ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção)

25 de julho de 2018 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Acordo‑quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo — Consequências de um despedimento por motivos disciplinares qualificado de “sem justa causa” — Conceito de “condições de emprego” — Trabalhador contratado a termo incerto — Diferença de tratamento entre o trabalhador permanente e o trabalhador contratado a termo certo ou a termo incerto — Reintegração do trabalhador ou atribuição de uma indemnização»

No processo C‑96/17,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Juzgado de lo Social n.o 2 de Terrassa (Tribunal do Trabalho n.o 2 de Terrassa, Espanha), por decisão de 26 de janeiro de 2017, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 22 de fevereiro de 2017, no processo

Gardenia Vernaza Ayovi

contra

Consorci Sanitari de Terrassa,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

composto por: C.G. Fernlund, presidente de secção, A. Arabadjiev (relator) e S. Rodin, juízes,

advogado‑geral: J. Kokott,

secretário: L. Carrasco Marco, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 7 de dezembro de 2017,

vistas as observações apresentadas:

em representação de G. Vernaza Ayovi, por M. Sepúlveda Gutiérrez, abogado,

em representação do Consorci Sanitari de Terrassa, por A. Bayón Cama e D. Cubero Díaz, abogados,

em representação do Governo espanhol, por A. Gavela Llopis, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por N. Ruiz García e M. van Beek, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 25 de janeiro de 2018,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro relativo a contratos de trabalho a termo, celebrado em 18 de março de 1999 (a seguir «acordo‑quadro»), que figura no anexo da Diretiva 1999/70/CE do Conselho, de 28 de junho de 1999, respeitante ao acordo‑quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo (JO 1999, L 175, p. 43), bem como do artigo 20.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe Gardenia Vernaza Ayovi ao Consorci Sanitari de Terrassa (Consórcio de Saúde de Terrassa, Espanha) a propósito do despedimento desta por motivos disciplinares.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, do acordo‑quadro:

«O presente acordo é aplicável aos trabalhadores contratados a termo ou partes numa relação laboral, nos termos definidos pela lei, convenções coletivas ou práticas vigentes em cada Estado‑Membro.»

4

O artigo 3.o do acordo‑quadro, com a epígrafe «Definições», prevê:

«1.

Para efeitos do presente acordo, entende‑se por “trabalhador contratado a termo” o trabalhador titular de um contrato de trabalho ou de uma relação laboral concluído diretamente entre um empregador e um trabalhador cuja finalidade seja determinada por condições objetivas, tais como a definição de uma data concreta, de uma tarefa específica ou de um certo acontecimento.

2.

Para efeitos do presente acordo, entende‑se por “trabalhador permanente em situação comparável” um trabalhador titular de um contrato de trabalho ou relação laboral sem termo que, na mesma empresa realize um trabalho ou uma atividade idêntico ou similar, tendo em conta as qualificações ou competências. No caso de não existir nenhum trabalhador permanente em situação comparável na mesma empresa, a comparação deverá efetuar‑se com referência à convenção coletiva aplicável ou, na sua falta, em conformidade com a legislação, convenções coletivas ou práticas nacionais.»

5

O artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro dispõe:

«No que diz respeito às condições de emprego, não poderão os trabalhadores contratados a termo receber tratamento menos favorável do que os trabalhadores permanentes numa situação comparável pelo simples motivo de os primeiros terem um contrato ou uma relação laboral a termo, salvo se razões objetivas justificarem um tratamento diferente.»

6

O artigo 5.o, n.o 2, do acordo‑quadro prevê:

«Os Estados‑Membros, após consulta dos parceiros sociais, e/ou os parceiros sociais, deverão, sempre que tal seja necessário, definirem que condições os contratos de trabalho ou relações de trabalho a termo deverão ser considerados:

a)

Como sucessivos;

b)

Como celebrados sem termo.»

Direito espanhol

7

O artigo 56.o, n.o 1, do Real Decreto Legislativo 2/2015 por el que se aprueba el texto refundido de la Ley del Estatuto de los Trabajadores (Real Decreto Legislativo 2/2015, que aprova o texto consolidado da Lei do Estatuto dos Trabalhadores), de 23 de outubro de 2015 (BOE n.o 255, de 24 de outubro de 2015), prevê:

«Quando o despedimento for declarado ilícito, o empregador, no prazo de 5 dias a contar da notificação da sentença, pode reintegrar o trabalhador na empresa ou pagar‑lhe uma indemnização equivalente a 33 dias de salário por ano de serviço, calculando‑se em duodécimos os períodos inferiores a um ano, até um máximo de 24 mensalidades. A opção pela indemnização determinará a cessação do contrato de trabalho, que produzirá efeitos na data da cessação efetiva do trabalho.»

8

O Real Decreto Legislativo 5/2015 por el que se aprueba el Texto Refundido de la Ley del Estatuto Básico del Empleado Público (Real Decreto Legislativo 5/2015, que aprova o texto consolidado da Lei do Estatuto de Base do Trabalhador do Setor Público), de 30 de outubro de 2015 (BOE n.o 261, de 31 de outubro de 2015, a seguir «Estatuto de Base do Trabalhador do Setor Público»), dispõe, no seu artigo 2.o, com a epígrafe «Âmbito de aplicação»:

«1.   O presente estatuto é aplicável aos funcionários e, quando tal se mostre adequado, aos agentes contratuais ao serviço das seguintes Administrações Públicas:

[…]

5.   O presente estatuto tem caráter supletivo para todo o pessoal das Administrações Públicas não incluído no seu âmbito de aplicação.

[…]»

9

O artigo 7.o do Estatuto de Base do Trabalhador do Setor Público, com a epígrafe, «Normas aplicáveis aos agentes contratuais», prevê:

«A situação dos agentes contratuais ao serviço das Administrações Públicas é regulada pela legislação laboral e pelas demais regras normalmente aplicáveis, bem como pelas disposições do presente estatuto que assim o prevejam.»

10

O artigo 8.o do Estatuto de Base do Trabalhador do Setor Público, com a epígrafe «Conceito e tipos de trabalhador do setor público», dispõe:

«1.   São trabalhadores do setor público as pessoas que desempenham funções remuneradas nas Administrações Públicas ao serviço do interesse geral.

2.   Os trabalhadores do setor público classificam‑se em:

a)

Funcionários de carreira.

b)

Funcionários interinos.

c)

Agentes contratuais, quer sejam permanentes, por tempo indeterminado ou temporários.

d)

Agentes temporários.»

11

O artigo 93.o do Estatuto de Base do Trabalhador do Setor Público, com a epígrafe «Responsabilidade disciplinar», dispõe:

«1.   Os funcionários públicos e os agentes contratuais estão sujeitos ao regime disciplinar estabelecido no presente título e nas leis relativas à função pública que implementam o presente Estatuto.

[…]

4.   Ao regime disciplinar dos agentes contratuais é aplicável, nas situações não previstas pelo presente título, a legislação laboral.»

12

O artigo 96.o do Estatuto de Base do Trabalhador do Setor Público, com a epígrafe «Sanções», prevê, no seu n.o 2:

«Haverá lugar à reintegração dos agentes contratuais permanentes quando o seu despedimento na sequência de um processo disciplinar por falta muito grave seja declarado ilícito.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

13

G. Vernaza Ayovi foi contratada em 30 de maio de 2006 na qualidade de enfermeira pela Fundació Sant Llàtzer (Fundação privada São Lázaro, Espanha) no âmbito de um contrato de substituição interina, isto é, um contrato temporário de substituição ou enquanto se aguarda que o posto de trabalho seja preenchido. Este contrato cessou em 14 de agosto de 2006. Em 15 de agosto de 2006, as partes celebraram um novo contrato de substituição interina, que, em 28 de dezembro de 2006, se tornou um contrato a termo incerto. Os direitos e obrigações resultantes da relação laboral foram cedidos ao Consórcio de Saúde de Terrassa.

14

Foi concedida a G. Vernaza Ayovi uma licença sem vencimento, pelo período compreendido entre 19 de julho de 2011 e 19 de julho de 2012, a qual foi renovada por duas vezes pelo período de um ano. Em 19 de junho de 2014, G. Vernaza Ayovi pediu a reintegração. O Consórcio de Saúde de Terrassa indeferiu o pedido, alegando a inexistência de um posto de trabalho disponível correspondente às suas qualificações. Em 29 de abril de 2016, G. Vernaza Ayovi renovou o seu pedido de reintegração.

15

Em 6 de maio de 2016, o Consórcio de Saúde de Terrassa enviou‑lhe um planeamento horário baseado num trabalho a tempo parcial. Uma vez que recusava um trabalho que não fosse a tempo inteiro, G. Vernaza Ayovi não se apresentou no local de trabalho e foi despedida em 15 de julho de 2016.

16

Em 26 de agosto de 2016, a recorrente no processo principal intentou uma ação no Juzgado de lo Social n.o 2 de Terrassa (Tribunal do Trabalho n.o 2 de Terrassa, Espanha) para efeitos de obter a declaração de que o despedimento fora efetuado sem justa causa e a condenação do seu empregador a reintegrá‑la em condições de trabalho idênticas às que estavam em vigor antes do seu despedimento, a pagar‑lhe a totalidade dos salários não recebidos desde a data do seu despedimento ou a pagar‑lhe a indemnização legal máxima em caso de despedimento sem justa causa.

17

Esse órgão jurisdicional considera que G. Vernaza Ayovi está abrangida pelo âmbito de aplicação do acordo‑quadro, na medida em que, por um lado, o seu contrato de trabalho só se tornou um contrato por tempo indeterminado após a celebração de dois contratos a termo certo, pelo que não está excluída uma utilização abusiva de contratos a termo, e, por outro, esta não tem o estatuto de agente contratual permanente.

18

Nestas condições, o Juzgado de lo Social n.o 2 de Terrassa (Tribunal do Trabalho n.o 2 de Terrassa) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«No âmbito da impugnação de um despedimento por motivos disciplinares de uma trabalhadora que se considera estar ao serviço das [A]dministrações [P]úblicas por tempo indeterminado[,] mas não permanente,

1)

Deve o artigo 4.o, n.o 1, [do acordo‑quadro] ser interpretado no sentido de que a resposta jurídica prevista no ordenamento jurídico para a qualificação de um despedimento por motivos disciplinares considerado ilegal e, em particular, a resposta prescrita no artigo 96.o, n.o 2, do [Estatuto de Base do Trabalhador do Setor Público] se insere no âmbito do conceito “condições de emprego”, previsto nesse artigo?

2)

Deve o artigo 4.o, n.o 1, do [acordo‑quadro] ser interpretado no sentido de que uma situação como a prevista no artigo 96.o, n.o 2, do [Estatuto de Base do Trabalhador do Setor Público], que prevê que, quando o despedimento por motivos disciplinares de um trabalhador permanente ao serviço das [A]dministrações [P]úblicas é declarado [efetuado sem justa causa] — ilegal — isso implica sempre a reintegração do trabalhador, mas que, quando se trata de [um trabalhador por tempo] indeterminado — ou não permanente — que exerce as mesmas funções de um trabalhador permanente, confere a possibilidade de não o reintegrar, contra o pagamento de uma indemnização, é discriminatória?

3)

Nas circunstâncias descritas na questão anterior, deve considerar‑se que a situação de desigualdade estaria justificada se fosse analisada à luz do artigo 20.o da [Carta], e não à luz da referida diretiva?»

Quanto às questões prejudiciais

19

Com as suas questões, que há que analisar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, segundo a qual, quando o despedimento por motivos disciplinares de um trabalhador permanente ao serviço de uma Administração Pública é declarado efetuado sem justa causa, o trabalhador em questão é obrigatoriamente reintegrado, ao passo que, na mesma hipótese, um trabalhador contratado a termo ou um trabalhador contratado a termo incerto que realiza as mesmas tarefas que esse trabalhador permanente pode não ser reintegrado e receber como contrapartida uma indemnização.

20

Com efeito, a título preliminar, há que salientar que, na medida em que a igualdade perante a lei que o artigo 20.o da Carta consagra, no que respeita aos trabalhadores contratados a termo, foi implementada pela Diretiva 1999/70, e em especial pelo artigo 4.o do acordo‑quadro que consta do anexo a esta, a situação em causa no processo principal deve ser apreciada à luz dessa diretiva e do acordo‑quadro.

21

Nos termos do artigo 1.o, alínea a), do acordo‑quadro, um dos objetivos deste é melhorar a qualidade do trabalho sujeito a contrato a termo, garantindo a aplicação do princípio da não discriminação. Do mesmo modo, no seu terceiro parágrafo, o preâmbulo do acordo‑quadro precisa que este «[a]firma ainda a vontade dos parceiros sociais [de] estabelecerem um quadro geral que garanta a igualdade de tratamento em relação aos trabalhadores contratados a termo, protegendo‑os contra discriminações». O considerando 14 da Diretiva 1999/70 indica para este efeito que o objetivo do acordo‑quadro consiste, nomeadamente, em melhorar a qualidade do trabalho com contrato a termo, fixando prescrições mínimas suscetíveis de garantir a aplicação do princípio da não discriminação (Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 36 e jurisprudência referida).

22

O acordo‑quadro, em especial o seu artigo 4.o, destina‑se a aplicar o referido princípio aos trabalhadores contratados a termo, com vista a impedir que uma relação laboral desta natureza seja utilizada por um empregador para privar estes trabalhadores dos direitos que são reconhecidos aos trabalhadores com contratos sem termo (Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 37 e jurisprudência referida).

23

Tendo em conta os objetivos prosseguidos pelo acordo‑quadro, o seu artigo 4.o deve ser entendido no sentido de que exprime um princípio de direito social da União que não pode ser interpretado de modo restritivo (Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 38 e jurisprudência referida).

24

Importa recordar que o artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro estabelece, no que respeita às condições de trabalho, uma proibição de tratar os trabalhadores contratados a termo de uma maneira menos favorável do que os trabalhadores contratados por tempo indeterminado numa situação comparável, pela simples razão de aqueles trabalharem ao abrigo de um contrato a termo, salvo se razões objetivas justificarem um tratamento diferente.

25

No caso em apreço, importa recordar, em primeiro lugar, que o órgão jurisdicional nacional afirma que, segundo os critérios do direito nacional, um contrato de trabalho como o de G. Vernaza Ayovi deve ser considerado um contrato de trabalho a termo.

26

Deve, assim, considerar‑se que uma trabalhadora como G. Vernaza Ayovi tem a qualidade de «trabalhador contratado a termo» na aceção do artigo 3.o, n.o 1, do acordo‑quadro e, por conseguinte, está abrangida pelo âmbito de aplicação deste.

27

Em segundo lugar, no que respeita ao conceito de «condições de emprego» na aceção do artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro, o critério decisivo para determinar se uma medida se enquadra neste conceito é precisamente o do emprego, isto é, a relação laboral estabelecida entre um trabalhador e o seu empregador (Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 41 e jurisprudência referida).

28

A este respeito, o Tribunal de Justiça já considerou que estão abrangidas por este conceito, designadamente, as regras relativas à determinação do prazo de pré‑aviso aplicável em caso de rescisão dos contratos de trabalho a termo, bem como as relativas à indemnização atribuída ao trabalhador devido à resolução do contrato de trabalho que o vincula ao seu empregador, uma vez que essa indemnização é paga devido à relação laboral que se constituiu entre estes (Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.os 42, 44 e 45).

29

Com efeito, uma interpretação do artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro que exclua da definição do referido conceito os requisitos de rescisão de um contrato de trabalho a termo equivaleria a, contrariando o objetivo atribuído à referida disposição, reduzir o âmbito de aplicação da proteção contra discriminações concedida aos trabalhadores com contratos a termo (Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 43 e jurisprudência referida).

30

Ora, estas considerações são integralmente transponíveis para o regime de reintegração em causa no processo principal, de que beneficia o trabalhador permanente em caso de despedimento por motivos disciplinares qualificado de «sem justa causa», uma vez que este regime tem como razão de ser a relação laboral que se constituiu entre este trabalhador e o seu empregador.

31

Daqui decorre que uma medida nacional como a que está em causa no processo principal se enquadra no conceito de «condições de emprego», na aceção do artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro.

32

Em terceiro lugar, importa recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o princípio da não discriminação, do qual o artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro constitui uma expressão particular, exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de modo igual, exceto se esse tratamento for objetivamente justificado (Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 46 e jurisprudência referida).

33

A este respeito, o princípio da não discriminação foi aplicado e concretizado pelo acordo‑quadro unicamente no que se refere às diferenças de tratamento entre os trabalhadores contratados a termo e os trabalhadores contratados por tempo indeterminado que se encontrem numa situação comparável (Acórdãos de 14 de setembro de 2016, de Diego Porras, C‑596/14, EU:C:2016:683, n.o 37, e de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 47).

34

Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, para apreciar se as pessoas interessadas exercem um trabalho idêntico ou similar na aceção do acordo‑quadro, cumpre, em conformidade com os seus artigos 3.o, n.o 2, e 4.o, n.o 1, averiguar se, atendendo a uma globalidade de fatores, como a natureza do trabalho, as condições de formação e as condições de trabalho, se pode considerar que estas pessoas se encontram numa situação comparável (Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 48 e jurisprudência referida).

35

No caso em apreço, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio, que tem competência exclusiva para apreciar os factos, determinar se G. Vernaza Ayovi se encontrava numa situação comparável à dos trabalhadores permanentes contratados pelo mesmo empregador no mesmo período (v., por analogia, Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 49 e jurisprudência referida).

36

Além disso, é facto assente que existe uma diferença de tratamento entre os trabalhadores permanentes e os trabalhadores não permanentes, como G. Vernaza Ayovi, no que diz respeito às consequências decorrentes de um eventual despedimento sem justa causa.

37

Por conseguinte, sem prejuízo da apreciação definitiva pelo órgão jurisdicional de reenvio da comparabilidade da situação de um trabalhador não permanente, como G. Vernaza Ayovi, e a de um trabalhador permanente à luz de todos os elementos pertinentes, importa verificar se há uma razão objetiva que justifique esse tratamento diferente.

38

A este respeito, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o conceito de «razões objetivas», na aceção do artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro, deve ser entendido no sentido de que não permite justificar uma diferença de tratamento entre os trabalhadores contratados a termo e os trabalhadores contratados por tempo indeterminado pelo facto de essa diferença estar prevista numa norma geral e abstrata, como uma lei ou uma convenção coletiva (Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 53 e jurisprudência referida).

39

Segundo jurisprudência igualmente constante, o referido conceito exige que a desigualdade de tratamento em causa seja justificada pela existência de elementos precisos e concretos, que caracterizem a condição de emprego em questão, no contexto específico no qual esta se insere e com base em critérios objetivos e transparentes, a fim de verificar se esta desigualdade responde a uma real necessidade, é apta para atingir o objetivo prosseguido e necessária para esse efeito. Os referidos elementos podem resultar, nomeadamente, da natureza particular das tarefas para cuja realização esses contratos a termo foram celebrados e das características inerentes a essas tarefas ou, eventualmente, da prossecução de um objetivo legítimo de política social de um Estado‑Membro (Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 54 e jurisprudência referida).

40

A este respeito, resulta dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe e das respostas às perguntas do Tribunal de Justiça na audiência que a regra geral aplicável em caso de despedimento qualificado de «sem justa causa» ou «ilícito» prevê que o empregador pode optar entre a reintegração ou a indemnização do trabalhador em causa.

41

Além disso, só por exceção à referida regra geral é que os trabalhadores permanentes ao serviço das Administrações Públicas cujo despedimento por motivos disciplinares seja declarado efetuado sem justa causa devem obrigatoriamente ser reintegrados.

42

O Governo espanhol alega que esta diferença de tratamento é justificada à luz das modalidades de recrutamento desta última categoria de trabalhadores e do contexto específico em que ocorre o seu recrutamento. A garantia de reintegração em causa está, assim, indissociavelmente ligada ao sistema de acesso aos empregos permanentes. Com efeito, o Estatuto de Base do Trabalhador do Setor Público prevê que o sistema de recrutamento dos agentes contratuais permanentes reveste um caráter seletivo que, a fim de respeitar os princípios da igualdade e de reconhecimento do mérito e da capacidade no acesso ao emprego público, deve incluir uma ou mais provas que visem avaliar a capacidade dos candidatos e estabelecer a sua classificação, ou resultar de um processo de avaliação do mérito dos candidatos. Com a reintegração automática em caso de despedimento declarado efetuado sem justa causa, o legislador espanhol visa proteger os trabalhadores permanentes na Administração Pública, respeitando os princípios da igualdade, do reconhecimento do mérito e da aptidão, bem como a publicidade.

43

O Governo espanhol alegou a este respeito que a manutenção em funções constitui um imperativo decorrente da aprovação num concurso de acesso à Administração Pública e que a aprovação num concurso deste tipo justifica conceder mais garantias ao pessoal permanente, como o direito de permanência no emprego, do que ao pessoal contratado a termo certo ou incerto.

44

Segundo este Governo, no caso dos agentes permanentes, a reintegração obrigatória garante, assim, essa estabilidade do emprego, tendo em conta os princípios consagrados pela Constituição espanhola, ao passo que, no caso do pessoal não permanente, a manutenção em funções não constitui um elemento determinante da relação laboral, pelo que, nesse caso, o legislador não considerou conveniente privar a administração empregadora da faculdade de optar entre a reintegração do trabalhador cujo despedimento por motivos disciplinares seja declarado efetuado sem justa causa e a atribuição de uma indemnização ao mesmo.

45

Esta diferença inerente às modalidades de recrutamento tem como efeito, segundo as explicações do Governo espanhol, que o agente contratual permanente, que não é funcionário, mas que ainda assim foi aprovado num processo de seleção conforme com os princípios da igualdade e do reconhecimento do mérito e da capacidade, pode beneficiar dessa garantia de permanência que constitui uma exceção ao regime geral do direito do trabalho.

46

Há que considerar que, embora a diferença de tratamento em causa não possa ser justificada pelo interesse público ligado, em si, às modalidades de recrutamento dos trabalhadores permanentes, não deixa de ser verdade que considerações decorrentes das características do direito da função pública nacional, como as recordadas nos n.os 42 a 44 do presente acórdão, podem justificar essa diferença de tratamento. A este respeito, as considerações de imparcialidade, de eficácia e de independência da administração implicam uma certa permanência e estabilidade de emprego. Estas considerações, que não têm equivalente no direito do trabalho geral, explicam e justificam os limites ao poder de resolução unilateral dos empregadores públicos e, por consequência, a escolha da legislação nacional de não lhes conceder a faculdade de optar entre reintegração e indemnização do prejuízo sofrido devido a um despedimento sem justa causa.

47

Por conseguinte, há que considerar que a reintegração automática dos trabalhadores permanentes se insere num contexto sensivelmente diferente, do ponto de vista factual e jurídico, daquele em que se encontram os trabalhadores não permanentes (v., por analogia, Acórdão de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility, C‑574/16, EU:C:2018:390, n.o 56).

48

Nestas condições, cabe observar que a desigualdade de tratamento verificada é justificada pela existência de elementos precisos e concretos, que caracterizam a condição de emprego em questão, no contexto parcial em que esta se insere e com base em critérios objetivos e transparentes, na aceção da jurisprudência recordada no n.o 39 do presente acórdão.

49

Tendo em conta todo o exposto, há que responder às questões que o artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, segundo a qual, quando o despedimento por motivos disciplinares de um trabalhador permanente ao serviço de uma Administração Pública é declarado efetuado sem justa causa, o trabalhador em causa é obrigatoriamente reintegrado, ao passo que, na mesma hipótese, um trabalhador contratado a termo certo ou a termo incerto que realiza as mesmas tarefas que esse trabalhador permanente pode não ser reintegrado e receber como contrapartida uma indemnização.

Quanto às despesas

50

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sexta Secção) declara:

 

O artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro relativo a contratos de trabalho a termo, celebrado em 18 de março de 1999, que figura no anexo da Diretiva 1999/70/CE do Conselho, de 28 de junho de 1999, respeitante ao acordo‑quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, segundo a qual, quando o despedimento por motivos disciplinares de um trabalhador permanente ao serviço de uma Administração Pública é declarado efetuado sem justa causa, o trabalhador em causa é obrigatoriamente reintegrado, ao passo que, na mesma hipótese, um trabalhador contratado a termo certo ou a termo incerto que realiza as mesmas tarefas que esse trabalhador permanente pode não ser reintegrado e receber como contrapartida uma indemnização.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.