ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

31 de maio de 2018 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num Estado‑Membro por um nacional de um país terceiro — Procedimentos de tomada e de retomada a cargo — Artigo 26.o, n.o 1 — Adoção e notificação da decisão de transferência antes da aceitação do pedido para efeitos de retomada a cargo pelo Estado‑Membro requerido»

No processo C‑647/16,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo tribunal administratif de Lille (Tribunal Administrativo de Lille, França), por decisão de 1 de dezembro de 2016, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 15 de dezembro de 2016, no processo

Adil Hassan

contra

Préfet du Pas‑de‑Calais,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: M. Ilešič (relator), presidente de secção, A. Rosas, C. Toader, A. Prechal e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

considerando as observações apresentadas:

em representação do Governo francês, por D. Colas, E. de Moustier e E. Armoet, na qualidade de agentes,

em representação do Governo húngaro, por M. Z. Fehér, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por M. Condou‑Durande, na qualidade de agente,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 20 de dezembro de 2017,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida (JO 2013, L 180, p. 31, a seguir «Regulamento Dublim III»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe Adil Hassan, nacional iraquiano, ao préfet du Pas‑de‑Calais (prefeito de Pas‑de‑Calais, França), a propósito da legalidade da decisão que ordena a sua transferência para a Alemanha.

Quadro jurídico

Direito da União

Regulamento (UE) n.o 603/2013

3

Nos termos do considerando 4 do Regulamento (UE) n.o 603/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo à criação do sistema «Eurodac» de comparação de impressões digitais para efeitos da aplicação efetiva do Regulamento (UE) n.o 604/2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou um apátrida, e de pedidos de comparação com os dados Eurodac apresentados pelas autoridades responsáveis dos Estados‑Membros e pela Europol para fins de aplicação da lei e que altera o Regulamento (UE) n.o 1077/2011 que cria uma Agência europeia para a gestão operacional de sistemas informáticos de grande escala no espaço de liberdade, segurança e justiça (JO 2013, L 180, p. 1):

«Para efeitos da aplicação do Regulamento [Dublim III] é necessário determinar a identidade dos requerentes de proteção internacional e das pessoas intercetadas por ocasião da passagem ilegal das fronteiras externas da União. Para efeitos da aplicação do Regulamento [Dublim III], nomeadamente do artigo 18.o, n.o 1, alíneas b) e d), é igualmente desejável que qualquer Estado‑Membro possa verificar se um nacional de país terceiro ou apátrida encontrado em situação irregular no seu território apresentou um pedido de proteção internacional noutro Estado‑Membro.»

4

O artigo 1.o, n.o 1, do Regulamento n.o 603/2013 prevê:

«É criado um sistema designado por “Eurodac”, cujo objetivo consiste em ajudar a determinar o Estado‑Membro responsável nos termos do Regulamento [Dublim III] pela análise de um pedido de proteção internacional, apresentado num Estado‑Membro por um nacional de país terceiro ou um apátrida, e em facilitar a aplicação do Regulamento [Dublim III] nos termos do presente regulamento.»

5

O artigo 9.o, n.o 1, do Regulamento n.o 603/2013 enuncia:

«Cada Estado‑Membro recolhe sem demora as impressões digitais de todos os dedos de cada requerente de proteção internacional com, pelo menos, 14 anos de idade e transmite‑as o mais rapidamente possível e no prazo de 72 horas a contar da apresentação do pedido de proteção internacional, tal como definido no artigo 20.o, n.o 2, do Regulamento [Dublim III] […].»

Regulamento Dublim III

6

Os considerandos 4, 5, 9 e 19 do Regulamento Dublim III enunciam:

«(4)

As conclusões do Conselho [Europeu, na sua reunião especial] de Tampere [em 15 e 16 de outubro de 1999,] precisaram igualmente que o [sistema europeu comum de asilo] deverá incluir, a curto prazo, um método claro e operacional para determinar o Estado‑Membro responsável pela análise dos pedidos de asilo.

(5)

Este método deverá basear‑se em critérios objetivos e equitativos, tanto para os Estados‑Membros como para as pessoas em causa. Deverá, permitir, nomeadamente, uma determinação rápida do Estado‑Membro responsável, por forma a garantir um acesso efetivo aos procedimentos de concessão de proteção internacional e a não comprometer o objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional.

[…]

(9)

Tendo em conta os resultados das avaliações efetuadas aos instrumentos da primeira fase, é conveniente, nesta ocasião, confirmar os princípios consagrados no Regulamento [(CE) n.o 343/2003 do Conselho, de 18 de fevereiro de 2003, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise e um pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro (JO 2003, L 50, p. 1)], ao mesmo tempo que se introduzem as melhorias necessárias, identificadas com base na experiência adquirida, para aumentar a eficácia do sistema de Dublim e a proteção concedida aos requerentes ao abrigo desse sistema. […]

[…]

(19)

A fim de garantir a proteção efetiva dos direitos das pessoas em causa, deverão ser previstas garantias legais e o direito efetivo de recurso contra as decisões de transferência para o Estado‑Membro responsável, nos termos, nomeadamente, do artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. A fim de garantir o respeito do direito internacional, o direito efetivo de recurso contra essas decisões deverá abranger a análise da aplicação do presente regulamento e da situação jurídica e factual no Estado‑Membro para o qual o requerente é transferido.»

7

O artigo 3.o do Regulamento Dublim III, sob a epígrafe «Acesso ao procedimento de análise de um pedido de proteção internacional», dispõe, no seu n.o 1:

«Os Estados‑Membros analisam todos os pedidos de proteção internacional apresentados por nacionais de países terceiros ou por apátridas no território de qualquer Estado‑Membro, inclusive na fronteira ou nas zonas de trânsito. Os pedidos são analisados por um único Estado‑Membro, que será aquele que os critérios enunciados no capítulo III designarem como responsável.»

8

O artigo 5.o do referido regulamento prevê:

«1.   A fim de facilitar o processo de determinação do Estado‑Membro responsável, o Estado‑Membro que procede à determinação realiza uma entrevista pessoal com o requerente. […]

2.   A realização da entrevista pode ser dispensada se:

[…]

b)

Depois de ter recebido as informações referidas no artigo 4.o, o requerente já tiver prestado por outros meios as informações necessárias para determinação do Estado‑Membro responsável. Se a realização da entrevista for dispensada, o Estado‑Membro deve dar ao requerente a oportunidade de apresentar novas informações relevantes para se proceder corretamente à determinação do Estado‑Membro responsável antes de ser adotada uma decisão de transferência do requerente para o Estado‑Membro responsável nos termos do artigo 26.o, n.o 1.

3.   A entrevista pessoal deve realizar‑se em tempo útil e, de qualquer forma, antes de ser adotada qualquer decisão de transferência do requerente para o Estado‑Membro responsável nos termos do artigo 26.o, n.o 1.

[…]»

9

O artigo 18.o deste regulamento, sob a epígrafe «Obrigações do Estado‑Membro responsável», enuncia, no seu n.o 1:

«O Estado‑Membro responsável por força do presente regulamento é obrigado a:

a)

Tomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 21.o, 22.o e 29.o, o requerente que tenha apresentado um pedido noutro Estado‑Membro;

b)

Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o, o requerente cujo pedido esteja a ser analisado e que tenha apresentado um pedido noutro Estado‑Membro, ou que se encontre no território de outro Estado‑Membro sem possuir um título de residência;

c)

Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o, o nacional de um país terceiro ou o apátrida que tenha retirado o seu pedido durante o processo de análise e que tenha formulado um pedido noutro Estado‑Membro, ou que se encontre no território de outro Estado‑Membro sem possuir um título de residência;

d)

Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o, o nacional de um país terceiro ou o apátrida cujo pedido tenha sido indeferido e que tenha apresentado um pedido noutro Estado‑Membro, ou que se encontre no território de outro Estado‑Membro sem possuir um título de residência.»

10

Nos termos do artigo 19.o do Regulamento Dublim III:

«1.   Se um Estado‑Membro conceder um título de residência ao requerente, as obrigações previstas no artigo 18.o, n.o 1, são transferidas para esse Estado‑Membro.

2.   As obrigações previstas no artigo 18.o, n.o 1, cessam se o Estado‑Membro responsável puder comprovar, quando lhe for solicitado para tomar ou retomar a cargo um requerente ou outra pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas c) ou d), que a pessoa em causa abandonou o território dos Estados‑Membros durante um período mínimo de três meses, a menos que seja titular de um título de residência válido emitido pelo Estado‑Membro responsável.

[…]

3.   As obrigações previstas no artigo 18.o, n.o 1, alíneas c) e d), cessam se o Estado‑Membro responsável puder comprovar, quando lhe for solicitado para retomar a cargo um requerente ou outra pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas c) ou d), que a pessoa em causa abandonou o território dos Estados‑Membros em conformidade com uma decisão de regresso ou uma medida de afastamento emitida na sequência da retirada ou do indeferimento do pedido.

[…]»

11

Nos termos do artigo 21.o, n.o 1, primeiro parágrafo, deste regulamento:

«O Estado‑Membro ao qual tenha sido apresentado um pedido de proteção internacional e que considere que a responsabilidade pela análise desse pedido cabe a outro Estado‑Membro pode requerer a este último, o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de três meses a contar da apresentação do pedido na aceção do artigo 20.o, n.o 2, que proceda à tomada a cargo do requerente.»

12

O artigo 22.o do referido regulamento prevê:

«1.   O Estado‑Membro requerido procede às verificações necessárias e delibera sobre o pedido, para efeitos de tomada a cargo dum requerente, no prazo de dois meses a contar da data de receção do pedido.

[…]

7.   A ausência de resposta no termo do prazo de dois meses mencionado no n.o 1 e de um mês, previsto no n.o 6, equivale à aceitação do pedido e tem como consequência a obrigação de tomada a carg[o] da pessoa, incluindo a obrigação de tomar as providências adequadas para a sua chegada.»

13

Nos termos do artigo 24.o deste regulamento:

«1.   Se o Estado‑Membro em cujo território se encontre, sem possuir um título de residência, a pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), e em que não foi apresentado nenhum novo pedido de proteção internacional, considerar que o Estado‑Membro responsável é outro, nos termos do artigo 20.o, n.o 5, e do artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c), ou d), pode solicitar a esse outro Estado‑Membro que retome essa pessoa a seu cargo.

2.   Em derrogação do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular [(JO 2008, L 348, p. 98)], se o Estado‑Membro, em cujo território se encontre, sem possuir um título de residência, a pessoa, decidir pesquisar o sistema Eurodac nos termos do artigo 17.o do Regulamento (UE) n.o 603/2013, o pedido de retomada a cargo de uma pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b) ou c) do presente regulamento, ou de uma pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alínea d), cujo pedido de proteção internacional não tenha sido indeferido por decisão definitiva, é apresentado o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de dois meses após a receção do acerto do Eurodac […].

[…]

5.   Os pedidos de retomada a cargo de uma pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), são feitos num formulário‑tipo e devem conter as provas ou indícios descritos nas duas listas a que se refere o artigo 22.o, n.o 3, e/ou os elementos relevantes das declarações da pessoa em causa, que permitam às autoridades do Estado‑Membro requerido verificar se é responsável, com base nos critérios definidos no presente regulamento;

[…]»

14

O artigo 25.o do Regulamento Dublim III prevê:

«1.   O Estado‑Membro requerido procede às verificações necessárias e toma uma decisão sobre o pedido de retomar a pessoa em causa a cargo o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, dentro do prazo de um mês a contar da data em que o pedido foi recebido. Quando o pedido se baseie em dados obtidos através do sistema Eurodac, o prazo é reduzido para duas semanas.

2.   A falta de uma decisão no prazo de um mês ou no prazo de duas semanas referidos no n.o 1 equivale à aceitação do pedido, e tem como consequência a obrigação de retomar a pessoa em causa a cargo, incluindo a obrigação de tomar as providências adequadas para a sua chegada.»

15

O artigo 26.o deste regulamento, sob a epígrafe «Notificação de uma decisão de transferência», dispõe:

«1.   Caso o Estado‑Membro requerido aceite a tomada ou retomada a cargo de um requerente ou de outra pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas c) ou d), o Estado‑Membro requerente deve notificar a pessoa em causa da decisão da sua transferência para o Estado‑Membro responsável e, se for caso disso, da decisão de não analisar o seu pedido de proteção internacional. […]

2.   A decisão a que se refere o n.o 1 deve conter informações sobre as vias de recurso disponíveis, nomeadamente sobre o direito de requerer o efeito suspensivo, se necessário, e sobre os prazos aplicáveis para as utilizar, indicações precisas sobre os prazos para a execução da transferência, incluindo se necessário informações relativas ao local e à data em que a pessoa em causa se deve apresentar no caso de se dirigir para o Estado‑Membro responsável pelos seus próprios meios.

[…]»

16

O artigo 27.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Vias de recurso», tem a seguinte redação:

«1.   O requerente ou outra pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas c) ou d), tem direito a uma via de recurso efetiva, sob a forma de recurso ou de pedido de revisão, de facto e de direito, da decisão de transferência, para um órgão jurisdicional.

2.   Os Estados‑Membros devem prever um período de tempo razoável para a pessoa em causa poder exercer o seu direito de recurso nos termos do n.o 1.

3.   Para efeitos de recursos ou de pedidos de revisão de decisões de transferência, os Estados‑Membros devem prever na sua legislação nacional que:

a)

O recurso ou o pedido de revisão confira à pessoa em causa o direito de permanecer no Estado‑Membro em causa enquanto se aguarda o resultado do recurso ou da revisão; ou

b)

A transferência seja automaticamente suspensa e que essa suspensão termine após um período razoável, durante o qual um órgão jurisdicional, após exame minucioso e rigoroso, deve tomar uma decisão sobre o efeito suspensivo de um recurso ou de um pedido de revisão; ou

c)

A pessoa em causa tenha a possibilidade de dentro de um prazo razoável requerer junto do órgão jurisdicional a suspensão da execução da decisão de transferência enquanto de aguarda o resultado do recurso ou do pedido de revisão. Os Estados‑Membros devem garantir a possibilidade de uma via de recurso, suspendendo o processo de transferência até que seja adotada a decisão sobre o primeiro pedido de suspensão. […]

4.   Os Estados‑Membros podem prever que as autoridades competentes possam decidir, a título oficioso, suspender a execução da decisão de transferência enquanto se aguarda o resultado do recurso ou da revisão.

[…]»

17

O artigo 28.o deste regulamento, sob a epígrafe «Retenção», enuncia:

«1.   Os Estados‑Membros não devem manter uma pessoa em regime de detenção pelo simples facto de essa pessoa estar sujeita ao procedimento estabelecido pelo presente regulamento.

2.   Caso exista um risco importante de que uma pessoa fuja, os Estados‑Membros podem reter essa pessoa a fim de garantir os procedimentos de transferência de acordo com o presente regulamento se existir um risco significativo de fuga, com base numa apreciação individual e apenas na medida em que a retenção seja proporcional, se não for possível aplicar de forma eficaz outras medidas alternativas menos coercivas.

3.   A retenção deve ser o mais curta possível, não devendo exceder o tempo razoavelmente necessário para cumprir, com a diligência devida, as formalidades administrativas requeridas até que seja efetuada a transferência ao abrigo do presente regulamento.

Se a pessoa estiver retida nos termos do presente artigo, o prazo para a apresentação de um pedido de tomada ou retomada a cargo não deve ser superior a um mês a contar da apresentação do pedido. Nesses casos, o Estado‑Membro que conduz o procedimento de acordo com o presente regulamento solicita uma resposta urgente ao pedido. A resposta deve ser dada no prazo de duas semanas a contar da receção do pedido. A falta de resposta no prazo de duas semanas equivale à aceitação do pedido e tem como consequência a obrigação de tomada ou retomada a cargo da pessoa, incluindo a obrigação de tomar as providências adequadas para a sua chegada.

[…]»

18

O artigo 29.o, n.os 1 e 2, do Regulamento Dublim III prevê:

«1.   A transferência do requerente ou de outra pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas c) ou d), do Estado‑Membro requerente para o Estado‑Membro responsável efetua‑se em conformidade com o direito nacional do Estado‑Membro requerente, após concertação entre os Estados‑Membros envolvidos, logo que seja materialmente possível e, o mais tardar, no prazo de seis meses a contar da aceitação do pedido de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa por outro Estado‑Membro ou da decisão final sobre o recurso ou revisão, nos casos em que exista efeito suspensivo nos termos do artigo 27.o, n.o 3.

[…]

2.   Se a transferência não for executada no prazo de seis meses, o Estado‑Membro responsável fica isento da sua obrigação de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa, e a responsabilidade é transferida para o Estado‑Membro requerente. Este prazo pode ser alargado para um ano, no máximo, se a transferência não tiver sido efetuada devido a retenção da pessoa em causa, ou para 18 meses, em caso de fuga.»

Regulamento (CE) n.o 1560/2003

19

O artigo 4.o do Regulamento (CE) n.o 1560/2003 da Comissão, de 2 de setembro de 2003, relativo às modalidades de aplicação do Regulamento (CE) n.o 343/2003 do Conselho, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro (JO 2003, L 222, p. 3, a seguir «regulamento de execução»), sob a epígrafe «Tratamento de um pedido para efeitos de retomada a cargo», prevê:

«Quando um pedido para efeitos de retomada a cargo se baseia em dados fornecidos pela Unidade Central da Eurodac e verificados pelo Estado‑Membro requerente […], o Estado‑Membro requerido reconhece a sua responsabilidade, exceto se as verificações a que tenha procedido demonstrarem que a sua responsabilidade cessou por força do [artigo 20.o, n.o 5, segundo parágrafo, ou do artigo 19.o, n.os 1, 2 ou 3, do Regulamento Dublim III]. A cessação da responsabilidade por força destas disposições apenas pode ser invocada com base em elementos de prova materiais ou declarações circunstanciadas e verificáveis do requerente de asilo.»

20

Em conformidade com o artigo 6.o do regulamento de execução, sob a epígrafe «Resposta positiva»:

«Quando o Estado‑Membro reconhece a sua responsabilidade, a resposta deve mencionar tal facto, especificando qual a disposição do [Regulamento Dublim III] em que se baseia para o efeito, e comportar as indicações úteis para a organização ulterior da transferência, tais como, nomeadamente, os dados relativos ao serviço ou pessoa a contactar.»

Direito francês

21

O artigo L. 512‑1, ponto III, primeiro parágrafo, do code de l’entrée et du séjour des étrangers et du droit d’asile (Código de entrada e permanência dos estrangeiros e do direito de asilo), na sua versão em vigor à data dos factos no processo (a seguir «Ceseda»), enuncia:

«Em caso de colocação em detenção, nos termos do artigo L. 551‑1, o estrangeiro pode pedir ao presidente do tribunal administrativo a anulação da obrigação de abandonar o território francês, da decisão que recusa um prazo de partida voluntária, da decisão que refere o país de destino e da decisão de proibição de regresso ao território francês ou de proibição de circulação no território francês que a acompanham, se for caso disso, no prazo de quarenta e oito horas após a sua notificação, quando essas decisões forem notificadas com a decisão de detenção. […]»

22

O artigo 551‑1, primeiro parágrafo, deste código tem a seguinte redação:

«Nos casos previstos nos pontos 1 a 7 do n.o I do artigo L. 561‑2, o estrangeiro que não apresente garantias de representação adequadas para prevenir o risco mencionado no ponto 3 do n.o II do artigo L. 511‑1 pode ser retido pela autoridade administrativa […] por um período de quarenta e oito horas.»

23

O artigo L. 561‑2, n.o I, do referido código prevê:

«A autoridade administrativa pode adotar uma decisão de prisão domiciliária em relação ao estrangeiro que não pode abandonar imediatamente o território francês, mas cujo afastamento continua a ser razoável, quando este estrangeiro:

1.o

Deva ser apresentado às autoridades competentes de um Estado‑Membro da União Europeia […] ou ser objeto de uma decisão de transferência em aplicação do artigo L. 742‑3;

[…]

7.o

Tendo sido objeto de uma decisão de prisão domiciliária em aplicação dos n.os 1 a 6 do presente artigo ou de colocação em detenção administrativa […], não tenha cumprido a medida de afastamento que lhe foi aplicada ou, tendo cumprido, tenha regressado à França apesar de esta medida ter ainda força executória.

[…]»

24

O artigo L. 742‑1, primeiro parágrafo, do Ceseda, que figura no capítulo II, sob a epígrafe «Procedimento de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de asilo», do livro VII deste código, por sua vez sob a epígrafe «O direito de asilo», dispõe:

«Quando a autoridade administrativa considerar que a apreciação de um pedido de asilo é da competência de outro Estado a que tenciona dirigir‑se, o estrangeiro beneficia do direito de se manter no território francês até ao termo do procedimento de determinação do Estado responsável pela apreciação do seu pedido e, sendo o caso, até à sua transferência efetiva para esse Estado. […]»

25

O artigo L. 742‑3, do referido código enuncia:

«Sem prejuízo do disposto no segundo parágrafo do artigo L. 742‑1, o estrangeiro que apresente um pedido de asilo cuja apreciação seja da responsabilidade de outro Estado pode ser transferido para o Estado responsável por essa apreciação.

Qualquer decisão de transferência é objeto de uma decisão escrita fundamentada tomada pela autoridade administrativa.

Esta decisão é notificada ao interessado. Deve referir as vias e os prazos de recurso, assim como o direito de avisar ou de fazer avisar o seu consulado, um conselheiro ou qualquer pessoa da sua escolha. […]»

26

O artigo L. 742‑4, n.o I, do Ceseda prevê:

«O estrangeiro destinatário de uma decisão de transferência referida no artigo L. 742‑3 pode, no prazo de quinze dias a contar da notificação desta decisão, pedir a sua anulação ao presidente do tribunal administrativo.

O presidente ou o magistrado designado para o efeito […] decide no prazo de quinze dias a contar da data em que o pedido lhe foi apresentado.

[…]»

27

Nos termos do artigo L. 742‑5 deste código:

«Os artigos L. 551‑1 e L. 561‑2 são aplicáveis ao estrangeiro destinatário de uma decisão de transferência a partir da notificação dessa decisão.

A decisão de transferência não pode ser objeto de execução oficiosa nem antes do termo do prazo de quinze dias nem, se a decisão de transferência tiver sido notificada com a decisão de colocação em detenção tomada em aplicação do artigo L. 551‑1 ou de prisão domiciliária tomada nos termos do artigo L. 561‑2, antes do termo de um prazo de quarenta e oito horas, nem antes de o tribunal administrativo ter deliberado, se este tiver sido chamado a pronunciar‑se.»

Litígio no processo principal e questão prejudicial

28

Adil Hassan foi detido em 26 de novembro de 2016 pelos serviços da polícia aérea e das fronteiras de Pas‑de‑Calais (França) na zona de acesso restrito do terminal do porto de Calais (França). Uma pesquisa no sistema Eurodac por estes serviços revelou que as suas impressões digitais tinham sido recolhidas pelas autoridades alemãs em 7 de novembro e 14 de dezembro de 2015 e que tinha solicitado, nesse momento, a proteção internacional na Alemanha, sem, no entanto, apresentar esse pedido em França.

29

No mesmo dia desta detenção e desta consulta do sistema Eurodac, o prefeito de Pas‑de‑Calais apresentou às autoridades alemãs um pedido de retomada a cargo de A. Hassan e decidiu, ao mesmo tempo, transferi‑lo para a Alemanha e colocá‑lo em detenção administrativa. Esta decisão foi notificada a A. Hassan na mesma data.

30

A. Hassan contestou a medida de colocação em detenção administrativa perante o juge des libertés et de la détention do tribunal de grande instance de Lille (juiz competente em matéria de liberdades e de detenção do Tribunal de Primeira Instância de Lille, França) com base no artigo L. 512‑1, n.o III, do Ceseda. Por decisão de 29 de novembro de 2016, esse juiz ordenou o levantamento desta medida.

31

Além disso, A. Hassan interpôs, no tribunal administratif de Lille (Tribunal Administrativo de Lille, França), um recurso suspensivo da decisão de 26 de novembro de 2016 na parte em que ordena a sua transferência para a Alemanha.

32

No âmbito deste último recurso, A. Hassan alega, designadamente, que esta decisão viola o artigo 26.o do Regulamento Dublim III, uma vez que foi tomada e lhe foi notificada antes mesmo de o Estado‑Membro requerido, neste caso a República Federal da Alemanha, ter expressa ou implicitamente respondido ao pedido das autoridades francesas para efeitos da sua retomada a cargo.

33

O prefeito de Pas‑de‑Calais sustenta, por sua vez, que nem o artigo 26.o nem qualquer outra disposição de direito nacional o impedem de tomar, desde a colocação em detenção, uma decisão de transferência e de a notificar ao interessado, uma vez que este último dispõe das vias de recurso previstas no artigo 27.o do Regulamento Dublim III. Em conformidade com o direito nacional, o prefeito teria mesmo sido obrigado, para poder proceder à colocação em detenção de A. Hassan, a tomar previamente uma decisão de transferência, sem aguardar a resposta do Estado‑Membro requerido. De qualquer modo, a transferência não pode ser efetuada enquanto o Estado‑Membro requerido não tiver aceitado retomar a cargo o interessado.

34

A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio observa que o prefeito de Pas‑de‑Calais não era obrigado a tomar a decisão de transferência para poder colocar A. Hassan em detenção administrativa, uma vez que essa detenção está prevista no artigo 28.o do Regulamento Dublim III, que é de aplicação direta. Contudo, reconhece que o direito nacional em que se apoiou o prefeito para adotar a referida decisão de transferência não proibia a adoção dessa decisão juntamente com a decisão de colocação em detenção. Assim, interroga‑se sobre a compatibilidade dessa prática administrativa com o artigo 26.o do Regulamento Dublim III.

35

O órgão jurisdicional de reenvio sublinha que os órgãos jurisdicionais nacionais estão divididos quanto a esta questão, explicando que alguns tribunais administrativos consideram que uma decisão de transferência pode ser tomada e notificada à pessoa em causa antes da resposta do Estado‑Membro requerido, enquanto outros tribunais consideram que o Estado‑Membro requerente é obrigado a aguardar pelo resultado do processo de determinação do Estado‑Membro responsável, conforme previsto nos artigos 20.o a 25.o do Regulamento Dublim III, antes de tomar e de notificar essa decisão.

36

Por sua vez, o órgão jurisdicional de reenvio considera que tanto a interpretação literal das diferentes versões linguísticas do artigo 26.o do Regulamento Dublim III como a interpretação teleológica das disposições em cujo contexto a mesma se insere militam a favor desta segunda interpretação, o que confirma, de resto, o exame dos trabalhos preparatórios do Regulamento Dublim III.

37

Precisa, no entanto, que a adoção e a notificação de uma decisão de transferência antes da resposta do Estado‑Membro requerido não impedem a pessoa em causa de impugnar utilmente essa decisão perante o juiz competente no contexto de um recurso com efeito suspensivo, em conformidade com o artigo 27.o do Regulamento Dublin III. Caso se verificasse que o Estado‑Membro requerido não é responsável tendo em conta os critérios fixados pelo regulamento, a decisão de transferência poderia, então, ser anulada.

38

Foi nestas circunstâncias que o tribunal administratif de Lille (Tribunal Administrativo de Lille) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão:

«As disposições do artigo 26.o do Regulamento [Dublin III] obstam a que as autoridades competentes do Estado‑Membro que apresentou, a outro Estado‑Membro que o primeiro Estado considera responsável pela aplicação dos critérios fixados pelo regulamento, um pedido de tomada a cargo ou de retomada a cargo de um nacional de um país terceiro ou de um apátrida que apresentou um pedido de proteção internacional sobre o qual ainda não foi proferida decisão definitiva ou de outra pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas c) ou d), do [mesmo] regulamento, tomem uma decisão de transferência e a notifiquem ao interessado antes de o Estado requerido ter aceitado essa tomada ou retomada a cargo?»

Quanto à questão prejudicial

39

Com a sua questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que o Estado‑Membro que tenha apresentado, junto de outro Estado‑Membro que considera responsável pela análise de um pedido de proteção internacional nos termos dos critérios fixados por este regulamento, um pedido para efeitos de tomada ou de retomada a cargo de uma pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, do referido regulamento adote uma decisão de transferência e a notifique a essa pessoa antes de o Estado‑Membro requerido ter dado o seu acordo explícito ou implícito a este pedido.

40

Segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, na interpretação de uma disposição do direito da União, há que ter em conta não só os seus termos mas também a sua génese, o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que a mesma faz parte (v., neste sentido, Acórdãos de 20 de dezembro de 2017, Acacia e D’Amato, C‑397/16 e C‑435/16, EU:C:2017:992, n.o 31, e de 17 de abril de 2018, Egenberger, C‑414/16, EU:C:2018:257, n.o 44 e jurisprudência referida).

41

A este respeito, no que se refere, antes de mais, aos termos do artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, esta disposição enuncia que, caso o Estado‑Membro requerido aceite a tomada ou retomada a cargo de um requerente ou de outra pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas c) ou d), deste regulamento, o Estado‑Membro requerente notifica à pessoa em causa a decisão da sua transferência para o Estado‑Membro responsável e, se for caso disso, a decisão de não analisar o seu pedido de proteção internacional.

42

Resulta assim da própria redação do artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III e, como salientou igualmente o advogado‑geral no n.o 35 das suas conclusões, em praticamente todas as suas versões linguísticas, que a notificação de uma decisão de transferência à pessoa em causa só pode ser feita se e, por conseguinte, após o Estado‑Membro requerido ter respondido favoravelmente ao pedido de tomada ou de retomada a cargo ou, se for o caso, após o termo dos prazos em que o Estado‑Membro requerido deve responder a este pedido, equivalendo a falta de resposta, em conformidade com o artigo 22.o, n.o 7, e o artigo 25.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, à aceitação desse pedido.

43

Por conseguinte, a própria redação do artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento de Dublim III põe em evidência que o legislador da União estabeleceu uma ordem processual precisa entre a aceitação do pedido para efeito de tomada ou retomada a cargo pelo Estado‑Membro requerido e a notificação da decisão de transferência à pessoa em causa.

44

Em seguida, relativamente à génese do referido artigo 26.o, n.o 1, há que observar, como salientou o advogado‑geral no n.o 36 das suas conclusões, que a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou um apátrida (COM/2008/0820 final), relativa à reformulação do Regulamento n.o 343/2003 e que conduziu à adoção do Regulamento Dublim III, enunciava que era necessário clarificar melhor o procedimento de notificação da decisão de transferência à pessoa interessada, a fim de garantir um direito de recurso mais efetivo da mesma.

45

Como resulta da exposição de motivos da referida proposta de regulamento, essas precisões deviam dizer respeito, nomeadamente, ao prazo, à forma e ao conteúdo da notificação das decisões de transferência. Ora, o artigo 25.o, n.o 1, desta proposta, atual artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, que contém as referidas precisões, não sofreu, no decurso do processo legislativo, qualquer alteração substancial a este respeito.

46

Por conseguinte, resulta dos próprios termos do artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, lidos à luz da génese da referida disposição, que uma decisão de transferência só pode ser notificada à pessoa em questão depois de o Estado‑Membro requerido ter, implícita ou explicitamente, aceitado a tomada a cargo ou a retomada a cargo dessa pessoa (v., neste sentido, Acórdão de 26 de julho de 2017, A.S., C‑490/16, EU:C:2017:585, n.o 33).

47

A sistemática geral do Regulamento Dublim III confirma esta interpretação.

48

A este respeito, importa salientar que o artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III figura no seu capítulo VI, sob a epígrafe «Procedimentos de tomada e retomada a cargo», que inclui disposições que indicam as fases sucessivas dos referidos procedimentos, e uma série de prazos imperativos que contribuem para determinar o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional (v., neste sentido, Acórdão de 25 de outubro de 2017, Shiri, C‑201/16, EU:C:2017:805, n.o 39 e jurisprudência referida).

49

Esses procedimentos de tomada a cargo e de retomada a cargo devem obrigatoriamente ser conduzidos em conformidade com as regras enunciadas, nomeadamente, no capítulo VI (v., neste sentido, Acórdão de 26 de julho de 2017, Mengesteab, C‑670/16, EU:C:2017:587, n.o 49 e jurisprudência referida).

50

Assim, resulta das secções II e III do capítulo VI do Regulamento Dublim III, relativas aos procedimentos aplicáveis aos pedidos de tomada e de retomada a cargo, que, num primeiro momento, o Estado‑Membro requerente pode solicitar a outro Estado‑Membro, consoante os casos, que proceda à tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa, em conformidade com as disposições, respetivamente, do artigo 21.o, n.o 1, do artigo 23.o, n.o 1, e do artigo 24.o, n.o 1, do referido regulamento.

51

Num segundo momento, compete ao Estado‑Membro requerido proceder, em conformidade com o artigo 22.o, n.o 1, ou o artigo 25.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, consoante os casos, às verificações necessárias com vista a determinar se é responsável pela análise do pedido de proteção internacional tendo em conta os critérios definidos no capítulo III deste regulamento e, portanto, por decidir sobre o pedido para efeitos de tomada ou de retomada a cargo nos prazos previstos nestas disposições.

52

Por conseguinte, só depois de o Estado‑Membro requerido ter procedido às referidas verificações é que pode pronunciar‑se sobre o pedido de tomada ou retomada a cargo e responder ao Estado‑Membro requerente. A este respeito, uma resposta favorável equivale à aceitação, em princípio, da transferência da pessoa em causa, aceitação que é, de forma geral, seguida da execução da referida transferência, em conformidade com as disposições do artigo 29.o do Regulamento Dublim III (v., neste sentido, Acórdão de 26 de julho de 2017, A.S., C‑490/16, EU:C:2017:585, n.o 50).

53

O artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, que figura, juntamente com o artigo 27.o deste regulamento, relativo às vias de recurso, na secção IV, sob a epígrafe «Garantias processuais», do capítulo VI do referido regulamento, visa assim, ao obrigar o Estado‑Membro requerente a notificar à pessoa em causa a decisão de transferência, reforçar a proteção dos direitos dessa pessoa assegurando que a mesma — quando a transferência é, em princípio, acordada entre os Estados‑Membros envolvidos no processo de tomada ou retomada a cargo — é informada do conjunto de motivos subjacentes à referida decisão, de forma a permitir‑lhe, se for caso disso, contestá‑la perante o órgão jurisdicional competente e pedir a suspensão da sua execução.

54

A sistemática geral do Regulamento Dublim III milita também a favor de uma interpretação do artigo 26.o, n.o 1, deste regulamento, segundo a qual uma decisão de transferência só pode ser notificada à pessoa em causa depois de o Estado‑Membro requerido ter aceitado a tomada ou retomada a cargo desta pessoa.

55

O mesmo se aplica ao objetivo prosseguido pelo Regulamento Dublim III, contrariamente ao que parece considerar a Comissão Europeia.

56

A este respeito, importa recordar, desde logo, que o Regulamento Dublim III tem por objetivo, segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, estabelecer um método claro e operacional, baseado em critérios objetivos e equitativos tanto para os Estados‑Membros como para as pessoas em questão, permitindo uma determinação rápida do Estado‑Membro responsável a fim de garantir o acesso efetivo aos procedimentos de concessão de proteção internacional e sem comprometer o objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional, garantindo ao mesmo tempo, em conformidade com o considerando 19 do referido regulamento, um recurso efetivo instituído pelo referido regulamento contra as decisões de transferência (v., neste sentido, Acórdãos de 7 de junho de 2016, Ghezelbash, C‑63/15, EU:C:2016:409, n.o 42, e de 25 de outubro de 2017, Shiri, C‑201/16, EU:C:2017:805, n.os 31 e 37 e jurisprudência referida).

57

Por outro lado, o Tribunal de Justiça já esclareceu que o legislador da União não quis sacrificar a proteção jurisdicional dos requerentes de proteção internacional em prol da referida exigência de celeridade (v., neste sentido, Acórdãos de 7 de junho de 2016, Ghezelbash, C‑63/15, EU:C:2016:409, n.o 57, e de 13 de setembro de 2017, Khir Amayry, C‑60/16, EU:C:2017:675, n.o 65).

58

No que se refere à proteção jurisdicional efetiva garantida, nomeadamente, pelo artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais, resulta do artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III que o requerente de proteção internacional dispõe de um direito de recurso efetivo, sob a forma de recurso da decisão de transferência ou de revisão, de facto e de direito, desta decisão de transferência num órgão jurisdicional. Esse recurso, cujo alcance não pode ser interpretado de forma restrita, deve abranger, por um lado, o exame da aplicação deste regulamento, no que diz respeito tanto ao cumprimento dos critérios enunciados no seu capítulo III como ao respeito das garantias processuais previstas, nomeadamente, no seu capítulo VI, e, por outro, o exame da situação de facto e de direito no Estado‑Membro para o qual o requerente é transferido (v., neste sentido, Acórdãos de 26 de julho de 2017, A.S., C‑490/16, EU:C:2017:585, n.os 26 a 28; de 26 de julho de 2017, Mengesteab, C‑670/16, EU:C:2017:587, n.os 43, 47 e 48; e de 25 de outubro de 2017, Shiri, C‑201/16, EU:C:2017:805, n.os 36 e 37).

59

A este respeito, se se admitisse que uma decisão de transferência pode ser notificada à pessoa em causa antes de o Estado‑Membro requerido ter respondido ao pedido de tomada ou retomada a cargo, poderia daí resultar que esta pessoa fosse obrigada, para impugnar esta decisão, a interpor um recurso dentro de um prazo que termina no momento em que o Estado‑Membro requerido deve dar a sua resposta, ou até, como no processo principal, antes de a referida resposta ser dada, uma vez que, em conformidade com o artigo 27.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, cabe aos Estados‑Membros fixar o prazo no qual a pessoa em causa pode exercer o seu direito a um recurso efetivo, sendo a única obrigação imposta por esta disposição que este prazo tenha um caráter razoável.

60

Nestas circunstâncias, a pessoa em causa seria, se for caso disso, obrigada, de forma preventiva, antes mesmo de o Estado‑Membro requerido, com base no artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, ter respondido ao pedido para efeito de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa, a interpor um recurso da decisão de transferência ou a apresentar um pedido de revisão da mesma. De resto, o Tribunal de Justiça já declarou que, em princípio, esse recurso não pode ser interposto ou esse pedido de revisão não pode ser apresentado numa situação em que o Estado‑Membro requerido respondeu favoravelmente a esse pedido (v., por analogia, Acórdão de 26 de julho de 2017, Mengesteab, C‑670/16, EU:C:2017:587, n.o 60).

61

Além disso, como salientou o advogado‑geral nos n.os 46 a 48 das suas conclusões, o alcance do direito de recurso efetivo referido no artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III seria suscetível de ser restringido, uma vez que uma decisão de transferência tomada e notificada à pessoa em causa antes de o Estado‑Membro requerido ter respondido ao pedido de tomada ou retomada a cargo se basearia apenas nos elementos de prova e em indícios recolhidos pelo Estado‑Membro requerente e não nos que são provenientes do Estado‑Membro requerido, como a data da sua resposta ao pedido de tomada ou retomada a cargo ou o teor dos motivos que o levaram a aceitar este pedido, quando a sua resposta for explícita.

62

Ora, há que sublinhar, como igualmente salientou o advogado‑geral no n.o 48 das suas conclusões, que esses elementos provenientes do Estado‑Membro requerido têm uma importância particular no âmbito dos recursos ou dos pedidos de revisão apresentados contra uma decisão de transferência tomada no desfecho de um procedimento para tomada a cargo, uma vez que o Estado‑Membro requerido é obrigado a verificar de forma exaustiva a sua responsabilidade atendendo aos critérios previstos pelo Regulamento Dublim III e a ter também em conta informações que não são necessariamente do conhecimento do Estado‑Membro requerente (v., neste sentido, Acórdão de 7 de junho de 2016, Ghezelbash, C‑63/15, EU:C:2016:409, n.o 43).

63

Há que recordar, igualmente, que o Estado‑Membro requerido pode ser levado, mesmo no caso de um acerto Eurodac, a responder negativamente a um pedido de tomada ou de retomada a cargo, quando, nomeadamente, considere que a sua responsabilidade cessou por força do artigo 19.o ou do artigo 20.o, n.o 5, segundo parágrafo, do Regulamento Dublim III, como confirma igualmente o artigo 4.o do regulamento de execução, devendo ser reservado ao requerente a possibilidade de invocar essa circunstância no âmbito do seu recurso (v., a este respeito, Acórdão de 7 de junho de 2016, Karim, C‑155/15, EU:C:2016:410, n.os 26 e 27).

64

Por outro lado, no que diz respeito à circunstância, referida no n.o 33 do presente acórdão, de que, numa situação como a do processo principal, a execução de uma decisão de transferência é suspensa até à resposta do Estado‑Membro requerido, basta salientar que nenhuma disposição do Regulamento Dublim III prevê essa suspensão. Com efeito, as regras relativas ao efeito suspensivo dos recursos, enunciadas no artigo 27.o, n.os 3 e 4, deste regulamento, visam as possibilidades de suspensão da decisão de transferência pela duração compreendida entre a data de interposição do recurso ou do pedido de revisão e, o mais tardar, o resultado do referido recurso ou do referido pedido de revisão, sem que a apresentação destes implique necessariamente a suspensão da decisão de transferência (v., neste sentido, Acórdãos de 13 de setembro de 2017, Khir Amayry, C‑60/16, EU:C:2017:675, n.os 64 e 68, e de 25 de janeiro de 2018, Hasan, C‑360/16, EU:C:2018:35, n.o 38).

65

Assim, admitir que a notificação dessa decisão, na aceção do artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, possa ser feita antes da resposta do Estado‑Membro requerido equivaleria, em ordens jurídicas que, diferentemente do que está em causa no processo principal, não preveem a suspensão dessa decisão antes da referida resposta, a expor a pessoa em causa ao risco de transferência para esse Estado‑Membro antes mesmo de este ter dado o seu consentimento em princípio.

66

De resto, na medida em que o Regulamento Dublim III tem por objetivo, como foi recordado no n.o 56 do presente acórdão, estabelecer um método claro e operacional para determinar o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de asilo, não se pode admitir que a interpretação do artigo 26.o, n.o 1, do referido regulamento, através do qual o legislador pretendeu reforçar a proteção dos direitos da pessoa em causa, possa variar em função da regulamentação dos Estados‑Membros envolvidos no procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável.

67

Seguindo a mesma lógica, relativamente ao facto de o direito francês não permitir a colocação do interessado em detenção administrativa antes de este ser notificado da decisão de transferência, uma dificuldade que, como é confirmado pelo órgão jurisdicional de reenvio, resulta exclusivamente do direito nacional, não pode pôr em causa a interpretação do artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, conforme descrita no n.o 46 do presente acórdão. De resto, resulta claramente do artigo 28.o, n.os 2 e 3, deste regulamento que os Estados‑Membros estão autorizados a colocar as pessoas em causa em detenção antes mesmo de o pedido de tomada ou retomada a cargo ser apresentado ao Estado‑Membro requerido, quando estão reunidas as condições previstas neste artigo, não constituindo assim a notificação da decisão de transferência um requisito necessário prévio a essa colocação (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de março de 2017, Al Chodor, C‑528/15, EU:C:2017:213, n.o 25, e de 13 de setembro de 2017, Khir Amayry, C‑60/16, EU:C:2017:675, n.os 25 a 27, 30 e 31).

68

Assim, o objetivo do Regulamento Dublim III, longe de invalidar a interpretação acolhida no n.o 46 do presente acórdão, milita igualmente em seu favor.

69

No entanto, as questões do órgão jurisdicional de reenvio incidem não só sobre o momento em que a notificação da decisão de transferência deve ocorrer, mas também sobre o momento em que esta decisão deve ser adotada.

70

A este respeito, é verdade que a redação do artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III refere a notificação da decisão de transferência e não a sua adoção. Contudo, o artigo 5.o, n.o 2, alínea b), e o artigo 5.o, n.o 3, deste regulamento, que precisam, respetivamente, as condições em que o Estado‑Membro que procede à determinação do Estado‑Membro responsável pode dispensar a entrevista com o requerente e o momento em que esta deve ter lugar, referem que essa entrevista ou qualquer outra possibilidade de o requerente apresentar informações relevantes devem ter lugar antes de a decisão de transferência ser adotada nos termos do referido artigo 26.o, n.o 1.

71

Por outro lado, há que salientar que, de acordo com o artigo 26.o, n.o 2, primeiro parágrafo, do Regulamento Dublim III, a decisão de transferência deve conter informações sobre as vias de recurso disponíveis, nomeadamente sobre o direito de requerer o efeito suspensivo, se for caso disso, e sobre os prazos aplicáveis ao exercício destas vias de recurso e à execução da transferência e inclui, se necessário, informações relativas ao local e à data em que a pessoa em causa se deve apresentar no caso de se dirigir pelos seus próprios meios para o Estado‑Membro responsável.

72

Ora, estas informações dependem, em princípio, como salientou o advogado‑geral no n.o 44 das suas conclusões, tanto do momento em que o Estado‑Membro requerido responde ao pedido de tomada ou retomada a cargo como do conteúdo da referida resposta, de acordo com as modalidades definidas no artigo 6.o do regulamento de execução, quando esta é explícita.

73

De qualquer modo, uma decisão de transferência não pode ser oponível à pessoa em causa antes de lhe ter sido notificada, sendo o momento em que a notificação deve ser feita, como resulta das considerações precedentes, definido com precisão no artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III. Daqui resulta que adoção dessa decisão antes da resposta do Estado‑Membro requerido, ainda que a notificação dessa decisão apenas fosse feita depois desta resposta, não poderia contribuir nem para o objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional nem para o objetivo de assegurar uma proteção jurisdicional efetiva dos direitos da referida pessoa, uma vez que a interposição de um recurso contra uma decisão de transferência é necessariamente posterior à notificação desta (v., a este respeito, Acórdão de 26 de julho de 2017, A.S., C‑490/16, EU:C:2017:585, n.o 54).

74

Nestas circunstâncias, o artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III opõe‑se igualmente à adoção de uma decisão de transferência antes da resposta, explícita ou implícita, do Estado‑Membro requerido ao pedido de tomada ou retomada a cargo.

75

Resulta das considerações precedentes que o artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que o Estado‑Membro que tenha apresentado, junto de outro Estado‑Membro que considera como sendo responsável pela análise de um pedido de proteção internacional em aplicação dos critérios fixados por este regulamento, um pedido para efeitos de tomada ou de retomada a cargo de uma pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, do referido regulamento, adote uma decisão de transferência e a notifique a essa pessoa antes de o Estado‑Membro requerido ter dado o seu acordo explícito ou implícito a esse pedido.

Quanto às despesas

76

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

 

O artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que o Estado‑Membro que tenha apresentado, junto de outro Estado‑Membro que considera como sendo responsável pela análise de um pedido de proteção internacional em aplicação dos critérios fixados por este regulamento, um pedido para efeitos de tomada ou de retomada a cargo de uma pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, do referido regulamento, adote uma decisão de transferência e a notifique a essa pessoa antes de o Estado‑Membro requerido ter dado o seu acordo explícito ou implícito a esse pedido.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: francês.