência ao longo de toda a cadeia de valor. O CESE considera encorajador o investimento de 7 mil milhões de euros em 2019 (mais 30 %).

2.3.

O plano coordenado está associado ao respeito pelos direitos fundamentais e sociais e à não discriminação através dos algoritmos. O presente parecer é indissociável do parecer relativo à proposta conexa de regulamento, que aborda os aspetos éticos e estabelece regras harmonizadas (3).

2.4.

O CESE considera que o quadro ético e normas reconhecidas e partilhadas, acompanhados de um plano coordenado, são os catalisadores essenciais e estruturantes capazes de suscitar a confiança necessária para a adesão dos europeus à IA, assegurando simultaneamente uma vantagem competitiva e um trunfo a nível mundial.

2.5.

Esta confiança dos cidadãos está indissociavelmente ligada ao direito à explicabilidade dos algoritmos e à possibilidade de contestar qualquer decisão que afete as suas vidas. A monitorização, por parte dos criadores e utilizadores, da IA e das suas aplicações é essencial, e deve traduzir-se em auditorias e testes regulares. O ser humano deve manter o poder de decisão.

2.6.

O CESE manifesta preocupação com o risco de fragmentação associado às diferentes estratégias nacionais e insta os Estados-Membros a intensificar a sua cooperação, em particular no domínio da cibersegurança, uma prerrogativa soberana que, no entanto, constitui a espinha dorsal do plano, no interesse da UE.

2.7.

O CESE apela para uma IA sustentável nos seus objetivos económicos, sociais e ambientais, no respeito pelas responsabilidades económicas, sociais e ambientais.

3.   Observações na especialidade

3.1.

As ambições da Comissão, plenamente justificadas, obrigam-na a trabalhar de forma concertada com os Estados-Membros, o setor privado e a sociedade civil organizada a fim de:

acelerar os investimentos em IA tendo em vista uma retoma económica e social célere e resiliente, assente em soluções digitais avançadas;

implantar atempadamente as estruturas e os programas previstos para aproveitar os benefícios legítimos reservados aos pioneiros na produção ou adoção de tecnologias;

otimizar a coesão das políticas para evitar a dispersão e responder em conjunto a este desafio mundial.

3.2.

O CESE aprova a intenção da Comissão de utilizar o Programa Europa Digital e o Horizonte Europa num montante de, pelo menos, mil milhões de euros por ano entre 2021 e 2027: o efeito de alavanca esperado impulsionará o investimento público e privado na IA no valor de 20 mil milhões de euros anuais durante o mesmo período. O Mecanismo de Recuperação e Resiliência reforçará este efeito de alavanca.

3.3.   Criar condições favoráveis — dados e infraestruturas

3.3.1.

O CESE insta a Comissão e os Estados-Membros a intensificar a cooperação e a coordenação na governação da IA: aplicação das estratégias nacionais e partilha de conhecimentos, de experiência e de boas práticas para acelerar o desenvolvimento e a adoção da IA e enfrentar os desafios mundiais neste domínio.

3.3.2.

A disponibilidade, a acessibilidade e a livre circulação dos dados são condições essenciais para o desenvolvimento da IA, a par da estratégia relativa aos dados, à sua proteção e à cibersegurança. O CESE recorda que a fluidez dos intercâmbios de dados pessoais depende de uma coordenação estreita e do cumprimento integral do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados. Tal como a segurança e a transparência dos dados, as normas podem representar uma vantagem competitiva na concorrência mundial (4). O CESE aprova o desenvolvimento do espaço europeu de dados e de espaços setoriais específicos.

3.3.3.

À exceção de alguns sistemas de IA que não dependem de dados, o desempenho da IA depende diretamente do volume, da pertinência e da qualidade dos dados disponíveis. Por conseguinte, o CESE considera essencial otimizar o potencial para facilitar intercâmbios de dados flexíveis, interoperáveis e seguros. O CESE aprova a identificação de setores essenciais, como a produção industrial, o Pacto Ecológico, a mobilidade, a saúde, o setor financeiro ou a energia, a fim de acompanhar atentamente as evoluções e avaliar os progressos realizados.

3.3.4.

O CESE apoia:

os objetivos de aumentar consideravelmente a capacidade computacional disponível na Europa para explorar e valorizar os dados em tempo real, e de criar e produzir na UE os processadores necessários, acompanhados de um programa de desenvolvimento sustentável,

o conceito de dados de interesse geral, entendido como a abertura dos dados pelos poderes públicos com vista a apoiar as suas atividades ou a promover a partilha de dados considerados essenciais (5), associando-os a dados provenientes de intervenientes que operam no território europeu mas não se inserem na sua política industrial.

3.3.5.

O CESE espera que os Estados-Membros se empenhem mais na investigação e inovação a fim de desenvolver as estruturas, as infraestruturas e os instrumentos necessários ao bem comum e de contribuir para a soberania da UE em matéria de IA.

3.4.   Promover a excelência desde o laboratório até ao mercado — inovação e parcerias

3.4.1.

O CESE apoia a abordagem holística que visa transformar a UE num espaço de excelência, desde a investigação fundamental e a inovação até à colocação no mercado. O CESE considera essencial que a UE e os Estados-Membros acelerem a sua cooperação de forma a criar condições propícias à inovação, às perspetivas comerciais da IA e ao desenvolvimento de talentos e competências em harmonia com a visão europeia centrada no ser humano e na confiança. O CESE constata com satisfação que as estruturas de colaboração horizontais apoiam estas ambições.

3.4.2.

O CESE acolhe com agrado as ambições da Comissão no sentido de promover a experimentação, reforçar os polos de inovação digital regionais em cooperação com as iniciativas nacionais e regionais, e partilhar as experiências. Estes polos de inovação e as plataformas a pedido facilitam a apropriação da IA pelas microempresas e pelas PME, em complemento de um apoio financeiro específico. O CESE considera importante apoiar as empresas em fase de arranque, as empresas em fase de expansão e as PME tradicionais nos seus esforços para desenvolver a IA.

3.4.3.

Contudo, o CESE sublinha que esta política de polos de excelência não deve prejudicar o financiamento normal e sustentado dos laboratórios de investigação tradicionais, sob pena de atrasar o surgimento de tecnologias revolucionárias.

3.4.4.

O CESE defende a promoção de programas de aculturação para as organizações e as micro, pequenas e médias empresas, desenvolvendo redes de acompanhamento específicas. É aconselhável que as iniciativas destinadas a apoiar o acesso das micro, pequenas e médias empresas à IA (instalações de ensaio e experimentação, polos de inovação digital e plataformas de IA a pedido) sejam reforçadas e avaliadas no que diz respeito aos efeitos práticos junto dessas empresas, tendo em vista o seu aperfeiçoamento.

3.4.5.

Um estudo recente, encomendado pelo CESE, mostra até que ponto a «expansão» é um requisito essencial, quer no acesso às competências necessárias, aos repositórios de dados para os algoritmos ou ao financiamento necessário, quer na orientação de um mercado suficientemente desenvolvido para assegurar a rápida amortização de infraestruturas dispendiosas. Por conseguinte, os responsáveis políticos devem dar prioridade às micro, pequenas e médias empresas e propor políticas adaptadas. Tendo em conta os prejuízos económicos provocados pela pandemia, o apoio às empresas em fase de arranque, às empresas em fase de expansão e às PME tradicionais no desenvolvimento da IA passou a ser uma obrigação imperiosa.

3.4.6.

O CESE aprova o desenvolvimento de «ambientes de testagem» para experimentar as novas ideias em condições próximas da realidade e promover a agilidade. O CESE defende uma melhor partilha dos resultados e o seu reconhecimento mútuo sem fronteiras.

3.4.7.

A excelência da investigação reflete os talentos e as competências existentes nos laboratórios, mas também a confiança dos utilizadores na IA. Por conseguinte, o CESE considera que os programas de ensino superior devem gerar talentos de craveira mundial para a inovação e o desenvolvimento comercial. Solicita que a UE proporcione condições que permitam manter os talentos e atrair competências do estrangeiro. O CESE preconiza um ambiente comercial global estável e de confiança que permita uma melhor apropriação da IA pelas empresas e pelos trabalhadores em benefício da investigação e da inovação.

3.4.8.

As organizações da sociedade civil devem ser apoiadas na aplicação de soluções de IA e figurar entre os beneficiários dos fundos e recursos dedicados à IA. Tal aplica-se, em especial, aos serviços sociais, no pleno respeito pelo direito à vida privada e pelas regras relativas ao tratamento e ao armazenamento de dados, incluindo os dados biométricos.

3.5.   Assegurar que a IA funciona em benefício dos cidadãos — competências e confiança

3.5.1.

O CESE apoia a estratégia da Comissão assente na criação de um ecossistema de excelência e de confiança. Esta abordagem é objeto do Livro Branco adotado em 2019 (6). Uma vez que a educação e a formação são fatores determinantes que permitirão promover a excelência e aumentar a confiança na IA, cabe aos sistemas de educação e formação satisfazer um vasto conjunto de necessidades, desde os conhecimentos de base e a compreensão geral até à aquisição de saber-fazer especializado e de competências de alto nível (7).

3.5.2.

O CESE congratula-se com a adoção do novo Plano de Ação para a Educação Digital, adotado pela Comissão para o período de 2020 a 2027, que permitirá uma melhor compreensão da natureza e do funcionamento da IA desde a escola primária até à universidade, bem como a renovação das competências.

3.5.3.

O CESE entende que os Estados-Membros devem desenvolver uma oferta de ensino da IA que integre também os temas éticos e ambientais conexos, e incentiva o intercâmbio de boas práticas, a fim de promover a diversidade no acesso à formação, ao desenvolvimento e à utilização da IA. O desenvolvimento da IA e da sua utilização em benefício de todos exige uma abordagem multidisciplinar, bem como elementos de ligação.

3.5.4.

O CESE considera que os parceiros sociais são intervenientes fundamentais para antecipar a evolução das competências e as mudanças em matéria de emprego. O diálogo social é essencial como contributo para o acompanhamento dos trabalhadores afetados pela automatização das suas tarefas.

3.5.5.

O CESE realça a importância da cooperação entre governos, estabelecimentos de ensino, parceiros sociais e organizações da sociedade civil envolvidas para conceber e aplicar novos programas de educação e de formação contínua, destinados prioritariamente às pessoas desempregadas. São necessárias formações adaptadas às micro, pequenas e médias empresas, destinadas a empresários e trabalhadores.

3.5.6.

O CESE lamenta que o plano não contemple a possibilidade de uma reflexão comum sobre o mundo do trabalho e o seu futuro no contexto da automatização. A promoção da confiança dos trabalhadores nas aplicações da IA implica um diálogo social reforçado, essencial para introduzir sistemas de IA que têm impacto nos trabalhadores, nomeadamente no domínio da gestão ou dos recursos humanos. Num contexto de possível destruição de postos de trabalho, aumento das desigualdades e reconfiguração dos setores produtivos, afigura-se necessário assegurar uma coordenação perfeita entre Estados-Membros, em estreita colaboração com as empresas, os territórios, os parceiros sociais e os organismos intermediários, a fim de:

desenvolver capacidades prospetivas, sustentadas e institucionalizadas em matéria de automatização,

desenvolver mecanismos inovadores e proativos para a transição das profissões e das competências,

refletir sobre a complementaridade, não apenas para «desenvolver a IA» nas profissões, mas também para identificar a mudança em termos de cultura e de prática e estabelecer normas de «boa complementaridade» favoráveis à emancipação individual.

3.5.7.

Uma vez que a confiança é a pedra angular de uma sociedade digitalizada, o CESE valoriza particularmente a abordagem da Comissão em todos os domínios que permitem garantir o interesse geral e, em especial, o interesse dos cidadãos, dos consumidores, bem como dos trabalhadores e das empresas, incluindo as do setor da economia social, para aumentar o nível de confiança geral na IA: proteção dos direitos fundamentais, cibersegurança, proteção dos dados, propriedade intelectual e utilização sustentável e eficaz dos recursos, sem esquecer as questões regulamentares ligadas à inovação. Afigura-se importante identificar com rigor os possíveis riscos associados a uma utilização abusiva da IA e propor soluções adequadas. O CESE apoia as medidas previstas pela Comissão para reforçar a segurança em todos os domínios e adaptar o quadro regulamentar aos desafios criados pela IA. Recorda, neste contexto, o papel pioneiro da sociedade civil organizada, por exemplo, na avaliação dos riscos inerentes ao reconhecimento facial.

3.5.8.

O CESE apoia plenamente a ambição de promover a nível mundial a visão europeia de uma IA sustentável e fiável, incentivando a definição de normas mundiais em matéria de IA e desenvolvendo parcerias e iniciativas conjuntas com países terceiros.

3.6.   Desenvolver uma liderança estratégica nos setores com grande impacto

3.6.1.

O CESE acolhe favoravelmente a abordagem realista da Comissão, que consiste em centrar as suas ações em setores nos quais a liderança em matéria de IA é indispensável: clima e ambiente, saúde, robótica e automatização, serviços públicos, segurança pública (incluindo a luta contra o terrorismo e as políticas de migração), mobilidade inteligente, agricultura e setores associados.

3.6.2.

O CESE considera que a transição digital é um instrumento fundamental da descarbonização e da gestão do ambiente, que permitirá simultaneamente limitar o possível impacto negativo das soluções assentes em IA no clima, no ambiente e no consumo de energia. O recurso à IA na gestão dos sistemas de energia e de transporte, assim como nos processos industriais e na agricultura, promove a eficiência energética, a economia circular e a gestão sustentável dos recursos naturais, sendo portanto um fator de produtividade e de eficiência económica. Além disso, a IA proporciona formas de compreender e dominar melhor os fenómenos climáticos e ambientais.

3.6.3.

O CESE solicita que se aproveitem as oportunidades oferecidas pela IA na investigação sobre as origens das doenças, no desenvolvimento de novas moléculas, de equipamento médico e de cuidados avançados, ou nos domínios da investigação, do diagnóstico e do tratamento, por exemplo, na luta contra o cancro. O espaço europeu de dados de saúde previsto, respeitando integralmente a vida privada e os dados pessoais, constitui um passo importante para o pleno aproveitamento do potencial da IA. A utilização de robôs para auxiliar doentes, idosos ou pessoas com deficiência no seu dia-a-dia ilustra os benefícios de uma excelência robótica mais centrada na compreensão da interação entre os seres humanos e os robôs do que em proezas tecnológicas.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  «Artificial intelligence, blockchain and the future of Europe» [A inteligência artificial, as cadeias de blocos e o futuro da Europa].

(2)  JO C 240 de 16.7.2019, p. 51

(3)  Parecer do CESE «Regulamento Inteligência Artificial» (ver página 61 do presente Jornal Oficial).

(4)  «La norme sans la force: l’énigme de la puissance européenne» [A norma sem a força: o enigma do poder europeu], Zaki Laïdi, 2005.

(5)  Regulamento Governação de Dados.

(6)  JO C 364 de 28.10.2020, p. 87

(7)  JO C 14 de 15.1.2020, p. 46


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/61


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece regras harmonizadas em matéria de inteligência artificial (Regulamento Inteligência Artificial) e altera determinados atos legislativos da União

[COM(2021) 206 final — 2021/106 (COD)]

(2021/C 517/09)

Relatora:

Catelijne MULLER

Consulta

Parlamento Europeu, 7.6.2021

Conselho, 15.6.2021

Base jurídica

Artigo 114.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Competência

Secção do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

2.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

225/03/06

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) saúda o facto de a proposta de regulamento relativo à Inteligência Artificial (o RIA), apresentada pela Comissão, não só abordar os riscos associados à inteligência artificial (IA), mas também elevar substancialmente o nível mínimo de exigência em matéria de qualidade, desempenho e fiabilidade da IA que a UE está disposta a aceitar. O CESE regozija-se particularmente com a abrangência do âmbito de aplicação do RIA e com o facto de este ter como elementos centrais a saúde, a segurança e os direitos fundamentais.

1.2.

O CESE entende que há margem para melhorias no que se refere ao âmbito de aplicação, à definição e à clareza das práticas de IA proibidas, às consequências das escolhas de categorização feitas no atinente à «pirâmide dos riscos», ao efeito de atenuação dos riscos através dos requisitos aplicáveis aos sistemas de IA de risco elevado, à aplicabilidade do RIA e à sua interação com outra regulamentação em vigor e outras propostas regulamentares recentes.

1.3.

O CESE salienta que a IA nunca funcionou à margem da lei. Em virtude do seu âmbito de aplicação abrangente e da sua primazia enquanto regulamento da UE, o RIA poderá entrar em conflito com atos legislativos nacionais e da UE em vigor e com propostas regulamentares conexas. O CESE recomenda que se altere o considerando 41, de forma a refletir adequadamente e a clarificar as relações entre o RIA e a legislação em vigor e futura.

1.4.

O CESE recomenda a clarificação da definição de IA, suprimindo o anexo I, alterando ligeiramente o artigo 3.o e alargando o âmbito de aplicação do RIA de modo a incluir os «sistemas de IA antigos» e os componentes de IA dos sistemas informáticos de grande escala no espaço de liberdade, segurança e justiça enumerados no anexo IX.

1.5.

O CESE recomenda a clarificação das proibições relacionadas com «técnicas subliminares» e com a «exploração das vulnerabilidades», a fim de refletir a proibição de práticas manipuladoras prejudiciais, bem como o aditamento dos «prejuízos para os direitos fundamentais, a democracia e o Estado de direito» enquanto fundamento dessas proibições.

1.6.

O CESE entende que não é admissível, na UE, a classificação da credibilidade de cidadãos da União com base no seu comportamento social ou em características de personalidade, independentemente do interveniente responsável pela classificação. O CESE recomenda que a proibição desse tipo de classificação seja alargada, a fim de abranger também a classificação social levada a cabo por organizações privadas e autoridades semipúblicas.

1.7.

O CESE apela para a proibição da utilização da IA para efeitos de reconhecimento biométrico automatizado, em espaços públicos ou privados, exceto para fins de autenticação em circunstâncias específicas, bem como para efeitos de reconhecimento automatizado de sinais comportamentais humanos, em espaços públicos ou privados, exceto em casos muito específicos, como determinadas finalidades de saúde, em que é importante o reconhecimento das emoções de um doente.

1.8.

A abordagem assente numa lista para os sistemas de IA de risco elevado corre o risco de normalizar e generalizar vários sistemas e utilizações de IA que ainda são fortemente criticados. O CESE adverte que a conformidade com os requisitos aplicáveis aos sistemas de IA de risco médio e elevado não atenua forçosamente, para todos os sistemas de IA de risco elevado, os riscos de prejuízos para a saúde, a segurança e os direitos fundamentais. O CESE recomenda que o RIA acautele esta situação. No mínimo, devem ser aditados os requisitos de i) a ação e supervisão humanas, ii) privacidade, iii) diversidade, não discriminação e equidade, iv) explicabilidade e v) bem-estar ambiental e societal, em conformidade com o disposto nas orientações éticas para uma IA de confiança.

1.9.

Em consonância com a abordagem da detenção do controlo por humanos, que há muito preconiza, o CESE recomenda vivamente que o RIA preveja que determinadas decisões permaneçam uma prerrogativa dos seres humanos, sobretudo em áreas em que tais decisões tenham uma componente moral e implicações jurídicas ou um impacto social, nomeadamente no sistema judicial, na manutenção da ordem pública, nos serviços sociais, nos cuidados de saúde, na habitação, nos serviços financeiros, nas relações laborais e na educação.

1.10.

O CESE recomenda que todos os sistemas de IA de risco elevado fiquem obrigatoriamente sujeitos a avaliações de conformidade realizadas por terceiros.

1.11.

O CESE recomenda a inclusão de um mecanismo de reclamação e recurso para as organizações e os cidadãos que tenham sofrido prejuízos causados por qualquer sistema, prática ou utilização de IA abrangido pelo âmbito de aplicação do RIA.

2.   Proposta regulamentar sobre a Inteligência Artificial — Regulamento IA

2.1.

O CESE saúda o facto de a proposta de regulamento relativo à Inteligência Artificial, apresentada pela Comissão, não só abordar os riscos associados à IA, mas também elevar substancialmente o nível mínimo de exigência em matéria de qualidade, desempenho e fiabilidade da IA que a UE está disposta a aceitar.

3.   Observações na generalidade — RIA

Objetivo e âmbito de aplicação

3.1.

O CESE saúda o objetivo e o âmbito de aplicação do RIA. Congratula-se, em especial, com o facto de a Comissão fazer da saúde, da segurança e dos direitos fundamentais elementos centrais do RIA. O CESE congratula-se também com o efeito externo do RIA, que assegura que a IA desenvolvida em países terceiros é obrigada a respeitar normas jurídicas idênticas às da UE se for implantada ou produzir efeitos no território da UE.

Definição de IA

3.2.

A definição de IA (artigo 3.o, n.o 1, em articulação com o anexo I do RIA) suscitou um debate entre cientistas no domínio da IA, na medida em que estes consideram que, por um lado, vários exemplos indicados no anexo I não constituem IA e que, por outro, estão ausentes desse anexo várias técnicas de IA importantes. O CESE considera que o anexo I não apresenta qualquer valor acrescentado e recomenda a sua remoção integral do RIA. O CESE recomenda ainda que a definição constante do artigo 3.o, n.o 1, passe a ter a seguinte redação:

«“Sistema de inteligência artificial” (sistema de IA), um programa informático capaz de, tendo em vista um determinado conjunto de objetivos definidos por seres humanos, criar de forma automatizada resultados, tais como conteúdos, previsões, recomendações ou decisões, que influenciam os ambientes com os quais interage».

Saúde, segurança e direitos fundamentais — a pirâmide dos riscos

3.3.

A «pirâmide dos riscos» progressiva (do risco baixo/médio, passando pelo risco elevado, até ao risco inaceitável) utilizada para categorizar várias práticas generalizadas de IA e casos de utilização de IA específicos a determinados domínios, reconhece que nem toda a IA acarreta riscos e que, por outro lado, nem todos os riscos são idênticos ou exigem as mesmas medidas de atenuação.

3.4.

A abordagem adotada levanta duas questões importantes. Em primeiro lugar, será que as medidas de atenuação dos riscos (para sistemas de IA de risco elevado e baixo/médio) atenuam suficientemente os riscos de prejuízos para a saúde, a segurança e os direitos fundamentais? Em segundo lugar, será que estamos dispostos a permitir que a IA substitua em larga escala a tomada de decisões humana, incluindo em processos cruciais, como a manutenção da ordem pública e o sistema judiciário?

3.5.

No que se refere à primeira questão, o CESE adverte que a conformidade com os requisitos estabelecidos para os sistemas de IA de risco médio e elevado não atenua forçosamente, em todos os casos, os riscos de prejuízos para a saúde, a segurança e os direitos fundamentais. Este aspeto será aprofundado na secção 4.

3.6.

No que se refere à segunda questão, aquilo que está em falta no RIA é a ideia de que a promessa da IA reside na melhoria da inteligência e da tomada de decisão humanas, e não na sua substituição. O RIA assenta na premissa de que, uma vez cumpridos os requisitos para sistemas de IA de risco médio e elevado, a IA pode substituir, em grande medida, a tomada de decisão humana.

3.7.

O CESE recomenda vivamente que o RIA preveja que determinadas decisões permaneçam uma prerrogativa dos seres humanos, sobretudo em áreas em que tais decisões tenham uma componente moral e implicações jurídicas ou um impacto social, como no sistema judicial, na manutenção da ordem pública, nos serviços sociais, nos cuidados de saúde, na habitação, nos serviços financeiros, nas relações laborais e na educação.

3.8.

Os sistemas de IA não funcionam à margem da lei. Atualmente, aplicam-se ou são relevantes para os sistemas de IA uma série de regras juridicamente vinculativas a nível nacional, europeu e internacional. As fontes jurídicas incluem, entre outros, o direito primário da UE (os Tratados da União Europeia e a respetiva Carta dos Direitos Fundamentais), o direito derivado da UE (tal como o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados, a Diretiva Responsabilidade dos Produtos, o Regulamento relativo ao livre fluxo de dados não pessoais, as diretivas relativas ao combate à discriminação, o direito dos consumidores e as diretivas relativas à segurança e saúde no trabalho), os tratados das Nações Unidas em matéria de direitos humanos e as convenções do Conselho da Europa (tal como a Convenção Europeia dos Direitos Humanos), bem como a legislação dos Estados-Membros da UE. Além das regras aplicáveis a nível transversal, existem várias regras setoriais específicas para determinadas aplicações de IA (por exemplo, o Regulamento Dispositivos Médicos no setor da saúde). O CESE recomenda que se altere o considerando 41, de forma refletir adequadamente este aspeto.

4.   Observações na especialidade e recomendações — RIA

Práticas de IA proibidas

4.1.

O CESE concorda que as práticas de IA indicadas no artigo 5.o não comportam, efetivamente, quaisquer benefícios sociais, devendo ser proibidas. Considera, porém, que algumas formulações são ambíguas, o que poderá levar a que determinadas proibições sejam difíceis de interpretar e fáceis de contornar.

4.2.

Existem provas de que as técnicas subliminares não só podem conduzir a danos físicos ou psicológicos (as atuais condições para desencadear esta proibição), mas também podem causar, atendendo ao ambiente em que são aplicadas, outros efeitos nocivos nos planos pessoal, social e democrático, como alterações do sentido de voto. Além disso, muitas vezes não é a própria técnica subliminar que se baseia em IA, mas sim a decisão acerca das pessoas visadas pela utilização de tal técnica.

4.3.

A fim de refletir melhor aquilo que o RIA pretende proibir no artigo 5.o, n.o 1, alínea a), isto é, o ato de manipular as pessoas para adotarem comportamentos nocivos, o CESE recomenda que essa alínea passe a ter a seguinte redação: «[…] um sistema de IA implantado, orientado ou utilizado para distorcer substancialmente o comportamento de uma pessoa de uma forma que cause ou seja suscetível de causar danos aos direitos fundamentais dessa pessoa, de outra pessoa ou de um grupo de pessoas, incluindo danos à sua saúde física e psicológica e à sua segurança, bem como à democracia e ao Estado de direito».

4.4.

O CESE recomenda que se insira uma alteração semelhante no que se refere à prática proibida de exploração de vulnerabilidades referida no artigo 5.o, n.o 1, alínea b), de modo a incluir os danos aos direitos fundamentais, incluindo danos físicos ou psicológicos.

4.5.

O CESE saúda a proibição da «classificação social» constante do artigo 5.o, n.o 1, alínea c). O CESE recomenda que a proibição da classificação social se aplique também às organizações privadas e às autoridades semipúblicas, e não apenas às autoridades públicas. Não é admissível, na UE, a classificação da credibilidade de cidadãos da União com base no seu comportamento social ou em características de personalidade, independentemente do interveniente responsável pela classificação. Se assim não fosse, a UE abriria a porta à classificação social em diversas áreas, nomeadamente no local de trabalho. As condições previstas nas subalíneas i) e ii) devem ser clarificadas, de forma a estabelecer uma distinção clara entre o que é considerado «classificação social» e o que pode ser considerado uma forma aceitável de avaliação para uma finalidade específica, isto é, o momento a partir do qual as informações utilizadas para a avaliação já não são consideradas pertinentes para o objetivo da avaliação ou já não estão razoavelmente relacionadas com ele.

4.6.

O RIA visa proibir a identificação biométrica à distância em tempo real (através de reconhecimento facial, por exemplo) para efeitos de manutenção da ordem pública e categorizá-la como «de risco elevado» quando utilizada para outros fins. Tal permite o reconhecimento biométrico «em diferido» e «quase ao vivo». Permite igualmente o reconhecimento biométrico que não visa identificar uma pessoa, mas antes avaliar o seu comportamento a partir das suas características biométricas (microexpressões, maneira de andar, temperatura, ritmo cardíaco, etc.). A limitação da proibição à «manutenção da ordem pública» permite a identificação biométrica e todas as outras formas de reconhecimento biométrico que não visam identificar uma pessoa, incluindo todas as formas referidas de «reconhecimento de emoções», para todos os demais efeitos, por todos os demais intervenientes, em todos os lugares públicos e privados, incluindo no local de trabalho, nas lojas, nos estádios, nos teatros, etc., o que deixa a porta aberta a um mundo em que estamos constantemente sob «avaliação do ponto de vista emocional» para qualquer fim considerado necessário pelo interveniente que efetua essa avaliação.

4.7.

De modo geral, o RIA categoriza o «reconhecimento de emoções» como sendo de risco reduzido, exceto em alguns domínios, no âmbito dos quais tal reconhecimento é considerado de risco elevado. Este tipo de reconhecimento biométrico é também conhecido como «reconhecimento afetivo» e, por vezes, «reconhecimento do comportamento». Todos estes tipos de práticas de IA são extremamente invasivos, carecem de uma base científica sólida e acarretam riscos substanciais para vários direitos fundamentais da Carta da UE, incluindo o direito à dignidade humana, o direito à integridade da pessoa (que abrange o direito à integridade mental) e o direito à privacidade.

4.8.

De forma largamente consentânea com os apelos da Autoridade Europeia para a Proteção de Dados (AEPD) e do Comité Europeu para a Proteção de Dados (CEPD), de 21 de junho de 2021, no sentido de se proibir a utilização da IA para o reconhecimento automático de características humanas em espaços acessíveis ao público e outras utilizações da IA que podem conduzir a práticas discriminatórias injustas, o CESE preconiza a:

proibição da utilização da IA para efeitos de reconhecimento biométrico automatizado em espaços públicos e privados (tal como o reconhecimento facial, da maneira de andar, da voz e de outras características biométricas), exceto para fins de autenticação em circunstâncias específicas (por exemplo, para obter acesso a espaços securizados);

proibição da utilização da IA para efeitos de reconhecimento automatizado de sinais comportamentais humanos em espaços públicos e privados;

proibição de sistemas de IA que recorram à biometria para agrupar pessoas com base na etnia, no género, na orientação política ou sexual ou noutros aspetos com base nos quais a discriminação é proibida ao abrigo do artigo 21.o da Carta da UE;

proibição da utilização de IA para inferir as emoções, o comportamento, as intenções ou as características de uma pessoa singular, exceto em casos muito específicos, como determinadas finalidades de saúde, em que é importante o reconhecimento das emoções de um doente.

Sistemas de IA de risco elevado

4.9.

Ao determinar se uma prática ou utilização de IA que comporta um risco para a saúde, a segurança ou os direitos fundamentais deve, não obstante, ser autorizada sob condições rigorosas, a Comissão reteve dois elementos: i) se a prática ou utilização de IA em questão é suscetível de ter benefícios sociais, e ii) se o risco de prejuízos para a saúde, a segurança e os direitos fundamentais apresentado pela mesma pode ser atenuado se forem respeitados certos requisitos.

4.10.

O CESE saúda a harmonização desses requisitos com os elementos das orientações éticas para uma IA de confiança. Contudo, o RIA não aborda especificamente, no âmbito dos requisitos para os sistemas de IA de risco elevado, cinco requisitos importantes contidos nessas orientações, a saber: i) a ação e supervisão humanas, ii) a privacidade, iii) a diversidade, a não discriminação e a equidade iv) a explicabilidade e v) o bem-estar ambiental e societal. O CESE entende que se trata de uma oportunidade perdida, dado que muitos dos riscos criados pela IA têm que ver com a privacidade, os enviesamentos, a exclusão, a inexplicabilidade dos resultados das decisões tomadas pela IA, o enfraquecimento da ação e supervisão humanas e do ambiente, quando todos estes aspetos têm impacto nos nossos direitos fundamentais.

4.11.

O CESE recomenda que estes requisitos sejam aditados aos que já constam do capítulo 2 do título III do RIA, a fim de melhorar a capacidade do RIA para proteger eficazmente a nossa saúde, a segurança e os direitos fundamentais em relação aos impactos adversos da IA utilizada tanto pelas autoridades públicas como por organizações privadas.

4.12.

O CESE saúda a «articulação» entre o RIA e a legislação de harmonização da União. Recomenda que o âmbito de aplicação do RIA e os requisitos aplicáveis aos sistemas de IA de risco elevado sejam alargados além dos «sistemas de IA que são componentes de segurança» ou das situações em que o próprio sistema de IA é um produto abrangido pela legislação de harmonização da União enumerada no anexo II. Tal justifica-se pelo facto de a IA poder apresentar riscos mesmo quando não é um componente de segurança e também pelo facto de o próprio sistema de IA nem sempre ser um produto. É o caso, por exemplo, da IA utilizada como parte de uma ferramenta de diagnóstico ou de prognóstico na área da saúde, ou de um termóstato baseado em IA que regula uma caldeira.

4.13.

O CESE alerta, contudo, para o facto de a abordagem escolhida, assente numa lista para os sistemas de IA de risco elevado incluídos no anexo III, correr o risco de legitimar, normalizar e generalizar várias práticas de IA que continuam a ser fortemente criticadas e em relação às quais os benefícios sociais são questionáveis ou estão por demonstrar.

4.14.

Além disso, os riscos de prejuízos para a saúde, a segurança e os direitos fundamentais nem sempre podem ser atenuados através do cumprimento dos cinco requisitos aplicáveis aos sistemas de IA de risco elevado, em especial no que se refere a direitos fundamentais menos debatidos, mas que também são suscetíveis de ser afetados pela IA, como o direito à dignidade humana, a presunção de inocência, o direito a condições de trabalho justas e equitativas ou a liberdade de associação e de reunião e o direito de greve, entre outros.

4.15.

O CESE recomenda vivamente que a gestão e a operação de infraestruturas de telecomunicações e de ligação à Internet sejam aditadas ao ponto 2 do anexo III. O CESE recomenda também que o âmbito desse ponto seja alargado por forma a ir além dos sistemas de IA usados como componentes de segurança.

4.16.

Os sistemas de IA utilizados para efeitos de acesso à educação e para avaliar os estudantes apresentam vários riscos para a saúde, a segurança e os direitos fundamentais dos estudantes. A título de exemplo, as ferramentas de supervisão em linha que recorrem a vários indicadores biométricos e ao rastreamento dos comportamentos para sinalizar «comportamentos suspeitos» e «indícios de fraude» durante exames em linha são verdadeiramente invasivas e carecem de uma base científica.

4.17.

A utilização de sistemas de IA para acompanhar, seguir e avaliar os trabalhadores suscita sérias preocupações no que se refere a direitos fundamentais dos trabalhadores como o direito a condições de trabalho justas e equitativas, o direito à informação e à consulta e o direito a um despedimento com justa causa. A inclusão desses sistemas de IA na lista de sistemas de risco elevado é suscetível de entrar em conflito com as legislações nacionais e as convenções coletivas de trabalho em matéria de despedimento com/sem justa causa, condições de trabalho saudáveis e seguras e prestação de informações aos trabalhadores. O CESE apela para que se assegure a plena participação e a informação dos trabalhadores e dos parceiros sociais no processo de decisão sobre a utilização da IA no local de trabalho e sobre o seu desenvolvimento, aquisição e implantação.

4.18.

O requisito da «supervisão humana» é especialmente pertinente no que respeita às relações laborais, dado que a supervisão será levada a cabo por um trabalhador ou grupo de trabalhadores. O CESE salienta que esses trabalhadores devem receber formação sobre a forma de desempenhar essa tarefa. Além disso, atendendo a que se espera que esses trabalhadores possam desconsiderar os resultados do sistema de IA ou até decidir não utilizá-lo, devem ser adotadas medidas para evitar o medo de consequências negativas (incluindo a despromoção ou o despedimento) caso seja tomada uma decisão dessa natureza.

4.19.

A utilização de sistemas de IA no âmbito do acesso a serviços públicos e do usufruto dos mesmos é mais ampla do que no caso dos serviços privados, mas só no que se refere a estes últimos se considera a avaliação da classificação de crédito realizada por um sistema de IA como sendo de risco elevado. O CESE recomenda um alargamento do âmbito de aplicação da alínea b) do ponto 5 do anexo III, para que esta passe a abranger os sistemas de IA concebidos para avaliar a elegibilidade para serviços privados essenciais.

4.20.

A IA utilizada pelas autoridades policiais e no âmbito da gestão da migração, do asilo e do controlo de fronteiras para levar a cabo avaliações individuais de risco (de crime ou de segurança) pode pôr em causa a presunção de inocência, os direitos de defesa e o direito de asilo previstos na Carta da UE. De modo geral, os sistemas de IA limitam-se a procurar correlações baseadas em características detetadas noutros «casos». Nesse contexto, a suspeita não assenta numa suspeita real de crime ou infração cometida pela pessoa em questão, mas apenas nas características que, coincidentemente, essa pessoa partilha com criminosos condenados (tais como morada, rendimentos, nacionalidade, dívidas, situação de emprego, comportamentos, comportamentos de amigos ou familiares, e assim por diante).

4.21.

A utilização da IA na administração da justiça e nos processos democráticos é uma questão especialmente sensível que deve ser abordada de forma mais matizada e minuciosa. A mera utilização de sistemas para assistir uma autoridade judiciária na pesquisa e na interpretação de factos e da lei, bem como na aplicação da lei a um conjunto concreto de factos, não tem em conta o facto de que o ato de julgar vai muito além de identificar padrões em dados armazenados (que é, fundamentalmente, aquilo que os atuais sistemas de IA fazem). O texto pressupõe igualmente que esses tipos de IA apenas se limitarão a assistir o sistema judicial, excluindo a tomada de decisões judiciais totalmente automatizada do âmbito de aplicação do regulamento. O CESE lamenta ainda que não seja feita referência aos sistemas e utilizações de IA no âmbito de processos democráticos, como as eleições.

4.22.

O CESE recomenda o aditamento de uma disposição que preveja uma situação em que é evidente — ou em que se tenha tornado claro, durante a avaliação prévia da conformidade — que os seis requisitos não atenuarão satisfatoriamente o risco de prejuízos para a saúde, a segurança e os direitos humanos (por exemplo, através de uma alteração do artigo 16.o, alínea g), do RIA).

Governação e aplicabilidade

4.23.

O CESE acolhe favoravelmente a estrutura de governação estabelecida pelo RIA. Recomenda que o Comité Europeu para a Inteligência Artificial organize trocas de opiniões obrigatórias com a sociedade em geral, incluindo com os parceiros sociais e as ONG.

4.24.

O CESE recomenda vivamente o alargamento do âmbito de aplicação do RIA no sentido de incluir os «sistemas de IA antigos», ou seja, os sistemas que já estão a ser utilizados ou que venham a ser implantados antes da entrada em vigor do RIA, a fim de evitar que os responsáveis acelerem a implantação de eventuais sistemas de IA proibidos de risco elevado e médio para contornar os requisitos de conformidade. Além disso, o CESE recomenda com firmeza que não se exclua do âmbito de aplicação do RIA a IA que é uma componente dos sistemas informáticos de grande escala no espaço de liberdade, segurança e justiça enumerados no anexo IX.

4.25.

A complexidade dos requisitos e das atividades de responsabilização, a par da autoavaliação, acarretam um risco de simplificação deste processo, transformando-o em listas de verificação em que um simples «sim» ou «não» poderão ser suficientes para satisfazer os requisitos. O CESE recomenda que todos os sistemas de IA de risco elevado fiquem obrigatoriamente sujeitos a avaliações realizadas por terceiros.

4.26.

O CESE recomenda a aplicação de medidas de apoio (financeiro) adequadas e de instrumentos simples e acessíveis para as micro e as pequenas organizações, bem como para organizações da sociedade civil, para que estas sejam capazes de compreender o objetivo e o significado do RIA e de cumprir os seus requisitos. Estas medidas não se devem limitar à prestação de apoio a polos de inovação digital, devendo visar a facilitação de acesso a conhecimentos especializados de alto nível sobre o RIA, os seus requisitos e as obrigações que impõe, e, em especial, sobre o respetivo fundamento.

4.27.

O CESE recomenda a inclusão de um mecanismo de reclamação e recurso para as organizações e os cidadãos que tenham sofrido prejuízos causados por qualquer sistema, prática ou utilização de IA abrangido pelo âmbito de aplicação do RIA.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/67


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às máquinas e seus componentes e acessórios»

[COM(2021) 202 final — 2021/0105 (COD)]

(2021/C 517/10)

Relator:

Martin BÖHME

Consulta

Conselho da União Europeia, 9.6.2021

Parlamento Europeu, 7.6.2021

Base jurídica

Artigos 114.o e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

2.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

226/0/7

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O setor das máquinas e seus componentes e acessórios é um dos principais setores de atividade da União Europeia. As capacidades e os campos de aplicação das máquinas estão a crescer rapidamente devido às novas possibilidades oferecidas pela engenharia técnica. É imperativo ter mais em conta as tecnologias digitais, como a inteligência artificial, a Internet das coisas e a robótica. Para o efeito, é igualmente necessário adaptar os requisitos regulamentares em matéria de segurança e de proteção da saúde aplicáveis às máquinas. Neste contexto, o regulamento proposto assume também grande relevância no mercado interno. O Comité Económico e Social Europeu (CESE) já abordou extensivamente o tema da Diretiva 2006/42/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (1) (Diretiva Máquinas) em 2020, no seu Relatório de informação — Revisão da Diretiva Máquinas (2).

1.2.

Embora haja necessidade de regulamentar normas a nível da UE no domínio das máquinas, de estabelecer requisitos juridicamente vinculativos e de assegurar uma aplicação coerente, o CESE salienta que as empresas, os fabricantes e os operadores de máquinas da UE não devem ser deixados de fora. Isto aplica-se às grandes empresas, mas também às pequenas e médias empresas. A engenharia mecânica é uma atividade internacional, pelo que a regulamentação da UE no domínio dos produtos deve ser capaz de promover a qualidade, a segurança e a competitividade, devendo ajudar e não dificultar às empresas o desenvolvimento de abordagens inovadoras.

1.3.

O CESE congratula-se com o facto de a proposta de regulamento continuar a centrar-se nos operadores de máquinas e seus componentes e acessórios, ou seja, nos trabalhadores, uma vez que a sua saúde e segurança continuam a constituir uma preocupação fundamental. Além disso, a transformação da Diretiva Máquinas num regulamento é considerada uma vantagem por permitir uma aplicação mais uniforme das disposições nos Estados-Membros. Assim, será ainda mais fácil identificar e corrigir deficiências de segurança no futuro, o que será particularmente benéfico para as pessoas que operam as máquinas.

1.4.

O CESE insta a Comissão a:

1.4.1.

Concretizar as disposições transitórias aplicáveis até à entrada em vigor do novo regulamento relativo às máquinas, a fim de criar segurança jurídica para todos os intervenientes.

1.4.2.

O CESE considera necessário adaptar a estrutura e o conteúdo dos anexos à proposta de regulamento. A conceção da numeração, a classificação dos tipos de máquinas e as sobreposições com a regulamentação da UE adjacente ainda levantam questões.

1.4.3.

O CESE considera necessário assegurar de forma inequívoca que as máquinas sejam seguras quando são colocadas no mercado e durante toda a sua vida útil.

1.4.4.

A crescente complexidade das máquinas exige uma formação especial dos utilizadores, a fim de não expor os trabalhadores a perigos desnecessários (3). Além disso, são necessárias estruturas que permitam a atribuição de responsabilidades claras em caso de acidentes. Há que envolver os representantes dos trabalhadores no processo de compra e instalação de máquinas novas.

1.4.5.

A utilização de inteligência artificial requer um quadro de segurança que possa ser definido caso a caso e que permita o funcionamento de tais sistemas.

1.4.6.

O envolvimento obrigatório dos organismos a notificar aquando da preparação das avaliações de conformidade das máquinas e seus componentes e acessórios tem de continuar a ser financeiramente comportável para as empresas.

1.4.7.

O CESE considera necessário assegurar um acompanhamento contínuo da legislação em matéria de máquinas e seus componentes e acessórios, sempre em consulta com as partes interessadas pertinentes, a fim de poder responder às inovações técnicas e aos desafios para os produtores e para a proteção da saúde física e psíquica dos trabalhadores.

2.   Contexto (incluindo a proposta legislativa em apreço)

2.1.

Em 2018, o setor da engenharia mecânica registou um volume de vendas de 700 mil milhões de euros, uma produção no valor de 670 mil milhões de euros e um valor acrescentado de 230 mil milhões de euros. O total das exportações de máquinas e equipamentos da UE ascendeu a 517 mil milhões de euros, dos quais cerca de 50 % foram exportados para os Estados-Membros da UE (ou seja, para o comércio intra-UE), enquanto o restante foi exportado para países terceiros (comércio extra-UE) (4).

2.2.

A proposta da Comissão para um novo regulamento relativo às máquinas e seus componentes e acessórios faz parte de um pacote mais abrangente em matéria de inteligência artificial. A proposta específica dedicada às máquinas diz respeito à revisão da designada «Diretiva Máquinas». A revisão visa tanto promover a transformação digital como reforçar o mercado interno. A Diretiva Máquinas insere-se na legislação em matéria de segurança dos produtos. O seu objetivo é assegurar um nível elevado de proteção dos trabalhadores, dos consumidores e de outras pessoas expostas, centrando-se na segurança da própria máquina. Impõe, assim, obrigações aos fabricantes das máquinas com vista à integração da segurança na conceção e no fabrico das máquinas (integração da segurança na conceção).

2.3.

A proposta traduz-se em seis objetivos específicos:

1)

Limitar as ameaças novas relacionadas com as tecnologias digitais emergentes;

2)

Assegurar uma interpretação coerente do âmbito de aplicação e das definições e melhorar a segurança das tecnologias tradicionais;

3)

Reavaliar máquinas consideradas de alto risco e reavaliar procedimentos de conformidade conexos;

4)

Reduzir requisitos de documentação em suporte de papel;

5)

Assegurar a coerência com outra legislação do novo quadro legislativo; e

6)

Reduzir possíveis divergências na interpretação resultantes da transposição para o direito nacional.

2.4.

A Comissão realizou um estudo de impacto no âmbito do qual comparou diferentes opções para lidar com a Diretiva Máquinas, cuja origem remonta a 2006, o que se traduz em 15 anos de existência, e que tem por base uma diretiva de 1989. Tendo em conta a rapidez do desenvolvimento no domínio da engenharia técnica, este é um horizonte temporal considerável. Neste contexto, foi decidido rever a diretiva no sentido de aumentar a competitividade, minimizando os encargos para os fabricantes e, além disso, aumentando a segurança através de requisitos mais claros ou adicionais. Tal envolve assumir custos adicionais relacionados com a conformidade.

2.5.

A transformação da diretiva num regulamento destina-se a evitar transposições divergentes nos Estados-Membros. Desta forma, a Comissão espera aumentar e assegurar a coerência global aquando da interpretação e aplicação da lei.

3.   Observações gerais

3.1.

Ao contrário de muitas outras diretivas, a Diretiva Máquinas em vigor até à data ainda não foi adaptada ao chamado «Novo Quadro Legislativo». A este respeito, o CESE congratula-se com o facto de o regulamento estar agora a ser atualizado e adaptado às condições-quadro alteradas na regulamentação da UE. Importa prestar esclarecimentos em relação ao âmbito de aplicação, em particular no que diz respeito à demarcação da Diretiva Baixa Tensão, da Diretiva Equipamentos sob Pressão e de outras diretivas, bem como clarificar determinadas definições terminológicas, tais como a de «quase-máquina».

3.2.

O CESE considera que a proposta de revisão constitui uma intervenção num domínio importante para muitas empresas, trabalhadores e outros grupos pertinentes na UE. As regras propostas constituem a principal base jurídica para qualquer empresa que conceba, fabrique ou explore máquinas. A segurança dos trabalhadores que operam máquinas depende, em grande medida, da aplicação e fiscalização coerentes das regras nos Estados-Membros.

3.3.

É no espírito do princípio da igualdade na UE que os requisitos de segurança e de saúde relativos às máquinas devem ser idênticos em todos os Estados-Membros e igualmente vinculativos para todos os fabricantes, distribuidores e operadores desses Estados. O CESE está convicto de que os produtos poderão ser livremente comercializados entre todos os Estados-Membros se estes requisitos forem satisfeitos.

3.4.

O CESE congratula-se com o facto de a proposta de regulamento manter o objetivo central da diretiva anterior, nomeadamente o de estabelecer em relação às máquinas regras básicas a nível europeu em matéria de segurança, de proteção da saúde e de livre circulação. Os objetivos principais permanecem, por um lado, a segurança e, por outro, a eliminação das barreiras comerciais, aos quais acresce agora a inclusão de inovações de engenharia técnica atuais e futuras no setor das máquinas.

3.5.

O CESE salienta a necessidade de existirem disposições transitórias, transparentes, adequadas e compreensíveis, na transição da Diretiva Máquinas para o novo regulamento relativo às máquinas. Há que especificar o artigo 50.o da proposta. Permanece por esclarecer a questão de saber que regras se aplicarão às máquinas produzidas ou colocadas no mercado durante o período de transição de 30 meses, bem como a forma como estas máquinas serão distinguidas dos produtos anteriores à transição. Os fabricantes e os importadores necessitam de um prazo adequado. Uma abordagem útil seria, por exemplo, prever que os Estados-Membros não pudessem, por um período máximo de 42 meses após a entrada em vigor do novo regulamento, impedir a colocação no mercado de máquinas produzidas em conformidade com a Diretiva 2006/42/CE previamente à data de revogação da diretiva.

3.6.

A proposta em apreço, relativa às máquinas e seus componentes e acessórios, vem alargar ainda mais a vastíssima gama de tipos de máquinas que um regulamento desta natureza deve abordar. O CESE considera que se trata de um passo lógico para criar um conjunto abrangente e compreensível de regras. É particularmente importante para os fabricantes, os exportadores e também para os compradores de máquinas que haja uma regulamentação segura em relação aos parques de máquinas, em particular no que se refere à integração de sistemas de inteligência artificial. Esta abordagem regulamentar holística permite que as empresas realizem apenas uma avaliação de conformidade de cada vez.

3.7.

O CESE considera necessário adaptar a estrutura e o conteúdo dos anexos ao projeto de regulamento. Não existe qualquer razão aparente para alterar a numeração dos anexos conexos da proposta de regulamento (o anexo IV é agora o anexo I, etc.). As alterações devem limitar-se aos casos em que haja uma clara necessidade. Além disso, tendo em conta o seu risco potencialmente elevado, é apropriado incluir certos componentes de segurança constantes do anexo II que asseguram funções de segurança, tais como estruturas de proteção em caso de capotamento (ROPS), estruturas de proteção contra a queda de objetos (FOPS) ou software, na lista de máquinas e seus componentes e acessórios de alto risco que consta do anexo I. Por outro lado, devem ser evitadas sobreposições contraditórias com outra legislação da UE em vigor aplicável às máquinas, como é o caso da Diretiva Baixa Tensão. Os procedimentos de avaliação da conformidade só deviam ser levados a cabo uma vez. Tal seria pertinente, por exemplo, para determinados requisitos de segurança e de saúde constantes do anexo III da proposta em apreço, que estão relacionados com certos riscos [por exemplo, a Diretiva 2014/53/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (5) (Diretiva Equipamento de Rádio) ou a Diretiva 2014/68/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (6) (Diretiva Equipamentos sob Pressão)]. Neste caso, os procedimentos de avaliação da conformidade previstos na proposta de regulamento em apreço só devem aplicar-se à colocação no mercado ou à colocação em serviço.

3.8.

O CESE considera que a saúde e segurança dos trabalhadores constitui um fator fundamental. Os fabricantes e projetistas de máquinas são responsáveis pela sua respetiva segurança básica. Nos casos em que não seja possível garantir a segurança, não haverá lugar à colocação em serviço. As pessoas que operam máquinas numa base diária não devem ser expostas a quaisquer perigos que assim pudessem ter sido evitados. Em termos concretos, isto significa que as máquinas devem ser seguras quando são colocadas no mercado e durante toda a sua vida útil. O cumprimento das regras de segurança deve ser verificado periodicamente. As máquinas devem poder ser operadas em segurança e todos os dispositivos de segurança e de proteção devem ser concebidos de forma a não poderem ser facilmente contornados ou desativados. Além disso, é necessário que quaisquer riscos residuais que não possam ser eliminados na conceção sejam claramente identificáveis por parte dos utilizadores ou operadores, mediante marcação e documentação técnica, em particular, o manual de instruções. O CESE recomenda à Comissão que inclua na proposta de regulamento uma recomendação sobre a necessidade de consultar os representantes dos trabalhadores e os responsáveis pela segurança no local de trabalho. As responsabilidades das pessoas singulares ou coletivas em caso de acidente devem também ser claramente definidas, em particular no tocante à utilização da inteligência artificial.

3.9.

O CESE remete para o conteúdo do seu Parecer — Plano Coordenado para a Inteligência Artificial, adotado em 2019 (7). Neste já se afirmara que, a fim de reduzir os riscos a que as pessoas possam estar expostas quando operam máquinas, os trabalhadores devem receber formação individual sobre a utilização de inteligência artificial e de robôs, permitindo-lhes trabalhar com estes em segurança e travá-los em caso de emergência («princípio de travão de emergência»). Isto é particularmente pertinente nos casos em que as pessoas e as máquinas trabalham em estreita colaboração. A este propósito, a Organização Internacional de Normalização (ISO) adotou uma norma sobre robôs, dirigida a fabricantes, distribuidores e utilizadores. Esta fornece diretrizes para a conceção e organização de áreas de trabalho, a fim de reduzir os riscos no local de trabalho.

3.10.

O CESE atribui prioridade ao manual de instruções digital. A pedido do cliente, o fabricante poderá fornecer o manual de instruções em formato de papel. No entanto, sabe-se da indústria que em muitos casos os clientes já estão a exigir manuais de instruções digitais.

3.11.

A utilização diária de máquinas mostra que a diversidade de aplicações e os perigos associados dificilmente permitem regulamentações generalizadas e supostamente menos complicadas, como a simples «proibição» da presença de arestas metálicas afiadas, visto estas fazerem, por vezes, parte da função da própria máquina. Em muitos tipos de máquinas, por exemplo prensas ou sistemas de corte por laser, os perigos para os operadores da máquina estão indissociavelmente ligados à função a que a máquina se destina. É da responsabilidade dos fabricantes reduzir ao máximo estes riscos de lesão, tomando as medidas de proteção adequadas.

3.12.

O CESE concorda com o facto de a proposta de regulamento apresentada passar a incluir também, e em particular, máquinas mais avançadas e, portanto, menos dependentes de operadores humanos. A quota destas tecnologias no mercado global europeu das máquinas deverá crescer fortemente nos próximos anos. São particularmente necessárias normas uniformes aplicáveis às máquinas com capacidade para aprender de forma independente, tornando-se sucessivamente mais autónomas e realizando, assim, novas ações e passos operacionais. Afinal, é quase evidente que tecnologias digitais como a inteligência artificial, a Internet das coisas e a robótica acarretarão novos desafios em termos de segurança dos produtos. Sobretudo a utilização de inteligência artificial requer um quadro de segurança que possa ser definido caso a caso e que permita o funcionamento de tais sistemas.

3.13.

O CESE salienta que, para além do aspeto da proteção da saúde (física e psíquica) dos operadores de máquinas, é necessário que os aspetos ambientais e os efeitos climáticos também desempenhem um papel significativo ao determinar se as máquinas são seguras. O fabrico e a utilização de uma máquina e a questão da sustentabilidade devem ser considerados em conjunto e avaliados em função do seu impacto nas pessoas e no ambiente. Uma máquina que prejudique o clima de forma permanente só dificilmente poderá ser considerada segura. A proposta apresentada aborda a questão do impacto ambiental. Reflete, em particular, sobre o que acontece nos casos em que as máquinas e seus componentes e acessórios são posteriormente modificados por intervenção física ou de forma digital e em que tal possa não corresponder às intenções do fabricante. Tal poderia fazer com que requisitos de segurança e saúde fundamentais deixassem de ser cumpridos, tornando inválidas quaisquer avaliações de conformidade prévias. Ao considerar a proteção ambiental e climática em geral no âmbito do fabrico e funcionamento de uma máquina, é necessário estabelecer uma ligação coerente com a restante legislação da UE (por exemplo, em matéria de sustentabilidade dos produtos).

3.14.

A Comissão prevê na sua proposta que no caso de máquinas de alto risco, obrigatoriamente sujeitas a uma avaliação, seja futuramente abolida a possibilidade de o fabricante realizar o procedimento de avaliação da conformidade exclusivamente por iniciativa própria, mesmo que sejam aplicadas normas harmonizadas. No entanto, muitas das máquinas em questão são fabricadas em pequenas séries ou mesmo como peças únicas, pelo que, nestes casos, não é, na prática, adequado o envolvimento de um organismo de auditoria externo. Por conseguinte, o CESE recomenda que o atual sistema seja mantido em casos específicos justificados, como, por exemplo, se a percentagem de inteligência artificial disser unicamente respeito a software estático que não pode evoluir nem tomar decisões de forma autónoma. Além disso, coloca-se a questão de saber se o envolvimento obrigatório de um organismo a notificar para efeitos de uma avaliação de conformidade não acarreta também custos avultados, o que não deixaria de representar um pesado encargo para as pequenas e médias empresas. Isto aplica-se em especial nos casos em que apenas uma pequena parte da máquina estiver equipada com inteligência artificial, mas esse facto obrigar a uma avaliação completa e à notificação como sendo uma máquina de alto risco. A questão da eficiência de um organismo a notificar externo coloca-se em particular quando se trata de peças únicas, em que não é possível aplicar uma norma de ensaio adequada.

3.15.

O CESE congratula-se com o facto de a Comissão poder formular as suas próprias especificações técnicas na ausência de normas harmonizadas adequadas. Neste caso, cabe contar com a participação prévia de todas as partes interessadas pertinentes.

3.16.

O CESE recomenda, no contexto de procedimentos uniformes de teste e notificação, a introdução de um certificado europeu para que as empresas comprovem a fiabilidade dos sistemas de inteligência artificial dignos de confiança (8).

3.17.

A proposta prevê que as máquinas e seus componentes e acessórios só possam ser disponibilizados no mercado ou colocados em serviço se forem devidamente instalados, mantidos e utilizados de acordo com o fim a que se destinam. Além disso, é necessário cumprir os requisitos essenciais de segurança e de saúde estabelecidos no anexo III (artigo 7.o). No entanto, as quase-máquinas não têm de ser colocadas em serviço e devem, portanto, ficar excluídas das disposições relativas à colocação em serviço. Nestes casos, poder-se-ia estipular, em disposições separadas, por exemplo, que as quase-máquinas só possam ser disponibilizadas no mercado se satisfizerem os requisitos essenciais de segurança e de saúde estabelecidos no anexo III para os quais o fabricante tenha declarado a conformidade na declaração de incorporação.

3.18.

A fim de assegurar uma aplicação o mais coerente possível do Regulamento Máquinas, o CESE considera necessária uma monitorização contínua por parte da Comissão Europeia e de todas as partes interessadas pertinentes. Isto requer processos coordenados de coordenação entre as Direções-Gerais GROW, EMPL e CONNECT. Além disso, o CESE entende que se deve ponderar a criação, por exemplo, de um organismo de coordenação contínua composto pelos Grupos de Cooperação Administrativa (ADCO) no âmbito do setor das máquinas e pelo Comité dos Altos Responsáveis da Inspeção do Trabalho (CARIT), a ser financiado pela Comissão.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Diretiva 2006/42/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de maio de 2006, relativa às máquinas e que altera a Diretiva 95/16/CE (JO L 157 de 9.6.2006, p. 24).

(2)  Relatório de informação — Revisão da Diretiva Máquinas.

(3)  Ver JO C 240 de 16.7.2019, p. 51.

(4)  Fonte: https://ec.europa.eu/growth/sectors/mechanical-engineering/machinery_pt.

(5)  Diretiva 2014/53/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativa à harmonização da legislação dos Estados-Membros respeitante à disponibilização de equipamentos de rádio no mercado e que revoga a Diretiva 1999/5/CE (JO L 153 de 22.5.2014, p. 62).

(6)  Diretiva 2014/68/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, relativa à harmonização da legislação dos Estados-Membros respeitante à disponibilização de equipamentos sob pressão no mercado (JO L 189 de 27.6.2014, p. 164).

(7)  JO C 240 de 16.7.2019, p 51.

(8)  Ver JO C 240 de 16.7.2019, p. 51.


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/72


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Taxonomia da UE, divulgação de informações sobre sustentabilidade das empresas, preferências em termos de sustentabilidade e deveres fiduciários: Direcionar as atividades financeiras para os objetivos do Pacto Ecológico Europeu

[COM(2021) 188 final]

(2021/C 517/11)

Relator:

Stefan BACK

Consulta

Comissão Europeia, 31.5.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social

Adoção em secção

8.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

191/1/10

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE acolhe favoravelmente o pacote Financiamento Sustentável e sublinha que o Regulamento Delegado da Comissão («regulamento delegado») (1) poderá desempenhar um papel fundamental na criação de um quadro claro, coerente e abrangente para relevar o desenvolvimento ambicioso de uma economia mais verde, sem efeitos de dependência e dotada de critérios técnicos, definindo claramente os investimentos ecológicos que contribuem diretamente para os objetivos climáticos da Europa e pelos quais se podem alinhar as práticas dos setores comerciais em causa e do setor financeiro.

1.2.

O CESE sublinha a urgência de adotar medidas eficazes para fazer face às alterações climáticas e reduzir as emissões, nos termos da Lei do Clima da UE e à luz do sexto relatório (2) do PIAC (Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas). Por esta mesma razão, é essencial utilizar instrumentos eficientes, facilmente aplicáveis, inovadores e produtivos, a fim de obter resultados rápidos e mensuráveis. A avaliação do regulamento delegado deve ser efetuada neste espírito.

1.3.

O CESE reconhece que o regulamento delegado é fundamental para assegurar a transparência através de critérios claros relativos ao investimento sustentável, a fim de ajudar quem pretende investir em tais projetos e, deste modo, evitar o «branqueamento ecológico» e sensibilizar para o investimento em projetos sustentáveis, atraindo esse investimento. Por conseguinte, pode criar condições de concorrência equitativas e transparentes para o financiamento ecológico na UE.

1.4.

Por conseguinte, uma definição clara e precisa dos critérios técnicos dispostos no regulamento delegado que cumprem a ambição de uma economia hipocarbónica para a Europa é o requisito fundamental para obter um compromisso razoável, realista e aceitável, sem o risco de branqueamento ecológico. A obtenção deste compromisso é um desafio importante, atendendo a que o regulamento delegado é crucial para a credibilidade da taxonomia, que, por sua vez, é essencial para o êxito deste sistema fundamentalmente voluntário.

1.5.

Assim o CESE entende que as atividades económicas e os projetos definidos no regulamento delegado como «sustentáveis» têm de atrair os investidores da economia real, e pressupõe que os investidores esperarão que um projeto sustentável seja realista, exequível, razoavelmente lucrativo e previsível para os intervenientes no mercado. Por outras palavras, tais projetos devem ser atrativos, sem criar o risco de branqueamento ecológico.

1.6.

De um modo geral, e principalmente para as PME da economia de mercado, o elevado nível de ambição no que se refere a medidas de mitigação das alterações climáticas, bem como os abrangentes requisitos de informação, com projeções a longo prazo sobre a adaptação às alterações climáticas, poderão revelar-se um desafio complexo e oneroso. Esta situação suscitou igualmente a questão de um reconhecimento mais amplo das soluções transitórias como via verde para assegurar uma transição harmoniosa. No entanto, é imperativo evitar efeitos de dependência.

1.7.

O CESE toma nota das preocupações dos intervenientes da economia real quanto aos efeitos negativos do regulamento delegado sobre as possibilidades de financiamento e respetivos custos. Por conseguinte, o Comité sublinha a importância de um controlo adequado pelas autoridades de fiscalização, a fim de evitar efeitos de distorção nos mercados financeiros, em especial tendo em conta o alargamento do âmbito dos critérios de taxonomia, que passam a incluir, por exemplo, a divulgação de informações não financeiras e a proposta de norma da UE para as obrigações verdes.

1.8.

O CESE assinala também o risco de custos demasiado elevados na aplicação dos critérios de taxonomia definidos no regulamento delegado. Por este motivo, o CESE salienta a necessidade de desenvolver seguros ecológicos para as PME, a fim de reduzir este risco de custos.

1.9.

O regulamento delegado estabelece normas ambientais que são, muitas vezes, mais ambiciosas do que as constantes da legislação setorial da UE. Tendo em conta a necessidade de clareza e de atratividade já mencionada, esta dualidade normativa pode gerar confusões, incluindo problemas de financiamento para os intervenientes que cumprem as normas ambientais mais rigorosas previstas na legislação setorial da UE. O CESE concorda que é necessária uma ambição elevada, mas, por razões de ordem prática e para evitar confusões, recomenda que as normas ambientais mais elevadas definidas na legislação de nível 1 da UE sejam aplicadas à taxonomia. Acresce ainda que o regulamento delegado (ato de nível 2) parece também incluir algumas disposições incoerentes, pouco claras ou que não foram objeto de uma avaliação exaustiva. Estes aspetos, em conjugação com o exposto, em particular, nos pontos 1.5 a 1.10, levam o CESE a questionar se o regulamento delegado, na sua forma atual, é adequado ao fim a que se destina, apesar do objetivo louvável. O CESE recomenda vivamente à Comissão que apresente propostas para reforçar as normas da legislação ambiental da UE.

1.10.

O CESE vê com bons olhos iniciativas que visem melhorar o sistema de taxonomia em conformidade com o acima disposto, a fim de ampliar a sua abrangência e de reforçá-lo enquanto forma de apoiar os objetivos da política climática da UE, através da aplicação eficiente da legislação ambiental da UE, instando a Comissão a empreender iniciativas adicionais nesse sentido. O Comité toma nota de que continua em aberto a questão importante da taxonomia da UE para as atividades que prejudicam o clima e o ambiente. É urgente resolver esta questão.

2.   Contexto

2.1.

Em 21 de abril de 2021, a Comissão Europeia lançou o pacote Financiamento Sustentável («o pacote»), composto pelos seguintes elementos:

A Comunicação da Comissão — Taxonomia da UE, divulgação de informações sobre sustentabilidade das empresas, preferências em termos de sustentabilidade e deveres fiduciários: Direcionar as atividades financeiras para os objetivos do Pacto Ecológico Europeu (3);

Um regulamento delegado, que complementa dois dos seis objetivos ambientais fixados nos artigos 10.o e 11.o do Regulamento (UE) 2020/852 do Parlamento Europeu e do Conselho (4) (designado por «o Regulamento Taxonomia»), através de critérios técnicos de avaliação, a fim de determinar as condições em que se considera que uma atividade económica específica contribui substancialmente para a mitigação das alterações climáticas (artigo 10.o) e contribui substancialmente para a adaptação às alterações climáticas (artigo 11.o), bem como critérios para determinar se uma atividade económica prejudica significativamente os objetivos ambientais (artigo 17.o). O regulamento delegado foi formalmente adotado em 4 de junho de 2021;

Uma proposta relativa a uma nova Diretiva sobre a comunicação de informações sobre a sustentabilidade das empresas;

Atos delegados alterados ao abrigo da Diretiva Mercados de Instrumentos Financeiros (MiFID II) e da Diretiva sobre a distribuição de seguros (DDS), que estabelecem que a sustentabilidade passa a fazer parte das informações a prestar aos clientes antes das decisões de investimento;

Outras alterações de atos delegados relacionados com deveres fiduciários e de atos delegados relativos à gestão de ativos, a seguros, a resseguros e a investimentos, com vista a incluir os riscos de sustentabilidade no valor dos investimentos.

3.   Observações na generalidade

3.1.

De acordo com a comunicação, o pacote destina-se a incentivar investimentos privados em projetos sustentáveis e a mobilizar os amplos recursos financeiros necessários à consecução do objetivo de neutralidade climática estabelecido no Pacto Ecológico, para além dos recursos que visam ajudar a economia europeia a recuperar da crise da COVID-19.

3.2.

A comunicação realça a importância do regulamento delegado para a determinação dos critérios que definem as atividades económicas ecológicas com um contributo substancial para os objetivos do Pacto Ecológico.

3.3.

O CESE acolhe favoravelmente o pacote e sublinha que o regulamento delegado poderá desempenhar um papel fundamental na criação de um quadro claro, coerente e abrangente para permitir o desenvolvimento ambicioso de uma economia mais verde, sem efeitos de dependência e dotada de critérios técnicos claros e transparentes, definindo os investimentos ecológicos que contribuem diretamente para os objetivos climáticos da Europa e pelos quais se podem alinhar as práticas dos setores comerciais em causa e do setor financeiro.

3.4.

O CESE sublinha a urgência de adotar medidas eficazes para fazer face às alterações climáticas e reduzir as emissões, nos termos da Lei do Clima da UE e à luz do sexto relatório (5) do PIAC. Por esta mesma razão, é essencial utilizar instrumentos eficientes, facilmente aplicáveis, inovadores e produtivos, a fim de obter resultados rápidos e mensuráveis. A avaliação do regulamento delegado deve ser efetuada neste espírito.

3.5.

Por conseguinte, uma definição clara e precisa dos critérios técnicos dispostos no regulamento delegado que cumprem a ambição de uma economia hipocarbónica para a Europa é o requisito fundamental para obter um compromisso razoável, realista e aceitável, sem o risco de branqueamento ecológico. A obtenção deste compromisso é um desafio importante, atendendo a que o regulamento delegado é crucial para a credibilidade da taxonomia, que, por sua vez, é essencial para o êxito deste sistema fundamentalmente voluntário.

3.6.

O CESE saúda, contudo, a ambição do regulamento delegado de estabelecer uma norma uniforme da UE que defina as atividades que podem ser consideradas como contribuindo substancialmente para a mitigação das alterações climáticas ou para a adaptação às mesmas. A definição de critérios técnicos deverá proporcionar um enquadramento claro para que os investimentos ecológicos criem condições de concorrência equitativas nos mercados financeiros e evitar projetos de «branqueamento ecológico». As opiniões dividem-se no que toca ao âmbito e à utilidade de opções transitórias. O CESE é de opinião que os critérios técnicos devem proporcionar possibilidades mais amplas de reconhecer as soluções transitórias como uma via que permite uma transição harmoniosa. É imperativo evitar efeitos de dependência.

3.7.

O CESE assinala que a comunicação refere que o regulamento delegado deve ser visto como um documento dinâmico, que evoluirá ao longo do tempo, tanto em termos do seu âmbito como do seu nível.

3.8.

O CESE reconhece, pois, a importância do regulamento delegado para assegurar a transparência de atividades que satisfazem os critérios estipulados e que atraem investidores interessados em investir em projetos sustentáveis. Consequentemente, o regulamento delegado constitui a base para definir uma atividade económica enquanto ambientalmente sustentável, bem como para aplicar as disposições obrigatórias em matéria de transparência e divulgação previstas no Regulamento Taxonomia. Poderá ser importante para sensibilizar para investimentos em projetos sustentáveis, atrair esses investimentos, bem como para prevenir o «branqueamento ecológico».

3.9.

O regulamento delegado é descrito como uma ferramenta de transparência e integra um sistema voluntário, na medida em que os operadores de mercado não estão obrigados a respeitar as normas definidas nesse ato, do mesmo modo que os investidores também não são obrigados a investir em atividades económicas ou projetos que cumpram tais normas.

3.10.

Nesse sentido, e conforme já indicado, as atividades económicas e projetos definidos como sustentáveis nos termos do regulamento delegado devem ser claros para serem atrativos para os investidores da economia real. É também razoável assumir que os investidores vão investir em projetos ecológicos sustentáveis que sejam realistas, lucrativos e previsíveis. As expectativas em matéria de rentabilidade poderão variar, e serão frequentemente mais conservadoras (5-6 % em vez dos habituais 11-15 %) em situações de financiamento através de cooperativas ou de bancos detidos a nível local ou regional. De um modo geral, uma maior rentabilidade atrairá grandes fluxos de capital, ao passo que a escolha de bancos cooperativos ou regionais deverá, normalmente, estar relacionada com projetos em pequena escala.

3.11.

É fundamental que os critérios estabelecidos no regulamento delegado, para determinar se uma atividade económica ou projeto podem ser considerados ambientalmente sustentáveis, se afigurem realizáveis a um custo adequado, lucrativos e razoavelmente previsíveis ou, por outras palavras, comercialmente atrativos. No entanto, neste contexto, é importante ter em conta que, em especial, as PME podem necessitar frequentemente de apoio para gerir a transição ecológica. Ainda assim, a taxonomia em si deve limitar-se aos critérios técnicos.

3.12.

Se a taxonomia não satisfizer os critérios referidos nos dois pontos acima, as perspetivas de todo o projeto podem ser colocadas em questão. Um sistema voluntário tem de ser atrativo para gerar a transformação pretendida.

3.13.

Com base nos elementos centrais acima expostos, várias das disposições do regulamento delegado parecem ser questionáveis. De um modo geral, o elevado nível de ambição no que se refere a medidas de mitigação das alterações climáticas, bem como os abrangentes requisitos de informação, com projeções a longo prazo sobre a adaptação às alterações climáticas, poderão revelar-se demasiado difíceis de concretizar, excessivamente complexos, onerosos ou pouco lucrativos, excetuando para um pequeno número de intervenientes de enorme dimensão. Acresce ainda que não é dada a devida atenção aos efeitos práticos, sobretudo no que se refere às PME. Esta situação comprometeria o elevado nível de aceitação desejável, causando, simultaneamente, dificuldades financeiras às empresas que cumprem a legislação ambiental aplicável da UE mas não o regulamento delegado. Por este motivo, o CESE salienta a necessidade de desenvolver seguros ecológicos para as PME, a fim de reduzir este risco de custos. São indicados adiante («Observações na especialidade») alguns exemplos do que precede.

3.14.

Os intervenientes na economia real manifestaram a sua preocupação com a possibilidade de os critérios técnicos estabelecidos no regulamento delegado darem origem a dificuldades de financiamento no que diz respeito a atividades que não cumprem o regulamento. O CESE concorda que poderá existir esse risco, tendo em conta que o âmbito da taxonomia está a ser alargado de modo a servir de base para a divulgação de informações não financeiras, nos termos do artigo 8.o do Regulamento Taxonomia, bem como para a proposta de norma da UE para as obrigações verdes (6).

3.15.

Assim, o CESE sublinha a importância de as autoridades de fiscalização acompanharem a aplicação do regulamento delegado, a fim de evitar efeitos discriminatórios para as possibilidades de crédito e os custos de crédito no que diz respeito às empresas que não cumprem os critérios de taxonomia. Esses intervenientes devem continuar a beneficiar de um tratamento justo quando captam os meios financeiros necessários.

3.16.

Neste contexto, o CESE remete para um relatório pericial do Conselho Consultivo Científico do Ministério das Finanças alemão, o qual indica que é muito difícil tentar orientar a utilização dos fluxos de capitais na economia real através da regulação financeira, na medida em que tal exigiria legislação de grande alcance, pormenorizada e muito completa, e que essa taxonomia comporta o risco de uma complexidade elevada e de custos burocráticos excessivos (7).

3.17.

Os únicos elementos obrigatórios do pacote, no que a este parecer diz respeito, são as disposições relativas à transparência constantes dos artigos 4.o a 7.o do Regulamento Taxonomia e os atos delegados alterados referentes aos mercados de instrumentos financeiros, à distribuição de seguros e aos vários deveres fiduciários relacionados com a sensibilização para as possibilidades e riscos inerentes aos investimentos sustentáveis e com a missão de garantir que os clientes e potenciais clientes estão suficientemente informados a esse respeito.

3.18.

Os atos delegados relativos aos mercados financeiros afiguram-se adequados à respetiva finalidade e, por conseguinte, são ferramentas apropriadas para sensibilizar para os investimentos sustentáveis e para abrir caminho à canalização de recursos altamente necessários para esses investimentos.

3.19.

O regulamento delegado estabelece normas ambientais que são, muitas vezes, mais ambiciosas do que as constantes da legislação setorial da UE. Tendo em conta a necessidade de clareza mencionada no ponto 3.6, esta dualidade normativa pode gerar confusões, incluindo problemas de financiamento para os intervenientes que cumprem as normas ambientais mais rigorosas previstas na legislação setorial da UE. O CESE concorda que é necessário um nível de ambição elevado. Contudo, por razões de ordem prática e para evitar confusões, para que a taxonomia também possa cumprir eficientemente a sua obrigação de assegurar a transparência dos produtos financeiros e prevenir o «branqueamento ecológico», recomenda que se lhe apliquem as normas ambientais mais elevadas previstas na legislação de nível 1 da UE. Estes motivos, em conjugação com o exposto nos pontos 3.6 e 3.13 a 3.16, levam o CESE a questionar se o regulamento delegado (ato de nível 2), na sua forma atual, é adequado ao fim a que se destina (8), apesar do objetivo louvável. O CESE recomenda vivamente à Comissão que apresente propostas para reforçar as normas da legislação ambiental da UE.

3.20.

É sobejamente sabido que os produtos financeiros ecológicos são também atrativos para os mercados financeiros. Assim sendo, o CESE louva o objetivo da taxonomia de proporcionar transparência, prevenir o «branqueamento ecológico» e chamar a atenção para os referidos produtos, mas salienta o risco de se gerarem efeitos de bolha perniciosos nos mercados financeiros.

3.21.

O CESE vê com bons olhos iniciativas que visem melhorar o sistema de taxonomia em conformidade com o acima disposto, a fim de ampliar a sua abrangência e de reforçá-lo enquanto importante forma de prestar apoio aos objetivos acordados da política climática da UE, através da aplicação eficiente da legislação ambiental da UE, instando a Comissão a empreender iniciativas adicionais nesse sentido.

3.22.

O Comité toma nota de que continua em aberto a questão importante da taxonomia da UE para as atividades que prejudicam o clima e o ambiente. É urgente resolver esta questão.

4.   Observações na especialidade

O regulamento delegado

4.1.

O CESE destaca o papel fundamental das energias renováveis na transição para a sustentabilidade e chama a atenção para a necessidade de assegurar soluções transitórias adequadas, como as que são necessárias, nomeadamente, para assegurar o bom funcionamento das cadeias de valor logísticas, prestando simultaneamente atenção à necessidade imperiosa de evitar efeitos de dependência.

4.2.

O ponto 6.3 do anexo 1 do regulamento delegado parece estabelecer que os autocarros que satisfaçam o critério de emissões nulas (medidas no tubo de escape) apenas serão considerados sustentáveis se forem explorados em tráfego urbano e suburbano, ao passo que outras formas de exploração de autocarros apenas são elegíveis para as chamadas atividades de transição, até 31 de dezembro de 2025, se corresponderem à categoria mais elevada da classe EURO (EURO VI). Se não for esse o caso, aplicar-se-á o critério de emissões nulas (medidas no tubo de escape), embora o texto dê a entender que essa atividade apenas será considerada uma atividade de transição sob reserva de uma reavaliação, pelo menos a cada três anos, nos termos do artigo 19.o do Regulamento Taxonomia. Ao que parece, não é feita qualquer referência às normas estabelecidas na Diretiva Veículos Não Poluentes. Atendendo à incerteza em torno da situação após 31 de dezembro de 2025, quem é que ousaria investir numa empresa de transporte por autocarro? O facto de os requisitos ambientais mais rigorosos da legislação da UE — EURO VI — serem classificados como uma atividade de transição causa estranheza e é suscetível de gerar confusão.

4.2.1.

Os veículos comerciais pesados (categorias N2 e N3) utilizados em serviços de transporte rodoviário de mercadorias (secção 6.6) são considerados sustentáveis se forem elegíveis como veículos com emissões nulas ao abrigo do artigo 3.o, ponto 11, do Regulamento (UE) 2019/1242 do Parlamento Europeu e do Conselho (9), com emissões inferiores a 1 g CO2/km, ou, no que se refere aos veículos com mais de 7,5 toneladas em relação aos quais, «do ponto de vista tecnológico e económico, não [seja] possível» alcançar emissões nulas, são considerados atividade de transição se respeitarem as normas de emissões reduzidas previstas no artigo 3.o, ponto 12, do mesmo regulamento. Aos veículos comerciais ligeiros com uma carga máxima de até 3,5 toneladas (N1) são aplicáveis emissões nulas (medidas no tubo de escape). Todos os outros serviços de transporte rodoviário de mercadorias são considerados de transição.

4.2.2.

O tratamento dos veículos comerciais pesados revela uma abordagem pragmática que deveria ter sido mais recorrente no regulamento delegado. O requisito de emissões nulas (medidas no tubo de escape) para veículos comerciais ligeiros (N1), previsto na secção 6.6, parece ser incoerente com a secção 6.5 sobre transporte em motociclos, veículos ligeiros de passageiros e veículos comerciais, nos termos da qual, e sem motivo aparente, são aplicáveis disposições menos exigentes.

4.2.3.

No seu todo, o tratamento diferenciado de veículos rodoviários afetos a atividades diferentes afigura-se incoerente e atabalhoado, sem que seja fornecida uma explicação para a abordagem altamente divergente em contextos diferentes.

4.3.

Uma disposição recorrente da secção 6 (Transporte) do anexo 1 exclui os veículos ou as embarcações dedicados ao transporte de combustíveis fósseis, dado que o acesso a estes não deve ser facilitado. No entanto, segundo o considerando 35, também pode ser avaliada a «possibilidade de utilizar» esse requisito. Afigura-se questionável inserir um requisito cuja utilidade suscite dúvidas. Acresce ainda que o requisito não é claro. Um veículo pode transportar tanto combustíveis fósseis como alternativos. Não resulta claro se o requisito se refere à construção ou à utilização, pelo que nem a interpretação nem o impacto são claros.

4.4.

As disposições constantes dos pontos 1.1, 1.2 e 1.3 do anexo 1 fornecem exemplos adicionais, designadamente no que toca a análises dos benefícios climáticos, que vêm juntar-se a requisitos relativos a planos de florestação, recuperação e gestão florestal, aplicáveis a pequenas explorações de 13 hectares. Os requisitos afiguram-se bastante complexos e a referência à disponibilidade de ferramentas fornecidas pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura não deverá servir de consolo aos pequenos agricultores, sendo demonstrativa da situação desvantajosa em que se encontram as pequenas explorações em resultado da abordagem descendente adotada pelo regulamento delegado.

4.5.

Obviamente que a preservação das florestas, incluindo dos sumidouros de carbono, é um elemento indispensável da política ambiental da UE, mas as obrigações administrativas devem ser proporcionais aos recursos das partes visadas. Os princípios aplicados pelo Conselho de Gestão Florestal constituem um exemplo de princípios claros e razoáveis para a exploração e gestão das florestas (10).

4.6.

No que se refere à adaptação às alterações climáticas, pode fazer-se referência às disposições do ponto 1.3 do anexo 2, relativo à gestão florestal, e do ponto 6.3 sobre transporte rodoviário de passageiros a nível urbano, suburbano e interurbano, que prevê uma análise dos efeitos climáticos dos grandes investimentos, no âmbito de projeções de 10 a 30 anos.

4.7.

A indicação, na comunicação, de que a taxonomia não aceita atividades que melhorem os níveis atuais de desempenho ambiental sem darem um contributo substancial é contrária ao artigo 10.o, n.o 2, do Regulamento Taxonomia. Por conseguinte, como já proposto, há que conceder mais espaço às soluções transitórias.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Regulamento Delegado da Comissão que complementa o Regulamento (UE) 2020/852 do Parlamento Europeu e do Conselho mediante o estabelecimento de critérios técnicos de avaliação para determinar em que condições uma atividade económica é qualificada como contribuindo substancialmente para a mitigação das alterações climáticas ou para a adaptação às alterações climáticas e estabelecer se essa atividade económica não prejudica significativamente o cumprimento de nenhum dos outros objetivos ambientais [C(2021) 2800 final].

(2)  «Climate Change 2021 — The Physical Science Basis» [Alterações climáticas em 2021 — Elementos de ciências físicas], 2021.

(3)  COM(2021) 188 final.

(4)  Regulamento (UE) 2020/852 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de junho de 2020, relativo ao estabelecimento de um regime para a promoção do investimento sustentável, e que altera o Regulamento (UE) 2019/2088 (JO L 198 de 22.6.2020, p. 13).

(5)  «Climate Change 2021 — The Physical Science Basis» [Alterações climáticas em 2021 — Elementos de ciências físicas], 2021.

(6)  Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às obrigações verdes europeias [COM(2021) 391 final — 2021/0191 (COD)].

(7)  «Grüne Finanzierung und Grüne Staatsanleihen — Geeignete Instrumente für eine wirksame Umweltspolitik?» [Financiamento verde e obrigações do Tesouro verdes: Instrumentos adequados para uma política ambiental eficaz?] — Wissenschaftlicher Beirat beim Bundesministerium der Finanzen [Conselho Consultivo Científico do Ministério das Finanças alemão], parecer 2/2021.

(8)  «Sustainable finance — Eine kritische Würdigung der deutschen und europäischen Vorhaben» [Financiamento sustentável — Uma avaliação crítica do projeto alemão e europeu], IKH — Câmara de Comércio e Indústria de Munique e Alta Baviera, Leibniz — Instituto de investigação científica da Universidade de Munique, 2020.

(9)  Regulamento (UE) 2019/1242 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, que estabelece normas de desempenho em matéria de emissões de CO2 dos veículos pesados novos e que altera os Regulamentos (CE) n.o 595/2009 e (UE) 2018/956 do Parlamento Europeu e do Conselho e a Diretiva 96/53/CE do Conselho (JO L 198 de 25.7.2019, p. 202).

(10)  www.fsc.org


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/78


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a estratégia da UE em matéria de luta contra o tráfico de seres humanos 2021-2025

[COM(2021) 171 final]

(2021/C 517/12)

Relator:

Carlos Manuel TRINDADE

Consulta

Comissão Europeia, 31.5.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

7.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

215/1/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O tráfico de seres humanos (tráfico SH) constitui primeiro que tudo uma grave violação dos direitos humanos. Viola direitos fundamentais como a liberdade, a dignidade e a igualdade consagrados em inúmeros instrumentos como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia ou o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

1.2.

As raízes profundas do tráfico SH residem na vulnerabilidade das vítimas, causada pela pobreza, as desigualdades de género e a violência perpetrada contra as mulheres e as crianças, as situações de conflito e pós-conflito, a falta de integração social, a falta de oportunidades e de emprego, a falta de acesso à educação e o trabalho infantil.

1.3.

Os traficantes aproveitam-se destas situações de vulnerabilidade para desenvolver um modelo de negócio criminoso, complexo e altamente lucrativo, que ainda hoje é de baixo risco e alta rendibilidade.

1.4.

A pandemia agravou a situação de vulnerabilidade económica e social e dificultou o acesso à justiça e a punição dos crimes. Paralelamente, desenvolveu-se um novo modelo de negócio de recrutamento e de exploração das vítimas através da Internet.

1.5.

O CESE apoia na generalidade a Estratégia da UE em matéria de luta contra o tráfico de seres humanos 2021-2025 («Estratégia»), apresentada pela Comissão Europeia («Comissão»), sem prejuízo dos comentários, propostas e recomendações que são apresentadas no presente parecer.

1.6.

O CESE acompanha a Comissão quando afirma que é necessário melhorar a qualidade dos dados recolhidos sobre este fenómeno de forma harmonizada nos Estados Membros (1). A luta contra o tráfico SH requer um conhecimento rigoroso, profundo e atempado do fenómeno, em particular, de todos os atores (vítimas, traficantes, utilizadores) e do modus operandi das redes de tráfico, forma de atribuir maior eficácia a essa luta, muito em especial, na elaboração de respostas adequadas. Não agindo desta forma, subestima-se e desvaloriza-se a real dimensão deste tráfico.

1.7.

O CESE regista que as medidas de combate ao tráfico SH não têm sido suficientemente eficazes, sendo necessário intensificar esse combate, numa estratégia mais abrangente, tomando novas medidas (2).

1.8.

O CESE apoia a possibilidade de a Diretiva Antitráfico ser revista em resultado da avaliação da sua aplicação, mas, no combate ao tráfico SH, o aperfeiçoamento dos meios sancionatórios é necessário, mas não é suficiente.

1.9.

O CESE sublinha e apoia a intenção de estabelecer normas mínimas a nível da UE que criminalizem as redes envolvidas no tráfico e exploração de seres humanos, bem como «a utilização de serviços que decorrem da exploração das vítimas de tráfico». Será essencial abranger a criminalização de toda a cadeia de contratação e de subcontratação que envolve o processo de tráfico e exploração de seres humanos.

1.10.

O CESE considera que o combate ao tráfico SH, para ser mais eficaz, tem de assentar numa análise mais abrangente, que valorize a dimensão social do contexto que permite o seu aumento, a qual só pontualmente é considerada no desenho da Estratégia.

1.11.

O CESE regista também (3) que há uma ligação entre o desenvolvimento do tráfico nos países de baixos rendimentos e o tráfico de crianças, «a maioria delas para alimentar o trabalho infantil», situação associada aos problemas de subsistência das famílias.

1.12.

O CESE considera que o imenso sofrimento das vítimas deve levar à abordagem humanista da sua situação em todas as fases. A perspetiva dominante da Estratégia não se pode reduzir ao repatriamento ou ao incitamento ao regresso voluntário ao país de origem, subestimando as condições que aí encontrariam e que as tornariam mais vulneráveis aos traficantes, devendo abranger também o reconhecimento do direito à integração na sociedade de acolhimento.

1.13.

O CESE constata que não existe nenhuma medida que aponte no sentido do reconhecimento e efetivação dos direitos das vítimas, nem para a concessão imediata de assistência, apoio e proteção (médica, legal, entre outras), nomeadamente quanto a quaisquer formas de sancionamento por parte de quem as explora. O CESE propõe à Comissão que integre esta proposta na Estratégia.

1.14.

O CESE nota que na Estratégia se reconhece as dificuldades que as vítimas enfrentam para reconstruírem as suas vidas e que as oportunidades para a sua inclusão nos mercados de trabalho são escassas, mas regista que nada se prevê no sentido de mudar esse estado de coisas (4). O CESE propõe, para solucionar esta situação, que às vitimas deva ser atribuído o direito à sua integração na sociedade de acolhimento através de um processo de integração adequado e célere.

1.15.

A legislação da UE só prevê a possibilidade de ser concedido à vítima um título de permanência/residência no caso de colaborarem na investigação e no processo penal contra os traficantes. O CESE chama a atenção que esta situação pode ser extremamente penalizadora para as vítimas, obrigando-as a reviver toda a experiência e traumas que sofreram, sem respeito pela sua saúde física e mental. O CESE propõe que estas situações sejam consideradas de forma singular, conforme a circunstância e o perfil psicológico de cada vítima, sendo que estas devem ter, entre outros, um forte apoio psicológico para conseguirem reviver e testemunhar os traumas que sofreram.

1.16.

O CESE considera positivamente a posição da Comissão de defesa da não punição das vítimas pelos crimes que foram obrigadas a cometer e a reanálise numa lógica de proteção das vítimas da diretiva de 2004 do Conselho no que respeita aos títulos de residência para as vítimas de tráfico SH.

1.17.

O CESE propõe que, nesta matéria, todas as vítimas do crime de tráfico SH sejam devidamente indemnizadas por um fundo público, tendo em conta a gravidade do sofrimento que lhes foi infligido. Nos casos de exploração laboral terão, nomeadamente, também direito a receberem os créditos vencidos pelo trabalho realizado, devendo ainda ser responsabilizado o beneficiário direto, isto é, o empregador último, ou, em casos concretos, o beneficiário do serviço prestado quando as «cadeias de abastecimento» se constituem como labirinto inexpugnável.

1.18.

O CESE considera que faz falta, na legislação europeia em matéria de imigração, a consideração da situação dos imigrantes económicos menos qualificados e mais pobres que chegam à Europa em busca de melhores condições de vida e de trabalho (o que já foi feito para os imigrantes mais qualificados ou com mais recursos económicos). Esta falta tem contribuído para que os migrantes económicos se envolvam com as redes de tráfico SH devido à ausência de mecanismos que permitam a sua imigração de forma regular. O CESE recomenda às instituições europeias que seja estabelecida legislação europeia que solucione esta situação.

1.19.

O CESE considera que integrar na Estratégia uma dimensão internacional (5) atribui maior eficácia ao combate ao tráfico SH. Porém, constata que se atribui pouco relevo à necessidade de, nos países de origem, existirem condições económicas e sociais dignas e suficientes (6) para as populações, condição principal para dificultar ou impedir o recrutamento das vítimas de tráfico. O CESE propõe que se valorize e integre na Estratégia a dimensão de cooperação para o desenvolvimento e a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas como principais formas de se criarem tais condições estruturais.

1.20.

O CESE constata que, no âmbito da atividade económica e quanto ao tráfico SH para exploração laboral, não existe na Estratégia qualquer referência à concorrência desleal praticada por empresa que utilizam esta mão de obra face às restantes empresas que exerçam a sua atividade no respeito pela legislação. Esta situação de dumping social é incompatível com a responsabilidade social das empresas e deve ser tratada, para além dos campos policiais e jurídicos, também no campo do diálogo social.

1.21.

O CESE nota que, tendencialmente, existe um maior recurso a esta mão de obra nos setores de atividade económica onde se pratica uma maior informalidade e onde é generalizada a inexistência de diálogo social, negociação coletiva e contratação coletiva. O CESE propõe à Comissão que, para melhor combater a exploração laboral, seja integrado na Estratégia o envolvimento ativo dos parceiros sociais no combate ao tráfico SH, de acordo com as suas competências e respeitando a sua autonomia, e, consequentemente, a promoção do diálogo social e contratação coletiva, enquanto instrumentos essenciais para esse fim.

1.22.

O CESE saúda a próxima iniciativa da Comissão sobre a governação sustentável das empresas, em particular assegurando que os contratos públicos incentivem a transparência e sejam socialmente responsáveis (7). O CESE nota que vários acordos coletivos já foram celebrados a nível nacional com o objetivo de prevenir situações de abusos e tráfico no local de trabalho e prevendo indemnizações às vítimas (8). O CESE recomenda que a Estratégia integre estes exemplos de boas práticas, que devem ser promovidos e replicados nos Estados-Membros como forma concreta para a existência dessa transparência.

1.23.

O CESE saúda o empenho da Comissão em adensar a Diretiva Sanções Aplicáveis aos Empregadores (que não cumpram a legislação aplicável), o que permitirá agravar as sanções que lhes são aplicáveis (9).

1.24.

O CESE constata que, na Estratégia, há uma ausência de referência à importante participação das organizações da sociedade civil e dos parceiros sociais, em especial dos sindicatos. O papel e as atividades que estas organizações têm realizado ao longo dos anos, especialmente nas dimensões de tráfico para exploração sexual, laboral e de crianças, identificando, denunciando e combatendo as situações e apoiando ativamente as vítimas, devem ser devidamente registados e valorizados. O CESE propõe que esta participação seja incorporada na Estratégia e que estas organizações sejam devidamente apoiadas, incluindo financeiramente.

1.25.

O CESE constata também que não é referida, na Estratégia, a ação de apoio importante que as organizações da sociedade civil, as redes comunitárias de solidariedade e os parceiros sociais realizam para proteger, acolher e integrar as vítimas, bem como a necessidade de apoio financeiro para realizarem estas atividades. O CESE propõe à Comissão que integre esta proposta na Estratégia.

1.26.

O CESE subescreve a orientação em como, neste combate, é necessário envolver, além da Europol e da Eurojust, a Autoridade Europeia de Trabalho («AET»), em estreita colaboração com as autoridades nacionais, em especial as inspeções de trabalho, reforçando as suas competências, bem como dotando-a de meios materiais, especialmente digitais e formais. Assim, o CESE propõe à Comissão que na Estratégia se proponha aos Estados-Membros que respeitem os rácios estabelecidos na Convenção 81.o da Organização Internacional do Trabalho (OIT) (10).

2.   Contexto

2.1.

Vemos, ouvimos e lemos e não podemos ignorar que o tráfico SH se traduz num imenso sofrimento para as vítimas, atinge a sua dignidade, priva-as de liberdade, destrói as suas vidas. O CESE e todos os seus membros, bem como todos os cidadãos da União Europeia têm consciência profunda de quão terrível é o tráfico SH e das consequências nefastas para as vítimas, sendo com elas solidários, apoiando todas as medidas para o combater e eliminar.

2.2.

Os estudos e relatórios têm vindo a aprofundar o conhecimento deste fenómeno, contribuindo para aperfeiçoar as estratégias de resposta, mas, apesar disso, o tráfico SH põe em perigo milhares de pessoas todos os anos, especialmente mulheres e crianças. Assim, verifica-se que:

i)

entre 2017-2018, foram registadas mais 14 000 vítimas, podendo o número ser maior, porque há dificuldades de registo,

ii)

quase metade das vítimas são cidadãos da UE e as restantes de países terceiros de África, dos Balcãs Ocidentais e Ásia (11),

iii)

a maioria das vítimas são mulheres e raparigas traficadas para exploração sexual,

iv)

a exploração laboral afeta 15 % das vítimas, mas a maioria das vítimas não é detetada,

v)

os principais setores do tráfico SH para exploração laboral são: agricultura/silvicultura; construção civil; hotelaria/restauração; limpezas; domésticas; indústrias transformadoras (têxtil, vestuário, alimentação (12)),

vi)

a maioria dos traficantes são cidadãos da UE,

vii)

este crime gera elevados lucros para os traficantes, estimando-se, em 2015, em 29,4 mil milhões de euros, sendo cerca de 14 mil milhões de euros da exploração sexual (13) e não tem em conta o tráfico para exploração laboral (14),

viii)

os custos económicos com o tráfico SH, em 2020, atingem 2,7 mil milhões de euros;

ix)

os traficantes aproveitam-se das desigualdades sociais, bem como da vulnerabilidade económica e social das pessoas,

x)

quase um quarto de todas as vítimas de tráfico SH são crianças e são traficadas para exploração sexual (15),

xi)

a exploração das vítimas de tráfico SH assume principalmente as seguintes formas: sexual; trabalho forçado; criminalidade forçada; mendicidade forçada; tráfico de crianças (16).

2.3.

A Estratégia em matéria de luta contra o tráfico de seres humanos 2021-2025 (17) surge num contexto marcado, por um lado, por uma consciência crescente de que o combate ao tráfico SH é uma exigência para a UE em virtude do seu empenhamento na defesa da dignidade humana e nos direitos humanos, e por outro, de que o tráfico SH tem continuado a crescer.

2.4.

A UE tem vindo a fazer desde 2002 um caminho de exigência crescente, que a proposta de Estratégia pretende prosseguir (18).

2.5.

A aprovação da Diretiva 2011/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (19) representou um enorme avanço no que se refere à luta contra o tráfico, vindo a ser justamente designada como Diretiva Antitráfico. O que se entende por tráfico SH foi-se tornando mais denso e abrangente.

2.6.

A diretiva adotou um conceito mais amplo de tráfico SH, passando a incluir novas formas de exploração das pessoas vítimas de tráfico. O CESE chama uma particular atenção para o seu n.o 2 — Infrações relativas ao tráfico de seres humanos, que estabelece as linhas fundamentais para o combate ao tráfico SH.

2.7.

O CESE recorda que tem um relevante acervo de pareceres sobre o tráfico SH, cujas conclusões, na generalidade, contribuíram, aquando da respetiva elaboração, para o combate a este flagelo (20).

2.8.

É neste contexto que a Comissão apresenta esta proposta de Estratégia, que está estruturada em seis capítulos, em cada um dos quais a Comissão assume os seus próprios compromissos (26), e em que convida os Estados-Membros a tomar ações para a aplicarem no respetivo âmbito (16), num total de quarenta e duas atividades previstas na Estratégia.

3.   Observações na generalidade

3.1.   Sobre a necessidade de dados (conhecimento da realidade)

3.1.1.

O CESE sublinha que a Comissão reconhece que o tráfico SH continua a crescer na UE, com um número crescente de vítimas, com custos humanos, sociais e económicos muito elevados, apesar das iniciativas tomadas, e devido, em particular, ao modelo de funcionamento das organizações criminosas.

3.1.2.

O CESE destaca que o número de vítimas identificadas e presumidas traduz a gravidade da situação, mas torna-se necessário reforçar o conhecimento sobre esta realidade, continuando a verificar-se uma dificuldade na obtenção de dados, particularmente num contexto marcado pela pandemia de COVID-19, que está a dificultar o acesso a alguns dados numa situação de forte confinamento de recursos humanos afetos ao setor público e privado.

3.2.   Sobre o combate ao tráfico de SH

3.2.1.

O CESE destaca que a Estratégia privilegia a vertente penal e securitária no combate ao tráfico SH enquanto crime, que coloca no centro da Estratégia, abordando as suas diversas dimensões.

3.2.2.

O CESE regista que a Estratégia valoriza nesse quadro o papel da legislação, destacando a Diretiva Antitráfico, mas reconhece que, apesar do acompanhamento da sua aplicação pela Comissão, a sua transposição é desigual e, sobretudo, que a impunidade dos autores dos crimes subsiste na UE e o número de condenações de traficantes permanece baixo (21).

3.3.   Sobre a dimensão social do combate ao tráfico SH

3.3.1.

O CESE regista que, como se reconhece na comunicação (22), «[a]s jovens e os menores das comunidade ciganas são especialmente vulneráveis à exploração e ao tráfico devido a vários fatores socioeconómicos, como a pobreza pluridimensional (…)».

3.3.2.

O CESE chama a atenção que pessoas que conjuguem pobreza pluridimensional com características próprias (pessoas com deficiência, LGBTI, entre outras) também são particularmente vulneráveis à exploração e ao tráfico de SH.

3.3.3.

O CESE regista também (23) que há uma ligação entre o desenvolvimento do tráfico nos países de baixos rendimentos e o tráfico de crianças, «a maioria delas para alimentar o trabalho infantil», situação associada aos problemas de subsistência das famílias.

3.3.4.

O CESE regista e considera muito positivamente que a AET, as inspeções de trabalho nos Estados-Membros, os parceiros sociais, muitas organizações da sociedade civil e muitos órgãos de comunicação social e redes sociais tenham uma constante ação de denúncia e luta contra o tráfico SH, em especial, partilhando e difundindo informações, denunciando e combatendo situações e procurando todo o tipo de soluções para proteger as vítimas e sancionar os traficantes. O CESE propõe à Comissão que estas intervenções sejam incluídas e valorizadas na Estratégia como exemplos de boas práticas a replicar.

3.3.5.

O CESE recorda que muitas organizações da sociedade civil, que têm tido uma ação extremamente meritória nas várias dimensões de combate e apoio às vítimas (salvação de náufragos, acolhimento de vítimas, apoio à sua integração, entre outras), têm sido, nalguns casos, criminalizadas. O CESE rejeita esta posição e apela à Comissão para que esta situação seja considerada na Estratégia.

3.4.   Sobre os direitos das vítimas

3.4.1.

O CESE considera que a situação das vítimas não é abordada de uma forma coerentemente humanista ao longo da Estratégia.

3.4.2.

O CESE opina que o acesso das vítimas aos seus direitos deve ser uma preocupação central, de acordo com uma abordagem centrada sempre na afirmação da dignidade humana das vítimas e dos seus direitos humanos.

3.4.3.

O CESE subescreve que a situação das vítimas que não são cidadãos da UE é ainda mais difícil. O CESE recorda que existem muitas situações em que as vítimas, sejam cidadãos da UE sejam de países terceiros, podem ficar acessíveis aos traficantes e expostas aos riscos de serem traficadas novamente.

3.5.   Sobre a abrangência da Estratégia e a sua concretização

3.5.1.

O CESE não ignora que, como refere a Comissão, as vítimas são traficadas para a UE em fluxos migratórios mistos através de todas as rotas e das organizações criminosas (24). Porém, a resposta a esta realidade não pode limitar-se a combater a rede de passadores, mas deve ter uma maior abrangência.

3.5.2.

O CESE sublinha que a Estratégia em matéria de luta contra o tráfico SH não pode, por isso, ser dissociada do novo Pacto em matéria de Imigração e Asilo, nem do Plano de Ação sobre a Integração e a Inclusão para 2021-2027 (25). O CESE chama a atenção que também o Plano de Ação para o Pilar Europeu dos Direitos Sociais deve ser considerado enquanto quadro global da estratégia social da UE. O CESE recomenda à Comissão que a Estratégia preveja uma coordenação harmoniosa com outras políticas sociais da UE, criando sinergias e tornando-as mais eficazes.

3.5.3.

O CESE apoia o desenvolvimento da Declaração de Compromisso Conjunto celebrado por 10 agências europeias para trabalharem em conjunto, propondo que, anualmente, sejam apresentados relatórios do trabalho realizado.

3.5.4.

O CESE considera que é positiva a perspetiva de género adotada, bem como várias propostas para melhorar o combate ao tráfico SH quando as vítimas são crianças.

4.   Observações na especialidade

4.1.   Sobre o capítulo 2

4.1.1.

O CESE considera que a proteção das vítimas em todas as fases, em especial, as mulheres e as crianças, tem de ser assegurada de forma eficaz (26), para tal sendo necessário envolver para isso as organizações da sociedade civil para tal vocacionadas e os parceiros sociais em todas as fases do processo.

4.1.2.

O CESE saúda e apoia a posição da Comissão no sentido de que a aplicação da Diretiva Antitráfico tem de ser assegurada em todos os Estados-Membros, devendo a sua revisão apoiar se numa avaliação rigorosa das limitações detetadas e na evolução verificada no tráfico SH, designadamente com o recrutamento e exploração das vítimas através da Internet.

4.1.3.

O CESE considera que a perspetiva dominante na Estratégia deve ser de que as vítimas, querendo, devem ter condições para recuperar o exercício dos seus direitos humanos em pleno, garantindo-lhes, em primeiro lugar, o acesso à proteção e indemnização pelo sofrimento que lhes foi infligido e, designadamente, o acesso ao trabalho com direitos onde se encontram e não de que as vítimas são repatriadas, ou de outra forma devolvidas aos países de origem. A preocupação com a integração das vítimas deve existir quer no caso em que optem por permanecer no país onde se encontram, quer quando livremente escolhem regressar aos países de origem. O CESE replica que deve ser atribuído às vítimas o direito à sua integração na sociedade de acolhimento através de um processo específico de integração célere.

4.1.4.

O CESE saúda o empenho da Comissão em garantir um financiamento adequado para lutar contra o tráfico SH dentro e fora da UE (27).

4.2.   Sobre o capítulo 3

4.2.1.

O CESE saúda a proposta da Comissão que convida os Estados-Membros a considerarem a criminalização da utilização consciente dos serviços impostos às vítimas de tráfico SH (28).

4.2.2.

O CESE propõe que seja promovido o envolvimento dos parceiros sociais nas operações nacionais e transfronteiriças de fiscalização e combate ao tráfico SH e ao trabalho forçado, em articulação com as inspeções de trabalho dos Estados-Membros e a AET. O CESE nota que vários acordos coletivos já foram celebrados a nível nacional com o objetivo de prevenir situações de abusos e tráfico no local de trabalho e prevendo indemnizações às vítimas (29). O CESE recomenda que a Estratégia integre estes exemplos de boas práticas, que devem ser promovidas e replicadas nos Estados-Membros.

4.2.3.

O CESE alerta que se torna necessário analisar também as consequências, em matéria de tráfico SH, da massificação de novas formas de prestação de trabalho e as suas implicações em novas formas de exploração laboral. A Estratégia refere corretamente o uso de redes digitais, mas parece ter em vista mais o tráfico para a exploração sexual e não tanto para a exploração laboral, nomeadamente, através da utilização das plataformas digitais. O CESE recomenda que a Estratégia tenha uma visão abrangente nesta abordagem.

4.2.4.

O CESE apoia o compromisso da Comissão em assegurar a ausência de trabalho forçado nas cadeias de valor das empresas europeias, bem como que as cadeias de abastecimento das empresas da UE não incorporem trabalho infantil (30).

4.3.   Sobre o capítulo 4

4.3.1.

O CESE subescreve a constatação em como a criminalidade organizada procura penetrar na atividade económica legal e os riscos daí inerentes para a própria sociedade, sendo necessário para a combater, nomeadamente, a utilização sistemática de investigações financeiras nas investigações policiais, bem como o desenvolvimento e aplicação de um quadro sólido para identificar, apreender e confiscar os produtos dos crimes (31).

4.3.2.

O CESE subescreve a necessidade de reforçar as capacidades para combater o tráfico, através da formação sistemática dos profissionais da justiça e dos profissionais responsáveis pela aplicação da lei, não esquecendo que a formação deve ter sempre em conta a perspetiva e as necessidades das vítimas (32). O CESE chama especialmente a atenção para a necessidade de reforço dos recursos humanos dos serviços que tratam desta matéria.

4.3.3.

O CESE considera que o combate ao modelo de negócio de recrutamento e exploração das vítimas através da Internet exige o cumprimento das obrigações legais já impostas às plataformas e um diálogo com as empresas tecnológicas e do setor da Internet para reduzir a sua utilização para recrutar e explorar vítimas (33). O CESE considera que o Observatório Europeu de Meios de Comunicação Digital (34) poderá vir a constituir uma ferramenta útil para a monitorização de canais ilegais de recrutamento em linha para o tráfico SH.

4.3.4.

O CESE considera que é imprescindível assegurar que os fornecedores de serviços da Internet e as empresas conexas apoiem a luta contra o tráfico SH com a identificação e a remoção de material associado à exploração e abuso das vítimas.

4.3.5.

O CESE chama particularmente a atenção para o facto de o sucesso da luta para desmantelar o modelo criminoso e travar a exploração das vítimas de tráfico SH depender em grande parte da participação ativa da generalidade da sociedade e da intervenção dos cidadãos, em especial, dos governos locais, do sistema de ensino, do sistema de saúde, dos parceiros sociais, das organizações da sociedade civil e das mensagens difundidas pela comunicação social e as redes sociais. Existe uma responsabilidade partilhada pela sociedade de combater o crime de tráfico SH. O CESE propõe que a Estratégia considere programas específicos de informação e formação direcionados para estes atores institucionais e sociais, pois a eficácia da Estratégia tem uma relação direta com o respetivo empenhamento e eficiência.

4.4.   Sobre o capítulo 5

4.4.1.

O CESE considera que há que promover sistemas mais eficazes de referenciação das vítimas de tráfico SH, de forma a assegurar a sua proteção e os seus direitos a nível de cada Estado-Membro, através de respostas coordenadas, com a assistência especializada de organizações da sociedade civil, dos parceiros sociais e de organizações internacionais não governamentais, tendo em conta, nomeadamente, a partilha de boas práticas (35).

4.4.2.

O CESE considera positivamente a posição da Comissão de defesa da não punição das vítimas pelos crimes que foram obrigadas a cometer e a reanálise numa lógica de proteção das vítimas da diretiva de 2004 do Conselho no que respeita aos títulos de residência para as vítimas de tráfico SH.

4.4.3.

O CESE subescreve a posição da Comissão no que se refere ao reforço da cooperação para um mecanismo de referenciação europeu.

4.4.4.

O CESE chama a atenção, quanto às crianças, que deve ser considerado o seu percurso de vida, pois o acontecimento traumatizante na idade infantil projetar-se-á na adolescência e na idade adulta. O CESE considera que acompanhar o desenvolvimento destas crianças deve fazer parte da estratégia de apoio às vítimas.

4.5.   Sobre o capítulo 6

4.5.1.

O CESE sublinha que, no campo internacional, a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas é o pilar essencial para se criar, nos países de origem, as condições económicas, sociais, de direitos humanos e políticos que possibilitam aos seus cidadãos uma vida digna em paz e segurança. As ações de cooperação para o desenvolvimento sustentável, realizadas pela UE e os Estados-Membros, são um dos seus principais instrumentos, que o CESE destaca, apoia e propõe que sejam valorizadas e integradas na Estratégia.

4.5.2.

O CESE apoia os esforços da Comissão na ação externa com as várias agências das Nações Unidas e do Conselho da Europa no combate ao tráfico SH, mas destaca que a OIT possui uma experiência muito antiga e frutuosa de combate contra o tráfico SH (36). Também a Organização Internacional das Migrações (OIM) tem um importante acervo de experiência e de boas práticas que importa ter em conta. O CESE recomenda à Comissão que integre estas agências nas relações interinstitucionais com quem trabalhará na efetivação da Estratégia.

4.5.3.

O CESE considera que a existência de fluxos migratórios mistos, através dos quais se processa a introdução de imigrantes em paralelo com o tráfico SH, não deve ser considerada apenas na lógica de combater as redes de passadores invocando para tal o Novo Pacto das Migrações (37).

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  COM(2021) 171 final, pp. 9 e 12.

(2)  COM(2021) 171 final, notas de p. 4 (20), p. 9 (39) e p. 10 (41).

(3)  COM(2021) 171 final, capítulo 6, Dimensão internacional.

(4)  COM(2021) 171 final, p. 16.

(5)  COM(2021) 171 final, capítulo 6, Dimensão internacional.

(6)  COM(2021) 171 final, p. 15.

(7)  COM(2021) 171 final, p. 7.

(8)  Ver Relatório da OIT de 2021 — «Acesso à proteção e remediação para vítimas de tráfico de pessoas para fins de exploração laboral na Bélgica e na Holanda».

(9)  COM(2021) 171 final, pp. 7 e 8.

(10)  A Convenção 81.o da OIT (sobre as Inspeções de Trabalho) define que exista um inspetor de trabalho por cada 10 000 trabalhadores.

(11)  COM(2021) 171 final, pp. 1 e 17.

(12)  COM(2021) 171 final, p. 6.

(13)  COM(2021) 171 final, p. 6.

(14)  COM(2021) 171 final, p. 6.

(15)  COM(2021) 171 final, p. 12.

(16)  COM(2021) 171 final, p. 10.

(17)  COM(2021) 171 final.

(18)  Referimo-nos à Decisão-Quadro 2002/629 JAI do Conselho, de 19 de julho de 2002, relativa à luta contra o tráfico de seres humanos (JO L 203 de 1.8.2002, p. 1): Plano de UE sobre as melhores práticas, normas e procedimentos para prevenir e combater o tráfico de seres humanos (2005); Convenção do Conselho da Europa relativa à Luta contra o Tráfico de Seres Humanos (1.2.2008); Programa de Estocolmo — Uma Europa aberta e segura que sirva e proteja os cidadãos (2010).

(19)  Diretiva 2011/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011, relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas, e que substitui a Decisão-Quadro 2002/629/JAI do Conselho (JO L 101 de 15.4.2011, p. 1).

(20)  Luta contra o tráfico de seres humanos (JO C 51 de 17.2.2011, p. 50); Medidas preventivas para a proteção das crianças contra abusos sexuais (JO C 24 de 28.1.2012, p. 154); Erradicação do tráfico de seres humanos (JO C 44 de 15.2.2013, p. 115); Agenda Europeia para a Segurança (JO C 177 de 18.5.2016, p. 51).

(21)  COM(2021) 171 final, p. 10.

(22)  COM(2021) 171 final, capítulo 5 — Proteger, apoiar e capacitar as vítimas, especialmente as mulheres e as crianças.

(23)  COM(2021) 171 final, capítulo 6, Dimensão internacional.

(24)  COM(2021) 171 final, capítulo 6, Dimensão internacional.

(25)  COM(2021) 171 final, p. 16.

(26)  COM(2021) 171 final, capítulo 2.

(27)  COM(2021) 171 final, p. 5.

(28)  COM(2021) 171 final, p. 6.

(29)  Ver Relatório da OIT de 2021 — «Acesso à proteção e remediação para vítimas de tráfico de pessoas para fins de exploração laboral na Bélgica e na Holanda».

(30)  COM(2021) 171 final, p. 8.

(31)  COM(2021) 171 final, p. 9.

(32)  COM(2021) 171 final, p. 10.

(33)  COM(2021) 171 final, p. 11.

(34)  Ver DG CONNECT da Comissão Europeia.

(35)  Neste quadro, é uma boa prática o novo sistema adotado em Portugal, «Sistema de Referenciação Nacional para crianças (presumíveis) vítimas de tráfico de seres humanos».

(36)  Convenção 29/1930 sobre o Trabalho Forçado, Convenção 105/1957 sobre a Abolição do Trabalho Forçado e o Protocolo da OIT de 2014 à Convenção sobre Trabalho Forçado e Abolição do Trabalho Forçado.

(37)  COM(2021) 171 final, p. 17.


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/86


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho «Estratégia da UE sobre o regresso voluntário e a reintegração»

[COM(2021) 120 final]

(2021/C 517/13)

Relator:

José Antonio MORENO DÍAZ

Consulta

Comissão Europeia, 31.5.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

7.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

219/1/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

A estratégia sobre o regresso voluntário e a reintegração visa estabelecer uma abordagem partilhada para a conceção, o desenvolvimento e a execução de programas de apoio ao regresso voluntário e à reintegração promovidos pelos Estados-Membros, definindo objetivos comuns e fomentando a coerência entre os programas nacionais e entre estes e a União Europeia. A estratégia pretende igualmente promover e estabelecer instrumentos comuns, bem como reforçar a cooperação entre os Estados-Membros nestes domínios.

1.2.

Até à data, a existência de uma grande variedade de instrumentos e abordagens em matéria de regresso voluntário e reintegração resultou numa amálgama de iniciativas, programas e projetos que frequentemente carecem de quadros de referência comuns, o que dificulta a sua avaliação, mas também a sua aplicação eficaz. O objetivo da estratégia em apreço é proceder à harmonização desses quadros de referência e promover a cooperação entre os países europeus em matéria de desenvolvimento de programas de apoio ao regresso voluntário e à reintegração.

1.3.

O CESE acolhe positivamente a estratégia enquanto instrumento de gestão que pretende melhorar a coordenação e os objetivos comuns dos Estados-Membros em matéria de governação da migração. Concorda com a abordagem da Comissão de proceder à revisão e harmonização dos instrumentos, bem como de melhorar a recolha de dados e os mecanismos de aconselhamento das pessoas envolvidas, a fim de eliminar a fragmentação das abordagens, reduzir os custos do regresso e reforçar as dotações financeiras para estes programas, entre outros desafios existentes.

1.4.

Contudo, tal como em ocasiões anteriores, o CESE lamenta que as medidas destinadas a melhorar as vias de entrada legais, que afetam a maioria da população estrangeira residente na União Europeia, estejam a ser desenvolvidas mais tarde e de forma mais limitada do que as propostas destinadas a resolver as questões ligadas às situações irregulares. É essencial adotar uma abordagem global da mobilidade para oferecer alternativas que vão além do controlo das fronteiras e do regresso.

1.5.

O CESE salienta que a maioria dos regressos não funciona corretamente devido à falta de envolvimento dos países de origem, e também devido à relutância das pessoas em situação irregular em participar. A este respeito, embora saudando os esforços da Comissão, o CESE tem reservas quanto à eficácia de algumas das propostas apresentadas, como o patrocínio dos regressos.

1.6.

O CESE manifesta igualmente preocupação com o papel futuro da Frontex, especialmente tendo em conta a apresentação do relatório do Parlamento Europeu sobre as violações de direitos por esta agência europeia (1). O CESE considera que é imprescindível criar mecanismos ágeis e eficazes para o acompanhamento e controlo efetivos (responsabilização) das atividades da Frontex, bem como para assegurar que as mesmas são levadas a cabo em conformidade com o respeito pelos direitos humanos.

1.7.

O CESE apoia uma coordenação mais eficaz entre todas as partes interessadas, bem como as melhorias previstas para reforçar a solidariedade entre os Estados-Membros e a cooperação com países terceiros. Apoia igualmente os esforços para melhorar o aconselhamento e a orientação em matéria de regresso, tal como o envolvimento da sociedade civil nas ações de regresso, em particular, de reintegração sustentável. Além disso, saúda os esforços para melhorar a disponibilidade de recursos e a recolha de dados, bem como o intercâmbio das boas práticas nestes domínios.

1.8.

O CESE manifesta preocupação com o objetivo mencionado de aumentar o número de procedimentos de regresso voluntário rápidos nas fronteiras externas, pois podem significar a ausência de garantias. Manifesta particular preocupação com o facto de os regressos voluntários poderem tornar-se um eufemismo para designar as expulsões ou a compensação financeira concedida aos países de destino que recebem esses repatriados, sem ter suficientemente em conta os seus desejos ou, o que é ainda mais preocupante, os seus direitos. O CESE alerta igualmente para a incongruência de oferecer incentivos em programas que implicam a existência de pessoas em situação irregular, pois tal pode desencorajar qualquer tentativa dos países de origem de reduzir esses fluxos.

1.9.

A este respeito, o CESE continua a considerar que uma das fraquezas estratégicas da política de imigração e asilo da União Europeia é a sua atenção quase exclusiva à luta contra as situações irregulares, quer nas fronteiras, quer através dos regressos voluntários e forçados. Para o efeito, convida uma vez mais a Comissão a rever o seu quadro de referência e a trabalhar eficazmente no sentido de uma abordagem global da política de imigração e asilo que promova uma mobilidade ordenada, regular e segura.

2.   Antecedentes e enquadramento

2.1.

A facilitação do regresso voluntário é um objetivo estratégico da política de migração da União Europeia, desde a aprovação da Diretiva Regresso em 2018, e tal como estabelecido no Novo Pacto em matéria de Migração e Asilo.

2.2.

O regresso voluntário é entendido como o instrumento que permite o regresso dos migrantes que se encontram em situação irregular no território da UE aos seus países de origem. Entende-se que este instrumento permite a decisão voluntária dos migrantes, facilita a readmissão no país de origem e permite uma melhor reintegração na sociedade de acolhimento do que os procedimentos de regresso forçado. Dos 491 195 nacionais de países terceiros em situação irregular a quem foi ordenado o regresso em 2019, 142 320 regressaram efetivamente a um país terceiro.

2.3.

O objetivo da estratégia é estabelecer uma abordagem partilhada para a conceção, o desenvolvimento e a execução de programas de apoio ao regresso voluntário e à reintegração promovidos pelos Estados-Membros, definindo objetivos comuns e fomentando a coerência entre os programas nacionais e entre estes e a União Europeia. A estratégia visa igualmente promover e estabelecer instrumentos comuns e reforçar a cooperação entre os Estados-Membros.

2.4.

O objetivo do apoio ao regresso e à reintegração é ajudar os migrantes em situação irregular a regressar voluntariamente e iniciar uma vida independente no seu país de origem, reduzindo assim o risco de remigração irregular. O apoio ao regresso pode incluir, por exemplo, aconselhamento antes da partida, apoio psicossocial e assistência na organização da viagem, ajuda para dar resposta a necessidades médicas imediatas e/ou apoio financeiro para facilitar o regresso e criar um quadro de vida estável à chegada. O apoio à reintegração visa ajudar a pessoa a reintegrar-se com sucesso na sociedade e pode incluir assistência e aconselhamento imediatos após a chegada, apoio para encontrar ou criar atividades geradoras de rendimentos para o repatriado, bem como atividades com as comunidades locais.

2.5.

A UE financia, diretamente ou através de programas dos Estados-Membros, um número significativo de ações ligadas ao regresso voluntário e à reintegração. Entre 2014 e 2018, cerca de 60 programas de apoio ao regresso voluntário e à reintegração foram financiados pelo Fundo para o Asilo, a Migração e a Integração (FAMI), e iniciativas semelhantes foram também financiadas através do Fundo Europeu de Desenvolvimento e de instrumentos como o Instrumento de Cooperação para o Desenvolvimento (ICD) e o Instrumento de Assistência de Pré-Adesão (IPA). Por outro lado, muitos Estados-Membros têm os seus próprios programas de apoio ao regresso voluntário e à reintegração.

2.6.

A existência desta variedade de instrumentos resultou numa amálgama de iniciativas, programas e projetos que frequentemente carecem de quadros de referência comuns, o que dificulta a sua avaliação, mas também a sua aplicação eficaz. O objetivo da estratégia em apreço é proceder à harmonização desses quadros de referência e promover a cooperação entre os países europeus em matéria de desenvolvimento de programas de apoio ao regresso voluntário e à reintegração.

2.7.

A estratégia apresentada pela Comissão fixa os seguintes objetivos: 1) aumentar a aceitação dos regressos voluntários entre os migrantes e a sua participação no número total de regressos; 2) criar uma via suplementar de cooperação e solidariedade entre os Estados-Membros, contribuindo para o patrocínio dos regressos; 3) melhorar a eficiência da assistência individual e comunitária, reduzindo lacunas e duplicações e aumentando as sinergias com outros doadores e países terceiros, incluindo através de uma proteção mais eficaz dos migrantes vulneráveis; 4) conceber ações de regresso e de reintegração sustentáveis que tenham em conta e atendam às necessidades do indivíduo; 5) promover a sustentabilidade dos regressos e reduzir a remigração irregular, nomeadamente através do apoio às comunidades de acolhimento; 6) reforçar a sustentabilidade das ações de reintegração a nível individual e comunitário e a sua contribuição para os planos de desenvolvimento dos países terceiros, nomeadamente através de ligações com outras atividades financiadas para o desenvolvimento a nível nacional ou comunitário; 7) reforçar as capacidades e a participação dos países terceiros no que diz respeito aos processos de regresso, readmissão e reintegração; 8) associar os objetivos acima referidos numa abordagem assente nos direitos e centrada nos migrantes.

2.8.

O regresso voluntário oferece aos repatriados oportunidades reais e tem em conta as suas necessidades, expectativas e perspetivas após o seu regresso. Além disso, pode contar com a participação dos países de regresso no quadro da cooperação com países terceiros. Por sua vez, a reintegração é fundamental para a eficiência e credibilidade dos programas de regresso, uma vez que implica o desenvolvimento de instrumentos para ajudar os migrantes a ultrapassar as dificuldades socioeconómicas e psicossociais que enfrentam quando regressam à sua comunidade e tornar o seu regresso mais sustentável. A reintegração deve ser concebida com a participação das autoridades nacionais e locais, das comunidades locais de acolhimento e da sociedade civil, para ajudar a oferecer perspetivas de futuro tangíveis ao repatriado e à sua comunidade local.

2.9.

A fim de apoiar as partes interessadas na aplicação, a estratégia proporá procedimentos operacionais específicos para alcançar os objetivos acima mencionados e um conjunto de ferramentas que vão desde soluções de TI para colmatar lacunas de informação e facilitar a gestão de dados até orientações centradas na gestão de projetos, na programação em matéria de desenvolvimento e no desenvolvimento de capacidades.

2.10.

A estratégia resulta de um processo participativo aberto que contou com a participação de diversos intervenientes fundamentais, bem como das autoridades nacionais responsáveis pelos programas de apoio ao regresso voluntário e à reintegração, entidades envolvidas em projetos de regresso, redes de serviços, etc.

3.   Observações sobre a apresentação da estratégia sobre o regresso voluntário e a reintegração

3.1.

O CESE acolhe positivamente a estratégia da UE sobre o regresso voluntário e a reintegração enquanto instrumento de gestão que pretende melhorar a coordenação e os objetivos comuns dos Estados-Membros em matéria de governação da migração.

3.2.

O CESE considera que a revisão de um instrumento como o regresso voluntário e a reintegração deve introduzir melhorias como as indicadas pela Comissão na sua comunicação. Eliminar a fragmentação das abordagens, reduzir os custos do regresso, melhorar a recolha de informações, melhorar o sistema de aconselhamento para os repatriados, melhorar a coordenação entre as partes envolvidas, apoiar a sustentabilidade dos projetos de regresso voluntário e de reintegração, e reforçar as dotações financeiras para estes programas são questões que o CESE considera necessárias para aumentar a eficiência desses instrumentos. Também se considera essencial melhorar a recolha de dados e a identificação de boas práticas, a fim de partilhar os ensinamentos adquiridos.

3.3.

Contudo, tal como em ocasiões anteriores (Parecer SOC/649 (2)), o CESE lamenta que as medidas destinadas a melhorar as vias de entrada legais, que afetam a maioria da população estrangeira residente na União Europeia, estejam a ser desenvolvidas mais tarde e de forma mais limitada do que as propostas destinadas a resolver as questões ligadas às situações irregulares. Recorda-se que é essencial adotar uma abordagem global da mobilidade para oferecer alternativas que vão além do controlo das fronteiras e do regresso.

3.4.

O CESE está consciente das dificuldades que a maioria dos Estados-Membros enfrenta para assegurar um regresso efetivo e do desejo da Comissão de avançar para um sistema europeu comum e eficaz em matéria de regresso. No entanto, o CESE reitera que a maioria dos regressos não funciona corretamente devido à falta de envolvimento dos países de origem, e também devido à relutância das pessoas em situação irregular em participar. O regresso voluntário a fim de evitar a expulsão forçada não pode ser considerado como uma ação livre, sem constrangimentos.

3.5.

O CESE manifesta mais uma vez reservas sobre o conceito de patrocínio dos regressos, uma vez que os incentivos para os Estados-Membros participarem neste mecanismo, que ainda se baseia na solidariedade voluntária, não são claros.

3.6.

O CESE reconhece os esforços da Comissão no domínio do regresso, tanto no acompanhamento dos programas nacionais como nas iniciativas financiadas pela própria UE. A este respeito, cabe destacar a Rede Europeia de Regresso e de Reintegração, que facilita a cooperação entre as autoridades competentes no domínio da migração. A Comissão prevê que, a partir de 2022, a Frontex assumirá as atividades desta rede, o que é motivo de grande preocupação para o CESE, dado o relatório do grupo de trabalho do Parlamento Europeu sobre a violação de direitos por esta agência europeia. O CESE considera que tal decisão requer a criação de mecanismos ágeis e eficazes para o acompanhamento e controlo efetivos (responsabilização) das atividades da Frontex, bem como para assegurar que as mesmas são levadas a cabo em conformidade com o respeito pelos direitos humanos (3). É essencial sublinhar este ponto, uma vez que a proteção dos direitos humanos é fundamental para todas as ações da UE, inclusivamente a política de migração e os processos de regresso e de reintegração, e deve ser possível controlar o papel da Frontex (e corrigi-lo, se necessário) em tempo real.

3.7.

Os programas de regresso e de reintegração mobilizam uma grande variedade de intervenientes, prestadores de serviços, formações, troca de informações e recursos, tanto nos países de partida como nos países de chegada. Este dinamismo assenta na presença de pessoas em situação irregular no território europeu. É preocupante pensar que se pode criar um espaço de atividade económica que sobrevive precisamente devido à existência de pessoas em situação irregular, o que por sua vez incentiva este canal de imigração, com expectativas de regresso (voluntário ou forçado).

4.   Algumas considerações complementares sobre a abordagem da estratégia

4.1.

O CESE continua a considerar que uma das fraquezas estratégicas da política de imigração e asilo da União Europeia é a sua atenção quase exclusiva à luta contra as situações irregulares, quer nas fronteiras, quer através de regressos voluntários e forçados. Para evitar situações irregulares é necessário estabelecer mecanismos de entrada regulares, ágeis, seguros e eficazes, que também limitem as possibilidades de criar espaços de exploração económica com base nas mesmas.

4.2.

O CESE manifesta preocupação com o objetivo mencionado de aumentar o número de procedimentos de regresso voluntário rápidos nas fronteiras externas, pois podem significar a ausência de garantias. Se o processo de regresso voluntário for entendido como uma decisão ponderada (pela pessoa) e que inclui ações de reintegração (em que participam as administrações de ambos os países), não é compreensível que se aposte neste modelo na fronteira. Pode-se considerar, neste caso, que o regresso voluntário é um eufemismo para designar as expulsões ou a compensação financeira concedida aos países de destino que recebem esses repatriados, sem ter suficientemente em conta os seus desejos ou, o que é ainda mais preocupante, os seus direitos.

4.3.

Uma coordenação eficaz entre todas as partes interessadas. O CESE não pode deixar de apoiar as melhorias na coordenação entre as partes envolvidas numa política pública. Contudo, existe a preocupação de que a rede de intervenientes e partes interessadas que veem o regresso voluntário como uma oportunidade de negócio seja alargada, e não tenha devidamente em conta as necessidades dos repatriados.

4.4.

Melhorar a solidariedade e a cooperação. As ações de regresso e de reintegração devem ser realizadas num quadro de cooperação e solidariedade entre os Estados-Membros. O objetivo é reforçar os instrumentos de coordenação para além da contribuição financeira, prestando também apoio mediante conhecimentos, empenho e ensinamentos adquiridos. Além disso, todas as ações devem basear-se no respeito e na colaboração com os países terceiros onde estas iniciativas serão desenvolvidas, favorecendo não só a participação institucional, mas também a colaboração e o contributo da sociedade civil.

4.5.

Apoio ao regresso voluntário e à reintegração de migrantes a partir de países terceiros e entre os mesmos. Na opinião do CESE, a cooperação com países terceiros é fundamental para a governação da migração. A concentração desta cooperação em instrumentos que vinculam a existência de recursos às situações irregulares não parece ser a forma mais adequada de desencorajar as mesmas.

4.6.

Aconselhamento e orientação eficazes sobre o regresso. É fundamental melhorar as informações fornecidas aos migrantes ao longo do processo, sendo que, mesmo num processo de afastamento, os direitos das pessoas são inalienáveis e devem ser garantidos. Precisamente por esta razão, e devido ao grande número de intervenientes que devem participar num programa de regresso voluntário bem-sucedido (na origem, no destino, diásporas, etc.), estes programas não podem ser estabelecidos como instrumentos «rápidos», sem estarem claramente ligados a programas de reintegração.

4.7.

Garantia da qualidade da ajuda. Mais uma vez, o CESE não pode deixar de concordar com a importância de apoiar o regresso voluntário com uma vasta gama de serviços que incluem o aconselhamento, o apoio médico e psicológico, e a assistência financeira, jurídica e logística para as viagens. Por conseguinte, importa referir, mais uma vez, que os programas de apoio ao regresso voluntário e à reintegração não podem ser entendidos como um instrumento de utilização generalizada e em massa: por exemplo, o regresso voluntário das famílias exige que se conceda especial atenção aos menores, sendo diferente de outras situações de regresso. O papel da Frontex na prestação e avaliação de alguns desses serviços é atualmente motivo de preocupação.

4.8.

A promoção da sustentabilidade do apoio à reintegração e a adesão dos países parceiros. Este ponto é fundamental não só para o futuro dos repatriados, mas também para o objetivo de evitar a remigração irregular. Mais uma vez, o CESE alerta para a incongruência de oferecer incentivos em programas que implicam a existência de pessoas em situação irregular, uma vez que tal pode desencorajar qualquer tentativa dos países de origem de reduzir esses fluxos. Além disso, basear toda a eficácia de uma política como o regresso voluntário numa realidade que depende da vontade de países terceiros pode minar significativamente a credibilidade e a coerência da política de migração europeia.

4.9.

O financiamento do regresso voluntário e da reintegração. É evidente que a UE é um dos principais intervenientes no financiamento de programas de apoio ao regresso voluntário e à reintegração em diferentes vertentes. É imperativo que a colaboração com países terceiros em qualquer aspeto esteja sujeita ao respeito desses países terceiros pelo direito internacional público, bem como à proteção dos direitos humanos e das liberdades individuais fundamentais. Qualquer espaço de cooperação com países terceiros em que sejam abordadas questões de direitos humanos deve ser aprovado pelo Parlamento Europeu. O facto de se tornar a cooperação em matéria de regresso um requisito para a ação externa e a política de vizinhança da UE é, paradoxalmente, um maior incentivo às situações irregulares do que um mecanismo que contribui para a sua redução.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Ver o «Report on the fact-finding investigation on Frontex concerning alleged fundamental rights violations» [Relatório sobre a investigação à Frontex para apuramento dos factos relativos a alegadas violações dos direitos fundamentais] da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos (LIBE), apresentado em 14 de julho de 2021 (https://www.europarl.europa.eu/cmsdata/238156/14072021%20Final%20Report%20FSWG_en.pdf).

(2)  JO C 123 de 9.4.2021, p. 15.

(3)  Ver as recomendações constantes do «Report on the fact-finding investigation on Frontex concerning alleged fundamental rights violations» [Relatório sobre a investigação à Frontex para apuramento dos factos relativos a alegadas violações dos direitos fundamentais] da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos (LIBE), apresentado em 14 de julho de 2021 (https://www.europarl.europa.eu/cmsdata/238156/14072021%20Final%20Report%20FSWG_en.pdf).


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/91


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a estratégia da UE para lutar contra a criminalidade organizada (2021- 2025)

[COM(2021) 170 final]

(2021/C 517/14)

Relator:

Rafał Bogusław JANKOWSKI

Consulta

Comissão Europeia, 31.5.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

07.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

226/0/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe favoravelmente a proposta da Comissão Europeia sobre a estratégia da UE para lutar contra a criminalidade organizada (2021-2025), a qual estabelece as prioridades, as ações e as metas a alcançar nos próximos cinco anos. Trata-se de um marco extremamente importante, pois constitui a primeira estratégia dedicada especificamente à criminalidade organizada desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, definindo objetivos concretos a médio e longo prazo a realizar no pleno respeito pelos direitos fundamentais.

1.2.

O CESE observa que a estratégia assenta essencialmente no reforço dos instrumentos existentes para apoiar a cooperação transfronteiras, incluindo a cooperação internacional, na luta contra a criminalidade considerada altamente prioritária, na repressão do financiamento das atividades criminosas e dos seus métodos para se infiltrarem na economia, incluindo a corrupção, e no apoio a medidas de combate à utilização das novas tecnologias por parte dos criminosos.

1.3.

O CESE considera que a União Europeia e os seus Estados-Membros têm de ser capazes de se antecipar às ações das organizações criminosas para estarem um passo à frente dos criminosos, centrando-se na vigilância, na infiltração dos meios ameaçados, na recolha e análise de dados, bem como na adoção de medidas preventivas. Neste contexto, importa dar especial atenção ao desenvolvimento de formas modernas e abrangentes de cooperação internacional, ao reforço da capacidade de funcionamento dos sistemas e das bases de dados utilizados, à cooperação com as organizações da sociedade civil, bem como ao investimento em instrumentos no domínio das novas tecnologias.

1.4.

O CESE acolhe com agrado a ideia de aprofundar as atividades organizadas no âmbito do ciclo político da UE EMPACT — Plataforma Multidisciplinar Europeia contra as Ameaças Criminosas. Considera plenamente justificado o anúncio de um aumento do financiamento dessa iniciativa, bem como o apoio ao desenvolvimento da cooperação com países terceiros nesse domínio.

1.5.

O CESE está convicto de que cabe igualmente dar especial atenção ao seguinte:

apoio e assistência assegurados pela Europol e pelo Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência (EMCDDA) na análise da ameaça da criminalidade ligada aos estupefacientes;

desenvolvimento e melhoria do funcionamento dos sistemas existentes, como o Sistema de informação Schengen (SIS), o quadro jurídico de Prüm, o registo de identificação dos passageiros (PNR) e a informação antecipada sobre passageiros (API);

importância de desenvolver e melhorar as redes de cooperação e as ações internacionais para lutar eficazmente contra os grupos de criminalidade organizada, como a plataforma para as equipas de investigação conjuntas e os chamados «alvos de grande importância».

1.6.

O CESE concorda com a atribuição de recursos adicionais para auxiliar os Estados-Membros a dotarem-se de soluções informáticas avançadas com vista à aquisição de informação em linha, à conservação de provas eletrónicas e à disponibilização de equipamento técnico e software específicos para utilização ativa em operações e investigações transfronteiras.

1.7.

O CESE assinala que o reforço das medidas de recuperação de bens e de combate ao branqueamento de capitais, assim como a promoção das investigações financeiras, a fim de eliminar os lucros gerados pela criminalidade organizada e prevenir a sua infiltração na economia legal e na sociedade, são fundamentais no contexto da luta contra a criminalidade organizada (1).

1.8.

O CESE observa que a criminalidade organizada pode ter forte impacto nas comunidades locais, nos serviços públicos e municipais, na proteção dos grupos vulneráveis, no ecossistema da atividade empresarial local, especialmente nas PME, e no domínio das atividades em matéria de neutralidade climática. O CESE recomenda o reforço do papel das ONG, das organizações da sociedade civil, das universidades, das organizações de juventude, das instituições de controlo social e dos denunciantes na luta contra a criminalidade organizada em sentido lato, em particular nas medidas de prevenção.

1.9.

O CESE incentiva os Estados-Membros a realizarem campanhas de sensibilização pública sobre a criminalidade organizada para informar adequadamente os cidadãos sobre o modo como os grupos de criminalidade organizada operam e a forma de os evitar. A cooperação com a Rede Europeia de Prevenção da Criminalidade é um excelente complemento a esse tipo de atividade. Cada Estado-Membro deve fazer o máximo possível para criar um sistema de informação claro, seguro e anónimo que permita comunicar incidentes e fenómenos suspeitos de ligação com a criminalidade organizada.

1.10.

O CESE sublinha que um dos aspetos mais importantes da luta contra a criminalidade organizada consiste em preparar as autoridades policiais e o sistema judiciário para a era digital, o que passa também por assegurar o acesso aos elementos de prova e às pistas de investigação digitais.

1.11.

A fim de aumentar o acesso da sociedade civil à informação, o CESE propõe a criação de um mecanismo de revisão (avaliação intercalar e final) da estratégia da UE de luta contra a criminalidade organizada (2021-2025), com base nas informações fornecidas pela Comissão Europeia.

1.12.

O CESE observa que, para prevenir e combater eficazmente os grupos de criminalidade organizada e garantir a proteção e a segurança enquanto uma das principais prioridades para os cidadãos da UE, as autoridades responsáveis pela aplicação da lei devem ter acesso às informações necessárias, no pleno respeito pelos direitos fundamentais. No tratamento de dados, não devem existir receios relacionados com a proteção da privacidade e os direitos fundamentais. O tratamento de dados pessoais já se encontra regulamentado de forma muito estrita, pelo que a atualização e harmonização da legislação permitiria uma análise mais eficaz de questões relacionadas com a proteção de dados.

1.13.

O CESE acolhe favoravelmente e apoia a iniciativa de desenvolver a cooperação com países terceiros, nomeadamente:

o início das negociações de acordos de cooperação entre a Eurojust e alguns países terceiros;

a intensificação das negociações sobre a cooperação entre a Europol e os países terceiros;

o reforço, juntamente com o Serviço Europeu para a Ação Externa, da cooperação internacional com os países terceiros e as organizações internacionais.

2.   Proposta da Comissão

2.1.

A proposta da Comissão Europeia sobre a estratégia da UE para lutar contra a criminalidade organizada (2021-2025) procura abordar de forma abrangente a questão complexa e vasta da criminalidade organizada. A estratégia estabelece as prioridades, as ações e as metas a alcançar nos próximos cinco anos. Trata-se de um marco extremamente importante, pois constitui a primeira estratégia dedicada especificamente à criminalidade organizada desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, definindo objetivos concretos a médio e longo prazo a realizar no pleno respeito pelos direitos fundamentais.

2.2.

A Comissão Europeia salienta que a criminalidade organizada constitui uma ameaça fundamental para a segurança das pessoas na UE. Há um número crescente de grupos de criminalidade organizada que operam em toda a União, gerando lucros enormes e utilizando os mesmos para expandir as respetivas atividades, bem como para infiltrar a economia legal.

2.3.

Nas suas prioridades, a Comissão Europeia destaca a necessidade de reforçar as medidas a nível da UE para apoiar os Estados-Membros na luta contra a criminalidade organizada através das seguintes ações:

promover a aplicação da lei e a cooperação judiciária;

desmantelar as estruturas da criminalidade organizada e combater os crimes altamente prioritários;

eliminar os lucros gerados pela criminalidade organizada e prevenir a sua infiltração na economia legal e na sociedade;

preparar as autoridades policiais e o sistema judiciário para a era digital.

2.4.

Todas as iniciativas para identificar e intensificar a ação no domínio da cooperação operacional e não operacional, assim como da formação, são importantes. O mesmo se aplica às várias iniciativas diferentes que demonstrem que, na situação atual, face às várias ameaças de criminalidade grave e organizada, não há outra solução nem possibilidade senão enveredar pela via da cooperação, da colaboração e do intercâmbio de boas práticas com os parceiros internacionais, bem como melhorar o funcionamento dos sistemas existentes e investir no desenvolvimento de novas tecnologias.

3.   Observações na generalidade e na especialidade

3.1.

A criminalidade internacional grave e organizada é uma das maiores ameaças globais ao desenvolvimento das sociedades modernas. Os grupos de criminalidade organizada são altamente móveis e, na maioria dos casos, operam a nível internacional, pelo que é impossível para cada país combatê-los eficazmente sozinhos. A natureza transfronteiras da criminalidade organizada exige uma cooperação estreita entre os serviços, as instituições e os respetivos homólogos estrangeiros no âmbito da União Europeia e das agências internacionais. Por esta razão, o CESE considera que a estratégia da Comissão é muito importante e oportuna.

3.2.

Face às ameaças atuais, cabe não só criar novos domínios de cooperação que reúnam as competências dos diferentes intervenientes ativos nos domínios da segurança, mas também reforçar os mecanismos de prevenção e de combate à criminalidade. Cabe ainda recorrer a outros instrumentos e tecnologias. Por conseguinte, o CESE entende que cumpre estabelecer uma cooperação estreita entre os Estados-Membros e as instituições da UE nesse domínio, tal como coordenar e recorrer eventualmente ao apoio operacional da Europol.

3.3.

O CESE considera fundamental prosseguir o desenvolvimento do plano de ação de luta contra os grupos de criminalidade organizada e os alvos das categorias prioritárias que representam o maior risco, através do recurso a unidades operacionais («Operational Task Force»), projetos internacionais e iniciativas regionais. Os alvos ditos de grande importância e as unidades operacionais são um exemplo de apoio prático e efetivo aos Estados-Membros da UE.

3.4.

Atualmente, a atividade criminosa patente no ciberespaço utiliza exclusivamente tecnologias avançadas para cometer crimes tradicionais de tráfico de armas de fogo e munições, substâncias utilizadas para a produção de explosivos, estupefacientes e novas drogas sintéticas. O maior obstáculo à deteção efetiva deste tipo de crime é, sem dúvida, a utilização de ferramentas de anonimização para atividades criminosas. As comunicações cifradas utilizadas pelos criminosos através de diferentes aplicações e dispositivos de mensagens instantâneas em linha colocam grandes dificuldades ao processo de deteção.

3.5.

Considera-se que a falta de acesso das autoridades responsáveis pela aplicação da lei às comunicações cifradas utilizadas pelos grupos de criminalidade organizada é uma das maiores deficiências, pois é impossível adotar medidas em tempo útil quando não se tem acesso a informação. Por conseguinte, o CESE considera extremamente prática e necessária a nova ferramenta de decifragem da Europol lançada pela Comissão Europeia, que contribuirá para fazer face a esses desafios. No entanto, importa prosseguir os trabalhos neste domínio, tendo em conta a evolução rápida das novas tecnologias.

3.6.

Outro aspeto da luta contra a cibercriminalidade prende-se com a dark Web, uma parcela obscura da Internet a que se pode aceder através da aplicação TOR, que garante o anonimato efetivo dos criminosos que utilizam o denominado «criptomercado» («dark market»), serviços comerciais subterrâneos em que são realizadas atividades criminosas que envolvem o tráfico de armas, de drogas, de dados roubados de cartões de crédito e de software malicioso, existindo inclusivamente ofertas para cometer «homicídio a soldo». O pagamento dessas transações processa-se através de moedas virtuais que, enquanto instrumento de transferência anónima de fundos obtidos a partir de atividades criminosas no ciberespaço (por exemplo, bitcoines), também podem ser utilizadas para fins de branqueamento dos capitais provenientes do crime. As autoridades responsáveis pela aplicação da lei não dispõem dos instrumentos jurídicos adequados para exigir aos prestadores de serviços que facultem as chaves de cifra que permitem o acesso a conteúdos de comunicação e transmitam gratuitamente os dados para efeitos de processos em curso ou de registo dos dados dos utilizadores e dos endereços IP das comunicações telefónicas e das mensagens de texto.

3.7.

O CESE insta as instituições da UE a melhorarem o quadro jurídico, a fim de apoiar e reforçar a capacidade de as instituições especializadas dos Estados-Membros combaterem eficazmente essas ameaças. Considera-se extremamente ambicioso o anúncio sobre o desenvolvimento pelo Centro Comum de Investigação de um instrumento de monitorização para recolher informações sobre as atividades ilegais exercidas na dark Web. Ao mesmo tempo, o desenvolvimento de tal instrumento pode ser considerado um marco na luta contra a criminalidade organizada no ciberespaço.

3.8.

A prática e a experiência atual das autoridades responsáveis pela aplicação da lei revelam o aumento dos riscos relacionados com a utilização de criptomoedas para atividades criminosas, nomeadamente, o branqueamento de capitais, a fraude, em especial através de redes informáticas, e a faturação da extorsão resultante de ataques de programas sequestradores («ransomware»). Uma ameaça igualmente importante e previsível é a possibilidade de os criminosos utilizarem a criptomoeda para eliminar o risco de as autoridades responsáveis pela aplicação da lei apreenderem ativos ilícitos. O CESE recomenda a adoção de novas medidas para a elaboração de regulamentação em matéria de vigilância e controlo das transações financeiras com recurso a este tipo de instrumentos.

3.9.

O CESE acolhe com extrema satisfação que se considere o nível técnico outro dos domínios de apoio aos Estados-Membros. O acesso a infraestruturas avançadas aumentará a eficácia das medidas e reduzirá significativamente os encargos financeiros de cada instituição (aumentando a eficiência da despesa a nível nacional). Com efeito, a atualização do equipamento e dos programas informáticos que permitem lutar eficazmente contra a cibercriminalidade constitui um desafio para os Estados-Membros, na medida em que representa um encargo financeiro considerável para cada instituição, dada a rápida evolução do mercado e o respetivo desenvolvimento. Por conseguinte, o CESE recomenda que a Comissão e os Estados-Membros avaliem melhor as necessidades das instituições e atribuam recursos suficientes, a fim de lhes permitir agir eficazmente contra essas ameaças.

3.10.

O CESE subscreve e considera muito importante a iniciativa da Comissão Europeia de propor legislação para melhorar a proteção das crianças contra o abuso sexual, inclusivamente exigindo que os operadores de serviços em linha detetem os conteúdos de pornografia infantil conhecidos e os denunciem às autoridades públicas (2).

3.11.

O conjunto de instrumentos da UE de combate à contrafação, que define os princípios para a ação conjunta, a cooperação e a partilha de dados entre as autoridades responsáveis pela aplicação da lei, os titulares de direitos e os intermediários, assume importância acrescida, em especial no contexto da contrafação de produtos médicos e sanitários durante a pandemia de COVID-19. Com efeito, a criminalidade organizada tem-se dedicado à produção e ao fornecimento de equipamentos de proteção, kits de teste e produtos farmacêuticos de contrafação. O CESE considera fundamental a cooperação e o intercâmbio de dados, pelo que apoia a continuação do desenvolvimento desse instrumento.

3.12.

Enquanto voz da sociedade civil europeia, o CESE considera que as ações de proteção do ambiente e dos bens culturais requerem apoio adequado, incluindo o reforço das capacidades dos peritos e a cooperação estrutural.

3.13.

O CESE defende que os Estados-Membros devem utilizar as possibilidades proporcionadas pela rede operacional contra o branqueamento de capitais (AMON), uma rede internacional informal de unidades de combate ao branqueamento de capitais, e pela Rede Camden Interserviços de Recuperação de Bens (CARIN), uma rede informal de profissionais das autoridades policiais e judiciárias especializados no domínio da deteção, congelamento, apreensão e confisco de bens.

3.14.

O CESE secunda a proposta da Comissão com vista ao desenvolvimento de um sistema de formação sobre cibercriminalidade e recomenda, em especial, a criação de regimes de certificação/acreditação para os peritos em investigação digital, enquanto dimensão muito prática da luta contra esse tipo de crime.

3.15.

A criminalidade grave e organizada é uma das maiores ameaças globais ao desenvolvimento das sociedades modernas. A luta contra a criminalidade organizada representa atualmente um desafio único, uma vez que os métodos utilizados pelos criminosos são cada vez mais sofisticados, especializados, camuflados e dissimulados sob diferentes tipos de atividades. À luz do exposto, o CESE concorda que todas as iniciativas para identificar e intensificar a ação no domínio da cooperação operacional e não operacional, assim como da formação são importantes. O mesmo se aplica às iniciativas que demonstrem que, na situação geopolítica atual, face às várias ameaças de criminalidade grave e organizada, não há outra solução nem possibilidade senão enveredar pela via da cooperação, da colaboração e do intercâmbio de boas práticas a nível internacional.

3.16.

A luta contra o financiamento das atividades criminosas, tal como a recuperação de bens e o respetivo confisco, são cruciais para detetar as atividades criminosas, sendo igualmente essencial desmantelar as estruturas da criminalidade, quebrar a lei do silêncio e dissuadir os criminosos da prática de novos crimes. Deste modo, será possível evitar a sua infiltração na economia legal e na sociedade. No entanto, apesar da elaboração de quadros jurídicos neste domínio e do alargamento das táticas das autoridades responsáveis pela aplicação da lei, apenas 1 % dos bens de origem criminosa são confiscados. O CESE considera que os desafios colocados pela luta contra o fenómeno do tráfico de droga na dark Web prendem-se principalmente com a rápida evolução do mercado (mercados com um período de «vida» muito curto) e um sistema complexo para identificar os pagamentos em criptomoedas. A falta de conhecimentos alargados sobre a cibercriminalidade, em especial a criminalidade ligada ao tráfico de drogas na Internet ou na dark Web, por parte dos agentes das autoridades responsáveis pela aplicação da lei, é uma vulnerabilidade que pode ser ultrapassada se as propostas da Comissão forem aplicadas.

3.17.

O CESE propõe que se pondere a adoção de medidas de prevenção da criminalidade através de uma maior sensibilização da sociedade, por exemplo através de campanhas públicas destinadas a sensibilizar as pessoas para as novas ameaças, assim como para os domínios da criminalidade organizada e o respetivo modus operandi, uma vez que, amiúde, as sociedades e os cidadãos não reconhecem a natureza criminosa das atividades dos grupos de criminalidade organizada.

A criação de um sistema que permita aos cidadãos da UE informar de forma simples as autoridades responsáveis pela aplicação da lei (anonimização das denúncias), caso detetem eventuais indícios de atividades criminosas, poderá ter um impacto significativo tanto no sentimento de segurança como na eficácia da luta contra a criminalidade organizada.

3.18.

Em todo o mundo, as autoridades responsáveis pela aplicação da lei e os serviços policiais reagem, normalmente, após a ocorrência de um crime e, na maior parte dos casos, não são capazes de prevenir a ocorrência do mesmo. O CESE considera que a abordagem ideal seria reagir e prevenir a atividade criminosa, mas importa estar ciente de que é extremamente difícil antecipar-se à atividade dos grupos criminosos, os quais utilizam facilmente as novas tecnologias e não estão condicionados por orçamentos, nem por leis, nem pela correção política; para eles, o lucro sobrepõe-se à vida humana. Os criminosos adaptam-se muito rapidamente às novas condições, criam novas formas de trabalho e penetram áreas em que ainda não operaram. A pandemia de COVID-19 é disso exemplo.

3.19.

Todos os anos, no âmbito da Plataforma Multidisciplinar Europeia contra as Ameaças Criminosas (EMPACT), elaboram-se planos de ação operacional para dar resposta às tendências mais recentes em matéria de criminalidade a nível europeu e mundial. Importa destacar que esses planos refletem as preocupações dos Estados-Membros da UE e dos países terceiros parceiros, como a Islândia, a Noruega e a Suíça, pelo que o seu trabalho permite não só identificar os problemas numa fase precoce, mas também desenvolver uma metodologia de trabalho adequada. Importa igualmente apoiar financeiramente as atividades operacionais de luta contra a criminalidade organizada.

3.20.

O CESE salienta a importância dos novos instrumentos para combater a criminalidade organizada, como a) o Sistema de informação Schengen (SIS), o quadro jurídico de Prüm, o registo de identificação dos passageiros (PNR) e a informação antecipada sobre passageiros (API); b) a plataforma para as equipas de investigação conjuntas, a fim de melhorar a comunicação e a partilha de informações e, neste mesmo contexto, o reforço da cooperação da Eurojust com os países terceiros; c) os chamados «alvos de grande importância», através do recurso a unidades operacionais, projetos internacionais e iniciativas regionais, para desenvolver redes de cooperação e ações internacionais para lutar eficazmente contra os grupos de criminalidade organizada.

3.21.

As diferenças nas legislações ou nas práticas entre os Estados-Membros são frequentemente apontadas como uma razão para a deficiente cooperação internacional ou mesmo para a sua falta, pelo que se acolhe com muito agrado a iniciativa com vista à criação de um código de cooperação policial da UE. Neste contexto, será certamente útil o estudo externo lançado pela Comissão Europeia para avaliar a Decisão-Quadro do Conselho de 2008 relativa à luta contra a criminalidade organizada.

3.22.

O método segundo o qual o poder local, em cooperação com as autoridades responsáveis pela aplicação da lei e a sociedade civil, recorre a instrumentos administrativos para evitar que a criminalidade organizada infiltre negócios legítimos e infraestruturas administrativas desempenha um papel importante ao promover a dimensão local articulada com uma abordagem administrativa.

3.23.

O problema da luta contra a criminalidade organizada, largamente abordado na estratégia da Comissão Europeia para 2021-2025, radica no facto de se tratar de um fenómeno criminoso em perpétua mutação, que se infiltra, sob diversas formas, em todos os domínios da nossa vida, assim como na esfera política e social. Utiliza os últimos avanços da era digital e continua tradicionalmente a explorar a pobreza e os instintos mais vis, fazendo com que pessoas desesperadas fiquem dependentes deles e aterrorizando-as de modo a perpetrarem atividades criminosas. O CESE está ciente de que a resolução deste problema exige ações conjuntas da UE e dos Estados-Membros, bem como a compreensão da necessidade de se antecipar às ações das organizações criminosas, identificando novas tendências nos grupos criminosos que operam para além das fronteiras políticas e administrativas.

3.24.

O CESE abordou recentemente nos seus pareceres e num relatório de informação a luta contra o terrorismo no âmbito do combate à criminalidade organizada. Continuará a acompanhar, em nome da sociedade civil, as próximas medidas adotadas contra os grupos de criminalidade organizada, congratulando-se com as propostas apresentadas pela Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu no sentido de associar a este esforço comum o Serviço Europeu para a Ação Externa, a Eurojust e a Europol nas negociações com países terceiros a este respeito (3).

3.25.

O CESE sublinha que importa consultar as organizações da sociedade civil, as instituições de vigilância independentes e os denunciantes e envolver os mesmos, com total proteção, no mecanismo de luta contra a criminalidade organizada, a fim de proteger eficazmente os cidadãos, a economia europeia e as comunidades locais e salvaguardar o Estado de direito e os direitos fundamentais.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 6

(2)  JO C 374 de 16.9.2021, p. 58

(3)  SOC/673 — Reforço do mandato da Europol (JO C 341 de 24.8.2021, p. 66); SOC/675 — Avaliação da Diretiva Luta contra o Terrorismo; SOC/676 — Agenda da UE em matéria de Luta contra o Terrorismo (JO C 341 de 24.8.2021, p. 71).


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/97


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Conselho relativa às orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros

[COM(2021) 282 final — 2021/0137 (NLE)]

(2021/C 517/15)

Relatora:

Marina Elvira CALDERONE

Consulta

Conselho da União Europeia, 11.6.2021

Base jurídica

Artigo 148.o, n.o 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

7.9.2021

Adoção em plenária

23.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

185/1/16

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE acolhe favoravelmente a proposta de decisão do Conselho relativa às orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros enquanto referência útil para focalizar essas mesmas políticas no apoio à desejada saída gradual da crise pandémica e para direcionar as várias formas de apoio económico no sentido de um resultado positivo para o emprego. Essas orientações serão também uma referência valiosa para as ações destinadas a reforçar a resiliência e a recuperação, a fim de lançar as bases para a criação de empregos de qualidade numa economia sustentável do ponto de vista ambiental e social. A coordenação de políticas de emprego eficazes é fundamental para melhorar a coesão entre os Estados-Membros e reduzir as disparidades sociais e económicas.

1.2.

As orientações para o emprego devem ter em conta o impacto da pandemia de COVID-19 no mercado de trabalho, o Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais e as conclusões da Cimeira Social do Porto, que estabelecem objetivos sociais ambiciosos para o emprego, a luta contra a pobreza e o acesso às competências. Importa igualmente acompanhar o impacto no emprego dos instrumentos de apoio como o Programa SURE e o Instrumento de Recuperação da União Europeia (Next Generation EU), que assentam na emissão de obrigações da UE sob a forma de dívida mútua contraída para auxiliar inclusivamente as políticas laborais. Os planos nacionais de recuperação e resiliência assegurarão também recursos para as políticas de emprego dos Estados-Membros, sujeitos, no entanto, a condições específicas em matéria de objetivos, domínios de intervenção e padrões de despesa, dando particular atenção às políticas ativas do mercado de trabalho.

1.3.

Importa coordenar as políticas europeias e os objetivos das orientações para o emprego, a fim de reforçar o mercado de trabalho, apoiar a produtividade e a competitividade das empresas, tal como a economia social de mercado da União Europeia, e incrementar as ações estruturais com vista à transição das medidas temporárias de proteção dos postos de trabalho para a criação de emprego de qualidade. Nesses processos, cumpre destacar a importância do diálogo social, da negociação coletiva e da participação dos parceiros sociais e dos representantes da sociedade civil nas decisões.

1.4.

No atinente à Orientação n.o 5 destinada a dinamizar a procura de mão de obra, o CESE defende que o processo de retoma da procura deve ser acompanhado de medidas destinadas a reforçar essa mesma procura, estimulando o acesso ao mercado de trabalho e promovendo a sustentabilidade económica e social das empresas, a profissionalização dos trabalhadores e a melhoria das condições de trabalho. Este objetivo pode ser alcançado tirando pleno proveito das possibilidades de transformação dos sistemas de produção, adotando tecnologias digitais e instrumentos de sustentabilidade ambiental e promovendo a aprendizagem ao longo da vida. Importa coordenar estreitamente as medidas de política económica e as políticas para dinamizar a procura de mão de obra.

1.5.

No atinente à Orientação n.o 6 destinada a reforçar a oferta de mão de obra e melhorar o acesso ao emprego, as aptidões e as competências, o CESE assinala que é fundamental que cada Estado-Membro seja capaz de estabelecer uma coordenação eficaz das medidas de investimento na formação e no mercado de trabalho previstas nos planos nacionais de recuperação e resiliência e nos fundos estruturais. A crise atual veio sublinhar ainda mais a necessidade de reconhecer e assegurar o direito à aprendizagem ao longo da vida, bem como o acesso efetivo à educação e formação de qualidade e à adaptação das competências, bem como de reduzir a atual disparidade na utilização da melhoria de competências, tanto entre os setores de produção como entre os Estados-Membros. A meta fixada no Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais relativa ao acesso à formação constitui um objetivo que aferirá a capacidade dos Estados-Membros de se dotarem de instrumentos novos que reduzam as disparidades de acesso e respondam às exigências do mercado de trabalho no domínio das novas competências necessárias.

1.6.

No que toca à Orientação n.o 7 destinada a melhorar o funcionamento dos mercados de trabalho e a eficácia do diálogo social, o CESE defende a criação de uma plataforma digital europeia para a correspondência entre a procura e a oferta de trabalho, assente numa norma partilhada pelos Estados-Membros e pelos serviços de emprego, a fim de promover as políticas ativas e a mobilidade na Europa, inclusivamente através do reforço dos serviços públicos e privados de emprego. A adoção de medidas robustas de segurança e prevenção dos riscos deve ser a base para a promoção de uma cultura de prevenção mais generalizada em cada Estado-Membro, enquanto componente essencial da disseminação e partilha de uma «cultura do trabalho» que valoriza o potencial de cada pessoa, promove o bem-estar e elimina todas as situações de perigo e de risco no local de trabalho. O diálogo social e a negociação coletiva são um pilar importante da sustentabilidade e da resiliência das economias europeias, mas em alguns Estados-Membros ainda é necessário um quadro regulamentar e institucional a nível nacional que fomente e apoie os sistemas de relações laborais.

1.7.

A par do reforço das políticas de emprego para os trabalhadores por conta de outrem, o CESE considera importante reforçar a capacidade dos Estados-Membros de promoverem medidas de apoio ao trabalho por conta própria, ao trabalho independente e às atividades profissionais, em especial para os jovens.

1.8.

A Orientação n.o 8 visa promover a igualdade de oportunidades para todos, fomentar a inclusão social e combater a pobreza. O CESE concorda com esta orientação, uma vez que se afigura essencial elaborar uma estratégia de política de emprego que garanta a igualdade de acesso ao mercado de trabalho e no contexto das relações laborais. O estabelecimento de uma relação entre a segurança social, o mercado de trabalho, o funcionamento da economia e a luta contra as desigualdades e a pobreza é uma orientação fundamental e uma linha diretriz para ajudar a assegurar que as políticas de emprego associam o crescimento económico ao desenvolvimento social. O CESE reitera ainda a importância de definir políticas de inclusão eficazes, que devem ser consideradas como investimentos cruciais para o crescimento e para a melhoria dos sistemas económicos e de produção. Além disso, afigura-se crucial adotar medidas para evitar o risco de «nova pobreza» dos trabalhadores com rendimentos baixos, em articulação com outras estratégias de combate à pobreza coerentes.

2.   Contexto

2.1.   Introdução

2.1.1.

Adotadas em 2019, as orientações para as políticas de emprego foram adaptadas em 2020, a fim de integrar elementos relacionados com as consequências da crise da COVID-19, as transições ecológica e digital e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. O CESE já apresentou um parecer (SOC/646 (1)) em que examina e avalia as referidas orientações, cujo conteúdo reitera. No entanto, com o presente parecer pretende apresentar observações sobre o impacto da crise pandémica nas condições de vida e de trabalho dos cidadãos europeus e sobre a necessidade de adaptar as prioridades de ação dos Estados-Membros e das instituições europeias.

2.1.2.

A proposta da Comissão prevê a manutenção para 2021 das orientações para as políticas de emprego, constantes do anexo da Decisão (UE) 2020/1512 do Conselho (2), e estipula que os Estados-Membros se guiem pelas mesmas quando da elaboração das suas políticas de emprego e dos programas nacionais de reformas. A prioridade é agora assegurar um impacto social positivo das medidas de apoio à resiliência e à retoma económica e da produção.

2.2.

As orientações são as seguintes:

Orientação n.o 5: Dinamizar a procura de mão de obra;

Orientação n.o 6: Reforçar a oferta de mão de obra e melhorar o acesso ao emprego, as aptidões e as competências;

Orientação n.o 7: Melhorar o funcionamento dos mercados de trabalho e a eficácia do diálogo social;

Orientação n.o 8: Promover a igualdade de oportunidades para todos, fomentar a inclusão social e combater a pobreza.

2.3.

A proposta salienta que a UE e os seus Estados-Membros devem:

2.3.1.

Combater a exclusão social e a discriminação, promover a justiça e a proteção sociais, bem como a igualdade de género, a solidariedade entre as gerações e a proteção dos direitos da criança. Na Cimeira Social do Porto, os Estados-Membros comprometeram-se a implementar metas sociais ambiciosas para a elaboração das políticas nacionais e de novos instrumentos europeus de apoio às transições ecológica e digital para alcançar uma convergência económica e social que reforce a competitividade da economia social de mercado da UE.

2.3.2.

Assegurar a coordenação das políticas económicas e de emprego a fim de concretizar a neutralidade climática na UE, acompanhar a transição europeia para uma economia digital e ecológica sustentável, atualizar as competências e melhorar a competitividade, assegurando condições de trabalho adequadas, fomentando a inovação, promovendo a justiça social e a igualdade de oportunidades, bem como combatendo as desigualdades e as disparidades regionais. A partilha de políticas e a aplicação de estratégias de emprego eficazes e homogéneas é um elemento fundamental para passar da gestão da crise para uma fase de recuperação suscetível de promover o desenvolvimento sustentável do ponto de vista ambiental e social e de criar novos postos de trabalho e melhores condições de emprego.

2.3.3.

Colaborar para enfrentar em conjunto fatores estruturais como as alterações climáticas e os desafios ambientais, a globalização, a digitalização, a inteligência artificial, o teletrabalho, a economia das plataformas e a evolução demográfica, adaptando, sempre que necessário, os sistemas existentes.

2.3.4.

Adotar as medidas e as políticas necessárias para reforçar o crescimento sustentável da economia, o emprego de qualidade e a produtividade, não deixando porém de reforçar simultaneamente a coesão social e territorial, fomentar a convergência ascendente e a resiliência das economias e promover o exercício da responsabilidade orçamental por parte dos Estados-Membros.

2.3.5.

Assegurar que as reformas do mercado de trabalho, incluindo dos mecanismos nacionais de fixação dos salários, respeitam as práticas nacionais de diálogo social e de negociação coletiva, com vista a assegurar salários justos e padrões de vida e de trabalho dignos.

2.3.6.

Assegurar a atenuação do impacto económico, social e laboral da crise da COVID-19 através de políticas e instrumentos eficazes.

2.4.

Os Estados-Membros e a União devem esforçar-se por desenvolver uma estratégia coordenada em matéria de emprego, em especial, de promoção da mão de obra qualificada, formada e com competências adaptadas às mudanças em curso (bem como mercados de trabalho orientados para o futuro que reajam rapidamente às mudanças económicas). Os Estados-Membros devem encarar a promoção do emprego como uma questão de interesse comum e coordenar a sua ação nesse domínio no âmbito do Conselho. O artigo 148.o do TFUE prevê que o Conselho adote as orientações para o emprego, que definem o âmbito e a direção da coordenação das políticas dos Estados-Membros e servem de base às recomendações específicas por país no contexto do Semestre Europeu.

2.5.

Importa salientar que, tal como demonstrado pelo impacto da pandemia de COVID-19 nos sistemas económicos e sociais, a presença de fatores de risco implica instrumentos de apoio, incluindo financeiro, que permitam aos Estados-Membros partilhar iniciativas comuns para contrariar o impacto das crises nas condições de trabalho e de vida dos cidadãos.

2.6.

O CESE concorda com as decisões da Comissão nos últimos meses, que levaram à aprovação dos planos nacionais de recuperação e resiliência, considerando que vão na direção certa para apoiar um modelo de desenvolvimento justo e sustentável. Do mesmo modo, cabe evitar que, na sequência da crise resultante da pandemia, se verifique um maior risco de exclusão social e uma aceleração dos desequilíbrios territoriais, que se agravaram nos últimos anos inclusive entre as regiões europeias, como assinalado desde 2013 pelo Índice de Competitividade Regional da Comissão Europeia, que mede a capacidade competitiva das regiões.

2.7.

A fim de construir um modelo económico e de desenvolvimento inclusivo, importa escorar as políticas e os investimentos para reforço das infraestruturas de produtividade, da digitalização e da logística em medidas destinadas a reforçar a coesão territorial, promover o capital humano, formar a mão de obra e reforçar os instrumentos de apoio ao mercado de trabalho e ao sistema de serviços sociais e à pessoa. Uma Europa marcada por diferenças e desigualdades excessivas no acesso às oportunidades será sempre mais fraca. O CESE considera que a coesão deve continuar a ser o eixo de referência das políticas, inclusivamente de crescimento.

2.8.

A crise resultante da pandemia agravou alguns problemas estruturais do mercado de trabalho europeu e pôs em evidência situações difíceis que exigem uma política mais vasta capaz de responder tanto à situação dos grupos mais vulneráveis como às dificuldades patentes em setores específicos do mercado de trabalho. Os Estados-Membros fazem face a uma transição que impõe a partilha e a coordenação estreitas das políticas, ações e medidas, bem como o apoio permanente do diálogo social.

2.9.

Todos os trabalhadores devem beneficiar de proteção social, quer no âmbito do teletrabalho quer das novas formas de trabalho, inclusivamente nas plataformas em linha, mediante o reforço dos sistemas de segurança social. Há que fomentar a inclusão dos grupos mais vulneráveis e a plena promoção da participação feminina do mercado de trabalho, a fim de evitar todas as formas de discriminação e eliminar as disparidades salariais entre homens e mulheres.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE remete para pareceres anteriores sobre as orientações para o emprego e salienta o que segue.

3.1.1.

A luta contra a discriminação coincide com os esforços para melhorar a qualidade do trabalho, o que implica a partilha de estratégias entre os Estados-Membros para associar a produtividade e a competitividade a sistemas capazes de promover o capital humano e assegurar as melhores condições de trabalho para os trabalhadores.

3.1.2.

As situações de crise tendem a aumentar os fatores de risco social, em especial, as desigualdades, pelo que o investimento e o apoio à retoma económica têm de estar associados a um sistema de investimento robusto em infraestruturas sociais e laborais, suscetível de melhorar as normas de proteção social vigentes nos Estados-Membros através de políticas e medidas adequadas.

3.1.3.

O processo de crescimento dos sistemas económicos e sociais europeus deve implicar uma ação forte e partilhada entre os Estados-Membros para evitar o dumping social, fenómeno que assenta na redução das formas de proteção, garantia e segurança dos trabalhadores, e promover simultaneamente uma concorrência leal que tenha em conta a inovação e se baseie na valorização dos trabalhadores e na sustentabilidade dos produtos e dos serviços. São necessárias políticas ativas do mercado de trabalho, como os incentivos temporários à contratação de pessoas pertencentes a grupos vulneráveis, as oportunidades de melhoria de competências e de requalificação e o apoio às empresas, incluindo da economia social.

3.1.4.

As novas gerações são cruciais para impulsionar a inovação, pelo que devem ter acesso a empregos de qualidade estáveis, que reforcem a mobilidade dos trabalhadores entre os Estados-Membros. O CESE concorda com a afirmação constante da Declaração do Porto, segundo a qual «os jovens representam uma fonte indispensável de dinamismo, talento e criatividade para a Europa». Para o efeito, importa igualmente apoiar o trabalho por conta própria, o trabalho intelectual e as atividades profissionais, a par das novas atividades empresariais e das empresas em fase de arranque inovadoras.

3.1.5.

A fim de assegurar um crescimento com qualidade social, importa dar atenção renovada ao trabalho improdutivo, em particular aos serviços à pessoa, ao território e às formas de organização cooperativa das atividades económicas e sociais, num contexto que coloque os laços sociais no centro do desenvolvimento e do crescimento.

3.1.6.

A este respeito, afigura-se essencial que as orientações se centrem na aplicação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, que constitui a referência para garantir um impacto adequado e positivo na sociedade das medidas destinadas a ultrapassar a crise económica e social, num contexto de risco acrescido de exclusão devido à crise sanitária (3). Face às três novas metas estabelecidas no plano de ação relativas à taxa de emprego, ao acesso à formação e adequação das competências e à luta contra a pobreza, começando pela pobreza infantil, os Estados-Membros devem identificar as políticas e os instrumentos, no âmbito do processo do Semestre Europeu, que estabelecem as etapas para a consecução dessas metas. Além disso, o Comité já sublinhou a necessidade de definir novos indicadores sociais para medir os progressos realizados pelos Estados-Membros.

3.1.7.

A participação ativa e estruturada dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil é essencial para a execução dos planos nacionais de recuperação e resiliência e para a consecução dos objetivos do plano de ação. O Comité reitera a necessidade de estabelecer procedimentos formais de consulta que facilitem o intercâmbio efetivo com os governos e as instituições nacionais e eliminem os obstáculos existentes à consulta e participação eficazes da sociedade civil. Além disso, cumpre criar instrumentos que reforcem a negociação coletiva e promovam a cobertura contratual.

3.1.8.

É evidente que a ligação entre as políticas sociais, económicas e de emprego gira em torno de sistemas de formação e aprendizagem contínua e que essas competências centrais e transversais são também cruciais para a eficácia das políticas ativas de emprego, devendo constituir uma linha diretriz das orientações.

3.1.9.

Uma das prioridades consiste em reforçar a qualidade dos sistemas de formação, tanto no que se refere ao reforço das competências transversais relacionadas com o digital e a sustentabilidade ambiental, como no atinente ao reforço das competências sociais e da capacidade de colaboração dos trabalhadores.

3.1.10.

A situação de emergência espoletou formas específicas de apoio para gerir as crises e atenuar o risco de desemprego, sendo o Programa SURE uma delas. À luz da Orientação n.o 5 e durante o processo de recuperação, a Comissão deve manter os instrumentos de financiamento e de apoio destinados a combater a crise, bem como os instrumentos e as políticas de reingresso no trabalho dos desempregados.

3.1.11.

Essas iniciativas devem permitir o apoio financeiro a medidas como regimes de tempo de trabalho reduzido, mecanismos de compensação dos rendimentos e outras medidas destinadas a evitar o desemprego, até que a atual situação de crise da COVID-19 esteja ultrapassada.

3.1.12.

Neste contexto, é fundamental prosseguir em 2021 as políticas lançadas desde 2020, através do recurso a instrumentos de solidariedade destinados a minorar as situações de maiores dificuldades de emprego, a par de políticas ativas do mercado de trabalho.

3.1.13.

Por conseguinte, afigura-se crucial fomentar o acesso ao crédito, apoiar os investimentos inovadores e produtivos e, de um modo geral, criar condições territoriais, fiscais e de infraestruturas propícias à inovação e à promoção da iniciativa económica, em especial para as PME, as empresas da economia social, o trabalho por conta própria e as atividades profissionais, a fim de impactar de forma positiva o emprego.

4.   Observações na especialidade

4.1.

O CESE reitera as observações que efetuou no seu parecer SOC/646, mas pretende salientar alguns aspetos à luz do impacto da pandemia, que pôs em evidência tanto os problemas críticos como as prioridades de ação e de intervenção. Uma vez que os desequilíbrios têm vindo a aumentar há mais de uma década, fenómeno que se agravou na sequência da crise da COVID-19, o CESE considera essencial adotar políticas eficazes para alinhar o crescimento económico com o desenvolvimento social, através de medidas destinadas a apoiar a competitividade e reforçar a qualidade dos sistemas de trabalho e das políticas de emprego. Nesse sentido, deve-se verificar que os investimentos aplicados pelos Estados-Membros no âmbito do plano nacional de recuperação e resiliência se coadunam com os objetivos estabelecidos nas orientações para 2021, dando especial atenção ao reforço da procura e da oferta de mão de obra e ao fomento de condições para a igualdade de oportunidades, o funcionamento do mercado de trabalho e a inclusão. São necessárias medidas a fim de assegurar a coordenação estreita e coerente das políticas concebidas para fazer face à crise, dos apoios concedidos pelo Programa SURE, bem como das ações e dos investimentos para a retoma no âmbito do plano de recuperação, incluindo as ações e iniciativas programadas e financiadas no âmbito dos fundos estruturais para o período 2021-2027.

4.2.

A retoma económica esperada para 2021 e viabilizada, em especial, por projetos de investimento no âmbito dos planos nacionais de recuperação e resiliência pode conduzir a uma recuperação generalizada do emprego, desde que os Estados-Membros adotem igualmente medidas específicas no domínio social e laboral para dar resposta aos desafios da mudança em curso.

4.3.

Neste contexto, importa reiterar os objetivos do Pilar Europeu dos Direitos Sociais e da Agenda para o Desenvolvimento Sustentável. Trata-se de iniciativas que devem animar a Comissão e os Estados-Membros a fazerem escolhas inelutáveis, que a pandemia tornou ainda mais evidentes e necessárias no que toca ao modelo de desenvolvimento a promover. Os objetivos previstos na agenda para a sustentabilidade económica, social e ambiental, centrados no bem-estar do ser humano, apontam para uma via de extrema importância e inspiraram algumas das opções de fundo efetuadas quer no plano de recuperação quer nas orientações principais dos fundos estruturais europeus.

4.4.

O CESE concorda com a necessidade de dinamizar a procura (Orientação n.o 5) e de assegurar salários mínimos adequados e justos a todos os trabalhadores na Europa, em conformidade com a legislação e as práticas nacionais, alargando a proteção social e o acesso aos sistemas de segurança social a todos os trabalhadores, inclusive os das novas formas de trabalho. A fim de passar da gestão da crise para a fase de recuperação, importa colocar a tónica em medidas de segurança social sustentável e incentivos eficazes à contratação, em especial para as PME. A este respeito, importa igualmente incentivar as medidas de requalificação, inclusivamente no âmbito dos regimes de tempo de trabalho reduzido devido à pandemia. Cumpre promover o diálogo social e associar os parceiros sociais a um processo de relações laborais sólido, respeitando simultaneamente a autonomia dos mesmos. A redução da carga fiscal sobre o trabalho não deve resultar numa redução da cobertura social com impacto negativo nos sistemas de segurança social e respetiva sustentabilidade. O CESE considera que se deve reforçar a luta contra a evasão e a elisão fiscais.

4.5.

No atinente à Orientação n.o 6 destinada a reforçar a oferta de mão de obra e melhorar o acesso ao emprego, as aptidões e as competências, o CESE assinala que é fundamental que cada Estado-Membro seja capaz de estabelecer uma coordenação eficaz das medidas de investimento para a formação e o mercado de trabalho previstas nos planos nacionais de recuperação e resiliência e nos fundos estruturais. Em especial, importa coordenar o FSE+ e as medidas de proteção e segurança social previstas no Programa SURE e noutros instrumentos até 31 de dezembro de 2022, a fim de promover a criação de sistemas nacionais de emprego eficazes que permitam a integração, a requalificação e a reafetação dos trabalhadores. Importa criar incentivos eficazes para a contratação e medidas de requalificação, a fim de apoiar a criação de postos de trabalho durante a recuperação.

4.6.

Com a expansão do trabalho à distância durante a pandemia, tornou-se ainda mais claro que cabe estabelecer regras e instrumentos para tornar mais virtuosa a relação entre a organização do trabalho, o bem-estar das empresas e a utilização das tecnologias digitais. O CESE reitera a importância de tirar pleno partido do potencial do teletrabalho enquanto instrumento para melhorar as condições de trabalho e conciliar a vida profissional e pessoal, evitando ao mesmo tempo que se torne uma possível fonte de discriminação e de dificuldades (4).

4.7.

A crise atual veio sublinhar ainda mais a necessidade de reconhecer e assegurar o direito à aprendizagem ao longo da vida, bem como o acesso efetivo à educação e formação de qualidade e à adaptação das competências, bem como de reduzir a atual disparidade na utilização da melhoria de competências, tanto entre os setores de produção como entre os Estados-Membros. A meta fixada no Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais relativa ao acesso à formação constitui um objetivo que aferirá a capacidade dos Estados-Membros de se dotarem de instrumentos novos que reduzam as disparidades de acesso e respondam às exigências do mercado de trabalho no domínio das novas competências necessárias.

4.8.

No que toca à Orientação n.o 7 destinada a melhorar o funcionamento dos mercados de trabalho e a eficácia do diálogo social, o CESE assinala que os objetivos de apoiar a mobilidade e a empregabilidade dos trabalhadores podem ser alcançados através da criação de uma plataforma digital europeia para a correspondência entre a procura e a oferta de trabalho, assente numa norma partilhada pelos Estados-Membros e pelos serviços de emprego, a fim de promover as políticas ativas e a mobilidade na Europa.

4.9.

O diálogo social e a negociação coletiva são um pilar importante da sustentabilidade e da resiliência das economias europeias, mas em alguns Estados-Membros ainda é necessário um quadro regulamentar e institucional (5) a nível nacional que fomente e apoie os sistemas de relações laborais. A execução dos planos nacionais de recuperação e resiliência será um teste à vontade real dos Estados-Membros de envolver e implicar a sociedade civil nas opções e nas medidas de desenvolvimento nacional.

4.10.

No atinente à Orientação n.o 8 destinada a promover a igualdade de oportunidades para todos, fomentar a inclusão social e combater a pobreza, o CESE reitera a importância de definir políticas de inclusão eficazes nesta fase, que devem ser consideradas como investimentos cruciais para o crescimento dos sistemas económicos e de produção. O CESE salienta igualmente o papel das políticas ativas de emprego enquanto instrumento de inclusão e combate à pobreza, evitando a utilização de medidas puramente assistenciais e promovendo a inclusão através da empregabilidade e da integração no mercado de trabalho. No entanto, nesta lógica, afigura-se crucial adotar medidas para evitar o risco de «nova pobreza» dos trabalhadores com rendimentos baixos, em articulação com políticas de combate à pobreza coerentes.

4.11.

Por último, a estratégia para a igualdade de oportunidades engloba elementos essenciais como a partilha de normas comuns no âmbito das políticas de género, a integração das pessoas com deficiência e das pessoas que vivem em condições precárias, assim como a criação de sistemas de promoção social que fomentem o envelhecimento ativo e a transferência de competências entre gerações.

4.12.

A pandemia deixou clara a importância de investir na garantia da saúde e segurança no local de trabalho e a urgência de reforçar as inspeções do trabalho nos Estados-Membros, a fim de assegurar a proteção dos trabalhadores. Vários países europeus assinaram protocolos com os parceiros sociais para combater a propagação do vírus no local de trabalho, demonstrando a sua responsabilidade e capacidade de resposta a situações de emergência.

Bruxelas, 23 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  JO C 232 de 14.7.2020, p. 18.

(2)  Decisão (UE) 2020/1512 do Conselho, de 13 de outubro de 2020, relativa às orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros (JO L 344 de 19.10.2020, p. 22).

(3)  JO C 374 de 16.9.2021, p. 38.

(4)  JO C 220 de 9.6.2021, p. 13 e JO C 220 de 9.6.2021, p. 1

(5)  JO C 10 de 11.1.2021, p. 14


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/103


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões «Orientações estratégicas para uma aquicultura na UE mais sustentável e competitiva para o período de 2021 a 2030»

[COM(2021) 236 final]

(2021/C 517/16)

Relator:

Anastasis YIAPANIS

Consulta

Comissão Europeia, 31.5.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

9.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

233/2/6

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE apoia todos os esforços realizados e as iniciativas lançadas pela Comissão Europeia para ajudar o setor a crescer e a tornar-se mais sustentável. Apesar disso, o setor da aquicultura da UE não está a realizar o seu verdadeiro potencial de crescimento. O CESE manifesta a sua preocupação com o facto de 65 % dos produtos aquáticos consumidos na Europa provirem de importações (1).

1.2.

As escolhas dos consumidores evoluíram para um estilo de vida mais nutritivo, com os produtos da pesca e da aquicultura a encabeçarem a lista. Esta evolução representa uma oportunidade de crescimento significativo no setor, mas também uma responsabilidade para garantir a segurança alimentar futura da UE. Garantir uma alimentação segura, saudável e sustentável na UE deve ser uma das prioridades principais.

1.3.

É necessário um esforço coordenado da Comissão Europeia e dos Estados-Membros para aumentar a capacidade de produção e a rentabilidade do setor. A simplificação imediata dos procedimentos administrativos deve ser complementada por normas ambientais rigorosas, a fim de preservar os ecossistemas e a biodiversidade e de melhorar a qualidade da água. O CESE congratula-se com a proposta da Comissão de criar balcões únicos para as licenças para aquicultura em todos os Estados-Membros.

1.4.

O CESE considera que é necessário encontrar o equilíbrio adequado entre a preservação da biodiversidade da Terra e a resposta às necessidades alimentares, tendo em conta o impacto social, a promoção de uma vida saudável e a proteção do ambiente. As águas marinhas e interiores devem ser preservadas e protegidas, promovendo ao mesmo tempo atividades aquícolas sustentáveis que garantam os alimentos necessários à população da UE.

1.5.

A disponibilidade de espaço representa um obstáculo importante para o desenvolvimento do setor. O CESE considera que as instalações aquícolas devem continuar a ser desenvolvidas, especialmente nas zonas costeiras e rurais da União, em locais que não se prestam a outras atividades económicas, e apela aos Estados-Membros para que ponham em prática projetos coordenados de ordenamento do território, incluindo a gestão do nível das bacias marítimas, a recuperação das instalações aquícolas abandonadas e os sistemas de análise dos grandes volumes de dados.

1.6.

O CESE considera que a participação dos parceiros sociais e das organizações pertinentes da sociedade civil na futura estratégia de desenvolvimento do setor gerará valor acrescentado para a União, já que estes podem proporcionar conhecimentos especializados de alto nível e excelentes oportunidades de comunicação.

1.7.

O CESE considera que a relação entre as partes interessadas ao longo das cadeias de valor deve reger-se por normas éticas. As PME e as empresas em fase de arranque devem receber todo o apoio necessário para crescerem, proporcionarem empregos de elevada qualidade e criarem novos modelos económicos sustentáveis, enquanto as parcerias público-privadas devem beneficiar de instrumentos de financiamento que cubram os compromissos a longo prazo.

1.8.

Os programas de educação e formação profissional podem contribuir para responder às necessidades do setor em termos de mão de obra altamente qualificada. Neste contexto, os convites à apresentação de propostas para o setor da aquicultura podem ser financiados pelo Fundo Social Europeu.

1.9.

Os requisitos de rotulagem desempenham um papel muito importante na informação dos consumidores sobre a qualidade dos produtos da aquicultura. Os cidadãos europeus devem receber informações fiáveis, em especial no caso dos produtos provenientes de países com um quadro legislativo escasso ou inexistente. Os requisitos em matéria de rastreabilidade devem ser aplicados de forma ascendente, até aos centros de incubação, para todos os produtos no mercado interno. O objetivo último deve ser a plena igualdade de condições de concorrência no mercado único.

1.10.

É primordial comunicar sobre os esforços e os progressos realizados pelo setor no sentido de garantir o desempenho ambiental e climático para assegurar a aceitação social e familiarizar os consumidores com os esforços envidados. Os sistemas de gestão de resíduos são uma necessidade imediata para um setor que tem um grande potencial de redução da sua pegada ambiental. O setor tem igualmente um potencial considerável para adotar a circularidade e os recursos aquáticos renováveis, ao mesmo tempo que se esforça por reduzir o consumo de energia e as emissões de carbono.

1.11.

São necessários investimentos públicos e privados rápidos e em grande escala, especialmente em atividades de investigação e desenvolvimento. A Comissão deve promover todos os fundos disponíveis da UE e as possibilidades de parceria pertinentes por intermédio dos parceiros sociais e das redes de organizações da sociedade civil, com o objetivo último de chegar a todos os produtores, em especial às PME.

1.12.

O CESE aprecia e apoia a proposta de criação de um mecanismo de assistência à aquicultura da UE, com uma plataforma em linha específica, e considera que é urgentemente necessária a nível europeu uma estratégia de crescimento da aquicultura que reforce o potencial do setor.

2.   Contexto

2.1.

Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), a população mundial poderá aumentar em mais de dois mil milhões de pessoas em relação aos níveis atuais, atingindo os 9,15 mil milhões em 2050. O crescimento dos rendimentos será ainda mais rápido. Para responder ao aumento da procura, a FAO estima que a produção agrícola mundial em 2050 será 60 % superior à de 2005 (2). O setor da aquicultura tem o potencial de crescer e satisfazer grande parte desta procura, aliviando assim alguma da pressão que tem sido exercida sobre o setor agrícola.

2.2.

A produção aquícola é largamente dominada pelos países da Ásia, com uma quota de cerca de 89 % nas últimas duas décadas (3). Na UE, a produção aquícola varia, desde os tanques e lagoas tradicionais até à utilização de jaulas e tanques em mar aberto ou sistemas de recirculação. O setor emprega diretamente mais de 74 000 pessoas em mais de 12 000 empresas (4).

2.3.

A UE é o segundo maior comerciante de produtos da pesca e da aquicultura do mundo, a seguir à China. Como importador líquido, a UE registou um défice na balança comercial de 21 mil milhões de euros em 2019. De acordo com os números mais recentes, a produção aquícola da UE representa apenas 1,15 % da produção mundial total (5). Um estudo do Eurobarómetro de 2017 (6) revelou que a grande maioria dos cidadãos da UE consome marisco pelo menos uma vez por mês, sendo os consumidores mais velhos os que o consomem com mais frequência.

2.4.

A Comunicação da Comissão Europeia «Orientações estratégicas para o desenvolvimento sustentável da aquicultura na UE» (7) constitui uma análise muito completa da situação atual no setor da aquicultura e apresenta muitas linhas de ação válidas para que o setor possa tornar-se mais sustentável e competitivo. A UE está claramente empenhada em prosseguir a realização dos objetivos do Pacto Ecológico Europeu e da Estratégia do Prado ao Prato.

3.   Observações na generalidade

3.1.

Os peixes e outros produtos aquáticos têm um elevado valor nutricional e são fortemente recomendados para a manutenção de uma boa saúde. Os consumidores têm aumentado a sua procura e as suas expectativas em matéria de produtos sustentáveis de elevada qualidade que proporcionem uma dieta saudável. A excelente qualidade dos alimentos aquáticos da UE continua a representar uma importante vantagem competitiva. No entanto, o setor não está a realizar o seu verdadeiro potencial de crescimento e a sua percentagem da produção global está a diminuir em comparação com outras partes do mundo.

3.2.

O CESE considera que o setor da aquicultura da UE deve fornecer muito mais produtos para responder à procura no mercado interno. Continua a ser inacreditável que 65 % dos produtos aquáticos consumidos na Europa provenham de importações. No estado atual das coisas, a União Europeia está a pôr em risco a sua segurança alimentar futura. O CESE já salientou que «o desequilíbrio na balança comercial externa de produtos aquáticos da UE não é aceitável, nem do ponto de vista económico, devido ao défice comercial que produz, nem a nível social, devido às oportunidades de emprego perdidas» (8). O CESE lamenta profundamente que, cinco anos depois, a situação seja a mesma e os resultados esperados não tenham sido alcançados.

3.3.

A aquicultura continental tem um potencial de crescimento notável. A piscicultura em tanques é, sem dúvida, a forma mais ecológica de aquicultura de água doce, mas a sua produtividade é baixa. No entanto, a UE dispõe de experiência prática suficiente para gerir os tanques e a piscicultura intensiva de uma forma totalmente respeitadora do ambiente e do clima, observando simultaneamente os princípios da economia circular. É necessário garantir a plena integração das tecnologias conformes com o clima na taxonomia dos investimentos ecológicos, a fim de assegurar um financiamento sem descontinuidades. Por último, o desenvolvimento da transformação dos alimentos, tanto a nível vertical como horizontal, incluindo as novas espécies, é valioso para melhorar o valor acrescentado, a aceitação pelos consumidores, o emprego e a recirculação de alimentos e resíduos.

3.4.

A procura acrescida de alimentos nos próximos anos deve ser satisfeita através de projetos sustentáveis que proporcionem, simultaneamente, alimentos de elevada qualidade e protejam o ambiente. A UE é pioneira na realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e o CESE considera que este é o caminho certo a seguir. O setor da aquicultura é extremamente importante para a consecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, em especial o ODS 2 (Erradicar a fome, alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição e promover a agricultura sustentável), o ODS 12 (Garantir padrões de consumo e de produção sustentáveis) e o ODS 15 (Proteger, restaurar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres).

3.5.

O CESE considera que existe um grande potencial para que o setor adira à circularidade e aos recursos aquáticos renováveis, ao mesmo tempo que se esforça por reduzir o consumo de energia e as emissões de carbono. É primordial comunicar sobre os esforços e os progressos realizados pelo setor no sentido de melhorar o desempenho ambiental e climático para assegurar a aceitação social de um maior crescimento do setor e da procura dos consumidores.

3.6.

As expectativas dos cidadãos evoluíram para uma dieta mais nutritiva, estando os produtos da pesca e da aquicultura entre os mais solicitados (9). Por outro lado, a pegada ambiental e os elevados custos associados à produção de alimentos são consideráveis. É muito claro que a manutenção do statu quo não pode ser considerada sustentável e que é necessário desenvolver novos modelos económicos.

3.7.

Segundo o mesmo relatório, só há uma forma de obter uma quantidade significativamente maior de alimentos e biomassa do oceano: colher produtos do mar que, em termos médios, provenham de um nível trófico inferior ao atual. A maricultura parece estar mais próxima desse objetivo. Tal implicaria, concretamente, um novo modelo de negócio centrado no aproveitamento de espécies que atualmente não são de todo exploradas, ou o são apenas de forma limitada.

3.8.

Os moluscos e as algas desempenham um papel importante, já que estão no nível inferior da cadeia alimentar e extraem os seus nutrientes diretamente da água. Enquanto em muitos países asiáticos as algas são cultivadas e consumidas em grande escala, na UE podem ser consideradas um produto novo e só algumas são cultivadas com êxito. Embora não sejam ricas em calorias, as algas são ricas em fibras, que oferecem diversos benefícios para a saúde. O CESE aplaude a intenção da Comissão Europeia de preparar uma iniciativa específica para apoiar o consumo de algas.

3.9.

O CESE considera que a competitividade do setor pode melhorar consideravelmente mediante a criação de postos de trabalho de elevada qualidade nas zonas costeiras e rurais da União, em locais onde o desenvolvimento de outras atividades económicas é bastante difícil. O Comité entende que o desenvolvimento de futuras normas sociais, a garantia de condições de trabalho dignas e a eliminação de práticas inaceitáveis são extremamente importantes para a capacidade de criar postos de trabalho, mas também para as cadeias de abastecimento. Para garantir a segurança alimentar, é necessário que haja um equilíbrio entre os três aspetos do desenvolvimento sustentável: ambiental, social e económico.

4.   Observações na especialidade

4.1.

Dado que a gestão da aquicultura é uma competência partilhada entre a Comissão Europeia e os Estados-Membros, é necessário um esforço coordenado para melhorar a sustentabilidade e a rentabilidade do setor. Tal inclui a simplificação dos procedimentos administrativos e a plena cooperação entre a Comissão e as administrações públicas nacionais e regionais. A redução da desnecessária e persistente carga administrativa no setor deve também ser complementada por normas ambientais rigorosas, com o objetivo de preservar os ecossistemas e a biodiversidade e de melhorar a qualidade da água.

4.2.

O CESE já assinalou que «a principal causa subjacente à lentidão dos procedimentos administrativos para a prática da aquicultura e à falta de disponibilidade de locais para as explorações reside na complexidade da aplicação da regulamentação ambiental da UE, nomeadamente a Diretiva-Quadro Água, a Diretiva-Quadro Estratégia Marinha e as diretivas relativas à rede Natura 2000, pelas administrações públicas dos Estados-Membros e das suas regiões. Esta situação conduz a requisitos demasiado onerosos para as empresas de aquicultura e que, paradoxalmente, não asseguram uma maior proteção do ambiente» (10).

4.3.

O CESE congratula-se com a proposta da Comissão de criar balcões únicos para as licenças para aquicultura em todos os Estados-Membros. Tal permitiria encurtar de forma significativa o atual processo de aprovação, que é extraordinariamente moroso.

4.4.

É extremamente importante fornecer financiamento adequado, tanto privado como público, para iniciativas de aquicultura sustentável. O CESE considera que a Comissão deve promover todos os fundos pertinentes disponíveis da UE por intermédio dos parceiros sociais e das redes de organizações da sociedade civil, com o objetivo último de chegar a todos os produtores, em especial às PME. As empresas em fase de arranque devem receber todo o apoio necessário para crescerem e proporcionarem empregos de elevada qualidade, e as parcerias público-privadas devem beneficiar de instrumentos de financiamento que cubram os compromissos a longo prazo. O CESE considera igualmente que a relação entre os produtores, os retalhistas e outras partes interessadas em todas as fases de transformação, manipulação e distribuição deve reger-se por normas éticas, de forma a garantir o acesso ao mercado dos pequenos produtores e eliminar as práticas desleais.

4.5.

É necessário um investimento rápido e em grande escala em I&D para um setor que quer crescer e que tem a capacidade de proporcionar alimentos saudáveis e sustentáveis. A UE tem de elaborar uma estratégia de desenvolvimento da aquicultura que aumente o potencial do setor. Sensibilizar os produtores sobre as oportunidades de financiamento disponíveis na UE é extremamente importante num setor dominado por PME.

4.6.

O CESE considera que o mercado interno tem capacidade para absorver, pelo menos, três vezes a capacidade de produção atual. Garantir uma alimentação segura, saudável e sustentável na UE deve ser uma das principais prioridades. Além disso, a nova abordagem em matéria de aquicultura sustentável deve ter em conta o impacto do Brexit, uma vez que o setor da aquicultura europeia foi consideravelmente afetado pela saída do Reino Unido da UE.

4.7.

O CESE insta a Comissão Europeia a garantir que os produtos importados respeitem os mesmos requisitos e normas que os impostos aos produtores locais. O CESE já solicitou que «os poderes públicos [devem exigir] para as importações a mesma segurança sanitária que se exige à produção europeia, permitindo uma rastreabilidade total “desde a produção até à mesa” (11)». A rastreabilidade deve ser tratada de forma ascendente, até aos centros de incubação, para todos os produtos que entram no mercado interno. É fundamental garantir condições de concorrência equitativas para os produtores europeus e produtos seguros e de qualidade para os consumidores.

4.8.

Os requisitos de rotulagem desempenham um papel muito importante na informação dos consumidores sobre a qualidade dos produtos da aquicultura sustentáveis. A legislação da UE proporciona o quadro jurídico necessário para assegurar a igualdade de condições de concorrência, mas nem sempre é respeitada ou não é respeitada plenamente. As atividades de controlo de qualidade e rotulagem devem ser reforçadas, a fim de proteger tanto os consumidores como as empresas legítimas e de proporcionar informações fiáveis, em especial no caso dos produtos provenientes de países com um quadro legislativo escasso ou inexistente

4.9.

O CESE considera que o objetivo último da Comissão e dos Estados-Membros deve ser a plena igualdade de condições de concorrência no mercado único. Este objetivo só pode ser alcançado garantindo o pleno cumprimento das normas da UE para todos os produtos que são vendidos no mercado interno, quer sejam produzidos localmente ou importados. O CESE apela a que os produtos sejam totalmente rastreáveis e que cumpram as normas ambientais e de qualidade. O CESE considera que a rastreabilidade dos produtos da aquicultura e a transparência a nível da cadeia de abastecimento são muito importantes, especialmente para as espécies em perigo.

4.10.

As PME são desproporcionadamente afetadas pela burocracia e pelos elevados custos administrativos envolvidos na criação e funcionamento de uma empresa de aquicultura. Dado que o setor é dominado por PME e pequenas empresas familiares, o CESE solicita que sejam criados centros de informação de balcão único em todos os Estados-Membros. Estes devem ser totalmente digitalizados e fornecer informações atualizadas e em tempo real aos produtores, investidores e consumidores. Além disso, o CESE considera que devem ser criadas mais organizações de produtores, pois estas são extremamente importantes para a competitividade do setor, em especial das PME. O CESE considera que também é necessária uma plataforma específica que apoie a continuidade das atividades e as aquisições maioritárias.

4.11.

O CESE solicita um quadro específico de incentivos que apoie o setor e o oriente para a sustentabilidade. O CESE recomenda o desenvolvimento imediato de um sistema de incentivos baseado na sustentabilidade, no âmbito do ODS 14. Os incentivos fiscais à produção aquícola sustentável constituem outra alternativa a seguir.

4.12.

A disponibilidade de espaço representa outro desafio para o setor da aquicultura, visto que muitas vezes compete com outras indústrias, como os estaleiros navais, as energias renováveis, as atividades recreativas, a extração, etc. Os Estados-Membros devem pôr em prática projetos coordenados de ordenamento do território, incluindo o ordenamento do nível das bacias marítimas, a recuperação das instalações aquícolas abandonadas e os sistemas de análise dos grandes volumes de dados.

4.13.

A recolha e avaliação de dados podem desempenhar um papel importante no desenvolvimento do setor e o CESE apela a uma ação a este respeito o mais rapidamente possível. Os resultados dependerão da disponibilização dos fundos necessários e da participação direta tanto dos poderes públicos como das entidades privadas. Além disso, garantir a transferência das melhores práticas dos grupos de ação local (GAL) para os grupos de ação local da pesca (GALP) e aumentar os fundos para estes últimos melhorará a capacidade dos pequenos produtores.

4.14.

Os programas de educação e formação profissional podem contribuir para responder às necessidades do setor da aquicultura e, ao mesmo tempo, sensibilizar as gerações jovens para as oportunidades de trabalho e as carreiras no setor. O CESE solicita também a realização de cursos de formação ao longo da vida sobre práticas de aquicultura sustentável. Neste contexto, os convites à apresentação de propostas podem ser financiados pelo Fundo Social Europeu e destinar-se especificamente à indústria da aquicultura.

4.15.

Os sistemas de gestão de resíduos são uma necessidade imediata para um setor que tem um grande potencial de redução da sua pegada ambiental, juntamente com o controlo de qualidade e as normas em matéria de saúde e segurança alimentar. Tal seria particularmente importante para a sustentabilidade futura do setor.

4.16.

As ações tomadas para apoiar o setor da aquicultura nos próximos cinco anos são cruciais para o futuro do setor e desempenharão um papel fundamental na determinação do grau de dependência das importações. O CESE considera que a participação dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil nos processos de conceção e execução é extremamente importante e permitirá gerar valor acrescentado para a União, impulsionando a produtividade sustentável e a competitividade do setor.

4.17.

O CESE considera que as águas marinhas e interiores devem ser preservadas e protegidas, promovendo ao mesmo tempo atividades aquícolas sustentáveis que assegurem os alimentos necessários à população da UE. É necessário encontrar o equilíbrio adequado entre a preservação da biodiversidade da Terra e a resposta às necessidades alimentares, tendo em conta os impactos sociais, a promoção de uma vida saudável e a proteção do ambiente. A água, os nutrientes, a localização da exploração e a energia estão entre os aspetos mais importantes que determinam a sustentabilidade ecológica das explorações de aquicultura.

4.18.

Por último, o CESE valoriza todos os esforços realizados e as iniciativas lançadas pela Comissão Europeia para ajudar o setor a crescer e a tornar-se mais sustentável. A proposta de criar um mecanismo de assistência à aquicultura da UE com uma plataforma em linha específica é extremamente importante para os produtores. É ainda necessário reforçar o intercâmbio das melhores práticas entre os Estados-Membros.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  https://www.eumofa.eu/documents/20178/415635/EN_The+EU+fish+market_2020.pdf

(2)  http://www.fao.org/fileadmin/user_upload/esag/docs/AT2050_revision_summary.pdf

(3)  «Expert Working Group on Economic Report of EU aquaculture sector» [Grupo de trabalho de peritos sobre o relatório económico relativo ao setor da aquicultura da UE].

(4)  https://stecf.jrc.ec.europa.eu/reports/economic/-/asset_publisher/d7Ie/document/id/2871698

(5)  https://www.eumofa.eu/documents/20178/415635/EN_The+EU+fish+market_2020.pdf

(6)  «Eurobarómetro especial n.o 450: EU consumer habits regarding fishery and aquaculture products» [Os hábitos dos consumidores da UE relativamente aos produtos da pesca e da aquicultura].

(7)  Orientações estratégicas para o desenvolvimento sustentável da aquicultura na UE

(8)  Parecer do CESE «Eliminar os obstáculos à aquacultura sustentável na Europa» (JO C 34 de 2.2.2017, p. 73).

(9)  «Science Advice for Policy by European Academies — Food from the Oceans» [Aconselhamento científico das academias europeias para a elaboração de políticas — Os alimentos dos oceanos].

(10)  Parecer do CESE «Eliminar os obstáculos à aquacultura sustentável na Europa» (JO C 34 de 2.2.2017, p. 73).

(11)  Parecer do CESE “Orientações estratégicas para o desenvolvimento sustentável na aquicultura na UE” (JO C 67 de 6.3.2014, p. 150).


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/108


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões relativa a uma nova abordagem para uma economia azul sustentável na UE «Transformar a economia azul da UE para assegurar um futuro sustentável»

[COM(2021) 240 final]

(2021/C 517/17)

Relator:

Simo TIAINEN

Consulta

Comissão Europeia, 31.5.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Competência

Secção da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

9.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

229/0/11

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

A economia azul desempenha um papel importante e encerra um potencial cada vez maior para a economia, a criação de emprego e o bem-estar das pessoas na União Europeia (UE) e no mundo. O Comité Económico e Social Europeu (CESE) considera que é extremamente importante tirar o máximo partido dessas oportunidades, minimizando, ao mesmo tempo, o impacto adverso no clima, na biodiversidade e no ambiente. A boa qualidade das águas e a saúde dos ecossistemas aquáticos são um pré-requisito para uma economia azul próspera e sustentável.

1.2.

Além dos desafios ambientais, os intervenientes na economia azul enfrentam outros desafios, como a concorrência desleal a nível mundial e a rápida evolução tecnológica. Muitas atividades, em especial o turismo, foram severamente afetadas pela pandemia de COVID-19. Uma recuperação harmoniosa e bem-sucedida é, por conseguinte, crucial para a economia azul.

1.3.

A economia azul abrange uma vasta gama de setores e de atividades, tanto tradicionais como emergentes. A crescente diversidade das atividades da economia azul suscita desafios em termos da compatibilidade dessas atividades entre si e gera concorrência pelo espaço e pelos recursos marinhos. O CESE destaca o papel importante do ordenamento do espaço marítimo para facilitar a coexistência das várias atividades e preparar para a adaptação às alterações climáticas.

1.4.

O CESE exorta a UE a apoiar ativamente o desenvolvimento e a introdução de tecnologias e de soluções digitais e ecológicas no domínio das atividades marinhas, com vista a gerar benefícios económicos, sociais e ambientais. Salienta igualmente a importância da investigação oceanográfica, a par da investigação sobre os impactos socioeconómicos e ambientais das atividades da economia azul.

1.5.

O CESE insta a UE a promover um ambiente favorável e previsível para a inovação e o investimento, simplificando os procedimentos administrativos e proporcionando segurança no que respeita às condições regulamentares e financeiras. O Comité congratula-se com o volume de financiamento considerável previsto pela UE para apoiar a economia azul sustentável e salienta a necessidade de facilitar o acesso dos operadores nacionais e locais ao financiamento.

1.6.

O CESE realça a necessidade de considerar a economia azul da UE e o seu potencial num contexto mundial, nomeadamente em matéria de relações externas e comerciais. O Comité exorta a UE a proporcionar às empresas da União condições de concorrência equitativas em relação aos seus concorrentes internacionais e a promover o reforço da aplicação a nível mundial das convenções e acordos internacionais em matéria de cooperação económica, condições de trabalho e ambiente.

1.7.

O CESE sublinha o papel central dos parceiros sociais na antecipação das mudanças no trabalho, no apoio ao desenvolvimento de competências e na melhoria da empregabilidade dos trabalhadores na economia azul. Além disso, o diálogo social aos níveis setorial, nacional e do local de trabalho é fundamental para garantir condições de trabalho adequadas.

1.8.

Dada a sua natureza horizontal, a economia azul deve ser considerada de forma abrangente e coerente na elaboração das políticas. Tal requer uma cooperação permanente entre os responsáveis políticos a todos os níveis: entre a UE e os Estados-Membros, entre os Estados-Membros nas várias regiões e entre diferentes domínios de intervenção, como a indústria, as pescas, o comércio, os transportes, a energia, o emprego e o ambiente.

1.9.

O CESE sublinha a necessidade de as políticas da economia azul se basearem em conhecimentos científicos sólidos e em dados fiáveis e de terem plenamente em conta as necessidades e os pontos de vista dos intervenientes e partes interessadas da economia azul. O Comité apela para que se associe estreitamente os empregadores, os trabalhadores e outros intervenientes da sociedade civil à elaboração, à execução e ao acompanhamento das políticas no domínio da economia azul a nível nacional e da UE.

1.10.

Embora seja pertinente e necessário abordar a economia azul de uma forma holística e horizontal, importa igualmente considerar os diferentes setores e atividades do ponto de vista das oportunidades e dos desafios específicos que encerram, o que permite fornecer um contributo da base para o topo para as políticas da economia azul.

1.11.

Ademais, o CESE sublinha a necessidade de prever medidas educativas e de sensibilização para a importância da economia azul, que, além de gerar emprego e prosperidade, também proporciona oportunidades em termos de alimentação saudável, mobilidade e lazer, bem como para a importância de proteger o ambiente marinho, por exemplo, contra o lixo de plástico.

2.   Observações na generalidade

2.1.

O CESE acolhe com satisfação a Comunicação da Comissão Europeia relativa a uma nova abordagem para uma economia azul sustentável na UE e subscreve os seus objetivos de apoiar a transição para uma economia com impacto neutro no clima, eficiente na utilização de recursos e competitiva, em consonância com o Pacto Ecológico Europeu.

2.2.

O CESE apoia e defende uma abordagem integrada da economia azul relativamente às diversas dimensões do desenvolvimento sustentável e salienta que a economia azul contribui para a maior parte dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, nomeadamente os relacionados com os oceanos, os mares e os recursos marinhos, a ação climática, a redução da pobreza e da fome, a promoção da saúde e do bem-estar, o consumo e a produção responsáveis, o trabalho digno e o crescimento económico (1).

2.3.

A economia azul desempenha um papel importante e encerra um potencial cada vez maior para reforçar a economia da UE e mundial, o emprego de qualidade e o bem-estar das pessoas em vários locais, com benefícios específicos para as zonas rurais e costeiras. O CESE considera que é extremamente importante tirar o máximo partido dessas oportunidades.

2.4.

O Comité considera que, ao mesmo tempo, é fundamental minimizar a poluição da água e do ar, a geração de resíduos e o impacto adverso no clima e na biodiversidade. Tal reveste-se de enorme importância não apenas por razões ambientais, mas também porque a boa qualidade do ambiente e a saúde dos ecossistemas são essenciais para assegurar condições e recursos adequados para a própria economia azul. Por conseguinte, importa considerar a gestão dos aspetos ambientais como parte integrante de qualquer atividade económica.

2.5.

A economia azul abrange uma vasta gama de atividades essenciais para a vida quotidiana das pessoas, e as empresas envolvidas vão desde grandes empresas internacionais a pequenas e médias empresas (PME) locais. A produção alimentar e energética, a mineração, as indústrias marítimas, o transporte e o turismo são atualmente os principais setores relacionados com o mar, mas estão a emergir novos setores, como é o caso da produção de novos tipos de produtos da bioeconomia azul. A economia circular e as atividades de proteção das águas também estão intrinsecamente ligadas à economia azul.

2.6.

A economia azul, por definição ligada aos oceanos, mares e zonas costeiras, diz sobretudo respeito aos países situados junto ao mar. No entanto, num contexto de cadeias de abastecimento transfronteiras e de mercados comuns, bem como de um clima e de um ambiente partilhados, a economia azul assume relevância para toda a União e respetivos Estados-Membros — do mar Mediterrâneo ao oceano Ártico, passando pelo mar Báltico, e do mar Negro ao oceano Atlântico, passando pelo mar do Norte.

2.7.

O CESE salienta igualmente que o conceito de economia azul não se deve limitar aos mares e oceanos, uma vez que existem atividades económicas análogas que dependem dos recursos de água doce e que, em última instância, os cursos de água interiores acabam por desaguar nos mares e oceanos. Tal sublinha a importância da cooperação regional no controlo da poluição da água.

2.8.   Desafios e oportunidades

2.8.1.

A crescente diversidade das atividades da economia azul suscita desafios em termos da compatibilidade dessas atividades entre si e gera concorrência pelo espaço e pelos recursos marinhos. Por conseguinte, o CESE realça o papel do ordenamento do espaço marítimo, incluindo a gestão integrada e a avaliação dos impactos cumulativos, e insta os Estados-Membros a procurar e a afetar espaços adequados às diversas atividades, a fim de permitir o seu desenvolvimento e coexistência, com um impacto negativo mínimo noutros intervenientes e no ambiente marinho.

2.8.2.

Embora os mares e os oceanos desempenhem um papel significativo enquanto sumidouros de carbono, os ecossistemas marinhos e as zonas costeiras são vulneráveis às alterações climáticas e aos seus efeitos, nomeadamente ao aquecimento das águas, à subida do nível do mar e aos fenómenos meteorológicos extremos. Por essas razões, o CESE considera que se tem de preparar de forma adequada a economia azul para a adaptação às alterações climáticas e insta os Estados-Membros a considerarem essa adaptação como um elemento essencial do ordenamento do espaço marítimo, privilegiando medidas que contribuam também para a preservação da biodiversidade. Além disso, o aumento da frequência das secas e a crescente escassez de água doce exigem novas soluções para garantir a segurança alimentar.

2.8.3.

O CESE salienta que os intervenientes na economia azul enfrentam também muitos outros desafios, como a concorrência desleal a nível mundial e a rápida evolução tecnológica. Acresce que muitas atividades foram gravemente afetadas pela pandemia de COVID-19 e devem fazer face ao seu impacto. É o caso, em especial, do turismo e dos serviços conexos. Uma recuperação harmoniosa e bem-sucedida — em linha com as transições ecológica e digital — é, por conseguinte, crucial para a economia azul.

2.8.4.

Em geral, a economia azul proporciona muitas oportunidades no que respeita às transições digital e ecológica, cujo aproveitamento exigirá esforços consideráveis no domínio da investigação e da inovação. Trata-se de um aspeto essencial tanto para o desenvolvimento das atividades tradicionais como para a criação de atividades novas, contribuindo assim para atrair os jovens e diversificar o espetro da economia azul.

2.8.5.

O CESE exorta a UE a apoiar ativamente o desenvolvimento e a introdução de soluções digitais no âmbito das atividades relacionadas com o mar, incluindo a sua utilização na cartografia marítima e na monitorização, exploração, modelização e previsão do estado do ambiente e dos recursos marinhos. A inovação é igualmente necessária para melhorar a eficiência energética e dos materiais e ajudar a reduzir as emissões de gases com efeito de estufa, a poluição do ar e da água e a quantidade de resíduos. Importa, em especial, não descurar o apoio às pequenas empresas durante as transições ecológica e digital. O CESE insta igualmente ao intercâmbio de boas práticas e à expansão das inovações sociais criadas pelos intervenientes e pelas partes interessadas da economia azul, nomeadamente com vista a reforçar a interconectividade, a resiliência, a transparência e a equidade das cadeias de valor.

2.8.6.

O desenvolvimento de uma economia azul sustentável requer uma compreensão adequada dos fenómenos físicos, químicos e biológicos relacionados com o mar, bem como da respetiva evolução. O CESE salienta a importância da investigação oceanográfica, acompanhada da investigação sobre os impactos socioeconómicos e ambientais das atividades da economia azul, seguindo a abordagem da ciência aberta e recorrendo a projetos de ciência cidadã.

2.8.7.

Ao concretizar o potencial de criação de emprego da economia azul, é essencial privilegiar o emprego de alta qualidade que promove o bem-estar dos indivíduos. É igualmente necessário desenvolver a formação avançada e as competências transversais, o reconhecimento mútuo das qualificações, a mobilidade intersetorial e a adaptabilidade às mudanças do mercado de trabalho. O CESE apela aos Estados-Membros e aos prestadores de serviços de educação para que tenham em atenção estas necessidades na elaboração dos programas de ensino e de formação, incluindo nos programas para a melhoria de competências e requalificação, colaborando para tal com os representantes dos operadores da economia azul e os parceiros sociais e utilizando, entre outros recursos, o Fundo Social Europeu Mais.

2.8.8.

O CESE sublinha também o papel fundamental dos parceiros sociais na antecipação das mudanças no trabalho, no apoio ao desenvolvimento de competências e na melhoria da empregabilidade dos trabalhadores na economia azul. Além disso, o diálogo social a nível setorial, nacional e do local de trabalho, incluindo a negociação coletiva, é essencial não só para garantir determinadas normas mínimas, mas também para melhorar as condições de trabalho em todos os setores da economia azul.

2.9.   Investimento, financiamento e quadro internacional

2.9.1.

A fim de aproveitar o potencial da economia azul sustentável, o CESE insta a UE a promover um ambiente favorável e previsível para a inovação, o investimento e o exercício da atividade, nomeadamente simplificando os procedimentos administrativos e proporcionando segurança no que respeita às condições regulamentares e financeiras. A comunicação da Comissão é um instrumento útil para assegurar a previsibilidade, uma vez que estabelece uma visão a longo prazo e um quadro abrangente.

2.9.2.

O Comité congratula-se com o volume de financiamento considerável previsto pela UE para apoiar a economia azul sustentável, que inclui fundos especificamente vocacionados para o setor marítimo e instrumentos gerais, como o Horizonte Europa, os Fundos Europeus Estruturais e de Investimento e o Mecanismo de Recuperação e Resiliência. O CESE salienta a necessidade de facilitar o acesso dos operadores nacionais e locais ao financiamento da UE.

2.9.3.

Para desenvolver a economia azul, importa igualmente mobilizar financiamento privado, pelo que os projetos devem ser atrativos para os investidores privados e os especialistas financeiros, guiados por princípios e normas de financiamento sustentável. Além disso, o CESE apela para o reforço dos projetos de parceria entre o setor público, as empresas e os cidadãos no terreno.

2.9.4.

O CESE sublinha a necessidade de considerar a economia azul da UE e o seu potencial num contexto mundial, dado que a maioria das atividades da economia azul tem ligações internacionais através do comércio e das cadeias de abastecimento ou de áreas marinhas partilhadas. A cooperação internacional e a aplicação de regras comuns são, por conseguinte, necessárias para garantir condições de concorrência equitativas e evitar conflitos no que respeita aos recursos marinhos. O CESE incentiva a UE a promover o reforço da aplicação a nível mundial das convenções e dos acordos internacionais em domínios como o comércio, os transportes, as condições de trabalho, o clima e o ambiente, para além da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar.

2.9.5.

O CESE exorta a UE a assegurar que a economia azul beneficia de condições competitivas no seu território relativamente a outros intervenientes internacionais como a China. Tais condições são necessárias para que as empresas da UE possam exportar produtos, tecnologias e soluções da economia azul sustentável para mercados internacionais e competir com êxito com as importações de países terceiros.

2.9.6.

O CESE chama igualmente a atenção para as oportunidades proporcionadas pela cooperação com os países em desenvolvimento e incentiva a UE a reforçar a importância da economia azul no âmbito da parceria com África.

2.10.   Elaboração de políticas coerentes e inclusivas

2.10.1.

Dada a sua natureza horizontal, a economia azul deve ser considerada de forma abrangente e coerente na elaboração das políticas. Tal requer uma cooperação permanente entre os responsáveis políticos a todos os níveis, tanto vertical como horizontalmente: entre os responsáveis políticos da UE e nacionais, entre os Estados-Membros e entre diversos domínios de intervenção, como a indústria, as pescas, o comércio, os transportes, a energia, o emprego e o ambiente.

2.10.2.

A cooperação regional entre os Estados-Membros e com países terceiros reveste-se de particular importância (2), tendo em conta a natureza transfronteiriça das áreas marinhas e de muitos cursos de água interiores. A cooperação é também fundamental para garantir a segurança das atividades relacionadas com o mar e proteger os direitos humanos e o ambiente face a um vasto leque de ameaças externas e internas, desde os riscos geopolíticos à pirataria, passando pelas infrações ambientais e pela cibercriminalidade.

2.10.3.

O CESE sublinha a necessidade de as políticas e medidas relativas à economia azul se basearem em factos assentes em conhecimentos científicos sólidos e em dados fiáveis. Além disso, tendo em conta o papel fundamental que os intervenientes da sociedade civil desempenham na criação de uma economia azul sustentável efetiva, o Comité apela para que se associem estreitamente as associações patronais e as organizações de trabalhadores, bem como as organizações ambientais e outras organizações interessadas, à definição, à execução e ao acompanhamento das políticas da UE e nacionais.

2.10.4.

O CESE solicita à Comissão que prossiga o trabalho com vista à elaboração de um roteiro de ação mais específico, que deverá basear-se nas opiniões e nos contributos de vários intervenientes e partes interessadas na economia azul e fazer uso do diálogo que terá lugar no Fórum Azul para os utilizadores do mar.

2.10.5.

O CESE sublinha igualmente a necessidade de prever medidas educativas e de sensibilização para a importância da economia azul, que, além de gerar emprego e prosperidade, também proporciona oportunidades em termos de alimentação saudável, mobilidade e lazer, bem como para a importância de proteger o ambiente marinho, por exemplo, contra o lixo de plástico.

3.   Observações na especialidade

3.1.

Ainda que seja pertinente e necessário abordar a economia azul de modo holístico e horizontal, importa igualmente considerar os diferentes setores e atividades do ponto de vista das oportunidades e dos desafios específicos que apresentam. Tal possibilita um contributo da base para o topo e a sua combinação com a abordagem do topo para a base da comunicação da Comissão.

3.2.   Transporte e portos

3.2.1.

O transporte marítimo é fundamental para a logística do transporte de mercadorias e para o transporte de passageiros tanto no interior como no exterior da UE. O CESE insta a UE a reforçar as condições para promover a competitividade internacional, a digitalização e a ecologização do transporte marítimo e a trabalhar no sentido de eliminar as práticas que conduzem a uma concorrência desleal, como as práticas abusivas no contexto da navegação sob pavilhão estrangeiro. Complementarmente aos avanços nas tecnologias individuais, as soluções digitais ao nível do sistema ajudam a melhorar o desempenho económico e ambiental dos transportes, por exemplo, através de uma melhor correspondência entre a oferta e a procura. Importa também tirar pleno partido dos benefícios do transporte marítimo de curta distância para reduzir os impactos ambientais do transporte. Além disso, o CESE chama a atenção para as oportunidades proporcionadas pelas novas rotas de transporte mundiais, tais como a Passagem do Nordeste no Ártico.

3.2.2.

O CESE realça o papel essencial dos portos como polos da economia azul, nomeadamente no âmbito das transições ecológica e digital. Embora os portos mantenham a sua função tradicional de facilitação do transporte marítimo e locais de desembarque de peixe, o seu papel tem vindo a ser alargado para incluir novas atividades como a promoção das energias renováveis e da economia circular. Tal exige investimentos em infraestruturas e um novo tipo de gestão global. Esses novos papéis podem também fazer com que os portos de menor dimensão assumam maior importância para as respetivas regiões.

3.3.   Pesca, aquicultura e novos bioprodutos

3.3.1.

O CESE destaca o papel importante da pesca, da aquicultura e das indústrias conexas para proporcionar aos cidadãos europeus uma alimentação hipocarbónica saudável. Tendo em conta a elevada quantidade de peixe e marisco importados pela UE, justifica-se reduzir a sua dependência das importações de géneros alimentícios e proporcionar condições competitivas na pesca, na aquicultura e nas indústrias conexas europeias, a fim de dar resposta a questões de segurança e soberania alimentares. Dada a vetustez da frota de pesca da UE, importa atribuir financiamento ao abrigo do Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos, das Pescas e da Aquicultura para modernizar as frotas e melhorar, assim, o seu desempenho ambiental, bem como as condições de trabalho e a atratividade destas atividades. O CESE reconhece os esforços realizados pelo setor da pesca para manter as unidades populacionais de peixe a níveis sustentáveis e proteger os ecossistemas marinhos e incentiva a prossecução desses esforços. Além disso, encoraja a partilha de práticas concretas, como o contributo dos arrastões para a recolha de lixo de plástico.

3.3.2.

No que diz respeito à aquicultura, o CESE remete para outro parecer, que se centra nas novas orientações estratégicas para a aquicultura na UE (3). Apoia igualmente o desenvolvimento de novos bioprodutos, tais como produtos farmacêuticos, alimentos e aditivos alimentares, alimentos para animais, cosméticos, e novos materiais baseados em algas e noutros organismos marinhos. Estes bioprodutos complementam o espetro da bioeconomia azul, tema que foi objeto de um parecer anterior do CESE (4), que abrangeu igualmente a questão das águas doces.

3.4.   Turismo e serviços conexos

3.4.1.

O turismo marítimo e costeiro, a que estão associadas várias atividades como o transporte e os serviços de hotelaria e restauração, é vital para muitas regiões da UE. No que respeita às medidas para responder aos problemas causados pela pandemia, o CESE remete para o seu parecer sobre turismo e transportes (5). Após a recuperação da pandemia, o turismo deverá retomar o seu importante papel enquanto setor que contribui para a economia e o emprego de qualidade a nível local, frequentemente com base em PME, de uma forma que assegure a sua sustentabilidade global. O CESE salienta que o turismo sustentável é um meio fundamental de proporcionar às pessoas atividades de lazer e de lhes dar a conhecer e descobrir a diversidade de culturas e ambientes da UE.

3.5.   Construção naval e tecnologia marítima

3.5.1.

A construção naval é uma indústria marítima tradicional que serve o transporte de mercadorias e de passageiros, mas na qual estão a ser introduzidos muitos elementos e abordagens novos, em consonância com as transições digital e ecológica. A título de exemplo, a automatização avançada de navios contribui para melhorar a eficiência energética e a segurança do transporte, e o desenvolvimento e a adoção de técnicas de propulsão não poluentes e de combustíveis renováveis são fundamentais para minimizar as emissões atmosféricas. As tecnologias e práticas de reparação, manutenção e desmantelamento de navios que reforçam a economia circular constituem também elementos essenciais desta evolução. O CESE insta, por conseguinte, a UE a promover condições favoráveis para o desenvolvimento das tecnologias marítimas e o investimento nas mesmas, nomeadamente no que diz respeito a equipamentos, software e mão de obra.

3.6.   Energia

3.6.1.

Tradicionalmente centradas na exploração de combustíveis fósseis, as atividades de produção de energia com base no mar estão atualmente orientadas para as energias renováveis, principalmente a energia eólica e a energia oceânica. A introdução de energias renováveis é fundamental para a realização de progressos no sentido da neutralidade climática, e a energia renovável relacionada com o mar pode contribuir significativamente para o futuro cabaz energético e para a redução das emissões de carbono. Ao mesmo tempo, é necessário encontrar soluções para abordar os interesses divergentes entre as várias utilizações das áreas marinhas. O Comité expressou o seu ponto de vista sobre a energia de fontes renováveis ao largo no seu recente parecer sobre a estratégia para este tipo de energia (6).

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  https://www.un.org/sustainabledevelopment/oceans/

(2)  Parecer do CESE «Iniciativa a favor do desenvolvimento sustentável da economia azul no Mediterrâneo Ocidental» (JO C 129 de 11.4.2018, p. 82).

(3)  Parecer do CESE «Orientações estratégicas para o desenvolvimento sustentável da aquicultura na UE» (NAT/816, ver página 103 do presente Jornal Oficial).

(4)  Parecer do CESE «Bioeconomia azul» (JO C 47 de 11.2.2020, p. 58).

(5)  Parecer do CESE «Turismo e transportes em 2020 e mais além» (JO C 429 de 11.12.2020, p. 219).

(6)  Parecer do CESE «Estratégia da UE para aproveitar o potencial de energia de fontes renováveis ao largo com vista a um futuro climaticamente neutro» (JO C 286 de 16.7.2021, p. 152).


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/114


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre um plano de ação para o desenvolvimento da produção biológica

[COM (2021) 141 final]

(2021/C 517/18)

Relator:

Andreas THURNER

Consulta

Comissão Europeia, 21.4.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

9.9.2021

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

185/3/4

1.   Conclusões e recomendações

O Comité Económico e Social Europeu (CESE):

1.1.

reconhece o papel da agricultura biológica na consecução dos objetivos do Pacto Ecológico Europeu e congratula-se com a comunicação da Comissão Europeia em apreço sobre um plano de ação para promover a produção biológica; é de opinião que a proposta constitui uma base sólida para o desenvolvimento sustentável desse setor;

1.2.

considera muito ambicioso o objetivo formulado no Pacto Ecológico Europeu de dedicar pelo menos 25 % das terras agrícolas da UE à agricultura biológica até 2030;

1.3.

apoia, em particular, a abordagem da Comissão Europeia orientada para o mercado de reforçar a procura e a confiança dos consumidores nos produtos biológicos. O êxito do desenvolvimento do setor biológico depende de um equilíbrio adequado entre a oferta e a procura;

1.4.

recomenda, tendo em conta as diferentes situações existentes nos Estados-Membros, o estabelecimento de um tipo de «mecanismo de geminação» que permita reforçar o intercâmbio de experiências entre os Estados-Membros, cabendo igualmente promover os intercâmbios entre agricultores; manifesta a sua inteira disponibilidade para colaborar, enquanto parceiro, em atividades de sensibilização para a produção biológica (por exemplo, no âmbito de um Dia Biológico da UE a celebrar anualmente);

1.5.

insta os Estados-Membros a elaborarem, em colaboração com as partes interessadas pertinentes, planos de ação nacionais ou regionais para o desenvolvimento da produção biológica e a aproveitarem as possibilidades da política agrícola comum (PAC) para apoiar a agricultura biológica. A fase de conversão para a agricultura biológica é complexa e requer especial atenção;

1.6.

considera importantes as medidas propostas para melhorar a transparência do mercado e as bases de dados no setor biológico. Apela, a este respeito, para que também se apresente de forma adequada a evolução do setor biológico na conferência anual sobre as perspetivas agrícolas da UE organizada pela Direção-Geral da Agricultura e do Desenvolvimento Rural (DG AGRI);

1.7.

recorda que os consumidores valorizam cada vez mais os produtos alimentares regionais; considera que as cadeias de produção e de comercialização de produtos biológicos mais curtas e locais, que têm em conta a sazonalidade, são uma via promissora para gerar mais valor acrescentado ao longo da cadeia alimentar e vê potencial neste contexto para a criação de novas oportunidades de emprego nas zonas rurais;

1.8.

salienta que os produtos biológicos são geralmente mais caros do que os produtos convencionais, o que constitui um obstáculo para determinados grupos sociais com rendimentos baixos. Por conseguinte, insta à adoção de medidas de apoio adequadas, para que os grupos socialmente vulneráveis também possam aceder aos produtos biológicos;

1.9.

considera, em particular, que o setor público (poder local, regional, central) com responsabilidade por contratos públicos (p. ex. cantinas) deve apostar cada vez mais em géneros alimentícios biológicos regionais, tendo também devidamente em conta o aspeto da sazonalidade;

1.10.

destaca a necessidade de atribuir recursos financeiros adequados para apoiar a investigação e a inovação no setor biológico.

2.   Contexto

2.1.

No âmbito do Pacto Ecológico Europeu, a Comissão Europeia estabeleceu um objetivo ambicioso para a produção biológica na UE com a Estratégia do Prado ao Prato e a Estratégia de Biodiversidade: dedicar pelo menos 25 % das terras agrícolas da UE à agricultura biológica até 2030. Em 25 de março de 2021, a Comissão Europeia publicou um plano de ação para o desenvolvimento da produção biológica (1), destinado a apoiar os Estados-Membros na aplicação desse objetivo.

2.2.

De acordo com a Comissão Europeia, este plano de ação para a produção biológica baseia-se nas realizações do plano de ação de 2014-2020 e tem em conta os resultados da consulta pública sobre a produção biológica realizada entre setembro e novembro de 2020 (2). O plano está dividido em três eixos interligados:

Eixo 1: estimular a procura e assegurar a confiança dos consumidores;

Eixo 2: estimular a conversão e reforçar toda a cadeia de valor;

Eixo 3: melhorar a contribuição da agricultura biológica para a sustentabilidade.

2.3.

Os três eixos baseiam-se em 23 medidas e devem ser mobilizadas várias fontes de financiamento. O apoio financeiro à agricultura biológica continuará a ser proporcionado através de compromissos em matéria de desenvolvimento rural (pilar 2), podendo ser disponibilizado um fluxo de financiamento adicional através de regimes ecológicos (pilar 1). Além disso, o consumo de produtos biológicos será impulsionado através de um orçamento ambicioso destinado à política de promoção da UE.

2.4.

Os serviços de aconselhamento agrícola serão reforçados, de modo a promover o intercâmbio de conhecimentos sobre a agricultura biológica. Para apoiar as ambições do plano de ação, a Comissão Europeia tenciona afetar, pelo menos, 30 % do orçamento destinado às ações de investigação e inovação no domínio da agricultura, da silvicultura e das zonas rurais a tópicos específicos ou pertinentes para o setor biológico, tais como o aumento do rendimento das culturas, a diversidade genética e alternativas aos produtos polémicos.

2.5.

Mais detalhadamente, no âmbito de cada um dos três eixos, as ações propostas visarão:

Eixo 1: estimular a procura e assegurar a confiança dos consumidores

a)

promover a agricultura biológica e o logótipo da UE;

b)

promover as cantinas biológicas e aumentar a utilização de contratos públicos ecológicos;

c)

reforçar os regimes de distribuição de produtos biológicos nas escolas;

d)

prevenir a fraude alimentar e reforçar a confiança dos consumidores;

e)

melhorar a rastreabilidade;

f)

facilitar a contribuição do setor privado.

Eixo 2: estimular a conversão e reforçar toda a cadeia de valor

a)

encorajar a conversão, o investimento e o intercâmbio de boas práticas;

b)

desenvolver a análise setorial para aumentar a transparência do mercado;

c)

apoiar a organização da cadeia alimentar;

d)

reforçar a transformação local e de pequeno volume e promover o circuito comercial reduzido;

e)

melhorar a nutrição animal em conformidade com as regras em matéria de produção biológica;

f)

reforçar a aquicultura biológica.

Eixo 3: melhorar a contribuição da agricultura biológica para a sustentabilidade

a)

reduzir a pegada ambiental e atenuar a contribuição para as alterações climáticas;

b)

melhorar a diversidade genética e aumentar os rendimentos;

c)

desenvolver alternativas aos insumos polémicos e a outros produtos fitofarmacêuticos;

d)

melhorar o bem-estar dos animais;

e)

aproveitar os recursos de forma mais eficiente.

2.6.

Para a sua execução, a Comissão Europeia recomenda que os Estados-Membros elaborem planos de ação nacionais adequados para o desenvolvimento da produção biológica, com objetivos claros que tenham em conta as especificidades regionais, além de os integrarem devidamente no plano estratégico nacional para a PAC.

2.7.

O presente parecer deve ser apreciado em conjunto com os pareceres anteriores do CESE sobre a sustentabilidade da produção e do consumo de alimentos (nomeadamente os pareceres sobre temas como a compatibilidade da política comercial da UE com o Pacto Ecológico Europeu (3); a Estratégia do Prado ao Prato para uma estratégia de alimentação sustentável (4); a promoção de cadeias de abastecimento alimentar alternativas e curtas na UE e o papel da agroecologia (5); e a promoção de regimes alimentares saudáveis e sustentáveis na UE (6)).

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE considera muito ambicioso o objetivo formulado no Pacto Ecológico Europeu de dedicar pelo menos 25 % das terras agrícolas da UE à agricultura biológica até 2030. Atualmente, este valor está próximo dos 8,5 %, o que significa que é preciso sensivelmente triplicar a superfície destinada à agricultura biológica até 2030. Numa perspetiva comparativa, entre 2009 e 2019, essa área aumentou de cerca de 8,3 para aproximadamente 13,8 milhões de hectares (+70 %), o que denota uma tendência de crescimento. O objetivo de 25 % implica aumentar para cerca de 40 milhões de hectares a superfície destinada à agricultura biológica, muito acima do ritmo de crescimento atual.

3.2.

O CESE congratula-se com a abordagem da Comissão Europeia orientada para o mercado de reforçar a procura e a confiança dos consumidores nos produtos biológicos. O êxito do desenvolvimento do setor biológico depende de um equilíbrio adequado entre a oferta e a procura.

3.3.

A expansão da produção biológica deve também ser orientada pela procura. Importa assegurar que o aumento da procura é proporcional ao crescimento da oferta. Se a produção de alimentos biológicos ultrapassar a procura, tal conduzirá inevitavelmente a uma concorrência negativa no mercado e, consequentemente, a uma queda dos preços no produtor.

3.4.

A agricultura biológica implica geralmente custos de produção mais elevados por unidade (devido a custos adicionais e a um menor rendimento das culturas) em comparação com a agricultura convencional. Para que o desenvolvimento do setor biológico seja sustentável, esses custos adicionais têm de ser suportados igualmente por receitas adequadas do mercado. No entanto, à medida que toda a cadeia de produção alimentar biológica se profissionaliza, a relação custo-benefício deve evoluir positivamente.

3.5.

A situação existente varia bastante entre Estados-Membros: em alguns deles, a agricultura biológica e a sua comercialização já estão bem estabelecidas, ao passo que noutros Estados-Membros a percentagem de terras agrícolas destinadas à agricultura biológica não ultrapassa sequer um só dígito. Estes pontos de partida regionais tão diferentes devem ser tidos em devida consideração no planeamento das medidas. O CESE recomenda o estabelecimento de um tipo de «mecanismo de geminação» que permita reforçar o intercâmbio de experiências entre os Estados-Membros. Aqueles que têm um setor biológico bem estabelecido adotaram amiúde uma abordagem dita «push-pull», ou seja, no lado da oferta e da procura, aplicando simultaneamente quer medidas de estímulo à produção, quer medidas de reforço da procura de produtos biológicos. Além disso, o comércio retalhista alimentar desempenha um papel fundamental no desenvolvimento do setor biológico.

3.6.

Na Europa, a multiplicidade de estruturas e as consideráveis diferenças regionais conduzem sempre a situações e questões complexas quando da aplicação das disposições do regulamento relativo à produção biológica. A fim de permitir o desenvolvimento e a prosperidade do setor, a sua aplicação deve assentar num equilíbrio que permita uma aplicação uniforme das regras em toda a UE e a satisfação das expectativas dos consumidores, mas também que proporcione a flexibilidade necessária para ter devidamente em consideração as diferenças e as especificidades locais, dentro dos limites do regulamento.

3.7.

O plano de ação da Comissão Europeia para o desenvolvimento da produção biológica constitui, com os seus três eixos (promoção do consumo, aumento da produção e reforço da sustentabilidade), uma base sólida para o desenvolvimento sustentável do setor biológico. A sua aplicação nos Estados-Membros deve ser acompanhada de um processo contínuo de monitorização e avaliação.

3.8.

Os Estados-Membros devem elaborar, em colaboração com as partes interessadas pertinentes, planos de ação nacionais ou regionais para o desenvolvimento da produção biológica e aproveitar as possibilidades da PAC para apoiar a agricultura biológica (nomeadamente no âmbito da elaboração dos planos estratégicos nacionais para a PAC).

4.   Observações na especialidade

4.1.

O êxito da agricultura biológica depende de uma confiança elevada dos consumidores, que devem poder confiar no cumprimento das normas de produção aplicáveis ao longo da cadeia alimentar, desde a produção ao consumo, passando pela transformação. Por conseguinte, as medidas previstas para prevenir a fraude e melhorar a rastreabilidade revestem-se de particular importância. Neste contexto, cabe tirar partido, em especial, das possibilidades proporcionadas pela digitalização.

4.2.

As medidas previstas para melhorar a transparência do mercado e as bases de dados no setor biológico ajudarão os operadores económicos a tirar as conclusões corretas deste processo. Até ao momento, as estatísticas a nível europeu não distinguem, na sua maioria, entre segmentos de produtos convencionais e biológicos. A inclusão da produção biológica na análise realizada pelos observatórios do mercado da DG AGRI é um passo na direção certa. A este respeito, propõe-se que também se apresente de forma adequada a evolução do setor biológico na conferência anual da DG AGRI sobre as perspetivas agrícolas da UE.

4.3.

O reforço previsto dos serviços de aconselhamento agrícola e as medidas de promoção do intercâmbio de conhecimentos sobre a agricultura biológica são medidas de apoio importantes. Importa intensificar os intercâmbios entre o mundo científico, os consultores, o mundo educativo, os agricultores e a sociedade. Os programas de intercâmbio regionais e internacionais podem ser muito benéficos, em especial para os jovens agricultores.

4.4.

Também os consumidores devem ser informados, através de medidas de sensibilização adequadas (idealmente a começar na escola), sobre os benefícios e os desafios associados aos produtos biológicos. O regime de distribuição de fruta, produtos hortícolas e leite nas escolas da UE (7) pode constituir uma boa plataforma para o efeito.

4.5.

A fim de aumentar a consciencialização para a produção biológica, a Comissão Europeia prevê, nomeadamente, introduzir um Dia Biológico da UE anual e criar prémios de excelência em todos os setores da cadeia alimentar biológica. O CESE manifesta a sua inteira disponibilidade para colaborar, enquanto parceiro, nessas iniciativas.

4.6.

Os consumidores valorizam cada vez mais os produtos alimentares regionais. A pandemia de COVID-19 tornou as pessoas ainda mais sensíveis em relação à qualidade dos alimentos. A combinação de cadeias de produção e de comercialização de produtos biológicos mais curtas e locais são uma via promissora para gerar mais valor acrescentado. Na perspetiva da sustentabilidade, importa considerar os aspetos da produção biológica, da regionalidade e da sazonalidade, tanto quanto possível, em conjunto. O reforço do logótipo biológico da UE deve ser prosseguido em sintonia com o reforço dos logótipos biológicos nacionais ou regionais já existentes. As informações sobre a origem dos alimentos (matérias-primas) devem ser tão específicas quanto possível, indo além do rótulo «Agricultura UE/não UE» e, sempre que possível, identificando o país ou a região.

4.7.

O turismo e a gastronomia encerram grande potencial para os produtos biológicos. Para libertar esse potencial, importa assegurar a transparência e sistemas de certificação credíveis.

4.8.

A agricultura biológica assenta, muitas vezes, em múltiplos processos de produção com necessidades elevadas de mão de obra, pelo que tem também potencial para criar oportunidades de emprego adicionais nas zonas rurais. Em contrapartida, os custos elevados da mão de obra podem, por sua vez, travar o desenvolvimento do setor biológico.

4.9.

Por norma, os produtos biológicos são mais caros do que os produtos convencionais, mas a diferença de preços tem vindo a diminuir (não apenas graças ao aumento da produtividade na agricultura biológica, mas também devido ao reforço dos requisitos ambientais aplicáveis a outras formas de agricultura no âmbito da evolução da PAC). Para determinados grupos sociais com rendimentos baixos, tais como pensionistas, jovens ou famílias de camadas sociais mais desfavorecidas, tal pode constituir um obstáculo. Por conseguinte, o CESE insta à adoção de medidas adequadas, para que estes grupos sociais também possam aceder aos produtos biológicos.

4.9.1.

As organizações de defesa do consumidor alertam para o facto de as margens no comércio relativas aos produtos biológicos serem em parte significativamente mais elevadas do que as relativas aos produtos não biológicos, o que também pode prejudicar a fixação dos preços dos produtos biológicos em relação aos géneros alimentícios convencionais. As margens dos comerciantes devem ser razoáveis.

4.9.2.

Nalguns Estados-Membros, a diferença de preços por vezes acentuada em relação aos produtos convencionais constitui um obstáculo significativo ao crescimento do mercado de consumo de produtos biológicos. Ao mesmo tempo, os preços dos géneros alimentícios biológicos também integram os benefícios elevados para bens públicos, como a biodiversidade nas terras agrícolas ou o bem-estar animal. Nesta perspetiva, a integração de externalidades (custos reais) em todos os produtos constitui uma forma de apoiar o setor da agricultura biológica.

4.9.3.

Em particular, o CESE considera ainda que o setor público (poder local, regional, central) com responsabilidade por contratos públicos (p. ex. cantinas) deve dar o exemplo e apostar cada vez mais em géneros alimentícios biológicos regionais e sazonais. Muitas cidades europeias (8) (nomeadamente Copenhaga, Viena, Nuremberga) já aplicaram estratégias nesse sentido com grande sucesso.

4.9.4.

As cadeias alimentares mais curtas e as oportunidades de comercialização direta junto dos consumidores podem ser uma via para alcançar preços razoáveis tanto para os produtores como para os consumidores.

4.10.

Uma maior percentagem de terras agrícolas destinadas à agricultura biológica trará novos desafios. Importa estabelecer estratégias para acompanhar de perto a evolução da pressão exercida pelas pragas e das doenças das plantas ligadas ao avanço das alterações climáticas. É necessário financiar devidamente a investigação aplicada, a fim de criar variedades adequadas para a agricultura biológica e elaborar medidas fitossanitárias eficazes e soluções inovadoras. Por conseguinte, o CESE salienta que se deve assegurar o acesso livre às variedades e às sementes.

4.11.

No que se refere à nutrição animal, há já vários anos que é difícil obter quantidades suficientes de alimentos proteicos para animais e aminoácidos essenciais (vitamina B) que sejam biológicos. A prometida intensificação da investigação sobre alternativas neste domínio é urgente e acolhida com grande satisfação.

4.12.

O período de conversão constitui um desafio importante para os agricultores, uma vez que durante esse tempo já têm de suportar custos mais elevados (p. ex. custos dos controlos, insumos biológicos), mas os produtos ainda não podem ser vendidos como sendo biológicos. Portanto, os Estados-Membros devem prever medidas de apoio adequadas. Importa analisar a possibilidade de se criar eventualmente um mercado para «produtos em conversão» (entre biológicos e convencionais).

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente da Secção do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  https://ec.europa.eu/info/food-farming-fisheries/farming/organic-farming/organic-action-plan_pt

(2)  https://ec.europa.eu/info/law/better-regulation/have-your-say/initiatives/12555-Agricultura-biologica-plano-de-acao-para-o-desenvolvimento-da-producao-biologica-na-UE_pt

(3)  Parecer do CESE «Compatibilidade da política comercial da UE com o Pacto Ecológico Europeu» (JO C 429 de 11.12.2020, p. 66).

(4)  Parecer do CESE «Do prado ao prato: uma estratégia para um sistema de alimentação justo, saudável e respeitador do ambiente» (JO C 429 de 11.12.2020, p. 268).

(5)  Parecer do CESE «Promover cadeias de abastecimento alimentar alternativas e curtas na UE: o papel da agroecologia» (JO C 353 de 18.10.2019, p. 65).

(6)  Parecer do CESE «Promoção de regimes alimentares saudáveis e sustentáveis na UE» (JO C 190 de 5.6.2019, p. 9).

(7)  https://ec.europa.eu/info/food-farming-fisheries/key-policies/common-agricultural-policy/market-measures/school-fruit-vegetables-and-milk-scheme_pt

(8)  https://www.organic-cities.eu/


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/120


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) 2020/2222 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a determinados aspetos da segurança e da conectividade ferroviárias respeitantes à infraestrutura transfronteiriça que liga a União e o Reino Unido através da ligação fixa do canal da Mancha

[COM(2021) 402 final — 2021/0228(COD)]

(2021/C 517/19)

Consulta

Conselho da União Europeia, 15.7.2021

Parlamento Europeu, 13.9.2021

Base jurídica

Artigo 91.o, n.o 1, e artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção dos Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

239/1/5

Considerando que o conteúdo da proposta é inteiramente satisfatório e não suscita quaisquer observações, o Comité, na 563.a reunião plenária de 22 e 23 de setembro de 2021 (sessão de 22 de setembro), decidiu, por 239 votos a favor, um voto contra e cinco abstenções, emitir parecer favorável ao texto proposto.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/121


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Conselho relativa à posição a tomar em nome da União Europeia no âmbito do Comité Diretor Regional da Comunidade dos Transportes no que diz respeito à adoção do orçamento da Comunidade dos Transportes para 2022

[COM(2021) 479 final — 2021/0272 (NLE)]

(2021/C 517/20)

Consulta

Conselho da União Europeia, 25.8.2021

Base jurídica

Artigo 218.o, n.o 9, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção dos Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

238/0/7

Considerando que o conteúdo da proposta é inteiramente satisfatório e não suscita quaisquer observações, o Comité, na 563.a reunião plenária de 22 e 23 de setembro de 2021 (sessão de 22 de setembro), decidiu, por 238 votos a favor e sete abstenções, emitir parecer favorável ao texto proposto.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/122


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a determinadas disposições aplicáveis à pesca na zona do acordo da CGPM (Comissão Geral das Pescas do Mediterrâneo) (reformulação)

[COM(2021) 434 final — 2021/0248 (COD)]

(2021/C 517/21)

Consulta

Parlamento Europeu, 13.9.2021

Conselho, 3.9.2021

Base jurídica

Artigo 43.o, n.o 2, e artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

235/1/2

Considerando que o conteúdo da proposta é inteiramente satisfatório e não suscita quaisquer observações, o Comité, na 563.a reunião plenária de 22 e 23 de setembro de 2021 (sessão de 22 de setembro) decidiu, por 235 votos a favor, 1 votos contra e 2 abstenções, emitir parecer favorável ao texto proposto.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


22.12.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 517/123


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.o 1380/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, no que respeita às restrições do acesso às águas da União

[COM(2021) 356 final — 2021/0176 (COD)]

(2021/C 517/22)

Consulta

Parlamento Europeu, 8.7.2021

Conselho, 16.7.2021

Base jurídica

Artigo 43.o, n.o 2, e artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em plenária

22.9.2021

Reunião plenária n.o

563

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

232/0/5

Considerando que o conteúdo da proposta é satisfatório e não suscita quaisquer observações, o Comité, na 563.a reunião plenária de 22 e 23 de setembro de 2021 (sessão de 22 de setembro), decidiu, por 232 votos a favor e cinco abstenções, emitir parecer favorável ao texto proposto.

Bruxelas, 22 de setembro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG