ISSN 1977-1010

Jornal Oficial

da União Europeia

C 374

European flag  

Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

64.° ano
16 de setembro de 2021


Índice

Página

 

I   Resoluções, recomendações e pareceres

 

PARECERES

 

Comité Económico e Social Europeu

 

562.a reunião plenária do Comité Económico e Social Europeu – por Interactio, 7.7.2021-8.7.2021

2021/C 374/01

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Transportes intermodais e logística multimodal — assegurar a complementaridade dos modos de transporte na ecologização dos transportes [Parecer de iniciativa]

1

2021/C 374/02

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Explorar as oportunidades económicas e sociais da digitalização e melhorar a transformação digital da economia, em particular das PME, focando-se nos dados e na inteligência artificial centrados no ser humano [Parecer exploratório]

6

2021/C 374/03

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Reforço da digitalização integradora, segura e de confiança para todos (Parecer exploratório)

11

2021/C 374/04

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Educação de adultos (Parecer exploratório a pedido da Presidência eslovena)

16


 

III   Atos preparatórios

 

Comité Económico e Social Europeu

 

562.a reunião plenária do Comité Económico e Social Europeu – por Interactio, 7.7.2021-8.7.2021

2021/C 374/05

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Orientações para a Digitalização até 2030: a via europeia para a Década Digital [COM(2021) 118 final]

22

2021/C 374/06

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à itinerância nas redes de comunicações móveis públicas da União (reformulação) [COM(2021) 85 final — 2021/0045 (COD)]

28

2021/C 374/07

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre uma nova estratégia de financiamento do Next Generation EU [COM(2021) 250 final]

33

2021/C 374/08

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais [COM(2021) 102 final]

38

2021/C 374/09

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — União da Igualdade: Estratégia sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência 2021-2030 [COM(2021) 101 final]

50

2021/C 374/10

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Proposta de recomendação do Conselho relativa à criação de uma Garantia Europeia para a Infância [COM(2021) 137 final] — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Estratégia da UE sobre os direitos da criança [COM(2021) 142 final]

58

2021/C 374/11

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de ação sobre as sinergias entre as indústrias civis, da defesa e do espaço[COM(2021) 70 final]

66

2021/C 374/12

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Revisão da Política Comercial — Uma política comercial aberta, sustentável e decisiva[COM(2021) 66 final]

73

2021/C 374/13

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Parceria renovada com a vizinhança meridional — Uma nova agenda para o Mediterrâneo[JOIN(2021) 2 final]

79

2021/C 374/14

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Criar uma Europa resiliente às alterações climáticas — a nova Estratégia da UE para a Adaptação às Alterações Climáticas[COM(2021) 82 final]

84


PT

 


I Resoluções, recomendações e pareceres

PARECERES

Comité Económico e Social Europeu

562.a reunião plenária do Comité Económico e Social Europeu – por Interactio, 7.7.2021-8.7.2021

16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Transportes intermodais e logística multimodal — assegurar a complementaridade dos modos de transporte na ecologização dos transportes

[Parecer de iniciativa]

(2021/C 374/01)

Relator: Stefan BACK

Decisão da Plenária

25.3.2021

Base jurídica

Artigo 32.o, n.o 2, do Regimento

 

Parecer de iniciativa

Competência

Secção dos Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

24.6.2021

Adoção em plenária

7.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

230/0/6

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

Para se encontrar uma solução viável a longo prazo para o desenvolvimento eficiente e sustentável dos transportes e da logística multimodais, importa dar uma resposta aos problemas que tornam o transporte multimodal mais dispendioso, mais lento e menos fiável do que, nomeadamente, o transporte unimodal rodoviário. Tal solução não pode assentar na promoção financeira nem no apoio regulamentar.

1.2.

Este tipo de abordagem é igualmente eficiente do ponto de vista da utilização dos recursos regulamentares, pois permitirá prescindir da adoção de um quadro regulamentar específico.

1.3.

Para melhorar o tráfego multimodal, o CESE recomenda igualmente a plena internalização dos custos externos em todos os modos de transporte, a fim de garantir condições de concorrência equitativas, para além da inovação técnica e da resolução dos problemas de competitividade. Apela para a adoção de medidas rigorosas de salvaguarda e/ou relançamento de um sistema europeu único de transporte de carga em vagão completo, a ligação entre infraestruturas estratégicas (por exemplo, portos) e soluções ferroviárias, os investimentos em ramais industriais, a participação de grandes empresas de logística numa reorientação modal dos seus fluxos.

1.4.

A fim de assegurar uma concorrência leal entre os modos de transporte, o CESE recomenda que todos os modos de transporte adotem comportamentos exemplares do ponto de vista social, com vista a garantir serviços de transporte de alta qualidade, empregos de qualidade e boas condições sociais, por forma a alcançar condições de concorrência equitativas para todos os intervenientes no mercado.

1.5.

Os problemas atuais relacionados com o transporte multimodal prendem-se com desvantagens como os longos prazos de entrega, a complexidade, o maior risco e a menor fiabilidade, para além dos custos adicionais resultantes do transbordo e das transações, o que dificulta o arranque da multimodalidade.

1.6.

Por conseguinte, cumpre adotar medidas para tornar o transporte multimodal de mercadorias intrinsecamente competitivo e lograr fluxos de transporte multimodal de mercadorias eficientes e contínuos aos mesmos custos que o transporte unimodal.

1.7.

É igualmente necessário que o transporte ferroviário se adapte melhor a um contexto de mercado aberto e solucione problemas resultantes da falta de pontualidade, de fiabilidade, de previsibilidade e de flexibilidade, que têm um impacto negativo nas soluções multimodais que envolvem o transporte ferroviário.

1.8.

No que diz respeito ao transporte por vias navegáveis interiores, afiguram-se necessárias melhorias em matéria de capacidade de transporte transfronteiriço.

1.9.

A existência de infraestruturas de terminais adequadas é fundamental para o êxito da intermodalidade. Para efeitos de eficiência na utilização dos recursos, seria igualmente útil se os Estados-Membros concordassem em colaborar no planeamento de infraestruturas de terminais nas regiões fronteiriças. A distância entre os terminais deve ser adaptada à procura, à densidade da rede e a outras condições locais.

1.10.

No que diz respeito à dívida pública, o CESE recomenda que o investimento público em infraestruturas intermodais não seja tido em conta nos cálculos do Pacto de Estabilidade e Crescimento, mesmo uma vez ultrapassada a crise da COVID-19.

1.11.

Para o bom funcionamento da multimodalidade, importa assegurar a coerência entre os regulamentos que regem, por exemplo, o manuseamento de mercadorias perigosas entre diferentes modos e resolver outras questões de ordem prática e regulamentar suscetíveis de causar dificuldades na interface entre os modos ou nos transportes entre os Estados-Membros.

1.12.

Vários dos problemas que prejudicam os transportes intermodais podem ser resolvidos por soluções digitais inteligentes, como as possibilidades de acompanhamento e localização e outras soluções digitais que facilitam a gestão eficaz dos fluxos de transporte multimodal.

1.13.

O Regulamento (UE) 2020/1056 do Parlamento Europeu e do Conselho (1) relativo a informações eletrónicas sobre o transporte de mercadorias facilitará o intercâmbio de informações regulamentares entre os operadores e as autoridades nas plataformas digitais a partir de agosto de 2024 e melhorará o fluxo dos transportes intermodais.

1.14.

O CESE insta a Comissão Europeia a ter em conta as sugestões acima quando da elaboração da futura revisão do quadro regulamentar relativo aos transportes intermodais e a permitir que o transporte multimodal desempenhe na íntegra o seu papel no sistema de transportes, sem medidas de apoio específicas.

2.   Contexto

2.1.

Na sua Comunicação — Estratégia de mobilidade sustentável e inteligente — pôr os transportes europeus na senda do futuro (COM(2020) 789), a Comissão Europeia assinala que importa transformar significativamente o quadro legislativo em vigor para os transportes intermodais para convertê-lo numa ferramenta eficaz, a fim de tornar as operações de carga na Europa mais ecológicas. Destaca a necessidade de rever o quadro regulamentar, incluindo a Diretiva Transporte Combinado (Diretiva 92/106/CEE do Conselho (2), a seguir designada «diretiva») e a opção de introduzir incentivos económicos tanto para as operações como para as infraestruturas. Os incentivos devem basear-se no controlo das emissões.

2.2.

A Estratégia de Mobilidade Sustentável e Inteligente centra-se na redução de 90 % das emissões de gases com efeito de estufa até 2050. O transporte multimodal desempenha um papel importante na estratégia, que visa assegurar uma interação otimizada do ponto de vista ambiental entre os modos de transporte, inclusive mediante a redução da predominância do transporte rodoviário de mercadorias.

2.3.

A Estratégia de Mobilidade Sustentável e Inteligente também destaca a importância da logística multimodal, designadamente nas zonas urbanas, sublinha a necessidade de um planeamento eficiente para evitar as deslocações em vazio e assinala a necessidade de incluir o transporte de mercadorias no planeamento da mobilidade urbana.

2.4.

A estratégia assinala ainda o problema da falta de infraestruturas de transbordo, incluindo terminais multimodais interiores, e a necessidade de melhorar as tecnologias de transbordo, incluindo o intercâmbio multimodal de dados e os sistemas inteligentes de gestão do tráfego em todos os modos de transporte. A Comissão tenciona disponibilizar fundos e orientar as políticas, nomeadamente em matéria de I&I, para abordar estas questões. As regras em matéria de auxílios estatais para o transporte ferroviário poderão também ser úteis neste sentido.

2.5.

No plano de ação que acompanha a Estratégia de Mobilidade Sustentável e Inteligente, a Comissão prevê apresentar uma revisão do quadro regulamentar para o transporte intermodal, incluindo a diretiva, em 2022.

2.6.

Numa proposta de 2017 (COM(2017) 648), a Comissão propôs alterações à diretiva, salientando a necessidade de uma coordenação mais eficaz entre os Estados-Membros no que diz respeito à construção de terminais intermodais e de várias simplificações administrativas, insistindo, contudo, na necessidade de uma abordagem promocional que inclua regras específicas sobre o acesso ao mercado, nomeadamente no que diz respeito ao trajeto rodoviário. Durante o processo legislativo, a proposta sofreu alterações consideráveis, pelo que a Comissão optou por retirá-la.

2.7.

No entanto, com o Regulamento (UE) 2020/1055 do Parlamento Europeu e do Conselho (3) que alterou o Regulamento (CE) n.o 1072/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho (4), os Estados-Membros tiveram a possibilidade de se afastar das regras específicas relativas ao acesso ao mercado no que diz respeito ao trajeto rodoviário e de aplicar apenas as regras de cabotagem normais.

3.   Observações gerais

3.1.

Para se encontrar uma solução viável a longo prazo para o desenvolvimento eficiente e sustentável dos transportes e da logística multimodais, importa dar uma resposta aos problemas que tornam o transporte multimodal mais dispendioso, mais lento e menos fiável do que, nomeadamente, o transporte unimodal rodoviário. Tal solução não pode assentar na promoção financeira nem no apoio regulamentar.

3.2.

Ao optar-se por este tipo de abordagem será igualmente possível prescindir de regras complexas para definir os transportes combinados ou multimodais e assegurar que os operadores têm direito a apoio financeiro e a regras específicas sobre o acesso ao mercado. Seria, além disso, eficiente na utilização dos recursos de um ponto de vista regulamentar.

3.3.

Para melhorar o tráfego multimodal, o CESE recomenda a plena internalização dos custos externos em todos os modos de transporte, a fim de garantir condições de concorrência equitativas, para além da inovação técnica e do reforço da competitividade. Apela para a adoção de medidas rigorosas de salvaguarda e/ou relançamento de um sistema europeu único de transporte de carga em vagão completo, a ligação entre infraestruturas estratégicas (por exemplo, portos) e soluções ferroviárias, os investimentos em ramais industriais, a participação de grandes empresas de logística numa reorientação modal dos seus fluxos.

3.4.

A fim de assegurar uma concorrência leal entre os modos de transporte, o CESE recomenda que todos os modos de transporte adotem comportamentos exemplares do ponto de vista social, com vista a garantir serviços de transporte de alta qualidade, empregos de qualidade e boas condições sociais, por forma a alcançar condições de concorrência equitativas para todos os intervenientes no mercado.

3.5.

O CESE sublinha que a existência de trabalhadores qualificados e motivados, assim como de boas condições de trabalho, é uma condição essencial para o êxito da evolução do transporte multimodal. O CESE solicita que se proceda a uma revisão das regras em matéria de destacamento, a fim de ter em conta a situação do pessoal ferroviário altamente móvel. Além disso, recomenda a adoção de regulamentação simples, clara e verificável, bem como de um sistema adequado de controlo da conformidade, a fim de garantir condições de trabalho justas (formação, horário de trabalho e períodos de descanso, nível linguístico, remuneração, saúde e segurança no trabalho, instalações sanitárias modernas, alojamento de pernoita adequado, etc.) para todos os trabalhadores do setor dos transportes, a fim de assegurar a respetiva saúde e uma concorrência leal.

3.6.

Os problemas relacionados com o transporte multimodal prendem-se com desvantagens como os longos prazos de entrega, a complexidade, o maior risco e a menor fiabilidade, para além dos custos adicionais resultantes do transbordo e das transações, o que dificulta o arranque da multimodalidade.

3.7.

Um estudo recente (5) revela uma diferença de custos considerável entre as soluções unimodais (exclusivamente rodoviárias) e intermodais. Os custos adicionais resultam do trabalho suplementar envolvido na organização do transporte multimodal (50-100 EUR por remessa), nos tempos de trânsito mais longos (de 4 a 120 horas), com uma média de 25 horas, implicando um custo adicional de 75-100 EUR por remessa, e da falta de procedimentos documentais harmonizados, o que leva a uma perda de 5 a 150 EUR por remessa.

3.8.

Não obstante, o estudo conclui que é possível encontrar um ponto de equilíbrio financeiro nas longas distâncias citando, sem contabilizar as medidas de apoio, 595 km para o transporte ferroviário/rodoviário, 266 km para as vias navegáveis interiores/transporte rodoviário e 736 km para a navegação de curta distância/transporte rodoviário.

3.9.

Concretamente, o estudo lamenta a ausência frequente de equipamentos de acompanhamento e localização, assim como os problemas e a impossibilidade de utilizar documentos em formato eletrónico.

3.10.

Uma avaliação de impacto da proposta legislativa de 2017 relativa à diretiva demonstra um custo adicional global para as soluções de transportes intermodais de quase 60 %, resultante principalmente da implementação, dos atrasos, do custo das transações, etc (6).

3.11.

Por conseguinte, cumpre claramente adotar medidas para tornar o transporte multimodal de mercadorias intrinsecamente competitivo e resolver os problemas acima referidos para lograr fluxos de transporte multimodal de mercadorias eficientes e contínuos aos mesmos custos que o transporte unimodal.

3.12.

Neste contexto, importa salientar também que o transporte ferroviário precisa de se adaptar melhor a um contexto de mercado aberto e de solucionar problemas resultantes da falta de pontualidade, de fiabilidade, de previsibilidade e de flexibilidade, que têm, obviamente, repercussões negativas nas soluções multimodais que envolvem o transporte ferroviário.

3.13.

No que diz respeito ao transporte por vias navegáveis interiores, afiguram-se necessárias melhorias em matéria de capacidade de transporte transfronteiriço.

3.14.

Os estrangulamentos resultantes da falta de capacidade dos terminais multimodais e das plataformas de logística são fonte de outros problemas. O documento de trabalho dos serviços da Comissão que acompanha a Estratégia de Mobilidade Sustentável e Inteligente (7) estima que as distâncias entre terminais superiores a 300 km, como por exemplo na Finlândia e em partes da Suécia, são demasiado grandes, pois limitam a possibilidade de trajetos rodoviários curtos de cerca de 150 km. Embora reconhecendo a importância vital de uma capacidade adequada dos terminais, nomeadamente ao longo dos corredores da rede principal da RTE-T, importa não esquecer que a distância entre terminais também tem de estar ligada aos volumes de transporte numa região e às diferenças na densidade da rede em diferentes partes da Europa.

3.15.

Por seu turno, a coordenação no planeamento dos terminais nas regiões fronteiriças entre Estados-Membros adjacentes é essencial para a eficiência na utilização dos recursos.

3.16.

Importa salientar, neste contexto, que um estudo recente (8) sobre as repercussões das restrições à cabotagem nos trajetos rodoviários combinados concluiu que a utilização da «cabotagem combinada» é relativamente frequente, devido a problemas de disponibilidade e flexibilidade dos condutores e a diferenças nos níveis de custos, e que as restrições a este tipo de cabotagem poderão provocar alguns efeitos negativos imediatos, nomeadamente uma regressão para o transporte rodoviário unimodal e uma redução dos serviços de transporte de mercadorias por via ferroviária, ao passo que, a longo prazo, os operadores dos terminais acreditam que a melhoria da produtividade e dos serviços nos terminais compensaria eventuais aumentos nos custos dos transportes.

3.17.

Importa igualmente ter em consideração a coerência dos regulamentos que regem, por exemplo, o manuseamento de mercadorias perigosas entre diferentes modos e a resolução de outras questões de ordem prática e regulamentar suscetíveis de causar dificuldades na interface entre modos ou nos transportes entre os Estados-Membros.

3.18.

Vários dos problemas indicados acima podem ser resolvidos com soluções digitais inteligentes, de que são exemplo as possibilidades de acompanhamento e localização e outras soluções digitais que facilitam a gestão eficaz dos fluxos de transporte multimodal.

3.19.

O Regulamento (UE) 2020/1056 relativo a informações eletrónicas sobre o transporte de mercadorias facilitará o intercâmbio de informações regulamentares entre os operadores e as autoridades nas plataformas digitais a partir de agosto de 2024 e resolverá, pelo menos, parte da questão da documentação normalizada e do intercâmbio eletrónico de documentos acima referida.

3.20.

Parece, pois, existir possibilidades para a resolução da maioria dos problemas acima expostos que dificultam a expansão do transporte multimodal de mercadorias.

3.21.

No entanto, para tal, importa disponibilizar infraestruturas de terminais adequadas. Para efeitos de eficiência na utilização dos recursos, seria igualmente útil se os Estados-Membros concordassem em colaborar no planeamento de infraestruturas de terminais nas regiões fronteiriças.

3.22.

No que diz respeito à dívida pública, o CESE recomenda que o investimento público em infraestruturas multimodais não seja tido em conta nos cálculos do Pacto de Estabilidade e Crescimento, mesmo uma vez ultrapassada a crise da COVID-19.

3.23.

Como já se referiu, cumpre adotar um comportamento mais orientado para o mercado, nomeadamente por parte dos caminhos-de-ferro e dos terminais das vias navegáveis interiores.

3.24.

Se os problemas acima descritos forem devidamente resolvidos, o transporte multimodal poderá desempenhar na íntegra o seu papel no sistema de transportes, sem medidas de apoio específicas.

Bruxelas, 7 de julho de 2021.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Regulamento (EU) 2020/1056 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2020, relativo a informações eletrónicas sobre o transporte de mercadorias (JO L 249 de 31.7.2020, p. 33).

(2)  Diretiva 92/106/CEE do Conselho, de 7 de dezembro de 1992, relativa ao estabelecimento de regras comuns para certos transportes combinados de mercadorias entre Estados–Membros (JO L 368 de 17.12.1992, p. 38).

(3)  Regulamento (UE) 2020/1055 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2020, que altera os Regulamentos (CE) n.o 1071/2009, (CE) n.o 1072/2009 e (UE) n.o 1024/2012 com vista à sua adaptação à evolução no setor dos transportes rodoviários (JO L 249 de 31.7.2020, p. 17).

(4)  Regulamento (CE) n.o 1072/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro de 2009, que estabelece regras comuns para o acesso ao mercado do transporte internacional rodoviário de mercadorias (JO L 300 de 14.11.2009, p. 72).

(5)  TRT (2017), «Gathering additional data on EU combined transport — Final report» [Recolha de dados suplementares sobre os transportes combinados na UE — Relatório final].

(6)  Documento de trabalho dos serviços da Comissão — Avaliação de impacto, SWD(2017) 362 (disponível apenas em inglês).

(7)  SWD(2020) 331.

(8)  «Mobility Package 1 — Data gathering an analysis of the impacts of cabotage restrictions on combined transport road legs» [Pacote de mobilidade 1 — Recolha de dados e análise dos impactos das restrições à cabotagem nos trajetos rodoviários combinados], TRT Transporti e Territorio SRL.


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/6


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Explorar as oportunidades económicas e sociais da digitalização e melhorar a transformação digital da economia, em particular das PME, focando-se nos dados e na inteligência artificial centrados no ser humano

[Parecer exploratório]

(2021/C 374/02)

Relatora:

Antje GERSTEIN

Consulta

Presidência eslovena, 19.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Competência

Secção do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

15.6.2021

Adoção em plenária

7.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

217/0/1

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

Embora tenhamos aprendido, durante a pandemia atual, que o trabalho à distância, o trabalho em casa e os regimes de trabalho flexíveis continuarão a ser, pelo menos em certa medida, o «novo normal», temos também de compreender que os modelos empresariais digitais definirão cada vez mais o nosso mundo de trabalho. Tais modelos devem ser concebidos tendo em conta as pessoas e os valores. Num sentido social mais lato, o desafio consiste em garantir a integração digital dos grupos especialmente vulneráveis.

1.2.

Prevê-se que os benefícios da concretização de um mercado único digital na UE contribuam em 415 mil milhões de euros por ano para a produção económica da UE. Embora a transformação digital envolva oportunidades importantes para as empresas em toda a UE, muitas empresas não só enfrentam um grau muito elevado de incerteza nas suas atividades transfronteiras, como também correm grandes riscos de ficarem a marcar passo devido à falta de acesso ou de recursos de investimento, bem como à falta de competências, o que acontece a muitas PME em geral e afeta as microempresas em particular.

1.3.

Um elemento essencial para o sucesso de um mercado único digital europeu será a abertura à tecnologia na regulamentação dos novos modelos empresariais e aplicações digitais, tais como a inteligência artificial (IA) e o acesso ao financiamento da inovação, de modo que as PME possam beneficiar das vantagens de tais aplicações digitais novas. O CESE levou a cabo um estudo sobre a IA nas PME, que pode fornecer informações úteis (1).

1.4.

O CESE tem estado na vanguarda do debate sobre a IA desde o seu primeiro parecer sobre esse tema, em 2017, e publicou vários pareceres sobre esta matéria nos últimos anos. O CESE está a elaborar um parecer formal sobre a proposta da Comissão Europeia de regulamento sobre a inteligência artificial (Regulamento IA). Este parecer será apresentado na reunião plenária do CESE de setembro e, entre outros, abordará em particular a definição de IA, dado que este é um elemento importante do Regulamento IA.

2.   Contexto

2.1.

Tendo em conta as suas prioridades, a Presidência eslovena do Conselho da UE solicitou ao Comité, por carta datada de 18 de março de 2021, que elaborasse pareceres exploratórios com base em propostas suas. Estes domínios de política da UE são especialmente importantes para a Presidência.

2.2.

O presente parecer é, assim, a resposta ao pedido da Presidência eslovena do Conselho da UE de elaboração de parecer exploratório sobre as oportunidades económicas e sociais da digitalização.

2.3.

O presente parecer exploratório sintetiza vários temas relacionados com a digitalização que são abrangidos por pareceres do CESE recentes ou em curso. Responde a quatro perguntas colocadas pela Presidência sobre o Regulamento Governação de Dados, o Regulamento Serviços Digitais e o Regulamento Inteligência Artificial. Todas as demais informações pertinentes sobre estes temas constam dos pareceres do CESE correspondentes (2).

3.   Observações na generalidade

3.1.

A crise de COVID-19 salientou o desfasamento digital da UE e o seu enorme potencial. Agora, mais do que nunca, temos de compreender que a UE necessita de um mercado único digital sólido, o que implica reforçar as suas capacidades em domínios como a computação em nuvem, a tecnologia 5G e a utilização segura dos dados. A fim de acompanhar o ritmo dos intervenientes mundiais, os EUA e a China, cabe investir numa Europa digital forte.

3.2.

Prevê-se que os benefícios da concretização de um mercado único digital na UE contribuam em 415 mil milhões de euros por ano para a produção económica da UE. A manutenção preditiva, as plataformas digitais e a computação quântica são apenas três exemplos da forma como as tecnologias terão um impacto significativo na digitalização da economia europeia. Embora a transformação digital envolva oportunidades importantes para as empresas em toda a UE, muitas empresas não só enfrentam um grau muito elevado de incerteza nas suas atividades transfronteiras, como também correm grandes riscos de ficarem a marcar passo devido à falta de acesso ou de recursos de investimento, bem como à falta de competências, o que acontece a muitas PME em geral e afeta as microempresas em particular.

3.3.

Embora tenhamos aprendido, durante a pandemia atual, que o trabalho à distância, o trabalho em casa e os regimes de trabalho flexíveis continuarão a ser, pelo menos em certa medida, o «novo normal», temos também de compreender que os modelos empresariais digitais definirão cada vez mais o nosso mundo de trabalho. Tais modelos devem ser concebidos tendo em conta as pessoas e os valores.

3.4.

Numa economia pós-pandemia, é necessário assegurar que as pequenas e médias empresas em determinados setores particularmente afetados (setores dos serviços, como o comércio a retalho e o turismo) não perdem terreno por os investimentos necessários serem demasiado elevados (e as poupanças esgotaram-se após mais de um ano de pandemia). Tais empresas necessitam de apoio especial para a transformação digital e para desenvolverem os seus modelos empresariais, o que se deve refletir nos planos nacionais de recuperação ligados ao Fundo de Recuperação da UE. A Comissão Europeia deve assumir um papel de coordenação, a fim de evitar a fragmentação entre os diferentes fundos europeus e garantir a racionalização das atividades e dos projetos neste domínio em particular (transformação digital para as PME).

3.5.

O quadro estratégico deve assegurar que as PME conseguem tirar partido das oportunidades oferecidas pela digitalização. A regulamentação só deve ser considerada nos casos em que seja claramente previsível efeitos indesejáveis. A inovação e os novos modelos empresariais requerem um determinado espaço para se desenvolverem. Regulamentação europeia precipitada ou demasiado estrita coloca as empresas europeias, nomeadamente as PME, em desvantagem em comparação com as empresas ativas a nível internacional no resto do mundo.

3.6.

No entanto, em determinados setores, em especial no setor dos serviços (ou seja, comércio a retalho, turismo, restauração), é urgente definir um quadro regulamentar que contribua para combater a desinformação no espaço digital e permita a adoção de medidas, por exemplo, contra as avaliações falsas, que podem ser extremamente prejudiciais para as empresas. O CESE debruçou-se sobre tais questões, que existem especialmente nas plataformas digitais, no seu recente Parecer — Regulamento Serviços Digitais (3).

3.7.

A evolução tecnológica e a transformação digital da economia também implicam certos riscos que devem ser tidos em conta, a fim de aproveitar plenamente o seu potencial. Por conseguinte, cabe assegurar que, a par da evolução tecnológica e da digitalização, existem mecanismos para combater a exclusão digital de grupos particularmente vulneráveis.

3.8.

O CESE tem estado na vanguarda do debate sobre a IA desde o seu primeiro parecer sobre esse tema, em 2017 (4), e publicou vários pareceres sobre esta matéria nos últimos anos (5). O CESE tem defendido uma abordagem da IA baseada na «detenção do controlo por humanos», em que os humanos controlam a IA em termos técnicos e mantêm a capacidade de decidir se, quando e de que forma a utilizam na nossa sociedade. O CESE congratulou-se com a estratégia europeia para a IA, publicada em 2018, a Comunicação da Comissão — Orientações éticas para uma IA de confiança, e a sua aprovação dos sete requisitos para uma IA de confiança. Além disso, o CESE chamou a atenção para o impacto da IA no emprego, a importância de encontrar o equilíbrio certo entre regulamentação, autorregulação e orientação ética, e o impacto da IA nos consumidores, entre outros elementos.

3.9.

O CESE está a elaborar um parecer formal sobre a proposta da Comissão Europeia de regulamento sobre a inteligência artificial (Regulamento IA) (6), que será apresentado na reunião plenária do CESE de setembro. O CESE não pode apresentar ainda a sua posição formal sobre o Regulamento IA, mas pode fornecer algumas reflexões sobre a pergunta específica colocada pela Presidência eslovena sobre a definição de IA constante do Regulamento IA.

3.10.

No tocante ao local de trabalho, como princípio básico na era da digitalização, há que assegurar a todos os trabalhadores um trabalho digno. Nas empresas, os trabalhadores e respetivos representantes devem participar numa fase precoce na implantação da inteligência artificial que os afeta diretamente, bem como na determinação da forma como a IA em causa será utilizada. Os trabalhadores devem receber formação para os novos postos de trabalho no mundo digital do trabalho, com o devido planeamento e em tempo útil.

4.   Observações na especialidade

4.1.

A Presidência considera que a inteligência artificial constitui o aspeto mais importante da digitalização. Outras questões particularmente importantes incluem a integração de tecnologias avançadas na sociedade e a transição para uma sociedade a gigabits. Com as tecnologias emergentes, como a IA e a economia de dados, a UE pode recuperar rapidamente da crise e tornar-se a principal sociedade digital do mundo.

4.2.

A Presidência solicitou ao CESE respostas a quatro perguntas específicas:

O Regulamento Governação de Dados introduz novos modelos empresariais, tais como os prestadores de serviços de partilha de dados, o que incentivará a utilização dos dados. Qual a opinião do CESE sobre os efeitos económicos de tais serviços?

O Regulamento Governação de Dados introduz organizações de altruísmo de dados, o que facilitará a reutilização dos dados disponibilizados por pessoas singulares e coletivas. Tal permitirá igualmente a prestação de novos serviços, incluindo a recolha de dados gerados por pessoas singulares para fins de interesse geral. Qual a opinião do CESE a este respeito?

Qual a posição do CESE sobre a proposta de definição adequada de inteligência artificial (incluída no Regulamento Inteligência Artificial, adotado em abril de 2021)?

Qual a opinião do CESE sobre o Regulamento Serviços Digitais?

4.3.

O Regulamento Governação de Dados introduz novos modelos empresariais, tais como os prestadores de serviços de partilha de dados, o que incentivará a utilização dos dados. Qual a opinião do CESE sobre os efeitos económicos de tais serviços? (7)

4.3.1.

O CESE considera o Regulamento Governação de Dados útil e necessário, uma vez que o tratamento, o armazenamento e a partilha de dados digitais têm vindo a ganhar importância não só do ponto de vista económico, mas também social e civil, na medida em que dizem respeito aos cidadãos, às administrações e às empresas e se exercem num ambiente regulamentar complexo e interligado.

4.3.2.

O CESE considera que se reconhece a utilidade do modelo cooperativo para o estabelecimento da gestão e do intercâmbio de dados e como instrumento muito útil para uma gestão neutra dos dados partilhados. A este respeito, incentiva a Comissão e os Estados-Membros a apoiarem as PME na promoção de iniciativas com vista a constituir organizações mutualistas para a gestão e o intercâmbio de dados.

4.3.3.

As cooperativas e outras estruturas assentes na cooperação parecem especialmente adequadas para gerir as atividades intermediárias e o intercâmbio ou partilha de dados entre os cidadãos (trabalhadores, consumidores, empresários) e as empresas. As cooperativas, em particular, permitiriam fazer coincidir os interesses da gestão de dados de pessoas e os do titular dos dados cooperativos — que, neste caso, seriam propriedade das mesmas pessoas — e, assim, tais estruturas possibilitariam uma governação participativa partilhada entre os cidadãos, as empresas e os empresários, que tanto fornecem como utilizam os dados. Este mecanismo poderia promover o clima de confiança e abertura necessário para uma boa governação dos dados no mercado único digital europeu.

4.4.

O Regulamento Governação de Dados introduz organizações de altruísmo de dados, o que facilitará a reutilização dos dados disponibilizados por pessoas singulares e coletivas. Tal permitirá igualmente a prestação de novos serviços, incluindo a recolha de dados gerados por pessoas singulares para fins de interesse geral. Qual a opinião do CESE a este respeito? (8)

4.4.1.

O CESE congratula-se com a proposta de prever regulamentação para as organizações que se dedicam à «gestão altruísta» de dados e concorda com a regra que determina que estas organizações devem ser entidades jurídicas sem fins lucrativos que perseguem objetivos de interesse geral, em condições de independência e autonomia em relação a outras organizações que perseguem objetivos lucrativos na gestão dos dados.

4.4.2.

Estas disposições, a par da constituição de um registo público específico dessas entidades, respondem adequadamente à necessidade de transparência e de proteção dos direitos e interesses dos cidadãos e das empresas cujos dados são partilhados com fins altruístas, reforçando, assim, a confiança de todas as partes interessadas.

4.5.

Qual a posição do CESE sobre a proposta de definição adequada de inteligência artificial (incluída no Regulamento Inteligência Artificial, adotado em abril de 2021)?

4.5.1.

O CESE congratula-se com a mensagem clara da Comissão Europeia, na sua recente proposta legislativa para a IA, de que os direitos fundamentais e os valores europeus estão no cerne da abordagem europeia da IA. Muitas das recomendações do CESE nos últimos anos foram tidas em conta na referida proposta.

4.5.2.

O CESE está a elaborar um parecer separado em resposta à proposta, que abordará em particular a definição de IA constante da proposta, dado que este é um elemento importante do Regulamento IA.

4.5.3.

Como observação preliminar, o CESE sublinha que a IA continua a ser um conceito essencialmente contestado, na medida em que não existe uma definição universalmente aceite. O facto de as definições jurídicas diferirem das definições puramente científicas complicam a situação, pois elas devem satisfazer uma série de requisitos, nomeadamente o caráter integrador, a precisão, a abrangência, a exequibilidade e a permanência, alguns dos quais são vinculativos e outros são considerados boas práticas regulamentares.

4.5.4.

Por um lado, o Regulamento IA analisa não só a tecnologia propriamente dita, mas também a sua utilização e a forma como é utilizada. Por outro lado, contém uma definição específica de IA que inclui uma lista das técnicas de IA abrangidas pelo âmbito de aplicação do regulamento. Assim, o Regulamento IA parece articular-se em torno de dois conceitos. O parecer do CESE sobre o Regulamento IA, em elaboração, debaterá em pormenor a questão de saber se tal abordagem ligeiramente ambivalente será adequada para responder aos desafios específicos da IA e promover as suas oportunidades.

4.6.

Qual a opinião do CESE sobre o Regulamento Serviços Digitais? (9)

4.6.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com a proposta relativa a um mercado único dos serviços digitais num momento em que surgiram serviços digitais novos e inovadores da sociedade da informação que mudaram a vida quotidiana dos cidadãos da UE, moldando e transformando a forma como comunicam, se relacionam, consomem e exercem as suas atividades económicas.

4.6.2.

O CESE apoia os esforços da Comissão para evitar a fragmentação do mercado interno devido à proliferação de regras e regulamentação nacionais e apela para uma declaração clara sobre o caráter exaustivo do Regulamento Serviços Digitais. Esta é uma oportunidade de definir normas gerais para os mercados digitais que orientem a Europa nesta nova era, assegurando um elevado nível de segurança e defesa do consumidor em linha.

4.6.3.

O CESE insta a Comissão e os Estados-Membros a definirem um calendário razoável para a realização do debate e de uma consulta pública integradora e para a aplicação do regulamento e da estratégia. É fundamental que os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil participem em tal processo, a fim de alcançar condições equitativas para todos os intervenientes.

4.6.4.

O CESE congratula-se com o reforço da transparência em relação aos sistemas de recomendação e publicidade, assegurando que os consumidores recebem apenas a publicidade que querem.

4.6.5.

O CESE observa que existem muitas lacunas no que diz respeito ao princípio do país de origem e apela para uma apreciação cautelosa de métodos alternativos, como o princípio do país de destino, particularmente em questões fiscais, laborais e de consumo, a não ser que exista uma regulamentação mais sólida ao nível da UE que assegure a concorrência leal e o nível mais elevado possível de defesa dos consumidores.

4.6.6.

O CESE defende o estabelecimento de um quadro adequado que permita às empresas assegurar a equidade, a fiabilidade e a segurança dos respetivos sistemas de IA, tendo em conta o mais elevado nível possível de proteção dos trabalhadores e dos consumidores.

4.6.7.

A isenção de responsabilidade dos serviços de armazenagem deve deixar de ser aplicável apenas quando se trata de conteúdos claramente ilegais ou considerados ilegais por decisão judicial. O CESE recomenda o estabelecimento de um regime de responsabilidade positivo para os mercados em linha, a aplicar em determinadas circunstâncias.

4.6.8.

O CESE chama a atenção para a tarefa hercúlea de conseguir uma coordenação adequada entre todos os instrumentos e iniciativas pertinentes, no contexto de uma abordagem regulamentar mais ampla da economia das plataformas. É necessária uma panorâmica adequada da forma de integrar as diferentes perspetivas que afetam o Regulamento Serviços Digitais.

4.6.9.

O CESE tem para si que a fiscalidade (10), a governação de dados, o estatuto profissional, as condições de trabalho e a defesa do consumidor são elementos importantes no âmbito da concorrência, por vezes desleal, nas economias digitais e que merecem uma atenção especial.

Bruxelas, 7 de julho de 2021.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Estudo intitulado «Promoção da utilização da inteligência artificial nas microempresas e pequenas e médias empresas da Europa».

(2)  Regulamento Governação de Dados (JO C 286 de 16.7.2021, p. 38); Regulamento Serviços Digitais (JO C 286 de 16.7.2021, p. 70); Regulamento Inteligência Artificial.

(3)  Regulamento Serviços Digitais.

(4)  JO C 288 de 31.8.2017, p. 1.

(5)  JO C 440 de 6.12.2018, p. 1; JO C 440 de 6.12.2018, p. 51; JO C 240 de 16.7.2019, p. 51; JO C 47 de 11.2.2020, p. 64; JO C 364 de 28.10.2020, p. 87.

(6)  Regulamento Inteligência Artificial

(7)  Regulamento Governação de Dados.

(8)  Regulamento Governação de Dados.

(9)  Regulamento Serviços Digitais.

(10)  JO C 367 de 10.10.2018, p. 73.


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/11


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Reforço da digitalização integradora, segura e de confiança para todos

(Parecer exploratório)

(2021/C 374/03)

Relator:

Philip VON BROCKDORFF

Correlatora:

Violeta JELIĆ

Consulta

Presidência eslovena, 19.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Competência

Secção do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

15.6.2021

Adoção em plenária

7.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

221/0/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE recomenda a rápida adoção de uma política integradora da UE em matéria de administração pública digital, baseada no Plano de ação europeu (2016-2020) para a administração pública em linha, na Declaração de Taline sobre a administração pública em linha, na Declaração de Berlim sobre a sociedade digital e na governação digital baseada em valores (1). As conclusões do Conselho reconhecem que as administrações públicas têm a responsabilidade acrescida de garantir que os cidadãos são tratados de forma equitativa e gozam dos mesmos direitos de acesso à administração pública digital.

1.2.

O CESE recomenda que, na prossecução da inclusividade, os governos ponham em prática estratégias globais, medidas de apoio e uma legislação adequada e proporcionada para garantir a interoperabilidade, a qualidade, a abordagem centrada no ser humano, a transparência, a segurança e a acessibilidade dos serviços e produtos públicos digitais, bem como um acesso ótimo à saúde, à educação e às oportunidades económicas e culturais. Os governos nacionais, regionais e locais devem proceder à digitalização o mais rapidamente possível e acelerar a implantação de novas infraestruturas digitais, nomeadamente a rede 5G.

1.3.

O CESE reconhece que são necessários grandes investimentos por parte dos governos para garantir a inclusividade. Além disso, é de presumir que, nos planos de recuperação e resiliência dos Estados-Membros, a inclusividade venha a assumir um lugar de grande destaque na transformação digital prevista, recorrendo ao Fundo para uma Transição Justa da UE, apesar de limitado, no âmbito do instrumento Próxima Geração UE, bem como ao programa Europa Digital e aos fundos estruturais e de Investimento Europeus (em particular o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) e o Fundo Social Europeu Mais (FSE+)).

1.4.

O CESE reconhece que a digitalização pode ser, simultaneamente, fonte de oportunidades e de ameaças para as empresas. Daí a necessidade de os governos proporcionarem um apoio financeiro adequado, inclusive através dos fundos da UE, às empresas de todas as dimensões, em particular às PME. Este apoio ajudá-las-á a adaptarem-se com êxito à transição.

1.5.

O CESE recomenda igualmente que sejam aplicadas práticas laborais como o trabalho à distância, tendo plenamente em conta o equilíbrio entre vida profissional e pessoal. O diálogo social, o apoio às PME e às empresas da economia social, e o respeito dos direitos dos trabalhadores, incluindo a negociação coletiva, são fundamentais para assegurar uma transição harmoniosa.

1.6.

O CESE recomenda que os Estados-Membros colaborem mais estreitamente no desenvolvimento e na validação de soluções digitais que conduzam à criação de uma rede de intercâmbio de boas práticas.

1.7.

O CESE recomenda também uma revisão, a nível da UE, das políticas e medidas governamentais para que as partes interessadas pertinentes participem na proposta de medidas eficazes baseadas na justiça social. Tal deverá incluir políticas e recursos financeiros com o objetivo de facilitar a transformação digital. O CESE salienta igualmente a necessidade de aumentar de forma significativa, nos próximos anos, as taxas de inscrição nos domínios de ensino relacionados com a ciência, tecnologia, engenharia e matemática (CTEM).

1.8.

O CESE recomenda o reforço do Regulamento Serviços Digitais e do Regulamento Mercados Digitais, como condição prévia para uma transformação digital de confiança e que permita aos consumidores fazer escolhas num mercado verdadeiramente aberto e competitivo. No Regulamento Serviços Digitais, as responsabilidades e as obrigações das plataformas devem ser mais claras e exigíveis do que as atualmente propostas. No Regulamento Mercados Digitais, deve ser proibida a utilização de «padrões obscuros» e outras arquiteturas de escolha «não neutras», que influenciam sub-repticiamente o comportamento dos consumidores.

1.9.

Por último, o CESE reconhece que a digitalização e a ecologização das economias da UE, e em particular os objetivos de neutralidade carbónica da UE, andam de mãos dadas. A passagem ao modelo «digital e ecológico» é de vital importância, mas, uma vez mais, o CESE salienta que a equidade e o diálogo social devem ser sempre os princípios orientadores da aplicação das tecnologias digitais e ecológicas.

2.   Observações na generalidade

2.1.

As sociedades europeias estão a avançar para uma presença digital. A pandemia de COVID-19 acelerou a necessidade de a sociedade se digitalizar, uma vez que os canais digitais foram muitas vezes, durante os confinamentos, os únicos canais à disposição dos cidadãos e das empresas.

2.2.

Por seu lado, muitos empresários reconhecem que é necessário gravitar para o mundo digital, a fim de assegurar o êxito a longo prazo dos seus negócios. De igual modo, os trabalhadores e o público em geral devem compreender em que consiste a digitalização, como afeta o seu trabalho e a sua vida quotidiana enquanto membros de uma organização empresarial ou uma entidade do setor público, ou simplesmente como membros de uma comunidade. Conforme estabelecido na Nova Agenda do Consumidor, os consumidores europeus devem estar no cerne das transições digitais e devem beneficiar de uma proteção e uma capacitação adequadas no processo de mudança.

2.3.

Para os governos em toda a UE, a rápida digitalização é inevitável e só é possível através da despesa pública em infraestruturas digitais. As autoridades a nível local, regional, nacional e europeu devem tornar-se organizações flexíveis, resilientes e inovadoras, que aproveitem os benefícios da transformação digital e das tecnologias emergentes e capacidades avançadas para oferecer, aos cidadãos e às empresas, serviços digitais centrados no ser humano, integradores, contínuos, convenientes, transparentes, seguros e fiáveis.

2.4.

As administrações públicas, as empresas, os trabalhadores e o público em geral devem adaptar-se (ao mesmo tempo que lhes é prestado apoio e, quando necessário, soluções analógicas como alternativa) ao mundo centrado na tecnologia em que vivemos, e é importante compreender qual é a diferença entre digitização, digitalização e transformação digital.

2.5.

A digitização refere-se à versão digital de elementos físicos ou analógicos e desempenha um papel importante no contexto das empresas e dos governos, bem como no número de horas trabalhadas. O processo de digitização espoleta uma cadeia de eventos que pode otimizar drasticamente o fluxo de trabalho de qualquer empresa e governo, dando origem a processos empresariais e governamentais automatizados. Este processo representa um desafio, tanto para os trabalhadores como para os funcionários públicos.

2.6.

Embora a maioria das empresas e dos governos utilizem métodos básicos de digitização nos seus processos diários, há muito mais que pode ser feito para aplicar a digitização de forma eficaz. O desafio, aqui, reside em gerar confiança entre os trabalhadores, os funcionários públicos e o público em geral para que se adaptem com êxito a novos fluxos de trabalho e processos digitizados. No local de trabalho, esta transição requer um diálogo social, bem como o respeito da negociação coletiva. A transição pode afetar profundamente a vida dos trabalhadores, donde a necessidade de proporcionar informação e realizar consultas numa fase inicial do processo. De igual modo, é necessário sensibilizar o público para as consequências involuntárias da transformação.

2.7.

Embora a digitização pareça aumentar a eficiência das empresas e dos governos (os benefícios potenciais foram sempre sobrestimados), há sempre um custo, como é o caso quando trabalhadores ou funcionários públicos são despedidos, ou quando o público, sobretudo os idosos e as pessoas com deficiência, não se adaptam suficientemente depressa ou não se adaptam de todo à digitização. Daí a importância de a digitalização ser acessível a todos, independentemente da idade, sexo, situação socioeconómica e deficiência. De igual modo, as PME podem ficar em situação de desvantagem competitiva se não conseguirem acompanhar o ritmo da digitização no seu setor, especialmente se estes processos exigirem um elevado custo inicial.

2.8.

A digitalização é o segundo termo que as empresas, os trabalhadores e o público em geral devem compreender. Abrange uma vasta gama de elementos. A digitalização ajuda a transformar o funcionamento das empresas através da aplicação de tecnologias digitais. Este processo afeta os modelos de negócio, os fluxos de comunicação dentro e fora da empresa em causa e, na verdade, toda a cadeia de valor.

2.9.

A digitalização abre novas janelas de oportunidade para as empresas ao criar fluxos de receitas baseados na tecnologia digital que nunca estiveram disponíveis no passado. Desde a integração das redes sociais à possibilidade de oferecer aos clientes serviços de dados por subscrição, dispor de aplicações empresariais à medida pode ser a chave para a inovação, o crescimento e a expansão das empresas no futuro. As novas tecnologias digitais, em especial as designadas pelo acrónimo SMACIT (do inglês — social, móvel, analítica, nuvem e Internet das coisas), constituem uma grande oportunidade para as PME, pois para as organizações grandes e antigas estas tecnologias representam, simultaneamente, oportunidades e ameaças existenciais.

2.10.

Anos de investigação sobre os resultados das transformações digitais demonstraram que a taxa de êxito destes esforços é sistematicamente baixa: menos de 30 % dos resultados previstos. Resultados de um estudo recente da McKinsey numa amostra de 263 inquiridos mostram que apenas 16 % deles afirmaram que as transformações digitais das suas organizações tinham melhorado com êxito o desempenho. As «indústrias inteligentes», como a alta tecnologia, os meios de comunicação e as telecomunicações, também se defrontam com estes desafios, entre os quais a taxa de resultados bem-sucedidos não excede os 26 %. Por outro lado, em organizações com menos de 100 trabalhadores, a probabilidade de os inquiridos se vangloriarem de uma transformação digital mais bem-sucedida é 2,7 vezes superior à das grandes organizações com mais de 50 000 trabalhadores.

2.11.

No entanto, independentemente da dimensão, as empresas que ainda estão arraigadas em processos mais tradicionais correm o risco de perder competitividade, sendo um erro supor a priori que todas as empresas podem realizar com êxito a digitalização. O mesmo se aplica aos trabalhadores, especialmente os que trabalham em atividades tradicionais.

2.12.

A transição para a digitalização pode contribuir para impulsionar a eficiência empresarial e abrir novas oportunidades para as empresas gerarem rendimentos, além de ajudar a reduzir a pegada de carbono. Pode também apoiar uma maior mobilidade no mercado de trabalho, aumentar a produtividade e a flexibilidade no local de trabalho e permitir o equilíbrio entre vida profissional e pessoal quando os trabalhadores trabalham à distância a partir de casa, como sucedeu durante a pandemia de COVID-19.

2.13.

A realidade, porém, pode ser muito diferente e há que perguntar se a digitalização e o trabalho à distância, em particular, resultaram efetivamente num melhor equilíbrio entre vida profissional e pessoal. Embora muitos trabalhadores sejam a favor do trabalho à distância, este tem sido frequentemente aplicado de forma aleatória, o que teve repercussões nas condições de trabalho, em especial no caso das mães trabalhadoras e dos trabalhadores com competências digitais inadequadas. Daí que seja legítimo perguntar se a digitalização diluiu os limites da vida privada e profissional. Embora a digitalização possa impulsionar o desempenho dos trabalhadores e das empresas, as implicações para a vida familiar e possivelmente para a saúde podem ser uma história totalmente diferente. As ferramentas de inteligência artificial, aplicadas apressadamente durante a pandemia, tenderam a aumentar o stress e os riscos para a saúde e a segurança dos trabalhadores.

2.14.

Há também uma tendência crescente para as pessoas não «se desligarem» dos processos de trabalho digitais. À medida que o trabalho à distância se torna a norma nas empresas e nos serviços públicos, é de vital importância que este tenha lugar no contexto do diálogo social e da negociação coletiva. O direito a desligar-se também deve ser reconhecido através de um instrumento à escala da UE.

2.15.

O último aspeto da digitalização afeta não só os empresários, mas também a sociedade em geral. Nas últimas três décadas, e muito especialmente nos últimos dez anos, ocorreu uma mudança drástica a favor da adoção de tecnologias digitais em todos os ambientes sociais e atividades humanas. Esta evolução tem essencialmente criado os ditos «clientes digitais», com um número crescente de pessoas a dependerem da digitalização em praticamente todos os aspetos da sua vida quotidiana. A digitalização está, a pouco e pouco, a tornar-se a base para o modo como organizações de todas as formas e dimensões se ligam aos clientes, mas seria um erro supor que todas as pessoas, independentemente da sua idade, são capazes de acompanhar o ritmo dos novos desenvolvimentos digitais.

2.16.

Isto leva-nos à distinção entre digitalização e transformação digital. Esta última tem a ver com a transformação das operações empresariais e sociais em elementos do mundo digital, como todos nós já testemunhámos de inúmeras formas durante a pandemia, com, por exemplo, o aumento do trabalho à distância.

3.   Observações na especialidade

3.1.

A digitalização em curso da nossa sociedade e economia não parará de crescer e aprofundar-se, e, embora a digitalização prometa mais vantagens sociais e económicas, suscita também preocupações quanto ao seu impacto fraturante na sociedade e quanto à questão de saber se um número crescente de pessoas possui realmente destreza digital. No papel, as tecnologias transformadoras parecem impulsionar a inserção social em vez de aumentar as diferenças entre os que possuem destreza digital e os mais desfavorecidos, mas, uma vez mais, a realidade no terreno pode ser um pouco diferente. Muitas pessoas simplesmente não conseguem adaptar-se ao ritmo acelerado da transformação digital. Isto aplica-se especialmente aos idosos, às pessoas com deficiência, e às pessoas que vivem em regiões rurais e remotas.

3.2.

Embora a digitalização para todos seja necessária para aumentar a eficiência e produtividade, bem como para acelerar o desenvolvimento socioeconómico num mundo pós-pandemia, a transformação digital tem de ser levada a cabo da forma correta. Com isto queremos dizer que a política de transformação digital, tanto para o setor público como para o privado, deve ser integradora, evitando a todo o custo a exclusão de grupos da sociedade, como os idosos, as pessoas desfavorecidas em termos socioeconómicos, as pessoas com deficiência e os habitantes das zonas rurais.

3.3.

Para garantir a inclusividade, os governos devem pôr em prática estratégias globais e medidas de apoio para garantir a interoperabilidade, a qualidade, a abordagem centrada no ser humano, a transparência, a segurança e a acessibilidade dos serviços e produtos públicos digitais, bem como um acesso ótimo à saúde, à educação e às oportunidades económicas e culturais. Neste contexto, as administrações públicas podem utilizar as ferramentas digitais para envolver os cidadãos na criação de serviços públicos digitais, garantindo que esses serviços respondem às necessidades e preferências dos cidadãos que os utilizam.

3.4.

Acima de tudo, a consecução da inclusividade requer um enorme investimento por parte dos governos, sendo de presumir que, nos planos de recuperação e resiliência dos Estados-Membros, a inclusividade venha a assumir um lugar de grande destaque na transformação digital prevista, recorrendo ao Fundo para uma Transição Justa da UE no âmbito do instrumento Próxima Geração UE, bem como ao programa Europa Digital e aos fundos estruturais e de Investimento Europeus (em particular o FEDER e o FSE+). No entanto, no caso do Fundo para uma Transição Justa, foram expressas reservas quanto à sua adequação para responder aos desafios da transição ligados tanto à digitalização como às alterações climáticas (2). Os governos nacionais, regionais e locais devem também proceder à digitalização e acelerar a implantação de novas infraestruturas digitais, nomeadamente a rede 5G.

3.5.

A vaga de transformação digital não tem precedentes em termos de rapidez, alcance e escala. Não é realista esperar que todas as empresas, as PME e as empresas da economia social se adaptem rapidamente e com êxito a esta vaga de mudança sem precedentes. A transformação pode gerar tantas vítimas como êxitos se as empresas não dispuserem de tempo para se adaptar e não forem apoiadas por medidas pertinentes.

3.6.

Estas medidas devem incluir, nomeadamente, o fornecimento às empresas da infraestrutura necessária para apoiar a transformação digital e um quadro legislativo que seja proporcionado e adequado à finalidade em causa. É também relevante a necessidade de os Estados-Membros colaborarem estreitamente no desenvolvimento e na validação de soluções digitais que conduzam à criação de uma rede de intercâmbio de boas práticas. Outras medidas poderiam incluir créditos fiscais para apoiar ainda mais o investimento que as empresas necessitam para a transformação digital das suas operações e processos de trabalho.

3.7.

A existência de mercados em que os consumidores possam confiar, estar livres de manipulação e fazer escolhas num ambiente verdadeiramente aberto e competitivo é uma condição prévia para uma digitalização de confiança. Muitas vezes não é este o caso, se observarmos a concentração que vigora em certos mercados (redes sociais, aplicações de comunicação, pesquisa, sistemas operativos, etc.) e a frequência com que os direitos dos consumidores são violados. No seu parecer sobre a Nova Agenda do Consumidor (INT/922 (3)), o CESE salientou que as regras de defesa dos consumidores também devem ser adaptadas ao mundo digitalizado. Os novos desafios que as tecnologias digitais emergentes colocam, como a inteligência artificial (IA), a Internet das coisas (IdC) e a robótica, exigem um reforço da proteção atual.

3.8.

Uma outra condição prévia para a obtenção dos resultados desejados da transformação digital é a preparação das empresas de todas as dimensões, incluindo as empresas da economia social, para a transformação digital. Isto passa por um apoio através de recursos financeiros elegíveis e de programas de formação destinados aos proprietários e ao pessoal das pequenas empresas, para que se familiarizem com as mais recentes tecnologias e as oportunidades que delas decorrem. Em segundo lugar, é necessário comunicar todos os aspetos da introdução desta profunda mudança a todos os níveis no local de trabalho. Em terceiro lugar, é igualmente necessário sensibilizar para a necessidade de introduzir novas formas de trabalho, comportamento e comunicação em consonância com a mudança sem precedentes na cultura organizacional.

3.9.

A transformação digital deu origem a um aumento significativo da procura de competências digitais em praticamente todos os setores, desde a indústria manufatureira até aos serviços financeiros e outros, e a procura não deverá parar de aumentar num futuro previsível. É, pois, imperativo que os governos e as empresas continuem a investir na educação e formação para todos, incluindo a formação profissional, para garantir que a transformação digital ocorra sem problemas e com o talento adequado para que as pessoas e as empresas possam colher os frutos desta transição. Tal deve incluir também a formação sobre a participação nas plataformas digitais.

3.10.

À medida que a transformação digital acelera, é necessário que seja acompanhada, nos próximos anos, de um aumento significativo das taxas de inscrição nos domínios de ensino relacionados com as CTEM. O desenvolvimento de competências nos domínios CTEM é necessário para apoiar a transformação, colmatar as disparidades de género e criar a próxima geração de inovadores. O ensino CTEM contribuirá para impulsionar a economia e criar postos de trabalho.

3.11.

A transformação digital conduziu a uma intensificação do trabalho e uma precariedade laboral acrescidas, colocando assim sérios desafios à proteção, representação e tratamento justo dos trabalhadores. A Declaração do Centenário da OIT para o Futuro do Trabalho, adotada em 2019, propôs uma abordagem centrada no ser humano para as novas tecnologias no mundo do trabalho. No entanto, o desafio consiste em saber como traduzir este propósito em políticas, legislação e medidas eficazes que protejam os trabalhadores e permitam uma representação adequada. Por esta razão, considera-se necessária uma revisão das políticas e medidas a nível da UE (e, muito possivelmente, a adoção de legislação proporcionada e adequada à finalidade em causa), não só para fins de coerência política, mas também para envolver as partes interessadas pertinentes na elaboração de uma política baseada no objetivo fundamental de alcançar a justiça social.

3.12.

Por último, qualquer debate sobre a digitalização para todos não pode ignorar a sua ligação com a ecologização das economias da UE e os objetivos de neutralidade carbónica da UE, nem tão-pouco a ênfase que se está a conferir nos planos de recuperação e resiliência às iniciativas que apoiam estes objetivos.

3.13.

«Digital e ecológico» não só devem andar de mãos dadas, como são essenciais para promover a inovação em toda a UE. Alguns exemplos são as tecnologias de cadeias de blocos para otimizar a cadeia de abastecimento e aumentar a eficiência, o que ajudaria a reduzir o consumo de recursos, ao mesmo tempo que é feito um acompanhamento dos componentes, produtos e materiais, contribuindo assim para a economia circular. Além disso, as tecnologias digitais podem ajudar a neutralizar ou compensar as emissões que são tecnicamente difíceis ou dispendiosas. A passagem ao modelo «digital e ecológico» é de vital importância, mas, como já foi salientado no presente parecer, a equidade na sociedade deve ser sempre o princípio orientador da sua aplicação. Dito de outra forma, os benefícios da transformação digital, por exemplo na aplicação das tecnologias mais recentes utilizadas para fornecer serviços inteligentes, contínuos e não intrusivos nos domínios da energia, da segurança, da mobilidade, do bem-estar e da comunidade, que contribuem para a consecução da neutralidade carbónica, devem ser acessíveis a todos.

3.14.

Reconhecemos que este não é um objetivo fácil de alcançar, mas é precisamente por essa razão que os planos de digitalização relacionados com a ecologização das economias da UE devem envolver um processo de consulta e análise multissetorial, baseado no diálogo social e na negociação coletiva, em que a tónica seja colocada em metas a médio e longo prazos que façam efetivamente a diferença na vida dos europeus.

Bruxelas, 7 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Esta recomendação está em consonância com as Conclusões do Conselho sobre a construção do futuro digital da Europa (9 de junho de 2020), nas quais o Conselho «exorta a Comissão a propor uma política reforçada da UE no que respeita à administração pública digital, tendo em mente a ciberinclusão de todos os cidadãos e intervenientes privados, a fim de assegurar coordenação e apoio na transformação digital das administrações públicas em todos os Estados-Membros da UE, incluindo a interoperabilidade e normas comuns que permitam fluxos e serviços de dados seguros e sem fronteiras no setor público».

(2)  https://www.epsu.org/article/proposed-transition-fund-really-just

(3)  JO C 286 de 16.7.2021, p. 45.


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/16


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Educação de adultos

(Parecer exploratório a pedido da Presidência eslovena)

(2021/C 374/04)

Relatora:

Tatjana BABRAUSKIENĖ

Pedido da Presidência eslovena do Conselho

Carta de 19.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Decisão da Mesa

23.3.2021

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

21.6.2021

Adoção em plenária

8.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

233/3/5

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe com agrado a maior atenção dedicada à educação de adultos, à formação e ao desenvolvimento de competências, reiterada nas recentes iniciativas da Comissão Europeia, nomeadamente na Agenda de Competências para a Europa. O CESE apela à elaboração e aplicação imediata de medidas políticas bem orientadas, acompanhadas de incentivos para apoiar os Estados-Membros, conforme já assinalado no seu Parecer — Sistemas educativos aptos a evitar a inadequação das competências — Que transição é necessária (1)?.

1.2.

O CESE salienta que, face à rápida invenção e difusão de novas tecnologias, importa assegurar uma melhoria de competências e requalificação eficazes. O CESE sublinha que o impacto da crise da COVID-19 na sociedade e na economia europeias realçou ainda mais a importância de dispor de políticas de educação e formação eficazes e de empregos de elevada qualidade para apoiar uma recuperação e a uma resiliência sustentáveis e justas, a nível económico e social, o que é essencial para ajudar a Europa a ultrapassar as consequências da pandemia. O investimento na educação de adultos e no desenvolvimento de competências pode desempenhar um papel fundamental na retoma económica e numa Europa social.

1.3.

O CESE recomenda que a Comissão Europeia e os Estados-Membros reforcem as políticas de educação de adultos adotando uma abordagem holística e melhorando a sua acessibilidade, qualidade e inclusividade, respeitando, ao mesmo tempo, as competências nacionais e o princípio da subsidiariedade. O CESE apela para que as políticas de educação de adultos sejam melhoradas num sentido amplo, tendo em consideração estratégias eficazes para dar resposta às novas exigências em matéria de competências, adaptadas às necessidades locais. O CESE sublinha a importância de melhorar a pedagogia e a andragogia na educação de adultos, proporcionado um ensino formal de qualidade, um desenvolvimento profissional contínuo e condições de trabalho melhores e mais justas, bem como um ambiente de trabalho favorável para todos os formadores da educação de adultos.

1.4.

O CESE sublinha que a educação de adultos é essencial para ajudar os adultos a melhorar e a adquirir competências associadas à cidadania e a assumir um papel ativo na sociedade. A aprendizagem ao longo da vida deve tornar-se um estilo de vida para todos, a fim de superar as disparidades e desigualdades na sociedade, devendo tornar-se também uma realidade no local de trabalho. A este respeito, a utilização de «competências» é extremamente importante no seu sentido mais lato, englobando o local de trabalho e a vida social e pessoal, numa perceção holística do processo de desenvolvimento de competências.

1.5.

O CESE sublinha a importância da educação de adultos e lamenta que as instituições da UE e vários Estados-Membros não a considerem uma prioridade política, sendo a educação de adultos essencial para explorar plenamente o potencial do emprego e da inclusão social e para permitir aos adultos participarem ativamente no mercado de trabalho e na vida democrática. O CESE recomenda que os Estados-Membros reforcem as políticas, a governação e o financiamento em matéria de educação de adultos de acordo com os princípios dos quatro pilares da educação da UNESCO (2): aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a viver juntos. A fim de implementar o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 4, é necessário prestar um apoio eficaz à sociedade civil para construir uma parceria sobre o fornecimento de educação de adultos em contextos informais e não formais e assegurar uma sensibilização eficaz das pessoas.

1.6.

O CESE propõe que a Comissão Europeia e os Estados-Membros fixem objetivos exequíveis a longo prazo e estabeleçam um sistema de acompanhamento permanente da participação na educação de adultos e da aprendizagem ao longo da vida de qualidade e acessível, incluindo a formação de trabalhadores, para cada Estado-Membro, tendo em conta as diferenças regionais. O objetivo deste sistema será assegurar que todos disponham dos conhecimentos, das aptidões, das competências e da atitude que são necessários para o estabelecimento de uma sociedade europeia justa, coesa, sustentável, digital e próspera. É igualmente importante melhorar a investigação e as informações sobre competências a nível setorial e nacional em relação às necessidades e previsões de competências, com vista a atualizar a educação de adultos confrontados com transições, a melhorar os dados sobre o investimento dos Estados-Membros na educação de adultos e a assegurar um acompanhamento frequente e a recolha de dados sobre os cursos de aprendizagem e formação concluídos pelos trabalhadores. Os parceiros sociais e a sociedade civil devem ser ativamente envolvidos nos esforços para melhorar as informações sobre as competências nacionais, nomeadamente analisando, prevendo e antecipando as necessidades de competências.

1.7.

Os Estados-Membros devem intensificar a aplicação da Recomendação do Conselho, de 19 de dezembro de 2016, sobre percursos de melhoria de competências: novas oportunidades para adultos (3), a fim de assegurar que todos os adultos com poucas competências ou pouco qualificados desenvolvem as suas competências de base e recebem orientação e motivação para participarem na formação destinada a melhorar a sua vida e empregabilidade. A fim de garantir que 80 % dos adultos possuem competências digitais de base, o CESE apela à Comissão Europeia e aos Estados-Membros para que apoiem os adultos a adquirir gratuitamente um nível mínimo de competências digitais de base, apoiando a aquisição de competências necessárias para o trabalho e para a vida quotidiana.

1.8.

O CESE salienta que todos os adultos, independentemente das suas qualificações e contexto socioeconómico, necessitam de apoio para poderem beneficiar de uma aprendizagem ao longo de vida de qualidade e inclusiva e para verem as suas aptidões e competências validadas. Os serviços públicos de emprego devem aumentar, facilitar e melhorar o acesso a orientação e aconselhamento equitativos e gratuitos e assegurar que todos os adultos sejam informados sobre as possibilidades de aprendizagem ao longo da vida e que os trabalhadores sejam sensibilizados para as mudanças no mercado de trabalho e as competências necessárias para as novas profissões e tarefas.

1.9.

O CESE solicita à Comissão Europeia e aos Estados-Membros que lancem juntamente com os parceiros sociais campanhas de informação e sensibilização para adultos e trabalhadores afetados pela transição ecológica e digital, a fim de ajudar a força de trabalho a adquirir as competências necessárias. A Comissão Europeia deve organizar eventos anuais, seguindo o exemplo da Semana Europeia das Competências associadas ao Ensino e Formação Profissionais (EFP), com vista a informar e motivar os adultos em relação à educação de adultos e à formação contínua e a apoiar as políticas nacionais.

1.10.

O CESE sublinha a importância da subsidiariedade em relação às políticas de educação de adultos, a fim de respeitar o papel dos parceiros sociais nacionais e setoriais na identificação das necessidades de competências e na gestão dos sistemas nacionais para financiar e assegurar o acesso à educação de adultos e à formação dos trabalhadores. O CESE salienta que a aplicação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais deve garantir que todas as empresas tenham o direito e a capacidade de estabelecer estratégias de desenvolvimento de competências para responder a necessidades de inovação e de promover uma transição justa para os trabalhadores, bem como programas de aprendizagem de qualidade para jovens e adultos no contexto da transição ecológica e digital. As orientações para as políticas de emprego do Conselho (4) (2020) estabelecem uma distinção clara entre a garantia de direitos de formação e a disponibilização de contas individuais de formação, que constituem um dos instrumentos possíveis, permitindo aos países decidirem de que forma asseguram tais direitos. As contas individuais de formação são instrumentos que podem garantir o direito à formação. Em conformidade com as convenções coletivas e as legislações nacionais, todos os adultos e trabalhadores devem ter direito de acesso à formação de qualidade para trabalhadores, à licença com vencimento para formação, a qualificações, à validação da aprendizagem informal e não formal e ao aconselhamento e orientação flexíveis e com garantia da qualidade. Os Estados-Membros da UE devem estabelecer mecanismos e instrumentos financeiros para facilitar o acesso dos adultos — e, em particular, dos trabalhadores — à aprendizagem e à formação, com a participação dos parceiros sociais.

1.11.

O CESE recorda aos Estados-Membros a necessidade de assegurar que todos os adultos, em especial os provenientes de contextos socioeconómicos desfavorecidos, tenham um acesso equitativo a uma aprendizagem ao longo da vida que seja benéfica para o seu desenvolvimento pessoal e profissional. É necessário prestar apoio específico aos jovens que não trabalham, não estudam e não seguem uma formação, aos migrantes e aos refugiados, aos grupos desfavorecidos e vulneráveis, e também aos idosos para assegurar um envelhecimento ativo e saudável. O CESE exorta a Comissão Europeia a assegurar que o foco da nova Estratégia sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência 2021-2030 seja alargado aos alunos de todas as idades e se concentre em tornar a educação de adultos acessível e gratuita para todos os alunos com deficiência e com dificuldades de aprendizagem, em ambientes fisicamente acessíveis, e em assegurar que seja dada formação aos professores sobre a forma de adaptar as suas aulas e tornar a aprendizagem em linha igualmente acessível.

1.12.

O CESE salienta que a governação democrática, incluindo um diálogo social efetivo e um processo adequado de consulta das organizações da sociedade civil, é fundamental para os sistemas de educação e formação, para promover o desenvolvimento de competências de todos os adultos, em particular dos trabalhadores e desempregados, atingindo simultaneamente os objetivos da UE em matéria de participação na educação de adultos, estabelecidos no Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, na Recomendação do Conselho sobre o EFP e na Declaração de Osnabrück, e para contribuir para a futura resolução do Conselho sobre uma agenda no domínio da educação de adultos. O CESE assinala que o diálogo social e a interação entre sindicatos e empregadores são fundamentais para aumentar o acesso à educação de adultos para todos, promover a flexibilidade e a orientação, alinhar a formação com as necessidades do mercado de trabalho, assegurar a qualidade da formação e financiar a formação.

1.13.

O CESE salienta que todos os adultos, em particular os trabalhadores, devem ter melhor acesso a informação atualizada sobre os procedimentos de reconhecimento e validação. Tal pode ser conseguido aplicando efetivamente a Recomendação do Conselho, de 20 de dezembro de 2012, sobre a validação da aprendizagem não formal e informal (5) e assegurando que os sistemas de validação recebem financiamento público suficiente em todos os países da UE. Assegurando que a formação é reconhecida, os empregadores e sindicatos podem apoiar o aumento dos níveis de qualificação dos trabalhadores e contribuir para a sua progressão na carreira e para uma transição justa no mercado de trabalho. A participação dos parceiros sociais na governação da educação de adultos, na formação dos trabalhadores e nos sistemas de licença com vencimento para formação é essencial, nomeadamente mediante a promoção de ações conjuntas entre os parceiros sociais.

1.14.

O CESE sublinha que a melhoria de competências e a requalificação assumem uma importância decisiva no apoio às transições ecológica e digital nas indústrias e devem ser encaradas como uma responsabilidade social e económica no sentido de garantir uma formação inclusiva para empregos de qualidade e uma transição justa para todos. São necessárias estratégias industriais prospetivas, incluindo políticas em matéria de competências eficazes, a fim de apoiar a melhoria de competências e a requalificação da mão de obra. Estas podem ajudar a assegurar uma transição equitativa e socialmente justa para uma economia com impacto neutro no clima, estabelecendo um equilíbrio no mercado de trabalho que contribua para uma digitalização inclusiva e empregos de alta qualidade. As empresas necessitam de um apoio eficaz para reforçar e financiar as suas estratégias de promoção da melhoria de competências e de requalificação dos seus recursos humanos a fim de fomentar a inovação. Ao mesmo tempo, há que respeitar o interesse económico e social geral. As convenções coletivas devem determinar o acesso a diferentes tipos de licenças com vencimento para formação que atendam às necessidades pessoais e profissionais dos trabalhadores. O CESE recorda aos Estados-Membros da UE que devem alinhar o acesso dos trabalhadores a licenças com vencimento para formação com a Convenção n.o 140 da OIT relativa à Licença com Vencimento para Formação o mais rapidamente possível, recorrendo a medidas nacionais e a convenções coletivas, e garantir, com o apoio dos parceiros sociais, que a sua utilização é eficaz.

1.15.

O CESE defende um financiamento nacional sustentável da educação de adultos, complementado pela aplicação efetiva dos fundos da UE, nomeadamente no âmbito do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, para promover o crescimento económico e uma sociedade resiliente no contexto das transições para a economia digital e para a economia verde, garantindo uma educação de adultos de qualidade e inclusiva para todos, incluindo para os desempregados e outras pessoas fora do mercado de trabalho, com especial ênfase em tornar a formação disponível e acessível a todos os trabalhadores. Tal requer um compromisso claro a nível europeu e nacional de consagrar uma parcela adequada dos recursos disponíveis à promoção do desenvolvimento de sistemas de educação de adultos metódicos e coordenados, enquanto componente fundamental dos planos nacionais.

1.16.

O CESE sublinha a importância de assegurar a qualidade, pertinência, eficácia e inclusão no âmbito da educação de adultos e da formação. O CESE propõe que os Estados-Membros sejam encorajados a assegurar que todos os programas e currículos de aprendizagem educativa e de formação dos trabalhadores definam claramente os resultados da aprendizagem e as competências essenciais, e que a Comissão Europeia continue a trabalhar na aplicação da Recomendação do Conselho, de 22 de maio de 2018, sobre as competências essenciais para a aprendizagem ao longo da vida (6) e a apoiar ações conjuntas entre os parceiros sociais. Importa melhorar os sistemas de garantia de qualidade na educação de adultos e continuar a desenvolver a rede EQAVET da Comissão Europeia, a fim de a aplicar à educação de adultos, ao EFP contínuo, aos programas de aprendizagem e à formação dos trabalhadores. Tal deve ter em conta a integração das necessidades da economia, dos empregadores e dos trabalhadores nos programas e currículos de educação de adultos.

1.17.

O CESE insta os Estados-Membros a envolverem tanto quanto possível as empresas e os sindicatos na definição de estratégias para o desenvolvimento de competências para a transição digital e a transição ecológica das indústrias. O CESE propõe a articulação das políticas ambientais com as políticas de educação e a definição de estratégias nacionais para o desenvolvimento de competências verdes a fim de sensibilizar todos os adultos para as alterações climáticas, a responsabilidade ambiental e o desenvolvimento sustentável no âmbito da aprendizagem ao longo da vida, nomeando coordenadores a nível nacional.

1.18.

O CESE exorta a Comissão Europeia e os Estados-Membros a reforçarem as políticas de educação de adultos, para que o acesso a educação de qualidade e inclusiva com vista ao desenvolvimento de competências necessárias para a vida seja um direito de todos os adultos, e para cumprirem e ultrapassarem o objetivo anual de 60 % de participação na educação de adultos, dando resposta à inadequação das competências e reforçando a governação e o financiamento da educação de adultos, incluindo da formação dos trabalhadores. O CESE insta a Comissão Europeia a restabelecer métodos abertos de coordenação entre os ministérios competentes em matéria de educação de adultos nos Estados-Membros da UE, os parceiros sociais e a sociedade civil no contexto de um grupo de trabalho e a velar por que o trabalho útil realizado por grupos de trabalho sobre a educação de adultos anteriores seja prosseguido. O CESE apela à criação de uma plataforma para os coordenadores nacionais da educação de adultos, os parceiros sociais e as partes interessadas, separada da EPALE (7), e para que estes diferentes intervenientes se reúnam regularmente em rede.

2.   Contexto

2.1.

A crise da COVID-19, as alterações demográficas, a digitalização do mercado de trabalho e a descarbonização da economia estão a provocar mudanças muito significativas nos postos de trabalho e nas tarefas. Mesmo antes da pandemia, previa-se que dois em cada cinco postos de trabalho teriam algumas tarefas alteradas e que 14 % dos postos de trabalho mudariam devido à digitalização (Cedefop). Estima-se que até 2030 possam ser criados até 20 milhões de postos de trabalho em todo o mundo graças à transição ecológica das indústrias (OCDE). Aproximadamente 128 milhões de adultos (8) — 46,1 % da população adulta da Europa — carecem de uma melhoria de competências e de requalificação. O efeito da digitalização, da robotização, de novos modelos económicos, como a Indústria 4.0, e da economia circular e da partilha nos requisitos de novas competências exige uma ação concertada, a fim de incentivar em maior medida a educação de adultos na Europa.

2.2.

Os dirigentes dos países da UE reuniram-se na Cimeira Social do Porto, em 7 de maio de 2021, para reforçar o Pilar Europeu dos Direitos Sociais. As medidas propostas no Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais visam criar «mais e melhores empregos», promover «competências e igualdade» e melhorar a «proteção e inclusão sociais». Os dirigentes estabeleceram metas para 2030, por exemplo, uma participação de, pelo menos, 60 % dos adultos em ações de formação todos os anos e a posse de, pelo menos, competências digitais básicas por 80 % dos adultos. Estas metas estão relacionadas com o primeiro princípio do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, que determina que «[t]odas as pessoas têm direito a uma educação, uma formação e uma aprendizagem ao longo da vida inclusivas e de qualidade, que lhes permitam manter e adquirir as competências necessárias para participar plenamente na sociedade e gerir com êxito as transições no mercado de trabalho», bem como com os direitos referidos no quarto princípio, incluindo o apoio em matéria de formação e de requalificação, especialmente o acesso dos jovens a formação contínua, a uma aprendizagem e a um estágio.

2.3.

A aplicação das recentes iniciativas políticas da Comissão Europeia (9) relacionadas com a aprendizagem ao longo da vida, a melhoria de competências e a requalificação deve contribuir para a consecução dos objetivos do Pilar Europeu dos Direitos Sociais no que respeita à educação de adultos, através de um diálogo social efetivo com os parceiros sociais e da consulta da sociedade civil. No seguimento da Recomendação (UE) 2021/402 da Comissão (10), os sistemas de educação de adultos devem ser complementados pelo estabelecimento de sistemas eficazes de orientação ao longo da vida e de atividades de aconselhamento e sensibilização, pela integração dos grupos vulneráveis e pela introdução de sistemas eficazes de validação da aprendizagem não formal e informal para todos.

3.   Observações gerais

3.1.

O reforço da governação democrática a nível europeu e nacional e o aproveitamento do potencial dos parceiros sociais para identificar as necessidades em matéria de competências e contribuir para melhorar a inclusão no mercado de trabalho são fundamentais para a conceção e a aplicação de sistemas de educação de adultos mais acessíveis e de qualidade, a fim de melhorar as competências quotidianas e sociais de todos os adultos, incluindo a sua sensibilização para as questões do desenvolvimento sustentável, da responsabilidade ambiental, da cidadania democrática, da tolerância e dos valores europeus. É importante reforçar as políticas de educação de adultos num sentido amplo e ponderar estratégias eficazes para responder às novas necessidades de competências.

3.2.

O diálogo social efetivo com os parceiros sociais e a consulta da sociedade civil são determinantes para garantir o êxito da conceção e execução das políticas de educação de adultos. Os parceiros sociais desempenham um papel essencial na definição das competências necessárias e na atualização dos perfis de qualificação numa altura em que as empresas e os trabalhadores são confrontados diariamente com a evolução dos postos de trabalho e das tarefas profissionais. As empresas e os trabalhadores devem ser plenamente envolvidos na definição de estratégias para o desenvolvimento de competências para as transições ecológica e digital das indústrias.

3.3.

Para tornar os sistemas de educação de adultos mais acessíveis para todos são necessárias estratégias nacionais fortes e uma maior cooperação política entre os países da UE, nomeadamente entre os ministérios, os parceiros sociais do setor da educação e as partes interessadas pertinentes da sociedade civil. É importante articular as políticas a nível local, regional, nacional e da UE para proporcionar um acesso efetivo à educação de adultos e à formação de trabalhadores, bem como interligar vários domínios de intervenção para que as políticas social, ambiental, digital e financeira possam promover uma melhor educação de adultos.

3.4.

A ambiciosa meta relativa à participação na educação de adultos estabelecida no Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais pode ser alcançada se uma iniciativa da UE apoiada por uma recomendação do Conselho encorajar os governos a assegurarem um melhor acesso à educação de adultos e à formação dos trabalhadores e o seu financiamento suficiente com recurso a vários instrumentos financeiros. O CESE remete para o seu Parecer — Financiamento sustentável para a aprendizagem ao longo da vida e o desenvolvimento de competências, no contexto da escassez de mão de obra qualificada (11) e salienta que o investimento público sustentável na educação de adultos e o investimento privado eficaz na formação dos trabalhadores constituem requisitos prévios para o êxito das medidas estratégicas que visam a inclusão social e económica dos aprendentes de todas as idades e o apoio às empresas. Por conseguinte, é necessário que o Plano de Recuperação, o Próxima Geração UE e outros fundos da UE (por exemplo, o FSE+, o Fundo para uma Transição Justa) sejam utilizados de uma forma eficiente e coerente para apoiar as políticas de educação e formação no âmbito do Semestre Europeu.

3.5.

O CESE chama a atenção (12) para a importância de melhorar as aptidões, as competências e as atitudes de todos os cidadãos europeus em relação ao ambiente e de dar resposta às necessidades de competências. É necessário que os Estados-Membros da UE articulem as políticas ambientais com as políticas de educação e estabeleçam estratégias nacionais para a promoção de competências e aptidões verdes a fim de sensibilizar todos os adultos para as alterações climáticas, a responsabilidade ambiental e o desenvolvimento sustentável no âmbito da aprendizagem ao longo da vida e assegurar que os trabalhadores estejam munidos das competências e aptidões verdes necessárias para uma transição justa nas indústrias.

3.6.

É fundamental que seja disponibilizado apoio à formação para os que dela mais necessitam, como é o caso dos trabalhadores pouco qualificados e atípicos. A formação de trabalhadores e a formação fora das empresas, mas financiada por estas, devem promover o desenvolvimento de competências para satisfazer as necessidades das empresas e dos trabalhadores. A fim de assegurar que todos os trabalhadores, independentemente do seu nível de competências e da sua situação contratual, têm acesso a formação com vista à melhoria de competências e à requalificação, devem ser celebrados acordos a nível setorial, nacional e das empresas para estabelecer as necessidades e as disposições em matéria de formação. Devem ser celebradas convenções coletivas para assegurar que os trabalhadores têm acesso, mediante diversos incentivos, à educação de adultos e a licenças com vencimento para formação.

3.7.

O CESE remete para a Resolução do Conselho sobre uma agenda renovada no domínio da educação de adultos (13) e sublinha que os Estados-Membros devem intensificar a sua ação para melhorar a qualidade do ensino no domínio da educação de adultos, aperfeiçoando o ensino formal e o desenvolvimento profissional contínuo com a participação dos professores, facilitando a mobilidade dos professores, dos formadores e de outros profissionais da educação de adultos, e assegurando boas condições de trabalho e um ambiente de trabalho favorável a todos os profissionais da educação de adultos. É necessário que exista um diálogo social efetivo com os sindicatos destes profissionais para poderem ser acordadas medidas para tornar a profissão mais atrativa e melhorar o recrutamento e a retenção.

3.8.

A criação de uma plataforma de intercâmbio europeia para materiais e cursos digitais no âmbito do Plano de Ação para a Educação Digital 2021-2027 e o estabelecimento de normas europeias sobre microcredenciais podem ser úteis para melhorar o acesso aos cursos de educação de adultos e a confiança nos mesmos. Os aprendentes necessitam de informações completas que indiquem se os cursos conduzem a qualificações integrais ou parciais, ou a microcredenciais, quem procede à validação e assegura a qualidade dos cursos, se e de que forma são reconhecidos, e de que forma podem ser convertidos em qualificações integrais.

Bruxelas, 8 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  JO C 228 de 5.7.2019, p. 16.

(2)  https://en.unesco.org/themes/education/research-foresight/revisiting-learning

(3)  JO C 484 de 24.12.2016, p. 1.

(4)  Orientações para as políticas de emprego.

(5)  JO C 398 de 22.12.2012, p. 1.

(6)  JO C 189 de 4.6.2018, p. 1, https://ec.europa.eu/education/education-in-the-eu/council-recommendation-on-key-competences-for-lifelong-learning_pt

(7)  https://epale.ec.europa.eu/pt

(8)  Cedefop: «Empowering adults through upskilling and reskilling pathways Volume 1: adult population with potential for upskilling and reskilling» [Cedefop: Capacitar os adultos através de percursos de melhoria de competências e requalificação. Volume 1: população adulta com potencial para melhorar as suas competências e para se requalificar], fevereiro de 2020.

(9)  As iniciativas em causa são a Comunicação — Agenda de Competências para a Europa em prol da competitividade sustentável, da justiça social e da resiliência, a Recomendação do Conselho, de 24 de novembro de 2020, sobre o ensino e a formação profissionais (EFP em prol da competitividade sustentável, da justiça social e da resiliência) (JO C 417 de 2.12.2020, p. 1), a Comunicação — Apoio ao emprego dos jovens: uma ponte para o emprego da próxima geração, a proposta de recomendação do Conselho relativa a Uma ponte para o emprego — Reforçar a Garantia para a Juventude e o Plano de Ação para a Educação Digital 2021-2027.

(10)  Recomendação (UE) 2021/402 da Comissão, de 4 de março de 2021, sobre um apoio ativo e eficaz ao emprego na sequência da crise da COVID-19 (EASE) (JO L 80 de 8.3.2021, p. 1).

(11)  JO C 232 de 14.7.2020, p. 8.

(12)  JO C 56 de 16.2.2021, p. 1.

(13)  JO C 372 de 20.12.2011, p. 1.


III Atos preparatórios

Comité Económico e Social Europeu

562.a reunião plenária do Comité Económico e Social Europeu – por Interactio, 7.7.2021-8.7.2021

16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/22


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Orientações para a Digitalização até 2030: a via europeia para a Década Digital

[COM(2021) 118 final]

(2021/C 374/05)

Relator:

Gonçalo LOBO XAVIER

Consulta

Comissão Europeia, 21.4.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Competência

Secção do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

15.6.2021

Adoção em plenária

7.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

207/0/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O plano da Comissão Europeia «Orientações para a Digitalização até 2030» chega num momento crítico para a União e para o mundo inteiro. O Comité Económico e Social Europeu (CESE) saúda o lançamento da iniciativa e o objetivo de utilizar as tecnologias digitais para melhorar as vidas dos cidadãos, criar mais postos de trabalho, facilitar o progresso e reforçar a competitividade europeia. A pandemia realçou a importância e as possibilidades decorrentes do desenvolvimento digital, vincou a necessidade de efetuar ajustamentos e mudou o modo como socializamos e trabalhamos. A UE tem de dar uma resposta adequada a estes desafios. Para transformar as intenções em resultados, é essencial dispor de uma estratégia, um plano com objetivos específicos e uma forma de avaliar os progressos.

1.2.

O CESE entende que a inovação digital tem de salvaguardar a todo o momento os direitos fundamentais, assegurando a saúde, a segurança e a privacidade (proteção dos dados pessoais) de todos. É fundamental que os cidadãos considerem que o desenvolvimento e o crescimento têm um impacto positivo na qualidade das suas vidas. Os efeitos das novas tecnologias que prestam apoio no nosso quotidiano têm de ser positivos e distribuídos de forma justa, devendo o direito à saúde prevalecer sempre e constar da lista dos direitos fundamentais da cidadania digital.

1.3.

O CESE chama a atenção para a necessidade de restaurar a confiança do público e melhorar a cibersegurança e a ciber-resiliência por meio da «segurança desde a conceção» ao longo de toda a cadeia de valor digital, de proporcionar às pessoas uma gama mais vasta de escolhas e um maior controlo dos seus dados («ética dos dados») e de estabelecer a responsabilidade dos intermediários na luta contra os conteúdos ilícitos e nocivos.

1.4.

A acessibilidade em linha de todos os serviços públicos europeus e nacionais é um objetivo legítimo. Contudo, o CESE chama a atenção para a necessidade de ninguém ficar para trás e para o facto de que é indispensável apoiar as pessoas que não podem beneficiar imediatamente do processo de digitalização. Há ainda um grupo significativo de cidadãos que carecem de conhecimentos e competências e até mesmo do equipamento informático e dos suportes lógicos necessários para beneficiar destes recursos. O CESE insta a Comissão a apoiar as pessoas que se encontram num processo de transição.

1.5.

O CESE salienta o considerável risco decorrente das desvantagens em matéria de aprendizagem que podem resultar de um investimento desequilibrado. Há que ter presente os efeitos da pobreza digital nos cidadãos de todas as idades, das crianças aos idosos, sendo, por conseguinte, prioritário conferir especial atenção aos riscos efetivos. O investimento na infraestrutura tem de ser acompanhado por um investimento na formação para reduzir as disparidades.

1.6.

O CESE salienta a necessidade de ajudar as pessoas na requalificação e melhoria de competências. Para tal, é necessário assegurar a igualdade de oportunidades mediante o reforço das parcerias público-privadas de requalificação e melhoria de competências (tanto da mão de obra atual como dos aprendentes adultos), promovendo uma atitude de aprendizagem ao longo da vida para todos.

1.7.

O CESE considera que é necessário modernizar a educação tendo em vista uma sociedade digital. É fundamental promover a digitalização dos sistemas de educação mediante a atualização dos conteúdos educativos para a era digital e criar ecossistemas público-privados para aplicar novas metodologias de ensino abertas e acessíveis de modo a proporcionar as mesmas oportunidades a todos.

1.8.

O desenvolvimento digital implica riscos como a fraude, a violação da privacidade e a falta de transparência, que podem prejudicar os objetivos previstos no documento. O CESE entende que é necessário criar condições para prevenir esses riscos e para regulamentar as responsabilidades a nível da UE.

1.9.

O CESE salienta a necessidade de ponderar estratégias para resolver a questão da possível perda de postos de trabalho decorrente da substituição pela tecnologia. Tal como referido em pareceres anteriores, reconhece-se que a inteligência artificial (IA) e a robótica provocarão perdas e transformarão determinados postos de trabalho, eliminarão alguns e criarão outros. Em todo o caso, a UE tem de assegurar que todos os trabalhadores, sejam eles trabalhadores por conta de outrem, trabalhadores por conta própria ou falsos trabalhadores por conta própria, têm acesso à proteção social, em consonância com o conjunto de direitos sociais da Europa. Há que promover o diálogo social, a todos os níveis, nestas matérias, e dar prioridade ao alinhamento das obrigações e dos direitos com a atual economia orientada para a esfera digital e as plataformas.

1.10.

O CESE entende que, para gerir de forma inclusiva e socialmente responsável a transição digital e para fazer frente à perda de postos de trabalho, em especial no período pós-COVID-19, uma das prioridades deve ser a criação de um fundo europeu, financiado sobretudo pela tributação das maiores empresas tecnológicas, no intuito de beneficiar os trabalhadores que estão a perder o seu emprego e a sua atividade devido à digitalização da economia, por meio de uma adequada formação, requalificação e melhoria das competências.

1.11.

O CESE insta igualmente à adoção de uma política coordenada que tenha plenamente em conta o ponto de partida da Europa e seja adaptada às transições tecnológica e societal que temos presenciado nos últimos anos e se têm intensificado devido à pandemia: é indispensável uma estratégia industrial — incluindo uma política em matéria de concorrência e regulamentação setorial, nomeadamente capazes de garantir uma conectividade segura.

2.   Observações na generalidade

2.1.

O CESE apoia o plano da Comissão Europeia intitulado «Orientações para a Digitalização até 2030: a via europeia para a Década Digital» enquanto parte integrante de um plano de ação mais amplo destinado a impulsionar a economia e a recuperação social da Europa.

2.2.

A crise da COVID-19 tem revelado um elevado nível de dependência externa no que respeita à tecnologia e aos processos digitais, o qual tem de ser combatido com eficiência e celeridade. Há que explorar melhor os ativos da Europa nestes domínios e envolver mais estreitamente os cidadãos europeus.

2.3.

O CESE realça a noção de que nenhum cidadão deve ficar para trás. A iliteracia digital ainda é elevada na Europa — 35 %, de acordo com a Comissão —, sendo necessário atenuar a falta de acesso aos recursos digitais. Todavia, importa garantir a possibilidade de interagir com seres humanos no quadro das relações económicas e administrativas. É igualmente importante assegurar que os benefícios da digitalização não são colhidos apenas por algumas pessoas. A Década Digital tem de aproveitar a todos.

2.4.

Há que apoiar as empresas europeias, em especial as PME, nos respetivos esforços de digitalização e capacitá-las para concorrerem a uma escala mundial. Nos casos em que a UE detenha ou financie recursos informáticos, como computadores para aceleração quântica, o acesso aos mesmos tem de ser distribuído de forma justa, com base em critérios objetivos.

2.5.

No entanto, a ambição e os fundos públicos por si sós não proporcionarão os resultados que pretendemos. É igualmente necessária uma política coordenada que tenha plenamente em conta o ponto de partida da Europa e seja adaptada às transições tecnológica e societal que temos presenciado nos últimos anos e se têm intensificado devido à pandemia: é indispensável uma estratégia industrial — incluindo uma política em matéria de concorrência e regulamentação setorial, nomeadamente capazes de garantir uma conectividade segura.

2.6.

O CESE acolhe com agrado a perspetiva do desenvolvimento de um ecossistema de ensino e inovação digital e destaca a necessidade de mobilizar as instituições científicas e académicas europeias mais destacadas para alcançar esse objetivo.

2.7.

É necessário reforçar a cooperação pública e privada existente e criar maiores sinergias para garantir um novo pacto digital baseado num modelo de governação que combina aspetos sociais, ambientais e económicos, para alcançar uma transição digital sustentável, justa e inclusiva a longo prazo.

2.8.

O CESE salienta a necessidade de ponderar estratégias para resolver a questão da possível perda de postos de trabalho decorrente da substituição pela tecnologia. Tal como referido em pareceres anteriores (1), reconhece-se que a IA e a robótica provocarão perdas e transformarão determinados postos de trabalho, eliminarão alguns e criarão outros. Em todo o caso, a UE tem de assegurar que todos os trabalhadores, sejam eles trabalhadores por conta de outrem, trabalhadores por conta própria ou falsos trabalhadores por conta própria, têm acesso à proteção social, em consonância com o conjunto de direitos sociais da Europa. Há que promover o diálogo social, a todos os níveis, nestas matérias e adotar e coordenar medidas de apoio às pessoas que perderam os seus postos de trabalho, eventualmente financiadas por meio um imposto da UE sobre as empresas que retiram maiores proveitos da economia digital.

2.9.

Não se pode descurar o papel do capital de risco, do mercado bolsista e do investimento privado em geral. O desenvolvimento digital na Europa será impulsionado pelas empresas privadas e a UE só conseguirá concorrer à escala mundial se permanecer um espaço convidativo a esses investimentos. É necessário que tudo isto se faça no respeito das normas sociais.

2.10.

As metas de conectividade ambiciosas devem ser concomitantes com um compromisso com um quadro regulamentar mais favorável que apoie o investimento privado na infraestrutura da rede. Será crucial alinhar a estratégia industrial da UE e a visão para uma liderança europeia na conectividade digital com a política de concorrência e as práticas regulamentares do setor das telecomunicações.

2.11.

O roteiro da Década Digital estabelece planos para desenvolver «as suas próprias infraestruturas e capacidades de computação em nuvem» para impedir que os dados produzidos na Europa sejam transferidos para o exterior, que é atualmente o destino de mais de 90 % dos dados europeus. A Europa não pode ser ingénua e tem de prosseguir o seu esforço para se tornar mais independente e manter os dados dos seus cidadãos, em especial os dados sensíveis, dentro das suas fronteiras. A este respeito, a meta prevista no plano para a Década Digital de implantar 10 000 nós periféricos e na nuvem de grande segurança e com impacto neutro no clima constitui um passo na direção certa. Há que intensificar o ritmo do projeto GAIA X e pô-lo rapidamente em funcionamento.

2.12.

O CESE apoia a ideia de promover um setor tecnológico europeu para reduzir a dependência das grandes empresas tecnológicas americanas e chinesas e para recuperar terreno em domínios como a implantação da 5G, a fabricação de circuitos integrados e o tratamento de dados, mas alerta para os perigos de uma abordagem protecionista da economia dos dados na Europa. É necessário promover as parcerias e a cooperação internacional.

2.13.

Para alcançar estes objetivos, será necessário empregar, até 2030, 20 milhões de peritos no domínio das tecnologias nas áreas de trabalho pertinentes, em comparação com os 7,8 milhões de peritos atualmente. Em 2019, só 18 % dos 7,8 milhões de trabalhadores no domínio das TIC eram mulheres. A diversidade nos setores digitais é essencial para ajudar a moldar a visão do mundo e dos seus desafios, mais especificamente para reduzir os riscos decorrentes da parcialidade. A meta de alcançar uma representação mais equilibrada dos géneros tem de ser acompanhada de perto e é necessário encorajar o êxito das mulheres nas disciplinas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (CTEM). O diálogo social deve ser promovido a todos os níveis (empresarial, industrial e nacional), porquanto pode contribuir para esse objetivo. Cumpre promover campanhas vigorosas nos Estados-Membros, logo na escola primária, para encorajar as jovens raparigas a escolherem disciplinas científicas e tecnológicas. A clivagem digital constitui um desafio significativo. Em muitas zonas rurais ainda nem existe a 3G. A Europa e os Estados-Membros devem dar incentivos para encorajar o investimento em zonas rurais para assegurar que nenhum cidadão fica para trás.

2.14.

Estes investimentos podem promover a coesão social e o desenvolvimento regional e podem permitir que as pessoas que o queiram vivam vidas mais gratificantes fora dos grandes centros urbanos (as «aldeias inteligentes» referidas na comunicação). O trabalho à distância tem de ser desenvolvido por meio do diálogo social e da negociação coletiva a todos os níveis, para salvaguardar a saúde e o bem-estar dos trabalhadores.

2.15.

O CESE encoraja a Comissão Europeia a criar incentivos ao estabelecimento das pessoas fora das grandes zonas urbanas, promovendo o desenvolvimento económico e social das zonas rurais, o que pode ser conseguido se for implantada a infraestrutura adequada, mais especificamente no domínio das telecomunicações e dos transportes.

2.16.

Dado que na próxima década teremos de superar desafios ambientais importantes, todas as medidas tomadas neste contexto também devem ter em conta o aspeto ambiental. Além disso, as «Orientações para a Digitalização» devem ser utilizadas como instrumento suplementar para alcançar os objetivos do Pacto Ecológico Europeu e reduzir os impactos ambientais.

2.17.

Analogamente, as tecnologias digitais têm de ser transparentes, inclusivas, não discriminatórias, justas e imparciais, o que é ainda mais essencial à medida que os serviços públicos se tornam cada vez mais digitais. De acordo com a Comissão, atualmente, 65 % dos cidadãos europeus têm as competências digitais essenciais, tendo sido assumida a meta de alcançar os 80 % até 2030. A questão de incluir e apoiar as restantes 20 % das pessoas (aproximadamente 90 milhões de cidadãos na UE) é fundamental para reduzir a pobreza e a exclusão. Estes cidadãos encontram-se, geralmente, entre as pessoas mais pobres, mais velhas e que vivem em zonas rurais, podendo tornar-se ainda mais vulneráveis ao lidarem com serviços públicos e privados, que se têm tornado cada vez mais digitais. O CESE salienta que importa garantir a possibilidade de interagir com seres humanos no quadro das relações económicas e administrativas.

2.18.

O CESE apoia plenamente o objetivo de disponibilizar em linha todos os serviços públicos fundamentais europeus e entende que será igualmente necessário que os processos clínicos dos cidadãos europeus sejam totalmente digitais, dado que se espera que 80 % dos cidadãos utilizem uma identidade digital. No entanto, tal implicará igualmente esforços concertados e vontade política por parte de todos os Estados-Membros. O CESE insta à participação das organizações da sociedade civil para alcançar este objetivo. As infraestruturas digitais essenciais para os serviços públicos devem ser, em princípio, gratuitas. Em todo o caso, a digitalização dos serviços públicos não pode conduzir ao aumento dos entraves financeiros para os utilizadores.

3.   Observações na especialidade

3.1.

O aumento da digitalização das nossas vidas exige um cuidado especial em termos de cibersegurança e suscetibilidade à fraude, sendo essencial educar os cidadãos a este respeito. A regulamentação da tecnologia usável suscita particular preocupação, devendo ser-lhe conferida atenção especial.

3.2.

A legislação europeia relativa à economia digital tem evoluído rapidamente. Os cidadãos e as empresas têm de ser informados dos seus direitos e deveres no domínio digital. Há que envidar um esforço contínuo para consolidar as iniciativas legislativas e tornar a lei mais fácil de compreender e aplicar para os cidadãos e as empresas.

3.3.

O CESE acolhe favoravelmente o acompanhamento periódico das metas e do sistema de governação apresentado na comunicação, bem como os projetos plurinacionais, que são essenciais para alcançar a visão delineada.

3.4.

O CESE propõe que sejam elaborados casos de estudo de determinados setores nos Estados-Membros e em países terceiros para adotar ou promover as boas práticas a nível europeu. Há que promover ambientes de testagem da regulamentação que proporcionem um espaço seguro para testar novas ideias e modelos de negócios. Uma economia digital ambiciosa tem de criar espaços de teste que sejam ágeis e facilitadores.

4.   Uma população dotada de competências digitais e profissionais do setor digital altamente qualificados

4.1.

O CESE apoia o objetivo de ter 20 milhões de peritos no domínio das TIC empregados, com uma convergência entre homens e mulheres (2) (base de referência de 2019: 7,8 milhões). Naturalmente, tal exigirá um investimento em sistemas de ensino adequados capazes de apoiar este objetivo.

4.2.

A digitalização dos serviços das profissões liberais estreitamente ligados a questões de interesse público, como a saúde, a segurança, o direito e o nível de vida, tem um impacto significativo na sociedade e exige novas abordagens profissionais e deontológicas. (3) O êxito daquela depende tanto de profissionais altamente qualificados como das competências digitais e da capacidade de compreensão dos utilizadores, dos pacientes, dos clientes e dos consumidores.

4.3.

O CESE salienta a cada vez maior necessidade de requalificar e melhorar as competências das pessoas, promovendo uma atitude de aprendizagem ao longo da vida para todos.

4.4.

A pandemia veio impulsionar a aprendizagem à distância. Ao mesmo tempo, tem-se tornado claro que tal comporta um elevado risco de atrasar a aprendizagem das crianças das classes sociais mais baixas. Ao pôr em prática o plano de ação das metas digitais para 2030, importa conferir uma atenção específica à pobreza digital.

5.   Papel mundial da UE na Década Digital e condições de concorrência equitativas para as PME

5.1.

No que respeita às PME, naturalmente, é essencial apoiar os seus esforços de digitalização por meio de diversas abordagens, mas é igualmente importante destacar o papel das PME enquanto forças motrizes da inovação nas tecnologias digitais.

5.2.

O desenvolvimento de suportes lógicos constitui um subsetor em rápido crescimento no processo digital. O apoio às PME inovadoras merece uma atenção específica. O CESE apoia os mecanismos financeiros suscetíveis de assegurarem um apoio adequado às PME para garantir uma transição sem percalços. Ao mesmo tempo, é necessário assegurar a continuidade, o que implica disponibilizar atualizações para versões mais recentes para que os utilizadores não tenham de investir constantemente em novos programas.

5.3.

Todas as empresas, sejam elas PME, empresas em fase de arranque ou empresas jovens de acelerado crescimento, necessitam de capital. Os objetivos estabelecidos no documento destacam a urgência de concretizar uma União dos Mercados de Capitais que tenha em conta as soluções de mercado e reduza a dependência do financiamento bancário e apoio antecipado, favorecendo a transferência de economias entre diferentes Estados-Membros em busca da melhor remuneração, bem como a necessidade de eliminar o desvio fiscal a favor da dívida. As empresas inovadoras necessitam de capital e de um regime fiscal que não penalize demasiado os empresários com taxas de imposto marginais sobre as suas mais-valias.

6.   Riscos e garantias

6.1.

A necessidade de segurança, previsibilidade e saúde física e psíquica também deve ser uma prioridade nesta agenda. É importante sensibilizar as pessoas para a segurança, bem como para a tecnologia, de modo a melhorar a qualidade de vida e do emprego. À luz deste princípio, o CESE considera que a Comissão Europeia deve aproveitar o exercício anual de monitorização da perceção dos cidadãos europeus quanto ao respeito dos seus direitos e valores para assegurar-se que o direito à saúde é adequadamente protegido.

6.2.

Na mesma ordem de ideias, o CESE recomenda que a UE elabore uma estratégia específica de monitorização que abranja toda a poluição eletromagnética gerada pelas diferentes tecnologias atualmente disponíveis de molde a acompanhar esta nova revolução industrial. Tal permitiria monitorizar a evolução da poluição eletromagnética em toda a Europa, dando, assim, azo à realização de uma série de estudos específicos neste domínio, a fim de aferir o estado de saúde da população, quando o registo de saúde eletrónico europeu se tornar finalmente realidade e for possível cruzar os dados. Todos os Estados-Membros devem monitorizar esta questão, devendo os dados recolhidos alimentar uma base de dados europeia única. Reputa necessário elaborar uma política europeia para melhorar a confiança dos cidadãos neste domínio.

6.3.

As tecnologias digitais devem estar ao serviço dos cidadãos europeus, que não devem nunca ser tratados como objetos ou meras fontes de dados. Há que ter em conta as orientações éticas e técnicas existentes, como as «Orientações éticas para uma inteligência artificial de confiança» do grupo de peritos de alto nível sobre a inteligência artificial.

6.4.

À luz dos riscos que o tratamento de dados apresenta, o CESE recomenda a adoção de medidas para assegurar que só sejam conservados os dados efetivamente necessários para as empresas e que os dados só sejam conservados durante o tempo necessário. Ao mesmo tempo, a inovação baseada em dados constitui um fator fundamental para a competitividade no ambiente digital, devendo as autoridades exercer pressão a favor de um quadro regulamentar intersetorial para a partilha de dados a fim de permitir a partilha de dados centrada nos utilizadores. O quadro aplicável tem de promover o acesso aos dados e centrar-se na interoperabilidade.

6.5.

O Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR) afeta 20 % dos seus fundos à conectividade digital e 37 % à transição ecológica. Tal exige uma visão ambiciosa e coerente para o setor europeu das telecomunicações e um compromisso com um quadro regulamentar mais favorável que apoie o investimento privado na infraestrutura da rede, bem como o desenvolvimento de serviços de telecomunicações integrados e soberanos com tecnologias na nuvem, periféricas, de dados e de IA.

6.6.

O CESE considera que a transição digital tem de ser consentânea com a transição para uma economia mais ecológica e tem de ter em conta o impacto ambiental. A utilização dos recursos (incluindo os recursos escassos) e o respetivo consumo de energia têm de ser razoáveis. Deve ser exigida transparência a nível europeu sobre a pegada de carbono dos serviços na nuvem para que qualquer organização consiga calcular a sua pegada de carbono digital e criar planos para reduzi-la.

6.7.

O CESE salienta a necessidade de acompanhar o ritmo da rápida evolução da tecnologia e dos modelos de negócios, envidando os maiores esforços para eliminar quaisquer lacunas regulamentares, em especial as suscetíveis de prejudicarem os consumidores e os cidadãos mais vulneráveis.

Bruxelas, 7 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  JO C 440 de 6.12.2018, p. 1.

(2)  Indicador IDES «2b1». Atualmente, a percentagem de mulheres entre os peritos no domínio das TIC é de apenas 18 %.

(3)  JO C 286 de 16.7.2021, p. 8.


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/28


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à itinerância nas redes de comunicações móveis públicas da União (reformulação)

[COM(2021) 85 final — 2021/0045 (COD)]

(2021/C 374/06)

Relator:

Christophe LEFÈVRE

Consulta

Parlamento Europeu, 24.3.2021

Conselho da União Europeia, 11.3.2021

Base jurídica

Artigo 114.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Competência

Secção do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

15.6.2021

Adoção em plenária

7.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

204/0/1

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) observa que a proposta da Comissão se enquadra no seguinte contexto:

a implantação de infraestruturas associadas à eliminação de zonas brancas e à conectividade de banda larga, e a implantação de tecnologias de nova geração (5G),

o objetivo de alcançar um nível elevado de defesa do consumidor e de assegurar a concorrência entre os operadores de redes móveis,

a criação de «Uma Europa Preparada para a Era Digital», a fim de evitar o ressurgimento dos obstáculos ao mercado único.

1.2.

O Comité observa que a proposta permitirá aumentar a transparência no mercado retalhista ao fornecer informações, nomeadamente nas condições contratuais, sobre:

a qualidade dos serviços que podem ser utilizados em itinerância na UE,

a comunicação relativa aos serviços de valor acrescentado, ao tipo de serviços suscetíveis de serem cobrados a preços mais elevados e às informações semelhantes através da mensagem «SMS de boas-vindas» enviada à entrada num novo país,

os diversos meios de acesso aos serviços de emergência quando em itinerância.

De um modo mais geral, a presente proposta aumentará o nível de proteção dos consumidores.

1.3.

Uma vez que ficou demonstrado por um estudo uma degradação da oferta da rede local utilizada em itinerância, a proposta visa garantir que os serviços de itinerância («Roam-Like-At-Home» — itinerância nas mesmas condições que no país de origem) são prestados nas mesmas condições que no âmbito de uma utilização nacional desses serviços, com acesso sem restrições às últimas gerações e tecnologias de rede disponíveis em itinerância. Se o problema se dever à falta de qualidade das infraestruturas locais, o CESE recomenda a intensificação dos investimentos nessas infraestruturas, nomeadamente com vista a melhorar a cobertura das zonas brancas, mas também a introdução de critérios mínimos a atingir gradualmente pelos operadores, a fim de permitir aos consumidores utilizar plenamente esses serviços.

1.4.

A redução dos preços máximos (pricecaps) que as redes visitadas podem cobrar aos operadores visitantes é também de saudar, mas a escala da redução é insuficiente, dada a diferença entre os preços novamente faturados e os custos reais de itinerância na rede visitada. Tal leva a um aumento do custo da assinatura de base para os consumidores e a um enfraquecimento da competitividade dos operadores de redes móveis virtuais (mobile virtual network operator) que têm de adquirir serviços de itinerância junto dos principais operadores móveis. O consumo de dados está a aumentar a um ritmo elevado. Para evitar efeitos de escala negativos para os operadores de redes móveis virtuais e os pequenos operadores de redes móveis, os limites máximos grossistas têm de diminuir ao mesmo ritmo que o aumento do consumo.

1.5.

O CESE apoia a opção preferida na proposta, a Opção 3 — «Roam-Like-At-Home» (RLAH) sustentável e genuína, e considera que se deve assegurar uma redução mais acentuada dos preços máximos do que a indicada na proposta.

1.6.

Embora a proposta de regulamento melhore a transparência das tarifas de valor acrescentado ao criar gamas de números para serviços de valor acrescentado através do estabelecimento de uma base de dados centralizada da UE acessível aos operadores dessas gamas de números, o Comité recomenda que tal inclua a possibilidade de interromper o serviço em caso de utilização fraudulenta (ping-call), mediante aviso das autoridades judiciais ou policiais, prevendo vias de recurso para os operadores desses serviços.

1.7.

Ainda que o regulamento refira uma «utilização responsável» para descrever a utilização em itinerância, o Comité lamenta que não especifique os limites e não aborde as regras da política de utilização equitativa no que diz respeito aos planos tarifários ilimitados, nem a tarifação das chamadas internacionais, independentemente de o cliente de origem se encontrar em itinerância ou não. O Comité propõe a supressão da expressão «sob reserva de políticas de utilização responsável», tendo em conta que não é especificado o seu âmbito, pois este argumento é atualmente utilizado pelos operadores para restringir fortemente a utilização das tarifas planas de itinerância.

1.8.

No que diz respeito aos alertas de consumo na aproximação de um limite definido pelo consumidor ou pelo operador, o Comité recomenda que o operador seja obrigado a voltar a alertar o consumidor sempre que o volume que define o primeiro alerta volte a ser atingido, especialmente durante a mesma chamada ou a mesma sessão de utilização de dados.

1.9.

Em especial, o Comité está particularmente atento às situações de utilização de dispositivos móveis em zonas que fazem fronteira com países não membros da União Europeia e recomenda:

que seja solicitada uma articulação específica com os operadores intervenientes nas zonas da União Europeia, para que os preços de itinerância RLAH da UE sejam alargados a esses países ou à zona geográfica limítrofe,

que sejam celebrados acordos internacionais com vista a alargar a itinerância RLAH da UE aos países vizinhos da UE.

1.10.

O Comité observa que uma parte dos estudos e consultas efetuados para efeitos de revisão do regulamento europeu é anterior à crise da COVID-19, a qual conduziu a restrições drásticas nas viagens intraeuropeias e ao recurso maciço a ferramentas de teletrabalho ou de teledifusão de cursos universitários, em especial para estudantes Erasmus+.

1.11.

O Comité constata a persistência de várias zonas não servidas de banda larga ao nível do lacete local na União Europeia e observa, em especial, a velocidade insuficiente para fazer face à procura originada por essas videoconferências, que, em itinerância ou não, consomem muitos dados.

1.12.

O Comité recomenda o reforço significativo quer da estratégia de cobertura dos territórios com fibra ótica de banda larga, quer da capacidade de fornecer banda larga, através do lacete local ou das redes móveis.

1.13.

O CESE recomenda a aplicação do regulamento europeu para que, a longo prazo, a União Europeia constitua uma zona tarifária única, num mercado único, que permite a aplicação de tarifas «locais» às chamadas e ao consumo de dados para todos os números móveis e fixos de consumidores que possuam uma assinatura telefónica na Europa, com as mesmas velocidades e igual acesso à infraestrutura, independentemente do país de chamada ou receção.

1.14.

O Comité expressa preocupação com a alteração proposta no que se refere ao método de revisão das tarifas grossistas máximas através de um ato delegado e recomenda uma apreciação legislativa completa, tendo em conta os aspetos societais do desenvolvimento da itinerância.

2.   Síntese da proposta da Comissão

2.1.

O objetivo da proposta é prorrogar a aplicação do Regulamento (UE) n.o 531/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho (1), que expira em 30 de junho de 2022. A proposta prevê um ajustamento das tarifas grossistas máximas a fim de assegurar a sustentabilidade da prestação de serviços retalhistas de itinerância a preços domésticos. Introduz ainda novas medidas para aumentar a transparência e garantir uma verdadeira experiência de utilização dos serviços de itinerância nas mesmas condições do país de origem («Roam-Like-At-Home») em termos de qualidade do serviço e acesso aos serviços de emergência. Tendo em conta que o Regulamento (UE) n.o 531/2012 foi alterado várias vezes, a proposta tem por objetivo reformulá-lo, no intuito de proporcionar maior clareza e substituir os diversos atos modificativos nele contidos.

2.2.

As principais alterações propostas visam assegurar que os operadores possam prestar serviços de itinerância nas mesmas condições do país de origem e recuperar os custos de forma sustentável a nível grossista. Propõe-se o estabelecimento de tarifas máximas de itinerância a nível grossista em toda a UE, aplicáveis a chamadas efetuadas, mensagens SMS e dados, a níveis inferiores aos vigentes até 30 de junho de 2022.

2.3.

Além da redução das tarifas grossistas máximas aplicáveis, a proposta contém alterações que visam assegurar uma verdadeira itinerância para os utilizadores finais nas mesmas condições do país de origem e facilitar a inovação e o acesso às redes, estabelecendo simultaneamente um quadro regulamentar orientado para o futuro para os consumidores e os operadores.

2.4.

Em síntese, a proposta contribui para a criação de uma «Europa Preparada para a Era Digital» e para concretizar a ambição de tirar o máximo partido da transição digital, a fim de proporcionar às pessoas mais oportunidades de se ligarem e comunicarem, bem como de facilitar a atividade profissional e comercial no mercado único. Tem por objetivo garantir que as barreiras ao mercado único que foram eliminadas com a abolição das sobretaxas de itinerância a nível retalhista não serão repostas.

3.   Base jurídica

3.1.

A base jurídica da presente proposta é o artigo 114.o, que constitui o quadro do processo legislativo ordinário e visa estabelecer ou melhorar o funcionamento do mercado interno (artigo 26.o do TFUE).

4.   Observações gerais

4.1.

O Comité acolhe favoravelmente o projeto de regulamento europeu em apreço e considera necessário que a proposta faculte, por fim, aos consumidores o mesmo nível de serviço e o mesmo nível de proteção tanto no estrangeiro como no país de origem. No entanto, os operadores devem ter a possibilidade de negociar os seus acordos grossistas de itinerância em função das suas necessidades comerciais. O regulamento não deve limitar a possibilidade de celebrar um acordo de acesso grossista apenas com os operadores que dispõem das redes mais avançadas.

4.2.

O Comité observa que a proposta da Comissão se enquadra no seguinte contexto:

a implantação de infraestruturas associadas à eliminação de zonas brancas e à conectividade de banda larga, e a implantação de tecnologias de nova geração (5G),

o objetivo de alcançar um nível elevado de defesa do consumidor e de assegurar a concorrência entre os operadores de redes móveis,

a criação de «Uma Europa Preparada para a Era Digital», a fim de evitar o ressurgimento dos obstáculos ao mercado único.

4.3.

O CESE constata que a Comissão realizou estudos de impacto desde 2018, nomeadamente uma consulta pública de 12 semanas em 2020, sobre 1) os serviços retalhistas de itinerância (clarificações e medidas relativas à qualidade do serviço, aos serviços de valor acrescentado e às comunicações de emergência em contexto de itinerância); 2) a prestação de serviços de itinerância grossistas; 3) os encargos administrativos relacionados com o Regulamento (UE) n.o 531/2012 e o impacto de potenciais medidas de simplificação.

4.4.

O CESE observa que a proposta aumentará a transparência no mercado retalhista ao fornecer informações, nomeadamente nas condições contratuais, sobre:

a qualidade dos serviços que podem ser utilizados em itinerância na UE,

a comunicação relativa aos serviços de valor acrescentado, ao tipo de serviços suscetíveis de serem cobrados a preços mais elevados e às informações semelhantes através da mensagem «SMS de boas-vindas» enviada à entrada num novo país,

os diversos meios de acesso aos serviços de emergência quando em itinerância, nomeadamente na mensagem «SMS de boas-vindas».

4.5.

O estudo do Organismo dos Reguladores Europeus das Comunicações Eletrónicas (ORECE/BEREC) de 2019 demonstrou a degradação da disponibilidade dos serviços quando em itinerância, apesar da aplicação de uma estratégia de aperfeiçoamento técnico em todo o território. A proposta visa garantir que os serviços de itinerância são prestados nas mesmas condições e com a mesma qualidade aplicáveis aos serviços prestados no mercado doméstico, e que os operadores de redes móveis podem conceder o acesso a todas as tecnologias e gerações de rede disponíveis.

4.6.

As medidas propostas são, por conseguinte, necessárias para corresponder às expectativas legítimas dos consumidores e satisfazer as ambições iniciais do regulamento relativo à itinerância. Se o problema se dever à falta de qualidade das infraestruturas locais, o CESE recomenda a intensificação dos investimentos nessas infraestruturas, nomeadamente com vista a melhorar a cobertura das zonas brancas, mas também a introdução de critérios mínimos a atingir gradualmente pelos operadores, a fim de permitir aos consumidores utilizar plenamente esses serviços.

4.7.

A redução nos preços máximos (pricecaps) que as redes visitadas podem cobrar aos operadores visitantes é também de saudar, mas a escala da redução é insuficiente, dada a diferença entre os preços novamente faturados e os custos reais de itinerância na rede visitada. Tal leva a um aumento do custo da assinatura de base para os consumidores e a um enfraquecimento da competitividade dos operadores de redes móveis virtuais que têm de adquirir serviços de itinerância junto dos principais operadores móveis.

4.8.

O CESE apoia a opção preferida na proposta, a Opção 3 — RLAH sustentável e genuína, e considera que se deve assegurar uma redução mais acentuada dos preços máximos do que a indicada na proposta.

4.9.

A proposta prevê um aumento da transparência a nível grossista no respeitante às gamas de números usadas para a prestação de serviços de valor acrescentado, criando uma base de dados centralizada da UE acessível aos operadores dessas gamas de números.

4.10.

O Comité recomenda que se inclua na proposta a possibilidade de interrupção do serviço em caso de utilização fraudulenta (ping-call), mediante aviso das autoridades judiciais ou policiais, prevendo vias de recurso para os operadores desses serviços.

4.11.

A proposta garante aos clientes de itinerância o livre acesso aos serviços de emergência, adotando medidas específicas ao nível do mercado grossista, incluindo chamadas gratuitas e a geolocalização.

4.12.

Apesar de visar efetivamente eliminar as anomalias observadas no acesso à rede de itinerância (fluidez da ligação, acesso reduzido à 3G ou 4G, etc.), em comparação com os consumidores detentores de uma assinatura adquirida no país de itinerância, o CESE observa que, em contrapartida, a proposta não regula as práticas que o Comité considera anómalas, tais como:

o facto de se limitar no estrangeiro o volume de megabytes incluído na assinatura quando este é utilizado em itinerância, e

a aplicação de tarifas ainda muito elevadas para os consumidores que não se encontram em itinerância quando contactam um assinante que adquiriu um serviço móvel num país diferente.

4.13.

Ainda que o regulamento refira uma «utilização responsável» para descrever a utilização em itinerância, o Comité lamenta que não especifique os limites e não aborde as regras da política de utilização equitativa no que diz respeito aos planos tarifários ilimitados, nem a tarifação das chamadas internacionais, independentemente de o cliente de origem se encontrar em itinerância ou não. O Comité propõe a supressão da expressão «sob reserva de políticas de utilização responsável», tendo em conta que não é especificado o seu âmbito, pois este argumento é atualmente utilizado pelos operadores para restringir fortemente a utilização das tarifas planas de itinerância.

4.14.

Em especial, o Comité está particularmente atento às situações de utilização de dispositivos móveis em zonas que fazem fronteira com países não membros da União Europeia e recomenda:

que seja solicitada uma articulação específica com os operadores intervenientes nas zonas da União Europeia, para que os preços de itinerância RLAH da UE sejam alargados a esses países ou à zona geográfica limítrofe,

que sejam celebrados acordos internacionais com vista a alargar a itinerância RLAH da UE aos países vizinhos da UE.

4.15.

O Comité observa que uma parte dos estudos e consultas efetuados para efeitos de revisão do regulamento europeu é anterior à crise da COVID-19, a qual conduziu a restrições drásticas nas viagens intraeuropeias e ao recurso maciço a ferramentas de teletrabalho ou de teledifusão de cursos universitários, em especial para estudantes Erasmus+.

4.16.

O Comité constata a persistência de várias zonas não servidas de banda larga ao nível do lacete local na União Europeia e observa, em especial, a velocidade insuficiente para fazer face à procura originada por essas videoconferências, que, em itinerância ou não, consomem muitos dados.

4.17.

O Comité recomenda o reforço significativo e qualitativo, quer da estratégia de cobertura dos territórios com fibra ótica de banda larga, quer da capacidade de fornecer banda larga, através do lacete local ou das redes móveis.

4.18.

No que diz respeito aos alertas de consumo na aproximação de um limite definido pelo consumidor ou pelo operador, o Comité recomenda que o operador seja obrigado a voltar a alertar o consumidor sempre que o volume que define o primeiro alerta volte a ser atingido, especialmente durante a mesma chamada ou a mesma sessão de utilização de dados. Se os alertas mencionados falharem ou não forem implementados, cumpre prever mecanismos de reembolso das taxas cobradas indevidamente.

4.19.

No que se refere à base de dados centralizada prevista para os números com serviços de valor acrescentado, o Comité recomenda que esta seja constituída de forma a incluir a possibilidade de interromper o serviço em caso de utilização fraudulenta (ping-call), mediante aviso das autoridades judiciais ou policiais, prevendo vias de recurso para os operadores desses serviços.

4.20.

O CESE recomenda a aplicação do regulamento europeu para que, a longo prazo, a União Europeia constitua um verdadeiro mercado único, que permite a aplicação de tarifas «locais» às chamadas e ao consumo de dados para todos os números móveis e fixos de consumidores que possuam uma assinatura telefónica na Europa, com a mesma velocidade e igual acesso à infraestrutura, independentemente do país de chamada ou receção.

4.21.

O Comité manifesta preocupação com a proposta de alteração no que se refere ao método de revisão das tarifas grossistas máximas através de um ato delegado. Deve optar-se por uma apreciação legislativa abrangente, de modo a levar em consideração todos os aspetos societais do desenvolvimento da itinerância. Neste contexto, importa escutar o Parlamento Europeu e a sociedade civil organizada.

Bruxelas, 7 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Regulamento (UE) n.o 531/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de junho de 2012, relativo à itinerância nas redes de comunicações móveis públicas da União (JO L 172 de 30.6.2012, p. 10).


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/33


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre uma nova estratégia de financiamento do Next Generation EU

[COM(2021) 250 final]

(2021/C 374/07)

Relatora:

Judith VORBACH

Consulta

Comissão Europeia, 31.5.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Competência

Secção da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social

Adoção em secção

22.6.2021

Adoção em plenária

8.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

186/0/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE congratula-se com o facto de todos os Estados-Membros terem concluído a ratificação da Decisão (UE, Euratom) 2020/2053 do Conselho (1) (Recursos Próprios) e da subsequente entrada em vigor desta nova decisão em 1 de junho de 2021, o que permite à Comissão começar a contrair empréstimos para financiar o instrumento de recuperação. O CESE insta todas as partes interessadas a adotarem rapidamente as medidas subsequentes para que as verbas possam começar a ser atribuídas.

1.2.

O efeito que o Next Generation EU teve no reforço da confiança já ajudou a estabilizar as economias e os custos de empréstimo da União Europeia (UE) e dos Estados-Membros. O financiamento deste instrumento aumentará o volume dos ativos seguros da UE e reforçará o papel internacional do euro. O CESE observa que a estratégia de financiamento do Next Generation EU assenta na contração de empréstimos nos mercados de capitais e no investimento privado.

1.3.

Em contraste com o debate geral sobre as despesas do Next Generation EU, o seu financiamento é encarado como uma questão técnica. No entanto, a adoção de uma estratégia de financiamento eficaz é fundamental para uma implementação harmoniosa do Next Generation EU. Um financiamento adequado, uma gestão de riscos sólida, custos de empréstimo baixos e um financiamento sustentável beneficiam a sociedade civil, que, em última instância, suporta os riscos do mercado. A contração de empréstimos e a gestão da dívida devem estar sujeitas ao controlo democrático e assentar na legitimidade e na transparência.

1.4.

As necessidades de financiamento do Next Generation EU exigem uma estratégia sofisticada para assegurar que a UE cumpre atempadamente e em condições de mercado favoráveis os compromissos assumidos em matéria de pagamentos. O CESE salienta a importância de a Comissão gerir diretamente a estratégia de financiamento e congratula-se com o aumento dos respetivos recursos humanos neste domínio. No entanto, tal deve ser feito de forma equilibrada do ponto de vista do género. Além disso, deve criar-se um conselho consultivo, em que estejam representados a Comissão, o Parlamento Europeu, o Conselho, os parceiros sociais e a sociedade civil organizada.

1.5.

O CESE salienta a importância de preservar a elevada capacidade de endividamento e os baixos custos de empréstimo da UE, a fim de evitar efeitos redistributivos dos mutuários para os mutuantes. Além disso, esta situação, em conjunto com a subida das taxas de crescimento económico, facilitará o reembolso. A capacidade de endividamento dependerá, acima de tudo, da robustez económica, política e social da UE e poderá ser consolidada com o aprofundamento da União Económica e Monetária (UEM). Em qualquer caso, é importante antecipar as crises, o que poderá implicar também que o Banco Central Europeu (BCE) atue como comprador de último recurso.

1.6.

Globalmente, uma parte muito significativa da nova estratégia de financiamento é dedicada às relações com os investidores. O CESE acolhe favoravelmente a decisão relativa à contração de empréstimos e os planos de financiamento, que constituem essencialmente formas de proporcionar transparência aos mercados financeiros. No entanto, a comunicação com o público e os seus representantes não deve nunca passar para segundo plano. É positivo que uma das condições essenciais para a participação na rede de corretores principais seja a supervisão por uma autoridade competente da União. Uma vez que é imperativo cumprir as regras aplicáveis, o CESE apoia a possibilidade de o Organismo Europeu de Luta Antifraude participar nesta supervisão e saúda o facto de também outros organismos públicos poderem ser designados para verificar a conformidade dos membros da rede de corretores principais com as regras estabelecidas na decisão.

1.7.

A participação em massa nos mercados de capitais implicará um vasto leque de riscos. O CESE apoia a criação de sistemas robustos de gestão dos riscos e a detenção de uma «conta do Next Generation EU» junto do BCE. Devido ao interesse público numa boa gestão dos riscos, o diretor de riscos deve consultar o Parlamento Europeu e o Conselho quando da elaboração da política de alto nível em matéria de risco e conformidade. Por último, o CESE insta a Comissão a assegurar a responsabilização, a transparência e a boa gestão financeira desde o início da contração de empréstimos no âmbito do Next Generation EU e adverte contra a contração excessiva de empréstimos junto de investidores de fora da UE, defendendo a introdução de novos recursos próprios.

1.8.

De um modo geral, o CESE acolhe favoravelmente a componente reforçada da partilha de riscos do Next Generation EU, mas salienta também a importância da redução dos riscos para assegurar a estabilidade dos mercados financeiros e proteger adequadamente os interesses financeiros da União. O CESE congratula-se com a proposta de um «quadro das obrigações verdes no âmbito do Next Generation EU» e recomenda que se pondere a emissão de obrigações sociais no mesmo contexto, de modo a ter devidamente em conta os interesses da sociedade civil.

2.   Contexto do parecer

2.1.

O Next Generation EU injetará um montante máximo de 806 mil milhões de euros na economia da UE — correspondente a 5 % do produto interno bruto da UE — sob a forma de subvenções e empréstimos. Em nome da UE, a Comissão contrairá estes montantes de empréstimo através de operações de financiamento nos mercados internacionais de capitais. O Next Generation EU é um instrumento temporário. A contração de empréstimos terá lugar entre meados de 2021 e 2026. Neste período, a Comissão executará operações de financiamento num montante de 150 a 200 mil milhões de euros por ano. O financiamento angariado pela UE terá de ser reembolsado quer diretamente pelos Estados-Membros (para os empréstimos), quer através do orçamento da UE (para o apoio não reembolsável), até, o mais tardar, dezembro de 2058.

2.2.

A Comunicação sobre uma nova estratégia de financiamento do Next Generation EU (2) é adotada ao abrigo do artigo 5.o, n.o 3, da Decisão (UE, Euratom) 2020/2053, que exige que a Comissão estabeleça as disposições necessárias para a gestão das operações de contração de empréstimos e informe periodicamente o Parlamento Europeu e o Conselho sobre todos os aspetos da sua estratégia de gestão da dívida. Com base na aprovação da Decisão Recursos Próprios por todos os Estados-Membros, a Comissão executará uma estratégia de financiamento, tal como descrito na comunicação e especificado em três decisões (3). Os instrumentos incluirão obrigações da UE e instrumentos financeiros de curto prazo da UE e as técnicas de financiamento consistirão em transações agrupadas e leilões. Proceder-se-á à publicação de uma decisão anual que estabelece os montantes máximos dos empréstimos a contrair e de planos semestrais de financiamento. A Comissão reforçará as suas estruturas e criará uma rede pan-europeia de corretores principais.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE apoiou o Next Generation EU desde o início e expressou reiteradamente essa aprovação (4). No seu Parecer — Estratégia Anual para o Crescimento Sustentável 2021 (5), o CESE confirma que o instrumento Next Generation EU foi elaborado e adotado de forma adequada e atempada. Devido ao seu efeito no reforço da confiança, o Next Generation EU já tem um impacto positivo na economia da UE, tendo reduzido a probabilidade de uma crise profunda em alguns países. Prevê-se que, a longo prazo, aumente consideravelmente a produção na UE, o que significa que, em última análise, todos os Estados-Membros deverão tornar-se beneficiários líquidos (6). O CESE congratula-se com o facto de todos os Estados-Membros terem concluído a ratificação da Decisão Recursos Próprios, permitindo o início da contração de empréstimos, e insta todas as partes interessadas a adotarem rapidamente as medidas subsequentes para que as verbas possam começar a ser atribuídas.

3.2.

Existe, e bem, amplo debate sobre a utilização dos fundos do Next Generation EU e — em menor medida — sobre os novos recursos próprios. Em contrapartida, tem-se dedicado pouca atenção ao financiamento do Next Generation EU, encarado como uma questão mais técnica do que política. Contudo, a contração de empréstimos no âmbito deste instrumento aumentará de forma significativa as obrigações financeiras da União e tem de ser realizada com controlo democrático, legitimidade e transparência. O CESE salienta que um financiamento adequado e sustentável, uma gestão de riscos sólida e custos de empréstimo baixos são objetivos de interesse público. Em última análise, a sociedade civil europeia será responsável pelas dívidas contraídas, e um aumento dos custos de empréstimo implicará efeitos redistributivos dos mutuários para os mutuantes. A adoção de uma estratégia de financiamento eficaz também é fundamental para uma implementação harmoniosa do Next Generation EU.

3.3.

O CESE observa que a estratégia proposta assenta no financiamento através dos mercados internacionais de capitais. Não são estabelecidas reservas de capitais, como acontece com o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) e não existem planos para renegociar o prazo de vencimento da dívida para além de 2058. Contudo, também foram debatidas publicamente outras abordagens, como as obrigações perpétuas garantidas e emitidas conjuntamente pelo BCE (7). A longo prazo, e principalmente em caso de emissão de dívida comum permanente, deve ponderar-se a possibilidade de atribuir ao BCE o papel de mutuante de último recurso.

3.4.

Uma vez que as necessidades de financiamento do Next Generation EU são avultadas e que o seu calendário de reembolso é complexo e eventualmente incerto, desconhecendo-se as dotações orçamentais precisas, importa adotar uma estratégia de financiamento sofisticada para contrair os empréstimos nos mercados. Cabe antecipar a evolução dos mercados financeiros, a fim de assegurar que a União pode cumprir atempadamente os compromissos assumidos em matéria de pagamentos sem ser obrigada a angariar fundos em condições de mercado adversas. Tal exige um conhecimento aprofundado do mercado e flexibilidade para decidir quando executar operações de financiamento e que técnicas de financiamento utilizar para garantir o menor risco de execução e os custos de financiamento mais baixos possíveis. O CESE salienta a importância de a Comissão gerir diretamente a estratégia de financiamento e não a externalizar. É necessário criar novas capacidades operacionais, e a Comissão está a reforçar, e bem, os respetivos recursos humanos e competências. O CESE insta a Comissão a aplicar, neste processo, uma abordagem equilibrada em termos de género.

3.5.

Além disso, o CESE observa que a estratégia de financiamento do Next Generation EU é acompanhada por um alargamento da responsabilidade da Comissão e saúda a obrigação de manter o Parlamento Europeu e o Conselho regularmente informados sobre todos os aspetos da estratégia de gestão da dívida, em complemento do disposto no Acordo Interinstitucional (8). A apresentação de atualizações anuais começará no terceiro trimestre de 2021. Tendo em conta o forte interesse público num financiamento robusto do Next Generation EU, este parece ser um nível de envolvimento mínimo. O CESE propõe que se crie um conselho consultivo para o financiamento do Next Generation EU. Os membros do Comité de Risco e Conformidade do Next Generation EU devem reunir-se semestralmente com representantes selecionados, competentes em matéria de mercados financeiros, do Parlamento Europeu, do Conselho, dos parceiros sociais e da sociedade civil organizada.

3.6.

Graças à notação de risco de crédito elevada e às perspetivas estáveis da UE, a Comissão poderá contrair empréstimos em condições financeiras vantajosas e transmitir esse benefício para os Estados-Membros. O CESE salienta a importância de manter os custos de empréstimo baixos durante todo o período de financiamento. Esta situação, a par do aumento previsto das taxas de crescimento económico, facilitará consideravelmente o reembolso. Acima de tudo, a capacidade de endividamento da UE dependerá da sua robustez económica, política e social e será consolidada com o aprofundamento da UEM. Em contrapartida, as forças centrífugas e os conflitos persistentes entre Estados-Membros poderão fragilizar essa capacidade de endividamento, enquanto a produção de efeitos das garantias (9) à custa de alguns Estados-Membros poderá criar atritos políticos graves (10). Além disso, importa antecipar crises de natureza económica ou relacionadas com os mercados financeiros, a saúde ou qualquer outra questão. Por conseguinte, é fundamental que a estratégia de financiamento assente numa base tão resiliente e sustentável quanto possível, o que poderá implicar também que o BCE atue como comprador de último recurso.

3.7.

Embora as atividades de financiamento do Next Generation EU já tenham começado, o calendário para a introdução de novos recursos próprios é muito menos concreto. A Comissão apresentará em meados de 2021 propostas para novos recursos próprios com base num mecanismo de ajustamento carbónico fronteiriço, no Sistema de Comércio de Licenças de Emissão e num imposto digital. As outras propostas a apresentar em 2024 poderão incluir um imposto sobre as transações financeiras ou uma contribuição financeira associada ao setor empresarial. Se antes de janeiro de 2028 estiverem disponíveis novos recursos próprios, estes serão utilizados para antecipar o reembolso. O CESE insta a Comissão a antecipar a apresentação das propostas previstas para 2024 e defende a introdução célere de novos recursos próprios. Se forem adequadamente aplicados, estes recursos, além de funcionarem como compensação quando não é possível cobrar eficazmente os impostos a nível nacional, devido à concorrência fiscal, contribuirão para um regime de reembolso justo e ajudarão a combater as alterações climáticas, ajudando também a evitar a necessidade de aumentar as contribuições nacionais ou de reduzir as despesas do orçamento da UE.

3.8.

A contração de empréstimos no âmbito do Next Generation EU, num montante de aproximadamente 800 mil milhões de euros, aumentará o volume dos ativos seguros denominados em euros para cerca de 2 biliões de euros, incluindo o instrumento SURE (11), a que acrescem os 800 mil milhões de euros em ativos emitidos através do MEE/Sistema Europeu de Supervisão Financeira e do Banco Europeu de Investimento antes da pandemia (12). O reforço de ativos seguros europeus que cobrem todos os prazos de vencimento até 30 anos proporcionará novos instrumentos seguros para o investimento, ajudará os bancos a diversificarem as suas reservas de obrigações soberanas, aumentará a atratividade da área do euro e reforçará o papel internacional do euro. Além disso, é provável que o efeito de reforço da confiança do Next Generation EU também reduza os custos de empréstimo para os setores público e privado, principalmente nos países da área do euro com grandes diferenciais em relação à Alemanha. A concessão de empréstimos pelo Next Generation EU também será uma opção para os Estados-Membros, em caso de tensões nos mercados que afetem as emissões de obrigações nacionais. O CESE saúda o reforço da componente de partilha dos riscos, mas salienta também a importância de reduzir os riscos assegurando uma boa regulação dos mercados financeiros e a convergência no domínio da supervisão.

4.   Observações na especialidade

4.1.

O CESE saúda o facto de a decisão-quadro anual relativa à contração de empréstimos definir limites máximos, por exemplo, para financiamento de longo e de curto prazo, e de a contração de empréstimos ser organizada com base em planos de financiamento semestrais assentes em informações sobre pagamentos futuros. Aparentemente, o objetivo destas medidas é proporcionar transparência aos mercados assegurando a previsibilidade das emissões para os investidores e facilitando a coordenação com outros emitentes, servindo também de base para a prestação de informações ao Parlamento Europeu e ao Conselho. O CESE tem plena consciência da importância das relações entre investidores e emitentes, mas salienta que a comunicação com o público e os seus representantes não deve ser nunca relegada para o segundo plano e que os interesses financeiros da União devem ser cuidadosamente protegidos.

4.2.

Um planeamento da liquidez permanente garantirá que as reservas de tesouraria são suficientes para evitar faltas de liquidez, evitando simultaneamente saldos de caixa elevados desnecessários. Uma vez que a capacidade de absorção dos mercados de capitais é finita e que a falta de liquidez causará problemas para a aplicação do Next Generation EU, o CESE defende que se dê prioridade à constituição de reservas robustas para riscos acima da minimização de custos excessivos e apoia expressamente o estabelecimento de reservas prudenciais de tesouraria detidas numa conta específica junto do BCE, a fim de evitar que estas reservas estejam sujeitas a qualquer risco de contraparte.

4.3.

A participação na rede de corretores principais habilita as instituições financeiras a participarem em leilões e implica a promoção da liquidez de mercado e a prestação de aconselhamento e informações adequados sobre os mercados à Comissão, mas está associada a compromissos em matéria de aquisição e comunicação de informações. O CESE saúda o facto de os candidatos já terem de ser membros ativos de uma rede de corretores principais da UE e ser supervisionados por uma autoridade competente da União. Os corretores principais desempenharão um papel fundamental no financiamento do Next Generation EU, e qualquer ato de negligência ou falta poderá aumentar os custos de empréstimo. Além disso, é necessário ter em conta os riscos de contraparte, assim como o poder de mercado e a relevância sistémica dos corretores principais.

4.3.1.

Devido às responsabilidades enormes dos membros da rede de corretores principais, é imperativo que estes se conformem às regras aplicáveis. A supervisão da conformidade com as regras estabelecidas na decisão (13) depende, em grande medida, das obrigações de comunicação de informações dos próprios corretores principais. Além disso, o CESE apoia a possibilidade de o Organismo Europeu de Luta Antifraude participar na supervisão e saúda o facto de, além da Comissão, outros organismos públicos poderem ser designados como terceiros para realizar verificações da conformidade com a decisão dos membros da rede de corretores principais.

4.3.2.

A Comissão também elaborará um método para determinar quais os corretores principais que serão considerados para efeitos de participação em transações agrupadas e que serão designados para cada transação de contração de empréstimos. Os membros particularmente ativos devem ser elegíveis para servir como gestores pilotos e copilotos em transações agrupadas e ser remunerados. Este grupo deve realizar atividades de criação de mercado, promover emissões com investidores e prestar mais aconselhamento e informações adequados sobre os mercados à Comissão. O CESE assinala o papel central das instituições financeiras nas atividades de financiamento e chama a atenção para possíveis conflitos de interesses, em especial no que diz respeito ao papel consultivo. Em qualquer caso, considera que é muito positivo assegurar capacidades e informações de alto nível sobre os mercados financeiros nos organismos públicos.

4.4.

A participação em massa nos mercados de capitais implicará um vasto leque de riscos, que são suportados, em última instância, pela sociedade civil europeia. O CESE concorda plenamente com a Comissão quando esta afirma que «[t]endo em conta os volumes sem precedentes das operações e a sofisticação da estratégia de financiamento necessária, é da maior importância que as operações do âmbito do Next Generation EU estejam sujeitas a um quadro robusto e independente de gestão dos riscos e de conformidade». Com efeito, é necessário garantir que as operações do âmbito do Next Generation EU são realizadas em consonância com as mais elevadas normas de integridade, probidade e boa gestão financeira. O CESE apoia a criação de sistemas robustos de governação e gestão dos riscos, incluindo o estabelecimento de princípios e estruturas para assegurar uma supervisão sólida e independente de todas as operações financeiras do âmbito do Next Generation EU.

4.4.1.

O diretor de riscos será um pilar central deste sistema e terá total autonomia no exercício das suas funções, respondendo, nomeadamente, perante o diretor-geral da Direção-Geral do Orçamento e o membro da Comissão responsável pelo Orçamento. O diretor de riscos será responsável pelo desenvolvimento de uma política de alto nível em matéria de risco e conformidade e por assegurar o seu cumprimento em todas as operações do âmbito do Next Generation EU, sendo apoiado por um responsável pela conformidade e por um Comité de Risco e Conformidade. Devido à importância de uma gestão robusta dos riscos e ao interesse público que lhe está associado, importa ponderar se o diretor de riscos terá de consultar o Parlamento Europeu e o Conselho quando da elaboração da política de alto nível em matéria de risco e conformidade.

4.4.2.

Subsistem dúvidas quanto à gestão dos riscos no início das atividades de contração de empréstimos, em especial durante o período anterior à nomeação do diretor de riscos e o período de três meses previsto para a elaboração da política de alto nível em matéria de risco e conformidade. A fim de compensar os desfasamentos de prazos de vencimento entre os empréstimos e os instrumentos de financiamento subjacentes, particularmente em 2021, a Comissão aplicará um conjunto de instrumentos dos mercados financeiros, incluindo swaps e, eventualmente, papéis comerciais, que comportam um risco particularmente elevado. O CESE insta a Comissão a assegurar a responsabilização, a transparência e a boa gestão financeira desde o início da contração de empréstimos no âmbito do Next Generation EU.

4.5.

Aparentemente, é necessário um sistema contabilístico complexo e abrangente para gerir adequadamente a estratégia de financiamento diversificada. O CESE congratula-se com o reforço das funções administrativas e contabilísticas da Comissão. A utilização de software experimentado e comprovado deve também, naturalmente, ser a prática normal. O CESE salienta o papel importante do contabilista da Comissão, responsável por assegurar uma contabilidade adequada de todas as operações do âmbito do Next Generation EU e por abrir a «conta do Next Generation EU» detida junto do BCE.

4.6.

O CESE reconhece que uma parte muito significativa da nova estratégia de financiamento é o desenvolvimento de uma estratégia para as relações com os investidores e dos instrumentos que a acompanham. Um dos seus elementos será um boletim informativo sobre o financiamento da UE, que permitirá à Comissão comunicar periodicamente e com transparência com a comunidade de investidores. A Comissão contactará também ativamente «investidores importantes em todo o mundo» através de um programa sistemático de visitas estruturadas. Contudo, o CESE adverte contra a contração excessiva de empréstimos junto de investidores de fora da UE, que pode comportar, principalmente em período de crise, riscos acrescidos como, por exemplo, uma interrupção súbita da atividade de concessão de empréstimos.

4.7.

A Comissão procurará angariar 30 % dos fundos do Next Generation EU através da emissão de obrigações verdes, que poderão ascender, no total, a 250 mil milhões de euros, estabelecendo a UE como um dos maiores emitentes mundiais de obrigações verdes e reforçando a política e a liderança de mercado da UE em matéria de financiamento sustentável. O CESE congratula-se com a proposta de um «quadro das obrigações verdes no âmbito do Next Generation EU», que tem por base a obrigação de os Estados-Membros assegurarem que 37 % das despesas financiadas pelo Mecanismo de Recuperação e Resiliência são afetados à luta contra as alterações climáticas. Além disso, importa reforçar a emissão de obrigações sociais no âmbito do Next Generation EU, complementando o volume de 100 mil milhões de euros afetados ao instrumento SURE. Para poderem receber apoio do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, os Estados-Membros da UE devem também elaborar projetos em domínios de intervenção como, por exemplo, o crescimento inclusivo e a coesão social, enquanto base para o desenvolvimento de um quadro de emissão de obrigações sociais. Desta forma, a estratégia de financiamento poderá ter plenamente em conta os interesses da sociedade civil.

Bruxelas, 8 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Decisão (UE, Euratom) 2020/2053 do Conselho, de 14 de dezembro de 2020, relativa ao sistema de recursos próprios da União Europeia e que revoga a Decisão 2014/335/UE, Euratom (JO L 424 de 15.12.2020, p. 1).

(2)  COM(2021) 250 final.

(3)  C(2021) 2500 final (JO L 131 de 16.4.2021, p. 170), C(2021) 2501 final, C(2021) 2502 final.

(4)  JO C 364 de 28.10.2020, p. 124.

(5)  JO C 155 de 30.4.2021, p. 45.

(6)  «The nonsense of Next Generation EU net balance calculations» [O absurdo dos cálculos do saldo líquido do Next Generation EU] | (Bruegel).

(7)  «Covid Perpetual Eurobonds: Jointly guaranteed and supported by the ECB» [Euro-obrigações perpétuas COVID-19: garantidas e apoiadas conjuntamente pelo BCE].

(8)  Acordo Interinstitucional de 16.12.2020 entre o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão.

(9)  Devido à adoção da Decisão Recursos Próprios.

(10)  Ver artigo 9.o, n.o 5, da Decisão (UE, Euratom) 2020/2053.

(11)  Instrumento europeu de apoio temporário para atenuar os riscos de desemprego numa situação de emergência.

(12)  Klaus Regling, seminário em linha — Deepening EMU and the role of ESM [O aprofundamento da UEM e o papel do MEE], 5.5.2021.

(13)  C(2021) 2500 final.


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/38


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais

[COM(2021) 102 final]

(2021/C 374/08)

Relatores:

Cristian PÎRVULESCU

Carlos Manuel TRINDADE

Consulta

Comissão Europeia, 26.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

21.6.2021

Adoção em plenária

8.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

160/79/19

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com o Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais (a seguir denominado «plano de ação») e com a sua aplicação a nível dos Estados-Membros e da UE, no pleno respeito das respetivas competências. Considera-o muito oportuno, em particular tendo em conta que a pandemia de COVID-19 perturbou todos os aspetos da vida humana, agravando os problemas sociais preexistentes, e exerceu enorme pressão tanto sobre as instituições estatais e as comunidades como sobre as organizações e as empresas. O CESE adverte que o fim da pandemia ainda não está para breve. Por conseguinte, a UE e os Estados-Membros devem desenvolver e valer-se das infraestruturas adequadas para enfrentar, no quadro do plano de ação, os desafios que esta coloca a médio e longo prazo, e ter presente que um diálogo civil e social eficaz, tal como a participação ativa dos parceiros sociais — que constituem elementos importantes de uma economia social de mercado competitiva —, desempenham um papel fundamental neste contexto.

1.2.

O CESE congratula-se com o consenso político construído em torno do plano de ação durante a Cimeira Social do Porto com o Compromisso Social do Porto. Saúda também a Declaração do Porto aprovada pelos membros do Conselho Europeu. Tal como referido no ponto 4 da Declaração, que o CESE subscreve plenamente, «[a] sua aplicação intensificará os esforços da União no sentido de uma transição digital, verde e justa e contribuirá para alcançar uma convergência social e económica ascendente e para dar resposta aos desafios demográficos. A dimensão social, o diálogo social e a participação ativa dos parceiros sociais sempre estiveram no centro de uma economia social de mercado altamente competitiva. O nosso compromisso de unidade e solidariedade pressupõe também a garantia da igualdade de oportunidades para todos e de que ninguém fica para trás.»

1.3.

O CESE apoia a visão e os objetivos estabelecidos no plano de ação e congratula-se com o conceito subjacente de que a adoção de metas sociais relevantes e consensuais ajudará a concentrar os esforços políticos na obtenção de resultados e constituirá um importante incentivo à reforma e ao investimento nos Estados-Membros. Sublinha ainda que o plano de ação deve assentar em medidas concretas e tangíveis, que sejam mensuráveis e respaldadas por quadros de acompanhamento, acordadas conjuntamente pelas partes interessadas pertinentes e abrangendo os critérios sociais, ambientais e económicos (1).

1.4.

O CESE reconhece a diversidade e, ao mesmo tempo, a base comum dos modelos sociais em toda a UE. Fazem parte da nossa história comum e constituem os alicerces do empenho partilhado num modelo social europeu que é parte integrante do mercado comum e de todas as políticas da UE. Os países com modelos sociais menos robustos devem ser fortemente apoiados através da promoção do investimento, da aprendizagem e da avaliação comparativa. O bem-estar e os direitos fundamentais dos cidadãos devem ser construídos em torno de um modelo social coerente e comum, mas suficientemente flexível para acomodar as diferentes tradições e experiências nacionais, em conformidade com os valores, princípios e objetivos do Tratado, do Pilar e do seu consenso renovado e virado para o futuro.

1.5.

O CESE é de opinião que garantir padrões sociais mínimos para todas as pessoas que vivem na UE é da maior importância para a construção de uma sociedade justa e inclusiva. Ao implementar o Pilar Social, deve visar-se uma combinação equilibrada de legislação e direito indicativo. A legislação deve estar em plena conformidade com a Carta dos Direitos Fundamentais, bem como com os princípios do Programa Legislar Melhor, e ser objeto de consultas exaustivas com os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil a nível da UE e nacional.

1.6.

Conforme anteriormente afirmado pelo CESE, a competitividade e o aumento da produtividade com base nas competências e no conhecimento são os ingredientes certos para preservar o bem-estar das sociedades europeias. Há que acentuar os pontos fortes do sistema europeu de economia social de mercado e eliminar, ao mesmo tempo, os seus pontos fracos, de modo a adaptá-lo para enfrentar os desafios futuros (2).

1.7.

O CESE reputa necessário definir objetivos e metas específicos para os 20 princípios do Pilar. Exorta, por isso, os Estados-Membros a serem ambiciosos na fixação voluntária dos seus próprios objetivos, de modo que todos os Estados-Membros, juntamente com os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil, contribuam para a consecução dos objetivos europeus. A Comissão Europeia deve acompanhar, apoiar e comunicar a qualidade e os resultados do diálogo relacionado com o Pilar e o plano de ação. Os objetivos e as metas devem ser incluídos no mecanismo de comunicação de informações previsto no Semestre Europeu e nos planos nacionais de reformas.

1.8.

O CESE propõe que os Estados-Membros possam definir objetivos e metas intermédios para 2025 no âmbito do plano de ação, através de um diálogo construtivo com os parceiros sociais, a fim de tornar mais eficaz a revisão intercalar prevista e permitir avaliar os progressos realizados na primeira metade do período de aplicação. A Comissão Europeia deve privilegiar a apresentação de orientações destinadas aos Estados-Membros sobre a utilização dos mecanismos de coordenação existentes.

1.9.

O CESE propõe que se utilize o quadro do Semestre Europeu enquanto mecanismo de coordenação europeu para a aplicação do plano de ação. Esse mecanismo de coordenação poderia assumir a forma de um fórum interinstitucional da UE sobre o Pilar Social, que se reuniria regularmente para avaliar os progressos e que daria um novo impulso ao plano de ação.

1.10.

O CESE apoia a intenção de atualizar sempre que necessário o painel de indicadores sociais, tendo em vista o alinhamento com a Agenda 2030 das Nações Unidas e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

1.11.

O CESE considera que o Semestre Europeu constitui o quadro adequado para o acompanhamento do plano de ação, sendo necessário dedicar igual atenção aos objetivos sociais e ambientais, a par da estabilidade macroeconómica e da produtividade. Congratula-se com a afirmação contida no plano de ação de que os planos nacionais de recuperação e resiliência representam uma oportunidade única para programar e financiar investimentos e reformas de apoio a uma recuperação social e centrada no emprego, que incorpore ao mesmo tempo as transições ecológica e digital e implemente as recomendações específicas por país pertinentes no âmbito do Semestre Europeu. O plano de ação apela, a justo título, aos Estados-Membros para que tirem pleno partido do Semestre Europeu e para que aproveitem a oportunidade sem precedentes oferecida pelo Mecanismo de Recuperação e Resiliência.

1.12.

O CESE assinala que o plano de ação não estipula claramente a necessidade de prolongar o atual apoio de emergência até que a economia já não necessite do mesmo, não valorizando suficientemente a necessidade de proteger o emprego e as empresas durante a crise. Assinala também que, embora o Próxima Geração UE seja um instrumento de emergência baseado no artigo 122.o do TFUE e continue a ser tratado como uma medida pontual, estabelece também um precedente de ação audaciosa e construtiva.

1.13.

O CESE toma nota do facto de o plano de ação reconhecer que as respostas políticas firmes a nível dos Estados-Membros e da UE à pandemia de COVID-19 permitiram limitar as suas consequências sociais e no emprego ao apoiar as empresas e os trabalhadores. Do mesmo modo, observa que a pandemia realçou ainda mais as desigualdades existentes (particularmente no que respeita aos trabalhadores com níveis de educação mais baixos, às mulheres, aos jovens, aos migrantes e a outros grupos vulneráveis), sendo provável que o desemprego e as desigualdades aumentem ainda mais como consequência, se o progresso social não estiver associado a um crescimento económico sustentável. O CESE espera que o plano de ação contribua para inverter esta tendência e salienta a necessidade de promover economias sustentáveis e competitivas, baseadas em empregos de qualidade e na igualdade de oportunidades para todos.

1.14.

O CESE considera que podem ser envidados mais esforços a nível da UE e dos Estados-Membros no domínio do combate à pobreza, em consonância com o primeiro Objetivo de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 das Nações Unidas. Em particular, considera que a UE deveria estabelecer o objetivo de reduzir a percentagem de crianças em risco de pobreza e de exclusão social de 22,8 % em 2019 para 10 % em 2030, com compromissos voluntários semelhantes em todos os Estados-Membros.

1.15.

O CESE propõe que o plano de ação preveja medidas que permitam combater a desigualdade de rendimento, dada a prioridade bem definida de garantir a coesão social, como parte essencial do modelo social europeu.

1.16.

O CESE considera que o plano de ação deve promover não só a criação de novos empregos — que é um objetivo justificado —, mas também a qualidade do emprego, incluindo o combate ao trabalho precário. Há que instaurar controlos jurídicos e administrativos adequados a nível nacional com vista a assegurar que os trabalhadores têm condições de trabalho seguras, salários adequados e previsíveis e uma representação organizada no local de trabalho. O CESE manifesta particular preocupação com as condições de trabalho de muitos trabalhadores sazonais, cidadãos da UE e de países terceiros que trabalham na agricultura, no setor dos serviços e na construção e apela para uma aplicação eficaz da Diretiva (UE) 2019/1152 do Parlamento Europeu e do Conselho (3) relativa a condições de trabalho transparentes e previsíveis na União Europeia, que visa melhorar as condições laborais promovendo um emprego mais transparente e previsível e assegurar, simultaneamente, a capacidade de adaptação do mercado do trabalho. O CESE reputa necessário reduzir significativamente a taxa de risco de pobreza no trabalho. Para alcançar o objetivo de erradicar a pobreza no trabalho dever-se-ão estabelecer normas mínimas comuns a nível da UE.

1.17.

O CESE saúda a intenção de reduzir as disparidades salariais e no mercado de trabalho entre homens e mulheres no espaço de uma década e de aumentar a oferta — embora este aumento ainda não tenha sido quantificado — no que diz respeito à educação e ao acolhimento na primeira infância. Para tal, o CESE apoia a Garantia Europeia para a Infância. A igualdade de género é um objetivo que deve ser perseguido em todos os aspetos da vida económica e social.

1.18.

O CESE observa que o plano de ação não inclui uma proposta de diretiva relativa a um rendimento mínimo garantido, que considera necessário para combater as formas mais graves de pobreza.

1.19.

O CESE subscreve o apelo lançado pela Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho para que concluam as negociações sobre a revisão das regras de coordenação da segurança social, a fim de melhorar a mobilidade dos trabalhadores e assegurar uma proteção social adequada na UE, sem criar encargos excessivos para os trabalhadores e as empresas.

1.20.

O CESE partilha da opinião da Comissão sobre a necessidade de promover o alargamento da negociação coletiva, tal como o número de associados dos parceiros sociais e a respetiva densidade organizativa. Por conseguinte, propõe que se pondere estabelecer indicadores pertinentes e acompanhar os mesmos a nível nacional e da UE e recomenda que os objetivos neste domínio sejam apoiados por fundos especificamente destinados ao reforço das capacidades e por ações conjuntas que visem alcançar os objetivos do plano de ação, preservando ao mesmo tempo a autonomia dos parceiros sociais. O CESE apoia a proposta avançada no plano de ação de negociar mais acordos a nível da UE com vista a contribuir para a transformação bem-sucedida dos mercados de trabalho europeus, bem como o apelo aos Estados-Membros para que incentivem e criem as condições necessárias a um diálogo social e a uma negociação coletiva mais eficaz e eficiente a todos os níveis.

1.21.

O CESE concorda com as conclusões da consulta que antecedeu a elaboração do plano de ação, que sublinharam a importância de uma melhor implementação e aplicação e de um cumprimento efetivo da legislação laboral e social da UE em vigor. A Comissão deve colaborar mais ativamente com os Estados-Membros, a fim de facilitar uma transposição atempada e de qualidade dos instrumentos jurídicos da UE e promover o respetivo cumprimento. O CESE espera que a Comissão recorra a procedimentos de infração se os Estados-Membros não cumprirem as suas obrigações ao abrigo do direito da UE.

1.22.

O CESE salienta a necessidade de alinhar o financiamento das políticas nacionais pelos objetivos e ações do plano de ação, bem como de assegurar o não retorno às regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) na sua forma original e que qualquer versão revista destas facilite plenamente a aplicação do plano de ação.

1.23.

O CESE insta a que se dê mais ênfase ao potencial contributo da contratação pública enquanto instrumento para a consecução dos objetivos do plano de ação.

2.   Observações na generalidade

2.1.   A conceção do plano de ação

2.1.1.

Desde a proclamação do Pilar em 2017, o CESE tem solicitado a adoção de um roteiro claro para a sua aplicação (4), pelo que acolhe com agrado o plano de ação ora apresentado. O Comité apoia o apelo a todas as partes interessadas para que se empenhem num esforço conjunto com vista à aplicação do Pilar dentro das suas esferas de competência. O CESE assinala que, além do contributo das instituições da UE, o êxito do plano de ação será fortemente determinado pelo empenho dos Estados-Membros e dos seus parceiros sociais na aplicação de todos os seus princípios.

2.1.2.

Na Cimeira Social do Porto, realizada nos dias 7 e 8 de maio, assumiu-se o compromisso de aplicar o Pilar Europeu dos Direitos Sociais ao mais alto nível político através do Compromisso Social do Porto. O referido compromisso saúda o Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais apresentado pela Comissão Europeia e apela a todos os intervenientes pertinentes para que retirem as necessárias ilações desta pandemia e unam esforços.

2.1.3.

O CESE toma nota do facto de o plano de ação combinar a ação legislativa e não legislativa com a definição de objetivos comuns a atingir através da ação conjunta das partes interessadas, nomeadamente os parceiros sociais e a sociedade civil, organizados a nível local, nacional e europeu. Espera que a legislação prevista no calendário do plano de ação respeite plenamente a Carta dos Direitos Fundamentais e seja objeto de avaliações de impacto, salientando a necessidade de consultar amplamente os parceiros sociais e a sociedade civil. Toda e qualquer decisão legislativa deve ser tomada com base em dados probatórios e ter em conta os pontos de vista das partes interessadas pertinentes.

2.1.4.

O CESE apoia as metas estabelecidas no plano de ação e a noção de que estas ajudarão a concentrar os esforços políticos na obtenção de resultados e constituirão um importante incentivo à reforma e ao investimento nos Estados-Membros, com vista a alcançar a convergência ascendente e o bem-estar. Sublinha ainda que o plano de ação deve assentar em medidas concretas e tangíveis, que sejam mensuráveis e respaldadas por quadros de acompanhamento, acordadas conjuntamente pelas partes interessadas pertinentes e abrangendo os critérios sociais, ambientais e económicos.

2.1.5.

Embora apoie as grandes metas definidas pela UE, o CESE subscreve o apelo da Comissão no sentido de os Estados-Membros estabelecerem voluntariamente as suas próprias metas nacionais. O Comité convida estes últimos a serem ambiciosos na definição das suas metas, de modo que todos os Estados-Membros, juntamente com os seus parceiros sociais e civis, contribuam para a consecução das metas europeias, e salienta que não será possível alcançá-las sem um esforço coordenado significativo. A definição das três principais prioridades — criação de emprego, melhoria das qualificações e inclusão social — proporcionará um quadro comum de ação, inclusive para a aplicação dos planos nacionais de recuperação e resiliência.

2.1.6.

O CESE congratula-se com o facto de a meta relativa ao emprego ser complementada por compromissos destinados à promoção do emprego inclusivo e à redução das disparidades em matéria de emprego, nomeadamente libertando o potencial do mercado de trabalho, reduzindo para metade as disparidades de género no emprego, diminuindo a taxa de jovens que não trabalham, não estudam e não seguem uma formação (jovens NEET) e garantindo que outros grupos sub-representados participam no mercado de trabalho ao máximo das suas capacidades. O Comité encoraja a Comissão a quantificar todos estes compromissos em cooperação com os Estados-Membros e os parceiros sociais.

2.1.7.

O CESE congratula-se igualmente com a ênfase colocada pelo plano de ação na educação, nas competências e na aprendizagem ao longo da vida, incluindo a melhoria de competências e a requalificação contínuas, com vista a melhorar a empregabilidade, impulsionar a inovação, assegurar a equidade social e colmatar o défice de competências digitais, e reitera que o acesso à aprendizagem contínua e ao longo da vida deve ser um direito individual de todos, a fim de poder fazer face à evolução no domínio da digitalização e da IA, moldar o progresso e manter o «controlo humano» (5).

2.1.8.

O CESE propõe que, a fim de tornar mais eficaz a revisão intercalar prevista, os Estados-Membros encetem um diálogo construtivo com os parceiros sociais e ponderem adotar metas intermédias para 2025, o que possibilitará avaliar os progressos realizados na primeira metade do período de aplicação.

2.2.   Criação de emprego e futuro do trabalho

2.2.1.

O CESE congratula-se com o facto de o plano de ação afirmar que as condições de trabalho na UE estão entre as melhores do mundo, embora reconheça também que as novas formas de trabalho não acarretam apenas oportunidades, mas também desafios. Os parceiros sociais, tanto a nível europeu como nacional, devem unir esforços e trabalhar em conjunto no sentido de responder às necessidades do trabalho do futuro, alcançar uma convergência ascendente e assegurar proteção e segurança aos trabalhadores, independentemente do setor em que trabalham e do país em que vivem. Os parceiros sociais, tanto a nível europeu como nacional, são fundamentais para desenvolver esforços conjuntos neste sentido. O plano de ação assinala, a justo título, que a preservação e criação de novos empregos de qualidade é uma prioridade para a UE. A crise da COVID-19 mostrou que o funcionamento das nossas sociedades depende de trabalhadores essenciais em vários setores, tais como os transportes, os serviços, a saúde e a agricultura. Há que criar os novos postos de trabalho do futuro, desenvolvendo os postos de trabalho essenciais de hoje.

2.2.2.

O CESE concorda com a abordagem estratégica de transição gradual das medidas de emergência para as ações que podem contribuir para atingir a meta de emprego definida no plano de ação.

2.2.3.

O CESE concorda com a preocupação expressa no plano de ação no que diz respeito aos grupos mais afetados pela pandemia, nomeadamente as mulheres, os jovens, os trabalhadores pouco qualificados e com salários baixos, os trabalhadores temporários, os trabalhadores por conta própria e os trabalhadores migrantes.

2.2.4.

O CESE considera que a afetação dos fundos da UE às prioridades deve ser acompanhada, tanto em termos de recursos disponibilizados pela Comissão como no que diz respeito aos recursos atribuídos pelos Estados-Membros e os parceiros sociais.

2.2.5.

O CESE concorda com o apelo da Comissão aos Estados-Membros para que utilizem os fundos da UE disponíveis para promover um apoio ativo e eficaz ao emprego.

2.2.6.

O CESE apoia a abordagem da Comissão no que diz respeito aos efeitos da transição digital no trabalho. Apoia também o acordo-quadro autónomo sobre a digitalização e disponibiliza-se para trabalhar com os parceiros sociais no sentido de lhe dar seguimento.

2.2.7.

O CESE toma nota do recente relatório da OCDE sobre as perspetivas para o emprego em 2020, intitulado «Worker Security and the COVID-19 crisis» (6) e reconhece que o bem-estar dos trabalhadores no local de trabalho contribui positivamente para o desempenho global das empresas, organizações e instituições em que trabalham. Ademais, para além da promoção da saúde e segurança dos trabalhadores, o CESE espera que sejam adotadas medidas ao nível adequado, em conformidade com os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, a fim de melhorar o funcionamento dos mercados de trabalho, contribuindo, assim, para o crescimento económico e a concorrência internacional e para promover condições de trabalho dignas. A evolução do mercado de trabalho deve ser apoiada e não dificultada, com vista a garantir a proteção e segurança dos trabalhadores e assegurar o seu contributo para o desempenho global das empresas, organizações e instituições em que trabalham.

2.2.8.

O CESE espera que sejam adotadas medidas ao nível adequado, em conformidade com os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, para promover a convergência ascendente, a fim de melhorar o funcionamento dos mercados de trabalho, para que contribuam para o crescimento económico e a concorrência internacional e promovam o trabalho digno e o bem-estar.

2.2.9.

O CESE sublinha que a UE tem de se manter fiel ao princípio de que todas as relações laborais, independentemente da sua natureza, devem estar cobertas pela proteção social. O CESE considera inaceitáveis todas as formas de trabalho não declarado e encoraja os Estados-Membros a o combaterem.

2.2.10.

O CESE exorta a Comissão e os Estados-Membros a adotarem todas as medidas necessárias para garantir que a digitalização não cria precariedade e vulnerabilidades, assegurando ao mesmo tempo que se tira pleno partido das oportunidades proporcionadas pela digitalização.

2.2.11.

O CESE gostaria que existisse uma ligação mais forte entre o ambicioso objetivo em matéria de competências, educação e aprendizagem ao longo da vida e os meios financeiros disponíveis para o alcançar. O CESE chama a atenção para o facto de a despesa pública a nível da UE com a educação ter caído de 5 % em 2010 para 4,7 % em 2019 e salienta que as metas e objetivos do Pilar Social não podem ser perseguidos sem mais investimento público na educação. Salienta também a necessidade de investimento público e privado em apoio à formação e aprendizagem ao longo da vida e incentiva os empregadores a proporcionarem aos trabalhadores mais oportunidades de aprendizagem e formação em contexto laboral.

2.2.12.

O CESE reconhece a preocupação da Comissão no que diz respeito às transições ecológica e demográfica e aos seus efeitos no emprego e nas competências. No entanto, o plano de ação pode beneficiar de compromissos e iniciativas específicos a este respeito, pelo que importa fornecer informações mais pormenorizadas no plano e nos documentos nacionais.

2.2.13.

A pandemia afetou de forma particularmente dura os jovens. As estatísticas mostram que metade dos jovens da UE tem um vínculo de emprego temporário. No contexto do combate aos riscos ligados ao emprego temporário involuntário, o plano de ação tem um potencial claro para melhorar a qualidade do emprego dos jovens — em especial através da revisão da Recomendação relativa a um Quadro de Qualidade para os Estágios, da ênfase na qualidade das ofertas ao abrigo da Garantia para a Juventude e de uma série de iniciativas previstas em matéria de condições de trabalho, por exemplo, para os trabalhadores de plataformas digitais.

2.2.14.

Embora o plano contenha disposições claras para reforçar o papel dos parceiros sociais (sindicatos e empregadores) nas iniciativas, é praticamente omisso quanto ao papel das organizações da sociedade civil, como as organizações de juventude, que desempenham um papel vital na representação dos cidadãos da UE.

2.3.   Competências e igualdade

2.3.1.

O CESE partilha com a Comissão a opinião de que a mão de obra qualificada é o motor de uma economia ecológica e digital próspera, alimentada por ideias e produtos inovadores e pela evolução tecnológica. Conforme afirmado no plano de ação, os sistemas de educação e de formação são fundamentais para lançar as bases da aprendizagem ao longo da vida e da empregabilidade e podem ajudar a superar a escassez de competências, desde que se orientem pelas necessidades do mercado de trabalho. A educação e as competências devem estar no centro da ação política destinada a apoiar a criação de emprego.

2.3.2.

O CESE apoia a ambição de melhorar a educação ao longo da vida e manifesta preocupação em relação ao acesso às competências digitais básicas, que considera, tal como a Comissão, uma condição prévia para a inclusão e a participação numa Europa digitalmente transformada.

2.3.3.

O CESE lamenta que não exista um objetivo em matéria de igualdade de género no acesso à aprendizagem ao longo da vida e incentiva a Comissão a defini-lo. Chama a atenção para a necessidade de integrar a dimensão de género em todas as políticas e estratégias da UE.

2.3.4.

O CESE está presentemente a elaborar um parecer específico sobre a proposta de diretiva que visa reforçar a aplicação do princípio da igualdade de remuneração por trabalho igual ou de valor igual entre homens e mulheres.

2.4.   Proteção e inclusão sociais

2.4.1.

O CESE considera que devem ser elaboradas novas propostas em matéria de proteção social e inclusão social. Partilha da ideia expressa no plano de ação de que a Europa acolhe as sociedades mais igualitárias do mundo, pauta-se pelas mais elevadas normas em matéria de condições de trabalho e assegura uma ampla proteção social. No entanto, os níveis de pobreza na UE permanecem inaceitavelmente elevados, sendo ainda necessários esforços consideráveis, a fim de assegurar condições semelhantes em todos os países.

2.4.2.

As crianças representam 20 % das pessoas em risco de pobreza na UE, o que, segundo o relator especial das Nações Unidas sobre a pobreza extrema e os direitos humanos, é um número excessivamente alto à luz dos padrões dos países desenvolvidos (7). O CESE congratula-se com as propostas da Comissão relativas a uma estratégia da UE sobre os direitos da criança e a uma recomendação relativa à criação de uma Garantia Europeia para a Infância, bem como com a meta de tirar cinco milhões de crianças da pobreza até 2030. Reitera o seu apelo para «um pacto para os cuidados na Europa, que assegure a prestação de serviços de maior qualidade para todos ao longo do ciclo de vida» (8) e para que os Estados-Membros invistam na disponibilidade de serviços de cuidados de qualidade, a preços comportáveis, acessíveis e diversificados. Está convicto de que a erradicação da pobreza infantil terá efeitos muito positivos na redução da pobreza entre os jovens adultos e os desempregados.

2.4.3.

O CESE considera que a UE deve estabelecer normas sociais mínimas em plena conformidade com a Carta dos Direitos Fundamentais e que este processo deve ser objeto de consultas exaustivas com os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil a nível da UE e nacional.

2.4.4.

O CESE observa que o plano de ação não prevê uma proposta de diretiva relativa a um rendimento mínimo garantido, que considera necessário para combater as formas mais graves de pobreza, mas sim uma recomendação (9).

2.4.5.

O CESE considera que cabe adotar medidas significativas para reforçar a resiliência dos sistemas de segurança social e a sua coordenação a nível da UE, garantindo aos trabalhadores um acesso universal, no respeito das competências nacionais em matéria de acesso à proteção social.

2.4.6.

O Comité partilha com a Comissão a opinião de que as reformas e os investimentos nos sistemas de saúde são necessários para melhorar, nomeadamente, o acesso a cuidados de saúde de qualidade para todos e reduzir as desigualdades sociais, territoriais e económicas no domínio da saúde. No entanto, caso se limite a prestar informações baseadas em dados concretos e a partilhar boas práticas, o apoio da Comissão aos Estados-Membros será insuficiente, sendo necessário fazer muito mais sem deixar de respeitar a repartição de competências: formular objetivos e metas, apoiar investimentos em infraestruturas, dar formação aos trabalhadores nos sistemas de saúde, criar normas comuns de qualidade e financiar a investigação no domínio da saúde.

2.4.7.

O CESE acolhe favoravelmente o plano de criação de um grupo de peritos de alto nível para estudar o futuro do Estado-providência. Enquanto representante da sociedade civil organizada europeia e fórum para o diálogo social e civil, o Comité está em posição privilegiada para refletir sobre os desafios do Estado-providência dos Estados-Membros. Preconiza, em especial, a adoção de modelos orçamentais — tendo em conta as características das economias nacionais e promovendo o crescimento sustentável — que permitam manter prestações sociais razoáveis e adequadas, apoiar os serviços públicos e sociais e distribuir a carga fiscal de forma equitativa, promovendo a inclusão ativa no mercado de trabalho e as transições digital e demográfica.

2.5.   Aplicação do plano de ação

2.5.1.

O CESE partilha da determinação dos chefes de Estado ou de governo expressa no Compromisso Social do Porto no sentido de continuar a aprofundar a aplicação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais a nível da UE e dos Estados-Membros, no pleno respeito das respetivas competências e dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade. O CESE salienta igualmente a complementaridade entre a dimensão social, o diálogo social e a participação ativa dos parceiros sociais e uma economia social de mercado altamente competitiva.

2.5.2.

O CESE salienta a necessidade de alinhar o financiamento das políticas nacionais pelos objetivos e as ações do plano de ação. Esta é outra razão pela qual não deve haver um regresso às regras do PEC. Além disso, toda e qualquer revisão das regras deve facilitar plenamente a aplicação do plano de ação.

2.5.3.

O CESE espera que as práticas de contratação pública socialmente responsável definidas e promovidas pela Comissão Europeia sejam integradas na execução do plano. Ascendendo a um valor superior mais de sete vezes ao valor do Quadro Financeiro Plurianual e do Mecanismo de Recuperação e Resiliência combinados (estimado em 2 biliões de euros, ou seja, 14 % do PIB anual), oferece um enorme potencial enquanto mercado para fomentar a organização dos trabalhadores, a respetiva representação e a negociação coletiva, bem como as práticas sustentáveis em matéria de emprego de qualidade e ambiente.

2.5.4.

O CESE reafirma a importância da integração entre os diferentes domínios de intervenção para a concretização do progresso social, seguindo de perto a recuperação e prosperidade económica. Importa criar sinergias entre as iniciativas e estratégias existentes e futuras abrangidas pelos diversos princípios do Pilar Social, cujos objetivos devem ser integrados e incluídos no quadro estratégico europeu para a recuperação pós-2020.

2.5.5.

O CESE exorta os Estados-Membros a reconhecerem e reforçarem o diálogo social e civil (bipartido e tripartido), sendo que tanto um como outro desempenha um papel específico na aplicação do plano de ação.

2.6.   Relação entre o Pilar Social e o Semestre Europeu

2.6.1.

O CESE considera que o Semestre Europeu constitui o quadro adequado para o acompanhamento do plano de ação, sendo necessário dedicar igual atenção aos objetivos sociais e ambientais, a par da estabilidade macroeconómica e da produtividade. Congratula-se com a afirmação contida no plano de ação de que os planos nacionais de recuperação e resiliência representam uma oportunidade única para programar e financiar investimentos e reformas de apoio a uma recuperação social e centrada no emprego, que incorpore ao mesmo tempo as transições ecológica e digital e implemente as recomendações específicas por país pertinentes no âmbito do Semestre Europeu. O plano de ação apela, a justo título, aos Estados-Membros para que tirem pleno partido do Semestre Europeu e para que aproveitem a oportunidade sem precedentes oferecida pelo Mecanismo de Recuperação e Resiliência.

2.6.2.

O CESE recomenda que, no âmbito do Semestre Europeu, seja feita uma avaliação de alto nível regular dos progressos efetuados, inclusive, quando pertinente, a nível nacional, através de indicadores elaborados em cooperação com os parceiros sociais, no contexto da integração dos princípios do Pilar e dos ODS das Nações Unidas.

2.6.3.

O CESE considera que o plano de ação deve ser um instrumento estruturante das políticas sociais da UE. Deve ser um elemento central numa governação económica e social renovada, orientada para uma recuperação económica e um crescimento sustentável e inclusivo, e dotada de indicadores de acompanhamento e de procedimentos que conduzam a recomendações específicas por país em todas as questões que lhe digam respeito.

3.   Observações na especialidade

3.1.

O CESE chama a atenção para a necessidade de adaptar o Sistema Estatístico Europeu às necessidades de acompanhamento das metas e dos indicadores definidos no painel de indicadores sociais.

3.2.

O CESE concorda com o ponto de vista expresso no plano de ação de que a integração e atualização do conjunto de indicadores existentes deve contribuir para acompanhar os progressos rumo aos princípios do Pilar de uma forma mais abrangente e ajudar a monitorar a aplicação das ações políticas propostas no plano.

3.3.

O CESE concorda com a necessidade de rever o conceito de população em idade ativa e incentiva a Comissão a colaborar com os Estados-Membros neste domínio, tendo em conta a integração das políticas em matéria de envelhecimento e os direitos reconhecidos e protegidos pela Carta dos Direitos Fundamentais.

3.4.

O CESE constata que o objetivo da formação profissional tem como base 2016, uma vez que o Sistema Estatístico Europeu apenas produz este indicador de cinco em cinco anos. A medição deste indicador deve ser anual, a fim de permitir o devido acompanhamento dos progressos.

3.5.

O CESE reitera a sua posição no que diz respeito ao trabalho nas plataformas e recomenda «que se caminhe na UE e nos Estados-Membros no sentido da uniformidade de conceitos para tornar digno o trabalho na economia das plataformas» (10).

3.6.

O CESE exorta a Comissão a aplicar, no domínio da segurança social, o princípio enunciado de que a «tributação deve ser transferida do trabalho para outras fontes mais favoráveis ao emprego e em consonância com os objetivos climáticos e ambientais, salvaguardando simultaneamente receitas para uma proteção social adequada», levando em consideração que o desafio essencial é garantir uma cobertura adequada para todos os trabalhadores num mercado de trabalho em constante mudança, no pleno respeito do princípio, expresso no ponto 3.2.9 supra, de que todas as formas de emprego devem beneficiar de proteção social.

3.7.

O CESE subscreve o apelo lançado pela Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho para que concluam as negociações sobre a revisão das regras de coordenação da segurança social, a fim de melhorar a mobilidade dos trabalhadores e assegurar uma proteção social adequada na UE, sem criar encargos excessivos para os trabalhadores e as empresas.

3.8.

O CESE exorta a Comissão e os Estados-Membros a assegurarem que os resultados do trabalho anunciado de um grupo de peritos sobre o investimento na educação e na formação se refletem na adoção de medidas que reforcem significativamente os sistemas de educação e formação, nomeadamente no cumprimento das metas definidas no plano de ação.

3.9.

O CESE considera que o domínio dos cuidados é um dos maiores desafios em toda a UE. O CESE apoia a inclusão, no plano de ação, de uma iniciativa em matéria de cuidados de longa duração que garanta um melhor acesso a serviços de qualidade para as pessoas necessitadas.

3.10.

No que se refere ao papel da UE enquanto líder mundial responsável, o CESE reafirma a sua anterior recomendação de que a Comissão Europeia, a OCDE e a OIT colaborem com os parceiros sociais a todos os níveis adequados, bem como com as organizações da sociedade civil em geral, a fim de elaborar disposições adequadas no que diz respeito a condições de trabalho dignas e à proteção necessária (11), bem como à promoção de uma política comercial progressista, justa e sustentável (12).

3.11.

Neste quadro, o CESE espera que o trabalho conjunto da Comissão, da OCDE e da OIT possa conduzir a uma eventual convenção da OIT sobre as plataformas (13). De igual modo, devem ser desenvolvidos esforços no respeitante à regulamentação do teletrabalho. O CESE remete para a sua recomendação de que «se deve iniciar um processo conjunto da Comissão Europeia, da OIT e da OCDE tendente à elaboração de uma convenção da OIT para o teletrabalho. O CESE estima igualmente que as condições de teletrabalho dignas devem constar da Agenda do Trabalho Digno da OIT e dos programas nacionais conexos» (14).

3.12.

O CESE considera, além disso, que a UE deve assumir uma maior responsabilidade para ajudar o mundo no combate à pandemia de COVID-19. O plano de ação deve reconhecer a participação da UE no Mecanismo COVAX, em consonância com a intervenção da presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, e a sua declaração de que a Europa deve «garantir a disponibilidade de vacinas seguras não só para quem as pode pagar, mas para toda a gente que delas necessita» (15).

Bruxelas, 8 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Contributo do CESE para a Cimeira Social do Porto (JO C 286 de 16.7.2021, p. 6).

(2)  Contributo do CESE para a Cimeira Social do Porto (JO C 286 de 16.7.2021, p. 6), ponto 7.

(3)  Diretiva (UE) 2019/1152 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, relativa a condições de trabalho transparentes e previsíveis na União Europeia (JO L 186 de 11.7.2019, p. 105).

(4)  JO C 81 de 2.3.2018, p. 145; JO C 14 de 15.1.2020, p. 1.

(5)  JO C 14 de 15.1.2020, p. 46, ponto 1.4.

(6)  «OECD Employment Outlook 2020 — Worker Security and the COVID-19 crisis» [Perspetivas para o emprego em 2020 da OCDE — Segurança dos trabalhadores e a crise da COVID-19].

(7)  Intervenção Olivier De Schutter.

(8)  JO C 220 de 9.6.2021, p. 13.

(9)  A opção também seguida há 30 anos: Recomendação 92/441/CEE do Conselho, de 24 de junho de 1992, relativa a critérios comuns respeitantes a recursos e prestações suficientes nos sistemas de proteção social (JO L 245 de 26.8.1992, p. 46).

(10)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 173 (ponto 1.8 das conclusões).

(11)  JO C 125 de 21.4.2017, p. 10 (ponto 3.9).

(12)  JO C 47 de 11.2.2020, p. 38, ponto 1.4.

(13)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 173 (ponto 1.14 das conclusões).

(14)  JO C 220 de 9.6.2021, p. 1 (ponto 1.14 das conclusões).

(15)  Discurso sobre o estado da União, 16 de setembro de 2020.


ANEXO

O seguinte contraparecer foi rejeitado durante o debate, tendo recolhido, contudo, pelo menos um quarto dos sufrágios expressos (artigo 43.o, n.o 2, do Regimento):

1.    Conclusões

1.1.

O CESE considera que o Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais (a seguir designado «plano de ação») constitui uma orientação útil para os Estados-Membros e a União nos seus esforços em prol da competitividade, do crescimento, do emprego, das reformas estruturais, dos investimentos produtivos e do bem-estar dos cidadãos. O CESE sublinha igualmente que não há dimensão social sem uma base económica sólida. A competitividade e o aumento da produtividade alicerçados nas competências e no conhecimento são condições prévias para a dimensão social da União. A evolução do mercado de trabalho deve ser apoiada, e não excessivamente regulamentada ou entravada. Para que a Europa possa fazer face à concorrência mundial, é necessário expandir a digitalização, adotar novos modelos empresariais e promover a inovação e a flexibilidade em matéria de emprego, horários de trabalho e mobilidade laboral.

1.2.

O CESE apoia os domínios prioritários do plano de ação e partilha da ideia nele expressa de que a Europa acolhe as sociedades mais igualitárias do mundo, pauta-se pelas mais elevadas normas em matéria de condições de trabalho e assegura uma ampla proteção social, dispondo já de um vasto acervo social.

1.3.

O CESE recorda que é possível aplicar o plano de ação quer a nível da União quer a nível dos Estados-Membros, tendo devidamente em conta as respetivas competências e os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade. A participação ativa dos parceiros sociais é crucial neste contexto.

1.4.

O CESE recorda a natureza juridicamente não vinculativa do Pilar, sublinha a repartição de competências entre a UE e os Estados-Membros e assinala que a política social é, essencialmente, da responsabilidade dos Estados-Membros. Eventuais iniciativas legislativas da UE no domínio da política social devem basear-se em dados probatórios que demonstrem que a legislação proposta serve o objetivo a que se destina. Estas iniciativas também devem ser sujeitas a um controlo específico da competitividade — uma medida de controlo para evitar propostas que prejudiquem o reforço da competitividade, a criação de emprego e o crescimento sustentável.

2.    Observações gerais

2.1.

O artigo 3.o do Tratado da União Europeia estabelece que o mercado interno deve contribuir para o desenvolvimento sustentável da Europa, assente num crescimento económico equilibrado e na estabilidade dos preços, numa economia social de mercado altamente competitiva que tenha como meta o pleno emprego e o progresso social.

2.2.

O artigo 153.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia consagra que a UE apenas apoia e complementa a ação dos Estados-Membros em domínios específicos da política social. A UE já dispõe de um vasto acervo social.

2.3.

Em 17 de novembro de 2017, o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão proclamaram, em Gotemburgo, os 20 princípios do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, que não alterou o direito primário da UE. O CESE assinala, em especial, o preâmbulo do Pilar Europeu dos Direitos Sociais no qual se afirma que «[a] nível da União, o Pilar Europeu dos Direitos Sociais não alarga as competências e tarefas da União conferidas pelos Tratados, pelo que deve ser aplicado dentro dos limites dessas competências.»

2.4.

Na sua Agenda Estratégica para 2019-2024, o Conselho Europeu realçou a necessidade de o Pilar Europeu dos Direitos Sociais ser aplicado ao nível da União e dos Estados-Membros, tendo devidamente em conta as competências respetivas.

3.    Aplicação

3.1.

O CESE considera que o plano de ação fornece orientações úteis, nomeadamente em matéria de emprego, competências, saúde e proteção social, mas chama a atenção para a repartição de competências entre a UE e os Estados-Membros, no âmbito da qual a política social é, essencialmente, da responsabilidade dos Estados-Membros.

3.2.

O CESE espera que sejam adotadas medidas ao nível adequado, em conformidade com os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, a fim de melhorar o funcionamento dos mercados de trabalho e os modelos sociais, contribuindo, assim, para o crescimento económico, a competitividade e a dimensão social.

3.3.

Tal exige respeitar os diferentes enquadramentos socioeconómicos e a diversidade dos sistemas nacionais, incluindo o papel e a autonomia dos parceiros sociais.

3.4.

O CESE reputa necessário continuar a reformar os mercados de trabalho na Europa, mas de diferentes formas em diferentes partes da União, tendo por base os diferentes modelos de mercado de trabalho. Em alguns Estados-Membros, pode passar por medidas relacionadas com salários mínimos ou com a necessidade de assegurar custos laborais indiretos mais baixos. Noutros, pode tratar-se de introduzir formas de emprego mais flexíveis ou de adaptar os sistemas de segurança social a fim de estimular o emprego. Isto significa que se deve dar preferência a instrumentos não vinculativos.

3.5.

Eventuais iniciativas legislativas da UE no domínio da política social devem basear-se em dados probatórios que demonstrem que a legislação proposta serve o objetivo a que se destina. Estas iniciativas também devem ser sujeitas a um controlo específico da competitividade — uma medida de controlo para evitar propostas que prejudiquem o reforço da competitividade, a criação de emprego e o crescimento sustentável.

4.    Fundamentos económicos, parceiros sociais, emprego e competências

4.1.

O CESE assinala que não há dimensão social sem uma base económica sólida. A competitividade e o aumento da produtividade alicerçados nas competências e no conhecimento são condições prévias para a dimensão social da União.

4.2.

O CESE partilha da opinião da Comissão sobre a necessidade de apoiar o alargamento da negociação coletiva e aumentar o número de associados dos parceiros sociais. Os parceiros sociais desempenham um papel importante na criação de mercados de trabalho eficientes.

4.3.

O CESE congratula-se com o ponto 4 da Declaração do Porto sobre o papel dos parceiros sociais: «A dimensão social, o diálogo social e a participação ativa dos parceiros sociais sempre estiveram no centro de uma economia social de mercado altamente competitiva.»

4.4.

O CESE considera que o diálogo social e a negociação coletiva são mais eficazes se nem o Estado nem a UE estiverem envolvidos na definição dos critérios de negociação coletiva e na respetiva aplicação, cabendo aos parceiros sociais a plena responsabilidade por ambos os processos.

4.5.

O plano de ação constitui uma boa oportunidade para demonstrar que os Estados-Membros e os respetivos parceiros sociais podem dar uma resposta adequada aos desafios que os mercados de trabalho enfrentam após a pandemia.

4.6.

O CESE subscreve o ponto de vista do plano de ação de que «[o] apoio ao emprego e aos trabalhadores não pode produzir resultados positivos sem o apoio às empresas e aos empresários» e de que «[uma] indústria dinâmica continua a ser fundamental para a prosperidade futura da Europa e para a criação de novos postos de trabalho.» No entanto, criar emprego não é sinónimo de nova legislação ou de mais obrigações que aumentem os encargos das empresas.

4.7.

Conforme afirmado pelo CESE, a competitividade e o aumento da produtividade com base nas competências e no conhecimento são os ingredientes para preservar o bem-estar das sociedades europeias.

4.8.

O CESE congratula-se com a ênfase colocada pelo plano de ação na educação, nas competências e na aprendizagem ao longo da vida, incluindo a melhoria de competências e a requalificação contínuas, com vista a melhorar a empregabilidade, impulsionar a inovação, assegurar a equidade social e colmatar o défice de competências digitais.

5.    Papel do Semestre Europeu

5.1.

O CESE considera que o eventual acompanhamento do plano de ação e das respetivas reformas nacionais deve realizar-se através do método aberto de coordenação e no âmbito do Semestre Europeu. O Semestre Europeu deve servir de quadro de referência para apoiar os esforços dos Estados-Membros e dos parceiros sociais no sentido de melhorar, por meio de reformas, os resultados das políticas sociais e de emprego nacionais.

5.2.

O CESE salienta que o painel de indicadores sociais proposto no plano de ação deve contribuir para o Semestre Europeu, de modo a orientar os Estados-Membros na reforma dos seus mercados de trabalho e das suas políticas sociais. O acompanhamento dos resultados do mercado de trabalho com base em indicadores deverá contribuir para intercâmbios coordenados de políticas a nível da UE, o que resultará na elaboração de recomendações específicas por país adaptadas no contexto do processo do Semestre Europeu.

5.3.

O CESE considera que os atuais mecanismos de coordenação dos Estados-Membros e da Comissão são os instrumentos adequados para assegurar a participação de todas as partes interessadas pertinentes a nível nacional na aplicação do Pilar, nomeadamente no que diz respeito à sua revisão intercalar. A Comissão Europeia deve privilegiar a apresentação de orientações destinadas aos Estados-Membros sobre a utilização dos mecanismos de coordenação existentes.

5.4.

O CESE apela aos Estados-Membros para que tirem pleno partido do Semestre Europeu e para que aproveitem a oportunidade sem precedentes oferecida pelo Mecanismo de Recuperação e Resiliência, elaborando planos nacionais de recuperação e resiliência ambiciosos. Assinala que o Próxima Geração UE é um instrumento de emergência baseado no artigo 122.o do TFUE e continuará a ser tratado como uma medida pontual.

Resultado da votação

Votos a favor:

93

Votos contra:

149

Abstenções:

14


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/50


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — União da Igualdade: Estratégia sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência 2021-2030

[COM(2021) 101 final]

(2021/C 374/09)

Relator:

Ioannis VARDAKASTANIS

Consulta

Comissão, 26.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

 

 

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

21.6.2021

Adoção em plenária

7.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

233/0/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe favoravelmente a nova Estratégia da UE sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que teve em conta muitas das sugestões propostas pelo movimento europeu em prol das pessoas com deficiência e pela sociedade civil. Reflete também muitas das propostas apresentadas no parecer do CESE de 2019 (1), visa implementar a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CNUDPD) a nível da UE e constitui uma parte essencial da União da Igualdade. No entanto, o CESE manifesta preocupação com a diluição da legislação e das medidas vinculativas que aplicam a estratégia, mas reconhece que a nova estratégia é um claro avanço na sua ambição em comparação com a estratégia de 2010-2020.

1.2.

O compromisso de criar uma Plataforma das Pessoas com Deficiência é bastante promissor, mas também se pode revelar dececionante se for aplicado de forma inadequada. Deve haver transparência quanto aos membros, às agendas das reuniões (com a possibilidade de introduzir elementos suplementares nos pontos da ordem do dia) e aos resultados. A plataforma também deve garantir que as organizações de pessoas com deficiência terão espaço para se fazerem ouvir. O CESE considera que tem um papel a desempenhar neste domínio, devendo, por isso, participar na plataforma.

1.3.

Cabe reforçar a ligação entre a Estratégia para a Deficiência e os investimentos significativos decorrentes do Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR). A ligação com a execução e o acompanhamento do Plano de Ação para o Pilar dos Direitos Sociais da UE, em especial do princípio 17 do pilar, também deve ser assegurada e maximizada. O CESE solicita à Comissão Europeia que defina uma agenda mais clara e mais forte sobre a forma de promover a utilização do MRR nacional para ajudar as pessoas com deficiência a recuperar da pandemia. A Comissão deve dirigir-se aos Estados-Membros que não foram transparentes quanto aos seus planos ou não seguiram as suas diretrizes no sentido de assegurar uma consulta significativa da sociedade civil. A Comissão também deve ser firme na oposição a planos que proponham investimentos que vão contra a CNUDPD, como os investimentos em estabelecimentos de cuidados institucionais.

1.4.

O CESE congratula-se com a proposta relativa ao AccessibleEU, embora, nesta fase, não corresponda ao pedido do Comité de criação de um Comité da Acessibilidade da UE. A Comissão deve ser clara e transparente quanto ao modo como pretende financiar e dotar esta agência de pessoal e de que forma garantirá a representação das pessoas com deficiência, as quais devem ser representadas internamente, na qualidade de funcionários e peritos, e não apenas externamente, como intervenientes consultados.

1.5.

O CESE apoia vivamente a iniciativa emblemática relativa ao Cartão Europeu de Deficiente, que considera ter potencial para promover grandes mudanças. No entanto, lamenta que ainda não haja qualquer compromisso quanto à forma de assegurar o seu reconhecimento pelos Estados-Membros. O Comité sublinha a necessidade de o Cartão de Deficiente ser implementado através de um regulamento, tornando-o diretamente aplicável e juridicamente vinculativo em toda a UE.

1.6.

O CESE apoia o plano para estabelecer um guia de boas práticas eleitorais relativo à participação das pessoas com deficiência no processo eleitoral, previsto para 2023. Apoia também a colaboração prevista com os Estados-Membros, a rede europeia de cooperação para as eleições e o Parlamento Europeu para assegurar em pé de igualdade os direitos políticos das pessoas com deficiência. O CESE recomenda que se antecipe o prazo para concretizar esta medida, a fim de dar mais tempo às entidades nacionais e locais para adotarem práticas mais acessíveis antes das eleições europeias de 2024.

1.7.

Faltam ações específicas que atendam às necessidades das mulheres e das raparigas com deficiência. O CESE apela para que esta situação seja corrigida tanto quanto possível, mediante a integração da dimensão de género nas ações já previstas na estratégia. Este aspeto deve ser abordado com especial cuidado nas ações de combate à violência. A tónica nas mulheres também deve ser alargada às pessoas que prestam cuidados continuados e informais a familiares com deficiência, uma vez que é mais provável que sejam as mulheres a assumir funções de prestação de cuidados. Após a revisão intercalar da estratégia, o CESE recomenda a apresentação de uma iniciativa emblemática específica sobre as mulheres com deficiência na segunda metade do período de vigência da estratégia.

1.8.

As ações relacionadas com o acesso à justiça e as pessoas com deficiência enquanto vítimas de violência são de extrema importância. O CESE considera que estas ações, nomeadamente as que dizem respeito à formação dos profissionais da justiça e dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei, devem também dar orientações quanto à forma de garantir que as pessoas com deficiência não são impedidas de aceder à justiça por incapacidade legal nem sujeitas a atrasos na justiça por motivos de acessibilidade, ausência de apoio ao processo de decisão ou falta de assistência na comunicação, como a disponibilidade de interpretação de linguagem gestual.

1.9.

A Comissão tem de abordar com especial cuidado as diretrizes propostas relativas a melhorias na vida autónoma e à inclusão na comunidade. As diretrizes devem basear-se em definições muito claras daquilo que se entende por cuidados institucionais, serviços de proximidade e vida autónoma. O CESE recomenda que a Comissão baseie as suas definições nas já estabelecidas e acordadas pelo Grupo europeu de peritos sobre a passagem de uma assistência no seio de instituições a uma assistência de proximidade, bem como no comentário geral n.o 5 da CNUDPD ao artigo 19.o.

1.10.

O pacote proposto para melhorar os resultados em matéria de emprego, bem como o compromisso da Comissão de melhorar o recrutamento e a integração de pessoas com deficiência nas instituições da UE, são uma resposta clara aos apelos da sociedade civil. Nunca é demais salientar a importância de privilegiar a promoção do emprego de qualidade para pessoas com deficiência no contexto da pandemia de COVID-19 (2). Nesse sentido, a estratégia poderia ter sido mais ambiciosa. O CESE recomenda vivamente que se iniciem os trabalhos de definição dos indicadores de acompanhamento da execução dessas ações e que se envidem esforços para alinhar essas medidas pelas da proteção civil e da saúde e segurança no trabalho. No que diz respeito ao emprego nos Estados-Membros, tal poderia ser alcançado, em parte, pela proposta da Comissão de incluir indicadores sobre as disparidades da taxa de emprego das pessoas com deficiência no novo painel de avaliação dos indicadores sociais do Pilar Social e de incluir a desagregação em torno da deficiência em alguns dos outros indicadores. O CESE salienta que o objetivo não é apenas aumentar as taxas de emprego, mas também aumentar o emprego de qualidade para que as pessoas com deficiência possam melhorar a sua posição social através do trabalho. Por conseguinte, o CESE propõe que o painel de avaliação contenha indicadores sobre a qualidade do emprego das pessoas com deficiência, nomeadamente se possuem contratos a tempo inteiro e de longo prazo e se estão empregadas no mercado de trabalho aberto. A Comissão terá de insistir fortemente nas metas estabelecidas para os Estados-Membros, que estipulam em que medida devem reduzir a disparidade da taxa de emprego das pessoas com deficiência até 2030. O CESE defende metas ambiciosas que visem, tanto quanto possível, a eliminação de qualquer disparidade no emprego, com ênfase no emprego no mercado de trabalho aberto.

1.11.

A estratégia propõe uma série de ações em matéria de educação. O CESE salienta que as medidas de formação para professores do ensino especial também se devem centrar na formação de professores em contextos de ensino geral, a fim de proporcionar uma aprendizagem inclusiva na sala de aula. Os Estados-Membros devem ser incentivados a colocar educadores do ensino especial em ambientes inclusivos, a fim de permitir às crianças com deficiência receber o apoio especializado de que podem necessitar ao estarem integradas numa escola do ensino geral frequentada por alunos sem deficiência.

1.12.

A proposta de atualização do «conjunto de instrumentos sobre a abordagem da cooperação para o desenvolvimento baseada nos direitos, abarcando todos os direitos humanos» é um passo na direção certa. Essa atualização deve processar-se com o contributo das organizações nacionais e locais de pessoas com deficiência sediadas nos países onde esses investimentos são efetuados.

1.13.

A ação para apoiar os Estados-Membros na aplicação da Convenção de Haia de 2000 entra em conflito com a CNUDPD no que diz respeito a questões como o tratamento forçado e a coação. Antes de adotar qualquer medida adicional, a Comissão deve procurar o contributo das organizações de pessoas com deficiência sobre esta questão.

1.14.

O CESE congratula-se com o empenho da Comissão em dar o exemplo. As propostas como as que se relacionam com a acessibilidade dos edifícios da Comissão devem ser rigorosamente aplicadas e não se devem afastar do calendário de aplicação delineado na estratégia.

1.15.

A estratégia proposta para a recolha de dados é uma das propostas fundamentais. O CESE sublinha a necessidade de garantir uma recolha mais sistemática de dados desagregados, possivelmente mediante a utilização do conjunto de perguntas para a elaboração de estatísticas sobre pessoas com deficiência (Washington short set of questions).

1.16.

Prevê-se finalizar até 2021 um quadro destinado a acompanhar os objetivos e as ações da estratégia. O CESE, designadamente o Grupo para as Pessoas com Deficiência do CESE, está disponível para ajudar a Comissão na sua conceção, em conjunto com as organizações de pessoas com deficiência que devem ser plenamente envolvidas, de forma significativa, em todo o processo.

1.17.

A Estratégia declara que as pessoas com deficiência devem participar plenamente na Conferência sobre o Futuro da Europa. O CESE gostaria de ver a Comissão Europeia honrar este compromisso, incluindo as pessoas com deficiência e as respetivas organizações representativas em todos os domínios da conferência e não apenas nos relacionados especificamente com a deficiência.

1.18.

O CESE insta a Comissão a começar a preparar a seleção de uma pessoa candidata da UE para a Comissão para os Direitos das Pessoas com Deficiência e recomenda que essa pessoa seja uma mulher europeia com deficiência.

1.19.

O Conselho da UE também tem um papel essencial a desempenhar na aplicação da estratégia. O CESE insta o Conselho a aderir à Plataforma das Pessoas com Deficiência e a designar rapidamente um coordenador da deficiência, conforme previsto na estratégia, o qual deverá ser o ponto focal da CNUDPD, conforme proposto à UE nas observações finais da revisão da CNUDPD em 2015.

1.20.

O CESE apela também ao movimento em prol das pessoas com deficiência para que seja pró-ativo e exerça pressão para que todas as ações previstas na estratégia cumpram o que prometem e que dê provas de solidariedade assegurando que as medidas também beneficiam os imigrantes e refugiados com deficiência. O lançamento da Estratégia sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência é apenas um ponto de partida. Não é a estratégia em si que proporcionará uma mudança real para as pessoas com deficiência, mas sim a força de cada uma das suas componentes ao longo da próxima década. Os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil devem apoiar plenamente a aplicação da nova estratégia.

2.   Observações gerais

2.1.

O CESE congratula-se com o facto de a Estratégia da UE sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência 2021-2030 ser um claro passo em frente em comparação com a estratégia anterior. Aplaude também vivamente o processo de consulta da Comissão e o facto de muitas das propostas apresentadas pelo CESE no seu parecer (3) terem sido incluídas na estratégia final, o que também sublinha a capacidade clara do Comité para definir os resultados das novas políticas e iniciativas da UE.

2.2.

O CESE congratula-se com o facto de a Comissão se ter comprometido a apresentar sete propostas emblemáticas com objetivos e prazos de consecução claros. Este nível de transparência facilitará consideravelmente o trabalho do CESE, da sociedade civil e dos parceiros sociais na preparação dos seus contributos para estas ações.

2.3.

Entre as propostas emblemáticas, o CESE vê um potencial especial no centro de recursos AccessibleEU. O seu êxito dependerá, em parte, dos recursos que a Comissão lhe atribuir, da experiência do pessoal que o dirige e da sua capacidade de reunir peritos que possam transmitir conhecimentos verdadeiramente importantes aos Estados-Membros.

2.4.

O CESE congratula-se com a proposta de um Cartão de Deficiente ao nível da UE. A diferença que este cartão fará na vida das pessoas com deficiência dependerá dos direitos e benefícios proporcionados pelo mesmo quando este for lançado e da adoção de medidas para garantir a sua aplicação em todos os Estados-Membros.

2.5.

Um dos pontos fortes da estratégia reside no impacto que esta terá no funcionamento interno da Comissão e na articulação com outras instituições da UE. O CESE congratula-se, em particular, com o compromisso de se organizar uma troca de pontos de vista anual entre a Comissão Europeia e o CESE. Considera também que deve participar na nova Plataforma das Pessoas com Deficiência, tal como as organizações de pessoas com deficiência.

2.6.

Em alguns aspetos, a estratégia parece ser um relutante passo em frente. A estratégia retoma muitas das propostas avançadas no parecer do CESE (4), mas não há nenhum compromisso relativamente à adoção de nova legislação. Das cinco ações relativas à legislação vinculativa, quatro são revisões já em curso da legislação existente, e uma é uma proposta para equacionar a possibilidade de legislar «se for caso disso». A nova estratégia privilegia mecanismos como as orientações e os conjuntos de ferramentas que, embora possam promover práticas nos Estados-Membros, apresentam um risco muito maior de incumprimento, sem qualquer possibilidade de recurso contra os Estados-Membros junto do Tribunal de Justiça da União Europeia.

2.7.

Na estratégia, a Comissão promete abordar certas questões através de outras estratégias e planos de ação da UE, como a Estratégia da UE para a Administração Pública Digital e o Plano de Ação para a Economia Social. A Comissão nem sempre fornece pormenores sobre o modo como as questões de deficiência serão tratadas no âmbito dessas estratégias, devendo especificar de que forma pretende fazê-lo.

2.8.

O CESE manifesta preocupação quanto à ação destinada a apoiar os Estados-Membros na aplicação da Convenção de Haia de 2000, que entra em conflito com a CNUDPD no que diz respeito a questões como o tratamento forçado e a coação nas intervenções médicas. Antes de adotar qualquer medida adicional, a Comissão deve procurar o contributo das organizações de pessoas com deficiência sobre esta questão.

2.9.

O CESE considera que a estratégia tem potencial para gerar mudanças reais, o que, contudo, depende inteiramente da sua aplicação e da ambição de cada ação. Se a Comissão e os Estados-Membros não forem ousados na promoção de ações que desafiem o statu quo, a estratégia poderá ficar aquém das expectativas de mais de 100 milhões de pessoas com deficiência na UE.

2.10.

O CESE apela para que o movimento em prol das pessoas com deficiência seja pró-ativo exercendo pressão para que a estratégia cumpra o que promete. Não é a estratégia em si que proporcionará uma mudança real para as pessoas com deficiência, mas sim a força de cada uma das suas componentes ao longo da próxima década.

3.   Acessibilidade e gozo dos direitos da UE

3.1.

Os capítulos dois e três da estratégia abrangem as ações relacionadas com a acessibilidade e o gozo dos direitos da UE. Entre as principais ações, são de referir as seguintes:

3.1.1.

Uma iniciativa emblemática para estabelecer um centro de recursos denominado AccessibleEU, que reunirá as autoridades nacionais responsáveis pela aplicação e execução das regras de acessibilidade, bem como peritos e profissionais da acessibilidade, partilhará boas práticas e desenvolverá ferramentas e normas para facilitar a aplicação da legislação da UE, o que reflete o apelo do CESE à criação de um Comité Europeu da Acessibilidade. A Comissão deve esclarecer de que forma esse centro será financiado e dotado de pessoal, e de que forma associará os peritos em acessibilidade, as pessoas com experiência em questões de acessibilidade e as organizações de pessoas com deficiência.

3.1.2.

Criação de um Cartão Europeu de Deficiente até ao final de 2023, a ser reconhecido em todos os Estados-Membros. O CESE congratula-se por ver que esta medida dá resposta ao apelo que fez no seu parecer de 2019 (5). O êxito da iniciativa dependerá do âmbito dos benefícios conferidos pelo cartão e da sua aplicação integral por todos os Estados-Membros. O CESE insta a Comissão a ser ambiciosa no que toca ao Cartão de Deficiente, tendo em conta que será uma das principais realizações da estratégia e servirá de referência para aferir o êxito da mesma.

3.1.3.

Avaliação da aplicação da Diretiva Acessibilidade da Web e averiguação se a mesma deve ser revista. Essa avaliação é uma oportunidade para analisar se esta legislação se adequa ao seu propósito num setor público cada vez mais digital, principalmente após a COVID-19. O CESE considera que a Comissão deve suspender a isenção do âmbito da diretiva aplicável a determinados sítios Web (por exemplo, escolas, jardins de infância e creches), uma vez que estas potenciais exclusões podem ter um impacto negativo nas pessoas com deficiência que apenas podem aceder a esses serviços públicos através de ferramentas digitais. Solicita também a apresentação de uma explicação mais clara sobre as medidas que serão adotadas caso os Estados-Membros não cumpram os requisitos da diretiva.

3.1.4.

Revisão de uma série de atos legislativos existentes, nomeadamente: o quadro legislativo relativo ao desempenho energético dos edifícios, incluindo o seu impacto nas melhorias da acessibilidade decorrentes dos requisitos de renovação; o quadro regulamentar relativo aos direitos dos passageiros; o Regulamento (UE) n.o 1315/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho (6) relativo às orientações da União para o desenvolvimento da rede transeuropeia de transportes, a fim de reforçar as disposições na área da acessibilidade; e o pacote de Mobilidade Urbana. Embora lamente o facto de a Comissão não ter sido mais ambiciosa ao propor mais ações com base em legislação vinculativa, o CESE congratula-se por verificar que o seu apelo à acessibilidade dos espaços construídos e dos transportes é determinante na estratégia. O CESE insta a Comissão a ser ambiciosa nas suas alterações e a defender medidas de acessibilidade ousadas.

3.1.5.

Estabelecimento de um guia de boas práticas eleitorais sobre a participação das pessoas com deficiência no processo eleitoral e colaboração com os Estados-Membros, a rede europeia de cooperação para as eleições e o Parlamento Europeu, a fim de assegurar os direitos políticos das pessoas com deficiência, nomeadamente o direito de se candidatarem a eleições e de receberem informações acessíveis. A Comissão abordará também as necessidades das pessoas com deficiência no compêndio de práticas de votação eletrónica e apoiará a participação democrática inclusiva. Importa que a Comissão trabalhe em estreita colaboração com o Parlamento Europeu, para garantir que as próximas eleições europeias serão acessíveis e que a UE será um exemplo.

4.   Qualidade de vida digna e participação equitativa

4.1.

Os capítulos quatro e cinco da estratégia abrangem as ações relativas à qualidade de vida e à igualdade. Entre as principais ações, são de referir as seguintes:

4.1.1.

Uma iniciativa emblemática relativa às diretrizes para uma vida autónoma, para que os Estados-Membros operem melhorias em matéria de autonomia e inclusão na comunidade. O CESE considera que esta iniciativa pode ser fundamental. A sua força dependerá de uma definição clara e rigorosa do que constitui cuidados institucionais, do motivo por que estes devem ser evitados e do que se entende por investimento em serviços de proximidade e vida autónoma. As diretrizes devem ser elaboradas com o contributo das pessoas com deficiência e das organizações que as representam.

4.1.2.

Um quadro relativo aos serviços sociais, destinado a melhorar a prestação de serviços para pessoas com deficiência e a aumentar a atratividade do emprego neste domínio. O CESE considera que este quadro deve centrar-se não só em tornar o setor dos serviços sociais mais atrativo em termos de salários e condições de trabalho, mas também em garantir que os prestadores de serviços recebem formação adequada em matéria de prestação de apoio orientada pela escolha dos utilizadores dos serviços, com uma abordagem centrada na pessoa assente nos direitos humanos.

4.1.3.

Um novo pacote relativo aos resultados do mercado de trabalho para as pessoas com deficiência. No âmbito deste pacote, a Comissão procurará também assegurar uma aplicação rigorosa, por parte dos Estados-Membros, dos direitos consagrados na Diretiva Igualdade no Emprego, e apresentará um relatório sobre a sua aplicação em 2021. A Comissão supervisionará também a elaboração de um Plano de Ação para a Economia Social em 2021, que contemplará as oportunidades relacionadas com as pessoas com deficiência e a sua integração no mercado de trabalho aberto. As pessoas com deficiência confrontam-se com muitos obstáculos em termos de acesso ao emprego. O CESE considera que a Comissão deve esclarecer quais os obstáculos que existem e quais os que devem ser eliminados com maior urgência, bem como em que medida a COVID-19 agravou a situação. Recomenda que a conceção do pacote seja precedida de um estudo ou inquérito para apurar junto das pessoas com deficiência e das respetivas organizações o que, na sua opinião, é preciso fazer. O CESE considera também que o pacote do emprego se deve centrar na capacidade de acesso a emprego de qualidade no mercado de trabalho aberto, inclusivamente na economia social e nos modelos de emprego da rede D-WISE, evitando uma maior exclusão das pessoas com deficiência e, em especial, chegando a mulheres e jovens com deficiência que procuram trabalho. O objetivo não deve ser apenas melhorar as taxas de emprego, mas também permitir que as pessoas com deficiência melhorem o seu estatuto social e a sua situação económica através de trabalho remunerado.

4.1.4.

Um estudo de 2022 sobre a proteção social e os serviços para pessoas com deficiência, seguido de orientações para apoiar os Estados-Membros na reforma da proteção social, com especial incidência nos quadros de avaliação dos graus de deficiência. O estudo deve centrar-se nos serviços sociais como base para garantir às pessoas com deficiência uma vida digna, bem como no papel das famílias e dos cuidadores. As orientações devem, assim, sublinhar que os serviços devem conseguir dar resposta às necessidades individuais das pessoas com deficiência, assentar em serviços de proximidade em vez de contextos isolados e ser acompanhados de subsídios de invalidez adequados. É fundamental que as orientações relativas às reformas da proteção social abordem o facto de o custo de vida para as pessoas com deficiência ser superior e exortem os Estados-Membros a serem mais flexíveis ao permitir que as pessoas mantenham os subsídios de invalidez independentemente dos seus rendimentos ou dos rendimentos dos seus cônjuges ou parceiros. As pessoas com deficiência devem ser livres de procurar emprego ou residir/casar com o respetivo parceiro, sem serem penalizadas financeiramente.

4.1.5.

Uma estratégia de formação para profissionais da justiça, com ênfase na legislação da UE em matéria de deficiência, incluindo a CNUDPD. Esta estratégia abrangerá um estudo sobre as garantias processuais para adultos vulneráveis em processos penais e avaliará a necessidade de propostas legislativas em matéria de apoio e proteção de adultos vulneráveis, em conformidade com a Estratégia sobre os Direitos das Vítimas. A Comissão também fornecerá aos Estados-Membros orientações sobre o acesso das pessoas com deficiência à justiça na UE. Apoiará os Estados-Membros no aumento da participação das pessoas com deficiência na qualidade de profissionais do sistema de justiça. O CESE acolhe favoravelmente estas propostas, que vão ao encontro das recomendações formuladas no seu parecer (7). Congratula-se também com o facto de a Comissão solicitar à Agência dos Direitos Fundamentais que averigue a situação das pessoas com deficiência que vivem em instituições relativamente a problemas de violência, maus-tratos e tortura. Essas ações também devem fornecer orientações quanto à forma de garantir que as pessoas com deficiência não são impedidas de aceder à justiça por incapacidade legal nem sujeitas a atrasos na justiça por motivos de acessibilidade, ausência de apoio ao processo de decisão ou falta de assistência na comunicação, como a disponibilidade de interpretação de linguagem gestual. Cabe compilar as boas práticas relativas ao apoio à tomada de decisão em conformidade com os artigos 12.o e 13.o da CNUDPD. Pode ainda ser útil examinar a forma como os Estados-Membros aplicaram a Recomendação da Comissão, de 27 de novembro de 2013, sobre as garantias processuais das pessoas vulneráveis suspeitas ou arguidas em processo penal (8).

4.1.6.

Diversas ações no domínio da educação. Estas ações abrangem o apoio aos Estados-Membros para assegurar tecnologias de apoio e proporcionar ambientes e conteúdos digitais de aprendizagem acessíveis no âmbito do Plano de Ação para a Educação Digital 2021-2027. A Comissão propõe também um conjunto de ferramentas para a inclusão na educação e no acolhimento na primeira infância, com um capítulo específico sobre as crianças com deficiência. Por último, a Comissão ajudará os Estados-Membros a desenvolverem os respetivos sistemas de formação de professores, a fim de fazer face à escassez de professores do ensino especial e capacitar todos os profissionais do ensino para gerir a diversidade e a educação inclusiva. O CESE congratula-se com o facto de a Comissão reconhecer que a UE pode contribuir para a promoção da educação inclusiva, nomeadamente na aprendizagem eletrónica, uma vez que os alunos com deficiência foram confrontados com muitos problemas de acessibilidade durante a pandemia de COVID-19. No entanto, salienta que as ações de formação para os professores do ensino especial também devem incidir na formação dos professores em contextos de ensino geral sobre a forma de proporcionarem uma aprendizagem inclusiva na sala de aula. A Comissão deve promover o ensino geral inclusivo e incentivar os Estados-Membros a colocar educadores do ensino especial em contextos de educação inclusiva. Importa também investir na oferta de orientação profissional para pessoas com deficiência nos sistemas de ensino e melhorá-la.

4.1.7.

Nos domínios das artes e da cultura, do desporto, do lazer e das atividades recreativas de natureza inclusiva, incluindo o turismo, a estratégia reforçará a participação através dos esforços em várias frentes, nomeadamente da cooperação com organizações desportivas gerais e específicas para as pessoas com deficiência, apoiando a criação artística por artistas com deficiência e utilizando fundos da UE para tornar os sítios do património cultural e os eventos artísticos mais acessíveis às pessoas com deficiência.

4.1.8.

O CESE lamenta que a estratégia não seja ambiciosa quanto à adoção da diretiva horizontal relativa à não discriminação, bloqueada no Conselho na última década. Não existem planos reais para ultrapassar esse bloqueio ou propor alternativas, caso o Conselho não chegue a acordo.

4.1.9.

O CESE insta a que se preste mais atenção às questões relacionadas com a saúde. A estratégia centra-se no Plano de Luta contra o Cancro, o que é positivo, mas é muito vaga no que diz respeito à saúde mental, à acessibilidade da informação relacionada com a saúde e à prestação de cuidados de saúde a pessoas com deficiência que ainda vivem em instituições.

5.   Promover os direitos das pessoas com deficiência a nível mundial

5.1.

O capítulo seis da estratégia abrange as ações relacionadas com a promoção dos direitos das pessoas com deficiência a nível mundial. Entre as principais ações, são de referir as seguintes:

5.1.1.

Reforço da recolha de dados da UE sobre pessoas com deficiência na ajuda humanitária financiada pela UE, por exemplo, promovendo a utilização do conjunto de perguntas para a elaboração de estatísticas sobre pessoas com deficiência. Trata-se de uma excelente proposta que dá resposta a anteriores pedidos do CESE. O Comité apela ao reforço da recolha de dados desagregados em todas as frentes, especialmente no que se refere a pessoas que vivem em instituições. A UE deve também apoiar a aplicação da CNUDPD e promover a ratificação a nível mundial.

5.1.2.

Atualização do conjunto de instrumentos sobre a abordagem da cooperação para o desenvolvimento baseada nos direitos, abarcando todos os direitos humanos, em 2021. Esta atualização deve processar-se não apenas em cooperação com organizações de pessoas com deficiência na UE, mas também com organizações nacionais e locais de pessoas com deficiência sediadas nos países onde esses investimentos são efetuados.

5.1.3.

Utilização sistemática do marcador de deficiência do Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da OCDE para acompanhar os investimentos inclusivos em matéria de deficiência, com vista a um acompanhamento específico do financiamento da UE. O CESE congratula-se com o facto de esta sugestão, formulada no seu parecer SOC/616 (9), ter sido levada em consideração.

6.   Executar a estratégia e dar o exemplo

6.1.

Os capítulos sete e oito da estratégia abrangem as ações relacionadas com a aplicação da estratégia e as mudanças que a Comissão introduzirá na sua estrutura e no seu modo de trabalho a fim de as concretizar. Entre as principais ações, são de referir as seguintes:

6.1.1.

Troca de pontos de vista anual com o CESE. O CESE congratula-se com a formalização da sua participação na aplicação da estratégia e aguarda com expectativa esta cooperação contínua e estruturada. Congratula-se também por verificar que a Comissão organizará reuniões regulares de alto nível com o Parlamento Europeu, o Conselho e o Serviço Europeu para a Ação Externa, envolvendo organizações representativas das pessoas com deficiência.

6.1.2.

Criação da Plataforma das Pessoas com Deficiência para substituir o Grupo de Alto Nível sobre a Deficiência. A plataforma apoiará a aplicação da estratégia, bem como as estratégias nacionais sobre deficiência. Reunirá os pontos focais nacionais da CNUDPD, as organizações de pessoas com deficiência e a Comissão, proporcionando um fórum para discutir as avaliações efetuadas pelas Nações Unidas sobre a aplicação da CNUDPD por parte dos Estados-Membros. O CESE acalenta fortes esperanças nesta nova estrutura, que promete ser mais aberta e transparente do que o Grupo de Alto Nível.

6.1.3.

Uma estratégia renovada de recursos humanos para impulsionar o recrutamento e as perspetivas de carreira do pessoal com deficiência, nomeadamente um «Gabinete para a Diversidade e a Inclusão» para supervisionar o desenvolvimento e a execução das ações que promovem a diversidade e a inclusão em toda a Comissão. O CESE considera que se trata de uma das ações mais promissoras no âmbito da estratégia e espera que resulte num aumento real do recrutamento de pessoas com deficiência nas instituições da UE. Regista igualmente com agrado que a Comissão atualizará a estratégia específica de comunicação e sensibilização do Serviço Europeu de Seleção do Pessoal e reforçará a comunicação pela direção de todos os serviços da Comissão de informações sobre a diversidade, incluindo as adaptações razoáveis para o pessoal com deficiência.

6.1.4.

Melhoria da acessibilidade de todos os serviços de comunicação audiovisual e conceção gráfica da Comissão até 2023. O CESE acolhe favoravelmente esta medida e insta a Comissão a trabalhar com peritos em acessibilidade, a fim de garantir o nível mais elevado possível de acessibilidade.

6.1.5.

Garantia da acessibilidade de todos os novos edifícios ocupados pela Comissão. A Comissão também garantirá que os locais onde são organizados os seus eventos são acessíveis e que todos os seus edifícios cumprem as normas europeias em matéria de acessibilidade até 2030. O CESE apela à Comissão para que não falhe este objetivo.

6.1.6.

Desenvolvimento de uma estratégia de recolha de dados que oriente os Estados-Membros e analise as fontes de dados e os indicadores existentes, incluindo os dados administrativos. O CESE sublinha a necessidade de recolher dados desagregados, possivelmente mediante a utilização do conjunto de perguntas para a elaboração de estatísticas sobre pessoas com deficiência, conforme referido na estratégia.

6.1.7.

Publicação de um quadro de acompanhamento dos objetivos e ações da estratégia, seguido do desenvolvimento de novos indicadores de deficiência e da publicação de um relatório em 2024 sobre a estratégia, avaliando a situação e, se necessário, atualizando os seus objetivos e ações. O CESE, designadamente o Grupo para as Pessoas com Deficiência do CESE, está disponível para apoiar a Comissão na conceção deste quadro, em conjunto com as organizações de pessoas com deficiência. Congratula-se com o facto de ter sido fixada uma data para a elaboração do relatório, programada de modo a permitir à Comissão corrigir eventuais lacunas durante o período de vigência da estratégia.

Bruxelas, 7 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  JO C 97 de 24.3.2020, p. 41.

(2)  Deficiência e integração no mercado de trabalho: Tendências políticas e apoio nos Estados-Membros da UE.

(3)  JO C 97 de 24.3.2020, p. 41.

(4)  JO C 97 de 24.3.2020, p. 41.

(5)  JO C 97 de 24.3.2020, p. 41; JO C 56 de 16.2.2021, p. 36.

(6)  Regulamento (UE) n.o 1315/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, relativo às orientações da União para o desenvolvimento da rede transeuropeia de transportes e que revoga a Decisão n.o 661/2010/UE (JO L 348 de 20.12.2013, p. 1).

(7)  JO C 97 de 24.3.2020, p. 41.

(8)  JO C 378 de 24.12.2013, p. 8.

(9)  JO C 97 de 24.3.2020, p. 41.


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/58


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Proposta de recomendação do Conselho relativa à criação de uma Garantia Europeia para a Infância

[COM(2021) 137 final]

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Estratégia da UE sobre os direitos da criança

[COM(2021) 142 final]

(2021/C 374/10)

Relatora:

Kinga JOÓ

Correlatora:

Maria del Carmen BARRERA CHAMORRO

Consulta

Comissão Europeia, 31.5.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Decisão da Mesa

23.3.2021

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

21.6.2021

Adoção em plenária

7.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

231/0/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O facto de uma em cada quatro crianças na União Europeia (UE) crescer em risco de pobreza e exclusão social é inaceitável e exige uma abordagem europeia coordenada baseada numa política e em quadros jurídicos sólidos, com vista a inverter esta tendência e quebrar o ciclo intergeracional do desfavorecimento. É preciso definir uma meta ambiciosa que vise retirar todas as crianças, e não apenas 5 milhões, da pobreza até 2030.

1.2.

A integração dos direitos da criança na elaboração das políticas é essencial. Praticamente todos os domínios de intervenção afetam as crianças, pelo que é necessária uma abordagem transversal à sociedade para assegurar que as diferentes políticas (relacionadas com a família, a educação, a economia, o mundo digital, o ambiente ou a habitação) produzam efeitos capacitadores e duradouros na saúde e no bem-estar das crianças. É necessário adotar urgentemente uma abordagem integrada e medidas horizontais a nível da UE, nacional, regional e local, a fim de incluir todos os domínios importantes que podem ter impacto nas vidas das crianças, agora e no futuro.

1.3.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) recomenda que os planos de ação nacionais no âmbito da Garantia para a Infância incluam um conjunto de medidas bigeracionais e multigeracionais para desenvolver os apoios destinados às crianças e aos seus pais, uma vez que não é possível abordar a vulnerabilidade de uma criança sem abordar a da sua família. Cumpre apoiar os pais e os cuidadores através de um conjunto de ações: rendimentos adequados, equilíbrio entre vida profissional e pessoal, utilização de licenças de maternidade, paternidade e parentais adequadamente remuneradas, bem como de licenças para assistência à família, regimes de trabalho flexíveis e locais de trabalho favoráveis à família.

1.4.

Os direitos humanos e os direitos da criança são vinculativos para todos os Estados-Membros, como estipulado no artigo 2.o do TUE. É necessário um quadro estratégico mais sólido a nível europeu para os direitos da criança, conforme solicitado por muitas partes interessadas. A sociedade civil organizada, e em especial os serviços sociais, as organizações de defesa das crianças, as organizações das famílias e os prestadores de serviços de ensino formal e não formal, deve ser consultada e adequadamente associada à elaboração dos planos de ação nacionais e aos seus mecanismos de acompanhamento. As ações orientadas são as que melhor podem apoiar uma aplicação efetiva destes dois quadros da UE para pôr fim à pobreza e promover a saúde e o bem-estar das crianças.

1.5.

Apenas 11 países tinham reservado financiamento específico do Fundo Social Europeu Mais (FSE+) para o objetivo de retirar crianças da pobreza, enquanto outros Estados-Membros estavam muito próximos da média da UE no que diz respeito aos dados sobre os riscos de pobreza nas crianças. O CESE recomenda que todos os Estados-Membros reservem dotações do FSE+ para retirar as crianças da pobreza, tomando os 5 % propostos como um valor mínimo. Também é necessário melhorar a recolha de dados desagregados de qualidade, a fim de ajudar a acompanhar os progressos na erradicação da pobreza infantil e da exclusão social.

1.6.

O CESE recomenda que os Estados-Membros concedam acesso gratuito à educação e ao acolhimento na primeira infância, à educação e a atividades em contexto escolar e a cuidados de saúde, ou disponibilizem esses serviços de forma gratuita. Em alternativa, podem assegurar, através de subvenções adequadas, que as crianças acedam a estes serviços essenciais sem encargos financeiros adicionais para as famílias.

1.7.

O CESE recomenda que os Estados-Membros, quando da elaboração dos seus planos nacionais ao abrigo da Garantia para a Infância, especifiquem o grupo etário visado, se for caso disso, e recorda que os direitos da criança se aplicam a todas as pessoas com menos de 18 anos de idade. Este aspeto é particularmente importante para assegurar a complementaridade de quadros como a Garantia para a Infância e a Garantia para a Juventude, no interesse dos beneficiários.

1.8.

O CESE insta a Comissão a colocar a Estratégia sobre os Direitos da Criança num nível de coordenação horizontal com outras estratégias europeias recentemente aprovadas, como as estratégias para a igualdade de género, para a igualdade de tratamento das pessoas LGBTIQ, para os ciganos e para os direitos das pessoas com deficiência.

2.   Introdução

2.1.

Os direitos da criança são os direitos humanos de todas as pessoas com menos de 18 anos de idade. A proteção dos direitos da criança é um objetivo da União Europeia consagrado no artigo 3.o, n.o 3, do Tratado da União Europeia e no artigo 24.o da Carta dos Direitos Fundamentais da UE. O Conselho da Europa promove e protege os direitos humanos das crianças com base na Convenção Europeia dos Direitos Humanos e na Estratégia sobre os Direitos da Criança (2016-2021) e outras normas jurídicas aplicáveis. Segundo a Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC) das Nações Unidas, todas as pessoas com menos de 18 anos de idade, em todo o mundo, gozam dos mesmos direitos civis, políticos, económicos, sociais e culturais, independentemente da sua origem étnica, do seu género, da sua religião, da sua língua, das suas competências, do seu estatuto migratório, da sua orientação sexual ou qualquer outro estatuto. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CNUDPD) e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas também se aplicam neste contexto.

2.2.

Em 4 de junho de 2007, foi lançado um Fórum sobre os Direitos da Criança, realizado anualmente. Esta plataforma permite o diálogo entre as instituições da UE e outras partes interessadas e acompanha anualmente a ação da UE no domínio dos direitos da criança. O CESE adotou, em 2010, o Parecer — Pobreza Infantil e Bem-estar das Crianças (1) e, em 2011, o Parecer — Programa da UE para os direitos da criança (2), nos quais instou os Estados-Membros a apoiarem as crianças de todas as formas possíveis.

2.3.

Em 20 de fevereiro de 2013, a Comissão adotou recomendações destinadas a reforçar os direitos da criança, reduzir a pobreza infantil e melhorar o bem-estar das crianças (3). Em 24 de novembro de 2015, o Parlamento Europeu instou a Comissão e os Estados-Membros da UE a introduzirem a Garantia para a Infância e programas de apoio e oportunidades para os pais saírem de situações de exclusão social e integrarem o mercado de trabalho (4). Em 13 de dezembro de 2017, o Parlamento, o Conselho e a Comissão proclamaram o Pilar Europeu dos Direitos Sociais (PEDS), que também abrange o «acolhimento e apoio a crianças» (5) (princípio 11). O PEDS consagra igualmente o direito à proteção contra a pobreza e o direito a medidas específicas destinadas a promover a igualdade de oportunidades. A título de seguimento, em julho de 2020, a Comissão encomendou um estudo de viabilidade (6) e, em agosto de 2020, lançou consultas públicas sobre a Garantia para a Infância e sobre a execução de uma Estratégia da UE sobre os Direitos da Criança.

2.4.

Em 24 de março de 2021, com o apoio do Parlamento Europeu (7), a Comissão adotou a primeira estratégia global da UE sobre os direitos da criança para 2021-2024, bem como uma proposta de recomendação do Conselho relativa à criação de uma Garantia Europeia para a Infância.

3.   Observações na generalidade relativas à Estratégia da UE sobre os Direitos da Criança e à proposta da Comissão sobre a Garantia Europeia para a Infância

3.1.

A Estratégia da UE sobre os Direitos da Criança é um quadro estratégico baseado nos direitos que integra os direitos da criança como questão transversal nas políticas e na legislação da UE. A proposta de recomendação do Conselho relativa à Garantia Europeia para a Infância é juridicamente vinculativa e contém um conjunto claro de ações de execução, metas e medidas que a UE deve acompanhar atentamente. O CESE acolhe favoravelmente as duas propostas, convicto de que a sua aplicação apoiará os esforços a nível europeu e nacional no sentido de promover o bem-estar das crianças e reduzir a pobreza infantil.

3.2.

As crianças são os membros mais vulneráveis da nossa sociedade e não podem combater sozinhas o risco de pobreza e exclusão social. A violência contra as crianças, em todas as suas formas, é um problema comum. A pandemia de COVID-19 conduziu a um aumento de algumas formas de violência, conforme indicado pelas forças policiais e outros serviços tradicionais, como as linhas de apoio para crianças em muitos Estados-Membros, que enfrentam um número crescente de casos (8). Na UE, 18 milhões de crianças, ou seja, 22,2 % de todas as crianças, cresciam em risco de pobreza e exclusão social em 2019, segundo dados do Eurostat, e este número deverá aumentar devido às consequências socioeconómicas da pandemia (9). Uma em cada quatro crianças na UE cresce em famílias em situações precárias que precisam de apoio para quebrar o ciclo da pobreza intergeracional.

3.3.

As crianças deram a sua opinião sobre os direitos e o futuro que desejam num inquérito denominado «Our Europe. Our Rights. Our Future (10)» [A nossa Europa. Os nossos direitos. O nosso futuro], que contribuiu para moldar quer a Estratégia da UE sobre os Direitos da Criança, quer a Garantia para a Infância. No total, cinco organizações de defesa dos direitos da criança recolheram as opiniões de mais de 10 mil crianças. As conclusões deixaram claro que as opiniões das crianças devem ajudar a conceber os quadros e prioridades económicos, sociais, jurídicos e estratégicos da UE.

3.4.

A Estratégia da UE sobre os Direitos da Criança adota uma abordagem holística, tendo como objetivo principal construir uma vida melhor para as crianças na UE e em todo o mundo em seis domínios importantes: i) participação das crianças na vida política e democrática da UE; ii) inclusão socioeconómica, educação e saúde; iii) prevenção e proteção contra todas as formas de violência e discriminação; iv) justiça adaptada às crianças; v) as crianças na era digital; e vi) a dimensão global dos direitos da criança. A proposta de recomendação do Conselho relativa à criação de uma Garantia Europeia para a Infância centra-se na inclusão socioeconómica e no acesso das crianças necessitadas a um conjunto de serviços essenciais: educação e acolhimento na primeira infância, educação e atividades em contexto escolar, acesso a cuidados de saúde, acesso a uma alimentação saudável e habitação adequada. Contribui para a Estratégia da UE sobre os Direitos da Criança, com ênfase nas crianças que vivem na UE.

3.5.

A estratégia insta a uma participação mais inclusiva e sistémica das crianças aos níveis local, nacional e da UE. Para o efeito, será utilizada uma nova Plataforma Europeia para a Participação das Crianças, que será criada em parceria com o Parlamento Europeu e as organizações dos direitos da criança, com vista a garantir uma maior participação das crianças no processo de tomada de decisões.

3.6.

A estratégia insta a que as crianças cresçam sem violência e sem exploração. As crianças podem ser vítimas, testemunhas ou autoras da violência. Segundo relatórios da Organização Internacional do Trabalho, muitas crianças são exploradas no mercado de trabalho e usadas para trabalho forçado, incluindo exploração sexual e prostituição. A estratégia solicita também uma justiça adaptada às crianças e salienta que os processos judiciais devem ser adaptados à sua idade e às suas necessidades, considerando em primeiro lugar o interesse superior da criança. Deve ser assegurado o acesso à justiça para as crianças, a fim de promover o pleno reconhecimento e exercício dos direitos da criança e de preservar ao mesmo tempo a eficiência dos processos judiciais, nomeadamente através da formação especializada de oficiais de justiça.

3.7.

O ambiente familiar é essencial para que as crianças prosperem. Na sua Estratégia para a Igualdade de Género 2020-2025, a Comissão assinala que a partilha equitativa das responsabilidades de assistência aos filhos entre os progenitores tem um papel essencial na inclusão social das crianças. A pandemia de COVID-19 teve um impacto socioeconómico desproporcionado nas mulheres, e cabe aos progenitores trabalharem em conjunto, mais do que nunca, como equipa, para defender o interesse superior da criança. A aplicação quer da Garantia para a Infância, quer da Estratégia sobre os Direitos da Criança deve ser associada a iniciativas fundamentais no âmbito do PEDS, como a transposição da Diretiva Equilíbrio Trabalho-Vida da UE.

3.8.

Existe uma grande variedade de modelos de família na UE, incluindo as famílias arco-íris com um ou mais membros LGBTIQ. Em conformidade com a Estratégia para a Igualdade de Tratamento das Pessoas LGBTIQ 2020-2025 da Comissão, as crianças de famílias arco-íris devem ser protegidas, principalmente em situações transnacionais em que, devido às diferenças existentes no direito da família entre Estados-Membros, os laços familiares podem deixar de ser reconhecidos quando estas famílias cruzam as fronteiras internas da UE. Em conformidade com a Estratégia sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência 2021-2030, as crianças com deficiência devem ter o mesmo direito a ser incluídas na comunidade, dispondo das mesmas escolhas de que usufruem todas as outras. Conforme previsto no Quadro Estratégico da UE para a Igualdade, a Inclusão e a Participação dos Ciganos para 2020-2030, é necessário abordar a mobilidade social ascendente das crianças ciganas. Importa promover desde tenra idade a prevenção da discriminação com base na orientação sexual, na identidade ou expressão de género e caráter sexual, na deficiência ou na origem étnica.

3.9.

A proposta relativa à Garantia prevê orientações e recursos para os Estados-Membros no apoio às crianças necessitadas, atendendo à forte correlação entre a exclusão social infantil e a falta de acesso a serviços essenciais. As crianças vulneráveis incluem i) as crianças sem-abrigo ou em situação de privação habitacional grave; ii) as crianças com deficiência; iii) as crianças com antecedentes migratórios; iv) as crianças pertencentes a minorias raciais ou étnicas (em especial os ciganos); v) as crianças que vivem em estruturas de cuidados alternativos (sobretudo institucionais); e vi) as crianças em situações familiares precárias.

3.10.

A Garantia é um quadro estratégico que orienta as ações dos 27 Estados-Membros através de planos de ação nacionais centrados na aplicação da Garantia que visam agregados familiares com crianças em risco de pobreza e exclusão social. A recomendação tem de ser adotada pelo Conselho da UE, seguindo-se um prazo de seis meses para os Estados-Membros elaborarem planos de ação nacionais no quadro da Garantia para a Infância. A proposta salienta que, embora a garantia do acesso aos serviços seja uma parte importante da luta contra a exclusão social infantil, terá de ser integrada numa abordagem mais ampla e num quadro favorável de política social e familiar.

3.11.

A estratégia formula recomendações para a ação a nível da UE e nacional, em diferentes políticas e programas de financiamento com impacto na saúde e no bem-estar das crianças, como os fundos da UE, a migração, os cuidados de saúde, a habitação, a educação, a economia, o ambiente e a transformação digital.

3.12.

A Comissão dará conta da evolução da estratégia a nível da UE e nacional no Fórum Europeu sobre os Direitos da Criança, que se realiza anualmente. No final de 2024, será realizada uma avaliação da estratégia, com a participação das crianças. A Comissão acompanhará a evolução da Garantia através de vários instrumentos, incluindo o Semestre Europeu.

3.13.

Os planos de ação nacionais devem incluir dados transparentes sobre a utilização de fundos da UE e nacionais, bem como um calendário de atividades. Os Estados-Membros podem utilizar fundos da UE para apoiar as suas ações, em especial o FSE+ e o Next Generation EU. O FSE+ tem um objetivo específico pertinente para este domínio e dedica fundos à luta contra a pobreza infantil. Segundo o novo regulamento, os Estados-Membros da UE com taxas médias de pobreza infantil superiores à média da UE em 2017-2019 (23,4 %) terão de afetar pelo menos 5 % dos seus recursos financeiros ao abrigo do FSE+ à luta contra a pobreza infantil.

4.   Observações na especialidade sobre a Estratégia da UE sobre os Direitos da Criança

4.1.

A Estratégia da UE sobre os Direitos da Criança é um quadro da União Europeia muito necessário para proteger os direitos da criança e capacitar as crianças. Ao passo que os adultos podem votar e têm acesso a vias de recurso e procedimentos formais para apresentar queixa se os seus direitos forem violados, as crianças estão muitas vezes excluídas de tais mecanismos. Por conseguinte, as crianças não têm voz no processo de tomada de decisões e os seus interesses podem permanecer invisíveis para os governos se não houver esforços conscientes e sistemáticos para proteger e promover esses interesses.

4.2.

A participação significativa das crianças, para ser o mais eficaz possível, implica mudanças generalizadas nas estruturas políticas e institucionais, assim como nas atitudes, nos valores e nas práticas culturais, no sentido do reconhecimento das crianças como cidadãs e partes interessadas. Para incentivar a participação das crianças e fazer ouvir as suas vozes e os seus anseios, é necessário capacitar tanto as crianças como os adultos, designadamente através de atividades não formais oferecidas por intervenientes da sociedade civil dentro e fora do contexto escolar. A Conferência sobre o Futuro da Europa constitui uma excelente oportunidade para materializar a participação das crianças, e o CESE também estudará formas de integrar progressivamente uma maior participação das crianças.

4.3.

Uma criança é um indivíduo e um membro de uma família e comunidade, com direitos e responsabilidades adequados à sua idade e fase de desenvolvimento, que goza do direito à qualidade de vida. Os pais e os cuidadores são fundamentais no desenvolvimento cognitivo, físico e emocional da criança. Uma relação afetiva e de apoio entre os pais (ou avós) e as crianças constitui um elemento essencial do bem-estar e da resiliência infantil. As relações entre irmãos também desempenham um papel fundamental no desenvolvimento das crianças. Esta relação é ainda mais importante para as crianças em cuidados alternativos, pelo que os irmãos e as irmãs devem poder permanecer juntos, a menos que tal seja contrário aos seus interesses. As políticas devem dar prioridade ao investimento nas crianças e nas suas famílias e assegurar a prestação de um apoio adequado e de elevada qualidade através de uma abordagem multigeracional sistémica destinada a ajudar as famílias a criarem os filhos com recurso a competências parentais positivas.

4.4.

A iniciativa, proposta na estratégia, que apoia o desenvolvimento e o reforço de sistemas integrados de proteção das crianças deve ser complementada por medidas que visem prevenir todas as formas de violência contra as crianças. A violência sofrida ou testemunhada na infância pode ter consequências duradouras no desenvolvimento físico, emocional e psicológico das crianças. É necessário um plano que integre todos os níveis de governo, da UE ao nível municipal, para prevenir e combater a violência contra crianças, e que lute contra a exposição a todas as formas de violência, maus-tratos e negligência, incluindo a violência física e psicológica, a violência sexual, a violência em linha e a violência doméstica, institucional e escolar. Importa abordar as vulnerabilidades que se intersetam, nomeadamente os riscos acrescidos para as raparigas, as crianças (principalmente do sexo feminino) com deficiência e as crianças que vivem em situações vulneráveis e agregados familiares propensos à violência. No caso de menores que sejam autores de atos de violência, é igualmente necessário, para além de processos judiciais adaptados às crianças, um contexto institucional adaptado às crianças para facilitar a sua plena reinserção social. As linhas de emergência e outros serviços geridos por ONG para apoiar as crianças e as famílias devem receber financiamento regular de modo a assegurar a sua sustentabilidade e eficácia.

4.5.

Os direitos da criança devem também ser abordados em esferas de influência fundamentais com impacto no bem-estar das crianças e das suas famílias. Os responsáveis políticos devem integrar de forma sistemática os direitos da criança na avaliação do impacto de uma iniciativa suscetível de afetar as crianças e os seus direitos. Neste contexto, quando estão em causa os direitos da criança nas relações com países terceiros, é importante atuar de forma rápida e eficaz sempre que necessário. Esta é a abordagem global adotada pela estratégia, que deve estar no centro do processo de aplicação e avaliação. Além disso, na aplicação da estratégia, os Estados-Membros devem poder aproveitar um conjunto de boas práticas já existentes noutros países que produziram resultados positivos.

4.6.

As crianças constituem o grupo menos responsável pelas alterações climáticas mas mais afetado pelo seu impacto. A estratégia menciona o impacto da crise ambiental e climática nas crianças, mas deve ir mais longe, assegurando que as políticas e a legislação em matéria de ambiente têm como ponto de partida a saúde física e mental das crianças, a fim de reduzir a sua exposição aos perigos ambientais. As crianças são mais sensíveis e vulneráveis do que os adultos aos riscos ambientais.

4.7.

É provável que a próxima geração assista a uma fusão total das suas vidas em linha e fora de linha. A estratégia adota a seguinte abordagem: integrar os direitos da criança no mundo digital de forma a orientá-los para o futuro. Atualmente, cada vez mais crianças utilizam dispositivos digitais, em idades cada vez mais precoces. Precisamos de ambientes digitais acessíveis que, por defeito, funcionem para todas as crianças, com uma regulação forte que permita uma Internet mais segura apoiada pela educação para a cidadania digital. As crianças têm direito a aceder a informações em linha provenientes de diversas fontes, sem estarem sujeitas a algoritmos inteligentes ou modelos de negócio publicitários que conduzem a uma informação de baixa qualidade.

4.8.

As crianças — desde tenra idade — podem tornar-se vítimas da ciberintimidação, que pode provocar problemas de saúde mental graves ou mesmo fatais. As crianças também podem ser vítimas de abusos sexuais em linha, como ocorreu, mais do que nunca, durante o período de confinamento, no qual se assistiu a um aumento significativo da pornografia infantil partilhada na Internet (11). Prevenir e combater qualquer forma de violência em linha é fundamental para a segurança das crianças na Internet.

4.9.

Todos os meios de comunicação social e anunciantes devem respeitar os direitos das crianças, em especial as mais pequenas, e as crianças devem ser protegidas enquanto consumidoras. Este aspeto é particularmente importante no que diz respeito a uma alimentação saudável que seja economicamente comportável e proveniente de fontes ambientalmente sustentáveis. A estratégia propõe o desenvolvimento de boas práticas e de um código de conduta voluntário para reduzir a comercialização de produtos com elevado teor de gordura, açúcar e sal destinados a crianças. É necessário elaborar políticas coerentes, efetuar controlos legislativos mais rigorosos das informações sobre os produtos e prestar informações sobre a segurança e a comercialização dos alimentos, com vista a limitar a publicidade a alimentos e bebidas pouco saudáveis.

5.   Observações na especialidade sobre a Garantia Europeia para a Infância

5.1.

A pobreza infantil, a privação, a discriminação e a exclusão são alguns dos obstáculos mais graves à aplicação dos direitos da criança; consequentemente, o CESE saúda a ênfase que a Garantia Europeia para a Infância coloca nestes domínios, associada a uma meta em matéria de pobreza, no âmbito do PEDS, que consiste em retirar pelo menos 5 milhões de crianças da pobreza até 2030. Trata-se de um passo em frente significativo, mas o CESE insta todos os Estados-Membros a apresentarem, nos seus planos de ação no quadro da Garantia para a Infância, metas qualitativas e quantitativas para além da meta da Comissão Europeia, tendo em consideração o impacto da COVID-19. Estes planos de ação devem ser associados a documentos jurídicos e estratégicos já existentes adotados no âmbito do acompanhamento previsto na CDC.

5.2.

O estudo sobre a viabilidade de uma Garantia para a Infância analisou as vantagens de uma abordagem dual que proporcionasse a todas as crianças, incluindo as mais necessitadas, acesso a serviços (12). Sempre que necessário, as crianças que enfrentam mais obstáculos ao acesso devem receber apoio adicional e direcionado para garantir o seu acesso através de mecanismos automáticos que evitem qualquer forma de estigmatização. Tal deve aplicar-se a todas as áreas de serviços destacadas na Garantia para a Infância, mediante uma abordagem abrangente e interseccional, a fim de assegurar que todas as crianças têm as mesmas oportunidades e o mesmo começo de vida, independentemente do seu contexto familiar ou das suas origens, ou das suas necessidades individuais, em plena consonância com a transição para serviços de acolhimento de boa qualidade, baseados na família e na comunidade.

5.3.

Na sua declaração conjunta, de 2020, sobre a prestação de serviços de acolhimento de crianças na UE, os parceiros sociais salientaram que todas as crianças têm direito ao acesso a educação e acolhimento na primeira infância de elevada qualidade e inclusivos, que lhes permitam um bom começo de vida, tendo em conta as metas de Barcelona e a sua futura revisão. Tal não implica qualquer obrigatoriedade: os pais devem ter liberdade para se pronunciarem sobre o que entendem ser o interesse do seu filho antes da idade do ensino obrigatório. Contudo, deve existir continuidade entre os cuidados prestados pelas famílias nos primeiros meses ou anos da vida de uma criança e uma educação e acolhimento na primeira infância profissionais e adaptados às necessidades individuais, à medida que as crianças entram no sistema educativo e os pais regressam ao mercado de trabalho ou à formação.

5.4.

No que diz respeito às crianças de grupos etários superiores (ou seja, dos 15 aos 18 anos), é necessário garantir a coerência entre a Garantia para a Infância e a Garantia para a Juventude, identificando possíveis sobreposições, assegurando uma afetação clara dos orçamentos e desenvolvendo medidas adequadas à idade e diferenciadoras nos planos de ação nacionais para apoiar as crianças e os pais e, dessa forma, assegurar transições harmoniosas entre a educação e o emprego. Tal inclui informações sem estereótipos para as crianças sobre o mundo do trabalho, a fim de as preparar para as realidades do emprego, e incentivos à participação das crianças nos estudos em ciência, engenharia e matemática, principalmente para as raparigas, incentivando também os rapazes a procurar profissões nos cuidados de saúde e no ensino.

5.5.

A desigualdade no acesso a cuidados de saúde é moral e socialmente injusta. Colide com o direito fundamental dos doentes ao mais elevado nível de saúde, incluindo saúde mental; além disso, tem um custo humano e é também oneroso do ponto de vista da sustentabilidade económica das despesas públicas. Além dos riscos para a saúde, observou-se uma diminuição do bem-estar emocional e mental das crianças como consequência da pandemia de COVID-19, tendo muitas crianças sofrido problemas de ansiedade, devido à falta de informação e à incerteza quanto à situação atual, sentido solidão ou tido ideias suicidas. Nestas situações é essencial prestar assistência médica de elevada qualidade e apoio à saúde mental.

5.6.

Em média, 5,4 % das crianças em idade escolar (dos 6 aos 16 anos) na Europa vivem em agregados familiares sem condições financeiras para pagar um computador ou uma ligação à Internet. Combater a pobreza infantil e familiar ao abrigo da Garantia para a Infância implica também lutar contra a privação digital. O indicador de privação material severa das estatísticas do rendimento e das condições de vida na UE (13) deve incluir pelo menos uma variável de privação digital. Um em cada quatro europeus não é capaz de iluminar, aquecer ou arrefecer adequadamente o seu domicílio — o que contribui para a morte de 100 mil pessoas todos os anos. De acordo com o relatório da Rede Europeia em matéria de Política Social, publicado no outono de 2020, a pobreza energética afeta não só os agregados familiares com baixos rendimentos mas também uma grande proporção de agregados com rendimentos médios num número significativo de Estados-Membros. A qualidade de vida e as opções de vida das crianças, assim como as suas condições de saúde, são afetadas pelo seu acesso à energia. Por uma questão tanto de justiça social como de justiça ambiental, a pobreza energética das crianças deve ser combatida no âmbito da Garantia para a Infância, em coordenação com as ações no quadro do princípio 20 do PEDS.

5.7.

Após a adoção célere da recomendação do Conselho, os planos de ação nacionais no âmbito da Garantia para a Infância devem ser alinhados com a abordagem em três vertentes prevista na Recomendação 2013/112/UE da Comissão (14) relativa ao investimento nas crianças (acesso a recursos adequados, acesso a serviços de qualidade economicamente comportáveis e o direito das crianças à participação), e devem ser elaborados em consulta com as crianças e as suas famílias e com as organizações da sociedade civil, reforçando o diálogo civil nacional, regional e local. As organizações que prestam serviços de apoio, quer sejam públicas ou sem fins lucrativos, devem ser incluídas nas partes interessadas que participam no processo da Garantia para a Infância, a par dos parceiros sociais ligados às áreas dos serviços, a fim de garantir condições de trabalho dignas e o acesso das crianças a serviços da máxima qualidade.

5.8.

O CESE acolhe favoravelmente a proposta de coordenadores nacionais da Garantia para a Infância, dotados de recursos e mandatos adequados, responsáveis por coordenar e acompanhar a aplicação da recomendação. Um sistema eficiente será essencial para introduzir mecanismos de coordenação intergovernamentais (aos níveis nacional e infranacional) para desenvolver, aplicar e acompanhar o bem-estar das crianças e reduzir a pobreza infantil e a exclusão social. É necessário assegurar que as abordagens integradas a nível nacional se traduzem em abordagens integradas a nível regional e local e que existem mecanismos eficazes para assegurar sinergias entre elas. Todos os indicadores pertinentes devem ser desagregados a nível local, sempre que possível, para permitir uma visão mais clara das disparidades territoriais e um melhor planeamento e acompanhamento da aplicação da recomendação.

5.9.

A pandemia de COVID-19 veio destacar desafios já existentes e necessidades imediatas para muitas famílias em situações precárias que, provavelmente, serão as mais afetadas pelas consequências que a pandemia produzirá a longo prazo no plano económico, educativo, sanitário e do bem-estar. As lacunas e a falta de coordenação entre sistemas foram agravadas. A deterioração das condições económicas e sociais aumentou o risco de abandono de crianças. O encerramento de estabelecimentos de ensino criou sérias dificuldades a muitos pais e cuidadores. O absentismo aumentou o risco de abandono escolar das crianças de grupos marginalizados e criou especiais dificuldades para as crianças com deficiência, incluindo deficiência intelectual. É essencial que os ambientes escolares proporcionem a todas as crianças, sempre que necessário, as mesmas oportunidades e apoio orientado.

5.10.

Os serviços familiares podem desempenhar um papel essencial de apoio às famílias para fazer face a esta situação (15). O apoio às famílias no seu papel fundamental passa por colmatar as lacunas na educação, na formação, na inclusão social, nas competências parentais, no bem-estar psicológico, no acesso a serviços, no emprego e nos rendimentos, olhando também para além da política social. Por conseguinte, o CESE reitera o seu apelo a um pacto para os cuidados na Europa, que assegure a prestação de serviços de maior qualidade para todos ao longo do ciclo de vida (16). A saúde e o bem-estar das crianças dependem de políticas familiares universais do século XXI, em que as crianças são tratadas de igual forma independentemente das estruturas familiares.

5.11.

O diálogo social contribui para o desenvolvimento de ferramentas práticas para tornar o acolhimento de crianças mais acessível e economicamente comportável, por exemplo criando fundos conjuntos através de convenções coletivas para apoiar projetos de acolhimento de crianças que abordem necessidades específicas dos progenitores trabalhadores em setores específicos, como os cuidados prestados a crianças com doenças e deficiências e os cuidados disponibilizados fora dos horários normais. Por conseguinte, é muito importante ter em conta a declaração conjunta dos parceiros sociais, que afirma que a escassez de serviços de acolhimento de crianças durante as férias e em períodos pós-escolares na Europa é um dos principais entraves ao trabalho a tempo inteiro para pais com filhos em idade escolar. A cooperação entre os serviços de acolhimento de crianças a tempo inteiro e a esfera sociocultural, como os clubes desportivos, as escolas de música e as iniciativas culturais, é fundamental. A atividade física e a educação cultural contribuem enormemente para o desenvolvimento físico, social, emocional e cultural das crianças.

Bruxelas, 7 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  JO C 44 de 11.2.2011, p. 34.

(2)  JO C 43 de 15.2.2012, p. 34.

(3)  JO L 59 de 2.3.2013, p. 5.

(4)  Resolução do PE (2015) sobre a redução das desigualdades, com especial atenção à pobreza infantil (JO C 366 de 27.10.2017, p. 19), n.o 46.

(5)  Proclamação Interinstitucional sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais.

(6)  Estudo sobre a viabilidade de uma Garantia para a Infância, relatório final (em inglês).

(7)  Resolução do PE (2021) sobre os direitos da criança tendo em vista a Estratégia da UE sobre os direitos da criança.

(8)  OMS Europa, «The rise and rise of interpersonal violence — an unintended impact of the COVID-19 response on families» [O aumento contínuo da violência interpessoal — um impacto indesejado da resposta à COVID-19 nas famílias] (2020).

(9)  UNICEF, «Supporting Families and Children Beyond COVID-19 — Social protection in high-income countries» [Apoio às famílias e às crianças para além da COVID-19 — proteção social em países de rendimento elevado] (2021).

(10)  UNICEF, “Children speak up about the rights and the future they want” [As crianças dão a sua opinião sobre os direitos e o futuro que desejam] (2021).

(11)  JO C 10 de 11.1.2021, p. 63.

(12)  Estudo sobre a viabilidade de uma Garantia para a Infância, relatório final.

(13)  Este indicador está a ser substituído por um indicador de privação material e social grave.

(14)  Recomendação da Comissão, de 20 de fevereiro de 2013, Investir nas crianças para quebrar o ciclo vicioso da desigualdade (JO L 59 de 2.3.2013, p. 5).

(15)  OCDE, «Looking beyond COVID-19: Strengthening family support services across the OECD» [Um olhar para além da COVID-19: reforço dos serviços de apoio familiar em toda a OCDE].

(16)  JO C 220 de 9.6.2021, p. 13.


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/66


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de ação sobre as sinergias entre as indústrias civis, da defesa e do espaço»

[COM(2021) 70 final]

(2021/C 374/11)

Relator:

Manuel GARCÍA SALGADO

Correlator:

Jan PIE

Consulta

Comissão Europeia, 26.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Competência

Comissão Consultiva das Mutações Industriais (CCMI)

Adoção em secção

17.6.2021

Adoção em plenária

8.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

195/0/7

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE considera que a iniciativa de promover as sinergias entre os instrumentos financiados pela UE e de facilitar a fertilização cruzada entre as indústrias civis, da defesa e do espaço pode reforçar a autonomia estratégica e a soberania tecnológica europeia, melhorar a segurança dos cidadãos, aprofundar o mercado único e estimular a competitividade, o crescimento económico e o emprego. Por conseguinte, apoia sem reservas os objetivos do plano de ação e solicita a execução célere, vigorosa e ambiciosa das 11 ações.

1.2.

Uma prioridade essencial do plano de ação deve ser a adoção de novas tecnologias digitais e outras tecnologias emergentes no domínio da defesa e da segurança. A fim de facilitar tal adoção, cabe garantir que as iniciativas civis pertinentes têm em conta, desde o início, os requisitos em matéria de defesa e segurança, o que contribuirá igualmente para otimizar o alcance e a eficiência dos instrumentos específicos de financiamento no domínio da defesa e da segurança.

1.3.

O CESE considera que o plano de ação não se deve limitar a identificar as oportunidades existentes de estabelecer sinergias. Deve também estabelecer a conduta a adotar para passar de uma abordagem ad hoc para uma mais sistemática que crie sinergias desde a conceção. Assim, insta a Comissão a introduzir novas formas de planeamento integrado em todos os programas pertinentes.

1.4.

Na opinião do CESE, a abordagem de associar competências, tecnologias e cadeias de valor pode resultar numa maior coerência e numa utilização mais estratégica do financiamento da UE. Insta, portanto, a Comissão a elaborar os programas da UE correspondentes.

1.5.

O CESE considera que o Observatório das Tecnologias Críticas previsto é um elemento essencial desta abordagem. A fim de promover a fertilização cruzada entre as indústrias civis, da defesa e do espaço, o observatório deve elaborar, em particular, uma taxonomia tecnológica comum aplicável a todos os setores.

1.6.

O CESE considera que o plano de ação constitui um dos pilares da estratégia industrial da UE. Neste contexto, é essencial que os roteiros tecnológicos sejam traduzidos com êxito em verdadeiras iniciativas emblemáticas industriais. Insta, portanto, a Comissão a se assegurar que o trabalho do observatório conduz a resultados concretos.

1.7.

O CESE tem para si que a plena participação das partes interessadas pertinentes, nomeadamente da indústria e das organizações de investigação e tecnologia, é fundamental para a execução adequada do plano de ação. Neste contexto, congratula-se com a intenção da Comissão de lançar ações específicas de apoio às empresas emergentes, PME e organizações de investigação e tecnologia para divulgar os programas e instrumentos da UE.

1.8.

É igualmente importante sensibilizar a opinião pública para os dividendos económicos e tecnológicos para os cidadãos do financiamento da UE no domínio da defesa e da segurança. Para tal, a Comissão deve levar a cabo campanhas de informação concretas que envolvam os representantes da sociedade civil.

1.9.

O CESE considera que as PME desempenham um papel fundamental no processo de execução do plano de ação. É, pois, importante garantir que têm acesso a todas as medidas previstas.

1.10.

Historicamente, as inovações no domínio da defesa têm sido adotadas pela produção civil. Hoje, as tecnologias emergentes são impulsionadas por investimentos consideráveis dos setores comerciais e a disseminação tecnológica flui cada vez mais na direção oposta, do setor civil para a defesa. Neste contexto, a digitalização assume particular importância. O plano de ação é fundamental para promover a integração de novas tecnologias digitais e outras tecnologias emergentes no ecossistema da defesa, da segurança e do espaço.

1.11.

Há que dar prioridade à contratação, retenção e promoção específicas das mulheres nos setores da defesa e da segurança, bem como à garantia de emprego de qualidade e qualificações para as jovens, a fim de fomentar a inclusão social e a igualdade de género num ecossistema ainda dominado pelo sexo masculino.

1.12.

A par dos direitos à igualdade de oportunidades e à não discriminação, o emprego de qualidade faz parte de um novo contrato social a celebrar com os cidadãos europeus.

1.13.

Cumpre integrar os aspetos sociais nos investimentos. Ou seja, o retorno do investimento não deve ser encarado apenas em termos económicos, mas também em função de aspetos-chave como o emprego, a criação de emprego e a qualidade do emprego. Cabe abrir as portas do espaço às PME, facilitando o seu acesso a fundos de resiliência, alargando as sinergias também na formação e qualificação dos trabalhadores das PME, bem como a sua mobilidade, reforçando os ecossistemas ao longo da cadeia de valor, não duplicando os recursos e partilhando-os com todos os países da UE.

1.14.

Da mesma forma, também no caso de investimentos de elevado valor estratégico, deve-se integrar a necessidade de realizar avaliações e um acompanhamento, com normas definidas em matéria de responsabilidade social das empresas.

1.15.

A obrigação de respeitar tais valores deve ser integrada nos investimentos a nível europeu, uma vez que nenhum domínio de investimento de fundos públicos deve ficar isento dessas disposições.

2.   Contexto

2.1.

A par da aeronáutica civil, o espaço, a defesa e a segurança constituem um ecossistema de alta tecnologia de importância estratégica para a Europa. Muitas empresas que se inserem nesse ecossistema desenvolvem atividades civis e de defesa e fazem parte de cadeias de abastecimento transfronteiras complexas, que incluem inúmeras empresas de média capitalização e PME. Esse ecossistema possui um longo histórico de sinergias entre os seus setores e com outros setores da indústria civil de alta tecnologia. O surgimento de novas tecnologias oferece um enorme potencial para futuras sinergias.

2.2.

Historicamente, as inovações no domínio da defesa têm sido adotadas pela produção civil. Hoje, as tecnologias emergentes são impulsionadas por investimentos consideráveis dos setores comerciais e a disseminação tecnológica flui cada vez mais na direção oposta, do setor civil para a defesa. Neste contexto, a digitalização assume particular importância. O plano de ação é fundamental para promover a integração de novas tecnologias digitais e outras tecnologias emergentes no ecossistema da defesa, da segurança e do espaço.

2.3.

O CESE considera que, para recuperar da crise da COVID-19 e fazer da revolução tecnológica em curso um sucesso, a UE necessita de uma «redefinição» industrial, assente na utilização de tecnologias digitais avançadas que fomentem o crescimento económico e criem um modelo económico mais resistente.

2.4.

O progresso tecnológico é um processo contínuo e dinâmico, contudo, ainda que ocorram de forma contínua, os avanços são difíceis de prever. Por conseguinte, é vital incentivar a convergência das tecnologias emergentes de dupla utilização através de projetos europeus de grande escala para estimular a inovação, a competitividade e a liderança tecnológica em setores de importância estratégica.

2.5.

Em outubro de 2020, o Conselho Europeu afirmou que alcançar a autonomia estratégica mantendo simultaneamente uma economia aberta é um objetivo fundamental da União e instou a UE a tornar-se mais autónoma no âmbito da indústria espacial e a reforçar a integração da base industrial da defesa. Estes objetivos são apoiados por diversas iniciativas importantes da UE, como o Fundo Europeu de Defesa (1), o Programa Espacial (2), o Programa Europa Digital, o Programa Horizonte Europa, a Estratégia para a União da Segurança e a nova estratégia industrial. O CESE considera que o plano de ação sobre as sinergias constitui um elo entre esses instrumentos e estratégias e insta a Comissão Europeia a empenhar-se ao máximo na implementação ambiciosa e eficaz das ações propostas.

2.6.

O retorno do investimento não deve ser encarado apenas em termos económicos, mas também em função de aspetos-chave como o emprego, a criação de emprego e a qualidade do emprego. O CESE sublinha, por conseguinte, a importância da educação e das competências para a execução bem-sucedida do plano de ação. Sem uma mão de obra altamente qualificada não há inovação nem competitividade, pelo que a adoção de novas tecnologias emergentes exigirá esforços adicionais de requalificação e de melhoria de competências. Além disso, as iniciativas destinadas a promover sinergias tecnológicas entre os setores devem ser acompanhadas de medidas que facilitem a mobilidade intersetorial dos trabalhadores.

2.7.

O CESE considera que a diversidade é um fator essencial para a inovação e insta a Comissão a utilizar o plano de ação para promover a inclusão social e a igualdade de género num ecossistema ainda dominado pelo sexo masculino. Os dados de investigação mostram que a diversidade conduz a melhores decisões. Por conseguinte, a presença de mulheres em todos os níveis de decisão é fundamental e deve ser promovida através de políticas de contratação, retenção e promoção. Além disso, o Comité insta a que sejam tomadas medidas para combater a segregação vertical e dar às jovens um primeiro incentivo para prosseguirem carreiras nestes setores, por exemplo, entusiasmando-as com o setor das CTEM numa fase precoce do seu percurso educativo.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O plano de ação da Comissão Europeia refere especificamente e enfatiza as «sinergias», que são consideradas «num ambiente internacional difícil, em que a UE necessita de manter a sua vantagem tecnológica e apoiar a sua base industrial». No novo contexto geopolítico, é especialmente importante apoiar os setores que contribuem para a autonomia estratégica e a soberania tecnológica da UE.

3.2.

O Quadro Financeiro Plurianual (QFP) da UE para 2021-2027 prevê um aumento significativo do investimento em tecnologias para setores estratégicos como a defesa, a segurança, a mobilidade, a saúde, a gestão da informação, a cibersegurança e o espaço. Com o Fundo Europeu de Defesa, inclui pela primeira vez um programa da UE especificamente dedicado a projetos de cooperação no domínio da defesa. Os programas pertinentes do QFP abrangem de forma complementar a investigação, o desenvolvimento, a demonstração, a prototipagem e a implantação (aquisição de produtos e serviços inovadores). Existe, assim, um enorme potencial de criação de sinergias entre os programas da UE. A plena exploração destas sinergias aumentaria consideravelmente o valor acrescentado dos investimentos europeus, devendo, por isso, constituir uma das principais prioridades da Comissão.

3.3.

A despesa pública com a investigação e a inovação (I&I) na Europa permanecem muito abaixo do nível dos EUA e da China. Os esforços ao nível da I&I são decisivos para a competitividade da indústria e a autonomia da Europa. Por conseguinte, as sinergias entre os programas da UE devem otimizar o retorno do investimento, mas não substituir o financiamento no domínio da I&I. Os Estados-Membros também devem intensificar os seus esforços e não utilizar o investimento europeu como pretexto para reduzir as suas despesas em setores estratégicos. É igualmente importante a sincronização entre os programas de I&I da UE, por exemplo, no âmbito do Semestre Europeu, e nacionais, como forma de garantir a utilização otimizada dos recursos.

3.4.

As novas tecnologias digitais e outras tecnologias emergentes são impulsionadas por enormes investimentos de setores comerciais. Ao mesmo tempo, também são elementos facilitadores indispensáveis no que toca às capacidades de defesa e segurança. A adoção dessas tecnologias na defesa e na segurança deve, por isso, ser uma prioridade do plano de ação. Deve assegurar que os programas civis como a Iniciativa Europeia para a Nuvem, a Aliança Europeia para o Hidrogénio Limpo e a Iniciativa do Processador Europeu têm em conta os requisitos de defesa e segurança desde o início.

3.5.

As sinergias tecnológicas são sobretudo possíveis em baixos níveis de maturidade tecnológica e no caso dos componentes e subsistemas. Em domínios digitais como a inteligência artificial, a computação de alto desempenho e as cadeias de blocos, muitos dos modelos e teorias subjacentes são comuns a diversos setores. A partilha de esforços de investigação a esses níveis acelerará o desenvolvimento de soluções específicas no setor e libertará recursos para a sua implantação. Uma nova abordagem de parceria para a governação entre a indústria, as entidades públicas, os parceiros sociais e outras partes interessadas deverá garantir uma transição justa dos ecossistemas, no âmbito da sua transformação digital e ecológica. Importa dar prioridade à procura de sinergias entre os ecossistemas e setores que enfrentam os maiores desafios para alcançar os objetivos de resiliência e sustentabilidade, nas suas três dimensões: ambiental, social e de governação. Cabe promover a integração das PME em agrupamentos transeuropeus, interdisciplinares e intersetoriais, ligando as cadeias de valor essenciais dos ecossistemas aeroespacial e da defesa, em especial, à mobilidade, à indústria automóvel e aos transportes, para além da saúde. Importa acompanhá-los, a fim de enfrentar os choques e as vulnerabilidades, ou diversificá-los, interligando-os a novos parceiros locais e transfronteiriços, através do lançamento de planos de competitividade sustentável.

3.6.

As sinergias na fase de investigação não eliminarão as diferenças entre as aplicações setoriais específicas. Devido à diversidade de exigências dos consumidores, o 5G no setor da defesa não será como o 5G no setor comercial, do mesmo modo que uma nuvem de combate será diferente de uma nuvem comercial, mesmo que os componentes tecnológicos de base sejam semelhantes. As indústrias da defesa, da segurança e do espaço são indispensáveis para a adaptação e integração das tecnologias emergentes em soluções setoriais específicas.

3.7.

Na opinião do CESE, a execução do plano de ação deve também ter em conta as diferenças entre os mercados da defesa, da segurança, do espaço e civis. Uma vez que os modelos de negócios e os quadros regulamentares não são iguais, deve procurar-se um ponto de equilíbrio entre a abertura dos resultados da investigação, os direitos de propriedade intelectual, as salvaguardas para os investimentos de alto risco, a garantia do retorno económico, etc. Nesse sentido, as tecnologias emergentes também trarão novos desafios, nomeadamente no que diz respeito à normalização e à proteção dos dados.

4.   Observações na especialidade

4.1.

O CESE considera que o plano de ação deve ter em conta as iniciativas pertinentes em matéria de segurança e defesa geridas pelos Estados-Membros. Como, por exemplo, as orientações estratégicas sobre segurança e defesa, a análise anual coordenada da defesa, a cooperação estruturada permanente e o Pacto sobre a Vertente Civil da política comum de segurança e defesa.

4.2.

O CESE considera igualmente importante ter em conta a cooperação entre a UE e a OTAN, garantindo, em especial, a interoperabilidade entre os recursos de ambas as organizações, inclusive no domínio das comunicações encriptadas e seguras. Os serviços da Comissão continuarão a trabalhar estreitamente com o Serviço Europeu para a Ação Externa e com a Agência Europeia de Defesa, cujas atividades adequadas serão tidas em conta na procura de sinergias e de fertilização cruzada.

4.3.

O CESE congratula-se com a importância que o plano de ação atribui aos projetos emblemáticos. Ao reunir empresas de todas as dimensões, de diferentes setores e de toda a UE, esses projetos emblemáticos promovem a cooperação transfronteiras e podem tornar-se quadros eficazes para a utilização coerente de instrumentos da política industrial. Para aplicar eficazmente o Pilar Europeu dos Direitos Sociais no âmbito das transições digital e ecológica e assegurar um impacto estrutural de longo prazo na implantação dos mecanismos de competitividade sustentável associados ao ciclo do Semestre Europeu, o CESE recomenda que as ações propostas sejam acompanhadas de um sistema de governação multilateral, a fim de garantir a coerência entre as diversas ações e envolver eficazmente todas as partes interessadas pertinentes.

4.4.

O CESE incentiva a Comissão a aplicar o plano de ação tanto numa abordagem de longo prazo como de curto prazo: numa abordagem de curto prazo, deve promover a fertilização cruzada entre as iniciativas existentes financiadas pela UE. O próprio plano de ação enumera um amplo leque de iniciativas em vários domínios, do espaço à segurança marítima, que parecem promissoras a este respeito.

4.5.

Ao mesmo tempo, o CESE considera que o plano de ação não se deve limitar a identificar as oportunidades existentes de estabelecer sinergias. Deve também estabelecer a conduta a adotar para passar de uma abordagem ad hoc para uma mais sistemática que crie sinergias desde a conceção. O plano de ação contém vários elementos que podem contribuir para que tal se concretize: a vigilância tecnológica intersetorial, o planeamento das capacidades, a estreita coordenação dos programas de financiamento, roteiros tecnológicos, a avaliação das cadeias de valor, etc. Para que sejam eficazes e tenham um impacto estrutural de longo prazo, o CESE recomenda que as ações propostas sejam acompanhadas de novas estruturas de governação e dos processos de planeamento correspondentes em todos os programas pertinentes. A fim de garantir a coerência entre as diversas ações e envolver eficazmente todas as partes interessadas pertinentes.

4.6.

O CESE considera que a transparência é igualmente importante. A escolha das tecnologias, dos roteiros e dos projetos emblemáticos a serem apoiados deve ser compreensível e basear-se em critérios objetivos. O relatório de progresso previsto de dois em dois anos deve definir indicadores-chave de desempenho para aferição do sucesso e incluir revisões intercalares para melhorar o processo e pôr termo a ações que não produzam valor. Os aspetos jurídicos e regulamentares também devem ser contemplados no processo de avaliação, a fim de identificar se, e em que casos, a base jurídica e as disposições dos programas da UE teriam de ser alteradas de modo a promover e explorar sinergias.

4.7.

Analisando cada ação individualmente, o CESE é da seguinte opinião:

4.7.1.

AÇÃO N.o 1: «antes do final de 2021, a Comissão apresentará uma proposta para reforçar a identificação precoce e prospetiva das necessidades e soluções no domínio da segurança interna e da aplicação da lei, promovendo abordagens centradas nas capacidades em todos os setores da segurança, com base nas melhores práticas dos setores da defesa e do espaço». Do ponto de vista do CESE, esta ação é de saudar, pois é fundamental uma abordagem que se baseie nas capacidades para ultrapassar a atual fragmentação do mercado da segurança europeu e permitir que os utilizadores finais da segurança antecipem ameaças à segurança atuais e futuras. Também o processo de planeamento das capacidades previsto para a gestão integrada das fronteiras é de saudar, mas o seu estabelecimento deve ser consideravelmente acelerado para ter impacto nos programas de despesas conexos antes do final do atual QFP. Para fazer face à diversidade de utilizadores finais no setor da segurança e conferir alguma estabilidade aos processos de planeamento, o CESE recomenda a definição, a nível da UE, de missões de segurança suficientemente amplas para respeitar os requisitos diversos e em evolução em matéria de capacidades. A abordagem prevista deve ser estratégica e de longo prazo, mas também suficientemente flexível para abranger possíveis eventos de baixa probabilidade, mas de grande impacto (como uma pandemia), e reagir ao surgimento repentino de ameaças inesperadas.

4.7.2.

AÇÃO N.o 2: «antes do final de 2021, e tendo em vista os programas de trabalho para 2022, a Comissão continuará a reforçar o seu processo interno para promover as sinergias entre as indústrias do espaço, da defesa e as indústrias civis conexas, melhorando a coordenação dos programas e dos instrumentos da UE e lançando ações para facilitar o acesso ao financiamento». O CESE considera que esta ação constitui um dos pilares do plano de ação. A UE deve explorar potenciais sinergias horizontalmente entre os programas de I&I (por exemplo, o Fundo Europeu de Defesa e o Programa Horizonte Europa), a fim de promover a fertilização cruzada, mas também verticalmente entre programas de I&I e de implantação (por exemplo, a investigação no domínio da segurança e o Fundo para a Segurança Interna), a fim de promover a aceitação dos resultados de investigação pelo mercado. As diferenças nas regras e condições dos programas correm o risco de se tornarem obstáculos às sinergias e exigirão uma ponderação cuidadosa de questões jurídicas e técnicas, como os direitos de propriedade intelectual. Será especialmente importante estabelecer, no seio da Comissão, novas formas de programação e planeamento integrados para garantir que as sinergias ocorrem não por coincidência, mas por conceção.

4.7.3.

AÇÃO N.o 3: «a partir do segundo semestre de 2021, a Comissão anunciará ações específicas para as empresas em fase de arranque, as PME e as OIT, a fim de aumentar a sensibilização para os programas e os instrumentos da UE que oferecem oportunidades de financiamento, prestam serviços de aceleração empresarial, apresentam soluções inovadoras e facilitam a entrada no mercado da defesa, da segurança, do espaço ou noutros mercados civis relevantes». O CESE reconhece que as empresas em fase de arranque e as PME são vetores cruciais da inovação e desempenham um papel importante nas sinergias, uma vez que operam frequentemente em setores diferentes e transpõem a linha que separa o setor civil do setor da defesa. Ao mesmo tempo, não têm, geralmente, capacidade para executar projetos complexos nem poder financeiro para operar de forma independente em mercados puramente públicos e altamente regulamentados, com necessidades muito específicas dos clientes. Por esse motivo, carecem de vínculos fortes com elementos integradores dos sistemas para estimular a inovação no mercado. O plano de ação deve, assim, apoiar a integração de empresas em fase de arranque e PME em cadeias de abastecimento transfronteiras e promover a ligação entre as organizações de investigação e tecnologia e a indústria.

4.7.4.

AÇÃO N.o 4: «a Comissão desenvolverá roteiros tecnológicos para impulsionar a inovação em matéria de tecnologias críticas para os setores da defesa, do espaço e os setores civis conexos [e estimular a cooperação transfronteiriça], utilizando, de uma forma sinergética, todos os instrumentos relevantes da UE. Estes roteiros basear-se-ão numa avaliação bienal por um novo Observatório das Tecnologias Críticas da Comissão. Os roteiros podem conduzir ao lançamento de novos projetos emblemáticos.» O CESE apoia plenamente a criação de um observatório e a sua missão de desenvolver roteiros tecnológicos que reúnam a defesa, o espaço e as indústrias civis conexas. Saúda também a intenção de incluir cadeias de valor na avaliação, uma vez que estas abrem caminho para a utilização coerente e combinada de instrumentos da política industrial, a fim de promover a liderança tecnológica em setores estratégicos. Ao mesmo tempo, o sucesso desta ação depende de vários fatores. O observatório terá de:

desenvolver vínculos fortes com processos de planeamento de capacidades;

acompanhar ativamente as tendências tecnológicas em todo o mundo e detetar, o mais cedo possível, interrupções e avanços tecnológicos e as tecnologias disruptivas;

estabelecer objetivos, regras e critérios para a avaliação de tecnologias;

desenvolver uma taxonomia comum aplicável a todos os setores relevantes, para garantir que o espaço, a defesa e a segurança falam a mesma «linguagem tecnológica».

Finalmente, é necessário garantir que os roteiros gerados pelo observatório não redundam em exercícios teóricos, mas são efetivamente implementados em programas de trabalho e projetos emblemáticos. Para o efeito, o CESE recomenda que o observatório também aproveite os ensinamentos colhidos no âmbito de processos semelhantes existentes, como o Grupo de Trabalho Conjunto (Agência Europeia de Defesa-Agência Espacial Europeia-Comissão Europeia), no que diz respeito a tecnologias espaciais críticas.

4.7.5.

AÇÃO N.o 5: «antes do final de 2022, a Comissão, em estreita cooperação com outras partes interessadas importantes, apresentará um plano para promover a utilização das normas híbridas civis/de defesa existentes e a elaboração de novas normas». O CESE considera que as normas são um importante instrumento para moldar os mercados. A utilização de normas híbridas será pertinente nos casos em que assim se justifique, e os exemplos de normas químicas, biológicas, radiológicas e nucleares ou do espaço de dados de segurança são, de facto, promissores. No entanto, o desafio reside na lentidão do processo de normalização das normas técnicas, que parece ter cada vez mais dificuldades em acompanhar o ritmo da evolução das novas inovações. Os requisitos das normas também devem fazer parte dos convites à apresentação de propostas do Programa Horizonte Europa para garantir que as novas inovações podem realmente ser utilizadas pelos utilizadores finais.

4.7.6.

AÇÃO N.o 6: «no primeiro semestre de 2022, a Comissão, em cooperação com o Conselho Europeu da Inovação e com outras partes interessadas, lançará uma “incubadora de inovação” para apoiar as novas tecnologias e moldar a inovação de dupla utilização. A Comissão apoiará ainda as redes de inovação transfronteiras no domínio da defesa que testem a relevância das tecnologias do setor civil e que apoiem a inovação responsável nas cadeias de valor da indústria da defesa. Estas ações darão igualmente resposta à atual fragmentação do panorama da inovação nos domínios civil e da defesa, à escassez de competências, bem como aos objetivos de igualdade e de inclusão». O CESE considera que a criação de uma incubadora de inovação de dupla utilização e de redes de inovação no domínio da defesa é interessante e merece ser explorada. Neste contexto, há que prestar especial atenção à rápida obsolescência de muitas tecnologias comerciais, o que muitas vezes constitui um forte obstáculo à sua utilização em aplicações de defesa. O CESE incentiva ainda a Comissão a promover ativamente as transferências intersetoriais de tecnologias com medidas de apoio de acompanhamento administrativo e financeiro. Uma vez que abre novos caminhos, o CESE recomenda um acompanhamento ativo e uma avaliação regular desta ação, a fim de medir o seu êxito.

4.7.7.

AÇÃO N.o 7: «a partir de junho de 2021, a Comissão, em conjunto com os Estados-Membros, lançará o Centro de Competências em matéria de Cibersegurança, afetando os recursos necessários dos programas e dos instrumentos relevantes da UE. A Comissão procurará reforçar as sinergias e obter benefícios de fora para dentro e de dentro para fora entre o trabalho do Centro, do FED e do Programa Espacial da UE em matéria de cibersegurança e de ciberdefesa, a fim de reduzir as vulnerabilidades e criar eficiências». O CESE considera que as atividades abrangidas pela ação 7 são essenciais para a soberania da Europa em domínios tecnológicos estratégicos. A cibersegurança e a ciberdefesa são escolhas óbvias para procurar sinergias entre a segurança, a defesa e o espaço, devendo ser-lhes conferida a máxima prioridade. Neste contexto, a cooperação estreita entre as autoridades públicas e o setor privado assume particular importância.

4.7.8.

AÇÃO N.o 8: «a partir do primeiro semestre de 2022, para apoiar as tecnologias disruptivas, a Comissão apresentará formas inovadoras de financiamento para promover a participação dos intervenientes não tradicionais, atrair as empresas em fase de arranque e promover a fertilização cruzada de soluções, aproveitando as oportunidades oferecidas pelos programas e pelos instrumentos da UE, incluindo o PED e o FED». O CESE acolhe favoravelmente o apoio a tecnologias potencialmente disruptivas como complemento lógico de uma abordagem mais tradicional assente nas capacidades e propõe relacioná-la mais estreitamente com o observatório tecnológico previsto. Apoia também o recurso ao Fundo Europeu de Defesa e ao Programa Europa Digital para tais atividades e recomenda o desenvolvimento, a médio prazo, de uma agência europeia de pleno direito análoga à DARPA (3).

4.7.9.

AÇÃO N.o 9: «Tecnologias de drones da UE». Os drones (4) apresentam inúmeros exemplos de tecnologias utilizadas na aeronáutica comercial e no espaço, na segurança e na defesa. A fertilização cruzada é essencial na tecnologia de drones, e a inserção de drones civis e militares na indústria aeroespacial também tem uma dupla finalidade. Por conseguinte, o CESE apoia plenamente o lançamento de um projeto emblemático de drones como uma escolha óbvia e recomenda que este assente num roteiro tecnológico específico que privilegie os componentes tecnológicos pertinentes de acordo com a sua relevância para a autonomia estratégica e a soberania tecnológica europeia.

4.7.10.

AÇÃO N.o 10: «Sistema global de comunicações seguras baseado no espaço da UE». O CESE considera este projeto emblemático muito importante, visto que abrange elementos essenciais da autonomia e da soberania tecnológica europeia. Ao mesmo tempo, não entende exatamente de que forma este projeto criará ou beneficiará de sinergias com o setor de defesa. Considera que uma opção para obter mais sinergias seria a inclusão de mais carga útil a bordo dos satélites deste sistema, tais como sensores destinados à vigilância espacial, o que criaria sinergias entre os dois projetos emblemáticos relacionados com o espaço.

4.7.11.

AÇÃO N.o 11: «Gestão do tráfego espacial». A gestão do tráfego espacial é fundamental para a segurança de ativos e infraestruturas baseados no espaço, que são cada vez mais importantes para o funcionamento das sociedades modernas. O CESE apoia, por isso, o lançamento de um projeto emblemático especificamente dedicado à gestão do tráfego espacial. Ao mesmo tempo, o CESE receia que esta iniciativa se limite a aspetos regulamentares e de normalização, que, embora importantes, não são suficientes. Por conseguinte, a Comissão deve também considerar a criação de um mercado para os dados de vigilância espacial (como é o objetivo nos EUA). A fim de desenvolver uma abordagem europeia de gestão do tráfego espacial credível, a Europa deve também melhorar significativamente as suas capacidades de vigilância espacial (novos sensores, capacidade de análise e cálculo, e por diante).

Bruxelas, 8 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Regulamento (UE) 2021/697 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2021, que cria o Fundo Europeu de Defesa e revoga o Regulamento (UE) 2018/1092 (JO L 170 de 12.5.2021, p. 149).

(2)  Comunicação sobre a política espacial [COM(2021) 208 de 21 de abril de 2021].

(3)  A Agência de Projetos de Investigação Avançada de Defesa (DARPA) é uma agência de I&D, sob a tutela do Ministério da Defesa dos Estados Unidos, responsável pelo desenvolvimento de tecnologias emergentes.

(4)  JO C 129 de 11.4.2018, p. 51.


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/73


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Revisão da Política Comercial — Uma política comercial aberta, sustentável e decisiva»

[COM(2021) 66 final]

(2021/C 374/12)

Relator:

Timo VUORI

Correlator:

Christophe QUAREZ

Consulta

Comissão Europeia, 26.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Competência

Secção das Relações Externas

Adoção em secção

16.6.2021

Adoção em plenária

8.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

208/2/1

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com o lançamento da nova estratégia de política comercial da UE. Para além da pandemia, o comércio mundial e a economia europeia proporcionam oportunidades e comportam riscos. Este é o momento certo para repensar as regras comerciais a nível mundial e da UE. Tendo em vista a conceção dos instrumentos adequados, a UE terá primeiro de analisar e quantificar as transformações do comércio, distinguindo entre as alterações temporárias relacionadas com a COVID-19 e as mudanças permanentes.

1.2.

O CESE subscreve o princípio da promoção de uma política comercial «aberta, estratégica e decisiva» como forma de melhorar o acesso ao mercado e criar condições de concorrência equitativas. Na prática, deve impulsionar o crescimento sustentável, a competitividade, o emprego digno e opções de consumo melhores na Europa. Para lograr o desenvolvimento económico positivo, é necessário conjugar adequadamente as políticas externas e as políticas internas, sendo a política comercial apenas uma parte da solução (1).

1.3.

O CESE concorda que a prioridade principal é modernizar a Organização Mundial do Comércio (OMC), dado o seu papel central na criação de uma matriz multilateral eficaz em prol de uma agenda comercial moderna que contemple as questões ambientais e sociais. Por conseguinte, a UE deve impulsionar reformas ambiciosas da OMC e promover a modernização da agenda da OMC, eliminando tabus (ou seja, os aspetos sociais do comércio) e superando de forma sustentável os desafios atuais e futuros. Para o efeito, o CESE insta a UE e os seus Estados-Membros a estabelecerem uma cooperação estratégica com os principais parceiros comerciais sobre as questões multilaterais prioritárias (2).

1.4.

O CESE considera que a UE deve promover regimes comerciais multilaterais e bilaterais mais adequados, bem como normas relacionadas com os desafios colocados pelas alterações climáticas e sociais, a agricultura, o combate à corrupção, as questões económicas e fiscais, a digitalização, a defesa ambiental, a biodiversidade, a economia circular e a segurança sanitária (3).

1.5.

O CESE apela há muito para que a sustentabilidade seja uma das forças motrizes da política comercial, tendo em conta o papel fundamental que o comércio pode desempenhar para realizar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas. Assim, congratula-se com a ênfase da política comercial da UE na sustentabilidade e com o facto de o Acordo de Paris passar a ser um elemento essencial dos futuros acordos de comércio e investimento. O CESE reitera o seu apelo para que esse caráter essencial seja alargado às convenções essenciais da Organização Internacional do Trabalho (OIT) (4).

1.6.

O CESE apela para o reforço ambicioso dos capítulos sobre comércio e desenvolvimento sustentável nos acordos bilaterais de comércio e investimento da UE, bem como para a sua aplicabilidade efetiva. A futura revisão relativa aos capítulos sobre comércio e desenvolvimento sustentável (5) é parte integrante da estratégia comercial da UE.

1.7.

O CESE apoia plenamente o reforço da sustentabilidade nas cadeias de valor mundiais (6). A política comercial da UE deve apoiar o trabalho a nível internacional destinado a criar condições de concorrência equitativas nas cadeias de abastecimento mundiais, desenvolvendo os instrumentos de combate à corrupção, às violações dos direitos humanos e às infrações ambientais, laborais e sociais. O CESE considera que a UE deve criar legislação ambiciosa, por exemplo, no que respeita ao dever de diligência nas cadeias de abastecimento e à sustentabilidade nos contratos públicos.

1.8.

O CESE lamenta a omissão do papel crucial da sociedade civil para o comércio e salienta a necessidade de reforçar a cooperação com a sociedade civil, desde a conceção até à monitorização dos instrumentos e acordos comerciais. Solicita o restabelecimento do grupo de peritos sobre acordos comerciais, que demonstrou, de forma ímpar, o tão necessário empenho profundo e sistemático em relação a questões comerciais específicas. Salienta igualmente a necessidade de reforçar os grupos consultivos internos, pilares essenciais do acompanhamento institucional dos acordos de comércio livre modernos.

1.9.

O CESE assinala que a UE deve compreender melhor a importância das cadeias de valor mundiais e o seu impacto nas empresas e nas pessoas. A diversificação das fontes de abastecimento pode ser um instrumento de resiliência mais eficaz do que a sua restrição. Também seria útil criar mecanismos de acompanhamento ao nível das empresas e dos contratos públicos, a fim de evitar a concentração das fontes de abastecimento.

1.10.

O CESE apoia o reforço da resiliência das cadeias de valor, nomeadamente através da sua sustentabilidade. A economia da UE depende das cadeias de abastecimento mundiais, e a «autonomia da UE» deve ter em conta essa realidade. A crise da COVID-19 demonstrou a necessidade de reforçar a autonomia da UE em domínios essenciais e estratégicos, e é importante que a UE avalie primeiro as suas vulnerabilidades. O CESE apoia o trabalho da UE em prol do dever de diligência obrigatório nas cadeias de aprovisionamento como forma de reforçar a sua resiliência, ajudando as empresas a identificar os riscos relacionados com as normas sociais e ambientais. Neste contexto, o CESE apoia os esforços no sentido de um novo Tratado das Nações Unidas sobre empresas e direitos humanos e uma convenção da OIT sobre o trabalho digno nas cadeias de abastecimento mundiais (7).

1.11.

O CESE salienta a importância de beneficiar de um amplo leque de acordos de comércio livre da UE que reflitam os valores da UE e as normas internacionais. Nos casos em que a OMC não pode agir ou defender totalmente os interesses da UE, a UE deve contar com tais acordos celebrados com as economias principais e emergentes no comércio internacional. Embora disponha de uma vasta rede, mais de 60 % do comércio externo da UE ainda se realiza à margem dos acordos preferenciais, com base nas regras gerais da OMC.

1.12.

O CESE apela à UE para que assegure acordos de comércio livre ambiciosos da UE com parceiros comerciais, nomeadamente na Ásia e na América. Ao estabelecer parcerias estratégicas com os países vizinhos da UE e os países do alargamento, incluindo os países mediterrânicos e africanos, o CESE destaca a importância estratégica de aprofundar as parcerias, em particular com os EUA. Além disso, deve continuar a melhorar as relações comerciais e a assegurar condições de concorrência equitativas com a Ásia e a América Latina.

1.13.

O CESE assinala que a UE deve assegurar um processo mais harmonioso entre a negociação e a ratificação dos acordos de comércio e investimento da UE, a bem da sua reputação enquanto parceiro comercial. Desde o início do mandato e ao longo das negociações (8), a Comissão deve colaborar com o Parlamento Europeu e a sociedade civil, nomeadamente através do CESE, de modo a ter em conta as preocupações existentes e assegurar processos de ratificação mais harmoniosos através da abordagem das mesmas.

1.14.

O CESE congratula-se com as ações concretas destinadas a aplicar, fazer avançar e garantir a execução efetiva dos acordos de comércio livre da UE em vigor. Estes constituem um instrumento valioso para a UE apoiar o fluxo de bens e serviços nas cadeias de abastecimento mundiais e assegurar o reforço da sua resiliência. O alto responsável pela execução da política comercial deve reforçar a coerência da aplicação e da execução dos acordos da UE e da OMC, nomeadamente dos capítulos sobre comércio e desenvolvimento sustentável.

1.15.

O CESE congratula-se com a determinação da UE em defender unilateralmente os seus valores e compromissos comerciais se todos os outros meios fracassarem. A UE deve também ter em conta todas as repercussões políticas e económicas possíveis de tais decisões.

1.16.

O CESE concorda que a UE continue a utilizar a sua Ajuda ao Comércio para ajudar os países em desenvolvimento a aplicarem os acordos de comércio e apoiar o cumprimento de regras e normas, especialmente em relação ao desenvolvimento sustentável.

1.17.

O CESE sublinha a necessidade de assegurar condições de concorrência equitativas para o setor agrícola da UE. O acesso dos produtos agrícolas europeus ao mercado de países terceiros deve ser mais adequado, e os produtos importados de países terceiros que sejam também importadores de produtos da UE devem cumprir as normas europeias em matéria de sustentabilidade e segurança alimentar. Os acordos de comércio livre da UE devem respeitar as normas sanitárias e fitossanitárias da UE e aderir ao princípio da precaução (9).

1.18.

O CESE congratula-se com a atenção especial que a nova política comercial confere às pequenas e médias empresas (PME), a todos os níveis (10). Reitera o seu apelo para que se envidem mais esforços a fim de comunicar o impacto do comércio internacional nas empresas e nas pessoas.

2.   Observações na generalidade

2.1.

O CESE congratula-se com o pedido da Comissão a favor da partilha de pontos de vista e ideias sobre as formas de assegurar que a nova política comercial da UE é favorável às empresas e às pessoas. Concorda, em particular, com a urgência desta revisão, dado o papel concreto que o comércio pode desempenhar na recuperação da pandemia de COVID-19. O CESE considera o comércio uma prioridade e, por esse motivo, contribuiu exaustivamente para a ampla consulta pública (11).

2.2.

O comércio internacional é vital para a economia europeia e a sua população. Permite manter mais de 35 milhões de postos de trabalho na UE, dos quais 45 % dependem de investimentos estrangeiros. As PME representam mais de 85 % de todos os exportadores da UE e o comércio internacional corresponde a 43 % do produto interno bruto da UE. A UE é o mercado de consumo maior e mais apelativo do mundo devido ao seu mercado único, que conta com 450 milhões de consumidores e um PIB per capita de 25 000 EUR. A UE é líder mundial no comércio agroalimentar e um dos principais parceiros comerciais de mais de 80 países. Tendo em conta todos estes elementos no seu conjunto, a UE é o maior operador comercial no plano internacional e a sua economia está profundamente interligada com o resto do mundo.

Importância do comércio internacional aberto e inclusivo para a economia e a população da Europa

2.3.

O CESE apoia a UE na prossecução da sua missão principal no âmbito da política comercial: a abertura dos mercados a bens, serviços, investimentos e contratos públicos europeus, reduzindo e eliminando os obstáculos que não se justificam ao comércio nos países terceiros e criando condições de concorrência equitativas através de regimes comerciais internacionais e bilaterais. Além disso, o CESE considera essencial que a política comercial promova os valores da UE e as normas internacionais, impulsionando o desenvolvimento sustentável, combatendo as alterações climáticas e reforçando a segurança.

2.4.

O CESE congratula-se com o facto de a estratégia comercial responder às preocupações de algumas partes interessadas, manifestadas quando da consulta pública. No entanto, carece de reflexões sobre as formas de melhorar a participação da sociedade civil na política comercial (12). O CESE sublinha a necessidade da cooperação contínua com a sociedade civil a nível nacional e da UE, além da revisão do diálogo com a sociedade civil já estabelecido, a fim de assegurar que a política comercial traz valor acrescentado à vida quotidiana.

2.5.

A crise da COVID-19 revelou as vulnerabilidades do sistema comercial mundial e dos trabalhadores das cadeias de abastecimento (13) face a uma crise sanitária. A perda de controlo das cadeias de valor e a consciencialização da dependência industrial da UE suscitaram questões sobre as interdependências no âmbito da saúde e do comércio.

3.   Observações na especialidade

Utilização eficiente da «autonomia estratégica aberta»

3.1.

O CESE apoia a ideia da autonomia estratégica aberta da UE. A UE deve adotar uma abordagem estratégica com vista a manter a abertura e condições de concorrência equitativas, mediante políticas comerciais e de investimento modernas. Deve promover um comércio aberto e justo assente em regras e proteger as empresas, os trabalhadores e os consumidores contra todas as práticas comerciais desleais.

3.2.

O reforço da resiliência e da sustentabilidade constitui uma escolha estratégica para a UE. É necessário encontrar o equilíbrio certo entre a abertura e a autonomia da economia europeia. Só a sustentabilidade trará resiliência.

Como reforçar a resiliência e a sustentabilidade das cadeias de valor

3.3.

A política comercial da UE pode desempenhar um papel crucial na recuperação pós-COVID-19, dada a profunda integração da nossa economia nas cadeias de valor mundiais.

3.4.

A UE deve avaliar cuidadosamente a sua dependência em relação ao mundo e às cadeias de abastecimento mundiais. As importações podem gerar resiliência através da diversificação das fontes de abastecimento (14).

3.5.

É necessário melhorar a coordenação e a resiliência a nível multilateral, nomeadamente nas Nações Unidas e, em particular, na OIT, na OMC e na Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos (OCDE). A título de exemplo, a UE deve tirar maior partido dos instrumentos internacionais, como a declaração da OIT sobre as empresas multinacionais (15) ou os novos indicadores de qualidade da OCDE para os investimentos diretos estrangeiros do ponto de vista do seu impacto no desenvolvimento sustentável (16). A UE deve apoiar a expansão do acordo da OMC relativo aos produtos farmacêuticos, adicionando produtos e países. Além disso, deve prosseguir-se com a liberalização do comércio de tecnologias e produtos de saúde.

3.6.

A UE continuará a depender da importação de diversos bens e serviços, desde matérias-primas a altas tecnologias, e é fundamental assegurar que o seu mercado se mantém aberto. Na economia digital, a UE deve preconizar a «soberania tecnológica inteligente», em que o comércio digital permite o fluxo regular de inovações e de bens e serviços de alta tecnologia, protegendo simultaneamente os valores e normas europeus em matéria de privacidade de dados e cibersegurança.

3.7.

A UE pode apoiar a relocalização da produção para a Europa, criando um ambiente empresarial mais favorável ao investimento, à inovação e à produção. A diversificação das cadeias de abastecimento pode ser um passo importante para reforçar a resiliência. Por conseguinte, a UE deve apoiar as empresas nas suas decisões comerciais, proporcionando condições empresariais sólidas e equitativas através da celebração de acordos de comércio livre bilaterais da UE e do seu mercado único.

Necessidade de reforma da OMC e regras mundiais em prol de uma globalização mais sustentável e equitativa

3.8.

O CESE apoia o papel ativo da UE na definição de regras mundiais (17). Tendo em conta que 2021 pode marcar uma mudança na governação do comércio, o CESE apoia os compromissos assumidos pela UE no sentido de um sistema comercial multilateral aberto e assente em regras, bem como a reforma da OMC (18). A UE e os seus Estados-Membros devem utilizar a sua influência e empenhar-se de forma proativa, formando alianças estratégicas com parceiros que partilham as mesmas ideias, a fim de assegurar que o respeito das normas laborais internacionais, definidas e acompanhadas pela OIT, é parte integrante do debate sobre a reforma da OMC. Enquanto exemplo positivo e oportunidade para reforçar esta nova forma de pensar ambiciosa, o CESE congratula-se com a proposta recente dos EUA de abordar o problema global do trabalho forçado nos navios de pesca no âmbito das negociações em curso da OMC sobre subsídios à pesca (19).

Formas de promover a transição ecológica através de cadeias de valor responsáveis e sustentáveis

3.9.

A política comercial da UE deve estar em consonância com a política do Pacto Ecológico Europeu, nomeadamente no que diz respeito a novos requisitos aplicáveis à transição digital, à transição ecológica e à transição justa. Por conseguinte, é importante abrir caminho a novos instrumentos, como o mecanismo de ajustamento carbónico fronteiriço, que devem ser compatíveis com as regras da OMC, eficazes na luta contra as alterações climáticas e úteis para a competitividade da indústria da UE (20). O CESE apoia a abertura do diálogo com países terceiros e parceiros comerciais importantes, como os EUA e a China (21).

3.10.

As cadeias de abastecimento mundiais constituem elementos essenciais do comércio internacional e da economia. São complexas, diversificadas e fragmentadas, proporcionam oportunidades e comportam riscos. O CESE exorta a UE a recolher mais dados sobre os impactos positivos e negativos das cadeias de abastecimento mundiais na UE (22).

Tirar partido do impacto regulamentar da UE

3.11.

A UE é o maior operador do mundo no que respeita à prestação de serviços. A política comercial da UE tem capacidade para apoiar um ambiente empresarial mundial em que os prestadores de serviços da UE possam crescer, inovar e concorrer. O comércio digital assume importância a nível mundial, nomeadamente devido às mudanças provocadas pela COVID-19. A UE deve impulsionar a concretização de um acordo célere e ambicioso da OMC sobre o comércio digital.

3.12.

A política comercial da UE deve complementar as ações empreendidas noutras organizações internacionais de regulação, como o trabalho da OCDE sobre os regimes económicos e fiscais. Deve apoiar a criação de sistemas de cooperação eficazes entre as autoridades fiscais, policiais e judiciais nos países parceiros.

3.13.

A estratégia deve otimizar a capacidade da UE de ativar todos os seus instrumentos unilaterais, bilaterais e multilaterais: o caráter vinculativo dos capítulos sobre «desenvolvimento sustentável» dos acordos de comércio e investimento, os instrumentos de defesa comercial, a triagem do investimento estrangeiro, a luta contra os obstáculos ao comércio e o encaminhamento para o órgão de resolução de litígios da OMC ou os mecanismos de consulta e resolução de litígios nos acordos comerciais bilaterais.

3.14.

A UE necessita de instrumentos de defesa comercial eficazes: períodos mais curtos para a imposição de disposições transitórias, redução dos encargos da recolha de informações que recaem sobre as indústrias da UE, assim como instrumentos reforçados no que respeita às subvenções estrangeiras. Para além do regulamento relativo à aplicação e cumprimento, a UE poderá ponderar a criação de um instrumento ad hoc que permita ajustar as condições de acesso ao mercado, nos casos em que não existem obrigações recíprocas, se as práticas prejudicarem significativamente os interesses comerciais da UE.

3.15.

Os novos países parceiros dos acordos de comércio livre da UE devem demonstrar que cumprem integralmente as convenções fundamentais da OIT como condição prévia para a celebração de um acordo comercial. As referidas convenções devem ser um elemento essencial de todos os acordos de comércio livre. No caso de um país parceiro não ter ratificado ou aplicado devidamente as referidas convenções, ou não ter demonstrado que aplica um nível de proteção equivalente, o CESE apela para a elaboração de um roteiro para a ratificação, vinculativo e com força executória, que conte com a assistência técnica da OIT. O roteiro deve também fazer parte dos capítulos sobre comércio e desenvolvimento sustentável, a fim de assegurar o cumprimento dessas obrigações em tempo útil.

3.16.

Além disso, todos os acordos de comércio livre da UE devem assentar numa política de avaliação da UE mais eficaz, que deve melhorar as suas avaliações de impacto económico e de impacto na sustentabilidade e prever uma avaliação ex post após cinco anos (23). Devem prever medidas compensatórias para atenuar potenciais efeitos negativos. Por último, a UE deve reforçar e utilizar os seus instrumentos de forma mais adequada para assegurar condições de concorrência leal com os países terceiros.

3.17.

Os contratos públicos da UE só devem estar abertos a empresas de países que cumprem as convenções fundamentais da OIT e o Acordo de Paris sobre o Clima. Muitos dos países terceiros aos quais a UE abriu os seus contratos públicos ainda não agiram em reciprocidade, o que é prejudicial para as empresas europeias. É essencial finalizar o regulamento relativo a um Instrumento Internacional de Contratação Pública, a fim de reforçar a posição da UE. Os acordos de comércio livre da UE devem promover as boas práticas sobre a integração de critérios ambientais e sociais nos contratos públicos (24).

3.18.

A UE deve continuar a utilizar a sua Ajuda ao Comércio para ajudar os países em desenvolvimento a aplicarem os acordos de comércio e apoiar o cumprimento de regras e normas, especialmente em relação ao desenvolvimento sustentável. Deve estabelecer uma relação económica justa e próspera entre a UE e os países em desenvolvimento, a fim de reduzir a pobreza e criar emprego digno. Necessita de estabelecer uma ligação mais forte entre o acesso preferencial e o cumprimento das normas internacionais, como os direitos laborais e humanos.

Bruxelas, 8 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  JO C 364 de 28.10.2020, p. 108; JO C 47 de 11.2.2020, p. 38.

(2)  JO C 364 de 28.10.2020, p. 53.

(3)  JO C 364 de 28.10.2020, p. 37.

(4)  JO C 129 de 11.4.2018, p. 27.

(5)  Prevê-se a adoção de um parecer de iniciativa específico (REX/535) em setembro de 2021.

(6)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 197.

(7)  JO C 97 de 24.3.2020, p. 9.

(8)  Prevê-se a adoção de um parecer de iniciativa específico (REX/536) no início de 2022.

(9)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 66.

(10)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 210.

(11)  Contributo do Comité de Acompanhamento para o Comércio Internacional, do CESE, para a revisão da política comercial, setembro de 2020.

(12)  Prevê-se a adoção de um parecer de iniciativa específico (REX/536) no início de 2022.

(13)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 197.

(14)  Documento de trabalho ocasional n.o 6/2020 do Centro Europeu de Economia Política Internacional (ECIPE) «Globalisation Comes to the Rescue: How Dependency Makes Us More Resilient» [O auxílio da globalização: Como a dependência aumenta a nossa resiliência]; relatório da Kommerskollegium (Direção Nacional de Comércio da Suécia) «Improving Economic Resilience Through Trade» [Melhorar a resiliência económica através do comércio], 2020.

(15)  Declaração Tripartida de Princípios sobre as Empresas Multinacionais e a Política Social (2017).

(16)  https://www.oecd.org/investment/fdi-qualities-indicators.htm

(17)  JO C 364 de 28.10.2020, p. 53.

(18)  JO C 159 de 10.5.2019, p. 15.

(19)  «The Use of Forced Labor on Fishing Vessels, Submission of the United States to the WTO» [O recurso ao trabalho forçado nos navios de pesca, documento apresentado pelos Estados Unidos à OMC], 26 de maio de 2021. https://ustr.gov/sites/default/files/IssueAreas/Trade%20Organizations/WTO/US.Proposal.Forced.Labor.26May2021.final%5B2%5D.pdf

(20)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 122; futuro Parecer NAT/834 — Mecanismo de ajustamento carbónico fronteiriço.

(21)  JO C 364 de 28.10.2020, p. 37.

(22)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 197.

(23)  JO C 47 de 11.2.2020, p. 38.

(24)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 197.


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/79


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Parceria renovada com a vizinhança meridional — Uma nova agenda para o Mediterrâneo»

[JOIN(2021) 2 final]

(2021/C 374/13)

Relatora:

Helena DE FELIPE LEHTONEN

Consulta

26.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

Decisão da Plenária

23.3.2021

Competência

Secção das Relações Externas

Adoção em secção

16.6.2021

Adoção em plenária

7.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

215/1/5

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com o compromisso renovado da comunicação em relação ao Estado de direito, aos direitos humanos e fundamentais, à igualdade, à democracia e à boa governação como pedra angular do desenvolvimento de sociedades equitativas, inclusivas e, por conseguinte, prósperas, bem como a atenção especial que consagra aos jovens, às mulheres e aos grupos desfavorecidos. Ao mesmo tempo, saúda os novos objetivos sociais da Cimeira do Porto, que devem ter impacto na aplicação da comunicação conjunta.

1.2.

O CESE congratula-se com o empenho da UE em promover uma cultura do Estado de direito, através da estreita participação da sociedade civil e da comunidade empresarial. As organizações da sociedade civil e as organizações dos parceiros sociais continuam a ser parceiros essenciais na definição e no acompanhamento da cooperação da UE. O Grupo Eventual para os Direitos Fundamentais e o Estado de Direito do CESE é um bom exemplo da forma como as organizações da sociedade civil estão a ganhar força nos países da UE.

1.3.

O CESE acolhe com grande satisfação as propostas de associar mais estreitamente o setor privado ao desenvolvimento da região, a fim de complementar o investimento público necessário e de aprofundar o diálogo público-privado, com vista a assegurar a sustentabilidade social e económica, que conduzirá à criação de emprego digno. Cumpre promover tal abordagem tanto no plano regional euro-mediterrânico como no plano nacional e local.

1.4.

O CESE congratula-se com o apoio crucial dado ao reforço da cooperação em fóruns multilaterais, centrado nas Nações Unidas, nomeadamente em matéria de paz e segurança, a fim de desenvolver soluções comuns e resolver os problemas que impedem a estabilidade e o progresso, apesar de a região continuar a ser afetada pelos mesmos problemas, no que diz respeito à paz, à segurança e ao desenvolvimento económico, 25 anos após o lançamento do Processo de Barcelona. O Comité apela para uma ação com base em sinergias entre os instrumentos previstos na Carta das Nações Unidas e na Estratégia da UE para a União da Segurança e defende que a UE tem de incrementar significativamente os seus esforços na região.

1.5.

O CESE considera importante melhorar a cooperação regional, sub-regional e inter-regional, principalmente através da União para o Mediterrâneo (UM), da Liga dos Estados Árabes, da União Africana, do Diálogo 5 + 5 ou de outros intervenientes e organizações regionais que promovem iniciativas pragmáticas de governação a vários níveis com base na geometria e na triangulação variáveis, que também ajudam a promover a cooperação com todo o continente africano e as regiões do Golfo e do Mar Vermelho.

1.6.

O CESE sublinha que a atenção se deve centrar na resolução das causas profundas da migração nos respetivos países parceiros. Para que não migrem por falta de oportunidades de vida, as pessoas devem ter uma vida digna, emprego e perspetivas nos seus próprios países, em consonância com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). São exemplos disso um melhor acesso à educação ou medidas para criar emprego de qualidade.

1.7.

O CESE insta a UE a garantir que a transição ecológica não é entendida como um modelo imposto do exterior, recomendando o investimento em campanhas de sensibilização, bem como a participação da sociedade civil nesse esforço.

1.8.

O CESE salienta a importância do destaque dado na comunicação ao papel fundamental dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil — formais e informais — enquanto intervenientes essenciais na conceção e execução das políticas públicas e guardiães do respeito pelos direitos dos cidadãos e pelo Estado de direito. Os sindicatos e as organizações empresariais desempenham um papel importante neste contexto, no quadro do diálogo social. O Comité considera, por isso, fundamental que a UE apoie e promova a ação das diferentes instituições e redes de organizações da sociedade civil em sentido lato, no plano euro-mediterrânico, para que possam desenvolver o seu trabalho nas melhores condições.

1.9.

O CESE considera que a igualdade de género não é apenas um direito humano universalmente reconhecido, mas também um imperativo para o bem-estar, o crescimento económico, a prosperidade, a boa governação, a paz e a segurança. Temos de intensificar os nossos esforços, nomeadamente através da integração da perspetiva de género em todos os programas de cooperação e ações orientadas, em conformidade com o terceiro plano de ação da UE em matéria de igualdade de género.

2.   Observações gerais

2.1.

Em 9 de fevereiro de 2021, a fim de relançar e reforçar a parceria estratégica entre a União Europeia e os seus parceiros na vizinhança meridional, o alto representante da Comissão Europeia adotou uma nova declaração política: a Comunicação — Parceria renovada com a vizinhança meridional — Uma nova Agenda para o Mediterrâneo.

2.2.

Essa declaração foi acompanhada de um plano de investimento económico específico para a vizinhança meridional que visa assegurar a melhoria da qualidade de vida das pessoas na região, bem como garantir que a recuperação económica, inclusivamente os efeitos sanitários da pandemia de COVID-19, o reforço da aplicação do Mecanismo COVAX e o fortalecimento das infraestruturas públicas sustentáveis, não deixa ninguém para trás. O respeito dos direitos humanos e do Estado de direito são parte integrante da comunicação e são essenciais para garantir a confiança dos cidadãos nas instituições.

2.3.

Ao abrigo do novo Instrumento de Vizinhança, de Cooperação para o Desenvolvimento e de Cooperação Internacional (IVCDI) da UE, serão reservados até 7 mil milhões de EUR para a sua execução entre 2021 e 2027, o que poderá mobilizar até 30 mil milhões de EUR em investimento público e privado na região na próxima década. Através do IVCDI, a UE também fomentará o investimento sustentável no âmbito do FEDS+, mobilizando capital para complementar as subvenções diretas de cooperação externa. O FEDS+ será acompanhado de uma garantia para a ação externa de 53 400 milhões de EUR, que também abrangerá os Balcãs Ocidentais.

2.4.

A nova agenda centra-se em cinco domínios de intervenção:

Desenvolvimento humano, boa governação e Estado de direito;

Resiliência, prosperidade e transição digital;

Paz e segurança;

Migração e mobilidade;

Transição ecológica.

3.   Contexto da Parceria renovada com a vizinhança meridional — Uma nova Agenda para o Mediterrâneo

3.1.

Vinte e cinco anos após a Declaração de Barcelona, a nova, ambiciosa e inovadora Agenda para o Mediterrâneo propõe relançar a parceria euro-mediterrânica.

2004: Lançamento da política europeia de vizinhança (PEV)

2008: Criação da organização intergovernamental União para o Mediterrâneo

2015: Revisão da política europeia de vizinhança, que define a estabilização e a segurança como os principais objetivos políticos

2020: Proposta da Comissão Europeia de criação de um Novo Pacto em matéria de Migração e Asilo

3.2.

O documento de trabalho sobre o plano de investimento para a vizinhança meridional contém propostas concretas de iniciativas em quatro dos cinco domínios prioritários. O plano de investimento destina-se expressamente a ser desenvolvido em cooperação com os Estados-Membros, possivelmente através de uma programação conjunta. É essencial associar as organizações da sociedade civil e os parceiros sociais ao processo de programação. Do mesmo modo, os intervenientes sociais devem poder aceder ao plano de investimento.

4.   Desenvolvimento humano, boa governação e Estado de direito

4.1.

A promoção do Estado de direito nos países parceiros é essencial. Nesse contexto, as organizações sociais, em especial os sindicatos, desempenham um papel central, assegurando a observância dos direitos sociais e laborais. Na região, o «crescimento económico sustentável» (1) deve ser promovido em conformidade. A UE pode desempenhar um papel crucial reforçando o ambiente empresarial para permitir a implantação e a florescimento das empresas privadas, evitando a burocracia e facilitando a criação de novas empresas. A este respeito, as empresas, especialmente as PME, podem prosperar verdadeiramente e devem também criar emprego de qualidade que contribui, designadamente, para combater as causas sociais da migração indesejada.

4.2.

Além disso, a boa governação, o Estado de direito e os direitos humanos, nomeadamente os direitos sociais e laborais, o diálogo social e a igualdade de acesso à justiça, promovem a paz, a prosperidade inclusiva e a estabilidade. O CESE preconiza um maior empenho na consideração das regras da OIT (2) e na sua aplicação eficaz nos países parceiros com base na Agenda 2030. A redução da burocracia é essencial para melhorar a cooperação entre a UE e os países parceiros.

4.3.

Um bom exemplo da abordagem de boa governação na região é o objetivo manifesto de apoio à União para o Mediterrâneo (UM) como um fórum de intercâmbio e cooperação. Em setembro de 2020, o CESE renovou o seu Memorando de Entendimento, reunindo esforços para intensificar a participação das partes interessadas económicas e sociais dos países da UM, a fim de cumprir os objetivos da Declaração de Paris de 2008 relativos à participação ativa da sociedade civil.

4.4.

O CESE preconiza a cooperação com os parceiros meridionais para promover a criação de ambientes de informação saudáveis e a liberdade dos meios de comunicação social como medidas para combater a desinformação e as informações erradas. É importante promover a boa governação, através de uma administração pública eficaz, justa e transparente, de um combate mais decisivo à corrupção e da igualdade de acesso à justiça.

5.   Reforçar a resiliência, criar prosperidade e aproveitar a transição digital

5.1.

A comunicação propõe ajudar os parceiros meridionais a «aproveitar a transformação digital e tornar-se competitiva na economia digital mundial». Cumpre promover especificamente as competências dos trabalhadores assalariados, dos trabalhadores independentes e dos empresários, a fim de as adequar à transformação digital no mundo do trabalho (3).

5.2.

O comércio e o investimento contribuem para o desenvolvimento da região. O CESE saúda o apoio à integração dos países do Norte de África na Zona de Comércio Livre Continental Africana (ZCLCA). No entanto, há que promover também a rede económica regional entre os países parceiros do Norte da África. O desmantelamento das barreiras não pautais ao comércio (um grande obstáculo à integração comercial na região) deve ser promovido em conformidade, levando em consideração as assimetrias económicas existentes. Por exemplo, as negociações da UE com a Tunísia e Marrocos (ZCLCA) estagnaram por não existir suficiente ponderação das assimetrias atuais (4).

5.3.

É atribuído particular destaque à oferta de oportunidades para os jovens através de programas de apoio ao emprego e à educação, com incidência no reforço do acesso ao financiamento, especialmente para as PME, de longe as maiores empregadoras da região, através da utilização de novos instrumentos financeiros, como o capital de risco. Ademais, cabe estabelecer mecanismos de transição da economia informal para a economia formal com base no trabalho por conta própria e nos empregos de qualidade.

5.4.

O CESE considera a educação e formação profissional, assim como os programas Erasmus+ para o Mediterrâneo, uma prioridade para os jovens, uma vez que se trata de uma oportunidade de emprego, promovendo a transição da escola para o trabalho. A infraestrutura digital é uma prioridade para a região e o impacto da digitalização no trabalho sob a forma de teletrabalho proporciona aos trabalhadores maior autonomia e um maior equilíbrio entre a vida profissional e privada (5).

5.5.

O objetivo de aprofundar a cooperação em matéria de segurança cibernética e aproveitar a tecnologia digital na aplicação da lei «no pleno respeito dos direitos humanos e das liberdades civis» é motivo de preocupação, dada a falta de transparência no passado na observância dos direitos humanos na região.

6.   Paz e segurança

6.1.

Os conflitos internos e os litígios regionais, que continuam a grassar na região (Sara Ocidental, Líbia, Israel/Palestina, Síria), representam um grande desafio. A comunicação sublinha a importância de normalizar as relações entre Israel e alguns Estados árabes com vista ao lançamento de novas iniciativas. O CESE considera que o diálogo social entre diferentes culturas e civilizações e o respeito mútuo constituem uma base para a paz, a estabilidade e a prosperidade partilhada na região.

6.2.

A luta contra o extremismo, a radicalização, a cibercriminalidade e o crime organizado deve respeitar o Estado de direito e, em especial, os direitos humanos. O estado de emergência constitui uma medida excecional, no decorrer da qual os direitos fundamentais dos cidadãos devem continuar a ser plenamente respeitados.

6.3.

A comunicação promete reforçar a cooperação policial e judicial entre a UE e os países da parceria PEV meridional, incluindo por meio da negociação de acordos de cooperação entre a UE e os países da vizinhança meridional. Dada a longa história de cooperação, a declaração de que a UE deve «colaborar com os parceiros meridionais a fim de assegurar que os seus sistemas judiciais e policiais cumprem os elevados padrões em matéria de proteção de dados e respeitam os direitos humanos» é um avanço em termos de abordagens conjuntas.

7.   Migração e mobilidade

7.1.

As disposições da comunicação em matéria de gestão da migração colocam a possibilidade de a assistência financeira depender, pelo menos em parte, da cooperação neste domínio. O CESE apoia o empenho da UE em trabalhar afincadamente no combate às causas profundas da migração ilegal e das deslocações forçadas através da resolução de conflitos e focando os desafios socioeconómicos exacerbados pela COVID-19 com soluções específicas adaptadas aos parceiros do Sul do Mediterrâneo. O respeito dos direitos humanos (Convenção de Genebra) é a base de qualquer cooperação no domínio da migração. A indisponibilidade para cooperar só pode ser combatida com «incentivos» (6).

7.2.

A comunicação propõe a promoção de «parcerias para a atração de talentos», apresentadas no Novo Pacto em matéria de Migração e Asilo. O novo instrumento parece visar a promoção da cooperação com países terceiros. Este domínio poderia ser um elo entre a formação profissional, as redes de empresas, as cadeias de valor inter-regionais e a migração circular, com vista a beneficiar as pessoas e as economias de ambos os lados do Mediterrâneo. Em qualquer caso, estes planos devem ser conciliados com a necessidade de reter suficiente mão de obra qualificada nos países parceiros, o que é essencial para o seu desenvolvimento económico sustentável.

8.   Transição ecológica: resiliência face às alterações climáticas, energia e ambiente

8.1.

A comunicação reconhece o potencial da vizinhança meridional para o desenvolvimento de energias renováveis, especialmente as energias solar e eólica, bem como a produção de hidrogénio, que considera uma «nova prioridade estratégica». O potencial está claramente associado ao Pacto Ecológico Europeu e à crescente integração das prioridades de desenvolvimento sustentável na cooperação global internacional. Neste contexto, o CESE assinala que, além dos projetos de grande escala (internacionais), é indispensável apoiar os projetos com impacto socioeconómico local direto.

8.2.

Deve haver resposta ao apelo ao Pacto Ecológico Europeu, a fim de trazer benefícios específicos para a agricultura, um setor essencial para as economias da maioria dos países fora da UE, com iniciativas destinadas a redescobrir e proteger o mar Mediterrâneo. A economia azul representa um poderoso instrumento de gestão dos bens comuns do Mediterrâneo, e o CESE destaca a necessidade de fazer um balanço da declaração ministerial da UM sobre uma economia azul sustentável no Mediterrâneo Ocidental.

8.3.

O CESE considera especialmente pertinentes as conclusões do primeiro relatório de avaliação da MedECC sobre o Mediterrâneo, promovido pela UM, relativo ao impacto nas alterações climáticas e ambientais e às suas consequências na região, promovendo espaços de cooperação conjunta entre as duas margens e fazendo face a desafios comuns em termos de sustentabilidade e resiliência climática, para facilitar a transição para uma economia ecológica, azul e circular na região.

9.   Igualdade de género e direitos das mulheres, das pessoas LGBTIQ+ e das pessoas com deficiência em ambos os lados do Mediterrâneo

9.1.

Os movimentos nacionalistas de extrema-direita em toda a Europa e os movimentos conservadores e islamistas na margem sul, ambos com recurso a linguagem tradicional e religiosa, têm reagido cada vez mais contra a igualdade de género.

9.2.

O CESE acolhe favoravelmente a iniciativa da UM de estabelecer mecanismos voluntários de acompanhamento dos compromissos assumidos pelos governos da região sobre as normas em matéria de igualdade de género sob a forma de indicadores concretos.

9.3.

A pandemia de COVID-19 veio piorar a situação. Em primeiro lugar, os governos não liberais e autocráticos aproveitaram a oportunidade para continuar a atacar os direitos das mulheres e das pessoas LGBTIQ+. Em segundo lugar, várias medidas governamentais adotadas em resposta à pandemia vieram efetivamente piorar as condições de vida das mulheres, das pessoas LGBTIQ+ e das pessoas com deficiência, tornando essencial a promoção de iniciativas para proteger os direitos desses grupos e a sua participação socioeconómica, cívica e política.

9.4.

A União Europeia deve intensificar os seus esforços e a cooperação no terreno para garantir que os direitos fundamentais das pessoas LGBTIQ+ são respeitados sem exceção, que estas não estão sujeitas a ações penais e que a sua participação na vida pública é reforçada (7).

9.5.

Embora muitos países parceiros tenham assinado a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, é ainda necessário melhorar significativamente as suas condições de vida. Por conseguinte, a União Europeia deve manifestar especial empenho na aplicação dos direitos das pessoas com deficiência consagrados na Convenção das Nações Unidas.

Bruxelas, 7 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, Objetivo 8: Trabalho digno e crescimento económico.

(2)  Conforme estabelecido nas convenções fundamentais, em especial, na Declaração de Princípios Tripartida sobre as empresas multinacionais e a política social da Organização Internacional do Trabalho [ponto 2.2 do Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Dever de diligência (JO C 429 de 11.12.2020, p. 136)].

(3)  Pontos 2.4.1 e 2.4.4 do Relatório de Informação do Comité Económico e Social Europeu — A digitalização e as PME na região euro-mediterrânica (REX/519).

(4)  Pontos 3.2.9 e 4.1.2 do Parecer do Comité Económico e Social Europeu — UE e África: realizar uma parceria equitativa para o desenvolvimento assente na sustentabilidade e em valores comuns (JO C 429 de 11.12.2020, p. 105), e pontos 4.1 e 6.1 do Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Ajuda externa, investimento e comércio enquanto vetores de redução das razões para a migração económica, com especial destaque para África (JO C 97 de 24.3.2020, p. 18).

(5)  Pontos 1.12 e 2.2.7 do Relatório de Informação do Comité Económico e Social Europeu — A digitalização e as PME na região euro-mediterrânica (REX/519).

(6)  Entrevista com Gerald Knaus, perito em migração: https://www.dw.com/de/knaus-eu-migrationspakt-ist-unrealistisch/a-55058035

(7)  Ponto 1.11 do Parecer do Comité Económico e Social Europeu — União da Igualdade: Estratégia para a Igualdade de Tratamento das Pessoas LGBTIQ 2020-2025 (JO C 286 de 16.7.2021, p. 128).


16.9.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 374/84


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Criar uma Europa resiliente às alterações climáticas — a nova Estratégia da UE para a Adaptação às Alterações Climáticas»

[COM(2021) 82 final]

(2021/C 374/14)

Relator:

Dimitris DIMITRIADIS

Correlator:

Kęstutis KUPŠYS

Consulta

Comissão Europeia, 26.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

23.6.2021

Adoção em plenária

7.7.2021

Reunião plenária n.o

562

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

229/3/12

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) apoia vivamente a adoção da Estratégia da UE para a Adaptação às Alterações Climáticas enquanto passo crucial no sentido do objetivo do Pacto Ecológico Europeu de neutralidade climática e resiliência às alterações climáticas até 2050. No entanto, gostaria que os domínios de ação previstos tivessem sido delineados não só em termos gerais, mas também com exemplos concretos. Cabe dar às pessoas uma descrição clara do que poderiam ser as mudanças.

1.2.

O risco de prejuízos económicos e perdas de vidas resultantes do aumento da frequência e da intensidade dos fenómenos meteorológicos extremos continuará a existir. Igualmente importante é o risco de que tanto os impactos das alterações climáticas como os esforços de adaptação às mesmas exacerbem as desigualdades existentes. A adaptação, centrada na equidade, é, pois, essencial para proteger a vida, o emprego e os meios de subsistência dos cidadãos europeus, especialmente dos mais vulneráveis, que, por norma, são mais afetados pelas alterações climáticas.

As organizações da sociedade civil desempenham um papel essencial no quadro de uma transição justa. Em particular, cabe assegurar a participação dos parceiros sociais, a fim de se conseguir realizar com êxito as adaptações no mundo do trabalho e manter condições de trabalho dignas através do diálogo social e da negociação coletiva.

1.3.

A execução da estratégia e do Pacto Ecológico Europeu deve assentar numa abordagem sistémica que procure, simultaneamente, abordar múltiplos objetivos e promover instrumentos estratégicos e soluções tecnológicas que possam ser utilizados nos vários setores da economia.

1.4.

O CESE apela, concretamente, para que seja dada «igual ênfase» ao financiamento da atenuação e da adaptação. É fundamental que todas as políticas climáticas a todos os níveis aliem estratégias de atenuação e de adaptação.

1.5.

O CESE entende serem necessárias orientações, metas e instrumentos de acompanhamento, parâmetros e indicadores específicos em matéria de adaptação para ajudar a assegurar transparência na afetação de recursos, prever e gerir os impactos das alterações climáticas e a avaliar os progressos da adaptação às mesmas, reforçando simultaneamente a capacidade local, nacional e regional para utilizar todos estes instrumentos.

1.6.

No seu entender, as soluções baseadas na natureza, a bioeconomia e a transição para uma economia circular são abordagens essenciais da adaptação às alterações climáticas e, ao mesmo tempo, uma oportunidade para a UE recuperar de uma forma sustentável do ponto de vista ambiental e social.

1.7.

O CESE insta a Comissão a procurar um melhor alinhamento das políticas em matéria de adaptação às alterações climáticas com a justiça climática em futuros trabalhos relativos à política de adaptação. O CESE reconhece que as alterações climáticas podem ter diferentes impactos no plano social, económico e de saúde pública, bem como outros impactos negativos nas comunidades, e recomenda que se corrijam as desigualdades existentes através de estratégias de atenuação e adaptação a longo prazo, para que ninguém seja esquecido.

1.8.

Para apoiar as empresas na sua própria adaptação e nos seus esforços para apresentar à sociedade soluções de adaptação, a UE tem de permitir e incentivar mais condições propícias à inovação, ao investimento e ao comércio que promovam o desenvolvimento sustentável. A adaptação às alterações climáticas e os respetivos custos devem também ser parte integrante da estratégia industrial da UE.

1.9.

O CESE considera que a agricultura, a silvicultura e as pescas estão entre as atividades económicas mais diretamente afetadas, embora possam ao mesmo tempo contribuir para a implementação de soluções de adaptação, o sequestro de carbono e a segurança alimentar. São necessárias investigação e inovação intensivas, mas também recompensas pela criação comprovada de sumidouros de CO2, para apoiar estes setores.

1.10.

Anualmente, as perdas económicas resultantes de catástrofes relacionadas com o clima são, em média, de centenas de milhares de milhões de dólares. As Nações Unidas, no seu relatório sobre os custos humanos das catástrofes («Human Costs of Disasters»), apresentam igualmente um cenário deprimente, assinalando que, entre 2000 e 2019, ocorreram 7 348 grandes catástrofes que resultaram na perda de 1,23 milhões de vidas, afetaram 4 200 milhões de pessoas (muitas delas mais do que uma vez) e provocaram perdas económicas de cerca de 2,97 biliões de dólares à escala mundial. Existem várias fontes de financiamento da UE disponíveis para financiar a adaptação: o orçamento do Pacto Ecológico Europeu, o QFP e o Instrumento de Recuperação da União Europeia. O CESE solicita maior clareza quanto às diferentes opções, bem como procedimentos de utilização fácil para garantir o acesso atempado ao financiamento no plano prático. Além disso, a eliminação dos subsídios aos combustíveis fósseis e a introdução de uma reforma fiscal ecológica libertariam recursos consideráveis dos orçamentos públicos, resolveriam incoerências sistémicas e gerariam novas receitas para financiar a adaptação às alterações climáticas. O CESE critica o facto de ainda não ter sido apresentado um roteiro concreto para a eliminação de tais subsídios prejudiciais ao ambiente.

1.11.

O CESE solicita igualmente medidas que façam da canalização do investimento para a indústria dos combustíveis fósseis a estratégia menos favorável às instituições financeiras e que incentivem a afetação de fluxos financeiros privados a atividades que contribuam para a atenuação das alterações climáticas e a adaptação às mesmas. Trata-se de um esforço importante para os investimentos, tanto dentro como fora da UE, sendo que, para a União emergir como um organismo de normalização mundial no domínio das finanças sustentáveis, a Comissão deve manter a fasquia elevada e seguir princípios científicos e tecnologicamente neutros, inclusivamente na taxonomia da UE.

1.12.

A estratégia reconhece a necessidade de obter financiamento internacional adicional para a adaptação às alterações climáticas, nomeadamente proveniente de fontes públicas. No entanto, o CESE exorta a Comissão a esclarecer o modo exato como tenciona suprimir os obstáculos ao acesso ao financiamento pelos países, pelas comunidades e pelos setores mais vulneráveis à escala mundial e o modo como incluirá as propostas para a integração da perspetiva de género e da luta contra as desigualdades à escala regional e local.

1.13.

A UE deve prestar especial atenção à cooperação internacional nas suas várias formas, nomeadamente parcerias de investimento, comércio e inovação, com o objetivo de reforçar as medidas de adaptação à escala mundial e, em especial, nos países em desenvolvimento.

1.14.

Em termos gerais, o CESE vê a estratégia como uma base para uma iniciativa juridicamente vinculativa que obrigará os Estados-Membros a desenvolver planos e estratégias nacionais de adaptação às alterações climáticas. A Lei Europeia do Clima será fundamental para a consecução de políticas vinculativas relacionadas com o clima.

1.15.

Os órgãos de poder local e regional, enquanto autoridades de execução da maior parte das iniciativas de adaptação, devem receber recursos suficientes para desenvolver capacidades neste domínio, nomeadamente na conceção de políticas de adaptação.

2.   Contexto

2.1.

Em 24 de fevereiro de 2021, a Comissão Europeia adotou a sua nova Estratégia da UE para a Adaptação às Alterações Climáticas (1), na qual descreve a forma como a União Europeia pode adaptar-se ao impacto das alterações climáticas e adquirir resiliência às mesmas até 2050.

2.2.

A adoção da Estratégia da UE para a Adaptação às Alterações Climáticas, com os seus quatro objetivos — tornar a adaptação da Europa mais inteligente, mais célere e mais sistémica e reforçar a ação internacional em matéria de adaptação às alterações climáticas —, é acolhida com agrado pelo CESE como um passo crucial no processo importante da elaboração das políticas.

2.3.

No âmbito da estratégia, a intenção é tornar a adaptação mais inteligente «melhorando os conhecimentos e a disponibilidade dos dados, gerindo simultaneamente a incerteza associada às alterações climáticas; obtendo mais dados, e de melhor qualidade, sobre as perdas e riscos relacionados com o clima e fazendo da Climate-ADAPT a plataforma europeia de referência no que respeita aos conhecimentos em matéria de adaptação às alterações climáticas». Procurar-se-á tornar a adaptação mais sistémica «apoiando a elaboração de políticas a todos os níveis da governação, da sociedade e da economia, bem como em todos os setores, melhorando as estratégias e os planos de adaptação às alterações climáticas; integrando a resiliência climática na política macro-orçamental e promovendo soluções em matéria de adaptação baseadas na natureza». Por último, acelerar-se-á a adaptação a todos os níveis «aumentando o ritmo do desenvolvimento e da implementação de soluções de adaptação às alterações climáticas; reduzindo os riscos relacionados com o clima; colmatando o fosso existente em termos de proteção contra os riscos climáticos e garantindo a disponibilidade e a sustentabilidade da água doce».

2.4.

Anualmente, as perdas económicas resultantes de catástrofes relacionadas com o clima são, em média, de centenas de milhares de milhões de dólares. Vários relatórios (2) mostram que, se as trajetórias de emissões atuais persistirem, prevê-se que partes do sul da Europa registem ondas de calor extremo uma vez de dois em dois anos e que o rendimento do milho de sequeiro diminua 50 %. Estes impactos diferenciados podem contribuir para criar mais divergências — e vez de convergência — na UE. A pandemia de COVID-19 revelou que é fundamental compreender e integrar a ligação entre os programas ambientais e de saúde pública no que diz respeito à elaboração das políticas, sem esquecer que a luta contra as ameaças à biodiversidade pode ajudar a reduzir o risco de futuras zoonoses e pandemias, e reconhecendo que as medidas de recuperação da pandemia e as medidas de adaptação às alterações climáticas têm o mesmo objetivo de resiliência para o futuro (3).

2.5.

O parecer do CESE sobre a estratégia visa apresentar uma perspetiva da sociedade civil sobre o objetivo da estratégia e as ações subjacentes à mesma.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE salienta que a aplicação conjunta dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), do Pacto Ecológico Europeu, da Lei Europeia do Clima e do Pacto Europeu para o Clima e o desenvolvimento e a execução dos planos de recuperação e resiliência têm de ser facilitados pelas estratégias de atenuação das alterações climáticas e de adaptação às mesmas. O CESE apoia veementemente a nova Estratégia da UE para a Adaptação às Alterações Climáticas da Comissão Europeia, adotada em 24 de fevereiro de 2021.

3.2.

O CESE salienta que, apesar das medidas intensivas para combater as alterações climáticas, existe uma necessidade urgente e de longa data de adaptação. O risco de prejuízos económicos e perdas de vidas humanas resultantes do aumento da frequência e da intensidade dos fenómenos meteorológicos extremos continuará a existir. Igualmente importante é o risco de que tanto os impactos climáticos como os esforços de adaptação às alterações climáticas exacerbem as desigualdades existentes. A adaptação será essencial para proteger os direitos humanos dos cidadãos europeus em matéria de segurança, trabalho digno e meios de subsistência resilientes.

3.3.

O CESE partilha a preocupação da Comissão com os riscos para a saúde decorrentes das alterações climáticas e a consequente necessidade de os compreender melhor, através da Plataforma Europeia de Adaptação às Alterações Climáticas Climate-ADAPT. No entanto, como salientaram tanto a Organização Mundial da Saúde (4) como a Agência Europeia do Ambiente (5), existem provas do impacto desigual da poluição e degradação ambientais nas comunidades socialmente desfavorecidas e nos grupos vulneráveis. O conceito de desigualdade ambiental deve, por conseguinte, ser integrado nas políticas da União, tendo em conta a dimensão social das alterações climáticas.

3.4.

O CESE observa que, se se adotarem as medidas certas, a adaptação terá um impacto vantajoso para todos, nomeadamente evitando perdas resultantes das alterações climáticas, gerando benefícios económicos, aumentando a justiça social e melhorando a segurança ambiental.

3.5.

A execução da nova Estratégia da UE para a Adaptação às Alterações Climáticas e do Pacto Ecológico Europeu deve fazer parte de uma abordagem sistémica que procure abordar múltiplos objetivos e promover instrumentos políticos e soluções tecnológicas que possam ser utilizados nos vários setores da economia. É, pois, necessário um método de análise sistémica abrangente, bem como os instrumentos pertinentes para a sua aplicação, para garantir a abordagem simultânea de múltiplos objetivos.

3.6.

O CESE entende serem necessárias orientações, metas e instrumentos de acompanhamento, parâmetros e indicadores específicos em matéria de adaptação para ajudar a prever e gerir os impactos das alterações climáticas e a avaliar os progressos da adaptação às mesmas.

3.7.

O CESE observa que as soluções baseadas na natureza, a bioeconomia e a transição para uma economia circular são abordagens essenciais da adaptação às alterações climáticas e remete para os seus pareceres anteriores sobre a bioeconomia (6) e a economia circular (7). Além disso, as práticas sustentáveis de gestão das florestas, dos solos e dos recursos hídricos contribuem tanto para a adaptação como para a atenuação, para além de proporcionarem a base para uma produção de alimentos e de biomassa resiliente às alterações climáticas, com impacto neutro no clima e sustentável.

3.8.

O CESE apela para que seja dada «igual ênfase» ao financiamento da atenuação e da adaptação. É fundamental que todas as políticas climáticas a todos os níveis aliem estratégias de atenuação e de adaptação, e o CESE solicita mais medidas para assegurar o cumprimento deste princípio, uma vez que a atenuação protege as gerações futuras do agravamento da crise climática enquanto a adaptação protege as gerações atuais e futuras dos fenómenos meteorológicos extremos causados pelas alterações climáticas já existentes. Cumpre alterar a metodologia relativa ao acompanhamento da ação climática prevista no orçamento da UE, de modo que estabeleça uma diferenciação explícita entre despesas de adaptação e de atenuação.

3.9.

Por exemplo, os Estados-Membros da UE devem informar as autoridades responsáveis pela revisão dos planos nacionais em matéria de energia e clima de que é necessário dar igual ênfase às estratégias de adaptação e de atenuação, devido à crescente ambição climática da UE e ao impacto da COVID-19. É necessário mobilizar e apoiar também as cidades e os municípios, eventualmente através do Pacto de Autarcas, para que integrem a adaptação nos seus planos de atenuação e criem sinergias.

3.10.

O CESE está convencido de que é necessária uma abordagem que inclua as partes interessadas na conceção e no desenvolvimento conjuntos das trajetórias de adaptação pertinentes. Estes planos devem ser criados conjuntamente de uma forma integrada com as trajetórias de atenuação pertinentes, uma vez que a atenuação e a adaptação estão interligadas e se afetam mutuamente. Importa igualmente que todas as partes interessadas prevejam um reforço das capacidades e uma aproximação ao público para apoiar as atividades de adaptação, inclusivamente aos jovens. Para os jovens, e em especial para as crianças, será crucial um melhor alinhamento entre o sistema de ensino e as necessidades de emprego da «quarta revolução industrial» em curso.

3.11.

Tendo em conta os aspetos económicos e ambientais, é essencial atenuar os eventuais impactos sociais negativos das políticas de adaptação para garantir um amplo apoio à execução da estratégia. O CESE solicita a ponderação de ações adicionais específicas para os grupos vulneráveis de partes interessadas, com especial destaque para o género, a idade e os grupos minoritários.

3.12.

O CESE constata que a inovação e a execução da adaptação exigem um financiamento paciente, estratégico e a longo prazo, o que requer um papel empreendedor significativo por parte do Estado. Os custos associados às políticas de descarbonização da UE terão de ser minimizados e partilhados entre os vários setores, a fim de garantir que os grupos da população com baixos rendimentos e as comunidades vulneráveis não suportam uma parte injusta dos encargos financeiros. A Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável (RSDS) (8), das Nações Unidas, aponta no seu relatório a necessidade de adoção de contramedidas adequadas para evitar o aumento das desigualdades e assegurar um apoio mais amplo à transição para a sustentabilidade.

3.13.

Existem vários fundos da UE disponíveis para o financiamento da adaptação. O CESE solicita maior clareza quanto às diferentes opções, bem como procedimentos de utilização fácil para garantir o acesso atempado dos intervenientes ao financiamento no plano prático.

3.14.

Importa reforçar o desenvolvimento e a utilização de instrumentos financeiros para as políticas de adaptação [subsídios, swaps de risco de crédito, obrigações no domínio da adaptação, redução de emissões da desflorestação e da degradação florestal (REDD), etc.]. Para aumentar a ambição global da estratégia, importa debater e incentivar a utilização de novos instrumentos potenciais, como os swaps dívida-clima, a fim de assegurar fluxos financeiros para os países com necessidade de ação imediata.

3.15.

O CESE salienta ainda a importância de integrar os riscos e as incertezas profundas (quando as probabilidades dos fenómenos são desconhecidas) relacionados com as catástrofes naturais climáticas nos modelos e instrumentos utilizados para conceber as políticas macro-orçamentais.

3.16.

A estratégia deve ser seguida de um plano que explicite o roteiro da sua execução à escala europeia, nacional, regional e local, incluindo o modo como é possível ajudar os diferentes setores da economia e da sociedade a compreender e combater os riscos climáticos, prestando especial atenção aos setores e às comunidades mais vulneráveis.

3.17.

É essencial que haja uma coordenação das medidas de adaptação com os programas de recuperação da COVID-19, tanto na fase pandémica como na fase «pós-pandemia».

4.   Observações na especialidade

Medidas à escala da UE

4.1.

O CESE insta a Comissão a procurar um melhor alinhamento das políticas em matéria de adaptação às alterações climáticas com a justiça climática. Na resposta aos desafios das alterações climáticas, ninguém deve ser esquecido e cumpre abordar em primeiro lugar as necessidades dos mais vulneráveis, que são frequentemente os menos preparados e, em muitos casos, os menos responsáveis pela situação climática atual.

4.2.

Na Europa, os impactos das alterações climáticas afetarão diferentes regiões geográficas de forma distinta. Essas diferenças e as características específicas das várias regiões têm de ser tidas em conta nas respostas políticas e nos esforços de adaptação às alterações climáticas.

4.3.

É crucial definir índices de vulnerabilidade local para orientar as estratégias de adaptação, que devem ser desenvolvidos em três dimensões: vulnerabilidade geográfica ou regional, vulnerabilidade setorial ou económica e vulnerabilidade social.

4.4.

A estrutura existente para os projetos de adaptação concentra-se frequentemente nos impactos das alterações climáticas e não nas causas profundas da vulnerabilidade. O CESE insta, por conseguinte, à integração profunda do planeamento da adaptação às alterações climáticas em todas as políticas, estratégias e medidas pertinentes da UE.

4.5.

Em primeiro lugar, é importante investir no reforço do capital humano, por exemplo facilitando a criação de inovações tecnológicas e sociais e disponibilizando conhecimentos e instrumentos para os cidadãos europeus se prepararem devidamente para os desafios climáticos que se avizinham. Importa prestar especial atenção à educação e às competências das pessoas sub-representadas e marginalizadas.

4.6.

Importa igualmente dar às empresas instrumentos e apoio para a avaliação e a gestão dos impactos das alterações climáticas. Os impactos climáticos afetam, direta ou indiretamente, todas as indústrias. A adaptação às alterações climáticas e os respetivos custos devem, por conseguinte, ser parte integrante da política industrial da UE e ser tidos em conta nos auxílios estatais.

4.7.

A agricultura, a silvicultura e as pescas estão entre as atividades económicas mais diretamente afetadas, embora possam ao mesmo tempo contribuir para a implementação de soluções de adaptação, o sequestro de carbono e a segurança alimentar. São necessárias investigação e inovação intensivas, mas também recompensas pela criação comprovada de sumidouros de CO2, para apoiar estes setores. Além disso, o CESE reconhece a necessidade urgente de fazer face às alterações climáticas nos oceanos através de decisões de gestão das pescas flexíveis, adaptáveis e rápidas, com vista a assegurar a sustentabilidade a longo prazo da produção hipocarbónica de proteínas animais na Europa.

4.8.

A digitalização oferece muitas oportunidades de adaptação às alterações climáticas, nomeadamente em termos de monitorização, modelação, produção e comunicação, devendo ser plenamente utilizada. São igualmente necessárias medidas adequadas para assegurar a resiliência climática das infraestruturas críticas à escala da UE, como a energia, os transportes e as redes e sistemas digitais.

4.9.

As soluções baseadas na natureza ajudarão a UE a adaptar-se à nova realidade climática e minimizam os impactos potencialmente devastadores das alterações climáticas. Oferecem uma oportunidade para a UE recuperar de uma forma sustentável do ponto de vista ambiental e social. O CESE solicita vigilância para garantir que as comunidades locais estão verdadeiramente empenhadas na sua implantação e na sua conceção.

4.10.

O abandono gradual dos combustíveis fósseis e o investimento em medidas de adaptação às alterações climáticas devem andar de mãos dadas. Por conseguinte, o CESE considera que a taxonomia da UE para o financiamento sustentável é um instrumento importante que permite à UE tornar-se mais ambiciosa no que diz respeito à adaptação às alterações climáticas. Além disso, a adaptação da fiscalidade ambiental e a transferência dos impostos sobre o trabalho para o consumo de recursos naturais poderiam corrigir incoerências sistémicas e gerar novas receitas para o financiamento da adaptação, bem como acelerar o abandono de atividades prejudiciais ao ambiente.

4.11.

O CESE toma nota do primeiro conjunto de critérios técnicos para definir as atividades que contribuem significativamente para a mitigação das alterações climáticas e a adaptação às mesmas (9). Solicita critérios taxonómicos científicos e tecnologicamente neutros que façam da canalização dos investimentos para a indústria dos combustíveis fósseis a estratégia menos favorável às instituições financeiras e que incentivem a afetação de fluxos financeiros privados a atividades que contribuam para as medidas de atenuação das alterações climáticas e de adaptação às mesmas.

4.12.

Em termos gerais, o CESE vê a estratégia como uma base para uma iniciativa juridicamente vinculativa, que obrigará os Estados-Membros a desenvolver planos e estratégias nacionais de adaptação às alterações climáticas.

Medidas à escala nacional e infranacional

4.13.

Em primeiro lugar, importa superar a inércia à escala nacional, com a ajuda de uma forte liderança e responsabilidade políticas e o envolvimento ativo da sociedade civil. Para que isso aconteça, há que incentivar os Estados-Membros a atribuir uma elevada prioridade ao Pacto Ecológico Europeu em geral e às questões de adaptação às alterações climáticas em particular aquando da definição dos seus objetivos políticos a longo prazo — num horizonte de 2050 e posterior. Além disso, são necessárias metas explícitas de despesa em medidas de adaptação e de transparência para evitar a marginalização da adaptação. Cumpre alterar a metodologia relativa ao acompanhamento da ação climática prevista no orçamento dos Estados-Membros, de modo que estabeleça uma diferenciação explícita entre despesas de adaptação e de atenuação.

4.14.

O CESE acredita que é crucial que todos os membros da sociedade vejam e sintam o modo como as medidas de adaptação os ajudam a melhorar as suas condições de vida específicas e a enfrentar riscos futuros. Por conseguinte, as estratégias nacionais de adaptação têm de incluir a manutenção de um forte apoio da segurança social para gerir a transição iminente.

4.15.

É necessária uma maior concentração na execução de políticas modernas em matéria de inovação e empresas, orientadas para sistemas de produção mais ecológicos e mais resilientes, bem como políticas ativas do mercado de trabalho centradas na criação de postos de trabalho, nas novas competências e na requalificação e na formação de trabalhadores, a fim de promover uma adaptação adequada à escala nacional. A abordagem deve associar ativamente os trabalhadores à conceção conjunta de programas de reforço das capacidades.

4.16.

São necessários novos investimentos em infraestruturas e serviços públicos para garantir sistemas de recursos hídricos, de energia, de transporte e digitais resilientes às alterações climáticas. O correto ordenamento do território é igualmente crucial, estabelecendo as bases para a diminuição da vulnerabilidade dos edifícios aos fenómenos meteorológicos extremos.

4.17.

A fiscalidade ambiental e outros mecanismos económicos de gestão do ambiente devem ter em conta considerações relacionadas com a equidade, que apoiem os incentivos à atenuação das alterações climáticas, proporcionem receitas para apoiar os esforços de adaptação e atenuem os efeitos regressivos destas políticas em grupos de partes interessadas desproporcionadamente afetados. O mesmo se aplica aos subsídios aos combustíveis fósseis, cuja eliminação, prometida em diversas ocasiões, libertará recursos consideráveis dos orçamentos públicos, que poderão, por sua vez, ser aplicados na adaptação às alterações climáticas. O CESE critica o facto de ainda não ter sido apresentado um calendário para a eliminação dos subsídios prejudiciais, apesar de o debate se arrastar há mais de 30 anos.

Cooperação internacional e um papel mais proeminente da UE no palco mundial

4.18.

O CESE defende a necessidade de «intensificar a ação internacional em prol da resiliência às alterações climáticas», conforme proposto pela Comissão, uma vez que concorda com a declaração desta última de que «[a] nossa ambição em matéria de adaptação às alterações climáticas deve estar à altura da nossa liderança mundial no que respeita à atenuação das alterações climáticas».

4.19.

O CESE salienta o facto de, fora da UE, os países menos desenvolvidos e os pequenos Estados insulares em desenvolvimento serem os mais afetados pelos impactos das alterações climáticas, para além de serem mais vulneráveis a choques económicos, às desigualdades e à crise sanitária da COVID-19.

4.20.

Em consonância com a estratégia para a parceria UE-África, o CESE defende que se trabalhe com os países africanos mais ameaçados. Cumpre continuar a apoiar programas, como o Pacto de Autarcas para a África Subsariana, que permitam aos intervenientes locais e nacionais colaborar em planos de atenuação e adaptação. O Banco Mundial, conforme citado pela Comissão, salientou que, só na África Subsariana, as alterações climáticas podem desencadear a migração de 70 milhões de pessoas, até 2050, com implicações sociais, económicas e ambientais significativas. O formato da Parceria Oriental proporcionaria outra plataforma de ação conjunta.

4.21.

A estratégia reconhece a necessidade de obter financiamento internacional adicional para a adaptação às alterações climáticas, nomeadamente proveniente de fontes públicas, e procurará aumentar o financiamento da adaptação através dos instrumentos da UE para a ação externa. No entanto, o CESE exorta a Comissão a esclarecer o modo exato como tenciona suprimir os obstáculos ao acesso ao financiamento pelos países, pelas comunidades e pelos setores mais vulneráveis à escala mundial e o modo como incluirá as propostas para a integração da perspetiva de género e da luta contra as desigualdades. O financiamento da adaptação baseado em subvenções seria essencial neste contexto.

4.22.

É importante disponibilizar os recursos necessários para a investigação e para a aplicação prática dos seus resultados. A este respeito, importa prestar especial atenção aos países do chamado «Sul global», que estão a levar a cabo muitos projetos promissores de combate aos efeitos das alterações climáticas. É importante garantir o necessário apoio financeiro e logístico para estes projetos.

4.23.

Para que o financiamento privado possa servir os objetivos climáticos, há que enfatizar concretamente o desincentivo do financiamento de atividades prejudiciais pelas instituições financeiras privadas fora das fronteiras da UE, reorientando esses recursos financeiros para as atividades de adaptação. A UE tem de participar ativamente na cooperação internacional, a fim de desenvolver uma taxonomia comum, e intensificar o seu papel enquanto organismo emergente de normalização em prol da ambição das finanças sustentáveis.

4.24.

O CESE considera que, para apoiar o reforço da resiliência em resposta às crises mundiais, a UE deve promover posições fortes em matéria de financiamento da adaptação durante as negociações. A UE deve apoiar a consecução de um equilíbrio de 50 %-50 % no financiamento da atenuação e da adaptação. Esse equilíbrio deveria ser alcançado tendo em mente a COP 26 deste ano.

4.25.

O plano de ação em matéria de adaptação, previsto no novo Roteiro do Banco do Clima do Grupo do Banco Europeu de Investimento (BEI), deve ponderar seriamente o incentivo do investimento na adaptação nos países em desenvolvimento, sem agravar as vulnerabilidades relacionadas com as dívidas.

4.26.

A adaptação às alterações climáticas é também uma questão de comércio e investimento direto estrangeiro. As alterações climáticas afetam, por exemplo, as cadeias de abastecimento mundiais, o acesso a matérias-primas estrangeiras e a logística. Apesar dos riscos, as alterações climáticas apresentam oportunidades às empresas da UE para criarem soluções de adaptação para os mercados mundiais. A gestão dos riscos e a exploração das oportunidades têm de ser tidos em consideração e facilitados pela política comercial da UE. O comércio também deve fazer parte das parcerias com os países em desenvolvimento para reforçar as suas possibilidades de adaptação.

4.27.

O CESE observa que a dinâmica política verificada atualmente à escala mundial não tem precedentes. O papel de liderança da Europa é indiscutível: o Pacto Ecológico Europeu foi o primeiro compromisso político anunciado com o nível adequado de ambição e orientação. A cimeira do presidente Joe Biden sobre as alterações climáticas (10), realizada em abril de 2021, foi um êxito notável e representa um ponto de viragem. As maiores economias do mundo — os Estados Unidos, a China, a União Europeia, o Japão, o Reino Unido, a Índia, o Canadá, a Coreia e o Brasil — estão finalmente a alinhar-se pelo objetivo de descarbonização profunda. O CESE reconhece que a UE tem de aproveitar esta dinâmica e intensificar os esforços à escala mundial para prosseguir a ambição de atenuação das alterações climáticas e adaptação às mesmas, nos termos do Acordo de Paris.

O papel dos intervenientes da sociedade civil

4.28.

A adaptação não pode ser concretizada com êxito sem o apoio ativo dos intervenientes da sociedade civil.

4.29.

Por conseguinte, as trajetórias de adaptação devem ser desenvolvidas em conjunto com todas as partes interessadas: decisores, empregadores e trabalhadores, organizações não governamentais (ONG), o setor financeiro, os cientistas e os produtores de tecnologias. A sociedade civil à escala nacional, regional e, mais importante ainda — tendo em conta o caráter local das políticas de adaptação —, à escala local deve participar em todas as fases do planeamento e da execução.

4.30.

A estratégia deve também promover e acompanhar o envolvimento dos parceiros sociais em diferentes setores à escala europeia e em todos os Estados-Membros garantindo um diálogo social bipartido e tripartido forte e incentivando, se for caso disso, a negociação coletiva.

4.31.

Há que desenvolver, estabelecer e utilizar instrumentos de participação das partes interessadas, incluindo os promovidos pela ciência cidadã.

4.32.

O CESE observa que é necessário reservar recursos financeiros significativos para a operacionalização destes instrumentos, o que exige a conceção científica dos mesmos e um investimento no reforço de capacidades.

4.33.

As organizações da sociedade civil também desempenham um papel importante na sensibilização, nomeadamente para temas relacionados com os hábitos de consumo, a utilização da energia e dos transportes e a conservação da natureza. Desempenham um papel importante na mobilização da sociedade, na transmissão às pessoas de mensagens relacionadas com a proteção do clima e na prestação de informações ao público para apoiar as decisões sobre o que pode ser feito para combater e adaptar-se às alterações climáticas.

4.34.

Mais importante ainda é o facto de serem os intervenientes da sociedade civil quem aplica as medidas de adaptação na prática. Por exemplo, muitas medidas de adaptação já são aplicadas por empresas que têm de prever mudanças, por exemplo, na procura de produtos, nas condições de investimento e de produção e na elegibilidade para seguros. As empresas também desenvolvem e fornecem à sociedade soluções de adaptação. Cumpre apoiar estas ações criando e incentivando condições para a inovação, o investimento e as trocas comerciais.

4.35.

Os empregadores e os trabalhadores estão em melhor posição para identificar os desafios e riscos que as consequências das alterações climáticas representam para os seus locais de trabalho, tais como a exposição a temperaturas elevadas, radiações ultravioletas naturais e outros perigos para a saúde e a segurança decorrentes das alterações climáticas. Devem participar na conceção e execução das políticas de adaptação a todos os níveis, com especial destaque para as condições de trabalho.

4.36.

O consumo de materiais, produtos e serviços tem um impacto direto na extensão da extração de recursos naturais e nos níveis de emissão, com importantes implicações para outros limites do planeta. O comportamento dos consumidores pode influenciar as emissões e a utilização dos recursos, tanto direta como indiretamente, e, por conseguinte, também a magnitude das alterações climáticas.

4.37.

No entanto, o CESE observa que o envolvimento ativo dos consumidores não é uma solução «mágica», e tão-pouco o é a participação de um qualquer parceiro a título individual. A atenuação das alterações climáticas e adaptação às mesmas exigem consciência e empenho por parte de todos os membros da sociedade, promovidos pelos governos e por outros responsáveis políticos. As ações políticas ousadas e uma transição ecológica célere serão, acima de tudo, os derradeiros catalisadores do desenvolvimento sustentável e determinarão, em especial, o êxito da ação de atenuação das alterações climáticas e de adaptação às mesmas.

Bruxelas, 7 de julho de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=COM:2021:82:FIN

(2)  https://www.eea.europa.eu//publications/climate-change-impacts-and-vulnerability-2016

(3)  https://covid19commission.org/enhancing-global-cooperation

(4)  OMS Europa, 2019, Environmental health inequalities resource package, Gabinete Regional para a Europa, Copenhaga.

(5)  Relatório n.o 21/2019 da AEA.

(6)  JO C 440 de 6.12.2018, p. 45; JO C 240 de 16.7.2019, p. 37; JO C 47 de 11.2.2020, p. 58; JO C 110 de 22.3.2019, p. 9.

(7)  JO C 264 de 20.7.2016, p. 98; JO C 230 de 14.7.2015, p. 99; JO C 14 de 15.1.2020, p. 29; JO C 367 de 10.10.2018, p. 97; JO C 345 de 13.10.2017, p. 102.

(8)  https://www.unsdsn.org/the-future-europe-wants-a-green-and-digital-job-based-and-inclusive-recovery-from-covid-19-pandemic

(9)  https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/ALL/?uri=COM:2021:188:FIN

(10)  O presidente dos Estados Unidos da América, Joe Biden, e o enviado para o clima, John Kerry, reuniram dirigentes mundiais que representam 82 % das emissões mundiais de carbono, 73 % da população mundial e 86 % da produção económica mundial para se empenharem numa ação climática ousada. Fonte: https://ourworldindata.org/co2-emissions