ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

27 de outubro de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Avaliação dos efeitos de determinados planos e programas no ambiente — Diretiva 2001/42/CE — Artigo 2.o, alínea a), e artigo 3.o, n.o 2, alínea a) — Conceito de ‘planos e programas’ — Condições relativas à instalação de turbinas eólicas, estabelecidas por uma portaria regulamentar — Disposições relativas, designadamente, a medidas de segurança, de controlo, de recuperação e de garantia, bem como normas relativas ao ruído definidas em função da afetação das zonas»

No processo C‑290/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Conseil d’État (Bélgica), por decisão de 2 de junho de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 15 de junho de 2015, no processo

Patrice D’Oultremont e o.

contra

Région wallonne,

sendo interveniente:

Fédération de l’énergie d’origine renouvelable et alternative ASBL (EDORA),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: M. Ilešič, presidente de secção, A. Prechal, A. Rosas, C. Toader (relatora) e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: J. Kokott,

secretário: V. Tourrès, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 7 de abril de 2016,

vistas as observações apresentadas:

em representação de P. D’Oultremont e o., por J. Sambon, avocat,

em representação da Fédération de l’énergie d’origine renouvelable et alternative ASBL (EDORA), por J. Sohier, S. Rodrigues, L. Levi, A. Blot e M. Chomé, avocats,

em representação do Governo belga, por J. Van Holm, M. Jacobs e S. Vanrie, na qualidade de agentes, assistidos por P. Moërynck, avocat,

em representação do Governo francês, por D. Colas e J. Traband, na qualidade de agentes,

em representação do Governo neerlandês, por M. K. Bulterman, B. Koopman e J. Langer, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por O. Beynet e C. Hermes, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 14 de julho de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 2.o, alínea a), e do artigo 3.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2001/42/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de junho de 2001, relativa à avaliação dos efeitos de determinados planos e programas no ambiente (JO 2001, L 197, p. 30).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe Patrice D’Oultremont e o. à Région wallonne acerca da validade do arrêté du gouvernement wallon, du 13 février 2014, portant conditions sectorielles relatives aux parcs d’éoliennes d’une puissance totale supérieure ou égale à 0,5 MW, modifiant l’arrêté du gouvernement wallon du 4 juillet 2002 relatif à la procédure et à diverses mesures d’exécution du décret du 11 mars 1999 relatif au permis d’environnement et modifiant l’arrêté du gouvernement wallon du 4 juillet 2002 arrêtant la liste des projets soumis à étude d’incidences et des installations et activités classées (Portaria do Governo da Valónia de 13 de fevereiro de 2014, que estabelece condições setoriais relativas aos parques eólicos com uma potência total superior ou igual a 0,5 MW, altera a Portaria do Governo da Valónia de 4 de julho de 2002, relativa ao processo e a diversas medidas de execução do Decreto de 11 de março de 1999 relativo à licença ambiental, e altera a Portaria do Governo da Valónia de 4 de julho de 2002, que aprova a lista dos projetos submetidos a estudo de impacto e das instalações e atividades classificadas) (Moniteur belge de 7 de março de 2014, p. 20263, a seguir «Portaria de 13 de fevereiro de 2014»).

Quadro jurídico

Direito internacional

Convenção relativa à avaliação dos impactes ambientais num contexto transfronteiras

3

A Convenção relativa à avaliação dos impactes ambientais num contexto transfronteiras, assinada em Espoo (Finlândia), em 26 de fevereiro de 1991 (a seguir «Convenção de Espoo»), foi aprovada em nome da Comunidade Europeia, em 27 de junho de 1997, e entrou em vigor em 10 de setembro do mesmo ano.

4

Nos termos do artigo 2.o, n.o 7, da Convenção de Espoo:

«As avaliações dos impactes ambientais determinadas pela presente Convenção serão efetuadas pelo menos na fase de projeto da atividade proposta. As Partes esforçar‑se‑ão, na medida do necessário, por aplicar os princípios da avaliação dos impactes ambientais às políticas, planos e programas.»

Protocolo relativo à avaliação ambiental estratégica à Convenção de Espoo

5

O Protocolo relativo à avaliação ambiental estratégica à Convenção de Espoo foi assinado em Kiev (Ucrânia), em 21 de maio de 2003, pela Comissão, em nome da Comunidade Europeia (a seguir «Protocolo de Kiev»). Este protocolo foi aprovado pela Decisão 2008/871/CE do Conselho, de 20 de outubro de 2008 (JO 2008, L 308, p. 33).

6

O artigo 13.o, n.o 1, do Protocolo de Kiev dispõe:

«Cada parte envidará esforços para garantir que as preocupações em matéria de ambiente, e de saúde, sejam tidas em conta e inseridas, na medida do possível, na preparação das suas propostas políticas e legislativas suscetíveis de exercer efeitos significativos no ambiente, e na saúde.»

Convenção de Aarhus

7

A Convenção sobre o acesso à informação, participação do público no processo de tomada de decisão e acesso à justiça em matéria de ambiente, aprovada em nome da Comunidade Europeia pela Decisão 2005/370/CE do Conselho, de 17 de fevereiro de 2005 (JO 2005, L 124, p. 1, a seguir «Convenção de Aarhus»), aborda igualmente a avaliação ambiental.

8

No seu artigo 6.o, esta Convenção contém regras relativas à participação do público na autorização de atividades. Os artigos 7.° e 8.° da mesma referem essa participação no que respeita, respetivamente, a planos, programas, políticas e disposições regulamentares, bem como outras disposições juridicamente vinculativas diretamente aplicáveis.

Direito da União

9

Nos termos do considerando 4 da Diretiva 2001/42:

«A avaliação ambiental constitui um instrumento importante de integração das considerações ambientais na preparação e aprovação de determinados planos e programas que possam ter efeitos significativos no ambiente nos Estados‑Membros, uma vez que garante que os efeitos ambientais da aplicação dos planos e programas são tomados em consideração durante a sua preparação antes da sua aprovação.»

10

O artigo 1.o desta diretiva, sob a epígrafe «Objetivos», prevê:

«A presente diretiva tem por objetivo estabelecer um nível elevado de proteção do ambiente e contribuir para a integração das considerações ambientais na preparação e aprovação de planos e programas, com vista a promover um desenvolvimento sustentável. Para tal, visa garantir que determinados planos e programas, suscetíveis de ter efeitos significativos no ambiente, sejam sujeitos a uma avaliação ambiental em conformidade com o nela disposto.»

11

O artigo 2.o da referida diretiva tem a seguinte redação:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

a)

‘Planos e programas’, qualquer plano ou programa, incluindo os cofinanciados pela [União] Europeia, bem como as respetivas alterações, que:

seja sujeito a preparação e/ou aprovação por uma autoridade a nível nacional, regional e local, ou que seja preparado por uma autoridade para aprovação, mediante procedimento legislativo, pelo seu Parlamento ou Governo, e

seja exigido por disposições legislativas, regulamentares ou administrativas;

b)

‘Avaliação ambiental’, a elaboração de um relatório ambiental, a realização de consultas, a tomada em consideração do relatório ambiental e dos resultados das consultas na tomada de decisões e o fornecimento de informação sobre a decisão em conformidade com os artigos 4.° a 9.°;

[...]»

12

Nos termos do artigo 3.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação»:

«1.   No caso dos planos e programas referidos nos n.os 2 a 4 suscetíveis de terem efeitos significativos no ambiente, deve ser efetuada uma avaliação ambiental nos termos dos artigos 4.° a 9.°

2.   Sob reserva do disposto no n.o 3, deve ser efetuada uma avaliação ambiental de todos os planos e programas:

a)

que tenham sido preparados para a agricultura, silvicultura, pescas, energia, indústria, transportes, gestão de resíduos, gestão das águas, telecomunicações, turismo, ordenamento urbano e rural ou utilização dos solos, e que constituam enquadramento para a futura aprovação dos projetos enumerados nos anexos I e II da Diretiva [2011/92/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente (JO 2012, L 26, p. 1), que revogou e substituiu a Diretiva 85/337, a partir de 17 de fevereiro de 2012];

[...]

3.   Os planos e programas referidos no n.o 2 em que se determine a utilização de pequenas áreas a nível local e pequenas alterações aos planos e programas referidos no mesmo número só devem ser objeto de avaliação ambiental no caso de os Estados‑Membros determinarem que os referidos planos e programas são suscetíveis de ter efeitos significativos no ambiente.

4.   Os Estados‑Membros devem determinar se os planos e programas que não os referidos no n.o 2 que constituam enquadramento para a futura aprovação de projetos, são suscetíveis de ter efeitos significativos no ambiente.

[...]»

Direito belga

13

Nos termos do artigo 6.o, n.o 1, II, da loi spéciale du 8 août 1980 de réformes institutionnelles (Lei especial de 8 de agosto de 1980, que aprova reformas institucionais) (Moniteur belge de 15 de agosto de 1980, p. 9434), as Regiões têm competência exclusiva no que respeita à proteção do ambiente.

14

Na Região da Valónia, a Diretiva 2001/42 foi parcialmente transposta pelos artigos D.52 e seguintes do livro I do code de l’environnement (Código do Ambiente) (Moniteur belge de 9 de julho de 2004, p. 54654), conforme resulta do artigo D.51/1 do mesmo código.

15

O artigo D.6, 13, do livro I do referido código define os «planos e programas» como sendo as «decisões, exceto as referidas no [code wallon de l’aménagement du territoire, de l’urbanisme, du patrimoine et de l’énergie] (Código do Ordenamento do Território, Urbanismo, Património e Energia) (Moniteur belge de 19 de maio de 1984, p. 6939; retificação no Moniteur belge de 25 de maio de 1984, p. 7636), conforme alterado, que tenham por objeto determinar quer uma sequência de ações ou operações destinadas a atingir um ou vários objetivos específicos relativamente à qualidade do ambiente quer a afetação ou o regime de proteção de uma ou várias zonas ou de um sítio, nomeadamente para definir o quadro em que aí pode ser autorizado o exercício de determinadas atividades, e que:

a.

sejam elaboradas e/ou adotadas por uma autoridade a nível regional ou local, ou elaboradas por uma autoridade com vista à sua adoção pelo Parlamento ou pelo Governo da Valónia;

b.

e sejam previstas por disposições de um decreto ou por disposições regulamentares ou administrativas;

Os planos e programas visados pelo presente decreto abrangem igualmente os que são cofinanciados pela [União] Europeia».

16

Nos termos do seu artigo 2.o, o décret du gouvernement wallon du 11 mars 1999 relatif au permis d’environnement (Decreto do Governo da Valónia de 11 de março de 1999, relativo à licença ambiental) (Moniteur belge de 8 de junho de 1999, p. 21114, e retificação no Moniteur belge de 22 de dezembro de 1999, p. 48280; a seguir «Decreto de 11 de março de 1999»), visa «assegurar, numa perspetiva de abordagem integrada de prevenção e de redução da poluição, a proteção do Homem ou do ambiente contra os perigos, danos ou inconvenientes que um estabelecimento é suscetível de causar, direta ou indiretamente, durante ou após a sua exploração».

17

O artigo 4.o deste decreto dispõe:

«O Governo estabelece as condições gerais, setoriais ou integrais no sentido de alcançar os objetivos previstos no artigo 2.o Tais condições têm valor regulamentar.

[...]

Essas condições podem, designadamente, ter por objeto:

[...]

as informações a prestar regularmente às autoridades designadas pelo Governo, relativas:

a.

às emissões do estabelecimento;

b.

às medidas adotadas para reduzir os danos ambientais;

[...]»

18

O artigo 5.o do referido código prevê:

«§ 1.   As condições gerais são aplicáveis a todas as instalações e atividades.

§ 2.   As condições setoriais são aplicáveis às instalações e atividades de um setor económico, territorial ou no qual surja ou possa surgir um risco particular.

[...]»

19

Nos termos do artigo 1.o da Portaria de 13 de fevereiro de 2014:

«As presentes condições setoriais aplicam‑se aos parques eólicos cuja potência total seja igual ou superior a 0,5 MW, referidos nas rubricas 40.10.01.04.02 e 40.10.01.04.03 do anexo I da [Portaria de 4 de julho de 2002, que aprova as condições gerais de exploração dos estabelecimentos referidos no Decreto de 11 de março de 1999 (Moniteur belge de 21 de setembro de 2002, p. 20264, retificação no Moniteur belge de 1 de outubro de 2002, p. 44152)].»

20

Segundo o artigo 5.o da Portaria de 13 de fevereiro de 2014, que consta do respetivo capítulo III, sob a epígrafe «Exploração»:

«Salvo por necessidades de manutenção, não podem ser ligados quaisquer dispositivos de iluminação, durante a noite, junto à turbina eólica ou nas suas proximidades.»

21

O artigo 9.o desta portaria, que consta do mesmo capítulo III, tem a seguinte redação:

«No interior do parque, mas no exterior das turbinas eólicas, o campo magnético inerente à atividade e medido a 1,5 metro do solo não pode ser superior ao valor‑limite de 100 microteslas.»

22

Nos termos do artigo 10.o, que consta igualmente do capítulo III da mesma portaria:

«§ 1.   Os efeitos das sombras estroboscópicas geradas pelo funcionamento das turbinas eólicas estão limitados a 30 horas por ano e 30 minutos por dia para todas as zonas habitacionais, construídas ou devidamente autorizadas por uma licença urbanística e abrangidas por aqueles. São calculados segundo a perspetiva da ‘situação mais desfavorável’, caracterizada segundo os seguintes parâmetros:

1.

o sol brilha de manhã à noite (céu continuamente limpo);

2.

as turbinas eólicas funcionam permanentemente (velocidade do vento sempre na gama de funcionamento das turbinas eólicas e disponibilidade destas a 100%);

3.

o rotor das turbinas eólicas está sempre orientado perpendicularmente aos raios solares.

Na exploração, são utilizados todos os meios disponíveis que permitam reduzir a exposição à sombra, para respeitar estes limites.

§ 2.   Estes limites não se aplicam se a sombra gerada pelo funcionamento da instalação não afetar os habitantes na sua zona habitacional, cabendo a prova de tal facto à entidade responsável pela exploração, por qualquer via jurídica.»

23

A secção I, intitulada «Normas relativas ao ruído», do capítulo V da Portaria de 13 de fevereiro de 2014, intitulado «Ruído», inclui, designadamente, o artigo 20.o, que define os limites de níveis de emissões sonoras de um parque eólico, e o artigo 21.o, que determina os valores‑limite, designadamente, em função das zonas ditas «de planeamento», ou seja, dos perímetros geográficos determinados com base num plano das autoridades competentes em função da sua afetação (zonas habitacionais, zonas agrícolas, zonas de atividade económica e outras).

Litígio no processo principal e questão prejudicial

24

Em 21 de fevereiro de 2013, o Governo da Valónia aprovou um «quadro de referência», posteriormente alterado em julho do mesmo ano, que estabelece recomendações para a implantação de turbinas eólicas na Região da Valónia. Este instrumento foi completado por um documento cartográfico que servia de quadro de planeamento da execução do programa eólico na Região da Valónia «no horizonte de 2020», denominado «mapa de referência». Este mapa foi objeto de um relatório ambiental.

25

Entre 16 de setembro e 30 de outubro de 2013, teve lugar um inquérito público em todos os municípios da Valónia. Entre os elementos colocados à disposição do público neste inquérito encontravam‑se, designadamente, os documentos referidos no número anterior do presente acórdão, em concreto, o quadro de referência, o mapa de referência e o relatório ambiental.

26

No entanto, nem o quadro de referência nem o mapa de referência foram definitivamente adotados.

27

Entretanto, o Governo da Valónia aprovou a Portaria de 13 de fevereiro de 2014.

28

Em 6 de maio de 2014, P. D’Oultremont e o. submeteram ao órgão jurisdicional de reenvio, o Conseil d’État (Bélgica), um pedido de anulação dessa portaria. Em apoio do seu pedido, P. D’Oultremont e o. alegam, designadamente, a desconformidade dessa portaria com o disposto na Diretiva 2001/42, na medida em que a Région wallonne aprovou a referida portaria sem que as suas disposições tivessem sido objeto de um processo de avaliação dos efeitos ou de um processo de participação pública.

29

A Région wallonne e a interveniente no processo principal, a Fédération de l’énergie d’origine renouvelable et alternative ASBL (EDORA), por seu lado, consideram que a mesma portaria não tem em conta o conceito de «planos e programas», na aceção dessa diretiva.

30

O órgão jurisdicional de reenvio refere que, apesar das especificações efetuadas pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 17 de junho de 2010, Terre wallonne e Inter‑Environnement Wallonie (C‑105/09 e C‑110/09, EU:C:2010:355), a resposta à questão de saber se as disposições da Portaria de 13 de fevereiro de 2014 são constitutivas de «planos e programas» não é evidente.

31

Segundo este órgão jurisdicional, uma dificuldade específica reside no facto de as disposições da referida portaria estarem dissociadas do quadro de referência e da cartografia das zonas para a implantação das turbinas eólicas, referidas no n.o 24 do presente acórdão, e de essa circunstância privar as referidas disposições, pelo menos em parte, de conteúdo programático para o enquadramento da produção de energia eólica.

32

Nesta perspetiva, a Portaria de 13 de fevereiro de 2014 não define um «quadro completo», um conjunto de medidas coordenadas que regule a exploração de parques eólicos com vista à preservação do ambiente. Ora, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, é certo que a tomada em consideração, na concessão de autorizações, das normas da referida portaria relativas designadamente ao ruído e aos efeitos das sombras estroboscópicas geradas pelo funcionamento das turbinas eólicas tem necessariamente por consequência determinar o lugar de implantação das turbinas eólicas relativamente à zona habitacional.

33

Se se adotar a definição do conceito de «planos e programas» dada pelo legislador regional no artigo D.6, 13, do livro I do Código do Ambiente, a partir do momento em que estão dissociadas do quadro de referência e da cartografia que descreve os lugares melhor localizados para a implantação das turbinas eólicas, as condições setoriais não constituem, por si só, segundo o referido órgão jurisdicional, um «processo de execução progressiva e ordenada de meios para alcançar um objetivo específico relativamente à qualidade do ambiente».

34

O órgão jurisdicional de reenvio especifica ainda que as condições setoriais previstas pela Portaria de 13 de fevereiro de 2014 também não determinam o destino ou o regime de proteção de uma ou várias zonas ou de um sítio. Estão abrangidos todos os parques eólicos, independentemente do sítio escolhido, sob reserva apenas de uma modulação das normas relativas ao ruído em função do ordenamento das zonas no plano setorial.

35

Ora, segundo este órgão jurisdicional, parece resultar dos anexos I e II da Diretiva 2001/42, lidos à luz do n.o 47 do acórdão de 17 de junho de 2010, Terre wallonne e Inter‑Environnement Wallonie (C‑105/09 e C‑110/09, EU:C:2010:355), que um plano ou um programa diz necessariamente respeito a uma zona geograficamente delimitada como, por exemplo, as «zonas vulneráveis identificadas no âmbito da gestão duradoura do azoto na agricultura», na aceção da Diretiva 91/676/CEE do Conselho, de 12 de dezembro de 1991, relativa à proteção das águas contra a poluição causada por nitratos de origem agrícola (JO 1991, L 375, p. 1), que estava em causa no referido acórdão.

36

Nestas condições, o Conseil d’État decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Os artigos 2.°, alínea a), e 3.°, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2001/42/CE, relativa à avaliação dos efeitos de determinados planos e programas no ambiente, implicam que deve ser qualificada de ‘plano ou programa’, na aceção destas disposições, uma portaria regulamentar que estabelece várias disposições relativas à instalação de turbinas eólicas, incluindo medidas de segurança, de controlo, de recuperação e de garantia, bem como normas relativas ao ruído definidas em função das zonas de planeamento, e que regulam a emissão de licenças administrativas que conferem ao promotor o direito de implantar e de explorar instalações sujeitas legalmente à avaliação dos efeitos no ambiente, por força do direito interno?»

Quanto à questão prejudicial

37

Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, alínea a), e o artigo 3.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2001/42 devem ser interpretados no sentido de que uma portaria regulamentar como a que está em causa no processo principal, que estabelece várias disposições relativas à instalação de turbinas eólicas, que devem ser respeitadas no âmbito da emissão de licenças administrativas para a implantação e a exploração de tais instalações, está abrangida pelo conceito de «planos e programas», na aceção desta diretiva.

38

Importa, antes de mais, recordar que resulta do considerando 4 da Diretiva 2001/42 que a avaliação ambiental constitui um instrumento importante de integração das considerações ambientais na preparação e aprovação de determinados planos e programas.

39

Em seguida, como observou a advogada‑geral no n.o 34 das suas conclusões, a delimitação do conceito de «planos e programas» face a medidas não abrangidas pelo âmbito de aplicação material da Diretiva 2001/42 deverá orientar‑se pelo objetivo específico estabelecido no artigo 1.o desta, ou seja, submeter a avaliação ambiental os planos e programas suscetíveis de ter efeitos significativos no ambiente (v., neste sentido, acórdão de 28 de fevereiro de 2012, Inter‑Environnement Wallonie e Terre wallonne, C‑41/11, EU:C:2012:103, n.o 40 e jurisprudência aí referida).

40

Por conseguinte, tendo em conta a finalidade desta diretiva, que consiste em garantir um nível elevado de proteção do meio ambiente, as disposições que delimitam o seu âmbito de aplicação, designadamente as que enunciam as definições dos atos nela previstos, devem ser interpretadas em sentido amplo (v., neste sentido, acórdãos de 22 de março de 2012, Inter‑Environnement Bruxelles e o., C‑567/10, EU:C:2012:159, n.o 37, e de 10 de setembro de 2015, Dimos Kropias Attikis, C‑473/14, EU:C:2015:582, n.o 50).

41

No que respeita ao artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2001/42, a definição do conceito de «planos e programas», constante desta disposição, enuncia a condição cumulativa de serem, por um lado, sujeitos a preparação e/ou aprovação por uma autoridade a nível nacional, regional ou local, ou preparados por uma autoridade para aprovação, mediante procedimento legislativo, pelo seu Parlamento ou Governo, e, por outro, exigidos por disposições legislativas, regulamentares ou administrativas.

42

Resulta dos factos apurados pelo órgão jurisdicional de reenvio que a Portaria de 13 de fevereiro de 2014 foi elaborada e aprovada por uma autoridade regional, no caso o Governo da Valónia, e que essa portaria é exigida pelo disposto no Decreto de 11 de março de 1999.

43

Por sua vez, o artigo 3.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2001/42 prevê que, sob reserva do disposto no n.o 3 do mesmo artigo, deve ser efetuada uma avaliação ambiental de todos os planos que tenham sido preparados, designadamente, para o setor da energia e que constituam enquadramento para a futura aprovação dos projetos enumerados nos anexos I e II da Diretiva 2011/92.

44

Ora, é também certo que a Portaria de 13 de fevereiro de 2014 respeita ao setor da energia e contribui para a definição do enquadramento para a execução, na Região da Valónia, de projetos de parques eólicos, que fazem parte dos projetos enumerados no anexo II da Diretiva 2011/92.

45

Quanto ao conceito de «planos e programas», embora seja verdade que deve abranger um determinado território, o certo é que não resulta da redação do artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2001/42 nem da do artigo 3.o, n.o 2, alínea a), desta mesma diretiva que os referidos planos ou programas devem ter por objeto o ordenamento de um determinado território. Com efeito, resulta da redação das referidas disposições que as mesmas visam, mais amplamente, o ordenamento de territórios ou de zonas em geral.

46

Ora, segundo as observações do órgão jurisdicional de reenvio, a Portaria de 13 de fevereiro de 2014 abrange todo o território da Região da Valónia e os valores‑limite que prevê em matéria de ruído apresentam uma estreita conexão com o referido território, uma vez que esses limites são determinados em função de diferentes tipos de afetação das zonas geográficas consideradas.

47

Quanto à circunstância de a Portaria de 13 de fevereiro de 2014 não definir um quadro suficientemente completo no que respeita ao setor eólico, importa recordar que a análise dos critérios enunciados no artigo 2.o, alínea a), e no artigo 3.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2001/42, para determinar se uma portaria como a que está em causa no processo principal pode estar abrangida pelo referido conceito, deve ser realizada designadamente à luz do objetivo desta diretiva, que, como resulta do n.o 39 do presente acórdão, consiste em submeter a avaliação ambiental as decisões suscetíveis de ter efeitos significativos no mesmo.

48

Além disso, tal como salientou a advogada‑geral no n.o 55 das suas conclusões, importa evitar eventuais estratégias que contornem as obrigações enunciadas pela Diretiva 2001/42, que podem materializar‑se numa fragmentação das medidas, reduzindo assim o efeito útil da mesma diretiva (v., neste sentido, acórdão de 22 de março de 2012, Inter‑Environnement Bruxelles e o., C‑567/10, EU:C:2012:159, n.o 30 e jurisprudência aí referida).

49

Tendo em conta este objetivo, saliente‑se que o conceito de «planos e programas» engloba qualquer ato que, ao definir regras e processos de controlo para o setor em causa, estabelece um conjunto significativo de critérios e modalidades para a autorização e execução de um ou vários projetos suscetíveis de ter efeitos significativos no ambiente (v., neste sentido, acórdão de 11 de setembro de 2012, Nomarchiaki Aftodioikisi Aitoloakarnanias e o., C‑43/10, EU:C:2012:560, n.o 95 e jurisprudência aí referida).

50

No caso vertente, recorde‑se que a Portaria de 13 de fevereiro de 2014 tem especialmente por objeto as regras técnicas, as modalidades de exploração (designadamente as sombras estroboscópicas), a prevenção dos acidentes e dos incêndios (designadamente, a paragem da turbina eólica), as normas relativas ao ruído, a recuperação e a constituição de uma garantia para as turbinas eólicas. Tais normas assumem uma importância e um alcance suficientemente significativos para a determinação das condições aplicáveis ao setor em causa, e as opções, designadamente de ordem ambiental, apresentadas através das referidas normas determinam as condições em que os projetos concretos de implantação e exploração de sítios eólicos poderão futuramente ser autorizados.

51

Por último, apoiando‑se na Convenção de Aarhus e no Protocolo de Kiev, o Governo francês propõe distinguir o conceito de «planos e programas» do de «regulamentação geral», o qual cobre a Portaria de 13 de fevereiro de 2014, razão pela qual esta última não está abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2001/42.

52

A este propósito, há que salientar, por um lado, que resulta da própria redação do artigo 2.o, alínea a), primeiro travessão, desta diretiva, corroborada neste sentido pela jurisprudência recordada no n.o 49 do presente acórdão, que o conceito de «planos e programas» pode abranger atos normativos adotados pela via legislativa ou regulamentar.

53

Por outro lado, como salientou a advogada‑geral no n.o 70 das suas conclusões, a Diretiva 2001/42 distingue‑se da Convenção de Aarhus e do Protocolo de Kiev na medida em que não contém, precisamente, disposições específicas relativas a políticas ou a regulamentações gerais que exijam uma diferenciação face aos «planos e programas».

54

Resulta das observações anteriores que há que responder à questão submetida que o artigo 2.o, alínea a), e o artigo 3.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2001/42 devem ser interpretados no sentido de que uma portaria regulamentar como a que está em causa no processo principal, que estabelece várias disposições relativas à instalação de turbinas eólicas, que devem ser respeitadas no âmbito da emissão de licenças administrativas para a implantação e a exploração de tais instalações, está abrangida pelo conceito de «planos e programas», na aceção desta diretiva.

Quanto às despesas

55

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

 

O artigo 2.o, alínea a), e o artigo 3.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2001/42/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de junho de 2001, relativa à avaliação dos efeitos de determinados planos e programas no ambiente, devem ser interpretados no sentido de que uma portaria regulamentar como a que está em causa no processo principal, que estabelece várias disposições relativas à instalação de turbinas eólicas, que devem ser respeitadas no âmbito da emissão de licenças administrativas para a implantação e a exploração de tais instalações, está abrangida pelo conceito de «planos e programas», na aceção desta diretiva.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: francês.