ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

14 de junho de 2012 ( *1 )

«Concorrência — Artigo 101.o TFUE — Setor automóvel — Regulamento (CE) n.o 1400/2002 — Isenção por categorias — Sistema de distribuição seletiva — Conceito de ‘critérios específicos’ no que respeita a um sistema de distribuição seletiva quantitativa — Recusa de aprovação como distribuidor de veículos novos — Inexistência de critérios de seleção quantitativos precisos, objetivos, proporcionados e não discriminatórios»

No processo C-158/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pela Cour de cassation (França), por decisão de 29 de março de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 1 de abril de 2011, no processo

Auto 24 SARL

contra

Jaguar Land Rover France SAS,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: J. N. Cunha Rodrigues, presidente de secção, U. Lõhmus, A. Rosas, A. Ó Caoimh (relator) e A. Arabadjiev, juízes,

advogado-geral: J. Mazák,

secretário: R. Şereş, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 11 de janeiro de 2012,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Auto 24 SARL, por R. Bertin, avocat,

em representação da Jaguar Land Rover France SAS, por J. Vogel e L. Boudailliez, avocats,

em representação do Governo francês, por G. de Bergues e J. Gstalter, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por B. Mongin, A. Biolan e F. Ronkes Agerbeek, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 1.o, n.o 1, alínea f), do Regulamento (CE) n.o 1400/2002 da Comissão, de 31 de julho de 2002, relativo à aplicação do n.o 3 do artigo 81.o do Tratado a certas categorias de acordos verticais e práticas concertadas no setor automóvel (JO L 203, p. 30, a seguir «regulamento»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Auto 24 SARL (a seguir «Auto 24») à Jaguar Land Rover France SAS (a seguir «JLR»), relativamente à recusa desta sociedade de aprovar a Auto 24 como distribuidor de veículos a motor novos da marca LAND ROVER.

Quadro jurídico

Direito da União

3

O regulamento, adotado com base no artigo 1.o do Regulamento n.o 19/65/CEE do Conselho, de 2 de março de 1965, relativo à aplicação do n.o 3 do artigo 85.o do Tratado a certas categorias de acordos e práticas concertadas (JO 1965, 36, p. 533; EE 08 F1 p. 85), estabelece uma isenção da proibição prevista no artigo 81.o, n.o 1, CE, para certas categorias de acordos verticais e práticas concertadas no setor automóvel (a seguir «isenção»).

4

O primeiro e quarto a oitavo considerandos do regulamento têm a seguinte redação:

«(1)

A experiência adquirida no setor automóvel relativamente à distribuição de veículos a motor novos […] permite a definição de categorias de acordos verticais que podem ser considerados como satisfazendo normalmente as condições estabelecidas no n.o 3 do artigo 81.o [do Tratado.]

[...]

(4)

O benefício da isenção por categoria deve limitar-se aos acordos verticais em relação aos quais se possa considerar com suficiente segurança que preenchem as condições estabelecidas no n.o 3 do artigo 81.o [do Tratado.]

(5)

Os acordos verticais abrangidos pelas categorias definidas no presente regulamento podem melhorar a eficiência económica no âmbito de uma cadeia de produção ou de distribuição, melhorando a coordenação entre as empresas participantes. Nomeadamente, estes acordos podem conduzir a uma redução dos custos de transação e distribuição das partes e garantir uma otimização das suas vendas e níveis de investimento.

(6)

A possibilidade de tais ganhos de eficiência compensarem eventuais efeitos anticoncorrenciais resultantes de restrições incluídas em acordos verticais depende do grau de poder de mercado das empresas em causa e, por conseguinte, da medida em que essas empresas enfrentem a concorrência de outros fornecedores de bens ou serviços considerados permutáveis ou substituíveis pelo comprador [...]

(7)

Devem ser estabelecidos limiares baseados em quotas de mercado a fim de refletirem o poder de mercado dos fornecedores. […] O limiar abaixo do qual se pode presumir que as vantagens garantidas pelos acordos verticais compensam os seus efeitos restritivos deve variar com as características dos diferentes tipos de acordos verticais. Pode, por conseguinte, presumir-se que, de modo geral, os acordos verticais apresentam tais vantagens, sempre que o fornecedor em causa disponha de uma quota até 30% nos mercados da distribuição de veículos a motor novos ou de peças sobressalentes ou até 40% quando é utilizada a distribuição seletiva quantitativa para a venda de veículos a motor novos. [...]

(8)

Acima desses limiares de quota de mercado, não pode presumir-se que os acordos verticais abrangidos pelo âmbito de aplicação do n.o 1 do artigo 81.o deem normalmente origem a benefícios objetivos dessa natureza e dimensão, de forma a compensar as desvantagens causadas à concorrência. Todavia, essas vantagens podem ser antecipadas no caso da distribuição seletiva qualitativa independentemente da quota de mercado do fornecedor.»

5

Nos termos do artigo 1.o, n.o 1, alíneas f) a h), do regulamento, para efeitos da sua aplicação, entende-se por:

«f)

‘Sistema de distribuição seletiva’, o sistema de distribuição em que o fornecedor se compromete a vender os bens ou serviços contratuais, quer direta quer indiretamente, apenas a distribuidores ou oficinas de reparação selecionadas com base em critérios específicos e em que estes distribuidores ou oficinas de reparação se comprometem a não vender esses bens ou serviços a distribuidores ou a oficinas de reparação independentes não autorizadas, sem prejuízo da possibilidade de vender peças sobressalentes a oficinas de reparação independentes ou da obrigação de fornecer a operadores independentes todas as informações técnicas, equipamento de diagnóstico, ferramentas e formação necessários para a reparação e manutenção de veículos a motor ou para a aplicação de medidas de proteção ambiental;

g)

‘Sistema de distribuição seletiva quantitativa’, o sistema de distribuição seletiva em que o fornecedor utiliza critérios para a seleção de distribuidores ou oficinas de reparação que limitam diretamente o seu número;

h)

‘Sistema de distribuição seletiva qualitativa’, o sistema de distribuição seletiva em que o fornecedor utiliza critérios para a seleção de distribuidores ou oficinas de reparação, que têm apenas caráter qualitativo, são exigidos pela natureza dos bens ou serviços contratuais, são estabelecidos uniformemente para todos os distribuidores ou oficinas de reparação que se candidatem ao sistema de distribuição, não são aplicados de forma discriminatória e não limitam diretamente o número de distribuidores ou de oficinas de reparação;»

6

O artigo 3.o, n.o 1, do regulamento prevê:

«Sem prejuízo dos n.os 2, 3, 4, 5, 6 e 7, a isenção prevista no artigo 2.o é aplicável, desde que a quota do fornecedor no mercado relevante em que vende os veículos a motor novos, as peças sobressalentes para veículos a motor ou os serviços de reparação e manutenção para veículos a motor não seja superior a 30%.

Contudo, o limiar da quota de mercado para aplicação da isenção é de 40% relativamente aos acordos que estabeleçam sistemas de distribuição seletiva quantitativa para a venda de veículos a motor novos.

Os limiares não são aplicáveis a acordos que estabeleçam sistemas de distribuição seletiva qualitativa.»

7

O artigo 5.o, n.o 2, alínea b), do regulamento dispõe, no que diz respeito à venda de veículos a motor novos, que a isenção não é aplicável a nenhuma «obrigação direta ou indireta imposta a qualquer distribuidor de veículos de passageiros ou veículos comerciais ligeiros num sistema de distribuição seletiva, que limite a sua possibilidade de criar instalações de venda ou de entrega suplementares noutros locais no mercado comum, quando é aplicada a distribuição seletiva».

8

Em conformidade com o artigo 6.o do regulamento, o benefício da isenção pode ser retirado se se verificar que, num caso determinado, os acordos verticais em causa têm efeitos incompatíveis com o disposto no n.o 3 do artigo 81.o CE.

9

Decorre do artigo 12.o do regulamento que este entrou em vigor a 1 de outubro de 2002, com exceção da alínea b) do n.o 2 do artigo 5.o, que é aplicável a partir de 1 de outubro de 2005.

Direito francês

10

Nos termos do artigo 1382.o do Código Civil, «[q]uem, por culpa sua, causar um dano a outrem, é obrigado a reparar esse dano».

Litígio no processo principal e questão prejudicial

11

A JLR é importador em França de veículos a motor novos e de produtos da marca LAND ROVER.

12

Desde 1994 que a Auto 24 era concessionária exclusiva da JLR em Périgueux (França). O seu contrato de concessão foi resolvido em 27 de setembro de 2002, com efeitos a 30 de setembro de 2004, mediante aviso prévio de dois anos, previsto nas disposições contratuais. Na data da resolução, a Auto 24 celebrou com a JLR um contrato de reparador autorizado. Em contrapartida, a sua candidatura para se tornar distribuidor autorizado foi rejeitada pela JLR.

13

Por sentença transitada em julgado em 28 de outubro de 2005, o tribunal de commerce de Versailles declarou que a JLR tinha mostrado discriminação na análise da referida candidatura e, consequentemente, condenou-a a pagar à Auto 24 uma indemnização no montante de 100000 euros por lucros cessantes, correspondentes aos lucros que esta podia ter obtido se tivesse sido designada distribuidor autorizado.

14

Em 19 de janeiro de 2006, a JLR recusou novamente à Auto 24 a qualidade de distribuidor autorizado em Périgueux, pelo facto de o numerus clausus estabelecido pela JLR não prever a designação de um distribuidor de veículos novos nessa cidade.

15

Em outubro de 2006, a sociedade Pericaud Automobiles, distribuidor autorizado da JLR, abriu um estabelecimento secundário em Trélissac (França), na periferia de Périgueux.

16

Nestas condições, a Auto 24 demandou a JLR no tribunal de commerce de Bordeaux, pedindo que esta fosse condenada a pagar-lhe uma indemnização pelo prejuízo sofrido pela sua recusa de a aprovar como distribuidor no setor de Périgueux.

17

Por sentença de 8 de fevereiro de 2008, o tribunal de commerce de Bordeaux julgou improcedentes todos os pedidos da Auto 24.

18

Por acórdão de 2 de dezembro de 2009, a cour d’appel de Paris confirmou a referida sentença, ao declarar, nomeadamente, que a JLR tinha recusado aprovar a Auto 24 como distribuidor, com base num numerus clausus estabelecido em 8 de abril de 2005, que previa 72 contratos de distribuidores autorizados para 109 locais, descritos numa tabela dos contratos e dos locais, da qual a Périgueux não consta.

19

A Auto 24 interpôs então recurso do referido acórdão para o órgão jurisdicional de reenvio. No seu recurso, a Auto 24 alega, nomeadamente, que a cour d’appel de Paris violou o artigo 1.o, n.o 1, alínea g), do regulamento e o artigo 1382.o do Código Civil, ao considerar que nenhuma disposição legislativa ou regulamentar de direito nacional ou de direito comunitário impõe ao concedente que justifique as razões económicas ou outras que estão na origem de um numerus clausus e ao declarar que a JLR tinha estabelecido um numerus clausus que não prevê a possibilidade de implantação em Périgueux, sem examinar a objetividade dos critérios de seleção, a sua utilidade económica, a melhoria do serviço prestado à clientela e as condições da sua aplicação. Na opinião da Auto 24, num sistema de distribuição seletiva quantitativa, o fornecedor, quando seleciona os seus distribuidores, deve aplicar critérios de seleção quantitativos precisos, objetivos, proporcionados ao objetivo a alcançar e utilizados de forma não discriminatória.

20

Nestas condições, a Cour de cassation, por ter dúvidas quanto à interpretação do regulamento, nomeadamente quanto às exigências relativas aos critérios de seleção em matéria de distribuição seletiva quantitativa, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Como deve ser entendida a expressão ‘critérios específicos’ constante do artigo 1.o, n.o 1, alínea f), do [r]egulamento [...] no que respeita a uma distribuição seletiva quantitativa?»

Quanto à questão prejudicial

21

Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se a expressão «critérios específicos», constante do artigo 1.o, n.o 1, alínea f), do regulamento, deve ser interpretada no sentido de que exige que, para beneficiar da isenção, um sistema de distribuição seletiva quantitativa na aceção do regulamento se baseie em critérios que sejam objetivamente justificados e aplicados de modo uniforme e indiferenciado a todos os candidatos à aprovação.

22

A título preliminar, importa recordar que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça (v., nomeadamente, acórdãos de 18 de dezembro de 1986, VAG France, 10/86, Colet., p. 4071, n.o 12; de 30 de abril de 1998, Cabour, C-230/96, Colet., p. I-2055, n.os 47, 48 e 51; e de 2 de abril de 2009, Pedro IV Servicios, C-260/07, Colet., p. I-2437, n.o 68) que o desrespeito de uma condição necessária à isenção não pode, por si só, dar lugar a uma indemnização ao abrigo do artigo 101.o TFUE ou obrigar um fornecedor a admitir um distribuidor candidato num sistema de distribuição.

23

No caso em apreço, a Auto 24 alega que, no essencial, qualquer critério quantitativo na aceção do artigo 1.o, n.o 1, alínea g), do regulamento, a saber, todo o critério que, para selecionar os distribuidores ou os reparadores, limita diretamente o seu número, deve respeitar justificações económicas objetivas, que o fornecedor deve provar, e ser aplicado de modo uniforme e não discriminatório a todas as zonas de atração comercial e a todos os potenciais candidatos ao sistema de distribuição.

24

A este respeito, importa recordar que decorre do primeiro e quarto a sexto considerandos do regulamento que o benefício da isenção está limitado aos acordos verticais que, à luz da experiência adquirida em matéria de distribuição no setor automóvel e dados os ganhos de eficiência que proporcionam, se presume que satisfazem as condições estabelecidas no artigo 101.o, n.o 3, TFUE.

25

Como decorre do sétimo considerando do regulamento, o limiar abaixo do qual se pode presumir que as vantagens garantidas pelos acordos verticais compensam os seus efeitos restritivos deve variar com as características dos diferentes tipos de acordos verticais.

26

Segundo o sétimo e oitavo considerandos do regulamento, os acordos verticais apresentam geralmente essas vantagens, sempre que o fornecedor em causa disponha de uma quota do mercado onde vende os veículos a motor novos, que não exceda 40% quando é utilizada a «distribuição seletiva quantitativa» para a venda de veículos a motor novos, ao passo que, no caso da «distribuição seletiva qualitativa», se pode contar com essas vantagens independentemente da quota de mercado do fornecedor.

27

Assim, nos termos do artigo 3.o, n.o 1, segundo parágrafo, do regulamento, o limiar da quota de mercado para a aplicação da isenção é de 40% relativamente aos acordos que estabeleçam sistemas de distribuição seletiva quantitativa para a venda desses veículos, ao passo que, em conformidade com o terceiro parágrafo do referido n.o 1, a quota de mercado detida pelo fornecedor em causa é irrelevante para efeitos da aplicação da isenção aos acordos que estabeleçam sistemas de distribuição seletiva qualitativa.

28

É neste contexto que há que entender os conceitos de «sistema de distribuição seletiva», de «sistema de distribuição seletiva quantitativa» e de «sistema de distribuição seletiva qualitativa», definidos, respetivamente, no artigo 1.o, n.o 1, alíneas f) a h), do regulamento.

29

Resulta destas últimas disposições que, no que diz respeito tanto aos sistemas de distribuição seletiva quantitativa como aos sistemas de distribuição seletiva qualitativa, na aceção do regulamento, os distribuidores devem ser selecionados com base em «critérios específicos», na aceção do artigo 1.o, n.o 1, alínea f), do regulamento.

30

Neste contexto, a expressão «critérios específicos», na aceção dessa disposição, deve ser interpretada no sentido de que se refere a critérios cujo conteúdo específico pode ser verificado.

31

Quanto a este ponto, importa precisar que, para verificar o seu conteúdo específico, não é necessário que os critérios de seleção utilizados para efeitos de um sistema de distribuição seletiva sejam publicados, sob pena de, como afirmou o Governo francês, comprometer o segredo comercial ou mesmo facilitar eventuais comportamentos colusórios.

32

Por outro lado, não decorre da definição do conceito de «sistema de distribuição seletiva quantitativa», constante do artigo 1.o, n.o 1, alínea g), do regulamento, que este conceito deva ser interpretado no sentido de que implica a exigência de que os critérios aplicados pelo fornecedor para selecionar os distribuidores não só sejam «definidos», mas, além disso, sejam objetivamente justificados e aplicados de modo uniforme e indiferenciado a todos os candidatos à aprovação.

33

Com efeito, é só no contexto dos sistemas de distribuição seletiva qualitativa que o regulamento, mediante a definição constante do seu artigo 1.o, n.o 1, alínea h), impõe, nomeadamente, que os critérios de seleção utilizados pelo fornecedor sejam «exigidos pela natureza dos bens ou serviços contratuais, [sejam] estabelecidos uniformemente para todos os distribuidores ou oficinas de reparação que se candidatem ao sistema de distribuição [e] não [sejam] aplicados de forma discriminatória».

34

Assim, decorre dos próprios termos das definições constantes do artigo 1.o, n.o 1, alíneas f) e g), do regulamento que, quando um sistema de distribuição para venda de veículos a motor novos proíbe a revenda aos distribuidores não autorizados e assenta em critérios específicos que limitam diretamente o número de distribuidores, esse sistema pode ser qualificado de «sistema de distribuição seletiva quantitativa», na aceção do regulamento. O facto de, na prática, os sistemas de distribuição de veículos a motor novos incluírem, muitas vezes, tanto critérios qualitativos como quantitativos não é relevante para o efeito, como a JLR e a Comissão reconheceram, no essencial, na audiência.

35

Nestas condições, como sustentam, no essencial, a JLR, o Governo francês e a Comissão, se, no âmbito do regulamento, os critérios quantitativos de seleção tiverem de ser obrigatoriamente objetivos e não discriminatórios, daí resultará uma confusão entre as condições exigidas pelo regulamento para a aplicação da isenção aos sistemas de distribuição seletiva qualitativa e as impostas por este mesmo regulamento em aplicação da isenção aos sistemas de distribuição seletiva quantitativa.

36

Ora, não decorre da sistemática do regulamento que o legislador tenha querido prever as mesmas condições de isenção para estes dois sistemas de distribuição seletiva. Pelo contrário, dado que, como resulta nomeadamente dos n.os 26 e 27 do presente acórdão, o regulamento prevê condições de isenção distintas consoante a distribuição seletiva em causa seja qualificada de «quantitativa» ou de «qualitativa», os elementos constantes unicamente do artigo 1.o, n.o 1, alínea h), do regulamento não podem ser também aplicados à alínea g) dessa disposição, sob pena de misturar estes dois tipos de distribuição seletiva.

37

Por outro lado, contrariamente ao que a Auto 24 deu a entender, o facto de, em conformidade com o artigo 5.o, n.o 2, do regulamento, um fornecedor não poder impedir a abertura de um estabelecimento secundário por um dos seus distribuidores autorizados é, a este respeito, irrelevante.

38

Além disso, a jurisprudência invocada pela Auto 24, resultante do acórdão de 25 de outubro de 1977, Metro SB-Großmärkte/Comissão (26/76, Colet., p. 659), não tem incidência no caso vertente. Quanto a este ponto, basta verificar que, no âmbito do regulamento, como resulta, nomeadamente, dos n.os 32 a 34 do presente acórdão, um «sistema de distribuição seletiva quantitativa» distingue-se, por definição, da «seleção qualitativa dos distribuidores», objeto do n.o 20 do acórdão Metro SB-Großmärkte/Comissão, já referido.

39

Face ao exposto, há que responder à questão submetida que a expressão «critérios específicos», constante do artigo 1.o, n.o 1, alínea f), do regulamento, deve ser entendida, no que diz respeito a um sistema de distribuição seletiva quantitativa na aceção desse regulamento, como critérios cujo conteúdo específico pode ser verificado. Para beneficiar da isenção prevista no referido regulamento, não é necessário que esse sistema se baseie em critérios objetivamente justificados e aplicados de modo uniforme e indiferenciado a todos os candidatos à aprovação.

Quanto às despesas

40

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

 

A expressão «critérios específicos», constante do artigo 1.o, n.o 1, alínea f), do Regulamento (CE) n.o 1400/2002 da Comissão, de 31 de julho de 2002, relativo à aplicação do n.o 3 do artigo 81.o do Tratado a certas categorias de acordos verticais e práticas concertadas no setor automóvel, deve ser entendida, no que diz respeito a um sistema de distribuição seletiva quantitativa na aceção desse regulamento, como critérios cujo conteúdo específico pode ser verificado. Para beneficiar da isenção prevista no referido regulamento, não é necessário que esse sistema se baseie em critérios objetivamente justificados e aplicados de modo uniforme e indiferenciado a todos os candidatos à aprovação.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: francês.