ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

11 de julho de 2013 ( *1 )

«Diretivas 84/450/CEE e 2006/114/CE — Publicidade enganosa e publicidade comparativa — Conceito de ‘publicidade’ — Registo e utilização de um nome de domínio — Utilização de etiquetas em metadados de um sítio Internet»

No processo C-657/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Hof van cassatie (Bélgica), por decisão de 8 de dezembro de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 21 de dezembro de 2011, no processo

Belgian Electronic Sorting Technology NV

contra

Bert Peelaers,

Visys NV,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: M. Ilešič (relator), presidente de secção, K. Lenaerts, vice-presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Terceira Secção, E. Jarašiūnas, A. Ó Caoimh e C. G. Fernlund, juízes,

advogado-geral: P. Mengozzi,

secretário: C. Strömholm, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 24 de janeiro de 2013

,vistas as observações apresentadas:

em representação da Belgian Electronic Sorting Technology NV, por P. Maeyaert, P. de Jong e J. Muyldermans, advocaten,

em representação de B. Peelaers e da Visys NV, por V. Pede e S. Demuenynck, advocaten,

em representação do Governo belga, por J.-C. Halleux e T. Materne, na qualidade de agentes,

em representação do Governo estónio, por M. Linntam, na qualidade de agente,

em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por S. Fiorentino, avvocato dello Stato,

em representação do Governo polaco, por B. Majczyna e M. Szpunar, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por M. Owsiany-Hornung e M. van Beek, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 21 de março de 2013,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do conceito de «publicidade», na aceção do artigo 2.o da Diretiva 84/450/CEE do Conselho, de 10 de setembro de 1984, relativa à publicidade enganosa e comparativa (JO L 250, p. 17; EE 15 F5 p. 55), conforme alterada pela Diretiva 2005/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2005 (JO L 149, p. 22, a seguir «Diretiva 84/450»), e do artigo 2.o da Diretiva 2006/114/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa à publicidade enganosa e comparativa (JO L 376, p. 21).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Belgian Electronic Sorting Technology NV, também denominada «BEST NV» (a seguir «BEST»), a B. Peelaers e à Visys NV (a seguir «Visys»), sociedade da qual aquele é um dos fundadores, a propósito do registo e da utilização pela Visys do nome de domínio «www.bestlasersorter.com» e da utilização por esta sociedade de etiquetas [indicadores hipertexto] em metadados que reenviam para a BEST e para os seus produtos.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Segundo o seu artigo 1.o, a Diretiva 84/450 tinha por objetivo proteger os profissionais contra a publicidade enganosa e as suas consequências desleais e estabelecer as condições em que a publicidade comparativa é permitida.

4

O artigo 2.o, n.os 1 a 2 A, da Diretiva 84/450 continha as seguintes definições:

«[…]

1)

Publicidade: qualquer forma de comunicação feita no âmbito duma atividade comercial, industrial, artesanal ou liberal tendo por fim promover o fornecimento de bens ou de serviços, incluindo os bens imóveis, os direitos e as obrigações.

2)

Publicidade enganosa: a publicidade que, por qualquer forma, incluindo a sua apresentação, induz em erro ou é suscetível de induzir em erro as pessoas a quem se dirige ou que atinge e cujo comportamento económico pode afetar, em virtude do seu caráter enganador, ou que, por estas razões, prejudica ou pode prejudicar um concorrente;

2   A Publicidade comparativa: a publicidade que identifica, explícita ou implicitamente, um concorrente ou os bens ou serviços oferecidos por um concorrente».

5

A Diretiva 84/450 foi revogada pela Diretiva 2006/114, que entrou em vigor em 12 de dezembro de 2007. Tendo em conta a data dos factos, o litígio no processo principal é regulado em parte pela Diretiva 84/450 e em parte pela Diretiva 2006/114.

6

Os considerandos 3, 4, 8, 9, 14 e 15 da Diretiva 2006/114 enunciam:

«(3)

A publicidade enganosa e a publicidade comparativa ilícita podem levar a distorções de concorrência no mercado interno.

(4)

A publicidade, seja ou não indutora de contratos, afeta a situação económica dos consumidores e dos negociantes.

[...]

(8)

A publicidade comparativa, quando compara características essenciais, pertinentes, comprováveis e representativas e não é enganosa, pode constituir um meio legítimo de informar os consumidores das vantagens que lhe estão associadas. É desejável prever uma definição ampla de publicidade comparativa que cubra todos os tipos de publicidade comparativa.

(9)

No que se refere à comparação, devem ser estabelecidas normas de permissão da publicidade comparativa, de forma a determinar as práticas relativas à publicidade comparativa que podem distorcer a concorrência, causar prejuízo aos concorrentes e influenciar desfavoravelmente a escolha dos consumidores. [...]

[...]

(14)

[P]ode ser indispensável, para uma efetiva publicidade comparativa, identificar os produtos ou serviços de um concorrente, através de referências à sua designação comercial ou a uma marca de que seja titular.

(15)

A utilização da marca, da designação comercial ou de qualquer outra marca distintiva de outrem não infringe o direito exclusivo do titular, na medida em que se dê cumprimento às regras da presente diretiva, já que o objetivo consiste apenas em acentuar objetivamente as respetivas diferenças.»

7

O artigo 1.o da Diretiva 2006/114 descreve o seu objetivo nos mesmos termos que o artigo 1.o da Diretiva 84/450.

8

No seu artigo 2.o, alíneas a) a c), a Diretiva 2006/114 reproduz textualmente as definições de publicidade, de publicidade enganosa e de publicidade comparativa que constavam da Diretiva 84/450.

9

O considerando 11 da Diretiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2000, relativa a certos aspetos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio eletrónico, no mercado interno («Diretiva sobre o comércio eletrónico») (JO L 178, p. 1), precisa:

«A presente diretiva não prejudica o nível de proteção, designadamente, da saúde pública e do consumidor, estabelecido por instrumentos comunitários. […] [A]plicam-se igualmente na sua integralidade aos serviços da sociedade da informação. Fa[z] igualmente parte desse acervo a Diretiva 84/450[…]»

10

Nos termos do artigo 1.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2000/31, esta tem por objetivo contribuir para o correto funcionamento do mercado interno, garantindo a livre circulação dos serviços da sociedade da informação entre Estados-Membros. Para tal, aproxima certas disposições nacionais aplicáveis aos serviços da sociedade da informação e que dizem respeito ao mercado interno, ao estabelecimento dos prestadores de serviços, às comunicações comerciais, aos contratos celebrados por via eletrónica, à responsabilidade dos intermediários, aos códigos de conduta, à resolução extrajudicial de litígios, às ações judiciais e à cooperação entre Estados-Membros.

11

O artigo 1.o, n.o 3, desta diretiva dispõe:

«A presente diretiva é complementar da legislação [da União] aplicável aos serviços da sociedade da informação, sem prejuízo do nível de proteção, designadamente da saúde pública e dos interesses dos consumidores, tal como consta dos atos [da União] e da legislação nacional de aplicação destes, na medida em que não restrinjam a liberdade de prestação de serviços da sociedade da informação.»

12

O artigo 2.o, alínea f), da referida diretiva define do seguinte modo a expressão «comunicação comercial»:

«[T]odas as formas de comunicação destinadas a promover, direta ou indiretamente, bens, serviços ou a imagem de uma empresa, de uma organização ou de uma pessoa que exerça uma profissão regulamentada ou uma atividade comercial, industrial ou artesanal. Não constituem comunicações comerciais:

as informações que permitam o acesso direto à atividade da empresa, da organização ou da pessoa, nomeadamente um nome de domínio ou um endereço de correio eletrónico,

as comunicações relativas aos bens, aos serviços ou à imagem da empresa, da organização ou da pessoa, elaboradas de forma independente, em especial quando não fornecidas mediante contrapartida financeira».

Direito belga

13

O artigo 93.o, n.o 3, da Lei de 14 de julho de 1991 sobre práticas comerciais e sobre a informação e a proteção do consumidor (Belgisch Staatsblad, 29 de agosto de 1991, p. 18712), que transpôs a Diretiva 84/450, define o conceito de publicidade como «qualquer comunicação que se destine, direta ou indiretamente, a promover a venda de produtos ou serviços, [independentemente] do lugar ou do meio de comunicação utilizado». Esta lei foi revogada e substituída pela Lei de 6 de abril de 2010 relativa às práticas de mercado e à proteção do consumidor (Belgisch Staatsblad, 12 de abril de 2010, p. 20803), que reproduz no seu artigo 2.o, n.o 19, a mesma definição.

14

O artigo 2.o, n.o 7, da Lei de 11 de março de 2003 relativa a determinados aspetos jurídicos dos serviços da sociedade da informação (Belgisch Staatsblad, 17 de março de 2003, p. 12962), que transpõe a Diretiva 2000/31, define o conceito de publicidade nos seguintes termos:

«[…] todas as formas de comunicação destinadas a promover, direta ou indiretamente, bens, serviços ou a imagem de uma empresa, de uma organização ou de uma pessoa que exerça uma profissão regulamentada ou uma atividade comercial, industrial ou artesanal.

Para efeitos da aplicação da presente lei, não constituem publicidade:

a)

as informações que permitam o acesso direto à atividade da empresa, da organização ou da pessoa, nomeadamente um nome de domínio ou um endereço de correio eletrónico;

b)

as comunicações elaboradas de forma independente, em particular as que são fornecidas sem contrapartida financeira».

15

Por força do artigo 2.o, n.o 1, da Lei de 26 de junho de 2003 relativa ao registo abusivo dos nomes de domínio (Belgisch Staatsblad, 9 de setembro de 2003, p. 45225), entende-se por nome de domínio «a indicação alfanumérica de um endereço IP (protocolo da Internet) digital que permite identificar um computador ligado à Internet [...]».

Litígio no processo principal e questão prejudicial

16

A BEST e a Visys concebem, produzem e comercializam máquinas e linhas de escolha automática equipadas com tecnologia laser.

17

A BEST foi fundada em 11 de abril de 1996. As suas máquinas têm a designação de série «Helius», «Genius», «LS9000» e «Argus».

18

A Visys foi fundada em 7 de outubro de 2004, designadamente por B. Peelaers, antigo funcionário da BEST.

19

Em 3 de janeiro de 2007, B. Peelaers registou, por conta da Visys, o nome de domínio «www.bestlasersorter.com». O conteúdo do sítio Internet com este nome de domínio é idêntico ao dos sítios Internet usados pela Visys, acessíveis através dos nomes de domínio «www.visys.be» e «www.visysglobal.be».

20

Em 4 de abril de 2008, a BEST registou a marca figurativa Benelux BEST para produtos das classes 7, 9, 40 e 42 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado.

21

Em 23 de abril de 2008, um funcionário judicial constatou que, digitando no motor de busca «www.google.be» os termos «Best Laser Sorter», surgia, como segundo resultado da pesquisa, a seguir ao sítio Internet da BEST, uma ligação ao sítio Internet da Visys e que esta utilizava nos seus sítios Internet as seguintes etiquetas, a saber, «Helius sorter, LS9000, Genius sorter, Best+Helius, Best+Genius, [...] Best nv».

22

Por considerar que o registo e a utilização do nome de domínio «www.bestlasersorter.com» e a utilização dos referidos metadados prejudicavam a sua marca e o seu nome comercial e constituíam violações das disposições relativas à publicidade enganosa e comparativa, bem como ao registo ilícito de nomes de domínio, a BEST intentou, em 30 de abril de 2008, uma ação contra B. Peelaers e a Visys, a fim de pôr termo aos alegados prejuízos e infrações. Em resposta, B. Peelaers e a Visys formularam um pedido reconvencional de anulação da marca figurativa Benelux BEST.

23

Por acórdão de 16 de setembro de 2008, o voorzitter van de rechtbank van koophandel te Antwerpen julgou improcedentes os pedidos da BEST, com exceção do pedido relativo à violação, em razão da utilização das etiquetas em causa, da regulamentação em matéria de publicidade comparativa e enganosa. Por outro lado, julgou improcedente o pedido reconvencional de B. Peelaers e da Visys.

24

Chamado a conhecer de um recurso interposto pela BEST e de um recurso subordinado interposto por B. Peelaers e pela Visys, o hof van beroep te Antwerpen, por acórdão de 21 de dezembro de 2009, negou provimento à totalidade dos pedidos da BEST, incluindo o pedido relativo à violação das regras em matéria de publicidade comparativa e enganosa e anulou a marca figurativa Benelux BEST por falta de caráter distintivo.

25

A BEST recorreu desse acórdão para o órgão jurisdicional de reenvio. Este último, por acórdão de 8 de dezembro de 2011, julgou improcedentes os fundamentos invocados pela BEST, com exceção do fundamento relativo à violação da legislação em matéria de publicidade comparativa e enganosa.

26

Nestas condições, o Hof van cassatie decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O conceito de ‘publicidade’ do artigo 2.o da Diretiva [84/450] e do artigo 2.o da Diretiva [2006/114] deve ser interpretado no sentido de que abrange o registo e a utilização de nomes de domínio, assim como a utilização de etiquetas em metadados de um sítio Internet?»

Quanto à questão prejudicial

27

A título preliminar, há que salientar que a BEST pede que o Tribunal de Justiça se pronuncie oficiosamente, por um lado, sobre a questão de saber se o artigo 3.o, n.o 1, alíneas b) e c), da Primeira Diretiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), se opõe ao registo de uma marca que é considerada promocional ou sugestiva. Por outro lado, a BEST pede ao Tribunal de Justiça que responda à questão de saber se a proteção atribuída ao nome comercial pelo artigo 8.o da Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial, assinada em Paris, em 20 de março de 1883, revista pela última vez em Estocolmo, em 14 de julho de 1967, e alterada em 28 de setembro de 1979 (Recueil des traités des Nations unies, vol. 828, n.o 11851, p. 305), lido em conjugação com os artigos 1.° e 2.° do Acordo sobre os aspetos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio, que constitui o anexo 1 C do Acordo que institui a Organização Mundial do Comércio, assinado em Marraquexe, em 15 de abril de 1994, e aprovado pela Decisão 94/800/CE do Conselho, de 22 de dezembro de 1994, relativa à celebração, em nome da Comunidade Europeia e em relação às matérias da sua competência, dos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986/1994) (JO L 336, p. 1), está subordinada à condição de ser possível verificar que o nome comercial apresenta caráter distintivo.

28

A este respeito, importa recordar que compete exclusivamente ao órgão jurisdicional de reenvio definir o objeto das questões que pretende submeter ao Tribunal de Justiça. Com efeito, compete apenas aos órgãos jurisdicionais nacionais, aos quais é submetido o litígio e que devem assumir a responsabilidade da decisão judicial a proferir, apreciar, face às particularidades de cada caso, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial, para poderem proferir a sua decisão, como a pertinência das questões que colocam ao Tribunal de Justiça (v. acórdãos de 16 de março de 1999, Castelletti, C-159/97, Colet., p. I-1597, n.o 14; de 6 de julho de 2006, Kersbergen-Lap e Dams-Schipper, C-154/05, Colet., p. I-6249, n.o 21; e de 25 de janeiro de 2007, Dyson, C-321/03, Colet., p. I-687, n.o 23).

29

Na verdade, o Tribunal de Justiça tem declarado reiteradamente que, mesmo que, no plano formal, um órgão jurisdicional de reenvio limite o seu pedido à interpretação de certas disposições do direito da União, essa circunstância não obsta a que o Tribunal de Justiça forneça ao órgão jurisdicional nacional todos os elementos de interpretação do referido direito que possam ser úteis para a apreciação do litígio que lhe foi submetido, quer esse órgão jurisdicional nacional lhes tenha ou não feito referência no enunciado das suas questões (v., designadamente, acórdãos Dyson, já referido, n.o 4; de 26 de abril de 2007, Alevizos, C-392/05, Colet., p. I-3505, n.o 64; e de 29 de janeiro de 2008, Promusicae, C-275/06, Colet., p. I-271, n.o 42).

30

Todavia, na medida em que o órgão jurisdicional de reenvio já negou provimento de forma definitiva aos fundamentos invocados pela BEST, aos quais se referem as questões mencionadas no n.o 27 do presente acórdão, uma resposta a essas questões já não pode ser considerada útil para a resolução do litígio submetido a esse órgão jurisdicional.

31

Como tal, não há que conhecer das questões que ultrapassam o âmbito da questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio.

32

Com a sua questão, esse órgão jurisdicional procura saber se o artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 84/450 e o artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2006/114 devem ser interpretados no sentido de que o conceito de «publicidade», conforme definido nestas disposições, abrange, numa situação como a que está em causa no processo principal, primeiro, o registo de um nome de domínio, segundo, a utilização desse nome e, terceiro, a utilização de etiquetas em metadados de um sítio Internet.

33

Com exceção da BEST e do Governo italiano, todas as outras partes no processo no Tribunal de Justiça, a saber, B. Peelaers e a Visys, os Governos belga, estónio e polaco, bem como a Comissão Europeia, consideram que o registo de um nome de domínio não pode ser qualificado de publicidade. Em contrapartida, quanto à utilização desse nome, apenas B. Peelaers, a Visys e a Comissão consideram que a mesma não pode, por princípio, constituir publicidade. Quanto à utilização de etiquetas em metadados de um sítio Internet, a BEST e os Governos belga e italiano são da opinião de que, designadamente em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, o conceito de publicidade engloba essa utilização, ao passo que B. Peelaers, a Visys, o Governo polaco e a Comissão defendem a tese contrária. O Governo estónio não tomou posição quanto a este último aspeto.

34

O artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 84/450 e o artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2006/114 definem o conceito de publicidade como qualquer forma de comunicação feita no âmbito de uma atividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, tendo por fim promover o fornecimento de bens ou de serviços.

35

O Tribunal de Justiça já salientou que, tendo em consideração esta definição particularmente ampla, a publicidade pode apresentar-se sob formas muito variadas (v., designadamente, acórdão de 25 de outubro de 2001, Toshiba Europe, C-112/99, Colet., p. I-7945, n.o 28) e, como tal, não está limitada às formas clássicas de publicidade.

36

Para determinar se uma dada prática constitui uma forma de publicidade na aceção das referidas disposições, há que ter em conta a finalidade das Diretivas 84/450 e 2006/114, que é, como resulta do artigo 1.o destas diretivas, proteger os profissionais contra a publicidade enganosa e suas consequências desleais e estabelecer as condições em que a publicidade comparativa é permitida.

37

Estes requisitos visam, como o Tribunal de Justiça declarou a propósito da Diretiva 84/450 e como resulta, relativamente à Diretiva 2006/114, dos seus considerandos 8, 9 e 15, estabelecer um equilíbrio entre vários interesses suscetíveis de serem afetados pela permissão da publicidade comparativa, ao permitir aos concorrentes que ponham em destaque, de forma objetiva, as vantagens dos vários produtos comparáveis e ao proibir, simultaneamente, práticas que podem distorcer a concorrência, causar prejuízo aos concorrentes e influenciar negativamente a escolha dos consumidores (v., neste sentido, acórdãos de 18 de junho de 2009, L’Oréal e o., C-487/07, Colet., p. I-5185, n.o 68, e de 18 de novembro de 2010, Lidl, C-159/09, Colet., p. I-11761, n.o 20).

38

Decorre, além disso, dos considerandos 3, 4 e 8, segunda frase, da Diretiva 2006/114 e das definições, também elas amplas, dos conceitos de «publicidade enganosa» e de «publicidade comparativa», previstas no artigo 2.o, n.os 2 e 2 A, da Diretiva 84/450 e no artigo 2.o, alíneas b) e c), da Diretiva 2006/114, que o legislador da União teve a intenção de definir, através destas diretivas, um enquadramento completo para todas as formas de manifestação publicitária, quer conduzam ou não à celebração de contratos, para evitar que essa publicidade cause prejuízos tanto aos consumidores como aos profissionais e leve a distorções de concorrência no mercado interno.

39

Consequentemente, o conceito de «publicidade», na aceção das Diretivas 84/450 e 2006/114, não pode ser interpretado e aplicado de forma a que comportamentos adotados por um profissional para promover a venda dos seus produtos ou serviços, que são suscetíveis de influenciar o comportamento económico dos consumidores e, assim, afetar a concorrência desse profissional, se furtem às regras de concorrência leal impostas por estas diretivas.

40

No processo principal, é dado assente que o registo, por B. Peelaers, do nome de domínio «www.bestlasersorter.com», por conta da Visys, e a utilização por esta última desse nome de domínio assim como das etiquetas em metadados «Helius sorter, LS9000, Genius sorter, Best+Helius, Best+Genius, [...] Best nv» foram feitos no âmbito da atividade comercial desta sociedade.

41

As partes no processo no Tribunal de Justiça discordam apenas sobre a questão de saber se os referidos atos de B. Peelaers e da Visys podem ser qualificados de «forma de comunicação» que é feita «tendo por fim promover o fornecimento de bens ou de serviços», na aceção do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 84/450 e do artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2006/114.

42

Antes de mais, quanto ao registo de um nome de domínio, há que constatar que este constitui apenas, conforme salienta o advogado-geral nos n.os 48 e 49 das suas conclusões, um ato formal mediante o qual um particular requer ao organismo incumbido da gestão dos nomes de domínio que faça figurar, contra pagamento, esse nome de domínio no seu banco de dados e ligue os utilizadores da Internet que o digitem exclusivamente ao endereço IP indicado pelo seu titular. O mero registo de um nome de domínio não implica, todavia, que o mesmo será depois efetivamente utilizado para criar um sítio Internet e que será consequentemente possível aos utilizadores da Internet tomarem conhecimento deste nome de domínio.

43

Ora, atendendo à finalidade das Diretivas 84/450 e 2006/114, recordada nos n.os 36 a 38 do presente acórdão, não se pode considerar que esse ato puramente formal, que, por si só, não implica necessariamente a possibilidade de uma tomada de conhecimento do nome de domínio pelos potenciais consumidores e que como tal não é suscetível de influenciar a sua escolha, constitui uma forma de comunicação com o fim de promover o fornecimento de bens ou de serviços do titular do nome de domínio, na aceção do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 84/450 e do artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2006/114.

44

Na verdade, como alega a BEST, o registo de um nome de domínio tem como consequência privar os concorrentes da possibilidade de registarem e de utilizarem esse nome de domínio para os seus próprios sítios de Internet. Todavia, o simples registo desse nome de domínio não contém em si mesmo nenhuma comunicação publicitária, constituindo, quando muito, uma restrição das possibilidades de comunicação desse concorrente, que pode, eventualmente, ser reprimida por outras disposições legais.

45

Em seguida, no que se refere à utilização de um nome de domínio, é dado assente que, no processo principal, está em causa o facto de a Visys utilizar o nome de domínio «www.bestlasersorter.com» para alojar um sítio Internet cujo conteúdo é idêntico ao dos sítios Internet habituais da Visys, acessíveis através dos nomes de domínio «www.visys.be» e «www.visysglobal.be».

46

Essa utilização tem manifestamente o fim de promover o fornecimento de produtos ou de serviços do titular do nome de domínio.

47

Com efeito, ao invés do que alegam B. Peelaers e a Visys, não é apenas através de um sítio Internet alojado sob o nome de domínio que esse titular pretende promover os seus produtos ou os seus serviços mas também através da utilização de um nome de domínio escolhido com cuidado, destinado a incitar o maior número possível de utilizadores da Internet a visitarem o seu sítio e a interessarem-se pela sua oferta.

48

Além disso, essa utilização de um nome de domínio, o qual faz referência a determinados produtos ou a determinados serviços ou ainda ao nome comercial de uma sociedade, constitui uma forma de comunicação, que se dirige aos potenciais consumidores e lhes sugere que encontrarão, sob esse nome, um sítio Internet relacionado com os referidos produtos ou serviços, ou ainda com a referida sociedade. Um nome de domínio pode, por outro lado, ser parcial ou totalmente composto por termos elogiosos ou ser entendido, enquanto tal, como um elogio aos méritos do produto e do serviço para os quais esse nome reenvia.

49

Esta conclusão não é posta em causa pela circunstância, invocada por B. Peelaers e pela Visys, bem como pela Comissão, de o artigo 2.o, alínea f), da Diretiva 2000/31 definir o conceito de comunicação comercial precisando, designadamente, que «[n]ão constituem comunicações comerciais [...] as informações que permitam o acesso direto à atividade da sociedade, da organização ou da pessoa, nomeadamente um nome de área ou um endereço de correio eletrónico».

50

A este respeito, há que constatar que a exclusão, prevista no artigo 2.o, alínea f), da Diretiva 2000/31, de determinadas informações e comunicações do conceito de comunicação comercial não significa que essas informações e essas comunicações sejam também excluídas do conceito de «publicidade», na aceção do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 84/450 e do artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2006/114, uma vez que este último conceito se encontra definido no sentido de incluir expressamente todas as formas de comunicação.

51

Esta constatação é, de resto, corroborada não apenas pelo facto de as Diretivas 84/450 e 2006/114, por um lado, e a Diretiva 2000/31, por outro, terem, como resulta do seu artigo 1.o, objetivos diferentes mas sobretudo porque decorre claramente do considerando 11 e do artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 2000/31 que esta se aplica sem prejuízo do nível existente de proteção dos interesses dos consumidores e que a Diretiva 84/450 e, como tal, também a Diretiva 2006/114 continuam a ser totalmente aplicáveis aos serviços prestados no âmbito da sociedade da informação.

52

Por último, quanto à utilização de etiquetas em metadados de um sítio Internet, é dado assente que, no processo principal, está em causa o facto de a Visys ter inserido nos metadados, e como tal no código de programação dos seus sítios Internet, as etiquetas «Helius sorter, LS9000, Genius sorter, Best+Helius, Best+Genius, [...] Best nv», que correspondem às denominações de determinados produtos e ao acrónimo do nome comercial da BEST.

53

Essas etiquetas constituídas por palavras-passe («keyword metatags»), que são lidas pelos motores de busca quando estes percorrem a Internet para proceder ao referenciamento dos vários sítios que aí se encontram, constituem um dos fatores que permitem a estes motores efetuar uma classificação dos sítios em função da sua pertinência relativamente ao termo de busca introduzido pelo utilizador da Internet.

54

Assim, a utilização dessas etiquetas que correspondem às denominações dos produtos de um concorrente e ao seu nome comercial terá, regra geral, como efeito que, quando um utilizador da Internet em busca dos produtos desse concorrente introduz uma dessas denominações ou esse nome num motor de busca, o resultado natural por este exibido será modificado em benefício do utilizador dessas etiquetas e a ligação para o seu sítio Internet será incluída na lista desses resultados, eventualmente em proximidade direta com a ligação para o sítio Internet do referido concorrente.

55

Mais particularmente em relação à utilização das etiquetas em metadados em causa no processo principal, ficou demonstrado que, quando um utilizador da Internet introduzia as palavras «Best Laser Sorter» no motor de busca «www.google.be», este reenviava, como segundo resultado da pesquisa, a seguir ao sítio Internet da BEST, para o sítio Internet da Visys.

56

Ora, na maior parte dos casos, o utilizador da Internet que introduz a denominação do produto de uma sociedade ou o seu nome como termo de busca quer encontrar informações ou ofertas sobre esse produto específico ou sobre essa sociedade e a sua gama de produtos. Assim, quando são exibidas, na lista dos resultados naturais, ligações para sítios que apresentam produtos de um concorrente desta sociedade, o utilizador da Internet pode entender essas ligações no sentido de que oferecem uma alternativa relativamente aos produtos da referida sociedade ou que fazem ligação a sítios que oferecem os produtos dessa sociedade (v., por analogia, acórdão de 23 de março de 2010, Google France e Google, C-236/08 a C-238/08, Colet., p. I-2417, n.o 68). A fortiori, esse é também o caso quando as ligações para o sítio Internet do concorrente da referida sociedade se encontram entre os primeiros resultados da pesquisa, na proximidade dos resultados daquela sociedade, ou quando o concorrente utiliza um nome de domínio que faz referência ao seu nome comercial ou à denominação de um dos seus produtos.

57

Na medida em que a utilização de etiquetas em metadados que correspondem às denominações dos produtos de um concorrente e ao seu nome comercial no código de programação de um sítio Internet tem como consequência sugerir ao utilizador de Internet, que introduz uma dessas denominações ou esse nome como termo de busca, que esse sítio está relacionado com a sua pesquisa, a referida utilização deve ser considerada uma forma de comunicação, na aceção do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 84/450 e do artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2006/114.

58

Contrariamente ao que alegam B. Peelaers e a Visys, não é pertinente a este respeito o facto de estas etiquetas em metadados serem invisíveis para o utilizador da Internet e de este não ser o seu destinatário direto, mas sim o motor de busca. Basta constatar a este respeito que, segundo as referidas disposições, o conceito de publicidade engloba expressamente todas as formas de comunicação, incluindo assim também as formas de comunicação indireta, a fortiori quando são suscetíveis de influenciar o comportamento económico dos consumidores e, como tal, de afetar o concorrente a cujo nome ou a cujos produtos as etiquetas aludem.

59

Por outro lado, não restam dúvidas de que essa utilização de etiquetas em metadados constitui uma estratégia de promoção, na medida em que visa incitar o utilizador da Internet a visitar o sítio e a interessar-se nos produtos ou serviços do seu titular.

60

À luz do exposto, deve responder-se à questão submetida que o artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 84/450 e o artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2006/114 devem ser interpretados no sentido de que o conceito de «publicidade», conforme definido nestas disposições, abrange, numa situação como a que está em causa no processo principal, a utilização de um nome de domínio e a utilização de etiquetas nos metadados de um sítio Internet. Em contrapartida, não está englobado neste conceito o registo, enquanto tal, de um nome de domínio.

Quanto às despesas

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Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

 

O artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 84/450/CEE do Conselho, de 10 de setembro de 1984, relativa à publicidade enganosa e comparativa, conforme alterada pela Diretiva 2005/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2005, e o artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2006/114/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa à publicidade enganosa e comparativa, devem ser interpretados no sentido de que o conceito de «publicidade», conforme definido nestas disposições, abrange, numa situação como a que está em causa no processo principal, a utilização de um nome de domínio e a utilização de etiquetas em metadados de um sítio Internet. Em contrapartida, não está englobado neste conceito o registo, enquanto tal, de um nome de domínio.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.