ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)
4 de setembro de 2014 ( *1 )
«Reenvio prejudicial — Política comercial — Direitos antidumping — Regulamento (CE) n.o 499/2009 — Validade — Produtos de importação originários da China — Importação dos mesmos produtos expedidos da Tailândia — Evasão — Prova — Não colaboração»
No processo C‑21/13,
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Finanzgericht Hamburg (Alemanha), por decisão de 19 de setembro de 2012, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 15 de janeiro de 2013, no processo
Simon, Evers & Co. GmbH
contra
Hauptzollamt Hamburg‑Hafen,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),
composto por: R. Silva de Lapuerta, presidente de secção, J. L. da Cruz Vilaça (relator), G. Arestis, J.‑C. Bonichot e A. Arabadjiev, juízes,
advogado‑geral: Y. Bot,
secretário: A. Calot Escobar,
vistos os autos,
vistas as observações apresentadas:
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em representação da Simon, Evers & Co. GmbH, por H. Henninger, Rechtsanwalt, |
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em representação do Governo grego, por M. Tassopoulou e K. Boskovits, na qualidade de agentes, |
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em representação do Governo português, por A. Coutinho da Silva e L. Inez Fernandes, na qualidade de agentes, |
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em representação do Conselho da União Europeia, por S. Boelaert, na qualidade de agente, assistida por A. Polcyn, avocate, |
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em representação da Comissão Europeia, por T. Maxian Rusche, na qualidade de agente, |
ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 10 de abril de 2014,
profere o presente
Acórdão
1 |
O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a validade do Regulamento (CE) n.o 499/2009 do Conselho, de 11 de junho de 2009, que torna extensivas as medidas antidumping definitivas instituídas pelo Regulamento (CE) n.o 1174/2005 sobre as importações de porta‑paletes manuais e dos seus componentes essenciais originários da República Popular da China às importações do mesmo produto expedido da Tailândia (independentemente de ser ou não declarado originário da Tailândia) (JO L 151, p. 1, a seguir «regulamento controvertido»). |
2 |
Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Simon, Evers & Co. GmbH (a seguir «Simon, Evers») ao Hauptzollamt Hamburg‑Hafen (Serviço Aduaneiro Principal do porto de Hamburgo, a seguir «Hauptzollamt»), a respeito de uma decisão deste último de impor à Simon, Evers o pagamento de direitos antidumping. |
Quadro jurídico
3 |
As disposições que regem a aplicação de medidas antidumping pela União Europeia, em vigor à época dos factos do litígio no processo principal, figuravam no Regulamento (CE) n.o 384/96 do Conselho, de 22 de dezembro de 1995, relativo à defesa contra as importações objeto de dumping de países não membros da Comunidade Europeia (JO 1996, L 56, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 461/2004 do Conselho, de 8 de março de 2004 (JO L 77, p. 12, a seguir «regulamento de base»). |
4 |
O artigo 13.o do regulamento de base, com a epígrafe «Evasão», dispunha: «1. A aplicação dos direitos antidumping instituídos nos termos do presente regulamento pode ser tornada extensiva às importações provenientes de países terceiros de produtos similares […], sempre que se verifique uma evasão às medidas em vigor. […] Entende‑se por evasão uma alteração dos fluxos comerciais entre os países terceiros e a Comunidade ou entre empresas do país sujeito às medidas e a Comunidade, resultante de práticas, processos ou operações insuficientemente motivadas ou sem justificação económica que não seja a instituição do direito, e quando houver elementos que demonstrem que há prejuízo ou que estão a ser neutralizados os efeitos corretores do direito no que se refere aos preços e/ou às quantidades do produto similar, bem como quando houver elementos de prova, se necessário em conformidade com o disposto no artigo 2.o, da existência de dumping relativamente aos valores normais anteriormente apurados para o produto similar. [...] 2. Considera‑se que uma operação de montagem na Comunidade ou num país terceiro constitui uma evasão às medidas em vigor sempre que:
[...]
3. Será iniciado um inquérito nos termos do presente artigo por iniciativa da Comissão, ou a pedido de um Estado‑Membro ou de qualquer parte interessada, com base em elementos de prova suficientes sobre os factores referidos no n.o 1. O inquérito é iniciado após consulta do comité consultivo, através de um regulamento da Comissão, que pode igualmente instruir as autoridades aduaneiras para tornarem obrigatório o registo das importações em conformidade com o n.o 5 do artigo 14.o, ou para exigirem garantias. Os inquéritos serão efetuados pela Comissão, que pode ser assistida pelas autoridades aduaneiras, devendo estar concluídos no prazo de nove meses. Sempre que os factos, tal como definitivamente estabelecidos, justificarem a prorrogação das medidas, o Conselho prorrogá‑las‑á, sob proposta da Comissão, após consulta do comité consultivo. [...] […]» |
5 |
Nos termos do artigo 14.o, n.o 6, do regulamento de base: «Os Estados‑Membros comunicarão mensalmente à Comissão os dados relativos às importações de produtos sujeitos a inquérito e a medidas, bem como o montante dos direitos cobrados ao abrigo do presente regulamento.» |
6 |
O artigo 18.o, n.os 1 e 6, do regulamento de base tinha a seguinte redação: «1. Quando uma parte interessada recusar o acesso às informações necessárias, não as facultar no prazo estabelecido no presente regulamento ou impedir de forma significativa o inquérito, podem ser estabelecidas, com base nos dados disponíveis, conclusões preliminares ou finais, positivas ou negativas. […] As partes interessadas devem ser informadas das consequências da não colaboração. [...] 6. Se uma parte interessada não colaborar ou se colaborar apenas parcialmente, estando, desse modo, a ocultar informações pertinentes, o resultado pode ser menos favorável para essa parte do que se tivesse efetivamente colaborado.» |
7 |
Na sequência de um inquérito conduzido pela Comissão entre 1 de abril de 2003 e 31 de março de 2004 (a seguir «inquérito inicial»), a União adotou o Regulamento (CE) n.o 1174/2005 do Conselho, de 18 de julho de 2005, que institui um direito antidumping definitivo e que estabelece a cobrança definitiva do direito provisório instituído sobre as importações de porta‑paletes manuais e dos seus componentes essenciais originários da República Popular da China (JO L 189, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 684/2008 do Conselho, de 17 de julho de 2008 (JO L 192, p. 1, a seguir «Regulamento n.o 1174/2005»). |
8 |
Nos termos do artigo 1.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1174/2005: «É instituído um direito antidumping definitivo sobre as importações de porta‑paletes manuais e dos seus componentes essenciais, ou seja, chassis e sistemas hidráulicos, classificados nos códigos NC ex 8427 90 00 e ex 8431 20 00 (códigos TARIC 8427 90 00 10 e 8431 20 00 10), originários da República Popular da China. [...]» |
9 |
Como resulta do quinto considerando do Regulamento (CE) n.o 923/2008 da Comissão, de 12 de setembro de 2008, que inicia um inquérito sobre a eventual evasão das medidas antidumping instituídas pelo Regulamento n.o 1174/2005, com a alteração que lhe foi dada pelo Regulamento n.o 684/2008, sobre as importações de porta‑paletes manuais e dos seus componentes essenciais originários da República Popular da China, através de importações de porta‑paletes manuais e dos seus componentes essenciais originários da Tailândia, independentemente de serem ou não declarados originários da Tailândia, e que torna obrigatório o registo destas importações (JO L 252, p. 3), a Comissão decidiu dar início a um inquérito (a seguir «inquérito sobre a evasão») com base em elementos de prova suficientes que, em seu entender, indicavam à primeira vista que as medidas antidumping aplicadas às importações de porta‑paletes manuais originários da China eram objeto de evasão através de operações de montagem do produto em causa na Tailândia. Para o efeito, a Comissão adotou o Regulamento n.o 923/2008. |
10 |
Resulta do considerando 10 do regulamento controvertido que o inquérito sobre a evasão abrangeu o período compreendido entre 1 de setembro de 2007 e 31 de agosto de 2008 (a seguir «período de inquérito»). |
11 |
Nos termos do considerando 6 do regulamento controvertido, «[a] Comissão informou oficialmente do início do inquérito [sobre a evasão] as autoridades da RPC e da Tailândia, os produtores‑exportadores da RPC e da Tailândia, os importadores da Comunidade conhecidos como interessados, bem como a indústria comunitária. Foram enviados questionários aos produtores‑exportadores conhecidos da RPC e da Tailândia, assim como aos importadores da Comunidade conhecidos da Comissão desde o inquérito inicial e às partes que se tinham dado a conhecer nos prazos previstos no artigo 3.o do [Regulamento n.o 923/2008]. Foi dada às partes interessadas a oportunidade de apresentarem as suas observações por escrito e de solicitarem uma audição no prazo fixado [nesse regulamento]. Todas as partes foram informadas de que a sua não colaboração poderia conduzir à aplicação do artigo 18.o do regulamento de base e ao estabelecimento de conclusões com base nos dados disponíveis». |
12 |
Resulta do considerando 7 do regulamento controvertido que a Comissão não recebeu nenhuma resposta aos questionários por parte dos produtores‑exportadores da Tailândia nem nenhumas observações das autoridades tailandesas. |
13 |
O considerando 8 do regulamento controvertido indica que «[u]m produtor‑exportador chinês respondeu ao questionário declarando as suas vendas de exportação para a CE, bem como algumas exportações muito pouco significativas do produto em causa para a Tailândia. Não foram recebidas quaisquer observações das autoridades chinesas». |
14 |
Além disso, resulta do considerando 9 desse regulamento que «nove importadores comunitários apresentaram respostas ao questionário, comunicando as suas importações provenientes da China e da Tailândia. Em geral, das suas respostas pode concluir‑se que houve um aumento das importações provenientes da Tailândia e uma descida abrupta das importações provenientes da RPC em 2006, o ano subsequente à entrada em vigor dos direitos antidumping definitivos. Nos anos seguintes, as importações provenientes da RPC aumentaram de novo, ao passo que, simultaneamente, as importações da Tailândia diminuíram ligeiramente, mas continuando a ser bem superiores aos níveis registados em 2005». |
15 |
No que respeita à alteração dos fluxos comerciais entre países terceiros e a União, os considerandos 16 a 21 do regulamento controvertido têm a seguinte redação:
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16 |
Na sequência do inquérito sobre a evasão, foi adotado o regulamento controvertido. |
17 |
O artigo 1.o deste regulamento estabelece: «1. O direito antidumping definitivo aplicável a ‘todas as outras empresas’ instituído pelo Regulamento (CE) n.o 1174/2005 sobre as importações de porta‑paletes manuais e dos seus componentes essenciais, ou seja, chassis e sistemas hidráulicos, conforme definidos no artigo 1.o do Regulamento [n.o 1174/2005], originários da [China], é tornado extensivo aos porta‑paletes manuais e seus componentes essenciais, ou seja, chassis e sistemas hidráulicos, conforme definidos no artigo 1.o do Regulamento [n.o 1174/2005], classificados nos códigos NC ex 8427 90 00 e ex 8431 20 00 (códigos TARIC 8427 90 00 11 e 8431 20 00 11), expedidos da Tailândia, independentemente de serem ou não declarados originários deste último país. 2. Os direitos tornados extensivos pelo n.o 1 são cobrados relativamente às importações registadas, nos termos do artigo 2.o do Regulamento (CE) n.o 923/2008 da Comissão e do n.o 3 do artigo 13.o e do n.o 5 do artigo 14.o do [regulamento de base]. [...]» |
Litígio no processo principal e questão prejudicial
18 |
No mês de outubro de 2008, a Simon, Evers importou porta‑paletes manuais da Tailândia. |
19 |
Em 12 de agosto de 2009, por aviso de liquidação de direitos de importação, o Hauptzollamt, com base no regulamento controvertido, exigiu à Simon, Evers o pagamento de um direito antidumping de 9666, 90 euros. |
20 |
Tendo o Hauptzollamt, por decisão de 21 de fevereiro de 2011, negado provimento ao recurso interposto desse aviso, a Simon, Evers recorreu para o Finanzgericht Hamburg. |
21 |
Esse órgão jurisdicional tem dúvidas de que os requisitos previstos no artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base relativos à determinação de uma evasão dos direitos antidumping estejam preenchidos no processo principal. Mais especificamente, interroga‑se quanto à questão de saber se uma alteração do volume de exportação dos países terceiros em causa pode permitir, por si só, estabelecer uma relação entre as importações provenientes do país sujeito ao direito antidumping e as do país a que o direito antidumping deve ser tornado extensivo. No que respeita à evolução das importações provenientes da Tailândia, o Finanzgericht Hamburg observa que estas, após um aumento significativo durante o ano de 2007, diminuíram de forma notável durante o período do inquérito. |
22 |
O órgão jurisdicional de reenvio duvida igualmente que a alteração dos fluxos comerciais entre os países terceiros e a União possa ser imputada à introdução dos direitos antidumping sobre os porta‑paletes originários da China quando, durante o período de inquérito, as próprias importações provenientes da China aumentaram consideravelmente. Ora, na falta de provas que permitam, por um lado, explicar o claro aumento das exportações provenientes da Tailândia e, por outro, provar a inexistência de verdadeiras atividades de produção de porta‑paletes manuais na Tailândia, afigura‑se no mínimo duvidoso que se possa concluir, na falta de qualquer outra motivação ou justificação económica suficiente na aceção do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base, que a alteração dos fluxos comerciais resultava da instituição do direito antidumping sobre os porta‑paletes manuais originários da China. |
23 |
Nestas condições, o Finanzgericht Hamburg decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial: «O [regulamento controvertido] é inválido, por a Comissão, não tendo atendido aos requisitos relativos à determinação de uma evasão às medidas antidumping previstos no artigo 13.o do [regulamento de base], ter considerado desde logo existir evasão em virtude de o volume das correspondentes exportações provenientes da Tailândia ter aumentado significativamente após a instituição das medidas, não obstante a Comissão, alegando a falta de colaboração dos exportadores tailandeses, não ter efetuado outras verificações concretas?» |
Quanto à questão prejudicial
Observações preliminares
24 |
Importa recordar, desde logo, que, com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o regulamento controvertido é inválido pelo facto de as instituições da União não terem feito prova bastante da existência de uma «evasão», na aceção do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base, por não terem caracterizado, por um lado, a alteração dos fluxos comerciais entre os países terceiros e a União e, por outro, a existência de práticas, operações e obras para as quais não existe outra fundamentação suficiente ou justificação económica que não seja a imposição do direito antidumping, na falta de colaboração dos exportadores tailandeses. |
25 |
Nas observações escritas apresentadas ao Tribunal de Justiça, a Simon, Evers invocou outro fundamento de invalidade do regulamento controvertido, com base no facto de as instituições da União não terem feito prova de que os efeitos corretores do direito antidumping tivessem sido comprometidos em termos de preços e/ou de quantidades de produtos semelhantes. |
26 |
Segundo jurisprudência constante, o procedimento previsto no artigo 267.o TFUE assenta numa nítida separação das funções entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça, pelo que compete apenas ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, apreciar, à luz das especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça (v., designadamente, acórdão Hoesch Metals and Alloys, C‑373/08, EU:C:2010:68, n.o 59). |
27 |
Resulta igualmente de jurisprudência bem assente que o artigo 267.o TFUE não constitui uma via de recurso para as partes num litígio pendente num tribunal nacional, de modo que o Tribunal de Justiça não pode ser obrigado a apreciar a validade do direito da União apenas porque esta questão foi invocada perante o mesmo por uma destas partes nas suas observações (v. acórdão MSD Sharp & Dohme, C‑316/09, EU:C:2011:275, n.o 23 e jurisprudência referida). |
28 |
Nestas condições, o exame da validade do regulamento controvertido não deve ser alargado a fundamentos não referidos pelo órgão jurisdicional de reenvio (v. acórdão Nuova Agricast, C‑390/06, EU:2008:224, n.o 44). |
Quanto à validade do regulamento controvertido
29 |
Segundo jurisprudência constante, no domínio da política comercial comum, e particularmente em matéria de medidas de defesa comercial, as instituições da União dispõem de um amplo poder de apreciação em razão da complexidade das situações económicas, políticas e jurídicas que devem examinar. Quanto à fiscalização jurisdicional de tal apreciação, deve, assim, ser limitada à verificação do respeito das regras processuais, da exatidão material dos factos tomados em consideração na opção impugnada, da ausência de erro manifesto na apreciação destes factos e da inexistência de desvio de poder (v. acórdão Conselho e Comissão/Interpipe Niko Tube e Interpipe NTRP, C‑191/09 P e C‑200/09 P, EU:C:2012:78, n.o 63 e jurisprudência referida). |
30 |
No que respeita, mais especificamente, à evasão às medidas antidumping, o artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base dispõe que a mesma consiste numa alteração dos fluxos comerciais entre os países terceiros e a União, resultante de práticas, processos ou operações insuficientemente motivadas ou sem justificação económica que não seja a instituição do direito, e quando houver elementos que demonstrem que há prejuízo ou que estão a ser neutralizados os efeitos corretores do direito no que se refere aos preços e/ou às quantidades do produto similar. |
31 |
Segundo o artigo 13.o, n.o 3, desse regulamento, incumbe à Comissão dar início a um inquérito com base em elementos de prova que deixam transparecer à primeira vista práticas de evasão. Se os factos provados no decurso do inquérito permitirem concluir pela existência dessa evasão, a Comissão propõe ao Conselho a prorrogação das medidas antidumping. |
32 |
Todavia, nenhuma disposição do regulamento de base confere à Comissão, no quadro de um inquérito sobre a existência de uma evasão, o poder de vincular os produtores ou os exportadores visados por uma denúncia a participarem no inquérito ou a prestarem informações. A Comissão é por isso tributária da cooperação voluntária das partes interessadas para lhe fornecer as informações necessárias. |
33 |
É a razão pela qual o legislador da União previu, no artigo 18.o, n.o 1, do regulamento de base, que, quando uma parte interessada recusar o acesso às informações necessárias, não as facultar, ou impedir de forma significativa o inquérito, podem ser estabelecidas, com base nos dados disponíveis, conclusões provisórias ou finais, positivas ou negativas. |
34 |
Além disso, o artigo 18.o, n.o 6, desse mesmo regulamento precisa que, se uma parte interessada não colaborar, ou colaborar apenas parcialmente, estando, desse modo, a ocultar informações pertinentes, o resultado poderá ser menos favorável para essa parte do que se tivesse efetivamente colaborado. |
35 |
Embora seja verdade que o regulamento de base, e especialmente o artigo 13.o, n.o 3, do mesmo, estabelece o princípio segundo o qual o ónus da prova de uma evasão incumbe às instituições da União, não é menos certo que, ao prever, na hipótese de falta de colaboração das partes interessadas, que essas instituições podem basear as conclusões de um inquérito relativo à existência de uma evasão nos dados disponíveis e que as partes que não colaboraram correm o risco de ficar numa situação menos favorável, os n.os 1 e 6 do artigo 18.o do regulamento de base visam claramente flexibilizar esse ónus. |
36 |
É verdade que, como observou o advogado‑geral nos n.os 68 e 69 das suas conclusões, resulta do artigo 18.o do regulamento de base que o legislador da União não pretendeu estabelecer uma presunção legal que permitisse deduzir diretamente da não colaboração das partes interessadas ou visadas a existência de uma evasão, dispensando, por conseguinte, as instituições da União do ónus da prova. Todavia, tendo em conta a possibilidade de estabelecer conclusões, inclusive definitivas, com base nos dados disponíveis e de tratar a parte que não colabora ou que colabora apenas parcialmente de maneira menos favorável do que se tivesse colaborado, é evidente que as instituições da União podem basear‑se num conjunto de indícios concordantes que permitam concluir pela existência de evasão na aceção do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base. |
37 |
Qualquer outra solução poderia comprometer a eficácia das medidas de defesa comercial da União sempre que as instituições da União fossem confrontadas com a não colaboração no quadro de um inquérito destinado a provar uma evasão. |
38 |
É à luz destas considerações que importa apreciar a questão da validade do regulamento controvertido. |
39 |
Em primeiro lugar, importa recordar que, no caso em apreço, os produtores‑exportadores tailandeses e as autoridades tailandesas não colaboraram no inquérito sobre a evasão. Além disso, um único produtor‑exportador chinês declarou as suas exportações para a União e exportações muito limitadas para a Tailândia e não foi recebida nenhuma observação por parte das autoridades chinesas. |
40 |
Ora, como resulta do considerando 6 do regulamento controvertido, a Comissão informou as autoridades chinesas e tailandesas, os produtores‑exportadores e os importadores comunitários em causa, bem como a indústria comunitária, do início do inquérito sobre a evasão. Além disso, foram dirigidos questionários aos referidos produtores‑exportadores e importadores comunitários, tendo estes tido, por conseguinte, a possibilidade de dar a conhecer os seus pontos de vista e de serem ouvidos pela Comissão. |
41 |
Devido à não colaboração desses interessados, o volume e o valor das exportações tailandesas e chinesas de porta‑paletes manuais para a União foram determinados pelo Conselho apenas com base nas informações disponíveis, ou seja, nos dados estatísticos recolhidos pelos Estados‑Membros e compilados pela Comissão, em conformidade com o artigo 14.o, n.o 6, do regulamento de base, e nos dados do Eurostat. |
42 |
Essas informações permitiram às instituições da União concluir que, na sequência da introdução das medidas antidumping sobre as importações de porta‑paletes manuais originárias da China, as importações de porta‑paletes manuais provenientes da Tailândia passaram de 7458 em 2005 para 64706 em 2007, antes de cair para 42056 durante o período de inquérito. Isto representou um crescimento de 868% entre 2005 e 2007 e, durante o período do inquérito, um crescimento de 564% relativamente a 2005. |
43 |
No que diz respeito às importações na União de porta‑paletes manuais provenientes da China, as instituições da União referiram que as mesmas passaram de 240639 em 2005 para 538271 em 2007 e 584 786 durante o período de inquérito. Com base nas informações de que essas instituições dispunham, este crescimento explicava‑se sobretudo por um aumento das exportações do produtor‑exportador chinês a que era aplicada a taxa de direito antidumping mais baixa, a saber 7,6%, ao passo que os outros produtores‑exportadores chineses estavam sujeitos a um direito antidumping compreendido entre 28,5% e 46,7%. |
44 |
Resulta desses elementos, em primeiro lugar, que as importações provenientes da Tailândia conheceram um aumento muito significativo a partir de 2005, isto é, a partir da aplicação do direito antidumping às importações provenientes da China, em segundo lugar, que havia uma razão económica plausível para justificar a progressão destas últimas importações a partir de 2005 e, em terceiro lugar, que essa progressão foi, proporcionalmente, muito inferior à das importações provenientes da Tailândia. |
45 |
A Simon, Evers alega, contudo, que os fluxos comerciais entre os países terceiros e a União não se alteraram de forma significativa, sendo certo que uma alteração de fluxos comerciais na aceção do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base se caracteriza pelo facto de que as importações originárias do país sujeito ao direito antidumping deviam diminuir na sequência da entrada em vigor das medidas antidumping, ao passo que as importações de produtos semelhantes provenientes do alegado país de evasão deviam aumentar. |
46 |
Ora, no processo principal, esse requisito não está preenchido. |
47 |
A este respeito, importa sublinhar que a exigência relativa à substituição das importações originárias do país sujeito ao direito antidumping pelas provenientes do país de evasão, enquanto requisito necessário à existência de uma evasão, não figura no artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base. |
48 |
Além disso, como indicou o advogado‑geral no n.o 87 das suas conclusões, a definição de «evasão» está formulada no artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base em termos muito gerais, que deixam uma grande margem de manobra às instituições da União e que não dão nenhuma explicação quanto à natureza e às modalidades da «alteração dos fluxos comerciais entre os países terceiros e a Comunidade». |
49 |
Por conseguinte, há que concluir que o Conselho fez prova bastante de uma alteração dos fluxos comerciais entre a China, a Tailândia e a União. |
50 |
Em segundo lugar, as dúvidas expressas pelo órgão jurisdicional de reenvio a respeito da validade do regulamento controvertido basearam‑se também no facto de as instituições da União não terem feito prova de que a alteração dos fluxos comerciais entre os países terceiros em causa e a União tinha origem na evasão do direito antidumping instituído sobre as importações originárias da China. |
51 |
Como resulta do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base, a existência de uma evasão exige que se demonstre que não existe motivação suficiente ou justificação económica que não seja a instituição do direito antidumping para as práticas, processos ou operações que são responsáveis pela alteração dos fluxos comerciais entre os países terceiros e a União. |
52 |
No caso em apreço, resulta do regulamento controvertido que as instituições se basearam num conjunto de indícios concordantes para concluir pela existência de tal evasão. Constataram que a alteração dos fluxos comerciais entre a Tailândia e a União começou logo após a instituição do direito antidumping sobre as importações provenientes da China. Essa coincidência no tempo constitui um indício importante que permite estabelecer um nexo lógico e razoável entre o considerável aumento das importações provenientes da Tailândia e a instituição do direito antidumping. |
53 |
Além disso, resulta do considerando 21 do regulamento controvertido que, no momento do início do inquérito sobre a evasão, as informações de que a Comissão dispunha pareciam indicar que tinham tido lugar importantes operações de montagem na Tailândia. |
54 |
Por último, nem os produtores‑exportadores tailandeses e chineses nem o Governo tailandês forneceram às instituições da União elementos de prova que permitam explicar o aumento considerável das importações de porta‑paletes manuais provenientes da Tailândia. Em especial, essas instituições não receberam nenhum elemento de prova que indique que havia verdadeiras atividades de produção de porta‑paletes manuais na Tailândia. |
55 |
A falta de colaboração das empresas e das autoridades nacionais em causa durante o inquérito sobre a evasão impediu, por isso, as instituições da União de determinarem com certeza as razões da alteração dos fluxos comerciais entre a Tailândia e a União. |
56 |
Ora, no quadro de uma situação caracterizada pela recusa total de colaboração no inquérito sobre a evasão, as instituições da União estavam assim habilitadas a basearem‑se em indícios a fim de concluir pela existência de práticas, processos ou operações na Tailândia que visam unicamente subtrair‑se à aplicação do direito antidumping aplicável às importações originárias da China. Nestas condições, caberá aos interessados fazer prova de um motivo razoável que justifique essas atividades, que não seja o de se subtrair ao referido direito antidumping (v., por analogia, acórdão Brother International, C‑26/88, EU:C:1989:637, n.o 29). |
57 |
Daqui decorre que, ao considerar, no regulamento controvertido, que houve uma evasão às medidas na aceção do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base, o Conselho não cometeu nenhum erro manifesto na apreciação dos factos. |
58 |
Em face das considerações precedentes, há que responder que o exame da questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio não revelou nenhuma elemento suscetível de afetar a validade do regulamento controvertido. |
Quanto às despesas
59 |
Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis. |
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara: |
O exame da questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio não revelou nenhum elemento suscetível de afetar a validade do Regulamento (CE) n.o 499/2009 do Conselho, de 11 de junho de 2009, que torna extensivas as medidas antidumping definitivas instituídas pelo Regulamento (CE) n.o 1174/2005 sobre as importações de porta‑paletes manuais e dos seus componentes essenciais originários da República Popular da China às importações do mesmo produto expedido da Tailândia (independentemente de ser ou não declarado originário da Tailândia). |
Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: alemão.