ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

24 de Janeiro de 2008 ( *1 )

«Directiva 92/50/CEE — Contratos públicos de serviços — Realização de um estudo sobre o registo cadastral, a urbanização e o acto de execução para uma zona de habitação — Critérios que podem ser definidos como ‘critérios de selecção qualitativa’ ou ‘critérios de adjudicação’ — Proposta economicamente mais vantajosa — Cumprimento dos critérios de adjudicação estabelecidos no caderno de encargos ou no anúncio de concurso — Fixação posterior de coeficientes de ponderação e de subcritérios relativos aos critérios de adjudicação — Princípio da igualdade de tratamento dos operadores económicos e obrigação de transparência»

No processo C-532/06,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.o CE, apresentado pelo Symvoulio tis Epikrateias (Grécia), por decisão de 28 de Novembro de 2006, entrado no Tribunal de Justiça em 29 de Dezembro de 2006, no processo

Emm. G. Lianakis AE,

Sima Anonymi Techniki Etaireia Meleton kai Epivlepseon,

Nikolaos Vlachopoulos

contra

Dimos Alexandroupolis,

Planitiki AE,

Aikaterini Georgoula,

Dimitrios Vasios,

N. Loukatos kai Synergates AE Meleton,

Eratosthenis Meletitiki AE,

A. Pantazis — Pan. Kyriopoulou kai syn/tes os «Filon» OE,

Nikolaos Sideris,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: P. Jann (relator), presidente de secção, A. Tizzano, A. Borg Barthet, M. Ilešič e E. Levits, juízes,

advogado-geral: D. Ruiz-Jarabo Colomer,

secretário: R. Grass,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da N. Loukatos kai Synergates AE Meleton, Eratosthenis Meletitiki AE, A. Pantazis — Pan. Kyriopoulou kai syn/tes os «Filon» OE e N. Sideris, por E. Konstantopoulou e P. E. Bitsaxis, dikigoroi,

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por M. Patakia e D. Kukovec, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 23.o, n.o 1, 32.o e 36.o da Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (JO L 209, p. 1), na redacção dada pela Directiva 97/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Outubro de 1997 (JO L 328, p. 1, a seguir «Directiva 92/50»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de dois litígios que opõem o consórcio de gabinetes de estudos e de peritos formado pela Emm. G. Lianakis AE (sucessora universal da Emm. Lianakis EPE), pela Sima Anonymi Techniki Etaireia Meleton kai Epivlepseon e por N. Vlachopoulos (a seguir «consórcio Lianakis»), por um lado, e o consórcio formado pela Planitiki AE, A. Georgula e D. Vasios (a seguir «consórcio Planitiki»), por outro, ao Dimos Alexandroupolis (município de Alexandroupolis) e ao consórcio formado pela N. Loukatos kai Synergates AE Meleton, Eratosthenis Meletitiki AE, A. Pantazis — Pan. Kyriopoulou kai syn/tes os «Filon» OE e N. Sideris (a seguir «consórcio Loukatos»), relativamente à adjudicação de um contrato para realização de um estudo sobre o registo cadastral, a urbanização e o acto de execução relativo a uma parte do Dimos Alexandroupolis.

Quadro jurídico

3

A Directiva 92/50 coordena os processos de adjudicação de contratos públicos de serviços.

4

Para esse efeito, essa directiva determina, por um lado, os contratos que devem ser submetidos a um processo de adjudicação e, por outro, as regras de processo a seguir, entre as quais, nomeadamente, o princípio da igualdade de tratamento dos operadores económicos, os critérios de selecção qualitativa dos operadores (denominados «critérios de selecção qualitativa») e os critérios de adjudicação dos contratos (denominados «critérios de adjudicação»).

5

Assim, o artigo 3.o, n.o 2, da Directiva 92/50 dispõe que «[a]s entidades adjudicantes assegurarão que não se verifique qualquer discriminação entre os vários prestadores de serviços».

6

O artigo 23.o, n.o 1, da referida directiva prevê que «[o]s contratos serão adjudicados com base nos critérios definidos no capítulo 3 [isto é, nos artigos 36.o e 37.o], tendo em conta o disposto no artigo 24.o, depois de as entidades adjudicantes terem verificado a aptidão dos prestadores de serviços não excluídos por força do disposto no artigo 29.o, de acordo com os critérios referidos nos artigos 31.o e 32.o».

7

Nos termos do artigo 32.o dessa mesma directiva:

«1.   A capacidade dos prestadores de serviços para a execução de serviços pode ser apreciada em função das suas qualificações, eficiência, experiência e fiabilidade.

2.   A prova da capacidade técnica dos prestadores de serviços pode ser fornecida por um ou mais dos meios a seguir indicados, de acordo com a natureza, quantidade e finalidade dos serviços a prestar:

a)

Habilitações literárias e profissionais do prestador de serviços e/ou dos quadros da empresa e, em especial, da pessoa ou pessoas responsáveis pela prestação;

b)

Uma lista dos principais serviços prestados nos últimos três anos, com indicação do montante, datas e destinatários públicos ou privados dos serviços executados:

[…]

c)

Indicação dos técnicos ou organismos técnicos envolvidos, quer dependam ou não directamente do prestador de serviços, e especialmente dos responsáveis pelo controlo da qualidade;

d)

Uma declaração relativa aos efectivos médios anuais do prestador de serviços e ao efectivo do pessoal de enquadramento nos últimos três anos;

e)

Uma declaração relativa às ferramentas e equipamento industrial e técnico à disposição do prestador de serviços para execução dos serviços;

f)

Uma descrição das medidas adoptadas pelo prestador de serviços para garantia da qualidade e dos seus meios de estudo e investigação;

[…]»

8

O artigo 36.o da Directiva 92/50 dispõe:

«1.   Sem prejuízo das disposições legislativas, regulamentares ou administrativas nacionais relativas à remuneração de determinados serviços, os critérios que a entidade adjudicante tomará como base para a adjudicação de contratos podem ser:

a)

Ou, quando a adjudicação contempla a proposta economicamente mais vantajosa, vários critérios que variam consoante o contrato: por exemplo, qualidade, mérito técnico, características estéticas e funcionais, assistência técnica e serviço pós-venda, data de entrega, prazos de entrega ou de execução, preço;

b)

Ou, unicamente o preço mais baixo.

2.   Sempre que o contrato deva ser adjudicado ao prestador de serviços que apresente a proposta economicamente mais vantajosa, as entidades adjudicantes devem indicar nos cadernos de encargos ou no anúncio de concurso quais os critérios de adjudicação que tencionam aplicar, se possível por ordem decrescente da importância que lhes é atribuída.»

Litígio no processo principal e questão prejudicial

9

Em 2004, o conselho municipal de Alexandroupolis lançou um concurso com vista a adjudicar a realização de um estudo sobre o registo cadastral, a urbanização e o acto de execução para a zona de Palagia, uma parte do referido município que tem menos de 2000 habitantes. Estava previsto, para esse estudo, um orçamento de 461737 euros.

10

O anúncio de concurso mencionava, como critérios de adjudicação por ordem de prioridade, em primeiro lugar, a comprovada experiência do perito, adquirida durante estudos realizados no decurso dos três últimos anos, em segundo lugar, o pessoal e o equipamento do gabinete e, em terceiro lugar, a capacidade de realizar o estudo no prazo previsto, combinada com os compromissos assumidos pelo gabinete e pelo seu potencial científico.

11

Treze gabinetes de estudos responderam a esse anúncio de concurso, entre os quais os consórcios Lianakis e Planitiki, bem como o consórcio Loukatos.

12

Para poder avaliar as propostas dos proponentes, a comissão de adjudicação do Dimos Alexandroupolis (a seguir «comissão de adjudicação») fixou, por ocasião do procedimento de avaliação, coeficientes de ponderação e subcritérios relativos aos critérios de adjudicação mencionados no anúncio de concurso.

13

Assim, estabeleceu uma ponderação, respectivamente, de 60%, 20% e 20% para os três critérios de adjudicação mencionados no anúncio de concurso.

14

Além disso, determinou que a experiência (primeiro critério de adjudicação) devia ser apreciada segundo o montante dos estudos realizados. Assim, um proponente recebia 0 pontos por um montante até 500000 euros, 6 pontos por um montante entre 500000 euros e 1000000 euros, 12 pontos por um montante entre 1000000 euros e 1500000 euros, e assim por diante até à nota máxima de 60 pontos por um montante superior a 12000000 euros.

15

O pessoal e o equipamento do gabinete (segundo critério de adjudicação) deviam ser apreciados em função do número dos efectivos do grupo de estudos. Por conseguinte, um proponente recebia 2 pontos por um grupo de 1 a 5 pessoas, 4 pontos por um grupo de 6 a 10 pessoas, e assim por diante até à nota máxima de 20 pontos por um grupo de mais de 45 pessoas.

16

Por último, a comissão de adjudicação decidiu que a capacidade de realizar o estudo no prazo previsto (terceiro critério de adjudicação) devia ser apreciada em função do montante dos compromissos assumidos. Deste modo, um proponente recebia a nota máxima de 20 pontos por um montante inferior a 15000 euros, 18 pontos por um montante entre 15000 euros e 60000 euros, 16 pontos por um montante entre 60000 euros e 100000 euros, e assim por diante até à nota mínima de 0 pontos por um montante superior a 1500000 euros.

17

Em aplicação das referidas regras, a comissão de adjudicação classificou o consórcio Loukatos em primeiro lugar, com 78 pontos, o consórcio Planitiki em segundo, com 72 pontos, e o consórcio Lianakis em terceiro, com 70 pontos. Consequentemente, propôs, na sua acta de 27 de Abril de 2005, a adjudicação do estudo ao consórcio Loukatos.

18

Por decisão de 10 de Maio de 2005, o conselho municipal de Alexandroupolis aprovou a acta da comissão de adjudicação e adjudicou a realização do estudo ao consórcio Loukatos.

19

Considerando que este último só pôde ser adjudicatário graças à fixação a posteriori, pela comissão de adjudicação, dos coeficientes de ponderação e dos subcritérios relativos aos critérios de adjudicação mencionados no anúncio de concurso, os consórcios Lianakis e Planitiki impugnaram a decisão tomada pelo conselho municipal de Alexandroupolis, primeiro perante esse mesmo conselho e, em seguida, perante o Symvoulio tis Epikrateias (Conselho de Estado helénico), com base, nomeadamente, em fundamentos relativos à violação do artigo 36.o, n.o 2, da Directiva 92/50.

20

Nestas circunstâncias, o Symvoulio tis Epikrateias decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«No caso de o anúncio para adjudicação de um contrato de serviços prever apenas a ordem de prioridade dos critérios de adjudicação, sem estabelecer os coeficientes de ponderação de cada critério, o artigo 36.o da Directiva 92/50[...] admite que os coeficientes de ponderação dos critérios sejam fixados em momento posterior pela comissão de adjudicação e, em caso de resposta afirmativa, em que condições?»

Quanto à questão prejudicial

21

Através da sua questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 36.o, n.o 2, da Directiva 92/50 se opõe a que, num processo de adjudicação, a entidade adjudicante fixe a posteriori coeficientes de ponderação e subcritérios relativos aos critérios de adjudicação mencionados no caderno de encargos ou no anúncio do concurso.

22

A Comissão das Comunidades Europeias alega, nas suas observações escritas, que, antes de responder à questão submetida, importa examinar se a Directiva 92/50 se opõe a que, num processo de adjudicação, a entidade adjudicante tenha em conta a experiência dos proponentes, o seu pessoal e o equipamento assim como a capacidade de executarem o contrato no prazo previsto, não a título de «critérios de selecção qualitativa», mas a título de «critérios de adjudicação».

23

A esse propósito, impõe-se reconhecer que, mesmo que, no plano formal, o órgão jurisdicional de reenvio tenha limitado a sua questão à interpretação do artigo 36.o, n.o 2, da Directiva 92/50 sob a óptica de uma eventual mudança a posteriori dos critérios de adjudicação, tal circunstância não obsta a que o Tribunal de Justiça lhe forneça todos os elementos de interpretação do direito comunitário que possam ser úteis para a decisão do processo que lhe está submetido, quer esse órgão lhes tenha ou não feito referência no enunciado da sua questão (v. acórdão de 26 de Abril de 2007, Alevizos, C-392/05, Colect., p. I-3505, n.o 64 e jurisprudência referida).

24

Portanto, em primeiro lugar, há que verificar a legitimidade dos critérios definidos como «critérios de adjudicação» e, em seguida, examinar a possibilidade de fixar posteriormente coeficientes de ponderação e subcritérios relativos aos critérios de adjudicação mencionados no anúncio de concurso.

Quanto aos critérios que podem ser definidos como «critérios de adjudicação» (artigos 23.o e 36.o, n.o 1, da Directiva 92/50)

25

A esse respeito, deve recordar-se que a Directiva 92/50 prevê no artigo 23.o, n.o 1, que os contratos serão adjudicados com base nos critérios definidos nos artigos 36.o e 37.o, tendo em conta o disposto no artigo 24.o, depois de as entidades adjudicantes terem verificado a aptidão dos prestadores de serviços não excluídos por força do artigo 29.o, de acordo com os critérios referidos nos artigos 31.o e 32.o

26

Resulta da jurisprudência que, embora a Directiva 92/50 não exclua, teoricamente, que a verificação da aptidão dos proponentes e a adjudicação do contrato possam ter lugar simultaneamente, não é menos verdade que essas duas operações são operações distintas e são regidas por regras diferentes (v., neste sentido, quanto aos contratos de empreitadas de obras públicas, acórdão de 20 de Setembro de 1988, Beentjes, 31/87, Colect., p. 4635, n.os 15 e 16).

27

A verificação da aptidão dos proponentes é, com efeito, efectuada pelas entidades adjudicantes de acordo com os critérios de capacidade económica, financeira e técnica (denominados «critérios de selecção qualitativa») referidos nos artigos 31.o e 32.o da referida directiva (v., no tocante aos contratos de empreitadas de obras públicas, acórdão Beentjes, já referido, n.o 17).

28

Ao invés, a adjudicação baseia-se nos critérios enumerados no artigo 36.o, n.o 1, dessa mesma directiva, isto é, ou no preço mais baixo ou na proposta economicamente mais vantajosa (v., neste sentido, quanto aos contratos de empreitadas de obras públicas, acórdão Beentjes, já referido, n.o 18).

29

Ora, embora seja verdade que, neste último caso, os critérios que podem ser definidos pelas entidades adjudicantes não são enumerados de forma limitativa no artigo 36.o, n.o 1, da Directiva 92/50 e que essa disposição deixa, portanto, às entidades adjudicantes a escolha dos critérios de adjudicação do contrato que entenderem definir, não é menos certo que essa escolha só pode fazer-se entre os critérios que visem identificar a proposta economicamente mais vantajosa (v., neste sentido, quanto aos contratos de empreitadas de obras públicas, acórdãos Beentjes, já referido, n.o 19, e de 18 de Outubro de 2001, SIAC Construction, C-19/00, Colect., p. I-7725, n.os 35 e 36, bem como, quanto aos contratos públicos de serviços, acórdãos de 17 de Setembro de 2002, Concordia Bus Finland, C-513/99, Colect., p. I-7213, n.os 54 e 59, e de 19 de Junho de 2003, GAT, C-315/01, Colect., p. I-6351, n.os 63 e 64).

30

Portanto, são excluídos como «critérios de adjudicação» os critérios que não visam identificar a proposta economicamente mais vantajosa, mas que estão ligados essencialmente à apreciação da aptidão dos proponentes para executar o contrato em questão.

31

No processo principal, os critérios definidos, pela entidade adjudicante, como «critérios de adjudicação» referem-se, no entanto, principalmente à experiência, às qualificações e aos meios susceptíveis de garantir uma boa execução do contrato em questão. Trata-se de critérios que dizem respeito à aptidão dos proponentes para executar esse contrato e que, portanto, não têm a qualidade de «critérios de adjudicação», na acepção do artigo 36.o, n.o 1, da Directiva 92/50.

32

Deve, por conseguinte, reconhecer-se que os artigos 23.o, n.o 1, 32.o e 36.o, n.o 1, da Directiva 92/50 se opõem a que, no quadro de um processo de adjudicação, a entidade adjudicante tenha em conta a experiência dos proponentes, o seu pessoal e o equipamento assim como a capacidade de executarem o contrato no prazo previsto, não a título de «critérios de selecção qualitativa», mas a título de «critérios de adjudicação».

Quanto à fixação a posteriori dos coeficientes de ponderação e dos subcritérios relativos aos critérios de adjudicação mencionados no caderno de encargos ou no anúncio de concurso

33

A esse propósito, recorde-se que o artigo 3.o, n.o 2, da Directiva 92/50 impõe às entidades adjudicantes que assegurem que não se verifica qualquer discriminação entre os vários prestadores de serviços.

34

O princípio da igualdade de tratamento, assim consagrado, comporta igualmente uma obrigação de transparência (v., neste sentido, quanto aos contratos públicos de fornecimento, acórdão de 18 de Novembro de 1999, Unitron Scandinavia e 3-S, C-275/98, Colect., p. I-8291, n.o 31, e, quanto aos contratos de empreitada de obras públicas, acórdão SIAC Construction, já referido, n.o 41).

35

Além disso, resulta do artigo 36.o, n.o 2, da Directiva 92/50 que, sempre que o contrato deva ser adjudicado ao prestador de serviços que apresente a proposta economicamente mais vantajosa, as entidades adjudicantes devem indicar nos cadernos de encargos ou no anúncio de concurso os critérios de adjudicação que tencionam aplicar, se possível, por ordem decrescente da importância que lhes é atribuída.

36

Segundo a jurisprudência, esta última disposição, à luz do princípio da igualdade de tratamento dos operadores económicos, enunciado no artigo 3.o, n.o 2, da Directiva 92/50, e da obrigação de transparência que dele decorre, exige que todos os elementos tomados em consideração pela entidade adjudicante para identificar a proposta economicamente mais vantajosa e a sua importância relativa sejam conhecidos dos potenciais proponentes no momento da preparação das suas propostas (v., neste sentido, quanto aos contratos públicos nos sectores da água, da energia, dos transportes e das telecomunicações, acórdão de 25 de Abril de 1996, Comissão/Bélgica, C-87/94, Colect., p. I-2043, n.o 88; quanto aos contratos de empreitadas de obras públicas, acórdão de 12 de Dezembro de 2002, Universale-Bau e o., C-470/99, Colect., p. I-11617, n.o 98; e, quanto aos contratos públicos de serviços, acórdão de 24 de Novembro de 2005, ATI EAC e Viaggi di Maio e o., C-331/04, Colect., p. I-10109, n.o 24).

37

Com efeito, os potenciais proponentes devem ter a possibilidade de conhecimento, no momento da preparação das suas propostas, da existência e do alcance desses elementos (v., neste sentido, quanto aos contratos públicos de serviços, acórdãos, já referidos, Concordia Bus Finland, n.o 62, e ATI EAC e Viaggi di Maio e o., n.o 23).

38

Portanto, uma entidade adjudicante não pode aplicar regras de ponderação ou subcritérios relativos aos critérios de adjudicação que não tenha levado previamente ao conhecimento dos proponentes (v., por analogia, quanto aos contratos de empreitadas de obras públicas, acórdão Universale-Bau e o., já referido, n.o 99).

39

Esta interpretação é corroborada pelo objectivo da Directiva 92/50 que visa suprimir os entraves à livre circulação de serviços e, portanto, proteger os interesses dos operadores económicos estabelecidos num Estado-Membro desejosos de propor serviços às entidades adjudicantes de outro Estado-Membro (v., neste sentido, nomeadamente, acórdão de 3 de Outubro de 2000, University of Cambridge, C-380/98, Colect., p. I-8035, n.o 16).

40

Para esse efeito, os proponentes devem ser colocados em pé de igualdade ao longo de todo o processo, o que implica que os critérios e condições que regem cada contrato devam ser objecto de publicidade adequada por parte das entidades adjudicantes (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Beentjes, n.o 21, e SIAC Construction, n.o 34, bem como, quanto aos contratos públicos de serviços, acórdão ATI EAC e Viaggi di Maio e o., já referido, n.o 22).

41

Contrariamente às dúvidas emitidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, estas declarações não colidem, de resto, com a interpretação do artigo 36.o, n.o 2, da Directiva 92/50 efectuada pelo Tribunal de Justiça no acórdão ATI EAC e Viaggi di Maio e o., já referido.

42

No processo que deu origem a esse acórdão, tanto os critérios de adjudicação e os seus coeficientes de ponderação como os subcritérios relativos a esses critérios de adjudicação foram, com efeito, definidos previamente e publicados no caderno de encargos. A entidade adjudicante em questão definiu todavia ex post, pouco antes da abertura dos envelopes, coeficientes de ponderação relativos aos subcritérios.

43

O Tribunal de Justiça, nesse acórdão, julgou no sentido de que o artigo 36.o, n.o 2, da Directiva 92/50 não se opõe a tal forma de proceder sob três condições muito precisas, desde que a decisão:

não altere os critérios de adjudicação do contrato definidos no caderno de encargos ou no anúncio de concurso,

não contenha elementos que, se tivessem sido conhecidos no momento da preparação das propostas, poderiam ter influenciado essa preparação,

não tenha sido adoptada tomando em consideração elementos susceptíveis de produzir efeitos discriminatórios relativamente a um dos proponentes (v., neste sentido, acórdão ATI EAC e Viaggi di Maio e o., já referido, n.o 32).

44

No processo principal, deve, pelo contrário, declarar-se que a comissão de adjudicação só mencionou, no anúncio de concurso, os próprios critérios de adjudicação e definiu ex post, depois da apresentação das propostas e depois da abertura dos pedidos de manifestação de interesse, tanto os coeficientes de ponderação como os subcritérios relativos a esses critérios de adjudicação. Ora, esta circunstância não cumpre manifestamente a obrigação de publicidade prevista pelo artigo 36.o, n.o 2, da Directiva 92/50, à luz do princípio da igualdade de tratamento dos operadores económicos e da obrigação de transparência.

45

Tendo presente o que precede, deve, portanto, responder-se à questão submetida que o artigo 36.o, n.o 2, da Directiva 92/50, à luz do princípio da igualdade de tratamento dos operadores económicos e da obrigação de transparência que dele decorre, opõe-se a que, num processo de adjudicação, a entidade adjudicante fixe a posteriori coeficientes de ponderação e subcritérios relativos aos critérios de adjudicação mencionados no caderno de encargos ou no anúncio de concurso.

Quanto às despesas

46

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

 

O artigo 36.o, n.o 2, da Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços, na redacção dada pela Directiva 97/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Outubro de 1997, à luz do princípio da igualdade de tratamento dos operadores económicos e da obrigação de transparência que dele decorre, opõe-se a que, num processo de adjudicação, a entidade adjudicante fixe a posteriori coeficientes de ponderação e subcritérios relativos aos critérios de adjudicação mencionados no caderno de encargos ou no anúncio de concurso.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: grego.