ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

18 de Junho de 2009 ( *1 )

«Directiva 2000/78/CE — Igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional — Discriminação em razão da idade — Determinação da remuneração dos agentes contratuais do Estado — Exclusão da experiência profissional adquirida antes dos 18 anos de idade»

No processo C-88/08,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.o CE, apresentado pelo Oberster Gerichtshof (Áustria), por decisão de 7 de Fevereiro de 2008, entrado no Tribunal de Justiça em 27 de Fevereiro de 2008, no processo

David Hütter

contra

Technische Universität Graz,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: A. Rosas, presidente de secção, A. Ó Caoimh, J. N. Cunha Rodrigues, P. Lindh (relatora) e A. Arabadjiev, juízes,

advogado-geral: Y. Bot,

secretário: R. Grass,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação de David Hütter, por T. Stampfer e C. Orgler, Rechtsanwälte,

em representação da Technische Universität Graz, por M. Gewolf-Vukovich, Mitglied der Finanz Prokuratur,

em representação do Governo dinamarquês, por B. Weis Fogh, na qualidade de agente,

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por J. Enegren e B. Kotschy, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação da Directiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de Novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional (JO L 303, p. 16).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe D. Hütter à Technische Universität Graz (a seguir «TUG») relativo à sua classificação nos escalões da carreira de agente contratual da função pública aquando da sua contratação.

Quadro jurídico

Regulamentação comunitária

3

O vigésimo quinto considerando da Directiva 2000/78 dispõe:

«A proibição de discriminações relacionadas com a idade constitui um elemento essencial para atingir os objectivos estabelecidos pelas orientações para o emprego e encorajar a diversidade no emprego. Todavia, em determinadas circunstâncias, podem-se justificar diferenças de tratamento com base na idade, que implicam a existência de disposições específicas que podem variar consoante a situação dos Estados-Membros. Urge pois distinguir diferenças de tratamento justificadas, nomeadamente por objectivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e da formação profissional, de discriminações que devem ser proibidas.»

4

Nos termos do artigo 1.o, a Directiva 2000/78 «tem por objecto estabelecer um quadro geral para lutar contra a discriminação em razão da religião ou das convicções, de uma deficiência, da idade ou da orientação sexual, no que se refere ao emprego e à actividade profissional, com vista a pôr em prática nos Estados-Membros o princípio da igualdade de tratamento».

5

O artigo 2.o da Directiva 2000/78, sob a epígrafe «Conceito de discriminação», estabelece:

«1.   Para efeitos da presente directiva, entende-se por ‘princípio da igualdade de tratamento’ a ausência de qualquer discriminação, directa ou indirecta, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.o

2.   Para efeitos do n.o 1:

a)

Considera-se que existe discriminação directa sempre que, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.o, uma pessoa seja objecto de um tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou possa vir a ser dado a outra pessoa em situação comparável;

b)

Considera-se que existe discriminação indirecta sempre que uma disposição, critério ou prática aparentemente neutra seja susceptível de colocar numa situação de desvantagem pessoas com uma determinada religião ou convicções, com uma determinada deficiência, pessoas de uma determinada classe etária ou pessoas com uma determinada orientação sexual, comparativamente com outras pessoas, a não ser que:

i)

essa disposição, critério ou prática sejam objectivamente justificados por um objectivo legítimo e que os meios utilizados para o alcançar sejam adequados e necessários, ou que,

ii)

relativamente às pessoas com uma determinada deficiência, a entidade patronal, ou qualquer pessoa ou organização a que se aplique a presente directiva, seja obrigada, por força da legislação nacional, a tomar medidas adequadas, de acordo com os princípios previstos no artigo 5.o, a fim de eliminar as desvantagens decorrentes dessa disposição, critério ou prática.

[…]»

6

O artigo 3.o da Directiva 2000/78, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», prevê no n.o 1:

«Dentro dos limites das competências atribuídas à Comunidade, a presente directiva é aplicável a todas as pessoas, tanto no sector público como no privado, incluindo os organismos públicos, no que diz respeito:

a)

Às condições de acesso ao emprego, ao trabalho independente ou à actividade profissional, incluindo os critérios de selecção e as condições de contratação, seja qual for o ramo de actividade e a todos os níveis da hierarquia profissional, incluindo em matéria de promoção;

[…]

c)

Às condições de emprego e de trabalho, incluindo o despedimento e a remuneração;

[…]»

7

O artigo 6.o da Directiva 2000/78, sob a epígrafe «Justificação das diferenças de tratamento com base na idade», dispõe no n.o 1:

«Sem prejuízo do disposto no n.o 2 do artigo 2.o, os Estados-Membros podem prever que as diferenças de tratamento com base na idade não constituam discriminação se forem objectiva e razoavelmente justificadas, no quadro do direito nacional, por um objectivo legítimo, incluindo objectivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e de formação profissional, e desde que os meios para realizar esse objectivo sejam apropriados e necessários.

Essas diferenças de tratamento podem incluir, designadamente:

a)

O estabelecimento de condições especiais de acesso ao emprego e à formação profissional, de emprego e de trabalho, nomeadamente condições de despedimento e remuneração, para os jovens, os trabalhadores mais velhos e os que têm pessoas a cargo, a fim de favorecer a sua inserção profissional ou garantir a sua protecção;

b)

A fixação de condições mínimas de idade, experiência profissional ou antiguidade no emprego para o acesso ao emprego ou a determinadas regalias associadas ao emprego;

c)

A fixação de uma idade máxima de contratação, com base na formação exigida para o posto de trabalho em questão ou na necessidade de um período razoável de emprego antes da reforma.»

8

Em conformidade com o disposto no artigo 18.o, primeiro parágrafo, da Directiva 2000/78, a República da Áustria devia adoptar as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à mesma até 2 de Dezembro de 2003 o mais tardar.

Legislação nacional

9

Resulta da decisão de reenvio que o § 128 da lei federal de 2002 relativa à organização das universidades e respectivos cursos (Universitätsgesetz 2002, BGBl. I, 120/2002) prevê que o conteúdo dos contratos de trabalho celebrados entre a universidade e os seus trabalhadores após a entrada em vigor dessa lei, isto é, 1 de Janeiro de 2004, até à entrada em vigor de uma convenção colectiva é determinado pela lei relativa ao estatuto dos agentes contratuais de 1948 (Vertragsbedienstetengesetz 1948, BGBl., 86/1948), conforme alterada pela lei de 1976 (BGBl. I, 176/2004, a seguir «VBG»).

10

O § 3, n.o 1, alínea a), da VBG define as normas de classificação dos agentes contratuais. Apenas podem ser contratadas pessoas maiores de 15 anos.

11

No que diz respeito aos direitos que dependem da duração da relação de trabalho ou da experiência profissional, a VBG não permite tomar em consideração os períodos de emprego completados antes dos 18 anos de idade, salvo em determinados casos concretos, não pertinentes no processo principal. Assim, no momento da determinação da data de referência para efeitos de progressão na carreira, o § 26, n.o 1, da VBG exclui a tomada em consideração dos períodos completados antes dos 18 anos de idade. Os períodos de emprego completados «no âmbito de uma formação profissional em matéria de ensino […] numa universidade ou num estabelecimento de ensino superior […]» referidos no § 26, n.o 2, ponto 1, alínea b), da VBG só podem ser tomados em consideração para efeitos da determinação de escalão se tiverem sido completados depois dos 18 anos de idade.

12

A Directiva 2000/78 foi transposta na Áustria pela lei federal relativa à igualdade de tratamento de 1993 (Bundes-Gleichbehandlungsgesetz 1993, BGBl., 100/1993), conforme alterada pela lei de 2004 (BGBl. I, 65/2004, a seguir «B-GIBG»). Esta lei regula os contratos de trabalho com as universidades. Todavia, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a B-GIBG não introduziu alterações ao § 26, n.o 1, da VBG, que, por isso, permanece aplicável aos factos em causa no processo principal.

Litígio no processo principal e questão prejudicial

13

D. Hütter, recorrente no processo principal, nasceu em 1986. Com uma colega, efectuou, de 3 de Setembro de 2001 a 2 de Março de 2005, um período de aprendizagem como técnico de laboratório na TUG, organismo público que se rege pela lei federal de 2002 relativa à organização das universidades e respectivos cursos.

14

D. Hütter e a sua colega foram seguidamente contratados pela TUG, de 3 de Março de 2005 a 2 de Junho de 2005, ou seja, por um período de três meses. Sendo a colega de D. Hütter 22 meses mais velha que ele, obteve uma classificação num escalão mais favorável, que se traduziu numa diferença de remuneração mensal de 23,20 euros. Esta diferença resulta do facto de o período de aprendizagem efectuado por D. Hütter durante a sua maioridade só ter sido de cerca de 6,5 meses, em comparação com os 28,5 meses da sua colega.

15

D. Hütter propôs uma acção no Landesgericht für Zivilrechtssachen Graz. Pediu a condenação da recorrida no pagamento de uma indemnização equivalente à diferença de remuneração de que é prejudicado em razão da sua idade e que considera injustificada e contrária quer à B-GIBG quer à Directiva 2000/78. Esta diferença de remuneração corresponde ao montante de 69,60 euros.

16

Tendo D. Hütter vencido em primeira instância e em sede de recurso, a TUG interpôs um recurso no órgão jurisdicional de reenvio. Este órgão jurisdicional pergunta concretamente se o artigo 6.o da Directiva 2000/78 se opõe a uma medida nacional que permite aos empregadores não ter em conta períodos de experiência profissional adquiridos antes da maioridade para evitar desfavorecer as pessoas que frequentaram estudos secundários, não incitar os alunos a abandonar esse tipo de estudos e, mais genericamente, não tornar a aprendizagem mais dispendiosa para o sector público a fim de favorecer a inserção de jovens aprendizes no mercado de trabalho.

17

Foi nestas condições que o Oberster Gerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Os artigos 1.o, 2.o e 6.o da Directiva [2000/78] devem ser interpretados no sentido de que se opõem a um regime nacional […] que exclui da determinação da data de referência para efeitos de progressão na carreira a contagem de períodos de emprego anteriores completados antes de ter sido atingida a idade de 18 anos?»

Quanto à questão prejudicial

Observações submetidas ao Tribunal de Justiça

18

D. Hütter considera que, quando a experiência profissional é igual, não existe nenhuma justificação que permita legitimar, ao abrigo do artigo 6.o, n.o 1, da Directiva 2000/78, uma diferença de tratamento baseada exclusivamente na idade em que essa experiência foi adquirida. Uma norma como aquela em causa no processo principal constitui um incentivo a que não se exerça qualquer actividade profissional antes dos 18 anos de idade. Considera que se trata de uma discriminação proibida pela Directiva 2000/78.

19

A TUG contesta a existência de uma discriminação. Sustenta que o § 26, n.o 1, da VBG é aplicável indistintamente a qualquer pessoa, independentemente da sua idade. Por consequência, não pode tratar-se de uma discriminação baseada no critério da idade. Daqui decorre que esta disposição só pode ser examinada à luz do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Directiva 2000/78 sobre as discriminações indirectas baseadas em critérios aparentemente neutros.

20

A TUG sustenta, a título subsidiário, que a medida em causa no processo principal prossegue um objectivo legítimo e é adequada e necessária, na acepção do artigo 6.o, n.o 1, da Directiva 2000/78.

21

Considera que a referida medida permite, com efeito, aos serviços públicos dispor de uma estrutura clara e uniforme para a fixação dos salários dos agentes contratuais. Em sua opinião, trata-se de um objectivo legítimo na acepção dos artigos 2.o, n.o 2, e 6.o, n.o 1, da Directiva 2000/78.

22

Durante o ano de 2000, cerca de 0,03% dos aprendizes completaram a sua formação depois de terem 18 anos de idade. A inserção profissional dos aprendizes é promovida pelo facto de estes deverem demonstrar períodos de experiência profissional adquirida antes dos 18 anos, períodos que não são tomados em consideração para o cálculo da sua remuneração. Segundo a TUG, isto permite aos empregadores reduzir os custos ligados à contratação de jovens aprendizes.

23

Por outro lado, a tomada em consideração dos períodos de emprego efectuados antes dos 18 anos de idade prejudicaria indevidamente as pessoas provenientes do ensino geral. Num Estado-Membro como a República da Áustria, onde o mercado de trabalho sofre de falta de licenciados do ensino superior, uma medida como aquela em causa no processo principal permite também evitar incitar as pessoas a abandonar o ensino geral.

24

O Governo dinamarquês considera que o artigo 6.o, n.o 1, da Directiva 2000/78 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma medida como a que está em causa no processo principal se esta prosseguir um objectivo legítimo ligado à formação profissional e à política de emprego a favor dos jovens e for apropriada e necessária.

25

O referido governo salienta o amplo poder de apreciação de que dispõem os Estados-Membros no que respeita às medidas baseadas no critério da idade (v., neste sentido, acórdãos de 22 de Novembro de 2005, Mangold, C-144/04, Colect., p. I-9981, n.os 62 e 63, e de 16 de Outubro de 2007, Palacios de la Villa, C-411/05, Colect., p. I-8531, n.o 68).

26

O Governo dinamarquês considera que prever uma remuneração inferior à dos adultos para as pessoas com menos de 18 anos as incita a seguir uma formação complementar que lhes permita obter uma remuneração superior. Por outro lado, se os empregadores fossem obrigados a remunerar as pessoas com menos de 18 anos nas mesmas condições que os trabalhadores adultos, seriam naturalmente inclinados a contratar trabalhadores mais velhos e mais experientes. Por último, as pessoas com menos de 18 anos não seriam capazes, de uma maneira geral, de efectuar as mesmas tarefas que os adultos. É esta a razão pela qual numerosas convenções colectivas na Dinamarca estabelecem condições de remuneração menos favoráveis para os trabalhadores nessa categoria de idade.

27

A Comissão das Comunidades Europeias considera que a norma em causa no processo principal diz respeito a uma condição de emprego e de trabalho na acepção do artigo 3.o, n.o 1, alínea c), da Directiva 2000/78, isto é, à condição de remuneração. A situação em causa no processo principal é, portanto, abrangida pelo âmbito de aplicação da referida directiva.

28

Segundo a Comissão, a norma que exclui os períodos de trabalho completados antes dos 18 anos de idade estabelece uma discriminação directamente baseada na idade. O facto de a medida em causa no processo principal ser aplicável indistintamente a qualquer pessoa que tenha atingido os 18 anos é, a este respeito, indiferente. Com efeito, a discriminação reside no facto de a norma ser mais favorável às pessoas que adquirem experiência profissional depois de terem atingido os 18 anos de idade. As circunstâncias em causa no processo principal demonstram o efeito discriminatório desta norma, uma vez que o recorrente no processo principal tem uma experiência igual mas é objecto de tratamento menos favorável do que uma das suas colegas de trabalho unicamente em razão da sua diferença de idade.

29

No que se refere à justificação baseada na necessidade de ter, para todos os assalariados, um sistema uniforme de tomada em consideração dos períodos de experiência profissional, a Comissão admite que pode tratar-se de um objectivo legítimo na acepção do artigo 6.o, n.o 1, da Directiva 2000/78. Considera, no entanto, que a norma em causa não é nem apropriada nem necessária para atingir esse objectivo. O sistema de cálculo dos períodos de antiguidade seria igualmente uniforme e lógico se os períodos de emprego efectuados antes dos 18 anos de idade não fossem excluídos.

30

No que se refere à justificação baseada na igualdade de tratamento entre os aprendizes, por um lado, e os alunos do ensino geral, por outro, a Comissão reconhece que pode fazer parte da política relativa à formação profissional, referida no artigo 6.o, n.o 1, da Directiva 2000/78. Duvida, no entanto, do carácter adequado e necessário da medida em causa no processo principal, já que esta medida favorece os alunos do ensino geral em detrimento dos aprendizes, uma vez que estes têm, geralmente, a possibilidade de adquirir experiência profissional antes de atingir a maioridade.

31

Por último, no que diz respeito à justificação baseada na inserção dos jovens no mercado de trabalho, a Comissão duvida que a medida em causa no processo principal tenha esse efeito. A diferença de tratamento estabelecida pela referida medida constitui uma desvantagem que acompanhará, ao longo de toda a sua carreira, o trabalhador que dela seja vítima. A exclusão dos períodos de emprego efectuados antes dos 18 anos de idade não afecta exclusivamente os jovens mas também, segundo a Comissão, todos os agentes contratuais aos quais é aplicável a VBG, independentemente da sua idade no momento da sua contratação. A Comissão considera que existem outros mecanismos menos restritivos que permitem favorecer o emprego dos jovens.

Resposta do Tribunal de Justiça

32

Importa verificar se uma legislação nacional como aquela em causa no processo principal está abrangida pelo âmbito de aplicação da Directiva 2000/78 e, em caso afirmativo, se se trata de uma medida discriminatória baseada na idade que pode eventualmente ser considerada justificada à luz da referida directiva.

33

Tanto do título e do preâmbulo como do conteúdo e da finalidade da Directiva 2000/78 decorre que tem por objectivo estabelecer um quadro geral para assegurar a todas as pessoas a igualdade de tratamento «no emprego e na actividade profissional», oferecendo-lhes uma protecção eficaz contra as discriminações baseadas num dos motivos referidos no seu artigo 1.o, nomeadamente a idade.

34

Mais concretamente, decorre do artigo 3.o, n.o 1, alíneas a) e c), da Directiva 2000/78 que esta é aplicável, no âmbito das competências conferidas à Comunidade, «a todas as pessoas, tanto no sector público como no privado, incluindo os organismos públicos», no que se refere, por um lado, «[à]s condições de acesso ao emprego […] incluindo os critérios de selecção e as condições de contratação, seja qual for o ramo de actividade e a todos os níveis da hierarquia profissional» e, por outro, «[à]s condições de emprego e de trabalho, incluindo o despedimento e a remuneração».

35

Ora, o § 26 da VBG exclui, de maneira geral, qualquer tomada em consideração da experiência profissional adquirida antes dos 18 anos de idade para efeitos da classificação no escalão dos agentes contratuais da função pública austríaca. Esta disposição afecta assim a determinação do escalão em que essas pessoas são colocadas. Afecta igualmente, por consequência, a sua remuneração. Por conseguinte, deve considerar-se que uma legislação dessa natureza estabelece normas relativas às condições de acesso ao emprego, de contratação e de remuneração, na acepção do artigo 3.o, n.o 1, alíneas a) e c), da Directiva 2000/78.

36

Nestas condições, a Directiva 2000/78 é aplicável a uma situação como a que deu lugar ao litígio submetido ao órgão jurisdicional de reenvio.

37

O artigo 2.o, n.o 1, da Directiva 2000/78 define o «princípio da igualdade de tratamento» que visa aplicar, como «a ausência de qualquer discriminação, directa ou indirecta, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.o» da directiva. O seu artigo 2.o, n.o 2, alínea a), indica que, para efeitos da aplicação do seu n.o 1, existe discriminação directa sempre que, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.o da mesma directiva, uma pessoa seja objecto de um tratamento menos favorável do que aquele que é dado a outra pessoa em situação comparável.

38

Ora, uma legislação nacional como aquela em causa no processo principal prevê um tratamento menos favorável às pessoas cuja experiência profissional tenha sido adquirida, ainda que apenas em parte, antes dos 18 anos de idade do que em relação às que obtiveram, depois de terem atingido essa idade, uma experiência do mesmo tipo e de duração comparável. Uma legislação desta natureza estabelece uma diferença de tratamento entre pessoas em função da idade em que adquiriram a sua experiência profissional. Conforme demonstram os factos em causa no processo principal, este critério pode chegar até a uma diferença de tratamento entre duas pessoas que tenham seguido os mesmos estudos e que tenham adquirido a mesma experiência profissional, exclusivamente em função da idade respectiva dessas pessoas. Tal disposição estabelece, portanto, uma diferença de tratamento directamente baseada no critério da idade na acepção do artigo 2.o, n.os 1 e 2, alínea a), da Directiva 2000/78.

39

Decorre, no entanto, do artigo 6.o, n.o 1, da Directiva 2000/78, que as diferenças de tratamento com base na idade «não constitu[e]m discriminação se forem objectiva e razoavelmente justificadas, no quadro do direito nacional, por um objectivo legítimo, incluindo objectivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e de formação profissional, e desde que os meios para realizar esse objectivo sejam apropriados e necessários».

40

No que se refere ao carácter legítimo do objectivo prosseguido pela legislação em causa no processo principal, resulta das explicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio que o legislador austríaco pretendeu excluir a tomada em consideração da experiência profissional obtida antes do reconhecimento, aos 18 anos de idade, da capacidade jurídica plena, para não desfavorecer as pessoas que tenham seguido uma formação escolar secundária do ensino geral em relação às procedentes da formação profissional. Além deste incentivo à prossecução dos estudos secundários, o órgão jurisdicional de reenvio menciona também a vontade do legislador em não encarecer, para o sector público, o custo da aprendizagem profissional e de favorecer deste modo a inserção dos jovens que tenham seguido este tipo de formação no mercado de trabalho. Por conseguinte, há que verificar se estes objectivos podem ser considerados legítimos na acepção do artigo 6.o, n.o 1, da Directiva 2000/78.

41

A este respeito, cabe recordar que os objectivos que podem ser considerados «legítimos» na acepção do artigo 6.o, n.o 1, da Directiva 2000/78, e, consequentemente, aptos a justificar uma excepção ao princípio da proibição da discriminação com base na idade, são objectivos de política social, como os ligados à política de emprego, do mercado de trabalho ou da formação profissional (acórdão de 5 de Março de 2009, Age Concern England, C-388/07, Colect., p. I-1569, n.o 46).

42

Os objectivos referidos pelo órgão jurisdicional de reenvio pertencem a essa categoria de objectivos legítimos e podem justificar diferenças de tratamento ligadas ao «estabelecimento de condições especiais de acesso ao emprego […] nomeadamente condições de […] remuneração […] para os jovens […] a fim de favorecer a sua inserção profissional» e à «fixação de condições mínimas de idade, experiência profissional ou antiguidade no emprego para o acesso ao emprego ou a determinadas regalias associadas ao emprego», referidas nas alíneas a) e b) do artigo 6.o, n.o 1, da Directiva 2000/78, respectivamente.

43

Por consequência, deve considerar-se, em princípio, que objectivos da natureza dos mencionados pelo órgão jurisdicional de reenvio justificam «objectiva e razoavelmente», «no quadro do direito nacional», como prevê o artigo 6.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Directiva 2000/78, uma diferença de tratamento baseada na idade estabelecida pelos Estados-Membros.

44

Há ainda que verificar, segundo os próprios termos da referida disposição, se os meios utilizados para realizar esses objectivos são «apropriados e necessários».

45

A este respeito, é incontestável que os Estados-Membros dispõem de um amplo poder de apreciação na escolha das medidas susceptíveis de realizar os seus objectivos em matéria de política social e de emprego. (acórdão Mangold, já referido, n.o 63).

46

Apesar desta margem de apreciação concedida aos Estados-Membros, importa sublinhar que os objectivos mencionados pelo órgão jurisdicional de reenvio podem parecer, à primeira vista, contraditórios. Com efeito, um desses objectivos consiste em incitar os alunos a frequentar o ensino secundário geral em vez da formação profissional. Outro objectivo consiste em favorecer a contratação de pessoas que tenham seguido uma formação profissional e não a de pessoas que provenham do ensino geral, como decorre do n.o 40 do presente acórdão. Trata-se, por consequência, no primeiro caso, de não desfavorecer as pessoas provenientes do ensino secundário geral em relação às que têm uma formação profissional e, no segundo caso, da hipótese inversa. Por conseguinte, à primeira vista, é difícil admitir que uma legislação nacional como aquela em causa no processo principal possa simultaneamente favorecer cada um desses dois grupos à custa do outro.

47

Para além desta falta de coerência interna, há igualmente que sublinhar que a legislação nacional em causa no processo principal se baseia no critério da experiência profissional anterior para efeitos da determinação da classificação no escalão e, consequentemente, da remuneração dos agentes contratuais da função pública. Ora, recompensar a experiência adquirida, que permite ao trabalhador melhor cumprir as suas tarefas é, regra geral, reconhecido como um objectivo legítimo. É, por conseguinte, lícito aos empregadores remunerar essa experiência (v. acórdão de 3 de Outubro de 2006, Cadman, C-17/05, Colect., p. I-9583, n.os 35 e 36). No entanto, não se pode deixar de observar que a legislação nacional como aquela em causa no processo principal não se limita a remunerar a experiência, estabelecendo também, quando a experiência é igual, uma diferença de tratamento em função da idade em que essa experiência foi adquirida. Nessas condições, esse critério ligado à idade não tem, por isso, relação directa com o objectivo que consiste, para o empregador, em recompensar a experiência profissional adquirida.

48

No que se refere ao objectivo de não desfavorecer o ensino secundário geral em relação à formação profissional, há que sublinhar que o critério da idade em que foi adquirida a experiência anterior é aplicável independentemente do tipo de ensino seguido. Exclui tanto a tomada em consideração da experiência adquirida antes dos 18 anos de idade por uma pessoa que tenha seguido um ensino geral como a adquirida por uma pessoa proveniente da formação profissional. Este critério pode, portanto, conduzir a uma diferença de tratamento entre duas pessoas provenientes da formação profissional ou entre duas pessoas provenientes do ensino geral com base unicamente no critério da idade em que adquiriram a sua experiência profissional. Nestas condições, o critério da idade em que foi adquirida a experiência profissional não parece apropriado para realizar o objectivo de não desfavorecer o ensino geral em relação à formação profissional. A este respeito, deve referir-se que um critério baseado directamente no tipo de estudos seguidos sem atender à idade das pessoas seria mais adaptado, à luz da Directiva 2000/78, à realização do objectivo de não desfavorecer o ensino geral.

49

No que diz respeito ao objectivo de favorecer a inserção no mercado de trabalho dos jovens que tenham seguido uma formação profissional, importa sublinhar que a exclusão da tomada em consideração da experiência adquirida antes dos 18 anos de idade é aplicável indistintamente a todos os agentes contratuais da função pública, independentemente da idade em que sejam contratados. Assim, este critério da idade em que tenha sido adquirida a experiência profissional não permite distinguir um grupo de pessoas definido pela sua juventude a fim de lhes atribuir condições de contratação especiais destinadas a favorecer a sua inserção no mercado de trabalho. Uma norma como aquela em causa no processo principal diferencia-se de medidas como as evocadas pelo Governo dinamarquês que visam favorecer a inserção profissional dos jovens com menos de 18 anos na medida em que estas prevêem, a seu respeito, condições mínimas de remuneração inferiores às aplicáveis aos trabalhadores mais velhos. Na medida em que não toma em consideração a idade das pessoas no momento da sua contratação, uma norma como a que está em causa no processo principal não é adequada para favorecer a entrada no mercado de trabalho de uma categoria de trabalhadores definida pela sua juventude.

50

Por consequência, uma legislação com características como aquelas em causa no processo principal não pode ser considerada apropriada na acepção do artigo 6.o, n.o 1, da Directiva 2000/78.

51

Por conseguinte, importa responder ao órgão jurisdicional de reenvio que os artigos 1.o, 2.o e 6.o da Directiva 2000/78 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional que, para efeitos de não desfavorecer o ensino geral em relação à formação profissional e de promover a inserção dos jovens aprendizes no mercado de trabalho, exclui a tomada em consideração de períodos de emprego completados antes dos 18 anos de idade para efeitos da determinação do escalão em que são colocados os agentes contratuais da função pública de um Estado-Membro.

Quanto às despesas

52

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

 

Os artigos 1.o, 2.o e 6.o da Directiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de Novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional que, para efeitos de não desfavorecer o ensino geral em relação à formação profissional e de promover a inserção dos jovens aprendizes no mercado de trabalho, exclui a tomada em consideração de períodos de emprego completados antes dos 18 anos de idade para efeitos da determinação do escalão em que são colocados os agentes contratuais da função pública de um Estado-Membro.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.