Processos apensos C‑182/03 e C‑217/03

Reino da Bélgica

e

Forum 187 ASBL

contra

Comissão das Comunidades Europeias

«Auxílio de Estado – Regime de auxílios existente – Regime fiscal dos centros de coordenação estabelecidos na Bélgica – Recurso interposto por uma associação – Admissibilidade – Decisão da Comissão segundo a qual esse regime não constitui um auxílio – Alteração da apreciação da Comissão – Artigo 87.°, n.° 1, CE – Protecção da confiança legítima – Princípio geral da igualdade»

Conclusões do advogado‑geral P. Léger apresentadas em 9 de Fevereiro de 2006 

Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 22 de Junho de 2006 

Sumário do acórdão

1.     Recurso de anulação – Pessoas singulares ou colectivas – Actos que lhes dizem directa e individualmente respeito

(Artigo 230.° CE)

2.     Recurso de anulação – Pessoas singulares ou colectivas – Actos que lhes dizem directa e individualmente respeito

(Artigo 230.° CE)

3.     Auxílios concedidos pelos Estados – Auxílios existentes

[Artigos 87.° CE e 88.° CE; Regulamento n.° 659/1999, Artigo 1.°, alínea b), v)]

4.     Auxílios concedidos pelos Estados – Exame pela Comissão

(Artigo 87.° CE)

5.     Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito

(Artigo 87.°, n.° 1, CE)

6.     Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito

(Artigo 87.°, n.° 1, CE)

7.     Actos das instituições – Fundamentação – Dever – Âmbito

(Artigo 253.° CE)

8.     Direito comunitário – Princípios – Protecção da confiança legítima – Condições

9.     Auxílios concedidos pelos Estados – Decisão da Comissão que impõe a supressão de um regime fiscal concedido por acreditação

1.     Nos termos do artigo 230.° CE, uma pessoa singular ou colectiva só pode interpor recurso de uma decisão dirigida a outra pessoa se essa decisão lhe disser directa e individualmente respeito.

No que respeita a esta segunda condição, o facto de uma disposição controvertida ter, pela sua natureza e pelo seu alcance, natureza geral, uma vez que se aplica à generalidade dos operadores económicos interessados, não exclui, porém, a possibilidade de afectar individualmente alguns deles.

Uma pessoa singular ou colectiva só pode pretender ser individualmente afectada se o preceito em causa a afectar devido a certas qualidades que lhe são próprias ou a uma situação de facto que a caracteriza em relação a qualquer outra pessoa.

A este respeito, quando o acto impugnado afecta um grupo de pessoas que estavam identificadas ou eram identificáveis no momento em que o acto foi adoptado, em função de critérios próprios aos membros do grupo, esse acto pode dizer individualmente respeito a essas pessoas na medida em que fazem parte de um círculo restrito de operadores económicos. É o que sucede com empresas relativamente às quais uma decisão em matéria de auxílios de Estado obsta a que o benefício de medidas fiscais nacionais derrogatórias se prolongue até ao termo previsto na legislação nacional ou a que lhes seja concedida a renovação desse benefício, que requereram e a que teriam direito.

(cf. n.os 55, 58‑64)

2.     Uma associação encarregada da defesa dos interesses colectivos de empresas só pode, em princípio, interpor recurso de anulação de uma decisão final da Comissão em matéria de auxílios de Estado se essas empresas ou algumas delas tiverem legitimidade para agir a título individual ou se puderem fazer valer um interesse próprio.

(cf. n.° 56)

3.     O Regulamento n.° 659/1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.°], que codifica o exercício, pela Comissão, dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 88.° CE, não define a abrangência do conceito de «evolução do mercado comum», que consta no seu artigo 1.°, alínea b), v), que especifica que uma medida que não constituía um auxílio no momento da sua entrada em vigor deve, não obstante, ser considerada existente quando se tenha transformado «em auxílio devido à evolução do mercado comum». Este conceito, que pode ser entendido como uma alteração do contexto económico e jurídico no sector afectado pela medida em causa, não abrange a hipótese de a Comissão mudar a sua apreciação com base unicamente numa aplicação mais rigorosa das regras do Tratado em matéria de auxílios de Estado.

No entanto, há que lembrar que o regulamento constitui um acto de direito derivado adoptado para aplicação dos artigos 87.° CE e 88.° CE, que não pode reduzir o alcance dos referidos artigos, isto na medida em que a Comissão obtém os seus poderes directamente a partir deles. Efectivamente, o artigo 88.°, n.° 1, CE confia à Comissão a missão de proceder ao exame permanente dos regimes de auxílios existentes nos Estados e de propor a estes últimos as medidas adequadas exigidas pelo desenvolvimento progressivo ou pelo funcionamento do mercado comum. O n.° 2 desse mesmo artigo permite à Comissão, em caso de não consecução, impor ao Estado‑Membro em causa alterações ao auxílio ou a supressão do mesmo, num determinado prazo.

Daqui resulta que, ao decidir proceder ao reexame do regime fiscal aplicado a determinadas empresas num Estado‑Membro que, embora tendo sido objecto de decisões anteriores que consideraram não representar qualquer auxílio, foi declarado prejudicial para o mercado comum por um grupo de trabalho do Conselho e ao aplicar‑lhe o procedimento de controlo de um auxílio existente, na sequência do qual concluiu que esse regime passava a constituir um auxílio de Estado incompatível, a Comissão desempenhou o papel que lhe cabe por força do artigo 88.° CE. Consequentemente, esta decisão tem como base legal os artigos 87.° CE e 88.° CE.

Tendo, portanto, sido respeitado o princípio da legalidade, a decisão constitui um acto certo cuja aplicação era previsível para os destinatários. Logo, esta decisão não é contrária ao princípio da segurança jurídica.

(cf. n.os 70‑76)

4.     No caso de um programa de auxílios, a Comissão pode limitar‑se a estudar as características do programa em questão, para apreciar se o mesmo assegura uma vantagem significativa aos beneficiários em relação aos seus concorrentes. Também não é obrigada a examinar cada caso particular a que o regime se aplique.

(cf. n.° 82)

5.     O conceito de auxílio pode abarcar, não apenas prestações positivas, tais como subsídios, empréstimos ou participações no capital de empresas, mas também intervenções que, de formas diversas, aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa e que, dessa forma, não sendo subsídios na acepção estrita da palavra, têm a mesma natureza e efeitos idênticos.

Constitui um auxílio de Estado uma medida através da qual as autoridades públicas atribuem a certas empresas uma isenção fiscal que, embora não implique transferência de recursos do Estado, coloca os beneficiários numa situação financeira mais favorável que a dos outros contribuintes.

(cf. n.os 86, 87)

6.     O artigo 87.°, n.° 1, CE impõe que se determine se, no quadro de um dado regime jurídico, uma medida nacional é susceptível de favorecer «certas empresas ou certas produções» relativamente a outras que se encontrem, na perspectiva do objectivo prosseguido pelo referido regime, numa situação factual e jurídica comparável. Em caso afirmativo, a medida preenche a condição de selectividade que é constitutiva do conceito de auxílio de Estado previsto nessa disposição.

(cf. n.° 119)

7.     Embora o dever de fundamentação de um acto comunitário previsto no artigo 253.° CE deva ser adaptado à natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do acto, de forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao órgão jurisdicional competente exercer o seu controlo, não se pode obrigar a Comissão a indicar, numa decisão que declara incompatível com o mercado comum um regime de auxílios, as razões pelas quais fez uma apreciação diferente do mesmo regime em decisões anteriores. Com efeito, o conceito de auxílio de Estado corresponde a uma situação objectiva apreciada na data em que a Comissão adopta a sua decisão.

(cf. n.° 137)

8.     O direito de fazer valer o princípio da protecção da confiança legítima estende‑se a todo o particular em cuja esfera jurídica uma instituição comunitária fez nascer esperanças fundadas. Além disso, não se pode invocar uma violação deste princípio na falta de garantias precisas que lhe tenham sido fornecidas pela Administração. Do mesmo modo, quando um operador económico prudente e avisado estiver em condições de prever a adopção de uma medida comunitária susceptível de afectar os seus interesses, não pode, quando essa medida for tomada, invocar esse princípio.

Por outro lado, mesmo que a Comunidade tenha previamente criado uma situação susceptível de originar uma confiança legítima, um interesse público peremptório pode opor‑se à adopção de medidas transitórias para situações surgidas antes da entrada em vigor da nova regulamentação, mas cuja evolução ainda não terminou. No entanto, na ausência de um interesse desse tipo, a inexistência de medidas transitórias destinadas a proteger a confiança que os operadores podiam legitimamente ter na manutenção de uma regulamentação comunitária, pode constituir uma violação de uma regra superior de direito.

(cf. n.os 147‑149)

9.     Viola simultaneamente o princípio da confiança legítima e o da igualdade uma decisão da Comissão que, reconsiderando apreciações anteriores, impõe a supressão, por se tratar de um auxílio de Estado incompatível com o mercado comum, de um regime fiscal especial sem prever medidas transitórias a favor dos operadores cuja acreditação, renovável sem dificuldades, necessária para beneficiar desse regime caduca simultaneamente ou a breve prazo após a data da sua notificação, embora não se opondo a que as acreditações em curso na referida data continuem a produzir os seus efeitos durante vários anos, dado que os operadores em questão, que não podem adaptar‑se à alteração do regime em causa num prazo curto podiam, em todo o caso, esperar que uma decisão da Comissão, reconsiderando a sua apreciação anterior, lhes concedesse o tempo necessário para tomar efectivamente em conta esta mudança de apreciação e que nenhum interesse público peremptório se opõe a que lhes seja concedido esse tempo necessário.

(cf. n.os 155‑167, 172‑174)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

22 de Junho de 2006 (*)

«Auxílio de Estado – Regime de auxílios existente – Regime fiscal dos centros de coordenação estabelecidos na Bélgica – Recurso interposto por uma associação – Admissibilidade – Decisão da Comissão segundo a qual esse regime não constitui um auxílio – Alteração da apreciação da Comissão – Artigo 87.°, n.° 1, CE – Protecção da confiança legítima – Princípio geral da igualdade»

Nos processos apensos C‑182/03 e C‑217/03,

que têm por objecto recursos de anulação nos termos do artigo 230.° CE, entrados em 25 e 28 de Abril de 2003,

Reino da Bélgica, representado inicialmente por A. Snoecx e, em seguida, por E. Dominkovits, na qualidade de agentes, assistidas por B. van de Walle de Ghelcke, J. Wouters e P. Kelley, avocats,

recorrente no processo C‑182/03,

Forum 187 ASBL, com sede em Bruxelas (Bélgica), representado por A. Sutton e J. Killick, barristers,

recorrente no processo C‑217/03,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por G. Rozet, R. Lyal e V. Di Bucci, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, J. Makarczyk, R. Schintgen, P. Kūris (relator) e J. Klučka, juízes,

advogado‑geral: P. Léger,

secretário: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 14 de Setembro de 2005,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 9 de Fevereiro de 2006,

profere o presente

Acórdão

1       Com a sua petição, o Reino da Bélgica pede a anulação da Decisão 2003/757/CE da Comissão, de 17 de Fevereiro de 2003, relativa ao regime de auxílios criado pela Bélgica a favor dos centros de coordenação estabelecidos neste país (JO L 282, p. 25, a seguir «decisão impugnada»), na medida em que não o autoriza a conceder, ainda que temporariamente, a renovação do estatuto de centro de coordenação aos centros de coordenação que beneficiavam desse regime em 31 de Dezembro de 2000.

2       O Forum 187 ASBL (a seguir «Forum 187») pede a anulação da decisão impugnada.

 Quadro jurídico

 Controlo dos regimes de auxílios existentes no direito comunitário

3       O artigo 88.°, n.os 1 e 2, primeiro parágrafo, CE prevê:

«1.      A Comissão procederá, em cooperação com os Estados‑Membros, ao exame permanente dos regimes de auxílios existentes nesses Estados. A Comissão proporá também aos Estados‑Membros as medidas adequadas, que sejam exigidas pelo desenvolvimento progressivo ou pelo funcionamento do mercado comum.

2.      Se a Comissão, depois de ter notificado os interessados para apresentarem as suas observações, verificar que um auxílio concedido por um Estado ou proveniente de recursos estatais não é compatível com o mercado comum nos termos do artigo 87.°, ou que esse auxílio está a ser aplicado de forma abusiva, decidirá que o Estado em causa deve suprimir ou modificar esse auxílio no prazo que ela fixar.»

4       Nos termos do artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho, de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.°] do Tratado CE (JO L 83, p. 1, a seguir «regulamento»):

«Quando a Comissão considerar que um regime de auxílio existente não é ou deixou de ser compatível com o mercado comum, informará o Estado‑Membro em causa da sua conclusão preliminar e dar‑lhe‑á a possibilidade de apresentar as suas observações no prazo de um mês. A Comissão pode prorrogar este prazo em casos devidamente justificados.»

 Regime fiscal belga dos centros de coordenação

5       O regime fiscal belga dos centros de coordenação, derrogatório do direito comum, rege‑se pelo Decreto real n.° 187, de 30 de Dezembro de 1982, relativo à criação dos centros de coordenação (Moniteur belge de 13 de Janeiro de 1983), por diversas vezes completado e alterado.

6       O benefício desse regime está subordinado à acreditação prévia e individual do centro por decreto real. Para obter esta acreditação, o centro deve fazer parte de um grupo com carácter multinacional, que disponha de capital e reservas cujo montante atinja ou exceda mil milhões de BEF e que realize um volume de negócios anual cujo montante consolidado atinja ou exceda dez mil milhões de BEF. Só são autorizadas certas actividades preparatórias, auxiliares ou de centralização e as empresas do sector financeiro não podem beneficiar deste regime. No mínimo, os centros devem empregar, na Bélgica, o equivalente a dez pessoas a tempo inteiro no fim dos dois primeiros anos da sua actividade.

7       A acreditação concedida ao centro é válida por dez anos e é renovável por igual período.

8       O regime fiscal de que beneficiam os centros de coordenação acreditados derroga o regime fiscal comum em vários aspectos.

9       Em primeiro lugar, o rendimento tributável dos centros é determinado por presunção, segundo o método dito «cost plus». Corresponde a uma percentagem do montante das despesas e dos custos de funcionamento, de que se excluem as despesas com pessoal, os encargos financeiros e o imposto sobre as sociedades.

10     Em segundo lugar, os centros estão isentos da contribuição predial relativa aos imóveis que utilizem para o exercício da sua actividade profissional.

11     Em terceiro lugar, o imposto de registo de 0,5% não é devido sobre as entradas de capital de que um centro beneficie nem sobre os aumentos do respectivo capital estatutário.

12     Em quarto lugar, estão isentos do imposto sobre os rendimentos de capitais, por um lado, os dividendos, os juros e as retribuições distribuídos pelos centros, salvo certas excepções, e, por outro, os rendimentos auferidos pelos centros sobre os respectivos depósitos em dinheiro.

13     Em quinto lugar, os centros pagam um imposto anual fixado em 400 000 BEF por membro do pessoal empregado a tempo inteiro, mas que não pode exceder 4 000 000 BEF por centro.

 Trabalhos do Conselho da União Europeia em matéria de concorrência fiscal com efeitos prejudiciais

14     No quadro de uma reflexão global sobre a concorrência fiscal com efeitos prejudiciais, o Conselho adoptou, em 1 de Dezembro de 1997, um código de conduta no domínio da fiscalidade das empresas (JO 1998, C 2, p. 2). Neste contexto, os Estados‑Membros comprometeram‑se a desmantelar progressivamente certas medidas fiscais qualificadas de prejudiciais, tendo a Comissão exprimido a sua intenção de examinar ou de reexaminar, à luz das regras relativas aos auxílios de Estado, os regimes fiscais em vigor nos Estados‑Membros.

15     A regulamentação belga relativa ao regime fiscal dos centros de coordenação figurava entre as medidas fiscais nacionais abrangidas por estas diferentes iniciativas.

 Factos anteriores à decisão impugnada

16     O regime fiscal dos centros de coordenação tinha sido examinado pela Comissão por ocasião da sua introdução. Em especial, em decisões comunicadas sob a forma de ofícios, em 16 de Maio de 1984 e 9 de Março de 1987 (a seguir «decisões de 1984 e de 1987»), a Comissão tinha considerado, essencialmente, que esse regime, assente num sistema de determinação por presunção dos rendimentos dos centros de coordenação, não continha elementos de auxílio.

17     Esta apreciação foi confirmada na resposta dada em nome da Comissão por L. Brittan, comissário para a Concorrência, em 24 de Setembro de 1990, à pergunta escrita n.° 1735/90 do deputado europeu Gijs de Vries (JO 1991, C 63, p. 37).

18     Após ter adoptado, em 11 de Novembro de 1998, uma Comunicação sobre a aplicação das regras relativas aos auxílios estatais às medidas que respeitam à fiscalidade directa das empresas (JO C 384, p. 3), a Comissão procedeu a um exame geral da legislação fiscal dos Estados‑Membros, na óptica das regras referentes aos auxílios de Estado.

19     Nesse quadro, em Fevereiro de 1999, a Comissão pediu às autoridades belgas algumas informações sobre, nomeadamente, o regime dos centros de coordenação, a que estas responderam em Março de 1999.

20     Em Julho de 2000, os serviços da Comissão informaram as referidas autoridades de que esse regime parecia constituir um auxílio de Estado. Com vista a iniciar o processo de cooperação, em conformidade com o disposto no artigo 17.°, n.° 2, do regulamento, os serviços da Comissão convidaram as autoridades belgas a apresentar as suas observações no prazo de um mês.

21     Na sua sessão de 26 e 27 de Novembro de 2000, o Conselho «Ecofin» recordou que, em conformidade com a sua resolução de 1 de Dezembro de 1997, todas as medidas prejudiciais em matéria de fiscalidade directa das empresas deviam ser desmanteladas até 1 de Janeiro de 2003. O Conselho adoptou a proposta da Presidência da União Europeia, que previa que, para as empresas que beneficiassem de um regime fiscal prejudicial em 31 de Dezembro de 2000, os efeitos desse regime deviam cessar, o mais tardar, em 31 de Dezembro de 2005, quer se tratasse de um regime concedido por um período determinado ou não. Previu igualmente que podia, caso a caso, a fim de ter em conta circunstâncias especiais, decidir, após relatório do grupo «código de conduta», prorrogar os efeitos de alguns regimes fiscais prejudiciais além de 31 de Dezembro de 2005.

22     Em 11 de Julho de 2001, a Comissão adoptou quatro propostas de medidas adequadas, com base no disposto no artigo 88.°, n.° 1, CE, nomeadamente no que respeita ao regime dos centros de coordenação. Propôs às autoridades belgas que aceitassem introduzir um certo número de alterações a esse regime, prevendo, no entanto, a título transitório, que os centros acreditados antes da data de aceitação dessas medidas pudessem continuar a beneficiar do regime anterior até 31 de Dezembro de 2005.

23     Como as autoridades belgas não aceitaram as medidas adequadas propostas, a Comissão deu início ao procedimento formal de investigação através de uma decisão notificada por ofício de 27 de Fevereiro de 2002 (JO C 147, p. 2), em conformidade com o disposto no artigo 19.°, n.° 2, do regulamento. Convidou, nomeadamente, o Reino da Bélgica a apresentar as suas observações e a fornecer qualquer informação útil para a avaliação da medida em causa. Convidou ainda esse Estado‑Membro e os terceiros interessados a apresentarem observações e a fornecerem qualquer elemento útil para determinar se existia, por parte dos beneficiários do regime visado, uma confiança legítima que impusesse a instituição de medidas transitórias.

24     Após ter sido prorrogado o prazo inicial de um mês, as autoridades belgas, por ofício de 12 de Abril de 2002, transmitiram as suas observações à Comissão.

25     Por ofício de 16 de Maio de 2002, as referidas autoridades notificaram o anteprojecto de lei destinado a alterar o Decreto real n.° 187. Esse anteprojecto foi registado pela Comissão como um auxílio novo, com a referência N351/2002.

26     Na sequência de várias reuniões, a Comissão enviou ao Reino da Bélgica um pedido de informações complementares, em Julho de 2002, respeitante simultaneamente ao regime existente e ao projecto notificado, pedido a que as autoridades belgas responderam por ofício de 30 de Agosto de 2002. No procedimento formal de investigação da medida em causa, participaram também terceiros interessados.

27     Em 21 de Janeiro de 2003, o Conselho «Ecofin» pronunciou‑se favoravelmente à prorrogação dos efeitos de alguns regimes fiscais prejudiciais para além de 2005. Previu, no que se refere ao regime fiscal belga dos centros de coordenação, que os centros abrangidos por este regime em 31 de Dezembro de 2000 poderiam continuar a beneficiar do mesmo até 31 de Dezembro de 2010.

 Decisão impugnada

28     Em 17 de Fevereiro de 2003, a Comissão adoptou a decisão impugnada, que foi notificada no próprio dia ao Reino da Bélgica. Tendo verificado que a formulação do artigo 2.° do dispositivo da referida decisão podia parecer contraditória com as conclusões a que tinha chegado nos n.os 122 e 123 dos respectivos fundamentos, a Comissão decidiu, em 23 de Abril de 2003, alterar o artigo 2.° através de um corrigendum. Essa rectificação foi notificada ao referido Estado‑Membro em 25 de Abril de 2003.

29     Na decisão impugnada, a Comissão justificou, a título liminar, o facto de ter qualificado de auxílio existente o regime dos centros de coordenação, bem como a base legal em que assenta o processo que seguiu. Nessa decisão, explica que o artigo 1.°, alínea b), do regulamento podia, no caso em apreço, servir de base legal e que, a não ser assim, os artigos 87.° CE e 88.° CE se impunham como a verdadeira base legal em que assentava a acção da Comissão.

30     A Comissão ainda indicou na decisão impugnada que, embora esta deva ser considerada uma revogação ou uma alteração das decisões de 1984 e de 1987, preenche as condições a que está sujeito o direito de que goza a Comissão de revogar ou modificar qualquer acto favorável que enferme de ilegalidade.

31     Na decisão impugnada, a Comissão explicou por que considera que as várias medidas que constituem o regime fiscal dos centros de coordenação preenchem as condições do artigo 87.°, n.° 1, CE, sem poderem beneficiar de nenhuma das derrogações contempladas nos n.os 2 e 3 do mesmo artigo.

32     No tocante à confiança legítima invocada pelos centros de coordenação, a decisão impugnada especifica, nos seus fundamentos:

«(117) A Comissão reconhece a existência de confiança legítima na esfera dos beneficiários do auxílio. Essa confiança legítima justifica que a Comissão permita que os centros que disponham, em [3]1 de Dezembro de 2000, de uma aprovação em curso aproveitem as vantagens do regime até à extinção do respectivo período de aprovação a correr no momento da presente decisão e, o mais tardar, até 2010. Esta posição assenta nos elementos a seguir desenvolvidos.

(118)          [...] [as] aprovações [concedidas pela Administração Fiscal] incidem apenas sobre factos e não descrevem de forma alguma o regime que será aplicado. Não podem, portanto, conferir a garantia jurídica de que o regime será mantido, como existente à data da aprovação, nos dez anos futuros. [...]

(119)          [...] Mesmo não constituindo a aprovação uma garantia da perenidade do regime ou do seu carácter vantajoso, a Comissão reconhece que a criação do centro, os investimentos realizados e os compromissos assumidos foram decididos com a expectativa razoável e legítima de uma certa continuidade das condições económicas, incluindo o regime fiscal. Por esta razão, a Comissão decidiu conceder um período transitório que permite a extinção progressiva do regime de cost plus no que toca aos actuais beneficiários.

(120)          Dado que as aprovações não conferem qualquer direito à perenidade do regime nem ao carácter vantajoso das suas disposições, mesmo relativamente ao período de aprovação, a Comissão considera que não podem em caso algum conferir o direito à renovação do benefício do regime para além da data da extinção das aprovações em curso. O facto de as aprovações estarem expressamente limitadas a dez anos impede mesmo que possa existir confiança legítima nessa renovação automática, que equivaleria virtualmente a uma aprovação perpétua.»

33     Segundo as conclusões expostas nos n.os 121 a 123 dos fundamentos da decisão impugnada:

«(121) A Comissão considera que o regime fiscal aplicável aos centros de coordenação na Bélgica é incompatível com o mercado comum e que deve ser posto termo à incompatibilidade dos seus vários componentes, quer pela sua revogação quer pela sua modificação. A partir da data da notificação da presente decisão, o benefício desse regime ou dos respectivos componentes já não poderá ser reconhecido a novos beneficiários nem ser prorrogado pela renovação de aprovações em vigor. A Comissão regista o facto de os centros aprovados em 2001 já não beneficiarem do regime desde 31 de Dezembro de 2002.

(122)          No que se refere aos centros que beneficiam actualmente do regime, a Comissão reconhece que a decisão de 1984 que autoriza o Decreto real n.° 187, bem como a resposta dada a uma questão parlamentar pelo comissário para a concorrência criaram na sua esfera a confiança legítima de que esse regime não infringia as normas do Tratado relativas aos auxílios de Estado.

(123)          Além disso, em razão dos importantes investimentos que tenham podido ser realizados com essa base, o respeito da confiança legítima e da segurança jurídica dos beneficiários justifica a concessão de um prazo razoável para a extinção dos efeitos do regime no que toca aos centros de coordenação já aprovados. A Comissão considera que esse prazo razoável termina em 31 de Dezembro de 2010. Os centros cuja aprovação expire antes dessa data deixarão de poder beneficiar desse regime após a data em que expire a respectiva aprovação. Após a data da extinção da aprovação e, em todo o caso, após 31 de Dezembro de 2010, a concessão ou a manutenção das referidas vantagens fiscais será ilegal.»

34     Nos termos dos artigos 1.° e 2.° do dispositivo da decisão impugnada:

«Artigo 1.°

O regime fiscal actualmente em vigor na Bélgica a favor dos centros de coordenação aprovados com base no Decreto real n.° 187 constitui um regime de auxílios de Estado incompatível com o mercado comum.

Artigo 2.°

A Bélgica é obrigada a suprimir o regime de auxílios referido no artigo 1.° ou a alterá‑lo para o tornar compatível com o mercado comum.

A contar da data da notificação da presente decisão, o benefício desse regime ou dos respectivos componentes já não poderá ser reconhecido a novos beneficiários nem ser prorrogado através da renovação de aprovações em curso.

No que respeita aos centros já aprovados antes de 31 de Dezembro de 2000, os efeitos do regime podem ser mantidos até à extinção da respectiva aprovação individual em vigor à data da notificação da presente decisão e, o mais tardar, até 31 de Dezembro de 2010. Em conformidade com o disposto no segundo parágrafo, em caso de renovação da aprovação antes dessa data, o benefício do regime objecto da presente decisão já não poderá ser concedido, ainda que temporariamente.»

 Factos posteriores à decisão impugnada

35     As alterações ao Decreto real n.° 187, que as autoridades belgas notificaram à Comissão em 16 de Maio de 2002, foram aprovadas pelo parlamento belga em 24 de Dezembro de 2002 e publicadas no Moniteur belge no dia 31 de Dezembro seguinte.

36     Em 23 de Abril de 2003, a Comissão autorizou este novo regime na medida em que o mesmo prevê, nomeadamente, o princípio da acreditação prévia dos centros de coordenação por um período de dez anos e a determinação da matéria colectável com base na totalidade das despesas de funcionamento, com aplicação de uma taxa de margem adequada. Todavia, dado que este novo regime também previa que estes centros ficassem isentos de imposto sobre os rendimentos de capitais e do imposto sobre as entradas de capital e que não se tributassem os benefícios ditos «anormais e sem contrapartida» concedidos a estes centros, a Comissão deu início ao procedimento formal de investigação no que se refere a estas três medidas.

37     Com a sua Decisão 2005/378/CE, de 8 de Setembro de 2004, relativa ao regime de auxílio que a Bélgica tenciona executar a favor dos centros de coordenação (JO L 125, p. 10), a Comissão considerou que, tendo em conta os compromissos assumidos pelo Reino da Bélgica, de suprimir as isenções em causa, substituindo‑as por medidas de isenção ou de redução aplicáveis a todas as empresas estabelecidas no seu território, e de tributar a totalidade dos benefícios «anormais e sem contrapartida» recebidos pelos centros de coordenação, as medidas constitutivas do novo regime fiscal dos centros de coordenação não constituíam auxílios abrangidos pelo artigo 87.°, n.° 1, CE.

38     Na audiência de 14 de Setembro de 2005, o representante do Reino da Bélgica confirmou a informação dada à Comissão por ofício de 28 de Fevereiro de 2005, segundo a qual este novo regime tinha sido abandonado.

39     Por outro lado, por ofício de 20 de Março de 2003, o Ministro das Finanças belga informou a Comissão, nos termos do artigo 88.°, n.° 3, CE, da sua intenção de conceder, até 31 de Dezembro de 2005, o benefício de determinadas medidas fiscais às empresas que estavam sujeitas ao regime dos centros de coordenação em 31 de Dezembro de 2000 e cuja acreditação caducava entre 17 de Fevereiro de 2003 e 31 de Dezembro de 2005.

40     O Reino da Bélgica pediu igualmente ao Conselho, por ofício do mesmo dia, que estas medidas fossem declaradas compatíveis com o mercado comum, em conformidade com o artigo 88.°, n.° 2, terceiro parágrafo, CE.

41     Por ofício de 25 de Abril de 2003, o presidente da Comissão declarou que a decisão impugnada era executória e entendeu que o ofício supra‑referido, de 20 de Março de 2003, não podia ser considerado uma notificação de um auxílio novo, na acepção do artigo 88.°, n.° 3, CE.

42     Por ofício de 26 de Maio de 2003, o Reino da Bélgica notificou novamente à Comissão a sua intenção expressa no ofício de 20 de Março de 2003.

43     Na sua reunião de 3 de Junho de 2003, o Conselho «Ecofin» deu a sua aprovação de princípio ao solicitado e encarregou o Comité de Representantes Permanentes de tomar todas as medidas necessárias para que o Conselho pudesse adoptar a decisão projectada o mais cedo possível e, em todo o caso, antes do fim do mês de Junho de 2003.

44     Com a sua Decisão 2003/531/CE do Conselho, de 16 de Julho de 2003, relativa à concessão pelo Governo belga de auxílio a determinados centros de coordenação estabelecidos na Bélgica (JO L 184, p. 17), adoptada com base no artigo 88.°, n.° 2, CE, foi declarado compatível com o mercado comum «o auxílio que a Bélgica projecta[va] conceder até 31 de Dezembro de 2005 às empresas que, em 31 de Dezembro de 2000, beneficiavam, ao abrigo do Decreto real n.° 187 […], de acreditação, enquanto centros de coordenação, que expira[va] entre 17 de Fevereiro de 2003 e 31 Dezembro de 2005». Esta decisão foi objecto do processo C‑399/03.

45     Por ofício de 17 de Julho de 2003, a Comissão, em resposta à já referida notificação de 26 de Maio de 2003, confirmou a posição que expusera no seu ofício de 25 de Abril de 2003.

46     Por despacho de 26 de Junho de 2003, Bélgica e Forum 187/Comissão (C‑182/03 R e C‑217/03 R, Colect., p. I‑6887), o presidente do Tribunal de Justiça ordenou a suspensão da execução da decisão impugnada, na medida em que proíbe ao Reino da Bélgica renovar as acreditações dos centros de coordenação em curso à data da notificação da referida decisão.

 Pedidos das partes e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

47     No processo C‑182/03, o Reino da Bélgica pede ao Tribunal de Justiça:

–       a anulação do artigo 2.°, segundo e terceiro parágrafos, da decisão impugnada, na medida em que dispõe que, «[a] contar da notificação da [referida] decisão, o benefício deste regime ou das suas componentes não pode ser […] prorrogado através da renovação [das acreditações] em vigor», e que, «[e]m conformidade com o segundo parágrafo […], em caso de renovação [da acreditação] antes de [31 de Dezembro de 2010], o benefício do regime objecto da presente decisão deixará de ser concedido, ainda que temporariamente»;

–       a condenação da Comissão nas despesas, incluindo as relativas ao processo de medidas provisórias.

48     No processo C‑217/03, o Forum 187 pede ao Tribunal de Justiça:

–       a título principal, a anulação da decisão impugnada e, a título subsidiário, a sua anulação na medida em que não previu medidas transitórias adequadas;

–       a condenação da Comissão nas despesas no processo C‑217/03 e no processo que deu lugar ao despacho do Tribunal de Primeira Instância de 2 de Junho de 2003, Forum 187/Comissão (T‑276/02, Colect., p. II‑2075).

49     A Comissão conclui, em cada um dos presentes processos, pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

–       negar provimento ao recurso;

–       condenar os recorrentes nas despesas, incluindo as relativas ao processo de medidas provisórias.

50     Por requerimento entregue em 16 de Junho de 2003, a Comissão suscitou uma questão prévia de admissibilidade relativamente ao recurso do Forum 187.

51     Por decisão de 30 de Março de 2004, o Tribunal de Justiça decidiu que a questão prévia de admissibilidade seria apreciada com o mérito da causa e prosseguir com o processo.

52     Por despacho do presidente da Segunda Secção de 28 de Abril de 2005, os processos C‑182/03 e C‑217/03 foram apensos para efeitos da fase oral e do acórdão.

 Quanto à admissibilidade

53     A Comissão defende que o Forum 187 não tem legitimidade para contestar a decisão impugnada, de que não é destinatário, por essa decisão não lhe dizer directa e individualmente respeito.

54     Por um lado, o Forum 187 contesta esta questão prévia de admissibilidade, afirmando que são directa e individualmente afectados pela decisão trinta centros que obtiveram a renovação da acreditação ao longo dos anos de 2001 e 2002, e para os quais o período durante o qual poderão beneficiar do regime fiscal controvertido terminará em 31 de Dezembro de 2010, e oito centros cujo pedido de renovação estava pendente à data em que a decisão impugnada foi adoptada. Por outro lado, considera que é afectado pela decisão impugnada na sua qualidade de órgão de representação dos centros de coordenação reconhecido pelas autoridades belgas e junto das quais dispõe de um estatuto quase oficial que, nomeadamente, lhe permitiu desempenhar um papel importante no procedimento administrativo na Comissão e devido ao facto de a decisão afectar a sua razão de ser.

55     Nos termos do artigo 230.° CE, uma pessoa singular ou colectiva só pode interpor recurso de uma decisão dirigida a outra pessoa, se essa decisão lhe disser directa e individualmente respeito.

56     Uma associação como o Forum 187, encarregada da defesa dos interesses colectivos dos centros de coordenação estabelecidos na Bélgica, só pode, em princípio, interpor recurso de anulação de uma decisão final da Comissão em matéria de auxílios de Estado, se as empresas que representa ou algumas delas tiverem legitimidade para agir a título individual (acórdão de 7 de Dezembro de 1993, Federmineraria e o./Comissão, C‑6/92, Colect., p. I‑6357, n.os 15 e 16) ou se puder fazer valer um interesse próprio (acórdão de 24 de Março de 1993, CIRFS e o./Comissão, C‑313/90, Colect., p. I‑1125, n.os 29 e 30).

57     No que respeita à primeira condição imposta pelo artigo 230.°, quarto parágrafo, CE, é pacífico que a decisão da Comissão, que impede o Governo belga de renovar as acreditações dos centros de coordenação, que caducam a partir de 17 de Fevereiro de 2003, e que limita, em qualquer hipótese, o efeito no tempo das acreditações vigentes em 31 de Dezembro de 2010, é de aplicação imperativa e que a decisão impugnada diz, portanto, directamente respeito aos centros de coordenação em causa.

58     No que respeita à segunda condição prevista no artigo 230.°, já referido, há que recordar que o Tribunal de Justiça decidiu repetidamente que o facto de uma disposição controvertida ter, pela sua natureza e pelo seu alcance, natureza geral, uma vez que se aplica à generalidade dos operadores económicos interessados, não exclui, porém, a possibilidade de afectar individualmente alguns deles (v., neste sentido, acórdão de 18 de Maio de 1994, Codorniu, C‑309/89, Colect., p. I‑1853, n.° 19).

59     Uma pessoa singular ou colectiva só pode pretender ser individualmente afectada se o preceito em causa a afectar devido a certas qualidades que lhe são próprias ou a uma situação de facto que a caracteriza em relação a qualquer outra pessoa (v. acórdão de 15 de Julho de 1963, Plaumann/Comissão, 25/62, Colect. 1962‑1964, p. 279).

60     A este respeito, o Tribunal de Justiça decidiu que quando o acto impugnado afecta um grupo de pessoas que estavam identificadas ou eram identificáveis no momento em que o acto foi adoptado, em função de critérios próprios aos membros do grupo, esse acto podia dizer individualmente respeito a essas pessoas na medida em que fazem parte de um círculo restrito de operadores económicos (v. acórdãos de 17 de Janeiro de 1985, Piraiki‑Patraiki e o./Comissão, 11/82, Recueil, p. 207, n.° 31, e de 26 de Junho de 1990, Sofrimport/Comissão, C‑152/88, Colect., p. I‑2477, n.° 11).

61     Em primeiro lugar, importa declarar que, por um lado, a decisão impugnada teve por efeito fixar em 31 de Dezembro de 2010, o mais tardar, o limite do período de acreditação dos centros de coordenação que beneficiaram de uma renovação da acreditação ao longo dos anos de 2001 e 2002, em vez de a fixar durante os anos de 2011 e 2012, e, por outro, que estes centros eram perfeitamente identificáveis no momento em que a decisão impugnada foi adoptada. Assim, os trinta centros de coordenação afectados pelos efeitos da referida decisão podiam agir individualmente contra esta última.

62     Em segundo lugar, importa indicar que a decisão impugnada não previu medidas transitórias a favor dos centros de coordenação cuja acreditação terminava concomitantemente à notificação dessa decisão e daqueles cujo pedido de acreditação estava pendente à data da notificação dessa decisão.

63     Assim, são afectados oito centros cujo pedido de renovação de acreditação estava então pendente. Estes fazem parte de um círculo restrito cujos membros são especialmente afectados pela decisão impugnada, uma vez que já não poderão obter a renovação da acreditação. Pelo que esses centros tinham legitimidade para agir a título individual contra a decisão impugnada.

64     Resulta do exposto, sem que seja necessário examinar se o Forum 187 pode invocar um interesse próprio, que esta associação tem legitimidade para agir na medida em que representa, por um lado, trinta centros de coordenação cujos direitos ao benefício do regime controvertido foram limitados a 31 de Dezembro de 2010 e, por outro, oito centros cujos pedidos de renovação estavam pendentes à data da notificação da decisão impugnada.

 Quanto à procedência dos recursos

65     Considerando que os pedidos do Reino da Bélgica e do Forum 187 têm em comum o facto de visarem a anulação da decisão impugnada, na medida em que esta não prevê disposições transitórias, há que examinar, em primeiro lugar, os pedidos do Forum 187, de anulação da referida decisão, por qualificar os referidos auxílios de incompatíveis com o mercado comum.

 Quanto aos pedidos do Forum 187, de anulação da decisão impugnada, por qualificar as medidas controvertidas de auxílios de estado incompatíveis com o mercado comum

 Quanto ao fundamento relativo à falta de base legal

66     Com este fundamento, o Forum 187 sustenta que a decisão impugnada está desprovida de base jurídica e viola o princípio da segurança jurídica. Tendo em conta as posições assumidas pela Comissão quinze anos antes, a referida decisão não se pode fundar nos artigos 87.° CE e 88.° CE, nem no artigo 1.°, alínea b), v), do regulamento, uma vez que não faz referência a uma qualquer evolução do mercado comum.

67     Por outro lado, a Comissão também não pode invocar o direito de rectificar os seus erros. Desta circunstância a associação conclui que, no caso em apreço, foi ignorado o princípio da segurança jurídica ligado ao respeito da intangibilidade das decisões anteriores.

68     A título liminar, há que lembrar que, com a decisão impugnada, a Comissão não revogou as decisões de 1984 e 1987. Na realidade, procedeu a um novo exame do regime fiscal dos centros de coordenação, aplicando‑lhe o procedimento de controlo de um auxílio existente, e concluiu que esse regime passava a constituir um auxílio de Estado incompatível.

69     Para verificar se a Comissão procedeu correctamente a esse novo exame, há que lembrar não só que o princípio da segurança jurídica implica que a legislação comunitária seja certa e que a sua aplicação seja previsível para os destinatários (acórdãos de 15 de Dezembro de 1987, Irlanda/Comissão, 325/85, Colect., p. 5041, n.° 18, e de 15 de Fevereiro de 1996, Duff e o., C‑63/93, Colect., p. I‑569, n.° 20) mas também que a sua aplicação deve ser conjugada com a do princípio da legalidade (acórdão de 22 de Março de 1961, SNUPAT/Alta Autoridade, 42/59 e 49/59, Recueil, p. 103, Colect. 1954‑1961, p. 597).

70     A este propósito, é ponto assente, como indicou o advogado‑geral nos n.os 212 e 213 das suas conclusões, que o regulamento, que codifica o exercício, pela Comissão, dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 88.° CE, não define a abrangência do conceito de «evolução do mercado comum», que consta no seu artigo 1.°, alínea b), v), que especifica que uma medida que não constituía um auxílio no momento da sua entrada em vigor deve, não obstante, ser considerada existente quando se tenha transformado «em auxílio devido à evolução do mercado comum».

71     Este conceito, que pode ser entendido como uma alteração do contexto económico e jurídico no sector afectado pela medida em causa, não abrange a hipótese de a Comissão, como no caso em apreço, mudar a sua apreciação com base unicamente numa aplicação mais rigorosa das regras do Tratado em matéria de auxílios de Estado.

72     No entanto, há que lembrar que o regulamento constitui um acto de direito derivado adoptado para aplicação dos artigos 87.° CE e 88.° CE, que não pode reduzir o alcance dos referidos artigos, isto na medida em que a Comissão obtém os seus poderes directamente a partir deles.

73     Efectivamente, o artigo 88.°, n.° 1, CE confia à Comissão a missão de proceder ao exame permanente dos regimes de auxílios existentes nos Estados e de propor a estes últimos as medidas adequadas exigidas pelo desenvolvimento progressivo ou pelo funcionamento do mercado comum.

74     O n.° 2 desse mesmo artigo permite à Comissão, em caso de não consecução, impor ao Estado‑Membro em causa alterações ao auxílio ou a supressão do mesmo, num determinado prazo.

75     Assim, ao decidir proceder ao reexame do regime fiscal dos centros de coordenação em vigor na Bélgica, que tinha sido declarado prejudicial para o mercado comum pelo grupo «código de conduta», a Comissão desempenhou o papel que lhe cabe por força do artigo 88.° CE. A decisão impugnada tem, portanto, como base legal os artigos 87.° CE e 88.° CE.

76     Tendo, portanto, sido respeitado o princípio da legalidade, a decisão impugnada constitui um acto certo cuja aplicação era previsível para os destinatários. Logo, esta decisão não é contrária ao princípio da segurança jurídica.

77     Além disso, o único procedimento aplicável, no caso em apreço, pela Comissão é o previsto pelo regulamento para o controlo dos auxílios existentes. Com efeito, não há dúvidas de que o regime fiscal em causa constitui uma medida existente, já que a Comissão dela foi notificada em 1984 e que o referido regime não tinha sofrido nenhuma alteração substancial.

78     Por conseguinte, o Forum 187 não tem razão quando afirma que a Comissão cometeu um erro de direito ao considerar que os artigos 17.° e 18.° do regulamento estavam na base do início do procedimento formal de investigação, como indicara no ofício de 17 de Julho de 2000 que enviou às autoridades belgas, e, depois, ao referir‑se apenas aos artigos 87.° CE e 88.° CE. Consequentemente, o primeiro fundamento não procede.

 Quanto ao fundamento relativo à violação do artigo 87.°, n.° 1, CE

79     Com este fundamento, o Forum 187 alega que o regime fiscal aplicável aos centros de coordenação não constitui um auxílio de Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE. Para tal, afirma não só que o método de análise desse regime fiscal, que a Comissão utilizou, era demasiado global mas também que as diferentes medidas que constituem o regime em causa não preenchem as condições previstas no referido artigo. Em especial, indica que essas medidas não conferem nenhuma vantagem aos centros, não provêm de uma transferência de recursos do Estado, não têm carácter selectivo e que a Comissão não fez prova de que tenham uma incidência na concorrência e nas trocas comerciais intracomunitárias. De qualquer modo, em sua opinião, o referido regime justifica‑se pela natureza e economia do sistema fiscal belga.

–       Quanto ao método de análise do regime fiscal

80     O Forum 187 censura a Comissão por ter ignorado a competência dos Estados‑Membros em matéria fiscal e por ter procedido a uma análise demasiado geral do regime em causa.

81     Há que responder, por um lado, que o artigo 87.° CE não exclui do seu campo de aplicação as normas fiscais.

82     Por outro lado, importa recordar que, no caso de um programa de auxílios, a Comissão pode limitar‑se a estudar as características do programa em questão, para apreciar se o mesmo assegura uma vantagem significativa aos beneficiários em relação aos seus concorrentes (acórdão de 17 de Junho de 1999, Bélgica/Comissão, C‑75/97, Colect., p. I‑3671, n.° 48). Também não é obrigada a examinar cada caso particular a que o regime se aplique (acórdão de 29 de Abril de 2004, Grécia/Comissão, C‑278/00, Colect., p. I‑3997, n.° 24 e jurisprudência aí referida).

83     Conclui‑se que a primeira parte do fundamento deve ser julgada improcedente.

–       Quanto às condições previstas no artigo 87.°, n.° 1, CE

84     A título liminar, importa precisar que, segundo jurisprudência consolidada, a qualificação de auxílio exige que todos os requisitos previstos no artigo 87.°, n.° 1, CE estejam preenchidos (acórdão de 24 de Julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, C‑280/00, Colect., p. I‑7747, n.° 74).

85     Logo, há que proceder ao exame de todas essas condições.

i)     No que respeita à existência de uma vantagem para certas empresas

86     A este propósito, o conceito de auxílio pode abarcar, não apenas prestações positivas, tais como subsídios, empréstimos ou participações no capital de empresas, mas também intervenções que, de formas diversas, aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa e que, dessa forma, não sendo subsídios na acepção estrita da palavra, têm a mesma natureza e efeitos idênticos (acórdão de 20 de Novembro de 2003, Gemo, C‑126/01, Colect., p. I‑13769, n.° 28 e jurisprudência aí referida).

87     Por outro lado, o Tribunal decidiu que uma medida através da qual as autoridades públicas atribuem a certas empresas uma isenção fiscal que, embora não implique transferência de recursos do Estado, coloca os beneficiários numa situação financeira mais favorável que a dos outros contribuintes, constitui um auxílio de Estado (acórdão de 15 de Março de 1994, Banco Exterior de España, C‑387/92, Colect., p. I‑877, n.° 14).

88     A Comissão considerou na decisão impugnada que o modo de determinação dos rendimentos tributáveis, a isenção da contribuição predial, do imposto sobre os rendimentos de capitais e do imposto sobre as entradas de capital, bem como o sistema de imposto fictício sobre os rendimentos de capitais constituem vantagens para os centros de coordenação.

89     O Forum 187 contestou esta análise.

90     Em primeiro lugar, a Comissão considerou, nos n.os 89 a 95 da decisão impugnada, que a determinação presumida dos lucros segundo o método «cost plus» constitui uma vantagem económica na acepção do artigo 87.° CE.

91     Efectivamente, segundo o regime em causa, o lucro tributável destes centros é fixado num montante presumido, correspondente a uma percentagem do montante total das despesas e dos custos de funcionamento, de que se excluem as despesas com pessoal e os encargos financeiros.

92     Por outro lado, a margem de lucro de um centro de coordenação deve, em princípio, ser fixada em função da actividade realmente exercida pelo centro. Se esse mesmo centro factura determinados serviços prestados a um preço correspondente ao montante dos custos acrescidos de uma margem de lucro, a percentagem que esta representa pode ser considerada desde que não seja anormal. Quando não existem critérios objectivos para determinar a percentagem dos lucros a tomar em consideração, esta deve, em princípio, ser fixada em 8%.

93     O lucro tributável do centro em questão não pode, contudo, ser inferior ao total das despesas ou dos encargos não dedutíveis a título de custos profissionais e dos benefícios «anormais ou sem contrapartida» concedidos ao centro pelos membros do grupo. Este lucro é tributado à taxa normal do imposto sobre as sociedades.

94     Este método de determinação do lucro tributável inspira‑se no método denominado «cost plus», preconizado pela Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) para a tributação dos serviços efectuados por uma filial ou um estabelecimento estável por conta das sociedades pertencentes ao mesmo grupo e estabelecidas noutros Estados.

95     Para examinar se a determinação dos lucros tributáveis, como prevista no regime dos centros de coordenação, confere uma vantagem a estes últimos, importa, como sugere a Comissão no n.° 95 da decisão impugnada, comparar o referido regime com o do direito comum baseado na diferença entre receitas e despesas de uma empresa que exerça as suas actividades em condições de livre concorrência.

96     Ora, a este respeito, as despesas com pessoal e os encargos financeiros assumidos no âmbito de actividades de gestão de tesouraria ou de financiamento representam elementos que contribuem de forma preponderante para a realização dos rendimentos dos centros de coordenação, uma vez que estes fornecem serviços, em particular de natureza financeira. Consequentemente, a exclusão destas despesas e encargos, que servem para a determinação dos rendimentos tributáveis dos referidos centros, não permite obter preços de transferência próximos dos que seriam praticados em condições de livre concorrência.

97     Conclui‑se que esta exclusão é susceptível de proporcionar uma vantagem económica aos referidos centros.

98     Contrariamente ao que defende o Forum 187, esta análise não pode ser posta em causa, nem pelo facto de a inclusão dos encargos financeiros poder, em certos casos, conduzir a uma matéria colectável demasiado elevada nem pelo volume da carga fiscal que o grupo poderia suportar, e ainda menos pela circunstância de o centro poder ser tributado sem ter realizado lucros. Com efeito, todos estes corolários são inerentes ao método «cost plus».

99     Além disso, a taxa anual, instituída a partir de 1 de Janeiro de 1993, de 10 000 euros por pessoa ocupada a tempo inteiro e com um limite de 100 000 euros, não compensa os efeitos positivos do método de cálculo utilizado, uma vez que o limite corresponde ao número mínimo de assalariados que os centros são obrigados a empregar no fim dos dois primeiros anos de actividade.

100   A mesma observação se impõe no que respeita à taxa de 8%, aplicada a título supletivo aos custos de funcionamento para determinar a matéria colectável, na medida em que esta taxa incide sobre uma base já reduzida e que a taxa de margem é, na realidade, muito diferente de um centro para o outro, uma vez que depende da actividade exercida.

101   Por fim, como referiu o advogado‑geral no n.° 265 das suas conclusões, a posição da Comissão, segundo a qual a base alternativa de tributação, destinada a evitar eventuais abusos ao instituir um limite mínimo, não é susceptível de suprimir a vantagem proporcionada com a aplicação conjugada das exclusões mencionadas e da taxa de 8%, merece aprovação. Com efeito, esta base só inclui montantes que, relativamente às sociedades não abrangidas pelo regime controvertido, são igualmente tributados na Bélgica.

102   Face a estes elementos, a Comissão teve, portanto, razão ao considerar que as regras relativas à determinação dos rendimentos tributáveis constituíam uma vantagem para os centros de coordenação e os grupos a que estes pertencem.

103   Em segundo lugar, nos n.os 76 e 77 da decisão impugnada, a Comissão considerou que a isenção da contribuição predial de que beneficiam os centros de coordenação lhes proporciona uma vantagem económica.

104   Efectivamente, o regime fiscal em causa prevê que estes centros fiquem isentos de contribuição predial relativamente aos imóveis que utilizam no exercício das suas actividades, ainda que este imposto onere, em princípio, o orçamento de qualquer sociedade que possua imóveis na Bélgica, ou seja, propriedades imóveis construídas e não construídas, bem como o material e o equipamento que apresente a característica de imóvel pela sua natureza ou pelo seu destino.

105   De onde resulta que a isenção da referida contribuição predial constitui uma vantagem económica. A circunstância de só 5% dos centros de coordenação beneficiarem realmente dela, porque todos os outros são locatários dos seus imóveis, não tem influência nesta apreciação, uma vez que a escolha entre propriedade e locação de um imóvel resulta apenas da vontade dos referidos centros.

106   Em terceiro lugar, nos n.os 78 e 79 da decisão impugnada, a Comissão considerou que a isenção do imposto sobre as entradas de capitais, de que beneficiam os centros de coordenação, constitui também uma vantagem económica.

107   Com efeito, sendo a tributação das entradas de capitais a regra na Bélgica, cada sociedade de capitais suporta o ónus dessa tributação. A isenção de que beneficiam os referidos centros de coordenação, que incide quer sobre as entradas iniciais quer sobre os aumentos estatutários, só pode, portanto, ser considerada uma vantagem.

108   A circunstância de o artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 69/335/CEE do Conselho, de 17 de Julho de 1969, relativa aos impostos indirectos que incidem sobre as reuniões de capitais (JO L 249, p. 25; EE 09 F1 p. 22), na redacção que lhe foi dada pela Directiva 85/303/CEE do Conselho, de 10 de Junho de 1985 (JO L 156, p. 23; EE 09 F1 p. 171), ter previsto que devem ser mantidas as isenções de operações em vigor em 1 de Julho de 1984, não tem qualquer influência nesta apreciação, uma vez que a isenção do imposto sobre as entradas controvertidas, que apenas está prevista para certos tipos de sociedades, não tem, assim, carácter geral.

109   Em quarto lugar, nos n.os 80 a 87 da decisão impugnada, a Comissão qualificou de vantagem económica a isenção do imposto sobre os rendimentos de capitais de que beneficiam os centros de coordenação.

110   Efectivamente, segundo o regime em causa, não é devido imposto sobre os rendimentos de capitais, isto é, a retenção na fonte sobre os dividendos, os juros – com excepção dos pagos a beneficiários que estão sujeitos na Bélgica ao imposto sobre as pessoas singulares ou colectivas –, as royalties distribuídas pelos centros de coordenação e sobre os rendimentos obtidos sobre os seus depósitos em numerário.

111   Do que a Comissão apurou resulta que o imposto sobre os rendimentos de capitais constitui o imposto belga definitivo para os rendimentos distribuídos a sociedades não residentes que não podem imputá‑lo ou obter o seu reembolso no Estado onde estão estabelecidas.

112   Pelo que, ao isentar os centros de coordenação do pagamento desse imposto, o regime controvertido concede a estes últimos uma vantagem cuja existência não pode, de qualquer modo, ser contestada pelo facto de outras isenções do mesmo imposto terem sido instituídas em benefício de outros tipos de empresas.

113   Em quinto lugar, no n.° 88 da decisão impugnada, a Comissão considerou que a concessão de um imposto fictício sobre os rendimentos de capitais constitui uma vantagem.

114   Com efeito, os destinatários dos pagamentos efectuados pelos centros de coordenação não só estão isentos do imposto sobre os rendimentos de capitais como beneficiam, além disso, de uma dedução presumida sobre o montante total do imposto que deverão pagar.

115   Resulta das discussões que a taxa do imposto fictício foi reduzida a zero em 1991.

116   No entanto, os juros pagos sobre empréstimos a longo prazo celebrados antes de 24 de Julho de 1991 continuam a estar isentos. Consequentemente, esta situação proporciona uma vantagem aos centros de coordenação em causa.

117   Em contrapartida, o facto de a taxa deste imposto, que foi reduzida a zero, poder ser alterada por decreto real constitui, no máximo, uma vantagem eventual e futura. Ora, essa eventualidade não pode ser atendida para se qualificar esta medida de auxílio de Estado.

118   Conclui‑se que o regime em causa proporciona uma vantagem aos centros de coordenação.

ii)  No que respeita à selectividade

119   Importa recordar que, segundo jurisprudência constante, o artigo 87.°, n.° 1, CE impõe que se determine se, no quadro de um dado regime jurídico, uma medida nacional é susceptível de favorecer «certas empresas ou certas produções» relativamente a outras que se encontrem, na perspectiva do objectivo prosseguido pelo referido regime, numa situação factual e jurídica comparável. Em caso afirmativo, a medida preenche a condição de selectividade que é constitutiva do conceito de auxílio de Estado previsto nessa disposição (v. acórdão de 3 de Março de 2005, Heiser, C‑172/03, Colect., p. I‑1627, n.° 40 e jurisprudência aí referida).

120   Assim, resulta da análise precedente que as isenções das contribuições prediais e dos impostos sobre os rendimentos de capitais, do imposto sobre as entradas de capital e a concessão de um imposto fictício sobre os rendimentos de capitais constituem derrogações ao regime fiscal belga de direito comum. A circunstância alegada pelo Forum 187, segundo a qual existem muitas outras derrogações, não põe em causa que este regime tenha, de facto, um carácter derrogatório e que limite essas isenções apenas aos centros de coordenação

121   Está demonstrado, portanto, o carácter selectivo das referidas isenções.

122   No que respeita ao modo de determinação dos lucros tributáveis, embora o Forum 187 afirme que o regime em causa se aplica às sociedades para as quais foi especialmente concebido a fim de evitar os riscos de dupla tributação, é pacífico que o referido regime apenas se aplica aos grupos internacionais cujas filiais estão implantadas em pelo menos quatro países diferentes, que dispõem de um capital e de reservas superiores ou iguais a mil milhões de BEF e que realizam um volume de negócios anual consolidado superior ou igual a 10 mil milhões de BEF.

123   De onde resulta que, quanto a este ponto, o regime em causa também apresenta carácter selectivo.

124   Esta conclusão não é posta em causa pela posição do Forum 187, que defende que o regime em causa não constitui uma derrogação ao regime geral de tributação aplicável às empresas, mas um tipo de regime diferente, ditado pela lógica fiscal e pela necessidade de solucionar o problema da dupla tributação dos serviços efectuados no interior de um grupo internacional de sociedades.

125   Efectivamente, por um lado, o Forum 187 não explica por que razão as diferentes medidas previstas no quadro do regime em causa são justificadas pelo sistema fiscal em vigor na Bélgica. Por outro lado, o Forum 187 não demonstrou em que medida o objectivo de resolver o problema da dupla tributação de serviços intragrupos justificava a limitação do benefício do regime em causa a centros criados por grupos de uma certa importância, nem em que medida este objectivo tornava necessária cada uma das diferentes vantagens que compõem este regime.

126   Assim, o Forum 187 não demonstrou que o regime em causa se justifica pela natureza ou pela economia geral do sistema fiscal belga em que se inscreve, pelo que há que concluir que o carácter selectivo deste regime está demonstrado.

iii)  No que respeita à exigência segundo a qual o auxílio deve ser concedido através de recursos de Estado e ser imputável ao Estado

127   Para que os benefícios possam ser qualificados de auxílios na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, devem, por um lado, ser concedidos directa ou indirectamente através de recursos de Estado e, por outro, ser imputáveis ao Estado (acórdão Gemo, já referido, n.° 24).

128   Se é pacífico que a segunda condição está satisfeita, uma vez que o regime fiscal em causa foi criado pelo Governo belga, o mesmo não acontece com a primeira condição, pois, segundo o Forum 187, o Estado belga recebeu 500 milhões de euros por ano de receitas fiscais e de quotizações sociais provenientes dos centros de coordenação.

129   Ora, basta observar que as isenções analisadas anteriormente estiveram na origem de falta de receitas fiscais e sociais nos cofres desse Estado, para demonstrar que os benefícios daí resultantes são concedidos através de recursos de Estado.

iv)  No que respeita à exigência segundo a qual o regime de auxílio deve afectar as trocas comerciais entre Estados‑Membros e falsear ou ameaçar falsear a concorrência

130   Resulta dos n.os 99 a 103 da decisão impugnada que a Comissão considerou que o regime em causa afecta as trocas comerciais entre Estados‑Membros e falseia ou ameaça falsear a concorrência.

131   Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a concorrência é falseada desde que uma medida aligeire os encargos da empresa beneficiária, reforçando assim a sua posição relativamente à de outras empresas concorrentes (v., neste sentido, acórdãos de 17 de Setembro de 1980, Philip Morris/Comissão, 730/79, Recueil, p. 2671, n.° 11, e de 11 de Novembro de 1987, França/Comissão, 259/85, Colect., p. 4393, n.° 24).

132   No caso em apreço, os benefícios conferidos aos centros de coordenação tiveram por efeito falsear a concorrência entre estes e os prestadores de serviços nos sectores financeiro, fiduciário, informático e de recrutamento, favorecendo a utilização, pelas sociedades do grupo, dos serviços prestados pelos referidos centros.

133   Por outro lado, como indicou o advogado‑geral no n.° 320 das suas conclusões, devido à amplitude do campo de actividades abrangido pelos grupos multinacionais que criaram centros de coordenação, o regime fiscal em causa tem necessariamente um impacto na concorrência.

134   Por fim, o referido regime afecta necessariamente as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, uma vez que os centros de coordenação são criados por sociedades multinacionais que estão implantadas em pelo menos quatro Estados.

135   Resulta do exposto que o regime fiscal dos centros de coordenação satisfaz as condições previstas no artigo 87.°, n.° 1, CE. Logo, o fundamento relativo à violação do referido artigo deve ser julgado improcedente.

–       Quanto ao fundamento relativo à falta de fundamentação

136   O Forum 187 alega, principalmente, que a Comissão não explicou as razões que a conduziram a alterar as suas decisões anteriores.

137   Importa notar, a este propósito, que, embora o dever de fundamentação de um acto comunitário previsto no artigo 253.° CE deva ser adaptado à natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do acto, de forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao órgão jurisdicional competente exercer o seu controlo (acórdãos de 9 de Julho de 1969, Itália/Comissão, 1/69, Recueil, p. 277, n.° 9, Colect. 1969‑1970, p. 91, e de 7 de Março de 2002, Itália/Comissão, C‑310/99, Colect., p. I‑2289, n.° 48), não se pode obrigar a Comissão a indicar as razões pelas quais fez uma apreciação diferente do regime em causa nas suas decisões anteriores. Com efeito, o conceito de auxílio de Estado corresponde a uma situação objectiva apreciada na data em que a Comissão adopta a sua decisão.

138   Consequentemente, há que considerar improcedente o fundamento relativo à falta de fundamentação e rejeitar os pedidos do Forum 187 de anulação da decisão impugnada por qualificar as medidas controvertidas de auxílios de Estado incompatíveis com o mercado comum.

 Quanto aos pedidos do Reino da Bélgica e do Forum 187 de anulação parcial da decisão impugnada

139   O Reino da Bélgica, que pede a anulação da decisão impugnada na medida em que não o autoriza a conceder, ainda que temporariamente, a renovação da acreditação dos centros que beneficiavam do regime em causa em 31 de Dezembro de 2000 e cuja acreditação expira antes de 31 de Dezembro de 2010, invoca quatro fundamentos relativos à violação do artigo 88.° CE e dos princípios de protecção da confiança legítima e da igualdade, assim como à falta de fundamentação.

140   O Forum 187, que pede a anulação da mesma decisão na medida em que não prevê medidas transitórias adequadas para os centros cuja acreditação expirava entre 17 de Fevereiro de 2003 e 31 de Dezembro de 2004, invoca dois fundamentos relativos à violação do princípio da confiança legítima e à falta de fundamentação.

 Quanto à violação do princípio da confiança legítima

–       Argumentos das partes

141   O Reino da Bélgica defende que se a Comissão baseou a sua decisão no código de conduta e nos trabalhos do Conselho «Ecofin» ao fazer beneficiar os centros de coordenação da acreditação em curso até 31 de Dezembro de 2010, não respeitou todas as posições do Conselho, em especial a nota de 26 e 27 de Novembro de 2000, que previa que o regime fiscal em causa seria mantido para todos os centros até 31 de Dezembro de 2005.

142   Alega igualmente que esta tomada de posição conduziu o Ministro das Finanças belga a anunciar oficialmente na câmara dos representantes, em 20 de Dezembro de 2000, esta possibilidade de renovação até 31 de Dezembro de 2005, data reproduzida pela Comissão nas suas propostas de medidas adequadas de 11 de Julho de 2001.

143   O Reino da Bélgica sustenta igualmente que, relativamente aos centros de coordenação, como a renovação da acreditação tem carácter automático desde que satisfeitas as condições requeridas, os centros cuja acreditação caducasse concomitantemente com a decisão impugnada podiam legitimamente acreditar que a renovação lhes seria concedida. Sublinha que, até à notificação da decisão impugnada, nem os referidos centros nem ele próprio podiam saber que esta data seria considerada pela Comissão para pôr fim às renovações das acreditações.

144   O Forum 187 sustenta que, tendo em conta as decisões anteriores da Comissão, os centros de coordenação podiam legitimamente crer que poderiam continuar a beneficiar de uma acreditação.

145   Alega também que os centros cuja acreditação caducava nos anos de 2003 e 2004 tinham necessidade de um período de transição de dois anos para se reorganizarem, ou mesmo, se necessário for, abandonarem a Bélgica. Contesta os motivos invocados pela Comissão para recusar a concessão de medidas transitórias.

146   A Comissão refuta todos estes argumentos, precisando que reconheceu a existência de uma confiança legítima dos centros no regime em causa, com origem nas suas decisões anteriores, e que, por essa razão, instituiu um período transitório, que termina, o mais tardar, a 31 de Dezembro de 2010, aplicável aos centros que dispunham de uma acreditação em curso na data da notificação da decisão impugnada.

–       Apreciação do Tribunal de Justiça

147   O Tribunal tem decidido reiteradamente que o direito de fazer valer o princípio da protecção da confiança legítima se estende a todo o particular em cuja esfera jurídica uma instituição comunitária fez nascer esperanças fundadas. Além disso, não se pode invocar uma violação deste princípio na falta de garantias precisas que lhe tenham sido fornecidas pela Administração (acórdão de 24 de Novembro de 2005, Alemanha/Comissão, C‑506/03, ainda não publicado na Colectânea, n.° 58). Do mesmo modo, quando um operador económico prudente e avisado estiver em condições de prever a adopção de uma medida comunitária susceptível de afectar os seus interesses, não pode, quando essa medida for tomada, invocar esse princípio (acórdão de 11 de Março de 1987, Van den Bergh en Jurgens e Van Dijk Food Products Lopik/Comissão, 265/85, Colect., p. 1155, n.° 44).

148   Por outro lado, mesmo que a Comunidade tenha previamente criado uma situação susceptível de originar uma confiança legítima, um interesse público peremptório pode opor‑se à adopção de medidas transitórias para situações surgidas antes da entrada em vigor da nova regulamentação, mas cuja evolução ainda não terminou (acórdão de 17 de Julho de 1997, Affish, C‑183/95, Colect., p. I‑4315, n.° 57).

149   No entanto, o Tribunal também decidiu que, na ausência de um interesse público peremptório, a Comissão, ao não ter colmatado a supressão de uma regulamentação com medidas transitórias de protecção da confiança que o operador podia legitimamente ter na regulamentação comunitária, violou uma regra superior de direito (v., neste sentido, acórdão de 14 de Maio de 1975, CNTA/Comissão, 74/74, Colect., p. 183, n.° 44).

150   Em primeiro lugar, importa examinar se as conclusões do Conselho de 26 e 27 de Novembro de 2000 e as propostas de medidas adequadas apresentadas pela Comissão puderam criar confiança na manutenção do regime em causa, pelo menos, até 31 de Dezembro de 2005.

151   Resulta dos autos que essas conclusões do Conselho exprimem uma vontade de natureza política e não podem, devido ao seu conteúdo, produzir efeitos de direito que os particulares possam invocar no Tribunal de Justiça. Por outro lado, as referidas conclusões não podem, em caso algum, vincular a Comissão no exercício das suas competências próprias, que lhe são confiadas em matéria de auxílios de Estado pelo Tratado. Pelo que o Governo belga não tem razão ao defender que essas mesmas conclusões teriam podido justificar certezas quanto à obtenção de medidas transitórias.

152   O mesmo acontece no que respeita aos centros de coordenação, que se supõe conhecerem as competências da Comissão e não podem, portanto, invocar essas conclusões do Conselho de 26 e 27 de Novembro de 2000 para as opor à Comissão.

153   No que concerne às propostas de medidas adequadas notificadas ao Reino da Bélgica pela Comissão, não podem, seja como for, constituir o fundamento de uma confiança na medida em que são parte integrante do procedimento formal de investigação e que um Estado pode, como no caso em apreço, recusá‑las.

154   Por consequência, nem o Reino da Bélgica nem o Forum 187 podem invocar a confiança na manutenção do regime em causa até, pelo menos, 31 de Dezembro de 2005.

155   Em segundo lugar, é pacífico que a Comissão, com as suas decisões de 1984 e 1987 e com a resposta dada em 24 de Setembro de 1990, criou confiança no facto de o regime em causa não conter elementos de auxílio.

156   É também pacífico que:

–       embora o regime em causa preveja um procedimento de atribuição de uma acreditação por um período de dez anos, a renovação dessa acreditação, sem ser automática, está sujeita ao mesmo procedimento e pode ser obtida sem dificuldades, desde que as condições objectivas exigidas continuem a ser satisfeitas;

–       além disso, o número de renovações não é definido pela legislação nacional;

–       na falta de apreciação discricionária pelas autoridades nacionais, os centros de coordenação que tinham de proceder a uma renovação de acreditação podiam razoavelmente considerar que nenhum obstáculo se oporia a essa renovação.

157   A circunstância, invocada pela Comissão, de as autoridades belgas terem procedido a uma redução das vantagens concedidas pelo regime em causa, instaurando nomeadamente uma taxa anual por assalariado empregado, não é susceptível de pôr em causa a apreciação sobre a continuidade do referido regime para os centros de coordenação. Efectivamente, não resulta das discussões que as alterações assim introduzidas no regime instituído pelo Decreto real n.° 187 apresentem um carácter substancial, susceptível de o transformar na sua essência.

158   Conclui‑se que, com as suas decisões de 1984 e 1987 e com a sua resposta de 24 de Setembro de 1990, a Comissão permitiu aos centros de coordenação acreditados em 31 de Dezembro de 2000 confiarem no facto de as normas do Tratado não se oporem à renovação da sua acreditação.

159   Em terceiro lugar, há que investigar se a confiança assim surgida é legítima.

160   A Comissão defende, no essencial, que os centros de coordenação não podiam invocar uma confiança legítima na perenidade do regime em causa, uma vez que dispunham de um certo número de elementos que os informavam de que esse regime não se manteria.

161   Mesmo admitindo que os elementos invocados a este respeito pela Comissão fossem susceptíveis de abalar a confiança dos centros de coordenação na compatibilidade do regime para estes centros com as normas do Tratado, os referidos centros podiam, em todo o caso, esperar que uma decisão da Comissão, reconsiderando a sua apreciação anterior, lhes concedesse o tempo necessário para tomar efectivamente em conta esta mudança de apreciação.

162   A este propósito, importa referir que o prazo que decorreu entre a publicação da decisão de dar início ao procedimento formal de investigação, de 20 de Junho de 2002, e a decisão impugnada de 17 de Fevereiro de 2003 foi insuficiente para permitir aos centros tomarem em consideração a eventualidade de uma decisão que pusesse fim ao regime em causa. Com efeito, como foi indicado anteriormente, o referido regime é um regime fiscal autorizado por um período de dez anos, que implica medidas contabilísticas e decisões financeiras e económicas que não podem ser adoptadas num prazo tão breve por um operador económico avisado.

163   Assim, os centros de coordenação cujo pedido de renovação da acreditação estivesse pendente na data da notificação da decisão impugnada ou cuja acreditação caducasse concomitantemente à notificação da referida decisão ou pouco tempo após a mencionada notificação podiam depositar uma confiança legítima na concessão de um período transitório razoável para se poderem adaptar às consequências resultantes da referida decisão. A este propósito, a expressão «a curto prazo» deve ser entendida no sentido de que se refere a uma data tão próxima da da notificação da decisão impugnada que os centros de coordenação não dispunham do tempo necessário para se adaptarem à mudança do regime em causa.

164   Em quarto lugar, importa ter a certeza de que nenhum interesse de ordem pública primava sobre o interesse dos centros de coordenação em causa em obter um tal período transitório.

165   Por um lado, há que indicar que a Comissão não demonstrou em que é que o interesse comunitário se opunha a tal período transitório. Por outro lado, a posição da Comissão demonstra falta de coerência quando permite às acreditações em curso na data da notificação dessa decisão manterem‑se, o mais tardar, até 31 de Dezembro de 2010 e, pelo contrário, recusa o benefício de qualquer regime transitório aos centros de coordenação cujo pedido de renovação da acreditação estivesse pendente na data da notificação da decisão impugnada ou cuja acreditação caducasse concomitantemente à notificação da referida decisão ou pouco tempo após a mencionada notificação.

166   Por fim, além de a Comissão ter admitido na sua decisão que os centros de coordenação tinham procedido a investimentos consideráveis e assumido compromissos a longo prazo, importa referir que nenhum regime de substituição ou de alteração existia na data da decisão impugnada.

167   Resulta do exposto que o fundamento relativo à violação do princípio da protecção da confiança legítima é procedente.

 Quanto à violação do princípio da igualdade

168   O Reino da Bélgica alega que a decisão impugnada cria uma discriminação infundada entre os centros de coordenação cuja acreditação caducou pouco tempo antes da sua adopção, que beneficiam assim do regime em causa até 31 de Dezembro de 2010, e aqueles cuja acreditação caduca posteriormente à data da notificação da decisão impugnada e que estão privados de qualquer medida transitória.

169   A Comissão refuta esta argumentação, afirmando que todos os centros de coordenação são objecto de uma acreditação decenal e que, podendo beneficiar da totalidade do período de acreditação, se encontram na mesma situação.

170   Segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, o princípio geral da igualdade exige que situações comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de maneira igual, a não ser que tal diferença de tratamento seja objectivamente justificada (acórdãos de 27 de Março de 1980, Salumi e o., 66/79, 122/79 e 128/79, Recueil, p. 1237, n.° 14, e de 6 de Março de 2003, Niemann, C‑14/01, Colect., p. I‑2279, n.° 49 e jurisprudência aí referida).

171   Tendo em conta a conclusão formulada no n.° 167 do presente acórdão, a decisão impugnada conduz a que se tratem diferentemente centros de coordenação que podiam, todos, depositar uma confiança legítima na concessão de um período transitório razoável.

172   Assim, consoante a data em que a última renovação de acreditação ocorreu nos anos de 2001 e de 2002, ou consoante o seu termo seja concomitante à notificação da decisão impugnada ou ocorra pouco tempo após a mencionada notificação, o prazo do benefício do regime em causa é diferente, já que, para os primeiros, terminará em 31 de Dezembro de 2010, enquanto, para os segundos, não está previsto nenhum período transitório.

173   Conclui‑se que, ao não adoptar medidas transitórias no que respeita aos centros de coordenação cuja acreditação termina concomitantemente à notificação da decisão impugnada ou pouco tempo após a mencionada notificação, a Comissão violou o princípio geral da igualdade.

174   Resulta do exposto que a decisão impugnada deve ser anulada na medida em que não prevê medidas transitórias no que respeita aos centros de coordenação cujo pedido de renovação da acreditação estivesse pendente na data da notificação da decisão impugnada ou cuja acreditação caducasse concomitantemente à notificação da referida decisão ou pouco tempo após a mencionada notificação.

175   Na medida em que os recursos são procedentes, não há que examinar os outros fundamentos das petições.

 Quanto às despesas

176   Por força do disposto no artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Segundo o n.° 3 do mesmo artigo, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes.

177   Tendo o Reino da Bélgica pedido a condenação da Comissão nas despesas e tendo esta sido vencida, há que condená‑la nas despesas dos processos C‑182/03 e C‑182/03 R.

178   Tendo o Forum 187 pedido a condenação da Comissão nas despesas e tendo esta sido parcialmente vencida, há que condená‑la em metade das despesas do Forum 187 no processo C‑217/03 e na totalidade das despesas no processo C‑217/03 R.

179   Em contrapartida, tendo o Tribunal de Primeira Instância condenado o Forum 187 nas despesas do processo que esteve na origem do seu despacho Forum 187/Comissão, já referido, há que negar provimento ao pedido do Forum 187 destinado a obter a condenação da Comissão nas despesas desse processo.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

1)      A Decisão 2003/757/CE da Comissão, de 17 de Fevereiro de 2003, relativa ao regime de auxílios criado pela Bélgica a favor dos centros de coordenação estabelecidos neste país, é anulada na medida em que não prevê medidas transitórias no que respeita aos centros de coordenação cujo pedido de renovação da acreditação estivesse pendente na data da notificação da decisão impugnada ou cuja acreditação caducasse concomitantemente à notificação da referida decisão ou pouco tempo após a mencionada notificação.

2)      Quanto ao restante, é negado provimento ao recurso do Forum 187.

3)      A Comissão das Comunidades Europeias é condenada nas despesas do processo C‑182/03 e em metade das despesas do Forum 187 ASBL no processo C‑217/03.

4)      A Comissão das Comunidades Europeias é condenada nas despesas dos processos C‑182/03 R e C‑217/03 R.

Assinaturas


* Línguas de processo: francês e inglês.