ISSN 1977-1010

Jornal Oficial

da União Europeia

C 246

European flag  

Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

60.° ano
28 de julho de 2017


Número de informação

Índice

Página

 

I   Resoluções, recomendações e pareceres

 

PARECERES

 

Comité Económico e Social Europeu

 

525.a reunião plenária de 26 e 27 de abril de 2017

2017/C 246/01

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre As mulheres e os transportes — Plataforma para a mudança (parecer exploratório a pedido da Comissão Europeia)

1

2017/C 246/02

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Digitalização e modelos económicos inovadores no setor financeiro europeu, consequências para o emprego e os clientes (parecer de iniciativa)

8


 

III   Atos preparatórios

 

COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU

 

525.a reunião plenária de 26 e 27 de abril de 2017

2017/C 246/03

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.o 560/2014 do Conselho, de 6 de maio de 2014, que estabelece a Empresa Comum Bioindústrias[COM(2017) 68 final — 2017/0024 (COD)]

18

2017/C 246/04

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao controlo das somas em dinheiro líquido que entram ou saem da União Europeia e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1889/2005[COM(2016) 825 final — 2016/0413 (COD)]

22

2017/C 246/05

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria um Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS) e altera os Regulamentos (UE) n.o 515/2014, (UE) 2016/399, (UE) 2016/794 e (UE) 2016/1624[COM(2016) 731 final — 2016/0357(COD)]

28

2017/C 246/06

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à Governação da União da Energia, que altera as Diretivas 94/22/CE, 98/70/CE, 2009/31/CE, os Regulamentos (CE) n.o 663/2009, (CE) n.o 715/2009, as Diretivas 2009/73/CE, 2009/119/CE do Conselho, 2010/31/UE, 2012/27/UE, 2013/30/UE e (UE) 2015/652 do Conselho, e revoga o Regulamento (UE) n.o 525/2013 [COM(2016) 759 final — 2016/0375/(COD)]

34

2017/C 246/07

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2012/27/UE relativa à eficiência energética[COM(2016) 761 final — 2016/0376/(COD)]

42

2017/C 246/08

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2010/31/UE relativa ao desempenho energético dos edifícios[COM(2016) 765 final — 2016/0381 (COD)]

48

2017/C 246/09

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis (reformulação)[COM(2016) 767 final — 2016/0382 (COD)]

55

2017/C 246/10

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu, ao Comité das Regiões e ao Banco Europeu de Investimento — Energias limpas para todos os europeus[COM(2016) 860 final]

64

2017/C 246/11

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de um novo Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento — O nosso mundo, a nossa dignidade, o nosso futuro[COM(2016) 740 final]

71


PT

 


I Resoluções, recomendações e pareceres

PARECERES

Comité Económico e Social Europeu

525.a reunião plenária de 26 e 27 de abril de 2017

28.7.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 246/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «As mulheres e os transportes — Plataforma para a mudança»

(parecer exploratório a pedido da Comissão Europeia)

(2017/C 246/01)

Relatora:

Madi SHARMA

Consulta

Comissão Europeia, 13.10.2016

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

11.4.2017

Adoção em plenária

26.4.2017

Reunião plenária n.o

525

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

148/0/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) tem uma experiência considerável de trabalho no domínio das políticas do setor dos transportes e, recentemente, analisou a dimensão do género neste setor tradicionalmente dominado pelos homens (ver parecer TEN/573 «As mulheres e os transportes») (1). Enquanto instituição da UE que representa a sociedade civil, possui conhecimentos especializados no âmbito da consulta e do diálogo com as partes interessadas relativamente a medidas legislativas.

1.2.

O CESE reconhece que as plataformas de partes interessadas constituem fóruns eficazes de mudança se:

permitirem o intercâmbio de boas práticas entre as diferentes instituições, empresas e associações que enfrentam desafios semelhantes;

encorajarem as partes interessadas a assumir a responsabilidade e a enfrentar os desafios;

tiverem em conta as causas profundas dos desafios;

perseguirem objetivos SMART (específicos, mensuráveis, alcançáveis, pertinentes, calendarizados);

realizarem atividades baseadas em elementos concretos para divulgação;

desenvolverem instrumentos e recursos que possam ser utilizados por outros intervenientes;

replicarem as plataformas europeias a nível nacional e até regional, a fim de encontrarem respostas para desafios semelhantes em todos os Estados-Membros;

receberem informações sobre as iniciativas de outros setores que enfrentam problemas semelhantes.

1.3.

O CESE propõe a criação de uma plataforma da UE para a mudança (a seguir designada «plataforma»), a fim de abordar a igualdade de género no setor dos transportes, conferindo prioridade, inicialmente, ao aumento da empregabilidade das mulheres no setor. Este objetivo inicial poderia ser complementado posteriormente, incluindo as «mulheres enquanto utentes». O setor dos transportes inclui o transporte aéreo, marítimo, rodoviário, ferroviário, a navegação interior e a logística. A plataforma poderia incluir, entre outros, organismos representativos, a nível da UE e nacional, de decisores políticos, da indústria dos transportes, os respetivos sindicatos, meios de comunicação social, organizações de passageiros e ONG que pretendam empenhar-se em ações concretas para combater a desigualdade de género no setor dos transportes.

1.4.

O CESE pretende promover a aplicação de políticas que tenham em conta a dimensão do género através do estabelecimento de objetivos claros: mandato e âmbito de intervenção preciso, incluindo indicadores, elaborados pelos membros na fase da constituição da plataforma. Tal constituiria um modelo de trabalho em parceria e de ação coordenada das partes interessadas do setor para transpor novas iniciativas em toda a Europa.

1.5.

O CESE recomenda que a plataforma mantenha a capacidade de ser flexível e adaptável a todas as dimensões do setor, bem como ao nível das políticas. Deve insistir na transparência e na responsabilização, tanto no que diz respeito aos seus membros como ao seu funcionamento. O acompanhamento, a avaliação e as análises anuais são instrumentos essenciais para a sua credibilidade e êxito.

1.6.

A plataforma só poderá ter êxito se os membros se apropriarem dela em pleno, pelo que o CESE propõe a criação de um sítio web com a lista dos membros e das suas atividades e uma base de dados das ações, recomendações, atividades de acompanhamento e avaliações, para que outros possam reproduzir ou extrair informações.

2.   Contexto

2.1.

O emprego das mulheres no setor dos transportes é particularmente baixo. Em 2013, 78 % dos trabalhadores no setor dos transportes da UE eram homens. É essencial atrair um maior número de mulheres a fim de alcançar um maior equilíbrio entre os géneros no setor, tornando-o mais acessível e, simultaneamente, compensando a escassez de mão de obra e os desafios que esta coloca (um terço de todos os trabalhadores dos transportes tem mais de 50 anos).

2.2.

Em 1 de julho de 2015, o CESE adotou um parecer exploratório sobre «As mulheres e os transportes» e, em abril de 2016, participou num evento de seguimento organizado pelas comissárias Violeta Bulc e Věra Jourová. Posteriormente, a DG Mobilidade e Transportes (DG MOVE) realizou várias consultas ao grupo de peritos, em que foram debatidos desafios atuais e recomendações. Um representante do CESE propôs a criação de uma «plataforma para a mudança», ideia que foi apoiada pela Comissão Europeia como uma boa forma de promover ações concretas e visíveis em prol da igualdade de género no setor dos transportes. Na sua carta de 13 de outubro de 2016, Frans Timmermans, vice-presidente da Comissão Europeia, afirmou que uma tal plataforma poderia ser lançada durante o segundo semestre de 2017, por ocasião de um evento coorganizado pelo CESE e pela Comissão.

3.   Plataforma para a mudança

3.1.

A Comissão Europeia tem muitas atividades e instrumentos de consulta das partes interessadas. Uma plataforma para a mudança poderia basear-se em ações voluntárias, concretas e mensuráveis, que impulsionem os objetivos na base da sua criação. Um exemplo deste tipo de plataforma de referência é a plataforma em matéria de alimentação, exercício físico e saúde, da DG Saúde e Segurança dos Alimentos.

3.2.

Por conseguinte, o CESE propõe à DG MOVE a criação de uma plataforma de partes interessadas a nível da UE capaz de pôr em prática compromissos, baseados em ações, em prol do aumento das oportunidades de trabalho para as mulheres e da igualdade de género no setor dos transportes, a fim de melhorar a integração das mulheres e gerar um maior crescimento económico, social e sustentável. No âmbito deste plataforma:

os seus membros devem respeitar critérios definidos relativamente à sua nomeação e à sua conduta;

as ações são definidas de acordo com os objetivos e o âmbito de intervenção estabelecido pelos seus membros quando da sua criação;

os compromissos são acompanhados, avaliados e tornados púbicos, o que permitirá divulgar o intercâmbio de informações.

3.3.

Tendo em vista a criação de uma plataforma deste tipo, o CESE propõe que a DG MOVE considere, inicialmente, os seguintes elementos e fases (apresentados em pormenor abaixo):

I.

Fase I — Preparação — Identificar as partes relevantes interessadas em participar na plataforma e iniciar o diálogo, a fim de determinar os interesses, objetivos, mandato e âmbito de intervenção.

II.

Fase II — Desenvolvimento — Elaborar, com as partes interessadas, projetos de carta de missão, mandato, âmbito de intervenção e objetivos, tendo em vista a sua aprovação. Estabelecer igualmente calendários, potenciais fontes de financiamento, um secretariado e ferramentas informáticas de apoio.

III.

Fase III — Aplicação — Organizar um evento inaugural com a participação do comissário responsável pela plataforma; nessa ocasião, os membros devem chegar a acordo sobre as definições, o mandato e o âmbito de intervenção, e formular recomendações concretas sobre as ações a realizar. Debater objetivos SMART, indicadores, comunicação sensível à dimensão de género, acompanhamento, avaliação, publicação e divulgação.

IV.

Fase IV — Sustentabilidade — Definir indicadores, metas, recursos disponíveis, a análise anual e mecanismos de retorno de informação. Identificar formas de dar continuidade aos compromissos e de mobilizar novos parceiros.

4.   Papel das instituições da UE

4.1.

A Presidência maltesa estabeleceu a igualdade de género como uma das suas prioridades, paralelamente ao impulso dado pelo presidente Jean-Claude Juncker em prol do crescimento e do emprego. A plataforma poderia oferecer à elaboração de políticas tradicional um mecanismo de «valor acrescentado da UE», dirigido especificamente a um dos desafios que se colocam à União: «Criar oportunidades através da igualdade de género no setor europeu dos transportes». Esta abordagem assestada permite mobilizar partes interessadas pertinentes que, de outra forma, poderiam não ter qualquer interação com a Comissão Europeia. A plataforma poderia, por conseguinte, complementar o trabalho das instituições da UE.

4.2.

É fundamental que a DG MOVE assuma a liderança e que o comissário responsável pela plataforma apoie o seu funcionamento, por exemplo assistindo pessoalmente à sua inauguração e, em geral, às reuniões da plataforma. Desta forma, embora cumpram os compromissos a título voluntário, os membros da plataforma reconhecerão que é um privilégio ser convidado a desempenhar esta função. Por conseguinte, a disponibilidade e a interação com a equipa de funcionários superiores da DG MOVE é fundamental. Da mesma forma, é importante que as instituições da UE assumam igualmente o compromisso de propor ações específicas, caso pretendam ser membros da plataforma.

4.3.

As instituições da UE e os representantes dos ministérios dos Transportes dos Estados-Membros desempenham um papel fundamental na divulgação das principais conclusões a nível nacional. Por conseguinte, o CESE recomenda a criação de um grupo de alto nível que ofereça aos governos e respetivos decisores políticos uma visão geral, criando um mecanismo que permita divulgar as boas práticas, reforçar o trabalho em parceria e melhorar a comunicação entre os decisores políticos e a plataforma. Caso estas partes interessadas decidam tornar-se membros da plataforma, devem comprometer-se igualmente a realizar ações concretas.

4.4.

O CESE considera que a DG MOVE deve ser responsável pelo funcionamento da plataforma. Esta direção-geral seria responsável pela afetação de orçamentos, pelo secretariado e por alguns recursos. Outras instituições da UE poderiam comunicar às partes interessadas recomendações das suas redes, bem como disponibilizar salas de reunião, serviços de tradução e interpretação. Os recursos dos membros da plataforma podem constituir opções de financiamento alternativas.

4.5.

O instrumento de comunicação central — o sítio web e a base de dados, incluindo a sua manutenção — representará uma despesa significativa. Vários órgãos da UE criaram este tipo de recursos em linha, e considera-se que a DG MOVE poderia adaptar um modelo já existente.

5.   Composição

5.1.

A plataforma não deveria ser um mero fórum de discussão mas um processo concebido para reunir as partes interessadas e debater os desafios e oportunidades com que se deparam as mulheres no setor dos transportes, a fim de em seguida assumir compromissos relativamente a ações passíveis de verificação. Compreender as características das partes interessadas representadas pelos membros ajudará a identificar o seu potencial interesse na matéria e a influência que exercem. Os grandes interessados serão as partes diretamente afetadas pelos atuais desafios do setor.

5.2.

A composição da plataforma pode incluir as seguintes partes interessadas a nível europeu e nacional: empresas do setor, associações de PME, sindicatos (parceiros sociais), incluindo organizações especializadas representativas das mulheres, administrações públicas, nomeadamente as suscetíveis de influenciar aquisições e contratos públicos, como o BERD, ONG que incluam organizações de cúpula de defesa dos direitos das mulheres e da igualdade, meios de comunicação social, grupos de reflexão, bem como universidades e institutos de investigação.

5.3.

Poderá ponderar-se também a possibilidade de incluir ocasionalmente: 1) pessoas envolvidas na definição dos compromissos, sem que sejam necessariamente designadas membros da plataforma; 2) responsáveis políticos e personalidades, incluindo instituições da UE e representantes/autoridades públicas dos Estados-Membros.

5.4.

A participação na plataforma deve ser gratuita e condicionada ao respeito de critérios e de um mandato. Numa fase inicial, não estariam previstos reembolsos pelas atividades realizadas pelos membros, nem pelos custos decorrentes da participação na plataforma.

5.5.

A composição da plataforma deve basear-se nos seguintes aspetos:

participação inclusiva;

transparência, abertura e responsabilização;

aceitação das diferenças e respeito da proporcionalidade;

recurso aos objetivos SMART para assegurar a coerência.

6.   Definição do objetivo e do âmbito de intervenção da plataforma

6.1.

O objetivo geral desta plataforma poderia ser aumentar a participação das mulheres e promover a igualdade de género no setor dos transportes, aumentando as oportunidades para as mulheres, para as empresas detidas por mulheres e para as mulheres que exercem funções de gestão, e melhorando as condições de trabalho para todos no setor, o que, em última instância, terá um impacto sobre o emprego, a inclusão, a inovação, a sustentabilidade e o crescimento. Importa colocar a tónica na igualdade de género, promovendo assim o emprego e eliminando as lacunas existentes no setor. Este objetivo pode ser alcançado, nomeadamente, através da melhoria da qualidade do emprego e das condições de trabalho para todos, da luta contra o assédio e a violência baseada no género, da melhoria da conciliação do trabalho e da vida privada e familiar, do aumento da presença feminina em cargos de decisão, e da melhoria da imagem do setor, de forma a atrair mais trabalhadoras, empresárias, e mulheres do mundo académico e da esfera da inovação. Posteriormente, o âmbito de intervenção da plataforma poderá ser alargado de forma a abranger questões conexas, como a melhoria da experiência do utente, e centrar-se em ações que visem as mulheres como utentes.

6.2.

O CESE recomenda a aplicação de políticas sensíveis à dimensão de género e da orçamentação sensível ao género, enquanto instrumento fundamental para a concretização dos objetivos acima referidos. Este novo conceito é muitas vezes mal compreendido: não representa um aumento das despesas globais, mas sim a definição de novas prioridades e a reorientação das despesas dentro dos programas, departamentos e serviços. A orçamentação sensível ao género contribui para uma maior clareza e cria mecanismos que tornam possível uma abordagem global e transversal para promover uma maior igualdade de género.

6.3.

O CESE recomenda que o âmbito de intervenção e as prioridades a ter em conta estejam em consonância com as políticas e a legislação da UE, respeitando, ao mesmo tempo, o diálogo com os parceiros sociais. A plataforma deve combinar abordagens descendentes e ascendentes para apoiar tanto as políticas do setor privado como do setor público, evitando a necessidade de alterar a legislação. Deve ser considerada por todos um investimento positivo e necessário.

6.4.

O CESE salienta que os benefícios da participação das partes interessadas são os seguintes:

fornecer às partes interessadas oportunidades para partilharem os seus pontos de vista, necessidades e conhecimentos;

definir objetivos comuns para alcançar metas comuns;

permitir que os participantes influenciem os resultados, associando-os aos processos de elaboração, desenvolvimento, identificação e execução de ações;

melhorar a compreensão entre os grupos de partes interessadas, reduzindo assim eventuais conflitos ou divergências de pontos de vista, e promovendo uma cooperação eficaz;

reforçar o empenho das partes interessadas e um sentimento de responsabilidade e apropriação;

assegurar a sustentabilidade dos projetos e das decisões conexas;

conferir autonomia e flexibilidade ao processo decisório e à execução.

6.5.

O CESE considera que a plataforma poderia identificar ações-chave para:

recolher dados e definir indicadores-chave para identificar e eliminar obstáculos e estereótipos;

assegurar que as mulheres participam de forma ativa e visível na elaboração de políticas, no processo decisório e no planeamento — para lá e acima das funções administrativas;

encorajar de forma proativa uma maior participação de ambos os sexos na criação de um melhor ambiente de trabalho: instalações, igualdade de remuneração por trabalho de igual valor, formação, conciliação do trabalho e da vida privada e familiar, etc.;

levar a cabo ações com vista a atrair as mulheres para as oportunidades de emprego, mediante medidas destinadas a melhorar a qualidade e a quantidade dos empregos, nomeadamente revendo os processos de recrutamento;

analisar os obstáculos jurídicos que possam impedir as mulheres de aceder a todos os tipos de emprego;

associar mais estreitamente as universidades e os serviços de orientação profissional para promover todo o setor, incluindo no domínio da tecnologia, I&D e engenharia; ter igualmente em conta as pessoas menos qualificadas, a fim de alargar as suas possibilidades de formação;

promover de forma proativa o papel das mulheres nas empresas;

capacitar as mulheres e favorecer a inclusividade no setor;

promover a importância do ensino e formação profissionais das mulheres ao longo da vida;

prevenir a violência, o assédio e a discriminação no local de trabalho.

6.6.

À medida que a plataforma for crescendo, poderá centrar-se em áreas fundamentais que poderão não envolver todos os membros, devido à diversidade existente no setor dos transportes. Por conseguinte, podem ser criadas subcomissões dedicadas a áreas de interesse fundamentais.

7.   Orientações para definir prioridades e garantir que as ações se ajustam às prioridades identificadas

7.1.

O CESE reconhece que só os membros da plataforma podem definir as suas prioridades. As partes interessadas poderão aderir à plataforma em defesa de interesses próprios, pelo que a grande prioridade deverá consistir em assegurar o empenho coletivo, a fim de fazer face aos desafios comuns. O compromisso em prol da mudança é uma responsabilidade que encorajará as partes interessadas a se apropriarem das questões em causa nas suas organizações e na plataforma.

7.2.

O CESE propõe que os compromissos sejam ambiciosos e desafiem o statu quo, o que exige um investimento dos recursos próprios dos membros. Uma comunicação clara e transparente das ações na página web não só trará reconhecimento aos compromissos, mas permitirá igualmente um controlo pelas partes interessadas. Por conseguinte, uma boa comunicação e diálogo entre os membros da plataforma reveste-se de importância fundamental para assegurar um empenho constante e evitar a divergência de expectativas. Importa igualmente fomentar atividades conjuntas.

7.3.

O CESE recomenda que se definam, a título adicional, objetivos e indicadores para apoiar as ações da plataforma. Estes objetivos e indicadores devem contribuir para a aplicação e a avaliação das medidas adotadas em prol das oportunidades de emprego, da igualdade de género e da capacitação das mulheres, incluindo em que medida homens e mulheres se encontram em pé de igualdade, independentemente das tecnologias utilizadas. Os indicadores de desenvolvimento, como instrumentos de avaliação, que reforçam o impacto e a integração dos resultados num relatório de situação, ajudam a influenciar o planeamento das políticas e estratégias através da identificação dos progressos.

7.4.

Estão disponíveis dados estatísticos gerais junto do Eurostat. A DG MOVE poderia trabalhar com o Eurostat e os membros da plataforma, a fim de melhorar a recolha de dados repartidos por sexo para fornecer um quadro mais completo.

7.5.

Os dados, metas e indicadores devem contribuir para uma reflexão sobre a igualdade de género e os estereótipos e a discriminação. Sem qualquer natureza normativa, o objetivo é encorajar as organizações a traduzir as questões relativas ao género numa comunicação transparente e compreensível para elas e para os cidadãos, permitindo-lhes simultaneamente realizar uma análise interna das suas próprias políticas e práticas.

7.6.

Poderiam ser desenvolvidos indicadores de referência nas seguintes áreas:

estabelecimento, pela plataforma, de objetivos específicos para concretizar metas alcançáveis;

percentagem de mulheres por tipo de funções, incluindo membros de conselhos de administração, proprietárias, gestoras, membros de sindicatos, da administração, funções técnicas, etc.;

análise periódica e elaboração de relatórios sobre as medidas adotadas para assegurar um equilíbrio entre os géneros ao nível do processo decisório;

políticas eficazes que visem a igualdade de remuneração e a redução gradual da disparidade salarial e de pensões entre homens e mulheres;

políticas/medidas adotadas para eliminar todos os obstáculos à igualdade de oportunidades e promover o trabalho das mulheres (assistência à infância, conciliação do trabalho e da vida privada e familiar, enquadramento transparente, etc.);

afetação de um orçamento específico ao apoio de políticas em matéria de igualdade de oportunidades;

análise periódica das condições de recrutamento, incluindo as previstas pelas agências de recrutamento ou estabelecimentos de ensino, em matéria de transparência, acessibilidade e comunicação sensível à dimensão de género;

desenvolvimento de indicadores relativos à possibilidade, prevalência e incidência da violência, do assédio e da discriminação no local de trabalho;

panorâmica anual dos objetivos previstos no orçamento sensível ao género.

8.   Acompanhamento e avaliação

8.1.

O CESE propõe que, para reforçar o trabalho em parceria, os membros definam compromissos e ações a debater com outros membros da plataforma antes da sua aplicação. Após a conclusão da ação, seria elaborado um relatório de acompanhamento enumerando as atividades, os calendários, os dados obtidos e as principais conclusões, permitindo a sua análise e avaliação pela plataforma. Estas análises deveriam ser apresentadas de forma objetiva e imparcial, com elementos factuais e avaliações qualitativas, refletindo a relevância para os objetivos da plataforma. Para o efeito, poder-se-ia recorrer a consultores externos, os recursos assim o permitindo, tal como sucede na avaliação da plataforma da DG Saúde e Segurança dos Alimentos (ver «Relatório anual de acompanhamento de 2016»).

8.2.

O CESE propõe que os compromissos sejam bem concebidos desde o início e pertinentes para os objetivos estabelecidos. Os membros devem considerar a adoção de compromissos SMART, que têm uma preparação aprofundada: calendários, objetivos e metas para uma prestação de informações eficaz, um acompanhamento fácil e a comunicação sobre os resultados.

8.3.

Os compromissos exigem trabalho e dedicação por parte dos membros, ultrapassando largamente as suas funções habituais. Este investimento deve oferecer um valor acrescentado às suas atividades internas, para lá da responsabilidade social das empresas, importando apresentá-lo ao mundo exterior como prova da sua intenção de apoiar um melhor equilíbrio entre os géneros no local de trabalho. Cumpre divulgar as suas ações para que outros as possam replicar.

8.4.

A análise das atividades da plataforma deve reforçar a criação de ligações em rede entre os membros e uma dinâmica de colaboração para promover os objetivos. Tal contribui, por conseguinte, para o aumento do número de compromissos conjuntos, mediante:

uma maior colaboração entre os decisores políticos, os membros do grupo de alto nível e da plataforma e as respetivas associações, favorecendo sinergias para relações e ações a longo prazo, podendo desenvolver novas políticas e contribuir para as mesmas, se necessário;

um aumento das atividades a desenvolver de modo menos formal fora da estrutura da plataforma, nomeadamente associando intervenientes que possam não satisfazer os critérios de adesão;

uma maior visibilidade do setor e dos seus esforços no sentido de promover uma maior igualdade de género, com melhores condições para todos;

a organização de eventos externos para dar a conhecer as ações, atrair novos trabalhadores e suscitar inovações ou contributos para o setor dos transportes;

a aprendizagem resultante da melhoria contínua como um coletivo e da aplicação de novas formas de trabalho e de promoção do setor.

Bruxelas, 26 de abril de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  JO C 383 de 17.11.2015, p. 1


28.7.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 246/8


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Digitalização e modelos económicos inovadores no setor financeiro europeu, consequências para o emprego e os clientes»

(parecer de iniciativa)

(2017/C 246/02)

Relator:TBL

Carlos TRIAS PINTÓ

Correlator:TBL

Pierre GENDRE

Decisão da Plenária

22.9.2016

Base jurídica

Artigo 29.o, n.o 2, do Regimento

 

Parecer de iniciativa

Competência

Comissão Consultiva das Mutações Industriais (CCMI)

Adoção pela CCMI

7.4.2017

Adoção em plenária

26.4.2017

Reunião plenária n.o

525

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

150/1/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1

Nas últimas décadas, o setor bancário e dos seguros têm continuado a ser profundamente alterados pela tecnologia, pela regulamentação e pela mudança das necessidades e expectativas dos consumidores. Os novos modelos de investimentos, poupanças, seguros e transferências de fundos permitem que o maior número possível de pessoas participe em projetos de diferentes dimensões.

1.2

As empresas FinTech (empresas que prestam serviços financeiros através das novas tecnologias) e InsurTech (empresas que prestam serviços de seguros através das novas tecnologias) são catalisadoras e, com frequência, parceiras das instituições de serviços financeiros na modernização dos seus serviços, consolidando pontos fortes e fracos e criando sinergias entre si. Na opinião do CESE, ao promover um ecossistema inovador em termos de «coo-corrência» (1), existe um potencial considerável de criação de valor.

1.3

É claramente necessário restabelecer a confiança e estabilidade no setor financeiro, sendo a gestão da transição do sistema antigo (sistema bancário tradicional) para o novo um fator crucial. Neste sentido, o CESE insta a que seja adotada legislação adequada ao nível da UE, no contexto de um processo integrador da união bancária e do mercado único digital, que permita o crescimento e a inovação, assegurando em simultâneo a proteção dos consumidores e dos trabalhadores na indústria financeira.

1.4

Para instaurar um mercado financeiro europeu verdadeiramente único, a política da Comissão Europeia deve apoiar a criação de condições equitativas no domínio da inovação. Como princípio geral, são necessárias condições globalmente análogas no que se refere à regulamentação, aos direitos dos consumidores, às condições de trabalho e às obrigações de supervisão, tanto para a indústria financeira tradicional como para as empresas FinTech, em conformidade com a norma de que uma atividade igual exige regulamentação e supervisão idênticas. Mais concretamente:

1.4.1

Uma abordagem da regulamentação com base nos riscos deve ser coerente ao longo de todo o ciclo de vida da inovação, proporcionando um quadro regulamentar proporcional e simplificado tanto para intervenientes tradicionais como para novos intervenientes, para que possam experimentar novas tecnologias e novos modelos económicos em interação com as autoridades reguladoras. A criação de um quadro da UE para a experimentação, em colaboração com a indústria e com um número mais amplo de partes interessadas — incluindo os representantes dos consumidores e dos trabalhadores — proporcionaria os instrumentos necessários para preparar o apoio à inovação em todas as suas atividades (um «sandbox» [ambiente digital para criar e testar exclusivamente novos conteúdos] para a inovação das FinTech) (2).

1.4.2

No sentido de estabelecer condições de igualdade relativamente a terceiros, é necessário considerar o tratamento do software como um bem imaterial, de modo a evitar deduzir do capital próprio os investimentos avultados que as entidades sediadas na UE já realizam nas TI (seguindo o exemplo dos sistemas bancários dos EUA e da Suíça ou do setor dos seguros (3)).

1.4.3

A Comissão Europeia, a Autoridade Bancária Europeia e os Estados-Membros têm de se empenhar solidamente numa aplicação harmonizada e eficaz da Diretiva Serviços de Pagamento revista (DSP2), que introduz requisitos de segurança muito rigorosos para a iniciação e o processamento de pagamentos eletrónicos e para a proteção dos dados financeiros dos consumidores, prestando especial atenção às redes sociais tecnológicas e aos gigantes comerciais.

1.4.4

Os desafios e os riscos para o consumidor associados à digitalização dos serviços financeiros devem ser cuidadosamente analisados pelo Plano de Ação para os Serviços Financeiros de Retalho (4) e pelo Grupo de Missão para as FinTech, garantindo uma estreita coordenação entre a DG JUST e a DG FISMA, em especial no que se refere às questões relacionadas com a proteção dos consumidores, como, por exemplo, a determinação do tipo de dados que devem ser usados para avaliar a qualidade de crédito, como garantir a compreensão de informações pré-contratuais e como realizar um controlo eficaz da identidade do interveniente através de um processo de triagem.

1.4.5

As medidas incluídas na proposta de alteração da Diretiva Branqueamento de Capitais (DBC) devem ser imediatamente transpostas (5), em especial as que combatem os riscos de financiamento do terrorismo associados às moedas virtuais e os riscos associados aos instrumentos pré-pagos anónimos.

1.4.6

Há que melhorar as soluções de financiamento colaborativo e outras soluções da economia colaborativa, explorando o potencial do estabelecimento de um «rótulo de qualidade» para criar confiança junto dos utilizadores, no sentido de desenvolver melhor as comunidades virtuais e facilitar a interação entre clientes cooperantes.

1.4.7

Importa dar apoio à introdução de soluções de software de fonte aberta no setor financeiro, a fim de aumentar a concorrência saudável no mercado, diminuir custos e evitar a dependência de um só fornecedor no setor.

1.4.8

Em simultâneo, é necessário rever a regulamentação relativa ao financiamento colaborativo por empréstimo, no sentido de incentivar contas de património mais pequenas.

1.4.9

A Comissão Europeia deve apoiar a concessão de empréstimos híbridos (motivados pelos requisitos de fundos próprios do Acordo de Basileia III).

1.5

O CESE realça que a digitalização nunca deve substituir um bom aconselhamento personalizado, prestado por um consultor humano qualificado (a proximidade da banca, com a ajuda de uma rede de agências adaptadas, não deve desaparecer!).

1.6

Compreender as FinTech exige novas competências por parte de todos: autoridades reguladoras, autoridades de supervisão, partes interessadas do ecossistema financeiro e população em geral. A fim de tirar partido de uma das principais potenciais vantagens das FinTech enquanto motor da inclusão financeira, os Estados-Membros da UE têm de reforçar a educação financeira e a literacia digital, antecipando os novos cenários. É algo que tem de começar nas escolas e deve incorporar informações sobre produtos financeiros no contexto da forma como são apresentados em linha e da sua relação com o desenvolvimento da Internet das coisas.

1.7

A digitalização no setor financeiro ameaça muitos empregos e este facto está a forçar os trabalhadores a atualizar as suas aptidões e competências. O CESE defende que se assegure que a formação de competências e a requalificação decorra a dois níveis. Internamente, permitindo que os trabalhadores assumam novas tarefas e criando uma transição entre os trabalhadores financeiros atuais de «instituições tradicionais» e de empresas FinTech/InsurTech, e externamente, preparando os trabalhadores que não consigam permanecer no setor para empregos noutros setores.

1.8

O CESE insta o Fundo Social Europeu a fornecer programas de formação específicos no âmbito da nova iniciativa emblemática «Coligação para a criação de competências e emprego na área digital» (6), para apoiar a melhoria das competências e a reciclagem profissional dos trabalhadores do setor financeiro, a fim de os preparar para as novas tecnologias digitais.

1.9

O CESE insta as empresas a replicarem códigos de conduta e boas práticas em matéria de regras internas que limitem a possibilidade de se exigir que os trabalhadores estejam constantemente em linha durante o dia e a emitirem orientações que desincentivem os trabalhadores de trabalharem aos fins de semana e durante as férias. Se as abordagens voluntárias não funcionarem, o CESE apela para regras vinculativas neste domínio.

1.10

A informação e a consulta atempadas, em consonância com as diretivas pertinentes da UE relativas à informação e consulta dos funcionários, são essenciais para fazer face a todos estes desafios. A Comissão Europeia e os Estados-Membros devem assegurar o cumprimento das disposições da legislação aplicável e, em especial, os direitos que os representantes dos trabalhadores têm de participar nas mudanças internas da empresa.

1.11

O CESE apela a que a proposta de diretiva relativa à reestruturação preventiva e à concessão de uma segunda oportunidade seja reforçada e completada, uma vez que isso ajudará a ter acesso a processos de reestruturação antes de qualquer declaração de insolvência das empresas.

2.   Um setor concentrado e diversificado sujeito a uma transformação rápida

2.1

O setor bancário e dos seguros na Europa é diversificado, marcado pela presença de grandes instituições europeias e até mesmo mundiais, bem como de estruturas locais e regionais com diferentes níveis de independência, e por determinadas características específicas de cada país. Apesar de estar em curso um processo de concentração na maioria dos Estados-Membros, a nível europeu o setor ainda se encontra fragmentado. As velhas linhas divisórias entre os grupos bancários e as grandes companhias de seguros praticamente desapareceram como resultado da criação do que são, na prática, conglomerados financeiros.

2.2

No novo panorama de mercados voláteis e taxas de juro reduzidas, a forte pressão reguladora, a supervisão e a fiscalização — impostas ao sistema bancário na sequência da crise financeira —, aliadas à transformação digital, a um aumento da concorrência (novas empresas FinTech), bem como as novas tendências de consumo, continuam a degradar os resultados do setor bancário. Com a chegada de novos modelos não bancários à economia digital, surge a necessidade de analisar a interligação entre quatro elementos: os bancos tradicionais, os novos intervenientes digitais, as autoridades reguladoras e os consumidores.

2.3

À medida que a utilização da Internet continua a aumentar, os bancos criam sucursais em linha e agências virtuais através das quais os clientes podem realizar operações simples e contactar um consultor. As estratégias das empresas destinadas a uma redução radical do investimento em recursos humanos, bem como a degradação das condições de atendimento aos clientes, levaram a que cada vez menos pessoas visitem agências bancárias, tendo muitas sido encerradas por toda a Europa.

2.4

No setor dos seguros, coexistem vários modos de distribuição: trabalhadores assalariados, corretores, agentes gerais, banca-seguros e agentes independentes para uma única empresa. Atualmente, os seguros podem ser vendidos em linha e através de telemóveis inteligentes. A predominância de cada uma destas redes de distribuição multicanais varia entre os Estados-Membros da UE e de produto para produto. Os seguros de vida, por exemplo, são essencialmente distribuídos através de redes bancárias (conhecidas como banca-seguros).

2.5

As formas de pagamento estão em constante evolução, prevendo-se que esta se intensifique. A utilização de cheques e de numerário diminuiu substancialmente desde o início da década de 1990. Ao mesmo tempo, verificou-se um aumento do pagamento por cartão, débito direto e transferência bancária, métodos que garantem uma maior rastreabilidade, controlo e segurança e comprometem a economia informal. Os pagamentos eletrónicos têm potencial para ampliar ainda mais o seu âmbito de aplicação, ou seja, servem para transferências de quantias entre pessoas e para pagamento de prestações sociais. Os novos intervenientes no domínio da moeda eletrónica estão a unir esforços com o comércio eletrónico, ao passo que novas tecnologias, como é o caso dos pagamentos sem contacto («contactless payments»), evoluem e a sua utilização aumenta juntamente com os cartões bancários. Além disso, importa prestar especial atenção ao seguimento da evolução dos mercados de criptomoeda (bitcoin e outras).

3.   Avanços tecnológicos no setor financeiro europeu e novos intervenientes

3.1

Os avanços tecnológicos no setor financeiro têm lugar na Internet, com a banca em linha, os megadados, a inteligência artificial, a cifragem progressiva (blockchain), a cibersegurança, etc. Os dados são trocados a alta velocidade, permitindo que as avaliações de risco e a tomada de decisões financeiras sejam realizadas com base em algoritmos e megadados.

3.2

Esta revolução tecnológica e as perturbações enfrentadas pelos bancos tradicionais no que se refere a problemas de capital próprio e de escassez temporária de liquidez, bem como o desenvolvimento de canais de vendas alternativos não abrangidos pelas obrigações regulamentares da indústria bancária, abriram caminho às FinTech, às InsurTech e à cifragem progressiva e, simultaneamente, criaram tanto novas oportunidades como novos riscos para os consumidores.

3.3

As empresas FinTech e InsurTech, cujo número continua a aumentar, conjugam os conceitos de finanças, seguros e tecnologia. Estas empresas recorrem à tecnologia para venderem produtos financeiros de formas inovadoras. Estão a crescer, em especial nas áreas da gestão de poupanças, do crédito pessoal, do financiamento às empresas e dos pagamentos em linha. Desempenham um papel cada vez mais relevante no financiamento participativo (financiamento colaborativo e financiamento coletivo), através de plataformas específicas e da utilização de aplicações móveis, moedas virtuais e pagamentos eletrónicos através da Internet ou de telemóveis inteligentes. Exercem uma enorme pressão sobre os bancos e as seguradoras, pois competem no seu território tradicional. As maiores empresas de Internet, e em especial as «GAFA» (Google, Apple, Facebook e Amazon), estão igualmente a desenvolver projetos relacionados com o setor financeiro, dado o seu controlo sobre os megadados.

3.4

As aplicações baseadas em «tecnologia do livro-razão distribuído» (DLT, do inglês «distributed ledger tecnology») podem ser capazes de conferir um novo tipo de confiança a uma vasta gama de serviços. A cifragem progressiva funciona sem qualquer organismo de controlo central, de uma forma transparente e segura. Tanto empresas como particulares podem usar este sistema para realizar determinadas operações e evitar o setor financeiro, designadamente através da utilização de criptomoedas.

De forma semelhante, o PayPal oferece a possibilidade de efetuar pagamentos em moeda estrangeira sem necessidade de facultar dados bancários.

3.5

As FinTech proporcionam às empresas e aos particulares acesso a financiamento colaborativo para projetos específicos, recorrendo a plataformas específicas para angariar fundos sob a forma de donativos ou empréstimos ou ainda de investimento de capital próprio. Estas plataformas permitem a concessão de financiamento coletivo, incluindo créditos ao consumo e créditos pessoais, sem ter de passar pelos bancos, e permitem que as microempresas e as PME sejam financiadas diretamente por particulares. As plataformas são capazes de complementar ou promover capital de risco, em especial para empresas inovadoras, e permitem, através das respetivas aplicações móveis, fornecer aos clientes, em tempo real, as informações financeiras de que necessitam para gerir as suas opções de despesa ou investimento.

3.6

Estes novos intervenientes concorrem com os modelos económicos tradicionais da banca e dos seguros, mas tanto bancos como companhias de seguros estão a começar a coexistir com eles. Alguns já encetaram um processo de cooperação com empresas FinTech e InsurTech, e outros possuem as suas próprias filiais. Além disso, o investimento em empresas FinTech aumentou rapidamente nos últimos anos, tendo este interesse sido alargado às InsurTech.

4.   Terão os clientes algo a ganhar?

4.1

Para as grandes empresas, este ajustamento à digitalização dos serviços financeiros implica mudanças que podem ser incorporadas na sua gestão quotidiana. Contudo, a situação é diferente para muitas PME tradicionais, e em especial para as microempresas, que não possuem conhecimentos nem recursos a nível interno que lhes permitam enquadrar-se facilmente num mundo financeiro em rápida mutação.

4.2

Na era da Internet e do telemóvel inteligente, os perfis dos clientes já não são os mesmos, mas a sua apetência pela banca e pelos seguros digitais depende de vários fatores, como a idade, o nível de instrução e a profissão. Contudo, no que toca a aconselhamento financeiro, mantém-se a necessidade de contacto humano baseado na experiência do cliente, mesmo entre os jovens.

4.3

As sucursais virtuais, filiais em linha dos grupos bancários e de seguros, oferecem aos clientes acesso ao crédito, empréstimos e seguros através da Internet e dos telemóveis inteligentes, recorrendo a novas aplicações. Estes negócios vêm acompanhados de condições mais favoráveis: um cartão bancário gratuito, taxas de juro bonificadas, um bónus por abertura de conta e um desconto de vários meses de contribuições para companhias de seguros e sociedades mútuas. Estas vantagens para o cliente fazem parte do período de transição entre o modelo empresarial tradicional dos bancos, das companhias de seguros e das sociedades mútuas e o modelo que está a surgir com a digitalização.

4.4

Este cenário apresenta tanto riscos como oportunidades para os consumidores:

Acesso mais facilitado aos produtos, mais/melhor escolha, possibilidade de comparação de preços através de sítios na Internet, ofertas mais personalizadas, redução dos custos de operação (tempo e dinheiro) e maior segurança graças a novos sistemas biométricos de autenticação.

Novos produtos úteis (por exemplo, financiamento colaborativo) mas também o surgimento de novos produtos que são complexos, opacos, difíceis de entender e arriscados, como o crédito imediato.

Eventuais problemas no fornecimento de informação pré-contratual/divulgação através de novos canais de vendas como os telemóveis inteligentes, devido ao tamanho reduzido dos ecrãs.

Informação insuficiente sobre os riscos associados aos produtos financeiros.

Supervisão/fiscalização insuficiente das atividades dos novos intervenientes no setor dos serviços financeiros.

Insegurança jurídica, em determinados casos, relativamente à legislação aplicável aos novos intervenientes.

Áreas não regulamentadas (por exemplo, aconselhamento automatizado).

Possível discriminação/exclusão injustificada associada à utilização de megadados e à falta de competências digitais.

Cibersegurança.

4.5

A digitalização deve criar mais transparência na divulgação de produtos financeiros, mas a aparente simplificação dos produtos disponíveis pode ocultar um desequilíbrio na relação financeira global. A utilização de algoritmos não garante a ausência de deficiências ocultas nem o cumprimento das normas europeias por parte dos produtos. Por conseguinte, a educação financeira deve incorporar informações sobre produtos financeiros no contexto da forma como são apresentados em linha.

5.   Outras fontes de financiamento e o lugar das finanças éticas e responsáveis

5.1

O facto de as empresas atualmente estarem muito dependentes do financiamento bancário (mais de 75 % na Europa, contra 20 % nos EUA) e a falta de uma cultura de capitais próprios na Europa tornam as PME (mais de 98 % de todas as empresas na Europa, que dão emprego a dois em cada três trabalhadores e criam 58 % de todo o valor acrescentado) potencialmente vulneráveis ao risco de uma crise de crédito como a que se verificou durante os anos da crise financeira mundial. Consequentemente, importa explorar métodos de financiamento complementar não bancários, bem como os riscos que acarretam, em especial em caso de crise.

5.2

No financiamento das PME, há inúmeras fontes alternativas que ajudam a melhorar o desenvolvimento das empresas e a reduzir os riscos, para além de ajudas dos fundos europeus para promover a criação de emprego e a competitividade das empresas por intermédio da redução dos custos de financiamento habituais, tal como previsto no Plano Juncker.

5.3

Terá de haver um reforço do modelo bancário socialmente responsável, transparente e sustentável e de um sistema financeiro enraizado na economia real, que proporcione estabilidade e coesão social e territorial. Os bancos sustentáveis adotam uma abordagem tripla intencional de negócio (que inclui medidas de desempenho financeiro, social e ambiental para financiar projetos sem externalidades negativas), centrando-se na criação de relações sólidas com os seus clientes e com a comunidade alargada das partes interessadas.

5.4

Os bancos, as cooperativas de seguros e as sociedades mútuas há muito que se concentraram na criação de valor para todas as partes interessadas — o modelo do «valor para as partes interessadas» — no desenvolvimento das suas atividades. No entanto, adotaram igualmente as práticas das instituições comerciais tradicionais, não tendo escapado às dificuldades suscitadas pela crise financeira. Por agora, não se afigura que a digitalização seja um fator essencial para um regresso a práticas comerciais mais éticas, que reajam às verdadeiras necessidades da sociedade.

6.   Impacto no emprego e nas condições de trabalho

6.1

Segundo a Bloomberg, os bancos suprimiram cerca de 600 mil postos de trabalho em todo o mundo desde a crise económica de 2008. Estas reduções maciças dos efetivos devem-se essencialmente à crise, mas foram igualmente consequência do processo de digitalização.

6.2

Na Europa, estima-se que os bancos e as companhias de seguros sejam responsáveis por quase quatro milhões de postos de trabalho, dos quais três milhões na banca e quase um milhão no setor dos seguros. O Citigroup prevê que o setor bancário suprimirá cerca de 1,8 milhões de postos de trabalho na Europa e nos EUA nos próximos dez anos. A Europa, cujos bancos dão emprego a quase 2,9 milhões de trabalhadores numa base equivalente a tempo inteiro, manteria apenas 1,82 milhões em 2025. Esta tendência é ilustrada pelos inúmeros cortes de pessoal anunciados recentemente por vários dos principais grupos bancários europeus. Em diversos países, pode observar-se uma tendência para o emprego a tempo parcial e outras formas de emprego na indústria financeira.

6.3

São necessárias medidas no âmbito da política ativa do mercado de trabalho, com vista a abordar as mudanças futuras e as atualmente em curso para os trabalhadores em questão. Os parceiros sociais a todos os níveis desempenham um papel crucial na identificação de soluções adequadas. Um exemplo de boas práticas a este nível é o fundo geral para a requalificação de todos os trabalhadores bancários afetados na Áustria, criado através da negociação coletiva a nível setorial e financiado tanto pela indústria como pelo público.

6.4

A erosão contínua da rede de agências bancárias foi acompanhada de uma revisão do conceito de agência em consonância com a natureza dos clientes em questão. Antes dos encerramentos das agências, o número de trabalhadores havia diminuído em consequência da automatização de operações. No setor dos seguros, a rede de agentes gerais e de corretores é robusta, apesar de uma acentuada tendência para a redução do seu número. O número de trabalhadores assalariados vai diminuir.

6.5

Ao nível da negociação, as compras/vendas de ações de empresas, divisas e swaps de risco de incumprimento (derivados financeiros em que o vendedor compensa o comprador em caso de incumprimento de um terceiro) são atividades cada vez mais realizadas por computadores.

6.6

Uma nova plataforma cognitiva desenvolvida a partir de megadados e testada por um dos principais grupos bancários é capaz de responder a perguntas feitas em linguagem natural numa enorme variedade de áreas e propor respostas pré-preparadas aos consultores de clientes. Esta tecnologia pode ser usada como um assistente virtual tanto na banca como nos seguros. A equipa de vendas poderá estar entre os primeiros afetados.

6.7

As condições de trabalho tornaram-se instáveis e os requisitos de formação aumentaram significativamente, tanto no sentido de equipar os trabalhadores com as competências digitais necessárias como para permitir-lhes mudar de emprego caso surja a necessidade de mobilidade profissional.

6.8

Uma vez que os avanços digitais exigirão uma grande mudança nas ferramentas, capacidades e competências de que os trabalhadores necessitam, as empresas têm de estar preparadas para investir no desenvolvimento contínuo de competências e qualificações. A negociação coletiva e o diálogo social têm de centrar-se na importância de adaptar a formação profissional às necessidades futuras e de tornar possível esta formação, bem como na indicação pormenorizada da forma como as novas tecnologias são já usadas no setor. As competências necessárias para que os atuais trabalhadores no setor financeiro se mantenham pertinentes no futuro e a forma como estas competências podem ser ensinadas é algo que deve ser explorado caso a caso.

6.9

Há uma preocupação crescente quanto às horas de trabalho associadas ao lançamento do trabalho em linha e aos muitos postos de trabalho que estão já a ser suprimidos. É já evidente que mais atividades financeiras serão relocalizadas no interior da UE e fora da Europa, em países com custos de mão de obra reduzidos e baixos níveis de proteção social.

6.10

Importa que as soluções digitais sirvam sempre as pessoas e ajudem a melhorar os padrões sociais e as condições de trabalho. É necessário reforçar o diálogo social setorial a todos os níveis, incluindo a nível europeu, no sentido de identificar as melhores soluções e, dessa forma, evitar perturbações sociais. A nível setorial e em cada empresa, os empresários têm de se esforçar por encetar negociações com os representantes sindicais, com vista a garantir que são tomadas medidas eficazes em matéria de rendimentos, condições de trabalho, proteção social, formação e apoio à mobilidade geográfica interna e profissional e ao destacamento. Estas medidas têm de ser aplicadas com a maior brevidade possível, em antecipação de processos de reestruturação e não apenas quando se começam a perder empregos.

6.11

A digitalização controlada do setor financeiro deve manter empregos de qualidade e melhorar as relações com os clientes, mantendo simultaneamente um acesso suficiente a aconselhamento financeiro personalizado. Deve garantir a segurança eficaz das operações e uma proteção eficiente dos dados pessoais, tanto para clientes como para trabalhadores. Os trabalhadores e os consumidores de serviços financeiros devem ser associados a este processo, por intermédio das respetivas organizações representativas, para que os seus conhecimentos práticos nesse domínio possam ser tidos em consideração.

7.   Regulamentação e supervisão

7.1

A crescente complexidade dos produtos financeiros e a velocidade do processamento de dados — juntamente com serviços anónimos e automatizados de comercialização, aconselhamento e consultoria — criam situações de alto risco que, com frequência, não podem ser avaliadas nem controladas pelo detentor dos fundos disponibilizados ou investidos. O CESE observa com preocupação a não adequação dos modelos de risco e da sua capacidade de avaliar devidamente os perfis de risco de diferentes categorias de investimentos não garantidos.

7.2

Segundo o governador do Banco de França, o aparecimento das finanças digitais tem de andar de mãos dadas com a regulamentação, que deve adaptar-se de forma a não limitar a inovação e continuar a garantir um nível elevado de segurança nas operações e de proteção dos consumidores. O CESE considera que tanto a indústria financeira tradicional como as novas empresas/os novos modelos económicos das FinTech têm de ser abrangidos por normas igualmente rigorosas.

7.3

A DMIF II (Diretiva Mercados de Instrumentos Financeiros II) é uma das principais iniciativas regulamentares que alterarão a estrutura do mercado e dos modelos económicos. As empresas devem encarar os requisitos regulamentares como uma oportunidade estratégica.

7.4

As novas regulamentações relativas aos pagamentos digitais (DSP2) visam aumentar os níveis de segurança das operações em linha, com o objetivo de reduzir o atual nível de fraude presente no canal.

7.5

Uma nova diretiva da UE contra o branqueamento de capitais introduzirá novos requisitos de controlo relativos à verificação de novos clientes, bem como novas obrigações em matéria de comunicação de transações suspeitas e de manutenção de registos dos pagamentos.

7.6

O quadro atualizado relativo à Cooperação no domínio da Defesa do Consumidor (Regulamento CDC) dará mais poderes às autoridades nacionais para aplicarem a legislação de proteção dos consumidores e melhorará a coordenação necessária entre os Estados-Membros.

7.7

Com a aplicação da legislação Solvência II às companhias de seguros e das disposições do Acordo de Basileia III/DRFP IV aos bancos, surge a questão de se saber de que forma uma abordagem regulamentar suplementar poderá tomar em consideração os riscos assumidos pelos novos intervenientes no sistema financeiro e o seu impacto na totalidade do setor.

7.8

Na sequência dos testes de esforço realizados pela Autoridade Bancária Europeia em 2016, a Comissão apresentou propostas que refletem o debate atualmente liderado pelo Comité de Basileia relativamente ao reforço dos requisitos de fundos próprios. As normas universais adotadas devem ser proporcionais à dimensão e à natureza das instituições de crédito e das empresas financeiras em fase de arranque. O CESE congratula-se com o mais recente pacote de propostas da Comissão (7).

7.9

A crise financeira constituiu uma enorme oportunidade negocial para os fundos de investimento direto — o sistema bancário sombra — nos últimos anos. O impacto da digitalização nestes fundos não deve dar origem a uma deficiência regulamentar que seja prejudicial à estabilidade do sistema financeiro.

7.10

Dada a deficiência dos modelos de avaliação de riscos tradicionais, incapazes de avaliar devidamente os modelos de financiamento não baseados em garantias, as autoridades de supervisão europeias devem intensificar os contactos com as empresas FinTech em fase de arranque, compreendendo que as FinTech requerem novas competências por parte das autoridades de supervisão.

Bruxelas, 26 de abril de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  Não só concorrência, mas também cooperação e parceria.

(2)  A Comissão está a estudar a possibilidade de introduzir, a nível da UE, uma licença única que permita às empresas tecnológicas do setor dos serviços financeiros operar em toda a Europa, e a criação de um «sandbox» pan-europeu, ou quadro regulamentar específico, para toda a União.

(3)  Ver os requisitos da Diretiva Solvência II.

(4)  Publicado em 23 de março: Plano de Ação para os serviços financeiros prestados a consumidores [COM(2017) 139 final], tendo sido lançada uma consulta pública sobre as Fintech.

(5)  JO C 34 de 2.2.2017, p. 121.

(6)  https://ec.europa.eu/digital-single-market/en/digital-skills-jobs-coalition.

(7)  Parecer do CESE (ECO/424) sobre a Reforma bancária — Alterações aos requisitos de fundos próprios e ao quadro de resolução bancária (ainda não publicado no Jornal Oficial)


Glossário

Inteligência artificial. Máquina dotada de capacidade de aprendizagem. Um «robô-conselheiro» é uma máquina capaz de prestar aconselhamento financeiro e que funciona da mesma forma que o cérebro humano.

Banca-seguros. Venda de produtos de seguros através das redes de agências dos bancos. Este tipo de parceria estratégica aproxima as redes e cria sinergias empresariais.

Megadados. Armazenamento e tratamento de grandes quantidades de dados transmitidos a grande velocidade. A «analítica» refere-se à conversão dos dados em informação através de métodos matemáticos e estatísticos para a tomada de decisões no setor financeiro.

Bigtech. Gigantes do setor tecnológico, como a Google, a Apple, a Facebook e a Amazon (GAFA), que estão a começar a projetar os seus longos tentáculos para o setor bancário.

Bitcoin. Moeda virtual em fase experimental, cada vez mais aceite no mercado.

Cifragem progressiva («blockchain»). Plataforma tecnológica que aceita a bitcoin. Dispõe de uma base de dados muito eficaz, que pode ser usada nas finanças ou em várias aplicações.

Nuvem. Modelos para a prestação de serviços baseados na Internet.

Conectividade. Graças aos progressos tecnológicos podemos hoje estar conectados a qualquer hora e em qualquer lugar, o que proporciona maior flexibilidade aos trabalhadores, já que podem trabalhar de casa ou de outro local (teletrabalho, trabalho inteligente), assim como a tempo parcial. Os jovens já estão habituados a esta forma de trabalhar, e a importância de dispor de um vasto leque de opções pode ser aproveitada da melhor maneira.

Financiamento colaborativo. Financiamento disponibilizado através de plataformas na Internet que põem os empresários em contacto com os investidores. Há plataformas que obrigam os empresários a ceder uma parte do capital da sua empresa em troca do investimento (equity crowdfunding).

Empréstimo colaborativo. Financiamento através da Internet para empresários, que recebem um empréstimo de um grupo de pessoas que tem de ser reembolsado com base numa taxa de juros fixa.

Experiência do cliente. Desenvolvimento de um conhecimento aprofundado de cada cliente individual, personalizando a sua experiência em todas as interações com o banco. As redes sociais e as plataformas cibernéticas são elementos essenciais.

Cibersegurança. Protege contra os riscos de ciberataques e de roubo de dados, e aumenta e assegura a confiança dos clientes.

Digitalização no setor financeiro europeu. Diz respeito à tecnologia em geral (Internet, tecnologias móveis, megadados, cifragem progressiva, inteligência artificial, computação em nuvem, robótica, cibersegurança) quando aplicada a novos modelos de relacionamento com os clientes e à gestão das transações dos bancos e das companhias de seguros. A tecnologia é uma forma de conseguir a digitalização, e não um fim em si mesma.

Disrupção. A transformação digital não é possível sem um novo modelo de organização e cultura. A inovação é fundamental para a competitividade neste processo bancário global. A mudança começa nas pessoas.

Banca exponencial. Usa tecnologias exponenciais (que surgiram em resultado da revolução digital) para aumentar o leque e a qualidade dos serviços financeiros e para reduzir os custos.

Fin Tech/Insur Tech. Empresas inovadoras em fase de arranque que propõem soluções inovadoras e a baixo custo para serviços bancários ou de seguros.

Empréstimo híbrido. Combinação de empréstimos por clientes dos bancos e da banca privada. Permite aos bancos manter mais clientes sem aumentar significativamente o seu balanço, satisfazendo ao mesmo tempo os seus clientes e os outros investidores.

«Knowmad» (Nómadas do conhecimento). Novos profissionais que consideram que o seu contributo reside no conhecimento, e dão, por isso, prioridade à liberdade de gestão do seu trabalho e do seu tempo.

Geração do milénio. Primeira geração de «nativos digitais», nascidos entre 1980 e 2000, que representarão 75 % da população ativa em 2025. Em geral, não se deslocam às agências bancárias.

Multicanalização. Combinação eficaz de canais digitais e presenciais para a atividade bancária. O cliente é o ponto focal da atividade empresarial.

Neobancos. Bancos que não precisam de uma licença financeira para funcionar: desenvolvem programas informáticos com base na infraestrutura de um banco existente.

Formas de pagamento. Tendência do comércio eletrónico, o pagamento através de terminais de ponto de venda é a forma de pagamento móvel mais comum em todo o mundo. Este ecossistema também inclui a opção PayPal e os operadores tecnológicos Samsung Pay, Apple Pay, etc. Os serviços de pagamento «pessoa-a-pessoa» são uma alternativa real para quem vive em países com um sistema bancário menos desenvolvido. Atualmente, as aplicações de serviços bancários móveis fazem parte da vida.

Regtech. Tecnologias inovadoras utilizadas para a facilitar o cumprimento da regulamentação, reduzindo os custos e os recursos necessários para a execução de tais tarefas. A regulamentação digital e a monitorização constituem um desafio para o setor financeiro (importa assegurar condições equitativas).

STEM. Estudo da ciência, da tecnologia, da engenharia e da matemática. As profissões atualmente em ascensão estão ligadas a estes domínios, e as competências digitais são fundamentais em todos os setores. A formação é, pois, prioritária.


III Atos preparatórios

COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU

525.a reunião plenária de 26 e 27 de abril de 2017

28.7.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 246/18


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.o 560/2014 do Conselho, de 6 de maio de 2014, que estabelece a Empresa Comum Bioindústrias»

[COM(2017) 68 final — 2017/0024 (COD)]

(2017/C 246/03)

Relator-geral:

Mihai MANOLIU

Consulta

Conselho, 21.3.2017

Base jurídica

Artigos 187.o e 188.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo

Decisão da Mesa

28.3.2017

Adoção em plenária

27.4.2017

Reunião plenária n.o

525

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

160/0/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE considera que a proposta de alteração de regulamento ora em análise visa melhorar as disposições do regulamento do Conselho e simplificá-las ainda mais para fins da realização dos objetivos da Empresa Comum Bioindústrias. A proposta é coerente com os objetivos iniciais e com as disposições existentes no domínio de ação.

1.2.

O CESE está em crer que a Empresa Comum Bioindústrias procura desenvolver sinergias com outros programas da União e com a política de coesão, a educação, o ambiente, as PME, a competitividade e a política de desenvolvimento rural, reforçando as capacidades de investigação e inovação nacionais e regionais no contexto de estratégias e políticas de especialização inteligente.

1.3.

A Comissão Europeia realiza continuamente intercâmbios de natureza operacional com o Consórcio Bioindústrias (BIC), incluindo consultas e debates sobre o modo de pagamento das contribuições financeiras dos membros da Empresa Comum Bioindústrias. O impacto da proposta de regulamento ora em apreço não é maior que o esperado do regulamento do Conselho inicial, uma vez que se trata de alterações técnicas que não necessitam de uma avaliação de impacto para a iniciativa em análise.

1.4.

O CESE congratula-se com o facto de a proposta em apreço reduzir os encargos administrativos do Consórcio BIC no que diz respeito ao seu papel de intermediário entre os seus membros sobre quem impende a obrigação de efetuar contribuições financeiras e os participantes nos projetos. Em última instância, o Consórcio BIC continuará a ser responsável pela comunicação do número agregado de contribuições financeiras dos seus membros.

1.5.

O CESE concorda com as principais clarificações introduzidas no novo regulamento, a saber:

o pagamento das contribuições financeiras passa a poder ser efetuado de duas formas: transferindo-as do Consórcio BIC para a Empresa Comum Bioindústrias (tal como anteriormente) e/ou transferindo-as diretamente de um membro do Consórcio BIC para um beneficiário de um projeto;

a categoria das partes que podem pagar a contribuição financeira (entidades constituintes do Consórcio BIC) será alargada;

o empenhamento na realização do objetivo financeiro global será mantido;

é possível aos membros do Consórcio BIC declararem as contribuições financeiras que efetuam a nível dos projetos.

2.   Observações na generalidade

2.1.

O CESE considera que o conceito de bioindústria faz parte do domínio mais vasto da bioeconomia, definido como a produção e a exploração de recursos biológicos renováveis e a sua transformação em produtos baseados em elementos biológicos, tais como os géneros alimentícios, os alimentos para animais e a bioenergia. Três quartos da superfície arável da UE são utilizados para este fim, tratando-se de um setor económico que emprega 17-19 milhões de pessoas e representa um volume de negócios de 2 biliões de euros. As empresas que operam no domínio do conhecimento ligado à bioeconomia registam um volume de negócios de 57 mil milhões de euros e empregam cerca de 305 000 trabalhadores (dados de 2009).

2.2.

Para a Europa, a bioeconomia pode promover o desenvolvimento, gerar valor acrescentado, criar novos postos de trabalho seguros e dignos, reduzir substancialmente a dependência de importações, contribuir de forma eficaz para uma utilização racional dos recursos biológicos finitos mas renováveis e dar um contributo substancial para o comércio mundial.

2.3.

Constata-se, não raro, a existência de uma concorrência a vários níveis, nomeadamente entre as diversas tecnologias e utilizações dos recursos biológicos. Esta situação é agravada pela disponibilidade limitada dos recursos biológicos. Por um lado, a bioeconomia pode contribuir significativamente para o objetivo de redução das emissões de CO2 que, por sua vez, tem um impacto positivo na saúde pública. Por outro lado, constata-se um efeito adverso que consiste em emissões adicionais de gases com efeito de estufa, cujo impacto no ambiente não é negligenciável.

2.4.

O quadro político europeu para a bioeconomia é segmentado em várias políticas setoriais: agricultura, pescas, silvicultura, clima, economia circular, investigação, sendo que estes domínios de atividade são abrangidos por diversos atos legislativos e políticas setoriais (1).

2.5.

Posto isto, em 2012, foi adotada uma estratégia inclusiva para a bioeconomia no sentido de assegurar uma coerência política. No entanto, subsistem ainda algumas incoerências. A UE concede financiamento a atividades inovadoras no domínio da bioeconomia através do programa-quadro de investigação Horizonte 2020 e de outros instrumentos de financiamento. O CESE reputa necessário assegurar a sustentabilidade e uma política coerente neste domínio.

2.6.

A importância de considerar a criação de uma parceria público-privada para a bioindústria, enquanto iniciativa tecnológica, é salientada numa série de comunicações da Comissão (2).

2.7.

A base jurídica desta proposta é constituída pelos artigos 187.oe 188.o do TFUE. Cabe à UE alterar o quadro jurídico da Empresa Comum, uma vez que os Estados-Membros não podem agir por si só. O objetivo da proposta de regulamento em análise é adaptar as disposições do regulamento do Conselho de modo a dar aos membros do Consórcio BIC a possibilidade de, na prática, cumprirem a sua obrigação de pagamento de uma contribuição financeira. A proposta respeita o princípio da proporcionalidade. A alteração também era necessária devido à impossibilidade de interpretar o regulamento do Conselho de modo a permitir o pagamento da contribuição financeira ao nível dos projetos.

3.   Observações na especialidade

3.1.

Em 2012, a Comissão Europeia, com base no Programa-Quadro de Investigação, adotou a Estratégia para a Bioeconomia, tendo em vista assegurar a coerência entre as diferentes políticas pertinentes e os respetivos objetivos, tanto a nível nacional como a nível da UE. Considerou-se que esta abordagem era necessária para aumentar o financiamento público e o investimento privado na bioeconomia. Foram definidos modelos de governação participativa. Esta estratégia criou as bases para um plano de ação com 12 medidas, agrupadas em torno de 3 temas principais:

investimento na investigação, inovação e desenvolvimento de competências;

interação política intensificada e participação das partes interessadas;

condições propícias ao mercado e à competitividade no domínio da bioeconomia.

3.2.

As medidas adotadas visavam a criação de uma associação das partes interessadas na bioeconomia, bem como de um observatório das atividades da bioeconomia, e promoviam novos mercados mediante a elaboração de normas, nomeadamente em matéria de durabilidade/sustentabilidade, proporcionando a base de conhecimentos necessária para a intensificação sustentável da produção primária. Previa-se uma revisão e atualização da estratégia em 2017.

3.3.

A proposta da Comissão contém uma alteração técnica do diploma em vigor, nomeadamente o Regulamento (UE) n.o 560/2014 do Conselho que estabelece a Empresa Comum Bioindústrias (BBI).

3.3.1.

A Empresa Comum BBI é um organismo que visa a execução de uma parceria público-privada cujos membros são a União Europeia, representada pela Comissão, e o Consórcio Bioindústrias (BIC). A Empresa Comum BBI foi criada com vista à execução da Iniciativa Tecnológica Conjunta Bioindústrias, até 31 de dezembro de 2024.

3.3.2.

Atendendo às dificuldades registadas pelo Consórcio BIC para efetuar a sua contribuição financeira nos moldes previstos no regulamento do Conselho, propõe-se incluir a possibilidade de pagamento das contribuições financeiras ao nível dos projetos, para além do modo de pagamento atual, ao nível do programa. Esta solução resolve eficazmente a situação e contribui para a realização dos objetivos iniciais do regulamento do Conselho, permitindo aos membros do Consórcio BIC cumprir o seu compromisso inicial. Trata-se de uma solução semelhante à adotada no que respeita à Empresa Comum IMI-2 (Iniciativa sobre Medicamentos Inovadores 2), em que os membros que não a União podem pagar as suas contribuições financeiras quer a nível do programa, o que fazem geralmente as fundações e as organizações caritativas, quer a nível dos projetos, que é o modo utilizado pelas entidades comerciais. A alteração proposta não se inscreve no programa REFIT.

3.4.

A Empresa Comum Bioindústrias tem por objetivo a execução de uma parceria público-privada constituída, por um lado, pela UE representada pela Comissão e, por outro, pelo Consórcio Bioindústrias (BIC), criado pelo Regulamento (UE) n.o 560/2014 do Conselho. Esta parceria visa a execução da Iniciativa Tecnológica Conjunta Bioindústrias, até 31 de dezembro de 2024, em conformidade com os Estatutos da Empresa Comum Bioindústrias.

3.5.

O artigo 3.o do regulamento do Conselho define concretamente a contribuição de cada membro da Empresa Comum, as despesas administrativas e operacionais, as quais são divididas e acrescidas de um montante indeterminado correspondente às contribuições em espécie para a execução de ações indiretas e às contribuições em espécie para a execução de atividades adicionais. Decorre da interpretação dos Estatutos que esta contribuição financeira do Consórcio BIC deve ser inscrita no orçamento da Empresa Comum BBI, a nível do programa. As entidades constituintes dos membros que não a União, que são as que participam na execução de ações indiretas financiadas, poderiam fazer contribuições financeiras diretamente a essas ações indiretas, a nível dos projetos.

3.6.

Muitos membros do Consórcio BIC têm sido confrontados com dificuldades no que respeita aos meios de pagamento. Considera-se que assegurar o pagamento da contribuição a nível do programa não só não é comercialmente viável como não oferece benefícios garantidos, em especial no que se refere aos resultados do projeto e aos respetivos direitos de propriedade intelectual, para além de poder levar a que um dos membros do Consórcio BIC entregue essa contribuição aos seus próprios concorrentes. Propõe-se um modo alternativo de pagamento da contribuição financeira a nível do projeto, em que os resultados do projeto beneficiam os participantes que contribuíram financeiramente, sendo esta uma modalidade que não afeta os interesses da União. Pretende-se preservar os interesses das cadeias de valor bioeconómicas, inclusive das PME, dos centros de investigação e de tecnologia e das universidades.

3.7.

A contribuição financeira dos membros que não a União deve cumprir os seguintes requisitos:

o pagamento de uma contribuição financeira a nível do programa aplica-se apenas à Empresa Comum BBI;

o atual modelo da Empresa Comum BBI é adequado para reforçar a cooperação com fundações e organizações caritativas;

o quadro jurídico da Empresa Comum BBI deve ser adaptado para facilitar a colaboração com empresas comerciais.

3.8.

Em conformidade com a proposta em análise, os membros do Consórcio BIC têm a possibilidade de continuar a pagar as suas contribuições financeiras a nível do programa. Além disso, terão a possibilidade de transferir a contribuição financeira diretamente para outro participante no projeto, em conformidade com as regras acordadas entre as partes (acordo de consórcio), o quadro jurídico aplicável [(transferência financeira dos membros do Consórcio BIC para o Consórcio BIC) e (transferências financeiras dos membros do Consórcio BIC para os beneficiários de projetos)], a sua legislação nacional e as suas práticas contabilísticas habituais. O Consórcio BIC será responsável pela comunicação do montante agregado das contribuições financeiras recebidas.

3.9.

O modelo de convenção de subvenção da Empresa Comum Bioindústrias será alterado em conformidade. Note-se que a proposta de alteração do regulamento em análise não tem consequências em matéria de proteção dos direitos fundamentais, nem implicações orçamentais. Considera-se que uma redução orçamental afetaria o setor académico e as PME pertinentes, uma vez que a contribuição financeira da União se destina principalmente a ações de investigação e inovação.

3.10.

A proposta de alteração é vinculativa em todos os seus elementos e diretamente aplicável em todos os Estados-Membros. Por conseguinte, não é necessário um documento explicativo.

Bruxelas, 27 de abril de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  PAC — política agrícola comum, estratégia da UE para as florestas, PCP — política comum das pescas, Estratégia Europa 2020, plano de ação da UE para a economia circular, 50 redes do Espaço Europeu de Investigação e 3 iniciativas de programação conjunta.

(2)  COM(2012) 60 final: Inovação para um Crescimento Sustentável: Bioeconomia para a Europa; COM(2014) 14 final: Por um renascimento industrial europeu; COM(2013) 494 final: Parcerias Público-Privadas no Programa-Quadro Horizonte 2020: um instrumento poderoso para gerar inovação e crescimento na Europa; COM(2012) 79 final: Parceria europeia de inovação «Produtividade e Sustentabilidade no Setor Agrícola».


28.7.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 246/22


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao controlo das somas em dinheiro líquido que entram ou saem da União Europeia e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1889/2005»

[COM(2016) 825 final — 2016/0413 (COD)]

(2017/C 246/04)

Relator:

Javier DOZ ORRIT

Correlator:

Mihai IVAȘCU

Consulta

Parlamento Europeu, 19.1.2017

Conselho da União Europeia, 19.1.2017

Base jurídica

Artigos 114.o e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social

Adoção em secção

6.4.2017

Adoção em plenária

27.4.2017

Reunião plenária n.o

525

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

154/4/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE considera que a luta contra o terrorismo e o seu financiamento, bem como os esforços para combater o branqueamento de capitais e outras formas conexas de criminalidade económica, devem ser prioridades permanentes das políticas da UE.

1.2.

O CESE manifesta o seu apoio às medidas estabelecidas na proposta da Comissão, que revoga o anterior regulamento de 2005, para ajustar o quadro regulamentar à situação atual e dar resposta às deficiências identificadas em vários estudos sobre a sua aplicação.

1.3.

O CESE considera que o alargamento do âmbito dos controlos e das competências das autoridades para que possam proceder a verificações e confiscar bens sempre que exista um indício razoável de atividades ilícitas facilitará a deteção de um maior número de casos fraudulentos e a recolha de mais informações.

1.4.

Na opinião do CESE, é necessário melhorar a cooperação, tanto entre as autoridades competentes como entre os Estados-Membros, a fim de potenciar ao máximo a aplicação do novo regulamento. O CESE solicita a todos os Estados-Membros que coloquem à disposição da Europol as suas bases de dados de luta contra o terrorismo. A Comissão deve também incentivar medidas de cooperação que permitam a todos os Estados-Membros dispor dos meios necessários para controlar eficazmente os diversos tipos de dinheiro líquido e os seus modos de transporte.

1.5.

O CESE propõe à Comissão que, na sequência de um estudo e de vastas consultas, elabore um plano para reduzir a utilização de dinheiro em numerário na UE. A este respeito, há que colocar a questão de saber se o limiar de 10 000 euros para a declaração obrigatória é adequado.

1.6.

O CESE entende que a Comissão deveria ir mais longe, definindo as sanções em caso de incumprimento da obrigação de declaração. As sanções devem ser harmonizadas entre os Estados-Membros e comunicadas à Comissão de forma coerente, a fim de evitar lacunas que beneficiem os prevaricadores.

1.7.

O CESE reitera as suas preocupações, expressas anteriormente no parecer ECO/408 (1), relativamente a uma série de fatores que podem limitar em grande medida a eficácia do regulamento. A questão principal é que os paraísos fiscais, onde tem lugar a parte mais significativa do branqueamento de capitais — e cujos fluxos de dinheiro líquido com a UE, em particular, devem ser controlados –, não figuram na lista de países e regiões considerados pela Comissão, na sua proposta de regulamento de 14 de julho de 2016, como apresentando um risco elevado.

1.8.

A investigação dos fluxos de dinheiro líquido de origem criminosa está ligada a outras infrações, nomeadamente de ordem fiscal. O CESE propõe, por conseguinte, que as autoridades fiscais tenham igualmente acesso a informações coligidas no decurso dos controlos dos fluxos de dinheiro líquido.

1.9.

O CESE considera que, a partir do momento em que o novo regulamento seja adotado, a definição de «dinheiro líquido» deve abranger outros «produtos de elevada liquidez» para além do ouro.

1.10.

Embora reconheça o valor social dos cartões pré-pagos em toda a UE, o CESE chama a atenção para o perigo de criminosos e terroristas continuarem a utilizar esses instrumentos para financiar, de forma dissimulada, as suas atividades.

1.11.

Perante o aumento da quantidade de dados recolhidos e trocados entre as autoridades, o CESE recomenda que se reforce a proteção desses dados e que se explore a possibilidade de aplicar sanções administrativas e penais mais graves para os funcionários públicos e outras pessoas que os utilizem de forma imprópria ou ilícita.

1.12.

O problema assume uma escala internacional e, como tal, as instituições da UE devem também participar plenamente no trabalho das organizações internacionais ativas neste domínio.

1.13.

O CESE acolhe favoravelmente a retirada de circulação das notas de 500 euros a partir de 2018, cuja utilização para pagamentos em dinheiro no âmbito do tráfico ilícito se encontra amplamente documentada, precisamente devido à facilidade de transportar e conservar grandes quantidades de dinheiro num espaço reduzido.

1.14.

O CESE recorda à Comissão que a proteção dos cidadãos europeus deve continuar a ser uma prioridade máxima, independentemente dos custos e esforços.

2.   Contexto e proposta da Comissão

2.1.

Em conformidade com o plano de ação (2) para reforçar a luta contra o financiamento do terrorismo, a Comissão propõe um novo regulamento relativo ao controlo das somas em dinheiro líquido que entram na UE a partir de países terceiros ou que saem para esses países, que revoga o regulamento de 2005 (3) atualmente em vigor.

2.2.

Em maio de 2015, a UE adotou o quarto pacote relativo à luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, constituído por diversas iniciativas, nomeadamente pela quarta diretiva relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo (DBC 4) e pelo regulamento relativo às informações que acompanham as transferências de fundos (4), que se encontram atualmente em fase de transposição. O CESE pronunciou-se sobre o pacote legislativo no seu parecer sobre a «Luta contra o branqueamento de capitais» (5).

2.3.

Em fevereiro de 2016, a Comissão publicou o seu plano de ação para reforçar a luta contra o financiamento do terrorismo (6), a ser aplicado em duas fases legislativas. Na primeira (julho de 2016), a Comissão elaborou duas propostas de diretiva — a DBC 5, que altera determinados aspetos da DBC 4, e a diretiva relativa ao acesso às informações antibranqueamento de capitais por parte das autoridades fiscais (7) — e o regulamento delegado (8) com vista a identificar os países terceiros de risco elevado (paraísos fiscais), como complemento das DBC 4 e 5 (9). O CESE adotou pareceres sobre a DBC 5 e o regulamento, bem como um parecer sobre a segunda diretiva (10).

2.4.

Na segunda fase (dezembro de 2016), para além da proposta de regulamento a que se refere o presente parecer, a Comissão apresentou uma proposta de diretiva relativa à luta contra o branqueamento de capitais através do direito penal (11) e uma proposta de regulamento relativo ao reconhecimento mútuo das decisões de congelamento e de confisco de bens de origem criminosa (12).

2.5.

O regulamento de 2005 complementa as disposições da diretiva relativa ao branqueamento de capitais (DBC), introduzindo controlos para as remessas de dinheiro líquido de valor igual ou superior a 10 000 euros. A atual proposta da Comissão (13) visa: preencher as lacunas na legislação atual de acordo com as investigações realizadas pelas autoridades policiais, judiciais e aduaneiras; desenvolver e complementar a DBC 4 (14) e a DBC 5 (15), a fim de combater o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo; adaptar a legislação da UE, alinhando-a com as normas e recomendações internacionais, em especial a recomendação n.o 32 do GAFI (Grupo de Ação Financeira sobre o Branqueamento de Capitais).

2.6.

A proposta em apreço aborda as imperfeições na cobertura dos movimentos transfronteiras de dinheiro líquido, as dificuldades no intercâmbio de informações entre as autoridades, a impossibilidade de reter montantes abaixo do limiar (inferiores a 10 000 euros), a definição imperfeita de «dinheiro líquido», as divergências das sanções em caso de não declaração aplicadas pelos Estados-Membros e os diferentes níveis de execução.

2.7.

O novo regulamento proposto, que se destina a substituir a atual legislação, alarga e aperfeiçoa a definição de dinheiro líquido, fazendo uma divisão em quatro categorias: moeda, meios de pagamento ao portador (cheques bancários, cheques de viagem, livranças e ordens de pagamento), produtos utilizados como reservas de valor de elevada liquidez (moedas e barras de ouro) e cartões pré-pagos.

2.8.

A proposta estabelece uma obrigação de declarar as somas em dinheiro líquido não acompanhado, ou seja, enviado por remessa postal, correio rápido ou frete, de valor igual ou superior a 10 000 euros. Alguns Estados-Membros também efetuam controlos dos movimentos de dinheiro líquido dentro da UE.

2.9.

Confere às autoridades competentes os poderes para realizar controlos das remessas de dinheiro líquido de valor inferior a 10 000 euros, bem como para notificar e investigar sempre que existam sérios indícios de atividade criminosa.

2.10.

Autoriza a retenção de fundos nos casos em que as remessas de dinheiro líquido não declaradas atinjam um valor igual ou superior a 10 000 euros ou em que as remessas de qualquer valor revelem indícios de atividade criminosa.

2.11.

Melhora o intercâmbio de informações ao exigir uma comunicação ativa com as unidades de informação financeira (UIF); atualmente, só se exige das autoridades competentes que disponibilizem a informação. Caso existam indícios de participação criminosa, as informações sobre operações irregulares devem ser também colocadas à disposição das autoridades competentes dos outros Estados-Membros e da Comissão. As informações podem também ser comunicadas a países terceiros, sob reserva do cumprimento de determinados requisitos.

2.12.

Promove a aplicação de sanções em todos os Estados-Membros no caso de incumprimento da obrigação de declaração, como complemento das sanções legais por atividade criminosa. As sanções aplicadas em cada Estado-Membro devem ser comunicadas à Comissão.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE saúda os esforços contínuos da Comissão na luta mundial contra o branqueamento de capitais e o terrorismo. Apoia igualmente as alterações agora propostas com vista a melhorar a legislação em vigor.

3.2.

A Comissão e as outras instituições da UE devem envidar esforços para assegurar que a população europeia está plenamente consciente da sua vontade de combater o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, recorrendo a todos os instrumentos jurídicos necessários, aos serviços de informação, às forças policiais e à ação judicial. O conhecimento de que os esforços das instituições a este respeito decorrem em cooperação com todos os Estados-Membros reforçará a sua credibilidade e legitimidade. Embora nem todos possam ser publicados, são já utilizados alguns indicadores em matéria de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo.

3.3.

O Comité insta a UE e os Estados-Membros a promoverem uma cooperação contínua a nível internacional na luta contra o terrorismo, o branqueamento de capitais e os crimes graves que lhes estão associados. Todas as instituições da UE devem empenhar-se em assegurar que as medidas propostas pela Comissão são também adotadas a nível internacional, o que deverá contribuir para aumentar a sua eficácia.

3.4.

A proposta de um novo regulamento visa combater os fluxos ilegais de dinheiro líquido entre a UE e países terceiros. Para que tenha êxito, a Comissão Europeia tem de cooperar com os Estados-Membros, a fim de garantir que as suas autoridades competentes dispõem dos recursos humanos e técnicos mais eficazes, bem como de quaisquer outros recursos necessários (por exemplo, cães pisteiros treinados).

3.5.

Os regimes de financiamento do terrorismo podem ser muito diversos, quer através do abuso de empresas legais ou organizações legítimas sem fins lucrativos para atividades criminosas, quer da utilização abusiva do sistema de comércio internacional. As organizações terroristas desenvolvem continuamente os seus métodos de financiamento, a fim de contornar as disposições legislativas existentes, tornando-se claramente necessário atualizar permanentemente o quadro jurídico. As diferenças de legislação entre os Estados-Membros são geralmente exploradas por criminosos e terroristas, que escolhem os países onde a legislação é menos rigorosa para realizar as suas transações financeiras.

3.6.

Na sequência da evolução da Agenda Europeia para a Segurança (16), da resposta aos ataques terroristas ocorridos na Europa e no resto do mundo e do interesse público nas operações de branqueamento de capitais, fraude fiscal e elisão fiscal através de paraísos fiscais, a Comissão Europeia adotou um grande número de iniciativas legislativas nos últimos dois anos.

3.7.

De acordo com o relatório do GAFI (17), o dinheiro líquido é amplamente utilizado no âmbito da criminalidade económica e continua a ser o mais importante recurso para o financiamento do terrorismo. Embora seja difícil estimar o volume de dinheiro «branqueado», o relatório do GAFI fala de centenas de milhares de milhões a um bilião de dólares americanos por ano.

3.8.

Uma análise da eficácia do atual regulamento revelou que o número de remessas em dinheiro líquido que entram e saem da UE continua a ser elevado. No entanto, o número de controlos das somas em dinheiro líquido é limitado (100 000 por ano no conjunto de todos os Estados-Membros) e varia de país para país, como varia também consideravelmente o número de casos suspeitos investigados. Apenas nove países participaram na consulta mais recente sobre o tema, e os dados relativos ao número de casos e de investigações eram díspares e limitados.

3.9.

As lacunas no atual regulamento permitem o envio de dinheiro líquido em remessas postais, por correio rápido ou por frete sem que esteja sujeito a controlos específicos suficientes. Em diversas ocasiões, as autoridades competentes não dispunham dos instrumentos necessários para realizar controlos adequados.

3.10.

Alargar o âmbito dos controlos e conferir às autoridades competentes os poderes para proceder a verificações e confiscar bens em caso de suspeita de atividade criminosa, mesmo abaixo do limiar de 10 000 euros, permitirá detetar um maior número de casos fraudulentos e recolher mais informações. Atualmente, as informações obtidas não são utilizadas como deveriam: são disponibilizadas de forma passiva em certos Estados-Membros e não existem medidas em vigor para garantir o seu processamento correto. É necessário reforçar a comunicação entre as autoridades competentes: entre as autoridades aduaneiras, na sua maior parte encarregadas da realização dos controlos, e as UIF responsáveis pela receção e análise das informações; entre as UIF e as autoridades fiscais e judiciais; entre as autoridades competentes dos Estados-Membros e as dos países terceiros, em especial os que são responsáveis pelo aumento dos fluxos ilegais de dinheiro líquido que entram e saem da UE, como é o caso dos paraísos fiscais.

3.11.

As sanções aplicadas ao abrigo do regulamento atual pelo incumprimento da obrigação de declarar as somas em dinheiro líquido não estão harmonizadas, e as análises efetuadas parecem indicar que não têm o efeito dissuasor que se pretende. O novo regulamento impõe aos Estados-Membros a obrigação de aplicar sanções em caso de incumprimento da obrigação de declaração, independentemente da suspeita de atividade criminosa ou da ligação desse dinheiro a investigações sobre outros crimes ou infrações; tais sanções devem ser obrigatoriamente comunicadas à Comissão. O CESE propõe que se estabeleça um procedimento de comunicação comum para todos os Estados-Membros. No entanto, cada Estado-Membro é livre de determinar as suas próprias sanções. As sanções previstas no artigo 13.o devem ser harmonizadas, a fim de não criar janelas de oportunidade para os criminosos que operam através de determinados países.

3.12.

A aplicação do regulamento e das medidas contra o branqueamento de capitais supramencionadas aumentará significativamente a quantidade de dados pessoais recolhidos, armazenados e disponibilizados aos órgãos e autoridades competentes em matéria de luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo. Para preservar os direitos fundamentais dos indivíduos, nomeadamente no que se refere à proteção dos dados pessoais, é importante avaliar a necessidade de aplicar novos mecanismos de proteção, sempre que necessário, e promover sanções penais mais pesadas para os funcionários públicos e outras pessoas que utilizem as informações de forma ilícita.

3.13.

Os canais e procedimentos utilizados para o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, incluindo as remessas ilegais em dinheiro líquido, levaram a Comissão, muito justamente, a adotar medidas legislativas que abrangem os dois tipos de crime. Ambos estão relacionados com outros crimes de magnitude semelhante ou superior. É essencial uma estreita coordenação, através dos mecanismos adequados, entre todas as autoridades e organismos nacionais em causa e os Estados-Membros para assegurar a execução eficaz do regulamento e das restantes medidas legislativas pertinentes. Há que referir que a cooperação entre as diversas autoridades e instituições dos Estados-Membros — policiais, de informação, judiciais, aduaneiras e fiscais — está longe de ser ideal. O CESE está particularmente preocupado com a falta de cooperação entre as forças policiais nacionais e a Europol, sendo exemplo disso o facto de a maioria dos Estados-Membros não ter colocado as suas bases de dados de luta contra o terrorismo à disposição da agência policial europeia. Por conseguinte, o CESE exorta as autoridades da UE e os Estados-Membros a porem termo a esta situação.

3.14.

Outro importante obstáculo à aplicação eficaz do regulamento e das demais disposições legislativas pertinentes na luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo é a ausência de uma verdadeira vontade política para erradicar os paraísos fiscais. A maior prova disso é a lista de «países terceiros de risco elevado que apresentam deficiências estratégicas», apresentada no anexo do Regulamento (UE) 2016/1675, que complementa a DBC 4 e a DBC 5. Nenhum dos paraísos fiscais associados à maioria das transações ilegais, nomeadamente os movimentos de dinheiro líquido abrangidos pela proposta de regulamento, consta da lista. O CESE vê-se forçado a reiterar o apelo formulado no parecer ECO/408: a Comissão deve propor uma nova lista de paraísos fiscais, transformando-a numa única lista dos países terceiros e territórios que não cooperam na ação judicial contra os crimes financeiros e o financiamento do terrorismo.

4.   Observações na especialidade

4.1.

O financiamento do terrorismo tem uma clara componente globalizada, o que significa que as operações terroristas num país são, muitas vezes, financiadas por atividades criminosas em curso noutro país. Cumpre realizar controlos das somas em dinheiro líquido e alterações legislativas profundas, a fim de bloquear os movimentos de dinheiro líquido, rastrear e limitar as operações financeiras, bem como facultar informações importantes sobre os terroristas e os seus financiadores. Tendo perfeita consciência da dimensão externa do financiamento do terrorismo, o CESE recomenda a plena participação de todas as instituições da UE em todas as organizações internacionais pertinentes, onde estas estejam representadas, de forma que possam ser aplicadas medidas semelhantes em todo o mundo.

4.2.

As remessas em dinheiro líquido continuam a ser o principal canal de operação dos branqueadores de capitais e outros criminosos financeiros (18). O CESE recomenda à Comissão que, após efetuar um estudo exaustivo, consultar todas as partes interessadas e estabelecer uma estreita relação de trabalho com os Estados-Membros, o BCE e os bancos centrais nacionais, elabore um plano para reduzir a utilização de dinheiro em numerário na UE. A supressão das notas de 500 euros é um passo na direção certa. No âmbito desse estudo, há que colocar a questão de saber se o limiar de 10 000 euros para a declaração obrigatória é adequado.

4.3.

O CESE insta a Comissão Europeia a intensificar os seus esforços para que a Convenção de Varsóvia (19) seja ratificada em toda a UE de forma coerente. Até à data, apenas 17 Estados-Membros a ratificaram, embora tenha sido assinada por 26.

4.4.

O CESE reconhece que o regulamento proposto poderá trazer melhorias significativas para os instrumentos utilizados na luta contra o financiamento do terrorismo, tendo simultaneamente um impacto mínimo nas pequenas e médias empresas europeias.

4.5.

Considera que o desenvolvimento de políticas de cooperação financeira com os países vizinhos e com os países de origem dos fluxos migratórios para a UE particularmente volumosos é essencial para facilitar a transparência das transações financeiras e custos baixos. Os obstáculos e o elevado custo associados à transferência de dinheiro de e para esses países incentivam a utilização de remessas em dinheiro líquido e as transações opacas e, consequentemente, o recurso a estes métodos para fins criminosos.

4.6.

Como ficou comprovado nos recentes ataques em solo europeu, os cartões pré-pagos têm sido utilizados por terroristas, por exemplo, para pagar quartos de hotel (atentados de Paris, 13 de novembro de 2015). Embora o valor social destes instrumentos seja evidente, na medida em que permitem às pessoas vulneráveis ou excluídas efetuar pagamentos tanto em linha como fora de linha, o CESE chama a atenção para a ameaça de uma maior utilização de tais instrumentos por criminosos ou terroristas.

4.7.

O transporte ilegal de dinheiro líquido está relacionado com outros tipos de transgressão: infrações fiscais, branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo. A proposta de regulamento da Comissão não permite a troca regular de dados da declaração de dinheiro líquido para efeitos fiscais. O CESE considera que as ações judiciais contra estas transgressões devem ser abrangentes. Em particular, entende que esta troca de dados deve ser permitida, dada a ligação evidente que existe entre a fraude fiscal e o branqueamento de capitais, que em muitos casos implicam a circulação de dinheiro líquido.

4.8.

Apesar de o artigo 2.o, n.o 2, e o artigo 14.o da proposta de regulamento conferirem à Comissão o poder de adotar atos delegados a fim de alterar o anexo, nomeadamente a secção que especifica quais os «produtos utilizados como reservas de valor de elevada liquidez» que são considerados formas de dinheiro líquido, o CESE entende não haver motivo algum para limitar esta categoria, desde o início, apenas ao ouro. Outros produtos particularmente valiosos, como metais preciosos ou pedras preciosas (em bruto ou lapidadas), podem ser incluídos na primeira lista a aprovar pelo Parlamento e pelo Conselho.

4.9.

O CESE reitera que a garantia da segurança dos nossos cidadãos deve continuar a ser uma das principais preocupações da UE e dos Estados-Membros, independentemente dos esforços necessários.

Bruxelas, 27 de abril de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  JO C 34 de 2.2.2017, p. 121.

(2)  COM(2016) 50 final.

(3)  Regulamento (UE) n.o 1889/2005 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 309 de 25.11.2005, p. 9).

(4)  Diretiva (UE) 2015/849 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 141 de 5.6.2015, p. 73), e Regulamento (UE) 2015/847 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 141 de 5.6.2015, p. 1).

(5)  JO C 271 de 19.9.2013, p. 31.

(6)  COM(2016) 50 final.

(7)  COM(2016) 450 final — 2016/0208 (COD) e COM(2016) 452 final — 2016/0209 (COD).

(8)  Regulamento Delegado (UE) 2016/1675 (JO L 254 de 20.9.2016, p. 1).

(9)  JO C 34 de 2.2.2017, p. 121.

(10)  JO C 34 de 2.2.2017, p. 127.

(11)  COM(2016) 826 — 2016/0414 (COD).

(12)  COM(2016) 819 — 2016/0412 (COD).

(13)  COM(2016) 825 final — 2016/0413 (COD).

(14)  Diretiva (UE) 2015/849 (JO L 141 de 5.6.2015, p. 73).

(15)  Proposta de DBC 5.

(16)  COM(2015) 185 final.

(17)  Relatório do GAFI: «Money Laundering: Through the Physical Transportation of Cash» [Branqueamento de capitais: O transporte físico de dinheiro líquido] (2015).

(18)  «Why is cash still king? A strategic report on the use of cash by criminal groups as a facilitator for money laundering» [Por que é que o dinheiro ainda é rei? — Um relatório estratégico sobre a utilização de dinheiro líquido por grupos criminosos como meio facilitador do branqueamento de capitais], Grupo de Informação Financeira, Europol, 2015.

(19)  Convenção do Conselho da Europa relativa ao branqueamento, deteção, apreensão e perda dos produtos do crime e ao financiamento do terrorismo, 2005.


28.7.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 246/28


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria um Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS) e altera os Regulamentos (UE) n.o 515/2014, (UE) 2016/399, (UE) 2016/794 e (UE) 2016/1624»

[COM(2016) 731 final — 2016/0357(COD)]

(2017/C 246/05)

Relator:

Jan SIMONS (NL-I)

Consulta

Comissão Europeia, 17.2.2017

Parlamento Europeu, 19/01/2017

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

3.4.2017

Adoção em plenária

27.4.2017

Reunião plenária n.o

525

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

184/0/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE considera que a intenção de criar um Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS), para identificar os riscos associados aos visitantes isentos da obrigação de visto que viajam para o espaço Schengen, constitui, atualmente, um passo inevitável na resposta às ameaças causadas por circunstâncias externas e internas.

1.2.

O Comité congratula-se com o facto de o ETIAS se enquadrar na estratégia geral da UE no domínio da migração e da segurança definida pela Comissão no seu programa «Fronteiras Inteligentes», de 2011, e de as informações recolhidas através do sistema permitirem a verificação prévia de potenciais riscos de segurança ou de migração irregular com vista a proteger os cidadãos da UE contra pessoas que entram com má intenção.

1.3.

O Comité sublinha com ênfase que o ETIAS deve respeitar plenamente os direitos fundamentais dos requerentes e evitar qualquer discriminação. Todos os dados, especialmente os relacionados com informações sensíveis sobre saúde, educação, criminalidade, etc., recolhidos pelo sistema devem ser protegidos e o acesso aos mesmos deve ser estritamente limitado às autoridades que investigam atividades criminosas, terrorismo, imigração ilegal e outras ameaças. O ETIAS deve igualmente respeitar o direito dos requerentes de contestar a recusa de autorização de viagem ou a sua retirada.

1.4.

O Comité está consciente da necessidade de resolver muitas questões técnicas relacionadas com o ETIAS, em especial a interoperabilidade e interconectividade com outros sistemas de recolha de dados e a governação. O ETIAS deve basear-se no equilíbrio correto entre riscos e segurança, evitando ao mesmo tempo um aumento dos encargos administrativos e das barreiras para os visitantes que viajam frequentemente para a UE por motivos de negócios, estudos, tratamento médico, etc.

1.5.

A Comissão e o Conselho devem também prestar atenção aos aspetos políticos da criação do ETIAS. Os países em causa devem ser informados sobre as razões da obrigação de obter uma autorização de viagem quando existe um regime de isenção de vistos, bem como sobre as vantagens de permitir uma travessia das fronteiras rápida e sem dificuldades para os viajantes com autorização de viagem. A Comissão deve também assegurar que quaisquer eventuais medidas recíprocas dos países em causa aplicadas aos cidadãos da UE sejam proporcionais às medidas da UE.

1.6.

O ETIAS deve ter em conta as pessoas que não são capazes de preencher o pedido em linha e fornecer «espaços de apresentação de pedidos» para os requerentes nos principais aeroportos e portos marítimos, assim como nos grandes pontos de passagem das fronteiras terrestres. Todos os requerentes devem poder utilizar os serviços de intermediários, tais como agências de viagens ou empresas de transporte. No entanto, os custos cobrados por estes intermediários pelos seus serviços devem ser vigiados e avaliados pelas delegações da UE nos países terceiros.

1.7.

Será igualmente necessário definir adequadamente os critérios aplicáveis às categorias de nacionais de países terceiros que, segundo a proposta, serão isentos da obrigação de obter uma autorização de viagem, tendo em conta os riscos de migração, de segurança ou de saúde.

1.8.

O Comité solicita que sejam encontradas soluções para os Estados-Membros que ainda não aplicaram plenamente o acervo de Schengen (Bulgária, Croácia, Chipre e Roménia) e, consequentemente, não têm acesso ao SIS, ao VIS e ao EES.

2.   Contexto

2.1.

Os cidadãos da União Europeia esperam que as autoridades garantam a sua segurança numa Europa aberta. Contam com a gestão eficaz das fronteiras externas do espaço Schengen, por forma a evitar a migração irregular, garantir simultaneamente uma maior segurança interna e a livre circulação no espaço Schengen e facilitar a travessia das fronteiras externas da UE num mundo de mobilidade.

2.2.

Atualmente, cerca de 1,4 mil milhões de pessoas de cerca de 60 países em todo o mundo (1) podem beneficiar de viagens isentas de visto para a União Europeia e do princípio da reciprocidade, que também beneficia os cidadãos da UE facilitando as viagens sem visto para o estrangeiro. O número de nacionais de países terceiros isentos da obrigação de visto que visitam os países do espaço Schengen continuará a aumentar, prevendo-se um aumento superior a 30 % do número de pessoas que atravessam a fronteira Schengen até 2020, passando de 30 milhões em 2014 para 39 ou 40 milhões em 2020 (2).

2.3.

Estes números demonstram a necessidade de instaurar um sistema de autorização semelhante ao existente em alguns países (EUA (3), desde 2009, Austrália (4), desde 1996, Canadá (5), desde 2016), designadamente para avaliar e gerir os potenciais riscos em matéria de migração irregular e segurança que os nacionais de países terceiros que visitam a UE possam representar, embora de forma mais simples e intuitiva para os visitantes do que o regime de vistos normal, em consonância com os objetivos da política de liberalização de vistos da UE.

2.4.

Em comparação com os nacionais de países terceiros a quem se exige um visto, as autoridades de fronteira e de aplicação da lei competentes dispõem de poucas informações sobre os nacionais de países terceiros isentos da obrigação de visto, antes da sua chegada à fronteira Schengen, quanto aos riscos que podem representar. O facto de incorporar estes dados em falta e a avaliação de riscos sobre os visitantes isentos da obrigação de visto conferiria um importante valor acrescentado às medidas existentes destinadas a manter e reforçar a segurança do espaço Schengen, permitindo ainda aos visitantes isentos da obrigação de visto beneficiar deste estatuto.

2.5.

No seu programa «Fronteiras Inteligentes», de 2011, a Comissão alertou para a necessidade de uma gestão mais moderna e eficiente dos fluxos de viajantes nas fronteiras externas da UE, utilizando novas tecnologias para simplificar a vida dos estrangeiros que viajam frequentemente para a UE e melhor monitorizar os nacionais de países terceiros que atravessam as fronteiras.

2.6.

As novas ameaças e desafios que surgiram nos anos subsequentes exigiram uma revisão do programa inicial «Fronteiras Inteligentes» e, após estudos técnicos e um processo de consulta, foi publicada, em 2016, uma nova proposta legislativa relativa a um regulamento que estabelece o Sistema de Entrada/Saída (EES). O CESE aprovou o seu parecer sobre o EES em setembro de 2016 (6). A recente proposta de alteração do Código das Fronteiras Schengen (7), destinada a reforçar os controlos nas fronteiras externas por confronto com as bases de dados pertinentes (SIS, base de dados da Interpol relativa a documentos de viagem roubados ou extraviados e outras bases de dados europeias), visa introduzir um controlo obrigatório de todos os nacionais de países terceiros, bem como dos cidadãos da UE, tanto à entrada como à saída da União Europeia.

2.7.

Para completar este processo de revisão, a Comissão publicou uma proposta de criação de um Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS), com vista a reforçar os controlos de segurança dos viajantes isentos da obrigação de visto (8). Trata-se de um sistema informático automatizado criado para identificar quaisquer riscos associados a visitantes isentos da obrigação de visto que entram no espaço Schengen, estando previstos 40 milhões de pedidos a partir de 2021 (9).

2.8.

As informações recolhidas através do sistema permitirão a verificação prévia de potenciais riscos de segurança ou de migração irregular, no pleno respeito dos direitos fundamentais e da proteção de dados.

2.9.

A autorização ETIAS não é um visto. Os nacionais de países isentos da obrigação de visto poderão continuar a viajar sem visto, mas deverão, como condição obrigatória para a entrada no espaço Schengen por via aérea, marítima ou terrestre, obter uma autorização de viagem antes da sua deslocação, após o pagamento de uma taxa (o montante proposto é de 5 euros). Para decidir se deve emitir ou rejeitar um pedido de deslocação à UE, o sistema efetuará verificações automáticas (95 % de resultados positivos esperados) ou, se necessário, verificações prévias manuais adicionais e, em seguida, emitirá ou recusará uma autorização de viagem. O resultado deste procedimento será comunicado ao requerente num prazo muito curto (alguns minutos ou no máximo 72 horas se forem necessários controlos adicionais). A decisão final de concessão ou recusa de entrada será sempre tomada pelos guardas de fronteira nacionais que executam os controlos nas fronteiras ao abrigo do Código das Fronteiras Schengen.

2.10.

No entanto, a verificação prévia dos viajantes de países terceiros isentos da obrigação de visto facilitará os controlos nas fronteiras e assegurará uma avaliação coordenada e harmonizada dos riscos associados aos nacionais de países terceiros, reduzindo substancialmente o número de recusas de entrada nos pontos de passagem de fronteira. Embora a autorização de viagem seja válida por um período de cinco anos, ou até ao termo da validade do documento de viagem, pode ser revogada ou anulada se as condições para a emissão da autorização de viagem deixarem de ser aplicáveis.

2.11.

O regulamento proposto comporta o princípio geral de que o ETIAS se baseia na interoperabilidade dos sistemas de informação a consultar e na reutilização de componentes desenvolvidos para os referidos sistemas de informação, em especial o Sistema de Entrada/Saída (EES). Esta abordagem permitirá também obter economias significativas de custos na criação e funcionamento do ETIAS. O ETIAS e o EES partilham um repositório comum de dados pessoais de nacionais de países terceiros, com dados suplementares do pedido ETIAS (por exemplo, dados da residência, respostas às perguntas sobre antecedentes, endereço IP, etc.) e dos registos de entrada e saída do EES, armazenados de forma separada, mas ligados a este processo de identificação partilhado e único. Esta abordagem está em plena sintonia com a estratégia de interoperabilidade e incluiria todas as salvaguardas adequadas em matéria de proteção de dados.

2.12.

A Europol participará na elaboração das regras de verificação e da lista de vigilância do ETIAS, que incluirá os dados relativos a pessoas suspeitas de terem praticado ou participado num crime, ou relativamente às quais existem indícios factuais ou motivos razoáveis para considerar que virão a praticar crimes graves ou a representar outros riscos em matéria de segurança e saúde.

2.13.

A eu-LISA, a Agência Europeia para a Gestão Operacional de Sistemas Informáticos de Grande Escala no Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça, irá desenvolver o Sistema de Informação ETIAS e será responsável pela sua gestão em termos técnicos. O custo estimado do desenvolvimento do ETIAS é de 212,1 milhões de euros e o custo médio anual das operações é de 85 milhões de euros. Prevê-se que o ETIAS esteja operacional já em 2020.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE considera que a intenção de criar um Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS) constitui, atualmente, um passo inevitável na resposta às ameaças causadas por circunstâncias externas e internas. Esta medida pode não ser bem acolhida por viajantes de países terceiros abrangidos pelo regime de isenção de vistos, mas enquadra-se na estratégia geral da UE no domínio da migração e da segurança definida pela Comissão no seu programa «Fronteiras Inteligentes», em 2011.

3.2.

O Comité observa que a proposta ETIAS visa colmatar a lacuna na gestão das fronteiras externas da UE que permite aos cidadãos de países isentos da obrigação de visto atravessar as fronteiras da UE na ausência de informação adequada sobre esses nacionais de países terceiros, antes da sua chegada às fronteiras Schengen, quanto aos riscos que podem representar.

3.3.

A proposta ETIAS centra-se nos aspetos técnicos do sistema, na sua governação, na tecnologia da informação necessária e na interoperabilidade e interconectividade com outros sistemas de recolha e análise de dados (10). O Comité está consciente da extrema complexidade destas questões e da necessidade de resolver muitas questões técnicas, por forma a que o sistema possa estar plenamente operacional após o seu lançamento, previsto para 2021. O ETIAS deve encontrar o equilíbrio correto entre riscos e segurança, evitando ao mesmo tempo um aumento dos encargos administrativos e das barreiras para quem viaja frequentemente para a UE, especialmente por motivos de negócios, trabalho, investigação ou estudos.

3.4.

O Comité está convencido de que a Comissão e o Conselho deveriam também prestar atenção aos aspetos políticos da criação do ETIAS e explicar aos países em causa as razões da sua criação, incluindo as vantagens de permitir uma travessia de fronteiras rápida e sem dificuldades para os viajantes com autorização de viagem e assegurar um nível de segurança adequado, tornando os requisitos de informação para essa autorização mais leves e menos onerosos do que no procedimento normal de visto. A Comissão deve também assegurar que, se os países em causa adotarem medidas recíprocas em relação aos cidadãos da UE, estas sejam proporcionais às medidas da UE.

3.5.

O Comité recomenda que os países em causa sejam informados em tempo útil sobre o sistema proposto e que se realizem as campanhas de comunicação necessárias para que os viajantes sejam devidamente informados e o sistema seja introduzido passo a passo, começando por ser facultativo e tornando-se depois obrigatório, quando estiver adequadamente implementado e for tecnicamente viável.

3.6.

O Comité solicita à Comissão que tome decisões sobre as possíveis formas de cooperação com os serviços de segurança da UE e que utilize os seus conhecimentos especializados para estabelecer perfis de risco e elaborar a lista de vigilância do ETIAS.

3.7.

O Comité, no seu parecer sobre o pacote «Fronteiras Inteligentes», sublinhou a necessidade de respeitar estritamente os direitos fundamentais e o princípio da não discriminação e de utilizar meios processuais e institucionais para garantir que todos os dados recolhidos e armazenados no sistema são protegidos e utilizados de forma adequada (11). Trata-se, nomeadamente, de dados pessoais sensíveis sobre a educação, a saúde, a criminalidade, etc. Neste contexto, o Comité reitera o seu pedido e insiste em que o acesso aos dados ligados às autorizações de viagem seja estritamente limitado às autoridades que investigam as atividades criminosas, o terrorismo, a imigração ilegal e outras ameaças.

3.8.

O Comité apoia a estrutura proposta para o ETIAS, que deverá consistir num sistema de informação, numa unidade central do ETIAS no âmbito da Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira (GEFC) e em unidades nacionais. Será necessário acompanhar a aplicação uniforme e completa do ETIAS por todos os Estados-Membros. O Comité apoia a criação de um comité de gestão do programa, necessário para assegurar uma interação eficaz entre a equipa central de desenvolvimento e os Estados-Membros, que se revelou muito útil durante o desenvolvimento do SIS II.

3.9.

O Comité insta veementemente a que o ETIAS seja plenamente interoperável com outros sistemas de informação europeus e interconectado a bases de dados da Interpol e que sejam utilizados componentes de outros sistemas europeus, em especial o EES, respeitando simultaneamente os direitos fundamentais e a proteção de dados pessoais.

3.9.1.

Neste contexto, o Comité solicita à Comissão e aos colegisladores que tenham em conta as observações e recomendações formuladas pela Autoridade Europeia para a Proteção de Dados no seu parecer sobre a proposta relativa ao ETIAS (12), especialmente no que diz respeito à necessidade de respeitar as diferenças substanciais entre os domínios da migração e da segurança, limitar a acessibilidade dos dados pessoais, analisar a fiabilidade e a utilidade dos dados de saúde recolhidos, parametrizar melhor os instrumentos de definição do perfil destinados ao controlo automático dos pedidos, entre outros aspetos.

3.10.

A lista de vigilância do ETIAS incluirá os dados relativos a pessoas suspeitas de terem praticado ou participado num crime grave, na aceção da proposta, ou relativamente às quais existem indícios factuais ou motivos razoáveis para considerar que poderão vir a praticar um tal crime grave ou a representar outros riscos em matéria de segurança ou saúde. O Comité estima que, em conformidade com as normas europeias, os requerentes devem ter o direito de conhecer os motivos da recusa e ter a possibilidade de recorrer.

4.   Observações na especialidade

4.1.

O Comité concorda que a duração da conservação dos dados deve ser fixada em cinco anos, tal como disposto no Regulamento EES.

4.2.

O Comité insiste em que o ETIAS deve ser capaz de responder de forma flexível e eficiente às mudanças nos padrões de migração, assim como aos riscos em matéria de segurança e saúde, sem ter de passar por longos processos legislativos, recorrendo a atos de execução e delegados, desde que sejam sujeitos a controlos democráticos.

4.3.

O ETIAS deve ter em conta as pessoas que não são capazes de efetuar o pedido em linha por qualquer motivo sério. O Comité apoia a intenção de disponibilizar «espaços de apresentação de pedidos» para os requerentes nos principais aeroportos e portos marítimos de partida, assim como nos principais pontos de passagem das fronteiras terrestres. Todos os requerentes poderão utilizar os serviços de intermediários, tais como agências de viagens ou empresas de transporte. No entanto, os custos por eles cobrados pelos seus serviços devem ser vigiados e avaliados pelas delegações da UE nos países terceiros.

4.4.

Dado o aumento previsto da frequência das travessias das fronteiras externas da UE (especialmente das suas fronteiras terrestres), devem ser aproveitadas todas as oportunidades para aumentar a eficácia dos controlos nas fronteiras, tal como declarado nos objetivos do regulamento. Por conseguinte, o Comité propõe que certas informações contidas no pedido de autorização de viagem sejam colocadas à disposição das autoridades de fronteira.

4.5.

O Comité gostaria de evitar o potencial estrangulamento do ETIAS, devido ao facto de permitir um período demasiado curto para a avaliação manual dos pedidos de autorização de viagem, uma vez que deve existir um controlo de alta qualidade dos requerentes que pode implicar consultas com outros Estados-Membros e a Europol. Por conseguinte, o Comité propõe prolongar os períodos para a avaliação manual, estabelecendo critérios rigorosos para esses prolongamentos.

4.6.

Será igualmente necessário definir devidamente os critérios aplicáveis às categorias propostas de nacionais de países terceiros que serão isentos da obrigação de obter a autorização de viagem, tendo em conta os riscos de migração, de segurança ou de saúde.

4.7.

No que diz respeito à taxa proposta para o pedido de autorização de viagem, o Comité recomenda que sejam cumpridos os seguintes critérios: a taxa de tratamento dos pedidos e os meios de cobrança não devem impedir determinados grupos de pessoas de solicitarem uma autorização de viagem, podendo também funcionar como um filtro que impeça a apresentação de múltiplos pedidos de autorização de viagem.

4.8.

Deve haver garantias suficientes de que o ETIAS é imune à fraude de identidade, incluindo a possível utilização futura de dados biométricos.

4.9.

O Comité apoia o direito de os requerentes recorrerem da recusa de uma autorização de viagem, ou da sua revogação ou anulação.

4.10.

O Comité chama a atenção para o facto de existirem Estados-Membros que ainda não aplicaram plenamente o acervo de Schengen (Bulgária, Croácia, Chipre e Roménia) e, consequentemente, não têm acesso ao SIS, ao VIS e ao EES. A questão do funcionamento do ETIAS nestes países não é mencionada na proposta de regulamento, e o Comité insta a que sejam encontradas soluções para estes Estados.

4.11.

O Comité chama a atenção para o facto de, no caso do transporte de passageiros por via navegável interior, como os cruzeiros no Danúbio que, num Estado terceiro ou não Schengen, podem embarcar novos passageiros que não necessitam de vistos para entrar na UE, o ETIAS dever aplicar-se à travessia das fronteiras de Schengen por via marítima.

Bruxelas, 27 de abril de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  Albânia, Andorra, Antígua e Barbuda, Argentina, Austrália, Baamas, Barbados, Bósnia e Herzegovina, Brasil, Brunei, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Domínica, Salvador, Granada, Guatemala, Honduras, Hong Kong, Israel, Japão, Quiribáti, Macau, Macedónia, Malásia, Ilhas Marshall, Maurícia, México, Micronésia, Moldávia, Mónaco, Montenegro, Nova Zelândia, Nicarágua, Palau, Panamá, Paraguai, Peru, São Cristóvão e Neves, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Samoa, São Marinho, Sérvia, Seicheles, Singapura, Ilhas Salomão, Coreia do Sul, Taiwan, Timor-Leste, Tonga, Trindade e Tobago, Tuvalu, Emirados Árabes Unidos, Estados Unidos da América, Uruguai, Vanuatu, Estado da Cidade do Vaticano, Venezuela, cidadãos britânicos que não sejam nacionais do Reino Unido na aceção do direito da União.

(2)  O regime de isenção de vistos está atualmente a ser acordado ou negociado com a Ucrânia, a Geórgia, o Kosovo e a Turquia.

(3)  Trinta milhões de pedidos por ano.

(4)  Um milhão de pedidos por ano.

(5)  Três milhões de pedidos por ano.

(6)  Parecer sobre o «Sistema de Entrada/Saída» — Relator: Cristian Pîrvulescu (JO C 487 de 28.12.2016, p. 66).

(7)  COM(2015) 670

(8)  Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria um Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS) e altera os Regulamentos (UE) n.o 515/2014, (UE) 2016/399, (UE) 2016/794 e (UE) 2016/1624 [COM(2016) 731 final de 16 de novembro de 2016].

(9)  A Comissão Europeia estimou em cerca de 107 000 os números diários esperados, dos quais 5 % necessitam de processamento manual. Entre 3 % e 5 % desses casos poderiam ser resolvidos na unidade central, enquanto os restantes seriam orientados para as unidades nacionais.

(10)  SIS II, VIS, EES, Eurodac, ECRIS, Europol, bases de dados da Interpol (SLTD, TDAWN).

(11)  JO C 271 de 19.9.2013, p. 97.

(12)  Parecer 3/2017 da AEPD sobre a proposta de um Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem, de 6 de março de 2017.


28.7.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 246/34


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à Governação da União da Energia, que altera as Diretivas 94/22/CE, 98/70/CE, 2009/31/CE, os Regulamentos (CE) n.o 663/2009, (CE) n.o 715/2009, as Diretivas 2009/73/CE, 2009/119/CE do Conselho, 2010/31/UE, 2012/27/UE, 2013/30/UE e (UE) 2015/652 do Conselho, e revoga o Regulamento (UE) n.o 525/2013

[COM(2016) 759 final — 2016/0375/(COD)]

(2017/C 246/06)

Relator:

Brian CURTIS

Consulta

Parlamento Europeu, 16.1.2017

Conselho da União Europeia, 20.1.2017

Base jurídica

Artigos 191.o, 192.o e 194.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

11.4.2017

Adoção em plenária

26.4.2017

Reunião plenária n.o

525

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

103/0/1

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

A proposta de Regulamento relativo à Governação da União da Energia destina-se a criar o quadro global de funcionamento dos vários aspetos da União da Energia, assim como a estabelecer obrigações de comunicação claras e um processo que visa a consecução das metas da UE em matéria de clima e energia para o futuro próximo. Constitui um instrumento legislativo complexo, de grande alcance e de importância vital.

1.2.

Não será exagerado salientar que, sem um sólido processo de governação, a União da Energia desintegrar-se-á e as hipóteses de a UE respeitar os compromissos assumidos, nomeadamente ao abrigo do Acordo de Paris, serão substancialmente reduzidas. Para o êxito deste processo é fundamental o envolvimento e a participação da sociedade civil, a cooperação e o apoio dos Estados-Membros e a aceitação e o empenho dos parceiros sociais. Importa esclarecer que o regulamento promove uma transição energética justa, em especial em termos de emprego e de custo da energia para as famílias e para as empresas.

1.3.

O CESE apoia o regulamento relativo à governação proposto, pois concebe um quadro que permite aos Estados-Membros optar por vias menos onerosas para os seus planos nacionais em matéria de energia e clima, além de reduzir os riscos de ativos de infraestruturas não produtivos. Contudo, para que tal suceda, haverá que introduzir alterações ao regulamento. São necessárias medidas de apoio conexas que permitam construir um consenso social, a nível nacional, regional e local, quanto à melhor forma de fazer face aos efeitos técnicos e socioeconómicos de uma transição energética justa.

1.4.

A solidariedade e segurança energéticas são extremamente importantes e, embora representem um dos cinco principais domínios abrangidos pela obrigação de comunicação e avaliação no regulamento, cumpre consagrar especial atenção ao desenvolvimento de uma diplomacia e uma política energéticas claras e comuns junto de países terceiros.

1.5.

Se o regulamento relativo à governação não for reforçado, todo o conceito de União da Energia ficará ameaçado pelo enfraquecimento da legitimidade do mandato da UE para liderar a transição energética. Além disso, se não forem adotadas medidas concretas tendo em vista o envolvimento dos cidadãos e a responsabilização, corre-se o risco de agravar a imagem da UE enquanto entidade distante e tecnocrática.

1.6.

No artigo do regulamento respeitante às «definições» é necessário clarificar, designadamente, os seguintes termos: «objetivos», «metas», «contributo nacional», «consulta», «pobreza energética» e «regional».

1.7.

O regulamento deve indicar de forma clara que parte de uma perspetiva para além de 2030 e incluir o compromisso inequívoco da UE quanto à meta em matéria de emissões de gases com efeito de estufa (GEE) para 2050 e, idealmente, o seu novo compromisso internacional de neutralidade de emissões de GEE até 2050.

1.8.

Do anexo do regulamento devem constar valores de referência indicativos para 2030 (as melhores estimativas da Comissão) em termos de contributos nacionais dos Estados-Membros em matéria de energias renováveis e eficiência energética.

1.9.

O regulamento deve exigir aos Estados-Membros a consagração no direito nacional dos contributos acordados para 2030.

1.10.

O regulamento deve declarar, de forma inequívoca, que é da responsabilidade de cada Estado-Membro contribuir para as metas globais da UE, de forma adequada e proporcional.

1.11.

É de salientar que a informação fornecida pelos Estados-Membros deverá ser atualizada e referir-se ao período de comunicação, sendo que, para tal, será necessário garantir que se dispõe dos recursos e dos sistemas de apoio adequados.

1.12.

Os planos nacionais para 2030 devem ser elaborados com base nas indicações e orientações fornecidas pelas estratégias de longo prazo, a fim de retirar os maiores benefícios possíveis (por exemplo, as escolhas a médio prazo seriam mais eficientes em termos de custos caso fossem efetuadas em consonância com a estratégia a longo prazo).

1.13.

O regulamento deve prever uma disposição «de ajustamento» que funcione como um mecanismo em prol do ambicioso objetivo, acordado no quadro do Acordo de Paris, de um aquecimento não superior a 1,5oC em relação aos níveis da era pré-industrial.

1.14.

O anexo do regulamento deve conter uma «definição de referência» relativa à pobreza energética para permitir uma análise comparativa e coerente dos dados.

1.15.

O regulamento deve esclarecer, de forma inequívoca, que os Estados-Membros estão obrigados a publicar o respetivo projeto de plano nacional em matéria de energia e clima o mais atempadamente possível, e que todas as versões posteriores do plano, incluindo comentários e respostas da Comissão, dos parceiros regionais e dos Estados-Membros, serão do domínio público.

1.16.

Importa transmitir informações mais detalhadas sobre a avaliação da compensação das contribuições financeiras, a natureza da «plataforma de financiamento», e se esta poderá ser utilizada para alavancar financiamentos adicionais. Cabe alargar o âmbito de aplicação dos fundos por forma a incluir medidas de eficiência energética.

1.17.

A definição de cooperação «regional» não deverá ficar confinada à proximidade geográfica, mas abranger conjuntos de Estados com recursos energéticos complementares, incluindo países terceiros.

1.18.

O anexo deve conter disposições específicas relativas à natureza, extensão e recursos da consulta pública por forma a assegurar uma consciencialização e participação informada e coerente dos cidadãos em toda a UE.

1.19.

Há que considerar a hipótese de formação de uma Unidade Europeia em matéria de Informação Energética no seio da Agência Europeia do Ambiente (AEA).

1.20.

O cenário «Brexit» e o cenário «28» devem ser elaborados e discutidos ao mesmo tempo que se procede à avaliação dos contributos nacionais.

2.   Introdução

2.1.

A Europa enfrenta atualmente muitos desafios de ordem política, económica e técnica que afetam os cidadãos e que, nessa medida, moldam a natureza e o futuro da nossa democracia. Durante anos, a energia tem sido um domínio em que se movem poderosas forças políticas, económicas e técnicas. A União da Energia, com a sua perspetiva para o futuro e a sua estratégia integrada, constitui o principal instrumento da UE para garantir que a energia da Europa é segura, acessível e respeitadora do ambiente.

2.2.

Uma governação eficaz no domínio da União da Energia não consiste apenas no reforço da confiança dos consumidores e dos investidores, de forma a maximizar os benefícios com o menor custo possível — é também fundamental para demonstrar o compromisso assumido pela União relativamente à aplicação do Acordo de Paris e para permitir à UE suplantar as metas traçadas para 2050 em matéria de energia e clima. Por conseguinte, lograr um regulamento relativo à governação apropriado constitui uma oportunidade fulcral para a UE mostrar a sua importância aos cidadãos, aos Estados-Membros e ao mundo. Trata-se de um aspeto de particular relevância porque transcende a divisão entre o regime de comércio de licenças de emissão e o Regulamento Partilha de Esforços, fazendo com que os Estados-Membros procedam ao planeamento da descarbonização de toda a economia.

2.3.

Em abril de 2015, o CESE adotou um parecer exploratório, a pedido da Comissão Europeia, sobre o tema «Desenvolvimento do sistema de governação proposto no contexto do quadro para o clima e a energia em 2030» (1). Verificou-se, no que se refere ao período de intervenção, uma maior urgência de medidas em matéria de energia e de clima e a necessidade de adotar uma perspetiva de mais longo prazo no domínio da governação da transição hipocarbónica. O regulamento proposto estabelece os requisitos aplicáveis aos planos nacionais integrados em matéria de energia e clima e um processo simplificado para a sua criação e supervisão. Contudo, nos últimos dois anos, a confiança por parte dos cidadãos na liderança política e institucional e na coesão política da UE sofreu um sério revés, tornando o desafio da governação simultaneamente mais urgente e mais complexo.

2.4.

Além disso, o Acordo de Paris de dezembro de 2015 consubstanciou um acordo a nível mundial assinado de forma conjunta e solidária pela UE e os seus Estados-Membros, em que foram assumidos compromissos de contributos determinados a nível nacional, coincidentes com os estabelecidos no regulamento. Foi ainda acordada a prossecução de esforços no sentido de limitar o aumento da temperatura global a 1,5oC acima dos níveis da era pré-industrial — uma aspiração que exige um planeamento a longo prazo e metas exigentes suscetíveis de serem mais ambiciosas do que as até agora assumidas pela UE para o horizonte de 2050.

2.5.

No seu parecer de 2015, o CESE antecipou essa evolução e adotou uma abordagem pragmática, identificando a necessidade de promover uma educação, informação e participação abrangentes e aprofundadas dos cidadãos como condição essencial para o êxito de uma eventual proposta de governação. Constatam-se alguns sinais de que tal se verificou. A governação — em virtude das suas implicações em matéria de requisitos vinculativos no que se refere a medidas que são da competência nacional — constitui um domínio sensível, designadamente em relação à energia, pois as circunstâncias de cada Estado-Membro variam substancialmente. Além disso, esse processo deve ser complementado com medidas de caráter não legislativo a fim de garantir o seu êxito.

2.6.

Em 2001, a Comissão Europeia adotou um Livro Branco sobre a governação (2). Estabeleceu cinco princípios de boa governação que ainda são válidos (mas nem sempre aplicados):

Abertura

Participação

Responsabilização

Eficácia

Coerência

Todos eles refletem os princípios e valores defendidos pelo CESE, embora, no contexto do regulamento proposto, se devesse acrescentar um novo princípio, o da «transição justa».

2.7.

O sistema de governação deve igualmente permitir a permanente manifestação de pontos de vista, preferências, perceções e valores, assegurando um escrutínio contínuo das decisões e um ajustamento das políticas. A governação deve assegurar processos de decisão sólidos e legítimos, mas também permitir a adaptação dessas opções às circunstâncias nacionais e a acontecimentos imprevistos que possam ocorrer ao longo do tempo. Tal não implica constantes mudanças de orientação. Pelo contrário, significa que a orientação global está assegurada através do compromisso assumido quanto às metas de curto e de longo prazo, consonantes com a ciência climática, e de um processo estável de adoção de medidas destinadas a atingir essas metas – ou seja, maior coerência e uma abordagem inclusiva.

3.   Síntese da proposta da Comissão

3.1.

A proposta de regulamento relativo à governação, que visa assegurar a coerência, a complementaridade e uma ambição adequada das políticas e das medidas que integram a União da Energia, assenta em duas vertentes. A primeira visa simplificar e integrar mais adequadamente as obrigações em matéria de planeamento, de comunicação e de acompanhamento dos planos nacionais em matéria de energia e clima, assim como a elaboração do plano para 2050 e os subsequentes relatórios intercalares, com um acompanhamento integrado da Comissão a nível da UE. A segunda propõe um processo de governação política entre a Comissão e os Estados-Membros no que se refere à criação e execução dos planos nacionais. Se a proposta for aprovada tal como apresentada — uma nova medida legislativa e a revisão do direito derivado atualmente em vigor — representará um novo mecanismo de cooperação entre os Estados-Membros e a Comissão.

3.2.

No seu conjunto, o regulamento proposto proporciona uma base legislativa que integra ou revoga mais de 50 obrigações individuais de planeamento, comunicação e acompanhamento em vigor relativas ao acervo em matéria de energia e clima (integração de 31 e revogação de 23). É aplicável a cinco dimensões da União da Energia: solidariedade e segurança energéticas, mercado da energia, eficiência energética, descarbonização e investigação, inovação e competitividade. Define mais detalhadamente o teor dos planos nacionais integrados em matéria de energia e clima, que são exigidos a cada Estado-Membro, a partir de janeiro de 2019, e, posteriormente, de 10 em 10 anos, e que devem abranger estas cinco dimensões. Exige-se uma consulta pública e a cooperação a nível regional, bem como com uma atualização do primeiro plano e dos subsequentes, efetuada de cinco em cinco anos. Os resultados mais significativos são os contributos nacionais no domínio das energias renováveis e da eficiência energética, assim como a elaboração de planos para o horizonte de 2050 em matéria de descarbonização da economia.

3.3.

Está prevista uma avaliação por parte da Comissão dos planos, atualizações e consequentes medidas adotadas pelos Estados-Membros na sequência das recomendações da Comissão. É criado um mecanismo detalhado de comunicação bienal, que deverá ser aplicado pelos Estados-Membros, com requisitos pormenorizados em matéria de políticas, medidas e projeções referentes aos gases com efeito de estufa, medidas nacionais de adaptação, apoio financeiro e tecnológico prestado aos países em vias de desenvolvimento, receitas provenientes do leilão, energias renováveis, eficiência energética, segurança energética, mercado interno da energia e investigação, inovação e competitividade. É proposta uma plataforma de comunicação eletrónica para a apresentação dos referidos relatórios.

3.4.

O regulamento integra cláusulas detalhadas sobre avaliação e acompanhamento, bem como um mecanismo de recomendação e reação a aplicar quando se considerar haver poucos progressos ou fraca ambição. A introdução de um quadro alargado e obrigatório aplicável aos planos nacionais em matéria de energia e clima contribui para assegurar a coerência e permite comparações. Exige-se que os Estados-Membros disponibilizem uma contribuição financeira para uma plataforma de financiamento destinada a cobrir eventuais défices em matéria de metas de referência acordadas para as energias renováveis. O relatório anual sobre o estado da União da Energia apresentará relatórios completos sobre estes domínios. A Agência Europeia do Ambiente desempenha um papel específico e de grande alcance na assistência prestada à Comissão.

3.5.

O regulamento é complementar e está em consonância com o Semestre Europeu e, sempre que pertinente para a realização de reformas macroeconómicas ou estruturais, as questões específicas de política energética ou climática continuarão a poder ser abordadas através das recomendações específicas por país no quadro do processo do Semestre Europeu.

4.   Observações na generalidade e na especialidade

4.1.    Objetivos, metas e contributos

4.1.1.

O regulamento relativo à governação fornece um quadro detalhado aplicável aos planos nacionais em matéria de energia e clima e um subsequente processo de comunicação, avaliação e ajustamento. Gira em torno da definição de objetivos, do acompanhamento das metas e da consecução dos contributos. Contudo, não se encontra uma definição destes termos no «Artigo 2.o — Definições», lacuna que deverá ser colmatada.

4.1.2.

O CESE apoia e subscreve os quadros detalhados apresentados no anexo I aplicáveis aos planos nacionais em matéria de energia e clima obrigatórios. Substituem os diferentes planos em matéria de eficiência energética e de energias renováveis. É particularmente relevante a obrigação de cada Estado-Membro definir os contributos nacionais nestas áreas, os quais, quando considerados em conjunto, deverão atingir, no mínimo, as metas globais acordadas a nível da UE.

4.1.3.

Em pareceres anteriores o CESE sempre defendeu veementemente a estipulação de metas nacionais vinculativas (3), e fê-lo na sequência dos muitos falhanços das políticas energéticas que se devem à sua deficiente implementação. Se os contributos previstos nos planos nacionais em matéria de energia e clima forem rigorosamente aplicados, adaptados e cumpridos, poderá obter-se um resultado equivalente à estipulação de metas vinculativas. No entanto, para que tal se concretize é necessário corrigir determinadas falhas da presente proposta.

4.1.4.

As bases de referência para os contributos nacionais em matéria de eficiência energética e de energias renováveis são os compromissos acordados para 2020 já indicados pelos Estados-Membros. Porém, o regulamento ficaria reforçado se previsse valores de referência indicativos para 2030 no que se refere aos contributos dos Estados-Membros. Esses valores terão de ser determinados, em qualquer caso, como uma base para o diálogo de ajustamento e contribuirão para o aceleramento do processo iterativo previsto se apresentados e tornados públicos numa fase inicial.

4.1.5.

Alguns países integraram as suas metas energéticas para 2020 na legislação nacional. O CESE considera que o regulamento devia exigir aos Estados-Membros a consagração na legislação nacional dos seus contributos para 2030 por forma a reforçar o peso das metas através de imperativos legislativos. No entanto, a experiência tem revelado que as obrigações legais também não garantem necessariamente a obtenção de resultados, razão pela qual o CESE sublinha a importância da boa governação enquanto processo estável que visa assegurar uma evolução positiva. Mais abaixo, será dada particular ênfase à relevância de disposições reforçadas destinadas a permitir e a garantir o envolvimento das partes interessadas na governação.

4.1.6.

Para reforçar a importância dos «contributos» nacionais, tanto no domínio da eficiência energética como no das energias renováveis, o regulamento deve esclarecer que é da responsabilidade de cada Estado-Membro contribuir para as metas globais da UE de forma adequada e proporcional. Atualmente esta obrigação constitui uma responsabilidade coletiva.

4.2.    Processo de comunicação

4.2.1.

O CESE saúda o processo de comunicação exigido aos Estados-Membros e o importante papel que cabe à Comissão, com a colaboração da Agência Europeia do Ambiente, na análise das referidas comunicações. Uma análise rigorosa, firme e corajosa é essencial para que os pareceres e as recomendações da Comissão sejam aplicados. É também fulcral que as informações transmitidas sejam atualizadas e pertinentes para o período de comunicação, tal como frisado no parecer do CESE sobre o «Estado da União da Energia — 2015» (4).

4.2.2.

Apesar de as informações exigidas no processo de comunicação estarem em consonância com as informações necessárias no quadro do Acordo de Paris sobre as alterações climáticas, as atualizações dos planos nacionais em matéria de energia e clima surgem antes da realização do balanço global do Acordo de Paris, que ocorre ao fim de cinco anos, circunstância que pode vir a atrasar significativamente uma resposta a qualquer «atualização» dos contributos determinados a nível nacional. Esta situação compromete de forma inaceitável o alinhamento da governação, em virtude de a UE já ter assinado o Acordo de Paris. Deve aproveitar-se a oportunidade para assegurar a calendarização adequada da revisão dos contributos determinados a nível nacional da ONU e da UE.

4.2.3.

Neste contexto, o regulamento deve integrar uma disposição «de ajustamento» que funcione como um mecanismo em prol do ambicioso objetivo de um aquecimento não superior a 1,5oC em relação aos níveis da era pré-industrial. Tal poderia concretizar-se através de um processo de adoção de «orçamentos carbono» em 5-10 fases nos quais a UE se compromete a alcançar a neutralidade de emissões de GEE até 2050.

4.2.4.

O regulamento exige que os planos nacionais em matéria de energia e clima integrem, entre outras, uma avaliação do impacto social e, em termos específicos, objetivos nacionais em matéria de pobreza energética, bem como um programa de ação. Trata-se de uma matéria que o CESE considera de especial relevância, pelo que se congratula com a sua inclusão no regulamento. Porém, os planos nacionais em matéria de energia e clima podem determinar a sua própria definição de pobreza energética, o que impossibilita a comparação de dados entre os Estados-Membros, comprometendo, por conseguinte, as hipóteses de a UE fazer uma transição justa, e aumenta as probabilidades de a opinião pública se opor ao próprio processo de transição. Por conseguinte, recomenda-se que o regulamento inclua uma definição de referência simples. Os Estados-Membros não estão obrigados a adotá-la para efeitos internos, mas esta estabeleceria um critério em relação ao qual os planos nacionais em matéria de energia e clima devem prestar informações. Como exemplo de definição, indica-se a seguinte: «verifica-se pobreza energética quando um agregado gasta mais do que 10 % do rendimento disponível em energia para efeitos de aquecimento e arrefecimento a um nível de temperatura adequado.» Esta definição permitiu a alguns países avaliar o seu progresso — ou a ausência dele — no combate à pobreza energética. No entanto, como este problema abarca múltiplos fatores, a definição poderá requer a inclusão de outros elementos.

4.3.    Transparência, responsabilização e aplicação

4.3.1.

O Comité observa que, no passado, muita da legislação em matéria de energia sofreu atrasos e incorreções, tanto na sua transposição como na sua execução. Por conseguinte, os Estados-Membros devem envidar todos os esforços, num espírito de solidariedade e de compromisso, para colocar a vontade política e os recursos administrativos ao serviço da efetiva implementação do regulamento. O calendário é excecionalmente exigente. Os projetos de planos nacionais em matéria de energia e clima — previamente sujeitos a um efetivo processo de consulta e de diálogo a nível regional — terão de ser transmitidos à Comissão até 1 de janeiro de 2018. Isto implica que os planos nacionais em matéria de energia e clima e os respetivos diálogos com as partes interessadas e os parceiros regionais já estão em curso. O CESE congratula-se com o facto de as exigências de um novo quadro e de novas metas para o período de 2020-2030 estarem a orientar este processo, mas receia que, sem uma verdadeira compreensão e participação por parte dos cidadãos, a legitimidade da política energética da UE possa ficar comprometida, em especial entre os consumidores que se deparam com o aumento dos preços da energia.

4.3.2.

O processo de governação contemplado não prevê sanções explícitas para as situações de fraca ambição ou de não cumprimento das metas. Transparência e responsabilização são fatores essenciais se se pretende que as partes interessadas, em especial os cidadãos, influam neste processo. Nessa medida, o CESE sugere a criação de um organismo independente representativo das partes interessadas por forma a garantir a sua consulta e representação em cada Estado-Membro, e que esse organismo proceda à publicação de um relatório anual sobre o processo de governação e o diálogo conexo (ver ponto 4.6).

4.3.3.

A transparência é frequentemente mencionada no regulamento, mas o CESE receia que não seja claro se a publicação prévia e o acesso do público a cada fase de execução dos planos nacionais em matéria de energia e clima são obrigatórios. Do preâmbulo consta uma referência — embora não no articulado do regulamento — à Convenção de Aarhus, mas o Comité considera-a inapropriada. O regulamento deve esclarecer, de forma inequívoca, que os Estados-Membros estão obrigados a publicar o respetivo projeto de plano nacional em matéria de energia e clima o mais atempadamente possível, e que todas as versões posteriores do plano, incluindo comentários e respostas da Comissão, dos parceiros regionais e dos Estados-Membros, serão do domínio público.

4.3.4.

Tendo em conta a importância do processo de transição para as energias renováveis, exige-se uma maior clareza sobre a natureza e o funcionamento da «plataforma de financiamento» (artigo 27.o) e de que forma essa contribuição financeira será transferida no caso de eventuais défices em matéria de fornecimento de energias renováveis. Por exemplo, será que se pretende que essa plataforma contribua para a alavancagem de fundos do setor privado com base nos «contributos» dos Estados-Membros? Sugere-se que os recursos financeiros reunidos nessa plataforma sejam aplicados em medidas de eficiência energética e de fornecimento de energias renováveis.

4.3.5.

Subsiste alguma incerteza sobre a forma de garantir a observância das recomendações da Comissão, subsequentes ao processo anual de comunicação, no caso de não serem rapidamente aplicadas pelos Estados-Membros. No caso de se optar pelo habitual processo de infração, a questão que se coloca é se este, por ser demasiado moroso, se revelará eficaz dentro dos prazos definidos.

4.4.

O CESE apoia totalmente as disposições em matéria de cooperação regional obrigatória entre os Estados-Membros destinadas a tornar mais eficazes e eficientes as medidas e a promover a integração do mercado e a segurança energética. Porém, considera que o termo «regional» deve ser visado no artigo 2.o (definições), para permitir à Comissão sugerir e reforçar o empenho, quando este não exista. Atualmente, é possível que o termo «regional» seja entendido como intraestatal (e não interestatal) e que o termo «região» seja definido, em termos geográficos, por oposição ao conceito de um «conjunto de Estados» com recursos energéticos complementares.

4.5.

O CESE manifesta, em particular, o seu desapontamento quanto à inadequação e especificidade do artigo 10.o sobre a consulta pública, que fica muito aquém da proposta do CESE para um Diálogo Europeu alargado sobre a Energia (DEE) — diálogo esse que poderia fazer chegar a mensagem aos cidadãos/consumidores, de forma direta e coerente, e fomentar uma educação e participação de base num processo que, em muitos Estados-Membros, será de difícil aceitação. Esse diálogo é demasiado importante para que seja abordado, se o for, ao abrigo de «medidas não legislativas», e deveria ser-lhe dado corpo através de uma cláusula adicional ao artigo 10.o. Este artigo também não respeita a Diretiva sobre Avaliação Ambiental Estratégica que estipula as normas para uma governação ambiental transparente e participativa, em que é fundamental o planeamento em matéria de energia e clima.

4.6.

Nessa medida, reitera-se que, na opinião do CESE, o processo de governação previsto neste regulamento será insuficiente para proporcionar os contributos determinados a nível nacional sem o envolvimento e o apoio da sociedade civil europeia. Para obter a confiança e o empenho dos cidadãos, esse diálogo deverá ser independente dos governos e do processo de implementação dos planos nacionais em matéria de energia e clima. Deverá centrar-se na informação dos consumidores, ajudar os fornecedores de energia a empenharem-se e a fortalecerem a confiança e ainda constituir um canal de comunicação das diversas preocupações dos diferentes grupos em matéria de segurança energética, acessibilidade e sustentabilidade. O CESE manifestou a sua vontade em desempenhar um papel neste processo, que designou DEE, através da organização e participação em determinados aspetos das consultas nacionais realizadas. No entanto, é necessário que esse diálogo assente em recursos mais alargados e num compromisso nacional mais abrangente. Sintetizando, serão necessárias as seguintes medidas:

instauração de um mecanismo com vista a criar um fundo de financiamento independente e objetivo, alimentado principalmente pelas partes interessadas de toda a cadeia de produção e abastecimento de energia, completado pelo devido apoio da UE e dos governos nacionais. Em geral, o DEE será uma maneira altamente eficaz, em termos de custos, de levar todos os tipos de consumidores a empenharem-se na modulação energética, mas também de reconhecer e estimular o contributo dos «prosumidores»;

paralelamente à orientação prestada sobre a estrutura dos planos nacionais, o DEE, em consulta com a Comissão e todas as principais partes interessadas, elaborará orientações para o estabelecimento de diálogos nacionais sobre a energia;

será criada uma entidade de coordenação do DEE totalmente independente para promover a adoção de medidas e a sua implementação em cada Estado-Membro. Esta entidade deverá contribuir, nomeadamente, para a necessária revisão por parte da Comissão do teor e ambição dos planos nacionais, assim como para a sua implementação. Pretende-se assim, realçar o contributo das partes interessadas no processo de formulação das políticas e satisfazer o requisito de consulta efetiva previsto no regulamento;

terão lugar debates sobre os planos nacionais e discussões realizadas a nível regional com grupos de diálogo europeu sobre a energia de países vizinhos, seguidos de debates a nível da UE entre todos os grupos de diálogo sobre a energia. Esses debates, promovidos através da entidade de coordenação independente, devem ter por objetivo aconselhar as instituições da UE e melhorar a eficácia, em termos de custos, das políticas da UE e nacionais.

4.7.

O CESE propõe a criação de uma Unidade Europeia de Informação Energética no seio da Agência Europeia do Ambiente, responsável pela recolha de dados e processos de avaliação relacionados com o regulamento relativo à governação, que deverá trabalhar em estreita colaboração com o observatório europeu sobre pobreza energética proposto e prestar serviços de informação ao Diálogo Europeu sobre Energia a nível nacional.

4.8.

A segurança energética constitui um dos cinco principais domínios em matéria de comunicação e de avaliação constantes do regulamento e requer, em particular, um diálogo alargado a nível regional. O Comité já observou que a UE precisa de uma política e de uma diplomacia claras e partilhadas em matéria de energia em relação a países terceiros (5). A segurança e a solidariedade energéticas são entendidas pela Comissão como o primeiro pilar de uma União da Energia comum, mas tal não será alcançado sem a celebração de acordos e parcerias sólidas com os principais atores mundiais e sem uma política energética comum.

4.9.

O CESE está preocupado com o impacto do «Brexit» no processo de governação. Em primeiro lugar, o processo previsto no regulamento ainda considera o Reino Unido como Estado-Membro da UE e os contributos determinados a nível nacional serão avaliados com base nesse pressuposto. Os planos nacionais em matéria de energia e clima finais serão determinados antes da saída formal do Reino Unido da UE, mas neste momento poderão ser necessários importantes ajustamentos para ter em conta a retirada dos contributos determinados a nível nacional do Reino Unido do contributo global da UE. O CESE sugere que a Comissão desenvolva um cenário «Brexit» juntamente com o cenário «28» e que ambos sejam discutidos em paralelo. Em segundo lugar, a saída do Reino Unido poderia ter um impacto significativo no equilíbrio político e na estratégia diplomática pertinentes para cada uma das cinco categorias do âmbito de aplicação do regulamento, em especial para a segurança energética.

Bruxelas, 26 de abril de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  JO C 291 de 4.9.2015, p. 8.

(2)  COM(2001) 428 final.

(3)  JO C 424 de 26.11.2014, p. 39, e JO C 75 de 10.3.2017, p. 103.

(4)  JO C 264 de 20.7.2016, p. 117.

(5)  JO C 264 de 20.7.2016, p. 117.


28.7.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 246/42


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2012/27/UE relativa à eficiência energética»

[COM(2016) 761 final — 2016/0376/(COD)]

(2017/C 246/07)

Relator:

Mihai MANOLIU

Consulta

Conselho, 9.12.2016

Parlamento Europeu, 12.12.2016

Base jurídica

Artigo 194.o, n.o 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

11.4.2017

Adoção em plenária

26.4.2017

Reunião plenária n.o

525

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

115/1/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

É necessário que os cidadãos europeus participem ativamente na promoção da eficiência energética, tomem a iniciativa e cooperem no âmbito de projetos comuns e colaborem para eliminar os obstáculos de ordem económica, administrativa e regulamentar. O objetivo comum deve consistir em realizar as metas pós-COP 21, tirando partido dos numerosos benefícios que daí resultam: novos investimentos (renovação de edifícios, melhoria do conforto, leitura de contadores eficaz e justa) suscetíveis de criar emprego, diminuição do nível de pobreza energética, redução da poluição, melhoria da saúde pública e, ainda, redução da dependência das importações de energia. O CESE apela aos Estados-Membros para que se empenhem mais firmemente na aplicação da Diretiva Eficiência Energética, uma vez que os novos objetivos propostos para 2030 são mais ambiciosos do que os definidos para 2020.

1.2.

A eficiência energética é extremamente importante para o futuro do sistema energético europeu. Aumentar a eficiência energética, em todos os âmbitos de utilização da energia, pode ser um meio poderoso de redução de custos para a economia europeia, e o princípio da eficiência energética pode tornar-se um fator de melhoria da acessibilidade financeira. Este princípio torna necessário reduzir a procura de infraestruturas auxiliares, extremamente onerosas. As obrigações em matéria de economias de energia são coerentes com o desenvolvimento sustentável (situação duradoura e segura), mas importa utilizar as sinergias para apoiar uma transição eficaz para um sistema energético inteligente, resiliente e hipocarbónico (sistemas de distribuição transregionais, gestão da procura, sistemas de armazenamento).

1.3.

O CESE toma nota da proposta da Comissão para se alcançar um objetivo vinculativo de eficiência energética de 30 % para 2030, mas considera que a iniciativa de fixar um objetivo superior a 27 % deve ser devidamente justificada, destacando os benefícios económicos e o nível de investimento necessário para alcançar estes objetivos. É da máxima importância que a avaliação de impacto tenha em consideração o conjunto de medidas referidas pelos pacotes legislativos em matéria de energia e de clima.

1.4.

O CESE solicita que, para eliminar os principais obstáculos à aplicação do artigo 7.o da Diretiva Eficiência Energética, se aumente o grau de sensibilização dos consumidores finais através de atividades de promoção e comunicação sobre os sistemas de eficiência energética, bem como de medidas alternativas. É necessário realizar investimentos adicionais e cada Estado-Membro deverá investir em medidas credíveis de informação, comunicação, educação e assistência que incentivem os cidadãos e as empresas, de forma a acelerar a concretização do objetivo político em matéria de clima e de eficiência energética.

1.5.

O CESE apela aos Estados-Membros para que prestem mais atenção aos agregados familiares afetados pela pobreza energética e às habitações sociais, para os quais convém reduzir de forma sustentável os custos da energia. Um outro objetivo importante neste contexto é melhorar a eficiência energética do parque dos edifícios residenciais e estabelecer normas mínimas para as habitações arrendadas (auditorias energéticas).

1.6.

O CESE assinala a importância de educar o consumidor final em matéria de técnicas de produção combinada de energia elétrica e térmica (cogeração, climatização), de medição inteligente do consumo e de planos de renovação. Esta ação é fundamental para incentivar os investidores, as autoridades públicas e as empresas, incutindo-lhes a confiança necessária para que realizem projetos com grande potencial de eficiência e participem no financiamento da investigação e do desenvolvimento.

1.7.

O CESE espera que as disposições que definem os instrumentos financeiros europeus (empréstimos, garantias, capital próprio para atrair fundos, subvenções) gerem e atraiam financiamentos privados destinados a projetos energéticos. Importa não negligenciar a componente das subvenções para os projetos com forte impacto social. Tais regimes financeiros devem ser concedidos a projetos destinados a consumidores com baixos rendimentos. Preconiza-se a elaboração, para os planos nacionais, de orientações em matéria de transparência e de comparabilidade. O CESE considera necessário apoiar prioritariamente os agregados familiares afetados pela pobreza energética, assegurando-se, assim, um quadro político estável a longo prazo para os Estados-Membros alcançarem um desenvolvimento local sustentável.

1.8.

O CESE entende que este dispositivo poderá ser realizado através de uma assistência técnica para a aplicação da Diretiva Eficiência Energética, graças a sistemas de financiamento inovadores baseados no mercado. No que se refere à concessão de incentivos financeiros, um elemento quantitativo importante é a auditoria energética (definição de PME, eliminação da dupla certificação, adoção de uma abordagem uniforme ao limiar de minimis alargado), que constitui um instrumento para aumentar a eficiência energética e uma vantagem em termos de competitividade. Importa igualmente adotar uma abordagem correta em matéria de garantia da qualidade e de programas nacionais de formação para os fornecedores de serviços de eficiência energética.

1.9.

O CESE recomenda que, a fim de aumentar a eficiência energética para os consumidores, sejam realizadas, a nível nacional, análises de custo-benefício, que contribuirão para reduzir os custos.

1.10.

O CESE solicita a adoção de uma abordagem global e a melhoria da eficiência energética em todo o sistema de transportes, com base nos progressos contínuos da tecnologia dos veículos e dos sistemas de propulsão, através da transição para modos de transporte eficientes do ponto de vista energético e sistemas de transporte inteligentes (STI) de modo a reforçar a taxa de utilização das capacidades disponíveis. A aplicação desta abordagem deve ser igualmente prevista para a aviação e os transportes marítimos. Os utilizadores devem ser informados do consumo de combustível associado a cada modo de transporte, incluindo os limites correspondentes de emissões de CO2.

2.   Observações na generalidade

2.1.

O CESE concorda que dar prioridade à eficiência energética é um elemento essencial da União da Energia e congratula-se por a proposta de alteração pretender aplicar este princípio: «A energia mais barata, mais limpa e mais segura é a que não é, de todo, consumida. A eficiência energética é […] uma das formas mais eficazes, em termos de custos, de apoiar a transição para uma economia hipocarbónica e gerar crescimento, emprego e oportunidades de investimento».

2.2.

No entanto, se o objetivo em matéria de eficiência energética foi fixado em 20 % para 2020, vários objetivos quantificáveis foram analisados para o horizonte de 2030 (entre 27 % e 40 %). O mais ambicioso consta da resolução do Parlamento Europeu, que apelou para um objetivo vinculativo de 40 %. Após uma análise dos benefícios obtidos em termos de emprego e crescimento económico, de segurança do aprovisionamento, de redução das emissões de gases com efeito de estufa, de saúde e ambiente, a Comissão propôs um objetivo vinculativo de eficiência energética de 30 %. Neste contexto, o CESE considera que é da máxima importância analisar cuidadosamente o impacto que os objetivos quantificáveis em matéria de eficiência energética terão nos outros objetivos fixados nas propostas legislativas relativas à energia e, em particular, no regime de comércio de licenças de emissão da União Europeia (RCLE-UE).

2.3.

Para atingir estes objetivos mobilizadores, os Estados-Membros — com a ajuda dos conselhos económicos e sociais dos diferentes países –, bem como os fornecedores e distribuidores de energia terão de tomar a medida fundamental de realizar economias de energia de 1,5 % por ano. O CESE entende que se justifica prorrogar a obrigação de economizar energia após 2020, mantendo a taxa de 1,5 % por ano, por meio de regimes de obrigação e de medidas alternativas flexíveis, a nível dos Estados-Membros, no que diz respeito ao cumprimento das obrigações de economia de energia.

2.4.

A nova abordagem, que o CESE apoia igualmente, proporciona aos Estados-Membros e aos investidores, uma perspetiva de longo prazo, que lhes permite definir as suas estratégias e planificar investimentos, a fim de alcançar o objetivo fixado a nível da UE, através da execução de políticas específicas a nível nacional e regional, que resultará em múltiplos benefícios até 2030, nomeadamente redução do consumo de energia de 17 % (em comparação com 2005), dinâmica no crescimento económico conduzindo a um aumento do PIB de 0,4 %, redução dos preços da eletricidade para uso doméstico e industrial (de 161 para 157 euros/MWh), criação de oportunidades de negócio e postos de trabalho adequados, redução da poluição e controlo dos efeitos nefastos na saúde (com custos reduzidos de 4,5 a 8,3 mil milhões de euros) e melhoria na segurança energética (redução das importações de gás em 12 % em 2030).

2.5.

No entender do CESE, a informação dos principais intervenientes no mercado da energia, o fornecimento aos agregados familiares e aos consumidores industriais de informações pertinentes, claras e concisas sobre o seu consumo, bem como o reforço dos seus direitos legítimos de contagem (leitura à distância dos contadores) e faturação do consumo de energia, nomeadamente para a energia térmica, constituem elementos essenciais. Convém não esquecer os consumidores vulneráveis que, graças à diminuição das suas faturas de energia, deverão conhecer um aumento do seu conforto e nível de vida.

2.6.

No entanto, para proteger os consumidores vulneráveis também é necessário que a diretiva não preveja a imposição de contadores individuais nos países em que a lei obriga os proprietários à assunção dos custos de energia do locatário, especialmente porque esta legislação em matéria de arrendamento incentiva bastante os proprietários a renovações para fins de eficiência energética. Cumpre igualmente salientar o facto de que, em alguns Estados-Membros, muitos dos contadores individuais recém-instalados em conformidade com a legislação da UE em vigor, têm uma duração de vida útil que vai muito além de 2027, o prazo fixado pela Comissão para a sua substituição por dispositivos de leitura à distância. Os consumidores da UE podem considerar a substituição destes contadores como um custo adicional desnecessário, o que, por conseguinte, deve ser evitado.

2.7.

O CESE considera essencial reforçar os aspetos sociais da eficiência energética e combater a precariedade e a pobreza energética, especialmente no caso de consumidores vulneráveis. Os Estados-Membros devem dar mais atenção às medidas sociais. A aplicação da diretiva constitui um fator essencial de bem-estar.

2.8.

Importa não esquecer que os objetivos de eficiência energética estão associados aos objetivos em matéria de clima, na medida em que ambos visam a redução das emissões de gases com efeito de estufa. É indispensável conduzir políticas que aumentem a intensidade e o ritmo a que as novas tecnologias são adotadas. Estas gerarão poupanças de energia nos transportes, na indústria e nos edifícios, bem como nos agregados familiares. Em última análise, nos termos do artigo 7.o da proposta de diretiva (economias reais de energia, medidas concretas de eficiência energética), as novas tecnologias representarão para os Estados-Membros uma forma economicamente eficiente de cumprir os objetivos nacionais do regime de comércio de licenças de emissão da União Europeia (RCLE-UE) e da Decisão Partilha de Esforços.

2.9.

No que diz respeito à legislação sobre eficiência energética atualmente em vigor, o Parlamento Europeu constata o seguinte: « A diretiva relativa à eficiência energética, ainda que aplicada de forma inadequada, cria um quadro para proporcionar a poupança energética; legislações concorrentes entre si obstaculizam êxitos em matéria ecológica, geram burocracia e encarecem os custos energéticos; é necessária mais coerência por parte da legislação em matéria de energia; mais eficiência energética — mais emprego e crescimento».

2.10.

Neste contexto, o CESE está convicto de que a nova proposta legislativa em matéria de eficiência energética terá em conta o presente parecer, bem como as medidas propostas pelo Parlamento Europeu.

3.   Observações na especialidade

3.1.    Base jurídica, subsidiariedade e proporcionalidade

3.1.1.

O artigo 194.o, n.o 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), em conjugação com a Diretiva 2012/27/UE, constitui a base jurídica das medidas no domínio da energia. Por conseguinte, uma diretiva de alteração constitui o instrumento adequado.

3.1.2.

O CESE considera que, até hoje, os objetivos de eficiência energética não puderam ser alcançados, devido ao facto de os Estados-Membros terem agido de forma independente. Uma ação coordenada a nível da UE é necessária para apoiar as atividades a nível dos Estados-Membros. Os problemas energéticos suscitam desafios políticos, económicos (mercado interno, desenvolvimento, investimentos, regulamentação) e sociais (consumo de energia, questões pautais, precariedade, emprego), bem como problemas de segurança do aprovisionamento energético. Importa, além disso, não descurar as dificuldades ligadas às alterações climáticas.

3.1.3.

O CESE insiste em realçar a necessidade de respeitar o princípio da subsidiariedade e de manter a flexibilidade no que se refere aos componentes do cabaz energético e das medidas nesta matéria, de forma a realizar as economias que os Estados-Membros se comprometeram voluntariamente a atingir até 2030.

3.2.    Execução, acompanhamento, avaliação e apresentação de relatórios

3.2.1.

Diferentes níveis de redução da energia primária foram avaliados comparativamente à base de referência de 2007 e, para a formulação do objetivo, foi analisado o consumo de energia primária e final, numa perspetiva de economia de energia ou de intensidade energética. Os resultados dos debates revelaram que a maioria das partes interessadas mostraram-se favoráveis a que o objetivo para 2030 seja fixado em 30 %.

3.2.2.

Com base nas análises, as opções preferidas são as seguintes:

para o artigo 7.o, que diz respeito à obrigação de economizar energia, foi preferida a opção 3 (prorrogação do artigo 7.o até 2030, simplificação e atualização);

para os artigos 9.o a 11.o, sobre as disposições relativas à contagem e faturação, foi selecionada a opção 2 (clarificação e atualização, incluindo a consolidação de certas disposições a fim de reforçar a coerência com a legislação do mercado interno da energia).

3.2.3.

Uma das principais conclusões sobre o impacto social: cada investimento de 1,2 milhões de euros no domínio da eficiência energética cria diretamente cerca de 23 postos de trabalho no setor.

3.2.4.

No que diz respeito à redução das despesas com combustível através de medidas de eficiência energética para as pessoas que se encontrem em situação de precariedade energética, prevê-se um resultado positivo, que poderia ajudar a resolver alguns dos problemas associados à exclusão social.

3.2.5.

O CESE congratula-se com o facto de que a proposta de alteração da diretiva terá um impacto positivo sobre as PME, graças a disposições específicas, a regimes de apoio (mecanismos para a cobertura dos custos das auditorias energéticas) e a programas que as incentivem a submeter-se a auditorias energéticas. Graças à renovação dos edifícios, bem como à prorrogação da aplicação do artigo 7.o até 2030, as pequenas empresas de construção poderão beneficiar de novas oportunidades de negócio. Os contratos de desempenho energético celebrados com os fornecedores de energia serão também um incentivo para as empresas de serviços energéticos que, em muitos casos, são PME.

3.2.6.

O CESE considera igualmente que as medidas relativas à contagem e faturação do consumo de energia conduzirão à clarificação e atualização das disposições em vigor para ter em conta os progressos tecnológicos, tratando-se de dispositivos de medição à distância do consumo térmico (aquecimento, climatização). Além disso, as informações relativas ao consumo de energia serão corretas, individualizadas e disponíveis com maior frequência, em conformidade com as políticas nacionais em matéria de energia.

3.2.7.

Embora o seu período de vigência seja prorrogado, a proposta, do ponto de vista orçamental ou administrativo, não acarretará custos adicionais para as autoridades públicas dos Estados-Membros, uma vez que estas já implementaram medidas e estruturas adequadas. Os custos associados às medidas no âmbito dos regimes de obrigação de eficiência energética serão repercutidos nos clientes finais. Estes últimos beneficiarão de faturas energéticas reduzidas devido a um menor consumo de energia. A proposta não tem qualquer incidência financeira no orçamento da União Europeia.

3.2.8.

A nova governação energética garantirá a criação de um sistema flexível e transparente de análise, de planeamento, de elaboração de relatórios e de acompanhamento, de acordo com os planos nacionais integrados em matéria de energia e alterações climáticas. Permitirá acompanhar os progressos realizados na aplicação dos planos nacionais no sentido da realização de objetivos em matéria de eficiência energética, bem como do objetivo geral da UE. Este dispositivo assentará no acompanhamento de indicadores de sucesso conformes com a opção preferida: a transposição e implementação corretas, incremento dos progressos na realização dos objetivos, disponibilização de mais informação aos consumidores, redução dos encargos administrativos e relatórios mais circunstanciados sobre as economias realizadas.

3.3.    Observações sobre as disposições específicas da proposta de alteração da diretiva

3.3.1.

O objetivo indicativo de 27 % foi substituído por um objetivo vinculativo de 30 % a nível da UE. Cabe a cada Estado-Membro definir um objetivo em termos de eficiência energética para 2020, baseado no consumo de energia final e primária. A Comissão avaliará os progressos, analisando todos os objetivos comunicados, a fim de determinar os progressos realizados no sentido da realização do objetivo a nível da UE. No caso de a UE não estar no bom caminho para atingir este objetivo, a Comissão pode propor medidas adicionais. O processo de avaliação será definido em pormenor no âmbito da governação da União da Energia.

3.3.2.

Cumpre aos Estados-Membros a obrigação de estabelecer uma estratégia a longo prazo para a mobilização de investimentos na renovação do parque imobiliário nacional. O parágrafo em que figura esta disposição será retirado da Diretiva relativa à eficiência energética (Diretiva 2012/27/UE) e aditado à Diretiva relativa ao desempenho energético dos edifícios (Diretiva 2010/31/UE). O CESE considera que esta última representa um instrumento muito importante para atingir os objetivos propostos pela União Europeia, pois os edifícios são responsáveis pelo maior consumo de energia na Europa (mais de 40 % de energia final).

3.3.3.

O CESE entende que o conceito de cogeração assume uma importância decisiva, garantindo a produção simultânea, na mesma instalação (por um gerador com uma turbina a vapor ou por um motor de combustão interna, etc.), de energia elétrica e térmica, sob a forma de água quente, vapor ou líquido de arrefecimento. A cogeração de alta eficiência pressupõe que a produção combinada garanta economias de energia primária de pelo menos 10 % em comparação com os valores de referência da energia elétrica e energia térmica que seriam produzidas separadamente. Ao contrário das centrais elétricas convencionais (por condensação) que convertem apenas 33 % da energia primária em energia elétrica, as centrais elétricas de cogeração de alta eficiência têm uma taxa de conversão de até 90 %, combinando os dois processos, ou seja, a produção simultânea de energia elétrica e térmica.

3.3.4.

A cogeração apresenta grandes benefícios: eficiência energética, flexibilidade na escolha do combustível, facilidade de exploração e manutenção, conforto para o cliente, custos reduzidos ao longo do ciclo de vida, diminuição do custo de capital e flexibilidade na conceção do dispositivo.

3.3.5.

Para além de fornecer energia a partir de fontes adequadas (com emissões de carbono reduzidas) e otimizar o consumo de energia, o armazenamento de energia elétrica pode constituir uma solução para as empresas que produzem energia renovável e pretendem otimizar o consumo em função das necessidades, ou procuram minimizar os seus custos, reduzindo o consumo de energia elétrica em horas de ponta para privilegiar a eletricidade mais barata fora dessas horas.

3.3.6.

O CESE concorda com a abordagem adotada pela Comissão relativa ao artigo 7.o, que é alterado para prorrogar os requisitos de poupança de energia até 2030, mantendo a taxa de 1,5 % por ano. Proceder-se-á a uma avaliação dos progressos realizados na execução das medidas em 2027 e, subsequentemente, todos os 10 anos, até que os objetivos a longo prazo da UE para 2050 em matéria de energia e clima sejam considerados atingidos.

3.3.7.

O CESE acolhe favoravelmente a alteração dos artigos relativos à contagem e faturação do consumo de energia, na medida em que clarifica os aspetos relativos ao aquecimento, arrefecimento e água quente para uso doméstico alimentados por fontes centrais. No entanto, a legislação da UE não deve impor contadores individuais nos países em que a lei obriga o proprietário à assunção dos custos de energia do locatário (renda que inclui os custos de aquecimento, negociação da renda, supervisionada pelo Estado, entre as organizações de proprietários e de locatários). No que diz respeito à leitura do consumo de gás, é obrigatório fornecer ao consumidor final um contador individual que reflita com exatidão o seu consumo.

3.3.8.

As informações relativas ao consumo de gás serão baseadas no consumo real de energia, graças a um sistema que permita ao cliente final verificar o seu contador. Será exigido que os dados relativos ao consumo e à faturação sejam postos à disposição dos fornecedores de serviços energéticos. É necessário que a fatura, em formato eletrónico, seja clara e compreensível para o consumidor. Atendendo às melhorias propostas, o CESE espera que os Estados-Membros se empenhem mais firmemente na busca de soluções adequadas, tanto do ponto de vista social como económico, no que diz respeito à resolução do problema do custo dos contadores (quem assumirá o custo?). Esta problemática é essencial do ponto de vista da equidade e de uma definição correta das condições de igualdade de acesso à energia.

3.3.9.

O setor da energia já por diversas vezes solicitou a revisão do fator de conversão em energia primária (FEP) da eletricidade, que tem por base o consumo de energia final para as economias de eletricidade em kWh nos Estados-Membros. A metodologia e o novo fator propostos representam uma melhoria significativa. O CESE congratula-se com o facto de o coeficiente por omissão ser de 2,0 para o FEP, tendo presente que os Estados-Membros podem aplicar um coeficiente diferente, desde que seja devidamente justificado. O setor da energia manifesta preocupação pelo modo de cálculo desfavorável aplicado à energia nuclear, na medida em que se considerou que o fator adequado deve ser de 1 (eficiências de conversão de 100 %), semelhante ao que é aplicado a outras fontes de energia sem emissões de carbono.

Bruxelas, 26 de abril de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


28.7.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 246/48


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2010/31/UE relativa ao desempenho energético dos edifícios»

[COM(2016) 765 final — 2016/0381 (COD)]

(2017/C 246/08)

Relatora:

Baiba MILTOVIČA

Correlatora:

Isabel CAÑO AGUILAR

Consulta

Parlamento Europeu, 12.12.2016

Conselho da União Europeia, 21.12.2016

Base jurídica

Artigo 194.o, n.o 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

11.4.2017

Adoção em plenária

26.4.2017

Reunião plenária n.o

525

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

157/0/1

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

A proposta de diretiva em apreço aperfeiçoa e alarga as medidas legislativas anteriores com vista a reforçar a eficiência energética dos edifícios. A sua eficácia será avaliada em função do seu contributo para os principais objetivos da União da Energia. Porém, uma vez que se concentra no meio edificado, o seu papel na consecução dos objetivos sociais e económicos (em particular, a redução da pobreza energética, a preservação da acessibilidade do preço da habitação e o potencial de redução dos custos da energia) também deve ser considerado essencial.

1.2.

O CESE reputa prioritário que a diretiva contenha propostas mais específicas para superar o desafio da pobreza energética, designadamente recomendações mais claras quanto ao teor necessário das definições nacionais de pobreza energética, uma definição de referência que permita avaliar a exaustividade da abordagem dos planos nacionais, bem como a prestação de aconselhamento e a coordenação de medidas através de um «balcão único» ou agência independente e orientado/a para o consumidor.

1.3.

O CESE considera que, nos seus planos nacionais, os Estados-Membros devem almejar o nível de ambição mais elevado estabelecido na opção estratégica III alternativa (apresentada na avaliação de impacto que acompanha a proposta da Comissão Europeia), respeitando simultaneamente a abordagem legislativa da opção estratégica II, que constitui a base das revisões apresentadas na diretiva. Tal será necessário para criar uma trajetória de longo prazo capaz de cumprir o objetivo ambicioso do Acordo de Paris.

1.4.

Recomenda-se que as estratégias nacionais de renovação dos edifícios sejam apoiadas pela diretiva em apreço, que deve prever a obrigação de propor metas setoriais específicas e uma metodologia de referência para aferição das melhorias. Devem também ser definidas orientações firmes com níveis mínimos de desempenho de eficiência energética aplicáveis à renovação dos edifícios públicos e comerciais.

1.5.

A diretiva não aproveitou a oportunidade para incentivar as «hipotecas ecológicas», os sistemas de aquecimento urbano ligados às energias renováveis, as medidas para o armazenamento da energia residencial e comercial, a melhoria dos sistemas de formação para instaladores e empreiteiros responsáveis pelas renovações ou outras medidas técnicas, financeiras e fiscais, que serviriam de esteio a uma melhor eficiência energética dos edifícios. Embora tais medidas sejam apoiadas através de outros atos, a abordagem moderada adotada nesta diretiva só poderá ser justificada se promover a flexibilidade e ações ambiciosas. O CESE insta a Comissão a acompanhar de perto a execução e a eficácia da diretiva e a estar preparada para agir rapidamente aquando da utilização do mecanismo de atualização e revisão no âmbito do regulamento de governação proposto.

1.6.

Devem ser tomadas medidas adicionais para promover a comparabilidade dos métodos de cálculo para os certificados de desempenho energético (CDE) em todos os Estados-Membros, o que, por sua vez, tornaria mais viável a comparação entre os referidos certificados.

1.7.

Há que propor outras formas de incentivar os senhorios privados e não municipais de habitação social a investirem na renovação de imóveis antigos.

1.8.

A proposta de um «indicador de inteligência», que não é específica, deve incluir a capacidade dos ocupantes de um edifício, não só para avaliar a eficiência energética, mas também para controlar e facilitar a sua própria produção e consumo de energia a partir de fontes renováveis e reduzir a fatura da energia.

1.9.

O CESE solicita, em particular, que se reconheça a capacidade dos órgãos de poder local para fomentar e coordenar programas de eficiência energética, e assinala o crescente potencial do Pacto de Autarcas a este respeito.

1.10.

O CESE sublinha a necessidade de promover a construção e renovação dos edifícios, um setor em que as PME representam 83 % do emprego total (OCDE: Small Businesses, Job Creation and Growth [Pequenas empresas, criação de emprego e crescimento]).

1.11.

O CESE observa que, sem inovação, não será possível reforçar o desempenho energético dos edifícios. A UE está a perder a liderança no que respeita às tecnologias energéticas de baixo teor de carbono conexas, representando atualmente menos de 15 % dos postos de trabalho no setor. Devem ser envidados esforços no domínio da formação, adaptando-a às competências necessárias para estes setores altamente especializados.

1.12.

A iniciativa Financiamento Inteligente para Edifícios Inteligentes — e a possibilidade de a associar às ambições do Plano Juncker — é uma medida positiva, que o Comité acolhe favoravelmente.

2.   Introdução

2.1.

A diretiva faz parte do pacote «Energia Limpa para todos os Europeus», concebido para concretizar a União da Energia e reforçar a consciência e o entendimento de que a transição para a energia limpa é o setor de crescimento do futuro. A energia nos edifícios representa 40 % da energia total consumida em toda a UE. Continuam a realizar-se progressos significativos na eficiência energética dos edifícios, tanto nas novas construções como na recuperação de imóveis antigos, promovidos, em parte, por quinze anos de intervenção legislativa a nível da UE; porém, há ainda oportunidades consideráveis para melhorar a eficiência e proporcionar outras repercussões benéficas do ponto de vista social.

2.2.

Não obstante os progressos técnicos, os dados de apoio pertinentes e o recurso ao financiamento público disponível através de instrumentos financeiros, as melhorias verificadas no parque imobiliário existente não são significativas. Com efeito, 75 % dos edifícios da UE ainda não são eficientes do ponto de vista energético.

2.3.

O impacto das alterações climáticas a nível mundial e a vontade de consolidar a política europeia da energia vieram imprimir urgência ao processo, mas ainda há questões fundamentais e complexas por resolver e esperavam-se maiores progressos. Se não forem adotadas medidas nesse sentido, dificilmente se alcançarão os objetivos em matéria de clima e de energia para 2030 e 2050. Há potencial para reduzir o consumo de energia nos edifícios entre 5 % e 6 % e diminuir as emissões de CO2 em cerca de 5 %. Contudo, tendo em conta que, anualmente, apenas 0,4 % a 1,2 % do parque imobiliário é objeto de renovação ou recuperação, é evidente que é necessário acelerar estes processos.

2.4.

A diretiva em apreço altera a anterior diretiva de 2010 sobre o mesmo tema, que era, por seu turno, uma reformulação da diretiva de 2002. No âmbito da reformulação de 2010, foram introduzidas alterações muito substanciais no texto de 2002. Em particular, reconheceu-se a importância crescente do papel desempenhado pela eficiência energética no meio edificado e do seu contributo para os objetivos estratégicos neste domínio, teve-se em consideração os progressos ao nível do conhecimento técnico, efetuando ajustamentos com base em oito anos de experiência prática, e salientou-se a necessidade absoluta de regularizar e melhorar a forma como os Estados-Membros abordam as questões.

2.5.

A proposta de revisão em apreço, embora consideravelmente mais curta do que a diretiva anterior, adota a mesma abordagem. Em particular, prevê a integração de estratégias de renovação dos edifícios a longo prazo, a utilização de tecnologia inteligente nos edifícios e a racionalização das disposições vigentes. Resulta de uma avaliação exaustiva da diretiva de 2010 e de uma avaliação pormenorizada do impacto das possíveis vias de ação no futuro. A opção de impacto elevado — opção estratégica III — foi rejeitada sobretudo por motivos de custo a curto prazo, de impacto ao nível da subsidiariedade e de realismo político, a favor da opção estratégica II, cujos resultados potenciais são de nível menos elevado.

2.6.

No entanto, todas as partes interessadas desejam alcançar melhorias ambiciosas. O setor é responsável por 18 milhões de empregos diretos e contribui para cerca de 9 % do PIB da UE; o desafio consiste em encontrar um equilíbrio entre a acessibilidade dos preços e as exigências dos mercados residencial e comercial, por um lado, e os objetivos em matéria social e climática, por outro.

3.   Síntese da proposta da Comissão

3.1.

A diretiva é composta por um conjunto de alterações que reforçam as disposições vigentes da Diretiva 2010/31/UE e simplificam determinados aspetos. Os principais pontos são os seguintes:

a definição de «sistema técnico do edifício» é alargada para incluir aspetos relacionados com as tecnologias de edifícios inteligentes e disposições sobre mobilidade elétrica;

a disposição relativa às estratégias nacionais de renovação a longo prazo, constante da Diretiva Eficiência Energética de 2012, é integrada nesta diretiva;

é exigido aos Estados-Membros que estabeleçam um roteiro com etapas intermédias e medidas claras para atingir o objetivo a longo prazo de 2050 de descarbonização do seu parque imobiliário nacional, com metas específicas para 2030. Tal contribuirá também para a redução da pobreza energética;

o incentivo ao investimento traduz-se numa disposição segundo a qual os Estados-Membros devem promover o agrupamento e a redução do risco dos projetos e disponibilizar financiamento público para estimular os investimentos do setor privado e resolver as áreas problemáticas que não sejam corrigidas pelo mercado;

os Estados-Membros podem estabelecer requisitos para assegurar que os edifícios não residenciais são equipados com sistemas de automatização e controlo;

os Estados-Membros podem estabelecer requisitos para assegurar que os edifícios residenciais dotados de sistemas técnicos centralizados são equipados de vigilância eletrónica contínua e funcionalidades de controlo eficazes para otimizar a geração, distribuição e utilização da energia;

os Estados-Membros estabelecem as medidas necessárias para a realização de inspeções periódicas às partes acessíveis dos sistemas de ar condicionado no que respeita aos edifícios não residenciais e no que respeita aos edifícios residenciais dotados de sistemas técnicos centralizados;

prevê-se uma disposição que obriga os Estados-Membros a facultar aos proprietários ou aos inquilinos dos edifícios informações sobre os certificados de desempenho energético, sobre a sua finalidade e os seus objetivos e sobre as formas rentáveis de melhorar o desempenho energético do edifício;

são adotadas medidas para assegurar que a instalação de pontos de carregamento (ou infraestruturas de cablagem) para os veículos elétricos é obrigatória em grande parte dos edifícios novos e determinados edifícios que são objeto de obras de renovação;

as alterações aos sistemas técnicos dos edifícios devem ser registadas, avaliadas e disponibilizadas;

propõe-se o desenvolvimento de um «indicador de inteligência» para complementar a informação existente relativa à eficiência energética do edifício;

estabelece-se uma ligação específica entre os instrumentos financeiros disponíveis para a renovação dos edifícios e o grau de eficiência energética obtido.

4.   Observações na generalidade e na especialidade

4.1.

O CESE aplaude a ênfase continuada na eficiência energética dos edifícios, mas manifesta especial preocupação pelo facto de não se abordar adequadamente a pobreza energética, assinalada pelo Comité em pareceres anteriores (1) e amplamente reconhecida como uma questão de forte relevância social.

4.2.

É necessária uma abordagem mais ampla e mais ambiciosa. As metas relativas à redução das emissões e à eficiência energética já estabelecidas pela UE, bem como a entrada em vigor, em outubro de 2016, do ambicioso Acordo de Paris exigem ações mais eficazes, especialmente tendo em conta que o historial de cumprimento insuficiente das propostas anteriores demonstra que os edifícios continuam a ser um desafio.

4.3.

O Comité manifesta algumas reservas quanto à escolha da opção estratégica II (definida na avaliação de impacto) como base para apresentar a alteração legislativa em apreço. Embora a opção estratégica III implique um grau de obrigatoriedade que excede consideravelmente o nível de rentabilidade ideal — posição com a qual o CESE não pode concordar —, é evidente que o nível de ambição muito mais elevado da opção estratégica III — com duas a três vezes maior impacto no clima, na eficiência e nos objetivos sociais — será provavelmente necessário para criar uma trajetória de longo prazo capaz de dar resposta ao objetivo ambicioso do Acordo de Paris. Consequentemente, nos seus planos nacionais, os Estados-Membros terão de visar o mais elevado nível de ambição estabelecido na opção estratégica III alternativa (apresentada na avaliação de impacto que acompanha a proposta da Comissão Europeia), respeitando simultaneamente a abordagem legislativa da opção estratégica II.

4.4.

As conclusões de um estudo recente sobre as estratégias dos Estados-Membros de renovação dos edifícios são, em geral, positivas (Centro Comum de Investigação, 2016: Relatório de síntese sobre a avaliação das estratégias dos Estados-Membros de renovação dos edifícios). Ainda que este domínio seja abrangido pela Diretiva Eficiência Energética, não existe atualmente uma norma comum sobre o que constitui «renovação». Seria importante incluir na Diretiva Desempenho Energético dos Edifícios a obrigação de propor metas setoriais específicas e uma metodologia de referência para a aferição das melhorias com um limiar de qualificação que suscite o apoio à «renovação». Em conjugação com estas metas, devem ser definidas orientações firmes que permitam atingir níveis mínimos de desempenho em matéria de eficiência energética aplicáveis à renovação dos edifícios públicos e comerciais.

4.5.

A diretiva amplia os requisitos relativos a uma base de dados nacional de certificados de desempenho energético e seria útil dispor de uma base de dados a nível da UE, acessível ao público, com dados nacionais anonimizados sobre as estratégias nacionais de renovação, que poderia estar ligada à plataforma de comunicação eletrónica proposta no Regulamento relativo à Governação da União da Energia. Neste contexto, a diretiva deveria estabelecer orientações categóricas sobre a comparação dos métodos de cálculo, que, por sua vez, tornariam mais viável a comparabilidade entre certificados de desempenho energético.

4.6.

Embora não existam motivos para os planos nacionais não abrangerem este domínio, a diretiva não contém propostas sobre formas adicionais de incentivo aos senhorios privados e não municipais de habitação social para investirem na renovação de imóveis antigos. Nos casos em que os arrendatários pagam a fatura da energia diretamente, os senhorios muitas vezes não consideram que a melhoria da eficiência dos edifícios lhes proporcionará qualquer benefício comercial. Em alguns países, o setor do arrendamento residencial representa uma parte considerável do parque habitacional. O desempenho energético dos edifícios tem um grande impacto na acessibilidade do preço da habitação e na pobreza energética, pelo que é essencial dispor de instrumentos financeiros que apoiem a renovação. Sobretudo os municípios, as associações de senhorios e os proprietários têm direito a contrair empréstimos para efetuar melhorias complexas na eficiência dos prédios de apartamentos. Não obstante, as condições proibitivas no que diz respeito ao financiamento, aos contratos e ao acesso ao crédito criam obstáculos para muitos deles.

4.7.

O incentivo às «hipotecas ecológicas» constitui uma medida a apoiar pela diretiva. É igualmente importante facilitar o agrupamento de programas de pequena escala relativos às boas práticas de renovação e eficiência em quadros de maior amplitude, permitindo a aplicação de pacotes financeiros.

4.8.

Na Estratégia para o Aquecimento e a Refrigeração de 2016 [COM(2016) 51 final] foram abordados em especial os ganhos obtidos através da renovação e da substituição de sistemas de aquecimento urbano em conjugação com as energias renováveis. As soluções de aquecimento urbano e municipal são, geralmente, encaradas como uma componente de infraestrutura dos sistemas de construção. Por conseguinte, exigem um incentivo específico para que tal se reflita no planeamento urbano, devendo ser estabelecida uma posição clara a este respeito na diretiva.

4.9.

É de assinalar que as metas em matéria de clima e energia estão associadas a tecnologias energéticas de baixo teor de carbono e a edifícios mais sustentáveis que têm de cumprir os objetivos de eficiência energética. Estes dependem cada vez mais de tecnologias facilitadoras essenciais utilizadas em materiais avançados (metais não ferrosos, aço, vidro, plástico, etc.) e, sem inovação, será impossível aumentar o desempenho energético dos edifícios. Cerca de 5 % dos materiais avançados produzidos atualmente são utilizados em tecnologias energéticas de baixo teor de carbono e em edifícios mais sustentáveis, cujos mercados se estão a desenvolver rapidamente.

4.10.

A UE está a perder a liderança no que respeita a estas tecnologias e, atualmente, é responsável por menos de 15 % dos empregos no setor (cerca de 1,1 milhões de postos de trabalho diretos e indiretos). No domínio dos materiais avançados necessários para estas tecnologias, a UE enfrenta também uma concorrência crescente a nível mundial e, se não forem adotadas políticas adequadas de impulso tecnológico e dinamização do mercado, a inovação e a produção continuarão a abandonar a UE. Além disso, importa não esquecer a formação no âmbito das novas competências necessárias para estes setores altamente especializados.

4.11.

O CESE apoia a emergência da mobilidade elétrica enquanto fator de descarbonização geral da economia, mas interroga-se quanto à necessidade de abordar o tema de forma tão pormenorizada, bem como ao impacto das medidas preconizadas na acessibilidade do preço da habitação e dos edifícios comerciais e na liberdade de escolha dos poderes públicos na introdução da mobilidade elétrica. Outro aspeto importante e complementar — o armazenamento de energia —, é mencionado na exposição de motivos, mas não é desenvolvido na diretiva, embora seja provável que esta tecnologia se desenvolva rapidamente e a preços acessíveis.

4.12.

Do mesmo modo, o crescimento visível da produção descentralizada de energia a partir de fontes renováveis gera oportunidades de articulação com medidas de eficiência para os edifícios não abrangidos pela rede de gás e promove a transição para as energias renováveis no aquecimento e na refrigeração. Tal deve ser promovido de forma assestada.

4.13.

As alterações destinadas a reforçar o compromisso de promover os edifícios inteligentes (públicos, comerciais e residenciais) são relativamente modestas e deveriam ser mais concretas e abrangentes.

4.14.

A proposta de um «indicador de inteligência» para medir a capacidade dos edifícios para utilizar TIC e sistemas eletrónicos com vista à otimização do funcionamento e à interação com a rede deverá ser mais desenvolvida, embora o princípio seja de louvar. O objetivo deve ser o desenvolvimento de um indicador transparente e significativo, que acrescente valor ao certificado de desempenho energético, porém sem a imposição de encargos indevidos associados à recolha de dados ou à realização de análises. Este indicador deve incluir a capacidade dos ocupantes de um edifício não só para avaliar a eficiência energética, mas também para controlar e facilitar a sua própria produção e consumo de energia a partir de fontes renováveis e reduzir a fatura da energia.

4.15.

A pobreza energética é identificada como um problema que deve ser resolvido através da previsão de etapas intermédias que assinalem os progressos na descarbonização do parque imobiliário. Contudo, a diretiva não estabelece qualquer quadro estratégico de apoio para o desenvolvimento de uma abordagem com uma boa relação custo-eficácia em relação à pobreza energética propriamente dita, para a qual contribui, nomeadamente, a ineficiência energética dos edifícios residenciais. O CESE entende que esta questão poderia inserir-se no âmbito desta diretiva e propõe, neste contexto, a inclusão de um novo conjunto de propostas de alteração aos artigos pertinentes da diretiva de 2012. Esta medida estaria em consonância com os requisitos constantes da proposta de regulamento relativo à Governação da União da Energia para os Estados-Membros avaliarem e especificarem estratégias, medidas e iniciativas destinadas a combater a pobreza energética.

4.16.

Por conseguinte, o CESE recomenda que a diretiva estabeleça critérios para a inclusão de uma definição de referência de pobreza energética e proponha igualmente a sua própria definição de referência. Esta não seria vinculativa, obrigando os Estados-Membros a adotá-la para efeitos internos, mas estabeleceria critérios que os planos nacionais em matéria de energia e clima teriam de cumprir. Uma tal definição permitiu a alguns países avaliar o seu progresso — ou ausência dele — no combate à pobreza energética, mas o CESE reconhece que a natureza multifacetada do problema poderá exigir que se dê prioridade a fatores nacionais específicos.

4.17.

Por conseguinte, o CESE insta os Estados-Membros a adotarem uma abordagem plenamente coordenada em relação à pobreza energética, que inclua uma compreensão do papel e da eficácia não só dos edifícios eficientes do ponto de vista energético, mas também das intervenções financeiras (nomeadamente, tarifas sociais e métodos de atenuação da pobreza), a prestação de aconselhamento aos consumidores sobre a seleção de fornecedores e de tarifários, bem como informações sobre medidas simples de poupança de energia. A fim de maximizar a eficiência e a eficácia, é essencial realizar a prestação do aconselhamento e a coordenação das medidas através de um «balcão único» ou agência que seja independente e se centre no consumidor.

4.18.

Vários estudos independentes e relatórios da Comissão assinalaram que o ritmo e a eficácia com que os Estados-Membros estão a aplicar os requisitos da Diretiva Desempenho Energético dos Edifícios são variáveis, referindo, nomeadamente, as questões seguintes:

problemas de transposição e interpretação, que a Comissão continua a acompanhar através de mecanismos de execução. Diversos Estados-Membros solicitam maior reconhecimento da centralidade que a eficiência energética dos edifícios ocupa para o cumprimento das metas em matéria de energia e clima, bem como empenho na aplicação das estratégias nacionais de renovação. O CESE incentiva a DG Energia a manter a supervisão atenta da aplicação dos requisitos e a continuar a atuar rapidamente no desencadeamento de procedimentos por infração;

qualidade e comparabilidade dos certificados de desempenho energético (CDE). Seria útil a harmonização específica dos requisitos da UE aplicáveis a peritos e entidades de certificação qualificados, bem como o estabelecimento de verificações de qualidade dos certificados. Seria igualmente favorável um desenvolvimento dos certificados de desempenho energético de modo a fornecerem informações técnicas adicionais e recomendações de melhorias;

o CESE constata que o método previsto na diretiva para vincular os incentivos financeiros aos certificados de desempenho energético só prevê um pagamento a posteriori dos incentivos financeiros, uma vez que o pagamento depende da comparação entre a situação «antes» e «após» a emissão do certificado de desempenho energético. Trata-se de uma solução contraproducente em termos de eficiência energética, uma vez que as renovações que dependem de subvenções só se poderão concretizar se o proprietário tiver a certeza que vai receber a subvenção antes de proceder à renovação;

utilização dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento e, concretamente, dos fundos no âmbito da política de coesão. Uma percentagem mínima do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional será direcionada para a transição para uma economia hipocarbónica em todos os setores, mas a aplicação de todos esses fundos à eficiência energética dos edifícios varia significativamente entre os Estados-Membros. Já existem orientações interpretativas claras, mas é necessário um maior incentivo à utilização deste tipo de financiamento;

apoio à formação técnica pertinente no domínio da renovação dos edifícios, especialmente entre as PME, que representam mais de 90 % das empresas de construção europeias.

4.19.

O Comité observa que se espera, no período de programação 2014-2020, que os Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI) e, concretamente, os fundos no âmbito da política de coesão, desempenhem um papel significativo na renovação e construção dos edifícios. Atualmente, existem muitos obstáculos a ultrapassar, principalmente o acesso limitado ao financiamento, os custos iniciais elevados, os prazos de recuperação do investimento relativamente longos, a perceção de um maior risco de crédito associado ao investimento em energia sustentável, prioridades concorrentes para os proprietários dos imóveis, etc. (Comissão Europeia: Technical guidance — Financing the energy renovation of buildings with Cohesion Policy funding [Orientação técnica — Financiamento da renovação energética dos edifícios através dos fundos no âmbito da política de coesão]). A iniciativa Financiamento Inteligente para Edifícios Inteligentes é uma medida positiva no processo de resolução de alguns destes problemas, e é possível tirar partido das ambições do Plano Juncker para mobilizar um maior investimento neste domínio.

4.20.

Por conseguinte, é fundamental estabelecer as prioridades e responsabilidades adequadas para os órgãos de poder local, a fim de assegurar que a utilização dos recursos disponibilizados pelos programas produz o máximo efeito possível, permitindo ir além dos requisitos mínimos (por exemplo, os requisitos de desempenho energético, as auditorias energéticas, etc.) estabelecidos ao nível dos Estados-Membros, e o nível de financiamento disponibilizado deve aumentar de acordo com o nível de ambição.

4.21.

O CESE assinala, em particular, o potencial do Pacto de Autarcas a este respeito. Contando com mais de 7 000 municípios participantes, os signatários comprometem-se a tomar as medidas necessárias em matéria de eficiência energética e de energias renováveis mediante a adoção dos Planos de Ação para as Energias Sustentáveis (PAES). A mobilização das cidades, onde se encontra a maior parte do nosso meio edificado, é uma iniciativa local com impacto mundial.

4.22.

As intenções da diretiva foram em geral acolhidas favoravelmente pela maioria das partes interessadas de todo o setor da construção e pelos representantes dos proprietários e dos arrendatários, quer comerciais quer residenciais. No entanto, será necessário espírito de cooperação, diálogo e empenho positivo para ir mais além nos progressos já realizados em matéria de eficiência energética.

Bruxelas, 26 de abril de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  JO C 341 de 21.11.2013, p. 21, JO C 424 de 26.11.2014, p. 64, JO C 82 de 3.3.2016, p. 22, e JO C 34 de 2.2.2017, p. 78.


28.7.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 246/55


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis (reformulação)»

[COM(2016) 767 final — 2016/0382 (COD)]

(2017/C 246/09)

Relator:

Lutz RIBBE

Correlator:

Stefan BACK

Consulta

Parlamento Europeu, 1.3.2017

Conselho Europeu, 6.3.2017

Base jurídica

Artigo 194.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

11.4.2017

Adoção em plenária

26.4.2017

Reunião plenária n.o

525

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

108/1/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com a apresentação da diretiva revista relativa à promoção das energias renováveis. O desenvolvimento das energias renováveis, em conjugação com as outras propostas do chamado «pacote de inverno», desempenha um papel decisivo na consecução dos objetivos da União Europeia da Energia, dos objetivos da UE em matéria de ação climática e do seu objetivo de retomar a liderança mundial no domínio das energias renováveis. A quota das energias renováveis no consumo final de energia deverá ser de 27 % em 2030.

1.2.

Para a concretização dos objetivos em matéria de ação climática e para a redução da dependência em relação às importações, um objetivo de 27 % tem uma expressão apenas limitada. Há que associá-lo a outras medidas de redução das emissões de CO2 (por exemplo, ganhos de eficiência), podendo, assim, ser suficiente, na verdade, sobretudo se as regras em matéria de governação levarem os Estados-Membros a tomar eventualmente medidas adicionais. Analisando o objetivo à luz da aspiração da UE de desempenhar um papel de liderança a nível mundial no domínio das energias renováveis, e atendendo a que, sem uma revisão da diretiva, segundo a Comissão, a quota de energias renováveis no consumo energético final atingiria 24,7 % já em 2030, é legítimo perguntar se esta meta é suficientemente ambiciosa.

1.3.

Não obstante as disposições relativas ao planeamento e ao acompanhamento no sistema de governação proposto para a União da Energia, o CESE torna a lamentar a ausência de metas nacionais vinculativas.

1.4.

O CESE subscreve fundamentalmente o objetivo de integrar as energias renováveis no mercado. Considera, por vários motivos, que está fora de questão a concessão de subvenções ad infinitum, quer se trate de fontes de energia fósseis, nucleares ou renováveis.

1.5.

A implantação de fontes de energia renováveis no mercado da eletricidade só poderá ser bem-sucedida, porém, se se criarem condições de concorrência equitativas para todas as fontes de energia. O facto de as energias renováveis necessitarem ainda hoje de apoios públicos deve-se, em grande medida, à forte subsidiação de que é alvo a produção convencional de eletricidade. É, por conseguinte, imperativo eliminar as atuais distorções desfavoráveis às energias renováveis, por exemplo, através de uma combinação entre a tributação da energia e o regime de comércio de licenças de emissão que cubra todos os custos externos (ver o parecer do CESE sobre a «Revisão da Diretiva Desempenho Energético dos Edifícios», ainda não publicado no Jornal Oficial). O CESE salienta que tal deve e pode gerar o mínimo possível de custos adicionais para os consumidores e as empresas.

1.6.

A nova política da energia deve centrar-se nos três «D»: descentralização, digitalização e democratização. As energias renováveis exigem também uma nova conceção de mercado que se ajuste às estruturas descentralizadas de produção de eletricidade a partir de fontes de energia renováveis.

1.7.

O CESE apoia o desenvolvimento de estruturas de mercado descentralizadas e inteligentes, como prevê a Comissão, mas exige uma resposta muito mais eficaz ao apelo da Comissão no sentido de colocar os consumidores e os cidadãos no centro da política europeia em matéria de energia. O desenvolvimento de novas estruturas de mercado inteligentes poderá também libertar o potencial «revolucionário», segundo a Comissão, inerente à transição energética, de modo a maximizar as vantagens sociais e regionais.

1.8.

O CESE acolhe favoravelmente o reconhecimento do prossumidor (produtor-consumidor) enquanto interveniente importante no novo mercado da energia, o que constitui um passo no sentido da democracia energética mediante a capacitação dos utentes de maior e menor dimensão e dos cidadãos. As oportunidades que a proposta lhes oferece representam algum progresso em relação à situação atual, mas não são, de forma alguma, suficientes, por exemplo no que respeita ao direito juridicamente tutelado de acesso e uso das redes públicas de distribuição e eletricidade. Por conseguinte, pode-se considerar a proposta apenas como um primeiro passo no longo trajeto destinado a explorar o verdadeiro potencial social, económico e regional dos mercados orientados para o prossumidor.

1.9.

O CESE salienta a importância de uma implantação rápida das redes inteligentes como forma de assegurar um aprovisionamento estável e seguro, de lograr uma combinação de setores integrando na rede a cogeração com produção de energia térmica (power-to-heat), o aproveitamento de energia para a produção de gás (power-to-gas) e a ligação dos veículos elétricos, inclusive em microescala, bem como de possibilitar uma negociação harmoniosa entre pares, para que os prossumidores participem plenamente e em pé de igualdade no mercado da eletricidade.

1.10.

A digitalização poderá permitir aos prossumidores participarem não só na produção de eletricidade a partir de fontes renováveis, mas também na sua comercialização. Por conseguinte, o CESE recomenda vivamente a formulação de um direito positivo correspondente.

1.11.

O potencial das energias renováveis, nomeadamente das energias biogénicas (incluindo os combustíveis alternativos), para a economia regional, embora mencionado nos considerandos, não é tido em conta no texto legislativo propriamente dito. Falta uma estratégia neste domínio que relacione as energias renováveis com o desenvolvimento económico regional. Também não se reconhece a grande importância das cidades, municípios e regiões, nem das PME, enquanto motores da transição para as energias renováveis.

1.12.

A ligação possivelmente estabelecida entre a nova política energética e o desenvolvimento regional é importante, e não só do ponto de vista da economia regional. A participação das partes interessadas a nível local em projetos de energia descentralizados é igualmente importante para gerar aceitação por parte dos cidadãos: a questão de quem detém a propriedade de um parque eólico — um fundo internacional de capitais privados ou partes interessadas locais — pode ser irrelevante em termos de proteção do ambiente ou de segurança energética, mas é fundamental para a aceitação pública do parque eólico.

1.13.

A pobreza energética é um problema social que cumpre abordar no âmbito da política social. Todavia, o CESE chama a atenção para o potencial, ainda por aproveitar, de uma combinação entre produção de eletricidade e calor a partir de fontes renováveis, poupança de energia, transferência de carga e prossumo (produção-consumo) para enfrentar este problema. Tal pressupõe que se encontrem soluções para financiar os investimentos iniciais, como por exemplo, fundos sociais ou mecanismos de investimento, e que se ultrapassem os obstáculos no acesso ao capital através de uma abordagem política sistemática. Cada cidadão e consumidor europeu deve ser dotado das capacidades para se tornar um prossumidor.

1.14.

O título da proposta de diretiva refere a «promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis», mas o texto em si não descreve quaisquer instrumentos de apoio específicos. Contudo, é fundamental dispor de regras claras, a fim de garantir a segurança do investimento. Por conseguinte, tem de haver um regime de apoio específico, claro e preciso para as comunidades de produtores de energia em pequena escala e de prossumidores. O CESE solicita a atualização das atuais regras de execução em matéria de auxílios estatais, com vista a garantir o máximo de segurança jurídica para atrair investimento.

1.15.

O CESE saúda o objetivo de promover fontes de energia biogénicas sustentáveis e combustíveis alternativos, mas lamenta que as disposições contempladas na proposta a este respeito em parte não sejam suficientemente flexíveis para permitir uma adaptação às circunstâncias locais no que toca à utilização de matérias-primas e de resíduos. Ao proceder à eliminação progressiva dos biocombustíveis não sustentáveis, importa evitar gerar ativos abandonados.

2.   Observações na generalidade sobre a promoção das energias renováveis

2.1.

Na opinião do CESE, as energias renováveis podem oferecer à União Europeia quatro vantagens fundamentais. Na realidade, a Comissão apenas aborda duas delas na proposta de diretiva, e mesmo essas de forma em parte algo vaga.

a)    Ação climática

2.2.

As energias renováveis desempenham um papel decisivo na concretização do objetivo de descarbonizar quase por completo o sistema energético europeu. Para o efeito, contudo, devem cumprir-se duas condições:

é necessário realizar progressos consideráveis em matéria de eficiência energética (ver o parecer do CESE sobre a «Revisão da Diretiva Eficiência Energética»);

os setores dos transportes e do aquecimento e refrigeração desempenham um papel importante na redução das emissões de gases com efeito de estufa. A utilização de eletricidade 100 % produzida a partir de fontes renováveis será fundamental para tornar os setores do aquecimento e dos transportes mais sustentáveis. Igualmente importantes neste contexto são as propostas relacionadas com a ligação dos veículos elétricos à rede, a regulamentação da cogeração com produção de energia térmica (power-to-heat) e do aproveitamento de energia para a produção de gás (power-to-gas), bem como o desenvolvimento e exploração de redes inteligentes (1).

b)    Segurança do aprovisionamento

2.3.

As energias renováveis darão um contributo indispensável para a segurança do aprovisionamento e reduzirão a dependência em relação à energia importada, desde que haja uma coordenação da produção, do consumo e da gestão da procura. Todavia, para tal são necessários incentivos específicos. O CESE duvida que as medidas de apoio previstas nesta proposta e na proposta relativa à conceção do mercado da eletricidade sejam suficientes. Muito provavelmente, serão necessárias medidas adicionais devido ao problema do «custo marginal zero» das energias renováveis.

c)    Erradicação da pobreza energética

2.4.

As energias renováveis, cujos custos estão constantemente a baixar, são agora mais baratas do que nunca e tornaram-se entretanto tão baratas que já estariam hoje em dia em condições de contribuir de forma construtiva para a mitigação do problema da pobreza energética. Neste contexto, o desenvolvimento do «prossumo» é uma opção extremamente eficaz. Por exemplo, um estudo do Centro Comum de Investigação (JRC Scientific and policy reports, «Cost Maps for Unsubsidised Photovoltaic Electricity» [Mapas de custos da eletricidade fotovoltaica não subsidiada]) mostra que, já em 2014, a eletricidade autogerada a partir da energia solar era mais barata do que a eletricidade da rede para 80 % dos europeus. Não obstante, a Comissão Europeia ainda não desenvolveu uma estratégia adequada para que os cidadãos aproveitem esta opção (ver o parecer TEN/598).

2.5.

O acesso ao capital é especialmente difícil para os grupos com baixos rendimentos, pelo que cabe disponibilizar apoio adequado. Este aspeto social não é abordado na diretiva nem no conjunto do «pacote de inverno», embora seja pertinente para o objetivo da Comissão Europeia de colocar os cidadãos no centro da política energética, em consonância com os artigos 17.o e 21.o da proposta.

2.6.

Neste contexto, o CESE considera útil analisar todas as opções possíveis para dar a todos os cidadãos, na medida do possível, a oportunidade de fazerem parte da «economia da energia» como participantes ativos no mercado e em pé de igualdade. Tal inclui a disponibilização de financiamento do Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos (FEIE) ou de outros mecanismos de investimento, em especial também para pequenas e microinstalações. Se os consumidores com baixos rendimentos pudessem ter acesso a capital para instalações descentralizadas de energias renováveis, teriam a possibilidade de se tornarem prossumidores. Através de um sistema de contagem líquida, utilizado em alguns Estados-Membros, nomeadamente em Itália, nos Países Baixos, na Bélgica (Valónia), na Polónia e na Eslovénia, é possível obter um alívio financeiro direto capaz de mitigar o problema da pobreza energética.

d)    Criação de valor regional

2.7.

As energias renováveis são, por natureza, recursos regionais que, tecnicamente, podem ser utilizados por todos. Este facto é particularmente importante em regiões com infraestruturas limitadas, onde é necessário criar novas oportunidades de criação de valor, e a Comissão Europeia refere a justo título esta vantagem em diversos pontos dos considerandos.

2.8.

A criação de valor regional implica, contudo, associar as partes interessadas locais e regionais aos processos económicos, com um assumido intuito estratégico, permitindo-lhes contribuir para a sua configuração e, deste modo, participar na evolução económica. Um efeito secundário positivo desta abordagem é uma maior aceitação do desenvolvimento necessário das infraestruturas, bem como o seu cofinanciamento.

2.9.

O CESE assinala, contudo, a ausência de uma estratégia clara que relacione o desenvolvimento regional com a exploração das energias renováveis. Os Estados-Membros deveriam ter estabelecido estratégias pertinentes já após a adoção da anterior diretiva relativa às energias renováveis, mas tal não aconteceu.

3.   Observações na generalidade sobre a proposta de diretiva

3.1.

O CESE sempre acolheu favoravelmente a ambição da Comissão Europeia de que a UE retome a liderança mundial no domínio das energias renováveis. Com efeito, muitas das medidas apresentadas na proposta de diretiva seguem na direção certa (por exemplo, a previsibilidade dos quadros de apoio, nomeadamente a exclusão de medidas retroativas). Há, todavia, um risco de as três lacunas fundamentais seguidamente expostas se continuarem a sobrepor ao desenvolvimento das energias renováveis.

a)    Adequação dos instrumentos de apoio

3.2.

A proposta de diretiva assenta nos objetivos estabelecidos pelo Conselho Europeu de outubro de 2014 e atualiza o anterior objetivo para a quota de energias renováveis no consumo final de energia de 20 % até 2020 para 27 % até 2030, o que equivale a um aumento inferior a um ponto percentual por ano. Sem a revisão da diretiva, a quota de energias renováveis no consumo energético final da UE seria de 24,7 % em 2030, pelo que se pretende gerar um aumento de 2,3 % adicionais.

3.3.

Esta taxa de crescimento lenta poderá, no entanto, significar que será necessário um aumento exponencial da quota das energias renováveis entre 2030 e 2050 para concretizar os objetivos do Roteiro para a Energia 2050 [COM(2011) 885 final]. As medidas necessárias para o efeito poderão comportar custos económicos adicionais. Em todo o caso, importa acompanhar de perto o desenvolvimento das energias renováveis, a fim de se poderem tomar medidas corretivas da forma mais atempada e económica possível.

3.4.

Na avaliação de impacto que acompanha a proposta [SWD(2016) 418 final], conclui-se que serão necessárias medidas de apoio, pelo menos até 2030, ao abrigo de um quadro jurídico estável. Por conseguinte, o CESE considera que a proposta de diretiva em apreço também deveria definir medidas de apoio muito claras, a aplicar de forma rápida e eficaz — elas não constam, porém, da proposta.

3.5.

A «aplicação» dos mecanismos de apoio fica a cargo dos Estados-Membros, que têm de agir em consonância com as regras da UE em matéria de auxílios estatais. Contudo, o direito vigente da UE em matéria de auxílios estatais estabelece limites extremamente estritos, pelo que cumpre alterá-lo sem demora.

3.6.

Com efeito, as regras em matéria de auxílios estatais da UE em vigor contribuíram para o corte drástico de instrumentos de apoio anteriormente eficazes, como a prioridade na integração de energia na rede e a remuneração da integração, que eram utilizados em particular pelos novos participantes no mercado. Novos instrumentos, como os concursos públicos, representam, em parte, obstáculos quase intransponíveis para os prossumidores, produtores de energia em pequena escala e outros intervenientes no mercado.

3.7.

As medidas de apoio constantes da proposta estão essencialmente relacionadas com a estrutura do mercado e algumas disposições gerais sobre a necessidade de medidas de apoio estáveis que respeitem as regras em matéria de auxílios estatais, o que não é, por si só, suficiente. O CESE considera importante rever, com caráter de urgência, a) o regulamento geral de isenção por categoria no âmbito dos auxílios estatais da Comissão [Regulamento (CE) n.o 800/2008] e b) as atuais orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental para o período de 2014-2020, a fim de assegurar a compatibilidade com os objetivos constantes da proposta e, em particular, no que se refere às necessidades dos prossumidores e das PME.

3.8.

Por exemplo, há que alargar a derrogação para pequenos projetos (pontos 125 e 127 das orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia) e fixar os respetivos valores na Diretiva Energias Renováveis, a fim de assegurar clareza absoluta.

3.9.

O CESE duvida da eficácia da introdução de quotas em relação ao acesso a regimes de apoio para instalações noutros Estados-Membros, em particular no contexto do objetivo de promoção das energias renováveis descentralizadas e do desenvolvimento económico regional.

b)    As distorções de mercado prejudicam as energias renováveis

3.10.

A mensagem do «pacote de inverno» na sua globalidade não poderia ser mais clara: a filosofia da Comissão Europeia é a de que se impõe, a partir de agora, uma integração tão célere quanto possível das energias renováveis no mercado. Embora louvável em essência, esta abordagem continuará a suscitar problemas enquanto não se corrigirem duas distorções fundamentais do mercado. Em primeiro lugar, ainda há a) subvenções nacionais diretas para centrais elétricas alimentadas a combustíveis fósseis, a que se acrescenta b) uma internalização dos custos externos completamente desadequada. Por conseguinte, a eletricidade produzida pelas centrais elétricas alimentadas a combustíveis fósseis e outras formas de energia produzida a partir de recursos fósseis são sistematicamente favorecidas em detrimento das energias renováveis, que geram custos externos nulos ou apenas marginais. O Fundo Monetário Internacional estima que, a nível mundial, as subvenções às energias «sujas» se situem nos 5,3 biliões de dólares por ano, dos quais não menos de 330 mil milhões de dólares anuais provêm da UE.

3.11.

Embora estas distorções de mercado em prejuízo das energias renováveis já sejam conhecidas há anos, e não obstante as promessas no sentido de pôr cobro a semelhante situação de desigualdade de condições de concorrência, esta permanece a grande lacuna a colmatar neste domínio.

3.12.

É curioso, em contrapartida, que ainda há pouco tempo se tenham criticado as supostas distorções de mercado alegadamente causadas pelo apoio às energias renováveis. Não é esse o caso. O facto de hoje em dia ainda ser necessário apoiar as energias renováveis é, em larga medida, uma consequência das subvenções à produção convencional de energia. Por outras palavras, se se deixasse de subvencionar a produção de energia nas centrais elétricas alimentadas a combustíveis fósseis e se criassem assim condições de concorrência verdadeiramente equitativas, o apoio às energias renováveis tornar-se-ia em larga medida desnecessário. O CESE reafirma a sua posição, segundo a qual há que criar condições equitativas de concorrência através, nomeadamente, de instrumentos de mercado para abolir as distorções de mercado e deixar de prejudicar as energias renováveis (ver o parecer do CESE sobre a «Revisão da Diretiva Desempenho Energético dos Edifícios»).

c)    O atual mercado da eletricidade não está adaptado às energias renováveis

3.13.

O antigo setor da energia caracterizava-se por um número relativamente pequeno de unidades de produção de elevada capacidade. Em contrapartida, um sistema energético assente em energias renováveis é caracterizado por unidades de produção de menor envergadura e mais descentralizadas.

3.14.

O CESE já se pronunciou sobre os novos conceitos possíveis para organizar o comércio da eletricidade em sistemas descentralizados, com destaque para a «abordagem celular» (2). Estes modelos baseiam-se no princípio de que os pequenos participantes no mercado também devem poder comunicar diretamente entre si e comercializar a energia. Em causa não está apenas, portanto, a melhoria das possibilidades de produção mas também a participação nas trocas comerciais.

3.15.

Estas transações entre pares permitiriam uma participação ampla da sociedade que não se cingiria à produção e ao autoconsumo, mas também se estenderia à gestão ativa de unidades de energia mais pequenas e de caráter regional, abrindo assim a porta a novas oportunidades de criação de valor. É de incluir neste contexto a integração setorial, visto que o aquecimento e a energia necessária para a mobilidade são amiúde propriedade local, produzidos e consumidos em pequenas unidades.

3.16.

O CESE sublinha que, devido a obstáculos administrativos e, de um modo geral, às lacunas existentes na regulamentação, as transações entre pares são atualmente impossíveis em muitos Estados-Membros. A proposta de diretiva em apreço e a proposta relativa à conceção do mercado da eletricidade deveriam remediar esta situação mas, entende o CESE, apresentam falhas grandes.

3.17.

A abertura dos mercados da eletricidade em toda a União às transações entre pares ajudaria a libertar o imenso potencial socioeconómico das energias renováveis. Ao ignorar este ponto e, nesse processo, não ter em atenção obstáculos de ordem muito prática, como os limites ao comércio da energia, a Comissão Europeia está a desperdiçar uma excelente oportunidade para melhorar substancialmente a posição dos cidadãos, dos pequenos e grandes prossumidores e das PME europeus no mercado da eletricidade, para permitir às grandes companhias exportar «soluções energéticas» para mercados não europeus e, em mais em geral, para reforçar de modo significativo a aceitação social da transição energética.

4.   Observações na especialidade sobre o texto da diretiva

a)    Ausência de metas nacionais vinculativas

4.1.

O CESE reitera as suas críticas (3) quanto ao facto de a nova diretiva já não prever metas nacionais vinculativas, contrariamente à diretiva de 2009. Continua a ter dúvidas em relação à capacidade do quadro de governação previsto para «motivar» os Estados-Membros contrários à definição de metas nacionais vinculativas no sentido de passarem a ser mais proativos. A proposta não prevê qualquer instrumento concreto de intervenção em caso de não cumprimento do objetivo de 27 % (ver o parecer do CESE sobre a «Governação da União da Energia»). Por outro lado, o CESE reconhece a «responsabilidade conjunta» em causa no artigo 3.o da proposta, já que, em conformidade com o disposto no Regulamento Governação, estão previstas sanções financeiras no caso de estas metas não serem conjuntamente alcançadas nos planos nacionais em matéria de energia e alterações climáticas. O modo de assegurar o seu cumprimento continua a não ser claro, porém.

b)    Ausência de estratégia para o desenvolvimento regional

4.2.

No entender do CESE, a Comissão não reconhece a importância da participação ativa dos atores locais e regionais tanto no que diz respeito à aceitação da política implementada como às suas consequências para as economias regionais. Por si só, o crescimento previsto da eletromobilidade criará uma vasta gama de oportunidades inéditas para as economias regionais se o desenvolvimento necessário das infraestruturas de produção e distribuição assentar em modelos de exploração descentralizados (4).

4.3.

Tal também contribuiria para o objetivo de reduzir o mais possível os custos de utilização das energias renováveis para os contribuintes e os consumidores. Para tanto, contudo, não bastará apenas levar em conta os preços da eletricidade, mas também importará considerar a globalidade da conjuntura económica a nível nacional e regional. Há que ter em consideração, por exemplo, a questão relativa às oportunidades de emprego a nível regional (ver considerando 49). O CESE assinala a tendência de certos Estados-Membros para continuarem a) a impor encargos desnecessários e injustificados à energia produzida e consumida localmente e b) a ignorar por completo os aspetos regionais.

4.4.

Refira-se igualmente que, regra geral, a regulamentação dos Estados-Membros não leva em conta os custos da rede e do sistema. O CESE está convicto de que, em última análise, as soluções descentralizadas levam à sua redução e, neste sentido, subscreve a posição defendida pela Comissão no considerando 52.

4.5.

Este considerando constava já da Diretiva 2009/28/CE, sem que por isso os Estados-Membros tivessem desenvolvido nos últimos anos as estratégias regionais específicas correspondentes. O CESE constatou («Mudar o futuro da energia: a sociedade civil como ator principal na geração de energias renováveis» — Estudo do CESE sobre o papel da sociedade civil na execução da Diretiva «Energias Renováveis» da UE) que os regulamentos e os programas de apoio de muitos Estados-Membros não contêm qualquer referência à dimensão local e regional e que, inclusive, determinados governos e administrações nacionais chegam mesmo a justificá-lo invocando a legislação europeia. Também neste domínio se impõe, portanto, uma maior concretização. Embora a proposta crie as condições formais para a descentralização e o desenvolvimento regional, não prevê nenhuma obrigação de aplicar uma estratégia coerente nesse sentido. Na opinião do CESE, enunciar princípios sem os alicerçar numa base jurídica sólida não é uma forma eficiente de legislar.

4.6.

A fim de melhor clarificar o considerando 49, a Comissão Europeia deveria precisar no texto legislativo o significado da afirmação: «Por conseguinte, a Comissão e os Estados-Membros deverão apoiar as medidas de desenvolvimento tomadas nas esferas nacional e regional […] e promover a utilização de fundos estruturais neste domínio». O teor exato do considerando 50 também é algo vago, afirmando-se que «é necessário ter em conta o seu impacto positivo nas oportunidades de desenvolvimento regional e local, nas perspetivas de exportação, na coesão social e nas oportunidades de emprego, em especial no que respeita às PME e aos produtores independentes de energia». Por último, em relação ao considerando 52 («[…] autorizar o desenvolvimento das tecnologias de produção descentralizada de energia renovável em condições não discriminatórias e sem inibir o financiamento dos investimentos em infraestruturas»), o CESE saúda a valorização das abordagens descentralizadas, mas assinala que também aqui há necessidade de clarificar e concretizar consideravelmente o texto.

c)    Necessidade de regras mais claras para os prossumidores e em matéria de direitos do consumidor

4.7.

É positivo que a proposta contenha uma definição pelo menos parcial dos conceitos de «sistemas de aquecimento urbano», «consumidor privado de energias renováveis», «autoconsumo de energias renováveis», «PME» e «comunidades de energias renováveis» (artigo 21.o), reconhecendo-os assim como termos jurídicos pertinentes para fins da política e da regulamentação no domínio da energia. No passado, a falta de clareza terminológica gerou situações de incerteza considerável em matéria de investimento. Há dois problemas, porém. Em primeiro lugar, continua a faltar uma definição clara de «prossumo» (produção-consumo), sendo que as definições propostas nem sempre são aplicadas com coerência no «pacote de inverno». Em segundo lugar, o fundamento jurídico da diretiva não é apropriado para verdadeiramente pôr estes conceitos em prática. O impacto destas regras depende da eficácia da sua aplicação. O CESE lamenta que a Comissão Europeia não forneça orientações claras para o efeito.

4.8.

Consumidores privados de energias renováveis:

O CESE congratula-se com as disposições relativas aos consumidores privados constantes do artigo 21.o (n.o 1 a n.o 3). Todavia, estas disposições poderão permanecer sem efeito se no artigo não se explicar exaustivamente o que significa a asserção de que os consumidores «[t]êm o direito de realizar o autoconsumo e de vender, inclusivamente através de contratos de aquisição de energia, a sua produção excedentária de eletricidade renovável sem estarem sujeitos a procedimentos desproporcionados e encargos que não reflitam os custos». A referência aos seus direitos como consumidores deveria ser complementada por uma referência ao capítulo III da proposta de diretiva que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade, em que se definem concretamente os direitos específicos de que dispõem os consumidores privados de energia que consomem a sua própria eletricidade e o modo como podem exercer esses direitos, incluindo o direito de realizar transações entre pares.

Caberia igualmente à Comissão esclarecer que o autoconsumo de eletricidade sem utilização da infraestrutura, à semelhança do autoconsumo de calor, deveria ficar isento de direitos e encargos.

A disposição segundo a qual, em determinadas circunstâncias, os consumidores privados não devem ser considerados fornecedores de energia clássicos vai na boa direção, mas requer clarificação. Com efeito, «autoconsumo» e «fornecimento» são noções fundamentalmente diferentes. Os limites indicados na diretiva são demasiado baixos. Para ter em conta a situação real do mercado — e em aplicação das disposições relativas aos pequenos projetos dos números 125 e 127 das regras atuais em matéria de auxílios estatais —, os limites adequados seriam 20 MWh (6 000 MWh no caso da energia eólica) para agregados familiares e 1 000 MWh (36 000 MWh no caso da energia eólica) para pessoas coletivas.

A disposição segundo a qual os consumidores privados recebem uma remuneração pela eletricidade renovável de produção própria integrada na rede que reflita o valor de mercado requer uma definição do conceito de «valor de mercado». Não é adequado determiná-lo com base no nível de preços no mercado grossista enquanto subsistirem distorções de mercado em virtude das subvenções à produção de energia baseada em combustíveis fósseis. Além disso, a remuneração também deverá ter em conta o estado do sistema na sua globalidade (nomeadamente no atinente à utilização da rede), a fim de incentivar os consumidores privados a armazenarem energia ou a transferirem a carga de uma forma «útil ao sistema».

O CESE aprova a disposição relativa ao aprovisionamento de edifícios individuais, constante do n.o 2, pois permite eliminar uma injustiça profunda que há anos subsiste.

4.9.

No que se refere a requisitos administrativos e autorizações, o CESE assinala que o teor das considerações constantes dos artigos 15.o e 16.o está em essência correto, mas o texto proposto apresenta vários problemas. Em primeiro lugar, o termo «dispositivos descentralizados», no artigo 15.o, n.o 1, alínea d), é demasiado vago e precisa de ser concretizado. Em segundo lugar, os Estados-Membros não costumam cumprir o objetivo de colocar os cidadãos produtores de energia em pé de igualdade com os principais participantes no mercado. Tal deve-se amiúde à interpretação que fazem das regras em matéria de auxílios estatais. Enquanto não se clarificarem as regras relativas aos pequenos projetos, ao autoconsumo e ao prossumo, não haverá condições de igualdade. Cabe à Comissão adotar com urgência medidas neste domínio. Em terceiro lugar, as propostas nos artigos 15.o e 16.o apenas dizem respeito à produção. Para terem um acesso pleno ao mercado e, acima de tudo, poderem realizar transações entre pares, os intervenientes no mercado, como as comunidades de produção de energia, necessitam de procedimentos simplificados para o armazenamento, a comercialização e o autoconsumo da eletricidade.

4.10.

Em relação às garantias de origem, o artigo 19.o da proposta não toma em devida conta as atuais deficiências do mercado. Embora a proposta tenha por objetivo fomentar o desenvolvimento das capacidades em matéria de energias renováveis através das possibilidades de escolha dos consumidores, a legislação europeia em vigor não proíbe as ofertas enganosas sob a capa da «eletricidade verde». Os fornecedores podem utilizar as garantias de origem para forjar uma fachada ecológica, enquanto continuam a produzir, adquirir e vender energia de fontes não renováveis. No futuro, a legislação da UE deveria obrigar as autoridades reguladoras nacionais a definirem requisitos vinculativos para todos os participantes no mercado que oferecem tarifas de «eletricidade ecológica». Os fornecedores deveriam justificar os benefícios ambientais suplementares de tais tarifas. Ainda assim, a proposta da Comissão poderia aumentar a confusão dos consumidores e gerar um excesso de oferta de garantias de origem. Além disso, as comunidades de prossumidores que comercializam diretamente a sua eletricidade deveriam ser dispensadas da obrigação de indicar a origem da eletricidade, visto que ela é claramente identificável no âmbito do prossumo ou da produção de energia em pequena escala.

d)    Mais ambição e flexibilidade para os biocombustíveis e os combustíveis alternativos

Biocombustíveis

4.11.

O CESE considera que a proposta adota uma abordagem demasiado rígida em matéria de biocombustíveis. Sem pôr em causa o objetivo de não interferir na produção alimentar, também é importante permitir uma utilização ótima dos recursos disponíveis. O CESE defende, pois, o desenvolvimento de biocombustíveis que não provenham de produtos agrícolas nem resultem de uma utilização do solo que interfira na produção alimentar, mas de outras fontes, como os produtos residuais, subprodutos e resíduos, nomeadamente de origem florestal (ver o parecer do CESE sobre a «Descarbonização do setor dos transportes») (5). Sublinha ainda a necessidade de prever medidas de eliminação progressiva para evitar gerar ativos abandonados.

4.12.

No seu parecer sobre «Alterações indiretas do uso do solo/biocombustíveis» (6) de 17 de abril de 2013, o CESE questionou o contributo quantitativo que os «biocombustíveis avançados» podem dar e a que custo. Até agora, estas perguntas ainda não obtiveram resposta.

4.13.

O CESE também salientou que aumentando o cultivo e a utilização de plantas oleaginosas no âmbito, em particular, da agricultura sustentável (conceito-chave: culturas mistas) se poderiam desenvolver domínios de aplicação muito úteis, nomeadamente para o funcionamento de equipamentos agrícolas e silvícolas. No entanto, este é outro domínio em que a Comissão parece não dispor ainda de uma estratégia adequada, não dando a proposta de diretiva uma resposta a este problema.

4.14.

O CESE reputa importante usar de flexibilidade em relação à redução dos biocombustíveis, biolíquidos e combustíveis de biomassa produzidos a partir de culturas alimentares e forrageiras, desde que preencham os critérios de sustentabilidade definidos no artigo 27.o da proposta.

4.15.

O CESE apoia firmemente os requisitos estabelecidos no artigo 26.o, n.o 5, a fim de assegurar uma silvicultura sustentável. Recomenda que se reformule a definição de «licença de exploração» no artigo 2.o, alínea jj), para incluir todas as formas de autorizações juridicamente válidas de extração da biomassa florestal.

Eletromobilidade

4.16.

A quota fixada na diretiva para os combustíveis alternativos não toma em devida conta o forte potencial de crescimento da eletromobilidade. Com o aumento rápido da percentagem de energias renováveis na produção de eletricidade, a eletromobilidade também se afirma como uma opção flexível que, se adequadamente executada em termos estratégicos, pode desempenhar um papel fundamental no desenvolvimento das estruturas de prossumo.

4.17.

Além da quota de combustíveis alternativos, nomeadamente por motivos de política industrial e regional, e a fim de pôr termo à dependência energética da Europa, poder-se-ia fixar um objetivo no horizonte 2030 de 10 % a 20 % para a eletromobilidade assente em eletricidade produzida a partir de fontes renováveis. É igualmente importante aplicar ao setor dos transportes os critérios de sustentabilidade relativos à quota máxima de energias renováveis no consumo energético final, previstos no artigo 27.o, a fim de evitar restrições excessivas na utilização de biocombustíveis neste setor.

e)    Novos impulsos para as energias renováveis no setor do aquecimento e nos sistemas de aquecimento urbano

Gás e aquecimento

4.18.

A proposta constante do artigo 23.o de aumentar em, pelo menos, 1 ponto percentual por ano a quota de energias renováveis na produção de energia para fins de aquecimento e refrigeração em cada Estado-Membro é insuficiente. Para atingir os objetivos em matéria de clima, há que fixar metas consideravelmente mais ambiciosas.

4.19.

A exigência prevista no artigo 20.o, n.o 1, relativa à avaliação da necessidade de expandir a infraestrutura da rede de gás para facilitar a integração do gás proveniente de fontes de energia renováveis faz sentido, mas importa ter presente que o gás também é um combustível fóssil finito — remete-se a este propósito para o parecer sobre a «Segurança do aprovisionamento de gás natural» (7). Quando da definição dos critérios de avaliação, cumpre assegurar que se toma em conta a questão da integração setorial.

4.20.

O CESE saúda a disposição constante do artigo 20.o, n.o 3, e do artigo 24.o no sentido de reforçar os dispositivos de aquecimento urbano, visto que são elementos importantes para favorecer a integração setorial, combater a pobreza energética e reforçar a economia regional. Ao mesmo tempo, constata que as soluções urbanas e regionais em matéria de integração setorial falham amiúde devido às regulamentações nacionais.

Bruxelas, 26 de abril de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  JO C 34 de 2.2.2017, p. 151.

(2)  JO C 82 de 3.3.2016, p. 13, e JO C 34 de 2.2.2017, p. 78.

(3)  JO C 291 de 4.9.2015, p. 8.

(4)  JO C 34 de 2.2.2017, p. 78.

(5)  JO C 198 de 10.7.2013, p. 56.

(6)  JO C 198 de 10.7.2013, p. 56.

(7)  JO C 487 de 28.12.2016, p. 70.


28.7.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 246/64


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu, ao Comité das Regiões e ao Banco Europeu de Investimento — Energias limpas para todos os europeus»

[COM(2016) 860 final]

(2017/C 246/10)

Relator:

Ulrich SAMM

Correlator:

Toni VIDAN

Consulta

Comissão Europeia, 17.2.2017

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

11.4.2017

Adoção em plenária

26.4.2017

Reunião plenária n.o

525

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

136/0/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE acolhe favoravelmente o Pacote «Energias limpas», que visa acelerar, transformar e consolidar a transição da economia da UE para as energias limpas, mantendo ao mesmo tempo os principais objetivos de crescimento económico e criação de emprego.

1.2.

De acordo com o pacote, os cidadãos devem estar no centro da União da Energia, o que pressupõe o seu envolvimento ativo no processo de transição e, em especial, a existência de condições assentes num quadro político que assegure custos energéticos acessíveis para todos os segmentos da nossa sociedade, designadamente as pessoas vulneráveis. O CESE subscreve esses princípios, mas receia que as propostas regulamentares possam não ser suficientemente específicas para ir ao encontro dos mesmos.

1.3.

O CESE gostaria de realçar que a «energia limpa» beneficia não apenas o clima mundial, mas também, e sobretudo, a qualidade do ar a nível local, proporcionando, dessa forma, um ambiente melhor e mais saudável para todos.

1.4.

O pacote constitui um elemento necessário para cumprir os compromissos da UE, no seguimento do Acordo de Paris sobre a atenuação das alterações climáticas, de 2015. As tecnologias de energias renováveis e os produtos e serviços energeticamente eficientes serão essenciais, tendo em conta que ainda estamos muito longe de reunir condições de concorrência equitativas em que as energias renováveis possam resistir sem um apoio especial.

1.5.

O CESE congratula-se com os vários elementos do pacote que dizem respeito aos sistemas de aquecimento e refrigeração de edifícios, à conceção ecológica, ao mercado da eletricidade e aos transportes, e que são passos no bom sentido. No entanto, receia que, embora o pacote constitua um importante avanço, ainda seja necessário envidar grandes esforços para alcançar condições de concorrência equitativas a um nível satisfatório para todos os participantes no mercado da energia e, ao mesmo tempo, assegurar o avanço rumo a uma economia da energia sem carbono.

1.6.

O CESE vê com agrado o panorama otimista apresentado no pacote, com alguns pressupostos bastante positivos sobre um aumento da produção industrial relacionada com as energias renováveis e as tecnologias energeticamente eficientes e o número de postos de trabalho que poderiam ser criados. No entanto, o CESE gostaria de salientar também que existem graves riscos e perigos, especialmente se o processo de transição for demasiado breve ou demasiado moroso e não tiver um planeamento integrado. Tanto as oportunidades como os riscos têm de ser devidamente ponderados.

1.7.

Em particular, a difícil tarefa de transformar a economia de regiões que atualmente assentam, em grande medida, na indústria do carvão merece uma ponderação muito mais séria do que aquela que o pacote apresenta.

1.8.

O Conselho Europeu fixou o objetivo de uma quota de, pelo menos, 27 % de energias renováveis no total das energias consumidas na UE em 2030. Este objetivo mínimo é vinculativo a nível da UE, mas não se traduzirá em objetivos vinculativos a nível nacional. O CESE lamenta a inexistência, neste momento, de um consenso entre os Estados-Membros sobre uma política comum da energia e, em especial, sobre objetivos nacionais. A Comissão pretende solucionar este problema introduzindo um sistema de governação que contemple os planos nacionais integrados em matéria de energia e clima para o qual os Estados-Membros se comprometam a dar o seu contributo.

1.9.

O CESE considera que a proposta de governação constitui a parte mais difícil e crucial do Pacote «Energias limpas», e tem grandes reservas quanto à proposta de regulamento. O conteúdo final dos planos nacionais e os contributos dos Estados-Membros dependem de um acordo satisfatório com a Comissão, que deverá ser alcançado com base em consultas, nas atitudes e na influência do público, assim como na pressão dos pares. Em particular, não existe uma descrição pormenorizada das «medidas» de que a Comissão dispõe, como a plataforma financeira, se os objetivos gerais não forem atingidos.

1.10.

O CESE subscreve na íntegra o princípio fundamental da proposta de «dar prioridade à eficiência energética». No entanto, a eficiência energética é um instrumento para a modernização da economia europeia, não uma forma de aliviar a pobreza energética. Será enganoso sugerir o contrário, tendo em conta que a eficiência energética requer investimentos que os consumidores vulneráveis poderão não estar em condições de fazer.

1.11.

O CESE regista com agrado que a Comissão está agora a criar um observatório da pobreza energética, conforme já proposto pelo CESE em 2013. Tal poderá ser fundamental para uma abordagem plenamente coordenada da pobreza energética, composta por diversas medidas como, por exemplo, tarifas sociais, medidas de atenuação da pobreza, aconselhamento aos consumidores ou eficiência energética.

1.12.

O CESE manifesta a sua apreensão quanto às bases financeiras do pacote num clima de austeridade pública e baixo crescimento a nível da UE e receia que os recursos previstos pela UE (bem como a sua mobilização) possam não ser suficientes para alcançar os objetivos.

2.   Introdução

2.1.

O presente parecer analisa o Pacote «Energias limpas para todos os europeus» no seu conjunto, enquanto uma série de outros pareceres (TEN/617, 618, 619, 620, 621, 622, 623, 625 e NAT/702) abordam as partes especificamente relacionadas com várias propostas legislativas que abrangem a eficiência energética, as energias renováveis, a configuração do mercado da eletricidade, a segurança do aprovisionamento e a regras de governação da União da Energia.

2.2.

Originalmente, o Pacote «Energias limpas» não era considerado um pacote, mas sim uma sequência de propostas. No entanto, tendo em conta as interligações entre estas propostas, o CESE congratula-se, por um lado, com a decisão de as agrupar num único pacote, mas critica veementemente, por outro lado, o volume do pacote, que ascende a mil páginas, o que dificulta a participação do público e da sociedade civil na análise e no debate exaustivo da proposta.

2.3.

Importa ter presente que o projeto da União da Energia tem estado em curso há algum tempo e que já foram publicados pacotes anteriores (por exemplo, segurança do aprovisionamento de gás), fortemente orientados para as questões relacionadas com as alterações climáticas e a segurança do aprovisionamento de combustíveis.

2.4.

O Pacote «Energias limpas» contempla as cinco dimensões fundamentais da União da Energia europeia:

a segurança energética;

o mercado interno da energia;

a eficiência energética;

a descarbonização;

a investigação, a inovação e a competitividade.

2.5.

A Comunicação — Energias limpas para todos os europeus destina-se também a dotar a União da Energia de uma visão ou narrativa.

3.   Observações gerais

3.1.

O pacote visa acelerar a transição para as energias limpas, não perdendo de vista, ao mesmo tempo, os importantes objetivos de crescimento económico e criação de emprego na Europa. As principais razões para a elaboração do pacote são:

o primeiro acordo mundial (Paris 2015) sobre a atenuação das alterações climáticas, que entrou em vigor em 4 de novembro de 2016. O cumprimento dos compromissos ambiciosos assumidos pela UE depende, em grande medida, do êxito da transição para um sistema energético limpo;

o setor energético é um elemento fulcral para o desenvolvimento da economia europeia. Por conseguinte, a eficiência energética desempenha um papel fundamental no estímulo de outros setores da economia. O desenvolvimento de tecnologias de energias renováveis e de produtos e serviços energeticamente eficientes levou à criação de novas empresas, enquanto outros modelos de negócio no setor da energia enfrentam dificuldades cada vez maiores. É essencial que a política da UE alcance a criação líquida de novos postos de trabalho de elevada qualidade e contribua para o sucesso das empresas da UE;

outro objetivo principal consiste em assegurar que a transição para um sistema energético limpo traz benefícios para todos os europeus. Trata-se de um enorme desafio, tendo em conta as grandes disparidades entre os Estados-Membros e a necessidade de abranger todos os segmentos da nossa sociedade, incluindo as pessoas vulneráveis.

3.2.

O CESE apoia esta estratégia, como mostra uma série de pareceres anteriores sobre estas questões (1).

3.3.

O CESE acolhe favoravelmente este pacote de propostas regulamentares e de medidas facilitadoras, que visam acelerar, transformar e consolidar a transição da economia da UE para as energias limpas. Aplaude, em particular, o facto de os domínios do aquecimento, da refrigeração e dos transportes gozarem agora da mesma importância que a produção de eletricidade.

3.4.

A comunicação «Energias limpas para todos os europeus» apresenta um panorama otimista, com pressupostos bastante positivos sobre um aumento da produção industrial e o número de postos de trabalho que se poderia criar. O CESE reconhece este facto e entende que estes sinais positivos têm, efetivamente, de ser emitidos para manter a dinâmica num processo de transição que, para alguns, se revela difícil.

3.5.

Por outro lado, o CESE gostaria de realçar igualmente que a transição energética representa um grande desafio para a Europa que envolve também graves riscos e perigos ligados à transição energética, especialmente se o processo de transição for demasiado breve ou demasiado moroso e não tiver um planeamento integrado. As grandes disparidades — económicas e políticas — que se verificam entre os Estados-Membros constituem especial motivo de preocupação, devendo ser matéria do novo regulamento relativo à governação. O CESE está convicto de que o êxito da transição energética depende da devida ponderação das oportunidades e dos riscos.

4.   A governação da União da Energia europeia é uma questão central

4.1.

Ainda que os Estados-Membros se tenham comprometido a efetuar contribuições nacionais em matéria de eficiência energética e energias renováveis até 2020, não existem valores de referência indicativos para 2030.

4.2.

O Conselho Europeu fixou o objetivo de uma quota de, pelo menos, 27 % de energias renováveis no total das energias consumidas na UE em 2030. Embora este objetivo mínimo seja vinculativo a nível da UE, não se traduzirá imediatamente em metas vinculativas nacionais. O CESE apela para a adoção de medidas firmes para apoiar os Estados-Membros com os objetivos mais ambiciosos.

4.3.

A proposta de regulamento relativo à Governação da União da Energia (ver TEN/617) estabelece agora os requisitos aplicáveis aos planos nacionais integrados em matéria de energia e clima, em substituição dos planos isolados em matéria de eficiência energética e energias renováveis, e um processo simplificado de estabelecimento e supervisão dos mesmos. A governação — em virtude das suas implicações em matéria de requisitos vinculativos no que se refere a medidas que são da competência nacional — constitui um domínio sensível, designadamente em relação à energia, pois as circunstâncias e posições políticas de cada Estado-Membro variam substancialmente.

4.4.

O CESE manifesta profunda preocupação quanto à capacidade do processo de governação de assegurar o cumprimento e apresentar resultados concretos. Há uma confiança excessiva nas consultas e na pressão dos pares, em vez de em regras claras. É necessário clarificar melhor o modo como a Comissão pode obrigar os Estados-Membros a tomar as «medidas necessárias» em caso de deteção de uma lacuna, tanto a nível da ambição como da execução, nomeadamente no que diz respeito às energias renováveis e à eficiência energética. Em particular, é necessária mais clareza quanto à natureza e ao funcionamento da «plataforma de financiamento» como forma de sanção em caso de insuficiência do fornecimento de energias renováveis.

4.5.

O CESE lamenta, nomeadamente, que a «consulta pública» não tenha um caráter específico no regulamento e que fique muito aquém da proposta do CESE de um diálogo europeu alargado sobre a energia. Para obter a confiança e o empenho dos cidadãos, esse diálogo deverá ser independente dos governos e do processo de execução dos planos nacionais integrados em matéria de energia e clima. Deverá centrar-se na informação dos consumidores, ajudar os fornecedores de energia a empenharem-se e a fortalecerem a confiança e ainda constituir um canal de comunicação das diversas preocupações dos diferentes grupos em matéria de segurança energética, acessibilidade e sustentabilidade.

4.6.

Em conformidade com o princípio da subsidiariedade, e para beneficiar plenamente da natureza descentralizada e flexível das tecnologias de eficiência energética e de energias renováveis, os Estados-Membros devem transferir uma parte mais substancial da elaboração de políticas e da tomada de decisões em matéria de energia para os órgãos de poder local e regional. A UE, os Estados-Membros e os órgãos de poder local e regional, em cooperação com a sociedade civil organizada, que assegura um forte empenho do público e da comunidade, devem facilitar esta transferência e garantir a sua aceleração e execução de uma forma coordenada que traga mais vantagens aos consumidores e às comunidades.

5.   A eficiência energética apresenta um enorme potencial em termos de poupança energética

5.1.

A melhoria da eficiência energética em todos os domínios (produção de energia, fabrico e transporte, eletricidade, aquecimento, refrigeração e mobilidade) é vital para o futuro sistema energético da Europa. O CESE congratula-se com o facto de a eficiência energética estar a ser alvo de maior atenção nas políticas da UE e de as novas iniciativas incluírem também o aquecimento, a refrigeração e os transportes, o que há muito se impunha (ver também o parecer TEN/618 sobre a Diretiva Eficiência Energética).

5.2.

Por si só, a melhoria da eficiência energética — mesmo ao nível mais ambicioso — não poderá resolver os problemas em matéria de energia relacionados com as alterações climáticas, a segurança do aprovisionamento ou a pobreza. No entanto, pode constituir um meio importante para atenuar os problemas. A melhoria das eficiências pode levar a uma redução do consumo energético e, dessa forma, travar ou reverter o aumento dos custos energéticos, mesmo num cenário de subida dos preços da energia.

5.3.

Importa notar que o aumento da eficiência energética está sempre dependente do investimento. Por conseguinte, a melhoria da eficiência não representa necessariamente uma redução dos custos para os consumidores ou para a indústria, como repetidamente refere a comunicação. É certo, contudo, que conduzem invariavelmente a um menor consumo energético e, nesse sentido, têm um efeito benéfico a nível do clima. No entanto, um efeito positivo nos custos depende fortemente do equilíbrio entre os investimentos e as poupanças dos custos energéticos. O CESE gostaria que fosse feita uma análise mais realista e crítica deste facto.

5.4.

O CESE aplaude a revisão da Diretiva Desempenho Energético dos Edifícios (TEN/620). Os sistemas de aquecimento e de refrigeração dos edifícios constituem um fator extremamente importante, uma vez que representam 40 % do consumo total de energia. As poupanças energéticas neste domínio implicam a renovação e a construção de novos edifícios, sendo que, em ambos os casos, é necessário realizar investimentos consideráveis. Contudo, tendo em conta que, anualmente, apenas entre 0,4 % e 1,2 % do parque imobiliário é alvo de renovação ou é construído de novo, torna-se evidente a necessidade de acelerar estes processos.

5.5.

É exigido aos Estados-Membros que estabeleçam um roteiro com etapas intermédias e medidas claras para atingir o objetivo a longo prazo de descarbonização do seu parque imobiliário nacional até 2050, com metas específicas para 2030.

5.6.

O CESE lamenta a opção por uma política menos ambiciosa, que prevê poupanças energéticas inferiores àquilo que seria possível. Está ciente de que não é possível garantir a vontade política dos Estados-Membros de alcançar melhores resultados neste domínio, ainda que a eficiência energética dos edifícios ofereça, efetivamente, a oportunidade mais evidente.

5.7.

O CESE vê com agrado a grande variedade de novos instrumentos financeiros propostos pela Comissão. É essencial dispor de instrumentos financeiros de apoio à renovação, nomeadamente para incentivar os proprietários privados e não municipais de habitação social a investirem na renovação de propriedades mais antigas.

5.8.

Os proprietários ou inquilinos de edifícios novos ou renovados gozam não só de um consumo energético mais baixo, como também de um modo de vida mais confortável e de uma melhor qualidade de vida. Infelizmente, na maioria dos casos, essa situação leva a um efeito de ricochete, em que as rendas mais elevadas das habitações renovadas facilmente excedem as poupanças de custos energéticos. Por outro lado, a comunicação expressa uma visão bastante otimista relativamente às poupanças de custos. O CESE recomenda uma abordagem mais crítica deste problema. É necessário aplicar critérios económicos e sociais, para evitar que se gere uma nova forma de pobreza para as gerações mais velhas.

5.9.

O CESE aplaude a iniciativa, prevista na diretiva, de tornar obrigatória a instalação de pontos de carregamento elétrico para veículos elétricos em grande parte dos novos edifícios. Importa referir, contudo, que a futura procura de uma maior potência elétrica requer o planeamento e a coordenação com os fornecedores de eletricidade, devido à necessidade acrescida de investir previamente em transformadores de alta potência na proximidade de áreas residenciais.

5.10.

O CESE considera que mais sistemas de transporte energeticamente eficientes, impulsionados pela constante evolução tecnológica e pelo desenvolvimento de Sistemas de Transporte Inteligentes Cooperativos, contribuirão significativamente para os esforços europeus no sentido da poupança energética (TEN/621). O novo plano de trabalho e regulamentação em matéria de conceção ecológica (NAT/702) representa um elemento importante para o mercado comum europeu, permitindo produtos altamente eficientes e apoiando a economia circular.

6.   Os consumidores no centro da União da Energia

6.1.

O CESE vê com agrado o facto de a Comissão desejar colocar os consumidores no centro da União da Energia. Na vida moderna, os transportes, a habitação, as comunicações e o consumo geral requerem a utilização de uma quantidade mínima de energia para todos os cidadãos. A energia não deve, por conseguinte, tornar-se um produto de luxo. Porém, o fenómeno da «pobreza energética» — frequentemente mencionado, mas não bem definido — indica uma tendência em que cidadãos vulneráveis enfrentam cada vez mais dificuldades na aquisição dos serviços energéticos mínimos de que necessitam. O CESE apela a que esta tendência seja contrariada e a que a política energética seja adaptada em conformidade.

6.2.

A evolução tecnológica permitiu que os custos para a produção de eletricidade diminuíssem ao longo dos últimos anos. Os consumidores não beneficiaram desta circunstância, pois essa redução foi muitas vezes compensada, por exemplo, por impostos ou custos de rede. Esta situação representa um sério problema, devido aos impactos negativos que tem em termos de pobreza energética.

6.3.

O CESE discorda da afirmação de que «a eficiência energética constitui uma das melhores formas de tratar as causas profundas da pobreza energética». A expressão «pobreza energética» surgiu quando os preços da energia começaram a aumentar exponencialmente, o que significa que as causas profundas desta categoria específica de pobreza residem antes nos preços elevados, devendo estes ser o alvo principal de quaisquer medidas que se destinem a ajudar os grupos vulneráveis. É certo que a melhoria da eficiência pode ser um contributo útil, mas estará inevitavelmente dependente de um investimento considerável, que os consumidores vulneráveis, em especial, podem não estar em condições de fazer (ver o parecer TEN/518).

6.4.

O CESE regista com agrado que a Comissão está agora a criar um observatório da pobreza energética, conforme já proposto pelo CESE em 2013 no parecer TEN/516 sobre a pobreza energética. O seu principal objetivo deve ser, em primeiro lugar, definir indicadores europeus de pobreza energética. Tal poderá ser fundamental para os Estados-Membros adotarem uma abordagem plenamente coordenada para a pobreza energética, incluindo uma compreensão do papel e da eficácia dos vários instrumentos, como, por exemplo, tarifas sociais, medidas de atenuação da pobreza, aconselhamento aos consumidores ou eficiência energética.

6.5.

O CESE gostaria de realçar que, além das questões referidas na comunicação (segurança energética, eficiência energética e descarbonização), a energia limpa ainda traz importantes benefícios de saúde para todos os cidadãos.

6.6.

O pacote reserva aos cidadãos um papel limitado no que diz respeito à influência direta nas decisões que moldam a sua vida diária e os seus modos de subsistência. Não é claro se os princípios de um diálogo em matéria de energia que resulte numa participação significativa estão a ser, ou serão, aplicados em toda a União (ver também TEN/617). Este diálogo requer a criação de condições de concorrência equitativas, nomeadamente na dimensão institucional.

6.7.

O CESE aplaude o reconhecimento da intensificação do papel dos cidadãos que se afirmam como prossumidores no mercado da eletricidade. Estes carecem de regimes de comercialização que se adequem às estruturas descentralizadas da geração de eletricidade a partir de fontes renováveis e que coloquem realmente os consumidores e cidadãos no centro da política europeia em matéria de energia.

6.8.

O CESE é favorável ao conceito de energia comunitária, que consiste num modelo de negócio em que os cidadãos possuem e participam, em conjunto, em projetos de energia renovável ou eficiência energética na área em que residem. As disposições legislativas contidas no novo pacote devem prever e incentivar iniciativas deste tipo sempre que possível.

7.   As energias renováveis num novo mercado

7.1.

O CESE apoia, de um modo geral, o objetivo da Diretiva Energias Renováveis (TEN/622) de impulsionar uma integração mais forte dos fornecedores de energia renovável no mercado, em consequência da redução dos custos das energias renováveis.

7.2.

O CESE receia também, contudo, que estejamos muito longe de reunir condições de concorrência equitativas em que as energias renováveis possam resistir sem um apoio especial. Ainda falta percorrer um longo caminho na eliminação das enormes distorções que se verificam nos atuais mercados da eletricidade, criadas por subsídios, por condições de limites estruturais e por uma contabilidade incerta no que diz respeito aos custos externos.

7.3.

O CESE manifesta-se favorável ao relatório recentemente publicado pela Agência Europeia do Ambiente (AEA), intitulado Transforming the EU power sector: avoiding a carbon lock-in [A transformação do setor da eletricidade na UE: evitar a dependência do carbono]. Os combustíveis fósseis ainda contribuem para quase metade da eletricidade produzida na Europa. O estudo da AEA compara as tendências dos atuais mercados da eletricidade com os objetivos da UE em matéria de clima para 2030 e para os anos subsequentes. O abandono do aprovisionamento de eletricidade com elevadas emissões de carbono implica o aumento do investimento em soluções alternativas, a par de quadros estratégicos que o sustentem.

7.4.

O CESE manifesta a sua preocupação face à falta de pormenores relativos a medidas específicas e instrumentos de apoio, o que pode pôr em causa uma maior promoção das energias renováveis.

7.5.

O CESE gostaria de salientar a necessidade de reanalisar a questão da segurança energética quando se verificar uma mudança radical do cabaz energético, algo que o pacote não trata devidamente.

8.   Oportunidades para a economia e a criação de postos de trabalho

8.1.

A transição energética constitui um grande desafio para a Europa, permitindo oportunidades de criação de novos postos de trabalho, de crescimento económico e de bem-estar para todos os cidadãos. Tendo em conta os riscos e perigos que também acompanham esta transição, é da maior importância desenvolver uma política equilibrada que proporcione os meios adequados para evitar danos para a nossa sociedade, por exemplo, para os trabalhadores (desemprego e qualidade do emprego), os consumidores e as PME. Tal só pode ser alcançado com a associação das partes interessadas a todas as fases desta transição e o CESE, enquanto parceiro valioso e pertinente, é uma delas.

8.2.

A liderança mundial em matéria de tecnologias limpas implica igualmente a exportação dessas tecnologias, o que é vantajoso tanto do ponto de vista económico como do ponto de vista ambiental (NAT/690).

8.3.

A investigação e a inovação são fatores essenciais para sustentar a competitividade da Europa a nível mundial, bem como a sua liderança em termos de tecnologias de energia avançadas e de soluções de eficiência energética. A estratégia específica de acelerar o ritmo da inovação no domínio das energias limpas (TEN/619) deve conduzir ao reforço do estabelecimento de prioridades e a ações concretas, para assegurar que as inovações destinadas a eliminar gradualmente as tecnologias carbónicas são aplicadas de forma mais abrangente e chegam mais rapidamente ao mercado. O CESE critica a reduzida referência à investigação de base e à sua possível contribuição. É feita uma breve referência ao Plano Estratégico Europeu para as Tecnologias Energéticas, mas infelizmente apenas de um ponto de vista industrial.

8.4.

O pacote refere repetidamente a indústria, os postos de trabalho e o crescimento como definição da inovação; no entanto, o conceito é mais abrangente. O bem-estar das pessoas e a natureza são bens importantes que ultrapassam os aspetos orientados para a indústria.

8.5.

O CESE congratula-se com a proposta da Comissão de criar um «fórum industrial das energias limpas», que poderia, num processo da base para o topo, integrar o conceito mais amplo de diálogo com a sociedade civil e outras partes interessadas. Sublinha a importância de um apoio equilibrado à cadeia de investigação e inovação, da investigação de base à investigação aplicada a inovações pioneiras de produtos.

8.6.

Dada a difícil tarefa de transformar a economia de regiões que atualmente assentam, em grande medida, na indústria do carvão, o CESE considera que esta questão merece uma ponderação muito mais séria do que aquela que o pacote apresenta.

8.7.

Os custos de capital para novos investimentos em energias renováveis e eficiência energética variam de forma significativa entre os Estados-Membros. O CESE considera que são necessárias medidas orçamentais e institucionais sólidas para suprimir ou minimizar essas condições discriminatórias para os consumidores e investidores.

8.8.

O sudeste da Europa dispõe de um grande potencial em matéria de energias renováveis e uma mão de obra qualificada que, até à data, ainda estão, em larga medida, por explorar. O CESE apela a um aumento significativo do apoio às partes interessadas que prosseguem objetivos da União da Energia na região. Tal proporcionará aos consumidores e aos investidores locais, grandes possibilidades de desenvolvimento, em consonância com os objetivos do pacote em apreço.

Bruxelas, 26 de abril de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  JO C 383 de 17.11.2015, p. 84; JO C 264 de 20.7.2016, p. 117; JO C 291 de 4.9.2015, p. 8; JO C 82 de 3.3.2016, p. 13; JO C 82 de 3.3.2016, p. 22; JO C 487 de 28.12.2016, p. 75, e JO C 303 de 19.8.2016, p. 1.


28.7.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 246/71


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de um novo Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento — O nosso mundo, a nossa dignidade, o nosso futuro»

[COM(2016) 740 final]

(2017/C 246/11)

Relator:

Ionuț SIBIAN

Correlator:

Mihai MANOLIU

Consulta

Comissão, 27.1.2017

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Decisão da plenária

26.4.2017

Competência

Secção Especializada de Relações Externas

Adoção em secção

4.4.2017

Adoção em plenária

26.4.2017

Reunião plenária n.o

525

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

166/1/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE congratula-se com a proposta da Comissão Europeia de um novo Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento — O nosso mundo, a nossa dignidade, o nosso futuro. A proposta responde às recomendações do parecer (REX/461) do CESE, sobre a «Agenda 2030 — Uma União Europeia empenhada no desenvolvimento sustentável a nível mundial», no qual se referia que é «urgente que as instituições da UE e os Estados-Membros estabeleçam um consenso ao mais alto nível político sobre a via a seguir, através de um acordo interinstitucional entre a Comissão, o Conselho e o Parlamento, a fim de fornecer uma base sólida para a futura ação política. Este acordo sobre a implementação dos ODS deve constituir a base de uma estratégia global para articular a Agenda 2030 com o objetivo de tornar a UE uma União do Desenvolvimento Sustentável». O mesmo parecer exortava a Comissão a «integrar plenamente a Agenda 2030 no Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento».

1.2.

O CESE reconhece a importância do Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento de 2006 para a política de cooperação para o desenvolvimento da União Europeia e dos Estados-Membros (1). O valor acrescentado do Consenso consistiu, fundamentalmente, em assegurar uma visão estabelecida de comum acordo para a UE e os Estados-Membros, bem como um quadro de execução a nível da UE, os quais foram posteriormente transpostos num conjunto de documentos, políticas e ações de orientação, tanto a nível da UE como a nível dos Estados-Membros. Prevê-se que o novo Consenso continue a desempenhar um papel similar.

1.3.

O CESE congratula-se com o compromisso explícito do Consenso para com o objetivo geral de erradicação da pobreza, em virtude de uma abordagem assente em direitos em relação à cooperação para o desenvolvimento e à igualdade de género, garantindo que a Agenda 2030 não exclui ninguém, independentemente do local de residência e da origem étnica, sexo, idade, deficiência, religião ou crença, orientação sexual, estatuto de migrante ou outro.

1.4.

Através da referência à Agenda 2030 e da colocação do foco na erradicação da pobreza, o Consenso confere o devido reconhecimento a este aspeto e reforça o perfil da cooperação para o desenvolvimento como um domínio específico de intervenção da União Europeia. Enquanto a política de desenvolvimento deve ser considerada como um dos pilares da ação externa da UE, o Consenso deve ser visto como uma garantia de que o desenvolvimento se encontra em pé de igualdade com outros domínios de intervenção da União, não podendo ser subordinado a estes (segurança, comércio, justiça e assuntos internos, etc.).

1.5.

A revisão do Consenso chega numa altura muito difícil, em que os valores e princípios europeus fundamentais (artigo 2.o do Tratado da União Europeia) e até a própria existência da UE são alvo de repetidos ataques. Crises múltiplas afetam a capacidade e a vontade dos governos de afetar os recursos necessários à implementação da Agenda 2030. Por conseguinte, é extremamente importante que todos os Estados-Membros da UE, bem como as suas instituições, se empenhem plenamente na aplicação e no cumprimento de um Consenso sobre o Desenvolvimento, incluindo no que se refere às suas implicações financeiras.

1.6.

O Consenso deve tentar definir os papéis da Comissão e dos Estados-Membros, tendo em conta as suas vantagens comparativas específicas na área do desenvolvimento. Este facto tornou-se ainda mais relevante, uma vez que se espera que a UE e os Estados-Membros reduzam o orçamento total afetado ao desenvolvimento na sequência do Brexit e de mudanças políticas internas. Segundo um relatório solicitado pela Comissão do Desenvolvimento do Parlamento Europeu em 2013 (2), o custo económico da inexistência de uma coordenação eficaz da ajuda ao desenvolvimento entre os Estados-Membros foi estimado em cerca de 800 milhões de euros. Este montante poderia ser economizado anualmente em custos de transação se os doadores concentrassem os seus esforços de ajuda em menos países e atividades. Estimou-se, igualmente, que se poderia atingir um suplemento de 8,4 mil milhões de euros em poupanças anuais através da melhoria dos padrões de afetação transnacionais.

1.7.

A UE e os Estados-Membros não devem utilizar a ajuda ao desenvolvimento como alavanca para impor a cooperação dos parceiros para o desenvolvimento no que se refere aos objetivos nos domínios de política económica e externa, segurança do Estado e controlo da migração. Em contrapartida, a cooperação para o desenvolvimento deve concentrar-se no seu objetivo principal de erradicação da pobreza, igualdade de oportunidades, dignidade para todos e garantia da sustentabilidade ambiental.

1.8.

O CESE chama, em particular, a atenção para o papel da agricultura na política de desenvolvimento. O reforço da base de produção alimentar a nível local, a melhoria da posição das mulheres nas zonas rurais e das associações de agricultores, bem como a cooperação, são fatores importantes para erradicar a pobreza e alcançar os objetivos de desenvolvimento sustentável nos países mais pobres do mundo.

1.9.

O Consenso reconhece o papel que cabe aos parceiros sociais e às organizações da sociedade civil tanto no que respeita à promoção da Agenda 2030 como ao contributo que dão para a sua implementação. Para além da necessidade de lhes conceder um forte apoio político para assegurar um ambiente em que possam desempenhar plenamente o seu papel, importa igualmente que a UE reconheça, apoie e preste apoio às organizações de defesa dos direitos humanos, às organizações de vigilância dos poderes públicos (as chamadas organizações «watchdog») e aos sindicatos que operam em contextos difíceis. A UE deve ainda envidar esforços para desenvolver mecanismos financeiros mais adaptados, que apoiem um leque mais variado de organizações da sociedade civil, de forma a assegurar o acesso das numerosas organizações locais mais pequenas aos programas da UE. O CESE formulou uma série de recomendações importantes a este respeito no seu parecer (REX/461) sobre «A Agenda 2030 — Uma União Europeia empenhada no desenvolvimento sustentável a nível mundial».

1.10.

O diálogo social, que deve ser reconhecido como instrumento de implementação da agenda de desenvolvimento, exige um ambiente propício e um quadro institucional eficaz, a começar pelo respeito da liberdade de associação e pelo direito à negociação coletiva. A UE deve colaborar com organizações independentes de empregadores e de trabalhadores (parceiros sociais), a fim de promover boas práticas no domínio das relações laborais e o funcionamento adequado das administrações do trabalho.

1.11.

Embora os fundos fiduciários da UE sejam um instrumento potencialmente positivo, não há suficientes estudos que provem que eles estão aptos a responder às necessidades de assunção de responsabilidades e de adaptação dos países em desenvolvimento. Uma vez que metade dos Estados-Membros aumenta as afetações de ajuda pública ao desenvolvimento (APD) para o setor privado, os investimentos do setor comercial com dinheiros públicos continuam em grande parte a não ser transparentes nem supervisionados (3). Os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil devem ser apoiados e autorizados a supervisionar a afetação de dinheiros públicos ao desenvolvimento, incluindo os que se destinam ao setor privado, e também ser envolvidos de forma significativa na formulação, implementação, monitorização e avaliação dos programas de desenvolvimento, de modo a corresponderem às necessidades reais do maior número possível de pessoas.

1.12.

A criação de emprego representa um desafio importante nos países em desenvolvimento e o setor privado tem um papel importante a desempenhar neste contexto. O parecer do CESE (REX/386) sobre a «Participação do setor privado no quadro de desenvolvimento pós-2015» destaca a importância do meio empresarial no combate à pobreza no mundo, na medida em que «cria emprego, produz bens e serviços, gera receitas e benefícios e contribui, através dos impostos que paga, para cobrir despesas públicas». No entanto, a criação de emprego não deve ser um fim em si, salvo se assegurar normas laborais e ambientais e um trabalho condigno, sobretudo para as mulheres e os jovens, em conformidade com a Agenda do Trabalho Digno da Organização Internacional do Trabalho (OIT), as normas de trabalho da OIT e outros documentos internacionais (por exemplo, os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos e as Orientações da OCDE para as Empresas Multinacionais).

1.13.

O CESE considera que o fundamento para a inclusão e a sustentabilidade assenta em empregos condignos e estáveis (sobretudo para as mulheres e os jovens), que geram receitas suficientes e cadeias de valor sustentáveis para uma série de serviços públicos consolidados. É necessário promover novos modelos de produção e consumo no âmbito da economia circular. Os grupos vulneráveis serão mais bem protegidos e terão acesso a serviços financeiros, sendo que um setor de negócios digno, justo e sustentável desenvolverá novos modelos empresariais (empresas sociais que fornecem serviços locais) e novas PME, regulamentadas de forma adequada.

2.   Contexto

2.1.

A política de desenvolvimento é parte essencial da ação externa da UE, em conformidade com o disposto no artigo 21.o, n.o 2, alínea d), do Tratado da União Europeia (TUE), devendo promover o desenvolvimento sustentável nos planos económico, social e ambiental dos países em desenvolvimento, tendo como principal objetivo erradicar a pobreza, como previsto no artigo 208.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).

2.2.

O novo Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento proposto visa estabelecer o enquadramento para a abordagem comum da política de cooperação para o desenvolvimento que será seguida pela UE e pelos Estados-Membros.

2.3.

Ao mesmo tempo, o Consenso representa uma declaração firme ao mundo, realçando a determinação da UE em permanecer um ator global credível, empenhado e responsável, que dá o exemplo. Estabelece os princípios e as prioridades da União no que toca a problemas mundiais sérios, bem como às formas de cumprimento dos compromissos assumidos pela UE na Agenda 2030 e no Acordo de Paris.

2.4.

O CESE observa que a revisão do Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento é oportuna e extremamente significativa no novo contexto, uma vez que visa não só orientar o compromisso da UE e dos Estados-Membros na aplicação da Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável, como também contribuir para a realização das prioridades da ação externa da UE, conforme previsto na estratégia global para a política externa e de segurança da UE.

2.5.

A crise económica prolongada, o Brexit, as mudanças políticas nos Estados Unidos da América, as perturbações crescentes no Leste, o conflito na Síria e as suas consequências humanitárias, o aumento do populismo e da xenofobia nos Estados-Membros, o impacto económico das alterações climáticas, tudo fatores que se conjugam para criar o maior desafio com que a UE se deparou em mais de meio século.

2.6.

Tal como sublinhado na nova estratégia global para a política externa e de segurança da União Europeia, intitulada «Visão partilhada, ação comum: Uma Europa mais forte», adotada em 2016, o novo contexto interno e mundial trouxe mais instabilidade e insegurança. Por conseguinte, a UE deve ser mais forte e mais unida do que nunca perante as ameaças existenciais cada vez maiores.

2.7.

A UE assumiu o compromisso coletivo de afetar 0,7 % do rendimento nacional bruto (RNB) à ajuda pública ao desenvolvimento (APD) dentro do prazo fixado na Agenda 2030. Para concretizar as ambições do Consenso, a UE e os Estados-Membros devem cumprir os objetivos em matéria de ajuda. Atualmente, atendendo ao contexto político da Europa, existem sérias preocupações relativamente à vontade dos governos, atuais e futuros, de manter este nível de compromisso financeiro. As evoluções políticas nos Estados-Membros poderiam pôr em causa os compromissos de cooperação para o desenvolvimento dos governos nacionais, uma vez que os movimentos políticos populistas reclamam, com firmeza, que se diminua a solidariedade a nível mundial e as despesas com a APD.

2.8.

Uma vez que o Reino Unido constituiu a maior fonte de ajuda ao desenvolvimento na UE (com mais de 14 mil milhões de euros em 2015), o Brexit terá já um impacto direto na posição e na capacidade da UE neste domínio de intervenção específico, limitando os recursos que previra afetar à implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Estima-se que, para além da capacidade de natureza não financeira, a UE venha a perder, através do Brexit, cerca de 15 % do seu orçamento destinado à ajuda ao desenvolvimento. É extremamente importante que os Estados-Membros conjuguem esforços e cumpram os objetivos no domínio da ajuda ao desenvolvimento.

2.9.

A UE deve assegurar que a APD se continua a centrar essencialmente na redução da pobreza nos países em desenvolvimento, que os fundos são aplicados eficaz e efetivamente em seu benefício e que a Coerência das Políticas para o Desenvolvimento (CPD) será reforçada. O relatório AidWatch de 2016 realizado pela Concord revela que, desde 2015, 17 % da ajuda da UE já não reflete uma transferência real de recursos para os países em desenvolvimento, uma vez que foi utilizada para as despesas dos doadores com os refugiados, para a diminuição do peso da dívida, para as despesas relacionadas com os estudantes, para a ajuda condicionada e para o pagamento de juros. Alguns Estados-Membros aumentaram quase todas as ajudas notificadas através de despesas com os refugiados nos próprios países, passando assim a ser os seus próprios principais beneficiários.

2.10.

A UE, quer pela sua natureza, quer por razões subjacentes à sua criação, é obrigada a promover e a defender o multilateralismo, ou seja, uma ordem mundial baseada em regras, na paz em todo o mundo e nos direitos humanos. Ao longo do tempo, a UE tornou-se um ator global necessário, responsável e regido por princípios, que abordou as razões subjacentes aos conflitos e à pobreza, promoveu os direitos humanos universais, deu o exemplo e utilizou o seu poder de influência para induzir mudanças positivas em todo o mundo.

2.11.

O compromisso da UE, juntamente com os Estados-Membros, enquanto ator global que assume a liderança na cooperação para o desenvolvimento, passou a ser parte da identidade da União e da sua projeção externa.

2.12.

A UE é o mercado mais aberto do mundo, aplicando concessões pautais generosas aos países em desenvolvimento que cumprem e ratificam as convenções internacionais fundamentais relacionadas com os direitos humanos e os direitos laborais, ambientais e de boa governação.

2.13.

Para além dos fluxos financeiros, a UE é um parceiro político essencial para os países em desenvolvimento, apoiando-os nas mudanças políticas e sociais positivas e ajudando-os a participarem, de forma mais ampla e esclarecida, nos processos políticos e económicos mundiais.

2.14.

A UE desempenhou um papel importante na formulação e implementação dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) (2005-2015) e foi uma força motriz importante para a adoção dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) (2016-2030), contribuindo de forma decisiva para a inclusão, na nova agenda de desenvolvimento global, dos valores da UE, tais como os direitos humanos, a democracia, o Estado de direito e a justiça social.

2.15.

A UE é um ator global de primeira linha, que impulsionou a agenda das alterações climáticas e teve um papel importante na criação de uma ampla coligação dos países desenvolvidos e em desenvolvimento que contribuíram para a adoção do Acordo de Paris, em dezembro de 2015. A UE comprometeu-se a afetar 20 % do seu orçamento a ações em matéria de clima, tanto de atenuação como de adaptação, a fim de apoiar o Acordo de Paris.

2.16.

Segundo o inquérito Eurobarómetro da UE sobre a cooperação e o desenvolvimento internacional, lançado em fevereiro de 2016, quase nove em cada dez cidadãos da União apoiam o desenvolvimento (89 %, ou seja, um aumento de quatro pontos percentuais em relação a 2014). Nos novos Estados-Membros, os números tendem a ser ligeiramente mais baixos do que nos Estados-Membros mais antigos. Os números mostram um aumento na proporção de pessoas que pensam que a luta contra a pobreza nos países em desenvolvimento deve constituir uma das principais prioridades da UE (com cinco pontos percentuais, até aos 69 %) e dos governos nacionais (com cinco pontos percentuais, até aos 50 %). Quase sete em cada dez participantes no inquérito se declararam a favor de um aumento da ajuda ao desenvolvimento concedida pela UE (68 %) — uma percentagem mais elevada do que nos últimos anos. Quase três quartos dos inquiridos concordaram que a ajuda ao desenvolvimento é uma forma eficaz de combater a migração ilegal (73 %), e 80 % dos europeus consideram que o desenvolvimento é do interesse da própria UE. Por outro lado, 52 % consideram que a UE deve cumprir a promessa de aumentar a ajuda aos países em desenvolvimento.

3.   Observações

3.1.

A interconectividade representa o pilar central da Agenda 2030, um quadro de ação para a elaboração de estratégias nacionais abrangentes relativas ao desenvolvimento sustentável, que integrará de forma equilibrada as dimensões económica, social e ambiental para obter efeitos positivos em áreas interligadas, tendo simultaneamente em conta fatores transversais, nomeadamente a igualdade entre homens e mulheres, a juventude, a mobilidade, a migração, o investimento e a energia sustentável. As prioridades definidas pela Agenda 2030 são estruturadas em torno dos seguintes elementos: população, planeta, prosperidade, paz e parceria.

3.2.

Embora o número das pessoas que vivem em situação de pobreza extrema tenha diminuído em mais de metade entre 1990 e 2015, mais de 800 milhões de pessoas ainda subsistem com menos de 1,25 dólares por dia, das quais 80 % vivem na África Subsariana e na Ásia do Sul. O Consenso centra-se na necessidade de erradicar a pobreza nos países muito pobres, instáveis ou afetados por conflitos e de reforçar a resiliência, sobretudo das populações vulneráveis, perante os choques ambientais e económicos, as catástrofes naturais ou provocadas pelo homem e as ameaças mundiais para a saúde.

3.3.

Até 2030, a população pobre estará concentrada em países instáveis que sofrem os efeitos de conflitos que criam ainda mais pobreza. Nestas condições, para poder ajudar os pobres, são necessárias diferentes abordagens. Embora haja cada vez mais pessoas que saem de uma situação de pobreza extrema, a desigualdade entre os países e no interior destes tem vindo a aumentar. Para além da pobreza, dos conflitos e das alterações climáticas, a igualdade tornou-se a principal fonte de instabilidade na maior parte do mundo.

3.4.

A política de cooperação para o desenvolvimento será definida pelos seguintes elementos que constituem a base do desenvolvimento sustentável: a problemática da discriminação e das desigualdades, o facto de ninguém dever ser excluído e o foco na erradicação da pobreza. Desta forma, realizar-se-ão progressos no plano da dignidade humana: erradicação da fome, acesso universal à educação e à formação, sistemas de cuidados de saúde, trabalho condigno para todos, transição de uma economia informal para uma economia formal, proteção social correta e adequada, e um ambiente saudável. Estes desideratos podem ser concretizados através de uma governação baseada em políticas nacionais consolidadas e corretas, que constituam um pilar de proteção das pessoas vulneráveis.

3.5.

Uma ação comum sustentável trará benefícios para as populações em situação de pobreza crónica, além de gerar crescimento económico, reduzir as desigualdades e transformar oportunidades em resultados. As realizações económicas concretas deverão ser acompanhadas por políticas de despesa pública redistributivas, consolidando o acesso a serviços de qualidade, com destaque para a educação, os serviços de saúde e o saneamento.

3.6.

Ao mesmo tempo, serão criados serviços de proteção social sustentáveis, corretos, equitativos e articulados através da solidariedade laboral que gera receitas. Um serviço elementar pode ser, também, a garantia de um rendimento básico (como novo instrumento) necessário para a resiliência, para evitar recaídas na pobreza extrema. Importa também consolidar as estruturas sociais a médio e longo prazo. Importa também consolidar as estruturas sociais a médio e longo prazo.

3.7.

Embora o Consenso não o refira explicitamente, espera-se que seja mantido o compromisso da Agenda Estratégica da União Europeia em Tempos de Mudança de prestar um apoio contínuo de pelo menos 20 % da ajuda da UE à inclusão social e ao desenvolvimento humano.

3.8.

Um elemento fundamental é a proteção e o exercício dos direitos das mulheres e das raparigas, a saúde sexual e reprodutiva e os direitos afins, fator essencial do desenvolvimento humano. Ao mesmo tempo, importa reforçar a resiliência das populações vulneráveis perante os choques económicos e ambientais, incluindo as catástrofes naturais ou antrópicas. É necessário um sistema para o fornecimento de ajuda humanitária que seja coerente, integrado e destinado a prestar assistência a pessoas deslocadas (com especial atenção aos menores e outras pessoas vulneráveis), reforçando o acesso à educação e a trabalho condigno.

3.9.

A capacidade vital humana realiza-se através do acesso a alimentos variados e suficientes, nutritivos, seguros e equitativamente acessíveis. É necessário um apoio às comunidades pobres para terem um acesso a recursos fundiários, água (incluindo água potável), saneamento, bem como a fontes contínuas de energia limpa, a um preço correto e equitativo, com efeitos mínimos sobre o ambiente. O acesso reduzirá as formas de desnutrição e subnutrição, bem como o atraso no crescimento e na emancipação das crianças, e contribuirá para a sua saúde mental. Por conseguinte, o acesso a serviços melhorados (progresso tecnológico e inovação digital) aumentará a qualidade de vida das populações rurais e urbanas em explosão demográfica, contribuindo para uma população mais saudável, mais próspera e mais digna, capaz de responder às necessidades.

3.10.

A resiliência e a sustentabilidade são elementos essenciais, indispensáveis para a identificação de uma solução viável no atual contexto global complexo, dinâmico e imprevisível. A vulnerabilidade agrava os efeitos mais extremos da pobreza, ao passo que a fragilidade extrema prolongada, relacionada com crises estruturais recorrentes, continua a gerar intervenções humanitárias de emergência, impedindo o desenvolvimento das comunidades. A persistência de conflitos ultrapassa os recursos, impede o exercício dos direitos humanos fundamentais e determina o aumento do número de refugiados e deslocados. O progresso está a ser posto em causa por situações recorrentes que colocam desafios à saúde pública.

3.11.

O acesso a serviços energéticos sustentáveis e a preços comportáveis (produção de energia renovável e combate à pobreza energética) permanece limitado e representa um obstáculo ao crescimento económico e à industrialização correta e eficaz, adaptada às condições, necessidades e possibilidades locais (em conformidade com a proteção do ambiente). O acesso aos recursos é limitado, dado que uma exploração não sustentável conduz ao seu esgotamento.

3.12.

A agricultura sustentável, os sistemas alimentares racionais e a pesca sustentável geram produtos que podem satisfazer de forma eficaz as necessidades das populações, com um crescimento exponencial quando existe uma pressão limitada sobre o ambiente. O stress hídrico e a procura (não sustentável) de água afetam as alterações climáticas.

3.13.

O Consenso pretende prestar especial atenção aos dividendos demográficos da juventude dos países em desenvolvimento, bem como à exploração do potencial de 1,3 mil milhões de pessoas, como força motriz para um crescimento inclusivo e para o desenvolvimento sustentável, através da criação de novos empregos de qualidade e do apoio à responsabilização e participação dos jovens nas economias, nas sociedades e nos processos decisórios locais, bem como na condução dos assuntos públicos.

3.14.

É necessário viabilizar a transição para a economia circular, de modo a permitir utilizar eficazmente os recursos disponíveis e apoiar o processo mais vasto de desenvolvimento correto e sustentável. Os novos intervenientes do setor privado têm um verdadeiro potencial para propor parcerias e soluções inovadoras, dispondo de mecanismos financeiros eficazes, viáveis e éticos que se podem tornar modelos de progresso. A cooperação e as tecnologias da informação e da comunicação (redes e infraestruturas resistentes e eficazes) são a chave do sucesso, desde que os recursos e os investimentos sejam realinhados para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, a fim de realizar progressos como resposta aos desafios globais.

3.15.

A erradicação da pobreza e o desenvolvimento sustentável pressupõem que haja sustentabilidade ambiental, um clima estável e oportunidades para os grupos vulneráveis da sociedade. Os processos económicos desequilibrados podem comprometer a paz e a estabilidade e causar migrações em larga escala. É necessário integrar as questões ambientais em medidas preventivas, incluindo o reforço da aplicação do princípio do «poluidor-pagador». Um setor privado responsável pode desempenhar um papel fundamental, promovendo a eficiência na utilização dos recursos, a produção e o consumo sustentáveis, elementos suscetíveis de dissociar o crescimento económico da degradação do ambiente na transição para a economia circular.

3.16.

O papel do setor privado na implementação da Agenda 2030 deve ser avaliado com base na sua capacidade de contribuir para a consecução dos objetivos de desenvolvimento nos países beneficiários, com base nos princípios da Parceria Global para a Eficácia da Cooperação para o Desenvolvimento. Embora os novos instrumentos de financiamento que envolvem intervenientes privados possam representar ferramentas eficazes que geram desenvolvimento económico, emprego e receitas públicas, é importante que sejam sujeitos às mesmas condições de transparência e de avaliação que o financiamento público. A UE e os Estados-Membros devem financiar avaliações transparentes e independentes, que permitam às partes interessadas, inclusivamente a nível local, avaliar a relação custo-eficácia e o impacto das atividades de financiamento do desenvolvimento dos setores privado e comercial. A UE e os seus Estados-Membros devem chegar a acordo sobre uma narrativa coerente quanto ao papel do setor privado no desenvolvimento, a fim de assegurar que nenhuma região ou país que necessite de ajuda é deixado para trás. Os mecanismos inovadores de financiamento do desenvolvimento, como as parcerias público-privadas (PPP), devem ser avaliados à luz dos princípios do desenvolvimento e da relação custo-eficácia, para evitar a concessão de ajuda condicionada e garantir um quadro regulamentar que permita aos governos organizar serviços públicos.

3.17.

A União Europeia deve promover fortes instrumentos internacionais no âmbito do empreendedorismo responsável, a fim de encorajar práticas empresariais e criar cadeias de abastecimento responsáveis. Numa altura em que há cada vez mais interesse no setor privado enquanto agente de desenvolvimento, cumpre conferir maior importância aos atuais instrumentos destinados a promover uma conduta empresarial responsável. A adesão aos princípios e às orientações internacionalmente reconhecidos em matéria de comportamento das empresas e aos respetivos instrumentos de responsabilização devem constituir condições fundamentais para a concessão de apoio ao setor privado no quadro da cooperação para o desenvolvimento. O seu cumprimento deve ser condição de elegibilidade, devendo ser aplicável, em caso de incumprimento, um sistema de controlo adequado que conduza à reavaliação do apoio financeiro.

3.18.

Importa apoiar firmemente as práticas empresariais responsáveis, a integração dos direitos humanos e laborais, bem como as condições de trabalho dignas (em conformidade com a Convenção da Organização Internacional do Trabalho e outras orientações e princípios internacionalmente reconhecidos em matéria de comportamento das empresas), a responsabilidade social das empresas (no que diz respeito a normas laborais e a condições dignas de trabalho), a probidade financeira, a luta contra a corrupção e as normas ambientais. Desta forma será possível evitar abusos e corrupção e promover a transição de uma economia informal para uma economia formal.

3.19.

O CESE considera que um requisito fundamental para o desenvolvimento sustentável é o acesso não discriminatório a uma formação de qualidade ao longo da vida, assegurando a todos os cidadãos os conhecimentos e as capacidades necessárias. Uma vida melhor, mais digna, mais empenhada e adequada às capacidades individuais é importante para definir direitos e criar adultos melhores e mais responsáveis numa sociedade correta, baseada no bem-estar social e económico.

3.20.

Outro fator essencial no desenvolvimento sustentável é a conceção, a construção, a implementação e o funcionamento de infraestruturas urbanas eficientes: redes de transportes sustentáveis, interconectadas e seguras, e outras infraestruturas resilientes. As cidades devem tornar-se plataformas de crescimento e inovação inclusivas, tendo em conta as comunidades rurais circundantes, com serviços básicos dignos. Estes desideratos são abrangidos pelo conceito de ordenamento do território, apoiado pela gestão equitativa dos mercados financeiros, bem como pela mobilidade urbana.

3.21.

A desigualdade, a ausência do Estado de direito, a exclusão e as violações dos direitos humanos e a impossibilidade de satisfazer as necessidades das pessoas são as principais causas da pobreza, da fragilidade e dos conflitos que geram deslocações forçadas. A governação democrática é a garantia do respeito dos direitos civis, políticos, económicos, sociais, culturais (diversidade cultural) e religiosos. O diálogo político — elemento essencial para a ação —, a reforma da justiça, o acesso à justiça para todos, bem como uma justiça independente, aberta, responsável e eficiente, aliviarão o fardo que pesa sobre os grupos vulneráveis da sociedade. É necessário reforçar o Estado de direito, combater a criminalidade e a violência urbanas, maximizar a segurança humana, consolidar o Estado, aumentar a responsabilização, promover a transparência e prevenir os conflitos. Igualmente importante é reforçar a confiança entre o governo e a população.

3.22.

O desenvolvimento sustentável necessita de sociedades inclusivas e de instituições democráticas que promovam os valores universais: boa governação a vários níveis, Estado de direito, transparência nos processos decisórios, iniciativas de combate à corrupção, direitos humanos, uma sociedade aberta, livre e correta e uma sociedade civil inclusiva e transparente, capaz de resistir a choques internos e externos.

3.23.

No contexto da futura estratégia da UE no domínio das relações culturais internacionais (JOIN 2016/029 e parecer do CESE (REX/480) ainda em elaboração), o Comité realça a importância da cultura como o quarto pilar da Agenda para o Desenvolvimento, recomendando, por conseguinte, a sua inclusão entre as prioridades do novo Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento.

3.24.

No seu parecer (SOC/268) sobre o tema «Imigração e cooperação para o desenvolvimento», adotado em 2007, o CESE refere que as migrações são positivas tanto para os países de origem como para os países de acolhimento. É de assinalar, porém, que uma má gestão das migrações pode violar os direitos humanos e negar às pessoas o acesso à saúde e à educação. Os migrantes podem tornar-se vítimas de trabalho forçado e de tráfico de seres humanos. Impõem-se reações e ações rápidas e firmes, tanto nos países de origem e de trânsito como nos países de destino, sendo necessária uma coordenação sistemática, estruturada e baseada em sinergias para maximizar os efeitos possíveis e reduzir a migração ilegal. Esta coordenação deve articular-se com a ajuda humanitária. A solução passa por uma política de desenvolvimento sustentável, um esforço contínuo nos países na origem dos fluxos migratórios. O diálogo político é uma componente da política externa europeia e uma alavanca propícia para limitar a migração.

3.25.

Segundo o inquérito Eurobarómetro da UE sobre a cooperação e o desenvolvimento internacional, lançado em fevereiro de 2016, mais de um terço (36 %) dos cidadãos da UE já ouviu falar, pelo menos, nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, mas apenas um em dez sabe o que estes representam (10 %). Os cidadãos das regiões nórdicas e centrais são mais suscetíveis de terem ouvido falar ou de terem lido sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Evidentemente, a UE deve envidar mais esforços no sentido de informar e formar os cidadãos da UE sobre a cooperação para o desenvolvimento, com especial destaque para os Estados-Membros meridionais e orientais. O CESE já formulou esta recomendação no seu parecer (REX/461) sobre a «Agenda 2030 — Uma União Europeia empenhada no desenvolvimento sustentável a nível mundial»: «A Comissão Europeia deve organizar e realizar atividades e campanhas de sensibilização para que a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Social seja uma agenda europeia. Além disso, deve providenciar a realização de inquéritos periódicos do Eurobarómetro com o objetivo de avaliar o nível de consciencialização e de conhecimento dos cidadãos europeus sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. As organizações da sociedade civil têm um papel fundamental a desempenhar neste processo.

3.26.

A UE tem potencial e encontra-se em posição de desempenhar um papel de primeiro plano nos ODS, tanto pela sua capacidade de solidariedade como pelas políticas sociais e pelas parcerias económicas e comerciais com todos os intervenientes interessados que partilham os mesmos valores. A sua extensa rede diplomática assegura a coerência, a congruência, bem como credibilidade e legitimidade acrescidas e um valor acrescentado com impacto positivo. A variedade de experiências europeias, as diferentes abordagens, o valor acrescentado e a unidade na diversidade são elementos específicos da ação externa europeia e uma vantagem competitiva para a UE.

Bruxelas, 26 de abril de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  Documento de trabalho dos serviços da Comissão Avaliação do Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento de 2005 que acompanha a iniciativa «Proposta de um novo Consenso para o Desenvolvimento».

(2)  «The Cost of Non-Europe in Development Policy: Increasing Coordination between EU Donors» [O custo da não Europa na política de desenvolvimento: aumentar a coordenação entre os doadores da UE], Parlamento Europeu, 2013.

(3)  Relatório AidWatch da Confederação Europeia das ONG de Emergência e Desenvolvimento (Concord), 2016.