ISSN 1977-1010

Jornal Oficial

da União Europeia

C 110

European flag  

Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

62.° ano
22 de março de 2019


Índice

Página

 

I   Resoluções, recomendações e pareceres

 

PARECERES

 

Comité Económico e Social Europeu

 

539.a reunião plenária do CESE, 12.12.2018-13.12.2018

2019/C 110/01

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O custo da não imigração e da não integração (parecer de iniciativa)

1

2019/C 110/02

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Uma bioeconomia sustentável na UE — Novas oportunidades para a economia europeia (parecer de iniciativa)

9

2019/C 110/03

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Facilitar o acesso dos intervenientes não estatais ao financiamento das ações climáticas (parecer de iniciativa)

14

2019/C 110/04

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre A situação das mulheres ciganas (parecer exploratório a pedido do Parlamento Europeu)

20

2019/C 110/05

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Igualdade de género nos mercados de trabalho europeus (parecer exploratório a pedido do Parlamento Europeu)

26

2019/C 110/06

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Aplicação da legislação ambiental da UE: qualidade do ar, água e resíduos (parecer exploratório)

33


 

III   Atos preparatórios

 

COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU

 

539.a reunião plenária do CESE, 12.12.2018-13.12.2018

2019/C 110/07

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões relativa a um setor retalhista europeu apto para o século XXI[COM(2018) 219 final]

41

2019/C 110/08

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Relatório sobre a Política de Concorrência 2017[COM(2018) 482 final]

46

2019/C 110/09

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (UE) 2015/1588 do Conselho, de 13 de julho de 2015, relativo à aplicação dos artigos 107.o e 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia a determinadas categorias de auxílios estatais horizontais[COM(2018) 398 final — 2018/0222 (NLE)]

52

2019/C 110/10

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho sobre a ação da União na sequência da sua adesão ao Ato de Genebra do Acordo de Lisboa relativo às denominações de origem e às indicações geográficas[COM(2018) 365 final — 2018/0189 (COD)]

55

2019/C 110/11

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta alterada de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.o 1093/2010 que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Bancária Europeia); o Regulamento (UE) n.o 1094/2010 que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma); o Regulamento (UE) n.o 1095/2010 que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados), o Regulamento (UE) n.o 345/2013 relativo aos fundos europeus de capital de risco; o Regulamento (UE) n.o 346/2013 relativo aos fundos europeus de empreendedorismo social; o Regulamento (UE) n.o 600/2014 relativo aos mercados de instrumentos financeiros; o Regulamento (UE) 2015/760 relativo aos fundos europeus de investimento a longo prazo; o Regulamento (UE) 2016/1011 relativo aos índices utilizados como índices de referência no quadro de instrumentos e contratos financeiros ou para aferir o desempenho de fundos de investimento; o Regulamento (UE) 2017/1129 relativo ao prospeto a publicar em caso de oferta de valores mobiliários ao público ou da sua admissão à negociação num mercado regulamentado; e a Diretiva (UE) 2015/849 relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo[COM(2018) 646 final — 2017/0230 (COD)]

58

2019/C 110/12

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira, que revoga a Ação Comum 98/700/JAI do Conselho, o Regulamento (UE) n.o 1052/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho e o Regulamento (UE) 2016/1624 do Parlamento Europeu e do Conselho — Contributo da Comissão para a reunião dos Chefes de Estado e de Governo de 19 e 20 de setembro de 2018 em Salzburgo [COM (2018) 631 final — 2018/0330 (COD)]

62

2019/C 110/13

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à prevenção da difusão de conteúdos terroristas em linha — Contribuição da Comissão Europeia para a reunião dos dirigentes realizada em Salzburgo em 19 e 20 de setembro de 2018[COM (2018) 640 final — 2018-0331 (COD)]

67

2019/C 110/14

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE, Euratom) n.o 1141/2014 no que diz respeito a um procedimento de verificação de violações das regras em matéria de proteção de dados pessoais no âmbito das eleições para o Parlamento Europeu [COM(2018) 636 final — 2018/0328 (COD)]

72

2019/C 110/15

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria o Fundo Europeu de Defesa[COM(2018) 476 final]

75

2019/C 110/16

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização (FEG)[COM(2018) 380 final]

82

2019/C 110/17

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria o programa Europa Criativa (2021-2027) e que revoga o Regulamento (UE) n.o 1295/2013[COM(2018) 366 final]

87

2019/C 110/18

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo aos requisitos mínimos para a reutilização da água[COM(2018) 337 final]

94

2019/C 110/19

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à harmonização das obrigações de comunicação de informações no âmbito da política ambiental e que altera as Diretivas 86/278/CEE, 2002/49/CE, 2004/35/CE, 2007/2/CE, 2009/147/CE e 2010/63/UE, os Regulamentos (CE) n.o 166/2006 e (UE) n.o 995/2010, e os Regulamentos (CE) n.o 338/97 e (CE) n.o 2173/2005 do Conselho [COM(2018) 381 final — 2018/0205 (COD)]

99

2019/C 110/20

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas e que revoga o Regulamento (UE) n.o 508/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho[COM(2018) 390 final — 2018/0210 (COD)]

104

2019/C 110/21

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Uma Europa que protege: ar limpo para todos[COM(2018) 330 final]

112

2019/C 110/22

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1224/2009 do Conselho e que altera os Regulamentos (CE) n.o 768/2005, (CE) n.o 1967/2006, (CE) n.o 1005/2008 do Conselho e (UE) 2016/1139 do Parlamento Europeu e do Conselho, no que respeita ao controlo das pescas[COM(2018) 368 final — 2018/0193 (COD)]

118

2019/C 110/23

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2008/106/CE relativa ao nível mínimo de formação dos marítimos e que revoga a Diretiva 2005/45/CE[COM (2018) 315 final — 2018/0162 (COD)]

125

2019/C 110/24

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho que estabelece o Programa de Investigação e Formação da Comunidade Europeia da Energia Atómica para o período de 2021-2025, que complementa o Horizonte Europa — Programa-Quadro de Investigação e Inovação[COM(2018) 437 final — 2018/0226 (NLE)]

132

2019/C 110/25

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Conselho que altera a Decisão 2007/198/Euratom, que institui a Empresa Comum Europeia para o ITER e o Desenvolvimento da Energia de Fusão e que lhe confere vantagens[COM(2018) 445 final — 2018/0235 (NLE)]

136

2019/C 110/26

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho que estabelece o programa de assistência ao desmantelamento nuclear da central nuclear de Ignalina na Lituânia (programa Ignalina) e revoga o Regulamento (UE) n.o 1369/2013 do Conselho[COM(2018) 466 final — 2018/0251 (NLE)], Proposta de regulamento do Conselho que estabelece um programa financeiro específico para o desmantelamento de instalações nucleares e a gestão de resíduos e que revoga o Regulamento (Euratom) n.o 1368/2013 do Conselho[COM(2018) 467 final — 2018/0252 (NLE)] e Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre a avaliação e execução dos programas de assistência ao desmantelamento nuclear na Bulgária, na Eslováquia e na Lituânia[COM(2018) 468 final]

141

2019/C 110/27

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Recomendação de decisão do Conselho que autoriza a abertura de negociações com vista a uma convenção que estabelece um tribunal multilateral para a resolução de litígios em matéria de investimento[COM(2017) 493 final]

145

2019/C 110/28

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria o Instrumento de Assistência de Pré-Adesão (IPA III)[COM(2018) 465 final — 2018/0247 (COD)]

156

2019/C 110/29

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Instrumento de Vizinhança, Desenvolvimento e Cooperação Internacional e Instrumento para a Cooperação no domínio da Segurança Nuclear[COM(2018) 460 final — 2018/0243 (COD)]

163


PT

 


I Resoluções, recomendações e pareceres

PARECERES

Comité Económico e Social Europeu

539.a reunião plenária do CESE, 12.12.2018-13.12.2018

22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O custo da não imigração e da não integração»

(parecer de iniciativa)

(2019/C 110/01)

Relator:

Pavel TRANTINA

Relator:

José Antonio MORENO DÍAZ

Decisão da plenária

15.2.2018

Base jurídica

Artigo 29. o , n.o 2, do Regimento

 

Parecer de iniciativa

 

 

Competência

Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

7.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

149/09/13

1.   Síntese das conclusões e recomendações

1.1.

O CESE considera que a imigração tem uma influência positiva no crescimento demográfico e da mão de obra. Mesmo que o crescimento natural da população seja negativo, a imigração pode contribuir para manter a população e a mão de obra constantes. É certo que a imigração não é a solução ideal para fazer face às consequências do envelhecimento demográfico na Europa, mas poderá ser uma solução para a escassez de mão de obra e de competências que não estão relacionadas com os processos demográficos.

1.2.

Um cenário de não imigração na Europa significaria o seguinte:

As economias dos Estados-Membros seriam consideravelmente afetadas; os mercados de trabalho ficariam sob uma pressão possivelmente insustentável, indústrias completas desapareceriam, a produção agrícola diminuiria, a construção não conseguiria acompanhar a procura.

Os desafios demográficos agravar-se-iam; os regimes de pensões poderiam tornar-se insustentáveis, o setor da saúde e dos cuidados de saúde poderia acabar, o despovoamento de certas regiões avançaria a um ritmo acelerado; com efeito, a coesão social seria prejudicada.

Uma proibição completa da migração legal conduziria inevitavelmente a um aumento exponencial das tentativas de migração irregular. Tal, por seu turno, levaria a uma securização, a uma repressão e a um policiamento excessivos, com custos desmesurados. Encorajaria mercados de trabalho não declarados, exploração e escravatura moderna, bem como tentativas desesperadas de reagrupamento familiar.

O racismo e a xenofobia desenvolver-se-iam ainda mais do que atualmente; os residentes permanentes com antecedentes migratórios, incluindo a segunda ou terceira gerações, seriam alvo da desconfiança e da indignação populares.

1.3.

Por outro lado, nos países de acolhimento, a migração tem o potencial de produzir os seguintes efeitos: preencher as ofertas de emprego e colmatar o défice de competências; manter o crescimento económico e preservar a prestação de serviços a uma população em envelhecimento, em localidades onde há escassez de jovens; as disparidades nas pensões de reforma podem ser colmatadas pelas contribuições de novos trabalhadores jovens migrantes; os imigrantes trazem energia e inovação; a diversidade cultural e étnica enriquece os países de acolhimento; as áreas em vias de despovoamento podem ser revitalizadas, incluindo as escolas que podem ser transformadas. Os países de origem beneficiam das remessas (pagamentos transferidos pelos migrantes para os países de origem), que superam a ajuda externa; os migrantes que regressam levam poupanças, competências e contactos internacionais.

1.4.

Para se explorar plenamente o potencial da migração, é necessária uma abordagem que, entre outras coisas, utilize melhor as competências da população migrante. O CESE está convicto de que esta abordagem deve ter por base políticas e mecanismos de validação das competências adequados, e insta a UE e os Estados-Membros a apoiarem a sua rápida elaboração. Além disso, a aplicação adequada de parcerias em matéria de competências com países terceiros beneficiaria mutuamente os países da UE e os países de origem dos migrantes.

1.5.

A UE deve adotar políticas e medidas que incentivem uma migração segura, ordenada e regular e que reforcem a integração e a coesão social.

1.6.

A não integração acarreta riscos e custos económicos, socioculturais e políticos. Assim, a melhor garantia contra eventuais problemas, custos e tensões no futuro consiste em investir na integração dos migrantes. As políticas públicas devem abordar os receios, as preocupações e inquietações de diversas camadas da população das sociedades da UE, a fim de evitar discursos xenófobos e anti-UE. Para tal, as políticas devem prever um conjunto claro, coerente e motivado das obrigações dos migrantes, mas também a denúncia coerente da retórica e dos comportamentos antimigrantes.

1.7.

O CESE salienta que a promoção da integração é fundamental para reforçar os valores e princípios fundamentais da UE, dos quais a diversidade, a igualdade e a não discriminação assumem uma importância crucial. A integração diz respeito a toda a sociedade, incluindo aos migrantes que se estabelecem num país de acolhimento, independentemente do seu estatuto ou da sua origem. No entanto, são necessárias políticas específicas para pessoas com vulnerabilidades específicas (como os refugiados). Uma abordagem de base comunitária e um apoio específico personalizado poderão produzir melhores resultados do que uma abordagem de modelo único. É, portanto, imperativo que os Estados-Membros da UE aprendam uns com os outros e se esforcem honestamente por promover um ambiente que permita a integração dos migrantes e evite os riscos.

2.   Contexto e objetivos do parecer

2.1.

Os maiores movimentos migratórios na Europa desde a Segunda Guerra Mundial acentuaram as preocupações dos cidadãos em relação a novos movimentos migratórios descontrolados e chamaram a atenção para a importância de uma estratégia conjunta para lutar contra a migração irregular e garantir a capacidade da UE de agir. Os Estados-Membros da UE têm enfrentado desafios em matéria de gestão, financiamento e comunicação da migração, bem como dos receios dos cidadãos em relação à mesma. Embora alguns políticos tenham explorado a situação, o CESE está convencido da necessidade urgente de mudar a narrativa sobre a migração e regressar a um debate nacional baseado em factos. Os refugiados e os migrantes não devem ser vistos como uma ameaça, mas como uma oportunidade para o modelo económico e social da Europa.

2.2.

As atuais políticas que atribuem ao controlo da migração a prioridade máxima no domínio dos negócios estrangeiros comprometem a posição da UE nas relações externas, tornando-a vulnerável a chantagem e propensa a uma perda de credibilidade em matéria de direitos humanos. O CESE estima que a UE e os Estados-Membros devem ir além do atual modelo e assegurar que são promovidas formas de entrada regulares para facilitar uma migração ordenada e uma integração bem-sucedida. A existência de vias seguras e legais podem aliviar a pressão sobre o sistema de asilo da UE.

2.3.

Ao mesmo tempo, enquanto os mercados da UE alimentarem a procura de mão de obra, haverá migração regular ou de outro tipo. Em determinadas profissões, pelo menos, a procura aumentará (setor dos cuidados de saúde, trabalho doméstico, serviços sociais, construção, etc.) (1).

2.4.

Durante as Jornadas da Sociedade Civil 2017, em junho, Federica Mogherini, alta-representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, proferiu um discurso sobre «A Europa global e o seu papel na paz e estabilidade» (2). No seu discurso, afirmou que a Europa necessitava de migração por motivos económicos e culturais. Propôs que o CESE elaborasse um estudo ou um relatório sobre os custos da não migração, pois tinha a perceção de que se, de um dia para o outro, a UE fosse privada de todos os seus migrantes vários setores da economia europeia desapareceriam. O relatório apresentaria o ponto de vista dos intervenientes económicos e sociais sobre o que seria a Europa sem migrantes. O presente parecer de iniciativa surge no seguimento da ideia por ela lançada.

2.5.

A migração tem muitas caras — pode ser regular, irregular ou, como tem sido o caso nos últimos três anos, humanitária, na sequência da guerra na Síria e noutras partes do mundo. Os fluxos migratórios também são mistos e a migração laboral pode ser sazonal, manual ou altamente qualificada. O presente documento incide principalmente sobre a migração laboral (e reagrupamento familiar conexo) segura, ordenada e apoiada pela UE. Porém, analisa igualmente outras formas de imigração para a UE e o potencial contributo dos migrantes que chegam por motivos humanitários — por um período temporário (requerentes de asilo), bem como a migração irregular.

3.   Observações na generalidade

3.1.   Demografia — Envelhecimento da população e regressão dos seus números na UE

3.1.1.

No início do século XXI, a Europa é confrontada com o envelhecimento demográfico, a estagnação ou mesmo o declínio das populações autóctones, o desemprego elevado e (em alguns dos seus principais Estados-Membros) também com o lento crescimento económico. Ao mesmo tempo, a Europa continua a ser um dos principais destinos da migração (3).

3.1.2.

As mutações na dimensão da mão de obra constituem um dos principais desafios da União Europeia. Embora a oferta de mão de obra (dimensão da mão de obra) não evolua independentemente da procura de mão de obra, as respetivas trajetórias futuras podem ser calculadas através da combinação de vários cenários de participação no mercado de trabalho com projeções demográficas, tal como identificado pelos autores da European Demographic Data Sheet 2018 (ficha de dados demográficos europeus para 2018) (4). A mão de obra atual na União Europeia é composta de cerca de 245 milhões de trabalhadores. A fim de estimar a futura oferta de mão de obra até 2060, os autores definiram três cenários para a participação no mercado de trabalho, que variam entre 214, 227 ou 245 milhões de trabalhadores.

3.1.3.

Outras previsões, como as apresentadas pela Comissão Europeia na sua ficha informativa para a Cimeira Social de Gotemburgo, realizada em 2017, defendem que, em 2060, haverá para cada pessoa idosa duas pessoas em idade ativa. Atualmente, existem quatro. Esta situação põe seriamente em risco a manutenção do modelo social europeu, tal como o conhecemos hoje.

3.1.4.

Por outro lado, a imigração tem uma influência positiva no crescimento demográfico e da mão de obra. Mesmo que o crescimento natural da população seja negativo, a imigração pode contribuir para manter a população e a mão de obra constantes. A imigração poderá também ser uma solução para a escassez de mão de obra e de competências que não estão relacionadas com os processos demográficos. No entanto, tal como preconiza o Instituto de Economia Internacional de Hamburgo (HWWI) no seu relatório intitulado «The Costs and Benefits of European Immigration» (5) (Os custos e benefícios da imigração europeia), a imigração não é a solução ideal para responder às consequências do envelhecimento demográfico na Europa (dado que os migrantes também envelhecem).

3.2.   O potencial da migração laboral dos países terceiros

São identificados os seguintes impactos (6):

3.2.1.

Nos países de acolhimento:

preencher as ofertas de emprego e colmatar o défice de competências,

manter o crescimento económico,

preservar a prestação de serviços a uma população em envelhecimento, em localidades onde há escassez de jovens,

as disparidades nas pensões de reforma podem ser colmatadas pelas contribuições de novos trabalhadores jovens migrantes, que também pagam impostos,

os imigrantes trazem energia e inovação,

a diversidade cultural e étnica enriquece os países de acolhimento,

as áreas em vias de despovoamento podem ser revitalizadas, incluindo as escolas com regressão no número de alunos.

3.2.2.

Nos países de origem:

os países em desenvolvimento beneficiam não só das remessas (pagamentos transferidos pelos migrantes para os países de origem), que agora frequentemente superam a ajuda externa (7), mas também do intercâmbio cultural,

a taxa de desemprego é reduzida e os jovens migrantes melhoram as suas perspetivas de vida,

os migrantes que regressam levam poupanças, competências e contactos internacionais.

4.   O custo da não imigração

4.1.   Manter o crescimento económico e satisfazer as necessidades do mercado de trabalho

4.1.1.

A imigração proveniente de países terceiros tem um impacto direto e indireto no crescimento económico: existe uma correlação clara entre o crescimento da mão de obra resultante da imigração e o crescimento do PIB agregado. Por exemplo, nos últimos anos, a Suécia atribuiu milhares de autorizações de trabalho a criadores de tecnologias da informação, colhedores de bagas e cozinheiros. A imigração laboral contribui com valores significativos para a economia sueca: o número de empresas que recrutam imigrantes laborais aumenta mais depressa do que as empresas comparáveis. Anualmente, os imigrantes laborais não UE/EEE contribuem com mais de mil milhões de euros para o PIB da Suécia e com mais de 400 milhões de euros em receitas fiscais (8).

4.1.2.

Entre 2004 e 2014, a população migrante gerou um crescimento de 70 % da população ativa da Europa (9). É difícil especificar o impacto que uma escassez de mão de obra desta magnitude teria na economia europeia e em cada um dos Estados-Membros. Além disso, a população nascida no estrangeiro integra normalmente nichos de mercado (segmentação) que estão em forte crescimento ou em declínio, proporcionando maior flexibilidade para responder às necessidades do mercado de trabalho da UE.

4.1.3.

Do mesmo modo, a população migrante tem um impacto no estado do emprego em cada país, contribuindo para o consumo e a criação de novos postos de trabalho. Os empresários migrantes contribuem para o crescimento económico e a criação de emprego, não raro revitalizando ofícios artesanais negligenciados e participando cada vez mais no fornecimento de bens e serviços de valor acrescentado (10). O CESE recomenda, por conseguinte, que para reforçar a «criatividade e capacidade de inovação» dos empresários migrantes sejam tomadas medidas específicas ao nível europeu, nacional e local. O objetivo é erradicar a discriminação e criar igualdade de condições para todos, de modo a poderem contribuir para o crescimento integrador e a criação de empregos de qualidade (11).

4.1.4.

O CESE também considera que, tendo em conta a sua tendência particular para operarem nos setores dos cuidados e da assistência e nas atividades da economia da partilha e da economia circular, as empresas da economia social podem favorecer e apoiar não só novos postos de trabalho, mas também o empreendedorismo e o acesso dos migrantes às atividades económicas fora da UE (12).

4.1.5.

A avaliação do impacto orçamental da imigração é uma questão complexa. No entanto, a OCDE afirma (13) que, no final de contas, os migrantes tiveram um impacto orçamental nulo nos últimos 50 anos, ou seja, todas as despesas que poderão ter gerado foram cobertas pelas receitas provenientes dos impostos e das taxas cobrados.

4.1.6.

Um estudo realizado pela Oxford Economics (14) concluiu que os trabalhadores migrantes tinham contribuído para manter uma oferta de mão de obra adequada que permitiu alimentar a expansão económica de 2004-2008. A disponibilidade de mão de obra migrante parece ter contribuído de forma decisiva para a sobrevivência de certas empresas ou para estas não precisarem de transferir a sua produção para o estrangeiro (os autores mencionam um inquérito que envolveu 600 empresas, das quais 31 % indicou que os migrantes eram importantes para a sobrevivência da empresa, um valor que aumenta para 50 % nos domínios da saúde, da assistência social e da agricultura).

4.1.7.

É evidente que a imigração pode ser economicamente vantajosa tanto para os países de origem como para os países de acolhimento. No entanto, com as atuais estruturas económicas e comerciais, os países ricos e poderosos são os que beneficiam mais. A migração também tem o potencial de unir as pessoas a nível cultural e de promover a compreensão mútua, mas se não forem envidados esforços para dissipar os mal-entendidos, os preconceitos ou os mitos das populações locais, mas também das comunidades migrantes, surgirão fricções.

4.2.   Colmatar o défice de competências

4.2.1.

Em geral, de acordo com um estudo elaborado pelo Institute for Market Economics [Instituto de Economia de Mercado] (IME) (15), encomendado pelo CESE e publicado em 24 de julho de 2018, a economia europeia perde mais de 5 % da produtividade cada ano devido à incompatibilidade das competências dos trabalhadores com as necessidades do mercado de trabalho. O estudo refere que tal corresponde a uma perda de 80 cêntimos de euro por cada hora de trabalho. Os setores mais afetados são as TI e as comunicações, a medicina e, de forma mais geral, a ciência, a tecnologia e a engenharia. O fenómeno também afeta professores, enfermeiros e parteiras. Esta tendência tem vindo a agravar-se devido ao declínio demográfico e à evolução tecnológica, afirmam os autores. Este défice de competências pode ser colmatado, em parte, pela migração laboral.

4.2.2.

Contudo, para se explorar plenamente o potencial da migração neste domínio, é necessária uma abordagem que, entre outras coisas, utilize melhor as competências e as qualificações da população migrante. Os imigrantes são, em geral, demasiado qualificados para os lugares que lhes são oferecidos (16).

4.2.3.

O défice de competências só pode ser parcialmente colmatado se as competências e qualificações dos imigrantes forem validadas. Contudo, os mecanismos de validação da UE ainda estão em desenvolvimento e dependem dos Estados-Membros. Os Estados-Membros e intervenientes no terreno não utilizam suficientemente a ferramenta da UE de definição de perfis de competências. No entanto, existem iniciativas não governamentais, tais como os «cartões de competência» ou a ferramenta de autoavaliação profissional em linha criados pela Bertelsmann Stiftung (17).

4.2.4.

A aplicação adequada de parcerias em matéria de competências com países terceiros beneficiaria mutuamente os países da UE e os países de origem dos migrantes.

4.3.   Manter o setor dos cuidados de saúde

4.3.1.

A escassez de mão de obra no setor dos cuidados de saúde é uma «bomba-relógio». A situação atual é de crise (18), e essa escassez tenderá a agravar-se, a menos que surjam respostas adequadas no plano político. Já em 1994 a Comissão Europeia definia o setor da prestação de cuidados como um setor estratégico. Em 2010, alertou para o facto de que, até 2020, a não serem tomadas medidas corretivas de emergência, o défice de oferta de mão de obra no setor da prestação de cuidados de saúde atingiria os dois milhões de trabalhadores, incluindo um milhão de profissionais no domínio dos cuidados continuados (19).

4.3.2.

A escassez de mão de obra é notória em profissões no âmbito da prestação de cuidados de saúde em muitos Estados-Membros, e essa escassez nos cuidados pode ser colmatada através do recrutamento de cuidadores profissionais, tanto em situação regularizada como sem documentos. Os sistemas de prestação de cuidados nos países do sul da Europa, em particular, dependem em larga medida dos cuidadores profissionais residentes. Em Itália, por exemplo, os migrantes nesta profissão representam cerca de três quartos da mão de obra afeta à prestação de cuidados no domicílio (20).

4.3.3.

Os países da Europa Central e Oriental também sofrem os efeitos da escassez de mão de obra no setor da prestação de cuidados, assim como do aumento das necessidades de cuidados na Europa Ocidental. A Polónia, por exemplo, é o país de origem de muitos cuidadores profissionais ativos noutros países, apesar da reduzida mão de obra no setor. Esta escassez está a ser minorada com a chegada à Polónia de trabalhadores provenientes da Ucrânia e de outros países terceiros (21).

4.3.4.

É também importante assinalar o contributo económico significativo das mulheres migrantes para as famílias e as comunidades através de trabalho remunerado, bem como a necessidade de resolver desigualdades entre homens e mulheres nos mercados de trabalho (22). Estudos revelam que a maioria das trabalhadoras migrantes está empregada no setor dos serviços (por exemplo, restauração, serviço doméstico e cuidados de saúde). O trabalho irregular, o subemprego e o emprego com contrato a tempo determinado podem criar desvantagens para as migrantes nos mercados de trabalho da UE, sendo de continuar a desenvolver as medidas de garantia de igualdade de tratamento e de proteção das pessoas vulneráveis.

4.4.   Combater o despovoamento das zonas rurais e remotas

4.4.1.

As zonas rurais, montanhosas e insulares estão a ficar despovoadas, o que cria uma espiral económica e social descendente, que ganha ímpeto à medida que mais pessoas migram para as cidades. A perda de população reduz a quantidade de dinheiro que circula numa comunidade, o que, por sua vez, afeta a viabilidade das empresas, do comércio e das ligações de transporte locais, bem como a disponibilidade de estruturas e serviços essenciais.

4.4.2.

Em algumas regiões da UE, como na Irlanda ou em Brandeburgo, o despovoamento está a ser colmatado pela instalação de migrantes. No caso da agricultura, por exemplo, o contributo dos trabalhadores migrantes foi essencial na Irlanda do Norte para garantir a sobrevivência de um setor com graves problemas de oferta de mão de obra e do seu envelhecimento. A população migrante está disposta a aceitar postos de trabalho com salários e em condições recusados pela população local, bem como a viver em aldeias com um elevado risco de despovoamento, apesar de se tratar de um setor não regulamentado e onde existe um elevado risco de exploração laboral (23).

4.4.3.

Ao abrigo da política de desenvolvimento rural da União Europeia, há a possibilidade de assistir as comunidades rurais locais com a chegada de migrantes. Uma série de organizações de desenvolvimento rural destacaram a eventual assistência que as zonas rurais podem oferecer aos migrantes, cuja chegada poderia contribuir para a revitalização das zonas subpopuladas e/ou em declínio económico. No seu estudo de 2017, o Parlamento Europeu salientou a importância de dar apoio para a inserção e integração sociais dos migrantes no mercado de trabalho (24).

4.5.   Abordar a diversidade cultural

4.5.1.

A falta de população migrante contribuiria para a perda da diversidade nos países da UE, o que levaria a uma retórica xenófoba e autocomplacente contrária aos princípios orientadores da União Europeia. Além disso, perder-se-ia um elemento que contribui para a expansão de valores como a igualdade de tratamento e a não discriminação, os quais progrediram nos últimos anos graças à visibilidade da população de origem migrante.

4.6.

Por tudo o que precede, a não imigração para a UE deve ser rejeitada enquanto cenário irrealista, não aplicável e extremamente prejudicial.

5.   O custo da não integração (e formas de o evitar)

5.1.

Para se explorar plenamente o potencial da migração para a Europa, tal como acima referido, e ao mesmo tempo minimizar os riscos conexos e duradouros e os custos socioeconómicos evitáveis, é da maior importância criar condições para uma integração bem-sucedida dos migrantes.

5.2.

Os princípios básicos comuns para a política de integração dos imigrantes na União Europeia (25), adotados pelo Conselho em 2004, apresentam os principais pontos pertinentes para a compreensão do conceito pela UE. Nesses princípios básicos comuns a integração é entendida como um processo dinâmico e bidirecional de adaptação mútua de todos os imigrantes e residentes nos Estados-Membros. Esta interpretação contradiz a conceção errada e generalizada da integração como sinónimo de assimilação, ou seja um processo unidirecional em que as pessoas abandonam as suas características nacionais e culturais para adotarem as do seu novo país de residência (26). No entanto, tal como reiterado no Plano de Ação da UE sobre a integração dos nacionais de países terceiros, de 2016, um elemento essencial de viver e participar na UE é a compreensão e a adesão aos seus valores fundamentais (27).

5.3.

Cabe destacar que a integração diz respeito a todos os migrantes instalados num país de acolhimento, independentemente do seu estatuto ou origem. No entanto, são necessárias políticas específicas para pessoas com vulnerabilidades específicas (como os refugiados). Uma abordagem de base comunitária poderá produzir melhores resultados do que uma abordagem de modelo único.

5.4.

O emprego constitui uma parte central do processo de integração. Os Estados-Membros e os parceiros económicos e sociais consideram, assim, prioritária a integração dos migrantes no mercado de trabalho. Com efeito, a procura de mão de obra migrante continua a ser um dos principais incentivos da imigração.

5.5.

Outras variáveis essenciais que determinam a integração dos migrantes no país de acolhimento são a certeza e a previsibilidade do estatuto de migrante, as possibilidades de aquisição de nacionalidade e os obstáculos à mesma, as possibilidades de reagrupamento familiar, a disponibilidade de cursos de línguas, os requisitos em matéria de conhecimentos linguísticos e culturais, os direitos políticos e a abertura geral de uma determinada sociedade, bem como a sua vontade de acolher, apoiar e interagir com os recém-chegados, e vice-versa.

5.6.

Além disso, a integração dos migrantes está estreitamente ligada a uma multiplicidade de políticas em termos de proteção no local de trabalho, habitação, cuidados de saúde, educação, direitos das mulheres, igualdade e não discriminação, citando apenas alguns exemplos.

5.7.

Num esforço para quantificar as políticas em vigor, criou-se o Índice das Políticas de Integração dos Migrantes (MIPEX), que fornece dados comparáveis sobre os Estados-Membros da UE e vários outros países (28). Os resultados sublinham as divergências existentes entre os Estados-Membros, incluindo a persistência do fosso entre o Leste e o Oeste.

5.8.

Seguindo a lógica do cenário de «não integração dos migrantes», podem ser identificados os seguintes riscos e/ou custos:

5.8.1.   Económicos

exclusão dos migrantes do mercado formal (e aumento do trabalho não declarado),

custos mais elevados para resolver problemas sociais após a sua ocorrência, em vez de os impedir,

incapacidade dos migrantes de explorar plenamente o seu potencial (muitas vezes transferida para as gerações seguintes).

5.8.2.   Socioculturais

ausência de identificação com os valores e as normas do país de acolhimento e de sua aceitação,

agravamento das diferenças socioculturais entre os migrantes e as comunidades de acolhimento,

discriminação estrutural dos migrantes, incluindo a falta de acesso adequado aos serviços,

aumento da xenofobia e da desconfiança mútua,

replicação de barreiras linguísticas,

segregação espacial, conduzindo à formação de guetos,

rutura da coesão social global.

5.8.3.   Segurança

aumento dos discursos de incitamento ao ódio e dos crimes de ódio,

diminuição da manutenção da ordem pública e eventual aumento das taxas de criminalidade, em especial nas zonas das pessoas socialmente excluídas,

possível radicalização e aumento do apoio a ideologias extremas (tanto pelas comunidades migrantes como pela sociedade de acolhimento).

5.9.

Tendo em conta o que precede, a melhor garantia contra eventuais problemas, custos e tensões no futuro consiste em investir na integração dos migrantes.

5.10.

As políticas devem prever um conjunto claro, coerente e motivado de obrigações dos migrantes, mas também a denúncia coerente da retórica e dos comportamentos antimigrantes.

5.11.

É, portanto, imperativo que os Estados-Membros da UE aprendam uns com os outros e se esforcem honestamente por promover um ambiente que permita a integração dos migrantes e evite os riscos acima referidos.

5.12.

É de assinalar abertamente que os esforços envidados por governos que visam criminalizar ou marginalizar os migrantes, incitar o nacionalismo étnico e reduzir o financiamento das medidas de integração (incluindo a não distribuição de fundos disponibilizados pela UE) — como observado recentemente em alguns Estados-Membros vão diretamente contra estes objetivos e podem causar danos irreparáveis a longo prazo.

5.13.

Por último, mas não menos importante, a promoção da integração é fundamental para reforçar os valores e princípios fundamentais da UE, dos quais a diversidade, a igualdade e a não discriminação assumem uma importância crucial.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Por exemplo, de entre os 4,3 milhões de imigrantes na UE em 2016, cerca de 2 milhões de cidadãos provinham de países terceiros, 1,3 milhões de pessoas tinham a cidadania de um Estado-Membro da UE diferente daquele para onde migraram, cerca de 929 000 pessoas migraram para um Estado-Membro da UE de que tinham cidadania (por exemplo, cidadãos nacionais regressados ou nascidos no estrangeiro) e cerca de 16 000 pessoas eram apátridas.

(2)  Discurso de Federica Mogherini nas Jornadas da Sociedade Civil 2017.

(3)  Portal de Dados sobre Migração.

(4)  European Demographic Data Sheet 2018.

(5)  The costs and benefits of European immigration, Econstor.

(6)  Com base no artigo «The pros and cons of Migration» (Os prós e contras da migração), Embrace, utilizando as suas conclusões.

(7)  Perspetivas sobre o desenvolvimento mundial 2017, OCDE.

(8)  DAMVAD Analytics (2016): «Labour immigration contributes to Swedish economic development» (A imigração laboral contribui para o desenvolvimento económico sueco).

(9)  OCDE (2014): «Is migration good for the economy?» (A migração é boa para a economia?), Migration Policy Debates (Debates sobre a política de migração).

(10)  Rath, J., Eurofound (2011), Promoting ethnic entrepreneurship in European cities (Promover o empreendedorismo imigrante nas cidades europeias), Serviço das Publicações Oficiais da União Europeia, Luxemburgo.

(11)  JO C 351 de 15.11.2012, p. 16.

(12)  JO C 283 de 10.8.2018, p. 1.

(13)  Perspetivas das migrações internacionais 2013, OCDE.

(14)  «The Economic, Labour Market and Skills Impacts of Migrant Workers in Northern Ireland» (O impacto dos trabalhadores migrantes na economia, no mercado de trabalho e nas competências na Irlanda do Norte), Departamento do Trabalho e da Aprendizagem, Reino Unido.

(15)  CESE (2018): Skills Mismatches — An Impediment to the Competitiveness of EU Businesses (Inadequação das competências — Um entrave à competitividade das empresas da UE), (ISBN: 978-92-830-4159-7).

(16)  LABOUR-INT: «Integration of migrants and refugees in the labour market through a multi-stakeholder approach» (Integração dos migrantes e dos refugiados no mercado de trabalho mediante uma abordagem multilateral).

(17)  «Meine Berufserfahrung zählt» (A minha experiência profissional conta).

(18)  UNI Europa UNICARE (2016).

(19)  Comissão Europeia (2013).

(20)  Serviço de Estudos do Parlamento Europeu (2016).

(21)  JO C 487 de 28.12.2016, p. 7.

(22)  Relatório sobre «Migrant women in the EU labour force. Summary of findings» (Mulheres migrantes entre os trabalhadores da UE. Resumo das conclusões), CE.

(23)  Nori, M. (2017). The shades of green: migrants' contribution to EU agriculture: context, trends, opportunities, challenges (As tonalidades de verde — O contributo dos migrantes para a agricultura da UE: contexto, tendências, oportunidades, desafios).

(24)  «EU rural development policy and the integration of migrants» (A política europeia de desenvolvimento rural e a integração dos migrantes), PE.

(25)  «Common Basic Principles for Immigrant Integration Policy in the EU» (Princípios básicos comuns para a política de integração dos imigrantes na União Europeia).

(26)  Para mais informações sobre a diferença conceptual, ver, por exemplo, «Assimilation vs integration» (Assimilação vs. Integração), Centro para o Estudo do Islão no Reino Unido, Área de Recursos para os Professores de Religião.

(27)  Plano de Ação sobre a integração dos nacionais de países terceiros.

(28)  Índice das Políticas de Integração dos Migrantes 2015: «How countries are promoting integration of immigrants» (A forma como os países promovem a integração dos imigrantes).


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/9


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Uma bioeconomia sustentável na UE — Novas oportunidades para a economia europeia»

(parecer de iniciativa)

(2019/C 110/02)

Relator:

Mindaugas Maciulevičius

Correlatora:

Estelle Brentnall

Decisão da Plenária

15.2.2018

Base jurídica

Artigo 29.o, n.o 2, do Regimento

Parecer de iniciativa

 

 

Competência

Comissão Consultiva das Mutações Industriais (CCMI)

Adoção pela CCMI

25.9.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

205/3/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

Introduzir um quadro de políticas e incentivos a longo prazo, coerente e transparente para promover a bioeconomia. É necessário um forte empenho político para enfrentar os muitos desafios societais transversais, e o ambiente político da União Europeia (UE) poderia ser mais favorável aos bioprodutos inovadores e às matérias-primas produzidas de forma sustentável na União. Os incentivos financeiros ou fiscais poderiam ajudar a fomentar os investimentos necessários, uma vez que são os Estados-Membros e as regiões, e não a UE, quem tem competência nestes domínios. As organizações de polos empresariais que agrupam PME e produtores primários de biomassa sustentável desempenham um papel fundamental no desenvolvimento de relações entre os intervenientes na cadeia de abastecimento. Um exercício de levantamento continuado e atualizado (1), associado à medição dos efeitos da bioeconomia, poderá identificar os polos empresariais ativos no domínio dos bioprodutos, devendo ser tomadas medidas para facilitar o desenvolvimento de novos polos a nível europeu, regional e nacional, nos casos em que existam lacunas.

1.2.

O papel dos agricultores, dos proprietários florestais e das suas cooperativas é essencial para assegurar uma utilização eficiente dos recursos naturais e contribuir para uma bioeconomia circular. São necessários um quadro financeiro plurianual, uma política agrícola comum e uma estratégia florestal europeia fortes para apoiar os serviços de aconselhamento, a formação e o intercâmbio de conhecimentos, a fim de responder melhor às necessidades dos agricultores e das cooperativas agrícolas. É necessário promover exemplos concretos para dar a conhecer e demonstrar os benefícios da bioeconomia para toda a cadeia de valor, de modo a atrair jovens agricultores e novos agricultores que criem novas empresas neste domínio. Há que promover também as organizações e cooperativas de produtores enquanto instrumentos importantes para aumentar a mobilização e o valor acrescentado da biomassa existente na UE. Por conseguinte, o apoio aos setores da agricultura e da silvicultura da União é crucial para aumentar o investimento e a inovação na produção sustentável de biomassa.

1.3.

Apoiar a criação de mercados e ajudar os consumidores e o público a tomarem decisões informadas sobre os produtos e os setores que apoiam através das suas compras diárias. Para colmatar a insuficiente sensibilização dos consumidores e transmitir mensagens coerentes e precisas sobre os bioprodutos, a União Europeia deve elaborar uma estratégia de comunicação que envolva todos os parceiros na cadeia de valor e todas as outras partes interessadas. Um primeiro passo importante nesse sentido foi o estabelecimento de normas claras a nível da UE para os bioprodutos, o qual pode abrir caminho à introdução de medidas de criação de mercados para impulsionar a aceitação, pelos consumidores e pelas entidades adjudicantes do setor público, dos bioprodutos produzidos na UE.

1.4.

Proporcionar uma rentabilidade financeira sustentável dos investimentos através de um financiamento de «balcão único». A regulamentação inteligente e a sua aplicação coerente a vários níveis em toda a UE devem constituir uma prioridade, a fim de eliminar obstáculos e reduzir os encargos administrativos e, ao mesmo tempo, garantir a sustentabilidade. Por exemplo, uma ferramenta baseada na Internet poderia ajudar a identificar o financiamento disponível e determinar se o requerente cumpre os critérios de elegibilidade para este mecanismo. Tal sistema poderia também fornecer as ligações e os recursos necessários para a apresentação de candidaturas diretas ao mecanismo de financiamento. Poderia funcionar como um mercado, disponibilizando informação sobre o financiamento disponível e colocando os requerentes de financiamento em contacto com potenciais financiadores (por exemplo, como um sítio Internet de financiamento colaborativo). Além disso, a continuação da Empresa Comum Bioindústrias (Empresa Comum BBI 2.0) após o atual Quadro Financeiro Plurianual é crucial para fomentar as cadeias de valor, novas e existentes, de bioprodutos e reforçar a competitividade das instalações de produção existentes, bem como para contribuir para o desenvolvimento rural, a criação de emprego e a promoção de empresas.

1.5.

A política de desenvolvimento regional da UE pós-2020 deve disponibilizar fundos suficientes para continuar a desenvolver as zonas rurais. Tais fundos devem privilegiar o apoio aos investimentos em infraestruturas e serviços necessários à existência de empresas eficientes e sustentáveis no domínio da bioeconomia rural.

1.6.

Aproveitar as oportunidades científicas e apoiar a adoção de inovações através de um quadro jurídico flexível, proporcionado e sólido. A investigação é fundamental para permitir, consolidar e avaliar a inovação na bioeconomia. A exploração comercial depende não só de uma investigação excelente, mas também de um quadro estratégico, jurídico e societal adequado para assegurar uma transferência rápida de conhecimentos para a indústria. Os pioneiros devem obter o espaço e o apoio necessários para inovar e acelerar o seu trabalho dentro dos limites regulamentares. Devem ser estabelecidos acordos de inovação e acordos ecológicos com as partes interessadas quando a regulamentação pode apoiar melhor o desenvolvimento da bioeconomia em geral e quando são necessárias soluções criativas. Além disso, a inovação é crucial para aumentar a sustentabilidade da produção de biomassa na UE.

1.7.

Melhorar os programas de educação, formação e de competências para novos talentos e para os trabalhadores existentes. A exploração do potencial da bioeconomia pode conduzir à criação de novos postos de trabalho. Contudo, a introdução de novas tecnologias coloca desafios importantes à organização do trabalho e às competências de que os trabalhadores necessitam. Por conseguinte, garantir o desenvolvimento e a adaptação contínuos das competências pessoais ao longo da vida reveste-se da maior importância. O compromisso de todas as partes interessadas pertinentes — produtores de biomassa, instituições de ensino, empresas, sindicatos, serviços públicos de emprego e governos — no sentido de melhorar a qualidade e a capacidade de resposta da oferta de educação e formação profissional é essencial para reduzir a inadequação das competências reforçando as ligações entre os sistemas de ensino e os mercados de trabalho. No entanto, as políticas globais de desenvolvimento e adequação de competências devem ser parte integrante de um conjunto de ações mais alargado que inclui as políticas em matéria de emprego, indústria, investimento, inovação e ambiente.

1.8.

Explorar a utilização da biomassa. A utilização mais eficiente da oferta de biomassa existente deve ser uma prioridade para dar resposta à crescente procura de matérias-primas. Por conseguinte, há que melhorar também a quantidade e a qualidade dos solos produtivos disponíveis para a agricultura, bem como incentivar a utilização de terras abandonadas, marginais ou subutilizadas. Os produtores de matérias-primas, sobretudo agricultores e proprietários florestais, desempenham um papel crucial no desenvolvimento da bioeconomia. São necessárias medidas de sensibilização para as potenciais oportunidades (utilizando diversos tipos de culturas) e o desenvolvimento de infraestruturas para a recolha, o armazenamento e o transporte de biomassa. A diminuição da complexidade dos sistemas de divulgação de informações sobre a sustentabilidade, o reforço da capacidade de produção e a transformação de biomassa versátil também poderão ter um papel decisivo. A utilização de resíduos e desperdícios como fontes alternativas de biomassa e a gestão sustentável das florestas europeias oferecem oportunidades para a bioeconomia e a bioenergia. É necessário avaliar os fluxos de resíduos sustentáveis, bem como realizar novos investimentos na mobilização da madeira e dos resíduos lenhosos. Além disso, é preciso desenvolver tecnologias para fazer face à variabilidade inerente a estes produtos. Em alguns casos, poderá ser necessário ajustar as políticas nacionais para ter em conta a utilização dos resíduos em bioprodutos.

2.   Observações na generalidade

2.1.

A bioeconomia engloba a produção de recursos biológicos renováveis e a sua conversão em alimentos para consumo humano e animal, bioprodutos e bioenergia. Abrange, assim, os setores da agricultura, silvicultura, pescas, alimentação e produção de pasta de papel e de papel, bem como setores das indústrias química, biotecnológica e energética. Para efeitos do presente parecer, a investigação em matéria de genomas, processos celulares e bioinformática não é especificamente tomada em consideração. A Estratégia Bioeconómica da UE de 2012 tinha por objetivo «preparar a via para uma sociedade mais inovadora, eficiente na utilização de recursos e competitiva que concilie a segurança alimentar com a utilização sustentável dos recursos renováveis para fins industriais, garantindo simultaneamente a proteção do ambiente». Em 2017, a Comissão procedeu a uma revisão da Estratégia Bioeconómica da UE de 2012, que concluiu que a estratégia demonstrou a pertinência dos seus objetivos e que a importância das oportunidades oferecidas pela bioeconomia é cada vez mais reconhecida na Europa e não só.

2.2.

Não obstante, embora os objetivos da Estratégia Bioeconómica da UE de 2012 continuem a ser pertinentes para enfrentar os desafios da segurança alimentar e nutricional, e o plano de ação que a acompanha tenha cumprido os objetivos propostos, considera-se necessária uma reorientação das ações e uma avaliação do âmbito de aplicação da estratégia à luz de desenvolvimentos políticos recentes, nomeadamente os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (ODS) e a Convenção-Quadro sobre Alterações Climáticas (compromissos da COP 21). Prevê-se que a população mundial cresça para quase 10 mil milhões de pessoas até 2050, e os recursos biológicos devem ser utilizados de forma mais eficiente para que possa haver alimentos seguros, nutritivos, de alta qualidade e a preços comportáveis para mais pessoas, com menos impacto ambiental e climático por unidade produzida, e suficiente matéria biológica renovável para produzir uma parte considerável do que retiramos atualmente do petróleo bruto fóssil, em conjunto com a energia eólica, solar e outras energias renováveis.

2.3.

Neste contexto, a bioeconomia sustentável é transversal a vários setores e está no centro das estratégias económicas sustentáveis em todo o mundo. A bioeconomia pode desempenhar um papel fundamental na competitividade europeia e neste momento é importante identificar e utilizar as suas oportunidades aos níveis europeu, dos Estados-Membros e regional. Por exemplo, noutros países terceiros, nomeadamente nos Estados Unidos, há uma liderança descendente (top-down) no desenvolvimento de uma bioeconomia que gera quase 400 mil milhões de dólares e apoia mais de quatro milhões de postos de trabalho através de contribuições diretas, indiretas e induzidas (2).

2.4.

A bioeconomia oferece opções que podem ajudar a reduzir as emissões de CO2 e a diminuir a dependência de recursos fósseis importados. Por exemplo, as florestas da UE sequestram uma quantidade de carbono correspondente a 10 % das emissões anuais da UE, ao mesmo tempo que fornecem uma quantidade sustentável e constante de biomassa para a produção de energia renovável. Além disso, as estimativas mostram que os 100 000 produtos químicos atualmente em produção podem, em teoria, ser obtidos a partir de matérias-primas renováveis. Tal não significa que todos o devam ser, mas é teoricamente possível. Este facto pode não apenas oferecer a possibilidade de produzir os nossos objetos domésticos do quotidiano localmente e de modo renovável, mas também criar emprego e crescimento na Europa, onde o ímpeto tecnológico permanece forte.

2.5.

No entanto, continuam a existir grandes entraves a uma maior inovação no âmbito da bioeconomia na UE. Um obstáculo significativo respeita à competitividade em termos de custos dos produtos em relação às alternativas fósseis e a produtos equivalentes de outras partes do mundo. A competitividade em termos de custos é afetada por muitos fatores, incluindo o nível de maturidade tecnológica, os custos da mão de obra, os subsídios aos combustíveis fósseis e a amortização dos investimentos, bem como o baixo nível de apoio do mercado aos produtos de base biológica. Este problema da competitividade é agravado pelas dificuldades no acesso ao financiamento para projetos inovadores e unidades de produção e, muitas vezes, pela persistente falta de sensibilização dos utilizadores finais para os bioprodutos, bem como a ausência de competências e relações operacionais para fazer avançar o setor. Além disso, os procedimentos de licenciamento de novos projetos de base biológica estão a tornar-se lentos e onerosos, gerando insegurança jurídica e riscos financeiros consideráveis para os agentes económicos.

3.   Observações na especialidade

3.1.

Estima-se que os setores da bioeconomia na UE apresentem um volume de negócios anual de cerca de 2 biliões de euros e empreguem perto de 19,5 milhões de pessoas (3), na sua maioria residentes em zonas rurais e costeiras, um número que representa cerca de 8,5 % da mão de obra da UE-28. Prevê-se que a agricultura, o setor florestal e as comunidades rurais beneficiem do desenvolvimento do setor dos bioprodutos em toda a UE através da criação de emprego e de rendimentos. A transformação da biomassa e a produção de bioprodutos proporcionam novas oportunidades de negócio relativas ao cultivo e à comercialização de culturas diversificadas. Em conjunto com culturas convencionais como os cereais, as oleaginosas, as batatas e a beterraba-açucareira, novas culturas, designadamente as gramíneas, as culturas silvícolas, as algas e as microalgas são consideradas potenciais criadoras de rendimentos futuros nas zonas rurais e costeiras.

3.2.

As biorrefinarias existentes já fornecem meios de subsistência e capacitação económica a famílias e comunidades rurais. Estas biorrefinarias — fábricas que utilizam matérias-primas renováveis (ou seja, biomassa, subprodutos e coprodutos, bem como resíduos) em vez de recursos fósseis — constituem o núcleo da bioeconomia. Localizadas em zonas rurais e costeiras, perto das matérias-primas renováveis que transformam, estão no centro da produção de alimentos para consumo humano e animal, da produção industrial e da produção de madeira e energia.

3.3.

As biorrefinarias reforçam cada componente das plantas que transformam, produzindo uma quantidade mínima de resíduos. Através de tecnologias eficientes e/ou inovadoras, as biorrefinarias baseadas na UE fabricam um vasto leque de produtos, tais como alimentos para consumo humano e animal, produtos químicos, fibras e combustíveis, que combinam as características de serem renováveis, reutilizáveis, recicláveis, compostáveis ou biodegradáveis. A versatilidade dos produtos e ingredientes biológicos é tal que estes podem ser utilizados numa grande variedade de aplicações, tais como alimentos para peixe, construção, cosmética, cartão, detergentes, combustíveis, lubrificantes, tinta, papel, produtos farmacêuticos, plásticos e outros produtos industriais, substituindo deste modo os ingredientes de origem fóssil por ingredientes renováveis.

3.4.

A criação de novas biorrefinarias, assim como o desenvolvimento e a expansão das já existentes, constituem um investimento em fábricas pioneiras. As biorrefinarias são instalações de capital intensivo, implicam períodos longos de retorno do investimento e estão expostas a riscos tecnológicos e de mercado. Por conseguinte, um quadro regulamentar e financeiro claro, estável e orientado para o apoio é importante para promover estes investimentos na Europa. Atualmente, é possível aceder a vários instrumentos diferentes, incluindo o programa Horizonte 2020 (e o novo e ambicioso programa-quadro de investigação e inovação Horizonte Europa, cuja proposta legislativa é acolhida com apreço) e a Empresa Comum Bioindústrias; os Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI); o Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (Feader); o InnovFin; o Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos (FEIE); e, por último mas não menos importante, o Banco Europeu de Investimento (BEI), para os empréstimos e as garantias. Contudo, o acesso a estes instrumentos pode ser difícil. Um balcão único para as empresas terem acesso a informação aprofundada e ajustada às suas necessidades poderia dar resposta a estes obstáculos.

3.5.

Neste contexto, é vital a abertura à sociedade civil, em conjunto com os agricultores, os proprietários florestais e a indústria, para incentivar o debate sobre a definição de uma bioeconomia mais competitiva para a Europa em benefício de todos. Ajudar a comunicar os benefícios da bioeconomia é fundamental para concretizar esta mudança de paradigma no sentido de uma economia com menos carbono baseada nas energias renováveis. Neste aspeto, os sistemas de certificação e rotulagem credíveis podem ser instrumentos importantes para alcançar uma indústria bioeconómica sustentável e fiável, bem como para dar confiança aos clientes industriais, às entidades adjudicantes públicas e aos consumidores.

3.6.

A UE, os Estados-Membros e os órgãos de poder regional podem dar contributos decisivos para ajudar a bioeconomia a crescer, estimulando a procura no mercado de produtos e serviços renováveis, inteligentes e eficientes em termos de recursos. Os Estados-Membros devem incluir nos futuros planos estratégicos da PAC medidas concretas para desenvolver e/ou continuar a apoiar os investimentos e promover soluções sustentáveis para os agricultores e os proprietários florestais da UE, bem como para as suas cooperativas, a fim de aumentar a sua competitividade e eficiência. Sempre que exista potencial para os bioprodutos substituírem as alternativas de carbono fóssil de modo sustentável, tal pode ser viabilizado através da elaboração de nova legislação, como o pacote da energia circular, e mediante a eventual revisão de outra legislação aplicável para incentivar a substituição de produtos tradicionais de carbono fóssil por alternativas de base biológica produzidas localmente. As atuais atividades de normalização, como as desenvolvidas pelo TC411 (Comité Técnico 411 do CEN), e os regimes de certificação existentes e/ou os novos sistemas de rotulagem voluntária como o biobased% também poderão ser úteis para esse fim.

3.7.

As entidades adjudicantes públicas a nível nacional e regional devem aumentar as referências a este tipo de certificação e rotulagem de conteúdos biológicos, tendo em conta a sua credibilidade. Por exemplo, em 2016, o organismo de normalização neerlandês NEN lançou um novo sistema de certificação de bioprodutos, o biobased% (http://www.biobasedcontent.eu/). Este sistema determina a quantidade de biomassa contida num produto e ajuda as empresas a prestarem informações transparentes e credíveis sobre os conteúdos biológicos de um produto nas comunicações destinadas quer a outras empresas quer aos consumidores. Tem por base a norma europeia EN 16785-1:2015 (que prevê um método para determinar os conteúdos biológicos de produtos sólidos, líquidos e gasosos utilizando a análise com carbono radioativo e análises elementares). As avaliações da conformidade são realizadas por organismos de certificação que tenham celebrado um acordo com o NEN. Agora que existe esta certificação, é importante sensibilizar para esta questão e incentivar a utilização de matérias-primas renováveis na legislação da UE atual e futura.

3.8.

No setor florestal, os sistemas de certificação desempenham um papel importante para garantir uma mobilização sustentável da biomassa. Por exemplo, 60 % das florestas da UE são certificados ao abrigo do programa para o reconhecimento de certificações florestais (PEFC) e/ou do sistema do Conselho de Gestão das Florestas (FSC). Além disso, a produção silvícola da UE obedece às mais elevadas normas ambientais do mundo, decorrentes de legislação como o regulamento da UE relativo à madeira, as regras em matéria de utilização dos solos, reafetação dos solos e silvicultura (LULUCF), as Diretivas «Aves» e «Habitats» e o pacote de medidas relativas à economia circular.

3.9.

Melhorar a comunicação empresa a empresa (B2B) e empresa ao consumidor (B2C) é, por conseguinte, fundamental. Sensibilizar a opinião pública com base em informações precisas, pertinentes e acessíveis é essencial para garantir o desenvolvimento de uma bioeconomia inteligente, sustentável e inclusiva, criar um mercado para os bioprodutos sustentáveis e promover um consumo e uma produção mais sustentáveis. São necessárias ações de sensibilização especialmente a nível regional e local, incluindo prémios ou galardões, assim como exposições sobre o papel da tecnologia e da ciência na bioeconomia.

3.10.

Por conseguinte, é fundamental transmitir mensagens claras e precisas aos cidadãos. Uma vez que a bioeconomia oferece diversas oportunidades de resposta aos desafios societais, é necessário sujeitá-la a uma avaliação económica global. Esta fornecerá informações sobre a dimensão da bioeconomia transversalmente a vários setores, bem como sobre o seu contributo para o crescimento económico e os respetivos efeitos a nível do mercado de trabalho. A comunidade científica desempenha um papel importante nesta matéria. Também por este motivo é essencial manter o investimento na investigação interdisciplinar e fundamental para que a UE concretize o seu potencial, contribuindo para a investigação e a inovação mundiais em prol da segurança alimentar e nutricional, da competitividade e da bioeconomia baseada no conhecimento. É crucial que a posição legislativa da UE tenha plenamente em conta a evolução das provas e experiências científicas em todo o mundo e que os processos de decisão sobre a supervisão regulamentar sejam transparentes.

3.11.

A educação das crianças e dos jovens do ensino básico e secundário é fundamental para criar uma geração que compreenda os desafios e aproveite as oportunidades da bioeconomia. Por exemplo, ensinar os princípios da circularidade, da ação simultaneamente global e local (agir «glocalmente»), e suscitar o interesse pela descoberta contribuirá para preparar a nova geração para encontrar o seu caminho. Já foram criados novos planos curriculares em universidades que combinam, nomeadamente, as ciências da vida, a engenharia e o marketing. Estes cruzamentos entre disciplinas e um ambiente favorável para empresas em fase de arranque podem ajudar os estudantes a tornarem-se empresários na área da bioeconomia. A formação profissional tem de evoluir para se adequar às exigências de qualificação na produção primária, no fabrico, nos transportes e noutros setores pertinentes. Além disso, numa fase posterior da sua vida, os trabalhadores precisam de atualizar as suas aptidões e competências. Os programas de aprendizagem ao longo da vida que ligam os estabelecimentos de ensino aos produtores, empregadores e trabalhadores, bem como aos investigadores e inovadores, podem apoiar este processo.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  https://biconsortium.eu/news/mapping-european-biorefineries.

(2)  Ver ficha informativa da USDA: An Economic Impact Analysis of the U.S. Biobased Products Industry: 2016 Update (Uma análise do impacto económico da indústria norte-americana de produtos de base biológica: Atualização de 2016) em: https://www.biopreferred.gov/BPResources/files/BiobasedProductsEconomicAnalysis2016FS.pdf.

(3)  Todos os valores citados constam de «JRC science for policy report: 2016 Bioeconomy Report» (Relatório do JRC sobre o contributo da ciência para a definição de políticas: relatório de 2016 sobre a bioeconomia), disponível em http://publications.jrc.ec.europa.eu/repository/bitstream/JRC103138/kjna28468enn.pdf.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/14


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Facilitar o acesso dos intervenientes não estatais ao financiamento das ações climáticas»

(parecer de iniciativa)

(2019/C 110/03)

Relator:

Cillian LOHAN (IE-III)

Base jurídica

Artigo 29.o, n.o 2, do Regimento

 

Parecer de iniciativa

Decisão da plenária

15.2.2018

 

 

Competência

Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

27.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

114/6/7

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

Embora tenha sido assumido o compromisso de disponibilizar recursos consideráveis no âmbito dos pactos finança-clima, o CESE chama a atenção para o problema do acesso dos pequenos intervenientes não estatais no domínio do clima a um financiamento que assegure o apoio e a realização de iniciativas potencialmente transformadoras.

1.2.

Os fluxos de financiamento das ações climáticas na União Europeia (UE) devem ser monitorizados e mapeados com urgência, o que facilitará a aferição do impacto nos intervenientes não estatais no domínio do clima e promoverá o progresso numa transição mais geral da economia para um modelo hipocarbónico.

1.3.

As fontes de financiamento são muito díspares, o mesmo acontecendo com as iniciativas ascendentes que necessitam de acesso. Não existem mecanismos para resolver este desfasamento. A solução é a constituição de um Fórum Finança-Clima inclusivo ao nível da UE.

1.4.

O CESE propõe um Fórum Finança-Clima para abordar as questões fundamentais, reunindo as principais partes interessadas para identificar obstáculos, conceber soluções e determinar os mecanismos mais eficientes para melhorar a repartição do financiamento, incluindo um tipo de serviço de «emparelhamento» que ligue os projetos às fontes de financiamento apropriadas no domínio do clima.

1.5.

É necessário criar um mecanismo (divulgando-o posteriormente de forma eficaz) que abranja iniciativas que necessitem de montantes mais reduzidos e que inclua:

um processo de candidatura simplificado,

requisitos de prestação de informações simplificados,

cofinanciamento,

apoio a projetos na fase de conceção e de pré-candidatura ao financiamento,

apoio ao reforço das capacidades, criação de redes, intercâmbios e desenvolvimento de plataformas ao nível local, regional, nacional e europeu.

1.6.

A concentração no financiamento das ações climáticas não deve implicar a ausência de financiamento responsável noutros domínios. Todos os financiamentos devem ser revistos à luz da luta contra as alterações climáticas, a fim de assegurar que todo e qualquer financiamento concedido à margem do financiamento específico para as ações climáticas não prejudica os compromissos e as metas em matéria de clima. Este objetivo deve ser respeitado no âmbito do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), do Acordo de Paris, para que os fluxos financeiros existentes sejam coerentes com a transição para baixas emissões de gás com efeito de estufa e um desenvolvimento resistente às alterações climáticas.

1.7.

Há que desenvolver um conjunto de instrumentos, com uma estratégia da comunicação clara, que permita aos intervenientes não estatais a todos os níveis perceberem e aceder ao financiamento das ações climáticas. O conjunto de instrumentos deve facilitar aos promotores de projetos elaborar projetos que contribuam para uma economia hipocarbónica e resistente às alterações climáticas.

2.   Introdução

2.1.

O presente parecer surge na sequência do Parecer do CESE «Coligação para cumprir os compromissos assumidos no Acordo de Paris» (1) e do Parecer do CESE «Promover ações climáticas por intervenientes não estatais» (2), assim como de um estudo (3) recente do CESE que chamou a atenção para os entraves que impedem uma maior participação dos intervenientes não estatais nas ações climáticas.

2.2.

Em 2018, o CESE apelou para um Diálogo Europeu sobre a Ação Climática Não Estatal, a fim de consolidar e de aumentar o âmbito e a escala da ação climática não estatal a nível europeu. O CESE afirmou que o diálogo deve ter como objetivo não só destacar e divulgar as ações, como também responder às necessidades dos intervenientes não estatais, fomentando a criação de novas parcerias entre intervenientes estatais e não estatais, facilitando a aprendizagem entre pares, a formação e a partilha de conselhos entre intervenientes não estatais, aumentando o financiamento disponível e agilizando o acesso ao mesmo.

2.2.1.

O termo «intervenientes não estatais» refere-se aos intervenientes que não são partes na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (CQNUAC). Esta interpretação lata do termo inclui vários tipos de atividades, nomeadamente as pequenas e médias empresas e microempresas, os investidores, as cooperativas, os municípios e regiões, os sindicatos, as comunidades e os grupos de cidadãos, as organizações confessionais, os grupos de jovens e outras organizações não governamentais.

2.2.2.

O processo proposto de Diálogo Europeu sobre a Ação Climática Não Estatal deve apoiar o acesso ao financiamento para as ações climáticas não estatais. Tal deve incluir:

o mapeamento das oportunidades de financiamento,

o aconselhamento sobre projetos passíveis de financiamento,

a análise da forma como a cadeia de valor financeiro existente (tanto pública como privada) concede o financiamento para os investimentos no domínio do clima projetados por intervenientes não estatais,

o exame das possibilidades de uma distribuição eficaz do financiamento por projetos em menor escala que tenham potencial transformador,

a análise dos atuais procedimentos de diálogo e consulta com os intervenientes não estatais, tendo em vista criar novas técnicas e boas práticas para aumentar a utilização dos fundos europeus e internacionais existentes,

a defesa de que o próximo quadro financeiro plurianual da UE sirva as ambições mais elevadas para a ação climática dos intervenientes não estatais e incentive as suas ações,

a exploração de formas de financiamento inovadoras (financiamento entre pares, financiamento colaborativo, microfinanciamento, obrigações verdes, etc.).

2.3.

O financiamento das ações climáticas pode ser interpretado de várias maneiras, mas o Comité Permanente de Finanças da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (CQNUAC) define-o como um financiamento que visa reduzir as emissões e reforçar os sumidouros dos gases com efeito de estufa, bem como reduzir a vulnerabilidade e manter e aumentar a resistência dos sistemas humanos e ecológicos ao impacto negativo das alterações climáticas.

2.4.

O presente parecer examina o financiamento das ações climáticas no tocante aos Estados-Membros da UE e às não-partes na CQNUAC nesses países, oferecendo às organizações da sociedade civil, aos municípios e ao governo local acesso aos instrumentos financeiros necessários para assistir na elaboração e execução de projetos, iniciativas e atividades que contribuem para reduzir as emissões e para criar comunidades resistentes às alterações climáticas.

2.5.

É importante encarar o presente parecer no contexto da justiça climática (4), como forma de assegurar que os custos das ações climáticas não recaiam desproporcionadamente nas pessoas mais pobres e mais vulneráveis da sociedade.

2.6.

O financiamento dos primeiros passos na transição para uma economia hipocarbónica, bem como na adaptação e atenuação, é essencial para assegurar uma transição equitativa e para acelerar as ações ao nível local.

2.7.

Para micro e pequenos projetos, pode ser difícil aceder a montantes entre 2 000 e 250 000 euros. São necessários mecanismos eficientes para assegurar que as ações de base comunitária em pequena escala não ficam excluídas do potencial transformador do financiamento das ações climáticas.

2.8.

Ao longo da última década, a UE tem desenvolvido com sucesso uma série de mecanismos de financiamento desse tipo adaptados às necessidades — Instrumento Europeu para a Democracia e os Direitos Humanos (IEDDH), Aliança Mundial contra as Alterações Climáticas (AMAC), instrumentos financeiros para a cooperação descentralizada e o cofinanciamento de ONG —, que poderão inspirar o desenvolvimento de instrumentos adequados para as ações climáticas.

3.   Problemas identificados

Contexto

3.1.

O CESE está firmemente empenhado na visão da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas e do Acordo de Paris. No entanto, a trajetória em que nos encontramos permitirá, na melhor das hipóteses, limitar o aumento da temperatura a 3 oC ou mais, muito acima do que está previsto no Acordo de Paris. A transição para a sustentabilidade exige esforços consideráveis e investimentos substanciais. A média anual dos investimentos para atenuar os efeitos relacionados com a energia para o período de 2015 a 2050 em soluções que limitem o aquecimento global a 1,5 oC está estimada em cerca de 900 mil milhões de dólares americanos, segundo um relatório especial do Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas (PIAC) sobre os efeitos de um aquecimento global de 1,5 oC acima dos níveis pré-industriais.

3.2.

Embora os investimentos necessários para combater as alterações climáticas sejam elevados, não são tão avultados como os investimentos que foram necessários nos últimos anos para salvar um setor financeiro em colapso. Nessa ocasião, foram mobilizados investimentos de 2,5 biliões de euros. A destruição potencial dos ecossistemas que nos sustentam deve merecer, no mínimo, uma resposta equivalente.

3.3.

O debate sobre o financiamento das ações climáticas concentra-se demasiadas vezes na criação de novas rubricas orçamentais explícitas, ao passo que o Acordo de Paris insta a que todos os fluxos financeiros sejam coerentes com a transição para baixas emissões de gases com efeito de estufa e um desenvolvimento resistente às alterações climáticas.

3.4.

A Parceria de Marraquexe e a Agenda Mundial de Ação Climática representam oportunidades para associar os intervenientes não estatais ao processo formal da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (CQNUAC). Atrair ações no interior da UE, e financiar ações para maximizar o seu impacto potencial, não é uma prioridade quando da elaboração dos pacotes de financiamento.

3.5.

Embora se tenham registado progressos no financiamento da luta contra o aquecimento global e os seus efeitos, a verdade é que são insuficientes. O último relatório do Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas (5) afirma claramente que nos encontramos num período crítico, sendo necessárias ações drásticas na próxima década para limitar o impacto a níveis geríveis. Deve ser atribuída prioridade política a uma economia e finanças sustentáveis, em particular através de uma legislação clara, estável e que incentive a ação.

3.6.

Não é suficiente afetar uma percentagem fixa do orçamento ao financiamento das ações climáticas se outra parte do orçamento for despendida em atividades prejudiciais ao clima. Todas as necessidades de financiamento devem ser examinadas à luz do seu impacto no clima. Segundo um documento de trabalho do Fundo Monetário Internacional, as subvenções diretas e indiretas, a nível mundial, a favor das energias fósseis ascendem a 5,3 biliões de dólares americanos por ano, o que equivale a mais de 15 mil milhões de dólares americanos por dia. Mesmo com o ambicionado Fundo Verde para o Clima, dotado de 100 mil milhões de dólares americanos anuais, não é possível compensar os efeitos negativos destas subvenções.

3.7.

A transição energética não terá lugar com êxito em tempo útil e em harmonia com os compromissos europeus assumidos no âmbito do Acordo de Paris se a questão da pobreza energética for negligenciada ao nível político. É necessária uma repartição equitativa dos custos e dos benefícios financeiros e sociais associados à transição da Europa para energias sustentáveis entre todos os níveis de governo e os intervenientes de mercado, incluindo os cidadãos. O estudo científico do Heat Roadmap Europe (6) indica que a Europa conseguirá reduzir 86 % das suas emissões de GEE até 2050, em comparação com 1990, com as tecnologias existentes de uma forma acessível e eficaz em termos de custos.

3.8.

A investigação realizada para o presente parecer salientou a falta de informações sobre o mapeamento dos fluxos de financiamento das ações climáticas nos Estados-Membros. É difícil avaliar se os fundos estão a ser repartidos em montantes mais pequenos e acessíveis ou qual o efeito transformador do financiamento. Esta ausência de acompanhamento e comunicação aumenta a ambiguidade em torno do problema identificado e impede o desenvolvimento de soluções mais eficazes.

Acesso por parte das empresas e das PME

3.9.

O acesso ao financiamento continua a ser um desafio de monta para todos os tipos de intervenientes não estatais, incluindo os diferentes desafios enfrentados pelas PME e pelas empresas de maior dimensão. Este desafio diz respeito não só à disponibilidade de financiamento mais elevado e adicional, mas também à clareza dos mecanismos de financiamento existentes.

3.10.

Além disso, é também difícil definir o que constitui um «investimento ecológico». Os investidores preocupam-se em especial com os riscos e os lucros, e é-lhes difícil avaliar o impacto potencial no clima de uma proposta de projeto e de aferir as suas possibilidades de sucesso. Os mutuantes privados terão relutância em financiar um projeto sem perceberem claramente quais os riscos do investimento e os mecanismos de redução dos riscos, ou seja, sem garantias.

Acesso por parte dos órgãos de poder local e regional

3.11.

No que se refere aos governos infranacionais, os fatores que limitam o seu acesso ao financiamento incluem baixas notações de crédito, capacidade limitada de mobilizar o financiamento privado devido à dimensão insuficiente do mercado de investimentos em infraestruturas hipocarbónicas e a perfis risco-retorno pouco atraentes, e limites soberanos definidos pelos governos nacionais para os montantes dos empréstimos do setor privado ao governo infranacional, se forem permitidos.

Acesso por parte de iniciativas de base comunitária

3.12.

Atualmente, há milhares de iniciativas locais em matéria de alterações climáticas e sustentabilidade na Europa. Estas iniciativas podem dar um contributo significativo para a consecução dos objetivos da UE em matéria de clima, energia e sustentabilidade, mas dependem sobretudo de voluntários, e um dos principais entraves ao seu desenvolvimento e crescimento é a falta de financiamento e de apoio profissional. Muitas vezes, são necessários apenas recursos muito limitados, sem os quais, porém, as iniciativas têm dificuldade em progredir e em lançar projetos. O potencial transformador destas iniciativas não está a ser aproveitado.

3.13.

Em muitos casos, as iniciativas locais enfrentam dificuldades no acesso às fontes de financiamento convencionais. Amiúde, os montantes mínimos de financiamento a solicitar são demasiado elevados e ultrapassam em muito as necessidades ou a capacidade de gestão das pequenas iniciativas locais. Os requisitos de cofinanciamento criam entraves adicionais.

3.14.

Entre os problemas identificados pelos grupos mais pequenos no acesso ao financiamento encontram-se os requisitos de cofinanciamento, a burocracia excessiva e a complexidade dos processos. Embora os projetos/iniciativas deste tipo sejam pequenos quando encarados isoladamente, o seu efeito cumulativo pode ser considerável. Também há muitos outros benefícios e vantagens locais por arrastamento quando os pequenos programas de base comunitária são apoiados por um financiamento adequado.

3.15.

A maioria do financiamento, se não todo, visa projetos e não resolve a necessidade de recursos para apoiar os processos a diferentes níveis, desde a organização de base comunitária e o reforço das capacidades ao nível local à criação de redes, aos intercâmbios e ao desenvolvimento de plataformas ao nível regional, nacional e europeu. O apoio financeiro neste domínio poderia contribuir muito para acelerar o empenho dos cidadãos e da comunidade nas ações climáticas, bem como para assegurar a existência de uma organização e colaboração adequadas para apoiar a expansão e o desenvolvimento estratégico.

Acesso ao financiamento da inovação

3.16.

Os empresários em início de carreira também enfrentam vários desafios em matéria de acesso ao financiamento, como a falta de conhecimentos e de experiência, de acesso aos mercados e de expansão para lá da fase de arranque. O financiamento da inovação é parte essencial da solução para a crise climática, sendo igualmente necessários mecanismos de financiamento inovadores e funcionais. Iniciativas como a CCI-Clima do Instituto Europeu de Inovação e Tecnologia (EIT) visam enfrentar esses desafios mediante a integração da dimensão do clima nos mercados financeiros, a democratização das informações sobre os riscos climáticos e o apoio aos investimentos em empresas inovadoras em fase de arranque.

4.   Soluções propostas

4.1.

O CESE propõe que se constitua um tipo de Fórum Finança-Clima ao nível da UE, com uma rede descentralizada, que reuniria todas as partes interessadas pertinentes e facilitaria uma resposta coordenada aos problemas aqui identificados, sendo um vetor de desenvolvimento dos mecanismos necessários, tal como identificados no presente parecer.

4.2.

O Fórum Finança-Clima deve ser uma plataforma de diálogo para ajudar a interligar as soluções não estatais particularmente promissoras e eficazes aos investidores privados e institucionais. Além disso, é necessária uma forte ênfase no potencial de expansão e de reprodução nos Estados-Membros da UE e noutros países, a fim de maximizar o impacto. O CESE, com a sua rede de organizações da sociedade civil de toda a Europa, encontra-se numa boa posição para participar num Fórum Finança-Clima, enquanto voz que representa os problemas locais de acesso a financiamento.

4.3.

Uma comunicação eficaz será parte essencial de qualquer estratégia bem-sucedida para resolver os problemas de financiamento das ações climáticas. A comunicação deve expandir-se em todas as direções, identificando claramente o público e comunicando numa linguagem eficaz, precisa e adequada as oportunidades e a acessibilidade das alternativas financeiras.

4.4.

A Comissão Europeia e as demais instituições europeias devem elaborar documentos de orientação para que os intervenientes não estatais possam tirar partido dos mecanismos de financiamento existentes. É necessário um sistema que identifique, analise, sintetize e divulgue informações sobre a diversidade de fontes de financiamento disponíveis para as ações climáticas por parte de intervenientes não estatais. Tal pode basear-se no trabalho efetuado pelo Comité das Regiões Europeu, que identifica as medidas para desenvolver um conjunto de instrumentos que inclua informações de fácil compreensão para os órgãos de poder local e regional sobre os recursos financeiros e o financiamento disponível para as ações climáticas.

4.5.

É necessário um mecanismo de acompanhamento que crie um mapeamento mais claro dos fluxos de financiamento das ações climáticas, contribuindo para identificar os obstáculos e concentrando-se em soluções práticas para os eliminar. Este é um primeiro passo urgente. Um processo de mapeamento também seria essencial para compreender os entraves ao acesso para os pequenos intervenientes não estatais. Mapear o financiamento também contribuiria para detetar os problemas em atrair ações climáticas positivas, que deveriam fazer parte do processo da Agenda Mundial de Ação Climática.

4.6.

O CESE insta a UE a assumir a liderança no desenvolvimento de um modelo para atrair os contributos de intervenientes não estatais para a consecução dos objetivos em matéria de clima. Os intervenientes não estatais em matéria de clima europeus (em especial os de menores dimensões) esperam apoio da parte das instituições europeias através de concessão de fundos específicos no domínio do clima, assim como um acesso melhorado ao financiamento graças a procedimentos e prestação de informações simplificados. Tal tornaria mais fácil atrair muitas ações que não são reconhecidas no combate às alterações climáticas. Por exemplo, os projetos abaixo de um determinado limiar financeiro, 50 000 euros, por exemplo, poderiam ter uma página de candidatura simplificada e uma página com o formulário de prestação de informações.

4.7.

É necessário financiamento suplementar sob a forma de pequenas subvenções, com procedimentos simplificados de candidatura e prestação de informações, especificamente destinadas às ações locais no domínio do clima e da sustentabilidade, e sem percentagens proibitivas de cofinanciamento. Poder-se-ia desenvolver mecanismos que permitam o agrupamento de projetos, a fim de melhorar o impacto do financiamento e facilitar o acesso ao mesmo. Estes instrumentos devem ser desenvolvidos com caráter de urgência.

4.8.

Há que desenvolver um mecanismo de apoio que permita aos projetos beneficiar de assistência na fase de pré-candidatura ao financiamento, a fim de que os projetos sejam concebidos e aperfeiçoados de forma eficaz e adequada.

4.9.

Há que desenvolver uma reflexão global ao nível da UE sobre mecanismos de financiamento inovadores. Os intervenientes não estatais devem ser associados a este debate desde o início, para assegurar a simplicidade e a clareza dos critérios de atribuição.

4.10.

De um modo geral, importa estabelecer uma cooperação mais estreita entre os fundos em matéria de clima e sustentabilidade e os programas financeiros já existentes, por um lado, e as redes de intervenientes não estatais, por outro. Trata-se de uma questão de partilha de conhecimentos, comunicação e diálogo, podendo um Fórum Finança-Clima facilitar esse intercâmbio.

4.11.

As medidas financeiras também poderiam incentivar a ação não estatal, ou uma atitude respeitadora do ambiente por parte dos intervenientes não estatais. Por exemplo, deduções fiscais a nível nacional poderiam contribuir para uma produção hipocarbónica e estimular a participação dos intervenientes não estatais na ação climática.

4.12.

A elaboração do novo Quadro Financeiro Plurianual da UE pode criar oportunidades para potenciar a ação climática não estatal da base para o topo com vista ao cumprimento eficiente dos compromissos da UE ao abrigo do Acordo de Paris. A esse propósito, o CESE preconiza um aumento para pelo menos 40 % das despesas da UE direcionadas para os objetivos em matéria de clima (7). O CESE insta igualmente a uma redução gradual dos subsídios aos combustíveis fósseis e a que os fundos europeus não (co)financiem direta ou indiretamente as energias fósseis.

4.13.

Há que desenvolver um instrumento de avaliação do impacto no clima que garanta que as despesas públicas não apoiam atividades que acentuam a crise climática. Tal deve também aplicar-se aos programas de financiamento privado. A afetação de fundos específicos ao financiamento das ações climáticas não deve implicar que as demais partes do orçamento ou do financiamento sejam afetadas a atividades contrárias aos objetivos em matéria de clima. Há que cumprir o objetivo definido no artigo 2.o, n.o 1, alínea c), do Acordo de Paris.

4.14.

O principal instrumento financeiro da UE de apoio ao desenvolvimento local da base para o topo é a abordagem do desenvolvimento local de base comunitária. Está idealmente posicionado para apoiar estas iniciativas ascendentes, com o potencial de conceder subvenções e financiamento adaptados às circunstâncias locais. Em dezembro de 2017, o CESE adotou o Parecer «Vantagens da abordagem de desenvolvimento local de base comunitária para o desenvolvimento local e rural integrado» (8), no qual exortou a Comissão Europeia a explorar e a examinar em profundidade as oportunidades para a criação de um fundo de reserva para o desenvolvimento local de base comunitária (DLBC) ao nível da UE. Independentemente disso, recomendou que a Comissão Europeia assegure que todos os Estados-Membros dispõem de um fundo a nível nacional consagrado ao DLBC (Fundo DLBC) para o qual contribuam os quatro Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEADER, FEDER, FSE e FEAMP). Esta estrutura DLBC pode ser um dos vetores utilizados para apoiar os micro e pequenos projetos referidos no ponto 2.7.

4.15.

Para tornar a cadeia de valor financeiro mais sustentável de um modo geral, o CESE apoia o Plano de Ação: Financiar um crescimento sustentável (9), adotado pela Comissão em março de 2018. O CESE formulou recomendações concretas sobre este plano de ação nos seus pareceres sobre a matéria (10).

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Parecer do CESE «Criar uma coligação entre a sociedade civil e os órgãos de poder infranacionais para cumprir os compromissos assumidos no Acordo de Paris» (JO C 389 de 21.10.2016, p. 20).

(2)  Parecer do CESE «Promover ações climáticas por intervenientes não estatais» (JO C 227 de 28.6.2018, p. 35).

(3)  Estudo do CESE «Um conjunto de ferramentas para parcerias climáticas multilaterais — Um quadro de política para estimular ações climáticas da base para o topo».

(4)  Parecer do CESE «Justiça climática» (JO C 81 de 2.3.2018, p. 22).

(5)  Relatório especial do PIAC sobre os efeitos de um aquecimento global de 1,5 oC acima dos níveis pré-industriais (outubro de 2018).

(6)  «Horizon 2020 research and innovation programme under grant agreement No. 695989» (Programa de investigação e inovação Horizonte 2020 ao abrigo da convenção de subvenção n.o 695989) — Heat Roadmap Europe.

(7)  Parecer do CESE «Pacto europeu finança-clima» (JO C 62 de 15.2.2019, p. 8).

(8)  Parecer do CESE «Vantagens da abordagem de desenvolvimento local de base comunitária» (JO C 129 de 11.4.2018, p. 36).

(9)  Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho Europeu, ao Conselho, ao Banco Central Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de Ação: Financiar um crescimento sustentável

(10)  Pareceres do CESE «Plano de Ação sobre Financiamento Sustentável» (JO C 62 de 15.2.2019, p. 73), «Finanças sustentáveis: taxonomia e índices de referência» (JO C 62 de 15.2.2019, p. 103) e «Obrigações dos investidores institucionais e dos gestores de ativos em matéria de sustentabilidade» (JO C 62 de 15.2.2019, p. 97).


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/20


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A situação das mulheres ciganas»

(parecer exploratório a pedido do Parlamento Europeu)

(2019/C 110/04)

Relator:

Ákos TOPOLÁNSZKY

Consulta

Parlamento Europeu, 30.5.2018

Base jurídica

Artigo 304.o, primeiro parágrafo, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

7.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

196/2/5

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

Uma parte significativa das mulheres (e raparigas) ciganas é alvo de discriminação múltipla e intersetorial, que as mantém numa situação em que o exercício dos seus direitos é limitado. As mulheres ciganas constituem o grupo minoritário mais vulnerável da UE. Pôr fim a esta situação representa, para as democracias europeias, um dever e uma obrigação da máxima importância.

1.2.

O CESE agradece às inúmeras mulheres ciganas determinadas, no presente ou no passado, a lutar corajosamente contra as estruturas discriminatórias e a violência institucional em prol de uma vida conjunta em plena liberdade numa Europa sem discriminação.

1.3.

É necessário eliminar sem demora o ensino segregado, cujo baixo nível de sucesso está precisamente associado à discriminação que o caracteriza, assegurando ao mesmo tempo que as jovens ciganas têm acesso igual a todos os elementos de um ensino público de qualidade. As regras relativas às escolas de ensino especial e aos procedimentos de orientação devem ser reavaliadas de forma aprofundada o mais rapidamente possível.

1.4.

O CESE espera que os Estados-Membros deem prioridade à erradicação das práticas de saúde que violam as normas de serviço que se regem por exigências deontológicas razoáveis e pela legislação pertinente, e criminalizem práticas ilegais como a esterilização forçada, a recusa de prestação de cuidados de saúde em razão da etnia ou a prestação de serviços de qualidade inferior.

1.5.

Os Estados-Membros devem abolir imediatamente as práticas laborais discriminatórias e, ao mesmo tempo, adotar políticas estruturadas que aumentem a probabilidade de as mulheres ciganas encontrarem emprego.

1.6.

Importa definir, adotar e fazer cumprir enquanto direito fundamental normas mínimas aceitáveis para a habitação e os serviços públicos, consagrando-as, se for caso disso, nas Constituições dos Estados-Membros.

1.7.

Cumpre combater com firmeza e sem discriminação todas as formas de tráfico de seres humanos e crimes de ódio que visam os ciganos e, em particular, as mulheres desta comunidade.

1.8.

As mulheres ciganas têm muito poucas oportunidades para desenvolver e avaliar as políticas suscetíveis de influenciar o seu próprio futuro. A sua participação em programas deste tipo deve ser garantida com uma representatividade adequada.

1.9.

Contrariamente ao que sucede atualmente na maioria dos Estados-Membros, cabe dedicar especial atenção às preocupações e aos interesses das mulheres ciganas nas estratégias europeias e nacionais de eliminação das desvantagens pós-2020.

2.   Situação das mulheres ciganas na União Europeia

2.1.

Uma parte significativa das mulheres (e raparigas) ciganas é alvo de discriminação múltipla e intersetorial, que as mantém numa situação em que o exercício dos seus direitos é limitado. As mulheres ciganas constituem o grupo minoritário mais vulnerável da UE. Esta situação deve ser encarada como uma ameaça sistémica à democracia, ao Estado de direito e aos direitos fundamentais, fragilizando profundamente o ideal europeu assente nos valores inscritos no artigo 2.o do Tratado da União Europeia (1), bem como na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (2). Foram realizados poucos progressos neste domínio nos últimos anos.

2.2.

Embora não estejam disponíveis dados discriminados por etnia e por sexo na maior parte dos Estados-Membros, a Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA) apresenta uma imagem exata da situação desfavorável em que se encontram as mulheres ciganas (principalmente no âmbito do inquérito EU-MIDIS II (3)). Observa-se que, em todos os setores da sociedade, as mulheres ciganas estão em desvantagem não apenas face à população em geral, mas também em relação aos homens da sua própria comunidade.

2.3.

O CESE está convicto de que a força do ideal europeu mencionado supra é proporcional à medida em que possa beneficiar os cidadãos mais frágeis da UE. Por conseguinte, adotar as medidas necessárias para melhorar a situação das mulheres e raparigas ciganas e promover a sua capacitação é não apenas uma obrigação para as instituições e os Estados-Membros da UE, mas também um teste à qualidade da sua organização democrática e à maturidade do seu Estado de direito.

3.   Observações gerais

3.1.

O artigo 2.o do Tratado da União Europeia refere, entre os principais valores que sustentam o ideal europeu, a igualdade e o respeito pelos direitos humanos, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias. Só existe uma aplicação efetiva destes direitos se forem garantidas mudanças concretas também em benefício dos grupos sociais mais marginalizados e discriminados, sendo a discriminação, a segregação e a hostilidade em relação aos ciganos manifestamente contrárias a estes valores.

3.2.

A capacitação económica das mulheres ciganas, tal como a aplicação dos direitos humanos e das liberdades fundamentais de que necessariamente elas têm de beneficiar no plano político, económico, social, cultural e civil e que devem ser garantidos constitucionalmente, implicam a igualdade de direitos entre os homens e as mulheres da comunidade cigana.

3.3.

Neste contexto, o CESE, no seguimento de pareceres anteriores (4), aprova os objetivos da estratégia-quadro da UE, chamando especialmente a atenção para a necessidade de uma aplicação coerente, bem como para a insuficiência dos progressos realizados.

3.4.

Constata-se também que a hostilidade em relação aos ciganos é visível em quase todos os níveis de atividade dos Estados-Membros, tanto nas administrações como nas instituições, o que impossibilita um acesso equitativo dos ciganos aos serviços públicos e os impede de fazer valer a igualdade dos seus direitos e a obrigação de igualdade de tratamento, de ter um peso na tomada de decisões políticas sobre as questões que lhes dizem respeito proporcional à sua representação na população total e de se proteger das consequências das discriminações. Tal é ainda mais patente no caso das mulheres ciganas.

3.5.

A fim de identificar as violações sistemáticas dos direitos das mulheres ciganas, o Comité solicita a elaboração de «livros brancos», com o contributo de organizações independentes e credíveis da comunidade cigana, consultando-as e reconhecendo-as oficialmente, de forma a criar as bases de uma reconciliação histórica.

3.6.

O CESE agradece às inúmeras mulheres ciganas determinadas, no presente ou no passado, a lutar corajosamente contra as estruturas discriminatórias e a violência institucional em prol de uma vida conjunta em plena liberdade numa Europa sem discriminação.

4.   Domínios específicos das políticas públicas (5)

4.1.   Educação

4.1.1.

O ensino segregado é sempre ilegal e traduz-se necessariamente em resultados negativos. A segregação escolar tem consequências particularmente negativas para as jovens ciganas, reduzindo as suas oportunidades de mobilidade social. É necessário, pois, utilizar todos os meios legais e apoios específicos das políticas públicas e garantir as dotações adicionais necessárias para corrigir, em conformidade com as aspirações da UE, o baixo nível de sucesso do ensino segregado que resulta da discriminação, assegurando, ao mesmo tempo, que as jovens ciganas gozam de acesso igual a todos os elementos de um ensino público de qualidade. Os governos devem assegurar a disponibilidade de recursos humanos, formações e programas pedagógicos adequados.

4.1.2.

Os diagnósticos infundados de atraso mental e a segregação escolar de que podem ser vítimas as crianças ciganas devem ser encarados como uma das mais graves violações dos seus direitos, que destroem o seu futuro, pelo que estas avaliações devem ser verificadas periodicamente por institutos especializados independentes. Importa assegurar que o procedimento de verificação possa ser iniciado sem entraves, a pedido de qualquer parte interessada, principalmente um progenitor ou tutor, ou mesmo a escola.

4.1.3.

Caso existam suspeitas de erros de avaliação recorrentes, e sobretudo sistemáticos, que tenham como objetivo ou como resultado a segregação, cumpre assegurar que os Estados-Membros são obrigados a realizar, sem demoras, um inquérito aprofundado sobre as causas, a publicar as respetivas conclusões, a avaliá-las no quadro dos mecanismos nacionais de luta contra a segregação e a tomar as medidas legislativas e de execução da legislação adequadas e necessárias.

4.1.4.

Entretanto, é necessário garantir que o nível pedagógico das classes de ensino especial converge com o do ensino geral, para que estas turmas não sejam meros «asilos» pedagógicos.

4.1.5.

O CESE defende uma limitação, um congelamento, ou, em caso de problemas reiterados, a pura e simples retirada dos fundos europeus aos países onde a segregação escolar aumenta em vez de diminuir. O Comité espera que, nestes casos, os mecanismos de proteção jurídica da União Europeia (artigo 7.o e mecanismo de proteção do Estado de direito) sejam aplicados de forma rápida e eficaz.

4.1.6.

Importa disponibilizar às mulheres ciganas, com o fito de aumentar as suas possibilidades de êxito no ensino e diminuir o risco de abandono escolar, um conjunto de programas de formação e de formação contínua complementar, que lhes permita aceder a outro tipo de postos de trabalho, que não os empregos subvencionados pelos poderes públicos ou «de segunda classe», parcialmente declarados ou atípicos, que as impedem de beneficiar da mobilidade social.

4.2.   Saúde

4.2.1.

As mulheres ciganas, que vivem muitas vezes em zonas marginalizadas ou de difícil acesso, enfrentam frequentemente situações de rejeição, de difamação ou mesmo de violência física e psicológica no contexto da prestação de cuidados de saúde. Em matéria de saúde reprodutiva, gozam geralmente de um acesso muito limitado aos seus direitos. O CESE insta os Estados-Membros a criarem e aproveitarem unidades móveis dotadas de equipamentos e capacidades adequados para servir as populações segregadas. Reclama igualmente uma revisão do funcionamento dos serviços ligados à maternidade e à gravidez, bem com a realização das melhorias necessárias.

4.2.2.

O CESE espera que os Estados-Membros deem prioridade à erradicação das práticas de saúde que violam as normas deontológicas razoáveis e a legislação pertinente e, nos casos que o justifiquem, recorram de forma sistemática à ação judicial. Importa garantir vias de recurso gratuitas e facilmente acessíveis para assegurar a aplicação dos direitos em matéria de saúde, bem como serviços especiais que reflitam as necessidades reais das pessoas afetadas, nomeadamente a criação de pontos de informação de saúde, a formação e o estabelecimento dos mediadores da saúde ou o lançamento de iniciativas de saúde pública que incluam as populações marginalizadas.

4.2.3.

Urge que os governos assumam clara e publicamente o compromisso de pugnar pelo princípio da igualdade de acesso aos cuidados de saúde e pela sua aplicação concreta, bem como de combater as práticas contrárias a este objetivo, e instituam programas de sensibilização destinados a todas as pessoas afetadas. Cumpre utilizar todos os meios legislativos necessários para garantir que as mulheres e crianças ciganas sem seguro de saúde de base estão cobertas neste domínio.

4.3.   Esterilização forçada

4.3.1.

Em vários países onde foram cometidas no passado violações sistemáticas dos direitos reprodutivos das mulheres, e onde a esterilização forçada e obrigatória foi maciçamente aplicada e utilizada como instrumento político do Estado, o nível político nem sequer se retratou ou assumiu a responsabilidade e, quando o fez, não houve lugar a qualquer reparação jurídica ou financeira. O Comité propõe que o legislador europeu desenvolva todos os esforços necessários para que, no âmbito da harmonização da legislação penal europeia, os Estados-Membros prolonguem de forma significativa, ou suprimam totalmente, o prazo de prescrição para este tipo de infrações penais — que substantivamente são comparáveis aos crimes contra a humanidade — e adotem legislação específica para que as vítimas possam obter reparação efetiva e uma compensação financeira.

4.3.2.

É necessário garantir, de boa-fé, o esclarecimento desta situação e assegurar plena transparência, a fim de promover a reconciliação e impossibilitar qualquer infração futura cometida pelos poderes públicos. Consequentemente, o CESE recomenda que, nos Estados-Membros em questão, comités de historiadores independentes, em colaboração com as vítimas e os seus representantes, estudem as infrações cometidas no passado nesta matéria e publiquem os resultados no âmbito de um processo de reconciliação societal, à semelhança do que se fez na Suécia com o «livro branco».

4.4.   Emprego

4.4.1.

No mercado de trabalho, as mulheres ciganas enfrentam uma situação bastante pior do que os homens da sua comunidade; todos os indicadores a seu respeito relacionados com o emprego estão a um nível extremamente baixo.

4.4.2.

O CESE solicita aos Estados-Membros que tomem as medidas concretas e globais necessárias para favorecer a capacitação económica das mulheres ciganas e lhes proporcionar as competências necessárias para esse fim. A promoção das empresas da economia social, a execução de programas de microcrédito e o acesso livre e sem discriminação às subvenções relacionadas com o mercado de trabalho assumem especial importância na luta contra a pobreza e a exclusão social.

4.4.3.

Os empresários ganharam preponderância enquanto criadores de emprego e agentes-chave do bem-estar das comunidades locais e regionais. Este aspeto é particularmente relevante para as comunidades de ciganos. No quadro das políticas orientadas para as necessidades das mulheres ciganas empresárias e das PME, há que tomar medidas específicas não só para promover a emancipação das mulheres ciganas, mas também para apoiar as suas iniciativas ligadas ao desenvolvimento de projetos comunitários e à criação de empresas. Esta política específica, concebida expressamente para apoiar as mulheres ciganas, é completamente inexistente na maior parte dos Estados-Membros, pelo que o CESE solicita que estes se empenhem na exploração das oportunidades que tal política pode oferecer.

4.4.4.

O Comité insta os poderes públicos a todos os níveis da sociedade a organizarem formações para facilitar a entrada no mercado de trabalho e a criarem emprego, incluindo formas de emprego subvencionado, em quantidade suficiente. Importa que estes prevejam subsídios de deslocação e apoios à formação contínua e ao aperfeiçoamento profissional e contribuam, através de instrumentos assestados de políticas públicas, para que as mulheres ciganas que se encontram numa situação de vulnerabilidade possam conciliar a sua vida profissional e familiar.

4.4.5.

Os Estados-Membros devem envidar todos os esforços para retirar as mulheres ciganas da sua posição vulnerável no mercado de trabalho e para erradicar as formas de trabalho (quase) forçado, parcialmente declarado ou ilegal de que elas são vítimas.

4.4.6.

Para este efeito, e tendo em conta a importância da integração destas mulheres no mercado de trabalho, é importante pôr em prática programas de formação complementar em matéria de emprego e proporcionar-lhes a assistência de mediadores, bem como subsídios de deslocação e apoios à formação. Por outro lado, devem ser envidados todos os esforços necessários para erradicar a discriminação no local de trabalho.

4.5.   Habitação, serviços públicos

4.5.1.

As mulheres e as crianças são quem mais sofre as consequências desastrosas da segregação no quotidiano. O CESE insiste, portanto, na necessidade de criar, também nestes territórios, um conjunto de normas mínimas aceitáveis para a habitação, os serviços públicos e as infraestruturas, que deve ser aplicado enquanto direito fundamental e, preferencialmente, estar incorporado nas Constituições dos Estados-Membros.

4.5.2.

O CESE propõe que a satisfação destas necessidades (garantindo, por exemplo, o abastecimento de água potável, a eletricidade, o saneamento ou o tratamento de águas residuais, a pavimentação das estradas, a recolha dos resíduos, a acessibilidade dos serviços públicos, etc.) seja uma condição prévia para a prossecução de investimentos no desenvolvimento urbano, bem como para a obtenção e utilização de subvenções.

4.5.3.

É necessário pôr termo aos processos de expulsão injustificados e ilegais e garantir que as mulheres ciganas vítimas destes processos possam beneficiar de uma proteção jurídica específica, disponível e acessível. As mulheres traumatizadas por estas expulsões forçadas devem poder ser indemnizadas.

4.6.   Eliminação das estruturas da violência

4.6.1.

As mulheres e raparigas ciganas são particularmente vulneráveis nas situações de discriminação e de segregação, tornando-se facilmente vítimas de crimes e de atos de violência. São afetadas de forma desproporcionada por todas as formas conhecidas de exploração e de tráfego de seres humanos.

4.6.2.

O Comité considera que todas as formas de tráfico de seres humanos e a violência contra as mulheres ciganas constituem violações flagrantes dos direitos humanos fundamentais expressamente proibidas pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, e que os Estados-Membros devem atuar em conformidade (6). Trata-se de infrações penais graves, que respondem a uma procura e se revelam, de formas muito diversas, excessivamente rentáveis para a criminalidade transnacional organizada, e a que as mulheres e crianças ciganas estão desproporcionadamente expostas.

4.6.3.

O CESE espera que os Estados-Membros incorporem sem demora no seu direito penal nacional a criminalização destas novas formas de infrações em permanente evolução, combatendo-as com medidas judiciais coordenadas e orientadas e interrompendo, ou suprimindo na medida do possível, os fluxos dos lucros obtidos com o trabalho forçado. É necessário abordar o contexto socioeconómico mais amplo em que estas infrações são cometidas, identificar as situações de miséria, de discriminação e de vulnerabilidade e pôr em prática de forma coerente os instrumentos (nomeadamente estratégicos, legislativos, financeiros, educativos ou de investigação) de política social que permitam corrigi-las.

4.6.4.

A violência sofrida pelas mulheres ciganas pode ter origem tanto na sociedade em geral como na sua própria comunidade. Em qualquer caso, é importante atuar com determinação contra todas as formas pontuais e organizadas de violência seguindo uma abordagem de género, centrada na vítima, que tenha em conta a especial vulnerabilidade das mulheres e das crianças e a proteção específica de que devem beneficiar e se baseie nos direitos humanos.

4.6.5.

O Comité congratula-se com o facto de, através da Comissão Europeia, a UE se ter tornado parte contratante na Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica, geralmente designada Convenção de Istambul. Insta todos os Estados-Membros da UE a ratificá-la e a iniciar a sua aplicação, sem reservas e de forma determinada, tendo em conta a particular exposição das mulheres ciganas neste domínio.

4.6.6.

Além disso, as mulheres e raparigas ciganas são, de forma igualmente desproporcionada, alvo e vítimas de crimes de ódio e, nomeadamente, do discurso de ódio. Cabe adotar medidas destinadas a facilitar o acesso à justiça das pessoas visadas e pôr em prática, com o apoio das organizações da sociedade civil, instrumentos que permitam consciencializar para a deteção deste tipo de infrações penais.

4.6.7.

O CESE apoia o alargamento geográfico e a aplicação do JUSTROM, o programa conjunto do Conselho da Europa e da Comissão Europeia, a fim de garantir o acesso das mulheres ciganas à justiça.

4.6.8.

O Comité salienta que todas as formas institucionais de hostilidade em relação aos ciganos e de segregação também podem ser consideradas uma forma de violência. O CESE sublinha a importância de garantir uma proteção contra este tipo de infrações nos serviços institucionais financiados pelo Estado (institutos de proteção da infância, serviços sociais e serviços de saúde), bem como nas estruturas públicas de manutenção da ordem e estruturas conexas (serviços de polícia, justiça penal e estabelecimentos prisionais), nos diferentes contextos em que a vulnerabilidade das mulheres ciganas é particularmente significativa. O Comité chama a atenção para a importância de assegurar um acesso fácil e gratuito à proteção jurídica nestes casos.

4.6.9.

O direito nacional e internacional deve definir o conceito de casamento forçado precoce como uma forma de tráfico de seres humanos e prever ações em conformidade. Importa disponibilizar às vítimas de casamentos forçados de crianças todos os instrumentos e programas de prevenção e proteção previstos no âmbito da luta contra o tráfico de seres humanos.

4.7.   Integração e participação

4.7.1.

As mulheres ciganas têm muito poucas oportunidades para desenvolver e avaliar as políticas suscetíveis de influenciar o seu próprio futuro. O CESE sublinha, por conseguinte, que, com base no princípio «nada sobre nós sem nós», é absolutamente indispensável integrar, a um nível adequado, as mulheres ciganas na conceção, planeamento, aplicação e avaliação de qualquer programa que lhes diga respeito ou tenha impacto nas suas comunidades. O CESE propõe que a adoção de programas especificamente destinados às mulheres ciganas conte com uma participação de, pelo menos, uma maioria de mulheres ciganas ativas e que, no caso da adoção de programas destinados às comunidades ciganas, estas representem, pelo menos, 30 % dos participantes. Deve ser aplicado um sistema de avaliação que permita medir esta proporcionalidade de modo fiável.

4.7.2.

O CESE propõe que estas taxas de participação sejam aplicadas de forma verificável nos organismos responsáveis pelas políticas de integração nacionais e regionais (conselhos de coordenação nacionais, regionais e departamentais, comissões de luta contra a segregação, etc.).

4.7.3.

Convida os governos e as autoridades a iniciarem um verdadeiro diálogo político de fundo com os representantes das mulheres ciganas a todos os níveis de organização social e a criarem as estruturas institucionais para esse diálogo. Para o efeito, o CESE recomenda a criação de instituições jurídicas específicas, por exemplo, comités de mulheres no âmbito das plataformas nacionais para os ciganos, no quadro dos quais as mulheres ciganas poderiam assegurar a sua representação de forma direcionada, ou a criação de um provedor independente para as mulheres ciganas.

4.7.4.

O Comité assinala que o ponto de vista das mulheres ciganas está muitas vezes ausente, ou pouco representado, quer na estratégia-quadro europeia atual, quer nas estratégias nacionais de integração dos ciganos. É necessário ter bastante mais em conta os pontos de vista dos representantes das mulheres ciganas, no âmbito não apenas dos processos após 2020, mas também da elaboração das futuras estratégias de inserção social.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A12012M%2FTXT

(2)  https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:12012P/TXT&from=pt

(3)  Apenas disponível em inglês: http://fra.europa.eu/en/project/2015/eu-midis-ii-european-union-minorities-and-discrimination-survey/publications

(4)  JO C 248 de 25.8.2011, p. 16, JO C 67 de 6.3.2014, p. 110, JO C 11 de 15.1.2013, p. 21.

(5)  Das inúmeras propostas apresentadas até à data pela comunidade cigana, as organizações da sociedade civil ativas na defesa dos direitos dos ciganos, a comunidade científica, os organismos internacionais e o CESE, o presente parecer apenas mencionará as que são particularmente pertinentes para a aplicação dos direitos das mulheres ciganas.

(6)  Artigo 5.o, n.o 3, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/26


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Igualdade de género nos mercados de trabalho europeus»

(parecer exploratório a pedido do Parlamento Europeu)

(2019/C 110/05)

Relatora:

Helena DE FELIPE LEHTONEN

Consulta

Parlamento Europeu, 3.5.2018

Base jurídica

Artigo 29.o, n.o 1, do Regimento

Decisão da plenária

DD/MM/YYYY

Competência

Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

7.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

151/2/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

Para melhorar a igualdade de género nos mercados de trabalho, o Comité Económico e Social Europeu (CESE) considera necessário elaborar uma estratégia europeia integrada e ambiciosa que vise superar os obstáculos sistémicos e estruturais e conduza a políticas, medidas e programas de financiamento da UE adequados para melhorar a igualdade entre mulheres e homens, promovendo, desse modo, uma maior igualdade entre homens e mulheres em termos de independência económica. Tal também constituiria um passo importante na aplicação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais.

1.2.

O presente parecer reitera a necessidade de continuar a abordar alguns desafios bem definidos, tais como as disparidades salariais entre homens e mulheres e a conciliação da vida profissional e familiar, e sobre os quais o CESE já emitiu pareceres (1).

1.3.

O CESE considera que são necessários esforços suplementares para eliminar as disparidades salariais persistentes entre homens e mulheres. Apoia plenamente os objetivos da Coligação Internacional para a Igualdade Salarial de trabalhar no sentido de colmatar as disparidades salariais entre homens e mulheres até 2030. Lamenta a baixa taxa de aplicação da Recomendação da Comissão Europeia relativa ao reforço, pela transparência, do princípio da igualdade salarial entre homens e mulheres, de 2014, e insta os Estados-Membros e a UE a tomarem as medidas adequadas para acelerar a sua aplicação.

1.4.

O CESE recorda que a transparência das remunerações ocupa um lugar importante na luta contra as disparidades salariais entre homens e mulheres (2). Recomenda sistemas de remuneração neutros do ponto de vista do género como forma de promover uma abordagem imparcial em relação à remuneração e ao recrutamento.

1.5.

O CESE concorda com a necessidade de reforçar as medidas para reduzir a segregação horizontal de género na educação, na formação e no mercado de trabalho. Devem ser levadas a cabo campanhas de sensibilização e outras medidas destinadas a combater os estereótipos e a segregação de género no ensino, na formação e nas opções de carreira, tirando o máximo partido das novas tecnologias. A melhoria das condições salariais e laborais nos setores em que predominam as mulheres poderia levar mais homens a procurar estas profissões.

1.6.

Devem ser dedicados mais esforços à integração no mercado de trabalho e à emancipação das mulheres pertencentes a grupos vulneráveis, tendo em conta uma abordagem intersetorial (3).

1.7.

O CESE aprecia os esforços envidados pela Comissão para garantir um acompanhamento mais atento dos serviços de acolhimento de crianças e de prestação de cuidados de longa duração no âmbito do Semestre Europeu. Esta deve continuar a ser uma prioridade a médio e a longo prazo. O CESE defende que se proceda a uma reflexão renovada com os Estados-Membros sobre os objetivos de Barcelona relativos às estruturas de acolhimento de crianças, acordados em 2002, com vista a torná-los mais ambiciosos e alargar a abordagem da assistência a outros dependentes.

1.8.

O CESE insta o Parlamento e o Conselho a introduzirem indicadores novos e adequados nos futuros fundos estruturais europeus, a fim de acompanhar melhor a contribuição financeira da UE para os vários serviços de prestação de cuidados e a igualdade de género.

1.9.

O CESE acolhe com satisfação a proposta do FSE+ no âmbito do Quadro Financeiro Plurianual para o período de 2021-2027, que visa apoiar a igualdade entre homens e mulheres e promover a participação das mulheres no mercado de trabalho através de medidas destinadas a melhorar a conciliação entre a vida profissional e a vida familiar e o acesso a estruturas de acolhimento de crianças e a outros serviços de prestação de cuidados. Contudo, também é de opinião que a afetação dos fundos da UE deve ser mais sensível às questões de género e que a igualdade de género deve constituir um objetivo independente, em vez de se fundirem os objetivos de igualdade de género e de luta contra a discriminação e o racismo sob a égide de um objetivo único.

1.10.

O CESE congratula-se igualmente com o Programa InvestEU para 2021-2027, que apoia investimentos em infraestruturas sociais. O CESE insta o Parlamento e o Conselho a apoiarem firmemente esta nova oportunidade para desencadear os investimentos necessários em estruturas de acolhimento de crianças (incluindo acolhimento extraescolar).

1.11.

O empreendedorismo feminino está a ficar para trás e deve ser promovido para explorar o enorme potencial da economia digital e da inovação tecnológica. O acesso ao financiamento tem de ser melhorado e as transições entre estatutos profissionais têm de ser facilitadas.

2.   Contexto e desafios

2.1.

O presente parecer do CESE foi elaborado em resposta a um pedido do Parlamento Europeu de elaboração de um parecer exploratório sobre a igualdade de género nos mercados de trabalho europeus. A pedido do Parlamento, o presente parecer analisa o impacto das medidas delineadas na Recomendação da Comissão relativa ao reforço, pela transparência, do princípio da igualdade salarial entre homens e mulheres, e a necessidade de tomar medidas suplementares para combater as disparidades salariais entre homens e mulheres.

2.2.

O artigo 2.o e o artigo 3.o, n.o 3, do Tratado da União Europeia, bem como a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, reconhecem que o direito à igualdade entre homens e mulheres é um dos valores fundamentais da União e, como tal, representa uma tarefa importante. O Pilar Europeu dos Direitos Sociais consagra a igualdade de género e o direito a uma remuneração igual para um trabalho de valor igual como um dos 20 princípios fundamentais para assegurar a equidade e o bom funcionamento dos mercados de trabalho e dos sistemas de proteção social.

2.3.

A União Europeia e os Estados-Membros têm vindo a promover a igualdade de género no mercado de trabalho através de uma combinação de instrumentos legislativos e não legislativos, recomendações, orientações políticas e apoio financeiro. No seu Compromisso estratégico para a igualdade de género 2016-2019, a Comissão Europeia confirmou as prioridades a respeitar: igualdade entre os géneros em termos de independência económica, igualdade de remuneração por trabalho de igual valor e igualdade no processo de tomada de decisões; dignidade, integridade e fim da violência baseada no género e igualdade entre homens e mulheres fora da UE.

2.4.

Em 2017, a taxa de emprego das mulheres continuou a aumentar a um ritmo lento mas constante, a par da dos homens, tendo alcançado o valor mais alto de sempre, de 66,5 %, contra 78,1 % para os homens. Todavia, a disparidade da taxa de emprego entre homens e mulheres — na ordem dos 11,5 pontos percentuais — permaneceu inalterada desde 2013. Além disso, é pouco provável que seja alcançado o objetivo da UE de alcançar uma taxa de emprego de 75 % para homens e mulheres até 2020. A pontuação de acordo com o Índice de Igualdade de Género aumentou de 62 pontos em 2005 para 65 pontos em 2012, mas apenas para 66,2 pontos em 2015, em parte devido à crise. Em vários Estados-Membros, as medidas destinadas a combater a crise não tiveram devidamente em conta o impacto negativo na igualdade de género.

2.5.

Apesar dos progressos gerais realizados no domínio da igualdade de género nos mercados de trabalho europeus, as desigualdades entre mulheres e homens persistem. A segregação horizontal e vertical é um fator importante que contribui para as disparidades «não ajustadas» entre homens e mulheres em termos de remuneração horária bruta, que é atualmente de cerca de 16 %. As disparidades são agravadas pela predominância de mulheres em empregos a tempo parcial e em setores com remunerações mais baixas, assim como pela elevada percentagem de mulheres que gozam de regimes de licença parental, o que resulta em interrupções na carreira, numa menor progressão na carreira e numa menor acumulação de direitos a pensões.

2.6.

Atualmente, a disparidade de género no emprego representa uma perda económica e social importante para a UE, estimada em 370 mil milhões de euros por ano. Face ao desafio demográfico e à diminuição da população em idade ativa, é necessário que a Europa explore plenamente o potencial do mercado de trabalho de todas as mulheres, tendo em conta a intersecção entre raça, origem étnica, classe social, idade, orientação sexual, nacionalidade, religião, sexo, deficiência, estatuto de refugiado ou migrante, que pode constituir um obstáculo específico à sua participação no mercado de trabalho.

2.7.

Enquanto as mulheres tendem a ter predominantemente empregos menos bem remunerados e menos qualificados em setores como os cuidados de saúde, a assistência social, a educação, a administração pública e o setor retalhista, os homens estão mais representados na engenharia, na construção e nos transportes. A escassez de homens em profissões nos domínios da educação, saúde e assistência social (ESA) está a aumentar, sendo agravada pela falta de exemplos a seguir e, frequentemente, por condições de trabalho e de remuneração menos atrativas. O mesmo se aplica às mulheres, que estão sub-representadas nas profissões das ciências, da tecnologia, da engenharia e da matemática (CTEM). Em 2016, apenas 17 % dos especialistas em tecnologias de informação e comunicação (TIC) na UE eram mulheres.

2.8.

Embora a nova legislação da UE esteja a ser debatida no Conselho da UE (Diretiva da conciliação da vida profissional e familiar, as mulheres continuam a ser vítimas de «penalização pela maternidade» no local de trabalho, incluindo durante a gravidez e após o parto, que continua a ser um problema em muitos Estados-Membros. As disparidades no emprego são particularmente acentuadas no caso das mães e das mulheres com responsabilidades de prestação de cuidados. Em 2016, mais de 19 % das mulheres inativas eram-no por terem de cuidar de crianças ou de adultos. Em média, a taxa de emprego das mulheres com um filho menor de seis anos é cerca de 9 % mais baixa do que a das mulheres sem filhos, uma diferença que, em alguns países, chega aos 30 %.

2.9.

O CESE está extremamente preocupado com o grau de assédio sexual a que as mulheres estão sujeitas no local de trabalho e com a generalização do assédio cibernético contra as mulheres. Recorda a necessidade de uma melhor aplicação da Diretiva 2006/54/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (4), que proíbe o assédio e a discriminação no local de trabalho (5).

2.10.

O CESE apela igualmente para a adoção de medidas gerais e específicas dirigidas às mulheres pertencentes a grupos vulneráveis, que amiúde enfrentam maiores dificuldades de inserção no mercado de trabalho. Sublinha a necessidade de uma abordagem intersetorial, a fim de aumentar as oportunidades do mercado de trabalho para as mulheres sujeitas a múltiplas formas de discriminação.

2.11.

O empreendedorismo feminino ainda está subdesenvolvido. As mulheres representam 52 % da população europeia total, mas apenas 34,4 % dos trabalhadores por conta própria na UE e 30 % dos empresários em início de atividade. As mulheres que trabalham por conta própria estão numa situação financeira menos favorável do que a dos homens que trabalham por conta própria. 76,3 % das mulheres que trabalham por conta própria na UE-28 não têm trabalhadores ao seu serviço, contra 69 % dos homens. Assim, os homens são mais frequentemente proprietários de empresas com trabalhadores, ao passo que as mulheres são geralmente trabalhadoras por conta própria sem trabalhadores ao seu serviço, com um risco mais elevado de terem baixos rendimentos. O potencial de criatividade e empreendedorismo das mulheres é uma fonte subexplorada de crescimento económico e emprego que tem de ser mais desenvolvida para criar empresas bem-sucedidas.

2.12.

O trabalho a tempo parcial pode ser um instrumento valioso para melhorar a conciliação entre a vida profissional e familiar dos homens e das mulheres. No entanto, as mulheres trabalham a tempo parcial mais frequentemente do que os homens (representando mais de 70 % dos trabalhadores a tempo parcial), tendo sido documentado um aumento dos postos de trabalho menos remunerados (vendas a retalho, limpeza e auxílio). Os níveis de trabalho a tempo parcial involuntário tanto no caso das mulheres como dos homens continuam a suscitar preocupação. O objetivo da UE de alcançar uma taxa de emprego de 75 % até 2020 só poderá ser conseguido através de uma estratégia integrada, composta por uma combinação coerente de políticas e de medidas destinadas a promover a participação no mercado de trabalho e empregos de qualidade, a assegurar a igualdade de tratamento no emprego e a incentivar uma partilha mais equilibrada das responsabilidades de prestação de cuidados entre progenitores e cuidadores de outros familiares dependentes.

3.   Áreas para novas ações que visam a igualdade de género nos mercados de trabalho europeus

3.1.   Abordar a transparência salarial para colmatar as disparidades salariais entre homens e mulheres

3.1.1.

A disparidade salarial entre homens e mulheres é um dos obstáculos mais persistentes à igualdade de género nos mercados de trabalho e na sociedade e ao crescimento económico. O CESE apoia plenamente a Coligação Internacional para a Igualdade Salarial (EPIC), uma iniciativa mundial liderada pela OIT, a ONU Mulheres e a OCDE, reunindo governos, empregadores, sindicatos e a sociedade civil com o objetivo de colmatar as disparidades salariais entre homens e mulheres no horizonte 2030. O CESE insta a UE a redobrar de esforços para assegurar a eliminação dessas disparidades na UE até 2030.

3.1.2.

O CESE reitera as suas recomendações relativas ao Plano de Ação da UE para colmatar as disparidades salariais entre homens e mulheres (6). O CESE reconhece igualmente que a reformulação da Diretiva Igualdade de Tratamento (2006/54/CE) e a Recomendação 2014/124/UE da Comissão aos Estados-Membros relativa ao reforço, pela transparência, do princípio da igualdade salarial entre homens e mulheres foram determinantes para combater as disparidades salariais entre homens e mulheres e continuam a ser válidas. Todavia, são necessários mais esforços. O Relatório da Comissão, de 2013, sobre a aplicação da Diretiva 2006/54/CE concluiu que a aplicação prática das disposições respeitantes à igualdade de remuneração nos Estados-Membros é uma das áreas mais problemáticas da diretiva.

3.1.3.

A EPIC declarou que a falta de transparência salarial desempenha um papel significativo nas disparidades remuneratórias entre homens e mulheres, pelo que o reforço da transparência nesse domínio pode contribuir para colmatar as disparidades salariais entre homens e mulheres. A transparência salarial ocupa um lugar importante no combate à eventual discriminação salarial. O CESE está preocupado com a baixa taxa de aplicação da Recomendação da Comissão relativa ao reforço, pela transparência, do princípio da igualdade salarial entre homens e mulheres, de 2014. Embora muitos Estados-Membros disponham de algumas medidas destinadas a aumentar a transparência salarial, num terço dos Estados-Membros estas medidas simplesmente não existem. O CESE apela aos Estados-Membros para que intensifiquem a aplicação da recomendação em causa, por exemplo, prevendo, a possibilidade de os indivíduos solicitarem informações sobre os níveis de remuneração ou a possibilidade de os empregadores em empresas, de dimensão a definir, prestarem informação sobre remunerações ou realizarem auditorias salariais, uma vez que tal promoveria uma abordagem equitativa do recrutamento e da remuneração. A necessidade de respeitar plenamente a privacidade dos (dados dos) empregados e as relações profissionais gerais deve igualmente ser tida em conta.

3.1.4.

A fim de aplicar o princípio da igualdade salarial e combater as disparidades salariais entre homens e mulheres são necessárias sinergias mais eficazes entre as diferentes medidas disponíveis. Entre essas sinergias, são fortemente encorajados os sistemas de remuneração neutros do ponto de vista do género, uma vez que promovem uma abordagem imparcial em relação à remuneração e ao recrutamento.

3.1.5.

Os parceiros sociais são os mais bem posicionados para reavaliar o valor das competências e das profissões. O diálogo social e a negociação coletiva são determinantes para alcançar este objetivo e para colmatar as disparidades salariais entre homens e mulheres.

3.1.6.

A nível europeu, as disparidades salariais são igualmente abordadas através do Semestre Europeu. Em 2017, as disparidades salariais entre homens e mulheres foram destacadas nos relatórios por país de nove Estados-Membros. Foram dirigidas a 12 Estados-Membros recomendações específicas por país centradas no investimento em estruturas de acolhimento de crianças e desincentivos fiscais, bem como noutras medidas relacionadas com as disparidades salariais entre homens e mulheres.

3.1.7.

Importa prestar especial atenção à sensibilização para os preconceitos inconscientes e para o aprofundamento das disparidades salariais no recrutamento e na promoção. O apoio das organizações empresariais, aliado à cooperação entre parceiros sociais, autoridades e organismos defensores da igualdade para encontrar soluções adequadas, é igualmente importante para reduzir as disparidades salariais entre homens e mulheres.

3.2.   Educação, segregação e estereótipos

3.2.1.

A segregação horizontal persistente na educação, formação e no mercado de trabalho, motivada por estereótipos e obstáculos no mercado de trabalho, deve ser abordada desde a primeira infância. Há uma forte ligação entre tal segregação e as disparidades salariais entre homens e mulheres. A tendência para subvalorizar determinadas profissões, nomeadamente em posições de liderança, deve ser salientada de forma mais clara. A melhoria das condições salariais e laborais nos setores em que predominam as mulheres poderá funcionar como incentivo para atrair mais homens para tais profissões, também ajudando desse modo a enfrentar a questão da segregação profissional entre homens e mulheres.

3.2.2.

Apesar do desempenho superior das mulheres na educação, estas enfrentam inúmeros obstáculos se pretenderem seguir carreiras em determinados setores dominados pelos homens, como as TIC. Mesmo que algumas raparigas optem por uma formação nas disciplinas CTEM, posteriormente apenas 10 % das mulheres seguem carreira nestas áreas. Esta situação exige que se dê maior ênfase ao combate à segregação e aos estereótipos na educação e a uma melhor promoção deste setor entre as mulheres.

3.2.3.

A escassez de homens no setor da educação, saúde e assistência social (ESA) está a assumir proporções preocupantes. O CESE apela para a realização de campanhas de sensibilização e para a promoção de modelos a seguir, tanto a nível da UE como a nível nacional, para promover as profissões nos domínios das TIC e das CTEM entre as mulheres e nos domínios da ESA entre os homens.

3.3.   Serviços de prestação de cuidados para melhorar a conciliação entre a vida profissional e familiar

3.3.1.

A combinação do trabalho com a vida privada e familiar é um dos maiores desafios para os pais e as outras pessoas com responsabilidades de prestação de cuidados. As mulheres são afetadas de forma desproporcionada, uma vez que, geralmente, são responsáveis por cuidar de familiares dependentes. A conciliação da vida profissional e familiar é particularmente desafiante para os agregados familiares monoparentais e as pessoas pertencentes a grupos vulneráveis. O CESE acolheu com agrado a iniciativa da Comissão de aumentar a participação dos progenitores no mercado de trabalho e ajudá-los a conciliar melhor a vida profissional com a familiar.

3.3.2.

A partilha das responsabilidades parentais e de outras responsabilidades de prestação de cuidados é um objetivo importante para alcançar a igualdade de participação no mercado de trabalho (7). O gozo da licença de paternidade e parental pelo pai é geralmente baixo, sendo que os homens geralmente apenas usufruem da mesma quando esta é remunerada. É essencial tomar medidas que incentivem os homens a envolverem-se mais na vida familiar, tendo simultaneamente em consideração os possíveis custos e esforços organizacionais que pressupõem para as empresas, sobretudo as pequenas e médias empresas.

3.3.3.

Uma vez que as responsabilidades de prestação de cuidados são um dos principais motivos que justificam a baixa participação das mulheres no mercado de trabalho, os objetivos de Barcelona são fundamentais, não tendo, contudo, sido suficientemente alcançados. Os dados indicam uma correlação positiva entre a existência de estruturas de acolhimento de crianças e a taxa de emprego das mulheres. O CESE lamenta que, mais de 15 anos após a sua adoção, um número tão reduzido de países tenha alcançado os objetivos de Barcelona. Apela para uma eventual revisão com o objetivo de definir objetivos mais ambiciosos a título de incentivo à promoção da igualdade de género.

A razoabilidade dos preços e a acessibilidade dos serviços de acolhimento de crianças e de outros serviços de prestação de cuidados continuam a constituir um desafio, sobretudo para as famílias com baixos rendimentos. Por conseguinte, é importante uma boa combinação de estruturas públicas e privadas de qualidade de acolhimento de crianças. Além disso, o horário de funcionamento das estruturas de acolhimento de crianças continua a constituir um verdadeiro obstáculo para os progenitores que exercem uma atividade profissional.

3.3.4.

O CESE chama igualmente a atenção para a necessidade de estruturas de acolhimento extraescolar de crianças para os pais que trabalham. Estas estruturas deveriam estar disponíveis nos países em que o dia escolar termina cedo e em que os pais tendem a optar por trabalho a tempo parcial para colmatar esta lacuna. São necessários mais dados que permitam compreender a dimensão e as consequências deste problema estrutural relacionado com a igualdade de género no mercado de trabalho.

3.3.5.

O crescimento do setor da prestação de cuidados, que tem um potencial significativo de emprego ainda por explorar, requer especial atenção devido à persistência da segregação de género e, em muitos casos, às más condições de trabalho e às baixas remunerações. Tal como já foi solicitado pelo CESE, é necessário recolher dados suficientes sobre os diferentes aspetos dos sistemas e preferências de prestação de cuidados remunerados na Europa. Tal deve incluir os serviços de cuidados ao domicílio, em rápida expansão, e o caso específico dos cuidadores profissionais residentes (8), muitos dos quais em situação de mobilidade intra-UE ou migrantes provenientes de países terceiros, que referem estarem sujeitos a más condições de trabalho e de remuneração. O CESE apela à Comissão Europeia para que adote uma estratégia integrada para o setor da prestação de cuidados.

3.3.6.

O CESE aprecia os esforços envidados pela Comissão para garantir um acompanhamento mais atento das estruturas de acolhimento de crianças e dos serviços de prestação de cuidados de longa duração no âmbito do Semestre Europeu e das recomendações específicas por país dirigidas aos Estados-Membros.

3.4.   Financiamento da igualdade de género: o quadro financeiro plurianual

3.4.1.

O CESE acolhe com satisfação a proposta do FSE+ no âmbito do Quadro Financeiro Plurianual para o período de 2021-2027, que visa apoiar a igualdade entre homens e mulheres, a igualdade de oportunidades e a não discriminação, e promover a participação das mulheres no mercado de trabalho através de medidas destinadas a melhorar a conciliação entre a vida profissional e a vida familiar e o acesso a estruturas de acolhimento de crianças. O CESE encoraja as instituições da UE e os Estados-Membros a aplicarem a sua recomendação de que o FSE+ apoie a igualdade entre homens e mulheres (9).

3.4.2.

O CESE é de opinião que a afetação dos fundos da UE deve ser mais sensível às questões de género. Além disso, receia que a fusão dos objetivos de igualdade de género e de luta contra a discriminação e o racismo sob a égide de um objetivo único comprometa a sua visibilidade e a clareza dos montantes averbados a cada objetivo individual. Há que refletir sobre a melhor forma de abordar esta questão.

3.4.3.

O CESE salienta a necessidade de investimentos em serviços e estruturas de prestação de cuidados de elevada qualidade, economicamente razoáveis e acessíveis para todos. A proposta da Comissão relativa ao FSE+ constitui um passo no sentido certo, através de um maior investimento nos serviços de acolhimento de crianças. Este financiamento deve continuar a ser promovido, com base em boas práticas a compilar pela Comissão.

3.4.4.

O CESE congratula-se igualmente com o Programa InvestEU no âmbito do Quadro Financeiro Plurianual para o período de 2021-2027 e com a sua prioridade de impulsionar os investimentos em infraestruturas sociais, que pode ter um impacto positivo na igualdade de género.

3.4.5.

O CESE manifesta-se preocupado por não existir atualmente uma avaliação da forma como os fundos da UE foram utilizados pelos Estados-Membros para apoiar a prestação de serviços de cuidados. Tal deve ser abordado nos próximos programas de financiamento, através da introdução de indicadores adequados para os Estados-Membros nos futuros fundos estruturais, incluindo o FSE+, a fim de acompanhar melhor a contribuição financeira da UE para os vários serviços de prestação de cuidados e a igualdade de género.

3.5.   Sistemas fiscais e de prestações sociais

3.5.1.

Os dados disponíveis indicam que as mulheres enfrentam frequentemente fortes desincentivos económicos quando ingressam no mercado de trabalho ou quando pretendem trabalhar mais: o modo como os sistemas de benefícios fiscais estão configurados pode ser um dissuasor para as pessoas que auferem o segundo rendimento da família, na maior parte dos casos, as mulheres. As consequências diretas desta situação é o montante reduzido ou nulo das contribuições pagas para os sistemas de pensões, que resulta posteriormente em baixos rendimentos de pensões e até mesmo em pobreza.

3.5.2.

O Semestre Europeu já sublinhou a necessidade de adaptar os sistemas de benefícios fiscais de modo a prevenir os fortes desincentivos às pessoas que auferem o segundo rendimento da família e que desejem aceitar um emprego ou trabalhar mais. Será necessário um acompanhamento atento da evolução desta situação nos Estados-Membros.

3.6.   Empreendedorismo feminino

3.6.1.

O empreendedorismo pode ser uma oportunidade para a independência económica das mulheres, proporcionando empregos de qualidade e carreiras de sucesso, tirando as mulheres de situações de pobreza e exclusão social e contribuindo para uma representação de género mais equilibrada na tomada de decisões. O empreendedorismo feminino deve ser apoiado através da melhoria do acesso e da qualidade das medidas de proteção social (10) e da integração da educação para o empreendedorismo no ensino e na formação.

3.6.2.

No que se refere ao trabalho por conta própria, as mulheres são mais frequentemente trabalhadoras por conta própria, enfrentando um risco mais elevado de pobreza no trabalho, ao passo que mais homens são proprietários de empresas com trabalhadores. As mulheres enfrentam igualmente mais obstáculos estruturais no que diz respeito ao acesso ao financiamento, a estereótipos e a falta de confiança. Estes obstáculos têm de ser eliminados. A orientação de investidores providenciais e novas formas de financiamento podem ser úteis para ultrapassar os obstáculos. As redes existentes no âmbito das organizações empresariais devem ser promovidas e divulgadas de forma mais ativa.

3.7.   Economia digital

3.7.1.

As mudanças no mercado de trabalho devido à globalização, à evolução tecnológica e às alterações demográficas criam novas perspetivas para os trabalhadores e para os empregadores. Os setores emergentes e em crescimento (por exemplo, TIC, economia verde, indústria 4.0, comércio eletrónico) podem oferecer às mulheres muitas oportunidades de empregos bem remunerados. O CESE salientou igualmente o problema de o fosso digital entre homens e mulheres colocar uma série de desafios que é necessário abordar. Formulou igualmente recomendações para corrigir os desequilíbrios nos sistemas de ensino e no mercado de trabalho (11).

3.7.2.

Para garantir que tanto as mulheres como os homens podem atuar com confiança na economia digital, é necessária uma maior clareza de estatuto a nível nacional em matéria de direitos, direitos de segurança social e obrigações, tanto em contratos de trabalho como em contratos entre empresas. O ensino e a formação devem estar no centro das estratégias de promoção das TIC, das CTEM e das carreiras verdes para as mulheres, devendo a perspetiva de género ser integrada na Estratégia para o Mercado Único Digital.

3.8.   Maior cooperação entre todos os intervenientes

3.8.1.

O papel dos parceiros sociais na negociação de convenções coletivas é uma importante forma de combater as dimensões múltiplas da igualdade de género e da igualdade de remuneração nos mercados de trabalho europeus. A nível da UE, os parceiros sociais adotaram, em 2005, um quadro de ações para a igualdade de género, seguido de ações comuns a nível nacional destinadas a abordar os papéis de género, a promover a participação das mulheres na tomada de decisões, a apoiar a conciliação entre a vida profissional e familiar e a combater as disparidades salariais entre homens e mulheres. Em 2008, reviram o seu acordo-quadro sobre a licença parental de 1996 [Diretiva 2010/18/UE do Conselho (12)] e, em 2012, desenvolveram um conjunto de ferramentas para reforçar a igualdade entre homens e mulheres na prática.

3.8.2.

As organizações da sociedade civil podem igualmente contribuir de forma útil para promover a igualdade de género no mercado de trabalho, em particular no que se refere aos grupos vulneráveis.

3.8.3.

O CESE apela para a adoção de uma estratégia renovada e ambiciosa a nível da UE no sentido de alcançar a igualdade de género nos mercados de trabalho europeus, a enquadrar de forma coerente no âmbito de qualquer futura estratégia europeia para o emprego, do Pilar Europeu dos Direitos Sociais e da dimensão europeia da Agenda 2030 das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  JO C 129 de 11.4.2018, p. 44; JO C 262 de 25.7.2018, p. 101.

(2)  JO C 129 de 11.4.2018, p. 44.

(3)  JO C 367 de 10.10.2018, p. 20.

(4)  JO L 204 de 26.7.2006, p. 23.

(5)  JO C 351 de 15.11.2012, p. 12, JO C 242 de 23.7.2015, p. 9, JO C 367 de 10.10.2018, p. 20.

(6)  JO C 262 de 25.7.2018, p. 101.

(7)  JO C 129 de 11.4.2018, p. 44.

(8)  JO C 487 de 28.12.2016, p. 7.

(9)  Ver o Parecer do CESE «Fundo Social Europeu+» (JO C 62 de 15.2.2019, p. 165).

(10)  JO C 173 de 31.5.2017, p. 45.

(11)  JO C 440 de 6.12.2018, p. 37.

(12)  JO L 68 de 18.3.2010, p. 13.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/33


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Aplicação da legislação ambiental da UE: qualidade do ar, água e resíduos»

(parecer exploratório)

(2019/C 110/06)

Relator:

Arnaud SCHWARTZ

Consulta

Parlamento Europeu, 3.5.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

Parecer exploratório

Decisão da Mesa

17.4.2018 (na previsão de consulta)

 

 

Competência

Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

27.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

117/2/6

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com o objetivo do reexame da aplicação da política ambiental da União Europeia (UE), que consiste em apresentar um panorama completo da situação de cada Estado-Membro e evidenciar as principais lacunas na aplicação, a nível nacional, da legislação ambiental da UE, assim como em recomendar medidas de correção e apoiar os Estados-Membros que registam atrasos na aplicação dessa legislação, nomeadamente por meio de um novo instrumento de assistência técnica entre pares.

1.2.

Contudo, no seu parecer sobre este tema (1), o CESE entende que o reexame da aplicação da política ambiental da UE revela que a aplicação deficiente, fragmentada e díspar da legislação ambiental da UE constitui um grave problema em muitos Estados-Membros. Atualmente como no passado, além das causas profundas da aplicação deficiente detetadas no reexame da aplicação da política ambiental, parece haver ainda uma falta de vontade política dos governos de muitos Estados-Membros em fazer da melhoria substancial da aplicação uma prioridade e em disponibilizar recursos suficientes para esse fim (através do Quadro Financeiro Plurianual — QFP). O CESE recorda, por conseguinte, que a aplicação adequada do acervo da UE em matéria de ambiente é do interesse dos cidadãos europeus e oferece verdadeiras vantagens económicas e sociais.

1.3.

Do mesmo modo, o CESE reafirma que a aplicação efetiva das medidas de proteção do ambiente depende em parte da atribuição de um papel ativo à sociedade civil — empregadores, trabalhadores e outros representantes da sociedade —, tal como sustentado no parecer supramencionado (2). Por conseguinte, o CESE reitera o seu apelo para uma maior e mais estruturada participação da sociedade civil, que poderia reforçar os processos de reexame. Para o CESE, as organizações da sociedade civil a nível nacional devem ter a oportunidade de contribuir, com os seus conhecimentos e competências, para os relatórios por país, assim como para os diálogos estruturados nacionais e o seu seguimento. Por esse motivo, o CESE disponibiliza-se para facilitar o diálogo da sociedade civil a nível da UE no quadro de uma economia verdadeiramente sustentável e circular.

1.4.

No seu parecer sobre o plano de ação da UE para melhorar a conformidade e a governação em matéria de ambiente (3), o CESE reitera que as lacunas atuais estão a minar a confiança dos cidadãos na eficácia da legislação da UE e renova o seu apelo aos Estados-Membros e à Comissão para que canalizem fundos significativos para a contratação de pessoal suplementar, a fim de monitorizar a aplicação da governação e da legislação ambientais.

1.5.

O CESE sublinha que, em alguns casos, é também necessário realizar investimentos ambientais, sensibilizar o público ou dispor de cadeias fortes de controlo da aplicação das regras; além disso, não obstante haver já inspetores ambientais, a UE e os seus Estados-Membros precisam igualmente de juízes e magistrados especializados.

1.6.

O CESE recorda também, tal como referido no seu parecer (4), que, para além das ações junto dos Estados-Membros e do público em causa destinadas a comunicar as regras a respeitar e a sensibilizar para as mesmas, a Comissão, na sua qualidade de «guardiã do Tratado», deve tomar medidas em matéria de monitorização e controlo da aplicação ao nível da UE. O plano de ação (5) não aborda determinadas razões da falta de conformidade com as regras, como por exemplo o oportunismo e a falta de vontade política. Embora o apoio dos Estados-Membros seja necessário, o CESE assinala uma vez mais que a estratégia para melhorar a conformidade com a legislação em matéria de ambiente não se pode restringir às medidas não vinculativas deste plano de ação.

1.7.

Tanto o reexame da aplicação da política ambiental da UE como o plano de ação supracitado seguem um ciclo de dois anos. O CESE salienta, assim, que deveria desempenhar um papel ativo no seguimento e na atualização regular do conteúdo dos mesmos, para fazer ouvir a voz da sociedade civil no processo de melhoria contínua das políticas ambientais da UE.

1.8.

Além disso, tal como o demonstram diversos documentos da Comissão Europeia, uma vez que muitas lacunas se devem a um nível insuficiente de cooperação entre os vários níveis de governação (nacional, regional, local) responsáveis pela aplicação da legislação ambiental, o CESE apela igualmente à UE para que integre a sociedade civil no seguimento e na avaliação contínua da aplicação desta legislação.

1.9.

Os cidadãos da UE consideram que a proteção do ambiente é crucial; no entanto, a sua maioria entende que a UE e os governos nacionais não fazem o suficiente para proteger o ambiente. Por conseguinte, o Conselho, o Parlamento e a Comissão devem trabalhar mais estreitamente, com a ajuda do CESE, para responder às expectativas dos cidadãos. Mais concretamente, esta ambição poderia traduzir-se num pedido, ao CESE, de elaboração de um parecer exploratório sobre o modo como a sociedade civil poderia dar um maior contributo para a elaboração e a aplicação da legislação ambiental da UE.

1.10.

Para já, o CESE solicita à Comissão que partilhe a lista que identifica, no âmbito do reexame da aplicação da política ambiental da UE, todas as lacunas detetadas em cada Estado-Membro na aplicação da legislação ambiental da UE nos domínios da qualidade do ar, da água e dos resíduos. Esta lista deve basear-se, em parte, nas indicações dadas à Comissão e na consulta à sociedade civil organizada. Convida ainda a Comissão a definir soluções para colmatar estas lacunas e a pô-las, posteriormente, em prática. O CESE, com os meios e capacidades de que dispõe, está disposto a contribuir para este processo de definição e a participar na avaliação da futura aplicação dessas soluções.

1.11.

O CESE considera que a Comissão deveria propor legislação, facilitar e apoiar a aplicação das leis, mas também providenciar para que os textos em vigor sejam mais coerentes e mais alinhados com os progressos científicos e os compromissos internacionais que visam proteger a saúde das populações e restabelecer o bom funcionamento dos ecossistemas, sem os quais o desenvolvimento económico e a justiça social não são possíveis. Em particular, a aplicação da legislação ambiental é essencial para a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas e a aplicação dos acordos em matéria climática. O CESE chama, pois, a atenção das autoridades competentes para os diversos exemplos de melhoria da legislação ambiental nos domínios da qualidade do ar, da água e dos resíduos, que figuram no presente parecer.

1.12.

Por último, seguindo o exemplo da recente proposta de diretiva relativa ao plástico de utilização única, afigura-se que o nível elevado de aceitação das medidas propostas se deve às ações de informação e às campanhas mediáticas levadas a cabo sobre a poluição dos oceanos com plásticos, que sensibilizaram os cidadãos para este problema. O CESE considera que o mesmo acontece relativamente a muitas outras medidas suscetíveis de oferecer aos habitantes da UE condições de vida saudáveis, de permitir a adaptação às alterações climáticas e de pôr fim à perda de biodiversidade. O CESE reafirma, a este respeito, a necessidade de uma participação empenhada da sociedade civil em prol de uma educação da população e espera que as autoridades europeias, nacionais e locais intensifiquem os seus esforços de sensibilização dos cidadãos e dos decisores públicos e privados (em particular as pequenas e médias empresas e as pequenas e médias indústrias) para estes grandes desafios do século XXI.

2.   Observações na generalidade

2.1.

O CESE saúda que o Parlamento Europeu lhe tenha solicitado este parecer exploratório sobre a aplicação da legislação ambiental da UE nos domínios da qualidade do ar, da água e dos resíduos, manifestando assim a sua disponibilidade de cooperação.

2.2.

A aplicação da legislação ambiental da UE nos domínios da qualidade do ar, da água e dos resíduos tem especial relevância para a proteção dos ecossistemas, mas abre também as portas a novas oportunidades económicas e a progressos favoráveis à saúde dos cidadãos europeus. Esta aplicação não levanta só a questão da transposição das diretivas para o direito nacional — que é apenas uma primeira etapa —, mas também implica a instituição dos órgãos de poder público necessários ou a disponibilização dos meios existentes em termos de recursos humanos, de competências e de responsabilidades, de conhecimentos técnicos e de recursos financeiros. Em muitos casos, são necessários investimentos ambientais, públicos e/ou privados (por exemplo, para o tratamento da água e dos resíduos) e, noutros casos, as atividades com impacto ambiental negativo têm de ser regulamentadas (por exemplo, para preservar a qualidade do ar).

2.3.

A melhoria da aplicação da legislação ambiental da UE deveria tornar-se uma prioridade em todos os Estados-Membros e os órgãos de poder público responsáveis por estas questões deveriam ser reforçados. Em vários pareceres anteriores, o CESE já havia formulado recomendações neste sentido e, em termos mais gerais, sobre a aplicação da legislação ambiental da UE em vigor nos domínios da qualidade do ar, da água e dos resíduos. Por conseguinte, remete para esses pareceres que abordaram individualmente os temas da qualidade do ar (6), da água (7) e dos resíduos (8).

2.4.

Além destes pareceres de natureza temática, convém igualmente chamar a atenção para os pareceres do CESE de âmbito mais geral que contêm também recomendações que podem dar resposta à presente consulta, tais como pareceres sobre o acesso à justiça (9) ou a aplicação da política ambiental e a governação em matéria de ambiente (10) e a proteção dos interesses coletivos dos consumidores (11), pareceres de caráter estratégico (12) ou pareceres cujo âmbito geográfico vai além do território da UE e abordam, nomeadamente, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) (13), acordos de comércio livre (14) ou o clima (15).

2.5.

Além da aplicação do direito vigente, que facilita o estabelecimento de um mercado único, propício a uma concorrência livre e isenta de distorções, digno da confiança dos cidadãos, sejam estes produtores ou consumidores — um direito suscetível de assegurar o respeito de normas elevadas de qualidade e de segurança em matéria de proteção das populações e do ambiente —, afigura-se indispensável colmatar as lacunas da legislação atual, velando, simultaneamente, por que a UE, no quadro das negociações comerciais bilaterais ou multilaterais, assegure sistematicamente normas equivalentes nos domínios social e ambiental para os produtos importados.

2.6.

Neste contexto, há que encarar o conjunto das observações, recomendações e conclusões apresentadas no presente parecer exploratório não como um risco, mas como uma oportunidade de orientação das nossas atividades, por forma a gerar vantagens competitivas ou cooperativas, que tenham sentido e futuro, nos domínios económico, social e ambiental.

2.7.

Para concluir, refira-se que, quer se trate das políticas relativas ao ar, à água ou aos resíduos, é necessário evitar disparidades entre os Estados-Membros na aplicação do direito europeu, sob pena de criar distorções de concorrência, desigualdades em termos ambientais e sociais ou ainda fronteiras artificiais que dificultem a gestão de recursos que são comuns e, na sua essência, transnacionais. Assim, a fim de reforçar as políticas existentes e as que possam vir a ser introduzidas no futuro, a UE deve adotar medidas tendentes a uma harmonização em matéria de impostos sobre a poluição e os recursos e dar resposta à necessidade de aperfeiçoamento dos instrumentos existentes em função das externalidades a cobrir. As políticas ambientais não devem continuar a servir de variável de ajustamento, mas sim tornar-se uma alavanca fundamental para uma reorientação estratégica das atividades humanas, artesanais, agrícolas e industriais na UE e, por efeito de contágio positivo, impor-se igualmente noutras regiões onde se encontram os seus parceiros políticos e comerciais.

3.   Observações na especialidade

3.1.   Aplicação da legislação ambiental da UE relativa à qualidade do ar

Juntamente com a água, a natureza e os resíduos, a qualidade do ar é um dos setores com o número mais elevado de infrações. Em maio de 2018, a Comissão intensificou os esforços para garantir a aplicação da legislação em seis Estados-Membros que violaram as regras da UE em matéria de qualidade do ar, intentando uma ação contra estes junto do Tribunal de Justiça (16). O CESE reconhece que a Comissão está a levar a cabo neste momento um balanço de qualidade da Diretiva Qualidade do Ar, para avaliar o desempenho das diretivas relativas à qualidade do ar ambiente no período de 2008-2018. Os esforços para melhorar a aplicação da legislação em matéria de qualidade do ar exterior, em particular, contribuiriam para a concretização do ODS n.o 11 consagrado às cidades sustentáveis.

No que diz respeito à qualidade do ar, há também que ter presente que a poluição atmosférica tem consequências a três níveis:

1)

na saúde, de tal forma que a poluição do ar interior e exterior continua a constituir um fator de risco importante na União Europeia (17) e no resto do mundo. Trata-se mesmo do principal risco para a saúde e o ambiente a nível mundial (18), sendo responsável por 6,5 milhões de mortes prematuras por ano, e representa um custo elevado para a sociedade, os sistemas de saúde, a economia e todas as pessoas cuja saúde é afetada por estes fatores. Um relatório recente do Tribunal de Contas Europeu sobre a poluição do ar estima que o número de mortes prematuras seja de cerca de 400 000 por ano, assinalando que a saúde dos cidadãos europeus ainda não é suficientemente protegida e que a ação da UE não produziu os efeitos esperados.

2)

na biodiversidade (impacto nas culturas, florestas, etc.);

3)

no edificado existente e, naturalmente, no património edificado histórico, que está associado às atividades turísticas.

3.1.1.   Ar interior

a)

A fim de melhorar a qualidade do ar interior, deveriam ser disponibilizadas ao consumidor, através da rotulagem, informações sobre as emissões dos produtos que este adquire, quer se trate de materiais de construção, produtos de decoração, mobiliário ou de outros produtos de uso doméstico. Para tal, e após efetuar uma comparação das legislações dos Estados-Membros, a UE deve dotar-se de um quadro coerente baseado nas boas práticas atuais.

b)

Deveria ser imposta a obrigação de realizar regularmente manutenção e inspeções à qualidade da ventilação dos edifícios, passada a fase de construção e de entrega dos mesmos. Esta monitorização a longo prazo do estado dos edifícios teria, sem dúvida, um impacto positivo não só no domínio da saúde, mas também no domínio da energia.

c)

Com vista a proteger os grupos mais vulneráveis da população, incluindo adultos e crianças cujo aparelho respiratório se encontra fragilizado ou ainda não está totalmente desenvolvido e que, portanto, necessitam de uma melhor qualidade do ar, importa, além disso, executar planos de ação para promover essa melhoria nos estabelecimentos que recebem público, em especial crianças.

d)

Por último, seria útil harmonizar as práticas de purificação do ar. A UE deveria definir critérios para medir a eficácia e a inocuidade dessas práticas, nomeadamente a fim de evitar quaisquer derivas comerciais, ou até mesmo sanitárias, induzidas pela relativa ausência de regras que se verifica atualmente.

3.1.2.   Ar exterior

a)

Para promover uma melhor qualidade do ar e reforçar a confiança dos cidadãos nas instituições europeias, é necessário, além de uma aplicação mais rigorosa da legislação em vigor e da imposição de sanções mais severas em caso de incumprimento, que as normas estabelecidas nas diretivas europeias passem a refletir as recomendações em falta da Organização Mundial de Saúde (OMS) quando estas últimas contribuírem para uma melhor proteção da saúde das populações.

b)

Atualmente, apenas as partículas PM10 e PM2,5 são objeto de vigilância (escala micrométrica). Contudo, no que diz respeito à saúde, algumas partículas ultrafinas têm muito mais efeitos sobre a saúde (escala nanométrica), dado que penetram muito mais profundamente no corpo humano e podem acumular-se nos órgãos vitais. Por conseguinte, é necessário que a legislação europeia tenha em conta esta realidade e preveja a monitorização obrigatória da concentração de partículas ultrafinas, para que a sua presença no ar possa ser também progressivamente reduzida.

c)

O mesmo deveria aplicar-se aos hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAP) e a diversos outros poluentes que ainda não são objeto de monitorização, nomeadamente os que são gerados pelos incineradores, transportes por via navegável, veículos terrestres, máquinas de estaleiros, etc., tanto mais que o avanço contínuo do conhecimento científico e das capacidades técnicas permite criar, desde já, condições para se alcançar uma melhor proteção da saúde e dos ecossistemas.

d)

Nesse sentido, a Diretiva Limites Nacionais de Emissão (LNE) (19) é fundamental para que os Estados-Membros reduzam as suas emissões de poluentes atmosféricos. No entanto, apenas propõe medidas indicativas, de acordo com o princípio da subsidiariedade, para que os Estados-Membros cumpram os compromissos de redução de emissões. A flexibilidade de aplicação concedida torna esta legislação muito fraca.

e)

Outro aspeto que pode ser melhorado prende-se com o facto de a diretiva não propor um objetivo de redução das emissões de metano, um poluente atmosférico fundamental, na medida em que é precursor de ozono, bem como um gás com poderoso efeito de estufa.

f)

A fim de assegurar uma harmonização das diferentes legislações europeias, deveriam ser introduzidos objetivos ao abrigo da política agrícola comum (PAC) em relação à poluição do ar proveniente do setor agrícola. A título de exemplo, refira-se que este setor é responsável por mais de 95 % das emissões de amoníaco, um poluente abrangido pela Diretiva LNE. Para que os Estados-Membros atinjam os respetivos objetivos de redução neste domínio, a PAC deveria oferecer instrumentos adequados.

g)

Recorde-se que, atualmente, a quantificação dos poluentes se baseia no seu peso (em μg/m3), apesar de, há vários anos, os toxicólogos sublinharem, nas reuniões científicas, que seria preferível uma quantificação baseada no número de partículas. Tal abordagem tem ainda mais sentido se atendermos à importância da análise dos elementos ultrafinos que respiramos (20).

3.2.   Aplicação da legislação ambiental da UE no domínio da água

No que diz respeito à água, saliente-se desde já que, embora a diretiva-quadro neste domínio seja, em termos gerais, satisfatória, a sua execução continua a ser insatisfatória, e que a maioria dos Estados-Membros não concretizou o objetivo do «bom estado ambiental», fixado para 2015. O mesmo acontece com a rede Natura 2000, devido ao fracasso generalizado do instrumento contratual. É possível introduzir diversas melhorias e inovações, ligadas nomeadamente aos progressos científicos relativos, por um lado, ao funcionamento dos solos e, por outro, à dispersão e à interação de determinados poluentes. Esta questão será examinada infra. Maiores progressos na aplicação da legislação da UE no domínio da água contribuirão para a consecução de vários objetivos relacionados com o ODS n.o 6, relativo à água potável e ao saneamento.

Um dos domínios mais críticos relacionados com a água é a execução da Diretiva Tratamento de Águas Residuais Urbanas, onde existem profundas diferenças entre os Estados-Membros em termos de conformidade, devido a uma combinação de questões de governação e financiamento. Embora a Comissão tenha envidado grandes esforços neste sentido no âmbito do seu atual mandato, continuam a existir necessidades consideráveis de financiamento neste domínio, bem como problemas por resolver relacionados com a governação. Com base na experiência comprovada da gestão dos resíduos sólidos, cabe explorar novas formas de responsabilizar os produtores pelo financiamento do tratamento suplementar de águas residuais a fim de captar poluentes emergentes, como os produtos farmacêuticos e os microplásticos.

3.2.1.   Águas de superfície

a)

A fim de melhorar a situação das águas de superfície, e também para evitar retrocessos na legislação e na governação em matéria de ambiente, seria preferível estabelecer definições para certos conceitos como, por exemplo, «continuidade ecológica», «curso de água» e «zona húmida». É indispensável, por exemplo, que as regras de caracterização das zonas húmidas sejam definidas de modo preciso a nível europeu, sabendo que a abordagem única assente na finalidade da proteção é demasiado complexa para ser transposta de modo viável para o ordenamento jurídico interno, pelo menos, em certos Estados-Membros.

b)

Será igualmente útil dispor de um quadro unificado que permita que as avaliações sejam conduzidas de forma clara e com a participação de todos os atores a que a aplicação da legislação diz respeito.

c)

No que respeita tanto às nanopartículas, como, por exemplo, as que são geradas pelas indústrias têxteis e agroalimentares, como aos perturbadores endócrinos, por exemplo os que têm origem na indústria farmacêutica e na agricultura, cumpre reduzir na fonte a sua difusão no ambiente e estabelecer limites, a observar rigorosamente, para as respetivas concentrações nas águas de superfície e subterrâneas, tendo em conta o seu impacto nos ecossistemas, e em especial nas cadeias alimentares, incluindo nos seres humanos. Para este fim, a UE deve dotar-se dos meios necessários para determinar os limiares também a mais longo prazo, tendo em conta o «efeito cocktail» entre estas substâncias, as diversas substâncias que já são objeto de monitorização e os respetivos subprodutos de degradação.

3.2.2.   Águas subterrâneas

a)

No que respeita à legislação sobre a água, as disposições relativas à recuperação dos custos induzidos pelas diferentes categorias de utilizadores, à internalização dos custos externos e a uma tarifação em função dos custos — tais como as que são previstas na Diretiva que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da política da água (21) — não são suficientemente vinculativas nem precisas para produzirem um efeito suficiente.

b)

Com as alterações climáticas, a recarga dos aquíferos subterrâneos pode tornar-se problemática, tanto mais que, em certas zonas, as práticas urbanísticas ou agrícolas conduzem a uma forma indesejável de rutura do ciclo da água, provocada por solos impermeabilizados ou com uma atividade biológica demasiado fraca, que favorecem o escoamento superficial, a erosão e as correntes de lama, em detrimento da infiltração, da depuração e do armazenamento naturais. Para evitar o agravamento destes fenómenos, a UE deve finalmente adotar legislação que favoreça os solos vivos, a qual terá também a vantagem de dar resposta aos problemas da qualidade e da quantidade da água disponível para os ecossistemas e para o consumo humano, bem como para as atividades agrícolas e industriais.

c)

Tendo em conta o papel das florestas e das sebes — e, em menor medida, dos prados permanentes e dos solos cultivados a longo prazo sem lavoura —, na geração de chuva por evapotranspiração, bem como na filtração, na depuração e no armazenamento de água nos solos e nos lençóis freáticos, estes deveriam merecer uma maior atenção da nossa parte e, na medida do possível, estar presentes e repartidos pelo conjunto do território europeu, tanto mais que representam uma ajuda não negligenciável para outros seres vivos, incluindo numerosos auxiliares de cultivo, face a picos de calor e a outros fenómenos climáticos extremos, que são cada vez mais frequentes.

3.2.3.   Diretiva que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da política da água

Na ótica de uma melhor aplicação da Diretiva-Quadro da Água, recomenda-se a alteração do texto da diretiva no que respeita a certos aspetos referidos, em parte, anteriormente, incidindo sobre os seguintes pontos:

a)

A referência ao estatuto da água no primeiro considerando, «[a] água não é um produto comercial como outro qualquer», deveria ser substituída por «[a] água não é um produto comercial».

b)

A aplicação dos princípios da prevenção e da precaução exige, tendo em conta o estado das águas na Europa, a supressão de todas as derrogações, como, por exemplo, as que são previstas no artigo 4.o, n.o 5, ou no artigo 7.o, n.o 4.

c)

Em virtude do estado das águas, deve ser exigida uma avaliação de impacto ambiental para todos os projetos suscetíveis de afetar os recursos hídricos e os meios aquáticos. Por conseguinte, a referência ao procedimento de avaliação de risco simplificado (artigo 16.o) deve ser suprimida.

d)

O princípio do poluidor-pagador deve ser revisto, nomeadamente no que respeita às suas modalidades de aplicação, mediante:

uma reformulação do artigo 9.o, substituindo o texto «Os Estados-Membros terão em conta o princípio da amortização dos custos dos serviços hídricos, mesmo em termos ambientais e de recursos, tomando em consideração a análise económica efetuada de acordo com o anexo III e, sobretudo, segundo o princípio do poluidor-pagador» por «Os Estados-Membros aplicam o princípio da recuperação dos custos diretos e indiretos ligados ao impacto das atividades humanas nos recursos hídricos em conformidade com o princípio do poluidor-pagador»,

supressão das exceções previstas no artigo 9.o, n.o 4,

aditamento de todos os setores, especificando os três domínios (agricultura, indústria e agregados familiares), em relação aos quais os Estados estabelecem regras com vista a suprimir a externalização dos custos. Um relatório anual especificaria, por setor, as modalidades de execução deste processo.

e)

Todas as formulações do tipo «devem garantir que» devem ser substituídas por uma obrigação real (por exemplo, no artigo 11.o, n.o 5, ou no artigo 14.o, n.o 1).

f)

Afigura-se igualmente necessário reduzir os limiares relativos à concentração de poluentes, inclusivamente em articulação com outras diretivas (como as diretivas relativas aos nitratos, aos produtos químicos, etc.), e atualizar a lista de substâncias prioritárias (integrando, por exemplo, os compostos perfluorados, as nanotecnologias, etc.).

g)

É necessário promover uma maior participação do público (artigo 14.o), sobretudo no que respeita ao planeamento. Tal participação deve ser alargada aos programas de medidas básicas e complementares, bem como a todos os controlos administrativos prévios.

h)

No que se refere ao contencioso (artigo 23.o), é necessário acrescentar que, ao abrigo da Convenção de Aarhus, os Estados devem estabelecer regras e procedimentos que favoreçam o acesso do público ao contencioso no domínio da água.

3.3.   Aplicação da legislação ambiental da UE no domínio dos resíduos

A avaliação de impacto subjacente à legislação recentemente adotada no domínio dos resíduos identificou vários problemas relacionados com a aplicação: problemas jurídicos/regulamentares, bem como relacionados com a governação e a sensibilização. As lacunas na aplicação da Diretiva-Quadro dos Resíduos devem-se frequentemente à falta de instrumentos económicos, por exemplo os que tornam a reciclagem mais atrativa do que a deposição em aterro. No entanto, a criação desses instrumentos económicos pode ser problemática para os municípios. Os órgãos de poder local não possuem, frequentemente, capacidade para traduzir as medidas e os instrumentos da UE a nível local, o que aponta para um problema de governação. A aplicação da legislação é também um problema grave em vários Estados-Membros. O CESE reconhece que a Comissão tem trabalhado, nos últimos anos, com os Estados-Membros para abordar estas lacunas na aplicação, por exemplo prestando apoio técnico e fornecendo orientações específicas sobre o que tem de ser alterado através dos dois exercícios de promoção da conformidade levados a cabo em 2012 e em 2015.

As propostas legislativas recentemente adotadas no domínio dos resíduos deverão resolver alguns dos problemas relacionados com a aplicação e contribuir para o ODS n.o 12 relativo ao consumo e à produção sustentáveis, mas as questões relacionadas com a governação e a garantia da aplicação ainda têm de ser abordadas a nível nacional. O CESE, juntamente com a Comissão, criou a Plataforma Europeia das Partes Interessadas para a Economia Circular, que já obteve resultados significativos ao facilitar a recolha, o intercâmbio e a divulgação de conhecimentos especializados e de boas práticas junto das diversas partes interessadas. Esta plataforma é um instrumento fundamental ao qual se deve recorrer com mais frequência para incentivar a aplicação da legislação da UE neste domínio.

3.3.1.   Prevenção de resíduos

a)

A revisão recente da política no domínio dos resíduos (22) constitui a ocasião para apoiar firmemente medidas destinadas a reduzir na fonte as nossas necessidades (inclusive as de matérias-primas primárias e secundárias), bem como a criação de futuros resíduos, em particular de resíduos de natureza perigosa para os ecossistemas e a saúde humana, o que significa que é necessário refletir sobre a adequação das nossas necessidades e daquilo que produzimos, e o modo de conceber os produtos, de prolongar a sua longevidade e de os transformar posteriormente com a mínima perda possível de material, já que esta tem um impacto geral no ambiente, na soberania energética e na sustentabilidade económica.

b)

Para que possamos falar de «materiais sustentáveis», mais do que de «resíduos», e de uma economia circular, é necessário eliminar, logo na fase de conceção dos produtos, os componentes que apresentem uma toxicidade ou uma perigosidade suscetível de dificultar uma futura fase de reciclagem.

c)

Em matéria de embalagens, deveria prevalecer a sobriedade e adotar-se medidas, da forma mais gradual e vinculativa possível, com vista a evitar distorções da concorrência em relação aos diferentes sistemas de retoma e reutilização, já existentes ou a desenvolver.

d)

A prevenção de resíduos passa também pela capacidade das nossas sociedades de reutilizarem e repararem o que produzimos. Para tal, é necessária uma legislação europeia ambiciosa, que fixe objetivos vinculativos, em vez de se limitar a medidas de caráter voluntário.

e)

A fim de dissociar o desenvolvimento económico do consumo de recursos naturais e do impacto ambiental daí decorrente, é necessário que a UE estabeleça objetivos mais ambiciosos a fim de tornar mais eficaz a utilização dos recursos nos sistemas de produção europeus.

3.3.2.   Gestão de resíduos

a)

Para conquistar e conservar a confiança da população, incluindo dos produtores e dos consumidores, é importante que a economia circular — andando a par dos mais modernos conhecimentos científicos — se salvaguarde de quaisquer escândalos futuros, nomeadamente no domínio da saúde, eventualmente relacionados com a concentração ou a dispersão de substâncias poluentes nos materiais reciclados (por exemplo, bromo ou perturbadores endócrinos) ou no ambiente (nanomateriais ou microplásticos).

b)

Tais esforços terão ainda mais credibilidade e eficácia se, com vista a aumentar a taxa de reciclagem de todos os tipos de materiais, for implantado um sistema de rastreio dos seus componentes desde a fase de produção, sendo garantida a maior transparência possível até chegarem ao consumidor.

c)

Por conseguinte, na União Europeia, deve aplicar-se aos materiais reciclados ou virgens o mesmo nível de proteção que é aplicado em relação à saúde humana ou ao ambiente. No que concerne aos materiais recicláveis, não deveria ser possível a utilização prolongada de produtos químicos perigosos em concentrações mais elevadas. Por conseguinte, aquando do estabelecimento de restrições e da fixação de limites para os produtos químicos no âmbito do Regulamento REACH (23), a Agência Europeia dos Produtos Químicos deverá fixar os mesmos limites para os materiais reciclados. Os materiais que não respeitem esses limites devem ser objeto de um tratamento através do qual a substância será retirada ou considerada inadequada para reutilização ou reciclagem.

d)

Além de promover a conceção ecológica, a que deveriam estar sujeitos os telemóveis inteligentes, bem como outros produtos elétricos e eletrónicos, a UE deve desenvolver e assumir uma política de gestão dos seus resíduos digna desse nome no seu território, em vez de deixar que estes sejam exportados para o estrangeiro.

e)

Tendo em consideração a análise do ciclo de vida, todas as opções de reciclagem são preferíveis à incineração (nomeadamente devido à energia incorporada, por exemplo, nos plásticos), exceto para a madeira, em alguns casos especiais, e também para alguns detritos/resíduos perigosos. A incineração, tal como a deposição em aterro, deve ser progressivamente suprimida, cabendo fixar objetivos ambiciosos nesse sentido.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Parecer — Reexame da aplicação da política ambiental da UE (JO C 345 de 13.10.2017, p. 114).

(2)  Ver nota de rodapé n.o 1.

(3)  Parecer — Ações da UE para melhorar a conformidade e a governação em matéria de ambiente (JO C 283 de 10.8.2018, p. 83).

(4)  Ver nota de rodapé n.o 3.

(5)  COM (2018) 10 final.

(6)  Parecer — Programa Ar Limpo para a Europa (JO C 451 de 16.12.2014, p. 134) e Parecer — Eliminar o amianto na UE (JO C 251 de 31.7.2015, p. 13).

(7)  Parecer — Um plano de ação para a natureza, a população e a economia, JO C 129 de 11.4.2018, p. 90; Parecer — Governação internacional dos oceanos: uma agenda para o futuro dos nossos oceanos, JO C 209 de 30.6.2017, p. 60, e Parecer — Qualidade da água destinada ao consumo humano (JO C 367 de 10.10.2018, p. 107).

(8)  Parecer — Restrições a substâncias perigosas (RSP) (JO C 345 de 13.10.2017, p. 110); Parecer — Relação entre as legislações relativas aos produtos químicos, aos produtos e aos resíduos (JO C 283 de 10.8.2018, p. 56); Parecer — Estratégia para os Plásticos na Economia Circular (incluindo o tratamento dos resíduos provenientes dos navios) (JO C 283 de 10.8.2018, p. 61); Parecer — Produção de energia a partir de resíduos na economia circular (JO C 345 de 13.10.2017, p. 102); e Parecer — Pacote de medidas relativas à economia circular (JO C 264 de 20.7.2016, p. 98).

(9)  Parecer — Acesso à justiça a nível nacional no âmbito de medidas de aplicação da legislação ambiental da UE (JO C 129 de 11.4.2018, p. 65).

(10)  Ver notas de rodapé n.os 1 e 3.

(11)  Parecer — Novo Acordo para os Consumidores (JO C 440 de 6.12.2018, p. 66).

(12)  Parecer — A transição para um futuro mais sustentável na Europa — uma estratégia para 2050 (JO C 81 de 2.3.2018, p. 44) e Parecer — Novos modelos económicos sustentáveis (JO C 81 de 2.3.2018, p. 57).

(13)  Parecer — A Agenda 2030 — Uma União Europeia empenhada no desenvolvimento sustentável a nível mundial, adotado em 20 de outubro de 2016 (JO C 34 de 2.2.2017, p. 58) e Parecer — O papel fundamental do comércio e do investimento no cumprimento e na implementação dos ODS (JO C 129 de 11.4.2018, p. 27).

(14)  Parecer — Capítulos sobre comércio e desenvolvimento sustentável nos acordos de comércio livre da UE (JO C 227 de 28.6.2018, p. 27).

(15)  Parecer — Protocolo de Paris — Um roteiro para o combate às alterações climáticas ao nível mundial para além de 2020 (JO C 383 de 17.11.2015, p. 74) e Parecer — Justiça climática (JO C 81 de 2.3.2018, p. 22).

(16)  http://europa.eu/rapid/press-release_IP-18-3450_pt.htm

(17)  De acordo com a Agência Europeia do Ambiente.

(18)  De acordo com a OMS.

(19)  Diretiva LNE.

(20)  https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0048969711005730?via%3Dihub

(21)  Diretiva-Quadro da Água.

(22)  http://ec.europa.eu/environment/waste/target_review.htm

(23)  Regulamento REACH — Regulamento (CE) n.o 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 396 de 30.12.2006, p. 1, retificado pelo JO L 136 de 29.5.2007, p. 3).


III Atos preparatórios

COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU

539.a reunião plenária do CESE, 12.12.2018-13.12.2018

22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/41


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões relativa a um setor retalhista europeu apto para o século XXI»

[COM(2018) 219 final]

(2019/C 110/07)

Relator:

Ronny LANNOO

Correlator:

Gerardo LARGHI

Consulta

Comissão Europeia, 18.6.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

21.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

171/3/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com a comunicação da Comissão sobre a modernização do setor retalhista. O CESE sublinha, uma vez mais, a importância económica e social do setor retalhista para todas as partes interessadas e para a sociedade em geral (1). O CESE assinala que já recomendou, em pareceres anteriores, a criação de um ambiente económico aberto, destinado a assegurar a concorrência leal, a fim de criar condições para a coexistência positiva e a cooperação entre os micro, pequenos, médios e grandes retalhistas.

1.2.

A defesa e a promoção da diversidade no setor retalhista são cruciais para dar resposta às necessidades dos consumidores, bem como para defender e promover o sistema produtivo europeu. Por conseguinte, o CESE entende que é necessário estabelecer um equilíbrio entre as medidas a favor dos grandes retalhistas, definidas muito claramente na comunicação, e as intervenções correspondentes que visam atender às necessidades das microempresas e pequenas empresas.

1.3.

O CESE refere que a proposta da Comissão se centra demasiado no «preço» enquanto elemento mais preponderante para os consumidores, em detrimento de outros aspetos essenciais, tais como a informação, a qualidade e a personalização dos produtos, a proximidade, a mobilidade, a economia circular e a durabilidade, a relação custo-benefício e o serviço prestado antes ou após a compra. A diversificação dos produtos deve ser devidamente protegida pela Comissão para servir os interesses de todas as partes.

1.4.

O CESE entende que, o direito de estabelecimento deve ser interpretado em consonância com o princípio da subsidiariedade e que a melhor forma de satisfazer as necessidades de todas as partes interessadas é chegando a um acordo aos níveis nacional, regional e local.

1.5.

Em particular, o CESE considera que alguns obstáculos à liberdade de estabelecimento e algumas restrições operacionais, que existem atualmente em certos Estados-Membros, entravam o estabelecimento de novas empresas, mas que a plena liberalização não assegura o equilíbrio necessário entre as grandes empresas, as pequenas empresas e as empresas familiares.

1.6.

O CESE considera que os regulamentos nacionais relativos aos horários de funcionamento das lojas e ao tempo de trabalho são essenciais para assegurar condições de concorrência equitativas entre empresas de diferentes dimensões e, sobretudo, para garantir a proteção social adequada tanto dos trabalhadores por conta de outrem como dos trabalhadores por conta própria, tendo igualmente em conta as alterações dos hábitos dos consumidores.

1.7.

O CESE reitera que um acordo a nível nacional ou infranacional é a melhor forma de definir os horários e dias de funcionamento, bem como de conciliar a necessidade dos consumidores de acederem a produtos e serviços específicos com a intenção de algumas empresas de abrirem aos domingos e nos dias de feriado, assegurando em simultâneo o equilíbrio entre a vida familiar e profissional dos empresários e trabalhadores, e reservando tempo para a formação.

1.8.

O CESE assinala igualmente, em consonância com o Pilar Social, a necessidade de garantir a todos os trabalhadores do setor, quer em linha quer fora de linha, uma remuneração justa e qualidade de trabalho. Chama a atenção, em particular, para o caso dos contratos de trabalho de milhares de pessoas que trabalham para empresas em linha ainda não abrangidos por acordos de negociação coletiva, bem como dos contratos de grandes retalhistas que visam exclusivamente atender à maior afluência de clientes aos fins de semana (resultando num aumento de contratos ocasionais) ou que não contabilizam os fins de semana nem as noites como horas extraordinárias. Por fim, na opinião do CESE, a criação de um mecanismo eficaz de diálogo social, que também envolva micro e pequenas empresas, proporcionaria às empresas melhores oportunidades de desenvolvimento e aos trabalhadores um melhor sistema de salvaguardas.

1.9.

O CESE concorda com a Comissão que é necessário incentivar e apoiar a inovação no setor retalhista, a aprendizagem ao longo da vida para os empregadores e os trabalhadores e a promoção dos produtos a longo prazo. Contudo, considera que, a par da proposta da Comissão, deve existir um roteiro para acompanhar este processo no contexto da transição digital, mediante financiamento adequado e especial incidência nas microempresas e pequenas empresas, em colaboração com as organizações que representam as PME.

1.10.

O CESE exorta as autoridades a todos os níveis a trabalharem em estreita cooperação com todas as partes interessadas, com vista à elaboração de um plano de ação específico sobre o futuro do comércio retalhista europeu no século XXI (isto é, através de informação, formação, financiamento e boas práticas, etc.).

2.   Síntese do documento da Comissão

2.1.

A comunicação em apreço visa contribuir para explorar o potencial que o setor retalhista representa para a economia da UE, identificando as boas práticas. Por conseguinte, as instituições da UE e os Estados-Membros devem envidar esforços a fim de apoiar a competitividade do setor, numa altura em que o crescimento rápido do comércio eletrónico e as alterações dos hábitos dos consumidores o estão a transformar.

2.2.

Para que o mercado único cumpra os seus objetivos, há que tomar medidas adequadas a todos os níveis. A produtividade do setor retalhista da UE tem registado um atraso relativamente a outros setores. Tal deve-se à acumulação de regulamentação fiscal a todos os níveis e a um atraso na transição para o mercado digital.

2.3.

Os retalhistas enfrentam inúmeras restrições no que respeita ao estabelecimento de lojas e operações. Muitas destas restrições são fundamentadas por razões legítimas de interesse público. Podem igualmente criar obstáculos às empresas em fase de arranque e à produtividade.

2.4.

A abertura de novos estabelecimentos comerciais constitui um elemento crucial para a viabilidade do setor. É importante aplicar estratégias de acesso ao mercado que combinem uma presença em linha e fora de linha. Os procedimentos de estabelecimento simples, transparentes e eficazes permitem que o setor retalhista melhore a sua produtividade.

2.5.

A Comissão recomenda que os Estados-Membros avaliem e modernizem, conforme necessário, os respetivos quadros regulamentares, inspirando-se, quando tal se afigurar pertinente, nas boas práticas desenvolvidas noutros Estados-Membros.

2.6.

De modo geral, as restrições operacionais afetam, sobretudo, os retalhistas tradicionais. As autoridades públicas devem avaliar o equilíbrio, a proporcionalidade e a eficácia dessas restrições, a fim de assegurarem condições de concorrência equitativas face ao comércio eletrónico.

2.7.

O custo do cumprimento representa entre 0,4 % a 6 % do volume de negócios anual dos retalhistas. Para as microempresas, este é um encargo especialmente pesado. A promoção do desenvolvimento do setor retalhista para benefício, em última instância, dos consumidores requer uma abordagem abrangente: simplificar os quadros regulamentares, assegurar que os mesmos se adequam a um ambiente multicanal, bem como reduzir as medidas excessivamente onerosas e dispendiosas e os procedimentos impostos aos retalhistas para garantir o cumprimento dessas regras.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com a tentativa da Comissão de modernizar o setor retalhista, a fim de dar resposta aos novos desafios relacionados com a digitalização e o comércio eletrónico.

3.2.

Em pareceres anteriores, em particular o parecer «Plano de ação europeu para o setor retalhista» (INT/682) (2), o CESE já recomendara a criação de um ambiente económico aberto com o objetivo de garantir a concorrência leal entre empresas de igual dimensão. A UE deve, em especial, criar condições favoráveis à diversidade, à coexistência positiva e à cooperação entre micro, pequenos, médios e grandes retalhistas em linha e fora de linha. A promoção da diversidade no setor retalhista da UE constitui uma ótima forma de dar resposta às várias necessidades dos consumidores e também de defender e promover o sistema produtivo europeu.

3.3.

O CESE assinala que a proposta da Comissão se centra demasiado no «preço» enquanto elemento mais preponderante para os consumidores, ao passo que o principal objetivo deveria ser a prestação de informações precisas aos consumidores (sensibilização dos consumidores). Os consumidores devem sentir-se livres para ter em conta outros elementos ao comprarem um produto, tais como a qualidade, a personalização, a durabilidade, a mobilidade do consumidor, a proximidade, a relação custo-benefício, o serviço prestado durante ou após a compra, o impacto na economia circular e os critérios ambientais. A diversificação dos produtos gera valor acrescentado para os setores retalhista e produtivo da UE, pelo que deve ser devidamente protegida pela Comissão (3).

3.4.

O CESE considera que a abordagem da Comissão favorece os grandes retalhistas, sendo importante contrabalançá-la com as necessidades das micro e pequenas empresas. Em particular, o CESE entende que é necessário garantir a coexistência das grandes empresas, das microempresas e das empresas familiares.

3.5.

O CESE concorda que algumas das restrições operacionais e ao direito de estabelecimento vigentes em alguns Estados-Membros podem entravar o estabelecimento de novas empresas e a sua expansão. Porém, considera que a plena liberalização do direito de estabelecimento não seria a solução para todos os problemas. Além disso, neste contexto, importa respeitar o princípio da subsidiariedade e chegar a um acordo aos níveis nacional, regional e local, a fim de responder adequadamente às necessidades locais e de todas as partes interessadas.

3.6.

O CESE não concorda com a interpretação negativa pela Comissão do acórdão Visser. Na opinião do CESE, este processo confirma o objetivo do legislador no que diz respeito à Diretiva «Serviços»: codifica a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia relativa à liberdade de estabelecimento e proíbe apenas determinados requisitos, tais como as avaliações das necessidades económicas, reconhecendo, ao mesmo tempo, que «[o] objetivo de proteção do ambiente urbano é suscetível de constituir uma razão imperiosa de interesse geral capaz de justificar uma restrição territorial como a que está em causa no processo principal». Importa equilibrar entre essas necessidades de acordo com os princípios da proporcionalidade e da subsidiariedade.

3.7.

Neste contexto, no processo de criação do mercado único europeu, muito pode ser feito para simplificar os procedimentos necessários para a constituição de uma empresa e para tornar estes procedimentos transparentes e uniformes, respeitando, ao mesmo tempo, as restrições legítimas existentes à escala territorial estabelecidas em conformidade com o princípio da subsidiariedade.

3.8.

O CESE considera extremamente importante manter e proteger alguns ambientes económicos específicos, especialmente se estiverem relacionados com a conservação do património histórico e artístico nacional e com objetivos de política social e cultural; uma abordagem diferente pode ter consequências negativas para comunidades locais e os consumidores (4).

3.9.

Em geral, o CESE entende que o alargamento, a expansão e o comércio eletrónico transfronteiras devem ser considerados uma opção realista e que as empresas, em coordenação com as suas organizações, devem ser apoiadas neste processo, o que não pode, porém, ser encarado como uma obrigação ou como única possibilidade de crescimento de todas as empresas, à luz do interesse primordial dos consumidores (distribuição e serviços multicanais). Esta é a razão pela qual é essencial incentivar e manter os processos de inovação, a formação e a promoção de produtos a longo prazo, incluindo apoiar todas as micro e pequenas empresas, bem como as organizações que as representam, mediante financiamento adequado.

3.10.

Uma política retalhista eficiente necessita de estabelecer o equilíbrio entre a rentabilidade e a eficiência no que diz respeito à localização. As considerações relacionadas com a perspetiva de (médio) longo prazo devem ser tidas em conta, especialmente no que se refere aos estabelecimentos tradicionais e à sua relação com os desenvolvimentos atuais e os que possam ocorrer no futuro (habitação, serviços disponíveis, etc., e, consequentemente, com os centros urbanos e bairros existentes). O CESE considera que a Comissão deveria completar a sua proposta, em colaboração com as organizações nacionais e regionais competentes, introduzindo medidas estruturais com vista à inclusão de fatores de desenvolvimento territorial para as comunidades locais e centros urbanos (zonas turísticas, ordenamento do território local, regulamentação e condições em matéria de construção, etc.).

3.11.

O CESE considera que os regulamentos nacionais relativos aos horários de funcionamento das lojas e ao tempo de trabalho, em conformidade com as novas soluções tecnológicas, desempenham um papel crucial, assegurando condições de concorrência equitativas entre empresas de diferentes dimensões e garantindo a proteção social adequada tanto dos trabalhadores por conta de outrem como dos trabalhadores por conta própria e, acima de tudo, constituem uma ferramenta essencial para a proteção social dos trabalhadores por conta de outrem e dos trabalhadores por conta própria.

3.12.

O CESE reitera que um acordo a nível nacional ou infranacional com as organizações em causa constitui a melhor forma de definir os horários e dias de funcionamento. Com efeito, é extremamente importante conciliar as necessidades dos consumidores de acesso a produtos e serviços específicos com o desejo de determinadas empresas de abrirem nos dias de feriado e à noite, e proteger as necessidades de descanso dos proprietários das microempresas e dos seus trabalhadores, assegurando, ao mesmo tempo, um equilíbrio entre a vida familiar e profissional, e reservando tempo para a formação.

3.13.

O CESE assinala igualmente, em consonância com o Pilar Social, a necessidade de garantir a todos os trabalhadores do setor, quer em linha quer fora de linha, uma remuneração justa e qualidade de trabalho. Chama a atenção, em particular, para o caso dos contratos de trabalho de milhares de pessoas que trabalham para empresas em linha ainda não abrangidos por acordos de negociação coletiva, bem como dos contratos de grandes retalhistas que visam exclusivamente atender à maior afluência de clientes aos fins de semana (resultando num aumento de contratos ocasionais) ou que não contabilizam os fins de semana nem as noites como horas extraordinárias. Por fim, na opinião do CESE, a criação de um mecanismo eficaz de diálogo social, que também envolva micro e pequenas empresas, proporcionaria às empresas melhores oportunidades de desenvolvimento e aos trabalhadores um melhor sistema de salvaguardas.

3.14.

O CESE congratula-se com a recomendação de que as autoridades públicas devem facilitar a adoção de tecnologias digitais pelas pequenas empresas. Todavia, esta não pode ser a única opção. As lojas tradicionais continuam a ser um elemento fundamental não só do crescimento na UE, mas também da coesão social, em particular nas comunidades locais e para os consumidores digitais não nativos. Por esta razão, os comércios em linha e fora de linha devem coexistir. Neste contexto, o CESE é de opinião que a Comissão subestima as dificuldades que as microempresas e as pequenas empresas enfrentam para participarem e retirarem benefícios do comércio eletrónico.

3.15.

O CESE concorda com a Comissão que é necessária formação de qualidade para os empregadores que pretendem entrar no comércio eletrónico. Não obstante, considera que a situação é mais complexa e que as PME, especialmente as micro e as pequenas empresas, enfrentam vários desafios, como, por exemplo: a) alterar e adaptar a sua organização interna; b) dominar línguas estrangeiras; c) obter e compreender informações jurídicas e administrativas; d) criar um sistema de entrega eficiente e competitivo; e e) vencer o dumping fiscal e social ao nível da UE (fraude no IVA, contrafação, etc.). Por este motivo, o CESE insta a Comissão e os Estados-Membros a apoiarem as PME e as suas organizações na transição para o comércio eletrónico, em particular no que se refere à formação, através de uma ampla abordagem que tenha em conta todas as condições necessárias à criação de empresas em linha bem-sucedidas.

3.16.

O CESE considera que o comércio eletrónico pode ser uma alternativa importante para muitas PME. Além disso, assinala que a Comissão publicou recentemente a sua primeira proposta que visa regulamentar as relações entre as plataformas e as empresas no mercado digital. Esta medida centra-se na transparência, mas não combate algumas práticas abusivas frequentes, que impedem a concorrência leal (por exemplo, cláusulas de paridade de preços, dumping fiscal, tributação diversificada, etc.) entre utilizadores comerciais e plataformas em linha de grandes dimensões (5). Por esta razão, o CESE recomenda que a Comissão crie condições de concorrência equitativas no mercado digital.

3.17.

Na opinião do CESE, são precisas várias medidas para assegurar as condições necessárias ao setor retalhista e, em particular, às PME e às microempresas, enquanto principais criadores de emprego líquido, para corrigir a inadequação das competências: reforçar a identificação e a previsão das necessidades de competências, incluindo orientação; melhorar os resultados da educação e da formação, de acordo com as necessidades do mercado, incluindo a promoção do ensino e da formação profissionais; melhorar as condições-quadro para adequar melhor a oferta e a procura; e prestar mais apoio às necessidades de formação das PME e das microempresas.

3.18.

O CESE congratula-se com a importância que a Comissão atribui ao custo do cumprimento, especialmente para as pequenas empresas, bem como ao facto de esta realçar a falta de sensibilização para as especificidades do setor.

4.   Observações na especialidade

4.1.

O CESE convida a Comissão a abordar o crescente problema da desertificação dos centros urbanos e as respetivas consequências sociais e ambientais. O grau de habitabilidade dos grandes e pequenos municípios depende sobretudo da sobrevivência de muitas micro e pequenas empresas (lojas locais), as quais dão resposta às necessidades de muitos consumidores, mas correm o risco de serem suplantadas pelo aumento da concentração dos grandes grupos retalhistas.

4.2.

O CESE lamenta que não haja qualquer referência a um setor retalhista sustentável nem ao papel que os microrretalhistas e pequenos retalhistas podem desempenhar neste processo. Porém, é necessário um quadro mais favorável que lhes permita tomar conhecimento da ligação entre escolhas sustentáveis e concorrência, e que lhes preste informações adequadas e assistência técnica, bem como os sistemas de crédito necessários para colocar em prática o que é possível melhorar. Dada a sua escassa capacidade de influenciar os consumidores e produtores, não devem ser impostas escolhas aos microrretalhistas e aos pequenos retalhistas.

4.3.

Na comunicação em apreço, não se faz referência aos problemas existentes nas relações contratuais entre empresas, como, por exemplo, contratos de franquia não equitativos, atrasos de pagamento e práticas comerciais desleais. Em particular, a crescente concentração de poder nos grandes retalhistas na Europa impõe sérios desafios (6). A fim de combater a concorrência desleal e manter a competitividade, estas duas questões deveriam ter sido abordadas na comunicação em apreço.

4.4.

O CESE reitera a sua recomendação à Comissão, formulada no seu parecer «Um novo acordo para os consumidores», para que defina e ponha em prática um sistema eficaz de resolução de litígios capaz de gerir situações de abuso de poder económico e práticas falseadoras da concorrência.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Volume de negócios em 2016: 9 864 468,4 milhões de euros; número de empresas (em 2015): 6 205 080; valor de produção (em 2015): 2 687 115 milhões de euros. Em 2016, este setor empregava 33 399 447 pessoas, das quais 27 892 082 eram funcionários.

(2)  JO C 327 de 12.11.2013, p. 20.

(3)  JO C 440 de 6.12.2018, p. 165.

(4)  Ver nota de rodapé 2.

(5)  JO C 440 de 6.12.2018, p. 177.

(6)  Ver nota de rodapé 3.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/46


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Relatório sobre a Política de Concorrência 2017»

[COM(2018) 482 final]

(2019/C 110/08)

Relatora:

Baiba MILTOVIČA

Consulta

Comissão Europeia, 5.9.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

21.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

188/1/9

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE acolhe favoravelmente o enfoque e a concisão do estilo do relatório de 2017, acompanhado de um extenso documento de trabalho dos serviços da Comissão. Uma política de concorrência eficaz e devidamente aplicada é a base de uma economia de mercado sustentável. Pode garantir condições de concorrência equitativas para os produtores de bens e serviços, inspirar a confiança dos consumidores, estimular a concorrência e alcançar objetivos fundamentais tanto no plano social, como a liberdade de escolha dos consumidores, como no plano político, nomeadamente o bem-estar dos cidadãos europeus e a promoção da integração dos mercados europeus. Desempenha igualmente um papel importante na relação com os países terceiros ao contribuir para uma dinâmica empresarial, ambiental e social positiva no comércio internacional.

1.2.

O relatório de 2017 insiste em particular na conformidade e na aplicação e dá exemplos de ações vigorosas que a Comissão levou a cabo. Os consumidores e as pequenas e médias empresas estão amiúde em situação de desvantagem face às grandes empresas que potencialmente abusam da sua posição dominante no mercado, pelo que se acolhem com especial agrado as medidas destinadas a combater as práticas anticoncorrenciais.

1.3.

O aumento das atividades anticoncorrenciais nos mercados da UE é concomitante com a afirmação contínua das autoridades nacionais da concorrência (ANC) enquanto importantes entidades responsáveis pela aplicação do direito da concorrência. A Diretiva REC+, que habilita as ANC a reforçarem a sua eficácia, fortalece as capacidades nacionais neste domínio.

1.4.

É fundamental reforçar a autonomia das ANC e afetar-lhes recursos adequados. Verdadeira independência, especialização e formação são qualidades necessárias para um trabalho eficaz. A fim de garantir que elas são respeitadas, há que acompanhar de perto a Diretiva REC+. Importa incentivar uma ação preventiva para evitar comportamentos anticoncorrenciais e aumentar as sanções à laia de medida dissuasiva eficaz.

1.5.

O CESE apoia a Comissão no domínio da aplicação privada das regras da concorrência e defende que cabe aos sistemas jurídicos de todos os Estados-Membros facilitar as ações coletivas. A Comissão deve continuar a acompanhar a eficácia dos mecanismos de tutela coletiva no caso de infrações ao direito da concorrência nos vários Estados-Membros e tomar medidas suplementares, se necessário. A este respeito, a proposta da Comissão relativa a ações coletivas, incluídas na proposta para Um Novo Acordo para os Consumidores, é dececionante.

1.6.

Importa igualmente ponderar outras propostas em matéria de franquias, a incluir no Regulamento Geral de Isenção por Categoria (1), a fim de restabelecer o equilíbrio comercial e contratual entre os franqueados e o franqueador.

1.7.

No caso de haver atividades paracomerciais significativas geridas por órgãos de poder local, os quais podem beneficiar de subsídios públicos que favorecem a concorrência desleal, cumprirá examiná-las para apurar a eventual necessidade de uma adaptação das regras relativas aos auxílios estatais ou de outros instrumentos.

1.8.

No atinente à Diretiva «Denunciantes», recomenda-se que, quando da sua transposição e aplicação, o direito nacional estabeleça que os denunciantes têm acesso aos representantes sindicais em qualquer momento e usufruem de proteção total em todas as circunstâncias.

1.9.

Sempre que pertinente para a aplicação do direito da concorrência, sugere-se que a Comissão realize uma análise detalhada sobre as práticas das entidades reguladoras da energia em todos os Estados-Membros, em conjunto com o Conselho dos Reguladores Europeus da Energia (CEER) e com a Agência de Cooperação dos Reguladores da Energia (ACER), a fim de identificar ações capazes de eliminar as práticas restritivas, que continuam a ser prejudiciais para os consumidores.

1.10.

Um novo exame do funcionamento da cadeia de distribuição alimentar em futuros relatórios sobre a política de concorrência poderia identificar e propor soluções para o exercício contínuo do poder de mercado por parte dos retalhistas dominantes que se mostre inadequado.

1.11.

No âmbito da economia digital, estão constantemente a acrescentar-se práticas novas à série de práticas anticoncorrenciais já existentes. O Comité está preocupado com o facto de não se estarem a canalizar recursos adequados para a supervisão deste setor em rápido desenvolvimento e financeiramente pujante e preconiza a previsão de uma disposição específica para o efeito no âmbito do Quadro Financeiro Plurianual.

1.12.

Há um conjunto de fatores que, embora exteriores ao âmbito imediato da política de concorrência, suscitam preocupações em termos de distorções do mercado: grandes disparidades entre os Estados-Membros ao nível da política de tributação das sociedades, as práticas laborais coletivamente conhecidas como dumping social, as práticas emergentes no âmbito da chamada «economia do biscate» (gig economy) e as questões relacionadas com a economia circular e a sustentabilidade económica mundial. O Comité insta a Comissão a exercitar em pleno os seus poderes e a sua capacidade para garantir que essas «zonas cinzentas» onde ocorrem comportamentos anticoncorrenciais são objeto de acompanhamento, clarificação e correção.

1.13.

O direito da concorrência é uma das partes mais antigas do acervo, mas nem sempre está à altura dos desafios deste século. Em particular, a separação artificial do mercado e da esfera socioambiental beneficiaria de uma revisão sistemática e abrangente do direito da concorrência da UE que levasse em conta objetivos económicos, ambientais e sociais.

2.   Síntese do Relatório sobre a Política de Concorrência 2017

2.1.

A política de concorrência é a base do mercado único e está em vigor desde o Tratado de Roma e a fundação da atual União Europeia. Foi instituída no âmbito de um quadro consagrado por disposições como os artigos 101.o e 102.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), que clarificam a sua substância e âmbito de aplicação.

2.2.

Em 2017, realizaram-se ações específicas em prol dos consumidores e da indústria europeia em domínios fundamentais, como a economia digital, a energia, o setor farmacêutico e agroquímico, as indústrias em rede e os mercados financeiros. A presente síntese põe em destaque os principais pontos do relatório, que é, por sua vez, uma síntese do vasto trabalho empreendido em numerosos setores económicos.

2.3.

A política tem de se traduzir em regras e as regras têm de ser aplicadas. A Comissão Europeia foi um dos membros fundadores da Rede Internacional da Concorrência e também participa em todos os fóruns internacionais consagrados à concorrência, nomeadamente a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos (OCDE), a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (CNUCED), a Organização Mundial do Comércio (OMC) e o Banco Mundial. Mais concretamente, a Comissão trabalha de perto com as autoridades nacionais da concorrência e propôs novas regras sob a forma de uma diretiva (2) que visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-Membros competências para aplicarem de forma mais eficaz as regras antitrust da UE.

2.4.

É importante que as pessoas que tenham conhecimento da existência ou do funcionamento de um cartel ou de outros tipos de infrações às regras no domínio antitrust disponham de meios para denunciar essas práticas. O lançamento de um novo instrumento de denúncia anónima veio facilitar este processo e está atualmente em funcionamento.

2.5.

Simplificaram-se os requisitos relativos à notificação de medidas de auxílio estatal de menor envergadura e complexidade, introduziram-se isenções e 24 Estados-Membros aderiram ao Módulo Transparência, que presta informações em matéria de auxílios estatais.

2.6.

As regras da concorrência nos mercados concentrados estão a ser alvo de aplicação rigorosa. O setor farmacêutico assistiu à primeira investigação da Comissão sobre potenciais práticas abusivas de fixação de preços na indústria farmacêutica; examinaram-se várias concentrações no setor agroquímico, tendo sido proibida uma concentração na indústria do cimento que teria reduzido a concorrência.

2.7.

No setor da energia, tomaram-se medidas de aplicação da legislação em relação aos auxílios estatais e aos mecanismos de capacidade. Prosseguiu igualmente a investigação sobre as práticas comerciais da Gazprom na Europa Central e Oriental, com a conclusão preliminar de que as regras antitrust da UE estavam a ser violadas.

2.8.

No que diz respeito aos transportes, examinaram-se as aquisições no setor da aviação e identificaram-se ações anticoncorrenciais no setor dos transportes ferroviários na Lituânia, que resultaram em coimas e medidas corretivas. Foi igualmente aprovada a concessão de auxílios estatais ao setor na Grécia e na Bulgária. A Scania foi alvo de uma ação anticartel no setor do transporte rodoviário de mercadorias e várias empresas do setor das peças de automóvel receberam coimas pesadas.

2.9.

O alargamento do Regulamento Geral de Isenção por Categoria aos portos e aeroportos facilitou a concessão de auxílios estatais adequados.

2.10.

A investigação da Comissão à proposta de fusão entre a Deutsche Börse e o London Stock Exchange Group concluiu que a fusão almejada teria criado um monopólio, pelo que foi proibida.

2.11.

Salienta-se que a política de concorrência da UE terá de responder de forma construtiva e criativa ao desafio da saída do Reino Unido da UE. Como estabelecido pelo Conselho Europeu, qualquer acordo comercial futuro deverá assegurar a paridade de condições, designadamente em termos de concorrência e de auxílios estatais.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE acolhe favoravelmente o relatório de 2017, que contém inúmeros exemplos do empenho da Comissão na promoção do bem-estar dos consumidores e na prevenção dos prejuízos que os afetam. Uma outra consequência desta abordagem, para além do reforço da integração do mercado único, é o reforço do desenvolvimento económico e dos objetivos afins em matéria de política social.

3.2.

No ano passado, os pareceres do CESE evidenciaram reiteradamente a importância de uma política de concorrência eficaz e aplicada. Os parâmetros de referência em matéria de bem-estar pessoal e social do consumidor, a par da manutenção de uma estrutura concorrencial eficaz, constituem o fundamento lógico para abordar a exploração, as práticas de exclusão e os acordos restritivos. Ao incentivar boas práticas económicas, uma política de concorrência firme incentiva o reforço das empresas europeias em mercados mundiais competitivos e a promoção dos objetivos sociais em que assenta.

3.3.   Emissões automóveis

3.3.1.

O parecer do CESE «Ações da UE para melhorar a conformidade e a governação em matéria de ambiente» (3) salientou que o desrespeito dos mecanismos que garantem a aplicação da legislação e a governação em matéria de ambiente é um fator lamentável que contribui para a concorrência desleal e é economicamente lesivo. O Comité frisa que a conformidade e a observância do Estado de direito são fundamentais para uma política de concorrência forte.

3.3.2.

Neste contexto, o Comité congratula-se com o facto de a investigação preliminar da Comissão sobre um possível cartel que envolve a BMW, a Daimler, a Volkswagen, a Audi e a Porsche, no intuito de averiguar se estas empresas restringiram o desenvolvimento de sistemas de redução catalítica seletiva e de filtros de partículas, potencialmente limitando a implantação de tecnologias mais ecológicas, levou agora a equipa de luta contra as práticas anticoncorrenciais a abrir uma investigação formal.

3.4.   Mecanismos de tutela coletiva

3.4.1.

O Comité regista a transposição final da Diretiva «Ações de indemnização» (4), que em parte aborda a questão da instituição de um mecanismo jurídico de tutela coletiva. No entanto, a retirada da proposta de diretiva elaborada pela DG COMP em 2009, aliada à proposta recentemente incluída no pacote «Novo acordo para os consumidores», revela falta de vontade política para avançar de modo significativo na senda da criação de um quadro verdadeiramente eficiente para as ações coletivas a nível europeu. Por conseguinte, o CESE insta a Comissão a continuar a acompanhar a eficácia destes mecanismos no caso de infrações ao direito da concorrência nos vários Estados-Membros e a tomar medidas adicionais, se pertinente.

3.5.   Sistema de franquia no comércio a retalho

3.5.1.

O CESE constata que há um problema crescente relacionado com os contratos de franquia no setor retalhista com repercussões potencialmente graves em matéria de concorrência. Por exemplo, um importante litígio nos Países Baixos entre o franqueador HEMA e vários franqueados relativamente aos contratos existentes e à percentagem das receitas de vendas através da Internet resultou na rescisão dos contratos de franquia. O Comité insta a Comissão a analisar esta situação e a apresentar propostas adicionais em matéria de franquias, que poderiam ser incluídas no Regulamento Geral de Isenção por Categoria, a fim de restabelecer o equilíbrio comercial e contratual entre os franqueados e o franqueador.

3.6.   Subsídios ao nível dos órgãos de poder local

3.6.1.

Em muitos Estados-Membros, os órgãos de poder local estão a voltar-se para o desenvolvimento de atividades comerciais utilizando recursos ou instalações públicos. Tal poderá gerar situações de concorrência desleal, caso se verifique a presença de um elemento de subvenção. Por exemplo, as PME no setor dos serviços alimentares e do turismo confrontam-se com atividades subvencionadas nas cantinas dos clubes desportivos, centros de lazer, etc. Os órgãos de poder local são proprietários destes clubes e associações ou oferecem-lhes fundos públicos, e estes estão frequentemente isentos do pagamento de IVA e beneficiam de bónus sociais, como o trabalho voluntário. Estas atividades paracomerciais são amiúde organizadas (em termos de volume de negócios e lucros) como empresas comerciais normais. O Comité insta a Comissão a estudar este fenómeno e a examinar a possibilidade de adaptar as regras relativas aos auxílios estatais ou outros instrumentos a nível da UE, de modo a regular estas atividades locais, que são, em alguns casos, subvencionadas com fundos da UE!

3.7.   Informações sobre os auxílios estatais

3.7.1.

A disponibilidade e a utilização do Módulo Transparência é particularmente bem-vinda, visto que permite às partes interessadas (a Comissão, os concorrentes e o público em geral) verificar a conformidade dos auxílios estatais com as regras. Até à data, foi publicada a concessão de cerca de 30 000 auxílios.

4.   Observações na especialidade

4.1.   Diretiva REC+

4.1.1.

O CESE congratula-se com a ênfase que o relatório põe na aplicação e aproveita esta oportunidade para reiterar os seus pontos de vista (5) sobre a Diretiva REC+ (6), que habilita as ANC a reforçarem a sua eficácia.

4.1.2.

O Comité já exprimiu anteriormente a sua opinião de que um regulamento seria um instrumento legislativo mais eficaz neste domínio, mas reconhece a necessidade de proporcionalidade. Além disso, a política de concorrência deve garantir a igualdade de oportunidades, tendo as ANC ao seu dispor as medidas e os instrumentos jurídicos necessários para combater os cartéis secretos.

4.1.3.

Embora a Diretiva REC+ deva garantir a independência, os recursos e um instrumentário eficaz para assegurar a aplicação, subsistem dúvidas quanto à autonomia e às capacidades das ANC. A realização de um trabalho eficaz requer verdadeira independência, conhecimentos especializados e formação. Importa fomentar uma ação preventiva para evitar comportamentos anticoncorrenciais e aumentar as sanções à laia de medida dissuasiva eficaz. Além disso, as ANC devem ter o poder de intentar uma ação judicial autonomamente.

4.2.   Proteção dos denunciantes

4.2.1.

Há trabalho a fazer no sentido de informar o público sobre as regras de concorrência. Tal permitirá reforçar a eficácia dos novos instrumentos disponíveis para notificar infrações, como o instrumento destinado aos denunciantes. Embora seja animador constatar que este instrumento é objeto de utilização regular, o CESE tem várias preocupações relativamente à diretiva proposta, que visa reforçar a proteção dos denunciantes (7).

4.2.2.

O CESE remete a Comissão para o seu parecer sobre esta diretiva (8), no qual recomenda que o âmbito de aplicação da diretiva não se limite à conformidade com o direito da UE, mas seja alargado de modo a incluir a conformidade com o direito nacional.

4.2.3.

É igualmente importante fazer referência à inclusão dos direitos dos trabalhadores e que os representantes sindicais e as ONG sejam mencionados como exemplos de pessoas coletivas. Os denunciantes devem ter acesso a representantes sindicais em todas as fases do processo.

4.3.   Economia digital

4.3.1.

O CESE observa que o novo Regulamento Cooperação para a Proteção dos Consumidores (9) foi adotado no final de 2017 e deve garantir uma melhor coordenação entre as redes de consumidores na aplicação de medidas contra as práticas anticoncorrenciais a nível transfronteiriço. Por exemplo, o regulamento identifica práticas de bloqueio geográfico no setor do comércio eletrónico, que é, por natureza, uma questão transfronteiriça. Os centros europeus de consumidores trabalharam nesta questão durante vários anos, reunindo exemplos e práticas transfronteiriços. Juntamente com a Rede Europeia de Concorrência e com a Rede de Cooperação no domínio da Defesa do Consumidor, prevê-se agora uma ação de aplicação mais coordenada.

4.3.2.

No domínio em rápida expansão da economia digital, estão continuamente a ser criados muitos outros tipos de práticas anticoncorrenciais. Por exemplo, a utilização de algoritmos sofisticados pode ajustar os preços em função dos dados de uma pessoa obtidos junto de várias fontes em linha, para além de também permitir que as empresas adotem práticas de colusão em linha. A Comissão precisa de dispor de recursos orçamentais adequados para controlar e combater tais práticas.

4.4.

O CESE considera que uma melhor cooperação entre as ANC e as organizações de consumidores seria benéfica para ambas as partes, sobretudo tendo em conta que as organizações nacionais de consumidores estão muito bem posicionadas para informar as ANC sobre suspeitas de infrações. Com efeito, podem fornecer às autoridades dados valiosos resultantes do seu próprio tratamento de reclamações.

4.5.

A União da Energia pode estimular o processo em curso de introdução de uma concorrência leal no setor da energia da UE, uma área em que persiste um espetro lato de preços para os consumidores e a indústria e em que as escolhas de mercado podem ser limitadas. O CESE considera que uma análise pormenorizada das práticas regulamentares — que variam consideravelmente entre Estados-Membros — servirá de base para um diálogo construtivo capaz de resolver as discrepâncias existentes. A sua realização deverá resultar de um esforço conjunto das ANC, das entidades nacionais reguladoras da energia e da Comissão. Tal poderia ajudar a perceber melhor a falta de escolha e as práticas restritivas em domínios como, por exemplo, os sistemas de aquecimento urbano.

4.6.

O exercício abusivo de poder de mercado no setor de retalho alimentar continua a ser um problema. A Comissão questiona-se se as grandes cadeias retalhistas obtiveram demasiado poder de negociação (nas negociações bilaterais com os seus fornecedores) e poder de compra (no mercado em geral) devido ao seu duplo papel de consumidores e concorrentes (através de marcas próprias) dos próprios fornecedores (10). O Comité apela para que se diligencie em consonância com o seu recente parecer sobre este tema (11) e reitera a sua recomendação de que a Comissão inclua uma análise do funcionamento da cadeia de distribuição alimentar em futuros relatórios sobre a política de concorrência.

4.7.   O direito da concorrência e o interesse público mais alargado

4.7.1.

As distorções do mercado podem ser causadas por uma série de fatores que escapam ao âmbito estrito da política de concorrência. Entre eles contam-se as grandes disparidades entre os Estados-Membros ao nível da política de tributação das sociedades, as práticas laborais coletivamente conhecidas como dumping social, as práticas emergentes no âmbito da chamada «economia do biscate» (gig economy) e as questões relacionadas com a economia circular e a sustentabilidade económica mundial.

4.7.2.

O direito da concorrência, assente nas perspetivas económicas de meados do século XX, tem agora de estar à altura dos desafios do século XXI. A fim de superar a separação artificial do mercado e da esfera socioambiental, cabe dar início a uma revisão sistemática e abrangente do direito da concorrência da UE que tome em conta objetivos económicos, ambientais e sociais.

4.7.3.

O CESE considera que importa ter em consideração os compromissos assumidos pela UE no atinente aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e ao Acordo de Paris sobre as alterações climáticas, para além dos compromissos constantes dos Tratados, enquanto objetivos de interesse público na aplicação do direito da concorrência, a par dos interesses dos consumidores.

4.7.4.

Há que reconhecer os efeitos das concentrações de mercado nas futuras gerações de consumidores e produtores. Importa avaliar os diferentes modelos de cálculo relativos aos efeitos nocivos a longo prazo, como já se fez, por exemplo, na contratação pública através do cálculo dos custos do ciclo de vida.

4.8.

O CESE apelou, em vários pareceres recentes (12), para o reforço das medidas em matéria de justiça fiscal adotadas pela Comissão Europeia (relativamente às multinacionais e aos indivíduos), pois há muitos problemas que continuam por resolver. Entre estes incluem-se a luta contra a fraude fiscal, os paraísos fiscais, o planeamento fiscal agressivo e a concorrência fiscal desleal entre os Estados-Membros.

4.9.

Em particular, há atualmente distorções de mercado substanciais provocadas pela forte heterogeneidade dos regimes nacionais de tributação das sociedades entre os Estados-Membros. A taxa de tributação das sociedades varia entre 9 % e 35 %, sendo que alguns países apresentam taxas ainda mais baixas em categorias como os direitos de propriedade intelectual. Uma vez que a política fiscal é uma competência nacional, a política de concorrência da UE terá sempre dificuldade em moderar as distorções causadas.

4.10.

A Diretiva «Antielisão fiscal», a aplicar através da legislação dos Estados-Membros a partir de 1 de janeiro de 2019, estabelece regras contra as práticas de elisão fiscal com incidência direta no funcionamento do mercado interno e contém elementos que deverão ajudar a evitar algumas abordagens nacionais divergentes, algo que é de louvar.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Regulamento (UE) n.o 330/2010 (JO L 102 de 23.4.2010, p. 1) https://eur-lex.europa.eu/legal-content/pt/ALL/?uri=CELEX:32010R0330

(2)  http://ec.europa.eu/competition/antitrust/proposed_directive_pt.pdf

(3)  JO C 283 de 10.8.2018, p. 83.

(4)  Diretiva 2014/104/UE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a ações de indemnização em processos antitrust (JO L 349 de 5.12.2014, p. 1).

(5)  JO C 345 de 13.10.2017, p. 70.

(6)  Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-Membros competências para aplicarem a lei de forma mais eficaz e garantir o bom funcionamento do mercado interno [COM(2017) 0142 final].

(7)  Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à proteção das pessoas que denunciam infrações ao direito da União [COM(2018) 218 final].

(8)  Parecer do CESE «Reforço da proteção dos denunciantes à escala da UE». Relatora: Franca Salis-Madinier (JO C 62 de 15.2.2019, p. 155).

(9)  Regulamento (UE) 2017/2394 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 345 de 27.12.2017, p. 1).

(10)  Documento de trabalho dos serviços da Comissão [SWD(2018) 349 final].

(11)  JO C 283 de 10.8.2018, p. 69.

(12)  JO C 262 de 25.7.2018, p. 1; JO C 197 de 8.6.2018, p. 29; JO C 81 de 2.3.2018, p. 29.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/52


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (UE) 2015/1588 do Conselho, de 13 de julho de 2015, relativo à aplicação dos artigos 107.o e 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia a determinadas categorias de auxílios estatais horizontais»

[COM(2018) 398 final — 2018/0222 (NLE)]

(2019/C 110/09)

Relator:

Jorge PEGADO LIZ

Consulta

Comissão Europeia, 12.7.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

 

Competência

Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

21.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

205/3/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE toma boa nota da proposta de regulamento que altera o Regulamento (UE) 2015/1588 do Conselho, de 13 de julho de 2015, relativo à aplicação dos artigos 107.o e 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia a determinadas categorias de auxílios estatais horizontais [COM(2018) 398 final], que se limita a incluir duas novas categorias no regulamento de habilitação que permite à Comissão adotar isenções por categoria [Regulamento (UE) 2015/1588 do Conselho (1), de 13 de julho de 2015].

1.2.

O CESE considera esta proposta necessária e oportuna no contexto de uma série de novas propostas ligadas nomeadamente ao próximo Quadro Financeiro Plurianual, na medida em que constitui um instrumento essencial para o funcionamento eficaz de várias medidas previstas nestas novas iniciativas. A proposta contribui decisivamente para que a Comissão desempenhe um papel importante na seleção dos projetos apoiados financeiramente, em conformidade com o interesse comum da UE, e para que os apoios públicos complementem o investimento privado de forma transparente.

1.3.

O CESE avaliza e apoia, portanto, esta nova proposta da Comissão. O CESE considera também oportuno incentivar as partes interessadas a seguirem as orientações do Código de Boas Práticas.

2.   A proposta da Comissão

2.1.

Em 6 de junho de 2018, a Comissão apresentou a proposta de regulamento que altera o Regulamento (UE) 2015/1588 do Conselho, de 13 de julho de 2015, relativo à aplicação dos artigos 107.o e 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia a determinadas categorias de auxílios estatais horizontais (2) no âmbito de uma série de novas propostas ligadas nomeadamente ao próximo Quadro Financeiro Plurianual (QFP) (3).

2.2.

A proposta em apreço pretende melhorar a interação entre determinados programas de financiamento da UE, nomeadamente no quadro dos programas COSME e Horizonte Europa, ou do Programa Europa Digital, do novo Fundo InvestEU e da promoção da cooperação territorial europeia e das regras em matéria de auxílios estatais. Deverá, por conseguinte, permitir proceder a alterações específicas das atuais regras em matéria de auxílios estatais, de modo que o financiamento público dos Estados-Membros — incluindo os Fundos Europeus Estruturais e de Investimento geridos a nível nacional — e os fundos da UE geridos a nível central pela Comissão possam ser combinados de forma tão integrada quanto possível, sem distorcer a concorrência no mercado da UE.

2.3.

A proposta limita-se, assim, a acrescentar duas novas categorias no regulamento de habilitação permitindo à Comissão adotar isenções por categoria [Regulamento (UE) 2015/1588, de 13 de julho de 2015], com base na definição de critérios de compatibilidade claros, garantindo que os efeitos sobre a concorrência e as trocas comerciais entre Estados-Membros são limitados. A adoção destas isenções por categoria permitiria simplificar consideravelmente os procedimentos administrativos para os Estados-Membros e a Comissão, com base em condições de compatibilidade ex ante claramente definidas.

2.4.

Em suma, a Comissão propõe aditar as duas subalíneas seguintes no artigo 1.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento (UE) 2015/1588:

«xv)

do financiamento canalizado através de ou apoiado por instrumentos financeiros ou garantias orçamentais da UE geridos de forma centralizada, sempre que o auxílio assuma a forma de financiamento adicional concedido através de recursos estatais,

xvi)

dos projetos apoiados pelos Programas de Cooperação Territorial Europeia da UE;».

3.   Observações gerais

3.1.

O CESE apoiou as novas iniciativas programáticas da Comissão em pareceres muito recentemente adotados, nomeadamente sobre os seguintes temas:

a)

InvestEU (4);

b)

Horizonte Europa (5);

c)

Inteligência artificial para a Europa (6);

d)

I&D — Uma nova Agenda Europeia (7);

e)

Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional e Fundo de Coesão (8);

f)

Regulamento Cooperação Territorial Europeia 2021-2027 (9);

g)

Mecanismo Interligar a Europa (10);

h)

Execução dos projetos da RTE-T (11);

i)

Mobilidade conectada e automatizada (12);

j)

Programa Europa Digital (13).

3.2.

A proposta da Comissão não só é necessária ao funcionamento eficaz de várias medidas previstas nestas novas iniciativas — enunciadas a título indicativo uma vez que o processo de debate entre os colegisladores está ainda em curso —, como também contribui decisivamente para que a Comissão desempenhe um papel importante na seleção dos projetos e regimes apoiados, em conformidade com o interesse comum da UE, e para que os apoios públicos complementem o investimento privado de forma transparente.

3.3.

Com efeito, os artigos 107.o, 108.o e 109.o, no capítulo «As regras de concorrência», constituem as disposições matriciais do direito primário da UE (TFUE) que regem os auxílios estatais.

3.4.

Com vista à sua execução, o Regulamento (UE) 2015/1588, de 13 de julho de 2015, prevê a aplicação dos artigos 107.o e 108.o do TFUE a determinadas categorias de auxílios estatais horizontais, quer se tratem de investimentos ou de garantias do Estado.

3.5.

Este regulamento deve ser adaptado para que os objetivos definidos na proposta da Comissão, e com os quais o CESE está plenamente de acordo, possam ser aplicados.

3.6.

O CESE avaliza, assim, as alterações a introduzir no Regulamento (UE) 2015/1588, tal como formuladas na proposta da Comissão, na medida em que as considera essenciais para a prossecução dos objetivos mencionados.

3.7.

Além disso, o CESE congratula-se com o facto de a Comissão também ter publicado, alguns dias após a apresentação da proposta em apreço, um Código de Boas Práticas para a condução dos procedimentos de controlo dos auxílios estatais (14) que revoga o código publicado em 2009 e integra a Comunicação relativa a um procedimento simplificado (15).

3.8.

O CESE congratula-se com esta iniciativa destinada a tirar o melhor partido das regras modernizadas em matéria de auxílios estatais, como as que figuram na proposta em apreço, a fornecer aos Estados-Membros, aos beneficiários e às partes interessadas orientações sobre o funcionamento prático dos procedimentos relativos aos auxílios estatais e a «tornar os procedimentos em matéria de auxílios estatais o mais transparentes, simples, claros, previsíveis e rápidos possível».

3.9.

Este Código de Boas Práticas de 2018, que não pretende ser exaustivo e que não cria um novo direito, descreve o procedimento e fornece orientações a seu respeito. Segundo o documento, o código deve ser lido em conjugação com todos os outros textos adotados a montante.

3.10.

O objetivo principal do código consiste em favorecer a cooperação das partes interessadas com a Comissão aquando das inspeções e em tornar o procedimento mais inteligível para as empresas e os Estados.

3.11.

Visa, além disso, melhorar o procedimento de tratamento das denúncias em matéria de auxílios estatais, obrigando os autores da denúncia a demonstrarem o interesse afetado logo na fase de preenchimento do formulário de denúncia e fixando prazos indicativos para o tratamento das denúncias.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  JO L 248 de 24.9.2015, p. 1.

(2)  COM(2018) 398 final.

(3)  COM(2018) 321 final de 2 de abril de 2018.

(4)  ECO/474 (JO C 62 de 15.2.2019, p. 131).

(5)  INT/858 (JO C 62 de 15.2.2019, p. 33).

(6)  JO C 440 de 6.12.2018, p. 51.

(7)  JO C 440 de 6.12.2018, p. 73.

(8)  ECO/462 (JO C 62 de 15.2.2019, p. 90).

(9)  JO C 440 de 6.12.2018, p. 116.

(10)  JO C 440 de 6.12.2018, p. 191.

(11)  TEN/669 (JO C 62 de 15.2.2019, p. 269).

(12)  TEN/673 (JO C 62 de 15.2.2019, p. 274).

(13)  TEN/677 (JO C 62 de 15.2.2019, p. 292).

(14)  Comunicação da Comissão C(2018) 4412 final, de 16.7.2018.

(15)  JO C 136 de 16.6.2009, p. 13.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/55


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho sobre a ação da União na sequência da sua adesão ao Ato de Genebra do Acordo de Lisboa relativo às denominações de origem e às indicações geográficas»

[COM(2018) 365 final — 2018/0189 (COD)]

(2019/C 110/10)

Relator:

Arnold PUECH D’ALISSAC

Consulta

Parlamento Europeu, 10.9.2018

Conselho, 17.10.2018

Base jurídica

Artigo 114.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

21.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

208/1/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

As indicações geográficas (IG) constituem um recurso único e precioso para os produtores da União Europeia num mercado mundial cada vez mais liberalizado e competitivo.

1.2.

A Comissão Europeia deve agir constantemente em prol da proteção dos modelos de produção e dos sistemas de qualidade que sejam reconhecidos mundialmente pela sua sustentabilidade benéfica para os consumidores e para os produtores.

1.3.

As indicações geográficas têm assim a particularidade de colocar a tónica na dimensão local de um produto, valorizando desse modo os aspetos culturais e os conhecimentos especializados locais, o território e as suas especificidades agroecológicas. Estas características devem ser preservadas.

1.4.

Ao nível mundial, tem-se assistido a uma tendência significativa para desenvolver símbolos oficiais de identificação da qualidade e da origem (SIQO).

1.5.

O CESE chama a atenção para este aspeto positivo e congratula-se com a proposta da Comissão Europeia que visa proteger, ao nível internacional, as denominações de origem e as indicações geográficas registadas no âmbito do Ato de Genebra e da sua prática jurídica; considera imperativo procurar criar um quadro harmonizado de proteção dos símbolos de qualidade ao nível internacional. No entanto, reputa essencial agir no sentido de uma abordagem global que vise proteger e promover o sistema de símbolos de qualidade no seu conjunto.

1.6.

Importa propor um sistema que garanta condições equitativas para todos os produtores europeus que pretendam que a sua indicação geográfica seja igualmente reconhecida ao nível internacional.

1.7.

O CESE considera que os direitos adquiridos por estas indicações geográficas já registadas e protegidas a nível europeu devem ser preservados, a fim de evitar penalizações e diferenças de tratamento.

2.   A proposta de regulamento

2.1.

O objetivo da proposta da Comissão é instaurar um quadro jurídico para a participação efetiva da União Europeia na União de Lisboa relativa às denominações de origem e às indicações geográficas da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), assim que a UE se tenha tornado parte contratante no Ato de Genebra.

2.2.

As partes contratantes no Ato de Genebra comprometem-se a proteger, no seu território, as denominações de origem e as indicações geográficas registadas no quadro do seu sistema e prática jurídica. Assim, uma denominação de origem ou uma indicação geográfica registada é protegida por cada parte contratante, desde que não tenha sido objeto de recusa.

2.3.

A Comissão Europeia propõe que a União Europeia, quando se tornar parte contratante no Ato de Genebra, apresente uma lista das suas indicações geográficas (a acordar com os Estados-Membros) a colocar sob a proteção do sistema de Lisboa. Após a adesão da UE à União de Lisboa, poderão ser apresentados novos pedidos de inscrição no registo internacional de indicações geográficas protegidas e registadas na União Europeia, por iniciativa da Comissão ou a pedido de um Estado-Membro ou de um agrupamento de produtores interessados.

2.4.

Importa criar procedimentos adequados de avaliação, pela Comissão, das denominações de origem e das indicações geográficas originárias de partes contratantes terceiras e inscritas no registo internacional. A União deverá respeitar as denominações de origem e as indicações geográficas originárias de partes contratantes terceiras e inscritas no registo internacional conformemente ao disposto no capítulo III do Ato de Genebra.

2.5.

Este ato estabelece, em particular, que cada parte contratante deve prever vias legais de recurso eficazes para a proteção das denominações de origem e das indicações geográficas registadas (ver artigo 14.o do Ato de Genebra do Acordo de Lisboa) (1).

2.6.

Sete Estados-Membros da UE são membros da União de Lisboa e, como tal, aceitaram proteger denominações de países terceiros. A fim de lhes proporcionar os meios para cumprirem as suas obrigações internacionais contraídas antes da adesão da UE à União de Lisboa, importa prever uma disposição transitória que produza efeitos apenas ao nível nacional, e sem efeitos sobre o comércio intra-União ou internacional.

2.7.

Incumbe ao Estado-Membro de que é originária a denominação de origem ou indicação geográfica pagar as taxas ao abrigo do Ato de Genebra e dos regulamentos comuns para apresentação de pedidos de inscrição de uma denominação de origem ou de uma indicação geográfica no registo internacional (ver artigo 11.o do Ato de Genebra do Acordo de Lisboa) (2).

2.8.

A UE criou sistemas de proteção uniformes e exaustivos para as indicações geográficas de produtos agrícolas. Através destes sistemas, as denominações protegidas dos produtos abrangidos beneficiam de uma proteção de grande alcance em toda a UE, com base num único processo de pedido de proteção. A proposta é coerente com a política geral da UE no sentido de promover e reforçar a proteção das indicações geográficas através de acordos bilaterais, regionais e multilaterais.

3.   Observações gerais

3.1.

O CESE congratula-se com a proposta da Comissão Europeia que visa proteger as denominações de origem e indicações geográficas registadas, ao nível internacional, no quadro do Ato de Genebra e da sua prática jurídica. Num contexto caracterizado por uma globalização cada vez mais acentuada, sobretudo no que diz respeito ao comércio de produtos agroalimentares, é imperativo procurar criar um quadro harmonizado de proteção dos sinais de qualidade ao nível internacional.

3.2.

A Comissão Europeia deve agir constantemente em prol da proteção dos modelos de produção e dos sistemas de controlo da qualidade que sejam reconhecidos mundialmente pelos seus benefícios para a saúde dos consumidores e pela sua sustentabilidade económica e ambiental.

3.3.

As indicações geográficas (IG) constituem um recurso único (5,7 % das vendas da indústria agroalimentar, ou seja, 54 mil milhões de euros em 2010) (3) e precioso para os produtores da União Europeia num mercado mundial cada vez mais liberalizado. No entanto, os esforços para competir no domínio da qualidade serão inúteis se o principal vetor utilizado pelos produtos de qualidade da UE, ou seja, as IG, não for devidamente protegido contra os mercados internacionais.

3.4.

O CESE sublinha que as indicações geográficas são sinais distintivos que permitem diferenciar os produtos concorrentes e informar o consumidor sobre a origem de um produto. Distinguindo-se das marcas comerciais, as indicações geográficas têm como objetivo realçar o vínculo entre um produto e o seu território de origem. Têm assim a particularidade de colocar a tónica na dimensão local de um produto, valorizando desse modo os aspetos culturais e os conhecimentos especializados locais, o território e as suas especificidades agroecológicas. Estas características devem ser preservadas.

3.5.

Já em 2008, no seu parecer «Indicações e denominações geográficas» (4), o CESE salientara que «na sociedade civil europeia, os consumidores estão cada vez mais atentos às características dos produtos agroalimentares, o que se traduz numa procura de produtos de qualidade». Esta constatação é hoje mais pertinente do que nunca, na medida em que o consumidor europeu procura cada vez mais produtos de qualidade oriundos de um território, de uma região ou de um país específicos e cuja qualidade e reputação, entre outras características, estão fundamentalmente ligadas a essa origem geográfica (5).

3.6.

Segundo um parecer recente do Conselho Económico, Social e Ambiental de França intitulado «Les signes officiels de qualité et d’origine des produits alimentaires» (Os sinais oficiais de qualidade e de origem dos produtos alimentares), assiste-se a uma tendência significativa para o desenvolvimento de símbolos oficiais de identificação da qualidade e da origem (SIQO) a nível mundial. As indicações geográficas estão a aumentar porque respondem a uma procura crescente dos consumidores e valorizam uma história, um património e um conhecimento ancestral que estão ligados a um determinado território.

3.7.

O CESE recorda que, segundo a FAO (6), regista-se um efeito muito positivo das indicações geográficas sobre os preços, independentemente do tipo de produto, da região de origem ou do prazo de validade do registo.

3.8.

Em todos os acordos bilaterais celebrados ou em negociação, as questões relacionadas com a proteção das indicações geográficas ocupam um lugar cada vez mais central. O CESE sublinha este aspeto positivo. No entanto, julga essencial agir no sentido de uma abordagem global que vise proteger e promover o sistema de sinais de qualidade no seu conjunto.

3.9.

Para esse efeito, o CESE reputa necessário reconsiderar a proposta de estabelecimento de uma lista positiva ao nível da UE, que não é consonante com a necessidade de proteção global do sistema de indicações geográficas. Importa, com efeito, propor um sistema que garanta condições equitativas para todos os produtores europeus que pretendam que a sua indicação geográfica seja igualmente reconhecida ao nível internacional. Isto é tanto mais verdade quanto os critérios escolhidos não têm em consideração outros critérios socioeconómicos essenciais para o desenvolvimento da economia de alguns territórios da União Europeia. As indicações geográficas contribuem frequentemente para o desenvolvimento de uma economia de proximidade que gera emprego, tem repercussões muito importantes para outros setores da economia, como o turismo, e são benéficas para o ordenamento e a utilização do território.

3.10.

O CESE solicita à Comissão que tenha em conta as consequências das futuras novas relações entre a União Europeia e o Reino Unido e o impacto que a determinação de uma lista positiva poderia ter nas negociações em curso, que devem ser conduzidas com base na proteção do sistema de qualidade da União Europeia no seu conjunto. Após a saída da UE, o Reino Unido deverá continuar a respeitar as indicações geográficas garantidas por um sistema de que tem beneficiado até hoje.

3.11.

O CESE realça que o setor agroalimentar europeu está fortemente ameaçado pela contrafação de produtos. Um relatório (7) recentemente publicado pela Comissão Europeia confirma que os produtos que são com mais frequência objeto de contrafação são os produtos agroalimentares.

3.12.

O CESE recorda que, neste momento, sete países da UE já são membros efetivos do Acordo de Lisboa (Bulgária, França, Hungria, Itália, Portugal, República Checa e Eslováquia) e que o acordo abrange atualmente mais de 1 000 indicações geográficas registadas, em relação às quais a proteção internacional das denominações de origem protegida (DOP) e das indicações geográficas protegidas (IGP) é assegurada por meio de um único procedimento de registo.

3.13.

O CESE considera que os direitos adquiridos por estas indicações geográficas já registadas devem ser preservados, a fim de evitar penalizações e diferenças de tratamento.

3.14.

Por último, o CESE chama a atenção para o estudo de 2012, o único disponível atualmente, sobre o valor comercial das IG na União (8). Ao que parece, porém, o prémio de valor para as IG (value premim rate) não evoluiu significativamente de então para cá.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  http://www.wipo.int/edocs/pubdocs/fr/wipo_pub_239.pdf

(2)  Ibidem.

(3)  Ver o concurso n.o AGRI-2011-EVAL-04.

(4)  JO C 204 de 9.8.2008, p. 57.

(5)  https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?qid=1540542863415&uri=CELEX:32012R1151

(6)  Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura.

(7)  https://ec.europa.eu/taxation_customs/sites/taxation/files/report_on_eu_customs_enforcement_of_ipr_2017_en.pdf (de momento disponível apenas em inglês).

(8)  https://ec.europa.eu/agriculture/external-studies/value-gi_en (de momento disponível apenas em inglês).


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/58


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta alterada de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.o 1093/2010 que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Bancária Europeia); o Regulamento (UE) n.o 1094/2010 que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma); o Regulamento (UE) n.o 1095/2010 que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados), o Regulamento (UE) n.o 345/2013 relativo aos fundos europeus de capital de risco; o Regulamento (UE) n.o 346/2013 relativo aos fundos europeus de empreendedorismo social; o Regulamento (UE) n.o 600/2014 relativo aos mercados de instrumentos financeiros; o Regulamento (UE) 2015/760 relativo aos fundos europeus de investimento a longo prazo; o Regulamento (UE) 2016/1011 relativo aos índices utilizados como índices de referência no quadro de instrumentos e contratos financeiros ou para aferir o desempenho de fundos de investimento; o Regulamento (UE) 2017/1129 relativo ao prospeto a publicar em caso de oferta de valores mobiliários ao público ou da sua admissão à negociação num mercado regulamentado; e a Diretiva (UE) 2015/849 relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo»

[COM(2018) 646 final — 2017/0230 (COD)]

(2019/C 110/11)

Relator-geral:

Petr ZAHRADNÍK

Consulta

Parlamento Europeu, 4.10.2018

Conselho da União Europeia, 12.11.2018

Base jurídica

Artigo 114.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

121/0/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE saúda a flexibilidade da resposta da Comissão Europeia aos problemas que surgiram nas instituições bancárias e financeiras e das medidas adicionais adotadas para combater as práticas de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo.

1.2.

O CESE considera também que o reforço da coordenação das autoridades de supervisão e o aumento da eficácia das interações entre elas deve ir de par com a coordenação das atividades com outras entidades pertinentes para resolver eficazmente este problema muito perigoso.

1.3.

O CESE adverte que as possibilidades tecnológicas e de comunicação não só permitem a criação de produtos financeiros inovadores que beneficiam os depositantes e os investidores, mas constituem também uma grande tentação para os autores de atos criminosos no domínio do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo. Solicita, por conseguinte, que as soluções adotadas visem eliminar ao máximo os riscos futuros.

1.4.

O CESE sublinha a importância crescente deste problema face a países terceiros num contexto de agravamento dos riscos geopolíticos, de segurança e políticos e salienta a necessidade de a UE se preparar, o melhor possível, para erradicar as práticas de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo e eliminar a utilização indevida do mercado e das instituições financeiras da União.

1.5.

O CESE toma nota e está consciente de que as medidas apresentadas na proposta legislativa em apreço são etapas, sem dúvida, importantes, mas parciais, nos domínios da coordenação, da organização e das competências, que se devem articular com outros conjuntos de medidas para resolver o problema. Ao mesmo tempo, concorda com a Comissão Europeia que é mais adequado avançar paulatinamente para evitar que se produza uma perturbação significativa da estabilidade e do caráter funcional do sistema em vigor, a fim de garantir a exequibilidade e a perenidade da solução escolhida.

1.6.

O CESE entende que convém, no âmbito do novo equilíbrio de competências entre as autoridades de supervisão, encontrar um equilíbrio entre a Autoridade Bancária Europeia (EBA) dotada de novas competências reforçadas e as autoridades nacionais de supervisão, para que todas as entidades envolvidas utilizem ao máximo as suas capacidades a fim de resolver o problema da forma pretendida.

1.7.

O CESE sublinha a importância da comunicação interna e externa sobre a questão do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo para atingir o objetivo das medidas propostas. No que diz respeito à comunicação interna, importa otimizar e proteger os fluxos de informação entre as autoridades de supervisão competentes. No que diz respeito à comunicação externa, o desafio reside na informação e sensibilização do público interessado, as quais constituem uma forma de prevenção e de preparação para a eventualidade de serem cometidos tais atos criminosos.

1.8.

O CESE gostaria de conhecer os fundamentos que estão por trás da designação do setor bancário como o mais vulnerável a uma utilização indevida para fins criminosos como o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, que levaram a que fosse a EBA a beneficiar do reforço da sua posição e das suas competências, e não as duas outras autoridades de supervisão da União.

1.9.

O CESE gostaria que fossem especificados com mais detalhe os contornos das novas relações em matéria de coordenação e de ação conjunta no domínio do combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo estabelecidos entre a EBA e as outras autoridades de supervisão, sejam estas da UE, dos Estados-Membros ou, em particular, dos países terceiros.

2.   Contexto geral da proposta e elementos factuais essenciais

2.1.

Está em vigor na UE, desde 2011, um novo sistema de supervisão financeira, que contribuiu de forma decisiva para estabilizar o mercado financeiro e limitar os seus riscos. Este sistema permitiu a harmonização das regras dos mercados financeiros na UE e a convergência das atividades de supervisão dos mesmos. Contudo, o rápido desenvolvimento verificado desde então em termos de inovações tecnológicas e financeiras voltou a alargar o leque de possibilidades de atos criminosos que utilizam indevidamente o setor financeiro para atividades criminosas e para legalizar os benefícios assim obtidos. Estes dois tipos de atividades são, como é óbvio, não só indesejáveis como condenáveis pela sociedade, e distorcem também, simultaneamente, o caráter funcional e eficaz dos mercados financeiros, uma vez que o seu objetivo primeiro não é a maximização do lucro resultante de possibilidades objetivas de fazer render cada ativo e da sua valorização, mas sim dissimular, ocultar e evitar qualquer divulgação. Estas ações explicam, em certa medida, o facto de os recursos financeiros não serem afetados automaticamente da melhor forma.

2.2.

As medidas propostas pretendem, por conseguinte, não só impedir ou restringir as possibilidades de cometer atos criminosos ou legalizar o respetivo produto, mas também manter a solidez das instituições financeiras utilizadas indevidamente quando dessas atividades criminosas, assegurando a respetiva estabilidade e a segurança em benefício dos clientes e investidores. Deste modo, consegue-se igualmente limitar os riscos políticos e de reputação que recaem sobre os Estados-Membros e a União Europeia no seu conjunto.

2.3.

Uma vez que, atualmente, os mercados financeiros são multinacionais e estão interligados de uma forma sem precedentes, é da máxima importância, para efeitos da proposta em apreço, criar um sistema que cumpra a sua missão num contexto transfronteiras, dado que os estudos empíricos revelam que estes atos criminosos são praticados com maior frequência numa base transfronteiras, nomeadamente através do envolvimento de entidades de países terceiros. Por melhor que seja a organização da repressão desses atos criminosos, tal não chega para assegurar em definitivo o êxito deste esforço, se a sua aplicação se fizer exclusivamente ao nível de um único Estado-Membro. Uma verdadeira ação conjunta das autoridades nacionais de supervisão é, por conseguinte, muito importante em matéria de branqueamento de capitais, tal como uma ação conjunta dos órgãos nacionais de supervisão financeira com os órgãos da UE responsáveis por esta matéria, mas também com as autoridades de supervisão de países terceiros.

2.4.

A medida proposta, objeto do presente parecer, é apenas de natureza parcial no quadro do objetivo indicado. Para este ser coroado de êxito, é imperativo coordená-lo com outros elementos, cujo conjunto forma uma abordagem sistemática e coerente que dificultará ao máximo o exercício destas atividades criminosas pelos criminosos.

2.5.

No essencial, a proposta em apreço tem por objetivo, nomeadamente:

otimizar a utilização de conhecimentos e recursos especializados disponíveis através da centralização das tarefas relacionadas com a prevenção e o combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo, em todo o setor financeiro, na Autoridade Bancária Europeia (EBA);

clarificar o âmbito e o conteúdo das tarefas relacionadas com o combate ao branqueamento de capitais que são confiadas à EBA;

reforçar os instrumentos que permitem exercer as funções relacionadas com o combate ao branqueamento de capitais;

reforçar o papel da EBA como coordenador para as questões internacionais em matéria de combate ao branqueamento de capitais.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE considera que o combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo é cada vez mais importante, não só em virtude da dinâmica das mutações tecnológicas e das inovações financeiras, mas também dos inúmeros casos recentes de que foi alvo o sistema bancário e financeiro em vários Estados da UE de utilização indevida para cometer tais atos criminosos. Neste contexto, pode-se considerar que o risco geopolítico acrescido, incluindo os atos terroristas, é significativo.

3.2.

O CESE está preocupado com o agravamento deste problema, pois estas atividades criminosas, assim como as tentativas de legalizar os benefícios assim obtidos através do setor financeiro, ocorrem numa base transfronteiras não só ao nível da UE, mas também de países terceiros. O CESE saúda o facto de a proposta da Comissão Europeia ser proativa na resposta a este problema.

3.3.

Neste contexto, o CESE assinala que, embora a revisão do Sistema Europeu de Supervisão Financeira já tenha sido abordada em 2017 (1), tendo o Comité adotado um parecer (2) a este respeito na sua reunião plenária de 15 de fevereiro de 2018, o aparecimento de novos conhecimentos e de novas circunstâncias impuseram a atualização da proposta, aditando elementos suplementares para aumentar a sua eficácia. O teor do referido parecer do CESE não perdeu, contudo, atualidade nem pertinência. O teor do referido parecer do CESE não perdeu, contudo, atualidade nem pertinência. Ao mesmo tempo, o CESE saúda a flexibilidade da resposta da Comissão Europeia face a uma série de escândalos bancários em muitos países da UE, que confirmaram que os autores de tais atos criminosos são capazes de utilizar indevidamente tanto os instrumentos tecnológicos e de comunicação como a legislação em vigor. Deste modo, expuseram as lacunas que afetam o mecanismo da UE em matéria de branqueamento de capitais.

3.4.

O CESE observa que os novos elementos que constam da proposta são de natureza principalmente técnica e organizativa, ao passo que a solução para a atual situação deve ser mais ampla e mais abrangente. O CESE considera que a proposta em exame diz respeito a uma categoria restrita de questões relacionadas com o aumento das competências da EBA e da sua coordenação com as autoridades nacionais de supervisão em matéria de combate ao branqueamento de capitais e, em certa medida e nalguns casos especiais, igualmente ao exercício de um certo controlo sobre elas. Além disso, a proposta em apreço não abrange a atividade dos serviços e das unidades de análise financeira. A proposta aborda de modo geral a coordenação das atividades e dos procedimentos, mas não foca o teor concreto do combate ao branqueamento de capitais.

3.5.

O CESE destaca e alerta para o facto de o branqueamento de capitais permitir legalizar os benefícios provenientes de atividades que são consideradas incompatíveis com o direito e reprováveis, mas que levam ao mesmo tempo a afetar os recursos de forma irracional, dado que a finalidade dessas operações é «não serem descobertas» e «legalizar» os recursos investidos, ou transferi-los para um local onde serão praticados outros atos criminosos, mas não necessariamente produzir lucro. O CESE observa e destaca que a atualização apresentada também não analisa as novas tendências e circunstâncias em que ocorre o branqueamento de capitais nas condições atuais. No contexto da eliminação destas práticas desleais, a proposta orienta-se de forma estrita e direcionada para certos setores, em que predomina o reforço do papel da EBA entre os organismos europeus de supervisão no âmbito da resolução do problema do combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo, e a coordenação e comunicação reforçadas da EBA com as autoridades nacionais de supervisão para as questões relacionadas com o combate ao branqueamento de capitais, as quais fazem essencialmente parte dos organismos de supervisão do mercado bancário ou financeiro.

3.6.

O CESE considera que é absolutamente essencial neste contexto repartir adequadamente as competências entre a EBA e as autoridades nacionais, no respeito do princípio da subsidiariedade. É indispensável, legítimo e justificado reforçar as competências da EBA para contemplar as operações transfronteiras. Em contrapartida, para resolver casos do foro exclusivamente nacional, que a EBA não está em condições de verdadeiramente detetar, o CESE considera que convém deixar estas competências nas mãos das autoridades nacionais.

3.7.

Tendo em conta que a questão do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo é absolutamente determinante para garantir um ambiente económico e financeiro seguro em toda a UE, o CESE questiona se não será judicioso criar uma organização específica no âmbito da vertente executiva da UE, por exemplo uma nova direção-geral neste domínio. Esta questão é cada vez mais importante no contexto da renovação da Comissão Europeia no outono de 2019.

3.8.

O CESE gostaria igualmente de saber qual é o fundamento para propor que seja a EBA a desempenhar um papel crucial na coordenação para resolver este problema. Significa isto que a Comissão Europeia considera que, na UE, é ao nível do setor bancário que surgem as maiores margens de manobra para o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo?

3.9.

O CESE concorda com o facto de a proposta em apreço fazer referência à necessidade de uma comunicação eficaz sobre o problema. Essa comunicação deverá procurar não só transmitir eficazmente as comunicações entre todos os organismos de supervisão associados (comunicação interna), mas também garantir um grau adequado de informação na esfera pública (os clientes do setor financeiro e o público em geral).

4.   Observações na especialidade

4.1.

O CESE solicita que a proposta defina minuciosamente os domínios e as relações em que a EBA tem um papel preponderante em relação aos outros organismos de supervisão da UE no domínio do combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo, sob a forma de um mandato mais abrangente para todo o mercado financeiro.

4.2.

Na mesma ordem de ideias, o CESE solicita uma explicação mais precisa das condições que permitem à EBA exercer uma supervisão dos procedimentos dos organismos nacionais de supervisão ou de dirigir decisões diretamente a operadores individuais do setor financeiro.

4.3.

O CESE gostaria também de ter mais informação sobre as formas de ação conjunta com as autoridades de supervisão de países terceiros.

4.4.

O CESE solicita igualmente que se esclareça o modo como se deverá processar a centralização de todas as informações pertinentes relativas ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo fornecidas pelas autoridades nacionais, quando se tratem de fontes classificadas de «secretas» ou «muito secretas», assim como o modo como estas serão protegidas.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Ver a proposta legislativa inicial, COM(2017) 536 final de 20 de setembro de 2017, cujo objetivo era consolidar a capacidade dos organismos europeus de supervisão para assegurar a convergência e a eficácia da supervisão financeira, sem abordar, contudo, especificamente o reforço do mandato desses organismos para questões de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo.

(2)  JO C 227 de 28.6.2018, p. 63.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/62


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira, que revoga a Ação Comum 98/700/JAI do Conselho, o Regulamento (UE) n.o 1052/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho e o Regulamento (UE) 2016/1624 do Parlamento Europeu e do Conselho»

Contributo da Comissão para a reunião dos Chefes de Estado e de Governo de 19 e 20 de setembro de 2018 em Salzburgo

[COM (2018) 631 final — 2018/0330 (COD)]

(2019/C 110/12)

Relator-geral:

Antonello PEZZINI

Consulta

Comissão, 29.10.2018

Parlamento Europeu, 22.10.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do TFUE

Competência

Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

127/1/5

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité manifesta a convicção de que, num espaço de livre circulação, as fronteiras externas passam a ser fronteiras comuns, pelo que quem entra em qualquer parte do território da União entra no espaço comum de liberdade, segurança e justiça da União Europeia, com todos os direitos e obrigações que daí decorrem para os cidadãos e as instituições nacionais e europeias.

1.2.

O CESE faz um apelo ingente para a melhoria da gestão das migrações, enfrentando, num esforço concertado com os Estados, as causas profundas que impelem as pessoas a buscar uma vida melhor fora da própria pátria.

1.3.

O CESE recomenda que, na ausência de um quadro político definido e partilhado por todos os Estados-Membros em matéria de migração e ajuda ao desenvolvimento nos países de emigração, se prescinda da delegação de poderes na Comissão para a adoção de atos de definição autónoma.

1.4.

O CESE defende com convicção a proposta de dotar a Agência do seu próprio braço operacional permanente, constituído por 10 000 efetivos operacionais, podendo dessa forma dispor, em cooperação com os Estados-Membros, das capacidades necessárias para:

proteger as fronteiras externas da UE;

evitar os movimentos irregulares;

gerir as migrações legais;

aplicar efetivamente os regressos dos migrantes em situação irregular.

1.5.

O Comité recomenda que a cooperação necessária entre a Agência e as administrações nacionais, tradicionalmente responsáveis pelo controlo das fronteiras, seja definida e organizada a nível europeu.

1.6.

É igualmente importante, no entender do CESE, prever uma definição clara e partilhada das missões da Agência por forma a evitar duplicações e conflitos de competências, bem como estabelecer a cadeia de comando entre os funcionários da Agência e os funcionários nacionais, sob o signo da clareza e da transparência.

1.7.

O CESE recomenda que, em caso de desafios desproporcionados e específicos nas fronteiras externas, a Agência possa intervir a pedido de um Estado-Membro, organizando e coordenando intervenções rápidas nas fronteiras mediante o destacamento — acordado e coordenado com o Estado em causa, ao qual compete assegurar o controlo e a responsabilidade pela gestão — de equipas do corpo permanente, dotadas de equipamento moderno e próprio.

1.8.

O CESE subscreve as recomendações dirigidas ao pessoal da Agência, tanto no atinente ao «respeito da vida humana» e às limitações à utilização de armas de fogo, como no que se refere à recusa ou à concessão de vistos na fronteira, tratando-se em ambos os casos de importantes prerrogativas das administrações responsáveis pela ordem pública nos Estados-Membros.

1.8.1.

A este respeito, o Comité recomenda que os Estados-Membros possam invocar o princípio da subsidiariedade e que o estatuto dos funcionários da Agência imponha um nível elevado de obrigações, sobretudo no concernente às obrigações de confidencialidade.

1.9.

O CESE recomenda vivamente o aprofundamento dos mecanismos de controlo constantes do anexo V, capítulo 3, da proposta, em caso de violação das regras por parte do pessoal. Os mecanismos deveriam prever a consulta dos tribunais da União.

1.10.

Tendo em conta o papel que seria atribuído à Agência em caso de detenção das pessoas e do seu eventual repatriamento, o Comité recomenda a previsão de módulos de formação para o pessoal estatutário sobre o respeito dos direitos fundamentais.

1.11.

O CESE reputa indispensável que a Agência consagre uma parcela substancial do orçamento à modernização do equipamento.

1.12.

Segundo o CESE, a definição do ciclo político estratégico plurianual para a gestão europeia integrada das fronteiras deveria ficar a cargo do Parlamento Europeu e do Conselho, após consulta do Comité, enquanto o planeamento anual deveria ser delegado na Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira, sob a obrigação de apresentar um relatório anual sobre as ações concluídas, as autorizações orçamentais e as missões efetuadas.

1.13.

No que diz respeito à cooperação internacional, o Comité recomenda o estabelecimento de uma ligação estreita entre as ações previstas pela proposta de regulamento e o desenvolvimento de outras políticas relevantes, em particular com o Acordo de Cotonu.

1.14.

O Comité recomenda o reforço do fórum consultivo que assiste a Agência no tocante à participação de organizações pertinentes e pede para também se associar a sociedade civil organizada às atividades do fórum, através do CESE.

2.   Introdução

2.1.

Num espaço de livre circulação, as fronteiras externas tornam-se fronteiras comuns, atualmente ao longo de mais de 50 000 quilómetros — num tal contexto, um problema de segurança num Estado-Membro ou nas suas fronteiras externas tem repercussões potenciais em todos os Estados-Membros.

2.1.1.

Por conseguinte, a confiança mútua está na base de um espaço comum de liberdade, segurança e justiça, sobretudo à luz de novos desafios, ameaças generalizadas e fenómenos imprevisíveis, que exigem mais cooperação, intervenções de recursos qualificados e melhor informação — em essência, importa consubstanciar a solidariedade, que funde e potencia a soma dos valores de cada um dos Estados.

2.2.

No Tratado de Lisboa, as disposições relativas às fronteiras constam do título V, parte III, do TFUE, no capítulo sobre as políticas relativas aos controlos nas fronteiras, ao asilo e à imigração, com o objetivo de criar um «sistema integrado de gestão das fronteiras externas», conforme previsto no artigo 77.o, n.o 1, alínea c), do TFUE. Estas disposições visam a criação de um «espaço de liberdade, segurança e justiça».

2.3.

Da própria leitura dos Tratados se deduz que a uma livre circulação dos cidadãos dentro da União deve corresponder obrigatoriamente uma política comum em matéria de gestão e controlo das pessoas provenientes de países terceiros.

2.3.1.

Tanto uma nova prorrogação dos controlos insuficientes atualmente realizados nas fronteiras externas como a reintrodução de novos controlos internos — em contramão ao sentido de marcha da história — imporiam custos económicos elevados à UE no seu conjunto, prejudicando gravemente o mercado único, que representa uma das maiores realizações da integração europeia.

2.4.

A gestão europeia integrada das fronteiras, assente no modelo de controlo do acesso a quatro níveis, inclui:

medidas nos países terceiros, como as previstas no quadro da política comum de vistos;

medidas aplicadas junto dos países terceiros vizinhos;

medidas para um controlo melhorado e reforçado das fronteiras externas;

análise dos riscos e medidas no espaço Schengen e em matéria de regresso.

2.5.

Após a criação inicial, em 2002-2003, de uma rede composta por peritos nacionais, sob a égide de um organismo comum de peritos denominado Comité Estratégico da Imigração, Fronteiras e Asilo (CEIFA) (1), deu-se a criação da Frontex (2), enquanto agência europeia de coordenação para o controlo das fronteiras.

2.6.

A agência de cooperação foi substituída em 2016 (3), aproveitando a experiência da Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira, com o objetivo de melhorar o controlo das fronteiras externas dos Estados-Membros e do espaço Schengen, a fim de:

elaborar avaliações da vulnerabilidade da capacidade de controlo das pessoas nas fronteiras pelos Estados-Membros;

organizar operações conjuntas e intervenções rápidas nas fronteiras para reforçar a capacidade dos Estados-Membros para controlar as fronteiras externas e fazer face aos desafios resultantes da imigração ilegal e da criminalidade organizada;

coadjuvar a Comissão na coordenação de equipas de apoio quando um Estado-Membro enfrenta pressões migratórias desproporcionadas em pontos específicos da fronteira externa;

assegurar uma resposta prática em situações que exijam uma intervenção urgente nas fronteiras externas;

prestar assistência técnica e operacional às operações de busca e salvamento de pessoas que se encontrem em perigo no mar, durante as operações de vigilância de fronteiras;

ajudar a criar uma reserva de intervenção rápida de, pelo menos, 1 500 guardas de fronteira

nomear agentes de ligação da Agência nos Estados-Membros;

organizar, coordenar e conduzir operações e intervenções de regresso;

promover a cooperação operacional entre Estados-Membros e países terceiros em matéria de gestão das fronteiras.

2.7.

Desde a sua criação, em outubro de 2016, a Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira tornou-se um centro nevrálgico da União para os regressos (4), com capacidade para apoiar eficazmente os Estados-Membros nas operações de regresso de quem não tem direito de permanência na UE.

2.8.

O Parlamento Europeu pronunciou-se sobre esta questão em várias resoluções e manifestou grande preocupação relativamente à aplicação do Regulamento (UE) 2016/1624 relativo à Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira; sublinhou ainda a necessidade de a Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira conduzir operações polivalentes com o objetivo de responder à necessidade de dispor de meios de busca e salvamento marítimos (5) e de introduzir uma verdadeira estratégia de gestão integrada das fronteiras.

2.9.

O Comité adotou uma resolução (6) em defesa do espaço Schengen, em que solicitou ao Conselho e aos Estados-Membros que garantissem o exercício da liberdade de circulação. Sublinhou igualmente num parecer (7) a necessidade de «maior transparência no que se refere à governação, às ações e à responsabilização da Agência».

2.10.

O CESE também pôs um acento forte (8) na necessidade de intensificar «a cooperação entre a Agência de Fronteiras e as autoridades nacionais» e melhorar «a coordenação entre as diferentes agências e instituições com competência em matéria de controlos das fronteiras, vigilância costeira, segurança marítima, salvamento marítimo, alfândegas e pescas», salientando que a «melhoria da gestão das fronteiras externas deve ser adotada em complemento das reformas do sistema comum de asilo».

2.11.

«Sempre que nas fronteiras externas, quer sejam marítimas ou terrestres, haja pessoas em situações que põem em risco a sua vida e segurança, a primeira obrigação da Guarda de Fronteiras, e das outras instituições que atuam em seu lugar, consiste em salvar a vida dessas pessoas e prestar-lhes a devida ajuda» (9).

2.12.

O CESE — como salientado na Agenda Europeia da Migração e no Pacto Global para Migrações Seguras, Ordeiras e Regulares (10) — realça com veemência a necessidade de melhorar a gestão da migração, abordando «as causas profundas que impelem as pessoas a buscar uma vida alhures».

3.   Propostas da Comissão

3.1.

A proposta da Comissão Europeia tem por objetivo reformar a Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira, instituindo as novas capacidades da Agência, em particular prevendo a criação do corpo permanente da Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira e a aquisição de equipamento próprio para a Agência, nomeadamente a fim de permitir enfrentar de modo cabal outras funções, novas ou potenciais.

3.2.

Com base nos custos totais do mandato atual e do futuro mandato — 1 220 milhões de EUR para o período 2019-2020, e 11 270 milhões de EUR para o período 2021-2027 —, a Comissão propõe criar, até 2020, um corpo permanente da Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira, dotado de poder executivo e composto por 10 000 agentes operacionais GEFC (11), a fim de dotar a Agência de um braço operacional eficaz e eficiente e adaptar a atuação da Agência às necessidades operacionais.

3.3.

A criação do corpo permanente deve ser integrada numa Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira plenamente funcional, em que os Estados-Membros, a União e as agências da UE (12), em especial a Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira, estejam bem coordenados e trabalhem em prol de objetivos políticos comuns e partilhados.

3.4.

As propostas excluem a Dinamarca, a Irlanda e o Reino Unido (excetuando eventuais possibilidades de cooperação a definir) do seu âmbito de aplicação, enquanto a sua aplicação a Gibraltar fica suspensa. Abrangem, em contrapartida, a Islândia, a Noruega, a Confederação Suíça e o Principado do Listenstaine, enquanto desenvolvimento das disposições do acervo de Schengen.

4.   Observações na generalidade

4.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) manifesta a convicção de que, num espaço de livre circulação, as fronteiras externas devem ser consideradas fronteiras comuns, pelo que quem entra em qualquer parte do território da União entra no seu espaço comum de liberdade, segurança e justiça, com todos os direitos e obrigações que daí decorrem.

4.2.

O CESE considera que pecou por tardia a execução de um sistema integrado de gestão das fronteiras externas, conforme previsto no artigo 77.o, n.o 2, alínea d), do TFUE, em consonância com uma definição inadiável partilhada por todos os Estados-Membros.

4.3.

O Comité perfilha o objetivo de, dotando a Agência de um braço operacional próprio e coerente, permitir que a UE disponha das capacidades necessárias para proteger as fronteiras externas, evitar os movimentos secundários e executar efetivamente o repatriamento dos migrantes em situação irregular.

4.4.

O Comité foi a primeira instituição a propor a criação de uma guarda europeia de fronteiras (13) e concorda plenamente com o objetivo de garantir a segurança das fronteiras externas, mercê de um corpo permanente e uma gestão europeia eficaz e integrada das fronteiras externas. Num espírito de responsabilidade partilhada, a Agência deverá desempenhar um papel de acompanhamento regular da gestão das fronteiras externas, não só através do conhecimento da situação e da análise de riscos, mas também através da presença de peritos do seu próprio pessoal nos Estados-Membros.

4.5.

O CESE entende que, em caso de desafios desproporcionados e específicos nas fronteiras externas, a Agência deve poder intervir a pedido de um Estado-Membro, organizando e coordenando intervenções rápidas nas fronteiras mediante o destacamento — acordado e coordenado com o Estado em causa, ao qual compete assegurar a responsabilidade principal pela gestão dos seus troços de fronteira externa — de equipas do corpo permanente da Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira.

4.6.

Apesar de considerar úteis as intervenções individuais da Agência, com base numa decisão da Comissão Europeia, «em situações de urgência e de acordo com um procedimento transparente que preveja a informação imediata dos legisladores europeus» (14), o Comité considera prematura — na ausência de um quadro definido e comum a todos os Estados-Membros sobre uma política de migração da União e de ajuda ao desenvolvimento nos países de emigração — a delegação permanente na Comissão do poder de adotar atos de definição autónoma das prioridades políticas e de orientações estratégicas para a gestão integrada das fronteiras.

4.7.

Em contrapartida, o Comité acolhe com agrado a oportunidade de atribuir à Comissão competências de execução no que se refere ao manual relativo ao Eurosur e ao FADO, as normas comuns para os quadros de situação e para a gestão dos riscos, bem como para o apoio financeiro ao corpo permanente.

4.8.

Segundo o CESE, a definição do ciclo político estratégico plurianual para a gestão europeia integrada das fronteiras deveria ficar a cargo do Parlamento Europeu e do Conselho, após consulta do Comité, enquanto o planeamento anual seria delegado na Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira, de acordo com um roteiro estabelecido pelo conselho de administração da Agência, sob reserva de apresentar um relatório anual sobre as ações concluídas, as autorizações orçamentais e as missões efetuadas.

4.9.

O Comité considera importante reforçar o fórum consultivo para assistir o diretor executivo e o conselho de administração da Agência no tocante aos direitos fundamentais e à aplicação do ciclo político estratégico plurianual, com a participação do Gabinete Europeu de Apoio em matéria de Asilo (EASO), da Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA), do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e de outras organizações relevantes; solicita ainda que a sociedade civil organizada também possa participar nas atividades do fórum através do CESE.

5.   Observações na especialidade

5.1.

O CESE recomenda vivamente o aprofundamento dos mecanismos de controlo constantes do anexo V da proposta no atinente quer à utilização de armas de fogo, quer à recusa ou à concessão de vistos na fronteira, tratando-se em ambos os casos de importantes prerrogativas das administrações responsáveis pela ordem pública nos Estados-Membros.

5.1.1.

Objeto de atenção deverão ser também os anexos III e V, a fim de assegurar a coerência entre a legislação nacional e europeia, visando evitar divergências de comportamento entre agentes que operam no mesmo local em igualdade de circunstâncias em termos de competências e qualificações, mas estão sujeitos a diferentes regras de empenhamento.

5.2.

Há que garantir de forma explícita o nível de obrigações previsto nos Estados-Membros, em particular no tocante à confidencialidade.

5.3.

Atendendo à coexistência de diferentes coortes de funcionários fronteiriços — afetos a serviços aduaneiros, fitossanitários, de segurança, financeiros, de imigração e regresso, de mediação cultural, no domínio dos direitos fundamentais, pessoal do EASO, agentes do ETIAS, analistas do Eurosur, agentes de ligação, para além do pessoal dos serviços de fronteira dos Estados-Membros e da Agência —, o CESE reputa indispensável que a UE preveja módulos de formação permanente entre agências e entre corpos de intervenção (15).

5.4.

Importa igualmente garantir que não há discriminação em termos de tratamento e de condições de trabalho entre o corpo da Agência e os corpos nacionais, em relação a efetivos com a mesma formação, competências e qualificações que estão a exercer as mesmas funções.

5.5.

No que diz respeito à cooperação internacional, o Comité recomenda que se estabeleça uma ligação estreita entre as ações previstas na proposta de regulamento e as outras políticas pertinentes, bem como com as ações relativas aos acordos económicos e comerciais e, em particular, no âmbito do diálogo entre a UE e os países ACP ao abrigo do Acordo de Cotonu.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Comité Estratégico da Imigração, Fronteiras e Asilo (CEIFA).

(2)  Organismo criado pelo Regulamento (CE) n.o 2007/2004 (JO L 349 de 25.11.2004, p. 1), posteriormente alterado pelos Regulamentos do Parlamento Europeu e do Conselho (CE) n.o 863/2007 (JO L 199 de 31.7.2007, p. 30), (UE) n.o 1168/2011 (JO L 304 de 22.11.2011, p. 1) e (UE) n.o 1052/2013 (JO L 295 de 6.11.2013, p. 11).

(3)  Com o Regulamento (UE) 2016/1624 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 251 de 6.11.2016, p. 1), que entrou em vigor em 6 de outubro de 2016.

(4)  Até à data, a UE celebrou 17 acordos de readmissão. O Acordo de Cotonu (que enquadra as relações da UE com 79 países de África, das Caraíbas e do Pacífico) inclui também disposições sobre o repatriamento dos migrantes irregulares.

(5)  Regulamento (UE) n.o 656/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 189 de 27.6.2014, p. 93).

(6)  JO C 133 de 14.4.2016, p. 1.

(7)  JO C 303 de 19.8.2016, p. 109.

(8)  Ver nota de rodapé n.o 7.

(9)  Ibidem.

(10)  https://www.iom.int/global-compact-migration.

(11)  Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira.

(12)  Ver, nomeadamente, a Agência Europeia da Segurança Marítima (EMSA), a Agência Europeia de Controlo das Pescas (AECP), o Centro de Satélites da União Europeia, a Agência da União Europeia para a Cooperação Policial (Europol) e a Agência Europeia para a Gestão Operacional de Sistemas Informáticos de Grande Escala no Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça (eu-LISA).

(13)  JO C 128 de 18.5.2010, p. 29, JO C 303 de 19.8.2016, p. 109, Parecer do CESE — Fundo para o Asilo e a Migração (FAM) e Fundo para a Gestão Integrada das Fronteiras (SOC/60, JO C 62 de 15.2.2019, p. 184).

(14)  Ver nota de rodapé n.o 7.

(15)  O artigo 69.o prevê a cooperação da Agência GEFC com outras doze agências e serviços da União.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/67


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à prevenção da difusão de conteúdos terroristas em linha

Contribuição da Comissão Europeia para a reunião dos dirigentes realizada em Salzburgo em 19 e 20 de setembro de 2018»

[COM (2018) 640 final — 2018-0331 (COD)]

(2019/C 110/13)

Relator:

José Antonio MORENO DÍAZ

Consulta

Conselho Europeu, 24.10.2018

Parlamento Europeu, 22.10.2018

Base jurídica

Artigo 114.o, n.o 1, e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Decisão da Mesa

11.12.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

126/0/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE congratula-se com a iniciativa que visa uma maior segurança dos habitantes da UE; contudo, no debate entre segurança e liberdade, o Comité preconizou sempre a necessária defesa das liberdades, nomeadamente de expressão e de acesso à informação e à comunicação, e a confidencialidade das comunicações, bem como o acesso a um recurso efetivo e a um processo justo e sem atrasos.

1.2.

Os ataques terroristas recentemente perpetrados na UE demonstraram o modo como os terroristas utilizam abusivamente as redes sociais para recrutar e preparar apoiantes. Os terroristas utilizam formas de comunicação encriptada para planear e facilitar atividades terroristas e a Web para glorificar as suas atrocidades, exortar outras pessoas a seguirem o seu exemplo e infundir medo no grande público.

1.3.

O CESE solicita que se estabeleçam, da forma mais precisa possível, critérios para definir conceitos jurídicos indeterminados, como «informação terrorista», «atos terroristas»«grupos terroristas» ou «apologia do terrorismo».

1.4.

Os conteúdos terroristas partilhados em linha para esses fins são difundidos através de prestadores de serviços de alojamento virtual que permitem o carregamento de conteúdos de terceiros. Em vários ataques terroristas recentemente perpetrados em solo europeu, os conteúdos terroristas em linha provaram ser indispensáveis para radicalizar e inspirar ataques dos chamados «lobos solitários».

1.5.

Além disso, apesar de os meios de prevenção tecnológicos (parâmetros automatizados, algoritmos, motores de busca, etc.) serem muito úteis, a intervenção do fator humano como mediador e intermediário é essencial para avaliar de forma adequada esses conteúdos.

1.6.

O CESE assinala a necessidade de combater a difusão de informação terrorista e o recrutamento digital nas redes sociais. Na mesma ordem de ideias, há que lutar contra a censura ou a autocensura na Internet. Recorda que, no âmbito da Internet, é essencial garantir a todos os habitantes da UE o direito efetivo à informação e o direito à liberdade de opinião.

1.7.

A proteção da Internet e a luta contra os grupos radicais devem contribuir para reforçar a confiança na Internet e, por conseguinte, garantir o desenvolvimento económico deste setor da economia.

1.8.

O CESE chama a atenção para a necessidade de avaliar os efeitos da aplicação da proposta em apreço sobre as pequenas e médias empresas, bem como ponderar a possibilidade de uma aplicação transitória que facilite a adaptação destas empresas e não prejudique a livre concorrência em benefício dos grandes operadores.

1.9.

As medidas regulamentares propostas para proteger a Internet e garantir a proteção dos jovens e da população devem estar estritamente reguladas por lei e garantir a todos o direito à informação e o recurso das decisões administrativas.

1.10.

O CESE insiste na necessidade de avaliar também os fornecedores de acesso, e de os gestores de redes sociais adotarem medidas proativas para promover a denúncia e a ação direta das associações, das ONG e dos utilizadores contra estes conteúdos: estes «contradiscursos» devem ser valorizados para agir de forma preventiva.

1.11.

Importa ter em conta o grande número de plataformas digitais a nível europeu e a diferença na dimensão destas empresas no que diz respeito à adaptação das disposições da proposta a estas pequenas empresas.

1.12.

O CESE salienta que os utilizadores devem ser relembrados de forma inequívoca das regulamentações nacionais relativas à utilização ou à produção de conteúdos terroristas. Solicita também que o direito de recurso da decisão administrativa seja garantido através de uma explicação clara deste direito e dos instrumentos disponíveis em linha para o exercer.

2.   Contexto da proposta

2.1.

A ubiquidade da Internet permite aos seus utilizadores comunicar, trabalhar, estabelecer contactos, criar, obter e partilhar informações e conteúdos com centenas de milhões de pessoas no mundo inteiro: por este motivo, a Comissão propõe estabelecer mecanismos para prevenir a comunicação e difusão de conteúdos terroristas (1).

2.2.

É importante distinguir os conceitos, e o termo «Internet» é demasiado genérico. A Internet engloba simultaneamente a Web, as redes sociais e a Internet obscura (Darknet). Inclui também a Internet das coisas, que constitui uma clara lacuna de segurança numa guerra eletrónica. Por exemplo, os recrutadores do Estado Islâmico comunicam mais facilmente hoje em dia através de consolas de jogos em linha do que através da Web. A expressão «preparar e facilitar atividades terroristas» não se aplica à Internet nem às redes sociais, mas sim à Internet obscura. Além disso, as grandes empresas da Internet, as GAFAM (Google, Amazon, Facebook, Apple e Microsoft), não têm atividades na Internet obscura ou em redes encriptadas.

2.3.

No entanto, a capacidade de chegar a um público tão vasto a um custo mínimo também atrai criminosos, desejosos de utilizar abusivamente a Internet para fins ilegais. Os ataques terroristas recentemente perpetrados na UE demonstraram o modo como os terroristas utilizam abusivamente a Internet para recrutar e preparar apoiantes, planear e facilitar atividades terroristas, glorificar as suas atrocidades, exortar outras pessoas a seguirem o seu exemplo e infundir medo no grande público.

2.4.

É certo que o Fórum Internet da UE reuniu diversos intervenientes, mas nem todos os prestadores de serviços de alojamento virtual afetados participaram neste fórum e, além disso, a dimensão e o ritmo dos progressos realizados pelos prestadores de serviços de alojamento virtual no seu conjunto não são suficientes para oferecer uma resposta adequada a este problema. É necessário um esforço específico para fornecer uma formação adequada aos moderadores das redes sociais.

2.5.

Os conteúdos terroristas partilhados em linha para esses fins são difundidos através de prestadores de serviços de alojamento virtual que permitem o carregamento de conteúdos de terceiros. Em vários ataques terroristas perpetrados em solo europeu, os conteúdos terroristas em linha provaram ser indispensáveis para radicalizar e inspirar ataques dos chamados «lobos solitários». Além disso, constatou-se uma maior influência entre as camadas mais jovens da população.

3.   Síntese e observações gerais sobre a proposta de regulamento

3.1.

O CESE já definiu a sua posição sobre os conteúdos ilegais em linha (2); esta nova iniciativa da Comissão diz respeito especificamente aos conteúdos terroristas na Internet.

3.2.

O âmbito de aplicação pessoal da proposta inclui os prestadores de serviços de alojamento virtual que oferecem os seus serviços na UE, independentemente do seu local de estabelecimento ou da sua dimensão.

3.3.

O Comité considera que se deveriam incluir os fornecedores de informações e motores de busca e os sítios ou redes de alojamento.

3.4.

As pequenas e médias empresas da Internet não dispõem das capacidades técnicas, humanas e financeiras necessárias para agir eficazmente contra os conteúdos terroristas. O CESE considera que se deve poder adaptar os prazos e os procedimentos a este tipo de empresas. No que diz respeito às pequenas e médias empresas, pode conceder-se um prazo para a aplicação do regulamento.

3.5.

Importa igualmente valorizar as medidas preventivas e proativas das ONG, dos sindicatos e da sociedade civil em geral.

3.6.

A fim de assegurar a remoção dos conteúdos terroristas, o regulamento introduz uma decisão de remoção, que pode ser emitida enquanto decisão administrativa ou judicial por uma autoridade competente de um Estado-Membro. Nesses casos, o prestador de serviços de alojamento virtual é obrigado a remover o conteúdo ou a bloquear o acesso ao mesmo no prazo de uma hora.

3.7.

A definição de conteúdo terrorista pode ser diferente de país para país, e é importante esclarecê-la de modo a evitar a arbitrariedade e a insegurança jurídica.

3.8.

O prazo de uma hora não é realista porque, por exemplo em França, o tempo que decorre atualmente entre a notificação e a eliminação da fonte é de 16 horas para sítios pedófilos e 21 horas para sítios terroristas, dado que a identificação dos sítios exige muito tempo. O CESE considera que se deve estabelecer um prazo mais realista e eficaz.

3.9.

O regulamento exige que, se for caso disso, os prestadores de serviços de alojamento virtual tomem medidas proativas proporcionais ao nível de risco e removam o material terrorista dos seus serviços, nomeadamente através da utilização de ferramentas de deteção automatizada. Tal é fundamental, e devemos apelar para um esforço de inovação tecnológica e apoiá-lo para poder desenvolver ferramentas tecnológicas.

3.10.

A Comissão propõe a utilização de ferramentas de deteção automatizada, entre outros meios, e convida as empresas a envidar esforços significativos para apoiar a investigação com vista ao desenvolvimento de ferramentas tecnológicas adequadas.

3.11.

No âmbito das medidas destinadas a proteger os conteúdos que não são conteúdos terroristas contra a remoção indevida, a proposta estabelece a obrigação de instituir vias de recurso e mecanismos de reclamação, a fim de garantir a possibilidade de os utilizadores contestarem a remoção dos seus conteúdos. Além disso, o regulamento introduz obrigações de transparência relativamente às medidas adotadas pelos prestadores de serviços de alojamento virtual para lutar contra os conteúdos terroristas, assegurando assim a sua responsabilização perante os utilizadores, os cidadãos e as autoridades públicas.

3.12.

Importa insistir não só nos esforços de controlo e revisão de conteúdos, mas também de mediação humana e tecnológica. A questão da censura por parte dos mediadores humanos pode ser muito preocupante tanto em termos de respeito pelos direitos dos trabalhadores como de aplicação das normas relativas ao direito à informação e ao respeito pela vida privada de todos os habitantes da UE.

3.13.

O CESE entende que o prestador deve notificar ao respetivo proprietário qual o sítio ou a informação que pretende censurar. Há que recordar que os cidadãos têm o direito de ser informados sobre uma decisão administrativa.

3.14.

A fim de garantir o direito dos cidadãos relativamente a uma decisão administrativa, o CESE convida os prestadores de acesso a indicar, nas suas políticas de conteúdos, os direitos e deveres dos clientes, referindo, por exemplo, que os produtores de informação são informados das decisões de remoção e as vias jurídicas à disposição dos clientes.

4.   Explicação das disposições da proposta

4.1.

A propaganda terrorista em linha visa incitar as pessoas a cometerem atentados terroristas, nomeadamente fornecendo-lhes instruções pormenorizadas sobre a forma de infligir o máximo de danos possível. Geralmente é difundida propaganda adicional depois dessas atrocidades, na qual os terroristas glorificam estes atos e incentivam outros a seguir o exemplo. O regulamento em apreço contribui para a proteção da segurança pública, reduzindo a acessibilidade dos conteúdos terroristas que promovam ou fomentem a violação dos direitos fundamentais.

4.2.

Relativamente às definições, a proposta indica que, para efeitos do regulamento em apreço, entende-se por:

«Prestador de serviços de alojamento virtual», um prestador de serviços da sociedade da informação que consistam na armazenagem das informações fornecidas por um fornecedor de conteúdos a pedido deste e na disponibilização das informações armazenadas a terceiros (3);

«Fornecedor de conteúdos», um utilizador que tenha fornecido informações que sejam ou tenham sido armazenadas a seu pedido por um prestador de serviços de alojamento virtual (4);

o CESE propõe que se adite um novo ponto que inclua:

«Fornecedores de informações»: motores de busca que permitam a identificação do conteúdo e o acesso ao mesmo.

4.3.

Relativamente à definição de «conteúdos terroristas» como uma ou mais informações que:

a)

Incitem ou façam a apologia, nomeadamente através da glorificação, da prática de infrações terroristas, acarretando assim o risco de tais atos serem cometidos;

b)

Encorajem a participação em infrações terroristas;

c)

Promovam as atividades de um grupo terrorista, nomeadamente incentivando a participação ou o apoio a um grupo terrorista na aceção do artigo 2.o, n.o 3, da Diretiva (UE) 2017/541;

d)

Forneçam instruções sobre métodos ou técnicas com vista à prática de infrações terroristas (5);

o CESE propõe que se adite um novo ponto que inclua:

recrutem e capacitem pessoas com a finalidade de cometer ou apoiar atos terroristas.

4.4.

A definição dos conteúdos a censurar é muito curta, uma vez que existem muitos textos, imagens, vídeos e outros conteúdos e formatos que não fazem a apologia do terrorismo, por não incitarem a atos concretos, mas facilitam e valorizam uma doutrina extremista que leva à violência.

4.5.

O regulamento contribui também para a luta contra as empresas que, através das suas atividades, facilitam e valorizam uma doutrina extremista que conduz à violência. O regulamento deve contribuir, além disso, para combater as atividades de recrutamento de pessoas nas redes sociais.

4.6.

O artigo 1.o define o objeto da proposta, indicando que o regulamento estabelece regras que visam prevenir a utilização abusiva dos serviços de alojamento virtual para a difusão de conteúdos terroristas em linha, nomeadamente deveres de diligência para os prestadores de serviços de alojamento virtual e medidas a pôr em prática pelos Estados-Membros.

4.7.

Deve substituir-se a expressão «utilização abusiva dos serviços de alojamento virtual para a difusão de conteúdos terroristas em linha» acrescentando a difusão de conteúdos, mensagens ou meios de propaganda e incluindo também a indicação dos URL e de informações para aceder a conteúdos ou mensagens terroristas, uma vez que tal envolverá os motores de busca.

4.8.

Por seu lado, o artigo 5.o prevê a obrigação de os prestadores de serviços de alojamento virtual instituírem medidas para avaliar rapidamente os conteúdos objeto de uma sinalização de conteúdos por parte de uma autoridade competente de um Estado-Membro ou de um organismo da UE, sem, no entanto, impor a obrigação de remover o conteúdo sinalizado, nem fixar prazos específicos para a ação.

4.9.

O CESE entende que, numa ótica de eficácia, se deve começar a elaborar uma lista com um número limitado de critérios para definir os tipos de conteúdos e mensagens de caráter terrorista ou que fazem a apologia do terrorismo, tendo em vista a segurança jurídica, a fim de evitar decisões arbitrárias de remoção de conteúdos e também para proteger o direito à informação e a liberdade de opinião. Além disso, o regulamento deveria incluir os critérios necessários para definir, a nível europeu, conteúdos como: informações sobre grupos terroristas, informações que glorificam o terrorismo ou justificam atos terroristas, informações técnicas ou metodológicas que facilitam a produção de armas suscetíveis de ser utilizadas num atentado ou apelos lançados para fins de recrutamento.

4.10.

O artigo 14.o prevê o estabelecimento de pontos de contacto tanto pelos prestadores de serviços de alojamento virtual como pelos Estados-Membros, a fim de facilitar a comunicação entre si, em especial no que diz respeito às sinalizações de conteúdos e às decisões de remoção. O CESE entende que, a fim de salvaguardar os direitos humanos em causa, estes pontos de contacto devem incluir juízes especializados na identificação destes problemas e que tenham formação, não só sobre identificação de atitudes, comportamentos ou ações terroristas, mas também no domínio das competências tecnológicas. Estas competências devem ser exigidas tanto aos prestadores de serviços de alojamento virtual como às pessoas designadas pelos Estados-Membros, a fim de facilitar a comunicação entre os mesmos, nomeadamente no que diz respeito às sinalizações de conteúdos e às decisões de remoção.

4.11.

O regulamento deve especificar a obrigação de os prestadores de serviços de alojamento virtual fornecerem informações acessíveis a todos para o funcionamento adequado dos pontos de contacto, e definir o conteúdo e a forma de comunicação com os membros desses pontos de contacto.

4.12.

O artigo 16.o exige que os prestadores de serviços de alojamento virtual que não disponham de um estabelecimento num Estado-Membro mas que proponham serviços na UE designem um representante legal na UE: o CESE considera que essa exigência se deve alargar aos prestadores de acesso e ao setor da Internet, a fim de incluir os motores de busca, as redes sociais, as aplicações da Internet para telefone e o setor dos jogos.

4.13.

Os prestadores de serviços de alojamento virtual que operam na Internet desempenham um papel essencial na economia digital, ligando as empresas e os cidadãos e facilitando o debate público e a difusão e receção de informações, opiniões e ideias, o que contribui de forma significativa para a inovação, o crescimento económico e a criação de emprego na UE. O CESE considera que também se deve incluir os prestadores de serviços de Internet, serviços de alojamento de conteúdos, redes sociais digitais e empresas que prestam serviços de telefonia digital.

4.14.

A proposta de regulamento apresenta um conjunto de medidas a adotar pelos Estados-Membros para identificar conteúdos terroristas, permitir a sua rápida remoção pelos prestadores de serviços de alojamento virtual e facilitar a cooperação com as autoridades competentes dos outros Estados-Membros, os prestadores de serviços de alojamento virtual e, se for caso disso, os organismos competentes da UE; tudo isso, segundo o CESE, para circunscrever os conteúdos relacionados com o terrorismo, permitir a sua rápida supressão por parte dos prestadores de serviços de alojamento e reduzir as atividades de propaganda e recrutamento de terroristas na Internet.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  COM(2018) 640 final.

(2)  JO C 237 de 6.7.2018, p. 19.

(3)  COM(2018) 640 final, artigo 2.o, ponto 1.

(4)  COM(2018) 640 final, artigo 2.o, ponto 2.

(5)  COM(2018) 640 final, artigo 2.o, ponto 5.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/72


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE, Euratom) n.o 1141/2014 no que diz respeito a um procedimento de verificação de violações das regras em matéria de proteção de dados pessoais no âmbito das eleições para o Parlamento Europeu

[COM(2018) 636 final — 2018/0328 (COD)]

(2019/C 110/14)

Relatora-geral:

Marina YANNAKOUDAKIS

Consulta

Parlamento Europeu, 1.10.2018

Conselho, 24.10.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Decisão da Mesa

16.10.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

109/2/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE apoia a posição da Comissão Europeia sobre a necessidade do regulamento em apreço à luz do recente caso «Facebook/Cambridge Analytica» relativo ao tratamento alegadamente ilícito de dados pessoais.

1.2.

O CESE reconhece que, no mundo atual, a evolução tecnológica, as redes sociais e o armazenamento de dados pessoais por empresas em toda a UE são um dado adquirido. Não está em causa a necessidade destes instrumentos, uma vez que avançamos para um mundo global de alta tecnologia. O desafio consiste em evoluir neste setor de uma forma que propicie a transparência e que proteja os direitos humanos fundamentais dos cidadãos da UE.

1.3.

A utilização dos dados e as redes sociais alteraram fundamentalmente o modo como os partidos políticos participam nas eleições, na medida em que lhes permitem visar os potenciais eleitores. Esta evolução conduziu a uma maior pressão nas redes sociais como forma de influenciar as intenções de voto. O CESE espera que a Autoridade para os Partidos Políticos Europeus e as Fundações Políticas Europeias (1) (a «Autoridade») examine as áreas passíveis de violações dos dados, proponha meios de as combater e adote um sistema de pesos e contrapesos para assegurar que a proteção e a utilização dos dados respeitam parâmetros bem definidos.

1.4.

O CESE apoia os objetivos da proposta e concorda que a democracia é um dos valores fundamentais que sustentam a UE. Para assegurar o funcionamento de uma democracia representativa a nível europeu, os Tratados determinam que os cidadãos da UE são diretamente representados no Parlamento Europeu (PE).

1.5.

Esta representação traduz-se na eleição de deputados que se candidatam às eleições, quer com o apoio dos partidos políticos, quer como independentes, nos Estados-Membros. A plataforma eleitoral evoluiu ao longo da última década, passando as redes sociais a reforçar o seu papel. A Comissão Europeia (CE) deve agora abordar esta evolução, e a Autoridade, através do reforço do seu pessoal, é um instrumento para garantir que os dados pessoais são protegidos e não são utilizados abusivamente para fins políticos. No âmbito desta abordagem, deve conferir-se prioridade à garantia de que as eleições são realizadas em condições equitativas e de que nenhum grupo beneficia da utilização dos dados.

1.6.

No entanto, para assegurar que a Autoridade funciona corretamente, devem estabelecer-se parâmetros sólidos relativos aos respetivos poderes e competências. Atualmente, as autoridades de proteção de dados (APD) dos Estados-Membros asseguram que não existe utilização abusiva dos dados pelos partidos políticos. Cumpre definir devidamente as condições da cooperação entre a Autoridade e as APD nacionais. Além disso, em muitos Estados-Membros, as APD dispõem de recursos limitados, pelo que a Comissão deve ponderar o seu financiamento de modo a permitir-lhes trabalhar com a Autoridade.

1.7.

No seu parecer sobre a proteção dos dados pessoais (2), o CESE assinalou os eventuais problemas da utilização abusiva dos dados e abordou os aspetos que suscitam preocupação.

1.8.

O CESE apoia o aumento do número de efetivos da Autoridade, na medida em que estes efetivos estarão em melhores condições para trabalhar com os Estados-Membros, através das APD, a fim de assegurar que as violações da proteção de dados são devidamente investigadas e aplicadas sanções nos casos confirmados.

1.9.

O CESE reconhece que o procedimento aplicável às eleições para o Parlamento Europeu é regido pelas disposições nacionais de cada Estado-Membro, no âmbito de um enquadramento da UE. O CESE espera igualmente que as violações das regras em matéria de proteção de dados sejam levadas ao conhecimento da Autoridade, quer pelas APD quer por partes individuais.

2.   Contexto do parecer

2.1.

Os acontecimentos recentes revelaram os riscos para os cidadãos de serem alvo de campanhas de desinformação em linha com o objetivo de descredibilizar e deslegitimar eleições. Considera-se também que houve utilização ilegal e abusiva de dados pessoais com o intuito de influenciar o debate democrático e a realização de eleições livres.

2.2.

Em maio de 2018, entrou em vigor o regulamento geral sobre a proteção de dados (RGPD), que estabelece regras sólidas para o tratamento e a proteção de dados pessoais. Abrange todos os partidos políticos europeus e nacionais, bem como outros intervenientes no contexto eleitoral, incluindo os corretores de dados e as plataformas de redes sociais.

2.3.

Na perspetiva das eleições de 2019 para o Parlamento Europeu, a Comissão Europeia propôs uma série de alterações específicas ao Regulamento (UE, Euratom) n.o 1141/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2014, relativo ao estatuto e ao financiamento dos partidos políticos europeus e das fundações políticas europeias (3), que visam assegurar que as eleições decorrem ao abrigo de regras democráticas sólidas e no pleno respeito dos valores europeus da democracia, do Estado de direito e do respeito pelos direitos fundamentais.

2.4.

Em particular, as alterações propostas permitirão sancionar os partidos políticos europeus ou as fundações que influenciam ou tentam influenciar as eleições através da violação das regras em matéria de proteção de dados. As sanções ascenderão a 5 % do orçamento anual do partido político europeu ou da fundação em causa e serão aplicadas pela Autoridade. Além disso, os partidos políticos e/ou fundações em situação de incumprimento serão impedidos de se candidatar a financiamento do orçamento geral da União Europeia no ano de aplicação das sanções.

2.5.

A proposta estabelece também um procedimento para verificar se uma violação de proteção de dados identificada por uma autoridade nacional de controlo da proteção de dados foi utilizada para influenciar o resultado das eleições para o PE, que envolverá um «comité composto por personalidades independentes», atuando a pedido da Autoridade. O artigo 11.o do regulamento estabelece a criação do referido comité, composto por seis peritos, que não podem ser funcionários da CE, do PE ou do Conselho.

2.6.

A fim de assegurar que a Autoridade dispõe de efetivos suficientes para desempenhar as suas funções de forma independente e eficaz, propõe-se, além disso, acrescentar sete funcionários (ao atual número de três, que inclui o diretor).

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE apoia os objetivos da proposta e concorda que a democracia é um dos valores fundamentais em que assenta a UE. Para assegurar o funcionamento de uma democracia representativa a nível europeu, os Tratados determinam que os cidadãos da UE são diretamente representados no PE. Como tal, é essencial que os seus cidadãos possam exercer o seu direito democrático sem impedimentos nem entraves. Qualquer interferência na liberdade de escolha durante o processo eleitoral é antidemocrática e inaceitável.

3.2.

O CESE reconhece a utilização crescente de dados pessoais nas campanhas eleitorais. Nas eleições do Reino Unido, em 2017, mais de 40 % das campanhas de publicidade foram despendidas em campanhas digitais. Neste contexto, é compreensível que seja aliciante utilizar os dados pessoais para visar determinados grupos. No entanto, não é aceitável que os dados pessoais sejam partilhados sem o conhecimento da pessoa em causa, além de constituir uma grave violação dos direitos humanos.

3.3.

A evolução da Web, a rapidez da transmissão de informações e as implicações ao nível global exigem uma abordagem firme da segurança dos dados armazenados. O RGPD estabelece regras sólidas para o efeito. Em especial, os dados pessoais devem ser tratados de forma lícita e leal. Atualmente, os partidos políticos têm legitimidade para utilizar dados ao abrigo do RGPD, respeitando determinados parâmetros. O desenvolvimento das campanhas políticas depende cada vez mais das redes sociais. A tentativa de pôr termo a esta tendência não serviria necessariamente o processo democrático, pois limitaria as possibilidades dos partidos políticos de divulgarem os seus programas eleitorais aos potenciais eleitores.

3.4.

O CESE reconhece a soberania dos Estados-Membros no processo eleitoral e a Comissão deve trabalhar no âmbito da referida soberania. A UE não pode legislar sobre a aplicação de sanções aos partidos políticos nacionais, dado tratar-se de uma competência dos Estados-Membros. Por conseguinte, a UE só pode propor medidas para sancionar os partidos políticos europeus. Para o efeito, a Comissão propõe uma alteração do regulamento que rege o estatuto e o financiamento dos mesmos, o que reforçará a conclusão da Autoridade quando tiver sido provada a utilização abusiva.

4.   Observações na especialidade e recomendações

4.1.

O CESE reconhece que a Autoridade não dispõe atualmente de pessoal suficiente. O diretor e os dois funcionários já têm um volume de trabalho muito elevado e a pressão aumentará devido às próximas eleições europeias. Por conseguinte, o CESE apoia a proposta de dotar a Autoridade de pessoal permanente e de delegar no seu diretor os poderes de uma autoridade investida do poder de nomeação, uma vez que é essencial que a Autoridade disponha de recursos humanos suficientes para acompanhar adequadamente as eleições.

4.2.

A utilização dos dados e das redes sociais alteraram fundamentalmente a forma como os partidos políticos participam nas eleições, na medida em que lhes permite visar os potenciais eleitores. Esta evolução conduziu a uma maior pressão nas redes sociais como forma de influenciar as intenções de voto. O CESE espera que Autoridade examine as áreas passíveis de violações dos dados, proponha meios de as combater e adote um sistema de pesos e contrapesos para garantir que a proteção e a utilização dos dados respeitam parâmetros bem definidos.

4.3.

O CESE propõe que se clarifique melhor o que se entende por tentativa de influenciar as eleições através de violações das regras de proteção de dados. Deve ser ponderada a criação de um grupo de trabalho composto por APD dos Estados-Membros e pela Autoridade, com o objetivo de estabelecer as melhores práticas de trabalho entre a Autoridade e as APD, uma vez que a proteção de dados não conhece fronteiras na UE.

4.4.

O diretor da Autoridade é nomeado através do procedimento previsto no artigo 6.o, n.o 3, do Regulamento. É independente e não responde perante as instituições da UE, mas tem de apresentar um relatório anual à Comissão Europeia e ao Parlamento Europeu. A este respeito, o CESE considera que seria prudente conceder ao PE o poder de contestar o relatório e de proceder à votação do mesmo. Tal asseguraria uma certa responsabilização da Autoridade e aumentaria a transparência do processo.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  www.appf.europa.eu

(2)  JO C 248 de 25.8.2011, p. 123.

(3)  JO L 317 de 4.11.2014, p. 1.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/75


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria o Fundo Europeu de Defesa»

[COM(2018) 476 final]

(2019/C 110/15)

Relator:

Aurel Laurențiu PLOSCEANU

Correlator:

Eric BRUNE

Consulta

Parlamento Europeu, 2.7.2018

Conselho, 4.7.2018

Decisão da Mesa

10.7.2018

Base jurídica

Artigos 173.o, n.o 3, e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Comissão Consultiva das Mutações Industriais (CCMI)

Adoção pela CCMI

22.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

200/1/6

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE considera imperativo aplicar a estratégia global da UE e o Plano de Execução sobre Segurança e Defesa de modo coerente e em conformidade com as disposições da declaração conjunta UE-OTAN, de julho de 2016, e com o princípio da segurança coletiva das Nações Unidas.

1.2.

Desde 2017, o CESE defende a criação de uma União Europeia da Defesa e apoia o Plano de Ação Europeu de Defesa, incluindo a criação de um Fundo Europeu de Defesa (FED) comum. Estima que o reforço da defesa europeia não visa enfraquecer, mas antes reforçar, a OTAN e as relações transatlânticas.

1.3.

O CESE apoia firmemente a proposta de regulamento que cria o Fundo Europeu de Defesa no âmbito do Quadro Financeiro Plurianual (QFP) de 2021-2027, publicada pela Comissão em 13 de junho de 2018.

1.4.

O CESE apela a progressos qualitativos significativos na cooperação europeia no domínio da defesa. Na verdade, a cooperação limitada entre os Estados-Membros em matéria de defesa cria duplicações e mantém a indústria da defesa muito fragmentada. A insuficiente integração no lado da procura do mercado não incentiva a cooperação transnacional entre empresas nem o reforço da integração da indústria. Tal provoca uma afetação ineficaz de recursos, a duplicação de capacidades industriais, lacunas tecnológicas e ausência de novos programas, em especial programas colaborativos.

1.5.

O CESE apoia o objetivo da autonomia estratégica, com o desenvolvimento de tecnologias-chave em áreas críticas e capacidades estratégicas. Este objetivo está estreitamente relacionado com a necessidade de uma boa avaliação e coordenação para garantir que essas tecnologias possam ser dominadas, retidas e produzidas a nível europeu, permitindo à UE tomar decisões e agir autonomamente se tal for necessário.

1.6.

O CESE considera que o reforço da base industrial e tecnológica da defesa europeia é uma condição essencial para o desenvolvimento de capacidades de defesa comuns.

1.7.

O CESE salienta que a União Europeia deve envidar esforços para manter, renovar e desenvolver uma mão de obra altamente qualificada e para conservar no seu território os trabalhadores com essas qualificações.

1.8.

O CESE propõe que a União Europeia intensifique os esforços para harmonizar as regras relativas à exportação dentro da União.

1.9.

O CESE apoia firmemente a especial atenção concedida às PME, assim como às empresas em fase de arranque, incluindo as que trabalham na área da investigação e desenvolvimento para fins de defesa.

1.10.

O CESE defende que o orçamento da UE para apoio das atividades de defesa não deve substituir as despesas com a defesa nacionais, mas impulsionar e acelerar uma maior e melhor cooperação no domínio da defesa. No mesmo sentido, o orçamento da UE para a investigação no domínio da defesa não deve retirar recursos à investigação civil noutros setores. Embora as decisões relativas ao investimento em matéria de defesa e aos programas de desenvolvimento da defesa continuem a ser prerrogativa dos Estados-Membros, o Fundo Europeu de Defesa (FED) poderá trazer valor acrescentado europeu incentivando a investigação conjunta e o desenvolvimento de produtos e tecnologias no domínio da defesa.

1.11.

O CESE está firmemente convicto de que uma política europeia de defesa mais harmonizada e otimizada pode gerar ganhos de eficiência através do aumento da quota de mercado da base industrial e tecnológica da defesa europeia e da melhor distribuição dos produtos entre países, regiões e empresas.

1.12.

O Fundo Europeu de Defesa só fará diferença se apoiar atividades realmente importantes. Assim, os seus programas devem ser estabelecidos com base num processo sólido de planeamento da defesa europeia que identifique as prioridades fundamentais da Europa em termos de capacidades.

1.13.

O CESE apoia uma política de cooperação que promova a participação das PME, bem como dos países não signatários da carta de intenções, sem, no entanto, esquecer as competências que podem acrescentar à base industrial e tecnológica da indústria da defesa.

1.14.

O CESE apoia a proposta destinada a limitar a elegibilidade para fundos europeus nos casos de empresas europeias controladas pela mesma entidade e a exigir a prestação de garantias se um país terceiro participar em atividades de desenvolvimento apoiadas pelo Fundo Europeu de Defesa.

1.15.

O CESE concorda com a ideia de que os fundos europeus devem ser geridos pela Comissão Europeia, mas entende que a Agência Europeia de Defesa pode ter uma intervenção útil na definição das necessidades de equipamento de defesa e na Organização Conjunta de Cooperação em matéria de Armamento (OCCAR), retirando ensinamentos de experiências que nem sempre foram bem-sucedidas, e desempenhar o seu papel na gestão de programas, já que a duplicação de competências no terreno prejudicaria a eficácia do sistema.

1.16.

O CESE apoia a ideia de que as atividades de investigação e desenvolvimento devem ser submetidas à apreciação de um comité de ética. As condições éticas devem ser definidas claramente e aferidas logo na avaliação da proposta, a fim de garantir segurança jurídica e clareza.

1.17.

O CESE está preocupado com o futuro da cooperação com o Reino Unido após o Brexit e defende uma segurança e uma defesa fortes que incluam o envolvimento do Reino Unido no FED.

1.18.

O CESE considera que o nosso continente envelhecido se sente ameaçado, revelando uma tendência para associar, e por vezes confundir, problemas como o terrorismo e os movimentos migratórios, e falta de solidariedade nos Estados-Membros e entre estes, num contexto de ressurgimento do nacionalismo e do autoritarismo em toda a União Europeia, que coloca pressão sobre as democracias europeias. Um instrumento estratégico industrial tão interessante como o Fundo Europeu de Defesa não dispensa novas reflexões sobre a política de defesa europeia.

2.   Apresentação da proposta

2.1.

O contexto geopolítico tornou-se instável na última década: enfrentamos um ambiente complexo e difícil no qual estão a surgir novas ameaças, tais como as ameaças híbridas e os ciberataques, bem como o regresso de desafios mais convencionais.

2.2.

Na declaração conjunta de 25 de março de 2017, em Roma, os dirigentes de 27 Estados-Membros e o Conselho Europeu, o Parlamento Europeu e a Comissão Europeia declararam que a União iria reforçar a sua segurança e defesa comuns e promover uma indústria da defesa mais competitiva e integrada.

2.3.

A defesa europeia enfrenta deficiências de mercado significativas associadas a economias de escala inexploradas (fragmentação dos mercados nacionais com um único comprador) e à duplicação de recursos a nível europeu.

2.4.

A procura provém quase exclusivamente dos Estados-Membros, mas os seus orçamentos consagrados à defesa, sobretudo para a investigação e desenvolvimento (I&D), têm sofrido cortes substanciais nos últimos 10 anos.

2.5.

Em 2015, apenas 16 % dos equipamentos de defesa foram adjudicados através de contratação pública europeia colaborativa, o que fica longe do objetivo coletivo de 35 % acordado no quadro da Agência Europeia de Defesa.

2.6.

O setor da defesa está fortemente fragmentado entre as fronteiras nacionais, com uma duplicação substancial e as ineficiências daí resultantes, o que impede a realização de economias de escala e de efeitos de aprendizagem.

2.7.

A situação atual não é sustentável, e o desenvolvimento de importantes sistemas de defesa de nova geração está cada vez mais fora do alcance dos Estados-Membros individualmente.

2.8.

A falta de cooperação entre os Estados-Membros enfraquece ainda mais a capacidade da indústria da defesa da UE para manter as capacidades industriais e tecnológicas necessárias para preservar a autonomia estratégica da UE e responder às suas necessidades atuais e futuras em matéria de segurança.

2.9.

Em 7 de junho de 2017, a Comissão adotou uma comunicação que lança o Fundo Europeu de Defesa, que é composto pelas vertentes de investigação e de capacidades, acompanhada de uma proposta legislativa de um regulamento que institui o Programa Europeu de Desenvolvimento Industrial no domínio da Defesa, ao abrigo da vertente de capacidades.

2.10.

A proposta de regulamento que cria o Fundo Europeu de Defesa no âmbito do QFP de 2021-2027 foi publicada pela Comissão em 13 de junho de 2018.

2.11.

O Fundo Europeu de Defesa pretende ser um instrumento para estimular a competitividade e a capacidade de inovação da base industrial e tecnológica da defesa da UE, contribuindo assim para a autonomia estratégica da União. Este instrumento destina-se a promover programas de cooperação que não existiriam sem uma contribuição da UE e a proporcionar os incentivos necessários para fomentar a cooperação em cada fase do ciclo industrial.

2.12.

Serão particularmente encorajados os projetos colaborativos com uma participação transfronteiras significativa das pequenas e médias empresas. Garantir-se-á assim que o FED permanece aberto a beneficiários de todos os Estados-Membros, independentemente da sua dimensão e localização.

2.13.

A proposta em apreço é aplicável a partir de 1 de janeiro de 2021, sendo apresentada para uma União de 27 Estados-Membros.

2.14.

Embora a investigação no domínio da defesa se enquadre no âmbito do Programa-Quadro de Investigação e Inovação (Horizonte Europa), as disposições específicas correspondentes para a investigação no domínio da defesa — tais como os objetivos, as regras de participação e os mecanismos de execução — constam da proposta.

2.15.

A proposta procura garantir sinergias com outras iniciativas da UE no domínio da I&D civil, tais como segurança e cibersegurança, controlo de fronteiras, guarda costeira, transporte marítimo e espaço.

2.16.

Estabelecer-se-ão ligações estreitas entre o FED e os projetos executados no quadro da cooperação estruturada permanente em matéria de defesa (CEP).

2.17.

O FED terá em conta o Plano de Desenvolvimento de Capacidades (PDC) da UE que identifica as prioridades em matéria de capacidades de defesa e a Análise Anual Coordenada da Defesa (AACD) da UE.

2.18.

Neste contexto, podem igualmente ser tidas em conta as atividades relevantes desenvolvidas pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e outros parceiros, quando servem os interesses de segurança e de defesa da União.

2.19.

O FED tem igualmente em conta as atividades de defesa executadas através da Facilidade Europeia de Apoio à Paz, um instrumento extraorçamental proposto à margem do QFP.

2.20.

A proposta prevê a possibilidade de combinar o apoio no âmbito do FED com financiamento ao abrigo do Fundo InvestEU.

2.21.

O FED deve ser utilizado para colmatar de modo proporcionado as deficiências do mercado ou as situações em que o investimento fica aquém do desejado, sem duplicar nem excluir o financiamento privado, e deve ter um claro valor acrescentado europeu.

2.22.

Para proteger os seus valores e interesses e o modo de vida europeu, a União, em sinergia e em cooperação com a OTAN, terá de assumir uma maior responsabilidade.

2.23.

Se pretende estar preparada para enfrentar as ameaças de amanhã e proteger os seus cidadãos, a União tem de reforçar a sua autonomia estratégica. Tal exige o desenvolvimento de tecnologias-chave em áreas críticas e capacidades estratégicas que garantam a liderança tecnológica.

2.24.

As decisões relativas aos investimentos em matéria de defesa e aos programas de desenvolvimento da defesa continuam a ser prerrogativa e responsabilidade dos Estados-Membros.

2.25.

A abordagem política proposta é proporcional à dimensão e à gravidade dos problemas identificados. A iniciativa é limitada aos objetivos que os Estados-Membros não podem, por si só, alcançar de forma satisfatória e quando é esperado que a União possa fazer melhor.

2.26.

Em abril de 2017, foi lançada uma Ação Preparatória em Matéria de Investigação no Domínio da Defesa com um orçamento total de 90 milhões de EUR ao longo de três anos. Começou a produzir resultados concretos iniciais com as primeiras convenções de subvenção assinadas em 2018, mas os projetos ainda estão todos em curso.

2.27.

O regulamento relativo ao Programa Europeu de Desenvolvimento Industrial no domínio da Defesa proposto para 2019-2020 terá um orçamento de 500 milhões de EUR e deve estar operacional a partir de 1 de janeiro de 2019.

2.28.

Realizou-se uma consulta pública aberta sobre o FED para todas as partes interessadas entre 13 de janeiro e 9 de março de 2018. Houve algumas críticas de um ponto de vista ético, mas as partes interessadas diretamente afetadas apoiam a iniciativa. As regras relativas aos direitos de propriedade intelectual precisam de ser adaptadas para a defesa.

2.29.

A dotação orçamental proposta para o período de 2021-2027 é de 13 mil milhões de EUR (a preços correntes), dos quais 4,1 mil milhões para ações de investigação e 8,9 mil milhões para ações de desenvolvimento.

2.30.

Sob reserva de confirmação da eficiência dos custos através de uma análise de custo-benefício, o FED pode ser gerido por uma agência de execução da Comissão.

2.31.

É proposto um regime de monitorização para apoiar a elaboração de relatórios sobre o desempenho e a avaliação. Os resultados serão disponibilizados gradualmente.

2.32.

A proposta da Comissão relativa ao QFP 2021-2027 fixa um objetivo mais ambicioso para a integração das questões climáticas em todos os programas da UE, com uma meta global de 25 % das despesas da UE contribuindo para os objetivos climáticos. O contributo do FED para atingir essa meta global será acompanhado através de um sistema de indicadores climáticos da UE a um nível de desagregação apropriado, incluindo a utilização de metodologias mais precisas, sempre que existam.

2.33.

A proposta é aplicável a partir de 1 de janeiro de 2021.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE reitera os apelos já lançados nos pareceres CCMI/149 (2017), CCMI/116 (2013) e CCMI/100 (2012). A estratégia global da UE e o Plano de Execução sobre Segurança e Defesa também apresentam abordagens importantes para esse efeito. O CESE considera imperativo executar estas iniciativas de modo coerente e em conformidade com as disposições constantes da declaração conjunta UE-OTAN, de julho de 2016, e com o princípio da segurança coletiva das Nações Unidas.

3.2.

Tendo em conta a atual conjuntura geoestratégica e a mais recente evolução no domínio da segurança, a Europa deve reforçar as suas capacidades em matéria de segurança e defesa. É indispensável ter uma compreensão clara dos objetivos estratégicos comuns da União: essa compreensão ainda não existe e é urgente desenvolvê-la. Trata-se de uma condição prévia para a identificação das capacidades de defesa necessárias que deverão assentar numa base industrial e tecnológica sustentável de defesa europeia.

3.3.

A retirada dos EUA do acordo nuclear celebrado com o Irão em 2015, a crise na Ucrânia, as preocupantes manifestações de força da Rússia nas fronteiras dos Estados bálticos e na fronteira oriental da UE, a turbulência no arco Líbia-Iraque-Síria, a instabilidade permanente no Sael, o potencial confronto político e militar entre um eixo EUA-Israel-Arábia Saudita e um eixo Irão-Síria-Rússia, sobretudo num contexto de ciberameaças, aumento do autoritarismo na Europa e muito maior imprevisibilidade da diplomacia dos EUA: o exercício de equilíbrio estratégico da UE raras vezes foi tão complexo e preocupante.

3.4.

As questões de segurança na UE e na sua vizinhança estão entre as principais preocupações dos cidadãos e dos chefes de Estado.

3.5.

A UE tem de abordar pelo menos quatro desafios, da forma mais consensual possível: autonomia na tomada de decisão, antecipação de crises, influência política e a coerência entre os nossos interesses e os nossos princípios democráticos.

3.6.

Em 2017, o CESE defendeu a criação de uma União Europeia da Defesa e apoiou o Plano de Ação Europeu de Defesa, incluindo a criação de um Fundo Europeu de Defesa (FED) comum.

3.7.

O CESE apelou a progressos qualitativos significativos na cooperação europeia no domínio da defesa. Na verdade, a cooperação limitada entre os Estados-Membros em matéria de defesa cria duplicações e mantém a indústria da defesa muito fragmentada. A insuficiente integração no lado da procura do mercado não incentiva a colaboração transnacional entre empresas nem o reforço da integração da indústria. Tal provoca uma afetação ineficaz de recursos, a duplicação de capacidades industriais, lacunas tecnológicas e ausência de novos programas, em especial programas colaborativos.

3.8.

O CESE apoia o objetivo da autonomia estratégica nas capacidades e tecnologias industriais críticas identificadas. Este objetivo está estreitamente relacionado com a necessidade de uma boa avaliação e coordenação para garantir que essas tecnologias possam ser dominadas, retidas e produzidas a nível europeu, permitindo à UE tomar decisões e agir autonomamente se tal for necessário.

3.9.

O CESE aprova a opção de apoiar o setor da defesa numa política industrial orientada pela procura.

3.10.

O CESE concorda que uma maior eficiência nos orçamentos nacionais deve tornar possível suprir todas as necessidades europeias de equipamento de defesa.

3.11.

O CESE concorda que a coerência entre os programas a nível europeu deve permitir aumentar a dimensão do mercado europeu servido pela indústria da defesa europeia.

3.12.

O CESE defendeu, como condição essencial para o desenvolvimento de capacidades de defesa comuns, o reforço de uma base industrial e tecnológica para a defesa europeia.

3.13.

O CESE salienta que a União Europeia deve envidar esforços para desenvolver uma mão de obra altamente qualificada e para manter no seu território os trabalhadores com essas qualificações.

3.14.

O CESE propõe que a União Europeia intensifique os esforços para harmonizar as regras relativas à exportação dentro da União.

3.15.

O CESE apoia firmemente a especial atenção concedida às PME, incluindo as que trabalham na área da investigação e desenvolvimento para fins de defesa.

3.16.

O Comité opôs-se à utilização para fins de defesa de fundos atuais que servem propósitos de ordem económica ou social.

3.17.

O CESE opôs-se a uma contabilização separada, para efeitos do Pacto de Estabilidade e Crescimento, dos recursos orçamentais nacionais afetados à defesa. As despesas com a defesa não devem desequilibrar as finanças públicas.

3.18.

O CESE apoiou a criação de um Fundo Europeu de Defesa com duas vertentes que incidem na investigação e no desenvolvimento de capacidades. Este instrumento pode apoiar a conceção de um processo de planeamento integrado para investimentos em todo o ciclo tecnológico. As decisões relativas à contratação pública continuam a ser da competência dos Estados-Membros. Uma forma de contratação conjunta, porém, pode reforçar a eficiência do lado da procura e contribuir para a competitividade e a eficiência da indústria da defesa europeia. O orçamento da UE para apoio das atividades de defesa não deve substituir as despesas com a defesa nacionais, mas impulsionar e acelerar uma maior e melhor cooperação no domínio da defesa. No mesmo sentido, o orçamento da UE para a investigação no domínio da defesa não deve retirar recursos à investigação civil noutros setores. O objetivo do FED é promover programas de cooperação e, apoiando atividades de investigação e desenvolvimento, proporcionar os incentivos necessários para fomentar a cooperação em cada fase do ciclo industrial. Embora as decisões relativas aos investimentos em matéria de defesa e aos programas de desenvolvimento da defesa continuem a ser prerrogativa dos Estados-Membros, o FED poderá trazer valor acrescentado europeu incentivando a investigação conjunta e o desenvolvimento de produtos e tecnologias no domínio da defesa.

3.19.

Além de se revestir de importância estratégica para a segurança e defesa dos cidadãos da União, o setor da indústria da defesa contribui de forma significativa para a economia e o bem-estar europeus, com um volume de negócios total de aproximadamente 100 mil milhões de EUR por ano e cerca de 500 000 postos de trabalho direta ou indiretamente ocupados por pessoas altamente qualificadas. Este setor está na origem de produtos, serviços e tecnologias de vanguarda, em que a inovação e o trabalho de investigação e desenvolvimento são essenciais para a competitividade.

3.20.

A indústria da defesa europeia, bem como a despesa com I&D, estão bastante concentradas nos seis países signatários da carta de intenções (Alemanha, Espanha, França, Itália, Reino Unido e Suécia), representando 95 % dos investimentos, a maioria das PME e empresas de média capitalização, bem como empresas de topo. Uma política europeia de defesa mais harmonizada e otimizada pode gerar ganhos de eficiência através da maior especialização de países, regiões ou empresas em determinadas tecnologias.

3.21.

Os países signatários da carta de intenções dominam o mercado da defesa europeu no que diz respeito ao número de empresas ativas e às vendas de armamento. Por exemplo, no Reino Unido, a BAE Systems é a maior empresa do setor da defesa. A SAAB é a principal empresa sueca no domínio aeroespacial e da defesa, enquanto as maiores empresas do setor em França são a Dassault Aviation, Naval Group, Safran e Thales. Na Alemanha, as empresas mais importantes incluem a Rheinmetall, ThyssenKrupp Marine Systems e Diehl. Em Itália, a Leonardo e a Fincantieri são as duas principais empresas. A Airbus, uma empresa transeuropeia, é a segunda maior da Europa neste setor, a seguir à BAE Systems. Uma outra empresa transnacional de relevo é a MBDA, uma empresa comum formada pelos três líderes europeus no domínio aeroespacial e da defesa (Airbus, BAE Systems e Leonardo), que produz mísseis e sistemas de mísseis. A KNDS, proprietária da Nexter e da KMW, também se está a tornar uma empresa transeuropeia. Importa assinalar que algumas destas empresas não operam exclusivamente no mercado da defesa, o que explica os rácios variáveis de vendas por trabalhadores.

No que se refere a empresas de menor dimensão, um estudo recente da IHS identificou quase 1 600 PME ativas no setor da defesa na Europa, estimando o número total de PME nas cadeias de abastecimento da defesa entre 2 000 a 2 500. Algumas destas PME são por natureza empresas de dupla orientação, envolvidas nos domínios civil e da defesa. Em qualquer caso, as PME desempenham um papel importante na indústria da defesa e são um motor essencial da competitividade.

3.22.

A indústria da defesa europeia não está distribuída de forma equilibrada na UE. Este facto sugere que o aumento das despesas militares pelos Estados-Membros da UE pode não beneficiar em igual medida todos os Estados-Membros. Se as despesas suplementares de um país tiverem como destino empresas de outros países, poderão surgir novos fluxos comerciais.

4.   Observações na especialidade

4.1.

O Fundo Europeu de Defesa só fará diferença se apoiar atividades realmente importantes. Assim, os seus programas devem ser estabelecidos com base num processo sólido de planeamento da defesa europeia que identifique as prioridades fundamentais da Europa em termos de capacidades.

4.2.

O CESE defende uma política de cooperação que promova a cooperação transfronteiras, o envolvimento de PME, também de Estados não signatários da carta de intenções, sem, contudo, voltar às políticas de «direito de regresso» que por vezes aumentavam a duplicação de competências.

4.3.

O CESE apoia a proposta destinada a limitar a elegibilidade para fundos europeus a empresas europeias controladas por interesses europeus e a exigir a prestação de garantias se um país terceiro participar em atividades de desenvolvimento apoiadas pelo Fundo Europeu de Defesa.

4.4.

O CESE concorda com a ideia de que a concessão de dotações europeias deve ser gerida pela Comissão Europeia, mas entende que a Agência Europeia de Defesa pode ter uma intervenção útil na definição das necessidades de equipamento de defesa e na OCCAR, retirando ensinamentos de experiências que nem sempre foram bem-sucedidas, e desempenhar o seu papel na gestão de programas, já que a duplicação de competências no terreno prejudicaria a eficácia do sistema.

4.5.

O CESE apoia a ideia de que as atividades de investigação e desenvolvimento devem ser submetidas à apreciação de um comité de ética. As condições éticas devem ser definidas claramente e aferidas logo na avaliação da proposta, a fim de garantir segurança jurídica e clareza.

4.6.

O CESE subscreve a ideia de uma soberania industrial europeia, mas questiona-se sobre a sua tradução política, dado que a maioria dos Estados-Membros da União Europeia se sentem parte integrante da Aliança Atlântica e outros continuam fiéis a um conceito nacional de soberania.

4.7.

O CESE está preocupado com o futuro da cooperação com o Reino Unido após o Brexit e defende uma segurança e uma parceria fortes que incluam o envolvimento do Reino Unido no FED.

4.8.

Atingidos pela globalização, que cria ruturas de muitas formas, os europeus já compreenderam alguns dos seus erros e das suas ilusões. O seu maior erro é a inação. A política de contenção estratégica, que nos permitiu colocar a tónica na economia e nos trouxe tanta prosperidade durante a Guerra Fria e até ao virar de século, transformou-se agora no principal obstáculo da Europa.

4.9.

A Europa, durante muito tempo, impôs a sua vontade ao mundo, primeiro por si só e, mais tarde, com os EUA. Num mundo em que o aquecimento global e os regimes autoritários estão cada vez mais fortes, as desigualdades no desenvolvimento entre países, mas também nos próprios países, estão a tornar-se insustentáveis. O nosso continente envelhecido sente-se ameaçado, revelando uma tendência para associar, e por vezes confundir, problemas como o terrorismo e os movimentos migratórios, e falta de solidariedade nos Estados-Membros e entre estes, num contexto de ressurgimento do nacionalismo e do autoritarismo, que coloca pressão sobre as democracias europeias. Um instrumento estratégico industrial tão interessante como o Fundo Europeu de Defesa não dispensa a União Europeia de levar a cabo reflexões políticas sobre o que se pretende defender e como fazê-lo.

4.10.

A defesa europeia já não se baseia apenas em ameaças estratégicas, intervenções externas, capacidade militar, inovação tecnológica e excelência industrial. Uma vez que a maior ameaça enfrentada hoje pelos europeus é o questionamento da própria democracia europeia, a política de defesa comum já não pode ignorar esta dimensão política.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/82


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização (FEG)»

[COM(2018) 380 final]

(2019/C 110/16)

Relator:

Vladimír NOVOTNÝ

Correlator:

Pierre GENDRE

Consulta

Parlamento Europeu, 11.6.2018

Conselho, 22.6.2018

Base jurídica

Artigos 175.o, n.o 3, e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Comissão Consultiva das Mutações Industriais (CCMI)

Adoção pela CCMI

22.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

201/1/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com a proposta da Comissão, que permitirá a prossecução do funcionamento do Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização (FEG) após 31 de dezembro de 2020. O CESE recomenda que o âmbito de aplicação do FEG, alargado para abranger os despedimentos resultantes não só de graves perturbações económicas, mas também de uma eventual nova crise financeira e económica mundial, tenha em consideração as transformações substanciais do emprego provocadas, por exemplo, pelo desenvolvimento digital, pela inteligência artificial, pela transição para uma economia descarbonizada e pelas eventuais consequências de uma contração do comércio mundial. O FEG deveria, pois, tornar-se um instrumento permanente para atenuar os efeitos negativos dos desafios do século XXI no mercado do trabalho.

1.2.

Constatando a existência de uma certa confusão entre os papéis dos diferentes fundos europeus, o Comité recomenda a divulgação de informações claras e simples a todas as partes interessadas sobre o alcance das respetivas intervenções e das suas possíveis complementaridades. O CESE recorda que o FEG não pretende substituir, mas sim complementar, se for caso disso, os dispositivos legais nacionais ou resultantes de convenções coletivas.

1.3.

O Comité solicita aos governos dos Estados-Membros que criem, em cooperação com a Comissão, mecanismos à escala nacional para reforçar as estruturas administrativas dentro das suas capacidades, a fim de facilitar e tornar mais eficazes a preparação das candidaturas à intervenção do FEG em prol das pequenas e médias empresas e a concessão de apoio aos trabalhadores que tenham perdido o emprego.

1.4.

O CESE reitera o seu pedido de que os parceiros sociais e as demais organizações da sociedade civil participem no processo de pedido de financiamento desde o início do procedimento e durante todas as fases de tramitação das candidaturas à intervenção do FEG, tanto ao nível das empresas como das regiões, dos Estados-Membros e da UE.

1.5.

O Comité é a favor da proposta da Comissão de os trabalhadores despedidos e os trabalhadores independentes cuja atividade tenha cessado terem igualdade de acesso ao FEG, independentemente do seu tipo de contrato de trabalho ou relação laboral.

1.6.

O Comité insta os Estados-Membros e as instituições da União envolvidos no processo decisório do FEG a fazer tudo o que estiver ao seu alcance para reduzir o tempo de tramitação e para simplificar os procedimentos, de modo a assegurar uma adoção rápida e sem problemas das decisões sobre a mobilização do FEG.

1.7.

O CESE convida os Estados-Membros a prestar especial atenção às categorias desfavorecidas da população, nomeadamente os jovens desempregados, os desempregados de idade mais avançada e as pessoas em risco de pobreza, dado que estes grupos têm particular dificuldade em encontrar um emprego estável.

1.8.

O Comité relembra vivamente que, no interesse dos beneficiários, a assistência deverá ser disponibilizada o mais rápida e eficazmente possível.

2.   Contexto (incluindo a proposta legislativa em apreço)

2.1.   Origens e evolução do Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização

2.1.1.

O Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização (FEG) foi instituído pelo Regulamento (CE) n.o 1927/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho (1) para o período de programação de 2007-2013, com vista a facilitar o regresso dos trabalhadores ao emprego nos domínios, setores, territórios ou mercados de trabalho que sofreram o choque de uma grave perturbação económica. O FEG presta apoio às pessoas, mas não apoia as empresas em dificuldades.

2.1.2.

No contexto da evolução da crise económica e financeira, a Comissão procedeu, em 2008, à revisão do FEG para alargar o respetivo âmbito de aplicação entre 1 de maio de 2009 e 30 de dezembro de 2011 e aumentar a taxa de cofinanciamento de 50 % para 65 %, reduzindo assim os encargos para os Estados-Membros.

2.1.3.

O âmbito de aplicação do FEG foi alargado em 2009, a fim de incluir também os trabalhadores despedidos em consequência direta da crise económica e financeira mundial.

2.1.4.

Para o período de vigência do Quadro Financeiro Plurianual de 2014-2020, o âmbito de aplicação do FEG foi novamente alargado pelo Regulamento (UE) n.o 1309/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho (2). O seu alargamento permitiu abranger os despedimentos resultantes não só de importantes mudanças estruturais no comércio mundial, mas também de uma eventual nova crise financeira e económica mundial.

2.1.5.

Em 17 de novembro de 2017, o Pilar Europeu dos Direitos Sociais foi proclamado conjuntamente pelo Parlamento Europeu, pelo Conselho e pela Comissão. Os seus princípios servirão de quadro de referência fundamental do Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização.

2.2.   Nova proposta relativa ao FEG após 2020

2.2.1.

O principal objetivo da nova proposta consiste em zelar por que o FEG, um instrumento especial que está fora dos limites máximos orçamentais do Quadro Financeiro Plurianual, continue a funcionar por um período indefinido após 31 de dezembro de 2020.

2.2.2.

O FEG pode também prestar assistência em caso de crises inesperadas conducentes a graves perturbações na economia local, regional ou nacional. Estas crises inesperadas podem assumir a forma de uma recessão grave que afete importantes parceiros comerciais ou um colapso do sistema financeiro.

2.2.3.

O apoio prestado pelo FEG é acessível aos trabalhadores, independentemente do seu contrato ou vínculo de trabalho. É possível incluir não só as pessoas com contratos de trabalho de duração indeterminada, mas também os trabalhadores com contratos a termo, os trabalhadores temporários, os proprietários-gestores de microempresas e os trabalhadores independentes.

2.2.4.

A candidatura à intervenção do FEG pode ser apresentada quando é atingido um nível mínimo de despedimentos. O limiar de 250 trabalhadores é mais baixo do que no período de programação de 2014-2020. Em muitos Estados-Membros, a maioria dos trabalhadores exerce a sua atividade em pequenas e médias empresas (PME).

2.2.5.

A tónica do FEG incide nas medidas ativas do mercado de trabalho destinadas a reintegrar rapidamente os trabalhadores despedidos num emprego estável. O FEG não pode contribuir para o financiamento de medidas passivas. Só podem ser incluídos subsídios se forem concebidos como incentivos para facilitar a participação dos trabalhadores despedidos em medidas ativas do mercado de trabalho, e a quota-parte dos subsídios num pacote coordenado de medidas ativas é limitada.

2.2.6.

Os Estados-Membros só solicitam a mobilização do FEG em situações de emergência. O FEG não pode substituir medidas já cobertas por fundos e programas da União incluídos no Quadro Financeiro Plurianual, nem medidas nacionais ou outras medidas que sejam da responsabilidade das empresas que procedem aos despedimentos, por força da legislação nacional ou de convenções coletivas.

2.2.7.

Uma candidatura à intervenção do FEG deve ser desencadeada sempre que um processo de reestruturação importante tenha um impacto significativo na economia local ou regional.

2.2.8.

Até 31 de dezembro de 2021, deve ser realizada uma avaliação ex post do regulamento em vigor.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE congratula-se com a proposta da Comissão, que permitirá a prossecução do funcionamento do FEG após 31 de dezembro de 2020. No passado, o Comité adotou um conjunto de pareceres relativos ao FEG, nos quais manifestou o seu apoio ao mesmo. O CESE considera que estes pareceres se mantêm válidos (3) (4) (5) (6).

3.2.

O Comité sublinha a importância contínua do papel do FEG enquanto fundo flexível para apoiar os trabalhadores que perderam os seus empregos na sequência de importantes processos de reestruturação e para os ajudar a encontrar um posto de trabalho o mais rapidamente possível. Recomenda que se tenha em conta a situação dos trabalhadores sujeitos a uma redução prolongada do tempo de trabalho sem um mecanismo de compensação das reduções salariais.

3.3.

Na opinião do Comité, seria sensato recolher dados de acompanhamento mais detalhados, em especial no que se refere à categoria de trabalhadores, à sua formação académica e experiência profissional, ao seu estatuto profissional e ao tipo de emprego encontrado. Tendo em conta a complexidade administrativa que uma tal iniciativa pressupõe e os encargos que representa, o Comité apoia, como solução alternativa, a recolha destas informações por meio de questionários em linha dirigidos aos beneficiários, conforme proposto pela Comissão.

3.4.

O Comité é a favor da proposta da Comissão de os trabalhadores despedidos e os trabalhadores independentes cuja atividade principal tenha cessado terem igualdade de acesso ao FEG, independentemente do seu tipo de contrato de trabalho ou relação laboral.

3.5.

O CESE considera que as contribuições financeiras do FEG deveriam ser orientadas principalmente para medidas ativas do mercado de trabalho, cujo objetivo consiste em reintegrar rapidamente os beneficiários num emprego sustentável. Importa também promover o apoio à mobilidade profissional e geográfica dos trabalhadores, a fim de facilitar a sua recolocação.

3.6.

O CESE regista que o montante máximo do FEG é fixado em 225 milhões de EUR por ano para o período de 2021-2027 e considera que esta dotação é adequada à situação económica atual da União. Observa, contudo, que, em caso de recaída numa crise mais profunda ou em situações como uma aceleração da evolução tecnológica e da transformação energética, esta dotação poderá revelar-se insuficiente.

3.7.

O Comité recomenda que, na fase intercalar do Quadro Financeiro Plurianual, se proceda a uma reavaliação do FEG tanto da perspetiva do estado da execução das dotações como da perspetiva do limiar mínimo de 250 trabalhadores despedidos, e solicita à Comissão que prepare, em cooperação com a autoridade orçamental da UE, uma adaptação consequente do financiamento do FEG.

3.8.

A Comissão deve prever, nestes casos, aumentar os recursos financeiros correspondentes, elevando-os a um valor próximo dos mil milhões de EUR. Tendo em consideração que o FEG é concebido como um fundo de emergência, há também que garantir que os processos decisórios relativos a este aumento da dotação sejam os mais curtos possíveis.

3.9.

O CESE convida os Estados-Membros a prestar especial atenção às categorias desfavorecidas da população, nomeadamente os jovens desempregados, os desempregados de idade mais avançada e as pessoas em risco de pobreza, dado que estes grupos têm particular dificuldade em encontrar um emprego estável.

3.10.

Os Estados-Membros e as instituições da União envolvidos no processo decisório do FEG deverão fazer tudo o que estiver ao seu alcance para reduzir o tempo de tramitação e para simplificar os procedimentos, de modo a assegurar uma adoção rápida e sem problemas das decisões de mobilização do FEG. O Comité relembra vivamente que, no interesse dos beneficiários, a assistência deverá ser disponibilizada o mais rápida e eficazmente possível.

3.11.

O CESE congratula-se com o facto de o Pilar Europeu dos Direitos Sociais constituir um quadro de referência fundamental do FEG, que permitirá à União traduzir os princípios em práticas em caso de reestruturações importantes. Tendo em conta a dificuldade em isolar um fator específico causador de despedimentos, o CESE recomenda que, no futuro, a mobilização do FEG se baseie, acima de tudo, no critério da magnitude do impacto de um processo de reestruturação associado não só aos processos de globalização, mas também aos processos de outras mudanças profundas, como, por exemplo, a descarbonização, a digitalização e a indústria 4.0, bem como a evolução tecnológica e os processos de transformação conexos, assim como as mudanças provocadas por um grande leque de causas que poderão estar na origem das deslocalizações ou despedimentos em massa ou de uma crise económica ou financeira. Neste contexto, o CESE congratula-se expressamente com o alargamento do âmbito de aplicação do FEG aos riscos no mercado de trabalho provocados pelas mudanças estruturais causadas pela digitalização e pela evolução no domínio da descarbonização.

3.12.

O CESE está convencido de que é necessário harmonizar melhor o FEG com as outras políticas da UE e detalhar ainda mais as modalidades de ação conjunta do FEG com outros fundos e programas (como, por exemplo, o FEAD, o FSE, o EaSI, o Programa de Saúde da UE), bem como a interação entre eles.

3.13.

Tendo em conta o título do fundo e os objetivos contraditórios para ele definidos, e não esquecendo o interesse de manter a sua sigla inglesa «EGF», o CESE propõe que se altere o título «Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização» para «Fundo Europeu de Ajustamento e Globalização», ou para outro título que preserve a sigla «EGF» referida.

3.14.

O Comité entende que será útil, no próximo período, alargar o âmbito de aplicação do FEG ao apoio a programas como os desenvolvidos à escala nacional do tipo de emprego de curta duração («Kurzarbeit») ou de desemprego parcial («short time»).

4.   Pequenas e médias empresas

4.1.

As pequenas e médias empresas asseguram cerca de 80 % dos postos de trabalho na UE, sendo, ao mesmo tempo, as mais vulneráveis em caso de crises ou transformações. Por esse motivo, o Comité solicita aos governos dos Estados-Membros que criem, em cooperação com a Comissão, mecanismos à escala nacional e que reforcem as estruturas administrativas dentro das suas capacidades, de modo a facilitar e a tornar mais eficazes a preparação das candidaturas das pequenas e médias empresas à intervenção do FEG e a concessão de apoio aos trabalhadores que tenham perdido o emprego.

4.2.

O CESE apoia a proposta que consiste em pôr em pé de igualdade os trabalhadores por conta de outrem e os trabalhadores independentes (artigo 7.o), sob reserva de não acumulação entre o trabalho independente e o emprego por conta de outrem e em caso de cessação da atividade principal.

4.3.

O Comité aprova a proteção dos proprietários de microempresas que podem perder o seu trabalho em resultado de uma crise económica ou financeira ou da evolução tecnológica, bem como a possibilidade de essas pessoas obterem assistência financiada pelo FEG. Tal não deve significar que um «trabalhador independente» será definido como «uma pessoa que empregava menos de 10 trabalhadores», como indicado no artigo 4.o da proposta de regulamento apresentada pela Comissão. Tal definição produziria vários efeitos diferentes nos atos legislativos europeus, pois qualificaria de forma idêntica categorias diferentes de atividade profissional e económica. Solicita à Comissão que encontre outra solução para concretizar o objetivo de proteger os proprietários de microempresas, que merece a aprovação do Comité.

4.4.

O CESE propõe à Comissão que, em cooperação com os Estados-Membros, os resultados do FEG sejam melhorados através de uma campanha de informação dirigida, inclusive, às pequenas e médias empresas, a fim de permitir aos seus trabalhadores tirar maior partido das possibilidades de concessão de apoio oferecidas pelo FEG.

4.5.

O CESE congratula-se com a nova configuração dos critérios de intervenção (artigo 5.o), que presta especial atenção à situação das pequenas e médias empresas, que representam uma grande parte do emprego por conta de outrem. Importa, em especial, e não obstante o limiar de 250 trabalhadores, ter em conta a noção de grupo e/ou de agrupamento territorial quando várias filiais de um mesmo grupo confrontadas com despedimentos não atingem este limiar a título individual.

5.   Observações na especialidade

5.1.

O CESE recomenda uma maior flexibilidade relativamente ao cálculo dos despedimentos e da cessação de atividade (artigo 6.o), aos beneficiários elegíveis (artigo 7.o) e às medidas elegíveis (artigo 8.o), para que o apoio chegue aos trabalhadores afetados o mais rapidamente possível.

5.2.

O Comité recomenda também a simplificação máxima dos procedimentos administrativos ligados à apresentação das candidaturas (artigo 9.o), bem como a aceleração de todo o processo. A simplificação dos documentos e a prestação de assistência técnica aos Estados-Membros, quando necessário, são elementos suscetíveis de alargar o âmbito das intervenções do FEG.

5.3.

O Comité está convencido de que é indispensável simplificar as medidas administrativas (ponto 2 do anexo da proposta de regulamento), nomeadamente as disposições em matéria de acompanhamento e de apresentação de relatórios, os sistemas de gestão e de controlo e as medidas de prevenção de fraudes e irregularidades.

5.4.

O CESE aprova a restrição da elegibilidade para a contribuição financeira do FEG referida no artigo 8.o, n.o 2, alínea b), onde se explica que as medidas apoiadas pelo FEG não substituem a responsabilidade das empresas, por força da legislação ou de convenções coletivas nacionais. Esta disposição não deve excluir em geral, dos vários apoios potenciais do FEG, as medidas de mercado assentes em convenções coletivas.

5.5.

O Comité espera que, no âmbito da avaliação ex post prevista do FEG, a Comissão preste mais atenção à análise das causas das disparidades entre os Estados-Membros da UE no recurso ao FEG e, em especial, das causas que levaram a um recurso tão raro, ou até mesmo nulo, ao FEG, nomeadamente na Bulgária, na República Checa, na Estónia, na Croácia, em Chipre, na Letónia, no Luxemburgo, na Hungria, em Malta, na Eslováquia e no Reino Unido.

5.6.

O CESE reitera o seu pedido de que os parceiros sociais e as demais organizações da sociedade civil participem no processo de pedido de financiamento desde o início do procedimento e durante todas as fases de tramitação das candidaturas à intervenção do FEG, tanto ao nível das empresas como das regiões, dos Estados-Membros e da UE. Tendo em conta o seu conhecimento exato da situação e das especificidades locais, as estruturas regionais e os municípios também podem desempenhar um papel importante neste domínio.

5.7.

O Comité recomenda à Comissão que explicite no regulamento que a definição de «trabalhadores» abrange igualmente os sócios-trabalhadores das cooperativas.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  JO L 406 de 30.12.2006, p. 1.

(2)  Regulamento (UE) n.o 1309/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, relativo ao Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização (2014-2020) e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1927/2006 (JO L 347 de 20.12.2013, p. 855).

(3)  JO C 318 de 23.12.2006, p. 38.

(4)  JO C 228 de 22.9.2009, p. 141.

(5)  JO C 376 de 22.12.2011, p. 92.

(6)  JO C 143 de 22.5.2012, p. 17.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/87


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria o programa Europa Criativa (2021-2027) e que revoga o Regulamento (UE) n.o 1295/2013»

[COM(2018) 366 final]

(2019/C 110/17)

Relatora:

Emmanuelle BUTAUD-STUBBS

Correlator:

Zbigniew KOTOWSKI

Consulta

Parlamento Europeu, 14.6.2018

Conselho, 21.6.2018

Decisão da Mesa

19.6.2018

Base jurídica

Artigos 173.o, n.o 3, e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Comissão Consultiva das Mutações Industriais (CCMI)

Adoção pela CCMI

22.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

207/2/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe favoravelmente a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria o programa Europa Criativa (2021-2027) [COM(2018) 366 final] e os seus indicadores definidos no anexo II. A construção de uma Europa forte e unida deve assentar na diversidade de raízes culturais, que devem ser transmitidas através da educação. A prossecução deste programa deve ser vista como altamente benéfica para o desenvolvimento da cultura europeia e das culturas de cada um dos Estados-Membros, sendo estas o pilar da nossa sociedade e o berço dos nossos valores democráticos.

1.2.

Durante muitos anos, o CESE promoveu os contributos significativos dos setores e indústrias criativos e culturais para a criação de valor e emprego na UE, a integração e o crescimento (1). Em 2012, de acordo com a OCDE, as indústrias com utilização intensiva de direitos de autor (2) na UE representavam 4,2 % do PIB e 3,2 % do emprego. De acordo com o artigo 2.o da proposta de regulamento [COM(2018) 366], esses setores incluem «a arquitetura, os arquivos, as bibliotecas e os museus, o artesanato, o audiovisual (em particular o cinema, a televisão, os jogos de vídeo e as atividades multimédia), o património cultural material e imaterial, o design (incluindo o design de moda), os festivais, a música, a literatura, as artes do espetáculo, os livros e a edição, a rádio e as artes plásticas».

1.3.

Tendo em conta a natureza específica dos atos e processos criativos e que nem sempre se inserem facilmente no quadro geral do direito do trabalho, o CESE está plenamente consciente dos desafios sociais que devem ser abordados em alguns Estados-Membros: a melhoria das condições de trabalho, a supressão das horas não pagas, a luta contra as disparidades entre géneros, a promoção de condições dignas de trabalho, a melhoria das condições de saúde e segurança, a facilitação da mobilidade, a integração de pessoas com deficiência e de pessoas em situação de exclusão, as políticas contra o assédio sexual, etc.

1.4.

O CESE considera que o orçamento previsto de 1,8 mil milhões de EUR não é suficiente para cumprir os objetivos ambiciosos do programa Europa Criativa 2021-2027, razão pela qual solicita um orçamento maior. Este investimento significativo na criatividade da Europa, dos seus artistas, criadores, músicos, escritores, fotógrafos, arquitetos, inventores de jogos de vídeo, cineastas, etc., ajudará a UE a competir com sucesso com países grandes que dispõem de estratégias de influência deliberadas (EUA, Japão e Coreia do Sul) a nível nacional e em organizações internacionais. O financiamento da UE deve ser complementado por financiamentos públicos nacionais e regionais. Os incentivos fiscais específicos também poderiam atrair a filantropia (por exemplo, a recuperação do património) e facilitar o financiamento coletivo para a criação de novos modelos de negócio.

1.5.

O CESE considera também necessário investir em instrumentos jurídicos e técnicos para combater mais eficazmente todas as formas de promoção da violência e da discriminação, nomeadamente na produção de jogos de vídeo em linha para crianças e jovens.

1.6.

O CESE apoia a inclusão de uma dimensão criativa e cultural na política externa da UE (política comercial, relações internacionais, etc.) (3).

1.7.

Este esforço financeiro sem precedentes deve ser alcançado através de três vias:

um orçamento reforçado para o programa Europa Criativa de 1 930 000 EUR em vez de 1 850 000 EUR para 2021-2027, que inclua um financiamento suplementar de 80 milhões de EUR à vertente INTERSETORIAL, por forma a permitir a realização de projetos de fertilização cruzada entre as próprias indústrias criativas e culturais (música, moda, design, arte, cinema, edição, etc.) e entre estas e outras indústrias, bem como mais recursos financeiros para mais formação no domínio dos meios de comunicação social, num contexto em que o pluralismo destes últimos foi recentemente contestado na UE;

apoio financeiro à cultura e à criação numa vasta gama de programas da UE, a fim de «melhorar o processo de integração da cultura nas outras políticas setoriais, do que resultariam benefícios mútuos tanto para a cultura como para o setor em causa» (4): Horizonte 2020, Fundo Social Europeu, Europa Digital, Fundo de Coesão, Erasmus;

apoio contínuo ao Mecanismo de Garantia Financeira destinado às «indústrias criativas e culturais», no intuito de conceder garantias, e, se necessário, apoio de tipo de participação no capital às PME e às empresas em fase de arranque.

1.8.

Esta ambição renovada de uma Europa mais cultural e criativa beneficiará também vários setores e cadeias de valor industriais da UE, desde os têxteis, o vestuário, o couro, o mobiliário, a cerâmica, os brinquedos, o turismo, a arte e o artesanato ao setor automóvel, passando pela construção, a saúde e o bem-estar, a energia verde, etc., graças à integração da criatividade, do design e das tecnologias de ponta. Na Europa, há muitos exemplos da transição bem-sucedida em determinados municípios ou regiões industriais para indústrias criativas que geram mais valor acrescentado (Turim).

1.9.

As oportunidades oferecidas pela «revolução digital» nas indústrias com utilização intensiva de direitos de autor são particularmente importantes, pelo que cumpre promover o investimento adequado em equipamento e software (inteligência artificial, cadeia de blocos, impressão 3D, digitalização de arquivos, por exemplo), bem como em formação.

1.10.

O potencial de inovação destas indústrias é ilimitado, uma vez que dependem maioritariamente da criatividade, das competências e da imaginação individuais. É por esta razão que as indústrias criativas e culturais devem ter um orçamento específico no âmbito do Horizonte 2020 [de pelo menos 3 mil milhões de EUR, que representa um pouco menos do que o seu peso no PIB da UE (4,2 %)].

1.11.

As grandes operações de fusão que se estão a realizar no mercado norte-americano terão impacto nas indústrias culturais e criativas da UE. Neste contexto, o CESE solicita à Comissão Europeia que lance, em 2019, um concurso para a apresentação de um relatório de informações comerciais sobre as principais tendências económicas e tecnológicas nos EUA que afetam os meios de comunicação social, o cinema e o audiovisual e as suas possíveis consequências para os seus homólogos da UE nas atividades de produção, consumo e distribuição.

1.12.

Dado que a UE27 poderia beneficiar consideravelmente de um diálogo permanente com o Reino Unido, que é um interveniente fundamental nestas indústrias, o CESE solicita à Comissão Europeia que apoie qualquer diálogo bilateral entre governos e redes que possa abrir caminho a um acordo bilateral, a fim de prosseguir programas bilaterais ambiciosos no âmbito do programa Europa Criativa 2021-2027. Acordos bilaterais semelhantes foram celebrados no passado (2014-2020) com países terceiros, nomeadamente a Geórgia, a Sérvia ou a Ucrânia.

2.   Observações na generalidade

2.1.   Um novo nível de ambição

2.2.

A proposta de regulamento em apreço [COM(2018) 366] baseia-se no artigo 3.o do Tratado da União Europeia, o qual dispõe que a UE tem por objetivo «promover a paz, os seus valores e o bem-estar dos seus povos» e que «respeita a riqueza da sua diversidade cultural e linguística e vela pela salvaguarda e pelo desenvolvimento do património cultural europeu». No entanto, existe uma perceção clara de que há um maior número de desafios a enfrentar, nomeadamente a concorrência de motores de pesquisa e plataformas em linha, a concentração do setor em torno de um número limitado de intervenientes importantes ou a crescente «desinformação».

2.3.

Com este novo programa, a Comissão Europeia quer oferecer aos operadores oportunidades para desenvolverem iniciativas europeias transfronteiras, tecnologicamente inovadoras e criativas, com vista a intercambiar, coproduzir e distribuir obras europeias. O objetivo é igualmente reforçar a posição dos intervenientes da UE nos mercados da UE e mundial. Exemplos de boas práticas neste domínio podem ser encontrados nas atividades realizadas no âmbito do fundo EURIMAGES do Conselho da Europa.

2.4.   Um orçamento maior, mas ainda insuficiente

2.4.1.

O orçamento proposto de 1,85 mil milhões de EUR para 27 Estados-Membros é superior ao atual, mas representa apenas 1/1 000 do Quadro Financeiro Plurianual global da UE para 2021-2027, o qual corresponde a 1 135 mil milhões de EUR.

2.5.

O orçamento proposto pela Comissão está dividido em três partes:

vertente CULTURA, com 609 milhões de EUR (33 % do orçamento total em relação a 31 % do orçamento total do programa Europa Criativa 2014-2020),

vertente MEDIA, com 1 081 milhões de EUR (58 % do orçamento total em relação a 56 % do orçamento total do programa Europa Criativa 2014-2020),

vertente INTERSETORIAL, com 160 milhões de EUR (9 % do orçamento total em relação a 13 % do orçamento total do programa Europa Criativa 2014-2020).

2.5.1.

O CESE solicita um orçamento suplementar de 80 milhões de EUR para a vertente INTERSETORIAL, destinado a desenvolver plenamente o potencial dos projetos de «fertilização cruzada» (5) (economia digital, turismo, arte, luxo, cultura, impressão digital…) e a identificar mais respostas práticas no domínio da literacia mediática.

2.5.2.

O objetivo de apoiar projetos prioritários destinados a um público alargado é adequado ao setor audiovisual (vertente MEDIA), mas não deve aplicar-se a todas as atividades culturais, em particular nas zonas rurais. A coesão social e a inserção social estão no centro do projeto europeu.

2.6.   O impacto do Brexit na criação e na cultura

2.6.1.

Este novo programa decorrerá na UE27 após a saída do Reino Unido, que é um dos Estados-Membros em que as indústrias criativas e culturais desempenham um papel fundamental (90 mil milhões de libras esterlinas em 2016, 2 milhões de trabalhadores). O CESE considera essencial para a dinâmica da Europa Criativa manter fortes relações culturais com o Reino Unido e encorajar, sempre que possível e necessário, a cooperação bilateral. O objetivo de um acordo bilateral específico e adaptado com o Reino Unido para a execução de ações e programas deve ser prosseguido com base no artigo 8.o do regulamento proposto e em conformidade com a revisão da Diretiva Serviços de Comunicação Social Audiovisual.

2.7.   Lições retiradas do anterior programa Europa Criativa 2014-2020

2.7.1.

As principais limitações identificadas nos diversos estudos de avaliação solicitados pela CE foram as seguintes:

orçamentos insuficientes para ter um impacto significativo a nível da UE ou setorial,

financiamento demasiado fragmentado para o programa MEDIA,

complexidade excessiva do acesso aos programas e financiamento da UE, bem como da elaboração de relatórios administrativos conexos, em especial para as PME, os particulares e os novos candidatos,

distribuição desigual dos fundos segundo os Estados-Membros.

2.7.2.

Durante uma audição organizada em Paris (6 de outubro de 2016) por Sylvia Costa, presidente do Comité da Cultura e da Educação, as partes interessadas identificaram outras questões concretas:

a taxa de êxito da vertente CULTURA é demasiado baixa: 11 %,

a duração máxima de uma tradução literária é demasiado curta: 2 anos,

o número de países terceiros que podem participar em determinados projetos é demasiado restrito,

o conceito de «experimentação» deve ser promovido e apoiado, bem como o de «inovação».

A fim de ter em conta estas críticas, a Comissão propõe algumas simplificações para 2021-2027:

maior flexibilidade para adaptar os programas de trabalho a circunstâncias imprevistas,

mais acordos-quadro de parceria e subvenções em cascata,

mais incentivos para recompensar resultados relacionados com a capacidade de chegar a um público mais alargado,

recurso sistemático a formulários e relatórios eletrónicos e obrigações de comunicação de informações aligeiradas.

2.8.   Vertente Cultura

2.8.1.

O orçamento global de 609 milhões de EUR apoiará a circulação transfronteiras de obras e a mobilidade de operadores criativos, incentivará parcerias, redes e plataformas que visam chegar a um público mais alargado dentro e fora da Europa para obras e operadores culturais e criativos europeus e promoverá a identidade, o património e os valores europeus através da sensibilização cultural, a educação artística e a criatividade na educação. Serão também apoiadas ações especiais da UE, como a iniciativa Capitais Europeias da Cultura, os prémios culturais da UE e a Marca do Património Europeu. Outra prioridade é promover o reforço internacional de capacidades, para que os setores culturais e criativos europeus possam assumir um papel ativo a nível internacional.

O CESE gostaria de acrescentar à proposta de regulamento um parágrafo sobre a criatividade popular e «amadora», já que foi precisamente esta forma de criatividade que lançou as bases para o desenvolvimento e a disseminação de uma sensibilidade genuinamente humanista e artística.

2.9.   Vertente Media

2.9.1.

Este programa abrange meios de comunicação social audiovisual, cinema e jogos de vídeo, com um orçamento global de 1 081 000 EUR. Está associado a alguns instrumentos legislativos específicos: a revisão do quadro dos direitos de autor e a revisão da Diretiva dos Serviços de Comunicação Social Audiovisual.

2.9.2.

O primeiro [COM(2016) 593 final] foi adotado pelo Parlamento Europeu (12 de setembro de 2018) na primeira leitura.

Esta proposta tem três objetivos principais: a) melhorar o acesso a conteúdos em linha e transfronteiras para programas de televisão e de rádio em plataformas de vídeo a pedido; b) harmonizar e modernizar as exceções aos direitos de autor na legislação da UE nos domínios do ensino, da investigação e da preservação do património cultural; c) criar um mercado de direitos de autor que funcione bem para editores de imprensa, autores e artistas que produzam conteúdos para plataformas em linha.

2.9.3.

A revisão da Diretiva dos Serviços de Comunicação Social Audiovisual prossegue vários objetivos: oferecer novas oportunidades de promoção às obras europeias dentro (pelo menos 30 % das obras da UE em plataformas de vídeo em linha) e fora da UE, promover a cooperação ao longo da cadeia de valor, desde as primeiras fases da produção até à distribuição e à exibição, e aumentar o nível de proteção das crianças e dos consumidores.

2.9.4.

O orçamento de 1 081 000 EUR consagrado ao setor audiovisual europeu, incluindo a indústria cinematográfica, a televisão e os jogos de vídeo, tem os seguintes objetivos: a) incentivar a colaboração e a inovação na produção de obras audiovisuais europeias; b) melhorar a distribuição cinematográfica e em linha além-fronteiras; c) apoiar a influência internacional das obras audiovisuais europeias através de uma melhor promoção e distribuição internacional de obras europeias e narrativas inovadoras, incluindo a realidade virtual.

2.10.   Vertente Intersetorial

2.10.1.

Está previsto um orçamento global de 160 milhões de EUR para apoiar o surgimento de projetos intersetoriais entre intervenientes criativos e culturais (música, meios de comunicação social, literatura, arte, etc.), a fim de ajudar os centros do programa Europa Criativa a promoverem o programa no seu país e a reforçar «um ambiente mediático livre, diverso e pluralista, do jornalismo de qualidade e da literacia mediática» [artigo 6.o, alínea c), COM(2018) 366 final].

2.10.2.

O CESE considera este último objetivo fundamental: em 2017, vários Estados-Membros perderam terreno em termos de liberdade de imprensa. Neste contexto específico, o CESE solicita um reforço do financiamento para apoiar a promoção da liberdade de expressão e de um ambiente mediático diversificado e pluralista, a promoção de normas de elevada qualidade em matéria de conteúdos e programas de literacia mediática para permitir que os cidadãos desenvolvam uma visão crítica dos meios de comunicação social.

3.   Observações na especialidade

3.1.   Direitos de autor na era digital

3.1.1.

Um estudo da OCDE de 2015 sobre «Direitos de autor na era digital» confirma a intensidade dos debates públicos e jurídicos sobre as formas e os meios de adaptar os regimes nacionais de direitos de autor à revolução da Internet.

Os principais temas em debate são: a) o âmbito dos direitos de autor; b) obras órfãs; c) exceções e limitações aos direitos de autor; d) o registo de direitos de autor; e) aplicação.

3.1.2.

O CESE gostaria de defender o novo direito dos direitos de autor para os editores no que diz respeito à utilização digital das suas publicações de imprensa, tal como previsto no artigo 11.o da proposta de diretiva relativa aos direitos de autor no mercado único digital, a proteção de conteúdos por serviços em linha, tal como previsto no artigo 13.o, o mecanismo de ajustamento contratual (artigo 15.o) e o mecanismo de resolução de litígios (artigo 16.o).

3.2.

Uma concorrência internacional feroz que conduza a uma estratégia clara da UE para as indústrias culturais e criativas, tanto para as políticas do mercado único como para as políticas externas (agenda internacional para a cultura, diplomacia cultural, política comercial).

3.2.1.

Empresas americanas como a Apple, com o iTunes, a maior loja de música em linha do mundo desde 2010, a Netflix, com 130 milhões de assinantes em 2017, e a YouTube, com 1 300 000 utilizadores por mês e mais de 5 mil milhões de vídeos visualizados todos os dias, detêm posições dominantes nas plataformas em linha.

3.2.2.

Na indústria cinematográfica, por exemplo (6), as produções e coproduções provenientes dos Estados Unidos representam 90 % dos filmes que registaram o maior número de entradas nas salas de cinema nesse ano [2012], com um corolário natural: existe uma predominância clara e quase indiscutível da língua inglesa.

3.2.3.

As grandes fusões que têm vindo a ser realizadas recentemente nos EUA confirmam a existência de mudanças significativas na produção, na distribuição e no consumo de conteúdos audiovisuais. Qual será o impacto dessas grandes mudanças nos EUA no setor audiovisual da UE, que continua fragmentado, com menos financiamento público e com um nível persistentemente baixo de difusão transfronteiras devido a um orçamento limitado e a barreiras linguísticas? A elaboração de um estudo independente com dados quantitativos e qualitativos afigurar-se-ia muito útil.

Outros países importantes como a China, o Japão, a Índia e o Canadá elaboraram políticas de incentivo eficientes e a longo prazo para apoiar tanto a nível interno como externo os recursos que fazem parte do seu chamado «poder persuasivo» (soft power) — A UE deve fazer o mesmo.

3.3.   Diversificação e renovação dos modelos de negócio

3.3.1.

A criação de modelos de negócio inovadores para as indústrias com utilização intensiva de direitos de autor na UE deve ser encorajada em três direções:

a)

a utilização de todas as ferramentas digitais (IA, cadeia de blocos, megadados, impressão 3D, etc.) como uma oportunidade para enriquecer o conteúdo dos bens e serviços culturais, e a forma como são disponibilizados aos consumidores;

b)

oportunidades associadas a uma melhor portabilidade de conteúdos nos projetos transfronteiras;

c)

a procura de novas formas de gerar receitas (assinaturas, pagamento por visualização, etc.) sem excluir os consumidores vulneráveis.

3.3.2.

Muitos estudos demonstram o efeito indireto das indústrias culturais e criativas e de vários setores económicos que integram uma «componente cultural ou criativa». A interface entre as indústrias culturais e criativas e as tecnologias digitais é uma importante fonte de inovação revolucionária e incremental.

3.3.3.

Naturalmente, certas atividades culturais, que beneficiam de financiamentos públicos ou privados, não devem basear-se apenas na geração de lucros. O novo programa deve cobrir igualmente as atividades «não orientadas para o mercado».

3.4.   Acesso ao financiamento

3.4.1.

Em junho de 2016, o Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos lançou um novo mecanismo de garantia para beneficiar as micro, pequenas e médias empresas nas indústrias culturais e criativas que têm dificuldade em obter empréstimos nos respetivos países. Estava previsto um montante inicial de 121 milhões de EUR para este novo mecanismo, que deverá criar 600 milhões de EUR em empréstimos e outros produtos financeiros.

3.4.2.

Após um início lento, nove Estados-Membros — Espanha, França, Roménia, Bélgica, República Checa, Finlândia, Itália, Luxemburgo e Reino Unido — celebraram acordos com o Fundo Europeu de Investimento (FEI) para uma capacidade total superior a 300 milhões de EUR em empréstimos potenciais. Em 2017, o FEI decidiu acrescentar mais 70 milhões de EUR. Segundo um relatório do FEI sobre a utilização da garantia das indústrias culturais e criativas (março de 2018), 418 «intervenientes» criativos e culturais beneficiaram deste mecanismo num montante total de 76 milhões de EUR em empréstimos, o que representa um empréstimo médio de 182 000 EUR por entidade.

3.4.3.

O CESE encoraja vivamente as autoridades competentes a nível nacional e regional, nas zonas urbanas e rurais, a promover este mecanismo específico, a fim de estimular o crescimento das indústrias culturais e criativas e de atrair investimentos e novas atividades comerciais nesses setores. É da sua responsabilidade evitar um fosso crescente entre as «cidades inteligentes», com uma forte concentração de indústrias culturais e criativas (7), e as zonas rurais.

3.5.   Assuntos sociais

3.5.1.

Os dados disponíveis em alguns Estados-Membros revelam condições de trabalho sociais injustas e insatisfatórias, nomeadamente horas não pagas, horas extraordinárias regulares, contratos temporários, empregos a tempo parcial não intencionais, más condições de saúde e segurança, fraco investimento em formação, disparidades entre géneros (8), falta de diversidade étnica, assédio sexual, baixo nível de proteção social, mobilidade insuficiente devido à dupla tributação e dificuldade de acesso a vistos para os nacionais de países terceiros.

Alguns Estados-Membros aplicaram requisitos sociais que as indústrias culturais e criativas devem cumprir para poderem aceder ao financiamento da UE, apoiando assim o modelo social europeu, em conformidade com o papel que o financiamento público pode desempenhar.

3.5.2.

Cumpre incentivar o diálogo social a nível nacional a fim de se encontrar soluções adequadas para melhorar a situação. A nível da UE, são necessários mais estudos independentes sobre as condições de trabalho nas indústrias culturais e criativas, de modo a inspirar a elaboração de novas políticas. Uma conclusão recente mostra, por exemplo, que o critério de «ocupação» pode ser mais eficaz do que o «setorial», uma vez que apenas 30,7 % dos empregos «criativos» pertencem aos setores das indústrias culturais e criativas (9).

3.5.3.   Agrupamentos e redes

Os agrupamentos regionais desempenham um papel fundamental na promoção de novos modelos de colaboração e parcerias transfronteiras. O novo programa deve incentivar a criação de novos agrupamentos e redes regionais para as indústrias culturais e criativas, bem como parcerias frutuosas entre os agrupamentos e as redes existentes (Emília-Romanha, Hamburgo, Milão, etc.), que poderiam impulsionar a expansão e as boas práticas.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  JO C 13 de 15.1.2016, p. 83, NAT/738 (JO C 440 de 6.12.2018, p. 22), SOC/590 (JO C 62 de 15.2.2019, p. 148).

(2)  As principais indústrias com utilização intensiva de direitos de autor incluem nove setores: imprensa e literatura, música, ópera e produção teatral, cinema e vídeo, fotografia, software e base de dados, artes plásticas e gráficas, publicidade e artes, bem como sociedades de gestão coletiva de direitos de autor.

(3)  Para uma estratégia da UE no domínio das relações culturais internacionais, JOIN(2016) 29 final.

(4)  Citação extraída do documento de reflexão da Presidência búlgara intitulado «O caminho a seguir: visão de longo prazo para o contributo da cultura para a UE depois de 2020», de 27 de abril de 2018.

(5)  Ver ponto 4.6 do parecer do CESE, JO C 13 de 15.1.2016, p. 83.

(6)  Diversity and the film industry: An analysis of the 2014 UIS Survey on Feature Film Statistics [A diversidade e a indústria cinematográfica: uma análise do inquérito UIS de 2014 sobre as estatísticas de longas-metragens], março de 2016, p. 31.

(7)  64 % do emprego criativo está localizado em zonas urbanas, J. Vlegels, W. Ysebaert, Creativiteit, diversiteit en werkomstandigheden: een analyse van de drietand van culturele en creatieve arbeid in België [Criatividade, diversidade e condições de trabalho: Análise das três vertentes do trabalho cultural e criativo na Bélgica], Sociologos 39, p. 241.

(8)  Ver o quadro de ações no âmbito da igualdade de género da Comissão para o Diálogo Social Setorial Audiovisual.

(9)  J. Vlegels, W. Ysebaert, Sociologos 39, p. 210-241.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/94


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo aos requisitos mínimos para a reutilização da água»

[COM(2018) 337 final]

(2019/C 110/18)

Relator:

Mindaugas MACIULEVIČIUS

Consulta

Parlamento Europeu, 2.7.2018

Conselho, 26.6.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Decisão da Mesa

19.9.2017

 

 

Competência

Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

27.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

140/1/0

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

Trata-se de uma iniciativa oportuna e muito positiva da Comissão Europeia. A proposta de regulamento incentivará significativamente o desenvolvimento de recursos hídricos adicionais seguros para fins de irrigação agrícola, ou seja, água que pode ser tratada a fim de ser utilizada com segurança na agricultura, assim como, se adequado, conservar um teor valioso de nutrientes úteis, bem como matéria orgânica adequada que contribui para a fertilização dos solos.

1.2.

O valor acrescentado desta iniciativa consiste, principalmente, em diminuir a pressão sobre as reservas de água potável e também em simplificar as possibilidades de investimento público e privado para criar este tipo de recursos hídricos suplementares. As referidas infraestruturas, distintas e específicas, de abastecimento e tratamento para utilização agrícola complementarão as fontes e infraestruturas de abastecimento existentes que, consoante o Estado-Membro, são serviços essenciais sob a responsabilidade do Estado, do município ou de entidades privadas.

1.3.

O CESE acolhe favoravelmente a proposta de regulamento em apreço enquanto complemento útil para a concretização dos objetivos da Diretiva-Quadro «Água» e contributo para o pacote Economia Circular. O regulamento incentivará a utilização mais sustentável dos recursos hídricos existentes e aumentará a confiança dos consumidores na segurança dos produtos agrícolas afetados.

1.4.

Atualmente, os consumidores desconhecem as diversas normas em vigor nos Estados-Membros em matéria de reutilização da água e muitos desconhecem que as águas depuradas são amplamente utilizadas na irrigação. Uma vez que o regulamento em apreço prevê uma abordagem coerente assente em pareceres científicos sólidos, pode ser considerado como um elemento de base necessário da política de segurança alimentar.

1.5.

Contrariamente à impressão criada pelo título geral do regulamento, a essência da proposta está estreitamente centrada na reutilização das águas residuais urbanas para fins de irrigação. Embora este aspeto seja mencionado na exposição de motivos do regulamento, recomenda-se dar maior relevância a esse enfoque para minimizar as preocupações de omissão das oportunidades de reutilização para fins domésticos e industriais.

1.6.

O potencial de reutilização da água para recarga de aquíferos, embora não seja objeto do regulamento em apreço, continua a ser de interesse, importando realizar mais análises técnicas para resolver os problemas complexos identificados na avaliação de impacto.

1.7.

O Comité recomenda vivamente a realização de um controlo eficaz dos recursos hídricos e a adoção de um sistema eficiente de execução e responsabilização em todos os Estados-Membros para que o regulamento em apreço tenha o máximo impacto pretendido. Em particular, devem ser aplicadas de forma mais coerente as proibições de extração ilegal de água.

1.8.

Existe uma justificação válida para se apoiar os investimentos de capital necessários à criação das infraestruturas de reutilização da água. No entanto, a construção de tais infraestruturas deve beneficiar do apoio dos fundos estruturais e, principalmente, do Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural e do Fundo de Coesão.

1.9.

Embora se espere que o impacto na concorrência de importações provenientes de países terceiros seja neutro, o CESE exorta a Comissão a aproveitar esta oportunidade para reforçar, com base na elaboração das presentes normas a nível da UE, em conjunto com a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos, a posição nos debates internacionais que visam a fixação de normas sobre a reutilização da água, de modo a assegurar igualmente a conformidade das importações provenientes de países terceiros. O CESE tem defendido regularmente a coerência das normas agrícolas internacionais, e o regulamento em apreço pode fixar parâmetros de referência a nível mundial para a reutilização da água (1).

2.   Introdução

2.1.

Devido às alterações climáticas e ao aumento da procura, a pressão sobre os recursos hídricos (2) já afeta muitos territórios da UE, um terço dos quais se depara com problemas de escassez e de qualidade da água ao longo do ano (3). O Comité salientou estas preocupações em pareceres anteriores, tendo instado ao aumento do investimento no tratamento das águas residuais para fins de reutilização e sublinhado que o objetivo de «fechar» o ciclo da água já não se afigura irrealista (4). Grande parte dos recursos hídricos é utilizada para a irrigação agrícola, especialmente nos Estados-Membros do sul da UE, onde os produtos agrícolas contribuem de forma significativa para a economia. O objetivo do regulamento em apreço não é alargar a superfície já irrigada, mas utilizar os recursos hídricos existentes com maior segurança e eficácia.

2.2.

Uma das principais prioridades da União é, naturalmente, manter a confiança dos consumidores nos géneros alimentícios, assim como no sistema regulamentar e de inspeção que assegura a sua segurança. O regulamento em apreço aumentará a segurança neste domínio, cujas normas atuais variam consideravelmente entre os Estados-Membros. Potencialmente, o regulamento em apreço pode aumentar em 4,9 mil milhões de m3 a água disponível para fins de irrigação por ano, o que se traduziria numa redução global de mais de 5 % da pressão sobre os recursos hídricos. O regulamento garantirá a segurança das águas depuradas e assegurará um elevado nível de proteção da saúde humana e animal, assim como do ambiente.

2.3.

O regulamento em apreço reforça a economia circular, aumenta a segurança alimentar da UE e contribui para a saúde pública, pois aborda diretamente a necessidade de estabelecer requisitos mínimos harmonizados de qualidade das águas depuradas, cuja grande maioria é utilizada na agricultura. A exigência de disponibilizar informação adequada e atualizada em linha sobre a reutilização da água assegura maior transparência perante os cidadãos. Além disso, a proposta de regulamento contribui para a consecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) pela UE, mais particularmente do ODS 6 relativo a «Água potável e saneamento». Ao contribuir para uma gestão mais adequada dos recursos hídricos na agricultura, permitindo aos agricultores aceder a um abastecimento de água mais sustentável, complementa a proposta da Comissão de uma nova política agrícola comum.

2.4.

Assinala-se que o regulamento em apreço é apresentado como parte de um programa evolutivo, cujo objetivo de longo prazo é equacionar a reutilização da água noutros domínios. No entanto, este regulamento específico centra-se essencialmente e aborda quase exclusivamente o tratamento das águas residuais urbanas já tratadas, a fim de permitir a sua utilização em várias formas de irrigação agrícola. A reutilização para fins domésticos e industriais não se insere no âmbito da proposta em apreço e, em certa medida, já é abrangida, por exemplo, pela Diretiva «Águas residuais urbanas», atualmente em fase de revisão (5).

3.   Síntese da proposta da Comissão

3.1.

A proposta de regulamento faz parte de uma estratégia de gestão integrada da água para resolver o grave problema crescente da pressão sobre os recursos hídricos na UE. A par da adoção de medidas de eficiência hídrica e de poupança de água, as águas tratadas provenientes de estações de tratamento de águas residuais urbanas podem contribuir para a resolução do problema em causa, constituindo uma forma alternativa de abastecimento de água fiável.

3.2.

Regra geral, a reutilização da água tem menor impacto ambiental do que outras formas alternativas de abastecimento de água e pode proporcionar uma série de benefícios ambientais, económicos e sociais. O regulamento centra-se na reutilização da água para fins de irrigação agrícola, que, atualmente, representa cerca de um quarto do total de água doce captada na UE.

3.3.

O regulamento aplica-se diretamente aos Estados-Membros, assim como aos operadores comerciais, podendo estimular o desenvolvimento e a adoção de tecnologias ambientais. A proposta estabelece requisitos mínimos para a qualidade e a monitorização das águas depuradas, introduz tarefas essenciais de gestão dos riscos e permite uma abordagem harmonizada da reutilização da água para fins de irrigação em toda a UE. Especificamente, a proposta estabelece:

3.3.1.

Requisitos mínimos para a qualidade das águas depuradas e para a monitorização, abrangendo elementos microbiológicos (por exemplo, níveis da bactéria E. coli) e requisitos de monitorização para controlos de rotina e para fins de validação. Tais requisitos garantirão que as águas depuradas produzidas em conformidade com a proposta de regulamento são seguras para fins de irrigação.

3.3.2.

Tarefas essenciais de gestão dos riscos, que conferem um nível de proteção adicional aos requisitos mínimos, isto é, a identificação de qualquer perigo adicional que tenha de ser resolvido para que a reutilização da água seja segura. Tal envolve essencialmente a elaboração de um plano de gestão dos riscos da reutilização da água pelo operador da estação de depuração, necessário para a emissão de uma licença pela autoridade competente, que deve ser reexaminada, pelo menos, de cinco em cinco anos.

3.3.3.

Maior transparência. As novas regras em matéria de transparência exigem que seja disponibilizada ao público informação em linha convivial sobre a prática de reutilização da água nos respetivos Estados-Membros. As disposições pormenorizadas relativas ao formato e à apresentação das informações a prestar serão fixadas por meio de um ato de execução.

3.4.

O regulamento prevê que os Estados-Membros, assistidos pela Agência Europeia do Ambiente, desenvolvam um conjunto de dados contendo informações sobre a reutilização da água, informações essas que permitirão obter, periodicamente, uma panorâmica do nível de execução do regulamento na União. A primeira avaliação está agendada para seis anos após a entrada em vigor do regulamento.

3.5.

Note-se que a proposta de regulamento não exige que os Estados-Membros procedam ao tratamento de águas residuais para fins de irrigação. O seu principal objetivo é criar confiança nas várias partes interessadas — autoridades competentes no domínio da água, agricultores, investidores e consumidores —, garantindo que as mais elevadas normas em matéria de segurança são aplicadas de forma coerente no abastecimento de água utilizada para fins de irrigação. Trata-se de um avanço considerável em relação à prática atual.

3.6.

A avaliação de impacto, bem como a documentação de investigação em que se baseia, inclui uma análise pormenorizada das questões técnicas, nomeadamente no que respeita à deteção, às normas de segurança e aos parâmetros-limite.

4.   Observações na generalidade

4.1.

O Comité acolhe favoravelmente o regulamento em apreço enquanto contributo para atenuar as ameaças decorrentes das alterações climáticas e complemento útil para a aplicação da Diretiva-Quadro «Água» e para a economia circular em geral. O CESE toma nota dos exemplos positivos de reutilização extensiva da água em conjugação com a produção agrícola, nomeadamente em Chipre e Israel, onde quase 90 % das águas residuais tratadas são, atualmente, reutilizadas. Questiona se, no âmbito do regulamento sobre a reutilização da água, não se deveria também ter considerado a questão da recuperação do calor a partir da água antes do seu encaminhamento para as estações de tratamento. A instalação dos equipamentos correspondentes deveria processar-se nas habitações unifamiliares e multifamiliares, assim como em piscinas, hotéis, etc.

4.2.

A proposta de regulamento reconhece a primazia das medidas de poupança de água e de eficiência hídrica na hierarquia da gestão dos recursos hídricos. A opção de reutilização voluntária só será selecionada quando for pertinente, segura e rentável. Há uma margem considerável para a aplicação da reutilização da água para fins de irrigação, especialmente em alguns Estados-Membros do sul da UE, onde predominam níveis modestos; por exemplo, Itália e Grécia reutilizam 5 % e Espanha 12 %, sendo encorajador o facto de a reutilização da água continuar a aumentar a um ritmo constante.

4.3.

O Comité observa que o regulamento visa estabelecer uma abordagem uniforme das normas de qualidade da água para reutilização. Atualmente, não é esse o caso. Geralmente, os consumidores desconhecem as grandes variações entre os Estados-Membros no que diz respeito à qualidade da água reutilizada para fins de irrigação. Uma única norma mínima incentivará a aceitação e o investimento, além de proporcionar maior segurança aos consumidores no que toca às questões de saúde.

4.4.

O Comité observa igualmente que as preocupações com agentes patogénicos, contaminantes que começam a causar preocupação, subprodutos de desinfeção e resistência aos antibióticos passam a ser abordadas (no anexo 2), com base no relatório técnico do Centro Comum de Investigação (JRC) «Science for Policy», que examina pormenorizadamente a gestão dos riscos sanitários e ambientais da reutilização da água para fins de irrigação agrícola (6). Tal deve assegurar, projeto a projeto, a proteção dos solos, das águas subterrâneas, da água potável e dos produtos alimentares.

4.5.

Em muitas situações, os preços dos recursos hídricos convencionais são, geralmente, subestimados e não refletem os custos ambientais e dos recursos. Além disso, subsistem captações ilegais significativas em rios e através de furos privados. Para que o regulamento em apreço tenha o máximo impacto pretendido, é necessário que todos os Estados-Membros realizem um controlo eficaz dos recursos hídricos e adotem um sistema eficiente de execução e responsabilização.

4.6.

A proposta de regulamento estabelece um procedimento de autorização específico para projetos de reutilização da água, o que contribuirá para a repartição clara das responsabilidades entre os diferentes intervenientes no ciclo da água com vista à sua reutilização.

4.7.

O Comité destaca a oportunidade proporcionada pelo regulamento, que incentiva a adaptação ou a conceção de estações de tratamento de água para fins de reutilização a fim de facilitar a «rega fertilizante». Trata-se da conservação de fertilizantes solúveis, como nitrogénio e fósforo na água tratada, tendo devidamente em conta a segurança, bem como de matéria orgânica benéfica que contribui para a fertilização dos solos, que, durante a utilização doméstica e industrial, entraram no ciclo da água. Esses benefícios adicionais são entendidos como secundários, consistindo o benefício primário em providenciar novos recursos hídricos através da reutilização.

5.   Observações na especialidade

5.1.

Assinala-se que a expressão «reutilização da água» se refere à utilização das águas geradas a partir de águas residuais (principalmente urbanas) que, após o tratamento, adquirem um nível de qualidade que as torna adequadas à utilização pretendida.

5.2.

O regulamento em apreço visa principalmente assegurar a qualidade e a segurança da reutilização da água proveniente de estações de tratamento de águas residuais urbanas. Não diz respeito à regulamentação da água potável, nem a medidas diretas de eficiência hídrica. No entanto, o Comité observa que o tratamento eficaz das águas residuais e a sua reutilização tem benefícios ambientais consideráveis quando comparado com outras opções. Em 2017, por exemplo, a seca conduziu a um prejuízo estimado em 2 mil milhões de euros para o setor agrícola italiano e é provável que este valor aumente em toda a UE devido às condições meteorológicas extremas em muitos Estados-Membros no verão de 2018. No entanto, a reutilização da água poderia suprir cerca de 47 % das necessidades totais de irrigação da Itália, mas atualmente é utilizada apenas de forma muito limitada.

5.3.

Embora o potencial de utilização das águas depuradas na irrigação agrícola exista sobretudo nos Estados-Membros do sul da UE, o impulso técnico e operacional gerado pelo regulamento em apreço será benéfico, no futuro, para toda a UE.

5.4.

A responsabilidade de assegurar o cumprimento das normas em matéria de segurança alimentar, que, regra geral, são estabelecidas pela UE por referência ao regulamento relativo à legislação alimentar geral, cabe, como é adequado, aos Estados-Membros. A proposta de regulamento assegurará a primazia da segurança dos consumidores, sempre que a água seja reutilizada para fins de irrigação de culturas alimentares. As importações de produtos agrícolas provenientes de países terceiros também têm de cumprir a legislação da UE em matéria de segurança alimentar, embora, atualmente, não existam requisitos específicos relativos às práticas de irrigação em países terceiros. O Comité preconiza que as normas comuns da UE sirvam de modelo para os países terceiros e, em especial, para os nossos parceiros comerciais bilaterais, embora este aspeto ainda deva ser objeto de negociação a nível internacional. Já se regista uma utilização significativa de águas residuais tratadas e não tratadas para fins de irrigação em todo o mundo, inclusive em muitos países dos quais a UE importa produtos agrícolas.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Parecer do CESE «A agricultura nas negociações comerciais», ponto 4.3 (JO C 173 de 31.5.2017, p. 20).

(2)  A pressão sobre os recursos hídricos ocorre quando a procura de água excede a quantidade disponível durante um determinado período ou quando a má qualidade restringe a sua utilização.

(3)  COM(2012) 672 final.

(4)  Parecer do CESE «Uma matriz destinada a preservar os recursos hídricos da Europa» (JO C 327 de 12.11.2013, p. 93).

(5)  Diretiva 91/271/CEE do Conselho, de 21 de maio de 1991, relativa ao tratamento de águas residuais urbanas (JO L 135 de 30.5.1991, p. 40).

(6)  Publicação do JRC: Towards a legal instrument on water reuse at EU level [Rumo a um instrumento jurídico europeu sobre a reutilização da água].


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/99


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à harmonização das obrigações de comunicação de informações no âmbito da política ambiental e que altera as Diretivas 86/278/CEE, 2002/49/CE, 2004/35/CE, 2007/2/CE, 2009/147/CE e 2010/63/UE, os Regulamentos (CE) n.o 166/2006 e (UE) n.o 995/2010, e os Regulamentos (CE) n.o 338/97 e (CE) n.o 2173/2005 do Conselho

[COM(2018) 381 final — 2018/0205 (COD)]

(2019/C 110/19)

Relator:

Vladimír NOVOTNÝ (CZ-I)

Consultas

Parlamento Europeu, 11.6.2018

Conselho, 22.6.2018

Base jurídica

Artigos 114.o, 192.o, n.o 1, 207.o e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Decisão da Mesa

17.4.2018 (na previsão de consulta)

Competência

Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

5.10.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

359

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

208/1/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE acolhe favoravelmente a proposta da Comissão relativa à harmonização das obrigações de comunicação de informações no âmbito da política ambiental e espera que ela conduza a uma maior transparência dos relatórios e da sua elaboração, ao fornecimento de uma base empírica para avaliar a eficácia das políticas ambientais, à simplificação dos procedimentos e à diminuição dos encargos administrativos para a Comissão e os Estados-Membros.

1.2.

O CESE apoia inteiramente a nova abordagem da Comissão em matéria de comunicação de informações ambientais, baseada numa profunda modernização dos procedimentos de recolha de dados, sua comunicação e posterior avaliação ambiental com recurso aos sistemas INSPIRE e Copernicus, bem como na transmissão de dados em tempo real e no processamento eletrónico dos mesmos. O CESE considera que a proposta da Comissão é consentânea com a abordagem «Legislar Melhor» e o programa REFIT.

1.3.

O CESE recomenda que as bases de dados centrais da Agência Europeia do Ambiente (AEA) sejam utilizadas para interligar os dados e informações sobre o ambiente com dados geográficos, económicos e sociais, bem como para os interpretar globalmente.

1.4.

O CESE insiste novamente na necessidade de associar as organizações da sociedade civil à elaboração e ao debate dos relatórios ambientais nos Estados-Membros.

1.5.

No entender do CESE, a adaptação às mudanças nos requisitos específicos de relato ambiental funciona melhor do que uma abordagem rigidamente unificada e de solução única, desde que seja salvaguardada a elevada qualidade dos dados e relatórios ambientais.

1.6.

O CESE está convicto de que a atualização da comunicação de informações ambientais e do tratamento e avaliação subsequentes dos dados ambientais contribuirá de forma significativa para atingir os objetivos da Convenção sobre Acesso à Informação, Participação do Público no Processo de Tomada de Decisão e Acesso à Justiça em Matéria de Ambiente (Convenção de Aarhus).

1.7.

O CESE exorta os governos dos Estados-Membros da UE, as suas autoridades e agências, a Comissão Europeia e a Agência Europeia do Ambiente a intensificarem os esforços para melhorar a acessibilidade, a clareza e o valor informativo dos relatórios e informações sobre o ambiente para vastos setores da sociedade civil e suas organizações neste domínio.

1.8.

O CESE recomenda que o acervo em matéria de aquisição de dados e de comunicação de informações ambientais continue a ser regularmente avaliado e revisto no futuro, que o intervalo de tempo entre a aquisição, o tratamento e a publicação dos dados seja reduzido e que a acessibilidade, a transparência e a clareza dos dados sejam aumentadas.

1.9.

O CESE insta as organizações ambientais a serem mais ativas na sensibilização do público para a situação ambiental nos respetivos países ou regiões; exorta, por sua vez, a Comissão a incentivar e a financiar as suas atividades neste domínio.

2.   O documento da Comissão

2.1.

Em 2017, a Comissão publicou uma avaliação aprofundada do balanço de qualidade sobre a comunicação de informações ambientais, que abrangeu 181 obrigações de comunicação consagradas em 58 atos legislativos da UE no domínio do ambiente.

2.2.

Esta análise transversal e abrangente das obrigações de comunicação (1) pretendia aumentar a transparência, fornecer uma base empírica para avaliações futuras, bem como simplificar e reduzir os encargos administrativos para os Estados-Membros e a Comissão.

2.3.

Uma avaliação individual dos atos legislativos em causa revelou que é possível melhorar a comunicação de informações previstas nos atos seguintes:

Diretiva 2002/49/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (2) relativa ao ruído ambiente (3),

Diretiva 2004/35/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (4) relativa à responsabilidade ambiental (5),

Diretiva 2007/2/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (6) que estabelece uma infraestrutura de informação geográfica (Diretiva INSPIRE) (7),

Diretivas 2009/147/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (8) e 92/43/CEE do Parlamento Europeu e do Conselho (9) (Diretivas «Aves» e «Habitats») (10),

Diretiva 2010/63/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (11) relativa aos ensaios em animais (12),

Regulamento (CE) n.o 166/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho (13) relativo ao Registo Europeu das Emissões e Transferências de Poluentes (RETP europeu) (14),

Diretiva 86/278/CEE do Conselho (15) relativa às lamas de depuração,

Regulamento (UE) n.o 995/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho (16) relativo à madeira

Regulamento (CE) n.o 338/97 do Conselho (17) (Regulamento CITES),

Regulamento (CE) n.o 2173/2005 do Conselho (18) relativo à aplicação da legislação, à governação e ao comércio no setor florestal (FLEGT).

Está atualmente em curso um processo de harmonização das propostas apresentadas pela Comissão Europeia em 2018 relativamente à água potável, aos poluentes orgânicos persistentes, à reutilização das águas residuais e aos plásticos de utilização única.

2.4.

Esta avaliação serviu de base à elaboração de uma proposta de harmonização dos diversos atos legislativos relativos a relatórios ambientais e de um plano pormenorizado para a aplicação das alterações propostas.

2.5.

O objetivo da proposta consiste em otimizar as atuais obrigações em matéria de comunicação de informações, transparência e monitorização da aplicação previstas na legislação da UE, respeitando simultaneamente os princípios da necessidade, da subsidiariedade e da proporcionalidade. Tem igualmente o intuito de harmonizar os requisitos da legislação em causa e melhorar a base empírica para a aplicação da política da UE.

2.6.

A proposta inclui medidas para melhorar a transparência e a subsidiariedade (em oito atos jurídicos), simplificar ou suprimir obrigações de comunicação de informação (em sete atos jurídicos), harmonizar o calendário da comunicação de informações (em três atos jurídicos), simplificar análises globais à escala da UE e clarificar os papéis das instituições da UE (em oito atos jurídicos) e preparar futuras avaliações (em cinco atos jurídicos).

2.7.

A proposta contribui para garantir que o público tenha acesso a informações ambientais claras a nível nacional. Ajudará, deste modo, o público a ter uma perspetiva do que se está a passar no domínio ambiental em toda a Europa, bem como as autoridades públicas nacionais a tratar as questões transfronteiriças. A proposta também deverá reduzir os encargos para os Estados-Membros, reforçar a subsidiariedade e disponibilizar ao público mais informações sobre a aplicação.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE acolhe favoravelmente a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à harmonização das obrigações de comunicação de informações no âmbito da política ambiental (19) como uma etapa fundamental para a modernização global do procedimento de elaboração e apresentação de relatórios ambientais. Concorda com o recurso aos sistemas INSPIRE e Copernicus e a ferramentas de processamento eletrónico de dados, com a transmissão de dados em tempo real e, em matéria de comunicação, com a substituição dos relatórios escritos formais pela criação de bases de dados dinâmicas centrais a nível da Comissão Europeia e da Agência Europeia do Ambiente. Na esteira da posição da Comissão e do texto da proposta de regulamento, o CESE também assinala que as alterações aos vários documentos jurídicos relacionados com a seleção de indicadores ambientais, a lista de substâncias regulamentadas e os respetivos limites são de caráter meramente processual e não substancial.

3.2.

Na opinião do CESE, a simplificação e a harmonização dos procedimentos de elaboração e apresentação de relatórios ambientais contribuirão para aumentar a sua eficácia e transparência. O CESE espera que a proposta conduza a uma redução dos encargos e dos custos respeitantes aos requisitos de comunicação de informações estabelecidos na legislação ambiental da UE, bem como a uma diminuição significativa do intervalo de tempo entre a aquisição dos dados e a sua publicação.

3.3.

O CESE considera essencial aumentar não só a disponibilidade dos relatórios, mas também a clareza dos mesmos e das informações destinadas a amplos setores da sociedade civil. Reitera o papel fundamental da sociedade civil não só como utilizadora de informações ambientais, mas também como participante ativa na recolha, elaboração e debate de tais informações e relatórios. A este respeito, destaca a importância de avaliar o impacto ambiental e a participação da sociedade civil nos debates sobre esta questão.

3.4.

A proposta de revisão de diversos atos legislativos em vigor insere-se no âmbito do programa para a adequação e a eficácia da regulamentação (REFIT (20)) da Comissão. O CESE adotou o parecer «Programa REFIT», no qual (21) manifestou preocupação a respeito das lacunas identificadas nas avaliações de impacto ambiental e salientou a necessidade de uma avaliação integrada e equilibrada das dimensões social, económica e ambiental.

3.5.

No seu parecer «Reexame da aplicação da política ambiental» (22), o CESE destacou a importância da participação da sociedade civil nos processos de decisão e de reexame, a qual é igualmente relevante para o reexame da legislação sobre a comunicação de informações ambientais.

3.6.

A proposta da Comissão Europeia contém referências cruzadas à Diretiva 2003/4/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (23) relativa ao acesso do público às informações sobre ambiente e à Diretiva 2007/2/CE relativa à informação geográfica, assegurando a coerência com os requisitos destas diretivas. O CESE adotou o parecer «Acesso à justiça a nível nacional no âmbito de medidas de aplicação da legislação ambiental da UE» (24), no qual salientou a importância da Convenção sobre Acesso à Informação, Participação do Público no Processo de Tomada de Decisão e Acesso à Justiça em Matéria de Ambiente (Convenção de Aarhus).

3.7.

Apesar de a proposta da Comissão Europeia se referir apenas à comunicação das informações ambientais exigidas pela legislação da UE, o CESE chama a atenção para o facto de haver uma quantidade significativa de informações voluntariamente fornecidas a nível de empresas, sindicatos, municípios, autarquias, outros organismos e organizações da sociedade civil.

3.7.1.

Entre os exemplos dessas atividades voluntárias que incluem relatórios ambientais figuram a Iniciativa Global Reporting (GRI) a nível empresarial; os relatórios de associações comerciais, como a Iniciativa Responsible Care (CEFIC) na indústria química, e os relatórios de responsabilidade social das empresas, que muitas vezes incluem um elemento ambiental.

3.7.2.

Também são fornecidas ao público avaliações de impacto ambiental e informações conexas no âmbito do sistema de gestão ambiental (SGA) e do Sistema Comunitário de Ecogestão e Auditoria (EMAS).

3.7.3.

A importância da participação das organizações da sociedade civil na análise dos relatórios elaborados nesses contextos há muito que foi demonstrada, aumentando a confiança da sociedade civil, por um lado, e a atividade empresarial, por outro. Os procedimentos de avaliação do impacto ambiental no domínio das informações ambientais também estão a ser aplicados a nível local e internacional.

4.   Observações na especialidade

4.1.   Melhorar a transparência e a subsidiariedade

Na opinião do CESE, a proposta da Comissão Europeia melhora a transparência e facilita o acesso do público a informações ambientais, preservando simultaneamente a subsidiariedade.

4.2.   Simplificar ou suprimir obrigações de comunicação de informações

O CESE considera que, para reduzir os encargos administrativos, seria útil simplificar ou encontrar um substituto adequado para o processo de comunicação de informações textuais e privilegiar a melhoria do acesso dos cidadãos às informações. Exorta a Comissão Europeia a diligenciar no sentido de estabelecer um conjunto de indicadores ambientais compostos de base que sejam claros para o grande público em todos os países da UE. Tal facilitaria a obtenção de um parecer em matéria de proteção do ambiente nos diferentes países ou regiões e desencadearia iniciativas destinadas a procurar alterações positivas.

4.3.   Harmonizar o calendário da comunicação de informações

O CESE apoia a racionalização dos prazos de apresentação dos mapas de ruído e dos planos de ação previstos na Diretiva 2002/49/CE (25), a previsão de tempo suficiente para a consulta pública e o reforço da participação da sociedade civil no reexame ou na revisão dos planos de ação. É favorável à introdução de disposições análogas noutros atos legislativos, desde que não haja uma redução da qualidade e da disponibilidade dos dados e relatórios ambientais.

4.4.   Simplificar análises globais à escala da UE e clarificar os papéis das instituições

No entender do CESE, é necessário clarificar e especificar melhor o papel da Comissão Europeia e da Agência Europeia do Ambiente nos processos de comunicação de informações em causa.

4.5.   Preparar futuras avaliações

O CESE congratula-se com o facto de a avaliação realizada pela Comissão Europeia ter revelado vários casos de duplicação, assim como ligações em falta e requisitos não essenciais, tanto na estrutura de recolha de dados e comunicação de informações como na periodicidade exigida, para além de outras lacunas na sua eficácia. O CESE está convencido de que se encontrarão mais lacunas no futuro. Recomenda, assim, que se proceda a uma avaliação regular do funcionamento do acervo neste domínio. A Comissão deverá realizar avaliações e requerer aos Estados-Membros que forneçam as informações necessárias para o efeito. No seu parecer SC/045 «Legislação à prova do tempo» (26), o CESE formulou recomendações sobre a forma de proceder no tocante à legislação futura.

4.6.   Dados no contexto

O CESE recomenda que as bases de dados centrais da Agência Europeia do Ambiente sejam organizadas de modo a interligar os dados e informações ambientais com dados geográficos, económicos e sociais, para que possam ser interpretados de uma forma global e objetiva. O CESE saúda os esforços da Comissão Europeia no sentido de introduzir melhor legislação para reduzir os encargos administrativos no âmbito da revisão das obrigações de comunicação de informações previstas no Regulamento (CE) n.o 166/2006 relativo ao Registo Europeu das Emissões e Transferências de Poluentes (RETP europeu), no que diz respeito a obrigações de comunicação de informações que têm uma importância limitada. Ao mesmo tempo, o CESE chama a atenção para a necessidade de respeitar o princípio da confidencialidade relativamente a determinados segredos comerciais, ainda que esta não deva criar obstáculos à transparência e à disponibilidade de relatórios e dados ambientais.

4.7.   Algumas alterações seletivas

O CESE considera que, no futuro, as alterações propostas deveriam ser adaptadas às especificidades de determinadas disposições jurídicas que introduzem obrigações de comunicação de informações ambientais em vez de obedecerem a uma abordagem unificada e de solução única. O CESE concorda igualmente com a harmonização dos prazos de comunicação entre a Diretiva 2009/147/CE (Diretiva «Aves») e a Diretiva 92/43/CEE (Diretiva «Habitats»).

4.8.   Incentivar a participação ativa dos cidadãos nas questões ambientais

O CESE insta as organizações ambientais a serem mais ativas na sensibilização do público para a situação ambiental nos respetivos países ou regiões; exorta, por sua vez, a Comissão a incentivar e a financiar as suas atividades neste domínio.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  SWD(2017) 230.

(2)  JO L 189 de 18.7.2002, p. 12.

(3)  SWD(2016) 454.

(4)  JO L 143 de 30.4.2004, p. 56.

(5)  SWD(2016) 121.

(6)  JO L 108 de 25.4.2007, p. 1.

(7)  COM(2016) 478 e SWD(2016) 273.

(8)  JO L 20 de 26.1.2010, p. 7.

(9)  JO L 206 de 22.7.1992, p. 7.

(10)  SWD(2016) 472 final.

(11)  JO L 276 de 20.10.2010, p. 33.

(12)  COM(2017) 631 e SWD(2017) 353.

(13)  JO L 33 de 4.2.2006, p. 1.

(14)  SWD(2017) 711.

(15)  JO L 181 de 4.7.1986, p. 6.

(16)  JO L 295 de 12.11.2010, p. 23.

(17)  JO L 61 de 3.3.1997, p. 1.

(18)  JO L 347 de 30.12.2005, p. 1.

(19)  COM(2018) 381 final — 2018/0205 (COD).

(20)  https://ec.europa.eu/info/law/law-making-process/evaluating-and-improving-existing-laws/refit-making-eu-law-simpler-and-less-costly_en

(21)  Parecer do CESE «Programa REFIT» (JO C 230 de 14.7.2015, p. 66).

(22)  Parecer do CESE «Reexame da aplicação da política ambiental» (JO C 345 de 13.10.2017, p. 114).

(23)  JO L 41 de 14.2.2003, p. 26.

(24)  Parecer do CESE «Acesso à justiça a nível nacional no âmbito de medidas de aplicação da legislação ambiental da UE» (JO C 129 de 11.4.2018, p. 65).

(25)  Diretiva 2007/2/CE.

(26)  Parecer do CESE «Legislação à prova do tempo» (JO C 487 de 28.12.2016, p. 51).


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/104


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas e que revoga o Regulamento (UE) n.o 508/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho»

[COM(2018) 390 final — 2018/0210 (COD)]

(2019/C 110/20)

Relator:

Brian CURTIS (UK-II)

Consulta pelo Conselho

12.7.2018

Consulta pelo Parlamento Europeu

2.7.2018

Base jurídica

Artigo 42.o, artigo 43.o, n.o 2, artigo 91.o, n.o 1, artigo 100.o, n.o 2, artigo 173.o, n.o 3, artigo 175.o, artigo 188.o, artigo 192.o, n.o 1, artigo 194.o, n.o 2, artigo 304.o e artigo 349.o do TFUE

 

 

Decisão da Mesa

22.5.2018 (na previsão de consulta)

 

 

Competência

Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

27.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

214/1/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com a proposta da Comissão, que prevê um sistema mais flexível para os Estados-Membros em conformidade com as suas prioridades estratégicas e visa apoiar um modelo de negócio sustentável para os pescadores e manter a competitividade do setor das pescas. Mais concretamente, o CESE defende uma aprovação rápida, um mecanismo de financiamento mais acessível e um sistema de sanções mais proporcional e harmonizado. A sociedade civil organizada e as plataformas regionais de partes interessadas devem participar em todas as fases do processo, desde a elaboração dos planos nacionais até à sua execução e avaliação final.

1.2.

O CESE considera que o orçamento do Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (FEAMP) deve manter-se ao nível atual (6,4 mil milhões de euros). Este aspeto é essencial para conseguir as alterações radicais e as melhorias solicitadas pela União Europeia ao setor das pescas. Importa notar, em especial, que o orçamento atual do FEAMP representa 0,6 % do Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2014-2020, pelo que qualquer redução do seu financiamento, embora venha a ter um impacto diminuto no orçamento global da UE, poderá ter consequências desastrosas para muitas regiões costeiras.

1.3.

O CESE observa que a proposta da Comissão não se baseia numa avaliação pormenorizada do impacto económico e social. Esta lacuna é agravada pelo facto de o setor das pescas estar em crise há mais de 20 anos. O Comité solicita, por isso, a intervenção imediata da Comissão Europeia (mais especificamente, a DG Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão) e o lançamento de um diálogo social setorial para identificar as medidas mais adequadas para compensar o impacto económico e social.

1.4.

O CESE salienta que a aquicultura e a economia azul ainda estão muito longe de compensar a perda de empresas e de postos de trabalho. O Comité encoraja a Comissão e os Estados-Membros a estabelecerem um mecanismo simplificado para novos projetos de aquicultura e para a modernização dos já existentes.

1.5.

O novo FEAMP deve dar prioridade à dimensão social para reforçar e financiar medidas de promoção e apoio do diálogo social, da segurança, das condições de trabalho e do reforço das capacidades, potenciando as competências dos trabalhadores e a «renovação geracional».

1.6.

O Comité incentiva a Comissão Europeia e os Estados-Membros a intervirem de forma mais resoluta, controlando a plena rastreabilidade das importações, tanto do ponto de vista da pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (pesca INN) como da segurança alimentar. O combate a todas as formas de escravatura e exploração, quer a bordo dos navios quer na transformação em terra, deve ser uma pedra angular da nova estratégia global da UE para as pescas e a governação dos oceanos.

1.7.

O CESE recomenda que sejam financiados navios novos para substituir navios antigos desde que a frota em questão não esteja em situação de sobrecapacidade e as espécies-alvo sejam pescadas a níveis de rendimento máximo sustentável (RMS). Esta medida deve incluir a utilização de motores mais sustentáveis e eficientes para reduzir as emissões de CO2 e garantir a segurança das tripulações.

1.8.

O Comité recomenda que sejam mantidos os atuais critérios de concessão de apoio financeiro e compensações em caso de cessação temporária ou definitiva da atividade de pesca. É importante que tanto os pescadores como os proprietários de navios de pesca possam beneficiar destes instrumentos financeiros.

1.9.

O Comité endossa a proposta de medidas específicas a favor da pequena pesca costeira, que é um fator vital da subsistência e do património cultural de muitas comunidades costeiras. Contudo, para apoiar um modelo de negócio sustentável para a pequena pesca, é igualmente importante estabelecer medidas técnicas e de conservação adaptadas aos locais onde ela é mais comum (por exemplo, o mar Mediterrâneo). Tais medidas devem ser adaptadas às diferentes formas de pesca e às características biológicas de cada mar. O CESE considera que a recolha de dados, o controlo e a execução eficazes são condições indispensáveis a uma gestão responsável das pescas que traga benefícios sociais e económicos aos pescadores e às comunidades locais.

2.   Introdução e metodologia

2.1.

O novo Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (FEAMP) faz parte do Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2021-2027. O FEAMP é um instrumento fundamental para apoiar a realização dos objetivos da política comum das pescas (PCP), promover a execução da política marítima da União Europeia e reforçar a governação internacional dos oceanos, sobretudo no quadro da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.

2.2.

O CESE vê o novo orçamento a longo prazo da UE como um fator crucial para o desenvolvimento sustentável, o crescimento e a coesão, e de uma forma mais geral para o futuro da Europa. Por este motivo, o presente parecer está estreitamente ligado a todos os outros que analisam fundos específicos no âmbito do novo QFP 2021-2027 (1).

3.   Síntese da proposta

3.1.

O novo FEAMP 2021-2027 centrar-se-á em quatro prioridades:

fomentar pescas sustentáveis e a conservação dos recursos biológicos marinhos,

contribuir para a segurança alimentar graças a uma aquicultura e mercados competitivos e sustentáveis,

permitir o crescimento de uma economia azul sustentável e fomentar a prosperidade das comunidades costeiras,

reforçar a governação internacional dos oceanos e assegurar oceanos e mares seguros, limpos e geridos de forma sustentável.

3.2.

O orçamento do novo FEAMP ascenderá a 6,14 mil milhões de euros a preços correntes. Os recursos são essencialmente divididos entre gestão partilhada e direta. Ao apoio em regime de gestão partilhada com os Estados-Membros são afetados 5,31 mil milhões de euros e ao apoio em regime de gestão direta pela Comissão Europeia, 0,83 mil milhões de euros.

3.3.

A proposta da Comissão visa superar as limitações do FEAMP 2014-2020 e estabelecer um sistema de financiamento que seja capaz de lidar com os novos desafios no âmbito dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). As principais características do novo FEAMP são as seguintes:

3.3.1.   Simplificação

O FEAMP 2014-2020 baseia-se numa descrição rígida das possibilidades de financiamento e das regras de elegibilidade, que dificultou a execução pelos Estados-Membros e pelos beneficiários. O FEAMP 2021-2027 proporciona um leque mais alargado de possibilidades que permitirão aos Estados-Membros direcionarem o apoio para as suas prioridades estratégicas. Mais concretamente, o regulamento descreve diferentes domínios de apoio para cada prioridade, proporcionando um quadro flexível de execução. Os Estados-Membros elaborarão o seu programa, indicando os métodos mais adequados para concretizar as prioridades. Ser-lhes-á concedida flexibilidade na definição das regras de elegibilidade.

3.3.2.   Alinhamento por outros fundos da UE

No novo QFP, as regras aplicáveis a todos os fundos são estabelecidas no Regulamento Disposições Comuns (RDC). Serão, nomeadamente, desenvolvidas sinergias específicas com outros fundos (FEDER, FSE, etc.).

3.3.3.   Condicionalidade

Em consonância com a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) e com o ODS n.o 14 relativo à conservação e à utilização sustentável dos oceanos, a UE está empenhada em promover uma economia azul sustentável, a conservação dos recursos biológicos e a consecução de um bom estado ambiental, bem como em proibir certas formas de subsídios da pesca que contribuem para a sobrecapacidade e a sobrepesca, eliminar os subsídios que contribuem para a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (pesca INN) e não introduzir novos subsídios deste tipo. Por este motivo, o regulamento estabelece restrições e condições («operações inelegíveis»), de modo a evitar impactos negativos na conservação das pescas.

3.3.4.   Concentração no desempenho

A execução do apoio do FEAMP será apreciada com base em indicadores. Os Estados-Membros apresentarão um relatório sobre os progressos alcançados para a realização dos objetivos intermédios e das metas. A Comissão avaliará anualmente o desempenho, com base em relatórios de desempenho preparados pelos Estados-Membros, de modo a detetar atempadamente potenciais problemas de execução e determinar medidas corretivas.

3.3.5.   Sustentabilidade ambiental, social e económica

A pesca e a aquicultura sustentáveis estão entre os principais objetivos da PCP. Em consonância com uma definição lata de sustentabilidade, devem procurar-se benefícios económicos, sociais e de emprego a par dos objetivos ambientais. O rendimento máximo sustentável (RMS) continuará a ser o principal método para garantir a sustentabilidade da pesca. Será prestado apoio à transição para atividades mais sustentáveis. Apenas será concedida compensação pela cessação extraordinária das atividades de pesca se o impacto dessas circunstâncias nos pescadores for significativo (2). A pequena pesca costeira, as regiões ultraperiféricas, a renovação geracional, o ensino, a formação e a saúde e segurança no trabalho serão objeto de atenção e apoio específicos no âmbito do novo FEAMP. A obrigação de desembarque poderá continuar a ser um aspeto crítico devido às suas enormes repercussões financeiras. Por este motivo, o FEAMP apoiará inovações e investimentos que contribuam para o cumprimento da obrigação de desembarque, nomeadamente investimentos em artes de pesca seletivas, na melhoria das infraestruturas portuárias e na comercialização das capturas indesejadas. Por último, será prestado apoio aos pescadores e aos portos para a recolha e gestão modernas de artes de pesca perdidas e lixo marinho.

3.4.

Mais de 60 % do peixe consumido na UE é importado de países terceiros (3). Para colmatar esta lacuna, é necessário apoiar não só as atividades de pesca como também a aquicultura, que produz peixe com elevados padrões de qualidade e a preços acessíveis. Por este motivo, o FEAMP apoiará a promoção e o desenvolvimento sustentável da aquicultura, incluindo a aquicultura de água doce.

3.5.

Sessenta por cento dos oceanos não se encontram sob jurisdição nacional, o que significa que a UE terá de ser mais ativa e desempenhar um papel mais forte no desafio global da governação dos oceanos. O FEAMP apoiará este compromisso para com oceanos seguros, limpos e geridos de forma sustentável em regime de gestão direta. Por último, a melhoria da proteção das fronteiras (cooperação da guarda costeira) e da vigilância marítima são desafios emergentes que serão financiados pelo FEAMP 2021-2027.

3.6.

Este apoio será complementado por um financiamento específico para a Agência Europeia de Controlo das Pescas, os acordos de parceria no domínio da pesca sustentável (APPS) e a participação da União em organizações regionais de gestão das pescas (ORGP) e outras organizações internacionais, que também contribuem para a execução das políticas da União no setor das pescas e no setor marítimo.

4.   Observações na generalidade

4.1.

O CESE congratula-se com a proposta da Comissão, que prevê um sistema mais flexível para os Estados-Membros em conformidade com as suas prioridades estratégicas, e visa apoiar um modelo de negócio sustentável para os pescadores e manter a competitividade do setor das pescas. Mais concretamente, o Comité salienta que o principal problema do atual FEAMP é o baixo nível de execução (4), essencialmente por dois motivos:

A aprovação tardia e a consequente execução tardia. Os colegisladores só adotaram o Regulamento FEAMP em maio de 2014, e os Estados-Membros precisaram de tempo adicional para elaborar e aprovar os seus programas nacionais.

O sistema atual é demasiado complicado e burocrático. Além disso, muitos pescadores hesitam antes de se candidatarem a novos financiamentos devido ao risco financeiro desproporcionado em que podem incorrer. De acordo com o artigo 12.o, n.o 2, da proposta (que mantém as disposições existentes), se, durante um período de cinco anos a contar da data do pagamento final, os beneficiários cometerem alguma infração grave (5), serão retroativamente inelegíveis e obrigados a reembolsar tudo o que receberam. Este requisito deve ser suprimido.

4.2.

Pelos motivos acima referidos, o CESE solicita uma aprovação rápida, um mecanismo de financiamento mais acessível e um sistema de sanções mais proporcional e harmonizado. Todos os pescadores devem considerar o FEAMP como um sistema de fácil utilização destinado a melhorar a sua atividade em termos de sustentabilidade e de qualidade. Este aspeto desempenhará um papel fundamental na aplicação e no respeito do novo sistema de controlo das pescas recentemente proposto pela Comissão Europeia (6). O Comité recomenda que a sociedade civil organizada e as plataformas regionais de partes interessadas participem em todas as fases do processo, desde a elaboração dos planos nacionais até à execução e à avaliação final.

4.3.

O novo orçamento do FEAMP (6,14 mil milhões de euros) foi reduzido (-4 %) em relação ao FEAMP 2014-2020 em curso (6,4 mil milhões de euros). O CESE está ciente de que o Brexit é um motivo forte para este corte financeiro. O CESE salienta, não obstante, que as alterações radicais solicitadas pela União Europeia ao setor das pescas, que emprega 150 000 pescadores e, em toda a cadeia de valor, 730 000 trabalhadores e gera quase 400 mil milhões de euros por ano em salários e lucros líquidos, requerem um montante mais elevado ou, pelo menos, a manutenção do orçamento atual. Importa notar que o orçamento atual do FEAMP representa 0,6 % do Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2014-2020, pelo que qualquer redução do seu financiamento, embora venha a ter um impacto diminuto no orçamento global da UE, poderá ter consequências desastrosas para muitas regiões costeiras.

4.4.

O CESE observa que a proposta da Comissão não se baseia numa avaliação pormenorizada do impacto económico e social. Esta lacuna é agravada pelo facto de o setor das pescas estar em crise há mais de 20 anos e de as medidas previstas para alcançar uma maior sustentabilidade das pescas e da aquicultura terem sido incapazes de inverter esta tendência (7). O Comité defende, por isso, a intervenção imediata da Comissão Europeia (mais especificamente, a DG Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão) e o lançamento de um diálogo social setorial (8) para identificar as medidas mais adequadas para compensar o impacto económico e social.

4.5.

O CESE salienta que as medidas adotadas para desenvolver a aquicultura e a economia azul ainda estão muito longe de compensar a perda de empresas e de postos de trabalho, sobretudo devido ao excesso de burocracia do sistema. O Comité encoraja a Comissão e os Estados-Membros a facilitarem um mecanismo simplificado para novos projetos de aquicultura e para a modernização dos existentes com um foco específico, a nível regional, com uma definição de zonas afetadas à aquicultura.

4.6.

A pesca sustentável continua a ser o principal objetivo, e o setor das pescas deve ser capaz de o alcançar. Contudo, esta prioridade, na forma proposta pela Comissão, não esclarece se inclui medidas financiadas ao abrigo do atual FEAMP para a melhoria das condições de trabalho e segurança, nomeadamente formação, serviços de aconselhamento, promoção do capital humano, diálogo social, jovens pescadores ou saúde e segurança. Tal como identificado pelo setor e pelas administrações, existe um problema de escassez de profissionais qualificados, o que dificulta a «renovação geracional». O CESE insta os colegisladores a darem prioridade à dimensão social para reforçar e financiar medidas de promoção e apoio do diálogo social, da segurança, das condições de trabalho e do reforço das capacidades, potenciando as competências dos trabalhadores. Se assim não for, os jovens não se sentirão atraídos por este setor.

4.7.

A modernização dos navios para aumentar a segurança a bordo sem aumentar a capacidade de pesca, a renovação geracional e as condições de trabalho adequadas, a formação e os salários são indicadores cruciais das deficiências da UE em termos de crescimento e de robustez do setor. O FEAMP deve associar os pescadores à conservação da biodiversidade marinha, nomeadamente através do apoio a artes de pesca inovadoras para aumentar a seletividade, de estudos de impacto ou da atenuação do impacto da pesca. Neste contexto, a abordagem de «redução» adotada pela Comissão não será capaz de resolver todos os problemas associados à sustentabilidade e à competitividade.

4.8.

O CESE observa que, na sua maioria, o peixe importado de países terceiros foi pescado de forma menos sustentável do que as capturas comparáveis da UE, para não falar das condições de trabalho, quer a bordo dos navios, quer na transformação em terra. Os preços mais baixos que daí resultam representam uma concorrência desleal para com os pescadores da UE, frustrando quaisquer perspetivas de alcançar preços mínimos estáveis «na primeira venda», que são indispensáveis à sua sobrevivência. O Comité incentiva a Comissão Europeia e os Estados-Membros a tomarem medidas mais fortes controlando a plena rastreabilidade das importações, tanto do ponto de vista da pesca INN como da segurança alimentar, e a organizarem campanhas de sensibilização destinadas a informar os consumidores sobre a qualidade do peixe. As práticas retalhistas dúbias, como a exposição de peixe descongelado em bancas de peixe fresco sem uma rotulagem clara e inequívoca, também devem ser travadas.

5.   Observações na especialidade

5.1.

O Comité apoia a nova abordagem adotada pela Comissão Europeia, que visa estabelecer um quadro geral sem medidas prescritivas, oferecendo maior flexibilidade aos Estados-Membros, às autoridades de execução e aos beneficiários. Mais concretamente, este sistema simplificado deve dar a oportunidade de criar programas nacionais adaptados. Tal deve, contudo, ser feito garantindo condições de igualdade de acesso ao financiamento a nível da UE. Além disso, o RDC, que inclui todas as regras de execução, deve facilitar a utilização conjunta de diferentes programas de financiamento da UE. Devem estabelecer-se mecanismos claros para verificar que o dinheiro público é efetivamente gasto naquilo em que é mais necessário e que o auxílio financeiro é destinado à gestão sustentável dos oceanos.

5.2.

O CESE apoia a proposta de definir quatro prioridades principais. O Comité acolhe com agrado, em especial, a concentração específica na governação dos oceanos e no desenvolvimento local, em consonância com pareceres anteriores seus, de modo a cumprir os ODS e a apoiar a pequena pesca (9). Contudo, o CESE salienta que foram descobertos recentemente casos de escravatura e exploração em navios europeus (10) e que, infelizmente, tais práticas são ainda mais comuns em países terceiros (incluindo a escravatura infantil). O Comité considera que a nova estratégia global desenvolvida pela Comissão deve tratar o combate a todas as formas de exploração de seres humanos como uma pedra angular.

5.3.

O Comité considera a renovação da frota como um problema essencial porque, em média, os navios de pesca europeus têm mais de 30 anos e uma simples remodelação normalmente não é suficiente. Por este motivo, o CESE recomenda que seja incentivado o financiamento de navios novos para substituir navios antigos, desde que a frota em questão não esteja em situação de sobrecapacidade e as espécies-alvo sejam pescadas a níveis de RMS. Além disso, tendo em conta a estratégia da Organização Marítima Internacional relativa à redução das emissões de gases com efeito de estufa dos navios, que visa reduzir as emissões anuais totais em pelo menos 50 % até 2050, os navios de maiores dimensões terão de mudar os seus motores para se adaptarem e conformarem a este objetivo internacional. Por conseguinte, é essencial incluir a aquisição de motores mais sustentáveis e eficientes para reduzir as emissões de CO2 e garantir a segurança das tripulações. Na verdade, conforme estimado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), a pesca é uma atividade potencialmente perigosa, sendo necessária formação adequada em matéria de saúde e segurança no trabalho para reduzir o número de mortes, lesões e doenças profissionais (11). Por todas estas razões, importa separar a capacidade de pesca e a proteção da biodiversidade, por um lado, da renovação das frotas e dos motores, por outro.

5.4.

O apoio à cessação temporária tem desempenhado um papel crucial na melhoria do estado das unidades populacionais, em especial no âmbito dos períodos de defeso, ao mesmo tempo que compensa parcialmente os pescadores pela perda de rendimento. A Comissão mantém esta medida no novo quadro financeiro, mas propõe novos requisitos que não existiam no regulamento anterior. Atendendo à ausência de denúncias de utilização indevida de fundos destinados à cessação temporária, a Comissão deve respeitar e manter os anteriores critérios para prestar esta assistência ao maior número possível de pescadores que dela necessitam. O mesmo princípio deve ser aplicado à cessação definitiva. Em ambos os casos, é importante que também os pescadores, e não apenas os proprietários de navios de pesca, beneficiem deste apoio financeiro, tal como estabelecido pelo atual FEAMP.

5.5.

A pesca é uma atividade sazonal e as capturas podem ser incertas, excedendo por vezes as necessidades do mercado. Por conseguinte, é necessário dispor de meios para gerir adequadamente os excessos de produção, ajudando a estabilizar parte da produção antes da comercialização, sobretudo em caso de redução das capturas. Para alcançar este objetivo, o FEAMP deve continuar a apoiar as organizações de produtores que necessitam de um mecanismo de armazenagem temporária para os produtos da pesca destinados a consumo humano. Para assegurar a sua plena operabilidade, este apoio deverá ser disponibilizado sem demora. A este respeito, o CESE apoia a manutenção de mecanismos para compensar os custos da armazenagem.

5.6.

A renovação geracional é outro problema crítico para o futuro do setor. Algumas novas iniciativas destinadas a facilitar a compra de um navio em segunda mão, a formação profissional e a melhoria das condições de trabalho podem ser úteis, mas não resolvem o problema principal: o baixo retorno dos investimentos. Esta situação é especialmente evidente na pequena pesca, com navios de comprimento inferior a 12 metros operados a nível familiar. O CESE observa que a constante perda de navios e postos de trabalho contradiz a previsão da Comissão de duplicação da produção do setor das pescas da UE até 2030, em consonância com o crescimento global estimado (12).

5.7.

O Comité apoia a proposta de medidas específicas a favor da pequena pesca costeira, que é uma força vital da subsistência e do património cultural de muitas comunidades costeiras. Esta representa 75 % de todos os navios de pesca registados na UE e quase metade dos postos de trabalho. Durante as últimas décadas, a pesca tradicional e a pequena pesca foram as mais afetadas pela crise, e precisam de uma estratégia específica para recuperar uma posição sólida no mercado. Esta iniciativa também terá efeitos positivos nas comunidades locais em situação crítica.

5.8.

O Comité considera necessário adotar abordagens inovadoras para gerir os direitos da pequena pesca e reputa essencial reforçar a colaboração para ajudar o setor a gerir as suas quotas/dias no mar, a ligar a produção à comercialização ou a resolver o problema das «espécies bloqueadoras». As comunidades costeiras e o meio marinho beneficiarão mais quando as oportunidades de pesca forem atribuídas com base em critérios ambientais, sociais e económicos transparentes. Os fundos para promover a sustentabilidade e os processos participativos poderão contribuir para combater estes desafios e incluirão ações como ateliês de facilitação ou a conceção de processos participativos para interagir com cientistas e outras partes interessadas.

5.9.

O desenvolvimento local de base comunitária tem sido um instrumento muito útil no período de programação de 2014-2020. Esta estratégia desempenhou um papel importante no aumento da diversificação económica nas comunidades locais. Por este motivo, o Comité aprova a proposta de a alargar a todos os setores da economia azul. A afetação de financiamento para uma economia azul sustentável deve, contudo, assegurar benefícios sociais e económicos para as gerações atuais e futuras, restaurar e proteger a diversidade, a produtividade, a resiliência e o valor intrínseco dos ecossistemas marinhos e promover tecnologias limpas, energias renováveis e fluxos materiais circulares.

5.10.

O Comité vê a Declaração de Malta («MedFish4Ever»), de 2017, como uma pedra angular da ação da UE. Não obstante, o CESE considera que as medidas técnicas e de conservação específicas devem ser adaptadas às diferentes formas de pesca e às características biológicas do mar Mediterrâneo. Na verdade, o CESE observou que o modelo bem-sucedido proporcionado pelo plano plurianual para pescarias monoespecíficas (por exemplo, mar Báltico) é menos eficaz para pescarias mistas (por exemplo, mar Mediterrâneo) (13). Além disso, os métodos de pesca são completamente diferentes no Norte e no Sul da Europa. Mais concretamente, a pesca no mar Mediterrâneo é caracterizada pela pequena pesca e pela pesca tradicional (14). Por este motivo, o Comité recomenda que se promova a investigação da avaliação de unidades populacionais e a recolha de dados para preparar sistemas adaptados e mais eficientes a fim de proteger a biodiversidade. A recolha de dados, o controlo e a execução eficazes são condições indispensáveis a uma gestão responsável das pescas que traga benefícios sociais e económicos aos pescadores e às comunidades locais.

5.11.

Tal como previsto pelo CESE (15), a obrigação de desembarque é um dos principais problemas para o setor, tanto para as empresas de pesca como para as autoridades nacionais, devido à sua complexidade e aos elevados custos da transição para uma pesca mais sustentável (por exemplo, a utilização de artes de pesca seletivas específicas). A nova proposta da Comissão sobre o controlo das pescas (16) deverá alargar as atuais obrigações dos navios de pequenas dimensões, e, em geral, criará novas competências e funções para todo o setor (ou seja, a obrigatoriedade de sistemas de televisão em circuito fechado (CCTV) a bordo). O CESE considera que é necessário um sistema de controlo mais simplificado, flexível e pragmático, devendo ser prestado apoio adequado a nível nacional a um elevado número de navios. Por este motivo, a fim de ajudar todos os pescadores a cumprirem o novo regulamento, a aplicação bem-sucedida do novo sistema de controlo depende, em grande medida, da aplicação rápida e integral do FEAMP 2021-2027 (17).

5.12.

O CESE salienta que a nova Diretiva da UE relativa à redução do impacto de determinados produtos de plástico (18) (por exemplo, artes de pesca usadas), aliada à nova Diretiva relativa aos meios portuários de receção (19), abre novos cenários e oportunidades para a pesca sustentável e para a economia circular. A medida destinada a encorajar a devolução de artes de pesca através de iniciativas dirigidas aos pescadores deve ser alargada à devolução de todos os outros resíduos e lixo marinho recolhidos durante as atividades de pesca.

5.13.

Esta iniciativa deve ser fundamental para o setor porque, de acordo com as leis atualmente em vigor, os pescadores são obrigados a pagar para as eliminar nos portos. Isto significa que, hoje, os pescadores pagam para limpar o oceano e eliminar resíduos que não produziram, mas sim recolheram. O CESE considera que os pescadores poderiam contribuir com um importante valor acrescentado e, com formação adequada, o ato de limpeza poderia tornar-se uma outra atividade económica lucrativa, nas mesmas linhas que a pesca turística (a economia azul) (20).

5.14.

O CESE, em consonância com a proposta da Comissão de afetar 25 % da totalidade do orçamento da UE à ação para as alterações climáticas, propõe que uma parte significativa destas verbas seja afetada à renovação dos portos, de modo a «fechar o ciclo» da gestão do lixo marinho e promover uma economia circular. Devem ser afetados fundos específicos à limpeza dos rios, no âmbito de uma estratégia alargada para a prevenção do lixo marinho (21). O CESE considera que os modelos de governação aberta com a participação dos poderes públicos e da sociedade civil organizada a nível local, como os «contratos de rio», poderiam ser replicados seguindo uma abordagem estruturada, promovendo a criação de redes transfronteiriças (22).

5.15.

Muitas partes interessadas salientaram dificuldades na consecução de condições equitativas em zonas em que o mar é utilizado para outros fins, sobretudo zonas partilhadas com frotas de países terceiros (23). Por este motivo, um papel mais forte da UE na governação internacional dos oceanos poderia oferecer mais oportunidades em termos de sustentabilidade ambiental e concorrência leal.

5.16.

O CESE apoia a realização de controlos em navios de países terceiros. Além disso, salienta que um melhor sistema de rastreabilidade do peixe proveniente de países terceiros seria útil para combater a fraude e garantir a segurança dos alimentos.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Pareceres do CESE: Quadro Financeiro Plurianual pós-2020 (JO C 440 de 6.12.2018, p. 106); Regulamento Disposições Comuns 2021-2027 (JO C 62 de 15.2.2019, p. 83); Regulamento relativo ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional 2021-2027 (JO C 62 de 15.2.2019, p. 90); Regulamento Cooperação Territorial Europeia 2021-2027 (JO C 440 de 6.12.2018, p. 116); Fundo Social Europeu + (JO C 62 de 15.2.2019, p. 165); Proposta para o Horizonte Europa (o novo PQ9) (JO C 62 de 15.2.2019, p. 33).

(2)  Se as atividades comerciais do navio em causa forem interrompidas durante pelo menos 90 dias consecutivos, e se as perdas económicas resultantes da cessação ascenderem a mais de 30 % do volume médio anual de negócios da empresa em causa durante um determinado período de tempo.

(3)  COM(2018) 390, p. 12.

(4)  O FEAMP para 2014-2020 em curso foi aplicado de forma muito limitada. Em especial, 29 % dos recursos financeiros foram atribuídos a projetos selecionados e apenas 8 % do orçamento total foi despendido pelos projetos selecionados. Dados: Comissão Europeia. https://cohesiondata.ec.europa.eu/funds/emff#

(5)  Uma infração grave implica uma sanção. Essa sanção pode variar na proporção da gravidade da infração. Em Espanha, por exemplo, pode variar entre 601 e 60 000 euros. Isto significa que um pescador pode ser condenado a uma sanção, proporcional à gravidade da infração, de apenas 601 euros, mas, em virtude do artigo 12.o, n.o 2, pode perder centenas de milhares de euros de apoio a um investimento que pode ter sido concluído e pago cinco anos antes. Este impacto é particularmente elevado na pequena pesca.

(6)  Parecer do CESE — Controlo das pescas (ver página 118 do presente Jornal Oficial).

(7)  Por exemplo, em Itália, em 8 000 km de costa, o número de navios de pesca diminuiu cerca de 33 % nos últimos 30 anos. Os navios têm, em média, 34 anos e precisam de melhorias urgentes ou de ser substituídos por navios novos. No mesmo período, perderam-se 18 000 postos de trabalho (o setor das pescas em Itália emprega 25 000 trabalhadores). Dados: Mipaaf, 2016.

(8)  Comité de Diálogo Social Setorial da UE — Pesca marítima (EUSSDC).

(9)  Parecer do CESE — Plano plurianual relativo às pescarias de pequenos pelágicos no mar Adriático (JO C 288 de 31.8.2017, p. 68).

(10)  10 https://www.theguardian.com/world/2018/may/18/we-thought-slavery-had-gone-away-african-men-exploited-on-irish-boats

(11)  A FAO estima que ocorram mais de 32 000 mortes no setor das pescas por ano em todo o mundo (https://safety4sea.com/fishers-fatalities-give-impetus-to-fishing-vessel-safety-work/).

(12)  OCDE, The Ocean Economy in 2030 [A economia dos oceanos em 2030], 2016.

(13)  Comissão Geral das Pescas do Mediterrâneo (CGPM), The State of Mediterranean and Black Sea Fisheries [O estado da pesca no mar Mediterrâneo e no mar Negro], 2016, p. 26. Tal como sublinhado pela CGPM da FAO, em mares com uma única espécie é mais fácil levar a cabo uma pesca específica, uma vez que coexistem poucos tipos de peixe, sendo, por isso, mais fácil impor limitações das capturas. Em contrapartida, em mares com várias espécies é possível encontrar muitas espécies de peixes na mesma zona.

(14)  Pareceres do CESE — Reforma da política comum das pescas, ponto 1.3 (JO C 181 de 21.6.2012, p. 183), e Plano plurianual relativo às pescarias de pequenos pelágicos no mar Adriático (JO C 288 de 31.8.2017, p. 68).

(15)  Parecer do CESE — Obrigação de desembarque (JO C 311 de 12.9.2014, p. 68). Ponto 1.2, «[A] proposta da Comissão é demasiado complexa e […] a obrigação de desembarque dará origem a uma carga de trabalho adicional excessiva e desproporcionada para os pescadores. Por essa razão, tem para si que se deveria apostar numa legislação mais pragmática, clara, simples e flexível, que permita efetivamente aos pescadores adaptarem-se ao longo de um período transitório, sem que sejam severamente sancionados.»

(16)  COM(2018) 368.

(17)  Ver nota 6.

(18)  COM(2018) 340 final.

(19)  COM(2018) 33 final.

(20)  Parecer do CESE — Plásticos de utilização única (JO C 62 de 15.2.2019, p. 207).

(21)  Relatório do Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA), 2016. Oitenta por cento do lixo marinho provém dos rios.

(22)  Ver nota 20.

(23)  MEDAC, Questions on post-2020 EU funding for fisheries and maritime sector [Questões sobre o financiamento da UE pós-2020 para o setor marítimo e das pescas], fevereiro de 2018.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/112


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Uma Europa que protege: ar limpo para todos»

[COM(2018) 330 final]

(2019/C 110/21)

Relator:

Octavian Cătălin ALBU

Consulta

Comissão Europeia, 18.6.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

 

Decisão da Plenária

19.6.2018

 

 

Competência

Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

27.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

129/0/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

Nos últimos 30 anos, a melhoria da qualidade do ar na União Europeia (UE) deveu-se à adoção de políticas específicas a nível da União. No entanto, muito há ainda a fazer, registando-se muitas excedências dos valores-limite fixados para as principais categorias de poluentes atmosféricos. O Comité Económico e Social Europeu (CESE) insta os Estados-Membros a colaborarem estreitamente, uma vez que este aspeto é crucial para a saúde dos cidadãos da UE. O CESE considera importante alertar para a qualidade do ar e as condições ambientais.

1.2.

O CESE frisa a imperiosidade de se reduzir a poluição nos setores comercial, institucional, doméstico e dos transportes. As instituições e os Estados-Membros devem dar o exemplo, mas a transição para fontes de aquecimento limpas, modernas e mais eficazes em termos energéticos implica que haja mais programas de apoio aos cidadãos.

1.3.

Tendo em conta que os transportes são uma das principais fontes de poluição atmosférica, o CESE acolhe favoravelmente o pacote Mobilidade Limpa que inclui várias iniciativas que, além de reduzirem as emissões de CO2, diminuirão também a poluição aos níveis local e regional.

1.4.

As medidas legislativas adicionais propostas pela Comissão Europeia para solucionar problemas como o escândalo relacionado com a manipulação das emissões nos veículos a diesel (dieselgate), ou as ações intentadas contra Estados-Membros por incumprimento da legislação vigente em matéria de poluição atmosférica, são um passo no bom sentido e o CESE apoia esta abordagem.

1.5.

O CESE está firmemente convicto de que a nova regulamentação ambiental, incluindo a que diz respeito aos transportes, deve ser acompanhada de medidas de apoio económico destinadas a incentivar a inovação e o desenvolvimento de novas tecnologias limpas, como baterias, veículos elétricos e sistemas de aquecimento e ventilação alternativos.

1.6.

Preocupa o CESE que, no setor agrícola, pese embora os progressos realizados na redução da poluição atmosférica, estes não sejam suficientes. O CESE recomenda que, no futuro, a política agrícola comum, juntamente com outros instrumentos financeiros e de investimento, se concentre mais nas iniciativas destinadas a reduzir o impacto ambiental e dê mostras de maior coerência no que respeita ao apoio concedido a agricultores para implementarem os programas que visam a realização deste objetivo. Neste contexto, considera um exemplo positivo as cooperativas de agricultores que produzem eletricidade a partir do biogás obtido de resíduos agrícolas.

1.7.

A cooperação internacional é essencial na luta contra a poluição e as alterações climáticas e, como tal, o CESE congratula-se que exista um amplo consenso entre os Estados-Membros quanto à realização dos objetivos do Acordo de Paris. O intercâmbio de boas práticas neste domínio e a Rede de Diplomacia Verde são particularmente importantes para o efeito. A fim de realizar os objetivos do acordo, os Estados-Membros devem também tomar medidas concretas para reduzir as emissões poluentes.

1.8.

O CESE insta os Estados-Membros a colaborarem estreitamente, uma vez que este aspeto é crucial para a saúde dos cidadãos da UE. Além disso, recomenda que os Estados-Membros e a Comissão Europeia colaborem mais estreitamente com a sociedade civil e os representantes das organizações da sociedade civil, a nível local e regional, no desenvolvimento e na realização de programas de proteção do ambiente e de campanhas de formação, informação e sensibilização da população para a qualidade do ar.

2.   Introdução

2.1.

Nos últimos 20 a 30 anos, a qualidade do ar na UE melhorou significativamente graças à adoção, pela UE e pelos Estados-Membros, de políticas específicas neste domínio, com vista a atingir um nível de qualidade do ar sem impactos negativos e riscos para a saúde humana e o ambiente. Assim, embora se observe uma tendência ascendente do PIB da UE, o nível de emissões de poluentes atmosféricos diminuiu 8 % no que se refere ao amoníaco e 72 % no que se refere aos óxidos de enxofre (1).

2.2.

A qualidade do ar é um fator determinante da saúde da população. As principais fontes de poluição do ar são as partículas em suspensão (PM10 e PM2,5) e o ozono troposférico, que é diretamente influenciado pelos óxidos de azoto (NOx) libertados para a atmosfera. Segundo a Organização Mundial da Saúde, a exposição a poluentes atmosféricos, como as partículas em suspensão, é responsável por 8 % das mortes por cancro do pulmão e por 3 % das mortes por doenças cardiovasculares em todo o mundo (2). Na UE, todos os anos, mais de 400 000 pessoas morrem prematuramente pela mesma causa (3).

2.3.

Devido a este facto, denota-se uma crescente preocupação dos cidadãos da UE com a poluição atmosférica (4). Em consequência, consagrou-se, pela via legislativa, quer a nível europeu quer nacional, o objetivo de atingir níveis de qualidade do ar que não sejam nocivos para a saúde da população e para o ambiente, tendo em vista a redução progressiva das emissões nocivas no pleno respeito da legislação da UE em vigor em matéria de qualidade do ar.

2.4.

As políticas da UE, neste contexto, assentam em três pilares:

o primeiro pilar abrange as normas de qualidade do ar ambiente, a cumprir por todos os Estados-Membros, com efeitos a partir de 2005 ou 2010, consoante o poluente;

o segundo pilar define objetivos nacionais de redução das emissões, recentemente revistos, que têm de ser concretizados em 2020 e 2030, e incluem um poluente adicional: as partículas finas (PM2,5);

o terceiro pilar estabelece normas sobre emissões aplicáveis às principais fontes de poluição: as emissões de veículos, de navios e de instalações industriais e de produção de energia. Devido ao escândalo relacionado com a manipulação das emissões nos veículos a diesel (dieselgate) em 2015, foi implementado o pacote de regras de emissões em condições reais de condução, e a Comissão propôs novas normas em matéria de emissões de CO2 para veículos ligeiros de passageiros, veículos ligeiros comerciais e veículos pesados novos.

2.5.

Segundo o relatório da AEA de 2017 sobre a qualidade do ar na Europa, as principais fontes de poluição atmosférica na Europa são os transportes (rodoviário e não só), a queima de combustíveis para fins comerciais, institucionais e domésticos, a produção de energia, os processos industriais e os setores agrícola e dos resíduos (5).

2.5.1.

O transporte rodoviário é responsável por 39 % de óxidos de azoto (NOx), 29 % de carbono preto, 20 % de monóxido de carbono (CO) e 11 % das emissões de partículas em suspensão (PM10 e PM2,5) do total das emissões poluentes. Com o pacote Mobilidade Limpa, a Comissão pretende estabelecer novas normas de emissão de CO2 para 2025 e 2030. Através da revisão da regulamentação (6) e de planos de ação (7) são promovidas novas tecnologias, como baterias, combustíveis alternativos e infraestruturas conexas. Além disso, o novo quadro do pacote Mobilidade Limpa recomenda a utilização integrada de comboios e camiões, a fim de aumentar a eficiência (8), incluindo a energética, e promover o desenvolvimento de itinerários de autocarros de longo curso, para reduzir as emissões e o congestionamento do tráfego (9).

2.5.2.

A queima de combustíveis para fins comerciais, institucionais e domésticos é responsável pela maior percentagem (42 % e 57 %) no que se refere à poluição por partículas em suspensão (PM2,5 e PM10), ao monóxido de carbono (CO) e às partículas de carbono preto, um poluente importante resultante da queima incompleta de combustíveis fósseis e de biomassa. Os valores da poluição proveniente deste setor permaneceram praticamente estáveis entre 2000 e 2015.

2.5.3.

A redução das emissões poluentes (59 % para o SO2 e 19 % para o NOx, no total) no setor da produção de eletricidade e calor deve-se aos seguintes fatores: desenvolvimento e maior utilização de fontes de energia alternativas e de sistemas de cogeração, modernização dos equipamentos das centrais elétricas e melhoria da sua eficiência, otimização energética dos processos de produção, melhoria do desempenho térmico dos edifícios, proibição gradual da queima de combustíveis fósseis e sua substituição por gás metano.

2.5.4.

A fim de reduzir as emissões das instalações industriais [50 % para os compostos orgânicos voláteis não metânicos (COVNM) e 17 % para as partículas PM10], foram implementadas medidas em conformidade e no respeito das disposições jurídicas em vigor a nível europeu. A fim de prevenir a poluição e assegurar o seu controlo, todas as instalações industriais devem estar registadas e dispor de uma autorização de laboração, na qual são fixados os valores-limite das emissões poluentes e estabelecidas todas as medidas necessárias para assegurar a proteção do ambiente.

2.5.5.

Tendo em conta que o setor agrícola é responsável por 95 % das emissões de amoníaco (NH3) e 52 % das emissões de metano (CH4), a sua redução é um problema da maior acuidade. As medidas para reduzir as emissões deste setor incluem medidas agronómicas (utilização equilibrada de adubos azotados nas explorações agrícolas, culturas de cobertura e de produtos hortícolas em terras aráveis para aumentar a fertilidade do solo), medidas zootécnicas (armazenamento fechado de estrume e a sua utilização em unidades de biogás), medidas energéticas (utilização da biomassa para fins de aquecimento, desenvolvimento de instalações fotovoltaicas, redução do consumo de combustíveis tradicionais e de eletricidade) e medidas agroambientais (aumento das competências profissionais dos agricultores e incentivo para que adotem práticas com baixa produção de emissões).

2.6.

O CESE mostra-se apreensivo com as condições ambientais, tendo alertado em várias ocasiões para este problema (10) e salientado «que é preciso envidar mais esforços no sentido de, antes de mais, prevenir a ocorrência dos danos ambientais e que uma estratégia profilática é sempre preferível a uma cura» (11).

3.   Observações gerais

3.1.

O CESE congratula-se com as medidas implementadas pela UE para alcançar níveis de qualidade do ar que não apresentem riscos para a saúde humana e para o ambiente, mas entende que estes esforços devem ser intensificados de forma significativa, tanto a nível da UE como a nível nacional, uma vez que os resultados obtidos não são totalmente satisfatórios. Não obstante os progressos registados na redução das emissões de poluentes, a qualidade do ar continua a afetar a saúde da população (12).

3.2.

O CESE manifesta preocupação com o facto de, atualmente, em vastas zonas da UE, a concentração de partículas em suspensão no ar ultrapassar os valores-limite admissíveis. Relativamente à concentração de partículas PM10, registaram-se excedências ao valor-limite diário em 19 % das estações de monitorização do ar ambiente, tendo sido esta percentagem de 6 % para as partículas PM2,5. Infelizmente, em 2015, a população urbana da UE esteve exposta a níveis que ultrapassavam os valores-limite admissíveis em 19 % no caso das partículas PM10 (um aumento em relação ao ano precedente) e em 7 % no caso das partículas PM2,5 (uma diminuição em relação ao ano precedente).

3.3.

O CESE chama a tenção para o facto de que, na Europa Central e Oriental, milhões de habitações utilizam madeira e carvão para aquecimento. Segundo a Organização Mundial da Saúde, na Europa Central e Oriental, esta prática contribui e continuará a contribuir para a poluição por PM2,5, que se mantém aos níveis de 2010-2015 (13). São necessárias mais medidas destinadas a apoiar e incentivar a população a transitar para fontes de aquecimento doméstico mais limpas.

3.4.

O CESE encara também com preocupação as excedências significativas dos valores de concentração anual de dióxido de azoto (NO2) em 22 Estados-Membros, registadas em 10 % das estações de monitorização, que em algumas grandes cidades ultrapassaram o dobro dos valores admissíveis regulamentados.

3.5.

O CESE salienta que a qualidade do ar é crucial tanto para os cidadãos como para as empresas (14). Assim, é necessário que os decisores europeus e nacionais tomem medidas concretas no que toca ao estabelecimento e cumprimento de um quadro legislativo nesta matéria.

3.6.

O CESE considera que, a fim de reduzir o nível de emissões poluentes dos setores comercial, institucional e doméstico, é imperativo que os Estados-Membros, com o apoio da Comissão, apostem fortemente em promover e otimizar o desempenho energético dos edifícios, a eficiência das instalações de produção de energia elétrica e térmica, a expansão e modernização das redes de aquecimento urbano, e apoiem sistemas alternativos de ar condicionado. Neste contexto, é de destacar o exemplo do edifício-sede do Banco Central Europeu, que está equipado com um sistema de aquecimento e ventilação inovador e ecológico.

3.7.

O CESE assinala que não se deve negligenciar a poluição do ar interior. A qualidade do ar que respiramos no interior dos edifícios é extremamente importante para a nossa saúde, em especial para os grupos sociais mais vulneráveis. O fumo do tabaco, a preparação de alimentos, a humidade, os sistemas de ventilação, a iluminação com velas, a utilização de produtos de limpeza sob a forma de detergentes, as ceras ou os vernizes e alguns materiais de construção podem tornar-se fontes importantes de poluição do ar interior. Assim, é importante dispor de uma política coerente em matéria de edifícios isentos de riscos para a saúde.

3.8.

O CESE entende que os Estados-Membros, em colaboração com a Comissão, devem definir e pôr em prática um novo conceito de desenvolvimento urbano, que preveja, entre outras medidas, a implementação de um sistema de transportes públicos ecológicos, bem como diversos incentivos à mobilidade elétrica ou híbrida, a utilização de meios eletrónicos para advertir os cidadãos em caso de excedência dos valores-limite admissíveis para a poluição atmosférica e o aumento das zonas verdes nas cidades, por forma a melhorar significativamente a qualidade do ar.

3.9.

O CESE considera que o acesso dos cidadãos a informações e dados sobre a qualidade do ar é um fator importante na luta contra a poluição atmosférica (15). As campanhas de formação e informação podem tornar os cidadãos mais conscientes do perigo da poluição atmosférica e do impacto das ações de cada cidadão. Há que reconhecer e valorizar o empenho das mães, preocupadas com o impacto da poluição na saúde dos filhos, em prol do ar limpo. A redução das possibilidades de passearem ao ar livre é considerada por estas mulheres como uma limitação dos seus direitos civis.

3.10.

O CESE congratula-se com a iniciativa de ONG e cidadãos que avançaram com uma ação judicial para requerer das autoridades nacionais a adoção de medidas adicionais para reduzir a poluição. Em países como a República Checa, Alemanha, Itália e Reino Unido, as decisões dos tribunais foram favoráveis aos requerentes (16).

3.11.

O CESE considera que as estratégias de descarbonização e os objetivos em matéria de energia proveniente de fontes renováveis devem ser definidos de modo que produza um verdadeiro impacto no ambiente sem, no entanto, afetar o desenvolvimento económico dos Estados-Membros.

4.   Observações na especialidade

4.1.

A Comissão dá muita importância ao cumprimento das normas sobre emissões poluentes de veículos, sobretudo depois do escândalo «dieselgate», e implementa medidas de controlo do cumprimento das obrigações previstas na respetiva legislação da UE em vigor.

4.2.

O CESE apoia a posição da Comissão, que exortou os Estados-Membros a identificarem todas as possibilidades de alteração e de melhorias para evitar que as emissões destes veículos ultrapassem os valores-limite regulamentados e, nessa impossibilidade, a proporem a retirada obrigatória e/ou voluntária, dos veículos afetados.

4.3.

O CESE congratula-se com a iniciativa da Comissão de instaurar processos contra 16 Estados-Membros por infração relacionada com a poluição causada por partículas (PM10) e contra 13 Estados-Membros por infração relacionada com a poluição causada por dióxido de azoto (NO2), e recomenda que estes Estados-Membros adotem, com celeridade, medidas para reduzir ou eliminar os períodos em que os valores-limite admissíveis para os poluentes são excedidos.

4.4.

O CESE congratula-se também com a decisão da Comissão de intentar junto do Tribunal de Justiça da União Europeia uma ação contra três Estados-Membros (Hungria, Itália e Roménia) por incumprimento dos valores-limite de poluição causada por partículas em suspensão (PM10) e contra três outros Estados-Membros (França, Alemanha e Reino Unido) por desrespeito dos valores-limite de poluição causada por dióxido de azoto (NO2). Estes seis Estados-Membros não propuseram, em tempo oportuno, medidas concretas e eficazes para reduzir a poluição de modo que não exceda os valores-limite admissíveis.

4.5.

Tendo em conta o elevado nível de poluição proveniente dos veículos a motor, o CESE acolhe com agrado as medidas propostas pela Comissão para reduzir as emissões, apresentadas no pacote Mobilidade, como a Diretiva Veículos Não Poluentes, as novas normas de CO2 para automóveis de passageiros e veículos pesados, um plano de ação para uma infraestrutura para combustíveis alternativos e uma iniciativa no domínio das baterias. Estas medidas também terão o efeito de reduzir as emissões analisadas no presente parecer.

4.6.

O CESE acolhe com agrado as novas regras propostas pela Comissão com o objetivo de reforçar significativamente a qualidade e a independência dos procedimentos utilizados na homologação e nos ensaios de veículos, antes de serem colocados no mercado, e de aumentar a eficiência do controlo dos veículos já em circulação. O regulamento que estabelece estas normas, que deverá entrar em vigor em setembro de 2020, proíbe a utilização de dispositivos manipuladores, visa a redução dos valores das emissões poluentes de veículos e estabelece o quadro jurídico necessário para uma transição para veículos com emissões reduzidas ou nulas.

4.7.

Dado o elevado nível emissões de poluentes com amoníaco (NH3) e metano (CH4) provenientes do setor agrícola (17), impõe-se a adoção de medidas ativas para as reduzir. O CESE considera que, nos próximos anos, a política agrícola comum deve focar-se mais no apoio aos agricultores e às cooperativas de agricultores para reduzir a poluição, facilitando o acesso ao financiamento, concedido por instituições bancárias europeias, a programas suscetíveis de reduzir as emissões de poluentes. Os futuros programas de desenvolvimento rural, no âmbito da PAC, também devem incluir medidas agroambientais destinadas a reduzir essas emissões.

4.8.

O CESE constata com preocupação que, entre 2000 e 2015, apesar das medidas aplicadas no setor agrícola e dos esforços dos agricultores, conseguiu-se apenas uma redução de 7 % das emissões de NH3 e de CH4. O aumento do número de cabeças de gado na UE resultou num aumento de 6 % das emissões de compostos orgânicos voláteis não metânicos (COVNM) provenientes sobretudo de estrume, mas as emissões por quilograma de carne diminuíram.

4.9.

Tendo em conta que a poluição atmosférica é um fenómeno global que não conhece fronteiras, o CESE considera imperativo que os Estados-Membros coordenem os seus esforços, com base nos objetivos e princípios acordados em toda a UE e no respeito do princípio da subsidiariedade. Existem precedentes nesse sentido e é necessário apoiar mais iniciativas desta natureza.

4.10.

O Comité considera que, para alcançar uma maior harmonização das políticas europeias e nacionais, a Comissão e os Estados-Membros têm de colaborar mais estreitamente com a sociedade civil para informar o público e desenvolver programas a nível local e regional.

4.11.

O CESE acolhe com agrado que a UE tenha alcançado um amplo consenso relativamente ao Acordo de Paris sobre as alterações climáticas e considera que a UE deve, no mesmo espírito, prosseguir os seus esforços no sentido de realizar os objetivos fixados, o que acabará por resultar na melhoria da qualidade do ar.

4.12.

O CESE insta os Estados-Membros, que ainda não o tenham feito, a desenvolverem estratégias para abandonar o carvão como fonte de energia. Sete Estados-Membros já suprimiram o carvão do seu cabaz energético e outros nove estão a planear fazê-lo (18).

4.13.

O CESE defende que a UE deve partilhar boas práticas com os seus parceiros internacionais. Não podemos ignorar os efeitos da poluição atmosférica no resto do mundo, que nos podem afetar tanto direta como indiretamente. A Rede de Diplomacia Verde e a coerência na política de desenvolvimento são hoje mais importantes do que nunca.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Air quality in Europe — 2017 report [A qualidade do ar na Europa — Relatório de 2017].

(2)  A nível mundial, 9 em cada 10 pessoas respiram ar poluído, mas são cada vez mais os países que estão a tomar medidas.

(3)  Air quality in Europe — 2017 report [A qualidade do ar na Europa — Relatório de 2017].

(4)  Eurobarómetro Especial n.o 468, «Attitudes of European citizens towards the environment» [Atitudes dos cidadãos europeus em relação ao meio ambiente].

(5)  Air quality in Europe — 2017 report [A qualidade do ar na Europa — Relatório de 2017].

(6)  COM (2017) 0653 final — 2017/0291 (COD).

(7)  COM (2017) 0652 final.

(8)  COM (2017) 0648 final — 2017/0290 (COD).

(9)  COM (2017) 0647 final — 2017/0288 (COD).

(10)  JO C 451 de 16.12.2014, p. 134.

(11)  JO C 283 de 10.8.2018, p. 83.

(12)  Tribunal de Contas Europeu, Relatório Especial n.o 23/2018.

(13)  Organização Mundial da Saúde, Residential heating with wood and coal: health impacts and policy options in Europe and North America [Aquecimento doméstico com madeira e carvão: impacto na saúde e opções políticas na Europa e na América do Norte].

(14)  Eurobarómetro Especial n.o 468, «Attitudes of European citizens towards the environment» [Atitudes dos cidadãos europeus em relação ao meio ambiente].

(15)  Air quality in Europe — 2017 report [A qualidade do ar na Europa — Relatório de 2017].

(16)  Tribunal de Contas Europeu, Relatório Especial n.o 23/2018.

(17)  Markus Amann, «Measures to adress air pollution from agricultural sources» [Medidas para combater a poluição atmosférica gerada pela agricultura].

(18)  «Overview: National coal phase-out announcements in Europe. Europe Beyond Coal» [Panorama dos países que anunciaram abandonar gradualmente o carvão na Europa. Desiste do carvão].


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/118


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1224/2009 do Conselho e que altera os Regulamentos (CE) n.o 768/2005, (CE) n.o 1967/2006, (CE) n.o 1005/2008 do Conselho e (UE) 2016/1139 do Parlamento Europeu e do Conselho, no que respeita ao controlo das pescas»

[COM(2018) 368 final — 2018/0193 (COD)]

(2019/C 110/22)

Relator:

Emilio FATOVIC

Consulta

Parlamento, 10.9.2018

Conselho, 5.7.2018

Base jurídica

Artigos 43.o, n.o 2, e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

 

Decisão da Plenária

19/06/2018 e 18/09/2018

 

 

Competência

Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

27.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

219/1/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) concorda, no essencial, com a proposta legislativa da Comissão sobre o controlo das pescas. No entanto, alguns dos problemas já assinalados pelas partes interessadas do setor ficaram sem resposta ou solução clara.

1.2.

O CESE reitera o princípio de que o conceito de sustentabilidade deve abranger as vertentes económica, social e ambiental. Neste contexto, é de assinalar que a proposta da Comissão não se baseia numa avaliação clara do impacto económico e social que se impunha, tendo em conta a profunda crise que o setor atravessa em vários países europeus, com consequências profundas no emprego e na economia das comunidades costeiras.

1.3.

A proposta da Comissão não tem em consideração dois fenómenos graves e significativos: o Brexit e as alterações climáticas. Ainda que de forma diversa, tanto um como outro vão alterar as práticas e os locais de pesca, pelo que exigem uma análise mais aprofundada e medidas adequadas para evitar desequilíbrios no setor das pescas.

1.4.

Cumpre implementar de forma uniforme e homogénea em toda a UE o sistema de controlos e sanções, baseado no chamado «sistema de licença por pontos», por forma a garantir tanto a concorrência leal entre as partes como a qualidade e a rastreabilidade dos produtos da pesca, no interesse e em prol da saúde de todos os cidadãos europeus. Ao mesmo tempo, as sanções devem basear-se em critérios de gestão do risco e ser efetivamente proporcionadas e dissuasivas.

1.5.

O CESE considera que a digitalização é, sem dúvida, da maior importância para a eficácia e a eficiência dos controlos. Frisa, porém, que, relativamente à legislação anterior, não se verifica, ao contrário do que foi anunciado pela Comissão, uma diminuição significativa das obrigações para os pescadores (nomeadamente para a pequena pesca) nem estas foram suficientemente simplificadas. Recomenda-se a realização de mais estudos sobre a real aplicabilidade de certas normas, designadamente as que dizem respeito às embarcações de comprimento inferior a 10 metros.

1.6.

O CESE opõe-se à obrigação horizontal de instalar sistemas de televisão em circuito fechado (CCTV) nas embarcações, na medida em que tal é contrário às normas fundamentais do direito do trabalho, à legislação relativa à privacidade e ao sigilo de empresa. Por conseguinte, propõe que os Estados-Membros avaliem o risco em determinados segmentos da frota caracterizados por um grau elevado e a prática generalizada de infrações graves, e que as autoridades de controlo exijam a instalação de CCTV nesses navios em função do seu historial de incumprimento. A fim de verificar o cumprimento da obrigação de desembarque, o CESE propõe que se reforce a presença de observadores a bordo e recomenda a criação de um mecanismo voluntário de introdução de CCTV, prevendo incentivos para os armadores que decidam aderir. Pontualmente, recomenda impor a obrigação temporária de CCTV nos casos de embarcações que registem repetidas infrações graves.

1.7.

O novo FEAMP 2021-2027 será fundamental para a adequação das embarcações europeias às novas disposições legislativas. É essencial que os fundos sejam facilmente acessíveis a nível nacional para todos os que os requeiram. Em especial, o Comité opõe-se à introdução de regras retroativas, que, em caso de infração grave, mesmo que isolada, obrigam o armador a restituir eventuais fundos anteriormente recebidos e devidamente comunicados.

1.8.

O CESE recorda que é nos países terceiros que se verifica grande parte dos casos de fraude e desrespeito pelas normas laborais e ambientais fundamentais. Todavia, o pescado fruto dessas práticas ilegais continua a chegar com relativa facilidade à mesa dos cidadãos europeus. É importante que os novos sistemas de rastreabilidade também resolvam estes problemas, monitorizando toda a cadeia de abastecimento. Ademais, salienta-se que, nos dias que correm, se registam ainda casos de exploração laboral em certas embarcações europeias. Recomenda-se, por conseguinte, que as autoridades de controlo consagrem especial atenção a este fenómeno e que se estabeleçam sanções pesadas para o erradicar definitivamente.

1.9.

O CESE observa que os modelos de sucesso proporcionados pelos planos plurianuais de pesca de uma única espécie são dificilmente adaptáveis à pescaria mista, tendo um grave impacto no ambiente e na economia. Por conseguinte, o Comité recomenda que o sistema de recolha de dados sobre as unidades populacionais seja mais aprofundado, a fim de elaborar estratégias específicas que possam melhor defender a biodiversidade sem prejudicar excessivamente o setor das pescas.

1.10.

O CESE entende que o regime de incentivos previsto para que os pescadores tragam para terra as redes deve ser alargado a todos os resíduos recolhidos no mar durante as atividades de pesca. Essa iniciativa seria fundamental para a limpeza dos mares, já que, até ao momento, são os pescadores a ter de pagar para retirar do mar lixo que não produziram. Na opinião do CESE, os pescadores poderiam, com formação adequada, acrescentar um valor significativo, contribuindo, por um lado, para limpar o mar e, por outro, para criar um círculo virtuoso de integração económica da atividade desenvolvida.

2.   Introdução

2.1.

O êxito da política comum das pescas (PCP) depende sobretudo da aplicação de um regime de controlo e execução eficaz. Encontram-se previstas medidas nesse sentido em quatro atos jurídicos diferentes: 1) o Regulamento relativo ao controlo das pescas, 2) o Regulamento que estabelece uma Agência Europeia de Controlo das Pescas (AECP), 3) o Regulamento que estabelece um regime para combater a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (Regulamento INN), e 4) o Regulamento relativo à gestão sustentável das frotas de pesca externas.

2.2.

Com exceção do Regulamento relativo à gestão sustentável das frotas de pesca externas, que foi recentemente revisto, o atual regime de controlo das pescas foi concebido antes da reforma da PCP, pelo que não é totalmente coerente com a mesma. Além disso, as referidas medidas têm mais de 10 anos; assim sendo, não dão conta das necessidades, atuais e futuras, de controlo das frotas e dos dados sobre as pescas, nem estão adaptadas às novas práticas e técnicas de pesca nem às novas tecnologias de controlo e sistemas de intercâmbio de dados. Por fim, não refletem algumas iniciativas importantes aprovadas pela União, como as estratégias para os plásticos, para o mercado único digital e para a governação dos oceanos.

2.3.

Assim, embora o regime atual de controlo das pescas tenha melhorado a situação anterior, a avaliação REFIT da Comissão, um relatório especial do Tribunal de Contas Europeu e uma resolução do Parlamento Europeu confirmaram que o regime de controlo das pescas apresenta algumas lacunas. As partes interessadas confirmaram as limitações do sistema vigente. Daqui decorre a necessidade de rever o enquadramento legislativo em vigor, na sua totalidade.

3.   Síntese da proposta da Comissão

3.1.

A proposta da Comissão consiste em alterar cinco regulamentos e visa: 1) colmatar as lacunas em relação à PCP e a outras políticas da UE, 2) simplificar o quadro legislativo e reduzir encargos administrativos desnecessários, 3) melhorar a disponibilidade, a fiabilidade e a exaustividade das informações e dos dados relativos às pescas, nomeadamente dos dados sobre as capturas, e permitir o intercâmbio e a partilha de informações, e 4) eliminar os obstáculos que impedem o desenvolvimento de uma cultura de cumprimento e o tratamento equitativo dos operadores ao nível da UE e nos Estados-Membros.

3.2.   Alterações ao Regulamento (CE) n.o 1224/2009 do Conselho (1) que institui um regime comunitário de controlo a fim de assegurar o cumprimento das regras da Política Comum das Pescas

3.2.1.

Inspeção e vigilância. São tornados mais claros o processo de inspeção e as obrigações dos inspetores, dos capitães e dos operadores. Os relatórios das inspeções serão digitalizados, permitindo uma melhor utilização e um melhor intercâmbio dos dados entre as autoridades competentes e os Estados-Membros.

3.2.2.

Sanções. É introduzida uma lista de critérios comuns para estabelecer a tipologia de infrações graves. São fixadas sanções administrativas obrigatórias e níveis mínimos de coimas para infrações graves, a fim de tornar o sistema sancionatório mais dissuasivo e eficaz em todos os Estados-Membros e assegurar condições de concorrência equitativas. É, ainda, reforçado e tornado mais claro o «sistema de pontos» para os navios titulares de licenças.

3.2.3.

Dados. São introduzidos sistemas digitalizados obrigatórios de localização e declaração das capturas aplicáveis a todos os navios de pesca da UE, incluindo os de comprimento inferior a 12 metros de fora a fora. Para a pequena pesca está previsto um sistema simplificado através da utilização de telemóveis. Também a pesca recreativa ficará sujeita a um controlo mais rigoroso. Pretende-se, com o recurso às tecnologias digitais, garantir a cabal rastreabilidade da cadeia de abastecimento, inclusive para os produtos importados de países terceiros, e acompanhar sistematicamente as atividades desenvolvidas nas embarcações, nomeadamente mediante sistemas de televisão em circuito fechado (CCTV), para cumprir o controlo da obrigação de desembarque.

3.2.4.

Alinhamento com outras políticas da UE. A comunicação sobre as artes de pesca perdidas é facilitada, através do preenchimento mais rigoroso de diários de pesca (eletrónicos). A obrigação de transportar a bordo o equipamento necessário para a recuperação de artes perdidas passa a aplicar-se também aos navios de pesca com comprimento inferior a 12 metros. São estabelecidas disposições relativas à marcação e ao controlo das artes de pesca para a pesca recreativa.

3.3.   Alterações ao Regulamento (CE) n.o 768/2005 do Conselho (2) que estabelece uma Agência Europeia de Controlo das Pescas

3.3.1.

A proposta alarga o âmbito geográfico das competências de inspeção da Agência Europeia de Controlo das Pescas, que deixa de estar limitado a águas internacionais. São introduzidas alterações que simplificam a gestão e o intercâmbio de dados, assim como normas que simplificam os processos de financiamento da agência.

3.3.2.

Em julho de 2018, a Comissão Europeia incorporou estas medidas ao apresentar a proposta COM(2018) 499, que visa codificar o Regulamento (CE) n.o 768/2005 que estabelece uma Agência Europeia de Controlo das Pescas, substituindo e integrando os diversos regulamentos nele compilados. O CESE pronunciou-se já a favor desta proposta num parecer especificamente consagrado ao tema (3).

3.4.   Alteração do Regulamento (CE) n.o 1005/2008 do Conselho (4) que estabelece um regime comunitário para prevenir, impedir e eliminar a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada

3.4.1.

As alterações ao regime de certificação das capturas da UE preveem a criação de uma base de dados para a gestão de certificados de captura (CATCH), que permitirá proceder a controlos baseados no risco, reduzirá o risco de importações fraudulentas e diminuirá a carga administrativa dos Estados-Membros. As funções operacionais do CATCH serão desenvolvidas em fases diferentes. São conferidos à Comissão poderes delegados e competências de execução relacionados com o funcionamento e desenvolvimento futuro do CATCH. As inspeções e sanções são alinhadas pelo novo enquadramento regulamentar.

4.   Observações na generalidade

4.1.

A iniciativa legislativa da Comissão, em linha com as posições expressas pelos Estados-Membros, os órgãos de poder regional e local e as partes interessadas, é, em termos gerais, bem aceite. Visa tornar mais claro o quadro regulamentar relativo aos controlos, simplificando-o, modernizando-o e alinhando-o pelos progressos políticos e regulamentares, garantindo a segurança jurídica e permitindo a sua aplicação uniforme e efetiva em toda a União Europeia.

4.2.

Infere-se, de uma análise minuciosa, que apesar do amplo processo de consulta levado a cabo pela Comissão, alguns problemas apresentados pelas partes interessadas do setor das pescas (por exemplo, obrigação de desembarque, excesso de burocracia, proporcionalidade do sistema sancionatório) ficaram sem resposta adequada e/ou solução clara na nova proposta legislativa (5).

4.3.

O CESE reitera o princípio de que o conceito de sustentabilidade deve abranger as vertentes económica, social e ambiental. Desta perspetiva, a pesca sustentável continua a ser o objetivo principal, mas convém que sejam dadas ao setor condições para o atingir. Por conseguinte, as medidas ambientais não podem ser dissociadas da necessidade de melhorar outros aspetos fundamentais, como as condições e a segurança no trabalho, a renovação das gerações, a rentabilidade da empresa, a formação dos profissionais e a vitalidade das comunidades costeiras.

4.4.

É de notar que as propostas de regulamento não têm em consideração dois fenómenos graves e significativos: o Brexit e as alterações climáticas. Por um lado, o Brexit exige uma revisão completa do mecanismo de estabilidade relativa, bem como uma redução das possibilidades de pesca nas águas atualmente europeias. Por outro lado, as alterações climáticas estão a causar mudanças significativas no comportamento e nos habitats dos peixes, cujas migrações são cada vez mais frequentes e significativas.

4.5.

O CESE constata que a proposta da Comissão não se baseia numa avaliação clara do impacto dos efeitos de caráter económico e social. Acresce que, em algumas regiões da UE, o setor das pescas se encontra em crise há mais de 20 anos, não tendo as medidas até agora estabelecidas pela Comissão em matéria de sustentabilidade e aquicultura contribuído para inverter essa tendência (6). Assim, o Comité apela para a pronta intervenção da DG Emprego no sentido de lançar um vasto debate no âmbito do diálogo social setorial (7) que permita identificar as medidas mais adequadas para avaliar e, se necessário, compensar o impacto económico e social das propostas (8).

4.6.

Segundo as críticas recentemente formuladas pelo Tribunal de Contas Europeu cumpre dar prioridade a uma aplicação uniforme e homogénea em toda a UE do sistema de controlos e sanções, baseado no chamado «sistema de licença por pontos», por forma a garantir tanto a concorrência leal entre as partes como a qualidade e a rastreabilidade dos produtos da pesca, no interesse e em prol da saúde de todos os cidadãos europeus.

4.7.

O CESE considera que a digitalização é, sem dúvida, da maior importância para a eficácia e a eficiência dos controlos. Considera positivo, bem assim, que estejam previstos controlos digitais simplificados para as embarcações de comprimento inferior a 12 metros de fora a fora (por exemplo, uma aplicação de geolocalização no telemóvel, embora em mar alto haja vastas áreas sem cobertura, o que impossibilita a monitorização das embarcações). Frisa, porém, que, relativamente à legislação anterior, não se verifica, ao contrário do que foi anunciado pela Comissão, uma diminuição significativa das obrigações para os pescadores (nomeadamente para a pequena pesca) nem estas foram suficientemente simplificadas.

4.8.

Os dispositivos de controlo digital devem permitir uma real poupança, económica e de tempo. O alargamento do conjunto das obrigações à pequena pesca será possível se os Estados-Membros dispuserem de um período transitório de dois anos, o que permitirá ter em conta as especificidades locais, mas poderá prejudicar as embarcações de comprimento inferior a 10 metros de fora a fora, que amiúde não dispõem de cabina de comando e são tripuladas apenas por uma pessoa. Para este caso, recomenda-se a realização de mais estudos que permitam avaliar a sua verdadeira exequibilidade, de modo a atingir um equilíbrio entre a necessidade de controlo e a capacidade efetiva dos pescadores de cumprir todas as práticas.

4.9.

O CESE observa, a propósito, que as medidas apresentadas com o objetivo de tornar mais claro o sistema de sanções se poderão revelar úteis ao setor, desde que sejam efetivamente baseadas em critérios de gestão do risco, proporcionadas e dissuasivas e aplicadas de forma homogénea nos diversos Estados-Membros. A análise da proposta revela, em particular, alguns aspetos contraditórios, como o de associar o montante pecuniário das sanções ao valor comercial dos produtos da pesca (entre o dobro e o quíntuplo do valor dos produtos da pesca), que varia significativamente consoante a área geográfica, o período do ano e a abundância ou não da espécie em causa, podendo mesmo gerar um efeito de incentivo a infringir a lei.

4.10.

O FEAMP constitui um instrumento crucial e indispensável para realizar a transição para o novo sistema de controlo previsto pela Comissão. O Comité manifesta a sua oposição ao princípio, já existente no sistema de controlos em vigor e no atual FEAMP, segundo o qual uma infração grave implica a restituição imediata de eventuais fundos europeus recebidos durante os cinco anos anteriores. Esta medida retroativa rígida constitui uma das causas principais do atraso do FEAMP na consecução dos seus objetivos, uma vez que levou muitos pescadores a não se candidatarem aos fundos europeus, com receio de terem de os restituir em caso de infrações consideradas graves que, por vezes, são sujeitas a uma sanção pecuniária muito reduzida. Cumpre, portanto, garantir maior proporcionalidade das sanções, de modo a não passarem de dissuasivas a desmotivantes.

4.11.

O CESE opõe-se firmemente à obrigação de instalar sistemas de televisão em circuito fechado (CCTV) nos navios de pesca para verificar o cumprimento da obrigação de desembarque. Este tipo de medidas é contrário às normas fundamentais do direito do trabalho, à legislação relativa à privacidade e ao sigilo de empresa, sobretudo porque é fixado de forma horizontal e não se fundamenta em eventuais riscos decorrentes de infrações anteriores repetidas da legislação. Por conseguinte, propõe que os Estados-Membros avaliem o risco em determinados segmentos da frota caracterizados por um grau elevado e a prática generalizada de infrações graves, e que as autoridades de controlo exijam a instalação de CCTV nesses navios em função do seu historial de incumprimento. O Comité entende que não é com uma monitorização e um controlo das atividades da pesca ao estilo do Big Brother que se atingirão os objetivos de sustentabilidade ambiental e revitalização do setor, mas antes com normas e sanções claras, fiáveis e transparentes aplicadas com eficácia e uniformemente em toda a UE.

4.12.

Em especial, o CESE propõe valorizar e reforçar a presença de observadores a bordo. Recomenda, além disso, a criação de um mecanismo voluntário de instalação de CCTV a bordo incentivado, por exemplo, com a possibilidade de aumentar a quota de capturas do navio de espécies que se encontram dentro dos níveis de RMS (rendimento máximo sustentável), recorrendo à reserva de quotas do Estado-Membro, se disponível, ou com mecanismos prioritários e simplificados de controlo e desembarque. Pontualmente, recomenda a obrigação temporária de CCTV nos casos de embarcações que registem repetidas infrações graves.

4.13.

O CESE entende que o novo FEAMP 2021-2027 será fundamental para a adequação das embarcações europeias às novas disposições legislativas. É essencial, sobretudo, que os fundos sejam facilmente acessíveis a nível nacional para todos os que os requeiram.

4.14.

Como já referiu noutros pareceres (9), o CESE considera importante definir a capacidade de pesca em função de parâmetros mais adequados relativos à arqueação e à potência do motor, que são fatores essenciais para garantir a segurança da tripulação a bordo e para atingir níveis de emissão de CO2 mais sustentáveis.

5.   Observações na especialidade

5.1.

A sobrepesca é certamente uma das principais causas do declínio dos recursos haliêuticos no mar. No entanto, o Comité considera que esta atividade deve ser considerada em conjugação com outros fenómenos igualmente prejudiciais para as espécies marinhas, como a poluição, as alterações climáticas, os transportes marítimos ou as perfurações subaquáticas (poluição sonora). É fundamental uma abordagem mais abrangente para elaborar estratégias eficazes de proteção dos habitats marinhos.

5.2.

Para ser verdadeiramente dissuasivo e eficaz, um regime de sanções deve ser claro e de fácil aplicação. O Comité observa que o sistema de licença por pontos pode, em alguns casos, prejudicar toda a tripulação ainda que sejam as escolhas e atitudes do capitão do navio a ser efetivamente sancionadas, nomeadamente quando são aplicadas medidas pesadas como a suspensão da licença de pesca. Durante o período de suspensão da licença de pesca (10) convém criar mecanismos de defesa dos trabalhadores dos navios de pesca que, tendo celebrado contratos «ao quinhão», correm o risco de ficar sem rendimento se não encontrarem outro navio para trabalhar, ou de terem de mudar de atividade. Num setor já em dificuldade, esta perda contínua de recursos humanos, competências e conhecimentos poderá prejudicar ainda mais as perspetivas de recuperação.

5.3.

O CESE concorda com a proposta de alargar o sistema de controlos à pesca recreativa, em que foram, recentemente, detetados numerosos casos de contorno da legislação em vigor para a pesca «clássica». Propõe-se, em particular, dedicar especial atenção à pesca recreativa enquanto fonte de rendimento, distinguindo-a da pesca recreativa para uso e consumo pessoal. Trata-se de uma medida fundamental para defender os pescadores que trabalham respeitando a lei e combater práticas de concorrência desleal ou, nos casos mais graves, de pesca ilegal.

5.4.

Embora reconhecendo que é da maior importância garantir a rastreabilidade dos produtos capturados, a escolha de eliminar a derrogação da obrigação de comunicar nos diários de pesca as capturas presentes a bordo estimadas como sendo inferiores a 50 kg poderá criar dificuldades, sobretudo aos pescadores de pequena escala. Na realidade, para dar cumprimento a todas as práticas burocráticas, que podem ser especialmente morosas em mares com várias espécies como o Mediterrâneo, estes pescadores poderão perder tempo excessivo antes do desembarque, o que os impedirá de vender o pescado ao melhor preço. Por conseguinte, recomenda que se mantenha o limiar atual, que deverá ser acompanhado de perto, velando por que não dê azo a qualquer efeito indesejável.

5.5.

O CESE apoia o novo mecanismo de rastreabilidade proposto pela Comissão, nomeadamente no que se refere aos produtos importados. É, de facto, nos países terceiros que se verifica grande parte dos casos de fraude e desrespeito pelas normas laborais (Convenção da OIT) e ambientais fundamentais; apesar disso, o pescado fruto dessas práticas ilegais continua a chegar com relativa facilidade à mesa dos cidadãos europeus. No entanto, importa notar que se verificam ainda hoje práticas de exploração laboral em algumas embarcações europeias (11) que requerem atenção específica por parte das autoridades de controlo e sanções pesadas para erradicar definitivamente este fenómeno.

5.6.

O Comité observa que a intensa rede de controlos da rastreabilidade existente não pode ser interrompida na primeira venda, pois é necessário controlar toda a cadeia de abastecimento, «do mar até à mesa». Também neste caso se recomenda a participação ativa de todas as partes interessadas, dos grossistas aos vendedores a retalho, passando pelo setor da transformação.

5.7.

A Declaração de Malta MedFish4Ever, de 2017, é uma pedra angular da ação da União Europeia. No entanto, o CESE pensa que seria conveniente adotar medidas técnicas e de conservação das unidades populacionais adequadas às diversas técnicas de pesca e às características biológicas do mar. O CESE observou, em particular, que os modelos de sucesso proporcionados pelos planos plurianuais de pesca de uma única espécie são dificilmente adaptáveis à pescaria mista, tendo um grave impacto no ambiente e na economia (12). Por conseguinte, o Comité recomenda que o sistema de recolha de dados sobre as unidades populacionais seja mais aprofundado, a fim de elaborar estratégias específicas que possam melhor defender a biodiversidade sem prejudicar excessivamente o setor das pescas (13).

5.8.

Tal como já assinalado em pareceres anteriores (14), o CESE considera que a combinação de um sistema de quotas rígido com a nova obrigação de desembarque constitui um dos principais problemas do setor. Os elevados custos da transição para uma pesca mais sustentável (por exemplo, redes seletivas) devem ser inteiramente suportados com financiamento do FEAMP. O CESE preconiza um sistema de controlo simplificado, baseado em análises de risco e pragmático, concebendo a realização de uma vasta ação a nível nacional, com o apoio das partes interessadas, para secundar a transição de um número alargado de embarcações.

5.9.

A Comissão propõe que todos os produtos da pesca sejam pesados por operadores registados no momento do desembarque, antes de serem armazenados, transportados ou vendidos. O CESE entende que é importante manter a atual possibilidade de realizar controlos por amostragem. Além disso, recomenda que, caso os produtos da pesca sejam transportados antes de serem colocados no mercado ou a primeira venda seja efetuada num país terceiro, se mantenha o atual limite de transmissão da devida documentação às autoridades competentes no prazo de 48 horas após o desembarque, a fim de evitar atrasos e a consequente perda de qualidade.

5.10.

O CESE apoia a proposta da Comissão sobre os plásticos de utilização única (15), em particular, as medidas de incentivo previstas para a receção em terra das artes de pesca rasgadas ou danificadas de modo a facilitar a respetiva reciclagem (16). Esta medida, em combinação com a nova medida a aplicar nos portos (17), abre novas perspetivas e oportunidades para a pesca sustentável e a economia circular. O CESE entende que o regime de incentivos previsto para que os pescadores tragam para terra as redes deve ser alargado a todos os tipos de resíduos recolhidos no mar durante as atividades de pesca. É igualmente importante assegurar que a introdução do mecanismo de responsabilidade alargada do produtor não comporta um agravamento dos custos de aquisição das redes para as empresas do setor das pescas. O FEAMP será, porventura, o instrumento financeiro mais adequado para apoiar esse processo.

5.11.

Uma iniciativa deste género seria fundamental para a limpeza dos mares, já que, até ao momento, são os pescadores a ter de pagar para descarregar em terra os resíduos recolhidos durante a pesca. Os resíduos correspondem a 90 % de todos os produtos recolhidos nas redes e os pescadores são ainda obrigados a separar os resíduos; quando não é possível identificá-los, devem catalogá-los como «resíduos especiais», o que exige formas de tratamento específicas. A legislação em vigor implica que, na prática, os pescadores paguem para retirar do mar lixo que não produziram. Na opinião do CESE, os pescadores poderiam, com formação adequada, acrescentar um valor significativo, contribuindo, por um lado, para limpar o mar e, por outro, para criar um círculo virtuoso de integração económica da atividade desenvolvida (18).

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  JO L 343 de 22.12.2009, p. 1.

(2)  JO L 128 de 21.5.2005, p. 1.

(3)  Parecer do CESE (NAT/756) sobre a «Agência Europeia de Controlo das Pescas» (codificação) (JO C 62 de 15.2.2019, p. 310).

(4)  JO L 286 de 29.10.2008, p. 1.

(5)  O Conselho Consultivo para o Mar Mediterrâneo (MEDAC), o Conselho Consultivo para a Frota de Longa Distância (LDAC) e a Associação das Organizações Nacionais das Empresas de Pesca da UE (Europeche) apresentaram por diversas vezes pedidos e propostas específicas para ultrapassar os problemas atuais do setor que não encontram resposta no pacote legislativo proposto pela Comissão.

(6)  Em Itália, em 8 000 km de costa, o número de navios de pesca diminuiu cerca de 33 % nos últimos 30 anos. Os navios de pesca têm, em média, 34 anos de idade e precisam de melhorias urgentes ou de serem substituídos por navios novos. Neste período, perderam-se 18 000 postos de trabalho (o setor das pescas em Itália emprega 27 000 trabalhadores). Dados: Ministério das Políticas Agrícolas, Alimentares e Florestais de Itália, 2016.

(7)  No âmbito do Comité do Diálogo Setorial da UE para a Pesca Marítima (EUSSDC).

(8)  Parecer do CESE (NAT/749) sobre o «Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (FEAMP)» (ver página 104 do presente Jornal Oficial).

(9)  Parecer do CESE (NAT/749) sobre o «Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (FEAMP)» (ver nota de rodapé 8).

(10)  A suspensão da licença de pesca, com base num critério de reincidência da infração, pode ir de um mínimo de 4 meses a um máximo de 1 ano, até à retirada definitiva da licença.

(11)  Ver artigo do The Guardian, «We thought slavery had gone away»: African men exploited on Irish boats («Pensávamos que a escravatura era coisa do passado»: africanos explorados em barcos irlandeses).

(12)  Comissão Geral das Pescas do Mediterrâneo (CGPM), The State of Mediterranean and Black Sea Fisheries (O estado da pesca no mar Mediterrâneo e no mar Negro), 2016, p. 26. Tal como sublinhado pela CGPM da FAO, em mares com uma única espécie é mais fácil levar a cabo uma pesca específica, uma vez que coexistem poucos tipos de peixe, sendo, por isso, mais fácil impor limitações das capturas. Em contrapartida, em mares com várias espécies encontram-se muitas espécies de peixes na mesma zona.

(13)  Parecer do CESE sobre o «Plano plurianual relativo às pescarias de pequenos pelágicos no mar Adriático» (JO C 288 de 31.8.2017, p. 68. Parecer do CESE (NAT/749) sobre o «Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (FEAMP)» (ver nota de rodapé 8).

(14)  Parecer do CESE sobre a «Obrigação de desembarque» (JO C 311 de 12.9.2014, p. 68). Ponto 1.2: «[A] proposta da Comissão é demasiado complexa e […] a obrigação de desembarque dará origem a uma carga de trabalho adicional excessiva e desproporcionada para os pescadores. Por essa razão, tem para si que se deveria apostar numa legislação mais pragmática, clara, simples e flexível, que permita efetivamente aos pescadores adaptarem-se ao longo de um período transitório, sem que sejam severamente sancionados.»

(15)  Parecer do CESE (NAT/742) sobre «Plásticos de utilização única» (JO C 62 de 15.2.2019, p. 207).

(16)  COM(2018) 340 final.

(17)  COM(2018) 33 final.

(18)  Parecer do CESE sobre a «Estratégia para os Plásticos na Economia Circular (incluindo medidas sobre o lixo marinho) (JO C 283 de 10.8.2018, p. 61).

Parecer do CESE (NAT/742) sobre «Plásticos de utilização única» (ver nota de rodapé 15).

Parecer do CESE (NAT/749) sobre o «Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (FEAMP)» (ver nota de rodape 8).


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/125


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2008/106/CE relativa ao nível mínimo de formação dos marítimos e que revoga a Diretiva 2005/45/CE»

[COM (2018) 315 final — 2018/0162 (COD)]

(2019/C 110/23)

Relatora:

Tanja BUZEK

Consulta

Parlamento Europeu, 11.6.2018

Conselho, 6.6.2018

Base jurídica

Artigo 100.o, n.o 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

 

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

20.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

201/3/6

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE apoia, de modo geral, os objetivos definidos pela Comissão na sua proposta de alteração da Diretiva 2008/106/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (1) relativa ao nível mínimo de formação dos marítimos, que revoga a Diretiva 2005/45/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (2) relativa ao reconhecimento mútuo dos certificados dos marítimos emitidos pelos Estados-Membros. O CESE considera que as alterações previstas no quadro regulamentar são necessárias, proporcionadas e eficazes em termos de custos.

1.2.

Embora reconhecendo que ambas as diretivas contribuíram tanto para a melhoria do ensino e da formação dos marítimos que trabalham a bordo de navios com pavilhão de um Estado-Membro da UE como para a mobilidade profissional dos marítimos certificados na União, o CESE considera oportuno ir mais longe neste domínio. Por conseguinte, recomenda que se tire partido da revisão da Diretiva 2008/106/CE para apelar para um debate mais amplo a nível europeu, envolvendo a Comissão, os Estados-Membros, as instituições de formação e o setor, sobre a forma de continuar a investir na base de competências marítimas europeia, a fim de preservar tanto a competitividade da frota europeia como a capacidade do setor de gerar emprego de qualidade para os marítimos europeus e outros profissionais do setor.

1.3.

Em particular, o CESE recomenda que se crie um fórum da UE que reúna as instituições de formação, o setor, os polos de atividades marítimas e as administrações marítimas nacionais, a fim de melhorar a formação dos marítimos e desenvolver cursos náuticos europeus de pós-graduação que ultrapassem o nível mínimo de formação dos marítimos acordado internacionalmente. Esta formação avançada proporcionaria uma vantagem competitiva aos marítimos europeus, ao dotá-los de competências que vão além das exigidas a nível internacional, e aumentaria atratividade das profissões marítimas na UE, especialmente no que diz respeito às mulheres e aos jovens.

1.4.

O CESE salienta a importância de desenvolver módulos de aprendizagem orientados para o futuro, prestando particular atenção à formação em matéria de gestão da qualidade, competências verdes e competências digitais, e considera que a promoção de competências avançadas deve ser acompanhada de modalidades de certificação/rotulagem.

1.5.

O CESE recomenda ainda o desenvolvimento de uma rede europeia de instituições de ensino e formação de marítimos que cumpram os critérios de qualidade, a fim de melhorar ainda mais o sistema de ensino marítimo na Europa. Recomenda igualmente a introdução, para a formação de comandantes e oficiais, de um sistema similar ao «Erasmus» para intercâmbios entre instituições de ensino e formação de marítimos de toda a UE, que seja adaptado às características específicas do setor.

1.6.

No que diz respeito ao mecanismo renovado para o reconhecimento dos certificados dos marítimos emitidos por países terceiros, o CESE estima ser da maior importância que os Estados-Membros consultem as associações de armadores e as organizações sindicais nacionais sobre a conveniência de reconhecer um novo país terceiro, antes de apresentarem o pedido à Comissão. O CESE gostaria de precisar ainda que, sempre que possível, a estimativa do número de marítimos suscetíveis de serem contratados será apenas um dos critérios a ter em conta no processo de decisão sobre o reconhecimento de um novo país terceiro e que deve ser acompanhado de forma transparente.

1.7.

No que se refere à prorrogação do prazo para a adoção de uma decisão sobre o reconhecimento de novos países terceiros de 18 para 24 meses, e em determinadas circunstâncias para 36 meses, o CESE manifesta preocupação quanto à questão de saber se este é o mecanismo adequado, uma vez que o processo pode ser desnecessariamente prolongado para um país que preencha claramente todos os requisitos. Por conseguinte, o CESE solicita que o processo seja concluído num prazo tão curto quanto possível, e que se preveja a possibilidade de este ser prolongado durante o tempo necessário se forem exigidas medidas corretivas.

1.8.

A fim de assegurar a utilização adequada dos recursos europeus, o CESE propõe que se altere o artigo 20.o de modo que as disposições em matéria de retirada do reconhecimento de um país terceiro também se apliquem aos países terceiros que não fornecem um número substancial de comandantes e oficiais durante, pelo menos, cinco anos. O CESE gostaria de precisar que a decisão final sobre a retirada, ou não, do reconhecimento continua a recair sobre o Estados-Membros, de acordo com o procedimento normal no âmbito do Comité para a Segurança Marítima e a Prevenção da Poluição por Navios (COSS), e que esses procedimentos permitem alguma margem de manobra para ter em conta informações importantes fornecidas pelos Estados-Membros.

1.9.

Tendo em conta que não pode haver cedências no que se refere à segurança marítima, o CESE recomenda que os países terceiros que fornecem um número limitado de comandantes e oficiais à frota da UE não sejam submetidos a um regime de avaliação menos rigoroso do que os outros países.

1.10.

Para além das alterações propostas ao procedimento de alteração (artigo 27.o), que prevê que a Comissão seja habilitada a alterar a Diretiva 2008/106/CE através de atos delegados, o CESE insta os Estados-Membros a tomarem medidas em tempo útil para aplicar as alterações, a fim de evitar que a inação do Estado de pavilhão crie a necessidade de prorrogações e de períodos de interpretação pragmática, como sucedeu anteriormente.

2.   Contexto

2.1.

A legislação da UE em matéria de ensino, formação e certificação dos marítimos baseia-se principalmente nos requisitos mínimos internacionais impostos pela Convenção da Organização Marítima Internacional (OMI) sobre Normas de Formação, de Certificação e de Serviço de Quartos para os Marítimos (Convenção STCW), na sua versão alterada.

2.2.

Além da integração da Convenção STCW a nível da UE através da Diretiva 2008/106/CE, conforme alterada, o quadro da UE prevê um mecanismo comum a nível da UE eficiente em termos de custos para o reconhecimento dos sistemas de ensino, formação e certificação dos marítimos de países terceiros. Este mecanismo está concebido de forma que a avaliação e reavaliação do cumprimento da Convenção STCW por parte de países terceiros sejam efetuadas de modo centralizado e harmonizado, evitando-se que cada Estado-Membro as tenha de realizar individualmente, sobretudo tendo em conta que atualmente são mais de 40 os países terceiros reconhecidos a nível da UE para este efeito.

2.3.

Este sistema regulamentar prevê igualmente um procedimento simplificado para o reconhecimento dos certificados dos marítimos emitidos pelos Estados-Membros ao abrigo da Diretiva 2005/45/CE. Esta diretiva teve como objetivo incentivar a mobilidade dos marítimos da UE entre navios que arvoram pavilhão de Estados-Membros da UE, permitindo o reconhecimento dos certificados detidos por comandantes e oficiais sem qualquer medida de compensação adicional.

2.4.

O quadro legislativo supramencionado pretende garantir um nível elevado de segurança da vida humana no mar e a proteção do meio marinho, minimizando os riscos de acidentes marítimos. Para atingir este objetivo, existe um entendimento comum de que a melhoria do ensino, formação e certificação do pessoal-chave a bordo de navios que arvoram pavilhão de Estados-Membros da UE é de extrema importância.

2.5.

A proposta decorre do Programa para a Adequação e a Eficácia da Regulamentação (REFIT) da Comissão, que avalia em que medida ambas as diretivas alcançaram os seus objetivos. O CESE observa que a revisão proposta resulta de uma avaliação aprofundada que incluiu um estudo exaustivo realizado pela Agência Europeia da Segurança Marítima (EMSA) («Study for the REFIT evaluation of Directives 2008/106/EC and 2005/45/EC» [Estudo para a avaliação REFIT das Diretivas 2008/106/CE e 2005/45/CE], de setembro de 2017 (3)), uma consulta pública, acompanhada de uma consulta mais específica, bem como seminários temáticos com a participação dos Estados-Membros e dos parceiros sociais, isto é, armadores e sindicatos que representam os marítimos.

2.6.

Segundo a avaliação REFIT, os resultados foram globalmente positivos e a legislação da UE contribuiu para o afastamento de tripulações insuficientemente qualificadas, a mobilidade dos marítimos na UE e o estabelecimento de condições equitativas entre os marítimos formados na União e os marítimos formados em países terceiros.

2.7.

Contudo, foram identificadas algumas insuficiências na eficácia do quadro regulamentar e na proporcionalidade de algumas das suas exigências. A proposta da Comissão pretende, por conseguinte, resolver as deficiências identificadas mediante a simplificação e a racionalização da legislação em vigor. Mais concretamente, considerou-se necessário uma nova intervenção para:

Assegurar a adaptação às alterações mais recentes efetuadas na Convenção STCW;

Atualizar a definição de certificados reconhecidos entre Estados-Membros, através da fusão da Diretiva 2005/45/CE com a Diretiva 2008/106/CE;

Definir critérios para um novo reconhecimento ou reavaliação de países terceiros, tendo em vista uma utilização mais eficiente dos recursos financeiros e humanos;

Estabelecer critérios de prioridade para a reavaliação de países terceiros, centrando-se nos principais países terceiros fornecedores de mão de obra, considerando simultaneamente a possibilidade de alargar o ciclo de reavaliação dos outros países;

Prorrogar o prazo para o reconhecimento de novos países terceiros, para que estes disponham de tempo suficiente para adotar e aplicar medidas corretivas, caso sejam necessárias.

3.   Síntese da proposta

3.1.

O objetivo geral da proposta consiste em simplificar e racionalizar a legislação atual. Tal inclui, em particular:

A adaptação contínua da legislação da UE pertinente à Convenção STCW;

O reforço da eficiência e da eficácia do mecanismo centralizado de reconhecimento de países terceiros;

Uma maior segurança jurídica no que diz respeito ao reconhecimento mútuo dos certificados dos marítimos emitidos pelos Estados-Membros.

3.2.

O mecanismo centralizado para o reconhecimento dos certificados dos marítimos emitidos por países terceiros exige que a Comissão disponibilize recursos humanos e financeiros substanciais, assistida nesta tarefa pela Agência Europeia da Segurança Marítima, a fim de, por um lado, avaliar os novos pedidos de reconhecimento efetuados pelos Estados-Membros e, por outro lado, realizar a reavaliação periódica dos países terceiros já reconhecidos.

3.3.

Tendo em vista uma melhor utilização dos recursos disponíveis, a Comissão propõe aumentar a transparência do processo de reconhecimento, permitindo ao Estado-Membro requerente expor os motivos da apresentação do pedido de reconhecimento. Esta medida consiste em introduzir um debate entre os Estados-Membros sobre a necessidade de reconhecer novos países terceiros.

3.4.

A Comissão propõe ainda critérios de prioridade para a reavaliação de países terceiros reconhecidos, baseando-se na ideia de que os recursos disponíveis devem ser redirecionados de países que fornecem um número reduzido de marítimos à frota da UE para os principais países terceiros fornecedores de mão de obra.

4.   Observações na generalidade

4.1.

O CESE apoia a proposta da Comissão de alterar a Diretiva 2008/106/CE relativa ao nível mínimo de formação dos marítimos, incluindo a integração no seu âmbito de aplicação do procedimento simplificado para o reconhecimento mútuo dos certificados dos marítimos emitidos pelos Estados-Membros, revogando a Diretiva 2005/45/CE.

4.2.

O CESE considera que se trata de uma revisão necessária, pois existe, de facto, margem para melhorar a eficiência do quadro administrativo no que se refere ao sistema de reconhecimento mútuo no âmbito da diretiva em apreço, a fim de permitir uma afetação mais eficiente dos recursos humanos e financeiros da Comissão e da Agência Europeia da Segurança Marítima.

4.3.

O CESE acolhe com especial agrado a ênfase colocada pela Comissão no nível de transparência que deve prevalecer no tratamento dos pedidos de reconhecimento dos certificados dos marítimos de novos países terceiros. O Comité considera que a nova fase processual que permite ao Estado-Membro requerente expor os motivos da apresentação do pedido de reconhecimento é proporcionada, transparente e eficiente em termos de custos. O Estado-Membro requerente continuará a ter a possibilidade de reconhecer o país terceiro unilateralmente, até que seja tomada uma decisão coletiva. Por conseguinte, o processo de decisão que conduz ao reconhecimento de um país terceiro estabelecerá um equilíbrio entre a necessidade de transparência no controlo e na boa utilização dos fundos públicos — os custos do procedimento de reconhecimento — e o objetivo de manter a competitividade da frota da UE — as vantagens competitivas para a frota da UE de contratar marítimos a partir dos países terceiros em causa.

4.4.

O CESE considera que o quadro regulamentar da UE em matéria de ensino, formação e certificação dos marítimos contribuiu para satisfazer as necessidades do mercado de trabalho do setor do transporte marítimo ao facilitar o acesso a emprego a bordo de navios que arvoram pavilhão de um Estado-Membro da UE a todos os comandantes e oficiais que detenham um certificado STCW válido, independentemente do seu local de residência ou nacionalidade. Embora seja inequívoco que o transporte marítimo opera num mercado de trabalho globalizado, o CESE gostaria de relembrar a importância de a UE investir fortemente na sua própria base de competências marítimas, a fim de salvaguardar uma massa crítica de marítimos europeus que mantém a competitividade do transporte marítimo europeu e dos polos de atividades marítimas em toda a UE. Por conseguinte, importa criar perspetivas de empregos altamente qualificados e de carreiras gratificantes no mar ou em atividades conexas em terra, em particular para os jovens europeus, ao mesmo tempo que se mantém ou até aumenta a percentagem de marítimos da UE na força de trabalho das profissões marítimas a nível mundial (os atuais 220 000 marítimos da UE representam 18 % do número total de marítimos a nível mundial) (4).

4.5.

Face ao exposto, o CESE exorta os Estados-Membros a aplicarem finalmente as recomendações contidas na Estratégia Europeia para o Transporte Marítimo no Horizonte de 2018 (5), bem como as recomendações políticas apresentadas pelo Grupo de Trabalho para o Emprego e a Competitividade no Setor Marítimo (6) à Comissão Europeia, no que toca a reforçar a eficácia e a eficiência do sistema de ensino no setor dos transportes marítimos. O CESE insta, em particular, a Comissão e os colegisladores da UE a terem em consideração as recomendações apresentadas infra na presente secção.

4.6.

O CESE recomenda que se crie um fórum da UE que reúna as instituições de formação, o setor, os polos de atividades marítimas e as administrações marítimas nacionais, a fim de melhorar a formação dos marítimos e, por sua vez, a sua colocação, progressão na carreira e mobilidade. Uma das missões principais desta rede consistiria em desenvolver cursos náuticos europeus de pós-graduação que ultrapassem o nível mínimo de formação dos marítimos acordado internacionalmente (também designados «certificados de excelência» ou «STCW+») (7). Esta formação avançada proporcionaria uma vantagem competitiva aos marítimos europeus, ao dotá-los de competências que vão além das exigidas a nível internacional.

4.7.

Tendo em conta o que precede, o CESE salienta a importância de desenvolver módulos de aprendizagem orientados para o futuro, prestando particular atenção à formação em matéria de gestão da qualidade, competências verdes e competências digitais. Estas últimas revestem-se de importância fundamental dado que as tecnologias de bordo, o intercâmbio de informações e de dados de comunicação e os sistemas de apoio em terra estão a evoluir rapidamente. O CESE considera que a promoção de competências avançadas deve ser acompanhada de modalidades de certificação/rotulagem, a fim de que a modernização da educação marítima se torne um trunfo precioso para ajudar os marítimos europeus a desenvolver as suas perspetivas de carreira. Tal permitirá, por sua vez, aumentar a atratividade das profissões marítimas na UE, especialmente no que diz respeito às mulheres e aos jovens, melhorando, ao mesmo tempo, a eficiência e a qualidade das operações dos navios, nomeadamente no que diz respeito à inovação permanente e à redução dos custos.

4.8.

Na mesma ordem de ideias, seria igualmente aconselhável ponderar a criação de uma rede europeia de instituições de ensino e formação de marítimos que cumprissem critérios de qualidade, a fim de melhorar ainda mais o sistema de ensino marítimo na Europa. Para o efeito, o CESE recomenda que se tome como exemplo a rede europeia de escolas de navegação interior — EDINNA (Education Inland Navigation), fundada em 2009 para promover a harmonização ascendente dos programas de ensino e formação. Esta plataforma revelou-se um excelente instrumento para permitir o intercâmbio de conhecimentos especializados e uma abordagem concertada para o desenvolvimento de competências profissionais. O CESE recomenda ainda a introdução, para a formação de comandantes e oficiais, de um sistema similar ao «Erasmus» para intercâmbios entre instituições de ensino e formação de marítimos de toda a UE, que seja adaptado às características específicas do setor.

4.9.

Além disso, o CESE apela a um impulso político concertado por parte da UE e dos Estados-Membros para apoiar este setor, que se esforça por responder aos desafios da digitalização, da automatização e da indispensável ecologização. O CESE observa que estes desafios podem ser enfrentados mais facilmente garantindo um sistema de ensino e formação marítimo europeu de elevada qualidade, que esteja orientado para o futuro. A este respeito, o Comité saúda o lançamento iminente do projeto quadrienal SkillSea. Este projeto fomentará a cooperação entre o setor — nomeadamente os parceiros sociais europeus no setor do transporte marítimo, a Associação de Armadores da Comunidade Europeia (ECSA) e a Federação Europeia dos Trabalhadores dos Transportes (ETF) —, os organismos de ensino e formação e as autoridades nacionais, tendo em vista melhorar os programas curriculares no domínio marítimo na Europa.

5.   Observações na especialidade

5.1.

O CESE congratula-se com o facto de as Diretivas 2005/45/CE e 2008/106/CE terem sido fundidas, pois considera que tal torna a aplicação mais eficaz e contribuirá provavelmente para aumentar a clareza e simplificar o quadro relativo à formação e certificação dos marítimos. Esta consolidação resolverá, nomeadamente, o problema da definição obsoleta de certificados constante da Diretiva 2005/45/CE e proporcionará uma clarificação e harmonização da definição de certificados dos marítimos reconhecidos pelos Estados-Membros. Com efeito, importa assegurar que a definição de certificados dos marítimos seja atualizada em conformidade com as novas definições introduzidas em 2012. Esta atualização aumentará provavelmente a segurança jurídica do mecanismo de reconhecimento mútuo entre Estados-Membros da UE.

5.2.

Um novo artigo 5.o-B visa incluir o reconhecimento mútuo dos certificados emitidos pelos Estados-Membros no âmbito de aplicação da Diretiva 2008/106/CE. O CESE entende que este aditamento é fundamental, na medida em que oferece uma clarificação sobre quais os certificados que serão mutuamente reconhecidos para que os marítimos certificados por um determinado Estado-Membro sejam autorizados a trabalhar a bordo de navios que arvorem pavilhão de outro Estado-Membro.

5.3.

O CESE apoia plenamente e incentiva uma maior mobilidade dos trabalhadores, a fim de ajudar os comandantes e oficiais certificados na UE e os armadores europeus a interagir mais facilmente. A este respeito, observa com satisfação que, de acordo com a Comissão (8), só em 2015, mais de 47 000 autenticações do certificado de competência emitido inicialmente por outro Estado-Membro se encontravam válidas na União, representando cerca de 25 % do número total de comandantes e oficiais disponíveis para trabalhar a bordo de navios que arvoram pavilhão de um Estado-Membro da UE.

5.4.

Os valores supramencionados demonstram que o mecanismo de reconhecimento mútuo dos certificados dos marítimos emitidos pelos Estados-Membros produziu resultados animadores, no que se refere à promoção da mobilidade de marítimos da UE entre navios que arvoram pavilhão de um Estado-Membro da UE. Além disso, o CESE sublinha a importância de contribuir em permanência para proteger os empregos europeus no mar, assegurar o futuro das instituições de ensino e formação de marítimos em toda a UE e salvaguardar os conhecimentos especializados marítimos europeus no seu conjunto.

5.5.

O CESE apoia a proposta de adaptação da Diretiva 2008/106/CE às alterações mais recentes da Convenção STCW, a fim de evitar incoerências jurídicas na diretiva relativamente ao quadro regulamentar internacional. Essa adaptação poderá assegurar a aplicação harmonizada a nível da UE e ajudar as tripulações a adquirir novas aptidões e competências — nomeadamente os requisitos de formação e qualificação dos marítimos que trabalham a bordo de navios de passageiros e navios abrangidos pelo Código Internacional para a Segurança dos Navios que utilizam Gases ou outros Combustíveis com Baixo Ponto de Inflamação (Código IGF) e pelo código de segurança para os navios que operem em águas polares (Código Polar) da OMI —, favorecendo ao mesmo tempo a evolução das carreiras.

5.6.

O CESE questiona o uso desproporcionado de recursos humanos e financeiros da União para avaliar novos países terceiros que poderão não conseguir fornecer um número substancial de comandantes e oficiais. Por conseguinte, apoia plenamente a proposta da Comissão de que cada novo pedido apresentado por um Estado-Membro para efeitos de reconhecimento de um país terceiro seja acompanhado de uma análise, na qual se inclua uma estimativa do número de oficiais e comandantes desse país suscetíveis de serem contratados. Além disso, o CESE estima ser da maior importância que os Estados-Membros consultem as associações de armadores e as organizações sindicais nacionais sobre a conveniência de reconhecer um novo país terceiro, antes de apresentarem o pedido à Comissão. O CESE gostaria, porém, de precisar que, sempre que possível, a estimativa do número de marítimos suscetíveis de serem contratados será apenas um dos critérios a ter em conta no processo de decisão sobre o reconhecimento de um novo país terceiro e que deve ser acompanhado de forma transparente.

5.7.

Para efeitos de maior eficácia e melhor utilização dos recursos disponíveis, o CESE congratula-se com o facto de, nos termos da proposta (artigo 19.o), sempre que um Estado-Membro pretender apresentar um pedido de reconhecimento de um novo país terceiro, deve apresentar uma justificação que será debatida entre os Estados-Membros. O CESE gostaria de precisar que a decisão final sobre o reconhecimento, ou não, de um novo país terceiro continua a recair sobre os Estados-Membros, de acordo com o procedimento normal, que prevê a votação por maioria qualificada no Comité para a Segurança Marítima e a Prevenção da Poluição por Navios (COSS). O CESE congratula-se também com o facto de se permitir que um Estado-Membro reconheça unilateralmente os certificados de um país terceiro, enquanto se aguarda o resultado da avaliação. O Comité apoia firmemente esta possibilidade, que oferece uma solução proporcionada e eficaz em termos de custos, preservando simultaneamente a competitividade da frota da UE.

5.8.

No que se refere à prorrogação do prazo para adoção de uma decisão sobre o reconhecimento de novos países terceiros de 18 para 24 meses, e em determinadas circunstâncias para 36 meses, o CESE considera que a medida proposta se justifica, desde que haja uma necessidade premente de o país terceiro aplicar medidas corretivas. Contudo, o CESE questiona-se sobre se o prolongamento automático do processo de reconhecimento constitui o mecanismo adequado, pois pode dar-se o caso de um país que claramente não cumpre todos os requisitos prolongar o processo desnecessariamente. Por conseguinte, o Comité propõe que o objetivo continue a ser concluir o processo num prazo tão curto quanto possível, e que se preveja a possibilidade de este ser prolongado durante o tempo necessário se forem exigidas medidas corretivas.

5.9.

O artigo 20.o revisto introduz uma razão distinta para anular o reconhecimento de um país terceiro, com base no não fornecimento de marítimos durante, pelo menos, cinco anos, à frota da UE. O CESE gostaria de precisar que a decisão final sobre a retirada, ou não, do reconhecimento continua a recair sobre os Estados-Membros, de acordo com o procedimento normal no âmbito do COSS, e que esses procedimentos permitem alguma margem de manobra para ter em conta informações importantes fornecidas pelos Estados-Membros. O CESE apoia, em princípio, esta revisão, mas gostaria de salientar que, para efeitos de uma utilização adequada dos recursos, o argumento aplica-se quer um país terceiro não forneça nenhum quer não forneça um número substancial de comandantes e oficiais. Neste contexto e em plena harmonia com os procedimentos, o CESE propõe que o reconhecimento de um país terceiro possa ser revogado caso este não forneça um número substancial de comandantes e oficiais durante, pelo menos, cinco anos.

5.10.

O CESE questiona a fundamentação subjacente à alteração do artigo 21.o, que prevê que o período de reavaliação possa ser alargado até dez anos, com base em critérios de prioridade. O CESE compreende que, de um ponto de vista estritamente matemático, os países terceiros que fornecem um número elevado de marítimos constituem, em teoria, uma maior ameaça à operação segura dos navios do que os que fornecem um número limitado de marítimos. Face ao exposto, e tendo em conta que não pode haver cedências no que se refere à segurança marítima, recomenda que os países terceiros que fornecem um número limitado de comandantes e oficiais à frota da UE não sejam submetidos a um regime de avaliação menos rigoroso.

5.11.

O CESE apoia a alteração do artigo 25.o-A, necessária para permitir a utilização transparente das informações fornecidas pelos Estados-Membros sobre o número de autenticações que atestam o reconhecimento de certificados emitidos por países terceiros, para efeitos de anulação do reconhecimento e de priorização da reavaliação destes países, conforme previsto nos artigos 20.o e 21.o.

5.12.

O CESE tem plena consciência de que, tendo em conta o caráter mundial do transporte marítimo, o objetivo deve ser evitar qualquer conflito entre os compromissos internacionais dos Estados-Membros e os seus compromissos a nível da União. Este facto exige uma adaptação contínua do quadro europeu à Convenção STCW, permitindo a criação de condições de concorrência equitativas entre a UE e os países terceiros na aplicação do quadro internacional relativo ao ensino, formação e certificação dos marítimos. Tendo em conta as considerações que precedem, e na eventualidade de futuras alterações à Convenção STCW, o CESE considera pertinente conferir à Comissão poderes para realizar alterações, através de atos delegados, a fim de assegurar uma adaptação mais fácil e mais rápida às alterações efetuadas na Convenção e no Código STCW.

5.13.

A este respeito, o CESE insta os Estados-Membros a tomarem medidas em tempo útil para aplicar as alterações, a fim de evitar que a inação do Estado de pavilhão crie a necessidade de prorrogações e de períodos de interpretação pragmática, como sucedeu anteriormente.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  JO L 323 de 3.12.2008, p. 33.

(2)  JO L 255 de 30.9.2005, p. 160.

(3)  https://ec.europa.eu/transport/sites/transport/files/legislation/2017-09-stwc-support-study-refit-eval-dirs-20080106-20050045.pdf

(4)  SWD (2016) 326 final.

(5)  COM (2009) 8 final.

(6)  O Grupo de Trabalho para o Emprego e a Competitividade no Setor Marítimo foi criado pelo vice-presidente da Comissão, Siim Kallas, e apresentou o seu relatório em 9 de junho de 2011.

(7)  COM (2009) 8 final.

(8)  SWD (2017) 18 final.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/132


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que estabelece o Programa de Investigação e Formação da Comunidade Europeia da Energia Atómica para o período de 2021-2025, que complementa o Horizonte Europa — Programa-Quadro de Investigação e Inovação»

[COM(2018) 437 final — 2018/0226 (NLE)]

(2019/C 110/24)

Relatora:

Giulia BARBUCCI

Consulta

Comissão Europeia, 12.7.2018

Conselho da União Europeia 13.7.2018

Base jurídica:

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

 

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

20.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Sessão plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

208/3/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe favoravelmente a proposta de regulamento que estabelece o Programa de Investigação e Formação da Comunidade Europeia da Energia Atómica (Euratom) para o período de 2021-2025, pondo em evidência a sua continuidade com os programas anteriores de investigação e desenvolvimento da fusão, da fissão e da segurança nucleares, e o Centro Comum de Investigação (CCI), abrangendo igualmente novos domínios de intervenção, como a proteção contra as radiações e a desativação das centrais nucleares.

1.2.

O CESE considera o orçamento do programa da Euratom adequado aos objetivos definidos e entende que é essencial manter esta dotação financeira independentemente dos resultados das negociações do Brexit. A este respeito, considera também que é crucial gerir muito cuidadosamente a saída do Reino Unido do programa da Euratom, em especial no que diz respeito às linhas de investigação já iniciadas, à partilha de instalações e ao impacto social no pessoal (p. ex., condições de trabalho) dentro e fora do solo britânico.

1.3.

O CESE considera o JET (Joint European Torus — Toro Conjunto Europeu) um fator crucial para o desenvolvimento do ITER, o qual, de resto, constitui a sua evolução lógica do ponto de vista científico. Por esse motivo, o Comité considera importante que o JET continue a funcionar (seja como projeto da UE seja como projeto partilhado entre a UE e o Reino Unido) até que o ITER esteja operacional.

1.4.

O CESE entende que os aspetos inovadores introduzidos no programa, como a sua simplificação, o alargamento dos objetivos (radiações ionizantes e desativação de instalações), uma melhor sinergia com o Programa Horizonte Europa e a possibilidade de financiar ações de educação e formação para investigadores (por exemplo, ações Marie Skłodowska-Curie), respondem às expectativas dos cidadãos e reforçam a eficiência e a eficácia do programa.

1.5.

O Comité considera que a segurança nuclear deve ser entendida como um conceito dinâmico, o que implica o acompanhamento e a adequação permanentes da legislação em vigor em função das descobertas e das inovações mais recentes, ao longo do tempo de vida das instalações. Importa prestar atenção particular às instalações situadas nas fronteiras entre países da UE, reforçando a coordenação entre as autoridades nacionais e locais e garantindo a participação efetiva dos cidadãos e dos trabalhadores.

1.6.

O CESE considera que a educação, a partir da escolaridade obrigatória, e a formação representam um fator essencial para aproximar os jovens das questões científicas e tecnológicas. Trata-se de um elemento essencial para aumentar no futuro o número de investigadores europeus no setor, investigadores esses que não são atualmente suficientes para dar resposta à procura do sistema produtivo e de investigação.

2.   Introdução

2.1.

A proposta de regulamento que estabelece o Programa de Investigação e Formação da Comunidade Europeia da Energia Atómica (Euratom) 2021-2025 faz parte do pacote legislativo relativo ao Programa-Quadro de Investigação e Inovação Horizonte Europa 2021-2027 (1). O programa proposto terá uma duração de cinco anos com base no artigo 7.o do Tratado Euratom, havendo a possibilidade de ser prorrogado dois anos a fim de o alinhar pela duração do Horizonte Europa e do Quadro Financeiro Plurianual (QFP).

2.2.

O Programa Horizonte Europa terá uma dotação financeira de 100 mil milhões de EUR para o período 2021-2027, dos quais 2 400 milhões de EUR se destinarão ao programa da Euratom. O Programa-Quadro Horizonte Europa cria igualmente o quadro de referência para os instrumentos e as modalidades de participação, bem como para as disposições em matéria de aplicação, avaliação e governação. Os domínios de investigação apoiados pelo programa da Euratom não estão incluídos no Horizonte Europa tanto por razões de ordem jurídica (tratados distintos), como por razões de gestão (para evitar duplicações), reforçando as sinergias entre programas.

2.3.

O CESE adotou um parecer neste domínio sobre a proposta de Programa Horizonte Europa (2), com o qual o presente parecer se relaciona estreitamente em termos de visão e de recomendações. O CESE formulou igualmente dois outros pareceres relacionados com o presente parecer, um sobre o ITER (3) e outro sobre o desmantelamento das centrais nucleares (4).

3.   Síntese da proposta

3.1.

O Programa de Investigação e Formação da Euratom diz respeito às diversas aplicações da energia atómica na Europa, tanto para a produção de energia como para diferentes finalidades noutros setores (por exemplo, as radiações ionizantes no setor médico). Os esforços da União Europeia têm por objetivo promover a inovação e o desenvolvimento de tecnologias seguras, reduzindo os riscos e garantindo um elevado nível de radioproteção. Por conseguinte, o programa permite integrar os contributos dos Estados-Membros, partilhando os processos de inovação, investigação e formação.

3.2.

A proposta define o orçamento e os objetivos comuns de investigação tanto para as ações diretas (levadas a cabo diretamente pela Comissão através do Centro Comum de Investigação — CCI) como para as ações indiretas (realizadas por entidades públicas ou privadas financiadas pelo programa), a executar segundo os programas de trabalho acordados com os Estados-Membros.

3.3.

O programa da Euratom para 2021-2025 será executado em regime de gestão direta. No entanto, se a Comissão o considerar oportuno e eficaz, poderá recorrer a um regime de gestão partilhada e/ou indireta, confiando, por contrato, a execução de certas partes do programa a Estados-Membros, pessoas ou empresas, bem como a países terceiros, organizações internacionais ou nacionais de países terceiros, nos termos do artigo 10.o do Tratado Euratom.

3.4.

O programa proposto prosseguirá as principais atividades de investigação do programa da Euratom atualmente em curso (radioproteção, segurança nuclear tanto das instalações como no quadro da politica internacional, gestão dos resíduos radioativos e energia de fusão), dando no entanto maior atenção à desativação e a aplicações distintas da produção de energia como as radiações ionizantes. O orçamento proposto de 1 675 milhões de EUR para o período 2021-2025 é repartido entre a investigação e o desenvolvimento da fusão nuclear (724 563 000 de EUR), da fissão nuclear, da segurança nuclear e da proteção contra as radiações (330 930 000 de EUR) e o CCI (619 507 000 de EUR).

3.5.

O alargamento do leque de objetivos aumenta a natureza transversal do instrumento, colocando-o mais ao serviço dos cidadãos. Em especial, o crescente número de aplicações das radiações ionizantes exige a proteção das pessoas e do ambiente contra uma exposição desnecessária às radiações. As tecnologias de radiações ionizantes são utilizadas quotidianamente na Europa em diversos setores, em especial no setor médico. Por conseguinte, também a investigação sobre a radioproteção será desenvolvida de modo transversal, tanto na vertente da produção de energia nuclear como para o setor médico, sem excluir outras formas de utilização na indústria, na agricultura, no ambiente e na segurança.

3.6.

Um outro elemento inovador reside na investigação orientada para o desenvolvimento e a avaliação de tecnologias destinadas à desativação e ao saneamento ambiental das instalações nucleares, na sequência de uma crescente exigência nesse sentido. Este aspeto é essencial para se fechar o círculo no que diz respeito aos outros aspetos de segurança já abrangidos pelo programa atualmente em curso: a segurança nuclear (isto é, a segurança dos reatores e do ciclo do combustível), a gestão do combustível consumido e dos resíduos radioativos, a proteção radiológica e a preparação para situações de emergência (acidentes radioativos e a investigação sobre radioecologia) e as medidas de execução das políticas para a segurança nuclear, as salvaguardas e a não proliferação.

3.7.

Estas iniciativas serão acompanhadas por uma ação específica destinada a apoiar o desenvolvimento da energia de fusão, uma fonte de energia potencialmente inesgotável e de menor impacto ambiental. Mais concretamente, a proposta está centrada em garantir a continuidade na implementação do «roteiro da fusão», que deverá conduzir à construção da primeira central na segunda metade do presente século. Por essa razão, a UE continuará a apoiar o ITER através de um programa específico (5) e, numa perspetiva de futuro, o projeto DEMO.

3.8.

Por último, para além de atividades de investigação, a proposta prevê a possibilidade de investigadores nucleares participarem em programas de educação e formação (por exemplo, nas ações Marie Skłodowska-Curie), a fim de se manter um elevado nível de competências, bem como um apoio financeiro específico que permita o acesso às infraestruturas de investigação europeias e internacionais (incluindo o CCI).

4.   Observações na generalidade

4.1.

O CESE acolhe favoravelmente a proposta de regulamento para o programa da Euratom para 2021-2025. Em especial, considera positiva a crescente interação no quadro do Programa Horizonte Europa, visando assegurar mecanismos comuns de governação, acesso e gestão dos fundos, bem como a integração entre as atividades de investigação e formação, evitando duplicações desnecessárias.

4.2.

O CESE considera o orçamento destinado ao programa da Euratom adequado aos objetivos que a União Europeia definiu no domínio nuclear. Por essa razão, considera essencial manter essa dotação financeira, independentemente dos resultados das negociações sobre o Brexit. A este respeito, considera que é também crucial gerir muito cuidadosamente a saída do Reino Unido do programa da Euratom, em especial no que diz respeito às linhas de investigação já iniciadas, à partilha de instalações e ao impacto social no pessoal (p. ex., condições de trabalho) dentro e fora do solo britânico (6).

4.3.

O CESE salienta, em particular, que a implementação do ITER requer o apoio do JET, cujas instalações, situadas no Reino Unido, são financiadas pela Euratom. Com efeito, o JET permite, entre outras coisas, testar partes das instalações do ITER atualmente em construção, sendo que o ITER representa para todos os efeitos, do ponto de vista científico, a continuação do JET. Essas instalações são únicas no mundo e não podem ser substituídas. Por esse motivo, o Comité considera importante que o JET continue a funcionar (seja como projeto da UE seja como projeto partilhado entre a UE e o Reino Unido) até que o ITER esteja operacional.

4.4.

O Comité apoia a abordagem da proposta de regulamento, que visa sobretudo dar continuidade às atividades de investigação e aos projetos já em curso, como o projeto ITER, que representa um importante objetivo nos processos de descarbonização (7), de aprovisionamento energético e de desenvolvimento industrial (8). Além disso, o novo programa inclui também novos aspetos interessantes, alargando a gama de atividades de investigação e inovação suscetíveis de financiamento orientadas para o desenvolvimento e o crescimento.

4.5.

O CESE acolhe muito favoravelmente a proposta de considerar suscetíveis de financiamento as ações referentes às radiações ionizantes, alargando a natureza transversal do programa, em consonância com o programa Horizonte Europa em matéria de desafios societais. A este respeito, é importante divulgar de forma rápida e sistemática os resultados dos processos de investigação e de inovação em termos de patentes e de novas tecnologias, dado o seu vasto âmbito de aplicação (9).

4.6.

É importante comunicar aos cidadãos os resultados obtidos graças ao financiamento e aos esforços conjuntos a nível europeu. Tal reforçará a confiança da população na ciência e na investigação, bem como a sensibilização para a importância da União Europeia e de uma estratégia específica para a melhoria da qualidade de vida de todos.

4.7.

O Comité considera igualmente positivo o alargamento do financiamento para a investigação e a disseminação do conhecimento à desativação e ao saneamento ambiental das instalações nucleares, tanto para fazer face às crescentes necessidades dos Estados-Membros como para fechar o círculo na gestão dos processos relacionados com a produção de energia nuclear, gestão essa que deve, necessariamente, resultar no saneamento ambiental seguro das instalações desativadas.

4.8.

Na opinião do CESE, o alargamento do programa às atividades de educação e de formação, como às ações Marie Skłodowska-Curie, é essencial para manter os elevados padrões de especialização no interior da UE. No entanto, é importante fixar também objetivos quantitativos além de qualitativos, uma vez que, até à data, os investigadores europeus do setor não são suficientes para cobrir todas as necessidades do sistema produtivo e de investigação europeu (10).

5.   Observações na especialidade

5.1.

O novo quadro para a segurança nuclear concluído após a catástrofe de Fucoxima (11) dá resposta às preocupações dos cidadãos. A União Europeia criou um sistema de controlos sistemáticos (análises pelos pares) e mecanismos de segurança dinâmicos e a vários níveis, que aumentaram o grau de segurança das instalações. O Comité recomenda o acompanhamento da correta aplicação da diretiva, bem como a sua atualização e adaptação aos novos desafios, para abranger todo o tempo de vida das instalações, desde o planeamento de novos reatores, passando pela adaptação permanente dos reatores existentes, até à sua desativação (12). Neste contexto, considera que as atividades de acompanhamento levadas a cabo por entidades externas e independentes podem assegurar normas mais elevadas segurança.

5.2.

Uma vez que muitos reatores estão localizados na fronteira entre dois ou mais países da UE, é importante criar um quadro reforçado de cooperação entre os Estados-Membros, a fim de estabelecer mecanismos de reação rápida a acidentes transfronteiriços imprevisíveis (13), assegurando uma cooperação e coordenação eficazes entre os respetivos órgãos de poder local e regional. Esse processo, em conformidade com o artigo 8.o da Diretiva 2014/87/Euratom, deverá prever também atividades de informação e de formação amplas e eficazes dirigidas aos trabalhadores e aos cidadãos, a apoiar através de linhas de financiamento específicas. Importa lançar iniciativas semelhantes com os países terceiros vizinhos que partilham os mesmos riscos (14).

5.3.

O Comité considera que a subcontratação poderá representar um fator de incerteza na manutenção das centrais nucleares e, por conseguinte, recomenda que esse expediente seja limitado e rigorosamente controlado (15).

5.4.

O CESE reputa essencial apoiar e favorecer o interesse dos jovens na ciência e na tecnologia, o que implica um empenho ativo e informado dos docentes escolares. Estes últimos, mediante uma formação e uma atualização constantes, deverão ser vetores positivos do conhecimento e promover debates abertos com os alunos sobre o tema, isentos de preconceitos e de estereótipos.

5.5.

Em particular, o CESE apoia as iniciativas (incluindo através do programa Erasmus+) que tenham por objetivo divulgar nas escolas o domínio CTEAM (ciência, tecnologia, engenharia, arte e matemática). Esta abordagem incentiva os estudantes a adotar uma atitude experimental e sistemática, uma vez que lhes proporciona a oportunidade de resolver de forma criativa problemas do mundo real. As investigação e os projetos já financiados pela UE nos últimos anos geraram resultados extremamente positivos, demonstrando que esta abordagem estimula o interesse pelas disciplinas técnicas, matemáticas e científicas, que se tornam posteriormente uma opção prioritária para os estudantes em vias de ingresso no ensino superior (16).

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  COM(2018) 435 final.

(2)  INT/858 — Horizonte Europa (JO C 62 de 15.2.2019, p. 33).

(3)  TEN/680, QFP e ITER (ver página 136 do presente do Jornal Oficial).

(4)  TEN/681 — QFP, desmantelamento nuclear e resíduos radioativos (ver página 141 do presente do Jornal Oficial).

(5)  TEN/680, QFP e QFP (ver nota de rodapé 3).

(6)  https://www.nature.com/articles/d41586-018-06826-y

(7)  JO C 107 de 6.4.2011, p. 37.

(8)  JO C 229 de 31.7.2012, p. 60.

(9)  INT/858 — Horizonte Europa (ver nota de rodapé 2).

(10)  JO C 237 de 6.7.2018, p. 38.

(11)  Diretiva 2014/87/Euratom do Conselho (JO L 219 de 25.7.2014, p. 42) e diretivas relacionadas.

(12)  JO C 341 de 21.11.2013, p. 92.

(13)  JO C 318 de 29.10.2011, p. 127.

(14)  JO C 487 de 28.12.2016, p. 104.

(15)  JO C 237 de 6.7.2018, p. 38.

(16)  JO C 75 de 10.3.2017, p. 6.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/136


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Conselho que altera a Decisão 2007/198/Euratom, que institui a Empresa Comum Europeia para o ITER e o Desenvolvimento da Energia de Fusão e que lhe confere vantagens»

[COM(2018) 445 final — 2018/0235 (NLE)]

(2019/C 110/25)

Relator:

Ulrich SAMM

Consulta

Comissão Europeia, 12.7.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

 

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

20.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

202/0/5

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE assinala que a obtenção de energia limpa constitui uma prioridade elevada. A energia de fusão é reconhecida neste contexto como uma solução potencial a longo prazo. A Europa está na vanguarda do desenvolvimento de tecnologias de fusão sustentáveis e sem emissões de carbono que contribuem para garantir a segurança do nosso cabaz de abastecimento energético.

1.2.

O CESE salienta que o elevado nível de investimento a longo prazo necessário para o desenvolvimento de uma central elétrica de fusão ainda comporta alguns riscos industriais. Contudo, em caso de sucesso, a sua realização constituiria um fator novo capaz de alterar significativamente o abastecimento energético existente ao introduzir uma inovação disruptiva, sendo o combustível de fusão abundante e praticamente inesgotável.

1.3.

A proposta aborda os principais desafios que o próximo QFP enfrenta para manter a dinâmica positiva do projeto ITER. No âmbito deste projeto, sete parceiros mundiais (UE, Estados Unidos, Rússia, Japão, China, Coreia do Sul e Índia) estão atualmente a construir, em colaboração, o primeiro reator de fusão ITER com uma potência térmica de 500 MW, em Cadarache (França). As operações terão início em 2025, prevendo-se que, em 2035, o reator esteja a funcionar em condições de desempenho máximas (500 MW). O CESE congratula-se com os progressos alcançados nos últimos anos, após uma revisão profunda do projeto ITER (novos órgãos de direção e revisão do calendário de referência do ITER) que permitiu ultrapassar os problemas existentes.

1.4.

O CESE exorta a Comissão a enfatizar a importância da necessidade de interligar o projeto ITER e a investigação europeia no domínio da fusão organizada pelo consórcio EUROfusion, que é financiado ao abrigo do Programa de Investigação e Formação da Euratom e gere o projeto Joint European Torus (JET), uma importante instalação experimental localizada em Culham (Reino Unido). Para além da construção, o ITER requer uma preparação minuciosa e só uma comunidade europeia de investigação robusta consegue manter os programas de acompanhamento e a liderança.

1.5.

O CESE reconhece o valor acrescentado da UE, demonstrado pelo êxito do EUROfusion. Este é o programa de investigação que na Europa mobiliza, de longe, mais Estados-Membros (exceto o Luxemburgo e Malta), contribuindo com projetos essenciais que, no seu conjunto, asseguram a liderança mundial da UE neste domínio.

1.6.

O CESE congratula-se com o facto de o novo roteiro europeu para a realização da energia de fusão, elaborado pelo EUROfusion, estabelecer uma trajetória bem definida para a construção de uma primeira central elétrica de fusão assente numa maior participação da indústria, na formação de cientistas e engenheiros no domínio da fusão em toda a Europa e numa forte colaboração fora da Europa. O roteiro prevê que, em 2035, o ITER esteja a funcionar normalmente em condições de elevado desempenho e que, com base nos resultados, o projeto de uma primeira central elétrica de fusão (DEMO), pela primeira vez fornecendo eletricidade à rede, esteja concluído por volta de 2040, ano em que a construção será iniciada.

1.7.

O CESE está ciente de que o ITER tem problemas importantes que só podem ser abordados no JET, pelo que partilha das preocupações manifestadas quanto ao efeito do Brexit na continuação do JET. Para minimizar os riscos operacionais do ITER e otimizar o seu plano de investigação, o CESE considera importante que o JET continue a funcionar (como uma instalação da UE ou uma instalação conjunta da UE e do Reino Unido) no período entre 2020 e o início do funcionamento do ITER, visto que não há soluções de reserva para a perda do JET neste período.

1.8.

A proposta da Comissão indica o orçamento para o ITER, mas nada diz sobre a adequação do orçamento necessário para o programa de investigação no domínio da fusão que o acompanha. O CESE salienta que o orçamento reservado para EUROfusion no período de 2021-2025 tem de ser compatível com os objetivos do roteiro para a fusão, sendo o trabalho relacionado com o ITER essencial.

1.9.

O CESE congratula-se com a importância dos investimentos em tecnologia de fusão para a indústria e as PME. Entre 2008 e 2017, a empresa comum Energia de Fusão (F4E) adjudicou contratos e concedeu subvenções no valor aproximado de 3 800 milhões de euros em toda a Europa. Pelo menos 500 empresas, incluindo PME, e mais de 70 organizações de I&D, de cerca de 20 Estados-Membros da UE e da Suíça, beneficiaram do investimento nas atividades do ITER. Além disso, as partes no ITER de países terceiros também assinaram contratos com a indústria europeia para apoiar o fabrico das suas próprias componentes para o ITER, o que gera novos postos de trabalho e crescimento para as empresas europeias. O CESE regista que o fator que mais contribui para o impacto líquido dos investimentos no ITER é o desenvolvimento de iniciativas derivadas e transferências de tecnologia, que criam novas oportunidades de negócio noutros setores.

1.10.

O CESE está convicto de que a investigação europeia no domínio da fusão, de um modo geral, e a realização do ITER, em particular, podem constituir um excelente exemplo ilustrativo do poder dos projetos europeus conjuntos. É importante informar o grande público sobre os resultados obtidos graças ao financiamento e aos esforços conjuntos a nível europeu. Tal aumentará a confiança dos cidadãos na ciência e na investigação, ao mesmo tempo que os sensibilizará para a importância da União Europeia.

2.   Introdução

2.1.

O ITER (Reator Termonuclear Experimental Internacional) é um projeto de colaboração científica internacional lançado em 2005 entre sete parceiros mundiais (as partes no ITER são: UE, Estados Unidos, Rússia, Japão, China, Coreia do Sul e Índia). O projeto visa demonstrar a viabilidade científica e tecnológica da energia de fusão para fins pacíficos através da construção e da exploração do primeiro reator de fusão ITER de 500 MW em Cadarache (França). O CESE já manifestou o seu apoio a este projeto em diversos pareceres (1). O ITER é a próxima etapa na via para a energia de fusão, a fonte de energia sustentável mais inovadora e promissora, capaz de fazer frente à crescente procura de energia, a par do desenvolvimento das energias renováveis.

2.2.

Em 2015, efetuou-se uma revisão profunda do projeto ITER que passou pela nomeação de novos órgãos de administração na Organização ITER e na F4E. Em 19 de novembro de 2016, o Conselho ITER aprovou o calendário de base revisto do ITER. Este calendário aponta o horizonte de dezembro de 2025 como a data mais precoce possível, em termos técnicos, para o primeiro plasma e o horizonte de 2035 como a data em que o reator deverá estar a funcionar em condições de desempenho máximas (500 MW), com utilização de combustível deutério-trítio. As avaliações independentes realizadas nos últimos anos confirmaram a apreciação positiva dos progressos do ITER, reconhecendo a estabilização do projeto e a existência de uma base realista para a sua concretização.

2.3.

O contributo europeu para a Organização ITER é assegurado pela Agência Interna da UE Energia de Fusão (F4E), localizada em Barcelona (Espanha). A F4E é uma empresa comum criada em conformidade com o capítulo 5 do Tratado Euratom. Ao abrigo dos seus estatutos, possui o seu próprio procedimento de quitação orçamental pelo Parlamento Europeu, na sequência de uma recomendação do Conselho da UE. Em 2015, foi adotado um novo regulamento financeiro da F4E; a responsabilidade pela supervisão do ITER e, por conseguinte, da F4E foi transferida da DG RTD para a DG ENER.

2.4.

Adicionalmente à construção do ITER, a investigação no domínio da fusão conta com o vasto e profundo apoio científico do Programa de Investigação e Formação (2), que complementa o programa geral de investigação Horizonte Europa (3). Para além das atividades de investigação nuclear clássica, este programa abrange as atividades de investigação fundamental relativas ao desenvolvimento da energia de fusão segundo o Roteiro de Investigação no Domínio da Fusão, que descreve uma trajetória otimizada que vai, através do ITER e de uma central elétrica de demonstração (DEMO), até à utilização comercial das instalações de fusão. O roteiro de investigação no domínio da fusão descreve não só as principais instalações necessárias, mas também a investigação a realizar para apoiar o ITER e a DEMO.

2.5.

O roteiro de investigação no domínio da fusão foi desenvolvido pelo EUROfusion, que é responsável pela coordenação das atividades europeias de investigação no campo da fusão. Este consórcio reúne 30 institutos de investigação nacionais e cerca de 150 universidades de 26 países da UE, mais a Suíça e a Ucrânia. O EUROfusion está sediado em Garching (Alemanha), enquanto a experiência emblemática Joint European Torus (JET) se localiza em Culham (Reino Unido).

3.   Síntese da proposta

3.1.

A proposta (4) aborda os principais desafios que o próximo QFP terá de enfrentar para manter a dinâmica positiva do projeto, assegurar a progressão regular dos trabalhos de construção e montagem e manter o empenho de todas as partes no ITER. A resposta a estes desafios exige que a UE continue a liderar o projeto, apoiando-se no excelente desempenho da F4E, e que respeite integralmente a sua quota-parte de obrigações de financiamento e contribuições em espécie.

3.2.

Os recursos de que a Euratom necessita para poder concluir a instalação e iniciar a fase de funcionamento/experimental estão especificados na Comunicação da Comissão — Contribuição da UE para uma reforma do projeto ITER, adotada pela Comissão em junho de 2017.

3.3.

A Comissão convida o Parlamento Europeu e o Conselho a fixarem o nível máximo dos compromissos da Euratom para o ITER no Quadro Financeiro Plurianual para o período 2021-2027 em 6 070 000 000 euros (em valores atuais). Considera-se que este montante constitui a massa crítica de financiamento necessária para garantir a eficácia das ações da UE relacionadas com o ITER, correspondendo à nova base de referência para a construção do ITER. O orçamento proposto baseia-se na data mais precoce possível, em termos técnicos, para a construção do ITER e não tem margem para imprevistos, assumindo, portanto, que é possível atenuar todos os riscos maiores.

4.   Observações na generalidade

4.1.

O CESE assinala que assegurar a competitividade e garantir a segurança do nosso abastecimento energético constitui uma preocupação prioritária que, no entanto, só é sustentável quando conjugada com o combate às alterações climáticas. As fontes de energia sem emissões de carbono e sustentáveis são, por conseguinte, cruciais para a nossa prosperidade e o nosso bem-estar futuros. A obtenção de energia limpa constitui uma prioridade elevada. A energia de fusão é reconhecida neste contexto como uma solução potencial a longo prazo, estando a Europa na vanguarda do desenvolvimento das tecnologias de fusão.

4.2.

O CESE salienta que o elevado nível de investimento a longo prazo necessário para o desenvolvimento de uma central elétrica de fusão ainda comporta alguns riscos industriais. Contudo, em caso de sucesso, a sua realização constituiria um fator novo capaz de alterar significativamente o abastecimento energético existente ao introduzir uma inovação disruptiva. O combustível de fusão é abundante e praticamente inesgotável: é possível produzir trítio a partir de lítio, metal ubíquo na crosta terrestre e na água do mar, enquanto o deutério está presente na água natural.

4.3.

O CESE deseja realçar as características de segurança da fusão que a distinguem da cisão nuclear convencional. Uma central elétrica de fusão é intrinsecamente segura: apenas alguns gramas de combustível compõem o plasma, que depressa se extingue em caso de avaria. As reações deutério-trítio libertam neutrões que ativam os materiais das paredes. Os subprodutos radioativos resultantes têm uma vida curta, pelo que a maioria dos materiais pode ser reciclada após um certo período de decaimento, não sendo necessário criar novas instalações de armazenamento de resíduos nucleares.

4.4.

O CESE exorta a Comissão a enfatizar a importância da necessidade de interligar o projeto ITER e a investigação europeia no domínio da fusão organizada pelo consórcio EUROfusion. Para além da construção, o projeto ITER requer uma preparação minuciosa e programas de acompanhamento. Na Europa, um programa coordenado que utiliza o JET e outros dispositivos, a par de modelos e simulações, ajuda a testar e a desenvolver os cenários de exploração do ITER, além de projetar e otimizar o desempenho do ITER e a conceção da DEMO. O funcionamento do Tokamak do JET com uma mistura deutério-trítio e uma parede análoga ao ITER é fundamental para a preparação da exploração do ITER.

4.5.

O CESE reconhece o valor acrescentado da UE, demonstrado pelo êxito do EUROfusion. Este é o programa de investigação que na Europa mobiliza, de longe, mais Estados-Membros (exceto o Luxemburgo e Malta), contribuindo com projetos essenciais que, no seu conjunto, asseguram a liderança mundial da UE neste domínio. Os investimentos e o financiamento da investigação têm beneficiado as indústrias, os centros de investigação e as universidades.

4.6.

O CESE está convicto de que a investigação europeia no domínio da fusão, de um modo geral, e a realização do ITER, em particular, podem constituir um excelente exemplo ilustrativo do poder dos projetos europeus conjuntos. É importante informar o grande público sobre os resultados obtidos graças ao financiamento e aos esforços conjuntos a nível europeu. Tal aumentará a confiança dos cidadãos na ciência e na investigação, ao mesmo tempo que os sensibilizará para a importância da União Europeia na consecução de um objetivo distante, difícil e inexequível se dependente do esforço e do financiamento isolados de cada país. As suas repercussões a longo prazo serão importantes, não só em termos tecnológicos e industriais, mas também no plano da investigação, da indústria e das PME, com um impacto significativo na economia e na criação de emprego, inclusive a curto e médio prazo.

5.   Observações na especialidade

5.1.

O CESE reconhece que o novo roteiro europeu para a realização da energia de fusão estabelece uma trajetória bem definida para a criação de uma primeira central elétrica de fusão assente numa maior participação da indústria, na formação de cientistas e engenheiros no domínio da fusão em toda a Europa e numa forte colaboração fora da Europa. O roteiro abrange o período a curto prazo até à entrada em funcionamento do ITER (2025), o período a médio prazo até ao funcionamento normal do ITER em condições de elevado desempenho (2035), e o período a longo prazo até à construção de uma primeira central elétrica de fusão (DEMO), que fornecerá eletricidade à rede pela primeira vez.

5.2.

O ITER é a instalação fundamental do roteiro, uma vez que deverá cumprir a maioria das etapas importantes no caminho para a energia de fusão. Deste modo, os recursos propostos a curto prazo para a EUROfusion são, na grande maioria, consagrados ao ITER e às experiências a este associadas, uma das quais é o projeto Joint European Torus (JET), em Culham (Reino Unido). O CESE reconhece que o projeto JET demonstrou que a construção e exploração de uma grande infraestrutura de investigação no domínio da fusão nuclear é eficiente e permite maximizar os benefícios científicos e industriais.

5.3.

O CESE apoia o pedido da Organização ITER para que os resultados obtidos sobre o JET sirvam de contributo útil durante o período anterior ao primeiro plasma no ITER. Uma vez que o JET tem capacidades únicas por ser o único Tokamak apto a funcionar com trítio, dispondo dos materiais da primeira parede do ITER e permitindo a telemanipulação total, o seu funcionamento pode contribuir para o plano de investigação do ITER com vista a reduzir riscos, economizar custos e assegurar um sistema de licenciamento operacional para o ITER. Este aspeto é tanto mais importante quanto o orçamento para o ITER proposto pela Comissão não tem margem para imprevistos, assumindo, portanto, que é possível atenuar todos os riscos principais.

5.4.

O CESE está ciente de que o ITER tem problemas importantes que só podem ser abordados no JET, pelo que perfilha as preocupações manifestadas quanto ao efeito Brexit na continuação do JET. Para minimizar os riscos operacionais do ITER e otimizar o seu plano de investigação, o CESE considera importante que o JET continue a funcionar (como uma instalação da UE ou uma instalação conjunta da UE e do Reino Unido) no período entre 2020 e o início do funcionamento do ITER, visto que não há soluções de reserva para a perda do JET neste período.

5.5.

A proposta da Comissão inclui o orçamento para o ITER, mas nada diz sobre a adequação do orçamento necessário para o programa de investigação no domínio da fusão que o acompanha. Este último é objeto de uma proposta separada (5), na qual, todavia, não se faz qualquer referência às necessidades do ITER. O CESE salienta que o orçamento reservado para o EUROfusion no período de 2021-2025 tem de ser compatível com os objetivos do roteiro para a fusão, sendo o trabalho relacionado com o ITER essencial, ao mesmo tempo que cumpre reforçar as atividades de conceção da DEMO.

5.6.

O CESE congratula-se com a importância dos investimentos na tecnologia de fusão para a indústria e as PME. O investimento da UE na construção do ITER proporciona benefícios importantes à indústria europeia, e a comunidade de investigação dá-lhe a oportunidade de participar em projetos avançados de I&D, tecnologia, conceção e fabrico de componentes para o ITER. A resultante criação de novos conhecimentos e iniciativas derivadas gera crescimento económico e promove o emprego. Entre 2008 e 2017, a Energia de Fusão adjudicou 839 contratos e concedeu subvenções no valor de cerca de 3 800 milhões de euros em toda a Europa. Pelo menos 500 empresas, incluindo PME, e mais de 70 organizações de I&D, de cerca de 20 Estados-Membros da UE e da Suíça, beneficiaram do investimento nas atividades do ITER. Além disso, as partes no ITER de países terceiros também assinaram contratos com a indústria europeia para apoiar o fabrico das suas próprias componentes para o ITER, o que gera novos postos de trabalho e crescimento para as empresas europeias.

5.7.

O CESE toma nota das informações exaustivas prestadas pela Comissão (6), que revelam que o fator que mais contribui para o impacto líquido dos investimentos do ITER é o desenvolvimento de iniciativas derivadas e de transferências de tecnologia. As tecnologias desenvolvidas para o ITER criam novas oportunidades de negócio noutros setores, uma vez que o trabalho no ITER aumenta a competitividade das empresas europeias na economia mundial, oferece às empresas tradicionais uma oportunidade de entrar no mercado da alta tecnologia e também proporciona às indústrias de alta tecnologia e às PME europeias uma oportunidade única para inovar e desenvolver produtos para exploração fora do domínio da fusão.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  JO C 302 de 7.12.2004, p. 27, JO C 318 de 29.10.2011, p. 127, JO C 229 de 31.7.2012, p. 60.

(2)  Parecer TEN/678 — Programa de Investigação e Formação para 2021-2025 (EURATOM); relatora: Giulia Barbucci (ver página 132 do presente Jornal Oficial).

(3)  Parecer INT/858 — Horizonte Europa; relator: Gonçalo Lobo Xavier (JO C 62 de 15.2.2019, p. 33).

(4)  COM(2018) 445 final.

(5)  COM(2018)437 final e parecer TEN/678, relatora: Giulia Barbucci (ver nota de rodapé 2).

(6)  Por exemplo, o estudo independente intitulado «Study on the impact of the ITER project activities in the EU» [Estudo sobre o impacto das atividades do projeto ITER na UE], ENER/D4/2017-458, 2018, Trinomics (Roterdão) e Cambridge Econometrics.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/141


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que estabelece o programa de assistência ao desmantelamento nuclear da central nuclear de Ignalina na Lituânia (programa Ignalina) e revoga o Regulamento (UE) n.o 1369/2013 do Conselho»

[COM(2018) 466 final — 2018/0251 (NLE)]

«Proposta de regulamento do Conselho que estabelece um programa financeiro específico para o desmantelamento de instalações nucleares e a gestão de resíduos e que revoga o Regulamento (Euratom) n.o 1368/2013 do Conselho»

[COM(2018) 467 final — 2018/0252 (NLE)]

e «Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre a avaliação e execução dos programas de assistência ao desmantelamento nuclear na Bulgária, na Eslováquia e na Lituânia»

[COM(2018) 468 final]

(2019/C 110/26)

Relator:

Rudy DE LEEUW

Consulta

Comissão Europeia, 12.7.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

 

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

20.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

177/8/6

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) apoia a proposta da Comissão e chama a atenção para as propostas de acompanhamento futuro formuladas no corpo do parecer.

1.2.

O CESE não propõe alterações à proposta mas preconiza o reforço do acompanhamento das atividades relativas aos aspetos destacados no parecer, nomeadamente:

Abordagem orientada para o desenvolvimento sustentável na escolha das energias;

Avaliação correta da situação específica da Lituânia em particular, mas também dos outros países afetados, no que diz respeito aos aspetos socioeconómicos;

Difusão em toda a UE dos conhecimentos adquiridos em matéria de desmantelamento, e o desafio da formação dos trabalhadores;

Gestão segura e sustentável dos resíduos nucleares assim produzidos;

Reforço dos indicadores de desempenho, incluindo o desempenho em matéria de proteção dos trabalhadores contra as radiações.

1.3.

Para além dos especialistas e das autoridades, a sociedade civil deve ser encorajada e ajudada a participar no acompanhamento dessas atividades.

1.4.

O Comité insta a Comissão a avaliar a situação de fim da vida útil de várias centrais nucleares na UE e a apresentar um relatório com propostas para minimizar os custos e os riscos associados ao desmantelamento dos reatores e ao armazenamento dos resíduos radioativos. O relatório deve igualmente ter em conta os efeitos da redução considerável na UE da capacidade de reprocessamento de combustível e resíduos nucleares devido ao Brexit e, inversamente, da sobrecapacidade de reprocessamento no Reino Unido.

2.   Síntese das propostas

2.1.

A Comissão propõe prolongar, durante o período abrangido pelo Quadro Financeiro Plurianual pós-2020 (QFP 2021-2027), os programas de financiamento para a assistência financeira ao desmantelamento de instalações nucleares e gestão de resíduos na Bulgária (Kozloduy 1-4), na Eslováquia (Bohunice Vl 1-2), bem como na Lituânia (Ignalina 1-2).

2.2.

Estas propostas introduzem duas alterações:

Uma maior flexibilidade na utilização do orçamento, como indicado: «Poderá obter-se flexibilidade orçamental suplementar mediante a redistribuição de fundos entre ações onde e quando necessário, em função dos progressos registados». Deste modo tem-se em conta o nível variável e imprevisível de despesas num determinado ano.

A integração no programa de desmantelamento de algumas instalações nucleares do Centro Comum de Investigação (JRC), situadas na Alemanha, Itália, Bélgica e Países Baixos.

3.   Observações na generalidade

3.1.

Observamos com satisfação que, com a realização de um dos objetivos do programa (responder melhor às necessidades e assegurar o desmantelamento seguro das instalações), a próxima etapa centrar-se-á nas atividades de desmantelamento que envolvem desafios de segurança radiológica. Estas atividades devem também ser avaliadas em função de uma abordagem orientada para um contexto energético sustentável, em conformidade com os acordos internacionais de que a UE é parte (Acordo de Paris, compromisso da UE de promover uma economia hipocarbónica, etc.).

3.2.

O relatório sobre a avaliação e execução dos programas de assistência ao desmantelamento nuclear na Bulgária, na Eslováquia e na Lituânia (doravante designado «relatório») confirma que é financeiramente viável prosseguir os programas. O CESE toma nota de que as previsões orçamentais do Quadro Financeiro Plurianual (QFP) pós-2020 para a continuação e conclusão dos programas de Kozloduy e de Bohunice correspondem a menos de um quarto do que representavam no QFP 2014-2020, ou seja, 63 milhões de euros para Kozloduy e 55 milhões de euros para Bohunice, e assegurarão a realização do estado final acordado do processo de desmantelamento. A estimativa orçamental para o QFP pós-2020 ascende a 522 milhões de euros, um montante que ultrapassa o previsto no QFP 2014-2020.

3.3.

O CESE salienta que ainda subsistem preocupações em relação à Lituânia. O CESE observa que o orçamento previsto pela Comissão cobre apenas 70 % das necessidades para este período e considera, por conseguinte, que a proposta em apreço não constitui uma prova de solidariedade nem um apoio financeiro suficiente para um projeto que também se reveste de importância para os Estados vizinhos. O desmantelamento bem-sucedido da central de Ignalina representa o principal desafio em matéria de segurança nuclear na União Europeia, e deve ser prosseguido garantindo ao mesmo tempo a diminuição dos riscos para os cidadãos da União.

3.4.

O CESE congratula-se com a iniciativa da Comissão no sentido de incluir algumas instalações do JRC no programa destinado à Bulgária e à Eslováquia. A estimativa do orçamento para o desmantelamento das instalações nucleares do JRC ascende a 348 milhões de euros. O CESE salienta a importância de a UE desempenhar um papel exemplar na gestão das suas próprias operações no JRC, uma vez que se trata de uma competência exclusiva da Comissão (JRC) enquanto titular da licença. Com base no Tratado Euratom, o JRC deve gerir as suas responsabilidades nucleares históricas e desmantelar as suas instalações nucleares após o seu encerramento. O programa tem um elevado potencial de criação e partilha de conhecimentos, apoiando, desta forma, os Estados-Membros da UE no desmantelamento das suas próprias instalações.

3.5.

No que se refere ao conhecimento, o CESE salienta igualmente a importância de avaliar o impacto económico e social do desmantelamento, por exemplo no mercado de trabalho, nos indicadores de saúde e no desenvolvimento estrutural de uma região de um Estado-Membro. É essencial aproveitar a oportunidade oferecida pelas atividades de desmantelamento para ministrar formação teórica e prática adicional aos trabalhadores locais sobre setores de atividade essenciais para o futuro. Estas formações não podem ser excluídas do financiamento.

3.6.

No âmbito do fomento de um acompanhamento mais estreito, o CESE recomenda que os recursos financeiros do programa sejam atribuídos de forma a assegurar a participação adequada das organizações da sociedade civil interessadas locais e nacionais, a fim de assegurar o acompanhamento independente, credível e permanente das atividades realizadas ao abrigo desta assistência financeira.

3.7.

O CESE constata com satisfação que a Eslováquia, a Bulgária e a Lituânia realizaram progressos significativos no sentido de desmantelar os seus reatores no prazo acordado. No entanto, o CESE assinala que se avizinham alguns desafios no futuro próximo, nomeadamente o desmantelamento do núcleo do reator e outras operações nos edifícios dos reatores. O relatório oferece poucas indicações sobre as restrições em matéria de gestão dos resíduos nucleares, em particular relativamente ao carbono, e sobre os reatores antigos situados em França e no Reino Unido. O CESE propõe que o relatório analise de forma mais aprofundada a questão da gestão dos resíduos nucleares, que constitui um problema muito importante a longo prazo.

3.8.

O CESE chama igualmente a atenção para a boa prática, nomeadamente na instalação de Ignalina, de ajudar os antigos trabalhadores da central nuclear a encontrar empregos a nível local, o que não só é útil em termos sociais, mas também favorece o desenvolvimento de capacidades específicas ligadas ao desmantelamento e à transferência de conhecimentos. O CESE considera que se trata de uma forma interessante de dar resposta às necessidades destas pessoas. Além disso, esta iniciativa pode ser acompanhada de medidas destinadas a formar os trabalhadores. Importa incentivar os institutos de investigação a participar ativamente em projetos deste tipo, que devem receber o apoio financeiro adequado.

3.9.

O âmbito de aplicação dos programas está em consonância com a política de segurança da UE formulada em três diretivas:

1)

Diretiva 2011/70/Euratom do Conselho (1) que estabelece um quadro comunitário para a gestão responsável e segura do combustível irradiado e dos resíduos radioativos;

2)

Diretiva 2009/71/Euratom do Conselho (2), alterada pela Diretiva 2014/87/Euratom do Conselho (3) que estabelece um quadro comunitário para a segurança nuclear das instalações nucleares;

3)

Diretiva 2013/59/Euratom do Conselho (4) que fixa as normas de segurança de base relativas à proteção contra os perigos resultantes da exposição a radiações ionizantes.

3.10.

Contudo, os programas derrogam parcialmente, por razões históricas, a responsabilidade final dos Estados-Membros de assegurar a atribuição de recursos financeiros adequados para o desmantelamento nuclear e a gestão de resíduos radioativos. O CESE já manifestou o seu acordo com esta posição por motivos de solidariedade.

3.11.

Além disso, uma maior segurança nuclear é de vital importância, não só a nível regional ou nacional, como também a nível europeu e até mundial. Por conseguinte, a realização de esforços conjuntos, tendo em vista a gestão segura dos problemas tecnológicos associados ao desmantelamento nuclear e a aquisição de conhecimentos neste domínio, reveste-se de importância não só para as regiões ou os Estados-Membros em causa mas também para a União Europeia no seu conjunto. Por este motivo, o CESE salienta a necessidade de uma estreita cooperação entre os Estados-Membros e os participantes nos programas, por um lado, e a Comissão, por outro.

3.12.

O CESE constata, com satisfação, que o programa tornou possível desenvolver novos instrumentos muito eficazes para reduzir o volume de resíduos. Recomenda que a Comissão adote uma abordagem proativa para contribuir para a partilha de conhecimentos sobre esta matéria.

3.13.

O CESE reconhece a importância dos indicadores de desempenho fundamentais utilizados para acompanhar os progressos em matéria de desmantelamento e os seus custos financeiros. O CESE destaca o benefício de um acompanhamento atento e de uma aplicação eficiente dos requisitos do programa, e salienta que as atividades financiadas pela UE devem promover um emprego de elevada qualidade no respeito do nível máximo de segurança e proteção contra as radiações, em conformidade com as diretivas europeias pertinentes mencionadas anteriormente.

4.   Observações na especialidade

4.1.

Em consonância com estas considerações, o CESE considera que deve ser possível obter uma imagem mais concreta da situação relativa à proteção radiológica operacional em cada instalação em causa, bem como elaborar uma estratégia ALARA (As Low As Reasonably Achievable — tão baixo quanto razoavelmente possível). É, evidentemente, da exclusiva responsabilidade do Estado-Membro em causa garantir que assim seja, em conformidade com o artigo 5.o da Diretiva 2013/59/Euratom que fixa as normas de segurança de base relativas à proteção contra os perigos resultantes da exposição a radiações ionizantes. Manter a dose de radiação a que os trabalhadores estão expostos na gama de um valor otimizado da dose efetiva é um indicador sintomático, que corresponde a um dos objetivos dos programas, que consiste em centrar-se na segurança radiológica. Estes dados devem estar disponíveis no registo das autoridades responsáveis em matéria de segurança e assuntos radiológicos dos Estados-Membros em causa.

4.2.

Outro motivo de preocupação é a eliminação final dos resíduos radioativos, que constitui claramente uma responsabilidade exclusiva do Estado-Membro. No entanto, o CESE recomenda à Comissão que apoie não só a partilha de conhecimentos, mas também a cooperação dinâmica entre os Estados-Membros, quando for juridicamente possível. Tal contribuirá para alcançar um elevado nível de segurança dentro de parâmetros económicos razoáveis.

4.3.

São fornecidas poucas informações sobre a cooperação com as autoridades de segurança locais. No entanto, é necessário dar mais atenção a alguns problemas identificados na Proposta de regulamento do Conselho que estabelece um programa financeiro específico para o desmantelamento de instalações nucleares e a gestão de resíduos e que revoga o Regulamento (Euratom) n.o 1368/2013 do Conselho, nomeadamente quando «os procedimentos de autorização morosos por parte das autoridades nacionais […] [tornam] difícil gerir o programa». A Comissão dispõe de numerosos instrumentos para reforçar esta cooperação, nomeadamente através do Grupo de Reguladores Europeus em matéria de Segurança Nuclear.

4.4.

O Comité observa que várias centrais nucleares da União Europeia chegaram ou estão a chegar ao fim da sua vida útil e terão de ser desmanteladas. Embora esta responsabilidade incumba exclusivamente ao Estado-Membro em causa, o CESE convida a Comissão a avaliar a situação e a apresentar um relatório com propostas para minimizar os custos e os riscos associados ao desmantelamento dos reatores e ao armazenamento dos resíduos radioativos. O relatório deve igualmente ter em conta os efeitos da redução considerável na UE da capacidade de reprocessamento de combustível e resíduos nucleares devido ao Brexit e, inversamente, da sobrecapacidade de reprocessamento no Reino Unido.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  JO L 199 de 2.8.2011, p. 48.

(2)  JO L 172 de 2.7.2009, p. 18.

(3)  JO L 219 de 25.7.2014, p. 42.

(4)  JO L 13 de 17.1.2014, p. 1.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/145


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Recomendação de decisão do Conselho que autoriza a abertura de negociações com vista a uma convenção que estabelece um tribunal multilateral para a resolução de litígios em matéria de investimento»

[COM(2017) 493 final]

(2019/C 110/27)

Relator:

Philippe DE BUCK

Correlatora:

Tanja BUZEK

Consulta

13.12.2017 (Comissão Europeia)

Base jurídica

Artigo 207.o do TFUE

Competência

Secção REX

Adoção em secção

23.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

206/3/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE reconhece plenamente que a resolução de litígios entre os investidores e o Estado (RLIE) em tratados de comércio e investimento se tornou cada vez mais controversa para algumas partes interessadas em termos de legitimidade, coerência e transparência. As críticas incluem, entre outras, considerações de ordem processual e substantiva.

1.2.

O CESE participou ativamente no debate em torno da reforma e modernização da proteção do investimento. Adotou os pareceres REX/464 e REX/411, nos quais manifestou várias preocupações e formulou recomendações.

1.3.

Por conseguinte, o CESE congratula-se com os esforços envidados pela Comissão Europeia no sentido de uma reforma multilateral da RLIE sob os auspícios da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (CNUDCI) e considera essencial que a UE permaneça aberta a todas as abordagens e ideias que surgiram em matéria de reforma da resolução de litígios entre os investidores e o Estado.

1.4.

O CESE congratula-se, em particular, com o compromisso no sentido de uma maior transparência, permitindo às organizações não governamentais acompanhar e inclusivamente participar nos debates.

1.5.

O CESE considera fundamental que o Grupo de Trabalho III da CNUDCI receba os contributos de todas as partes interessadas num esforço de maior inclusividade, e defende que é necessário melhorar o processo de convite das partes interessadas, assegurando um maior equilíbrio entre estas. Além disso, o CESE insta a Comissão a envidar todos os esforços para associar ativamente o CESE aos trabalhos do Grupo de Trabalho III.

1.6.

O CESE sempre reconheceu que o investimento direto estrangeiro (IDE) é um importante contributo para o crescimento económico, sendo necessário que os investidores estrangeiros beneficiem de uma proteção global contra a expropriação direta e a discriminação e gozem de direitos equivalentes aos dos investidores nacionais.

1.7.

No entanto, o CESE também sempre sublinhou que não se deve pôr em causa o direito de os Estados-Membros legislarem no interesse público.

1.8.

No contexto da criação de um tribunal multilateral de investimento (TMI), o CESE sublinha que há uma série de questões fundamentais que têm de ser abordadas: o âmbito de aplicação, a proteção do interesse público, a acessibilidade e a relação com os tribunais nacionais.

1.9.

O âmbito de aplicação: embora considere que seria preferível uma abordagem mais holística que abrangesse as preocupações relativas tanto aos aspetos substantivos como aos processuais da proteção do investimento, o CESE observa que o âmbito de aplicação foi limitado aos aspetos processuais da resolução de litígios entre os investidores e os Estados.

1.10.

O interesse público: o CESE considera fundamental que o TMI em nada afete a capacidade da UE e dos Estados-Membros de cumprirem as suas obrigações decorrentes de acordos internacionais em matéria de ambiente, direitos humanos e trabalho, bem como de proteção dos consumidores, e preveja garantias processuais contra ações que visem a legislação de interesse público nacional. Por conseguinte, o CESE entende que tal só pode ser suficientemente alcançado mediante a inclusão de uma cláusula de hierarquia e de uma exceção de interesse público.

1.11.

Direitos de terceiros e pedidos reconvencionais: o CESE considera a permissão de observações amicus curiae um primeiro passo, cabendo, no entanto, garantir que estas são devidamente tidas em consideração pelos juízes; congratula-se com o facto de o mandato prever a possibilidade de intervenções de terceiros e recomenda analisar o papel destes terceiros, que podem ser residentes locais, trabalhadores, sindicatos, grupos de proteção do ambiente ou consumidores.

1.12.

Relação com os tribunais nacionais: o CESE considera que o TMI não pode, em circunstância alguma, afetar negativamente o sistema judicial da UE e a autonomia do direito da UE. Assinala que as partes interessadas têm posições divergentes sobre a questão da relação entre os tribunais nacionais e o TMI; não obstante, incentiva a Comissão Europeia a estudar de forma mais aprofundada a questão do esgotamento das vias de recurso locais e a forma como esta regra poderia funcionar no contexto do tribunal multilateral de investimento.

1.13.

Independência e legitimidade dos juízes: a nomeação de juízes a título permanente é considerada um fator essencial para começar a estabelecer jurisprudência, ao mesmo tempo que as suas qualificações exigem conhecimentos comprovados num leque alargado de ramos do direito. O CESE congratula-se com os compromissos de definir critérios claros e de alto nível para assegurar o Estado de direito e a confiança do público e solicita que o processo de seleção seja transparente e sujeito aos princípios do controlo público.

1.14.

Um sistema eficaz: embora deva haver um secretariado incumbido de gerir eficazmente o TMI, este deve estar dotado de recursos suficientes para o seu funcionamento, e os custos administrativos devem ser cobertos pelas partes numa base equitativa tendo em conta diferentes critérios. As PME devem beneficiar do mesmo nível de proteção e de acesso aos mecanismos de resolução de litígios mediante condições e custos razoáveis e todas as decisões do TMI devem ter força executiva e ser tornadas públicas.

1.15.

Elevado nível de proteção e eventual período de transição: é importante notar que nenhum dos acordos celebrados pela UE ou os Estados-Membros será automaticamente colocado sob a jurisdição de um tribunal multilateral de investimento e que durante um eventual período de transição os procedimentos de resolução de litígios acordados continuam a aplicar-se, a fim de assegurar um elevado nível de proteção dos investimentos, dada a constitucionalidade e a viabilidade de um TMI ao abrigo da legislação da UE.

2.   Contexto

2.1.

Desenvolvido por mais de 3 200 acordos desde a década de 1970, o sistema de proteção do investimento inclui cláusulas substantivas de proteção do investimento e cláusulas relativas ao procedimento de resolução de litígios, que preveem um mecanismo através do qual os investidores estrangeiros podem intentar ações contra os Estados de acolhimento (resolução de litígios entre os investidores e o Estado, RLIE) em conformidade com as disposições jurídicas previstas nos acordos.

2.2.

O CESE chama a atenção para uma publicação recente no âmbito dos documentos de trabalho da Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos (OCDE) sobre o investimento internacional, da autoria do analista político Joachim Pohl, intitulada «Societal benefits and costs of International Investment Agreements — A critical review of aspects and available empirical evidence» [Custos e benefícios para a sociedade dos acordos de investimento internacionais — Análise crítica de certos aspetos e dos dados empíricos disponíveis] (1).

2.3.

Nos últimos anos, a reforma da RLIE tem ocupado um lugar central no debate sobre a política de investimento da UE, tendo o sistema de proteção do investimento sido alvo de crescente controvérsia, com várias partes interessadas a apontarem o dedo à sua legitimidade, coerência e transparência. As críticas incluem, entre outras, considerações de ordem processual e substantiva.

2.4.

Estas preocupações foram expressas em particular em duas consultas públicas organizadas pela Comissão Europeia — a primeira durante as negociações sobre a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (PTCI) (2) em 2014 e a segunda no âmbito dos esforços multilaterais para a reforma da resolução de litígios em matéria de investimentos (3) em 2017.

2.5.

Na sua resolução de 8 de julho de 2015 relativa à PTCI, o Parlamento Europeu convidou a Comissão a «substituir o sistema de resolução de litígios entre os investidores e os Estados por um novo sistema de resolução de litígios entre os investidores e os Estados sujeito aos princípios e ao controlo democráticos, mediante o qual os eventuais processos sejam tratados de forma transparente por juízes profissionais, independentes e nomeados pelo poder público em audições públicas e que inclua um mecanismo de recurso capaz de garantir a coerência das decisões judiciais e o respeito da competência dos tribunais da UE e dos Estados-Membros e que não permita que os interesses privados comprometam os objetivos das políticas públicas» (4).

Evolução a nível da UE

2.6.

Em resposta aos críticos do atual sistema de RLIE e à insistência da sociedade civil na necessidade de o reformar, a Comissão propôs o Sistema de Tribunais de Investimento (STI), que consiste num sistema de resolução de litígios entre os investidores e o Estado, e incluiu-o no Acordo Económico e Comercial Global UE-Canadá (CETA) e nos acordos de comércio livre entre a UE e Singapura e a UE e o Vietname.

2.7.

Neste contexto, é prevista uma disposição específica no artigo 8.29 do CETA, que insta as partes a ponderarem a possibilidade de instituírem um tribunal multilateral de investimento (TMI) no futuro: «As Partes, em conjunto com outros parceiros comerciais, procedem à instituição de um tribunal multilateral de investimento e de um mecanismo de recurso para a resolução de litígios em matéria de investimento. Quando da instituição desse mecanismo multilateral, o Comité Misto CETA adota uma decisão que estabelece que os litígios em matéria de investimento ao abrigo da presente secção devem ser decididos mediante recurso ao referido mecanismo multilateral e adota as disposições transitórias adequadas».

2.8.

No entanto, ainda nenhum dos acordos supramencionados foi ratificado e há um processo pendente no Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) relacionado com o STI previsto no CETA (5), cuja decisão demorará vários meses.

2.9.

O CESE regista que o Acordo de Parceria Económica UE-Japão não inclui qualquer capítulo relativo à proteção do investimento, dado que o Japão não pôde aceitar a proposta da UE sobre o STI.

Participação do CESE

2.10.

Ao longo deste processo, o Comité Económico e Social Europeu (CESE) tem participado ativamente no debate sobre a modernização e a reforma da proteção do investimento, e o sistema de RLIE em particular, o que inclui a organização de duas audições públicas em junho de 2016 (6) e, mais recentemente, em fevereiro de 2018 (7). Neste contexto, o CESE adotou o Parecer REX/464 — Posição do CESE sobre questões-chave específicas da PTCI (8), bem como o Parecer REX/411 — Proteção dos investidores e resolução de litígios entre os investidores e o Estado nos acordos comerciais e de investimento da UE com países terceiros (9).

2.11.

O CESE reconheceu que o investimento direto estrangeiro (IDE) é um importante contributo para o crescimento económico, sendo necessário que os investidores estrangeiros beneficiem de uma proteção global contra a expropriação direta e a discriminação e tenham direitos equivalentes aos dos investidores nacionais.

2.12.

Ao mesmo tempo, o CESE sublinhou que o direito que assiste ao Estado de regulamentar em prol do interesse público é primordial e não pode ser posto em causa pelas cláusulas de nenhum acordo de investimento internacional (AII). Impõe-se, assim, a introdução de uma cláusula inequívoca que estipule horizontalmente este direito.

2.13.

Em conclusão, o CESE considerou que a proposta da Comissão Europeia relativa ao STI é um passo na direção certa, mas deve ser melhorada em vários domínios para que esse sistema possa funcionar como um órgão judicial internacional independente. Por outro lado, o CESE tomou nota de que certas partes interessadas questionam a necessidade de um sistema separado de arbitragem em matéria de investimento, no âmbito de sistemas jurídicos nacionais que funcionam devidamente e estão bem desenvolvidos.

2.14.

No seu Parecer — Proteção dos investidores e resolução de litígios entre os investidores e o Estado nos acordos comerciais e de investimento da União Europeia com países terceiros (10), o CESE suscita várias questões que dizem mais especificamente respeito à RLIE, nomeadamente: conflito de interesses e parcialidade dos árbitros; ações improcedentes; natureza do setor da arbitragem; utilização da RLIE sem procurar outras vias de recurso; utilização desnecessária da RLIE entre países com sistemas judiciais desenvolvidos; eventual incompatibilidade da RLIE com o direito da UE; e opacidade dos procedimentos.

Nível multilateral

2.15.

Simultaneamente, estão também em curso debates a nível multilateral sobre a reforma da RLIE. Em 10 de julho de 2017, na sequência de um pedido formal de muitos dos seus membros, incluindo os Estados-Membros da União Europeia (11), a Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (CNUDCI) decidiu criar o Grupo de Trabalho III, liderado pelos governos, cujo mandato o autoriza a i) identificar e ter em conta as preocupações relativas à RLIE; ii) determinar se é desejável uma reforma tendo em conta os eventuais problemas identificados; e iii) caso o grupo de trabalho conclua que é desejável uma reforma, desenvolver soluções pertinentes a recomendar à Comissão Europeia (12).

2.16.

Numa perspetiva mais ampla, a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (CNUCED) também contribui para o debate em curso sobre a reforma da RLIE, proporcionando uma análise do atual sistema de AII e recomendações para a modernização dos mesmos, nomeadamente promover a interpretação conjunta das disposições dos acordos, alterar ou substituir acordos desatualizados, referenciar normas mundiais, atuar a nível multilateral e denunciar ou abandonar antigos acordos (13).

2.17.

Segundo estatísticas da CNUCED, que foram salientadas na audição pública do CESE realizada em fevereiro de 2018, 107 acordos de investimento que continham cláusulas de RLIE foram rescindidos sem serem substituídos nos últimos anos. No ano passado, o número de acordos de investimento que foram rescindidos foi superior ao número de acordos celebrados (14). O CESE constata que alguns países começaram a reconsiderar a sua abordagem da RLIE.

2.18.

O CESE salienta que, para além da reforma da RLIE, vários instrumentos políticos podem também contribuir para assegurar um enquadramento viável para os investimentos, nomeadamente:

reforço dos sistemas judiciais nacionais;

fornecimento de seguros aos investidores, nomeadamente através da Agência Multilateral de Garantia dos Investimentos do Banco Mundial;

prevenção de litígios;

formas mais conciliadoras de resolução de litígios, como a mediação;

promoção do investimento; e

resolução de litígios entre Estados.

2.19.

Por último, o CESE toma nota da Resolução 26/9 do Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas, de 26 de junho de 2014, nos termos da qual decidiu estabelecer um grupo de trabalho intergovernamental aberto sobre empresas transnacionais e outras empresas no âmbito dos direitos humanos, cujo mandato consiste em elaborar um instrumento internacional juridicamente vinculativo para regulamentar, no direito internacional em matéria de direitos humanos, as atividades de empresas transnacionais e outras empresas (15). Este «tratado vinculativo das Nações Unidas», que está atualmente a ser debatido pelos seus membros, visa codificar as obrigações internacionais em matéria de direitos humanos aplicáveis às atividades de empresas transnacionais. O CESE considera que tal poderá ter efeitos futuros no contexto dos acordos comerciais e de investimento.

Mandato da Comissão

2.20.

Em 13 de setembro de 2017, a Comissão Europeia publicou a recomendação de decisão do Conselho que autoriza a abertura de negociações com vista a uma convenção que estabelece um tribunal multilateral para a resolução de litígios em matéria de investimento (16). O mandato, com a redação que lhe foi dada pelos Estados-Membros, foi adotado pelo Conselho em 20 de março de 2018 (17).

2.21.

As diretrizes de negociação adotadas visam a criação de um tribunal permanente com juízes independentes que possam tomar decisões constantes, previsíveis e coerentes sobre litígios em matéria de investimento entre investidores e Estados com base em acordos bilaterais ou multilaterais, quando ambas as partes (ou pelo menos duas das partes) nesses acordos tenham concordado em submetê-los à jurisdição do tribunal. É também prevista uma instância de recurso. De um modo geral, o tribunal deve funcionar de forma transparente, eficiente e eficaz em termos de custos, inclusivamente quando da nomeação de juízes. O tribunal deve também permitir a intervenção de terceiros (incluindo, por exemplo, organizações laborais ou ambientais interessadas).

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE saúda os esforços da Comissão Europeia no sentido de uma reforma multilateral da resolução de litígios entre os investidores e o Estado. Reconhece igualmente a dinâmica mais ampla da reforma da RLIE, os esforços multilaterais desenvolvidos sob a égide da CNUDCI, bem como diferentes esforços nacionais.

3.2.

O CESE considera fundamental que a UE permaneça aberta a todas as opções para a reforma da RLIE, especialmente tendo em conta as várias outras abordagens e ideias que emergiram em relação à reforma da RLIE. As propostas formuladas por outros países e organizações devem ser tidas em conta e analisadas, nomeadamente pelo Grupo de Trabalho III da CNUDCI.

3.3.

Neste contexto, o CESE toma nota de que a consulta pública realizada pela Comissão Europeia sobre as opções para uma reforma multilateral da resolução de litígios em matéria de investimento incidiu sobretudo em questões técnicas relativas à criação de um TMI permanente. O CESE sublinha que as partes interessadas têm posições bastante díspares sobre a consideração ou não de opiniões alternativas pela avaliação da Comissão Europeia.

3.4.

Embora o processo de negociação relativo à criação de um TMI não tenha ainda sido lançado, e se preveja um processo moroso e complexo, o CESE saúda o empenho reforçado da Comissão Europeia em prol da transparência, em especial a publicação do projeto de mandato de negociação. O CESE louva o Conselho pela publicação do mandato final aprovado pelos Estados-Membros. Trata-se de um passo importante para garantir que os debates e as eventuais negociações decorrem de forma transparente, responsável e inclusiva.

3.5.

A realização de debates sob a égide da CNUDCI constitui, sobretudo em termos de transparência, um passo na direção certa, uma vez que permite às organizações não governamentais acompanhar os debates e até participar nos mesmos. Não obstante, o CESE assinala que nem todas as partes interessadas pertinentes tiveram acesso aos debates e que mais organizações — representantes de empresas, sindicatos e outras organizações de interesse público — devem ser convidadas pela CNUDCI no âmbito do Grupo de Trabalho III O processo de decisão deve ser totalmente transparente e baseado no consenso.

3.6.

O CESE considera fundamental que o grupo de trabalho acolha os contributos de todas as partes interessadas num esforço para reforçar a inclusividade e que o processo de seleção das partes interessadas deve ser melhorado e mais equilibrado. Neste contexto, apela à Comissão Europeia para que assegure uma participação mais ativa do CESE.

3.7.

A criação de um TMI é um projeto a longo prazo que requer o empenho de uma massa crítica de Estados dispostos a serem partes no tribunal. Por conseguinte, a UE deve empreender todos os esforços diplomáticos necessários para convencer países terceiros a participarem nessas negociações. O CESE considera particularmente importante que este projeto seja também realizado e apoiado pelos países em desenvolvimento.

3.8.

Qualquer futuro TMI teria como objetivo agilizar o procedimento de resolução de litígios em ações intentadas entre investidores e Estados no âmbito de um leque alargado de acordos internacionais em vigor em matéria de investimento. Embora exista uma certa semelhança entre as cláusulas substantivas de proteção do investimento em tratados bilaterais em matéria de investimentos ou em acordos de comércio livre com capítulos sobre a proteção do investimento, é difícil alcançar a plena harmonização do sistema.

3.9.

Tal exigiria uma reforma mais ampla. Embora ainda não esteja implementado, e esteja a ser examinado pelo TJUE, o STI, conforme previsto no CETA (18) e nos acordos de comércio livre entre a UE e Singapura (19), a UE e o Vietname e a UE e o México, e noutros que se seguirão (20), poderá proporcionar experiência e contribuir para o desenvolvimento de regras para um TMI.

3.10.

O objetivo da recomendação da Comissão Europeia é criar um novo sistema de resolução de litígios entre os investidores e os Estados. O CESE reconhece que várias preocupações manifestadas pela sociedade civil podem ser abordadas pelo novo sistema. No entanto, algumas questões fundamentais permanecem em aberto e exigem maior clarificação.

Questões fundamentais

3.11.

Reconhecendo que o processo de reforma multilateral da RLIE se encontra ainda nas suas fases iniciais, várias questões fundamentais são levantadas pelas partes interessadas no contexto da criação de um TMI. Estas questões concentram-se em torno de aspetos relativos ao âmbito de aplicação — a reforma abrangerá os elementos substantivos ou os elementos processuais da proteção do investimento, ou ambos —, à acessibilidade — os investidores só poderão intentar ações no âmbito de um TMI ou poderão fazê-lo também no âmbito de outras instâncias —, e ao esgotamento das vias de recurso internas — será ou não necessário esgotar primeiro as vias de recurso internas disponíveis antes de um investidor poder intentar uma ação no âmbito de um futuro TMI. O presente parecer analisa estas questões.

3.12.

Quanto a estas questões, o CESE salienta que a eventual criação de um TMI deve ter em conta tanto o princípio da subsidiariedade como o artigo 1.o do TUE, que prevê que «as decisões serão tomadas de uma forma tão aberta quanto possível e ao nível mais próximo possível dos cidadãos» (21).

3.13.

O CESE toma nota das preocupações com a possibilidade de o TMI resultar na expansão do sistema de RLIE sem que primeiro sejam adequadamente abordadas as preocupações existentes a respeito do STI, incluindo a sua compatibilidade com o direito da UE. O CESE partilha a opinião de que um tribunal internacional de investimento não deve, em nenhuma circunstância, tornar-se um substituto geral para a resolução de litígios internos em países com sistemas judiciais adequados.

3.14.

Várias partes interessadas expressaram sérias reservas quanto a uma reforma do procedimento antes de avaliar o direito substantivo a aplicar por um futuro TMI e à atribuição de poderes a um órgão multilateral institucionalizado para interpretar estas normas. De igual modo, existem receios de que tal possa criar uma nova base de poder jurídico em si mesma. Outras partes interessadas concordam com o ponto de vista da Comissão Europeia de que o direito substantivo está definido nos acordos subjacentes.

4.   Âmbito de aplicação da reforma proposta: entre as cláusulas substantivas de proteção e o procedimento de resolução de litígios

4.1.

O CESE constata que o âmbito de aplicação da reforma multilateral proposta foi limitado aos aspetos processuais da resolução de litígios entre os investidores e o Estado.

4.2.

O CESE, embora considere que seria preferível uma abordagem mais holística, abrangendo as preocupações relativas a aspetos substantivos e processuais da proteção do investimento, reconhece a complexidade dessa abordagem e a necessidade de reunir apoio político a nível multilateral.

4.3.

Atendendo aos debates realizados sob a égide da CNUDCI, o Grupo de Trabalho III identificou vários desafios, incluindo a questão de saber se é possível avançar para uma reforma processual da resolução de litígios entre os investidores e o Estado antes de uma reforma de fundo. A CNUDCI considera esta tarefa difícil, mas não impossível. Neste contexto, o Grupo de Trabalho III analisará questões que possam estar relacionadas com o processo mas, ao mesmo tempo, possam afetar de modo significativo a legitimidade e a coerência do sistema no seu conjunto, designadamente: um código de conduta para árbitros, financiamento de terceiros e procedimentos paralelos.

4.4.

A proteção substantiva do investimento é normalmente concedida através de alguns princípios, designadamente: tratamento nacional, tratamento de nação mais favorecida (NMF), tratamento justo e equitativo e garantia de transferência de capital. No entanto, existem limitações às ações intentadas por investidores estrangeiros para resolução de litígios. Por exemplo, as ações não podem basear-se apenas no fundamento do lucro cessante ou unicamente numa alteração da legislação nacional.

4.5.

Os Estados adotam medidas diferentes para dar resposta às preocupações manifestadas. Estas medidas variam entre abordagens mais holísticas, nomeadamente o desenvolvimento de novos modelos de acordos que visam reformar os elementos substantivos e processuais da proteção do investimento, e abordagens mais específicas que se concentram na reforma da componente substantiva ou da componente processual da proteção do investimento. O CESE observa que a UE já começou a promover uma abordagem mais holística, pelo menos a nível bilateral, através do STI.

4.6.

O objetivo expresso pela Comissão Europeia é o de que, uma vez criado, o TMI se torne o modelo normalizado para a resolução de litígios em matéria de investimento em todos os futuros acordos da UE e, em última análise, substitua os mecanismos processuais nos acordos de investimento da UE e dos Estados-Membros em vigor.

4.7.

Neste contexto, se vier a ter lugar, a criação de um TMI deverá reformar o sistema de RLIE em vigor, de uma forma que, por um lado, assegure uma proteção eficaz dos investimentos diretos estrangeiros e, por outro, aborde plenamente as preocupações suscitadas pelas partes interessadas. Importa notar que, a este respeito, foram alcançados progressos consideráveis, em particular no contexto dos mais recentes e modernos acordos de comércio livre negociados pela UE.

5.   O interesse público

5.1.

O CESE considera fundamental que o TMI em nada afete a capacidade da UE e dos Estados-Membros de cumprir as suas obrigações decorrentes de acordos internacionais em matéria de ambiente, direitos humanos e trabalho, bem como de proteção dos consumidores.

5.2.

Antes de mais, o acordo que institui o TMI deverá conter uma cláusula de hierarquia que garanta que, em caso de incoerência entre um acordo de investimento internacional e qualquer acordo internacional em matéria ambiental, social ou de direitos humanos que vincule uma das partes num litígio, prevalecem as obrigações decorrentes do acordo internacional em matéria ambiental, social ou de direitos humanos, de molde a evitar que seja dada primazia aos acordos de investimento (22). Esta cláusula é particularmente importante para assegurar que as partes no TMI dispõem da liberdade necessária para alcançar os objetivos ao abrigo do Acordo de Paris, que exige uma alteração significativa da regulamentação para concretizar uma transição energética bem-sucedida.

5.3.

São necessárias garantias processuais contra ações que visem legislação de interesse público nacional para garantir que o direito das partes de regulamentar em prol do interesse público, da forma que entendam adequada, se sobrepõe à proteção do investidor. O CESE entende que tal só pode ser suficientemente conseguido através da inclusão de uma exceção de interesse público. Contudo, essa exceção deve ser acompanhada das necessárias garantias contra a utilização abusiva por motivos protecionistas. Neste contexto, o direito de regulamentar no domínio da proteção social tem de ser expressamente mencionado nos acordos coletivos, onde se incluem os acordos tripartidos e/ou de aplicação geral (erga omnes), a fim de evitar que os mesmos possam ser interpretados como uma violação das expectativas legítimas de um investidor (23).

5.4.

O CESE assinala que o artigo 8.18, n.o 3, do CETA já garante que um investidor não pode intentar uma ação se o investimento tiver sido realizado através de comportamento doloso, encobrimento, corrupção ou um ato que configure um desvio de processo. Um possível futuro acordo que institua o TMI deverá assegurar o alargamento desta cláusula à legislação aplicável em matéria de fraude, violações dos direitos humanos e violações do direito (internacional) social, do ambiente e do consumidor.

5.5.

Deverão também ser incluídos critérios rigorosos para evitar ações improcedentes e garantir a rápida rejeição de processos infundados no regulamento interno do TMI. A existência de procedimentos de tramitação prejudicial acelerada para rejeitar ações improcedentes é importante, uma vez que abordará uma das críticas contra o atual sistema, evitando, no futuro, a sua utilização de forma abusiva. Além disso, uma tal tramitação acelerada para as ações destituídas de fundamento jurídico contribuirá para a redução dos custos de funcionamento do tribunal.

5.6.

O CESE assinala que um ponto de preocupação levantado durante a sua audição pública foi a possibilidade de os litígios serem financiados por terceiros. O financiamento por terceiros pode não servir os objetivos iniciais dos acordos de investimento e pode resultar em incentivos perversos. Por conseguinte, o CESE recomenda que se estude o impacto e a necessidade de financiamento por terceiros e a sua regulamentação no âmbito do TMI (24).

6.   Direitos de terceiros e pedidos reconvencionais

6.1.

O CESE considera que a permissão de observações amicus curiae (25), que atualmente já são possíveis no âmbito de um número significativo de procedimentos de RLIE, constitui um primeiro passo bem-vindo para assegurar um sistema equilibrado e justo. No entanto, o CESE entende que é essencial assegurar que a convenção que estabelece o TMI não só garanta a admissibilidade das observações amicus curiae, como também exija que os juízes as tenham em devida consideração nas suas deliberações.

6.2.

O CESE congratula-se, por conseguinte, com a inclusão da possibilidade de intervenção de terceiros no mandato do TMI. Contudo, o CESE recomenda que se analise o papel dos terceiros para além das atuais regras da CNUDCI, a fim de assegurar um sistema equilibrado e justo e direitos efetivos para os terceiros afetados, que podem ser habitantes locais, trabalhadores, sindicatos, grupos ambientais ou consumidores.

6.3.

O CESE acolhe com agrado os esforços desenvolvidos pela Comissão Europeia, no contexto da proposta relativa à criação de um tribunal de investimentos no quadro da PTCI, no sentido de assegurar a possibilidade de intervenção de terceiros, bem como a clarificação, no mandato, de que tais intervenções estarão abertas a todas as partes interessadas que tenham um interesse legítimo num processo. O CESE solicita à Comissão Europeia que assegure que os critérios vigentes no âmbito do TMI não sejam desnecessariamente restritivos e permitam um acesso justo aos processos, no pleno respeito e no espírito das obrigações da UE ao abrigo da Convenção de Aarhus.

6.4.

Algumas partes interessadas são de opinião que o TMI deveria também poder pronunciar-se sobre ações intentadas por terceiros, bem como sobre pedidos reconvencionais apresentados por Estados contra investidores, como acontece atualmente ao abrigo do antigo sistema de RLIE. Esta matéria suscita uma série de questões jurídicas e práticas que têm de ser cuidadosamente analisadas. Por exemplo, esta possibilidade depende da legislação aplicável, ou seja, as disposições substantivas incluídas nos acordos submetidos à jurisdição do tribunal.

6.5.

O CESE solicita à Comissão Europeia que assegure que, no mínimo, o TMI não fecha a porta a ações de terceiros afetados contra investidores estrangeiros. Para este efeito, a convenção que estabelece o TMI poderia conter disposições que admitissem tais ações nos casos em que as partes num acordo internacional tenham acordado na competência jurisdicional do TMI em tais litígios.

7.   Relação com os tribunais nacionais

7.1.

O CESE considera que o TMI não pode, em circunstância alguma, afetar negativamente o sistema judicial da UE e a autonomia do direito da UE. O CESE recorda que, no Parecer REX/411, afirmou que há fortes preocupações quanto à relação da RLIE com o ordenamento jurídico da UE, tanto em termos dos Tratados da UE como do direito constitucional. Por conseguinte, para que a RLIE respeite o direito da UE, o CESE considerou «imperativo que o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) se pronuncie formalmente, sob a forma de um parecer, antes de as instituições competentes tomarem uma decisão e antes da entrada em vigor provisória de quaisquer acordos de investimento internacionais negociados pela Comissão Europeia».

7.2.

Neste contexto, o CESE chama a atenção para dois casos examinados pelo TJUE, que se basearam no antigo sistema de arbitragem em matéria de RLIE e são pertinentes para a discussão. Em primeiro lugar, no seu Parecer 2/15, de 16 de maio de 2017, sobre o Acordo de Comércio Livre entre a UE e Singapura, o TJUE determinou que a UE não dispõe de competência exclusiva em matéria de RLIE, considerando que a RLIE «subtrai litígios à competência jurisdicional dos Estados-Membros». Em segundo lugar, no seu Acórdão no processo C-284/16, Slowakische Republik contra Achmea BV, sobre acordos de investimento intra-UE, o TJUE considerou que a RLIE subtrai litígios à competência dos órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros da UE e, por conseguinte, ao sistema de vias de recurso jurisdicionais no sistema jurídico da UE.

7.3.

O CESE louva o Governo belga pela solicitação de um parecer nos termos do artigo 218.o, n.o 11, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) sobre a compatibilidade do sistema judicial em matéria de investimento incluído no CETA com os Tratados da UE, como solicitado no seu Parecer — Posição do CESE sobre questões-chave específicas das negociações relativas à Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (PTCI) (26). O CESE manifesta a esperança de que o Parecer 1/17 do TJUE forneça às instituições da UE a muito necessária orientação sobre questões importantes de direito constitucional europeu.

7.4.

O CESE está ciente de que algumas partes interessadas consideram que a forma mais eficaz de preservar os poderes dos tribunais nacionais é limitar o recurso ao tribunal multilateral de investimento aos Estados e organizações internacionais como a UE. Além disso, a resolução de litígios entre Estados é o mecanismo-padrão de resolução de litígios ao abrigo do direito internacional público, já foi utilizada em vários acordos de investimento e deve, por conseguinte, ser privilegiada em relação ao direito em matéria de investimento. O CESE assinala que outras partes interessadas consideram que a resolução de litígios entre os investidores e o Estado é uma opção mais eficaz no caso do investimento, proporcionando, em seu entender, uma resolução de litígios neutra, despolitizada e eficaz em termos de custos. Tem sido o sistema-padrão para a resolução de litígios em matéria de investimento desde o seu estabelecimento há várias décadas.

7.5.

O CESE observa que a questão da relação entre os tribunais nacionais e o tribunal multilateral de investimento é vista de forma diferente por várias partes interessadas. Enquanto umas consideram que o tribunal multilateral de investimento deve ser utilizado como último recurso, depois de obrigatoriamente se terem esgotado as vias de recurso internas, outras defendem que a abordagem «no U-turn» (sem retorno) atualmente seguida pela Comissão Europeia constitui também uma boa base no âmbito do tribunal multilateral de investimento.

7.6.

Ao abrigo da abordagem «no U-turn», o investidor tem o direito de recorrer diretamente aos tribunais locais ou ao STI/TMI. Contudo, depois de concluído num destes foros, o processo não pode ser reaberto pelo investidor noutro foro. Algumas partes interessadas consideram que esta abordagem responde com sucesso às preocupações suscitadas pelo facto de os investidores terem a possibilidade de procurar reparação em múltiplos foros pela mesma alegada violação. Assinalam também que vários acordos de investimento internacionais seguem esta abordagem (27). De acordo com uma análise apresentada pela CNUCED (28), a cláusula «no U-turn» visa impedir a simultaneidade de uma ação internacional interposta por um investidor que alega violações do AII e de processos nacionais movidos pela filial do investidor alegando violações de um contrato ou do direito interno.

7.7.

O requisito de esgotar primeiro as vias de recurso internas é um princípio fundamental do direito internacional consuetudinário e do direito internacional em matéria de direitos humanos. Existem também vários acordos de investimento celebrados pelos Estados-Membros da UE com países terceiros que exigem expressamente que os demandantes esgotem as vias de recurso nacionais (29). A lógica subjacente a esta regra é a de conceder ao Estado em que a violação ocorreu uma oportunidade de repará-la pelos seus próprios meios, no quadro do seu sistema jurídico interno, e aplica-se sempre que processos internacionais e internos têm por objetivo a obtenção do mesmo resultado (30). O Tribunal Internacional de Justiça considerou que esta regra é tão importante que não pode ser entendida como tendo sido implicitamente derrogada por um acordo internacional (31). Assim, algumas partes interessadas consideram importante que esta regra seja explicitamente integrada no acordo que estabelece o TMI.

7.8.

Tendo em conta a reflexão acima, o CESE incentiva a Comissão Europeia a estudar de forma mais aprofundada a questão do esgotamento das vias de recurso locais e a forma como esta regra poderia funcionar no contexto do TMI.

8.

Independência e legitimidade dos juízes

8.1.

Qualquer que seja a sua estrutura institucional (uma organização internacional autónoma ou vinculada a uma instituição existente), a independência do TMI deve ser salvaguardada. A nomeação de juízes a título permanente é considerada um fator essencial para começar a estabelecer jurisprudência, melhorando, assim, a previsibilidade e abandonando progressivamente a abordagem do sistema de RLIE, frequentemente considerada ad hoc.

8.2.

Se a criação do TMI for por diante, o objetivo final deverá ser dotá-lo de juízes permanentes. Nas fases iniciais da sua criação, o tribunal deverá poder organizar-se de modo autónomo, tendo em conta o número de processos que irá tratar. Tal depende do número de partes originais na convenção que estabelece o tribunal e do número de acordos que colocam sob a sua jurisdição.

8.3.

Embora o método de nomeação dos juízes não esteja previsto nas recomendações da Comissão Europeia para um mandato, o CESE congratula-se com os compromissos assumidos na definição de critérios claros e de alto nível, incluindo critérios relativos às qualificações dos candidatos e ao respeito de um código de conduta, como a Magna Carta dos Juízes (32), que devem assegurar a inexistência de conflitos de interesses e a independência dos juízes. Este aspeto é essencial para assegurar o Estado de direito e a confiança dos cidadãos.

8.4.

No que diz respeito às qualificações dos juízes, devem ser exigidos conhecimentos comprováveis não só no domínio do direito internacional público, mas também em domínios como a legislação e a resolução de litígios em matéria de investimento, consumidores, ambiente, direitos humanos e trabalho. Estas qualificações são fundamentais para assegurar que os juízes possuem a experiência necessária para tratar os diferentes tipos de processos, relativos a diferentes setores e tipos de investimentos, que serão movidos no âmbito da competência do tribunal, sendo capazes de compreender na íntegra e analisar de forma adequada o contexto jurídico.

8.5.

Além disso, o CESE apoia um processo de nomeação dos juízes que seja transparente e cumpra critérios que assegurarão a representação equitativa de todas as partes na convenção que estabelece o tribunal. O processo de seleção deve ser transparente e estar sujeito aos princípios do controlo público.

8.6.

Assegurar a transparência, a acessibilidade da informação ao público em geral, bem como às partes interessadas, por exemplo através da acreditação, constitui outro elemento crucial para aumentar a credibilidade e a legitimidade do sistema. As regras da CNUDCI em matéria de transparência da arbitragem entre os investidores e o Estado e a Convenção das Nações Unidas sobre a transparência da arbitragem entre os investidores e o Estado baseada nos tratados («Convenção da Maurícia sobre Transparência») devem proporcionar um nível de base para as regras de transparência num futuro TMI.

9.   Um sistema eficaz

9.1.

Deve existir um secretariado responsável pela administração eficaz do TMI. Embora ainda não seja claro se o tribunal será uma organização nova ou estará vinculado a uma organização internacional existente, é necessário assegurar a afetação de recursos suficientes para o funcionamento do secretariado.

9.2.

O projeto de mandato propõe que os custos administrativos sejam suportados pelas partes numa base equitativa, tendo em conta diversos critérios, nomeadamente o nível de desenvolvimento económico das partes, o número de acordos abrangido por cada parte e o volume dos fluxos ou existências de investimento internacionais de cada parte.

9.3.

No que diz respeito à repartição dos custos relacionados com a decisão dos processos (excluindo a remuneração dos juízes que se propõe que seja fixa), o projeto de mandato nada refere. O CESE solicita o esclarecimento desta questão.

9.4.

Um montante substancial do investimento direto estrangeiro (IDE) é gerido por pequenas e médias empresas (PME), que necessitam do mesmo nível de proteção e de acesso à resolução de litígios em condições e a custos razoáveis.

9.5.

Deve ser igualmente ponderada a possibilidade de disponibilizar um mecanismo de conciliação destinado a ajudar as partes a resolver um litígio de forma amigável.

9.6.

Todas as decisões do TMI devem ter caráter executório e ser publicamente divulgadas.

10.   Nível elevado de proteção e eventual período de transição

10.1.

Importa observar que, para que um acordo seja submetido à jurisdição do tribunal, é indispensável que ambas as partes no acordo o consintam previamente. Na realidade, isto significa que nenhum dos acordos assinados pela UE ou pelos Estados-Membros da UE será automaticamente submetido à jurisdição do tribunal sem o acordo da terceira parte.

10.2.

A este respeito, durante um eventual período de transição entre o atual sistema de RLIE e o STI, e até ao estabelecimento de um TMI, continuarão a aplicar-se os procedimentos de resolução de litígios acordados a fim de garantir um nível elevado de proteção dos investimentos, dada a sua constitucionalidade e viabilidade ao abrigo do direito da UE, na pendência do caso submetido à apreciação do TJUE pela Bélgica (33).

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  http://www.oecd-ilibrary.org/finance-and-investment/societal-benefits-and-costs-of-international-investment-agreements_e5f85c3d-en

(2)  http://trade.ec.europa.eu/consultations/index.cfm?consul_id=179

(3)  http://trade.ec.europa.eu/consultations/index.cfm?consul_id=233.

(4)  https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52015IP0252

(5)  Em 6 de setembro de 2017, a Bélgica solicitou um parecer do Tribunal de Justiça da União Europeia sobre a compatibilidade do STI com i) a competência exclusiva do TJUE na interpretação definitiva do direito da União Europeia; ii) o princípio geral da igualdade e o requisito do «efeito prático» da legislação da União Europeia; iii) o direito de acesso aos tribunais; e iv) o direito a um poder judicial independente e imparcial (https://diplomatie.belgium.be/sites/default/files/downloads/ceta_summary.pdf).

(6)  https://www.eesc.europa.eu/en/agenda/our-events/events/public-hearing-framework-eesc-own-initiative-opinion-position-eescspecific-key-issues-ttip-negotiations

(7)  https://www.eesc.europa.eu/en/agenda/our-events/events/multilateralinvestment-court-hearing

(8)  Ver o Parecer do CESE — Posição do CESE sobre questões-chave específicas das negociações relativas à Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (PTCI) (JO C 487 de 28.12.2016, p. 30).

(9)  Ver o Parecer de Iniciativa do CESE — Proteção dos investidores e resolução de litígios entre os investidores e o Estado nos acordos comerciais e de investimento da União Europeia com países terceiros (JO C 332 de 8.10.2015, p. 45). O parecer inclui um anexo que faz referência a um possível instrumento multilateral de resolução de litígios entre investidores e Estados.

(10)  Ver nota 9.

(11)  Não sendo um Estado, a UE não é membro da CNUDCI, mas reforçou o estatuto de observador no seu âmbito.

(12)  http://daccess-ods.un.org/access.nsf/Get?OpenAgent&DS=A/CN.9/WG.III/WP.142&Lang=E

(13)  http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/diaepcb2017d3_en.pdf

(14)  «IIA Issues Note: Recent Developments in the International Investment Regime» [Nota sobre questões relativas aos AII: Evolução recente do sistema de investimento internacional], CNUCED, maio de 2018, disponível em http://investmentpolicyhub.unctad.org/Publications/Details/1186

(15)  http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/HRC/WGTransCorp/Pages/IGWGOnTNC.aspx

(16)  http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=COM:2017:493:FIN

(17)  http://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST-12981-2017-ADD-1-DCL-1/pt/pdf

(18)  https://www.eesc.europa.eu/en/agenda/our-events/events/multilateral-investment-court-hearing

(19)  No Parecer 2/15 de 16 de maio de 2017, o Tribunal de Justiça da União Europeia esclareceu a natureza do Acordo de Comércio Livre entre a UE e Singapura, declarando quais as partes do acordo são de exclusiva competência da UE e quais as que são da denominada «competência partilhada», que requerem ratificação pelos parlamentos nacionais (https://curia.europa.eu/jcms/upload/docs/application/pdf/2017-05/cp170052pt.pdf).

(20)  Por exemplo, o Acordo de Comércio Livre entre a UE e o Chile (atualmente em processo de atualização), o Acordo de Parceria Económica UE-Japão (celebrado em 2017, não contém um capítulo sobre proteção do investimento, mas foi acordado pelas partes que a questão será debatida e abordada no futuro), bem como os futuros acordos de comércio livre com a Austrália e a Nova Zelândia.

(21)  Esta regra é igualmente parte integrante dos tratados internacionais em matéria de direitos humanos, incluindo a Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH).

(22)  Para uma análise crítica de anteriores processos de RLIE, ver Andreas Kulick, Global Public Interest in International Investment Law [Interesse público global no direito internacional em matéria de investimento] (Cambridge University Press 2012), p. 225-306.

(23)  Ver nota 8.

(24)  http://ccsi.columbia.edu/work/projects/third-party-funding-in-investor-state-dispute-settlement/

(25)  Amicus curiae significa, literalmente, «amigo do tribunal». Uma pessoa que tenha manifesto interesse no objeto de uma ação, ou opinião significativa a respeito, mas que não seja parte no litígio, pode solicitar ao tribunal autorização para apresentar observações, supostamente em nome de uma parte, mas que na realidade sugerem uma fundamentação coerente com o seu próprio ponto de vista. Para mais informações consultar: https://legal-dictionary.thefreedictionary.com/amicus+curiae

(26)  Ver nota 8.

(27)  Muitos acordos celebrados pelos Estados Unidos e pelo Canadá incluem disposições «no U-turn». É o caso, por exemplo, do artigo 26.o do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre o Canadá e a Jordânia, celebrado em 2009, relativo às condições prévias para a submissão de um pedido de arbitragem.

(28)  UNCTAD Series on Issues in International Investment Agreements II, «Investor-State Dispute Settlement» [Coleção da CNUCED sobre questões relativas aos acordos de investimento internacionais II, Resolução de litígios entre os investidores e o Estado], CNUCED, 2014, disponível em http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/diaeia2013d2_en.pdf

(29)  Ver, por exemplo, o artigo 5.o do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre a Alemanha e Israel de 1976, o artigo 8.o do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre o Egito e a Suécia de 1978, o artigo 7.o do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre a Roménia e o Sri Lanca de 1981, o artigo 8.o do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre a Albânia e a Lituânia de 2007, o artigo XI do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre o Uruguai e a Espanha de 1992 e o artigo X do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre o Uruguai e a Polónia de 1991.

(30)  Tribunal Internacional de Justiça, processo Interhandel (Suíça c. Estados Unidos da América), exceções, Acórdão de 21 de março de 1959, Coletânea 1959, p. 6, 27. Disponível em http://www.icj-cij.org/docket/files/34/2299.pdf, 27.

(31)  Tribunal Internacional de Justiça, processo Elettronica Sicula S.p.A. (ELSI) (Estados Unidos da América c. Itália), Acórdão de 20 de julho de 1989, Coletânea 1989, p. 15, 28 ILM 1109 (julho 20), ponto 50.

(32)  https://rm.coe.int/16807482c6

(33)  Ver nota 5.


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/156


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria o Instrumento de Assistência de Pré-Adesão (IPA III)»

[COM(2018) 465 final — 2018/0247 (COD)]

(2019/C 110/28)

Relator:

Dimitris DIMITRIADIS

Consulta

Parlamento Europeu, 2.7.2018

Comissão Europeia, 12.7.2018

Conselho da União Europeia, 18.7.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

 

Competência

Secção Especializada de Relações Externas

Adoção em secção

23.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

181/1/1

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe com agrado a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria o Instrumento de Assistência de Pré-Adesão (IPA III) para o período de 2021-2027.

1.2.

O CESE acolhe igualmente com agrado a afirmação de que o IPA III deve atribuir ao critério do desempenho um papel mais central, permitindo uma maior reorientação global das dotações de financiamento, de modo que estas tenham em conta os compromissos dos beneficiários e os progressos no âmbito das reformas. A utilização de indicadores de desempenho contribuirá para a avaliação global do IPA III e é consentânea com as suas anteriores recomendações sobre o IPA II (1).

1.3.

O CESE está convencido de que a criação do Instrumento de Assistência de Pré-Adesão está em conformidade com a nova estratégia da Comissão para os Balcãs Ocidentais intitulada «Uma perspetiva de alargamento credível e um maior empenhamento da UE nos Balcãs Ocidentais», publicada em 6 de fevereiro de 2018, e com as suas seis iniciativas emblemáticas que englobam o reforço do Estado de direito, o reforço da cooperação em matéria de segurança e migração através de equipas de investigação conjuntas, a Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira, a expansão da União da Energia da UE aos Balcãs Ocidentais, a redução das tarifas de itinerância e a implantação da banda larga na região (2). Além disso, é consentânea com a política de alargamento da União Europeia com vista a uma possível futura adesão da Turquia.

1.4.

O CESE reafirma a sua posição, assente no artigo 49.o do Tratado da União Europeia, que estabelece que qualquer Estado europeu que adote os valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do Estado de direito e do respeito pelos direitos humanos, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias, e esteja empenhado em promovê-los, pode pedir para se tornar membro da União.

1.5.

O CESE congratula-se com o facto de a referência financeira prevista no projeto de regulamento que cria o IPA III para o período de 2021 a 2027 ser de aproximadamente 14,5 mil milhões de euros, de acordo com a proposta da Comissão Europeia.

1.6.

O CESE congratula-se igualmente com o facto de 25 % das despesas da UE se destinarem a contribuir para os objetivos em matéria de clima.

1.7.

O CESE saúda o facto de o IPA III introduzir mais flexibilidade na medida em que não prevê que as dotações destinadas aos parceiros sejam fixadas desde o início. O quadro de programação do IPA deverá basear-se na evolução das necessidades e garantir um equilíbrio entre a previsibilidade e o financiamento em função do desempenho.

1.8.

O CESE salienta que as observações formuladas após a avaliação intercalar do IPA II (3) e muitas das anteriores recomendações do CESE (4) devem ser plenamente adotadas, tanto pela Comissão Europeia como pelos países candidatos e potenciais candidatos.

1.9.

O CESE sublinha a importância da assistência de pré-adesão para promover as reformas económicas e criar um ambiente empresarial favorável e previsível que fomente o empreendedorismo, a criação de empresas e contribua para o crescimento das PME, aumentando assim a competitividade e o crescimento económico e criando novos postos de trabalho dignos.

1.10.

O CESE salienta a relevância dos programas de reforma económica e da participação ativa dos parceiros sociais e de outras organizações da sociedade civil no processo de desenvolvimento e aplicação desses programas. O CESE solicita que sejam atribuídos mais fundos, incluindo subvenções de organização, ao reforço das capacidades dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil, a fim de estes poderem participar efetivamente nesses processos. Há que promover melhorias na qualidade e no conteúdo do diálogo social dos países candidatos e potenciais candidatos.

1.11.

O CESE considera que o financiamento concedido pelo IPA III é importante para a integração das economias dos Balcãs Ocidentais na UE.

1.12.

O CESE concorda que os progressos dos beneficiários do IPA no âmbito das reformas são essenciais para a absorção (entre 64,3 % e 88,9 % do IPA II) e para a exploração destes fundos e salienta a necessidade de reforçar uma cultura de cooperação entre os beneficiários dos Balcãs Ocidentais. O caso da Turquia é muito mais complexo e delicado. O financiamento de um país relativamente ao qual não se exclui totalmente a possibilidade de um agravamento da situação em matéria de direitos humanos exige prudência e a aplicação do princípio da condicionalidade.

1.13.

O CESE sublinha a necessidade de utilizar a assistência de pré-adesão para reforçar as capacidades da administração dos países candidatos e potenciais candidatos, a fim de os preparar para a utilização futura dos fundos estruturais e para a participação na política agrícola comum (PAC) da UE.

1.14.

O CESE acredita firmemente que a UE deve definir mecanismos rigorosos e eficientes de controlo da distribuição da assistência de pré-adesão a todos os países candidatos e potenciais candidatos. Sobretudo no caso da Turquia, devem ser envidados mais esforços para acabar com os atrasos crónicos em vários setores.

1.15.

O CESE afirma que a execução do IPA III terá de ser acelerada, em especial nos primeiros anos, para evitar atrasos estruturais em matéria de contratação e execução e absorver progressivamente os atuais atrasos. A Comissão deve prestar especial atenção à gestão indireta com os beneficiários. A avaliação intercalar demonstrou que, embora o seu impacto em termos de uma maior apropriação seja considerado positivo, produziram-se escassos resultados em matéria de contratação e longos atrasos de execução, em particular na Turquia.

1.16.

O CESE sublinha que o acompanhamento deve ser efetuado com base nos indicadores definidos na proposta da Comissão Europeia. Os indicadores de desempenho pertinentes são definidos e incluídos no quadro de programação do IPA e serão impostos, aos beneficiários de fundos da UE, requisitos de prestação de informações proporcionados. Os relatórios relativos ao alargamento constituirão um ponto de referência na avaliação dos resultados da assistência ao abrigo do IPA III. O sistema de prestação de informações sobre o desempenho deve assegurar que os dados necessários para o acompanhamento da execução e dos respetivos resultados são recolhidos de forma eficiente, eficaz e oportuna.

1.17.

O CESE entende que a Comissão deve proceder regularmente a um controlo das suas ações e a uma análise dos progressos para alcançar os resultados previstos. As avaliações determinarão os efeitos do instrumento no terreno com base nos indicadores e metas pertinentes e numa análise detalhada do grau de relevância, eficácia, eficiência do instrumento, de suficiente valor acrescentado da UE e da coerência com outras políticas da UE. Incluirão os ensinamentos colhidos com vista a identificar eventuais lacunas/problemas ou qualquer potencial para um maior aperfeiçoamento das ações ou respetivos resultados e ajudar a maximizar a exploração/impacto destes.

1.18.

O CESE acredita firmemente que se devem definir padrões e divulgar boas práticas junto dos países candidatos e potenciais candidatos, a fim de reforçar a sua absorção ativa dos fundos.

1.19.

O CESE salienta que a nova proposta de regulamento também dá importância à maior coordenação e cooperação com outros doadores e instituições financeiras, inclusive do setor privado.

1.20.

O CESE convida a Comissão Europeia a explorar o potencial de uma perspetiva de mais longo prazo na execução. Deste modo, será possível aumentar o nível de previsibilidade e reduzir a pressão do tempo, sobretudo nos casos em que se verifica a acumulação de atrasos substanciais durante o período atual.

1.21.

O CESE considera necessário melhorar a qualidade global dos documentos (de trabalho) utilizados para o planeamento da abordagem setorial, bem como clarificar esse planeamento junto de todas as partes interessadas. Para isso, recomenda a tomada de medidas destinadas a melhorar a capacidade da Comissão Europeia para integrar questões transversais. É geral a necessidade de reforçar as capacidades de todas as instituições envolvidas na sua realização da Assistência de Pré-Adesão. Tal deverá incluir também uma utilização proporcionada da assistência técnica para apoiar estas instituições nos países candidatos e potenciais candidatos.

1.22.

O CESE considera que o IPA III deve ser utilizado para reforçar a sensibilização para os valores fundamentais da UE, bem como para promover o valor acrescentado da assistência de pré-adesão junto dos cidadãos dos países candidatos e potenciais candidatos. Tal deve ser efetuado através de programas de subvenções geridos pelas delegações da União Europeia.

1.23.

O CESE congratula-se com a ligação da assistência de pré-adesão aos seguintes aspetos: a) Estado de direito, b) boa governação e direitos fundamentais, c) desenvolvimento socioeconómico, d) adoção das políticas e do acervo da UE, e) reconciliação e relações de boa vizinhança e f) cooperação regional.

2.   Estado de direito, boa governação e direitos fundamentais

2.1.

O CESE sublinha que ainda existe uma grande divergência entre as normas da UE e as de todos os países candidatos e potenciais candidatos. A situação afigura-se mais difícil agora na Turquia do que antes, sobretudo após a tentativa falhada de golpe de estado de julho de 2016 e a imposição da lei marcial.

2.2.

O CESE considera que o IPA III deve continuar a investir nos projetos relacionados com o Estado de direito que ajudaram países a criar organismos judiciais e de aplicação da lei sólidos e profissionais, independentes e livres de influências externas.

2.3.

O CESE considera ainda que é necessário demonstrar um interesse específico na formação de um sistema eficiente para proteger as fronteiras, gerir os movimentos migratórios, evitar as crises humanitárias e oferecer asilo aos que dele carecem. A assistência técnica da UE de apoio a boas práticas de governação nestes domínios poderá revelar-se muito útil. Além disso, todos os países candidatos e potenciais candidatos devem desenvolver mecanismos destinados a prevenir a criminalidade organizada e a acabar com o terrorismo e a imigração ilegal. A Turquia deve demonstrar um empenho mais sólido na execução do acordo assinado com a UE, em 28 de março de 2016, que visa acabar com o movimento migratório irregular através da Turquia para a Europa (5).

2.4.

O CESE sublinha que o setor público em todos os países candidatos e potenciais candidatos ainda sofre de problemas como o clientelismo, a opacidade, a corrupção e a desigualdade.

2.5.

O CESE está ciente de que, em todos os países candidatos e potenciais candidatos, as minorias ainda enfrentam muitos problemas resultantes de comportamentos e atitudes discriminatórios.

2.6.

O CESE acredita firmemente que, no âmbito da assistência de pré-adesão, se deve dar prioridade a iniciativas de reforma e despolitização do setor público, de promoção da transparência e da responsabilização, de reforço da administração pública em linha e de melhoria da gestão. Neste contexto, a assistência de pré-adesão deve ser utilizada para criar oportunidades significativas para a participação do leque mais amplo possível de organizações da sociedade civil na elaboração das políticas governamentais.

2.7.

O CESE acredita firmemente que a sociedade civil deve ser reconhecida como um interveniente importante para garantir o Estado de direito, razão pela qual os programas de assistência de pré-adesão devem dar prioridade às suas iniciativas.

2.8.

O CESE entende ainda que as instituições de financiamento que facilitam e promovem a igualdade e o respeito pelos direitos humanos também devem ser prioritárias no âmbito da assistência de pré-adesão.

3.   Desenvolvimento socioeconómico

3.1.

O CESE reconhece que a necessidade de assistência financeira a estes parceiros é manifestada pelo nível persistentemente elevado das taxas de desemprego (por exemplo, 21,6 % na antiga República jugoslava da Macedónia e 35,3 % no Kosovo (*1) no primeiro trimestre de 2018) e pela lentidão na recuperação do atraso face aos países da UE em termos de PIB per capita.

3.2.

O CESE está perfeitamente ciente do facto de a pobreza, o elevado nível de desemprego, a economia informal, os salários baixos, a corrupção, a prevaricação, a emigração de trabalhadores qualificados e a «fuga de cérebros» estarem a afetar todos os parceiros dos Balcãs Ocidentais (6) e a Turquia.

3.3.

O CESE entende que o papel da educação, nomeadamente a igualdade de acesso aos sistemas de ensino, é fundamental, em todos os parceiros dos Balcãs Ocidentais e na Turquia, para promover os valores europeus, cultivar a tolerância em relação às minorias, melhorar a igualdade de género, lutar contra os preconceitos e reforçar a coesão social.

3.4.

O CESE considera também que deverá ser aplicada, através do IPA III, uma «agenda da coesão social» através do reforço da eficiência e eficácia dos sistemas de ensino, colmatando assim as lacunas em matéria de competências e a inadequação das competências, bem como enfrentando os desafios do mercado de trabalho criados pela evolução digital e tecnológica da economia. O reforço do apoio financeiro destinado aos programas de ensino profissional e aos regimes de estágios e aprendizagem ao longo da vida, bem como a maior participação dos parceiros sociais e de outras organizações da sociedade civil pertinentes na sua conceção, contribuiriam para combater a inadequação das competências no mercado de trabalho e para reduzir os elevados níveis de desemprego, bem como o número de ofertas de emprego por preencher.

3.5.

O CESE sublinha a importância de, através da assistência de pré-adesão, criar mecanismos para combater a pobreza e conceder acesso ao mercado de trabalho, sobretudo para os jovens, as mulheres e os grupos minoritários, prevenindo assim a emigração e a «fuga de cérebros».

3.6.

O CESE estima que o aprofundamento e o alargamento do diálogo social são condições essenciais para o desenvolvimento socioeconómico. Os parceiros sociais devem desempenhar um papel importante na elaboração e aplicação das políticas.

3.7.

O CESE está muito convicto que o reforço das capacidades para fortalecer a estabilidade macroeconómica e apoiar os progressos no sentido de instituir uma economia de mercado viável dotada da capacidade de fazer face à pressão competitiva e às forças do mercado no interior da União deve ser uma prioridade para todos os países candidatos e potenciais candidatos durante a distribuição da assistência de pré-adesão. No entanto, o nível empresarial das economias dos beneficiários do IPA III também requer uma atenção especial. O empreendedorismo, o trabalho por conta própria, as PME e o microfinanciamento não devem ser esquecidos.

3.8.

O CESE apela a que se preste especial atenção à melhoria da orientação do mercado para o setor privado e da competitividade das empresas privadas através da repartição da assistência de pré-adesão.

3.9.

O CESE entende que devem ser disponibilizadas, no âmbito do IPA III, subvenções de funcionamento que abranjam pelo menos 36 meses para as organizações da sociedade civil.

3.10.

O CESE considera que se deve reforçar o impacto dos pequenos regimes de reafetação das subvenções destinadas às organizações da sociedade civil rurais/de base e de menor dimensão, especialmente através de uma participação muito maior das referidas organizações em todas as fases de planeamento de cada regime de reafetação de subvenções.

3.11.

O CESE salienta a necessidade de prestar apoio através das instituições responsáveis pela prestação de assistência de pré-adesão no que diz respeito à promoção e distribuição de tecnologias digitais, à proteção do ambiente e à definição dos padrões de segurança nuclear mais elevados.

3.12.

O CESE entende também que a formação de instituições que promovam a igualdade de acesso à educação na infância, que desenvolvam o ensino profissional, que melhorem a qualidade do ensino superior e que reforcem a aprendizagem ao longo da vida, os mecanismos/organismos que regulamentam as relações laborais, o processo de negociação coletiva e de resolução de litígios no trabalho, assim como o diálogo social estruturado entre os parceiros sociais, deve ser prioritária no que diz respeito à obtenção de assistência de pré-adesão.

4.   Adoção das políticas e do acervo da UE

4.1.

O CESE está ciente de que existe uma grande divergência entre as normas da UE e as que se aplicam a todos os países candidatos e potenciais candidatos.

4.2.

O CESE entende que se deve dar importância à promoção da harmonização das normas, políticas e práticas dos países candidatos e potenciais candidatos com as da União, incluindo as regras relativas aos auxílios estatais.

4.3.

O CESE salienta que, para além da harmonização com a parte legislativa do acervo da UE, os países candidatos e potenciais candidatos deverão familiarizar-se e eventualmente sintonizar-se com as políticas atualmente em debate e desenvolvidas na UE, tais como o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) das Nações Unidas e a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, bem como com a cooperação entre os Estados-Membros da UE quanto aos movimentos de refugiados e migrantes e ao controlo integrado das fronteiras.

5.   Reconciliação e relações de boa vizinhança

5.1.

Os países candidatos e potenciais candidatos dos Balcãs Ocidentais e a Turquia ainda estão marcados pelas guerras e conflitos, pelo ódio étnico, por movimentos irredentistas e por conflitos congelados, que podem voltar a eclodir. Há que incentivar fortemente a resolução dos problemas bilaterais mais prementes antes da sua adesão à UE, embora a insistência em soluções para todos os problemas pendentes seja suscetível de atrasar este processo. O incentivo à reconstrução das suas relações comerciais e de outras relações económicas poderia contribuir para a resolução dos conflitos e o crescimento económico.

5.2.

O CESE congratula-se com as iniciativas lançadas pelas instituições públicas do setor da educação e da cultura, pelo meio académico e pelas organizações da sociedade civil nos domínios da reconciliação, das relações de boa vizinhança e da adoção de uma abordagem crítica do passado.

5.3.

O CESE salienta que o reforço das capacidades das organizações da sociedade civil e das organizações de parceiros sociais, incluindo as associações profissionais, e o incentivo à criação de redes a todos os níveis entre organizações baseadas na União e as organizações dos beneficiários deverão facilitar o processo de integração.

5.4.

O CESE entende que o IPA III deve conceder financiamento às organizações da sociedade civil que pretendam melhorar o espaço cívico para o envolvimento e a participação. O apoio às infraestruturas da sociedade civil e às plataformas e redes temáticas regionais da sociedade civil deve ser aumentado no âmbito do IPA III.

6.   Cooperação regional

6.1.

As redes de energia e de transporte devem contribuir para o desenvolvimento e a interconectividade da região. Tal ofereceria aos cidadãos dos países candidatos e potenciais candidatos dos Balcãs Ocidentais e da Turquia uma ideia clara das vantagens sociais, económicas e ambientais da adesão à UE. Por exemplo, a eficiência energética e a poupança de energia são fatores geradores de atividade para as empresas e fatores de criação de empregos ecológicos, mas também tradicionais.

6.2.

O CESE entende que, no âmbito da assistência de pré-adesão, se deve dar prioridade às instituições e iniciativas que criem ligações entre os países candidatos e potenciais candidatos nos domínios da energia, da comunicação, da digitalização, da inovação, dos transportes e da proteção do ambiente. O caso da cooperação entre as cidades de Kula, na Bulgária, e Boljevac, na Sérvia, que queriam adquirir veículos especializados, drones de vigilância e equipamento de proteção individual para combate a incêndios florestais, poderia ser um exemplo de boas práticas (7).

6.3.

O CESE apoia o Tratado que institui uma Comunidade dos Transportes, celebrado pela UE e pelos países candidatos e potenciais candidatos dos Balcãs Ocidentais em 12 de julho de 2017, e exorta as Partes a continuarem a desenvolvê-lo. A este respeito, a Comissão Europeia, o Banco Europeu de Investimento e os parceiros dos Balcãs Ocidentais devem concentrar os seus investimentos para ligar a rede principal da RTE-T da UE e as infraestruturas dos Balcãs Ocidentais. Por conseguinte, torna-se necessário um programa partilhado, com a identificação dos fundos disponíveis e a definição de um calendário comum.

6.4.

A melhoria das infraestruturas reduzirá os custos dos transportes e da energia e favorecerá a realização de grandes investimentos na região, bem como facilitará o comércio intrarregional. Além disso, a promoção da modernização digital e a redução gradual das tarifas de itinerância dos Balcãs Ocidentais contribuirão para o desenvolvimento empresarial, para o aumento da produtividade e para a melhoria da qualidade de vida. No entanto, a falta de infraestruturas não é o principal obstáculo à cooperação entre os parceiros dos Balcãs Ocidentais. As hostilidades do passado e os diferendos por resolver entre estes países limitaram o âmbito e o teor da cooperação. Esta situação poderia ser parcialmente solucionada incentivando os projetos de cooperação transfronteiras do IPA.

6.5.

Os meios de comunicação social e outras formas de comunicação devem ser utilizados para destacar a presença e a importância das atividades da UE nos países candidatos e potenciais candidatos. Além disso, há que reforçar as capacidades dos funcionários públicos locais em termos de gestão e execução de projetos ao longo de todo o processo de adesão à UE.

7.   Observações específicas sobre o projeto de regulamento IPA III

7.1.

O CESE entende que a proposta se baseia nas realizações e nos ensinamentos colhidos durante os anteriores períodos de programação e considera-a adequada à concretização dos seus objetivos. Não obstante, insiste que os países candidatos e potenciais candidatos estão expostos a desafios bastante diferentes em comparação com os Estados-Membros, sendo, por isso, essencial muita flexibilidade.

7.2.

O CESE apoia plenamente os objetivos declarados do IPA III, mas salienta que os efeitos diretos são dificilmente observáveis a curto prazo. Recomenda, por conseguinte, que o valor acrescentado das futuras intervenções seja exaustivamente avaliado no que diz respeito ao grau de envolvimento, peso político e defesa de causas para a maioria dos beneficiários. O facto de o apoio orçamental concedido no período de programação atual ter sido um catalisador da mudança institucional e do reforço do diálogo estratégico nos países beneficiários (por exemplo, Sérvia, Montenegro e Albânia) deve ser louvado.

7.3.

Tendo em mente a situação difícil da grande maioria dos beneficiários, o CESE recomenda que seja assegurada suficiente simplificação no momento de definir os requisitos documentais e que a atenção seja centrada no apoio e na garantia da apropriação dos resultados pelos beneficiários. Para isso, deverão continuar a ser envidados esforços no sentido de desenvolver o modo de gestão indireta com o país beneficiário, acompanhados por ações de reforço das capacidades, de modo a ajudar as partes interessadas a participar de forma construtiva no processo de programação global.

7.4.

O CESE considera necessário reforçar a complementaridade do IPA III com as ações financiadas ao abrigo de outras fontes de financiamento nos países candidatos e potenciais candidatos.

7.5.

O CESE propõe que sejam adotadas medidas especiais durante o processo de negociação a nível nacional nos países candidatos e potenciais candidatos, a fim de superar os atrasos crónicos, os estrangulamentos e as ineficiências que surgiram durante o atual período de programação. É evidente que a escala relativamente limitada dos fundos do IPA em comparação com os orçamentos nacionais em alguns dos países beneficiários e a necessidade de um consenso estável entre a Comissão Europeia e as suas instituições nacionais devem ser tidas em consideração, servindo de base ao diálogo estratégico.

8.   Boas práticas

8.1.

Modelos de pedidos: é necessária uma maior simplificação, e sobretudo unificação, no âmbito do IPA, mas também em relação aos outros doadores e aos requisitos das legislações nacionais. Existem demasiadas orientações e instruções, e existe margem para a harmonização, sendo os aspetos específicos resumidos posteriormente num capítulo separado.

8.2.

As qualificações, os conhecimentos e as competências das entidades adjudicantes devem ser melhorados, inclusive os dos organismos de controlo/auditoria, especialmente nos casos em que é necessário interpretar uma questão e cujas respostas são muito demoradas.

8.3.

Alguns regimes de subvenção impõem requisitos excessivos no que diz respeito à análise do contexto do projeto, à situação das regiões, etc., o que é muito exigente para o requerente normal. A situação pode ser invertida. As administrações adjudicantes podem contratar peritos para efetuar estas análises e avaliar a viabilidade de um determinado projeto.

8.4.

Abordagem mais prática para os requerentes: os pacotes de pedido podem ser revistos antecipadamente ou consultados por funcionários das respetivas administrações (ou por prestadores de assistência técnica), sendo concedido tempo adicional para permitir o cumprimento dos requisitos administrativos.

8.5.

Alterações contratuais: há que garantir um tratamento mais flexível e célere. Normalmente, um programa é definido no prazo de um a dois anos, seguindo-se um processo de candidatura moroso, pelo que serão necessários meios flexíveis de alteração dos contratos.

8.6.

Relações públicas, marcas e visibilidade: existe margem para simplificar e otimizar os requisitos. É também de reforçar a visibilidade dos projetos financiados pela UE.

8.7.

As fichas de setor e as fichas de projeto relativas aos valores-alvo dos indicadores devem ser modificadas e sincronizadas com o período de execução real.

8.8.

Os contratos de reforma setorial contribuirão para a execução das reformas estratégicas e para a consecução dos resultados específicos por setor. Possíveis medidas a adotar no âmbito do IPA III são: o envolvimento de pessoal qualificado na estrutura operacional e a prestação de apoio técnico adequado e contínuo para a estrutura operacional. A apropriação do processo pelas principais partes interessadas deve ser reforçada. Desafios em matéria de programação: a sequenciação de contratos no programa pode levar à violação do prazo do contrato, o que poderá vir a dar origem a diversos problemas no decurso do processo de execução.

8.9.

Potenciais riscos ocorridos durante o período de referência do IPA II mostraram a necessidade de garantir o empenho e uma cooperação e coordenação interministeriais eficientes. Tal deve-se à complexidade das intervenções e às responsabilidades partilhadas pelas instituições nacionais específicas, tendo em conta que as reformas previstas são da responsabilidade de diferentes setores governamentais.

8.10.

Os problemas na preparação para as aquisições/contratação a nível dos projetos consistem sobretudo em dificuldades no cumprimento das condições prévias estipuladas, desafios em termos de coordenação e sequenciação com os outros projetos/contratos conexos, mas também falta de capacidade para a preparação atempada de documentação de qualidade para os concursos.

8.11.

Do ponto de vista da contratação, os principais ensinamentos retirados que devem ser tidos em consideração no futuro são os seguintes: capacidade insuficiente devido a flutuações de recursos humanos nas instituições beneficiárias; baixa qualidade da documentação apresentada pelos beneficiários; falta de competências especializadas práticas a nível interno para projetos complexos; necessidade de reforçar a apropriação do processo pelas principais partes interessadas; sequenciação complexa dos contratos no programa que pode resultar na violação do contrato e/ou no incumprimento do prazo de execução; cumprimento atempado das condições prévias, etc.

8.12.

Um problema que surge com frequência é a discrepância entre os indicadores incluídos nas fichas iniciais de setor/projeto e os valores posteriores, no final do período de comunicação do programa. Além disso, a qualidade e o alcance dos indicadores são, em alguns casos, inadequados, o que impede o acompanhamento eficiente da execução do programa.

8.13.

O conteúdo de alguns contratos que são geridos por autoridades descentralizadas depende dos resultados dos contratos anteriores celebrados pelas entidades centrais adjudicantes. Assim, há receios quanto à publicação atempada de concursos e à execução de contratos que são geridos por autoridades descentralizadas.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Parecer do CESE sobre o Instrumento de Assistência de Pré-Adesão/Instrumento Europeu de Vizinhança (JO C 11 de 15.1.2013, p. 77).

(2)  Os princípios básicos da estratégia da UE para os Balcãs Ocidentais foram definidos pela Comissão em 6 de fevereiro de 2018, na sua Comunicação — Uma perspetiva de alargamento credível e um maior empenhamento da UE nos Balcãs Ocidentais, COM(2018) 65 final.

(3)  https://ec.europa.eu/europeaid/evaluation-instrument-pre-accession-assistance-ipa-ii-draft-report_en

(4)  Ver referência na nota 1.

(5)  http://www.europarl.europa.eu/legislative-train/theme-towards-a-new-policy-on-migration/file-eu-turkey-statement-action-plan

(*1)  Esta designação não prejudica as posições relativas ao estatuto e está conforme com a Resolução 1244 (1999) do CSNU e com o parecer do TIJ sobre a declaração de independência do Kosovo.

(6)  Parecer do CESE sobre «A coesão económica e social e a integração europeia dos Balcãs Ocidentais — desafios e prioridades» (JO C 262 de 25.7.2018, p. 15).

(7)  https://ec.europa.eu/transparency/regdoc/rep/3/2018/PT/C-2018-3051-F1-PT-MAIN-PART-1.PDF


22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/163


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Instrumento de Vizinhança, Desenvolvimento e Cooperação Internacional e Instrumento para a Cooperação no domínio da Segurança Nuclear»

[COM(2018) 460 final — 2018/0243 (COD)]

(2019/C 110/29)

Relator:

Cristian PÎRVULESCU

Consulta

Parlamento Europeu, 2.7.2018

Comissão Europeia, 12.7.2018

Conselho da União Europeia, 18.7.2018

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

Artigo 206.o do Tratado Euratom

 

 

Competência

Secção Especializada de Relações Externas

Adoção em secção

23.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

176/0/1

1.   Conclusões e recomendações

1.1.   Instrumento de Vizinhança, Desenvolvimento e Cooperação Internacional

1.1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) apoia os objetivos gerais e específicos da proposta e considera que a decisão de concentrar os instrumentos utilizados em relação aos países vizinhos e aos países terceiros é útil e bem-vinda. A UE deve estabelecer uma relação construtiva, realista e pragmática com os países vizinhos e países terceiros, na qual os valores devem permanecer centrais.

1.1.2.

O Comité constata a determinação evidente nesta proposta, por parte da Comissão, das demais instituições europeias e dos Estados-Membros, em apoiar o desenvolvimento dos sistemas de proteção da sociedade civil, da democracia e dos direitos humanos. O funcionamento do novo instrumento consolidado deve ser orientado, em todas as fases, desde o planeamento ao acompanhamento e avaliação, para a promoção dos valores da UE, nomeadamente o Estado de direito, a integridade, o pluralismo, a democracia e a proteção dos direitos humanos. Neste contexto, o Comité insta a Comissão Europeia a aumentar significativamente a dotação para os direitos humanos e a democracia, bem como para os programas temáticos da sociedade civil.

1.1.3.

O Comité apoia o objetivo do Instrumento de Vizinhança, Desenvolvimento e Cooperação Internacional, que consiste em manter e promover os valores e os interesses da União a nível mundial, através da prossecução dos objetivos e dos princípios da sua ação externa. A comunicação afirma ainda que, na aplicação do regulamento em apreço, será assegurada a coerência com outros domínios da ação externa e com outras políticas da UE pertinentes, conforme previsto na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável (Agenda 2030). Isto significa ter em conta o impacto de todas as políticas de desenvolvimento sustentável a todos os níveis — nacional, da UE, de outros países e mundial.

1.1.4.

O Comité aproveita esta oportunidade para recordar a União Europeia de que a Agenda 2030 tem em vista um mundo em que todos os países, tendo em conta os diferentes níveis de desenvolvimento e capacidades nacionais, beneficiam de crescimento económico sustentado, integrador e sustentável, de desenvolvimento social, incluindo trabalho digno para todos, e de proteção ambiental. Um mundo em que a democracia, a boa governação e o Estado de direito, bem como um ambiente propício a nível nacional e internacional, são elementos essenciais do desenvolvimento sustentável.

1.1.5.

Esta importante responsabilidade de apoiar o plano de ação a favor das pessoas, do planeta e da prosperidade da Agenda 2030 exige uma maior concentração nos instrumentos de apoio, bem como no modo como são organizados e como se ligam às difíceis realidades da política mundial. A concentração e a unificação dos instrumentos utilizados constituem um grande passo rumo a uma ação eficiente e orientada para as prioridades na realização dos objetivos propostos. A UE está frequentemente em posição de apoiar de forma decisiva os grupos e indivíduos mais vulneráveis. Trata-se de uma responsabilidade que deve ser assumida e cumprida.

1.1.6.

Os países vizinhos e os países terceiros confrontam-se com vários problemas graves, diversificados e concomitantes. No atual clima mundial, em que as reformas de promoção da democratização, da estabilização política e do desenvolvimento económico parecem ter estagnado, a UE tem de intensificar os seus esforços, ao invés de os abandonar. Deve manter contacto permanente com os governos dos países vizinhos e dos países terceiros, motivando-os e incentivando-os a cooperar de forma responsável. As suas relações na base da parceria com estes governos devem ser sólidas, assertivas e firmemente orientadas para a melhoria das condições de vida das pessoas que vivem nestes países.

1.1.7.

O Comité considera que a UE deve atuar de forma proativa, até 2030, para apoiar o fim da pobreza e da fome, combater as desigualdades entre países e dentro de cada país, criar sociedades pacíficas, justas e integradoras, proteger os direitos humanos e promover a igualdade de género e a emancipação das mulheres e das raparigas e garantir a proteção duradoura do planeta e dos seus recursos naturais.

1.1.8.

O Comité congratula-se com a decisão, expressa na proposta em apreço, de reduzir os encargos administrativos para as instituições da UE e os Estados-Membros e de assegurar uma maior concentração nos objetivos políticos e no envolvimento com parceiros externos. O Comité acolhe favoravelmente e apoia os progressos significativos apresentados na proposta: maior simplificação e flexibilidade e melhor acompanhamento dos resultados.

1.1.9.

O Comité congratula-se com o alargamento das competências orçamentais e de controlo do Parlamento Europeu na sequência da integração no orçamento da UE das atividades atualmente financiadas pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento (FED).

1.1.10.

O Comité encoraja a Comissão Europeia a tirar partido dos ganhos e dos progressos realizados com os instrumentos precedentes. Por exemplo, o Instrumento para a Democracia e os Direitos Humanos reconheceu todos os direitos económicos, sociais e culturais e promoveu o diálogo social (1). As organizações da sociedade civil que lutam pela liberdade, pela democracia, pelos direitos humanos e pela equidade dos processos eleitorais receberam apoio, apesar da atitude hostil de alguns governos em relação a elas. Este compromisso deve ser mantido e reforçado.

1.1.11.

O Comité salienta a importância dos processos democráticos e eleitorais nos países vizinhos e nos países terceiros e encoraja a Comissão Europeia a dar prioridade ao desenvolvimento de instituições eleitorais fortes e independentes. As instituições da UE devem trabalhar em estreita colaboração com a Comissão de Veneza, o Conselho da Europa, a OSCE e as redes de peritos eleitorais, por forma a dar substância ao seu apoio crucial a processos eleitorais justos e sólidos.

1.1.12.

O Comité incentiva os Estados-Membros a cooperarem plenamente, com base na sua relação de longa data com países vizinhos e países terceiros, a fim de melhorar os resultados do funcionamento do instrumento.

1.1.13.

O Comité apoia as recomendações formuladas no parecer do Comité das Regiões e incentiva a Comissão a assegurar, em todas as circunstâncias, que as partes interessadas pertinentes, incluindo os órgãos de poder local e regional, são devidamente consultadas e têm um acesso atempado às informações de que necessitam para poderem desempenhar um papel significativo durante a conceção, a execução e a monitorização dos programas. Além disso, o Comité salienta que a democracia a nível infranacional deve ser incluída nos princípios orientadores, uma vez que é aos níveis local e regional que os cidadãos podem viver a democracia de forma mais direta.

1.2.   Instrumento para a Cooperação no domínio da Segurança Nuclear

1.2.1.

No que diz respeito ao Instrumento Europeu para a Segurança Nuclear, após a catástrofe nuclear de Fucoxima, tornou-se perfeitamente claro que os problemas e os riscos da utilização da energia nuclear são de dimensão mundial. Infelizmente, a proposta não aborda, aos níveis estratégico e político, a exigência legítima de um planeamento a longo prazo em matéria de energia nuclear dos cidadãos, da sociedade civil e do setor empresarial.

1.2.2.

O Comité congratula-se com a intenção da Comissão de incluir atividades no domínio nuclear que estejam em consonância com a política de desenvolvimento e de cooperação internacional em matéria de saúde, agricultura, indústria e projetos sociais destinados a abordar as consequências de acidentes nucleares. Contudo, não é claro de que modo o orçamento disponível e as disposições institucionais em vigor poderão contribuir para pôr em prática esta intenção.

1.2.3.

O papel da Agência Internacional da Energia Atómica é essencial, e a agência deve assumir a responsabilidade de garantir a transparência e o alerta precoce no que se refere ao desenvolvimento de novas centrais nucleares no mundo. A UE deve cooperar plenamente com as instituições e organizações mundiais para promover a segurança nuclear.

1.2.4.

São necessários esforços renovados para assegurar que os sítios existentes e os previstos na vizinhança europeia funcionam com elevados níveis de transparência e segurança. O CESE insta todos os Estados-Membros a apoiarem este objetivo e a tornarem a segurança nuclear um objetivo fundamental das relações bilaterais e multilaterais com os países parceiros.

1.2.5.

Além disso, tendo em conta os principais desafios mundiais relacionados com a energia nuclear e a presença de um elevado número de centrais nucleares na sua vizinhança, o Comité considera que a dotação financeira prevista para a execução do regulamento em apreço para o período de 2021-2027, de 300 milhões de EUR, a preços correntes, é extremamente insuficiente.

2.   Observação na generalidade

2.1.   Contexto da proposta — Instrumento de Vizinhança, Desenvolvimento e Cooperação Internacional

2.1.1.

A comunicação apresenta as principais prioridades e o quadro orçamental global para os programas de ação externa da UE na rubrica «Países Vizinhos e Resto do Mundo», incluindo a criação do Instrumento de Vizinhança, Desenvolvimento e Cooperação Internacional.

2.1.2.

Através da proposta em apreço, a UE continuará a poder desempenhar um papel ativo na promoção dos direitos humanos, da prosperidade, da estabilização, do desenvolvimento, da segurança, do combate às causas profundas da migração irregular, do comércio, da luta contra as alterações climáticas e da proteção do ambiente, entre outros aspetos. No entanto, poderá fazê-lo de uma forma mais abrangente, proporcionando maior flexibilidade para mover os recursos para onde estes são necessários à medida que o contexto internacional muda.

2.1.3.

A proposta em apreço prevê um quadro facilitador através do qual as políticas de ação externa e as obrigações internacionais possam ser executadas. Os compromissos internacionais incluem a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, o Acordo de Paris sobre as Alterações Climáticas, a Agenda de Ação de Adis Abeba, o Quadro de Sendai para a Redução dos Riscos de Catástrofe (2015-2030) e a Resolução 2282 (2016) do Conselho de Segurança da ONU sobre a manutenção da paz. Na UE, o quadro das políticas inclui as disposições do Tratado relativas à ação externa que são aprofundadas através da Estratégia Global da UE para a Política Externa e de Segurança, o novo Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento, a Parceria UE-África renovada e a política europeia de vizinhança revista, entre outros documentos políticos. O regulamento também irá constituir o quadro para a execução da parceria que sucederá ao atual Acordo de Cotonu, que estabelece o acordo de parceria entre os membros do grupo de Estados da África, das Caraíbas e do Pacífico, por um lado, e a União Europeia e os seus Estados-Membros, por outro.

2.1.4.

A avaliação de impacto concluiu que a maioria dos instrumentos, exceto os que possuem uma natureza muito específica, como a ajuda humanitária com o respetivo princípio de neutralidade, poderia ser objeto de fusão num único instrumento, designadamente, o Regulamento de Execução Comum, o Instrumento de Cooperação para o Desenvolvimento, o Fundo Europeu de Desenvolvimento, o Fundo Europeu para o Desenvolvimento Sustentável, o Mandato de Empréstimo Externo, o Instrumento Europeu de Vizinhança, o Instrumento Europeu para a Democracia e os Direitos Humanos, o Fundo de Garantia, o Instrumento para a Estabilidade e a Paz e o Instrumento de Parceria. Os instrumentos que devem permanecer separados são: o Instrumento de Assistência de Pré-Adesão; a ajuda humanitária; o orçamento da Política Externa e de Segurança Comum; os países e territórios ultramarinos, incluindo a Gronelândia; o Mecanismo de Proteção Civil da UE; o regime de Voluntários para a Ajuda da UE; o apoio à comunidade cipriota turca; a Reserva para Ajudas de Emergência; e o novo Mecanismo Europeu de Apoio à Paz.

2.1.5.

A concentração de vários instrumentos num único instrumento abrangente possibilitará a racionalização dos sistemas de gestão e supervisão e, deste modo, a redução dos encargos administrativos para as instituições da UE e para os Estados-Membros. Em vez de se concentrarem nos vários processos de programação, os debates centrar-se-ão mais nos objetivos políticos e no envolvimento com parceiros externos. As ações que recebam financiamento cumulativo de diferentes programas da União serão objeto de uma única auditoria, abrangendo todos os programas em causa e as respetivas regras aplicáveis.

2.1.6.

Simplificação não significa que haja menos controlo ou responsabilização. O equilíbrio interinstitucional será plenamente preservado. Pelo contrário, as competências orçamentais e de controlo do Parlamento Europeu serão alargadas pela integração das atividades atualmente financiadas pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento no orçamento da UE.

2.1.7.

O enquadramento financeiro é repartido do seguinte modo:

a)

68 000 milhões de EUR para programas geográficos:

para a Vizinhança da UE, 22 000 milhões de EUR, no mínimo,

para a África Subsariana, 32 000 milhões de EUR, no mínimo,

para a Ásia e o Pacífico, 10 000 milhões de EUR,

para as Américas e as Caraíbas, 4 000 milhões de EUR, e

b)

7 000 milhões de EUR para programas temáticos:

para os direitos humanos e a democracia, 1 500 milhões de EUR,

para as organizações da sociedade civil, 1 500 milhões de EUR,

para a estabilidade e a paz, 1 000 milhões de EUR,

para os desafios globais, 3 000 milhões de EUR,

c)

4 000 milhões de EUR para ações de resposta rápida.

2.1.8.

A reserva para os novos desafios e prioridades, num montante de 10 200 milhões de EUR, aumentará os montantes referidos no artigo 6.o, n.o 2, em conformidade com o artigo 15.o.

2.1.9.

No processo de afetação de recursos, é dada prioridade aos países mais necessitados, em particular os países menos desenvolvidos, os países de baixo rendimento e os países em situação de crise, pós-crise, fragilidade e vulnerabilidade, e designadamente aos pequenos Estados insulares em desenvolvimento.

2.1.10.

Os programas sobre estabilidade e paz e direitos humanos e democracia, bem como as ações de resposta rápida, estão abertos a entidades de todos os países devido ao interesse da União em ter a oferta mais vasta possível, tendo em conta o âmbito mundial das ações, as difíceis circunstâncias em que a assistência é prestada e a necessidade de agir rapidamente. As organizações internacionais são igualmente elegíveis.

2.1.11.

O novo Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento («Consenso»), assinado em 7 de junho de 2017, estabelece o quadro para uma abordagem comum da cooperação para o desenvolvimento da União e dos seus Estados-Membros na aplicação da Agenda 2030 e da Agenda de Ação de Adis Abeba. A erradicação da pobreza, o combate às discriminações e desigualdades, o desígnio de não deixar ninguém para trás e o reforço da resistência estão no centro da política de cooperação para o desenvolvimento.

2.1.12

. Em especial, tal como acordado no Consenso, as ações realizadas ao abrigo do regulamento em apreço deverão contribuir para que 20 % da ajuda pública ao desenvolvimento financiada no âmbito deste regulamento seja consagrada à inserção social e ao desenvolvimento humano, e nomeadamente à igualdade de género e ao empoderamento das mulheres.

2.1.13.

A fim de assegurar que os recursos são direcionados para onde são mais necessários, em especial para os países menos avançados («PMA») e para os países em situações de fragilidade e conflito, o regulamento em apreço deverá contribuir para a realização do objetivo coletivo de consagrar 0,20 % do rendimento nacional bruto da União aos países menos desenvolvidos no horizonte temporal da Agenda 2030.

2.1.14.

O regulamento deverá refletir a necessidade de concentração nas prioridades estratégicas, tanto de um ponto de vista geográfico — a Vizinhança Europeia e África, bem como os países fragilizados e mais necessitados, como temático — segurança, migração, alterações climáticas e direitos humanos.

2.1.15.

A política europeia de vizinhança, tal como revista em 2015, visa a estabilização dos países vizinhos e o reforço da resistência, designadamente através do equilíbrio das três dimensões do desenvolvimento sustentável: económica, social e ambiental. Para alcançar este objetivo, a política europeia de vizinhança revista tem incidido sobre quatro domínios prioritários: boa governação, democracia, Estado de direito e direitos humanos, com especial destaque para uma maior colaboração com a sociedade civil, o desenvolvimento económico, a segurança, a migração e a mobilidade, incluindo o combate às causas profundas da migração irregular e das deslocações forçadas.

2.1.16.

Embora a democracia e os direitos humanos, incluindo a igualdade de género e o empoderamento das mulheres, devam ser tomados em consideração ao longo de toda a aplicação do regulamento em apreço, a assistência da União ao abrigo dos programas temáticos em matéria de direitos humanos e democracia e de organizações da sociedade civil deverá ter um papel suplementar e complementar específico em virtude da sua natureza global e da independência da sua ação em relação ao consentimento dos governos e autoridades públicas dos países terceiros em causa.

2.1.17.

As organizações da sociedade civil deverão abarcar um vasto leque de intervenientes com diferentes funções e mandatos, que inclui todas as estruturas não estatais, sem fins lucrativos, não partidárias e não violentas através das quais as pessoas se organizam para perseguir objetivos e ideais partilhados, de natureza política, cultural, social ou económica. Funcionando à escala local, nacional, regional ou internacional, incluem organizações urbanas e rurais, formais e informais.

2.1.18.

O regulamento deverá permitir à União enfrentar os desafios, dar resposta às necessidades e aproveitar as oportunidades relacionadas com a migração, em complementaridade com a política de migração da União e com o seu compromisso de realização da Agenda 2030. Este compromisso (ODS 10.7) reconhece o contributo positivo dos migrantes para o crescimento integrador e o desenvolvimento sustentável; reconhece que a migração internacional é uma realidade multidimensional de importância fundamental para o desenvolvimento dos países de origem, de trânsito e de destino, que exige respostas coerentes e abrangentes; e compromete-se a cooperar a nível internacional para assegurar uma migração segura, ordeira e regular no pleno respeito pelos direitos humanos e pelo tratamento humano dos migrantes, independentemente do estatuto de migração, dos refugiados e das pessoas deslocadas. Esta cooperação também deve reforçar a resistência das comunidades que acolhem refugiados.

2.2.   Observações na especialidade

2.2.1.

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) constituem uma boa base para o aumento da coerência entre as políticas internas e externas, e o Comité considera que a concentração nos ODS 16.3, 16.6 e 16.7, que promovem a democracia, o Estado de direito, as instituições transparentes e as decisões participativas e representativas, são importantes para unir os esforços e conferir-lhes um sentido estratégico.

2.2.2.

O novo instrumento tem a vantagem de promover a coerência entre as medidas e as ações externas. Esta coerência deve ser promovida tanto ao nível da governação europeia do instrumento como ao nível dos países vizinhos e dos países terceiros. As administrações centrais e locais destes países não estão equitativamente equipadas para coordenar e aplicar os programas. Devem ser criados mecanismos de coordenação das várias atividades ao nível de cada governo, com a assistência da UE e com o apoio e a participação da sociedade civil e das partes interessadas sociais.

2.2.3.

O conjunto de desafios e necessidades nos países parceiros significa que são necessários processos de planeamento mais fortes para cada país. Esta necessidade é reconhecida nos meios de execução da Agenda 2030 e no ODS 17, que afirma que a escala e a ambição da nova agenda exigem uma parceria mundial revitalizada para assegurar a sua execução. Esta parceria funcionará num espírito de solidariedade mundial. Promoverá um forte compromisso a nível mundial no sentido de apoiar a execução de todas as metas e objetivos, reunindo os governos, o setor privado, a sociedade civil e outros intervenientes, e mobilizando todos os recursos disponíveis.

2.2.4.

O Comité considera que se deve criar um tal processo, que deverá gerar um plano integrado para cada país, sujeito a consenso político e que será prioritário para o nível administrativo. Na prática, este plano garantirá sinergias e complementaridades e ajudará a identificar medidas, bem como o impacto do apoio europeu nos países parceiros.

2.2.5.

O Comité considera que os esforços para simplificar os procedimentos administrativos e financeiros devem ser prioritários, de modo que facilite o acesso a apoio financeiro da UE por parte das organizações da sociedade civil e dos órgãos de poder local.

2.2.6.

O Comité apoia a posição segundo a qual o montante afetado à ação externa não deve ser inferior à soma do Fundo Europeu de Desenvolvimento e dos outros instrumentos de financiamento externo combinados. Além disso, concorda com a transferência das flexibilidades do FED para o orçamento da UE.

2.2.7.

O Comité salienta a importância do ODS 16, mais concretamente a estrutura de governação do novo instrumento e dos respetivos procedimentos de decisão. Na qualidade de representante da sociedade civil organizada europeia, com experiência e ligações em muitos países vizinhos e países terceiros, o Comité disponibiliza-se para participar neste instrumento, em todas as fases das suas medidas e projetos.

2.2.8.

O Comité espera que a substituição do atual Instrumento Europeu para a Democracia e os Direitos Humanos, que apoia o ODS 16, mais concretamente intervenções no domínio dos direitos humanos, das liberdades fundamentais e da democracia em países terceiros, não prejudique de modo algum, mas sim reforce, a cobertura e a estrutura destas medidas.

2.2.9.

O Comité reconhece a necessidade urgente de ações aos níveis nacional e internacional para combater as alterações climáticas e apoia o objetivo da UE de dedicar pelo menos 25 % do seu orçamento a esta finalidade.

2.2.10.

O Comité reitera a afirmação da Agenda 2030 de que as interligações e a natureza integrada dos ODS são de importância crucial para garantir a realização do objetivo da agenda. O Comité recomenda a criação de programas transversais, que abranjam vários domínios de ação pertinentes e possam produzir resultados palpáveis nos diferentes países terceiros. A título de exemplo, as alterações climáticas estão a prejudicar as atividades agrícolas na África Subsariana. O facto de não ser possível cultivar as terras está a levar à desintegração das comunidades e é uma das principais causas de migração para a Europa. Na prática, estas pessoas podem ser consideradas «refugiados do clima», o que exige uma resposta complexa que tenha como elemento central o fim da desertificação e a implantação de programas de apoio, tanto às pessoas em risco como às que tenham decidido migrar.

2.2.11.

Há que ajudar os países terceiros, que são igualmente países de origem dos migrantes e dos refugiados, a melhorar as suas capacidades e infraestruturas económicas e a enfrentar os desafios principais — económicos, políticos, sociais e ambientais. O instrumento deve abordar as causas profundas da migração, especialmente no que diz respeito aos refugiados, e utilizar estrategicamente os recursos existentes de modo que promova a paz, a estabilidade, a democracia e a prosperidade nos países parceiros.

2.2.12.

O Comité observa que 10 % do enquadramento financeiro da UE deverá ser dedicado a atacar as causas profundas da migração irregular e das deslocações forçadas e a apoiar a gestão e a governação da migração, incluindo a proteção dos direitos dos refugiados e migrantes no âmbito dos objetivos do regulamento. O Comité aproveita esta oportunidade para recordar a UE e os seus Estados-Membros de que devem cumprir as suas obrigações internacionais no que diz respeito aos migrantes.

2.2.13.

Tal como acontece com o processo de planeamento acima referido, no que diz respeito ao acompanhamento, à avaliação e à prestação de informações sobre a execução do regulamento, o Comité recomenda a integração de uma perspetiva por país. O agrupamento das ações e dos indicadores por país poderia ajudar a identificar sinergias e complementaridades, ou a falta destas, bem como a sua coerência com os objetivos fundamentais da política da UE.

2.2.14.

Como princípio geral, o Comité gostaria de incentivar a Comissão Europeia a assegurar, em todas as circunstâncias, que as partes interessadas dos países parceiros, incluindo as organizações da sociedade civil e os órgãos de poder local, são devidamente consultadas e têm um acesso atempado às informações de que necessitam para poderem desempenhar um papel significativo durante a conceção, a execução e a monitorização dos programas.

2.2.15.

O Comité congratula-se com a decisão de aplicar o princípio de cumprimento das responsabilidades assumidas no que diz respeito aos países parceiros, e considera que a utilização dos sistemas dos países parceiros para executar os programas é o rumo certo a adotar. No entanto, importa salientar que tal só pode acontecer se estiverem reunidas as condições certas e se houver garantias credíveis quanto à eficiência, à integridade e à imparcialidade destes sistemas.

2.2.16.

No que diz respeito à programação geográfica e à criação de um quadro de cooperação específico e por medida, o Comité recomenda que a Comissão Europeia, para além de ter em conta os indicadores nacionais, também se centre nas comunidades definidas territorialmente em risco de serem ignoradas. As comunidades rurais e as comunidades que se encontram afastadas das capitais e dos centros urbanos encontram-se, muitas vezes, em situação de extrema precariedade e vulnerabilidade. Estas devem, em primeiro lugar, tornar-se visíveis e ser tidas em conta no processo de planeamento.

2.2.17.

A programação geográfica também deve ter em conta a situação dos grupos sociais e das comunidades não territoriais que podem ser afetadas por graves problemas, como os jovens, os idosos, as pessoas com deficiência e outras categorias de indivíduos.

2.3.   Contexto da proposta — O Instrumento Europeu para a Segurança Nuclear

2.3.1.

O objetivo do novo Instrumento Europeu para a Segurança Nuclear é promover a criação de normas de segurança nuclear eficazes e eficientes em países terceiros, em conformidade com o artigo 206.o do Tratado Euratom, com base na experiência adquirida com as atividades em matéria de segurança nuclear na Comunidade Europeia da Energia Atómica.

2.3.2.

O objetivo do regulamento consiste em complementar as atividades de cooperação nuclear que são financiadas ao abrigo do [Regulamento NDICI], em especial tendo em vista apoiar a promoção de um elevado nível de segurança nuclear, proteção contra as radiações e aplicação de salvaguardas eficazes e eficientes dos materiais nucleares em países terceiros, com base nas atividades na Comunidade e em conformidade com as disposições do regulamento em apreço. O regulamento visa especialmente:

a)

a promoção de uma verdadeira cultura de segurança nuclear e a aplicação das mais elevadas normas de segurança nuclear e de proteção contra as radiações, bem como a melhoria contínua da segurança nuclear;

b)

a gestão responsável e segura do combustível irradiado e dos resíduos radioativos e a desativação e reabilitação de antigas centrais e instalações nucleares;

c)

a criação de sistemas de salvaguardas eficazes e eficientes.

2.3.3.

As ações financiadas ao abrigo da proposta devem ser coerentes e complementares das ações realizadas no âmbito do Instrumento de Vizinhança, Desenvolvimento e Cooperação Internacional que abrangem atividades no domínio nuclear, do Instrumento de Pré-Adesão, da Decisão relativa aos países e territórios ultramarinos, da política externa e de segurança comum e do recentemente proposto Mecanismo Europeu de Apoio à Paz, que é financiado fora do orçamento da UE.

2.3.4.

A indústria nuclear da UE opera num mercado mundial avaliado em 3 biliões de EUR até 2050 e emprega diretamente meio milhão de pessoas. Estão em funcionamento 129 reatores nucleares em 14 Estados-Membros e está prevista a construção de novos reatores em 10 desses Estados. A UE dispõe das normas juridicamente vinculativas mais avançadas a nível mundial no domínio da segurança nuclear, e as empresas europeias estão profundamente envolvidas na produção mundial de combustível nuclear. (Comunicado de imprensa do CESE, «EESC urges the EU to adopt a more comprehensive nuclear strategy (PINC)» [CESE insta a UE a adotar uma estratégia mais abrangente], n.o 58/2016, 22.9.2016).

2.4.   Observações na especialidade

2.4.1.

O Comité congratula-se com a proposta apresentada sob a forma de regulamento, o que assegura a sua aplicação uniforme, o caráter vinculativo em todos os seus elementos e a aplicabilidade direta. A União e a Comunidade podem complementar as atividades dos Estados-Membros para fazer face a situações potencialmente perigosas ou em caso de intervenções especialmente onerosas, e são responsáveis por essas atividades. Tal como a proposta indica, em alguns domínios em que os Estados-Membros não estão ativos, a União e a Comunidade continuam a ser os principais, e por vezes os únicos, intervenientes a agir.

2.4.2.

Após a catástrofe nuclear de Fucoxima, tornou-se perfeitamente claro que os problemas e os riscos da utilização da energia nuclear são de dimensão mundial. A UE tem um perfil único, o que a torna um dos principais intervenientes, e dos mais capazes, na busca mundial pela segurança nuclear e pelas tecnologias de energias limpas.

2.4.3.

Infelizmente, a proposta não aborda, aos níveis estratégico e político, a exigência legítima de um planeamento a longo prazo em matéria de energia nuclear dos cidadãos, da sociedade civil e do setor empresarial. Não é claro de que modo a UE irá utilizar os seus recursos para abordar os principais desafios da energia nuclear, em relação às preocupações e necessidades crescentes de energia a preços acessíveis, tanto na UE como no resto do mundo.

2.4.4.

O papel da Agência Internacional da Energia Atómica é essencial e a agência deve assumir a responsabilidade de garantir a transparência e o alerta precoce no que se refere ao desenvolvimento de novas centrais nucleares no mundo. A UE deve cooperar plenamente com as instituições e organizações mundiais para promover a segurança nuclear.

2.4.5.

A UE deve promover ativamente os mais elevados padrões de segurança nuclear e garantir que os procedimentos, as boas práticas e as tecnologias europeias mais avançadas são promovidos a nível mundial, com vista a garantir que as instalações e os reatores recentemente planeados sejam seguros.

2.4.6.

São necessários esforços renovados para assegurar que os sítios existentes e os previstos na vizinhança europeia funcionam com elevados níveis de transparência e segurança. O CESE insta todos os Estados-Membros a apoiarem este objetivo e a tornarem a segurança nuclear um objetivo fundamental das relações bilaterais e multilaterais com os países parceiros.

2.4.7.

O CESE mantém o seu ponto de vista de que a Comissão Europeia não refletiu sobre as questões prementes da competitividade da energia nuclear, do seu contributo para a segurança do abastecimento e para a consecução dos objetivos em matéria de alterações climáticas e de carbono e da sua segurança, a par das questões da transparência e da preparação para emergências, na sua proposta de um programa indicativo sobre os objetivos e o investimento em produção nuclear (2).

2.4.8.

O Comité congratula-se com a intenção da Comissão de garantir a coerência e a complementaridade com o Instrumento de Vizinhança, Desenvolvimento e Cooperação Internacional, nomeadamente realizando atividades no domínio nuclear que servem os seus objetivos mais gerais, principalmente as utilizações pacíficas da energia nuclear, em sintonia com a política de desenvolvimento e de cooperação internacional em matéria de saúde, agricultura, indústria e projetos sociais destinados a abordar as consequências de acidentes nucleares. Contudo, não é claro de que modo o orçamento disponível e as disposições institucionais em vigor poderão contribuir para pôr em prática esta intenção.

2.4.9.

Tendo em conta os principais desafios mundiais relacionados com a energia nuclear e a presença de um elevado número de centrais nucleares na sua vizinhança, o Comité considera muito insuficiente o enquadramento financeiro previsto para a aplicação do regulamento para o período de 2021-2027, de 300 milhões de EUR, a preços correntes.

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Instrumento Europeu para a Democracia e os Direitos do Homem (IEDDH), relator: Giuseppe Iuliano (JO C 182 de 4.8.2009, p. 13); parecer do Comité Económico e Social Europeu — Instrumento de Cooperação para o Desenvolvimento da União Europeia: O papel da sociedade civil organizada e dos parceiros sociais, relator: Giuseppe Iuliano (JO C 44 de 11.2.2011, p. 123).

(2)  Comité Económico e Social Europeu, parecer — Programa Indicativo Nuclear, relator: Brian Curtis, adotado em 22 de setembro de 2016 (JO C 487 de 28.12.2016, p. 104).