Processo T‑362/08

IFAW Internationaler Tierschutz‑Fonds gGmbH

contra

Comissão Europeia

«Acesso aos documentos – Regulamento (CE) n.° 1049/2001 – Documentos relativos à realização de um projecto industrial numa zona protegida nos termos da Directiva 92/43/CEE – Documentos que emanam de um Estado‑Membro – Oposição manifestada pelo Estado‑Membro – Recusa parcial de acesso – Excepção relativa à política económica de um Estado‑Membro – Artigo 4, n.os 5 a 7, do Regulamento n.° 1049/2001»

Sumário do acórdão

1.      União Europeia – Instituições – Direito de acesso do público aos documentos – Regulamento n.° 1049/2001 – Excepções ao direito de acesso aos documentos – Documentos emanados de um Estado‑Membro

(Regulamento n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 4.°, n.os 1 a 3 e 5)

2.      União Europeia – Instituições – Direito de acesso do público aos documentos – Regulamento n.° 1049/2001 – Excepções ao direito de acesso aos documentos – Protecção do interesse público – Documentos emanados de um Estado‑Membro

[Regulamento n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 4.°, n.os 1, alínea a), e 5]

3.      União Europeia – Instituições – Direito de acesso do público aos documentos – Regulamento n.° 1049/2001 – Excepções ao direito de acesso aos documentos – Dever de fundamentação – Alcance

(Artigo 235.° CE; Regulamento n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigos 4.°, 9.° e 11.°, n.° 2)

4.      União Europeia – Instituições – Direito de acesso do público aos documentos – Regulamento n.° 1049/2001 – Excepções ao direito de acesso aos documentos – Obrigação de autorizar o acesso parcial aos dados não cobertos pelas excepções

(Regulamento n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 4.°, n.os 1 a 3 e 6)

1.      Em caso de correspondência entre a decisão de uma instituição que não autoriza o acesso a um documento que emana de um Estado‑Membro, por um lado, e o pedido que este apresentou ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, por outro, é da competência do juiz da União fiscalizar, a pedido do requerente a quem foi oposta uma recusa de acesso pela instituição solicitada, se essa recusa pode ser validamente fundamentada nas excepções previstas nos n.os 1 a 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, e se essa recusa resulta da apreciação das mesmas pela própria instituição ou pelo Estado‑Membro em causa. Conclui‑se que, devido à aplicação do n.° 5 do artigo 4.° desse regulamento, o controlo a efectuar pelo juiz da União não é necessariamente um controlo prima facie. A aplicação desta disposição não o impede de proceder a um controlo integral da decisão de recusa da Comissão, que deve, designadamente, respeitar o dever de fundamentação e que assenta na apreciação material, pelo Estado‑Membro em causa, da aplicabilidade das excepções previstas nos n.os 1 a 3 do artigo 4.° do referido regulamento.

A fiscalização integral, pelo juiz da União, da aplicabilidade das excepções materiais em causa não implica obrigatoriamente que a instituição, autora da decisão, esteja, ou não, habilitada a efectuar um controlo completo da oposição manifestada pelo Estado‑Membro ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001. Mesmo que a referida instituição tenha recusado o acesso a um documento que emana de um Estado‑Membro após ter concluído, com base num controlo prima facie, que, em seu entender, os fundamentos da oposição apresentados por esse Estado‑Membro não foram invocados de forma manifestamente inadequada, o controlo do juiz da União não está limitado, por força do disposto no artigo 4.°, n.° 5, a um controlo prima facie da aplicabilidade das excepções materiais previstas nos n.os 1 a 3 dessa disposição, pois fiscaliza a aplicabilidade dessas excepções com base na apreciação material efectuada pelo Estado‑Membro em causa.

(cf. n.os 86 a 88)

2.      No que diz respeito ao alcance da fiscalização da legalidade de uma decisão de recusa de acesso a um documento pelo juiz da União, no quadro da aplicação de uma das excepções materiais visadas no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 1049/2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, importa reconhecer à instituição, autora da decisão, um amplo poder de apreciação para determinar se a divulgação de documentos que pertencem aos domínios abrangidos pelas referidas excepções pode prejudicar o interesse público. Essa margem de apreciação baseia‑se, designadamente, no facto de essa decisão de recusa ter um carácter complexo e delicado que obriga a um especial grau de prudência e na circunstância de os critérios enunciados no referido artigo 4.°, n.° 1, alínea a), serem muito genéricos.

Este raciocínio continua válido se, no caso de recusa de uma instituição em permitir o acesso a um documento que emana de um Estado‑Membro ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, a aplicação de uma excepção material prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), desse diploma assentar na apreciação do Estado‑Membro. Com efeito, a apreciação da questão de saber se a divulgação de um documento prejudica os interesses protegidos por essas excepções materiais pode integrar as responsabilidades políticas desse Estado‑Membro. Nesse caso, o Estado‑Membro deve dispor, como a instituição, de uma ampla margem de apreciação.

A fiscalização a exercer pelo juiz da União deve, portanto, limitar‑se à verificação do respeito das regras processuais e de fundamentação, da exactidão material dos factos bem como da inexistência de erro manifesto de apreciação e de desvio de poder.

(cf. n.os 104 a 105 e 107)

3.      No caso de uma decisão de recusa de acesso a um documento, ao abrigo de uma excepção prevista no artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, a fundamentação deve incluir explicações quanto à questão de saber como é que o acesso a esse documento pode, em concreto, prejudicar efectivamente o interesse protegido por essa excepção. Porém, pode ser impossível apresentar as razões que justificam a confidencialidade do documento, independentemente de se tratar ou não de um documento sensível na acepção do artigo 9.° desse regulamento, sem divulgar o seu conteúdo, privando assim a excepção daquilo que é a sua finalidade essencial.

A necessidade de não revelar elementos susceptíveis de, indirectamente, prejudicar os interesses que as referidas excepções têm, especificamente, por objectivo proteger é sublinhada, nomeadamente, pelo artigo 11.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001. Esta disposição prevê, designadamente, que, quando um documento, independentemente de ser sensível ou não na acepção do artigo 9.° desse regulamento, seja objecto de uma referência no registo de uma instituição, essa referência deve ser concebida de forma a não prejudicar a protecção dos interesses a que se refere o artigo 4.° do mesmo regulamento.

(cf. n.os 110 a 112)

4.      O n.° 6 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, não está indissociavelmente ligado aos n.os 1 a 3 dessa mesma disposição. Com efeito, embora a análise concreta das excepções previstas nessas disposições seja efectivamente uma condição necessária para se decidir da possibilidade de se permitir um acesso parcial ao documento, o exame dessa possibilidade não diz respeito às condições de aplicação das excepções em causa. A necessidade desse exame decorre do princípio da proporcionalidade. Com efeito, no quadro do referido artigo 4.°, n.° 6, há que determinar se o objectivo prosseguido com a recusa de acesso a um documento pode ser alcançado mesmo no caso de só serem censuradas as passagens que podem prejudicar o interesse protegido.

As condições de aplicação do artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001 devem, portanto, ser examinadas separadamente e num estádio de análise diferente do das excepções ao direito de acesso previstas nos n.os 1 a 3 dessa disposição.

(cf. n.os 147 e 148)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

13 de Janeiro de 2011 (*)

«Acesso aos documentos – Regulamento (CE) n.° 1049/2001 – Documentos relativos à realização de um projecto industrial numa zona protegida nos termos da Directiva 92/43/CEE – Documentos que emanam de um Estado‑Membro – Oposição manifestada pelo Estado‑Membro – Recusa parcial de acesso – Excepção relativa à política económica de um Estado‑Membro – Artigo 4, n.os 5 a 7, do Regulamento n.° 1049/2001»

No processo T‑362/08,

IFAW Internationaler Tierschutz‑Fonds gGmbH, com sede em Hamburgo (Alemanha), representada por S. Crosby, solicitor, e S. Santoro, advogado,

recorrente,

apoiada por:

Reino da Dinamarca, representado por J. Bering Liisberg e B. Weis Fogh, na qualidade de agentes,

República da Finlândia, inicialmente representada por J. Heliskoski, M. Pere e H. Leppo, e posteriormente por J. Heliskoski, na qualidade de agentes,

e

Reino da Suécia, representado por K. Petkovska, A. Falk e S. Johannesson, na qualidade de agentes,

intervenientes,

contra

Comissão Europeia, representada por C. O’Reilly e P. Costa de Oliveira, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Comissão, de 19 de Junho de 2008, que recusou à recorrente o acesso a um documento que as autoridades alemãs enviaram à Comissão no quadro de um processo relativo à desclassificação de um sítio protegido nos termos da Directiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de Maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (JO L 206, p. 7),

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção),

composto por: E. Martins Ribeiro, presidente, N. Wahl e A. Dittrich (relator), juízes,

secretário: N. Rosner, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 16 de Abril de 2010,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        O Regulamento (CE) n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43), define os princípios, as condições e os limites do direito de acesso aos documentos dessas instituições previsto no artigo 255.° CE. Este regulamento é aplicável desde 3 de Dezembro de 2001.

2        O artigo 2.° do Regulamento n.° 1049/2001 dispõe:

«1.      Todos os cidadãos da União e todas as pessoas singulares ou colectivas que residam ou tenham a sua sede social num Estado‑Membro têm direito de acesso aos documentos das instituições, sob reserva dos princípios, condições e limites estabelecidos no presente regulamento.

[…]

3.      O presente regulamento é aplicável a todos os documentos na posse de uma instituição, ou seja, aos documentos por ela elaborados ou recebidos que se encontrem na sua posse, em todos os domínios de actividade da União Europeia.

[…]»

3        O artigo 3.° do Regulamento n.° 1049/2001 enuncia:

«Para os efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

a)      ‘Documento’, qualquer conteúdo, seja qual for o seu suporte (documento escrito em suporte papel ou electrónico, registo sonoro, visual ou audiovisual) sobre assuntos relativos às políticas, acções e decisões da competência da instituição em causa;

b)      ‘Terceiros’, qualquer pessoa singular ou colectiva ou qualquer entidade exterior à instituição em causa, incluindo os Estados‑Membros, as restantes instituições ou órgãos comunitários e não‑comunitários e os Estados terceiros.»

4        O artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, que define as excepções ao referido direito de acesso, estabelece o seguinte:

«1.      As instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a protecção:

a)      Do interesse público, no que respeita:

–        à segurança pública,

–        à defesa e às questões militares,

–        às relações internacionais,

–        à política financeira, monetária ou económica da Comunidade ou de um Estado‑Membro;

[…]

3.      […]

O acesso a documentos que contenham pareceres para uso interno, como parte de deliberações e de consultas preliminares na instituição em causa, será recusado mesmo após ter sido tomada a decisão, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

4.      No que diz respeito a documentos de terceiros, a instituição consultará os terceiros em causa tendo em vista avaliar se qualquer das excepções previstas nos n.os 1 ou 2 é aplicável, a menos que seja claro se o documento deve ou não ser divulgado.

5.      Qualquer Estado‑Membro pode solicitar à instituição que esta não divulgue um documento emanado desse Estado‑Membro sem o seu prévio acordo.

6.      Quando só algumas partes do documento pedido forem abrangidas por qualquer das excepções, as restantes partes do documento serão divulgadas.

7.      As excepções previstas nos n.os 1 a 3 só são aplicáveis durante o período em que a protecção se justifique com base no conteúdo do documento. As excepções podem ser aplicadas, no máximo, durante 30 anos. No que se refere aos documentos abrangidos pelas excepções relativas à vida privada ou a interesses comerciais e aos documentos sensíveis, as excepções podem, se necessário, ser aplicáveis após aquele período.»

5        O artigo 9.° do Regulamento n.° 1049/2001, relativo ao tratamento de documentos sensíveis, estabelece:

«1.      Documentos sensíveis são os documentos emanados das instituições ou das agências por elas criadas, dos Estados‑Membros, de Estados terceiros ou de organizações internacionais, classificados como ‘TRÈS SECRET/TOP SECRET’, ‘SECRET’, ou ‘CONFIDENTIEL’ por força das regras em vigor no seio da instituição em causa que protegem os interesses essenciais da União Europeia ou de um ou vários dos seus Estados‑Membros abrangidos pelo n.° 1, alínea a), do artigo 4.°, em especial a segurança pública, a defesa e as questões militares.

2.      Os pedidos de acesso a documentos sensíveis no âmbito dos procedimentos previstos nos artigos 7.° e 8.° serão tratados exclusivamente por pessoas autorizadas a tomar conhecimento do conteúdo desses documentos. Sem prejuízo do disposto no n.° 2 do artigo 11.°, cabe a estas pessoas precisar as referências dos documentos sensíveis que poderão ser inscritas no registo público.

3.      Os documentos sensíveis só serão registados ou divulgados mediante acordo da entidade de origem.

[…]»

6        O artigo 6.°, n.° 4, da Directiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de Maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (JO L 206, p. 7), está redigido nos seguintes termos:

«Se, apesar de a avaliação das incidências sobre o sítio ter levado a conclusões negativas e na falta de soluções alternativas, for necessário realizar um plano ou projecto por outras razões imperativas de reconhecido interesse público, incluindo as de natureza social ou económica, o Estado‑Membro tomará todas as medidas compensatórias necessárias para assegurar a protecção da coerência global da rede Natura 2000. O Estado‑Membro informará a Comissão das medidas compensatórias adoptadas.

No caso de o sítio em causa abrigar um tipo de habitat natural e/ou uma espécie prioritária, apenas podem ser evocadas razões relacionadas com a saúde do homem ou a segurança pública ou com consequências benéficas primordiais para o ambiente ou, após parecer da Comissão, outras razões imperativas de reconhecido interesse público.»

 Antecedentes do litígio

7        A recorrente, a IFAW Internationaler Tierschutz‑Fonds gGmbH, é uma organização não governamental que actua no domínio da preservação do bem‑estar dos animais e da protecção da natureza.

8        Na sequência de um pedido que a República Federal da Alemanha lhe apresentou ao abrigo do disposto no artigo 6.°, n.° 4, segundo parágrafo, da Directiva 92/43, a Comissão das Comunidades Europeias, em 19 de Abril de 2000, deu um parecer favorável à realização de um projecto industrial no sítio de Mühlenberger Loch, uma zona protegida nos termos dessa directiva. Este projecto consistia na ampliação da fábrica da sociedade D. com vista à montagem final do Airbus A3XX.

9        Por carta de 20 de Dezembro de 2001 que endereçou à Comissão, a recorrente pediu para ter acesso a diversos documentos que foram recebidos pela referida instituição no âmbito da apreciação do projecto industrial acima mencionado, a saber, a correspondência enviada pela República Federal da Alemanha, pelo Município de Hamburgo e pelo Chanceler alemão.

10      Considerando que o artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 a proibia de divulgar os documentos em causa, a Comissão adoptou, em 26 de Março de 2002, a sua decisão de recusar à recorrente o acesso a determinados documentos que havia recebido no quadro do procedimento no termo do qual proferiu o seu parecer de 19 de Abril de 2000.

11      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de Junho de 2002, a recorrente interpôs um recurso de anulação da decisão da Comissão de 26 de Março de 2002.

12      Com o acórdão de 30 de Novembro de 2004, IFAW Internationaler Tierschutz‑Fonds/Comissão (T‑168/02, Colect., p. II‑4135), o Tribunal Geral negou provimento a esse recurso.

13      Em 10 de Fevereiro de 2005, o Reino da Suécia, interveniente no processo T‑168/02, já referido, interpôs, no Tribunal de Justiça, recurso do acórdão que o Tribunal Geral proferiu nesse processo.

14      Por acórdão de 18 de Dezembro de 2007, Suécia/Comissão (C‑64/05 P, Colect., p. I‑11389), o Tribunal de Justiça anulou o acórdão IFAW Internationaler Tierschutz‑Fonds/Comissão, referido no n.° 12 supra, e a decisão da Comissão de 26 de Março de 2002.

15      Na sequência do acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, a recorrente, por carta de 13 de Fevereiro de 2008 endereçada à Comissão, reiterou o seu pedido de acesso aos documentos das autoridades alemãs e recebidos por essa instituição no quadro do estudo do projecto Mühlenberger Loch.

16      Por ofício de 20 de Fevereiro de 2008, a Comissão acusou a recepção da carta da recorrente de 13 de Fevereiro de 2008.

17      Em 26 de Março de 2008, a recorrente convidou a Comissão a responder ao seu pedido de 13 de Fevereiro de 2008.

18      Por ofício de 7 de Abril de 2008, a Comissão informou a recorrente de que estava a decorrer uma consulta às autoridades alemãs sobre a divulgação dos documentos pedidos.

19      Em 9 de Abril de 2008, a recorrente, mais uma vez, instou a Comissão a responder ao seu pedido de 13 de Fevereiro de 2008 até 22 de Abril de 2008.

20      Não tendo obtido qualquer resposta da Comissão até essa data, a recorrente, por carta de 29 de Abril de 2008, apresentou um pedido confirmativo.

21      Em 19 de Maio de 2008, a Comissão acusou a recepção do pedido confirmativo e comunicou‑lhe que lhe responderia dentro do prazo previsto no Regulamento n.° 1049/2001.

22      Em 19 de Junho de 2008, a Comissão tomou uma decisão sobre o pedido confirmativo da recorrente (a seguir «decisão impugnada»), que lhe foi comunicada nesse mesmo dia. Com essa decisão, a Comissão divulgou todos os documentos solicitados pela recorrente, ou seja: oito documentos do Município de Hamburgo e da República Federal da Alemanha, excepto uma carta de 15 de Março de 200 que o Chanceler alemão enviou ao presidente da Comissão (a seguir «carta do Chanceler alemão»), por as autoridades alemãs se terem oposto à sua divulgação.

23      Segundo a decisão impugnada, por um lado, as autoridades alemãs declararam que a divulgação da carta do Chanceler alemão iria prejudicar a protecção do interesse público no que respeita às relações internacionais e à política económica da República Federal da Alemanha, na acepção do artigo 4.°, n.° 1, alínea a), terceiro e quarto travessões, do Regulamento n.° 1049/2001.

24      Com efeito, essa carta continha uma declaração confidencial destinada a uso puramente interno. Dizia respeito a um assunto confidencial relativo à política económica da República Federal da Alemanha e de outros Estados‑Membros. A sua divulgação não só poria em causa a confidencialidade, em detrimento das relações entre a República Federal da Alemanha, as instituições da União Europeia e outros Estados‑Membros, como também comprometeria a política económica da República Federal da Alemanha e de outros Estados‑Membros. Por conseguinte, o acesso à carta do Chanceler alemão devia ser recusado ao abrigo do artigo 4.°, n.° 1, alínea a), terceiro e quarto travessões, do Regulamento n.° 1049/2001.

25      Por outro lado, as autoridades alemãs indicaram que a divulgação da carta do Chanceler alemão iria prejudicar gravemente a protecção do processo decisório da Comissão, na acepção do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001.

26      Com efeito, essa carta continha uma declaração confidencial endereçada à Comissão e destinada a uso puramente interno no quadro das deliberações relativas ao parecer da Comissão de 19 de Abril de 2000. Dizia respeito à política económica da República Federal da Alemanha e de outros Estados‑Membros. A sua divulgação poria em causa a confidencialidade e comprometeria, assim, as relações entre a República Federal da Alemanha, as instituições da União e outros Estados‑Membros. Também prejudicaria gravemente o processo decisório da Comissão. Por conseguinte, no que respeita à carta do Chanceler alemão, devia ser aplicada a excepção prevista no artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001.

27      Além disso, a Comissão também referiu, na decisão impugnada, que, por força do artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001, a excepção ao direito de acesso não é aplicável se existir um interesse público superior que justifique a divulgação do documento em causa. Apesar de o documento em causa também ser abrangido pelas duas excepções previstas no artigo 4.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1049/2001, que não estão sujeitas à necessidade de justificação com fundamento no interesse público, a Comissão, no presente caso, verificou se esse interesse público superior existia.

28      Segundo a Comissão, para que exista um interesse público superior que justifique a divulgação, esse interesse deve, em primeiro lugar, ser público e, em segundo, ser superior, ou seja, primar sobre os interesses protegidos pelo artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001. No presente caso, não dispunha de qualquer elemento indiciador da existência de um eventual interesse público superior, na acepção do referido regulamento, que prime sobre a exigência de proteger o processo decisório da Comissão.

29      Quanto à questão do acesso parcial ao documento em causa, a Comissão referiu, na decisão impugnada, que, por força do acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, era obrigada, com base nas excepções invocadas pelas autoridades alemãs e nas razões que estas aduziram, a assumir as consequências do processo de consulta e a recusar o acesso à carta do Chanceler alemão. Como essas autoridades se opuseram à divulgação da integralidade da carta do Chanceler alemão, também não podia ser autorizado um acesso parcial a esse documento com base no artigo 4.°, n.°  6, do Regulamento n.° 1049/2001.

 Tramitação processual e pedidos das partes

30      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 28 de Agosto de 2008, a recorrente interpôs o presente recurso.

31      Por ofício que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 9 de Janeiro de 2009, a República da Finlândia pediu para intervir no presente processo em apoio da recorrente. Esse pedido foi deferido, após audição das partes, por despacho de 5 de Março de 2009 do presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral.

32      A República da Finlândia apresentou o seu articulado de intervenção em 17 de Abril de 2009. Por articulados apresentados na Secretaria do Tribunal Geral em 26 de Junho de 2009, as partes apresentaram as suas observações sobre aquele articulado.

33      Por ofícios que deram entrada na Secretaria do Tribunal Geral em, respectivamente, 18 e 29 de Junho de 2009, o Reino da Suécia e o Reino da Dinamarca pediram para intervir no presente processo em apoio do pedido da recorrente. Esses pedidos foram deferidos, após audição das partes principais, por despachos de 12 de Agosto de 2009 do presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral.

34      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Oitava Secção) decidiu abrir a fase oral.

35      Foram ouvidas as alegações das partes, o Reino da Suécia e o Reino da Dinamarca e as suas respostas às questões que, oralmente, o Tribunal lhes colocou na audiência de 16 de Abril de 2010. Como a República da Finlândia não pôde estar representada na audiência, foi decidido, antes de se encerrar a fase oral, colocar‑lhe, por escrito, uma questão relativa à admissibilidade da sua argumentação sobre o acesso parcial à carta do Chanceler alemão e a aplicação ratione temporis das excepções ao direito de acesso em causa ao abrigo dos n.os 6 e 7 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001. A República da Finlândia apresentou a sua resposta no prazo fixado e as partes, o Reino da Suécia e o Reino da Dinamarca apresentaram as respectivas observações.

36      Quanto às observações da recorrente, estas não se limitaram ao conteúdo da resposta da República da Finlândia. Como as partes só podem completar o processo depois da audiência com observações sobre a referida resposta, o presidente da Oitava Secção do Tribunal decidiu, em 15 de Junho de 2010, só permitir que fosse junta aos autos a parte das observações que versa sobre o conteúdo da resposta da República da Finlândia.

37      A fase oral foi declarada encerrada em 15 de Junho de 2010.

38      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        ordenar à Comissão que transmita ao Tribunal a carta do Chanceler alemão;

–        anular a decisão impugnada ;

–        condenar a Comissão nas despesas

39      O Reino da Dinamarca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia concluem pedindo que o Tribunal se digne anular a decisão impugnada.

40      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

41      Em apoio dos seus pedidos, a recorrente apresenta dois fundamentos. O primeiro é relativo à violação do artigo 4.°, n.° 1, alínea a), terceiro e quarto travessões, do Regulamento n.° 1049/2001. Nos termos desse artigo, o acesso aos documentos será recusado quando a sua divulgação possa prejudicar a protecção do interesse público, no que respeita, designadamente, às relações internacionais e à política económica de um Estado‑Membro. O segundo é relativo à violação do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, nos termos do qual o acesso a documentos que contenham pareceres para uso interno, no âmbito de deliberações e de consultas preliminares na instituição em causa, será recusado mesmo após ter sido tomada a decisão, quando a sua divulgação puder prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, excepto quando um interesse público superior imponha a sua divulgação.

42      Os intervenientes apoiam a argumentação da recorrente a este respeito. A República da Finlândia também alega a violação do artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001 sobre a possibilidade de acesso parcial a um documento. Além disso, segundo a República da Finlândia, as exigências impostas pelo artigo 4.°, n.° 7, desse diploma no que respeita à aplicação ratione temporis da excepção ao direito de acesso prevista no segundo parágrafo do n.° 3 desse artigo não foram respeitadas. Nas observações que apresentou sobre o articulado de intervenção da República da Finlândia, a recorrente «acolhe favoravelmente» a argumentação desse Estado‑Membro relativa ao artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001 alargando‑a a todas as excepções em causa no presente processo.

43      As partes, ao fazerem as suas interpretações do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, com vista a determinar as consequências da sua aplicação no presente caso, à luz do acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, que, segundo afirmam, está no âmago do presente litígio, apresentam uma argumentação que é válida para todos os fundamentos. Antes de abordar especificamente os diversos fundamentos, importa, portanto, examinar essa questão.

 Quanto à interpretação do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001

 Argumentos das partes

44      A recorrente alega que importa conhecer todas as razões que levaram a Comissão a aprovar, com o seu parecer de 19 de Abril de 2000, a desclassificação de uma reserva natural protegida ao abrigo do programa Natura 2000, como definido na Directiva 92/43. Sublinha que a República Federal da Alemanha diversas vezes denunciou as reticências da Comissão em desclassificar a reserva natural e em permitir a ampliação da fábrica da sociedade D., situada no Elba em Hamburgo, para efeitos da montagem final do Airbus A3XX. A Comissão só aprovou a desclassificação pouco tempo após ter recebido a carta do Chanceler alemão.

45      Segundo a recorrente, resulta do acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra (n.° 94), que é da competência do juiz da União fiscalizar se a recusa de acesso pela instituição solicitada pôde validamente fundar‑se nas excepções previstas no artigo 4.°, n.os 1 a 3, do Regulamento n.° 1049/2001, quer essa recusa resulte da apreciação das excepções pela própria instituição ou do Estado‑Membro em causa.

46      A tese da Comissão, que consiste em alegar que o seu papel está limitado ao exame sumário das razões do Estado‑Membro, conduziria à reintrodução efectiva da regra do autor. A Comissão deveria apreciar sempre, em cada caso concreto, a questão de saber se os documentos que foram objecto do pedido de acesso são abrangidos pelas excepções em causa.

47      O Reino da Dinamarca alega que, segundo o Regulamento n.° 1049/2001, as instituições da União dispõem de autonomia decisória. Têm responsabilidade final de verificar se a recusa de acesso se justifica e devem proceder a uma apreciação concreta do pedido de aceso aos documentos.

48      Embora, em determinados casos e a título excepcional, as instituições da União se possam limitar a uma apreciação prima facie, o facto de o procedimento previsto no artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 se aplicar ao presente caso não constitui uma circunstância que justifica a suficiência de uma apreciação prima facie.

49      A República da Finlândia sublinha que, segundo o acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, na medida em que o artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 é aplicável, a instituição em causa deve sempre, ao examinar o documento em causa, verificar se as excepções ao acesso ao referido documento, invocadas pelo Estado‑Membro em causa, são aplicáveis. Se, de acordo com a apreciação da Comissão, as razões aduzidas pelo Estado‑Membro não forem adequadas, essa instituição deverá permitir o acesso do requerente ao documento em causa. Como, no presente caso, a Comissão não cumpriu essa obrigação, a decisão impugnada deve ser anulada.

50      Em apoio da sua interpretação a República da Finlândia alega, em primeiro lugar, que as excepções previstas no artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001 devem ser interpretadas e aplicadas estritamente.

51      Em segundo lugar, o dever de fundamentação nos termos do artigo 253 CE também é aplicável no que respeita às decisões de indeferimento tomadas ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001. Ao Estado‑Membro em causa apenas é reconhecido um poder de participação no processo decisório da União (acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, n.os 76 e 81). Como se trata de uma decisão de uma instituição da União, esta é responsável pela exacta apreciação da aplicabilidade das excepções em causa.

52      Em terceiro lugar, a abolição da regra do autor pelo Regulamento n.° 1049/2001 é irrelevante se, como a Comissão defende, essa instituição apenas tivesse que examinar se a excepção invocada por um Estado‑Membro é manifestamente inadequada. A República da Finlândia acrescenta que as instituições da União devem sempre examinar, em todos os casos que lhes sejam submetidos, se o documento está abrangido pelas excepções previstas no artigo 4.° do referido regulamento.

53      O Reino da Suécia alega que resulta do acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, que o Estado‑Membro em causa não possui um direito de veto geral e incondicional que lhe permita opor‑se arbitrariamente à divulgação de um documento por uma instituição e que tem o dever de fundamentar devidamente a sua oposição invocando as excepções ao direito de acesso previstas no Regulamento n.° 1049/2001. Contudo, nesse acórdão não ficou esclarecido qual o tipo de exame a que uma instituição deve proceder quando um Estado‑Membro se opõe à divulgação.

54      A este respeito, o Reino da Suécia esclarece que a Comissão deve assegurar‑se de que as motivações do Estado‑Membro, no plano jurídico, são formal e materialmente correctas e deve examinar individualmente cada documento e efectuar uma análise para determinar se existe um risco concreto e real de a divulgação de um documento prejudicar um interesse protegido. A importância de conservar uma interpretação uniforme do Regulamento n.° 1049/2001 também milita em favor do direito de exame da instituição.

55      Segundo o Reino da Suécia, a decisão da instituição deve ser precedida de um diálogo cooperante e leal com os Estados‑Membros. Em alguns casos, como, por exemplo, quando a política financeira e económica de um Estado‑Membro possa ser afectada negativamente, a perspectiva do Estado‑Membro deve prevalecer. Noutros casos, quando a divulgação de um documento possa prejudicar seriamente o processo decisório de uma instituição, é à instituição em causa que deve ser reconhecida mais margem de manobra para determinar se a argumentação do Estado‑Membro é pertinente.

56      A Comissão sublinha que, dado que o documento a que foi recusado o acesso emana de um Estado‑Membro, aplicou o artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, conforme interpretado pelo Tribunal de Justiça no acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra. Alega que as autoridades alemãs manifestaram a sua oposição à divulgação da carta do Chanceler alemão.

57      Segundo a Comissão, a questão central que se coloca é a de saber em que medida é obrigada a respeitar a oposição que um Estado‑Membro manifestou relativamente à divulgação de um documento quando essa oposição se baseia correctamente em fundamentos decorrentes das excepções previstas no artigo 4.°, n.os 1 a 3, do Regulamento n.° 1049/2001. Por outras palavras, há que determinar em que medida a Comissão deve substituir a apreciação do Estado‑Membro pela sua.

58      A Comissão defende que duas disposições do Regulamento n.° 1049/2001 estão relacionadas com a situação em que o documento cujo acesso é requerido emana não da instituição em causa, mas de terceiros, ou seja, o artigo 4.°, n.° 4, que visa o regime geral de acesso a documentos emanados de terceiros, e o artigo 4.°, n.° 5, relativo aos documentos emanados de um Estado‑Membro. Através da inserção do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, o legislador atribuiu aos Estados‑Membros uma posição especial, em conformidade com o disposto na Declaração n.° 35, relativa ao n.° 1 do artigo 225.° CE, anexa à Acta Final do Tratado de Amesterdão.

59      Segundo a Comissão, o Tribunal de Justiça afirmou, no acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra (n.° 44), que se corria o risco de a exigência de um acordo prévio do Estado‑Membro, que consta do n.° 5 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, ser letra morta se, apesar da oposição manifestada por um Estado‑Membro à divulgação de um documento que dele emana e no caso da instituição não dispor de nenhum acordo desse Estado‑Membro, esta pudesse mesmo assim divulgar o documento em causa. Essa exigência ficaria sem qualquer efeito útil se a necessidade de obter esse acordo prévio para a divulgação do referido documento dependesse, em última análise, da vontade discricionária da instituição detentora do documento. Segundo os n.os 45 e 46 desse acórdão, um acordo é juridicamente distinto de um simples parecer e o direito de ser consultado já se encontra amplamente consolidado nos Estados‑Membros por força do artigo 4.°, n.° 4, do referido regulamento.

60      No n.° 47 do acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, o Tribunal de Justiça sublinhou que diversamente do artigo 9.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001, o artigo 4.°, n.° 5, desse diploma confere uma faculdade ao Estado‑Membro, e só o seu exercício efectivo num caso determinado tem por consequência erigir o acordo prévio do Estado‑Membro em condição necessária para a divulgação futura do documento em causa.

61      Do ponto de vista processual, segundo o n.° 87 do acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, o Estado‑Membro que manifesta a sua oposição à divulgação de um documento tem o dever de fundamentar essa oposição à luz das excepções previstas no artigo 4.°, n.os 1 a 3, do Regulamento n.° 1049/2001. Dos n.os 45 a 47 e 76 desse acórdão resulta que a existência de uma oposição correctamente fundamentada obsta a que a Comissão divulgue o documento em causa.

62      A Comissão não pode dar seguimento à oposição manifestada por um Estado‑Membro e está, portanto, obrigada a uma apreciação própria, se essa oposição não tiver qualquer fundamentação ou se a fundamentação aduzida não for articulada por referência às excepções enumeradas no Regulamento n.° 1049/2001 (acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, n.° 88).

63      Segundo o n.° 89 do acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, a Comissão é obrigada a referir, na sua decisão de recusa, as razões invocadas pelo Estado‑Membro para concluir pela aplicação de uma das excepções ao direito de acesso previstas no artigo 4.°, n.os 1 a 3, do Regulamento n.° 1049/2001.

64      A Comissão alega que respeitou as obrigações que para si decorrem do Regulamento n.° 1049/2001, conforme interpretado pelo Tribunal de Justiça no acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra. Com efeito, as autoridades alemãs foram consultadas, opuseram‑se à divulgação da carta do Chanceler alemão e justificaram a sua posição fundando‑se nas excepções previstas no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), terceiro e quarto travessões, e n.° 3, segundo parágrafo, desse diploma. Em seguida, a Comissão examinou se, à primeira vista, as excepções tinham sido correctamente invocadas e, tendo chegado à conclusão de que assim era, apresentou as razões justificadoras da sua decisão de recusa.

65      Segundo a Comissão, quando um Estado‑Membro manifesta a sua oposição, o controlo que lhe cabe está limitado à verificação de que essa oposição se funda, à primeira vista, nas excepções previstas no Regulamento n.° 1049/2001 e que não é manifestamente inadequado invocar essas excepções. Manifestamente inadequada seria uma excepção que um Estado‑Membro invoca para recusar o acesso a um documento que está claramente fora do âmbito dessa excepção, conforme interpretada pelo juiz da União.

66      O controlo jurisdicional da legalidade da decisão impugnada também deve consistir em apenas verificar se a Comissão se certificou devidamente que as excepções aplicáveis não foram invocadas de forma manifestamente inadequada.

 Apreciação do Tribunal

67      Recorde‑se que o Regulamento n.° 1049/2001, tal como resulta do seu quarto considerando 4 e do seu artigo 1.°, se destina a permitir o mais amplo efeito possível ao direito de acesso do público aos documentos na posse de uma instituição. Nos termos do seu artigo 2.°, n.° 3, esse direito abrange não só os documentos elaborados por uma instituição mas também os recebidos de terceiros, entre os quais figuram os Estados‑Membros, como explicitamente é indicado no artigo 3.°, alínea b).

68      O Regulamento n.° 1049/2001 prevê, no seu artigo 4.°, excepções ao direito de acesso aos documentos. O n.° 5 deste artigo determina que qualquer Estado‑Membro pode solicitar à instituição que não divulgue um documento desse Estado sem o seu prévio acordo.

69      No presente caso, República Federal da Alemanha exerceu a faculdade que lhe é reconhecida pelo artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 e pediu à Comissão que não divulgasse a carta do Chanceler alemão. Baseou a sua oposição nas excepções relativas à protecção do interesse público no que respeita às relações internacionais e à política económica de um Estado‑Membro, previstas no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), terceiro e quarto travessões, do referido regulamento, e na excepção relativa à protecção do processo decisório da Comissão, prevista no artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do mesmo diploma. Em seguida, a Comissão, na decisão impugnada, fundou a recusa de acesso à carta do Chanceler alemão na oposição manifestada pelas autoridades alemãs ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001.

70      Assim, cabe examinar o âmbito da oposição manifestada pelas autoridades alemãs ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001.

71      A este propósito, sublinhe‑se que, como resulta do acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra (n.° 81), essa disposição tem natureza processual porquanto diz respeito ao processo de adopção de uma decisão da União.

72      Diferentemente do n.° 4 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, que confere aos terceiros, no caso de documentos que deles emanem, apenas um direito de consulta, o n.° 5 desse artigo erige o acordo prévio do Estado‑Membro em condição necessária à divulgação de um documento que dele emane caso este o solicite. Nesse caso, a instituição que não dispõe do acordo do Estado‑Membro não tem liberdade para divulgar o documento em causa (acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, n.° 44). No presente caso, a decisão da Comissão relativa ao pedido de acesso ao documento em causa dependia, portanto, da decisão tomada pelo Estado‑Membro no quadro do processo de aprovação da decisão impugnada.

73      Porém, segundo o acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra (n.° 58), o artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 não confere ao Estado‑Membro em causa um direito de veto geral e incondicional para se opor, de forma puramente discricionária e sem ter de fundamentar a sua decisão, à divulgação de todo e qualquer documento na posse de uma instituição comunitária pelo simples facto de o referido documento emanar desse Estado‑Membro.

74      Ainda segundo o acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra (n.° 76), o exercício do poder que o artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 confere ao Estado‑Membro em causa encontra‑se enquadrado pelas excepções materiais enumeradas nos n.os 1 a 3 desse mesmo artigo, sendo apenas reconhecido ao Estado‑Membro um poder de participação na decisão da instituição da União. O acordo prévio do Estado‑Membro ao qual se refere o referido n.° 5 assemelha‑se não a um direito de veto discricionário, mas a uma forma de confirmação de que não existe nenhum dos motivos de excepção enunciados nos n.os 1 a 3 desse mesmo artigo. O processo decisório assim instituído pelo artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 exige, portanto, que a instituição e o Estado‑Membro em causa se atenham às excepções materiais previstas no artigo 4.°, n.os 1 a 3, desse mesmo diploma (acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, n.° 83).

75      Além disso, importa referir que a execução dessas normas de direito comunitário é confiada conjuntamente à instituição e ao Estado‑Membro que exerceu a faculdade prevista no n.° 5 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001. No quadro do processo decisório em causa, no qual participam a instituição e o Estado‑Membro interessado, destinado a determinar se o acesso a um documento deve ser recusado por via de uma das excepções materiais previstas nos n.os 1 a 3 do mesmo artigo 4.°, estes são obrigados a respeitar o dever de cooperação leal enunciado no artigo 10.° CE e evocado no décimo quinto considerando desse diploma (acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, n.° 85).

76      O Estado‑Membro que, no termo deste diálogo, se oponha à divulgação do documento em questão é obrigado a fundamentar essa oposição à luz das referidas excepções (acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, n.° 87).

77      Conclui‑se que o artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 só autoriza o Estado‑Membro a opor‑se à divulgação de documentos que dele emanam com base nas excepções de carácter material previstas nos n.os 1 a 3 dessa disposição e fundamentando devidamente a sua posição a esse respeito (acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, n.os 87 e 99).

78      Como se trata, aqui, do alcance do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 em relação à Comissão, deve recordar‑se, como foi declarado pelo Tribunal de Justiça no n.° 94 do acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, que relativamente ao requerente a intervenção do Estado‑Membro em causa não afecta o carácter de acto da União da decisão que a instituição lhe dirige posteriormente em resposta ao pedido de acesso que lhe foi apresentado relativamente a um documento na sua posse. Este aspecto é ainda mais importante se essa decisão se fundar exclusivamente no exame, pelo Estado‑Membro, da aplicabilidade das referidas excepções de carácter material.

79      A Comissão, na sua qualidade de autor da decisão de recusa de acesso a documentos, é responsável pela legalidade dessa decisão. Antes de recusar o acesso a um documento que emana de um Estado‑Membro deve, portanto, examinar se este baseou a sua oposição nas excepções de carácter material previstas nos n.os 1 a 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001 e se fundamentou devidamente a sua posição a esse respeito.

80      Sublinhe‑se que, no presente caso, o exame da aplicabilidade das excepções de carácter material deve resultar dos fundamentos da decisão da instituição da União (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral de 19 de Julho de 1999, Hautala/Conselho, T‑14/98, Colect., p. II‑2489, n.° 67; de 6 de Abril de 2000, Kuijer/Conselho, T‑188/98, Colect., II‑1959, n.° 38, e de 13 de Abril de 2005, Verein für Konsumenteninformation/Comissão, T‑2/03, Colect., p. II‑1121, n.° 69). Se a decisão de recusa assentar apenas no exame, pelo Estado‑Membro em causa, da aplicabilidade das referidas excepções, a sua aplicação acaba por se basear no raciocínio do Estado‑Membro. Conclui‑se, assim, que o seu raciocínio deve estar patente nos fundamentos da decisão da instituição da União.

81      Na medida em que a Comissão não se opõe à divulgação do documento em causa e refere na sua decisão as razões invocadas pelo Estado‑Membro, são as razões aduzidas por esse Estado‑Membro, reproduzidas na referida decisão, que devem ser examinadas pelo órgão jurisdicional da União.

82      Dado que resulta de jurisprudência constante que a fundamentação das decisões das instituições da União deve revelar, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do acto, (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 1 de Fevereiro de 2007, Sison/Conselho, C‑266/05 P, Colect., p. I‑1233, n.° 80 e jurisprudência aí indicada), há que sublinhar que as razões aduzidas pelo Estado‑Membro em causa no quadro do pedido que apresentou ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, devem cumprir as exigências do artigo 253.° CE conforme interpretado pela jurisprudência no domínio do direito de acesso aos documentos ao abrigo desse mesmo diploma. A fundamentação aduzida pelo Estado‑Membro em causa deve permitir ao requerente compreender a origem e as razões da recusa e ao tribunal competente exercer, eventualmente, a fiscalização que lhe compete (acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, n.° 89).

83      O Tribunal de Justiça já declarou que a Comissão não pode dar seguimento à oposição manifestada por um Estado‑Membro à divulgação de um documento que dele emana se essa oposição não tiver qualquer fundamentação ou se a fundamentação aduzida não for articulada por referência às excepções enumeradas no artigo 4.°, n.os 1 a 3, do Regulamento n.° 1049/2001 (acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, n.° 88). No processo de tomada de uma decisão de recusa de acesso, a Comissão deve assegurar‑se da existência dessa fundamentação e mencioná‑la na decisão de recusa de acesso que acabou por tomar (acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, n.° 99).

84      No âmbito da análise do presente caso, cabe sublinhar que não é necessário apurar se a Comissão, para além de um controlo puramente formal da existência de uma fundamentação de recusa de acesso pelo Estado‑Membro e de uma referência às excepções previstas nos n.os 1 a 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, era obrigada a proceder a um controlo prima facie ou a um controlo integral dos fundamentos da oposição invocados pelo Estado‑Membro.

85      Com efeito, relativamente à divulgação ou à recusa de acesso a um documento que emana de um Estado‑Membro sem o acordo prévio deste, podem distinguir‑se dois níveis de controlo quanto à legalidade dessa divulgação ou dessa recusa de acesso, ou seja, o controlo que a Comissão está habilitada a fazer relativamente à oposição manifestada pelo Estado‑Membro ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 e o controlo que o órgão jurisdicional da União está habilitado a fazer no que respeita à decisão final da Comissão de permitir ou recusar o acesso.

86      O presente caso diz respeito a uma decisão de recusa da Comissão que não está em contradição com os fundamentos de oposição invocados pelo Estado‑Membro em causa, antes neles se baseando, e que, portanto, implicou a não transmissão do documento em causa. A questão que, no presente caso, cabe examinar não diz, portanto, respeito ao tipo de controlo que a Comissão podia efectuar relativamente à oposição manifestada pelo Estado‑Membro ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001. Como a decisão impugnada corresponde ao pedido do Estado‑Membro em causa, a questão de saber se a Comissão podia efectuar um controlo prima facie ou um controlo integral dos fundamentos da oposição invocados pelo Estado‑Membro não é relevante. Teria sido necessário examinar essa questão se a decisão da Comissão não correspondesse ao pedido do Estado‑Membro. Em caso de correspondência entre a decisão da Comissão sobre a divulgação de um documento que emana de um Estado‑Membro e o pedido que este apresentou ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, o tipo de controlo a que se deve proceder é aquele que o juiz da União está habilitado a efectuar relativamente à decisão da Comissão de recusar o acesso ao documento em causa.

87      Relativamente ao controlo jurisdicional da legalidade de uma decisão de recusa deste tipo, resulta do n.° 94 do acórdão Suécia/Comissão, referido no n.° 14 supra, que é da competência do juiz da União fiscalizar, a pedido do requerente a quem foi oposta uma recusa de acesso pela instituição solicitada, se essa recusa pode ser validamente fundamentada nas excepções previstas nos n.os 1 a 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, quer essa recusa resulte da apreciação das mesmas pela própria instituição ou pelo Estado‑Membro em causa. Assim, contrariamente ao que a Comissão alega, por força da aplicação do n.° 5 do mesmo artigo, o controlo a efectuar pelo juiz da União não é necessariamente um controlo prima facie. A aplicação desta disposição não o impede, portanto, de proceder a um controlo integral da decisão de recusa da Comissão, que deve, designadamente, respeitar o dever de fundamentação e que assenta na apreciação material, pelo Estado‑Membro, da aplicabilidade das excepções previstas nos n.os 1 a 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001.

88      A fiscalização integral, pelo juiz da União, da aplicabilidade das excepções materiais em causa não implica obrigatoriamente que a Comissão esteja, ou não, habilitada a efectuar um controlo completo da oposição suscitada pelo Estado‑Membro ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001. Mesmo que a Comissão tenha recusado o acesso a um documento que emana de um Estado‑Membro após ter concluído, com base num controlo prima facie, que, em seu entender, os fundamentos da oposição apresentados por esse Estado‑Membro não foram invocados de forma manifestamente inadequada, o controlo do juiz da União não está limitado, por força do disposto no artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, a um controlo prima facie da aplicabilidade das excepções materiais previstas nos n.os 1 a 3 dessa disposição, pois fiscaliza a aplicabilidade dessas excepções com base na apreciação material efectuada pelo Estado‑Membro em causa.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 4.°, n.° 1, alínea a), terceiro e quarto travessões, do Regulamento n.° 1049/2001

89      Este fundamento tem duas partes, que importa examinar em conjunto. Refere‑se às excepções ao direito de acesso relativas à protecção do interesse público no que respeita às relações internacionais e à política económica de um Estado‑Membro.

 Argumentos das partes

90      Quanto, em primeiro lugar, à excepção ao direito de acesso relativa ao interesse público no que respeita às relações internacionais, prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, a recorrente alega que essa disposição não se aplica às relações internas à União. As relações internacionais só abrangem as relações entre as instituições da União e países terceiros ou organizações internacionais.

91      Na decisão impugnada, a Comissão apenas evocou as relações entre a República Federal da Alemanha, as instituições da União e outros Estados‑Membros. Por conseguinte, a Comissão, ao aplicar a disposição em causa, cometeu um erro de direito.

92      Quanto, em segundo lugar, à excepção ao direito de acesso relativa à protecção do interesse público no que respeita à política económica de um Estado‑Membro, prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), quarto travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, a Comissão limitou‑se a enunciar, na decisão impugnada, que o documento em causa era respeitante a uma declaração confidencial destinada a um uso puramente interno e que, por conseguinte, a sua divulgação comprometia o carácter confidencial da política económica da República Federal da Alemanha e de outros Estados‑Membros. Não apresentou mais nenhuma razão.

93      Segundo a recorrente, o laconismo da fundamentação da decisão impugnada poderia justificar‑se se a carta do Chanceler alemão fosse efectivamente confidencial. A recorrente sublinha que a questão que se coloca é, portanto, a de saber se a carta do Chanceler alemão é, ou não, confidencial. Tem dificuldades em admitir que essa carta possa conter informações tão sensíveis, embora recorde que não a pôde consultar. O ónus de demonstrar que a carta do Chanceler alemão tem natureza confidencial é da Comissão.

94      A recorrente acrescenta, nas suas observações sobre o articulado de intervenção da República da Finlândia, que a validade do que afirma ainda é reforçada pelo facto de ter decorrido um grande lapso de tempo desde que a Comissão recebeu as informações contidas nesse documento. A Comissão deveria ter reconsiderado, na acepção do artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001, as verdadeiras razões que estiveram na origem da não divulgação da carta do Chanceler alemão.

95      Contrariamente ao que a Comissão pretende, só uma das partes no processo podia beneficiar de uma ampla margem de apreciação. O exercício desse poder de apreciação pode, portanto, ser controlado pelo juiz da União. No presente caso, a decisão foi tomada por um terceiro ao processo, ou seja, o Estado‑Membro, sendo que o exercício desse poder não é passível de fiscalização jurisdicional. Esse Estado‑Membro não dispunha, portanto, de uma ampla margem de apreciação, embora o exercício do seu poder estivesse enquadrado pelas excepções previstas nos n.os 1 a 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001.

96      O Reino da Dinamarca alega que a Comissão não respeitou o seu dever de fundamentação no que respeita à decisão impugnada.

97      A República da Finlândia acrescenta que, contrariamente ao que a Comissão alega, a recorrente não necessita de demonstrar que a excepção em causa não se aplica ao documento em questão, pois não conhece suficientemente o seu conteúdo.

98      Quanto à aplicação ratione temporis das excepções ao direito de acesso, ao abrigo do artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001, a República da Finlândia, apoiada pela recorrente, pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia, sublinha que esta disposição está indissociavelmente ligada ao disposto nos n.os 1 a 3 do mesmo artigo.

99      O Reino da Suécia sublinha que a excepção ao direito de acesso prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 não é aplicável devido ao carácter não internacional das relações em causa.

100    A Comissão contesta a argumentação da recorrente e dos intervenientes.

 Apreciação do Tribunal

101    No âmbito deste fundamento, a recorrente alega que a Comissão não podia validamente basear a sua recusa de acesso à carta do Chanceler alemão na oposição manifestada pelas autoridades alemãs, ao abrigo do disposto no artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, fundando‑se nas excepções relativas à protecção do interesse público no que respeita às relações internacionais e à política económica de um Estado‑Membro, previstas no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), terceiro e quarto travessões, desse Regulamento.

102    Importa examinar, antes do mais e à luz das considerações relativas à interpretação do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 (v. n.os 67 a 88 supra), a acusação referente à excepção relativa à protecção do interesse público no que respeita à política económica de um Estado‑Membro, prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), quarto travessão, desse regulamento.

103    A este propósito, recorde‑se que, no presente caso de recusa da Comissão de acesso a um documento que emana de um Estado‑Membro ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, a aplicação das excepções relativas ao interesse público previstas no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), desse diploma repousa na apreciação material do Estado‑Membro e não na da Comissão.

104    Ora, no que diz respeito ao alcance da fiscalização da legalidade de uma decisão desse tipo pelo juiz da União, refira‑se que o Tribunal de Justiça já declarou, no quadro da aplicação de uma das excepções materiais visadas no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 1049/2001 por uma instituição fora do âmbito do n.° 5 do artigo 4.° desse diploma, que há que reconhecer a essa instituição um amplo poder de apreciação para determinar se a divulgação de documentos que pertencem aos domínios abrangidos pelas referidas excepções pode prejudicar o interesse público. O Tribunal de Justiça baseou essa margem de apreciação, designadamente, no facto de essa decisão de recusa ter um carácter complexo e delicado que obriga a um especial grau de prudência e na circunstância de os critérios enunciados no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 1049/2001 serem muito genéricos (acórdão Sison/Conselho, referido no n.° 82 supra, n.os 34 a 36).

105    Este raciocínio continua válido se, no caso de recusa da Comissão em permitir o acesso a um documento que emana de um Estado‑Membro ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, a aplicação de uma excepção material prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), desse diploma assentar na apreciação do Estado‑Membro. A este propósito, acrescente‑se que a apreciação da questão de saber se a divulgação de um documento prejudica os interesses protegidos por essas excepções materiais pode integrar as responsabilidades políticas desse Estado‑Membro (v., por analogia, acórdãos do Tribunal Geral Hautala/Conselho, referido no n.° 80 supra, n.° 71, e de 7 de Fevereiro de 2002, Kuijer/Conselho, T‑211/00, Colect., p. II‑485, n.° 53). Nesse caso, o Estado‑Membro deve dispor, como a instituição, de uma ampla margem de apreciação.

106    Segue‑se que, no presente caso, se deve reconhecer à República Federal da Alemanha um amplo poder de apreciação para determinar se a divulgação de documentos dos domínios abrangidos pela excepção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), quarto travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 pode prejudicar o interesse público.

107    A fiscalização a exercer pelo juiz da União deve, portanto, limitar‑se à verificação do respeito das regras processuais e de fundamentação, da exactidão material dos factos bem como da inexistência de erro manifesto de apreciação e de desvio de poder (v., neste sentido, acórdão Sison/Conselho, referido no n.° 82 supra, n.os 34 e 64).

108    Quanto à excepção relativa ao interesse público no que respeita à política económica de um Estado‑Membro, prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), quarto travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, a recorrente contesta, em primeiro lugar, a suficiência da fundamentação da decisão impugnada relativamente a esta excepção, alegando que a Comissão se contentou em invocar sucintamente o carácter confidencial de uma declaração constante da carta do Chanceler alemão, sem acrescentar mais nenhuma razão, e, em segundo lugar, a aplicabilidade desta excepção ao presente caso. O Reino da Dinamarca também alega que a Comissão não respeitou o seu dever de fundamentação.

109    No que respeita, em primeiro lugar, à fundamentação da decisão impugnada, resulta de jurisprudência constante que, por força do artigo 253.° CE, esta deve ser adaptada à natureza do acto em causa e revelar, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do acto, por forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso em apreço, designadamente, do conteúdo do acto, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas directa e individualmente afectadas pelo acto podem ter em obter explicações. Não é exigido que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um acto satisfaz as exigências do artigo 253.° deve ser apreciada à luz não somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (v. acórdão Sison/Conselho, referido no n.° 82 supra, n.° 80 e jurisprudência aí indicada).

110    No caso de uma decisão de recusa de acesso a um documento, ao abrigo de uma excepção prevista no artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, a fundamentação deve incluir explicações quanto à questão de saber como é que o acesso a esse documento pode, em concreto, prejudicar efectivamente o interesse protegido por essa excepção (acórdão do Tribunal de Justiça de 1 de Julho de 2008, Suécia e Turco/Conselho, C‑39/05 P e C‑52/05 P, Colect., p. I‑4723, n.° 49, e acórdão do Tribunal Geral de 11 de Março de 2009, Borax Europe/Comissão, T‑121/05, não publicado na Colectânea, n.° 37).

111    Porém, pode ser impossível apresentar as razões que justificam a confidencialidade do documento sem divulgar o seu conteúdo, privando assim a excepção daquilo que é a sua finalidade essencial (v. acórdão do Tribunal Geral de 26 de Abril de 2005, Sison/Conselho, T‑110/03, T‑150/03 e T‑405/03, Colect., p. II‑1429, n.° 60 e jurisprudência aí indicada). A aplicação desta jurisprudência não exige, contrariamente ao que a recorrente alega, que se trate de um documento sensível na acepção do artigo 9.° do Regulamento n.° 1049/2001 (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral de 5 de Março de 1997, WWF UK/Comissão, T‑105/95, Colect., p. II‑313, n.° 65; de 25 de Abril de 2007, WWF European Policy Programme/Conselho, T‑264/04, Colect., p. II‑911, n.° 37, e de 30 de Janeiro de 2008, Terezakis/Comissão, T‑380/04, não publicado na Colectânea, n.° 71).

112    Com efeito, como o Tribunal de Justiça declarou, a necessidade de não revelar elementos susceptíveis de, indirectamente, prejudicar os interesses que as referidas excepções têm, especificamente, por objectivo proteger é sublinhada, nomeadamente, pelo artigo 11.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001 (acórdão de 1 de Fevereiro de 2007, Sison/Conselho, referido no n.° 82 supra, n.° 83). Esta disposição prevê, designadamente, que, quando um documento, independentemente de ser sensível ou não, seja objecto de uma referência no registo de uma instituição, essa referência deve ser concebida de forma a não prejudicar a protecção dos interesses a que se refere o mencionado artigo 4.°

113    No presente caso, a Comissão baseou‑se, para recusar o acesso à carta do Chanceler alemão, no que respeita à excepção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), quarto travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, no facto de a divulgação dessa carta poder prejudicar a protecção do interesse público no que respeita à política económica da República Federal da Alemanha. Segundo a fundamentação apresentada pelas autoridades alemãs, como apresentada na decisão impugnada, a carta do Chanceler alemão continha uma declaração confidencial destinada a um uso puramente interno. Essa carta dizia respeito a um assunto confidencial relativo à política económica da República Federal da Alemanha e de outros Estados‑Membros. A sua divulgação poria em causa a confidencialidade e comprometeria a política económica da República Federal da Alemanha e de outros Estados‑Membros (v. n.° 24 supra).

114    Essa fundamentação da decisão impugnada, por mais sucinta que seja, não deixa de ser adequada, na perspectiva do contexto do caso em apreço, e suficiente para a recorrente poder apreciar as razões da recusa de acesso ao documento em causa e o juiz da União exercer a fiscalização da legalidade que lhe compete.

115    Com efeito, importa sublinhar que a recorrente conhece perfeitamente o contexto do caso.

116    Por um lado, teve conhecimento do parecer favorável da Comissão, de 19 de Abril de 2000, à realização do projecto industrial em causa no sítio de Mühlenberger Loch, uma zona protegida nos termos da Directiva 92/43. Este projecto consistia na ampliação da fábrica da sociedade D. com vista à montagem final do Airbus A3XX. No referido parecer e por força do disposto no artigo 6.°, n.° 4, da Directiva 92/43, a Comissão debruçou‑se, em particular, sobre as razões imperativas de reconhecido interesse público que as autoridades alemãs invocaram para justificar a realização desse projecto, ou seja, razões económicas e sociais, como a grande importância económica do projecto para o Município de Hamburgo, a Alemanha do Norte e a indústria aeronáutica europeia, apesar das conclusões negativas a que haviam chegado no termo da avaliação das incidências do projecto sobre o sítio e da falta de soluções alternativas. Devido a essas razões imperativas de reconhecido interesse público, a Comissão chegou à conclusão, no referido parecer, de que os efeitos negativos do projecto se justificavam.

117    Por outro lado, a Comissão transmitiu à recorrente, em anexo à decisão impugnada, todos os documentos das autoridades alemãs que esta lhe havia solicitado, excepto a carta do Chanceler alemão.

118    Neste contexto, ao indicar que a carta que o Chanceler alemão endereçou ao presidente da Comissão continha uma declaração cuja divulgação comprometeria a política económica da República Federal da Alemanha e de outros Estados‑Membros, a fundamentação da decisão impugnada revela claramente as razões pelas quais, no entender da Comissão, o acesso a esse documento poderia, em concreto, prejudicar efectivamente o interesse protegido pela excepção em causa. A evocação de informações suplementares, fazendo designadamente referência ao conteúdo preciso da declaração constante do referido documento, privaria a excepção invocada da sua finalidade (v., neste sentido, acórdão de 26 de Abril de 2005, Sison/Conselho, referido no n.° 111 supra, n.° 62).

119    Conclui‑se que a Comissão não violou o dever de fundamentação.

120    Em segundo lugar, quanto à aplicabilidade da excepção em causa no presente processo, há que examinar se a apreciação segundo a qual a divulgação da carta do Chanceler alemão podia prejudicar a protecção do interesse público no que respeita à política económica da República Federal da Alemanha assenta num erro manifesto das autoridades alemãs.

121    Na medida em que as excepções ao acesso aos documentos estabelecem derrogações ao princípio do acesso mais amplo possível do público aos documentos, estas excepções devem ser interpretadas e aplicadas de forma estrita (v. acórdão de 1 de Fevereiro de 2007, Sison/Conselho, referido no n.° 82 supra, n.° 63 e jurisprudência aí indicada).

122    Antes de se oporem à divulgação dos documentos solicitados pela recorrente, as autoridades alemãs eram obrigadas a examinar se, atentas as informações de que dispunham, essa divulgação podia efectivamente prejudicar algum dos aspectos do interesse público protegido pelas excepções que permitem recusar o acesso. Para que essas excepções sejam aplicáveis, o risco de prejuízo para o interesse público deve, portanto, ser razoavelmente previsível e não puramente hipotético (acórdãos Kuijer/Conselho, referido no n.° 105 supra, n.os 55 e 56, e WWF European Policy Programme/Conselho, referido no n.° 111 supra, n.° 39). É jurisprudência assente que o exame exigido para a apreciação de um pedido de acesso a documentos deve ter natureza concreta (v. acórdão Verein für Konsumenteninformation/Comissão, referido no n.° 80 supra, n.° 69 e jurisprudência aí indicada). Esse exame concreto deve, além disso, ser realizado relativamente a cada documento a que se refere o pedido. Com efeito, decorre do Regulamento n.° 1049/2001 que todas as excepções mencionadas nos n.os 1 a 3 do seu artigo 4.° são enunciadas como devendo ser aplicadas «a um documento» (acórdãos do Tribunal Geral Verein für Konsumenteninformation/Comissão, referido no n.° 80 supra, n.° 70, e de 6 de Julho de 2006, Franchet e Byk/Comissão, T‑391/03 e T‑70/04, Colect., p. II‑2023, n.° 116).

123    No presente caso, em primeiro lugar, resulta da decisão impugnada que o exame do pedido de acesso a documentos que a recorrente apresentou foi feito relativamente a cada documento a que esse pedido se referia. Com efeito, como as autoridades alemãs não se opuseram à divulgação de oito documentos do Município de Hamburgo e da República Federal da Alemanha, individualmente referidos na decisão impugnada, mas apenas à carta do Chanceler alemão apresentando razões específicas para tal, a Comissão permitiu o acesso a esses oito documentos e apenas recusou divulgar a carta do Chanceler alemão (v. n.° 22 supra).

124    Em segundo lugar, as autoridades alemãs não cometeram qualquer erro manifesto de apreciação ao concluírem, no quadro da apreciação concreta do documento em causa, que existia um risco de prejuízo para a política económica da República Federal da Alemanha caso a carta do Chanceler alemão fosse divulgada. Dada a importância económica do projecto em causa, o entendimento de que esse risco era razoavelmente previsível e não puramente hipotético não é manifestamente incorrecto.

125    Com efeito, por um lado, resulta da fundamentação apresentada pelas autoridades alemãs, como enunciada na decisão impugnada, que, para chegarem a essa conclusão, essas autoridades procederam a um exame concreto da carta do Chanceler alemão. Para se oporem à sua divulgação, as autoridades alemãs fundaram‑se na declaração concreta do Chanceler alemão constante desse documento e não apenas em factos abstractos, como, designadamente, a circunstância de essa carta ter a sua origem no Chanceler alemão de então.

126    Por outro lado, como a Comissão referiu sem que a recorrente a tivesse contestado, resulta da análise do parecer de 19 de Abril de 2000 que no âmago da questão da desclassificação do sítio em questão estavam considerações de política económica. O parecer da Comissão de 19 de Abril de 2000 estava sobretudo relacionado com a questão de saber se, nos termos do artigo 6.°, n.° 4, da Directiva 92/43, existiam outras razões imperativas de reconhecido interesse público, como a grande importância económica da ampliação da fábrica da sociedade D. com vista à montagem final do Airbus A3XX para o Município de Hamburgo, a Alemanha do Norte e a indústria aeronáutica europeia, que justificavam a realização desse projecto apesar das conclusões negativas a que se chegara no termo da avaliação das incidências do projecto sobre o sítio em causa e da falta de soluções alternativas. A existência dessas considerações de política económica não foi contestada pela recorrente.

127    Atento o que precede, conclui‑se que a apreciação segundo a qual a divulgação da carta do Chanceler alemão podia prejudicar a protecção do interesse público no que respeita à política económica da República Federal da Alemanha não assenta num erro manifesto das autoridades alemãs.

128    Esta conclusão não é posta em causa pela argumentação da recorrente segundo a qual, dado o período de tempo decorrido após o envio da carta do Chanceler alemão, a recusa de acesso deixara de se justificar na perspectiva do conteúdo dessa carta, nos termos do artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001, e segundo a qual a Comissão deveria reconsiderar as razões que estiveram na origem da não divulgação dessa carta.

129    A este propósito, recorde‑se que, nos termos do artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001, as excepções em causa só são aplicáveis durante o período em que a protecção se justifique com base no conteúdo do documento. Podem ser aplicadas, no máximo, durante 30 anos.

130    No presente caso, é apenas nas suas observações sobre o articulado de intervenção da República da Finlândia que a recorrente menciona a aplicação ratione temporis das excepções ao direito de acesso prevista no artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001. Com efeito, a petição não contém qualquer argumento sobre o artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001. A República da Finlândia, no seu articulado de intervenção, só alega uma pretensa violação do artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001 no quadro da excepção ao direito de acesso prevista no artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, desse regulamento relativa ao processo decisório da Comissão. Nas suas observações sobre este articulado, a recorrente acolheu favoravelmente a ideia apresentada pela República da Finlândia alargando‑a às excepções tidas em vista no presente fundamento.

131    Sublinhe‑se que sendo as condições de admissibilidade de um recurso e as acusações nele enunciadas de ordem pública, o Tribunal Geral pode examiná‑las oficiosamente, nos termos do artigo 113.° do seu Regulamento de Processo (v., neste sentido, despacho do Tribunal de Justiça de 15 de Abril de 2010, Makhteshim‑Agan Holding e o./Comissão, C‑517/08 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 54, e acórdão do Tribunal Geral de 9 de Setembro de 2009, Brink’s Security Luxembourg/Comissão, T‑437/05, ainda não publicado na Colectânea, n.° 54 e jurisprudência aí indicada).

132    Resulta das disposições conjugadas dos artigos 44.°, n.° 1, alínea c), e 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo que a petição deve indicar o objecto do litígio e conter uma exposição sumária dos fundamentos do pedido e que é proibido deduzir novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo.

133    Ora, o facto de um recorrente ter tomado conhecimento de um elemento de direito no decurso do processo no Tribunal não significa que esse elemento constitua um elemento de direito surgido no decurso da instância. É ainda necessário que esse recorrente não tenha podido conhecê‑lo anteriormente (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 8 de Março de 2007, France Télécom/Comissão, T‑340/04, Colect., p. II‑573, n.° 164 e jurisprudência aí indicada). A este propósito, sublinhe‑se que não resulta dos autos que a recorrente não estivesse em condições de conhecer uma eventual violação da aplicação ratione temporis das excepções ao direito de acesso em causa.

134    Atento o que precede, cabe concluir que a argumentação da recorrente sobre o artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001 é inadmissível, porquanto constitui um argumento novo que não foi apresentado na petição. Além disso, cabe ainda sublinhar que também não constitui uma ampliação dos fundamentos que a recorrente apresentou na petição.

135    Com efeito, contrariamente ao que a recorrente e os interveniente alegam, o artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001 não está indissociavelmente ligado ao disposto nos n.os 1 a 3 dessa disposição. É certo que o artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001 deve ser aplicado conjuntamente com as excepções ao direito de acesso previstas nos n.os 1 a 3 desse artigo. Contudo, daqui não se pode concluir que a alegação de que houve violação de uma parte dessas disposições equivale a alegar que houve violação de todas elas. A alegação da violação do artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001 não apresenta um nexo estreito com os fundamentos da recorrente relativos à violação dos n.os 1 e 3 desse artigo. Com efeito, embora a análise concreta das excepções previstas no artigo 4.°, n.os 1 e 3, do Regulamento n.° 1049/2001 seja efectivamente uma condição necessária para se decidir da aplicação ratione temporis das excepções em causa, o artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001 não diz respeito às condições da sua aplicabilidade, previstas nos n.os 1 a 3 desse artigo, mas à sua aplicabilidade no tempo.

136    De todo o modo, importa sublinhar que dos autos não resulta que quando foi tomada a decisão impugnada, dado o conteúdo da carta do Chanceler alemão, deixara de se justificar a protecção do interesse público em causa. A este propósito, observe‑se que, para fundamentar a respectiva argumentação sobre a alegada violação dos artigo 4.°, n.° 7, do Regulamento n.° 1049/2001, nem a recorrente nem os intervenientes invocam outras circunstâncias para além do tempo decorrido, como seria o caso, por exemplo, de elementos capazes de pôr em causa a importância das considerações de política económica apresentadas.

137    A carta em causa contém uma declaração do Chanceler alemão sobre a realização de um projecto de ampliação da fábrica da sociedade D. com vista à montagem final do Airbus A3XX no sítio de Mühlenberger Loch, uma zona protegida nos termos da Directiva 92/43. Como se apurou, no âmago da questão da desclassificação do sítio de Mühlenberger Loch estavam considerações de política económica atinentes ao Município de Hamburgo, à Alemanha do Norte e à indústria aeronáutica europeia. Dado o conteúdo da declaração contida na carta do Chanceler alemão, que, portanto, dizia respeito a um assunto da maior importância para a política económica da República Federal da Alemanha, o período de cerca de oito anos decorrido entre o envio da carta do Chanceler alemão (15 de Março de 2000) e a tomada da decisão impugnada (19 de Junho de 2008) deve ser considerado um período durante o qual a protecção do interesse público em causa, ou seja, a política económica da República Federal da Alemanha, se justifica.

138    Atento o que precede, cabe concluir que foi correctamente que a Comissão recusou divulgar a carta do Chanceler alemão na sequência da oposição manifestada pela República Federal da Alemanha, ao abrigo do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001, com base na excepção relativa à protecção do interesse público no que respeita à política económica de um Estado‑Membro, prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), quarto travessão, do mesmo diploma.

139    Assim, deixa de ser necessário examinar tanto a alegação relativa à violação do artigo 4.°, n.° 1, alínea a), terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, referente à excepção ao direito de acesso relativa à protecção do interesse público no que respeita às relações internacionais, como o segundo fundamento, relativo à violação do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do mesmo diploma, referente à excepção relativa à protecção do processo decisório.

 Quanto à alegada violação do artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001

 Argumentos das partes

140    A República da Finlândia alega que a Comissão não cumpriu a sua obrigação, prevista no artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001, de apreciar a possibilidade de acesso parcial ao documento em causa. Esta instituição não se deveria ter contentado em remeter para a declaração do Estado‑Membro em causa, segundo a qual este recusava o acesso à integralidade do documento em causa.

141    Em resposta a uma questão que lhe foi colocada pelo Tribunal a propósito da admissibilidade da sua argumentação, a República da Finlândia, apoiada pela recorrente, pelo Reino da Dinamarca e pelo Reino da Suécia, sublinha a sua admissibilidade por o n.° 6 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001 estar indissociavelmente ligado aos n.os 1 a 3 dessa mesma disposição.

142    A Comissão contesta a argumentação da República da Finlândia.

 Apreciação do Tribunal

143    O Tribunal pode, a qualquer momento, suscitar oficiosamente qualquer excepção de inadmissibilidade de ordem pública, entre as quais figura a admissibilidade de um argumento aduzido por um interveniente (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 23 de Fevereiro de 1961, De Gezamenlijke Steenkolenmijnen in Limburg/Alta Autoridade, 30/59, Colect. 1954‑1961, pp. 551, 558).

144    Importa observar que a argumentação relativa à alegada violação do artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001, referente à questão do acesso parcial ao documento em causa, apenas foi apresentada pela República da Finlândia. A recorrente não apresentou qualquer argumentação nesse sentido.

145    A este propósito, sublinhe‑se que, nos termos do artigo 40.°, quarto parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, aplicável ao Tribunal Geral por força do artigo 53.° do referido estatuto, as conclusões do pedido de intervenção devem limitar‑se a sustentar as conclusões de uma das partes principais. Além disso e nos termos do artigo 116.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, o interveniente aceita o processo no estado em que este se encontra no momento da sua intervenção. Ora, embora estas disposições não se oponham a que o interveniente apresente argumentos diferentes dos da parte que ele apoia, é, contudo, na condição de que não se modifique o quadro do litígio e que a intervenção tenha sempre por objectivo apoiar os pedidos apresentados por esta última (v., neste sentido, acórdãos De Gezamenlijke Steenkolenmijnen in Limburg/Alta Autoridade, referido no n.° 143 supra, p. 558, e Verein für Konsumenteninformation/Comissão, referido no n.° 80 supra, n.° 52).

146    No presente caso, o litígio como configurado entre a recorrente e a Comissão tem por objecto a anulação da decisão impugnada. Diz respeito às consequências da aplicação do artigo 4.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1049/2001 e à alegada violação das excepções ao direito de acesso previstas no artigo 4.°, n.° 1, alínea a), terceiro e quarto travessões, e n.° 3, segundo parágrafo, do mesmo diploma. Nem a petição nem a contestação contêm elementos sobre a eventual violação do artigo 4.°, n.° 6, desse regulamento. Além disso, a recorrente referiu expressamente, na petição, não contestar a decisão impugnada no que respeita ao acesso parcial. A alegada violação do artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001 foi suscitada pela primeira vez no articulado de intervenção da República da Finlândia.

147    Contrariamente ao que a República da Finlândia alega o n.° 6 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001 não está indissociavelmente ligado aos n.os 1 a 3 dessa mesma disposição. Com efeito, embora a análise concreta das excepções previstas no artigo 4.°, n.os 1 e 3, do Regulamento n.° 1049/2001 seja efectivamente uma condição necessária para se decidir da possibilidade de se permitir um acesso parcial ao documento em causa (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral Verein für Konsumenteninformation/Comissão, referido no n.° 80 supra, n.° 73 ; Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 122 supra, n.° 117, e de 19 de Janeiro de 2010, Co‑Frutta/Comissão, T‑355/04 e T‑446/04, ainda não publicado na Colectânea, n.° 124), o exame dessa possibilidade não diz respeito às condições de aplicação das excepções em causa previstas nos n.os 1 a 3 desse artigo. A necessidade desse exame decorre do princípio da proporcionalidade. Com efeito, no quadro do artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001, há que determinar se o objectivo prosseguido com a recusa de acesso ao documento em causa pode ser alcançado mesmo no caso de só serem censuradas as passagens que podem prejudicar o interesse protegido (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Dezembro de 2001, Conselho/Hautala, C‑353/99 P, Colect., p. I‑9565, n.os 27 a 29, e acórdão WWF European Policy Programme/Conselho, referido no n.° 111 supra, n.° 50).

148    As condições de aplicação do artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001 devem, portanto, ser examinadas separadamente e num estádio de análise diferente do das excepções ao direito de acesso previstas nos n.os 1 a 3 dessa disposição (v., neste sentido, acórdãos de 26 de Abril de 2005, Sison/Conselho, referido no n.° 111 supra, n.os 86 a 89 e WWF European Policy Programme/Conselho, referido no n.° 111 supra, n.os 47 a 55). Só uma eventual violação do artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001 poderá conduzir à anulação de uma decisão de recusa parcial de acesso.

149    Conclui‑se que a argumentação da República da Finlândia relativa à violação do artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001, é alheia ao objecto do litígio, como definido pelas partes principais, e altera, portanto, o quadro do presente litígio. Esta argumentação deve, por conseguinte, ser julgada inadmissível.

 Quanto ao pedido de apresentação do documento em causa

 Argumentos das partes

150    A recorrente pede ao Tribunal que ordene à Comissão, por meio de diligências de instrução, nos termos do artigo 66.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, que apresente a carta do Chanceler alemão para que esse órgão jurisdicional possa examinar o seu conteúdo e assim determinar se e em que medida a carta é abrangida pelas excepções invocadas pela Comissão.

151    A Comissão e os intervenientes não se pronunciaram sobre o pedido da recorrente.

 Apreciação do Tribunal

152    Como resulta de todo o exposto, o Tribunal Geral pode decidir o recurso, com base nos pedidos, fundamentos e argumentos formulados no processo.

153    Por conseguinte, indefere‑se o pedido da recorrente de que seja ordenado à Comissão que apresente a carta do Chanceler alemão (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 10 de Setembro de 2008, Williams/Comissão, T‑42/05, não publicado na Colectânea, n.os 130 e 131).

154    Em face do exposto há que negar provimento ao recurso na íntegra.

 Quanto às despesas

155    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Por outro lado, nos termos do n.° 4 deste artigo, os Estados‑Membros e as instituições que intervenham no processo devem suportar as respectivas despesas.

156    Tendo a recorrente sido vencida há que condená‑la nas suas próprias despesas e nas despesas da Comissão, em conformidade com o pedidos que esta apresentou. O Reino da Dinamarca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia suportarão as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A IFAW Internationaler Tierschutz‑Fonds gGmbH é condenada nas suas próprias despesas e nas da Comissão Europeia.

3)      O Reino da Dinamarca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia suportarão as suas próprias despesas.

Martins Ribeiro

Wahl

Dittrich

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 13 de Janeiro de 2011.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.