CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

ATHANASIOS RANTOS

apresentadas em 9 de setembro de 2021 ( 1 ) ( i )

Processo C‑581/20

Skarb Państwa Rzeczypospolitej Polskiej reprezentowany przez Generalnego Dyrektora Dróg Krajowych i Autostrad

contra

TOTO SpA — Costruzioni Generali,

Vianini Lavori SpA

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Varhoven kasatsionen sad (Supremo Tribunal de Cassação, Bulgária)]

«Pedido de decisão prejudicial — Cooperação judiciária em matéria civil — Competência judiciária e reconhecimento de decisões em matéria civil e comercial — Regulamento (UE) n.o 1215/2012 — Conceito de matéria civil e comercial — Medidas provisórias e cautelares — Contrato relativo à execução de obras de construção de uma via pública»

1.

Em 2015, para garantir obrigações assumidas no âmbito de um contrato público celebrado na Polónia para a construção de um troço de via rápida, as empresas às quais o contrato tinha sido adjudicado apresentaram à entidade adjudicante polaca garantias subscritas por uma seguradora búlgara.

2.

Alguns anos mais tarde, as empresas adjudicatárias solicitaram, sem sucesso, a um tribunal polaco, que, a título provisório e cautelar, impedisse a entidade adjudicante de utilizar essas garantias. Apresentaram um pedido idêntico nos órgãos jurisdicionais búlgaros que o indeferiram em primeira instância e o julgaram procedente em sede de recurso.

3.

A entidade adjudicante polaca interpôs recurso de cassação no Varhoven kasatsionen sad (Supremo Tribunal de Cassação, Bulgária). No seu âmbito importará determinar, em especial, se, à luz do artigo 35.o do Regulamento (UE) n.o 1215/2012 ( 2 ), os tribunais búlgaros têm competência internacional para decretar as medidas provisórias e cautelares requeridas ( 3 ).

4.

Salvo erro da minha parte, até agora o Tribunal de Justiça pronunciou‑se apenas numa ocasião a respeito do referido artigo ( 4 ). Todavia, acórdãos proferidos com base em diplomas anteriores ( 5 ) fornecem pistas sobre as questões do órgão de reenvio, embora não as resolvam.

5.

Por indicação do Tribunal de Justiça, estas conclusões abordarão apenas a segunda questão prejudicial. A resposta exigirá o aprofundamento da relação entre dois tribunais de Estados‑Membros diferentes — o que conhece do mérito do litígio e o que o faz exclusivamente em matéria de tutela provisória e cautelar — em casos transfronteiriços, relativamente aos quais o artigo 35.o tem por objetivo evitar «às partes um prejuízo resultante da longa duração dos prazos inerente aos processos internacionais em geral» ( 6 ).

I. Quadro jurídico

A.   Regulamento n.o 1215/2012

6.

O considerando 33 enuncia:

«Se medidas provisórias, incluindo medidas cautelares, forem decididas por um tribunal competente para conhecer do mérito da causa, a sua livre circulação deverá ser garantida nos termos do presente regulamento. Todavia, as medidas provisórias, incluindo as medidas cautelares, impostas por esse tribunal sem que o requerido seja notificado para comparecer não deverão ser reconhecidas ou executadas nos termos do presente regulamento, a menos que a decisão que contém a medida seja notificada ao requerido antes da execução. Tal não deverá obstar ao reconhecimento e execução dessas medidas ao abrigo da lei nacional. Se medidas provisórias, incluindo medidas cautelares, forem decididas por um tribunal de um Estado‑Membro que não seja competente para conhecer do mérito da causa, os seus efeitos deverão confinar‑se, nos termos do presente regulamento, ao território desse Estado‑Membro.»

7.

Nos termos do artigo 2.o:

«Para efeitos do presente regulamento entende‑se por:

a)

“Decisão”, qualquer decisão proferida por um tribunal de um Estado‑Membro, independentemente da designação que lhe for dada, tal como acórdão, sentença, despacho judicial ou mandado de execução, bem como as decisões de fixação do montante das custas do processo pela secretaria do tribunal.

Para efeitos do capítulo III, o termo “decisão” abrange as medidas provisórias, incluindo as medidas cautelares, decididas por um tribunal que, por força do presente regulamento, é competente para conhecer do mérito da causa. Não abrange as medidas provisórias, incluindo as medidas cautelares, impostas por esse tribunal sem que o requerido seja notificado para comparecer a menos que a decisão que contém a medida seja notificada ao requerido antes da execução;

[…].»

8.

O artigo 29.o, na secção «Litispendência e conexão», tem a seguinte redação:

«1.   Sem prejuízo do disposto no artigo 31.o, n.o 2, quando ações com a mesma causa de pedir e entre as mesmas partes forem submetidas à apreciação de tribunais de diferentes Estados‑Membros, qualquer tribunal que não seja o tribunal demandado em primeiro lugar deve suspender oficiosamente a instância até que seja estabelecida a competência do tribunal demandado em primeiro lugar.

2.   Nos casos referidos no n.o 1, a pedido de um tribunal a que ação tenha sido submetida, qualquer outro tribunal demandado deve informar o primeiro tribunal, sem demora, da data em que ação lhe foi submetida nos termos do artigo 32.o

3.   Caso seja estabelecida a competência do tribunal demandado em primeiro lugar, o segundo tribunal deve declarar‑se incompetente em favor daquele tribunal.»

9.

Nos termos do artigo 35.o («Medidas provisórias e cautelares»):

«As medidas provisórias, incluindo as medidas cautelares, previstas na lei de um Estado‑Membro podem ser requeridas às autoridades judiciais desse Estado‑Membro, mesmo que os tribunais de outro Estado‑Membro sejam competentes para conhecer do mérito da causa.»

10.

Nos termos do artigo 36.o, na secção «Reconhecimento»:

«1.   As decisões proferidas num Estado‑Membro são reconhecidas nos outros Estados‑Membros sem quaisquer formalidades.

[…].»

11.

O artigo 42.o, n.o 2, dispõe:

«Para efeitos da execução num Estado‑Membro de uma decisão proferida noutro Estado‑Membro que decrete medidas provisórias, incluindo medidas cautelares, o requerente deve facultar às autoridades de execução competentes:

a)

Uma cópia da decisão que satisfaça as condições necessárias para atestar a sua autenticidade;

b)

Uma certidão emitida nos termos do artigo 53.o que contenha uma descrição da medida e ateste que:

i)

o tribunal é competente para conhecer do mérito da causa,

ii)

a decisão é executória no Estado‑Membro de origem; e

c)

Se a medida tiver sido decretada sem que o requerido tenha sido notificado para comparecer, o comprovativo da notificação da decisão.»

12.

O artigo 45.o, n.o 1, alínea c), dispõe:

«1.   A pedido de qualquer interessado, o reconhecimento de uma decisão é recusado se:

c)

A decisão for inconciliável com uma decisão proferida no Estado‑Membro requerido entre as mesmas partes.»

B.   Direito nacional. Grazhdanski Protsesualen Kodeks ( 7 )

13.

São relevantes para este processo o artigo 18.o (imunidade de jurisdição dos Estados); os artigos 389.o a 396.o (decreto de medidas provisórias); os artigos 397.o a 403.o (medidas cautelares); e os artigos 274.o a 280.o (recursos das decisões).

14.

Uma vez que as minhas conclusões se focarão exclusivamente na interpretação do artigo 35.o do Regulamento n.o 1215/12, não é necessário transcrever esses artigos.

II. Matéria de facto, litígios e questões prejudiciais

15.

Por contrato de 30 de julho de 2015, o Skarb Państwa Rzeczypospolitej Polskiej reprezentowany przez Generalnego Dyrektora Dróg Krajowych i Autostrad (a seguir «Tesouro Público polaco») incumbiu as empresas TOTO SpA — Costruzioni Generali e Vianini Lavori SpA, atuando em consórcio registado em Itália, da construção da via rápida S‑5 Posnânia — Breslávia, troço Posnânia A2, Gluchowo — Wronczyn.

16.

As partes incorporaram no contrato uma cláusula, a saber, o artigo 20.6, que atribuía a competência para a resolução dos seus diferendos aos tribunais da sede da entidade adjudicante (ou seja, aos tribunais polacos) ( 8 ).

17.

Nesse mesmo contrato foram emitidas as garantias n.o 02900100000348 e n.o 02900100000818 para assegurar, respetivamente, o cumprimento do contrato ( 9 ) e o eventual pagamento de uma «cláusula penal» após a conclusão das obras ( 10 ). Estas duas garantias foram concedidas pela companhia de seguros búlgara Evroins AD e são regidas pelo direito substantivo polaco.

18.

As sociedades adjudicatárias intentaram no Sąd Okręgowy w Warszawie (Tribunal Regional de Varsóvia, Polónia) ações declaratórias negativas contra o Tesouro Público polaco. Pediam que seja declarado que o [Tesouro Público referido] não tinha o direito de exigir o pagamento da cláusula penal, uma vez que não estavam preenchidos os requisitos e/ou o [Tesouro Público polaco] não tinha direito a uma cláusula penal devido à alegada mora no cumprimento do contrato ( 11 ).

19.

Apresentaram também ao tribunal um pedido «de medidas provisórias, ordenando à demandada que não invocasse as garantias n.o 02900100000348 e 02900100000818 concedidas pela [companhia de seguros Evroins AD]» ( 12 ).

20.

Por Despacho de 7 de junho de 2019, o Sąd Okręgowy w Warszawie (Tribunal Regional de Varsóvia) recusou decretar as medidas provisórias e cautelares pedidas ( 13 ).

21.

Em 31 de julho de 2019, as sociedades adjudicatárias requereram novamente a concessão dessas medidas, desta vez no Sofiyski gradski sad (Tribunal da cidade de Sófia, Bulgária), em apoio das ações intentadas no Sąd Okręgowy w Warszawie (Tribunal Regional de Varsóvia).

22.

O pedido foi indeferido em primeira instância, mas deferido em sede de recurso pelo Sofiyski apelativen sad (Tribunal de Recurso de Sófia, Bulgária). Este último, subordinando‑o ao pagamento de uma caução, ordenou o arresto cautelar do crédito do Tesouro Público polaco, resultante das garantias n.o 02900100000348 e n.o 02900100000818, emitidas a seu favor pela companhia de seguros Evroins AD.

23.

O Tesouro Público polaco interpôs recurso de cassação no Varhoven kasatsionen sad (Supremo Tribunal de Cassação). Nesse recurso apresentou igualmente uma injunção de pagamento europeia, ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 1896/2006 ( 14 ), formulário E ( 15 ).

24.

As sociedades adjudicatárias, que se tinham oposto à injunção utilizando o formulário F do Regulamento n.o 1896/2006, apresentaram‑no na resposta ao recurso de cassação.

25.

Neste contexto, o Varhoven kasatsionen sad (Supremo Tribunal de Cassação) submete ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 1.o do [Regulamento n.o 1215/12] ser interpretado no sentido de que um processo como o descrito no presente despacho de reenvio deve ser considerado, no todo ou em parte, matéria civil ou comercial na aceção do artigo 1.o, n.o 1, deste regulamento?

2)

Uma vez exercido o direito de requerer medidas provisórias ou cautelares e depois de o órgão jurisdicional competente para conhecer do mérito ter proferido a sua decisão, deve o órgão jurisdicional, a quem foi submetido um pedido de medidas provisórias com o mesmo fundamento e com base no artigo 35.o do [Regulamento n.o 1215/12], ser considerado incompetente a partir do momento em que sejam apresentadas provas de que o órgão jurisdicional competente para conhecer do mérito já proferiu uma decisão a esse respeito?

3)

Se resultar das respostas às duas primeiras questões prejudiciais que o órgão jurisdicional ao qual foi submetido um pedido nos termos do artigo 35.o do [Regulamento n.o 1215/12] é competente, os requisitos para serem decretadas medidas cautelares nos termos do artigo 35.o [Regulamento n.o 1215/12] devem ser interpretados de forma autónoma? Deve ficar desaplicada uma norma que, num caso como o presente, não autoriza que seja decretada uma medida cautelar contra um organismo público?»

III. Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

26.

O pedido de decisão prejudicial foi registado no Tribunal de Justiça em 5 de novembro de 2020. Foi indeferido o pedido para o submeter a tramitação acelerada, prevista no artigo 105.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

27.

Apresentaram observações escritas a TOTO — Costruzioni Generali, a Vianini Lavori, a República da Polónia e a Comissão Europeia. Todas, bem como o Tesouro Público polaco, intervieram na audiência que se realizou em 15 de julho de 2021.

IV. Análise

28.

Como já referi, as minhas conclusões limitar‑se‑ão à segunda questão prejudicial. Esta tem por objeto, em síntese, a relação entre órgãos jurisdicionais de diferentes Estados‑Membros aos quais são submetidos pedidos sucessivos de medidas provisórias ou cautelares em aplicação do Regulamento n.o 1215/2012.

29.

Para responder a esta questão, é necessário proceder à interpretação do artigo 35.o do Regulamento n.o 1215/2012, o que permitirá determinar se um órgão jurisdicional (neste caso, um tribunal búlgaro) que não tem competência para conhecer do mérito da causa pode decretar medidas provisórias e cautelares quando o órgão jurisdicional competente para conhecer do mérito (neste caso, um tribunal polaco) já se pronunciou sobre um pedido idêntico.

30.

Antes de sugerir uma resposta a esta questão, procederei à análise de alguns aspetos gerais do Regulamento n.o 1215/2012 que nos podem ajudar a refletir.

A.   Considerações preliminares: tutela provisória e cautelar no Regulamento n.o 1215/2012

1. Regime de competência judiciária internacional e circulação de decisões relativas a medidas provisórias e cautelares

31.

O Regulamento n.o 1215/2012 estabelece uma dupla via para a obtenção de medidas provisórias e cautelares em litígios abrangidos pelo seu âmbito de aplicação:

Em primeiro lugar, atribui competência judiciária internacional aos órgãos jurisdicionais que, em conformidade com as secções 1 a 6 do capítulo II, também a tenham para decidir do mérito da causa ( 16 ). A competência destes órgãos não depende da existência de um elemento de conexão determinado entre o objeto da medida e o foro ( 17 ). Além disso, sob reserva do que exporei, uma medida decretada por um órgão jurisdicional competente para o litígio no processo principal beneficia do regime de reconhecimento e de execução do Regulamento n.o 1215/2012.

Em segundo lugar, o artigo 35.o do mesmo regulamento prevê que os tribunais que não têm competência para decidir quanto ao mérito do litígio decretem medidas provisórias e cautelares relativas a esse litígio.

32.

Nesta segunda hipótese, o Tribunal de Justiça submete a certas exigências a possibilidade de um juiz incompetente para conhecer do mérito da causa ser, não obstante, competente para decidir sobre o incidente cautelar ( 18 ):

As medidas provisórias ou cautelares devem «destina[r‑se] a manter uma situação de facto ou de direito a fim de salvaguardar direitos cujo reconhecimento é, por outro lado, pedido ao juiz da questão de fundo» ( 19 ).

Não podem ser decretadas medidas que, pelos seus efeitos, substituam de facto o processo quanto ao mérito, ou seja, sirvam para contornar, na fase da instrução, as regras de competência ( 20 ).

Deve existir um elemento de conexão real entre o órgão jurisdicional incompetente para conhecer do mérito e a medida requerida. A sua concessão «requer […] uma circunspeção especial e um conhecimento aprofundado das circunstâncias concretas em que as medidas solicitadas são chamadas a produzir os seus efeitos» ( 21 ).

33.

Estes condicionalismos prendem‑se com o facto de o artigo 35.o do Regulamento n.o 1215/2021 conferir a quem requer medidas provisórias e cautelares um benefício suscetível de colocar a parte contrária numa situação desfavorável, por derrogar o regime de competência organizado pelo próprio regulamento. Por este motivo, a sua interpretação deve ser restritiva ( 22 ).

34.

Além disso, o artigo 35.o, ao abrir um foro suplementar, pode igualmente favorecer estratégias de forum shopping ( 23 ) e abuso ( 24 ).

35.

No âmbito do Regulamento n.o 1215/2012, o poder do juiz que decreta medidas provisórias e cautelares em aplicação do artigo 35.o tem adicionalmente uma limitação importante: o efeito destas medidas deve confinar‑se ao território do próprio Estado‑Membro ( 25 ).

36.

Todavia, importa não esquecer que a concessão das medidas provisórias e cautelares da competência de um juiz diferente do que conhece ou virá a conhecer ( 26 ) do mérito da causa responde a necessidades práticas específicas da proteção jurisdicional provisória e cautelar ( 27 ) facilmente compreensíveis.

37.

Esta disposição oferece à parte interessada a possibilidade de obter uma medida provisória e cautelar no Estado‑Membro onde se encontram os bens ou a pessoa sobre os quais executará essa medida. São assim evitados os inconvenientes decorrentes da necessidade de pleitear no estrangeiro, em primeiro lugar, e obter o reconhecimento da decisão proferida noutro foro, num segundo momento ( 28 ).

38.

Esta possibilidade impõe‑se tanto mais quando as medidas provisórias e cautelares decretadas inaudita parte pelo juiz que conhece do mérito (cuja concessão preserva o seu efeito surpresa) não estão autorizadas, em princípio ( 29 ), a circular livremente ( 30 ) entre Estados‑Membros ao abrigo do Regulamento n.o 1215/2012 ( 31 ).

39.

A exclusão da livre circulação deste tipo de medidas encontra‑se refletida na definição de «decisão» no artigo 2.o, alínea a), segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1215/2012. Na prática, traduz‑se na exigência do seu artigo 42.o, n.o 2: a execução, num Estado‑Membro, da medida provisória e cautelar decretada noutro Estado‑Membro pelo juiz do processo principal está subordinada à apresentação da certidão prevista no artigo 53.o. Esta certidão contém referências específicas que comprovam a qualidade do juiz e a notificação do requerido para comparecer ou, na sua falta, a notificação da medida.

2. Relação entre os foros

40.

Não existe uma hierarquia formal entre os foros à disposição do requerente de tutela provisória ou cautelar, que pode escolher entre eles. Por conseguinte, são possíveis situações de pluralidade de processos de tutela provisória e cautelar, em relação aos quais o legislador não previu expressamente uma solução específica.

a) Pluralidade dos processos de tutela provisória e cautelar

41.

O Regulamento n.o 1215/2012 inclui uma norma específica (artigo 35.o) para as medidas provisórias e cautelares. Poderia dizer‑se que complementa assim o poder natural do juiz competente quanto ao mérito para as decretar. Simultaneamente, possibilita a tramitação de processos idênticos em órgãos jurisdicionais diferentes, com o risco de decisões inconciliáveis entre si.

42.

Na minha opinião, o princípio da prioridade que, na secção «Litispendência e conexão» do Regulamento n.o 1215/2012, regula a pluralidade dos processos com as mesmas partes e a mesma causa de pedir, nos termos do seu artigo 29.o, pode ser alargado à fase cautelar desses processos ( 32 ).

43.

Segundo esse princípio, qualquer tribunal que não seja demandado em primeiro lugar«deve suspender oficiosamente a instância até que seja estabelecida a competência do tribunal demandado em primeiro lugar». O tribunal que não foi demandado em primeiro lugar deve inibir‑se em favor do tribunal demandado em primeiro lugar, quando este se declare competente ( 33 ).

44.

Como já expliquei, a coexistência de pedidos de medidas provisórias e cautelares num tribunal competente para conhecer do mérito e noutro que não o é (mas a que se recorre ao abrigo do artigo 35.o do Regulamento n.o 1215/2012) oferece à parte interessada a opção de contornar os atrasos habitualmente associados à importação para um Estado‑Membro da medida decretada noutro Estado‑Membro.

45.

Nesta perspetiva, poderia qualificar‑se de paradoxal o facto de que quem requer uma medida provisória e cautelar num segundo tribunal precisamente para evitar os atrasos do primeiro tenha de o fazer exclusivamente, nos termos da regra da litispendência, no Estado do processo principal, apenas porque o pedido dessa medida foi aí formulado em primeiro lugar ( 34 ).

46.

Em alternativa, seria possível não aplicar, para as medidas provisórias e cautelares, a regra geral da litispendência (artigo 29.o do Regulamento n.o 1215/2012) e abordar o problema de duas decisões inconciliáveis, se fossem proferidas, decidindo a posteriori sobre o seu reconhecimento e a sua execução ( 35 ).

47.

Todavia, penso que tal solução poderia não ser conforme com este regulamento.

48.

Embora o Tribunal de Justiça não se tenha pronunciado a este respeito, referiu‑se de modo negativo à «multiplicação da titularidade da competência judiciária a respeito de uma mesma relação jurídica que é contrária aos objetivos da Convenção», relativamente ao artigo 24.o da Convenção de Bruxelas ( 36 ).

49.

Presentemente, basta dizer que as exceções à regra de litispendência estão contidas no próprio regulamento e nenhuma corresponde à acima descrita ( 37 ). As propostas de alteração relativas a este ponto, apresentadas no que respeita ao artigo 35.o do Regulamento n.o 1215/2012, não foram incluídas no texto, o que milita contra um tratamento especial da litispendência para os pedidos de medidas provisórias e cautelares no sistema em vigor ( 38 ).

50.

Em suma, entendo que a regra de litispendência enunciada no artigo 29.o do Regulamento n.o 1215/2012 é aplicável aos pedidos de medidas provisórias e cautelares. Desta regra decorrem duas consequências: a) é prioritário o tribunal em que o pedido de medidas cautelares foi apresentado em primeiro lugar quando se declare competente; e b) a partir desse momento, o tribunal que não foi demandado em primeiro lugar deve declarar‑se incompetente em favor daquele.

b) Inconciliabilidade entre medidas provisórias e cautelares de órgãos jurisdicionais diferentes

51.

O cenário das medidas provisórias e cautelares decretadas por dois órgãos jurisdicionais (um competente por força do artigo 24.o da Convenção de Bruxelas e outro escolhido pelas partes para decidir quanto ao mérito) foi analisado pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Italian Leather ( 39 ) a propósito do artigo 27.o, n.o 3, dessa convenção.

52.

Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça:

Precisou que a inconciliabilidade que impede o reconhecimento de uma decisão estrangeira diz respeito aos efeitos jurídicos das decisões, e não à existência de quadros jurídicos diferentes nos Estados‑Membros, ou a uma apreciação diferente pelos órgãos respetivos de um mesmo requisito ( 40 ).

Confirmou que a inconciliabilidade se verifica quando as consequências das decisões em jogo, se ocorrem simultaneamente num Estado‑Membro, perturbam a sua ordem social ( 41 ).

Considerou que, nessas condições, e tendo em conta o caráter obrigatório do motivo de não reconhecimento previsto no artigo 27.o, n.o 3, da Convenção de Bruxelas, o órgão requerido é obrigado a negar o reconhecimento da decisão estrangeira ( 42 ).

53.

A semelhança entre o artigo 27.o, n.o 3, da Convenção de Bruxelas, e o atual artigo 45.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 1215/2012 ( 43 ), permite concluir que a mesma solução é imposta em aplicação deste último.

B.   Resposta à segunda questão prejudicial

54.

As dúvidas do órgão jurisdicional de reenvio que determinaram a sua segunda questão prejudicial, bem como os argumentos das partes a este respeito, baseiam‑se em diversos fundamentos que aqui abordarei seguidamente:

em primeiro lugar, abordarei a incidência da cláusula contratual de escolha de foro a favor dos órgãos jurisdicionais polacos;

em seguida, debruçar‑me‑ei sobre o elemento de conexão real entre as medidas requeridas e o território búlgaro;

por último, pronunciar‑me‑ei sobre a incidência, no órgão jurisdicional búlgaro, da decisão judicial polaca que recusou as medidas provisórias e cautelares.

1. A cláusula de escolha de foro: obstáculo à concessão de medidas pelos tribunais búlgaros?

55.

A competência do juiz do processo principal para decretar medidas provisórias e cautelares não depende de uma conexão específica entre o objeto da medida e o foro; basta que estejam reunidas as circunstâncias que, nos termos do Regulamento n.o 1215/2012, justificam a atribuição de competência quanto ao mérito da causa.

56.

Uma dessas circunstâncias diz respeito ao facto de as partes terem convencionado a escolha da jurisdição competente, através de uma cláusula atributiva de jurisdição exclusiva nos termos do artigo 25.o do Regulamento n.o 1215/2012.

57.

Ora, em razão do seu fundamento na autonomia da vontade, é legítimo pôr em causa o facto de qualquer pacto atributivo de jurisdição abranger de modo automático as medidas provisórias e cautelares. Inversamente, poderia questionar‑se se uma escolha de foro exclui, por sistema, a possibilidade prevista no artigo 35.o do Regulamento n.o 1215/2012.

58.

O Tribunal de Justiça ainda não se pronunciou sobre este problema. Em todo o caso, a Acórdão Italian Leather precisa que a competência do artigo 35.o pode coexistir com a de um órgão jurisdicional diferente escolhido pelas partes para decidir definitivamente o litígio.

59.

Em meu entender, as partes podem (pelo menos, não encontrar razões que o impeçam) prorrogar ou revogar, por acordo, a competência judiciária internacional para a tutela provisória, quando se encontrem numa situação abrangida pelo Regulamento n.o 1215/2012. A questão de saber que diferendos são abrangidos pelo pacto relativo à escolha de foro e que diferendos não o são constitui uma questão de interpretação do pacto que tenham celebrado.

60.

Seria certamente desejável que as partes manifestassem expressamente a sua intenção de que a cláusula abranja igualmente a tutela provisória. Na falta de uma vontade clara, poderia presumir‑se ( 44 ) que uma cláusula de escolha de foro redigida em termos gerais estende a competência da jurisdição escolhida à concessão de medidas provisórias ou cautelares.

61.

Em contrapartida, esta solução não seria aplicável à exclusão do acesso a qualquer órgão jurisdicional de outro Estado‑Membro diferente do convencionado ( 45 ): a renúncia ao benefício do artigo 35.o do Regulamento n.o 1215/2012 não deve ser presumida.

62.

No caso em apreço, as partes inseriram no seu contrato uma cláusula que, em termos gerais, designava os tribunais polacos como jurisdição competente para resolver os seus diferendos, dado a sede da entidade adjudicante ser a Polónia ( 46 ).

63.

O órgão jurisdicional de reenvio não tem dúvidas no que respeita à competência exclusiva dos órgãos jurisdicionais polacos quanto ao mérito; todavia, interroga‑se sobre se também é exclusiva em matéria de tutela provisória.

64.

As observações do Governo polaco e das sociedades adjudicatárias não coincidem quanto ao alcance da escolha do foro no contrato ( 47 ). Estou de acordo com a Comissão quanto ao facto de competir ao órgão jurisdicional de reenvio dar resposta à questão de saber se essa escolha inclui ou não as medidas cautelares, com exclusão de qualquer outra jurisdição ( 48 ).

65.

Neste contexto, importa ter em consideração o facto de que, para proteger a previsibilidade das partes, «[u]ma cláusula atributiva de jurisdição só pode dizer respeito a litígios que tenham surgido ou que possam surgir de uma determinada relação jurídica, o que limita o alcance de um pacto atributivo de jurisdição apenas aos litígios que têm a sua origem na relação de direito na altura em que esse pacto foi celebrado […]» ( 49 ).

66.

Por conseguinte, o pacto atributivo de jurisdição não abrangerá um «litígio [que] não é razoavelmente previsível para a empresa vítima no momento em que deu o seu consentimento à referida cláusula» ( 50 ).

67.

Sem prejuízo de, como já referi, a decisão pertencer ao órgão jurisdicional de reenvio, penso que as partes signatárias da cláusula pactuada neste processo podiam prever razoavelmente que uma delas, sendo caso disso, pediria uma medida provisória e cautelar para se opor à execução das garantias. No âmbito dos contratos públicos, as diferenças quanto à execução das garantias pelas entidades adjudicantes não são incomuns.

2. Elemento de conexão real

68.

Ainda que se considerasse que a cláusula atributiva de jurisdição não produz os seus efeitos quanto à proteção cautelar, negando assim a exclusividade da competência dos órgãos jurisdicionais polacos, essa conclusão não teria como consequência imediata a afirmação da competência dos órgãos jurisdicionais búlgaros enquanto tribunais chamados a pronunciar‑se ao abrigo do artigo 35.o do Regulamento n.o 1215/2012.

69.

Nessa hipótese, a competência dos tribunais búlgaros dependeria, antes de mais, das disposições das regras nacionais a este respeito. Além disso, seria necessário que existisse uma conexão real entre o objeto da medida provisória e cautelar e a competência territorial do Estado‑Membro (Bulgária).

70.

Foram suscitadas dúvidas quanto à existência do elemento de conexão real neste litígio, por duas razões:

a natureza mobiliária dos bens situados no território búlgaro sobre os quais a medida será executada;

o pagamento efetivo da garantia controvertida deve ser efetuado ao Tesouro Público polaco, no território polaco, em relação a irregularidades relacionadas com a execução de um contrato de empreitada celebrado e executado na Polónia ( 51 ).

71.

A exigência do elemento de conexão real está diretamente relacionada com a razão de ser do artigo 35.o do Regulamento n.o 1215/2012, ou seja, que a medida seja decretada e executada no mesmo Estado‑Membro. Por conseguinte, o elemento de conexão real concretiza‑se efetivamente nos ativos sobre os quais incide a medida provisória e cautelar.

72.

Em contrapartida, o lugar de pagamento da própria garantia é irrelevante.

73.

Neste litígio, como já foi referido, as medidas provisórias e cautelares tinham por objeto assegurar pedidos de declaração da inexistência de um direito do Tesouro polaco à cobrança dos montantes garantidos. Em execução dessas medidas, o tribunal de recurso búlgaro ordenou o arresto cautelar do crédito da entidade adjudicante polaca contra a seguradora búlgara Evroins AD.

74.

Em suma, a conexão real entre os tribunais búlgaros e as medidas provisórias e cautelares depende do facto de se considerar que o referido crédito se localiza na Bulgária ( 52 ), o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

3. A decisão proferida na Polónia como obstáculo à concessão de medidas cautelares pelos tribunais búlgaros

75.

Deve o tribunal búlgaro ser declarado incompetente para decretar a medida provisória e cautelar requerida quando tenha sido apresentado um pedido idêntico ( 53 ) no órgão jurisdicional (polaco) que conhece do mérito da causa do processo principal e este tenha recusado decretá‑la?

76.

A resposta admite duas abordagens consoante a decisão do órgão jurisdicional polaco que vai contra a concessão das medidas provisórias e cautelares seja definitiva ou não. Como os elementos fornecidos não permitem inferir com certeza a natureza dessa decisão, debruçar‑me‑ei sobre as duas hipóteses possíveis.

a) Decisão definitiva: o seu eventual reconhecimento

77.

No sistema do Regulamento n.o 1215/2012, pode ser posto termo a um processo, cautelar ou quanto ao mérito, iniciado num Estado‑Membro invocando a natureza definitiva ( 54 ) de uma decisão relativa ao mesmo tomada noutro Estado, pela via processual correspondente.

78.

Das observações das partes deduzo que a força de caso julgado ( 55 ) da decisão polaca constitui um aspeto controverso, que deve ser esclarecido pelo órgão jurisdicional de reenvio. Em todo o caso, em vez de caso julgado (conceito que se depara com dificuldades quando é aplicado a decisões de natureza cautelar), prefiro a referência à natureza definitiva, isto é, final e insuscetível de recurso, da decisão jurisdicional.

79.

Se se confirmar que a decisão cautelar reveste essa natureza final na Polónia, poderá também produzir os seus efeitos na Bulgária e impedir (se as circunstâncias de facto forem as mesmas) ( 56 ) a concessão de outra medida com a mesma causa de pedir e as mesmas partes.

80.

O Varhoven kasatsionen sad (Supremo Tribunal de Cassação) interroga‑se igualmente sobre o momento em que deve retirar as consequências jurídicas da existência da decisão estrangeira. Em especial, pergunta se se deve declarar incompetente a partir da data em que é produzida a prova dessa decisão.

81.

Em princípio, a resposta é afirmativa. Nos termos do artigo 36.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1215/2012, o reconhecimento da decisão de um Estado‑Membro noutro Estado‑Membro não exige quaisquer formalidades. Todavia, quem a invocar tem de preencher as condições formais previstas no artigo 37.o, apresentando uma cópia autêntica da decisão e a certidão do artigo 53.o que, nos termos do regulamento, não é dispensável ( 57 ). O tribunal ou a autoridade perante a qual a decisão estrangeira é invocada pode igualmente requerer uma tradução ou transliteração, nos termos do artigo 37.o, n.o 2.

82.

Compete à parte negativamente afetada pelo reconhecimento da decisão já proferida pedir a sua recusa com base num dos fundamentos do artigo 45.o, se o considerar conveniente. Este pedido pode ser apresentado a título incidental, em conformidade com o artigo 36.o, n.o 3, do regulamento.

83.

O artigo 45.o, n.o 1, alínea c), não pode ser invocado neste contexto: nas circunstâncias do caso em apreço, ainda não existe, na Bulgária, uma medida de efeitos inconciliáveis com os da decisão polaca, pelo que o argumento relativo ao reconhecimento desta não poderia ser acolhido.

b) Decisão não definitiva: a regra de litispendência

84.

Se a decisão polaca for suscetível de recurso na Polónia, deve considerar‑se, na aceção do Regulamento n.o 1215/2012, que o processo relativo às medidas cautelares continua pendente nesse país.

85.

Neste contexto, é certo que a parte interessada pode pedir o reconhecimento da medida na Bulgária ( 58 ). Todavia, o facto de ainda ser suscetível de recurso pode tornar esse pedido prematuro. O regulamento autoriza o tribunal requerido a suspender o reconhecimento de uma decisão estrangeira quando esta é impugnada no Estado‑Membro de origem ( 59 ).

86.

Estando pendente na Bulgária um pedido idêntico e posterior de tutela provisória, a regra de litispendência, que impõe oficiosamente obrigações ao órgão jurisdicional chamado a pronunciar‑se em segundo lugar, parece‑me mais adequada.

87.

O documento comprovativo da decisão polaca tem (ou pode ter, se preencher os requisitos previstos no direito aplicável) ( 60 ) valor probatório dos elementos essenciais do artigo 29.o do Regulamento n.o 1215/2012:

serve para verificar que as partes e a causa de pedir dos dois processos são as mesmas;

regista a data em que o primeiro tribunal foi demandado;

comprova que o primeiro tribunal se considerou competente para decretar ou recusar a medida provisória e cautelar ( 61 ).

88.

Se, uma vez comprovados estes elementos, se confirmar que o tribunal da Polónia foi o primeiro a quem foi submetido o litígio, bem como o facto de a causa de pedir e as partes serem as mesmas, o órgão jurisdicional búlgaro deve declarar‑se incompetente, em aplicação do artigo 29.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1215/2012.

V. Conclusão

89.

Atendendo ao exposto, proponho que o Tribunal de Justiça responda à segunda questão prejudicial do Varhoven kasatsionen sad (Supremo Tribunal de Cassação, Bulgária) nos seguintes termos:

«1)

O artigo 35.o do Regulamento (UE) n.o 1215/12 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, deve ser interpretado no sentido de que o órgão jurisdicional em que se encontra pendente um pedido de medidas provisórias e cautelares deve abster‑se de as declarar quando: a) o tribunal de outro Estado‑Membro, chamado a pronunciar‑se quanto ao mérito da causa, proferiu uma decisão final sobre essas medidas; b) o interessado invoca essa decisão final, apresentando os documentos exigidos pelo Regulamento n.o 1215/2012 para o seu reconhecimento no Estado‑Membro onde o processo ainda se encontra pendente; e c) as ações intentadas nos dois órgãos jurisdicionais têm a mesma causa de pedir e as mesmas partes.

2)

Se a decisão proferida pelo órgão jurisdicional competente para conhecer do mérito da causa ainda não for definitiva, o tribunal chamado a pronunciar‑se em segundo lugar, em aplicação do artigo 35.o do Regulamento n.o 1215/2012, no qual está pendente o pedido de medidas provisórias e cautelares com o mesmo fundamento, a mesma causa de pedir e as mesmas partes, deve declarar‑se incompetente em favor do primeiro, em aplicação do artigo 29.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1215/2012.»


( 1 ) Língua original: francês.

( i ) Os n.os 18, 30 e as notas 9, 10, 13 e 57 do presente texto foram objeto de uma alteração de ordem linguística, posteriormente à sua disponibilização em linha.

( 2 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 2012, L 351, p. 1).

( 3 ) Uso os termos «medidas provisórias e cautelares» dado serem os utilizados no Regulamento n.o 1215/2012. Na realidade, seria necessário determinar a que categoria de medidas corresponde a pedida em cada caso concreto.

( 4 ) Acórdão de 3 de setembro de 2020, Supreme Site Services e o. (C‑186/19, EU:C:2020:638).

( 5 ) O artigo 24.o da Convenção de Bruxelas de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 1972, L 299, p. 32, texto consolidado em JO 1998, C 27, p. 1; a seguir «Convenção de Bruxelas»); e o artigo 31.o do Regulamento (CE) n.o 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 2001, L 12, p. 1; a seguir «Regulamento n.o 44/2001»). A redação destas disposições e do atual artigo 35.o não é a mesma; além disso, o legislador determinou o regime da tutela provisória noutras passagens do Regulamento n.o 1215/2012. Todavia, as alterações não prejudicam a utilidade da jurisprudência anterior do Tribunal de Justiça enquanto referência para este processo.

( 6 ) Acórdão de 28 de abril de 2005, St. Paul Dairy (C‑104/03, EU:C:2005:255; a seguir «Acórdão St. Paul Dairy», n.o 12).

( 7 ) Código de Processo Civil, Bulgária; a seguir «GPK».

( 8 ) Segundo o n.o 2 das observações do Governo polaco, a cláusula tinha a seguinte redação: «O tribunal competente da sede da entidade adjudicante […] tem competência para decidir sobre qualquer litígio que possa ser suscitado a respeito da execução [do contrato]».

( 9 ) Segundo o resumo do despacho de reenvio, esta garantia foi constituída para cumprimento exato do contrato no montante total de 52294272,43 PLN [zlótis polacos (PLN)]; no anexo 4 de 25 de janeiro de 2019 fixou‑se a eficácia desta garantia até 31 de julho de 2019 no montante acima mencionado como garantia em caso de não cumprimento ou cumprimento deficiente do contrato até ao montante máximo, e até 30 de junho de 2024 como garantia para execução de obras de acordo com o contrato até 15877,73 PLN.

( 10 ) Segundo o despacho de reenvio, esta garantia foi constituída para garantir o pagamento de uma cláusula penal no montante de 9314671,95 PLN até 31 de julho de 2019, que se destinava a assegurar a conclusão atempada das obras de construção, tal como especificado no contrato.

( 11 ) Despacho de reenvio, n.o 2.

( 12 ) Despacho de reenvio, n.o 4.

( 13 ) Segundo o despacho de reenvio, n.o 4, o tribunal polaco considerou que os pedidos de medidas provisórias não tinham fundamento por falta de interesse em agir, uma vez que não havia razão aceitável para que a demandada não assinasse um novo anexo e que, além disso, as empresas não tinham apresentado razões pelas quais parecia provável que a recusa de medidas provisórias tornasse impossível ou significativamente mais difícil a aplicação de uma possível decisão futura que tivesse em conta os potenciais pedidos das requerentes. As empresas também não demonstraram a probabilidade de a recusa de medidas provisórias levar a danos irreparáveis, nem em que medida as possíveis cláusulas penais poderiam pôr em perigo a sua estabilidade financeira.

( 14 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, que cria um procedimento europeu de injunção de pagamento (JO 2006, L 399, p. 1).

( 15 ) A injunção de pagamento foi apresentada a seu favor contra a companhia de seguros Evroins AD, no montante de 4086197,80 PLN referente a capital e juros no montante de 3322112,05 PLN e 76405,75 PLN.

( 16 ) A sua competência para decretar medidas provisórias ou cautelares não consta de modo expresso, mas resulta naturalmente da sua familiaridade com o processo. Decorre implicitamente do considerando 30 do Regulamento n.o 1215/2012; v., igualmente, Acórdão de 17 de novembro de 1998, Van Uden (C‑391/95, EU:C:1998:543; a seguir «Acórdão Van Uden», n.o 19).

( 17 ) Acórdão de 27 de abril de 1999, Mietz (C‑99/96, EU:C:1999:202, n.o 41).

( 18 ) As condições foram estabelecidas no âmbito da interpretação das disposições correspondentes da Convenção de Bruxelas e do Regulamento n.o 44/2001.

( 19 ) Acórdãos de 26 de março de 1992, Reichert e Kockler (C‑261/90, EU:C:1992:149, n.o 34); Van Uden, n.o 37; e de 3 de setembro de 2020, Supreme Site Services e o. (C‑186/19, EU:C:2020:638, n.o 50).

( 20 ) Acórdãos Van Uden, n.os 43 e segs.; de 27 de abril de 1999, Mietz (C‑99/96, EU:C:1999:202, n.o 42); e St. Paul Dairy, n.o 18.

( 21 ) Acórdão Van Uden, n.o 38.

( 22 ) Acórdão St. Paul Dairy, n.o 11. É certo que o artigo 35.o constitui uma anomalia no sistema: tal é igualmente demonstrado pela sua posição numa secção de artigo único, afastada das regras de competência propriamente ditas, mas ainda no capítulo II do Regulamento n.o 1215/2012.

( 23 ) Esta preocupação foi evidenciada pelos intervenientes na audiência, que não manifestaram o seu acordo quanto ao alcance real do risco. A Comissão sugeriu, nomeadamente, que o próprio artigo 35.o contém elementos de autorrestrição. Isto é verdade: na sua interpretação, o legislador e o Tribunal de Justiça têm vindo a limitar o âmbito desta disposição. Todavia, não concordo com nenhum dos argumentos da Comissão: em especial, com a ideia de que as medidas suscetíveis de serem concedidas ao abrigo do artigo 35.o devem ser urgentes. Em primeiro lugar, acontece que, na maior parte dos casos, a tutela cautelar e provisória é requerida com esse caráter, o que, de facto, reduz a eficácia desse limite. Em segundo lugar, também não é certo que a urgência seja ou não um requisito de aplicação propriamente dito do artigo 35.o; em caso afirmativo, a sua compreensão deveria ser autónoma.

( 24 ) Na audiência, foi especificamente referido o perigo da «excesso de garantia» resultante da concessão de diversas medidas cautelares com o mesmo fim por dois órgãos jurisdicionais diferentes, que não são obrigados a comunicar entre si neste contexto (quanto à tentativa falhada de incluir uma obrigação nesse sentido no Regulamento n.o 1215/2012, v. infra, nota n.o 38 das presentes conclusões). O regulamento não prevê uma solução para esta situação para além da que resulta da aplicação das regras de litispendência ou relativas ao reconhecimento.

( 25 ) Considerando 33 e artigo 2.o, alínea a), segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1215/2012. Esta restrição já resultava do regime anterior, que exigia um elemento de conexão real entre o objeto das medidas requeridas e a competência territorial do Estado do tribunal chamado a decidir.

( 26 ) Pode tratar‑se quer do juiz que decide do mérito da causa, quer do juiz que o fará no futuro, se a medida for decretada antes do início do processo principal.

( 27 ) Acórdãos de 21 de maio de 1980, Denilauler (125/79, EU:C:1980:130, n.os 15 e 16); de 26 de março de 1992, Reichert e Kockler (C‑261/90, EU:C:1992:149, n.o 33). V. igualmente, com referência ao prejuízo resultante da longa duração dos prazos inerente aos processos internacionais em geral, Acórdão St. Paul Dairy, n.o 12.

( 28 ) Inconvenientes que existem mesmo no regime simplificado de reconhecimento automático e de execução sem exequatur do Regulamento n.o 1215/2012: o interessado deve obter no Estado de origem os documentos que lhe são exigidos; não está excluído a priori que a parte contra a qual é requerido o reconhecimento ou a execução solicite a sua recusa pela via processual correspondente; também não se pode excluir a possibilidade de a medida decidida num Estado‑Membro exigir uma adaptação para ser executada noutro Estado‑Membro.

( 29 ) A sua livre circulação só será possível se o requerido tiver sido notificado para comparecer ou, em caso contrário, se a decisão que contém a medida lhe foi notificada antes da sua execução.

( 30 ) Segundo o considerando 33, a limitação aplica‑se para efeitos da execução e também do reconhecimento.

( 31 ) Nos termos do considerando 33, podem, todavia, fazê‑lo se o direito nacional o permitir.

( 32 ) Não ignoro que existem dúvidas quanto à aplicação mecânica do artigo 29.o em matéria de medidas provisórias e cautelares, por razões que variam segundo as características do cenário de dualidade de processos.

( 33 ) A regra de prioridade temporal é excecionalmente invertida no caso de escolha de foro a título exclusivo: v. artigo 31.o, n.os 2 e 3. No caso em apreço, o primeiro pedido de medidas cautelares foi apresentado no tribunal polaco, escolhido pelas partes no contrato para resolver os seus diferendos.

( 34 ) Este argumento não convence a todos. A proposta do Report on the Application of Regulation Brussels I in the Member States (Study JLS/C4/2005/3), elaborado a pedido da Comissão, consistia, em todo o caso, em dar prioridade ao órgão jurisdicional competente quanto ao mérito, tendo em conta o seu melhor conhecimento do processo: v. n.o 777. É nesse sentido que aponta o artigo 15.o do Regulamento (UE) 2019/1111 do Conselho, de 25 de junho de 2019, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e ao rapto internacional de crianças (JO 2019, L 178, p. 1), sem paralelo em qualquer outro instrumento.

( 35 ) É o que é proposto por alguma doutrina: v. Eichel, F., «Art. 35 Brüssel Ia‑VO», em Wieczorek/Schütze, Zivilprozessordnung und Nebengesetze, Band 13/2, 4.a ed., 2019, marg. 83, com outras referências.

( 36 ) Acórdão St. Paul Dairy, n.o 20.

( 37 ) Além disso, recordo que o argumento da duração excessiva dos processos, como fundamento para afastar a aplicação do artigo 21.o da Convenção de Bruxelas (à época), foi afastado pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 9 de dezembro de 2003, Gasser (C‑116/02, EU:C:2003:657).

( 38 ) V. Report on the Application of Regulation Brussels I in the Member States (Study JLS/C4/2005/3), referido na nota 34. Também não foi acolhida a proposta da Comissão de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, COM (2010) 748 final, a favor de uma comunicação entre tribunais com vista à coordenação dos processos.

( 39 ) Acórdão de 6 de junho de 2002 (C‑80/00, EU:C:2002:342; a seguir «Acórdão Italian Leather»).

( 40 ) Ibidem, n.o 44.

( 41 ) Ibidem, n.o 48.

( 42 ) Ibidem, n.o 2 do dispositivo.

( 43 )

( 44 ) Logicamente, a presunção seria ilidível.

( 45 ) Tendo em conta as suas consequências: com efeito, qualquer medida que não pudesse ser executada no Estado‑Membro do tribunal escolhido estaria sujeita ao reconhecimento e à execução. A esse respeito, v. supra, nota 28 das presentes conclusões.

( 46 ) V. n.o 16 das presentes conclusões. Considero pacífico o facto de o Tesouro Público polaco ter contestado a competência dos órgãos jurisdicionais búlgaros com base nessa cláusula.

( 47 ) N.os 7 e segs., em especial, n.o 11, das observações da República da Polónia e n.os 28 e 29 das observações da TOTO — Costruzioni Generali e daVianini Lavori.

( 48 ) N.o 19 das observações escritas da Comissão. V., nomeadamente, Acórdão de 21 de maio de 2015, CDC Hydrogen Peroxide (C‑352/13, EU:C:2015:335, n.o 67).

( 49 ) Por analogia, Acórdão de 21 de maio de 2015, CDC Hydrogen Peroxide (C‑352/13, EU:C:2015:335, n.o 68).

( 50 ) Ibidem, n.o 70.

( 51 ) Observações da República da Polónia, n.o 36.

( 52 ) Enquanto bem incorpóreo, o direito ao crédito não tem lugar físico; a sua localização pode ser determinada por referência à inscrição na conta na qual é representado, ou através de uma ficção legal.

( 53 ) O órgão jurisdicional de reenvio não suscita nenhuma objeção baseada na alegada falta de identidade ou numa alteração superveniente das circunstâncias, pelo que não aprofundarei este aspeto.

( 54 ) Quanto ao reconhecimento de uma decisão estrangeira que ainda não é definitiva v. n.o 85 das presentes conclusões.

( 55 ) Referem‑se à força de caso julgado o despacho de reenvio e as observações das partes.

( 56 ) Devo insistir no facto de que as partes e a causa de pedir devem ser as mesmas: se assim não fosse (por exemplo, porque factos supervenientes provocam alterações significativas na situação originária), nada impediria um novo pedido de medidas provisórias e cautelares, eventualmente num tribunal estrangeiro não competente para conhecer do mérito. Dada a sua natureza, este tipo de medidas é decretado ou recusado em função das circunstâncias apresentadas ao juiz num momento específico. Se essas circunstâncias se alteram, a recusa inicial não impede a concessão posterior.

( 57 ) A obrigatoriedade de produção desse elemento de prova parece ser taxativa, contrariamente ao que acontecia no regime anterior: o artigo 55.o do Regulamento n.o 44/2001 previa a possibilidade de dispensa da apresentação da certidão do anexo V deste regulamento ou de a substituir por documentos equivalentes. É discutível que devam constar as referências exigidas pelo atual artigo 42.o, uma vez que só são literalmente exigidas para a execução da medida; em contrapartida, o considerando 33 refere‑se a uma circulação restrita também para efeitos do reconhecimento; e a «decisão» é definida no artigo 2.o para o conjunto do capítulo III. Em qualquer caso, no presente processo, a questão pode manter‑se aberta.

( 58 ) O Regulamento n.o 1215/2012 não subordina o reconhecimento ou a execução de decisões estrangeiras à sua natureza definitiva.

( 59 ) Artigo 38.o, alínea a).

( 60 ) O nacional do Estado requerido ou o nacional previsto por uma convenção; este aspeto não é regulado pelo Regulamento n.o 1215/2012.

( 61 ) Para cujo efeito não é necessária uma declaração formal: v. Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Cartier parfums‑lunettes e Axa Corporate Solutions assurances (C‑1/13, EU:C:2014:109).