CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

GIOVANNI PITRUZZELLA

apresentadas em 14 de janeiro de 2021 ( 1 )

Processo C‑718/18

Comissão Europeia

contra

República Federal da Alemanha

«Incumprimento de Estado — Mercados internos da eletricidade e do gás natural — Diretivas 2009/72 e 2009/73 — Conceito de “empresa verticalmente integrada” — Separação efetiva entre gestão das redes de transporte e atividades de produção e comercialização — Independência do pessoal e da gestão do operador da rede de transporte — Competências exclusivas e independência das entidades reguladoras nacionais — Princípio da democracia»

1.

Qual é o alcance do conceito de «empresa verticalmente integrada» nos setores da eletricidade e do gás e, mais concretamente, recaem no âmbito desse conceito igualmente atividades exercidas fora da União Europeia? Qual é o alcance das competências exclusivas atribuídas pelo direito da União às entidades reguladoras nacionais (a seguir «ERN») nos setores da eletricidade e do gás e de que margens de intervenção legislativa dispõem os Estados‑Membros a esse respeito?

2.

São estas, em substância, as questões mais importantes que se colocam no presente recurso no qual a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que declare que a República Federal da Alemanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força de várias disposições da Diretiva 2009/72/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade e que revoga a Diretiva 2003/54/CE ( 2 ), e da Diretiva 2009/73/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, que estabelece regras comuns para o mercado interno do gás natural e que revoga a Diretiva 2003/55/CE ( 3 ) (a seguir igualmente designadas, conjuntamente, «diretivas»).

I. Quadro jurídico

A.   Direito da União

1. Diretiva 2009/72

3.

Nos termos do artigo 2.o, ponto 21, da Diretiva 2009/72, «[p]ara efeitos da presente diretiva, entende‑se por: “empresa verticalmente integrada”, uma empresa de eletricidade ou um grupo de empresas de eletricidade em que a mesma pessoa ou as mesmas pessoas têm direito, direta ou indiretamente, a exercer controlo e em que a empresa ou grupo de empresas exerce, pelo menos, uma das atividades de entre o transporte ou a distribuição e, pelo menos, uma das atividades de entre a produção ou comercialização de eletricidade».

4.

O artigo 19.o da Diretiva 2009/72, com a epígrafe «Independência do pessoal e da gestão do operador da rede de transportes», enuncia, nos seus n.os 3, 5 e 8:

«3.   Não devem ter sido exercidos, direta ou indiretamente, nos três anos que precedem a nomeação das pessoas responsáveis pela gestão e/ou dos membros dos órgãos de administração do operador da rede de transporte sujeitos à aplicação do presente número, quaisquer posições ou responsabilidades profissionais, interesses ou relações de negócios com a empresa verticalmente integrada ou qualquer parte da mesma ou com os seus acionistas maioritários para além do operador da rede de transporte. […]

5.   As pessoas responsáveis pela gestão e/ou os membros dos órgãos de administração e empregados do operador da rede de transporte não podem ser titulares de qualquer interesse em qualquer parte da empresa verticalmente integrada para além do operador da rede de transporte, nem dela receber, direta ou indiretamente, qualquer benefício financeiro. A sua remuneração não pode depender das atividades ou resultados da empresa verticalmente integrada para além dos do operador da rede de transporte. […]

8.   O disposto no n.o 3 é aplicável à maioria das pessoas responsáveis pela gestão e/ou dos membros dos órgãos de administração do operador da rede de transporte.

As pessoas responsáveis pela gestão e/ou os membros dos órgãos de administração do operador da rede de transporte que não sejam abrangidos pelo disposto no n.o 3 não podem ter exercido qualquer atividade de gestão ou outra relevante na empresa verticalmente integrada pelo menos nos seis meses antes da respetiva nomeação.

O primeiro parágrafo do presente número e os n.os 4 a 7 são aplicáveis a todas as pessoas responsáveis pela gestão executiva e a todos aqueles que respondam diretamente perante elas sobre questões relacionadas com o funcionamento, a manutenção ou o desenvolvimento da rede.»

5.

O artigo 35.o da Diretiva 2009/72, com a epígrafe «Designação e independência das entidades reguladoras», dispõe:

«1.   Cada Estado‑Membro designa uma única entidade reguladora nacional a nível nacional. […]

4.   Os Estados‑Membros devem garantir a independência da entidade reguladora e assegurar que esta exerça os seus poderes de modo imparcial e transparente. Para o efeito, cada Estado‑Membro deve assegurar que, no exercício das funções reguladoras conferidas pela presente diretiva e pela legislação conexa, a entidade reguladora:

a)

Seja juridicamente distinta e funcionalmente independente de qualquer outra entidade pública ou privada;

b)

Seja dotada de pessoal e de pessoas responsáveis pela sua gestão:

i)

que ajam de forma independente de qualquer interesse de mercado, e

ii)

que não solicitem nem recebam instruções diretas de qualquer entidade governamental ou outra, pública ou privada, no desempenho das funções reguladoras. Este requisito não prejudica a estreita cooperação, quando adequado, com outras autoridades nacionais competentes nem as orientações políticas gerais emanadas do governo não relacionadas com as obrigações e competências regulatórias nos termos do artigo 37.o

5.   A fim de proteger a independência das entidades reguladoras, os Estados‑Membros devem, nomeadamente, assegurar que:

a)

As entidades reguladoras possam tomar decisões autónomas, independentemente de qualquer órgão político […]»

6.

O artigo 37.o da Diretiva 2009/72, com a epígrafe «Obrigações e competências das entidades reguladoras», dispõe:

«1.   As entidades reguladoras têm as seguintes obrigações:

a)

Estabelecer ou aprovar, mediante critérios transparentes, tarifas de transmissão ou distribuição ou as suas metodologias […];

6.   As entidades reguladoras são responsáveis por fixar ou aprovar, com a antecedência devida em relação à sua entrada em vigor, pelo menos as metodologias a utilizar para calcular ou estabelecer os termos e condições de:

a)

Ligação e acesso às redes nacionais, incluindo as tarifas de transporte e distribuição ou os respetivos métodos. Essas tarifas ou métodos devem permitir que sejam realizados os investimentos necessários de molde a garantir a viabilidade das redes;

b)

Prestação de serviços de compensação, que devem realizar‑se da forma mais económica possível e proporcionar incentivos adequados aos utilizadores da rede, de molde a garantir um equilíbrio entre o seu contributo e o seu consumo. Os serviços de compensação devem ser equitativos, não discriminatórios e basear‑se em critérios objetivos; […]»

2. Diretiva 2009/73

7.

O artigo 2.o, n.o 20, o artigo 19.o, n.os 3, 5 e 8, o artigo 39.o, n.os 1, 4 e 5 e o artigo 41.o, n.os 1, alínea a), e 6, alíneas a) e b), da Diretiva 2009/73 correspondem mutatis mutandis, no setor do gás natural, às disposições já referidas da Diretiva 2009/72.

B.   Direito alemão

8.

Nos termos do artigo 3.o, ponto 38, da Energiewirtschaftsgesetz (Lei relativa à Gestão Racional da Energia, a seguir «EnWG») ( 4 ), uma «empresa verticalmente integrada de fornecimento de energia» é «uma empresa que exerce atividade na União Europeia no setor da eletricidade ou do gás ou um grupo de empresas de eletricidade ou de gás, nos termos do artigo 3.o, n.o 2, do Regulamento n.o 139/2004 […] relativo ao controlo das concentrações de empresas [ ( 5 )], sempre que a empresa em questão ou o grupo em questão exerça na União Europeia: no setor da eletricidade, pelo menos uma das funções de transporte ou de distribuição e pelo menos uma das funções de produção ou de distribuição de eletricidade; ou, no setor do gás natural, pelo menos uma das funções de transporte, de distribuição, de gestão de instalações de GNL (gás natural liquefeito) ou de armazenagem, e simultaneamente uma das funções de extração ou de distribuição de gás natural».

9.

O artigo 10c, n.o 2, da EnWG dispõe:

«A maioria das pessoas responsáveis pela gestão do operador da rede de transporte não pode, nos três anos que precedem a sua nomeação, ter sido empregado ou ter tido relações comerciais com uma empresa verticalmente integrada ou um seu acionista maioritário, que exerça, no setor da eletricidade, uma das funções de produção, distribuição, comercialização ou aquisição de eletricidade e, no setor do gás natural, uma das funções de produção, distribuição, comercialização, aquisição ou armazenagem de GNL ou que exerça funções comerciais, técnicas ou relativas à manutenção relacionadas com essas funções. As restantes pessoas responsáveis pela gestão do operador de transporte independente não podem ter exercido, pelo menos nos seis meses que precedem a sua nomeação, funções de direção ou funções análogas às exercidas no âmbito do operador de transporte independente junto de uma empresa da empresa verticalmente integrada ou um seu acionista maioritário que exerça, no setor da eletricidade, uma das funções de produção, distribuição, comercialização ou aquisição de eletricidade e, no setor do gás natural, uma das funções de produção, distribuição, comercialização, aquisição ou armazenagem de gás natural ou que exerça funções comerciais, técnicas ou de manutenção em relação com essas funções […]»

10.

O artigo 10c, n.o 4, da EnWG dispõe o seguinte:

«O operador de transporte independente e a empresa verticalmente integrada de fornecimento de energia garantem que as pessoas responsáveis pela gestão e os outros empregados do operador de transporte independente, após 3 de março de 2012, não adquirem nenhuma participação no capital da empresa verticalmente integrada de fornecimento de energia ou de uma das suas partes, a menos que se trate de participações no operador de transporte independente. As pessoas responsáveis pela gestão cedem o mais tardar em 31 de março de 2016 as participações na empresa verticalmente integrada de fornecimento de energia ou em partes desta. […]»

11.

Nos termos do artigo 10c, n.o 6, da EnWG, o n.o 2 do mesmo artigo aplica‑se mutatis mutandis a todas as pessoas que dependam diretamente das pessoas responsáveis pela gestão e que sejam responsáveis pelos setores da gestão, manutenção ou desenvolvimento da rede.

12.

O artigo 24.o da EnWG, com a epígrafe «Disposições relativas às condições de acesso à rede, às taxas de acesso à rede e ao fornecimento e aquisição de serviços de compensação. Poder regulamentar» dispõe:

«1.   O Governo federal está autorizado, mediante regulamento, com a aprovação do Bundesrat, a:

1.

estabelecer as condições de acesso à rede, incluindo a aquisição e o fornecimento de serviços de compensação, bem como as metodologias usadas para determinar essas condições, bem como as metodologias para a determinação das tarifas de acesso [...];

2.

regular em que casos e condições a entidade reguladora pode fixar tais condições ou metodologias ou aprová‑las a pedido do operador de rede do sistema;

3.

regular em que casos específicos de utilização da rede e em que termos a autoridade reguladora pode autorizar ou recusar a autorização relativamente às tarifas individuais para o acesso à rede.»

II. Procedimento pré‑contencioso e tramitação processual no Tribunal de Justiça

13.

Em 20 de maio de 2014, a Comissão, no âmbito de um exame oficioso da transposição das Diretivas 2009/72 e 2009/73 para o direito alemão, destinado a verificar a existência de eventuais incompatibilidades com o direito da União, dirigiu à República Federal da Alemanha uma série de questões relativas à transposição dessas diretivas, às quais as autoridades alemãs responderam por carta de 12 de setembro de 2014.

14.

A Comissão, entendendo que o direito nacional não era conforme com as diretivas em diversos aspetos, transmitiu à República Federal da Alemanha em 27 de fevereiro de 2015 uma notificação para cumprir no processo por infração n.o 2014/2285, à qual esse Estado‑Membro respondeu por carta de 24 de junho de 2015.

15.

Em 29 de abril de 2016, a Comissão enviou à República Federal da Alemanha um parecer fundamentado, no qual reforçou a opinião expressa na sua notificação para cumprir, segundo a qual algumas disposições de direito alemão não eram conformes com as Diretivas 2009/72 e 2009/73. A República Federal da Alemanha respondeu por carta de 29 de agosto de 2016, indicando que estava em curso a adoção de alterações legislativas relativas a algumas críticas suscitadas no parecer fundamentado e, em 19 de setembro de 2017, comunicou o texto da lei alterada, em vigor a partir de 22 de julho de 2017.

16.

Entendendo que as disposições jurídicas adotadas pela República Federal da Alemanha continuavam a não ser plenamente conformes com as duas diretivas, a Comissão interpôs o presente recurso.

III. Análise jurídica

17.

A Comissão fundamenta o seu recurso em quatro acusações, todas relativas à transposição incorreta por parte da República Federal da Alemanha das Diretivas 2009/72 e 2009/73 para a EnWG.

A.   Quanto à primeira acusação, relativa à transposição incorreta do conceito de «empresa verticalmente integrada»

1. Argumentos das partes

18.

A Comissão sustenta que a definição do conceito de «empresa verticalmente integrada» contida no artigo 3.o, ponto 38, da EnWG não é conforme com o artigo 2.o, ponto 21, da Diretiva 2009/72 nem com o artigo 2.o, ponto 20, da Diretiva 2009/73 e que, consequentemente, a República Federal da Alemanha não cumpriu as obrigações decorrentes dessas disposições das diretivas.

19.

A Comissão salienta que, na definição constante da EnWG, o conceito de «empresa verticalmente integrada» é limitado às empresas que exercem atividade na União. Desse modo, as empresas que, apesar de serem controladas pela empresa verticalmente integrada, exercem atividades fora da União, ficam excluídas dessa definição. Assim, por exemplo, as atividades de produção ou de comercialização exercidas fora da União não entram no âmbito de aplicação da definição. A ERN alemã, quando atribui a qualidade de empresa verticalmente integrada, não tem em conta as atividades exercidas fora da União. Desse modo, não analisa se tais atividades causam conflito de interesses.

20.

Segundo a Comissão, a legislação alemã é contrária quer ao disposto no artigo 2.o, ponto 21, da Diretiva 2009/72 e no artigo 2.o, ponto 20, da Diretiva 2009/73, quer aos objetivos das normas relativas à separação efetiva das atividades prevista pelas diretivas.

21.

De um ponto de vista literal, nenhuma dessas duas disposições contém uma limitação quanto ao âmbito geográfico em que as atividades da empresa verticalmente integrada devam ser exercidas. Pelo contrário, resulta dos considerandos 24 da Diretiva 2009/72 e 21 da Diretiva 2009/73 que a separação efetiva entre as atividades da rede e as atividades de comercialização e produção deve aplicar‑se em toda a União, quer às empresas da União quer às que não pertencem à União.

22.

Quanto aos objetivos, as normas relativas à separação efetiva visam assegurar que um operador de uma rede de transporte obtenha a certificação apenas quando seja garantido que gere a rede de modo independente e não discriminatório. As normas têm como objetivo eliminar os incentivos a que as empresas verticalmente integradas discriminem os concorrentes no acesso à rede, no acesso às informações comerciais e aos investimentos. Segundo a Comissão, semelhante conflito de interesses pode verificar‑se não apenas quando as atividades da empresa verticalmente integrada são exercidas no interior da União, mas igualmente quando tais atividades são exercidas fora da União.

23.

A inclusão no âmbito de aplicação do conceito de empresa verticalmente integrada de atividades exercidas fora da União não implica que empresas não europeias se tornem diretamente destinatárias de direitos e obrigações por força da regulamentação europeia e não alarga os âmbitos de competência da União. Com efeito, os operadores das redes de transporte sujeitos às normas relativas à separação efetiva atuam sempre no interior da União. Incluir atividades exercidas fora da União na definição de empresa verticalmente integrada permite avaliar tais atividades na União. Nenhum princípio de direito da concorrência ou de direito internacional se opõe a uma interpretação desse género.

24.

A República Federal da Alemanha contesta os argumentos da Comissão.

25.

Em primeiro lugar, de um ponto de vista literal, resulta da jurisprudência que os Estados‑Membros não estão obrigados a transpor textualmente as diretivas, desde que seja assegurada, em substância, a sua transposição. A definição do conceito de «empresa verticalmente integrada» referida no artigo 3.o, ponto 38, da EnWG não contraria o texto do artigo 2.o, ponto 21, da Diretiva 2009/72 nem do artigo 2.o, ponto 20, da Diretiva 2009/73. Essas disposições, com efeito, não fornecem nenhuma indicação sobre o alcance geográfico e, consequentemente, exigem um esclarecimento quanto a esse ponto no momento da sua transposição para o direito nacional dos Estados‑Membros. O Tribunal de Justiça, de resto, declarou recentemente que, embora uma disposição de uma diretiva deva ser precisada de modo que satisfaça o princípio da segurança jurídica, cabe aos Estados‑Membros efetuar essas especificações no momento da transposição ( 6 ). Os considerandos 24 e 25 da Diretiva 2009/72 e os considerandos 21 e 22 da Diretiva 2009/73 corroboram a interpretação do Governo alemão.

26.

Em segundo lugar, a tese proposta pela Comissão não se coaduna com os objetivos das normas das diretivas sobre a separação efetiva. Antes de mais, a Comissão não exerceu o seu ónus da prova do incumprimento e não forneceu nenhum exemplo de possível conflito de interesses. Segundo o Governo alemão, os objetivos das disposições relativas à separação efetiva não exigem que as atividades exercidas fora da União por parte de empresas de comercialização de energia sejam tidas em conta na definição de empresa verticalmente integrada. Com efeito, unicamente pode existir uma situação de conflito de interesses quando as partes de uma empresa verticalmente integrada que exercem atividades nos setores concorrenciais da produção e da distribuição de eletricidade ou gás operam na União. Não existindo atividade no território da União, não há nenhum risco de influência negativa sobre um operador de uma rede de transporte.

27.

Em terceiro lugar, uma extensão da definição do conceito de «empresa verticalmente integrada» a atividades exercidas fora da União por empresas de países terceiros é contrária quer à jurisprudência segundo a qual o direito da União deve ser aplicado apenas quando o comportamento em questão tenha um efeito imediato e substancial na União, quer ao direito internacional. As referidas empresas de países terceiros tornar‑se‑iam, com efeito, sujeitos com direitos e obrigações sem operarem no território da União e sem que as suas atividades exercidas fora da União produzam efeitos no território desta.

28.

Em quarto lugar, o Governo alemão sustenta que uma interpretação das diretivas à luz das bases jurídicas e dos direitos e liberdades fundamentais reforça a sua posição. Por um lado, sublinha que as diretivas foram adotadas com base no artigo 47.o, n.o 2, CE e nos artigos 55.° e 95.° CE ( 7 ), que visam facilitar o exercício da liberdade de estabelecimento e da livre prestação de serviços e têm por objeto o estabelecimento e o funcionamento do mercado interno. Por conseguinte, tais disposições do Tratado não podem constituir a base legal para a adoção de disposições aplicáveis às atividades económicas das empresas exercidas num país terceiro. Por outro lado, as diretivas impõem às empresas verticalmente integradas obrigações que limitam a livre circulação de capitais, nos termos do artigo 63.o TFUE, bem como a liberdade profissional das empresas e dos seus trabalhadores, consagrada no artigo 16.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), e o direito de propriedade, consagrado no artigo 17.o, n.o 1, da Carta. Na medida em que as atividades de empresas de países terceiros exercidas fora da União não produzem efeitos no mercado interno, tais limitações aos direitos e às liberdades fundamentais não são necessárias para atingir o objetivo de garantir um funcionamento eficiente e não discriminatório das redes de transporte na União.

2. Apreciação

29.

A apreciação da procedência da primeira acusação do recurso da Comissão depende da determinação do alcance do conceito de «empresa verticalmente integrada», tal como é definida no artigo 2.o, ponto 21, da Diretiva 2009/72 e no artigo 2.o, ponto 20, da Diretiva 2009/73. Em especial, há que apreciar se é compatível com essa definição uma legislação nacional, como a legislação alemã em causa, que exclui desse conceito, e, por conseguinte, do âmbito de aplicação das disposições relativas à separação efetiva entre as redes e as atividades de produção de eletricidade ou de produção de gás e de comercialização desses produtos energéticos, as atividades exercidas por uma empresa ou grupo de empresas fora da União.

30.

A esse respeito, deve antes de mais salientar‑se que nem o artigo 2.o, ponto 21, da Diretiva 2009/72 nem o artigo 2.o, ponto 20, da Diretiva 2009/73 contêm uma remissão para o direito dos Estados‑Membros relativamente à definição do conceito de «empresa verticalmente integrada».

31.

Nesse contexto, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, decorre das exigências tanto da aplicação uniforme do direito da União como do princípio da igualdade que os termos de uma disposição do direito da União que não contenha uma remissão expressa para o direito dos Estados‑Membros para determinar o seu sentido e o seu alcance devem normalmente ser objeto, em toda a União, de uma interpretação autónoma e uniforme, tendo em conta não só o seu teor mas também o contexto da disposição e do objetivo prosseguido pela regulamentação em causa ( 8 ).

32.

No que respeita, em primeiro lugar, ao teor das duas disposições em questão, saliente‑se, antes de mais, que estas, contrariamente ao artigo 3.o, ponto 38, da EnWG, não contêm expressamente nenhuma limitação geográfica do alcance da definição do conceito de «empresa verticalmente integrada», no sentido de esta ser circunscrita apenas às atividades exercidas no território da União.

33.

A esse respeito, importa recordar que, de acordo com jurisprudência constante, se um Estado‑Membro não está obrigado a proceder à transposição literal das definições previstas por uma diretiva, e, portanto, a transposição de uma diretiva para o direito interno não exige necessariamente uma reprodução formal e textual das suas disposições numa disposição legal ou regulamentar, todavia, é necessário que este Estado‑Membro assegure efetivamente a plena aplicação da diretiva de um modo suficientemente claro e preciso ( 9 ).

34.

Por conseguinte, é decisivo determinar se a limitação do alcance do conceito de «empresa verticalmente integrada» unicamente às atividades exercidas na União prevista pelo direito alemão constitui uma mera precisão da definição desse conceito constante das diretivas, como sustentou o Governo alemão, ou constitui uma restrição indevida do alcance dessa definição, como sustentou a Comissão.

35.

A esse respeito, embora o elemento literal não permita chegar a uma conclusão definitiva, entendo que a análise sistemática e teleológica das disposições milita a favor da segunda opção e confirma que a inexistência no texto das diretivas de uma limitação explícita do alcance do conceito de «empresa verticalmente integrada» unicamente às atividades exercidas na União implica que o âmbito de aplicação dessa definição não é circunscrito apenas a essas atividades.

36.

Com efeito, no que se refere, em segundo lugar, ao contexto em que se enquadra a definição do conceito de «empresa verticalmente integrada», convém salientar que esta se insere no quadro das disposições das diretivas destinadas a assegurar a separação efetiva entre as redes e as atividades de produção de eletricidade ou entre a produção de gás e a comercialização desses dois produtos energéticos ( 10 ).

37.

A esse respeito, é útil recordar que, a fim de garantir a referida separação efetiva, as diretivas oferecem três possibilidades aos Estados‑Membros. Estes podem, como primeira opção, prever a separação da propriedade, que implica a designação do proprietário da rede como operador da rede e a sua independência em relação a quaisquer interesses de comercialização e produção. No sistema da diretiva, essa configuração constitui o meio mais eficaz de eliminar o conflito de interesses, que as próprias diretivas definem como «inerente», entre os produtores e os fornecedores, por um lado, e os operadores das redes de transporte, por outro ( 11 ).

38.

No entanto, a diretiva deixa aos Estados‑Membros a possibilidade de permitir que uma empresa de eletricidade (ou um grupo de empresas de eletricidade) que exercem atividades de produção ou comercialização mantenham a propriedade dos elementos patrimoniais da rede, optando pela criação de um operador de sistemas independentes (segunda opção) ou de um operador de transmissão independente (terceira opção) ( 12 ), isso, todavia, na condição de que seja assegurada a separação efetiva ( 13 ).

39.

Nesse contexto, é relevante o conceito de «empresa verticalmente integrada» ( 14 ), que desempenha um papel fundamental na determinação das entidades sujeitas às obrigações previstas pelas diretivas a fim de assegurar a separação efetiva, na falta de separação da propriedade, ou seja, no caso de operadores de sistemas independentes, o disposto nos artigos 13.° e 14.° da Diretiva 2009/72 e nos artigos 14.° e 15.° da Diretiva 2009/73 e, no caso dos operadores de transporte independente, as disposições do capítulo V da Diretiva 2009/72 e do capítulo IV da Diretiva 2009/73. É no quadro sistemático dessas disposições e à luz dos objetivos prosseguidos pelas diretivas por meio dessas disposições que há que interpretar o conceito de «empresa verticalmente integrada».

40.

Do mesmo modo, sempre de um ponto de vista sistemático, é oportuno salientar que o conceito de «empresa verticalmente integrada» faz referência ao conceito de controlo, cuja definição, como se deduz do considerando 13 da Diretiva 2009/72 e do considerando 10 da Diretiva 2009/73, é proveniente do Regulamento (CE) n.o 139/2004 do Conselho, de 20 de janeiro de 2004, relativo ao controlo das concentrações de empresas ( 15 ). Entendo, todavia, que a definição desse conceito não é relevante para os efeitos da análise da presente acusação ( 16 ).

41.

É no quadro sistemático assim delineado que devem, em terceiro lugar, referir‑se os objetivos da diretiva e, em especial, das normas respeitantes à separação efetiva.

42.

A esse propósito, como resulta de vários considerandos das duas diretivas ( 17 ) e como já foi referido, o objetivo de tais normas é o de eliminar o conflito de interesses inerente que existe entre, por um lado, as empresas que exercem atividade na produção de eletricidade ou de gás e na sua comercialização e, por outro, os operadores da rede de transporte, a fim de garantir um acesso equitativo à rede, promover de modo não discriminatório os investimentos na infraestrutura, criar transparência no mercado e garantir a segurança do aprovisionamento, com a finalidade última de criar um mercado interno da eletricidade e do gás natural ( 18 ).

43.

A esse respeito, entendo que, como expôs a Comissão, não se pode excluir que existam situações de conflito de interesses entre um operador da rede de transporte situada na União e empresas que exercem atividades na produção de eletricidade ou de gás e na sua comercialização quando tais atividades se realizem fora do território da União, de modo que a inclusão de tais atividades para os fins da qualificação de uma entidade como empresa verticalmente integrada pode ser sistematicamente excluída.

44.

Nos seus articulados e na audiência, a Comissão indicou o exemplo específico de uma situação em que o gás ou a eletricidade produzidos fora da União por uma empresa são transportados numa rede de transporte na União que é propriedade da mesma empresa. Num caso desse tipo, parece evidente o risco de surgirem comportamentos discriminatórios na gestão da rede (tais como, por exemplo, falta de investimentos ou investimentos atrasados), que desfavoreçam as partes da rede utilizada para o transporte de produtos energéticos de concorrentes. Além disso, num caso como esse, o operador da rede tem acesso a dados sensíveis respeitantes aos concorrentes que podem ser utilizados em seu benefício para as suas atividades de produção ou comercialização. É indubitável que, à luz dos objetivos prosseguidos pelas disposições das diretivas sobre a separação efetiva, situações deste tipo devem recair no seu âmbito de aplicação.

45.

Daí resulta que a interpretação restritiva do conceito de «empresa verticalmente integrada», como a que é proposta pelo Governo alemão, põe em risco o efeito útil das disposições das diretivas que dizem respeito à separação efetiva e que a exclusão do âmbito de aplicação desse conceito de situações de potencial conflito de interesses como a mencionada no número anterior, devido a uma limitação do alcance do referido conceito exclusivamente às atividades exercidas dentro da União, como acontece em virtude do artigo 3.o, ponto 38, da EnWG, não é conforme com os objetivos prosseguidos pelas diretivas.

46.

A esse propósito, saliente‑se igualmente que, por um lado, no que respeita à Diretiva 2009/72, o Tribunal de Justiça já teve ocasião de esclarecer que resulta dos seus considerandos 16, 17 e 19, bem como do seu artigo 47.o, n.o 3, que as exigências de separação efetiva se destinam a garantir uma independência total e efetiva dos operadores da rede de transporte relativamente às atividades de produção e de fornecimento ( 19 ). As mesmas considerações são válidas no que se refere à Diretiva 2009/73 ( 20 ).

47.

Por outro lado, resulta do considerando 24 da Diretiva 2009/72 e do considerando 21 da Diretiva 2009/73 que a plena separação entre as atividades da rede e as atividades de comercialização e produção deve aplicar‑se em toda a União quer a empresas da União quer a empresas que não são da União. Situações como a mencionada a título de exemplo no n.o 44, supra, não garantem, na União, onde se encontra a rede de transporte objeto de regulação, a plena separação entre as atividades da rede e as atividades de comercialização e produção.

48.

A esse respeito, há que salientar que, ao contrário do que sustenta o Governo alemão, uma interpretação do conceito de «empresa verticalmente integrada» que inclua no âmbito do mesmo as atividades de produção ou comercialização exercidas fora da União não implica nem uma aplicação extraterritorial do direito da União contrária à jurisprudência do Tribunal de Justiça ou ao direito internacional, nem uma violação dos direitos ou das liberdades fundamentais de empresas que não atuam dentro da União. Com efeito, como evidenciou, com razão, a Comissão, as diretivas não constituem uma regulamentação das atividades exercidas pela empresa verticalmente integrada fora do território da União, mas determinam as condições que essas empresas devem respeitar para poder gerir as redes de transporte de eletricidade ou gás dentro da União ( 21 ).

49.

Resulta das considerações precedentes que, em minha opinião, a primeira acusação da Comissão deve ser julgada procedente.

B.   Quanto à segunda acusação, relativa à transposição insuficiente das disposições em matéria de períodos transitórios no quadro do modelo do operador de transporte independente

1. Argumentos das partes

50.

A Comissão sustenta que o disposto no artigo 10c, n.os 2 e 6, da EnWG limita indevidamente o alcance do disposto nos artigos 19.°, n.os 3 e 8, das diretivas e constitui, portanto, uma transposição insuficiente destas disposições. A República Federal da Alemanha não cumpriu, portanto, as obrigações decorrentes dessas disposições das diretivas.

51.

Segundo a Comissão, os artigos 19.°, n.o 3, das diretivas aplicam‑se a todas as posições ou funções, a todos os interesses ou relações comerciais, quer diretos, quer indiretos, no âmbito da empresa verticalmente integrada, dos seus ramos de atividade, das empresas que fazem parte desta e dos seus acionistas maioritários. O alcance de tais disposições não pode ser limitado às partes da empresa verticalmente integrada ou dos seus acionistas maioritários que exerçam, no setor da energia, as atividades enumeradas no artigo 10c, n.o 2, da EnWG.

52.

A limitação prevista pelo direito alemão a tais atividades não é, portanto, conforme nem com o texto dos artigos 19.°, n.os 3 e 8, das diretivas, nem com os objetivos das regras relativas à separação efetiva. Com efeito, segundo o modelo do operador de transporte independente, este pode ser parte de uma empresa verticalmente integrada unicamente se forem satisfeitas algumas condições rigorosas de organização, de direção e de investimento, previstas nas diretivas, que assegurem a sua independência efetiva da empresa verticalmente integrada no seu conjunto. Com efeito, os interesses da parte de uma empresa verticalmente integrada que exerce atividade no setor da energia podem ter repercussões na política e nos interesses de toda a empresa verticalmente integrada, inclusivamente nas suas partes que não exercem atividade nos setores da energia.

53.

A exclusão de partes da empresa verticalmente integrada que não exercem diretamente atividade nesse setor permite contornar as normas em matéria de separação efetiva. As unidades de uma empresa verticalmente integrada são, com efeito, necessária e estritamente interdependentes. Não é, portanto, possível excluir a priori que, na necessária interação entre as diversas componentes desta, se possam verificar eventuais condicionamentos das unidades que não exercem atividade no setor da energia decorrentes dos interesses da empresa verticalmente integrada nos setores da produção e comercialização. É precisamente para evitar esses riscos e para garantir a separação efetiva entre o operador de transporte e a empresa verticalmente integrada que o legislador da União decidiu inclui‑la, com todas as suas partes, no âmbito de aplicação do disposto nos artigos 19.°, n.os 3 e 8, das diretivas e não limitar o alcance dessas disposições exclusivamente às partes que exercem atividade no setor da energia, como faz a legislação alemã de transposição das diretivas.

54.

A República Federal da Alemanha contesta os argumentos da Comissão. Sustenta, em primeiro lugar, que as disposições pertinentes das diretivas e da EnWG têm o mesmo alcance. Com efeito, deduz‑se do artigo 2.o, ponto 21, da Diretiva 2009/72 e do artigo 20.o, ponto 20, da Diretiva 2009/73 que uma empresa verticalmente integrada é constituída por empresas de eletricidade ou empresas de gás natural e não por empresas que operam noutros setores da economia. Portanto, também nas diretivas, tal como no direito alemão, a qualificação de empresa de eletricidade ou de gás natural está subordinada a um âmbito de atividade específico.

55.

Em segundo lugar, para alcançar os objetivos prosseguidos pelas diretivas, ou seja, a eliminação das situações de conflito de interesses entre produtores, fornecedores e operadores das redes de transporte, é necessário, mas suficiente, assegurar a independência entre o operador da rede de transporte e as partes da empresa verticalmente integrada que exercem atividade nos setores da energia. Para evitar os referidos conflitos de interesses não é, no entanto, necessário estender o alcance das disposições relativas aos períodos transitórios às partes da empresa que não exercem atividade nesses setores. Não é sequer teoricamente concebível que a transferência de pessoal de uma parte da empresa que não opera no setor da energia para o operador da rede de transporte possa criar um conflito de interesses entre produtores, fornecedores e operador da rede de transporte.

56.

Em terceiro lugar, as disposições sobre os períodos transitórios podem afetar a livre circulação dos trabalhadores nos termos do artigo 45.o TFUE e o direito fundamental de livre escolha da profissão nos termos do artigo 15.o, n.o 1, da Carta. As limitações a esses direitos apenas são justificadas se visarem objetivos de interesse geral e forem necessárias e proporcionadas para os efeitos da realização desses objetivos. Todavia, a efetividade da separação e a prevenção dos conflitos de interesses no quadro do modelo do operador de transporte independente requerem a suspensão temporária da passagem do pessoal apenas entre diferentes partes da empresa verticalmente integrada que exercem atividades no setor da energia e não relativamente a outras partes da referida empresa.

2. Apreciação

57.

A apreciação da segunda acusação do recurso da Comissão depende da determinação do alcance do disposto nos artigos 19.°, n.os 3 e 8, das diretivas que preveem que, durante certos «períodos transitórios» (nos três anos ou nos seis meses que precedem a sua nomeação), as pessoas responsáveis pela gestão e/ou os membros dos órgãos de administração do operador de transporte independente, bem como todas as outras pessoas indicadas no terceiro parágrafo do n.o 8 dessas disposições, não tenham, em substância, tido relações profissionais e/ou comerciais com a empresa verticalmente integrada ou partes dessa, nem com os seus acionistas maioritários.

58.

Em especial, há que apreciar se é compatível com essas disposições das diretivas uma legislação nacional de transposição que, como a legislação alemã que está em causa, limita a aplicabilidade dos períodos transitórios necessários aí previstos apenas ao pessoal das partes da empresa verticalmente integrada ou dos seus acionistas maioritários que exerçam, no setor da energia, as atividades enumeradas no artigo 10c, n.o 2, da EnWG.

59.

A esse respeito, como resulta do n.o 31, supra, há que determinar o alcance das disposições pertinentes das diretivas tendo em conta não só os seus termos, mas também o contexto em que se inserem e o objetivo prosseguido pela regulamentação em questão.

60.

Do ponto de vista literal, há que salientar que, contrariamente à disposição de transposição da EnWG, o disposto nos artigos 19.°, n.os 3 e 8, das diretivas não contém nenhuma limitação explícita do seu alcance apenas ao pessoal das partes da empresa verticalmente integrada que exerçam atividade nos setores da energia. Antes pelo contrário, quer o n.o 3 quer o segundo parágrafo do n.o 8 se referem à empresa verticalmente integrada no seu conjunto, e o n.o 3 faz também referência a partes dessa empresa sem mais nenhuma especificação.

61.

Do ponto de vista contextual e teleológico, os artigos 19.°, n.os 3 e 8, das diretivas fazem parte das normas já referidas do capítulo V da Diretiva 2009/72 e do capítulo IV da Diretiva 2009/73 que, no quadro da terceira opção mencionada no n.o 38, supra, têm o objetivo de assegurar a independência entre o operador de transporte independente e a empresa verticalmente integrada, a fim de eliminar os conflitos de interesses inerentes que existem entre, por um lado, os interesses relativos às atividades de produção de eletricidade ou produção de gás e de comercialização e, por outro, a gestão da rede de transporte, a fim de prosseguir os outros objetivos indicados no n.o 42, supra.

62.

A esse respeito, deve recordar‑se que, tal como foi salientado no n.o 46, supra, as disposições inerentes à separação efetiva visam assegurar uma independência total e efetiva dos operadores de sistemas de transporte dentro da empresa verticalmente integrada, nos casos em que sejam escolhidas opções diferentes da separação da propriedade, que, como já salientei, constitui uma solução preferível aos olhos do legislador da União ( 22 ). Resulta dessas considerações que as disposições respeitantes à separação efetiva, que desempenham um papel fundamental no sistema criado pelas diretivas, não podem ser interpretadas restritivamente, mas sim entendidas em sentido amplo, a fim de garantir a independência total e efetiva entre o operador de transporte independente e a empresa verticalmente integrada.

63.

Em concreto, entendo que, como alega a Comissão, não se pode excluir a priori que, no quadro de uma empresa verticalmente integrada, possam criar‑se situações de conflito entre os interesses da empresa verticalmente integrada considerada no seu conjunto e os interesses do operador de transporte que possam afetar as decisões de gestão deste último. Numa estrutura necessariamente complexa como pode ser a de uma empresa verticalmente integrada que exerça atividades, nomeadamente, no setor da energia, não se pode excluir que os interesses nos setores da produção e da comercialização possam condicionar a atividade de partes da empresa que não exercem atividades diretamente no setor da energia. Entendo que é precisamente por esta razão que o legislador da União, no quadro dos artigos 19.°, n.os 3 e 8, das diretivas, se referiu à empresa verticalmente integrada no seu conjunto e não limitou explicitamente o alcance dessas disposições apenas às partes desta que exerçam atividade nos setores da energia.

64.

A esse propósito, saliente‑se que, como evidencia o Governo alemão, é certo que a definição do conceito de «empresa verticalmente integrada» do artigo 2.o, ponto 21, da Diretiva 2009/72 e do artigo 2.o, ponto 20, da Diretiva 2009/73 se refere a «empresas de eletricidade» e a «empresas de gás natural» (ou a um grupo dessas empresas), tal como são definidas, respetivamente, nos n.os 35 e 1 dos referidos artigos. Todavia, embora destas definições se deduza que entram no âmbito desse conceito as pessoas singulares e coletivas que exercem pelo menos uma das funções aí indicadas ( 23 ), não se deduz das mesmas, porém, que devam ser excluídas do conceito de «empresa verticalmente integrada» as partes dessa empresa que não exercem atividade nesses setores, com a consequente exclusão dessas partes do âmbito de aplicação das disposições das diretivas relativas à separação efetiva. Como salienta a Comissão, uma interpretação restritiva desse tipo daria lugar a uma cisão artificial da empresa que não corresponde à realidade económica e que é, em minha opinião, contrária à exigência mencionada, no n.o 62, supra, de interpretação em sentido lato das disposições referidas.

65.

No que respeita, em seguida, à livre circulação dos trabalhadores nos termos do artigo 45.o TFUE, invocada pelo Governo alemão, entendo que, como sustentou o mesmo Governo, embora o disposto nos artigos 19.°, n.os 3 e 8, das diretivas possa efetivamente constituir um obstáculo ao exercício dessa liberdade, todavia, corresponde a objetivos de interesse geral prosseguidos pela União e é justificado e proporcionado.

66.

A esse respeito, recorde‑se que, segundo a jurisprudência, uma medida que constitui um obstáculo à livre circulação de trabalhadores só é admissível se prosseguir um dos objetivos legítimos enunciados no Tratado FUE ou se se justificar por razões imperiosas de interesse geral. Em tal caso, é ainda necessário que a aplicação dessa medida seja adequada para garantir a realização do objetivo em causa e não exceda o que é necessário para alcançar esse objetivo ( 24 ).

67.

A esse propósito, saliente‑se que o objetivo de assegurar a separação efetiva prosseguido pelos artigos 19.°, n.os 3 e 8, das diretivas é necessário para garantir o funcionamento do mercado interno da energia mencionado no artigo 194.o, n.o 1, TFUE. Essas disposições são igualmente adequadas para atingir o referido objetivo, na medida em que a previsão de «períodos transitórios» no seio da empresa verticalmente integrada ou relativamente aos seus acionistas maioritários antes da nomeação para posições de responsabilidade ou de direção do operador da rede de transporte é adequada para garantir a independência deste relativamente às estruturas da empresa verticalmente integrada que possam ser influenciadas pelos interesses suscetíveis de serem reconduzidos às atividades de produção e comercialização de eletricidade ou gás. Tendo em consideração a duração limitada no tempo das limitações previstas, entendo igualmente que essas disposições não excedem o necessário para atingir os objetivos fixados.

68.

Em contrapartida, no que diz respeito ao direito fundamental à livre escolha da profissão nos termos do artigo 15.o, n.o 1, da Carta, há que recordar que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, esse direito não constitui uma prerrogativa absoluta, antes devendo ser tomado em consideração por referência à sua função na sociedade. Por conseguinte, podem ser introduzidas restrições ao exercício desse direito, desde que essas restrições correspondam efetivamente a objetivos de interesse geral prosseguidos pela União e não constituam, em face desses esses objetivos, uma intervenção desproporcionada e intolerável, suscetível de atentar contra a própria essência desses direitos ( 25 ).

69.

Resulta do exposto no n.o 67, supra, que os artigos 19.°, n.os 3 e 8, das diretivas correspondem, efetivamente, a objetivos de interesse geral prosseguidos pela União. Em razão do seu caráter limitado no tempo, não podem sequer, em minha opinião, ser considerados uma intervenção desproporcionada e intolerável, suscetível de atentar contra a própria essência do direito fundamental à livre escolha da profissão garantido pelo artigo 15.o, n.o 1, da Carta.

70.

Resulta das considerações precedentes que, em minha opinião, a segunda acusação da Comissão deve igualmente ser considerada procedente.

C.   Quanto à terceira acusação, relativa à transposição insuficiente do disposto nos artigos 19.°, n.o 5, das Diretivas 2009/72 e 2009/73

1. Argumentos das partes

71.

A Comissão acusa a República Federal da Alemanha de não ter transposto de modo suficiente para o direito nacional o disposto nos artigos 19.°, n.o 5, das diretivas, que preveem, no âmbito da opção do operador de transporte independente, que as pessoas responsáveis pela gestão e/ou os membros dos órgãos de administração e os empregados do operador da rede de transporte não podem ser titulares de interesses em qualquer parte da empresa verticalmente integrada para além do operador da rede de transporte, nem dela receber benefícios.

72.

A obrigação de ceder as participações detidas no capital da empresa verticalmente integrada, adquiridas antes de 3 de março de 2012, estabelecida pelo artigo 10c, n.o 4, da EnWG, aplica‑se, com efeito, unicamente às participações detidas pelas pessoas responsáveis pela gestão do operador da rede de transporte, e não àquelas que são detidas pelos empregados, ao passo que, por força do artigo 19.o, n.o 5, das diretivas, essa obrigação se aplica indiferentemente aos membros da direção e aos empregados do referido operador. Segundo a Comissão, ainda que não possam tomar decisões de gestão, os empregados de um operador de redes de transporte podem, contudo, influenciar as atividades do seu empregador, o que justifica que lhes seja igualmente aplicável a obrigação de ceder as suas participações no capital da empresa verticalmente integrada. Uma obrigação desse tipo não afeta os direitos de propriedade desses empregados, desde que se aplique apenas para o futuro, de modo que os dividendos já distribuídos não sejam afetados. Além disso, tais participações seriam cedidas apenas com o consentimento do seu titular e mediante retribuição adequada.

73.

A República Federal da Alemanha contesta os argumentos da Comissão. O tratamento diferenciado dos responsáveis pela gestão do operador da rede de transporte relativamente aos outros empregados no que se refere à obrigação de ceder as participações na empresa verticalmente integrada é devido à sua posição proeminente. Para as pessoas responsáveis pela gestão, com efeito, as «stock options» ou as participações no capital fazem habitualmente parte da remuneração, a qual depende, portanto, da evolução do valor dessas participações. Além disso, essas pessoas exercem uma influência estratégica decisiva na gestão do operador de transporte, o que implica um risco especial de conflitos de interesses. Os outros empregados, pelo contrário, não podem exercer uma influência significativa na gestão quotidiana da rede. Além disso, antes da entrada em vigor das exigências reforçadas de independência constantes das diretivas, as participações na empresa verticalmente integrada faziam habitualmente parte integrante da constituição do património ou da poupança individual dos empregados. A fim de não criar uma restrição desproporcionada ao seu direito de propriedade, constitucionalmente garantido, foi, por conseguinte, decidido apenas proibir aos empregados a aquisição futura de participações na empresa verticalmente integrada. Essa decisão é o resultado da uma ponderação entre as exigências relativas à separação efetiva e à proteção do direito de propriedade dos empregados. Em qualquer caso, as diretivas não determinam como devem ser tratadas as participações que os empregados adquiriram antes da data limite, de modo que os Estados‑Membros puderam adotar as disposições transitórias que consideraram apropriadas.

2. Apreciação

74.

A apreciação da procedência da terceira acusação do recurso da Comissão depende da determinação do alcance do disposto nos artigos 19.°, n.o 5, das diretivas. Em especial, há que apreciar se é compatível com essas disposições uma legislação nacional de transposição, como a prevista no artigo 10c, n.o 4, da EnWG, que prevê uma obrigação de cessão das participações no capital da empresa verticalmente integrada ou numa parte desta, apenas para as pessoas responsáveis pela gestão com exclusão, portanto, dos outros empregados do operador da rede de transporte.

75.

A esse respeito, como resulta do n.o 31, supra, impõe-se determinar o alcance das disposições pertinentes das diretivas tendo em conta não apenas os seus termos, mas também o contexto em que se inserem e o objetivo prosseguido pela regulamentação em questão.

76.

Do ponto de vista literal, deve salientar‑se que os artigos 19.°, n.o 5, das diretivas são claros ao proibir quer às pessoas responsáveis pela gestão e/ou aos membros dos órgãos de administração, quer aos empregados do operador da rede de transporte a detenção de interesses em qualquer parte da empresa verticalmente integrada. Essas disposições não estabelecem nenhuma distinção entre a primeira e a segunda categoria de pessoas em questão.

77.

Do ponto de vista contextual e teleológico, entendo que considerações análogas às efetuadas nos n.os 61 e 62, supra, a respeito dos n.os 3 e 8 dos mesmos artigos das diretivas são aplicáveis igualmente para a determinação do alcance do disposto no n.o 5 dos mesmos artigos. Em especial, a exigência que subjaz às disposições inerentes à separação efetiva de assegurar uma independência total e efetiva dos operadores de redes de transportes dentro da empresa verticalmente integrada, nos casos em que sejam seguidas opções diferentes da separação da propriedade ( 26 ), justifica, em minha opinião, uma interpretação em sentido amplo da proibição de detenção das participações na empresa verticalmente integrada, que respeite o elemento literal das disposições e consequentemente inclua uma obrigação de cessão, em caso de detenção de tais participações pelos empregados. Como salientou a Comissão, mesmo no caso de não participar nas decisões de gestão corrente do operador da rede de transporte, não se pode excluir a priori que um empregado seja capaz de influenciar as atividades do seu empregador e que, consequentemente, possam criar‑se situações de conflito de interesses no caso de ele deter participações na empresa verticalmente integrada ou em partes da mesma.

78.

Nesse contexto, entendo, por conseguinte, que os Estados‑Membros não dispõem de nenhuma margem de discricionariedade na transposição das disposições da diretiva em causa, para excluírem os empregados do operador da rede de transporte da obrigação de cessão dos interesses na empresa verticalmente integrada.

79.

Quanto à questão da proporcionalidade da proibição de deter interesses na empresa verticalmente integrada para a totalidade dos empregados do operador da rede de transporte, resulta do texto das disposições em causa que o legislador da União decidiu não fazer distinções entre os diferentes tipos de empregados do operador de transporte independente que são objeto da proibição. Nesse contexto, em minha opinião, tornar a discutir essa decisão equivale, em substância, a voltar a pôr em causa a legalidade das disposições das diretivas.

80.

A esse respeito, importa recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, um Estado‑Membro não poderá utilmente, na inexistência de uma disposição do Tratado FUE que expressamente lho autorize, invocar a ilegalidade de uma diretiva de que é destinatário como defesa contra uma ação por incumprimento fundada na inexecução dessa diretiva. Só o poderia fazer se o ato em causa enfermasse de vícios particularmente graves e evidentes, a ponto de poder ser qualificado de ato inexistente ( 27 ), questão que não se coloca no caso vertente.

81.

Por último, no que respeita ao argumento do Governo alemão segundo o qual a legislação nacional permite respeitar o direito de propriedade dos empregados, deve recordar‑se que o direito de propriedade garantido pelo artigo 17.o, n.o 1, da Carta não é uma prerrogativa absoluta e que o seu exercício pode ser objeto de restrições justificadas por objetivos de interesse geral prosseguidos pela União. Por conseguinte, como resulta do artigo 52.o, n.o 1, da Carta, podem ser impostas restrições ao gozo do direito de propriedade, na condição de essas restrições corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral e não constituírem, relativamente à finalidade prosseguida, uma intervenção excessiva e intolerável que atente contra a própria substância do direito assim garantido ( 28 ).

82.

A esse propósito, saliente‑se, em primeiro lugar, que, como resulta do n.o 67, supra, as disposições relativas à separação efetiva entre a gestão da rede de transporte e as atividades de produção e comercialização de eletricidade ou gás natural, de que os artigos 19.°, n.o 5, das diretivas fazem parte, correspondem efetivamente a objetivos de interesse geral prosseguidos pela União.

83.

Em segundo lugar, entendo igualmente que a proibição prevista nessas disposições não é suscetível de afetar a substância do direito de propriedade garantido pelo artigo 17.o, n.o 1, da Carta. A esse respeito, o Tribunal de Justiça salientou que a proteção conferida por esta disposição tem por objeto «os direitos que têm um valor patrimonial» do qual decorre, tendo em conta a ordem jurídica em causa, «uma posição jurídica adquirida que permite o seu exercício autónomo pelo e a favor do seu titular » ( 29 ). Todavia, as disposições da diretiva em questão não são suscetíveis de tornar a pôr em causa o valor patrimonial correspondente às participações eventualmente detidas pelos empregados. Com efeito, as diretivas não se opõem a uma venda de tais participações ao preço de mercado ou a outras formas de reconhecimento do valor patrimonial de tais participações a favor dos empregados sujeitos à obrigação de cessão.

84.

À luz das considerações precedentes, entendo que a terceira acusação da Comissão deve ser considerada procedente.

D.   Quanto à quarta acusação, relativa a uma violação das competências exclusivas da entidade reguladora nacional

1. Argumentos das partes

85.

A Comissão sustenta que, ao atribuir ao Governo, pelo artigo 24.o, n.o 1, da EnWG, competências para estabelecer as tarifas de transporte e de distribuição, as condições de acesso às redes nacionais e as condições para a prestação de serviços de compensação, e ao adotar, com base nessa disposição, uma série de regulamentos relativos às modalidades de exercício das obrigações de regulação ( 30 ), a República Federal da Alemanha violou as competências exclusivas que o direito da União conferiu à ERN. Assim, este Estado‑Membro transpôs de modo incorreto o artigo 37.o, n.o 1, alínea a), e n.o 6, alíneas a) e b), da Diretiva 2009/72 e o artigo 41.o, n.o 1, alínea a), e n.o 6, alíneas a) e b), da Diretiva 2009/73.

86.

A Comissão salienta que as disposições nacionais em questão não preveem simplesmente «orientações políticas gerais emanadas do Governo», nos termos do artigo 35.o, n.o 4, alínea b), ii), da Diretiva 2009/72 e do artigo 39.o, n.o 4, alínea b), ii), da Diretiva 2009/73. Pelo contrário, essas disposições atribuem diretamente ao Governo algumas competências que, por força dessas diretivas, estão reservadas exclusivamente às ERN e estão relacionadas com as funções e as competências das ERN. Os regulamentos nacionais adotados com base no artigo 24.o, n.o 1, ponto 1, da EnWG constituem instruções extremamente pormenorizadas e dirigidas à ERN sobre as modalidades de exercício das suas funções de regulação. Os referidos regulamentos estabelecem o procedimento e as modalidades de determinação das tarifas relativas à rede prevendo elementos pormenorizados como, por exemplo, o método de amortização e a indexação.

87.

Ainda que as disposições regulamentares nacionais referidas deixem uma certa margem de discricionariedade à ERN no que respeita à sua aplicação, as mesmas disposições, sendo muito detalhadas, reduzem consideravelmente os poderes da ERN no que diz respeito à determinação das metodologias, das tarifas a aplicar e dos custos a ter em conta. Além disso, preveem regras detalhadas a respeito das condições de acesso à rede, tais como indicações pormenorizadas sobre os acordos de interconexão entre operadores de redes de transporte ou respeitantes às capacidades suscetíveis de serem atribuídas livremente, ou ao número de mercados territoriais. Segundo a Comissão, a previsão de disposições tão detalhadas impede a ERN de efetuar as suas próprias avaliações e, consequentemente, reduz a sua margem de discricionariedade, privando‑a de competências que as diretivas lhe atribuem a título exclusivo.

88.

Quanto à invocação do princípio da separação de poderes e à preservação da soberania do legislador, a Comissão não contesta que as funções confiadas às ERN devam ser estabelecidas por atos legislativos, o que de resto é indispensável, ao ser necessário transpor as diretivas para o direito nacional. A Comissão contesta, porém, que, na transposição das diretivas, o legislador alemão não tenha confiado à ERN funções previstas pelo legislador da União. Em vez de ter determinado, como prescrevem as diretivas, que essas funções são competências exclusivas da ERN, o legislador alemão previu na EnWG que as condições nas quais a ERN pode exercer essas funções são estabelecidas por ato regulamentar do Governo. Todavia, em conformidade com as diretivas, os Estados‑Membros são obrigados a garantir que seja atribuída à ERN uma competência exclusiva para exercer as funções definidas no artigo 37.o da Diretiva 2009/72 e no artigo 41.o da Diretiva 2009/73.

89.

Segundo a Comissão, as diretivas definem as funções e as competências das ERN de modo detalhado, prevendo exigências de caráter processual e material que as ERN devem respeitar no exercício das suas funções. Na sua interação com outros atos pertinentes de direito da União ( 31 ), as diretivas garantem que a ERN exerça as funções que lhe são confiadas pelo legislador da União nos âmbitos de competência definidos por este último. As disposições de direito da União são suficientes para estabelecer o quadro jurídico necessário para a ação administrativa da ERN e para obedecer ao princípio de separação de poderes. Outras disposições de direito nacional relativas ao exercício das funções da ERN não podem implicar uma violação das competências exclusivas que lhe são atribuídas. As disposições regulamentares em causa adotadas na Alemanha não se limitam a prever regras gerais que devem ser respeitadas pelos organismos nacionais no que se refere à legalidade e ao fundamento da atividade administrativa, mas constituem regulamentações detalhadas aplicáveis ao exercício das funções de regulamentação previstas nas diretivas. O Tribunal de Justiça já decidiu que isso constitui um incumprimento por parte do Estado‑Membro no Acórdão de 29 de outubro de 2009, Comissão/Bélgica (C‑474/08, não publicado, EU:C:2009:681, a seguir «Acórdão Comissão/Bélgica»).

90.

A República Federal da Alemanha, apoiada pelo Reino da Suécia, contesta os argumentos suscitados pela Comissão. A título preliminar, considera que, no seu articulado de réplica, a Comissão suscitou uma nova acusação relativa à violação da independência da ERN. Essa nova acusação constitui um alargamento a posteriori do objeto do litígio e, nessa medida, é inadmissível.

91.

Quanto ao mérito, a República Federal da Alemanha sustenta que a EnWG se funda no princípio da «regulamentação normativa» (normative Regulierung), segundo o qual a ERN adota as decisões concretas de regulamentação com toda a independência, mas, no que se refere à determinação das metodologias para o acesso à rede, está vinculada pelas decisões de princípio do legislador parlamentar que se concretizam nos regulamentos adotados pelo Governo. Nesse quadro, a ERN goza de uma ampla margem de discricionariedade, mas o exercício do seu poder é estruturado previamente (vorstrukturiert) de modo que garanta que a cadeia de legitimação democrática não seja interrompida, como exige o direito constitucional alemão. Não compete à ERN, mas ao legislador, adotar decisões de princípio em matéria de política de energia, como as que são necessárias no âmbito do processo de transição energética para as energias renováveis.

92.

A EnWG não confere competências de regulamentação ao Governo Federal, mas autoriza‑o, mediante uma delegação de competência legislativa, a exercer um poder normativo‑regulamentar, com a aprovação do Bundesrat (Conselho Federal, Alemanha), nos termos do artigo 80.o, n.o 1, da Grundgesetz (Lei Fundamental da República Federal da Alemanha). Os regulamentos adotados pelo Governo Federal não têm por objeto as condições individuais de acesso à rede, mas a definição abstrata e geral de metodologias que a ERN precisa e aplica em cada caso individual. No direito constitucional alemão, os regulamentos desse tipo não constituem orientações de política geral, mas atos normativos materiais.

93.

A regulamentação da EnWG é conforme com as disposições das diretivas relativas às funções das ERN. A República Federal da Alemanha, apoiada nesse ponto pelo Reino da Suécia, considera com efeito que as diretivas não excluem de modo nenhum que o legislador nacional adote disposições mais específicas e precisas do que as disposições gerais das diretivas sobre as metodologias relativas à regulamentação nas quais a ERN está obrigada a fundar‑se. De resto, seria contrário ao princípio da autonomia processual dos Estados‑Membros reconhecido pelo Tribunal de Justiça que as disposições das diretivas não deixassem nenhuma margem aos Estados‑Membros na transposição das normas relativas às competências das ERN.

94.

As diretivas permitem que os Estados‑Membros adotem diversos sistemas regulamentares que constituem todos transposições suficientes das diretivas. No caso da «regulamentação normativa», o legislador e a autoridade investida do poder de adotar regulamentos estabelecem as metodologias de cálculo em termos gerais e abstratos e a ERN tem competência para completar essas metodologias e, em parte, alterá‑las. Além disso, nesse caso, a ERN adota uma decisão de regulação precisa com base nesses métodos de cálculo. A interpretação proposta pela Comissão implica, porém, que a ERN tem competência tanto para a determinação das tarifas como para as metodologias, o que é contrário à letra, ao espírito, aos objetivos e à génese das diretivas.

95.

O Acórdão Comissão/Bélgica não é pertinente na medida em que, no caso vertente, os regulamentos adotados com base no artigo 24.o da EnWG são leis materiais e não instruções do Governo na sua função de autoridade executiva de nível hierárquico superior à ERN. Além disso, a «estruturação prévia» da discricionariedade da ERN mediante prescrições normativas não viola a independência desta, que reside na falta de sujeição a instruções da parte do Governo ou de outras autoridades. Essa condição é garantida pelo direito alemão.

96.

De resto, o princípio da «regulamentação normativa» é reconhecido igualmente no direito da União, como se demonstra pela competência da própria Comissão para adotar códigos de rede, que não constituem simples orientações de política geral, mas verdadeiras prescrições metodológicas detalhadas. O direito da União, e concretamente as diretivas, não contêm prescrições materiais suficientemente precisas quanto à determinação dos métodos em matéria de acesso à rede de determinação das tarifas. As disposições dos Regulamentos n.o 714/2009 e n.o 715/2009 não são aplicáveis ao comércio de eletricidade e gás num Estado‑Membro, nem no plano das redes de distribuição. Nesse contexto, a fim de garantir uma transposição correta das diretivas, os Estados‑Membros estão obrigados a elaborar os seus próprios critérios para enquadrar o poder regulamentar das ERN.

97.

Por último, a República Federal da Alemanha sustenta que os princípios consagrados pela jurisprudência que se reconduz ao Acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, EU:C:1958:7, a seguir «Acórdão Meroni»), são aplicáveis igualmente quando o legislador da União confia determinadas competências às ERN independentes. Com base nesses princípios, a delegação de poderes a tais autoridades é possível apenas se o legislador tiver adotado previamente requisitos suficientemente precisos no que respeita às funções e às competências dessas autoridades. A legislação da União não contém esses requisitos, pelo que cabe aos Estados‑Membros adotá‑los. A mesma obrigação decorre dos princípios da democracia e do Estado de direito, que fazem parte das estruturas políticas e constitucionais fundamentais da República Federal da Alemanha, que a União deve respeitar nos termos do artigo 4.o, n.o 2, TUE.

2. Apreciação

98.

A título preliminar, há que considerar improcedente a exceção suscitada pela República Federal da Alemanha segundo a qual os argumentos da Comissão relativos à violação da independência da ERN constituem uma acusação nova e, por conseguinte, inadmissível.

99.

A esse propósito observe‑se que, com a quarta acusação, a Comissão alega que a República Federal da Alemanha transpôs de modo incorreto diversas disposições das diretivas, na medida em que a legislação nacional em causa viola as competências exclusivas que estas conferem à ERN. A legislação nacional atribui ao Governo algumas competências reservadas pelas diretivas às ERN e, ao prever uma regulamentação detalhada do exercício dos seus poderes, reduz consideravelmente a margem de discricionariedade da ERN nos âmbitos de competências que lhe são reservados.

100.

A esse respeito, há que salientar que tanto a atribuição a uma entidade diferente da ERN do poder de intervir em âmbitos que são reservados a esta última como a sujeição da ERN a disposições adotadas por outras entidades que preveem de modo detalhado o exercício dos seus poderes nos âmbitos de competência que são reservados àquela, podem afetar a possibilidade de a ERN adotar, nesses âmbitos, decisões de modo autónomo, em plena liberdade e sem influências externas. Daí resulta que à quarta acusação subjazem questões relativas à violação da independência garantida pelas diretivas às ERN e que, consequentemente, os argumentos suscitados pela Comissão a esse respeito não podem ser considerados como uma nova acusação diferente da que foi invocada inicialmente e, portanto, inadmissível.

101.

Quanto ao mérito, a fim de apreciar a quarta acusação suscitada pela Comissão há que, em minha opinião, analisar as disposições pertinentes das diretivas tendo em conta a sua redação, mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que fazem parte ( 32 ).

102.

A esse respeito, há que salientar, antes de mais, que, nas diretivas, as normas que regulam a designação, os objetivos, as obrigações e as competências das ERN, respetivamente, no setor da eletricidade e do gás natural, se encontram no capítulo IX (artigos 35.° a 40.°) da Diretiva 2009/72 e no capítulo VIII (artigos 39.° a 44.°) da Diretiva 2009/73.

103.

Quanto a essas disposições, o Tribunal de Justiça já teve ocasião de salientar que o artigo 35.o, n.o 4, da Diretiva 2009/72, ao qual corresponde expressis verbis o artigo 39.o, n.o 4, da Diretiva 2009/73, impõe aos Estados‑Membros o dever de garantir a independência da ERN e de assegurar que esta exerça os seus poderes de modo imparcial e transparente ( 33 ). A mesma disposição precisa em seguida que, para esse fim, cada Estado‑Membro deve assegurar que, no exercício das funções reguladoras conferidas pela diretivas e pela legislação conexa, a ERN seja juridicamente distinta e «funcionalmente independente de qualquer outra entidade pública ou privada» e que o seu pessoal e as pessoas responsáveis pela sua gestão «ajam de forma independente de qualquer interesse de mercado», e «não solicitem nem recebam instruções diretas de qualquer entidade governamental ou outra, pública ou privada, no desempenho das funções reguladoras». O n.o 5 do mesmo artigo, ao qual corresponde o artigo 39.o, n.o 5, da Diretiva 2009/73, acrescenta que, a fim de proteger a independência da ERN, os Estados‑Membros devem, nomeadamente, assegurar que a ERN possa «tomar decisões autónomas, independentemente de qualquer órgão político» ( 34 ).

104.

O conceito de «independência» não é definido nem na Diretiva 2009/72 nem na Diretiva 2009/73. Todavia, a esse respeito, o Tribunal de Justiça já declarou, com particular referência às ERN no setor da energia que, no que respeita aos órgãos públicos, este conceito designa, no seu sentido habitual, normalmente um estatuto que assegura ao órgão em causa a possibilidade de agir com total liberdade em relação aos organismos relativamente aos quais a sua independência deve ser assegurada, ao abrigo de qualquer instrução e de qualquer pressão ( 35 ). Mais especificamente, no setor da energia, a independência decisória garantida pelas diretivas implica que, no âmbito das obrigações e das competências regulatórias referidas no artigo 37.o da Diretiva 2009/72 e no artigo 41.o da Diretiva 2009/73, a ERN adote as suas decisões autónomas, apenas com base no interesse público, para garantir o respeito dos objetivos prosseguidos pela referida diretiva, sem estar sujeita a instruções externas de outros órgãos públicos ou privados ( 36 ).

105.

Além disso, o Tribunal de Justiça já teve ocasião de esclarecer expressamente que os requisitos previstos pelas diretivas, mencionados no n.o 103, implicam que a ERN deva desempenhar as suas funções reguladoras sem qualquer influência externa ( 37 ). A esse respeito, sublinhe‑se igualmente que a especificação reiterada nas diretivas quanto à exigência de garantia da independência funcional da ERN não deixa margem para dúvidas de que essa independência deve ser garantida não apenas relativamente às entidades privadas e aos interesses comerciais mas também a qualquer entidade pública e, por conseguinte, não só relativamente ao governo enquanto titular do poder executivo. As expressões utilizadas nas diretivas são inequívocas ao estabelecer, por um lado, que a independência funcional deve ser garantida relativamente a qualquer órgão político, portanto não só ao governo, mas também ao parlamento e, por outro, que a garantia deve ser completa e não limitada a determinados atos, identificados pela forma ou pelo conteúdo. A exigência de independência da ERN de qualquer interesse político resulta, de resto, também expressamente dos considerandos 34 da Diretiva 2009/72 e 30 da Diretiva 2009/73.

106.

Daí resulta que a independência da ERN que as diretivas garantem no âmbito das obrigações e competências que lhe são atribuídas com caráter exclusivo pelo artigo 37.o da Diretiva 2009/72 e pelo artigo 41.o da Diretiva 2009/73 não pode ser limitada nem sequer por lei do parlamento ou por atos que, para usar as categorias referidas pelo Governo alemão na audiência, sejam, segundo uma classificação típica do direito constitucional nacional, «leis materiais», como os regulamentos governamentais.

107.

Uma interpretação das diretivas destinada a assegurar uma ampla independência funcional às ERN coaduna‑se, aliás, com os objetivos da diretiva. Nesse sentido, a interpretação literal é confirmada pela interpretação teleológica.

108.

A esse respeito, o Tribunal de Justiça já salientou que a Diretiva 2009/72 visa essencialmente criar um mercado interno da eletricidade aberto e competitivo, que permita aos consumidores escolher livremente os seus fornecedores e a estes últimos fornecer livremente os seus clientes, criar condições de concorrência equitativas nesse mercado, garantir a segurança do fornecimento e combater as alterações climáticas ( 38 ). O Tribunal de Justiça identificou em termos muito semelhantes o objetivo prosseguido pela Diretiva 2009/73 ( 39 ).

109.

A esse propósito, importa acrescentar que, como resulta de vários considerandos das diretivas ( 40 ), o objetivo principal de realizar o mercado interno nos setores da eletricidade e do gás natural e de criar condições de concorrência uniformes para todas as empresas de eletricidade estabelecidas na União foi prosseguido tendo em conta o facto de a regulamentação anterior não ter sido suficiente para estabelecer os pressupostos para a criação de um mercado interno perfeitamente funcional, simultaneamente protegendo os consumidores, promovendo os investimentos e garantindo a segurança do fornecimento. A adoção de novas diretivas visava, entre outros, expressamente evitar o risco permanente, na falta de uma separação efetiva entre as redes e as atividades de produção e comercialização — separação que as normas das diretivas anteriores ( 41 ) não tinham conseguido garantir — de criar discriminações não só na gestão da rede, mas também nos incentivos das empresas verticalmente integradas para investirem adequadamente nas suas redes; daí o objetivo das diretivas de introduzir normas destinadas a realizar a separação efetiva entre as atividades de produção e comercialização e as operações da rede ( 42 ).

110.

Nesse contexto, como já salientou o Tribunal de Justiça, foi justamente para alcançar esses objetivos que as diretivas conferiram à ERN amplas prerrogativas em matéria de regulação e de supervisão do mercado da eletricidade ( 43 ).

111.

No quadro estabelecido pelas diretivas, as ERN visam garantir o bom funcionamento do sistema no seu conjunto. Em especial, como resulta expressamente dos considerandos 36 da Diretiva 2009/72 e 32 da Diretiva 2009/73 e se reflete, respetivamente, no artigo 37.o, n.o 1, alínea a), e no artigo 41, n.o 1, alínea a) destas diretivas, deverão ter a possibilidade de fixar ou aprovar as tarifas ou os métodos de cálculo destas com base numa proposta do(s) operador(es) das redes de transporte ou do(s) operador(es) das redes de distribuição, ou numa proposta acordada entre esse(s) operador(es) e os utilizadores das redes. No exercício destas funções, as ERN deverão assegurar que as tarifas de transporte e distribuição sejam não discriminatórias e reflitam os custos e, além disso, ter em consideração os custos marginais a longo prazo da rede que as medidas de produção distribuída e de gestão da procura permitem evitar.

112.

A realização dos objetivos anteriormente referidos exige a máxima garantia de independência da ERN, nos amplos termos que resultam do teor literal das disposições referidas nos n.os 102 e seguintes, supra. Com efeito, a plena independência em relação aos operadores económicos e às entidades públicas, quer sejam órgãos administrativos quer sejam órgãos políticos, e neste último caso titulares do poder executivo ou legislativo, visa garantir que as decisões tomadas sejam realmente imparciais e não discriminatórias, excluindo radicalmente a possibilidade de um tratamento de algum modo privilegiado das empresas e dos interesses económicos ligados ao governo, à maioria ou, em qualquer caso, ao poder político ( 44 ). Deste modo, como salientou justamente a Comissão, neutraliza‑se o risco — cuja concretização ameaça a realização do mercado interno da energia aberto ao acesso transfronteiriço de novos fornecedores de eletricidade de fontes de energia diferentes, bem como de novos fornecedores de produção de energia — de que sejam privilegiadas empresas nacionais ou empresas ligadas ao poder político, risco esse particularmente forte visto que em muitos países a empresa verticalmente integrada é ainda o antigo monopolista público que mantém ligações, por exemplo através de participações acionistas, com o governo ( 45 ).

113.

De resto, como resulta expressamente dos considerandos 33 da Diretiva 2009/72 e 29 da Diretiva 2009/73, era justamente nessa perspetiva que as referidas diretivas visavam especificamente o reforço da independência da ERN e que, como resulta dos considerandos 34 e 30 das mesmas diretivas, estas preveem disposições para que os reguladores da energia possam tomar decisões sobre todas as questões de regulação relevantes, para um funcionamento adequado do mercado interno da eletricidade e ser inteiramente independentes de quaisquer outros interesses públicos ou privados ( 46 ).

114.

O quadro geral sobre a independência das ERN, delineado deste modo, é especificado nas disposições das diretivas que definem, de forma analítica, os seus objetivos, obrigações e competências. Nesse sentido, a interpretação literal e teleológica é, pois, confirmada pela interpretação sistemática. Assim, o artigo 37.o da Diretiva 2009/72 e o artigo 41.o da Diretiva 2009/73 determinam de maneira pontual as competências das ERN, que são única e exclusivamente as definidas pelas diretivas.

115.

Além disso, tais competências inserem‑se numa estrutura jurídica que delimita, a vários níveis, os seus objetivos e critérios de exercício. No exercício das competências que lhes são confiadas, com efeito, as ERN estão obrigadas a atuar em consonância com os objetivos indicados no artigo 36.o da Diretiva 2009/72 e no artigo 40.o da Diretiva 2009/73. Trata‑se de objetivos determinados que circunscrevem o âmbito das decisões confiadas às ERN, estabelecendo critérios que devem ser seguidos para a prossecução dos objetivos fixados previamente ( 47 ).

116.

Em alguns casos, esses critérios são detalhados, com referência a competências específicas, pelo artigo 37.o da Diretiva 2009/72 e pelo artigo 41.o da Diretiva 2009/73. Assim, por exemplo, no que respeita às tarifas de transmissão e de distribuição ou às respetivas metodologias de cálculo, nos termos do n.o 1 dessas duas disposições, devem ser determinadas com base em critérios transparentes e, nos termos do n.o 6, alínea a), das mesmas disposições, as mesmas, bem como as condições de ligação e acesso às redes nacionais, devem ser determinadas tendo em conta a necessidade de serem efetuados investimentos necessários de molde a garantir a viabilidade das redes ( 48 ). Nos termos do n.o 10 das mesmas disposições, tais condições, tarifas e metodologias devem ser proporcionadas e aplicadas de forma não discriminatória. No que respeita à prestação de serviços de compensação, o artigo 37.o da Diretiva 2009/72 e o artigo 41.o da Diretiva 2009/73, no seu n.o 6, alínea b), dispõem que devem realizar‑se da forma mais económica possível e proporcionar incentivos adequados aos utilizadores da rede, de molde a garantir um equilíbrio entre o seu contributo e o seu consumo, e devem ser equitativos, não discriminatórios e basear‑se em critérios objetivos. Além disso, nos termos do n.o 8 das disposições acima referidas, aquando da fixação ou aprovação das tarifas ou metodologias e dos serviços de compensação, as ERN devem assegurar que os operadores das redes de transporte e distribuição recebam o incentivo adequado, quer a curto quer a longo prazo, para aumentar a sua eficiência, promover a integração do mercado e a segurança do fornecimento e apoiar as atividades de investigação conexas ( 49 ).

117.

As diretivas preveem igualmente uma série de garantias de caráter processual que as ERN devem respeitar no exercício das suas funções, como a obrigação de publicação das suas decisões, a obrigação de manter a confidencialidade das informações comercialmente sensíveis e a obrigação de plena fundamentação ( 50 ).

118.

Os critérios indicados nas diretivas que as ERN devem seguir no exercício das competências que lhes são atribuídas são objeto de outras especificações em outros atos normativos, como os Regulamentos n.o 714/2009 e n.o 715/2009. Assim, por exemplo, os artigos 14.° e 13.°, respetivamente, desses dois regulamentos ( 51 ) fornecem critérios específicos para a determinação das taxas, das tarifas ou das respetivas metodologias de cálculo para o acesso às redes ( 52 ) e o artigo 21.o do Regulamento n.o 715/2009 prevê disposições relativas às regras sobre a compensação.

119.

As referidas disposições foram ulteriormente integradas e especificadas por diversos códigos de rede instituídos por regulamentos da Comissão que contêm disposições detalhadas a respeito, entre outros, das estruturas tarifárias harmonizadas para o transporte do gás ( 53 ), dos requisitos para a ligação à rede das instalações de consumo, das instalações de distribuição e das redes de distribuição ( 54 ), dos requisitos ao nível europeu para a ligação à rede elétrica das instalações de produção ( 55 ) e dos requisitos para a ligação à rede das redes de alta tensão ( 56 ). Num quadro legal tão detalhado, a República Federal da Alemanha não pode, em minha opinião, sustentar que os Estados‑Membros foram obrigados a elaborar os seus próprios critérios de cálculo das tarifas a fim de transpor adequadamente as Diretivas 2009/72 e 2009/73. E isso sem contar que, como sustentou com razão a Comissão, a determinação de um sistema de tarifas equitativas constitui uma função básica clássica das ERN, de modo que estas dispõem (e devem dispor) de serviços especializados capacitados para exercer essa função.

120.

Da forma como são definidas e estruturadas as competências das ERN decorrem duas consequências importantes. Em primeiro lugar, a regulamentação da União, ao definir pontualmente competências, objetivos e critérios de exercício das competências não parece deixar espaço a intervenções nacionais que se interponham entre a diretiva e o exercício por parte das ERN das funções que lhes são atribuídas com exclusividade pelas diretivas. A definição em termos amplos da independência funcional e a regulamentação das competências conduzem a esta conclusão. Com a consequência de poder sustentar‑se que as diretivas preveem uma «reserva de competências» a favor das ERN a respeito das obrigações enumeradas no artigo 37.o da Diretiva 2009/72 e no artigo 41.o da Diretiva 2009/73, já referidos. Daí deduz‑se que qualquer estruturação prévia (Vorstrukturierung) do seu funcionamento por parte do legislador nacional não pode afetar o exercício do núcleo das competências que lhes são reservadas pelas diretivas. Em segundo lugar, as ERN deverão limitar‑se a atuar no âmbito traçado pela regulamentação europeia sem poderem introduzir novos interesses ou critérios além dos previamente determinados pelo legislador europeu. As ERN deverão dar execução técnica ao disposto na regulamentação secundária da União.

121.

As conclusões a que chegámos não encontram obstáculo no facto de as diretivas deixarem aos Estados‑Membros o poder de estabelecerem «orientações políticas gerais» ( 57 ).

122.

A esse respeito, impõem-se duas observações. Em primeiro lugar, uma vez que as diretivas admitem expressamente apenas orientações de caráter geral, são certamente incompatíveis com as mesmas as indicações ou regulamentações específicas, que prevejam indicações detalhadas. Em segundo lugar, como o Tribunal de Justiça já salientou ( 58 ), resulta expressamente das disposições pertinentes das diretivas que as orientações políticas gerais elaboradas pelo Governo do Estado‑Membro em causa não podem estar relacionadas com as obrigações e as competências regulatórias nos termos do artigo 37.o da Diretiva 2009/72 e do artigo 41.o da Diretiva 2009/73, entre as quais se incluem obrigações e competências relativas à regulação, aprovação e supervisão de diversas tarifas e preços, nomeadamente as que figuram no n.o 1, alínea a), desses artigos, que consistem em estabelecer ou aprovar, mediante critérios transparentes, as tarifas de transporte ou distribuição de eletricidade ou os seus métodos de cálculo. Deduz‑se daí que, apesar de os Estados‑Membros e, portanto, o parlamento e o governo manterem competências em matéria de política energética, como é confirmado pelo artigo 194.o TFUE, isso não invalida que as orientações políticas gerais versem sobre âmbitos diferentes dos que são abrangidos pela reserva de regulação a favor das ERN. A esse respeito, aliás, importa salientar que, em qualquer caso, o Governo alemão esclareceu que as disposições postas em causa pela Comissão na presente acusação não constituem orientações políticas gerais na aceção das diretivas.

123.

A interpretação acima referida, resultante da análise literal, teleológica e sistemática das disposições pertinentes das diretivas é, de resto, conforme com a abordagem adotada pelo Tribunal de Justiça na sua jurisprudência.

124.

Assim, no Acórdão Comissão/Bélgica, o Tribunal de Justiça esclareceu, referindo‑se especificamente ao setor da eletricidade, que a atribuição por parte de um Estado‑Membro a uma entidade distinta da ERN da competência para definir elementos determinantes para o cálculo das tarifas de transporte ou de distribuição, tais como a determinação das amortizações ou das margens de lucro, constituía um incumprimento das disposições da Diretiva 2003/54 que atribuíam competências na matéria às ERN. O Tribunal de Justiça declarou que a atribuição dessas competências ao poder executivo reduzia o âmbito das competências conferidas pela diretiva em causa, na medida em que a ERN, na determinação das tarifas, estava vinculada pelas regras específicas sobre a determinação desses elementos estabelecidas por uma outra entidade ( 59 ). Essa abordagem foi confirmada pelo Tribunal de Justiça num acórdão muito recente, relativo igualmente ao Reino da Bélgica, e que respeita, especificamente, ao artigo 37.o, n.o 6, alínea a), da Diretiva 2009/72 e ao artigo 41.o, n.o 6, alínea a), da Diretiva 2009/73 ( 60 ). Ao contrário do que sustenta a República Federal da Alemanha, essa jurisprudência é pertinente também no caso de a regulamentação em causa prever intervenções nos âmbitos de competência reservados à ERN mediante leis materiais e não apenas mediante instruções do governo na sua função de autoridade executiva hierarquicamente superior à ERN. Com efeito, como resulta do exposto nos números anteriores, os poderes atribuídos com exclusividade às ERN pelas diretivas e a independência das ERN devem ser garantidos relativamente a qualquer órgão político, portanto, não apenas pelo governo, mas também relativamente ao legislador nacional, o qual, embora possa e até deva determinar esses poderes em atos normativos, não pode, todavia, subtrair parte deles às ERN e atribuí‑los a outros organismos públicos.

125.

De resto, também noutros domínios do direito da União, em que se tornou necessária a instituição de entidades independentes com funções destinadas a realizar um mercado concorrencial capaz de proteger simultaneamente outras finalidades, expressamente indicadas e regulamentadas pelo legislador europeu, como por exemplo a proteção de direitos fundamentais específicos e dos direitos do consumidor, a interpretação do conceito de independência pelo Tribunal de Justiça foi o mais ampla possível.

126.

Nessa perspetiva, cumpre referir‑se o Acórdão de 9 de março de 2010, Comissão/Alemanha (C‑518/07, EU:C:2010:125). Nesse processo, estava em discussão o significado da expressão «com total independência» referente às autoridades de controlo nacionais encarregadas de fiscalizar o respeito das disposições relativas à proteção dos dados pessoais ( 61 ). O litígio versava sobre duas conceções opostas da independência das autoridades de controlo: por um lado, uma interpretação ampla segundo a qual o requisito da independência deve ser interpretado no sentido de que uma autoridade de controlo deve ser subtraída a qualquer tipo de influência, por outro, a interpretação mais restritiva defendida pela República Federal da Alemanha, que limitava a independência ao setor que não o público sujeito ao seu controlo, quando se considerava admissível um mecanismo de vigilância das autoridades na Administração. O Tribunal de Justiça, interpretando a independência à luz das finalidades da diretiva em questão, optou pela primeira interpretação, afirmando que «as autoridades de controlo competentes para fiscalizar o tratamento de dados pessoais no setor não público devem gozar de uma independência que lhes permita exercer as suas funções sem influência externa. Essa independência exclui não só qualquer influência exercida pelos organismos de controlo mas também qualquer instrução ou qualquer outra influência externa, direta ou indireta, que possam pôr em causa o cumprimento, pelas referidas autoridades, da sua tarefa de estabelecer um justo equilíbrio entre a proteção do direito à vida privada e a livre circulação de dados pessoais» ( 62 ).

127.

De modo semelhante, no domínio das comunicações eletrónicas, a jurisprudência do Tribunal de Justiça visa assegurar o respeito da margem de discricionariedade garantida às ERN no exercício dos seus poderes ( 63 ).

128.

Em conclusão, entendo que a interpretação ampla da regulamentação sobre a independência das ERN nos setores da eletricidade e do gás se coaduna plenamente com uma análise de ordem sistemática, como se confirma pela jurisprudência do Tribunal de Justiça. O ordenamento jurídico da União privilegia um conceito amplo de independência no que se refere às competências específicas confiadas às entidades independentes.

129.

Essa conclusão não é infirmada pelos outros argumentos suscitados pela República Federal da Alemanha.

130.

No que respeita, em primeiro lugar, à invocação pela República Federal da Alemanha do princípio da autonomia processual dos Estados‑Membros, há que recordar que do artigo 288.o TFUE resulta que os Estados‑Membros, na transposição de uma diretiva, têm a obrigação de assegurar a sua plena eficácia, embora disponham de uma ampla margem de apreciação quanto à escolha das modalidades e dos meios destinados a assegurar a sua execução. Esta liberdade deixa assim intacta a obrigação que incumbe a cada um dos Estados‑Membros destinatários de adotar todas as medidas necessárias para assegurar a plena eficácia da diretiva em causa, em conformidade com o objetivo por ela prosseguido ( 64 ).

131.

Daí deduz‑se que, como já salientou o Tribunal de Justiça, embora os Estados‑Membros gozem de autonomia institucional na organização e na estruturação das ERN previstas pelas diretivas, essa autonomia deve, no entanto, ser exercida no pleno respeito dos objetivos e das obrigações estabelecidos pelas mesmas diretivas ( 65 ), o que inclui o pleno respeito dos âmbitos de competência que essas diretivas garantem às ERN.

132.

Em segundo lugar, ao contrário do que sustenta o Governo alemão, entendo que a interpretação referida das disposições pertinentes das diretivas sobre a independência e os poderes das ERN se coaduna com a jurisprudência que remonta ao Acórdão Meroni, cuja abordagem foi estendida pelo Tribunal de Justiça às agências da União no acórdão subsequente relativo aos poderes atribuídos à Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados ( 66 ).

133.

Resulta, em especial, dessa jurisprudência que o Tribunal de Justiça não considera admissível que seja conferida a uma agência da União, por delegação, um «amplo poder discricionário» que implica uma ampla liberdade de apreciação suscetível de traduzir, pela respetiva utilização, uma verdadeira política [económica], ao substituir as escolhas da autoridade delegante pelas da autoridade delegatária, e operando portanto uma «verdadeira transferência da responsabilidade» ( 67 ). Contudo, o que é possível conferir a tais agências são poderes executivos claramente delimitados e cuja utilização seja, portanto, suscetível de um controlo rigoroso à luz de critérios objetivos ( 68 ).

134.

Todavia, mesmo que essa jurisprudência seja aplicável a um caso como o presente, relativo a entidades nacionais instituídas não pela própria União mas designadas pelos Estados‑Membros em aplicação de uma diretiva, importa observar que a interpretação proposta é, de qualquer modo, conforme com essa jurisprudência. Com efeito, por um lado, as competências reservadas às ERN entram na esfera da execução, com base numa apreciação técnica especializada da realidade e não atribuem nenhuma competência autónoma à referida entidade que ultrapasse o quadro instituído pelo direito da União ( 69 ) e que implique escolhas de caráter político ( 70 ); por outro, como se analisou nos n.os 114 a 119, supra, as normas previstas nos atos normativos da União circunscrevem o conteúdo dessas competências e regulam os critérios e as condições que delimitam o campo de atuação das ERN ( 71 ).

135.

Em terceiro lugar, a interpretação proposta não é posta em dúvida pelos argumentos apresentados pela República Federal da Alemanha relativos ao princípio da democracia.

136.

A respeito da interação entre o princípio da democracia e as ERN, o Tribunal de Justiça já forneceu várias indicações no Acórdão de 9 de março de 2010, Comissão/Alemanha (C‑518/07, EU:C:2010:125), já referido. Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça recordou, antes de mais, que o princípio da democracia pertence ao ordenamento jurídico da União e foi consagrado expressamente pelo artigo 6.o, n.o 1, TUE, como um dos fundamentos da União. Enquanto princípio comum aos Estados‑Membros, deve ser tido em conta na interpretação de um ato de direito derivado ( 72 ).

137.

Em seguida, o Tribunal de Justiça salientou que o princípio referido não obsta à existência de autoridades públicas fora do âmbito da administração hierárquica clássica e mais ou menos independentes do governo. A existência e as condições de funcionamento dessas autoridades decorrem, nos Estados‑Membros, da lei ou mesmo, em determinados Estados‑Membros, da Constituição, e essas autoridades estão obrigadas ao cumprimento da lei, sob o controlo dos órgãos jurisdicionais competentes. Essas autoridades administrativas independentes, como, de resto, existem no sistema jurídico alemão, têm frequentemente funções reguladoras ou exercem funções que devem ser subtraídas à influência política, embora permanecendo sujeitas ao cumprimento da lei, sob o controlo dos órgãos jurisdicionais competentes ( 73 ).

138.

Além disso, o Tribunal de Justiça salientou que o direito da União não impõe «a ausência de qualquer influência parlamentar», tendo em conta, por um lado, que as pessoas que assumem a direção das autoridades de controlo podem ser nomeadas pelo parlamento ou pelo governo, e por outro, que o legislador pode impor às autoridades de controlo a obrigação de informar o parlamento das suas atividades ( 74 ).

139.

As considerações do Tribunal de Justiça referidas nos números anteriores aplicam‑se igualmente no caso das ERN nos setores da eletricidade e do gás e estão na base da compatibilidade da sua independência com o princípio democrático. Em especial, por um lado, resulta expressamente do considerando 34 da Diretiva 2009/72 e do considerando 30 da Diretiva 2009/73 que a independência das ERN garantida pelas diretivas não preclude o exercício de uma fiscalização parlamentar nos termos das constituições dos Estados‑Membros. Daí resulta que, embora as ERN não sejam sujeitas a qualquer influência preventiva dos órgãos políticos, não podem esquivar‑se, no entanto, à obrigação de informar o parlamento das suas atividades. A exigência de ligação ao princípio democrático conduz, portanto, à introdução de uma forma de «accountability» das ERN a que apenas os Estados‑Membros podem dar seguimento.

140.

Por outro lado, há que efetuar uma precisão importante. As ERN nos setores da eletricidade e do gás operam, como vimos, no âmbito das competências que lhes são reservadas, dando aplicação ao direito da União, sem ingerências dos órgãos políticos nacionais, nem sequer através de leis formais ou materiais. A regulamentação da União toma o lugar que a lei do parlamento ocupava no modelo de administração nacional para a ligar ao princípio democrático. Dado que o processo decisório que produz os atos normativos da União é um processo democrático, que conta com a participação do Parlamento Europeu, eleito pelos cidadãos da União, e do Conselho, onde estão presentes os interesses dos Estados‑Membros através dos governos com legitimidade democrática, as ERN são desse modo reconduzidas aos circuitos da legitimidade democrática.

141.

Além disso, como foi salientado nos n.os 114 a 119, supra, não só as competências das ERN são determinadas e enumeradas especificamente pelas diretivas, mas os objetivos e os critérios do seu exercício são também definidos pelo direito derivado da União. As ERN dão execução às normas do direito derivado através de uma atividade eminentemente técnica. Por conseguinte, em consonância com a jurisprudência que se reconduz ao Acórdão Meroni, falta‑lhes aquela ampla discricionariedade que é própria do poder político e, portanto, as ERN não podem tomar decisões de política energética, cuja competência é repartida entre a União e os Estados‑Membros. As ERN não exercem nenhum poder de natureza política e não se substituem aos órgãos titulares do poder político que atuam com base numa legitimação democrática. Sendo desse modo circunscrito o âmbito de ação das ERN, a interpretação proposta é plenamente compatível com o princípio da democracia.

142.

O quadro delineado a respeito das relações entre a independência das ERN, as competências de que são titulares e os atos normativos que definem o seu âmbito de atuação, leva a concluir igualmente pela sua plena compatibilidade com os princípios do Estado de direito. O Estado de direito, que é um valor em que se funda a União, afirmado no artigo 2.o TUE, e que como tal deve presidir igualmente à interpretação do direito da União, postula que a Administração atua com base na lei, por forma a evitar qualquer arbítrio, a garantir os direitos dos cidadãos e a que a sua atuação seja suscetível de fiscalização jurisdicional. O direito constitucional dos Estados‑Membros exige que a atuação da Administração, para usar a expressão usada pelo Governo alemão, seja previamente estruturada pela lei. A lei é a base das competências da Administração, não apenas no sentido de que cada uma das competências administrativas encontra o seu fundamento na lei, mas igualmente no sentido de que a lei adota também uma regulamentação substancial do seu exercício, circunscrevendo a discricionariedade administrativa e tornando o cidadão suscetível de proteção perante um órgão jurisdicional independente no caso de a Administração se afastar dos parâmetros legais. No ordenamento jurídico alemão, faz‑se referência à reserva de lei [Vorbehalt des Gesetzes, que se reconduz aos princípios da democracia e do Estado de direito garantidos nos n.os 2 e 3 do artigo 20.o da Lei Fundamental alemã (Grundgesetz)], fórmula adotada também noutros sistemas constitucionais, ao passo que a doutrina constitucionalista italiana prefere falar de «legalidade em sentido substancial» para indicar a necessidade de uma regulamentação legislativa prévia da atividade administrativa.

143.

A exigência ligada à reserva de lei relativa à Administração, ou seja, a de circunscrever o exercício da discricionariedade e definir um parâmetro de apreciação da sua atuação, é plenamente satisfeita também a respeito das ERN nos setores da eletricidade e do gás. Esta exigência já não é satisfeita mediante uma norma legal prévia, mas mediante uma regulamentação prévia constante de atos normativos da União. Graças a essa regulamentação, o uso das competências reservado às ERN é orientado pelos objetivos e pelos critérios indicados pelo legislador europeu e, no caso de serem infringidos, além do caso da violação das normas nacionais que, no respeito das competências das ERN previstas pelo direito da União, regulam a sua atividade, os interessados poderão recorrer a um órgão independente a fim de verem protegidas as suas posições subjetivas ( 75 ).

144.

No presente processo, quanto à quarta acusação suscitada pela Comissão, à luz das considerações precedentes, convém salientar que não se discute que o artigo 24.o, n.o 1, da EnWG atribui a um órgão distinto da ERN, ou seja, ao Governo federal, a competência para estabelecer as condições de acesso à rede, incluindo a aquisição e a comercialização de serviços de compensação, bem como as metodologias usadas para determinar essas condições, e as metodologias para a determinação das tarifas de acesso. Também é incontroverso que os regulamentos adotados pelo Governo federal com base nessa disposição da EnWG mencionados pela Comissão ( 76 ) se destinam a estabelecer prescrições específicas e detalhadas respeitantes a elementos importantes para a determinação das tarifas de transporte e de distribuição ( 77 ), das condições de acesso às redes nacionais e das condições para a prestação de serviços de compensação ( 78 ).

145.

Nesse contexto, à luz das considerações precedentes, há que considerar procedente, em minha opinião, a quarta acusação formulada pela Comissão e declarar que a República Federal da Alemanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 37.o, n.o 1, alínea a), e n.o 6, alíneas a) e b), da Diretiva 2009/72 e do artigo 41.o, n.o 1, alínea a), e n.o 6, alíneas a) e b), da Diretiva 2009/73.

IV. Conclusão

146.

À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça declare que:

1)

A República Federal da Alemanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Diretiva 2009/72/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade e que revoga a Diretiva 2003/54/CE, e da Diretiva 2009/73/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, que estabelece regras comuns para o mercado interno do gás natural e que revoga a Diretiva 2003/55/CE, na medida em que não transpôs de forma correta:

o artigo 2.o, ponto 21, da Diretiva 2009/72 e o artigo 2.o, ponto 20, da Diretiva 2009/73;

o artigo 19.o, n.os 3 e 8, da Diretiva 2009/72 e o artigo 19.o, n.os 3 e 8 da Diretiva 2009/73;

o artigo 19.o, n.o 5, da Diretiva 2009/72 e o artigo 19.o, n.o 5 da Diretiva 2009/73; e

o artigo 37.o, n.o 1, alínea a), e n.o 6, alíneas a) e b), da Diretiva 2009/72 e o artigo 41.o, n.o 1, alínea a), e n.o 6, alíneas a) e b), da Diretiva 2009/73.

2)

A República Federal da Alemanha é condenada nas despesas.


( 1 ) Língua original: italiano.

( 2 ) JO 2009, L 211, p. 55. A Diretiva 2009/72 foi revogada com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2021 pela Diretiva (UE) 2019/944 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de junho de 2019, relativa a regras comuns para o mercado interno da eletricidade e que altera a Diretiva 2012/27/UE (reformulação) (JO 2019, L 158, p. 125).

( 3 ) JO 2009, L 211, p. 94.

( 4 ) Energiewirschaftsgesetz de 7 de julho de 2005 (BGBl. I, pp. 1970 e 3621), conforme alterada.

( 5 ) Regulamento (CE) n.o 139/2004 do Conselho, de 20 de janeiro de 2004, relativo ao controlo das concentrações de empresas (JO 2004, L 24, p. 1).

( 6 ) Acórdão de 30 de janeiro de 2019, Planta Tabak (C‑220/17, EU:C:2019:76, n.o 33).

( 7 ) Atuais artigos 53.°, n.o 2, TFUE, 62.° TFUE e 114.° TFUE.

( 8 ) V., ex multis, Acórdão de 8 de outubro de 2020, Crown Van Gelder (C‑360/19, EU:C:2020:805, n.o 21 e jurisprudência referida).

( 9 ) V., neste sentido, entre outros, Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Comissão/República Checa (C‑314/16, EU:C:2018:42, n.o 35 e jurisprudência referida).

( 10 ) V. considerando 9 da Diretiva 2009/72 e considerando 6 da Diretiva 2009/73.

( 11 ) V. considerando 11 da Diretiva 2009/72 e considerando 8 da Diretiva 2009/73.

( 12 ) V., a este respeito, Acórdão de 26 de outubro de 2017, Balgarska energiyna borsa (C‑347/16, EU:C:2017:816, n.o 33).

( 13 ) V. considerando 16 da Diretiva 2009/72 e considerando 13 da Diretiva 2009/73.

( 14 ) V. artigo 9.o, n.o 8, da Diretiva 2009/72 e artigo 9.o, n.o 8, da Diretiva 2009/73.

( 15 ) JO 2004, L 24, p. 1.

( 16 ) Com efeito, no quadro do controlo das concentrações, o conceito de «controlo» diz respeito, fundamentalmente, aos critérios relativos à pessoa que detém o controlo, à determinação do objeto do controlo (empresa ou ativos patrimoniais), aos meios através dos quais se exerce o controlo, bem como aos tipos de controlo (exclusivo ou conjunto); v., a este respeito, Comunicação consolidada da Comissão em matéria de competência ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 139/2004 do Conselho relativo ao controlo das concentrações de empresas (JO 2008, C 95, p. 1, em especial a secção II). Todavia, o Governo alemão esclareceu que, nos termos do artigo 3.o, ponto 38, da EnWG como interpretado pela ERN, a qualificação de «empresa verticalmente integrada» não depende do facto de a empresa verticalmente integrada exercer o controlo sobre empresas com ou sem sede na União, mas que essa disposição prevê um critério geográfico que exige que, para efeitos dessa qualificação, as atividades no setor da eletricidade e do gás sejam exercidas na União. Daí resulta que, para os fins da análise da presente acusação, não é relevante o exercício do controlo (e, portanto, o conceito de controlo), mas a questão do eventual exercício de atividades, por parte de uma empresa de eletricidade ou de gás natural ou de um grupo de empresas desse tipo, fora da União, e que é independente de um eventual exercício de controlo sobre uma empresa com sede fora da União.

( 17 ) V. considerandos 9, 11, 12, 15, 16, 19 e 24 da Diretiva 2009/72 e considerandos 6, 8, 9, 12, 13, 16 e 21 da Diretiva 2009/73.

( 18 ) V., a este respeito, Acórdãos de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.o 22 e jurisprudência referida), no que respeita à Diretiva 2009/72, e de 19 de dezembro de 2019, GRDF (C‑236/18, EU:C:2019:1120, n.o 34 e jurisprudência referida), no que respeita à Diretiva 2009/73. V., igualmente, n.o 108, infra.

( 19 ) Acórdão de 26 de outubro de 2017, Balgarska energiyna borsa (C‑347/16, EU:C:2017:816, n.o 34).

( 20 ) Os supramencionados considerandos e disposições da Diretiva 2009/72 correspondem aos considerandos 13, 14 e 16 e ao artigo 52.o, n.o 3, da Diretiva 2009/73.

( 21 ) V., igualmente, neste sentido, Acórdãos de 28 de fevereiro de 2013, Comissão/Áustria (C‑555/10, EU:C:2013:115, n.o 60), e de 28 de fevereiro de 2013, Comissão/Alemanha (C‑556/10, EU:C:2013:116, n.o 64). Na mesma perspetiva devem, em minha opinião, ser interpretados os artigos 11.° das duas diretivas, referidos pelo Governo alemão nos seus articulados, e que dizem respeito aos processos de certificação relativamente a países terceiros. Entendo que não se pode deduzir dessas disposições, de modo nenhum, que as atividades exercidas fora da União nos setores da eletricidade e do gás devam ser excluídas do conceito de «empresa verticalmente integrada».

( 22 ) V. considerando 11 da Diretiva 2009/72, considerando 8 da Diretiva 2009/73 e n.o 37 das presentes conclusões.

( 23 ) Em concreto, funções de produção, transporte, distribuição, fornecimento ou aquisição de eletricidade ou gás natural e de responsabilidade pelas funções comerciais, técnicas e/ou de manutenção ligadas a estas funções.

( 24 ) V. Acórdãos de 23 de abril de 2020, Land Niedersachsen (períodos anteriores de atividade pertinente) (C‑710/18, EU:C:2020:299, n.o 34 e jurisprudência referida); de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais (C‑325/08, ECLI:EU:C:2010:143, n.o 38); e de 10 de outubro de 2019, Krah (C‑703/17, EU:C:2019:850, n.o 55).

( 25 ) V. Acórdãos de 5 de julho de 2017, Fries (C‑190/16, EU:C:2017:513, n.o 73), e de 6 de setembro de 2012, Deutsches Weintor (C‑544/10, EU:C:2012:526, n.o 54 e jurisprudência referida).

( 26 ) V. n.o 38, supra.

( 27 ) V., a este respeito, ex multis, Acórdão de 11 de outubro de 2016, Comissão/Itália, C‑601/14, EU:C:2016:759, n.o 33 e jurisprudência referida.

( 28 ) Acórdão de 20 de setembro de 2016, Ledra Advertising e o./Comissão e BCE (C‑8/15 P a C‑10/15 P, EU:C:2016:701, n.os 69 e 70 e jurisprudência referida).

( 29 ) Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.o 69 e jurisprudência referida.

( 30 ) A Comissão menciona a Stromnetzentgeltverordnung (StromNEV), Regulamento relativo à Determinação das Tarifas de Utilização da Rede de Transporte de Eletricidade, de 25 de julho de 2005, BGBl. I p. 2225), a Gasnetzentgeltverordnung (GasNEV), Regulamento relativo à Determinação das Tarifas de Utilização da Rede de Transporte de Gás, de 25 de julho de 2005, BGBl. I p. 2197), a Anreizregulierungsverordnung (ARegV), Regulamento relativo à Regulamentação das Redes de Fornecimento de Energia Mediante Recurso a Incentivos, de 29 de outubro de 2007, BGBl. I, p. 2529), a Stromnetzzugangsverordnung (StromNZV), Regulamento relativo ao Acesso à Rede de Transporte de Eletricidade de 25 de julho de 2005, BGBl. I p. 2243) e a Gasnetzzugangsverordnug (GasNZV), Regulamento relativo ao Acesso ao Sistema de Transporte de Gás, de 3 de setembro de 2010, BGBl. I p. 1261).

( 31 ) A Comissão refere‑se ao Regulamento (CE) n.o 714/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, relativo às condições de acesso à rede para o comércio transfronteiriço de eletricidade e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1228/2003 (JO 2009, L 211, p. 15, a seguir «Regulamento n.o 714/2009») e ao Regulamento (CE) n.o 715/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, relativo às condições de acesso às redes de transporte de gás natural e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1775/2005 (JO 2009, L 211, p. 36, a seguir «Regulamento n.o 715/2009»).

( 32 ) V., neste sentido, ex multis, Acórdão de 16 de julho de 2020, Comissão/Hungria (taxas de acesso às redes de transporte da eletricidade e do gás natural) (C‑771/18, EU:C:2020:584, n.o 42 e jurisprudência referida).

( 33 ) V., a este respeito, Acórdão de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.o 31).

( 34 ) Acórdão de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.o 50).

( 35 ) Acórdão de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.o 32), que se refere ao Acórdão de 13 de junho de 2018, Comissão/Polónia, C‑530/16, EU:C:2018:430, n.o 67.

( 36 ) V., relativamente à Diretiva 2009/72, Acórdão de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.o 54), aplicável por analogia à Diretiva 2009/73. V. igualmente, a este respeito, Acórdão de 3 de dezembro de 2020, Comissão/Bélgica (C‑767/19, EU:C:2020:984, n.o 111).

( 37 ) V., no que respeita à Diretiva 2009/72, Acórdão de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.o 33). O sublinhado é meu. As mesmas considerações são aplicáveis por analogia à Diretiva 2009/73.

( 38 ) Acórdão de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.o 22 e jurisprudência referida).

( 39 ) Acórdão de 19 de dezembro de 2019, GRDF (C‑236/18, EU:C:2019:1120), n.o 34 e jurisprudência referida.

( 40 ) V., inter alia, considerandos 1, 6, 7, 19, 25, 37, 42, 46 e 50 da Diretiva 2009/72 e 1, 5, 16, 21, 22, 30, 57 e 58 da Diretiva 2009/73.

( 41 ) Ou seja, a Diretiva 2003/54/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2003, que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade e que revoga a Diretiva 96/92/CE (JO 2003, L 176, p. 37), e a Diretiva 2003/55/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2003, que estabelece regras comuns para o mercado interno de gás natural e que revoga a Diretiva 98/30/CE (JO 2003, L 176, p. 57).

( 42 ) Considerandos 9 e 10 da Diretiva 2009/72 e 6 e 7 da Diretiva 2009/73.

( 43 ) V., a respeito da Diretiva 2009/72, Acórdão de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.o 23).

( 44 ) A esse respeito, observe-se igualmente que a plena separação em relação ao poder político permite às ERN prosseguir a sua ação numa perspetiva de longo prazo, que é necessária para realizar os objetivos da diretiva, dissociando as suas decisões das exigências ligadas aos ciclos eleitorais a que estão vinculados os titulares dos órgãos políticos. Esta ligação, que certamente permite a conexão com a procura e com as necessidades da sociedade representadas na opinião pública, constitui a principal virtude da democracia representativa, mas pode tornar‑se o seu «calcanhar de Aquiles» quando impede em matérias técnicas a adoção de uma perspetiva de longo prazo capaz de resistir às pressões dos interesses setoriais.

( 45 ) Quanto à exigência de neutralizar riscos de conflitos de interesses desta natureza através do reconhecimento da independência da ERN, v., por analogia, n.o 35 do Acórdão de 9 de março de 2010, Comissão/Alemanha (C‑518/07, EU:C:2010:125) a respeito da independência da entidade reguladora em matéria de proteção dos dados pessoais.

( 46 ) Acórdão de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.os 24 e 25).

( 47 ) Assim, por exemplo, nos termos da alínea d) do artigo 36.o da Diretiva 2009/72 e do artigo 40.o da Diretiva 2009/73, o objetivo do desenvolvimento de redes seguras, fiáveis, eficientes e não discriminatórias deve ser realizado da forma mais rentável possível e deve ser orientado para o consumidor.

( 48 ) V., a este respeito, Acórdão de 16 de julho de 2020, Comissão/Hungria (taxas de acesso às redes de transporte da eletricidade e do gás natural) (C‑771/18, EU:C:2020:584, n.o 49).

( 49 ) V., a este respeito, Acórdão de 16 de julho de 2020, Comissão/Hungria (taxas de acesso às redes de transporte da eletricidade e do gás natural) (C‑771/18, EU:C:2020:584, n.o 50).

( 50 ) V. artigo 37.o, n.os 7 e 16, da Diretiva 2009/72 e artigo 41.o, n.os 7 e 16, da Diretiva 2009/73.

( 51 ) V., a este respeito, Acórdão de 16 de julho de 2020, Comissão/Hungria (taxas de acesso às redes de transporte da eletricidade e do gás natural) (C‑771/18, EU:C:2020:584, n.os 43 e segs.).

( 52 ) Quanto ao argumento da República Federal da Alemanha, segundo o qual os critérios constantes destas disposições são aplicáveis apenas no comércio transfronteiriço ao nível das redes de transporte, argumento contestado pela Comissão, saliente-se que, mesmo que fosse esse o caso, isso não invalida que as tarifas e as respetivas metodologias de cálculo devam ser determinadas e aplicadas de forma não discriminatória e na perspetiva da criação de um mercado interno da eletricidade e do gás, de modo que a determinação das tarifas ou das respetivas metodologias de cálculo no comércio interno e transfronteiriço deve ser efetuada com base em critérios uniformes.

( 53 ) Regulamento (UE) 2017/460 da Comissão, de 16 de março de 2017, que estabelece um código de rede relativo a estruturas tarifárias harmonizadas para o transporte de gás (JO 2017, L 72, p. 29).

( 54 ) Regulamento (UE) 2016/1388 da Comissão, de 17 de agosto de 2016, que estabelece um código de rede relativo à ligação do consumo (JO 2016, L 223, p. 10).

( 55 ) Regulamento (UE) 2016/631 da Comissão, de 14 de abril de 2016, que estabelece um código de rede relativo a requisitos da ligação de geradores de eletricidade à rede (JO 2016, L 112, p. 1).

( 56 ) Regulamento (UE) 2016/1447 da Comissão, de 26 de agosto de 2016, que estabelece um código de rede relativo a requisitos de ligação à rede de sistemas de corrente contínua em alta tensão e de módulos de parque gerador ligados em corrente contínua (JO 2016, L 241, p. 1).

( 57 ) Respetivamente, no artigo 35.o, n.o 4, alínea b), ii), da Diretiva 2009/72 e no artigo 39.o, n.o 4, alínea b), ii), da Diretiva 2009/73.

( 58 ) Acórdão de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.o 52).

( 59 ) V. n.os 27 e segs. do Acórdão Comissão/Bélgica.

( 60 ) Acórdão de 3 de dezembro de 2020, Comissão/Bélgica (C‑767/19, EU:C:2020:984).

( 61 ) Nos termos do artigo 28.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de outubro de 1995, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (JO 1995, L 281, p. 31).

( 62 ) V. n.o 30 do Acórdão.

( 63 ) V., por exemplo, neste sentido, Acórdão de 3 de dezembro de 2009, Comissão/Alemanha (C‑424/07, EU:C:2009:749, n.os 80 a 83).

( 64 ) V. Acórdãos de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.o 37), e de 19 de outubro de 2016, Ormaetxea Garai e Lorenzo Almendros (C‑424/15, EU:C:2016:780, n.o 29 e jurisprudência referida).

( 65 ) V. Acórdão de 11 de junho de 2020, Prezident Slovenskej republiky (C‑378/19, EU:C:2020:462, n.o 38 e jurisprudência referida).

( 66 ) Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Conselho e Parlamento Europeu (C‑270/12, EU:C:2014:18, n.os 41 e segs.).

( 67 ) V. Acórdão Meroni, p. 41, e Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Conselho e Parlamento Europeu (C‑270/12, EU:C:2014:18, n.os 41, 42 e 54).

( 68 ) V. Acórdão Meroni, p. 41, e Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Conselho e Parlamento Europeu (C‑270/12, EU:C:2014:18, n.o 41).

( 69 ) V., neste sentido, Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Conselho e Parlamento Europeu (C‑270/12, EU:C:2014:18, n.o 44).

( 70 ) V., a este respeito, mais em pormenor, n.o141, infra.

( 71 ) V., neste sentido, Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Conselho e Parlamento Europeu (C‑270/12, EU:C:2014:18, n.o 45).

( 72 ) Acórdão de 9 de março de 2010, Comissão/Alemanha (C‑518/07, EU:C:2010:125, n.o 41).

( 73 ) Acórdão de 9 de março de 2010, Comissão/Alemanha (C‑518/07, EU:C:2010:125, n.o 42).

( 74 ) Acórdão de 9 de março de 2010, Comissão/Alemanha (C‑518/07, EU:C:2010:125, n.os 43 a 45).

( 75 ) V., a este respeito, n.os 15 e 17 do artigo 37.o da Diretiva 2009/72 e do artigo 41.o da Diretiva 2009/73.

( 76 ) V. nota 30, supra.

( 77 ) A StromNEV e a GasNEV contêm ambas uma parte (Teil 2) intitulada especificamente «Método para a determinação das tarifas de rede» que contém disposições detalhadas a respeito, entre outros, dos métodos de amortização, dos índices de preços aplicáveis, dos diferentes métodos de repartição dos custos de rede em vários tipos de rede, bem como dos limiares e parâmetros de cálculo para as diversas tarifas. Na mesma perspetiva, a ARegV contém uma lista de componentes de custos não influenciáveis ou parâmetros para a comparação da eficiência para os operadores das redes ou fórmulas detalhadas para o cálculo dos limites das receitas.

( 78 ) A esse respeito, quer a StromNZV, quer a GasNZV contêm indicações detalhadas a respeito dos acordos de interconexão entre os operadores de rede, das capacidades livremente atribuíveis e do número de mercados territoriais. Estas contêm igualmente toda uma série de disposições a respeito dos serviços de compensação.