Processo T‑146/04

Koldo Gorostiaga Atxalandabaso

contra

Parlamento Europeu

«Regulamentação referente às despesas e subsídios dos deputados ao Parlamento Europeu – Controlo da utilização de subsídios – Prova das despesas – Recuperação de uma dívida por via de compensação»

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Segunda Secção alargada) de 22 de Dezembro de 2005 

Sumário do acórdão

1.     Parlamento – Regulamentação referente às despesas e aos subsídios dos deputados ao Parlamento Europeu – Recuperação de montantes indevidamente pagos – Aplicação do procedimento descrito nos artigos 16.°, n.° 2, e 27.°, n.os 3 e 4, da referida regulamentação como lex specialis relativamente à que está prevista no n.° 2 deste último artigo

2.     Parlamento – Regulamentação referente às despesas e subsídios dos deputados ao Parlamento Europeu – Decisão do secretário‑geral relativa à recuperação de montantes indevidamente pagos – Incompetência deste para ordenar a referida recuperação por via de compensação com os subsídios devidos ao deputado, sem ter sido encarregado para esse efeito pela Mesa, em conformidade com o procedimento aplicável

3.     Recurso de anulação – Competência do juiz comunitário – Pedido destinado a repor um processo numa fase anterior à adopção do acto anulado, a fim de retomar o procedimento no ponto da ilegalidade em causa – Inadmissibilidade

(Artigos 230.° CE e 233.° CE)

4.     Direito comunitário – Princípios – Direitos da defesa – Documentos que não foram objecto de tomada de posição por parte do interessado – Exclusão como meios de prova – Limites

5.     Actos das instituições – Obrigação geral de informar os destinatários das vias de recurso e dos prazos – Inexistência – Guia das obrigações dos funcionários e dos agentes do Parlamento Europeu – Disposição que prevê a menção, nos actos, da possibilidade de interpor recuso jurisdicional – Incumprimento – Violação de formalidades essenciais – Inexistência

6.     Actos das instituições – Fundamentação – Dever – Alcance – Decisão do secretário‑geral do Parlamento Europeu relativa à recuperação de montantes pagos a título de subsídios parlamentares – Referência a um relatório de auditoria enviado ao interessado – Referência aos documentos apresentados por este bem como ao reembolso parcial – Admissibilidade

(Artigo 253.° CE)

7.     Direito comunitário – Princípios – Igualdade de tratamento – Limites – Benefício ilegalmente atribuído

8.     Recurso de anulação – Fundamentos – Desvio de poder – Conceito

9.     Parlamento – Regulamentação referente às despesas e aos subsídios dos deputados ao Parlamento Europeu – Subsídio de assistência parlamentar – Terceiro pagador encarregado da gestão dos montantes pagos – Falta de documentos que justifiquem uma utilização conforme – Obrigação de reembolso – Ónus da prova em caso de impugnação perante o juiz comunitário

1.     O artigo 27.°, n.° 2, da regulamentação referente às despesas e aos subsídios dos deputados ao Parlamento Europeu, que prevê um procedimento que atribui aos Questores competência para decidir qualquer controvérsia relativa à aplicação da referida regulamentação entre um deputado e o secretário‑geral, constitui disposição de âmbito geral que se refere, sem prejuízo de regras especiais, à totalidade das matérias regidas por esta regulamentação. Por conseguinte, constitui uma disposição geral relativamente ao artigo 16.°, n.° 2, e ao artigo 27.°, n.os 3 e 4, que dizem respeito, mais particularmente, às controvérsias em matéria de recuperação de subsídios parlamentares indevidamente pagos. Consequentemente, existindo disposições especiais, o artigo 27.°, n.° 2, não é aplicável em matéria de recuperação de subsídios parlamentares indevidamente pagos.

(cf. n.° 83)

2.     Deve ser anulada uma decisão do secretário‑geral do Parlamento Europeu que, por um lado, declare que as quantias nela mencionadas foram indevidamente pagas a um deputado a título de despesas e subsídios parlamentares e que é necessário recuperá‑las e, por outro, ordene que se proceda à sua cobrança por via de compensação com os subsídios a pagar ao deputado, na medida em que dispõe que a devolução de que o deputado é devedor será feita por via de compensação.

A este respeito, o artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação referente às despesas e aos subsídios dos deputados ao Parlamento Europeu (a seguir «regulamentação DSD») descreve efectivamente um procedimento de compensação. Desde logo, esta disposição remete para o artigo 73.° do Regulamento Financeiro n.° 1605/2002 e para as normas de execução deste artigo, cujo n.° 1, segundo parágrafo, prevê a obrigação do contabilista de cada instituição proceder à cobrança por via de compensação junto de qualquer devedor que seja simultaneamente titular de um crédito certo, líquido e exigível perante as Comunidades, até ao limite das suas dívidas a estas últimas. Além disso, resulta do artigo 78.°, n.° 3, alíneas d) a f), e dos artigos 83.° e 84.° do Regulamento n.° 2342/2002, relativos às normas de execução dos artigos 71.° e 73.° do Regulamento Financeiro, que cada instituição deve recorrer prioritariamente à recuperação dos créditos comunitários por via de compensação e que, na falta de recuperação, deve iniciar o processo de recuperação por qualquer outra via jurídica.

Todavia, no que respeita à relação de especialidade entre o artigo 16.°, n.° 2, o artigo 27.°, n.° 3, e o artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD, este último artigo indica o procedimento a seguir no caso de estar prevista a aplicação de um modo de recuperação (a compensação), que incida sobre os subsídios a pagar a um deputado a fim de lhe permitir exercer as suas funções representativas com toda a eficácia, velando para que este possa exercer o seu mandato de forma efectiva. Por esta razão, prevê uma série de garantias processuais e substantivas. Uma vez que esta disposição diz respeito a um determinado modo de recuperação de um ou mais subsídios indevidamente pagos, deve ser considerada lex specialis em relação ao artigo 16.°, n.° 2, e ao artigo 27.°, n.° 3, da regulamentação DSD, o que justifica, aliás, a sua inserção depois deste último número. Neste contexto, a expressão «[e]m casos excepcionais» que consta do início do artigo 27.°, n.° 4, confirma que a compensação só pode ser efectuada após terem sido observadas essas garantias.

Por conseguinte, ao modificar a sua regulamentação DSD acrescentando um novo n.° 4 ao artigo 27.° já referido, o Parlamento quis prever que, nos casos em que seja necessário cobrar um crédito junto de um deputado por via de compensação com subsídios parlamentares devidos a este último, esta cobrança só pode ser efectuada de acordo com o procedimento previsto no n.° 4 do dito artigo. Por conseguinte, visto que o secretário‑geral não tem competência para ordenar a compensação em questão sem ter sido encarregado para o efeito pela Mesa, em conformidade com o procedimento previsto nesta disposição, a sua decisão deve ser anulada na medida em que ordena essa compensação.

(cf. n.os 86, 87, 95‑97, 99)

3.     No que respeita ao pedido apresentado no quadro de um recurso de anulação e destinado a recolocar um processo numa fase anterior à adopção do acto anulado, a fim de retomar a tramitação no ponto em que a ilegalidade se verificou, não compete ao juiz comunitário pronunciar‑se sobre o seguimento que uma instituição deve dar ao acórdão de anulação, parcial ou total, de um acto. Em contrapartida, incumbe à instituição em causa tomar, de acordo com artigo 233.° CE, as medidas necessárias à execução do acórdão de anulação.

(cf. n.° 98)

4.     Segundo o princípio geral do respeito dos direitos de defesa, a pessoa que é objecto de uma acusação por parte da administração comunitária deve ter a possibilidade de tomar posição sobre qualquer documento que esta pretenda utilizar contra ela. Na medida em que tal possibilidade não lhe seja concedida, os documentos não divulgados não devem ser tidos em consideração como meio de prova. Todavia, a exclusão de determinados documentos utilizados pela administração apenas tem importância se a acusação por esta formulada só pudesse ser provada através daqueles documentos. Compete ao juiz comunitário verificar se a não divulgação dos documentos indicados pelo recorrente pôde influenciar, em seu prejuízo, o desenvolvimento do processo e o conteúdo da decisão recorrida.

Além disso, o juiz comunitário pode, no âmbito do recurso jurisdicional interposto da decisão que põe termo ao procedimento administrativo, ordenar medidas de organização do processo e organizar um acesso completo ao dossier, a fim de apreciar se a recusa de divulgar um documento pode ser lesiva para a defesa do recorrente.

(cf. n.os 118, 119)

5.     Não há nenhuma disposição expressa de direito comunitário que imponha às instituições uma obrigação geral de informar os destinatários dos actos das possibilidades de recurso nem dos prazos em que estes podem ser exercidos. Quanto às obrigações que o Parlamento Europeu se impôs a si mesmo ao adoptar o guia das obrigações dos funcionários e dos agentes, o facto de não ter indicado num acto a possibilidade de interpor recurso jurisdicional pode, com certeza, constituir uma violação das obrigações impostas pelo referido guia. O incumprimento desta obrigação não constitui uma violação das formalidades essenciais que tenha por consequência afectar a legalidade do acto.

(cf. n.° 131)

6.     A fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve ser adaptada à natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do acto, para permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização. A este respeito, pode ser considerada suficientemente fundamentada uma decisão do secretário‑geral do Parlamento Europeu relativa à recuperação de montantes pagos a um deputado a título de subsídios parlamentares, quando remete explicitamente para um relatório de auditoria, enviado ao interessado, e para os documentos apresentados por este após a auditoria, bem como para o reembolso parcial da dívida através de mensalidades.

(cf. n.os 134‑136)

7.     O respeito do princípio da igualdade de tratamento deve ser conciliado com o respeito do princípio da legalidade, segundo o qual ninguém pode invocar, em seu proveito, uma ilegalidade cometida a favor de outrem.

(cf. n.° 141)

8.     Um acto só enferma de desvio de poder se se verificar, com base em indícios objectivos, pertinentes e concordantes, que foi adoptado com a finalidade exclusiva ou, pelo menos, determinante de atingir fins diversos dos invocados ou de eludir um processo especialmente previsto pelo Tratado para fazer face às circunstâncias do caso em apreço.

(cf. n.° 145)

9.     De acordo com o sistema instituído pela regulamentação referente às despesas e subsídios dos deputados ao Parlamento Europeu, o deputado que designa um terceiro pagador encarregado da gestão dos montantes pagos a título de subsídios de assistência parlamentar deve poder apresentar documentos que justifiquem a sua utilização conforme aos contratos celebrados com os seus assistentes. A inexistência de documentos justificativos das despesas efectuadas a título de salários dos assistentes ou de qualquer outra despesa reembolsável nos termos da regulamentação DSD só pode ter como consequência a obrigação de reembolsar os montantes correspondentes ao Parlamento. Com efeito, qualquer montante cuja utilização conforme à regulamentação DSD não seja demonstrada por meio de documentos deve ser considerado indevidamente pago. Cabe, por isso, ao interessado que tenha apresentado à administração documentos para justificar a utilização dos fundos recebidos invocar e provar, como fundamento do seu recurso perante o juiz comunitário, que esta última cometeu um erro ao recusar tê‑los em conta.

(cf. n.° 157)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção alargada)

22 de Dezembro de 2005 (*)

«Regulamentação referente às despesas e aos subsídios dos deputados ao Parlamento Europeu – Controlo da utilização de subsídios – Prova das despesas – Recuperação de uma dívida por via de compensação»

No processo T‑146/04,

Koldo Gorostiaga Atxalandabaso, antigo deputado ao Parlamento Europeu, residente em Saint‑Pierre‑d’Irube (França), representado por D. Rouget, advogado,

recorrente,

contra

Parlamento Europeu, representado por H. Krück, C. Karamarcos e D. Moore, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrido,

apoiado por

Reino de Espanha, representado pelo seu agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

interveniente,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão do secretário‑geral do Parlamento Europeu de 24 de Fevereiro de 2004, relativa à recuperação dos montantes pagos ao recorrente a título de despesas e subsídios parlamentares,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção alargada),

composto por: J. Pirrung, presidente, A. W. H. Meij, N. J. Forwood, I. Pelikánová e S. Papasavvas, juízes,

secretário: C. Kristensen, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 12 de Setembro de 2005,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1       O artigo 199.°, n.° 1, CE dispõe:

«O Parlamento Europeu estabelecerá o seu regulamento interno por maioria dos membros que o compõem.»

2       O artigo 5.° do Regimento do Parlamento Europeu, na redacção aplicável ao caso em apreço (JO 2003, L 61, p. 1, a seguir «regimento»), dispõe:

«Cabe à Mesa regulamentar o pagamento de ajudas de custo e subsídios aos deputados.»

3       O artigo 16.° do regimento dispõe:

«Após a eleição dos Vice‑Presidentes, o Parlamento procederá à eleição dos cinco Questores.

A eleição dos Questores obedecerá ao disposto para a eleição dos Vice‑Presidentes.»

4       Nos termos do artigo 21.° do regimento:

«1. A Mesa é composta pelo Presidente e pelos catorze Vice‑Presidentes do Parlamento.

2. Os Questores são membros da Mesa na qualidade de consultores.»

5       De acordo com o artigo 22.°, n.° 2, do regimento:

«Compete à Mesa decidir sobre as questões financeiras, de organização e administrativas que digam respeito aos deputados, à organização interna do Parlamento, ao seu secretariado e aos seus órgãos.»

6       Nos termos do artigo 25.° do regimento:

«Os Questores são responsáveis pelas questões administrativas e financeiras directamente relacionadas com os deputados, de acordo com as linhas de orientação adoptadas pela Mesa.»

7       De acordo com o artigo 182.°, n.° 1, do regimento:

«O Parlamento é apoiado por um secretário‑geral nomeado pela Mesa.

O secretário‑geral tomará perante a Mesa o solene compromisso de exercer as suas funções com total imparcialidade e em plena consciência.»

8       A regulamentação referente às despesas e aos subsídios dos deputados ao Parlamento Europeu (a seguir «regulamentação DSD») foi adoptada pela Mesa do Parlamento Europeu com base no artigo 22.° do regimento e ao abrigo do artigo 199.° CE, do artigo 112.° EA e do artigo 25.° CA.

9       De acordo com o artigo 13.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da regulamentação DSD, com a redacção em vigor à época dos factos do litígio, «[o]s deputados têm direito a um subsídio fixo mensal, pelo índice em vigor, fixado pela Mesa, para cobrir as despesas resultantes das suas actividades parlamentares não abrangidas por outros subsídios em virtude da presente regulamentação (seguidamente designado ‘subsídio para despesas gerais’)».

10     O artigo 14.°, n.° 1, da regulamentação DSD dispõe:

«Sem prejuízo da conformidade com o disposto no presente artigo, os deputados têm direito a um subsídio (seguidamente designado ‘subsídio de assistência parlamentar’) destinado a cobrir as despesas resultantes da contratação ou do recurso aos serviços de um ou mais assistentes [...]»

11     Em conformidade com o disposto no artigo 14.°, n.os 2 e 7, alínea b), da regulamentação DSD, o deputado pode incumbir um terceiro, designado «terceiro pagador», da gestão administrativa de parte ou da totalidade do seu subsídio de assistência parlamentar (igualmente designado «subsídio de secretariado»).

12     Nos termos do artigo 16.°, n.° 2, da regulamentação DSD:

«Se o secretário‑geral se certificar de que foram indevidamente pagos montantes a título do subsídio de assistência parlamentar, dará instruções para a recuperação desses montantes junto do deputado em causa.»

13     Nos termos do artigo 27.° da regulamentação DSD:

«2.      Um deputado que considere que esta regulamentação foi incorrectamente aplicada pode dirigir‑se por escrito ao secretário‑geral. Se não for obtido um acordo entre o deputado e o secretário‑geral, a questão será transmitida aos Questores, que decidirão após terem consultado o secretário‑geral. Os Questores podem igualmente consultar o Presidente e/ou a Mesa.

3.      Se o secretário‑geral, em consulta com os Questores, concluir que foram indevidamente pagas aos deputados do Parlamento Europeu verbas a título dos subsídios previstos na presente regulamentação, dará instruções para a sua recuperação junto do deputado em questão.

4.      Em casos excepcionais, e mediante proposta do secretário‑geral após consulta dos Questores, assiste à Mesa, nos termos do artigo 73.° do Regulamento Financeiro e das respectivas Normas de Execução, a faculdade de dar instruções ao secretário‑geral para que este suspenda temporariamente o pagamento dos subsídios parlamentares até o deputado ter efectuado o reembolso dos montantes indevidamente utilizados.

A Mesa adoptará a sua decisão velando por que o mandato do deputado seja efectivamente exercido e pelo bom funcionamento da Instituição, sendo que o deputado em causa será ouvido antes de a decisão ser aprovada.»

14     O n.° 4 acima transcrito foi aditado ao artigo 27.° da regulamentação DSD por decisão da Mesa de 12 de Fevereiro de 2003.

15     O artigo 5.° das disposições internas para a execução do orçamento do Parlamento Europeu, aprovadas pela Mesa em 4 de Dezembro de 2002, dispõe:

«3.      Por decisão de delegação tomada pela Instituição, representada pelo seu Presidente, o secretário‑geral é designado como gestor orçamental delegado principal.

4.      As delegações são conferidas pelo gestor orçamental delegado principal aos gestores orçamentais delegados. As subdelegações são conferidas pelos gestores orçamentais delegados aos gestores orçamentais subdelegados.»

16     O artigo 71.°, n.° 2, do Regulamento (CE, Euratom) n.° 1605/2002 do Conselho, de 25 de Junho de 2002, que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO L 248, p. 1, a seguir «Regulamento Financeiro»), dispõe:

«Os recursos próprios postos à disposição da Comissão, bem como qualquer crédito apurado como certo, líquido e exigível, devem ser objecto de uma ordem de cobrança emitida ao contabilista, seguida de uma nota de débito dirigida ao devedor, sendo ambos os documentos elaborados pelo gestor orçamental competente.»

17     Nos termos do artigo 72.°, n.° 2, do Regulamento Financeiro:

«A instituição pode formalizar o apuramento de um crédito a cargo de pessoas que não Estados numa decisão que constituirá um título executório na acepção do artigo 256.° do Tratado CE.»

18     O artigo 73.°, n.° 1, do Regulamento Financeiro dispõe:

«O contabilista registará as ordens de cobrança dos créditos devidamente emitidas pelo gestor orçamental competente. Deve diligenciar no sentido de assegurar a cobrança das receitas das Comunidades e velar pela conservação dos respectivos direitos.

O contabilista procederá à cobrança por compensação junto de qualquer devedor que seja simultaneamente titular de um crédito certo, líquido e exigível perante as Comunidades, até ao limite das dívidas desse devedor às Comunidades.»

19     De acordo com o artigo 78.°, n.° 3, do Regulamento (CE, Euratom) n.° 2342/2002 da Comissão, de 23 de Dezembro de 2002, que estabelece as normas de execução do Regulamento Financeiro (JO L 357, p. 1):

«A nota de débito é um documento pelo qual se informa o devedor de que:

a)      As Comunidades apuraram esse crédito;

b)      O pagamento da sua dívida para com as Comunidades é exigível numa determinada data (em seguida designada ‘data de vencimento’);

c)      Na ausência de pagamento na data de vencimento, a dívida vence juros à taxa referida no artigo 86.°, sem prejuízo das disposições regulamentares específicas aplicáveis;

d)      Sempre que possível, a Instituição procederá à cobrança por compensação, após informação do devedor;

e)      Na ausência de pagamento na data de vencimento, a Instituição procederá à cobrança por execução das garantias prévias;

f)      Caso, na sequência das fases descritas supra, não tenha sido possível efectuar a cobrança integral, a Instituição procederá à cobrança por execução forçada do título obtido, quer em conformidade com o n.° 2 do artigo 72.° do Regulamento Financeiro, quer por via contenciosa.

O gestor orçamental enviará esta nota de débito ao devedor e uma cópia da mesma ao contabilista.»

20     O artigo 80.° do Regulamento n.° 2342/2002 dispõe:

«1.      Qualquer apuramento de créditos deve basear‑se em documentos comprovativos que atestem os direitos das Comunidades.

2.      O gestor orçamental competente procederá pessoalmente ao exame dos documentos comprovativos ou assegurar‑se‑á, sob a sua responsabilidade, de que este exame foi efectuado, antes de tomar a decisão de apuramento de créditos.»

21     De acordo com o artigo 83.° do Regulamento n.° 2342/2002:

«Em qualquer fase do procedimento e após ter informado o gestor orçamental competente e o devedor, o contabilista procederá à cobrança por compensação do crédito apurado se o devedor for também titular, face às Comunidades, de um crédito apurado como certo, líquido e exigível e que tenha por objecto um montante apurado por uma ordem de pagamento.»

22     Nos termos do artigo 84.° do Regulamento n.° 2342/2002:

«1.      Sem prejuízo do disposto no artigo 83.° e se na data de vencimento prevista na nota de débito a cobrança integral não tiver tido lugar, o contabilista informará deste facto o gestor orçamental competente e iniciará de imediato o processo de recuperação, por qualquer via de direito, incluindo, se necessário, através de execução de qualquer garantia prévia.

2.      Sem prejuízo do artigo 83.°, sempre que o modo de cobrança referido no n.° 1 não for viável e o devedor não tenha procedido ao pagamento solicitado na carta de notificação formal enviada pelo contabilista, este recorrerá à execução forçada do título, em conformidade com o n.° 2 do artigo 72.° do Regulamento Financeiro ou com base num título obtido por via contenciosa.»

23     O artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43), prevê:

«O acesso a documentos, elaborados por uma instituição para uso interno ou por ela recebidos, relacionados com uma matéria sobre a qual a instituição não tenha decidido, será recusado, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.»

 Antecedentes do litígio

24     Koldo Gorostiaga Atxalandabaso era, desde 1999, deputado ao Parlamento Europeu pela lista do grupo político basco «Euskal Herritarok/Batasuna» (a seguir «EH/B»). Em virtude de um despacho do Juzgado de Instrucción n.° 5 de Madrid (Juízo de instrução n.° 5 de Madrid), de 26 de Agosto de 2002, e de um acórdão do Tribunal Supremo (Supremo Tribunal espanhol) de 27 de Março de 2003, o EH/B foi declarado ilegal em Espanha. Os recursos interpostos deste acórdão para o Tribunal Constitucional espanhol foram julgados improcedentes. A interdição do EH/B não teve consequências jurídicas para o mandato parlamentar do recorrente, que o continuou a exercer até ao fim da legislatura, no mês de Junho de 2004.

25     Os subsídios parlamentares do recorrente foram pagos, desde o início do seu mandato em 1999 e, no que se refere aos subsídios de despesas gerais e de secretariado, até 31 de Agosto de 2001, numa conta corrente aberta no Banque Bruxelles Lambert SA, em seu nome e no do EH/B. Este último agia na qualidade de terceiro pagador na acepção do artigo 14.°, n.° 2, da regulamentação DSD.

26     Em 21 de Março de 2002, o recorrente retirou a quantia de 210 354 euros da caderneta de poupança correspondente à conta corrente.

27     No dia seguinte ao levantamento, ou seja, em 22 de Março de 2002, o Sr. Gorrotxategi, tesoureiro do EH/B e contabilista do recorrente, foi detido para interrogatório à chegada a território francês quando vinha da Bélgica. O primeiro juiz de instrução do tribunal de grande instance de Paris ordenou então a apreensão da quantia de 200 304 euros na posse do Sr. Gorrotxategi.

28     A Mesa do Parlamento tomou conhecimento deste caso pela primeira vez na sua reunião de 8 de Abril de 2002. O ponto 8.2 da acta da referida reunião tem a seguinte redacção:

«A Mesa […]

–       toma nota das notícias divulgadas pelos meios de comunicação social, de acordo com as quais as autoridades financeiras haviam detido dois membros de um partido político nacional em posse de uma considerável verba em dinheiro, os quais declararam que estes fundos foram pagos a um MPE, no âmbito das suas actividades enquanto membro do Parlamento Europeu;

–       mandata, após ouvir uma declaração do Presidente, o secretário‑geral para tomar todas as medidas necessárias decorrentes da presente situação e, em especial, verificar se as despesas feitas pelo membro em causa estão em conformidade com as normas em vigor e a transmitir aos Questores qualquer eventual infracção a estas normas.»

29     Por carta de 12 de Abril de 2002, o secretário‑geral do Parlamento (a seguir «secretário‑geral») recordou ao recorrente os diferentes subsídios que lhe foram pagos desde o início do seu mandato e pediu‑lhe que fornecesse, antes do final do mês de Abril de 2002, dados precisos relativos à utilização dos créditos pagos a título de subsídio de secretariado desde 1999 até 31 de Janeiro de 2001, assim como precisões sobre a utilização de créditos pagos a título de subsídio para despesas gerais.

30     O recorrente respondeu por carta datada de 6 de Maio de 2002 apresentando dados contabilísticos relativos à utilização de subsídios de secretariado e de despesas gerais respeitantes aos anos de 1999, 2000 e 2001. De acordo com esses dados, o recorrente devia 103 269,79 euros ao EH/B, 51 070,19 euros a três assistentes e 15 359,46 euros a organismos de segurança social, ou seja, um montante total de 169 699,44 euros.

31     Após as explicações dadas pelo recorrente, o secretário‑geral pediu‑lhe, por carta de 7 de Junho de 2002, que encarregasse uma empresa especializada de realizar uma auditoria à utilização desses subsídios. Além disso, afirmava nesta carta que o recorrente não tinha utilizado, a título de subsídio de secretariado, o montante de 58 155,82 euros, pedindo‑lhe o reembolso imediato. No tocante a este montante, o recorrente comprometeu‑se a reembolsar ao Parlamento pagando mensalmente o montante de 3 000 euros.

32     O recorrente respondeu a esta carta em 20 de Junho de 2002, indicando que a quantia de cerca de 200 000 euros apreendida pelas autoridades francesas provinha exclusivamente do Parlamento, que a conta corrente da qual essa quantia tinha sido retirada recebia exclusivamente pagamentos provenientes do Parlamento e que a sua restituição constituía uma condição prévia indispensável para fazer face, se fosse caso disso, às suas obrigações para com o Parlamento. O recorrente pediu também ao secretário‑geral que emitisse um atestado de proveniência da referida quantia para o apresentar ao primeiro juiz de instrução do tribunal de grande instance de Paris. Além disso, manifestou a sua concordância com a auditoria proposta pelo secretário‑geral.

33     O secretário‑geral respondeu por carta de 8 de Julho de 2002, à qual se encontrava anexo um atestado onde se mencionavam todos os pagamentos efectuados pelo Parlamento na conta corrente. Deste atestado resulta que o Parlamento tinha depositado nessa conta, de 1 de Julho de 1999 a 31 de Dezembro de 2001, a quantia total de 495 891,31 euros a título de subsídios de despesas de viagem, de despesas gerais e de despesas de secretariado (a partir de 1 de Setembro de 2001, o subsídio de despesas de secretariado foi depositado noutras contas).

34     Por nota de 9 de Janeiro de 2003, o director‑geral das Finanças do Parlamento enviou ao recorrente o relatório de auditoria (datado de 19 de Dezembro de 2002) relativo aos pagamentos efectuados a título de subsídios de despesas gerais e de secretariado. Esta auditoria foi realizada por uma empresa privada, escolhida de comum acordo pelas partes.

35     Segundo o n.° 4 do relatório, a missão dos auditores tinha por objecto as quantias pagas entre 1 de Julho de 1999 e 31 de Dezembro de 2001 a título de subsídios de despesas gerais e de secretariado.

36     Segundo o relatório de auditoria, o Parlamento pagou ao recorrente de 1 de Julho de 1999 a 31 de Dezembro de 2001, a título de despesas gerais, a quantia de 104 021 euros, dos quais 103 927 euros foram devidamente justificados. No decurso do mesmo período, o Parlamento pagou ao recorrente, a título de despesas de secretariado, a quantia de 242 582 euros. Relativamente a esta quantia, 53 119 euros foram devidamente justificados, enquanto que da utilização dos restantes 189 463 euros o recorrente não apresentou nenhum documento comprovativo.

37     O recorrente fez comentários sobre esse relatório, que foram anexados ao mesmo.

38     Por carta de 30 de Janeiro de 2003, o secretário‑geral informou o recorrente que, atendendo ao relatório de auditoria, lhe era dada a oportunidade de apresentar antes da próxima reunião da Mesa, prevista para 10 de Fevereiro, os documentos comprovativos da utilização da quantia de 189 463 euros.

39     Por carta de 6 de Fevereiro de 2003, o recorrente apresentou documentos comprovativos e deu explicações suplementares.

40     Em 12 de Fevereiro de 2003, a Mesa tomou a decisão de encarregar o secretário‑geral de fixar o montante exacto da dívida do recorrente e de lhe exigir que procedesse ao seu reembolso.

41     Em 26 de Fevereiro de 2003, o secretário‑geral enviou uma carta ao recorrente indicando que, com base nos elementos fornecidos por este na carta de 6 de Fevereiro de 2003, só um montante de 12 947 euros podia ser considerado devidamente justificado. Quanto às outras despesas, o secretário‑geral recusou tê‑las em conta por não terem sido justificadas com documentos adequados, de não dizerem respeito ao subsídio de secretariado, ou de se referirem a montantes que não tinham ainda sido pagos aos beneficiários. Por consequência, o montante inicial foi reduzido a 176 516 euros. O secretário‑geral convidou o recorrente a contactar os serviços do Parlamento para chegar a acordo quanto às formas de reembolso.

42     Em 10 de Março de 2003, foi indeferido por despacho o pedido apresentado pelo recorrente ao primeiro juiz de instrução do tribunal de grande instance de Paris destinado a obter a restituição dos 200 304 euros apreendidos. De acordo com as informações prestadas pelo advogado do recorrente, este processo encontra‑se actualmente pendente no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

43     Após o advogado do recorrente ter solicitado determinados documentos e explicações, que lhe foram fornecidos, em parte, pelo secretário‑geral numa carta de 16 de Abril de 2003, o recorrente interpôs, em 21 de Abril de 2003, um recurso administrativo da carta do secretário‑geral de 26 de Fevereiro de 2003, nos termos do artigo 27.°, n.° 2, da regulamentação DSD.

44     O secretário‑geral respondeu por carta de 17 de Julho de 2003 ao recurso administrativo interposto pelo recorrente. Considerava que este recurso era, na realidade, dirigido contra a decisão da Mesa de 12 de Fevereiro de 2003. Observava que a referida decisão se limitava a dar‑lhe instruções, assim como ao Serviço Jurídico do Parlamento, que podiam dar lugar a decisões que afectassem o recorrente. O secretário‑geral referia também que o procedimento se encontrava apenas em fase de investigação, tendo em vista uma eventual consulta dos Questores nos termos do artigo 27.°, n.° 2, da regulamentação DSD e que, por consequência, não tendo sido adoptada pela Mesa nenhuma decisão que afectasse directamente o recorrente, não lhe competia conhecer do mérito do recurso.

45     Seguidamente, o recorrente apresentou outros documentos, nomeadamente, uma convocação para comparecer no Departamento da Justiça, do Emprego e da Segurança Social da Administração da Comunidade Autónoma de Euskadi, no sentido de obter uma conciliação relativamente a um pedido apresentado por três dos seus assistentes respeitante a salários em atraso no montante de 50 865,43 euros. Apresentou igualmente um cálculo de despesas, no montante total de 63 308,64 euros, efectuadas no decurso do período objecto da auditoria a título de despesas domésticas relativas ao domicílio do recorrente e dos seus assistentes em Bruxelas. Estas despesas foram assumidas pelo EH/B que, nos termos de um acordo celebrado com este, retinha a quantia fixa de 600 euros do salário de cada assistente. Este montante continua até hoje por pagar e, por consequência, devido ao EH/B.

46     O secretário‑geral recusou‑se a ter em conta estes elementos. Por carta de 18 de Dezembro de 2003, por um lado, afirmou que o recorrente não tinha apresentado documentos comprovativos do pagamento dos salários em atraso objecto da conciliação. Por outro lado, em relação às facturas relativas às despesas domésticas, declarou não terem sido apresentados documentos que demonstrassem a existência de obrigações contratuais que justificassem o pagamento do montante de 63 308,64 euros e indicou, além disso, que essas facturas tinham sido emitidas, na sua maioria, não em nome do EH/B, mas em nome de uma outra pessoa.

47     Por carta de 28 de Janeiro de 2004, o secretário‑geral recordou ao recorrente que a sua dívida para com o Parlamento ascendia, de acordo com a auditoria e os documentos justificativos produzidos e aceites posteriormente, a 176 516 euros (v. n.os 38 e 41 supra). Indicava que, uma vez que o recorrente tinha já iniciado o reembolso de uma parte da dívida, que ascendia a 58 155,82 euros, através de mensalidades de 3 000 euros (v. n.° 31 supra), lhe faltava restituir um saldo de 118 360,18 euros.

48     O secretário‑geral indicava que, nos termos do artigo 16.°, n.° 2, e do artigo 27.°, n.° 3, da regulamentação DSD, lhe competia dar instruções para a recuperação da quantia de 118 360,18 euros indevidamente paga ou, se necessário, propor à Mesa a suspensão temporária de certos subsídios do recorrente, em conformidade com o artigo 27.°, n.° 4, da referida regulamentação.

49     Em 9 de Fevereiro de 2004, o secretário‑geral ouviu o recorrente. Segundo a acta da respectiva audiência, o secretário‑geral pretendia submeter à Mesa uma proposta para a sua reunião de 25 de Fevereiro de 2004.

50     Por carta datada de 24 de Fevereiro de 2004, o secretário‑geral dirigiu‑se ao recorrente nos seguintes termos:

«Na sequência da minha carta do passado dia 28 de Janeiro e depois de ter ouvido V. Exa. a esse respeito no dia 9 do corrente, junto envio a decisão que acabo de adoptar, em virtude das disposições pertinentes do Regulamento Financeiro da União, bem como da Regulamentação referente às despesas e aos subsídios dos deputados ao Parlamento Europeu, quanto à recuperação, pelo Parlamento, do montante devido de 118 360,18 euros. A Mesa será devidamente informada desta matéria na sua próxima reunião. […]»

51     A decisão do secretário‑geral, de 24 de Fevereiro de 2004, junto à carta acima referida (a seguir «decisão impugnada»), baseia‑se nos artigos 16.° e 27.° da regulamentação DSD e nos artigos 71.° e 73.° do Regulamento Financeiro. A decisão impugnada remete igualmente para uma consulta ao Colégio de Questores que teve lugar em 14 de Janeiro de 2004. A quantia devida ao Parlamento é, de acordo com o primeiro considerando da decisão impugnada, de 176 576 euros e, uma vez que o recorrente já tinha iniciado o reembolso de 58 155,82 euros através de mensalidades de 3 000 euros (v. n.° 47 supra), o montante a restituir é de 118 360,18 euros. Na decisão impugnada, é referida uma ordem de cobrança n.° 92/332, de 18 de Março de 2003, emitida pelo gestor orçamental subdelegado do Parlamento para o montante de 118 360,18 euros.

52     O segundo considerando da decisão impugnada indica que cumpre proceder, em conformidade com os artigos 16.°, n.° 2, e 27.°, n.° 3, da regulamentação DSD, à recuperação do montante de 118 360,18 euros por via de compensação através da retenção dos subsídios parlamentares menos essenciais à execução do mandato eleitoral do recorrente.

53     Nos termos do dispositivo da decisão impugnada:

«1.      Que sejam retidos dos subsídios a pagar ao Sr. Koldo Gorostiaga Atxalandabaso, deputado ao Parlamento Europeu, até à liquidação total da sua dívida perante o Parlamento Europeu de um montante que ascende actualmente a 118 360,18 euros:

–       50% do subsídio de despesas gerais,

–       50% do subsídio de despesas de estadia.

2.      Na hipótese de cessação do mandato do Sr. Koldo Gorostiaga Atxalandabaso, deputado ao Parlamento Europeu, serão retidos, até à liquidação integral da sua dívida perante o Parlamento Europeu:

–       o subsídio transitório de fim de mandato, e

–       todos os outros pagamentos devidos ao deputado.»

54     Por carta de 1 de Março de 2004, o recorrente apresentou as suas observações relativamente à decisão impugnada, solicitando documentos e explicações suplementares, assim como o acesso à totalidade do processo que deu origem às decisões que o afectam.

55     Por carta de 31 de Março de 2004, o secretário‑geral respondeu dando determinados esclarecimentos e indicando que lhe seria concedido acesso à totalidade do processo dentro dos limites impostos pelas disposições pertinentes do Regulamento n.° 1049/2001 e do Regulamento (CE) n.° 45/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2000, relativo à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições e pelos órgãos comunitários e à livre circulação desses dados (JO 2001, L 8, p. 1).

 Tramitação processual e pedidos das partes

56     Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 20 de Abril de 2004, o recorrente interpôs o presente recurso. O Parlamento apresentou a sua contestação na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 29 de Junho de 2004.

57     Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 13 de Julho de 2004, o Reino de Espanha pediu que fosse admitida a sua intervenção no presente processo em apoio do Parlamento. Por despacho de 14 de Outubro de 2004, o presidente da Segunda Secção do Tribunal de Primeira Instância admitiu esta intervenção. O interveniente apresentou os seus articulados no prazo fixado.

58     Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal decidiu dar início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo, as partes foram convidadas a responder por escrito a uma série de questões.

59     Ouvidas as partes, o Tribunal remeteu o processo à Segunda Secção alargada.

60     Por cartas do recorrente, apresentada em 27 de Maio de 2005, e do Parlamento, apresentada em 1 de Junho de 2005, as partes deram cumprimento às medidas de organização do processo adoptadas pelo Tribunal de Primeira Instância, apresentando também determinados documentos.

61     Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal de Primeira Instância na audiência de 12 de Setembro de 2005.

62     O recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       anular a decisão impugnada;

–       condenar o Parlamento nas despesas.

63     O Parlamento conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       negar provimento ao recurso;

–       condenar o recorrente nas despesas.

64     O Reino de Espanha conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       negar provimento ao recurso;

–       condenar o recorrente nas despesas.

 Questão de direito

65     Em apoio dos seus pedidos, o recorrente invoca oito fundamentos de anulação relativos, em primeiro lugar, à violação da regulamentação DSD; em segundo lugar, à violação do «princípio da objectividade e da imparcialidade»; em terceiro lugar, à violação do princípio do contraditório e do respeito dos direitos de defesa; em quarto lugar, à violação das regras de notificação das decisões; em quinto lugar, à violação do dever de fundamentação; em sexto lugar, à violação do princípio da igualdade e da não discriminação; em sétimo lugar, ao desvio de poder; e, em oitavo lugar, aos erros na apreciação dos documentos comprovativos apresentados ao secretário‑geral.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação da regulamentação DSD

 Argumentos das partes

66     O primeiro fundamento é composto por cinco partes. As duas primeiras partes são relativas, respectivamente, à não observância do artigo 27.°, n.os 2 e 4, da regulamentação DSD e as três partes seguintes à violação dos direitos de defesa, do princípio da igualdade e, por último, do artigo 27.°, n.° 3, da regulamentação DSD.

67     Quanto à violação do artigo 27.°, n.° 2, da regulamentação DSD, o recorrente observa que, após a sua carta de 21 de Abril de 2003 (v. n.° 43 supra), na qual tinha observado que a regulamentação DSD tinha sido incorrectamente aplicada a seu respeito, e atendendo ao facto de que o secretário‑geral e ele próprio não chegaram a nenhum acordo, esta questão devia ter sido transmitida aos Questores em conformidade com esse artigo para que estes tomassem uma decisão após terem consultado o secretário‑geral e, eventualmente, o presidente ou a Mesa. No entanto, a decisão impugnada foi tomada pelo secretário‑geral, que não tem competência nesta matéria.

68     Quanto à violação do artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD, o recorrente recorda que, de acordo com o disposto nesta disposição, só a Mesa tem competência para tomar uma decisão sobre a recuperação de quantias indevidamente recebidas a título de subsídios parlamentares por compensação com os subsídios devidos ao deputado em causa.

69     Relativamente à violação do princípio da igualdade, o recorrente alega que o Parlamento agiu de forma discriminatória no que se refere à publicação dos nomes dos deputados que têm um litígio com a instituição. Ao passo que o Parlamento não comunica habitualmente dados pessoais a este respeito, esta prática não foi seguida no que a ele se refere. Salienta, a este respeito, que o Gabinete do Parlamento em Espanha divulgou em Março de 2003 uma revista de imprensa que reunia os artigos dos jornais diários espanhóis relativos ao presente processo, que lhe eram desfavoráveis. Este comportamento constitui, ao mesmo tempo, uma violação das disposições sobre a protecção de dados de carácter pessoal e do artigo 8.° da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (a seguir «CEDH»).

70     Quanto à violação do artigo 27.°, n.° 3, da regulamentação DSD, o recorrente considera que, contrariamente ao que impõe esta disposição, o secretário‑geral, sem ter previamente consultado os Questores, tinha chegado à conclusão, desde a sua decisão de 26 de Fevereiro de 2003 (v. n.° 41 supra), de que a quantia de 176 516 euros tinha sido indevidamente paga.

71     O Parlamento afirma, no que respeita às duas primeiras partes do fundamento, que resulta da leitura conjugada do artigo 16.°, n.° 2, e do artigo 27.°, n.os 2 a 4, da regulamentação DSD que esta prevê três procedimentos distintos em caso de contestação ou de incumprimento quanto ao pagamento ou à utilização de diferentes subsídios.

72     O primeiro procedimento, descrito no artigo 27.°, n.° 2, diz respeito ao apuramento dos direitos financeiros do deputado e ao pagamento das despesas e subsídios e é seguido no caso de divergência entre o interessado e a instituição. Neste caso, segundo o Parlamento, o deputado dirige‑se em primeiro lugar ao secretário‑geral, que pode dar deferimento à sua «reclamação». Se as partes não chegarem a acordo, a questão é transmitida aos Questores para decisão, após consulta facultativa ao secretário‑geral e ao presidente ou à Mesa.

73     O segundo procedimento, descrito no artigo 16.°, n.° 2, e no artigo 27.°, n.° 3, tem por objecto o controlo a posteriori da utilização de quantias pagas ao deputado a título de despesas e subsídios, bem como à recuperação de quantias indevidamente pagas. Segundo o Parlamento, se o secretário‑geral concluir que foram indevidamente pagas quantias a título de subsídios parlamentares (porque não foram utilizadas em conformidade com o disposto na regulamentação DSD), dá instruções para a sua recuperação. O artigo 27.°, n.° 2, não é aplicável a este procedimento porque tornaria impossível a aplicação do artigo 27.°, n.os 3 e 4, visto que excluiria qualquer decisão definitiva do secretário‑geral.

74     O terceiro procedimento, previsto no artigo 27.°, n.° 4, diz respeito a casos excepcionais em que a Mesa pode decidir suspender temporariamente o pagamento dos subsídios parlamentares.

75     O Parlamento invoca igualmente os artigos 71.° e 73.° do Regulamento Financeiro, sublinhando que uma decisão de recuperação deve respeitar as disposições deste regulamento. O Parlamento remete igualmente para o artigo 5.° das disposições internas para a execução do seu orçamento (v. n.° 15 supra). Nos termos deste artigo, o secretário‑geral é designado como gestor orçamental delegado principal. Em contrapartida, não se prevê neste âmbito nenhum papel a desempenhar pela Mesa ou pelos Questores. O Parlamento indica que a recuperação da dívida do recorrente foi efectuada por via de compensação em conformidade com o artigo 73.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento Financeiro (v. n.° 18 supra).

76     O Parlamento sublinha que o presente litígio diz respeito exclusivamente ao procedimento previsto no artigo 27.°, n.° 3, da regulamentação DSD e não ao previsto no n.° 2 do referido artigo. O Parlamento esclarece nas suas respostas às questões escritas do Tribunal que, com efeito, considerou preferível aplicar cumulativamente os artigos 16.°, n.° 2, e 27.°, n.° 3, da regulamentação DSD.

77     No que se refere à carta do recorrente de 21 de Abril de 2003 (v. n.° 67 supra), o Parlamento observa que esta não podia ter desencadeado o procedimento previsto no artigo 27.°, n.° 2, da regulamentação DSD, já que o secretário‑geral não tinha ainda, nesse momento, tomado uma decisão definitiva.

78     Além disso, o Parlamento alega que o procedimento previsto no artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD também não foi aplicado. Ao seguir o procedimento previsto no artigo 27.°, n.° 3, da regulamentação DSD, o Parlamento não pôs em causa as despesas e os subsídios a pagar ao recorrente, tendo antes utilizado uma parte destes, por via de compensação, para reduzir a quantia de que era devedor o recorrente. Na hipótese de o Parlamento ter suspendido o pagamento dos subsídios com base no artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD, não haveria quantias que pudessem, a seguir, compensar a dívida do recorrente para com o Parlamento.

79     Daqui decorre que o artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD não descreve um procedimento de compensação, antes dando ao Parlamento a possibilidade de exercer pressão sobre os seus membros através da suspensão temporária do pagamento de subsídios, até que o deputado em causa restitua, por sua própria iniciativa, os montantes indevidamente recebidos a título de subsídios parlamentares. Segundo o Parlamento, trata‑se de uma disposição com uma redacção infeliz, que, por este facto, é inoperante na sua formulação actual.

80     Por último, o Parlamento sublinha que a argumentação do recorrente relativa à violação das disposições sobre a protecção de dados de carácter pessoal é, na falta de elementos de facto e jurídicos que a sustentem, inoperante. Quanto à violação do artigo 8.° da CEDH, o Parlamento defende a inadmissibilidade deste fundamento pelo facto de constar pela primeira vez da réplica.

81     O Reino de Espanha adopta a argumentação do Parlamento no que respeita à análise dos três procedimentos descritos nos artigos 16.° e 27.° da regulamentação DSD e à aplicação do segundo procedimento no presente caso. De onde se conclui, segundo o Reino de Espanha, que os artigos 16.°, n.° 2, e 27.°, n.° 3, constituem a base jurídica adequada da decisão impugnada.

82     O Reino de Espanha expôs na audiência, a título subsidiário, algumas reflexões quanto às eventuais consequências no caso de o Tribunal considerar que o artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD devia ter sido utilizado pelo Parlamento como base jurídica adequada. Em tal situação, a eventual anulação da decisão impugnada recolocaria o processo na fase anterior à adopção da decisão impugnada e daria lugar a uma regularização do procedimento. Neste âmbito, o Reino de Espanha invoca o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Outubro de 1998, Industrie des poudres sphériques/Conselho (T‑2/95, Colect., p. II‑3939). Segundo a análise do Reino de Espanha, o Tribunal de Primeira Instância poder‑se‑ia inspirar no n.° 91 deste acórdão e declarar que, se a decisão impugnada tiver de ser anulada por esse motivo, não haverá que pôr em causa todo o procedimento administrativo que conduziu à sua adopção.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

–       Quanto às duas primeiras partes do primeiro fundamento

83     No que respeita à primeira parte, relativa à violação do artigo 27.°, n.° 2, da regulamentação DSD, há que observar que esta disposição prevê um procedimento que atribui aos Questores competência para decidir qualquer controvérsia relativa à aplicação da regulamentação DSD entre um deputado e o secretário‑geral. Trata‑se de uma disposição de âmbito geral que se refere, sem prejuízo de regras especiais, à totalidade das matérias regidas por esta regulamentação (apólices de seguros, cursos de línguas, pensões, despesas médicas, etc.). Por conseguinte, importa referir que constitui uma disposição geral relativamente aos artigos 16.°, n.° 2, e 27.°, n.os 3 e 4, que dizem respeito, mais particularmente, às controvérsias em matéria de recuperação de subsídios parlamentares indevidamente pagos. Por consequência, existindo disposições especiais, o artigo 27.°, n.° 2, não é aplicável em matéria de recuperação de subsídios parlamentares indevidamente pagos (v., por analogia, acórdãos do Tribunal de Justiça de 12 de Dezembro de 1995, Chiquita Italia, C‑469/93, Colect., p. I‑4533, n.° 61, e de 19 de Junho de 2003, Mayer Parry Recycling, C‑444/00, Colect., p. I‑6163, n.os 49 a 57). Por conseguinte, a primeira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

84     Quanto à segunda parte, relativa à violação do artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD, há que esclarecer a título liminar que a decisão impugnada contém no essencial duas partes, ou seja, por um lado, a declaração do secretário‑geral de que as quantias nela mencionadas foram indevidamente pagas ao recorrente e que é necessário recuperá‑las e, por outro, a decisão de proceder à sua cobrança por via de compensação com subsídios a pagar ao recorrente.

85     Esta parte do fundamento refere‑se unicamente à legalidade da segunda parte da decisão impugnada. A este respeito, importa verificar, em primeiro lugar, se este número descreve efectivamente um procedimento de compensação e, em caso afirmativo, se tal procedimento prevalece, como lex specialis, sobre os artigos 16.°, n.° 2, e 27.°, n.° 3, da referida regulamentação.

86     Quanto ao primeiro ponto, o Tribunal de Primeira Instância observa que o artigo 27.°, n.° 4, descreve efectivamente um procedimento de compensação. Esta observação baseia‑se nos elementos seguintes. Desde logo, o artigo 27.°, n.° 4, remete para o artigo 73.° do Regulamento Financeiro e para as normas de execução deste artigo. O artigo 73.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento Financeiro prevê a obrigação do contabilista de cada instituição proceder à cobrança por via de compensação junto de qualquer devedor que seja simultaneamente titular de um crédito certo, líquido e exigível perante as Comunidades, até ao limite das dívidas desse devedor às Comunidades.

87     Além disso, resulta do artigo 78.°, n.° 3, alíneas d) a f), e dos artigos 83.° e 84.° do Regulamento n.° 2342/2002, relativos às normas de execução dos artigos 71.° e 73.° do Regulamento Financeiro, que cada instituição deve recorrer prioritariamente à recuperação dos créditos comunitários por via de compensação e que, na falta de recuperação (parcial ou total), deve iniciar o processo de recuperação por qualquer outra via jurídica (execução de garantia prévia, execução forçada de um título nos termos do artigo 72.°, n.° 2, do Regulamento Financeiro ou execução de um título obtido por via contenciosa).

88     Por outro lado, importa referir que a interpretação que o Parlamento propõe, segundo a qual o artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD dá à instituição a possibilidade de suspender, na totalidade ou em parte, o pagamento dos subsídios devidos a um deputado até que este reembolse mais tarde e por sua própria iniciativa os montantes indevidamente recebidos, sem utilizar, para este fim, os montantes dos subsídios que lhe são devidos, mas cujo pagamento foi suspenso, é contrário ao princípio da proporcionalidade.

89     A este respeito, o Tribunal recorda que o princípio da proporcionalidade, que faz parte dos princípios gerais do direito comunitário, exige que os actos das instituições comunitárias não ultrapassem os limites do que é adequado e necessário à realização dos objectivos legitimamente prosseguidos pela regulamentação em causa, entendendo‑se que, quando exista uma escolha entre várias medidas adequadas, se deve recorrer à menos rígida, e que os inconvenientes causados não devem ser desproporcionados relativamente aos objectivos pretendidos (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Julho de 2005, Rica Foods/Comissão, C‑41/03 P, Colect., p. I‑6875, n.° 85 e a jurisprudência referida).

90     Além do mais, o princípio da proporcionalidade constitui um critério de interpretação das disposições do direito comunitário (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de Julho de 2002, MRAX, C‑459/99, Colect., p. I‑6591, n.os 61 e 62; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 25 de Março de 1999, Forges de Clabecq/Comissão, T‑37/97, Colect., p. II‑859, n.° 128, e de 19 de Julho de 1999, Hautala/Conselho, T‑14/98, Colect., p. II‑2489, n.° 87), de forma que, entre várias interpretações possíveis de uma disposição, se deve adoptar a que é conforme ao referido princípio.

91     No caso em apreço, a interpretação proposta pelo Parlamento implica que seja tomada uma medida coerciva contra um parlamentar (a suspensão de determinados subsídios a fim de que este efectue o reembolso por sua própria iniciativa dos montantes indevidamente recebidos), enquanto a compensação efectuada em conformidade com o artigo 73.° do Regulamento Financeiro e com as suas normas de execução é suficiente para satisfazer os interesses da instituição para efeitos de repetição do indevido. Tal interpretação seria ainda contrária aos artigos referidos no n.° 87 supra, que prevêem que cada instituição deve recorrer prioritariamente à recuperação dos créditos comunitários por via de compensação relativamente aos outros modos de recuperação. Por conseguinte, a interpretação proposta pelo Parlamento conduziria à adopção de uma medida que poderia causar prejuízos desproporcionados ao deputado em causa.

92     Por outro lado, as expressões «temporariamente» e «até o deputado ter efectuado o reembolso dos montantes indevidamente utilizados» do artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD não confirmam a interpretação do Parlamento. Com efeito, o significado do termo «temporariamente» é esclarecido no próprio artigo, ou seja, até o deputado ter efectuado o reembolso dos montantes indevidamente utilizados. Ora, a expressão «ter efectuado o reembolso» não implica necessariamente um pagamento, mas pode também designar o reembolso por via de compensação, que constitui um modo de extinção simultânea de obrigações recíprocas (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Julho de 2003, Comissão/CCRE, C‑87/01 P, Colect., p. I‑7617, n.° 59).

93     Acresce que o Parlamento afirmou na audiência, em resposta a uma questão oral, que a Mesa, ao adoptar o artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD, tinha a intenção de criar uma regra especial relativamente à regra contida no n.° 3 do mesmo artigo, dotada de certas garantias processuais a favor do deputado cuja dívida é recuperada por via de compensação.

94     O Tribunal observa ainda que a acta de 14 de Janeiro de 2004, que relata o conteúdo da reunião dos Questores com o secretário‑geral (entregue pelo Parlamento a pedido do Tribunal), indica que estavam preenchidas as condições para a aplicação do artigo 27.°, n.os 3 e 4, que a Mesa tomaria a decisão definitiva e que o secretário‑geral tinha sido convidado a ouvir o recorrente antes de submeter o processo à Mesa, o que remete para o disposto no artigo 27.°, n.° 4.

95     Quanto à relação de especialidade entre o artigo 16.°, n.° 2, o artigo 27.°, n.° 3, e o artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD, o Tribunal observa que este último artigo indica o procedimento a seguir no caso de estar prevista a aplicação de um modo de recuperação (a compensação) que incida sobre os subsídios a pagar a um deputado a fim de lhe permitir exercer as suas funções representativas com toda a eficácia, velando para que este possa exercer o seu mandato de forma efectiva. Por esta razão, prevê uma série de garantias processuais e substantivas (a consulta prévia dos Questores, a atribuição da competência para tomar a decisão a um órgão colectivo, no presente caso a Mesa, a protecção do exercício efectivo do mandato do deputado e do bom funcionamento da instituição e, por último, a audiência prévia do deputado em causa). Uma vez que esta disposição diz respeito a um determinado modo de recuperação de um ou mais subsídios indevidamente pagos, deve ser considerada lex specialis em relação ao artigo 16.°, n.° 2, e ao artigo 27.°, n.° 3, da regulamentação DSD, o que justifica, aliás, a sua inserção depois deste último número.

96     É neste contexto que se deve compreender a expressão «[e]m casos excepcionais» que consta do início do artigo 27.°, n.° 4, da regulamentação DSD, que confirma que a compensação só pode ser efectuada após terem sido observadas as garantias mencionadas no número anterior.

97     Por conseguinte, o Tribunal considera que, ao modificar a sua regulamentação DSD em Fevereiro de 2003 acrescentando um novo n.° 4, o Parlamento quis prever que, nos casos em que seja necessário cobrar um crédito junto de um deputado por via de compensação com subsídios parlamentares devidos a este último, esta cobrança só pode ser efectuada de acordo com o procedimento previsto no n.° 4 do referido artigo. Por conseguinte, visto que o secretário‑geral não tem competência para ordenar a compensação em questão sem ter sido disso encarregue para o efeito pela Mesa, em conformidade com o procedimento previsto nesta disposição, a decisão impugnada deve ser anulada na medida em que ordena essa compensação.

98     No que se refere às observações do Reino de Espanha quanto à possibilidade de sanar este vício, o Tribunal sublinha que, de acordo com o artigo 233.° CE, não lhe compete pronunciar‑se sobre o seguimento que uma instituição deve dar ao acórdão de anulação, parcial ou total, de um acto. Em contrapartida, incumbe à instituição em causa tomar as medidas necessárias à execução do acórdão de anulação (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Janeiro de 1998, Ladbroke Racing/Comissão, T‑67/94, Colect., p. II‑1, n.° 200).

99     A decisão impugnada deve, portanto, ser anulada na medida em que versa sobre a recuperação do montante em causa por via de compensação.

100   Por conseguinte, o Tribunal considera que é necessário examinar o mérito dos outros fundamentos invocados no recurso, na medida em que dizem respeito à existência e ao alcance da obrigação do recorrente de restituir ao Parlamento a quantia indicada na decisão impugnada.

–       Quanto às terceira, quarta e quinta partes do primeiro fundamento

101   A terceira parte, relativa à violação dos direitos de defesa, será examinada no âmbito do terceiro fundamento.

102   Quanto à violação do princípio da igualdade no que se refere à publicação dos nomes dos deputados que têm um litígio com o Parlamento e à violação das disposições sobre a protecção de dados de carácter pessoal (v. n.° 69 supra), basta referir que o recorrente não indica os actos concretos do Parlamento que constituem a referida violação, nem os dados que foram transmitidos, nem a relação existente entre essa transmissão e a decisão impugnada. A divulgação de uma revista de imprensa que reunia artigos relativos ao presente processo não constitui um acto relacionado com a decisão impugnada. É, aliás, ponto assente que os artigos em causa foram redigidos por pessoas que não tinham nenhuma ligação ao Parlamento. Portanto, não colhe a terceira parte do primeiro fundamento.

103    Por último, a parte do presente fundamento relativa à violação do artigo 27.°, n.° 3, da regulamentação DSD, segundo a qual o secretário‑geral, sem ter previamente consultado os Questores, tinha chegado à conclusão, desde a sua decisão de 26 de Fevereiro de 2003, que a quantia de 176 516 euros tinha sido indevidamente paga (v. n.° 70 supra), deve ser julgada inadmissível em virtude do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), e do artigo 48.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância. Com efeito, o recorrente só invoca este fundamento nos n.os 30 a 32 da réplica, não tendo os elementos de facto alegados em seu apoio (a decisão da Mesa de 12 de Fevereiro de 2003 e a carta do secretário‑geral de 26 de Fevereiro de 2003) surgido durante o processo.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do «princípio de objectividade e de imparcialidade»

 Argumentos das partes

104   O recorrente sustenta, em primeiro lugar, que não existe um quadro regulamentar que assegure a independência e a imparcialidade da Mesa face às influências e às pressões dos grupos políticos do Parlamento.

105   O recorrente alega também, em segundo lugar, que o litígio se enquadra no âmbito de uma campanha destinada à criminalização da actividade política dos independentistas bascos, nomeadamente do EH/B, iniciada em 2002 na sequência de uma conferência de imprensa dada pelos porta‑vozes dos grupos parlamentares e dos partidos políticos espanhóis, que exerciam pressão para que a instituição abrisse um inquérito.

106   O recorrente produz vários artigos de imprensa que revelam o contexto político do processo. Sublinha que membros do Parlamento, que não eram membros da Mesa, tiveram acesso a informações privilegiadas e fizeram comentários desfavoráveis a seu respeito, quando o próprio ignorava o conteúdo da deliberação da Mesa de 12 de Fevereiro de 2003. O recorrente faz igualmente referência às declarações e ataques verbais dos três vice‑presidentes do Parlamento de que foi objecto.

107   Face às pressões dos três vice‑presidentes espanhóis do Parlamento, todos os membros da Mesa hesitaram, segundo o recorrente, em tomar uma posição que pudesse ser considerada favorável ou mesmo neutra a seu respeito.

108   O Parlamento sublinha, por um lado, que a Mesa não tomou nenhuma decisão que afectasse o recorrente e, por outro, que este não indica de que modo as suas críticas se relacionam com a decisão impugnada.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

109   Há que observar que as críticas do recorrente são dirigidas contra os actos da Mesa e não contra a decisão impugnada, que foi aprovada pelo secretário‑geral. Daqui decorre que estas críticas não são susceptíveis de afectar a legalidade da decisão impugnada (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Setembro de 2003, Atlantic Container Line e o./Comissão, T‑191/98, T‑212/98 a T‑214/98, Colect., p. II‑3275, n.° 471).

110   Com efeito, ainda que a Mesa tenha tomado decisões no decurso do procedimento administrativo, nenhuma delas constitui o fundamento jurídico da decisão impugnada. Daqui decorre que o recorrente não pode invocar alegadas irregularidades que afectam estas decisões da Mesa como fundamento de anulação da decisão impugnada.

111   Em todo o caso, a crítica relativa à falta de um mecanismo regulamentar que garanta a independência e a imparcialidade da Mesa não é fundada, uma vez que resulta da jurisprudência que, entre as garantias conferidas pela ordem jurídica comunitária nos procedimentos administrativos, figura nomeadamente o princípio da boa administração, ao qual se prende a obrigação, para a instituição competente, de examinar, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos relevantes do caso em apreço (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Novembro de 1991, Technische Universität München, C‑269/90, Colect., p. I‑5469, n.° 14; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Janeiro de 1992, La Cinq/Comissão, T‑44/90, Colect., p. II‑1, n.° 86, e de 11 de Setembro de 2002, Alpharma/Conselho, T‑70/99, Colect., p. II‑3495, n.° 182). Competia, portanto, ao recorrente fornecer elementos probatórios que demonstrassem a violação deste princípio, o que não fez.

112   Quanto às alegações do recorrente mencionadas nos n.os 105 e 106 supra, o Tribunal salienta que são destituídas de relevância, visto que se referem a actos de terceiros (as autoridades espanholas, representantes de partidos políticos espanhóis, os porta‑vozes dos grupos parlamentares, deputados ao Parlamento Europeu e os meios de comunicação social) que não têm nenhuma ligação com a decisão impugnada. As críticas formuladas contra os vice‑presidentes da Mesa são igualmente destituídas de relevância, já que as decisões da Mesa não constituem o fundamento da decisão impugnada, especialmente na medida em que esta se refere à existência e ao montante do crédito do Parlamento perante o recorrente. Por consequência, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do princípio do contraditório e do respeito dos direitos de defesa

 Argumentos das partes

113   Segundo o recorrente, o relatório aos Questores, elaborado pelo secretário‑geral em virtude do mandato que lhe foi conferido pela Mesa em 8 de Abril de 2002, não lhe foi comunicado. Aliás, o secretário‑geral recusou‑lhe acesso ao processo que conduziu à decisão da Mesa de 12 de Fevereiro de 2003. Além do mais, o resultado da consulta dos Questores realizada em 14 de Janeiro de 2004 não foi comunicado ao recorrente. Acresce que, tendo os Questores sido consultados antes de 9 de Fevereiro de 2004, não puderam ter em consideração as observações do recorrente apresentadas nesta data. Por último, o Parlamento não comunicou ao recorrente, na íntegra, a acta dos debates da Mesa nem os resultados dos votos da Mesa relativos às medidas tomadas.

114   No que respeita ao artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001, invocado pelo secretário‑geral, o recorrente observa que o Parlamento não demonstrou como é que a divulgação dos referidos documentos poderia prejudicar gravemente o processo decisório, a confidencialidade, o segredo profissional ou o segredo comercial, como exige a referida disposição.

115   Segundo o recorrente, o Parlamento cometeu um erro de direito ao considerá‑lo um «terceiro» pertencente ao «público» conforme se encontra definido no Regulamento n.° 1049/2001. Com efeito, ao ser a pessoa directamente «afectada», o recorrente é «parte» no processo.

116   O Parlamento alega que não foi tomada pela Mesa nenhuma decisão contra o recorrente em 12 de Fevereiro de 2003 e que, por consequência, não podia existir nenhum processo que tivesse conduzido a essa decisão. Todavia, o secretário‑geral invocou o artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001, e em particular o facto de a instituição não ter ainda decidido definitivamente, para justificar a recusa do Parlamento ao pedido do recorrente.

117   Quanto ao segundo pedido de acesso ao processo formulado pelo recorrente em 1 de Março de 2004, o Parlamento alega que nunca lhe foi recusado e que pode sempre gozar desse direito, tal como lhe foi indicado na carta de 31 de Março de 2004 (v. n.° 55 supra).

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

118   Segundo o princípio geral do respeito dos direitos de defesa, a pessoa que é objecto de uma acusação por parte da administração comunitária deve ter a possibilidade de tomar posição sobre qualquer documento que esta pretenda utilizar contra ela. Na medida em que tal possibilidade não lhe seja concedida, os documentos não divulgados não devem ser tidos em consideração como meio de prova. Todavia, a exclusão de determinados documentos utilizados pela administração apenas tem importância se a acusação por esta formulada só pudesse ser provada através daqueles documentos (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Novembro de 1999, Tzoanos/Comissão, C‑191/98 P, Colect., p. I‑8223, n.° 34; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 3 de Julho de 2001, E/Comissão, T‑24/98 e T‑241/99, ColectFP, pp. I‑A‑149 e II‑681, n.° 92). Compete ao Tribunal verificar se a não divulgação dos documentos indicados pelo recorrente pôde influenciar, em seu prejuízo, o desenvolvimento do processo e o conteúdo da decisão recorrida (acórdão E/Comissão, já referido, n.° 93).

119   Além disso, o Tribunal de Primeira Instância pode, no âmbito do recurso jurisdicional interposto da decisão que põe termo ao procedimento administrativo, ordenar medidas de organização do processo e organizar um acesso completo ao dossier, a fim de apreciar se a recusa de divulgar um documento pode ser lesiva para a defesa do recorrente (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colect., p. I‑123, n.° 102).

120   No que se refere à consulta dos Questores de 14 de Janeiro de 2004, o Parlamento apresentou, no âmbito das medidas de organização do processo, a acta correspondente. O recorrente, pelo seu lado, não fez qualquer observação sobre a forma como a não comunicação deste documento poderia ser lesiva para a sua defesa e afectar em seu detrimento o desenvolvimento do procedimento administrativo. A única crítica formulada pelo recorrente relativamente a esta acta é que ele, contrariamente ao que o secretário‑geral expôs aos Questores nessa consulta, nunca reconheceu, mas pelo contrário, sempre contestou, a tese do Parlamento segundo a qual o montante em causa lhe foi pago indevidamente. A este respeito, basta referir que a decisão impugnada não foi aprovada com base num reconhecimento por parte do recorrente, mas em virtude do resultado da auditoria e das peças justificativas que o recorrente apresentou posteriormente (v. n.os 39 e 41 supra). Importa observar, neste âmbito, que a consulta dos Questores não vincula o secretário‑geral, gestor orçamental da instituição, em matéria de apuramento de um crédito baseado na falta de documentos que demonstrem a utilização de um subsídio parlamentar em conformidade com a regulamentação DSD. Por conseguinte, a não divulgação da acta relativa à consulta dos Questores de 14 de Janeiro de 2004 não era susceptível de violar os direitos de defesa do recorrente.

121   Além disso, resulta da jurisprudência que se presume a inexistência de um documento a que foi pedido o acesso quando é feita uma afirmação neste sentido pela instituição em causa. Trata‑se, contudo, de uma presunção simples que o recorrente pode ilidir através de qualquer meio, com base em indícios pertinentes e concordantes (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 25 de Outubro de 2002, Tetra Laval/Comissão, T‑5/02, Colect., p. II‑4381, n.° 95 e a jurisprudência referida).

122   O Parlamento declarou, em resposta às questões escritas do Tribunal, que o secretário‑geral não tinha redigido nenhum relatório dirigido aos Questores após a decisão de 8 de Abril de 2002. Uma vez que o recorrente não apresentou indícios pertinentes e concordantes susceptíveis de pôr em causa esta declaração, há que rejeitar a sua argumentação.

123   Além disso, segundo as respostas do Parlamento às questões escritas do Tribunal, também não existe qualquer processo que tenha conduzido à decisão da Mesa de 12 de Fevereiro de 2003. O recorrente não apresentou argumentos que pusessem em causa esta afirmação do Parlamento.

124   No que diz respeito à crítica do recorrente segundo a qual foi ouvido após a consulta dos Questores pelo secretário‑geral, de modo que aqueles não puderam ter em conta as suas observações, há que recordar que, uma vez que a consulta dos Questores não vincula o secretário‑geral relativamente à sua decisão sobre as ilações a tirar da inexistência de peças justificativas, o facto de o recorrente ter sido ouvido após a referida consulta não era susceptível de violar os direitos de defesa.

125   Quanto aos argumentos do recorrente relativos à não comunicação da acta dos debates da Mesa e dos resultados dos votos, importa referir que se trata de documentos sem relevância, na medida em que não se referem à decisão impugnada, daqui decorrendo que o recorrente não pode invocar utilmente esta falta de comunicação (v., por analogia, acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, já referido no n.° 119 supra, n.° 126). Portanto, o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação das regras de notificação das decisões

 Argumentos das partes

126   Segundo o recorrente, a decisão de 12 de Fevereiro de 2003, que constitui o fundamento do mandato conferido ao secretário‑geral, só lhe foi notificada após o seu pedido. O recorrente observa também que a decisão resultante da consulta dos Questores de 14 de Janeiro de 2004 não lhe foi comunicada.

127   O recorrente alega que a obrigação que incumbe às instituições de notificar aos interessados toda e qualquer decisão que afecte os seus direitos ou interesses e de mencionar as vias de recurso e os prazos respectivos resulta dos princípios gerais do direito comunitário e do Guia sobre as obrigações dos funcionários e agentes do Parlamento Europeu (JO 2000, C 97, p. 1, a seguir «guia das obrigações»). Refere que o ponto A, n.° 6, da parte III deste último indica que, «[c]aso uma decisão seja passível de recurso, esse facto deve ser claramente indicado, juntamente com todas as informações necessárias para a interposição do recurso».

128   O Parlamento observa que, ao não existir uma verdadeira decisão adoptada em 12 de Fevereiro de 2003 que afectasse o recorrente, não havia nada a notificar‑lhe e, por consequência, não havia que mencionar prazos e vias de recurso. No que respeita ao guia das obrigações, o Parlamento invoca a inadmissibilidade da argumentação do recorrente, pelo facto de ter sido formulada pela primeira vez na réplica. Além disso, a eventual obrigação (negada pelo Parlamento) de fazer referência aos prazos e às vias de recurso foi, de qualquer maneira, cumprida pelas cartas do secretário‑geral de 16 de Abril de 2003 e 31 de Março de 2004 (v. n.os 43 e 55 supra). O Parlamento também alega que o ponto invocado do guia das obrigações só diz respeito às relações da instituição com os cidadãos e não às relações com os seus membros.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

129   No que respeita à notificação da decisão da Mesa de 12 de Fevereiro de 2003, basta observar que a mesma não constitui a decisão impugnada nem o seu fundamento jurídico e que, em qualquer caso, foi notificada ao recorrente por fax de 20 de Fevereiro de 2003. Nestas circunstâncias, o facto de esta notificação ter tido lugar na sequência do pedido do recorrente não tem qualquer relevância.

130   Quanto à notificação do resultado da consulta dos Questores de 14 de Janeiro de 2004, este argumento constitui uma crítica idêntica à invocada no âmbito do fundamento relativo à violação dos direitos de defesa, que foi já julgado improcedente.

131   Por último, no que se refere à menção dos prazos e vias de recurso na decisão impugnada, importa referir que não há nenhuma disposição expressa de direito comunitário que imponha às instituições uma obrigação geral de informar os destinatários desses actos das possibilidades de recursos nem dos prazos em que estes podem ser exercidos (despacho do Tribunal de Justiça de 5 de Março de 1999, Guérin automobiles/Comissão, C‑153/98 P, Colect., p. I‑1441, n.os 13 e 15; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Fevereiro de 2000, ADT Projekt/Comissão, T‑145/98, Colect., p. II‑387, n.° 210). Quanto às obrigações que a instituição se impôs a si mesma ao adoptar o guia das obrigações, o facto de não ter indicado na decisão impugnada a possibilidade de interpor um recurso jurisdicional pode, com certeza, constituir uma violação das obrigações impostas pelo referido guia (v., por analogia, despacho do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Março de 2002, Laboratoire Monique Rémy/Comissão, T‑218/01, Colect., p. II‑2139, n.° 25). No entanto, o incumprimento desta obrigação não constitui uma violação das formalidades essenciais que tenha por consequência afectar a legalidade da decisão impugnada. Daqui decorre que o quarto fundamento não colhe.

 Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do dever de fundamentação

 Argumentos das partes

132   O recorrente alega que a decisão impugnada não está suficientemente fundamentada, na medida em que não indica de que modo as peças justificativas que apresentou ao secretário‑geral ao longo de todo o procedimento não são conformes à regulamentação DSD. Sublinha igualmente que o pagamento de certas dívidas só poderia ser efectuado após a restituição do montante apreendido pelas autoridades francesas. Daqui resulta que a exigência de apresentação de documentos que demonstrem a extinção das suas obrigações está insuficientemente fundamentada, uma vez que a sua existência não foi contestada.

133   Segundo o Parlamento, a decisão impugnada indica o montante a reembolsar, o motivo do reembolso e as formas de cálculo do referido montante. Além disso, o Parlamento recorda que, em geral, as exigências de fundamentação são menores quando o interessado tenha estado estreitamente ligado ao processo de elaboração da decisão e conheça, por meio de um relatório de auditoria para o qual remete a decisão impugnada e que lhe foi comunicado, a razão pela qual a instituição considera não dever imputar as despesas controvertidas ao orçamento.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

134   Importa recordar que a fundamentação deve ser adaptada à natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do acto, para permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização (acórdãos do Tribunal de Justiça de 6 de Julho de 2000, Eridania, C‑289/97, Colect., p. I‑5409, n.° 38, e de 14 de Março de 2002, Itália/Conselho, C‑340/98, Colect., p. I‑2663, n.° 58).

135   Além disso, uma decisão pode ser considerada suficientemente fundamentada quando faz referência a um relatório de auditoria, enviado ao recorrente (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Abril de 1996, Industrias Pesqueras Campos e o./Comissão, T‑551/93, T‑231/94 a T‑234/94, Colect., p. II‑247, n.os 142 a 144, e de 17 de Setembro de 2003, Stadtsportverband Neuss/Comissão, T‑137/01, Colect., p. II‑3103, n.os 52 a 58).

136   No caso em apreço, a decisão impugnada remete explicitamente para a auditoria realizada em Dezembro de 2002. Por carta de 9 de Janeiro de 2003 do director‑geral das Finanças do Parlamento, foi enviada ao recorrente uma cópia do relatório dessa auditoria. O recorrente apresentou por escrito os seus comentários acerca deste relatório (v. n.os 34 e 37 supra). De igual modo, a decisão impugnada refere‑se aos documentos apresentados pelo recorrente após a auditoria e às mensalidades de 3 000 euros em pagamento da dívida que ascende a 58 155,82 euros. Nestas circunstâncias, a remissão expressa ao relatório de auditoria notificado ao recorrente deve ser considerada suficiente no que se refere às exigências de fundamentação da decisão impugnada (acórdão Industrias Pesqueras Campos e o./Comissão, já referido no n.° 135 supra, n.° 144).

137   Além disso, o recorrente esteve, com efeito, estreitamente ligado ao processo de elaboração da decisão impugnada e conhece, pelo relatório de auditoria e pelas peças justificativas que ele próprio apresentou ao Parlamento, os elementos de facto em que o secretário‑geral se baseou para determinar o montante exacto da dívida (v. n.os 37, 39, 41 e 51 supra).

138   Os argumentos relativos à não consideração de certas peças justificativas não dizem respeito à existência ou à suficiência da fundamentação, mas sim à procedência dos fundamentos, relevando essa procedência da legalidade quanto ao fundo da decisão impugnada (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Março de 2001, França/Comissão, C‑17/99, Colect., p. I‑2481, n.° 35); por conseguinte, esses argumentos serão analisados no âmbito do oitavo fundamento. Resulta do exposto que o quinto fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação do princípio da igualdade e da não discriminação

 Argumentos das partes

139   O recorrente sublinha que, embora não tenha sido acusado de um abuso análogo aos regularmente constatados, designadamente pelo Tribunal de Contas, as medidas tomadas a seu respeito não têm precedente. Isto constitui uma violação dos princípios da igualdade e da não discriminação.

140   O Parlamento responde que os abusos eventuais ou existentes são objecto de investigações pelo Secretariado‑Geral e já deram lugar à recuperação de quantias indevidamente pagas.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

141   Resulta da jurisprudência que o respeito do princípio da igualdade de tratamento deve ser conciliado com o respeito do princípio da legalidade, segundo o qual ninguém pode invocar, em seu proveito, uma ilegalidade cometida a favor de outrem (acórdãos do Tribunal de Justiça de 9 de Outubro de 1984, Witte/Parlamento, 188/83, Recueil, p. 3465, n.° 15; de 4 de Julho de 1985, Williams/Tribunal de Contas, 134/84, Recueil, p. 2225, n.° 14; e Itália/Conselho, já referido no n.° 134 supra, n.os 87 a 93).

142   Assim, mesmo supondo fundadas as críticas formuladas pelo recorrente a respeito das ilegalidades cometidas a favor de outros deputados, devido à inexistência ou insuficiência de controlo da utilização dos subsídios parlamentares, este último não pode daí tirar proveito. Por conseguinte, o sexto fundamento não colhe.

 Quanto ao sétimo fundamento, relativo ao desvio de poder

 Argumentos das partes

143   Segundo o recorrente, existem no caso vertente indícios objectivos, pertinentes e concordantes que indicam que o procedimento foi iniciado pela Mesa por motivos puramente políticos sob pressão dos porta‑vozes de dois grupos políticos espanhóis. Estes pediram aos três vice‑presidentes espanhóis que actuassem no seio da Mesa contra o recorrente.

144   O Parlamento retorque que não foi tomada nenhuma decisão da Mesa relativamente ao recorrente e que, por consequência, a argumentação apresentada por este é inoperante. Além disso, os elementos de que o Parlamento dispunha justificavam a abertura de um inquérito na matéria.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

145   Resulta da jurisprudência que um acto só enferma de desvio de poder se se verificar, com base em indícios objectivos, pertinentes e concordantes, que foi adoptado com a finalidade exclusiva ou, pelo menos, determinante de atingir fins diversos dos invocados ou de eludir um processo especialmente previsto pelo Tratado para fazer face às circunstâncias do caso em apreço (acórdãos do Tribunal de Justiça de 13 de Novembro de 1990, Fedesa e o., C‑331/88, Colect., p. I‑4023, n.° 24, e de 14 de Maio de 1998, Windpark Groothusen/Comissão, C‑48/96 P, Colect., p. I‑2873, n.° 52).

146   O recorrente não apresentou esses indícios. Recorde‑se que o recorrente tinha recebido, até ao momento da apreensão, o montante global de 495 891,31 euros a título de despesas e subsídios parlamentares. A apreensão de uma parte considerável deste montante (200 304 euros) que provinha, segundo as declarações do recorrente, do Parlamento, só podia suscitar dúvidas quanto à conformidade da utilização de uma parte considerável das despesas e subsídios pagos ao recorrente com a regulamentação DSD. A abertura de um inquérito estava, por isso, justificada. Portanto, o sétimo fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao oitavo fundamento, relativo aos erros na apreciação das peças justificativas apresentadas ao secretário‑geral

 Argumentos das partes

147   O recorrente alega que o Parlamento cometeu um erro manifesto de apreciação ao não ter em conta o facto de ele não estar em condições de apresentar determinados elementos da sua contabilidade devido à detenção do seu tesoureiro e à apreensão de numerosos documentos contabilísticos e da quantia de 200 304 euros. Esta quantia provinha, segundo o recorrente, exclusivamente do Parlamento.

148   A recusa em considerar várias categorias de despesas, sem indicar em que é que eram contrárias à regulamentação DSD, constitui também, do ponto de vista do recorrente, um erro manifesto de apreciação. As despesas que, segundo o secretário‑geral, não puderam ser comprovadas por documentos contabilísticos conformes podem ser objecto de uma avaliação com base em montantes fixos. O recorrente recorda a este respeito a sua carta de 6 de Fevereiro de 2003 enviada ao secretário‑geral (v. n.° 39 supra), que incluía um novo cálculo, segundo o qual as despesas justificadas a título de subsídio de secretariado ascendiam naquele momento a 191 860 euros, ou seja, 138 741 euros justificados pelos elementos anexos à referida carta, que acrescem aos 53 119 euros já justificados pela auditoria, de modo que o saldo a reembolsar ao Parlamento ascendia a 50 722 euros.

149   Mais concretamente, o recorrente considera que o secretário‑geral devia ter tido em conta os montantes relativos aos salários em atraso (67 340 euros) e às contribuições para a Segurança Social em atraso (26 054 euros), uma vez que estas dívidas serão saldadas quando o montante apreendido for restituído. Além disso, o recorrente questiona a recusa do Parlamento de ter em consideração montantes relativos a valores fixos de despesas pessoais (27 600 euros), ao passo que estes montantes poderiam ser comprovados por outros meios, assim como as despesas com telemóveis calculadas com base numa extrapolação (4 800 euros).

150   De igual modo, a recusa de ter em consideração uma série de documentos e de facturas referentes a despesas relativas ao domicílio do recorrente e dos seus assistentes, no montante de 63 308,64 euros, assim como as despesas relativas a salários em atraso das quais foi declarado devedor pelo órgão jurisdicional em matéria laboral de San Sebastián (50 865,43 euros, v. n.° 45 supra) constitui também um erro manifesto de apreciação.

151   O recorrente esclareceu na audiência que o Sr. Gorrotxategi ficaria com 100 000 euros dos 200 304 apreendidos, porque lhe adiantou esse montante a título de tesouraria para fazer face às suas obrigações para com os seus assistentes. Além disso, o montante relativamente ao qual foi declarado devedor dos seus assistentes pelo órgão jurisdicional de San Sebastián seria deduzido da quantia apreendida.

152   O Parlamento indica a título preliminar que o atestado emitido a pedido do recorrente (v. n.os 32 e 33 supra) se limita a mencionar os pagamentos, efectuados nas contas bancárias de que é titular conjuntamente com o organismo terceiro pagador, correspondentes aos diferentes subsídios parlamentares, não se referindo à quantia apreendida.

153   O Parlamento observa que não existe nenhuma relação entre a recuperação dos 200 304 euros e a apresentação de peças justificativas suplementares, visto que a quantia apreendida diz respeito a um período posterior àquele em que os subsídios deviam ter sido utilizados em conformidade com a regulamentação DSD. Foi, por isso, tanto a falta de peças justificativas como a existência de um montante considerável na conta corrente que levou o Parlamento a pensar que estas quantias não tinham sido utilizadas para honrar os compromissos contraídos na observância da regulamentação DSD.

154   Segundo o Parlamento, o relatório de auditoria demonstrou que o recorrente tinha violado a regulamentação DSD. Além disso, o próprio recorrente reconheceu não ter cumprido algumas das suas obrigações para com os seus assistentes. O Parlamento contesta, de resto, o valor probatório dos elementos invocados pelo recorrente e referentes à conciliação relativa aos montantes em atraso dos assistentes do recorrente (v. n.° 149 supra), bem como dos documentos apresentados durante o processo.

155   O Parlamento sublinha que os montantes invocados pelo recorrente, que eram devidos aos assistentes, não podiam ser tidos em conta, visto que, segundo o relatório de auditoria, os contratos em causa tinham sido celebrados entre aqueles e o EH/B, o que foi igualmente sublinhado pelo Reino de Espanha.

156   Por último, o Parlamento declara que, tal como foi indicado no n.° 3 da decisão impugnada, continua disposto a ter em consideração as peças justificativas suplementares que o recorrente lhe possa apresentar.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

157   Importa observar, a título preliminar, que, de acordo com o sistema instituído pela regulamentação DSD, o deputado que designa um terceiro pagador encarregado da gestão dos montantes pagos a título de subsídios de assistência parlamentar deve poder apresentar documentos que justifiquem a sua utilização conforme aos contratos celebrados com os seus assistentes. A falta de documentos justificativos das despesas efectuadas a título de salários dos assistentes ou de qualquer outra despesa reembolsável nos termos da regulamentação DSD só pode ter como consequência a obrigação de reembolsar os montantes correspondentes ao Parlamento. Com efeito, qualquer montante cuja utilização conforme à regulamentação DSD não seja demonstrada por meio de documentos deve ser considerado indevidamente pago. Cabe, por isso, ao interessado que tenha apresentado à administração documentos para justificar a utilização dos fundos recebidos invocar e provar, em apoio do seu recurso no Tribunal, que esta última cometeu um erro ao recusar tê‑los em conta.

158   Neste âmbito, não pode ser acolhido o argumento do recorrente relativo às dificuldades com que se defrontou em consequência da detenção do seu tesoureiro e da apreensão de numerosos documentos. O recorrente indicou a este respeito, em resposta a uma questão escrita do Tribunal, que o único documento apreendido pelas autoridades francesas era o talão que mencionava o levantamento de 210 354 euros, entregue pelo Banque Bruxelles Lambert ao mandatário da conta corrente. O recorrente obteve uma cópia do referido talão na agência bancária e apresentou‑o ao Tribunal. Assim, o facto de o recorrente ter tido que refazer a sua contabilidade sem a ajuda do seu tesoureiro não tem qualquer relevância.

159   Quanto à avaliação das despesas com base em montantes fixos preconizada pelo recorrente, esta não pode ser aceite. É ponto assente que o pagamento de obrigações cobertas pelo subsídio de secretariado deve ser provado por meio de peças justificativas que indiquem todos os elementos necessários à realização de um controlo a posteriori (os montantes exactos, as datas dos pagamentos, os dados sobre o devedor e o credor, o fundamento jurídico do pagamento, etc.). Uma avaliação com base em montantes fixos, que aliás não está prevista em nenhuma disposição, não oferece esta possibilidade.

160   No que se refere à restituição da quantia de 200 304 euros apreendida em França e, mais concretamente, ao argumento do recorrente de que o Parlamento deveria ter tido em conta que a apresentação de uma parte das peças justificativas se encontra subordinada a esta restituição, este argumento não pode ser acolhido.

161   Com efeito, o recorrente tenta provar que é devedor de certos montantes a pessoas remuneradas através dos créditos do subsídio de secretariado e alega que, por esta razão, o Parlamento deveria ter considerado os referidos montantes devidamente justificados. Faz referência a este respeito aos salários em atraso (67 340 euros) e às contribuições para a Segurança Social em atraso (26 054 euros), sublinhando que estas dívidas serão saldadas quando o montante apreendido for restituído.

162   No entanto, o facto de o recorrente ser devedor de determinados montantes a pessoas às quais é destinado o subsídio de secretariado não o pode dispensar do dever de apresentar os documentos que demonstrem a extinção das suas obrigações. Caso contrário, um deputado poderia cobrar um subsídio sem pagar as quantias destinadas aos prestadores de serviços e privar em seguida o Parlamento de todo o controlo, apresentando uma qualquer prova da sua dívida para com estes últimos.

163   Daqui decorre que, tal como já foi observado, o Parlamento deve controlar a existência de peças justificativas que demonstrem a utilização dos fundos em conformidade com a regulamentação DSD. Além do mais, o Parlamento não pode ser obrigado a dispensar o recorrente da apresentação de peças justificativas em consequência de uma apreensão da qual não é responsável. Com efeito, é o parlamentar que, a partir do momento em que recebe um subsídio, corre os riscos inerentes à sua própria gestão. De resto, o Parlamento declarou que continuava disposto a ter em consideração as peças justificativas relativas ao pagamento das dívidas às quais o recorrente faz referência. Consequentemente, o Parlamento teve em conta a apreensão efectuada em França e oferece ao recorrente a possibilidade de justificar as quantias gastas a título dos subsídios parlamentares.

164   Relativamente à recusa do Parlamento de ter em consideração os montantes relativos a valores fixos com despesas pessoais (27 600 euros), ao passo que, segundo o recorrente, estes montantes poderiam ser comprovados por outros meios, basta referir que este último não indica os referidos meios. Quanto às despesas com telemóveis, importa referir que, pelas razões expostas no n.° 159 supra, a extrapolação proposta não pode ser admitida como método para justificar as despesas no âmbito da regulamentação DSD.

165   Quanto à decisão do órgão jurisdicional em matéria laboral de San Sebastián, invocada pelo recorrente como prova da sua dívida (no montante de 50 865,43 euros) para com os seus assistentes, há que sublinhar que não se trata de um acto de uma autoridade judiciária, mas de uma decisão de natureza administrativa do conciliador do Departamento da Justiça do Governo basco e baseada num acordo entre o recorrente e os seus assistentes. Em todo o caso, este acto não comprova a extinção da dívida do recorrente para com os seus assistentes, não constituindo uma peça justificativa conforme (v. n.os 162 e 163 supra). A título exaustivo, um acordo celebrado no âmbito de uma conciliação, como aquele em que se baseia a decisão acima referida, não oferece, na realidade, nenhuma prova certa da existência de um crédito. Portanto, o Parlamento exigiu legitimamente documentos comprovativos do pagamento desses montantes em atraso aos assistentes a fim de proceder à redução da dívida.

166   O recorrente sustenta que a quantia de 63 308,64 euros devia ter sido considerada justificada a título de despesas domésticas. Estas despesas foram assumidas pelo EH/B, que, nos termos de um acordo celebrado com este, retém a quantia fixa de 600 euros do salário de cada assistente. Este montante é, segundo o recorrente, devido ao EH/B (v. n.os 45 e 150 supra).

167   Basta observar a este respeito que, pelas razões já expostas, uma dívida não saldada não pode ser tida em conta como despesa justificada. Por conseguinte, o Parlamento recusou‑se, com razão, a ter em conta este elemento.

168   Resulta do que precede que a recusa do secretário‑geral de ter em conta os documentos apresentados pelo recorrente, acima mencionados, não está viciada por nenhum erro. Por conseguinte, o oitavo fundamento deve ser julgado improcedente.

169   Tendo as três últimas partes do primeiro fundamento e a totalidade dos fundamentos seguintes (do segundo ao oitavo) sido julgados improcedentes, importa anular a decisão impugnada unicamente na medida em que dispõe que a recuperação do montante de que o recorrente é devedor será feita por via de compensação.

 Quanto às despesas

170   Nos termos do artigo 87.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas. No caso em apreço, atendendo à anulação parcial da decisão impugnada e à improcedência da maioria dos fundamentos invocados pelo recorrente, há que decidir que cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

171   Nos termos do artigo 87.°, n.° 4, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros que intervenham no processo devem suportar as respectivas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção alargada)

decide:

1)      A decisão do secretário‑geral do Parlamento Europeu de 24 de Fevereiro de 2004, relativa à recuperação dos montantes pagos ao recorrente a título de despesas e subsídios parlamentares, é anulada na medida em que dispõe que a recuperação do montante de que o recorrente é devedor será feita por via de compensação.

2)      Quanto ao mais, é negado provimento ao recurso.

3)      O recorrente, o Parlamento e o Reino de Espanha suportarão as respectivas despesas.

Pirrung

Meij

Forwood

Pelikánová

 

      Papasavvas

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 22 de Dezembro de 2005.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      J. Pirrung


* Língua do processo: francês.