ISSN 1725-2482

Jornal Oficial

da União Europeia

C 74

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Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

48.o ano
23 de Março de 2005


Número de informação

Índice

Página

 

II   Actos preparatórios

 

Comité Económico e Social Europeu

 

411.a Reunião Plenária de 15 e 16 de Setembro de 2004

2005/C 074/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de acção: A agenda europeia para o espírito empresarial[COM(2004) 70 final]

1

2005/C 074/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Política no domínio do turismo e cooperação entre os sectores público e privado

7

2005/C 074/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à homologação de veículos a motor, no que diz respeito às suas reutilização, reciclagem e valorização e que altera a Directiva 70/156/CEE do ConselhoCOM(2004) 162 final — 2004/0053 (COD)

15

2005/C 074/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao património cinematográfico e à competitividade das actividades industriais conexasCOM(2004) 171 final — 2004/0066 (COD)

18

2005/C 074/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Conselho relativa ao sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado (revisão)COM(2004) 246 final — 2004/0079 (CNS)

21

2005/C 074/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Para uma melhor governação económica da UE

23

2005/C 074/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Construir o nosso futuro em comum — Desafios políticos e recursos orçamentais da União alargada para 2007-2013(COM(2004) 101 final)

32

2005/C 074/8

Parecer do Comité Económico E Social Europeu sobre O papel das organizações de mulheres como agentes não governamentais na aplicação do Acordo de Cotonou

39

2005/C 074/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Rumo ao 7.o programa-quadro em matéria de investigação: As necessidades de investigação no domínio das mutações demográficas — Qualidade de vida dos idosos e necessidades tecnológicas

44

2005/C 074/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Conselho que altera as Directivas 66/401/CEE, 66/402/CEE, 2002/54/CE e 2002/57/CE, no que diz respeito aos exames realizados sob supervisão oficial e à equivalência de sementes produzidas em países terceirosCOM(2004) 263 final — 2004/0086 (CNS)

55

2005/C 074/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu — Integração dos aspectos ambientais na normalização europeiaCOM(2004) 130 final

57

2005/C 074/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Agricultura Periurbana

62

PT

 


II Actos preparatórios

Comité Económico e Social Europeu

411.a Reunião Plenária de 15 e 16 de Setembro de 2004

23.3.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 74/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de acção: A agenda europeia para o espírito empresarial»

[COM(2004) 70 final]

(2005/C 74/01)

Em 11 de Fevereiro de 2004, a Comissão decidiu, em conformidade com o artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada

A Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 14 de Julho de 2004, sendo relator B. BUTTERS.

Na 411.a reunião plenária, realizada em 15 e 16 de Setembro de 2004 (sessão de 15 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 150 votos a favor, 1 voto contra e 6 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Contexto

1.1

As conclusões do Conselho Europeu de Lisboa, realizado em 2000, e a Carta Europeia das Pequenas Empresas sublinharam a importância da actividade empresarial para o desenvolvimento sustentável na Europa e a necessidade de criar um enquadramento político propício à promoção da empresa.

1.2

Posteriormente, o Presidente da Comissão Europeia, Romano PRODI, anunciou, no Conselho Europeu da Primavera de 2002, realizado em Barcelona, que a Comissão apresentaria um Livro Verde sobre o espírito empresarial antes do Conselho Europeu da Primavera de 2003. A Comissão apresentou o referido Livro Verde em Janeiro de 2003 dando início a uma consulta rigorosa e pública das partes interessadas nos meses que se seguiram. O Conselho da Primavera de 2003 solicitou à Comissão que apresentasse um Plano de Acção em matéria de Espírito Empresarial ao Conselho da Primavera de 2004.

1.3

O parecer do Comité sobre o Livro Verde foi adoptado na reunião plenária de Setembro de 2003 (1).

1.4

Em Fevereiro de 2004, a Comissão adoptou o seu «Plano de acção: A agenda europeia para o espírito empresarial» (2).

2.   Objectivos deste parecer

2.1

A exemplo do anterior parecer do Comité sobre o Livro Verde «Espírito Empresarial na Europa», o presente parecer procura contribuir para o actual processo de entendimento e fomento do espírito empresarial. Pretende fazê-lo formulando algumas observações na generalidade e procedendo a uma análise mais precisa do Plano de Acção. Em seguida, o parecer apresentará um conjunto de recomendações construtivas do Comité quanto à forma como esta iniciativa pode traduzir-se em medidas realistas e concretas que beneficiarão a actual e as futuras gerações de empresários europeus.

3.   Observações na generalidade sobre o Plano de Acção: o plano atinge o objectivo de constituir «o quadro estratégico para a promoção do espírito empresarial»?

3.1

O Livro Verde «Espírito Empresarial na Europa» fez uma apreciação clara das questões que se colocam e da dimensão do repto que consiste em elevar o nível do espírito empresarial na UE. O parecer do Comité reconheceu esse facto e felicitou a Comissão pelo Livro Verde e pelo subsequente processo de consulta aberto e rigoroso.

3.2

Tomando por base o Livro Verde, o Plano de Acção faz uma análise mais aprofundada da natureza do desafio empresarial na Europa. As metas do Plano de Acção são, a justo título, ambiciosas, mas estão associadas a objectivos indefiníveis. A impressão geral é a de que se trata de um documento vago e conservador. O Plano de Acção dá poucas provas da criatividade a que se aludiu no Livro Verde e na consulta pública, preferindo, não raras vezes, citar iniciativas já existentes. Prevê poucos mecanismos de concretização e não delega responsabilidades neste âmbito nem institui procedimentos de acompanhamento e de avaliação.

3.3

Uma das questões fundamentais que ressaltaram dos debates realizados ao longo da elaboração do Livro Verde e da consulta subsequente foi o vasto leque de áreas de política que afectam os empresários e a consequente necessidade de uma abordagem horizontal para vencer os desafios identificados. Claramente, o Plano de Acção não logra demonstrar às partes interessadas que esta iniciativa recebeu mais do que o apoio simbólico de serviços da Comissão para além da DG Empresa ou das administrações dos Estados-Membros. Sem esse apoio, o Plano de Acção terá um impacte mínimo.

3.4

A Comissão recebeu 250 respostas à sua consulta. Embora o Comité reconheça a transparência mostrada pela Comissão ao publicar todas as contribuições que recebeu no seu sítio web, o Plano de Acção contém muito poucas referências específicas às observações formuladas, não ficando claro para o leitor a forma como as respostas foram analisadas e nele integradas. Dado o alcance deste exercício e o interesse suscitado em toda a UE, seria lamentável que tais respostas não fossem cuidadosamente analisadas. Se o foram, o Plano de Acção deve demonstrá-lo.

3.5

O Plano de Acção podia ter reconhecido a heterogeneidade das PME e que tal diversidade requer soluções políticas focadas e não genéricas. Por exemplo, a recente comunicação da Comissão Europeia sobre a «Promoção das sociedades cooperativas na Europa» (3) reconhece a importância da promoção das cooperativas na Europa, devendo ter sido incluída no Plano de Acção uma referência correlacionada ao papel específico das empresas da economia social (4). Do mesmo modo, as necessidades dos trabalhadores independentes são significativamente diferentes das das sociedades anónimas (5). O Plano de Acção, além de demonstrar apreço por estes tipos específicos de propriedade de empresas, devia reconhecer a necessidade de abordagens políticas direccionadas para as empresas com necessidades e características específicas, como as que iniciam a actividade ou as empresas estabelecidas de actividades mais convencionais.

3.6

O Comité defende que é, também, importante incentivar uma mentalidade empresarial no sector público. O Comité compreende que o Plano de Acção se concentre no espírito empresarial sob a forma de criar, gerir e desenvolver uma actividade empresarial, mas tem para si que podia ter sido reiterada a necessidade de incentivar atitudes empresariais nas administrações públicas.

3.7   Estrutura

3.7.1

No seu parecer sobre o Livro Verde, o Comité recomendou que o Plano de Acção se dividisse em duas áreas distintas:

Promoção do espírito empresarial, a fim de desenvolver uma cultura empresarial, e «restaurar» e melhorar a imagem do empresário junto dos potenciais empresários nos meios escolares, universitários e familiares, dos serviços públicos e privados, particularmente o sector bancário, e das administrações europeias e dos Estados-Membros;

Criação de um clima incentivador da actividade empresarial, tendo em vista a definição de um programa de acções operacionais com o objectivo de favorecer a actividade das empresas em resposta às dez questões do Livro Verde (6).

3.7.2

De uma maneira geral, o Comité concorda com os domínios abrangidos pelas cinco áreas políticas estratégicas. Preocupa-o, todavia, o facto de não se delinearem acções específicas em cada um deles. Além disso, o Comité mantém o ponto de vista de que a abordagem segundo dois eixos essenciais acima referida teria sido mais coerente do que a natureza algo arbitrária destas cinco áreas políticas estratégicas. As cinco áreas políticas, revelam-se incoerentes, parecem sobrepor-se e incluem quatro grandes reptos e uma questão específica (melhoria do acesso ao financiamento).

3.7.3

Porém, e por razões de coerência, as observações na especialidade sobre o Plano de Acção serão divididas nas mesmas cinco áreas no próximo capítulo deste parecer.

3.7.4

O Comité considera que o documento da Comissão define a agenda nas suas grandes linhas. A próxima fase deverá corresponder ao desenvolvimento de acções específicas, políticas e mecanismos de acompanhamento e de actualização, bem como índices e dados relativos ao espírito empresarial que assegurem a realização de progressos.

4.   Observações na especialidade sobre as cinco áreas políticas estratégicas

4.1

O Comité identifica diversas prioridades específicas no âmbito de cada uma das cinco áreas políticas estratégicas.

4.1.1   Dinamizar a cultura empresarial

4.1.1.1

Trata-se de um objectivo a longo prazo que envolve diversas entidades a níveis muito diferentes. A DG Empresa necessita do apoio da DG Educação e Cultura, bem como das entidades nacionais e subnacionais envolvidas na formulação e concretização da política de educação.

4.1.1.2

Como o Livro Verde salienta, os empreendedores são motivados por uma grande variedade de ambições, como o ganho financeiro, a independência ou a satisfação profissional. Qualquer que seja a sua motivação, é essencial que os empreendedores potenciais e existentes reconheçam as responsabilidades sociais inerentes à propriedade de empresas.

4.1.1.3

O CESE acolhe favoravelmente as recomendações do Plano de Acção relativas aos jovens, mas gostaria de salientar a evolução demográfica para um envelhecimento da população na Europa. Seria uma atitude negligente não criar um ambiente que proporcione às pessoas com mais idade a oportunidade de se tornarem empresários, já que reúnem os requisitos necessários (competências, capacidade de gestão, capital, etc.) para criar e gerir uma empresa.

4.1.1.4

O Comité vê, igualmente, com agrado a ênfase dada no Plano de Acção à resposta a necessidades específicas das mulheres empresárias. As mulheres que tentam lançar e desenvolver empresas debatem-se com desafios particulares de cariz prático, económico e cultural, que variam significativamente de Estado-Membro para Estado-Membro. Os responsáveis oficiais podem apreciar melhor e actuar sobre esses desafios se fizerem participar mulheres empresárias bem e mal sucedidas no processo de elaboração de políticas

4.1.1.5

Existe uma longa tradição, em diversos Estados-Membros, de programas de promoção do espírito empresarial nas escolas. Não é necessário «voltar a descobrir a pólvora». O Plano de Acção deve basear-se na análise e partilha de boas práticas e no incentivo à sua adopção. A Comissão coordenou diversos e valiosos projectos BEST nesta área nos anos 90, cujos resultados e recomendações seriam preciosos para o desenvolvimento de políticas no âmbito do Plano de Acção.

4.1.1.6

O Programa Plurianual para as PME 2006-2010 da Comissão deveria prever mecanismos para facilitar a intensificação da participação das organizações representativas das empresas em projectos com as escolas.

4.1.1.7

Porém, criar uma sociedade com um maior espírito empresarial na Europa não se resume à formação de futuros empresários. Esta política cairá em saco roto se a Europa não criar também um ambiente que permita que os potenciais empresários tenham êxito, o que significa sensibilizar um leque muito mais vasto de intervenientes na comunidade empresarial (sector público, sector privado e a sociedade no seu conjunto) para a necessidade de compreender e apreciar o espírito empresarial. O espírito empresarial deve, pois, ser adoptado pelos funcionários do sector público que procuram exercer as suas funções eficazmente, bem como pelos que intervêm na gestão de empresas.

4.1.1.8

O Comité considera que as políticas devem procurar desdramatizar o espírito empresarial, reduzindo as barreiras, sentidas e reais, entre os empresários e o resto da sociedade. Os modernos padrões de trabalho permitem que as pessoas experimentem diferentes formas de participação na economia, passando de trabalhadores por conta de outrem para trabalhadores por conta própria ou empregadores, e vice-versa, com relativa facilidade. O espírito empresarial deveria, pois, ser encarado por muito mais pessoas como uma opção a longo ou a curto prazo. Isto terá a dupla vantagem de incentivar mais pessoas a ponderar a possibilidade de se tornarem gestores proprietários de empresas como uma opção positiva e de melhorar a atitude de um amplo leque de partes interessadas para com os empresários. Ao criar um ambiente desta natureza, é necessário dedicar atenção à possibilidade de registar e cancelar o registo de uma empresa com um mínimo de procedimentos burocráticos. Esta necessidade é especialmente aguda em vários dos novos Estados-Membros, onde a administração que se ocupa da mudança de trabalhador independente para trabalhador por conta de outrem é considerada excessivamente onerosa e as barreiras burocráticas ao acesso demasiado impeditivas.

4.1.1.9

Ao mesmo tempo, as autoridades e outras partes interessadas têm de garantir que não haja abusos da facilidade de mudança de um para outro dos vários estatutos de trabalho. Para conseguir um equilíbrio é importante que os trabalhadores, ou os desempregados, não sejam levados com lisonjas ou falsas promessas nem compelidos a tornarem-se trabalhadores independentes contra aquilo que pensam e que a empregadores menos escrupulosos não seja permitido passarem as suas responsabilidades para os trabalhadores (7).

4.1.2   Suscitar mais vocações empresariais

4.1.2.1

O Plano de Acção trata devidamente a questão central do justo equilíbrio entre risco e recompensa.

4.1.2.2

O Comité aguarda com interesse a próxima comunicação da Comissão sobre transmissão de empresas. Espera-se que esta comunicação tire proveito do valioso relatório BEST de Maio de 2002 e prossiga a tarefa de fazer com que os funcionários dos Estados-Membros e a comunidade financeira compreendam o que está em jogo e sejam mais sensíveis a esta importante área de política. É necessário enfrentar vários problemas específicos para facilitar as transmissões e maximizar as oportunidades de continuidade das empresas. Em especial, os regimes fiscais, os impostos sucessórios, a legislação sobre as sucessões e o direito das sociedades estão a desincentivar a sucessão nas empresas, pelo que se impõe a sua revisão.

4.1.2.3

O Plano de Acção salienta, a justo título, o «estigma do insucesso» como uma considerável barreira ao aumento da actividade empresarial. Em parte, é possível vencer este desafio através de estratégias bem sucedidas de sensibilização da sociedade para o espírito empresarial. Todavia, é necessária uma atenção mais directa à atitude das instituições financeiras, que têm de ser mais flexíveis no tratamento que reservam às pessoas associadas ao encerramento de empresas. O Comité recomenda que a Comissão demonstre às instituições financeiras que os empresários com experiência anterior (bem sucedida ou não) têm mais possibilidades de êxito nos seus novos empreendimentos.

4.1.2.4

Neste processo, é importante o equilíbrio entre o viabilizar o reinício da actividade empresarial após falência «honesta» e o garantir a proibição de práticas ilegais. O direito falimentar precisa, por consequência, de ser menos julgador e mais transparente.

4.1.2.5

Embora considere necessária uma informação mais pormenorizada sobre as acções específicas previstas, o Comité acolhe favoravelmente o facto de o Plano de Acção referir que a Comissão e os Estados-Membros continuarão a debruçar-se sobre a questão dos regimes de segurança social dos empresários.

4.1.3   Orientar os empresários para o crescimento e a competitividade

4.1.3.1

Os estudos efectuados revelam a necessidade de acções de formação e de apoio aos gestores proprietários de empresas, especialmente no domínio do marketing. Verificaram-se também grandes desenvolvimentos no domínio da transferência do conhecimento para as PME através de colocações temporárias e de ligações mais estreitas entre os institutos de investigação e o sector das PME. Devem ser mais desenvolvidos e apoiados programas tutoriais em que jovens empresas/empreendedores possam aprender com empresas/empreendedores mais experientes.

4.1.4   Melhorar os fluxos dos financiamentos

4.1.4.1

O Comité acolhe favoravelmente a proposta de incentivar os Estados-Membros a procederem ao intercâmbio de boas práticas e a apresentação de um novo Plano de Acção sobre contratação electrónica.

4.1.4.2

O Comité recomenda uma abordagem mais holística à questão do acesso ao financiamento, que contemple o seguinte:

Aumentar a perspicácia dos gestores proprietários de empresas no sentido de compreenderem o que é necessário para assegurar financiamento com vista ao crescimento das suas empresas, o que se poderia conseguir através de redes acreditadas de apoio às empresas;

Sensibilizar as instituições financeiras para as necessidades das empresas que procuram financiamento e apoio para o seu crescimento, o que também implica a promoção de uma maior compreensão do espírito empresarial no sector financeiro;

Abrir os contratos públicos às pequenas empresas — Esta é a medida mais directa do lado da procura que o sector público pode tomar. Como referido pelo Comité no parecer sobre o Livro Verde, são muitos os obstáculos que limitam o acesso das pequenas empresas aos contratos públicos (8). Os funcionários públicos deparam-se igualmente com barreiras administrativas. As potenciais vantagens para ambas as partes e para a economia justificam que se continue a reflectir sobre esta questão e a intervir nesta área. Os EUA constituem um modelo positivo por os departamentos e agências federais aspirarem a adjudicar 23 % dos contratos públicos a pequenas empresas;

Simplificar e reduzir os procedimentos de cumprimento da legislação fiscal – Se bem que o Plano de Acção avance algumas ideias interessantes, esta questão não foi ainda analisada de forma adequada. O Comité reconhece que a competência em matéria de aplicação de medidas concretas cabe às autoridades nacionais e, nalguns casos, às autoridades regionais ou mesmo locais. O Comité reitera a sua proposta de incentivos fiscais ao reinvestimento dos proveitos das empresas  (9), a que não é feita qualquer referência no Plano de Acção.

4.1.5   Criar um quadro administrativo e regulamentar mais favorável para as PME

4.1.5.1

O parecer do Comité sobre o Livro Verde salientou a necessidade de opções políticas de apoio a que as pequenas empresas «se integrem horizontalmente em todos os sectores de política relevantes (emprego, fiscalidade, ambiente, educação, etc.) e verticalmente em todos os níveis decisórios». Apesar do Pacote «Legislar Melhor», de Junho de 2002, que foi muito incentivador, diversos serviços da Comissão ainda não avaliam de forma adequada o impacte das propostas políticas nas PME ou outras partes interessadas. O Comité apoia, pois, a defesa que recentemente tem sido feita de que um vice-presidente da Comissão Europeia tenha a responsabilidade mais directa de superintender na reforma regulamentar.

4.1.5.2

Mais em geral, há ainda significativas possibilidades de melhorar os procedimentos de avaliação do impacte regulamentar, tanto na Comissão como no Parlamento e no Conselho.

4.1.5.3

O Comité lamenta que se tenha abandonado a referência à abordagem de «pensar pequeno primeiro» («think small first»). De acordo com ela, a regulamentação ou a legislação devem ser elaboradas tendo em conta as características e os desafios específicos das pequenas empresas. Fulcrais são avaliações específicas de impacto nas empresas tanto da legislação nova como da vigente, tendo por alvo as pequenas empresas e as micro-empresas. Se posta em prática em todo o processo de elaboração de políticas comunitárias, esta abordagem representaria a contribuição mais significativa das instituições para uma maior actividade empresarial.

4.1.5.4

A recente adesão de dez novos Estados-Membros à UE amplia consideravelmente o sector das PME, muitas das quais se esforçam por se adaptar à actual legislação da União antes de poderem acompanhar as eventuais novas propostas regulamentares. A Comissão deve, pois, tomar por base diversas iniciativas isoladas e ir mais longe, procurando assim obter, de uma forma proactiva, o ponto de vista das PME. É ainda mais importante que a Comissão demonstre que está a ter em conta as reacções, se se quiser evitar o descontentamento e um défice cultural entre as instituições e políticas da UE e as pequenas empresas.

4.1.5.5

O Comité salienta a importância do diálogo efectivo entre a Comissão e representantes das PME. A consulta das PME, através das suas organizações representativas, deve ser fulcral em todos os processos de consulta da Comissão. Para facilitar isto mesmo e garantir que os serviços da Comissão permanecem cientes dos pontos de vista da comunidade das PME, o Comité recomenda que se tire partido do papel do representante das PME através da nomeação de um comissário para as PME na nova Comissão. Fulcral, nesta função, deve ser a supervisão da aplicação do princípio de «pensar pequeno primeiro» («Think small first») por toda a Comissão.

4.1.5.6

Os mesmos princípios de diálogo são aplicáveis aos parceiros sociais, que lidam com muitas matérias de grande importância para os empreendedores futuros e actuais. O Comité recomenda uma revisão do diálogo social — principalmente ao nível da UE, mas também, em alguns casos, ao nível nacional — para ponderar o modo de formalizar uma participação mais proporcionada da comunidade das PME, que é cada vez mais significativa e diversificada.

4.1.5.7

Quanto à questão específica do regime de auxílios estatais, o Comité saúda calorosamente o desenvolvimento de um instrumento que permita identificar qualquer ajuda pouco susceptível de produzir efeitos significativos sobre a concorrência. Importa, por exemplo, que os processos de auxílios estatais não coloquem obstáculos à exploração e aplicação de formas inovadoras de resolver eventuais lacunas de financiamento das PME.

5.   Recomendações com vista à maximização do impacte positivo do Plano de Acção

5.1

O Comité solicita as seguintes clarificações e/ou melhorias processuais:

5.1.1

Abordagens coerentes de política para as empresas: Na Comissão Europeia, a Direcção-Geral da Empresa desempenha, claramente, um papel-chave na pilotagem do progresso. O Plano de Acção tem que ver com todas as áreas da política da Comissão para as empresas e, como o Comité recomendou no parecer sobre o Livro Verde (10), isso tem de se reflectir em cada iniciativa política da Direcção-Geral. Em especial, o programa plurianual para as PME (2006-2010) tem de demonstrar ter uma correlação clara com o Plano de Acção para o espírito empresarial e, depois, prever um mecanismo de resposta a algumas das suas prioridades.

5.1.2

Avaliação: Apesar das melhorias recentemente introduzidas, a comunidade empresarial não está satisfeita com a abordagem utilizada para a avaliação da Carta Europeia das Pequenas Empresas. Actualmente, os funcionários públicos, tanto a nível da UE como a nível nacional, podem ser «juiz e júri». É crucial que os representantes das empresas sejam mais estreitamente associados à avaliação do Plano de Acção.

5.1.3

Um quadro para a futura avaliação ex-post vai ter de ser definido para que seja possível o melhoramento constante da política. Nessa definição devem participar funcionários da Comissão e dos Estados-Membros e representantes reconhecidos das empresas ao nível comunitário e nacional.

5.1.4

Indicadores apropriados de desempenho são um instrumento essencial para o estabelecimento de metas de aumento da actividade empresarial e medição da respectiva consecução. Isto foi recomendado pelo Comité em precedente parecer (11) e salientado nas Conclusões do Conselho Competitividade. Estes dados permitirão também o estudo comparativo das políticas e ambientes empresariais dos Estados-Membros.

5.1.5

Calendários claros: As conclusões do Conselho «Competitividade» de 20 de Fevereiro instam a Comissão a estabelecer um calendário mais ambicioso. Para ser eficaz, o calendário deve também ser preciso e focalizado em termos de objectivos. O Comité julga compreender que a Comissão, desde a publicação do Plano de Acção, elaborou uma série de fichas de trabalho, metas e calendários mais precisos para acções específicas. Dentro do mesmo espírito que prevaleceu durante a consulta, o Comité insta com a Comissão para que promova a existência dessas fichas de trabalho e as ponha prontamente ao dispor das partes interessadas.

5.1.6

Acompanhamento do processo e delegação de competências: A Comissão não pode nem deve aplicar muitas das acções necessárias, mas deve supervisar e acompanhar cuidadosamente os progressos realizados na aplicação do Plano de Acção. Paralelamente, é, pois, essencial que a responsabilidade pela concretização de diversas acções seja delegada para o nível pertinente e que o calendário seja transmitido a todas as partes interessadas e por elas acordado. Isto exige a participação concertada de diversos actores, pelo que o Comité recomenda as seguintes iniciativas para garantir o seu empenhamento no trabalho que os aguarda.

5.1.7

Para reforçar o empenhamento da Comissão no processo, deve ser constituído um Comité de Acompanhamento do Plano de Acção , seja qual for a sua forma, no âmbito da estrutura revista da Comissão pós-Novembro 2004. Este comité incluiria representantes de cada uma das Direcções-Gerais que elaboram propostas legislativas com impacte nas empresas, bem como das Direcções-Gerais responsáveis pela supervisão da aplicação dos programas da Comissão decorrentes do Plano de Acção.

5.1.8

A criação de um grupo de trabalho, constituído por funcionários pertinentes dos Estados-Membros reforçaria o empenhamento destes no processo. Este grupo deveria reunir periodicamente para debater aspectos específicos das recomendações do Plano de Acção, registar os progressos realizados e identificar as insuficiências.

5.1.9

É vital que a comunidade empresarial seja estreitamente associada à aplicação, acompanhamento e avaliação do Plano de Acção. Com isto, o Comité quer significar a comunidade empresarial no seu sentido mais lato, incluindo empresas de todos os formatos e dimensão, dos independentes às multinacionais e das empresas sociais às empresas estritamente públicas. Se não for conseguido este amplo empenhamento, corre-se o risco de privar as empresas do direito de participarem no processo em curso, o que, por sua vez, minimizará o seu impacte. O Comité recomenda, pois, a consulta sistemática, ao longo de todo o processo, de representantes reconhecidos da comunidade empresarial a nível da UE e dos Estados-Membros.

5.1.10

Como as reacções ao Livro Verde mostraram, um número cada vez maior de actores, para além da comunidade das PME, está interessado no espírito empresarial. Por exemplo, os sindicatos, em geral, reconhecem a importância da política para as empresas. A todas estas partes interessadas deve ser permitido contribuir para a execução do Plano de Acção.

5.1.11

Em termos gerais, o Comité recomenda um esforço concertado da parte da Comissão para manter o Plano de Acção na ribalta entre os decisores políticos e, mais em geral, em toda a comunidade. Actividades promocionais e campanhas de consciencialização permanentes ligadas a objectivos específicos no quadro do plano global ajudarão a manter a dinâmica e o empenhamento de grande variedade de actores indispensáveis a garantir o êxito desta iniciativa vital.

6.   Conclusões

6.1

O Comité acolhe favoravelmente o Plano de Acção da Comissão e reafirma o seu apreço pelos esforços desenvolvidos pela Direcção Geral «Empresa» desde o início deste processo em princípios de 2002. O Comité reconhece que grande parte da acção necessária tem de ser promovida por responsáveis políticos de diversas instâncias, e não apenas da DG «Empresa».

6.2

O Plano de Acção é apenas o ponto de partida de um processo a longo prazo. Esse processo só terá êxito se houver uma integração horizontal entre diversas áreas de política e vertical entre os responsáveis políticos a vários níveis. O Plano de Acção e outras iniciativas com ele relacionadas, que serão lançadas proximamente, devem obter uma resposta positiva desses responsáveis políticos. O Comité insta, em particular, outras Direcções-Gerais da Comissão e as autoridades dos Estados-Membros a desempenharem um papel activo.

Bruxelas, 15 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  JO C 10 de 14.1.2004, pág. 58.

(2)  COM(2004) 70 final, pág. 4.

(3)  COM(2004) 18 final.

(4)  Ver pareceres do CESE 242/2000 (OLSSON) e 528/2004 (FUSCO e GLORIEUX) para mais referências ao significado das empresas da economia social.

(5)  JO C 10 de 14.1.2004, pontos 5.4 e 6.12.

(6)  JO C 10 de 14.1.2004, ponto 2.2.2.

(7)  JO C n.o 10 de 14.1.2004, ponto 5.3.

(8)  JO C 10 de 14.1.2004, pontos 6.10 e 6.10.2.

(9)  JO C 10 de 14.1.2004, ponto 6.11.1.

(10)  JO C 10 de 14.1.2004, ponto 6.2.1.

(11)  JO C 10 de 14.1.2004, ponto 4.3.


23.3.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 74/7


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Política no domínio do turismo e cooperação entre os sectores público e privado»

(2005/C 74/02)

Em 29 de Janeiro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre «Política no domínio do turismo e cooperação entre os sectores público e privado».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, que emitiu parecer em 14 de Julho de 2004 (relator: J. MENDOZA).

Na 411.a reunião plenária de 15 e 16 de Setembro (sessão de 15 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 148 votos a favor, 1 contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

No quadro dos compromissos do Comité Económico e Social Europeu em relação ao sector do turismo europeu, a Assembleia Plenária do CESE, na sessão de 29 de Outubro de 2003, adoptou o parecer «Para um turismo acessível a todas as pessoas e socialmente sustentável».

1.1.1

O referido parecer foi posteriormente apresentado no Fórum Europeu do Turismo de 2003 como contributo para a melhoria do turismo em geral e do turismo acessível em particular, no quadro do «Ano Europeu das Pessoas com Deficiência».

1.2

O parecer estabelece um quadro geral para análise, princípios e propostas para a definição do futuro do sector do turismo nas suas múltiplas e diversas facetas. Foram seleccionados especificamente dez aspectos pertinentes, sendo propostas dez iniciativas para cada um, resultando num conjunto de cem iniciativas práticas que, individualmente e em conjunto, têm por objectivo a configuração de um turismo sustentável e acessível para o século XXI.

1.3

Tendo, portanto, fixado estes objectivos como referência, o CESE, no seu novo parecer sobre «Política no domínio do turismo e cooperação entre os sectores público e privado», pretende definir as acções e as medidas a levar a cabo para possibilitar e concretizar na prática esses objectivos. Pretende igualmente analisar indivíduos, sectores, organizações, entidades e instituições que as executam, tanto com base nas suas próprias responsabilidades e competências específicas, como em cooperação com os demais intervenientes

1.4

O presente parecer tem por objectivo analisar e propor metodologias de cooperação entre os sectores público e privado, especialmente entre as administrações públicas e as empresas privadas e respectivas organizações empresariais, abrangendo, também, aspectos onde estão presentes outros agentes do sector do turismo: trabalhadores e respectivos sindicatos, organizações de consumidores, etc. Por último, pretende responsabilizar cada interveniente em relação às suas próprias competências e simultaneamente encontrar os mecanismos e os instrumentos que permitam coordenar essa acção com a dos demais intervenientes na política e na gestão do turismo, tendo em vista reforçar a competitividade e a sustentabilidade do sector.

1.5

É importante assinalar que, apesar de as realidades da evolução e da importância do turismo nos diversos países da Europa serem muito diferentes, a cooperação público-privado manifesta-se em todos como um instrumento de reforço da qualidade, sustentabilidade e competitividade do turismo.

1.6

A audição pública realizada em Sevilha (Espanha), em 15 de Abril de 2004, mostrou com mais clareza a existência de múltiplas e valiosas experiências bem sucedidas de cooperação público-privado e a necessidade de prosseguir essa via, a fim de progredir na qualidade, na sustentabilidade e na competitividade do sector turístico. Esses objectivos serão ainda mais pertinentes numa Europa alargada, onde a actividade turística terá indubitavelmente um papel importante.

2.   Definição dos intervenientes e dos sectores na indústria do turismo: sector público e sector privado.

2.1

O presente parecer não pretende fixar uma definição e uma delimitação perfeitas dos sectores público e privado. A título indicativo e com o objectivo de orientar a análise, optámos por apresentar em geral, de forma simples e com carácter meramente enunciativo, os dois sectores, de forma a explicar a sua posição em relação à cooperação no sector do turismo.

2.2

O sector público é constituído pelos vários níveis da administração (local, regional, nacional e internacional), bem como pelos órgãos e instituições que deles dependem em grande medida e que são financiados por impostos ou pela tarifação pública. Isto abrange, portanto, uma vasta gama de instituições, designadamente educativas e promocionais, incluindo algumas sob a forma de empresas privadas ou conjuntas, mas com competências bem definidas. O seu papel na sociedade é estritamente regulado e o objectivo principal é a promoção do bem público. Cabe citar neste âmbito a experiência de empresas públicas que actuam no mercado, como é o caso dos Paradores em Espanha e as Pousadas em Portugal. Em geral, o sector público presta serviços básicos a desenvolver pelas empresas.

2.2.1

É de referir em especial as entidades responsáveis pela informação e promoção do turismo, domínio em que a cooperação é imprescindível para definir objectivos e acções comuns.

2.2.2

Para o sector público, as diversas formas de cooperação público-privado podem significar novas formas de financiamento de actividades, em especial na promoção, na realização de infra-estruturas, no reforço da qualidade e em várias acções.

2.3

Por seu lado, o sector privado é constituído por empresas, na maioria sob a forma de sociedades, cooperativas ou individuais, mas também (e de forma muito importante) pelos parceiros sociais, sindicatos e associações empresariais e de cidadãos enquanto actores e consumidores directamente interessados no bem-estar da sociedade. Os seus interesses e objectivos são essencialmente pessoais e individuais, mas também abrangem o domínio social, na medida em que as suas actividades afectam directa ou indirectamente a sociedade no seu conjunto e são, pois, responsáveis perante a sociedade tanto pelos seus actos como pelas suas omissões.

2.3.1

Cabe realçar que esta vasta gama de empresas também pode ser classificada por dimensão (grandes empresas, micro-empresas, pequenas e médias empresas (PME)). A dimensão parece ser um factor pertinente para o estabelecimento de domínios de cooperação e são as PME que mostram com mais frequência maior vontade de cooperação, talvez por serem mais dependentes e, daí, precisarem de maior apoio para a consecução dos seus objectivos. Outro factor relevante também poderá ser o seu âmbito de acção, dado que as empresas locais ou regionais estão mais dispostas a cooperar do que as grandes empresas multinacionais, que tendem a ser mais rígidas pela sua estrutura de gestão centralizada e uniforme e têm interesses mais dispersos e distribuídos em diversos lugares ou destinos turísticos.

2.3.2

No que se refere aos agentes económicos e sociais, podem ser classificados segundo os grupos sociais que representam, designadamente empresários e trabalhadores. É patente a importância extraordinária que têm as suas associações na constituição de uma parceria público-privado, dado que, apesar de defenderem interesses fundamentalmente privados, os seus interesses colectivos aproximam-se muito dos interesses públicos, sendo, por isso, mais fáceis de coordenar. O profissionalismo dos seus representantes pode e deve ser um factor essencial para a constituição bem sucedida de uma parceria.

2.3.3

O sector social oferece uma vasta gama de associações e instituições privadas de diversos tipos, que, tal como os representantes dos agentes económicos e sociais, têm como objectivo a defesa de interesses privados e colectivos. Incluem associações de consumidores, entidades ecologistas e associações de vizinhos. São geralmente bons colaboradores nas parcerias desenvolvidas em torno do sector do turismo e, por vezes, são capazes de mobilizar os outros agentes.

2.3.4

Embora não seja propriamente o objectivo do presente parecer, considera-se oportuno chamar a atenção para o facto de ser possível e desejável outros tipos de cooperação entre instituições públicas de diferentes níveis e, ainda, entre empresas de naturezas e titularidades diferentes, tanto sob a forma de integração horizontal como vertical.

3.   A situação actual

3.1

A actual gama de relações possíveis entre os sectores público e privado apresenta quatro grandes cenários alternativos possíveis que dificilmente ocorrerão na sua forma pura, mas que indicam tendências na prática.

3.1.1

Antagonismo. Este cenário baseia-se em relações de confronto entre os sectores público e privado, em que cada um vê o outro, ou pensa que vê, como um opositor ou um obstáculo à concretização dos seus objectivos e interesses. Frequentemente, o sector privado vê o sector público como fonte de distorção do seu objectivo de rentabilidade por inadequação das infra-estruturas necessárias para o correcto desenvolvimento da sua actividade ou por baixa ou falta de qualidade dos serviços públicos destinados aos turistas ou empresas do sector do turismo. Por vezes, as empresas vêem as instituições públicas unicamente como colectoras de impostos, tributando cada vez mais um sector que enfrenta uma forte concorrência de preços e provocando distorção da concorrência face a impostos diferentes entre países, regiões ou localidades, e solicitam a harmonização de impostos, como por exemplo, o IVA dos serviços turísticos. Ou seja, encaram o sector público como algo a combater e que contribui apenas para uma quebra da competitividade do sector.

3.1.1.1

Neste cenário possível de antagonismo entre as relações público-privado, as instituições públicas podem considerar o sector privado de turismo como uma fonte de problemas, obstáculos e distorções dos seus objectivos públicos nos domínios do bem-estar social, da preservação e sustentabilidade dos recursos naturais, da coesão social e da responsabilidade das empresas em relação às populações locais, etc.

3.1.1.2

Em virtude destas relações, a tensão, os confrontos internos ou externos transcendem em maior ou menor grau a sociedade através dos meios de comunicação, criando-se um clima de confronto e de contínuas acusações mútuas que não ajudam qualquer dos sectores a alcançar os seus objectivos.

3.1.1.3

É evidente que esse cenário não parece ser o mais adequado para obter um desenvolvimento social, económico e ambiental sustentável e competitivo do turismo, nem da perspectiva do consumidor e da população local nem da do empresário, que pretende aproveitar a capacidade do turismo de gerar e distribuir riqueza.

3.1.2

Coexistência. Neste cenário, as entidades públicas e as empresas privadas toleram-se mutuamente, trabalham de forma autónoma para conseguir os respectivos objectivos, respeitam as respectivas competências, cumprem os seus deveres jurídicos e sociais e respeitam os direitos dos demais agentes turísticos. É um ambiente de tolerância mútua, que embora represente uma evolução em relação ao cenário anterior, é claramente insuficiente para desenvolver o turismo sustentável que consideramos adequado para o século XXI. É um cenário bastante frequente em destinos em que o turismo não é a actividade principal, servindo apenas para completar os rendimentos obtidos noutros sectores, ou em povoações ou cidades com economias diversificadas em que o turismo representa apenas uma pequena percentagem da actividade económica local.

3.1.3

Coordenação. Este ambiente caracteriza-se pela existência de uma certa coordenação de políticas, estratégias e acções dos diferentes agentes públicos e privados que actuam no turismo. Cada um deles tem os seus próprios objectivos, mas compreende que a coerência e a informação mútua dos dois sectores resultam num melhor cumprimento dos objectivos de cada um, beneficiando, assim, a sociedade. O principal instrumento deste cenário é a informação e comunicação, tanto de políticas como de acções, entre os diversos intervenientes do sector enquanto actores no turismo. Essa comunicação pode ser realizada mediante instrumentos de participação sob a forma de grupos de trabalho, fóruns, reuniões informativas, etc. Pressupõe um nível superior de cooperação público-privado e, na nossa opinião, promove a consecução do objectivo de sustentabilidade económica, social e ambiental do turismo. Tem tendência para existir em situações ou destinos tipicamente turísticos, em que o turismo se desenvolve de forma adequada, com actores públicos e privados conscientes da importância do turismo para as suas populações.

3.1.4

Cooperação. Este cenário pressupõe que, apesar de cada interveniente público ou privado manter os seus próprios objectivos, há objectivos comuns ao nível das intervenções e das estratégias ou até mesmo das políticas. Tal exige coerência nos objectivos e uma visão da actividade turística muito evoluída que é difícil de alcançar, sendo necessária a aplicação contínua de critérios de sustentabilidade económica, social e ambiental, a curto, médio e longo prazos. Consideramos que este é o cenário mais evoluído que o novo conceito de turismo sustentável deve atingir se quiser sobreviver enquanto indústria geradora de benefícios nos domínios económico, social e ambiental.

3.1.4.1

Podem utilizar-se diversos instrumentos para essa cooperação: empresas conjuntas, entidades patronais, fundações, instituições conjuntas, conselhos, parcerias, etc. Todavia, em todos eles o intercâmbio de experiências, de conhecimentos, de projectos empresariais de investimento a longo prazo constituem elementos essenciais para realizar a cooperação e a optimização dos esforços. É importante assinalar que essa cooperação tem o seu expoente máximo ao nível local, onde os interesses públicos e privados se aproximam mais concreta e directamente. É ao nível local que se pode criar o enquadramento adequado para que o turismo seja o promotor do desenvolvimento local, criador de emprego de qualidade e socialmente sustentável.

3.1.4.2

Uma das actividades que expressa com maior frequência este nível de cooperação é a criação de produtos turísticos, de forma conjunta, entre os sectores público e privado. Há produtos criados em cooperação que obtêm grande sucesso.

3.2

Ao analisar a actual situação, verifica-se que na prática existem os quatro cenários descritos, umas vezes na sua forma pura, mas em geral combinando elementos e criando situações intermédias e diversificadas. O presente parecer considera que a cooperação é um objectivo possível e desejável para o sector turístico da Europa e do mundo, na medida em que reforça a competitividade e a sustentabilidade do turismo. Há também que reconhecer e promover as boas práticas que, na Europa e em todo o mundo, estão a ser levadas a cabo no sector do turismo, umas por iniciativa do sector público e muitas outras fomentadas e criadas pelo sector privado.

3.3

Em geral, podemos dizer que, nos destinos turísticos ou actividades em que a cooperação público-privado está na base da melhoria de qualidade, do planeamento do desenvolvimento, da resposta a uma situação de crise e em diversos casos semelhantes, a eficácia e a rentabilidade das acções aumentam bastante e são reforçadas pela competitividade do destino ou actividade.

3.3.1

Por outro lado, as situações de confronto, a falta de coordenação ou a simples ignorância da realidade que, por vezes, surgem voluntária ou inconscientemente, apenas agravam os problemas, atrasam as soluções, reduzem a competitividade e são um obstáculo à rentabilidade.

3.3.2

Diversos estudos mostram e confirmam que o turista se apercebe de que a qualidade dos serviços recebidos durante uma viagem ou umas férias depende em 50 % dos serviços prestados pelas entidades públicas e que os restantes 50 % dependem dos serviços prestados pelo sector privado, essencialmente empresas, através dos seus trabalhadores. A medida dos indicadores de qualidade apreendidos pelos turistas e a sua ponderação no resultado final da percepção da qualidade do produto total foram examinados em diversos estudos realizados, por exemplo, pelo município de Calvià em Espanha, no âmbito dos planos de excelência turística.

3.4

É encorajador notar a tendência contínua no sentido da cooperação em detrimento do antagonismo, que foi talvez mais comum nos primeiros anos do turismo enquanto indústria, em períodos de forte crescimento, sem limites de ocupação dos melhores lugares da costa ou das paisagens naturais. Foram tempos em que a procura da rentabilidade a curto prazo encobria outros condicionantes de sustentabilidade, que até o sector público não foi capaz de ter em consideração nem incorporar na sua estratégia e desenvolver a sustentabilidade em cooperação com o sector privado.

3.4.1

A consciência social sobre os factores e as limitações a longo prazo, em especial no que se refere à conservação dos recursos naturais, tem vindo a aumentar, e a forma de actuar no turismo é hoje em dia muito mais coerente com objectivos comuns do que no passado.

4.   Objectivos da cooperação público-privado actual

4.1

Em termos gerais, os objectivos básicos de todo o processo de cooperação só podem ser o fomento e a integração dos objectivos próprios de cada interveniente nas suas acções, nas suas estratégias e no planeamento da sua própria actividade que está na base da sua presença na sociedade de hoje e do futuro. Cada interveniente deve apresentar os seus objectivos, individuais e colectivos, e procurar integrá-los nos dos demais intervenientes.

4.2

É possível distinguir diversos tipos de objectivos para a cooperação no sector turístico.

4.2.1

Sectoriais. Tal como já foi referido de diversas formas e em várias ocasiões, o sector e a indústria de turismo têm uma importância estratégica para a concretização de vários objectivos que estão no centro da própria razão de ser das políticas da União Europeia, da sua vontade de construir uma Europa melhor, hoje e para o futuro das gerações vindouras.

4.2.1.1

O desenvolvimento turístico, pelas suas consequências directas nas condições económicas, sociais e ambientais do meio onde se produz, pode e deve constituir um instrumento privilegiado de melhoria da qualidade de vida dos cidadãos europeus; mas para assegurar o cumprimento a longo prazo deste potencial e para torná-lo real, o turismo deve observar determinados requisitos de sustentabilidade que todos os intervenientes —instituições públicas e privadas, empresas e utilizadores — devem respeitar. O objectivo fundamental da cooperação público-privado pode e deve ser a viabilidade e a competitividade do sector do turismo a longo prazo.

4.2.1.2

Cabe referir em especial que a cooperação público-privado se revelou muito eficaz na gestão de situações de declínio e mesmo de crise turística em destinos maduros que vêm ameaçada a sua continuidade como geradores de riqueza. A necessária actuação em conjunto de todos os intervenientes aumenta a eficácia e a visibilidade das acções realizadas.

4.2.1.3

Isso é aparente em situações de crise, como o 11-S em Nova Iorque e o muito recente 11-M em Madrid, em que é necessário instar todos os actores públicos e privados activos e com capacidade de decisão a unirem-se para atenuar os efeitos negativos destas tragédias no turismo.

4.2.1.4

Uma das áreas em que as alianças e a cooperação público-privado se podem revelar eficazes no domínio sectorial será no sector dos transportes, no qual a proliferação das companhias aéreas de baixo custo conduziu a uma redução geral dos custos dos transportes. As alianças público-privado deverão salvaguardar as condições de qualidade do serviço, de emprego e.de segurança neste tipo de ofertas.

4.2.1.5

Se a formação dos profissionais que trabalham num sector é um objectivo claro em todas as actividades humanas, no caso do turismo é ainda mais evidente na medida em que o turismo tem uma componente clara e importante de relações humanas. A cooperação público-privado neste campo reveste grande importância, tendo ambos os sectores interesse na melhoria da formação e da profissionalização dos seus trabalhadores.

4.2.2

Sociais. Não é possível fixar objectivos para a cooperação público-privado se não se tiver em conta os objectivos sociais que devem estar subjacentes a todas as actividades humanas. Mais concretamente, o desenvolvimento local e a criação de postos de trabalho estão na base dos objectivos do turismo e, por conseguinte, da cooperação no sector.

4.2.2.1

O facto de o turismo ser uma actividade económica fundamentalmente de serviços pessoais permite que qualquer nova actividade turística gere novos postos de trabalho. Todavia, um turismo de qualidade e sustentável só é possível com empregos de qualidade.

4.2.2.2

A melhoria da realidade social das comunidades locais que recebem o turismo deve ser indubitavelmente um dos objectivos de uma cooperação eficaz entre os sectores público e privado. As alterações recentes e futuras à Política Agrícola Comum prevêem mudanças para várias regiões europeias, que terão de se adaptar, e a promoção de quintas de férias talvez possa ser um elemento de diversificação da actividade, combinando a manutenção da actividade tradicional com uma nova actividade, a turística, com rendimentos adicionais. Da mesma forma, conviria estudar a promoção do turismo nas zonas afectadas pela reconversão industrial, no sector mineiro ou de actividades similares, enquanto nova forma de actividade turística. O Comité Económico e Social Europeu pretende elaborar parecer de iniciativa, abordando e desenvolvendo concretamente essa alternativa para as zonas afectadas.

4.2.2.3

A preservação do património cultural, arqueológico e arquitectónico é possivelmente um dos objectivos de carácter social em que a cooperação público-privado se pode expressar melhor, como foi o caso da rede de Paradores em Espanha e das Pousadas em Portugal, cujos projectos representaram a recuperação de numerosos monumentos colocados ao serviço da actividade turística, criando uma riqueza indubitável no seu enquadramento. Desta forma, conjugou-se a conservação de bens de utilidade pública em mãos públicas com o objectivo da sua valorização e utilização. O mesmo se pode dizer dos espaços naturais, que são sinónimo, para várias pequenas e médias empresas, de oportunidade de negócio. No entanto, essas acções não são necessariamente realizadas por empresas públicas. Há várias exemplos de recuperações e valorizações cuidadas de palácios e monumentos em geral por entidades privadas que se tornaram rentáveis graças ao turismo, tal como é o caso da visita organizada no âmbito da audição realizada em Sevilha. A integração dos novos países na Europa, países com um património extraordinário a reabilitar, representa uma possibilidade nova e valiosa de combinar a actividade turística e a preservação do património, e as diversas formas de cooperação público-privado têm um papel muito importante a desempenhar nesse objectivo.

4.2.2.4

A cooperação público-privada em outros sectores também pode beneficiar a actividade turística. Assim, por exemplo, quanto ao valor da gastronomia como elemento de riqueza e património cultural e turístico, o fomento daquela cooperação na melhoria da evolução agroalimentar de qualidade e das denominações de origem, terá repercussão futura na oferta turística.

4.2.2.5

A aplicação generalizada do Código Ético do Turismo, aprovado há alguns anos pela Organização Mundial do Turismo, poderá ser um bom objectivo da cooperação público-privado.

4.2.3

Económicos. A evidência de que o factor económico é essencial no âmbito turístico é consensualmente aceite. Tal como já se indicou, a indústria turística revelou-se um forte motor de geração de emprego e riqueza em praticamente todo o mundo, mas de forma intensiva na Europa e inclusivamente ainda mais concentrada nos países da área do Mediterrâneo. Os objectivos da sustentabilidade, no que se refere a este factor, implicam a necessidade de uma visão económica a longo prazo, não a curto ou a médio prazo, o que significa apresentar os produtos turísticos em termos de competitividade, hoje e no futuro, com capacidade de gerar benefícios a curto, médio e longo prazos e emprego estável e de qualidade durante todo o ano. A procura e a manutenção da competitividade e da rentabilidade económica do sector do turismo serão, pois, objectivos comuns de uma cooperação eficaz.

4.2.3.1

As tecnologias de informação e comunicação (TIC) são outro domínio dos objectivos económicos do sector que exige cooperação devido à necessidade de uma resposta que associe os objectivos dos destinos turísticos, normalmente representados pelo sector público, aos da actividade económica de vendas de serviços turísticos, geralmente representados pelas empresas. A informação turística acessível a todos, incluindo as regiões periféricas, é um instrumento necessário para a competitividade do sector.

4.2.3.2

No âmbito dos objectivos económicos da cooperação, há que ter em conta que a intervenção do sector público deve ser exercida, por um lado, evitando a concorrência desleal e, por outro lado, no sentido da uniformização de situações de concorrência, como por exemplo a fiscalidade, que propiciam um mercado não transparente.

4.2.4

Ambientais. O turismo é uma indústria, possivelmente a única, com a particularidade de o seu produto básico ser o «atractivo natural», integrado por um conjunto de elementos nos quais a percepção da natureza, da sua variedade de ambientes e paisagens, da sua diversidade biológica e, consequentemente, do seu respeito ambiental, desempenham um papel essencial na qualidade e adequação do produto que os utilizadores, os turistas, procuram. É perfeitamente possível e desejável que os actores públicos e privados determinem como objectivo da cooperação a manutenção de condições que assegurem a sustentabilidade dos recursos naturais e a sua utilização racional e sustentável, garantindo a sua capacidade de gerar lucros.

4.2.4.1

A prevenção ambiental é um dos domínios em que a cooperação público-privado pode revelar-se um instrumento de acção para a concretização do objectivo de qualidade do ambiente. Acontecimentos recentes, como o desastre do Prestige, revelaram não só a necessidade da prevenção ambiental, mas também a necessidade de aquela ser desenvolvida tanto pelo sector privado como pelo sector público.

4.3

Por último, os possíveis objectivos de uma cooperação público-privado eficaz devem ser coerentes com o conceito de sustentabilidade que abarca, por um lado, três aspectos da economia, sociedade e natureza, e, por outro lado, três prazos (curto, médio e longo), e a participação de todos os intervenientes no sector do turismo enquanto elemento essencial e integrador. A cooperação tem por base a política e as acções de desenvolvimento sustentável.

5.   Princípios e critérios de cooperação

5.1

São vários os princípios que devem reger as relações de cooperação entre o sector público e o sector privado no que se refere ao turismo.

5.1.1

Princípio de competências. É claro que para estabelecer uma parceria sólida e duradoura os diversos agentes envolvidos devem poder realizar de forma autónoma os seus próprios objectivos, fixados por mútuo acordo. Para tal devem ver as suas competências reconhecidas, seja sob a forma de mandato jurídico específico, de delegação de poderes ou simplesmente de representação formal ou informal.

5.1.2

Princípio da co-responsabilidade. Os diversos intervenientes devem estar directa ou indirectamente relacionados ou envolvidos na situação subjacente à constituição da parceria.

5.1.3

Princípio do voluntariado. Só quem escolher livremente participar de forma activa numa parceria fica abrangido pelas suas disposições.

5.1.4

Princípio da democracia. As regras da tomada de decisões e de representação devem ser bem claras e cumprir os princípios da democracia participativa.

5.2

Os critérios de acção das parcerias para garantirem a consecução eficaz dos objectivos incluem:

5.2.1

Critério de concretização de objectivos, que devem ser explícitos, concretos e, se possível, quantificados em termos económicos, cronológicos e consensuais.

5.2.2

Critério de pertinência. Os objectivos fixados devem ser importantes para todos os intervenientes, seja directa ou indirectamente.

5.2.3

Critério de controlo dos resultados. É importante que os intervenientes vejam claramente os resultados da sua participação numa parceria. Se assim não for, perdem o interesse e abandonam a parceria.

5.2.4

Critério de proporcionalidade. É imprescindível que haja proporcionalidade entre a dimensão dos desafios e o envolvimento dos intervenientes.

6.   Instrumentos e formas de associação e cooperação

6.1

Para descrever instrumentos e formas de associação é necessário, antes de mais, definir o âmbito espacial eficaz em que a cooperação tem sentido, o que significa analisar e definir o âmbito em que o repto se manifesta, em que é possível encontrar uma solução, em que se possam reunir as competências de todos os intervenientes. O âmbito será, portanto, local se o problema for unicamente local e se existirem a esse nível as competências para encontrar e aplicar soluções. O mesmo se aplica aos níveis regional e nacional.

6.2

Outra característica fundamental é a da generalidade. É importante que todos os agentes possam contribuir de alguma forma para a solução, seja mediante instrumentos, informações ou coordenação de actividades.

6.3

Formas concretas de parceria poderão ser:

6.3.1

De tipo informal: os agentes envolvidos constituem um grupo informal, em alianças estratégicas, um grupo de trabalho, um fórum ou algo similar, mas sem qualquer personalidade jurídica. As decisões são tomadas por maioria, mas não são vinculativas nem representam obrigações para as partes integrantes, excepto as assumidas voluntariamente.

6.3.2

De tipo formal: seja sob a forma de parcerias, fundações, empresas públicas, empresas mistas, associações, etc. Regem-se por estatutos que estipulam as condições dos acordos e a sua execução.

6.3.3

O espírito de cooperação entre os actores económicos e sociais na definição de um quadro de relações laborais estável e com direitos, bem como o desenvolvimento da negociação colectiva proporcionam elementos com consequências positivas para a competitividade, a rentabilidade e a eficiência social e económica do turismo. O mesmo acontece com os processos de diálogo social entre actores económicos e sociais com a participação das administrações e instituições públicas, quando os temas a desenvolver requerem essa estrutura tripartida.

7.   O papel das redes de agentes turísticos: de cidades, de empresários, de projectos concretos

7.1

Num mundo globalizado como o nosso, a actividade económica só pode ser realizada segundo critérios de relação com os demais actores. Esse mesmo princípio aplica-se a cidades e, neste caso, aos destinos e actores do sector turístico. Peritos neste tema indicam que a nova economia global se articulará territorialmente em torno de redes de cidades, procurando agir de forma coordenada. Apesar de numa primeira fase os destinos turísticos seguirem estratégias competitivas para a recolha de financiamento, para o aumento de vendas, para serem elementos essenciais na informação que flui pelo mundo, ou seja, para serem melhores, mais competitivos e crescerem mais, numa fase posterior percebe-se a necessidade de estabelecer relações de complementaridade com outros destinos para a promoção e actuação conjuntas face a governos nacionais e/ou organismos internacionais.

7.2

Cada vez mais se considera necessário o intercâmbio de experiências entre destinos turísticos mundiais para colaborar nos objectivos comuns de sustentabilidade e competitividade. Isso implica um conjunto de aspectos positivos, dos os quais a possibilidade de eliminação de erros estratégicos ou a integração dos melhores instrumentos de gestão sustentável parece ser alguns dos seus melhores efeitos. As redes surgem como instrumentos complementares e alternativos às formas organizadas de representação de cidades, empresas ou instituições. As tecnologias da informação e da comunicação fomentam as redes, permitindo uma relação informal, instantânea e valiosa entre as componentes das redes.

7.3

Nem sempre a constituição de redes se faz sem problemas e aspectos negativos: por vezes surgem conflitos de interesses que dificultam a cooperação e também por vezes os membros mais fortes da rede são os que obtêm maiores benefícios.

7.4

No que se refere aos empresários, tal como para as cidades, a formação de redes representa um forte instrumento de informação e troca de informações tendo em vista o reforço da competitividade das empresas e do seu peso face às instituições públicas.

7.5

Diversos projectos turísticos concretos estão articulados em redes, designadamente o Programa URB-AL da União Europeia, que tem por objectivo a constituição de redes de cidades para trabalhar múltiplos aspectos da economia, sociedade e urbanização, aspectos que por vezes se centram no intercâmbio de experiências turísticas de sustentabilidade.

8.   Experiências bem sucedidas de cooperação público-privado no âmbito do turismo europeu

8.1

Durante a audição pública realizada em Sevilha, no dia 15 de Abril de 2004, foram analisadas diversas experiências bem sucedidas de cooperação público-privado, sendo de referir as seguintes:

8.1.1

Turismo de Barcelona: a experiência baseia-se na constituição, em 1993, da empresa TURISMO DE BARCELONA pela Cámara de Comercio de Barcelona, o Ayuntamiento de Barcelona e a Fundación Barcelona Promoció, com o objectivo de fomentar a promoção da cidade de Barcelona no domínio turístico. Nos dez anos decorridos desde então, a Turismo de Barcelona reforçou a imagem e a realidade turística da cidade. Essa evolução positiva traduz-se no aumento da oferta e da procura, na melhoria da ocupação hoteleira e de outros indicadores. Todavia, o aspecto mais relevante poderá ser o facto de a dotação orçamental institucional ter passado, nesse período, de 70 % a 20 % do orçamento total, sendo os restantes rendimentos gerados pela própria actividade da Turismo de Barcelona de intermediação turística do mercado da habitação. A criação de diversos produtos turísticos bem sucedidos, como o Barcelona Bus Turistic, o Barcelona Card, o Barcelona Pass, entre outros, e de programas como o Barcelona Convention Bureau, o Barcelona Shopping Line, etc., merece uma referência especial. O sucesso da experiência deve-se sem dúvida alguma à cooperação estreita entre a indústria turística e as instituições públicas, que se uniram numa aliança para melhorarem a realidade turística de Barcelona.

8.1.2

ICTE Instituto para a Qualidade Turística Espanhola: neste caso, a experiência remonta à criação, no início dos anos 90, de diversos instrumentos activos ao serviço da procura da qualidade culminando, no ano 2000, na criação do Instituto para a Qualidade Turística Espanhola, em resposta à ameaça evidente que os destinos turísticos emergentes no Mediterrâneo, nas Caraíbas, entre outros, representavam para a liderança da indústria turística espanhola. Optou-se por uma clara estratégia de qualidade integral tendo em conta a necessidade de integrar todos os actores que intervêm na actividade turística. As empresas vinculadas do sector estão presentes em todas as suas acções: hotéis, restaurantes, agências de viagem, transportes, turismo rural, golfe, estações balneares, municípios e províncias, etc. A situação actual caracteriza-se pela participação no sistema integral de qualidade turística espanhola de mais de 250 associações empresariais, da administração pública, das Comunidades Autónomas e dos municípios, de mais de três mil empresas turísticas que recebem assistência técnica e de 463 empresas e entidades certificadas em qualidade turística. Tal como em Barcelona, o ICTE representa um modelo bem sucedido de cooperação público-privado na procura desse elemento essencial na actividade turística que é a qualidade integral.

8.1.3

Outras experiências apresentadas na audição de Sevilha: o modelo de cooperação público-privado da Andaluzia, que existe há já duas décadas e que se traduziu na celebração de cinco acordos de concertação que abrangem os sectores de produção e, entre eles, o turismo. O modelo inclui a participação entre a administração pública da Comunidade Autónoma, a Confederação de Empresários da Andaluzia e as Centrais Sindicais Maioritárias Andaluzas, Unión General de Trabajadores (U.G.T.) e Comisiones Obreras (CC.OO.), o que permitiu estabelecer um clima de confiança e estabilidade necessário à actividade turística.

8.2

Como exemplo de política local, o CESE considera positivo que, no quadro da audição em Sevilha sobre a cooperação entre os sectores público e privado, o presidente da câmara dessa cidade tenha lançado novo apelo aos actores económicos e sociais e ao sector do turismo em geral tendo em vista a elaboração de um pacto que previa a plena participação de todos os intervenientes na concepção, elaboração, planeamento, execução e avaliação da política de turismo na sua esfera. Essa iniciativa pode ser uma referência, em conjunto com outras já em curso, para as grandes cidades e localidades de qualquer dimensão para fomentar a cooperação ao nível local.

8.3

Existem também várias experiências bem sucedidas de cooperação no domínio do turismo social destinadas a promover o acesso a férias e a turismo ao maior número possível de pessoas. É o caso do cheque-férias gerido em França pela Agência Nacional de Cheques-férias (ANCV) e na Hungria pela Sociedade Nacional do Lazer. É também o caso dos programas de turismo sénior do Instituto Nacional para o Aproveitamento do Tempo Livre dos Trabalhadores (INATEL) em Portugal, e o Programa Turismo da terceira idade do Instituto Nacional de Serviços Sociais (INSERSO) de Espanha, da promoção de centros de alojamento para jovens em Bruxelas com o apoio da Comissão Comunitária Francesa (COCOF) e de programas públicos para a formação e o auxílio à renovação de centros de férias filiados em associações como «Centro Turistico Giovanile» (CTG) em Itália.

8.4

Existem sem dúvida na Europa e no mundo várias outras experiências bem sucedidas de cooperação público-privado, nomeadamente aquelas incluídas no valioso contributo da publicação da Organização Mundial do Turismo e na da Comissão Canadiana de Turismo intitulada «Cooperação e parceria no turismo: uma perspectiva mundial», editada em 2003. Nessa publicação são apresentados dezoito casos bem sucedidos de cooperação no turismo a nível mundial, que devem ser tidos em conta pela sua importância na demonstração de boas práticas.

9   Promoção da cooperação ao nível europeu

9.1

A Europa alargada apresenta um quadro muito dinâmico em todos os domínios e em especial no turístico, no qual se registam várias mudanças, tanto na estrutura da oferta como da procura. A Cimeira de Lisboa atribuiu-se o objectivo estratégico para os próximos anos de se tornar na economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos, e com maior coesão social. A consecução deste objectivo ambicioso exige uma ampla cooperação a nível institucional e ao nível dos sectores público e privado, capaz de assumir esse desafio de forma consensual. O turismo já provou ser uma indústria geradora de emprego e de bem-estar e deve continuar a sê-lo para a Europa dos 25 e do futuro alargamento. Como cenário concreto para o desenvolvimento do princípio de cooperação no âmbito europeu, o CESE propõe à Comissão que analise a possibilidade de ser constituído um Conselho Consultivo Europeu de Turismo.

9.2

Esse conselho podia contemplar, na sua composição, a presença das instituições europeias (Comissão, Parlamento, Comité Económico e Social Europeu e Comité das Regiões), do Conselho Europeu para a Juventude, de representantes dos Estados-Membros, representantes de organizações patronais e sindicais de forma paritária, bem como de organizações europeias de consumidores, ambientalistas, pessoas com deficiência, turismo social, universidades e peritos de prestígio reconhecido.

9.3

O Conselho Consultivo Europeu de Turismo proposto poderá receber e analisar os dados sobre a evolução e perspectivas do turismo, propor linhas de apoio e colaboração com a acção da Comissão, facilitar uma referência de cooperação a desenvolver pelos diferentes agentes do sector nos demais domínios turísticos da União e ainda planear a convocatória do Fórum Europeu do Turismo e o seguimento dos acordos celebrados nesse quadro.

9.4

Se a Comissão aprovar esta proposta, o CESE está disposto a colaborar na sua execução, de forma a o referido conselho estar constituído e plenamente em vigor no Fórum Europeu do Turismo de 2005.

10.   Considerações finais

10.1

Vivemos num mundo globalizado e, ao mesmo tempo, especializado, que nos obriga a repensar continuamente os modelos vigentes das nossas actividades económicas, sociais, de articulação do território e de construção das cidades. A actividade turística não escapa a essa necessidade e apresenta a todos os intervenientes vários desafios de qualidade, sustentabilidade e competitividade.

10.2

Consideramos que apenas através de uma atitude essencialmente cooperativa dos diferentes actores públicos e privados será possível enfrentar os desafios difíceis que se colocam a toda a actividade humana, em especial ao turismo, pelo seu carácter estratégico, pela sua configuração essencial de prestação de serviços ao Homem e pela sua essência de intercâmbio cultural.

10.3

A cooperação público-privado é cada vez mais um elemento imprescindível e presente nas acções positivas no domínio do turismo. Há que incentivar e fomentar de diversas formas esse progresso, a única forma de realizar os objectivos do sector. Cabe a todos os actores incluir essa vertente nas suas acções face às transformações importantes a que assistimos neste mundo.

10.4

O CESE continua a considerar positiva a iniciativa da Comissão Europeia de manter a realização anual do Fórum Europeu do Turismo, como cenário a partir do qual, numa perspectiva europeia, com a participação dos actores do sector, principalmente económicos e sociais, as administrações e as instituições podem definir as linhas e os critérios de cooperação a articular com as iniciativas desta natureza ao nível dos Estados, regiões e localidades, e entre sectores e âmbitos territoriais entre si, na União Europeia.

10.5

Quanto ao CESE, pretende contribuir para a cooperação no sector turístico fomentando o encontro, o diálogo e o consenso entre os representantes do turismo, em particular entre os actores económicos e sociais, as administrações dos Estados, das regiões e das localidades, sem esquecer as entidades e as associações implicadas num turismo sustentável: associações de consumidores e organizações ambientalistas, economia social e pessoas com deficiências. Da mesma forma, preservaremos a nossa cooperação com a Organização Mundial do Turismo (OMT) e o Centro Internacional do Turismo Social. Assim, o CESE reitera a sua oferta de servir de ponto de encontro para os que concebem o turismo como um direito da pessoa, que deve ser considerado não só sob os seus aspectos industriais e de actividade económica, mas deve ser também apreendido como um factor de realização pessoal e humana e de compreensão, de aproximação e de paz entre os indivíduos e os povos.

10.6

O CESE apoiará anualmente, com uma declaração, o Dia Mundial do Turismo estabelecido pela OMT (Organização Mundial de Turismo). Assim, neste momento, o presente parecer é considerado a «Declaração de Sevilha sobre a política de turismo e a cooperação entre o sector público e o sector privado», o contributo do CESE para este evento e para o Fórum Europeu do Turismo de 2004, em Budapeste.

Bruxelas, 15 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


23.3.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 74/15


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à homologação de veículos a motor, no que diz respeito às suas reutilização, reciclagem e valorização e que altera a Directiva 70/156/CEE do Conselho»

COM(2004) 162 final — 2004/0053 (COD)

(2005/C 74/03)

Em 30 de Março de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Em 14 de Julho de 2004, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer com base no projecto do relator V. RANOCCHIARI.

Na 411.a reunião plenária de 15 e 16 de Setembro de 2004 (sessão de 15 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 125 votos a favor, 4 votos contra e 7 abstenções, o presente parecer.

1.   Introdução

1.1

Anualmente, são comercializados na Europa cerca de 16 milhões de veículos de passageiros e de veículos comerciais ligeiros; neste mesmo período, mais de 9 milhões de veículos atingem a fase de fim de vida, produzindo mais de 8 milhões de toneladas de resíduos.

1.2

A gestão desta quantidade gigantesca de resíduos tem sido realizada, nos últimos anos, de uma forma não homogénea nos diversos países europeus que nem sempre têm dado a devida atenção à questão da reciclagem e da valorização dos materiais.

1.3

Porém, mais recentemente, desde o início dos anos noventa e graças ao notável contributo das organizações ambientalistas, todos os Estados-Membros têm procurado, seja através de acordos seja por meio da legislação nacional, estabelecer regras para o tratamento dos veículos em fim de vida com resultados inegavelmente positivos para o ambiente.

1.4

Por fim, com o propósito de harmonizar as diversas medidas nacionais e evitar distorções da concorrência e, o que é mais importante, com o objectivo de reduzir futuramente o impacto ambiental destes veículos, o Parlamento Europeu e o Conselho adoptaram em 18 de Setembro de 2000 a Directiva 2000/53/CE (1) que estabelece os requisitos para as instalações de recolha e tratamento dos veículos em fim de vida, bem como os objectivos a cumprir pelos Estados-Membros quanto a reutilização e valorização dos resíduos, prevendo que:

a)

Até 31 de Dezembro de 2006, a reutilização e valorização de todos os veículos em fim de vida deve ser aumentada para um mínimo de 85 %, em massa, em média, por veículo e por ano. A reutilização e reciclagem deve ser aumentada, dentro do mesmo prazo, para um mínimo de 80 %, em massa, em média, por veículo e por ano.

b)

Até 1 de Janeiro de 2015, esta percentagem deve ser aumentada para um mínimo de 95 % no que se refere à reutilização e à valorização e para um mínimo de 85 % no que se refere à reutilização e à reciclagem.

1.5

Recorde-se que a Directiva 2000/53/CE, conhecida no jargão comunitário por «End of Life Vehicles Directive (ELV)» foi aprovada após amplo debate e recebeu muitas críticas por vezes falaciosas de que há também vestígios no parecer emitido pelo CESE nessa ocasião (2). Há, além disso, que reconhecer que, embora difícil de aplicar, esta directiva imprimiu um ímpeto considerável a um processo virtuoso que, como se refere acima, já fora iniciado nos Estados-Membros, geralmente em consenso com as empresas do sector automóvel e os operadores do sector de desmantelamento.

2.   A proposta da Comissão Europeia

2.1

A proposta que o Comité foi convidado a analisar, entretanto conhecida no jargão comunitário por «Triple R», é a resposta à necessidade expressa no n.o 4 do artigo 7.o da directiva «End of life vehicles» que estabelecia requisitos para a homologação da reutilização, reciclagem e valorização dos «veículos em fim de vida».

2.2

A proposta de directiva em apreço prevê que, para satisfazer as exigências comunitárias em matéria de homologação, os veículos M1 e N1 devem ser concebidos por forma a cumprir as taxas mínimas exigidas pela directiva «End of life» no que diz respeito às suas reutilização, reciclagem e valorização.

2.3

Uma vez aprovada a directiva «Triple T», as disposições nela contidas passarão a fazer parte do sistema comunitário de homologação alterando a Directiva 70/156/CEE (3) que está na sua base.

2.4

Com efeito, a homologação comunitária de veículos completos é concedida a um dado modelo de veículo quando a entidade homologadora determina que o mesmo cumpre os requisitos de todas as directivas específicas aplicáveis enumeradas no anexo IV ou no anexo XI da Directiva 70/156/CEE. Uma vez aprovada, a directiva «Triple T» completará a lista de directivas específicas e já não será possível conceder qualquer homologação a um modelo de veículo não conforme com as disposições nela definidas.

2.5

A proposta prevê os trâmites que o fabricante deve seguir para obter da entidade competente a homologação de cada modelo de veículo. Todos eles têm por objectivo demonstrar que o veículo foi concebido e fabricado por forma a cumprir os níveis de reciclagem e valorização estabelecidos na proposta de directiva.

2.6

Para esta finalidade, o fabricante deve, através de uma avaliação preliminar, proceder ao cálculo das taxas de reciclagem e de valorização nas folhas de cálculo apensas que serão posteriormente validadas pela entidade homologadora. Ao mesmo tempo, o fabricante aconselhará a entidade competente sobre a estratégia mais recomendável para a reutilização, a reciclagem e a valorização do modelo de veículo a homologar, mediante a elaboração de um manual de montagem já previsto na directiva «End of life».

2.7

Dada a complexidade do produto automóvel que pode ser constituído por mais de 10 000 componentes, não há qualquer hipótese de conferir minuciosamente todos os cálculos relativamente a todos os veículos. Por este motivo e apenas para fins da homologação, limitar-se-ão as verificações exaustivas a um ou vários veículos, denominados veículos de referência seleccionados entre as versões de um modelo mais representativas do ponto de vista da reutilização, da reciclagem e da valorização.

2.8

É igualmente estipulada a proibição de reutilizar determinados componentes que poderiam representar um risco para a segurança e/ou para o ambiente. Estes componentes, constantes de uma lista apensa, não poderão ser reutilizados no fabrico de novos veículos.

2.9

Estão ainda previstas derrogações à proposta no caso de veículos para fins especiais (ambulâncias, autocaravanas, etc.), de veículos produzidos em pequenas séries (no máximo 500 exemplares por Estado-Membro) e de veículos comerciais ligeiros fabricados em várias fases, ou seja, nos casos em que o fabricante ainda não sabe, na fase de concepção, que tipo de carroçaria será colocada sobre o chassi.

3.   Observações na generalidade

3.1

É de aplaudir uma vez mais o gesto da Comissão ao apoiar um processo de aperfeiçoamento contínuo da gestão destes resíduos numa linha que é impossível não partilhar, já que visa reduzir ao mínimo a eliminação final dos resíduos, transformando um problema numa vantagem ambiental e, potencialmente, também económica por intermédio de processos de reutilização, reciclagem e valorização.

3.2

Importa igualmente reconhecer o papel determinante da indústria automóvel na consecução dos objectivos previstos e que vem investindo já há muitos anos em estudos e investigação orientados para a concepção de veículos recicláveis sem renunciar a outras prioridades que poderiam ser penalizadas por uma tal estratégia.

3.3

A conjugação «feliz» entre os impulsos da Comissão, o empenhamento dos fabricantes e a legislação de muitos governos tem contribuído para que hoje já se esteja muito perto dos objectivos almejados pela directiva «End of life». Para confirmá-lo, é de assinalar o relatório recentemente publicado pela ACEA que informa sobre a situação da aplicação desta última directiva nos quinze Estados-Membros e na Noruega.

4.   Observações na especialidade

4.1

É correcta a opção da Comissão, que não deve ser posta em causa, em consubstanciar a aplicação das disposições do n.o 4 do artigo 7.o da directiva «End of life» numa directiva ad hoc — agora em exame — em vez de enveredar por outras vias, que seriam, aliás, aceitáveis.

4.2

Todavia, no atinente às modalidades propostas, essa opção apresenta alguns aspectos problemáticos quer para os fabricantes de automóveis, face aos custos elevados que representa, quer para os serviços técnicos e as entidades homologadoras que terão grandes dificuldades em dar conta do controlo da grande quantidade de dados enunciados no anexo II, alguns deles nem sequer pertinentes (por exemplo, número e disposição dos cilindros, cilindrada, etc.).

4.3

Para minorar esses problemas, são indispensáveis algumas alterações que, na opinião do CESE, tornariam o processo mais eficaz e mais eficiente sem, com isso, desnaturar ou diminuir o espírito e os objectivos da proposta. Seria, sobretudo, necessário rever os seguintes artigos:

Artigo 4. o (5): O veículo de referência sujeito aos ensaios de homologação é definido como a versão de um modelo de veículo que é identificada pela entidade homologadora como sendo a mais problemática em termos de reutilização, reciclagem e valorização. Se considerarmos todos os acabamentos geralmente presentes no mesmo modelo de veículo, nem sempre é fácil identificar o veículo de referência. Para evitar mal entendidos entre as partes e perdas de tempo precioso, seria conveniente indicar explicitamente que o veículo de referência será seleccionado de comum acordo entre o fabricante e a autoridade homologadora como a versão mais problemática quanto a reutilização, reciclagem e valorização.

Artigo 5. o (3): Na sua introdução, a proposta de directiva prevê no ponto 6.2.2 um controlo físico dos protótipos do veículo a homologar a fim de verificar as declarações do fabricante e dos seus fornecedores no que diz respeito à marcação, à natureza dos materiais, às massas dos componentes, etc. Mais adiante, o n.o 3 do artigo 5.o estabelece o controlo físico da marcação dos componentes feitos de polímeros ou de elastómetros. Contudo, na realidade, as inspecções são realizadas em protótipos cujos materiais não são marcados na fase de «pré-serie». A aplicação literal da norma implicaria o fabrico de protótipos específicos destinados exclusivamente às inspecções gerando custos que se iriam juntar aos custos já muito elevados decorrentes da observância de outras disposições da directiva proposta. Uma solução menos dispendiosa seria alterar o n.o 3 do artigo 5.o estabelecendo que a entidade verifique se o fabricante se empenha ou não em respeitar as exigências em matéria de marcação dos componentes feitos de polímeros ou de elastómeros produzidos em série. Os controlos físicos poderão ser sempre efectuados antes da introdução dos veículos no mercado e deverão incidir nos veículos fabricados durante o processo de homologação e usados para os vários ensaios (travões, ruído, segurança, etc.) ou, melhor ainda, utilizados para os controlos de conformidade da produção.

Artigo 10. o (3): Este artigo determina que os procedimentos exigidos serão aplicados a partir de 36 meses após a entrada em vigor da presente directiva, quer no caso dos veículos de nova homologação (novos modelos) quer no caso dos veículos de nova matrícula (a produção na sua íntegra). Ora, este prazo está em contraste flagrante com o estabelecido em disposições análogas. Com efeito, no caso dos veículos com matrícula nova, os prazos são protelados dois a três anos para além dos prazos previstos para os veículos de nova homologação. Esta medida foi pensada para permitir que os fabricantes adaptem os veículos já em produção às novas exigências. Uma data de aplicação única criaria aos fabricantes muitos problemas tanto em termos de adequação do produto como em termos de tempo e de disponibilidade para a homologação de todos os modelos de veículos automóveis. Não se deve esquecer que, para além dos fabricantes, também participam no processo de homologação os serviços técnicos e a entidade homologadora, que poderiam igualmente ver-se em dificuldades por terem de tratar num breve prazo da homologação de um grande número de modelos de veículos. Face ao exposto e sem querer com isso perfilhar a posição daqueles que exigem que os veículos já em produção sejam excluídos do âmbito de aplicação da directiva, o CESE considera oportuno alterar o n. o 3 do artigo 10. o para prever um período mais longo (48 ou 60 meses) após a entrada em vigor da directiva (em vez dos 36 meses previstos) para a aplicação das novas disposições aos veículos de matrícula nova.

Anexo I (9): Este ponto prevê que, para efeito das verificações dos materiais e das massas dos componentes, o fabricante porá à disposição os veículos representativos de cada tipo de carroçaria e os componentes destinados a esses veículos. Também esta exigência implica custos consideráveis quer para os fabricantes quer para a entidade homologadora quando não são realmente imprescindíveis para a realização correcta do processo de homologação. Parece, por exemplo, inútil testar todos os tipos de carroçaria (três portas, cinco portas, veículos familiares, etc.) quando seria mais simples neste caso específico privilegiar a versão do veículo considerada como mais problemática em termos de reciclabilidade.

5.   Síntese e conclusões

5.1

O CESE reafirma o seu aplauso pelos esforços da Comissão Europeia nos últimos anos para garantir uma gestão correcta e inteligente dos resíduos resultantes do desmantelamento dos veículos automóveis.

5.2

Mais concretamente, a Directiva 2000/53 («End of life vehicles») harmoniza finalmente ao nível europeu a regulamentação que os Estados-Membros já tinham começado a estabelecer para a recolha e o tratamento dos veículos em fim de vida. Esta mesma directiva indica, além disso, os requisitos mínimos para a reutilização e a valorização dos resíduos e prazos respectivos.

5.3

O CESE aproveita a oportunidade para recomendar aos Estados-Membros que continuem atentos e zelem pelo controlo e a gestão correctos dos componentes e das peças sobressalentes dos veículos ainda em função (baterias, pneumáticos, etc.) que são igualmente fonte de poluição ambiental.

5.4

O CESE concorda plenamente com a lógica da proposta em apreço sobretudo quando determina que os veículos automóveis, para serem homologados, devem ser concebidos por forma a cumprirem as percentagens de reutilização, reciclagem e valorização.

5.5

As reservas do Comité incidem antes no instrumento preestabelecido, ou seja, a adopção de uma nova directiva quando se poderia obter mais facilmente e mais rapidamente o mesmo resultado de outro modo. Teria, de facto, bastado inserir no anexo X à Directiva 70/156/CEE, mencionada já como base do sistema de homologação, uma «avaliação da capacidade do fabricante por analogia com as disposições previstas para avaliar a capacidade do fabricante» de produzir veículos iguais aos homologados.

5.6

Por outro lado, conforme se recorda acima, a opção da Comissão por uma directiva é tecnicamente correcta e não pode ser aqui posta em causa, mesmo não coincidindo com a via da tão apregoada simplificação da legislação europeia.

5.7

Por este motivo, o CESE espera que a Comissão Europeia tenha em linha de conta as suas considerações e as alterações à proposta de directiva que sugeriu. Estas alterações, sem trair o espírito e os objectivos da proposta, têm todavia a vantagem de tornar todo o processo menos complexo e menos oneroso para os fabricantes, os serviços técnicos e as entidades homologadoras e para os consumidores que, no fim de contas, são os primeiros a ressentir-se de qualquer protelação dos prazos e de qualquer aumento dos custos decorrentes de uma regulamentação desnecessariamente complexa.

Bruxelas, 15 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  JO L 269 de 21.10.2000.

(2)  JO C 129 de 27.4.1998.

(3)  JO L 42 de 23.2.1970.


23.3.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 74/18


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao património cinematográfico e à competitividade das actividades industriais conexas»

COM(2004) 171 final — 2004/0066 (COD)

(2005/C 74/04)

Em 26 de Março de 2004, o Conselho decidiu, em conformidade com o disposto no artigo 157.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação emitiu parecer em 8 de Julho de 2004, com base no relatório introdutório do relator P. BRAGHIN.

Na sua 411.a reunião plenária de 15 e 16 de Setembro de 2004 (sessão de 15 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o seguinte parecer com 129 votos a favor, 3 votos contra e 6 abstenções.

1.   Introdução

1.1

O documento da Comissão articula-se em duas partes: uma comunicação sobre a prorrogação, até 30 de Junho de 2007, dos critérios específicos de compatibilidade para os auxílios à produção cinematográfica e televisiva vigentes até Junho de 2004, e uma recomendação relativa ao património cinematográfico e à competitividade das actividades industriais conexas.

1.2

A recomendação aplica-se a todos os aspectos do património cinematográfico (recolha, catalogação, criação de bases de dados, preservação, restauro, utilização para fins pedagógicos, académicos, culturais e de investigação, bem como cooperação entre os organismos responsáveis à escala europeia) e considera que o depósito legal das obras cinematográficas é um meio que permite preservar e salvaguardar o património audiovisual europeu. Solicita-se o parecer do Comité sobre este documento.

1.3

O parecer solicitado ao Comité tem apenas por objecto a recomendação. Quanto à comunicação, o CESE aplaude a abordagem da Comissão que declara estar «disposta a considerar, o mais tardar quando da próxima revisão da Comunicação, a possibilidade de se disponibilizarem montantes mais elevados, na condição de os regimes de auxílio cumprirem as condições de legalidade geral nos termos do Tratado e, em especial, na condição de se reduzirem os obstáculos à livre circulação de trabalhadores, mercadorias e serviços na UE neste sector». O CESE reserva-se a possibilidade de analisar os resultados do estudo sobre os efeitos dos actuais regimes de auxílios do Estado neste sector, para avaliar o respectivo impacto, tanto económico como cultural, e verificar assim se os actuais mecanismos são eficazes ou se, pelo contrário, será oportuno procurar mecanismos e instrumentos diferentes.

2.   Observações na generalidade

2.1

O CESE concorda com a afirmação de que devem ser melhoradas as condições necessárias para a competitividade das actividades industriais relacionadas com o património cinematográfico, especialmente no que se refere à utilização das tecnologias como a digitalização, motivo pelo qual foi proposto o artigo 157.o do Tratado CE como base jurídica para a recomendação.

2.1.1

A opção por uma recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho é partilhada pelo CESE, na medida em que permite a consecução dos objectivos de uma cooperação eficaz entre os Estados-Membros e o alargamento do debate político sobre um tema de tão grande importância cultural.

2.1.2

Além disso, o CESE deseja que a Comissão efectue uma análise aprofundada das informações solicitadas aos Estados-Membros de dois em dois anos, sobre as medidas adoptadas em resposta à presente recomendação, e que avalie que medidas, inclusivamente jurídicas, são oportunas para conseguir a cooperação e a coordenação necessárias para efeitos de uma protecção eficaz do património audiovisual e da sua valorização económica.

2.2

O CESE aprova o princípio de que a cessão das obras cinematográficas aos organismos responsáveis pelo seu arquivo não implica a cessão dos direitos de autor e dos direitos conexos. Aliás, os Estados-Membros podem prever, em conformidade com a Directiva 2001/29/CE (1), uma excepção ou limitação no que se refere a actos específicos de reprodução praticados por bibliotecas ou arquivos acessíveis ao público, que não tenham por objectivo a obtenção de uma vantagem económica ou comercial, directa ou indirecta. O CESE apoia igualmente a recomendação de permitir a reprodução de obras cinematográficas depositadas para efeitos de restauro (ponto 9 da recomendação).

2.3

As problemáticas jurídicas conexas aos direitos de autor e aos actos de reprodução específicos efectuados por bibliotecas ou arquivos acessíveis ao público, bem como à reprodução para efeitos de restauro, devem ser examinadas e resolvidas com urgência: o CESE sugere que seja confiado um mandato explícito a um grupo de alto nível, eventualmente através do desenvolvimento neste sentido da rede de peritos nacionais já consultados.

2.4

O CESE pretende a redução do período em que deverá ser feito o depósito depois da disponibilização ao público, e que se prevejam mecanismos para favorecer igualmente o depósito de obras cinematográficas e audivisuais, que constituem o património audivisual nacional, anteriores à obrigação de depósito estabelecida na recomendação em apreço.

2.5

O CESE considera que as obras cinematográficas e audivisuais constituem um produto industrial e ao mesmo tempo cultural, que deve ser protegido como património comum europeu, promovido como factor de pluralismo e valorizado no plano económico. Segundo esta lógica, também é desejável que determinados tipos de produções televisivas dos emissores nacionais sejam sujeitas a depósito obrigatório e não voluntário, na medida em que se trata de expressões de uma cultura em desenvolvimento dinâmico, muito mais relacionada com a actualidade sociocultural do que uma obra cinematográfica. Embora esteja consciente de que os emissores não se manifestaram a favor deste depósito obrigatório, o CESE convida a Comissão a aprofundar este aspecto mediante estudos sectoriais, para avaliar se pelo menos os programas de televisão mais importantes no plano sociocultural deverão ou não ser sujeitos ao depósito obrigatório enquanto património cultural audiovisual.

2.6

O CESE concorda com a afirmação de que a indústria cinematográfica tem um grande potencial de criação de emprego, inclusivamente no âmbito da protecção do património cinematográfico, mas isto é mais válido ainda para o sector audiovisual em sentido lato, tendo em conta a pluralidade dos formatos e dos meios de transmissão e as potencialidades oferecidas pela tecnologia digital. O CESE deseja, por conseguinte, que todas as formas de apoio sejam alargadas ao conjunto das obras audivisuais, que sejam mais orientadas para a competitividade das várias vertentes do sector e que as perspectivas de formação não se limitem nem se concentrem prioritariamente no sector cinematográfico, abrangendo antes o sector audivisual na sua acepção mais lata.

2.7

O CESE concorda com a necessidade de um sistema de depósito voluntário dos formatos acessórios e publicitários, dos materiais constituídos por imagens em movimento e das obras cinematográficas do passado, na medida em que constituem uma componente importante do património audiovisual europeu. O CESE sublinha a necessidade de estabelecer incentivos idóneos para esta recolha, e de dotar os organismos responsáveis com os fundos adequados para poderem fornecer, num prazo razoavelmente breve, um testemunho sistemático da riqueza das identidades culturais e da diversidade dos povos europeus.

3.   Conclusões

3.1

Para atingir os principais objectivos enunciados, o CESE considera fundamental que a Comissão desenvolva a partir de agora um papel dinâmico de acordo com as intenções expressas no documento em apreço, e em particular que:

defina os procedimentos de depósito que permitam a interconexão e a interoperabilidade dos sistemas nacionais, promovendo normas europeias de catalogação,

adopte as condições prévias de natureza técnica e jurídica que permitam depósitos em linha cabalmente protegidos e actualizados em tempo real e que possam estar futuramente na origem de uma base de dados «europeia»,

proponha um modelo de contrato europeu entre os organismos designados, os depositantes e, eventualmente, os titulares dos direitos de autor, em conformidade com a Directiva 2001/29/CE, que facilite o restauro das obras, a sua ulterior disponibilização aos investigadores, e também para efeitos pedagógicos,

identifique, em cooperação com os organismos interessados, os critérios para tornar as obras depositadas acessíveis ao público,

apoie a cooperação entre os organismos nacionais e/ou regionais, inclusivamente através de estruturas próprias e, se necessário, de financiamentos específicos,

apoie a actividade de avaliação comparativa (benchmarking) com base nas melhores práticas, e verifique os progressos realizados através de relatórios periódicos.

3.2

Por outro lado, o CESE considera que a Comissão, sempre no respeito pelo princípio da subsidiariedade, deve ter um papel activo de apoio ao sector, com recursos financeiros e humanos adequados, para atingir os seguintes objectivos:

a compilação de uma filmografia audiovisual europeia e a produção em comum de projectos pedagógicos e de investigação, pois uma cooperação numa base voluntária dificilmente poderá dar resultados satisfatórios se tivermos em conta a desigualdade de recursos e de tradições culturais dos 25 Estados-Membros,

o depósito das obras, mesmo antigas, que fazem parte do espólio dos novos Estados-Membros: estes têm de facto uma importante produção cinematográfica que é testemunho da história, da cultura, dos estilos de vida e dos usos e costumes que correm o risco de desaparecer, na medida em que estes países têm escassos recursos económicos para o efectuar,

a constituição de um estrutura apropriada para a valorização dos fundos existentes ao nível dos organismos nacionais e/o regionais, favorecendo a respectiva difusão ao nível europeu e internacional através dos formatos multimédia mais recentes (por exemplo, DVD com material de arquivo, com legendas em várias línguas da UE e que ofereçam assim oportunidades de rendimento económico, mesmo para obras do passado), especialmente para obras relativas a assuntos e a políticas comunitárias (por exemplo, a protecção dos menores ou a dignidade da mulher) ou a tradições específicas (por exemplo, filmes de animação, filmes para crianças e documentários),

a valorização das obras apresentadas nos vários festivais temáticos ao nível regional ou local, para favorecer a produção independente e a dos realizadores que estão à margem dos circuitos comerciais, se necessário através do depósito obrigatório,

o incentivo à formação profissional no âmbito da preservação e do restauro, na medida em que estes domínios implicam qualificações e técnicas novas, apoiando-a com fundos comunitários adequados, de preferência no quadro do programa MEDIA Formação que está em fase de revisão.

3.3

O CESE anseia igualmente por que, no decurso dos debates já iniciados sobre o novo programa MEDIA Formação, se tenha mais em conta os processos de formação ligados às novas tecnologias e às novas necessidades em termos de recolha, catalogação, preservação e restauro de obras cinematográficas e televisivas e, em geral, de materiais com imagens em movimento. É particularmente oportuno alargar a formação ao domínio da utilização e do conhecimento das novas técnicas e métodos de arquivo, da gestão das bases de dados e dos métodos normalizados de salvaguarda de obras em formato digital de elevada qualidade, através de processos de actualização dos operadores para que o trabalho efectuado possa ser acessível ao público em geral e aos investigadores e docentes em particular.

Bruxelas, 15 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Directiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação; JO n.o L 167 de 22.6.2001.


23.3.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 74/21


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Conselho relativa ao sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado (revisão)»

COM(2004) 246 final — 2004/0079 (CNS)

(2005/C 74/05)

Em 30 de Abril de 2004, o Conselho da União Europeia decidiu, de harmonia com o disposto no artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Em 13 de Julho de 2004, a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, incumbida de preparar os correspondentes trabalhos, emitiuo parecer com base no projecto do relator, U. BURANI.

Na 411.a reunião plenária de 15 e 16 de Setembro (sessão de 15 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 147 votos a favor, 6 votos contra e 10 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

A proposta de directiva em apreço (1) afasta-se do normal trabalho de codificação da legislação comunitária. A Comissão observou que as disposições relativas ao IVA — originalmente constantes da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho e sucessivamente alterada em inúmeras ocasiões — necessitavam de uma revisão radical. Com efeito, ao longo dos anos, a matéria foi por diversas vezes revista, corrigida e ampliada, com o resultado inevitável de ter incorporado repetições, disposições pouco claras e sobreposições. Havia assim que introduzir alterações que tornassem o texto mais claro e compreensível, sem todavia alterar o significado e o alcance das disposições: uma tarefa que vai bem mais além que uma simples codificação.

1.2

Além disso, sempre na mesma perspectiva, foram introduzidas outras modificações, para respeitar os princípios de boa qualidade da legislação estabelecidos entre o Conselho, o Parlamento Europeu e a Comissão. O novo texto é submetido à aprovação do Conselho e do Parlamento Europeu: desde que as alterações sejam essencialmente formais, não se trata de uma codificação, mas sim de uma «reorganização» técnica, que permite modificar e codificar os actos compilando-os num texto legislativo único, em conformidade com o Acordo Interinstitucional de 2001 (2).

1.3

O texto da proposta de directiva que resulta de considerável trabalho da Comissão substitui, revogando-a, a Sexta Directiva IVA: cada artigo foi individualmente revisto para ficar menos longo e complexo, o que teve como resultado que os artigos passaram de 53 a 402; o texto é ainda acompanhado de um documento que torna a consulta mais rápida e fácil: uma novidade certamente bem recebida.

2.   Observações do CESE

2.1

Tratando-se, sem margem para dúvidas, de uma reorganização e não de uma nova directiva, as observações do CESE poderiam limitar-se a tomar conhecimento do bom trabalho efectuado pela Comissão e a congratular-se com o resultado: os agentes e as administrações não poderão deixar de constatar vantagens em termo de maior celeridade de consulta e de menores incertezas de interpretação. Por outro lado, o relator não poderá deixar de aceitar a declaração da Comissão, segundo a qual o novo texto adere no seu âmbito aos textos actualmente em vigor: seria impossível um controlo pormenorizado que, por outro lado, já foi efectuado pelos peritos nacionais e pelos agentes, oportunamente consultados.

2.2

No entanto, um exame menos superficial permite aduzir algumas considerações de fundo em matéria de política do IVA e, mais em geral, sobre uma política fiscal que tem como objectivo declarado a harmonização das condições de funcionamento do mercado interno. Neste contexto, a proposta de directiva diz (5.o«considerando»): que «um sistema de IVA atinge o maior grau de simplicidade e de neutralidade se o imposto for cobrado da forma mais geral possível … Por conseguinte, é do interesse do mercado comum e dos Estados-Membros adoptar um sistema comum … retalho.»

2.3

Todavia, nos dois «considerandos» seguintes, a Comissão introduz inicialmente uma nota de cautela: é necessário «proceder por fases, uma vez que a harmonização dos impostos sobre o volume de negócios implicará, nos Estados-Membros, modificações das suas estruturas fiscais»; declara assim que, embora as taxas de tributação e as isenções não estejam «completamente» harmonizadas, o principal objectivo do IVA (harmonizado) é possibilitar uma neutralidade concorrencial em cada país.

2.4

O Comité frisa que estas considerações são recuperadas do texto original da Sexta Directiva: se após quase quarenta anos se sente a necessidade de as repetir, há então que reconhecer que ainda nos encontramos no ponto de partida, ou quase. A harmonização parece marcar passo e outros sinais, dos quais se fala nos pontos seguintes, não incentivam o optimismo.

2.5

Deve-se mais uma vez recordar que o regime do IVA, instituído pela Sexta Directiva, e que ainda continua, é «transitório», e não se entrevêem sinais que façam surgir uma vontade de mudança determinada para um regime «definitivo»: isto parece ser um sinal evidente de uma incerteza quanto à bondade do sistema, que o Comité comentou, com propostas concretas, no seu parecer sobre «Lugar da prestação dos serviços» (3).

2.6

Outras considerações têm origem no sistema de derrogações, que – se efectivamente necessárias – deveriam ser sempre temporárias, numa óptica de mercado único. As últimas, no tempo, foram concedidas aos dez novos Estados-Membros, algumas a título temporário, outras sem indicação de termo. Mas outras derrogações, concedidas aos Estados da«segunda vaga» (Áustria, Grécia, Finlândia,, Portugal, Espanha e Suécia) ainda continuam em vigor. Impõe-se dizer, a este respeito, que só algumas surgiam nas directivas que alteravam a Sexta Directiva; a maior parte delas estavam «escondidas» nos Actos de Adesão. Um dos méritos da nova proposta de directiva é o de ter exposto todas as derrogações, concedidas a qualquer título.

2.7

Não parece que exista vontade de examinar todas as derrogações – inclusive as concedidas há muito — com o objectivo de as suprimir. Por outro lado, mesmo os Estados «fundadores» não parecem ter interesse em levantar a questão: a seu tempo, também eles beneficiaram de derrogações que têm todo o cuidado em evitar colocar em questão (pelo menos enquanto perdurar o «regime transitório»); entre outras, a famosa «taxa zero» concedida originalmente a dois países. Longe de ser suprimida, a «taxa zero»«foi alargada a diversos novos Estados-Membros».

2.8

Na verdade, nem todas as derrogações são injustificadas. Algumas com carácter permanente respeitam a territórios ultramarinos, ilhas, regiões ultraperiféricas que, na altura da tomada de decisões, apresentavam características de subdesenvolvimento. Todavia, dado o tempo decorrido, seria oportuno reexaminar a lista das isenções territoriais, para verificar se permanecem, ou não, os pressupostos que na origem as tinham justificado.

2.9

Outras derrogações de algum relevo respeitam às pequenas empresas: dezasseis Estados-Membros (os novos e os da «segunda vaga») estão autorizados a conceder a isenção de IVA às pequenas empresas, mesmo quando o volume de negócios é superior ao limiar previsto na Sexta Directiva. O Comité não pode deixar de manifestar a sua perplexidade: se para os dez novos Estados-Membros a isenção se pode de alguma forma justificar, já não se compreende porque é que deve permanecer em vigor para os outros, doze anos passados desde a respectiva adesão.

2.10

O Comité considera que a isenção de IVA às empresas referidas no ponto anterior pode ser um caso de distorção da concorrência, mesmo que provavelmente limitada no seu montante global. Os Estados-Membros e a Comissão deverão aprofundar este aspecto.

3.   Conclusões

3.1

O Comité felicita a Comissão pelo trabalho efectuado, com prudência e rigor mas, sobretudo, com transparência; sem este último critério não teria sido fácil ter consciência de quanto as regras — em absoluto válidas para todos — sofrem derrogações, isenções, «distinções». É evidente que nem todos os desvios a um princípio são injustificados. Todavia, parece necessário que os Estados-Membros metam mãos à obra para renegociar — e se possível suprimir — aquelas que deixaram de ter motivo para permanecer em vigor.

3.2

O Comité não considera que essa vontade seja evidente; pelo contrário, já um Estado-Membro de entre os maiores manifestou uma «reserva geral» que até poderia colocar em causa mesmo a aprovação da proposta de directiva da Comissão. Se se considerar o passado, as perspectivas não parecem ser cor-de-rosa: uma Comunicação da Comissão, de 1996, que incluía um programa de trabalho e uma proposta de harmonização das taxas, jaz no Conselho e nunca foi discutida; a Comunicação de 2000, sobre uma nova estratégia IVA, não parecer ter tido grande êxito, a julgar pelos factos.

3.3

O CESE não tenciona, com o presente documento, manifestar um parecer negativo sobre a política dos Estados-Membros em matéria de IVA; tem consciência do facto de ainda demasiados factores internos, económicos e políticos, condicionarem as suas decisões. Todavia, manifesta o desejo de que, não daqui a muito tempo, toda a matéria seja reexaminada, para instituir um regime definitivo e atenuar, se não mesmo suprimir, um dos mais visíveis obstáculos ainda existentes para a realização de um mercado interno inspirado em regras comuns.

Bruxelas, 15 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  COM(2004) 246 final — 2004/0079 (CNS)

(2)  JO C 77 de 28.3.2002.

(3)  JO C 117 de 30 de Abril de 2004.


23.3.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 74/23


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Para uma melhor governação económica da UE»

(2005/C 74/06)

Em 29 de Janeiro de 2004, o Comité Económico e Social decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar parecer para «Para uma melhor governação económica da UE».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social emitiu parecer em 13 de Julho de 2004, sendo relator Joost van IERSEL.

Na 411.a reunião plenária de 15 e 16 de Setembro de 2004 (sessão de 15 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 130 votos a favor, 3 votos contra e 7 abstenções, o seguinte parecer.

RESUMO

A União Europeia está a entrar numa nova era. 2004 é o ano da adesão de dez novos Estados-Membros, da instalação de uma nova Comissão, da eleição de um novo Parlamento Europeu e, assim se espera, também o ano da Constituição. Neste ano está igualmente a ser preparada a revisão intercalar da estratégia de Lisboa para 2005. As análises da Comissão, designadamente a realizada no âmbito das Orientações Gerais para a Política Económica, põem a nu várias insuficiências no avanço da integração. Estas devem-se, por um lado, à fraca conjuntura económica mas, por outro lado, também à falta de disposição dos Estados-Membros de cumprirem escrupulosamente os objectivos acordados e os compromissos celebrados entre si. Impulsionar o crescimento económico é extremamente importante, mas não basta, também é preciso insuflar nova vida à estratégia de Lisboa. No presente parecer dá-se particular ênfase à aplicação prática desta concepção estratégica, absolutamente imprescindível para a credibilidade e a combatividade da União Europeia. É urgente dispor de um quadro institucional que inspire confiança e não perca de vista a repartição correcta das tarefas dentro da União – quem é responsável por quê e em que momento – e tenha em mira a concretização nos Estados-Membros dos objectivos e das orientações emanados do Conselho Europeu e dos conselhos especializados. A estratégia de Lisboa de «novo estilo» poderia inspirar-se em exemplos de sucesso como a «Europa 92» e a União Económica e Monetária. Neste documento é defendido o método comunitário com toda a veemência. É imperiosa uma abordagem integrada com base num plano por etapas fruto de concertação prévia.

1.   Introdução

1.1

A União Europeia está a atravessar uma fase crítica. São gigantescos os desafios que tem diante de si: o alargamento, a necessidade de impulsionar o crescimento económico e a competitividade, o projecto de Constituição e uma resposta cabal à crescente falta de confiança na UE. Estas difíceis incumbências requerem uma política certeira e coesa e uma aplicação adequada. O ano passado, por ocasião da publicação das Orientações Gerais de Política Económica para 2003-2005, o CESE elaborou dois pareceres sobre esta matéria (1).

1.2

Mas é necessária uma reflexão mais profunda. Uma política e uma integração eficazes são impensáveis sem um quadro constitucional transparente e credível capaz de assegurar o cumprimento dos compromissos europeus.

1.3

A análise da Comissão, principalmente a da sua comunicação de 21 de Janeiro de 2004 (2) e da Actualização em 2004 de 7 de Abril passado (3), só confirma as tendências de 2003. O mesmo se pode dizer da premência das suas recomendações. É justamente por este motivo que o CESE se refere explicitamente no presente parecer à necessidade de condições-quadro institucionais e administrativas, ou seja, de uma boa governação. A governação é o tema central da UE a 25 (4).

1.4

E são muitos os que partilham esta apreensão com o Comité. As presidências sucessivas – Irlanda e Países Baixos – na esteira da Comissão e dos representantes do mundo empresarial e das organizações cívicas, colocam particular ênfase na acção concreta e na aplicação. Declarações solenes sem iniciativas que lhes dêem seguimento têm um efeito contraproducente. A execução é, pois, um objectivo fundamental (5).

1.5

As Orientações Gerais de Política Económica analisam as políticas macroeconómica e orçamental dos Estados-Membros, a política de emprego e a evolução do mercado interno. Ilustram bem tanto as diversas responsabilidades da UE e dos governos nacionais como as diferentes realidades nos Estados-Membros.

1.6

O crescimento económico lento e o não respeito pelos Estados-Membros dos compromissos assumidos pelo Conselho Europeu criaram a situação seguinte:

política orçamental: deterioração gradual da disciplina;

atraso no reforço da competitividade pela economia do conhecimento;

investimentos insuficientes para aumentar a produtividade no sector das TIC e nas áreas do conhecimento e da formação;

clima de investimento inseguro;

deslocação de certos investimentos para regiões fora do território da UE;

pressão sobre o emprego;

política do mercado laboral: reformas e adaptações insuficientes.

1.7

Entretanto, o panorama económico da Europa tornou-se um pouco mais favorável, mas a sua revitalização continua periclitante. Os EUA apresentam um crescimento económico superior. Por outro lado, surpreendentemente, a China e a Índia têm vindo a avançar cada vez mais para o primeiro plano.

1.8

Há uma globalização dos fluxos financeiros e dos investimentos, mas nesta globalização são patentes grandes assimetrias socioeconómicas e políticas entre as várias regiões do planeta. É esta imagem global que deverá servir à Europa de quadro de referência.

1.9

No ano em curso será necessário que a Comissão e o Conselho reflictam mais a fundo sobre a abordagem a adoptar e os instrumentos a utilizar, porquanto:

A UE está a entrar numa fase inteiramente nova da sua história: dez novos Estados-Membros, um novo PE, uma nova Comissão, adaptação gradual da estrutura da Comissão às novas circunstâncias, tudo isto com a Constituição ainda por aprovar;

As implicações do alargamento são importantes não só no plano quantitativo como quantitativo; A heterogeneidade na União aumentará consideravelmente, tornando-se significativamente mais diversa;

A evolução mundial dos mercados de bens e de serviços e o nervosismo permanente nos mercados financeiros compelem os Estados-Membros a orientar a sua política sempre pelos mesmos princípios e à integração efectiva.

2.   A análise de 2004

2.1

As Orientações Gerais de Política Económica para 2003-2005 têm por alvo a abordagem integrada:

da política macroeconómica orientada para o crescimento e a estabilidade;

do reforço das potencialidades de crescimento na Europa mediante reformas económicas;

da necessidade de dar maior ênfase ao carácter sustentável do crescimento.

2.2

O Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) criou ao longo de vários anos uma base sólida e gerou um sentimento de confiança entre os Estados-Membros. Mas um ciclo económico menos propício acabou por corroer os alicerces da disciplina acordada. As regras processuais são suficientemente claras, porém a ausência de uma verdadeira vinculação aos compromissos assumidos continua a ser um problema. Tal não significa que uma grande parte dos Estados-Membros (dentro e fora) da zona euro não continuem a esforçar-se por respeitar a disciplina orçamental requerida. Os Estados escandinavos, por exemplo, têm sido exemplares.

2.3

As divergências de opinião em torno dos procedimentos subjacentes ao PEC levaram a Comissão a instaurar ao Conselho um processo no Tribunal Europeu de Justiça (6). A Comissão considera, com efeito, que o Conselho não respeitou devidamente as suas competências. Uma discrepância tão profunda de modo algum propicia o debate entre os parceiros no Conselho ECOFIN.

2.4

A Comissão constata que se tornou bastante exígua a margem de manobra dos governos. Em 2003, apenas cinco dos Estados-Membros lograram alcançar um equilíbrio ou um excedente orçamental, apresentando outros, em contrapartida, um défice orçamental persistente e ascendente. Infere-se do relatório da Comissão de 7 de Abril último, a Actualização de 2004, que a situação orçamental em vários Estados-Membros se deteriorou muito velozmente, tendo redundado em défices públicos muito elevados. Estes obrigam, por seu turno, à reestruturação das dívidas em detrimento dos investimentos no crescimento e no emprego.

2.5

A Comissão endereça, por este motivo, recomendações especiais aos Estados-Membros que se encontram nesta situação. Não obstante a evolução conjuntural nos Estados-Membros ser semelhante, as suas metas orçamentais são muito divergentes. Este facto suscita igualmente uma série de recomendações.

2.6

Fica-se ainda com a impressão de que a Comissão não dispõe de instrumentos eficazes para avaliar de modo satisfatório a qualidade das despesas públicas nos Estados-Membros, o que dificulta bastante a sua aferição com o quadro orçamental acordado.

2.7

A segurança social, o mercado de trabalho, o mercado interno e o processo de Lisboa são os temas centrais do relatório anual. Dele faz parte um elenco de objectivos mais ou menos ambiciosos, cuja realização depende, só parcialmente, de decisões comunitárias. Uma boa parte das áreas políticas é reservada aos Estados-Membros. São, além disso, abordadas questões sobre as quais o poder central apenas exerce uma influência muito marginal. É, por exemplo, o caso do desenvolvimento do «conhecimento».

2.8

As competências comunitárias estão concentradas no mercado interno. O mercado de trabalho, a segurança social, o regime de pensões, a política orçamental, a I & D, a fiscalidade e as infra-estruturas são geralmente da responsabilidade dos Estados-Membros, mesmo que, em certos casos, «Bruxelas» coloque algumas restrições à sua liberdade de decisão. Mas é verdade também que nestes casos a Comissão opta normalmente por recomendações e orientações gerais, mas estas não são seguidas da mesma maneira em todos os países.

2.9

Os mercados de trabalho são compostos por diversos segmentos pouco permeáveis entre si, o que dificulta a circulação dos trabalhadores. Tomando este facto como ponto de partida, a Comissão constata que, embora tenham sido criados nos últimos anos milhões de empregos, o desemprego não cessou de crescer. Por outro lado, continua reduzida a taxa de participação dos trabalhadores mais idosos e persistem os obstáculos ao acesso das mulheres ao mercado de trabalho. A inactividade tem tido também, como é óbvio, consequências muito danosas para os orçamentos nacionais.

2.10

Em 2005, a taxa de emprego elevar-se-á a 64,5 % em toda a União Europeia, mas com grandes variações entre os diversos Estados-Membros. O emprego tem um desenvolvimento mais positivo nos países onde os parceiros sociais são consensuais relativamente aos métodos de flexibilização do mercado laboral e do tempo de trabalho. Na opinião da Comissão, a possibilidade de alcançar até 2010 o objectivo de 70 % de emprego dependerá essencialmente da realização de novas reformas no mercado de trabalho (7). Daí que defenda vivamente a concretização das recomendações da Task Force Kok (8).

2.11

A par das adaptações da segurança social, a Comissão é a favor de uma maior diferenciação salarial, de uma maior flexibilidade do mercado laboral, desde que devidamente salvaguardada a protecção dos trabalhadores, e de uma maior mobilidade. Face à heterogeneidade dos percursos legislativos e dos resultados do diálogo socioeconómico, existem discrepâncias consideráveis entre os Estados-Membros. Este fenómeno manifesta-se, designadamente, no tempo de trabalho efectivo e na produtividade, o que explica, em parte, as diferenças no crescimento entre a UE e os EUA.

2.12

A Comissão observa que persiste a tendência, aliás já manifesta desde 1995, de um fraco crescimento da produtividade. Também aqui são consideráveis as diferenças entre os Estados-Membros. Na Europa, a Finlândia, a Suécia e a Irlanda acompanham os Estados Unidos a par e passo. O não aumento da produtividade é, designadamente, fruto das disparidades na introdução das TIC e da inovação nas empresas em geral. Na Europa tarda-se mais a fazer novos investimentos no aumento da produtividade. Esta atitude é sobretudo perceptível na falta de investimentos nos chamados «novos sectores de alta tecnologia».

2.13

A evolução demográfica e o envelhecimento da população causam cada vez mais preocupações quer pela pressão que exercem sobre os orçamentos quer pelo seu efeito (asfixiante) no crescimento. Alguns países iniciaram percursos promissores na reforma dos regimes de pensões ao elevarem efectivamente a idade de aposentação.

2.14

A concorrência nos mercados de bens e de serviços é insuficiente. As medidas de protecção nacional continuam a existir. O mercado interno segue o seu curso irrefreável. Foram, entretanto, apresentadas novas propostas ao nível da política da concorrência. Os trabalhos legislativos do sector dos serviços financeiros progridem consideravelmente: 36 das 42 medidas previstas foram adoptadas definitivamente. Também melhoraram as medidas fiscais para investimentos privados.

2.15

Verifica-se, por outro lado, que é cada vez maior o desleixo na transposição das directivas comunitárias para a legislação nacional. Os prazos não são devidamente respeitados e a «tradução» das directivas em legislação adopta amiúde um carácter nacional. Tal acontece, designadamente, quando os Estados-Membros, tendo em mira um compromisso no Conselho, fazem concessões em Bruxelas de que se vêm a arrepender mais tarde. E é cada vez mais difícil controlar este processo.

2.16

No conhecimento e na inovação são, sem sombra de dúvida, visíveis alguns sinais positivos, mas dadas as insuficiências ao nível do capital de risco, da I & D, das patentes e das TIC, os resultados continuam muito aquém das expectativas. O objectivo estabelecido na Cimeira de Barcelona de canalizar pelo menos 3 % do PIB para a I & D continua a ser letra morta na maioria dos Estados-Membros. Os escandinavos parecem ser os mais bem sucedidos. Para garantir a exequibilidade do objectivo de 3 %, foi prevista uma divisão proporcional de 1/3 para 2/3 entre os governos e as empresas. Mas dá a impressão de que, na maioria dos casos, nem os governos nem as empresas têm conseguido alcançar este objectivo.

2.17

Mesmo num período de estagnação económica, a sustentabilidade da economia continua a exigir atenção e legislação adequadas. A sustentabilidade tem várias facetas, o sector da energia é prova disso. A Comissão realça acertadamente os aspectos ambientais e refere, a propósito, a situação desfavorável dos novos Estados-Membros. Confronta, além disso, os novos desenvolvimentos com os compromissos internacionais. No entanto, a energia pode representar uma ameaça para o crescimento sustentável em consequência do aumento do preço do petróleo face à procura (China) e à dependência política das fontes de energia.

2.18

Para restaurar a confiança nas empresas e nos mercados bolsistas após os recentes escândalos financeiros numa série de empresas são apresentadas propostas para uma variante europeia ao governo das sociedades (corporate governance).

2.19

Este primeiro relatório intercalar dá-nos, num contexto plurianual (2003-2006), uma imagem que não deixa dúvidas. Na sua conclusão final, a Comissão constata alguns progressos no mercado de trabalho, na política de concorrência, no ambiente empresarial, nas novas tecnologias, na educação e nas pensões. A situação já é menos optimista no que toca à integração dos mercados, à I & D e aos ajustamentos das políticas social e ambiental. A rápida deterioração da situação orçamental de vários Estados-Membros e a ausência de uma vontade política para invertê-la é classificada pela Comissão como extremamente inquietante. Conclui afirmando que, se o ritmo das reformas não for acelerado é pura utopia pensar na hipótese de alcançar até 2006 os objectivos almejados. Esta situação também tornará praticamente impossível a conclusão do processo de Lisboa prevista para 2010.

2.20

Na Actualização de 2004, a Comissão alega que os novos Estados-Membros se debatem com problemas semelhantes aos da UE a 15 no atinente à situação orçamental, ao endividamento e ao emprego. É certo que os Dez têm feito até à data progressos dignos de aplauso que se traduzem, por exemplo, numa taxa de crescimento económico mais elevado do que na UE a 15, mas isso não quer dizer que não persistam grandes assimetrias ao nível do desenvolvimento. Ao mesmo tempo, a Comissão refere que é preciso ainda colmatar o fosso considerável entre os Dez e a UE a 15.

2.21

Mas para o CESE, quando se fala de «problemas semelhantes», tal não significa que os novos Estados-Membros apresentem o mesmo perfil da UE a 15. Uma comparação com os chamados «países da coesão» é válida só em parte. Os novos Estados-Membros são «mercados emergentes». O índice de desemprego em alguns desses países, e sobretudo em certas regiões, é muito elevado. A reestruturação industrial avança sem cessar gerando uma elevada percentagem de desemprego de fricção. É igualmente patente uma dependência excessiva dos investimentos estrangeiros.

2.22

O alinhamento da legislação e das regras económicas e sociais pelo nível extremamente avançado da UE a 15 poderá causar algumas convulsões nesses países. A estabilidade, imprescindível para manter o nível ascendente dos investimentos nacionais e estrangeiros, pressupõe um controlo financeiro e monetário eficaz e uma certa previsibilidade dos percursos legislativos. Mas a criação de um tal clima de estabilidade não é um automatismo e merece, por isso, a máxima prioridade. O CESE concorda com a Comissão quando diz que, para o desenvolvimento estável neste dez países, é conveniente estabelecer para cada um deles um calendário para a realização dos objectivos económicos e financeiros.

2.23

De facto, na UE está-se cada vez mais ciente de que esta situação deve ser resolvida com a maior urgência. As orientações comunitárias afloram com certa regularidade nas conclusões da Comissão, dos conselhos especializados e do Conselho Europeu. São de recente data as cartas de chefes do governo expressando as mesmas preocupações (9). Em princípio, tudo aponta para uma via comum, só que não se sabe exactamente quem será responsável pela gestão e a aplicação num dado momento.

3.   Mercado interno, emprego e processo de Lisboa

3.1

No atinente ao mercado interno, a Comissão defende para o próximo ano uma acção urgente em duas frentes (10):

por um lado, é preciso redobrar esforços em domínios fundamentais tais como a patente comunitária, a directiva relativa à aplicação dos direitos de propriedade intelectual e o Plano de Acção dos Serviços Financeiros, absolutamente imprescindíveis para o crescimento e o emprego; um novo adiamento do problema poderia ter um efeito dominó;

por outro lado, os Estados-Membros são chamados a garantir uma «melhor governação» (better governance); para tal, terão de colaborar entre si em sistema de parceria a fim de realizarem todas as tarefas que lhes incumbem.

3.2

Ambas as medidas são necessárias para realizar os objectivos de «Lisboa» e para consolidar os alicerces de um mercado interno «alargado». O aumento do comércio intracomunitário e da concorrência obriga as empresas a uma maior eficácia e a uma maior produtividade que, numa zona de salários relativamente elevados como é a UE, são a chave para a competitividade e a prosperidade a longo prazo.

3.3

Na prática, o comércio intracomunitário tem regredido nos últimos tempos e ao mesmo tempo os preços tendem a divergir mais do que a convergir. O saldo dos investimentos comunitários no mundo e dos investimentos estrangeiros na União Europeia é negativo para esta.

3.4

A Comissão desenha o panorama actual do mercado interno do seguinte modo. Encontram-se em preparação as chamadas directivas de «nova abordagem». Ainda não existe um verdadeiro mercado de serviços, embora estes representem mais de 50 % do PIB europeu e sejam responsáveis por 60 % dos empregos. Daí a prioridade da adopção da directiva recentemente apresentada sobre a livre circulação dos serviços. Está em curso a liberalização das indústrias de rede (energia, transportes e telecomunicações), mas são bem conhecidos os problemas e os obstáculos que tem vindo a enfrentar. A falta de harmonização fiscal continua a causar problemas ao mercado interno. Mas a eliminação das distorções fiscais está no bom caminho. O mesmo sucede com o Plano de Acção dos Serviços Financeiros. A não observância pelos governos das regras estabelecidas para os contratos públicos provoca uma alta de preços muito considerável. Este assunto voltou à ordem do dia. Face ao envelhecimento demográfico, a Comissão tenciona promover o acesso internacional aos serviços de saúde. A conclusão do processo em torno da patente europeia tem-se vindo a arrastar indefinidamente e o mesmo continua pendente.

3.5

A simplificação da legislação baseia-se no Plano de Acção para uma Melhor Regulamentação. Mas é longo o caminho a percorrer, visto haver Estados que não procedem às avaliações de impacto acordadas.

3.6

A execução é um problema muito sério. O esteio do mercado interno é a confiança que importa consolidar sobretudo no actual contexto do alargamento. A nova fase da União Europeia está bem caracterizada na seguinte asserção: «Mas o verdadeiro sucesso de um mercado interno composto por vinte e oito países exigirá uma atitude diferente e relações de trabalho diferentes. Os Estados-Membros devem assumir plenamente a propriedade do seu mercado interno e trabalhar em parceria com os outros Estados-Membros e com a Comissão para que este funcione na prática.»  (11)

3.7

A estratégia para o emprego é também de grande actualidade, principalmente ao nível nacional. Mas também ao nível europeu os sistemas sociais estão na ordem do dia, em primeiro lugar, porque a política orçamental nacional terá de enquadrar-se nos contornos europeus predefinidos e, em segundo lugar, em virtude da sua relação com as reformas do mercado de trabalho e com o envelhecimento demográfico.

3.8

A maneira de abordar as recomendações da Task Force Kok e a sua concretização são condicionadas pelo processo de decisão ao nível nacional. Estas são cruciais para secundar o processo de Lisboa e abarcam áreas muito vastas: mais flexibilidade para promover o espírito empresarial e a inovação, maior participação no mercado de trabalho e uma segurança social mais actuante, investimento na educação, na formação e na parceria para a mudança. Todos os parceiros que têm vantagem nos processos de mudança deverão ser chamados a participar. Tudo isto se encontra idealmente sintetizado na frase: «A Europa precisa de uma população activa mais numerosa e mais produtiva». Num seu parecer adoptado recentemente, o CESE associou-se, em termos gerais, com algumas críticas à margem, às recomendações desta Task Force  (12).

3.9

É evidente a conexão entre o processo de Lisboa, no seu todo, e a estabilidade da política orçamental. O relatório elaborado para o Conselho Europeu da Primavera (13) considera que a falta de avanços no processo de Lisboa tem para a Europa um preço muito elevado e que as suas consequências serão um fraco crescimento, o aumento insuficiente da taxa de emprego e atrasos na educação e na I & D.

3.10

O relatório para o Conselho da Primavera trata dos temas antes focados: o desenvolvimento do mercado interno e das possibilidades de emprego. No que se refere ao conhecimento, a Comissão reputa essencial reforçar os investimentos em redes e em cientistas e técnicos, principalmente no âmbito da I & D, da educação e da formação profissional.

3.11

Continua a não haver interacção entre universidades e empresas que se encontram demasiado afastadas umas das outras. É óbvio que uma situação como esta está longe de corresponder às ambições de uma economia do conhecimento. A exemplo do que se passa nos EUA, essa interacção seria a melhor via para aumentar a produtividade e revitalizar as empresas. É justamente este valor acrescentado que falta actualmente. Merece menção especial a fuga de cérebros da Europa: o saldo entre a entrada e a saída de especialistas em economia do conhecimento é já negativo (14) e prevê-se o recrudescimento desta tendência.

3.12

Na linha de outros relatórios, a Comissão avança no seu relatório para o Conselho da Primavera com uma série de propostas muito claras baseadas em três princípios fundamentais: investimento, competitividade e reformas.

3.13

As orientações políticas e os relatórios sobre o mercado interno, a estratégia do emprego e o processo de Lisboa são comparáveis em termos de conteúdo e método de avaliação. A Comissão coloca as finanças públicas e vários aspectos socioeconómicos numa perspectiva de reciprocidade, tornando assim visíveis os problemas causados pela deslocação das despesas públicas ligadas ao consumo para as despesas ligadas à produção.

4.   O quadro institucional

4.1

O CESE está ciente de que uma tal situação exige

que, face às condições económicas difíceis, esta transição tão decisiva de uma União a 15 para uma União a 25 decorra de uma forma o mais equilibrada possível;

que sejam recuperados, simultaneamente, os atrasos em relação a acordos celebrados anteriormente pelo Conselho Europeu que não perderam em nada a sua actualidade;

que seja mantido o ritmo encontrado e seja imprimido um novo ímpeto ao processo.

4.2

Na opinião do CESE, tudo isto não depende simplesmente da forma como são formuladas as decisões políticas. Têm aqui também um papel essencial os factores organizativos, sobretudo o controlo e a supervisão, e os factores políticos e culturais. Neste contexto, o CESE tomou conhecimento das análises e das conclusões da Comissão, com que aliás concorda, constantes da sua comunicação de 21 de Janeiro e da Actualização de 7 de Abril último. As conclusões do Conselho «Competitividade» de 17 e 18 de Maio são, infelizmente, demasiado gerais e pouco incisivas (15).

4.3

Face ao alargamento da União, é ainda mais candente garantir o bom funcionamento institucional e a delimitação criteriosa das competências e das responsabilidades, para prevenir o risco de indisciplina e de diluição (16).

4.4

Com o correr dos anos foi tomando forma um elenco de responsabilidades e de processos decisórios comunitários e intergovernamentais muito divergentes. O projecto de Constituição também parte visivelmente do princípio de que uma União a 25 jamais poderá funcionar como uma União a 15.

4.5

A introdução do euro deveria ter dado origem não só a um Pacto de Crescimento e Estabilidade eficaz mas também a uma maior convergência das políticas económicas. Mas o facto é que há um sem número de acordos e decisões sem carácter vinculativo.

4.6

Dada a falta de resultados palpáveis que deveriam ter sido gerados pelos compromissos estabelecidos, as potencialidades da União Europeia são colocadas seriamente à prova.

4.7

Existe aparentemente no Conselho Europeu um consenso quanto aos objectivos, embora estes não se encontrem sempre definidos com a precisão devida. Mas as boas intenções políticas não têm sido convertidas em medidas legislativas e regras exequíveis cuja observância terá de ser realmente controlada.

4.8

Nos últimos anos, tem-se depositado muita esperança na concorrência entre as políticas, no sistema de naming and shaming (denúncia e censura) e no método aberto de coordenação. Mas num ciclo económico menos favorável, os seus efeitos deixam muito a desejar. Na prática, os Estados-Membros não se interpelam, ou pelo menos não como deviam, para apontarem mutuamente as suas limitações. E neste caso é muito exígua a margem de manobra da Comissão. Mas o problema é que não há pura e simplesmente uma alternativa satisfatória ao método comunitário.

4.9

A situação do mercado interno é preocupante. Os objectivos e os compromissos sobre a liberdade de circulação e a igualdade de condições não são respeitados ou são-no insuficientemente. Os resultados nacionais revelam que, na transposição das directivas do mercado interno, a disciplina deixa muito a desejar rondando vezes de mais a incúria. (17)

4.10

A subsidiariedade é um princípio muito louvável. Mas um aspecto ainda não devidamente realçado é que o apelo indevido à subsidiariedade pode levar a que cada Estado-Membro interprete a regulamentação comunitária à sua maneira.

4.11

Também não convém descurar a coexistência de diversas velocidades na União Económica e Monetária. Aos doze Estados participantes juntaram-se agora treze não membros. E é evidente que uma UEM a doze contra três é uma realidade diversa de uma UEM a doze contra treze, não obstante as perspectivas no plano económico abertas pela adesão de dez novos Estados. O essencial é velar pelo cumprimento das exigências de disciplina orçamental consagradas no Tratado.

4.12

O euro deve estribar-se na política macroeconómica dos países e no prosseguimento e no aprofundamento da integração.

4.13

É preciso salvaguardar em todas as circunstâncias o princípio do Estado de direito intrínseco à União Europeia.

4.14

Haverá, portanto, que encontrar um método para evitar que a Comissão e o Conselho se limitem a apontar as insuficiências ou a fazer um apelo urgente aos Estados-Membros antes de passarem à análise da ordem do dia. O processo de Lisboa e o substancial alargamento exigem uma actuação mais firme.

4.15

A estratégia de Lisboa é um conceito estratégico. Nesta acepção é comparável a conceitos estratégicos anteriores que fizeram avançar a integração de forma considerável. Nestes casos havia uma programação com um calendário com etapas bem definidas resultante da cooperação entre a Comissão e os Estados-Membros. Foi o que aconteceu, no fim dos anos sessenta, com a União Aduaneira consagrada no Tratado. O êxito da «Europa 92» foi também fruto de um plano deste tipo. A elaboração de um programa composto por 279 projectos de directiva com base no Acto Único de 1987 permitiu vencer a estagnação e progredir notoriamente na realização do mercado interno. A União Monetária é outro exemplo de sucesso. A partir de 1993 têm baixado continuamente os défices orçamentais de todos os países aspirantes à integração. O mesmo sucedeu com a inflação e as taxas de juro. Isto permitiu que o euro e uma política monetária avalizada por um Banco Central independente vissem a luz do dia no momento preestabelecido.

4.16

Nos casos antes citados ou foi o método comunitário que funcionou com eficácia, como na União Aduaneira e na «Europa 92» ou foi a contribuição positiva dos Estados-Membros que os ajudou a alcançar o resultado que ambicionavam, ou seja, a participação na UEM. O problema é que actualmente não se verifica nenhuma destas situações. Assim, para conseguir avanços satisfatórios depende-se única e exclusivamente da vontade política.

4.17

O Conselho Europeu de 27 e 28 de Março passado corrobora, com efeito, a análise e as conclusões da Comissão. Releva a importância do equilíbrio orçamental, inclusivamente do excedente orçamental, e da estabilidade dos preços e exorta ao cumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Tendo em conta a coesão social e a sustentabilidade, o Conselho estabelece três prioridades ao Conselho «Competitividade»: competitividade, dinamização do mercado interno e melhor legislação. Seja como for, é imperioso investir em toda a linha no conhecimento. No atinente à política do emprego, o Conselho Europeu defende a aplicação do relatório da Task Force Kok.

5.   Europa de novo numa encruzilhada

5.1

A Europa encontra-se de novo numa encruzilhada, numa fase decisiva da sua história. A recuperação económica ainda é muito precária. As expectativas do processo de Lisboa não se concretizaram. Isto num momento em que a União Europeia entra numa nova era, com um crescimento demográfico de 20 % e uma heterogeneidade muito maior. Ao mesmo tempo, o alargamento imprime à UE uma nova dinâmica e oferece uma nova perspectiva de crescimento e de prosperidade.

5.2

Como é a credibilidade da União Europeia que está em jogo, é preciso ter em conta o significado da opinião pública e da redução dos apoios destinados ao processo de integração.

5.3

O alargamento não deverá conduzir a uma espécie de autismo por parte da União Europeia. É bom não esquecer que o seu campo de acção continua a ser o mundo. O CESE entende, por conseguinte, que a sua posição no mundo é a melhor base de referência. Não se trata apenas dos Estados Unidos mas de todo o planeta, inclusivamente dos inúmeros mercados emergentes em pleno desenvolvimento, como a China, o Sudeste Asiático e a Índia que reclamam a sua participação no processo de globalização.

5.4

Anos a fio, este mesmo espírito tem imbuído as análises e as recomendações da Comissão e da presidência do Conselho para o Conselho da Primavera. Não existe praticamente qualquer ponto de discórdia entre as instituições sobre as tarefas que incumbem à União Europeia e aos Estados-Membros. A competitividade ocupa um lugar cada vez mais importante no contexto geral. Mas, mesmo assim, os Estados-Membros procuram sistematicamente contornar as recomendações e não cumprir ou cumprir só parcialmente os acordos celebrados. A transposição e a execução são o problema fundamental.

5.5

Por todos os motivos apontados, é de extrema importância insuflar uma nova alma à estratégia de Lisboa. O CESE não hesita em subscrever o enorme significado desta perspectiva a longo prazo. Dá igualmente o seu aval à via escolhida pela Comissão e pelo Conselho Europeu e a um roteiro comum para os novos e os antigos Estados-Membros.

5.6

Este roteiro deverá ter em vista o aprofundamento da integração. Sem este aprofundamento, uma União Europeia a 25 não será muito mais do que uma zona de comércio livre. No jogo de forças mundial de amanhã esta opção não é desejável para ninguém: nem para a economia europeia nem para as empresas e os cidadãos.

5.7

Uma estratégia de Lisboa de «novo estilo» na UE – reforço da competitividade e da intensidade do conhecimento da economia, promoção da sustentabilidade, consultas sociais e diálogo social – poderá ter repercussões positivas na autonomia política dos Estados-Membros.

5.8

As orientações políticas revelam que finanças públicas sãs e investimentos públicos e privados exigem incondicionalmente um quadro coerente, transparente e fiável que cabe ao Conselho e à Comissão assegurar. É urgente que a União Europeia se mostre mais combativa. A Europa encontra-se de novo numa encruzilhada.

6.   Recomendações e conclusões

6.1

Neste processo o CESE parte das seguintes considerações:

na análise e na definição dos objectivos há que definir claramente a parte do processo decisório reservada a «Bruxelas» e aos Estados-Membros;

para garantir a credibilidade e evitar frustrações, importa perseguir objectivos realistas;

o crescimento económico e uma estratégia de Lisboa de «novo estilo» deverão ocupar um lugar privilegiado nestes objectivos quer para reforçarem a competitividade quer para servirem de retaguarda aos ajustamentos estruturais;

os Estados-Membros não deverão criticar «Bruxelas» por objectivos europeus que foram decididos em conjunto.

6.2

A transparência exige que se preste atenção à vertente institucional. A repartição divergente de competências entre os Estados-Membros e a União Europeia não tem sido, como deveria, objecto de uma reflexão séria. É difícil explicar aos cidadãos o porquê desta desvinculação numa área tão fundamental.

6.3

Disposições mais vinculativas ofereceriam, além disso, uma base de apoio aos Estados-Membros e facilitariam o funcionamento interno e externo da Comissão. Com efeito, numa União Europeia alargada, é ainda mais relevante uma implantação sólida da Comissão.

6.4

No atinente ao orçamento do Estado e à política macroeconómica, os Estados-Membros deverão respeitar a disciplina que impuseram a si próprios no Pacto de Estabilidade e Crescimento.

6.5

Os reflexos intergovernamentais tendem a aumentar. O CESE adverte energicamente para esta evolução. Nenhum Estado-Membro nem nenhum grupo de Estados-Membros está em condições de assumir o papel específico da Comissão. Sabe-se perfeitamente que todos os Estados-Membros discernem habitualmente a partir da sua situação concreta e acabam sempre por imprimir em tudo o seu tom político, quando seriam aqui mais apropriadas distância, objectividade e uma supervisão perspicaz.

6.6

O propósito do Tratado Constitucional é a melhoria da governação da União Europeia a 25. Neste período crucial, será muito positiva a extensão da maioria qualificada. Se tal não se verificar, pode-se desde já contar com bloqueios indesejáveis. As empresas, os parceiros sociais e outros actores da sociedade (universidades, centros de investigação, etc.) poderão influir positivamente nessa melhoria.

6.7

Mas paira ainda no ar a ameaça de fragmentação. O CESE defende, em sua contraposição, uma abordagem integrada, possível de conseguir através de uma maior eficácia do Conselho «Competitividade», em colaboração com o ECOFIN, e graças a uma publicidade mais incisiva. As conclusões do Conselho Europeu vão justamente neste sentido, tal como, aliás, a argumentação que fundamenta as alegações dos chefes do Governo (18) a favor de um «supercomissário» para a política económica.

6.8

No que lhe diz respeito, o CESE apreciaria que fosse dado mais relevo ao conselho «Competitividade». Seria um ponto de partida concreto para uma melhor governação. Este conselho não tem qualquer interesse em ver as suas salas de reuniões povoadas de comissários e de uma constelação de ministros em mudança constante para tratar das áreas políticas mais diversas. Em primeiro lugar, a Comissão terá de zelar por uma coordenação transparente do conselho «Competitividade» e pela sua visibilidade perante a opinião pública. Face à importância da Agenda de Lisboa, esta é claramente uma tarefa para o presidente da Comissão Europeia. Em segundo lugar, a organização mais eficaz do conselho «Competitividade» e a sua racionalização ao nível comunitário deveriam dar origem a um modelo de competências dos membros dos governos nacionais mais fácil de identificar internacionalmente. Tal dar-lhes-ia um maior poder de persuasão perante a opinião pública e promoveria a responsabilidade recíproca pelas políticas adoptadas pela Comunidade.

6.9

A União Europeia não encontrou ainda uma definição formal para o conceito «Europa a diversas velocidades». Exemplos bem sucedidos são a UEM e o Acordo de Schengen. Mas as situações e as abordagens divergentes dos Estados-Membros projectadas nas Orientações Políticas não tornam muito atraente o conceito mal definido de «diversas velocidades» que são fonte de distorções da concorrência. O procedimento preconizado pelo projecto de Constituição oferece pontos de partida interessantes.

6.10

Para o mercado interno – que continua a ser o cerne da integração – a opção por «diversas velocidades» é pouco aliciante porque poderia provocar, em certas áreas, coligações flutuantes e ser para os Estados-Membros mais recalcitrantes uma saída demasiado fácil para os seus dilemas.

6.11

Nas áreas reservadas aos Estados-Membros só muito dificilmente se poderá propor um elenco geral de medidas e ajustamentos. A forma como se tenta agora remediar este problema, ou seja, a descrição exacta das situações nacionais e das melhores práticas, merece todo o apoio. Mas, para facilitar a obtenção de dados numéricos comparáveis, é preciso aperfeiçoar este método. Por outro lado, a Comissão, deve munir-se de instrumentos que lhe facilitem a avaliação da qualidade das despesas públicas.

6.12

O CESE continua partidário da concorrência entre as políticas e do método aberto de coordenação para áreas políticas bem definidas a que não seja aplicável o método comunitário. Mas tendo a plena consciência de que não surgirão daqui (seguramente a curto prazo) resultados verdadeiramente espectaculares, pelo simples facto de os Estados-Membros não se deixarem influenciar uns pelos outros. Alguns deles têm adaptado consideravelmente a sua política, por exemplo, ao nível das pensões e do mercado laboral. Mas é preciso melhorar a divulgação destes acontecimentos para o exterior.

6.13

O Conselho Europeu aplaude a intenção da Comissão de estabelecer um roteiro para a consolidação e a aplicação efectiva da estratégia de Lisboa. A melhor governação é um dos princípios fundamentais. A confiança e a estabilidade exigem um quadro institucional muito claro.

6.14

O CESE considera essencial que a estratégia de Lisboa de «novo estilo» se guie pela metodologia da «Europa 92» que teve tanto êxito. Valer-se da prática existente implica sintetizar os relatórios sobre as Orientações de Política Económica para o mercado interno, o emprego e o processo de Lisboa num plano por etapas único munido de um calendário indicando claramente quem (a Comissão, o Conselho, o Parlamento Europeu ou os Estados-Membros) terá de realizar que acções, com base em que decisões e em que prazos. Neste contexto, o CESE sublinha a importância do papel da Comissão e do método comunitário que foram decisivos para o êxito da «Europa 92». A Comissão apresenta anualmente um relatório de progressos analisado pelo Conselho Europeu, após consulta do Parlamento Europeu, que fixa as prioridades que servem de base às propostas da Comissão.

6.15

O único autêntico progresso no processo de Lisboa cabe ao mercado interno, pelo menos no que se refere à legislação e à regulamentação. Mas a sua aplicação falha regularmente. E este progresso é consequência directa do método comunitário. O CESE é favorável a que todas as questões de mercado sejam sintetizadas num só programa com um calendário bem definido compreendendo:

todos os elementos pendentes do Plano de Acção do Mercado Interno;

todos os elementos pendentes do Plano de Acção dos Serviços Financeiros;

componentes do sector do conhecimento subordinadas ao processo comunitário de decisão;

reconsideração e simplificação da regulamentação demasiado rígida e minuciosa;

execução.

6.16

No atinente aos capítulos que dependem de decisões nacionais, como é o caso da segurança social, do mercado de trabalho (Task Force Kok) e da fiscalidade, o CESE preconiza que o Conselho (para além da concorrência entre as políticas e da coordenação aberta) delibere igualmente, por proposta da Comissão, sobre os objectivos a perseguir e a sua concretização. O calendário proposto deverá prever ao mesmo tempo a supervisão destes processos nacionais. Ora é justamente neste campo que a governação se torna mais complexa. Mas um acordo pouco sentido tem se não for realizado na prática.

6.17

Também outras questões que não dependem da regulamentação e são, por vezes, apenas parcialmente da competência nacional mas têm uma ligação com a competitividade, o conhecimento e a capacidade económica, merecem também um lugar de destaque na estratégia de Lisboa de «novo estilo», designadamente:

a política industrial em certos sectores surgida de uma acção concertada entre as empresas (incluindo o diálogo social), a Comissão e o Conselho (19);

os resultados dos programas e das plataformas tecnológicas da UE, o reforço da cooperação transfronteiras entre os centros de conhecimento e os cientistas à escala comunitária e a intensificação da cooperação entre as universidades e os intervenientes no mercado;

uma política regional em que se dê especial ênfase ao conhecimento e à inovação.

6.18

Tanto a Comissão como o Conselho Europeu são a favor de uma «parceria para a mudança». O CESE comunga deste desiderato que pode transformar-se num conceito nuclear. A estratégia de Lisboa nunca foi considerada como um mero processo do topo para a base. O seu êxito: a formulação da política e a sua execução dependem de uma multiplicidade de actores, desde as autoridades (ao nível europeu, nacional e regional) até aos parceiros sociais e muitas outras organizações da sociedade civil. Uma apresentação clara dos objectivos explicando aos actores políticos e sociais o que se espera deles poderá ser a nova e tão necessária fonte de inspiração.

6.19

A «parceria para a mudança» alberga em si um enorme potencial desde que devidamente apresentada. Poderá resultar numa nova forma de comunicação e em novas alianças entre os muitos participantes no processo de integração europeia. Também esta parceria é parte integrante da boa governação.

6.20

O Conselho Europeu convidou a Comissão a constituir um Grupo de Alto Nível que apresentará à Comissão até ao dia 1 de Novembro próximo um relatório sobre a futura abordagem do processo de Lisboa. As informações nele contidas e a posição defendida por este Grupo de Alto Nível são fundamentais na perspectiva da revisão intercalar da estratégia de Lisboa no Conselho da Primavera de 2005. O Conselho Europeu convidou também o CESE a formular igualmente recomendações para serem consideradas nesta revisão intercalar.

Bruxelas, 15 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  JO C 133 de 6.6.2003

JO C 80 de 30.3.2004

(2)  Comunicação da Comissão sobre a aplicação das orientações gerais para as políticas económicas de 2003-05 — COM(2004) 20 final.

(3)  Actualização de 2004 das Orientações Gerais paras as Políticas Económicas dos Estados-Membros e da Comunidade — COM(2004) 238 final.

(4)  O CESE elaborou a este respeito em 2002 um primeiro relatório (JO 221 de 17.9.2002

(5)  A par disto, dá-se cada vez mais atenção à melhoria da legislação comunitária (vide Plano de Acção «Simplificar e melhorar o ambiente regulador» de 2003 e as Conclusões do Conselho «Competitividade» de 17 e 18 de Maio de 2004.)

(6)  V. Acórdão do Tribunal de 13.7.2004, proc. C-27/04.

(7)  Previsões Económicas para a Primavera de 2004, p. 31.

(8)  Jobs, Jobs, Jobs — Creating more employment in Europe (Empregos, empregos e mais empregos — Criar emprego na Europa) – Relatório da Taskforce «Emprego» presidida por Wim Kok, 26 de Novembro de 2003.

(9)  Carta subscrita pelo primeiro-ministro Tony Blair, pelo presidente Chirac e pelo chanceler federal Schröder de 18 de Fevereiro de 2004 e a «Contribuição Comum ao Conselho da Primavera de 2004» dos chefes do governo Aznar (Espanha), Balkenende (Países Baixos), Berlusconi (Itália), Durão Barroso (Portugal), Miller (Polónia) e Parts (Estónia).

(10)  Relatório sobre a aplicação da estratégia do mercado interno (2003-2006) de 21 de Janeiro de 2004 — COM(2004) 22 final.

(11)  Relatório sobre a aplicação da estratégia do mercado interno (2003-2006) de 21 de Janeiro de 2004 — COM(2004) 22 final.

(12)  Parecer sobre as «Medidas de apoio ao emprego» — JO C 114, de 30/4/04 (SOC/159).

(13)  Relatório da Comissão para o Conselho Europeu da Primavera do Conselho Europeu «Concretizar Lisboa — reformas para a União alargada» (COM(2004) 29 final).

(14)  «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Investigadores no Espaço Europeu da Investigação: uma profissão, múltiplas carreiras» — JO C 110 de 30.4.2004 (INT/216) e «Comunicação da Comissão: A Europa e a investigação fundamental» — JO C 110 de 30/04/2004 (INT/229).

(15)  Conclusões do Conselho «Competitividade» de 17 e 18 de Maio de 2004.

(16)  V. nota 4.

(17)  V. Internal Market Scoreboard, Edition 13, 13 de Julho de 2004, http://www.europa.eu.int/comm/internal_market/score/docs/score13/score13-printed_en.pdf

(18)  Carta subscrita pelo primeiro-ministro Blair, pelo presidente Chirac e pelo chanceler federal Schröder de 18 de Fevereiro de 2004.

(19)  Conclusões do Conselho «Competitividade» de 26 e 27 de Novembro de 2003.


23.3.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 74/32


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Construir o nosso futuro em comum — Desafios políticos e recursos orçamentais da União alargada para 2007-2013»

(COM(2004) 101 final)

(2005/C 74/07)

Em 18 de Março de 2004, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social emitiu parecer em 13 de Julho de 2004, sendo relator Giorgios DASSIS.

Na 411.a reunião plenária de 15 e 16 de Setembro de 2004 (sessão de 15 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 143 votos a favor, 26 votos contra e 11 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Objectivo do parecer

1.1

Em 1 de Maio de 2004, a União Europeia deu um grande passo em frente na materialização da visão dos fundadores da Comunidade Europeia em 1952, a qual era compartilhada por homens que passaram por guerras, catástrofes e outros infortúnios e sofreram pobreza e miséria. O caminho que falta percorrer até uma verdadeira integração europeia já não é longo. A Europa dos vinte e cinco é uma realidade e a decisão relativa aos vinte e sete já está tomada.

1.1.1

Esta evolução não significa, porém, que fique afastado o risco de um retrocesso, com consequências imprevisíveis. O edifício europeu comum deve fundar-se em pilares, o mais sólido dos quais será a convicção dos cidadãos de serem parte integrante do projecto, o orgulho que terão em pertencer a uma vasta entidade geográfica democrática, que assegure e garanta a paz e o respeito dos direitos humanos e vise o bem-estar de todos, em depender de uma estrutura em que a solidariedade seja a regra fundamental de convivência de cidadãos animados de um sentimento patriótico para com a Europa e orgulhosos de nela viver.

1.2

Para tanto, é indispensável, porém, que a União Europeia consolide as políticas comuns e se lance, em ritmo firme e mediante processos democráticos, na concepção e na transposição prática de todas as que faltam para que a união económica e monetária constitua uma realidade social e política.

1.3

Conceber e aplicar estas políticas implica evidentemente um certo custo, que convirá repartir equitativamente, em função da potência económica de cada cidadão e de cada Estado-Membro.

1.4

Desejoso de contribuir para o debate sobre a elaboração do orçamento para o novo período de 2007 a 2013, o CESE, ao elaborar o parecer sobre a matéria, considerou igualmente o terceiro relatório da Comissão Europeia sobre a coesão económica e social (1).

1.5

O CESE não se cinge, porém, ao exame crítico destes dois documentos, alargando a sua reflexão a temas, questões e dimensões políticas neles não abordados, a despeito da suma importância que revestem para a construção do futuro europeu e para o funcionamento orçamental da União durante o período em causa.

1.6

Assim sendo, sem ignorar os ditos documentos e, nomeadamente, a comunicação da Comissão relativa às perspectivas financeiras no período de 2007 a 2013, o CESE não pode, atenta a sua natureza e composição, cingir-se a um exame crítico, analisando igualmente os temas, as questões e as dimensões políticas não abordados pelo texto da dita comunicação.

1.7

Por outras palavras, paralelamente ao parecer (convergente ou divergente) que emitirá sobre as posições e as propostas da Comissão Europeia, o CESE deve contribuir para aprofundar o debate sobre a construção do futuro comum da Europa, insistindo nas demais vertentes da questão.

2.   Síntese da comunicação da Comissão

2.1

Na comunicação ao Conselho e ao Parlamento Europeu (2), a Comissão apresenta a sua visão da União Europeia e do futuro quadro financeiro para o período de 2007-2013.

2.2

Com vista a colher integralmente os benefícios do alargamento e a contribuir para a prosperidade da Europa são propostas três grandes prioridades – o desenvolvimento sustentável, o dar pleno sentido à cidadania europeia e o reforço do papel da União Europeia enquanto parceiro mundial.

2.3   Desenvolvimento sustentável: crescimento, coesão e emprego

2.3.1

No Conselho Europeu de Lisboa, em 2000, os chefes de Estado e de Governo aprovaram um programa destinado a construir uma Europa que se torne na «economia do conhecimento mais competitiva e dinâmica a nível mundial, capaz de um crescimento económico sustentável, acompanhado de uma melhoria quantitativa e qualitativa do emprego e de uma maior coesão social».

2.4

Segundo a Comissão, impõe-se reactivar este processo, atribuindo-lhe objectivos credíveis e concretos, tanto a nível nacional como europeu. É necessário promover a competitividade das empresas no mercado interno, intensificar a investigação e o desenvolvimento tecnológico, favorecer a interligação em rede na Europa, melhorar a qualidade da educação e da formação na UE, reforçar mais a agenda para a política social e auxiliar a sociedade europeia a antecipar e gerir as mutações sociais.

2.5

Os objectivos de crescimento e de competitividade serão igualmente as principais prioridades da próxima geração das políticas regionais e de coesão, pondo a tónica na ajuda às regiões mais atrasadas. O crescimento e a coesão têm que ser muito mais complementares do que no passado.

2.6

De futuro, a política de coesão tem de abordar sistematicamente o problema da falta de competitividade, para que um maior número de regiões da União possa contribuir para o crescimento e o emprego.

2.7

As propostas da Comissão também confirmam expressamente as decisões do Conselho, em 2003, no sentido de reformar a política agrícola comum e de definir, até 2013, as despesas agrícolas para as medidas de apoio ao mercado e os pagamentos directos. A reforma irá reorientar radicalmente a política agrícola da UE para o desenvolvimento sustentável, dissociando o apoio da produção. A futura política de desenvolvimento rural, reorganizada num único instrumento, contribuirá para aumentar a competitividade da agricultura e para melhorar o ambiente e a diversidade do espaço rural. Serão concedidos financiamentos adicionais, transferindo para os agricultores montantes provenientes dos pagamentos directos para reforçar os programas de desenvolvimento rural.

2.8

A nova política comum da pesca reformada continuará a centrar-se na exploração sustentável dos recursos. A política do ambiente tem em vista satisfazer as expectativas dos cidadãos quanto à melhoria das condições de vida e de solidariedade entre gerações, bem como os compromissos internacionais e a promoção da eficiência e da competitividade.

2.9   Cidadania

2.9.1

Desde o Tratado de Amsterdão, grande parte das políticas em matéria de liberdade, segurança e justiça foi transferida para a competência comunitária. Hoje em dia, os desafios colocados pela imigração, asilo e luta contra a criminalidade e terrorismo já não podem ser adequadamente solucionados recorrendo apenas a medidas nacionais. O mesmo vale para a protecção das catástrofes naturais, as crises sanitárias e ambientais, o acesso aos serviços públicos e os aspectos relacionados com o consumidor e a saúde.

2.10

Melhores instrumentos e um financiamento adequado contribuirão para vencer estes desafios.

2.11   A UE enquanto parceiro mundial

2.11.1

A União alargada tem que desempenhar um papel mais importante como líder regional e parceiro mundial. Para responder a estas expectativas, há que transformar a UE num interlocutor politicamente responsável, capaz de impor o seu peso.

2.12

A União deverá desempenhar plenamente o seu papel na governança política mundial e na segurança estratégica. Esta missão consiste, nomeadamente, na luta contra as ameaças, bem como na garantia da segurança civil e na protecção dos cidadãos contra os diferentes riscos.

2.13   Exigências financeiras

2.13.1

Estes objectivos podem ser realizados numa União de 27 Estados-Membros sem aumentar o actual tecto das despesas.

2.14

Tendo em conta o desafio acima descrito, que consiste em construir um projecto político credível, há que dispor dos recursos necessários para a sua execução. A Comissão calculou um nível de despesas médias de 1,14 % ao longo do período. Será realizada uma mudança significativa no equilíbrio do orçamento da UE para apoiar as novas prioridades. Numa primeira fase, o nível das despesas aumentará devido ao efeito do alargamento, mas no final do período estará próximo do nível inicial. Os pagamentos situar-se-ão abaixo do limite máximo actual de 1,24 % do RNB.

2.15

A Comissão propõe-se introduzir futuramente um mecanismo de correcção generalizado, que estabeleça um método transparente e objectivo de correcção de uma carga orçamental considerada excessiva em relação à prosperidade relativa do país.

2.16

A Comissão elaborará em 2004 as propostas legislativas adequadas e um roteiro concreto para atingir estes objectivos.

3.   Observações do CESE sobre o texto e as propostas da Comissão Europeia

3.1

Em termos gerais, o CESE reputa positivo o texto da comunicação da Comissão Europeia. Particularizando, considera que o texto:

é coerente, já que as diferentes partes que o compõem se articulam de modo consequente, formando um conjunto homogéneo, sem contradições, incompatibilidades ou lacunas,

radica em premissas políticas sólidas e ambiciosas: declina de modo satisfatório, completo e perspicaz o seu fundamento político em objectivos que legitimam a construção de um futuro comum,

propõe opções e prioridades claras e lógicas em matéria de prática política: define medidas e acções congruentes com a realização dos objectivos políticos fixados,

é equilibrado: aceitando compromissos ou ponderando certos factores e estruturas, procura adaptar os recursos financeiros às necessidades ditadas pela prossecução dos objectivos políticos, com base na prática política.

3.2

O CESE emite parecer favorável às opções e posições expressas no texto, subscrevendo em particular:

3.2.1

A noção de desenvolvimento sustentável e o seu conteúdo, em torno das dimensões económicas, sociais e ambientais.

3.2.1.1

O CESE perfilha a posição da Comissão Europeia na matéria e assinala que a noção de desenvolvimento sustentável é complexa e abrange:

a protecção dos recursos naturais da União (dimensão ambiental),

a criação de um clima propício:

1)

a melhoria da competitividade (dimensão económica — quantitativa),

2)

a progressão da solidariedade (dimensão social —qualitativa), dando particular atenção aos cidadãos em risco de exclusão social, garantia de mais prosperidade e segurança para todos os europeus.

3.2.1.2

Com efeito, a noção de desenvolvimento sustentável não se cinge a parâmetros quantitativos de crescimento económico, englobando igualmente elementos qualitativos (sociais, ambientais).

3.2.1.3

O CESE lamenta a confusão existente em outros textos entre as noções de «crescimento económico sustentável» e de «desenvolvimento sustentável». No parecer sobre «Avaliação da estratégia da UE para o desenvolvimento sustentável» (3), assinala que as perspectivas financeiras da UE para o período de 2007 a 2013 poderiam ter sido uma oportunidade para dar um impulso decisivo ao desenvolvimento sustentável. Faz notar ainda que não basta continuar a aplicar, sem qualquer alteração, políticas que se revelaram problemáticas para o desenvolvimento sustentável, inscrevendo-as futuramente na rubrica orçamental «crescimento sustentável». Por fim, chama a atenção para o facto de que «desenvolvimento sustentável» e «crescimento sustentável» são duas noções distintas, que podem contradizer-se.

3.2.1.4

O CESE entende que, para concretizar o desenvolvimento sustentável, é imperioso e premente consagrar-lhe recursos financeiros mais importantes do que os que lhe são hoje afectados ou estão previstos nas perspectivas financeiras para o período de 2007 a 2013. Acresce que, à luz da modéstia dos recursos financeiros e dado que o ambiente é um bem comum público que ignora fronteiras e uma vertente essencial da estratégia de desenvolvimento sustentável, o CESE pergunta-se em que medida não seria aconselhável excluir os investimentos aferentes do cálculo do défice orçamental fixado no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento (4).

3.2.1.5

A Europa pode desempenhar um papel de vulto na economia mundializada e influir no seu curso, conferindo um lugar mais importante ao desenvolvimento sustentável. Os recursos financeiros previstos são, porém, insuficientes. A União Europeia deve actuar em uníssono. Os Estados-Membros, independentemente da sua dimensão e importância, não podem inflectir o desenvolvimento à escala mundial. É, pois, imperativo coordenar os esforços para a prossecução de objectivos comuns no âmbito da União Europeia.

3.2.2

A rendibilidade económica da coesão social e a constatação clara de que, para além da sua função social e do papel que desempenha na redução das disparidades, a política de coesão impulsiona também o desempenho económico em geral.

3.3

Todo o programa de consecução e realização desta visão política global radica no conceito fundamental do desenvolvimento sustentável, tal como definido no interior da estrutura complexa das dimensões económica, social e ambiental.

3.4

Paralelamente às análises do terceiro relatório sobre a coesão económica e social, o texto da Comissão formula e debate o problema da organização da cooperação inter-regional e do procedimento a seguir para a promover.

3.4.1

Nele propõe-se suprimir os «complementos de programação» dos quadros comunitários de apoio (QCA), bem como os próprios QCA enquanto instrumentos de gestão, substituindo-os por um texto estratégico equivalente sobre a coesão, equilibrado a nível comunitário.

3.4.2

Propõe-se ainda, face ao diagnóstico de ineficácia da prática seguida até à data, com base nas 60 ou 70 prioridades indicadas nos antigos textos, estabelecer três ou quatro prioridades que sejam específicas a cada país, e uma outra, comum, em matéria de governança administrativa. Para ter em conta as especificidades dos Estados-Membros, a União Europeia poderia adoptar métodos de gestão mais flexíveis e descentralizados, no respeito da transparência e do máximo rigor.

3.4.3

A proposta no sentido de modificar o método de controlo da gestão económica e financeira é, pois, extremamente significativa: em vez de o controlo ser efectuado projecto a projecto, optar-se-ia pela celebração prévia de um pacto de confiança fixando as regras na matéria. Segundo tal método, o regime de controlo enquadra-se num sistema único, aceite por todas as instâncias em causa.

3.4.4

Além disso, o CESE manifesta a sua preocupação quanto ao agravamento da diferença entre as dotações de autorização e as dotações de pagamento. Calcula-se que, no termo do período de 2007-2013, a diferença atinja os 188 mil milhões de euros, ou seja, o orçamento de um ano. O CESE considera, pois, indispensável tornar as perspectivas financeiras mais flexíveis. Oferecendo a possibilidade de alongar de um ano o prazo de pagamento das autorizações subscritas no âmbito dos fundos estruturais (alteração da regra n+2 em n+3), poder-se-ia utilizar e explorar mais serenamente os fundos postos à disposição sem pressões de tempo, o que se afigura mais judicioso e eficaz.

3.5

O cerne do debate deve consistir em reconhecer que o orçamento comunitário e os recursos económicos da UE dependem directamente do grau de desenvolvimento económico dos diferentes Estados-Membros e do valor dos PNB nacionais.

3.5.1

Por conseguinte, o orçamento comunitário, ao contribuir para promover o desenvolvimento económico dos dez novos países, cria as condições necessárias para melhorar e alargar futuramente a base de cálculo dos recursos próprios da UE. Com efeito, o reforço das capacidades de cada país e o incremento dos PNB nacionais redundarão no aumento do orçamento comunitário, por força do crescimento das contribuições dos Estados-Membros (cálculo percentual numa base alargada).

3.5.2

Por outro lado, importa notar que a incorporação no mercado único europeu dos novos Estados-Membros aumenta as perspectivas de crescimento dos quinze antigos Estados-Membros. Com efeito, não seria difícil avaliar a dimensão do crescimento adicional a que cada um dos quinze países poderá aspirar dos efeitos multiplicadores do desenvolvimento dos novos Estados e da integração dos seus mercados no mercado único europeu. Em qualquer caso, este crescimento adicional esperado da Europa dos quinze implicará igualmente a criação de novos recursos para o orçamento comunitário.

3.5.3

Na opinião do CESE, para uma repartição dos recursos da UE capaz de responder ao objectivo essencial que é a convergência é necessário privilegiar as necessidades dos novos Estados-Membros onde se encontra a maioria das regiões menos desenvolvidas e onde o processo de integração ainda não chegou ao seu termo.

3.5.4

O CESE opina que convém considerar muito atentamente não só o limite máximo anual para o orçamento comunitário, mas também as projecções em que se baseia. Com efeito, o orçamento baseia-se no rendimento nacional bruto (RNB) da UE, em cujo cálculo devem entrar como hipóteses de trabalho o crescimento económico, a taxa de câmbio entre o euro e o dólar, o preço do petróleo bruto, etc. Consequentemente, são muitas as contingências que influem nos recursos financeiros. O CESE recomenda, pois, à Comissão Europeia que elabore cenários alternativos com base em conjecturas optimistas e pessimistas, de molde a determinar um intervalo no interior do qual se situem os orçamentos anuais para o período de 2007 a 2013.

3.6

No entender do CESE, para resolver a questão da reconciliação das duas variáveis que são a estimativa económica (custo) de objectivos políticos ambiciosos e os recursos financeiros (modestos) disponíveis, é necessário apreciar até que ponto os meios disponíveis são congruentes com os objectivos.

3.7

Na manipulação destas variáveis, coloca-se o dilema seguinte: irá a pressão do ajustamento enfraquecer os objectivos políticos e a visão que representam, trazendo-os ao nível dos recursos disponíveis, ou, ao invés, será necessário elevar os recursos a um nível congruente com a concretização dos objectivos? Procurando com realismo e eficácia chegar à boa adequação dos recursos disponíveis, este dilema será tão-só teórico.

3.8

Porque são necessários para construir eficazmente o futuro comum da Europa, afigura-se problemática toda e qualquer diluição. Neste sentido, a tentativa da Comissão Europeia de redefinir os equilíbrios necessários, com uma diluição mínima dos seus objectivos políticos, não é facilmente aceitável, nem tão-pouco compreensível.

4.   Cenários alternativos para o tecto das dotações de autorização

4.1

Como ressalta do texto da comunicação, a Comissão hesitou, antes de chegar a uma proposta de compromisso, entre três possibilidades para o tecto das dotações de autorização do orçamento comunitário, atentas as evoluções recentes.

4.2

A primeira possibilidade consistia na fixação do tecto em 1 % do RNB, conforme desejo expresso por certos Estados-Membros. A Comissão Europeia considera, porém, tal percentagem insuficiente.

4.3

A segunda possibilidade incidia na fixação do tecto em 1,30 % do RNB. A Comissão Europeia considera que este valor, não sendo exagerado, permitiria à União Europeia responder cabalmente aos imperativos da concretização dos seus objectivos políticos.

4.4

A terceira possibilidade era a fixação do tecto em 1,24 % do RNB, o que corresponde ao quadro financeiro actual. A Comissão Europeia precisa, porém, que, a ser aprovado este valor, será necessário proceder a ajustamentos no orçamento da União Europeia por forma a deixar margem para o financiamento das novas prioridades.

4.5

A Comissão Europeia decidiu-se pela terceira possibilidade, o que significa:

4.5.1

Em primeiro lugar, a manutenção do quadro financeiro actual, o que suscita a questão de saber se, ao fim e ao cabo, será possível aplicar e financiar as novas prioridades com os recursos que até à data financiavam menor número de prioridades. Cabe notar que o desenvolvimento da maioria dos dez novos Estados-Membros (doze no futuro) se caracteriza por um atraso significativo em relação à Europa dos quinze e que um apoio financeiro eficaz exigirá a atribuição de novos recursos em montantes elevados. Sobre a questão, reza no texto da Comissão que «na União alargada, não só o PIB médio per capita será inferior em mais de 12 % ao registado na Europa dos quinze como também as disparidades em matéria de rendimento duplicarão na globalidade».

4.5.2

Em segundo lugar, correcções e ajustamentos a introduzir no orçamento comunitário: importa saber se resultarão na diluição dos objectivos políticos estabelecidos na comunicação da Comissão Europeia, acarretando o enfraquecimento da base necessária para a construção do futuro comum da Europa.

4.5.3

Em terceiro lugar, com a aprovação e a entrada em vigor da sua carta constitucional, a União Europeia adquirirá, em larga medida, uma estrutura e um modo de funcionamento federal, no sentido da atenuação da subsidiariedade e da extensão e reforço das políticas europeias comuns e, consequentemente, de recursos congruentes.

4.5.4

O CESE chama a atenção para as referências específicas no texto da comunicação da Comissão às eventuais carências financeiras que poderão surgir no decurso do período de 2007 a 2013 e que serão susceptíveis de transtornar as previsões políticas e de invalidar a concretização do plano de acção descrito e proposto.

4.5.5

Com efeito, a despeito do tom conciliatório, medido e equilibrado que caracteriza o texto da Comissão, ela não deixa de sublinhar que, «tendo em conta que o alargamento exercerá um impacto assimétrico no orçamento comunitário — o aumento das despesas superará o aumento das receitas — a simples manutenção do acervo requer uma intensificação dos esforços financeiros» (introdução). Esta observação, formulada em termos elegantes, não deixa qualquer dúvida quanto à impossibilidade de preservar (quanto mais melhorar) o acervo comunitário se os recursos não forem aumentados.

4.5.6

Mais, a Comissão reforça tal observação quando afirma que «Não se pode permitir que a lacuna entre a assunção de compromissos políticos ambiciosos ao mais alto nível e a incapacidade de os pôr em prática continue a aumentar» e «Em muitas destes novos domínios prioritários, a capacidade da União de materializar as promessas dos Estados-Membros é limitada pela falta de vontade política de agir e pela insuficiência dos recursos» (introdução).

4.5.7

Encontram-se observações similares noutras passagens do texto da comunicação. Assim, no capítulo 2, faz valer que «o desvio entre o que se exige da União e os recursos à sua disposição tornou-se demasiado grande» e adverte, logo a seguir, que «impor à União uma série de objectivos e recusar-lhe depois os recursos requeridos seria condená-la às críticas justificadas dos cidadãos que se vêm defraudados nas suas legítimas expectativas».

4.5.8

O CESE considera criteriosa a observação da Comissão quando faz notar que «todos os Estados-Membros serão prejudicados» se não se chegar a um novo compromisso no sentido de acordar os objectivos do projecto europeu para a União alargada nos anos vindouros e de lhe propiciar os recursos necessários à sua concretização.

4.5.9

Na avaliação das referidas observações, convém igualmente ter em conta que, em virtude da incorporação no orçamento comunitário do Fundo Europeu de Desenvolvimento no novo período de 2007 a 2013, na prática este não se manterá ao mesmo nível, mas será reduzido.

4.5.10

No novo período de 2007 a 2013, as políticas europeias comuns serão reforçadas, enquanto as aplicadas pelos Estados-Membros serão limitadas. Esta evolução é justificada pelo facto de a União Europeia não se poder transformar em mera executora das políticas nacionais. O interesse comum requer a formulação e a aplicação de políticas comuns europeias.

4.5.11

No entanto, o valor acrescentado da União não pode ser deixado ao critério das políticas nacionais. A Comissão explica sem rodeios que a sua eficácia «requer massas críticas que excedem o alcance de cada governo nacional ou a conjugação dos esforços envidados a nível nacional» (página 4 da versão portuguesa).

4.5.12

Por conseguinte, é um erro encarar a questão como um mero problema de redistribuição de recursos entre os Estados-Membros. Muito pelo contrário, o problema não se prende com a redistribuição de recursos entre os Estados-Membros, mas sim com a forma de maximizar o impacto das políticas comuns para que se possa aumentar o valor acrescentado de cada euro despendido a nível europeu (página 4 da versão portuguesa).

4.5.13

Ademais, ao enumerar os pontos positivos, a Comissão acentua o alcance das intervenções comunitárias e o valor acrescentado europeu propiciado por cada euro a cargo do orçamento da União.

4.5.14

Referências desta natureza figuram igualmente nas passagens seguintes do texto da Comissão:

na introdução, quando afirma «Devem envidar-se esforços no sentido de maximizar a eficácia das despesas públicas e assegurar que os esforços nacionais e europeus correspondam a algo mais do que a mera soma do seu produto»,

no ponto I.A.1, alínea e), quando afirma que a acção da UE funciona também como catalisador da implementação pelos Estados-Membros da agenda de política social como parte da estratégia geral de Lisboa,

no ponto I.A.2, que examina o valor acrescentado da coesão política,

no ponto I.A.3, que realça as implicações em termos de valor acrescentado da política agrícola comum,

no ponto I.C, quando afirma que «relações externas coerentes podem aumentar a sua influência (da União Europeia) para além daquilo que os Estados-Membros podem alcançar separadamente ou mesmo com linhas de acção paralelas»,

no ponto I.C.2, com a constatação de que «O poder multiplicador da assistência financeira da UE e das preferências comerciais bilaterais seria aumentado consideravelmente por uma tal presença unificada no seio dos órgãos de governança económica multilateral, como o Banco Mundial, o FMI e as agências económicas da ONU: em especial, o valor de cada euro gasto nesse novo contexto aumentaria substancialmente»,

no ponto I.C.3, que analisa o valor acrescentado da assistência da UE a países terceiros (vantagem comparativa de uma abordagem da UE relativamente às crises externas),

no ponto III.B, que desenvolve a questão da valor acrescentado produzido pela criação e pelo funcionamento do novo instrumento de vizinhança.

4.5.15

O CESE entende útil fazer notar que é absurdo ambicionar «mais Europa», reduzindo ao mesmo tempo os recursos postos à disposição. Além disso, a limitação dos recursos próprios a 1 % do RNB obrigará, em última instância, a efectuar cortes na dotação das políticas estruturais e da política de coesão, tanto mais que, dado o regime de financiamento da política agrícola comum até 2013, todas as reduções ulteriores impostas pela diminuição do orçamento comunitário incidirão na política de coesão, com repercussões drásticas ao nível dos desafios e das necessidades decorrentes do alargamento da UE. Mais ainda, tal tendência retirará conteúdo e valor a toda a iniciativa ou incentivo em matéria de desenvolvimento.

4.5.16

Com base nas observações expendidas, o CESE crê necessário superar as reservas da Comissão e optar por aumentar os recursos próprios do orçamento comunitário no novo período de 2007 a 2013 para o tecto de 1,30 % do RNB, superior ao quadro financeiro em vigor, zelando paralelamente por que a fixação anual deste tecto não sofra desvios excepcionais.

4.5.17

Esta posição é ainda reforçada pelo facto de, no que se refere às economias dos Estados-Membros que são contribuintes líquidos para o orçamento comunitário, uma parte dos recursos a título dos fundos estruturais reverter a favor destes países sob a forma de um aumento das exportações. Esta problemática já foi estudada ao nível da Europa dos quinze, prevendo-se que o dispositivo funcione da mesma maneira na Europa dos vinte e cinco. Por conseguinte, uma fracção importante dos fundos que serão desbloqueados para o desenvolvimento dos 10 novos Estados-Membros reverterá a favor dos países que são contribuintes líquidos para o orçamento comunitário (mercado dos equipamentos tecnológicos ou electrónicos, fornecimento de serviços especializados, transferência de tecnologias, etc.). Este aspecto da questão não pode ser ignorado na preparação do novo orçamento comunitário. Cabe ainda sublinhar que no texto da comunicação a Comissão faz referência a esta questão, ao observar que um dos efeitos mensuráveis do respeito pelas regras do mercado único é visível no aumento do comércio intracomunitário, sobretudo entre os Estados-Membros e as regiões menos desenvolvidas e o resto da UE. Tal significa que «cerca de um quarto das despesas ao abrigo dos programas neste domínio reverte a favor do resto da União sob a forma de um aumento das exportações».

4.6

O CESE faz suas as observações da Comissão sobre as consequências da aquisição da qualidade de cidadão europeu. Com efeito, as vantagens aferentes não devem limitar-se às liberdades do mercado: paralelamente à liberdade, à justiça e à segurança, importa igualmente garantir o acesso aos serviços fundamentais. A Comissão faz notar, com toda a razão, que importa «assegurar que a repartição e a acessibilidade dos benefícios da Europa sem fronteiras sejam uniformes e equitativas». A União deve, por conseguinte, complementar os esforços dos Estados-Membros, acção que induz um custo.

4.7

O CESE adere igualmente à análise da Comissão segundo a qual é necessário dispor não só de meios mas também de recursos para os explorar se a Europa pretende ocupar um lugar de destaque (assistência ao desenvolvimento, política comercial, política externa e de segurança, dimensões externas de outras políticas, etc. (ver página 5 da versão portuguesa).

4.7.1

Acresce que, com base nas disposições da carta constitucional da União Europeia em curso de adopção, a protecção do cidadão europeu assumida pela UE não se limita ao simples reconhecimento deste imperativo, mas cria a responsabilidade jurídica correspondente de a garantir, impondo-lhe, por conseguinte, os deveres e as obrigações dela decorrentes em termos de compensação (por exemplo, para as vítimas de actos de terrorismo ou de catástrofes naturais).

4.8

O CESE aplaude a evolução de certas rubricas orçamentais, embora em termos percentuais ela seja muito relativa. Assim, o aumento dos recursos de 162 % previsto para o ciclo de sete anos de 2007 a 2013 no capítulo «cidadania, liberdade, segurança e justiça» limita-se a 2 239 euros. Ao mesmo tempo, as despesas para a agricultura recuarão 3 %, ou seja, 1 442 milhões de euros. No termo do período, as despesas para estes dois capítulos serão, respectivamente, 2 % e 26 % do orçamento. No que toca às despesas para a agricultura, há que ter em conta que o alargamento da União e a reforma das organizações comuns de mercado suscitarão novos reptos para a PAC a que importa dar resposta.

5.   Observações na especialidade

5.1

Nem o texto da comunicação, nem o terceiro relatório sobre a coesão económica e social abordam uma questão que terá fortes repercussões no orçamento comunitário, nomeadamente a livre circulação dos trabalhadores dos dez novos Estados-Membros no mercado de trabalho dos quinze actuais e a aplicação do período transitório de dois, cinco ou sete anos. Neste domínio, põe-se a questão de saber em que medida as restrições de emprego impostas pelos quinze aos trabalhadores dos dez novos países aderentes pesarão no grau de desenvolvimento económico e social esperado.

5.2

Um outro tema a debater é a correlação entre a contribuição dos fundos europeus e o grau de adopção e de respeito dos compromissos assumidos pelos dez novos Estados-Membros.

5.3

Para examinar as perspectivas económicas de um dado período, importa analisar separadamente os recursos próprios, por um lado, e as despesas orçamentais, por outro. A comunicação da Comissão parte de um sistema comparável: o capítulo 4 é consagrado à nova estrutura financeira, insistindo nas despesas, enquanto o capítulo 5 reflecte sobre o sistema de financiamento.

5.4

O presente parecer concentra-se no exame das despesas, dado que o CESE voltará à questão dos recursos próprios quando a Comissão submeter ao Conselho o relatório sobre o tema.

5.5

Na fase actual, o CESE não pode deixar de frisar o seguinte:

o lançamento de um imposto comunitário (pago directamente pelos cidadãos comunitários para reforçar o orçamento) constitui uma sugestão positiva e interessante. Convém, porém, usar da maior circunspecção antes de lançar qualquer imposto comunitário, para evitar suscitar reacções anti-europeias,

afigura-se desejável fixar um novo sistema de contribuições, mais equitativo do que o actual. Um simples exame da razão entre as contribuições e os benefícios revela que o funcionamento comunitário na matéria não atende ao nível de rendimento per capita dos diferentes Estados-Membros, que, não obstante, constitui um bom indicador da riqueza dos seus cidadãos.

5.5.1

Ao invés, o CESE manifesta fortes reservas quanto ao mecanismo de correcção generalizado que mais não faria do que institucionalizar o princípio da «contrapartida justa». Trata-se de uma forma de solidariedade dos países menos ricos que é inaceitável. Num relatório de 1998 (5), a Comissão tinha procedido a simulações sobre as implicações de tal mecanismo, concluindo que, em 1996, na hipótese de o mecanismo corrector generalizado ter sido aplicado a 5 países (UK, DE, NL, AT, SE: 48,7 % do PIB) e, na circunstância da sua exclusão do financiamento da correcção, a carga orçamental teria sida repartida entre os dez outros países representando 48,9 % do PNB da UE! O recente alargamento a países com um nível de vida menos elevado viria agravar ainda mais esta injustiça.

5.5.2

Em qualquer caso, a revelar-se necessário um mecanismo de correcção generalizado, o CESE opina que, na correcção dos desequilíbrios, não deveriam ser consideradas as despesas incorridas por conta das intervenções estruturais, posto que perseguem explicitamente um objectivo de redistribuição.

5.5.3

O CESE pensa que, na perspectiva da instauração de um mecanismo corrector generalizado, os saldos orçamentais deveriam ser calculados unicamente na base das despesas operacionais, como já foi dito em Berlim, em 1999. Desta forma, evitar-se-iam efeitos perversos decorrentes da imputação das despesas administrativas da União e das despesas para as políticas comunitárias ao país onde tais despesas vão ser efectivamente efectuadas, o que aliás seria mais coerente com o método dito direct budgeting, segundo o qual as despesas administrativas estão ligadas às despesas operacionais que as geram e que levou à discriminação das dotações das despesas administrativas por todas as categorias.

5.6

Ademais, quanto à questão dos recursos indirectos, o CESE remete para a proposta formulada no parecer sobre a generalização e a interoperabilidade dos sistemas de teleportagem rodoviária na Comunidade (6) no que se refere à criação de um Fundo Europeu de Infra-estruturas de Transportes, que seria financiado pelo pagamento de 1 cêntimo por litro de combustível consumido nas estradas e auto-estradas, por todas as categorias de veículos.

5.7

O CESE faz sua a sugestão da Comissão de fazer coincidir o novo quadro financeiro com a duração do mandato das instituições europeias (Parlamento, Comissão).

5.7.1

O CESE regozija-se com a inscrição das perspectivas financeiras na Constituição, já que conferirá mais estabilidade ao quadro financeiro da UE.

5.7.2

O CESE não pode, porém, deixar de lamentar que o Conselho Europeu não tenha incluído a proposta da Convenção Europeia segundo a qual as perspectivas financeiras seriam adoptadas por maioria qualificada a médio prazo. Com efeito, o Conselho Europeu preferiu conservar a unanimidade fazendo-a acompanhar da possibilidade de passar à maioria qualificada sempre que a decisão fosse adoptada por unanimidade no Conselho Europeu. O CESE receia, com efeito, que a manutenção da unanimidade venha a precipitar a União numa grave crise constitucional ou que as ambições políticas da União saiam enfraquecidas.

5.8

O CESE sustenta a proposta que faria do Parlamento Europeu a principal instância incumbida do orçamento comunitário, tornando-o integralmente responsável tanto pelas despesas obrigatórias como pelas não obrigatórias.

5.9

O CESE crê útil assinalar que, apesar dos reptos lançados pela estratégia de Lisboa e as iniciativas que ela induz, o texto da Comissão não parece propor medidas concretas, capazes de suscitar acções de desenvolvimento económico na União. A única ideia prática que emerge do documento (capítulo IV – O novo quadro financeiro, ponto C — Flexibilidade) consiste na criação de um fundo especial de acompanhamento do crescimento embora com recursos insuficientes. O CESE recorda a propósito que a concretização da estratégia de Lisboa se funda na hipótese de uma taxa de crescimento média anual de 3 %, enquanto as previsões para os próximos anos não excedem 2,3 % na Europa dos vinte e sete. Mais, com o crescimento económico anémico que a caracteriza desde 2000, a União não chega a reabsorver o «défice de crescimento económico».

5.10

Impõe-se, por conseguinte, elevar os montantes em causa a fim de respeitar o princípio fundamental que condiciona a progressão e o êxito da estratégia de Lisboa – a mudança do sistema vigente no que se refere ao investimento na formação e na investigação.

Bruxelas, 15 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  COM(2004) 107 final (não existe versão portuguesa).

(2)  COM(2004) 101 final, de 10 de Fevereiro de 2004.

(3)  CESE 661/2004 de 28.4.2004.

(4)  Parecer do CESE sobre a «Política orçamental e tipo de investimento»in JO C 110 de 30.4.2004, p. 111.

(5)  O financiamento da União Europeia: Relatório da Comissão sobre o funcionamento do sistema de recursos próprios.

(6)  JO C 32 de 5.2.2004, p. 36, ponto 4.1.


23.3.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 74/39


Parecer do Comité Económico E Social Europeu sobre «O papel das organizações de mulheres como agentes não governamentais na aplicação do Acordo de Cotonou»

(2005/C 74/08)

Em 17 de Janeiro de 2002, o Comité Económico e Social Europeu decidiu elaborar, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, um parecer sobre «O papel das organizações de mulheres como agentes não governamentais na aplicação do Acordo de Cotonou».

A Secção Especializada de Relações Externas, incumbida de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu o parecer em 7 de Julho de 2004, com base no projecto da relatora, S. FLORIO.

Na 411.a reunião plenária (sessão de 15 de Setembro de 2004), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 115 votos a favor, 8 votos contra e 8 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

No âmbito das actividades respeitantes às políticas da União Europeia nos países em desenvolvimento, e em particular nos ACP, o Comité Económico e Social Europeu teve o ensejo de analisar a forma como a política de cooperação da UE tem evoluído. A evolução vai cada vez mais no sentido de uma abordagem participativa, isto é, inclusão dos agentes não estatais e reconhecimento do seu papel na definição e aplicação das pertinentes políticas, pelo que as instituições e os agentes não estatais (ANE) exercem uma função complementar no reforço do impacto dos programas de desenvolvimento.

O Acordo de Cotonou é até à data o único caso em que esta participação foi institucionalizada, ao exigir dos governos que associem plenamente os agentes não estatais às diversas fases das estratégias nacionais de desenvolvimento.

1.2

Atendendo a estas orientações e ao facto de que o Comité já se exprimiu num precedente parecer sobre o «Papel da sociedade civil na política europeia de desenvolvimento» (REX 097/2003), é importante que se aprofunde o tema da participação das mulheres e do seu contributo fundamental e específico para a definição e execução das políticas de desenvolvimento nos países ACP, incluindo as estabelecidas nos Acordos de Cotonou; reputamos útil sublinhar a importância de que se reveste o papel das mulheres e a necessidade de o valorizar no âmbito destes Acordos, bem como no quadro de todas as políticas de desenvolvimento.

1.3

De resto, enquanto organismo da UE representativo da sociedade civil, o Comité já afirmou no passado «o papel fundamental das mulheres enquanto agentes de desenvolvimento de primeira linha e vinca a necessidade de promover as suas organizações e assegurar-lhes participação equitativa nos órgãos de consulta e decisão.» («parecer sobre o Livro Verde sobre as relações entre a União Europeia e os países ACP no limiar do séc. XXI — desafios e opções para uma nova parceria», relator H. MALOSSE, EXT 152/1997).

A participação efectiva dos agentes não estatais, em geral, e das mulheres, em particular, está muito longe de ser uma realidade.

2.   Observações na generalidade

2.1

O último relatório do Banco Mundial (World Development Report 2004) reconhece explicitamente que o mercado global já não se adequa ao desenvolvimento económico e social e ao crescimento do emprego, mostrando-se sobretudo incapaz de remover os obstáculos que impedem o crescimento equitativo e sustentável de todos os países dos hemisférios Norte e Sul. Em 2002, o rendimento per capita de cinco sextos da população mundial era inferior a 1 200 dólares, contra um rendimento médio de mais de 26 000 por habitante para o resto da população, que na sua esmagadora maioria vive nos países mais ricos.

2.2

Actualmente, nenhuma instituição internacional (FMI, BM, OMC, OIT, ONU, etc.) pode agir como instância «reguladora» democrática e global nem consegue, só por si, reduzir as disparidades de desenvolvimento económico entre países e estratos sociais.

2.3

Além disso, e particularmente num período de fraco crescimento económico na maioria dos países, os países em desenvolvimento vêem-se impelidos a adoptar políticas económicas de ajustamento estrutural, preconizadas ou impostas por organismos internacionais, que impõem medidas dificilmente sustentáveis que penalizam sobretudo as camadas mais desfavorecidas da população. As mudanças estruturais, porque não acompanhadas de políticas de protecção social adequadas, provocaram o aumento da pobreza, da precariedade e da insegurança nas camadas mais vulneráveis, e isto tanto nos países do hemisfério Norte como nos do Sul.

2.4

Nos últimos anos acentuou-se, além disso, o fosso entre a economia global formal e a economia local informal. As pessoas que vivem no sector da economia informal não gozam de direitos nem participam no crescimento económico do país, se bem que para ele contribuam.

2.5

As mulheres são maioritárias nesta faixa da população, pelo que são as que mais sofrem com esta situação. As mulheres que vivem na pobreza nos países em desenvolvimento não só não acedem a bens e serviços como também são vítimas de graves violações de direitos humanos, sociais e económicos.

2.6

A pobreza, o desemprego e o subemprego afectam sobretudo as mulheres.

2.7

As várias conferências organizadas pelas Agências e Comissões das Nações Unidas desembocaram em numerosas propostas respeitantes a políticas, acções e projectos em prol das mulheres. Na mais recente – a Conferência sobre «Os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio» — foram aprovados dois documentos essenciais, nos quais figuram, entre os temas mais debatidos, os direitos das mulheres à igualdade de oportunidades e à plena participação nos processos de decisão, bem como a necessidade de prevenção das doenças e a defesa da saúde.

3.   As instituições europeias e as políticas de integração das questões de género

3.1

O artigo 3.o do Tratado dispõe que a UE procura eliminar as desigualdades e promover a igualdade entre homens e mulheres em todas suas actividades, incluindo a cooperação para o desenvolvimento.

3.2

A Comunidade e seus Estados-Membros são signatários da Declaração de Pequim e da Plataforma de Acção, aprovadas na Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada em Pequim em 1995, que lançavam uma verdadeira estratégia para remover todos os obstáculos existentes em matéria de igualdade entre os sexos e consagravam o princípio de integração das questões de género (mainstreaming) para promover essa igualdade. Na sequência do compromisso assumido em Pequim com a assinatura da Plataforma, foi aprovado o Regulamento CE n.o 2836/98 relativo à integração das questões de género na cooperação para o desenvolvimento.

3.3

Este texto, que chegou ao seu termo de vigência em Dezembro de 2003, foi substituído por um novo regulamento para o biénio de 2004-2006, que reforça substancialmente os seus objectivos, isto é, apoiar o mainstreaming juntamente com medidas específicas a favor das mulheres e com a promoção da igualdade entre homens e mulheres como importante contributo para reduzir a pobreza. O documento insiste também no apoio a acções empreendidas pelos sector público e privado nos países em desenvolvimento, cujo objectivo é favorecer a igualdade entre homens e mulheres.

3.4

O regulamento do Parlamento e do Conselho relativo à «promoção da igualdade entre homens e mulheres na cooperação para o desenvolvimento» pode ser considerado importante ponto de referência para as políticas de cooperação. Os sectores de intervenção tidos por prioritários e objecto de particular atenção são o controlo por parte das mulheres dos recursos e dos serviços, em especial na área da educação, do emprego e da participação no processo decisório. O documento insiste na necessidade de se dispor de estatísticas discriminadas por sexo e por idade, para que se possa desenvolver e difundir novos métodos de intervenção, análises, estudos de impacto, etc.

4.   Cotonou: abordagem participativa e questões de género

4.1

O Acordo de Cotonou, assinado em 23 de Junho de 2000 com os países ACP, constitui um ponto de viragem nas políticas comerciais e de desenvolvimento da UE, já que é a primeira vez que os agentes não estatais vêem garantida a sua participação na definição das estratégias de desenvolvimento nacionais e reconhecida uma função complementar da das instituições estatais. O Acordo define como agentes não governamentais o sector privado, os parceiros económicos e sociais, incluindo as organizações sindicais, a sociedade civil sob todas as suas formas segundo as características nacionais.

4.2

O texto dispõe que os agentes não estatais devem ser informados e consultados sobre as políticas de cooperação, as prioridades de cooperação nos domínios que lhes dizem respeito e sobre o diálogo político; beneficiam de recursos financeiros para apoiar os processos de desenvolvimento local; devem participar na execução de projectos e programas nas zonas ou sectores que lhes dizem respeito; por último, recebem apoio para reforçar as suas capacidades e aumentar as suas competências, em particular no atinente à organização, representação e execução de mecanismos de consulta, de intercâmbio e de diálogo para promover alianças estratégicas.

4.3

Além disso, e em conformidade com as políticas da União Europeia, o Acordo põe em evidência a relação existente entre política, comércio e desenvolvimento. Com efeito, a parceria assenta em cinco pilares interdependentes: dimensão política global, promoção da abordagem participativa, objectivo de redução da pobreza, estabelecimento de um novo quadro de cooperação económica e comercial e reforma da cooperação financeira.

4.4

Além disso, as estratégias de desenvolvimento deveriam ter sistematicamente em consideração as questões de género, que constituem um dos três temas transversais do Acordo (artigos 8.o e 31.o).

4.5

Neste quadro, o Acordo de Cotonou institucionaliza o papel do Comité como interlocutor privilegiado dos grupos de interesse económicos e sociais dos países ACP, conferindo-lhe expressamente um mandato de consulta das organizações da sociedade civil.

5.   Participação das associações, ONG e organizações de mulheres

5.1

Tendo em conta as orientações da União em matéria de participação e de perspectiva de género, bem como a função cometida ao Comité pelo Acordo, parece-nos útil aprofundar o papel específico das mulheres e da sua participação no diálogo civil no âmbito do Acordo de Cotonou.

5.2

Atendendo ao grande número de países ACP, para além do mais pertencentes a áreas geográficas diferentes, as mulheres destes países não constituem um grupo homogéneo. As diferenças são profundas consoante a região, o contexto cultural, a categoria económica e social, o nível de rendimento, o meio — rural ou urbano — em que vivem. Mas porque não podemos fugir a determinadas generalizações, é importante estudar de que modo podem as mulheres ser associadas aos processos de participação previstos nos Acordos de Cotonou.

5.3

Uma primeira dificuldade reside no facto de as «Orientações sobre os princípios e as boas práticas para a participação dos intervenientes não governamentais nas consultas e no diálogo sobre desenvolvimento» só marginalmente mencionarem as questões de género, e de as avaliações preliminares das disposições do Acordo de Cotonou sobre a participação de agentes não estatais na definição das estratégias nacionais (23 de Janeiro de 2004) não fornecerem dados quantitativos nem qualitativos sobre a presença das mulheres.

5.4

De testemunhos recolhidos em fóruns e seminários regionais infere-se que a participação das associações, ONG e organizações de mulheres na definição das estratégias nacionais é muito escassa na maioria dos casos.

5.5

É grande o fosso entre, por um lado, intenções proclamadas e dispositivos do Acordo e, por outro, a sua aplicação prática. Igualmente escassas são, de resto, as acções e medidas que visam facilitar a participação das mulheres.

5.6

Não há dúvida que em contextos onde já é difícil criar e estruturar um diálogo com a sociedade civil, mais difícil é pretender aumentar o espaço de acção das mulheres. Acresce que a aplicação das disposições do acordo sobre participação é um processo ainda in fieri que tem como protagonistas a Comissão, cujo papel pode, segundo se crê, ser fundamental, os governos, ou os próprios agentes não governamentais, cuja potencialidade, competências e nível de organização variam de área para área.

5.7

Os obstáculos à realização de uma abordagem participativa são vários e de natureza diversa. Entre eles importa mencionar, como já foi assinalado em anterior parecer (1):

forte resistência por parte da maioria dos governos nacionais a dialogar com os agentes não estatais;

reduzidas possibilidades de os agentes não estatais (ANE) terem uma acção concreta na definição dos programas e das estratégias de desenvolvimento, mesmo quando esse diálogo está previsto;

elevado grau de centralização administrativa que existe naqueles países que, ao não favorecer a participação dos ANE em geral, tende a marginalizar as realidades locais periféricas, em particular as rurais, que são as mais difíceis de alcançar e, amiúde, as mais pobres;

falta de regras e normas precisas que rejam efectivamente a participação dos agentes não estatais;

escasso nível de organização da sociedade civil dos países terceiros; não raro, o principal problema é desenvolver as potencialidades dos agentes que deveriam participar no processo;

acesso ao financiamento, que está estreitamente ligado à difusão e acesso à informação; com efeito, os agentes não estatais dos países terceiros queixam-se da falta de um sistema de difusão das informações e de os procedimentos previstos para a concessão de financiamento serem, na maior parte dos casos, demasiado dispendiosos e complicados.

5.8

No que se refere à participação das mulheres, estes obstáculos avolumam-se devido a condições objectivas ligadas, por um lado, a factores socioeconómicos, culturais e religiosos e, por outro, ao facto de muitos governos estarem pouco familiarizados com os direitos fundamentais em geral, e com os direitos das mulheres, em particular.

5.9

Deste ponto de vista, o Acordo de Cotonou considera que o respeito dos direitos do homem, dos princípios democráticos e do Estado de direito são elementos essenciais da parceria e prevê a adopção de medidas contra os prevaricadores em caso de violação grave. Todavia, como o Comité teve o ensejo de referir em anterior parecer («O Acordo de associação ACP-UE», relator R. BAEZA SAN JUAN), deveria ter-se fixado critérios mais restritos para a salvaguarda desses princípios.

6.   As mulheres nos processos de desenvolvimento e os temas prioritários de intervenção

6.1

Na realidade, o tema da participação das mulheres na sociedade civil está intimamente ligado ao papel que desempenham no processo de decisão e em todo o processo de desenvolvimento e, neste sentido, seria porventura útil alargar o campo de reflexão.

6.2

As mulheres podem contribuir consideravelmente para os processos de desenvolvimento, mas também devem poder usufruir de todos os benefícios e oportunidades que o desenvolvimento proporciona.

6.3

Com efeito, nos países em desenvolvimento e, em particular nos ACP, as mulheres são o elo fraco da sociedade e as mais atingidas pela pobreza e as privações, porque não têm acesso aos recursos, que lhes permitam melhorar as condições de vida e contribuir para o desenvolvimento económico do país.

6.4

O acesso aos recursos e respectivo controlo é, pois, condição indispensável para combater a pobreza e desencadear processos de desenvolvimento sustentável e duradouro.

Além disso, quando as mulheres participam na actividade económica fazem-no principalmente no sector informal, isto é o sector mais vulnerável face às políticas macroeconómicas de reestruturação.

6.5

Não obstante os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio a que a União Europeia aderiu, tendo em vista reduzir a pobreza para metade até 2015, existe o perigo de os negociadores de ambas as partes se centrarem unicamente nos efeitos das vertentes macroeconómica e política, em detrimento dos objectivos mais vastos e do impacto das medidas negociadas sobre as diferentes camadas da população. Haverá que apoiar as acções da Comissão destinadas a criar instrumentos que avaliem os efeitos dos referidos acordos.

6.6

De entre os temas tratados em documentos das Nações Unidas, da FAO e de outros organismos internacionais, é possível referir alguns (lista não exaustiva):

—   Educação e formação

Está demonstrado que promover a educação e a formação não significa apenas melhorar as condições de vida das pessoas, antes tem repercussões positivas para toda a comunidade local. A correlação entre educação e outras áreas da economia e da sociedade e a maneira como isto se repercute no papel que as mulheres (escolarizadas) desempenham na sociedade são aspectos que muitos estudos, pesquisas e estatísticas têm posto em evidência. Por isso é fundamental favorecer o acesso à educação e à formação, designadamente nas zonas rurais e mais pobres dos países em desenvolvimento, e garantir a sua gratuidade aos homens como às mulheres. Ainda hoje, 24 % das raparigas em idade de frequentar o ensino primário não estão escolarizadas (contra 16 % de rapazes). Nos países em desenvolvimento 61 % dos homens possuem, pelo menos, uma escolaridade de base, contra 41 % das mulheres.

—   Acesso aos recursos

O acesso aos recursos financeiros, em especial a possibilidade de as mulheres poderem aceder com facilidade ao empréstimo bancário, aos micro-créditos, à poupança e aos serviços de seguros, deve ser considerada uma das intervenções prioritárias. A informação sobre estes instrumentos é, porventura, uma das possíveis «chaves» da intervenção. Neste sentido, já foram apresentadas à ONU algumas recomendações, em particular sobre a melhoria do acesso das mulheres aos recursos financeiros. Além disso, tendo em conta as rápidas mutações na economia e no mercado global, todos os aspectos referentes aos recursos em prol do desenvolvimento deveriam ser analisados do ponto de vista das mulheres. As disparidades entre homens e mulheres no atinente ao acesso aos recursos económicos, aos bens públicos e serviços e à propriedade da terra privaram as mulheres de direitos fundamentais, de oportunidades económicas, de poder, bem assim da possibilidade de fazerem ouvir a sua voz independente nos processos políticos e na tomada de decisões.

—   Políticas de emprego

Se bem que a participação das mulheres no mercado de trabalho registe pequenos passos em frente, não se pode falar de igualdade de oportunidades no acesso ao trabalho, formal e equitativamente remunerado, nos países ACP. O sector informal representa a primeira fonte de rendimento e de emprego nos países em desenvolvimento. As mulheres foram as primeiras vítimas da supressão de postos de trabalho em numerosos países ACP, tendo sido empurradas para o desemprego ou para formas de trabalho informal e precário, com níveis de remuneração muitas vezes aquém do limiar de sobrevivência. A possibilidade de aceder ao microcrédito, de favorecer a microempresa feminina e a posse da terra é fundamental para garantir uma vida digna, mas segundo dados da FAO (Organização para a Alimentação e Agricultura) as mulheres estão praticamente excluídas deste direito em muitos países em desenvolvimento. A análise dos sistemas de crédito em cinco países africanos revela que as mulheres recebem 10 % do crédito destinado aos pequenos proprietários, destinando-se os restantes 90 % aos homens.

—   A mulher e a saúde

A saúde reprodutiva e, em geral, o direito das mulheres à saúde são conceitos ainda desconhecidos em muitos países em vias de desenvolvimento, o que tem repercussões extremamente negativas não só para as mulheres, cuja vida corre perigo, mas também para a sociedade em geral. Para ilustrar a gravidade da situação basta pensar nas dificuldades que se levantam ao tratamento e à prevenção da SIDA e nas repercussões da propagação de doenças sobre os sistemas económicos e sociais de muitos países, em particular na África Subsariana.

As diferenças sexuais e biológicas entre homens e mulheres reflectem-se igualmente na área da saúde e da higiene pessoal. O papel e o estatuto conferidos às mulheres não reflectem as suas legítimas necessidades de acesso adequado à assistência sanitária e medicamentosa e, além disso, não têm em conta as responsabilidades que exercem na sociedade. É muito escassa a atenção dada às necessidades específicas das mulheres, o que tem efeitos negativos ao longo da sua vida. Este quadro é ainda mais negro quando o contexto sociocultural tende a justificar abusos físicos, psicológicos e sexuais sobre mulheres.

—   Combate a todas as formas de violência contra as mulheres

O combate à violência contra as mulheres continua a ser uma das batalhas mais árduas de travar e quantificar. Basta pensar na violência doméstica, já difícil de denunciar nas sociedades ocidentais, nas mutilações genitais e no tráfico de seres humanos, em constante expansão. As principais vítimas deste fenómeno, que se traduz por escravidão sexual, outras formas de trabalho forçado e violação dos direitos humanos, são as mulheres e as crianças e, em especial, as que vivem em países devastados por guerras e conflitos.

7.   Recomendações

7.1

É necessário definir com maior clareza e determinação os objectivos destinados a apoiar as mulheres, bem como as medidas a tomar se a União Europeia quiser realmente melhorar as condições de vida das mulheres e dos pobres. Impõe-se grande vigilância em relação às políticas de ajustamento cujos efeitos penalizaram as mulheres e, em geral, as camadas mais vulneráveis da população, por forma a que estes estratos sociais retirem vantagens das transformações operadas.

7.2

Neste sentido, afigura-se necessário que a avaliação dos acordos comerciais da UE com os países terceiros, e especialmente os ACP, inclua análises específicas do impacto que eles terão nas condições de vida das camadas mais pobres da população e nas questões de género.

7.3

O investimento para reforçar associações e as ONG que trabalham pela igualdade entre os sexos e pela responsabilização das mulheres é essencial para melhorar as condições económicas, sociais e políticas nos países em desenvolvimento e consolidar o crescimento social e económico compatível com o desenvolvimento sustentável.

7.4

Do atrás exposto fica claro que não se trata simplesmente de promover uma maior integração das mulheres na sociedade civil, mas antes, e sobretudo, de criar as condições de base da sua real participação, valorização e apoio, a fim de que elas beneficiem das mesmas oportunidades que os homens com vista ao desenvolvimento dos respectivos países. O reforço do papel das mulheres no processo participativo constitui, de facto, um momento decisivo na aquisição de poder de decisão.

7.5

A condição de base mais importante é, em todo o caso, reconhecer às mulheres a igualdade no direito de acesso ao ensino e à formação. A este propósito dever-se-ia favorecer os programas e projectos com esse fim, desde a alfabetização ao apoio à informatização e à construção de redes de associações femininas, como pilar e garantia de participação e valorização do papel da mulher no desenvolvimento nacional.

7.6

No âmbito do processo de descentralização realizado pela Comissão, é crucial o papel das delegações tal como vem definido nas orientações gerais sobre os princípios e as boas práticas para a participação dos agentes não estatais (24.2.2002). Dado que as delegações gozam de grande flexibilidade na escolha dos meios necessários, cabe-lhes promover a participação o mais alargada possível dos agentes não estatais. Se bem que as referidas orientações não sejam explícitas quanto à participação e ao papel das organizações de mulheres, pensamos que as delegações podem desenvolver uma acção importante para favorecer a participação das mulheres no diálogo civil, criar redes e gizar uma estratégia de desenvolvimento das capacidades especificamente virada para as mulheres.

Deveriam ser conferidas responsabilidades específicas às delegações para promover a igualdade entre homens e mulheres e, pelo menos um representante deveria receber formação apropriada em questões de género.

7.7

Particular atenção deverá ser dada à identificação das realidades existentes na área do associativismo feminino e suas características próprias, já que é escassa a informação nesta matéria.

O próprio Comité poderia contribuir para identificar as associações e organizações internacionais europeias que desenvolvem esforços para promover a participação das mulheres nos países ACP.

7.8

Os documentos sobre às estratégias nacionais deveriam prever expressamente a participação das mulheres na redacção dos mesmos, bem como nas iniciativas e acções positivas de apoio às actividades das respectivas associações. Entendemos que a Comissão pode ter uma certa influência neste campo.

O Comité convida a Comissão a abrir uma linha de financiamento específica para as organizações femininas da sociedade civil dos países ACP.

7.9

Seria importante criar canais preferenciais para as organizações de mulheres quer no atinente aos critérios de elegibilidade dos agentes não estatais, quer no que diz respeito ao acesso ao financiamento.

7.10

A realização de cursos de formação para promover actividades das associações e organizações de mulheres que trabalham no terreno, no âmbito dos acordos de Cotonou, poderia revestir-se de grande utilidade para a vida dessas mesmas associações.

7.11

O Comité compromete-se a promover a organização de seminários que possam seleccionar e aprofundar temas referentes ao estatuto e à participação das mulheres nos países ACP.

7.12

O Comité solicitará uma participação igual de delegações femininas nos seminários e promoverá encontros com mulheres e respectivas associações tanto nos países ACP como em países terceiros em geral.

7.13

Compromete-se a organizar, no primeiro semestre de 2005, uma conferências com os referidos interlocutores, que tenha por objectivo valorizar o papel das mulheres nos processos de decisão, identificar os obstáculos e definir estratégias que tenham por base o ponto de vista das mulheres como protagonistas que são do desenvolvimento.

Bruxelas, 15 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  «O papel da sociedade civil na política europeia de desenvolvimento» (REX 097/2003).


23.3.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 74/44


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Rumo ao 7.o programa-quadro em matéria de investigação: As necessidades de investigação no domínio das mutações demográficas — Qualidade de vida dos idosos e necessidades tecnológicas»

(2005/C 74/09)

Em 29 de Janeiro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, emitir um parecer sobre o tema: «Rumo ao 7.o programa-quadro em matéria de investigação: As necessidades de investigação no domínio das mutações demográficas — Qualidade de vida dos idosos e necessidades tecnológicas»

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 14 de Julho de 2004, sendo relatora R. HEINISCH.

Na 411.a reunião plenária de 15 e 16 de Setembro de 2004 (sessão de 15 de Setembro), o Comité adoptou, por 144 votos a favor, 1 voto contra e 2 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Resumo

1.1

Tendo em conta as mutações demográficas, bem como as oportunidades e os riscos para a qualidade de vida do número cada vez maior de pessoas idosas na Europa, o Comité apela

a)

à inserção no 7.o programa-quadro em matéria de investigação de uma acção-chave neste domínio e

b)

à adopção de medidas de acompanhamento visando criar bases fundamentadas de decisão, que permitam planificar, decidir e actuar politicamente em tempo útil, tanto a nível nacional como europeu.

Justificação

Os aspectos biológicos, psicológicos, sociais, culturais, tecnológicos, económicos e estruturais do envelhecimento estão estreitamente interligados. Paralelamente, o envelhecimento acontece num contexto sócio-espacial concreto, que, na Europa, se caracteriza por profundos contrastes geográficos, culturais e sociais. Estes dois aspectos — o carácter multidimensional do processo de envelhecimento, bem como as diferentes circunstâncias em que o mesmo se desenvolve — não são devidamente tidos em conta nos actuais programas de investigação. Contudo, só uma investigação alargada e duradoura permitirá elaborar de modo sustentado as bases de planificação e de decisão necessárias nos diversos sectores da sociedade e em todos os níveis de poder, atendendo às alterações da estrutura etária da população.

Em relação à alínea a), carecem de investigação os seguintes aspectos:

política económica e financeira (4.1)

trabalho e emprego (4.2)

realidade quotidiana dos idosos (4.3)

universo sócio-espacial (4.4)

aprendizagem ao longo da vida (4.5)

preservação da saúde e cuidados de saúde (4.6)

novas tecnologias (4.7)

tratamento, coordenação e complemento dos conhecimentos actuais (4.8).

O carácter multidimensional do processo de envelhecimento, bem como as diferentes circunstâncias culturais, económicas e estruturais em que o mesmo se desenvolve tornam necessária uma investigação multi e interdisciplinar a longo prazo.

Quanto à alínea b), as seguintes medidas de acompanhamento são consideradas particularmente necessárias para garantir o cumprimento do artigo 85.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que reconhece às pessoas idosas o direito a uma existência condigna e à sua participação activa na vida cívica e nos processos de decisão:

aplicação do «método aberto de coordenação», a fim de adoptar uma abordagem uniformizada para os indicadores da qualidade de vida dos idosos nos países europeus e sua recolha, possibilitar o intercâmbio de experiências, a comparação inter-europeia e a aprendizagem mútua, promover o diálogo entre os representantes da sociedade civil organizada e as competentes direcções-gerais da Comissão e chegar a consenso sobre concepções comuns em relação ao envelhecimento da sociedade.

criação de um observatório comum (Observatório Europeu) com vista à instalação de uma Agência Europeia do Envelhecimento e de um banco de dados com o objectivo de produzir, compilar e difundir conhecimentos, a fim de melhorar o método aberto de coordenação e deles extrair conclusões importantes do ponto de vista político e prático;

criação no CESE de uma categoria denominada «Estatísticas do Envelhecimento»;

organização de seminários e conferências a fim de melhor compreender as mutações demográficas e a necessidade de medidas preventivas de acompanhamento, aumentar a consciencialização, difundir o mais amplamente possível os resultados da investigação e promover o intercâmbio entre os «antigos» e os «novos» Estados-Membros, bem como

Objectivo:

Criação de uma base de conhecimentos global

tendo em vista determinar as medidas políticas destinadas a manter e, se necessário, melhorar a qualidade de vida das actuais e futuras gerações de idosos, e

reforçar o desenvolvimento económico e a competitividade da Europa face às potencialidades proporcionadas pelas mutações demográficas.

2.   Introdução

2.1

A alteração da estrutura demográfica é, ao mesmo tempo, um dos grandes sucessos históricos e um desafio actual do nosso tempo. Nunca até agora gerações inteiras puderam legitimamente ter a esperança e a expectativa de que a sua velhice se prolongasse por muitos anos. Esta recém-surgida fase da vida oferece um vasto leque de oportunidades, mas envolve também obrigações completamente novas, tanto para os cidadãos como para a sociedade. Na maior parte dos países europeus, muitos idosos têm rendimento suficiente e competências físicas e cognitivas para viver esses anos com satisfatória autonomia, daí resultando novas oportunidades de desenvolvimento económico e social. Com a idade aumenta, porém, o risco de diminuírem as competências físicas, sensoriais e cognitivas com as consequentes limitações funcionais. Para além disso, existem também grupos na sociedade sem recursos materiais, sociais e pessoais suficientes que lhes garantam envelhecer com dignidade. É o que se passa, sobretudo, com muitas mulheres idosas que vivem sozinhas. Também entre os países europeus existem grandes diferenças nesta perspectiva. Além disso, o alargamento da estrutura etária em todos os países exigirá uma redistribuição dos meios existentes e a adaptação dos sistemas de saúde e de segurança social. O envelhecimento da população afecta, se bem que a ritmos um tanto diferentes, todos os países da União Europeia. No seu relatório sobre as actividades do CESE 2000-2002, o presidente afirma:

2.2

«O Comité chamou também a atenção para os preocupantes prognósticos demográficos, com o seu impacto no emprego, na saúde pública e nas pensões».

2.3

Estes prognósticos servem de ponto de partida ao presente parecer de iniciativa sobre «As necessidades de investigação no domínio das mutações demográficas – Qualidade de vida dos idosos e necessidades tecnológicas», no qual se apela à inserção no 7.o programa-quadro em matéria de investigação de uma acção-chave neste domínio, que inclui dois aspectos distintos, mas estreitamente ligados: em primeiro lugar, as mutações demográficas enquanto tais, provocadas, por um lado, pela diminuição da taxa de natalidade e consequente alteração da estrutura familiar e, por outro, pelo aumento da expectativa de vida da população. Em segundo lugar, o envelhecimento e a velhice como fase de vida autónoma com o seu enorme potencial de inovações sociais, culturais, organizacionais, tecnológicas e económicas, mas também riscos. Ambos os aspectos requerem investigação sobre as consequências para toda a sociedade e a necessidade de uma actuação política adequada (macro-escala), mas também sobre as consequências e a necessidade de uma actuação política destinada a garantir a qualidade de vida dos mais velhos, tendo em conta também as situações específicas relativas ao sexo (micro-escala).

3.   Contexto e justificação do parecer de iniciativa

3.1

A novidade das mutações demográficas e as alterações que provocam na estrutura social e da população aumentam a necessidade de aprofundar os conhecimentos, para que possam ser avaliadas as implicações para o desenvolvimento global da sociedade e criadas bases fundamentadas de decisão, que permitam planificar, decidir e actuar politicamente em tempo útil, tanto a nível nacional como europeu. Pareceres do CESE e comunicações da Comissão em matéria de política de emprego (1), integração social (2), cuidados de saúde, aprendizagem ao longo da vida (3), etc. apontam também nesta direcção.

3.2

Uma tal base de conhecimentos constitui, ao mesmo tempo, o requisito indispensável a inovações sociais, organizacionais, económicas e tecnológicas, as quais podem contribuir, por um lado, para assegurar a qualidade de vida das pessoas idosas e, por outro, para aliviar os sistemas de saúde e de segurança social. Em especial, o aumento rápido do número de pessoas de idade avançada, que determina em parte a existência simultânea de várias gerações de idosos, torna também necessários serviços e profissões completamente novos.

3.3

Os projectos apoiados no âmbito da acção-chave «Envelhecimento da população» (acção-chave 6) do programa temático «Qualidade de vida e gestão dos recursos vivos» do 5.o programa-quadro em matéria de investigação já produziram vários resultados importantes. A Direcção-Geral da Investigação publicou recentemente um relatório intercalar sobre os conhecimentos e as experiências no âmbito desta acção-chave multidisciplinar. A aplicação dos resultados dos projectos no âmbito do programa telemático pode também contribuir para melhorar a qualidade de vida dos idosos e das pessoas com deficiência. Todavia, ainda não se generalizou a abordagem integrada, tal como representada no programa telemático no final da década de noventa.

3.4

O 6.o programa-quadro prossegue o apoio à investigação sobre o envelhecimento da população e suas consequências individuais e sociais unicamente num número reduzido de subdomínios das prioridades temáticas: «Ciências da vida, genómica e biotecnologia para a saúde» (prioridade 1), «Tecnologias da Sociedade da Informação» (prioridade 2), «Cidadãos e governação na sociedade do conhecimento» (prioridade 7) e «IDT para apoio às políticas e previsão das necessidades científicas e tecnológicas» (prioridade 8). bem como ERA-NET

3.4.1

Esperam-se resultados politicamente importantes, sobretudo, dos projectos actualmente em curso ao abrigo da prioridade 8 sobre a previsão demográfica e sobre os custos e despesas de saúde, tendo em conta o envelhecimento da população. O programa Tecnologias da Sociedade da Informação (IST) tem como objectivo estratégico especial promover a integração de idosos e deficientes na sociedade de informação. Também neste domínio se registam já resultados bastante úteis e projectos promissores envolvendo grandes consórcios e a indústria. Mesmo assim, continuam a ser necessários grandes esforços para colmatar as lacunas ainda existentes. O tema «Envelhecimento da população» deixa, todavia, de estar previsto como domínio independente dentro das prioridades temáticas.

3.5

Espera-se que os projectos de carácter médico-biológico apoiados pelo 5.o e 6.o programas-quadro tragam com avanços consideráveis no conhecimento dos processos fisiológicos e biológicos do envelhecimento, na luta contra as doenças e na promoção e preservação da saúde.

3.6

Os conhecimentos neste domínio são de indiscutível importância. Não bastam, porém, para resolver os problemas da população idosa nem para ajudar a sociedade europeia no seu todo a cumprir a missão social que lhe caberá num futuro próximo devido ao número crescente de idosos e, particularmente, de pessoas de idade muito avançada. Devido à taxa de natalidade relativamente baixa, a percentagem de jovens (com menos de 20 anos de idade) na população total da UE entre 1960 e 2001 desceu de 32 % para 23 %, ao passo que, nesse mesmo período, a percentagem de pessoas mais idosas (a partir dos 60 anos) aumentou de 16 % para 22 %. O rácio de dependência dos idosos, ou seja, a percentagem da população de idade igual ou superior a 60 anos em relação à população de idade compreendida entre os 20 e os 60 anos, aumentou, nesse intervalo de tempo, de 29,5 % para 38,9 %. Nos próximos anos, a percentagem de pessoas mais idosas continuará a aumentar devido ao défice de nascimentos nos últimos trinta anos, atingindo, em 2020, 27 % da população, o que significa que mais de um quarto dos cidadãos europeus terão 60 ou mais anos (4). Regista-se, por conseguinte, um aumento especialmente acentuado no número de pessoas de idade muito avançada (ver também o ponto 4.5.1). Dado o grande alcance e as consequências do envelhecimento da população para os diferentes domínios sociais, actualmente ainda impossíveis de prever, importa alargar manifestamente a perspectiva de investigação. Tal como acontece com o envelhecimento em si, que não é apenas um mero processo biológico, mas engloba num processo contínuo de muitos anos múltiplas facetas, também a investigação relativa à velhice e ao envelhecimento deverá adoptar uma abordagem multi e interdisciplinar a longo prazo. A investigação não pode ter como objectivo apenas melhorar a saúde e aumentar a expectativa de vida, mas deverá também contribuir para melhorar a qualidade de vida nesses anos extra.

3.7

Neste contexto, o 7.o programa-quadro deveria incluir uma acção-chave relativa aos desafios das mutações demográficas com vista a completar a investigação actualmente desenvolvida, sobretudo de carácter médico-biológico, por uma perspectiva de carácter cultural, socioeconómico que parta das ciências sociais e humanas e vise a prevenção ao longo da vida. Uma tal abordagem integrada da investigação deve incluir não só a investigação fundamental, mas também a investigação aplicada e o desenvolvimento (5). Além disso, conviria associar as organizações europeias mais representativas dos idosos, tal como recomendado no 2.o Plano de Acção Internacional sobre o Envelhecimento, que foi aprovado na Segunda Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento, realizada em Abril de 2002, em Madrid, e na estratégia adoptada pela UNECE por ocasião da Conferência Ministerial realizada em Setembro de 2002, em Berlim. Dada a extensão e a complexidade dos processos de decisão política, é absolutamente urgente apoiar um tal tipo de investigação. Segue-se uma análise mais pormenorizada sobre as necessidades de investigação nestes moldes em algumas áreas.

4.   Necessidades específicas de investigação

O presente parecer de iniciativa trata, em particular, os aspectos que carecem de investigação para que os cidadãos europeus vivam e envelheçam com dignidade num ambiente de mutações demográficas, designadamente os processos de envelhecimento e as condições de vida dos próprios interessados, que podem variar consideravelmente de país para país. Importa ainda considerar as condições sociais existentes, também elas bastante diferentes consoante o país.

Das múltiplas áreas afectadas pelas alterações da estrutura demográfica, são abordadas aqui apenas aquelas em que se faz sentir uma maior necessidade de inovação e uma investigação mais aprofundada num quadro de cooperação entre diferentes disciplinas científicas.

4.1   Necessidades de investigação no domínio da política económica e financeira

4.1.1

A análise das implicações das mutações demográficas sob o prisma socioeconómico, que, de acordo com os estudos da DG dos Assuntos Económicos e Financeiros, têm tendência a agravar-se, é um primeiro aspecto fundamental muito pouco referenciado no 6.oprograma-quadro em matéria de investigação. É necessário, por conseguinte, uma base sólida de conhecimentos que permita articular os dados sobre rendimentos e emprego com as informações em matéria de saúde e de conduta social. Para a elaboração de previsões fundamentadas é necessário que os dados estatísticos sejam recolhidos de forma continuada e por períodos de tempo prolongados (bons exemplos disso são o estudo longitudinal inglês do envelhecimento (English Longitudinal Study of Ageing — ELSA) e o inquérito norte-americano sobre a saúde e as reformas dos EUA (Retirement Survey — HRS)). Importa, pois, analisar as seguintes questões:

As projecções demográficas são bastante falíveis, mas os responsáveis políticos têm de planear concretamente os cuidados de saúde, a segurança social e as pensões de reforma. Quais os dados necessários que deverão ser recolhidos a fim de apoiar as medidas políticas apropriadas?

Qual a importância das mutações demográficas para o consumo e a poupança? Que comportamentos são de esperar e quais serão os mais adequados tendo em conta o aumento da esperança de vida?

Qual a relação entre o envelhecimento da população e a produtividade? Quais as consequências para a produtividade, a capacidade de inovação e o espírito empresarial?

Como poderão as potencialidades positivas proporcionadas pela evolução demográfica no que toca a novos produtos e serviços ser aproveitadas em prol das actuais e futuras gerações de idosos, reforçando, ao mesmo tempo, o desenvolvimento económico da Europa (tópico: «Economia do conhecimento»)?

Que comportamento económico é de esperar da futura geração de idosos, que serão em grande parte mais saudáveis, terão melhor formação e mais mobilidade do que os actuais, cuja situação, no entanto, ameaça piorar sobretudo nas camadas sociais mais desprotegidas (ver a este respeito também os pontos 4.2.1 e 4.3.6)

4.2   Necessidades de investigação no domínio do trabalho e do emprego

4.2.1

Devido às alterações da estrutura etária da população e à consequente necessidade de redistribuir os escassos recursos, que não crescerão proporcionalmente, as empresas, os sistemas de segurança social e as próprias pessoas de meia-idade deverão, de futuro, estar alertados para o facto de que a mão-de–obra e os conhecimentos da população mais velha serão utilizados por um período de tempo superior ao actual (6). É do conhecimento geral que a população mais idosa não é, na generalidade, menos competente do que as gerações mais jovens; simplesmente, algumas das suas capacidades diminuem, enquanto outras se desenvolvem. Importa, neste contexto, analisar as seguintes questões:

Em que áreas de trabalho poderão os trabalhadores idosos pôr em prática as suas competências de forma particularmente eficiente, apesar da idade?

Que possibilidades de trabalho e estruturas alternativas deverão ser criadas para que o exercício de uma actividade profissional em idade avançada continue a ser atraente? O trabalho a tempo parcial, por exemplo, poderá ser uma hipótese exequível?

Como melhorar a saúde e a segurança no local de trabalho para que a participação activa dos trabalhadores no mundo laboral seja mais prolongada?

Que medidas tomar no que respeita à criação de postos de trabalho e ao ambiente de trabalho, bem como à regulamentação dos ritmos e da organização do trabalho com vista ao melhor bem-estar possível dos trabalhadores idosos? Até que ponto a adopção de tecnologia adequada poderá contribuir para tal?

Como reintegrar no mercado de trabalho desempregados de longa duração e pessoas que, por outras razões (por exemplo, para tomar conta dos filhos ou cuidar de familiares), estiveram ausentes da vida activa por longos períodos de tempo?

Quais as razões invocadas pelas empresas para se desembaraçarem dos trabalhadores mais velhos? Por que razão aumenta o desemprego sobretudo entre as mulheres mais velhas?

Quais os obstáculos a um contrato mais longo ou a uma nova contratação de um trabalhador idoso e como ultrapassá-los?

Qual o grau de flexibilidade que a transição da vida activa para a reforma poderá e deverá ter, de modo a ser simultaneamente útil aos trabalhadores idosos, às empresas e aos sistemas de segurança social competentes?

Em que moldes se poderá e deverá transferir o saber, para que a experiência e os conhecimentos acumulados ao longo dos anos pelos trabalhadores idosos possam ser transmitidos aos mais jovens, de modo a que estes absorvam de bom grado o «velho» saber, integrando–o no seu «novo» acervo de conhecimentos, para benefício deles próprios e das empresas?

Em relação às acções de formação profissional, ver ponto 4.5.

A percentagem crescente de idosos na população total torna necessário, para além disso, expandir os sectores profissionais existentes e criar novos. Faltam, contudo, informações sobre os domínios em que é especialmente urgente alargar as competências profissionais de modo a satisfazer as pretensões e as necessidades dos mais idosos e sobre aqueles em que são necessárias novas áreas de actividade e onde elas propiciam novas oportunidades de emprego.

Estas circunstâncias devem ser analisadas

tendo em conta as alterações nos padrões de rendimento e de consumo que decorrem das mutações demográficas (ver também os pontos 4.1.1 e 4.3.6);

tendo em conta a redução de mobilidade dos idosos, dever-se-ia pensar, neste contexto, em serviços a domicílio a desenvolver de novo, tais como cabeleireiro e pedicura, que podem ser prestados no domicílio, bem como em serviços à distância, como, por exemplo, telecompras, aconselhamento em linha e outros serviços similares.

Quanto às questões de política de emprego, em especial, nos domínios da saúde e da assistência, ver o ponto 4.6.

4.3   Necessidades de investigação sobre a realidade quotidiana dos idosos

4.3.1

O envelhecimento não é apenas um processo biológico, mas, sobretudo, um processo social. As condições sociais diferem muito de país para país e entre eles, o que se aplica tanto à macro-escala, isto é, aos sistemas políticos e sociais que se foram sedimentando ao longo dos tempos, como à micro-escala — aos percursos e recursos individuais. Igualmente díspares são as condições de envelhecimento e de vida dos idosos nos vários grupos populacionais. A investigação sobre a realidade quotidiana dos idosos deve ter em conta estas diferenças, quer elas tenham a ver ou não com os requisitos específicos consoante o sexo, as experiências de vida e/ou profissionais, as condições de vida materiais, etc.

4.3.2

Os países europeus variam consideravelmente no que toca ao clima, topografia, densidade populacional, tipo de aglomerações, infra-estruturas de transportes, legislação relativa à assistência social pública e muitos outros aspectos, todos eles influenciando a possibilidade de viver de forma autónoma e de participar activamente na vida social. Em alguns deles estão previstas pensões mínimas, que constituem um suporte financeiro suficiente para uma velhice desafogada, ao passo que em outros a pensão não cobre sequer as necessidades básicas. Contudo, mesmo a nível de cada país e dentro do vasto grupo social das «pessoas idosas», existem diferenças consideráveis.

Que influência têm os diferentes sistemas de assistência social dos países europeus na qualidade de vida dos seus idosos?

Que medidas preventivas permitirão ultrapassar as discriminações que dificultam às pessoas idosas o acesso a alojamento adequado, a meios de transporte confortáveis, à oferta cultural, a uma nutrição saudável e/ou às novas tecnologias, prejudicando, assim, a sua qualidade de vida?

Considerando, em particular, a limitação das prestações sociais e de saúde, como garantir a qualidade de vida dos idosos, cuja existência física e social é ameaçada pela pobreza, por problemas crónicos de saúde, falta de formação, fracos conhecimentos linguísticos e insuficiência de outros recursos?

Em que condições vivem as pessoas que, pelos seus próprios meios, (já) não podem viver de forma autónoma? Quais as disposições aplicáveis a estas pessoas nos Estados-Membros e quais as medidas necessárias para salvaguardar os seus interesses?

Em que condições vivem os idosos nos lares e em instituições especializadas? Quais as formas de representação dos seus interesses?

Quais são as condições de prevenção, tratamento e prestação de cuidados existentes nos Estados-Membros para as pessoas com doença de Alzheimer ou outras doenças do foro neurológico? Quais as possibilidades e as experiências feitas no que toca a formas diferentes de alojamento?

4.3.3

A autonomia, a autodeterminação e a integração social são objectivos pessoais e político-sociais importantes. No entanto, no caso dos idosos e, sobretudo, das pessoas de idade avançada, vários factores comprometem a sua realização. Em primeiro lugar, o envelhecimento implica um maior risco de problemas de saúde. Neste caso, condições ambientais inadequadas e a falta de recursos económicos fazem com que os idosos tenham mais dificuldade em manter a sua independência e participação social. As normas e concepções sociais (por exemplo, estereótipos discriminatórios relativos à idade) podem funcionar também como obstáculos e levar à sua exclusão de vários domínios da sociedade. Porém, à visão negativa da idade opõe-se o facto de a grande maioria dos idosos ser capaz de ter uma vida autónoma e independente durante muitos anos. Para além disso, prestam importantes contributos à família e à sociedade através da assistência (social e financeira) entre gerações e do trabalho voluntário em agremiações políticas, sindicais e religiosas.

4.3.4

As pessoas idosas têm uma enorme capacidade psicológica de superar dificuldades relativas às muitas circunstâncias adversas e limitações inerentes aos problemas de saúde. No entanto, este equilíbrio interno enfrenta riscos quando os problemas se acumulam.

Quando e de que maneira se deverá intervir para evitar uma sobrecarga de problemas para os mais idosos e, pelo contrário, ajudá-los a gerir situações graves?

Quais as medidas necessárias para satisfazer aspectos que vão para além da cobertura de necessidades básicas, tais como a necessidade psicológica de segurança, de relações familiares e outras relações interpessoais e de integração social?

4.3.5

A grande maioria das pessoas idosas é capaz de viver os 20-30 anos da fase do envelhecimento de forma relativamente saudável e activa. No entanto, devido à novidade histórica que esta fase representa, há ainda poucos exemplos positivos de como ela deve ser concebida. Não existem praticamente dados fiáveis e comparáveis a nível europeu sobre os domínios em que os idosos desempenham actualmente uma actividade e prestam um importante contributo cívico, social e económico, nomeadamente através de trabalho remunerado ou voluntário em organizações políticas, sindicais e religiosas, no apoio, formação e educação dos mais jovens, etc.

Quais as áreas de actividade, ofertas de formação profissional, formas de participação e oportunidades de encontro que podem ser criadas para que cada um aproveite as potencialidades destes anos de existência de um modo tal que dê sentido à sua vida e beneficie a sociedade?

Até que ponto são diferentes os interesses, as experiências, as necessidades e as capacidades das mulheres e dos homens idosos? De que modo podem e devem estas diferenças ser tidas em conta?

Como poderão os idosos, directa ou indirectamente através das organizações que os representam, participar aos mais variados níveis nacionais e europeu em processos de decisão respeitantes ao seu direito a uma existência condigna e independente e à sua participação na vida social e cultural de modo a pôr efectivamente em prática o artigo 25.o da Carta de Nice?

Quais as necessidades de mobilidade supraregional e transfronteiriça dos idosos, sobretudo dos migrantes mais velhos, e de que modo se poderá responder mais facilmente a essas necessidades (tal como com os trabalhadores)?

4.3.6

Discute-se o envelhecimento da sociedade, em grande medida, apenas enquanto problema, sobrecarga e sob o prisma do aumento dos custos sociais e de saúde. Os aspectos positivos, porém, raramente são considerados, e pouca informação existe sobre eles, por exemplo, sobre o facto de os idosos já não saturarem o mercado de trabalho, mas continuarem a contribuir, enquanto consumidores, para o desenvolvimento económico.

Até que ponto os padrões de rendimento e consumo e as necessidades de consumo das pessoas idosas diferem das dos jovens?

Que modificações são de esperar no comportamento de consumo das novas gerações?

Quais os domínios com particular potencial de inovação, de modo a que, de futuro, as necessidades específicas dos idosos possam ser tidas mais em conta?

Ver a este respeito também os pontos 4.1.1 e 4.2.1.

4.3.7

Muitos idosos sentem-se mais como uma sobrecarga para a sociedade do que membros respeitados da mesma. Para isto contribuem os debates actuais sobre questões, tais como as despesas ligadas à saúde, o financiamento das pensões e, nalguns países, a questão da eutanásia.

Como dar maior visibilidade e reconhecimento às contribuições ideológicas e materiais que as pessoas idosas trazem aos diversos domínios sociais?

Que medidas político-sociais se deverão aplicar para que os idosos deixem de se sentir um peso, um encargo?

Como poderão ser modificadas as atitudes negativas em relação à velhice em geral, de modo a possibilitar uma sua maior aceitação e uma cultura positiva do envelhecimento? Como despertar nos jovens uma maior compreensão em relação aos idosos e como promover o diálogo intra e intergeracional? (ver também o ponto 4.5.2)

Que fazer para que os meios de comunicação social apresentem uma imagem mais diferenciada da velhice?

A agonia e a morte são, em larga medida, tabu, muito embora sejam um factor económico não despiciendo. Como se poderá evitar a pura comercialização da morte e, em vez disso, desenvolver uma cultura eticamente responsável?

4.4   Necessidades de investigação sobre o universo sócio-espacial

4.4.1

O ambiente social das pessoas mais idosas sofrerá modificações profundas nos próximos anos. Baixas taxas de natalidade, a constituição tardia de família e elevadas taxas de divórcio estão a minar a rede tradicional das relações familiares. Simultaneamente, com o aumento da esperança de vida é cada vez mais frequente chegarem a co-existir cinco gerações numa família («verticalização da estrutura familiar»).

Qual a influência destas modificações na integração e na participação das pessoas idosas na sociedade?

Poderão as novas gerações recorrer cada vez mais a relações fora da família e nelas confiar mesmo no caso de ser necessária assistência específica?

Que medidas de política social e/ou inovações organizacionais e técnicas poderão contribuir para ajudar as redes familiares e extra-familiares a aumentarem a sua capacidade para enfrentarem revezes e a prolongarem a sua duração?

4.4.2

Estudos sobre a gestão do tempo e a mobilidade demonstram que, com a idade, o tempo passado em casa aumenta, enquanto o tempo dedicado a actividades externas diminui.

Que medidas tomar relativamente à habitação, em particular habitações em edifícios antigos, mas também em casas individuais, de modo a que as mesmas estejam disponíveis a um preço o mais acessível possível e a que as pessoas idosas ali possam permanecer mantendo a sua autonomia e com a possibilidade de ali serem assistidas, no caso de limitações motoras, sensoriais ou cognitivas?

Quais os aspectos a considerar, de um modo geral, na modernização das habitações, para que as pessoas possam continuar a viver em casa o mais tempo possível?

Que adaptações arquitectónicas ou técnicas poderão contribuir para que as pessoas com limitações específicas (problemas de surdez, visão, deficiências motoras, demência) possam manter a sua autonomia?

De que modo podem, em particular, os conceitos inovadores de «casa inteligente» contribuir para que as pessoas tenham uma vida independente e continuem a governar a sua casa autonomamente durante mais tempo?

Que experiências positivas existem na Europa nestes domínios? Que lições se podem delas tirar ?

4.4.3

A necessidade de ir para um lar quando os problemas de saúde se agravam inspira horror à maioria dos idosos.

Que alternativas interessantes e economicamente viáveis existem quando a própria habitação passa a ser um encargo demasiado pesado, não sendo possível continuar a aí viver de forma autónoma?

Que experiências foram feitas no que toca a novos esquemas de vida, tais como o «alojamento apoiado»? Que condições-quadro contribuem para o êxito ou o fracasso dessas e de outras alternativas semelhantes?

4.4.4

Os aparelhos, sistemas e serviços técnicos podem revelar-se uma ajuda preciosa para a resolução de problemas quotidianos das pessoas idosas. No entanto, é frequente não estarem adaptados às suas necessidades, Os aparelhos deveriam, contudo, poder ser concebidos segundo os princípios do «Design para Todos» e adaptados de forma flexível a diferentes grupos de utilizadores. pelo que é imprescindível que os futuros utilizadores participem no seu processo de desenvolvimento a fim melhorar a qualidade dos produtos e dos serviços. Neste contexto, recomenda-se a participação activa das organizações de idosos europeias mais representativas, bem como dos próprios idosos, com vista a um intercâmbio permanente (auditoria social) que tenha em conta as verdadeiras necessidades dos idosos.

Que conhecimentos deverão os produtores e os designers possuir sobre a abordagem e o método do «Design para todos» e sobre as capacidades, limitações, necessidades e comportamentos das pessoas idosas, para que os produtos técnicos possam ser adaptados em conformidade e a população idosa os possa aceitar e utilizar melhor?

O que é que muda com a velhice e que alterações ocorrerão provavelmente com as novas gerações de pessoas idosas?

De que forma as mutações das capacidades e das necessidades dos idosos poderão ser integradas na concepção das tecnologias gerais, mais do que até agora? Que medidas políticas são susceptíveis de contribuir para uma participação mais forte da indústria e da economia na realização do objectivo do «Design para todos»?

Como criar um quadro eficaz de participação dos utilizadores no desenvolvimento dos aparelhos técnicos?

Para além disso, deverá examinar-se com mais acuidade quais os instrumentos técnicos realmente utilizados e quais as condições-quadro necessárias para que eles possam contribuir para a qualidade de vida dos idosos:

Como poderão eles apoiar as pessoas mais idosas nas suas necessidades quotidianas? Até que ponto poderão ser úteis tanto ao pessoal como aos serviços prestados aos idosos de forma formal ou mesmo informal nas situações em que há necessidade de cuidados de saúde ou nos casos de doenças mentais?

Que aspectos éticos deverão neste contexto (por exemplo, no caso de pessoas sofrendo de confusão mental) ser tidos em conta de modo a excluir a violação da vida privada que a vigilância técnica, designadamente, poderia acarretar?

Quais as possibilidades inovadoras que as novas tecnologias oferecem e qual o impacto a longo prazo da sua aplicação? Quais as medidas de acompanhamento sociais necessárias para que elas contribuam para melhorar a qualidade de vida e a participação dos idosos na sociedade e não para o seu isolamento e discriminação social?

4.4.5

É um facto que a actividade física, social e cultural contribui para um envelhecimento saudável e equilibrado. No entanto, obstáculos ao ambiente natural e/ou artificial e meios de transporte deficitários impedem muitas vezes o acesso às instalações onde elas são praticadas. Os problemas são, em grande medida, conhecidos (7), mas muito há ainda a fazer na prática.

Que medidas se podem e devem tomar urgentemente nas áreas do planeamento social, urbanístico e de transportes, de modo a adaptar o ambiente residencial, as ruas, os meios de transporte, as infra-estruturas dos serviços, etc. às necessidades da crescente população de idosos, ajudando-os assim a manter a sua autonomia?

De que modo pode a qualidade do ambiente residencial, em especial, contribuir para a integração social das pessoas, nomeadamente criando pontos de encontro e disponibilizando meios de transporte?

Que países registam já resultados positivos das experiências feitas nesta matéria e em que domínios, e até que ponto podem elas ser transferidas para outros países e domínios?

4.4.6

A falta de meios sociais e financeiros mesmo a nível individual e/ou limitações motoras ou sensoriais impedem frequentemente o acesso e a participação em actividades externas. A participação em actividades sociais e culturais seria especialmente importante para essas pessoas – muitas vezes, mulheres idosas que vivem sozinhas —, para evitar que fiquem isoladas.

Que medidas de política social e/ou inovações organizacionais e técnicas poderão ajudar os idosos necessitados a participarem na sociedade?

4.5   Necessidades de investigação sobre a aprendizagem ao longo da vida

4.5.1

Numa sociedade em rápida mutação social, cultural e técnica a aprendizagem ao longo da vida adquire importância cada vez maior. Isto aplica-se sobretudo aos trabalhadores mais velhos, cujos conhecimentos adquiridos no passado já não bastam para satisfazer as novas exigências dos postos de trabalho. O objectivo de criar um espaço europeu de aprendizagem ao longo da vida já foi salientado numa comunicação conjunta da Direcção-Geral da Educação e da Cultura e da Direcção-Geral do Emprego e dos Assuntos Sociais, bem como numa resolução do Conselho de 27 de Junho de 2002 (8). Também neste aspecto, a necessidade de investigação continua a ser urgente:

Que tipo de formação profissional contínua seria particularmente benéfico para os trabalhadores mais velhos em termos de teor e de metodologia?

Que fazer para que todos os trabalhadores beneficiem de igual forma de medidas apropriadas, independentemente da sua idade ou sexo?

4.5.2

A necessidade de aprender ao longo da vida diz respeito, todavia, mesmo às pessoas que já não exercem uma actividade profissional. Também elas devem ter a possibilidade de aprofundarem os seus conhecimentos em proveito próprio e da sociedade.

Como se cria e se difunde o saber na sociedade do conhecimento?

De que modo se poderá incentivar melhor a aprendizagem ao longo da vida das pessoas idosas independentemente de trabalharem ou não? Que hipóteses de participação em programas de formação e de informação sobre temas profissionais ou culturais existem já hoje nos Estados-Membros e que experiências foram desenvolvidas com universidades da terceira idade, por exemplo, ou em encontros sobre domínios temáticos variados?

Existe alguma relação entre o tipo de actividade profissional anteriormente exercida e a futura formação? Das acções de formação seguidas durante a vida profissional activa poder-se-ão tirar conclusões quanto ao modo de manter nos idosos o gosto pela aprendizagem, pela formação e pela cultura?

De que modo se poderá melhorar o acesso às oportunidades de aprendizagem, inclusivamente para os grupos até agora subrepresentados, e assegurar a diversidade cultural?

Que papel podem os meios de comunicação social públicos bem como as novas tecnologias e o e-learning desempenhar a fim de preservar a participação social, veicular os conhecimentos e a informação e promover o aperfeiçoamento pessoal da população idosa?

Que competências básicas são especialmente importantes na velhice? (ver a este propósito também o ponto 4.6.1)

Por outro lado, que conhecimentos básicos sobre a velhice e o envelhecimento deverão dispor as pessoas e as organizações que se ocupam dos idosos? E que iniciativas em matéria de formação se adequarão melhor a despertar nos jovens uma maior compreensão em relação aos idosos? (ver também o ponto 4.3.7).

Como poderá ser testada a execução de medidas anteriormente adoptadas e transmitido o acervo de experiências positivas?

4.6   Necessidades de investigação sobre a preservação da saúde e os cuidados de saúde

4.6.1

Prevê-se que uma das consequências particularmente importantes das mutações demográficas serão os custos agravados dos sistemas de saúde e de segurança social devido ao aumento rápido do número de pessoas de idade avançada. Nos próximos quinze anos espera-se um aumento de 50 % do número dos octogenários a nível europeu, em cerca de 20 milhões (9). O número de pessoas com mais de cem anos regista, pois, um aumento exponencial (10). Por isso, a investigação em particular sobre a prevenção, a manutenção e o restabelecimento da funcionalidade e autonomia em idade avançada é de uma importância fulcral.

De que forma influem determinados estilos de vida, a longo prazo, no estado geral de saúde e, em particular, em enfermidades específicas? Como promover hábitos saudáveis?

Como dar a conhecer aos idosos as medidas e propostas em matéria de preservação da saúde (por exemplo, actividades desportivas, musicais e estéticas, alimentação saudável), para que eles as utilizem?

Que outras actividades poderão contribuir para a manutenção das capacidades físicas, sensoriais, cognitivas e sociais?

As necessidades de investigação existem em especial no domínio da epidemiologia e da etiologia de doenças geriátricas a fim de melhorar as possibilidades de prevenção (por exemplo, em relação à demência e especialmente a doença de Alzheimer ou evitar quedas que podem ter como consequência a fractura da anca).

Há necessidade urgente de investigação também em matéria de prevenção e de cuidados de saúde no domínio profissional (ver também o ponto 4.2.1).

Além disso, as necessidades de investigação fazem-se sentir também em relação às possibilidades de tratamento dos idosos, não só no que diz respeito às perturbações gerais com características próprias da velhice, mas também às doenças geriátricas. Mas, para tal faltam frequentemente as bases terapêuticas, porquanto os testes clínicos e de medicamentos são feitos, em grande medida, em jovens adultos. O estado de saúde das pessoas idosas não é comparável, pois, na maior parte das vezes, não sofrem de uma doença específica, mas sim de patologias mais ou menos graves que podem afectar simultaneamente várias das suas funções.

Ver também o ponto 4.6.3.

4.6.2

O aumento da população de idade avançada levará, nos próximos anos, a uma grande necessidade de prestação de cuidados de saúde, bem como a um aumento dos custos para as famílias e para as entidades públicas. Também neste aspecto, as necessidades de investigação são múltiplas:

Como melhorar as qualificações e condições de trabalho do pessoal prestador de cuidados aos idosos, para que esta profissão se torne mais atraente a longo prazo?

Quais as condições externas e as necessidades em termos de pessoal para que a relação entre utente e prestador de cuidados a todos satisfaça?

De que modo poderá a oferta de cuidados de saúde ser melhor ajustada às necessidades e exigências das pessoas idosas deles necessitando e como reforçar mais a assistência domiciliária?

De que forma poderão soluções de carácter técnico contribuir para aliviar os familiares do idoso e o pessoal prestador de cuidados, sem prejuízo da integridade e dignidade da pessoa idosa?

Que apoio económico e reconhecimento social são necessários para aliviar os familiares do idoso e o pessoal prestador de cuidados? Como poderão esses familiares ser ajudados a obterem o direito à sua própria pensão?

Que poderá ser feito em relação à concepção dos cuidados, ao tratamento contra a dor e ao acompanhamento dos doentes terminais para que estes acabem os seus dias com dignidade?

4.6.3

No que respeita aos cuidados de saúde, não existem na Europa definições de conceitos harmonizadas em termos de conteúdo (por exemplo, a definição de «não autónomo», de «cuidados no domicílio», etc.), estruturas uniformizadas nos vários serviços nem orientações sobre as qualificações do pessoal.

Que medidas poderão contribuir para harmonizar os termos utilizados e, consequentemente, dotar a área dos cuidados de saúde de maior transparência?

Qual a formação e quais as competências programáticas, técnicas, geriátricas e sociopsicológicas desejáveis para a qualificação do pessoal médico e dos prestadores de cuidados de saúde a nível europeu?

4.7   Necessidades de investigação em matéria de novas tecnologias

4.7.1

Em todos os domínios supramencionados se fazem sentir os efeitos de uma comprovadamente rápida e progressiva tecnicização, sobretudo das novas tecnologias da informação e da comunicação, (pontos 4.1 a 4.6). No domínio profissional, por exemplo, estas tecnologias são frequentemente utilizadas como pretexto para excluir os trabalhadores mais idosos. Em contrapartida, estudos há que demonstram que uma adaptação adequada poderia mesmo reforçar a produtividade desses trabalhadores. Daí que este aspecto deva ser tido em conta nas investigações feitas em todos os domínios. Convirá atender, nomeadamente, aos aspectos éticos, bem como à questão da integração das pessoas mais idosas que não podem ou não querem utilizar as novas tecnologias.

4.8   Tratamento, coordenação e complemento dos conhecimentos actuais

4.8.1

Existe já um amplo acervo de conhecimentos graças à investigação levada a cabo a nível nacional e europeu. No entanto, esses conhecimentos dizem respeito sobretudo a aspectos específicos e foram obtidos a partir da análise isolada de várias ciências. São muito dispersos e frequentemente só estão disponíveis na língua nacional. Os resultados da investigação são muitas vezes incompatíveis com os resultados de outros estudos devido à diversidade das amostras e da metodologia utilizada.

Seria vantajoso tratar este acervo de conhecimentos de modo a poderem ser articulados, comparados e avaliados sistematicamente e, por fim, disponibilizados em geral.

Outras medidas consistiriam em efectuar análises secundárias do material tratado deste modo, bem como acordar sobre métodos e instrumentos de pesquisa com vista a uma investigação alargada mais aprofundada, conjunta e interdisciplinar. Como medida de apoio a este tipo de produção, integração e veiculação de conhecimento estão disponíveis os instrumentos criados recentemente no âmbito do 6.o programa-quadro em matéria de investigação — os Centros de Excelência, e as Redes de Excelência e «Acções de Coordenação Temática» (11).

Seria ainda desejável que se adoptasse uma abordagem uniformizada para os indicadores da qualidade de vida dos idosos nos países europeus e sua recolha, bem como que fossem acompanhados e documentados a longo prazo numa base de dados europeia. Neste contexto, é imprescindível a diferenciação por sexo, grupos etários e escalões salariais, bem como por regiões, pois os indicadores recolhidos até à data não bastam para compreender as condições de vida dos idosos. Deverão ser acrescentados indicadores que forneçam informações sobre o estado de saúde e situações invalidantes, os sistemas de prestação de cuidados de saúde e as exigências específicas a cada país. Deve ser testada a cooperação com o EUROSTAT.

A informação estatística e outra relevante que já existe, em muitos casos, a nível nacional e europeu necessita urgentemente de ser orientada e integrada. Mesmo os resultados da investigação decorrentes dos vários temas do 5.o e do 6.o programa-quadro em matéria de investigação requerem uma abordagem integrada que permita extrair conclusões importantes do ponto de vista político e prático. É um dever divulgar, tão cedo quanto possível, os conhecimentos integrados e tratados deste modo.

A investigação e a política devem ser feitas não só para, mas também com a colaboração da população idosa, pelo que as organizações de idosos deverão ser envolvidas em projectos futuros mais estreitamente do que até agora.

5.   Objectivos e obrigações

5.1

O presente parecer de iniciativa justifica o pedido de inserção no 7.o programa-quadro em matéria de investigação de uma acção-chave sobre «Mutações demográficas – Qualidade de vida dos idosos e necessidades tecnológicas».

5.2

O objectivo é conseguir, através do apoio à investigação multi e interdisciplinar e da investigação geriátrica socialmente participativa sobre um vasto leque,

a)

criar uma base de conhecimentos necessários à planificação e acção política, que permita responder às implicações das mutações da estrutura etária na Europa de forma inovadora, socialmente justa e economicamente rentável e

b)

oferecer as bases e os instrumentos necessários para que a velhice seja vista e considerada pela sociedade com mais dignidade.

5.3

As áreas de investigação supramencionadas e os exemplos de questões com elas relacionadas evidenciam a estreita relação e interdependência entre os aspectos biológicos, psicológicos, sociais, culturais, tecnológicos, económicos e estruturais relativos ao envelhecimento e às pessoas idosas. Simultaneamente, importa ter em conta o facto de o envelhecimento ser um processo que se desenvolve num contexto sócio-espacial concreto, o qual se caracteriza, na Europa, por profundos contrastes geográficos, culturais e sociais entre e no interior dos Estados-Membros. Estes dois aspectos — o carácter multidimensional do processo de envelhecimento, bem como as diferentes circunstâncias em que o mesmo se desenvolve – exigem que a investigação geriátrica opte por uma abordagem multi e interdisciplinar. Também a perspectiva de uma investigação a longo prazo é um factor fulcral no que respeita à compreensão dos processos de alteração em causa, de modo a poder dar-lhes uma resposta adequada (12).

5.4

Só uma investigação alargada e duradoura nos moldes acima referidos poderá preparar as bases para uma planificação e decisão sólidas, que serão necessárias nas diversas áreas sociais e a todos os níveis de poder devido às alterações na estrutura etária da população. O envelhecimento é não só uma questão de carácter médico-biológico e tecnoeconómico, ainda por resolver, mas também uma tarefa cívica, social e cultural a desempenhar.

5.5

Para além das actividades de investigação referidas, o Comité reclama as seguintes medidas de acompanhamento:

uma audição no CESE sobre «Mutações demográficas — Qualidade de vida dos idosos», a fim de propor, nomeadamente, um estudo de viabilidade sobre a criação de uma agência específica e sobre outras iniciativas eventualmente necessárias.

a criação de uma agência comum pro-activa e prospectiva (Observatório Europeu), encarregado de recolher os indicadores da qualidade de vida dos idosos nos países europeus, observá-los e documentá-los a longo prazo numa base de dados europeia, elaborar previsões fundamentadas de forma empírica, compilar e difundir os conhecimentos, deles extraindo conclusões importantes do ponto de vista político e prático;

a organização de seminários e conferências a fim de melhor compreender as mutações demográficas e a necessidade de medidas preventivas de acompanhamento, aumentar a consciencialização sobre as potencialidades da velhice e combater a discriminação com base na idade, difundir o mais amplamente possível os resultados da investigação e promover o intercâmbio entre os «antigos» e os «novos» Estados-Membros;

a prossecução do estudo deste tema através do «método aberto de coordenação». Tendo em conta a complexidade e a importância do envelhecimento da população e a diversidade de oportunidades e desafios a ele associados, o Comité considera este método adequado ao fomento do intercâmbio de experiências, da comparação inter-europeia e da aprendizagem mútua,

à promoção do diálogo entre os representantes da sociedade civil organizada e as competentes direcções-gerais da Comissão (13),

à definição de objectivos comuns,

à verificação da execução do 2.o Plano de Acção Internacional (aprovado em Abril de 2002, em Madrid) e da estratégia de execução (adoptada através da Declaração Ministerial de Berlim de Setembro de 2001), e

à criação de um quadro de concepções comuns em relação ao envelhecimento da sociedade.

5.6

O objectivo final é garantir não apenas às pessoas idosas e de idade avançada de hoje, mas a todas as gerações futuras uma VIDA E ENVELHECIMENTO DIGNOS.

Bruxelas, 15 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  COM(2004) 146 final; Directiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de Novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional; Comunicação da Comissão Europeia de 26 de Março de 2004«Reforçar a aplicação da Estratégia Europeia de Emprego», anexo 1, COM(2004) 239 final; http://europa.eu.int/comm/employment_social/fundamental__rights/legis/legln_en.htm.

(2)  Decisão 200/750/CE do Conselho, de 27 de Novembro de 2000, que estabelece um programa de acção comunitário de luta contra a discriminação (2001-2006 http://europa.eu.int/comm/employment_social/fundamental__rights/index_en.htm; Parecer do CESE in JO C 284 de 14 de Setembro de 1998; Brochura do CESE — 2000-018 «Jobs, Learning and Social inclusion: The work of the European EESC» (Empregos, Aprendizagem e Inclusão Social : Contribuição do CESE) (N.T.:Não existe em português).

(3)  Resolução do Conselho de 27 de Junho de 2002, (2002/C 163/01) in JO C 163 de 9 de Julho de 2002. COM(2002) 678 final (Novembro de 2001); ver também COM(2004) 156 final.

(4)  Comunidades Europeias (2002). Estatística social europeia : população. Eurostat Tema 3, População e condições sociais. Luxemburgo: Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias.

(5)  INT/229 — COM(2004) 9 final; ver também INT/163 — COM(2002) 565 final, em especial os pontos 3.3 e 4.2.

(6)  Ver a este respeito também o parecer do CESE sobre «Política de inovação», JO C 10 de 14 de Janeiro de 2004, (COM(2003) 112 final), parte 4 — Observações na especialidade, ponto 7.

(7)  Conferência Europeia dos Ministros dos Transportes (CEMT). (2002). Os transportes e o envelhecimento da população. Paris Cedex: Publicações da OCDE.

(8)  COM(2001) 678 final; Resolução do Conselho de 27 de Junho de 2002, (2002/C 163/01) in JO C 163 de 9 de Julho de 2002.

(9)  EUROSTAT (2002). A situação social na União Europeia — 2002. Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias.

(10)  Ver Robine, J. M. & Vaupel, J. (2001). Emergence of supercentenarians in low mortality countries. («O Surgimento dos »Supercentenários« nos Países de Baixa Mortalidade»). The Gerontologist, 41 (número especial II), 212.

(11)  Ver a este propósito o parecer do Comité Económico e Social sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões — Rumo a um espaço europeu da investigação», in JO C 204 de 18 de Julho de 2000.

(12)  Ver a este respeito ainda o parecer do CESE in JO C 95 de 23 de Abril de 2003, (COM(2002) 565 final) e o documento CESE 319/2004 (ainda não publicado no Jornal Oficial) (COM(2004) 9 final).

(13)  Comunicação da Comissão COM(2002) 277 final.


23.3.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 74/55


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Conselho que altera as Directivas 66/401/CEE, 66/402/CEE, 2002/54/CE e 2002/57/CE, no que diz respeito aos exames realizados sob supervisão oficial e à equivalência de sementes produzidas em países terceiros»

COM(2004) 263 final — 2004/0086 (CNS)

(2005/C 74/10)

Em 29 de Abril de 2004, decidiu o Conselho, ao abrigo do artigo 37.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a a proposta supra mencionada.

A Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 6 de Julho de 2004 (Relator único: G. BROS).

Na 411.a reunião plenária, de 15 e 16 de Setembro de 2004 (sessão de 15 de Setembro) o Comité Económico e Social Europeu adoptou o presente parecer por 85 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções.

1.   Introdução

1.1

De 1998 a 2003, a Comissão autorizou os Estados-Membros a realizarem uma experiência temporária de amostragem e ensaio de sementes, de harmonia com a legislação comunitária sobre comercialização de sementes. A análise dos resultados mostrou que:

em condições definidas, era possível uma simplificação dos procedimentos de certificação oficial das sementes sem uma diminuição significativa da qualidade das sementes, quando comparada com a obtida com o sistema de amostragem e ensaio de sementes oficial;

as inspecções de campo sob supervisão oficial deveriam alargar-se a todas as culturas para produção de sementes certificadas;

a parte de zonas a controlar e inspeccionar por inspectores oficiais pode ser reduzida.

1.2

Foram adoptadas as alterações das regras aplicáveis às sementes destinadas ao comércio internacional (sistema da OCDE). Por isso, o âmbito da «equivalência» de sementes da UE, no que diz respeito às sementes colhidas em países terceiros, pode ser alargado a todos os tipos de sementes que respeitem as características e os requisitos em matéria de exame estabelecidos nas diversas directivas comunitárias relativas à comercialização de sementes.

1.3

O Comité pretende examinar a proposta da Comissão em função da evolução das regras propostas e com a preocupação da manutenção de um elevado nível de exigência quanto à qualidade das sementes produzidas e às questões fitossanitárias.

2.   A proposta da Comissão

2.1

A Comissão propõe a prorrogação até 31 de Março de 2005 da experiência das inspecções sob supervisão oficial (Decisão 98/320/CE) para manter as condições comunitárias para a comercialização das sementes produzidas em conformidade com esta decisão, enquanto se espera a aplicação (transposição das directivas) das novas disposições.

2.2

Ao mesmo tempo, as Directivas 66/401/CEE (comercialização de sementes de plantas forrageiras), 66/402/CEE (comercialização de sementes de cereais), 2002/54/CE (comercialização de sementes de beterrabas) e 2002/57/CE (comercialização de sementes de plantas oleaginosas e de fibras) devem ser adaptadas às conclusões legitimadas pelos resultados da experiência e integrar as alterações seguintes:

a introdução do exame sob supervisão oficial para as diferentes categorias de sementes;

a definição do exame sob supervisão oficial (inspecção de campo ou em laboratório de ensaio de sementes aprovado pela autoridade de certificação de sementes competente do Estado-Membro em causa);

a colheita de amostras para a certificação pode ser feita oficialmente ou sob supervisão oficial. São descritos os requisitos da amostragem sob supervisão oficial (qualificação das pessoas, supervisão das práticas e regras em matéria de sanções);

o princípio da equivalência é alargado às sementes colhidas em países terceiros que satisfaçam as condições e exigências comunitárias (sistema de controlo e de certificação).

3.   Observações na generalidade

3.1

A proposta da Comissão Europeia tem por principal objectivo simplificar os procedimentos de supervisão no sector da produção de sementes. A prática da delegação da supervisão já é seguida em muitos Estados-Membros. O Comité apoia, pois, a iniciativa da Comissão. Todavia, faz questão de salientar que a Comissão podia ter a apresentado uma nova directiva que contemplasse a integralidade dos elementos das quatro directivas em causa, o que facilitaria a compreensão das alterações e garantiria a coerência na harmonização das medidas de execução.

3.2

A decisão da Comissão sobre a experiência para os exames sob supervisão oficial expira em 31 de Julho de 2004. Vai existir, portanto, um vazio jurídico durante o processo de co-decisão de que é objecto a proposta legislativa da Comissão Europeia. O Comité apela à Comissão para que altere a Decisão n.o 98/320/CE para evitar todo e qualquer vazio jurídico.

3.3

A Comissão propõe, igualmente, uma prorrogação até 31 de Março de 2005 da fase de experiência para permitir a transposição das alterações das directivas em causa. O Comité faz questão de salientar, desde já, que este prazo será demasiado curto, em virtude do tempo necessário (cerca de dez meses) para as transposições. Por isso, o Comité propõe que a prorrogação vá até 31 de Julho de 2005.

3.4

O Comité não tem condições, neste momento, para se pronunciar sobre a pertinência dos dados técnicos respeitantes à inspecção de campo (nomeadamente a modificação da taxa de amostragem) ou do número de amostras necessárias em laboratório. Não quer, porém, deixar de sublinhar que é necessário estabelecer um denominador comum a todos os Estados-Membros. Portanto, os dados expressos sob a forma de intervalo deverão ser transformados em percentagens mínimas de controlo.

3.5

A delegação das supervisões oficiais em pessoas autorizadas possibilita a maior eficácia dos procedimentos. A Comissão deve assegurar-se de que os sistemas de supervisão da certificação continuem a ser eficientes. Actualmente, são realizados pela Comissão ensaios comparativos comunitários e intercâmbios de práticas. A verba atribuída (entre 0,5 e 0,6 milhões de euros) para estas acções continua a ser insuficiente em função do objectivo visado. O Comité solicita à Comissão que atribua recursos financeiros suplementares a estas acções de harmonização dos sistemas de controlo.

3.6

O Comité faz questão de lembrar que, quando das negociações de adesão dos novos Estados-Membros, foram concedidos períodos de transição para variedades não inscritas no catálogo por não corresponderem aos critérios comunitários. O Comité chama a atenção da Comissão para essas variedades não inscritas, que só podem ser comercializadas nos países em causa (Chipre, Letónia, Malta e Eslovénia). Importa acompanhar este período de derrogação com garantias suplementares, nomeadamente quanto à dimensão das amostras e à presença da avena fatua.

3.7

O Comité chama a atenção da Comissão para os litígios relativos à comercialização de lotes de sementes de má qualidade entre Estados-Membros. A realização do mercado único atingirá os seus objectivos, também, garantindo-se aos operadores económicos a rastreabilidade dos lotes comercializados e uma boa coordenação entre os serviços de certificação e as entidades produtoras de sementes.

3.8

Relativamente ao alargamento do âmbito da equivalência aos países terceiros, cumprindo as regras da OCDE, o Comité salienta que a Comissão Europeia deve obter desses mesmos países terceiros a reciprocidade desta equivalência, em função de normas idênticas. Do mesmo modo, deve ser pedida a equivalência dos sistemas de supervisão para a selecção conservadora, para que se assegure um nível de qualidade idêntico.

4.   Conclusões

4.1

O Comité aprova a proposta da Comissão Europeia, que vai no sentido da simplificação dos procedimentos de supervisão sem alterar o nível de exigência de qualidade na produção de sementes. O Comité assinala, porém, que a Comissão deve conservar uma análise do desempenho dos sistemas de supervisão.

4.2

De um ponto de vista legislativo, o Comité salienta que a Comissão deveria ter aproveitado esta ocasião para apresentar uma proposta legislativa que agrupasse o conjunto das directivas que se ocupam da comercialização das sementes de cereais, de plantas forrageiras, de beterraba e de plantas oleaginosas.

4.3

O Comité tem para si que a prorrogação até 31 de Março de 2005 será insuficiente para a transposição das directivas para o direito nacional. Por isso, propõe que esta derrogação vigore até 31 de Julho de 2005.

Bruxelas, 15 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


23.3.2005   

PT

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C 74/57


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu — Integração dos aspectos ambientais na normalização europeia»

COM(2004) 130 final

(2005/C 74/11)

Em 25 de Fevereiro de 2004, a Comissão decidiu, em conformidade com o artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supra mencionada:

A Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 6 de Julho de 2004, com base no relatório elaborado pelo relator, A. PEZZINI.

Na 411.a reunião plenária, realizada em 15 e 16 de Setembro de 2004 (sessão de 15 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o seguinte parecer por unanimidade.

1.   Introdução

1.1

A problemática da integração dos aspectos ambientais no processo de normalização europeia insere-se nas prioridades delineadas na estratégia da União Europeia em favor do desenvolvimento sustentável, adoptada pela Comissão em 2001 (1), sobre a qual o Comité emitiu parecer em Novembro de 2001 e fez, recentemente, um balanço (2). Tal estratégia visa o equilíbrio entre os aspectos económicos, sociais e ambientais e o reforço do princípio estabelecido no Tratado CE (3) de integração das exigências ambientais nas outras políticas comunitárias. Com efeito, o próprio Sexto Programa Comunitário de Acção em matéria de Ambiente (4) sublinha, a este respeito, que, nas actividades de normalização técnica, se deve ter em conta as exigências em matéria de protecção do ambiente.

1.2

O processo de normalização técnica pode, além disso, dar um contributo não despiciendo para a realização de um mercado interno europeu plenamente integrado numa perspectiva de progresso respeitador do ambiente, o que concilia, de facto, o empenhamento da UE em se tornar no espaço económico mais competitivo do mundo até 2010 com o desenvolvimento de uma economia sustentável e criadora de novos e melhores empregos no quadro de uma Europa alargada caracterizada por uma coesão económica e social cada vez maior, como estabelecido na estratégia adoptada em Lisboa, em 2000, pelos Chefes de Estado e de Governo da União.

1.3

Por outro lado, a normalização técnica, que se baseia no consenso voluntário entre todas as partes interessadas, é um elemento essencial do processo de aplicação das políticas comunitárias e, em particular, da política integrada de produtos, sobre a qual o Comité já teve o ensejo de se pronunciar por diversas vezes (5), que considera a própria normalização como um potencial instrumento para a redução do impacte ambiental dos produtos e dos serviços.

1.4

O Conselho «Normalização» de 1 de Março de 2002 reafirmou a oportunidade das normas harmonizadas nos sectores actualmente incluídos na «nova abordagem», sublinhou a importância da efectiva participação de todos os parceiros sociais interessados no processo de normalização e congratulou-se, por último, com a intenção da Comissão de elaborar um documento sobre a normalização e sobre a protecção do ambiente.

1.5

Na sequência do referido Conselho, a Comissão definiu, num documento de trabalho sobre o «Papel da normalização em apoio da legislação e da política europeia», um conjunto de áreas-chave, particularmente as seguintes:

1.5.1

utilização mais alargada da normalização europeia nas políticas e na legislação da União para promover, de acordo com as necessidades da sociedade e das empresas, a extensão da normalização técnica a novas áreas como os serviços, as tecnologias da informação e da comunicação, os transportes, a defesa dos consumidores e a protecção do ambiente;

1.5.2

reforço da consciencialização dos empresários e das demais partes interessadas quanto às vantagens da normalização para o mundo dos negócios, particularmente através de acções destinadas a melhorar e facilitar a sua participação no processo de elaboração das normas, envolvendo, sobretudo, os representantes das PME;

1.5.3

revisão do quadro legislativo vigente sobre a normalização, de forma a melhor responder aos mais recentes desenvolvimentos e desafios em matéria de normas técnicas europeias, de simplificação legislativa e de «legislar melhor» (6), em conformidade com as orientações de política industrial numa Europa alargada (7) e com as prioridades 2003-2006 da estratégia para o mercado interno (8);

1.5.4

adopção de um quadro financeiro estável em apoio da normalização europeia assente em bases jurídicas sólidas, assegurando o co-financiamento Comissão/Estados-Membros das actividades de normalização europeia, das infra-estruturas europeias e de maiores sinergias entre o CEN, o CENELEC e o ETSI

1.5.5

apoio às organizações europeias de normalização para aumentar a sua eficácia no processo de elaboração de normas técnicas e de promoção da elaboração e aplicação de normas internacionais, facilitando o acesso aos mercados e ao comércio internacional, evitando criar obstáculos inúteis às trocas comerciais e assegurando a dimensão global da normalização.

1.6

O desenvolvimento de uma cultura europeia da normalização técnica é, além disso, essencial para garantir o funcionamento eficaz e equilibrado do mercado interno na União a 25. Importa, pois, especialmente no domínio ambiental, assegurar a adopção de medidas para a formação de peritos e para a criação e utilização de bancos de dados adequados, por forma a assegurar a integração dos aspectos ambientais no sistema europeu de normalização, bem como a plena integração dos novos Estados-Membros nesse sistema, graças à participação das respectivas organizações de normalização. Para tal, e dada a estrutura e dimensão das empresas destes últimos países, o Comité considera indispensável uma acção de apoio à plena participação das pequenas e médias empresas de toda a Europa alargada nos trabalhos de normalização, bem como na utilização das normas técnicas europeias existentes.

1.7

O sistema europeu de normalização técnica, baseado no consenso entre todas as partes interessadas na elaboração das novas normas e na sua adesão voluntária às normas adoptadas, deu provas da sua validade, bem como de um nível de eficácia e de flexibilidade que permite um considerável incremento da elaboração de normas. As normas europeias atingiram, em 2003, o importante número total aproximado de 13 500, desempenhando um papel extremamente positivo para a economia, reduzindo os custos das transacções, facilitando o comércio e os intercâmbios, aumentando a competitividade e reforçando a inovação. Outro aspecto importante da normalização é o facto de ter reduzido os obstáculos às trocas comerciais no mercado interno e, não raro, também no mercado global.

1.8

Estas características de sucesso devem, no entender do Comité, não apenas ser preservadas na sua totalidade, mas também reforçadas, como sublinhado nas Conclusões do Conselho «Normalização» de Março de 2002. Na opinião do Comité, toda e qualquer tomada em consideração — ainda que desejável — dos aspectos económicos, sociais e ambientais no processo de normalização não deve, de modo algum, prejudicar a natureza e as características essenciais de tal processo, que deve continuar a ser livre, voluntário e consensual. Trata-se, com efeito, dos aspectos que dele fizeram um instrumento bem sucedido no plano interno e internacional.

2.   Síntese dos principais elementos da Comunicação

2.1

Os objectivos da Comunicação da Comissão podem resumir-se, essencialmente, como segue:

sensibilizar para a necessidade de uma integração sistemática dos aspectos ambientais num processo de normalização europeia voluntário e fundamentalmente gerido pelas partes interessadas;

abrir um debate permanente com todos os actores do sector da normalização, com vista à elaboração de um plano de acções concretas que preveja: 1) actividades de formação e de sensibilização; 2) organização e apoio da participação de todas as partes interessadas no processo de normalização; 3) utilização sistemática de todos os instrumentos disponíveis para ter em conta considerações de ordem ambiental a nível das normas; 4) redefinição do quadro de formulação, por parte da Comissão, dos mandatos de normalização e dos mandatos específicos relativos a políticas ambientais ou a aspectos ambientais dos produtos;

proceder à avaliação e ao controlo permanente do processo de integração dos aspectos ambientais na normalização europeia, à luz dos resultados obtidos nos quatro sectores supramencionados.

2.2

Para atingir estes objectivos, a Comissão propõe as seguintes medidas:

a nível das partes interessadas: apresentar propostas de promoção das actividades de sensibilização; trocar experiências de boas práticas em matéria de formação e de sensibilização; proceder a uma ampla consulta para a formulação dos mandatos de normalização; definir as prioridades para as actividades de integração dos aspectos ambientais nas normas europeias; elaborar indicadores do nível de integração dos requisitos ambientais nas normas; identificar e coordenar os aspectos ambientais tratados pelas organizações europeias de normalização; conceder apoio comunitário aos grupos europeus de interesses que levam a cabo tais acções; informar periodicamente sobre as modalidades de utilização dos diversos instrumentos de integração dos requisitos ambientais nas normas;

a nível dos Estados-Membros, particularmente os de adesão recente: prever medidas de promoção de actividades de formação e de sensibilização; garantir a recolha e difusão da informação por parte das respectivas organizações de normalização; assistir todas as partes interessadas, especialmente os representantes da sociedade civil e as entidades públicas activas no domínio do ambiente, e facilitar a sua tarefa, por forma a que participem plenamente no processo de normalização; informar sobre as medidas de apoio adoptadas, com o objectivo de promover os intercâmbios de experiências e de boas práticas;

a nível comunitário: adoptar medidas financeiras de apoio comunitário a projectos de sensibilização e de formação promovidos por organizações europeias de normalização; organizar um controlo permanente das actividades de formação e de sensibilização levadas a cabo; incluir, mediante consulta prévia das partes interessadas se for caso disso, os aspectos ambientais na formulação dos mandatos de normalização; apoiar os grupos interessados, à escala europeia, na identificação e coordenação dos elementos ambientais da normalização europeia; organizar reuniões para permitir o intercâmbio de experiências e de boas práticas e a aprovação de indicadores do progresso da normalização europeia particularmente atinentes à dimensão ambiental; instituir um sistema de avaliação permanente dos progressos realizados nos sectores indicados, avaliação essa que deverá ser examinada, pelo menos uma vez por ano, com as partes interessadas.

3.   Observações na generalidade

3.1

O Comité congratula-se com a iniciativa da Comissão de proceder a uma reflexão aprofundada sobre as possibilidades, oportunidades e modalidades de integração, na definição de normas técnicas europeias, de considerações inspiradas não só na protecção do ambiente, mas também na utilização sustentável dos recursos naturais e das matérias-primas necessárias ao fabrico, embalagem, distribuição, manutenção e tratamento de fim de ciclo dos produtos.

3.2

A este respeito, o Comité sublinha a importância de criar uma verdadeira cultura europeia da normalização técnica, com o objectivo de garantir um funcionamento eficaz e equilibrado do mercado interno da União Europeia e assegurar, especialmente no domínio ambiental, a adopção de medidas destinadas à formação de peritos e à criação de bancos de dados adequados, para que seja possível avaliar as possibilidades e oportunidades de integração dos aspectos ambientais no sistema europeu de normalização, inclusivamente no que respeita aos novos Estados-Membros.

3.3

Em qualquer caso, é essencial, no entender do Comité, que a natureza voluntária e as características de consenso, abertura e transparência de procedimentos livremente realizados por e para os próprios interessados, que constituem os trunfos do processo de normalização técnica europeia, não sejam desvalorizadas, mas sim reforçadas, inclusivamente na tomada em consideração dos aspectos socioeconómicos e ambientais.

3.3.1

O Comité faz notar que, actualmente, são já muitas as normas técnicas europeias que tratam directamente de questões ambientais ou que têm em conta aspectos ambientais. Refiram-se, em particular, as normas relativas aos aspectos essenciais do ciclo de vida dos produtos, aos métodos normalizados de medição e de ensaio, ou ainda as normas técnicas relativas às tecnologias ambientais e à gestão ambiental, como, por exemplo, a gestão EMAS baseada numa norma EN/ISO da série 14001.

3.3.2

O Comité observa ainda, com agrado, que as organizações de normalização europeias dispõem de um conjunto perfeitamente adequado de instrumentos para optimizar a integração dos aspectos ambientais nos trabalhos de normalização técnica. São disso exemplo o Guia IEC 109 (9) — introduzido com êxito em 1995 e recentemente actualizado — no que respeita às normas técnicas dos produtos electrotécnicos e electrónicos, a norma ISO/TR 14062 (10), ratificada em 2002, no que diz respeito à concepção e desenvolvimento dos produtos, as mais de 100 «Emissions and immunity quality standards» do ETSI/CENELEC e, por último, o Código de Conduta ISO/64, promovido pelo Environment Help Desk criado pelo CEN.

3.4

O Comité considera que o acima exposto reforça a convicção de que os objectivos de uma associação eficaz dos aspectos ambientais ao processo de normalização técnica podem ser mais eficazmente atingidos — especialmente no caso das pequenas e médias empresas – através de códigos de conduta, relatórios técnicos e instrumentos mais flexíveis, ou através de workshops de formação e de manuais práticos que possam transmitir conhecimentos e sensibilizar para esta questão desde a fase de concepção de novos produtos, de novos processos de produção e de novos serviços. A este propósito, podem ser utilizados procedimentos simplificados, adoptados no caso do EMAS ou das normas de higiene e de segurança para as pequenas empresas, como foi por diversas vezes sublinhado no parecer do CESE (11).

3.5

O Comité sublinha que, em todo este processo, se deve evitar sobrecarregar ou abrandar o processo de normalização. Torná-lo mais dispendioso e mais burocrático estaria também em contradição com os princípios comunitários de simplificação das normas. A este respeito, o Comité está inteiramente de acordo com a opinião expressa pelo Conselho «Normalização», de 1 de Março de 2002, de que a vitalidade do sistema de normalização global na Europa está longe de estar assegurada, à luz de um ambiente europeu e internacional em rápida evolução e da alteração das fontes de rendimento tradicionais (12). O Comité entende que a normalização deve, cada vez mais, ser atraente e útil para as empresas e para os seus peritos, que dispõem de competência técnica para melhor integrar os aspectos ambientais na concepção dos produtos a custos sustentáveis.

3.6

A fim de optimizar o desempenho geral das empresas, é necessário desenvolver os mecanismos que permitem melhorar o conhecimento especializado em matéria ambiental de todos os actores, que devem assegurar uma participação activa das partes interessadas desde o início do processo de elaboração das normas. Para além dos aspectos técnicos, económicos e sociais, devem ser tomados em consideração os relativos à saúde, à segurança e à satisfação do cliente. Sobretudo nos últimos anos, surgiu a necessidade de prestar grande atenção à redução e racionalização do consumo de recursos naturais e de energia, à redução dos resíduos e das emissões e, acima de tudo, à qualidade do próprio processo de elaboração das novas normas técnicas voluntárias, de modo a assegurar a sua fácil transposição ao nível internacional.

3.7

No entender do Comité, e à luz do actual processo democrático, que se baseia, fundamentalmente, nas estruturas nacionais, seria conveniente deixar às partes interessadas ( stakeholders ) a responsabilidade de definir — recorrendo a peritos ou consultores — as modalidades de integração dos aspectos ambientais na normalização, evitando assim abordagens do tipo «top-down» (do topo para a base).

3.8

O Comité considera que o processo de elaboração das normas técnicas não pode evoluir mais rapidamente do que as mutações culturais, que são necessárias aos diversos sectores para que se consciencializem do seu papel num contexto de desenvolvimento sustentável. A tarefa da Comissão assume particular importância no processo de sensibilização e de« foresight » (previsão) cultural a levar a cabo através da difusão de conhecimentos e de boas práticas.

3.9

A elevada qualidade das normas técnicas voluntárias é o elemento essencial do seu valor acrescentado ao nível europeu e só pode ser assegurada, na opinião do Comité, através de uma participação activa no processo de normalização de todas as partes interessadas, isto é, dos peritos e dos representantes industriais do sector, bem como das pequenas e médias empresas, dos trabalhadores, dos consumidores e das ONG. A multiplicidade de actores representa um justo equilíbrio entre as exigências económicas, sociais e ambientais, sem contar com os aspectos prioritários da saúde e da segurança.

3.10

Em aplicação do princípio da subsidiariedade, tal participação deve ser assegurada, em primeiro lugar, ao nível nacional, sobretudo no que diz respeito aos novos Estados-Membros. É necessário apoiar não só as ONG, para que assegurem uma participação activa e competente, mas também, e sobretudo, as PME, que, não raro, dada a sua estrutura e dimensão, apresentam grande necessidade de melhorar o seu acesso ao processo de normalização. A este propósito, vale a pena recordar que estruturas europeias criadas especificamente para as PME, como a NORMAPME, deveriam ser reforçadas e utilizadas ao máximo.

3.11

O Comité salienta a necessidade de medidas prioritárias de apoio comunitário a acções de « capacity building » (reforço das capacidades) promovidas pelas organizações de normalização e pelas ONG dos novos Estados-Membros, bem como a projectos de formação de peritos, e sugere o estabelecimento de uma rede de bancos de dados, plenamente interoperacional e descentralizada, próxima do utilizador final. Trata-se, em última análise, de garantir o acesso permanente e cada vez melhor à informação e a participação consciente de todas as empresas no processo de normalização.

3.12

O Comité considera que as prioridades nos trabalhos de normalização devem continuar a ser definidas no âmbito de um processo consensual voluntário em que participem livremente todas as partes interessadas e que devem ser evitadas prioridades fundadas apenas no plano político que não tenham em conta as especificidades dos produtos e das empresas que os produzem.

3.13

Quanto ao recurso, por parte da Comissão, a mandatos obrigatórios no âmbito da «nova abordagem», o Comité entende que a promoção da utilização de normas técnicas ambientais não deve ser objecto de decisões «do topo para a base», devendo antes realizar-se através de uma aceitação mais ampla dos produtos compatíveis com o ambiente, orientando, da melhor forma possível, os interesses e as necessidades dos cidadãos e dos consumidores.

3.14

No entender do Comité, a formulação de mandatos bem definidos decorrentes da aplicação da nova abordagem contribuiu para o êxito do mercado interno europeu. Esse êxito não deve agora ser neutralizado por uma utilização destinada a transferir processos decisórios difíceis de natureza política para os organismos técnicos de normalização.

3.15

A transposição das normas técnicas europeias ao nível internacional reveste, no entender do Comité, uma importância essencial para garantir a plena presença e competitividade dos nossos produtos no mercado global. Actualmente, graças aos Acordos de Desden e de Viena, mais de 83 % das normas CENELEC e cerca de 40 % das normas CEN derivam das normas dos organismos internacionais de normalização ISO, CEI e UIT. O Comité considera que é, portanto, necessário evitar que os requisitos de normalização ambiental sejam considerados como barreiras comerciais no âmbito do Acordo TBT da Organização Mundial do Comércio ou se traduzam em desvantagens competitivas para as empresas europeias no mercado global. A este propósito, é necessário adoptar uma atitude proactiva no diálogo transatlântico (TABD), no diálogo com o Japão (EJBD) e no diálogo com o Mercosul (MEBF), de forma a não alargar o fosso existente entre normas europeias e normas internacionais.

4.   Observações na especialidade

4.1

Participação — É necessário evitar que uma participação alargada implique uma maior lentidão do processo de adopção e de revisão das normas, que tem já uma duração média de 3 a 5 anos. O princípio da subsidiariedade deve ser plenamente assumido. Ao nível nacional, deve ser assegurada a participação de todas as partes interessadas, particularmente dos empresários e dos trabalhadores, enquanto, a nível europeu, os representantes das organizações nacionais de normalização devem transmitir os resultados das posições consensuais alcançadas. A este nível, devem também poder participar os representantes das organizações europeias das pequenas e médias empresas e das ONG interessadas, com base nas posições consensuais adoptadas.

4.2

Cooperação – O Comité considera particularmente importante o intercâmbio organizado de conhecimentos técnicos e o desenvolvimento de códigos de conduta geridos numa base voluntária e de boas práticas, devendo, para tal, recorrer-se aos instrumentos já existentes (ver ponto 3.3.2), que merecem ser reforçados e alargados, especialmente no que respeita aos novos Estados-Membros.

4.3

Cultura — A formação de uma cultura europeia da normalização técnica que tenha em conta aspectos económicos, sociais e ambientais é prioritária para as empresas e respectivas organizações, particularmente as das PME, bem como para as organizações dos trabalhadores e das partes interessadas (stakeholders). As organizações de defesa dos consumidores e de protecção do ambiente devem poder beneficiar, tanto ao nível nacional como ao nível europeu, de apoios financeiros adequados, de forma a reforçar a sua formação no domínio técnico e normativo e assegurar uma representação qualificada e competente.

4.4

Financiamento — Necessidade de rubricas orçamentais plurianuais, nacionais e comunitárias, para desenvolver acções de formação e de sensibilização. Tais dotações deveriam ser atribuídas, em particular, a organismos de normalização nacionais e europeus, aos parceiros sociais e aos organismos representativos das diversas instâncias da sociedade civil.

4.5

Prioridades — As prioridades no que se refere à elaboração das novas normas técnicas devem ser definidas, de forma consensual, por todos os participantes, que são os actores directos do processo de normalização e devem assumir inteira responsabilidade pelo mesmo; não devem, em caso algum, resultar de um processo do «topo para a base». Instrumentos — A utilização sistemática dos instrumentos — como os examinados nos pontos 3.3.1 e 3.3.2 — necessários para integrar os aspectos ambientais na normalização deve ser encarada como uma oportunidade oferecida, e não imposta, aos actores do processo de normalização técnica voluntário.

4.6

Acompanhamento — O acompanhamento e a avaliação dos resultados obtidos com as acções de sensibilização e de formação e com o reforço das organizações nacionais e europeias de normalização, inclusivamente em termos de participação qualificada das ONG e das organizações representativas das PME, deve poder fornecer à Comissão, ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu as bases para a elaboração dos relatórios bienais previstos e para a revisão, de cinco em cinco anos, das acções e das orientações comunitárias na matéria.

5.   Conclusões

5.1

O CESE está convicto da necessidade de acelerar o processo de normalização sem contudo o sobrecarregar, de modo a assegurar o desenvolvimento de um Mercado Interno de elevada qualidade, sob todos os aspectos, inclusive os ambientais. O objectivo é tornar o processo de normalização eficaz, pouco dispendioso e não burocrático e adaptar previamente as capacidades institucionais dos Estados-Membros.

5.2

No entender do CESE, o processo que visa a integração dos aspectos ambientais no sistema de normalização europeu deveria respeitar inteiramente o princípio da subsidiariedade, o qual deve garantir a plena participação de todos os actores, sobretudo das PME e das ONG, particularmente ao nível nacional/regional, que é claramente o nível mais próximo das partes interessadas.

5.3

O desenvolvimento do mercado global e a abertura ao comércio mundial de novas entidades de grande dimensão, como a China, a Índia e a Rússia, tornam prioritária a transposição das actuais regulamentações técnicas europeias ao nível internacional, de acordo com as disposições dos Acordos de Dresden e de Viena, de forma que as soluções de normalização se traduzam em vantagens comerciais para as empresas europeias.

5.4

Na opinião do CESE, o objectivo é realizar uma complementaridade óptima entre as regulamentações ambientais imperativas e as normas técnicas voluntárias, que resultam de uma acentuada sensibilidade em relação ao ambiente e à qualidade.

5.5

O CESE insiste no reforço das plataformas de intercâmbio de boas práticas e de diálogo entre os parceiros sociais (organismos europeus e nacionais de normalização, indústria, PME, representantes dos trabalhadores, consumidores e ONG) para o desenvolvimento de conhecimentos especializados, tendo em vista apoiar o desenvolvimento do processo de normalização de acordo com a Estratégia de Lisboa e com os princípios do crescimento sustentável e competitivo.

5.6

É necessário, em particular:

promover uma cultura europeia da normalização técnica para a UE;

prever medidas de formação para peritos e desenvolver bancos de dados adequados e de ampla utilização;

integrar cada vez mais a protecção do ambiente no sistema de normalização europeia;

promover acções de sensibilização da procura (ou seja, dos consumidores) para que o mercado vise, cada vez mais, uma utilização sustentável dos recursos naturais, tanto a nível das matérias-primas como dos produtos acabados e embalados;

assegurar um equilíbrio adequado entre a salvaguarda dos aspectos prioritários de segurança, de higiene e de saúde e dos aspectos ambientais globais, tendo em conta o Protocolo de Quioto;

aplicar plenamente o princípio da subsidiariedade, promovendo a participação de todas as partes interessadas ao nível nacional/regional;

promover códigos de conduta mais flexíveis que conduzam a processos de normalização respeitadores do ambiente, de modo a ajudar, sobretudo as PME, a adoptar processos técnicos que sejam também economicamente válidos para a realização de novos produtos, novos processos e novos serviços;

desenvolver uma plataforma de intercâmbio entre a Estratégia de Lisboa para o Mercado Interno e o Plano de Acção 2004-2010 para o Ambiente e a Saúde, com o objectivo de promover um diálogo a nível de conhecimentos especializados entre todas as partes interessadas no processo de normalização: CEN, CENELEC, ETSI, PME-normalização, ANEC (consumidores), TUTB (sindicatos de trabalhadores), ECOS (instâncias ambientais), indústria, distribuição e serviços;

apoiar o desenvolvimento da normalização técnica de base para a regulamentação relativa à qualidade dos produtos e dos processos no domínio da produção agrícola e alimentar.

Bruxelas, 15 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  COM(2001) 264 final.

(2)  Parecer CES 1494/2001, de 29 de Novembro de 2001 e parecer CESE 661/2004, de 29 de Abril de 2004.

(3)  Tratado CE, artigos 2.o e 6.o (versão consolidada).

(4)  Decisão 1600/2002/CE de 22.7.2002.

(5)  Parecer CES sobre o Livro Verde sobre a P.I.P. (JO C 260 de 17.9.2001) e parecer CESE 1598/2003 de 10.12.2003 sobre a comunicação «A política integrada de produtos — desenvolver o conceito de ciclo de vida ambiental».

(6)  Comunicação da Comissão COM(2002) 278 final.

(7)  Comunicação «Política industrial numa Europa alargada» — COM(2002) 714 final.

(8)  Comunicação «Estratégia do Mercado Interno — prioridades 2003-2006» — COM(2003) 238 final.

(9)  Guia IEC/109 sobre «Environmental aspects — Inclusion in electro-technical product standards».

(10)  ISSO/TR 14062 sobre «Environmental management — Integrating environmental aspects into product design and development».

(11)  Parecer CES 560/1999, de 29 de Maio de 1999 (JO C 204 de 22 de Julho de 1999).

(12)  JO C 66 de 15 de Março de 2002.


23.3.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 74/62


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Agricultura Periurbana»

(2005/C 74/12)

Em 17 de Julho de 2003, nos termos do disposto no n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, o Comité Económico e Social Europeu decidiu elaborar um parecer sobre «A Agricultura Periurbana».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, que emitiu parecer em 6 de Julho de 2004 (relator: J. CABALL i SUBIRANA).

Na 411.a reunião plenária de 15 e 16 Setembro de 2004 (sessão de 16 Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 132 votos a favor e 3 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1   Uma actividade produtiva condicionada pelo meio urbano envolvente

1.1.1

Uma das preocupações que são objecto de debate e reflexão em diversos fóruns europeus, designadamente no Comité Económico e Social Europeu, é a questão dos espaços periurbanos. Trata-se de um fenómeno em expansão em numerosos municípios da União Europeia como consequência do desenvolvimento urbanístico, industrial e do sector terciário, bem como do incremento de infra-estruturas de comunicação e transporte que fagocitam o território em detrimento do espaço produtivo agrícola, gerando cada vez mais espaços marginais ou espaços agrícolas não competitivos.

1.1.2

A actividade agrícola nas zonas periurbanas está condicionada pelo meio urbano em que se desenvolve e que sobre ela produz efeitos negativos que limitam a sua viabilidade económica. Este impacto negativo é o principal causador da degradação ambiental do território e da deterioração das relações sociais entre cidade e campo. Este conflito entre cidade e campo, sendo resolvido a contento da primeira, pode comprometer a sobrevivência da própria actividade agrícola.

1.1.3

Aos problemas tradicionais dos espaços agrícolas periurbanos veio juntar-se recentemente um outro que defende a existência de espaços livres em redor das cidades, mas sem actividade agrícola. É, em suma, uma concepção do território como «parque temático», onde tudo será artificial, descontextualizado e impessoal, justificado por critérios estéticos pretensamente sustentados por normas baseadas na preservação da biodiversidade ou numa concepção da paisagem que procura marginalizar ou folclorizar a actividade agrícola.

1.1.4

Desde a instituição da Política Agrícola Comum (PAC) da União Europeia tem-se insistido na necessidade de diversificar a economia das explorações agrícolas, integrando actividades que gerem novas receitas para os agricultores. Convém sublinhar que sem agricultura não há paisagem agrícola, isto é, paisagem com campos de cultivo, animais, prados e, sobretudo, com agricultores.

1.1.5

Tudo isto (a pressão do ambiente urbano, a concepção de uma agricultura sem agricultores e sem agricultoras e a própria reforma da PAC) coloca sérios problemas para a sobrevivência e a estabilidade da agricultura periurbana (muito mais acentuados que noutras zonas agroclimáticas semelhantes, o que implica um risco mais elevado de desaparecimento da actividade agrícola).

1.1.6

À perda de solos com aptidão agrícola acrescem as dificuldades que enfrentam as estruturas produtivas em alguns Estados-Membros pelo facto de não existir legislação clara que regule o mercado dos solos e dos arrendamentos rústicos e, consequentemente, não poderem dispor de mercado de solos aptos para o cultivo, para a integração de jovens ou para aumentar a dimensão da exploração agrícola. Muitos proprietários (particulares ou entidades públicas) de terrenos têm bloqueado o mercado de solos, evitando facultar contratos de arrendamento aos agricultores profissionais. São processos especulativos que comprometem sensivelmente o futuro de muitos espaços agrícolas periurbanos e que os Estados-Membros da UE devem combater mediante legislação específica.

1.1.7

Espaços naturais agrícolas que, sem escaparem às transformações ocorridas no mundo rural nos últimos anos, se caracterizam por valores e funções que permitem ou não as actividades que neles se desenvolvem.

1.2   Muito mais do que uma actividade meramente económica

1.2.1

O CESE, enquanto parte interessada no desenvolvimento rural directamente empenhada em garantir um desenvolvimento económico, ambiental e social sustentado das zonas rurais da Europa, recorda que as funções ambientais, sociais e económicas que os espaços agrícolas também desempenham têm nas zonas periurbanas maior relevância do que no resto do território. O solo agrícola funciona, nas zonas periurbanas, como pulmão verde das grandes urbes; estas áreas são um elemento fundamental do ordenamento do território, pois impedem o crescimento ilimitado das cidades, geram paisagens e humanizam os ambientes urbanos. Mas a sua função económica, essencial para manter e perspectivar o futuro dos espaços agrícolas, vê-se reduzida pela pressão urbanística a que está sujeita e pela escassa importância produtiva que se lhe atribui no cômputo geral da economia das áreas periurbanas.

1.2.2

Parafraseando o primeiro princípio da Conferência de Salzburg — não há agricultura sem vitalidade do espaço natural nem vitalidade do espaço natural sem actividade agrícola (1) — o CESE insiste em que os verdadeiros protagonistas dos espaços agrícolas periurbanos são e devem continuar a ser os agricultores profissionais que se dedicam a esta actividade a tempo inteiro, embora se reconheça o papel importante dos agricultores a tempo parcial em muitos espaços periurbanos.

1.3   Condicionalismos e oportunidades da agricultura em espaços heterogéneos e dinâmicos

1.3.1

O CESE está consciente da dificuldade de definir um conceito unívoco de espaço periurbano devido à sua enorme heterogeneidade e dinamismo. Este espaço é, antes de mais, uma zona de contacto entre o mundo rural propriamente dito e o mundo urbano, mas, ao mesmo tempo, mantém os traços fundamentais do primeiro e sofre a atracção do segundo.

1.3.2

O elemento comum aos espaços periurbanos é a precariedade territorial, ambiental e social e o facto de estarem localizados na periferia das aglomerações urbanas. É precisamente esta agricultura profissional praticada nestes espaços que é designada por «agricultura periurbana». Com esta agricultura profissional convivem outras actividades relacionadas com o cultivo de plantas com fins recreativos, terapêuticos, pedagógicos, etc., ou para criação e manutenção de paisagens (paisagistas, jardineiros, etc.). Essas actividades têm particular importância em algumas zonas dos Estados-Membros.

1.3.3

Trata-se de espaços naturais com características e condicionalismos específicos que os distinguem de outros espaços rurais e que comprometem gravemente a sua existência.

1.3.4

Ora, a agricultura periurbana possui, em bastantes casos, uma característica que lhe é peculiar e que deve ser aproveitada ao máximo, ou seja, as oportunidades que lhe são abertas pela proximidade de um mercado de consumidores, pela crescente sensibilização dos consumidores para aspectos como a qualidade e a segurança alimentares, bem como pela procura social de novas actividades (lazer, formação, educação ambiental, agro-turismo, etc.) Estas novas actividades complementares permitiriam diversificar o risco empresarial e melhorar o rendimento dos agricultores.

1.3.5

O artigo 20.o do Regulamento (CE) n.o 1257/1999 do Conselho sobre o apoio do Fundo Europeu de Orientação e Garantia Agrícola (FEOGA) ao desenvolvimento rural, ao dispor que «podem ser equiparadas a zonas desfavorecidas outras zonas afectadas por desvantagens específicas, nas quais a actividade agrícola deva ser mantida, onde necessário e sob certas condições, para conservar ou melhorar o meio ambiente, manter o espaço natural e preservar o potencial turístico da zona, ou por motivos de protecção da costa», reforça a posição que o CESE tem defendido, pois considera os espaços agrícolas periurbanos como «zonas afectadas por desvantagens específicas».

1.3.6

A Agenda 2000 e a recente revisão intercalar da PAC deram novo impulso a estas orientações.

1.3.7

O preâmbulo das Conclusões da Conferência de Salzburgo sublinha a «necessidade de auxiliar os agricultores europeus a assumir em toda a União Europeia (2) o papel multifuncional que lhes incumbe como guardiães do espaço natural e como produtores orientados para o mercado». O que, aliás, foi dito no parecer de iniciativa do CESE, de que foi relator BROS, «O segundo pilar da PAC: as perspectivas de adaptação da política de desenvolvimento dos territórios rurais (seguimento da Conferência de Salzburgo). (3)».

2.   Objectivos em matéria de preservação e de desenvolvimento da agricultura periurbana

2.1

Na opinião do CESE, a agricultura periurbana vive inquestionáveis problemas limitativos específicos, fáceis de detectar e de definir, que são reflexo de dificuldades que importa sanar com medidas concretas que permitam preservar, planear e gerir os espaços periurbanos com aptidão agrícola produtiva. Neste sentido, o CESE propõe que se accionem mecanismos e instrumentos para proteger e desenvolver os espaços naturais periurbanos.

2.2   Objectivo n.o 1 — Reconhecer do ponto de vista social, político e administrativo a existência de espaços periurbanos agrícolas como espaços rurais com dificuldades e condicionalismos específicos

2.2.1   Reforço de um tecido activo e eficaz de «cidades intermédias»

2.2.1.1

O CESE verifica que a «metropolização» do território europeu é um fenómeno que se tem intensificado, provocando o crescimento disperso da urbanização extensiva e, consequentemente, a perda constante e irreparável de solos férteis, o que constitui a principal ameaça para as áreas periurbanas, como se pode ler no parecer de iniciativa do CESE, cujo relator foi VAN IERSEL, «As áreas metropolitanas europeias: repercussões socioeconómicas para o futuro da Europa» (4).

2.2.1.2

Esta perda de actividade agrícola não só se repercute no sector agrícola, como acarreta prejuízos no que diz respeito aos recursos naturais, à qualidade de vida dos habitantes e à gestão do território.

2.2.1.3

Na óptica de um território europeu equilibrado e sustentável, o CESE insiste em que é necessário um tecido activo e eficaz de redes de «cidades intermédias», assim designadas, não por razões demográficas, mas pelo papel de mediação entre os territórios rurais e urbanos da sua área de influência.

2.2.1.4

Esta tecitura só é possível se existirem na periferia destas cidades espaços agrícolas e naturais, em última análise espaços periurbanos, que sirvam de separadores entre áreas construídas e de conectores entre espaços naturais, permitindo assim favorecer e consolidar a personalidade dos municípios e a diversidade biológica e, ao mesmo tempo, viabilizar a actividade agrícola.

2.2.2   Reconhecimento da acção da agricultura na relação cidade/campo

2.2.2.1

Para o CESE um instrumento essencial é, sem dúvida, o reconhecimento social, político e administrativo da existência destas zonas rurais/urbanas (periurbanas) como áreas de uso agrícola que enfrentam dificuldades específicas, bem como do papel que elas desempenham na relação cidade/campo.

2.2.2.2

Para que este reconhecimento se faça, é necessário, em primeiro lugar, estudar os problemas que estes espaços enfrentam, mas também suscitam e, em segundo lugar, fazer uma análise integral dos valores que encerram (água, paisagem, biodiversidade, arquitectura, estrutura agrícola, etc.) e das funções económicas, ambientais e sociais que têm que desempenhar consoante os valores neles presentes.

2.2.3   A sensibilização como instrumento de reconhecimento

2.2.3.1

É necessário que a sociedade integre a «cultura dos solos» como recurso natural limitado e como património comum que, quando destruído, é difícil de recuperar. Daí a importância do crescimento urbano centrípeto (para dentro) através de programas de reabilitação e recuperação de espaços urbanos degradados e de zonas industriais obsoletas, evitando assim delapidar solos com construções, e de legislações específicas que combatam os processos especulativos do solo agrícola tão frequentes nas periferias de muitas cidades europeias.

2.2.3.2

Para que haja reconhecimento social, político e administrativo ao nível europeu, o CESE propõe que se leve a cabo uma acção europeia sobre os espaços agrícolas periurbanos que reconheça os valores e as funções destes espaços e da actividade aí desenvolvida e se lancem as bases para a elaboração de legislações nacionais sobre a matéria, assentes em critérios comuns, que tenham em vista proteger e desenvolver este tipo de espaços naturais.

2.3   Objectivo n.o 2: Preservar os espaços agrícolas periurbanos de serem incorporados no processo urbano através de medidas de planeamento, ordenamento e impulso municipal

2.3.1

O CESE considera que, para preservar os espaços agrícolas periurbanos, não basta que os mesmos sejam objecto de reconhecimento social e político (conceptual ou emocional), é indispensável que todos os Estados-Membros criem e apliquem instrumentos de gestão dos solos agrícolas periurbanos capazes de travar processos especulativos que levem ao abandono destes solos.

2.3.2

Em seu entender, os instrumentos de gestão dos solos devem assentar em seis pilares:

a)

recurso a instrumentos legais de planeamento territorial e ordenamento urbano nos planos europeu, estatal e regional, e ocupação do solo, a nível nacional e regional, que contemplem os espaços naturais periurbanos e as políticas agrícolas e dificultem a requalificação de solos agrícolas para outras utilizações;

b)

elaboração de legislação transparente sobre cessão temporária de utilização de terras pelos seus proprietários (particulares ou entidades públicas), mediante celebração de contratos de arrendamento com agricultores profissionais tendo em vista a actividade agrícola ou pecuária e facilitar o rendimento das explorações agrárias;

c)

não onerar excessivamente as terras afectas à actividade agrária nestas zonas, com fiscalidade igual à das zonas industriais e/ou residenciais urbanas;

d)

impulso e recuperação da iniciativa municipal através do reforço do princípio de subsidiariedade (responsabilidade das autoridades locais) em matéria de ordenamento municipal, sempre mediante critérios supramunicipais baseados na cooperação intermunicipal e conectividade territorial;

e)

integração de novos critérios de financiamento dos municípios como, por exemplo, o conceito de «solo agrícola protegido», em que a protecção dos solos prevaleça sobre a ocupação urbanística, permitindo reduzir a dependência do financiamento tributário municipal de outros critérios;

f)

realização obrigatória e coerciva do «estudo de impacto agrícola» pelos serviços agrários competentes, sempre que qualquer actuação no espaço agrícola periurbano possa implicar perda de solo agrícola.

2.3.3

Trata-se, pois, de proteger os espaços agrícolas perirurbanos da procura constante de solos por parte das cidades (crescimento urbano, desenvolvimento dos sectores industrial e terciário, infra-estruturas de comunicação e de abastecimento de energia) através de instrumentos de planeamento, ordenamento territorial, uso dos solos, financiamento municipal e estudos de impacto agrícola para, desta forma, evitar a degradação do território, que pode ser utilizada para desacreditar e justificar o desaparecimento dos espaços agrícolas periurbanos.

2.4   Objectivo n.o 3: Garantia de um desenvolvimento dinâmico e sustentável da agricultura periurbana e dos espaços onde ela é praticada

2.4.1

A garantia de um desenvolvimento dinâmico e sustentável da agricultura periurbana e dos correspondentes espaços pressupõe processos em que a administração local desempenha um papel fundamental, bem como critérios de gestão intermunicipal para além dos critérios de planeamento e ordenamento supramunicipais.

2.4.2

Mas, para isso, é necessário que os territórios periurbanos se unam e disponham de um organismo que tenha como objectivo fundamental defender e dinamizar a actividade agrícola nesses espaços naturais, através de planos supramunicipais de conservação, utilização e gestão dos solos.

2.4.3

Os agricultores participarão nesse organismo com vista a realizar parcerias com as colectividades locais (cidadãos e entidades políticas) e demais interlocutores interessados (universidades, associações de defesa do ambiente), a fim de promover os seus objectivos e organizar a gestão do espaço natural.

2.4.4

Os gestores dos espaços periurbanos têm de ser conservadores em relação aos valores territoriais, progressistas com atitudes positivas, imaginativas e criativas em relação às propostas de desenvolvimento das funções do espaço agrícola periurbano, e rigorosos na regulação dos usos. Por outras palavras, têm de pautar a sua acção por critérios de sustentabilidade.

2.4.5

A subsidiariedade na gestão das áreas naturais periurbanas é fundamental para estabelecer um pacto entre as administrações e o sector produtivo agrícola, baseado no compromisso de preservar e desenvolver o território de agricultura periurbana. Em suma, um contrato para a gestão agrícola sustentável entre a administração pública e os agricultores.

2.4.6

A gestão deve basear-se na«rede de cooperação» entre os agentes públicos e privados envolvidos na gestão e organizados numa «entidade de participação e de gestão», em torno da qual se congreguem finalidades e interesses comuns e se lancem acções específicas associadas à base territorial e aos recursos naturais (por exemplo, impulso e dinamização dos produtos, incorporação das tecnologias de informação e comunicação, fomento da educação ambiental, preservação da paisagem, etc.). Enfim, uma entidade que defina condições gerais, verifique a sua aplicação e promova acções de apoio e fomento do espaço periurbano a dinamizar.

2.4.7

Trata-se de trabalhar, também nas zonas de agricultura periurbana, na linha das orientações propostas no sexto e sétimo princípio da Conferência de Salzburgo (5), que insiste que «a futura política deve generalizar o apoio da UE às zonas rurais mediante parcerias locais construídas da base para o topo» [e que gozem de] «maior responsabilidade na definição e execução de estratégias globais, baseadas em objectivos e resultados claramente definidos».

2.4.8

Para além dos contratos de gestão agrícola sustentável importa não esquecer os projectos de gestão supranacional que, dadas as características territoriais dos espaços agrícolas (espaços rurais urbanos), devem assumir os contornos de verdadeiros projectos «rururbanos» entre administrações e as entidades de gestão, que actuem como medida de conservação e recuperação de espaços agrícolas e de repercussão mútua entre a cidade e o campo das receitas geradas. É fundamental que as receitas derivadas das externalidades induzidas pelo espaço agrícola revertam também a favor do sector agrícola.

2.4.9

Os projectos rururbanos devem ser promovidos pelas entidades que participam na gestão dos espaços de agricultura periurbana e assentar em critérios multisectoriais que integrem aspectos produtivos que satisfaçam a procura dos consumidores; aspectos ambientais que minimizem o impacto da actividade produtiva sobre a natureza, criem paisagem e a mantenham, bem como aspectos sociais que respondam a necessidades urbanas, como seja o uso do espaço natural para actividades pedagógicas e de ar livre.

2.4.10

O desenvolvimento de projectos rururbanos e de contratos de gestão agrária promovidos pela entidade gestora do espaço periurbano exige que, previamente, os agentes envolvidos na gestão desse espaço periurbano (administrações, em particular a administração local, e o sector agrícola) elaborem e aprovem um acordo formal sobre a necessidade de uma gestão integrada do projecto.

2.4.11

Este compromisso institucional entre a administração local e supralocal e os agricultores pode consistir na redacção de princípios gerais definidos de comum acordo numa Carta da Agricultura Periurbana.

2.4.12

O âmbito desta carta pode ser alargado para lograr maior grau de concretização e de compromisso mútuo, mediante a elaboração e aprovação de um «plano estratégico de gestão e de desenvolvimento sustentável» que defina princípios, linhas estratégicas e acções a empreender, a fim de salvaguardar os valores e desenvolver as funções inerentes a um espaço agrícola perirurbano concreto.

3.   Conclusões

3.1

A implantação destes projectos rururbanos e dos contratos de compromisso mútuo terão de assentar em critérios organizados em torno de um pacto cidade-campo através dos órgãos de gestão e dos mecanismos de participação dos cidadãos e do sector agrícola. Estes pactos pressupõem a consecução dos seguintes objectivos:

a)

primeiro objectivo: existência de um projecto territorial de preservação e desenvolvimento dos espaços agrícolas perirubanos, devendo os projectos articular-se em torno de planos territoriais, urbanísticos e de uso dos solos e respeitar as disposições específicas que regulam o mercado dos solos agrícolas;

b)

segundo objectivo: estabilidade do solo agrícola periurbano, recorrendo a instrumentos e mecanismos que garantam essa estabilidade, reduzindo ao máximo a pressão urbanística e os usos alheios à actividade agrícola, e facilitem o acesso ao uso da terra;

c)

terceiro objectivo: gestão integrada através de uma entidade gestora que actue como impulsionador e dinamizador do espaço agrícola periurbano e divulgue junto dos cidadãos os valores destes territórios periurbanos; isto pressupõe o desenvolvimento dinâmico e sustentável mediante um compromisso de gestão a partir de projectos rururbanos e passa por uma relação contratual entre os cidadãos, a administração local e os agricultores assente num contrato para a gestão agrícola sustentável.

3.2

Para realizar estes objectivos é fundamental que:

a)

mulheres e jovens participem mais activamente nos projectos territoriais e nos contratos de gestão agrícola das explorações, como garantia de actividade no presente e no futuro;

b)

os cidadãos tenham a percepção de que a actividade agrícola pode oferecer segurança alimentar, porque a sua gestão é correcta do ponto de vista ambiental e útil do ponto de vista social;

c)

a água seja factor de consolidação dos espaços naturais periurbanos. É necessária legislação específica na matéria que, sem menosprezar o uso da água para fins agrícolas, integre uma nova «cultura da água», que poupe as águas superficiais e subterrâneas e reutilize as águas residuais depuradas para fins agrícolas;

d)

se consolidem estes espaços agrícolas periurbanos, o que significa reconhecer as dificuldades específicas com que estão confrontados;

e)

se desenvolvam instrumentos e acções destinados a melhorar os rendimentos agrícolas, aumentar a eficácia das infra-estruturas e melhorar a oferta de serviços orientados para a actividade agrícola;

f)

se favoreçam sistemas de produção e comercialização que dêem resposta às exigências do mercado, com especial atenção para o fomento da diversidade alimentar, privilegiando um tipo de actividade agrícola que seja sustentável e respeitadora do ambiente, da identidade cultural e do bem–estar dos animais;

g)

se racionalize a utilização e a preservação dos recursos naturais, em especial solos, água e paisagem.

3.3

Dada a fragilidade dos espaços naturais periurbanos e da própria agricultura periurbana europeia, o CESE considera importante que se crie um observatório europeu sobre a agricultura periurbana, que tenha uma visão global dos espaços naturais periurbanos e da agricultura periurbana e, sobretudo, funcione como centro de referência para o seguimento, análise e difusão da situação da agricultura periurbana europeia e como ponto de encontro, reflexão e diálogo entre as administrações locais de primeiro e segundo nível e entre vários organismos europeus. Deve, ainda, apresentar propostas de iniciativas de preservação e desenvolvimento destes espaços periurbanos e da sua agricultura.

Bruxelas, 16 de Setembro de 2004.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Literalmente: «A vitalidade do espaço natural é fundamental para a agricultura, da mesma forma que a actividade agrícola é fundamental para a vitalidade do espaço natural.». Conclusões da Segunda Conferência Europeia sobre Desenvolvimento Rural, realizada em Salzburgo, de 12 a 14 de Novembro de 2003; MEMO/03/236.

(2)  Ver nota de rodapé 1.

(3)  CESE 961/2004 — NAT/243.

(4)  CESE 968/2004 — ECO/120.

(5)  Ver nota de rodapé 1.