ISSN 1725-2482

Jornal Oficial

da União Europeia

C 221

European flag  

Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

48.o ano
8 de Setembro de 2005


Número de informação

Índice

Página

 

II   Actos preparatórios

 

Comité Económico e Social Europeu

 

414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005

2005/C 221/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o XXXIII Relatório sobre a Política de Concorrência — 2003(SEC(2004) 658 final)

1

2005/C 221/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo aos direitos e obrigações dos passageiros dos serviços ferroviários internacionaisCOM(2004) 143 final — 2004/0049 (COD)

8

2005/C 221/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho sobre indemnização por incumprimento dos requisitos de qualidade contratuais nos serviços de transporte ferroviário de mercadoriasCOM(2004) 144 final — 2004/0050 (COD)

13

2005/C 221/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Livro Branco sobre os serviços de interesse geralCOM(2004) 374 final

17

2005/C 221/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Utilização da energia geotérmica — O calor da terra

22

2005/C 221/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselhom relativo à realização das fases de implantação e de exploração do programa europeu de radionavegação por satéliteCOM (2004) 477 final — 2004/0156 (COD)

28

2005/C 221/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece uma infra-estrutura de informação espacial na Europa (INSPIRE)COM(2004) 516 final — 2004/0175 (COD)

33

2005/C 221/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Gestão dos riscos de inundação — Protecção contra as cheias e inundações, sua prevenção e mitigaçãoCOM(2004) 472 final

35

2005/C 221/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho relativo ao financiamento da política agrícola comumCOM(2004) 489 final — 2004/0164 (CNS)

40

2005/C 221/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CEE) n.o 2759/75, o Regulamento (CEE) n.o 2771/75, o Regulamento (CEE) n.o 2777/75, o Regulamento (CE) n.o 1254/1999, o Regulamento (CE) n.o 1255/1999 e o Regulamento (CE) n.o 2529/2001 no que diz respeito às medidas excepcionais de apoio do mercadoCOM(2004) 712 final — 2004/0254 (CNS)

44

2005/C 221/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu Beijing dez anos depois: avaliação dos progressos na Europa e nos países em desenvolvimento em matéria de igualdade entre homens e mulheres

46

2005/C 221/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Verde — Contratos públicos no sector da defesa (COM(2004) 608 final)

52

2005/C 221/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Directiva 2001/12/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2001, que altera a Directiva 91/440/CEE do Conselho relativa ao desenvolvimento dos caminhos-de-ferro comunitáriosCOM(2004) 139 final — 2004/0047 (COD)

56

2005/C 221/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à certificação do pessoal de bordo que assegura a condução de locomotivas e comboios na rede ferroviária da ComunidadeCOM(2004) 142 final — 2004/0048 (COD)

64

2005/C 221/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho relativo à aplicação de um sistema de preferências pautais generalizadasCOM(2004) 699 final — 2004/0242 (CNS)

71

2005/C 221/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria um procedimento de injunção de pagamentoCOM(2004) 173 final/3 — 2004/0055 (COD)

77

2005/C 221/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à protecção dos menores e da dignidade humana e ao direito de resposta em relação ao desenvolvimento da competitividade da indústria europeia de serviços audiovisuais e de informaçãoCOM(2004) 341 final — 2004/0117 (COD)

87

2005/C 221/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Política de emprego: Papel do CESE após o alargamento e na perspectiva do processo de Lisboa

94

2005/C 221/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Financiamento da rede NATURA 2000 COM(2004) 431 final

108

2005/C 221/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos serviços no mercado internoCOM(2004) 2 final — 2004/0001 (COD)

113

2005/C 221/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu: Compensação e liquidação na União Europeia — O rumo a seguirCOM(2004) 312 final

126

2005/C 221/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um programa de acção integrado no domínio da aprendizagem ao longo da vidaCOM(2004) 474 final — 2004/0153 (COD)

134

2005/C 221/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Como garantir uma melhor integração das regiões em situação de desvantagem natural e estrutural permanente

141

2005/C 221/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre A Política dos Consumidores após o Alargamento da UE

153

PT

 


II Actos preparatórios

Comité Económico e Social Europeu

414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005

8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «XXXIII Relatório sobre a Política de Concorrência — 2003»

(SEC(2004) 658 final)

(2005/C 221/01)

Em 4 de Junho de 2004, a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o «XXXIII Relatório sobre a Política de Concorrência — 2003»

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos do Comité, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 11 de Janeiro de 2005 (relator Franco CHIRIACO).

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu aprovou, por 75 votos a favor com 1 abstenção, o presente parecer.

1.   Introdução

1.1

O relatório deste ano reflecte as importantes alterações ocorridas na organização e nos métodos de trabalho da Comissão no domínio da política de concorrência e documenta o modo como a Comissão assegura a coerência da governação económica europeia.

1.2

A política de concorrência da UE desempenha um papel importante na consecução dos objectivos em matéria de competitividade da estratégia de Lisboa. Engloba não só as regras antitrust e as relativas às operações de concentração, mas também a aplicação de uma disciplina rigorosa e eficiente no domínio dos auxílios estatais.

1.3

A Comissão, a fim de permitir que a entrada dos dez novos Estados-Membros se faça suavemente, deu especial atenção à aplicação de um sistema de regras de concorrência comuns, em prol da igualdade da aplicação das regras dos auxílios estatais a todos os Estados-Membros, acentuando a importância de combater as intervenções estatais que distorcem a concorrência com a mesma firmeza com que se fazem cumprir as regras aplicáveis às empresas.

1.4

Em 2003, o número total de processos novos em matéria de violação do direito da concorrência foi de 815 e, entre outras disposições, foi instituída a figura do Funcionário de Ligação com os Consumidores, com o intuito de assegurar um diálogo permanente com o consumidor europeu, cujo interesse é a principal preocupação da política de concorrência, mas cuja voz não é suficientemente ouvida ao longo da tramitação dos processos ou durante o debate dos aspectos políticos. A função do Funcionário de Ligação com os Consumidores não se limita ao controlo das operações de concentração, envolvendo outrossim o domínio antitrust — cartéis e abusos de posição dominante — e outras vertentes em matéria de concorrência.

1.5

Em Outubro de 2003, a Comissão Europeia publicou um projecto de regulamento e um projecto de orientações relativos aos acordos de transferência de tecnologia sobre o qual o CESE já emitiu parecer (1). O objectivo da proposta de reforma, tendo em conta a evolução registada nos últimos anos neste tipo de acordos, é simplificar e alargar o campo de aplicação do regulamento comunitário sobre a isenção. As novas normas apresentam as seguintes vantagens:

O regulamento de isenção por categoria apenas terá uma lista de proibições («lista negra»): tudo o que não é expressamente excluído da isenção por categoria encontra-se agora isento,

as novas regras distinguirão claramente os acordos entre empresas concorrentes e não concorrentes,

está prevista a adopção de um «pacote de modernização».

1.6

Além disso, a Comissão nomeou um economista principal especializado em concorrência, por três anos a partir de 1 de Setembro de 2003, reforçando ao mesmo tempo de uma forma positiva o papel do auditor. O economista principal desempenha três funções essenciais:

Fornecer orientações económicas e econométricas na aplicação das regras de concorrência comunitárias, incluindo, eventualmente, a contribuição para o desenvolvimento de instrumentos de política geral;

Fornecer orientações gerais sobre processos individuais de concorrência desde a fase inicial; e

Fornecer orientações minuciosas nos processos de concorrência mais importantes, que envolvam questões económicas complexas, em especial os que exijam análises quantitativas sofisticadas.

1.7

O auditor exercerá com responsabilidade alargada e a maior independência o papel de garante do direito a ser ouvido nos processos em matéria de concorrência. Depende directamente do comissário responsável pelas questões da concorrência e não recebe instruções da DG Concorrência. Pode intervir sempre que estejam em causa questões legítimas de direito de defesa, organiza e conduz as audições orais de forma objectiva, decide do direito de terceiros a serem ouvidos e da apresentação de novos documentos. Apresenta ao comissário competente um relatório sobre a audição e as conclusões que dela retira.

2.   Aplicação das regras antitrust — Artigos 81.o e 82.o do Tratado

2.1

Em Outubro de 2003, a Comissão lançou a fase final do processo de reforma do sistema de aplicação das regras antitrust, conhecida por «pacote de modernização», a fim de facilitar a aplicação dos poderes de execução conferidos às autoridades de concorrência e aperfeiçoar os mecanismos de cooperação com as autoridades nacionais de concorrência (ANC) e os tribunais nacionais previstos no Regulamento (CE) n.o 1/2003.

2.2

Concretamente, o pacote de modernização inclui o novo regulamento de aplicação que aborda principalmente as modalidades de audição das partes interessadas, bem como várias outras questões processuais, como o acesso ao processo e o tratamento das informações confidenciais. Os seis projectos de comunicação centram-se, entre outros, nos mecanismos de cooperação entre os vários organismos responsáveis pela aplicação das regras de concorrência comunitárias — Comissão, autoridades nacionais de concorrência e tribunais nacionais, e o conceito de efeitos no comércio entre Estados-Membros, a tramitação das denúncias e das cartas de orientação que a Comissão pode emitir para ajudar as empresas na apreciação de questões novas ou não resolvidas. No atinente ao pacote de modernização no seu conjunto, convém referir o parecer do CESE (1).

2.3

No decurso de 2003, a Comissão adoptou cinco decisões contra acordos horizontais ilícitos: carne de bovino francesa, sorbatos, produtos eléctricos e mecânicos de carbono e de grafite, peróxidos orgânicos e tubos de cobre industriais. O montante das coimas aplicadas ascendeu a mais de 400 milhões de euros, soma que deverá exercer um efeito dissuasivo. As investigações implicam a realização de inspecções a empresas. Concede-se imunidade total em matéria de coimas à primeira empresa que contacta a Comissão sobre a existência de um acordo e que facilite os elementos de prova suficientes para que a Comissão ordene a inspecção. Prevê-se que a Comissão emita parecer favorável quando os acordos entre empresas não limitem a concorrência nos mercados em causa e os consumidores beneficiem da dita cooperação. Em 2003, a Comissão emitiu decisões sobre três casos de violação do artigo 82.o:

estratégia de preços utilizada pela Deutsche Telekom AG (DT) para o acesso local à rede de telefonia fixa;

estratégia de preços da Wanadoo para os seus serviços ADSL; e

abuso de posição dominante no mercado ferroviário italiano (infra-estrutura, tracção e transporte de passageiros) por parte da Ferrovie dello Stato SpA (FS).

3.   Evolução sectorial da política de concorrência

3.1

Em 2003, verificaram-se progressos significativos no processo de liberalização do sector da energia (electricidade e gás), embora não fossem totalmente satisfatórios. De entre estes, o mais importante foi a adopção, em Junho, do pacote legislativo que assegura que todos os consumidores europeus de electricidade e gás possam escolher o seu fornecedor até Julho de 2007. Estas disposições visam obter um equilíbrio entre incentivos à criação de novas infra-estruturas e a realização do mercado comum.

3.2

Subsistem, porém, entre os consumidores e entre as empresas de diversos Estados-Membros sentimentos difusos de insatisfação pelos níveis ainda elevados dos preços e a eficácia relativa destes serviços. Além disso, mormente nos novos Estados-Membros, os parceiros sociais e as associações de consumidores frisam a necessidade de respeitar a independência das autoridades nacionais de concorrência e das autoridades de regulamentação dos serviços de utilidade pública.

3.2.1

Ocasionalmente e embora dispondo de regras de concorrência abrangentes, depara-se, sobretudo nos novos Estados-Membros, com uma certa falta de vontade em assegurar o seu controlo e em permitir às agências de execução que desempenhem o seu papel adequadamente, facto este que tem impedido a promoção dos interesses dos consumidores e de mercados eficientes. O Comité apoia o reconhecimento formal da complementaridade entre política de concorrência e política dos consumidores. Um movimento de consumidores mais organizado e com mais recursos terá mais depressa condições de ajudar os governos a tomarem decisões e de prestar informações sobre os mercados e as práticas anticoncorrenciais.

3.3

A directiva sobre os serviços postais, adoptada em 2002, define um caminho claro para a conclusão do mercado interno, através, nomeadamente, de uma redução progressiva da esfera exclusiva e da liberalização do correio transfronteiriço de saída. Acresce que a Comissão, com base num acordo alcançado no Conselho Europeu, realizará em 2006 um estudo para avaliar a situação do serviço universal em cada Estado-Membro. A partir dos resultados deste estudo, a Comissão adoptará uma proposta de abertura total do mercado postal a partir de 2009 ou qualquer outra medida tendente a assegurar a prestação do serviço universal.

3.4

Em Julho de 2004 terminou o prazo para a transposição do novo pacote regulamentar sobre as comunicações electrónicas para o direito nacional. No relatório sobre o assunto, a Comissão sublinhou os princípios seguintes: é necessário analisar os mercados com base nos princípios em matéria de concorrência; só podem ser impostas obrigações às empresas que detêm uma posição dominante; todos os serviços e as redes de comunicação electrónica devem ser tratados de modo não discriminatório (neutralidade tecnológica). O desenvolvimento das comunicações electrónicas e o seu acesso generalizado não bastam para garantir o relançamento do crescimento económico. Para tanto, é fundamental aumentar o nível de conhecimento e de competência de todos os utilizadores das tecnologias da informação e comunicação.

3.5

A Comissão decidiu, em 2003, iniciar um diálogo sectorial, não relacionado com processos específicos, com todos os interessados no sector dos transportes aéreos. O objectivo é preparar orientações políticas transparentes e coerentes sobre as questões fundamentais da aplicação do direito da concorrência no domínio das alianças e concentrações entre companhias aéreas.

3.5.1

Foi, além disso, lançado o trabalho de definição e execução de orientações comuns para a aplicação plena das regras antitrust no sector ferroviário no que respeita ao transporte de mercadorias e de passageiros.

3.5.2

O diálogo sectorial prosseguiu também no sector dos transportes marítimos, da distribuição de veículos automóveis e dos seguros, com o objectivo de rever ou de adoptar regulamentos de isenção por categoria.

3.5.3.

O diálogo sectorial que se desenvolverá nos sectores de transporte supracitados deverá ter igualmente em conta formas comparáveis de tratamento fiscal.

3.6

Meios de comunicação social: A Comissão considera fundamental o pluralismo dos meios de comunicação social para o desenvolvimento da União Europeia e da identidade cultural dos Estados-Membros, mas recorda que a responsabilidade do controlo da concentração dos meios de comunicação social incumbe fundamentalmente aos Estados-Membros. A aplicação de instrumentos da política de concorrência no sector dos meios de comunicação está limitada ao mercado subjacente, à incidência económica do comportamento das empresas de comunicação social e ao controlo dos auxílios estatais. Não pode — nem pretende — substituir os controlos nacionais da concentração dos meios de comunicação, nem as medidas nacionais para garantir o pluralismo. O campo de aplicação das regras de concorrência limita-se à resolução dos problemas suscitados pela criação ou pelo reforço de posições dominantes nos mercados respectivos e ao controlo da exclusão dos concorrentes desses mercados.

3.6.1

Convém observar que esta posição da Comissão, embora formalmente correcta, não conseguiu impedir ou opor-se, sobretudo em alguns países, a posições dominantes e práticas anticoncorrenciais. Os mercados em causa são diversos e neles o mercado publicitário televisivo exerce um peso determinante no pluralismo, questão que ainda não foi adequadamente explorada.

3.6.2

Acresce que, no controlo das concentrações, foram negligenciados os métodos que alguns grupos de sociedades activos no sector dos meios de comunicação social empregam para reforçar a sua posição dominante, nomeadamente mediante o recurso a medidas defensivas destinadas a desencorajar as aquisições hostis por meio do endividamento da empresa visada ou mediante a atribuição de direitos de voto múltiplos que facilitam o controlo da sociedade por parte dos accionistas minoritários.

3.6.3

A Comissão deverá, portanto, manter-se excepcionalmente vigilante quanto à aplicação das normas e das práticas concorrenciais.

3.7

Profissões liberais: A Comissão Europeia pôs à disposição do público um estudo realizado pelo Institute for Advanced Studies (IHS), de Viena. Este estudo revelou níveis de regulamentação significativamente diferentes entre os Estados-Membros e também entre as diversas profissões. Concluiu que nos países relativamente menos regulamentados uma maior liberdade nas profissões liberais permitiria uma maior criação de riqueza a nível global.

3.7.1

Além disso, a Conferência sobre a Regulamentação das Profissões Liberais, realizada em Outubro de 2003, em Bruxelas, debateu, na presença de 260 representantes das partes interessadas, os efeitos das várias disposições regulamentares na estrutura empresarial e na protecção dos consumidores.

3.7.2

O Comissário Mario Monti, no discurso de encerramento da conferência, anunciou a intenção de a Comissão publicar um relatório sobre a concorrência no sector das profissões liberais no início de 2004. O relatório em causa, que contém orientações e directrizes assaz importantes, foi publicado em 9 de Fevereiro de 2004.

4.   Reforma do controlo das concentrações

4.1

Em 27 de Novembro de 2003, o Conselho chegou a um acordo político sobre a reformulação do regulamento das concentrações, que integra uma parte substancial das alterações propostas pela Comissão em Dezembro de 2002. Estas alterações referem-se a medidas não legislativas destinadas a racionalizar o processo de decisão, a melhorar a análise económica e a garantir o direito de defesa. Além disso, a Comissão nomeou um economista especializado em concorrência e instituiu um painel para garantir conclusões plenamente independentes. No tocante à avaliação das fusões, remete-se para o parecer do CESE sobre a proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às fusões transfronteiras das sociedades de capitais (2).

4.2

Objectivo: assegurar que o critério material do regulamento das concentrações (critério da posição dominante) seja efectivamente aplicado a todas as operações de concentração de que resultem entraves significativos à concorrência, preservando a segurança jurídica. O critério material foi comparado com o critério da«redução substancial da concorrência» (substantial lessening of competition), passando a ter a seguinte redacção: «uma operação de concentração susceptível de entravar de modo significativo uma concorrência efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste, nomeadamente em resultado da criação ou reforço de uma posição dominante, deve ser declarada incompatível com o mercado comum».

4.2.1

A nova disposição, quando diz «em resultado da criação ou reforço de uma posição dominante...» deixa entrever um alargamento potencial do campo de aplicação da proibição a âmbitos não vinculados ao requisito de posição dominante. Não obstante, esta norma é interpretada e aplicada à luz do disposto na declaração conjunta do Conselho e da Comissão sobre o artigo 2.o com referência ao considerando n.o 25 do regulamento (3), quando precisa que «[A noção de entrave significativo a uma concorrência efectiva] ... deverá ser interpretada como abrangendo, para além dos casos em que é aplicável o conceito de posição dominante, apenas os efeitos anticoncorrência de uma concentração resultantes do comportamento não concertado de empresas que não teriam uma posição dominante no mercado em questão».

4.3

Orientações relativas à apreciação de concentrações de carácter horizontal: Trata-se da concorrência entre empresas concorrentes ou potencialmente concorrentes. As orientações deixam claro que as fusões e aquisições só serão ilícitas se delas resultar uma empresa com um poder de mercado tão grande que seja susceptível de ter consequências negativas para os consumidores, nomeadamente sob a forma de preços mais elevados, produtos de qualidade inferior ou redução das possibilidades de escolha, independentemente de os efeitos anticoncorrenciais decorrerem da criação ou do reforço de um único operador dominante no mercado ou de resultarem de uma situação de oligopólio. O efeito provável de uma operação de concentração será, além disso, apreciado em relação ao que aconteceria no mercado se a operação não se realizasse. Isto pode significar, por exemplo, que a aquisição de uma «empresa insolvente» não justificará a intervenção da Comissão.

4.4

Novo código de boas práticas: No âmbito do pacote de reformas de 2002, a Comissão lançou uma consulta pública sobre uma versão revista do código de boas práticas sobre a condução das investigações em matéria de concentrações, cujo período de consulta terminou oficialmente em Fevereiro de 2003. O código de boas práticas visa fornecer às partes interessadas orientações sobre a gestão dos procedimentos em matéria de controlo das concentrações a nível da UE.

5.   Cooperação internacional

5.1

A Comissão participa activamente no grupo de trabalho da Rede Internacional da Concorrência (RIC) sobre o controlo multijurisdicional das concentrações. As actividades do grupo de trabalho organizam-se em três subgrupos:

notificação e procedimentos,

técnicas de investigação,

quadro analítico.

5.1.1

A Comissão participa activamente nos trabalhos dos três subgrupos. O seu objectivo fundamental é melhorar a compreensão mútua entre jurisdições de controlo das concentrações de modo a tornar a sua actividade mais eficaz.

5.1.2.

Mais em geral, a RIC configura-se como rede virtual entre várias autoridades de concorrência, que procura facilitar a cooperação internacional e formular propostas com vista a reduzir os custos regulamentares e a favorecer a convergência processual e substantiva.

5.1.3.

Na Segunda Conferência Anual da RIC, que decorreu em Mérida, no México, em Junho de 2003, foi acentuada a necessidade de adoptar em matéria de concorrência uma linguagem clara e facilmente acessível, e insistiu-se no carácter estratégico da actividade de promoção da concorrência nos sectores regulamentados, reduzindo assim os custos regulamentares e removendo obstáculos à compreensão mútua entre jurisdições de controlo das concentrações.

6.   Auxílios estatais

6.1

O controlo dos auxílios estatais centra-se nos efeitos sobre a concorrência dos auxílios concedidos pelos Estados-Membros às empresas. Objectivo: assegurar que as intervenções públicas não comprometem o funcionamento harmonioso do mercado interno, fomentam a concorrência e mercados competitivos na Comunidade e reforçam as reformas estruturais. Procura-se, nomeadamente, assegurar que os efeitos benéficos da liberalização não sejam comprometidos por auxílios estatais. Conselho Europeu de Estocolmo: os Estados-Membros devem prosseguir os seus esforços com vista a reduzir o nível dos auxílios estatais, reorientando simultaneamente os auxílios para objectivos horizontais de interesse comunitário (reforço da coesão económica e social, emprego, protecção do ambiente, promoção da I&D, desenvolvimento das PME). A Comissão acompanha de perto a recuperação dos auxílios ilícitos concedidos pelos Estados-Membros.

6.1.1

Neste contexto, lamenta-se a falta de abertura, por parte de uma série de Estados-Membros, dos concursos para fornecimentos públicos a candidatos de outros Estados-Membros. Na UE, o sector dos concursos públicos tem uma facturação anual superior a 1,5 bilião de euros: a prática, seguida por alguns Estados-Membros, de favorecer as empresas nacionais prejudica a concorrência e aumenta a pressão fiscal sobre os consumidores.

6.2

Auxílios estatais de emergência e à reestruturação a empresas em dificuldade: As orientações comunitárias, que vigoraram até Outubro de 2004, dispunham que os auxílios públicos só poderiam ser considerados compatíveis com o mercado comum se respeitassem condições rigorosas. Estas orientações estão a ser reexaminadas e entre os seus principais aspectos referem-se os seguintes:

assegurar que o auxílio de emergência é limitado a um apoio financeiro reversível, temporário e a curto prazo, concedido apenas durante o período estritamente necessário para pôr em prática um plano de reestruturação global,

concentrar o controlo dos auxílios estatais nas grandes empresas activas em toda a UE,

reforçar, sobretudo no caso das grandes empresas, o princípio segundo o qual o beneficiário do auxílio é obrigado a financiar uma parte substancial dos custos de reestruturação, sem qualquer auxílio estatal,

aplicar o princípio do «auxílio único».

6.3

Enquadramento multissectorial para grandes projectos de investimento: Prevê regras estritas para os sectores com dificuldades estruturais. Devia ter sido estabelecida até ao final de 2003 uma lista desses sectores. Devido às dificuldades metodológicas e técnicas para a elaboração dessa lista, a Comissão decidiu adiar a sua adopção e a prorrogação das regras transitórias em vigor aplicáveis a grandes projectos de investimento em sectores sensíveis até Dezembro de 2006.

6.4

Auxílios à I&D a favor das PME: Os auxílios à investigação e desenvolvimento podem contribuir para o crescimento económico, o reforço da competitividade e o aumento do emprego. Revestem importância específica para as PME.

6.5

Auxílios para protecção do ambiente, auxílios à I+D, auxílios à formação e auxílios fiscais: No domínio dos auxílios fiscais, a Comissão examinou, em especial, a aplicação de métodos de tributação alternativos, como o método «cost plus» (percentagem do montante das despesas e dos custos de funcionamento). No domínio dos auxílios sectoriais (em particular, a aplicação do mecanismo defensivo temporal (MDT)) foram considerados os seguintes sectores: siderurgia, telecomunicações, carvão, transporte ferroviário, transporte combinado, transporte rodoviário, transporte marítimo e transporte aéreo.

6.6

Agricultura: Em 23 de Dezembro, a Comissão adoptou um novo regulamento que institui um regime de isenção por categoria relativamente a certos tipos de auxílios estatais. Os Estados-Membros deixam de ter de os notificar previamente à Comissão para aprovação. O novo regulamento será aplicável até ao final de 2006 e diz respeito aos auxílios estatais concedidos às pequenas e médias empresas (PME) do sector agrícola. Tendo em conta a definição de PME (250 empregados no máximo, 40 milhões de euros de volume de negócios ou 27 milhões de euros no balanço), quase todas as explorações agrícolas e empresas do sector agrícola são abrangidas por estas disposições. A Comissão institui igualmente uma nova norma de transparência: cinco dias antes do início do pagamento dos auxílios será publicada na Internet uma síntese de todos os auxílios estatais isentos por Estado-Membro. Todas as partes interessadas terão assim acesso ao conjunto das informações relativas às medidas de auxílio abrangidas pela isenção por categoria.

7.   Observações na generalidade

7.1

Sintetizado e comentado em parte o «XXXIII Relatório sobre a Política de Concorrência — 2003», impõe-se agora formular observações sobre todo o relatório e sobre alguns dos seus aspectos essenciais e perspectivas mais relevantes.

7.2   Relação entre política de concorrência e política económica de desenvolvimento

7.2.1

A política de concorrência da União Europeia tornou-se mais eficaz e mais aberta a uma relação positiva com as empresas e os consumidores, graças à introdução dos novos procedimentos de aplicação das regras antitrust, à revisão do regulamento sobre as concentrações e, por último, às novas disposições na organização interna da Comissão.

7.2.2

Graças à política de concorrência, a União Europeia avançou substancialmente no processo de liberalização, restituindo sectores económicos à lógica e à dinâmica do mercado interno e trabalhando concretamente para a criação de um mercado único europeu. A política de concorrência é, pois, fundamental e a sua plena autonomia deve ser sempre preservada.

7.2.3

Não obstante, a política de concorrência não pode satisfazer por si só a necessidade, particularmente aguda hoje em dia em toda a União, de uma recuperação geral do crescimento e de uma política económica de desenvolvimento sustentado baseada na inovação e no diálogo social. As mutações estruturais ocorridas na produção e no comércio mundial, a começar pelas induzidas pelas novas tecnologias, exigem da Comissão a activação e a coordenação de outros instrumentos de política económica a fim de salvaguardar e relançar a competitividade da economia europeia e de reforçar a coesão económica e social, o emprego, a protecção do ambiente e a promoção de vastos e ambiciosos programas de investigação e desenvolvimento. Tanto a posição da Comissão sobre o tema «Acompanhar as mutações estruturais: Uma política industrial para a Europa alargada» como o parecer elaborado pelo CESE (4) neste contexto apontam nesta direcção. A agenda de Lisboa traça o rumo a seguir. É, porém, preciso concretizá-lo e acelerar a sua realização a nível geral e sectorial.

7.2.3.1

A nível sectorial, o CESE, confirmando as considerações constantes do parecer de 30 de Junho de 2004 sobre «LeaderSHIP 2015 — Definição do futuro do sector europeu da construção e da reparação naval — Competitividade através da excelência» (5), reitera a necessidade de aplicar uma nova abordagem plenamente integrada, definida pelo Conselho «Competitividade» em Novembro de 2003, tendo em vista aumentar a competitividade industrial e encorajar a investigação, o desenvolvimento e a inovação em todos os sectores.

7.3   Auxílios estatais e serviços de interesse geral

7.3.1

O processo de reforma, que pretende racionalizar e simplificar os procedimentos relativos ao controlo dos auxílios estatais, avançou significativamente rumo aos objectivos fixados pelo Conselho Europeu de Estocolmo de reduzir o nível dos auxílios estatais e de os reorientar para objectivos horizontais de interesse comunitário, entre outros os objectivos de coesão. Devem entender-se neste sentido diversas medidas adoptadas pela Comissão, tais como a extensão do campo de aplicação dos auxílios à I&D, bem como as orientações aplicáveis aos acordos de transferência de tecnologia, à reestruturação das empresas em dificuldade, aos auxílios para a formação e a protecção do ambiente, para além do enquadramento multissectorial para grandes projectos de investimento.

7.3.2

O Tribunal de Justiça, no acórdão Altmark, em Julho de 2003, confirmou, sujeita a determinadas condições, a exclusão dos auxílios estatais em causa das compensações concedidas às empresas encarregadas da prestação de serviços de interesse geral. Ficam, todavia, por resolver alguns problemas decorrentes sobretudo da tentativa de estabelecer a relação ideal entre as ajudas estatais e os serviços de interesse geral (SIG). A natureza das condições impostas pelo Tribunal exige, de facto, que a certeza jurídica seja assegurada, sobretudo em matéria de avaliação dos custos, de definição dos financiamentos dos serviços (4) e de melhor descrição do tipo de obrigações de serviço público alvo de compensação. De resto, o Livro Verde sobre os Serviços de Interesse Geral (SIG), publicado em Maio de 2003, reconhecia a necessidade de examinar se os princípios que regem os SIG deviam ser ulteriormente consolidados e precisados num quadro comunitário geral e de determinar a regulamentação óptima desses serviços e as medidas que permitam promover a certeza jurídica de todos os operadores.

7.3.3

Com efeito, as obrigações de serviço universal, não sendo correctamente definidas e financiadas, poderiam conduzir as empresas sujeitas a tais obrigações a perdas crescentes devido à possível entrada dos concorrentes nos segmentos de actividade mais rentáveis.

7.3.4

O CESE frisa, pois, a necessidade, já patente no parecer (1) sobre o citado Livro Verde de adoptar um instrumento claro em matéria de serviços de interesse geral, com o fim de garantir um acesso eficaz e equitativo de todas as pessoas a serviços de elevada qualidade que satisfaçam as suas necessidades. Ademais, recomenda que, para assegurar a reorganização e o funcionamento dos serviços sociais, seja promovido um diálogo com os parceiros sociais e as ONG tão amplo quanto possível.

7.4   Profissões liberais.

7.4.1

Os trabalhos de análise exaustiva efectuados pela Comissão sobre os enquadramentos regulamentares dos serviços profissionais nos Estados-Membros revelaram-se extremamente úteis na medida em que permitiram substanciar eficazmente a mensagem sobre a necessidade de rever, ainda que com ponderação, as disposições restritivas neste campo e de tornar mais produtivo e competitivo o acervo de cultura e conhecimento do mundo profissional, traduzindo-se, obviamente, numa grande vantagem tanto para os profissionais como para as empresas e os consumidores.

7.4.2

Guia-se, pois, pelo senso comum — para além de ser um princípio reiteradamente afirmado pelo Tribunal de Justiça — afirmar que a oferta de serviços profissionais deve respeitar as regras da concorrência. Se é verdade que o critério económico não pode ser o único parâmetro de avaliação de uma prestação profissional, dado que não é uma simples prestação técnica aplicativa e repetitiva, mas uma prestação que confronta um saber e um problema — há que reconhecer que o seu exercício constitui uma actividade económica que, se desenvolvida no respeito das regras de concorrência, produz mais prosperidade e pode dar uma contribuição importante para a agenda de Lisboa.

7.4.2.1.

No tocante ao conteúdo da comunicação da Comissão «Relatório sobre a concorrência nos serviços das profissões liberais» (6), é significativo que, por um lado, se sublinhe que os serviços das profissões liberais têm um papel importante a desempenhar no reforço da competitividade da economia europeia, uma vez que contribuem para a economia e para a actividade empresarial e que, por outro, um corpo significativo de investigação empírica revele os efeitos negativos que uma regulamentação restritiva excessiva ou desactualizada — por exemplo, preços, regras em matéria de publicidade, exigências de entrada e direitos exclusivos, e regras relativas à estrutura das empresas — pode ter para os consumidores.

7.4.3

Impõe-se, pois, lançar e acelerar o processo de reforma. Para o efeito, o CESE solicita à Comissão que honre o compromisso de publicação em 2005 de um relatório sobre os progressos realizados na eliminação das regras restritivas e injustificadas. Recorda, além disso, que, nesse contexto, a Comissão se comprometeu a aprofundar a relação existente entre o nível de regulamentação, os resultados económicos (preço e qualidade) e a satisfação dos consumidores.

7.4.4

Ao mesmo tempo, o CESE chama a atenção para a importância do acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Outubro de 2003, no processo Consorzio Industria Fiammiferi, porquanto dispõe que «perante comportamentos de empresas contrários ao artigo 81. o do Tratado que sejam impostos ou favorecidos por uma legislação nacional que legitima ou reforça os seus efeitos, (...), uma autoridade nacional da concorrência (...) tem obrigação de deixar de aplicar essa legislação nacional».

7.4.5

Por último, o CESE considera necessário promover uma maior e mais consciente participação dos sectores interessados no processo de reforma.

7.5   Pluralidade da informação e direito da concorrência

7.5.1

No XXXIII Relatório sobre a Política de Concorrência, a Comissão sustenta, por um lado, que a manutenção e o desenvolvimento do pluralismo dos meios de comunicação social e a liberdade de fornecer e receber informações são objectivos fundamentais da União Europeia, enquanto valores cruciais do processo democrático e, por outro, que o controlo da concentração dos meios de comunicação social incumbe em primeiro lugar aos Estados-Membros. A aplicação de instrumentos da política de concorrência no sector dos meios de comunicação, acrescenta a Comissão, está limitada à resolução dos problemas suscitados pela criação ou pelo reforço de posições dominantes nos mercados respectivos e ao controlo da exclusão dos concorrentes desses mercados. Segundo o CESE, tal distinção entre concorrentes da UE e concorrentes dos Estados nacionais afigura-se vaga, deixando patentes alguns problemas importantes:

é preciso recordar que nos diferentes Estados-Membros existem regulamentações e abordagens diferentes, que exigem uma harmonização: a Comissão começou a intervir nesse sentido em 1989, prosseguindo os trabalhos em 1997 com a directiva «Televisão sem fronteiras», que define não só objectivos de eficiência económica mas também o respeito da diversidade cultural, a protecção dos menores, o direito de sequência, etc.;

é necessário distinguir, no campo dos meios de comunicação social, entre os princípios antitrust e as regras específicas orientadas para defender o pluralismo da informação. O funcionamento das regras de concorrência é condição fundamental mas não suficiente para garantir o pluralismo. Contrariamente a um regime de concorrência em que o poder de mercado de cada empresa deve entrar em linha de conta com a iniciativa e a actividade das empresas concorrentes, a promoção e a defesa do pluralismo exige, em contrapartida, o reconhecimento explícito do direito do cidadão a dispor efectivamente de fontes de informação livres e de uma informação alternativa e potencialmente diferente a proteger a todos os níveis;

por último, o processo de convergência progressiva entre telecomunicações, informática, radiotelevisão e edição dificulta a identificação das estruturas dos diferentes mercados. Sem uma correcta compreensão deste processo, corre-se o risco de, ao mesmo tempo, reduzir a eficácia das regras de concorrência e atenuar o princípio do pluralismo.

7.5.2

A nova Constituição Europeia ampliará, em larga medida, o mandato da Comissão. O CESE está convencido de que, no novo quadro jurídico, a Comissão poderá exercer com mais vigor a sua acção de direcção e de intervenção directa para defesa e desenvolvimento da liberdade e do pluralismo da informação.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 80 de 30.03.2004.

(2)  JO C 117 de 30.4.2004.

(3)  Regulamento (CE) n.o 193/2004 do Conselho de 20.01.2004 (JO L 24 de 29.01.2004, p. 1).

(4)  JO C 157 de 28.6.2005.

(5)  JO C 302 de 07.12.2004.

(6)  COM(2004) 83 final, de 9.02.2004.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/8


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo aos direitos e obrigações dos passageiros dos serviços ferroviários internacionais»

COM(2004) 143 final — 2004/0049 (COD)

(2005/C 221/02)

Em 28 de Abril de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 71.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramecionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 17 de Janeiro de 2005, tendo sido relator Eduardo CHAGAS.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 119 votos a favor, 1 voto contra e 4 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

A presente proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo aos direitos e obrigações dos passageiros dos serviços ferroviários internacionais (doravante «regulamento sobre a qualidade do transporte de passageiros») constitui uma componente do chamado Terceiro Pacote Ferroviário apresentado pela Comissão Europeia em 3 de Março de 2004. Os outros elementos são os seguintes:

Alteração da Directiva 91/440/CEE: liberalização dos serviços de transporte ferroviário internacional de passageiros (COM(2004)139 final);

Proposta de directiva que visa a certificação do pessoal de bordo que assegura a condução de locomotivas e de comboios (COM(2004) 142 final);

Proposta de regulamento relativo à indemnização por incumprimento dos requisitos de qualidade contratuais nos serviços de transporte ferroviário de mercadorias (COM(2004) 144 final);

e

Comunicação da Comissão intitulada «Avançar na integração do sistema ferroviário europeu» (COM(2004) 140 final);

Documento de trabalho da Comissão sobre a abertura progressiva do mercado dos serviços de transporte ferroviário internacional de passageiros (SEC(2004) 236).

1.2

O Primeiro Pacote Ferroviário (também denominado «pacote da infra-estrutura ferroviária»), em vigor desde 15 de Março de 2001, tinha de ser transposto para o direito nacional até 15 de Março de 2003. Era constituído pelos seguintes elementos:

Alteração da Directiva 91/440/CEE: entre outros aspectos, concessão às empresas de transporte internacional de mercadorias por caminho-de-ferro de livre acesso à rede transeuropeia de transporte ferroviário de mercadorias até 15 de Março de 2003 e liberalização da totalidade do transporte internacional de mercadorias por caminho-de-ferro até 15 de Março de 2008 (1);

Alargamento do âmbito de aplicação para uma licença europeia concedida a empresas de transporte ferroviário (alteração da Directiva 95/18/CE) (2);

Harmonização das disposições relativas à repartição de capacidade da infra-estrutura ferroviária, à aplicação de taxas de utilização da infra-estrutura ferroviária e à certificação da segurança (substitui a Directiva 95/19/CE) (3).

1.3

Em Outubro de 2003, a Comissão Europeia interpôs acções judiciais no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias contra os 9 Estados-Membros que não a notificaram da transposição para direito nacional do primeiro pacote ferroviário. Em Maio de 2004, cinco países ainda não tinham notificado a Comissão, enquanto dois Estados-Membros haviam apenas transposto parcialmente as disposições para as respectivas ordens jurídicas nacionais.

1.4

O chamado Segundo Pacote Ferroviário foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia em 30 de Abril de 2004 e tem de ser transposto para o direito nacional até 30 de Abril de 2006. É constituído pelos seguintes elementos:

Alteração da Directiva 91/440/CEE: antecipação para 1 de Janeiro de 2006 da data de livre acesso ao mercado do transporte ferroviário internacional de mercadorias e liberalização do transporte ferroviário nacional de mercadorias, incluindo a cabotagem, a partir de 1 de Janeiro de 2007 (4);

Directiva relativa à segurança dos caminhos-de-ferro da Comunidade (5).

Regulamento que institui a Agência Ferroviária Europeia (6);

Alteração da Directiva 96/48/CE relativa à interoperabilidade do sistema ferroviário transeuropeu de alta velocidade e da Directiva 2001/16/CE relativa à interoperabilidade do sistema ferroviário transeuropeu convencional (7).

1.5

Com o primeiro e segundo pacotes foram criadas as bases jurídicas para a realização do mercado interno no sector do transporte ferroviário de mercadorias. As medidas abrangem o acesso ao mercado, concessão de licenças e certificação da segurança de empresas de transporte ferroviário, acesso a infra-estruturas e cálculo das taxas de utilização, criação de um quadro legislativo em matéria de segurança ferroviária, bem como medidas técnicas de interoperabilidade do sistema ferroviário.

1.6

Este quadro legislativo criado pelo primeiro e segundo pacotes pressupõe, tal como assinalado pelo CESE no seu parecer sobre o segundo pacote ferroviário (8), uma completa reorganização do sector, implicando a criação de novas autoridades e competências.

1.7

Com o presente projecto, a Comissão propõe legislar o sector do transporte ferroviário para proteger os direitos dos passageiros dos serviços internacionais à semelhança do transporte aéreo, onde há uma maior protecção dos direitos dos passageiros em caso de recusa de embarque por excesso de reserva («overbooking») e atraso.

2.   Proposta da Comissão

2.1   Responsabilidade e indemnização

2.1.1

O projecto de regulamento determina a responsabilidade da empresa ferroviária em caso de morte ou lesão de passageiros, ou em caso de perda ou avaria da bagagem.

2.1.2

A proposta prevê indemnizações mínimas em caso de atraso (Anexo III) que devem ser pagas sem que o passageiro perca o direito ao transporte.

Anexo III

Tipo de serviço

Duração do serviço

Indemnizações de 50% em caso de:

Indemnizações de 100% em caso de:

Viagens internacionais em serviço regular de alta velocidade (total ou parcialmente)

Até 2 horas

Atraso de 30 a 60 minutos

Atraso superior a 60 minutos

Mais de 2 horas

Atraso de 60 a 120 minutos

Atraso superior a 120 minutos

Viagens internacionais em serviços regulares clássicos

Até 4 horas

Atraso de 60 a 120 minutos

Atraso superior a 120 minutos

Mais de 4 horas

Atraso de 120 a 240 minutos

Atraso superior a 240 minutos

2.1.3

O projecto de regulamento fixa de forma ampla os direitos dos passageiros em caso de atraso que origine a perda de uma correspondência ou de anulação do serviço, bem como a assistência a prestar aos passageiros em caso de atraso e perda de correspondência.

2.2   Informações a prestar e venda de bilhetes

2.2.1

O Anexo I estipula as informações mínimas a fornecer pelas empresas ferroviárias antes, durante e após a viagem. O Anexo II contém os requisitos mínimos a fornecer no bilhete.

2.2.2

As empresas ferroviárias proporão a venda de bilhetes e/ou bilhetes únicos para viagens para as estações ferroviárias principais, bem como para as estações ferroviárias circundantes. Para este efeito, as diferentes empresas ferroviárias deverão cooperar e celebrar acordos que permitirão assegurar a venda de bilhetes únicos, que deverão ser postos à venda em bilheteiras, máquinas de venda automática, por telefone ou pela Internet. Caso as bilheteiras se encontrem encerradas ou as máquinas de venda automática avariadas, deve ser possível adquirir bilhetes para viagens internacionais no comboio. Os vendedores de sistemas deverão estar abertos a todas as empresas ferroviárias para fornecimento de informação e venda de bilhetes.

2.2.3

As empresas ferroviárias devem informar o grande público dos planos para suprimir serviços internacionais.

2.3   Pessoas com mobilidade reduzida

2.3.1

A proposta estabelece regras para prestação de assistência às pessoas com mobilidade reduzida na estação e no comboio, incluindo o embarque e o desembarque e a transferência para um serviço de correspondência. A necessidade de assistência deve ser notificada com 24 horas de antecedência.

2.4   Normas de qualidade do serviço e procedimentos para apresentação de queixas

2.4.1

As empresas ferroviárias são obrigadas a estabelecer normas de qualidade de serviço (definidas no Anexo IV) e a implantar um sistema de gestão da qualidade, devendo publicar todos os anos um relatório anual sobre o seu desempenho nesta matéria.

2.4.2

Será criado um procedimento para apresentação de queixas, em que o queixoso receberá a resposta na língua em que a queixa foi formulada. A queixa poderá ser feita numa das línguas dos países do trajecto do comboio internacional. As queixas apresentadas em alemão, inglês ou francês serão sempre admissíveis. O mesmo se aplica na apresentação de queixas ao balcão de vendas.

3.   Avaliação da proposta

3.1   Observações de fundo

3.1.1

A proposta da Comissão regulamenta simultaneamente duas áreas. As propostas respeitantes à responsabilidade das empresas e às indemnizações no caso de atraso, cancelamento, danos corporais ou materiais, bem como à prestação de assistência às pessoas com mobilidade reduzida correspondem de um modo geral ao âmbito de aplicação do regulamento sobre a indemnização e a assistência aos passageiros dos transportes aéreos em caso de recusa de embarque, cancelamento ou atraso considerável (9). A proposta em apreço estabelece os direitos dos passageiros ao nível comunitário num segundo sector dos transportes, o ferroviário.

3.1.2

A segunda área refere-se a uma outra esfera, nomeadamente a obrigação de cooperação entre as empresas de molde a assegurarem um balcão único para venda de bilhetes e prestação de informações sobre horários e preços num sistema concorrencial, o que deve englobar tanto as ligações entre as ditas estações ferroviárias principais, como as estações ferroviárias localizadas numa zona cujo centro seja a estação ferroviária principal mais próxima. Esta proposta está em estreita relação com a proposta de alteração da Directiva 91/440/CEE e a liberalização dos serviços de transporte internacional de passageiros.

3.1.3

Nas actuais condições, em que os serviços de transporte ferroviário internacional de passageiros são assegurados em cooperação entre as empresas ferroviárias ou por agrupamentos internacionais, estão satisfeitos os requisitos em matéria de informação sobre horários e tarifas com algumas excepções (por ex.: Thalys, Eurostar), bem como a emissão dos bilhetes. Num sistema de empresas concorrentes aquela situação deve ser mantida e melhorada mediante regulação e legislação.

3.2   Âmbito de aplicação

3.2.1

O âmbito de aplicação concerne os serviços de transporte ferroviário internacional de passageiros. As disposições abrangem, no entanto, igualmente, as ligações entre as estações ferroviárias principais e as estações ferroviárias localizadas numa zona cujo centro seja a estação ferroviária principal mais próxima.

3.2.2

O CESE adverte que os serviços de correspondência podem referir-se a serviços sujeitos a contratos públicos.

3.2.3

Todavia, o âmbito de aplicação é restringido com a definição de empresas ferroviárias constante do regulamento (n.o 1 do artigo 2.o), que inclui apenas as empresas cuja actividade principal consista na prestação de serviços de transporte ferroviário de passageiros. Esta formulação pode levar a concluir que as empresas ferroviárias que também efectuam transportes de mercadorias estão excluídas do âmbito de aplicação do regulamento, o que é inaceitável.

3.3   Responsabilidade e indemnização

3.3.1

O CESE saúda fundamentalmente a introdução de normas comunitárias sobre indemnização dos passageiros em caso de inexecução ou de execução defeituosa de serviço e de responsabilização obrigatória das empresas ferroviárias.

3.3.2

Contudo, há que assegurar nos textos vinculativos um tratamento igual dos diferentes modos de transporte concorrentes.

3.3.3

É notório que o direito a indemnização no transporte ferroviário internacional entre em vigor mais cedo do que no transporte aéreo, não obstante o transporte ferroviário por via terrestre implicar com frequência trajectos mais longos e, logo, com maiores possibilidades de perturbação. Assim, no transporte aéreo, o reembolso do custo do bilhete só é possível após cinco horas de atraso.

3.3.4

Em caso de atraso do comboio, a refeição gratuita a fornecer aos passageiros deve estar em proporção razoável ao tempo de espera. No transporte aéreo, este limite é de, no mínimo, duas horas de tempo de espera.

3.3.5

Se o cancelamento de um voo se ficar a dever a «circunstâncias extraordinárias», a transportadora aérea não é obrigada a pagar uma indemnização. Esta causa de exclusão de responsabilidade não existe para o transporte ferroviário de passageiros.

3.3.6

Do mesmo modo, o regulamento do transporte aéreo não prevê qualquer direito a indemnização por danos indirectos causados por atrasos ou anulações de serviços, ao passo que tal está previsto para o transporte ferroviário. Ademais, a proposta de regulamento não estipula quaisquer limites máximos para os danos indirectos.

3.3.7

O limite máximo de responsabilidade para a bagagem de mão é diferente do estipulado para a restante bagagem: 1 800 euros para a bagagem de mão e 1 300 euros para a restante bagagem. Da exposição de motivos da proposta depreende-se que a Comissão se apoiou em diferentes acordos equivalentes (CIV para o sector ferroviário e Convenção de Montreal para o sector da aviação) para chegar a esta decisão. Do ponto de vista do passageiro, esta diferenciação é incompreensível.

3.3.8

O projecto de regulamento contém diferentes disposições sobre responsabilidade objectiva e responsabilidade fundada na culpa da empresa em relação ao cliente. Deste modo, a empresa só será responsável pela perda ou avaria da bagagem de mão, por cuja supervisão o passageiro é responsável, quando imputáveis a falta da empresa. Para os restantes casos, a responsabilidade da empresa é sempre objectiva.

3.3.9

A empresa não responderá pelos atrasos devidos a circunstâncias meteorológicas excepcionais, catástrofes naturais, actos de guerra ou terrorismo. Em outros casos, a empresa continua a ser responsável objectivamente.

3.3.10

O CESE é fundamentalmente a favor da aplicação da responsabilidade objectiva em caso de atraso para todos os sectores de transporte. Não se trata aqui de um indemnização por danos e prejuízos em sentido estrito, mas sim de uma compensação por serviços não prestados. Para o consumidor/cliente é irrelevante saber se existe ou não falta da empresa, pelo que as restrições aqui propostas se afiguram adequadas.

3.3.11

O projecto de regulamento não estipula de forma clara que um passageiro pode renunciar à partida para uma viagem em caso de atraso, contra reembolso total do custo do bilhete. No caso de viagens de negócios, é evidente que um atraso pode fazer com que a viagem se torne desnecessária.

3.4   Assistência às pessoas com mobilidade reduzida e a outros passageiros

3.4.1

O CESE congratula-se com as disposições sobre a prestação de assistência às pessoas com mobilidade reduzida.

3.4.2

As empresas ferroviárias devem prestar informação acessível a todos os passageiros, incluindo as pessoas com mobilidade reduzida como definidas no n.o 21 do artigo 2.o, situando as janelas e os pontos de informação a uma altura adequada e preparando os textos com formatos de letra maiores e de fácil leitura.

3.5   Informação aos passageiros e títulos de transporte

3.5.1

O CESE saúda as disposições referentes à informação a fornecer aos passageiros antes, durante e após a viagem (Anexo I). A falta de informação, em particular no caso de atraso antes e durante a viagem, é fonte frequente de enorme exasperação entre os clientes.

3.5.2

Quanto às informações mínimas a fornecer no bilhete (Anexo II), dever-se-ia mencionar se o bilhete pode ser devolvido contra reembolso do custo da viagem e quando. Em virtude de sistemas de reserva muito diferentes, tal não é muitas vezes claro para o passageiro.

3.5.3

O regulamento estipula que (artigos 3.o, 5.o e 6.o):

as empresas ferroviárias e/ou os operadores turísticos deverão pôr à disposição informação sobre os horários das viagens, os preços dos bilhetes, as possibilidades de transporte de bicicletas, etc., de todas as empresas ferroviárias que prestam esses serviços, e isto em todos os sistemas de venda (bilheteiras, telefone, Internet ou outros sistemas futuros);

as empresas devem cooperar por forma a venderem aos clientes bilhetes integrados (únicos) em todos os sistemas de venda.

3.5.4

O CESE considera fundamentalmente desejável que os passageiros tenham acesso a um ponto único de informação e reserva para todas as ofertas de transporte ferroviário e serviços associados.

3.5.5

O CESE gostaria, porém, de destacar as especificidades do transporte ferroviário:

a subordinação à rede, a interdependência entre os transportes de longa distância internacionais, os transportes de longa distância nacionais e os transportes de curta distância, incluindo os transportes públicos que estão sujeitos a diferentes obrigações contratuais;

a vantagem de se poderem efectuar reservas imediatas (viagens espontâneas), o acesso ao embarque ao longo do trajecto e, em muitos casos, a inexistência de lugares marcados;

títulos de transporte impessoais e transmissíveis.

3.5.6

A complexidade decorrente da interligação de serviços internacionais de transporte ferroviário de passageiros com serviços regionais num sistema de rede incluindo a integração de operadores concorrentes não pode ser tida em conta de forma adequada através de um regulamento, cuja aplicação é directa. O número de estações ferroviárias afectadas (estações principais e estações localizadas numa zona cujo centro seja a estação ferroviária principal) é, por exemplo, considerável.

3.5.7

O Comité realça que no transporte ferroviário internacional de passageiros aqueles padrões já são, em larga medida, actualmente satisfeitos. Num sistema de empresas concorrenciais aquela situação deve ser mantida e melhorada mediante regulação e legislação.

3.6   Consequências do regulamento para o emprego

3.6.1

O artigo 21.o da proposta de regulamento estatui que a empresa ferroviária é responsável pelo seu pessoal. Em contrapartida, o artigo 22.o prevê a possibilidade de acumulação de pedidos de indemnização, abrangendo igualmente qualquer acção movida contra o pessoal. Há que definir de forma inequívoca que os trabalhadores ferroviários não ficam expostos a quaisquer pedidos de indemnização, deduzidos por passageiros ou outros terceiros, e que o empregador permanece responsável.

3.6.2

A existência de elevadas indemnizações por atrasos não levará, em consequência, os operadores ferroviários a aceitar riscos superiores no plano da segurança para se furtarem a pedidos indemnizatórios. É de excluir, também, que as empresas ferroviárias exerçam pressão excessiva sobre os seus trabalhadores com o risco de negligenciarem o tempo de trabalho, de condução e de pausa. Acresce que é necessário garantir a existência de trabalhadores qualificados em número suficiente, por forma a cumprir os requisitos de qualidade.

3.6.3

O Anexo IV sobre normas mínimas de qualidade do serviço deve, portanto, abarcar as qualificações do pessoal. Isto é válido não só para o pessoal de bordo, como também para o pessoal da estação e o pessoal responsável pelo tratamento das queixas.

4.   Conclusões

4.1

O CESE congratula-se com a apresentação de uma proposta de regulamento sobre os direitos e as obrigações dos passageiros dos transportes ferroviários internacionais. A proposta em apreço transpõe para mais um modo de transporte as disposições de protecção do consumidor vigentes actualmente apenas no sector do transporte aéreo.

4.2

O CESE pronuncia-se, porém, contra um tratamento desigual entre os diferentes modos de transporte concorrentes. As disposições aplicáveis ao sector ferroviário não podem ser mais rigorosas do que as disposições vigentes para o sector da aviação.

4.3

O CESE considera que há necessidade de aperfeiçoar o regulamento, nomeadamente no respeitante às disposições individuais em matéria de responsabilidade por danos indirectos, à definição dos limites máximos de responsabilidade e às causas de exclusão em caso de supressão de um comboio.

4.4

Em princípio, o CESE pronuncia-se por uma responsabilidade objectiva em matéria de reembolso do custo do bilhete no caso de serviços não prestados ou prestados de forma insatisfatória, caso tal seja aplicável a todos os modos de transporte.

4.5

O CESE é favorável a um ponto único de informação e reserva em prol de um serviço de qualidade para o passageiro. Levanta, contudo, algumas objecções quanto ao facto de este tema complexo ser tratado em um regulamento sobre responsabilidade e indemnização.

4.6

O CESE recorda que o estabelecimento de um ponto único de informação e reserva, no âmbito de um sistema variado de fornecedores de rede de transporte comunitário, regional, nacional e internacional ligado a operadores de linhas concorrentes, é extremamente complexo, sobretudo quando esse sistema deve ser proposto em todos os sistemas de venda.

4.7

O Comité realça que a apresentação de legislação sobre a informação a fornecer ao passageiro e a emissão de bilhetes nos transportes ferroviários internacionais deve ser considerada em estreita relação com a alteração à Directiva 91/440/CEE sobre a liberalização dos serviços de transporte ferroviário internacional de passageiros.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Directiva 2001/12/CE — JO L 75 de 15/3/2001, pág. 1 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22/7/1999, pág. 22.

(2)  Directiva 2001/13/CE — JO L 75 de 15/3/2001, pág. 26 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22/7/1999, pág. 22.

(3)  Directiva 2001/14/CE — JO L 75 de 15/3/2001, pág. 29 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22/7/1999, pág. 22.

(4)  Directiva 2004/51/CE — JO L 164 de 30.04.2004, pág. 164 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.

(5)  Directiva 2004/49/CE — JO L 164 de 30.04.2004, pág. 44 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.

(6)  Directiva 2004/881/CE — JO L 164 de 30.04.2004, pág. 1 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.

(7)  Directiva 2004/50/CE — JO L 164 de 30.04.2004, pág. 114 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.

(8)  JO C 61 de 24/3/2003, pág. 131.

(9)  Regulamento (CE) n.o 261/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Fevereiro de 2004, que estabelece regras comuns para a indemnização e a assistência aos passageiros dos transportes aéreos em caso de recusa de embarque e de cancelamento ou atraso considerável dos voos e que revoga o Regulamento (CEE) n.o 295/91.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/13


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho sobre indemnização por incumprimento dos requisitos de qualidade contratuais nos serviços de transporte ferroviário de mercadorias»

COM(2004) 144 final — 2004/0050 (COD)

(2005/C 221/03)

Em 28 de Abril de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 71.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 17 de Janeiro de 2005, tendo sido relator E. CHAGAS.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 130 votos a favor, com 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

A proposta de regulamento sobre indemnização por incumprimento dos requisitos de qualidade contratuais nos serviços de transporte ferroviário de mercadorias (adiante denominado «Regulamento sobre a qualidade do transporte de mercadorias») constitui uma componente do chamado Terceiro Pacote Ferroviário apresentado pela Comissão Europeia em 3 de Março de 2004. Os outros elementos são os seguintes:

Alteração da Directiva 91/440/CEE: liberalização dos serviços de transporte ferroviário internacional de passageiros (COM(2004)139 final);

Proposta de directiva relativa à certificação do pessoal de bordo que assegura a condução de locomotivas e comboios na rede ferroviária da Comunidade (COM(2004) 142 final);

Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo aos direitos e obrigações dos passageiros dos serviços ferroviários internacionais (COM(2004) 143 final);

e

Comunicação da Comissão intitulada «Avançar na integração do sistema ferroviário europeu» (COM(2004) 140 final);

Documento de trabalho da Comissão sobre a abertura progressiva do mercado dos serviços de transporte ferroviário internacional de passageiros (SEC(2004) 236).

1.2

O Primeiro Pacote Ferroviário (também denominado «pacote da infra-estrutura ferroviária»), em vigor desde 15 de Março de 2001, tinha de ser transposto para o direito nacional até 15 de Março de 2003. Era constituído pelos seguintes elementos:

Alteração da Directiva 91/440/CEE: entre outros aspectos, concessão às empresas de transporte internacional de mercadorias por caminho-de-ferro de livre acesso à rede transeuropeia de transporte ferroviário de mercadorias até 15 de Março de 2003 e liberalização da totalidade do transporte internacional de mercadorias por caminho-de-ferro até 15 de Março de 2008 (1);

Alargamento do âmbito de aplicação para uma licença europeia concedida a empresas de transporte ferroviário (alteração da Directiva 95/18/CE) (2);

Harmonização das disposições relativas à repartição de capacidade da infra-estrutura ferroviária, à aplicação de taxas de utilização da infra-estrutura ferroviária e à certificação da segurança (substitui a Directiva 95/19/CE) (3).

1.3

Em Outubro de 2003, a Comissão Europeia interpôs acções judiciais no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias contra os nove Estados-Membros que não a notificaram da transposição para o direito nacional do primeiro pacote ferroviário. Em Maio de 2004, cinco países ainda não tinham notificado a Comissão, enquanto dois Estados-Membros haviam apenas transposto parcialmente as disposições para as respectivas ordens jurídicas nacionais.

1.4

O Segundo Pacote Ferroviário foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia em 30 de Abril de 2004 e tem de ser transposto para o direito nacional até 30 de Abril de 2006. Era composto por:

Alteração da Directiva 91/440/CEE: antecipação para 1 de Janeiro de 2006 da data de livre acesso ao mercado do transporte ferroviário internacional de mercadorias e liberalização do transporte ferroviário nacional de mercadorias, incluindo a cabotagem, a partir de 1 de Janeiro de 2007 (4);

Directiva relativa à segurança dos caminhos-de-ferro da Comunidade (5);

Regulamento que institui a Agência Ferroviária Europeia (6);

Alteração da Directiva 96/48/CE relativa à interoperabilidade do sistema ferroviário transeuropeu de alta velocidade e da Directiva 2001/16/CE relativa à interoperabilidade do sistema ferroviário transeuropeu convencional (7).

1.5

Com o primeiro e segundo pacotes foram criadas as bases jurídicas do mercado interno no sector do transporte ferroviário de mercadorias. As medidas abrangem o acesso ao mercado, concessão de licenças e certificação da segurança de empresas de transporte ferroviário, acesso a infra-estruturas e cálculo das taxas de utilização, criação de um quadro legislativo em matéria de segurança ferroviária, bem como medidas técnicas de interoperabilidade do sistema ferroviário.

1.6

A proposta ora em apreço complementa o quadro jurídico criado para a abertura de mercado com medidas destinadas a melhorar a qualidade do transporte de mercadorias.

2.   Proposta da Comissão

2.1

A proposta de regulamento sobre a qualidade do transporte de mercadorias contribuirá para melhorar a qualidade do transporte ferroviário de mercadorias graças a um acordo contratual sobre indemnizações entre a empresa ferroviária e o seu cliente. A Comissão considera que a causa principal para a reduzida quota-parte do caminho-de-ferro no crescimento do transporte de mercadorias e a sua retracção em relação a outros modos de transporte se deve à falta de qualidade e fiabilidade do transporte ferroviário de mercadorias.

2.2

A Comissão espera que a aplicação de regimes de indemnização estimule as empresas ferroviárias a melhorarem a eficiência dos seus serviços de transporte de mercadorias. Parte do princípio de que a concorrência ao longo dos tempos exercerá uma forte pressão em prol da melhoria da qualidade; todavia, em sua opinião, a abertura efectiva do mercado europeu do transporte ferroviário de mercadorias não se faz com a prontidão necessária. Às empresas recém–chegadas correspondem apenas 3 a 4 % do mercado, e em vários Estados-Membros não existe sequer concorrência.

2.3

A proposta de regulamento estabelece a obrigação de as empresas ferroviárias e os clientes fixarem requisitos de qualidade nos contratos de transporte e pagarem indemnizações em caso de incumprimento dos mesmos. As partes contratantes são obrigadas a estabelecer, pelo menos, os seguintes requisitos de qualidade:

prazo de entrega para transporte das mercadorias, vagões ou comboios,

horário de chegada e indemnização por atraso;

indemnização por perda ou avaria da mercadoria;

indemnização por supressão de um comboio pela empresa ferroviária ou pelo cliente dos serviços de transporte ferroviário de mercadorias;

um sistema de controlo da qualidade.

2.4

A proposta de regulamento estabelece os valores mínimos e máximos da indemnização a pagar em caso de perda, avaria ou atraso da mercadoria transportada ou ainda de falta de informação sobre os prejuízos causados por atrasos. Por exemplo, no caso de avarias, a indemnização fixada é de 75 euros, no máximo, por quilograma de massa bruta avariada. Na eventualidade de atraso de um comboio-bloco, o montante da indemnização fixado não pode ser inferior a 5 % nem superior a 25 % do preço do transporte. À falta de informação sobre os atrasos corresponde uma indemnização de, no mínimo, 5 % do preço do transporte.

2.5

As partes contratuais são obrigadas a estabelecer indemnizações no caso de supressão de um comboio pela empresa de caminho-de-ferro ou pelo cliente dos serviços de transporte ferroviário de mercadorias e podem chegar a acordo sobre indemnizações em caso de declaração de valor da mercadoria transportada ou de interesse na entrega.

2.6

Há exclusão de responsabilidade em caso de falta de uma parte contratante, falta ou intervenção de um terceiro, força maior ou circunstâncias impossíveis de evitar e cujas consequências não podia obviar. Se houver lugar a indemnização por culpa do gestor de infra-estrutura, a empresa ferroviária é responsável pelo seu pagamento, tendo direito de regresso contra o gestor de infra-estrutura.

2.7

No caso de intervenção de várias empresas ferroviárias, existe «responsabilidade solidária» de todas as empresas intervenientes, independentemente de qual a empresa em que o atraso ou dano tenha ocorrido.

3.   Observações sobre a proposta da Comissão

3.1

No interesse de um sistema de transportes sustentável e de uma relação equilibrada entre os modos de transporte, tal como formulado no Livro Branco sobre a política europeia de transportes até 2010, a transferência para o caminho-de-ferro de uma parte mais substancial do transporte de mercadorias constitui um objectivo comunitário. Para o efeito, a melhoria da qualidade dos serviços prestados no transporte ferroviário é uma das muitas abordagens, que, em princípio, deve ser acolhida favoravelmente.

3.2

A Comissão propõe um sistema de incentivos que permitam melhorar a qualidade e sobretudo a pontualidade, evitando o pagamento de indemnizações. Normalmente os operadores de mercado reagem ao acréscimo de risco financeiro decorrente do pagamento de eventuais indemnizações começando por aumentar os preços.

3.3

Perguntar-se-á, pois, se o instrumento proposto pela Comissão constitui um incentivo adequado.

3.4

O âmbito de aplicação é extensivo ao transporte internacional e nacional. A Comissão refere na exposição de motivos da proposta de regulamento existirem já hoje contratos de qualidade, mais frequentemente no transporte nacional do que no internacional. Noutro passo do documento afirma que os problemas surgem antes de mais quando intervêm várias empresas ferroviárias, o que acontece sobretudo no transporte internacional.

3.5

Dada a intromissão na organização de acordos de parceiros comerciais — não se trata aqui de defesa do consumidor –, é lícito questionar se não seria mais adequado um âmbito de aplicação mais limitado para o transporte internacional de mercadorias.

3.6

Conviria reflectir ainda sobre os incentivos positivos que existem como alternativa às indemnizações fixadas, mediante legislação da UE que seria única para o sector ferroviário e que se aditaria à Convenção internacional COTIF (CIM). Assim, o artigo 11.o da Directiva 2001/14/CE prevê já possibilidades de abatimentos nas taxas de utilização da infra-estrutura ferroviária se a empresa contribuir para reduzir as perturbações e aumentar o desempenho do sistema.

3.7

Para promover o transporte ferroviário de mercadorias é imperioso evitar uma desigualdade de tratamento entre os vários modos de transporte concorrentes.

3.8

Coloca-se, portanto, a questão de disposições comunitárias comparáveis para o transporte aéreo e para o transporte rodoviário de mercadorias. Os acordos internacionais relativos a indemnizações por avaria ou perda prevêem taxas consideravelmente mais baixas (na Convenção de Montreal relativo ao transporte aéreo a taxa corresponde a um terço do montante máximo previsto no Regulamento, a Convenção Relativa ao Contrato de Transporte Internacional de Mercadorias por Estrada (CMR) prevê um sexto desse montante máximo).

3.9

Não é clara a relação entre o sistema de controlo da qualidade a acordar pelas partes contratantes e as especificações técnicas de interoperabilidade telemática no âmbito do transporte de mercadorias. O problema do controlo electrónico do movimento ferroviário de mercadorias em tempo real a nível comunitário é tratado nas especificações técnicas de interoperabilidade relativas ao transporte de mercadorias. Aí se definem os pressupostos técnicos harmonizados e as condições de comunicação. Para a sua aplicação e execução são necessários, todavia, investimentos elevados e muitos anos.

3.10

A proposta dá à empresa ferroviária a possibilidade de obter do gestor da infra-estrutura o reembolso das indemnizações pagas se for ele o responsável pelo atraso.

3.11

Há que contar também com manobras de tergiversação sob a forma de aumento dos preços dos traçados ferroviários (suplemento de risco) e a introdução na planificação de mecanismos de amortecimento dos atrasos. Face às limitadas capacidades em infra-estruturas, esta seria uma reacção indesejada. No sector dos transportes aéreos, é possível observar este fenómeno logo após a entrada em vigor da directiva sobre a indemnização aos passageiros. Para o gestor da infra-estrutura é extremamente complicado calcular o risco, pois não conhece nem pode influenciar o valor dos fluxos de mercadorias e o montante das indemnizações daí resultantes.

3.12

Não se pode esquecer que as infra-estruturas nos novos Estados-Membros da Europa Central e Oriental se encontram em pior estado, carecendo de grandes investimentos, e que as obrigações previstas no regulamento relativamente a indemnizações poderiam causar graves problemas.

3.13

Nos termos da proposta, a determinação das responsabilidades e o exercício pela empresa ferroviária do direito de regresso contra o gestor de infra-estrutura implicam despesas avultadas. A repartição de responsabilidades complica-se quando estão em causa várias empresas ferroviárias.

3.14

A existência de elevadas indemnizações por atrasos não levará, em consequência, os operadores ferroviários a aceitar riscos superiores no plano da segurança para se furtarem a pedidos indemnizatórios. É de excluir, também, que as empresas ferroviárias exerçam pressão excessiva sobre os seus trabalhadores com o risco de negligenciarem o tempo de trabalho, de condução e de repouso.

3.15

Já no parecer sobre o segundo pacote ferroviário o CESE salientou o facto de as condições sociais no sector dos transportes rodoviários representarem desvantagens concorrenciais para o transporte ferroviário de mercadorias. Não se pode daqui concluir que se devam adaptar as condições de trabalho no sector do transporte ferroviário às do transporte rodoviário e motivar as empresas a desrespeitar as disposições e a exercer pressão sobre os trabalhadores.

4.   Conclusões

4.1

O CESE acolhe, em princípio, favoravelmente as medidas destinadas a melhorar a qualidade do transporte ferroviário.

4.2

Incentivos positivos deveriam ser preferidos a normas rígidas sobre indemnizações, que levam a uma série de manobras de tergiversação e a um complexo sistema de reembolso, em particular no que respeita ao papel do gestor de infra-estrutura.

4.3

As medidas para melhorar a qualidade do transporte ferroviário de mercadorias não deverão provocar discriminações em relação a outros modos de transporte.

4.4

O CESE apela à Comissão para que examine as repercussões dessas medidas nas empresas e nos gestores de infra-estrutura nos novos Estados-Membros.

4.5

Insiste em que as medidas para melhorar a qualidade do transporte de mercadorias não deverão levar as empresas a manobras de tergiversação no que toca à sensibilização para as questões de segurança e às condições de trabalho.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Directiva 2001/12/CE — JO L 75 de 15/3/2001, pág. 1 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22/7/1999, pág. 22.

(2)  Directiva 2001/13/CE — JO L 75 de 15/3/2001, pág. 26 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22/7/1999, pág. 22.

(3)  Directiva 2001/14/CE — JO L 75 de 15/3/2001, pág. 29 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22/7/1999, pág. 22.

(4)  Directiva 2004/51/CE — JO L 164 de 30/4/2004, pág. 164 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.

(5)  Directiva 2004/49/CE — JO L 164 de 30/4/2004, pág. 114 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.

(6)  Regulamento (CE) n.o 881/2004 — JO L 164 de 30/4/2004, pág. 114 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.

(7)  Directiva 2004/50/CE — JO L 164 de 30/4/2004, pág. 114 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/17


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Livro Branco sobre os serviços de interesse geral»

COM(2004) 374 final

(2005/C 221/04)

Em 13 de Maio de 2004, em conformidade com o previsto no artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, a Comissão decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a comunicação supramencionada.

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 17 de Janeiro de 2005 (relator: R. HENCKS — co-relator: B. HERNÁNDEZ BATALLER).

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 131 votos a favor, 5 votos contra e 2 abstenções o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

Os serviços de interesse geral (SIG) constituem, nos dias de hoje, um tema de sociedade, intimamente ligado à construção europeia.

1.2

Os tratados actuais reconhecem que os serviços de interesse económico geral (SIEG) fazem parte dos valores comuns da União e contribuem para a respectiva coesão social e territorial (artigo 16.o); a Carta dos Direitos Fundamentais (Título IV, artigos II-34.o a II-36.o) reconhece o acesso aos SIEG e os direitos relativos a componentes específicas dos serviços de interesse geral (segurança social e auxílio social, protecção da saúde, protecção do ambiente, etc.).

1.3

Para além de serem fulcrais para a competitividade e um elemento importante na prossecução dos objectivos de Lisboa, os SIG são elementos constitutivos do modelo social europeu. Os SIG participam na garantia dos direitos fundamentais da pessoa humana, são factores da economia do conhecimento e da coesão social, económica e territorial e constituem elementos do desenvolvimento sustentável.

1.4

Apesar de não ter sido satisfeito o pedido formulado pelo CESE de que a promoção dos serviços de interesse geral figurasse como objectivo do artigo 3.o do Tratado Constitucional, o referido Tratado acabou por representar, depois de concluído, um certo progresso para os serviços de interesse geral: o artigo III-122.o permite à UE legislar de modo transversal, em matéria de serviços de interesse económico geral, sobre os princípios e as condições para o cumprimento dos serviços de interesse económico geral. O Tratado reconhece também o princípio da livre administração das colectividades territoriais locais e transforma em princípio constitucional a possibilidade de elas próprias prestarem serviços de interesse económico geral, concretizando assim o princípio da subsidiariedade no plano das competências da União e dos Estados-Membros no que respeita aos serviços de interesse geral.

1.5

Não obstante, o essencial do direito derivado continua marcado por um desequilíbrio geral entre, por um lado, o direito da concorrência, «corpus» comunitário pormenorizado e de efeito directo, e, por outro lado, os objectivos de interesse geral que resultam da excepção a este direito.

1.6

A União Europeia continua a ter dificuldades em ultrapassar as contradições entre a construção de um mercado tendo como ferramenta única a concorrência e a necessidade de assegurar um controlo público de processos que não podem depender unicamente de mecanismos económicos. Os serviços de interesse geral não são técnicas ou instrumentos, mas trazem consigo direitos da pessoa humana, assim como ligação social de inclusão e de integração.

1.7

Para além disso, não é possível ignorar que se assiste ao desenvolvimento de incompreensões, críticas e rejeições da parte dos cidadãos europeus relativamente a políticas que parecem apontar no sentido de uma integração europeia que parece cada vez mais alheia às preocupações que os afligem, acentua a divisão social, põe em perigo a coesão social e coloca o modelo social numa situação precária.

1.8

A construção europeia deverá culminar numa combinação harmoniosa de mecanismos de mercado e missões de interesse geral nos domínios onde tal complementaridade seja compatível com os objectivos dos serviços de interesse geral e possa representar uma mais-valia para o utente ou para o consumidor. Isto implica que, sob reserva das condições estabelecidas no n.o 2 do artigo 86.o do Tratado CE, o cumprimento efectivo de uma missão de interesse geral prevalece, em caso de tensão, sobre a aplicação das regras do Tratado relativas à concorrência, em conformidade com a jurisprudência comunitária.

1.9

Os serviços de interesse geral remetem para a vontade política de dominar a gestão dos interesses colectivos e de satisfazer as necessidades e direitos fundamentais no quadro do modelo de sociedade europeia. Este modelo consiste em garantir a cada um, independentemente da idade, estatuto social ou região de residência, uma protecção social adequada, mas também um acesso fácil, de boa qualidade e a preços acessíveis a bens essenciais como alimentação, habitação, água, transportes, comunicações, etc. Os serviços de interesse geral enquadram-se claramente no campo da economia social de mercado, que não pode ser assegurada apenas pela concorrência. Sem uma intervenção pública adequada, a União desenvolver-se-á a duas velocidades com o agravamento das disparidades de desenvolvimento, das desigualdades e da exclusão social.

1.10

Num futuro próximo, muitos dos cidadãos europeus serão chamados a pronunciar-se, no quadro de um referendo, sobre a ratificação do Tratado Constitucional. Não haverá Europa política sem o apoio das opiniões públicas e estas, por seu lado, não darão esse apoio se a União não der garantias de salvaguarda e de desenvolvimento do modelo europeu de sociedade e do modelo social europeu.

1.11

O Livro Branco sobre os serviços de interesse geral, na medida em que estabelece as bases para garantir serviços de interesse geral de qualidade, acessíveis e a custo comportável, constitui neste quadro uma etapa importante (entre outras) para promover a Europa junto dos europeus e para evitar que um «Não» venha quebrar a dinâmica da construção europeia.

1.12

A reflexão suscitada pelo Livro Branco e os desenvolvimentos subsequentes são indissociáveis das reflexões sobre a parceria sector privado — sector público, o mercado dos serviços, designadamente os serviços sociais, os auxílios estatais, o relatório em elaboração sobre a água, o reexame da Estratégia de Lisboa e os relatórios de avaliação.

2.   O Livro Branco sobre os serviços de interesse geral

2.1

O Livro Branco adoptado pela Comissão Europeia em 12 de Maio de 2004 faz o balanço do importante debate europeu ocorrido na sequência do Livro Verde de 2003 e das inúmeras contribuições subsequentes, nomeadamente das instituições europeias e da sociedade civil, e propõe orientações estratégicas para os próximos anos.

2.2

O debate sobre o Livro Verde fez vir à superfície diferenças de pontos de vista e de perspectivas. Contudo, dele resultou um consenso quanto à necessidade de assegurar uma combinação harmoniosa entre mecanismos de mercado e missões de serviço público.

2.3

Enquanto a prestação de serviços de interesse geral pode ser organizada em cooperação com o sector privado ou entregue a empresas privadas ou públicas com fins lucrativos ou não, em contrapartida, a definição das obrigações e missões do serviço público continua a ser da competência dos poderes públicos ao nível adequado. Os poderes públicos envolvidos têm igualmente a seu cargo de regulamentar os mercados e velar por que os operadores — públicos ou privados — cumpram as missões de serviço público que lhes são confiadas.

2.4   A abordagem da Comissão baseia-se em nove princípios:

2.4.1

Permitir às autoridades públicas estar próximas dos cidadãos: os serviços de interesse geral deveriam ser organizados e regulados tão perto quanto possível dos cidadãos e o princípio da subsidiariedade deve ser rigorosamente respeitado.

2.4.2

Atingir objectivos de serviço público em mercados abertos e competitivos: a Comissão continua a considerar que um mercado interno aberto e concorrencial, por um lado, e o desenvolvimento de serviços de interesse geral de qualidade, acessíveis e a preços abordáveis, por outro, são objectivos compatíveis; ao abrigo do Tratado CE, e sob reserva das condições estabelecidas no n.o 2 do artigo 86.o, o cumprimento efectivo de uma missão de interesse geral prevalece, em caso de tensão, sobre a aplicação das regras do Tratado.

2.4.3

Assegurar a coesão e o acesso universal: o acesso de todos os cidadãos e empresas a serviços de interesse geral de qualidade e a preços acessíveis em todo o território dos Estados-Membros é essencial para favorecer a coesão social e territorial da União Europeia. Neste contexto, o serviço universal é uma noção-chave que a Comunidade desenvolveu para assegurar a acessibilidade efectiva dos serviços essenciais.

2.4.4

Manter um nível elevado de qualidade e segurança: além disso, a segurança da prestação dos serviços, nomeadamente a segurança de abastecimento, constitui uma exigência essencial que deve ser tida em conta aquando da definição das missões de serviço público. É igualmente necessário que as condições de prestação dos serviços ofereçam aos operadores incentivos suficientes para manter níveis adequados de investimento a longo prazo.

2.4.5

Garantir os direitos dos consumidores e dos utentes: estes princípios dizem em especial respeito ao acesso aos serviços, nomeadamente os serviços transfronteiriços em todo o território da União, e para todos os grupos da população, a acessibilidade financeira dos serviços, incluindo regimes especiais para as pessoas com baixos rendimentos, a segurança física, a segurança e a fiabilidade, a continuidade, a qualidade elevada, a escolha, a transparência e o acesso às informações dos fornecedores e dos reguladores. A aplicação destes princípios requer geralmente a existência de reguladores independentes investidos de poderes e deveres claramente definidos. Estes incluem os poderes de sanção (meios de controlar a transposição e a aplicação das regras em matéria de serviço universal), e deveriam igualmente incluir disposições relativas à representação e à participação activa dos consumidores e dos utentes aquando da definição e avaliação dos serviços, a disponibilidade de vias de recurso e de mecanismos de compensação apropriados, bem como a existência de uma cláusula evolutiva que permita a adaptação das exigências em função da evolução das necessidades e das preocupações dos utentes e dos consumidores, bem como das mutações do ambiente económico e tecnológico.

2.4.6

Acompanhar e avaliar o funcionamento dos serviços: partilhando o parecer mais correntemente expresso aquando das consultas públicas, a Comissão considera que uma eventual avaliação deverá ser pluridimensional e dizer respeito a todos os aspectos jurídicos, económicos, sociais e ambientais pertinentes.

2.4.7

Respeitar a diversidade dos serviços e das situações: qualquer política comunitária relativa aos serviços de interesse geral deve ter devidamente em conta a diversidade que caracteriza os diferentes serviços deste tipo e as situações em que são fornecidos. Contudo, tal não significa que não seja necessário assegurar a coerência da abordagem comunitária em relação aos diferentes sectores ou que a elaboração de conceitos comuns aplicáveis a vários sectores não seja útil.

2.4.8

Aumentar a transparência: este princípio deverá aplicar-se a todos os aspectos do processo de execução e abranger a definição das missões de serviço público, organização, financiamento e regulamentação dos serviços, bem como a sua produção e avaliação, incluindo os mecanismos de tratamento das queixas apresentadas.

2.4.9

Garantir a segurança jurídica: a Comissão tem consciência de que a aplicação do direito comunitário aos serviços de interesse geral poderá levantar questões complexas. Por esta razão, vai desenvolver esforços constantes a fim de melhorar a segurança jurídica ligada à aplicação do direito comunitário ao fornecimento dos serviços de interesse geral, sem prejuízo da jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e do Tribunal de Primeira Instância.

2.5   Com base no que precede, o Livro Branco propõe oito novas orientações:

2.5.1

Respeitar a diversidade num quadro coerente: a Comissão reexaminará a viabilidade e a necessidade de uma lei-quadro relativa aos serviços de interesse geral aquando da entrada em vigor do Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa; procederá a um exame da situação dos serviços de interesse geral e apresentará um relatório até ao final de 2005.

2.5.2

Esclarecer e simplificar o quadro jurídico relativo à compensação das obrigações de serviço público: a Comissão adoptará, até Julho de 2005, uma decisão relativa à aplicação do artigo 86.o do Tratado aos auxílios estatais concedidos sob forma de compensação pelo serviço público a certas empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral; adoptará, até Julho de 2005, um quadro comunitário relativo aos auxílios estatais concedidos sob forma de compensação para o serviço público; adoptará, até Julho de 2005, uma alteração da Directiva 80/723/CEE relativa à transparência das relações financeiras entre os Estados-Membros e as empresas públicas; continuará a esclarecer, até Julho de 2005, as condições nas quais as compensações para o serviço público podem constituir um auxílio estatal na acepção do n.o 1 do artigo 87.o.

2.5.3

Fornecer um quadro claro e transparente para a selecção das empresas encarregadas de um serviço de interesse geral: a Comissão procederá a uma consulta pública a respeito do Livro Verde sobre os aspectos das parcerias público-privadas respeitantes aos contratos públicos; apresentará, se necessário, propostas baseadas nos resultados da consulta pública.

2.5.4

Reconhecer plenamente o interesse geral nos serviços sociais e de saúde: a Comissão apresentará em 2005 uma comunicação sobre os serviços sociais e de saúde de interesse geral; facilitará a cooperação entre os Estados-Membros no domínio dos serviços de saúde e dos cuidados médicos, a fim de contribuir para assegurar um nível elevado de protecção da saúde em toda a União.

2.5.5

Analisar os resultados e avaliar o funcionamento dos serviços: a Comissão apresentou, em 2004, a sua primeira avaliação horizontal dos serviços de interesse geral, com base na sua metodologia de avaliação; irá rever em 2006 os seus mecanismos de avaliação.

2.5.6

Rever as políticas sectoriais: a Comissão incentivará a cooperação das autoridades de regulamentação nacionais através da rede de reguladores; terá em conta os resultados da consulta pública sobre o Livro Verde aquando dos exames já previstos para os diferentes sectores: o exame do âmbito de aplicação do serviço universal das comunicações electrónicas, até Julho de 2005; o exame do pacote sobre as comunicações electrónicas, até Julho de 2006; o exame da directiva sobre os serviços postais, até 2006; o exame dos mercados internos da electricidade e do gás, até 1 de Janeiro de 2006; o exame da directiva «Televisão sem fronteiras» no início de 2005; a avaliação do sector da água, em curso.

2.5.7

Reflectir as nossas políticas internas na nossa política comercial internacional: a Comissão continuará a assegurar que as posições adoptadas pela Comunidade aquando das negociações comerciais internacionais sejam totalmente coerentes com o quadro regulamentar interno da União no sector dos serviços de interesse geral.

2.5.8

Promover os serviços de interesse geral na cooperação para o desenvolvimento: a Comissão ajudará os países em desenvolvimento a criar um quadro regulamentar e institucional sólido, condição prévia essencial para a promoção dos investimentos nos serviços de interesse geral de base e para o acesso ao financiamento por parte desses países.

3.   Observações na generalidade

3.1

O CESE congratula-se com a publicação do Livro Branco e regista os nove princípios e as oito novas orientações nele propostas para consolidar a existência dos serviços de interesse geral. Não pode, todavia, deixar de lamentar que não tenham ainda sido satisfeitas as sucessivas solicitações por si formuladas nos últimos anos (1) no sentido da publicação de uma directiva-quadro ou de uma lei-quadro que permitisse assegurar a existência dos SIG, a liberdade de definição e de organização dos Estados-Membros, a livre escolha das formas de gestão, o respectivo financiamento a longo prazo, a avaliação dos seus resultados, os direitos dos consumidores, etc., embora a Comissão assuma o compromisso de apresentar um relatório sobre esta questão até ao final de 2005.

3.2

O CESE aprecia em especial o facto de o Livro Branco comportar uma agenda precisa das propostas e medidas que a Comissão Europeia se compromete a tomar no decurso dos próximos anos para colocar em prática estes princípios e orientações.

3.3

O CESE acompanhará atentamente a execução destes compromissos e disponibiliza-se para contribuir para a sua eficácia.

4.   Observações na especialidade

4.1

O primeiro princípio, «permitir às autoridades públicas estar próximas dos cidadãos», implica que os serviços de interesse geral sejam organizados e regulados tão perto quanto possível dos cidadãos e que «o princípio da subsidiariedade deverá ser rigorosamente respeitado». Ora, a nota de rodapé número 30 remete para o projecto de regulamento sobre o transporte terrestre local, que imporia aos Estados-Membros a utilização de contratos de concessão de serviços públicos e, por conseguinte, a sistemática abertura de concursos. A subsidiariedade desaparece se cada colectividade territorial não dispuser de liberdade para escolher o modo de gestão dos serviços de interesse geral que sejam da sua competência.

4.2

O terceiro princípio, «assegurar a coesão e o acesso universal», leva a Comissão a sublinhar que o «serviço universal é uma noção-chave que a Comunidade desenvolveu para assegurar a acessibilidade efectiva dos serviços essenciais». Este conceito implica que se permita a adaptação das exigências em função da evolução das necessidades e das preocupações dos utentes e dos consumidores, bem como das mutações do ambiente económico e tecnológico. Nesta ordem de ideias e no quadro do plano «e-Europe», que preconiza a generalização da utilização da banda larga para as comunicações electrónicas, o CESE lembra que, na Europa dos quinze, 20 % da população está, actualmente, excluída do acesso a esses serviços. Ora, a banda larga é um serviço de interesse geral que melhora as condições de vida, reduzindo as distâncias e facilitando o acesso aos cuidados de saúde, à educação e aos serviços públicos tanto para os cidadãos isolados geograficamente como para os mais desfavorecidos. Enquanto o serviço universal de telecomunicações não for alargado, a um preço acessível, ao acesso em banda larga e à telefonia móvel, o atraso da União Europeia na instalação e utilização das novas tecnologias da informação e da comunicação e da sociedade do conhecimento vai aumentar, enquanto a clivagem digital se agravará, nomeadamente nos novos Estados-Membros.

4.3

O sexto princípio, «acompanhar e avaliar o funcionamento dos serviços», corresponde também à insistência, não só do CESE mas também de vários outros actores, no desenvolvimento de uma dinâmica progressiva de avaliação dos resultados dos serviços de interesse geral no sentido de contribuir para a sua eficácia, igualdade de acesso e adaptação à evolução das necessidades dos consumidores, dos cidadãos e da sociedade, e para a revisão das regras. O Livro Branco salienta, correctamente, que a avaliação deve ser «pluridimensional e dizer respeito a todos os aspectos jurídicos, económicos, sociais e ambientais pertinentes»; neste quadro o CESE pretende que a avaliação examine as questões do emprego. O CESE insiste em que o papel da União Europeia é o de definir uma metodologia comum, critérios comuns, nomeadamente de qualidade, e de impulsionar a dinâmica de uma avaliação objectiva e independente, que deve ser conduzida no respeito do princípio da subsidiariedade. Para o CESE, as propostas do Livro Branco de reexaminar as políticas sectoriais (cf. 2.5.6) devem ser acompanhadas de relatórios de avaliação dos efeitos das medidas anteriores. O CESE lembra a proposta que apresentou de contribuir para a pilotagem da avaliação, já que reúne no seu seio o conjunto das principais intervenientes interessadas. O CESE analisará a oportunidade de criar, nesta perspectiva, um grupo de estudo permanente para os SIG.

4.4

O sétimo princípio, «respeitar a diversidade dos serviços e das situações», «não significa que não seja necessário assegurar a coerência da abordagem comunitária em relação aos diferentes sectores ou que a elaboração de conceitos comuns aplicáveis a vários sectores não seja útil». A proposta de orientação consiste no reexame, pela Comissão, da viabilidade e da necessidade de elaborar uma lei-quadro relativa aos serviços de interesse geral aquando da entrada em vigor do Tratado Constitucional e na apresentação de um relatório até ao final de 2005. Por conseguinte, o Livro Branco não responde à solicitação de uma directiva-quadro (cf. parecer do CESE sobre o Livro Verde sobre os serviços de interesse geral — J. O. C 80, de 30.3.2004) formulada pelo CESE e por vários outros actores europeus. Parece, porém, urgente consolidar os SIG no seu conjunto, incluindo os serviços sociais e de saúde de interesse geral, em matéria de relações com o direito da concorrência, de financiamento, de aplicação do princípio da subsidiariedade ou do lugar que ocupam na integração europeia.

4.5

O nono princípio, «garantir a segurança jurídica», conduz a Comissão a «desenvolver esforços constantes», sem prejuízo da jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e do Tribunal de Primeira Instância. Deste princípio emergem duas propostas de orientação:

4.5.1

«Esclarecer e simplificar o quadro jurídico relativo à compensação das obrigações de serviço público até Julho de 2005», o que, no respeito dos princípios da transparência, da não-discriminação e da proporcionalidade, deveria conduzir à garantia da segurança de financiamento a longo prazo, por um lado, dos investimentos necessários à continuidade e durabilidade dos serviços e, por outro lado, da compensação ligada a obrigações de serviço público ou de serviço universal; ao reconhecimento de que esta compensação pode assumir várias formas e deve permitir a adaptação aos objectivos definidos: subvenções públicas, perequações internas que permitam financiar os custos induzidos por benefícios de actividades rentáveis, acompanhadas ou não de direitos exclusivos, fundos de compensação entre operadores, isenções de impostos ou outras, parcerias entre os sectores público e privado, ajudas para a prestação de serviços aos utentes, etc.

4.5.2

«Fornecer um quadro claro e transparente para a selecção das empresas encarregadas de um serviço de interesse geral», com base na consulta pública relativa ao Livro Verde sobre as parcerias público-privadas. Para o CESE, tal implica reconhecer a necessária diversidade dos modos possíveis de gestão dos serviços de interesse geral e a liberdade de escolha de cada colectividade territorial envolvida: seja uma gestão directa pela própria autoridade pública (serviço ou organismo público), seja uma gestão confiada a uma empresa pública ou mista, controlada pela autoridade pública ao mesmo título que os seus próprios serviços, ou da economia social e cooperativa ou associativa sem fins lucrativos, seja a delegação numa empresa por um período determinado (concessão com concurso prévio), se esquecer a possibilidade de reversibilidade de um modo de gestão para outro.

5.   Conclusões

5.1

O Livro Branco sobre os serviços de interesse geral representa um progresso no reconhecimento dos referidos serviços ao nível da União. Este documento representa um bom ponto de partida para o desenvolvimento de elementos conceptuais relativos a uma política europeia em matéria de serviços de interesse geral, capaz de proporcionar às empresas e aos cidadãos serviços públicos acessíveis, de custo comportável, eficazes e na vanguarda do progresso tecnológico.

5.2

Os serviços de interesse geral são não apenas fulcrais na competitividade económica, mas constituem igualmente um elemento essencial nos domínios social e ambiental. Os SIG completam o tríptico (economia, sector social e ambiental) da estratégia de Lisboa, representando um trunfo importante e indispensável para fazer da União Europeia a sociedade assente no conhecimento mais competitiva e mais dinâmica, com base num crescimento económico sustentável, numa melhoria quantitativa e qualitativa do emprego e numa coesão social reforçada. Os serviços de interesse geral, dadas as suas especificidades, vão para além do mercado único e constituem uma condição prévia do bem-estar económico e social dos cidadãos e das empresas.

5.3

Tratar-se-á, por conseguinte, de alcançar uma combinação harmoniosa de mecanismos de mercado e missões de serviços públicos nos domínios em que tal complementaridade seja compatível com os objectivos dos serviços de interesse geral e possa representar uma mais-valia em favor da melhoria da qualidade de vida dos cidadãos europeus, num quadro de crescimento económico, criação de emprego e bem-estar sustentável.

5.4

«Os direitos dos cidadãos de beneficiarem de serviços de interesse geral acessíveis devem ser salvaguardados e consolidados em nome da solidariedade e da coesão económica e social, reconhecidas pelos princípios fundamentais do Tratado. Um processo de liberalização dos serviços de interesse geral decidido por um Estado-Membro deve realizar-se no respeito dos critérios supra referidos. É a razão pela qual deve ser elaborado um corpus de princípios universais para serviços heterogéneos, cujas modalidades de prestação variam de um Estado-Membro para outro, sem prejuízo da observância plena do princípio da subsidiariedade.»

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Pareceres do CESE sobre «Os serviços de interesse geral», JO C 241, de 7.10.2002, e sobre o «Livro Verde sobre os serviços de interesse geral», JO C 80, de 30.3.2004.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/22


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Utilização da energia geotérmica — O calor da terra»

(2005/C 221/05)

Em 1 de Julho de 2004, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre o tema «Utilização da energia geotérmica — O calor da terra».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação que emitiu parecer em 17 de Janeiro de 2005, tendo sido relator G. WOLF.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 132 votos a favor e 2 abstenções, o seguinte parecer:

O presente parecer vem completar anteriores pareceres do Comité sobre as políticas de energia e de investigação. O seu tema é o desenvolvimento e aproveitamento da geotermia como fonte de energia sustentável (pela vastidão das suas reservas) que não emite, durante a sua utilização, quantidades sensíveis de CO2 e pode ser incluída entre as fontes de energia renováveis. O parecer fará resumidamente o ponto da situação do desenvolvimento e aproveitamento da energia geotérmica e avaliará o seu potencial e os problemas da sua eventual introdução no mercado, à luz do problema global do aprovisionamento energético.

Índice

1.

A questão da energia

2.

A energia geotérmica

3.

Situação actual

4.

Evolução futura e recomendações

5.

Conclusão

1.   A questão da energia

1.1

A energia aproveitável (1) está na base do nosso modo de vida e da nossa cultura actuais. Só um aprovisionamento suficiente de energia tornou possível o nível de vida das sociedades actuais: a esperança média de vida, a alimentação, o bem-estar geral e as possibilidades de deslocação atingiram nas nações industriais um nível nunca antes alcançado. Sem um aprovisionamento suficiente de energia, estes progressos estariam comprometidos.

1.2

A necessidade de um aprovisionamento seguro, acessível, ecológico e sustentável de energia aproveitável está no cerne das decisões dos Conselhos de Lisboa, Gotemburgo e Barcelona. Por conseguinte, a União Europeia persegue uma política energética com três objectivos estreitamente relacionados e de igual importância, a saber, a protecção e a melhoria (1) da competitividade, (2) da segurança do aprovisionamento e (3) do ambiente, com vista a um desenvolvimento sustentável.

1.3

Em vários pareceres anteriores (2) o Comité salientou que o fornecimento e o consumo de energia implicam riscos, danos para o ambiente, o esgotamento dos recursos e o problema da dependência de fontes estrangeiras e de factores imponderáveis (veja-se os actuais preços do petróleo), e defendeu que a forma mais segura de reduzir os riscos económicos, de aprovisionamento e outros consistia num consumo tão variado e equilibrado quanto possível, incluindo a poupança e a utilização racional da energia.

1.4

Nenhuma das opções a contemplar para o futuro aprovisionamento energético é tecnicamente irrepreensível, nenhuma permite uma protecção total do ambiente, nenhuma satisfaz totalmente todas as necessidades e nenhuma tem um potencial suficientemente previsível a longo prazo. Acresce que as actuais tendências de evolução dos preços quer das energias convencionais quer de fontes de energia alternativas mostram sem qualquer dúvida que no futuro a energia será muito mais cara do que os combustíveis fósseis convencionais (3) (petróleo, carvão, gás natural) o são actualmente.

1.5

É por isso que uma política energética europeia prudente e responsável não pode partir do pressuposto de que um fornecimento energético suficiente, de acordo com os objectivos acima enumerados, poderá ser garantido por apenas uma forma de energia.

1.6

Não há, portanto, qualquer garantia de um fornecimento de energia económico, ecológico e acessível a longo prazo, nem na Europa nem a nível mundial (4). Só a investigação intensiva e o desenvolvimento poderão trazer eventuais soluções. Essas soluções dependerão igualmente da criação de instalações-piloto, do seu aproveitamento técnico e económico, e da introdução progressiva dos resultados da investigação no mercado.

1.7

O Comité recomendou ainda que a análise do problema da energia deveria ser mais global e abranger um espaço de tempo mais vasto, dado que as alterações do sector energético se dão a um ritmo lento, que a emissão de gases com efeito de estufa não é um problema regional mas global. É de esperar que esse problema se agrave ainda mais no futuro, em particular na segunda metade do presente século.

1.8

Tanto a diminuição dos recursos energéticos como a questão das emissões de gases com efeito de estufa tornam-se ainda mais problemáticas por se prever que as necessidades mundiais de energia aumentarão, até 2060, para o dobro ou para o triplo dos níveis actuais, mercê do aumento da população e do progresso económico dos países menos desenvolvidos. As previsões actuais confirmam que este aumento considerável das necessidades não poderá ser contrabalançado apenas por um aumento da eficiência e pela poupança de energia.

1.9

As estratégias (5) e perspectivas de desenvolvimento devem, pois, ir além do horizonte temporal de 2060.

1.10

Entretanto, e tal como o Comité fez já notar, esta realidade nem sempre merece a devida atenção por parte dos cidadãos e nos debates públicos, em que as posições vão do exagero ao menosprezo total dos riscos e das oportunidades.

1.11

É por isso que não há ainda uma política energética global suficientemente uniforme, facto que compromete as chances da UE na concorrência mundial.

1.12

A falta de consenso quanto à questão energética verifica-se mesmo no interior dos Estados-Membros da União Europeia. Prevalece, porém, o consenso, tanto a nível nacional como comunitário, de que todas as opções devem continuar a ser exploradas (à excepção, em certos Estados-Membros, da opção nuclear). Para esse efeito são aplicados, tanto a nível nacional como a nível da UE, grande número de programas de apoio à I&D e outros, por vezes de forma cumulativa.

1.13

Um dos principais objectivos da UE é aumentar sensivelmente, a médio e longo prazo, a utilização de energias renováveis, com benefícios também para a protecção ambiental. A energia geotérmica assume um papel de relevo para a consecução destes objectivos.

2.   A energia geotérmica

2.1

A obtenção da energia geotérmica passa por técnicas que permitem captar e aproveitar o fluxo térmico que circula entre as profundezas extremamente quentes da terra e a sua superfície. O meio de captação desse calor é a água (em estado líquido ou gasoso).

2.1.1

No entanto, a intensidade deste fluxo térmico é muito reduzida. As temperaturas subterrâneas aumentam muito lentamente com a profundidade (em média, apenas 3° C por cada 100 metros). As zonas geológicas que registam um aumento térmico mais acentuado com a profundidade são designadas de anomalias geotérmicas.

2.1.2

A temperatura das camadas terrestres mais próximas da superfície pode ainda ser influenciada pela radiação solar, mas este aspecto será subsumido no âmbito da energia geotérmica para efeitos do presente parecer.

2.2

Podem distinguir-se duas formas de aproveitamento da energia geotérmica.

2.2.1

A primeira é o seu aproveitamento para aquecimento. O aquecimento reclama cerca de 40 % do aprovisionamento total da UE em energia e requer, em geral, temperaturas (da água) relativamente moderadas (menos de 100° C).

2.2.1.1

Para a obtenção de energia para aquecimento são utilizadas nomeadamente sondas de energia geotérmica, que consistem na colocação de um tubo co-axial (de uma profundidade de 2,5 a 3 km) isolado na parte inferior, o qual é continuamente preenchido com água e permite uma captação de energia de cerca de 500 kWth.

2.2.1.2

Uma forma particular de aproveitamento do calor da superfície da terra é a aplicação de bombas geotérmicas («refrigeradores invertidos») para aquecimento dos edifícios (de cerca de 2 kWth a 2 MWth); adicionalmente, é utilizado um «refrigerador» (6). Há muitas variantes desta técnica, que podem ir de profundidades de não mais do que um metro até várias centenas de metros.

2.2.2

A segunda forma de aproveitamento da energia geotérmica é a geração de energia eléctrica, para o que são, porém, necessárias temperaturas (de água) mais elevadas (geralmente acima dos 120° C); a água é em regra conduzida através de dois furos subterrâneos de grande profundidade e continuamente irrigados. Esta técnica permite a obtenção de maiores temperaturas, geralmente da ordem dos 5 a 30 MWth.

2.2.2.1

Mas mesmo estas temperaturas são ainda reduzidas para atingir o grau de intensidade termodinâmica para transformar a energia térmica em energia eléctrica e tendo em conta as temperaturas de ebulição necessárias para o funcionamento das turbinas.

2.2.2.2

É por isso que para o funcionamento das turbinas são geralmente preferidas substâncias com uma temperatura de ebulição inferior à da água (como o perfluorpentano C5F12). Para esse efeito têm sido desenvolvidos ciclos especiais de funcionamento das turbinas, como o «Organic Rankine Cycle (ORC)» ou o processo Kalina.

2.2.3

Particularmente vantajosa é a combinação das duas formas de aproveitamento (electricidade e calor) da energia geotérmica, permitindo a geração simultânea de energia térmica e de energia eléctrica: o calor não aproveitado para a produção de electricidade é usado para o aquecimento.

2.3

Para produzir energia tecnicamente aproveitável, sobretudo para a produção de electricidade, só podem ser utilizados, regra geral, reservatórios de calor situados vários quilómetros abaixo da superfície, o que exige perfurações custosas.

2.3.1

Também os custos de exploração dessas instalações se tornam mais elevados quanto maior for a profundidade. Torna-se assim necessário procurar um equilíbrio, em função do aproveitamento desejado, entre a profundidade do furo, o grau de eficácia e o calor a explorar.

2.4

É por isso que ao início esses reservatórios eram procurados apenas nas zonas geológicas com anomalias geotérmicas.

2.4.1

Essas zonas (chamadas reservatórios de alta entalpia (7)) encontram-se sobretudo em regiões de grande actividade vulcânica (Islândia, Itália, Grécia, Turquia). Os reservatórios de alta entalpia eram utilizados como termas já na antiguidade e são aproveitados há cerca de cem anos para a geração de electricidade (Larderello, Itália, 1904).

2.4.2

Por outro lado, existem anomalias geotérmicas ligeiras (os chamados reservatórios termais de baixa entalpia), i.e., com um aumento menos acentuado da temperatura segundo a profundidade, em zonas tectonicamente activas (fossa do Alto Reno, Mar Tirreno, Mar Egeu, etc.) e nas zonas de sedimentos aquíferos (bacia da Panónia, na Hungria e na Roménia, e bacia da Alemanha do norte e da Polónia).

2.5

Dada a limitação das zonas com anomalias geotérmicas tem-se procurado cada vez mais, desde meados dos anos 80, explorar o calor acumulado igualmente nas formações geológicas «normais», com vista a satisfazer a procura crescente de energia utilizável e adaptar melhor a oferta de energia às necessidades regionais.

2.5.1

Assim, a partir dos anos 90 começou-se a utilizar reservatórios fora das zonas de anomalias geotérmicas (sobretudo no espaço germanófono) para a obtenção de energia. A geração de energia eléctrica só foi possível nos últimos quatro anos em Altheim e Bad Bluman (na Áustria) e em Neustadt Glewe (na Alemanha).

2.5.2

Dado que esta técnica requer profundidades de pelo menos 2,5 km, mas idealmente entre 4 e 5 km, é necessário efectuar furos dessas dimensões.

2.6

As vantagens deste processo são:

o facto de a geotermia, ao contrário da energia solar ou eólica, ser independente das condições climáticas e das estações, podendo servir para o importante aprovisionamento em carga de base;

o facto de não ser preciso recorrer aos processos tradicionais de produção de calor (como a combustão ou a fusão ou fissão nucleares) com os seus custos e impacto ambiental atinentes, bastando aproveitar o calor já acumulado a alguns quilómetros da superfície;

o facto de se tratar de reservatórios de calor virtualmente inesgotáveis e permanentemente renovados, cuja exploração pode dar, em teoria, um importante contributo ao aprovisionamento energético.

2.7

Por outro lado, tem as desvantagens seguintes:

as temperaturas reais são demasiado baixas para permitir um rendimento termodinâmico suficiente para a produção de electricidade;

dada a necessidade de restabelecer um fluxo de calor para os reservatórios subterrâneos e dada a transmissão de calor desses reservatórios, é imperativo explorar e aproveitar grandes volumes para impedir que os reservatórios se esgotem sempre que sejam extraídas grandes quantidades de calor e tenham de ser abandonados antes do prazo previsto para a sua exploração;

para o aproveitamento dos reservatórios há que prevenir a eventual libertação de substâncias corrosivas e/ou nocivas para o ambiente (como o CO2, o CH4, o H2S ou sais) e evitar a corrosão do equipamento;

os custos e os factores económicos imponderáveis (como o risco de prospecção ou o risco de esgotamento do reservatório) da exploração dos reservatórios geotérmicos são ainda muito elevados se comparados com os de outras fontes de energia.

3.   Situação actual

3.1

Essencialmente há três técnicas, com algumas variantes, de obtenção e aproveitamento da energia geotérmica (8) (cada uma normalmente com pelo menos dois furos — Dublette), a saber:

os reservatórios hidrotermais são utilizados como fonte de água quente subterrânea e não artesiana (i.e., não pressurizada) que é trazida à superfície e aproveitada sobretudo para o aquecimento. Actualmente, este processo está a ser aplicado à produção de electricidade através de reservatórios de água a temperaturas mais elevadas. O calor é aproveitado a partir da água extraída das profundezas;

o processo «Hot-Dry-Rock» (formações rochosas quentes e secas) consiste em realizar furos profundos em formações geológicas adequadas, que são depois sujeitas a estimulação intensiva. A água da superfície é introduzida nos furos e o calor acumulado é extraído pelo arrefecimento artificial das superfícies de intercâmbio de calor;

os reservatórios de água quente sob pressão, com uma mistura de água e vapor a temperaturas que podem atingir os 250° C (o que, porém, só ocorre muito raramente), são aproveitadas para a produção de electricidade ou para o aproveitamento do calor.

Além disso, estão a ser desenvolvidas técnicas de superfície (9) que deverão permitir uma melhor transferência e utilização do calor.

3.2

Na UE, a capacidade actual de geração de electricidade em instalações geotérmicas (a maior parte das quais em Itália, e no essencial por aproveitamento de anomalias geotérmicas) é de cerca de 1 GWe1, ou seja, cerca de 2‰ da capacidade total de geração de energia eléctrica da UE. A capacidade geotérmica para a geração de calor para aquecimento é actualmente de cerca de 4 GWth, mas deverá aumentar para 8 GWth até 2010.

3.3

Nenhuma destas duas formas de aproveitamento da geotermia pode, pois, dar um contributo substancial ao aprovisionamento energético da UE, e mesmo entre as fontes de energia renováveis a sua proporção é ínfima.

3.4

Contudo, os últimos anos têm assistido a um crescimento marcado da utilização da energia geotérmica, graças à sua promoção quer nos Estados-Membros quer a nível comunitário. Quando a produção de calor se limita a algumas dezenas de MWth, a geotermia contribui igualmente para a descentralização do aprovisionamento energético.

3.5

No entender do CESE, esta evolução é positiva e deve ser apoiada. Trata-se, porém, na maior parte dos casos, de instalações-piloto, nas quais deverão ser ensaiados e desenvolvidos diversos métodos.

3.6

Fora das zonas de anomalias geotérmicas, os custos de produção por kWhel de energia eléctrica são actualmente de cerca de metade dos custos da energia solar e do dobro dos da energia eólica; e mesmo neste caso é necessário produzir simultaneamente calor e electricidade.

3.6.1

No entanto, como acima referido, a oferta de energia geotérmica pode em grande parte ser orientada em função da procura, o que constituirá uma vantagem à medida que as energias renováveis forem ocupando uma posição cada vez mais importante no mercado da energia. Com efeito, as flutuações no rendimento da energia eólica e solar requererão cada vez mais sistemas reguladores e sistemas tampão. É provável que as energias renováveis venham a revelar-se impraticáveis sem o recurso a acumuladores custosos e consumidores de energia, como o hidrogénio.

4.   Evolução futura e recomendações

4.1

Se a energia geotérmica não estivesse confinada às zonas de anomalia geotérmica (ver pontos 2.4 e 2.5), poderia dar um contributo considerável a um aprovisionamento energético sustentável e ecológico (ver ponto 4.13.).

4.2

Para explorar e desenvolver esse potencial são necessários, para uma produção de electricidade economicamente rentável, furos de pelo menos 4 a 5 km de profundidade que permitam aceder às camadas geológicas que apresentam as temperaturas mínimas indispensáveis (cerca de 150° C). Além disso, as formações geológicas deverão ser preparadas (estimuladas) de forma a permitir um intercâmbio de calor bastante entre as rochas quentes e a água presente naturalmente ou injectada artificialmente, assim como uma suficiente circulação da água.

4.2.1

Em compensação (ver ponto 2.2.1.1), para um aproveitamento da energia apenas para fins de aquecimento são já suficientes profundidades da ordem dos 2 a 3 km.

4.3

Na Europa estão actualmente a ser desenvolvidos e testados projectos tecnológicos correspondentes em diversos locais (p. ex., Soultz-les-Forêts, Gross Schönebeck) com diferentes tipos de formações geológicas. O potencial de desenvolvimento dependerá da possibilidade de explorar, tanto quanto possível, tecnologias de utilização independentes da localização e, logo, exportáveis. Este objectivo requer, contudo, importantes investimentos em I&D.

4.4

Por um lado, há que aperfeiçoar as diferentes técnicas actualmente disponíveis a fim de torná-las operacionais e procurar reunir as condições acima referidas para uma exploração sustentável da energia geotérmica.

4.4.1

Para tal importa nomeadamente averiguar se um reservatório assim estimulado poderá respeitar as condições hidráulicas e termodinâmicas necessárias para ser verdadeiramente sustentável.

4.5

Por outro lado, importa melhorar e optimizar as diferentes fases do processo de modo a tornar mais competitivos os custos desta forma de energia (cf. infra). Para isso haverá que envidar esforços no domínio da I&D (ver ponto 1.6), mas igualmente preparar o mercado para alcançar a redução dos custos de produção.

4.6

A médio prazo, «competitivo» quer dizer que a energia geotérmica deverá ser capaz de competir com a energia eólica a nível dos custos. Este objectivo não parece difícil de alcançar, dadas as desvantagens cada vez mais patentes da energia eólica, nomeadamente as enormes flutuações na sua oferta (que, como se sabe, podem gerar custos secundários e provocar a transferência de emissões para outros locais), os inconvenientes para os habitantes e a degradação da paisagem, bem como os custos crescentes de reparação e manutenção. Também os encargos para os consumidores e para o sector público (decorrentes dos apoios financeiros à exploração destas formas de energia) deveriam ser incluídos no cômputo final.

4.7

A longo prazo, e tendo em mente o muito provável aumento continuado dos preços do crude e do gás natural (assim como o esgotamento das respectivas reservas), coloca-se a questão da competitividade geral da energia geotérmica. Isso implica determinar se a energia geotérmica poderá um dia (e se sim, quando), tendo em conta os custos externos de todas as técnicas de adaptação energética, ser economicamente viável a longo prazo e sem beneficiar de subvenções ou de condições preferenciais distorcedoras da concorrência.

4.8

Para tal, importa (10)

fomentar, através de programas específicos de I&D tanto a nível nacional como a nível comunitário, o desenvolvimento científico e técnico de modo a permitir que os diferentes processos e técnicas possam ser utilizados e testados por um número suficientemente elevado de instalações de experimentação;

visando apoiar inicialmente (que deverá diminuir progressivamente) a introdução da energia geotérmica no mercado, criar também regulamentação (p. ex., lei sobre o aprovisionamento da rede pública em electricidade e legislação sobre a climatização e o aquecimento dos espaços interiores) como incentivo para os investimentos privados e tornar atraente a venda desta forma de energia durante a fase da sua introdução no mercado, com vista a poder igualmente testar, melhorar e avaliar o seu potencial a nível económico; a este respeito, importa dar atenção particular aos modelos dos contratos propostos pelas empresas fornecedoras de energia aos consumidores;

oferecer garantias contra os riscos associados à prospecção e à exploração dos depósitos geotérmicos, como o risco de exploração e o risco de perfuração.

4.9

Apraz ao Comité reconhecer que houve já grandes progressos neste domínio. O CESE apoia plenamente os projectos de I&D em curso ou programados pela Comissão para este efeito e aplaude a intenção da Comissão de envidar esforços ainda mais intensos no próximo programa-quadro de I&D. Anima igualmente os Estados-Membros nos seus correspondentes programas de I&D e nas suas tentativas de facilitar e promover desde já a introdução gradual da energia geotérmica no mercado através de incentivos.

4.10

O Comité reitera a sua recomendação anterior de aproveitar o potencial do espaço europeu da investigação através de uma estratégia integrada, transparente e coordenada da investigação energética, a executar por todos os parceiros e a incluir como elemento essencial do sétimo programa-quadro de I&D e do programa EURATOM.

4.11

Estes programas devem dar também o devido destaque às medidas de I&D necessárias para o desenvolvimento da geotermia até que seja possível estimar e avaliar mais exactamente os custos a longo prazo e o verdadeiro potencial desta tecnologia num mercado de energia em constante mutação.

4.12

O Comité recomenda ainda que todos os programas de I&D sobre a geotermia (incluídos os programas que até à data só tenham beneficiado de ajudas nacionais) sejam integrados, no sentido do método aberto de coordenação, num programa único europeu de investigação energética, promovendo desse modo igualmente a cooperação europeia.

4.13

A este respeito, o Comité apela ao envolvimento dos novos Estados-Membros no programa de I&D da UE. A renovação dos sistemas de energia em curso nesses países deve ser aproveitada para testar projectos e instalações-piloto neste domínio.

4.14

A Comité exorta ainda a Comissão a harmonizar, na medida do possível, as medidas mais eficazes de promoção da introdução no mercado da energia geotérmica em toda a UE (p. ex., leis sobre o aprovisionamento da rede pública em electricidade), com vista a criar, pelo menos no sector da geotermia, condições equitativas para técnicas similares.

4.15

Dado que a geotermia permite a produção simultânea de calor e de energia eléctrica, o CESE insta a Comissão a tomar as medidas necessárias para desenvolver redes de aquecimento e de exploração da energia térmica.

5.   Conclusão

5.1

A obtenção da energia geotérmica passa por técnicas que permitem captar e aproveitar o fluxo térmico que circula entre as profundezas extremamente quentes da terra e a sua superfície.

5.2

Destina-se antes de mais ao fornecimento de energia térmica, mas também de energia eléctrica ou das duas em simultâneo.

5.3

A energia geotérmica é já explorada em zonas de anomalia geotérmica, mas o seu contributo relativo para o aprovisionamento global de energia é muito reduzido.

5.4

A utilização de tecnologias que permitam o aproveitamento da energia geotérmica mesmo fora das zonas de anomalia geotérmica pode aumentar o potencial desta forma de energia de contribuir para um aprovisionamento energético sustentável, sobretudo no domínio da carga de base. No entanto, essas tecnologias envolvem perfurações de 4 a 5 quilómetros de profundidade, bem como formas de estimulação acessória.

5.5

Entretanto, o aproveitamento do calor próximo da superfície para aquecimento das habitações através de bombas geotérmicas apresenta igualmente um elevado potencial de crescimento.

5.6

As possibilidades de aprovisionamento em carga de base distinguem a geotermia das fontes de energia sujeitas a flutuações (como a solar e a eólica), as quais dependem ou dependerão cada vez mais de sistemas de regulação, de tampão ou de acumulação e suscitam oposição por parte das populações locais por requererem vastas superfícies ou degradarem a paisagem.

5.7

O Comité reitera a sua recomendação de aproveitar o potencial do espaço europeu da investigação através de uma estratégia integrada da investigação energética.

5.8

Essa estratégia deve comportar as medidas de I&D necessárias para desenvolver a geotermia, na continuação e em complemento dos programas específicos já em curso.

5.9

O Comité recomenda que todos os programas de I&D sobre a geotermia que até à data tenham beneficiado exclusivamente de ajudas nacionais sejam fundidos, no sentido do método aberto de coordenação, num programa único europeu de investigação energética e nas respectivas medidas de integração.

5.10

O Comité apela à criação de incentivos iniciais, que diminuirão ao longo do tempo, para a introdução da energia geotérmica no mercado e para a sua regulamentação (p. ex., lei sobre o aprovisionamento da rede pública em electricidade) para estimular os investimentos privados e tornar atraente a venda desta forma de energia. Desta forma possibilita-se igualmente a prova, a melhoria e a avaliação do potencial económico desta forma de energia.

5.11

O Comité exorta a uma harmonização tão extensa quanto possível das medidas de apoio em toda a UE por forma a criar condições de concorrência equitativas para todas as tecnologias de aproveitamento da geotermia.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  A energia não é consumida, apenas transformada e aproveitada. Isto é possível graças a processos de transformação específicos como a combustão do carvão, a conversão da energia eólica em electricidade ou a fusão nuclear (obtenção de energia; E = mc2). Fala-se assim de «abastecimento energético», de «obtenção de energia» e de «aproveitamento da energia».

(2)  Fontes de energia renováveis; Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à promoção da cogeração baseada na procura de calor útil no mercado interno da energia; Proposta de directiva (Euratom) do Conselho que define as obrigações de base e os princípios gerais no domínio da segurança das instalações nucleares; Os desafios colocados pela energia nuclear na produção de electricidade; Fusão nuclear.

(3)  A utilização dos quais terá de ser progressivamente restringida devido não só à exiguidade das suas fontes mas também às limitações da emissão de CO2 impostas por Quioto.

(4)  O problema que hoje se coloca foi prenunciado pelas anteriores crises petrolíferas (1973 e 1979) e pela actual controvérsia quanto à repartição dos certificados de emissões, que opõe interesses económicos a ecológicos.

(5)  Cf., porém, os pontos 2.2.1.2 e 2.2.2.2.

(6)  De futuro, por exemplo o CO2.

(7)  O conceito de entalpia, utilizado na termodinâmica, designa a soma da energia interna e da energia elástica (trabalho elástico).

(8)  Cf. também os pontos 2.2.1.1 e 2.2.1.2 sobre as sondas e as bombas geotérmicas, respectivamente.

(9)  Cf. 2.2.2.2 sobre o ciclo das turbinas.

(10)  «Promoção das energias renováveis – Meios de acção e instrumentos de financiamento».


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/28


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselhom relativo à realização das fases de implantação e de exploração do programa europeu de radionavegação por satélite»

COM (2004) 477 final — 2004/0156 (COD)

(2005/C 221/06)

Em 16 de Novembro de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 156.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 17 de Janeiro de 2005, sendo relator V. RANOCCHIARI.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 134 votos a favor e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

O CESE tem acompanhado o desenvolvimento do programa europeu Galileo de radionavegação e determinação da posição por satélite desde o seu lançamento, reconhecendo o seu papel estratégico fundamental para a competitividade do sistema europeu, tanto pelas suas repercussões inovadoras em termos económicos, de emprego e sociais como pela melhoria da qualidade de vida que pode assegurar à sociedade civil (1). O CESE salientou ainda a necessidade de associar, desde o lançamento da Empresa Comum Galileo (2), o sector privado ao desenvolvimento e à exploração do sistema, assegurando um apoio contínuo durante as fases de desenvolvimento e de implantação (3).

1.2

No seu mais recente parecer sobre a matéria (4), o CESE salientou que «o projecto Galileo pôde enfim ter início graças ao acordo concluído no Conselho da AEE em 26 de Março de 2003 sobre as contribuições financeiras dos seus membros» e reafirmou que «o Programa Galileo tem destacada importância para a União Europeia, para a sua independência, as suas capacidades tecnológicas e científicas, a sua economia e, sobretudo, o seu sector espacial».

2.   A situação actual e os desenvolvimentos esperados

2.1

Convém recordar que o Programa Galileo compreende quatro fases:

a fase de definição, iniciada em 1999 e concluída em 2001, durante a qual foi concebida a arquitectura do sistema e foram definidos os cinco tipos de serviços a oferecer, que mais adiante se enumeram; esta fase foi financiada principalmente pelo V Programa-Quadro de IDT & D 1998-2002;

a fase de desenvolvimento e validação, que vai de 2002 a 2005 e prevê o desenvolvimento dos satélites e das componentes terrestres, bem como a validação «em órbita» do sistema. A dotação financeira pública UE/ASE é de 1,2 mil milhões de euros, para além de 100 milhões de euros a cargo do VI Programa-Quadro de IDT & D 2002-2006;

a fase de implantação, que decorrerá, previsivelmente, entre 2006 e 2007 e engloba a construção e o lançamento dos satélites — os dois primeiros serão lançados já em finais de 2005 — e a instalação de todo o segmento terrestre. A dotação financeira global é de 2,1 mil milhões de euros, 1/3 dos quais, ou seja o equivalente a cerca de 700 milhões de euros, a cargo do orçamento comunitário e 2/3, isto é, cerca de 1,4 mil milhões de euros, a cargo do consórcio seleccionado;

a fase de exploração comercial, que terá início em 2008 e prevê um custo anual de funcionamento e manutenção de cerca de 220 milhões de euros, inteiramente a cargo do sector privado, à excepção de uma intervenção pública extraordinária da UE da ordem dos 500 milhões de euros no total durante os primeiros anos desta fase, de acordo com as decisões que serão tomadas sobre as perspectivas financeiras do orçamento comunitário 2007-2013.

2.2

Após a fase de definição, foi constituída, em Maio de 2002, a Empresa Comum Galileo por um período de quatro anos, com o objectivo de «garantir a unidade da administração e do controlo financeiro do projecto na fase de investigação, desenvolvimento e demonstração do Programa Galileo e, para tanto, mobilizar os fundos afectados a este programa».

2.3

Além disso, com o Regulamento 1321/2004 (5), que institui a Autoridade Europeia de Supervisão GNSS (sistema global de radionavegação por satélite) e com a Acção Comum 2004/552/PESC (6), ambos de 12 de Julho de 2004, foram criadas as estruturas operacionais do sistema, destinadas a gerir os interesses públicos relativos aos programas e a garantir a protecção e a segurança do sistema Galileo.

2.4

A nível internacional, a União Europeia e os Estados Unidos da América concluíram, em 26 de Junho de 2004, após quatro anos de negociações, um acordo de extrema importância sobre os sistemas Galileo e GPS (7), relativo à promoção, fornecimento e utilização dos serviços dos dois sistemas de navegação e determinação da posição por satélite e das aplicações conexas em condições de plena compatibilidade e interoperabilidade: os dois sistemas funcionarão em paralelo, sem interferências entre os respectivos sinais. Isto permitirá que o sistema Galileo, no âmbito dos sistemas mundiais de navegação por satélite GNSS, se torne a norma mundial dos sinais abertos para utilização civil e comercial (o sistema GPS é um sistema de gestão militar) e seja igualmente acessível e «apetecível» para os actuais utilizadores do sistema GPS, através de um só receptor.

2.5

Ainda a nível da cooperação internacional, foi assinado, em 13 de Julho de 2004, um Acordo de Cooperação com Israel, na sequência do que fora assinado com a China em 30 de Outubro de 2003. Já há algum tempo que foram iniciadas negociações com vista à obtenção da interoperabilidade com o sistema russo GLONASS  (8), que se encontram em fase avançada, sobretudo no que se refere à aquisição das frequências e à utilização de vectores de lançamento russos. Está igualmente adiantada a negociação de acordos de cooperação com a própria Federação Russa, a Ucrânia e a Índia. Foram já estabelecidos contactos com a Austrália, o Brasil, o México e a Coreia do Sul. A Suíça, a Noruega e o Canadá estão também a equacionar a sua eventual participação financeira.

2.6

Na Bacia Mediterrânica foi lançado um plano de acção pela Conferência Euromediterrânica dos Ministros dos Negócios Estrangeiros de Valência, em Abril de 2002, que contempla a cooperação mediterrânica em matéria de radionavegação e determinação da posição por satélite. Recentemente, no Cairo, a Empresa Comum Galileo lançou um projecto Euro-Med GNSS de demonstração, formação e coordenação do plano GNSS regional, a fim de verificar, em cooperação com os parceiros Meda, o impacte do sistema EGNOS  (9), satélite geoestacionário precursor do sistema Galileo.

2.7

Uma vez operacional, o sistema GALILEO prestará cinco tipos de serviços:

um serviço de base aberto, destinado, em particular, a aplicações «grande público» e a serviços de interesse geral;

um serviço comercial que assegurará o desenvolvimento de aplicações para fins profissionais, oferecendo, portanto, serviços com um nível de desempenho superior ao do serviço de base, particularmente no que se refere à garantia do serviço;

um serviço denominado «Safety of Life», de qualidade e integridade muito elevadas, para aplicações em que está em jogo a vida humana, como a navegação marítima ou aérea;

um serviço de busca e salvamento destinado a melhorar decisivamente os sistemas de assistência actualmente existentes em situações de perigo e de salvamento de pessoas;

um serviço para utilização institucional denominado «Public Regulated Service» (PRS), codificado e resistente a perturbações e interferências rádio, reservado fundamentalmente às instituições públicas que operam no domínio da protecção civil, da segurança nacional, da manutenção da ordem pública e do cumprimento da lei, que exigem protecção absoluta (10).

2.8

Dadas as características de utilização e gestão civil do sistema Galileo, que se destina essencialmente a aplicações comerciais e profissionais, o seu mercado potencial, segundo a Comissão, poderá situar-se, em 2010, em torno dos 3 mil milhões de receptores, com um retorno do investimento anual de cerca de 250 mil milhões de euros e a criação de novas empresas e postos de trabalho altamente qualificados na ordem das centenas de milhares, dos quais mais de 150.000 serão criados na Europa.

2.9

A Empresa Comum Galileo concluiu, em Setembro de 2004, a fase de negociação competitiva, tendo recebido as propostas finais de dois consórcios candidatos à concessão (Eurely (11) e Inavsat (12)), que submeteu a avaliação final com base em três critérios: capacidades empresariais e financeiras; capacidades técnicas; aspectos legais e contratuais.

2.10

Em conformidade com o seu mandato, a Empresa Comum, após ter apresentado um relatório à Comissão e na sequência da apresentação, por esta última, de uma Comunicação ao Parlamento e ao Conselho (13) sobre a passagem às fases de implantação e exploração comercial, poderá obter as directivas políticas necessárias quanto ao financiamento público das próximas fases do programa e às missões de serviço público, particularmente a definição dos serviços, e, portanto, apresentar uma proposta de assinatura do contrato por parte da Autoridade de Supervisão, que é, com efeito, a autoridade signatária responsável pela execução do contrato nos termos do citado Regulamento (CE) n.o 1321/2004.

2.11

O Comité interroga-se se tal procedimento não correrá o risco de se revelar demasiado complexo, com sobreposições e uma duplicação dos controlos que podem originar dificuldades e falta de clareza.

2.12

Por outro lado, a Autoridade de Supervisão, referida na proposta de regulamento objecto do presente parecer e nela definida como agência comunitária de gestão dos interesses públicos relativos aos programas de radionavegação por satélite, regulada pelo Regulamento (CE) n.o 1321/2004, apenas será constituída em 2005.

3.   A proposta da Comissão Europeia

3.1

A proposta objecto deste parecer responde à necessidade de dispor de um instrumento jurídico específico que, assegurando ao programa uma rubrica orçamental autónoma, permita uma gestão e um controlo mais eficazes das fases de implantação e de exploração do sistema Galileo do ponto de vista financeiro, nomeadamente no que se refere ao concessionário.

3.2

A presente proposta de regulamento visa, pois, estabelecer as modalidades da contribuição financeira da Comunidade para as fases de implantação e de exploração comercial, centrando-se nos seguintes aspectos:

3.2.1

necessidade de intervenção comunitária para assegurar a congruência do quadro financeiro entre os recursos atribuídos pela própria Comunidade e os que o concessionário obtém através de:

fornecimento dos diversos serviços gerados pelo sistema Galileo;

licenças e direitos de propriedade intelectual sobre as componentes do sistema que lhe são gratuitamente cedidos pela Autoridade de Supervisão;

empréstimos a longo prazo a conceder pelo BEI;

3.2.2

adequação do mecanismo institucional de gestão e controlo da Autoridade de Supervisão.

4.   Observações na generalidade

4.1.

O CESE considera que importa precisar desde já as características técnicas da prestação dos diversos tipos de serviços, a fim de garantir normas abertas que permitam o acesso a outros fornecedores de serviços e a serviços inovadores, evitando barreiras artificiais ou elevados encargos para os recém-chegados, particularmente os de pequena dimensão.

4.2

Quanto à congruência do quadro financeiro de referência, o CESE espera que sejam aprovadas quanto antes novas perspectivas financeiras do orçamento comunitário e apoia o facto de a Comissão solicitar para o Programa Galileo o montante de mil milhões de euros, através de uma rubrica orçamental específica independente de outras rubricas orçamentais. O Comité solicita, por outro lado, que esse montante seja adequadamente reforçado, de forma a assegurar o desenvolvimento e a integração do sistema EGNOS no Programa Galileo. O CESE considera ainda oportuno que o VII Programa-Quadro de IDT & D preveja actividades de investigação em matéria de sistemas de determinação da posição por satélite GNSS e recursos para o efeito.

4.3

O CESE interroga-se, por outro lado, sobre a forma como serão inseridas nesse quadro as eventuais contribuições públicas de organismos de países terceiros que já manifestaram a intenção de participar financeiramente no Programa Galileo.

4.4

O CESE verifica que o quadro financeiro refere os benefícios que o concessionário retira da sua qualidade de fornecedor de serviços e detentor de licenças e DPI (14) gratuitos. A este respeito, o CESE não pode deixar de manifestar preocupação em relação à eventual pré-constituição de uma posição dominante ou monopolista do concessionário, com as distorções de concorrência e as restrições ao mercado livre que daí poderiam advir.

4.5

No que concerne à adequação do quadro institucional de gestão e controlo externalizado a uma agência europeia (Autoridade Europeia de Supervisão do Sistema Global de Navegação por Satélite), o Comité salienta o seguinte:

4.5.1

no Conselho de Administração da Autoridade Europeia GNSS não está representada a Agência Espacial Europeia. Ora, esta agência integra o actual Conselho de Administração da Empresa Comum;

4.5.2

as competências de gestão e de controlo são transferidas da Empresa Comum para a Autoridade Europeia GNSS, que gere os fundos atribuídos ao Programa Galileo, desempenha o papel de autoridade outorgante nos contratos de concessão, vela pelo cumprimento das obrigações contratuais, cede ao concessionário os direitos de utilização dos bens durante o período de validade do contrato, gere o acordo com o operador do sistema EGNOS, coordena as acções dos Estados-Membros relativamente às frequências necessárias ao funcionamento do sistema, garante que os componentes sejam devidamente certificados e assegura a aplicação das disposições de segurança, incluídas as decorrentes da Acção Comum 2004/552PESC.

4.5.3

O CESE não pode deixar de manifestar preocupação em relação à fase extremamente delicada de transferência de responsabilidades da Empresa Comum, que será dissolvida em Maio de 2006, para a nova Autoridade Europeia de Supervisão GNSS, que deverá estar operacional a partir da primeira metade de 2005.

4.5.4

O Comité recomenda, pois, que a Comissão e o Conselho supervisionem a referida fase de transição e de «coabitação» entre a Empresa Comum e a Autoridade de Supervisão.

4.5.5

As disposições da Acção Comum 2004/552/PESC e do Regulamento que institui a Autoridade Europeia de Supervisão GNSS, que prevê um Comité de Protecção e Segurança do Sistema, regulam as questões de segurança interna do sistema Galileo.

No entender do CESE, importa aprofundar desde já as relações do sistema Galileo com as demais iniciativas europeias coexistentes, como o sistema Global Monitoring for Environment and SecurityGMES, o sistema COSPAS-SARSAT (15) de busca e salvamento, as redes no domínio da justiça e dos assuntos internos, as redes multimédia GRID, etc.

4.5.6

O CESE sublinha a necessidade, já expressa nos seus anteriores pareceres (16), de, paralelamente à resolução dos problemas de segurança, tratar igualmente as questões atinentes à salvaguarda da privacidade e à protecção dos dados pessoais, disso incumbindo, sempre que possível, a Agência Europeia dos Direitos Fundamentais  (17) ou prevendo a criação de um órgão consultivo apropriado. Com efeito, não se afigura suficiente a referência às disposições do Regulamento (CE) n.o 45/2001, contida no art. 19.o do regulamento que institui a Autoridade Europeia de Supervisão GNSS, seria criado um órgão consultivo apropriado para o efeito. No entender do Comité, assegurar explicitamente a salvaguarda adequada da privacidade e dos dados pessoais não é menos importante do que dar garantias em matéria de segurança, se se quiser assegurar o êxito do sistema Galileo com o pleno apoio da sociedade civil.

4.5.7

No que se refere à participação da sociedade civil, o CESE verifica que uma iniciativa tão importante para a Europa como o Programa Galileo é ainda praticamente desconhecida da maioria dos cidadãos europeus. O CESE espera que as instituições comunitárias, em concertação com os governos nacionais, lancem, logo que possível, uma campanha de informação e sensibilização que, para além de dar a conhecer este excelente produto da investigação e da indústria europeia e fazer com que o mesmo seja devidamente apreciado, tranquilize os cidadãos europeus quanto ao respeito e protecção dos seus direitos à privacidade.

5.   Observações na especialidade

5.1

Face ao exposto, o CESE recomenda que, nos «considerandos» da proposta de regulamento, se proceda aos seguintes aditamentos:

5.1.1

novo considerando (3-A): Em virtude do impacte que o programa poderá ter na vida dos cidadãos europeus, a Comissão empenhar-se-á em que seja atribuída à Agência Europeia dos Direitos Fundamentais ou, em alternativa, a um órgão consultivo «ad hoc», a salvaguarda da privacidade e a protecção dos dados pessoais na prestação dos serviços Galileo, a fim de assegurar um desenvolvimento transparente e um diálogo constante com os potenciais utilizadores e com a sociedade civil;

5.1.2

no considerando (12), aditar: «... assegurar recursos comunitários adicionais na mesma rubrica orçamental para o desenvolvimento e a integração do sistema EGNOS no Programa Galileo e prever, no VII Programa-Quadro de IDT & D, acções no âmbito da radionavegação por satélite e da integração entre as redes existentes, atribuindo-lhes recursos adequados»;

5.1.3

novo considerando (13-A): «A Comissão e o Conselho assegurarão que o processo de transição entre a Empresa Comum Galileo e a nova Autoridade Europeia de Supervisão GNSS decorra com a maior transparência, de modo a evitar possíveis sobreposições, atrasos de funcionamento ou, pior ainda, restrições de mercado»;

5.1.4

novo considerando (14-A): «A Comissão velará por que as eventuais contribuições e participações financeiras de organismos de países terceiros para o património da Autoridade Europeia de Supervisão GNSS se realizem no respeito dos interesses recíprocos e dos equilíbrios existentes, através de acordos adequados a submeter ao Conselho e ao Parlamento Europeu».

6.   Conclusões

6.1

O CESE reafirma o seu inteiro apoio ao Programa Galileo e à aceleração dos prazos de realização das duas últimas fases do seu desenvolvimento, por forma a que esteja efectivamente operacional, para todos os efeitos, em 2008.

6.2

O CESE convida a Comissão a prosseguir a avaliação ex-ante dos benefícios adicionais para o concessionário decorrentes do fornecimento de serviços e dos direitos de propriedade intelectual, dando uma informação clara e precisa sobre os resultados dessa avaliação.

6.3

O CESE considera que foram dados passos em frente essenciais no sentido da realização de uma infra-estrutura mundial, particularmente com a Acordo de Cooperação UE-EUA, que visa assegurar a plena compatibilidade e interoperabilidade entre os sistemas de radionavegação e determinação da posição por satélite existentes na cena mundial.

6.4

O CESE salienta a importância da cooperação internacional com a China e Israel e considera que devem ser envidados todos os esforços para se chegar a acordos de interesse mútuo com a Suíça, a Noruega, a Federação Russa, a Ucrânia, a Índia, a Austrália, o México, o Brasil e a Coreia do Sul. O Comité entende que a Bacia Mediterrânica deve constituir uma zona privilegiada, dado já poder usufruir dos serviços prestados pelo sistema EGNOS e ser uma área estratégica para a paz, a estabilidade e o desenvolvimento sustentável da Europa.

6.5

A este respeito, o CESE está convicto de que a abertura aos países terceiros constitui um importante contributo para a dimensão externa da política da União Europeia.

6.6

O CESE espera que a Comissão Europeia possa dispor de uma rubrica orçamental a consagrar a uma campanha de informação e sensibilização que, para além de dar a conhecer este excelente produto da investigação e da indústria europeia e fazer com que o mesmo seja devidamente apreciado, tranquilize os cidadãos europeus quanto ao respeito e protecção dos seus direitos à privacidade.

6.7

O CESE espera, por último, que as observações e sugestões acima apresentadas em relação a alguns «considerandos» do regulamento proposto (salvaguarda da privacidade, aumento dos recursos financeiros, período de transição e contribuições de países terceiros) mereçam acolhimento favorável. Tais observações e sugestões visam contribuir para uma maior clareza e transparência da iniciativa e assegurar-lhe recursos adequados, sendo, pois, do interesse tanto das instituições europeias como da sociedade civil.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 311 de 17/11/2001, pág. 19.

(2)  Empresa Comum Galileo: constituída ao abrigo do artigo 171.o do Tratado CE, através do Regulamento CE 876/2002, de 21 de Maio de 2002. Assegura a gestão da fase de desenvolvimento do Programa Galileo e prepara a gestão das fases de implantação e de exploração do programa. Está sediada em Bruxelas. Os membros fundadores são a Comunidade Europeia, representada pela Comissão, e a Agência Espacial Europeia.

(3)  JO C 48, de 21/02/2002, pág. 42.

(4)  Parecer do CESE sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho: Ponto da situação do Programa de investigação GALILEO no início de 2004» — JO C 302 de 7.12.2004.

(5)  Regulamento do Conselho sobre as estruturas de gestão dos programas europeus de radionavegação via satélite (JO L 246 de 20/7/2004).

(6)  Ver JO L 246 de 20.7.2004.

(7)  US GPS: United States Global Positioning System, de gestão militar.

(8)  GLONASS: GLOBAL NAVIGATION SATELLITE SYSTEM.

(9)  EGNOS – European Geostationary Navigation Overlay Service: sistema baseado na correcção do sinal GPS através de uma rede de estações terrestres e de satélites geoestacionários. Lançado em 1996 e já em funcionamento como precursor do sistema Galileo, o serviço EGNOS deverá agora integrar-se com este último, nomeadamente em termos de regime comum de concessão.

(10)  Ver contrato de concessão das fases de implantação e de gestão do Programa Galileo – 2003/s200-17989, publicado em 17 de Outubro de 2003.

(11)  EURELY: consórcio formado por ALCATEL, FINMECCANICA e VINCI.

(12)  INAVSAT: formado por EADS Space, Inmarsat Ventures e Thales Group.

(13)  COM(2004) 636 final, de 6/10/2004.

(14)  DPI: direitos de propriedade intelectual.

(15)  COSPAS (acrónimo russo «Cosmicheskaya Sistyema Pioska Avariynich Sudov», ou seja, «Sistema espacial para a busca de navios em dificuldade») – SARSAT («Search and Rescue Satellite-Aided Tracking»: Investigação e salvamento via satélite); trata-se de um sistema internacional de busca, identificação e salvamento via satélite com fins humanitários. No período 1982-2003, o sistema permitiu salvar mais de 15 000 pessoas em todo o mundo.

(16)  Ver Parecer do CESE sobre a Proposta de regulamento do Conselho relativo à constituição da empresa comum GALILEO — JO C 48 de 21.2.2002.

(17)  Ver COM(2004) 693 final, de 25/10/04, Comunicação da Comissão que propõe a criação da Agência em 2005, admitindo que lhe seja igualmente confiada a protecção das pessoas singulares relativamente ao tratamento dos dados pessoais.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/33


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece uma infra-estrutura de informação espacial na Europa (INSPIRE)»

COM(2004) 516 final — 2004/0175 (COD)

(2005/C 221/07)

Em 13 de Setembro de 2004, o Conselho decidiu, em conformidade com o artigo 175.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente emitiu parecer em 13 de Janeiro de 2005 (relator: D. RETUREAU).

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 140 votos a favor e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Síntese do parecer do Comité

1.1

O Comité entende que o estabelecimento proposto de uma infra-estrutura de informação espacial na Comunidade (INSPIRE) é apropriado, desejável e conforme com o princípio da proporcionalidade. Esta infra-estrutura coordenará e tornará interoperáveis e acessíveis os dados espaciais reunidos no plano nacional pelos Estados-Membros, para documentar melhor, numa base científica, as decisões e o seguimento em matéria de ambiente, bem como os relatórios previstos no quadro de certas directivas. O Comité considera que a base jurídica (art. 175.o do TCE) é apropriada.

1.2

Esta iniciativa é susceptível de reduzir as duplicações, as lacunas ou as insuficiências e de favorecer a coordenação e a pertinência na recolha e no tratamento dos dados disponíveis, sendo necessária uma intervenção comunitária. A iniciativa garantirá uma utilização mais eficaz dos dados pelas administrações e serviços interessados, e a sua exploração por operadores públicos e privados sob diversas formas, nomeadamente serviços de valor acrescentado (mapas ou bases de dados especializadas, etc.).

1.3

O directiva proposta estabelece o quadro legal e técnico indispensável para realizar esse objectivo, instituindo um comité técnico e impondo aos Estados-Membros a obrigação de autorizar o acesso aos respectivos dados geográficos. O seguimento compete à Comissão, estando prevista a elaboração de relatórios periódicos.

1.4

Por tudo isto, o Comité aprova a proposta que lhe foi apresentada para parecer, na medida em que representa um indiscutível valor acrescentado comunitário, ao oferecer um quadro harmonizado de referência e ao promover um progresso indispensável na qualidade e na natureza dos dados espaciais recolhidos, que servirá de base para a política do ambiente e, eventualmente, para outras políticas nacionais e europeias, bem como para apoiar os processos de decisão.

1.5

O Comité pretende insistir na necessidade de empregar protocolos e formatos de ficheiros abertos ou suportes-padrão universais e legíveis com software de leitura gratuito; insiste também na necessidade de garantir que as informações referenciadas e disponíveis no quadro de INSPIRE sejam do domínio público, pois trata-se de dados científicos indispensáveis tanto para os responsáveis das políticas ambientais, como para os estudantes e os investigadores. Por fim, o Comité sublinha que este exercício deve ser efectuado sem pôr em risco a confidencialidade de certos dados, quer porque se trate de dados privados, quer por motivos de interesse geral e segurança.

2.   A proposta da Comissão

2.1

A base jurídica adoptada é o artigo 175.o, n.o 1, do TCE. Esta base permite, remetendo para o artigo 174.o, propor medidas no domínio do ambiente e da protecção da saúde, com base em dados técnicos e científicos.

2.2

Tanto os fenómenos naturais como os que são provocados pelas actividades humanas têm um impacto sobre a qualidade do ambiente e a saúde; isto justifica uma acção comunitária de informação e coordenação, tendo em conta os princípios de proporcionalidade, subsidiariedade e precaução.

2.3

Propõe-se uma directiva-quadro que deixa uma ampla margem à subsidiariedade na adaptação das disposições às diferentes realidades nacionais e regionais.

2.4

Os metadados recolhidos emanam principalmente de fontes públicas nacionais, mas não está excluído o recurso a outras fontes. Um portal comunitário permitirá o acesso às bases de dados nacionais em formato electrónico.

2.4.1

A recolha dos dados mencionados nos anexos não é obrigatória para os Estados-Membros. A iniciativa INSPIRE completa outras iniciativas tais como o sistema GMES e o programa GALILEO, que podem recolher dados específicos ou complementares.

2.4.2

A natureza horizontal de INSPIRE é essencial, na medida em que permeia vários sectores, o que contribui para identificar as lacunas existentes e para encontrar soluções.

2.4.3

A legislação sobre o ambiente prevê a natureza, a qualidade e a notificação dos dados pertinentes para cada um dos textos sectoriais (directiva sobre a qualidade da água, por exemplo).

2.4.4

O facto de partilhar os dados deverá permitir a identificação das dificuldades ou das lacunas eventualmente encontradas pelos Estados-Membros, bem como a sua progressiva resolução.

2.5

Trata-se de recolher e de coordenar os dados espaciais (geográficos) enumerados a título de exemplo nos anexos I, II e III, de garantir a interoperabilidade entre os diversos sistemas nacionais de recolha e de tratamento destes dados, para os colocar à disposição dos órgãos de decisão, dos serviços administrativos, das estruturas de investigação e do público interessado em geral.

2.6

Os dados harmonizados são colocados em rede pelos Estados-Membros. Estes dados e vários serviços facilmente acessíveis poderão servir de base técnica e científica para as políticas europeias, nacionais ou infra-nacionais em toda uma série de domínios.

2.7

Ao partilhar e combinar as informações e os conhecimentos adquiridos nos vários países e sectores, será possível evitar duplicações e ter em conta os imperativos ambientais em todas as políticas comunitárias.

2.8

A Comissão exercerá as competências de execução que lhe foram atribuídas pela Decisão do Conselho de 22 de Junho de 1998; vários serviços da Comissão, de que se destacam o Eurostat e o Centro Comum de Investigação, participarão activamente na aplicação da directiva, sendo igualmente assistidos pela Agência Europeia do Ambiente. Cada Estado-Membro designará a autoridade pública que será responsável pelos contactos com a Comissão. Está previsto um procedimento de comitologia para a gestão técnica de INSPIRE, que reunirá os peritos governamentais, as agências europeias e as direcções-gerais competentes.

3.   Observações na generalidade

3.1

O Comité aprova e apoia o projecto de directiva que cria uma infra-estrutura de dados geográficos comunitários e considera pertinente a escolha do artigo 175.o, n.o 1, do TCE como fundamento jurídico.

3.2

Actuando em sinergia com outras fontes de informação, INSPIRE servirá de apoio às decisões sobre as políticas do ambiente e da saúde, e em muitos outros domínios.

3.3

O Comité considera que a relação custos-benefícios é favorável ao projecto, o que permitirá evitar duplicações, apurar as políticas comunitárias e melhorar a informação ao público.

3.4

Para o Comité, a infra-estrutura comunitária e as informações e serviços aos quais ela dá acesso devem ser do domínio público, pois trata-se essencialmente de dados científicos e de bases de conhecimentos cuja utilização é de interesse geral (prevenção dos riscos naturais ou industriais, saúde, etc.). Deve ser evitado o obstáculo que poderiam representar os direitos demasiado restritivos de utilização das séries e dos serviços de dados.

3.5

Não obstante, é de considerar a possibilidade de estabelecer parcerias entre o sector público e o privado, bem como a utilização dos dados pelos organismos ou entidades privadas para criar serviços de valor acrescentado ou bases de dados geográficos especializadas para fins comerciais.

3.6

A interoperabilidade das sérias e dos serviços é absolutamente essencial para o êxito da infra-estrutura INSPIRE, e o Comité apoia a proposta no sentido de determinar as regras de aplicação em colaboração com os fornecedores e os utilizadores, bem como com os organismos de normalização. É certo que há uma necessidade urgente de harmonização, mas trata-se de um domínio complexo. No entanto, o Comité aprova os prazos previstos para a aplicação e apresentação de relatórios.

3.7

O Comité considera que os protocolos e os formatos dos ficheiros utilizados ao nível nacional e comunitário devem ser abertos, acessíveis a todos e isentos de direitos, e que os dados devem ser compatíveis com o software normal de acesso à Internet, para evitar discriminações no acesso e utilização dos dados em função deste software ou do material utilizado.

3.8

Embora aprove a lista de excepções proposta pela Comissão, o Comité recorda por último a sua preocupação constante com a protecção dos dados pessoais e a vida privada. Quanto à natureza ou precisão dos dados em consulta livre, esta protecção deve aliar-se à necessidade de proteger dos interesses nacionais essenciais e dos imperativos de segurança pública.

4.   Observações na especialidade

4.1

No quadro dos relatórios periódicos previstos no projecto de directiva, o Comité gostaria de fazer parte do rol dos destinatários destes relatórios.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/35


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Gestão dos riscos de inundação — Protecção contra as cheias e inundações, sua prevenção e mitigação»

COM(2004) 472 final

(2005/C 221/08)

Em 12 de Julho de 2004, a Comissão Europeia decidiu, ao abrigo do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a comunicação supramencionada.

A Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, incumbida da preparação dos trabalhos correspondentes, emitiu parecer em 13 de Janeiro de 2005 (relatora: María Candelas SÁNCHEZ MIGUEL).

Na 414.a reunião plenária, de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu aprovou o presente parecer por 132 votos a favor, sem votos contra e 2 abstenções.

1.   Introdução

1.1

Ao adoptar a directiva-quadro da política da água (1), a União Europeia restruturou profundamente a sua política de protecção da água. Tal ficou a dever-se não só à coordenação das diferentes situações em que se encontram as águas continentais e marítimas, mas também ao estabelecimento de um método eficaz de avaliação da sua qualidade e de um sistema organizativo centralizado que facilita a intervenção uniforme em cada bacia hidrográfica, independentemente da coexistência de competências para cada trecho da mesma. Ademais, a Comissão completou o conteúdo da directiva mediante disposições legislativas (2) e outras (3), de forma que a política de protecção da água da UE protegesse rios e mares.

1.2

Não obstante, incompreensivelmente, a directiva omitiu alguns aspectos de suma importância para a qualidade das bacias hidrográficas, nomeadamente as inundações. As inundações são fenómenos naturais, mas os seus efeitos são, em parte, seriamente agravados pela actividade humana. Muitos dos efeitos catastróficos que produzem poderiam ser atenuados, mediante uma política correcta de uso e protecção do leito dos cursos de água e das margens adjacentes e, sobretudo, exigindo que a construção de infra-estruturas hidráulicas atendesse de facto, e não apenas formalmente, ao impacto ambiental, por forma a não alterar as dinâmicas naturais nem desvirtuar a finalidade perseguida — o bom aproveitamento dos recursos hídricos.

1.3

Os riscos de inundação continuarão a estar presentes na União Europeia fundamentalmente por dois factores: as alterações climáticas, com um possível aumento da frequência das chuvas torrenciais e a potencial subida do nível do mar, consequência do aquecimento da atmosfera, e o impacto da actividade humana, como a construção em grande escala em áreas de alto risco de inundação e de infra-estruturas hidráulicas de contenção e derivação do curso dos rios e a construção de portos sem medidas de avaliação e correcção do impacto ambiental. Importaria ainda incluir entre os factores humanos a desertificação do continente europeu, causada por abate de florestas, incêndios e outras actividades que prejudicam a natureza. Ao fim e ao cabo, o aumento dos riscos de inundação é fruto do desenvolvimento insustentável. A adopção de modelos sustentáveis de desenvolvimento económico, social e ambiental pode, pois, mitigar e reduzir estes riscos.

1.3.1

A inundação de terrenos onde estão instalações industriais, actividades agrícolas e pecuárias intensivas, mas também de zonas urbanizadas, implica a dispersão de substâncias e produtos, cujo uso, em condições normais, não representa risco para a qualidade da água, mas que, na sequência de um episódio deste tipo, se convertem em perigosos poluentes, com efeitos potenciais sobre a saúde pública e os ecossistemas atingidos.

1.4

O CESE lembra que, entre 1998 e 2002, mais de 100 cheias provocaram na Europa grandes prejuízos, nelas se incluindo as cheias catastróficas dos rios Elba e Danúbio em 2002. Desde 1998, as cheias causaram cerca de 700 vítimas, o desalojamento de cerca de meio milhão de pessoas e prejuízos económicos cobertos por seguros que ascenderam, pelo menos, a 25 mil milhões de euros (4).

1.5

A Comissão, consciente desta situação, apresentou ao Conselho «Ambiente» de Julho de 2004 uma proposta de acção para protecção contra as inundações à escala europeia, tendente à gestão de uma acção concertada em matéria dos riscos de inundação para melhorar a protecção contra estes fenómenos. Os Estados-Membros deverão cooperar na elaboração de mapas de risco e na aplicação de planos de gestão dos riscos de inundação nas bacias hidrográficas e nas zonas costeiras, cabendo à Comissão facilitar a coordenação da informação entre todos os Estados, bem como a promoção das boas práticas.

1.6

Por último, convém acrescentar que, embora se trate de uma intervenção no domínio da política da água, importa sublinhar que o problema afecta outras políticas europeias, tais como agricultura, ambiente, protecção civil, transportes, etc. Além disso, um problema jurídico de grande envergadura relacionado com a gestão das zonas inundáveis está subjacente a estas políticas: a delimitação e a definição do domínio público aplicável à protecção das margens adjacentes a rios e mares, de forma que não se exponham a alterações substanciais por motivos políticos que afectam outras competências em matéria de gestão da água e dos riscos de inundação. Assim, a demarcação das zonas protegidas facilitaria a introdução de medidas de prevenção das inundações.

2.   Síntese da proposta

2.1

A comunicação subdivide-se em três capítulos:

gestão dos riscos de inundação,

acções em curso e iniciativas,

programa de acção concertada da UE.

2.2

A gestão dos riscos de inundação tem um objectivo — reduzir a probabilidade e o impacto das inundações. Para tanto, propõe-se incorporar nos programas os seguintes elementos:

prevenção,

protecção,

preparação,

resposta de emergência,

recuperação e experiência adquirida.

2.3

Quanto às acções em curso e iniciativas contra os efeitos das inundações são propostos três níveis de intervenção.

2.3.1

A nível europeu, as acções centram-se na utilização das medidas e políticas vigentes para prevenção e mitigação das inundações. Na política de investigação, trata-se de utilizar os projectos de investigação, como FLOODsite, que visa contribuir para melhorar as metodologias de gestão e análise integradas dos riscos de inundação. Os fundos estruturais, especialmente o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, podem contribuir para melhorar a investigação e o desenvolvimento tecnológico das infra-estruturas (5). Assim, o projecto IRMA («INTERREG Rhine-Meuse Activities») constitui um exemplo bem sucedido de cooperação transfronteiriça de combate às inundações.

2.3.1.1

Também a nível europeu, propõe-se recorrer à PAC estabelecendo zonas de protecção contra as inundações através da silvicultura e outras actividades agrícolas como sistemas de protecção do solo. Pretende-se aplicar a política ambiental no mesmo sentido, ao abrigo da directiva em causa, mediante a incorporação da gestão dos riscos de inundação nos planos de gestão integrada das bacias hidrográficas. Além disso, mantém-se o Fundo de Solidariedade da União Europeia, criado em 2002 na sequência das graves inundações da Europa Central, para operações de emergência.

2.3.2

Quanto à acção dos Estados-Membros, cabe frisar as actividades realizadas contra os efeitos das inundações mediante directrizes oficiais e textos jurídicos, especialmente nos Estados mais afectados. Trata-se de planos e estratégias de protecção e, inclusive, foram elaborados mapas de risco de inundação nas regiões onde estas ocorrem com mais frequência.

2.3.3

Em terceiro lugar, foram estabelecidas medidas de cooperação internacional nos rios transfronteiriços, especialmente na Europa Central, através da criação de organismos encarregados da coordenação da gestão de bacias hidrográficas.

2.4

O programa de acção concertada da UE comporta elementos essenciais para estabelecer medidas de prevenção e mitigação das inundações. Entre estas cabe destacar a melhoria na coordenação entre entidades competentes, através do plano de gestão das bacias hidrográficas e zonas costeiras, bem como a elaboração de mapas de risco de inundações como instrumento de planeamento, tudo isso recorrendo ao intercâmbio de boas práticas.

2.4.1

Para levar este programa a bom porto é primordial que os Estados-Membros, a Comissão e as outras partes interessadas cooperem e desempenhem cabalmente as suas funções e obrigações no campo da prevenção dos riscos de inundação, nos termos estabelecidos.

2.4.2

Os custos desta acção concertada são difíceis de quantificar. Em todo o caso, os benefícios da redução dos riscos de inundação para os cidadãos europeus, os seus bens, e as pessoas e territórios afectados superam qualitativamente os custos.

2.5

A comunicação inclui um anexo de suma importância para a elaboração e a aplicação dos planos de gestão dos riscos de inundação e dos mapas de risco, de forma a permitir um certo grau de harmonização com base nos objectivos fixados.

3.   Observações na generalidade

3.1

O CESE considera positivo o conteúdo da comunicação apresentada pela Comissão com o fim de melhorar e harmonizar os sistemas de prevenção estabelecidos em muitos Estados-Membros para mitigar os efeitos das inundações. Não obstante, entende que haveria que realizar, antes do mais, um diagnóstico mais profundo do problema, para poder adoptar medidas adequadas, especialmente as destinadas a tornar as acções de prevenção mais eficazes, o que evitaria muitos dos danos causados pelas inundações e, seguidamente, definir conceitos básicos, não incluídos na proposta, para poder chegar a consenso quanto às medidas propostas nos planos de gestão e mapas de risco da maneira mais harmonizada possível.

3.2

As inundações são fenómenos naturais associados ao funcionamento normal dos sistemas fluviais e costeiros e operam numa escala de tempo geológico muito superior à da gestão económica, urbanística, etc. Assim, o intervalo de «recorrência» significa que:

no momento das cheias, cada 100 ou 500 anos, o rio inundará uma determinada área;

essas cheias produzem-se fatalmente;

podem ocorrer a todo o momento.

Os conceitos aplicados no planeamento hidrológico incluem:

leito ou álveo natural de uma corrente contínua ou descontínua é o terreno coberto pela água nas máximas enchentes normais;

zonas inundáveis são as delimitadas pelos níveis teóricos que alcançariam as águas nas cheias, cujo intervalo estatístico de recorrência pode ser de 100 ou 500 anos. Tal não afecta a titularidade dos terrenos (público ou privado) e a entidade competente pode impor limitações ao uso para garantir a segurança de pessoas e bens;

as características habituais dos leitos de cheia incluem, em geral, zonas húmidas, florestas de inundação, planícies de inundação, cones aluviais nas zonas de montanha, pântanos, albufeiras e numerosos elementos (muitos deles associados a ecossistemas de grande valor ecológico) que assinalam os limites de enchente que alcançam estes fenómenos, que, como já foi dito, estão associados ao regime fluvial e à dinâmica costeira.

3.3

A gravidade de uma inundação depende da ocupação e do uso pelo homem dos terrenos inundáveis para actividades que afectam o funcionamento normal destes sistemas hídricos, alterando substancialmente as condições do meio fluvial e costeiro. Incrementa-se assim o risco de um funcionamento anormal e extremadamente prejudicial para pessoas e bens. O CESE entende que deveriam ser tidos como factores que aumentam a gravidade e a importância das inundações:

um incorrecto planeamento, que persiste por vezes há anos, do uso do solo ao longo da História, fruto do facto de se ignorar os conhecimentos científicos e técnicos (hoje inaceitável),

uma imprópria gestão dos riscos de inundação (correcção de leitos, canalização de cheias, construção de represas e barragens, separação dos espaços de retenção através da construção de diques nas zonas ribeirinhas), medidas que provaram frequentemente serem insuficientes e, numa visão global, até contraproducentes, sobretudo nos troços finais.

3.4

A tendência para um incremento do risco de inundações como consequência de factores naturais, em especial das alterações climáticas, requer importante esforço de investigação para estudar como estas alterações podem influenciar a dinâmica fluvial e costeira e, dessa sorte, as zonas inundáveis e os intervalos de recorrência, entre outras variáveis.

3.5

A tendência para incremento do risco de inundações como consequência de factores humanos (uso dos terrenos e número de pessoas neles instaladas) pode e deve inverter-se mediante a inclusão de políticas activas de planeamento orientadas para garantir um uso sustentável das zonas inundáveis e a mitigação dos riscos.

4.   Observações na especialidade

4.1

O CESE reconhece que a gestão dos riscos de inundação tem por objectivo reduzir a probabilidade e o impacto da sua origem, mediante, geralmente, um procedimento que integre os objectivos de prevenção, protecção, informação, etc., como a Comissão assinala. Não obstante, é conveniente estabelecer uma classificação das intervenções e das medidas a adoptar e dos critérios para escolha correcta em cada caso. A título de orientação, podem aplicar-se as seguintes medidas preventivas:

que evitam naturalmente as cheias e inundações, por exemplo, melhoria ou restabelecimento da infiltração natural através da redução da densidade dos solos ou da reflorestação de declives montanhosos; regeneração de (antigos) espaços naturais de retenção, redução da velocidade da corrente e da velocidade das águas, evitando-se a regularização das margens de cursos de água e melhorando a desobstrução dos canais de drenagem das águas pluviais em zonas urbanas;

que atenuam a susceptibilidade da zona inundável aos danos potenciais (sistemas de previsão e alerta, gestão e restrição de uso nas zonas inundáveis, etc.);

que incidem sobre as cheias (medidas hidrológicas ou hidráulicas). Podem ser estruturais (barragens para laminação de caudais, canais de derivação, diques, etc.) ou não estruturais (restrições de uso urbanístico, medidas cautelares destinadas à garantia de bens, etc.).

4.2

O CESE sugere à Comissão que na elaboração dos planos de gestão se incluam os seguintes princípios e medidas não estruturais:

a adequação ao funcionamento natural dos sistemas hídricos fluviais e costeiros fomentando a recuperação dos espaços e elementos naturais de auto-regulação da bacia de retenção (reflorestação das zonas de montanha afectadas, protecção das zonas húmidas e ecossistemas associados, linhas de controlo da erosão e sedimentação dos leitos, programas de substituição de usos e recuperação dos terrenos de alto risco, etc.);

o princípio de alcançar um desenvolvimento sustentável das zonas inundáveis, mediante:

i.

a estimativa do potencial económico utilizável do uso da terra nestas áreas compatível com o regime natural das inundações;

ii.

a preparação da transição para esses modelos nos diferentes sectores do planeamento, em particular no urbanístico.

É nesta óptica que se deve entender o princípio da «abordagem estratégica de longo prazo». Não se trata apenas de atender à evolução prevista, como a comunicação da Comissão indica, mas fundamentalmente de a corrigir, quando se considere que persiste o risco actual.

4.3

Importa definir orientações e critérios adequados para seleccionar as medidas destinadas a melhorar a prevenção das inundações:

A melhoria da prevenção das inundações não pode resultar num agravamento da situação hidráulica em outros lugares (por exemplo, aceleração do escoamento da água, aumento dos níveis de água ou aceleração das inundações nos troços finais);

Na medida do possível, e no sentido de um desenvolvimento sustentável, devem ser privilegiadas medidas naturais que visem uma melhor retenção da água nas superfícies («extensão e não aumento do nível da água»), em vez da construção de instalações técnicas de protecção;

Sempre que possível, deve ser dada prioridade a medidas que permitam conciliar efeitos sinergéticos positivos com outros objectivos do desenvolvimento sustentável (por exemplo, os objectivos da Directiva-Quadro da Água respeitantes à qualidade dos cursos de água e das águas subterrâneas, ou os objectivos das directivas europeias de protecção da natureza).

4.4

A experiência na gestão dos riscos de inundação em diversas partes do mundo, sobretudo a partir dos anos setenta, revelou que as principais dificuldades na aplicação das medidas preventivas não são técnicas e não se resolvem apenas com mapas de risco ou de perigo. Nos Estados Unidos da América, por exemplo, o Army Corps of Engineers tem cartografados mais de 20 000 mapas de risco mas são poucas as entidades que a eles recorrem e, quando o fazem, optam por intervenções de tipo estrutural (canais de derivação, represas e diques, etc.) que, amiúde, não permitem controlar adequadamente as inundações e são responsáveis por muitos danos evitáveis, porque geram na administração e na população uma falsa sensação de segurança.

4.5

Convém destacar que na UE os fundos estruturais (FEDER e Fundo de Coesão) financiam precisamente estas intervenções, que prevêem fundamentalmente a construção de infra-estruturas de contenção ou derivação, cuja utilidade é limitada. As medidas preventivas, estruturais ou não, recebem em geral menos recursos. Por isso, o CESE considera oportuno avaliar a necessidade de criar uma linha de financiamento específica para este programa de acção ou, na sua falta, elaborar orientações para inscrever as intervenções em outros programas financiados pela Comissão.

4.6

Em todo o caso, as medidas estruturais não são suficientes para prevenir as inundações ou proteger as zonas inundáveis. Só fazem sentido como parte de uma abordagem mais ampla que tenha em conta o ordenamento do território, o planeamento do transporte (rodoviário, ferroviário, etc.), a manutenção dos canais de descarga e evacuação e a protecção das zonas e dos ecossistemas que regulam o escoamento natural das águas. Neste sentido, seria conveniente desenvolver mais concretamente no futuro as directrizes que figuram no anexo da comunicação, introduzindo, entre outros, princípios metodológicos ou boas práticas para a elaboração destes planos.

4.7

A incorporação dos planos de gestão dos riscos de inundação nos planos de gestão da directiva-quadro da política da água é fundamental para garantir o planeamento necessário à intervenção em toda a extensão da bacia hidrográfica, equilibrando e coordenando as medidas e as acções das entidades competentes nos vários níveis (local, estatal, transnacional, etc.). Não obstante, importa estabelecer critérios e fórmulas para uma adequada integração destes dois quadros de planeamento, compatíveis mas diferentes, através de uma directiva que a facilite. Estes elementos seriam desenvolvidos na proposta de alargamento das directrizes anexas.

4.8

A incorporação da gestão da inundação no âmbito da directiva-quadro da política da água requer:

uma definição de «inundação» como fenómeno associado ao regime fluvial normal e à dinâmica costeira, que pode, excepcional e periodicamente, afectar a qualidade da água e dos ecossistemas;

uma definição de «zona inundável» relacionada intimamente com o âmbito territorial de intervenção da directiva-quadro da política da água (uso do solo, contaminação potencial, ecossistemas associados à qualidade da água, etc.);

uma definição do risco de inundação relacionada com os riscos e danos às massas de água abrangidas pela directiva-quadro da política da água;

uma gestão específica dos riscos que afectam a gestão da água tal como definida na directiva-quadro da política da água (uso da água na bacia hidrográfica, amortização dos custos, planos de acção, estabelecimento de zonas protegidas).

4.9

Os elementos mais significativos da gestão dos riscos de inundação relacionados com os planos previstos pela directiva-quadro da política da água são:

1.a

Definição e gestão de risco:

riscos hidrológicos, qualidade da água e ecossistemas,

riscos geológicos associados, deslizamento de terras, avalanches,

gestão e restauração do domínio público hidráulico e marítimo,

critérios ecológicos para a gestão de inundações,

critérios urbanísticos.

2.o

Alertas e emergências:

zonagem territorial,

sistemas de informação hidrológica e sistema de prevenção de emergências,

protecção civil,

quadro normativo de regulação em cada Estado-Membro dos aspectos anteriores,

civismo,

coordenação entre as entidades competentes.

3.o

Outros aspectos:

investigação e coordenação multidisciplinar,

cobertura por seguro,

segurança na construção de infra-estruturas.

5.   Conclusões

5.1

O CESE entende que qualquer intervenção em matéria de prevenção, protecção e mitigação das inundações deve incorporar os métodos e instrumentos criados pela directiva-quadro da política da água, em especial o plano de gestão de bacia hidrográfica, que permite regular todas as actividades relacionadas com a gestão das águas continentais e das zonas costeiras a elas adstritas. Para tanto, considera necessário incorporar numa directiva comunitária o conteúdo da presente comunicação e as observações aduzidas, com vista a facilitar a adequação dos planos de gestão de risco às características de cada plano de gestão de bacia, adaptando-se assim às condições particulares dos rios e costas.

5.2

Para concretizar tal incorporação convém:

definir de forma precisa os conceitos básicos que fundamentam a acção, especialmente os mencionados no ponto 4.7 do presente parecer;

fazer um diagnóstico profundo da situação actual em cada bacia e zona costeira europeia, especialmente nas zonas de alto risco, na sequência das alterações climáticas e das actividades humanas;

insistir nas medidas preventivas contra os efeitos prejudiciais das inundações, desenvolvendo e incluindo todas as medidas dirigidas à população, através da educação e informação necessárias.

5.3

Os planos de gestão de risco e mapas de risco, tal como constam dos anexos da proposta de comunicação, devem ser ampliados, com o fim de estabelecer e clarificar uma classificação de intervenções e medidas, definindo as mais prioritárias e adequadas ao financiamento obtido, assim como os critérios a aplicar a fim de reduzir os custos e ampliar os benefícios para as pessoas e os bens. O objectivo mais importante é conciliar o funcionamento natural dos sistemas hidrológicos e costeiros com a actividade humana, conseguindo um desenvolvimento sustentável e integrado nas zonas inundáveis.

5.4

Por último, o CESE considera que os elementos mais significativos da gestão dos riscos de inundação, relacionados com os planos previstos na directiva-quadro da política da água, correspondem à definição de risco, alerta e emergência quando esses fenómenos ocorrem. Além disso, importa não perder de vista outras intervenções comunitárias em matéria de investigação e cooperação multidisciplinar, destinadas especificamente a mitigar os danos causados pelas inundações, assim como a cobertura por seguro para minimizar as perdas económicas das pessoas afectadas e, sobretudo, a necessidade de vigilância e controlo da segurança das construções de infra-estruturas que afectam o sistema hidrológico e costeiro.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Directiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2000, que estabelece um quadro de acção comunitária no domínio da política da água — JO L 327 de 22.12.2000, p. 72.

(2)  Parecer do CESE sobre a proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho sobre a protecção das águas subterrâneas contra a poluição (COM(2003) 550 final) — JO C 112 de 30 de Abril de 2004, p. 40-43.

(3)  Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece a lista das substâncias prioritárias no domínio da água (COM(2000) 47 final) — JO C 177E de 27/06/2000, p. 74; comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social – A tarifação como modo de reforçar a utilização sustentável dos recursos hídricos (COM(2000) 477 final); comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Rumo a uma estratégia de protecção e de conservação do meio marinho (COM(2002) 539 final).

(4)  Fonte: COM(2004) 472 final.

(5)  Sándor TÓTH, representante do Ministério do Ambiente e da Gestão Hídrica da Hungria, apresentou, na reunião da Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, um exemplo interessante sobre o programa de gestão dos riscos de inundação e desenvolvimento regional a longo prazo no vale de Tisza.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/40


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho relativo ao financiamento da política agrícola comum»

COM(2004) 489 final — 2004/0164 (CNS)

(2005/C 221/09)

Em 29 de Outubro de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do segundo parágrafo do artigo 37.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente emitiu parecer em 13 de Janeiro de 2005 sobre esta matéria, tendo sido relator Adalbert KIENLE.

Na sua 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o CESE aprovou por 133 votos a favor e 6 abstenções o presente parecer.

1.   Introdução

Em 1 de Janeiro de 2005, começou a aplicar-se uma reforma agrária de fundo, cujo cerne é o regime de pagamento único dissociado e uma maior focalização no desenvolvimento rural. Os recursos financeiros disponíveis para a PAC constam da decisão dos chefes de Estado e de governo de Outubro de 2002, na qual é estabelecido um limite máximo das despesas agrícolas para o primeiro pilar, que não deve ultrapassar até 2013 o nível efectivo de 2006 para a UE-25. As perspectivas financeiras da UE para o período de 2007 a 2013, que regem o financiamento global da UE, confirmam esta decisão no domínio agrário. As despesas da política agrícola comum, incluindo o desenvolvimento rural (para a UE-27) devem ascender a cerca de 57,18 mil milhões de euros em 2007 e subir até ao ano de 2013 em 1,1 por cento (a preços de 2004).

Ao contrário do que o título possa induzir, o objecto da presente proposta de regulamento da Comissão sobre o financiamento da política agrícola comum não é a origem nem a utilização dos recursos da PAC, mas sim a execução do orçamento de apoio à agricultura e ao desenvolvimento rural.

2.   Conteúdo da proposta da Comissão

Com a presente proposta, a Comissão Europeia pretende criar os fundamentos orçamentais da política agrícola comum, incluindo a política de desenvolvimento rural da UE, para o período de 2007 a 2013. O financiamento da política agrícola comum deverá ser regulamentado com um único acto jurídico. A proposta deve ser considerada em conjunto com o projecto de regulamento sobre o apoio ao desenvolvimento rural. A Comissão pretende, deste modo, alcançar uma maior simplificação e eficácia através de um rigoroso sistema de fiscalização, avaliação e apresentação de relatórios.

2.1   Organização dos fundos de financiamento

2.1.1   Até ao presente: o Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA)

O Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA) existente até agora para financiar a política agrícola comum está dividido em duas secções: a secção Garantia e a secção Orientação. A primeira aplica-se à organização dos mercados agrícolas (pagamentos directos, restituições à exportação, intervenções), a determinadas despesas no domínio veterinário ou de preservação fitossanitária e a medidas de informação e avaliação da política agrícola comum. A secção Garantia financia ainda determinadas medidas abrangentes de desenvolvimento rural (medidas agro-ambientais, compensações para as regiões desfavorecidas, florestação, reforma antecipada), bem como o investimento em zonas que não são de Objectivo n.o 1.

A secção Orientação financia as restantes despesas de investimento no desenvolvimento rural que não recaem no âmbito de aplicação da secção Garantia do FEOGA, ou seja medidas a aplicar em zonas de Objectivo n.o 1 e a iniciativa Leader +.

2.1.2   Princípios dos futuros fundos para a política agrícola comum

Os novos fundos deverão ser estruturados de forma semelhante ao FEOGA. A gestão dos fundos deverá ser feita por um comité, composto por representantes dos Estados-Membros e da Comissão (artigo 41.o, Comité dos Fundos). Todas as acções financiadas ao abrigo dos novos fundos estarão, doravante, sujeitas a apuramento de contas. Até ao presente, isto acontecia apenas para as medidas da secção Garantia. A verificação das medidas financiadas ao abrigo da secção Orientação era feita no âmbito dos programas de apoio plurianuais (nos termos do Regulamento n.o 1260/1999 sobre os Fundos Estruturais).

2.1.3   O novo Fundo Europeu Agrícola de Garantia (FEAGA)

O FEAGA é similar à actual secção Garantia do fundo agrícola comum (FEOGA) e deverá continuar a financiar, à semelhança desta, medidas de intervenção, restituições às exportações, pagamentos directos e acções de informação e de promoção. As actuais medidas de apoio ao desenvolvimento rural deixam de ser efectuadas ao abrigo do FEAGA passando, de futuro, para o domínio do FEADER.

2.1.4   O novo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER)

O novo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER) passa a financiar todas as medidas de desenvolvimento rural, o que simplificará o financiamento do segundo pilar. O Fundo irá agrupar os recursos da secção Orientação do FEOGA e os recursos para o desenvolvimento rural da secção Garantia. A modulação dos recursos do primeiro pilar, que resulta das percentagens previstas no Regulamento (CE) n.o 1782/2003, artigo 10.o, deverá, de acordo com a proposta da Comissão Europeia, fazer com que, em 2013, as dotações orçamentais para o desenvolvimento rural ascendam, no total, a 14,2 mil milhões de euros (para a UE-27 a preços de 2004).

2.2   Gestão dos pagamentos e controlo

2.2.1   Organismos pagadores

A proposta da Comissão determina que a gestão dos pagamentos será da competência de organismos pagadores a criar pelos Estados-Membros. Os organismos pagadores são os serviços ou organismos dos Estados-Membros que têm por missão: verificar a elegibilidade dos pedidos, contabilizar os pagamentos efectuados e apresentar os documentos comprovativos à Comissão.

2.2.2   Modo de pagamento e autorizações orçamentais

Os pagamentos serão respectivamente mensais e trimestrais para o FEAGA e o FEADER. Segundo o projecto de regulamento, a autorização orçamental no âmbito do FEADER é feita a nível de cada programa e para vários anos, dividida em fracções anuais, sendo de aplicação a regra «n + 2», seguida de uma anulação automática decorrido este lapso de tempo. Esta regra significa que os montantes financiados no âmbito de um programa devem ser despendidos antes do fim do segundo ano que segue ao ano de autorização («n» = ano de autorização).

2.2.3   Comunicação das informações à Comissão

Os Estados-Membros devem transmitir à Comissão as declarações de despesas e, no termo do exercício orçamental, as contas anuais, bem como um certificado de integralidade, exactidão e veracidade das contas apresentadas. A obrigatoriedade de apresentar uma declaração de fiabilidade do responsável do organismo pagador constitui uma novidade. Segundo a proposta da Comissão, as contas anuais dos organismos pagadores relativas às despesas do FEADER devem ser elaboradas separadamente para cada programa.

2.2.4   Apuramento das contas e da conformidade e relatório financeiro

Segundo a proposta de regulamento, a Comissão apura as contas dos organismos pagadores até 30 de Abril. A decisão de apuramento das contas diz respeito à integralidade, exactidão e veracidade das contas anuais comunicadas. À semelhança do actual procedimento, a Comissão verifica se há montantes a excluir do financiamento comunitário e que montantes são estes (apuramento da conformidade). A diferença em relação ao actual procedimento é a extensão de 24 para 36 meses do prazo para correcção financeira. A Comissão deve apresentar anualmente ao Parlamento Europeu e ao Conselho, até 1 Setembro (anteriormente 1 de Julho), um relatório financeiro sobre a administração dos Fundos.

3.   Observações na generalidade

3.1   As ajudas concedidas devem ser aceitáveis e justificáveis perante os cidadãos

O CESE compreende que as dotações financeiras da política agrícola comum constituam uma parte considerável (ainda que tenha vindo a diminuir um pouco ao longo dos tempos) do orçamento geral da UE. Por esta razão considera indispensável que o apoio à agricultura e ao desenvolvimento rural seja compreensível e aceitável para a sociedade. Para tal, é necessário cumprir, na opinião do CESE, dois pressupostos.

Os pagamentos devem ser feitos, na medida do possível, por inteiro aos beneficiários.

Há que prevenir os abusos através de controlos eficazes.

3.2   Abordagens inovadoras para uma gestão dos pagamentos mais simples

O CESE considera que a presente proposta de regulamento contém diferentes abordagens inovadoras para uma melhor gestão e simplificação orçamental. A criação de dois fundos de teor claramente diferente é, na opinião do CESE, uma abordagem correcta e judiciosa. O regulamento consegue atingir claros progressos em matéria de simplificação, regulamentando o financiamento da política agrícola comum com uma única base jurídica. Em vez de continuarem a existir dois sistemas de controlo, introduz-se um único, uniformizando-se os diferentes sistemas de gestão financeira para as medidas de desenvolvimento rural. Contudo, mantém-se em vigor um segundo sistema de gestão financeira para as medidas no âmbito do FEAGA. Paralelamente, o projecto de regulamento do apoio ao desenvolvimento rural condensa os cinco regimes de programação num único e reduz o número dos programas. O CESE toma nota destas simplificações que serão particularmente sentidas pela administração em Bruxelas.

3.3   A simplificação deve ser sentida pelos beneficiários

Contudo, na opinião do CESE, uma simplificação deve ser sentida impreterivelmente em todos os níveis, devendo não só a UE, mas também os Estados-Membros e os beneficiários tirar proveito dela. É particularmente importante para o CESE que uma simplificação dos procedimentos burocráticos seja sentida no final da cadeia administrativa ou seja, nos agricultores. A actual situação dos agricultores europeus caracteriza-se por uma burocracia excessiva aliada a frequentes hesitações ao nível do pagamento das ajudas. Um caso extremo é o exemplo do SAPARD (instrumento de ajudas de pré-adesão no domínio da agricultura e do desenvolvimento rural nos países candidatos) que foi mesmo objecto de críticas recentes pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias. O risco de não se conseguirem recuperar os montantes indevidamente pagos aos agricultores é, porém, muito reduzido. Por esta razão, o CESE considera extremamente urgente que o apoio aos beneficiários passe a ser mais rápido e o menos complicado possível.

3.4   A carga administrativa pode ser reduzida

O objectivo visado de se conseguir uma simplificação administrativa é conseguido para a Comissão, mas não de forma satisfatória para os Estados-Membros. Há partes do regulamento que têm, pelo contrário, o efeito oposto e aumentam a carga administrativa. O CESE lamenta que os organismos pagadores tenham de continuar a gerir dois sistemas de gestão financeira diferentes devido aos diversos modos de pagamento e autorizações orçamentais. É por esta razão que se deve procurar que estes dois sistemas sejam racionalizados para que o peso administrativo se mantenha num nível o mais reduzido possível. Assim, são necessárias outras adaptações, em especial no regulamento sobre o apoio ao desenvolvimento rural. A apresentação de documentos adicionais constitui uma carga administrativa suplementar para os Estados-Membros.

3.5   Maiores exigências para os Estados-Membros

A presente proposta da Comissão implica um aumento da responsabilidade financeira para os Estados-Membros, devido à prolongação do prazo de imputação, ao agravamento das regras referentes aos prazos e à recuperação dos fundos pela Comissão. O CESE saúda, em princípio, que, com a disposição regulamentar sobre a recuperação das ajudas, a responsabilidade pelo apoio financeiro atribuído passe a ser igualmente dos Estados-Membros, para além da UE. Para uma maior eficácia e transparência na atribuição dos recursos deve haver a possibilidade de recuperar os fundos pagos indevidamente, mesmo após ter decorrido muito tempo. Tendo conhecimento das críticas de muitos Estados-Membros devido a esta responsabilidade acrescida, o CESE vai velar atentamente por que estes Estados-Membros não percam o interesse nestes programas, o que prejudicaria os potenciais beneficiários. Com o prazo estrito de pagamento (restrição dos prazos), procura-se, igualmente, uma maior disciplina da parte dos Estados-Membros. O CESE felicita-se com a limitação dos prazos de pagamento, mas considera que um prazo assim tão curto é excessivo, pelo que convida a Comissão a reconsiderar os prazos previstos.

3.6   As «meta-ajudas» devem permanecer uma excepção

O CESE estima que a extensão da assistência técnica leva a uma redução dos recursos disponíveis para o verdadeiro objectivo dos fundos, isto é, o apoio à agricultura e ao desenvolvimento rural. Este género de «meta-ajuda», ou seja o apoio às instituições e estruturas que devem pôr em prática as ajudas propriamente ditas, não deve ser preponderante, devendo restringir-se, pelo contrário, às verdadeiras necessidades. Neste contexto, o CESE deplora as ajudas comunitárias à construção ou ao reforço das estruturas administrativas e de controlo de um Estado-Membro, já que estas são, indubitavelmente, da competência dos Estados-Membros. O CESE propõe que este género de extensão da assistência técnica se restrinja a poucos casos excepcionais e tenha uma duração limitada. O CESE insta a que a Comissão elabore, neste caso, um relatório para poder acompanhar de perto este tipo de apoio.

4.   Observações na especialidade

4.1   Denominação do Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER)

Na versão alemã do regulamento sobre o apoio ao desenvolvimento rural, o novo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER) é denominado Fundo Europeu de Desenvolvimento Rural (FEDR). O CESE solicita que se evitem estas diferentes designações e que se uniformize a denominação do Fundo nos textos regulamentares.

4.2   Carga administrativa

4.2.1   Extensão do procedimento de certificação (artigo 7.o)

A extensão do procedimento de certificação aos sistemas de acompanhamento e de controlo (artigo 7.o) leva a um ónus administrativo suplementar. Até à data, o organismo de certificação verificava a integralidade, exactidão e veracidade das contas anuais comunicadas à Comissão. A partir de agora, o organismo de certificação é responsável pela «certificação dos sistemas de gestão, acompanhamento e controlo estabelecidos pelos organismos pagadores aprovados, bem como das contas anuais destes últimos». O CESE solicita que se explicitem as razões para uma tal certificação. O objectivo deveria ser a concentração uniforme do trabalho dos organismos de certificação na confirmação das despesas efectuadas pelos organismos pagadores.

4.2.2   Organização das contas anuais (artigo 8.o)

Para que os pagamentos possam ser efectuados pelo novo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER) há que estabelecer previamente contas anuais. Contudo, o sistema de financiamento (autorizações orçamentais, pré-financiamento, pagamentos intermédios e pagamento do saldo) está globalmente organizado em função da duração dos programas. O CESE receia que os organismos pagadores tenham de prestar contas das suas despesas duas vezes: nas contas anuais e no balanço final de encerramento de um programa, o que acarretará um aumento do trabalho administrativo. As contas anuais finais devem ser aceites caso a caso.

Os organismos pagadores devem, ademais, comunicar contas anuais separadas para as despesas de cada programa do FEADER. Os organismos de certificação, que deveriam até à data apresentar relatórios no âmbito das contas anuais, deverão, em consequência, passar a fazê-lo também para diferentes relatórios anuais. O CESE lamenta que a Comissão não tenha conseguido chegar a uma maior simplificação, mas considera aceitável este ónus administrativo.

4.2.3   Documentos adicionais (artigo 8.o)

A apresentação das contas anuais deve ser acompanhada por uma declaração de fiabilidade do responsável do organismo pagador. O CESE não vê qualquer necessidade para tal, uma vez que já existe um sistema de controlo no âmbito da organização dos organismos pagadores e dos organismos de certificação. Na opinião do CESE, seria suficiente que o responsável do organismo pagador confirmasse a veracidade da informação.

4.3   Financiamento

4.3.1   Extensão do financiamento da assistência técnica (artigo 5.o)

O financiamento da assistência técnica será alargado à análise, gestão, acompanhamento e execução da política agrícola comum, bem como à aplicação de sistemas de controlo e à assistência técnica e administrativa. A estas acções vem-se juntar o financiamento das agências de execução instituídas nos termos do Regulamento (CE) n.o 58/2003 e das acções relativas à difusão, sensibilização, promoção da cooperação e intercâmbio de experiências a nível da Comunidade, realizadas no âmbito do desenvolvimento rural, incluindo a ligação em rede dos intervenientes. Isto será efectuado de forma centralizada. O CESE é extremamente crítico em relação ao facto de a Comunidade dar apoio à administração de um Estado-Membro.

Em contrapartida, faz sentido que o apoio à ligação em rede seja efectuado pela Comissão.

4.3.2   Recuperação dos montantes (artigos 32.o, 33.o e 35.o)

A participação dos Estados-Membros nas consequências financeiras decorrentes da ausência de recuperação é reforçada. Segundo a proposta, a Comissão pode imputar ao Estado-Membro os montantes a recuperar, caso este não tenha dado início a todos os procedimentos administrativos ou judiciais previstos na legislação nacional e comunitária com vista à recuperação (para os pagamentos pelo FEAGA: no ano seguinte ao do primeiro auto administrativo ou judicial). Isto não era possível até agora. Caso a recuperação não se tenha realizado num prazo de quatro anos após a data do primeiro auto administrativo ou judicial ou num prazo de seis anos, caso a recuperação seja objecto de uma acção perante as jurisdições nacionais, as consequências financeiras da ausência de recuperação são assumidas até 50 % pelo Estado-Membro em causa. Até à data, as consequências financeiras eram assumidas na totalidade pela Comunidade. O CESE saúda o facto de a Comissão deixar de assumir sozinha a responsabilidade pelos pagamentos, que passam a incumbir também aos Estados-Membros, o que poderá fazer com que estes organizem de forma mais cuidada as suas estruturas de apoio e os seus controlos. Contudo, uma maior responsabilidade financeira não deve levar a que os Estados-Membros percam interesse nos programas. Tendo em conta que a duração do processo pode ultrapassar os quatro ou seis anos previstos, o CESE propõe que se reconsiderem os períodos e as percentagens de participação dos Estados-Membros.

4.3.3   Limitação do pré-financiamento a 7 % (artigo 25.o)

Nos termos do artigo 25.o, o pré-financiamento, cujo pagamento é efectuado pela Comissão após aprovação do programa de desenvolvimento rural ao organismo pagador designado pelo Estado-Membro, está limitado a um máximo de 7 % da participação do FEADER. O CESE considera esta limitação inaceitável, pois já existem limitações deste género e não há qualquer risco de insolvência dos organismos pagadores.

4.4   Prazos (artigo 16.o)

O artigo 16.o fixa como limite definitivo o prazo de 15 de Outubro do exercício orçamental em causa para os pagamentos tardios dos Estados-Membros. Em certa medida, os atrasos nos pagamentos são inevitáveis (por exemplo, em caso de processos judiciais). As administrações carecem de um maior lapso de tempo devido sobretudo ao novo sistema de pagamento (dissociado). O CESE entende, pois, que a data de 15 de Outubro não é oportuna.

4.5   Prazo para recusa de financiamento (artigo 31.o)

Nos termos do artigo 31.o (apuramento da conformidade), a Comissão pode recusar o financiamento sob determinadas condições (não conformidade com as regras comunitárias, esforços para chegar a acordo com o Estado-Membro). Tal não é válido para as despesas efectuadas mais de trinta e seis meses antes de a Comissão comunicar por escrito ao Estado-Membro em causa o resultado da verificação. O prazo de prescrição é agora de vinte e quatro meses. Esta alteração aumenta as possibilidades de a Comissão evitar pagamentos não conformes ao direito comunitário. O CESE considera, no entanto, pertinente que o lapso de tempo previsto para a verificação da conformidade seja relativamente curto à semelhança do prazo vigente actualmente. Por outro lado, uma intervenção precoce da UE serve também a prevenção e pode disciplinar os Estados-Membros.

4.6   Redução dos pagamentos pela Comissão (artigo 17.o)

Com o artigo 17.o, a Comissão reserva-se a possibilidade de reduzir ou suspender os pagamentos mensais aos Estados-Membros. À possibilidade que a Comissão já possui, no âmbito do apuramento das contas anuais, de exigir o reembolso dos pagamentos ou de não os efectuar, junta-se agora a possibilidade de reduzir temporariamente as subvenções em caso de constatação de uma utilização abusiva dos fundos comunitários. Na verdade, um procedimento deste género já existe actualmente. O CESE considera que se deve apoiá-lo com a criação do quadro jurídico correspondente.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/44


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CEE) n.o 2759/75, o Regulamento (CEE) n.o 2771/75, o Regulamento (CEE) n.o 2777/75, o Regulamento (CE) n.o 1254/1999, o Regulamento (CE) n.o 1255/1999 e o Regulamento (CE) n.o 2529/2001 no que diz respeito às medidas excepcionais de apoio do mercado»

COM(2004) 712 final — 2004/0254 (CNS)

(2005/C 221/10)

Em 3 de Dezembro de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 37.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionda.

A Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 13 de Janeiro de 2005, sendo relator Leif E. NIELSEN.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 135 votos a favor com 6 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Antecedentes

1.1

A ocorrência de graves epizootias contagiosas, como a encefalopatia espongiforme bovina (EEB), a febre aftosa, a peste suína e a doença de Newcastle provocou repetidas crises nos mercados de produtos animais na União Europeia. A ocorrência destas epizootias conduziu ao abate de animais e a restrições ao seu comércio a fim de evitar a sua propagação. Regra geral, e até à data, as despesas relacionadas com a eliminação destas epizootias foram cobertas pelo Fundo Veterinário em 50 % das despesas suportadas pelos Estados-Membros.

1.2

Além disso, o mercado destes produtos sofreu as consequências das proibições de venda e das zonas de restrição. Tendo em conta a situação, as organizações de mercado para a carne suína, os ovos, as aves de capoeira, a carne bovina, o leite e os laticínios, além das carnes ovina e caprina, prevêem a possibilidade de medidas de apoio ao mercado. Uma condição importante da aplicação destas medidas excepcionais prende-se com o facto de não se poderem tomar estas medidas se os Estados-Membros não tomarem medidas veterinárias e sanitárias para a erradicação rápida das epizootias, e na medida e duração estritamente necessárias para o apoio do mercado.

1.3

As medidas excepcionais adoptadas pela Comissão no âmbito do processo de gestão foram, no início, totalmente cobertas pelo orçamento comunitário, designadamente no caso da peste suína nos finais da década de 1980 e no início da década de 1990. Foi em 1992, por ocasião de uma epidemia de peste suína, que se recorreu, pela primeira vez, ao co-financiamento nacional das despesas. Em virtude do aspecto delicado deste financiamento, a Comissão decidiu, em 1994, fixar em 70 % o financiamento comunitário e precisou o número máximo de animais. Posteriormente, a mesma percentagem foi aplicada às medidas no sector da carne bovina, no âmbito da luta contra a EEB e a febre aftosa. A partir de 2001, a participação dos Estados-Membros no co-financiamento eleva-se a 50 %, o que corresponde à exigência de paralelismo entre o co-financiamento das medidas veterinárias e o das medidas de apoio ao mercado formulada pelo Tribunal de Contas.

1.4

Em 2003, a pedido da Alemanha, o Tribunal recusou à Comissão o direito de fixar um co-financiamento nacional de 30 %; o acórdão do Tribunal referia-se a uma questão relacionada com a regulamentação relativa à compra de gado em relação com a EEB (1). Em conformidade com esta decisão, a Comissão não se vincula ao prosseguimento da prática actual e propõe, assim, no futuro, um co-financiamento nacional de 50 %, através de uma alteração das organizações de mercado para a carne suína, os ovos, as aves de capoeira, a carne bovina e os laticínios, bem como para as carnes ovina e caprina, quer se trate de medidas relacionadas com as trocas intercomunitárias ou de exportações para os países terceiros.

2.   Observações na generalidade

2.1

É de lamentar que, após 1992, a Comissão e os Estados-Membros não tenham respeitado o princípio geral em vigor para o financiamento comunitário a 100 % das medidas do «primeiro pilar» da política agrícola comum, entre as quais figuram as medidas adoptadas no âmbito das organizações comuns de mercado. É de estranhar que, com a adopção da actual proposta, o Conselho se afaste deste princípio, aliás por si mesmo estabelecido. Todavia, como estabelece o Tribunal de Justiça no processo referido, a Comissão não pode derrogar sem autorização explícita as decisões do Conselho, mesmo com o apoio dos Estados-Membros nos respectivos comités de gestão.

2.2

Conforme a amplitude e a duração das epizootias, as medidas podem conduzir a despesas consideráveis, que, no essencial, deverão ser financiadas pelos fundos públicos. A questão da repartição dos custos entre a União Europeia e os Estados-Membros diz respeito, em primeiro lugar, à solidariedade financeira entre os Estados-Membros. No caso do co-financiamento nacional, alguns Estados-Membros estarão mais dispostos — ou terão mais possibilidades — que outros a suportar estas despesas. Alguns Estados-Membros repercutirão, de modo directo ou indirecto, os custos nas empresas, o que, como se verificou na crise das vacas loucas, conduzirá a uma importante distorção do mercado.

2.3

A Comissão prevê que os Estados-Membros, mediante o co-financiamento, envidarem mais esforços para lutar contra as epizootias e evitar que surjam. Embora o CESE compreenda esta óptica, não pode excluir que, em certas situações, atrase ou dificulte a tomada de decisões, o que contrariaria a eficácia da luta.

2.4

Do mesmo modo, o CESE compreende os argumentos da Comissão, segundo os quais a proposta significaria o prosseguimento da prática em vigor desde 1992, e garantiria o paralelismo entre as medidas aplicadas no âmbito do Fundo Veterinário e as medidas adoptadas no âmbito das organizações de mercado.

2.5

Na opinião do CESE, não se deve esquecer que as despesas com as medidas excepcionais no âmbito das organizações de mercado, originalmente estabelecidas pelo Conselho, cabem no âmbito da responsabilidade comum e da solidariedade financeira. O CESE considera que qualquer derrogação a este princípio corre o risco de criar disparidades na luta contra as epizootias nos diferentes Estados-Membros; ora, estas epizootias, não obstante a eficácia dos controlos e das medidas de prevenção, podem surgir de modo acidental e imprevisível. As repercussões no mercado atingem igualmente os outros Estados-Membros. Por outro lado, o co-financiamento nacional neste domínio significa um risco de contágio em outros domínios, correndo-se o risco de uma renacionalização da política agrícola comum.

2.6

Se, apesar destes argumentos, a proposta da Comissão for apoiada, querer tratar a questão do contributo financeiro dos Estados-Membros no âmbito deste regulamento, conforme as disposições do Tratado relativas às ajudas estatais, constituiria um encargo no plano administrativo, sem justificação possível no plano técnico. Teria sido preferível aplicar, desde o início, a proposta da Comissão sobre a dispensa do procedimento de notificação.

3.   Conclusão

3.1

O CESE pronuncia-se a favor da manutenção do princípio de plena e completa solidariedade comunitária para as medidas excepcionais no âmbito das organizações de mercado; rejeita, assim, a proposta da Comissão no sentido de elevar para 50 % o co-financiamento pelos Estados-Membros.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Acórdão de 30 de Setembro de 2003, no caso C-239/01, colectânea das decisões 2003 I-10333.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/46


Parecer do Comité Económico e Social Europeu «Beijing dez anos depois: avaliação dos progressos na Europa e nos países em desenvolvimento em matéria de igualdade entre homens e mulheres»

(2005/C 221/11)

Em 16 de Dezembro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu decidiu elaborar, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, um parecer de iniciativa sobre o tema «Beijing dez anos depois: avaliação dos progressos na Europa e nos países em desenvolvimento em matéria de igualdade entre homens e mulheres».

A Secção Especializada de Relações Externas, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu o parecer em 12 de Janeiro de 2005, com base no projecto da relatora S. FLORIO.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 135 votos a favor, 1 voto contra e 6 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

A 49.a sessão da Comissão das Nações Unidas sobre o Estatuto da Mulher (CEM) que terá lugar de 28 de Fevereiro a 11 de Março de 2005 procederá à avaliação da execução da Plataforma de Acção e da Declaração de Beijing aprovadas durante a 4.a Conferência Mundial das Nações Unidas sobre a Mulher (Beijing, 1995) e dos documentos finais aprovados durante a 23.a Sessão Extraordinária da Assembleia Geral «Mulheres 2000: Igualdade entre os Sexos, Desenvolvimento e Paz no Século XXI» (Nova Iorque, 2000) onde se fez um primeiro ponto da situação dos progressos registados e dos obstáculos encontrados na via que conduz à igualdade de género.

1.2

Nessa ocasião a Assembleia Geral aprovou uma resolução contendo «Acções e iniciativas ulteriores para aplicar a Declaração de Beijing e a Plataforma de Acção» e uma declaração política que comprometia os Estados-Membros a reavaliarem, dez anos após a adopção da Plataforma, os progressos alcançados e a pensarem em novas actividades.

1.3

Conforme prevê o programa de trabalho plurianual da CEM, os trabalhos da 49.a sessão articular-se-ão em torno dos progressos alcançados nas doze áreas enunciadas na Plataforma de Acção e na identificação dos desafios actuais procurando gizar novas estratégias para a promoção e a emancipação das mulheres e das jovens. Com o fito de favorecer o diálogo, a assembleia estará aberta à participação mais ampla das delegações dos Estados-Membros, da sociedade civil e das organizações internacionais.

1.4

Tem sido fundamental o empenhamento das Nações Unidas no sentido de conferir ao problema da igualdade de direitos entre homens e mulheres uma valência internacional. Para ilustrá-lo, refira-se a convocação em 1975 da Primeira Conferência Mundial sobre a Mulher que inaugurou o Decénio da Mulher (Cidade do México). É com a Segunda Conferência («a meio do decénio» — Copenhaga, 1980) que os governos começam a assinar (57) a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW, 1979) que constitui um dos marcos fundamentais do difícil trajecto que conduz à igualdade de género. Com a Terceira Conferência (Nairobi, 1985) é aprovado o plano de acção «Futura estratégia para a promoção das mulheres» com o qual os governos e as organizações internacionais proclamam o objectivo da igualdade.

1.5

Outro passo essencial no processo de reconhecimento das especificidades femininas e do papel das mulheres foi a Resolução 1325 de 2000 do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre Mulheres, Paz e Segurança (em que se reconhece que é diferente o impacto da guerra nas mulheres e se reafirma a necessidade de reforçar o seu papel nos processo de decisão com respeito à prevenção e à resolução de conflitos). Mas, em termos mais gerais, há mais de dez anos que o tema da promoção das mulheres vem sendo considerado nas conclusões de todas as grandes conferências e dos encontros internacionais sob a égide das Nações Unidas (1).

1.6

Outro momento alto foi a Cimeira do Milénio das Nações Unidas realizada em Setembro de 2000 em que os Estados-Membros estabeleceram oito objectivos (Millennium Development Goals) claros e mensuráveis para reduzir significativamente, até 2015, a pobreza, a fome, as doenças e a degradação ambiental. A Declaração do Milénio surge igualmente do imperativo de criar uma lista de prioridades homogénea incluindo igualmente as estabelecidas no decénio anterior pelas várias conferências e cimeiras internacionais. Destes objectivos o terceiro tem por finalidade a promoção da igualdade de género e da emancipação das mulheres e encontra-se estreitamente ligado com a formação e a educação, enquanto o quinto se ocupa da saúde reprodutiva. A perspectiva de género é, de qualquer modo, transversal aos oito pontos.

2.   Observações na generalidade

2.1

Não obstante o sistema das Nações Unidas ter criado um quadro legislativo fundamental para alcançar a igualdade de género, nota-se por vezes uma certa falta de coerência entre as intenções da carta e a aplicação prática dos princípios nos vários Estados-Membros e as suas políticas comerciais e de desenvolvimento. A plena afirmação dos direitos cívicos, económicos, sociais e políticos das mulheres é, de facto, minada frequentemente por políticas macroeconómicas e acordos comerciais inspirados pelo neoliberalismo que ignoram completamente a dimensão do género.

2.2

Além disso, não há dúvida de que a complexa situação internacional não é o terreno mais propício para fazer singrar a promoção das mulheres que é antes ameaçada pela erosão persistente das posições conquistadas nos últimos anos.

2.3

Os conflitos actuais debilitam e deterioram cada vez mais a situação das mulheres.

2.4

A violência doméstica é, ainda, uma realidade em todo o mundo e atinge mulheres de todas as idades, classes sociais e religiões.

2.5

É, pois, essencial vincar a igualdade de género e a defesa dos direitos das mulheres como objectivo prioritário e como meio para alcançar um desenvolvimento equitativo, uma melhor redistribuição da riqueza, um crescimento económico sustentável e o reforço dos sistemas de protecção dos estratos mais vulneráveis da população.

3.   O papel do Comité Económico e Social Europeu

3.1

Parece-nos essencial que o Comité Económico e Social elabore um documento sobre a matéria que lhe dê a oportunidade de participar na avaliação em curso dos progressos realizados pela União Europeia na igualdade de género.

3.2

Convém lembrar a este propósito que o Comité sempre tem seguido com especial atenção as actividades centradas na melhoria da posição da mulher na sociedade, quer elaborando inúmeros pareceres sobre a matéria quer fazendo-se promotor de várias iniciativas. No contexto da Quarta Conferência sobre as Mulheres (Beijing 1995) e do seguimento que lhe foi dado posteriormente (Beijing +5), contribuiu com dois pareceres (EXT/131 e REX/033) em que sublinhava, designadamente, a importância da participação de uma delegação do Comité nos trabalhos das Nações Unidas.

3.3

Numa óptica de colaboração com as instituições europeias, sobretudo o Conselho, o Parlamento e a Comissão, o Comité tem tido um papel crucial no acompanhamento de numerosas iniciativas da União Europeia todas com o propósito de garantir a igualdade de género que, nos últimos anos têm procurado dar uma resposta aos desafios e aos obstáculos evidenciados em Beijing.

3.4

Neste contexto, é nossa convicção que, partindo dos progressos e dos obstáculos encontrados desde a Quarta Conferência até aos nossos dias, o Comité poderia ter um notável contributo para a integração sistemática das questões especificamente femininas num número cada vez maior de áreas da política e da sociedade europeia.

3.5

Além disso, tendo em mente o papel de protagonista que cabe à União Europeia no cenário internacional e a enorme responsabilidade que tal implica, propomo-nos delinear neste parecer os possíveis contributos da UE para a melhoria das condições de vida e de promoção das mulheres no mundo, através das suas políticas comerciais, de cooperação e de desenvolvimento.

4.   A União Europeia

4.1

Na União Europeia, o princípio da igualdade entre géneros, já presente no Tratado, foi codificado ulteriormente pelo Tratado de Amesterdão ao consagrar a «dupla abordagem» que coloca em paralelo, por um lado, a aplicação da perspectiva de género em todas as políticas comunitárias e, por outro, a adopção de medidas específicas a favor das mulheres. No entanto, a questão da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres tinha sido já enquadrada na política de coesão económica e social da Comunidade e constituía, desde 1994, um objectivo primordial dos Fundos Estruturais.

4.2

A UE adoptou uma abordagem integrada, distinguindo entre os instrumentos legislativos e financeiros e a utilização do método aberto de coordenação nas políticas sociais. Os instrumentos mais recentes concebidos para a consecução da igualdade de género são, no âmbito da UE, a Estratégia-Quadro da Comunidade para a Igualdade de Géneros (2001-2005), com os correspondentes programas de trabalho anuais, e os Fundos Estruturais.

4.3

Esta estratégia-quadro propõe-se coordenar as actividades e os programas antes desenvolvidos numa base sectorial, adoptando a óptica da abordagem dupla de Amesterdão para garantir doravante uma maior coerência, sobretudo graças a indicadores adequados e a um sistema de controlo, avaliação e disseminação dos resultados obtidos.

4.4

As áreas de intervenção os objectivos, interdependentes, enunciados na estratégia para a promoção da igualdade de género são essencialmente cinco: economia (em ligação com a Estratégia Europeia de Emprego e Fundos Estruturais, bem como a efectiva integração da perspectiva de género em todas as políticas com repercussões na situação das mulheres na vida económica); participação e representação (relativamente aos processos de decisão); direitos sociais (vida quotidiana e disparidades bem visíveis nos sistemas de protecção social); vida civil (direitos humanos e liberdades fundamentais com ênfase especial na violência e no tráfico para fins de exploração sexual); mudança nos papéis e nos estereótipos de género (indústrias da cultura e meios de comunicação).

4.5

O reforço das políticas de igualdade entre homens e mulheres passou também pela adopção de medidas no âmbito dos Fundos Estruturais. O regulamento aplicável ao período de programação de 2000 a 2006, que adopta a abordagem dupla consagrada no Tratado de Amesterdão, é fruto de uma análise atenta e crítica das medidas em prol da igualdade de oportunidades e da constatação das suas fraquezas. De resto, os Fundos Estruturais sempre foram considerados — sobretudo o Fundo Social Europeu — o principal instrumento da Estratégia Europeia de Emprego; nas Novas Orientações para o Emprego, aprovadas em Julho de 2003, prevê-se que a igualdade de género tenha uma dimensão horizontal em todos os objectivos e a Paridade Homem-Mulher constitui uma das orientações específicas.

4.6

Foram sensíveis os avanços no contexto do Fundo Social Europeu (FSE), sobretudo nas políticas do emprego e da formação. Os esforços nesta área têm-se concentrado mormente na melhoria do acesso, na participação e na posição das mulheres no mercado de trabalho (eixo E) e nas possibilidades de conciliar a vida profissional com a vida familiar, sendo encorajador o número de exemplos positivos. Neste sentido, o FSE fez seu o objectivo quantitativo do Conselho Europeu de Lisboa de 2000, segundo o qual a percentagem de mulheres empregadas deve aumentar dos 51 % (2000) para 60 %, e o do Conselho Europeu de Barcelona, de 2002, segundo o qual deve ser assegurada a inserção pré-escolar a 90 % das crianças entre os três anos de idade e a idade escolar e, pelo menos, para 33 % das crianças com idade inferior a três anos.

4.7

Todavia, parece ainda esporádico o carácter das medidas destinadas a melhorar as condições de trabalho e as perspectivas de carreira, a estimular o espírito empresarial das mulheres, a reduzir as disparidades salariais e a aumentar a sua representatividade no sector das novas tecnologias; há diversas iniciativas ao nível das estruturas de acolhimento de crianças com o fito de reconciliar a vida profissional e familiar, mas já são escassas as que se dirigem explicitamente aos idosos ou aos familiares dependentes.

4.8

Em contrapartida, a dimensão de género continua muito débil nos demais Fundos, sobretudo os que contemplam a agricultura e a pesca, sectores em que as mulheres se encontram tradicionalmente sub-representadas apesar de terem um papel activo no seu desenvolvimento. Mantêm-se, por conseguinte, muito fortes as desigualdades neste domínio, continuando o contributo das mulheres para a comunidade a ser pouco valorizado, também no que se refere à maior protecção do ambiente.

4.9

As políticas comunitárias são apoiadas por diversas iniciativas e por programas de financiamento específicos. São dignos de menção, por exemplo, Novas Oportunidades para as Mulheres (NOW) no mercado laboral, STOP para o reforço da cooperação contra o tráfico de mulheres e de crianças, DAPHNE para a melhoria da informação e a protecção das vítimas da violência e Mulheres e Ciência (Programa-Quadro de Investigação e Desenvolvimento) no sector das novas tecnologias. A Estratégia-Quadro antes referida tem ainda o propósito de reforçar a integração da perspectiva de género em várias iniciativas comunitárias, por exemplo, EQUAL, INTERREG, URBAN, LEADER ou, no sector cultural, LEONARDO, SOCRATES, JUVENTUDE, CULTURA, etc..

4.10

O Relatório da Comissão sobre a igualdade entre homens e mulheres (COM(2004) 115 final) refere que existem já na União Europeia leis muito avançadas nesta matéria (2), algumas delas corroboradas por uma jurisprudência muito extensa. Está, além disso, a ser elaborado um projecto de directiva única sobre a aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e da igualdade de tratamento de homens e mulheres em matéria de emprego que se propõe uniformizar e sistematizar a legislação em vigor sobre esta matéria.

4.11

Foi justamente neste espírito que o Conselho Europeu dos Ministros do Trabalho e dos Assuntos Sociais, realizado durante a Presidência holandesa, se pronunciou ao preconizar que a directiva única sobre a igualdade de tratamento deveria incidir prinicipalmente nas áreas que mais carecem de intervenção e que são: a igualdade salarial, a igualdade de oportunidades no acesso ao mercado de emprego, a igualdade de tratamento nos sistemas de protecção social, na formação e nas possibilidades de carreira e o ónus de prova no caso de discriminação em razão do sexo.

4.12

A proposta de directiva para a aplicação do princípio de igualdade de tratamento entre homens e mulheres no acesso a bens e serviços (2003/0265(CNS) também foi analisada num parecer do CESE (3) que realçou algumas lacunas importantes a colmatar num futuro próximo.

4.13

Na linha da aprovação da Plataforma de Acção de Beijing e na sequência do Conselho de Lisboa têm aumentado nos últimos anos as estatísticas de género, também graças à definição de novos indicadores (por exemplo, no atinente aos processos decisórios, ao mercado laboral ou à violência doméstica) que permitem analisar efectivamente os problemas e quantificar o impacto das políticas e das acções realizadas. Ao nível estatístico, portanto, são já perceptíveis alguns progressos embora ainda haja muito que fazer para controlar eficazmente os diversos sectores. Com efeito, só se for possível estudar e analisar fenómenos actuais de um ponto de vista quantitativo e qualitativo se poderá ter uma ideia exacta da dimensão dos progressos conseguidos.

4.14

Além disso, os orçamentos de género, concebidos para concretizar a integração da perspectiva de género nos procedimentos orçamentais, ainda são praticamente desconhecidos quer ao nível europeu quer ao nível nacional. Ao introduzir uma perspectiva de género em todas as fases do processo orçamental está-se a admitir que as decisões dos administradores não são neutras, mas têm repercussões diversas nos homens e nas mulheres. Neste sentido, a orçamentação de género pode ser considerada também como instrumento de avaliação do impacto das políticas, dos financiamentos e da tributação em homens e mulheres.

4.15

Infelizmente, não obstante o reforço das políticas comunitárias a favor das mulheres, para alcançar realmente os objectivos almejados são imprescindíveis a adopção de acções positivas e o máximo empenho dos Estados-Membros por serem os principais responsáveis pela aplicação destas políticas.

4.16

Se é verdade que a taxa de desemprego feminino, na Europa, diminuiu sensivelmente para os 55,6 %, parece ainda muito longínqua, em diversos países, a meta estabelecida pelo Conselho de Lisboa. De facto, as mulheres vieram engrossar as fileiras dos trabalhadores mais vulneráveis, os precários, e normalmente excluídos de qualquer sistema de protecção social. Em muitos Estados a discriminação salarial entre homens e mulheres continua a existir ou tem aumentado e a segregação quer vertical quer horizontal é ainda uma realidade deplorável. Como já assinalámos, as medidas para facilitar a conciliação entre vida profissional e familiar parecem concentrar-se exclusivamente no acolhimento das crianças, sendo praticamente inexistentes as dirigidas aos familiares que necessitam de cuidados especiais. Por outro lado, são poucos os Estados que adoptaram medidas para encorajar a licença parental também para os pais trabalhadores.

4.17

Também ainda são muito fortes as disparidades no sector da tomada de decisões. Basta pensar que na UE o Colégio de Comissários da Comissão Europeia é composto por 22 homens e 7 mulheres (apenas 24 %), enquanto o Parlamento conta com 510 deputados e 222 deputadas (apenas 30 %). Ao nível nacional a situação não é melhor: a média das mulheres com assento nos parlamentos nacionais não chega aos 25 % e nos governos não vai muito além dos 20 % (4). As mulheres também estão sub-representadas no CESE: em 317 conselheiros 79 são mulheres (apenas 25 %).

5.   A União Europeia e os países terceiros: cooperação e comércio internacional a favor das mulheres

5.1

A questão da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres ocupa agora uma posição de pleno direito nas políticas de cooperação e de desenvolvimento da União Europeia. A comunicação da Comissão (COM(95)423 final) de 18 de Setembro de 1995, seguida pela resolução do Conselho sobre a integração das questões de género na cooperação para o desenvolvimento, de 20 de Dezembro de 1995, constituíram a base para a aprovação de um primeiro regulamento do Conselho em 1998 (n.o 2836/98 (CE) de 22 de Dezembro de 1998) recentemente renovado para o período 2004-2006. O novo texto (n.o 806/2004(CE)) consolida os objectivos definidos anteriormente — apoio da integração da perspectiva de género e adopção de medidas favoráveis à promoção da igualdade entre homens e mulheres, enquanto contributo importante para a luta contra a pobreza no mundo — e considera prioritário o controlo dos recursos e dos serviços a favor das mulheres, sobretudo nos domínios da educação, do emprego e da participação nos processos de decisão. É reafirmado igualmente o apoio às actividades públicas e privadas que têm por objectivo a igualdade entre os sexos.

5.2

O programa de acção para a integração da igualdade entre as mulheres e os homens na cooperação para o desenvolvimento da Comunidade (2001-2006) (5) pretende colmatar o desfasamento entre os princípios enunciados e a prática através de uma estratégia concreta e da definição de domínios de acção prioritários: apoio às políticas macroeconómicas, às estratégias para a redução da pobreza e aos programas de carácter social nos sectores da saúde e da educação, segurança alimentar e desenvolvimento rural sustentável, transportes, reforço das capacidades institucionais e boa governação, comércio e desenvolvimento, integração e cooperação regional, integração da dimensão do género nos projectos ou programas concebidos a nível nacional ou regional, munir o pessoal da Comissão Europeia com instrumentos e formação adequada em matéria de igualdade de género.

5.3

O documento de programação concebido para promover a igualdade de género na política de cooperação para 2005-2006 menciona como áreas de intervenção prioritária a promoção de atitudes e de comportamentos positivos nos adolescentes para combater a violência contra as mulheres e as jovens e a necessidade de formação e de apoio metodológico dos principais actores dos países parceiros.

5.4

A Comissão apoia, em geral, acções e projectos com vista a melhorar a igualdade de género através da cooperação bilateral e regional com os Balcãs Ocidentais, a Europa de Leste e a Ásia Central, a área do Mediterrâneo, a África, as Caraíbas e os países do Pacífico e da América Latina. Estão previstas outras ajudas financeiras numa base não geográfica mas temática.

5.5

Afigura-se, além disso, oportuno realçar um momento importante na evolução das relações da UE com os países terceiros, o da assinatura em 23 de Junho de 2000 do Acordo de Cotonou com os países ACP (África-Caraíbas-Pacífico). O Acordo, evidenciando as relações entre a política, o comércio e o desenvolvimento, introduz uma dimensão social ao promover a plena participação nas estratégias de desenvolvimento de intervenientes não estatais, incluindo a sociedade civil, e ao considerar a igualdade de género como um dos temas transversais do Acordo, devendo, por isso, ser tida sistematicamente em consideração (artigos 8.o e 31.o). Parece-nos extremamente positivo que o Acordo tenha instituído a participação dos intervenientes não estatais nas várias etapas da programação dos documentos estratégicos nacionais e esperamos que a inclusão das associações de mulheres mereça especial atenção neste contexto.

O Acordo atribui ainda explicitamente ao Comité um mandato de consulta dos grupos de interesses económicos e sociais, institucionalizando assim o seu papel de interlocutor privilegiado.

5.6

Embora cientes de que a plena inclusão e a participação activa das mulheres nas políticas de desenvolvimento será um processo difícil e de grande fôlego, reputamos fundamental que as instituições europeias se mantenham extremamente vigilantes para que os princípios deixem de ser letra morta e se traduzam em acções concretas.

5.7

Nesta óptica, é essencial que as políticas de coesão económica e social se apresentem como um modelo susceptível de ser exportado para o resto do mundo e que a UE se empenhe na promoção e na aplicação internacional dos seus princípios no âmbito das relações com os países terceiros.

5.8

A introdução de cláusulas específicas nos acordos comerciais e de cooperação pode ser um instrumento muito útil, tal como a adopção de medidas positivas a favor dos países que respeitam os direitos das mulheres.

5.9

Se é verdade que a liberalização do comércio aumentou as possibilidades de emprego das mulheres nos países em desenvolvimento, também é verdade que as tem relegado geralmente para o grupo de trabalhadores precários, menos qualificados, menos remunerados e excluídos de qualquer sistema de protecção social. Além disso, a liberalização dos intercâmbios é muitas vezes acompanhada de políticas de ajustamento estrutural sugeridas ou impostas pelos organismos internacionais que, sem o amparo de mecanismos adequados de protecção social, se revelam insustentáveis para os estratos da população mais vulneráveis em que as mulheres representam, muitas vezes, a maioria.

5.10

Não obstante este facto, estas políticas, e em especial as políticas comerciais, ainda não prestam atenção suficiente às questões de género. Tendo em conta que estas, muito longe de serem neutras, têm um impacto negativo justamente sobre as mulheres e o desenvolvimento de um país não se dever fazer em detrimento da justiça social, seria conveniente introduzir sistemas de avaliação dos efeitos produzidos por essas políticas tanto ao nível macroeconómico como microecoómico.

6.   Conclusões e propostas de trabalho

A boa colaboração conseguida até à data graças aos esforços das instituições europeias tem facilitado o estabelecimento de políticas activas a favor das mulheres com reflexos perceptíveis nos programas e projectos específicos os quais têm contribuído para a sua inserção no mercado de emprego, para a defesa dos seus direitos e para a melhoria das suas condições de vida. O CESE é, todavia, de opinião que ainda há muitas áreas onde é preciso intervir:

A participação nos processos de decisão e a representatividade das mulheres ainda são incipientes quer nas instituições europeias quer na maioria dos Estados-Membros, tanto no níveis nacional, como regional e local. É, portanto, indispensável promovê-las em todas as sedes e até com uma reflexão sobre o sistema de quotas.

É imperioso levar a cabo acções de formação directas para propagar a integração da perspectiva de género nas instituições e nos Estados-Membros, que são os níveis de decisão onde são concretizadas as políticas e as estratégias.

São imprescindíveis estudos e análises de género bem focadas, estatísticas e indicadores específicos para definir os temas, afinar as políticas e as estratégias de intervenção e para avaliar realmente o seu impacto. É igualmente necessário continuar a produzir estatísticas desagregadas e estabelecer novos indicadores.

Importa quantificar os recursos reservados às acções positivas a favor das mulheres em todos os fundos e instrumentos de financiamento da UE e nos Estados-Membros, mediante, sobretudo, a promoção e a disseminação da orçamentação de género.

A condição de base mais importante é, essencialmente, reconhecer às mulheres a igualdade no direito de acesso ao ensino e à formação, conforme prevê o terceiro ponto dos Objectivos de Desenvolvimento para o Milénio.

No atinente aos Fundos Estruturais, seria oportuno reforçar as acções dirigidas às mulheres nos sectores da agricultura (FEOGA) e da pesca (IFOP), relacionando-as com a protecção do ambiente, outra questão em que as políticas comunitárias ligadas ao género são muito pouco incisivas.

Convém imprimir uma nova dinâmica às políticas a favor do espírito empresarial das mulheres com vista a aumentar a presença das mulheres no sector das novas tecnologias.

É necessário intensificar as acções de formação no sector da sociedade do conhecimento, para que esta não se torne num momento ulterior de discriminação e exclusão das mulheres, que muito podem contribuir para a consecução dos objectivos fixados pela Estratégia de Lisboa.

De um modo mais geral, e com respeito ao mercado de emprego, importa continuar a insistir em medidas de combate à segregação vertical e horizontal e na remoção de todos os obstáculos à verdadeira igualdade; tal implica que os Estados-Membros terão de estabelecer objectivos e alvos específicos e quantificáveis em consenso com os parceiros sociais. Sobretudo no tocante às discriminações salariais, os Estados-Membros deverão começar a aplicar a abordagem individualizada nas orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros (6) que menciona a formação e a educação, a classificação do tipo de trabalho, os sistemas salariais e os estereótipos culturais como aspectos fundamentais do problema.

É preciso dar maior atenção, nas medidas destinadas a conciliar a vida profissional com a vida familiar, à assistência a familiares idosos, dado o envelhecimento da população, mas sem diminuir os cuidados prestados à infância.

Para favorecer a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, importa incentivar e melhorar os investimentos nos serviços públicos, particularmente no sector da educação escolar e universitária, da saúde e da assistência.

É preciso reforçar, também ao nível nacional, as políticas de imigração e de integração das imigrantes e as favoráveis ao asilo, bem como as iniciativas dirigidas às mulheres vítimas de conflitos, de discriminação e de violência no seu país de origem.

É mais do que nunca imperioso lutar contra o tráfico de mulheres e de crianças.

Com respeito às políticas de desenvolvimento e comerciais, haverá que intensificar a abordagem participativa da sociedade em geral e consolidar o papel das mulheres em particular, com o envolvimento em pé de igualdade dos grupos de interesse das mulheres na formulação das políticas de desenvolvimento e na elaboração dos documentos de estratégia nacionais de cada país, aumentando também e sobretudo os meios de financiamento específicos para as mulheres de modo a obterem mais peso nos níveis económico e social.

Convém seguir de perto as repercussões dos acordos comerciais e das políticas de desenvolvimento, também ao nível microeconómico, prevendo análises específicas do seu impacto nas condições de vida dos grupos mais vulneráveis da sociedade e tendo em conta as diferenças de género.

Urge valorizar o papel da Comissão e das delegações que poderão exercer uma influência concreta na salvaguarda dos direitos humanos e, por conseguinte, no respeito dos direitos das mulheres sempre que estes sejam violados.

Deveriam ser conferidas responsabilidades específicas às delegações na promoção da integração da perspectiva de género.

A União Europeia deveria usar de toda a sua influência para levar o maior número possível de Estados a ratificar e a aplicar todos os tratados internacionais com impacto positivo na condição feminina e, em particular, a Convenção internacional contra todas as formas de discriminação das mulheres e o seu Protocolo adicional, e para persuadir os Estados signatários a retirar as reservas que insistem em colocar.

O Comité está empenhado em aprofundar a análise da situação da condição feminina nos novos Estado-Membros da União Europeia.

Tendo em mente a natureza do Comité, o seu papel face à sociedade civil, os seus objectivos e a experiência adquirida graças ao acompanhamento constante dos temas que dizem respeito à igualdade de género, seria sem dúvida útil que um dos seus representantes fizesse parte da delegação da Comissão da União Europeia à 49.a sessão da Comissão das Nações Unidas sobre o Estatuto da Mulher.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Conferência sobre Ambiente e Desenvolvimento (Rio de Janeiro, 1992), Conferência Mundial sobre os direitos Humanos (Viena, 1993), Sessão Extraordinária da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre o VIH/SIDA (Nova Iorque, 2001), Conferência Internacional sobre a População e o Desenvolvimento (Cairo, 1994), Cimeira Mundial sobre o Desenvolvimento Social (Copenhaga, 1995), Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e a Intolerância Conexa (Durban, 2001), Conferência Internacional sobre o Financiamento do Desenvolvimento (Monterrey, 2002), Segunda Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento (Madrid, 2002), a Cimeira Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável (Joanesburgo, 2002) e a Cimeira Mundial sobre a Sociedade da Informação (Genebra, 2005 – Túnis, 2005).

(2)  Directivas relativas à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere à paridade de remunerações (75/117/CE); ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho (directiva do Conselho 2002/73/CE que altera a 76/207/CEE), à segurança social (79/7/CEE) e aos regimes jurídicos e profissionais de segurança social (86/378/CEE), para os trabalhadores independentes (86/613/CEE) e ainda a directiva relativa à segurança e á saúde das mulheres no local de trabalho durante a gravidez e o aleitamento (92/85/CEE), à organização do tempo de trabalho (93/104/CE), às licenças parentais (96/34/CE), ao ónus de prova nos casos de discriminação em razão do sexo (97/80/CE) e ao trabalho em tempo parcial (97/81/CE).

(3)  JO C 241, de 28/9/2004.

(4)  Dados da Comissão Europeia, DG do Emprego e Assuntos Sociais, actualizados em 29/9/2004.

(5)  COM(2001) 295 final.

(6)  Decisão do Conselho de 22 de Julho de 2003 sobre as orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros (JO L 197/2003).


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/52


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Verde — Contratos públicos no sector da defesa

(COM(2004) 608 final)

(2005/C 221/12)

Em 23 de Setembro de 2004, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Verde — Contratos públicos no sector da defesa

O Comité Económico e Social Europeu incumbiu a Secção de Mercado Único, Produção e Consumo da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência do trabalho, o CESE propôs C. Wilkinson como relator-geral na sua 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro). Nesta mesma reunião plenária, o CESE adoptou o seguinte parecer por 96 votos a favor, com 9 abstenções:

1.   Introdução

1.1

O Livro Verde sobre os contratos públicos no sector da defesa (COM(2004) 608 final) constitui uma das acções anunciadas pela Comissão Europeia na sua Comunicação «Para uma política comunitária em matéria de equipamento de defesa», adoptada em 11 de Março de 2003, e sobre a qual o Comité se pronunciou em Setembro de 2003 (1).

1.2

Na realidade, o «Mercado Europeu de Equipamento de Defesa (EDEM)» é apenas uma parte do mercado interno que abrange um sector específico. O Livro Verde procura contribuir para a construção progressiva de um mercado interno de equipamento de defesa europeu mais aberto e transparente, sem deixar de respeitar a natureza específica deste sector. Estas acções deverão fortalecer a indústria da defesa e reforçar a sua competitividade, garantir uma melhor afectação dos recursos no sector e apoiar o desenvolvimento das capacidades militares da UE no quadro da Política Europeia de Segurança e Defesa (PESD), no contexto da Política Externa e de Segurança Comum (PESC).

1.3

Em 12 de Julho de 2004, o Conselho decidiu criar a Agência Europeia de Defesa (AED) vocacionada para «apoiar os esforços dos Estados-Membros para melhorar as capacidades de defesa europeias no domínio da gestão das crises e apoiar a PESD nos seus moldes actuais e futuros». Esta Agência entrou agora em funcionamento. As atribuições (2) da AED prendem-se com a melhoria do desempenho da Europa no sector da defesa através da promoção da coerência, destinada a substituir a fragmentação actual.

1.4

O «desempenho em matéria de defesa» implica a garantia da disponibilidade das capacidades necessárias para a realização das missões previstas e a doutrina subjacente a esta realização, com uma boa relação custos/benefícios. Isto incluirá a garantia da máxima interoperabilidade possível. Actualmente, os 25 Estados-Membros atribuem juntos cerca de 160 mil milhões de euros por ano à defesa, dos quais cerca de 20 % são destinados aos processos de adjudicação de contratos públicos de equipamentos (incluindo investigação e desenvolvimento, aquisição e assistência) (3).

2.   Observações na generalidade

2.1

O Livro Verde em apreço aborda os aspectos que se prendem com a melhoria do sistema de adjudicação de contratos públicos de equipamentos de defesa nos 25 Estados-Membros (EM). Apenas será possível realizar progressos significativos quando tiverem sido definidos os outros elementos do «desempenho em matéria de defesa» (ver ponto 1.4 supra) (4). É de particular importância para a indústria a necessidade de orientações muito claras, de requisitos harmonizados e de continuidade. Não obstante, o Comité acolhe favoravelmente a presente iniciativa na medida em que esta pode ser considerada como uma parte distinta do processo de elaboração de uma PESD mais viável num mercado transparente e competitivo.

2.2

O Comité congratula-se com o papel preponderante previsto para a AED. Será necessário um acordo claro sobre os papéis respectivamente da AED e dos outros organismos que estão actualmente envolvidos no sector dos equipamentos de defesa (5). Neste contexto, o CESE espera que sejam minimizadas as diferenças entre as respectivas funções, na medida em que os progressos realizados o permitam. Todavia, antes de se proceder a modificações, devem ser examinados os ensinamentos retirados da experiência da OCCA (6) (que se ocupa da gestão efectiva dos projectos, incluindo a questão fundamental do direito contratual).

2.3

O Comité congratula-se com o facto de ter sido reconhecido que os Estados-Membros vivem situações e seguem procedimentos muito diferentes em matéria de adjudicação de contratos de equipamentos de defesa, e que o ritmo das adaptações poderá ser variável. O Comité concorda com o facto de que seria útil estabelecer uma base mais comum em matéria de contratos públicos de defesa e que isto é possível num prazo relativamente curto com o acordo e a cooperação de todos os Estados-Membros.

2.4

O CESE concorda com o facto de que é necessário reduzir a fragmentação do mercado dos equipamentos de defesa e aumentar a sua competitividade e transparência, sendo estas condições sine qua non para a manutenção e o reforço de uma indústria de defesa comunitária viável, bem como um contributo para uma melhor relação custos-eficácia dos contratos públicos e da gestão de capacidades de defesa apropriadas.

2.5

A análise das especificidades próprias dos contratos no sector dos equipamentos de defesa mencionadas no ponto 2 Livro Verde constitui um bom ponto de partida para examinar a situação do mercado e indica algumas das dificuldades encontradas.

2.6

Todavia, o CESE sublinha que qualquer reestruturação das indústrias de defesa deve antes de mais ser efectuada pelas empresas interessadas, tendo em conta as realidades do mercado (7). Com efeito, a maioria das empresas importantes é transnacional, embora os seus clientes sejam nacionais. Além disso, os Estados-Membros têm estratégias industriais diferentes, de que a indústria da defesa apenas constitui uma parte.

2.7

A indústria (tanto no sector da defesa como nos outros) deve evitar um excesso de procedimentos regulamentares para funcionar de maneira eficaz e lograr resultados económicos e eficazes em termos de custos.

3.   Observações na especialidade

3.1

Convém especificar exactamente os domínios dos processos de adjudicação de contratos públicos de equipamentos de defesa que deverão ser abrangidos pelas normas adoptadas. Além da aquisição deste tipo de equipamento, há que considerar os aspectos da investigação e do desenvolvimento, da manutenção, da assistência, das adaptações e da formação, que estão incluídos no custo de «propriedade». que geralmente são muito mais dispendiosos a longo prazo do que a aquisição.

3.2   Artigo 296.o

3.2.1

O CESE concorda que as derrogações à regulamentação comunitária sobre os contratos públicos previstas no artigo 296.o do Tratado UE vão continuar a ser necessárias para garantir aos Estados-Membros a protecção dos seus interesses de segurança essenciais.

3.2.2

A Comissão deverá fornecer indicações sobre o valor dos equipamentos que beneficiaram de uma derrogação nos últimos cinco anos (e indicar a percentagem que representam em relação ao montante total atribuído aos equipamentos de defesa na UE). Isto constituiria uma plataforma de referência para a avaliação dos progressos realizados.

3.2.3

O problema é que o recurso a estas derrogações quase que se tornou a regra em vez da excepção, o que é claramente incompatível com o Mercado Único. Tal como a Comissão, o Comité considera que isto tem que mudar. O desafio vai consistir em utilizar o artigo 296.o em conformidade com as decisões adoptadas em casos passados (8), mantendo a possibilidade de derrogar às regras normais sobre os contratos públicos. Os Estados-Membros têm que justificar (juridicamente, se necessário) as derrogações que aplicam. Os benefícios de uma competitividade e transparência acrescidas devem ser salientados nos debates.

3.2.4

A lista dos produtos produzidos em 1958 em conformidade com o artigo 296.o, n.o 2, que sugere o âmbito de aplicação do artigo 296.o, n.o1, não é funcional e provavelmente continuará a não ter qualquer valor real como instrumento útil para garantir uma utilização apropriada das derrogações sobre segurança. É preciso continuar a analisar cada situação em particular, visto que mesmo os equipamentos de base (9) poderão recair, em certos casos, no âmbito de aplicação das derrogações. Por outro lado, é improvável que as listas acompanhem as últimas evoluções.

3.2.5

Sendo assim, não há uma solução fácil para definir quais os equipamentos e serviços conexos que poderão recair no âmbito de aplicação do artigo 296.o. Numa primeira abordagem, urge clarificar o actual quadro jurídico da UE através de uma «comunicação interpretativa» que melhore a compreensão da questão e facilite uma aplicação mais coerente e de melhor qualidade.

3.2.6

Tal como os contratos públicos, qualquer comunicação deste género terá implicações para uma série de outros aspectos. Os auxílios estatais e (eventualmente) os serviços de interesse geral são alguns exemplos que precisam de ser considerados.

3.2.7

O Comité entende que o «processo por negociação», com notificação prévia, seria apropriado para as necessidades específicas dos equipamentos de defesa, e que não são apropriados os métodos «aberto» e «restrito». No entanto, talvez seja preciso rever esta posição em função da experiência obtida com a aplicação da «comunicação interpretativa».

3.2.8

Para alguns, uma comunicação apenas poderá constituir uma medida temporária até à adopção de uma directiva específica (ou de outro instrumento jurídico específico). O CESE considera que depois de ter sido elaborada e adoptada uma «comunicação interpretativa» deste género, poderá ser considerada a necessidade de um instrumento legislativo à luz do seu impacto. O Comité faz votos por que sejam rapidamente desenvolvidas acções para elaborar esta comunicação.

3.2.9

Há outra possibilidade, que não foi referida no Livro verde, de estabelecer um «código de conduta» que deverá ser utilizado pelos Estados-Membros participantes e que constitui outro meio de estabelecer um EDEM. Sendo este um dos sectores da responsabilidade dos Estados-Membros, poderia ser considerada esta possibilidade, recorrendo eventualmente à AED como intermediária. Poderá ser difícil controlar e aplicar este código e, além disso, ainda deveriam ser incluídos os aspectos relacionados com o mercado interno.

3.3   Publicação dos anúncios de concurso

3.3.1

Não parece ser necessário analisar mais exaustivamente o sistema e o formato dos anúncios de concurso. Se convém tratar os equipamentos de defesa como qualquer outro domínio do Mercado Único (embora tenha mais possibilidades de derrogações), em princípio os respectivos anúncios de concurso deverão ser tratados da mesma maneira do que os outros tipos de concursos. Isto supõe, como noutros casos, diferentes sistemas e problemas, nomeadamente de ordem linguística. Os argumentos a favor de um sistema de publicação centralizado são pouco convincentes.

3.3.2

Os domínios potencialmente problemáticos são a confidencialidade e as compensações; estes problemas são mais susceptíveis de surgir em relação aos equipamentos de defesa do que em relação a outros equipamentos e serviços; há também a segurança do abastecimento, visto que é difícil mudar de fornecedores ou de contratantes depois de ter sido assinado um contrato. Em todas estes domínios, os Estados-Membros envolvidos devem assumir responsabilidades, embora possam ser úteis algumas orientações gerais da Comissão.

3.4   Natureza dual

3.4.1

Hoje em dia, é muitas vezes difícil incluir certas empresas na classificação de «fabricantes de equipamentos de defesa». Actualmente, muitos equipamentos são de «natureza dual» e esta percentagem está a aumentar. Esta evolução é positiva por vários motivos; por exemplo, as economias de escala poderão resultar em preços mais competitivos e poderá ser mais fácil garantir a segurança do abastecimento.

3.4.2

Por outro lado, os esforços envidados em matéria de IDT para este tipo de equipamentos também servem outros objectivos (civis). Por conseguinte, é importante que os recursos consagrados à IDT no domínio da defesa não sejam submetidos a um regime demasiado rígido.

3.4.3

O Comité continua preocupado com o muito que ainda resta fazer para maximizar o valor da coordenação e da coerência que são necessárias no domínio dos equipamentos de defesa, conforme sublinhou no seu documento anterior consagrado a este tipo de equipamentos (10).

3.5   Agência Europeia de Defesa (AED)

3.5.1

O Comité saúda a criação da AED e reconhece que poderá desempenhar um papel de primeiro plano no domínio dos equipamentos de defesa, mas salienta que esta instância ainda está a angariar os recursos necessários para a realização das funções que lhe foram atribuídas.

3.5.2

É importante que a AED garanta que a doutrina e as capacidades da UE tenham plenamente em conta o papel, a doutrina e as capacidades da OTAN, maximizando a interoperabilidade e minimizando eventuais diferenças. Nesta fase, ainda não se sabe de que modo um envolvimento directo da AED na adjudicação de contratos poderá resultar em valor acrescentado, não obstante os seus conhecimentos periciais no domínio dos equipamentos de defesa colocarem esta instância em boa posição para propor métodos de melhorar a harmonização das regulamentações nacionais.

3.5.3

A AED também poderá fazer um contributo precioso para o estabelecimento de um acordo sobre os aspectos financeiros da cooperação em matéria de equipamentos, caso seja necessário. A repartição dos custos e dos benefícios da IDT nos domínios ligados à defesa e, através deste processo, a separação entre aspectos gerais e de defesa, constituem uma fonte notável de dificuldades potenciais.

3.5.4

A AED deverá contribuir de igual modo para a aproximação dos sistemas de licenças nacionais nos casos de transferências de equipamentos entre Estados-Membros. Actualmente, os procedimentos nacionais são divergentes e complicados. A Agência também poderia contribuir para o estabelecimento de um acordo sobre as modalidades de tratamento das disposições de compensação, na medida em que estas continuarão, futuramente, a ser um elemento característico das adjudicações de contratos.

3.5.5

A AED poderá igualmente contribuir para um acordo sobre as políticas industriais em matéria de equipamentos de defesa e para definir os elementos que constituem os «equipamentos estratégicos», que a UE gostaria de ser capaz de proporcionar para reduzir a dependência dos países terceiros; isto seria um contributo bastante valioso.

3.5.6

A AED poderá igualmente incitar os Estados-Membros a considerar métodos de aquisição inovadores, como o «pooling», o aluguer com opção de compra e a especialização para satisfazer as necessidades em termos de capacidades.

3.5.7

Considerando que a PESD apenas será efectiva se os Estados-Membros derem provas de uma vontade política suficientemente forte para estabelecer e manter as capacidades necessárias à realização das missões estabelecidas no quadro da UE, convém igualmente que a AED incentive os Estados-Membros neste sentido.

4.   Conclusões

4.1

Os equipamentos de defesa apenas constituem uma das condições necessárias para um «desempenho de defesa» viável. Para que a indústria possa desempenhar plenamente a sua missão, precisa de orientações muito claras, de requisitos harmonizados e de continuidade. Além disso, as empresas devem ser as principais responsáveis pelas reestruturações necessárias. É igualmente necessário que a indústria evite o peso do excesso de procedimentos regulamentares.

4.2

Convém especificar exactamente que partes dos processos de adjudicação de contratos públicos de equipamentos de defesa serão abrangidas pelas normas adoptadas.

4.3

Continuará a ser necessário o artigo 296.o do Tratado. Para evitar uma utilização demasiado frequente, a Comissão deverá estabelecer um critério de referência baseado no desempenho actual. Não é possível manter uma dada lista de equipamentos e de procedimentos aos quais pode ser aplicado o artigo 296.o.

4.4

Numa primeira fase, a Comissão deverá estabelecer, o mais rapidamente possível, uma «comunicação interpretativa» com base no artigo 296.o. Só depois de ter sido adquirida experiência com esta comunicação será possível decidir se um instrumento jurídico será igualmente necessário.

4.5

Os equipamentos de «utilização dual» são cada vez mais comuns e esta tendência é positiva, em particular em virtude do potencial de utilização civil da IDT que se aplica ao equipamento militar.

4.6

O Comité felicita-se do papel importante previsto para a Agência Europeia de Defesa (AED); importa especificar qual o papel que deverá ser desempenhado por todas as agências envolvidas.

4.7

As principais atribuições da AED neste domínio são as seguintes:

Garantir a coordenação com as exigências da OTAN,

Contribuir para negociar todos os aspectos financeiros necessários,

Contribuir para harmonizar os procedimentos nacionais existentes,

Propor maneiras inovadoras de facultar as capacidades necessárias,

Encorajar a manutenção da necessária vontade política.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JOCE n.o C 10/1 de 14.01.04.

(2)  A AED tem quatro funções: desenvolvimento das capacidades de defesa, cooperação em matéria de armamento, a base tecnológica e industrial da defesa europeia, bem como o mercado, a investigação e a tecnologia dos equipamentos de defesa.

(3)  Conforme o CESE fez notar no seu parecer sobre o documento COM(2003) 113 final, as despesas combinadas totais da UE correspondem a cerca de 40 % das despesas dos EUA, mas só produzem aproximadamente 10 % das suas capacidades operacionais.

(4)  Por exemplo, o Comité refere a declaração recente (Setembro de 2004) do director da AED de que as forças da UE não estão bem adaptadas ao mundo moderno nem aos seus conflitos e ameaças; este responsável afirmou ser necessário adquirir mais equipamento de alta tecnologia.

(5)  Como o OCCA (Organismo Conjunto de Cooperação em matéria de Armamento), o Grupo de Armamento da Europa Ocidental (GAEO) e o Grupo LoI de países signatários da Carta de Intenções.

(6)  A OCCA é uma organização conjunta de cooperação no sector do armamento, à qual aderem actualmente cinco Estados-Membros.

(7)  Contudo, devido à natureza específica dos mercados da defesa e à necessidade de gestão dos pagamentos no quadro das regulamentações financeiras nacionais, os Estados-Membros vão inevitavelmente desempenhar um papel de incentivo ao desenvolvimento do equipamento de defesa.

(8)  Os acórdãos adoptados no «caso Bremen» (1999/763/63( JO n.o L 301/8 de 24 de Novembro de 1999 são testemunhos da falta de clareza actual.

(9)  Note-se que mesmo os equipamentos aparentemente simples (o vestuário, por exemplo), podem implicar tecnologias avançadas.

(10)  Ver ponto 5 do parecer a que faz referência a nota de rodapé 1.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/56


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Directiva 2001/12/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2001, que altera a Directiva 91/440/CEE do Conselho relativa ao desenvolvimento dos caminhos-de-ferro comunitários»

COM(2004) 139 final — 2004/0047 (COD)

(2005/C 221/13)

Em 28 de Abril de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 71.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 17 de Janeiro de 2005, tendo sido relator E. CHAGAS.

Na 414.o reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 122 votos a favor, 53 votos contra e 12 abstenções, o presente parecer.

1.   Introdução

1.1

A presente proposta de directiva que altera a Directiva 91/440/CEE relativa ao desenvolvimento dos caminhos-de-ferro comunitários é parte integrante. Os outros elementos são os seguintes:

Proposta de directiva relativa à certificação do pessoal de bordo (COM(2004) 142 final);

Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo aos direitos e obrigações dos passageiros dos serviços ferroviários internacionais (COM(2004) 143 final);

Proposta de regulamento relativo à indemnização por incumprimento dos requisitos de qualidade contratuais nos serviços de transporte ferroviário de mercadorias (COM(2004) 144 final);

e

Comunicação da Comissão intitulada «Avançar na integração do sistema ferroviário europeu» (COM(2004) 140);

Documento de trabalho da Comissão sobre a abertura progressiva do mercado dos serviços de transporte ferroviário internacional de passageiros (SEC(2004) 236).

1.2

O Primeiro Pacote Ferroviário (também denominado «pacote da infra-estrutura ferroviária»), em vigor desde 15 de Março de 2001, tinha de ser transposto para o direito nacional até 15 de Março de 2003. Era constituído pelos seguintes elementos:

Alteração da Directiva 91/440/CEE: entre outros aspectos, concessão às empresas de transporte internacional de mercadorias por caminho-de-ferro de livre acesso à rede transeuropeia de transporte ferroviário de mercadorias até 15 de Março de 2003 e liberalização da totalidade do transporte internacional de mercadorias por caminho-de-ferro até 15 de Março de 2008 (1);

Alargamento do âmbito de aplicação para uma licença europeia concedida a empresas de transporte ferroviário (alteração da Directiva 95/18/CE) (2);

Harmonização das disposições relativas à repartição de capacidade da infra-estrutura ferroviária, à aplicação de taxas de utilização da infra-estrutura ferroviária e à certificação da segurança (substitui a Directiva 95/19/CE) (3).

1.3

Em Outubro de 2003, a Comissão Europeia interpôs acções judiciais no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias contra os nove Estados-Membros que não a notificaram da transposição para direito nacional do primeiro pacote ferroviário. Em Maio de 2004, cinco países ainda não tinham notificado a Comissão, enquanto dois Estados-Membros haviam apenas transposto parcialmente as disposições para as respectivas ordens jurídicas nacionais.

1.4

O chamado Segundo Pacote Ferroviário foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia em 30 de Abril de 2004 e tem de ser transposto para o direito nacional até 30 de Abril de 2006. Era constituído pelos seguintes elementos:

Alteração da Directiva 91/440/CEE: antecipação para 1 de Janeiro de 2006 da data de livre acesso ao mercado do transporte ferroviário internacional de mercadorias e liberalização do transporte ferroviário nacional de mercadorias, incluindo a cabotagem, a partir de 1 de Janeiro de 2007 (4);

Directiva relativa à segurança dos caminhos-de-ferro da Comunidade (5);

Regulamento que institui a Agência Ferroviária Europeia (6);

Alteração da Directiva 96/48/CE relativa à interoperabilidade do sistema ferroviário transeuropeu de alta velocidade e da Directiva 2001/16/CE relativa à interoperabilidade do sistema ferroviário transeuropeu convencional (7).

1.5

Com o primeiro e segundo pacotes foram criadas as bases jurídicas para a realização do mercado interno no sector do transporte ferroviário de mercadorias. As medidas abrangem o acesso ao mercado, concessão de licenças e certificação da segurança de empresas de transporte ferroviário, acesso a infra-estruturas e cálculo das taxas de utilização, criação de um quadro legislativo em matéria de segurança ferroviária, bem como medidas técnicas de interoperabilidade do sistema ferroviário.

1.6

Este novo quadro legislativo pressupõe, tal como assinalado pelo CESE no seu parecer sobre o segundo pacote ferroviário (8), uma completa reorganização do sector, implicando a criação de novas autoridades e competências.

1.7

O CESE já nesse seu parecer advertira igualmente para a necessidade de disposições sociais europeias. Entretanto, os parceiros sociais europeus do sector ferroviário, a Comunidade dos Caminhos-de-Ferro Europeus (CER) e a Federação Europeia dos Trabalhadores dos Transportes (ETF) celebraram, em 17 de Fevereiro de 2004, dois acordos europeus:

1)

instauração de uma licença europeia para maquinistas que efectuam serviços transfronteiras;

2)

acordo sobre determinados aspectos das condições de utilização do pessoal móvel empregado nos serviços transfronteiras de transportes ferroviários.

1.8

A Comissão apresenta no âmbito deste terceiro pacote ferroviário uma proposta de directiva relativa à certificação do pessoal de bordo com efeito entre 2010 e 2015.

1.9

Com a apresentação de uma nova alteração à Directiva 91/440/CEE, a Comissão persegue, além disso, o objectivo de liberalização gradual do sector ferroviário.

2.   Proposta da Comissão Europeia

2.1

A Comissão propõe a liberalização do acesso ao mercado dos serviços internacionais de transporte de passageiros a partir de 1 de Janeiro de 2010. A proposta inclui a cabotagem, ou seja, o embarque e o desembarque de passageiros em estações localizadas no mesmo trajecto. Ao mesmo tempo, será suprimida a disposição que regula o livre acesso ao mercado de agrupamentos internacionais.

2.2

Na UE a 25 são transportados anualmente por via férrea cerca de 6 mil milhões de passageiros. A maior parte cabe ao transporte ferroviário de passageiros e aos serviços regionais. Calcula–se, com base nas vendas de bilhetes, que a quota-parte correspondente ao transporte ferroviário internacional de passageiros ronda os 10 %. Este segmento abarca as ligações regionais transfronteiras, os serviços internacionais de longo curso e os de alta velocidade.

2.3

A Comissão reconhece que a abertura à concorrência do transporte internacional de passageiros, incluindo a cabotagem, poderá eventualmente ter um impacto negativo no equilíbrio económico do serviço de transporte de passageiros enquanto serviço de interesse público. Sugere, por conseguinte, que seja autorizada uma derrogação ao livre acesso ao mercado quando, para o mesmo trajecto, tenham sido celebrados contratos de serviço público nos termos do Regulamento (CEE) n.o 1191/69 e se provar que a liberalização dos serviços de transporte internacionais afecta o equilíbrio económico desses contratos de serviço público. Esta derrogação apenas será legítima se for absolutamente imprescindível para a salvaguarda do carácter público dos transportes e autorizada pela entidade reguladora nos termos do artigo 30.o da Directiva 2001/14/CE. Deverá, além disso, ser passível de controlo judicial.

2.4

A Comissão apresentará, o mais tardar em 31 de Dezembro de 2012, um relatório sobre a aplicação das disposições previstas.

3.   Avaliação da proposta

3.1   Premissas para a revitalização do sector ferroviário

3.1.1

A proposta de liberalização dos serviços de transporte ferroviário internacional de passageiros parte da suposição de que a concorrência nos serviços transfronteiras se traduzirá em uma ou mais das consequências seguintes: aumento do número de passageiros, na transferência de outros modos de transporte (sobretudo os transportes aéreos) para a via férrea e numa relação entre preço e qualidade mais favorável para os clientes.

3.1.2

O CESE já tinha indicado no parecer sobre o segundo pacote ferroviário (9) as premissas fundamentais para a revitalização do sistema rodoviário:

financiamento da ampliação e da melhoria da infra-estrutura;

adopção de medidas técnicas de interoperabilidade e seu funcionamento;

instauração de condições de concorrência equitativas entre os modos de transporte, mais concretamente:

observância das disposições sociais no sector rodoviário;

taxas de utilização da infra-estrutura equitativas para todos os modos de transporte.

3.1.3

Até hoje ainda não foi apresentada a proposta anunciada no Livro Branco «A política europeia de transportes no horizonte 2010» de um quadro legislativo para taxas de utilização da infra-estrutura equitativas para todos os modos de transporte.

3.1.4

O acompanhamento e a correcta aplicação da legislação social no transporte rodoviário permanece um grave problema.

3.1.5

Acresce a este facto o imperativo de encontrar soluções para sanar os problemas de endividamento de muitos operadores dos caminhos-de-ferro. Sobretudo, as empresas ferroviárias dos novos Estados-Membros não estarão à altura de concorrer no mercado do sector se não houver solução para o elevado endividamento.

3.1.6

O CESE advertiu ainda que a criação dos organismos competentes (entidades reguladoras, organismos de tarifação, entidades responsáveis pela repartição, organismos notificados, autoridades responsáveis pela segurança e organismos de investigação das causas de acidentes) requerida pelo segundo e terceiro pacotes ferroviários exige a reorganização a curto prazo do sector ferroviário e que a optimização do seu funcionamento precisa de vários anos e de alguma experiência prática. O CESE defendeu então que se deveria dar a máxima prioridade à segurança ferroviária, incluindo a adopção de medidas sociais europeias para o sector ferroviário.

3.2   Avaliação ex-post da liberalização do transporte ferroviário de mercadorias

3.2.1

Entretanto, foram tomadas decisões quanto à liberalização do transporte ferroviário de mercadorias, mas, por falta de experiência, ainda não se sabe quais serão os seus efeitos.

3.2.2

A Comissão Europeia terá de apresentar até 1 de Janeiro de 2006 um relatório com os seguintes elementos (10):

aplicação da Directiva 91/440/CE nos Estados-Membros e funcionamento efectivo dos diferentes organismos envolvidos;

evolução do mercado, nomeadamente tendências do tráfego internacional, actividades e quota de mercado de todos os intervenientes so mercado, incluindo os novos participantes;

impacto no sector dos transportes na sua totalidade, nomeadamente no que se refere às transferências modais;

impacto no nível de segurança em cada Estado-Membro;

as condições de trabalho no sector por Estado-Membro.

3.2.3

O CESE reputa conveniente aguardar este relatório e coligir informações sobre o desenvolvimento das medidas adoptadas e só depois avançar com o processo de abertura do mercado, solicitando, do mesmo passo, à Comissão que publique o relatório a tempo.

3.3   Avaliação ex-ante da liberalização do transporte ferroviário internacional de passageiros

3.3.1

No âmbito do terceiro pacote ferroviário, a Comissão encomendou um estudo sobre a liberalização do transporte de passageiros. O objectivo concreto era examinar diversos modelos de liberalização e recomendar o mais adequado dentre os seguintes:

transportes internacionais sem cabotagem;

transportes internacionais com cabotagem;

transporte nacional e internacional de passageiros por via férrea.

3.3.2

O estudo aconselhava a optar, dentre os três modelos, pela liberalização do transporte internacional de passageiros com cabotagem (11).

3.3.3

O CESE lamenta que uma avaliação ex-ante desta natureza não tenha servido para analisar criteriosamente questões fundamentais, por exemplo, o impacto da liberalização do transporte de passageiros

no transporte regional e no transporte ferroviário enquanto serviços de interesse geral, sobretudo nos Estados-Membros pequenos e médios;

na qualidade dos serviços prestados aos clientes;

no emprego e nas condições de trabalho no transporte ferroviário de passageiros;

nas empresas ferroviárias dos novos Estados-Membros da Europa Central e Oriental.

3.3.4

Este estudo contém algumas observações sobre cada uma das áreas analisadas (inclusivamente sobre a importância dos preços dos bilhetes e das taxas de utilização da infra-estrutura) formuladas com base em quatro casos específicos (Suécia, Alemanha, Espanha e Hungria) e num modelo de simulação gizado a partir de dois trajectos concretos. Desaconselha particularmente a liberalização do transporte ferroviário nacional de passageiros. Mas, o objectivo do estudo era explicitamente recomendar um dos três modelos.

3.4   Impacto da abertura do mercado nas ligações regionais e nos transportes como serviço de interesse público

3.4.1

Com a cabotagem, a proposta de liberalizar o transporte internacional de passageiros contém um elemento da abertura do mercado de uma parte do transporte nacional de passageiros.

3.4.2

O transporte nacional de passageiros é muitas vezes uma rede em que os lucros obtidos em trajectos com mais afluência de passageiros compensam as perdas nos trajectos menos frequentados, o que permite aumentar a oferta. Tal não se aplica apenas às ligações que garantem o serviço público e usufruem de direitos de exclusividade e/ou beneficiam de ajudas, para as quais a proposta da Comissão prevê, mediante condições estritas, a possibilidade de derrogação.

3.4.3

Sobretudo nos Estados-Membros pequenos e médios tal poderá provocar perturbações sensíveis no transporte ferroviário de passageiros que não tem direitos de exclusividade ao abrigo de um contrato.

3.4.4

Em alguns Estados-Membros os contratos que regulam as obrigações dos serviços públicos não são celebrados por cada um dos trajectos, mas aplicam-se a uma rede completa. Por este motivo, é praticamente impossível provar que põem em risco o equilíbrio dos transportes enquanto serviço de interesse público.

3.4.5

A possibilidade de derrogação proposta pela Comissão implica procedimentos de demonstração laboriosos e pode dar lugar a litígios.

3.4.6

Em Julho de 2000, a Comissão Europeia propôs o COM(2000) 7 final para substituir por um novo regulamento o Regulamento (CEE) 1191/69, relativo às obrigações de serviço público de transporte, com regras sobre direitos exclusivos e compensações no transporte público de passageiros.

3.4.7

A proposta de alteração do Regulamento (CEE) n.o 1161/69 encontra-se bloqueada há vários anos no Conselho «Transportes». As discrepâncias fundamentais entre a proposta da Comissão e a posição do Parlamento Europeu podem influenciar consideravelmente o impacto da proposta no âmbito da liberalização do transporte de passageiros por via férrea. A Comissão tenciona apresentar ainda este ano uma nova proposta.

3.4.8

Também por este motivo convinha aguardar por enquanto a promulgação de textos legislativos relevantes antes de passar à adopção de propostas destinadas a salvaguardar o equilíbrio do transporte ferroviário de passageiros enquanto serviço de interesse público no âmbito da liberalização.

3.5   Impacto na qualidade dos serviços prestados aos clientes

3.5.1

Segundo o estudo antes citado, face aos custos elevados e aos preços geralmente baixos dos bilhetes, é bastante improvável que a liberalização do transporte internacional de passageiros ocasione uma redução suplementar dos preços pagos pelos utentes.

3.5.2

Uma maior oferta graças a empresas ferroviárias concorrentes operando no mesmo trajecto poderá significar que não será possível continuar a garantir aquilo que até hoje tem sido norma oferecer — horário, um bilhete, informações provenientes de uma só fonte. Será cada vez mais difícil obter as informações desejadas.

3.5.3

A Comissão reage mediante uma proposta de legislação que obriga as empresas concorrentes a cooperar entre si para manter o nível de informação garantido até à data.

3.5.4

O CESE analisará esta proposta à parte num outro parecer. Gostaria, contudo, de frisar desde já que só depois da abertura do mercado do transporte de passageiros é que será necessário obrigar as empresas concorrentes a cooperarem entre si para informarem devidamente os utentes.

3.6   Impacto no emprego

3.6.1

A Comissão supõe que, a curto prazo, a liberalização do transporte internacional de passageiros levará à supressão de postos de trabalho mas que, em contrapartida, aumentarão os empregos em consequência do maior número de ligações ferroviárias. A Comissão não tem em conta, por exemplo, as possíveis consequências negativas para o emprego, dado o seu impacto no transporte regional e nos transportes enquanto serviço de interesse público. Quanto ao n.o 7 do artigo 1.o desta proposta de directiva, os respectivos efeitos dependeriam dos financiamentos do transporte regional de passageiros pelos Estados-Membros.

3.6.2

O número de trabalhadores do sector ferroviário baixou nos últimos dez anos para metade. As empresas ferroviárias nos novos Estados-Membros, mas também as que operam na Europa Ocidental, anunciam uma supressão de postos de trabalho ainda mais considerável. Se a liberalização do transporte internacional de passageiros banir inclusivamente do mercado nacional de longo curso as empresas ferroviárias dos pequenos e médios Estados-Membros, será praticamente impossível esperar um impacto positivo no emprego.

3.6.3

Os caminhos-de-ferro são tradicionalmente um modo de transporte para todas as classes sociais. O transporte aéreo deixou de ser um meio de transporte de luxo para se transformar num meio de transporte de massas. As repercussões deste fenómeno no emprego não se repetirão, com essa amplitude, no transporte ferroviário internacional de passageiros.

3.6.4

Ao mesmo tempo, observa-se no sector aéreo que os empregos de qualidade das antigas companhias aéreas estatais deram lugar a empregos de qualidade inferior em outros segmentos da indústria de aviação civil.

3.6.5

O CESE vê com grande preocupação o grande decréscimo de empregos no sector ferroviário. Sobretudo nos novos Estados-Membros que já de si apresentam elevados níveis de desemprego e um débil sistema social, a supressão de postos de trabalho gerará enormes problemas sociais, o que torna absolutamente urgentes medidas sociais para respaldar este processo. O CESE opõe-se a quaisquer medidas que agravem ainda mais o problema da supressão de postos de trabalho neste sector já tão sacrificado e deteriorem a qualidade dos empregos nos caminhos-de-ferro.

3.7   Impacto nas empresas ferroviárias dos novos Estados-Membros

3.7.1

O estudo acima referido da autoria de Steer Davies GLEAVE aponta como outros obstáculos importantes a uma maior concorrência a degradação da infra-estrutura nos novos Estados-Membros, a má situação financeira das empresas ferroviárias e os preços dos bilhetes, que estão geralmente muito aquém do nível de custos esperado a longo prazo.

3.7.2

As empresas ferroviárias não dispõem, além disso, de material circulante com qualidade suficiente para resistirem à pressão da concorrência.

3.7.3

A importância do transporte regional nos novos Estados-Membros é ainda maior do que na UE a 15. Se a liberalização do transporte internacional de passageiros tiver efeitos negativos na oferta de ligações regionais, estes far-se-ão sentir mais fortemente nos novos Estados-Membros, onde será inevitável a diminuição da sua quota-parte no transporte de passageiros que é hoje relativamente elevada.

4.   Conclusões

4.1

O CESE sempre se pronunciou nos seus pareceres a favor da revitalização dos caminhos-de-ferro comunitários, realçando a necessidade de criar certas premissas fundamentais, a saber:

ampliação da infra-estrutura e eliminação de pontos de estrangulamento;

instauração da interoperabildiade do sistema ferroviário;

criação de condições de concorrência equitativas entre os modos de transporte;

garantia da segurança ferroviária e de disposições sociais.

4.2

Insta a Comissão e os Estados-Membros a darem o seu contributo para a realização destas premissas o mais depressa possível.

4.3

Realça a importância do transporte ferroviário de passageiros para suprir as necessidades de mobilidade das pessoas, bem como a sua missão de serviço de interesse geral.

4.4

Reconhece a enorme utilidade de um operador de rede e da sua integração com outros meios de transporte públicos para assegurar a mobilidade da população. A prestação destes serviços não poderá de forma alguma ser ameaçada.

4.5

O CESE entende que qualquer proposta de liberalização do transporte ferroviário internacional de passageiros assentará num amplo e claro conhecimento dos efeitos globais sobre o transporte ferroviário de passageiros e do impacto das medidas tomadas ao abrigo do 1.o e 2.o Pacote Ferroviário.

4.6

Motivo por que o Comité solicita à Comissão que faça uma avaliação ex-ante das vantagens e inconvenientes da liberalização do transporte de passageiros, analisando as implicações desta liberalização

no transporte regional e no transporte ferroviário enquanto serviços de interesse geral, sobretudo nos pequenos e médios Estados-Membros;

na qualidade dos serviços prestados aos clientes;

no emprego e nas condições de trabalho no sector do transporte ferroviário de passageiros;

nas empresas ferroviárias dos novos Estados-Membros da Europa Central e Oriental.

4.7

O CESE convida a Comissão a, logo que possível, apresentar o relatório exigido na Directiva 91/440/CE (alterada pela Directiva 2004/51/CE) sobre a abertura do mercado do transporte ferroviário de mercadorias.

4.8

Alerta para o facto de ainda se encontrar pendente no Conselho o projecto de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à acção dos Estados-Membros em matéria de obrigações de serviço público e adjudicação de contratos de serviço público no sector do transporte de passageiros por via férrea, estrada e via navegável interior (COM(2000) 7 final), alterado pela proposta da Comissão, COM(2002) 107 final. A concepção deste regulamento poderá ter repercutir-se nas disposições de defesa do serviço público, no âmbito da liberalização do transporte internacional de passageiros por via férrea.

4.9

A melhoria da qualidade dos serviços prestados pelo sector ferroviário contribuirá para tornar este modo de transporte mais atraente e poderá apoiar os objectivos da política europeia de transportes no que toca a um sistema de transportes sustentável. Às empresas ferroviárias cabe, neste contexto, a principal responsabilidade. O CESE coloca, porém, sérias reservas a quaisquer medidas que possam comprometer o actual nível de qualidade destes serviços, e daria mais atenção às medidas de melhoria da qualidade dos serviços.

4.10

Entende o CESE que será via correcta a promoção da melhor cooperação entre as empresas ferroviárias, com o fito de aperfeiçoar a qualidade do serviço aos passageiros do transporte ferroviário internacional, especialmente do transporte internacional regional.

4.11

O CESE apreciaria especialmente que a Comissão dialogasse com os parceiros sociais europeus sobre o impacto da abertura do mercado dos caminhos-de-ferro e, particularmente, sobre as suas implicações quantitativas e qualitativas para o emprego.

4.12

Nos novos Estados-Membros, a quota-parte do transporte de passageiros por via férrea nos transportes de passageiros em geral é bastante mais elevada que nos países da UE a 15. O CESE considera indispensável seguir com particular atenção a evolução deste tipo de transporte e o impacto da abertura do mercado nos novos Estados-Membros. A Comunidade tem todo o interesse em que essa percentagem elevada seja salvaguardada, o que se enquadra, aliás, perfeitamente nos objectivos estabelecidos pelo Livro Branco sobre a Política de Transportes.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Directiva 2001/12/CE — JO L 75 de 15/3/2001, pág. 1 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22/7/1999, pág. 22.

(2)  Directiva 2001/13/CE — JO L 75 de 15/3/2001, pág. 26 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22/7/1999, pág. 22.

(3)  Directiva 2001/14/CE — JO L 75 de 15/3/2001, pág. 29 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22/7/1999, pág. 22.

(4)  Directiva 2004/51/CE — JO L 164 de 30/4/2004, pág. 164 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.

(5)  Directiva 2004/49/CE — JO L 164 de 30/4/2004, pág. 44 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.

(6)  Regulamento (CE) n.o 881/2004 — JO L 164 de 30/4/2004, pág. 1 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.

(7)  Directiva 2004/50/CE — JO L 164 de 30/4/2004, pág. 114 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14/3/2003, pág. 131.

(8)  JO C 61 de 14/3/2003, p. 131.

(9)  Ver nota de rodapé 8.

(10)  N.o 2, alínea d), do artigo 1.o da Directiva 2004/51/CE do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 91/440/CEE do Conselho relativa ao desenvolvimento dos caminhos-de-ferro comunitários.

(11)  EU Rail Passenger Liberalisation: Extended impact assessment, February 2004 by Steer Davies GLEAVE, London.


ANEXO

ao Parecer do Comité Económico e Social Europeu (nos termos do n.o 3 do artigo 54.o

As propostas de alteração seguintes, que recolheram pelo menos um quarto dos votos, foram rejeitadas durante os debates.

Ponto 3.1.4

Suprimir.

Justificação

O presente ponto não tem nada a ver com a liberalização dos caminhos-de-ferro. Misturam-se dois sectores num parecer que trata do desenvolvimento dos caminhos-de-ferro na Europa. Não se pode afirmar que o controlo da legislação social no transporte rodoviário é um grave problema, quando existe muita legislação que regula os tempos de condução e de descanso e o dia de trabalho do pessoal em circulação. A aplicação desta legislação controla-se com o tacógrafo. Além disso, em Agosto deste ano entra em vigor um novo dispositivo de controlo, o tacógrafo digital, que proporcionará o controlo mais preciso da jornada de trabalho dos motoristas.

Resultados da votação:

A favor: 58

Contra: 80

Abstenções: 7

Ponto 3.1.6

Suprimir parte da última frase:

«O CESE advertiu ainda que a criação dos organismos competentes (entidades reguladoras, organismos de tarifação, entidades responsáveis pela repartição, organismos notificados, autoridades responsáveis pela segurança e organismos de investigação das causas de acidentes) requerida pelo segundo e terceiro pacotes ferroviários exige a reorganização a curto prazo do sector ferroviário e que a optimização do seu funcionamento precisa de vários anos e de alguma experiência prática. O CESE defendeu então que se deveria dar a máxima prioridade à segurança ferroviária,incluindo a adopção de medidas sociais europeias para o sector ferroviário.».

Justificação

A segurança ferroviária na União Europeia foi regulada pela Directiva 2004/49/CE.

Resultados da votação:

A favor: 52

Contra 93

Abstenções 5

Substituir o ponto 3.2.3 pelo seguinte:

«O CESE considera que é conveniente analisar o conteúdo do relatório, logo que publicado, para determinar se a proposta de directiva deverá ser objecto de emenda ou de alteração de fundo.».

Justificação

Na verdade, a actual redacção solicita que se bloqueie o processo legislativo, o que de certa forma constitui uma incerteza jurídica prejudicial a todos: empresas, empregados, clientes.

Parece-nos mais positivo e construtivo indicar claramente o desígnio de ter em conta as conclusões, para eventualmente emendar ou alterar a proposta de directiva.

Mantém-se, assim, um processo dinâmico e aberto.

Resultados da votação:

A favor: 54

Contra 92

Abstenções 9

Substituir os pontos 3.4.7 e 3.4.8 pelo seguinte texto e alterar a numeração de acordo:

«A partir do momento que a nova proposta de alteração do Regulamento (CEE) n.o 1161/69 for apresentada ao Conselho de Ministros e ao Parlamento Europeu, convém analisar o impacto que este texto terá, eventualmente, na liberalização do transporte de passageiros por via férrea e no equilíbrio do serviço público».

Justificação

A passagem do parecer refere-se a uma situação que deixou de ser actual. A Comissão redigiu um novo texto, que poderia ser apresentado ao Conselho «Transportes», em Junho próximo. Não é possível prever o acolhimento que o Conselho de Ministros e o Parlamento Europeu lhe reservarão.

Pretende-se com esta alteração uma abordagem mais construtiva.

Resultados da votação:

A favor: 68

Contra 90

Abstenções 8

Ponto 3.6

Suprimir.

Justificação

Não se pode afirmar que a liberalização dos transportes ferroviários resultará no aumento do nível de desemprego e que os que se criem serão de pior qualidade quando nos outros meios de transporte a liberalização envolveu a criação de novos postos de trabalho. Há que ter presente que os caminhos-de-ferro são o único modo de transporte por liberalizar.

Resultados da votação:

A favor: 66

Contra 102

Abstenções 6


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/64


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à certificação do pessoal de bordo que assegura a condução de locomotivas e comboios na rede ferroviária da Comunidade»

COM(2004) 142 final — 2004/0048 (COD)

(2005/C 221/14)

Em 28 de Abril de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 71.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação emitiu parecer em 17 de Janeiro de 2005, tendo sido relator E. M. CHAGAS.

Na 414.o reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 127 votos a favor, 25 votos contra e 26 abstenções, o presente parecer.

1.   Introdução

1.1

A proposta de directiva relativa à certificação do pessoal de condução constitui uma componente do chamado Terceiro Pacote Ferroviário apresentado pela Comissão Europeia em 3 de Março de 2004. Os outros elementos são os seguintes:

Alteração da Directiva 91/440/CEE: liberalização dos serviços de transporte ferroviário internacional de passageiros (COM(2004) 139 final);

Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo aos direitos e obrigações dos passageiros dos serviços ferroviários internacionais (COM(2004) 143 final);

Proposta de regulamento relativo à indemnização por incumprimento dos requisitos de qualidade contratuais nos serviços de transporte ferroviário de mercadorias (COM(2004) 144 final);

e

Comunicação da Comissão intitulada «Avançar na integração do sistema ferroviário europeu» (COM(2004) 140);

Documento de trabalho da Comissão sobre a abertura progressiva do mercado dos serviços de transporte ferroviário internacional de passageiros (SEC(2004) 236).

1.2

O Primeiro Pacote Ferroviário (também denominado «pacote da infra-estrutura ferroviária»), em vigor desde 15 de Março de 2001, tinha de ser transposto para o direito nacional até 15 de Março de 2003. Era constituído pelos seguintes elementos:

Alteração da Directiva 91/440/CEE: entre outros aspectos, concessão às empresas de transporte internacional de mercadorias por caminho-de-ferro de livre acesso à rede transeuropeia de transporte ferroviário de mercadorias até 15 de Março de 2003 e liberalização da totalidade do transporte internacional de mercadorias por caminho-de-ferro até 15 de Março de 2008 (1);

Alargamento do âmbito de aplicação para uma licença europeia concedida a empresas de transporte ferroviário (alteração da Directiva 95/18/CE) (2);

Harmonização das disposições relativas à repartição de capacidade da infra-estrutura ferroviária, à aplicação de taxas de utilização da infra-estrutura ferroviária e à certificação da segurança (substitui a Directiva 95/19/CE) (3).

1.3

Em Outubro de 2003, a Comissão Europeia interpôs acções judiciais no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias contra os nove Estados-Membros que não a notificaram da transposição para direito nacional do primeiro pacote ferroviário. Em Maio de 2004, cinco países ainda não tinham notificado a Comissão, enquanto dois Estados-Membros haviam apenas transposto parcialmente as disposições para as respectivas ordens jurídicas nacionais.

1.4

O chamado Segundo Pacote Ferroviário foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia em 30 de Abril de 2004 e tem de ser transposto para o direito nacional até 30 de Abril de 2006. Este segundo pacote é constituído pelos seguintes elementos:

Alteração da Directiva 91/440/CEE: antecipação para 1 de Janeiro de 2006 da data de livre acesso ao mercado do transporte ferroviário internacional de mercadorias e liberalização do transporte ferroviário nacional de mercadorias, incluindo a cabotagem, a partir de 1 de Janeiro de 2007 (4);

Directiva relativa à segurança dos caminhos-de-ferro da Comunidade (5);

Regulamento que institui a Agência Ferroviária Europeia (6);

Alteração da Directiva 96/48/CE relativa à interoperabilidade do sistema ferroviário transeuropeu de alta velocidade e da Directiva 2001/16/CE relativa à interoperabilidade do sistema ferroviário transeuropeu convencional (7).

1.5

Com o primeiro e segundo pacotes foram criadas as bases jurídicas para a realização do mercado interno no sector do transporte ferroviário de mercadorias. As medidas abrangem o acesso ao mercado, concessão de licenças e certificação da segurança de empresas de transporte ferroviário, acesso a infra-estruturas e cálculo das taxas de utilização, criação de um quadro legislativo em matéria de segurança ferroviária, bem como medidas técnicas de interoperabilidade do sistema ferroviário.

1.6

Este novo quadro legislativo pressupõe, como assinalado pelo CESE no seu parecer sobre o segundo pacote ferroviário (8), uma completa reorganização do sector, implicando a criação de novas autoridades e competências.

1.7

Este quadro jurídico não prevê, ou pelo menos não prevê na medida desejável, disposições sociais respeitantes à garantia das habilitações do pessoal afecto a funções críticas de segurança e às suas condições de utilização.

1.8

Os parceiros sociais europeus do sector ferroviário, a Comunidade dos Caminhos-de-Ferro Europeus (CER) e a Federação Europeia dos Trabalhadores dos Transportes (ETF) celebraram, em 17 de Fevereiro de 2004, dois acordos europeus, nomeadamente:

1)

instauração de uma licença europeia para maquinistas que efectuam serviços transfronteiras;

2)

acordo sobre determinados aspectos das condições de utilização do pessoal móvel empregado nos serviços transfronteiras de transportes ferroviários.

1.9

A proposta de directiva em apreço, que visa a certificação do pessoal de bordo que assegura a condução de locomotivas e comboios, retoma parcialmente o acordo celebrado entre os parceiros sociais quanto à instauração de uma licença europeia para maquinistas.

1.10

No que toca ao acordo sobre as condições de utilização (tempo de condução e de repouso), a Comissão Europeia fez saber ao CESE que os parceiros sociais europeus haviam requerido formalmente que a implementação deste acordo se fizesse através de uma decisão do Conselho, pedido este que está a ser analisado pela Comissão.

2.   Proposta da Comissão Europeia

2.1

A Comissão invoca como justificação para a proposta de directiva a necessidade de melhorar a interoperabilidade e a gestão do pessoal. Pretende-se, assim, simplificar o processo de certificação das empresas ferroviárias, mantendo um elevado nível de segurança e garantindo as condições de livre circulação dos trabalhadores.

2.2

Na proposta são igualmente citados os objectivos dos parceiros sociais europeus, como por exemplo:

garantir elevado nível de qualificação do pessoal de condução que permita manter ou mesmo aumentar o nível de segurança;

reduzir o risco de dumping social.

2.3

A Comissão propõe que a certificação dos maquinistas se efectue com base em normas mínimas comuns ao nível europeu. Os maquinistas deverão ser certificados até 2010, no caso dos serviços transfronteiras, e até 2015, nos outros casos.

2.4

Segundo informações da Comissão, numa primeira fase serão abrangidos cerca de 10 000 maquinistas, aumentando este número numa segunda fase para 200 000 em toda a União.

2.5

Por outro lado, a Comissão propõe uma certificação do pessoal de bordo que participe indirectamente na condução de locomotivas e comboios. No entanto, a proposta de directiva não contém disposições específicas a este respeito, nem sobre o nível de qualificação do pessoal de acompanhamento. Apresentam-se, em seguida, os princípios da directiva. A definição das normas de qualificação efectuar-se-á numa fase posterior através da Agência Ferroviária Europeia ou no âmbito das Especificações Técnicas de Interoperabilidade.

2.6

A proposta de directiva prevê uma certificação em duas fases:

1)

carta de condução europeia, emitida pelas autoridades competentes e válida em toda a União Europeia. Este documento é propriedade do maquinista e comprova as habilitações gerais e as condições básicas;

2)

certificado complementar harmonizado, emitido pela empresa de transporte ferroviário, que permanece propriedade da empresa e comprova as habilitações específicas relacionadas com a empresa ou as infra-estruturas.

2.7

É necessária a criação de dois registos, nomeadamente junto das autoridades competentes e da empresa de transporte ferroviário, de que constem as respectivas habilitações, renovações, retiradas e eventuais alterações das licenças e os certificados complementares harmonizados.

2.8

São propostas três categorias de maquinistas: (A) locomotivas de manobra e comboios de trabalhos, (B) transporte de passageiros e (C) transporte de mercadorias.

2.9

A idade mínima é de 20 anos. Contudo, ao nível nacional, a idade mínima pode ser fixada em 18 anos.

2.10

A proposta contém disposições quanto à alteração e renovação da carta de condução, sobre os certificados complementares harmonizados e quanto ao controlo periódico das condições exigidas e à retirada da licença, para além de prever possibilidades de reclamação. Estão igualmente previstas disposições sobre controlos e sanções.

2.11

O acesso à formação, o exame e a verificação da qualidade dos sistemas de formação e dos procedimentos são também aqui objecto de disposições particulares.

2.12

No Anexo I são descritos o modelo comunitário da carta de condução e o certificado complementar. Dos anexos II a VII constam definições das funções, aptidões físicas e mentais e habilitações profissionais exigidas aos maquinistas.

2.13

A Agência Ferroviária Europeia é incumbida de elaborar um relatório, até 2010, para fazer o balanço do que foi entretanto realizado e avaliar a possibilidade de introduzir um cartão com circuito integrado.

3.   Avaliação da proposta da Comissão

3.1   Observações na generalidade

3.1.1

O CESE é favorável, em princípio, à proposta de directiva relativa à certificação do pessoal de bordo.

3.1.2

Os maquinistas e o pessoal de acompanhamento afecto a funções críticas de segurança têm grandes responsabilidades quanto à segurança do transporte, do pessoal, dos passageiros e das mercadorias. Num mercado dos transportes ferroviários liberalizado são necessárias disposições comuns para se alcançar um elevado nível de qualificação.

3.1.3

Normas mínimas harmonizadas facilitam, além disso, a utilização transfronteiriça do pessoal (9). No entanto, a disparidade dos sistemas de exploração e das regras de segurança nos Estados-Membros da União constitui o maior obstáculo à utilização de maquinistas além fronteiras. Estes sistemas díspares, associados à diversidade linguística, impõem consideráveis exigências adicionais à qualificação do pessoal.

3.1.4

O CESE continua a defender que um nível elevado de qualificação e respectiva certificação contribuem para que a profissão continue a ser reconhecida e atraente. Este aspecto é tanto mais relevante quanto se trata de uma profissão com horários de trabalho pouco convidativos e com cada vez menos garantias de segurança de emprego, situação que se agrava com o aparecimento de agências de trabalho temporário. As empresas que operam nos sectores do transporte rodoviário e por via navegável interior já se queixam de grande dificuldade em recrutar pessoal. O objectivo da directiva em apreço nunca poderá ser o de reduzir o tempo de formação.

3.1.5

As empresas ferroviárias tradicionais, auto-reguladas, assumem plena responsabilidade pela formação e pelo nível de qualificação do pessoal de bordo, bem como pela segurança dos transportes. Esta circunstância conduziu a um elevado nível de qualificação e fez com que o transporte ferroviário se tornasse um dos mais seguros.

3.1.6

Há que evitar que o objectivo prosseguido pela directiva de aumentar a mobilidade dos maquinistas e permitir um acesso não-discriminatório a institutos de formação faça decair a qualidade da formação e leve os trabalhadores a assumirem os custos de formação.

3.2   Observações na especialidade

3.2.1   Âmbito de aplicação e introdução da certificação

3.2.1.1

O CESE apoia a introdução gradual da certificação para os serviços de transporte internacional e nacional. Deste modo, as empresas dispõem de uma certa margem de manobra temporal.

3.2.1.2

O que é de estranhar é o horizonte temporal 2008-2010 para o transporte transfronteiras e 2010-2015 para maquinistas afectos a serviços nacionais (artigo 34.o). Face à liberalização do transporte internacional de mercadorias, iniciada em 2003 e que deverá ser concluída em 2006, e do transporte nacional de mercadorias a partir de 2007, dever-se-ia acelerar o processo de certificação dos maquinistas.

3.2.1.3

O CESE acolhe também favoravelmente a certificação do pessoal de acompanhamento. O pessoal que exerce funções de segurança tem um papel importante no sistema de segurança do transporte ferroviário. No entanto, a definição proposta é incompreensível: «Qualquer outro agente que não o maquinista, presente na locomotiva ou no comboio e que participe indirectamente na condução de locomotivas e comboios (...)» (Artigo 25.o). Seria preferível falar de pessoal de acompanhamento com funções de segurança. O CESE é de opinião que as regras respeitantes às funções e qualificações exigidas a esta categoria de pessoal deveriam igualmente constar do anexo à directiva.

3.2.2   Categorias de maquinistas

3.2.2.1

São propostas três «categorias de cartas de condução», nomeadamente para locomotivas de manobra e comboios de trabalhos, transporte de passageiros e transporte de mercadorias (n.o 2 do artigo 4.o). O estabelecimento de uma diferença entre transporte de passageiros e transporte de mercadorias não só não é prático, como nem sequer se justifica. Entre formação e exercício efectivo da profissão não existe diferença. Os conhecimentos dos respectivos comboios e locomotivas são certificados em documentos separados, embora, muitas vezes, se utilizem os mesmos comboios e locomotivas. Seriam suficientes duas categorias em função dos requisitos de segurança: condução de locomotivas e comboios em linhas fechadas (serviço de manobras e obras) e em linhas abertas (condução-ferrovia).

3.2.2.2

O CESE considera, também, que a categoria de maquinista deveria constar da carta de maquinista e não do certificado complementar harmonizado.

3.2.3   Idade mínima e experiência profissional

3.2.3.1

A proposta de directiva fixa a idade mínima em 20 anos, embora, ao nível nacional, possa ser reduzida para 18 anos, limitando-se a validade nesse caso ao território do Estado-Membro que emite a carta (artigo 8.o). Vários Estados-Membros (10) fixaram a idade mínima em 21 anos. A directiva teria como consequência uma redução da idade mínima, pelo menos no caso dos serviços transfronteiras.

3.2.3.2

O CESE considera que a idade mínima deveria passar para 21 anos, pois é precisamente no transporte transfronteiras que são exigidos mais requisitos e habilitações. Tal não exclui a possibilidade de fixação de uma idade inferior ao nível nacional.

3.2.3.3

O CESE seria mesmo a favor da comprovação, por parte de qualquer maquinista de comboio a prestar serviços transfronteiras, de um mínimo de 3 anos de experiência profissional. O artigo 10.o já prevê uma disposição semelhante para o transporte dentro do território de um Estado-Membro. Nos casos de empresas de transporte ferroviário que se limitam a oferecer serviços de transporte internacional, a experiência profissional exigida aos maquinistas poderia ser obtida em cooperação com outras empresas de transporte ferroviário que prestam serviços no tráfego nacional.

3.2.4   Estrutura da certificação

3.2.4.1

A Comissão propõe uma certificação em duas partes: uma carta de condução europeia, válida em toda a Europa e emitida pelas autoridades competentes, e um certificado harmonizado emitido pela empresa. Esta divisão é justificada pelo facto de o lançamento, inicialmente planeado, de um único cartão com circuito integrado ser demasiado complicado e oneroso.

3.2.4.2

O CESE concorda, em princípio, com a estrutura proposta pela Comissão. No entanto, a certificação das habilitações em dois documentos separados não é suficientemente precisa. Sobretudo no tocante aos conhecimentos da infra-estrutura. Quanto a este aspecto, dever-se-ia fazer uma nítida distinção entre, por um lado, o conhecimento das regras de exploração e dos regulamentos em matéria de segurança de uma determinada infra-estrutura e, por outro lado, o conhecimento dos itinerários e dos locais. O conhecimento da regulamentação sobre a exploração de uma ou mais redes de infra-estruturas deveria ser certificado na carta europeia, ao passo que o conhecimento dos itinerários e dos locais, que necessitam ser regularmente actualizados, deveriam ser atestados no certificado complementar harmonizado.

3.2.4.3

A estrutura bipartida da certificação é possível num período de transição. Tal não deve, no entanto, fazer perder de vista o objectivo da introdução de um único documento munido de circuito integrado, no qual sejam certificados quer os conhecimentos básicos quer os conhecimentos que dizem especificamente respeito às empresas.

3.2.5   Acreditação de examinadores e institutos de formação

3.2.5.1

A Agência Ferroviária Europeia está encarregada de estabelecer critérios de acreditação de formadores, examinadores e institutos de formação. O CESE considera que esta é uma hipótese viável, embora alguns aspectos da directiva devam ser esclarecidos. A directiva não precisa quais os exames a efectuar por examinadores acreditados e quais as habilitações que podem ser certificadas pelas próprias empresas de transporte ferroviário, sem recorrer aos serviços de um examinador acreditado. Também não está claramente estabelecido que a verificação dos conhecimentos adquiridos sobre o sistema de exploração e de segurança de uma infra-estrutura determinada compete a um examinador acreditado pelo Estado-Membro interessado.

3.2.6   Habilitações profissionais e aptidões físicas e mentais

3.2.6.1

Nos anexos à proposta de directiva são indicados as funções dos maquinistas, os requisitos de base, as habilitações profissionais e as aptidões físicas e mentais exigidas. A Comissão guiou-se, principalmente, pelo acordo dos parceiros sociais europeus relativo à instauração de uma carta de condução europeia para maquinistas.

3.2.6.2

O CESE congratula-se por a Comissão ter optado como orientação para a sua proposta as exigências físicas e mentais definidas pelos próprios parceiros sociais. Vê nisso uma garantia de elevado nível de qualificação em prol da segurança do transporte. Basicamente, o CESE considera que deverá ser a directiva a regulamentar a questão das habilitações indispensáveis e das condições de certificação dos maquinistas.

3.2.6.3

Eventuais alterações aos anexos serão efectuadas pelo comité dos representantes dos Estados-Membros, igualmente competente para emitir as Especificações Técnicas de Interoperabilidade (ETI). A Directiva «Interoperabilidade» prescreve a realização de uma consulta aos parceiros sociais sobre questões relacionadas com habilitações e medidas de protecção do trabalho e da saúde. Uma vez que os anexos à directiva relativa à certificação do pessoal de bordo se baseiam nas definições apresentadas pelos parceiros sociais europeus, seria lógico que estes participassem numa eventual alteração aos anexos. O CESE insiste na inserção, na directiva, de uma disposição nesse sentido.

3.2.7   Controlos periódicos

3.2.7.1

A conservação da carta europeia ou do certificado harmonizado está sujeita à verificação periódica de determinados conhecimentos.

3.2.7.2

No tocante aos exames médicos periódicos, a Comissão orientou-se pelo acordo dos parceiros sociais europeus.

3.2.7.3

Neste contexto, o CESE chama a atenção para a necessidade de um acompanhamento psicológico após acidentes ferroviários que envolvam pessoas (não são raros os casos de pessoas que cometem suicídio nas vias férreas), aspecto que não é abrangido pela directiva (nem no artigo 14.o, nem no Anexo III).

3.2.7.4

É demasiado imprecisa a redacção quanto à actualização periódica dos conhecimentos dos itinerários. Motivo por que se deve indicar, na directiva, que haverá perda gradual de conhecimentos se o maquinista não tiver circulado nas linhas durante mais de um ano, independentemente da certificação dos conhecimentos.

3.2.7.5

A directiva é omissa quanto à formação que visa a actualização periódica dos conhecimentos dos maquinistas, aspecto aliás regulamentado no acordo dos parceiros sociais europeus. O CESE recomenda que a directiva, tal como o acordo dos parceiros sociais, preveja que o desenvolvimento e a actualização das aptidões básicas se realizem com periodicidade anual.

3.2.8   Retirada da licença

3.2.8.1

A directiva preceitua que os maquinistas que deixarem de cumprir as condições necessárias ao exercício da actividade profissional desse facto notifiquem as autoridades competentes. Ora, isto equivale a uma autodenúncia, impossível de cumprir por parte dos maquinistas. Apenas um médico do trabalho acreditado pode tomar uma tal decisão e disso informar a empresa. A empresa, por sua vez, informará as autoridades.

3.2.8.2

A directiva não prevê disposições quanto ao procedimento de reatribuição de uma licença retirada.

4.   Proposta de directiva relativa à certificação do pessoal de bordo e o acordo dos parceiros sociais europeus para a criação de uma carta de condução europeia para maquinistas

4.1

O CESE felicita-se por os parceiros sociais CER/ETF terem tomado a iniciativa de prever para os sectores que lhes dizem respeito uma licença para os maquinistas que efectuam um serviço transfronteiras.

4.2

O acordo tem a vantagem de garantir imediatamente aos empregados das empresas membros da CER um elevado nível de qualificação, sem terem de esperar por 2010. Estas empresas não devem por isso ser prejudicadas em relação às que não aplicam o acordo.

4.3

Para o CESE, todos os pontos coincidentes do acordo dos parceiros sociais europeus e da directiva deverão ser tidos em conta.

4.4

O acordo dos parceiros sociais europeus parte do princípio de que os maquinistas abrangidos são titulares de uma certificação nacional, seja ela qual for, não regulamentando, portanto, este domínio. O que se baseia na longa experiência das empresas ferroviárias tradicionais em serviços de transporte assegurados em cooperação.

4.5

Segundo o acordo dos parceiros sociais, a carta de condução europeia para maquinistas é uma licença complementar que comprova os conhecimentos adicionais necessários para conduzir um comboio nas infra-estruturas de um outro país. É emitida pela empresa e é sua propriedade.

4.6

A proposta da directiva que visa a instauração de um certificado complementar harmonizado coincide, grosso modo, com o sistema da licença europeia para maquinistas.

4.7

O CESE insta a Comissão a examinar em que medida a carta europeia para maquinistas, prevista no acordo dos parceiros sociais, poderá ser transitoriamente equiparada ao certificado complementar harmonizado, a fim de apoiar as empresas que já tenham começado a tomar medidas. A directiva deveria conter uma disposição neste sentido.

4.8

Há um ponto para o qual o CESE chama a atenção: as empresas que aderiram ao acordo dos parceiros sociais são prejudicadas em relação às empresas que procedem à certificação nos termos da directiva, pois o acordo prevê uma formação contínua anual dos conhecimentos profissionais básicos. Esta disposição não foi retomada na proposta de directiva, embora seja essencial para que não se comprometa o nível de qualificação.

5.   Conclusões

5.1

O CESE é favorável à proposta de directiva relativa à certificação do pessoal de bordo. Lamenta, porém, que estas medidas sociais sejam apresentadas como o último elo de uma cadeia da legislação europeia sobre a liberalização dos serviços de transporte ferroviário de mercadorias.

5.2

Os maquinistas e o pessoal de acompanhamento exercem funções importantes para a segurança. A certificação destes elementos do pessoal deverá garantir um elevado nível de qualificação.

5.3

O CESE constata, com preocupação, que entre a abertura plena do mercado de transporte ferroviário de mercadorias e a entrada em vigor da certificação medeia um grande intervalo de tempo, solicitando à Comissão que aja no sentido de reduzir esse tempo.

5.4

Solicita, portanto, ao Conselho e ao Parlamento Europeu que retirem a proposta de directiva relativa à certificação do pessoal de bordo do Terceiro Pacote e a examinem separadamente, por forma a evitar mais atrasos. O Parlamento Europeu e o Conselho deverão dar prioridade a esta directiva e adoptá-la sem demora.

5.5

Neste contexto, deveria ser tido devidamente em conta o parecer emitido pelo CESE, incluindo as alterações nele propostas.

5.6

O CESE congratula-se com o acordo dos parceiros sociais europeus sobre determinados aspectos das condições de utilização do pessoal móvel empregado nos serviços de transporte ferroviário transfronteiras, insta a Comissão a apresentá-lo ao Conselho para decisão e recomenda ao Conselho que o adopte.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Directiva 2001/12/CE — JO L 75 de 15.3.2001, pág. 1 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22.7.1999, pág. 22.

(2)  Directiva 2001/13/CE — JO L 75 de 15.3.2001, pág. 26 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22.7.1999, pág. 22.

(3)  Directiva 2001/14/CE — JO L 75 de 15.3.2001, pág. 29 — Parecer do CESE, JO C 209 de 22.7.1999, pág. 22.

(4)  Directiva 2004/51/CE — JO L 164 de 30.4.2004, pág. 164 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14.3.2003, pág. 131.

(5)  Directiva 2004/49/CE — JO L 164 de 30.4.2004, pág. 44 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14.3.2003, pág. 131.

(6)  Regulamento (CE) n.o 881/2004 — JO L 164 de 30.4.2004, pág. 1 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14.3.2003, pág. 131.

(7)  Directiva 2004/50/CE — JO L 164 de 30.4.2004, pág. 114 — Parecer do CESE, JO C 61 de 14.3.2003, pág. 131.

(8)  JO C 61 de 14.03.2003, pág. 131.

(9)  Refira-se, contudo, que a troca de maquinistas e pessoal de bordo nas fronteiras demora apenas alguns minutos (por exemplo, oito minutos no túnel ferroviário de Brenner). Quanto ao transporte de mercadorias, as paragens nas fronteiras devem-se a outros factores, tais como verificação de documentos, controlo dos veículos, etc..

(10)  Por exemplo, a Áustria, a Dinamarca, os Países Baixos, a Alemanha e a Noruega.


ANEXO

ao parecer do Comité Económico e Social Europeu (n.o 3 do artigo 54.o do regimento)

A seguinte proposta de alteração, que recolheu um número de votos favoráveis que representam pelo menos um quarto dos sufrágios expressos, foi rejeitada:

Suprimir o ponto 3.2.3.3.

Justificação

A proposta de directiva prevê uma certificação em duas fases:

carta de condução europeia válida em toda a União Europeia;

certificado complementar harmonizado que comprova as habilitações específicas relacionadas com a empresa ou as infra-estruturas.

A proposta contém igualmente disposições quanto à alteração e renovação da carta de condução, sobre os certificados complementares harmonizados e quanto ao controlo periódico das condições mínimas exigidas.

O objectivo do certificado complementar harmonizado é verificar as aptidões dos maquinistas e os seus conhecimentos sobre a(s) linha(s) em questão.

Não se justifica, portanto, exigir adicionalmente, para o tráfico internacional, a comprovação de três anos de experiência profissional, a acrescer, segundo a redacção deste ponto, aos dois anos eventualmente exigidos para o transporte nacional, como condição para passar da categoria de maquinistas de locomotivas de manobra para as categorias de maquinistas de locomotivas destinadas ao transporte de passageiros ou mercadorias.

Uma regra deste tipo, que acaba por exigir cinco anos de experiência profissional, significaria uma desvalorização do certificado complementar harmonizado, indo contra o desejo de promover a interoperabilidade nos serviços transfronteiriços. O resultado seria um bloqueio do desenvolvimento e do reforço das relações transfronteiriças no domínio ferroviário.

Por último, não se entende porque motivo se deve colocar exigências diferentes à condução de uma locomotiva numa linha em território nacional ou numa linha internacional, visto que o certificado complementar harmonizado já comprova as competências e os conhecimentos sobre os itinerários.

Em face do exposto, o ponto 3.2.3.3 parece destituído de fundamento e deveria ser suprimido.

Resultado da votação:

A favor: 59

Contra: 100

Abstenções: 11


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/71


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho relativo à aplicação de um sistema de preferências pautais generalizadas»

COM(2004) 699 final — 2004/0242 (CNS)

(2005/C 221/15)

Em 10 de Novembro de 2004 o Conselho decidiu, em conformidade com o artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção de Relações Externas emitiu parecer em 12 de Janeiro de 2005, sendo relator A. PEZZINI.

Na 414.o reunião plenária, realizada em 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 132 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

O Regulamento do Conselho (CE) n.o 2501/2001 de 10 de Dezembro de 2001 (1), que aplica um sistema plurianual de preferências pautais generalizadas (SPG) expirará em 31 de Dezembro de 2005. Em Julho de 2004, a Comissão adoptou orientações (2) sobre o SPG para o próximo período de dez anos, de 1 de Janeiro de 2006 até 31 de Dezembro de 2015. Publicou agora a sua proposta (3) de regulamento relativo à aplicação.

1.1.1

Em 1994, as orientações anteriores (4) para o período 1994-2005, e os respectivos regulamentos de aplicação introduziram diversas alterações importantes, tais como a modulação de tarifas para produtos sensíveis, graduação e regimes especiais de incentivo. Em 2001, introduziu-se um regime especial para os Países Menos Desenvolvidos (PMD), «Tudo excepto armas», ilimitado no tempo. A experiência demonstra que algumas destas medidas funcionam bem na prática e deveriam ser continuadas, enquanto outras requerem ajustamentos à luz da experiência adquirida.

1.1.2

Desde 1971, a Comunidade concede preferências comerciais aos países em desenvolvimento, no âmbito do seu SPG. A política comercial desempenha um importante papel nas relações da UE com o resto do mundo. O SPG faz parte dessa política e deve ter coerência, bem como deve consolidar os objectivos da política d desenvolvimento. Para tal, deve obedecer às exigências da OMC e, em particular, à cláusula de habilitação GATT de 1979. Deverá ser igualmente compatível com a Agenda de Desenvolvimento Doha. Uma importante prioridade consiste em ajudar os países em desenvolvimento a beneficiarem da globalização, através da interligação do comércio com o desenvolvimento sustentável. Entende-se, neste contexto, que o desenvolvimento sustentável compreende uma série de aspectos, tais como o respeito dos direitos humanos fundamentais, a boa governação e a protecção do ambiente. Além disso, a luta contra a droga é uma responsabilidade partilhada por todos os países.

1.2

Desde a sua publicação, a Comissão empreendeu largas consultas sobre as orientações para o próximo período de dez anos. Todavia, e em virtude das necessárias estatísticas especializadas, as avaliações de impacto foram efectuadas internamente. Á entrada em vigor do regulamento, a Comissão efectuará uma avaliação do impacto nas regiões ultraperiféricas da UE.

1.3

Não se prevê que as alterações apresentadas na proposta impliquem uma mudança considerável na perda anual de direitos aduaneiros, em comparação com a situação actual.

2.   As propostas da Comissão

2.1

As propostas constituem uma simplificação do sistema actual, diminuindo os regimes de cinco para três; tal se conseguiu através da introdução de um único regime de incentivo, em substituição dos actuais três regimes especiais de incentivo à protecção dos direitos dos trabalhadores, protecção do ambiente e luta contra a produção e o tráfico de droga. Assim, o sistema proposto implica:

Um regime geral;

Um regime especial de incentivo para o desenvolvimento sustentável; e

Um regime especial para os países menos desenvolvidos.

2.2

Uma outra medida de simplificação consistiria em retirar da lista dos beneficiários os países com acesso preferencial ao mercado da UE com base num acordo bilateral, regional ou em acordos de comércio livre (ACL). A Comunidade certificar-se-á que os países afectados por esta mudança não sejam prejudicados, já que as vantagens SPG de todos os produtos que beneficiavam anteriormente deste regime deverão ser consolidadas no ACL em questão.

2.3

As preferências continuarão a variar em função da sensibilidade dos produtos. Os direitos aduaneiros sobre produtos considerados não sensíveis continuariam suspensos, com excepção dos componentes agrícolas. Mantém-se a actual redução fixa de 3,5 pontos percentuais para os produtos sensíveis.

2.4

O regime geral deve ser concedido a todos os países beneficiários, excepto os classificados como países de elevado rendimento pelo Banco Mundial durante três anos consecutivos, e quando as cinco maiores secções das suas exportações para a Comunidade abrangidas pelo SPG representarem menos de 75 % do total das suas exportações para a Comunidade abrangidas pelo SPG. Esses países actualmente beneficiários ao abrigo do regime SPG seriam retirados do sistema à entrada em vigor do regulamento proposto. Quando um país beneficiário beneficia de um acordo comercial com a Comunidade que abranja, pelo menos, todas as preferências previstas pelo presente sistema para esse país, será excluído da lista de países beneficiários.

2.5

O regime especial de incentivo ao desenvolvimento sustentável é concedido aos países em desenvolvimento mais vulneráveis. As preferências adicionais são imediatamente concedidas (após requerimento) aos países em desenvolvimento que tenham ratificado e efectivamente aplicado as 16 principais convenções sobre direitos humanos e dos trabalhadores, referidas no Anexo I, e pelo menos 7 das convenções relativas à boa governança e à protecção do ambiente, referidas no Anexo II. Simultaneamente, os países beneficiários estão a comprometer-se eles próprios a ratificar e aplicar efectivamente as convenções internacionais por eles ainda não ratificadas. Este processo deve ser cumprido até 31 de Dezembro de 2008.

2.5.1

As convenções consideradas são também as que comportam mecanismos que as organizações internacionais pertinentes podem utilizar para avaliar periodicamente a eficácia da sua aplicação. A Comissão terá em conta essas avaliações antes de decidir quais os países candidatos que serão seleccionados para beneficiar deste regime de incentivo. Com base nos pedidos dos países em desenvolvimento, a Comissão elaborará então uma lista dos beneficiários do regime.

2.5.2

Os países interessados em beneficiar do regime de incentivo deverão apresentar um pedido nesse sentido no prazo de três meses subsequente à data de publicação do regulamento.

2.5.3

Os países requerentes devem ser países vulneráveis. Entende-se por país vulnerável um país que não seja classificado pelo Banco Mundial como um país de elevado rendimento e cujas exportações para a Comunidade abrangidas pelo SPG representem menos de 1 % do total das exportações para a Comunidade abrangidas pelo SPG.

2.6

A proposta inclui medidas para reduzir o impacto no país beneficiário quando as Nações Unidas o retirarem da lista de países menos desenvolvidos. Tal se traduz num período de transição para a retirada gradual do país da disposição TMA (tudo menos armas). Actualmente, o país em questão perde automaticamente todas as vantagens do SPG de que beneficiava na sua qualidade de país menos desenvolvido. O novo mecanismo permite a retirada progressiva de um país do regime TMA.

2.7

Mantém-se o mecanismo de graduação, que foi objecto de simplificação. Actualmente, a graduação deve ser aplicável a grupos de produtos de países que são competitivos no mercado comunitário e que já não necessitam do SPG para promover as suas exportações, mas os critérios actuais (parte nas importações preferenciais, índice de desenvolvimento, índice de especialização em matéria de exportação) foram substituídos por um critério único e simples: a parte do mercado comunitário, expressa em percentagem das importações preferenciais. Os grupos de produtos são definidos tomando como referência as «secções» da Nomenclatura Combinada. Uma vez que só são graduados países competitivos em relação a todos os produtos de uma secção, os pequenos países beneficiários não foram graduados apenas com base num número restrito de produtos competitivos de uma secção.

2.7.1

A graduação seria aplicável a qualquer país beneficiário cujos produtos pertencentes a uma secção se a média comunitária das importações de produtos incluídos nessa secção originárias desse país exceder durante três anos consecutivos 15 % das importações comunitárias desses mesmos produtos originárias de todos os países. Em relação a determinados produto têxteis o limiar é de 12,5 %.

2.8

Se a taxa de um direito ad valorem reduzido ao abrigo do presente título for igual ou inferior a 1 %, esse direito é suspenso na sua totalidade. Do mesmo modo, se a taxa de um direito específico reduzido ao abrigo do presente título for igual ou inferior a 2 euros para cada montante calculado em euros, esse direito é suspenso na sua totalidade.

2.9

A proposta inclui medidas no sentido de que os regimes preferenciais podem ser temporariamente suspensos relativamente a todos ou a alguns produtos, originários de um país beneficiário, em certas circunstâncias específicas. Essas medidas não são consideravelmente diferentes da situação actual. A Comissão assinala que estas disposições só serão aplicadas em circunstâncias excepcionais.

2.9.1

Se um produto originário de um dos países beneficiários for importado em condições que provoquem ou possam provocar dificuldades graves a um fabricante comunitário de produtos similares ou directamente concorrentes, podem ser restabelecidos relativamente a esse produto, em qualquer momento, os direitos da pauta aduaneira comum a pedido de um Estado-Membro ou por iniciativa da Comissão.

2.10

Na aplicação do, a Comissão é assistida por um Comité das Preferências Generalizadas, composto por representantes dos Estados-Membros e presidido pelo representante da Comissão. O Comité analisará os efeitos do sistema comunitário de preferências pautais generalizadas com base num relatório da Comissão, mas, em particular, estaria envolvido na determinação da elegibilidade de um país requerente para adesão ao regime especial de incentivo ao desenvolvimento sustentável, da suspensão temporária dos benefícios, no restabelecimento das pautas aduaneiras comuns em casos de prejuízo para um produtor comunitário, e no estabelecimento de períodos de transição para países afectados pela perda dos benefícios TMA em virtude da sua retirada da lista de PMD pelas Nações Unidas.

3.   Observações na generalidade

3.1

O SPG é um importante elemento da política de comércio externo da UE, com amplas repercussões; influencia de modo considerável os acontecimentos no mundo em desenvolvimento, tem impacto no orçamento da UE, afecta as relações com os parceiros comerciais da UE em organizações tais como a OMC, e tem consequências consideráveis para a indústria comunitária, em particular a indústria transformadora. É uma das poucas matérias geridas ao nível comunitário de maneira mais federal do que não-federal; a Comissão tem uma competência exclusiva neste domínio. A globalização aumentou a importância do SPG; a UE tem recorrido a este regime para ajudar os países em desenvolvimento a tirarem partido do processo de globalização. Tem, simultaneamente, este mesmo regime permitido promover a prática de desenvolvimento sustentável através da concessão de acesso preferencial ao mercado comunitário aos países que respeitam os princípios fundamentais dos direitos humanos.

3.2

Quando a Comissão publicou as orientações (5) que estão na base da presente proposta, o CESE emitiu um parecer (6) em que fazia observações na especialidade sobre as questores levantadas. Considerava, no parecer, que a simplificação do sistema deveria ser um dos objectivos principais. Assim, acolhia com agrado as medidas propostas pela Comissão no sentido de simplificar a estrutura. Considerava, em particular, que a redução dos regimes de cinco para três contribuiria para atingir facilmente aquele objectivo.

3.3

Apelava igualmente para a redução do número de países participantes (7) e propunha, inter alia, a exclusão de países que actualmente beneficiam de acesso preferencial ao abrigo de acordos de comércio livre, garantindo a salvaguarda dos benefícios do actual SPG nos acordos bilaterais. Congratula-se com a adopção desta recomendação.

3.4

O CESE manifestava preocupação (7) pelo facto de que uma parte indevida do benefício estava a ir parar aos países que menos precisam dele, e não aos países mais carenciados. Constata, com agrado, que a Comissão tratou esta questão, mas interroga-se se as propostas vão na boa direcção.

3.5

O CESE recomendava (7) que o sistema de graduação fosse mantido, mas que fosse mais simples e mais transparente. Aprovou as propostas da Comissão nesta área e considerava que contribuiriam para melhorar o sistema nos dois aspectos. A substituição, em particular, por um critério único e claro do actual sistema de critérios múltiplos contribuiria para simplificar o processo e para aumentar a sua transparência.

3.6

O CESE instava (7) a que se aproveitasse a oportunidade para harmonizar, unificar e racionalizar todas as regras e procedimentos do SPG nas novas orientações. Em sua opinião, as presentes propostas vão no bom sentido para atingir o objectivo.

3.7

O CESE considerava (7) que a Comissão devia apresentar uma avaliação pormenorizada do impacto com as suas propostas relativas às novas orientações. Lamenta que tal não tenha sido feito e assinala que efectuar uma avaliação do impacto nas regiões ultraperiféricas da UE após a aplicação seria inútil, a não ser que se pretenda alterar o sistema à luz da avaliação, o que contrariaria a exigência de estabilidade dos regulamentos no tempo. Um clima de incerteza não se coaduna com o funcionamento satisfatório do SPG.

3.8

O CESE aprova a ideia de incluir na definição de «desenvolvimento sustentável» o respeito dos direitos humanos, a protecção dos direitos dos trabalhadores, a protecção do ambiente, a boa governação e a luta contra a produção e o tráfico de droga.

3.9

O CESE reconhecia (7) que os actuais regimes de incentivo tinham sido ineficazes para atingir os objectivos pretendidos. Só dois países foram incluídos nos regimes especiais de incentivo à protecção dos direitos dos trabalhadores e nenhum país foi incluído nos regimes especiais de incentivo à protecção do ambiente; entretanto, doze países beneficiaram do incentivo especial de luta contra a produção e o tráfico de drogas, sem que se verificasse um efeito perceptível na incidência destas actividades.

3.9.1

O CESE considera que as novas propostas, introduzindo embora uma boa medida de simplificação no processo, não terão grandes possibilidades de atingir maior eficácia. A amplitude do incentivo não foi aumentada, e não há razão para pensar que os novos regimes contribuirão para induzir os países beneficiários ao cumprimento dos princípios e prática de desenvolvimento sustentável. Perante a exigência de ratificação de 27 convenções internacionais, aqueles países poderão preferir prosseguir as suas vias e renunciar aos benefícios oferecidos.

3.9.2

Em virtude da dificuldade de oferecer um incentivo adequado no âmbito de uma redução contínua das barreiras pautais, poder-se-ia ponderar a possibilidade de aliar o cumprimento destas convenções ao fornecimento de assistência ao desenvolvimento.

3.10

O CESE constata que todas as convenções cujo cumprimento se exige dos países requerentes são as que têm mecanismos que as «organizações internacionais relevantes» podem utilizar para efectuarem uma avaliação regular da sua efectiva aplicação. O CESE preconiza que os parceiros sociais tenham um papel nesta avaliação.

3.11

O CESE constata que as condições de suspensão temporária dos benefícios diferem pouco das actuais. Uma vez que foram invocadas apenas num só caso (Myanmar), que representa um exemplo flagrante de desprezo pelas convenções internacionais, pode-se levantar a questão da sua utilidade para a promoção do desenvolvimento sustentável. Uma sanção aplicada em circunstâncias tão raras terá pouco efeito dissuasivo. O CESE preferiria uma aplicação alargada deste mecanismo para o reforço dos regimes especiais de incentivo na promoção do desenvolvimento sustentável, os quais correm o risco de cair em desuso.

3.12

O CESE pergunta se o novo sistema terá um efeito mais dissuasivo de fraude do que o sistema que vem substituir. Seria preferível uma abordagem mais proactiva desta questão. Preferiria, em particular, a criação de mecanismos de cooperação mais estreita entre órgãos na UE e respectivos homólogos nos países beneficiários. É difícil evitar a conclusão de que, neste domínio, a Comissão adoptou uma política de festina lente.

3.13

O CESE constata, com agrado, que a Comissão, antes de formular estas propostas, efectuou vastas consultas, tanto na UE como nos países beneficiários.

3.14

O CESE constata que a Comissão continuará a contar com a assistência do Comité das Preferências Generalizadas para a gestão do SPG, no quadro do procedimento de «comité de regulamentação».

4.   Observações na especialidade

4.1

O CESE constata que os países a excluir do regime geral serão os que foram classificados pelo Banco Mundial como países de rendimento elevado e cujas exportações não são suficientemente diversificadas. Em sua opinião, será limitado o número de países que cumprem estes critérios. Propôs (7) que as novas orientações deveriam excluir, inter alia, a participação de países que têm um programa de armas nucleares e de países que são paraísos fiscais. Deplora que muitos destes países continuam a figurar na lista de beneficiários.

4.2

Um dos critérios para inclusão no regime de incentivo especial ao desenvolvimento sustentável é o de que um país seja um «país vulnerável». O n.o 2 do artigo 9.o define um país vulnerável como um país não excluído do regime geral nos termos referidos no ponto 4.1 supra, ou cujas exportações para a Comunidade abrangidas pelo SPG representem menos de 1 % do total das exportações para a Comunidade abrangidas pelo SPG. O CESE considera que esta redacção deveria ser modificada substituindo a palavra «ou» por «e» (na versão inglesa); caso contrário, o artigo teria um efeito que, decerto, não se pretendia.

4.3

O CESE assinalou (7) que, no sistema em vigor, o período de referência utilizado para actualizar a graduação se afasta demasiado do momento da actualização efectiva. Assim, acolhe com agrado o facto de que, no futuro, a graduação de uma secção no que respeita a um país beneficiário deve ser aplicada se essa secção satisfizer os critérios de graduação durante três anos consecutivos, que é o período de referência para qualquer país e secção.

4.4

O CESE apoia a proposta da Comissão Europeia de manter a cumulação regional, na acepção do Regulamento (CEE) n.o 2454/93, sempre que um produto utilizado numa posterior fabricação num país que pertença a um grupo regional for originário de outro país do grupo que não beneficie dos regimes aplicáveis ao produto final, desde que ambos os países beneficiem de cumulação regional para esse grupo. Desejaria assinalar que, no passado, estas disposições prestaram-se a um nível considerável de manipulação fraudulenta.

4.5

O CESE reitera a sua opinião (7) de que as regras de origem aplicadas às trocas comerciais preferenciais deveriam ser simplificadas, e que se deveriam reduzir os ónus de conformidade para os importadores comunitários, e gostaria que essas regras fossem substituídas por regras novas à imagem das que actualmente regem os bens não-preferenciais.

4.6

O CESE reitera o seu apelo (8) ao diálogo entre a UE e os PMD para melhorar as regras de aplicação das disposições especiais para os PMD, em determinados casos específicos, em particular mediante uma adaptação do período de transição.

4.7

O CESE acolhe com agrado a proposta de suprimir totalmente os direitos sempre que do tratamento preferencial resultem direitos ad valorem iguais ou inferiores a 1 % ou direitos específicos iguais ou inferiores a 2 euros. Considera que esta medida representa uma simplificação considerável.

4.8

O CESE constata que o período de suspensão é limitado a três meses e pode ser prorrogado uma vez. A Comissão pode prorrogar este período nos termos dos artigos 3.o e 7.o da Decisão 1999/468/CE, como foi o caso de Myanmar. O CESE preferiria uma disposição segundo a qual a suspensão temporária, uma vez aplicada, poderia manter-se até que o país em causa eliminasse o motivo da suspensão vinculando-se ao cumprimento das convenções internacionais.

4.9

O CESE sente que o requisito de um país ou território para beneficiar do incentivo especial ao desenvolvimento sustentável, ter de apresentar um pedido num prazo de três meses após a data da publicação do regulamento, é de certo modo oneroso e contraproducente em virtude do limite imposto. Poderá dar-se o caso de um número de países não poderem satisfazer os critérios dentro daquele prazo, o que poderá dissuadi-los de submeter um pedido. Após o termo do prazo estabelecido, esses países não teriam qualquer incentivo para ratificarem e aplicarem de modo efectivo as convenções internacionais constantes dos anexos 1 e 2. O CESE preferiria uma política de porta aberta para admissão desses países numa data ulterior, sob reserva do cumprimento dos critérios.

4.10

O CESE assinalou (7) que o SPG é um dos elementos da política comercial da UE, e que, como tal, tem de ser articulado com as demais componentes dessa política. Para uma maior coerência da política comercial, torna-se imperioso associar ao processo outras direcções-gerais da Comissão. Deveria haver, em particular, uma cooperação permanente e efectiva entre as direcções-gerais Comércio e Empresa.

4.11

O CESE considera aconselhável, em caso de perturbação grave dos mercados para os produtos inscritos no anexo I do Tratado, que a cláusula de salvaguarda também possa ser invocada a pedido de um Estado-Membro à Comissão, que consultará o respectivo comité de gestão.

4.12

De acordo com a proposta da Comissão, é de integrar no SPG, o regime especial para os países menos desenvolvidos (PMD), e de adoptar a regulamentação — inclusivamente a respeitante ao açúcar — nos termos do Regulamento 416/2001. Têm todo o fundamento os receios manifestados pelos PMD de que a reforma do regime do açúcar, que será acompanhada de uma redução maciça dos preços desencadeada pela abertura total a estes países do mercado comunitário a partir de 1 de Julho de 2009, lhes trará muito mais inconvenientes do que vantagens. O Comité remete, a este propósito, para o seu parecer sobre a proposta da reforma do sector do açúcar de 15 de Dezembro de 2004 (9), no qual convida a Comissão a negociar, em reacção ao desejo expresso pelos PMD, as quotas de importação preferencial do açúcar para o período posterior a 2009, com verificações periódicas que tenham em conta a relação entre a reforma do sistema do mercado comunitário do açúcar e os objectivos de desenvolvimento dos PMD. O CESE declara-se favorável à interdição da prática de operações de triangulação (SWAP).

4.13

De um modo geral, o Comité é de opinião que, para os produtos em causa, as modalidades de aplicação do n.o 1 do artigo 12.o deveriam ser claramente definidas no quadro das respectivas organizações comuns de mercado.

5.   Conclusões

5.1

O CESE preconizava a simplificação e transparência do sistema em vigor, e instava a aproveitar a oportunidade para harmonizar, unificar e racionalizar todas as regras e procedimentos do SPG. Considera que o sistema proposto representa uma melhoria concreta a este respeito e apoia as propostas da Comissão.

5.2

O CESE aprova a redução do número de países beneficiários, mas receia que a redução não atinja as proporções suficientes.

5.2.1

O CESE considera que o sistema de preferências generalizadas deve ser reservado aos países menos desenvolvidos e países mais necessitados para beneficiarem ao máximo do novo regime, por isso o limiar de graduação para os produtos têxteis e de vestuário deve ser baixado para 10 % (10).

5.3

O CESE considera que o novo regime especial de incentivo para promover o desenvolvimento sustentável terá pouco mais impacto no comportamento dos países beneficiários do que os que vem substituir.

5.4

O CESE está preocupado com a falta de tratamento efectivo da questão da fraude, e considera que se poderia fazer mais nesta matéria.

5.5

O CESE lamenta que não tenham sido publicadas avaliações de impacto pormenorizadas relativamente ao proposto e que, aparentemente, em certos casos, nem sequer tenham sido efectuadas.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO L 346 de 31/12/2001

(2)  COM(2004) 461 final.

(3)  COM(2004) 699 final.

(4)  COM(1994) 212 final.

(5)  Op cit.

(6)  Parecer do CESE de 25.02.2004 — J. O. C, de 30.04.2004.

(7)  Ibid.

(8)  CESE 1646/2004 — Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Criação de um modelo agrícola sustentável para a Europa através da PAC reformada — Reforma do sector do açúcar – COM(2004) 499 final

(9)  CESE 1646/2004 — Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Criação de um modelo agrícola sustentável para a Europa através da PAC reformada – Reforma do sector do açúcar — COM(2004) 499 final.

(10)  Art. 13.o da proposta de regulamento do Conselho (COM(2004) 699 final).


ANEXO I

Principais convenções da ONU — OIT relativas aos direitos humanos e aos direitos dos trabalhadores

1.

Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos

2.

Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais

3.

Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial

4.

Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres

5.

Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Punições Cruéis, Desumanos ou Degradantes

6.

Convenção sobre os Direitos da Criança

7.

Convenção para a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio

8.

Idade Mínima de Admissão ao Emprego (N.o 138)

9.

Interdição das Piores Formas de Trabalho das Crianças e Acção Imediata com vista à sua Eliminação (N.o 182)

10.

Convenção de Abolição do Trabalho Forçado (N.o 105)

11.

Convenção do Trabalho Forçado (N.o 29)

12.

Igualdade de Remuneração entre a Mão-de-obra Masculina e a Mão-de-obra Feminina em Trabalho de Valor Igual (N.o 100)

13.

Convenção sobre a Discriminação em matéria de Emprego e Profissão (N.o 111)

14.

Convenção sobre a Liberdade Sindical e a Protecção do Direito Sindical (N.o 87)

15.

Convenção sobre a Aplicação dos Princípios do Direito de Organização e Negociação Colectiva (N.o 98)

16.

Convenção Internacional para a Supressão e Punição do Crime de Apartheid


ANEXO II

Convenções relativas ao ambiente e aos princípios da governança

17.

Protocolo de Montreal relativo às Substâncias que Deterioram a Camada de Ozono

18.

Convenção de Basileia sobre o Controlo dos Movimentos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos e Sua Eliminação

19.

Convenção de Estocolmo sobre Poluentes Orgânicos Persistentes

20.

Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Extinção

21.

Convenção sobre a Diversidade Biológica

22.

Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança

23.

Protocolo de Quioto da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas

24.

Convenção Única das Nações Unidas sobre Estupefacientes (1961)

25.

Convenção das Nações Unidas sobre Substâncias Psicotrópicas (1971)

26.

Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Narcóticos e Substâncias Psicotrópicas (1988)

27.

Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (Convenção do México)


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/77


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria um procedimento de injunção de pagamento»

COM(2004) 173 final/3 — 2004/0055 (COD)

(2005/C 221/16)

Em 6 de Abril de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

A Mesa do Comité Económico e Social Europeu decidiu incumbir a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), designou relator-geral J. PEGADO LIZ e adoptou, por 73 votos a favor e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Objecto da Proposta

1.1

Com a Proposta de Regulamento com vista à criação de um procedimento judicial europeu de injunção de pagamento (1), a Comissão vem dar seguimento a uma série de iniciativas com vista à gradual realização e desenvolvimento de um espaço de liberdade, de segurança e de justiça, eliminando barreiras e promovendo a facilitação da tramitação processual civil a nível europeu, tal como definido, designadamente, no seu Plano de Acção aprovado pelo Conselho de Justiça e Assuntos Internos de 3 de Dezembro de 1998 (2).

1.2

A presente Proposta cumpre um dos objectivos centrais do Livro Verde de 20 de Dezembro de 2002 (3), sendo que o outro objectivo de criação de um procedimento europeu para acções de pequeno montante, está a ser objecto de tratamento separado pela Comissão.

1.3

No que agora respeita à criação de um procedimento europeu de injunção, a Comissão, tendo tomado em linha de conta os comentários e recomendações que sobre o referido Livro Verde proferiram quer o Parlamento Europeu, quer este Comité Económico e Social, apresenta um projecto de Regulamento com o objectivo de instituir um procedimento de injunção único em todo o espaço da União Europeia.

1.4

A sua justificação para esta iniciativa é fundada nas diferenças de regime do direito processual civil dos Estados-Membros, nos elevados custos daí resultantes e nas delongas que são consequência nos litígios transfronteiras, os quais assumem proporções exageradas, em especial nos processos para cobrança de créditos não contestados.

1.5

Entendeu a Comissão alargar a aplicação do procedimento de injunção único aos litígios internos, por razões de igualdade entre os sujeitos de direito e de não distorção da concorrência entre os operadores económicos, nesta orientação seguindo o Parecer do CESE proferido sobre o Livro Verde, mas assegurando a sua compatibilidade com os princípios da proporcionalidade e da subsidiariedade.

1.6

O carácter facultativo do procedimento de injunção é bem enunciado no articulado, seguindo, aqui também, a opinião expressa do CESE, podendo sempre o credor optar por outro procedimento, mais formal, de acordo com o seu direito interno.

1.7

Na formulação dos mecanismos processuais em vista, a Comissão orientou-se pelos seguintes princípios fundamentais:

a)

máxima simplicidade processual com utilização de formulários-tipo;

b)

não apreciação do mérito;

c)

desnecessidade de produção de prova;

d)

garantias suficientes de defesa do réu;

e)

ausência de recurso;

f)

força executiva;

g)

não obrigatoriedade de constituição de advogado;

1.8

A Comissão garante ainda a informação recíproca dos órgãos jurisdicionais competentes para emitir as injunções europeias nos diferentes Estados-Membros, informação que será periodicamente actualizada.

1.9

O Comité congratula-se com a indicação de que o Reino Unido e a Irlanda consideram a possibilidade de aderir a esta iniciativa, à semelhança do que tem acontecido em iniciativas semelhantes; em contrapartida o Comité teria apreciado que, para um melhor funcionamento do sistema agora proposto, a Dinamarca se não excluísse totalmente da aplicação do regulamento e espera que, no futuro, sejam ultrapassados os constrangimentos que dificultam a sua plena adesão a um espaço judiciário único europeu.

1.10

O âmbito da aplicação territorial da proposta poderá dar lugar a dificuldades no momento da sua aplicação. Para as obviar deveriam ser tidas em linha de conta as especificidades de certos territórios reflectidas no artigo 299.o do TCE e as responsabilidades que alguns Estados-Membros assumiram relativamente aos mesmos. É necessário precisar, nesse sentido, que independentemente do exercício concreto do procedimento de injunção, a designação dos respectivos organismos competentes deverá ser efectuada pela autoridade nacional que assuma a responsabilidade externa do Estado, avalizando, por conseguinte, a legitimidade dos ditos organismos.

2.   Antecedentes e Iniciativas Paralelas

2.1

De há muito que a preocupação pela uniformização e simplificação processual civil, como meio de garantir uma aplicação célere e eficaz da justiça, era patente em vários documentos das instituições comunitárias, desde o Parlamento Europeu (4) a este Comité Económico e Social (5).

2.2

Também a Comissão, fazendo-se eco destas preocupações, que eram geralmente veiculadas pelos operadores económicos, profissionais e consumidores, de há muito vinha reflectindo sobre as melhores vias a seguir, sendo particularmente interessantes os avanços dados no domínio pioneiro do direito do consumo (6).

2.3

Mas foi claramente com o «Livro verde relativo a um procedimento de injunção de pagamento e a medidas para simplificar e acelerar as acções de pequeno montante» que a questão foi equacionada em termos de possível iniciativa legislativa.

2.4

Esta iniciativa enquadra-se, no entanto, num conjunto de medidas de extraordinário relevo que têm vindo sucessivamente a ser tomadas ao nível da cooperação judiciária em matéria civil no decurso dos últimos anos (7).

2.5

Destaque merece, em particular, o Regulamento CE/805/2004 de 21 de Abril de 2004 que cria o Título Executivo Europeu para créditos não contestados (8), texto que, aliás, não pode deixar de estar presente na apreciação que se faça da actual Proposta da Comissão, na medida em que ambos constituem duas faces de uma mesma realidade — a necessidade de tornar simples e eficaz a aplicação da justiça civil num espaço judiciário único.

3.   Instrumento legal e base jurídica

3.1

À semelhança da generalidade das iniciativas tomadas neste domínio, a Comissão decidiu propor a utilização de um regulamento e fundou a sua proposta no artigo 61.o al. c) e 65.o do Tratado.

3.2

O CESE no seu Parecer, tinha-se pronunciado aberta e frontalmente pela adopção de um regulamento, pelo que não pode deixar de apoiar a escolha da Comissão.

3.3

Também quanto à base jurídica ela é, no seu entendimento, inteiramente correcta, correspondendo a uma interpretação não meramente formalista dos preceitos legais referidos, única consentânea com o objectivo da criação de um espaço judiciário único na U.E..

4.   Observações na Generalidade

4.1

O CESE saúda a apresentação da presente proposta de regulamento, a qual, como se referiu, deu acolhimento à generalidade das observações feitas por este Comité quando da apreciação do «Livro Verde relativo a um procedimento europeu de injunção de pagamento e a medidas para simplificar e acelerar as acções de pequeno montante» e procura acertadamente dar cumprimento ao direito consagrado no artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da U.E..

4.2

O CESE exorta a Comissão a ponderar a possibilidade desta Proposta de Regulamento ser alargada ao Espaço Económico Europeu.

4.3

A necessidade de criar um procedimento europeu para cobrança rápida de créditos não contestados está bem documentada nas respostas dos vários Estados-Membros ao referido Livro Verde, assim como a preocupação em garantir aos supostos devedores adequados direitos de defesa.

4.3.1

O CESE entende, no entanto, que a proposta da Comissão só teria a ganhar se fosse devidamente documentada com elementos estatísticos relativos à previsão dos casos de litígios, quer transfronteiriços, quer nacionais, que serão objecto do novo instrumento agora proposto e bem assim com uma análise de custos/benefícios relativamente à sua implementação — matéria em que a Exposição dos Motivos da Comissão é omissa.

4.4

O CESE, no seu parecer ao Livro Verde, afirma, nomeadamente «Ao conceber um procedimento europeu para acções de pequeno montante, deve-se procurar sobretudo adoptar as medidas mais adequadas para acelerar este tipo de litígios sem com isso pôr em causa as garantias legais das partes».

4.5

Ora, na opinião do CESE, a presente proposta de regulamento, embora necessite de ser objecto de uma cuidada e atenta revisão tendente a melhor a adequar aos seus objectivos, contempla, de uma forma equilibrada, estas duas necessidades: celeridade na cobrança e garantia dos direitos de defesa.

4.6

Apesar disso, o CESE chama a atenção para que importa ter em conta que a injunção não pode ser uma forma de encobrir procedimentos menos correctos por parte de certas empresas, designadamente, como forma de pressão ou de cobrança de créditos que resultem de desrespeito pelas regras de protecção dos consumidores; identicamente importa assegurar que, com o modelo adoptado, se não propiciem situações de conluio entre empresas situadas em Estados-Membros diferentes que, pela simulação de injunções não contestadas, efectuem transferencias pecuniárias de proveniência duvidosa e/ou mesmo criminosa, utilizando um meio legal para o branqueamento de dinheiro.

4.7

O CESE alerta, por outro lado, para o facto de um número significativo de processos de cobrança que entopem os tribunais, eventualmente até não contestados, estarem relacionados com publicidade agressiva e/ou enganosa que promove os seus produtos criando a convicção ao consumidor de que a sua compra e a sua utilização ou consumo não acarretam despesas acrescidas ou, quando acarretam, são irrelevantes nos orçamentos familiares.

4.8

Por isso, no entender do CESE, a presente proposta de regulamento representa apenas uma face de um problema mais vasto e complexo. Assim, exorta, uma vez mais, a Comissão a apresentar uma proposta legislativa que defina a responsabilidade dos fornecedores, na medida em que possam contribuir com certos comportamentos menos leais, para o endividamento excessivo das famílias (9).

4.9

A Comissão é de entendimento que o procedimento europeu de injunção agora proposto poderá coexistir com outros procedimentos de idêntica natureza e objectivo, constantes dos direitos nacionais dos Estados-Membros.

4.9.1

Ora, na opinião do CESE, só deverá existir um procedimento de injunção de pagamentos — o previsto e regulado pela proposta de regulamento em análise, o qual, por definição, não poderá deixar de ser considerado como o mais adequado às situações a que se aplica, sob pena de perder legitimidade — pelo que, com a adopção do presente regulamento, deverão desaparecer os procedimentos de injunção de pagamentos previstos em algumas legislações nacionais dos Estados-Membros.

4.9.2

A natureza facultativa deste procedimento de injunção deverá verificar-se apenas quanto a outros processos comuns e não quanto a procedimentos de injunção da mesma natureza e finalidade.

4.9.3

Pelo exposto, quer a Exposição de Motivos, quer o considerando 8, devem ser reformulados no sentido de prever, com clareza, a complementaridade do procedimento europeu de injunção de pagamentos apenas com outros processos comuns, sumários ou ordinários, e não com procedimentos nacionais de injunção da mesma natureza.

4.10

A proposta do Regulamento em análise utiliza amiúde a expressão «devedor» para se referir ao destinatário do procedimento europeu de injunção de pagamento. Na opinião do CESE esta designação é incorrecta, dado que transmite a ideia de que o destinatário deste procedimento é um devedor, quando até ser dada força executiva à injunção de pagamento não há ainda, em rigor, um devedor, que pode nunca chegar a existir.

4.10.1

Assim, o CESE entende que a expressão «devedor» deve ser substituída por «requerido» em todos os artigos onde é referida, uniformizando-se, assim, esta designação na proposta de regulamento.

4.11

Todos os prazos constantes desta proposta de regulamento devem ser contados em dias e não em semanas, com definição precisa das regras da sua própria contagem e da sua suspensão ou interrupção (p.ex. férias judiciais, feriados, sábados e domingos, etc.), por razões óbvias de segurança jurídica, sugerindo-se que sejam adoptadas para o efeito as regras constantes dos artigos 80.o e seguintes do Regulamento Processual do Tribunal de Justiça.

4.12

Em direito processual são conceitos distintos o processo comum e o ordinário. Em vários Estados-Membros a distinção de base é entre o processo comum e o especial. É especial quando há, na lei um processo específico para determinados litígios, é comum em todas as outras situações. Por sua vez, o processo comum pode ser ordinário, sumário ou sumaríssimo consoante o valor da causa.

4.12.1

A proposta de regulamento utiliza a expressão processo ordinário sem o rigor enunciado. No art.o 2.o n.o 2 refere-se a processo ordinário por oposição a processo sumário. Nos art.os 6.o n.o 5, 8.o e 12.o refere-se a processo ordinário na acepção de processo comum.

4.12.2

Assim, as referências a processo ordinário constantes dos art.os 6.o n.o 5, 8.o e 12.o da proposta de regulamento devem ser substituídas por «processo comum».

5.   Observações na Especialidade

5.1   Art.o 2.o — Procedimento europeu de injunção de pagamento

5.1.1

A expressão «créditos pecuniários não contestados de montante específico e exigíveis» deve ser substituída pela expressão «créditos pecuniários não contestados de montante certo, líquido e exigível».

5.1.2

Com efeito, essencial para que um determinado crédito seja exequível, é que ele esteja determinado, seja líquido e exigível. Este tipo de conceito é muito preciso nos vários sistemas jurídicos pelo que deverá ser mantido para uma maior certeza jurídica na aplicação do direito.

5.2   Art.o 4.o — Requisitos para a emissão de uma injunção de pagamento europeia

5.2.1

No n.o 1, a frase «... se estão preenchidos os requisitos estabelecidos nos art.os 1.o, 2.o e 3.o ...» deverá ser alterada, dado que os art.os 1.o e 2.o não se referem propriamente a requisitos. O art.o 1.o define o âmbito de aplicação do regulamento, o art.o 2.o identifica o procedimento que o regulamento estabelece.

5.2.1.1

Assim, o CESE sugere a seguinte redacção: «... se estão preenchidas as condições e os requisitos estabelecidos nos art.os 1.o, 2.o e 3.o, respectivamente.»

5.2.2

O n.o 2 deste artigo atribui ao tribunal a faculdade de convidar o requerente a completar ou rectificar o requerimento.

5.2.2.1

O CESE convida a Comissão a analisar as vantagens de transformar esta faculdade numa obrigação pelo menos para os casos evidentes de erros grosseiros de preenchimento incompleto ou deficiente dos formulários, por razões de maior segurança jurídica e economia processual.

5.2.2.2

Por outro lado, a proposta de regulamento deveria prever um prazo definido, necessariamente curto, para o requerente dar cumprimento ao convite do tribunal. Findo esse prazo, sem que o requerente tenha aperfeiçoado o requerimento, este seria liminarmente rejeitado.

5.3   Art.o 5.o — Rejeição do Requerimento

5.3.1

Processualmente, nos termos gerais, a decisão de rejeição do requerimento de injunção poderia ser atacada por impugnação ou por recurso. Ora, o que se pretende com o n.o 2 deste art.o 5.o é que esta decisão não seja sindicável, seja qual for o meio processual utilizado.

5.3.2

Assim, dada a forma como este procedimento foi concebido e a sua natureza facultativa que, por isso, não impede a utilização de outros meios judiciais, o recurso torna-se desnecessário.

5.3.3

Nestes termos, deve ser acrescentada na parte final do n.o 2 deste artigo, a seguinte expressão: «ou recurso», para compatibilizar o que se dispõe no art.o 5.o com o que consta da Exposição de Motivos.

5.4   Art.o 6.o — Notificação de pagamento europeia

5.4.1

Prevê-se, na parte final do n.o 2 deste artigo, que, se se conhecer, com segurança, o endereço do requerido (como se referiu anteriormente a expressão «devedor» deverá ser substituída por «requerido»), são admissíveis modos de citação ou notificação que não forneçam prova de recepção pelo próprio devedor.

5.4.1.1

O CESE alerta a Comissão para o facto da expressão «conhecer com segurança o endereço do requerido» ser demasiadamente vaga para criar situações de grande incerteza jurídica com consequências penosas para os requeridos.

5.4.1.2

Existe em vários Estados-Membros a regra do domicílio convencionado, nos termos da qual, se a citação ou notificação for enviada para o domicílio convencionado, pelas partes no contrato, se presume recebida, dispensando, assim, a prova da recepção. A convenção do domicílio será suficiente para preencher o requisito do conhecimento com segurança? Julga-se que não.

5.4.1.3

Se conjugarmos esta regra, ou seja, a dispensa de citação ou notificação com prova de recepção pelo requerido com a da penhora dos bens, em sede de execução, antes da própria citação ou notificação dos executados, facilmente se pode chegar a uma situação em que o requerido só tome conhecimento da injunção quando lhe são penhorados os bens, em sede de execução.

5.4.1.4

Esta situação, grave e penosa para quem vê os seus bens penhorados sem ter tido oportunidade de se opor, é, na opinião do CESE, de evitar (10). Assim, o CESE propõe, na sequência do afirmado com insistência no Parecer sobre o Livro Verde já referido, que não seja possível a utilização de modos de citação e notificação que não forneçam prova de recepção pelo próprio devedor eliminando-se, por isso, a expressão «se não for conhecido com segurança o endereço do devedor» na parte final deste n.o 2 do art.o 6.o.

5.4.2

O prazo de três semanas referido na al. b) do n.o 3 do art.o 6.o deve ser alterado para o número de dias equivalente facilitando, assim, a contagem dos prazos.

5.4.3

É necessário especificar qual a natureza do prazo a que se refere o n.o 5 deste artigo 6.o. Assim, o CESE propõe que se acrescente a seguir a «prazo» a expressão «de prescrição», pelo menos na versão portuguesa e nas que a não contiverem.

5.4.4

No parecer sobre o Livro Verde já identificado o CESE recomendou à Comissão «a necessidade de estabelecer, no contexto deste instrumento jurídico, normas sobre as consequências da omissão» do dever de informação.

5.4.4.1

Na presente proposta nada se refere a este respeito, pelo que, o CESE novamente exorta a Comissão a prever tais normas.

5.5   Art.o 8.o — Efeitos da declaração de defesa

5.5.1

Na opinião do CESE não está claro na proposta de regulamento em análise que a partir do momento em que seja apresentada uma declaração de defesa o procedimento prosseguirá nos termos da lei civil de cada Estado-Membro sem que seja necessário qualquer outro impulso processual das partes.

5.5.2

Assim, no n.o 1 do art.o 8.o, a seguir a «procedimento prosseguirá», deve ser acrescentada a frase «automaticamente e sem necessidade de novo impulso processual».

5.6   Art.o 9.o — Injunção de pagamento europeia

5.6.1

Tal como referido quanto ao art.o 6.o, prevê-se, na parte final do n.o 2 deste artigo, que, se se conhecer com segurança o endereço do requerido (como se referiu anteriormente a expressão «devedor» deverá ser substituída por «requerido») são admissíveis modos de citação ou notificação que não forneçam prova de recepção pelo próprio devedor.

5.6.2

O CESE alerta a Comissão para o facto da expressão «conhecer com segurança o endereço do requerido» ser suficientemente vaga para criar situações de grande incerteza jurídica com consequências penosas para os requeridos.

5.6.3

Por essa razão, o CESE entende que se deve seguir neste local exactamente o que foi proposto para o artigo 6.o ou seja, que não seja possível a utilização de modos de citação e notificação que não forneçam prova de recepção pelo próprio devedor eliminando-se, por isso, a expressão «se não for conhecido com segurança o endereço do devedor» na parte final deste n.o 2 do art.o 9.o.

5.7   Art.o 11.o — Oposição contra a injunção de pagamento europeia

5.7.1

Aceitando a Comissão a sugestão do CESE de não admitir modos de citação ou notificação que não forneçam prova de recepção pelo próprio requerido deverá, em conformidade, ser eliminada a al. i) da al. a) do n.o 4 deste art.o 11.o.

5.7.2

A expressão «actue com celeridade» constante da parte final do n.o 4 deste art.o 11.o é muita vaga e susceptível de ser interpretada de formas muito diversas.

5.7.2.1

Assim, e de forma a reforçar a certeza e segurança jurídicas, o CESE sugere que a Comissão defina um prazo limite para exercício dos direitos previstos no n.o 4 do art.o 11.o.

5.8   Art.o 12.o — Efeitos da apresentação de uma declaração de oposição

5.8.1

Tal como foi referido quanto ao art.o 8.o, não está claro na proposta de regulamento em análise que a partir do momento em que seja apresentada uma declaração de defesa o procedimento prosseguirá nos termos da lei civil de cada Estado-Membro sem que seja necessário qualquer outro impulso processual das partes.

5.8.2

Assim, no n.o 1 do art.o 12.o a seguir a «procedimento prosseguirá» deve ser acrescentada a frase «automaticamente e sem necessidade de novo impulso processual».

5.9   Art.o 13.o — Representação Judiciária

5.9.1

Na opinião do CESE a dispensa de representação por advogado ou outro profissional forense pode admitir-se quando o valor do litígio for suficientemente diminuto para se justificar, de um ponto de vista económico, a contratação de tais profissionais.

5.9.2

No entanto, a proposta de regulamento em análise não define montantes máximos (ao contrário de algumas legislações de Estados-Membros) para este procedimento de injunção pelo que poderá ser utilizado para cobrar montantes elevados que, por exemplo, de acordo com a legislação dos vários Estados-Membros e no caso de existir oposição, obrigue a que sigam um processo ordinário.

5.9.3

Nestas situações não faz sentido que a intervenção do profissional forense se faça apenas quando da transição para o processo civil ordinário. Com efeito, ao requerido, ao preencher o formulário de resposta proposto, não é só exigido que diga se reconhece ou não a dívida mas, igualmente, se apresenta uma declaração de oposição em relação à totalidade da dívida ou, em relação só ao crédito principal, só aos juros ou só às despesas. Ora, ao preencher este formulário o requerido pode estar a prejudicar, inadvertidamente, a defesa que o advogado delinearia caso interviesse desde o início do procedimento de injunção.

5.9.4

Por outro lado, a dispensa de representação por profissionais forenses, pode constituir uma desvantagem quando estiverem em causa partes com estruturas muito desequilibradas (consumidores versus profissionais, grandes empresas versus empresas pequenas ou familiares).

5.9.5

Pelo exposto, o CESE aconselha a Comissão a ponderar a não dispensa de representação por advogado ou outro profissional forense a partir de um determinado montante (por exemplo 2.500 euros).

5.10   Art.o 14.o — Despesas

5.10.1

No entender do CESE deveria ser acrescentado um n.o 2 a este artigo com o seguinte texto: «O procedimento europeu de injunção de pagamento não tem custas se não existir declaração de defesa ou de oposição».

5.10.2

Dada a natureza não judicial do processo de injunção não contestado sugere-se, antes, a fixação de uma taxa única inicial, de montante reduzido, independentemente dos valores reclamados.

5.10.3

Quando assim se não entenda, deverá resultar claro do presente regulamento que são aplicáveis a este procedimento as disposições que, no direito interno de cada Estado-Membro, tenham procedido à transposição da Directiva 2003/8/CE de 27 de Janeiro de 2003, relativa ao apoio judiciário (11).

5.11   Formulários anexos

5.11.1

Todo o sistema agora proposto assenta na utilização de formulários que constituem os anexos 1 a 3 da proposta de regulamento em análise (12). O eficaz funcionamento dos procedimentos propostos passa, assim, pela correcta adequação dos formulários às funções a que se destinam.

5.11.2

Na aplicação dos formulários em conflitos transfronteiriços, o CESE tem justificadas dúvidas quanto à sua eficácia e praticabilidade.

5.11.3

Considere-se o seguinte exemplo: uma empresa italiana apresenta um requerimento de injunção de pagamento a um tribunal italiano contra um consumidor polaco. Em que língua vai o consumidor polaco receber a notificação de pagamento europeia? Em italiano? Em polaco? Na primeira hipótese, como é garantido que o consumidor percebeu o conteúdo da notificação de modo a poder decidir se apresenta uma declaração de defesa? Na última hipótese, de quem é a responsabilidade pela tradução da notificação?

5.11.4

Acresce ainda que os formulários em causa pressupõem que o requerente não só tem que assinalar os campos pré-definidos como também tem que escrever texto. Quem é responsável pela tradução desse texto? E quem certifica a sua conformidade?

5.11.5

O Regulamento n.o 1348/2000, de 29/05/2000 relativo à citação e notificação dos actos judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial nos Estados-Membros, não resolve as preocupações antes enunciadas dada a natureza pouco formal e célere do procedimento europeu de injunção ora em análise.

5.11.6

Com efeito, mesmo que o já referido e hipotético consumidor polaco receba a notificação de pagamento europeia na sua língua materna, em que língua vai responder? Quem vai traduzir do polaco para o italiano? Por outro lado, se não a receber em polaco irá, nos termos legais, recusá-la. Ora, em qualquer destas situações, estão criados entraves que põem em causa a celeridade do procedimento europeu de injunção.

5.11.7

Assim, o CESE exorta a Comissão a reflectir sobre a forma mais eficaz de garantir que os objectivos de celeridade de cobrança de dívidas e garantia de defesa do requerido não são prejudicados na utilização dos formulários em conflitos transfronteiriços.

5.11.8

O CESE entende igualmente que, com excepção dos Formulários de Resposta, todos os outros são demasiado complexos para serem preenchidos por pessoas que não tenham formação jurídica.

5.11.9

Com efeito, conceitos como «taxa de juro legal»; «% superior à taxa de base do BCE»; «causa de pedir»; «injunção de pagamento»; «força executiva», não são de fácil entendimento para leigos na matéria e, dado que a Comissão propõe a não obrigatoriedade de constituição de advogado (na opinião do CESE só até determinado valor reclamado) neste procedimento, necessário se torna acautelar que os verdadeiros utilizadores compreendam e saibam preencher os formulários em questão.

5.11.10

Por outro lado, pelo menos em Portugal, são conceitos distintos o arrendamento e o aluguer; arrendam-se imóveis e alugam-se móveis. Assim, pelo menos na versão portuguesa os pontos 8.2 do Requerimento de Injunção Europeia, e 9.3 da Notificação de Pagamento Europeia e da Injunção de Pagamento Europeia devem ser alterados para «Contrato de locação — bens móveis». Cuidado idêntico de correcção jurídica da terminologia utilizada deve ser tido nas várias versões linguísticas da Proposta, de acordo com os conceitos do direito civil de cada Estado-Membro.

5.11.11

Finalmente, os pontos 11 do Requerimento de Injunção Europeia, e 12 da Notificação de Pagamento Europeia e da Injunção de Pagamento Europeia são de muito difícil preenchimento para quem não tenha formação jurídica. O CESE sugere que esta questão seja analisada pelo tribunal através das moradas do requerente e do requerido.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2004) 173 final, de 19.03.04.

(2)  In JO C 19, de 23.01.99.

(3)  COM(2002) 746 final, de 20.12.02, sobre o qual foi produzido o Parecer, de que foi relator o conselheiro VON FUSTENWERTH (JO C 220, de 16.9.2003).

(4)  Cf. As Resoluções do PE A2-152/86 de 13.03.87, A3-0212/94 de 22.04.94 e A-0355/96 de 14.11.96.

(5)  Recordam-se, a propósito, designadamente, os Pareceres sobre o Livro Verde do Acesso dos Consumidores à Justiça, de que foi relator o ex-conselheiro M. Ataíde Ferreira (JO C 295 de 22.10.94) sobre Mercado Único e Defesa dos Consumidores: Oportunidades e Obstáculos no Grande Mercado, de que foi relator o conselheiro Ceballo Herrero (JO C 39 de 12.2.1996)

(6)  Cf. a propósito os seguintes documentos:

Memorandum da Comissão sobre «O acesso dos Consumidores à Justiça» [COM(84) 692 final de 12.12.1984] e «Comunicação Complementar» [COM(87) 210 final de 7.5.1987] in Suplemento ao Boletim das Comunidades Europeias 2/85.

Comunicação da Comissão «Novo Impulso para a Política dos Consumidores» [C0M(85) 314 final de 23.07.85] in JO C 160 de 1.7.1985.

Plano de Acção da Comissão de 14 de Fevereiro de 1996 [COM(96) 13 final].

Comunicação da Comissão «Para uma maior eficácia na obtenção e execução das decisões na União Europeia» [COM(97) 609 final de 22.12.1997, in JO C 33 de 31.01.98]

Livro Verde sobre o acesso dos consumidores à Justiça e a resolução dos litígios no Mercado Único, [COM(93) 576].

Livro Verde sobre os modos alternativos de resolução dos litígios em matéria civil e comercial [COM(2002) 196 final de 19.4.2002].

(7)  De que se destacam:

Recomendação da Comissão de 12 de Maio de 1995 relativa aos atrasos de pagamento nas transacções comerciais e Comunicação da Comissão a ela relativa respectivamente in JO L 127 de 10.6.95 e JO C 144 de 10.06.95.

Directiva 98/27/CE de 19.05.98 relativa às acções inibitórias (JO L 166/51 de 11.06.98)

Directiva 2000/35/CE de 29 de Junho sobre as medidas de luta contra os atrasos de pagamento em transacções comerciais in JO L 200, de 8.8.2000

Regulamento CE 44/2001 de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, o reconhecimento e a execução de decisões em matéria civil e comercial (Bruxelas I) in JO L 12 de 16.1.2001. O Parecer do CESE sobre o assunto foi da autoria do conselheiro Malosse in JO C 117 de 26.04.2000.

Regulamento CE/1206 de 28 de Maio de 2001 relativo à cooperação entre os órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros no âmbito da obtenção de provas em matéria civil e comercial in JO L 174 de 27.6.2001. O Parecer do CESE sobre este assunto foi da autoria do Conselheiro H.Bataller in JO C 139 de 11.5.2001.

Programa de medidas destinadas a aplicar o princípio de reconhecimento mútuo das decisões em matéria civil e comercial (in JO C 12 de 15.01.2001).

Regulamento CE 1346/2000 de 29 de Maio de 2000, relativo ao processo de insolvência, in JO L 160 de 30.06.2000. O Parecer do CESE sobre o assunto foi da autoria do conselheiro Ravoet in JO C 75 de 15.3.2000).

Regulamento CE 1347/2000 de 29 de Maio de 2000, relativo ao reconhecimento e execução de decisões em matéria matrimonial e de regulação do poder paternal; Idem. O Parecer do CESE sobre o assunto foi da autoria do conselheiro Braghin in JO C 368 de 20.12.1999.

Regulamento CE 1348/2000, de 29 de Maio de 2000, relativo à citação e à notificação de actos judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial ; Idem. O Parecer do CESE sobre o assunto foi da autoria do conselheiro H. Bataller in JO C 368 de 20.12.1999.

Decisão do Conselho de 28 de Maio de 2001, relativa à criação de uma rede judiciária europeia em matéria civil e comercial ; in JO L 174 de 27.06.2001. O Parecer do CESE sobre este assunto foi da autoria do conselheiro Retureau in JO C 139 de 11.5.2001;

Comunicação da Comissão relativa a um novo quadro jurídico para os pagamentos no mercado interno [COM(2003) 718 final de 2.12.2003]. O Parecer do CESE sobre esta matéria foi da autoria do Conselheiro RAVOET, in JO C 302. de 7.12.2004.

(8)  COM(2002) 159 final, in JO C 203 de 27.08.02. O Parecer do CESE sobre este assunto foi da autoria do conselheiro Ravoet in JO C 85 de 8.4.2003.

(9)  Cf. Relatório de Informação e Parecer do CESE sobre o Endividamento das Famílias, de que foi relator o conselheiro M. Ataíde Ferreira in JO C 149, de 21.6.2002.

(10)  O Regulamento n.o 805/2004 de 21 de Abril de 2004, que cria o título executivo europeu para créditos não contestados prevê no seu artigo 14.o a possibilidade da citação ou notificação sem prova de recepção pelo requerido não a considerando admissível se não for conhecido com segurança o endereço do requerido. Das várias situações previstas só as das alíneas c), d) e e) justificam as objecções levantadas pelo CESE quer no presente parecer quer no parecer sobre o Livro Verde respectivo.

(11)  In JO L 26/41 de 31/01/03.

(12)  O anexo 1 diz respeito ao Requerimento de Injunção de Pagamento Europeia referido no art.o 3.o da proposta de regulamento. O anexo 2 diz respeito à Notificação de Pagamento Europeia referida no art.o 6.o da proposta de regulamento e ao Formulário de Resposta – Notificação de Pagamento Europeia referido no art.o 7.o da proposta de regulamento. O anexo 3 diz respeito à Injunção de Pagamento Europeia referida no art.o 9.o da proposta de regulamento e ao Formulário de Resposta – Injunção de Pagamento Europeia referido no art.o 11.o da proposta de regulamento.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/87


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à protecção dos menores e da dignidade humana e ao direito de resposta em relação ao desenvolvimento da competitividade da indústria europeia de serviços audiovisuais e de informação»

COM(2004) 341 final — 2004/0117 (COD)

(2005/C 221/17)

Em 14 de Maio de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 157.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 17 de Janeiro de 2005, sendo relator J. PEGADO LIZ.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 73 votos a favor, 2 votos contra, o seguinte parecer:

1.   Súmula da proposta de recomendação

1.1

A Comissão, com a presente Proposta de recomendação que (1) incide sobre o conteúdo dos serviços audiovisuais e de informação e abrange todas as formas de difusão, desde a radiodifusão até à Internet, propõe-se dar seguimento ao 2.o relatório, de 12 de Dezembro de 2003, de avaliação dos resultados da implementação da Recomendação do Conselho de 24 de Setembro de 1998, relativa ao desenvolvimento da competitividade da indústria europeia de serviços audiovisuais e de informação, através da promoção de quadros nacionais conducentes a um nível comparável e eficaz de protecção de menores e da dignidade humana (2).

1.2

Os motivos determinantes invocados para a necessidade desta recomendação adicional são, por um lado, os desafios colocados pelos recentes desenvolvimentos tecnológicos, de que se destacam o aumento da potência e da capacidade de armazenamento dos computadores e o facto de as tecnologias de banda larga permitirem a distribuição de conteúdos, como sejam os vídeos nos telemóveis de 3.a geração (3), e, por outro lado, as preocupações manifestadas pelos cidadãos em geral e, em particular, pelos pais e responsáveis de educação, pela indústria e pelos reguladores, no que se refere à proliferação de conteúdos e comportamentos ilegais, lesivos e indesejáveis em todas as formas de teledifusão, desde a radiodifusão à Internet.

1.3

Conquanto a Comissão tenha competência própria para formular recomendações neste domínio, excluído do âmbito da harmonização legislativa, sempre que o considere necessário para garantir o funcionamento e o desenvolvimento do mercado comum, entendeu antes, no presente caso, envolver directamente o Conselho e o Parlamento Europeu na sua formulação e adopção.

Sendo objectivo da recomendação contribuir para o desenvolvimento da competitividade da indústria europeia do audiovisual e da informação através da promoção de um quadro nacional conducente a um nível comparável e eficaz de protecção dos menores e da dignidade humana, a Comissão é de parecer que o debate público alargado, consequência da intervenção do Parlamento Europeu, de um lado, e o empenhamento dos Estados-Membros reunidos em Conselho, do outro, são garantia de que o objectivo referido será mais facilmente atingido. Para esse efeito, a Comissão propõe, como base jurídica para a adopção da Recomendação, o art. 157.o do Tratado.

1.4

Na presente Proposta de recomendação, a Comissão pretende que o Parlamento Europeu e o Conselho recomendem aos Estados-Membros a criação de condições legais ou outras que propiciem um clima de cooperação que incentive o desenvolvimento dos serviços audiovisuais e de informação.

Para tal efeito, destaca quatro ordens de medidas com vista a:

a)

garantir a existência de um direito de resposta em todos os meios de comunicação, incluindo a Internet, sem prejuízo da possibilidade de adaptar a maneira como esse direito é exercido para ter em conta as particularidades de cada tipo de meio de comunicação;

b)

permitir aos menores uma utilização responsável dos novos serviços audiovisuais e de informação em linha, nomeadamente por uma maior sensibilização dos pais, educadores e professores para o potencial dos novos serviços e para os meios adequados de protecção dos menores, em particular através das competências relacionadas com os meios de comunicação ou de programas educativos nesse domínio;

c)

facilitar a identificação e o acesso a conteúdos e serviços de qualidade para menores, designadamente pelo fornecimento de meios de acesso nos estabelecimentos de ensino e nos locais públicos;

d)

incentivar a indústria a evitar e a combater qualquer tipo de discriminação baseada no sexo, raça ou origem étnica, religião ou crença, deficiência, idade ou orientação sexual em todos os meios de comunicação.

1.5

Mais entende a Comissão que o Parlamento Europeu e o Conselho devem recomendar às indústrias e às partes interessadas que

a)

desenvolvam iniciativas com vista a facilitar um acesso mais vasto dos menores aos serviços audiovisuais e de informação, com garantias de segurança e controle dos conteúdos dos programas, evitando simultaneamente conteúdos potencialmente lesivos, incluindo uma harmonização «ascendente» através da colaboração entre os organismos de auto-regulação e de co-regulação dos Estados-Membros e do intercâmbio de melhores práticas em várias questões, entre elas um sistema de símbolos descritivos comuns que auxilie os espectadores a avaliar o conteúdo dos programas;

b)

e evitem e combatam toda e qualquer forma de discriminação e promovam uma imagem diversificada e realista das competências e do potencial das mulheres e dos homens na sociedade.

1.6

Em anexo, a Proposta inclui algumas orientações indicativas para a aplicação, a nível nacional, de medidas destinadas a assegurar o direito de resposta em todos os meios de comunicação, dos quais se salientam:

a legitimidade independentemente da nacionalidade;

os prazos consentâneos com o exercício do direito;

a possibilidade do recurso a Tribunal.

2.   Antecedentes da proposta

2.1

A problemática da protecção dos menores contra conteúdos nocivos e do exercício do direito de resposta nas emissões televisivas aparece, pela primeira vez, no direito comunitário na Directiva do Conselho de 3 de Outubro de 1989 relativa à coordenação de certas disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros relativas ao exercício de actividades de radiodifusão televisiva (89/552/CEE) (4), alterada pela Directiva 97/36/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Junho de 1997 (5) (a chamada Directiva TV sem fronteiras).

2.2

No entanto, e como recorda a Comissão, o primeiro texto comunitário que pretendeu introduzir alguma regulamentação nos conteúdos dos serviços audiovisuais e de informação, foi a Recomendação de 24 de Setembro de 1998, na qual, refletindo o teor das considerações constantes do Livro Verde sobre a «Protecção dos Menores e da dignidade da pessoa humana nos serviços audiovisuais e de informação» de 16 de Outubro de 1996 (6) e as conclusões da Resolução sobre o conteúdo ilegal e lesivo na Internet, de 17 de Fevereiro de 1997 (7), avançou com uma série de recomendações aos Estados-Membros, à indústria e as partes interessadas, no sentido de, fundamentalmente através da auto-regulação, criarem um clima de confiança que incentivasse o desenvolvimento dos serviços audiovisuais e de informação assegurando um elevado nível de protecção dos menores e da dignidade humana.

2.3

Sobre este importante texto, o CESE, no seu Parecer de 29 de Abril de 1998 (8), depois de chamar a atenção para vários aspectos fundamentais relativos aos princípios, à natureza, ao alcance, ao âmbito e ao conteúdo de qualquer regulamentação que tenha em vista uma efectiva protecção dos menores e da dignidade humana nos meios de comunicação audiovisual, concluía, em síntese, preconizando uma abordagem harmonizada e integrada a nível internacional da regulamentação relativa aos serviços audiovisuais, ressaltando os aspectos dos sistemas de classificação e dos software de filtragem dos conteúdos, da clarificação das questões da responsabilidade pelos conteúdos ilícitos e lesivos, recomendando iniciativas ao nível da educação e da consciencialização de pais, encarregados de educação e professores, apelando a uma maior cooperação e coordenação entre as organizações europeias e internacionais e propondo a criação de um quadro europeu ou, de preferência, internacional, de códigos de conduta, directivas e medidas básicas para adequada protecção dos menores e da dignidade humana.

2.4

Depois deste primeiro texto, várias têm sido as iniciativas que, com idênticas preocupações, têm sido desenvolvidas a nível comunitário, pelo Conselho e pela Comissão (9).

2.5

Mas também o CESE tem desenvolvido várias iniciativas com idênticas preocupações. Destacam-se, a esse propósito:

a)

O Parecer sobre «Um Programa para a protecção da Infância na Internet» (10);

b)

O Parecer sobre a Comunicação da Comissão relativa aos Princípios e linhas directrizes da política audiovisual da Comunidade na era digital (11);

c)

Os Pareceres sobre as Propostas de Decisão 276/1999/CE e 1151/2003/CE, (respectivamente COM(1998) 518 final e COM(2002) 152 final) (12);

d)

O Parecer sobre a Proposta de Decisão do PE e do Conselho para uma utilização mais segura da Internet (COM(2004) 91 final de 12/03/2004) (13),

para cujas considerações e recomendações se remete.

3.   Observações na generalidade

3.1

O CESE congratula-se com a iniciativa da Comissão de aprofundar e desenvolver a Recomendação do PE e do Conselho de 24 de Setembro de 1998 à luz dos resultados do 2.o relatório de avaliação da sua aplicação nos aspectos essenciais como são a protecção dos menores e da dignidade humana, o combate às discriminações sociais em qualquer das suas formas e a garantia de existência de um direito de resposta em todos os ramos da comunicação, incluindo a Internet.

3.2

O CESE reconhece que, no estádio actual, o Tratado não confere competências próprias à União Europeia no âmbito da harmonização legislativa no domínio do audiovisual, mas não pode deixar de lamentar esse facto e de recomendar que essa situação seja objecto de reflexão em próxima revisão dos Tratados.

3.3

O CESE não pode deixar de considerar anómalo que, para a protecção dos menores e da dignidade humana, para a defesa da honra e da vida privada nos meios de comunicação na União Europeia, com a total abertura de fronteiras que é facultada pela Directiva TV sem Fronteiras, seja necessário invocar, como motivo determinante, não os direitos de personalidade em si mesmos, mas «o desenvolvimento da competitividade da indústria europeia de serviços audiovisuais e de informação». A protecção deste núcleo de direitos fundamentais do cidadão não pode ter um cariz meramente instrumental da realização do objectivo de desenvolvimento do mercado audiovisual.

3.4

O CESE reconhece, no entanto, que, com as referidas limitações legais, a melhor forma de prosseguir no aprofundamento das matérias em causa é a recomendação nos termos, em geral, formulada pela Comissão e subscreve a base jurídica sugerida pela Comissão para a presente recomendação (artigo 157.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia), idêntica, aliás, à base legal utilizada na Recomendação do Conselho, de 24 de Setembro de 1998, relativa ao desenvolvimento da competitividade da indústria europeia de serviços audiovisuais e de informação através da promoção de quadros nacionais conducentes a um nível comparável e eficaz de protecção dos menores e da dignidade humana (14), que é complementada pela presente proposta de recomendação e pela Decisão do Conselho, de 20 de Dezembro de 2000, relativa a um programa de incentivo ao desenvolvimento, à distribuição e à promoção de obras audiovisuais europeias (MEDIA Plus — Desenvolvimento, Distribuição e Promoção) (2001-2005) (15).

3.5

O CESE reitera o entendimento expresso no parecer (16) sobre a «Proposta de recomendação do Conselho relativa à protecção dos menores e da dignidade humana nos serviços audiovisuais e de informação» (98/C 214/07), no sentido de que o desenvolvimento da indústria europeia de serviços audiovisuais e de informação apenas poderá atingir o seu pleno potencial num clima de confiança, o qual, por sua vez, só poderá ser alcançado com a garantia da protecção dos menores e da dignidade humana.

3.6

O CESE reafirma igualmente o seu entendimento de que apenas com uma abordagem harmonizada e integrada a nível internacional da regulamentação relativa aos serviços audiovisuais será possível implementar eficazmente quaisquer medidas de protecção, em particular no que se refere aos aspectos dos sistemas de classificação e dos software de filtragem dos conteúdos, da clarificação das questões da responsabilidade pelos conteúdos ilícitos e lesivos, pelo que apela, de novo a uma maior cooperação e coordenação entre as organizações europeias e internacionais e renova a sua proposta da criação de um quadro internacional de códigos de conduta, directivas e medidas básicas para adequada protecção dos menores e da dignidade humana.

3.7

O CESE chama em particular a atenção para a definição do conceito de dignidade humana hoje constante da Carta dos Direitos Fundamentais da União e parte integrante do Projecto de Constituição Europeia (artigo I-2), e para a necessidade de, no âmbito da presente proposta de Recomendação, tal conceito ser entendido em estrita consonância com a noção e o conteúdo que tem na mencionada Carta.

3.8

O CESE entende que a efectiva protecção dos menores e da dignidade humana no contexto do desenvolvimento tecnológico da indústria de serviços audiovisuais e de informação requer, nomeadamente, a promoção da literacia para os meios de comunicação «para que os consumidores possam utilizar os meios de comunicação orientando-se pelos valores da sociedade e desenvolver uma capacidade de discernimento neste domínio» (17).

3.9

No domínio específico da Internet, o CESE considera essencial a articulação de políticas e medidas que promovam a literacia e a segurança na utilização da Internet por menores revendo-se, assim, nas conclusões do Fórum Europeu sobre Conteúdos Ilegais organizado pelo Conselho da Europa em 28 de Novembro de 2001 (18).

3.10

O CESE reitera o apoio às práticas de auto-regulação, quando eficazes, e salienta a importância do recurso a modelos de co-regulação dado parecerem especialmente eficazes em relação à aplicação das regras em matéria de protecção dos menores, tal como foi expressamente referido na Comunicação da Comissão «O futuro da política europeia de regulação audiovisual», de 15 de Dezembro de 2003 (19).

3.11

Sem prejuízo da importância decisiva e estrutural de iniciativas que promovam a literacia para os meios de comunicação, o CESE encara de forma positiva o eventual estabelecimento de critérios comunitários para a descrição e identificação dos conteúdos audiovisuais ressalvando, porém, e atendendo às especificidades culturais, a apreciação dos conteúdos para os planos nacional ou regional.

3.12

O CESE manifesta o seu apoio em relação à generalidade das inovações e dos desenvolvimentos muito positivos da nova iniciativa da Comissão, que representam avanços significativos em relação à sua anterior Recomendação, de que ressalta:

a)

a referência, no ponto I (2), primeiro traço, às competências relacionadas com os meios de comunicação e aos programas educativos;

b)

o apelo positivo ao «incentivo ao combate» de toda e qualquer forma de discriminação, para além da mera noção passiva de «evitar» essa discriminação, no ponto I (3);

c)

a ideia de uma harmonização «ascendente» através da colaboração entre os organismos de auto-regulação e co-regulação dos Estados-Membros e do intercâmbio de melhores práticas, entre as quais o sistema de «símbolos descritivos» para avaliação do conteúdo dos programas (ponto II (1));

d)

e, em particular, a recomendação para a consagração de um direito de resposta em todos os meios de comunicação, incluindo a Internet, assumindo que o mesmo direito é aplicável também ao conteúdo das publicações/transmissões das Instituições Comunitárias.

3.13

O CESE entende, contudo que teria sido possível ir mais além no sentido preconizado, que passa a enunciar.

4.   Observações na especialidade

4.1   A protecção de menores

4.1.1

Não são apenas os menores que necessitam de uma especial protecção face a certos conteúdos lesivos e prejudiciais, marcados em especial pela violência, a pornografia e a pedofilia — será também o caso de outros públicos mais sensíveis ou vulneráveis, como os idosos ou os diminuídos psíquicos — pelo que, no âmbito da recomendação, deveriam igualmente ser tidos em conta.

4.1.2

Vários aspectos relativos à protecção de menores, suscitados pelo CESE no seu recente Parecer sobre a Proposta de decisão que institui um Programa comunitário plurianual visando promover uma utilização mais segura da Internet (20) devem ser considerados como desejáveis recomendações aos Estados-Membros, a integrar na presente Proposta de Recomendação, como sejam, em particular:

a)

uma maior formação e informação sobre os meios de garantir uma maior segurança na utilização da Internet;

b)

a responsabilização dos fornecedores de espaços e de acessos e a sua obrigação de acatar de imediato qualquer decisão de autoridade legítima que ordene a cessação de transmissão de programas ou de conteúdos ilegais, nocivos ou prejudiciais;

c)

o incitamento e o apoio ao desenvolvimento de hotlines, de tecnologias de filtragem, de classificação de conteúdos, de medidas de luta contra o spam e o spim;

d)

a responsabilização dos autores de meios informáticos de acesso à Internet e de sistemas de exploração de servidores pela defesa e preservação dos sistemas vendidos contra os ataques de vírus, com a obrigação de oferecer meios fáceis e acessíveis de luta antivírus;

e)

implementação de sistemas de identificação e de informação sobre os conteúdos nocivos e prejudiciais e a retirada de todos os conteúdos de carácter racista xenófobo ou que façam a apologia do crime, da violência ou do ódio.

4.1.3

A particular preocupação reflectida no que se refere à utilização da internet não deve no entanto ser entendida como menor atenção a ser dada em relação a todos os meios tradicionais de comunicação social, em particular a radiodifusão sonora e televisiva, onde ofensas graves a públicos sensíveis, designadamente a menores, devem ser objecto de uma especial actuação seja por via da auto-regulação seja da hetero-regulação.

4.2   A protecção da dignidade humana

4.2.1

A defesa da dignidade humana nos meios de comunicação não se pode limitar à proibição de qualquer forma de discriminação. Devem igualmente ser objecto de reflexão pelas autoridades nacionais competentes, e na medida em que o impacte social o justifique, as emissões de conteúdos que possam por em causa a vida privada e os direitos fundamentais de quem quer que seja.

4.2.2

Deve ainda ser recomendado aos Estados-Membros, nesta sede, que:

a)

encorajem os media a adoptar regras de deontologia precisas e concretas com vista a assegurar o respeito devido pela vida privada;

b)

incitem os media a criar mecanismos de auto-regulação perante os quais as vitimas de atentados à vida privada e à dignidade humana possam apresentar as suas queixas;

c)

criem órgãos independentes, incluindo de natureza judicial, para exame deste tipo de queixas se os mecanismos de auto-regulação se revelarem inoperantes;

d)

instaurem um direito à indemnização dos prejuízos materiais e morais com função simultaneamente reparadora para as vítimas e dissuasória para os responsáveis por atentados graves e sistemáticos à vida privada e à dignidade das pessoas;

e)

procedam a um acompanhamento das emissões de conteúdos que possam constituir atentados à vida privada, à dignidade humana e aos direitos fundamentais.

4.3   O direito de resposta

4.3.1

Para além de um direito de resposta, deve ser igualmente consagrado, com o mesmo âmbito geral e nas mesmas condições previstas, um «direito de rectificação», como reacção contra conteúdos falsos, incorrectos ou menos rigorosos, que afectem os seus direitos.

4.3.2

Deve ser claramente referido que o direito de resposta pode ser assegurado não somente por via legislativa mas igualmente pelo recurso a medidas de co-regulação e auto-regulação.

4.3.3

No Anexo deverão ser ainda incluídas disposições quanto:

a)

à identificação precisa e taxativa dos casos em que pode ser recusada a publicação do direito de resposta ou de rectificação (à semelhança do constante na Resolução 74/26 do Conselho da Europa), e do prazo curto para o exercício de tal recusa;

b)

ao princípio de que a resposta deve receber um tratamento que garanta a visibilidade equivalente em local de publicação e tipo de transmissão idêntico ao da publicação/transmissão a que se responde;

c)

ao principio da gratuitidade do exercício do direito de resposta e de rectificação.

4.3.4

No primeiro traço do anexo, onde se diz «sem consideração de nacionalidade» deverá acrescentar-se « e de residência ».

5.   Observações finais

5.1

Reiterando o acolhimento da proposta de recomendação em apreço, com as ressalvas apontadas no capítulo «observações na especialidade», e tendo em consideração que a inovação e o progresso tecnológico suscitarão novos desafios em termos quantitativos e qualitativos, o CESE sugere que seja aditada a realização de uma avaliação do impacte da recomendação junto dos Estados-Membros, da indústria e demais partes interessadas, decorrido o prazo de quatro anos após a sua aprovação.

5.2

Tendo em consideração o processo de avaliação referido no ponto anterior, o CESE sugere a criação de um Observatório que tenha por missão o levantamento sistemático das medidas promovidas pelos Estados-Membros, pela indústria e partes interessadas na execução da recomendação em apreço.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Doc. COM(2004) 341 final de 30/04/2004.

(2)  Recomendação 98/560/CE publicada no JO L 270 de 07/10/98; sobre a respectiva proposta, o Comité emitiu o seu Parecer 626/98 de 29 de Abril de 1998 de que foi relatora a conselheira BARROW. Por seu turno, o 2.o relatório de avaliação consta do Doc. COM(2003) 776 final.

(3)  Cf. A Comunicação da Comissão sobre as «Ligações de elevado débito na Europa: evolução recente no sector das comunicações electrónicas» (COM(20044) 61 final) e o Parecer do JO C 120 de 20.5.2005, de que foi relator o conselheiro McDONOGH; cf. igualmente a Comunicação da Comissão relativa aos «Serviços Móveis de Banda Larga», COM(2004) 447 final de 30/06/2004.

(4)  Directiva do Conselho de 3 de Outubro de 1989 relativa à coordenação de certas disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros relativas ao exercício de actividades de radiodifusão televisiva (89/552/CEE), JO L 298 de 17/10/1989, p. 23.

(5)  Directiva 97/36/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Junho de 1997, que altera a Directiva 89/552/CEE do Conselho relativa à coordenação de certas disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros relativas ao exercício de actividades de radiodifusão televisiva, JO L 202 de 30/7/1997, p. 60.

(6)  COM(96) 483 final, sobre o qual foi proferido o Parecer do CESE, de que foi relatora a conselheira BARROW in JO C 287 de 22/09/97, p. 11.

(7)  JO C 70 de 6.3.1997.

(8)  JO C 214 de 10/07/98, de que foi relatora a conselheira BARROW.

(9)  Destacam-se, como mais importantes:

a)

a Decisão 276/1999/CE de 25 de Janeiro de 1999 que adopta um plano de acção comunitária plurianual para fomentar uma utilização mais segura da Internet e das novas tecnologias em linha através do combate aos conteúdos ilegais e lesivos, principalmente no domínio da protecção das crianças e dos menores (in JO L 33 de 6/02/1999, alterada pela Decisão 1151/2003/CE de 16 de Junho de 2003, in JO L 162 de 01/07/2003, que prorrogou por dois anos o plano de acção;

b)

a Comunicação da Comissão de 14 de Dezembro de 1999, sobre «Princípios e Orientações para a Política Audiovisual da Comunidade na Era Digital», onde se afirma que o desenvolvimento do quadro regulamentar deverá garantir uma protecção eficaz dos interesses gerais da sociedade, designadamente a liberdade de expressão e o direito de resposta, a protecção dos autores e das suas obras, o pluralismo, a defesa do consumidor, a protecção de menores e da dignidade humana, bem como a promoção da diversidade linguística e cultural (COM(1999) 657 final;

c)

as Conclusões do Conselho de 17 de Dezembro de 1999 relativas à protecção dos menores no contexto do desenvolvimento dos serviços audiovisuais digitais, onde é salientada a necessidade de adaptar e completar os sistemas de protecção dos menores contra os conteúdos audiovisuais lesivos, à luz da evolução a nível técnico, social e do mercado (in JO C 8 de 12/01/2000);

d)

a Directiva 2000/31/CE de 8 de Junho de 2000 sobre o comércio electrónico, que contém disposições pertinentes no que se refere à protecção dos menores e da dignidade humana, nomeadamente o n.o 1, alínea e), do artigo 16.o, segundo o qual os Estados-Membros e a Comissão devem encorajar a redacção de códigos de conduta em matéria de protecção dos menores e da dignidade humana (in JO L 178 de 17/07/2000);

e)

a Comunicação da Comissão de COM(2000) 890 final de 26/01/2001 – Parecer de 12/09/2001, in JO C 311 de 17.11.2001, «Criar uma Sociedade da Informação mais segura, reforçando a segurança das infraestruturas da informação e lutando contra a cibercriminalidade», onde se elenca toda uma série de medidas legislativas e não legislativas destinadas a reagir contra violações à vida privada, aos conteúdos ilegais, ao acesso não autorizado, à sabotagem e à propriedade intelectual (COM(2000) 890 final e de que foi relator DANTIN), e a Proposta de decisão quadro relativa a ataques contra os sistemas de informação, que lhe sucedeu (COM(2002) 173 final de 19/04/2002) e Parecer de 28/11/2001, in JO C 48 de 21/02/2002«Comunicação da Comissão ao Conselho, Parlamento Europeu, Comité Económico e Social e Comité das Regiões – Segurança das redes e da informação: Proposta de abordagem de uma política europeia» de que foi relator o conselheiro RETUREAU;

f)

o Relatório de avaliação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu relativo à aplicação da recomendação do Conselho de 24 de Setembro de 1998 com relação à protecção dos menores e da dignidade humana, no qual são mencionados resultados encorajadores quanto à aplicação da recomendação, mas é igualmente apontada a necessidade de uma maior implicação dos utilizadores e de um período de tempo mais alargado para permitir a aplicação integral da recomendação (COM(2001) 106 final de 27/02/2001), factos estes salientados nas conclusões do Conselho de 23 de Julho de 2001 respeitantes ao relatório de avaliação da Comissão (in JO C 213 de 31/07/2001);

g)

o Quarto Relatório sobre a aplicação da Directiva 89/552/CEE «Televisão sem Fronteiras», aprovado em 6 de Janeiro de 2003, cujo anexo, com o programa de trabalho de revisão da directiva, compreendia a realização de uma consulta pública que abordou, entre outras, as problemáticas da protecção dos menores e do direito de resposta (COM(2002) 778 final de 06/01/2003). A consulta pública baseou-se nos documentos de reflexão publicados no sítio Internet da Comissão (http://europa.eu.int/comm/avpolicy/regul/review-twf2003/consult_en.htm);

h)

o Segundo Relatório de avaliação sobre a Recomendação do Conselho de Setembro de 1998, já referido, aprovado em 12 de Dezembro de 2003, no qual se analisam criticamente as medidas adoptadas pelos Estados-Membros e ao nível da União Europeia;

i)

a Comunicação da Comissão sobre «O futuro da política europeia de regulação audiovisual» na qual se enunciam as prioridades da política comunitária de regulação a médio prazo para o sector em apreço no quadro de uma Europa alargada e onde, atendendo às preocupações manifestadas no processo de consulta pública de revisão da Directiva TSF, a Comissão referiu a necessidade de actualização da Recomendação relativa à protecção dos menores e da dignidade humana centrada no desenvolvimento de modelos de auto-regulação e co-regulação tendo em vista, nomeadamente, o ambiente em linha, de forma a contribuir para uma observância efectiva dos princípios de protecção dos menores e da ordem pública e anunciou que iria adoptar a ideia de um direito de resposta que deve ser aplicável a todos os meios de comunicação, a qual, numa primeira fase, poderia ser consagrada na Recomendação relativa à protecção dos menores e da dignidade humana (COM(2003)784 final de 15/12/2003);

j)

a recente Proposta de decisão do PE e do Conselho relativa à adopção de um programa comunitário plurianual para a promoção de uma utilização mais segura da Internet e das novas tecnologias em linha centrando-se desta feita nos utilizadores finais – sobretudo pais, educadores e crianças (COM(2004) 91 final de 12/03/04).

(10)  JO C 48 de 28.02.02, de que foi relatora a conselheira DAVISON.

(11)  JO C 14 de 16/01/2001 de que foram relatores os conselheiros MORGAN e CARROLL.

(12)  JO C 214 de 10/07/1998 de que foi relatora a conselheira DRIJFHOUT-ZWEIJTZER e JO C 73/2003 de 26/03/2003, de que foi relatora a conselheira DAVISON.

(13)  JO C 157 de 28.6.2005, adoptado pela Plenária em 16/12/2004 de que foram relatores os conselheiros RETUREAU e DAVISON.

(14)  JO L 270 de 7/10/1998, p. 48.

(15)  JO L 13 de 17/1/2001, p. 35. Cf. a este propósito, a recente Proposta de decisão relativa ao Programa a MEDIA 2007, COM(2004) 470 final de 14/07/2004 e o Parecer do CESE em elaboração pelo relator do presente parecer.

(16)  Parecer do Comité Económico e Social sobre a «Proposta de recomendação do Conselho relativa à protecção dos menores e da dignidade humana nos serviços audiovisuais e de informação» (98/C 214/07), JO C 214 de 10/7/1998, p. 25.

(17)  Parágrafo 14.o da Resolução do Parlamento Europeu sobre o relatório de avaliação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu relativo à aplicação da recomendação do Conselho de 24 de Setembro de 1998 sobre a protecção dos menores e da dignidade humana, COM(2001) 106 final.

(18)  European Forum on Harmful and Illegal Cyber Content: Self-Regulation, User Protection and Media Competence. Estrasburgo, 28 de Novembro de 2001, Edifício dos Direitos Humanos.

(19)  Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões «O futuro da política europeia de regulação audiovisual», COM(2003) 784 final de 15 de Dezembro de 2003; cf. igualmente o Anteprojecto de Relatório de Informação revisto sobre «O estado actual da co-regulação e da auto regulação no mercado único» (INT/204, de 16/11/2004) de que é relator o conselheiro VEVER.

(20)  Ver nota de pé-de-página 13.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/94


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Política de emprego: Papel do CESE após o alargamento e na perspectiva do processo de Lisboa»

(2005/C 221/18)

Em 1 de Julho de 2004, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, emitir um parecer sobre a «Política de emprego: Papel do CESE após o alargamento e na perspectiva do processo de Lisboa».

A Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, incumbida de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 20 de Janeiro de 2005, sendo relator W. GREIF.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 9 de Fevereiro de 2005), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 138 votos a favor, 1 voto contra e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

Em Março de 2000, o Conselho de Europeu de Lisboa lançou um vasto programa de reformas com ambiciosos objectivos de crescimento e emprego. A promoção da competitividade numa economia baseada no conhecimento e um crescimento económico sustentável e com efeitos positivos para o emprego deveriam andar a par com uma melhoria das condições de trabalho e com o reforço da coesão social. Gozando de amplo apoio, este programa deu azo à esperança de que o seu êxito poderia aproximar sensivelmente o projecto de uma União alargada dos seus cidadãos.

1.2

Face à actual situação económica, as metas traçadas para 2010, e sobretudo os objectivos em matéria de emprego, só dificilmente poderão ser alcançadas, o que poderá comprometer a confiança em todo o processo. O Comité Económico e Social Europeu opina que esta crise de confiança só poderá ser mitigada se o público puder ser persuadido de que todos os responsáveis políticos estão activamente empenhados em aplicar de forma consequente e harmoniosa os objectivos da Estratégia de Lisboa (aumento da competitividade, crescimento económico com criação de mais e melhores postos de trabalho, reforço da coesão social e desenvolvimento ecologicamente sustentável).

1.3

Convicto de que a Estratégia de Lisboa não precisa de uma nova agenda mas sim de uma nova política destinada a concretizar os objectivos definidos através da adopção das medidas necessárias, mormente nos Estados-Membros, o CESE pretende com o presente parecer, que surge em complemento do seu anterior parecer sobre «Melhorar a aplicação da Estratégia de Lisboa» (1), salientar os principais desafios que se colocam em matéria da política de emprego e apresentar recomendações para a continuação do processo até 2010.

2.   Avaliação intercalar do processo de Lisboa: a Europa está longe da via para mais e melhor emprego

2.1

O aumento da competitividade e o crescimento económico sustentado são instrumentos essenciais para permitir à UE criar mais e melhores postos de trabalho, lançar bases mais estáveis para os sistemas de segurança social e consolidar a luta contra a pobreza e a exclusão social. Para o CESE, esta estratégia política integrada é um dos aspectos mais importantes do processo de Lisboa.

2.2

A Estratégia de Lisboa deveria dar um novo impulso à estratégia europeia de emprego, contribuindo para uma política activa de emprego, fomentando o espírito empresarial como motor do crescimento e do emprego e aumentando em toda a UE o número de postos de trabalho através da definição de objectivos quantitativos.

Assim, até 2010 a taxa de emprego global da UE deveria aumentar de 61 % para 70 %, e a das mulheres de 51 % para 60 %. Para esse fim, um ano mais tarde foram adoptados em Estocolmo objectivos intermédios (uma taxa de emprego global de 67 % e uma taxa de emprego feminino de 57 % até 2005). Além disso, foi definida uma nova meta para o aumento da taxa de emprego para a faixa etária de 5564 anos, a qual deveria ser de 50 % em 2010.

Os Estados-Membros foram exortados a definir objectivos nacionais ambiciosos com base nas suas diferentes situações de emprego. Assim, os países que em 2000 já apresentavam taxas de emprego de 70 % ou mais (como a Suécia, os Países Baixos, a Dinamarca e o Reino Unido) ou apenas ligeiramente inferiores (como a Áustria, Portugal e a Finlândia) deveriam igualmente contribuir para o aumento da taxa média de emprego, e assim para os objectivos de Lisboa.

2.3

Mas a Estratégia de Lisboa não inaugurou apenas a perspectiva de «mais emprego» no mundo, declarando igualmente que era imperativo alcançar uma maior produtividade e uma maior competitividade, sobretudo através da promoção da inovação e do fomento da qualidade do trabalho: o investimento no capital humano, na investigação, na tecnologia e na inovação foi considerado tão prioritário como as medidas em matéria de mercado de trabalho e de política estrutural. Correspondentemente, foram adoptados novos objectivos quantitativos, como por exemplo o aumento dos investimentos em capital humano per capita/promoção da aprendizagem ao longo da vida (participação de 12,5 % de todos os trabalhadores em medidas de formação contínua, redução para metade do número de jovens entre os 18 e os 24 anos sem formação posterior ou profissional), aumento do investimento em I&D para 3 % do PIB (devendo dois terços dos investimentos provir do sector privado) ou a expansão da rede de creches (criação de vagas em creches para 33 % das crianças até aos 3 anos e para 90 % das crianças até à idade da escolaridade obrigatória).

2.4

Apesar de alguns êxitos iniciais, no início de 2005 a Europa está ainda longe de alcançar estes objectivos ambiciosos. A economia europeia conhece pelo terceiro ano consecutivo um crescimento económico muito baixo e claramente inferior ao seu potencial. A actividade económica no seu conjunto progride de forma tímida e é extremamente vulnerável aos aumentos dos preços do petróleo e aos enormes desequilíbrios globais. Uma avaliação intercalar obriga a concluir que os objectivos de emprego de Lisboa quase seguramente não serão alcançados até 2010.

2.5

Os quadros 1-3 (vd. infra: os valores mais altos indicados correspondem aos objectivos de Lisboa) deixam bem clara a improbabilidade de concretizar os objectivos de Lisboa em 2010.

Tanto a taxa global de emprego como a taxa de emprego feminino aumentaram rapidamente no final dos anos 90, numa altura em que a economia europeia cresceu relativamente depressa. A depressão conjuntural, que sofreu choques externos insuficientemente absorvidos pelas políticas macro-económicas, praticamente paralisou a evolução da taxa de emprego global em 2001. A taxa de emprego feminino continuou a aumentar cerca de 0,5 % por ano. Se houvesse um rápido aumento do crescimento económico, este objectivo poderia ser alcançado até 2010, pelo menos na UE dos 15.

Para os trabalhadores idosos, que representam mais de 8 % da população activa na UE dos 15 e quase 10 % na UE dos 25, o objectivo do emprego afigura-se particularmente difícil de alcançar (2). Contudo, a subida das taxas de crescimento apesar da conjuntura adversa parecem revelar que as medidas de dissuasão da reforma antecipada e de promoção do envelhecimento activo no quadro da Estratégia de Lisboa estão a surtir algum efeito. Por exemplo, a idade média de abandono da vida activa subiu de 60,4 em 2001 para 60,8 em 2002 (3). Ironicamente, os dois outros indicadores principais para o emprego acusaram, antes do lançamento da Estratégia de Lisboa, um crescimento próximo dos objectivos definidos, mas que não tem sido registado desde então. Isto revela claramente a importância de factores cíclicos e macro-económicos, os quais, todavia, foram negligenciados em proveito da concentração nas chamadas medidas «estruturais». Ambos revestem igual significado.

Quadros 1-3: Evolução dos objectivos de emprego da Estratégia de Lisboa (4):

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2.6

Para concretizar o objectivo de uma taxa global de emprego de 70 % definido em Lisboa seria necessário criar até 2010 15 milhões de novos postos de trabalho na UE dos 15 e 22 milhões na UE dos 25, ou seja, mais de 3 milhões por ano, o mesmo número que em 2000, que foi o melhor ano para o emprego desde há mais de 10 anos.

2.7

O alargamento da UE confere uma nova dinâmica económica à Europa, mas condiciona igualmente a evolução do emprego. Como mostram os quadros, os níveis de emprego dos novos Estados-Membros são sensivelmente inferiores aos da UE dos 15, o que não era o caso ainda no final dos anos 90, sobretudo no que se refere às mulheres. Por outro lado, a evolução económica é actualmente bastante mais dinâmica nos novos Estados-Membros, que apresentam níveis de crescimento por vezes bem acima dos 4 %. Na definição da sua estratégia de emprego a UE deve dar particular atenção às necessidades dos novos Estados-Membros para lhes permitir alcançar igualmente os objectivos de emprego comunitários. Para tanto, os critérios de convergência para uma eventual adesão à UE devem ser concebidos de forma a promover, em vez de atravancar, o crescimento da economia e do emprego. O CESE examinou já em pormenor este aspecto no âmbito dos comités consultivos mistos com representantes da sociedade civil organizada dos novos Estados-Membros.

3.   A política de emprego não pode resumir-se a reformas estruturais dos mercados de trabalho

3.1.

É inquestionável que a situação negativa do emprego acima descrita se deve em grande medida à evolução da economia. A Estratégia de Lisboa partia da premissa de um crescimento médio anual real do PIB de 3 %. Em vez da esperada retoma, a situação económica tem-se deteriorado rapidamente desde 2000. As taxas de crescimento dos últimos anos têm sido extremamente reduzidas: 1,7 % em 2001, 1 % em 2002 e apenas 0,8 % em 2003.

3.2.

Face a isto, torna-se patente que os objectivos da política de emprego só poderão ser realizados se for possível relançar um crescimento conjuntural sustentável. Devem ser criadas as condições-quadro adequadas que favoreçam tanto a procura externa como a interna, de modo a aumentar o potencial de crescimento e lograr o pleno emprego. A este respeito, o CESE salientou já repetidamente a necessidade absoluta de um contexto macro-económico saudável a nível comunitário, e sobretudo de uma macropolítica que, em caso de crescimento económico, deixe aos Estados-Membros a necessária margem de manobra para intervir na política económica e financeira em caso de estagnação económica.

Nesta linha, o Comité acolhe favoravelmente as propostas da Comissão de revisão do Pacto de Estabilidade e de Crescimento como um passo na direcção certa, e em particular a intenção de avaliar os défices fiscais em função das condições específicas de cada país (conjuntura, dívida pública, inflação). A reorientação do Pacto para um maior crescimento económico implica igualmente que os Estados-Membros e os parlamentos nacionais sejam envolvidos mais de perto na consolidação orçamental. Além disso, o tipo de despesas estatais deve igualmente ser tido em linha de conta, com uma eventual exclusão dos investimentos estratégicos para o crescimento e o emprego do cálculo dos défices (5). É ao Conselho que caberá, em colaboração com a Comissão, determinar as despesas que poderão ser consideradas como investimentos estratégicos de interesse comunitário.

Cumpre apoiar estas medidas através de uma política monetária pragmática que tenha em atenção a economia no seu conjunto e as repercussões para o emprego. O CESE apelou já várias vezes a que se averiguasse a melhor forma de o BCE passar a respeitar um objectivo de estabilidade em sentido lato que promova, ao lado da estabilidade monetária, também a estabilidade do crescimento, do emprego e dos sistemas de coesão social. Um diálogo permanente com as instituições europeias e os parceiros sociais é indispensável para esse fim e reforçaria a confiança dos investidores e dos consumidores.

3.3.

O abrandamento económico dos últimos três anos (após uma taxa de crescimento de 3 % na UE dos 15 em 2000) deveu-se muito mais a factores macro-económicos do que a factores políticos ou estruturais. É por isso que o Comité tem reclamado repetidamente que as orientações da política económica europeia reflictam este facto nas suas recomendações (6). Importa estimular de forma sensível o consumo e os investimentos, públicos como privados, para atenuar o baixo poder de compra na Europa. A Europa, com a sua balança comercial e um volume de exportações em crescimento, é perfeitamente competitiva. O que tem estagnado é a procura interna. As reformas estruturais só poderão ter êxito num contexto macro-económico mais favorável. Os salários não podem ser encarados apenas como factor de custo do lado da oferta, dado que determinam igualmente os padrões da procura e as perspectivas comerciais das empresas, em particular das pequenas e médias empresas, que estão circunscritas a uma localização definida. O exemplo alemão demonstra que a forte contenção dos salários pode fortalecer a oferta mas, simultaneamente, enfraquece a procura, dificultando a revitalização conjuntural da economia. Embora as negociações salariais dependam de vários factores decisivos, importa compreender que a indexação do crescimento dos salários ao crescimento da produtividade nacional garante por um lado um aumento suficiente da procura e por outro lado a orientação da actividade do ECB para a manutenção da estabilidade. Esta política económica pode levar a um crescimento sustentado e estável na Europa.

3.4.

Nos últimos anos, as orientações políticas comunitárias têm sido dominadas pela perspectiva de que os factores estruturais (política salarial dos parceiros sociais, regulamentação rígida dos mercados, horários de trabalho demasiado reduzidos, imobilidade e inflexibilidade dos trabalhadores, etc.) eram os responsáveis pelos problemas dos mercados de trabalho europeus. Na maior parte dos Estados-Membros, as políticas de emprego têm-se concentrado efectivamente, nos últimos anos, nesses factores. A promoção da empregabilidade, as ofertas de formação e a integração no mercado de trabalho dos grupos mais desfavorecidos passaram, pelo contrário, para segundo plano.

3.5.

O CESE frisou já várias vezes que a redução das prestações sociais e das receitas dos trabalhadores e a insuficiência dos investimentos no capital humano levam ao enfraquecimento da procura interna, o que agudiza ainda mais os problemas económicos e compromete a produtividade. Acresce que esta orientação exclusiva para a oferta está em contradição com o conjunto dos objectivos de Lisboa, e em particular com os do aumento da produtividade e da qualidade do trabalho. Em todo o caso, é certo que uma política do mercado de trabalho que não dê o peso devido à formação contínua e obrigue trabalhadores qualificados a aceitar empregos não qualificados só pode ter um impacto negativo na produtividade. O CESE entende que só um aumento paralelo dos níveis de emprego e da produtividade laboral — como preconizado, de resto, pela própria Comissão — constitui uma estratégia apropriada. É evidente que também surgirão empregos que requerem um baixo nível de qualificações. Quanto a este aspecto, há que velar pelo cumprimento da regulamentação em matéria laboral e social.

3.6.

O actual debate sobre o emprego na Europa centra-se na necessidade de aumentar as taxas de emprego. O objectivo estratégico de Lisboa consiste na promoção do emprego como melhor forma de combater a pobreza e a exclusão. Estes objectivos implicam uma estratégia de melhoria da qualidade dos postos de trabalho, e não a criação de postos de trabalho a qualquer preço. Neste sentido, o caminho para o pleno emprego na Europa deve imperativamente estar associado a salários adequados, à segurança social e a padrões elevados de qualidade de trabalho. O CESE apela a que seja conferido, na continuação da Estratégia de Lisboa, especial destaque à qualidade do trabalho, sobretudo no seguimento de reformas estruturais.

3.7.

O CESE não quer de modo algum afirmar que as reformas do mercado de trabalho ou noutros sectores são completamente irrelevantes para a criação de emprego. Está, contudo, convicto de que para criar mais e melhor emprego é indispensável estimular a economia e conceber adequadamente as reformas estruturais. Só assim se poderá multiplicar o efeito e a aceitação dessas reformas. A macropolítica e as reformas estruturais não são mutuamente exclusivas, e sim complementares.

4.   Novas vias da política de emprego: capacidade de inovação das empresas — Investimento no trabalho — Conhecimento como recurso essencial

4.1

A capacidade de inovação das empresas europeias é decisiva para o dinamismo económico. Sem produtos e serviços inovadores e melhorados, sem acréscimo de produtividade, a Europa perderá terreno em termos económicos e de emprego. Um aumento da produtividade implica mutações no mundo do trabalho, nem sempre, ou pelo menos não imediatamente, com consequências positivas. Mas voltar as costas à inovação social e económica levará com toda a certeza a uma regressão. O impacto destas mutações no mercado de trabalho deve ser suavizado e acompanhado por medidas sociais.

4.2

O crescimento económico e condições favoráveis ao investimento são condições indispensáveis para a criação de novos postos de trabalho e para a manutenção dos existentes, que se devem em grande medida, no mercado interno europeu, às novas empresas e às PME (7). As pequenas empresas também estão, em grande parte, enraizadas na economia local e beneficiarão, por isso, de uma procura interna maior e mais estável. Por esse motivo, o CESE apelou já em várias ocasiões a que fosse dada, em matéria de emprego, a devida atenção ao desenvolvimento do espírito empresarial, à política de preservação das empresas e aos incentivos à criação de empresas susceptíveis de criar emprego através da inovação (8). Muitas vezes, são as PME que, movidas pela necessidade de subsistir no mercado, se revelam as mais inovadoras. Importa dar igualmente maior prioridade às ajudas às empresas mais pequenas. Para isso, impõe-se que essas empresas possam explorar plenamente o seu potencial de inovação, sobretudo através de um acesso facilitado ao financiamento, da simplificação das disposições de gestão empresarial e do reforço das medidas de promoção da qualificação.

4.3

O CESE tem igualmente salientado que as pessoas, com os seus conhecimentos e aptidões, constituem o recurso mais importante para a inovação e para o progresso na sociedade do conhecimento (9). A Europa deve encontrar formas de desenvolver o seu potencial em mão-de-obra qualificada, em conhecimentos científicos, em investigação e em tecnologia e convertê-lo em novos produtos e serviços capazes de penetrar nos mercados e, logo, também em emprego. Isso requer maiores índices de formação de todas as camadas da população, um bom sistema de formação profissional e uma transição mais fácil da formação superior para o mundo do trabalho. As condições sociais devem evoluir de tal forma que a formação passe a ser um dado adquirido e que o ensino superior deixe de ser visto como um privilégio. Estudos recentes da OCDE têm demonstrado os pontos fracos dos sistemas de formação e de educação de diversos Estados-Membros (10). A carência de investigadores e de peritos torna-se numa desvantagem económica e reflecte a falta de acesso à formação. Há muito que se impõe uma reforma da política de formação e de educação. Onde estão os investimentos para

reduzir drasticamente os níveis de abandono do ensino, aumentar a taxa de conclusão dos estudos superiores e assegurar efectivamente a possibilidade de aprendizagem ao longo da vida para todos?

melhorar a transição da formação superior e universitária para a vida profissional, sobretudo nas PME?

garantir, como medida preventiva essencial da política de emprego, uma formação inicial e profissional de elevada qualidade que permita aos jovens uma entrada sem problemas e uma permanência durável no mercado de trabalho?

permitir ao maior número possível de trabalhadores uma maior participação nas ofertas de formação, p. ex., através da concessão de uma semana de formação por ano?

4.4

No que a isto respeita, o CESE sublinhou reiteradamente a importância de as empresas assumirem a responsabilidade geral pela formação inicial e contínua e constatou que os investimentos na aquisição de qualificações não deve competir apenas ao Estado, senão também às empresas e aos próprios indivíduos, dado que as vantagens da aprendizagem ao longo da vida beneficiam em igual medida os trabalhadores, as empresas e a sociedade em geral (11). A formação profissional e a aprendizagem ao longo da vida não podem ser encaradas isoladamente, mas sim como elementos de base da planificação das carreiras dos trabalhadores. Independentemente da faixa etária e do nível de qualificações, todos os trabalhadores deveriam beneficiar de encorajamento e de possibilidades suficientes de participação na formação contínua. O desenvolvimento das aptidões e da capacidade de inovação pressupõe assim também a nível das empresas investimentos adequados na educação e na formação contínua, assim como a criação de uma cultura empresarial favorável à inovação.

4.5

No entanto, não basta, hoje em dia, que cada indivíduo seja criativo e esteja disposto a adquirir novas aptidões. A própria empresa deve ser capaz de aprender, i.e., de absorver novos conhecimentos e de os converter em produtos e serviços capazes de singrar nos mercados. A capacidade de inovação é essencial para a competitividade. Para assegurar as bases da inovação no futuro, a ciência e a investigação devem ser vistas como prioritárias. É imperativo explorar plenamente o potencial dos sistemas de investigação públicos e privados e promover os contactos entre ambos. Para esse fim, assume especial importância a promoção da inovação e da investigação e o correspondente aumento do orçamento para as actividades de I&D para 3 % do PIB (dos quais dois terços de origem privada), em harmonia com os objectivos de Lisboa (12). As ajudas públicas a I&D devem ser intensificadas a nível europeu e nacional, sobretudo para as tecnologias-chave promotoras do crescimento, de modo a alargar a base científica e a incentivar os investimentos em I&D da parte do sector privado. Ao mesmo tempo, os Estados-Membros e a Comissão Europeia devem procurar explorar a adjudicação de contratos públicos para fomentar a criação de novos produtos e serviços inovadores e que requeiram uma investigação intensiva.

4.6

Uma gestão e uma configuração inovadoras do trabalho são importantes também para as PME. Muitas delas desenvolveram soluções específicas e tornaram-se «actores globais», outras necessitam de aconselhamento específico em matéria de inovação orientado para a criação de condições de trabalho favoráveis à formação e para as necessidades dos trabalhadores em matéria de qualificações. A interligação em rede e a gestão dos conhecimentos podem ajudar as PME a explorar em conjunto novos potenciais cognitivos (13). Esta lacuna cultural deve ser colmatada para que as PME possam beneficiar cada vez mais de investigação de base. Para serem inovadoras, as PME necessitam além disso também de acesso ao financiamento e ao capital de risco. Concretamente, isso significa que as directivas sobre o mercado interno devem ser sujeitas também a uma avaliação do impacto sobre as PME e consequentemente alteradas quando necessário (p. ex., as directivas relativas à liberalização dos mercados financeiros ou ao acordo Basileia II).

4.7

Uma base industrial altamente produtiva é e continuará a ser indispensável para uma economia próspera na UE. A indústria e os serviços são mutuamente complementares. Fomentar a inovação implica também orientar a investigação e o desenvolvimento para as necessidades da sociedade do conhecimento e dos serviços, com especial destaque para a exploração de novos sectores de emprego não apenas nos domínios tradicionais das indústrias produtivas. Ao lado da promoção das tecnologias de ponta, a Estratégia de Lisboa exige igualmente uma maior ênfase nos serviços, o que pressupõe uma reavaliação dos serviços ligados à sociedade, o alívio da pressão sobre o orçamento das administrações públicas e a valorização da importância destas para o desenvolvimento económico. Conceitos como formação, mobilidade, individualização, os desafios colocados pela evolução demográfica aos sistemas de saúde, a conciliação da vida familiar e da vida profissional e a evolução dos hábitos de comunicação e dos lazeres impõem novas exigências aos serviços sociais, pessoais e comerciais. Muitas vezes, esses serviços actuam apenas quando um indivíduo inicia a sua actividade profissional (14). O CESE salientou já várias vezes, a esse respeito, o importante papel da economia social e do sector terciário para a inovação e o emprego (15).

4.8

A inovação depende em primeira análise das pessoas, do espaço deixado à criatividade, à qualificação, ao conhecimento, à capacidade de aprendizagem e à organização do trabalho. A independência, a autonomia e os direitos de participação são de importância crucial. Assim, a reformulação das relações laborais e dos mecanismos de consulta dos trabalhadores torna-se imprescindível. Relações laborais estáveis incentivam a inovação. Procurar restringir, em vez de reforçar, a representação dos interesses dos trabalhadores, a reformulação das relações laborais e, logo, os direitos básicos dos trabalhadores significa, pois, entravar a inovação. O CESE recorda aqui que a actual proposta de directiva-quadro sobre os serviços no mercado único não pode levar ao rebaixamento dos actuais padrões mínimos sociais, salariais e de segurança no trabalho.

5.   As mutações requerem um Estado social sustentável e competitivo, uma política laboral activa e preventiva e a modernização e melhoria dos sistemas de segurança social

5.1

A inovação e as reformas necessitam, mais do que da mera iniciativa privada, também do apoio da sociedade. A assunção do risco é indissociável da segurança social. Muitos indivíduos dependem de serviços sociais que possibilitam a exploração de novos sectores. A inovação não pode ser concebida sem a coesão social como elemento fundamental do modelo social europeu. O Estado social deve responder de contínuo a novas exigências. A esse respeito entende o CESE que os objectivos de emprego de Lisboa só poderão tornar-se realidade se for alargado o âmbito de acção da política social e se for perseguida uma política de normas sociais mínimas para a criação de condições de vida e de trabalho equitativas. Isto é particularmente urgente na União alargada, onde as disparidades entre os níveis de bem-estar continuam a aumentar.

5.2

Para prevenir o desencadear de uma concorrência entre padrões sociais, é necessário aplicar melhor e continuar a desenvolver a regulamentação existente no âmbito da legislação social comunitária em matéria de condições de trabalho, protecção da saúde e do emprego, direitos dos trabalhadores, igualdade entre os géneros e garantia dos direitos pessoais, nomeadamente no que se refere aos horários de trabalho.

5.3

O CESE expressou-se já várias vezes, como no seu recente parecer sobre «Medidas de apoio ao emprego», sobre inovações necessárias e acessíveis nos seguintes domínios (16):

Alargamento das bases da segurança social — criação de barreiras contra a pobreza;

A capacidade de adaptação exige um real equilíbrio entre a flexibilidade e a segurança no mercado de trabalho; novas formas de organização do trabalho requerem novas formas de segurança;

Adopção de medidas activas e preventivas de política laboral, sobretudo para os grupos mais desfavorecidos, e melhoria da integração dos trabalhadores migrantes;

Integração dos jovens no mercado de trabalho e combate ao desemprego juvenil;

Ofensiva no domínio da educação — Melhoria da educação pré-escolar — Acompanhamento de alta qualidade das crianças durante todo o dia — Ofertas de formação contínua consagradas no contrato de trabalho;

Promoção de uma organização do trabalho em função da faixa etária — explorar melhor o conhecimento e a experiência dos trabalhadores mais antigos;

Aumentar a taxa de emprego feminino — Assegurar a possibilidade de conciliar vida familiar e vida activa.

5.4

O CESE deu especial destaque aos aspectos seguintes:

A adopção de medidas activas e preventivas para as pessoas desempregadas ou inactivas deve ser reconhecida como um objectivo prioritário e a política laboral deve procurar reintegrar os desempregados no mercado de trabalho.

Importa dar apoios adequados aos jovens para lhes permitir entrar o mais facilmente possível no mercado de trabalho. Ao lado de um crescimento contínuo, a qualidade da formação profissional e a garantia de uma educação de qualidade até ao nível universitário são determinantes para que os jovens de ambos os sexos possam permanecer e progredir nos mercados de trabalho. Todos os intervenientes desses mercados têm, pois, o dever de rever os seus actuais contributos e medidas de combate ao desemprego juvenil (17).

Para grupos específicos, como as pessoas com deficiência ou com poucas habilitações que se vêem confrontadas com dificuldades adicionais no acesso ao emprego, há que criar as condições necessárias, mormente no domínio da formação contínua, para facilitar a entrada, a manutenção e a progressão no mercado de trabalho.

No que tange às previsões de diminuição da população activa na Europa, os imigrantes podem contribuir para assegurar que seja preservado um número suficiente de trabalhadores qualificados, o que porém requer medidas adequadas (18).

Para promover eficazmente o envelhecimento activo em face das tendências para a ancianidade da população activa haverá que criar condições económicas e políticas adequadas que incentivem a manutenção na vida activa e tornem mais fácil às empresas a contratação de trabalhadores mais idosos.

5.5

O Comité salientou já a necessidade de um maior empenho no aumento da taxa de emprego feminino, de afastar os entraves que continuam a manter muitas mulheres arredadas do mercado de trabalho e de combater sistematicamente as desigualdades que continuam a verificar-se entre os géneros (nomeadamente a nível salarial). Dado que uma taxa mais elevada de emprego feminino depende em boa parte da possibilidade de conciliar a vida profissional com a vida familiar (de resto, tanto para as mulheres como para os homens), este objectivo de Lisboa deve ser perseguido com especial fervor. O CESE aplaude, pois, o apelo lançado aos Estados-Membros para assegurarem a todos os níveis, inclusivamente através de organismos públicos, o acesso do público em geral a um número suficiente de lugares para crianças em creches e centros de dia e a cuidados adequados para as pessoas mais necessitadas (idosos, doentes, etc.). Os Estados-Membros deverão respeitar as recomendações a este respeito constantes das orientações gerais da política de emprego definindo objectivos concretos e elaborando planos de acção para a respectiva prossecução.

5.6.

Além disso, a aplicação da estratégia de Lisboa no domínio do emprego e da integração social de todos os grupos marginalizados ou desfavorecidos deve dar prioridade ao combate à discriminação e à promoção da igualdade de oportunidades. Para tal, os Estados-Membros devem ser expressamente encorajados a incluir nos seus planos de acção nacionais medidas de combate à discriminação.

5.7

O relatório do grupo de peritos sobre o futuro da política social confirmou recentemente que a teoria de que a segurança social compromete a competitividade, o crescimento económico e um elevado índice de emprego não tem qualquer fundamento na realidade e que Países como a Suécia, a Dinamarca, a Áustria, o Luxemburgo e os Países Baixos oferecem um elevado nível de protecção social e apresentam índices económicos altamente positivos (19). Os países mais competitivos são também os que mais investem na política social e nos sistemas de segurança social, e nem por isso deixam de conhecer simultaneamente elevadas taxas de emprego e índices de pobreza reduzidos. O que importa hoje em dia é alcançar um equilíbrio adequado entre a modernização e a melhoria dos sistemas de segurança social para os adaptar, sem prejuízo das suas funções de protecção social, à realidade actual (como por exemplo, a evolução demográfica). Neste sentido, o financiamento a longo prazo desses sistemas deve ter igualmente em conta critérios como a adequação social, o acesso universal e a elevada qualidade dos serviços.

5.8.

Na maior parte dos países europeus, o financiamento da segurança social repousa sobretudo nas contribuições sociais dos empregadores e dos trabalhadores. Estas contribuições aumentaram, em muitos casos, a um nível tal que se repercutem negativamente na criação de postos de trabalho.

Neste aspecto, o CESE está de acordo com a recomendação do Grupo de Alto Nível sobre o futuro da política social numa União alargada de alargar as bases de financiamento dos sistemas de segurança social, aliviando a pressão sobre o factor trabalho (20).

Ao mesmo tempo, há que tomar medidas para prevenir a iminente ruptura dos sectores fiscal e das contribuições. O CESE faz mais uma vez notar que a adopção de uma base harmonizada para o imposto sobre as sociedades em toda a UE poderia constituir um passo importante nesta direcção. A tributação de factores móveis, assim como no domínio do ambiente, deve ser debatida com base em valores fiscais mínimos.

O CESE tem repetidamente exortado os Estados-Membros a intensificar os seus esforços no sentido de modernizar e racionalizar os sistemas de protecção social para torná-los mais favoráveis à criação de emprego (21).

5.9

Um outro objectivo de Lisboa é o aumento dos índices de participação na vida activa dos trabalhadores idosos. De acordo com a Comissão, terão de ser criados sete milhões de postos de trabalho para cumprir o objectivo dos 50 %. O CESE salientou já anteriormente que uma das medidas políticas e económicas mais adequadas para favorecer o envelhecimento activo se conta a elevação da idade real do abandono da vida activa. Contudo, vários Estados-Membros têm-se concentrado, nas suas reformas dos sistemas de pensões, num mero aumento da idade legal de acesso à reforma, o que restringe cada vez mais, quando não elimina absolutamente, a possibilidade da reforma antecipada. Esta posição baseia-se na assunção unilateral de que se os trabalhadores não permanecem activos por mais tempo, isso se deve sobretudo à desmotivação e à falta de incentivos no direito das pensões. São assim ignorados muitos outros aspectos importantes. O Estados-Membros deverão criar medidas que incentivem os trabalhadores, com base no voluntariado, à sua manutenção na vida activa, dentro da idade legal para a reforma, solicitando, porém às empresas que os desejem empregar, ordenar os postos e as condições de trabalho que lhes reservem.

5.10

Em consonância com os Grupos de Alto Nível sobre o emprego, sobre o futuro da política social na União Europeia alargada e sobre a Estratégia de Lisboa para o crescimento e o emprego, o CESE apela à adopção de práticas (como as já utilizadas em certos Estados-Membros, nomeadamente a Finlândia e a Suécia) que fomentem a qualidade do trabalho e a formação contínua. Para aumentar a participação na vida activa dos trabalhadores da faixa etária 55-64 até 2010 haverá que criar um mercado de trabalho que favoreça o emprego de trabalhadores mais idosos, o que requer o empenho activo de todos os intervenientes, nomeadamente na melhoria das qualificações. Para esse fim, são necessários investimentos numa formação contínua produtiva e na protecção e promoção da saúde, com vista a prolongar a capacidade de trabalhar. Uma política que pretenda alterar a situação dos trabalhadores idosos virá, porém, sempre demasiado tarde se só começar com o grupo etário dos 40 a 50 anos. Uma gestão do pessoal que acompanhe cada trabalhador desde a entrada em funções é tão necessária quanto modelos de organização do trabalho para o pessoal mais idoso (p. ex., horários adequados que reduzam a pressão física e psíquica sobre os mesmos) (22).

6.   Recomendações políticas do CESE

6.1   Melhor coordenação das políticas económica e de emprego

Desde o lançamento da Estratégia de Lisboa têm sido vários os esforços no sentido de coordenar cronologicamente a política do emprego com a política económica. O grande problema continua a ser a coordenação dos conteúdos, que requer um equilíbrio adequado entre os princípios da política económica e as orientações da política de emprego.

Uma verdadeira coordenação entre todos os intervenientes (governos, BCE, parceiros sociais) só será possível quando a política monetária e a política orçamental assumirem elas também uma parte da responsabilidade pelo crescimento e pelo emprego e isso se reflectir nas orientações gerais da política económica.

Para este fim, haveria que pôr em prática as propostas da Comissão para uma reconfiguração do Pacto de Estabilidade e de Crescimento mais favorável ao crescimento, como fora já sugerido pelo Grupo de Peritos sobre a Estratégia de Lisboa, passando nomeadamente pela exclusão dos investimentos estratégicos para o crescimento e o emprego do cálculo dos défices. É ao Conselho que caberá, em colaboração com a Comissão, determinar as despesas que poderão ser consideradas como investimentos estratégicos de interesse comunitário.

6.2   Melhor envolvimento dos parceiros sociais e valorização do diálogo macro-económico

Importa fazê-lo tanto a nível nacional como a nível comunitário. Só assim poderá ter lugar um diálogo macro-económico realista capaz de contribuir para uma melhor governação, com o envolvimento dos parceiros sociais e tendo em conta a respectiva posição, e para o êxito do processo em geral. Trata-se da única possibilidade de reunir todos os intervenientes económicos e da política de emprego num diálogo aberto sobre a melhor forma de obter a combinação de políticas mais favorável ao crescimento económico e à criação de emprego na UE.

A nível dos Estados-Membros, e sem embargo da sua autonomia, há que garantir uma participação adequada dos parceiros sociais sobretudo nas reformas estruturais e em todas as medidas relacionadas com a qualificação e a inovação, mas também nos debates nacionais e em todas as fases da aplicação da estratégia europeia de emprego (elaboração, execução, avaliação dos planos de acção nacionais) (23).

6.3   Cooperação efectiva das formações competentes do Conselho

Para poder levar a bom termo uma estratégia global de emprego na UE é necessária uma maior colaboração da parte de diversas formações do Conselho relevantes para os objectivos de Lisboa. Em particular, é urgente uma melhor coordenação entre o Conselho Economia e Finanças e os Conselhos Concorrência, Emprego, Política Social, Saúde e Protecção dos Consumidores.

Essa coordenação melhorada impõe-se sobretudo também durante a preparação das cimeiras da Primavera: Lisboa é um processo horizontal que não pode ser deixado exclusivamente nas mãos dos Conselhos dos ministros da Economia e das Finanças.

6.4   As políticas macro-económicas e as reformas estruturais devem completar-se mutuamente

O abrandamento económico dos últimos três anos (após uma taxa de crescimento de 3 % na UE dos 15 em 2000) deveu-se muito mais a factores macro-económicos do que a factores políticos ou estruturais. As orientações gerais das políticas económicas da UE devem reflectir esta constatação.

Importa revitalizar o consumo e os investimentos públicos e privados, importantes para fomentar a procura, de modo a atenuar o fraco poder de compra na Europa. Uma concepção adequada das reformas estruturais, que não venha reduzir ainda mais a procura interna, pode dar um incentivo importante à criação de emprego.

Neste sentido, deve ser dada especial importância à a promoção da empregabilidade, ao combate à falta de habilitações e à integração dos grupos menos favorecidos no mercado de trabalho.

A UE, no seu todo, tem beneficiado da concorrência global, apresentando uma balança comercial positiva, mas continua a registar índices de crescimento insuficientes. Num contexto de concorrência global, a Europa deve socorrer-se dos seus pontos fortes. Não pode concorrer com os países da Ásia e da África em termos salariais. Em vez disso, deve continuar a investir numa ampla política de inovação e na produção de serviços e de bens de elevada qualidade e com valor acrescentado.

Para assegurar que a liberalização do comércio tenha um impacto positivo na economia europeia são imprescindíveis um regime cambial que impeça a distorção dos preços dos bens comerciais e uma repartição do trabalho por parte de todos os países envolvidos no comércio para permitir aumentos salariais indexados ao aumento da produtividade. Estas condições não estão ainda disponíveis e a sua criação deve ser um dos objectivos dos responsáveis políticos da UE.

O CESE apela a que seja conferido, na continuação da Estratégia de Lisboa, especial destaque à qualidade do trabalho, sobretudo no seguimento de reformas estruturais.

6.5   Apoio ao papel das PME na criação de emprego

São principalmente as pequenas e médias empresas as responsáveis pelo crescimento económico e pela criação de novos postos de trabalho no mercado interno europeu. Assim, importa estimular o espírito empresarial e explorar ao máximo o potencial das empresas, sobretudo através de um acesso facilitado ao financiamento, da simplificação das disposições de gestão empresarial e do reforço das medidas de promoção da qualificação (24).

As ajudas devem beneficiar sobretudo as empresas que, por mais inovadoras, contribuam mais para o crescimento e para o emprego. É muito mais importante auxiliar as empresas inovadoras do que procurar simplesmente aumentar o número total de empresas.

6.6   Optimizar a execução da Estratégia de Lisboa nos próprios Estados-Membros

Seguindo o relatório do Grupo de Peritos sobre a Estratégia de Lisboa, presidido por Wim KOK, de Novembro de 2004, o CESE está convicto de que a prossecução dos objectivos de Lisboa requer um muito maior empenho da parte dos Estados-Membros. Actualmente, o incumprimento dos diferentes objectivos não tem afectado minimamente a formulação das políticas nacionais. A «denúncia» pública desse incumprimento só parcialmente tem surtido efeito.

Há que converter os objectivos globais de emprego de Lisboa em objectivos nacionais correspondentes, criar maior transparência e encorajar um debate nacional alargado em torno de relatórios nacionais sobre a aplicação da Estratégia de Lisboa (ou sobre os planos de acção nacionais).

A comparação de desempenhos deve revelar a posição relativa dos diferentes Estados-Membros, permitindo que sejam tiradas as conclusões políticas adequadas.

Em função dos seus valores de 2000, alguns Estados-Membros terão de ser incitados a esforçar-se mais do que os outros para alcançar o objectivo global de emprego de Lisboa. Actualmente, os Estados-Membros com taxas de emprego de 70 % ou mais continuam a estar sujeitos aos mesmos requisitos que os restantes. Nesta linha, haverá que começar a dar mais ênfase à criação de novos postos de trabalho do que à mera comparação de estatísticas.

Para o êxito deste processo é essencial formar verdadeiras parcerias nacionais para as reformas, incluindo adequadamente os parceiros sociais (como já sugerido pelo Conselho Europeu de Março de 2004), e tornar os parlamentos nacionais mais responsáveis pela persecução dos objectivos.

6.7   Reflectir melhor o impacto do alargamento

Na definição da sua estratégia de emprego a UE deve dar particular atenção às necessidades dos novos Estados-Membros para lhes permitir alcançar igualmente os objectivos de emprego comunitários.

Também aqui importa garantir a participação adequada e efectiva dos parceiros sociais em todas as fases da execução da estratégia.

Os critérios de convergência para uma eventual adesão à UE devem ser concebidos de forma a promover, em vez de dificultar, o crescimento da economia e do emprego.

6.8   Tornar o orçamento da UE mais propício à Estratégia de Lisboa

Os objectivos de emprego da UE dependem de iniciativas europeias de crescimento que não se limitem a antecipar projectos já decididos pelo BEI. O relatório Sapir de 2003 fez já várias recomendações importantes no sentido de um orçamento conjuntural.

Também as perspectivas financeiras apresentadas pela Comissão para 2006-2013 contêm propostas interessantes, como a criação de um fundo de adaptação ao crescimento. Estas considerações devem ser aprofundadas e tudo deve ser feito para que o futuro orçamento da UE permita lançar iniciativas europeias eficazes de crescimento e emprego.

Para isso, é necessário garantir que os recursos disponibilizados sejam aplicados eficazmente, sobretudo nos países do alargamento, para uma prossecução consequente dos objectivos de crescimento e emprego de Lisboa.

6.9   Diálogo reforçado com a sociedade civil e papel do CESE

A Estratégia de Lisboa depende igualmente da sua aceitação pelo público europeu. O CESE está disposto a oferecer a sua experiência no âmbito da política europeia de emprego e a contribuir para a necessária sensibilização dos cidadãos europeus para a Estratégia de Lisboa.

O CESE vê o processo de Lisboa como uma das principais prioridades dos seus trabalhos e contempla empreender as reformas internas necessárias para poder cooperar estreitamente com a Comissão e com outros órgãos comunitários, em contacto permanente com a sociedade civil a nível europeu e nacional.

Tendo em conta os seus conhecimentos periciais e a sua representatividade, o CESE considera poder desempenhar um papel na elaboração de análises de impacto que a Comissão pretende sistematizar. Como o mostraram os debates em curso, é essencial que as propostas legislativas reflictam pluralidade de pontos de vista e sejam rigorosa e objectivamente fundadas. A transmissão prioritária das análises de impacto ao CESE, a possibilidade de este aduzir observações previamente à comunicação dessas análises às Instituições Europeias poderia contribuir para uma melhor aceitação das propostas legislativas europeias, no espírito da Parceria para a Renovação Europeia.

Bruxelas, 9 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Parecer do CESE sobre «Melhorar a aplicação da Estratégia de Lisboa» (relator: B. VEVER; co-relatores: E. EHNMARK e J. SIMPSON) (JO C 120 de 20.5.2005 — ECO/153).

(2)  Cf. o parecer do CESE de 16 de Dezembro de 2004 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Aumentar os níveis de emprego dos trabalhadores mais velhos e retardar a saída do mercado de trabalho» (Relator: G. DANTIN) (JO C 157 de 28.6.2005).

(3)  Cf. comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Aumentar os níveis de emprego dos trabalhadores mais velhos e retardar a saída do mercado de trabalho, COM(2004) 146 final.

(4)  Os dados do Eurostat só estão disponíveis até 2003. Dado o fraco crescimento económico, os dados para 2004 deverão ser, no melhor dos casos, apenas muito pouco superiores aos de 2003.

(5)  Cf. v.g. o parecer do CESE de 26/2/2004 sobre «Política orçamental e tipo de investimento» (relatora: S. FLORIO) (JO C 322 de 25/2/2004 — ECO/105).

(6)  Cf. nomeadamente o parecer do CESE de 11/12/2003 sobre as «Grandes orientações das políticas económicas 2003-2005» (relator: DELAPINA) (JO C 80 de 30/3/2004).

(7)  Cf. parecer do CESE de 30/6/2004 sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Decisão 2000/819/CE relativa a um programa plurianual para a empresa e o espírito empresarial, em especial para as pequenas e médias empresas (PME) (2001-2005)» (relator: D. DIMITRIADIS) (JO C 302, de 7.12.2004), parecer do CESE de 31.3.2004 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Actualizar e simplificar o acervo comunitário» (relator: D. RETUREAU) (JO C 112 de 30/4/2004) e o parecer do CESE de 18/06/2003 sobre «O papel das pequenas e microempresas na vida económica e no tecido produtivo europeu» (relator: PEZZINI) (JO C 220 de 16/9/2003).

(8)  Cf. nomeadamente o parecer do CESE de 24/9/2003 sobre o «Livro Verde sobre o espírito empresarial na Europa» (relator: BUTTERS) (JO C 10 de 14/1/2004).

(9)  Cf. nomeadamente o actual parecer de prospectiva do CESE de 28/10/2004 sobre «Formação e produtividade» (relator: KORYFIDIS) (CESE 1435/2004).

(10)  Veja-se o PISA 2003: OECD Programme for International Assessment (PISA) [programa da OCDE de avaliação internacional].

(11)  Parecer de iniciativa do CESE de 26/02/2004 sobre as «Medidas de apoio ao emprego» (relatora: R. HORNUNG-DRAUS, co-relator: W. GREIF) (JO C 110 de 30/4/2004).

(12)  Cf. o parecer do CESE de 15.12.2004 sobre a Comunicação da Comissão intitulada «Ciência e tecnologia, as chaves para o futuro da Europa – Orientações para a política de apoio à investigação da União» (relator: WOLF) (JO C 157 de 28.6.2005).

(13)  Um estudo conjunto da Universidade de Cantabrígia e do Instituto de Tecnologia do Massachusetts (MIT) concluiu que cerca de 2/3 das PME do Reino Unido recorrem a conhecimentos periciais das universidades, contra apenas 1/3 nos EUA. Por outro lado, apenas 13 % das PME britânicas consideram importante a interligação em rede da formação universitária, contra 30 % nos EUA (cf. Financial Times, Londres, 30/11/2004).

(14)  Cf. o relatório do Grupo de Alto Nível sobre o futuro da política social na União Europeia alargada, de Maio de 2004.

(15)  Cf. igualmente o parecer do CESE de 10/12/2003 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Revisão intercalar da agenda de política social» (SOC/148 — relator: JAHIER – JO C 80 de 30/3/2004), o parecer de iniciativa do CESE de 12/09/2001 sobre «Os serviços sociais privados com fins não lucrativos no contexto dos serviços de interesse geral na Europa» (SOC/67 – relator: BLOCH-LAINE — JO C 311 de 7/11/2001) e o parecer do CESE de 2/3/2000 sobre «A economia social e o mercado único» (INT/29 – relator: OLSSON — JO C 155 de 29/5/2001).

(16)  Parecer de iniciativa do CESE de 26/02/2004 sobre as «Medidas de apoio ao emprego» (relatora: R. HORNUNG-DRAUS, co-relator: W. GREIF) (JO C 110 de 30/4/2004).

(17)  Cf. «The European Pact for Youth» [Pacto Europeu para a Juventude], apresentado no Conselho Europeu de 5 de Novembro de 2004 pela França, Alemanha, Espanha e Suécia, entre outros países, e destinado a solucionar os problemas do desemprego entre os jovens e da exclusão social.

(18)  Cf. o parecer do CESE de 10/12/2003 sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre imigração, integração e emprego» (relator: PARIZA CASTAÑOS) (JO C 80 de 30/3/2003).

(19)  Cf.: European Policy Centre (2004): Lisbon Revisited – Finding a New Path to European Growth (citado no relatório do grupo de alto nível sobre o futuro da política social, de 20 de Maio de 2004, p. 42).

(20)  Cf. o relatório do Grupo de Alto Nível sobre o futuro da política social na União Europeia alargada, de Maio de 2004.

(21)  Cf. o parecer do CESE de 1/7/2004 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Modernizar a protecção social para mais e melhores empregos: uma abordagem global para tornar o trabalho compensador» (relatora: Donna ST. HILL) (JO C 302, de 7.12.2004).

(22)  Cf. o parecer do CESE de 16 de Dezembro de 2004 sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Aumentar os níveis de emprego dos trabalhadores mais velhos e retardar a saída do mercado de trabalho» (Relator: G. DANTIN) (JO C 157 de 28.6.2005).

(23)  Cf. o relatório de 2004 sobre as iniciativas dos parceiros sociais dos Estados-Membros para a aplicação das orientações gerais do emprego, ETUC, UNICE, UEAPME, 2004.

(24)  Cf. os pareceres do CESE referidos nas notas 7 e 8.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/108


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Financiamento da rede NATURA 2000

COM(2004) 431 final

(2005/C 221/19)

Em 15 de Julho de 2004, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, a Comissão decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o seguinte documento: Comunicação supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente emitiu parecer em 13 de Janeiro de 2005, sendo relator L. RIBBE.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 10 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por unanimidade, o seguinte parecer:

1.   Preâmbulo

1.1

A comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre o «Financiamento da rede NATURA 2000» em análise

descreve a situação, para já insatisfatória, da protecção da natureza na Europa,

remete para as muitas decisões políticas, designadamente, dos chefes de Estado e de governo da UE, centradas na preservação da biodiversidade na Europa,

enuncia a legislação europeia pertinente em matéria de protecção da natureza e as obrigações que dela decorrem para a UE, mas também para os Estados-Membros, sobretudo com respeito à criação de uma rede de sítios protegidos, a NATURA 2000,

reitera uma vez mais os argumentos que defendem o empenhamento na protecção da natureza que não dizem apenas respeito ao domínio ambiental ou cultural propriamente dito, mas têm igualmente ligações com a economia e a sociedade e

avança com propostas para o possível co-financiamento pela UE das medidas ao abrigo da NATURA 2000.

1.2

Nesta comunicação a Comissão descreve a prática actual, induzida principalmente pelo artigo 8.o da Directiva FFH (1) (preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens), que até à data ainda não mostrou ser capaz de resolver os problemas existentes.

1.3

A necessidade de financiamento para o estabelecimento, a aplicação e a gestão da rede NATURA 2000 é um dado adquirido. No entanto, a Comissão adverte para o facto de a mesma não se encontrar ainda quantificada em termos exactos e definitivos. Neste momento, a Comissão considera a estimativa dos custos em 6 100 milhões de euros ao ano a mais fiável (para a UE a 25) (2), mas é preciso salientar que esta «pode e deve ser melhorada». Convida-se, portanto, os Estados-Membros a rever os dados apresentados, já que, no fim de contas, o pedido de co-financiamento releva da sua competência.

1.4

Infere-se do documento da Comissão que na UE já não se discute se a construção e a manutenção da rede NATURA 2000 deve ou não contar com apoio financeiro comunitário, mas unicamente como utilizá-lo da melhor maneira.

1.5

São apontadas três possibilidades:

a utilização dos actuais fundos comunitários (nomeadamente, os Fundos de Desenvolvimento Rural, a FEOGA-Garantia, os Fundos Estruturais, como FEDER, FSE, FEOGA-Orientação, o Fundo de Coesão e LIFE-Natureza);

o aumento e a melhoria do instrumento LIFE-Natureza, de modo a torná-lo o principal mecanismo de aplicação;

a criação de um novo instrumento de financiamento consagrado exclusivamente à rede NATURA 2000.

1.6

Nas suas reflexões, a Comissão, após ter consultado designadamente os Estados-Membros envolvidos, decidiu-se pela primeira opção, ou seja, o recurso aos fundos comunitários existentes.

1.7

Não deixa, contudo, de chamar a atenção para as limitações inerentes a esta opção que convém superar. Alerta, por exemplo, para o facto de uma parte dos fundos actuais não terem uma cobertura geográfica integral e de haver, por isso, regiões com sítios NATURA 2000 que ficariam praticamente excluídas do apoio financeiro. É sabido que o FEDER não se aplica em toda a parte e que as dotações do Fundo de Coesão apenas beneficiam certos Estados-Membros. A Comissão promete remediar esta situação através da redefinição dos Fundos Estruturais.

2.   Observações na generalidade

2.1

O CESE regozija-se com a comunicação da Comissão que, no seu todo, constitui uma boa base de reflexão. O debate agora lançado já se impunha há muito tempo porque, não obstante as inúmeras manifestações políticas e a situação da protecção da natureza ser hoje catastrófica, pouco ou nada mudou nos últimos anos. A Comissão e os Estados-Membros não se cansam de referir a sua crescente deterioração. Se nos orientarmos pelo produto nacional bruto, vemos que enquanto, por um lado, a sociedade europeia nunca esteve tão bem materialmente, por outro, a protecção da Natureza nunca esteve tão mal como nos tempos que correm.

2.2

O CESE remete a propósito para o seu parecer de iniciativa intitulado: «A situação da natureza e da protecção da natureza na Europa»  (3)de 2001, bem como para a comunicação da Comissão sobre o tema «Análise da política de ambiente 2003» (4). Neste contexto, muito se compraz em constatar a visível convergência de pontos de vista entre a Comissão e o CESE na avaliação da situação.

2.3

A rede NATURA 2000 assenta fundamentalmente na directiva FFH adoptada em 1992. Por seu intermédio tanto os Estados-Membros como a União Europeia fizeram duas promessas:

por um lado, a criação de uma rede europeia de protecção da natureza designada por NATURA 2000 a finalizar dentro de um prazo de três anos (5) e,

por outro lado, a afectação de meios financeiros para não fazer impender os encargos sobre os proprietários ou os utilizadores das terras.

2.4

Ora, nenhuma destas promessas foi cumprida. O Comité espera, portanto, que a Comissão e os Estados-Membros não se fiquem apenas por decisões bem sonantes mas que sejam também consequentes e as transformem em acções concretas.

2.5

A rede NATURA 2000 é essencial para preservar a biodiversidade na Europa. Os chefes de Estado e de governo comprometeram-se já por várias vezes a refrear o seu declínio dramático. O CESE recorda, a este propósito, os compromissos celebrados pela UE e os Estados-Membros no âmbito da Convenção sobre Biodiversidade. A protecção da natureza e das espécies é, além disso imprescindível para a conservação dos recursos genéticos e bióticos.

2.6

É evidente que na questão do financiamento da NATURA 2000, não é só a protecção da natureza propriamente dita que está em causa, mas também a sua aceitação pela sociedade e a credibilidade que a Comissão e os Estados-Membros conseguirem granjear para a sua política ambiental.

2.7

O CESE observa que tem havido enormes atrasos na identificação dos sítios NATURA 2000, e que, doze anos volvidos sobre a adopção da directiva FFH, esta rede ainda não se encontra implantada. Os proprietários e os utilizadores das terras continuam a considerar uma desvantagem o facto de terem de explorar terras localizadas em sítios NATURA 2000. Esta atitude deve-se, sobretudo, à falta de um esclarecimento definitivo sobre as consequências financeiras.

2.8

Já não é a primeira vez que o CESE adverte que, para a conservação do património natural único da Europa, é imprescindível desenvolver uma verdadeira parceria entre a protecção da Natureza e a agricultura. Por outro lado, é essencial que os agricultores, que respeitam e aplicam as normas da protecção da natureza, sejam tratados como parceiros de pleno direito pelas instâncias competentes e pelas organizações ambientalistas locais. O esclarecimento dos aspectos financeiros é aqui de importância fundamental.

2.9

O documento da Comissão é, por conseguinte, extemporâneo. Não passaram, aliás, despercebidas ao CESE as grandes dificuldades com que se debateu a Comissão para chegar a um consenso sobre a redacção da comunicação, o que levou a adiar por várias vezes a sua publicação.

2.10

No seu parecer de iniciativa, o CESE chamou a atenção para dois pontos cruciais que a Comissão considera agora também extremamente importantes. Ei-los:

A Europa não só possui valores culturais extraordinários mas as diversas paisagens culturais e naturais representam também um património natural de realce que merece ser preservado. A enorme variedade e multiplicidade das paisagens e o grande número de espécies animais e vegetais que lhes são próprias é que infundem ao continente europeu um carácter tão fascinante e atraente. A sua preservação é, portanto, um grande desafio para a política, a administração e os cidadãos em todos os níveis políticos e administrativos, que devem fazer tudo para dar às gerações vindouras a possibilidade de desfrutarem elas também deste privilégio.

Mas a protecção da natureza não é apenas um fim em si, a natureza é um fundamento indispensável para a vida e a economia. É um recurso fundamental para as actividades económicas e constitui, além disso, uma premissa para inúmeras actividades desportivas, de tempos livres e lazer, condicionando a saúde pública e servindo de base a diversas terapias.

2.11

O CESE aprecia que a Comissão tenha dado na sua comunicação justamente realce à vertente económica. A sua asserção de que «a protecção da biodiversidade não é simplesmente uma opção, mas um elemento essencial do desenvolvimento sustentável» merece todo o apoio do Comité.

2.12

Convém, aliás, salientar que a importância para a economia regional referida no ponto 2.2.3 da comunicação e os benefícios económicos que lhe são inerentes, bem como os benefícios sociais que deles resultarão, só muito raramente são ventilados ou têm a atenção que merecem no debate em torno da protecção da natureza e da rede NATURA 2000.

2.13

Mais do que seria de desejar, a protecção da natureza (e a correspondente identificação dos sítios NATURA 2000) é injustamente mais percebida como factor de custos, como uma sobrecarga, como uma desvantagem ou até como uma ameaça, o que explica perfeitamente as resistências observadas com bastante frequência e as extremas dificuldades com que colide a aplicação da legislação geralmente exemplar no âmbito da protecção da natureza.

2.14

O CESE dedicou algumas considerações a esta questão tão fundamental no parecer atrás referido. Mas verifica com pesar que nos últimos anos pouco ou nada se tem feito para mudar a situação. Convida, por isso, a Comissão a lançar, em colaboração com as instituições comunitárias e as demais partes interessadas ao nível comunitário e nacional, uma ampla campanha de sensibilização centrada neste problema.

2.15

Deve ser possível persuadir os cidadãos de que, parafraseando a Comissão, «um sítio da rede NATURA 2000 se pode transformar num motor de desenvolvimento sustentável, para a economia local, e contribuir para sustentar as comunidades rurais locais. Tomar em conta activamente estas questões no quadro de um diálogo com todos os actores implicados é imprescindível para o sucesso da criação da rede NATURA 2000 e para a sua integração no quadro socioeconómico mais vasto de uma União Europeia em crescimento.». O CESE crê que esta sensibilização é tão fundamental para o êxito da protecção da natureza na Europa como o esclarecimento da questão do financiamento que se espera esteja para breve.

2.16

Até à data só muito esporadicamente foi possível persuadir a opinião pública do valor económico das zonas de grande biodiversidade para o desenvolvimento regional (turismo, produtos regionais, etc.) ou da importância geral das áreas reservadas à natureza, por exemplo, para a protecção contra as alterações climáticas (6) ou contra as inundações. Também de pouco têm servido estudos como o mencionado no Anexo 1 que provam que «a vantagem puramente financeira da preservação da biodiversidade ... compensa largamente os custos que acarreta.».

2.17

Neste contexto, o CESE verifica com perplexidade que parece mais fácil disponibilizar recursos comunitários para reparar os danos causados por calamidades naturais, que são em parte resultado da delapidação dos recursos naturais e paisagísticos — e portanto de uma protecção da natureza insuficiente –, do que para a variante afinal bem mais económica de prevenir e evitar essas mesmas calamidades.

2.18

O CESE recorda que o artigo III-284.o do projecto de Constituição Europeia contém disposições segundo as quais: «a União incentiva a cooperação entre os Estados-Membros a fim de reforçar a eficácia dos sistemas de prevenção e de protecção contra as catástrofes naturais ou de origem humana no interior da União.». Ora, os sítios NATURA 2000 estão perfeitamente à altura de assumir esta função.

2.19

No entanto, enquanto foi possível reunir rapidamente fundos comunitários para catástrofes após a cheia calamitosa do rio Elba em 2002, é extremamente difícil adoptar e financiar, por exemplo, medidas de protecção ecológica integrada contra inundações nos rios e nas várzeas ribeirinhas que, segundo está provado, são capazes de reduzir o perigo de inundações (7) a montante e de evitar assim danos potenciais. O mesmo sucede com a prevenção de incêndios florestais, particularmente no Sul da Europa. Esta situação não pode continuar. Prevenir em vez de remediar, deveria ser este o lema da política comunitária, para mais sabendo-se que são determinantes os contributos da protecção da Natureza neste sentido.

2.20

Um dos motivos para a presente situação reside seguramente no facto de os custos ocasionados directa ou indirectamente pela protecção da natureza serem normalmente suportados pelos proprietários e utilizadores privados das terras, enquanto os efeitos positivos para a população são quase sempre contabilizados como «benefícios externos» (em contraposição aos «custos externos»), não se reflectindo positivamente no cálculo, por exemplo, do produto interno bruto. A nova regulamentação aplicável ao financiamento deverá ter em conta esta circunstância.

3.   Observações na especialidade

3.1

O CESE apraz-se constatar que não se discuta na Comissão a questão do co-financiamento das medidas comunitárias no âmbito da rede NATURA 2000, mas se fale «apenas» dos instrumentos a que é preciso recorrer.

3.2

A justificação dada para a opção de financiamento escolhida, ou seja, desenvolver os instrumentos de apoio existentes, é secundada inteiramente pelo Comité. A materialização da rede NATURA 2000, ao nível do planeamento, da administração e das finanças, deverá ter lugar onde se manifestam os problemas mas também onde existem as potencialidades de desenvolvimento, ou seja, in loco, nos Estados-Membros. Ao estruturar e ao utilizar de uma forma mais favorável para a protecção da natureza os fundos de financiamento existentes, como o FEDER, o Fundo de Coesão, o FEOGA e o novo Fundo Europeu Agrícola para o Desenvolvimento Rural (FEADER), está-se a oferecer aos serviços competentes dos Estados-Membros maior flexibilidade e maior liberdade de acção.

3.3

Também é acertado o ponto de vista da Comissão segundo o qual esta será provavelmente a melhor maneira de garantir «a integração da gestão dos sítios da rede NATURA 2000 nas políticas mais vastas de ordenamento do território da UE».

3.4

O CESE não quer deixar de chamar a atenção para a necessidade de multiplicar esforços, quer por parte da Comissão quer das autoridades competentes, para garantir que, futuramente, a UE não co-financiará mais qualquer projecto nocivo para o ambiente e que os danos causados à natureza e ao ambiente não serão mais tarde cobertos de novo por fundos comunitários.

A situação financeira da UE e a previsível luta para obter subsídios

3.5

O debate em torno do financiamento da rede NATURA 2000 terá por pano de fundo as esperadas dissensões quanto ao montante do orçamento geral da UE e à repartição dos meios disponíveis (8). É óbvio que haverá uma luta renhida para obter subsídios:

As perspectivas financeiras apresentadas pela Comissão para o período 2007-2013 prevêem despesas numa média de 1,14 % do RNB, com um tecto de recursos próprios de 1,24 %. Os chamados «contribuintes líquidos» insistem actualmente em fixar um limite máximo de 1 %, o que significaria um montante de 30 mil milhões de euros em 2013, no caso de levarem avante a sua exigência.

Com o alargamento da UE acabar-se-á forçosamente por deslocar meios financeiros entre Estados-Membros e regiões, sobretudo no âmbito das ajudas estruturais (9). As regiões que até à data beneficiavam de apoio deixarão provavelmente, após um período transitório, de ser elegíveis segundo os critérios vigentes.

3.6

O debate sobre o limite máximo deve ser visto com base no facto de a quantia mínima anual de 6 100 milhões de euros orçada pela Comissão para a protecção da Natureza se ir juntar às tarefas do segundo pilar, sem que tenham sido até à data previstos nas perspectivas financeiras meios adequados para o efeito. É de esperar uma luta renhida para obter subsídios quer entre as regiões quer entre as várias políticas sectoriais. Esta controvérsia não é de modo algum inédita, só que no passado a protecção da natureza ficava sempre em último lugar.

3.7

Importa, por conseguinte, assegurar que a protecção da natureza, considerada acertadamente como uma componente da política global, não seja subordinada pelos Estados-Membros a outras prioridades e acabe impiedosamente trucidada. O CESE não se cansa de realçar que a protecção da natureza na Europa não é um luxo de que se pode desfrutar em períodos de prosperidade económica e de que se pode prescindir se não houver dinheiro suficiente para sustentá-lo. A protecção da natureza — como têm salientado repetidamente os chefes de Estado — é uma missão de toda a sociedade, um dever político cujo financiamento é indispensável.

3.8

Para observar o princípio de uma gestão orçamental prudente, é essencial, por um lado, esclarecer quais as áreas de intervenção da rede NATURA 2000 que são consideradas absolutamente imprescindíveis ou as que relevam de um programa «mais ou menos livre». No caso das acções imprescindíveis (p.ex. pagamentos de compensação ou incentivos para os proprietários e utilizadores das terras) haverá que impor obrigações específicas bem claras. Se assim não for, o CESE ver-se-á impossibilitado de aprovar o princípio da integração do financiamento da rede NATURA 2000 nos fundos existentes e terá de pronunciar-se — como muitas das partes envolvidas já fizeram — a favor de um instrumento financeiro próprio.

Necessidades específicas da protecção da natureza na Europa

3.9

O quadro 2 do anexo à comunicação da Comissão classifica os sítios NATURA 2000 por tipo de utilização dos solos. As antigas pastagens, charnecas, matagais e prados perfazem 26,3 % das áreas NATURA 2000, a superfície ocupada pelas florestas (não exploradas ou unicamente de forma extensiva) é mesmo de 28,9 %, os pântanos e as zonas húmidas não passam de uns meros 13 %, pomares antigos ou as dehesas da Espanha ou de Portugal tão ricas em espécies (no total nem chegam a 800.000 hectares) andam à volta de 2 %. A parte que corresponde à agricultura não ultrapassa os 5,6 % (10).

3.10

A Comissão descreve minuciosamente as medidas necessárias para a realização da rede NATURA 2000 (parte 3 do anexo) e calcula os custos daí decorrentes (actualmente 6,1 mil milhões de euros). Sem querer entrar em detalhes, é possível distinguir entre custos de administração e de planeamento (p.ex. compra de terras mas também investimentos) e despesas correntes, designadamente para pagamentos compensatórios a proprietários fundiários ou para medidas de manutenção dos habitats.

3.10.1

O CESE considera absolutamente premente que se apresente com toda a brevidade cálculos mais exactos dos custos envolvidos. Duvida, por exemplo, que seja suficiente a importância indicada para os novos Estados-Membros de 0,3 mil milhões de euros (no caso da UE a 15 é de 5,8 mil milhões de euros). É obviamente de prever que alguns países (p.ex. a Polónia) venham a notificar posteriormente outros sítios elegíveis para a rede NATURA 2000, o que implicará decerto meios financeiros suplementares.

3.11

Na opinião do CESE, a Comissão tem razão ao afirmar que a protecção da natureza implica muitas vezes garantir por princípio a manutenção dos métodos de exploração tradicionais indispensáveis para o surgimento e a conservação dos habitats naturais. São em geral práticas agrícolas que, com o tempo, se têm revelado pouco rentáveis para os seus utilizadores. Um exemplo: raros são os sistemas que se coadunam tão bem com o princípio de desenvolvimento sustentável como o antigo sistema de pastagens extensivas usado na Península Ibérica (dehesas), que incluindo o transporte de gado das terras do Sul para os pastos de Verão no Norte de Espanha (transumância) através das chamadas «cañadas», o qual transformou ao longo de décadas esta região numa valiosa área natural.

3.12

No entanto, após leitura do documento da Comissão, o CESE continua sem saber se é realmente imprescindível e se está previsto em todos os domínios o co-financiamento da UE ou em que casos se deve esperar exclusivamente dos Estados-Membros contributos financeiros no âmbito da transposição do direito comunitário. Tudo aponta para a necessidade de clarificar este ponto.

3.13

Como os conflitos surgem normalmente do facto de os utilizadores da terra não terem até à data usufruído de compensações ou de incentivos cabais, haverá que prestar a máxima atenção a este problema. Não se pode falar do valor da protecção da natureza para a sociedade e para a economia em geral e, ao mesmo tempo, imputar aos proprietário e utilizadores das terras os «custos» daí decorrentes. Futuramente, as disposições financeiras terão de garantir aos proprietários ou aos utilizadores privados das terras, no mínimo, uma compensação ou melhor ainda um incentivo para encorajá-los a iniciativas favoráveis à protecção da natureza. Viver nos sítios NATURA 2000 e explorá-los do ponto de vista agrícola deveria ser visto como uma «bênção» e não como uma «maldição».

3.14

Para esse efeito, haverá que determinar em cada um dos casos o grau de necessidade de pagamentos compensatórios. Estabelecer um tecto geral ou uma limitação temporal da validade do direito a estes pagamentos, conforme se prevê actualmente, apenas servirá para comprometer esta abordagem global.

3.14.1

Para os pagamentos compensatórios deveria recorrer-se em primeira instância — se não tiver sido criada qualquer rubrica orçamental específica — ao segundo pilar, enquanto no caso dos investimentos interviriam antes os clássicos Fundos Estruturais. O CESE verifica com grande apreensão que não será possível financiar a partir deste programa as novas actividades ou os pagamentos que viriam juntar-se às prestações actuais do primeiro pilar (as do futuro «desenvolvimento rural»), a não ser que se proceda a cortes nas despesas ou se disponibilize meios financeiros suplementares.

3.14.2

Isso significa concretamente que, para preservar a qualidade do desenvolvimento rural e contribuir além disso para o financiamento de NATURA 2000, por intermédio do segundo pilar, são necessários meios financeiros suplementares ligados a objectivos concretos. O CESE constata, todavia, que um tal aumento não se encontra previsto nas perspectivas financeiras apresentadas pela Comissão, e não é aceite pelos contribuintes líquidos, e que é grande o risco de se ter de economizar justamente no segundo pilar. O CESE vê nisso não só uma grande fraqueza e uma fonte de conflitos, como também uma ameaça real para todos os esforços comunitários para proteger a natureza.

3.14.3

Assim sendo, apenas poderá aprovar a regulamentação prevista se esta não puser em causa outras medidas de desenvolvimento rural. Sem recursos suplementares, a Comissão e os Estados-Membros jamais poderão cumprir as exigências requeridas nem as suas promessas políticas de apoio ao desenvolvimento rural e à execução da rede NATURA 2000. Os responsáveis políticos que desejam transformar deste modo o rosto da Europa deveriam, pelo menos, ter a coragem de explicar claramente e sem rodeios à opinião pública que já não há interesse político em assumir determinadas tarefas (por exemplo, a protecção da natureza).

3.15

O CESE não quer dizer com isto que não deva haver uma certa contenção financeira. O objectivo primordial da regulamentação da protecção da natureza da UE e, consequentemente, da rede NATURA 2000, é a preservação da biodiversidade. É por assim dizer um «programa obrigatório» no qual a UE terá de participar, pelo menos nos domínios com relevância para a Europa.

3.16

Mas, inversamente, isso também significa que nem todas as medidas municipais de protecção da natureza são forçosamente medidas com relevância para a Europa e não têm, por esse facto, direito a co-financiamento. Os Estados-Membros, as regiões, os municípios, etc. não devem eximir-se à sua clara responsabilidade financeira e política dizendo: «Sem a ajuda financeira da UE não há protecção da natureza». Do mesmo modo, a UE não deve escudar-se com a sua posição: «Criamos a possibilidade de financiar medidas a partir dos fundos existentes. Se os Estados-Membros não a aproveitam, por terem outras prioridades, a culpa é deles.»

3.17

Por outro lado, se a conveniência de explorar as potencialidades de desenvolvimento económico dos sítios NATURA 2000, no plano regional, surge como incontestável (porque a protecção da natureza traz sem dúvida benefícios económicos), este facto já não é tão pertinente quando se trata da preservação das espécies.

3.18

Tal significa para o CESE que determinadas medidas de financiamento previstas no âmbito da execução da rede NATURA 2000 são imprescindíveis e que convém, para este efeito, coadunar as dotações estabelecidas com as exigências financeiras. O CESE exorta, por último, os Estados-Membros e a Comissão a prosseguirem as suas reflexões neste sentido.

Bruxelas, 10 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Directiva 92/43/CEE in JO L 206 de 22/7/1992, p. 7.

(2)  Custos totais cujo financiamento compete aos Estados-Membros e à UE.

(3)  JO C 221 de 7/8/2001, p. 96-102.

(4)  Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu «Análise da política de ambiente 2003» — COM(2002)745 final, de 3/12/2003.

(5)  O período de três anos (ou seja até 1995) diz respeito à notificação pelos Estados-Membros das regiões contempladas. Neste momento, esta notificação ainda não se encontra totalmente concluída.

(6)  Zonas pantanosas e húmidas são, por exemplo, preciosos reservatórios de CO2.

(7)  Estas medidas devem ter um carácter transfronteiras. Os Países Baixos beneficiam sem sombra de dúvida de medidas desta natureza que, ao mesmo tempo, têm muitas vezes um valor inestimável em termos de protecção da natureza.

(8)  Ver parecer do CESE sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Construir o nosso futuro em comum – Desafios políticos e recursos orçamentais da União alargada para 2007-2013» — (COM(2004) 101 final) – CESE 1204/2004 (ainda não publicado no Jornal Oficial).

(9)  De onde proviriam importantes componentes do financiamento da rede NATURA 2000.

(10)  De referir ainda, por exemplo, os 13 % de zonas marítimas e 4 % de zonas costeiras que dão origem a custos de vigilância muito elevados.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/113


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos serviços no mercado interno»

COM(2004) 2 final — 2004/0001 (COD)

(2005/C 221/20)

Em 20 de Fevereiro de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 11 de Janeiro de 2005, tendo sido relator A. METZLER e co-relator E. EHNMARK.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 10 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 145 votos a favor, 69 votos contra e 9 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Preâmbulo

1.1

A nota explicativa da Comissão ao Conselho (Doc. 10865/04 de 25 de Junho de 2004), juntamente com o Doc. 1153/04 de 5 de Julho de 2004 respeitante ao artigo 24.o, bem como os documentos de trabalho do Parlamento Europeu datados de 25 de Março de 2004 (Comissão dos Assuntos Jurídicos e do Mercado Interno — Relatora: Evelyne GEBHARD) e de 26 de Março de 2004 (Comissão do Emprego e dos Assuntos Sociais — Relatora: Anne E. M. Van LANCKER), serviram de base à análise efectuada pelo Comité.

1.2

A partir da análise das respostas a um questionário previamente distribuído, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, incumbida dos trabalhos preparatórios, efectuou consulta em 24 de Maio de 2004, na qual participaram representantes da economia dos serviços. Foram avaliadas mais de 100 respostas adicionais escritas e orais.

2.   Observações na generalidade

2.1

De acordo com a Estratégia de Lisboa, o sector dos serviços tem um papel crucial na realização do mercado interno europeu e assume importância fundamental para o crescimento económico da UE. A proposta de directiva da Comissão sobre serviços no mercado interno, e respectiva nota explicativa, inscrevem-se no processo de reforma económica europeu para transformar a Europa, até 2010, na economia assente no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos e com maior coesão social. Sendo um elemento construtivo básico, a proposta de directiva pretende estabelecer um quadro jurídico que assegure a liberdade de estabelecimento e prestação de serviços transfronteiriços entre os Estados-Membros nos domínios da indústria, do comércio, dos vários ofícios e das profissões liberais, independentemente de se tratar de trabalho a tempo inteiro, trabalho parcial ou trabalho temporário por intermédio de agências. A nova abordagem horizontal visa simplificar os procedimentos, garantir ao consumidor qualidade uniforme dos serviços e maior transparência das disposições a cumprir. A prestação de serviços transfronteiriços é um elemento fundamental do mercado interno e a supressão de obstáculos reveste-se da maior importância para o desenvolvimento económico deste sector e, sobretudo, para os consumidores. A directiva procura aumentar o número de fornecedores de serviços e fomentar a concorrência, levando a preços mais reduzidos e a uma maior escolha para os consumidores. O Comité acolhe, pois, com agrado os objectivos gerais da proposta de directiva.

2.1.1

Para um bom funcionamento do mercado interno é essencial eliminar obstáculos e criar regulação adequada. Por sua vez, o aumento da competitividade europeia passa pela adopção de regulamentação e harmonização das normas à escala nacional e comunitária.

2.2

O Comité está ciente de que a realização do mercado interno dos serviços é um assunto complexo, atendendo às disparidades entre os ordenamentos jurídicos e as culturas dos Estados-Membros. Este aspecto foi salientado pelo Comité no seu parecer INT/105, de 28 de Novembro de 2001 (1), sobre a Comunicação da Comissão intitulada «Uma estratégia do mercado interno para os serviços», no qual subscreve plenamente o objectivo da Comissão Europeia de acelerar a conclusão do mercado interno. Sendo o objectivo da proposta de directiva criar no mercado interno um quadro intersectorial, é importante prever soluções flexíveis, sem burocracia, através de sistemas comprovados de auto-regulação na União Europeia. O processo de integração, para além de ter de ser melhorado, tendo em conta a nova proposta de directiva da Comissão Europeia para o reconhecimento das qualificações profissionais, deve corresponder a padrões (de segurança) de comprovada eficácia, relevantes não apenas para o consumidor, mas também social e ecologicamente.

2.3

A proposta de directiva em apreço está intimamente ligada à proposta de directiva sobre o reconhecimento das qualificações profissionais e à comunicação sobre a concorrência nos serviços das profissões liberais, ao debate actual sobre os serviços de interesse geral e à respectiva consulta em curso, bem como à Convenção «Roma I» e à proposta de regulamento «Roma II». Todas estas propostas têm por objectivo melhorar o funcionamento do mercado interno. Por conseguinte, seria desejável uma melhor coordenação por parte da Comissão, fundamental para uma articulação entre os trabalhos desenvolvidos e as disposições existentes.

2.4

A proposta de directiva incide em dois tipos de liberdade de estabelecimento e de prestação de serviços transfronteiriços: um prestador de serviços de um Estado-Membro pretende estabelecer-se num outro Estado-Membro para fornecer os seus serviços; e um prestador de serviços estabelecido num Estado-Membro pretende a partir daí prestar serviços num outro Estado-Membro, deslocando-se ao território deste temporariamente. Para garantir a supressão do que a Comissão Europeia tem vindo a considerar como obstáculos, são propostas quatro medidas fundamentais:

Aplicação do princípio do país de origem;

Repartição de tarefas entre o Estado-Membro de origem e o Estado-Membro de destino, em caso de destacamento de trabalhadores para prestação de serviços;

Fortalecimento da confiança recíproca; e

Reforço da assistência mútua entre os Estados-Membros, limitando-se simultaneamente as possibilidades de os Estados-Membros se munirem de mecanismos próprios de acompanhamento, controlo e cumprimento.

3.   Proposta da Comissão

3.1

O CESE analisou cuidadosamente a proposta de directiva na perspectiva do que se pode esperar de uma directiva de tão grande amplitude, tendo concluído que são indispensáveis inúmeras clarificações e alterações para responder convenientemente às questões em aberto, e fazer com que este novo esforço de promoção dos serviços no mercado interno constitua um verdadeiro passo em frente. Esta afirmação é corroborada pelas insuficientes avaliações efectuadas antes da apresentação da proposta de directiva. Nem mesmo o documento da Comissão Europeia apresentado ao Conselho da União Europeia em 25 de Junho de 2004 (documento do Conselho 10865/04) conseguiu dissipar completamente as numerosas preocupações manifestadas pelos mais variados sectores económicos e sociais na consulta efectuada em 24 de Maio de 2004. Uma avaliação de impacto apresentada pela Comissão seria, pois, útil a todas as partes envolvidas.

3.2   Aplicação prática

3.2.1

O Comité constata, com alguma admiração, que a exposição de motivos da proposta de directiva não indica nenhuma base estatística fiável para a quantificação da liberdade de estabelecimento e de prestação de serviços transfronteiriços. Estes dados devem ser incluídos no relatório de avaliação da Comissão. Uma base empírica rigorosa é extremamente importante se se quiser ilustrar, com fiabilidade, a importância dos serviços para o funcionamento do mercado interno e o resultado — positivo ou, talvez até, negativo — da simplificação da regulamentação prevista no projecto de directiva. O Comité considera que o apuramento das verdadeiras razões que determinam a liberdade de estabelecimento e de prestação de serviços transfronteiriços é fundamental para a realização do mercado interno.

3.2.2

Dever-se-ia tomar em maior consideração o material estatístico disponível em administrações públicas, institutos de investigação, companhias de seguros e estruturas administrativas autónomas dos vários Estados-Membros.

3.2.3

Por outro lado, para fazer face às lacunas existentes, o Comité considera indispensável que se abram novas vias de exploração dos dados empíricos, sem que daí resulte um aumento da burocracia. Haverá, talvez, que prever a possibilidade de cruzar dados apurados individualmente com dados das estatísticas oficiais.

3.3   Âmbito de aplicação: Definições — Conflitos de leis — Delimitação

3.3.1

O Comité sugere que o âmbito de aplicação da proposta de directiva e as excepções nela previstas sejam definidos e delimitados com maior clareza e precisão. O facto de não haver definições claras origina incertezas quanto ao campo de aplicação e aos sectores dos serviços abrangidos, não permitindo saber como e em que medida serão afectados.

3.3.2

O Comité concorda com a delimitação das definições de «serviços comerciais» e «serviços das profissões liberais», tanto mais que já propusera reforçar transitoriamente a harmonização em determinados domínios (profissões liberais, outras áreas particularmente sensíveis). E isto para que os mecanismos de garantia da qualidade, previstos no Capítulo IV da proposta de directiva, se possam tornar mais favoráveis ao consumidor. No acórdão de 11 de Outubro de 2001 (Processo C-267/99), o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias aponta, por exemplo, os principais elementos que caracterizam as profissões liberais, os quais poderiam servir de base a uma definição comum a nível da Europa.

3.3.3

Tendo a Comissão apresentado um Livro Verde e um Livro Branco, em 12 de Maio de 2004, sobre o tema «Serviços de interesse geral 2003», seria conveniente analisar mais detalhadamente e definir o impacto da proposta de directiva nesta área sensível nos Estados-Membros. Tendo a Comissão assumido o compromisso de apresentar, antes do final de 2005, um relatório sobre a viabilidade e necessidade de uma lei-quadro, como refere explicitamente o artigo III.122.o do Tratado Constitucional, o Comité considera preferível que o conjunto dos serviços de interesse geral (económicos e não económicos) sejam excluídos do âmbito de aplicação da Directiva «Serviços», até que o quadro comunitário sobre os serviços supramencionados estabeleça os princípios e fixe as condições, nomeadamente a nível económico e financeiro, que permitem aos serviços de interesse geral cumprirem a sua missão.

3.3.4

A excepção ao princípio do país de origem a que se refere o n.o 8 do artigo 17.o não pode limitar-se a alguns artigos ou títulos da directiva sobre o reconhecimento mútuo das qualificações profissionais, ainda em fase de elaboração. A aplicação do princípio do país de origem e a aplicação da proposta de directiva sobre o reconhecimento mútuo das qualificações profissionais têm de coordenar-se. Caso a excepção a que se refere o n.o 8 do artigo 17.o se aplicar apenas ao Título II da proposta sobre o reconhecimento mútuo das qualificações profissionais, é legítimo perguntar, por exemplo, de que forma se deve revestir a repartição de tarefas entre os chamados «pontos de contacto nos Estados-Membros» (artigo 53.o da proposta de directiva sobre o reconhecimento das qualificações profissionais) e os balcões únicos (One-Stop-Shops) previstos no artigo 6.o da proposta em apreço.

3.3.5

Resta esclarecer se e como o âmbito de aplicação da directiva — particularmente no que diz respeito ao princípio do país de origem — deverá ser mais delimitado por forma a evitar «conflitos» entre legislações internas dos Estados-Membros em matéria fiscal e penal. É assim que em alguns Estados-Membros, por exemplo, os auditores, peritos fiscais e advogados estão adstritos à obrigação de sigilo profissional, cuja inobservância é punida, enquanto que outros Estados-Membros prevêem uma obrigação — mesmo que limitada — de prestação de informações ou, até, de notificação por parte destes profissionais. Será que um prestador de serviços obrigado a prestar informações num Estado-Membro, mas que por força do princípio do país de origem teria o direito e até a obrigação de sigilo, pode desrespeitar o sistema penal nacional? O direito penal e o direito fiscal são da competência dos Estados-Membros, e não da UE, pelo que se impõe uma melhor delimitação jurídica a fim de evitar consequências indesejáveis para os interessados.

3.3.6

Dever-se-ia também analisar convenientemente as possibilidades de estabelecer uma relação entre os sistemas sociais e as obrigações orçamentais em caso de aplicação do princípio de origem. Importa igualmente prever derrogações para os casos em que o respeito por este princípio apresenta o risco de interferência com os sistemas nacionais de segurança e de saúde.

3.3.7

Quanto ao sector da saúde, o Comité considera necessário rever a questão da inclusão do sector hospitalar. Eventualmente, a jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias sobre o reembolso dos custos por tratamentos efectuados num outro Estado-Membro deveria ser levada à prática através de regulamentação ad hoc em matéria de regimes legais de segurança social, mas fora do âmbito da proposta de directiva.

3.3.7.1

Relativamente ao sector dos serviços sociais e sanitários, o Comité recomenda, por motivos de coordenação, que se aguarde a comunicação da Comissão prevista para 2005, não deixando, porém, de assinalar que muitas foram as vozes que sugeriram a exclusão deste sector do âmbito da proposta.

3.3.8

Por outro lado, há que estabelecer uma delimitação coerente relativamente ao campo de aplicação da oitava Directiva 84/253/CEE do Conselho, que está a ser revista, relativa à aprovação das pessoas encarregadas da fiscalização legal dos documentos contabilísticos (n.o 15 do artigo 17.o). As traduções da proposta da Comissão nem sempre são suficientemente claras quanto a este ponto.

3.3.9

Dever-se-ia incluir no texto vinculativo da directiva a clarificação que já consta da exposição de motivos da proposta de directiva, segundo a qual as disposições sobre o estabelecimento e a prestação de serviços não são aplicáveis às actividades que envolvam o exercício da autoridade pública (artigos 45.o e 55.o do Tratado CE).

3.3.10

O trabalho temporário por intermédio de agências, um sector particularmente sensível, deveria ser expressamente excluído de todo o âmbito de aplicação da directiva. Deverão ser desenvolvidos esforços no sentido de uma harmonização a nível europeu das necessárias disposições nacionais aplicáveis a este sector. O Comité refere-se, neste contexto, à anunciada proposta de directiva sobre as condições de trabalho temporário por intermédio de agências. Deve igualmente ser tida em conta a Convenção n.o 181 da OIT sobre as agências de emprego privadas, cujo n.o 2 do artigo 3.o prevê expressamente um sistema de autorização e licenciamento, com vista a garantir a protecção dos trabalhadores e melhor qualidade do trabalho prestado por estas agências.

3.3.11

Em alguns Estados-Membros há regulamentação extremamente rígida em matéria de protecção da liberdade de imprensa. Também neste campo, o Comité considera indispensável delimitar o respectivo campo de aplicação em relação à proposta de directiva.

3.3.12

A Comissão deve ainda esclarecer expressamente se esta proposta é, também, aplicável aos serviços de radiodifusão e, sendo esse o caso, de que modo pretende harmonizá-la com o disposto na Directiva «Televisão sem fronteiras». É indispensável clarificar se a referida proposta se aplica apenas aos serviços audiovisuais gerais ou também aos serviços audiovisuais prestados «a pedido» (service on demand), que já são objecto de disposições comunitárias sobre determinados aspectos jurídicos (Directiva 2000/31/CE sobre o comércio electrónico).

3.3.13

O CESE defende que, na fase actual, estes serviços deveriam ser expressamente excluídos do âmbito de aplicação da proposta de directiva, sobretudo no que diz respeito ao princípio do país de origem e à noção de «estabelecimento» que constitui critério essencial para determinar qual o Estado-Membro competente.

3.4   Balcões únicos («One-Stop-Shops»)

3.4.1

A ideia de simplificar os procedimentos através da criação de um balcão único é acolhida com agrado. No entanto, o Comité manifesta preocupação quanto ao facto de, no respeitante à liberdade de estabelecimento, a proposta de directiva prever, no artigo 6.o, que determinados procedimentos — em particular, para o início de uma actividade — sejam efectuados num ponto de contacto único. Mas há aqui um problema: no tocante às obrigações legais de inscrição nos registos públicos (de registo comercial), o balcão único terá que remeter para os serviços de registo competentes. Os chamados «balcões únicos» não podem ocupar-se sozinhos desta tramitação. A questão é saber como irão, na prática, cooperar com as autoridades de registo competentes.

3.4.2

No artigo 53.o da proposta de directiva sobre o reconhecimento das qualificações profissionais fala-se de «pontos de contacto», entendidos como pontos de informação central. Por sua vez, o artigo 6.o da proposta de directiva em apreço prevê a criação dos chamados «balcões únicos» («One-Stop-Shops») como pontos centralizados de contacto. Deverá, portanto, haver uma coordenação para evitar a proliferação de pontos de contacto, que é contrária ao objectivo primeiro de garantir aos cidadãos acesso fácil a informações na e sobre a União Europeia. A nova Comissão deverá dar especial atenção à simplificação dos procedimentos burocráticos, sendo de evitar um acréscimo da carga administrativa nos Estados-Membros.

3.4.3

É também necessário clarificar a questão da responsabilidade dos «balcões únicos» em caso de informações incompletas ou falsas. A omissão de uma dada autorização constituiria uma infracção à lei, com consequências negativas para o prestador de serviços. Mas o consumidor poderá também vir a sofrer consequências negativas se não houver cobertura suficiente em matéria de responsabilidade civil.

3.5   Princípio do país de origem

3.5.1

O Comité considera que a aplicação do princípio do país de origem em todo o território da UE exige que se criem, primeiro, as condições para o efeito, adoptando uma abordagem diferenciada que privilegie uma harmonização com normas elevadas em matéria de protecção dos trabalhadores, dos consumidores e do ambiente nos diferentes sectores, a fim de realizar um mercado interno de qualidade.

3.5.2

A aplicação generalizada do princípio do país de origem prevista no artigo 16.o da proposta de directiva em apreço constitui, juntamente com as derrogações previstas no artigo 17.o, o cerne da proposta. O regime do princípio do país de origem, até à data aplicado às mercadorias, é transposto sem mais para o sector dos serviços. Mas para tal são necessárias duas condições: normalização dos serviços, como se de mercadorias se tratasse, e elevado grau de harmonização das regras, para evitar distorções de concorrência, práticas de dumping social e a desconfiança dos consumidores. Caso não haja ou não seja possível estabelecer normas (as chamadas prestações não classificáveis), há que ter em conta estas particularidades.

3.5.3

O Comité considera, portanto, problemática a aplicação do princípio do país de origem aos serviços transfronteiriços, na medida em que pressupõe a existência de um nível jurídico efectivo e comparável. Na opinião do Comité, a aplicação do princípio do país de origem só pode funcionar se houver certeza e segurança jurídica quanto ao seu âmbito de aplicação. A aplicação do princípio do país de origem, sem que seja estabelecida uma fase de transição, é problemática. Tanto mais que, na perspectiva do Comité, ainda não se esgotaram todas as possibilidades de harmonização sectorial. Este princípio comporta o risco de uma concorrência entre sistemas com o consequente nivelamento por baixo de normas relevantes para os consumidores, para os trabalhadores e para o ambiente, uma vez que na UE continuam a coexistir diferentes sistemas jurídicos, sociais e de saúde. Numa perspectiva de harmonização, uma abordagem sectorial pode garantir, sobretudo em áreas particularmente sensíveis, uma melhor adaptação aos desafios do mercado interno do que uma abordagem meramente horizontal. Isto passa pela análise da viabilidade da aplicação do princípio do país de origem a cada sector, através de uma avaliação detalhada, que inclua também os aspectos sociais e ambientais relevantes, e com a participação de todas partes interessadas, nomeadamente organizações de defesa do consumidor, parceiros sociais, etc. Dado que as medidas de harmonização por si constituem, também, um instrumento para a realização do mercado interno, há que proceder, num período transitório adequado, à aproximação das diferentes disposições sobre sectores relativamente aos quais os Estados-Membros estabeleceram regulamentação específica em matéria social, sanitária e laboral. Num período transitório, a Comissão Europeia, o Parlamento Europeu e o Conselho devem fazer o ponto da situação e analisar o grau de harmonização alcançado nos sectores atrás referidos. Em função do estado de avanço da harmonização jurídica, poderá ser necessário prever um período para a conclusão da harmonização. Para o Comité, a vantagem deste método, desde que associado a uma definição limitativa de serviços específicos (por exemplo, as profissões liberais), é que os sectores em causa têm assim a possibilidade de se prepararem progressiva e convenientemente para uma eventual aplicação do princípio do país de origem, na perspectiva da realização do mercado interno. Isto aplica-se também aos mecanismos de co-regulação e auto-regulação.

3.5.4

O Comité considera que se deverá reflectir sobre a utilidade de criar um registo central autónomo, do qual constassem ilegalidades e irregularidades no exercício de profissões reguladas no domínio da prestação de serviços transfronteiriços, e cujo conteúdo pudesse ser consultado em tempo útil. Dele constariam infracções cometidas no exercício da actividade profissional, a serem comunicadas pelas autoridades competentes. O objectivo deste registo seria claramente o de permitir uma comunicação rápida e desburocratizada entre as autoridades nacionais competentes e, paralelamente, controlar e disciplinar os intervenientes no mercado.

3.5.5

A proposta de directiva estabelece que o Estado-Membro de origem é responsável pelo controlo do prestador de serviços, e dos serviços que este possa prestar, independentemente de serem fornecidos num outro Estado-Membro. Esta disposição acarreta uma enorme responsabilidade — e carga de trabalho — para o país de origem e respectivos serviços administrativos. No entanto, a alínea b) do artigo 6.o da proposta de directiva sobre o reconhecimento mútuo de qualificações profissionais já salienta a necessidade de comunicar ao país de acolhimento, quando se trate de serviços transfronteiriços, as actividades que exigem qualificações profissionais específicas. Por outro lado, poderá haver lugar a distorções de concorrência se um prestador de serviços operar num outro Estado-Membro em que vigoram regras mais rigorosas. Na opinião do Comité, esta situação poderia ser evitada se houvesse uma aproximação gradual das legislações nacionais para garantir padrões de qualidade mínimos, com níveis adequados para os consumidores, para os produtores e para o ambiente. É indispensável definir as condições e os princípios segundo os quais se efectuarão os controlos das empresas que prestam serviços noutros Estados-Membros. Os consumidores devem poder confiar que os serviços que lhes são prestados cumprem a legislação vigente.

3.5.6

O cumprimento do princípio do país de origem só é viável se as autoridades dos Estados-Membros estiverem muito bem organizadas, incluindo aos níveis regional e local. A interconexão das actuais redes de controlo e de cooperação electrónicas não são suficientes. A supervisão profissional do Estado de origem — como previsto nos artigos 36.o e 37.o da proposta de directiva na forma de uma «cooperação» entre país de origem e país de acolhimento — não seria eficaz.

3.5.7

De resto, o Comité está convencido de que os atrasos causados por barreiras linguísticas e canais de comunicação mais longos impedem uma actuação rápida para defender os consumidores contra uma prestação deficiente dos serviços. É indispensável assegurar aos consumidores uma forma eficaz e simples de apresentarem reclamações e queixas por má prestação de serviços. Segundo a proposta de directiva, as entidades competentes no Estado de acolhimento não poderão aqui intervir, pois não são regularmente informadas da designação, do tipo de seguro de responsabilidade civil, etc., com que o prestador de serviços estrangeiros entra em contacto com o consumidor. Por conseguinte, dever-se-á no mínimo prever, como medidas adicionais, a obrigação de comunicação e a instauração de procedimentos disciplinares por parte das autoridades competentes do Estado de acolhimento, tarefas estas que poderiam ser realizadas pelo registo central proposto. Neste sentido, e no âmbito do processo legislativo, o Parlamento Europeu já apresentou, em primeira leitura, alterações à proposta de directiva sobre o reconhecimento mútuo das qualificações profissionais.

3.5.8

Por último, o Comité receia que, apesar das excepções pontuais previstas no artigo 17.o, alíneas 20) a 23), da proposta de directiva em apreço, não seja possível criar um instrumento jurídico comum para as obrigações contratuais e extra-contratuais, como estipulado na convenção «Roma I» e na proposta de regulamento «Roma II». Estes dois instrumentos regem-se pela seguinte lógica: regular o direito privado internacional, ao nível da UE ou ao nível internacional, no sentido de garantir clareza jurídica para todas as partes envolvidas.

3.6   Destacamento de trabalhadores

3.6.1

A Directiva «Destacamento» 96/71/CE, de 16 de Dezembro de 1996, pretende conciliar o objectivo de alargar as possibilidades de as empresas prestarem serviços noutros Estados-Membros com o cumprimento de normas mínimas aplicáveis aos trabalhadores. Neste sentido, ela regulamenta a coordenação prática das condições de trabalho e emprego dos trabalhadores destacados. Por conseguinte, a Comissão prevê no artigo 17.o, n.o 5, da proposta de directiva em análise uma derrogação à aplicação do princípio do país de origem à Directiva «Destacamento», manifestando assim a sua intenção de delimitar claramente o campo de aplicação dos diferentes instrumentos. Contudo, o Comité, após ter analisado em detalhe os artigos 24.o e 25.o da proposta de directiva, tem dúvidas quanto à clareza da derrogação formulada.

3.6.1.1

A relação entre a Directiva «Destacamento» e a Directiva «Serviços» tem suscitado inúmeras questões, as quais variam de país para país consoante o sistema que aplicam ao mercado de trabalho. Para que uma Directiva «Serviços» possa ter aceitação, é imprescindível levar em conta as posições dos parceiros sociais, sejam eles europeus ou nacionais.

3.6.1.2

A Directiva «Serviços» não poderá interferir nos direitos sindicais, no direito de associação e no direito de negociação colectiva, incluindo o direito dos parceiros sociais de proceder à negociação colectiva, nem no direito à greve. Propomos que esta asserção fique bem explícita no artigo 3.o. Os trabalhadores de outros Estados-Membros não podem ser tratados de maneira menos favorável do que os trabalhadores do país onde é prestado o serviço. Este facto é evidenciado claramente na perspectiva de não discriminação que serve de base a todos os tratados da UE. As condições salariais e de trabalho deverão, por conseguinte, e em todos os seus aspectos essenciais, ser regidas pelas regras aplicáveis no país de destacamento. O controlo do cumprimento destas regras, para ser eficaz, deverá ter lugar no local onde é realizado o trabalho. Assim sendo, a Directiva «Serviços» terá de deixar bem claro que o objectivo da Directiva «Destacamento» é proteger os trabalhadores, permitindo, inteiramente, regras mais favoráveis do que as exigências mínimas obrigatórias impostas aos trabalhadores num certo país.

3.6.2

Em opinião do Comité, a proibição de procedimentos de controlo, prevista nos artigos 24.o e 25.o da proposta de directiva, torna absurda a excepção a que se refere o n.o 5 do artigo 17.o, pois não se sabe através de que meios o país de origem poderá tomar conhecimento de eventuais infracções cometidas no país de destacamento, uma vez que este último deixa de poder efectuar controlos e aplicar sanções. Mesmo se tal fosse viável, manter-se-ia em aberto a questão de saber de que modo o país de origem poderia actuar num outro país em que não pode exercer poderes de soberania. Em contrapartida, a Directiva «Destacamento» permite aos Estados-Membros definir normas claras quanto às declarações que o Estado de acolhimento pode exigir das empresas (por exemplo, no âmbito da adjudicação de contratos públicos), à indicação da pessoa autorizada para efeitos de aplicação de coimas e instauração de acções, bem como à forma de que se deverá revestir a publicitação qualificada das actividades. Estas disposições devem ser mantidas.

3.6.3

Uma cooperação mais estreita entre as autoridades do Estado de origem e do Estado de destacamento é certamente desejável e merece ser promovida. Porém, na prática, a situação é diferente, circunstância que, na opinião do CESE, não é devidamente tida em conta na proposta de directiva. O Comité concluiu que a directiva sobre os serviços deve ser mais específica e clara no que se refere à cooperação entre o Estado de origem e o Estado de acolhimento.

3.6.4

Quanto ao destacamento transfronteiriço de trabalhadores de países terceiros, a proposta de directiva indica que compete ao país de origem certificar-se de que o prestador apenas destaca o trabalhador, seja ele cidadão da União ou não, se este preencher as condições de residência e de emprego regular estabelecidas na legislação do Estado-Membro de origem. O Estado de acolhimento não pode submeter nem o trabalhador nem o prestador de serviços a controlos preventivos. Daí poderão surgir problemáticas como as atrás referidas. Também neste domínio, é necessário que a directiva precise que se deve seguir a legislação actualmente em vigor.

3.7   Protecção do consumidor e seguro obrigatório

3.7.1

O Comité reconhece que o facto de se exigir um seguro obrigatório de responsabilidade profissional aos prestadores de serviços que constituam um risco financeiro, de saúde ou de segurança para os beneficiários, pode ser um meio de aumentar a confiança dos consumidores. Também para garantir condições de concorrência iguais para todos os prestadores de serviços, poderá ser necessário prever na UE disposições comuns em matéria de seguros de responsabilidade profissional. Ponderando os prós e os contras, o seguro obrigatório só se justifica se estiver em jogo a salvaguarda de interesses terceiros ou a protecção dos consumidores. Eis por que a directiva deveria conter uma definição dos grupos profissionais e dos ramos pertinentes. Por outro lado, dever-se-ia prever uma regra suficientemente flexível para poder ter em conta as várias situações de risco e atender todas as necessidades de segurança dos potenciais beneficiários do seguro.

3.8   Garantia de qualidade através de certificação

3.8.1

O Comité está seguro de que uma prestação de serviços baseada no conhecimento obriga os prestadores a um aperfeiçoamento profissional contínuo. A sua sobrevivência depende da capacidade de actualização dos conhecimentos nos domínios científico e técnico. Os selos de qualidade e os certificados só conseguem obter a garantia de qualidade desejada se o consumidor puder compreender as normas por que se regem. O reconhecimento dos certificados depende do seu grau de popularidade. Caso contrário, não se proporcionará ao consumidor a transparência necessária. Os consumidores devem igualmente ser informados de forma simples e transparente sobre as designações de qualidade dos serviços propostos. A proliferação de designações desconhecidas dos consumidores pode levar a uma desvalorização das mesmas, impedindo a prestação da informação necessária ao consumidor.

3.9   Transparência de preços

3.9.1

É também necessário garantir transparência — como previsto no n.o 3 do artigo 26.o da proposta de directiva — nos processos de composição e formação de preços. O Comité considera que se deveria ponderar a possibilidade de garantir a transparência de preços nas transacções entre empresas e consumidores (business to consumer), mesmo que não haja pedido expresso nesse sentido no acto de encomenda de um serviço. A transparência de preços ao consumidor poderia ser garantida, por exemplo, através da fixação de taxas e encargos, em conformidade com a legislação comunitária vigente. Eventualmente, seriam daqui excluídas as transacções entre empresas (business to business).

3.10   Utilização de meios electrónicos

3.10.1

O Comité concorda que todos os processos devam ser, em princípio, realizados por via electrónica. Trata-se de uma exigência virada para o futuro e, portanto, positiva. No entanto, é essencial — como se deduz da limitação prevista no artigo 5.o da proposta de directiva — que os originais dos documentos justificativos ou, no caso de documentos importantes como certificados, extractos de registo, etc., as traduções oficiais dos mesmos só possam ser apresentados por via electrónica se for possível provar a sua autenticidade mediante assinatura reconhecida ou por outros meios. No entanto, isto não é possível através de meios de comunicação electrónicos simples e pressupõe a criação de condições técnicas adequadas em todos os Estados-Membros (cf. os trabalhos do Comité sobre comunicação e meios de comunicação modernos).

3.11   Cooperação interdisciplinar

3.11.1

Para o Comité é importante que o consumidor tenha acesso a amplos pacotes de soluções na cooperação interprofissional no domínio da prestação de serviços. No entanto, devido à posição privilegiada de alguns prestadores de serviços na legislação dos seus países é importante regulamentar a cooperação através de legislação apropriada: em caso de direitos e obrigações de sigilo que recaem sobre determinados prestadores de serviços, a cooperação só será possível se estes forem comuns aos diferentes profissionais. Caso contrário, corre-se o risco de violação dos direitos do consumidor consignados na Carta Europeia dos Direitos Humanos.

3.12   Códigos de conduta

3.12.1

O Comité subscreve a proposta que visa a introdução ao nível europeu de códigos de conduta. Tendo em conta a diversidade da regulamentação relativa aos serviços profissionais e à conduta profissional, os códigos de conduta representam uma possibilidade, entre outras, de garantir a qualidade dos serviços prestados. As cartas de qualidade elaboradas pelos prestadores de serviços são acordos voluntários sem vínculo jurídico. Isto não significa que não produzam efeitos, mas que são de certo modo limitativos em termos de aplicação. As reservas existentes nalguns Estados-Membros dificultam a aplicação desses acordos.

3.13   Segurança social

3.13.1

Na União Europeia alargada há uma diversidade de sistemas de segurança social, surgidos de uma colaboração estreita com os parceiros sociais ao longo dos anos. A troca de experiências positivas tem sido o motor principal da evolução dos sistemas de segurança social. Este facto reflecte-se também na proposta de directiva sobre os serviços no mercado interno. Importa, antes do mais, não comprometer o que já foi alcançado ao nível sociopolítico.

3.13.2

Os parceiros sociais desempenham, obviamente, um papel importante no desenvolvimento do sector dos serviços, considerando-se, portanto, que este um ponto dispensa indicação. Contudo, assinale-se, neste contexto, que não está explicitamente prevista a participação dos sindicatos nas consultas às «partes interessadas» mencionadas na proposta de directiva. O Comité parte do princípio que estes serão ouvidos sempre que oportuno. O CESE enfatiza que os parceiros sociais e a sociedade civil organizada têm de ser consultados, sempre que necessário, em relação ao desenvolvimento do sector dos serviços. As iniciativas propostas pelas partes interessadas são sempre acolhidas com grande interesse.

3.13.3

Uma outra questão particularmente importante neste contexto é o facto de a proposta de directiva não considerar que, em alguns Estados-Membros da UE, os acordos colectivos desempenham o papel de lei. Em termos práticos, isto significa que tanto os acordos colectivos como a legislação tradicional produzem efeitos jurídicos vinculativos. É este o caso dos países nórdicos, onde os acordos colectivos assumem um papel específico. Nestes países é frequente que sejam os parceiros sociais independentes a negociar as condições salariais e de trabalho em nome da colectividade. A proposta de directiva deverá ser alterada de modo a reconhecer, explicitamente, que os acordos colectivos são um meio para cumprir as obrigações impostas pela proposta em análise.

3.14   Sistema de autorização

3.14.1

As limitações previstas às possibilidades de os Estados-Membros introduzirem ou manterem os seus próprios sistemas de autorização são muito rigorosas e terão um impacto em numerosos Estados-Membros, obrigando a alterações. Coloca-se, pois, a questão de saber se esta circunstância interfere na possibilidade de os Estados-Membros aplicarem regras nacionais, por exemplo em matéria social, sanitária e ambiental. A possibilidade de cada Estado encontrar maneira própria de se organizar e ter margem de manobra para decidir, ao nível nacional, regional ou local, é fundamental para influenciar os níveis de qualidade e de segurança nos sectores social e da saúde. Precisamente esta flexibilidade depende, também, da possibilidade de impor obrigações e requisitos aos prestadores de serviços locais.

3.15   Fiscalidade

3.15.1

No respeitante à fiscalidade, a proposta de directiva prevê, no artigo 2.o, que algumas áreas sejam excluídas do âmbito de aplicação da directiva. O Comité aponta que a falta de harmonização das regras fiscais em vigor nos Estados-Membros continua a ser um dos principais obstáculos à realização do mercado interno. Uma harmonização fiscal ao nível comunitário poderia permitir adaptações pontuais. Acontece que também aqui não se considera que seja possível aplicar sistematicamente o princípio do país de origem: a Comissão Europeia propõe na reforma da 6.a Directiva «IVA» que o imposto sobre serviços prestados seja tributado no Estado de acolhimento — e não no Estado de origem. Este exemplo demonstra uma falta de coerência no que diz respeito à simplificação da prestação de serviços entre Estados-Membros, coerência essa não só útil, como até necessária.

4.   Síntese das propostas do Comité

4.1

O Comité acolhe favoravelmente que a Comissão Europeia, ao apresentar a sua proposta de directiva relativa aos serviços no mercado interno, tenha por objectivo concretizar o mercado interno e contribuir para fazer da UE a economia assente no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos e com maior coesão (Estratégia de Lisboa). O mercado dos serviços é um multiplicador significativo para a criação de emprego e o crescimento económico em toda a UE. Além disso, a realização do mercado interno de serviços poderá trazer enormes vantagens aos consumidores por se traduzir em preços mais baixos e numa escolha mais variada. O Comité considera, pois, que a proposta de directiva deverá considerar as alterações e especificações aqui propostas, para atingir efectivamente o objectivo pretendido.

4.2

O parecer incide com especial atenção nos seguintes aspectos:

4.2.1

Harmonização faseada de determinados serviços: O Comité considera que a aplicação, independentemente das circunstâncias, do princípio do país de origem ao domínio da prestação de serviços transfronteiriços é precoce. De modo geral, o Comité recomenda que se proceda à análise da viabilidade da aplicação do princípio do país de origem aos diversos sectores (por exemplo, o sector da saúde e dos serviços sociais). Sempre que a aplicação seja viável, dever-se-ia ter em conta que a harmonização e o princípio do país de origem têm a mesma importância enquanto instrumentos para a criação do mercado interno. No entanto, dever-se-ia dar prioridade à harmonização, ao menos durante um período transitório, do trabalho desempenhado nos sistemas de saúde nacionais, nas profissões liberais e noutros domínios sensíveis (categorias a definir separadamente). Na fase actual, o Comité receia que a aplicação imediata do princípio do país de origem resulte num «nivelamento por baixo». As novas disposições, cuja estrutura se pretende o mais clara possível, devem ser de fácil aplicação para permitir uma execução simples e eficaz. Isto é também aplicável aos mecanismos de co-regulação e auto-regulação.

4.2.2

Problemática da dimensão social: Há que evitar que a proposta de directiva resulte em normas sociais, laborais e de segurança no local de trabalho menos rigorosas, sobretudo no tocante à Directiva «Destacamento». Os sistemas nacionais de negociação colectiva e os acordos colectivos, incluindo as disposições nacionais ligadas à transposição da Directiva «Destacamento» (Directiva 96/71/CE), não devem ser afectados. É necessário que os Estados-Membros procedam a uma definição vinculativa dos conceitos «trabalhador», «trabalhador independente» e «falso trabalhador por conta própria», que sirva de base ao campo de aplicação da Directiva «Destacamento», limitando ao mesmo tempo o alcance do princípio do país de origem. Por outro lado, os Estados-Membros deverão providenciar para que os trabalhadores destacados tenham direito às mesmas condições gerais de trabalho que os trabalhadores nacionais do país de destino. Para garantir o cumprimento das obrigações, dever-se-ia prever a presença de um agente in loco, cuja tarefa consistiria em disponibilizar os documentos de trabalho necessários.

4.2.3

Âmbito de aplicação e conflitos de leis: Impõe-se aqui analisar melhor e distinguir o âmbito de aplicação, as derrogações e os conflitos que possam advir da aplicação do princípio do país de origem ao domínio da prestação de serviços transfronteiriços. Importa distinguir claramente esta directiva da directiva prevista relativa ao reconhecimento das qualificações profissionais e esclarecer se e como devem ser evitados conflitos entre as disposições vigentes no país de origem — às quais a proposta dá prioridade — e as disposições sociais, fiscais e penais do país de acolhimento. Seja como for, há que evitar incoerências jurídicas entre normativos. Sobretudo as convenções «Roma I» e «Roma II» devem ser mantidas inalteradas. No entanto, frequentemente, é possível resolver os litígios com maior clareza recorrendo-se às disposições do direito internacional privado. A Directiva «Serviços» não deverá ser aplicável aos serviços de interesse geral, na ausência de um quadro comunitário.

4.2.4

Registo central das actividades transfronteiriças: Segundo o Comité, e para satisfazer os requisitos estabelecidos na proposta de directiva em matéria de controlo das actividades de determinados prestadores de serviços, por exemplo do sector das profissões liberais, convém ponderar a necessidade e a eficácia de um registo central ao nível comunitário, do qual constassem as infracções detectadas no âmbito das actividades de controlo.

4.2.5

Melhoria da análise empírica: Os instrumentos capazes de detectar correntes no mercado interno dos serviços têm de ser examinados e melhorados, a fim de aferir quais são as medidas mais adequadas, numa relação de causa e efeito.

4.2.6

Garantia da qualidade e transparência de preços: A protecção do consumidor tem toda a prioridade e deve ser alcançada através de sistemas de garantia da qualidade e, eventualmente, também através da introdução de seguros obrigatórios. No domínio da prestação de serviços transfronteiriços entre uma empresa e um consumidor, este deveria ter acesso generalizado a informações sobre as condições e os custos da prestação do serviço, mesmo que não haja pedido expresso nesse sentido. Regulamentos de taxas e encargos poderiam constituir uma solução, desde que não sejam contrários à legislação comunitária vigente.

4.2.7

Aproximação da legislação fiscal: para além dos numerosos pequenos obstáculos, reais e imaginários, o principal obstáculo à concretização do mercado interno é criado pelos Estados-Membros e pelas autarquias: a fragmentação e aplicação desigual do direito dos impostos. Os Estados-Membros são chamados a prestar a maior atenção a este facto.

5.

Os aspectos positivos do mercado interno, em particular para as PME e os não assalariados, incluindo o projecto PRISM do Comité, devem ser promovidos com firmeza. O Comité está convencido da impossibilidade de maximizar as potencialidades de crescimento no sector dos serviços, se os prestadores de serviços e os consumidores não acreditarem nas vantagens do mercado interno.

Bruxelas, 10 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 48 de 21/2/2002.


ANEXO

ao Parecer do Comité Económico e Social Europeu

As seguintes propostas de alteração foram rejeitadas, tendo recolhido, contudo, pelo menos um quarto dos sufrágios expressos:

Ponto 2.1.1

Dar a seguinte redacção:

«Para um bom funcionamento do mercado interno é essencial eliminar obstáculos e criar regulação adequada. Por sua vez, o aumento da competitividade europeia passa por uma simplificação dos processos e das formalidades administrativos, garantindo o acesso aos serviços.».

Resultado da votação:

Votos a favor: 48

Votos contra: 113

Abstenções: 6

Ponto 3.3.3

Suprimir.

Resultado da votação:

Votos a favor: 52

Votos contra: 130

Abstenções: 6

Ponto 3.5

Suprimir o texto deste ponto e substituir pelo seguinte:

«3.5.1

Embora os Tratados e a jurisprudência do Tribunal de Justiça prevejam já o direito de livre prestação de serviços transfronteiras, as empresas não estão muitas vezes seguras quanto aos seus direitos na prática. O princípio do país de origem constitui a este respeito um elemento central capaz de permitir às empresas, e antes de mais às PME, conhecer melhor as suas obrigações e os seus direitos sempre que prestam serviços transfronteiras sem estarem implantadas no país em que esses serviços são prestados. Ainda que a directiva formule uma lista de excepções ao princípio do país de origem, o Comité entende (na medida em que não sejam propostas novas excepções) que ele pode contribuir para o desenvolvimento do mercado interno dos serviços em benefício dos consumidores, dos trabalhadores e da competitividade da Europa.

3.5.2

No entender do CESE, o princípio do país de origem pode ser um estímulo à aproximação das legislações dos Estados-Membros e eventualmente a uma harmonização da legislação em matéria de protecção dos consumidores e do ambiente.

3.5.3

O Comité considera que o princípio do país de origem só será eficaz se houver segurança e clareza jurídicas quanto ao seu âmbito de aplicação. Importa pois garantir desde logo que este princípio não viola os direitos actuais dos consumidores e dos trabalhadores nem afecta o actual nível de protecção do ambiente. Ao mesmo tempo, haverá que averiguar da compatibilidade do princípio do país de origem com o direito internacional, Roma I e II, e, se necessário, esclarecer quaisquer outras questões jurídicas sem prejuízo do respeito do objectivo do princípio do país de origem de permitir às empresas prestar mais facilmente os seus serviços além-fronteiras.».

Resultado da votação:

Votos a favor: 68

Votos contra: 127

Abstenções: 5

Substituir os pontos 3.5.1, 3.5.2 e 3.5.3 por um novo ponto 3.5.1:

« A aplicação generalizada do princípio do país de origem prevista no artigo 16. o da proposta de directiva em apreço constitui, juntamente com as derrogações referidas no artigo 17. o , o cerne da proposta. Só assim é possível prosseguir sem mais atrasos a abertura dos mercados de serviços. A competitividade transfronteiriça entre prestadores de serviços não só traz vantagens aos consumidores, como também pode criar novos postos de trabalho. Na opinião do Comité, a aplicação do princípio do país de origem só pode funcionar se houver certeza e segurança jurídica quanto ao seu âmbito de aplicação. A aplicação do princípio do país de origem deveria ser precedida de uma análise para identificar os serviços em que uma maior aproximação das disposições jurídicas pudesse ser proveitosa. Importa, ainda, ter presente que a liberdade da prestação de serviços não se deve repercutir negativamente nos direitos dos trabalhadores e dos consumidores, nem na protecção do ambiente. Em comparação internacional, a UE caracteriza-se por elevados padrões nestes domínios, que têm de ser garantidos. ».

Resultado da votação:

Votos a favor: 83

Votos contra: 122

Abstenções: 5

Ponto 3.5.1

Suprimir.

Resultado da votação:

Votos a favor: 73

Votos contra: 141

Abstenções: 7

Ponto 3.5.2

«A aplicação generalizada do princípio do país de origem prevista no artigo 16. o da proposta de directiva em apreço constitui, juntamente com as derrogações previstas no artigo 17. o , o cerne da proposta. O regime do princípio do país de origem é particularmente apropriado em caso de normalização dos serviços, como se de mercadorias se tratasse, ou quando haja um elevado grau de harmonização das regras, para evitar incompatibilidades. Caso não haja ou não seja possível estabelecer normas (as chamadas prestações não classificáveis), há que ter em conta estas particularidades.».

Resultado da votação:

Votos a favor: 76

Votos contra: 134

Abstenções: 6

Ponto 3.5.3

Dar a seguinte redacção:

«Na opinião do Comité, a aplicação do princípio do país de origem funcionará se houver certeza e segurança jurídica quanto ao seu âmbito de aplicação. Isto passa pela análise da viabilidade da aplicação do princípio do país de origem a cada sector, através de uma avaliação detalhada, que inclua também os aspectos sociais e ambientais relevantes. Dado que as medidas de harmonização são, com o princípio do país de origem, um instrumento complementar para a realização do mercado interno, há que proceder, num período transitório adequado, à aproximação das diferentes disposições sobre sectores relativamente aos quais os Estados-Membros estabeleceram regulamentação específica em matéria social, sanitária e laboral, se a Comissão Europeia, o Parlamento Europeu e o Conselho o considerarem necessárioO exposto aplica-se também aos mecanismos de co-regulação e auto-regulação.».

Resultado da votação:

Votos a favor: 79

Votos contra: 139

Abstenções: 7

Ponto 3.5.4

Suprimir.

Resultado da votação:

Votos a favor: 65

Votos contra: 150

Abstenções: 4

Ponto 3.6.2

Suprimir.

Resultado da votação:

Votos a favor: 74

Votos contra: 140

Abstenções: 3

Ponto 3.9

Suprimir.

Resultado da votação:

Votos a favor: 73

Votos contra: 134

Abstenções: 5

Ponto 3.15

Suprimir.

Resultado da votação:

Votos a favor: 90

Votos contra: 135

Abstenções: 2

Ponto 4.2.1

Substituir texto:

« É correcta a abordagem da Comissão segundo a qual se deve aplicar de um modo geral o princípio do país de origem. Só assim é possível prosseguir sem mais atrasos a abertura dos mercados de serviços. Ao mesmo tempo, dever-se-ia velar por que na aplicação do princípio do país de origem reine a certeza e a segurança jurídica. A aplicação do princípio do país de origem deveria ser precedida de uma análise para identificar os serviços em que uma maior aproximação das disposições jurídicas pudesse ser proveitosa. Importa, ainda, ter presente que a liberdade da prestação de serviços não se deve repercutir negativamente nos direitos dos trabalhadores e dos consumidores, nem na protecção do ambiente. As novas disposições, cuja estrutura se pretende o mais clara possível, devem ser de fácil aplicação para permitir uma execução simples e eficaz. Isto é também aplicável aos mecanismos de co-regulação e auto-regulação. ».

Resultado da votação:

Votos a favor: 66

Votos contra: 146

Abstenções: 4

Ponto 4.2.1

Dar a seguinte redacção:

« O princípio do país de origem e a harmonização são tanto um como o outro instrumentos fundamentais para assegurar a livre circulação dos serviços. Ao mesmo tempo, este princípio pode ser considerado como um catalisador na aproximação da legislação dos Estados-Membros, preparando eventualmente o terreno para uma futura harmonização nos sectores em que tal se revele necessário. Por si só, o princípio do país de origem pode facilitar às empresas a sua projecção além fronteiras, já que não precisam de estabelecer-se no país onde prestam os serviços. Isso poderia servir de alavanca ao desenvolvimento do mercado interno de serviços em benefício dos consumidores, dos trabalhadores e da competitividade europeia. Todavia, para se tirar o máximo proveito do princípio do país de origem, é essencial resolver as eventuais questões jurídicas pendentes. ».

Resultado da votação:

Votos a favor: 75

Votos contra: 135

Abstenções: 3

Ponto 4.2.2

Dar a seguinte redacção:

«Problemática da dimensão social: Há que evitar que a proposta de directiva resulte em normas sociais, laborais e de segurança no local de trabalho menos rigorosas, sobretudo no tocante à Directiva “Destacamento”. Os sistemas nacionais de negociação colectiva e os acordos colectivos, incluindo as disposições nacionais ligadas à transposição da Directiva “Destacamento” (Directiva 96/71/CE), não devem ser afectados.».

Resultado da votação:

Votos a favor: 84

Votos contra: 132

Abstenções: 1

Ponto 4.2.4

Dar a seguinte redacção:

«A ideia de simplificar os procedimentos e de criar um balcão único para os prestadores de serviços é positiva. Estão ainda, todavia, por concretizar as formalidades necessárias. Neste contexto, é imprescindível não descurar a luta contra a carga burocrática e administrativa.».

Resultado da votação:

Votos a favor: 74

Votos contra: 141

Abstenções: 3

Ponto 4.2.6

Suprimir.

Resultado da votação:

Votos a favor: 76

Votos contra: 140

Abstenções: 1


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/126


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu: Compensação e liquidação na União Europeia — O rumo a seguir»

COM(2004) 312 final

(2005/C 221/21)

Em 29 de Abril de 2004, a Comissão Europeia decidiu, conformemente ao disposto no artigo 262.o do Tratado que institui a União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a comunicação supramencionada.

O Comité Económico e Social Europeu incumbiu, em 1 de Junho de 2004, a Secção de Mercado Único, Produção e Consumo da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 10 de Fevereiro), designou relator-geral U. BURANI e adoptou, por 99 votos a favor e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

No contexto do Plano de Acção para os Serviços Financeiros, adoptado em 1999, a Comissão Europeia analisou o problema complexo das transacções no domínio dos valores mobiliários, e em particular o da compensação e da liquidação, que constituem o elemento fundamental de qualquer transacção. A segurança e a eficiência dos mecanismos, invisíveis para os pequenos investidores, são fundamentais para o funcionamento dos mercados de valores mobiliários. Se, por um lado, os conceitos de base são simples (a compensação oferece uma garantia contra o «risco do custo de substituição» [incumprimento de uma contraparte numa transacção], ao passo que a liquidação garante o pagamento dos valores vendidos), por outro lado, o desenrolar dos processos, os mecanismos e a regulamentação em que esses conceitos se baseiam são matéria extremamente complexa e técnica. No presente capítulo serão resumidos os aspectos fundamentais do documento da Comissão.

1.2

A nível nacional, os sistemas funcionam satisfatoriamente do ponto de vista económico e da segurança. Os problemas verificam-se, porém, a nível transfronteiriço, que acusam ineficácia, riscos e custos elevados em consequência de uma fragmentação excessiva dos mercados, por sua vez provocada pelas diferenças de legislação, normas e usos entre os vários países. São os próprios operadores do mercado a salientar a necessidade de reformas.

1.3

A comunicação — à qual se seguirá uma proposta de directiva a publicar futuramente — propõe basear a discussão entre as partes interessadas nos diferentes aspectos do problema, com o objectivo fundamental de criar um mercado europeu eficiente, integrado e seguro para a compensação e a liquidação dos valores mobiliários. A integração dos sistemas deverá ser realizada mediante a intervenção conjunta das forças do mercado e dos poderes públicos: a Comissão tenciona promover a coordenação entre os organismos do sector privado, as autoridades de supervisão e os responsáveis políticos.

1.4

Será necessária uma directiva-quadro para garantir que os fornecedores das infra-estruturas e os utilizadores dos serviços (operadores autorizados) tenham acesso ao sistema de compensação e liquidação da sua preferência, sistema esse que deverá ser devidamente autorizado, controlado e respeitador das regras de concorrência. A Comissão protesta que a redacção da directiva respeitará os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, tendo em consideração a exigência de não interferir, na medida do possível, com os critérios adoptados pelas autoridades nacionais para regulamentar as respectivas estruturas de mercado. Esta forma de proceder deverá assegurar uma base jurídica clara, fiável e coerente.

1.5

A Comissão não discute os méritos de uma eventual concentração (transfronteiriça) das actividades de compensação e liquidação, que em seu entender deve ser sobretudo impulsionada pelas forças de mercado, sob reserva de serem satisfeitas as preocupações legítimas de interesse geral (concorrência, durabilidade/eficácia dos sistemas, etc.).

2.   Situação actual

2.1

As técnicas de compensação e liquidação são complexas. No documento da Comissão, esses dois conceitos designam o «conjunto de mecanismos necessários para finalizar uma transacção relativa a valores mobiliários ou instrumentos derivados». Mais precisamente, a função de compensação compreende a novação (interposição do sistema de compensação e gestão do risco de contraparte) e o netting (cálculo das posições de débito e de crédito e tratamento jurídico da compensação bilateral); uma função adicional é a do netting com novação , que garante a contraparte contra o risco do custo de substituição (risco de prejuízo por insolvência da contraparte).

2.1.1

As funções de liquidação são, no essencial, de carácter escritural (registo dos valores, depósito central dos valores desmaterializados, troca de informações nominativas entre depositantes e emitentes, etc.), de conservação central dos valores (gestão das contas correntes de títulos, registo das posições, etc.) e de liquidação propriamente dita (cálculo das contrapartes, transferências entre contas correntes de valores, ligação aos bancos centrais, transferência automática dos saldos líquidos, operações pontuais de transferência de liquidez para os sistemas de pagamento em dinheiro, execução das transacções de política monetária, etc.).

2.1.2

A definição das funções, dos termos técnicos e respectivos conteúdos é assaz ambígua, quer porque a terminologia nem sempre é similar em todas as línguas, quer porque nos mercados nacionais os conceitos podem ser usados com acepções distintas. É, pois, da máxima importância que a futura directiva adopte uma terminologia comprovadamente exacta, de compreensão universal e traduzida nas diversas línguas oficiais com a colaboração de técnicos nacionais.

2.2

Os serviços de compensação são prestados por entidades geralmente denominadas contrapartes centrais (CCP, ou central counterparties, em inglês); a liquidação incumbe aos depositários centrais de valores mobiliários (CSD, ou central securities depositories, em inglês). CCP e CSD formam um circuito fechado que inclui, para além das suas relações recíprocas, os bancos centrais e os bancos e as instituições financeiras autorizados. Os investidores não têm contactos com as CCP ou os CSD, aos quais só têm acesso os operadores (bancos e instituições financeiras membros dos sistemas de compensação).

2.3

As transacções transfronteiras podem ser objecto de liquidação através dos canais seguintes:

acesso directo à distância ao sistema de liquidação de valores mobiliários estrangeiro,

recurso a uma entidade de guarda com acesso directo ou indirecto ao sistema de liquidação de valores mobiliários estrangeiro,

recurso, na qualidade de intermediário, a um CSD internacional com acesso directo ou indirecto ao sistema de liquidação de valores mobiliários estrangeiro.

2.3.1

Para além do facto de nem todas estas opções serem acessíveis a todos os operadores, cada uma delas apresenta vantagens e desvantagens. Têm, todavia, uma característica comum: custos elevados e ineficiência, não directamente imputáveis aos sistemas, mas devidos à necessidade de recorrer a processos complexos e de assegurar todos os participantes contra o risco de insolvência ou de não entrega.

2.4

Do que fica dito pode inferir-se que para criar um mercado integrado, competitivo e seguro seria suficiente adoptar padrões comuns, harmonizar as legislações e a fiscalidade, racionalizar e internacionalizar as estruturas. O Comité adverte, contudo, que o problema não deve ser subestimado. As soluções que, na teoria, podem parecer de fácil aplicação devem ser avaliadas com uma consideração atenta da situação actual numa Europa composta de vinte e cinco países, profundamente diferentes quanto às dimensões e ao peso económico. Na União Europeia há vinte e quatro CSD, dois dos quais são por si sós responsáveis por 32,2 % de todas as transacções e por 60,4 % do seu volume global; 14 dos 25 Estados-Membros não possuem estruturas responsáveis pela compensação (CCP). Por outro lado, na Europa dos 15 a liquidação com moeda do banco central é de longe superior à liquidação com moeda bancária e corresponde a 67 % de todas as transacções e do respectivo volume.

2.4.1

Esta situação, aparentemente muito desequilibrada, torna-se compreensível se se atender a que diversos países com uma capitalização de mercado muito reduzida não dispõem, nem podem dispor, de estruturas de CSD e de CCP: estas são, com efeito, onerosas e só se tornam viáveis quando tratam volumes consistentes de transacções. Algumas estruturas atingiram uma posição de quase monopólio nos seus países (o mesmo não equivalendo a dizer que infringem as regras de concorrência) e funcionam de forma eficiente e com baixos custos.

3.   Observações na generalidade

3.1

O Comité acolhe favoravelmente a iniciativa da Comissão, cuja redacção representa, em seu entender, um progresso na via da integração dos mercados europeus de valores mobiliários. A matéria é deveras especializada, de natureza técnica e implicando conceitos económicos e financeiros nem sempre de fácil compreensão, mas abrange igualmente aspectos políticos e concorrenciais que podem ter repercussões de vulto no futuro dos mercados. As inovações (quer sugeridas quer impostas) deverão por isso ser postas em prática gradualmente e acompanhadas de uma avaliação do seu impacto imediato e a mais longo prazo.

3.2

Se, por um lado, o objectivo explícito da iniciativa da Comissão consiste em tornar o mercado europeu competitivo com o americano (o qual, de resto, é tomado como «modelo» por sugestão do Parlamento Europeu), cabe não esquecer que o recente alargamento da União implicou a absorção de mercados relativamente débeis ou com experiências e estruturas ainda por consolidar. Reformas efectuadas sem uma correspondente avaliação do impacto — imediato mas sobretudo a longo prazo — poderão deixar sequelas traumáticas e incorrer no risco de gerar uma predominância indevida dos sistemas mais fortes. As concentrações evocadas pela Comissão como um efeito benéfico da integração (e a respeito das quais a Comissão se proclama neutral) não devem ser induzidas pela necessidade de sobreviver, mas sim baseadas numa avaliação livre das oportunidades por parte das forças do mercado.

3.3

Para além dos condicionalismos descritos no ponto 2.4, os principais motivos da fragmentação do mercado são as diferenças entre as legislações nacionais e os sistemas fiscais, quer no que toca ao direito de propriedade quer em matéria de transacções. Nestes domínios é necessária uma intervenção comunitária a fim de promover uma convergência legislativa que suprima os obstáculos jurídicos e sobretudo fiscais ainda existentes.

3.4

A convergência legislativa é, entretanto, uma condição imprescindível, mas não suficiente. Se o objectivo último é a criação de uma estrutura paneuropeia robusta, importa criar condições de concorrência equitativas entre os bancos e as instituições financeiras e promover uma concorrência baseada antes de mais na liberdade de escolha dos intermediários (cf. ponto 3.7), mediante um controlo rigoroso das regras de acesso. A criação de condições de concorrência ideais é indispensável para uma redução dos preços para os investidores.

3.5

A Comissão não toma posição sobre o problema da distinção entre o papel dos operadores (bancos e instituições financeiras) e o das infra-estruturas e da respectiva clarificação. Estas últimas exercem as funções de compensação (contrapartes centrais, CCP) e de liquidação e guarda (depositários centrais de valores imobiliários, CSD). Cada uma destas categorias tem atribuições e modos de funcionamento distintos, pelo que se torna necessário adoptar regras diferentes e formas de controlo apropriadas a cada um dos papéis. O Comité salienta além do mais que os bancos comerciais têm tendência a integrar cada vez mais as funções de compensação e de liquidação.

3.5.1

No mercado actual há já bastante tempo que operam dois dos maiores organismos que correspondem exactamente à situação descrita no ponto precedente, agindo como bancos e intermediários, embora com contas separadas. As experiências destes organismos são positivos no que concerne à eficiência, às economias de escala e aos resultados económicos; por outro lado, não teria cabimento prescrever nos nossos dias uma cisão ou restruturação de empresas que constituem a espinha dorsal do mercado.

3.5.2

Há duas opções possíveis: ou se aceita a possibilidade de existirem organismos mistos, ou se escolhe a solução estritamente legalista de impor a separação entre as actividades bancárias e as de compensação e liquidação. A primeira solução é mais favorável para o mercado por razões de eficiência e de custos, mas comporta maiores riscos, pelo menos teoricamente, e a possibilidade de uma menor eficácia dos controlos; a segunda seria conforme aos cânones tradicionais de separação das actividades, mas revela-se menos viável e, em fim de contas, menos desejável. É evidente que a única recomendação que o Comité pode fazer a este respeito é que a manutenção de contas separadas seja suficientemente transparente para permitir controlos eficazes tanto da parte das autoridades de supervisão como da concorrência. Seria útil, e mesmo necessária, uma directiva que apresentasse soluções concretas para garantir estas condições.

3.6

Como se disse, os investidores têm contactos exclusivamente com os operadores; às contrapartes centrais (CCP) e aos depositários centrais de valores mobiliários (CSD) têm acesso apenas os operadores, através, respectivamente, dos membros dos sistemas de compensação (clearing members) e dos depositários dos valores mobiliários. Os CSD interagem, por sua vez, com os respectivos bancos centrais nacionais e com outros CSD nacionais ou estrangeiros.

3.7

Os operadores estão sujeitos às autoridades de supervisão, mas os intermediários impõem regras extremamente severas, de natureza técnica e patrimonial, para o acesso aos seus serviços. Daí que apenas um número reduzido de operadores tenha contactos directos com os intermediários, ao passo que os outros têm de recorrer a operadores autorizados para a conclusão de transacções de risco. As regras impostas pelos intermediários são condicionadas pela função de interesse público que incumbe a essas entidades: cabe-lhes assegurar a estabilidade do mercado e, em última análise, a protecção dos investidores. As autoridades de supervisão e as autoridades competentes em matéria de concorrência devem assegurar-se, por outro lado, que as regras de acesso definidas pelos intermediários não possam ser utilizadas para restringir a liberdade de acesso.

3.8

Dadas as características funcionais de cada um dos intervenientes, é importante para os investidores que os operadores sejam fiáveis e estáveis; o mercado, por sua vez, depende da fiabilidade e da estabilidade dos intermediários. Embora os riscos sejam comuns a operadores e a intermediários, os controlos exercidos sobre uns e outros devem responder a ditames diferentes. Daí a necessidade, referida no ponto 3.5, de manter papéis e normas distintas para cada um deles. No que concerne aos CSD, cabe notar que o risco de crédito dos participantes (que são em grande parte instituições de crédito) é praticamente inexistente dado que a legislação dos Estados-Membros protege os investidores contra a insolvência de um CSD, estipulando que os valores mobiliários que são objecto de guarda não figurem no balanço dos participantes.

3.9

A propósito da diferenciação de atribuições, o Comité regista com uma certa perplexidade (compartilhada aliás por vários dos operadores) a tendência de algumas instituições bancárias a adquirir CSD em diversos países, desenvolvendo desse modo o seu papel tradicional de forma integrada (ou, melhor, mista) com o dos CSD internacionais (I-CSD). O Comité insta a Comissão a averiguar, antes de mais, se há provas de possíveis distorções da concorrência quando uma entidade (ou entidades distintas mas relacionadas) acumula as funções de operador e de intermediário. Importa sobretudo assegurar que as funções do CSD não são utilizadas para financiar ou promover outras actividades.

3.10

Mesmo que as distorções de concorrência não sejam provadas, a acumulação de funções provoca, como anteriormente mencionado, dificuldades de controlo por parte das autoridades: embora um I-CSD, enquanto banco, esteja sujeito às regras e aos controlos bancários dos países em que está estabelecido, enquanto CSD rege-se por normas diferentes e é controlado pelas autoridades responsáveis pelos mercados de valores mobiliários dos países em que opera. Mesmo se forem mantidas duas contabilidades separadas, as relações (evidentes ou não) podem criar sobreposições de competências ou, o que é mais grave, situações perigosas de ausência de controlo. Registe-se, contudo, em nome da objectividade que a legislação sobre a guarda dos valores imobiliários referida no ponto 3.8 protege eficazmente os investidores.

3.11

A concluir as observações na generalidade, e como mote às observações na especialidade que se seguirão, o Comité constata que o documento da Comissão deriva da preocupação de criar um mercado integrado, livre de obstáculos, respeitador das regras de concorrência e operando a custos reduzidos, um objectivo que deve ser partilhado sem reservas. O CESE deseja realçar em particular as considerações seguintes:

qualquer inovação tem um impacto, positivo ou negativo, na solidez do mercado. Nenhuma consideração de liberalização ou de concorrência deve prevalecer sobre a necessidade de proteger os investidores;

as regras de concorrência devem ser respeitadas, mas importa ter em conta que nem todos os participantes enfrentam o mesmo nível de risco;

a noção de mercado aberto deve ser temperada pela preocupação de não comprometer a sua qualidade;

enquanto não se alcançar uma verdadeira convergência dos procedimentos fiscais, o mercado continuará a registar distorções e custos elevados, as quais se tornarão ainda mais patentes uma vez suprimidos os obstáculos técnicos e legislativos. A uniformização dos procedimentos, entre outras coisas, tornaria mais fácil o controlo das evasões fiscais;

se é verdade que é preciso eliminar os obstáculos que actualmente dificultam o acesso aos mercados locais, não deve subestimar-se o facto de que cada mercado tem as suas características e os seus usos particulares, que nenhuma harmonização conseguirá esbater. A este propósito, embora a afirmação da Comissão citada no ponto 1.4 pareça promissora, o Comité recorda que a segurança jurídica continua a ser uma exigência primordial.

4.   Observações na especialidade

4.1   Os obstáculos identificados nos relatórios Giovannini

4.1.1

Os dois relatórios do Grupo Giovannini (1) constituem o ponto de partida das reflexões da Comissão. As conclusões neles avançadas são fruto do trabalho de peritos renomeados, que merecem inteira confiança. Todavia, ainda que os factos descritos sejam incontestáveis, o Comité estima que há margem para reflexões mais aprofundadas sobre as opiniões que deles decorrem. As observações a seguir expendidas enquadram-se, assim, num espírito construtivo.

4.1.2

Os obstáculos identificados pelos dois relatórios Giovannini, num total de quinze, podem ser divididos em três grupos distintos: obstáculos técnicos ou decorrentes das práticas do mercado, obstáculos relacionados com as formalidades fiscais, e obstáculos de carácter jurídico. De acordo com a opinião expressa nos relatórios, e partilhada pela Comissão, um dos principais obstáculos à integração consiste nas restrições em matéria do local de execução da compensação e da liquidação, as quais, quando aplicadas, privam os operadores da liberdade de acesso e de escolha do local da compensação ou da liquidação. A Comissão observa, com razão, que essas restrições limitam a concorrência. O Comité, por sua vez, embora concordando com o teor global destas conclusões, sugere que sejam aprofundadas as motivações de algumas destas restrições de forma a determinar se há razões válidas que as justifiquem, para lá do simples proteccionismo.

4.1.3

Outros obstáculos detectados são os que levam, ou obrigam, os operadores a recorrer a intervenientes locais para acederem a sistemas de liquidação externos. Também neste caso o Comité recomenda cautela: como referido no ponto 3.11, nem todos os obstáculos ou restrições resultam da vontade de proteger os mercados próprios.

4.1.4

Por outro lado, o CESE concorda plenamente com a crítica da Comissão ao facto de que em certos países os sistemas de liquidação tenham de integrar um mecanismo de cobrança dos impostos sobre as transacções, ao passo que o uso de um sistema diferente pode acarretar impostos mais elevados. Este entrave, que certamente restringe a liberdade de escolha dos operadores por motivos de custo, revela-se, no entanto, um dos mais difíceis a transpor, dado que se trata de uma medida fiscal de nível nacional.

4.2   Ausência de um quadro regulamentar e prudencial comum

4.2.1

Os sistemas de compensação e liquidação estão sujeitos às regras e ao controlo das autoridades nacionais: não existe um quadro de regulamentação europeu. À falta de legislação comum (e, logo, de um «passaporte europeu»), é lógico que as autoridades nacionais possam negar o acesso ao seu próprio mercado a sistemas que não controlem. A sua justificação é que lhes incumbe proteger o mercado pelo qual são responsáveis. A fim de colmatar esta lacuna, o Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC) e o Comité das Autoridades de Regulamentação dos Mercados Europeus dos Valores Mobiliários (CARMEVM) formaram um grupo de trabalho conjunto encarregue de definir padrões comuns para os prestadores europeus de serviços de compensação e liquidação, adaptando ao contexto europeu as recomendações do Comité relativo aos sistemas de pagamento e liquidação dos bancos centrais do G-10. Os resultados dos seus trabalhos traduzir-se-ão (espera-se) em recomendações, e não em regras. A vantagem das recomendações é que poderão ser adoptadas por todos e facilmente adaptadas à evolução tecnológica dos mercados.

4.2.2

A adopção de regras comuns é imprescindível para a integração dos mercados. No entanto, os padrões SEBC/CESR não serão obrigatórios, dado que somente uma directiva comunitária pode modificar ou revogar as disposições jurídicas nacionais. O Comité espera que as regras SEBC/CESR sejam publicadas após a publicação da directiva-quadro, limitando-se, em coerência com as linhas directrizes, a integrar as normas nela contidas ou a preencher eventuais lacunas normativas. Um procedimento distinto poderia gerar confusão nos mercados.

4.3   Desigualdade das condições de concorrência

4.3.1

Algumas entidades que prestam serviços de compensação e de liquidação gozam também de autorizações na sua qualidade de bancos ou de empresas de investimento. A Comissão salienta que os bancos e as empresas de investimento podem oferecer serviços de guarda transfronteiriços utilizando o «passaporte DSI» (Directiva sobre os Serviços de Investimento), ao passo que as entidades que prestam apenas serviços de compensação e de liquidação não têm direitos comparáveis. Por outro lado, as duas categorias de operadores estão sujeitas a obrigações diferentes em matéria de adequação de fundos próprios e obedecem a regras distintas em matéria de controlos e de oferta de serviços. A Comissão conclui que esta situação coloca problemas fundamentais de igualdade de tratamento.

4.3.2

A Comissão parece encarar o problema essencialmente do ponto de vista da abertura dos mercados e da igualdade das condições de concorrência; o Comité prefere dar prioridade à segurança dos mercados e à eficácia dos controlos. A situação que tem vindo a criar-se deve ser vista com alguma perplexidade: na ausência de uma regulamentação clara e uniforme, surgiram estruturas híbridas ou conjuntas nas quais não resulta fácil destrinçar a actividade principal — bancária, de intermediação de valores mobiliários, ou de compensação. Se é certo que actividades conjuntas geram sinergias e economias de escala, não o é menos que importa evitar a pluralidade de controlos e de regras diferentes para as diferentes actividades. Assim, o Comité recomenda a máxima prudência na análise deste aspecto pelo prisma da concorrência: a segurança dos mercados deve ser a pedra de toque de todas as alternativas.

4.3.3

Em remate, o Comité exprime as maiores reservas quanto a analisar este aspecto do ponto de vista da concorrência: a segurança dos mercados deve ser o argumento decisivo e condicionante de todas as escolhas. Só uma vez cumprida esta condição se poderá procurar um equilíbrio razoável entre o respeito das regras de um mercado livre e a protecção dos interesses dos operadores e dos investidores.

5.   Os objectivos da Comissão

5.1

O objectivo que a Comissão se propõe é o de criar sistemas comunitárias de compensação e de liquidação que sejam eficientes e seguros e garantam tratamento igual a todos os fornecedores desses serviços. A Comissão propõe-se igualmente aproximar esses sistemas através da adopção de medidas e de políticas adequadas de:

liberalização e integração dos actuais sistemas de compensação e liquidação de valores mobiliários, assegurando o pleno direito de acesso e eliminando os obstáculos;

aplicação da política da concorrência;

adopção de um quadro regulamentar e prudencial comum;

adopção de mecanismos adequados de governação dos sistemas.

5.2

O Comité revê-se, ainda que com algumas reservas, quer nestes objectivos quer nos procedimentos e nas políticas a adoptar. Está igualmente de acordo com as grandes linhas do plano de acção delineado pela Comissão. Limitar-se-á, por isso, a aduzir, nos parágrafos seguintes, algumas observações com vista a contribuir para os trabalhos da Comissão.

5.3

Os relatórios Lamfalussy e Giovannini, assim como a Comissão, são unânimes em afirmar que a adopção de todas as medidas necessárias desencadeará um processo salutar de concentração dos sistemas de compensação e de liquidação. O motor desse processo deverá ser o mercado. A Comissão considera dever assumir uma postura neutral quanto às questões estruturais e abster-se de tomar posição nos confrontos entre concentrações horizontais ou verticais e sobre a oferta de serviços de intermediação e/ou bancários por parte dos sistemas de liquidação ou das contrapartes centrais.

5.4

O Comité deseja expor algumas considerações a este respeito, em complemento e para esclarecimento do que ficou dito no ponto 4.3.2. Em seu entender, enquanto a concentração transnacional de organismos homólogos pode gerar economias de escala e simplificar os procedimentos, a concentração de actividades diversas numa só entidade tende a criar organismos híbridos de enormes dimensões. As autoridades de supervisão deveriam, em estreita colaboração com as autoridades competentes em matéria de concorrência, certificar-se de que daí não advêm riscos para a sobrevivência das empresas de menores dimensões. Por outro lado, e não fosse que por razões de transparência, os intervenientes do mercado devem poder saber quem faz o quê.

5.4.1

A declaração de «não intervenção» da Comissão deve, entretanto, ser considerada à luz da «declaração de intenção» referida mais adiante no documento em apreço (cf. ponto 6.2, último travessão), que confirma as intenções de controlar o respeito das regras de concorrência.

6.   As iniciativas da Comissão

6.1

O programa da Comissão para a concretização dos objectivos afigura-se perfeitamente correcto, racional e, sobretudo, realista: as inovações poderão ser introduzidas gradualmente (incluindo prazos razoavelmente longos para uma aplicação integral) e sempre no respeito das regras do mercado, devendo os responsáveis legislativos e as autoridades de supervisão actuar apenas quando necessário.

6.2

A Comissão criou um grupo consultivo e de acompanhamento a fim de examinar todos os obstáculos Giovannini pelos quais o sector privado seja exclusiva ou conjuntamente responsável. Além disso, a Comissão tenciona:

propor uma directiva-quadro que institua um quadro legislativo seguro e permita o reconhecimento mútuo dos diferentes sistemas nacionais;

constituir grupos de peritos para analisar os obstáculos jurídicos e fiscais à integração e, se for caso disso, propor métodos de harmonização das legislações e/ou procedimentos nacionais;

assegurar a aplicação efectiva do direito da concorrência, controlando as posições de monopólio existentes e qualquer nova consolidação do sector e intervindo sempre que necessário.

6.2.1

A maior parte dos elementos previstos nas iniciativas concretas da Comissão não suscitam observações particulares. O Comité cinge-se a alguns comentários como base de reflexão.

6.3

Liberdade de acesso e de escolha (ponto 2.1 da comunicação). O problema central da construção de um mercado paneuropeu aberto consiste nos obstáculos levantados por algumas autoridades (e, até certo ponto, por quase todas) ao acesso e à escolha por parte dos prestadores de serviços de compensação e de liquidação do local onde se processa a compensação e a liquidação. Perante a resistência oposta por diversas autoridades nacionais, a Comissão não vê outra alternativa senão a adopção de uma directiva que imponha a supressão destes obstáculos e garanta a todos os interessados (empresas de investimento e bancos, contrapartes centrais (CCP) e sistemas de liquidação (CSD)) o direito de acesso às contrapartes apropriadas em qualquer país da União. Dessa forma, seria nomeadamente possível aos mercados regulamentados e aos sistemas multilaterais de negociação concluir acordos com CCP e CSD de outros países da União.

6.3.1

O Comité concorda com o teor geral dos objectivos da Comissão, mas não deixa de recomendar a necessária cautela. Nem sempre os obstáculos actualmente encontrados se devem ao proteccionismo das autoridades nacionais; em muitos casos, a sua meta é proteger o mercado contra riscos que escapem ao controlo das autoridades. Trata-se de uma preocupação legítima. O intercâmbio de informações nem sempre é satisfatório e, mais importante, as informações podem não ser disponíveis imediatamente, o que impossibilita uma intervenção rápida.

6.3.2

O documento da Comissão refere uma série de medidas prudenciais reforçadas, sobretudo em matéria de adequação de fundos próprios e de gestão dos riscos, mantendo o princípio do controlo do país de origem. Será instaurado um modelo de cooperação em matéria prudencial, «a fim de evitar que os sistemas de compensação e liquidação de valores mobiliários que operem a nível transfronteiras estejam sujeitos à supervisão de diversas entidades distintas». Esta estratégia é seguramente a mais acertada, mas não deve subestimar-se as dificuldades da sua aplicação na prática.

6.3.3

A crescente sofisticação dos mercados, o ritmo acelerado das concentrações, fusões, da evolução dos sistemas, etc., impõem um trabalho difícil às autoridades de supervisão. Do ponto de vista teórico, as medidas de cooperação serão sem qualquer dúvida correctas e razoáveis. Todavia, ao nível prático é de recear que surjam dificuldades não despiciendas: não será fácil integrar vinte e cinco sistemas, cada um com diferentes níveis de eficiência, recursos, e experiência. O Comité recorda que a entrada em vigor das medidas de liberalização deverá ser posterior à obtenção de um acordo sem reservas entre todas as autoridades nacionais de supervisão, as quais deverão dar garantias de poderem participar, de forma responsável, no sistema de intercâmbio de informações e de garantir a protecção dos mercados contra o risco sistémico.

6.4

Governação dos sistemas (ponto 2.3 da comunicação). A Comissão assevera não pretender influir na escolha da forma de governação das empresas que gerem os sistemas de liquidação e das suas contrapartes centrais. O Comité observa, no entanto, que muitos dos problemas de concorrência e de posição dominante poderiam ser resolvidos através de uma forma de governação cooperativa entre os participantes no sistema que vise o equilíbrio orçamental mais do que a obtenção de lucros.

6.4.1

Dada a complexidade das funções dos intermediários e o grande poder de mercado que detêm, a Comissão considera necessário definir requisitos para uma governação de sistemas eficiente, transparente e capaz de controlar os sistemas e a gestão dos assuntos correntes. O Comité está de acordo: os requisitos propostos não suscitam comentários específicos e estão em harmonia com os conceitos modernos de corporate governance.

6.4.2

A Comissão acrescenta, entretanto, que estas entidades, exactamente porque dotadas de um grande poder, poderão adoptar práticas anticoncorrenciais. Para obviar a esta eventualidade, os CCP e os CSD deverão manter contabilidades separadas que evidenciem a gestão das suas actividades institucionais por oposição à prestação dos diferentes serviços. As mesmas disposições deverão ser aplicadas às actividades que a Comissão designa de «acessórias, tal como os serviços bancários». Por mais importante que possa ser uma CCP ou um CSD, qualificar a actividade bancária de acessória parece demasiado redutor: os participantes nos sistemas de liquidação necessitam de crédito em moeda de bancos comerciais (ou dos bancos centrais) para fazerem frente a carências temporárias de liquidez. A actividade bancária pode envolver somas consideráveis e, sobretudo em momentos de tensão do mercado, não pode subestimar-se a possibilidade de um risco sistémico.

6.4.2.1

Uma excepção à separação das contas torna-se aceitável, porém, no caso dos CSD, dado que as funções «bancárias» destas instituições dizem respeito aos bancos participantes e são por isso, em regra, de natureza subsidiária à liquidação. O crédito é, assim, de certa forma, parte integrante da liquidação e, como tal, poderia (ou deveria, segundo alguns) constituir uma actividade ligada às funções institucionais do CSD. Idênticas considerações podem aplicar-se aos CCP quando o crédito seja necessário para um desenvolvimento regular da compensação, da qual possa considerar-se parte integrante.

6.4.3

Não é muito claro de que forma as autoridades de supervisão bancária e as autoridades de controlo das CCP e dos CSD poderão, na prática, colaborar em casos de emergência com a necessária celeridade. Como anteriormente referido, o Comité espera que a consideração dos riscos potenciais para o mercado leve todas as autoridades responsáveis pela supervisão das actividades bancárias e não bancárias sob a égide do BCE a concluírem acordos de colaboração e de informação recíproca de carácter contínuo, com a adopção de medidas rápidas e eficazes em caso de urgência.

6.5

Discrepâncias no plano jurídico e fiscal (ponto 3 da comunicação). Os problemas de ordem jurídica são de tal forma numerosos e complexos que não é possível enumerá-los na íntegra. As discrepâncias a nível fiscal revestem aspectos contratuais, patrimoniais, de direito internacional, de direito das sociedades e das falências e têm repercussões jurídicas sobre todas as fases dos processos de aquisição, compensação e guarda de valores mobiliários. A Comissão faz notar que «as discrepâncias nos direitos substantivos nacionais podem ainda afectar negativamente todo o processo».

6.5.1

Não padece dúvida que a resolução dos inúmeros e complexos problemas jurídicos será tarefa longa, mormente conta tida de que os particularismos nacionais e o conservadorismo burocrático provocaram atrasos e obstáculos nos processos de harmonização legislativa. O CESE apela a que o sentido de responsabilidade dos Estados-Membros prevaleça, por uma vez, sobre os interesses nacionais. A Comissão tenciona instituir um grupo composto de peritos académicos, dos poderes públicos e de representantes da profissão jurídica, ao qual incumbirá aprofundar as análises já encetadas pelo grupo Giovannini e propor soluções adequadas. O grupo deverá estabelecer contactos com os organismos que levaram a cabo a mesma atribuição a nível mundial (Unidroit). O Comité recomenda que o grupo inclua peritos técnicos e jurídicos do meio dos operadores.

6.5.2

O processo de harmonização legislativa que a Comissão se propõe iniciar não poderá ser concluído antes que os outros aspectos da directiva-quadro tenham sido actualizados. No entretanto, serão de aplicação as legislações existentes, com alterações dos aspectos jurídicos apenas quando tal se revelar absolutamente necessário. Não devem fazer-se alterações precipitadas que possam obrigar a correcções posteriores. Por outro lado, o Comité faz notar que os mercados têm funcionado até esta data sem graves problemas com base nas práticas e nos usos consagrados, os quais raramente têm dado origem a contestações e ainda mais raramente a litígios judiciais. As diferenças legislativas devem, pois, ser consideradas, mais do que como um entrave propriamente dito, como um factor de complicação dos procedimentos que se traduz num agravamento considerável dos custos.

6.5.3

As considerações exaradas no ponto precedente aplicam-se igualmente às medidas de ordem fiscal, um domínio em que a diversidade das legislações e a vontade legítima dos Estados-Membros de tributarem as receitas mobiliárias provocam uma multiplicidade de disposições, muitas vezes discriminatórias, por vezes de difícil interpretação, mas sempre onerosas para o mercado. O Comité considera não dever pronunciar-se sobre os méritos das medidas propostas pela Comissão: estas revelam-se correctas do ponto de vista formal, mas não serão sempre facilmente aceites pelos Estados-Membros, sobretudo se não forem preliminarmente dissipados preconceitos ideológicos incompatíveis. O objectivo principal é harmonizar os procedimentos de cobrança dos impostos; todos os métodos, entre as várias opções possíveis, apresentam vantagens e desvantagens, mas importa que, pelo menos neste ponto, os Estados-Membros cheguem a acordo.

6.6

Política de concorrência (ponto 4 da comunicação): o documento da Comissão dedica especial atenção a este aspecto e define um princípio importante: as medidas de liberalização e de integração dos sistemas e a política de concorrência são complementares. Este princípio parece óbvio, mas uma vez posto em prática pode prestar-se a interpretações diversas, em particular de tipo restritivo. A Comissão declara não querer tomar posição sobre a questão da integração horizontal ou vertical, mas adverte que poderão surgir problemas do ponto de vista da concorrência se algumas concentrações obtiverem ou consolidarem uma posição dominante no mercado, o que é já o caso actualmente. O problema não é a posição dominante, que em si mesma não é ilegal, mas sim o uso ilícito da posição dominante, uma situação que, face às características do mercado, poderia levar a problemas de aplicação das normas.

6.6.1

Já há exemplos, citados pela Comissão, de concentrações transfronteiriças entre CCP nacionais e internacionais, com a criação de organismos de dimensões consideráveis. Estão em discussão outras formas de concentração ou de colaboração estruturada. Ao examinar se as estruturas existentes ou a criar são ou não respeitadoras das regras de concorrência há que ter em consideração que em qualquer dos casos as CCP e os CSD são necessariamente poucos e de grandes dimensões. Dada a especificidade da sua natureza, é irrealista pensar que em cada país possa vir a surgir uma pluralidade de estruturas tal que seja necessário prevenir que uma delas assuma uma posição mais importante do que as outras; o mesmo se aplica, e com maior acerto, a nível europeu. A diferença entre um organismo de maior relevo do que os outros e um que assume uma posição dominante é extremamente subtil, e a decisão das autoridades de concorrência deverá fundamentar-se num conhecimento profundo das características do mercado e das suas necessidades operacionais.

6.6.2

Será ainda mais difícil tomar decisões quanto à posição concorrencial ou quanto às actividades anticoncorrenciais se se mantiver a tendência — sobre a qual a Comissão assume uma posição neutral — para a integração horizontal entre operadores centrais e actividades bancárias. Particularmente complexo será o controlo dos preços, que não serão seguramente regulamentados mas que a Comissão tenciona verificar para se certificar de que não são aplicados segundo critérios discriminatórios. Os critérios de fixação dos preços obedecem, ou deveriam obedecer, às leis do mercado e depender dos volumes, da segurança, das garantias dadas e de uma série de considerações qualitativas; não será fácil determinar com toda a certeza que critérios são subjectivos ou objectivos, e se são discriminatórios ou não. Mais árduo ainda será detectar os preços excessivos resultantes de uma posição dominante, para o que não há critérios definidos à partido e se torna necessário analisar caso por caso.

6.6.3

Ao concluir este exame sumário dos aspectos concorrenciais, o CR exprime o seu acordo de princípio com a estratégia da Comissão, mas lança um apelo (que espera ver convertido em normas vinculativos) à colaboração entre autoridades de supervisão e autoridades de concorrência, a nível nacional como europeu. As autoridades de supervisão (em cooperação com as de concorrência) deverão poder efectuar controlos ex ante para evitar que a existência de posições dominantes leve a abusos e exclusões e para precluir a necessidade de intervenções ex post, conflituosas e prejudiciais para o mercado.

6.6.4

Por último, a Comissão detém-se, sem tomar posição, sobre o problema dos acordos, exclusivos ou não, escusando-se evidentemente à sua análise caso a caso; trata-se de uma solução equilibrada, que o Comité compartilha inteiramente.

7.   Conclusões

7.1

O Comité examinou o documento da Comissão com subido interesse, analisando-o sobretudo na perspectiva dos actores sociais por si representados, e está de acordo com as suas principais linhas de força. O CESE reconhece que a matéria é sobremodo complexa e delicada, pelo que haverá ainda um longo caminho a percorrer antes da entrada em vigor de uma directiva. Segundo os peritos, a entrada em vigor das regras poderá levar vários anos.

7.2

O Comité está consciente de que a consulta de todas as partes interessadas — mercado, autoridades de supervisão e governos — é uma tarefa necessariamente árdua e longa e que o processo legislativo de adopção de uma directiva poderá ser assaz complexo. O CESE questiona-se, pois, sobre a situação que prevalecerá nesse entretanto — uma pergunta pertinente que não pretende suscitar alarmismos inúteis. Os mercados deram já provas de poder superar momentos de emergência com as regras existentes, e as autoridades foram capazes de controlar as situações mais difíceis.

7.3

O problema essencial é o do futuro a breve prazo: a evolução dos mercados externos (americano, mas também asiático) escora a tendência para a criação na Europa de estruturas mais robustas e eficazes. Uma tendência racional e coerente com as regras de um mercado que não pode ser isolado, mesmo do ponto de vista da regulamentação, do contexto mundial. Importa, por isso, usar de bom senso e prudência, à luz das regras de concorrência, na autorização ou interdição de concentrações de empresas ou da assunção de novas funções por empresas ou grupos financeiros.

7.4

Por outro lado, o Comité mantém que as decisões não podem ser tomadas exclusivamente pelas autoridades de concorrência: embora não seja uma prática seguida regularmente, deveria tornar-se obrigatória a consulta das autoridades de controlo. O desejo de abrir os mercados respeitando as regras de concorrência não pode comprometer a segurança dos próprios mercados, um aspecto que só poderá ser tido na devida conta pelas instâncias que são responsáveis por essa segurança.

Bruxelas, 10 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Os relatórios Giovannini e os documentos com eles relacionados podem ser consultados no sítio da Comissão Europeia: http://europa.eu.int/comm/internal_market/financial-markets/index_en.htm#otherdocs.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/134


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um programa de acção integrado no domínio da aprendizagem ao longo da vida»

COM(2004) 474 final — 2004/0153 (COD)

(2005/C 221/22)

Em 9 de Setembro de 2004, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do n.o 4 do artigo 149.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 20 de Janeiro de 2005, tendo sido relator C. KORYFIDIS.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 10 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 107 votos a favor, 2 votos contra e nenhuma abstenção, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

Após um longo processo de investigação, elaboração e consulta (1), a Comissão apresentou uma proposta de criação de um programa de acção integrado no domínio da aprendizagem ao longo da vida.

1.2

O Comité Económico e Social Europeu aplaude, referindo que o presente parecer tem por objectivo contribuir para que a proposta concreta apresentada pela Comissão Europeia seja o mais eficaz e funcional possível.

1.3

Neste contexto, a posição do CESE sobre a proposta da Comissão baseia-se sobretudo nos conhecimentos e nas experiências adquiridos, designadamente no que respeita aos seguintes aspectos:

os contratempos que têm marcado a consecução dos objectivos de Lisboa;

o atraso registado em estabelecer uma correspondência entre a formação/educação e a produtividade (2);

a situação demográfica da Europa;

as preocupações que têm vindo a ser manifestadas, quer a nível europeu quer a nível mundial, em relação à busca de soluções para os problemas atrás referidos (3).

2.   Proposta da Comissão

2.1

A proposta de directiva da Comissão (COM(2004) 474 final) visa a reorganização dos programas educativos existentes. Segundo a proposta, a reorganização fundamenta-se em quatro factores principais:

as transformações que se observam em toda a União e que se traduzem na integração crescente dos sistemas de educação e formação num contexto de aprendizagem ao longo da vida;

o papel cada vez mais importante da educação e da formação na criação na Europa de uma economia do conhecimento competitiva e dinâmica;

a necessidade de potenciar os pontos fortes e responder às descontinuidades e à falta de sinergia constatadas;

a necessidade de simplificar e racionalizar os instrumentos legislativos comunitários através de um quadro integrado, que permita o financiamento de um leque diversificado de actividades.

2.2

A proposta tem por base os actuais programas Sócrates e Leonardo da Vinci, o programa eLearning, a iniciativa Europass e as diversas acções financiadas através do programa de acção comunitário para promover organismos, ao nível europeu, e apoiar actividades específicas no domínio da educação e da formação.

2.3

Nela se constata que «a integração do apoio comunitário à cooperação e à mobilidade transnacionais no domínio da educação e da formação num programa único traria vantagens significativas, uma vez que permitiria obter maiores sinergias entre os diversos domínios de acção, reforçaria a capacidade de apoiar o desenvolvimento da aprendizagem ao longo da vida e proporcionaria modos de gestão mais coerentes, racionais e eficientes» (4).

2.4

A conclusão a que se chega é que «deveria, por conseguinte, estabelecer-se um programa integrado, a fim de contribuir, através da aprendizagem ao longo da vida, para o desenvolvimento da União Europeia enquanto sociedade de conhecimento avançada, caracterizada por um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos e uma maior coesão social» (5).

2.5

O documento da Comissão afirma, ainda, que «tendo em conta as especificidades do ensino básico e secundário, do ensino superior, da formação profissional e da educação de adultos, e a consequente necessidade de a acção comunitária se basear em objectivos, formas de acção e estruturas organizativas adaptadas a estes domínios, convém manter, no quadro do programa integrado, programas específicos para cada um destes quatro sectores e maximizar a coerência e os elementos comuns entre esses programas» (6).

2.6

O «programa integrado» compreende as seguintes categorias de programas:

Os programas específicos:

o programa Comenius, que atenderá às necessidades de ensino e de aprendizagem de todos os intervenientes no ensino pré-escolar e escolar;

o programa Erasmus, que atenderá às necessidades de ensino e aprendizagem de todos os intervenientes no ensino superior formal e no ensino e formação profissionais de nível superior;

o programa Leonardo da Vinci, que atenderá às necessidades de ensino e aprendizagem de todos os intervenientes no ensino e formação profissionais;

o programa Grundtvig, que atenderá às necessidades de ensino e de aprendizagem dos intervenientes em todos as formas de educação de adultos;

O programa transversal, que abrange as quatro actividades principais seguintes:

cooperação política no domínio da educação e da aprendizagem ao longo da vida na Comunidade;

promoção da aprendizagem de línguas;

criação de conteúdos, serviços, pedagogias e práticas inovadores, baseados nas TIC, no domínio da aprendizagem ao longo da vida;

divulgação e exploração dos resultados das acções apoiadas no quadro do programa e de programas anteriores com ele relacionados e intercâmbio de boas práticas;

O programa Jean Monnet, destinado a prestar apoio a instituições e actividades no domínio da integração europeia, abrange as três actividades principais seguintes:

acção Jean Monnet;

concessão de subvenções para o funcionamento de instituições específicas que operam na área da integração europeia;

concessão de subvenções para o funcionamento de outras instituições e associações europeias que actuam nas áreas da educação e formação.

2.7

Um aspecto marcante da proposta da Comissão é que os objectivos quantificados são revistos à luz das alterações aos montantes propostos nas perspectivas financeiras pormenorizadas para 2007-2013. Os números em causa são os seguintes:

participação de um em 20 alunos em acções Comenius no período 2007-2013;

3 milhões de estudantes Erasmus até 2011;

150 000 estágios Leonardo da Vinci até 2013;

25 000 acções de mobilidade Grundtvig até 2013.

2.7.1

A Comissão vê nestes objectivos ambiciosos um elemento essencial para que o novo programa possa constituir um instrumento capaz de contribuir para a construção, até 2010, da economia do conhecimento mais competitiva e dinâmica do mundo.

2.7.2

O montante indicativo proposto é fixado em 13 620 milhões de euros para os 7 anos do programa.

3.   Observações na generalidade

3.1

Proceder a uma abordagem criativa da proposta da Comissão em apreço não é tarefa fácil, sobretudo porque isso pressupõe um conhecimento geral e detalhado dos objectivos, dos recursos e dos problemas inerentes à política europeia de educação. Tal exige, também, a capacidade de articular, de forma integrada, as opções educativas com os grandes objectivos a que a União se propõe para o século XXI (7), e, mais especificamente, para a década actual (8). Por último, analisar a proposta implica ter uma noção clara das opções que fazemos no presente e das suas consequências no futuro.

3.2

O CESE assume uma posição clara relativamente à hierarquização dos grandes objectivos da União e adopta um ponto de vista bem determinado em relação à forma de os articular com a aprendizagem ao longo da vida. Esta posição é defendida no parecer exploratório, recentemente elaborado pelo CESE a pedido da Presidência neerlandesa, sobre o tema «Formação e competitividade» (9). A análise do CESE da proposta da Comissão enquadra-se, em grande parte, neste contexto.

3.3

O CESE sustenta a sua posição nos vastos conhecimentos que possui sobre os resultados das políticas comunitárias nos domínios da cultura, do ensino profissional, da juventude e do desporto, e respectivos programas.

3.3.1

Não obstante algumas reservas, as experiências acumuladas contribuem, de modo geral, para uma imagem positiva, com destaque para os seguintes programas, entendidos:

como instrumento de alta qualidade e de grande eficácia ao serviço da comunicação dos órgãos da União, e nomeadamente da Comissão, com os cidadãos europeus;

como terreno privilegiado para promover na prática, no seio da União, não só a mobilidade das pessoas, como também a circulação de ideias e boas práticas;

como campo de acção que proporciona, e vai continuar a proporcionar, um elevado valor acrescentado europeu.

3.3.1.1

Assinale-se que os programas educativos da União Europeia figuram entre as raras actividades comunitárias directamente orientadas para os cidadãos europeus. O novo programa deverá ter por objectivo, por um lado, promover o desenvolvimento democrático baseado no ideal da democracia participativa e de cidadania activa e, por outro, promover o emprego e um mercado de trabalho versátil. Este programa contribuirá também para criar condições que permitam aos cidadãos europeus realizarem-se, quer no plano pessoal quer no plano profissional, capacitando-os a alargar e explorar as suas potencialidades. O importante para a União, e para a sua relação com os cidadãos, é desenvolver um programa integrado orientado para todos os grupos etários, incluindo os grupos marginalizados, o mundo laboral, as pequenas e médias empresas e os parceiros sociais.

3.4

O CESE acolhe favoravelmente a criação de um «programa de acção integrado no domínio da aprendizagem ao longo da vida», como proposto pela Comissão. As sugestões aqui apresentadas têm um único objectivo — o de contribuir para a melhoria do programa.

3.4.1

Assim, o primeiro aspecto a apontar diz respeito à natureza da aprendizagem ao longo da vida.

3.4.1.1

Concretamente, o CESE pensa que é necessário ter uma visão homogénea (10) das políticas de educação, formação e juventude, por considerar que a aprendizagem ao longo da vida constitui uma única e mesma trajectória, desde o pré-escolar até à pós-reforma (11). Ao mesmo tempo, é de opinião que se afigura necessário evitar a compartimentação entre os diferentes grupos etários, imposta aos cidadãos europeus pelos sistemas europeus de educação e formação.

3.4.1.2

O CESE tem noção de que a aprendizagem ao longo da vida só pode ser promovida aos níveis nacional, regional e local. Tem igualmente consciência da existência a nível europeu de obstáculos que impedem que o programa proposto seja realmente integrado. Por outro lado, reclama que os programas específicos prevejam disposições no sentido de eliminar as barreiras rígidas (de idade ou de conteúdo dos estudos) que os actuais sistemas de educação e formação colocam entre si e aos formandos. Ao mesmo tempo, pronuncia-se a favor da criação de sinergias de desenvolvimento activas entre o programa integrado e os programas orientados para a cultura, a juventude e o desporto (na perspectiva da ratificação da Constituição Europeia). Este último ponto reveste-se de grande importância, na medida em que as acções educativas informais estão basicamente relacionadas com a aquisição de princípios indispensáveis para que os cidadãos possam aceder ao emprego e ter um comportamento activo no plano social.

3.4.2

Há também lacunas ao nível da comunicação horizontal e da articulação dos programas sectoriais.

3.4.2.1

O CESE é de opinião que os problemas ligados à realização dos grandes objectivos da União são altamente complexos. Para os resolver, impõe-se desde já desmantelar os entraves à mobilidade entre os subsistemas educativos, quer seja dentro de um país ou entre vários Estados. É necessário suprir estas barreiras e limitações para fazer da aprendizagem ao longo da vida uma realidade concreta e fecunda.

3.4.2.2

A exposição de motivos da proposta da Comissão contém uma observação de peso, formulada inicialmente na Comunicação intitulada «A nova geração de programas comunitários no domínio da educação e da formação após 2006» (12), na qual se defende a «integração crescente dos sistemas de educação e formação num contexto de aprendizagem ao longo da vida, de modo a fazer face aos novos desafios da sociedade do conhecimento e da evolução demográfica» (13). Infelizmente, a proposta da Comissão em apreço não concretiza esta visão. O texto da Comissão foca principalmente as estruturas dos actuais sistemas educativos, limitando-se a encorajar algumas sinergias entre os diferentes níveis de educação. O CESE entende que o novo programa seria mais flexível e inovador se o acesso aos programas específicos fosse alargado a vastos grupos-alvo, sem exclusão, por critérios de qualificação ou de idade, de determinadas categorias eventualmente interessantes.

3.4.2.3

Eis porque se propõe aumentar o financiamento e o raio de acção do programa transversal, no intuito de promover medidas de cooperação e acções coordenadas para que haja condições favoráveis a um verdadeiro espaço de aprendizagem ao longo da vida, que comporte um forte valor acrescentado europeu e contribua substancialmente para a realização dos objectivos de Lisboa, nomeadamente para o desenvolvimento duradouro. É claro que estas medidas de cooperação e iniciativas devem ser acordadas por todas as componentes dos sistemas educativos (14), pelos parceiros sociais e, mais em geral, pela sociedade civil organizada, bem como pelos poderes públicos, em particular os que actuam aos níveis regional e local.

3.4.2.4

Neste contexto, será de toda a conveniência reforçar o programa Grundtvig que atenderá às necessidades de todas as modalidades de educação e formação de adultos.

3.4.3

Constata-se ainda uma terceira — e importante — lacuna ao nível da articulação do programa integrado com os objectivos estabelecidos pela Estratégia de Lisboa.

3.4.3.1

O CESE constata um enorme atraso na realização dos objectivos de Lisboa. O ano de 2010 chegará rapidamente e, portanto, está nas mãos dos cidadãos participantes no sistema produtivo alcançar, ou não, os objectivos de Lisboa. Por fim, entende que, para fazer compreender a Estratégia e os objectivos de Lisboa, é necessário intervir de modo constante e integrado junto desta fatia da população europeia, em colaboração com os parceiros sociais. Isto significa que, paralelamente à promoção da aprendizagem ao longo da vida a todos os níveis, é necessário contribuir para que os Europeus compreendam a Estratégia e os seus objectivos, e congreguem esforços para responder, com êxito, aos desafios do desenvolvimento duradouro e da economia do conhecimento.

3.4.3.2

Neste sentido, o CESE propõe que os programas de aprendizagem ao longo da vida orientados para os cidadãos participantes no sistema produtivo sejam, por um lado, reforçados e, por outro, directamente articulados com o desenvolvimento duradouro e a criação da economia do conhecimento. Por outras palavras, este imperativo pressupõe o desenvolvimento de programas de aprendizagem ao longo da vida, baseados em exigências concretas e decididos de acordo com os parceiros sociais, tendo em vista o desenvolvimento duradouro e a realização dos objectivos de Lisboa (15), programas esses que, segundo os casos, podem ser de maior ou menor dimensão.

3.4.3.3

O CESE é particularmente a favor de que as PME possam ter acesso aos mecanismos do programa. Numa outra ocasião, o CESE assinalava que «as PME (...) têm o dever de contribuir com o seu apoio, o seu aconselhamento e o seu empenho para o enquadramento socioeconómico em que se inserem, dado que lhes é difícil desenvolver por si sós intervenções educativas integradas» (16). Posto isto, o CESE preconiza um procedimento simplificado para abordar a questão das PME, de modo a que a sua participação no programa seja viável e produza resultados.

3.4.3.4

Tendo em conta os limites orçamentais do programa, o financiamento das propostas apresentadas pelo CESE implica uma revisão da ponderação do peso das acções de mobilidade e das acções de desenvolvimento, devendo dar-se prioridade a estas últimas, no período até 2010. O financiamento das propostas do CESE pode também ser assegurado através de uma articulação e uma complementaridade mais integradas e coerentes com as outras políticas comunitárias pertinentes (artigo 14.o da proposta). Neste quadro, importa que as políticas europeias de emprego e investigação, assim como o Fundo Social Europeu e os Fundos Estruturais, se desenvolvam em torno de uma perspectiva de aprendizagem ao longo da vida. Ao mesmo tempo, e ainda até 2010, a sua pretensão deverá ser garantir a maior compatibilidade possível com os objectivos do programa de aprendizagem ao longo da vida aqui enunciados.

3.5

Uma outra deficiência diz respeito à confusão criada pelo escalonamento de competências entre os níveis europeu, nacional, regional e local, mas também entre os poderes públicos e os parceiros sociais ou, mais em geral, a sociedade civil organizada.

3.5.1

O CESE considera que a repartição clara e funcional de funções e atribuições entre todos os intervenientes e actores do «programa integrado de aprendizagem ao longo da vida» constitui uma questão de decisiva importância. Neste esforço colectivo tão importante, que aposta na Europa do conhecimento, estabelecer uma distinção entre os factores activos, ou seja, os responsáveis pelas políticas, e os factores passivos, nomeadamente os seus beneficiários, seria uma contradição.

3.5.2

O CESE solicita, portanto, que os parceiros sociais, incluindo os órgãos de poder local e regional, participem em todas as acções do programa integrado de aprendizagem ao longo da vida. Esta participação activa, parece-nos ser condição essencial para que o programa seja aceite pela sociedade e bem sucedido.

3.5.3

A proposta aqui formulada cria as condições indispensáveis para que o programa em apreço se baseie nas necessidades reais quotidianas da sociedade e, também, dos mercados, o que aumentará as possibilidades de alcançar um maior equilíbrio entre as necessidades dos que trabalham e os imperativos da colectividade.

3.5.3.1

O CESE gostaria de assinalar que a proposta da Comissão em apreço não faz referência às prioridades fixadas pelos parceiros sociais, em Março de 2002, no tocante às acções que visam desenvolver competências e qualificações ao longo da vida.

3.6

Um outro problema crucial prende-se com a mobilidade, a afectação dos recursos necessários e a maneira como são repartidos entre os programas específicos.

3.6.1

Do ponto de vista do CESE, a mobilidade pode ser uma componente positiva desde que esteja correlacionada com os elementos qualitativos dos programas. Consequentemente, o objectivo de triplicar os programas de mobilidade não pode deixar de colocar a tónica nos aspectos qualitativos. Como tal, até 2010, a mobilidade dos cidadãos participantes no sistema produtivo comporta, como se viu, aspectos qualitativos, devendo contribuir significativamente para a realização dos objectivos de Lisboa.

3.6.2

O CESE solicita que os recursos consagrados à mobilidade sejam repartidos de modo mais equilibrado, a favor desta camada populacional.

3.7

O CESE considera que a vertente comunicativa é um factor de grande peso para que o «programa integrado» venha a merecer acolhimento favorável dos cidadãos.

3.7.1

Este cenário é agravado pelo facto de a denominação «programa integrado» não contribuir, nem do ponto de vista da comunicação, nem de outros, para que haja uma evolução num sentido positivo.

3.7.2

Propõe-se, pois, substituir a denominação «programa integrado» por uma outra que seja mais compreensível e clara, quer em termos de informação, quer em termos de fundo. Para o CESE, «Atena», nome da deusa da sabedoria na Grécia Antiga, seria uma designação apropriada.

4.   Observações na especialidade

4.1

O objectivo das observações que se seguem é precisar as reservas do CESE quanto a alguns artigos da proposta da Comissão. Salvo indicação em contrário, o CESE é, em princípio, a favor da proposta no seu conjunto.

4.2   Artigos 1.o a 8.o

4.2.1

O CESE aponta para a necessidade de reformular os artigos 1.o a 8.o de acordo com as observações feitas, no sentido de assegurar uma participação mais activa dos parceiros sociais, da sociedade civil e dos órgãos de poder local e regional nos procedimentos e acções previstos (ponto 3.5.2) e alterar a designação do programa (ponto 3.7.2).

4.2.2

No que diz mais particularmente respeito aos programas específicos, e na mesma lógica das observações na generalidade, o CESE propõe lançar as bases institucionais imprescindíveis para apoiar as acções comuns de longo fôlego, orientadas sobretudo para os sectores que privilegiam a lógica da aprendizagem ao longo da vida e a capacidade de reacção dos cidadãos face aos desafios contemporâneos.

4.3   Artigos 9.o a 14.o

4.3.1

O CESE entende que a formulação do artigo 11.o, respeitante à representação e participação dos parceiros sociais no comité incumbido de assistir a Comissão, é deficiente.

4.3.1.1

A participação dos parceiros sociais nesse comité é, logo à partida, bastante problemática. De facto, o estatuto de observador dos parceiros sociais, independentemente de gozarem do direito de pedir que as suas posições constem das actas, é incompatível com a lógica da democracia participativa tão defendida pela União na Constituição Europeia, que está neste momento a ser ratificada. Acresce que, na conjuntura actual, o imperativo principal consiste em criar condições necessárias a uma cultura de co-responsabilidade social no contexto da concepção e aplicação das políticas educativas europeias. Associar os parceiros sociais, de modo efectivo, ao referido comité, permitindo-lhes exercer o direito de voto, não só criaria as condições necessárias para uma co-responsabilidade da sociedade, como também permitiria que assumissem um papel de importância primordial no que diz respeito à concepção e ao desenvolvimento de acções educativas eficazes.

4.3.1.2

Paralelamente, esta fórmula concreta, que se apresenta como uma forma imperfeita de envolvimento dos parceiros sociais no comité, cria um precedente para a adopção de soluções análogas aos níveis nacional, regional e local. Ora, uma tal situação é inadmissível, já que os parceiros sociais, pelo menos nalguns Estados-Membros, ocupam um papel de primeira ordem na configuração das políticas supramencionadas.

4.3.1.3

O CESE defende que se deve estabelecer um diálogo específico sobre a composição do comité, no intuito de o tornar mais funcional e eficaz. No entanto, o CESE pode desde já afirmar que considera indispensável a representação de todos os actores que influenciam, ou são influenciados, pela aprendizagem ao longo da vida, e que possuem conhecimentos gerais ou específicos sobre a matéria, objectivo este que só pode ser atingido através de um equilíbrio criativo. Por outras palavras, a composição do comité deveria assentar numa estrutura que reflectisse não só os Estados, mas também o mundo laboral (parceiros sociais e, de um modo mais geral, a sociedade civil) e o mundo do conhecimento (círculos académicos).

4.3.1.4

Por último, o CESE considera que a participação dos parceiros sociais não se deve limitar às questões relacionadas com a formação profissional. O funcionamento do comité deveria enquadrar-se no processo de realização da Europa do conhecimento. Esta obrigação significa que o comité pode ser um exemplo de boas práticas para traçar e seleccionar uma política baseada em conhecimentos validados, que procura abordar a problemática na sua globalidade e, também, na sua especificidade, como parte de um todo. Importa, pois, que todos os intervenientes com voz no comité estejam implicados em todas as fases do processo, de um modo simultaneamente operacional e claro quanto à natureza, aos meios e às finalidades das várias opções.

4.3.1.5

O CESE reclama uma actuação mais activa no que diz respeito às necessidades de aprendizagem específicas dos portadores de deficiência. Para tanto, solicita que a alínea b) do artigo 12.o seja reformulada como segue:

Alínea b) do artigo 12.o: «medidas destinadas aos aprendentes com necessidades especiais, em particular os portadores de deficiência, especialmente com vista a promover a sua integração no sistema geral de educação e formação».

4.4   Artigos 15.o a 46.o

4.4.1

Na linha das observações atrás formuladas (ponto 3.4.2), o CESE propõe ampliar o alcance das acções do programa transversal e aumentar o respectivo financiamento, com a consequente redução proporcional das quantias afectas aos programas sectoriais.

4.4.1.1

O móbil desta proposta é simples: o reforço do programa transversal e dos seus conteúdos pressupõe a modernização dos sistemas educativos europeus no seu conjunto. Tal significa, em resumo, que os investimentos efectuados a título do dito programa se traduzirão num valor acrescentado para os sistemas de ensino da Europa. Em tais circunstâncias, o que acontece é que as acções mais produtivas e mais fecundas serão as realizadas dentro do quadro do programa transversal.

4.4.2

O CESE sugere que se estabeleça uma relação directa entre o programa transversal de aprendizagem ao longo da vida, na sua versão melhorada, e os objectivos de Lisboa, o desenvolvimento duradouro e os cidadãos europeus que, até 2010, participam na esfera produtiva (ponto 3.4.3.2).

4.4.2.1

Mais concretamente, esta articulação pressupõe uma abordagem integrada do conjunto da estratégia de aprendizagem ao longo da vida, baseada nos problemas básicos, nos objectivos a que nos propomos para solucioná-los e, também, nos recursos disponíveis para atingir esses fins. Ou seja, esta ligação baseia-se nos seguintes pressupostos:

Apoio às investigações e aplicações-piloto levadas a cabo pela comunidade científica, pelos parceiros sociais e, mais em geral, pela sociedade civil organizada, bem como ao nível dos poderes públicos regionais, no que diz respeito ao modo de atingir os objectivos de Lisboa;

Apoio à cooperação de todos os intervenientes para se alcançar este objectivo e contribuir para o desenvolvimento duradouro;

Apresentação pela União de um conjunto de pistas baseadas nas boas práticas, no sentido de encontrar um modo de articular, ao nível local, a aprendizagem ao longo da vida com os objectivos de Lisboa.

4.5

O CESE considera que o programa em análise representa uma opção da maior importância para o futuro da Europa. É, portanto, de opinião que a sua concretização passa por intervenções correctoras, devendo ser controlada ao mais alto nível. Nesta óptica, o CESE veria com bons olhos a criação de um comité interinstitucional de alto nível incumbido de acompanhar a execução do programa, no quadro do método aberto de coordenação. Com o apoio da Comissão Europeia, esta instância teria por principal tarefa exercer um controlo permanente sobre as actividades do programa e informar regularmente o Conselho Europeu, tendo em vista eventuais medidas rectificadoras.

Bruxelas, 10 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anna-Marie SIGMUND


(1)  Em anexo são recapituladas as principais etapas deste processo.

(2)  JO C 120 de 20.5.2005.

(3)  Refira-se que, recentemente, começaram a ser mobilizados recursos para responder aos problemas actuais da União, nomeadamente os derivados dos objectivos de Lisboa (emprego, economia do conhecimento, desenvolvimento sustentável, etc.). A aprendizagem ao longo da vida e a sua promoção constituem o denominador comum de todas as vias propostas para ultrapassar as dificuldades acima referidas. É neste contexto que se inserem as iniciativas da Presidência neerlandesa, lançadas em colaboração com a Comissão Europeia, sobre as relações existentes entre formação e produtividade e o reforço da cooperação europeia no domínio da formação profissional, bem como o relatório Kok sobre a avaliação intercalar da Estratégia de Lisboa, a apresentar em Março de 2005 (http://europa.eu.int/comm/lisbon_strategy/pdf/2004-1866-FR-complet.pdf).

(4)  COM(2004) 474 final, ponto 16.

(5)  COM(2004) 474 final, ponto 17.

(6)  COM(2004) 474 final, ponto 18.

(7)  Estes objectivos consistem, nomeadamente, em construir a sociedade do conhecimento, garantir o desenvolvimento sustentável, nas três dimensões que o caracterizam, e instaurar o sistema multilateral de governação mundial.

(8)  Ou seja, os objectivos de Lisboa, no que respeita à economia do conhecimento e ao desenvolvimento sustentável (Gotemburgo), bem como os objectivos de Barcelona, relacionados com o aspecto qualitativo dos sistemas de educação europeus.

(9)  Ver CESE 1435/2004.

(10)  Ver a este propósito JO C 157 de 25/5/1998, ponto 3.7.1, onde se afirma que «a reunião das políticas relativas ao espaço educativo europeu (educação, formação e juventude) e a concentração das acções correspondentes constituem a condição sine qua non para o seu desenvolvimento. Da sua concepção e da sua adopção à sua aplicação, as políticas da educação, da formação e da juventude devem inscrever-se num quadro de acção homogéneo e ser integradas. Com esta tomada de posição, o Comité não pretende de modo algum reprovar o lançamento de determinadas iniciativas educativas, nem muito menos preconizar a adopção de um esquema político centralizador, mas deseja salientar a importância de uma estratégia unificada que é necessário estabelecer em matéria de educação, formação e de juventude, em simultâneo com um programa de acção integrado».

(11)  Ver a este respeito a definição do conceito de «aprendizagem ao longo da vida» constante da proposta da Comissão (artigo 3.o, n.o 3).

(12)  COM(2004) 156 final.

(13)  Primeiro travessão do n.o 3 do documento COM(2004) 474 final.

(14)  Entre estes «subsistemas» do sector educativo contam-se os diferentes níveis de ensino (primário, secundário e superior), bem como os seus ramos (ensino geral, ensino e formação profissionais), os seus actores (prestadores de educação, formadores e professores) e as suas formas (clássicas e informais).

(15)  Para mais informações, ver o ponto 9 (exemplo de boas práticas) do parecer CESE 1435/2004.

(16)  Cf. o ponto 8.1.1.3 do parecer JO C 120 de 20.5.2005.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/141


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Como garantir uma melhor integração das regiões em situação de desvantagem natural e estrutural permanente»

(2005/C 221/23)

Em 27 de Janeiro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre «Como garantir uma melhor integração das regiões em situação de desvantagem natural e estrutural permanente».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social emitiu parecer em 19 de Janeiro de 2005, sendo relator Paulo BARROS VALE.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 10 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 80 votos a favor, 0 votos contra e 3 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução e considerações gerais

1.1   Identificação e estabilização do conceito de regiões com debilidades físicas estruturais permanentes

1.1.1

Um dos objectivos estratégicos da União Europeia é o de atingir um desenvolvimento harmonioso e homogéneo para o conjunto do seu território, eliminando, em particular, os factores, sejam eles socioeconómicos, históricos, físicos ou naturais, que comprometem a competitividade de determinadas zonas e travam o seu desenvolvimento.

1.1.2

Entre os vários obstáculos, a acessibilidade apresenta-se como um dos mais significativos, condicionando de modo decisivo as condições de vida de certas áreas, como por exemplo, as ilhas ou as zonas de montanha. A reduzida densidade demográfica constitui também mais uma desvantagem no que respeita ao desenvolvimento de diversas regiões. Territórios há em que se verifica a coexistência de mais do que uma debilidade, como seja o caso das ilhas com características de montanha, e que vêem, por este facto, as suas dificuldades acrescidas.

1.1.3

No quadro dos trabalhos sobre a coesão económica e social, a Comissão Europeia tem reconhecido a existência de handicaps estruturais permanentes (desvantagens geográficas ou naturais e demográficas específicas) em determinadas regiões da UE — territórios montanhosos, territórios fracamente povoados e territórios insulares — que dificultam a actividade económica e constituem uma verdadeira desvantagem para o desenvolvimento das regiões afectadas.

1.1.4

É, contudo, opinião do CESE que a política regional europeia não tem constituído, no seu conjunto, uma resposta verdadeiramente adequada, no sentido de ter em devida conta os fortes condicionalismos que pesam sobre estas regiões.

1.1.5

Com efeito, apesar da existência de um conjunto de medidas comunitárias que visa, ou, sobretudo, implica algumas destas regiões, seja de modo efectivo ou potencial, não existe uma política europeia estruturada em relação a todos os territórios afectados por este tipo de desvantagens, constituída de medidas exclusivas em função das suas especificidades.

1.1.6

É entendimento do CESE de que esta situação é resultado, em grande parte, da ausência, a um nível jurídico e formal, de um verdadeiro conceito comunitário de «regiões em situação de desvantagem natural e estrutural permanente».

1.1.7

No actual contexto europeu, de uma Europa alargada a 25 Estados-Membros, o CESE considera da máxima importância o reconhecimento jurídico/formal de tal conceito como suporte para a definição de um quadro de intervenção específico.

1.1.8

No entender do CESE, estes territórios deveriam ser vistos com particular atenção, nomeadamente, através da criação de um enquadramento específico que incluísse medidas de carácter permanente, afinal as únicas compatíveis com a minimização de problemas estruturais particularmente recorrentes. Só assim será possível evitar o perigo de um maior isolamento/marginalização destas regiões e contribuir para a sua integração na Comunidade da qual fazem parte em condições equitativas.

1.1.9

Já no seu parecer sobre «O futuro das regiões de montanha na União Europeia» (1), o CESE considerava indispensável assegurar uma visão comum através do reconhecimento da especificidade destes territórios nos Tratados, tal como já existe nos artigos 158.o e 299.o do Tratado de Amsterdão. Este reconhecimento, que se justifica pelas desvantagens e desafios que afectam estes territórios, poderia ser formulado atribuindo-lhes um direito à solidariedade, bem como o direito à diferença e à experimentação.

1.1.10

Sempre foi entendimento do CESE de que tais territórios requerem um reconhecimento que lhes permita consolidar os princípios fundamentais que lhes permitirão assumir-se plenamente como territórios de autenticidade e de diversificação.

1.1.11

Deste modo, o CESE congratula-se com o facto do Tratado Constitucional da União Europeia, aprovado no passado dia 18 de Junho na Conferência Intergovernamental que reuniu Chefes de Estado e de Governo da União Europeia, ainda sujeito a ratificação, incluir num artigo, que parece traduzir uma reformulação do artigo 158.o do Tratado de Amsterdão, uma referência explícita às regiões afectadas por desvantagens estruturais permanentes, como a insularidade, a montanha e a baixa densidade populacional.

1.1.12

Com efeito, na Secção dedicada à Coesão Económica, Social e Territorial, o artigo III–220.o acrescenta aos dois parágrafos já previstos no artigo 158.o do Tratado de Amsterdão o seguinte parágrafo «Será dada particular atenção às áreas rurais, às áreas afectadas por reconversão industrial e às áreas que sofrem de severos handicaps permanentes, naturais ou demográficos, como é o caso das regiões mais a norte com uma baixa densidade populacional, as ilhas, zonas de fronteira e áreas de montanha».

1.1.13

É opinião do CESE que o facto das regiões com este tipo de handicaps estarem agora patentes no Tratado Constitucional, constitui sem dúvida uma importante alavanca política no sentido de permitir levar a cabo futuras acções, tanto a nível nacional como comunitário, mais adequadas à realidade destas regiões, tendo em vista a redução de forma sustentável das desvantagens estruturais permanentes ou, pelo menos, a redução do respectivo impacto.

1.1.14

O CESE congratula-se com o facto da União Europa continuar empenhada em fomentar a coesão económica e social e considera que o reconhecimento das especificidades destes territórios no Tratado constitui sem dúvida uma importante oportunidade para o futuro destas regiões. No entanto, é opinião do CESE de que a instituição de uma verdadeira base jurídica de referência para o reconhecimento das regiões em causa, requer necessariamente uma clarificação do conceito, designadamente do que se entende por handicaps naturais permanentes, handicaps demográficos, regiões com baixa densidade populacional ou áreas de montanha.

1.1.15

Importa agora, através de legislação comunitária, definir objectivamente quais os territórios em que é aplicável, no sentido de garantir a aplicação de futuras intervenções específicas de carácter permanente a favor dessas regiões.

1.1.16

A consagração de tal conceito daria certamente mais força a uma acção da política comunitária modulada em função das especificidades destas regiões, no sentido de as compensar das desvantagens estruturais que enfrentam.

1.2   A problemática das regiões insulares da União Europeia

1.2.1

A insularidade é apontada como uma característica geocultural e uma desvantagem permanente que acrescenta uma dificuldade suplementar à competitividade dessas regiões.

1.2.2

No plano institucional têm sido feitas referências claras aos territórios insulares (artigo 154.o do Tratado de Maastricht, artigo 158.o do Tratado de Amsterdão e Declaração Anexa n.o 30 do Tratado de Amsterdão), onde se reconhece que as desvantagens estruturais ligadas à insularidade prejudicam gravemente o respectivo desenvolvimento económico e social e, como tal, se recomenda que ao nível da legislação comunitária devem ser tomadas, sempre que se justifique, medidas em favor destas regiões, por forma a integrá-las melhor no mercado interno em condições equitativas.

1.2.3

O relatório sobre a análise das regiões insulares (2), com data de Março de 2003, refere, contudo, que apesar da importância das referências institucionais, poucos efeitos foram ainda produzidos em termos de acções específicas.

1.2.4

Um estudo relativo às 286 regiões insulares (3) revela os seguintes resultados:

estas regiões possuem cerca de dez milhões de habitantes e uma superfície de 100 000km2 (correspondendo assim a 3 % da população da União Europeia e a 3,2 % da sua superfície);

estima-se que o PIB total destes territórios seja de 18 mil milhões de euros (ou seja 2,2 % do PIB da União Europeia) e que o PIB por habitante (em Paridade de Poder de Compra) seja de 16 300 euros (72 % da média da UE), com fortes disparidades entre as regiões insulares;

com algumas excepções, a situação económica e social apresenta-se nestes territórios menos favorável comparativamente ao país a que pertencem. O PIB per capita dos territórios insulares é, em geral, inferior à média nacional, sem ser necessariamente o mais baixo do Estado a que pertencem (apresenta-se, contudo, amplamente superior ao do grupo das dez regiões mais pobres da União Europeia);

a economia dos territórios insulares apresenta uma grande vulnerabilidade, na medida em que se mantém centrada num número limitado de actividades, com uma hiper-especialização em actividades como a agricultura, a pesca e o turismo. A falta de matérias-primas coloca entraves ao desenvolvimento do sector secundário (as regiões insulares apresentam uma taxa de emprego no sector secundário inferior à média da UE). Têm sido implementadas algumas estratégias no sentido de alargar a base económica e de reduzir a sazonalidade;

as ilhas revelam uma percentagem elevada de pequenas empresas. A pequena dimensão do mercado interno, o nível ainda pouco elevado de qualificações e a falta de tradição em matéria de criação de empresas constituem factores particularmente vulneráveis para as empresas desses territórios;

a população insular reparte-se de forma muito desigual pelas três zonas geográficas: 95 % da população concentra-se nas ilhas mediterrânicas, contra 5 % nas ilhas atlânticas e do Norte. Este desequilíbrio é ainda mais vincado em termos de repartição por ilha (um grupo de cinco ilhas concentra cerca de 85 % da população);

a dimensão da população residente é a fonte de desvantagem mais determinante. Este critério permite evidenciar um patamar de 4-5 000 habitantes, acima do qual a taxa de crescimento demográfico é geralmente positiva, o nível de equipamento e de infra-estruturas é elevado e a população é mais nova. Abaixo deste patamar as ilhas estão particularmente expostas ao êxodo e ao envelhecimento da sua população, bem como a carências patentes de equipamento;

paralelamente à dimensão da população residente, as condições geomorfológicas e naturais caracterizam uma tripla desvantagem: a insularidade, a montanha e a configuração de arquipélago. Com efeito, estes territórios, de relevo maioritariamente montanhoso, devem ainda fazer face aos condicionalismos decorrentes da sua estrutura de grupos de ilhas;

os territórios insulares apresentam, porém, várias vantagens que devem ser mais e melhor exploradas, nomeadamente no que se refere às actividades ligadas ao lazer (turismo, desporto, residência secundária …), desempenhando ainda um importante papel ao nível das auto-estradas marítimas.

1.2.5

Um dos critérios que, segundo o EUROSTAT, definem o conceito de ilha é que nenhuma das ilhas seleccionadas deve conter uma capital da UE. Antes do alargamento esta definição efectivamente excluía a Grã-Bretanha e a Irlanda, mas agora passa também a excluir duas ilhas relativamente pequenas: Chipre e Malta. O CESE sugere que a definição seja reavaliada de modo a possibilitar a eventual inclusão destes dois novos Estados-Membros. Esta questão já foi reconhecida pela Comissão Europeia na sua proposta para os novos Fundos Estruturais e de Coesão (4), bem como a nível da nova Constituição Europeia (5), que incluía uma declaração a este respeito.

1.3   A problemática das regiões de montanha

1.3.1

As regiões de montanha representam cerca de 40 % do território da UE e são habitadas por cerca 66,8 milhões de pessoas (17,8 % da população total da UE).

1.3.2

Em virtude das especificidades geofísicas, culturais e económicas (as montanhas são frequentemente fronteiras de um Estado), muitas actividades económicas não encontram nas regiões de montanha um contexto adequado para o seu desenvolvimento, condicionando assim o modo de vida dos seus habitantes.

1.3.3

Num estudo recente sobre as regiões de montanha (6), para além de se salientar os diversos handicaps, naturais económicos e sociais, aponta-se para a existência de elevada disparidade entre as diversas zonas.

1.3.4

O mesmo estudo conclui que as políticas nacionais para as zonas de montanha têm sido diversas, enquanto em alguns países assumiram fundamentalmente um carácter sectorial, dirigidas fundamentalmente à agricultura/desenvolvimento rural, noutros países destinaram-se a um desenvolvimento multissectorial, designadamente em áreas como as infra-estruturas públicas, ambiente e turismo.

1.3.5

O estudo sobre as zonas de montanha refere ainda que o ambiente, a paisagem e os valores culturais, que constituem um verdadeiro património, estão actualmente mais protegidos sob o ponto de vista de legislação nacional e comunitária, mas aponta para a necessidade de uma melhor coordenação com as estratégias de desenvolvimento.

1.3.6

No contexto do processo de globalização, o estudo alerta para a existência de três riscos: a tendência de tornar as zonas de montanha num «museu aberto» (de reservas natural/cultural e áreas de recreação), a tendência de promover o crescimento económico sem aplicação do princípio da sustentabilidade e a tendência ao abandono.

1.4   A problemática das zonas de baixa densidade populacional

1.4.1

Nas áreas de baixa densidade populacional, o principal problema é geralmente o transporte: tanto no tocante à duração das viagens como ao custo do transporte. Em muitos casos, o problema é uma verdadeira falta de infra-estruturas de transportes. É raro encontrar economias de escala nestas áreas, o que representa um problema não apenas para a produção privada mas também para os serviços sociais e outros serviços públicos. Esta situação coloca à prova a solidariedade nacional numa sociedade quando os serviços públicos das zonas em questão têm de assumir uma parte das despesas públicas superior ao que seria de esperar, tendo em conta o tamanho da população.

1.4.2

Uma outra característica problemática destas áreas é o clima. A baixa densidade populacional e um clima frio são dois factores que geralmente encontramos juntos. A acrescentar aos elevados custos de transportes de longa duração encontramos, entre outros, também elevados custos de aquecimento.

1.5   As questões associadas aos transportes e seus custos, seja numa análise per capita, seja numa análise absoluta

1.5.1

Na sua resolução de 12 de Fevereiro de 2003 relativa ao Livro Branco sobre a Política dos Transportes, o Parlamento Europeu recorda a obrigação de a política dos transportes contribuir para a coesão económica e social e assumir a natureza particular das regiões periféricas, insulares, montanhosas e com baixa densidade demográfica, realçando ainda a importância de se tomar em consideração as necessidades particulares destas regiões. Atenta a sua situação geográfica, os transportes revestem uma importância estratégica para estas regiões.

1.5.2

Além disso, o facto de algumas destas regiões serem constituídas por arquipélagos aumenta a sua dependência em relação a este tipo de serviços, sendo a manutenção das relações políticas, económicas e sociais com o continente dependente dos serviços de transporte aéreo e marítimo.

1.5.3

Os sobrecustos de transporte, em resultado quer do afastamento destas regiões quer da necessidade de assegurar a regularidade do seu serviço, constituem uma dificuldade acrescida ao seu desenvolvimento económico. Com efeito, as desvantagens económicas reflectem-se nos elevados custos de transporte, de pessoas e mercadorias de e para estas regiões (nas ilhas o custo de transporte de mercadorias para aceder ao mercado externo é mais elevado, em virtude da dependência do transporte marítimo ou aéreo, mais caro que o rodoviário ou ferroviário para as mesmas distâncias), nos elevados custos de distribuição (dada a necessidade de manter elevados stocks no sentido de prevenir riscos de escassez devido a condições climatéricas e outras e ainda de responder a uma procura sazonal) e nos mais elevados custos de produção (agravados pela pequena dimensão do mercado local e nalguns casos pelo elevado custo dos terrenos e pela reduzida capacidade de investimento local).

1.5.4

Apesar do peso económico e demográfico relativamente fraco destas regiões, em relação ao conjunto da União Europeia, algumas regiões, designadamente as mais periféricas e as ultraperiféricas, podem constituir uma plataforma da Europa para o desenvolvimento de relações comerciais com os respectivos vizinhos.

1.5.5.

Assim, tem-se argumentado que a política comum dos transportes, designadamente através de uma melhor integração dos aeroportos e dos portos destas regiões nas redes transeuropeias, apresenta-se como essencial para responder às necessidades específicas destas regiões, tendo em vista seu desenvolvimento económico e social.

1.5.6

No relatório sobre as regiões estruturalmente desfavorecidas, a Comissão da Política Regional, dos Transportes e do Turismo salienta o papel que, para remover a desvantagem da acessibilidade e para promover a competitividade, podem desempenhar as grandes redes transeuropeias nos sectores dos transportes e da energia, no sentido de assegurar uma melhor conexão destas regiões com o resto da UE e de reduzir a fragmentação interna dos mercados regionais.

1.6   As questões associadas às telecomunicações

1.6.1

As longas distâncias, quer até aos principais mercados europeus quer no interior das regiões, lesam seriamente a competitividade das mesmas e as suas possibilidades de desenvolvimento.

1.6.2

O desenvolvimento da sociedade da informação, das redes de telecomunicações, dos serviços multimédia e da inovação tecnológica, constitui uma verdadeira oportunidade para estas regiões

1.6.3

Ao reduzirem as barreiras do tempo e das distâncias, as novas tecnologias da informação e comunicação são tidas como um meio de reduzir os efeitos da insularidade e de ajudar a fornecer às ilhas diferentes serviços (designadamente, nas áreas da educação e da saúde, neste último caso através do desenvolvimento da telemedicina) e constituem um importante requisito para o desenvolvimento de negócios destas regiões.

1.6.4

Consciente de que estas questões constituem aspectos incontornáveis no desenvolvimento das economias locais, a União Europeia tem vindo a apoiar os esforços das regiões e dos agentes económicos, quer públicos quer privados, no sentido de modernizar as infra-estruturas de telecomunicações, desenvolver os serviços necessários à realização da sociedade da informação e inseri-los da melhor maneira no contexto regional.

1.6.5

Os estudos revelam, porém, que, apesar das infra-estruturas das telecomunicações terem sido consideravelmente melhoradas nestas regiões, tanto em qualidade como em número de linhas conectadas, quer para as ligações regionais e nacionais como para as comunicações internacionais, e de terem sido desenvolvidos os serviços telemáticos, o que permitiu uma melhor informação dos utilizadores dos serviços públicos e privados, as disparidades continuam a ser muito grandes em relação às regiões europeias continentais.

1.6.6

Em suma, apesar dos progressos significativos, não estão ainda completamente resolvidos todos os problemas, esperando-se que os progressos da tecnologia venham a permitir mudanças positivas nos próximos anos de forma a atenuar o sentimento de isolamento psicológico dos habitantes destas regiões.

1.7   Infra-estruturas e acesso aos serviços públicos, nomeadamente, portos, aeroportos, caminhos-de-ferro, estradas, serviços de saúde, educação e formação e política do conhecimento

1.7.1

As regiões em situação de desvantagem natural e estrutural permanente registam, em geral, grandes dificuldades na fixação da sua população.

1.7.2

A ausência de massa crítica dita, em geral, a insuficiência de serviços públicos, quer no plano qualitativo, quer no plano quantitativo, nestes territórios. Os sobrecustos dos serviços de base, tais como os transportes, condicionam o desenvolvimento económico destas regiões. É, por isso, opinião do CESE que, pelo seu impacto social, os serviços públicos são também determinantes para a dinâmica territorial destas regiões.

1.7.2.1

Uma vez que a prestação de serviços públicos é da responsabilidade do Estado-Membro, as políticas para os mesmos serviços são uma questão sobretudo nacional. Por conseguinte, o CESE insta os Estados-Membros a criarem sistemas de serviços sociais caracterizados por solidariedade socio-geográfica.

1.7.3

Sendo verdade que as tecnologias de informação e comunicação têm permitido oferecer algumas soluções, os progressos registados a este nível foram ainda muito lentos na maior parte destas regiões.

1.7.4

À semelhança do Parlamento Europeu, o CESE considera que a revisão da política comunitária da concorrência deve permitir reforçar o impacto das ajudas regionais nas regiões que padecem de desvantagens geográficas permanentes, a fim de aí assegurar a manutenção de serviços públicos de qualidade.

1.8   Constrangimentos e potencialidades ligados ao ambiente; a diversidade de ecossistemas

1.8.1

O ambiente é em diversas destas regiões muito frágil e o desenvolvimento do turismo, em particular em algumas ilhas mediterrânicas, aumenta ainda mais a pressão a este nível. Existem, no entanto, imensas potencialidades, como a própria diversidade dos ecossistemas que podem e devem ser equilibradas e sustentadamente aproveitadas.

1.8.2

No que se refere à energia, as regiões insulares, em particular as ultraperiféricas, caracterizam-se por uma grande dependência relativamente ao abastecimento petrolífero (devido à sua localização, afastada das grandes redes de energia, e ao custo mais elevado da produção de electricidade, em virtude da dimensão média e frequentemente muito pequena das redes eléctricas a alimentar), pelo que devem ser exploradas alternativas de energias renováveis em que no geral estas regiões são particularmente favorecidas.

1.9   A problemática da actividade económica; concentração de actividades sectoriais e a falta de alternativas; a situação do emprego

1.9.1

Um dos grandes problemas revelados por estas regiões é sem dúvida a fraca capacidade de criação e consolidação das empresas, em resultado da escassez de capital e em grande parte, de um clima económico e social pouco propício ao desenvolvimento dos negócios.

1.9.2

Alguns estudos recomendam que as economias destas regiões, em particular as exclusivamente dependentes do turismo, devem ser diversificadas e devem ser promovidas novas fontes integradas de desenvolvimento endógeno.

1.9.3

Alguns estudos consideram que um programa de formação com vista a apoiar a inovação e a criação de empresas revela-se indispensável para sustentar o desenvolvimento de novos sectores ou para permitir uma descolagem das actividades turísticas e, por essa via, para promover o emprego.

1.9.4

A estrutura do emprego revela, em geral, um peso significativo do sector agrícola. O emprego no sector dos serviços é também elevado, mas essa importância fica sobretudo a dever-se ao emprego no sector público.

1.10   Oportunidades para o turismo e recreação

1.10.1

O turismo assume, indiscutivelmente, elevada importância enquanto elemento impulsionador da actividade económica e, consequentemente, de combate ao atraso de desenvolvimento das regiões com handicaps estruturais permanentes. Este sector representa, por vezes, a primeira actividade em termos de riqueza gerada por estas regiões.

1.10.2

O esforço de aproximação destes territórios às regiões mais desenvolvidas da UE requer, no entender do CESE, a valorização do papel do turismo, assente em verdadeira profissionalização, e do potencial de desenvolvimento económico que este representa.

1.10.3

O CESE continua a defender que o turismo não deverá constituir só por si a base da economia destes territórios, a qual deverá ser diversificada e multifacetada.

1.10.4

Já no seu parecer sobre «O futuro das regiões de montanha na União Europeia» (7), o CESE defendia que, dentro dos limites impostos pelos princípios de desenvolvimento sustentável, a oferta turística de montanha deverá ser diversificada, a fim de se conseguir um melhor escalonamento no tempo (melhor equilíbrio do fluxo turístico entre as diferentes estações) e no espaço (melhor repartição dos fluxos turísticos no território).

1.10.5

O CESE continua a defender que a vocação dos territórios para o acolhimento de visitantes para actividades de lazer, seja de turismo ou simples actividade recreativa, é o resultado das qualidades intrínsecas dos territórios, mas considera que esta funcionalidade deve, todavia, ser objecto de preservação e de acompanhamento, a fim de poder adaptar-se às exigências da procura.

1.10.6

Os estudos salientam que o turismo e recreação constituem valores-chave para estas regiões, mas alertam para a desvantagem de uma hiper-especialização nestes sectores de actividade económica.

1.11   Capacidade de atrair investimento e gerar oportunidades de fixação das populações, e do desenvolvimento do seu potencial endógeno

1.11.1

Por se tratar de regiões com desvantagens objectivas e permanentes geradoras de constantes sobrecustos, o CESE considera de uma importância extrema a implementação de políticas activas, por exemplo através da vertente da fiscalidade, que promovam o desenvolvimento da economia local com vista à fixação das populações nesses territórios.

1.11.2

Atendendo às características e condicionalismos específicos destas regiões, e sendo certo que importa procurar em cada caso a estratégia mais adequada aos objectivos de desenvolvimento destes territórios, entende o CESE que o apoio ao desenvolvimento de actividades no domínio do turismo sustentável e de qualidade, bem como de actividades produtivas locais, privilegiando, por exemplo, o desenvolvimento de serviços de proximidade às empresas e encorajando a criação e o desenvolvimento das pequenas e micro-empresas, constituem aspectos particularmente importantes para permitir o desenvolvimento de uma economia local a fim de contribuir para a criação e/ou preservação de emprego.

1.11.3

É também opinião do CESE que uma maior cooperação/envolvimento entre as autoridades locais e os interlocutores sociais destas regiões, por exemplo através de acções integradas, poderá criar condições e massa crítica no sentido de contribuir para uma maior valorização do potencial de desenvolvimento destas regiões, tendo em vista a sua aproximação às regiões mais desenvolvidas da UE. Estas regiões, devido ao impacto turístico, são vectores de difusão dos valores da União Europeia.

1.11.4

O CESE acredita que o acesso a educação de qualidade elevada e formação profissional é a chave para o desenvolvimento das regiões em questão.

1.12   Afastamento dos principais mercados e dos grandes centros de decisão e ausência de massa crítica para a sustentabilidade económica de múltiplas actividades

1.12.1

O afastamento destas regiões e também a sua dispersão interna constituem um obstáculo muito claro ao seu desenvolvimento, tanto mais que a sua dimensão reduzida coloca dificuldades em termos de rentabilização de fortes investimentos e da realização de economias de escala, bem como da sustentabilidade económica de múltiplas actividades.

1.13   Realidade dos movimentos económicos e sociais representativos das regiões em questão

1.13.1

Entende o CESE que só com movimentos económicos e sociais intervenientes e representativos se podem levar a cabo políticas públicas bem ajustadas às necessidades muito específicas de cada região. A falta de massa crítica (pessoas, infraestruturas, serviços, etc.) de muitas destas regiões e de níveis de organização eficazes dos parceiros económico-sociais são factores limitativos do desenvolvimento e da competitividade.

1.14   Políticas comunitárias e nacionais para a minimização dos problemas estruturais permanentes

1.14.1

Os Fundos Estruturais têm abrangido uma parte significativa da população destes territórios (no caso das ilhas, mais de 95 %), dada a sua elegibilidade ao nível dos Objectivos 1 e 2.

1.14.2

Suportados por políticas comunitárias e nacionais, têm sido desenvolvidos vários programas no sentido de assegurar um desenvolvimento sustentado destes territórios, tendo por base a exploração das suas vantagens específicas. Destacam-se a este nível o apoio ao desenvolvimento do artesanato local, de projectos turísticos, de novas infra-estruturas de transporte, de formação e do ambiente.

1.14.3

Com efeito, uma parte substancial dos financiamentos comunitários foi consagrada à modernização e ao reforço dos sectores produtivos, de modo a contribuir para a criação ou preservação de empregos. Entre as várias acções destacam-se, para além das tradicionais ajudas directas ao investimento, alguns dispositivos de engenharia financeira (sistemas de garantia, reforço dos fundos próprios, juros bonificados, etc.) que exerceram um efeito de alavanca para a mobilização de recursos nos mercados de capitais. As ajudas públicas incidiram também em elementos periféricos à actividade das empresas, designadamente ao nível da viabilização de zonas de actividade, de disponibilização de serviços comuns, de desenvolvimento de projectos de investigação aplicada e transferências de tecnologia e de utilização de novas tecnologias de comunicação.

1.14.4

Em matéria agrícola, foram conduzidas acções específicas a fim de reforçar as culturas tradicionais locais e incentivar a diversificação assim como a investigação aplicada e a experimentação.

1.14.5

Em matéria de pesca e de aquicultura, algumas regiões puderam beneficiar de financiamentos para projectos relativos à construção e modernização de embarcações, aquicultura, ordenamento dos portos de pesca, transformação e comercialização.

1.14.6

No sentido de desenvolver a capacidade de acolhimento e responder às necessidades específicas de certos sectores, foram também realizados diversos investimentos na área da formação (ao nível da construção de equipamento/cursos de formação).

1.14.7

Foram ainda lançadas acções na área da protecção do ambiente, com vista à redução da poluição, designadamente no que se refere à gestão e tratamento dos resíduos e efluentes líquidos de origem industrial e doméstica.

1.14.8

As medidas comunitárias de desenvolvimento rural especificamente destinadas a apoiar as regiões montanhosas tiveram em vista garantir a utilização continuada das terras agrícolas nas zonas menos produtivas e um maior apoio ao investimento nessas zonas. Através de medidas agroambientais foram apoiados métodos de produção agrícola compatíveis com as exigências da protecção do ambiente e a preservação do espaço natural.

1.15   Constatação da evolução das regiões em causa ao longo dos anos, e em função das políticas públicas que têm sido praticadas

1.15.1

As políticas comunitárias, designadamente através dos Fundos Estruturais, tiveram um papel muito relevante no desempenho global destas regiões, nomeadamente no sentido da convergência com o resto da União Europeia. Os efeitos dessas políticas foram muito importantes, ou mesmo determinantes, em vários domínios, como nas infra-estruturas de transporte, bem como na pesca e na agricultura, dois dos seus sectores produtivos essenciais.

1.15.2

A criação ou o desenvolvimento de infra-estruturas de redução do isolamento externo constitui um dos aspectos mais visíveis ao nível das acções co-financiadas pela União Europeia em cada uma das regiões. A acessibilidade de cada região foi claramente melhorada, o que beneficiou não só as populações locais, mas também a actividade turística. No plano interno, as regiões beneficiaram de ordenamentos rodoviários importantes e, em certos casos, de acções de desenvolvimento dos transportes colectivos. Em vários domínios, as infra-estruturas de apoio às actividades económicas foram reforçadas para fazer face à evolução das necessidades.

1.15.3

A par da melhoria das ligações aéreas e marítimas, as acções no domínio das tecnologias avançadas de comunicação (teleconferência, telediagnóstico, telemática, cablagens de rede) também contribuíram para reduzir as desvantagens inerentes à insularidade e/ou ao afastamento.

1.15.4

Ao nível dos sectores produtivos, os esforços realizados contribuíram para melhorar a produtividade das empresas e a adaptação da oferta às oportunidades dos mercados locais e à exportação.

1.16   O esforço de solidariedade nas políticas estruturais

1.16.1

No contexto da reforma dos Fundos Estruturais em 2006-2013, a situação específica das regiões afectadas por handicaps permanentes e as suas debilidades estruturais permanentes devem ser consideradas adicionalmente às suas características socioeconómicas.

1.16.2

O CESE olha com grande satisfação para a alusão no Terceiro Relatório da Coesão Económica e Social, adoptado pela Comissão Europeia em 18 de Fevereiro de 2004, aos problemas específicos destas regiões e à necessidade de adoptar medidas específicas adaptadas à sua situação particular.

1.16.3

O CESE considera que na alocação de recursos no âmbito da Prioridade II –«Competitividade Regional e Emprego» e também da Prioridade III — «Cooperação Territorial Europeia», previstas na nova arquitectura para a política de coesão da UE para o período de programação de 2007-2013, sejam tidos em devida conta critérios que avaliem desvantagens estruturais permanentes, como a situação periférica, o isolamento, a fraca acessibilidade e a fraca densidade populacional, que, como é sabido, colocam sérios entraves ao desenvolvimento económico e social das regiões afectadas.

1.16.4

Apoia, assim, a intenção da Comissão Europeia de tomar em devida conta, na nova abordagem preconizada pelos Fundos Estruturais, no âmbito do próximo período de programação financeira, a perspectiva territorial como uma perspectiva complementar à perspectiva económica e social. Com efeito, a Comissão Europeia propõe que a ajuda comunitária a favor da Prioridade II deverá ter em conta critérios territoriais que reflictam as desvantagens relativas das regiões com handicaps geográficos (ilhas, zonas de montanha e regiões com baixa densidade demográfica).

1.16.5

Concorda o CESE com a proposta da Comissão Europeia de que os Estados-Membros deverão assegurar que a especificidade destas regiões seja tida em conta na afectação de recursos no quadro dos Programas Regionais e de que os territórios com handicaps geográficos permanentes beneficiem de uma majoração da participação máxima comunitária.

1.16.6

O CESE considera que deverá ser dada especial atenção às situações em que tais condicionalismos se acumulam (por exemplo, ilha com zona de montanha e com baixa densidade demográfica).

1.16.7

Considera ainda desejável que as necessidades específicas destes territórios sejam tidas em conta não apenas no quadro da política de coesão mas em todas as políticas comunitárias.

1.16.8

Entende o CESE que, paralelamente à necessidade da política de coesão enfrentar os problemas da competitividade das regiões que sofrem de desvantagens estruturais permanentes que condicionam o seu desenvolvimento, outras políticas comunitárias, por exemplo a política da concorrência, deveriam ter em conta as suas implicações, directas e indirectas, positivas e negativas sobre estas regiões, no sentido de as integrar plenamente na Comunidade a que pertencem.

1.17.   As regiões do Objectivo 1: Um esforço sustentado e adaptado

1.17.1

O desenvolvimento económico e social das zonas mais desfavorecidas da União é não só socialmente justo mas também importante para a sua estabilidade política e para o seu desenvolvimento harmonioso. É legítimo atribuir prioridade às regiões onde se registam os mais baixos níveis de desenvolvimento da Comunidade e os mais graves problemas sociais.

1.17.2

No âmbito das dotações financeiras dos Fundos Estruturais destinadas ao Objectivo 1 após 2006, as debilidades associadas aos handicaps permanentes deverão, proporcionalmente às dimensões respectivas, ser consideradas como factores determinantes nos critérios de distribuição. As dotações financeiras deverão igualmente atender aos factores agravantes que são a insularidade, a desertificação ou os problemas de acessibilidade ligados ao relevo.

11.17.3

Pouco importa que tal instrumento assuma a forma jurídica de um programa dedicado ou de uma série de disposições específicas no quadro regulamentar de um «Objectivo 2» renovado, desde que responda a um certo número de critérios ou objectivos:

1.17.3.1

A existência de condicionalismos geográficos ou demográficos de natureza transitória ou permanente deve constituir explicitamente um critério de elegibilidade;

1.17.3.2

As suas esferas de intervenção devem inscrever-se em domínios que abranjam indiscutivelmente condicionalismos geográficos ou demográficos permanentes. Nomeadamente, através de:

financiamento da aquisição ou da renovação de infra-estruturas de transporte fixas ou móveis;

financiamento de capitais de risco para criar novas ligações marítimas ou aéreas, intracomunitárias ou com países terceiros;

financiamento de infra-estruturas públicas cujo aumento se justifica pela insularidade, pelo isolamento decorrente do relevo, ou baixa densidade populacional;

assunção de certos sobrecustos decorrentes da aplicação da legislação comunitária nestes territórios (por exemplo, aplicação de normas em matéria de ambiente, de gestão de resíduos, de recursos hídricos, etc.);

auxílios às empresas insulares (sobretudo às de pequena dimensão), para acções de promoção e de prospecção de mercado, na medida em que contribuam para as emancipar da exiguidade do mercado de proximidade, etc..

1.17.3.3

A distribuição deste instrumento deve assentar, de acordo com o princípio da proporcionalidade, na intensidade do handicap, apreciado em função da acessibilidade, da situação demográfica e, eventualmente, da produtividade. O cúmulo de condicionalismos que caracteriza grande número de regiões insulares (tais como a dispersão arquipelágica, uma situação demográfica difícil ou o relevo de uma parte do território) deve entrar nos critérios de distribuição.

1.17.4

Para que a criação de tal instrumento não seja apenas simbólica, será necessário que os recursos atribuídos sejam congruentes, devendo estar compreendidos, no mínimo, entre o actualmente concedido às regiões do Objectivo 2 e, no máximo, o actualmente concedido às regiões do Objectivo 1.

1.18   A reforma do regime dos auxílios estatais (8)

1.18.1

O total dos auxílios estatais concedidos pelos Estados-Membros é comparativamente superior ao dos Fundos Estruturais. É, pois, primordial para estas regiões que os diversos regimes de auxílios administrados pela Comunidade tenham em conta os sobrecustos e os condicionalismos inerentes à sua especificidade.

1.18.2

A argumentação dos representantes destas regiões por um quadro mais flexível baseia-se no facto de os auxílios que visam compensar os sobrecustos decorrentes da sua situação não constituírem um factor de distorção de mercado mas serem, pelo contrário, uma medida de reequilíbrio.

1.18.3

A legislação comunitária em matéria de auxílios e, nomeadamente, de auxílios estatais com finalidade regional e de ajudas agrícolas deve, pois, ser reformulada. Impõe-se que integre, de acordo com o princípio da diferenciação positiva, os condicionalismos inerentes à sua especificidade e o seu cúmulo eventual com outros condicionalismos permanentes de natureza geográfica ou demográfica. Seguem-se alguns exemplos:

1.18.3.1

O regime dos auxílios estatais com finalidade regional tem em conta os condicionalismos que afectam as regiões com uma densidade populacional muito baixa e autoriza-as a beneficiar de taxas mais elevadas e de ajudas directas aos transportes. Não faz, contudo (afora uma menção anedótica), qualquer referência ao caso das ilhas. Convém, pois, no mínimo, alargar a todas as ilhas o regime de que beneficiam as zonas com baixa densidade populacional:

percentagens de ESL (equivalente de subvenção líquida) comparáveis,

autorização de auxílios ao funcionamento que permitam cobrir os sobrecustos em matéria de transporte.

1.18.3.2

Acresce que esta mesma legislação só tolera, no melhor dos casos, auxílios ao funcionamento quando estes são «degressivos e temporários». Esta restrição não contempla o carácter permanente dos condicionalismos inerentes à insularidade e deve, pois, ser suprimida, particularmente no caso das ajudas aos transportes.

1.18.3.3

A proibição formal de ajudas directas aos transportes para as trocas entre os Estados-Membros da Comunidade deve ser reconsiderada no caso das ilhas. Tais ajudas poderão com efeito contribuir para uma melhor integração económica no espaço comunitário e permitir-lhes explorar a sua situação geográfica nos espaços marítimos europeus. Tal é particularmente válido para as regiões insulares situadas mais próximo das costas de um outro Estado-Membro do que as da sua metrópole e mais ainda — numa outra escala — das regiões cujas trocas com a Comunidade dependem do transporte transoceânico.

1.18.3.4

O problema das ajudas aos transportes deve igualmente ser abordado no contexto da OMC a fim de fomentar o desenvolvimento das trocas directas com os países terceiros mais próximos.

1.18.3.5

O regime de concorrência prevalecente no sector dos transportes marítimos e aéreos contém diversas disposições relativas às ilhas que devem ser melhoradas ou completadas. Assim:

a regra do preço mais baixo deve ser modulada pela consideração de factores tais como o impacto económico e social que a adjudicação do contrato pode exercer numa ilha;

o fraccionamento dos serviços de uma região em diversos concursos deve ser evitado quando esta prática é susceptível de pôr em risco a sua qualidade e fiabilidade;

a duração dos contratos de serviço público deve poder ser prolongada no sector marítimo, para atender ao prazo de amortização dos navios.

1.18.3.6

No caso das ajudas à agricultura ou à pesca, devem ser previstas medidas específicas de apoio às produções locais destinadas a limitar os efeitos dos sobrecustos de transporte ou os decorrentes da exiguidade do mercado. Tal poderia, por exemplo, ocorrer com as ajudas ao funcionamento para pequenas unidades de transformação (matadouros, leitarias, etc.) quando a modéstia do volume de produção da região ou a exiguidade do mercado de proximidade não autoriza o seu funcionamento em condições de viabilidade económica.

1.18.3.7

A aplicação de taxas uniformes em matéria de fiscalidade indirecta (IVA, impostos especiais de consumo, etc.) tende a agravar a situação nas regiões com handicaps permanentes onde os preços no consumo são mais elevados. Os Estados devem gozar de uma certa flexibilidade na aplicação das taxas de certos impostos nestas regiões quando tal contribua para reduzir os seus sobrecustos estruturais para melhorar as condições de vida da população. O mesmo vale, por motivos evidentes, para a fiscalidade ligada aos transportes ou aos direitos de uso (por exemplo: taxas aeroportuárias).

2.   Conclusões e recomendações

2.1

A situação de vulnerabilidade que caracteriza as regiões com handicaps permanentes tende a dificultar o seu desenvolvimento, e, em muitos casos, a exacerbar as suas dificuldades económicas e sociais. Confrontada com um contexto do mesmo tipo, uma população estabelecida nas regiões que não sofrem este tipo de debilidades, conhecerá uma prosperidade maior ou, pelo menos, dificuldades menores.

2.2

Seria igualmente tão inexacto quanto maniqueísta afirmar que existe uma espécie de fatalidade que condena as regiões com handicaps permanentes ao papel de territórios de segunda e os seus habitantes a um subdesenvolvimento endémico. As regiões europeias com handicaps permanentes possuem amiúde muitos trunfos ou potencialidades que podem ser explorados — a proximidade de recursos naturais relevantes, a capacidade para produzir energias renováveis, a atractividade no plano turístico, a posição geoestratégica, a proximidade de rotas marítimas, a diversidade dos ecosistemas, etc..

2.3

O problema destas regiões é que, para aproveitar estas oportunidades, terão provavelmente que envidar mais esforços ou assumir riscos muito superiores aos exigidos para levar por diante semelhante empresa noutras zonas mais privilegiadas da EU. Em período de recessão, serão, porém, as primeiras afectadas pela menor rentabilidade das suas indústrias.

2.4

Uma política europeia para as regiões com handicaps permanentes deve, pois, consistir num corpo de medidas que reduza, tanto quanto possível, a sua vulnerabilidade e que contribua para criar uma verdadeira «igualdade de oportunidades» entre estes territórios e o resto da União. Sendo esta política uma resposta a condicionalismos naturais objectivos, é legítimo que seja modulada em função da intensidade destes últimos. Pelo mesmo motivo, não deve significar uma substituição mas um complemento às medidas aplicadas tradicionalmente no âmbito da política de coesão económica e social.

2.5   Quais deverão ser os elementos constituintes de tal política?

2.5.1

Uma política europeia para as regiões com handicaps permanentes deve radicar em três grandes princípios e visar várias finalidades:

o primeiro é o princípio da «permanência», porque os condicionalismos geográficos que afectam estes territórios têm carácter constante. O princípio da permanência contrasta com a noção de «recuperação» que, até à data, serviu de base às políticas comunitárias para abordar os problemas económicos e sociais;

o segundo princípio é o da «discriminação positiva», que consiste em considerar que as medidas concedidas a certos territórios, para lhes permitir contrabalançar os condicionalismos estruturais permanentes, não constituem vantagens indevidas mas contribuem para a instauração de uma paridade real. A este título, a diferenciação positiva contrasta com discriminação que, segundo a definição do Tribunal de Justiça Europeu: «… consiste em lidar do mesmo modo com situações diferentes ou de modo desigual com situações idênticas» (Acórdão do Tribunal de Primeira Instância — quarta câmara — de 26 de Outubro de 1993. Processos apensos T-6/92 e T-52/92);

por fim, o terceiro princípio é o da «proporcionalidade», porque as situações dos territórios com handicaps permanentes são sinónimos de diversidade. A aplicação de uma diferenciação positiva às regiões com handicaps permanentes só é defensável se assentar na realidade das suas características geográficas, demográficas, ambientais e nos condicionalismos que estas lhes impõem. Estas realidades diferem necessariamente de uma para outra região.

2.5.2

Mais do que a escolha de medidas aplicáveis sistemática e uniformemente a todo o território, trata-se, antes do mais, de criar uma conjuntura propícia à integração destas diferenças. Assentando em disposições jurídicas, em recursos financeiros e em formas de governação, tal conjuntura permitirá elaborar soluções adaptadas a cada região proporcionalmente à natureza e intensidade dos problemas encontrados. Em certos casos, tal significará medidas comuns a todas as regiões com handicaps permanentes. Em outros casos, pelo contrário, tal implicará disposições específicas a uma dada situação, não se justificando a sua generalização.

2.6   Os objectivos de uma política para as regiões com handicaps permanentes

2.6.1

Os três tipos de objectivos de uma política para as regiões com handicaps permanentes são de ordem social, económica e ambiental e estão estreitamente imbricados.

2.6.2

Para uma apropriada aplicação das ajudas nas zonas desfavorecidas dever-se-ia ter em vista uma dupla acepção de sustentabilidade, mediante uma perspectiva socioeconómica, que garanta a sobrevivência das empresas familiares e de sistemas produtivos viáveis que impeçam o êxodo demográfico e mediante práticas compatíveis com o ambiente.

2.6.2.1

Objectivos sociais: os «objectivos sociais» de uma política europeia para as regiões com handicaps permanentes são permitir aos habitantes destas regiões que o assim pretendam «nascer, viver e trabalhar na região».

2.6.2.2

Os habitantes destas regiões devem poder beneficiar de uma escolha e de uma qualidade de infra-estruturas e de serviços tão próximos quanto possível dos disponíveis geralmente nas outras zonas da União.

2.6.2.3

Tal aplica-se a múltiplos sectores mas, em particular, à educação, à formação profissional inicial e ao longo da vida, saúde, transportes e telecomunicações. A paridade com as restantes zonas da União não pode ser definida de modo puramente estatístico, devendo ser apreciada em termos qualitativos. Quando as infra-estruturas ou os serviços são sofisticados, quanto mais escassa for a população de uma região, tanto mais a sua dimensão e o seu custo serão desproporcionados em relação ao número de habitantes. Não existe uma resposta uniforme para este problema, afora a aplicação de um princípio — oferecer prestações de qualidade para permitir, no mínimo, reter a população.

2.6.2.4

Os instrumentos exigidos são a intervenção dos Fundos Estruturais, orientada especialmente para o sector dos transportes (infra-estruturas fixas ou móveis), da gestão dos resíduos, dos recursos hídricos, dos serviços educativos e da saúde. No sector dos transportes, da energia e das telecomunicações, esta intervenção deve ser reforçada pela aplicação efectiva do artigo 154.o do Tratado relativo às redes transeuropeias, com meios financeiros congruentes.

2.6.2.5

Os habitantes das regiões com handicaps permanentes devem poder ter acesso a bens de consumo ou serviços a preços socialmente comportáveis.

2.6.2.6

As situações de desigualdade poderão ser corrigidas, em certos casos, por medidas destinadas a reduzir o preço no consumo e a incitar certos prestadores de serviços a estabelecerem-se nas zonas mais isoladas e menos povoadas.

2.6.2.7

Os instrumentos exigidos são medidas intervencionistas de natureza social, tais como:

ajudas directas à certos segmentos do comércio ou prestadores de serviços,

tarifas preferenciais para os residentes nos transportes marítimos ou aéreos,

a existência de serviços públicos de qualidade.

A intensidade de algumas destas medidas poderá ser proporcional ao isolamento das comunidades em causa e inversamente proporcional à dimensão do mercado.

2.6.2.8

Uma utilização extensiva das disposições dos artigos 73.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia (prestações inerentes à noção de serviço público), 86.o, n.o 2 (empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral) e 87.o, n.o 2 (auxílios de natureza social atribuídos a consumidores individuais) poderia, em certos casos, servir de base a tais disposições.

2.6.3

Objectivos económicos: os objectivos económicos de uma política europeia para as regiões com handicaps permanentes devem contribuir para a sua integração no mercado único, atenta a sua fragilidade social e ambiental. Os princípios do mercado livre devem, pois, ser temperados pelos da coesão económica, social e territorial.

2.6.3.1

A integração das economias destas regiões na do mercado único requer condições equitativas.

2.6.3.2

De um modo geral, uma redução dos sobrecustos ocasionados pelos transportes por meio de auxílios directos às empresas.

2.6.3.3

Caso a caso e dependendo das situações, disposições destinadas a contrabalançar a exiguidade do mercado de proximidade e a escassez dos recursos naturais ou humanos. Estas são obtidas por medidas de apoio e de incentivo ao sector privado, moduladas em função da natureza das actividades, da rentabilidade e do impacto social e ambiental.

2.6.4

Objectivos ambientais: os «objectivos ambientais» de uma política europeia para as regiões com handicaps permanentes consistem em assegurar a preservação do ambiente, em harmonia com os imperativos do seu desenvolvimento económico e social. O «ambiente» compreende os recursos naturais, as paisagens e os ecossistemas destas regiões, bem como o seu património cultural sob as formas mais diversas: arquitectura, monumentos históricos, património linguístico, canto, dança, literatura, artesanato, etc..

2.6.4.1

A preservação do património ambiental não deve ser uma medida estática ou passadista, destinada a transformar as regiões com handicaps permanentes em «reservas de índios». Trata-se, ao invés, de uma medida activa e dinâmica destinada, em especial, a promover o desenvolvimento sustentável necessário à retenção na região da população residente e a garantir a qualidade do seu nível de vida.

2.6.4.2

Os objectivos ambientais exigem intervenções em escalões muito diversos — local, evidentemente, mas também nacional, europeu e mesmo por vezes mundial. Por exemplo:

a preservação do património linguístico passa por políticas escolares elaboradas a nível local e nacional;

a protecção da costa da poluição marítima exige a vigilância da navegação nas águas nacionais e internacionais e medidas obrigatórias (como para a passagem nos estreitos) que são discutidas entre os Estados limítrofes e a nível mundial (no âmbito da OMI);

a gestão dos recursos haliêuticos implica, consoante os casos, as regiões, os Estados-Membros, a Comunidade e os países terceiros (caso das Caraíbas) ou instâncias internacionais (caso das pescarias do Atlântico Norte);

todas as políticas ligadas ao controlo do efeito de estufa e às limitações das suas consequências devem imperativamente ser tratadas a todos os níveis precedentes mas têm igualmente de ser abordadas a nível mundial, no âmbito das Nações Unidas e das diversas conferências sobre o ambiente.

2.6.4.3

Os objectivos ambientais inscrevem-se, em muito larga medida, na governação. As comunidades insulares, nórdicas, serranas ou ultraperiféricas devem ser consultadas e, se possível, associadas às decisões ambientais que as afectam.

2.6.4.4

A União Europeia deve, nomeadamente, levar em conta a vulnerabilidade específica das regiões com handicaps permanentes quando são debatidas questões ambientais no palco internacional (nomeadamente, nos acordos de pesca com os países terceiros ou ainda no âmbito da luta contra o efeito de estufa).

3.   Nota final

3.1

Tendo em conta a importância e dispersão pelo Território da União, das Regiões com as características especiais abordadas neste Parecer de Iniciativa, bem como as considerações e sugestões que o CESE entende expressar sob a matéria a fim de garantir uma melhor integração das mesmas, o Comité Económico e Social Europeu continuará a acompanhar a evolução desta problemática dando o seu contributo para a avaliação das diversas políticas a levar a cabo para a resolução dos seus problemas.

Bruxelas, 10 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 61 de 14/3/2003, p. 187.

(2)  Relatório final (2000 CE.16.0.AT.118) sobre a análise das regiões insulares e das regiões ultraperiféricas da União Europeia, datado de Março de 2003.

(3)  Os cinco critérios que segundo o EUROSTAT definem o conceito de ilha são os seguintes: a superfície da ilha deve ser, no mínimo, de 1km2; a distância mínima entre a ilha e o continente deve ser de 1km; a população permanente deve ser, pelo menos, de 50 habitantes; não deve existir uma ligação permanente entre o continente e a ilha; nenhuma das ilhas seleccionadas deve conter uma capital da UE.

(4)  COM(2004) 492 final, art. 52, ponto 1b) i).

(5)  Anexo XIX.

(6)  «Mountain Areas in Europe: Analysis of mountaine areas in EU member states, acceding and other European countries», Comissão Europeia, Janeiro de 2004.

(7)  JO C 61 de 14/3/2003, p. 187.

(8)  Um auxílio estatal consiste numa transferência directa para as empresas, sob a forma de subvenções, isenções fiscais, participações no capital, empréstimos bonificados, diferimentos de impostos e de garantias, calculada de forma a harmonizar os dados da componente formada pelo auxílio estatal num indicador comum comparável de um país para outro.


8.9.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 221/153


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A Política dos Consumidores após o Alargamento da UE»

(2005/C 221/24)

Em 17 de Julho de 2003, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre «A Política dos Consumidores após o Alargamento da UE»

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 8 de Setembro de 2004, sendo relator J. PEGADO LIZ.

Na 414.a reunião plenária de 9 e 10 de Fevereiro de 2005 (sessão de 10 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 95 votos a favor e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução. Razão de Ordem

1.1

O alargamento da UE, com a adesão simultânea de 10 novos Estados-Membros, não põe exclusivamente problemas de quantidade.

A análise global do impacto da adesão na estrutura e no funcionamento da União constitui um dos fundamentos da Convenção Europeia e está na origem de toda uma série de iniciativas constantes do Projecto de Constituição.

Também ao nível das políticas sectoriais o alargamento implica uma reflexão sobre os seus efeitos nos diferentes sectores interessados (1).

1.2

No que em particular se refere à Política e ao Direito do Consumo na UE, porém, não tinha sido até hoje, feita uma reflexão sistemática e aprofundada quanto às consequências, de natureza qualitativa, que o alargamento induz, nem quanto às eventuais mudanças e adaptações que deve determinar por forma a adequá-los a um novo mercado com cerca de 500 milhões de consumidores.

1.2.1

No entanto, durante a reunião promovida pelo CESE nos dias 14 e 15 de Março de 2003 em Salónica, foi salientado que o alargamento poderia implicar mudanças importantes em orientações de fundo da Política dos Consumidores, com reflexos até no próprio Tratado e nas formas concretas de definir novas medidas de protecção dos consumidores e no modo de as aplicar e tornar efectivas com um grau suficiente de harmonização, em todo o espaço europeu, cuja heterogeneidade dos acervos normativos nacionais irá crescer considerável e inevitavelmente.

1.3

Com efeito, o que está em causa é um verdadeiro «salto qualitativo», uma outra maneira, uma outra forma, um outro modo de fazer a defesa, a protecção, a promoção dos consumidores, de assegurar a sua consulta e a sua participação, de garantir a sua representação a todos os níveis de decisão política, agora num espaço diferente, com características diversas, com práticas e hábitos de consumo distintos, com tradições culturais diferentes, com diversas legislações e diferentes códigos de conduta.

1.4

O objectivo do presente Parecer de Iniciativa foi, assim, o de promover uma reflexão tão aprofundada quanto possível quanto aos efeitos do alargamento na política dos consumidores e no direito do consumo que pudesse concluir com propostas quer em relação às orientações da política dos consumidores para os anos que se seguem à completa integração dos novos Estados-Membros, quer a eventuais modificações no acervo comunitário na área da protecção, da defesa, da promoção e da participação dos consumidores, quer mesmo a novas iniciativas legislativas consideradas necessárias.

2.   Metodologia adoptada e trabalhos preparatórios

2.1

Como base preparatória para a elaboração do presente Parecer julgou-se indispensável o conhecimento, tão preciso quanto possível, das dificuldades encontradas na aplicação do direito comunitário nos novos países aderentes.

2.2

Para tal efeito foram enviados dois questionários a várias personalidades com responsabilidades na matéria, quer da administração pública, quer das organizações representativas dos interesses dos consumidores e de certas organizações profissionais mais directamente implicadas nas relações com os consumidores. Foi ainda organizada uma audição, que teve lugar no dia 2 de Dezembro de 2003, e contou com larga e participativa presença de muitos convidados.

2.3

Com base nos resultados da audição organizada e na análise das respostas aos questionários, e tendo em conta os contactos bilaterais que se realizaram ao longo da preparação dos trabalhos, o presente parecer pode constituir a base para apresentar conclusões e recomendações quanto às eventuais modificações a introduzir nas orientações para a política dos consumidores pós-alargamento.

3.   Uma definição de organização representativa dos consumidores como base para a promoção e a participação dos consumidores

3.1

Parece consensual a noção de que o objectivo primeiro de uma política dos consumidores adequada à realidade dos nossos dias, num mercado único alargado, deverá ser uma cada vez maior promoção dos consumidores como «parceiros de mercado» e, consequentemente, o incentivo e a criação dos meios e dos mecanismos adequados à sua participação na definição das orientações políticas que lhes digam respeito (2).

3.2

Se é certo que, na consecução deste objectivo, têm papel importante não só as organizações governamentais, regionais e locais, nos diferentes Estados-Membros, mas também as estruturas departamentais próprias das várias instituições e organizações comunitárias, é sentimento comum e generalizado que incumbe aos próprios consumidores, por sua iniciativa, e no âmbito da sua liberdade de associação e de federação, decidir a melhor forma de se organizarem para a defesa e a representação dos seus interesses e a participação na discussão e na definição das orientações das políticas que lhes respeitem aos vários níveis de decisão política e legislativa.

3.3

O princípio fundamental, nesta matéria, não poderá, assim, deixar de ser o pleno reconhecimento da capacidade e da autonomia de organização e gestão dos consumidores para, aos níveis local, regional, nacional, comunitário e internacional, se associarem e federarem com vista a assegurar uma adequada representação dos seus interesses e participação em todas as instâncias onde as decisões que os afectem sejam tomadas.

E esta é, seguramente, uma obrigação que incumbe ao legislador, quer nacional, quer comunitário, garantir e assegurar.

3.4

É, no entanto, aspiração expressa e generalizada, a da necessidade de serem definidos, a nível comunitário, parâmetros idênticos que garantam que as organizações de consumidores, saídas da sua livre iniciativa, respeitam, em comum, princípios fundamentais de constituição e funcionamento democráticos que assegurem uma efectiva representação dos consumidores em geral, com autonomia e independência.

3.4.1

Foram, assim, considerados relativamente insuficientes os critérios constantes de alguns instrumentos comunitários que definem os parâmetros de representatividade das organizações e associações de consumidores por forma a garantir a sua comparabilidade em todo o espaço comunitário (3).

3.4.2

Por seu turno, para efeitos específicos, a UE tem definido alguns critérios para o reconhecimento das organizações representativas dos consumidores, como os constantes, por exemplo da Directiva 98/27/CE de 19 de Maio de 1998, relativa às acções inibitórias (4).

3.4.2.1

No entanto, tais critérios, remetendo para uma decisão «administrativa» dos Estados-Membros, não pode servir de base a uma definição uniforme de associação ou organização representativa dos consumidores, idêntica e comparável nos vários Estados-Membros, no espaço único do mercado interno.

3.5

Várias características foram apontadas para uma tentativa de definição de um conceito uniforme de associação representativa dos consumidores, destacando-se:

a)

a personalidade jurídica e judiciária;

b)

a ausência de fins lucrativos;

c)

o fim estatutário principal ser a defesa e a representação dos interesses dos consumidores em geral (associações de interesse genérico) ou a protecção e representação dos seus associados, consumidores ou utilizadores de bens ou serviços determinados (associações de interesse específico);

d)

os seus órgãos serem livremente eleitos por voto universal e secreto dos associados;

e)

gozarem de autonomia financeira;

f)

serem independentes do poder político ou económico, bem como dos negócios e das organizações de negócios (operando do lado da oferta do mercado).

3.5.1

Foi, igualmente sugerido que organizações cooperativas, designadamente de consumo fossem equiparadas a associações de consumidores (5).

3.5.2

Foi ainda aventada a possibilidade de ser exigível o reconhecimento administrativo da representatividade das associações, por entidade pública credenciada dos Estados-Membros; no entanto foi também defendido que o apoio às organizações de consumidores deveria basear-se nas suas qualificações técnicas e no resultado do seus trabalhos e não apenas na credenciação por parte das autoridades nacionais.

3.6

Pela sua delicadeza, é entendimento do Comité que esta matéria, cuja importância se reconhece, deverá ser objecto de uma reflexão aprofundada por parte da Comissão a tornar pública em Comunicação sobre o assunto.

3.7

Paralelamente, e como condição para o adequado exercício do direito de representação dos consumidores nomeadamente a nível comunitário, por parte das organizações representativas dos seus interesses, gerais ou específicos, foram identificadas várias deficiências ou lacunas nos sistemas existentes.

3.7.1

Lugar de destaque merecem, desde logo, as necessidades de formação dos dirigentes, técnicos e formadores das referidas associações ou organizações representativas dos consumidores (6).

3.7.2

Identicamente, para além dos programas de informação genérica dirigida aos consumidores em geral, as associações e organizações de consumo devem ser objecto de informação personalizada e prévia para possibilitar a sua difusão aos seus associados ou aos consumidores em geral nos seus respectivos países ou regiões.

3.7.3

A própria representação das associações de consumidores ao nível comunitário deve ser reforçada, nas várias instâncias comunitárias, quer directamente, quer através dos seus organismos federativos, embora se saúdem as recentes iniciativas da Comissão no sentido de reformular o Comité dos Consumidores (7) e de nomear um encarregado das relações com os consumidores, no seio da Direcção Geral da Concorrência (8) no que deveria ser seguido nas restantes áreas das políticas que interessam aos consumidores (9).

3.7.4

Igualmente importante parece ser retomar a organização periódica dos Fóruns Europeus de Consumo, no sentido de alargar e melhorar o diálogo, a informação e a cooperação entre as organizações de consumidores.

4.   Financiamento das organizações e associações dos consumidores

4.1

Uma das prioridades básicas para uma adequada representação de consumidores é assegurar o adequado financiamento das suas estruturas representativas, seja no que se refere à sua organização, seja no que respeita ao seu funcionamento (10).

4.2

Independentemente dos sistemas nacionais vigentes em cada país, alguns representantes dos consumidores manifestaram o seu sentimento de que apenas com um forte apoio e incentivo comunitário será possível dotar as associações representativas dos consumidores com os meios indispensáveis ao papel que lhes compete jogar para a necessária defesa, promoção e representação dos consumidores, a nível regional, nacional, comunitário e internacional (11).

4.3

Foi, com efeito, salientado, de forma geral, que as associações dos consumidores, só por si, com os meios gerados pela quotização dos seus associados ou por iniciativas próprias, dificilmente alcançam o ponto de não rotura financeira, de modo a salvaguardar a sua autonomia e independência em face dos poderes político e económico (12).

Para preservar estes princípios, qualquer apoio financeiro deve, por via de regra, incidir sobre acções, programas, projectos e iniciativas, designadamente no âmbito da formação de quadros técnicos, educação de consumidores e custeamento de acções colectivas para defesa de interesses difusos de consumidores e não quanto à gestão corrente dessas entidades.

4.4

O actual quadro comunitário de apoio às organizações e associações de consumidores acha-se consubstanciado nomeadamente, na Decisão 20/2004/CE de 8 de Dezembro de 2003, que estabelece um quadro geral para o financiamento de actividades comunitárias em apoio à política dos consumidores na UE para o período de 2004-2007 (13), a qual deve ser articulada com o «Reexame do Programa de acções deslizante de estratégia para a política dos consumidores 2002-2006» de 15 de Setembro (14).

5.   Uma harmonização máxima ao mais elevado nível de protecção dos consumidores

5.1

O artigo 153.o é expresso ao consagrar, como princípio fundante da política comunitária dos consumidores, a noção de harmonização mínima e um elevado nível de defesa dos interesses dos consumidores (15).

5.2

Nesse sentido, que, aliás não é novo (16), e também não é alterado no Projecto de Constituição, a generalidade das directivas adoptadas em matéria de protecção de consumidores incluía a chamada «cláusula minimal», sensivelmente com a seguinte formulação comum:

«A presente directiva não impede os Estados-Membros de adoptarem ou manterem disposições mais favoráveis ou mais rigorosas em matéria de protecção do consumidor no domínio por ela abrangido, sem prejuízo das obrigações decorrentes do Tratado  (17).».

5.3

A partir, porém, pelo menos do Livro Verde sobre a Defesa do Consumidor na UE (18) e mais recentemente da Comunicação da Comissão relativa à Estratégia da Política dos Consumidores para 2002-2006 (19), a orientação recente parece ter passado a ser a de privilegiar a harmonização total como forma de realizar a aproximação das legislações em matérias relacionadas com a protecção e a defesa dos consumidores.

5.3.1

Tal orientação consta, designadamente, das recentes propostas de directiva relativas ao crédito aos consumidores (20) e às práticas comerciais desleais (21) e, acompanhada da sobrevalorização do princípio do reconhecimento mútuo (22), parece definir uma orientação geral e não meramente pontual, justificada pela natureza das matérias ou a necessidade de garantir a realização de aspectos fundamentais do mercado interno.

5.3.2

O CESE, tendo em particular consideração o alargamento da União a 25 países membros, reconhece a vantagem de, sempre que estiverem em causa medidas destinadas a assegurar, em exclusivo ou primordialmente, o funcionamento do mercado interno, serem adoptados instrumentos legislativos que garantam a maior uniformidade possível dos regimes jurídicos reguladores das relações jurídicas entre empresas ou entre estas e os consumidores.

5.3.2.1

Daí que o CESE entenda que, sempre que possível, e tendo em conta a natureza do assunto em causa, devem ser adoptados regulamentos ou, segundo a nova nomenclatura saída da Constituição Europeia, «leis europeias» (23) ou, quando não, directivas ou «leis-quadro» de acordo com a mencionada nomenclatura, em que se procure a harmonização máxima, como forma de melhor garantir a certeza e a segurança do direito derivado.

5.3.3

É, no entanto, entendimento do CESE que o recurso a este tipo de harmonização deve ter como condição «sine qua non» a garantia de que a protecção dos consumidores se faça pelo mais elevado nível consentâneo com os desenvolvimentos da tecnologia, os conhecimentos científicos e os padrões culturais vigentes.

5.4

Em todas as outras situações em que os interesses a tutelar não sejam essencial nem fundamentalmente orientados pela realização e o funcionamento do mercado interno, e em que, ao contrário, sobreleve a protecção e a defesa dos consumidores, o CESE é de parecer que a melhor forma de os assegurar e garantir é a manutenção do princípio de harmonização mínima, sempre a um elevado nível de protecção, mas deixando aos Estados-Membros a possibilidade de manterem ou de introduzirem medidas mais protectoras dos consumidores, consentâneas com o Tratado, na estrita aplicação do disposto no n.o 5 do artigo 153.o.

5.5

Com a adesão de mais dez novos Estados-Membros, o CESE aconselha a Comissão a rever a sua posição no que se refere à orientação recente de preferência indiscriminada pela harmonização máxima, restringindo-a às situações em que esteja em causa a necessidade de realizar ou de fazer funcionar o mercado interno, e assegurando sempre que, nesses casos, é garantida a protecção dos consumidores pelo mais elevado nível consentâneo com o estádio dos conhecimentos científicos, dos desenvolvimentos tecnológicos e dos padrões socioculturais, no domínio em causa.

5.6

«Conhecimentos científicos» refere-se à base de conhecimento para os decisores políticos da política dos consumidores. Incluem os resultados aprovados:

a)

da Teoria do Consumo,

b)

de investigação empírica do comportamento dos consumidores e do desenvolvimento das organizações,

c)

da avaliação das medidas e projectos programados pela Comissão, etc.

Devem ser eliminados os défices aparentes de disponibilidade de uma base de conhecimento criando capacidade prática de investigação.

5.7

Mais aconselha o CESE que, sempre que possível, e o estado de desenvolvimento técnico-jurídico o permita, seja utilizado o regulamento (ou a lei europeia na nova nomenclatura), como instrumento mais adequado a garantir uma efectiva aproximação das legislações e a assegurar de modo eficaz a certeza e a segurança do direito na sua aplicação às relações jurídicas (24).

6.   Os princípios da subsidiariedade, do reconhecimento mútuo e da precaução — uma interpretação e aplicação ajustadas à protecção dos consumidores

6.1

Alguns princípios fundamentais constantes do Tratado são estruturantes do direito derivado e a eles se deve fazer sempre apelo na definição da natureza, da essencialidade, da oportunidade e do âmbito material das medidas de regulação nos diversos sectores e no desenvolvimento das diferentes políticas da União Europeia.

O direito dos consumidores não será, por isso, excepção.

6.2

Entre tais princípios destacam-se, pela sua importância, o princípio da subsidiariedade (25), o princípio do reconhecimento mútuo e o princípio da precaução.

6.3

Na realidade, e sem entrar numa análise aprofundada do alcance do princípio da subsidiariedade, aplicado à regulação dos interesses dos consumidores, resulta imediatamente da sua formulação, conjugada com a do artigo 153.o, que se está perante aquilo que alguns autores chamaram de «dupla subsidiariedade» (26).

6.3.1

Com efeito, para além do crivo da subsidiariedade «primária» e geral do artigo 3.o B, no caso das medidas referidas na alínea b) do n.o 3 do artigo 153.o, o legislador quis submetê-las a uma malha ainda mais apertada, que funciona como uma verdadeira subsidiariedade «secundária». É que estas medidas da Comunidade, só serão admissíveis depois de já terem passado o crivo da subsidiariedade, se, e na medida em que «completem» ou «apoiem» iniciativas de Estados-Membros, nos referidos domínios.

6.3.2

Ou seja, é sempre necessário que os Estados-Membros tenham tomado a iniciativa de tomar medidas a nível nacional ou se proponham fazê-lo, para que a Comunidade, pontualmente, possa desenvolver alguma medida no sentido de «completar» ou «apoiar» essas iniciativas.

6.3.3

Em suma, a Comunidade vê-se, assim, privada de qualquer poder de iniciativa própria para tomar qualquer medida, mesmo nos referidos domínios taxativamente enunciados, e ainda que, à luz do princípio da subsidiariedade do artigo 3.o B, a sua actuação se justificasse, se o não for no seguimento ou na sequência de iniciativas tomadas especificamente pelos Estados-Membros.

6.4

Será, pois, indispensável que os representantes dos consumidores, em todas as circunstâncias, e em face da aplicação concreta do princípio de subsidiariedade, façam sentir, junto das instituições comunitárias, que da sua interpretação, não pode resultar o bloqueamento da adopção de medidas necessárias e proporcionais de protecção e defesa dos consumidores.

6.5

Também quanto ao princípio do reconhecimento mútuo (27) teve já o Comité oportunidade de sobre ele se pronunciar de forma aprofundada em Parecer de Iniciativa de Novembro de 2000 (28), no seguimento da importante Comunicação da Comissão sobre «O reconhecimento mútuo no contexto do seguimento do Plano de Acção para o Mercado Único» (29).

6.6

Por seu turno, a Comissão tem, para áreas sectoriais distintas, vindo a publicar programas de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo, destacando-se os relativos às decisões penais e às decisões em matéria civil e comercial (30).

6.7

No que, em particular se refere a medidas tomadas em relação aos consumidores, a tendência crescente tem vindo a ser a sua extensão a vários domínios objecto de regulação, em especial quando é simultaneamente visada a harmonização total.

6.8

Deve referir-se que, embora justificada a sua aplicação de uma forma geral, há domínios onde a sua adopção significa a sujeição dos consumidores a diversas legislações dos Estados-Membros, criando situações geradoras de menor clareza e de claro desincentivo à contratação transfronteiras (31).

6.9

Daí que se chame a atenção da Comissão para a necessidade de uma aplicação prudente e ajustada à realidade de cada sector onde se faça recurso ao princípio do reconhecimento mútuo como forma de aproximação das legislações.

6.10

Ao contrário, o CESE entende que o princípio da precaução, integrado no direito comunitário com o Tratado de Maastricht e limitado à política do ambiente, deverá ser considerado como um princípio jurídico comum a todas as políticas da UE e, em particular, no que se refere à política de protecção e de defesa dos consumidores, com importantes consequências práticas ao nível, designadamente, da avaliação sistemática e objectiva dos riscos e da inversão do ónus da prova em favor dos consumidores como regra geral do direito da responsabilidade civil (32).

7.   Uma efectiva horizontalidade da política dos consumidores

7.1

Como se referiu, a noção de horizontalidade ou de transversalidade da política dos consumidores, introduzida no Tratado CE com o Tratado de Amsterdão, e já anteriormente enunciada em vários documentos programáticos da Comissão (33), ganhou hoje reforço substancial nas orientações políticas da Comissão, para além de ter merecido consagração no Projecto de Constituição, como direito fundamental (34).

7.2

Pode, com efeito, ler-se no documento sobre a «Estratégia da Política dos Consumidores para 2002/2006» (35) que «além das regras específicas para a sua defesa, os consumidores são igualmente afectados por outras políticas comunitárias importantes: mercado interno, ambiente e desenvolvimento sustentável, transportes, serviços financeiros, concorrência, agricultura, comércio externo, etc. A política dos consumidores enquanto tal não pode ser definida isoladamente, sem ter em conta outros domínios que têm repercussões para os consumidores. É fundamental integrar sistematicamente os interesses dos consumidores em todos os domínios das políticas comunitárias» (36).

7.3

Acontece, porém que, na prática este princípio não tem sido traduzido em acções concretas e de modo sistemático ao nível das medidas adoptadas na prossecução e no desenvolvimento das várias políticas comunitárias, nem o referido documento de estratégia elegeu este objectivo em prioridade, ao contrário do que foi proposto pelo CESE no seu parecer sobre a Comunicação da Comissão (37).

7.4

Urge, assim, que sejam definidos mecanismos transparentes e instituídas práticas credíveis que garantam que, na adopção de quaisquer medidas em qualquer domínio das competências comunitárias, sejam sempre tidos em conta os interesses dos consumidores e garantido um elevado nível de defesa dos consumidores (38).

7.5

Para tanto o CESE sugere, designadamente, que a Comissão equacione a necessidade de reforço dos meios humanos e materiais da D.-G. SANCO e uma redefinição dos métodos e processos da sua articulação com as restantes Direcções-Gerais.

7.5.1

Identicamente, as restantes instituições comunitárias, desde o Conselho ao Parlamento Europeu, ao Comité das Regiões e ao próprio CESE devem repensar as fórmulas da sua organização por forma a melhor garantir a efectiva consideração da defesa dos consumidores em todas as políticas comunitárias.

8.   A simplificação e a codificação do direito dos consumidores

8.1

A proliferação e a complexidade crescentes das iniciativas legislativas e regulamentares no domínio do direito do consumo aconselham, se não impõem mesmo, como imperativo sine qua non, que se prossiga com um esforço de melhoria na forma de legislar e de simplificação legislativa.

8.2

A Comissão tem vindo a preocupar-se cada vez mais com estes aspectos da produção legislativa comunitária (39).

8.3

Por seu turno, o Comité não só tem acompanhado a Comissão em idênticas preocupações (40) como instituiu mesmo, como assunto permanente do seu Observatório do Mercado Único, desde 2000, o tema da «simplificação».

8.4

O CESE congratula-se, por isso, com o acordo interinstitucional alcançado entre o PE, o Conselho e a Comissão nesta matéria (41) e, no restante, remete para as considerações já feitas nos pareceres citados e, em especial, no recentemente aprovado a propósito da última Comunicação da Comissão sobre o assunto (42).

8.5

Trata-se, com efeito, de preocupação maior que, no que se refere em especial ao direito do consumo, na medida em que se dirige fundamentalmente a particulares, deve merecer uma particular atenção e o prosseguimento dos esforços no sentido da simplificação, por forma a tornar o direito mais facilmente apreensível e aplicável (43).

8.6

Paralelamente, outra vertente da mesma preocupação traduz-se no esforço de codificação, aliás já iniciado pela Comissão, embora em matriz reduzida, a propósito de várias directivas.

8.7

Nas variadas acepções que o termo «codificação» pode assumir, não se afigura que seja útil encetar esforços no sentido da produção de um verdadeiro e próprio Código do Consumo Europeu (44), mas antes prosseguir na via da reformulação concertada das disposições comunitárias por grandes temas, compatibilizando as disposições das diferentes iniciativas legislativas e ordenando sistematicamente as matérias.

8.8

Uma forma generalizadamente referida como meio para diminuir a carga legislativa seria a maior utilização dos mecanismos de auto e co-regulação.

8.8.1

Sem pretender adiantar relativamente ao Parecer do CESE em elaboração sobre este tema, pode, no entanto, e no que em especial respeita ao direito do consumo, afirmar-se, desde já, que, num mercado ainda não consolidado e com déficites reconhecidos de informação, só com base num quadro legal bem definido quanto ao âmbito, parâmetros e critérios de actuação será possível desenvolver sistemas alternativos de auto e co-regulação, como, aliás o CESE já afirmou no seu Parecer sobre as práticas comerciais desleais (45).

9.   A informação e a educação dos consumidores

9.1

De há muito que o CESE tem vindo a evidenciar o papel decisivo para a promoção, a protecção e a defesa dos consumidores da sua adequada informação e educação.

9.2

No que se refere em especial à informação dos consumidores, o CESE tem defendido que não basta a informação específica a propósito de cada serviço ou produto, nem uma informação qualquer, ainda que muito completa, mas a necessidade de uma informação genérica sobre os direitos dos consumidores como fundamento de uma informação ajustada e personalizada ao tipo de bens e de serviços em causa. (46).

9.3

Quanto à educação dos consumidores, em recente parecer de iniciativa, o CESE não só fez a apologia do «consumidor educado» como elencou os conteúdos e as técnicas de educação dos consumidores e o papel dos vários intervenientes nos processos de educação (União Europeia, Estados, associações de consumidores, profissionais, etc. …) (47).

9.4

Numa reformulação da política dos consumidores, consequência necessária do alargamento, a informação e a educação dos consumidores assumem um lugar ainda de maior relevo para assegurar a sua efectiva promoção e protecção, sem embargo de dever ser sempre deixada aos Estados-Membros e às associações representativas dos consumidores a definição das orientações e dos critérios para a sua melhor adequação às realidades próprias de cada mercado nacional, regional ou local.

9.4.1

Nessa importante tarefa, não são só as escolas, as associações de consumidores, as empresas, os profissionais e os Estados que tem um papel a desempenhar.

À União Europeia cabe não apenas a coordenação das iniciativas, mas o incentivo e a promoção das medidas que conduzam à melhoria da qualidade da informação e ao aprofundamento do nível da educação dos consumidores (48).

9.4.2

Estas medidas não se devem restringir a adequados apoios financeiros, mas devem assumir mesmo o desenvolvimento de campanhas e de programas comuns de informação e de educação.

9.4.3

No seu âmbito devem ser incluídos quer os consumidores, quer os profissionais, fornecedores de bens e de serviços, e ainda os reguladores e os aplicadores do direito, com especial incidência nos profissionais do foro (juízes, advogados, magistrados do Ministério Público, etc. …)

10.   A cooperação administrativa relativa à aplicação das leis sobre a protecção dos consumidores

10.1

Aspecto de importância fundamental é o que resulta da recente proposta de Regulamento relativo à cooperação entre as autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da legislação do consumidor (COM(2003) 443 final de 18/07/2003) sobre o qual o Comité já teve oportunidade de emitir o seu Parecer (49).

10.2

Será necessário que várias limitações denunciadas do referido instrumento sejam devidamente supridas por forma a que o sistema de controle das infracções comunitárias seja cada vez mais eficaz e sua implementação a nível nacional garanta a efectividade da sua aplicação.

Aspecto, designadamente, a merecer imediata alteração, é o do seu âmbito de aplicação, que o CESE considerou demasiado restrito.

11.   Alguns elementos de reflexão com vista à realização de uma efectiva e adequada protecção, defesa e promoção dos consumidores no mercado único alargado

11.1

Tem o CESE perfeita consciência que quaisquer alterações legislativas não produzem efeitos imediatos nem resultados instantâneos. Por isso, para além da sua preocupação em sublinhar a necessidade de consolidar e de promover uma efectiva aplicação do direito existente, na abordagem que aqui se faz aos vários temas susceptíveis de serem aprofundados ou melhorados é igualmente preocupação do CESE acentuar o carácter gradual e concertado dos eventuais desenvolvimentos a prosseguir, por forma a não subverter o indispensável equilíbrio dos principais interesses em causa, mas sem esquecer a situação de desfavor que o consumidor assume, a maior parte das vezes, na relação de consumo.

11.2

É com esta perspectiva que o CESE enuncia algumas áreas que considera necessitarem de reflexão, com vista ao melhoramento do actual quadro normativo regulador das relações jurídicas que interessam directamente aos consumidores.

11.2.1

Um desses domínios é o relativo à segurança nos serviços para os consumidores e à consequente regulação da responsabilidade do prestador de serviços defeituosos.

11.2.2

Suspensa, desde 1992, a proposta de directiva sobre esta matéria (50), é com renovada esperança que se verifica que a Comissão, respondendo favoravelmente ao convite dirigido pelo Conselho e pelo Parlamento no sentido de «identificar as necessidades, possibilidades e prioridades para uma acção comunitária na segurança dos serviços» (51), decidiu relançar a discussão neste domínio com o seu «Relatório» de 6 de Junho de 2003 (52) e ainda com a mais recente Proposta de Directiva relativa aos serviços no mercado interno (53).

11.2.3

No entanto, teme-se que a orientação imprimida à aproximação da Comissão a este tema não se venha a concretizar em medidas pontuais e eficazes de regulação, com base numa interpretação desajustada do princípio da subsidiariedade e da complementaridade em relação às políticas nacionais (54).

11.2.4

Outro dos domínios em que se verifica uma importante lacuna regulamentar ao nível comunitário é o que se refere à definição do âmbito dos serviços essenciais de interesse geral e dos princípios que os devem reger, pelo que toca à continuidade e à universalidade das prestações, à abordabilidade dos preços, ao direito de acesso e à liberdade de escolha, etc. (55).

11.2.4.1

No seguimento dos seus Pareceres sobre este tema (56), o CESE é de opinião que o alargamento da UE impõe que sejam definidas linhas de orientação precisas tendo em vista as situações de privatização de alguns serviços públicos essenciais e a identificação, com carácter imperativo, do núcleo de serviços de interesse geral, de que não podem deixar de fazer parte os transportes aéreos e ferroviários, a electricidade, o gás, os serviços postais e as telecomunicações (57).

11.2.4.2

Na ausência de indicadores de qualidade suficientemente precisos para permitir uma avaliação comparativa destes serviços aguarda-se, com expectativa, a comunicação prometida pela Comissão sobre uma metodologia para avaliação horizontal dos serviços de interesse geral (58).

11.2.5

Outra lacuna até hoje ainda não preenchida é a que se refere à uniformização, a nível comunitário, da lei aplicável às obrigações não contratuais.

11.2.5.1

Merece, por isso, uma referência muito especial a iniciativa da Comissão de ter avançado com uma proposta de Regulamento nesta matéria (59), a qual, com as observações e sugestões que o CESE fez no seu parecer (60), constitui um elemento essencial de harmonização legislativa a nível da UE alargada em domínio essencial para a adequada protecção dos consumidores.

11.3

No que se refere ao direito à informação, no que em especial se refere aos géneros alimentícios (61), além da rotulagem dever ser cada vez mais compreensível para os consumidores, deverão ser igualmente utilizados outros métodos modernos que melhorem a informação dos consumidores (internet, linhas gratuitas, serviços de apoio ao consumidor, etc..) sem descurar, sempre que exigível e possível, a identificação da sua origem (62).

11.4

No que toca à protecção da saúde e da segurança, o funcionamento ainda mais eficaz do sistema RAPEX (63) depende da capacidade de resposta das autoridades dos Estados-Membros. O CESE reafirma, assim, a necessidade de investir na qualidade da fiscalização do mercado comunitário, através de projectos que contribuam para a formação e desenvolvimento dos mecanismos de controlo do mercado nos Estados-Membros e em particular nos novos Estados aderentes, apoiando quer organismos representativos dos consumidores, quer as entidades públicas competentes (64).

11.4.1

Por seu turno, às organizações de consumidores compete garantir uma informação fidedigna sobre os produtos e os serviços mais seguros e, bem assim, fornecer os resultados dos controlos efectuados ao nível nacional.

11.5

No que se refere à protecção dos interesses económicos dos consumidores são vários os aspectos a merecer atenção e reformulação.

11.5.1

Quanto à responsabilidade do produtor  (65), o actual regime apresenta um desequilíbrio em detrimento do consumidor, entre o ónus de prova imposto ao consumidor e as causas de exclusão da responsabilidade do produtor.

11.5.1.1

Justifica-se, assim, plenamente que sejam prosseguidos os trabalhos em curso relativamente à Directiva 85/374/CEE de 25 de Julho de 1985 no sentido preconizado, designadamente, no Livro Verde sobre a Responsabilidade por Produtos Defeituosos (66) e de que têm vindo, sucessivamente, a dar conta vários estudos entretanto encomendados pela Comissão (67).

11.5.2

A delimitação da protecção dos consumidores em matéria de vendas ao domicílio  (68) à solicitação expressa do consumidor coloca algumas reservas, pela dificuldade de prova e pela ocorrência de situações fronteira que não oferecem segurança jurídica. O CESE entende que este problema deveria ser reanalisado por forma a estabelecer presunções que protejam o consumidor contra comportamentos fraudulentos, para além de que toda a directiva deverá ser revista à luz das actuais práticas desleais e agressivas e dos textos comunitários que a elas se referem.

11.5.3

Relativamente aos contratos celebrados á distância  (69), seria importante determinar, com carácter imperativo, a imposição do ónus de prova ao fornecedor acerca do cumprimento das obrigações de informação prévia, da sua confirmação por escrito, bem como do consentimento do consumidor (70). Por outro lado, seria pertinente analisar a adequação dos deveres de informação nos contratos à distância respeitantes a novas tecnologias.

11.5.4

O CESE manifesta a sua preocupação no que toca ao exercício do direito de retractação, importando proceder à uniformização dos prazos nos vários textos legislativos e definir regras claras para o exercício do direito, designadamente no que se refere à comercialização à distância de serviços financeiros (71) e em matéria de crédito ao consumo (72). O CESE não pode deixar de apontar a necessidade de simplificar este regime, que é complexo e pouco transparente (73).

11.5.5

Em matéria de protecção do consumidor face às cláusulas abusivas  (74), seria interessante que a Comissão procedesse a um levantamento sistemático e actualizado das cláusulas gerais contratuais expressamente declaradas abusivas, quer pelas jurisprudências nacionais dos vários Estados-Membros, quer pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, com vista à sua divulgação junto dos organizações representativas dos consumidores e dos profissionais (75).

11.5.5.1

Por outro lado o seu normativo acha-se reconhecidamente ultrapassado, urgindo que a Comissão ultime rapidamente os trabalhos da sua revisão, no seguimento do seu Relatório sobre a aplicação da Directiva (76) e das inúmeras reuniões de trabalho que tem promovido sobre o tema.

11.5.6

Quanto à problemática do crédito ao consumo  (77) o CESE, já teve oportunidade de se pronunciar acerca da recente proposta da Comissão (78) nesta matéria, cabendo reafirmar agora a necessidade de combater os fenómenos usurários e de equilibrar os direitos e deveres dos consumidores e das entidades que concedem crédito. A existência de disparidades entre as regulamentações nacionais nesta matéria e os diferentes níveis de protecção do consumidor, situação que, podendo agravar-se com a entrada de novos Estados, poderá vir a prejudicar a confiança no mercado de serviços financeiros e provocar distorções na concorrência.

11.5.7

Questão a merecer tratamento urgente a nível comunitário como já por diversas vezes sublinhado pelo CESE, é a do sobreendividamento das famílias que se tem vindo a agravar e que se teme que possa disparar com a provável subida das taxas de juro (79).

11.5.8

O CESE considera igualmente que é essencial aprofundar a regulamentação em matéria de segurança nos pagamentos electrónicos  (80), saudando-se a recente iniciativa da Comissão de lançar um debate sobre o estabelecimento de um espaço único para os pagamentos no mercado interno (81).

11.5.8.1

No entanto, continua a faltar uma perspectiva de conjunto no domínio do comércio electrónico por forma a ganhar a confiança dos consumidores, como foi bem evidenciado durante a Conferência realizada em Dublin, quando da comemoração do Dia Europeu do Consumidor de 2004.

11.5.8.1.1

Acresce que os trabalhos até agora desenvolvidos no sentido de criar sistemas de acreditação dos profissionais não se chegaram a concretizar em medidas sequer de autoregulação capazes de permitir aos consumidores identificar os «sites» da Internet dignos de confiança.

11.5.8.1.2

São assim, de saudar, apesar das suas limitações, os recentes desenvolvimentos, de iniciativa da Comissão, com vista a promover uma utilização mais segura da Internet (82) e relativo à protecção de menores e da dignidade humana e ao direito de resposta nos serviços audiovisuais e de informação (83).

11.5.8.2

Por outro lado, e a nível internacional, falta um quadro jurídico semelhante ao introduzido na UE com o Regulamento de Bruxelas I, essencial para o desenvolvimento seguro das transacções electrónicas internacionais, pelo que uma Convenção sobre as questões de competência e de aplicação das sentenças em matéria civil e comercial neste domínio se afigura objectivo essencial a ser prosseguido no âmbito da Conferência da Haia.

11.5.9

Domínio de importância fundamental é o da uniformização do direito dos contratos, lançado pela Comissão e apoiado pelo CESE (84), o qual deveria ser prosseguido e aprofundado, privilegiando-se a uniformização de certos contratos em especial, com particular interesse para os consumidores (85).

11.5.10

Recentemente publicada a directiva relativa a certos aspectos de venda de bens de consumo e das garantias a eles relativas (86) onde sobrelevam os aspectos relacionados com as garantias na venda de bens, ainda são bem actuais as críticas que a respectiva proposta mereceu no parecer do CESE (87), em particular pelo que respeita às relações entre as garantias comerciais e as legais e aos procedimentos para pôr em prática essas garantias.

11.5.10.1

Será necessário repensar agora não só o alargamento do seu âmbito de aplicação aos serviços pós-venda (88) mas, em especial, um acompanhamento muito atento por parte da Comissão quanto à forma como a mesma está a ser transposta nos Estados-Membros pela complexidade do seu regime e a difícil articulação com os direitos internos nacionais.

11.5.11

Área onde há muito se esperava uma tomada de posição da Comissão no seguimento do Livro Verde relativo à Protecção dos Consumidores (89) era, precisamente, o de uma proposta relativa às práticas comerciais desleais.

11.5.11.1

No entanto, no seu parecer sobre o assunto (90) o CESE teve já oportunidade de manifestar a sua decepção e profunda apreensão quanto ao sentido e à orientação imprimidas ao instrumento em preparação.

11.5.11.2

Será pois um tema cujo desenvolvimento futuro terá de ser acompanhado muito de perto e com particular atenção pelos representantes dos consumidores em especial nos novos Estados aderentes.

11.5.12

Identicamente o CESE manifestou já a sua posição de descontentamento quanto ao projecto de regulamento relativo à Promoção das Vendas  (91), e reafirma aqui a sua apreensão quanto à forma final do mesmo e à sua compatibilização com a proposta relativa às práticas comerciais desleais, temendo que, no seu conjunto, estes dois instrumentos, em vez de contribuírem para uma maior promoção dos consumidores, acabem por representar um retrocesso no nível actual da sua protecção e defesa.

11.6

Finalmente no domínio do acesso à justiça, o CESE considera que é necessário aprofundar não só a tutela dos interesses colectivos, difusos ou individuais homogéneos dos consumidores (92), pela revisão urgente da directiva relativa à acção inibitória comunitária (93) alargando o seu âmbito de aplicação por forma a transformá-la numa verdadeira «class action», destinada a promover a reparação de danos para além da mera cessação da práticas ilícitas ou desleais, mas igualmente os legítimos interesses de um consumidor individual em situação de conflito, designadamente no que toca ao acesso a uma justiça célere e tendencialmente gratuita (94). Neste domínio, o CESE reafirma a sua aposta não só nos meios alternativos de resolução de conflitos (95) mas igualmente nos procedimentos arbitrais, e considera prioritário o apoio às autoridades nacionais ao nível operacional e técnico no sentido da sua criação e implementação nos vários Estados-Membros (96).

11.6.1

O CESE advoga ainda a adopção de um instrumento vinculativo que, sem prejuízo do princípio da subsidiariedade e da proporcionalidade, assegure os objectivos enumerados pela Comissão nas suas recomendações nesta matéria (97), designadamente o princípio da liberdade do consumidor e o princípio da imparcialidade e transparência do processo, transformando em preceitos imperativos o que são hoje meras recomendações que não têm tido aplicação prática efectiva generalizada.

11.7

Neste domínio, o CESE saúda as iniciativas recentes da Comissão em matéria de cooperação judiciária, de que destaca os regulamentos relativos à insolvência (98) e à lei aplicável em matéria de competência dos tribunais (Convenção de Bruxelas) (99) bem como a proposta de regulamento relativo à lei aplicável às obrigações extracontratuais (Roma II) (100), o Livro Verde relativo a transformação da Convenção de Roma sobre obrigações contratuais em regulamento comunitário (Roma I) (101), ou o regulamento que cria um quadro geral para as actividades comunitárias destinadas a facilitar o progresso do espaço judiciário europeu em matéria civil (102) e incentiva a Comissão a prosseguir na via da criação de um espaço judiciário único como elemento estruturante essencial dos aspectos adjectivos da realização do mercado único, cada vez mais essencial numa UE alargada.

12.   Conclusões

12.1

A promoção, a participação, a protecção e a defesa dos consumidores devem constituir um objectivo permanente de todas as políticas da União Europeia, como verdadeiro direito da cidadania europeia.

12.2

Com o alargamento a mais de dez Estados-Membros, onde, na sua maioria, a protecção dos consumidores é uma questão relativamente nova, haverá que repensar toda a política dos consumidores em termos da sua adequação à nova realidade de um mercado com cerca de 500 milhões de consumidores.

12.3

À União Europeia e às suas instituições cabe um papel decisivo no estabelecimento das prioridades na reformulação do quadro legal e institucional e dos programas de acções indispensáveis para assegurar uma efectiva política dos consumidores que assegure e realize aqueles objectivos.

12.4

O CESE, com o presente parecer de iniciativa, propõe-se contribuir para a definição de uma tal política, como intérprete das preocupações da sociedade civil e tendo em especial conta a participação dos representantes oriundos dos novos Estados-Membros.

12.5

O CESE é de parecer que as prioridades imediatas, em termos de política de consumidores, são:

a consolidação do acervo comunitário, num esforço de simplificação e codificação

a efectiva aplicação do direito legislado e adequadamente transposto, e o seu estrito controle

a implementação da directiva-quadro sobre as práticas comerciais desleais

um esforço urgente no sentido de melhor informação e educação dos consumidores

a consideração da efectiva integração da política dos consumidores nas restantes políticas quer ao nível comunitário quer ao nível nacional

o apoio às organizações de consumidores com vista à realização de análise de produtos e troca de informações sobre a sua qualidade.

12.6

O CESE defende que organizações representativas dos consumidores fortes e independentes constituem a base para uma efectiva política de defesa, promoção e participação dos consumidores.

12.7

O CESE entende que, para esse efeito, é necessário garantir que as organizações de consumidores sejam adequadamente financiadas para o desenvolvimento de acções, programas, projectos e iniciativas.

12.8

O CESE é de opinião que a definição de critérios de representatividade e de participação das organizações de consumidores poderá contribuir decisivamente para uma maior eficácia da política dos consumidores.

12.9

O CESE entende que, de forma gradual e sem se perder de vista a necessidade de manter o equilíbrio dos interesses em causa, se deverá prosseguir ou dar início a novas iniciativas legislativas, destacando os seguintes domínios:

segurança de serviços e responsabilidade de prestação de serviços defeituosos

serviços essenciais de interesse geral

protecção da saúde e da segurança

maior segurança nos pagamentos electrónicos e na utilização da Internet

sobreendividamento das famílias

meios de pagamento

direito dos contratos

acesso à justiça e espaço judiciário único.

12.10

Por outro lado, o CESE é de entendimento que deveria ser revista e compatibilizada entre si vária legislação comunitária já existente, em ordem a adequá-la ao novo mercado único alargado, destacando, em especial, as seguintes áreas:

responsabilidade do produtor

vendas ao domicílio, vendas à distância, comércio electrónico e promoção das vendas

cláusulas abusivas

crédito ao consumo

garantias na venda de bens e serviços.

12.11

O CESE lembra a sua proposta de criar um Instituto Europeu de Investigação para a Protecção do Consumidor para proporcionar a base de conhecimento para a política dos consumidores (103).

12.12

O CESE apela aos Estados-Membros para que considerem a protecção, a defesa, a promoção e a participação dos consumidores como uma prioridade a considerar em todas as suas políticas.

12.13

O CESE recomenda à Comissão que tenha presente as propostas e sugestões constantes do presente Parecer na definição das novas orientações em matéria de política dos consumidores e que proceda à divulgação periódica de relatórios sobre a situação do consumo e dos consumidores na Europa.

Bruxelas, 10 de Fevereiro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Sobre todas estas questões teve o CESE oportunidade de se debruçar em sucessivos Pareceres, de que se destacam os seguintes:

«O futuro da política de coesão na perspectiva do alargamento e da motivação para a economia do conhecimento» de que foi relator MALOSSE, JO C 241, de 7/10/2002.

«As consequências económicas e sociais do alargamento para os países candidatos», de que foram relatores DIMITRIADIS e BELABED, JO C 85, de 8/4/2003.

«O impacto do alargamento na UEM» de que foi relator VEVER, JO C 61, de 14/3/2003.

«Os efeitos do alargamento da União no Mercado Único», de que foi relatora BELABED, JO C 85, de 8/4/2003.

«Transportes e alargamento», de que foi relator KIELMAN, JO C 61, de 14/3/2003.

«Assistência financeira para a pré-adesão», de que foi relator WALKER JO C 61, de 14/3/2003.

«O alargamento da UE: o desafio dos países candidatos no cumprimento dos critérios económicos de adesão», de que foi relator VEVER, JO C 193, de 10/7/2001.

«O alargamento a leste da União Europeia e o sector florestal», de que foi relator KALLIO, JO C 149, de 21/6/2002.

(2)  É o que resulta, designadamente, do ponto 14 da Resolução do Conselho, de 2 de Dezembro de 2002, relativo à política comunitária em matéria de consumidores para 2002-2006 (JO C 11/1 de 17/1/2003) onde se lê:

«I:

4

apoiem as associações representativas dos consumidores por forma a que possam promover independentemente os interesses dos consumidores tanto a nível comunitário como nacional, exercer influência, entrar por exemplo em diálogo equilibrado com as empresas e participar na elaboração das políticas comunitárias. Para o efeito, será determinante o desenvolvimento de projectos de criação de capacidades que reforcem as organizações de consumidores, sempre que se justifique, bem como instrumentos de educação em aspectos específicos das transacções transfronteiras;».

(3)  Referem-se, em particular, as disposições constantes dos n.o 2 e 3 do artigo 7.o da Decisão 20/2004 CE, de 8 de Dezembro de 2003, que estabelece um quadro geral para o financiamento de actividades comunitárias em apoio à política dos consumidores da UE para o período 2004-2007 (JO L 5/1 de 9/1/2004) onde se lê:

«2.   O apoio financeiro para a acção 16 pode ser concedido às organizações europeias de consumidores que:

a)

Sejam organizações não governamentais sem fins lucrativos, independentes de interesses no plano industrial, comercial, profissional ou outro e cujos objectivos e actividades primordiais sejam a promoção e a protecção da saúde, de segurança e dos interesses económicos dos consumidores na Comunidade;

b)

Estejam mandatadas para representar os interesses dos consumidores a nível comunitário por organizações nacionais de pelo menos metade dos Estados-Membros, que sejam representativas dos consumidores, de acordo com normas ou práticas nacionais, e que exerçam uma actividade a nível nacional ou regional; e

c)

Tenham fornecido à Comissão dados satisfatórios relativamente aos seus membros, regras internas e fontes de financiamento.

3   O apoio financeiro para a acção 17 pode ser concedido às organizações europeias de consumidores que:

a)

Sejam organizações não governamentais sem fins lucrativos, independentes da indústria, do comércio, de outros interesses empresariais e de outros interesses incompatíveis, cujos objectivos e actividades primordiais sejam representar os interesses dos consumidores no processo de normalização a nível comunitário; e

b)

Estejam mandatadas em, pelo menos, dois terços dos Estados-Membros, para representar os interesses dos consumidores a nível comunitário:

por organismos que, de acordo com as normas ou práticas nacionais, sejam representativos das organizações nacionais de consumidores dos Estados-Membros, ou

na ausência desses organismos, por organizações nacionais dos Estados-Membros, que sejam representativas dos consumidores, de acordo com normas ou práticas nacionais, e que exerçam uma actividade a nível nacional».

(Ver, sobre este tema, o parecer do CESE da autoria de HERNÁNDEZ BATALLER (INT/180) de 17/7/2003 no JO C 234, de 30/9/2003).

(4)  JO L 166/51, onde se pode ler:

«Artigo 3.o

Das entidades competentes para intentar a acção

Para efeitos da presente directiva, entende-se por entidade competente, qualquer organismo ou organização que, devidamente constituído segundo a legislação de um Estado-Membro, tenha interesse legítimo em fazer respeitar as disposições referidas no artigo 1.o designadamente:

a)

Um ou vários organismos públicos independentes, especificamente responsáveis pela protecção dos interesses previstos no artigo 1.o, nos Estados-Membros em que esses organismos existam;

b)

As organizações que tenham por finalidade proteger os interesses previstos no artigo 1.o, de acordo com os critérios previstos na respectiva legislação nacional».

Ou, na sua actual «versão codificada»:

«Artigo 3.o

Legitimidade para agir

Para efeitos da presente directiva, têm legitimidade para agir os organismos ou organizações que, devidamente constituídos segundo a legislação de um Estado-Membro, tenham interesse legítimo em fazer respeitar as disposições referidas no artigo 1.o e designadamente:

a)

Um ou vários organismos públicos independentes, especificamente responsáveis pela protecção dos interesses previstos no artigo 1.o, nos Estados-Membros em que esses organismos existam;

b)

As organizações que tenham por finalidade proteger os interesses previstos no artigo 1.o, de acordo com os critérios previstos na respectiva legislação nacional.».

(5)  Sobre a importância do sector cooperativo ver a Comunicação da Comissão sobre a promoção das sociedades cooperativas na Europa (COM(2004) 18 final de 23 de Fevereiro de 2004), onde é relançada a ideia de um estatuto da sociedade cooperativa europeia (Parecer de HOFFELT).

(6)  Saúda-se, por isso, a recentíssima iniciativa da Comissão (DG SANCO) de confiar ao BEUC a organização de cursos de formação em gestão de recursos financeiros e humanos, de relações públicas e de «lobbying» e direito dos consumidores já no ano em curso.

(7)  Decisão de 9 de Outubro de 2003 relativa à criação de um Grupo Consultivo Europeu dos Consumidores (JO L 258, de 10/10/2003).

(8)  Anunciada a criação deste posto em Dezembro de 2002, a fim de poder manter um diálogo permanente com os consumidores europeus, foi o mesmo provido por Juan RIVIERE y MARTI, por nomeação do comissário Mário MONTI no passado dia 9 de Dezembro de 2003. (IP/03/1679 de 9/12/2003).

(9)  Destaca-se, pela sua importância, a recente Decisão da Comissão que institui comités científicos no domínio da segurança dos consumidores, da saúde pública e do ambiente (JO L 66 de 4/3/2004).

(10)  72 % dos organismos inquiridos referem a existência de apoios estatais; porém qualificam o apoio de insuficiente.

(11)  Particularmente oportuno foi o apelo lançado pelo BEUC, em Agosto de 2003, no sentido de os Governos dos novos Estados-Membros oferecerem adequado apoio financeiro às suas associações de consumidores e chamando a atenção para a eventualidade de ser utilizado o Programa PHARE para esse efeito.

(12)  75 % dos inquiridos dizem não existir um enquadramento fiscal mais benéfico para Associações de Defesa dos Consumidores.

(13)  JO L 5/1 de 9/1/2004, cf. parecer de que foi relator HERNÁNDEZ BATALLER: JO C 234 de 30/9/2003.

(14)  SEC(2003) 1387 de 27/11/2003.

(15)  É o que resulta claramente da conjugação dos n.o 1 e 5 do artigo 153.o na parte em que este último refere que as medidas de apoio, complemento e acompanhamento da política seguida pelos Estados-Membros adoptadas pelo Conselho deliberando nos termos do artigo 251.o e após consulta do CESE, «não obstam a que os Estados-Membros mantenham ou introduzam medidas de protecção mais estritas», desde que, obviamente, compatíveis com o Tratado, designadamente subsidiariedade e proporcionalidade.

(16)  Idêntica estatuição constava já do artigo 129.o A, tal como resultou do Tratado de Maastricht.

(17)  Cf. por ex. as Directivas: 90/314 (viagens organizadas) artigo 8.o; 94/47 (time-share) artigo 11.o; 93/13 (cláusulas abusivas) artigo 8.o; 97/7 (contratos à distância) artigo 14.o; 85/577 (contratos negociados fora dos estabelecimentos comerciais); 84/450 (publicidade enganosa) artigo 7.o; 87/102 (crédito ao consumo) artigo 15.o. Sobre este tema é importante recordar o importante estudo realizado a pedido da Comissão pelo Centre de Droit de la Consommation e coordenado por Monique GOYENS, em que o relator deste parecer teve oportunidade de colaborar, a par de eminentes juristas como Klaus TONNER, LOPEZ-SANCHEZ, Susanne STORM, Jérome FRANK, Alexandros VOUTSAS, William FAGAN, Paolo MARTINELLO, Andrée COLOMER, A. TAVASSY e Geraint HOWELLS (SPC/02/93/CM, Julho de 1994) e em cujo relatório final se elabora correctamente a distinção entre as diversas formas de harmonização: mínima, completa, parcial, total e opcional.

(18)  COM(2001) 531 final de 2/10/2001.

(19)  COM(2002) 208 final de 7/5/2002.

(20)  COM(2002) 443 final de 11/9/2002.

(21)  COM(2003) 356 final de 18/6/2003.

(22)  Introduzido, de forma expressa, no Tratado com o Acto Único Europeu.

(23)  Cf. artigo 32.o do Projecto de Constituição.

(24)  São bons exemplos da utilização do regulamento, as recentes iniciativas no domínio da competência judiciária, reconhecimento e execução de decisões em matéria civil e comercial (Regulamento CE 44/2001 de 22/12/2000); relativa à citação e à notificação dos actos judiciais extrajudiciais em matéria civil e comercial (Regulamento CE 1348/2000 de 29/5/2000); relativa à competência, reconhecimento e execução de decisões em matéria matrimonial e de regulação do poder paternal (Regulamento CE 1347/2000 de 29/5/2000); relativa aos processos de insolvência (Regulamento CE 1346/2000 de 29/5/2000); relativa à promoção das vendas no mercado interno (COM(2002) 585 final de 25/10/2002); relativa à cooperação no domínio de defesa do consumidor (COM(2003) 443 final de 18/7/2003); relativa aos materiais e objectos destinados a entrar em contacto com alimentos (COM(2003) 689 final de 17/11/2003); etc..

(25)  Constante hoje do artigo 5.o II do Tratado CE, com a seguinte redacção:

«Nos domínios que não sejam das suas atribuições exclusivas, a Comunidade intervém apenas, de acordo com o princípio da subsidiariedade, se e na medida em que os objectivos da acção encarada não possam ser suficientemente realizados pelos Estados-Membros, e possam pois, devido à dimensão ou aos efeitos da acção prevista, ser melhor alcançados ao nível comunitário.».

Existem, no entanto, algumas diferenças na redacção do n.o 3 do artigo 9.o da Constituição, que mereceriam uma elaboração doutrinal aprofundada.

É o seguinte o texto constitucional:

«Em virtude do princípio da subsidiariedade, nos domínios que não sejam da sua competência exclusiva, a União intervém apenas quando, e na medida em que, os objectivos da acção projectada não possam ser atingidos de forma suficiente pelos Estados-Membros, tanto a nível central como a nível regional e local, podendo contudo, devido às dimensões ou aos efeitos da acção projectada, ser alcançados mais adequadamente ao nível da União.».

Destacam-se, no entanto, por todas as seguintes contribuições para a discussão do princípio:

«Subsidiarité: défi du changement», Actas do Colóquio, Jacques DELORS, publicação do Institut Européen d'Administration Publique, Maastricht, 1991 (IEAP 11/04); «Le principe de subsidiarité», Jean-Louis CLERGERIE, Eellipres, 1997; o estudo, que se julga não publicado, de G. VANDERSANDEN; «Considérations sur le principe de subsidiarité», Jan. 1992; «Il principio di sussidiarietà nella prospectiva dell'attuazione del Trattato sull' Unione europea», de Gian PIETRO ORSELLO, Roma, 1993 e o Commentaire Mégret ao Tratado, Vol. I, 2. ed., Addendum, Cap. III, pág. 421 e seguintes.

(26)  Imprescindível será, no entanto, referir que a interpretação que foi feita, desde logo, pela Comissão, e apresentada no Conselho de Edimburgo de 11/12 de Dezembro de 1992, foi no sentido de que a análise, à luz do referido princípio, determinaria a retirada de toda uma série de propostas de directivas já em preparação e o congelamento e a revisão de muitas outras.

(27)  Introduzido, de forma alargada, com a redacção dada ao artigo 100.o B pelo acto Único Europeu, e consagrando definitivamente a jurisprudência «Cassis de Dijon».

(28)  «O reconhecimento mútuo no mercado interno» da autoria de LAGERHOLM publicado no JO C 116, de 20/4/2001.

(29)  COM(1999) 299 final de 16/6/1999.

(30)  JO C 12, de 15/3/2001.

(31)  Pensa-se, designadamente, nos produtos financeiros oferecidos em comércio à distância.

(32)  Cf. parecer do CESE sobre «O recurso ao princípio de precaução», de que foi relator BEDOSSA (JO C 268/6 de 19/9/2000).

(33)  Cf. desde logo, o Programa Preliminar da CEE de 14 de Abril de 1975, onde já se podia ler que «todos estes direitos (dos consumidores) devem ser garantidos por meio de acções conduzidas no quadro de políticas específicas da Comunidade, tais como, por exemplo, a política económica, a política agrícola comum, a política social, as políticas do meio ambiente, dos transportes e da energia, assim como a aproximação das legislações que, todas afectam a situação do consumidor» (JO C 92, de 25/4/1975). A ideia seria desenvolvida, posteriormente, na Comunicação ao Conselho de 4 de Julho de 1985, o chamado «Novo Impulso» onde, pela primeira vez se considera justamente que a realização do mercado interno é «um meio e não o fim da criação da Comunidade Económica Europeia» (COM(85) 314 final) que está na origem da resolução do Conselho, de 23/6/1986).

Também o Parlamento Europeu, na sua resolução de Março de 1992, sobre as normas de protecção dos consumidores e da saúde pública na perspectiva da realização do mercado interno, convidou a Comissão «a tomar cada vez mais em linha de conta, em todos os sectores políticos, os imperativos da protecção dos consumidores» (PE 152150).

Mas coube ao CESE, nas vésperas da realização do Conselho Europeu de Amsterdão, no seu parecer sobre o Mercado Único e a Defesa dos Consumidores, (CES 1309/95 de 22 de Novembro, de que foi relator CEBALLO HERRERO; JO C 39 de 12/2/1996) enunciar, com clareza, toda uma série de recomendações quanto à implementação da horizontabilidade da política dos consumidores e exigir a sua consagração, com caracter de generalidade, no Tratado revisto.

(34)  Art. III-38.o e art. III-5.o.

(35)  COM(2002) 208 final de 7/5/2002.

(36)  Loc. Cit. Pág. 7.

(37)  Parecer 276/2003 de 26 de Fevereiro de 2003, de que foi relatora Ann DAVISON; JO C 95 de 23/4/2003.

(38)  No seu parecer 1309/95 de 22 de Novembro, já citado, o CESE, a este propósito, recomendava que:

«—

em todas as decisões de política comercial da União Europeia, os interesses dos consumidores devem ser tidos em consideração, segundo critérios objectivos e públicos;

a fim de reforçar a aplicação dos artigos 85.o e 86.o do Tratado, a política de concorrência deve ser revista, passando a ser necessária a consulta das organizações de consumidores em caso de excepções e autorizações de acordos entre empresas e, muito em especial, nas concentrações de empresas, visto que ambas as práticas incidem negativamente na livre concorrência no mercado;

devem adoptar-se directivas relativas à concorrência e à publicidade desleais;

deve harmonizar-se a legislação dos seguros, protegendo os consumidores de práticas discriminatórias ou agressivas de venda neste sector;

Deve ser reforçada a política de cooperação em matéria de fiscalização das normas de segurança e de punição das transacções de produtos ou serviços que constituam um perigo para a segurança e a saúde. (ponto 3.2.4).»

(39)  Disso são bem significativos desde 1992, os seus documentos «Legislar melhor» de que se destaca o relativo ao ano de 2002 (COM(2002) 715 final de 11/12/02) e ainda as suas Comunicações de 5 de Dezembro de 2001 sobre «Simplificar e melhorar o ambiente regulador» (COM(2001) 726 final de 5/6/02), sobre «Governança Europeia: Legislar Melhor» (COM(2002) 275-278 final de 11/2/03) sobre «Actualizar e simplificar o acervo comunitário» (COM(2003) 71 final) e, em particular no seu recente «Programa Legislativo e de Trabalho para 2004» (COM(2003) 645 final de 29/10/03) onde se sublinha, como prioridade para 2004 a simplificação e codificação da legislação comunitária (Anexo 5).

(40)  Cf. os pareceres do CESE de que foram relatores os Srs.VEVER (JO C 14 de 16/1/01), K. WALKER (JO C 48 de 21/2/02 e JO C 125 de 27/5/02), J. SIMPSON (JO C 133 de 6/6/03) e RETUREAU (INT/187 de 17 Março de 2004 — CESE 500/2004, JO C 112 de 30/4/2004).

(41)  JO C 321 de 31/12/2003. Cf. pela sua importância, o Relatório do PE de 25.09.093 (A5-0313/2003) de que foi autora a deputada MONICA FRASSONI.

(42)  COM(2003) 71 final, de que foi relator RETUREAU (CESE 500/2004; JO C 112 de 30/4/2004).

(43)  Quanto ao estado de transposição do acervo comunitário, 65 % das entidades inquiridas afirmam que a reforma legislativa está completa e 35 % afirmam que o processo de transposição não está completo.

(44)  A ideia duma «codificação» do direito comunitário do consumo e as diferentes acepções do termo «codificação» foram largamente debatidas no Colóquio realizado em Lyon a 12 e 13 de Dezembro de 1997 cujas actas, sob o título «Vers un Code Européen de la Consommation», foram publicadas pela Bruylant (1998), e retomadas no Colóquio realizado em Bologne-sur-Mer a 14 e 15 de Janeiro de 2000, cujas actas foram publicadas pela Documentation Française (Paris 2002). O tema foi designadamente objecto de reflexão por vários autores na obra de Dominique FENOUILLET e Françoise LABARTHE, «Faut-il recodifier le droit de la consommation?», (ECONOMICA, 2002).

(45)  Parecer 105/2004 do CESE de que foi relator H. BATALLER (JO C 108 de 30/4/2004).

(46)  Ver, neste sentido, em geral, os pareceres do CESE sobre «Mercado Único e Defesa dos Consumidores», de que foi relator CEBALLO HERRERO (in JO C 39 de 12/2/1996) e sobre o «Livro Verde sobre a defesa do consumidor na União Europeia» de que foi relatora Ann DAVISON (in JO C 125 de 27/5/2002) e, em particular, nomeadamente os pareceres sobre as propostas de directiva relativas à publicidade enganosa e comparativa, às vendas ao domicílio, ao crédito ao consumo, às viagens organizadas, às clausulas abusivas, ao time-share, às vendas à distância de bens em geral e de serviços financeiros em particular, à responsabilidade do produtor, às garantias, ao comércio electrónico e à segurança dos produtos e às práticas comerciais desleais.

(47)  Parecer de 26 de Março de 2003 de que foi relator H. BATALLER (JO C 133, de 6/6/2003). Pelo seu interesse não pode deixar de se referir o relatório do Comitee for Consumer Affairs dos Países Baixos, de Novembro de 2000, sobre este tema.

(48)  Como, aliás, o Conselho já havia definido, desde 1986, na sua Resolução de 9 de Junho (JO C 184 de 23/7/86).

(49)  Parecer, aprovado em 28 de Janeiro de 2004 de que foi relator HERNÁNDEZ BATALLER (JO C 108 de 30/4/2004). A Comissão já havia chamado a atenção para a necessidade de melhorar o controle da aplicação do direito comunitário na sua Comunicação de 11 de Dezembro de 2002 (COM(2002) 725 final).

(50)  Foi no Conselho de Edimburgo de 11/12 de Dezembro de 1992 que por aplicação do princípio da subsidiariedade, foi decidido retirar toda uma série de propostas de directiva em preparação, entre as quais a referida no texto (SN/456/92 anexo C às Conclusões da Presidência).

(51)  Directiva 2001/95/EC, artigo 20.o.

(52)  COM(2003) 313 final de 6/6/2003.

(53)  COM(2004) 2 final de 13 de Janeiro de 2004. Cf. Parecer de que são relatores. METZLER e EHNMARK. Cf. ainda a Resolução do Conselho de 1 de Dezembro de 2003, publicada no JO C 299 de 10/12/2003.

(54)  Isto sem pretender prejudicar o parecer do CESE (CESE 137/2005) sobre esta matéria.

(55)  Cf. o Livro Verde sobre os serviços de interesse geral (COM(2003) 270 final, de 21/5/2003) e a comunicação da Comissão «Os serviços de interesse geral na Europa» (COM(96) 443 final de 11/9/1996).

(56)  Parecer CESE 1607/2003 de 10/12/2003 (JO C 80 de 30/3/2004) de que foi relator HERNÁNDEZ BATALLER e parecer CES 605/1997 de Van DIJK, de 29/05/1997 (JO C 287 de 22/9/1997). Cfr. igualmente, os pareceres sectoriais do CESE sobre alguns serviços essenciais, de que se destacam o parecer CES 1269/96 de 31/10/1996 (JO C 66 de 3/3/1997) sobre a energia e o parecer CES 229/2001 de 1/3/2001 (JO C 139 de 11/5/2001 sobre os serviços de comunicações electrónicas, ambos de HERNÁNDEZ BATALLER.

(57)  Em Portugal foi-se agora surpreendido com a exclusão do serviço telefónico dos serviços públicos essenciais! (Lei 5/2004, de 10/2/2004).

(58)  A Comunicação referida consta hoje do documento COM(2004) 374 final de 12/05/2004.

(59)  Regulamento relativo à lei aplicável às obrigações extracontratuais (COM(2003) 427 final de 22/7/2003) (Roma II).

(60)  Parecer CESE 841/2004 de que é relator Von FÜRSTENWERTH (JO C 241 de 28/9/2004).

(61)  Directiva 2000/13/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Março de 2000, JO L 109 de 6/5/2000.

(62)  De acordo com a directiva a identificação da origem do produto só é obrigatória quando a sua omissão possa induzir em erro o consumidor, formulação que levanta muitas dúvidas e não se apresenta suficientemente clara do ponto de vista da segurança jurídica.

(63)  Serviço de Alerta Rápido.

(64)  No mesmo sentido o parecer do CESE sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à segurança geral de produtos», (JO C 367 de 20/12/2000). Sobre os mecanismos de fiscalização do mercado, 65 % consideram-nos adequados e 37 % consideram-nos pouco eficientes.

(65)  Directiva 85/374/CEE, de 25 de Julho de 1985, relativa à aproximação das disposições legislativas dos Estados-Membros em matéria de responsabilidade decorrente de produtos defeituosos, alterada pela Directiva 99/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 10 de Maio de 1999, que veio alargar o âmbito de aplicação ao mercado da electricidade.

(66)  COM(1999) 396 final, de 28/7/1999.

(67)  Refere-se, em particular, o relatório apresentado pela LOVELLS (MARKT/2001/II/D), Contract N.o ETD/2001/B5-3001/D/76, em que o relator igualmente participou.

(68)  Directiva 85/577CEE do Conselho, de 20 de Dezembro de 1985, relativa à protecção dos consumidores no caso de contratos negociados fora dos estabelecimentos comerciais, JO L 372, de 31/12/1985.

(69)  Directiva 97/7/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Maio de 1997, relativa à protecção dos consumidores em matéria de contratos à distância, JO L 144, de 4/6/1997.

(70)  Alínea a) do artigo11.o da Directiva 97/7.

(71)  Directiva 2002/65/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Setembro de 2002, relativa à comercialização à distância de serviços financeiros, JO L 271, de 9/10/2002.

(72)  Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à harmonização das disposições legislativas regulamentares e administrativas dos Estados-Membros em matéria de crédito aos consumidores, COM(2002) 443, de 11/9/2002.

(73)  89 % dos inquiridos afirmam existir consagração legal deste direito mas para 30 % estes mecanismos não têm aplicação efectiva.

(74)  Directiva 93/13/CEE de 5 de Abril, JO L 95/29, de 21/4/1993.

(75)  Ao que se sabe o CLAB não tem continuado a ser actualizado e é de difícil acesso. 52 % dos inquiridos consideram suficiente a protecção conferida aos consumidores face às cláusulas abusivas e apenas 19 % consideram esta protecção insuficiente.

(76)  COM(2000) 248 final, de 6/7/2000; cf. parecer, de que foi relator ATAÍDE FERREIRA, JO C 116, de 20/4/2001.

(77)  Directiva 87/102, JO L 42, de 12/2/1987 e Directiva 98/7, JO L 101, de 1/4/1998.

(78)  Parecer do CESE sobre a proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à harmonização das disposições legislativas regulamentares e administrativas dos Estados-Membros em matéria de crédito aos consumidores, de 17 de Julho de 2003 (JO C 234 de 30/9/2003), no qual o CESE manifesta a sua opinião de não aceitar que a proposta mantenha, à semelhança da Directiva 87/102/CEE, como preocupação de primeira linha o desenvolvimento do mercado interno, e que a protecção dos consumidores só releve na medida em que ela possa proporcionar o fomento da livre circulação da oferta de crédito, não constituindo um fim em si própria mas apenas um instrumento de desenvolvimento do mercado interno.

(79)  Recordam-se, a este propósito, os ainda bem actuais Relatório de Informação e Parecer de Iniciativa do CESE, de 24/4/2002, de que foi relator ATAÍDE FERREIRA, JO C 149 de 21/6/2002, e as diversas reuniões promovidas pela Comissão e por organizações nacionais de consumidores sobre o tema.

(80)  A Recomendação da Comissão 87/598/CEE relativa a um código Europeu de boa conduta em matéria de pagamento electrónico, JO L 365, de 24/12/1987, é insuficiente para proteger os interesse dos consumidores nesta matéria.

(81)  Comunicação da Comissão sobre um Quadro Jurídico relativo aos pagamentos no Mercado Interno (COM(2003) 718 final), parecer do CESE da autoria de RAVOET (CESE, de 30/6/2004).

(82)  Cf. COM(2004) 91 final de 12/3/04 e o parecer do CESE em elaboração da autoria dos conselheiros RETUREAU e DAVISON.

(83)  Cf. COM(2004) 341 final e o parecer, de que também é relator o relator do presente parecer.

(84)  Cf. a comunicação da Comissão sobre o Direito Europeu dos Contratos (COM(2001) 398 final, de 11/7/2001) e o parecer do CESE de que foi relator RETUREAU; JO C 241, de 7/1/2002.

(85)  Cf. o parecer de iniciativa relativo ao Contrato de Seguro (INT/202), de que também é relator o relator do presente parecer.

(86)  Directiva 1999/44/CE, de 25/5/1999; JO L 171, de 7/7/1999.

(87)  Parecer 743/94, de 1 de Junho de 1994, de que foi relator J. PROUMENS (JO C 295 de 22/10/1994).

(88)  Como aliás era previsto já no excelente «Livro Verde» da Comissão (COM(93) 509 final, de 15/11/1993) e cujo espirito a directiva atraiçoou.

(89)  COM(2001) 531 final; cf. parecer CESE 344/2002 de que foi relatora DAVISON (JO C 125, de 27/5/2002).

(90)  Parecer do CESE, de 28/1/2004, de que foi autor HERNÁNDEZ BATALLER (JO C 108 de 30/4/2004).

(91)  No seu parecer CES, JO C 221, de 17/9/2002, da autoria de DIMITRIADIS, sobre a proposta de regulamento da Comissão (COM(2001) 546 final, de 2/10/2001).

(92)  71 % dos inquiridos afirmam que existem mecanismos de acesso à justiça e apenas 29 % responderam que não existem mecanismos específicos; quanto à sua eficácia, 58 % consideram-nos adequados e 35 % consideram-nos pouco eficientes.

(93)  Directiva 98/27/CE, de 19/5/1998, (JO L 166, de 11/6/1998) hoje já em versão codificada (COM(2003) 241 final, de 12/5/2003).

(94)  Quanto à existência de regras de isenção de custas de processo para Associações de Defesa dos Consumidores 73 % dos inquiridos responderam que não existem.

(95)  Parecer do CESE sobre o Livro Verde sobre os modos alternativos de resolução dos litígios em matéria civil e comercial, (COM(2002) 196, de 19/4/2002) de que foi relator MALOSSE, JO C 85, de 8/4/2003. No seu seguimento o CESE aguarda a publicação do relatório sobre o funcionamento da EEJ-NET, mas desde já chama a atenção para a necessidade de aumentar a sua operacionalidade.

(96)  Para 78 % dos inquiridos existem mecanismos de ADR e apenas 33 % responderam negativamente.

(97)  Recomendação 98/257/CE, de 30 de Maio, relativa aos princípios aplicáveis aos organismos responsáveis pela resolução extrajudicial de litígios de consumo, JO L 115, de 17/4/1998 e Recomendação 2001/310/CE, de 4 de Abril de 2001, JO L 109, de 19/4/2001.

(98)  Doc. 9179/99 + con. 1-99/00806 do Conselho de cujo parecer do CESE foi relator RAVOET (JO C 75, de 15/3/2000) e constitui hoje o Regulamento CE (JO L 160/1, de 30/6/2000).

(99)  Regulamento CE 44/2001 (JO L 12, de 16/1/2001).

(100)  COM(2003) 427 final, de 22/7/2003.

(101)  COM(2002) 654 final, de cujo parecer do CESE foi relator também o relator do presente parecer (Parecer CESE 88/2004 in JO C 108 de 30/4/2004).

(102)  COM(2001) 705 final, de 22/11/2001, de cujo parecer do CESE foi relator ATAÍDE FERREIRA (JO C 36 de 8/2/2002).

(103)  Parecer sobre a «Estratégia da Política dos Consumidores para 2002-2006», JO C 95, de 23/4/2003; relatora: Ann DAVISON). Parecer sobre «Um quadro geral para o financiamento de actividades comunitárias em apoio à política dos consumidores da União Europeia para o período de 2004-2007» (JO C 234, de 30/9/2003; relator: HERNÁNDEZ BATALLER).


ANEXO

ao Parecer do Comité Económico e Social Europeu

Foi rejeitada a seguinte proposta de alteração que recolheu, no entanto, pelo menos um quarto dos votos expressos:

Ponto 12.5

Completar como segue a enumeração das prioridades.

«–

a possibilidade de solucionar os problemas atinentes aos direitos dos consumidores, quando estes estão fora do próprio país, na sua língua nacional através de um representante do seu país.».

Justificação

É actualmente difícil aos consumidores apurarem os direitos de que dispõem em país da UE que não o da sua nacionalidade, devido à barreira linguística e ao desconhecimento dos mecanismos, por exemplo, em caso de inobservância dos direitos do consumidor letão nos Países Baixos, ou vice-versa.

Resultado da votação:

Votos a favor: 23

Votos contra: 43

Abstenções: 3