CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

M. POIARES MADURO

apresentadas em 16 de Junho de 2005 1(1)

Processos apensos C‑232/04 e C‑233/04

Nurten Güney‑Görres (C‑232/04)

e

Gül Demir (C‑233/04)

contra

Securicor Aviation (Germany) Ltd

e

Kötter Aviation Security GmbH & Co. KG

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Arbeitsgericht Düsseldorf (Alemanha)]

«Transferência de empresas – Directiva 2001/23/CE – Conceito de transferência – Âmbito de aplicação – Disponibilização de elementos de exploração – Contratos públicos de serviços»





1.     O presente processo destina‑se a que o Tribunal de Justiça precise, uma vez mais, os contornos do conceito de «transferência» na acepção do artigo 1.° da Directiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de Março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos (2) (JO L 82, p. 16). Efectivamente, em duas decisões de reenvio distintas, de 5 de Maio de 2004, o Arbeitsgericht Düsseldorf (Alemanha) submeteu ao Tribunal de Justiça questões sobre a aplicação desta directiva no caso em que um prestador sucede a outro num contrato de serviços respeitante ao controlo de passageiros no Aeroporto de Düsseldorf. Mais particularmente, o tribunal de reenvio deseja saber quais as consequências a atribuir à disponibilização, pelo adjudicante (3), de certos elementos de exploração em benefício dos adjudicatários.

I –    Factos, quadro jurídico e questões prejudiciais

2.     Nos termos de um contrato celebrado em 24 de Março/5 de Abril de 2000 com a República Federal da Alemanha, a Aviation Defence International Germany Ltd ficou responsável pelo controlo de bagagens e de passageiros no Aeroporto de Düsseldorf. Mais tarde, a Securicor Aviation (Germany) Ltd (a seguir «Securicor») assumiu a execução deste contrato. Entretanto, por carta de 5 de Junho de 2003, a Securicor foi avisada de que o seu contrato não seria prorrogado além de 31 de Dezembro de 2003, uma vez que as funções de segurança aérea no aeroporto passavam a ser desempenhadas pela sociedade Kötter Aviation Security GmbH & Co. KG (a seguir «Kötter»). Esta última iniciou as referidas actividades em 1 de Janeiro de 2004.

3.     Nos termos do contrato, que não variaram aquando da mudança de adjudicatário, a República Federal da Alemanha põe à disposição deste os equipamentos de segurança aérea necessários à execução dos controlos, ficando a seu cargo a respectiva manutenção. Trata‑se de portais de detecção, de tapetes rolantes munidos de um sistema de inspecção automática através de raios X (sistema de controlo de bagagem e aparelhos de detecção radioscópica), de detectores manuais e de detectores de explosivos.

4.     O contrato estipula igualmente que o adjudicatário deve respeitar o § 29 c, n.° 1, da Luftverkehrsgesetz (lei sobre o transporte aéreo), que prevê «[a] protecção contra atentados à segurança no transporte aéreo, particularmente contra o desvio de aviões ou actos de sabotagem, compete às autoridades aeronáuticas. A competência territorial das autoridades aeronáuticas estende‑se a toda a zona aeroportuária. Na medida em que o desempenho destas funções exige a revista de pessoas e a revista, a inspecção ou qualquer outra forma de controlo de objectos, as autoridades aeronáuticas podem recorrer a pessoas qualificadas, como agentes auxiliares, que devem exercer as suas funções sob a sua supervisão» (4).

5.     Consequentemente, os assalariados do adjudicatário afectos a funções de controlo devem receber uma formação específica de quatro semanas e passar num exame de assistente de segurança aérea, a fim de obter um certificado oficial investindo‑os de autoridade para exercer essas actividades de controlo.

6.     N. Güney‑Görres e G. Demir estavam empregadas, respectivamente, desde 26 de Abril de 2000 e 7 de Maio de 2001, como agentes de segurança e, nessa qualidade, encontravam‑se sujeitas às prescrições do § 29 c da Luftverkehrsgesetz. A Securicor enviou a cada uma delas uma carta, datada de 26 de Novembro de 2003, denunciando os seus contratos de trabalho, com efeitos a partir de 31 de Dezembro de 2003. As referidas trabalhadoras reagiram propondo acções no Arbeitsgericht Düsseldorf, que deram entrada nesse tribunal em 18 de Dezembro de 2003, destinadas a obter a declaração de que os seus contratos de trabalho deviam manter‑se com o novo adjudicatário, pois tinha havido uma transferência de empresa.

7.     O conceito de «transferência» de empresa está definido no artigo 1.°, n.° 1, da Directiva 2001/23, que dispõe:

«a)      A presente directiva é aplicável à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento, quer essa transferência resulte de uma cessão convencional quer de uma fusão.

b)      Sob reserva do disposto na alínea a) e das disposições seguintes do presente artigo, é considerada transferência, na acepção da presente directiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória.

[…]» (5).

8.     Esta disposição foi transposta para o direito alemão pelo § 613 a do Bürgerliches Gesetzbuch, cujo n.° 1 dispõe nomeadamente que «[s]empre que um estabelecimento ou uma parte de estabelecimento for transferido por acto jurídico para outro titular, este assume os direitos e obrigações emergentes das relações de trabalho existentes à data da transferência. […]»

9.     Segundo o Arbeitsgericht Düsseldorf, a existência de uma transferência de empresa depende da eventual transferência de elementos de exploração, a saber, os equipamentos de segurança aérea, da Securicor para a Kötter. Ora, está provado que esta última utiliza os mesmos elementos de exploração que a Securicor, postos à disposição pelo adjudicante do contrato. O tribunal de reenvio pergunta se esta circunstância é, por si só, suficiente para se poder concluir pela existência de uma transferência de estabelecimento na acepção do artigo 1.° da Directiva 2001/23, tal como foi interpretada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Abler e o. (6). Com efeito, neste acórdão, o Tribunal de Justiça baseou‑se na disponibilização de elementos de exploração por parte do mandante para concluir pela existência de uma transferência de empresa entre sucessivos prestadores de serviços. As dúvidas do tribunal de reenvio decorrem igualmente da interpretação do conceito de transferência na jurisprudência do Bundesarbeitsgericht, que considera que os elementos de exploração postos à disposição do adjudicatário só podem ser equiparados aos elementos de exploração deste último no caso de serem utilizados numa «gestão económica própria» (7). Consequentemente, em duas decisões distintas de 3 de Maio de 2004, apensas por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 9 de Julho de 2004 em virtude da identidade das questões submetidas, o Arbeitsgericht Düsseldorf pediu ao Tribunal de Justiça que se pronunciasse sobre as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Na apreciação da existência de uma transferência de estabelecimento de acordo com o artigo 1.º da Directiva 2001/23/CE – e independentemente da questão das relações de propriedade –, em caso de nova adjudicação de um contrato e no âmbito de uma avaliação global, só se verifica uma transferência dos elementos de exploração do adjudicatário inicial para o novo adjudicatário na condição de esses elementos serem cedidos a este último para os fins de uma gestão económica própria? Consequentemente, para admitir a existência da transferência dos elementos de exploração, é necessário que o adjudicatário tenha o direito de decidir sobre a forma de utilização dos mesmos, em função do seu interesse económico próprio? Deve, por conseguinte, distinguir‑se consoante os elementos de exploração do adjudicatário constituam o ‘objecto’ ou o ‘meio’ da prestação efectuada pelo adjudicatário?

2)      Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

a)      A afectação dos elementos de exploração à gestão económica própria deve ser excluída quando o mandante tenha colocado estes elementos à disposição do adjudicatário unicamente para uma simples utilização, sendo a respectiva manutenção, incluindo as despesas inerentes a essa utilização, assumidas pelo mandante?

b)      Existe gestão económica própria pelo adjudicatário quando, no âmbito do controlo de passageiros nos aeroportos, o mesmo utilize os portais de detecção, os detectores manuais e os equipamentos de detecção radioscópica postos à sua disposição pelo mandante?»

10.   Estas questões destinam‑se a obter uma definição das condições em que se pode considerar que houve uma transferência de elementos de exploração, quando estes sejam postos, pelo adjudicante, à disposição dos sucessivos adjudicatários do contrato.

11.   Note‑se, a título liminar, que a aplicabilidade da Directiva 2001/23 aos contratos de serviços não levanta qualquer dúvida. O Tribunal de Justiça reconheceu essa possibilidade no acórdão Watson Rask e Christensen (8). Posteriormente, os acórdãos Schmidt (9) e Süzen (10) confirmaram esta interpretação. A título de exemplos de aplicação da Directiva 2001/23 a sucessões de contratos, podem referir‑se os processos Hidalgo e o. (11), Hernandez Vidal e o. (12), Allen e o. (13), Liikenne (14), Temco (15) e, em último lugar, Abler e o., já referido.

12.   Embora a jurisprudência a este respeito seja abundante, o debate acerca do conceito de transferência de empresa não está encerrado, uma vez que os advogados‑gerais têm continuado a apresentar ao Tribunal de Justiça argumentos que visam pôr em causa a interpretação extensiva que ele faz daquele conceito (16). A jurisprudência tem, por vezes, sérias dificuldades em encontrar uma linha de demarcação nítida entre transferência de actividade e transferência de empresa (17). Ora, esse limite constitui o garante de um equilíbrio entre os dois objectivos prosseguidos pela Directiva 2001/23, a saber, por um lado, a título principal, a protecção dos trabalhadores (18) e, por outro, a realização do mercado único (19).

13.   Para que mantenha a sua identidade após uma transferência, a entidade deve existir previamente como entidade autónoma (20). Ao contrário do que a Kötter defendeu na audiência, não tenho dúvidas quanto à existência de uma entidade económica destinada a efectuar actividades de controlo no Aeroporto de Düsseldorf. Todavia, para responder às questões do tribunal de reenvio, convém, numa primeira fase, determinar se os elementos disponibilizados pelo mandante fazem parte da entidade transferida, isto é, apreciar se esses elementos postos à disposição da Securicor lhe são imputáveis. A natureza da disponibilização será determinante para efeitos desta análise. Numa segunda fase do raciocínio, será abordada a questão da manutenção da identidade da entidade.

II – Considerações preliminares sobre a transferência de elementos de exploração do mandante a favor dos prestadores

14.   Com a primeira questão, o tribunal de reenvio pretende saber se os elementos de exploração disponibilizados pelo adjudicante fazem parte da entidade económica transferível. Poderá considerar‑se, como faz o tribunal de reenvio, que o acórdão Abler e o., já referido, fornece uma resposta a esta interrogação?

15.   É certo que resulta da jurisprudência que, para uma transferência de elementos corpóreos ou imobiliários ter lugar, não é necessária uma transferência de propriedade. No processo Redmond Stichting (21), por exemplo, a associação beneficiária de um subsídio comunal – a Redmond Stichting, posteriormente Sigma – arrendava um imóvel à comuna. O Tribunal de Justiça incluiu, como um dos elementos que permitiam provar a existência de uma transferência, o facto de que «o imóvel arrendado pela Redmond foi arrendado à Sigma» (22). Assim, a inexistência de transferência de propriedade de um prestador para outro não obsta a que uma transferência de activos possa ter lugar, desde que se prove que os activos em causa fazem parte da entidade transferível (23).

16.   A questão de saber em que circunstâncias uma disponibilização de activos por um mandante equivale à integração desses activos na entidade transferível do prestador é mais delicada. A jurisprudência não fornece nenhuma indicação sobre este ponto, estando, pelo contrário, muito dividida.

17.   No quadro de uma sucessão de empresas na execução de uma actividade de limpeza, o acórdão Süzen, sem se pronunciar directamente sobre o assunto, limitava‑se a referir que a identidade de uma entidade económica resulta de elementos como «os [elementos] de exploração» disponibilizados pelo mandante (24).

18.   Posteriormente a este acórdão, o Tribunal de Justiça parece ter de novo hesitado em pronunciar‑se, no acórdão Watson Rask e Christensen (25). Nesse processo, a sociedade Philips confiava pela primeira vez a gestão das suas cantinas a um prestador externo. Punha à disposição da sociedade ISS Kantineservice, sem contrapartida financeira, os locais de venda e de produção aprovados por esta, o equipamento necessário à gestão das cantinas, a electricidade, a água quente e o telefone e comprometia‑se a assegurar a manutenção geral das instalações e dos equipamentos, bem como a remoção dos lixos (26). No n.° 6 das suas conclusões, o advogado‑geral W. Van Gerven afirmou que esta situação devia ser analisada como uma «ausência de transferência dos seus bens móveis pela Philips». O Tribunal de Justiça limitou‑se a declarar que a Directiva 77/187 é aplicável a uma situação de externalização, ao mesmo tempo que considerou que a disponibilização de elementos de exploração pelo mandante faz parte dos «diversos benefícios cujas modalidades são determinadas pelo contrato celebrado» (27) entre as duas empresas.

19.   Todavia, o acórdão Temco, já referido, parece fornecer uma resposta à questão das consequências a atribuir a uma disponibilização de activos por parte do mandante. Neste caso, a Volkswagen punha à disposição das empresas de limpeza por ela contratadas os meios necessários à limpeza industrial das suas instalações. O Tribunal de Justiça aceitou a análise feita pelo tribunal nacional, que deduziu daquela circunstância não ter havido passagem de elementos do activo de um prestador para outro (28). Efectivamente, nada impede que os elementos de exploração disponibilizados sejam utilizados por um adjudicatário e, seguidamente, pelo seu sucessor, sem que por isso façam parte da entidade transferível.

20.   Contrariamente ao que parecia ter ficado assente neste acórdão, o Tribunal de Justiça adoptou uma abordagem diferente no acórdão Abler e o., já referido, onde reconheceu que, em certos casos, uma disponibilização de activos pelo mandante pode acarretar uma transferência de activos entre prestadores. Com efeito, neste processo, em que dois prestadores de serviços se sucediam na tarefa de assegurar os serviços de restauração num hospital, a instituição gestora punha à disposição daqueles as próprias instalações, bem como a água, a energia e os pequenos e grandes equipamentos indispensáveis. O Tribunal de Justiça declarou que «os elementos corpóreos em causa indispensáveis para a actividade visada […] foram retomados pela Sodexho» (29). Ora, como observou o Governo alemão na audiência, esta conclusão implica necessariamente que os elementos corpóreos em causa faziam parte da entidade transferível, embora o hospital tivesse conservado a propriedade dos mesmos (30).

21.   Assim, enquanto no processo Temco, já referido, uma disponibilização de elementos de exploração pelo mandante não acarretava a inclusão desses elementos na entidade transferível, no processo Abler e o., chegava‑se a uma conclusão de sentido contrário (31). É perturbador que esta divergência não tenha resultado da aplicação de um critério que permitisse distinguir os dois casos. Pelo contrário, como defendeu o Governo alemão nas suas observações orais, parece‑me que tal divergência pode ser interpretada como decorrendo da inexistência de um critério operacional.

22.   Perante estas hesitações da jurisprudência e contrariamente ao que sustenta a Securicor, importa evitar uma generalização que leve a que qualquer disponibilização de elementos de exploração por parte de um mandante seja sinónimo da sua inclusão na entidade transferível. Como referiu o Governo alemão na audiência, nesta hipótese, qualquer sucessão de prestadores de serviços na execução de um contrato seria qualificada de transferência de empresa, para tal bastando que o mandante lhes disponibilizasse elementos de exploração. Uma simples perda de mercado a favor de um concorrente correria, portanto, o risco de ser equiparada a uma transferência de empresa, contrariamente a jurisprudência assente do Tribunal de Justiça (32). A linha de demarcação entre transferência de empresa e transferência de actividade seria de novo posta em causa (33).

23.   Por outro lado, como observaram a Kötter e o Governo alemão na audiência, as consequências económicas de uma generalização dessa natureza, não sustentada por um critério coerente, poderiam ser particularmente significativas, uma vez que os elementos sobre os quais a concorrência entre prestadores se exerceria seriam fortemente reduzidos: o reconhecimento automático de uma transferência de empresa entre sucessivos prestadores de serviços equivale a transformar os custos de pessoal em custos fixos. A margem de manobra de que disporiam os potenciais concorrentes para se diferenciarem no quadro de um mercado de serviços competitivo tornar‑se‑ia insignificante, uma vez que se limitaria a incidir sobre a organização do pessoal (34).

24.   Carecendo a jurisprudência de um critério de distinção claro, o tribunal de reenvio, apoiado pelo Governo alemão, sugere que a questão de saber se activos disponibilizados por um adjudicante são ou não imputáveis ao adjudicatário que os utiliza depende do conceito de «gestão económica própria».

III – O critério da gestão económica própria

25.   Segundo a jurisprudência do Bundesarbeitsgericht, em aplicação do critério da gestão económica própria, os elementos de exploração disponibilizados pelo mandante tornar‑se‑ão parte integrante da entidade económica transferível na condição de o prestador ter a possibilidade de gerir livremente esses elementos, em função do seu próprio interesse.

26.   No entender do tribunal de reenvio e do Governo alemão, este critério permite explicar a posição adoptada pelo Tribunal de Justiça no processo Abler e o. (35). Efectivamente, neste processo, a Sodexho gozava de liberdade de gestão económica da cozinha que havia sido posta à sua disposição. Agia em conformidade com o seu próprio interesse económico, quer quanto à concepção dos menus quer no que respeita ao fornecimento de outros clientes que não o hospital. Além disso, as despesas de manutenção estavam a cargo do utilizador dos elementos de exploração. Segundo o Governo alemão, no caso vertente, ao invés, os equipamentos de controlo de passageiros disponibilizados pela Securicor não podem ser considerados como fazendo parte de uma entidade transferível, pois não existe qualquer margem de manobra na sua utilização.

27.   Antes de avaliar a pertinência do critério proposto pelo tribunal de reenvio, importa referir o disposto no artigo 1.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 2001/23, que define entidade económica como «um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória». Nada na letra deste artigo prescreve ou proíbe a elaboração de um critério que permita determinar os casos em que uma disponibilização de activos equivale a uma «transferência» desses activos do mandante para o adjudicatário.

28.   Todavia, pelas razões a seguir expostas, não me parece que o critério da gestão económica própria, tal como é proposto pelo tribunal de reenvio, seja operacional.

29.   Em primeiro lugar, o critério proposto pelo tribunal de reenvio não é sustentado por nenhuma justificação normativa. Com efeito, a distinção entre uma situação em que existe uma gestão económica própria e outra em que tal gestão é inexistente não foi concebida para assegurar a protecção dos trabalhadores nem para permitir a realização do mercado interno. O facto de o critério sugerido não estar ligado a nenhum dos objectivos da Directiva 2001/03 mina a sua credibilidade.

30.   Em segundo lugar, porém, não basta concluir que o critério da gestão económica própria equivale, em certos casos, a restringir o âmbito de aplicação da Directiva 2001/23, para o afastar. Embora seja incontestável que se destina, a título principal, a proteger os trabalhadores, a referida directiva visa igualmente a realização do mercado interno, como prova a respectiva adopção com base no artigo 94.° CE. Por conseguinte, não se pode sustentar, como fazem a Comissão e a Securicor, que o espírito ou o efeito útil da Directiva 2001/23 seriam postos em causa pelo simples facto de ela não ser aplicável a todas as situações de sucessões de prestadores de serviços, mas apenas às que correspondam a uma transferência de empresa (36).

31.   Em terceiro lugar, embora seja inegável que a Securicor dispõe de menos flexibilidade na utilização de equipamentos de controlo do que uma empresa que explore uma cantina disporá relativamente a uma cozinha, não é verdade que uma transferência de elementos de exploração só possa verificar‑se no segundo caso. Como sublinhou a Comissão na audiência, a diferença entre as duas situações é apenas uma questão de grau: as duas empresas conservam uma certa flexibilidade na sua forma de organizar a sua actividade com a ajuda dos elementos de exploração postos à sua disposição (37).

32.   Além disso, o critério da gestão económica própria cria o risco de dar origem a debates casuísticos, cujo desfecho será difícil de prever para as empresas, em detrimento da sua segurança jurídica. A este respeito, basta referir o acórdão proferido pelo Bundesarbeitsgericht em 25 de Maio de 2000, anexo às observações apresentadas pelo Governo alemão, para se concluir que este critério exige efectivamente uma análise detalhada da autonomia conferida pelo contrato de prestação de serviços à empresa encarregada de efectuar essa prestação. Ora, uma vez que qualquer prestador de serviços beneficia necessariamente de uma certa autonomia económica relativamente ao mandante, o referido critério não permite delimitar os casos em que se verificou uma transferência de activos.

33.   Por último, partilho da opinião da Comissão segundo a qual o critério da gestão económica própria confere excessiva importância às disposições contratuais previstas entre o mandante e o prestador de serviços. Se o conteúdo do contrato celebrado se tornasse decisivo para a qualificação de transferência de empresa, os co‑contratantes poderiam, consequentemente, contornar a aplicação da Directiva 2001/23. As disposições contratuais entre o mandante e o prestador a quem foi adjudicada a execução de um contrato devem, pelo contrário, ser tidas em consideração para efeitos de uma apreciação objectiva das diferentes circunstâncias do caso concreto (38).

34.   Em última análise, de uma disposição contratual que prevê a disponibilização de activos pelo mandante não pode decorrer automaticamente uma transferência de activos entre dois prestadores. Caso contrário, gerar‑se‑ia confusão entre manutenção de uma actividade e manutenção de uma empresa (39). Com efeito, a mera disponibilização de activos pelo mandante daria origem a uma transferência de empresa entre prestadores de serviços.

35.   Face às considerações precedentes, entendo que o critério da gestão económica própria não é operacional, pois, por um lado, não permite delimitar os casos em que, apesar de disponibilizados pelo mandante, os elementos de exploração se integram de facto numa entidade económica distinta e, por outro, carece de justificação normativa.

36.   À luz da sua interpretação do acórdão Abler e o., já referido, a Comissão e a Securicor sugerem que o factor determinante resida em saber se os elementos de exploração disponibilizados são indispensáveis à execução da prestação de serviços em causa. Todavia, este critério alternativo ignora o facto de que o adjudicatário não dispõe da faculdade de escolher, uma vez que, a partir do momento em que lhe é adjudicado o contrato, fica vinculado, para com o adjudicante, pelas condições previstas nesse contrato. Acresce que parece lógico pressupor que o mandante só porá à disposição do prestador de serviços elementos de exploração necessários à execução do contrato que lhe foi adjudicado.

37.   Por outro lado, embora, no acórdão Abler e o., já referido, o Tribunal de Justiça tenha deixado bem claro que os elementos disponibilizados pelo adjudicante, a saber, diversos equipamentos de cozinha, eram indispensáveis à execução do contrato em causa, a saber, o fornecimento de refeições, nada nesse acórdão indica que esta característica tenha sido decisiva. Por último, o referido critério é incapaz de resolver a contradição assinalada entre os acórdãos Abler e o. e Temco, já referidos, pois, neste último processo, os elementos disponibilizados pelo mandante eram igualmente indispensáveis à execução da prestação de serviços.

38.   Embora nem o critério proposto pelo tribunal de reenvio nem o defendido pela Comissão e pela Securicor me pareçam convincentes pelos motivos acima evocados, resta averiguar se uma disponibilização de activos pelo mandante deve ter influência na determinação da existência de uma transferência de empresa entre prestadores.

39.   Na hipótese em que são celebrados contratos de serviços idênticos entre um mandante e sucessivos prestadores, é particularmente difícil identificar os contornos da entidade económica, visto numerosos elementos dessa entidade serem fixados contratualmente. Assim, é inerente à natureza de um acordo celebrado no quadro de uma adjudicação que a clientela do prestador de serviços se mantenha idêntica. De igual modo, do ponto de vista dos sucessivos prestadores, os elementos disponibilizados representam uma constante na equação que aqueles devem resolver ao apresentarem uma proposta, tal como, por exemplo, a localização ou ainda a infra‑estrutura física do Aeroporto de Düsseldorf, no caso da Securicor e da Kötter. Efectivamente, os mesmos elementos de exploração disponibilizados pelo mandante serão utilizados por todos os sucessivos prestadores, privados de margem de manobra a esse respeito. Por outras palavras, os elementos disponibilizados escapam à esfera de controlo dos sucessivos prestadores e, consequentemente, não podem ser considerados como fazendo parte de uma entidade organizacional transferível.

40.   Por este motivo, no caso vertente, a fim de determinar a existência de uma transferência de empresa, importa, para efeitos da aplicação dos critérios definidos no acórdão Spijkers (40), fazer incidir a análise sobre os elementos da entidade económica que são próprios do prestador. Apenas desta forma é possível garantir que a transferência diga respeito a uma entidade autónoma, em conformidade com a letra e o objectivo do artigo 1.° da Directiva 2001/23. Na medida em que se baseia unicamente na problemática da gestão económica própria, a primeira questão submetida pelo tribunal nacional deve ser respondida negativamente. Por conseguinte, a resposta à segunda questão é também negativa.

41.   Nos processos pendentes no Arbeitsgericht Düsseldorf, atendendo a que os elementos de exploração necessários ao exercício das actividades de controlo adjudicadas à Securicor e, seguidamente, à Kötter são disponibilizados pela República Federal da Alemanha, a existência de uma transferência de empresa entre estes dois prestadores deve ser estabelecida a partir de outros elementos que não essa disponibilização.

42.   Como refere o Governo alemão nas suas observações escritas, as questões do órgão jurisdicional nacional apenas dizem respeito a um dos elementos úteis para a apreciação da transferência. Ora, resulta da resposta sugerida que esse elemento, ou seja, a transferência dos elementos de exploração disponibilizados, não deve ser determinante. Face aos elementos que constam dos autos e a fim de fornecer ao tribunal de reenvio uma resposta útil para a resolução deste processo, importa, assim, perspectivar as consequências da análise proposta nas circunstâncias do caso vertente.

IV – As consequências da análise proposta para o caso vertente

43.   Antes de proceder a um exame das circunstâncias do processo, é necessário recordar as condições em que uma transferência de empresa pode ter lugar sem que haja transferência de elementos do activo.

44.   No processo Redmond Stichting, já referido, uma das questões prejudiciais versava sobre as consequências do facto de não haver transferência de bens móveis. Na altura, o Tribunal de Justiça declarou que essa circunstância «não parece por si só susceptível de constituir obstáculo à aplicabilidade da directiva», tendo remetido para o juiz nacional a tarefa de inserir este elemento na sua apreciação de conjunto.

45.   Contudo, no processo Liikenne, já referido, após ter constatado que não houve transferência de activos entre duas companhias de transporte em autocarros, o Tribunal de Justiça excluiu a aplicação da Directiva 2001/23, apesar de parte do pessoal ter sido transferida de uma empresa para a outra.

46.   Estas decisões, aparentemente contraditórias, provam a importância da determinação prévia da natureza da actividade objecto da eventual transferência. Com efeito, os elementos pertinentes para apurar a existência de uma transferência de empresa dependem do tipo de actividade exercida pela entidade económica (41).

47.   Este critério foi introduzido pelo Tribunal de Justiça em relação a actividades que assentam essencialmente na mão‑de‑obra e suas competências, e levou‑o a concluir que «um conjunto de trabalhadores que executa de forma durável uma actividade comum pode corresponder a uma entidade económica» (42). Daí decorre que, para uma actividade deste tipo, «é forçoso admitir que essa entidade é susceptível de manter a sua identidade para além da sua transferência, quando o novo empresário não se limita a prosseguir a actividade em causa, mas também retoma uma parte essencial, em termos de número e de competências, dos efectivos que o seu predecessor afectava especialmente a essa missão» (43).

48.   Diversamente, se a actividade em causa não assenta essencialmente na mão‑de‑obra e suas competências, a existência de uma transferência de empresa está, em princípio, sujeita à conclusão de que houve uma transferência de activos entre as empresas (44).

49.   Resulta desta jurisprudência que, para determinar se houve uma transferência de empresa, há que qualificar previamente o tipo de actividade em causa. A segurança de um depósito sanitário do Bundeswehr (exército federal) foi qualificada de actividade que assenta essencialmente na mão‑de‑obra e suas competências (45). No caso vertente, como refere a Securicor nas suas observações escritas, ao invés de uma simples actividade de segurança, a actividade de controlo num aeroporto carece de equipamentos de controlo especializados e sofisticados. Todavia, contrariamente ao que a Securicor deixa entender, a obrigação de resultado imposta a uma empresa encarregada do controlo da segurança num aeroporto não parece pertinente para distinguir essa actividade de uma actividade de segurança, uma vez que não tem qualquer incidência na organização da entidade económica em causa.

50.   Embora a análise da importância respectiva a atribuir aos diferentes critérios da existência de uma transferência na acepção da Directiva 2001/23 caiba, em último lugar, ao tribunal de reenvio, parece resultar dos autos que a entidade económica cuja actividade consiste no controlo de bagagens e de passageiros num aeroporto é formada pelos activos específicos disponibilizados pelo mandante e por pessoal qualificado.

51.   Ora, uma vez que, em qualquer dos casos, os equipamentos de controlo especializados são postos à disposição dos sucessivos prestadores de serviços pelo mandante, importa verificar se a retoma, entre a Securicor e a Kötter, dos efectivos afectos à execução do contrato é significativa, em termos de número e de competências (46).

52.   À primeira vista, afigura‑se paradoxal fazer depender a conclusão de que a transferência de empresa resulta do facto de um empregador retomar a outro o pessoal e respectivas competências, quando, em princípio, é essa consequência que decorre do reconhecimento de que houve uma transferência de empresa (47). Todavia, este critério integra‑se numa análise global das circunstâncias, só adquirindo importância se não houver uma transferência de activos, quando é necessário identificar outros elementos susceptíveis de constituir uma entidade transferível. Além disso, o referido critério não está estritamente ligado à transferência do pessoal, enquanto tal, mas sobretudo à transferência das suas competências específicas, encaradas como uma entidade organizada. O objectivo é impedir que as partes na transferência sejam livres de afastar a aplicação da Directiva 2001/23.

53.   Por outro lado, embora a qualificação de transferência de empresa na acepção do artigo 1.° da Directiva 2001/23 tenha como consequência que o empregador cessionário da entidade transferida é obrigado a manter os contratos de trabalho (48), nada se opõe a que o mesmo proceda a reestruturações, e eventualmente a despedimentos, na condição de estes últimos não estarem directamente relacionados com a transferência (49).

54.   Por último, é irrelevante o argumento da República Federal da Alemanha segundo o qual a manutenção dos contratos de trabalho teria consequências especiais na Alemanha, dada a rigidez do direito de trabalho aí em vigor. Com efeito, resulta de jurisprudência constante que um Estado‑Membro não pode invocar o seu direito nacional para afastar a aplicação de uma directiva comunitária.

55.   É dado assente que a Kötter retomou 167 dos 295 efectivos anteriormente empregados pela Securicor e afectos a actividades de controlo de passageiros e de bagagens no Aeroporto de Düsseldorf, por conta da República Federal da Alemanha. Estes trabalhadores receberam uma formação específica para poderem efectuar as tarefas de controlo que lhe estavam confiadas.

56.   Assim, não se pode excluir que a Kötter retomou o essencial dos efectivos do seu predecessor. Sendo este o caso, e sem prejuízo da apreciação de todas as circunstâncias pertinentes pelo tribunal nacional, parecem estar presentes diversos elementos que permitem concluir que houve uma transferência de empresa, da Securicor para a Kötter, na acepção da Directiva 2001/23.

V –    Conclusão

57.   Consequentemente, proponho que o Tribunal de Justiça responda da seguinte forma às questões submetidas pelo Arbeitsgericht Düsseldorf:

«Em caso de nova adjudicação de um contrato, não havendo transferência de elementos do activo de um prestador para outro, quando o adjudicante põe à disposição dos sucessivos adjudicatários os elementos de exploração necessários à execução do contrato, a existência de uma transferência de empresa de um prestador para outro, na acepção do artigo 1.° da Directiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de Março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos, não está sujeita à condição de esses meios serem cedidos para efeitos de uma gestão económica própria pelo prestador, devendo ser apreciada com base noutros elementos que não essa disponibilização, directamente imputáveis ao prestador de serviços, como a transferência do essencial dos efectivos e respectivas competências.»


1 – Língua original: português.


2 – Esta directiva codifica as modificações introduzidas na Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos ou de partes de empresas ou de estabelecimentos (JO L 61, p. 26; EE 05 F2 p. 122), pela Directiva 98/50/CE do Conselho, de 29 de Junho de 1998 (JO L 201, p. 88).


3 – Ao longo do texto, é feita referência, indistintamente, a «mandante» e a «adjudicante».


4 – Esta lei é citada na versão da promulgação de 27 de Março de 1999 (BGBl. 1999 I, p. 550), modificada em último lugar pela Lei de 6 de Abril de 2004 (BGBl. 2004 I, p. 550).


5 –      Esta definição mantém‑se inalterada relativamente à sua versão resultante da Directiva 98/50.


6 – Acórdão de 20 de Novembro de 2003 (C‑340/01, Colect., p. I‑14023).


7 – Acórdão da Oitava Secção do Bundesarbeitsgericht de 11 de Dezembro de 1997 (8 AZR 426/94, BAGE 87, 296); despacho de 22 de Janeiro de 1998 (8 ABR 83/96), ainda não publicado; e acórdão de 25 de Maio de 2000 (8 AZR 337/99), ainda não publicado, reproduzidos em anexo nas observações do Governo alemão.


8 – Acórdão de 12 de Novembro de 1992 (C‑209/91, Colect., p. I‑5755, n.° 17).


9 – Acórdão de 14 de Abril de 1994 (C‑392/92, Colect., p. I‑1311, n.os 12 a 14). Todavia, posteriormente a este acórdão, fortemente criticado pela doutrina, a Comissão havia sugerido, numa proposta de revisão da Directiva 77/187, que se distinguisse a transferência de uma entidade, por um lado, da transferência de apenas uma actividade de uma entidade, por outro, não estando esta última abrangida pelo âmbito de aplicação da directiva. Perante a oposição do Parlamento Europeu das Comunidades Europeias, a Comissão alterou a sua proposta inicial e suprimiu esta cláusula do texto. Contudo, o acórdão de 11 de Março de 1997, Süzen (C‑13/95, Colect., p. I‑1259), retoma a distinção entre uma entidade e uma «simples actividade».


10 – Acórdão já referido.


11 – Acórdão de 10 de Dezembro de 1998 (C‑173/96 e C‑247/96, Colect., p. I‑8237).


12 – Acórdão de 10 de Dezembro de 1998 (C‑127/96, C‑229/96 e C‑74/97, Colect., p. I‑8179).


13 – Acórdão de 2 de Dezembro de 1999 (C‑234/98, Colect., p. I‑ 8643).


14 – Acórdão de 25 de Janeiro de 2001 (C‑172/99, Colect., p. I‑745).


15 – Acórdão de 24 de Janeiro de 2002 (C‑51/00, Colect., p. I‑969).


16 – Por exemplo, segundo o advogado‑geral L. A. Geelhoed, as circunstâncias factuais no processo Abler e o., já referido, deviam ser analisadas como «perda do contrato por parte do prestador de serviços inicial e celebração de um contrato por parte do novo prestador de serviços» (n.° 54), e não como transferência de empresa. No n.° 38 das suas conclusões no processo Temco, já referido, o advogado‑geral L. A. Geelhoed insiste também na importância do contexto económico e afirma que «[s]e se admitir, com demasiada flexibilidade, que existe transferência de empresa na acepção da directiva, corre‑se o risco de perturbar a dinâmica do mercado».


17 – Apenas a segunda transferência está abrangida pelo âmbito de aplicação da Directiva 2001/23. Uma transferência de actividade é um dos elementos constitutivos da transferência de empresa. Para que uma transferência de empresa tenha lugar, importa, além disso, que seja igualmente transferida uma entidade económica estável, suporte de actividade. Quanto ao conceito de entidade económica, v., nomeadamente, os n.os 13 e 14 das conclusões do advogado‑geral W. Van Gerven no processo Schmidt, já referido; Pochet, P., L’apport de l’arrêt Schmidt à la définition du transfert d’une entité économique, Droit social, 1994, p. 931; e O’Leary, S., Employment Law at the European Court of Justice, Oxford, 2002, p. 259.


18 – V., em último lugar, acórdão de 26 de Maio de 2005, Celtec (C‑478/03, n.os 26 e 27, ainda não publicado na Colectânea). V. também Mertens de Wilmars, J., e Nyssens, H., «Intégration européenne et correction des mécanismes du marché: un modèle économique et social européen», Philosophie du droit et droit économique:Mélanges en l’honneur de Gérard Farjat, 1999, p. 557.


19 – A Directiva 2001/23 tem em conta, de uma forma mais geral, exigências económicas, dado que, no seu artigo 5.°, n.° 1, prevê que não é aplicável quando o cedente for objecto de um processo de falência ou de um processo de insolvência. Quanto ao equilíbrio entre os dois objectivos prosseguidos pela directiva, Kenner, J., EU Employment Law, From Rome to Amsterdam and beyond, Oxford, 2003, p. 352.


20 – A jurisprudência é constante: acórdãos Süzen, já referido, n.° 13; de 19 de Setembro de 1995, Rygaard (C‑48/94, Colect., p. I‑2745, n.° 20); Liikenne, já referido, n.° 31; e Abler e o., já referido, n.° 30.


21 – Acórdão de 19 de Maio de 1992 (C‑29/91, Colect., p. I‑3189).


22 – N.° 26 do acórdão. No n.° 13 das suas conclusões, o advogado‑geral W. Van Gerven afirmava: «[v]erificou‑se igualmente de facto uma transferência dos activos materiais na medida em que o edifício arrendado à Sophie Redmond pela comuna de Groningen foi arrendado à Sigma a partir de 1 de Janeiro de 1991».


23 – V., igualmente, acórdão Abler e o., já referido, n.° 42, e acórdão do Tribunal EFTA de 10 de Dezembro de 2004, Rasmussen (E‑2/04, ainda não publicado).


24 – Acórdão já referido, n.° 15.


25 – Acórdão já referido.


26 – Ibidem, n.° 6.


27 – Ibidem, ponto 1 do dispositivo.


28 – Conclusões apresentadas pelo advogado‑geral L. A. Geelhoed no processo Temco, já referido, n.° 25. Note‑se que, neste processo, o Tribunal de Justiça concluiu que tinha havido uma transferência de empresa de um prestador para outro, em razão de uma retoma, por parte do segundo prestador, do essencial dos efectivos.


29 – Acórdão Abler e o., já referido, n.° 36.


30 – Note‑se que, no n.° 77 das suas conclusões, o advogado‑geral L. A. Geelhoed sugeria uma solução oposta: «Dado que o adjudicante é proprietário dos meios de produção, uma vez expirado o contrato, o adjudicante recuperará a plena disposição destes meios de produção. No caso em apreço, não se verifica pois a transferência destes elementos.»


31 – Esta conclusão poderia explicar‑se como sendo o resultado da vontade de o Tribunal de Justiça impedir que as partes afastem contratualmente a aplicação da Directiva 77/187.


32 – V. acórdão Süzen, já referido, n.° 16: «A simples perda de um contrato de prestação de serviços em favor de um concorrente não pode, portanto, por si só, revelar a existência de uma transferência na acepção da directiva. Nesta situação, a empresa anteriormente titular do contrato, mesmo que perca um cliente, nem por isso deixa de continuar a existir plenamente, sem que se possa considerar que um dos seus estabelecimentos, ou partes de estabelecimento, foi cedido ao novo adjudicatário do contrato.»


33 – Sobre os perigos desta confusão, v., por exemplo, crónica de Déprez, J., RJS, 1995, n.° 5, p. 315; ou ainda Bailly, P., Le flou de l’article L. 122‑12, alinéa 2, du Code du travail, Droit social, 2004, p. 366.


34 – More, G., «The Acquired Rights Directive: Frustrating or Facilitating Labour Market Flexibility?», New Legal Dynamics of European Union, 1995, p. 129.


35 – A doutrina alemã referiu, pelo contrário, um risco de contradição entre o acórdão Abler e o. e o critério da gestão económica própria: Adam, R., Betriebsübergang – Der Übergang materieller Betriebsmittel als Tatbestandsmerkmal des 613a BGB, Monatsschrift für Deutsches Recht, 2004, n.° 16, p. 909; Willemsen, H. J., Annuss, G., Auftragsnachfolge – jetzt doch ein Betriebsübergang?, Der Betrieb, 2004, n.° 3, p. 134.


36 – Esta distinção corresponde à que foi acima exposta a propósito da transferência de actividade e da transferência de empresa.


37 – V., igualmente, acórdão Hidalgo e o., já referido, n.° 27: «A presença de uma entidade suficientemente estruturada e autónoma no seio da empresa titular do contrato não é, em princípio, afectada pela circunstância, aliás frequente, de esta empresa estar sujeita ao respeito de obrigações precisas que lhe são impostas pelo organismo adjudicante. Com efeito, embora possa suceder que a influência exercida por este último no serviço fornecido pelo [prestador] seja alargada, este tem normalmente uma certa liberdade, ainda que reduzida, para organizar e executar o serviço em questão, sem que a sua tarefa possa ser interpretada como uma mera colocação do seu pessoal à disposição do organismo adjudicante.»


38 – Acórdão de 18 de Março de 1986, Spijkers (24/85, Colect., p. 1119, n.° 13).


39 – É este o perigo que encerra o acórdão Abler e o., já referido, na medida em que pode ser interpretado no sentido de que a existência de uma transferência de empresa assenta na simples circunstância de o mandante ter posto elementos de exploração à disposição de um prestador de serviços. Contudo, não está excluído que activos disponibilizados possam ser transferidos de um prestador para outro, nomeadamente para evitar que os co‑contratantes procurem afastar a aplicação da Directiva 2001/23 à sua operação.


40 – Acórdão já referido, n.° 13: «[…] convirá tomar em consideração o conjunto de circunstâncias de facto que caracterizam a operação em causa, entre as quais figura, designadamente, o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata, a transferência ou não dos elementos corpóreos, tais como os edifícios e os bens móveis, o valor dos elementos incorpóreos no momento da transferência, o emprego ou não por parte do novo empresário do essencial dos efectivos, a transferência ou não da clientela, bem como o grau de similitude das actividades exercidas antes e depois da transferência e da duração de uma eventual suspensão destas actividades […]».


41 – Acórdãos, já referidos, Süzen, n.° 18; Hernandez Vidal e o., n.° 31; Hidalgo e o., n.° 31; Liikenne, n.° 35; e Abler e o., n.° 35.


42 – Acórdão Süzen, já referido, n.° 21. A introdução desta distinção pelo Tribunal de Justiça destina‑se a impedir que a protecção concedida aos trabalhadores seja menor se estiverem empregados num sector em que a mão‑de‑obra constitui o elemento essencial.


43 – Ibidem.


44 – A título de exemplo, o Tribunal de Justiça declarou que «o transporte em autocarro não pode ser considerado uma actividade que assenta essencialmente na mão‑de‑obra na medida em que exige material e instalações importantes» (acórdão Liikenne, já referido, n.° 39). Consequentemente, «a ausência de transferência a um nível significativo do antigo para o novo titular do contrato de tais elementos, indispensáveis ao bom funcionamento da entidade, deve levar a que se considere que esta última não conserva a sua entidade» (acórdão Liikenne, já referido, n.° 42). Assim, não houve transferência de empresa entre duas sociedades encarregadas do transporte em autocarro, uma vez que a segunda não tinha retomado os veículos da primeira.


45 – Acórdão Hidalgo e o., já referido, n.° 26.


46 – Este critério decorre do acórdão Süzen, já referido, e é retomado no acórdão Temco, já referido, n.° 33.


47 – V., por exemplo, n.° 80 das conclusões do advogado‑geral G. Cosmas no processo Hernandez Vidal e o., já referido. A doutrina suscita também este paradoxo: Davies, Taken to the cleaners? Contracting Out of Services Yet Again 1997, 26 ILJ 193; Engels, C., Salas, L., «Cause and consequence, what’s the difference in respect of the EC Transfer Directive?», Labour Law and industrialrelations at the turn of the century, 1998, p. 275; e Garde, A., Recent Developments in the law relating to transfers of undertakings, 39 CMLRev., 2002, p. 523. No seu comentário ao acórdão Abler e o., já referido, Gomes, J., in Revista de direito e de estudos sociais, 2004, p. 213, contrapõe a esta linha de raciocínio um argumento convincente. Sublinha que as empresas partes na operação têm necessariamente o poder de decidir quais os elementos do activo que são objecto da sua transacção.


48 – Artigo 3.° da Directiva 2001/23.


49 – Artigo 4.° da Directiva 2001/23. V. também Hunt, J., The Court of Justice as a policy actor, the case of the Acquired Rights Directive, 1998, Legal Studies, p. 336.